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Capítulo 1
PROBLEMATIZANDO O ENSINO DA MÚSICA NO CONSERVATÓRIO

1.1) O PROBLEMA:

Uma pesquisa possui basicamente um questionamento principal, uma formulação


sucinta da dúvida em forma de pergunta, e que direciona todos os esforços na busca das possíveis
respostas. Não que tenhamos a certeza de obtê-las, porque sabemos de antemão que poderemos
no final, “concluir sem conclusões”, mas é estimulante saber que as coisas poderão não ser
exatamente as mesmas de quando começamos as investigações. Saberemos por exemplo, que
perguntas poderão ficar no ar, mas é melhor isso do que situações estáticas, de conformação ou
de neutralidade ante os fatos que desfilam perante nossos sentidos. Desta forma, considerando o
fenômeno da evasão, nos inquieta o fato de observarmos alunos abandonarem o curso, por vezes
temporariamente, outras vezes definitivamente, sem concluí-lo e também sem que tenhamos a
possibilidade de isolarmos a situação, e analisá-la, por curiosidade ou por puro instinto
investigativo. Por conseguinte, a formulação da pergunta que identificará ao leitor o problema em
pauta, seria: “O que provoca o fenômeno da evasão, no Conservatório Pernambucano de
Música?”. Conseqüências, sugestões de combate a isso, desdobramentos, etc., poderão surgir, no
entanto, e devemos deixar que o curso investigativo siga de forma natural, tomando-se para isso,
os cuidados e rigor científico que requerem qualquer trabalho de pesquisa.
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1.2) OBJETIVOS:

Partindo do princípio básico descrito pela definição do problema, os objetivos da


pesquisa passam a ser mais fáceis de serem descritos ou detectados. Com certeza, o leitor
levantará um questionamento, isto é, argüirá o porque da escolha de tal tema, já que temos
problemas demais na instituição (como poucos professores para a grande procura por vagas,
limitações financeiras, etc), e todos, à priori, de difícil solução. A análise de tudo o que se refere
às ramificações do problema “abandono de curso” (como veremos adiante), acreditamos que
responderá por si só todas as interrogações, e convergirão diretamente ao nosso objetivo
principal. Essa abrangência portanto, nos leva a apontar como meta prioritária, ou objetivo geral,
fazer surgir a preocupação ante o mencionado fenômeno, isto é, chamar a atenção da comunidade
do CPM, realçando que devemos “nos mexer”, buscando alternativas de ação, visando minimizar
as conseqüências a partir do combate das causas. Como objetivos secundários, as mencionadas
ramificações do problema nos auxiliarão a listá-los, isto é, auxiliar na otimização da oferta de
cursos e na incrementação das estatísticas de conclusão e emissão de diplomas, e por fim,
contribuir para melhorar o atendimento ao aluno, considerando todos os pontos relacionados,
diretamente ou indiretamente, à educação musical oferecida pela instituição.
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1.3) O ENSINO DE MÚSICA NA RMR

Como se trata de uma profissão com características próprias e singulares, faremos


inicialmente uma pequena descrição desta atividade, no seu universo mais profissional e
considerando a Região Metropolitana do Recife, para depois apresentar o que há em termos de
preparação do Músico para o mercado de trabalho.
Ter a profissão de Músico, na RMR, significa a priori, executar um instrumento, ser
cantor, ou ainda, ensinar numa escola particular ou em uma instituição pública. A opção do
ensino se dá ou em escolas especializadas em música, ou ainda, em escolas regulares particulares
ou públicas, onde se ministram aulas de música ou de arte. Criar e escrever, pelo menos
atualmente, ainda é uma prática profissional para poucos. Há de uma forma geral, uma
irregularidade na formação artística da maioria e carência no número de boas escolas, que
explicam essa irregularidade. Como se trata de arte, e principalmente, é uma atividade que não
põe em risco a integridade física de ninguém, o ensino anteriormente mencionado possui diversos
níveis de graduação, atendendo a todos os gostos e necessidades, sem que haja uma preocupação
governamental na averiguação da qualidade e objetivos dos diversos cursos oferecidos. O
nivelamento por baixo da qualidade musical oferecida ao público pela mídia, é responsável
principal e contribui bastante para o “pouco-caso” que se faz na hora de escolher que caminhos
trilhar para uma boa educação musical. Uma pequena confusão entre o trabalho profissional do
músico e a prática musical nas diversas manifestações culturais e folclóricas locais é também
constantemente verificada, provocando também um equívoco bastante comum: o músico
profissional deve sempre buscar a perfeição na sua prática, diferentemente do que ocorre na
música existente nos folguedos populares. Estes devem sempre direcionar sua execução musical
no sentido de satisfazer plenamente e perdurar uma tradição folclórica ou de cultura popular.
Um músico, cantando ou executando um instrumento qualquer, possui mercado de
trabalho junto à orquestras, bandas (civis e militares), coros, conjuntos musicais eruditos,
populares e mistos (como por exemplo em Igrejas), gravadoras, apresentações avulsas (como em
shows), etc. Conforme mencionamos acima, como professor licenciado ou não, o Músico tem
atividade docente através de aulas particulares em escolas privadas, e em uma das quatro escolas
públicas existentes: Conservatório Pernambucano de Música, Centro Profissionalizante de
Criatividade Musical do Recife, CEMO – Centro Musical de Olinda, e nos cursos de extensão e
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de terceiro grau da Universidade Federal de Pernambuco (voltados para futuros bacharéis e


licenciados em Música, possuindo também um curso de extensão). Como a Lei permite, alguns
professores acumulam a função de docente em duas escolas públicas apontadas anteriormente, ou
em uma delas e um cargo de músico na Orquestra Sinfônica do Recife ou Banda da Cidade do
Recife, dois importantes grupos musicais pertencentes à Prefeitura Cidade do Recife. Além disso,
há um mercado ainda em evolução, no ensino de música como parte da disciplina de Artes,
presente no programa do curso básico, notadamente nas escolas das Redes Públicas de Ensino.
Como dissemos antes, as funções de compositor (erudito mais raramente ainda), arranjador ou
pesquisador, são exercidas de forma irregular, por poucos músicos que tiveram a possibilidade de
se capacitarem. Atualmente, o interesse por essas áreas de atuação está aumentando, e existe a
cada dia uma renovação crescente e initerrupta, não só em quantidade mas como em qualidade.
Por outro lado, a preparação de um músico, de forma semelhante ao exercício desta
profissão, não possui uma padronização, e vários são os casos em que o indivíduo é iniciado e
aperfeiçoado sem qualquer metodologia escolar especializada. As experiências auto-didáticas, de
formação familiar, em bandas militares e de interior, nos grupos musicais nas Igrejas são
inúmeras, gerando quase sempre mão de obra pouco qualificada, recheada de vícios técnicos, de
postura, má qualidade sonora, inexistência de capacidade de identificação gráfica musical, etc. A
situação se agrava quando, independentemente da procedência do pleiteante ao exercício da
atividade musical profissional, uma prova na Ordem dos Músicos do Brasil, secção de
Pernambuco, o habilita formalmente perante a lei. Poderá a partir daí, possuir uma Carteira de
Músico Profissional, ao ser aprovado num exame básico de teoria e prática, ou de Músico
Prático, modalidade recém criada para acolher os que apenas executam um instrumento ou
cantam, sem necessidades ou conhecimentos mais aprofundados na área músical.
As instituições públicas mencionadas acima, financiadas pelo erário governamental
(nas tres esferas: municipal, estadual e federal), oferecem cursos organizados e mais completos, e
são oferecidos para aqueles que procuram uma maior amplitude de conhecimentos na área. Com
exceção ao Curso de Nível Superior da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE, são
oferecidos em nível médio, e alguns são apresentados com formato profissionalizante. Como todo
sistema de ensino público, proliferam-se as carências de material pedagógico, professores, etc., e
esse processo também contribui para uma formação limitada do músico.
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Já no caso das diversas escolas privadas de música, estas se propõem a ensinar


segmentos específicos do conhecimento musical, de uma forma mais leve, evitando quase sempre
grandes sofisticações, e procurando levar em consideração as diversas necessidades individuais.
Em geral, são voltadas para instrumentistas amadores, profissionais liberais, indivíduos da
terceira idade, crianças e adolescentes levadas pelos pais a uma complementação educacional,
diletantes em música, etc. Esta forma de ensino atrai normalmente, enfim, aqueles que não
objetivem uma profissionalização, ou estejam buscando conhecimentos superficiais em música,
entretanto, são muitas vezes suficientes para suprir necessidades pessoais numa determinada
prática musical. Verifica-se além disso, o surgimento de cursos de arranjo, harmonia e canto
voltados para um público mais especializado, dotado de um nível mais avançado de informações
técnicas e teóricas.
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1.4) O CONSERVATÓRIO PERNAMBUCANO DE MÚSICA

O Conservatório Pernambucano de Música possui uma página eletrônica, que apesar


de estar desatualizada, situa a instituição com informações de funcionamento, dados históricos,
corpo docente, grupos representativos, etc. Neste item, referenciaremos com alguns comentários,
os textos constantes na referida página eletrônica.
Inicialmente, reproduziremos na íntegra, as informações referentes à apresentação da
instituição em si:

“O CPM possui hoje cerca de 1.250 alunos, e um corpo docente formado por 95
professores. Funciona atualmente em dois prédios (sede e anexo), oferecendo cursos
regulares (Iniciação Musical, Preparatório e Curso Técnico em Instrumento e Canto) e
Cursos de Extensão (Livres). Promove, também, a reciclagem periódica dos seus
mestres, com vistas à melhoria da qualidade de ensino.
Numerosos eventos, com artistas de alto nível, são realizados em seu auditório,
permitindo ao seu alunado assistir e participar de concertos, que, além de enriquecerem a
vivência curricular, reelaboram o gosto musical dos jovens aprendizes dos mais variados
instrumentos.
O CPM possui ampla Biblioteca, Memorial Ernani Braga, e um dos melhores estúdios
de gravação do Estado; oferece cursos nas seguintes áreas:
Cordas: violino, violoncelo, contrabaixo, violão erudito, violão popular, cavaquinho,
bandolim e baixo elétrico.
Percussão: bateria e percussão erudita.
Sopro: trompete, trombone, trompa, saxofone, fagote, clarinete, flauta transversa e flauta
doce.
Teclados: piano erudito, piano popular, teclado, órgão e cravo.
Área vocal: canto.” (CONSERVATÓRIO PERNAMBUCANO DE MÚSICA.
Instituição)

Acrescentaríamos um comentário ao trecho, por conta da falta de alguns instrumentos


que não são oferecidos: na área erudita, o oboé e tuba, e na área popular, a guitarra elétrica. Como
possuímos na instituição, uma Orquestra Sinfônica e uma Big Band, esses instrumentos fazem
falta, e aparecem nas apresentações onde são necessários, através de convites feitos a
instrumentistas da cidade, ou participações voluntárias de alunos de outras instituições. E
adicionaríamos ao texto, por outro lado, a percussão popular e a viola (instrumento erudito), pois
são oferecidos e não constam na redação acima. O Memorial Ernani Braga está sendo usado
atualmente como sala de aula, e o Estúdio é pouco utilizado para gravações pois seu equipamento
carece ser atualizado. Segundo técnicos e músicos que conhecem o sistema de gravação do CPM,
os estúdios concorrentes investem pesadamente em novas máquinas, como mesas automatizadas
e computadores, provocando uma diminuição na procura existência na região de serviços mais
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rápidos, práticos e de menor custo. No entanto, a sala acústica utilizada para as gravações é uma
das maiores e seu projeto acústico é um dos melhores do Estado.
Em seqüência, através de outro “link”, pudemos ter contato com o histórico da
instituição, e entremearemos a transcrição integral do texto de acordo como o mesmo se encontra
no “site”, com considerações a respeito, baseadas em entrevistas com alguns professores
esclarecidos, e consulta a relatórios de administrações anteriores, existentes na Biblioteca do
CPM, com a finalidade de complementação ou de posicionamento crítico:

“O professor e maestro Ernani Braga, liderando outros ilustres músicos da época,


desenvolveu uma campanha em prol da criação do Conservatório Pernambucano de
Música, como um meio de elevar o nível de ensino da música, através da educação
musical. Ele não entendia como Recife - capital aberta às grandes iniciativas culturais e
com uma plêiade numerosa de músicos - não tivesse um estabelecimento de ensino do
gênero, dispondo de tão grande potencial docente”. (CONSERVATÓRIO
PERNAMBUCANO DE MÚSICA. Instituição. Histórico)

Conforme um relatório impresso da administração do Maestro Clóvis Pereira,


disponível na Biblioteca da instituição, a fundação se deu em 1º de agosto de 1930, e além do
Maestro Ernani Braga, constam como fundadores, a professora Maria Artur Orlando Paes
Barreto, maestros Manoel Augusto dos Santos, Luiz Oliveira e Vicente Fittipaldi. O documento
também menciona o maestro Nelson Ferreira como um dos integrantes do Conselho Deliberativo.
(CONSERVATÓRIO PERNAMBUCANO DE MÚSICA: Relatório de Atividades –
Administração Clóvis Pereira). Por outro lado, conforme o Manual de Organização do CPM
(também disponível na Biblioteca), a criação da instituição é antecedida e inspirada pela Semana
de Arte Moderna, e impulsionada pelo surgimento de equipamentos tecnológicos de gravação.
(MANUAL DE ORGANIZAÇÃO, Recife-1989)

“O deputado Arruda Falcão quis ser o intérprete deste grupo e apresentou o projeto de
criação do Conservatório Pernambucano de Música à Assembléia Legislativa, onde foi
aprovado. Com sede na cidade do Recife, a sua fundação deu-se em 17 de julho de 1930
e seria administrado pelo Diretor - o maestro Ernani Braga - e pela Congregação dos
Catedráticos, todos em caráter definitivo”. (ibid.)

Conforme podemos observar, no entanto, há uma divergência de datas de fundação, e


verificamos que o texto da página eletrônica divulgada na Internet é derivado quase que
integralmente, do mencionado Manual de Organização do ano de 1989. Continuando o texto,
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“O vocábulo "conservatório", na acepção específica de escola de música, provém da


cidade de Nápoles na Itália, onde o padre espanhol Juan de Tapia, em 1537, fundou o
Conservatório Della Madona de Loreta que recolhia crianças abandonadas, conseguindo
excelentes resultados na sua educação por meio do ensino da música, além de integrá-las
à comunidade através da arte.” (ibid.)

Consultando o Dicionário Aurélio Básico, a palavra “ Conservatório” revela ser um


“estabelecimento público destinado ao ensino das belas-artes”, no entanto, curiosamente, o
mesmo volume estabelece que “belas-artes” é a “designação comum às artes plásticas,
especialmente a pintura, a escultura e a arquitetura” (DICIONÁRIO AURÉLIO BÁSICO da
Língua Portuguesa, 1988, 687p.), não mencionando a música. Por outro lado, o Dicionário da
Mirador Internacional, aparentemente mais completo e abrangente, define que o vocábulo
“Conservatório” trata de um “estabelecimento de ensino destinado ao cultivo e ensino das belas-
artes, especialmente da música” e entende que “belas-artes” se refere às artes que “que têm por
objeto representar o belo: o desenho, a pintura, a escultura, a arquitetura, a música, a coreografia,
a arte dramática, a oratória e a poesia” (DICIONÁRIO BRASILEIRO DA LÍNGUA
PORTUGUESA, 1979). O texto da página eletrônica segue:

“No primeiro Estatuto do Conservatório Pernambucano de Música, aprovado pela


Congregação dos Catedráticos em 1º de agosto de 1930, constavam os seguintes
objetivos da entidade:
1) difundir o ensino teórico e prático da música, acessível a todas as classes sociais;
2) criar uma biblioteca e um museu da música;
3) formar o orfeão e a orquestra do Conservatório.
Iniciava o Conservatório as suas atividades oferecendo cursos de teoria e solfejo, canto
coral, harmonia, piano, violoncelo e canto harmônico, sendo as disciplinas teóricas, de
canto coral e harmonia, ministradas coletivamente e as disciplinas de instrumento e
canto lecionadas individualmente. Recife via no fardamento verde dos alunos do
Conservatório o acesso a uma arte que, até então, era privilégio da burguesia. Entretanto,
as audições dos alunos aconteciam no sempre lotado Teatro de Santa Isabel, para um
público elitizado.
O Estatuto tratava, das inscrições e formas de admissão, dos exames, dos concursos e
diplomas, dos deveres dos alunos, do corpo docente, das competências da Congregação
e do Diretor.
O Conservatório funcionava em prédio alugado, situado na esquina da rua Riachuelo
com a rua da União, ponto central da cidade e de fácil acesso aos alunos e professores.
Outro Estatuto, aprovado em janeiro de 1937, determinava que o ensino da música
ministrado no Conservatório fosse orientado pelo Instituto de Música do Rio de Janeiro
e criava os cursos de Ginástica Rítmica e Danças Clássicas a serem oferecidos em anexo
ao Conservatório. Determinava também que, após 3 (três) anos de teoria e solfejo, o
aluno freqüentaria as aulas de Harmonia, não podendo diplomar-se nos cursos de
Instrumento e Canto, sem ter cursado, no mínimo, o primeiro ano dessa disciplina.
Através da Portaria nº 202, de 09 de março de 1941, do Secretário do Interior, foi
aprovado o Regulamento que mantinha os objetivos iniciais do Conservatório, inclusive
aqueles que visavam criar uma biblioteca e um museu de música e formar o orfeão e a
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orquestra, podendo-se inferir que, após quase 11 (onze) anos de funcionamento, estes
objetivos não haviam sido alcançados.
Quando Pernambuco sofreu intervenção federal, o interventor Governador Agamenon
Magalhães nomeou nova Diretoria e, em 22 de março de 1941, transformou a entidade
em Autarquia Administrativa - Conservatório Pernambucano de Música, através do
Decreto nº 603, vinculando-a à Secretaria do Interior.
Os cursos ministrados permaneciam os mesmos, acrescidos, apenas, do curso de História
da Música. O regulamento inovava em relação aos cursos de extensão e aperfeiçoamento
a serem oferecidos fora do horário dos cursos regulares.
O regulamento ainda normatizava sobre:
1) o regime disciplinar discente;
2) as competências da Congregação e do Diretor Presidente;
3) o quadro de pessoal docente e o concurso de provimento dos cargos;
4) a escrituração escolar;
5) a conservação do acervo da Biblioteca;
6) as penalidades para os funcionários;
7) a origem dos recursos e o regime financeiro;
8) e a organização do patrimônio.
Ainda no ano de 1941, foi oficializada a criação da Orquestra Sinfônica do Recife, e
organizada pelo Governo do Estado com a colaboração do Conservatório, da Força
Policial, da Rádio Clube de Pernambuco e do Sindicato dos Músicos.” (ibid.)

Segundo a administração atual da Orquestra Sinfônica do Recife, a real criação do


conjunto se deu em julho de 1930, pelo maestro Vicente Fittipaldi. No entanto, existem
controvérsias quanto a data e situação em que ocorreu a sua fundação, pois o Professor e
Pesquisador José Amaro Santos da Silva, do Curso de Música da UFPE, defende que a Orquestra
surgiu na realidade, na época da fundação do Teatro de Santa Isabel, em meados do séc. XIX,
com o nome de Orquestra do Teatro de Santa Isabel, e possivelmente sendo inicialmente regida
pelo Maestro Inocenzzo Smoltz. Essa orquestra seria bem menor em tamanho que a atual, e era
utilizada para acompanhar as Companhias de Ópera vindas da Europa. Em 1929, o seu regente da
época, Euclides de Aquino Fonseca, veio a falecer, e o Maestro Fittipaldi a assumiu, na ocasião
com o nome de “Orquestra da Sociedade de Concertos Populares”, iniciando a sua fase histórica
que se distende até os dias de hoje. Continuando o texto eletrônico:

“Assim organizado, o Conservatório prossegue suas atividades até que, em 14 de


fevereiro de 1968, pelo Decreto nº 1.490 o então Governador do Estado Dr. Nilo de
Souza Coelho aprovava outro Regulamento que estabelecia como finalidade do
Conservatório a incrementação do bom gosto musical e a difusão e popularização do
ensino teórico e prático da música, nos níveis elementar e médio, para todas as classes
sociais.
O regulamento previa cursos de Iniciação Musical, Ginástica Rítmica, Teoria e Solfejo,
Canto, Canto Coral, Harmonia e História da Música, Piano, Violino, Viola, Violoncelo,
Contrabaixo, Flauta, Oboé, Clarinete, Fagote, Trompa, Trompete, Trombone e
Percussão.
Previa a organização de: um quarteto de cordas - para incrementar o gosto pelo estudo da
música de Câmera; um coral estadual com repertório religioso, erudito, folclórico e
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popular; uma banda de música infanto-juvenil; festivais e concursos regionais e


nacionais de música erudita e popular.
Regulamentava sobre a inscrição e admissão aos cursos, a sistemática de ensino, o
custeio, os exames e diplomas, o corpo discente, docente e a administração do
Conservatório, que se desdobrava em Diretor Presidente e Diretor Superintendente. O
Regulamento criava os seguintes órgãos: Secretaria, Assessoria Técnica e Assessoria
Jurídica.
Pelo Decreto nº 2.297, de 04 de fevereiro de 1971, do mesmo Governador Dr. Nilo
Coelho, extinguiu-se o cargo de Diretor Presidente.” (ibid.)

Neste ponto do texto, a redação passa a ser de responsabilidade da atual gestão, pois
passa a ser diferenciada do Manual de organização de 1989. Algumas complementações serão
fornecidas, apontadas por professores da instituição ou por fatos históricos por nós vivenciados
nos últimos quinze anos. Daí por diante, o texto eletrônico discorre da fase mais atual do CPM:

“O Conservatório Pernambucano de Música, atualmente está vinculado à Secretaria de


Educação e Cultura do Estado.
Para atender as novas demandas internas e externas do ensino musical, o Conservatório
entrou em nova fase de reestruturação organizacional, em agosto de 1989, buscando
adequar-se à nova realidade e aos desafios que, no final de século por certo, haveriam de
surgir, passando por uma ampla reforma administrativa e pedagógica concluída em 1990,
cujo envolvimento dos professores e dos profissionais de música na condução dos
trabalhos constituiu o elemento de maior força criativa na concepção de novo modelo
organizacional.
Os produtos normativos obtidos desta reforma administrativa foram:
I - O ESTATUTO que abordava as finalidades da instituição; a questão democrática
viabilizada pelo Conselho Deliberativo com representantes de todos os segmentos da
comunidade conservatoriana; os princípios organizacionais; as diretrizes pedagógicas
dos cursos regulares, de extensão, de aperfeiçoamento e livres; e o regime financeiro.
II - O REGIMENTO GERAL - que tratava da estrutura organizacional do Conservatório;
da organização e funcionamento dos cursos; dos direitos e deveres dos corpos discente,
docente, técnico, administrativo e dos profissionais de música; e do regime disciplinar;
III - O MANUAL DE ORGANIZAÇÃO com as atribuições de todas as unidades da
estrutura do Conservatório;” (ibid.)

Complementando com algumas informações adicionais, n a gestão do Maestro


Henrique Gregori, foram criados os concertos “Quartas Musicais”, e na primeira gestão da Profa.
Elyanna Silveira Varejão, foi adotado o Projeto Suzuki, criada a Biblioteca Henrique Gregori, e
realizado em 1990 o primeiro concurso público para contratação de professores através da
Secretaria de Educação. A gestão do Maestro Clovis Pereira foi marcada pela compra do prédio
vizinho ao CPM, e várias salas de aula foram construídas.
Em 1994 foi realizado um Concurso Público para provimento das vagas surgidas após
a aprovação do novo quadro de professores e funcionários do CPM, na segunda gestão do
maestro Cussy de Almeida, os quais foram contratados diretamente para a instituição, diferente
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de anos anteriores, onde todos os concursados passavam a ser ligados à Secretaria de Educação, e
encaminhados à disposição do Conservatório. O projeto Suzuki foi estendido à comunidade do
Alto do Céu.
Na segunda gestão da pianista Elyanna Caldas,

“foi proposta a inclusão dos cursos regulares de música para formação do profissional-
artista do nível médio do CPM, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
apresentada ao Deputado Federal Carlos Vasconcellos para defende-la na Câmara
Federal.
Em 1997, na gestão da pianista Elyanna Caldas, empreendeu-se uma reforma
pedagógica nos cursos do Conservatório, coordenada pela Professora e Pianista Jussiara
Albuquerque Corrêa de Oliveira, então Diretora do Departamento de Teoria Musical,
para ajustar o ensino profissionalizante de música promovido pelo CPM, à Lei 9.394/96
- Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.” (ibid.)

Além disso, foi criada a Orquestra de Câmara do CPM e integrados outros grupos
como representativos da instituição, entre eles o Sa Grama, o Quartetóide, o Trio Sonata e o
Allegretto. O texto neste ponto comenta sobre a adaptação da instituição à nova legislação
federal:

“A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB desvinculou a educação


regular do ensino profissionalizante e o MEC criou o Programa de Expansão da
Educação Profissional - PROEP, com vistas a implementar as reformas da educação
profissional no Brasil. A Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco, e a atual
Presidência do CPM, conseguiram a aprovação do MEC para um projeto que fará do
Conservatório Pernambucano de Música - CPM, um dos Centros de Educação
Profissional do Brasil na área de música, oferecendo cursos em todos os níveis: da
iniciação ao curso técnico de música.” (ibid.)

Em 2003, o Governo do Estado tentou através do Projeto de Lei Complementar


1388/2003, no seu art. 53, transformar o CPM em Organização Social, o que levaria a uma
privatização da casa, e sua conseqüente extinção. Através de uma forte pressão política realizada
pela comunidade da instituição, contando inclusive com um abaixo assinado contendo mais de
5.000 assinaturas, uma movimentação principalmente dos professores e do ex-dirigente da escola,
Maestro Cussy de Almeida, e um forte envolvimento de vários deputados, o Conservatório foi
poupado, e transformado em Superintendência, passando seu quadro para a folha salarial da
Secretaria de Educação do Estado. Ainda hoje a instituição não tem sua situação organizacional
definida, e a criação da Associação dos Professores e Funcionários ocorrida em 2005 pode ser
considerada como um marco importante para a defesa da instituição e de seus componentes.
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Ainda em 2005, foram inauguradas após mais de dois anos de obras, as novas
instalações da sede, com dezenas de salas num primeiro andar, uma dependência para ensaios, e
uma nova cantina ao lado do prédio principal. O texto da página eletrônica divulgada pela
Internet conclui como segue:

“O Conservatório Pernambucano de Música será, para o país, um pólo de estímulo à arte


musical, de avanço tecnológico e de mudanças nas relações do trabalho, projetando-se
como referência nacional na educação musical.
Vale assinalar o nome de todos aqueles que exerceram a direção do Conservatório
Pernambucano de Música, empreendendo uma incessante luta em prol da formação
musical dos alunos:
Ernani Braga - fundador (1930 - 1939)
Manoel Augusto dos Santos (1939 - 1967)
Cussy de Almeida (1967 - 1979)
Henrique Gregori (1979 - 1983)
Clóvis Pereira dos Santos (1983 - 1987)
Elyanna Silveira Varejão (1987 - 1990)
Cussy de Almeida (1991 - 1994)
Elyanna Silveira Varejão (1995-1998)
Jussiara Albuquerque C. de Oliveira - desde 1999” (ibid.)

Atualmente, há estudos sobre a criação do Plano de Cargos e Carreiras dos docentes e


funcionários administrativos do Conservatório, e foi criada a Associação dos Professores e
Funcionários do Conservatório Pernambucano de Música-APEFCPM, já com uma página
eletrônica, <http://spaces.msn.com/members/APEFCPM/>, para tratar de assuntos vários
relacionados com as classes envolvidas pela mesma.

1.5) METODOLOGIA UTILIZADA NA PESQUISA


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Para uma escolha sobre o tipo adequado de pesquisa a ser utilizado neste trabalho,
devemos refletir sobre a natureza do problema exposto, e a forma de apresentação que os dados
coletados devem possuir.
As características da evasão e do fracasso verificados num curso de música, cuja
essência deste reside na espontaneidade da procura do aluno pelo mesmo, nos remetem a uma
relação entre a demanda por parte da instituição e o interesse por parte de uma população no
aprendizado da música em uma escola especializada, como no caso, o Conservatório
Pernambucano de Música. Vale salientar (e a pesquisa de campo reforça isso) que esse interesse é
extremamente variado, e vão desde um simples desejo de se divertir com um instrumento
musical, até um real direcionamento visando a profissionalização.
A investigação Quantitativa, com suas características objetivas, numéricas e precisas,
e pelo fato de que “a crítica (ao seu uso) está no fato de se restringir a realidade social ao que
pode ser observado e quantificado apenas” (MINAYO, 1999, p. 30), será utilizada apenas como
coletora de informações numéricas junto à secretaria da instituição. Assim sendo, junto aos
registros escolares do Conservatório levantamos algumas informações, como a quantidade de
alunos que desistiram recentemente, tempo total do curso e duração das etapas (iniciação musical,
preparatório e médio). Temos assim uma visão global das estatísticas mais interessantes para a
natureza da pesquisa.
Procura-se, na verdade, perfis de um problema mais relacionados com a opinião
daqueles que abandonaram o curso de música por diversos fatores (e daqueles que conviveram
com estes de perto), do que com levantamentos numéricos frios (às vezes mal armazenados), e
simplesmente adquiridos nos registros da instituição. A subjetividade permeia, nesta pesquisa,
todo o processo investigatório, em contrapartida aos dados quantitativos, que conforme a crítica
referida acima “sacrificam os significados no altar do rigor matemático” (HARRISON: 1947, 10-
21; DILTHEY: 1956; WEBER: 1949; SCHUTZ: 1963; apud MINAYO, 1999, p. 31).
No entanto, as abordagens quantitativa e qualitativa podem conviver conjuntamente,
segundo alguns autores (CRONBACH et al., 1980; MILES e HUBERMAN, 1984; REICHARDT
e COOK, 1974 apud BOGDAN, 1994, p. 63). Conforme Mercurio, “freqüentemente, a estatística
descritiva e os resultados qualitativos têm sido apresentados conjuntamente” (MERCURIO, 1979
apud BOGDAN, 1995, p. 63). O nosso trabalho é traçar um paralelo entre as informações
estatísticas obtidas, a literatura encontrada, e os pareceres provenientes das fontes primárias e das
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secundárias, verificando a procedência ou não destes depoimentos, de acordo com os casos


encontrados.
A abordagem qualitativa também é alvo de críticas, as quais atingem vários pontos da
mesma. Conforme Minayo, a confusão formada entre um conceito científico e o empirismo
provocado pela descrição dos fatos, a ênfase na descrição destes, o envolvimento do pesquisador
na análise final e a dificuldade de se trabalhar com “estados mentais” são algumas das restrições
atribuídas à abordagem qualitativa (MINAYO, 1999, p. 36). No entanto, este tipo de investigação
é usado fortemente nas questões sociais, pois, o objeto desta forma de pesquisa, ainda de acordo
com Minayo, “se recusa (...) a se revelar apenas nos números ou a se igualar com sua própria
aparência” (MINAYO, 199, p. 36).
Prosseguindo com o estudo das abordagens a serem utilizadas na pesquisa,
consideremos a abordagem etnográfica numa investigação educacional, e sua conveniência no
presente trabalho. Segundo Firestone e Dawson, algumas características podem ser consideradas
no momento atual, como: a redescoberta do problema no campo; a permanência pessoal do
pesquisador no campo a maior parte do tempo; a possibilidade de vários tipos de coleta e
apresentação de vários dados primários. Entretanto, as considerações desta fonte a respeito de
uma longa duração do trabalho de campo e experiência pregressa do investigador com outras
culturas, acreditamos não se adequarem necessariamente à presente pesquisa (FIRESTONE e
DAWSON, 1981, apud LÜDKE e ANDRÉ, 1986, p. 14).
Além disso, a observação participante relacionada com a pesquisa etnográfica, não
nos parece útil à finalidade da nossa investigação, pois os principais sujeitos a serem procurados,
e portadores de informações primárias são exatamente os alunos que abandonaram a instituição, e
serão contactados em outras localidades (ou por telefone, como foi o caso), externamente ao
Conservatório. Em resumo, na questão da evasão considerada, não há o que observar dentro do
espaço escolar, a não ser que se formulem suspeitas que relacionem o fenômeno investigado com
alguma prática, a ser observada, existente no cotidiano, o que acreditamos não ser o caso.
Como estamos concentrando nossas investigações numa única instituição escolar (o
Conservatório Pernambucano de Música), e também num único fenômeno (a evasão que está
sendo estudada), acreditamos que estamos diante de um estudo de caso, o qual será analisado em
seguida.
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Segundo Merriam, “o estudo de caso consiste na observação detalhada de um


contexto, ou indivíduo, de uma única fonte de documentos ou de um acontecimento específico”
(MERRIAM, 1988, apud BOGDAN, 1994, p. 89), e desta forma, podemos traçar um elo de
ligação entre a afirmação acima citada e o caso da evasão observada no Conservatório
Pernambucano de Música. Nosso trabalho é averiguar as possíveis causas e, se for o caso, propor
ou não sugestões para minimizar ou solucionar o problema. Também é possível não se chegar a
conclusão alguma! Definir claramente os contornos do caso também é desafiador, pois podemos
ou não associar o fenômeno em estudo a outros por similaridade, ou ainda (o que é mais difícil),
concluir que exista uma singularidade no que ocorre na instituição.
Conforme Menga Lüdke, o estudo de caso possui uma série de características, e
assim, podemos considerar que:
a) “Os estudos de caso visam à descoberta”: isto é, novos horizontes, aspectos ou elementos
poderão surgir no decorrer da pesquisa, refazendo a cada momento a construção do
conhecimento. Não podemos esquecer que, no nosso caso, estaremos evoluindo num
horizonte meio que desconhecido, não que inexistam possíveis hipóteses, e sim, podemos
esperar surpresas a cada passo, na evolução do trabalho de campo (e isso realmente
ocorreu no decorrer dos contatos com ex-alunos).
b) “Os estudos de caso enfatizam a interpretação em contexto”: onde vários fatores e o
momento influenciam o contexto em que se situa(m) o(s) objeto(s) e o(s) sujeito(s)
envolvido(s) na pesquisa. Para que isto ocorra, optamos em restringir ao biênio 2003-
2004 o período estudado, onde os contextos institucionais e políticos podem ser
considerados com singulares semelhantes (restrições às contratações e afastamentos de
professores cada vez mais freqüentes por aposentadorias, licenças, etc, reformas físicas do
prédio, muitos anexos e poucas condições de trabalho, grande interesse verificado pelo
Vestibular para Música, etc).
c) “Os estudos de caso buscam retratar a realidade de forma completa e profunda”: desta
forma há uma enfatização da complexidade das situações com as quais o pesquisador se
depara. No caso em questão, vários fatores tornarão o estudo mais complexo, e com
possíveis conclusões que venham particularizar situações e/ou generalizar outras. Isso
porque, como veremos adiante, diversificadas serão as informações colhidas em campo,
provenientes dos depoimentos dos professores entrevistados, dos alunos e dos ex-alunos.
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d) “Os estudos de caso usam uma variedade de fontes de informação”: assemelhando-se


neste caso à uma das características da abordagem etnográfica, e onde há uma coleta em
diversos momentos, situações e informantes. No nosso caso, podemos citar os quatro
sujeitos (professores, alunos matriculados, alunos com matrícula trancada e alunos que
abandonaram o curso) e informações levantadas na secretaria como fontes de informação.
Vale salientar nesse ponto do texto, os critérios que nos levaram a escolher os
mencionados sujeitos. O corpo docente do CPM, nos parece guardar uma grande
quantidade de histórias de vida relacionadas com os alunos, durante anos. Como não
existem turmas muito numerosas, e grande parte das aulas é individualizada (por
exemplo, aulas de instrumento), a interação professor-aluno é muito grande, permitindo
um estreitamento de relações aprofundado cotidianamente. Isto é, o que poderiam revelar
(o que de fato aconteceu), poderia seria de fato importante (como realmente o foi). No
caso dos alunos regularmente matriculados no Conservatório, julgamos interessante os
seus depoimentos, pois é com esta clientela que devemos nos preocupar, evitando que se
tornam evadidos. Os serviços prestados pela instituição, o atendimento observado nos
diversos setores, as relações de conflito que existem no CPM, tudo isso nos interessa.
Principalmente, é de grande relevância saber se algo hoje, no Conservatório, levaria
algum aluno a abandonar o curso. Não é de interesse de ninguém (não só do professor e
da escola, mas também do Governo), verificarmos um investimento, por menor que seja,
na educação musical de um aluno que não conclua integralmente o curso. Quanto aos ex-
alunos procurados, o interesse nosso nas informações obtidas é óbvio.
e) “Os estudos de caso revelam experiência vicária e permitem generalizações
naturalísticas”: considerando-se assim as experiências anteriores dos informantes ou
sujeitos, em confrontação com informações obtidas nas fases já completadas da pesquisa.
f) “Estudos de caso procuram representar os diferentes e às vezes conflitantes pontos de
vista presentes numa situação social”: isto estará com certeza presente na pesquisa,
quando vários sujeitos externam uma opinião sobre a evasão escolar, e diversas situações
surgirão, com histórias de vida quase que invariavelmente possuindo caminhos, interesses
e preocupações conflitantes. Foi o que observamos, principalmente se consideramos os
diversos interesses por parte do público, e também os posicionamentos dos entrevistados.
23

g) “Os relatos do estudo de caso utilizam uma linguagem e uma forma mais acessível do que
os outros relatórios de pesquisa”: como a fonte principal, isto é, os depoimentos
considerados primários são provenientes dos que vivenciaram pessoalmente a evasão de
uma escola de música, podemos esperar uma linguagem acessível, num “estilo informal,
narrativo, ilustrado por figuras de linguagem, citações, exemplos e descrições” (LÜDKE e
ANDRE, 1986, pp. 18-20). Como veremos adiante, é mais um detalhe que será percebido
no decorrer da investigação.
Um estudo de caso é desenvolvido, segundo Nisbet e Watt (1978, apud LÜDKE e
ANDRÉ, 1986, p. 21), em tres fases:
(I) uma exploratória, com os primeiros passos na investigação, onde os dados
iniciais emergem através de diversas fontes: literatura, observação,
depoimentos, documentação, experiências, etc., e vão sendo explicitados,
reformulados ou abandonados conforme a situação.
(II) uma outra mais sistemática na coleta de dados, onde se inicia uma depuração
mais conscienciosa das informações, isso depois de uma identificação dos
contornos do problema em questão.
(III) e uma terceira, com a análise e interpretação sistemática dos dados coletados,
seguindo-se a elaboração do relatório conclusivo.
Com isso, podemos como pressupostos de uma metodologia, recolher dados
quantitativos e informações nas observações do cotidiano, conversas informais com professores e
funcionários, norteando a pesquisa para a escolha de métodos de coleta mais sistemáticos e
organizados, agora sim, em um trabalho efetivamente de campo. No nosso caso, essas
considerações podem ser relacionadas ao período (efetivo) de mais de duas décadas que o autor
desta pesquisa possui na instituição, suas observações, relacionamentos e experiências várias. Por
conseguinte, estes conhecimentos prévios facilitaram e aceleram em parte, os processos iniciais
investigatórios.
Nesta fase da investigação, algumas considerações deverão ser feitas, principalmente
por se tratar de uma instituição onde regularmente desenvolvemos nosso trabalho pedagógico.
Dos três métodos que mencionaremos a princípio, a observação participante, como dissemos
anteriormente, não se faz necessária, pelos motivos que expusemos ao tecermos considerações
sobre abordagem etnográfica. A análise documental foi utilizada no momento da consulta às
24

fichas individuais do corpo discente. Inicialmente, ao definirmos os sujeitos da pesquisa


(professores e alunos regularmente matriculados e freqüentando, denominados de “Fontes
Secundárias”; alunos com matrícula trancada e os que abandonaram o curso denominados de
“Fontes Primárias”, englobando tanto os indicados por pessoas da comunidade, quanto os
aleatoriamente escolhidos por sorteio), necessitamos de listagens que possuam nomes de alunos
evadidos. A entrevista foi utilizada na pesquisa, exclusivamente para colher informações de dez
professores e coordenadores (escolhidos usando-se critérios de representatividade por áreas), e
dessa forma, mais de oito horas de depoimentos foram gravados e transcritos em mais de 160
páginas. Assim sendo, faremos uma descrição cronológica dos procedimentos adotados para
coleta de dados.
(I) Como dissemos, dez professores foram selecionados para as entrevistas, todos
concursados e com mais de dez anos de casa. Adotamos estes critérios de escolha para
que pudéssemos coletar dados enriquecidos com as vastas experiências pessoais que
cada um desses profissionais têm nas suas áreas e práticas docentes. Os professores
com contratos temporários têm todos menos de dois anos de exercício profissional, e
não têm vínculos sólidos com a instituição, por isso não foram selecionados.
Abordamos nas entrevistas basicamente 3 aspectos: a) Se o entrevistado reconhece a
evasão como um fato importante no CPM; b) Na perspectiva individual de cada
professor, quais as situações que provocam (ou provocaram) a evasão; c) Que
sugestões dariam estes mesmos professores para sanar ou minimizar esse tipo de
problema. Todos os docentes foram informados antecipadamente que as identidades
dos mesmos serão mantidas em sigilo, e que as informações prestadas serão
repassadas à pesquisa com uma codificação própria. Dessa forma, neste trabalho, os
docentes foram denominados FS01, FS02, etc (significando Fonte Secundária 01,
Fonte Secundária 02, etc), evitando-se com isso qualquer identificação nominal. A
única dificuldade encontrada nessa fase, foi a conciliação de horários para que a
entrevista fosse realizada. No entanto, inúmeras foram as contribuições colhidas nas
considerações experienciais e críticas de cada docente. As entrevistas foram
registradas num gravador digital, e após a conclusão das mesmas, foram uma a uma
pacientemente transcritas, e as informações, analisadas, categorizadas e utilizadas no
próximo capítulo deste trabalho.
25

(II) Ao mesmo tempo que as entrevistas eram realizadas, por solicitação nossa, uma
relação com 570 nomes de alunos que abandonaram o curso e um outra com 453
nomes de alunos considerados “trancados” nos foram fornecidas pela secretaria da
escola, todos com desistência recente (máximo de dois anos desde que se evadiram).
Destas listagens (que serviram de base para todos as nossas investigações junto ao
corpo discente evadido), inicialmente sorteamos 25 nomes de cada uma, e solicitamos
da secretaria os telefones de contato e datas de nascimento constantes nas fichas
individuais. Por conseguinte, 50 ex-alunos seriam por telefone contactados, e após
serem informados da pesquisa, responderiam à pergunta-chave da investigação: “Qual
ou quais os motivos o levaram a deixar o curso no Conservatório?”. Entretanto,
conseguimos o contato com apenas vinte e quatro ex-discentes, devido à números
equivocados de telefones, ou telefones inexistentes, apesar de provenientes dos
próprios arquivos da secretaria. As respostas obtidas, no entanto, foram
surpreendentes, e deram subsídios extraordinários à pesquisa.
(III) Além desses ex-alunos contactados por telefone, 7 outros responderam pessoalmente
(6 que abandonaram e 1 que trancou o curso), preenchendo questionários específicos
(vide anexos); esses ex-alunos foram indicados por professores e alunos do CPM.
(IV) Quase que ao mesmo tempo que o item anterior, 50 alunos regularmente matriculados
e cursando, responderam a outro questionário (vide anexos) onde a principal pergunta
foi: “algum ou alguns dos motivos abaixo expostos, poderiam ser importantes numa
decisão sua de abandonar o Conservatório?”, e 25 possíveis itens-respostas foram
expostas para livre escolha, sendo a última discursiva. Duas outras perguntas também
foram formuladas, sondando-se se os alunos matriculados conhecem algum(ns)
aluno(s) evadido(s), e se conheciam os motivos pelos quais os colegas passaram a ser
considerados desistentes do curso de música.
(V) Como julgamos ser insuficiente a quantidade de questionários colhidos e respondidos
pelos ex-alunos (item II), mais uma vez com o auxílio da secretaria fizemos uma nova
listagem com mais 50 nomes de evadidos (mais 25 “trancados” e 25 “em abandono”),
também com informações de telefones de contato, datas de nascimento e instrumento
que estudavam. Nessa “leva” de nomes, conseguimos fazer contato com vinte e dois
ex-alunos (ou seus pais). Assim sendo, e organizando de uma forma mais estatística,
26

46% de todos os alunos listados foram efetivamente contactados (itens II e V, um total


de 100 ex-alunos, nas duas ocasiões que foram feitos os levantamentos) e 6% não
tinham número de telefone na ficha da escola; um total de 21 alunos em estado de
trancamento (cerca de 19,6 %) responderam os questionários, e 34 em situação de
abandono de curso (cerca de 31,8%) também o fizeram, isso incluindo os que foram
listados pela secretaria e atenderam o telefone, somados aos 7 ex-alunos que
responderam pessoalmente à pesquisa. Finalmente, contabilizamos um total de 56
números de telefones que apresentaram problemas vários (número inexistente,
telefone fora de área, número errado (com a ligação sendo atendida, isto é, como
engano), telefone chamado sem atender ou constantemente ocupado).
(VI) Enquanto a pesquisa de campo (com os sujeitos) era desenvolvida, uma investigação
na literatura existente foi realizada, e considerando que no nosso caso nada foi
encontrado sobre o tema, envolvendo escolas de música, doze obras sobre evasão em
escolas regulares (Ensino Médio e Superior) foram consultadas e pesquisadas, e
consideramos trechos que julgamos semelhantes aos possíveis casos de evasão no
Conservatório Pernambucano de Música.
Decidimos, pois, que traçaríamos paralelos entre as informações colhidas nessas
publicações e na pesquisa de campo, isto é, as entrevistas com os professores, e os questionários
preenchidos ou respondidos pelos alunos com o que se colhia nos livros consultados. O fato de
não termos encontrado nada que nos fosse referência ao tema evasão em uma escola de música,
isso já era esperado, mesmo porque ainda que consideremos casos semelhantes, “não há dois
sistemas escolares que estejam organizados exatamente do mesmo modo” (BOGDAN, 1994, p.
116), e no caso do Conservatório, também era de se esperar que nada seria encontrado e que
pudesse ser considerado como caso precedente, já que não encontramos nada a respeito na
biblioteca da instituição. No entanto, as publicações sobre a evasão e fracasso escolar nos
esclareceram sobre comportamentos e histórias de vida, existentes nas escolas tradicionais em
todos os níveis, ajudando a pesquisa no que se refere ao entendimento do comportamento dos
alunos, de uma forma geral.
O Conservatório Pernambucano de Música, como já dissemos neste sub-capítulo, foi
o Universo pesquisado, por opção investigativa. A escolha se deve ao fato de pertencermos ao seu
quadro funcional, e nos interessam assuntos que dizem respeito à evolução positiva da instituição.
27

Além disso, ingressamos nessa escola como aluno em 1965, e lá freqüentamos alguns cursos
durante doze anos, o que demonstra nossa preocupação com os problemas que a ela se referem.
Os sujeitos de pesquisa, na nossa ótica, devem ser os atores que mais se aproximam da
problemática da evasão escolar, isto é, professores e alunos. Isto nos parece óbvio a princípio,
pois nenhum outro fator pedagógico envolvido com a prática escolar têm poder decisivo no
afastamento do aluno da instituição. É verdade que um mau atendimento por parte de setores
administrativos da escola podem levar a uma desmotivação e conseqüente evasão, mas
preferimos aguardar os diversos depoimentos dos alunos para caracterizar esse problema. A
evasão escolar é inerente ao corpo discente, ou no máximo, aos seus pais ou responsáveis. Por
isso, como primeira opção, consideramos o aluno que trancou ou abandonou o curso de música,
mas também incluímos nesta categoria, pais ou responsáveis de crianças ou pré-adolescentes.
Alguns foram contactados e deram seus depoimentos valiosos, como veremos adiante. Todos
estes personagens, enfim, forneceram depoimentos bastante expressivos para a investigação, pois
sempre acreditamos e reiteramos que o fenômeno relacionado com a evasão na escola, é uma
atitude voluntária e própria do estudante (ou seus pais), e o que eles têm a dizer é importante e
alvo de nossas investigações. Também não abordamos quaisquer discussões sobre o pensamento
da instituição no que se refere à inclusão ou exclusão social, ausência ou não de uma preocupação
da mesma com o patamar referencial artístico existente na região, etc, pois acreditamos que isso é
para considerações posteriores e fogem do escopo deste trabalho.
Com relação aos instrumentos de pesquisa, conforme comentamos anteriormente,
consideramos alguma análise documental (a que foi possível), questionários, e principalmente a
entrevista. Os arquivos do Conservatório necessitam ser atualizados e muitas informações de
arquivos são inexistentes ou equivocadas. No caso da entrevista, esta modalidade de coleta de
dados uma ferramenta poderosíssima na investigação do problema, já que a subjetividade
associada ao tema em pauta é evidente e óbvia, e “a entrevista é utilizada para recolher dados
descritivos na linguagem do próprio sujeito” (BOGDAN, 1994, p. 134). O caráter pessoal dos
depoimentos das diversas entrevistas já era esperado, visto que é uma característica importante da
entrevista. A elaboração de questionários fechados poderia provocar uma sistematização
exagerada de respostas, e isso não seria, ao nosso ver, de grande utilidade. Por conseguinte, com
a finalidade de colher melhores resultados, adotamos a entrevista semi-estruturada com
características da não-padronizada, pois isso dependia (como de fato aconteceu) da
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personalidade, experiência e cultura do entrevistado. O objetivo principal era deixar o


entrevistado se expressar com liberdade e tranqüilidade, não se sentindo ele constrangido como
se estivesse num inquérito policial. Isso porque “as boas entrevistas caracterizam-se pelo fato de
os sujeitos estarem à vontade e falarem livremente sobre os seus pontos de vista” com “riqueza
de dados, recheadas de palavras que revelam as perspectivas dos respondentes” (BOGDAN,
1994, p. 136). “Assegure-lhes que não vai usar o seu nome ou que vai disfarçar a morada”
(BOGDAN, 1994, p. 119), e a franqueza nas respostas será obtida, ajudando fortemente nos
nossos resultados finais, e principalmente na análise comparativa dos pontos de vista dos
entrevistados. Entretanto, lançamos mão de um roteiro, para evitar divagações sem muita
utilidade, e poupar tempo. Essas divagações realmente aconteceram a despeito dos cuidados do
entrevistador, mas como a mesma tornou-se inevitável em algumas ocasiões, as usamos para
tornar a conversa agradável e descontraída. No caso de nossa pesquisa, os motivos que levaram
ao abandono ou trancamento de curso foram expostos da melhor maneira possível, e orientações
discretas por parte do entrevistador conduziram a uma maior objetividade dos depoimentos.
Tínhamos consciência de que quanto mais nos aprofundarmos nos depoimentos, melhor, pois
dessa forma poderíamos passar a conhecer mais o pensamento do entrevistado, já que “os
pormenores e detalhes particulares são revelados a partir de perguntas que exigem exploração”
(BOGDAN, 1994, p. 136). Ao planejar as entrevistas, estávamos prontos para esperar ter que
tivéssemos que contornar alguns problemas, pois “na maioria dos estudos que implicam
entrevistas, terá de pedir individualmente a cada um dos entrevistados para cooperar, ainda que
geralmente os sujeitos estejam ligados à mesma instituição” (BOGDAN, 1994, p. 120). O corpo
docente, no entanto, esclareceu brilhantemente vários pontos relacionados ao cotidiano e ao
comportamento dos alunos, observados por outras óticas.

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