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11/10/2019 Por que o novo 'Aladdin' reforça estereótipos sobre a cultura árabe?

- Revista Galileu | Cinema

CINEMA

Por que o novo 'Aladdin' reforça


estereótipos sobre a cultura árabe?
Professora especialista em etnias analisa como Hollywood
insiste em retratar clichês do Oriente Médio como uma região
romântica, exótica e de terroristas

6 min de leitura

Evelyn Alsultany*
30 Mai 2019 - 09h37 | Atualizado em 30 Mai 2019 - 11h22

Naomi Scotti, como Jasmine, e Mena Massoud, como Aladdin (Foto:


Reprodução/Disney)

Embora aclamado pela crítica e adorado pelo público, o longa


Aladdin de 1992 teve sérios problemas com a formação de
estereótipos. Por isso, a Disney queria evitar repetir os
problemas na versão live-action, lançada em 24 de maio. Eles
procuraram o Conselho Consultivo Comunitário formado por

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acadêmicos, ativistas e artistas do Oriente Médio, do Sul da


Ásia e muçulmanos.

Fui convidado para fazer parte do grupo por causa de minha


experiência em representações de árabes e muçulmanos na
mídia dos Estados Unidos. O fato de um grande estúdio
querer ouvir a comunidade árabe reflete o crescente
compromisso de Hollywood com a diversidade.

Mas enquanto o live-action de Aladdin consegue retificar


alguns estereótipos, ainda deixa muito a desejar.

Gênios mágicos e xeques lascivos


No livro Orientalismo: O Oriente como invenção do Ocidente,
de 1978, o professor de literatura Edward Said argumentou
que as culturas ocidentais historicamente estereotiparam o
Oriente Médio para justificar o controle sobre ele.

O orientalismo em Hollywood tem uma longa história. Os


primeiros filmes, como O Sheik (1921) e As Mil e uma Noites
(1942), retratam o Oriente Médio como uma terra de fantasia
monolítica – um deserto mágico repleto de gênios, tapetes
voadores e homens ricos que vivem em palácios opulentos
com suas meninas de harém.
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Filme O Shiek, de 1921 (Foto: Reprodução)

Embora essas representações fossem indiscutivelmente tolas


e inofensivas, elas achataram as diferenças entre as diversas
culturas do Oriente Médio, ao mesmo tempo em que
retratavam a região como atrasada e necessitada de
civilização pelo Ocidente.

Depois veio uma série de conflitos na região: a guerra árabe-


israelense de 1967, o embargo do petróleo árabe de 1973, a
crise dos reféns no Irã e a Guerra do Golfo. Na mídia norte-
americana, o exótico Oriente Médio desapareceu, e surgiram
representações de violência e terroristas sinistros.

Como observou Jack G. Shaheen, acadêmico de mídia,


centenas de filmes de Hollywood nos últimos 50 anos ligaram
o Islã à guerra santa e ao terrorismo, ao mesmo tempo em que
descrevem os muçulmanos como “invasores alienígenas
hostis” ou “xeques lascivos com intenção de usar armas
nucleares”.

Leia também:
+ 'Aladdin': live-action contagia pela animação e efeitos
incríveis
+ Quatro perguntas e respostas para conhecer o
Islamismo

Momentos dignos na animação Aladdin


Contra esse pano de fundo, o Orientalismo da animação
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de 1992 não foi tão surpreendente. A letra da música de


abertura, na versão em inglês, descreve um terreno "ende eles
cortam sua orelha se eles não gostam do seu rosto" e "é
bárbaro, mas hey, está em casa!".

Quando o Comitê Anti-Discriminatório Americano-Árabe


protestou contra as letras, a Disney retirou a referência de
cortar as orelhas no filme que foi vendido em VHS e DVD, mas
deixou o termo “bárbaro”.

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Animação Aladdin, da Disney, de 1992 (Foto: Reprodução/Disney)

Depois, havia as formas pelas quais os personagens eram


retratados. Como muitos notaram, os maus árabes são feios e
têm sotaques estrangeiros, enquanto os bons árabes – Aladdin
e Jasmine – possuem características européias, são quase
brancos e sotaque norte-americano.

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O filme também continuou a tradição de apagar distinções


entre as diversas culturas do Oriente Médio. Por exemplo,
Jasmine, que deveria ser de Agrabah – originalmente Bagdá,
mas ficcionalizado por causa da Guerra do Golfo em 1991 –
tem um tigre chamado Rajah.

Progresso questionável
Após o 11 de setembro, surgiram longas que reencenaram
antigos terroristas. Mas, surpreendentemente, algumas
representações positivas de personagens do Oriente Médio e
muçulmanos foram produzidas.

Em 2012, publiquei meu livro Árabes e Muçulmanos na Mídia:


Raça e Representação após o 11 de setembro. Nele, detalho
as estratégias que escritores e produtores usaram após os
ataques para compensar os estereótipos.

O mais comum é a inclusão de um patriota do Oriente Médio


ou de um muçulmano norte-americano, para "equilibrar" suas
representações como terroristas. Na série de TV Homeland,
por exemplo, Fara Sherazi, analista da CIA, é muçulmana de
descendência iraniana e norte-americana. Ela é morta por um
terrorista muçulmano, mostrando que "bons" muçulmanos
norte-americanos estão dispostos a morrer pelos Estados
Unidos.

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Personagem Fara Sherazi, da série Homeland (Foto: Reprodução)

Mas isso não mudou o fato de que o Oriente Médio e os


muçulmanos eram, de modo geral, retratados como ameaças
ao Ocidente. Adicionar um "bom" personagem do Oriente
Médio não ajuda a combater estereótipos quando a maioria
ainda aparece em histórias sobre terrorismo.

Outra estratégia também surgiu nos roteiros: reverter para


velhas tropas orientalistas do exótico e romântico Oriente
Médio. Talvez escritores e produtores acreditassem que
representar a região como exótica seria melhor do que
associá-la ao terrorismo.

O filme de 2004, Mar de Fogo, por exemplo, conta a história de


um caubói norte-americano que viaja ao deserto da Arábia em
1891 para participar de uma corrida de cavalos. Na moda
orientalista clássica, ele salva a filha do xeque rico do sobrinho
que é maligno e faminto de poder.

Já o longa Victoria e Abdul, de 2017, descreve uma improvável


amizade entre a rainha Victoria e seu servo indiano-
muçulmano, Abdul Karim. Enquanto o filme critica o racismo e
a islamofobia da Inglaterra do século XIX, também infantiliza e
exotiza Abdul.

No entanto, alguns problemas gritantes persistiram. Jake


Gyllenhaal foi escalado para o papel principal de O Príncipe da
Pérsia: As Areias do Tempo (2010), enquanto Christian Bale e
Joel Edgerton foram escalados em Êxodo: Deuses e Reis
(2014) como personagens egípcios. E por que atores brancos
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assumiram esses papéis? Quando desafiado, o produtor


Ridley Scott infamemente afirmou que ele não poderia “dizer
que meu ator principal é Mohammad fulano de tal e tal coisa.
Não vou financiar isso”.
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Vilão Jafar, de Aladdin, 1992 (Foto: Reprodução/Disney)

O novo Aladdin tem progressos?


Talvez como desejo de evitar erros do passado, os executivos
da Disney procuraram conselhos de consultores culturais como
eu. Certamente, há progressos notáveis na versão live-action.

O ator canadense-egípcio, Mena Massoud, faz o papel de


Aladdin. Dada a escassez de pessoas de ascendência do
Oriente Médio em papéis de protagonismo, a importância de
escalar Massoud não pode ser exagerada. E apesar do fato de
alguns brancos terem sua pele escurecida durante as

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filmagens, a Disney colocou atores com descendência árabe


na produção.

A decisão de ter atriz britânica-indiana, Naomi Scott, como


Jasmine era controversa. Muitos esperavam ver uma atriz
árabe ou do Oriente Médio nesse papel, e se perguntavam se
a escolha de alguém de ascendência indiana simplesmente
reforçaria as noções de intercambiabilidade "oriental". No
entanto, o filme faz referência que a mãe de Jasmine é de
outra terra.

O maior problema com o Aladdin de 2019 é que perpetua a


tendência de reverter ao Orientalismo mágico – como se fosse
uma melhoria em relação aos retratos de terroristas. Na
verdade, não é animador trocar o racismo explícito pelo
exotismo clichê. Para ser justo, Aladdin distingue-se de
Hidalgo e outros filmes orientalistas com essa tendência, visto
que não gira em torno das experiências de um protagonista
branco.

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Filme Aladdin, de 2019 (Foto: Reprodução/Disney)

No entanto, mais uma vez, os personagens com sotaque


norte-americano são os “mocinhos”, enquanto aqueles com
sotaques não-americanos são em grande parte, mas não
inteiramente, “ruins”. E o público hoje será tão pressionado
quanto em 1992 para identificar quaisquer culturas distintas do
Oriente Médio além daquelas de um “Oriente”
supergeneralizado. Dança do ventre e dança de Bollywood,
turbantes e keffiyehs, sotaques iranianos e árabes – todos
aparecem no filme de forma intercambiável.

Assim como fazer ajustes positivos em uma história sobre o


terrorismo não é muito importante, o mesmo acontece na
trama sobre o Oriente exótico. Diversificar representações
requer ir além desses tópicos e expandir as narrativas.

Aladdin, é claro, é um conto fantástico, então perguntas sobre


precisão representacional podem parecer exageradas. É
também um filme divertido em que Mena Massoud, Naomi
Scott e Will Smith brilham. Mas ao longo do último século,
Hollywood produziu mais de 900 longas que estereotipam
árabes e muçulmanos – o que influencia a opinião pública e as
políticas públicas.

Se houvesse 900 filmes que não retratassem árabes, iranianos


e muçulmanos como terroristas, títulos como Aladdin poderiam
ser "apenas entretenimento". Até lá, teremos que esperar que
o gênio deixe retratos mais sutis e diversificados da lâmpada.
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* Evelyn Alsultany é professora de Estudos Americanos e


Etnia, da Faculdade de Letras, Artes e Ciências da
Universidade do Sul da Califórnia Dornsife, nos EUA. Este
artigo foi escrito em inglês e originalmente publicado no The
Conversation.

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