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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa

constitucional

A REVOGAÇÃO DAS ISENÇÕES TRIBUTÁRIAS E A NÃO-SURPRESA


CONSTITUCIONAL

Revista Tributária e de Finanças Públicas | vol. 86/2009 | p. 261 - 304 | Maio - Jun /
2009
DTR\2011\1417
___________________________________________________________________________
Rogério Wanderley Guasti
Mestre em Direito e Economia pela UGF. MBA em Direito Tributário pela FGV/Rio.
Professor de Direito Tributário da UFES, Fabavi, Faculdade Pitágoras de Linhares/ES e
Metodista/ES e da pós-graduação da Faesa. Advogado.

Área do Direito: Constitucional; Tributário

Resumo: Atualmente, o assunto da revogação das isenções ganha terreno no fórum de


debates da doutrina devido à valorização do princípio da segurança jurídica em virtude
da égide da exaltação aos direitos humanos. E, como o princípio da não-surpresa é
corolário deste, apontado por alguns como direito fundamental, na proteção de uma
relação legítima, equilibrada e leal, entre o Fisco e o contribuinte. Desenvolve-se este
estudo como o fim de propor considerações acerca da jurisprudência superior mais atual
sobre o caso em tela, e os conflitos que há ainda na interpretação da norma isentiva ao
longo dos anos desde o advento do Código Tributário Nacional.

Palavras-chave: Isenção - Não-surpresa - Revogação - Segurança jurídica

Abstract: Currently, the subject of the revocation of the exemptions gains land in forum
of canvasses of the doctrine due to valuation of the beginning of the legal security in
virtue of protection of the dither to the human rights. And, as the beginning of the not-
surprise is corollary of this, pointed by some as right basic, in the protection of a
legitimate, balanced and loyal relation, between the Treasury department and the
contributor. This study is developed as the end to consider respects concerning the more
current superior jurisprudence on the case in screen, and the conflicts that still has in
the interpretation of the frank norm throughout the years since the advent of the
Internal revenue code.

Keywords: Tax exemption - Not-surprise - Revocation - Judicial security

Sumário:
INTRODUÇÃO - 1. A ISENÇÃO TRIBUTÁRIA - 2. O PRINCÍPIO DA NÃO-SURPRESA - 3. A
REVOGAÇÃO DA ISENÇÃO E O PRINCÍPIO DA NÃO-SURPRESA - 4. CONCLUSÃO -
BIBLIOGRAFIA

INTRODUÇÃO

Tema um tanto quanto debatido, e cuja delimitação amplia a criatividade dos

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doutrinadores e a incerteza da jurisprudência pátria, muitas das vezes, fugindo do conceito


prescrito no Código Tributário Nacional (LGL\1966\26), 1 é o instituto da isenção tributária,
que para uma considerável parcela dos tributaristas, encabeçada por Rubens Gomes de
Sousa, 2 é uma dispensa legal ao pagamento do tributo; para outros é uma não-incidência,
3
ou simplesmente a visão pura da lei, ou seja, a exclusão do credito tributário,
entendimento este que se considera mais adequado.

Vê-se, com isto, que há uma discussão episódica que até então não chegou a um resultado
comum, ainda mais, quando se insere o princípio da anterioridade, 4 tão aclamado hoje
como direito fundamental do contribuinte, na questão da aplicação e revogação deste
instituto fiscal, que não deixa de ser um tema muito complexo, já que, alicerçado no
princípio da segurança jurídica.

Pois bem, a divergência ora existente faz com que também existam debates doutrinários
quanto à essência do significado do próprio instituto da isenção tributária.

Porque a análise do Direito Tributário passa necessariamente pelo estudo da Constituição,


e é no art. 150 e 151 deste Diploma fundamental de 1988. que se encontra o subsistema
de normas programáticas referente às “limitações do poder de tributar”. E, pela leitura
deste artigo percebe-se que há princípios e imunidades que concorrem sobre o mesmo
assunto: limitações ao poder de tributar. 5 Princípios informadores e programáticos que
dizem como devem ser feitas as leis tributárias; e, imunidades que dizem o que não pode
ser tributado por imposto, proibindo ao legislador o exercício da sua competência
tributária.

Isto é, as limitações ao poder de tributar interferem na própria competência de tributar,


e esta limitação à competência tributária, portanto, tem subserviência explícita na
Constituição da República (LGL\1988\3) Federativa do Brasil de 1988. Neste caso,
portanto, somente a Constituição pode imunizar determinado fato, pessoa ou situação. E,
esta própria, define em que ocasião o legislador não pode cobrar tributo. É uma
impossibilidade de incidência decorrente de previsão constitucional. Está fora do campo
de incidência da norma.

Tal entendimento caminha na direção do estudo em pródromo, e é extensível à isenção,


com a ressalva de que a previsão isencional é sempre legal, pois se a lei prevê
determinados casos em que não é possível a tributação, ipso facto também está impedindo
a própria incidência da norma, o surgimento da obrigação tributária.

O certo é que, em ambos, os fatos poderiam ser tributáveis não fosse à norma imunizante
ou isencional. Por isto que retirados do mundo jurídico os fatos imunes ou isentos
encontra-se à hipótese de incidência da norma de tributação. E, é aqui que se observa o
primeiro equívoco atinente, que atrai muitos outros acessórios que se propõem a elucidar
neste exame científico tributário, no qual expõem-se acerca dos institutos da isenção e do
princípio da anterioridade, resolvendo-se quando e se este último incide sobre a aplicação
e revogação do primeiro.

Para isto parametrizou-se no primeiro capítulo acerca da isenção – sua evolução histórica
e definição, natureza, modalidades, sua aplicação (alcance) e revogação; no segundo,
sobre o princípio da anterioridade ou da não-surpresa – origem, conceituação (comum e
nonagesimal), abrangência (eficácia) e especificações; no terceiro, abordou-se a respeito

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da interconexão entre a isenção tributária e a anterioridade tão exposta, a fim de resolver


que seja parcialmente ou totalmente, mas com votos ponderados de interpretação e com
o apoio da jurisprudência ao caso que seja escassa, as dúvidas existentes neste discurso
até hoje tão pouco trabalhado, diante da clara carência de fontes bibliográficas, mas que
se tenta suprir com propriedade e providência.

Nesta pesquisa, utilizou-se, então, o método científico-monográfico, no qual depois da


leitura de textos, reagrupamento das fontes de dados disponíveis e bibliografia adquirida
compulsada, gerou a superfície na qual se estruturou todo o trabalho que ora se introduz.
Com isto, pode-se integrar por uma interdisciplinaridade entre o Direito Constitucional e
o Tributário, as normas indeterminadas e lacunosas que existem no Sistema Tributário
Nacional acerca dos institutos ora estudados.

1. A ISENÇÃO TRIBUTÁRIA

1.1 Evolução histórica e definição

A historicidade deste instituto inicia-se na grande celeuma da distinção entre privilégios


odiosos dos não odiosos, pois diversas gerações e épocas políticas têm a tendência de
reputar odiosos os privilégios concedidos pelas anteriores. Por isso mesmo há forte carga
negativa e pejorativa na palavra privilégio. 6 No Estado Patrimonial já havia vários
privilégios fiscais, não obstante o fato de a renda de impostos ser secundária. Ao lado das
imunidades, que eram forma de intributabilidade absoluta dos bens da Igreja e do
senhorio, em homenagem a liberdades estamentais preexistentes, apareciam os
privilégios, como concessão do Governante, geralmente ao clero e à nobreza. O fenômeno
ocorre em todos os países que conhecem a estrutura patrimonialista: Itália, Alemanha,
Áustria, França, Espanha, Portugal etc. Eram considerados privilégios não-odiosos, porque
os clérigos faziam a intermediação entre os cidadãos e a divindade pela oração, enquanto
a nobreza empunhava as armas, tudo o que justificava a exoneração dos impostos.

Todavia, com as grandes revoluções do final do séc. XVIII e com a substituição do Estado
Patrimonial pelo Estado Fiscal – o que vive precipuamente de impostos – modifica-se
radicalmente o enfoque das isenções. Todos os privilégios do antigo regime passam a ser
considerados odiosos, na França e nos países que fazem a revolução industrial. Nos
Estados Unidos, em que não se conhecia a estrutura de classes presentes na França e em
outros Estados Patrimoniais, o privilégio entra com outro sentido, nitidamente afirmativo;
a Constituição americana garante as imunidades e os privilégios dos cidadãos, e estes se
definem como o direito ao tratamento igualitário. Porém, no Brasil, que segue o direito
francês, os privilégios, por seu caráter odioso, foram extintos pela Constituição de 1824,
salvo os do clero, que, em virtude da ligação entre Igreja e Estado, se manteve durante
todo o Império, sendo ratificado por inúmeras leis ordinárias.

Com a eclosão da República modifica-se o problema dos privilégios, extinguindo-se os dos


padres e da nobreza. A Constituição de 1891, por outro lado, incorpora diversos
dispositivos correspondentes às imunidades. Posteriormente, passa-se por dois períodos
de autoritarismo que agravam sensivelmente a questão dos privilégios. De 1930 a 1945,
o Estado Novo, de 1964 a 1979, a Ditadura Militar, nos quais se assiste a uma simbiose
entre o Estado e uma certa parcela da burguesia e do empresariado, com o
recrudescimento da política de concessão de privilégios. E o desenvolvimento do país
assume o lugar de honra entre os privilégios econômicos e jurídicos e as isenções e demais

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incentivos fiscais tornam-se a panacéia para o crescimento econômico.

Contudo, com a Constituição de 1988 começa a se sinalizar outra direção, ou seja, o abuso
na concessão de incentivos e isenções, a falta de controle do emprego do dinheiro público,
o enfraquecimento da utopia da inesgotabilidade dos recursos do Estado e a crise
financeira gravíssima do Tesouro Nacional conduzem a ideologia dos privilégios fiscais ao
descrédito. Ainda mais em um país, que procedeu a enorme transferência de rendas das
classes pobres para as ricas, em curto período. A Constituição atual fornece, então,
algumas orientações básicas para a política das isenções, por exemplo, o art. 150, III, que
proíbe os privilégios odiosos, que são os destituídos de razoabilidade e de apoio na
capacidade contributiva ou no desenvolvimento econômico. O art. 70 da CF/1988
(LGL\1988\3) determina que o Tribunal de Contas faça o controle da legitimidade e da
economicidade, o que inclui o exame do real proveito das renúncias e subvenções,
desmascarando, assim, os incentivos camuflados e equiparando os privilégios radicados
na receita pública7 aos que operam na vertente da despesa. 8 O art. 150, § 6.º, da CF/1988
(LGL\1988\3), na redação da EC 3/1993, estabeleceu o combate às renúncias de receitas.

Por tudo isto, a isenção tributária tem sido até hoje objeto de muitas edificações
doutrinárias, algumas jusfilosóficas, que se propõem a descrever a figura em todos os
seus aspectos.

E sendo todas derivadas da dogmática continental européia, têm-se: (a) a teoria clássica
– que é a tese de que a isenção é um favor legal consubstanciado na dispensa do
pagamento do tributo devido, encampada por Rubens Gomes de Souza, 9 o principal co-
autor do Anteprojeto do Código Tributário Nacional (LGL\1966\26), e que impregnou toda
a disciplina jurídica da matéria naquele Estatuto fiscal; (b) a teoria infringente – que se
insurgindo contra os fundamentos da postura clássica, inspira-se na divisão das normas
jurídicas de Pontes de Miranda e em postulados da Teoria Geral do Direito para esposar
que o preceito isentante tem por fim justamente negar a existência da relação jurídica
tributária, ou seja, a regra de isenção incide para que a de tributação não possa incidir, 10
tem em Alfredo Augusto Becker e José Souto Maior Borges seus maiores expoentes, sendo
que o segundo autor aprofundou as investigações do primeiro, tentando provar por
inúmeras maneiras o que ele acreditava como descabimento jurídico na vertente
tradicional, e fortaleceu suas convicções com o apoio das categorias fundamentais do
Direito, sopesadas à luz da lógica jurídica, sua proposta conduz o pensamento para ver
nas isenções tributárias hipóteses de não-incidência legalmente qualificadas; 11 (c) a teoria
moderada – no caminho descritivo das isenções tributárias, vê o instituto como fato
impeditivo, encartado normativamente na regra isencional, e que teria a virtude de
impedir que certas situações fossem atingidas pelo impacto da norma que institui o tributo,
no âmbito internacional tem como defensores desta tese Fernando Sainz de Bujanda 12 e
Salvatore la Rosa, e no nacional Alberto Xavier e João Augusto Filho para quem o suposto
da norma jurídica de isenção tem estrutura mais complexa que a hipótese da norma
jurídica tributária, porque, além de abranger todos os aspectos desta, encerra um fato
impeditivo que elide a eficácia da norma do tributo; 13 e, (d) a teoria crítica – que criada
por Paulo Barros de Carvalho, 14 defende que o preceito da isenção subtrai parcela do
campo de abrangência do critério antecedente ou do conseqüente da norma tributária,
paralisando a atuação da regra-matriz de incidência para certos e determinados casos.

Contudo, os esclarecimentos acerca da fenomenologia da isenção tributária não se

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esgotam nas quatro teorias que, sumularmente, se salientou acima. Há outras elaboradas
para o mesmo fim: isenção como delimitação negativa da hipótese de incidência tributária;
como tutela jurídica do interesse do contribuinte; como renúncia ao exercício da
competência tributária; como manifestação do poder de não tributar; 15 porém
selecionaram-se essas, sobretudo pelo grau de relevância que assumiram em função dos
rumos da Ciência do Direito Tributário no Brasil.

Destarte, como a intenção neste tópico é trazer à baila uma definição para o instituto da
isenção, após este discurso aporético, enleio aos debates episódicos, a lição de José Souto
Maior Borges é ideal neste ínterim, pois discorre de uma cognição impessoal, in verbis:

“A isenção é um expediente técnico de liberação do ônus tributário que se torna efetivo


por modalidades diversas; ora são concedidas sem termo de duração legalmente
prefixado, em caráter incondicional ou, em suma, de modo gracioso pelo poder que isenta;
ora são concedidas por tempo determinado, em caráter contraprestacional ou bilateral,
previstas ou não em contrato.” 16

Por hora, entende-se pertinente o estudo da natureza deste instituto no tópico seguinte,
visto que sua significação por termo conforme a lei, art. 111 do CTN (LGL\1966\26), isto
é, segundo a literalidade da norma, é a dispensa legal do tributo, razão pela qual não se
prolonga ainda mais este rico debate.

1.2 Natureza

Como os tributos só podem ser criados ou majorados por lei em sentido estrito, também
as isenções tributárias devem obedecer ao princípio da reserva legal. Por consistirem ora
em incentivos fiscais, ora em expressão do princípio da capacidade contributiva, não
podem configurar-se como privilégio injustificado que crie situação de desigualdade entre
os que foram isentos e aqueles que continuam obrigados a recolher o tributo ao erário
público.

A isenção, antes de tudo, deve ter por fim atender ao interesse público, bem como
promover a isonomia material. Esta é a principal essência do instituto das isenções
tributárias, aliás, a única que legitima competência para isentar.

De acordo com Aliomar Baleeiro, isenção tributária: “não é privilégio de classe ou de


pessoas, mas uma política de aplicação da regra da capacidade contributiva ou de
incentivos a determinadas atividades, que o Estado visa a incrementar pela conveniência
pública”. 17

Também José Souto Maior Borges preleciona acerca da finalidade do instituto: “as isenções
tributárias, hodiernamente, são concedidas visando primária e diretamente o interesse
público e só secundária e indiretamente, a interesse dos particulares”. 18

Deste modo, a aplicação das isenções deve, essencialmente, corresponder ao atendimento


das finalidades para as quais foram idealizadas, não sendo admitida a utilização das
normas isentivas à concessão de favores legais, como já foi defendido por alguns
doutrinadores, de forma que sua instituição só pode ser considerada válida no
ordenamento, se respeitados os princípios constitucionais que orientam os termos
essenciais a qualquer discriminação legal, como também, os demais princípios
informadores do sistema tributário.

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Por serem exonerações tributárias, autorizadas pela facultatividade do exercício da


competência tributária, ou, em outras palavras, como expressão da competência para
eximir, as isenções devem também se submeter aos preceitos do sistema, sob pena de se
tornarem instituto odioso e intolerável.

É o que esposa o professor Aurélio Pitanga Seixas Filho: “daí se infere que não serão
toleráveis discriminações nem isenções que não correspondam a critérios razoáveis e
compatíveis com o sistema da Constituição”. 19

Em regra, as normas isentivas visam à promoção da igualdade substancial através da


observância da capacidade contributiva, excepcionalmente, porém, podem consistir em
incentivos fiscais que não atendam, necessariamente, a este princípio, objetivando, por
exemplo, o desenvolvimento de regiões mais pobres (note-se que aqui também não se
configuram como favores legais). Em tais casos, há que ser observada a igualdade formal.

Neste ínterim, Misabel Derzi chama a atenção ao fato de que o incentivo fiscal:

“(…) não poderá ofender o princípio da igualdade formal, o qual assegura que as pessoas
identicamente situadas devem merecer o mesmo tratamento, ou seja, o prêmio, a
subvenção social ou a isenção do imposto.” 20

Estes termos devem, então, ser estabelecidos através de critérios objetivos, que permitam
ao contribuinte que os possua usufruir o benefício pelos motivos para os quais foi instituída
a isenção e nunca, repita-se, nunca esta pode ser criada objetivando uma pessoa
específica ou um caso particular, mas sempre situações que propiciem alcançar seu fim,
tendo como orientação a busca do interesse público e o tratamento justo e isonômico.

Ressalta-se, por ventura, como bem alertou a jurista mineira, que os incentivos fiscais
não podem se cristalizar em direito adquirido à não contribuição tributária, devido à inércia
do Legislativo. Conforme salientado, estes incentivos só se justificam enquanto, e na
medida em que, atendam ao interesse público.

Pois bem, as isenções foram tratadas no Código Tributário Nacional (LGL\1966\26), in


verbis: “Art. 175. Excluem o crédito tributário: I – a isenção (…).”

Entretanto, apesar da lei geral prescrever a isenção como exclusão do crédito tributário,
por mais ilógica que seja esta nomenclatura, é a que o Código Tributário Nacional
(LGL\1966\26) adotou, tanto é, que assim expressa o art. 111 do Diploma legal tributário,
vejamos:

“Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:

I – suspensão ou exclusão do crédito tributário;

II – outorga de isenção; (…)” (sem grifos no original).

Razão esta, que para não fugirmos do contexto do ordenamento jurídico vigente, nos
filiamos por ser a em conformidade com a lei vigente. Apesar disto, parte da doutrina
tributária insiste, ainda, numa posição interpretativa inventiva ilegítima, reconhecendo
que as isenções não consistem em uma das modalidades de exclusão do crédito tributário,
mas sim de não-incidência. É por isto que se afirma que a doutrina clássica tributária,
tendo como um de seus arautos Rubens Gomes de Souza, permanece até hoje, atual,
posto que esposar entendimento contrário, não basta, mas sim se elaborar projeto de lei

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complementar tributária que competente que é para tratar deste tipo de matéria,
conforme o art. 146 da CF/1988 (LGL\1988\3), poderia essa sim modificar a nomenclatura
deste instituto tão discutido hodiernamente, por ser capaz de definir normas gerais.

Todavia como age a norma isentiva sobre a regra matriz de incidência?

Neste tópico, grande foi a contribuição do professor Paulo de Barros Carvalho. Para o
autor, as normas isentivas são normas de estrutura e, como tais, determinam como
deverá ser o relacionamento das normas de conduta; no caso específico, interferem na
incidência da regra matriz do tributo. 21

Continua o raciocínio, concluindo que a modificação operada pela norma isentiva sobre a
regra matriz de incidência atinge parte de um dos aspectos desta:

“(…) guardando a sua autonomia normativa, a regra de isenção investe contra um ou mais
dos critérios da norma-padrão de incidência, mutilando-os, parcialmente. (…) O que o
preceito de isenção faz é subtrair parcela do campo de abrangência do critério do
antecedente ou do conseqüente.” 22

Temos a acrescentar apenas que, para nós, a norma isentiva não mutila parte da
abrangência de um ou mais dos aspectos da norma-padrão, mas tão somente afeta a sua
forma de incidir, condicionando-a, ou seja, excluindo-a, para que incida de acordo com o
que determina a norma de estrutura (a isenção), fazendo com que o fato que surgiria
como tributário ou tributável, seja dispensado, isto é, surja como fato isento.

Mutilar significa suprimir o critério, e isto, por certo, não ocorre. Com o advento da
isenção, dispensa-se temporariamente, de modo determinado ou não, a eficácia de parte
de um ou alguns dos critérios da regra matriz, que permanecerá intacta (vigente),
interferindo a norma isentiva, tão somente, na eficácia de algumas hipóteses da norma
de tributação. Não podemos falar, assim, em mutilação.

Não é este, porém, o entendimento do professor Roque Antonio Carrazza, para quem a
norma isentiva opera verdadeira derrogação da regra matriz de incidência. Com este
pensar, uma vez revogada a norma isentiva, a parcela da norma que foi por ela
“revogada”, não voltará a produzir efeitos jurídicos, pois não se admite o efeito
repristinatório das normas. Também Paulo de Barros compartilha o posicionamento de
que as isenções revogam a norma tributária.

Vejamos, assim, o que diz o professor Carrazza:

“(…) a lei que concede uma isenção revoga (no todo ou em parte) a lei anterior que
mandava tributar (se e quando ocorrido o fato). Pois bem, revogada a lei isentiva, nem
por isto a primitiva lei tributária voltará a vigorar. Por quê? Simplesmente porque não há
o chamado efeito repristinatório no Direito Tributário Brasileiro.” 23

Por isto, não se vislumbra a possibilidade de atribuir naturezas jurídicas distintas ao


mesmo instituto em dado subsistema jurídico, conforme o caso em que ele esteja inserido.
Isto porque, quando o autor comenta acerca das isenções com prazo determinado, traz
conclusão incongruente com a defesa acima esposada. Di-lo:

“(…) vezes há, e não raras, em que a lei que concede uma isenção tem prazo prefixado
de vigência. Pensamos que, findo tal prazo, a Fazenda Pública não precisa ficar na aguarda
do próximo exercício financeiro para cobrar o tributo cabível. O motivo disto é onipatente:

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embora a lei que concede uma isenção com prazo certo (v.g., por um ano) revogue a lei
tributante, ela implicitamente determina que, ao final deste prazo, passará a vigorar com
o conteúdo da lei revogada.” 24

Ora, como não pode uma norma revogada ser reinserida no ordenamento implicitamente
pela própria lei que a revogou; em vista do que dispõem os arts. 2.º e § 3.º da LICC.
(LGL\1942\3) Certo é se afirmar que ao determinar a necessidade de disposição expressa
na nova norma para autorizar a repristinação da norma revogada, caso se admita a tese
sustentada pelo autor, está-se a afirmar tudo, menos que a primeira norma foi revogada
por norma posterior e que após a revogação desta, aquela volta a vigorar. Como se sabe,
além do que se acabou de mencionar, só existe mais um meio de uma norma ganhar
vigência: sendo publicada no Diário Oficial e aguardando, se for o caso, o período da
vacatio legis.

Pois bem, finalmente, a posição que se adota acerca da natureza jurídica das isenções
tributárias e como se opera a incidência da regra matriz após o advento de norma isentiva
é que estas, posteriores ou contemporâneas às normas instituidoras dos tributos,
suspendem a cobrança de tributos sobre a regra matriz que incide sobre determinados
fatos sócio-econômicos, tornando-os fatos jurídicos tributários dispensados
temporariamente. Atuam na verdade modificando o comportamento da norma tributária,
autorizando sua incidência e dispensando seu crédito logo em seguida.

Neste passo, os fatos previstos na regra isentiva passarão a surgir no ordenamento como
fatos jurídicos isentos, isto é, somente a norma de isenção sobre eles incide, já que a de
tributação nesta parte não tem eficácia.

Isto posto, de modo sucinto, analisa-se as modalidades de isenção, por ser fundamental
sua exposição dentro do esquema proposto.

1.3 Modalidades de isenção

Esta pode ser classificada em: gratuita, onerosa, subjetiva e objetiva. A isenção gratuita
é aquela concedida sem qualquer contraprestação por parte do contribuinte, é outorgada
de modo geral, quase sempre se refere aos impostos indiretos e não exige reconhecimento
formal. A onerosa por outro lado é contratual ou contraprestacional, concedida a prazo
certo e sob condição de o contribuinte beneficiado praticar certas atividades ou realizar
algum investimento (dela cuida o art. 179 do CTN (LGL\1966\26)). A isenção subjetiva 25
é aquela que exclui o crédito para determinadas pessoas indicadas na lei e em geral se
refere aos impostos reais ou indiretos (podendo se estender a imposto sobre produção ou
a circulação de mercadorias, quanto a certos tipos de empresa). Já a objetiva é a que
dispensa a obrigação tributária sobre coisa ou mercadoria, aplicando-se principalmente ao
imposto real ou indireto. 26 Pode ainda ser classificada a isenção de imprópria, apesar de
pouco aplicado, sendo esta aquela definida como exclusão qualificada do crédito tributário,
a ocorrer somente na disposição da hipótese de incidência que se dispensa quando
relevantes algumas situações em virtude de considerações de justiça ou de oportunidade
econômica.

A seguir, depois de descritos os tipos do instituto em estudo, ver-se-á uma disposição


muito relevante, qual seja a distinção ente isenção e imunidade tributária.

1.4 Isenção x imunidade: diferenciação

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A discutida semelhança que aproxima a isenção da imunidade, levando vários


doutrinadores ao estudo paralelo destes institutos, é o fato de que todos eles referem-se
a hipóteses sócio-econômicas que não autorizam o surgimento da obrigação tributária, 27
seja por incompetência tributária dos entes políticos em tributá-los (imunidade) ou ainda
por existência de norma que exclui a obrigação tributária destes fatos como fatos
tributáveis (isenção).

Todavia, a natureza jurídica destes dois institutos é bem distinta, assim como diversas
são as conseqüências trazidas por cada um. Para afastar eventual confusão, trazem-se
alguns breves esclarecimentos acerca da imunidade, demonstrando determinados pontos
de disparidade que guardam em relação às isenções.

Frisa-se, todavia, que não se irá aprofundar acerca da natureza jurídica da imunidade,
pois esta não é objeto deste foco analítico. Traz-se somente à baila o entendimento
doutrinário que julga-se mais coerente.

Assim, imunidade tributária configura-se como vedação ou limitação constitucional


expressa ao poder de tributar. Todos os fatos previstos como imunes, estão excluídos da
competência tributária dos entes públicos. Corrobora com esta cognição o professor Paulo
de Barros Carvalho, que define as imunidades como:

“(…) a incompetência das pessoas políticas de direito constitucional interno para expedir
regras instituidoras de tributos que alcancem as situações específicas e suficientemente
caracterizadas.” 28

Por isto, não se pode definir a imunidade como isenção constitucionalmente qualificada,
assim como não é correto afirmar que a isenção é uma não incidência legalmente
qualificada. 29 Pois, sabe-se que esta é uma modalidade de exclusão do crédito tributário.

Assim, ambas são definições empregadas de forma errônea, porque incompatíveis com a
essência da imunidade, que é verdadeira incompetência tributária. Não existe competência
ilimitada, de modo que as imunidades consistem em um dos limites à competência
tributária das pessoas políticas de direito público interno.

As imunidades, apesar de incorreto chamá-las de isenções constitucionalmente


qualificadas, guardam com as normas isentivas outras duas semelhanças, além da já
mencionada. Os dois institutos são regras de estrutura 30 e contém o mesmo comando
normativo na classificação de Noberto Bobbio, porque proíbem obrigar. 31

De resto, as imunidades não guardam qualquer outro ponto de aproximação com as


isenções que justifique o estudo paralelo entre os institutos. Ao contrário, inúmeras vezes
maiores são as disparidades existentes entre eles, não nos parecendo apropriada qualquer
definição que tente aproximá-los. Por hora, adverte-se que a isenção tributária, como
esclarece José Souto Maior Borges, “é o próprio poder de tributar visto ao inverso”. 32

O que confirma a assertiva é a própria essência do “poder de tributar”, como faculdade de


exercício da competência tributária. Ora, se determinada pessoa jurídica de direito público
interno pode deixar de exercer sua competência, pode também exercê-la para dispensar
que a determinados fatos haja o lançamento da obrigação tributária.

Observe-se, porém, que a competência para eximir não pode ficar aquém das diretrizes
constitucionais e garantias individuais e coletivas asseguradas; eventual afronta aos

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princípios contidos na Carta da República de 1988 investiria contra a competência de


eximir, subtraindo a legitimidade do seu exercício.

Passa-se, então, ao estudo do princípio da anterioridade para fins de posteriormente


desenvolver o raciocínio matriz do estudo em curso, qual seja, a aplicação deste na
revogação das isenções, idéia motivadora do presente trabalho analítico-monográfico.

2. O PRINCÍPIO DA NÃO-SURPRESA

2.1 Origem histórico-constitucional

O princípio da não-surpresa ou anterioridade tributária surgiu no nosso sistema jurídico,


através da EC 18/1965 em substituição ao princípio da anualidade tributária ou princípio
da autorização orçamentária, como era conhecido.

O texto da emenda, contudo, limitou-se a exigir a anterioridade da lei tributária, aos


impostos sobre patrimônio e renda sendo que em relação a todos os demais tributos, a
exigência poderia ser feita imediatamente.

Com o advento da Constituição Federal de 1967, ou seja, pouco tempo após a


promulgação da EC 18/1965, o princípio da anualidade é reintroduzido e o da anterioridade
excluído no ordenamento jurídico. O princípio da anterioridade, somente ressurge com a
EC 1/1969 e, em que pese a variação de forma, desde a promulgação dessa Emenda, o
princípio da anterioridade nunca deixou de integrar o sistema jurídico brasileiro.

Importante ressaltar, todavia, que em todos os textos legais, tanto o princípio da


anterioridade como o da anualidade, sempre aparecem no mesmo artigo constitucional
que assegura direitos fundamentais como: vida, liberdade, segurança, propriedade, entre
outros. Resta evidente, portanto, o caráter fundamental dos princípios, bem como a
importância dos mesmos no ordenamento jurídico brasileiro.

Hoje, o princípio da anterioridade tributária está disciplinado pelo art. 150 da CF/1988
(LGL\1988\3), com a seguinte redação: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias
asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios: (…) III – cobrar tributos: (…) b) no mesmo exercício financeiro em que haja
sido publicada a lei que o instituiu ou aumentou.”

Em todos os textos legais, o princípio da anterioridade aparece com o objetivo de impedir


que um tributo seja instituído ou majorado no mesmo exercício financeiro.

Nessa esteira, impende salientar que o princípio da anterioridade surge no nosso sistema,
para garantir a eficácia do princípio da segurança jurídica, que ao ser aplicado no âmbito
do direito tributário, entre outros aspectos, determina que nenhuma pessoa poderá ser
surpreendida com a imposição de tributos da noite para o dia, exigindo que a lei tributária
seja clara, segura e erradie seus efeitos somente após o decurso de tempo hábil, que
garanta ao contribuinte o direito de se preparar economicamente para a nova lei tributária.
Entretanto, essa regra comporta exceções, uma vez que alguns tributos poderão sim ser
cobrados imediatamente a entrada da lei em vigor. O § 1.º do art. 150 da CF/1988
(LGL\1988\3) elenca os impostos de importação, exportação, sobre produtos
industrializados, sobre operações de câmbio, crédito e seguro ou relativos a títulos e
valores imobiliários e o lançado por motivo de guerra externa.

Imprescindível ressaltar o caráter taxativo da enumeração do art. 150, § 1.º, da CF/1988

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

(LGL\1988\3), sem esquecer, entretanto, da excepcionalidade dos empréstimos


compulsórios, que poderão ser instituídos “para atender a despesas extraordinárias,
decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência” conforme dispõe
art. 148, I, da CF/1988 (LGL\1988\3).

Após este breve histórico do princípio da anterioridade no ordenamento jurídico brasileiro,


cumpre agora distinguir sua figura mitigada da comum para fins de se evitar confusões
de conceitos.

2.2 Conceituação (comum e mitigada)

A Constituição Federal de 1988 criou a chamada anterioridade mitigada ou especial, para


as contribuições destinadas ao custeio da seguridade social, através da redação do art.
195, § 6.º.

Segundo referido artigo, todas as contribuições previdenciárias, somente poderão ser


exigidas, depois de decorridos 90 dias da data da promulgação da lei que as houver
instituído ou modificado, não lhes aplicando o disposto no art. 150, III, b, da CF/1988
(LGL\1988\3).

Para essas contribuições, o legislador constituinte elegeu um prazo fixo para o princípio
da anterioridade, por isso que a doutrina o considera especial ou mitigado. Destarte, o
legislador constituinte utilizou-se de critérios de anterioridade diversos para os tributos
em geral e para as contribuições sociais, estabelecendo, para as contribuições, a
anterioridade baseada em dias.

Assevera-se que a Constituição Federal de 1988 não quis destinar às contribuições sociais,
a anterioridade ordinária do art. 150, III, b, fundada no exercício financeiro, e também
não pretendeu excepcionar essas contribuições, liberando-as da anterioridade. Desta
forma, entre liberar de vez as contribuições sociais do princípio da anterioridade e aplicar
às mesmas a anterioridade do art. 150 da CF/1988 (LGL\1988\3), o legislador constituinte
criou a denominada anterioridade especial ou mitigada, regulada por um lapso de tempo
certo e determinado de 90 dias.

Evidencia-se, portanto, que a regra da anterioridade aplicada às contribuições sociais é


uma exceção à regra geral da anterioridade, impondo um limite parcial ao princípio, devido
às características sociais das contribuições.

Com efeito, o princípio da anterioridade atribuído às contribuições sociais, muitas vezes


apresenta-se mais eficaz, para a garantia da segurança jurídica do contribuinte, do que o
princípio da anterioridade disciplinado pela regra geral, principalmente quando
determinado tributo é instituído ou majorado no final de determinado ano e, pela regra da
anterioridade do art. 150 da CF/1988 (LGL\1988\3), começa a ter eficácia alguns dias
depois, com a entrada do novo ano fiscal. Nesses casos, a regra que excepciona a geral,
atribuindo às contribuições sociais prazo inferior para a anterioridade, torna-se de mais
valia.

Por esta razão, impõe-se necessário um reexame da abrangência (eficácia) prática do


princípio, tanto na sua forma geral como especial. Buscando a melhor interpretação do
mesmo e a concretização dos seus efeitos, sob pena de torná-lo letra morta culminando
com seu desaparecimento do ordenamento jurídico.

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
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2.3 Abrangência do princípio da anterioridade

Para uma interpretação correta de determinada norma constitucional, o intérprete deverá


observar os fins e os valores previstos na Carta Magna (LGL\1988\3), situando a norma
interpretada no bojo da totalidade significativa da Lei Fundamental. Ou seja, se o
interprete buscar o significado isolado do princípio da anterioridade, certamente irá
encontrar finalidade diversa da que encontraria se fizesse uma interpretação do princípio
em conjunto com toda norma constitucional.

Com efeito, é o que parece ocorrer quando o legislador e aplicador do direito, faz incidir
uma norma tributária, majorando ou criando uma exação, sem que tenha havido um lapso
de tempo razoável para respeitar a segurança jurídica do contribuinte.

Neste diapasão, a doutrina jurídica vem cada vez mais aprimorando seus estudos na busca
da melhor forma de interpretação das normas, especialmente no que se refere às normas
constitucionais, buscando sempre garantir a realização dos valores e fins contemplados
pela ordem jurídica em sua totalidade. Para auxiliar o intérprete a hermenêutica
constitucional estabeleceu certos princípios de interpretação constitucional.

Assim, grande parte dos autores aponta para os seguintes princípios de interpretação
constitucional: (a) da unidade da Constituição; (b) do efeito integrador; (c) da máxima
efetividade; (d) da conformidade funcional; (e) da concordância prática ou da
harmonização; (f) da força normativa da constituição; (g) da interpretação conforme a
constituição. 33

Outrossim, por este simples cotejo analítico, observa-se que entre os métodos de
interpretação constitucional e o princípio da anterioridade, pode-se perceber que em
certos casos, o princípio não vem sendo interpretado de forma a garantir sua finalidade
precípua, qual seja, a de conferir a segurança ao contribuinte oferecendo-lhe um certo
liame temporal, para assegurar o direito de conhecer previamente suas obrigações
tributárias e com isso, preparar-se com meios hábeis, adequando seu orçamento ao
custeio das novas despesas sociais.

O intérprete, ao fazer com que determinada norma, que tenha instituído ou aumentado
tributo, ou mesmo revogado uma isenção, tenha eficácia sem garantir ao contribuinte um
tempo mínimo para o conhecimento desta, viola os seguinte postulados constitucionais:
(a) da supremacia da Constituição – por interpretar a Constituição a partir da lei e não o
contrário; (b) da unidade da Constituição – ao interpretar o princípio da anterioridade
isoladamente enquanto que o postulado determina que a interpretação seja sistemática;
(c) da maior efetividade possível – que determina que o dispositivo constitucional seja
interpretado no sentido que lhe atribua maior eficácia; (d) da harmonização – que
determina que um princípio não contrarie outro pertencente à Constituição. Isto só vem a
evidenciar a contradição, na aplicação deste princípio, que muitas das vezes acaba por
violar a segurança jurídica dos contribuintes, quando não aplicada a anterioridade
considerando-se a revogação de uma isenção, como em uma verdadeira instituição de
tributo.

Não obstante não se possuir o conhecimento científico de um doutrinador constitucional


renomado e experiente, consegue-se, através dos meios oferecidos pela doutrina, chegar-
se à consideração de que o princípio da anterioridade, como vem sendo interpretado, não

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representa a realidade do pretendido pelo legislador constituinte, pois, pela rápida análise,
já identifica-se a contrariedade da interpretação efetivada com os princípios da supremacia
e da unidade da Constituição, da maior efetividade possível e da harmonização.

Porém, impende tecer que o intérprete tem a importante missão de alterar esse cenário,
uma vez que o princípio da anterioridade cada vez mais vem sendo deteriorado e seus
efeitos esvaziados. Os estudiosos do direito devem tentar resgatar o espírito do princípio,
para que o mesmo possa ser restabelecido como a efetiva garantia de que o contribuinte
terá seu direito de segurança jurídica assegurado, conforme determinam os preceitos
constitucionais.

Neste contexto, cumpre citar as importantes colaborações de doutrinadores preocupados


com a perda de eficácia do princípio da anterioridade, como Luiz Paulo Romano para quem:

“Não são necessárias grandes abstrações para concluir que tal procedimento não condiz
com a ratio legis pretendida pelo constituinte, ao instituir o dogma da anterioridade. Ora,
se o intuito da regra é permitir que o contribuinte seja pessoa física ou jurídica, tome
conhecimento prévio da carga tributária que estará sujeito no próximo ano, para o regular
planejamento de suas atividades, não é admissível que se concorde com a deliberada
publicação de leis ao término do exercício financeiro. A publicação da lei na véspera do
novo ano esvazia por inteiro o direito do contribuinte de organizar sua vida e seus
negócios, ajustando-se com calma à nova realidade tributária. Sendo o princípio em voga,
uma linha mestra orientadora de condutas, a ele deveria ser dada a máxima efetividade,
o que não tem se mostrado presente, em face do exaltado apetite arrecadatório do
Governo Federal (…).” 34

Ainda segundo o professor, o legislador constituinte teria acertado caso houvesse fixado
o princípio da anterioridade em termos reais, tal como o fez para as contribuições federais
ou, ainda, a exemplo do procedido na esfera eleitoral pelo art. 16 da CF/1988
(LGL\1988\3), no qual está expresso que a lei que altera o processo eleitoral não se aplica
à eleição que ocorra em até um ano da data de sua vigência. Ao concluir, o ilustre professor
sugere: “De toda sorte, em tempo de reformas, não seria ocioso sugerir a aplicação de
mesmo raciocínio e reescrever o princípio da anterioridade tal como: ‘a lei que instituir ou
majorar tributos só terá eficácia decorrido um ano da sua publicação’.” 35

Ao analisar a EC 33/2001, Omar Augusto Leite Melo invoca as decisões proferidas pelo
STF, no que diz respeito à proteção dos direitos individuais dos contribuintes e cláusulas
pétreas e conclui que:

“O princípio da anterioridade constitui-se, sim, numa cláusula pétrea, e seu fundamento


maior decorre do princípio geral da segurança jurídica, pois impede a voracidade fiscal no
sentido de aumentar brusca e repentinamente um tributo, pegando o contribuinte de
surpresa.” 36

O mestre admite, também, divergências no que diz respeito à caracterização do princípio


da anterioridade como cláusula pétrea, mas ressalta que: “(…) no mínimo o princípio da
anterioridade já garante à lei tributária uma ‘dedicação’ bastante peculiar, não vista em
nenhuma outra lei de natureza diversa: este princípio incomoda o legislador tributário”. 37

Outra colaboração de elevado valor acadêmico, foi a do professor Luiz Cláudio Portinho
Dias ao dispor, com rigor técnico que:

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
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“(…) resta evidente a insuficiência do princípio da anterioridade para garantir qualquer


espécie de segurança aos contribuintes, tendo em vista a possibilidade de exigência dos
tributos recém instituídos/majorados já no primeiro dia do exercício financeiro seguinte.
Com isso, torna-se inócua e ineficaz a previsão constitucional.” 38

Mais adiante, Portinho Filho sugere que:

“Seria interessante que os governantes/legisladores, mantendo-se a atual redação


constitucional do princípio da anterioridade (baseada no exercício financeiro),
abstivessem-se de dispor expressamente sobre a data em vigor das legislações tributárias.
Dessa forma, assegurar-se-ia, no mínimo, a obediência ao prazo de vacatio legis previsto
no art. 1.º da LICC (LGL\1942\3), isto é, 45 dias da publicação oficial. É o prazo mínimo
que se admite para que uma nova obrigação tributária seja exigível.” 39

Por derradeiro, cumpre citar as pertinentes observações de Eduardo Bottallo que


preleciona uma nova proposta de interpretação ao postulado da anterioridade, litteris:

“(…) se, por exceção constitucional, a lei nova, instituidora ou majoradora de uma
determinada espécie tributária, somente passa a produzir efeitos 90 dias após a sua
publicação, é perfeitamente conseqüente inferir-se, como regra, aplicável aos demais
tributos sujeitos ao princípio, que o lapso temporal haverá de ser maior (ainda que por
um dia) em relação aos início do exercício financeiro subseqüente.” 40

Pelo ora exposto, em que pese a doutrina ainda ser escassa, já se consegue vislumbrar
alguns questionamentos e uma movimentação para restabelecer o princípio da
anterioridade e com isso, promover aos contribuintes, maior segurança jurídica frente às
imposições governamentais, principalmente no caso da revogação das isenções, matéria
a ser desenvolvida a frente.

2.4 Não-surpresa e segurança jurídica

Ao lado dos princípios constitucionais gerais, a Constituição elenca outros, que carregam
no seu bojo força axiológica maior por exprimirem a noção de mandamento nuclear do
sistema jurídico. São os denominados princípios fundamentais do Estado, que, ao contrário
dos gerais, não são identificados através de processo dedutivo, mas sim, estão
consagrados, de forma expressa ou intrínseca, nos textos constitucionais.

Com efeito, os princípios fundamentais visam essencialmente definir o Estado e a política


econômica social do mesmo, bem como a relação dos poderes com a coletividade. Eles
sintetizam todas as normas constitucionais e à eles, as normas devem submissão.

Estes são os valores eleitos pelo constituinte como base do ordenamento jurídico, por
explicitarem as valorações políticas fundamentais do legislador constituinte e a base da
estruturação do Estado, possuindo uma função orientadora e apresentando-se como auto-
aplicáveis.

E, ainda que se considerem todas as normas constitucionais com a mesma hierarquia, não
há dúvida que os princípios fundamentais têm uma ascendência axiológica e funcional
sobre as demais normas constitucionais e fazem parte do núcleo imodificável do sistema,
porque de se dizer que a não-surpresa tributária está associada ao princípio da
anterioridade no direito tributário, evitando que os contribuintes sejam surpreendidos com
novas cobranças, sem terem tido tempo suficiente para melhor conhecer a nova

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
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legislação, e, em função dela, poderem programar-se, já que também o contribuinte,


empresário ou não, necessita de planejamento para dar continuidade a suas atividades,
empreendimentos, assim como para controle do orçamento familiar. Vertente esta, que é
do princípio da segurança jurídica.

Nos dizeres de Hugo de Brito Machado:

“A lei fiscal há de ser anterior ao exercício financeiro em que o Estado arrecada o tributo.
Com isto se possibilita o planejamento anual das atividades econômicas, sem o
inconveniente da insegurança, pela incerteza quanto ao ônus tributário a ser considerado.”
41

Este princípio, corolário lógico que é do princípio da segurança jurídica, como dizia Roque
Antonio Carrazza, visa evitar surpresas para o contribuinte, com a instituição ou a
majoração de tributos, no curso do exercício financeiro.

Graças a este, os destinatários da lei tributária (Fisco e contribuintes), conhecendo-a,


podem preparar-se para bem cumpri-la.

Assim, como o princípio da não-surpresa, confundido que é com o princípio da


anterioridade pela doutrina, muito das vezes posto como sinônimo, em verdade é um
princípio-efeito, ou seja, é um resultado implícito da aplicação da anterioridade, isto é,
lógico, porém com definição diferente, como visto antes. Todavia por estar
intrinsecamente a anterioridade, carreada na não-surpresa, o STF, por meio da ADIn 939,
já declarou que o princípio da anterioridade tributária é cláusula pétrea, pois consiste em
garantia individual do contribuinte, confirmando, a Corte Maior, a existência de direitos e
garantias de caráter individual dispersos no texto constitucional.

Uma vez que a segurança jurídica é, ao lado da justiça, um dos objetivos fundamentais
do direito, é fundamento para vários institutos no ordenamento jurídico brasileiro, como
o do direito adquirido, o do ato jurídico perfeito, o da coisa julgada, o da prescrição, o da
decadência etc.

A idéia sempre presente é a da certeza do direito, da certeza de que situações consolidadas


pelo passar do tempo também estarão juridicamente asseguradas.

Tanto é, que a título de exemplo, cita-se o caso da MedProv 812/1994, que limitando a
compensação de prejuízos no cálculo do IRPJ, tornando-o mais oneroso, fora editada e
publicada, num sábado, dia 31.12.1994, sendo que o Diário Oficial daquele dia só circulou
efetivamente dia 02.01.1995, na segunda-feira próxima. E ao analisar o caso, o STJ
através do REsp 318.849, manifestou que:

“Quando da publicação da MedProv 812/1994, em 31.12.1994, ainda estava em curso o


período de apuração do imposto de renda do ano-base de 1994. Pouco importa que o
Diário Oficial só tenha circulado no dia 02.01.2005, pois, o que determina a vigência da
lei, neste caso, é a data de sua publicação. Recurso especial provido.”

Deste episódio, o STF ateve o mesmo entendimento (ver o Informativo 184), o que
demonstra que se a garantia da anterioridade, por si só, já era frágil, a forma como o
Poder Judiciário a tratava acabava por torná-la um quase inútil ornamento constitucional.

Por este motivo, num raro caso de emenda à Constituição que, ao menos em parte,
beneficia o contribuinte, a EC 42/2003 estendeu como regra para os tributos em geral o

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princípio da noventena ou nonagesimal, que até então só era aplicável às contribuições


para financiamento da seguridade social por força do art. 195, § 6.º, da CF/1988
(LGL\1988\3).

Assim, foi incluída no art. 150, III, uma alínea c, afirmando que é vedado cobrar tributos
“antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu
ou aumentou”, observando-se ainda a alínea b (anterioridade).

Agora, a anterioridade comum e a mitigada laboram em conjunto, devendo ser observadas


simultaneamente. Como resultado, a regra passa a ser a existência de um prazo mínimo
de 90 dias para a cobrança do tributo, que, mesmo assim, só pode ser feita no exercício
financeiro subseqüente ao de sua instituição ou majoração, o que é aplicado à revogação
da isenção, respeitadas as exceções.

Em suma, é lícito afirmar que o princípio da segurança jurídica é corolário do da não-


surpresa, que traz incutido o princípio da anterioridade comum e especial, cujas exceções,
ver-se-á a seguir, que não deixam de ser particularidades.

2.5 Particularidades específicas

Alguns tributos escapam à aplicação do princípio da anterioridade. O rol de exceções está


no at. 150, § 1.º, da CF/1988 (LGL\1988\3), que, mesmo com a nova redação dada na
EC 42/2003, não esgota as situações que escapam ao princípio. Entre as exceções, tem-
se tributos que, por atenderem a certos objetivos extrafiscais (política monetária, política
de comércio exterior), necessitam de maior flexibilidade e demandam rápidas alterações.
Por isso, o imposto de exportação, o de importação, o imposto sobre produtos
industrializados e o sobre operação de crédito, câmbio, seguro e operações com títulos e
valores mobiliários (além de comportarem exceção ao princípio da estrita reserva legal,
no sentido de poderem ter suas alíquotas alteradas por ato do Poder Executivo, dentro de
limites e condições definidas na lei) não se submetem ao princípio da anterioridade, e,
portanto, podem ser aplicados no próprio exercício financeiro em que seja editada a lei
que os tenha criado ou aumentado (ou em que tenha sido publicado o ato do Poder
Executivo que haja majorado a alíquota).

Exceção estrita foi criada pela EC 33/2001, em relação ao ICMS, ao acrescentar o § 4.º
ao art. 155 da Carta Magna (LGL\1988\3). As alíquotas do ICMS sobre combustíveis e
lubrificantes com tributação monofásica prevista em lei complementar (art. 155, § 2.º,
XII, h, da CF/1988 (LGL\1988\3) – alínea acrescida pela EC 33/2001) devem ser definidas
mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, na forma disciplinada em lei
complementar (art. 155, § 4.º, IV, e § 2.º, XII, g, da CF/1988 (LGL\1988\3)), e podem
ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o art. 150, III, b, (art. 155, § 4.º,
IV, c, da CF/1988 (LGL\1988\3)). A mesma Emenda acrescentou ao art. 177 o § 4.º, cujo
item I, b, prevê que a alíquota da contribuição de intervenção no domínio econômico
relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás
natural e seus derivados e álcool combustível pode ser reduzida e restabelecida por ato
do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150, III, b, da CF/1988
(LGL\1988\3).

Há ainda outros tributos que não se submetem ao princípio da anterioridade. É o caso do


empréstimo compulsório por motivo de guerra externa ou calamidade pública, onde, dada

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a premência das causas que justificam a incidência, não se pode aguardar o exercício
subseqüente para aplicar o tributo. Já o empréstimo compulsório criado para atender a
investimento público urgente e relevante não foge à aplicação do princípio, o que revela
forte contradição: se a Constituição condiciona o empréstimo a que o investimento seja
urgente, não faz sentido subordiná-lo ao aguardo do exercício subseqüente para que a
União possa arrecadá-lo (art. 148, I e II, da CF/1988 (LGL\1988\3)). Na redação original
da Constituição de 1988, estava expresso que o empréstimo compulsório ficava sujeito à
anterioridade na situação do inc. II do art. 148; a contrário sensu, entendia-se que o do
inc. I não se submetia ao princípio; talvez tivesse sido melhor se expressasse a exceção
(no inc. I) e não a submissão à regra (no inc. II). Com a redação dada pela EC 42/2003,
o inc. II do art. 148 continua firmando sua submissão ao enunciado e o art. 150, § 1.º,
passa a deixar expressa a exceção.

Excepciona-se, também, do princípio da anterioridade, por razões óbvias, o imposto


extraordinário que a União pode instituir em caso de guerra ou sua iminência (art. 154,
II, CF/1988 (LGL\1988\3)).

A EC 42/2003, que vedou, em regra, a cobrança de tributo antes de decorridos 90 dias da


lei que o instituiu ou aumentou, reitera o rol de exceções relativo ao art. 153, III, b, e
acrescenta, como situação não sujeita ao lapso temporal de que trata a alínea c do mesmo
dispositivo, a fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156,
I, da CF/1988 (LGL\1988\3) (IPVA e IPTU).

As contribuições (arts. 149 e 149-A, da CF/1988 (LGL\1988\3)) devem, em regra,


obediência ao princípio da anterioridade. Excetuam-se as da seguridade social, que, de
acordo com o art. 195, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3), se submetem apenas à
anterioridade de 90 dias: “As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser
exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído
ou notificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, b.”

Parece, então, óbvio que o preceito (ao falar em contribuições “exigidas”) só autoriza a
incidência sobre fatos que ocorram após os 90 dias. Não atende ao preceito o mero
adiamento, por 90 dias, do pagamento de contribuições que pudessem imediatamente
incidir sobre fatos ocorridos a partir da publicação da lei: esta só grava os fatos (descritos
inabstrato na norma) que ocorram após 90 dias contados de sua publicação. O problema
é análogo ao que se discute a propósito da expressão “cobrar tributos no mesmo exercício
financeiro”, posta na formulação constitucional do princípio da anterioridade (art. 150, III,
b, da CF/1988 (LGL\1988\3)).

Portanto, em consonância ao curso do estudo ora desenvolvido, calha imprimir que como
regra de estrutura que são, as isenções, assim como o princípio da anterioridade das
normas, interferem na eficácia das normas-padrões de incidência. Este, postergando a
eficácia da norma-padrão, aquelas suspendendo sua eficácia, todavia sua revogação é
como a instituição do tributo isento, porque da aplicação da anterioridade.

Pois bem, em relação às isenções com prazo determinado, exceção à anterioridade,


nenhuma dúvida haveria, porque respeitado estaria o princípio da não-surpresa, pois,
desde o início da concessão da isenção os contemplados estariam cientes do seu término.
Assim, basta que o prazo expire para que o tributo volte a ser cobrado a partir daquela
data, não necessitando aguardar o próximo exercício financeiro, uma vez que, nestes

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casos, a eficácia retorna de imediato, e a norma de tributação pode novamente incidir,


juridicizando os fatos em tributários.

Maior dificuldade não há para compreender como se daria o retorno da eficácia da parcela
dos critérios da norma tributária que fora suspensa por isenção sem prazo determinado,
cuja particularidade específica, é de fácil visualização. Nestas hipóteses, a única diferença
é que a eficácia plena da norma tributária será devolvida no exercício financeiro posterior
àquele em que se revogou a isenção, conforme nos preceitua o art. 104, III, do CTN
(LGL\1966\26):

“Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a
sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou renda:

(…)

III – que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais
favorável ao contribuinte, e observado o disposto no art. 178.”

Como foi visto, o que o dispositivo determina é que a norma que revoga, total ou
parcialmente, a isenção dos impostos referentes ao patrimônio ou a renda terá postergada
sua vigência ao próximo exercício financeiro àquele em que tenha sido publicada. Além de
prestigiar o princípio da não-surpresa, aproxima-se à finalidade do princípio da
anterioridade.

Entretanto, enquanto este posterga a eficácia da norma tributária que crie ou majore
tributo, o artigo em apreço posterga a vigência da norma que revoga a isenção.

Certamente, o que inspirou a criação de ambos os preceitos foi o intuito de evitar, seja
postergando a eficácia ou a vigência, que os tributos pudessem ser cobrados no mesmo
exercício financeiro em que fora tornada pública a norma (tanto a que cria ou majora
tributos, quanto a que revoga isenção concedida indeterminadamente). Deste modo, a
preocupação do legislador em um ou noutro caso foi, justamente, a de resguardar o
contribuinte da surpresa tributária.

Assim, por força do art. 104, III, do CTN (LGL\1966\26), para que norma posterior
objetive extinguir ou reduzir uma isenção, deverá aguardar o próximo exercício financeiro
ao da sua publicação para entrar em vigor e retirar o obstáculo (falta de eficácia) que
impedia a incidência de parcela de um ou alguns dos critérios da norma tributária.

Vale ressaltar que o preceito contido no dispositivo supra não deve ficar adstrito à
revogação das normas isentivas dos impostos sobre patrimônio ou renda, mas a todos os
tributos. Tal idéia se extrai a partir de uma interpretação integrada do ordenamento, aliada
ao que Carlos Maximiliano chama de exegese extensiva:

“(…) em regra, as normas jurídicas aplicam-se aos casos que, embora não designados
pela expressão literal do texto, se acham no mesmo virtualmente compreendidos, por se
enquadrarem no espírito das disposições: baseia-se neste postulado a exegese extensiva.”
42

Por isto, as isenções, como todo instituto jurídico do ordenamento, cumprem uma
finalidade; logo, pressupõe-se que, se não há mais a finalidade que ensejou a norma
isentiva, cumpre seja ela revogada, não se justificando a continuação do “benefício”, em
havendo inércia do legislativo na reinstituição dos tributos que foram isentos.

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

Pois esta é a conseqüência de entender-se a norma isentiva como norma revogadora, ou


seja, uma vez extinta a vigência da isenção, na ausência de nova lei que reinstitua os
tributos antes isentos, de nada valerá a revogação da isenção, haja vista a regra matriz
não volta a viger porque a norma isentiva perdeu a vigência, continuando a existir,
portanto, o “benefício” que fora revogado.

Por tudo, então, apresenta-se posteriormente a posição que melhor atende aos preceitos
constitucionais, inclusive com a sistemática normativa da matéria, em relação à
revogabilidade das isenções e ao princípio da anterioridade ora analisado. Posto que é o
objeto deste discurso dialético.

3. A REVOGAÇÃO DA ISENÇÃO E O PRINCÍPIO DA NÃO-SURPRESA

3.1 Da revogabilidade à visão doutrinária da aplicação da anterioridade

Do mesmo modo que as isenções são concedidas mediante leis, são por estas revogáveis.
Razão esta, que após o estudo do alcance e do conceito dos institutos da isenção, e da
anterioridade, sujeitos da cena jurídica analisada, propõe-se, sem mais delongas
demonstrar, agora, quais os limites e de que forma ocorrem as revogações do ponto de
vista doutrinário.

Pois bem, sendo a isenção um instituto jurídico que libera o encargo tributário de diversos
modos: algumas vezes são concedidas sem o prazo de duração previamente prefixado,
por razões de política social (são as chamadas incondicionais), outras são concedidas com
prazo determinado e com a fixação de algumas condições, com tônus de bilateralidade
entre o ente tributante e o contribuinte beneficiário (isenções condicionais). 43 Assim, no
que pertine à sua revogabilidade os efeitos jurídicos de ambas as modalidades não são
iguais.

Destarte, como a segurança jurídica exige que se a isenção for reconhecida, não sejam
promovidas modificações arbitrárias no estatuto jurídico dos seus beneficiários. Sendo
esta concedida para ter eficácia por prazo certo (isenções condicionais), como incentivo
às obrigações assumidas, a isenção não pode ser revogada a qualquer tempo,
contrariando a regra geral. Como bem assevera Souto Maior Borges:

“Intangíveis, portanto, as isenções de caráter bilateral (temporárias, condicionais ou


contratuais). A regra da revogabilidade esbarra diante do direito adquirido ao gozo da
isenção enquanto persistirem as condições e os requisitos em função dos quais esta foi
outorgada.” 44

Nesta senda subsiste o art. 178 do CTN (LGL\1966\26), na redação da LC 24/1975, art.
13, in fine:

“Art. 178. A isenção, salvo se concedida por prazo certo ou em função de determinadas
condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o
disposto no inciso III do art. 104.”

Esta capacidade assente pela lei de revogar isenções não pode ser exercida com violação
do direito adquirido, já que como bem leciona Roque Antonio Carrazza:

“As vantagens da isenção condicional com prazo certo incorporam-se ao patrimônio da


pessoa que cumpriu o encargo, a qual passa a ter o direito adquirido de continuar
desfrutando do benefício, até a expiração do prazo fixado na lei isentiva.” 45

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

Apropriadamente, Souto Maior Borges defende esta posição quando afirma que: “(…) o
ordenamento jurídico reconhece, portanto, o direito à isenção, adquirido pelo contribuinte
( direito tributário adquirido)”. 46

Pelo ora exposto, então, atendidas as condições para o direito à revogabilidade das
isenções, esta vigora por todo o período de tempo para o qual fora concedida. Seria o
mesmo que afirmar tratar-se de isenção irrevogável; muito embora essas explanações só
sirvam para explicar o que ocorre com as isenções condicionais. Melhor, pode-se, ainda,
aduzir que esse direito à não-incidência nasce dos fatos isentos ocorridos na vigência da
lei isentante.

Portanto, em conformidade com os arts. 178 e 179 do CTN (LGL\1966\26), na isenção


condicionada e por prazo certo atua o Poder Legislativo como estabelecedor dos
pressupostos gerais para a sua concessão, o Poder Executivo como o responsável pela
expedição do ato de concessão à vista da observância dos pressupostos legais pelo isento;
e o particular que pratica os atos necessários ao desfrute da exoneração fiscal, é o
beneficiário. 47

Esclarecido os papéis nesta relação, necessário é agora tratar das isenções incondicionais.

E, a doutrina majoritária, de acordo com o Código Tributário Nacional (LGL\1966\26),


concorda com a revogabilidade das isenções como regra geral, principalmente no que
tange às incondicionais.

Entretanto, o sistema jurídico deve buscar sempre consonância com a realidade social, e
esta pugna por estabilidade nas relações jurídicas existentes. É o que alerta o professor
Maior Borges, in verbis:

“A faculdade de revogar isenções sofre limitações que decorrem dos princípios e normas
da constituição; não pode ser entendida como absoluta e sem condicionamentos de ordem
temporal; comporta temperamentos ditados pelos diversos modos através dos quais o
direito positivo disciplina a matéria, modalidades que, enquanto correspondem a
diferentes técnicas de emprego do instituto da isenção, são susceptíveis de ordenação
jurídica diversificada.” 48

Traçada, assim, a introdução sobre a questio da revogabilidade, volta-se, novamente, para


o escopo principal deste trabalho que é estudar a incidência ou não da regra da
anterioridade no instituto da isenção tributária quando revogada por lei.

E para tanto, suscita-se em primeira linha, que o entendimento do STF, no tratamento da


revogação das isenções incondicionais esposa a cobrança imediata do tributo devido, sem
atentar para a regra da anterioridade (art. 150, III, b, da CF/1988 (LGL\1988\3)), sem
atentar, como insistentemente afirmado, para a segurança das relações jurídicas. Como
bem se observa no voto do Min. Prado Kelly, no RMS 13.947 ( RTJ 39/64).

Para ilustrar esta afirmativa é inolvidável trazer à baila pronunciamento do professor


Aurélio Pitanga Seixas Filho, para quem:

“O comando constitucional ordena que nenhum tributo poderá ser cobrado em cada
exercício sem que a lei que o houver aumentado esteja em vigor antes do início do
exercício financeiro. (…) Devemos ver que, diante do princípio constitucional da
anterioridade da lei tributária, a revogação da isenção fiscal produz eficácia apenas após

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

o início do exercício financeiro seguinte. Caso contrário, teríamos aumento ou criação de


tributo no meio do exercício financeiro. (…) Os dispositivos editados com esse fim
equivalem, em tudo e por tudo, aos que instituem o tributo, inaugurando um tipo de
incidência. Nesses termos, em homenagem ao princípio da anterioridade, o termo inicial
de sua eficácia fica diferido para o primeiro dia do próximo exercício.” 49

Com cognição respeitável Souto Maior Borges preleciona neste caso, que:

“Nenhum dispositivo que venha a extinguir ou reduzir isenções poderá entrar em vigor
senão no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação, salvo
se a lei dispuser de modo mais benéfico para o contribuinte.” 50

Deste modo, dentro de um mesmo exercício orçamentário não é lícito criar novo imposto,
mesmo pela via oblíqua de revogação de isenção, já que fazendo um paralelo com o antigo
princípio da anualidade, esta amostragem significativa da doutrina brasileira serve para
contrastar com a jurisprudência do STF, que, de tão remansosa, já se cristalizou na
Súmula 615, cujo texto é o seguinte: “O princípio constitucional da anualidade (§ 29 do
art. 153 da CF/1988 (LGL\1988\3)) não se aplica à revogação da isenção do ICM.”

Esta posição do STF já vem de longa data, pois ao julgar o RMS 15.466/SP, em
18.11.1965, o Plenário, unanimemente, decidira que: “A revogação da isenção opera de
imediato, passando o tributo a ser devido sobre as transações posteriores, ainda que no
mesmo exercício.” 51

Argumentação que dá suporte ao entendimento da Corte Suprema é a seguinte, conforme


o Min. Moreira Alves:

“Ora, embora seja sustentável, teoricamente, que a isenção obste o nascimento da


obrigação tributária, e, portanto, a sua extinção amplie a área de incidência do tributo, o
que equivaleria à própria instituição do tributo (assim, entre alguns outros, Baleeiro,
Direito tributário brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro, 1981, p. 424; e Souto Maior,
Isençõestributárias. 2. ed. São Paulo, 1980, p. 135 e ss.), o certo é que esse entendimento
é repudiado – como o reconhece o próprio Souto Maior, ob. cit., p. 164 – pela ‘quase-
unanimidade da doutrina nacional’, uma vez que (as palavras que se seguem são do
mesmo autor) ‘a isenção é, via de regra, caracterizada em doutrina nacional como a
dispensa legal do pagamento de tributo devido’.

E, a doutrina nacional predominante – seguida, inclusive, por Rubens Gomes de Souza –


foi a que veio a prevalecer no Código Tributário Nacional (LGL\1966\26), que, após,
distinguir a obrigação tributária do crédito tributário, coloca a isenção juntamente com a
anistia como causa de exclusão do crédito tributário, em termos que são inequívocos no
sentido de que a obrigação tributária existe e persiste, embora haja a dispensa legal do
pagamento do tributo devido. Com efeito, depois de o art. 175 do CTN (LGL\1966\26)
declarar que ‘excluem o crédito tributário: I – a isenção; II – a anistia’, estabelece, em
seu parágrafo único: ‘A exclusão do crédito tributário não dispensa o cumprimento das
obrigações acessórias dependentes da obrigação principal cujo crédito seja excluído, ou
dela conseqüente.’

O que implica dizer, sem a menor dúvida, que a obrigação principal, cujo cumprimento foi
dispensado pela isenção, persiste sem esse efeito, mas tanto persiste que as obrigações
acessórias dela dependentes ou conseqüentes devem ser cumpridas, pois aquela dispensa

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

não as alcança. Se a isenção significasse não-incidência, e, portanto, não-instituição do


tributo, seria difícil explicar como pode haver obrigação acessória dependente, ou, o que
é mais conseqüente, de obrigação que não existe.

Assim sendo, em face de nosso direito positivo, a isenção é caracterizada como ‘dispensa
legal do pagamento do tributo devido’, e, portanto, sua revogação não importa extensão
de incidência, o que permitiria seu enquadramento na figura da instituição do tributo.” 52

Dito isto, até então, para os Ministros do STF as normas isencionais não eram normas
restritivas ou não juridicizantes, porém normas derrogatórias ou desjuridicizantes, pois a
obrigação tributária existe e persiste, embora haja a dispensa legal do pagamento do
tributo devido.

Todavia, em vista do julgamento da MC na ADIn 2.325/DF, o rel. Min. Marco Aurélio


pronunciou que: “a modificação do sistema de creditamento pela Lei Complementar
impugnada [ LC 102/2000], quer consubstancie a redução de um benefício de natureza
fiscal, quer configure a majoração de tributo, cria uma carga para o contribuinte e,
portanto, sujeita-se ao princípio da anterioridade” (vide Informativo do STF 212 de
01.12.2000).

Realidade esta, hoje, encampada pelo STF. Assim, pondera-se que as normas isencionais
são normas não juridicizantes ou restritivas, não sendo derrogatórias ou desjuridicizantes,
como defendia o antigo argumento básico da Suprema Corte que perdeu totalmente sua
sustentação.

Posto que, como bem leciona Luciano Amaro:

“Se se trata de tributo sujeito ao princípio da anterioridade, é óbvio que a revogação da


isenção, tendo o mesmo efeito da edição de regra de tributação, importa em que o tributo
só possa ser aplicado a partir do exercício seguinte àquele em que a norma legal seja
editada, O Código Tributário Nacional (LGL\1966\26) deixou isso expresso no art. 104,
III.” 53

E, citando a Súmula 615 (MIX\2010\2338) do STF, o mesmo autor doutrina que:

“Os fundamentos dessa jurisprudência partem de premissas equivocadas, que, mesmo na


hipótese de serem assumidas como corretas, não levariam às conclusões que foram
firmadas pelo Supremo. Já alhures procuramos demonstrar que, mesmo quando se admita
a consagração, pelo Código Tributário Nacional (LGL\1966\26), do conceito de isenção
como ‘dispensa de tributo devido’ (coisa que até Rubens Gomes de Sousa negou, ao dizer
que o Código não tomou partido nessa discussão), ainda assim não se pode culpar o
Código de ter propiciado oblíquo desrespeito ao princípio da anterioridade na hipótese em
exame, pois o seu art. 104, no item III, cuidou adequadamente da matéria, quando
explicitou que a revogação de isenção de tributo (sujeito à anterioridade) só autoriza a
tributação no exercício subseqüente. E mesmo que não o dissesse, não se poderia dar ao
Código Tributário Nacional (LGL\1966\26) interpretação que pudesse ferir, ainda que
indiretamente, um princípio constitucional.

Com efeito, o art. 104 do CTN (LGL\1966\26) o que fez foi desdobrar as conseqüências
do princípio da anterioridade (que, na época de sua edição, era aplicável, como já vimos,
apenas aos impostos sobre a renda e o patrimônio). Ao proceder à definição dos efeitos
da anterioridade, o preceito foi expresso ao estabelecer que a revogação das isenções se

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

submete àquele princípio. Aquilo que, na época, era aplicável apenas aos tributos sobre
renda e patrimônio hoje deve ser entendido como abrangente de todos os tributos
protegidos pelo princípio da anterioridade. Assim, mesmo a revogação de uma isenção de
tributo não mencionado no art. 104 submete-se ao princípio da anterioridade, desde que,
hoje, esse tributo esteja sujeito a tal princípio.” 54

O também autor e professor Kiyosh Harada, neste esteio doutrinário, diz que, “(…) salvo
quando concedida por prazo certo, pode ela [a isenção] ser revogada a qualquer tempo,
observado, entretanto, o princípio da anterioridade”. 55

Nesta esteira, compreende-se a afirmação de Hugo de Brito Machado, segundo a qual:

“(…) a revogação de uma lei que concede isenção equivale à criação de um novo tributo.
Por isto deve ser observado o princípio da anterioridade da lei, assegurado pelo art. 150,
III, b, da CF (LGL\1988\3), e já por nós estudado.” 56

Corroborando com esta afirmativa, Luiz Emygdio F. da Rosa Jr. contribui aduzindo que:

“Assim, o art. 104 do CTN (LGL\1966\26) deve ser interpretado em consonância com o
art. 150, III, b, da CF/1988 (LGL\1988\3), que estabelece a regra sobre a anterioridade,
bem como com os arts. 150, § 1.º, 148, I, 195, § 6.º da CF/1988 (LGL\1988\3), e o art.
75, § 1.º, do ADCT (LGL\1988\31), que consagram as exceções. Daí a necessidade de o
caput do art. 104 do CTN (LGL\1966\26) ser entendido como se tivesse a seguinte
redação, mantendo-se a dos seus incisos:

‘Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua
publicação os dispositivos de lei referentes a tributos, salvo os impostos sobre importação,
exportação, IPI, IOF, extraordinários por motivo de guerra, empréstimos compulsórios
decorrentes de calamidade pública, guerra externa ou sua iminência e contribuições
sociais e CPMF.’

Todavia, o STF enuncia na Súmula 615 que o referido art. 104 não se aplica à revogação
de isenção do ICMS (art. 104, III, do CTN (LGL\1966\26)) sob o fundamento de que o
referido imposto não se inclui nas categorias econômicas de patrimônio ou renda. Tal
entendimento do STF estaria certo se a EC 1/1969 e a Constituição Federal de 1988
tivessem mantido a redação da EC 18/1965 no tocante ao princípio da anterioridade da
lei fiscal, o que, no entanto, não ocorreu. Assim, tal entendimento é manifestamente
equivocado e não tem supedâneo no texto constitucional vigente, esperando-se que seja
modificado.” 57

Neste debate, o livre docente Roque Antonio Carrazza desenvolve um outro argumento
para fundamentar o direito do contribuinte de só pagar o tributo com a vigência no
exercício posterior ao da revogação da norma que concedia isenção. Este entendimento é
o seguinte:

“A lei que concede uma isenção revoga (no todo ou em parte) a lei anterior que mandava
tributar (se e quando ocorrido de terminado fato). Pois bem, revogada a lei isentante,
nem por isto a primitiva lei tributária voltará a vigorar. Por quê? Simplesmente porque
não há o chamado efeito repristinatório no Direito Tributário brasileiro. Realmente, a lei
tributária, uma vez revogada, nunca mais voltará a vigorar, ainda que a lei que a tiver
revogado desapareça. Um exemplo talvez elucide melhor este assunto: se a lei tributária
‘A’ tiver sido revogada pela lei ‘B’ e esta, de sua feita, vier a ser revogada pela lei ‘C’, nem

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

assim a lei ‘A’ voltará a vigorar. O que pode se verificar – hipótese rara, mas não
impossível – é a lei ‘C’ encampar o conteúdo da lei ‘A’. No entanto, em vigor estará, neste
caso, simplesmente a lei ‘C’. A lei ‘A’ pertencerá irreversivelmente a História do Direito
(…). A lei é necessariamente orientada na direção do que deve ser, isto é, para o futuro.
Seria de todo inconcebível que os direitos das pessoas pudessem ser alterados a cada
mudança de legislação, ainda mais quando esta cuida da criação ou do aumento de
tributos. Assim, a lei, ao deixar o cenário jurídico, não mais a ele torna. O ordenamento
jurídico caracteriza-se por um vir a ser constante de normas que não cessam de se
renovar: as que caem fulminadas pela revogação não voltam mais a produzir efeitos em
seus hemisférios. De conseguinte, revogada a lei isentiva, e restabelecido o dever de pagar
o tributo – pela nova lei, que o recria –, é inafastável a incidência do princípio da
anterioridade, que encerra, para o contribuinte, uma garantia de estabilidade da ordem
jurídica.” 58

Com propriedade, Paulo de Barros Carvalho perscruta que:

“É questão assente que os preceitos de lei que extingam ou reduzam isenções só devam
entrar em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que forem publicados. Os
dispositivos editados com esse fim equivalem, em tudo e por tudo, aos que instituem o
tributo, inaugurando um tipo de incidência. Nesses termos, em homenagem ao princípio
da anterioridade, o termo inicial de sua vigência fica diferido para o primeiro dia do
próximo exercício.

Esse o conteúdo do art. 104, III, do CTN (LGL\1966\26), se bem que restringindo a regra
aos impostos sobre o patrimônio e a renda. A restrição, porém, prevaleceu apenas até o
início da vigência da Carta de 1967, quando o constituinte retomou, com entusiasmo a
linha de primazia da anterioridade. A partir de então o âmbito de abrangência do citado
art. 104, III, passou a ser pleno, estendendo-se a qualquer espécie de tributo.” 59

Para desfecho, cita-se o professor mineiro Sacha Calmon Navarro Coêlho que adverte que:

“De observar, na espécie, o art. 104, III, que, na livre revogação das isenções, manda
observar o princípio da anterioridade, e não apenas no que tange aos impostos sobre o
patrimônio e a renda. A redação do art. 104 do Código é assim porque a Constituição de
1946, com a redação da EC 18, vigente no tempo em que ele foi promulgado, restringia a
anterioridade, e não apenas no que tange aos impostos sobre o patrimônio e a renda. A
redação do artigo agora conforme a constituição é outra. A cronologia há que ser
respeitada, mas com o fito de tornar eficaz e coerente o Código Tributário Nacional
(LGL\1966\26) em relação à Constituição atual, que manda aplicar o princípio
generalizadamente, salvo as exceções do seu próprio texto.” 60

É o claro exemplo citado, de eficácia do princípio da receptividade 61 no sistema


constitucional vigente, que vários doutrinadores do mais elevado escol corroboram em
defender, que é a tese aqui exposta, e que ganha maior sustentação quando a
fundamentamos nos esclarecimentos dos aspectos da fenomenologia da isenção tributária,
numa perfeita harmonia com o conceito do princípio da anterioridade e sua abrangência.

Por tudo, fica verificado, com amparo em diversos fundamentos e em renomada doutrina
que as isenções incondicionais devem, irrefutavelmente, quando revogadas, obedecer à
valiosa regra da anterioridade, corolária do princípio da segurança jurídica, tão enaltecida

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

pela doutrina constitucional atual e até mesmo reafirmada pelo STF no julgamento da MC
na ADIn 2.325/DF, pelo rel. Min. Marco Aurélio, em 29.11.2000.

Por outro lado, apesar do pronunciamento do Supremo em interpretação conforme à


Constituição e sem redução de texto, como fora o que ocorreu no julgamento da ação
direta de inconstitucionalidade acima citada, nem toda a jurisprudência tem concordado
com a doutrina majoritária, que é a mais condizente com a interpretação sistemática,
hoje, aplicada.

No próximo subtítulo colaciona-se julgados recentes, a fim de cominar-se considerações


de peso que possam acrescer ou responder o problema em estudo.

3.2 Colação da jurisprudência e seus conflitos aparentes com a doutrina mais


atualizada

Devido às contradições existentes entre a jurisprudência e a doutrina, cotejam-se alguns


julgados:

“Mandado de segurança – Tributário – Imposto de renda na fonte – Benefício


complementar ao da previdência social – Isenção – Ausência de direito adquirido –
Revogação – Vigência imediata da lei revogadora.

1. Mandado de segurança impetrado objetivando afastar o desconto do imposto de renda,


na fonte, sobre o valor recebido da Fundação Petrobrás – Petros, a título de
complementação de proventos de aposentadoria.

2. Incidência do imposto de renda após a Lei 9.250/1995, que alterou a Lei 7.713/1988.

3. Ausência de direito adquirido à isenção tributária após a revogação da lei que a


concedera em caráter geral.

4. A lei que revoga a que concedera a isenção tem eficácia imediata, podendo o tributo
ser cobrado no mesmo exercício, sem quebra do princípio da anterioridade.

5. Apelação improvida.” (TRF-2.ª Reg., Ap em MS, Processo 1999.02.01.056053-4, v.u.,


rel. Des. Paulo Barata, DJ 24.02.2002, p. 363-374).

“Tributário – Mandado de segurança – Dec.-lei 2.324/1987 – Isenção por prazo certo e


sob determinadas condições – Irrevogabilidade – Matéria-prima – Não está contemplada
na norma isentiva.

– A norma isentiva com prazo certo não pode ser revogada. Art. 178 do CTN
(LGL\1966\26).

– A fruição do direito ao benefício da isenção depende da presença de todos os requisitos


legalmente exigidos.

– O conceito de bem descrito na norma deve ser interpretado restritivamente, ou a isenção


só abarca os itens literalmente descritos. Matéria-prima não faz parte desse rol. Apelação
a que se nega provimento” (TRF-3.ª Reg. Ap em MS, Processo 95.03.03773-5, 4.ª T.,
v.u., rel. Juíza Therezinha Cazerta, DJ 01.02.2002, p. 564).

“Processual civil e tributário – Embargos à execução fiscal – ICMS – Redução da base de


cálculo – Isenção parcial – Revogação: possibilidade – art. 178 c/c o art. 104 do CTN
(LGL\1966\26) – Súmula 544 (MIX\2010\2267)/STF – Aplicação da taxa Selic:

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

possibilidade – Lei estadual 6.763/1975 (com redação alterada pela Lei 10.562/1991) –
violação do art. 535 do CPC (LGL\1973\5): inexistência.

1. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC (LGL\1973\5) se o Tribunal analisa, ainda que
implicitamente, a questão tida por omissa.

2. Segundo o STF, a redução da base de cálculo do ICMS equivale à isenção parcial do


tributo, aplicando-se a mesma disciplina em ambas as hipóteses. Precedentes.

3. A revogação da isenção e do benefício da redução da base de cálculo do imposto pode-


se ocorrer a qualquer tempo, exceto se concedidos por prazo certo e em função de
determinadas condições (art. 178 c/c o art.104, III, do CTN (LGL\1966\26)).

4. Correção do acórdão que entendeu possível a supressão do benefício fiscal sem


observância do princípio da anterioridade.

5. Recurso especial não provido” (STJ, REsp 762.754/MG, 2.ª T., j. 20.09.2007, rel. Min.
Eliana Calmon, DJ 02.10.2007, p. 230 – sem grifos no original).

“ Tributário – Isenção – Importação – Lei 8.032/1990 – IPI e Imposto de importação –


Dec.-lei 2.324/1997.

A isenção, quando concedida por prazo certo e sob condição onerosa, não pode ser
revogada. Recurso improvido” (STJ, REsp 198.331/SC, 1.ª T., j. 23.03.1999, rel. Min.
Garcia Vieira, DJ 17.05.1999, p. 148 – sem grifos no original).

“Tributário. ICMS. Isenção não condicionada. Incidência imediata da lei que a revoga.
Ainda que concedida por prazo certo, a isenção pode ser modificada ou revogada a
qualquer tempo; só gera direito adquirido aquela que, além do prazo certo, seja outorgada
mediante o implemento de condição onerosa (art. 178 do CTN (LGL\1966\26)). Recurso
especial não conhecido” (STJ, REsp 48735/SP, 2.ª T., j. 05.06.1997, rel. Min. Ari
Pargendler, DJ 23.06.1997 p. 29073).

“ A isenção em caráter geral não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, podendo, a


qualquer momento, ser revogada, não havendo ofensa ao princípio da anterioridade da lei
(RE 99.908/RS, rel. Min. Rafael Mayer, RTJ 107/430-432).62

Apuração de crédito do ICMS

Iniciado o julgamento de medida liminar em ação direta ajuizada pela Confederação


Nacional da Indústria – CNI contra dispositivos da LC 102, de 11.07.2000, que, alterando
a LC 87/1996, modificam o critério de apropriação dos créditos do ICMS decorrentes de
aquisições de mercadorias para o ativo permanente, de energia elétrica e de serviços de
telecomunicação (inserção do § 5.º ao art. 20, alteração do inc. II do art. 33 e acréscimo
do inciso IV). O Tribunal, apreciando a questão do princípio da anterioridade (art. 150, III,
b, CF/1988 (LGL\1988\3)), emprestou interpretação conforme à Constituição e sem
redução de texto, no sentido de afastar a eficácia do art. 7.º da referida Lei Complementar
(‘Esta Lei Complementar entra em vigor no primeiro dia do mês subseqüente ao da sua
publicação’) no tocante à inserção do § 5.º do art. 20 da LC 87/1996, e às inovações
introduzidas no art. 33, II, da referida Lei, bem como à inserção do inc. IV, vale dizer,
esses dispositivos só terão eficácia a partir de 01.01.2001. À primeira vista, o Tribunal
entendeu que a modificação do sistema de creditamento pela Lei Complementar
impugnada, quer consubstancie a redução de um benefício de natureza fiscal, quer

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A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

configure a majoração de tributo, cria uma carga para o contribuinte e, portanto, sujeita-
se ao princípio da anterioridade.“ (MC na ADIn 2.325/DF, rel. Min. Marco Aurélio, j.
29.11.2000 – sem grifos no original).

Pelo visto, o último julgamento ora colacionado e sua decisão final, 63 que reafirmou este
ponto suscitado, é posicionamento que mais está coadunado com o sistema constitucional
vigente, que percebe a anterioridade como direito fundamental do contribuinte, referência
esta, a qual a doutrina majoritária interpreta de modo técnico e especializado, conforme
a Constituição Federal de 1988. Corrente a que se filia.

Assim, após este breve mais eficaz repertório, passa-se a aduzir as considerações finais.

4. CONCLUSÃO

Pelo princípio da não-surpresa é vedado cobrar tributos no mesmo exercício financeiro em


que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou. De acordo com este princípio,
portanto, evita-se a cobrança de um tributo inesperado ou o aumento de um já existente.
E a própria Constituição Federal de 1988 enuncia expressamente os casos em que se pode
afastar este princípio, verdadeira cláusula pétrea.

Pois, com a anterioridade busca-se evitar a surpresa do contribuinte no trato dos seus
negócios, no sentido de prevenir a possibilidade de cobrança de um tributo de um dia para
o outro. Por isto, este princípio é também chamado de princípio da não-surpresa.

De qualquer sorte, a anterioridade vem reforçar outro princípio constitucional: segurança


jurídica. Aos cidadãos-contribuintes, a certeza inclusive de que não serão onerados
intempestivamente.

Portanto, as isenções condicionadas ou a termo não podem ser revogadas, enquanto não
houver a implementação do tempo, ou enquanto observada a condição imposta, conforme
o art. 178 do CTN (LGL\1966\26), e as incondicionadas podem ser revogadas, porém
somente tendo aplicação da lei que revogou, no próximo exercício financeiro, ou após 90
dias, por questão de segurança jurídica, observadas as exceções a anterioridade comum
e especial.

Isto se deve ao fato de que a revogação da isenção implica no aumento do tributo, já que
do nada pagar, para pagar algo, com certeza, implica em aumento do tributo. Ainda mais,
em vista do entendimento, hoje, aplicado no STF.

Todavia, a jurisprudência não é unânime, devido à mudança no tempo de interpretação


conforme a Constituição pelo STF, alterações estas que estão trilhando para se coadunar
a posição atual.

Já que, a realidade brasileira impõe, inexoravelmente, que os comandos constitucionais


sejam efetivamente chancelados pelo STF, pois esta é a única maneira de se fazer valer à
verdadeira justiça, que seja até através de súmula vinculante.

Afinal, a ciência do direito oportuniza celebrar a liberdade: duvidar, contestar, ousar. Seu
papel é o eterno atrevimento para se evoluir a aplicação do direito. O conforto do passado
é dos colecionadores dogmáticos. Aos verdadeiros juristas cabe a angústia de criar.

BIBLIOGRAFIA

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Página 27
A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
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1 “Art. 175. Excluem o crédito tributário: I – a isenção.”

2 SOUZA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. São Paulo: Resenha
Tributária, 1975, p. 96 e 97: “(…) É importante fixar bem as diferenças entre não-
incidência e isenção: tratando-se de não incidência, não é devido o tributo porque não
chega a surgir a própria obrigação tributária; ao contrário, na isenção o tributo é devido,
porque existe a obrigação, mas a lei dispensa o seu pagamento; por conseguinte, a
isenção pressupõe a incidência“ (sem grifos no original). Amílcar de Araújo Falcão, neste
ponto, corroborando com o professor antes citado, acerca da isenção tributária, leciona
que: “(…) nela há incidência, ocorre o fato gerador. O legislador, todavia, seja por
motivos relacionados com a apreciação da capacidade econômica do contribuinte, seja
por considerações extrafiscais determina a inexigibilidade do débito tributário” (FALCÃO,
Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002, p. 41).

3 Nas palavras de Hugo de Brito Machado, “(…) não incidência é a situação em que a
regra jurídica de tributação não incide porque não se realiza a sua hipótese de
incidência, ou, em outras palavras, não se configura o suporte fático” (MACHADO, Hugo
de Brito. Curso de direito tributário. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 188).

4 O que se esta tentando significar é que o princípio da anterioridade é o corolário lógico


do princípio da segurança jurídica. Visa evitar surpresas para o contribuinte, com a
instituição ou a majoração de tributos, no curso do exercício financeiro. E de fato, o
princípio da anterioridade veicula a idéia de que deve ser suprimida a tributação de
surpresa (que afronta a segurança jurídica dos contribuintes). Ele não permite que, da
noite para o dia, alguém seja colhido por uma nova exigência fiscal. É ele, ainda, que
exige que o contribuinte se depare com regras tributárias claras, estáveis e seguras. E,
mais do que isso: que tenha o conhecimento antecipado dos tributos que lhe serão
exigidos ao longo do exercício financeiro, justamente para que possa planejar sua vida

Página 29
A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

econômica. (CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 21.


ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 133).

5 “O Poder de Tributar é irrenunciável e indelegável, porém não absoluto, pois a própria


Constituição Federal (LGL\1988\3) define o modus operandi do exercício deste poder
pelo Estado, através de comandos que garantem a harmonia e o equilíbrio na relação
jurídica tributária (poder-dever).” (BARRÊTTO, Pedro. Limitações ao poder de tributar.
Rio de Janeiro: Tele-Jur, 2000. 9 DVDs).

6 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 13. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2006, p. 304.

7 Isenção, dedução, anistia, remissão, isto é, renúncias de receita ou gastos tributários.

8 Subvenções, restituições de tributos etc.

9 SOUZA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. 3. ed. Rio de Janeiro:
Edições Financeiras, 1960.

10 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus,
1998, p. 277.

11 BORGES, José Souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 2007, p. 201.

12 SAINZ DE BUJANDA, Fernando. Hacienda y derecho. Estudios de derecho financieiro.


Madri: Instituto de Estudios Políticos, 1966. vol. 3.

13 AUGUSTO FILHO, João. Isenções e exclusões tributárias. Porto Alegre: Bushatsky,


1979, p. 161.

14 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17. ed. São Paulo: Saraiva,
2005, p. 488.

15 MESQUITA, Carlos José Wanderley de. Poder de tributar, isenção e imunidade. 1.ª e
2.ª partes. Caderno de Direito Tributário e Finanças Públicas 15/95 e 16/38. São Paulo:
Ed. RT, abr.-jun./jul.-set. 1996, respectivamente.

16 BORGES, José Souto Maior. Op. cit., p. 78.

17 BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11. ed. atual. por Misabel de Abreu
Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 931.

18 BORGES, José Souto Maior. Op. cit. p. 76.

19 SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Teoria e prática das isenções tributárias. 2. ed. Rio

Página 30
A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

de Janeiro: Forense, 1990, p. 105.

20 Misabel de Abreu Machado Derzi, atualizando Aliomar Baleeiro. Op.cit. p. 938.

21 CARVALHO, Paulo de Barros. Op. cit., p. 445.

22 Idem, p. 448.

23 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucionaltributário cit., p. 154.

24 Idem, p. 164.

25 Cf. ALESSI, Renato. Sistema instituzionale del diritto tributario. Milão: Giuffrè, 1960,
p. 70: “As isenções subjetivas são dispostas em consideração a determinadas
circunstâncias ou qualidades inerentes às pessoas isentas” (trad. livre).

26 JARACH, Dino. Curso superior de derecho tributário. Buenos Aires: Cima, 1957, t. I.

27 Falamos em obrigação tributária no sentido empregado por Geraldo Ataliba, ou seja,


como vínculo da relação jurídica tributária. (ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência
tributária. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 33).

28 CARVALHO, Paulo de Barros. Op. cit., p. 178.

29 MESQUITA, Carlos José Wanderley de. Poder de tributar, isenção e imunidade (1.ª
parte). Caderno de Direito Tributário e Finanças Públicas 15/111. São Paulo: Ed. RT,
abr.-jun. 1996.

30 Segundo a classificação de Paulo de Barros Carvalho, as normas jurídicas podem ser


regras de conduta ou regras de estrutura. Para o autor, as regras de estrutura são
aquelas que determinam como se dará o relacionamento entre as normas e entre estas
e os fatos sociais.

31 MESQUITA, Carlos José Wanderley de. Poder de tributar, isenção e imunidade (1.ª
parte) cit., p. 103.

32 BORGES, José Souto Maior. Op. cit., p. 29.

33 Cf. BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo:


Saraiva, 1996, p. 51.

34 ROMANO, Luiz Paulo. Mitigação do princípio da anterioridade. Jus Navigandi 44, ano
4, Teresina, ago. 2000. Disponível em:
[http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1298]. Acesso em: 22.09.2007.

35 Idem.

Página 31
A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

36 MELO, Omar Augusto Leite. A EC 33/2001 e suas inconstitucionais violações ao


princípio da anterioridade. Jus Navigandi 55, ano 6, Teresina, mar. 2002. Disponível em:
[http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2777]. Acesso em: 22.09.2007.

37 Idem.

38 DIAS, Luiz Claudio Portinho. O princípio da anterioridade e a segurança jurídica. Jus


Navigandi 52, ano 6, Teresina, nov. 2001. Disponível em:
[http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2403]. Acesso em: 23.09.2007.

39 Idem.

40 BOTTALLO, Eduardo Domingos. Fundamentos do IPI. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2005,
p. 45.

41 MACHADO, Hugo de Brito. Op. cit., p. 152.

42 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 11. ed. São Paulo:


Forense, 1991, p. 225.

43 Tributário. “Capef”. Entidade de previdência privada. Complementação de proventos


de aposentadoria. Imposto de renda na fonte. Isenção tributária. Lei 7.713/1988.
Precedentes. 1. Recurso Especial interposto contra venerando acórdão que julgou
procedente pedido de isenção do imposto de renda incidente sobre a complementação
de proventos de aposentadoria, recebida de entidade de previdência privada, no caso, a
Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Nordeste do Brasil – Capef. 2. O art.
6.º da Lei 7.713/1988, é expresso ao determinar que ficam isentos do Imposto de
Renda os benefícios recebidos de entidades de previdência privada, relativos ao valor
correspondente às contribuições cujo ônus tenha sido do participante, desde que os
rendimentos e ganhos de capital produzidos pelo patrimônio da entidade tenham sido
tributados na fonte. 3. As isenções condicionadas, também conhecidas como bilaterais
ou onerosas, são as que exigem uma contraprestação do benefício da isenção, ao passo
que as incondicionadas ou as chamadas isenções simples não importam qualquer ônus
para os beneficiários. 4. A doutrina é assente ao consolidar que a isenção condicional é
aquela que exige do beneficiário uma contraprestação em troca do condicionante,
constante na lei, e que a entidade de previdência privada tenha sido tributada na fonte.
5. Precedentes das 1.ª e 2.ª Turmas desta Corte Superior. 6. Recurso não provido. (
REsp 429.379/CE, 1.ª Turma, j. 06.08.2002, rel. Min. José Delgado, DJ 23.09.2002, p.
273).

44 BORGES, José Souto Maior. Op. cit., p. 79.

45 CARRAZZA Roque Antonio. Imunidade, isenção e não-incidência. In: BARRETO, Aires


F.; BOTALLO, Eduardo Domingos (coords.). Curso de iniciação em direito tributário. São
Paulo: Dialética, 2004, p. 105.

Página 32
A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

46 BORGES, José Souto Maior. Op. cit., p. 82.

47 “Art. 179. A isenção, quando não concedida em caráter geral, é efetivada, em cada
caso, por despacho da autoridade administrativa, em requerimento com o qual o
interessado faça prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos
previstos em lei ou contrato para concessão.§ 1.º Tratando-se de tributo lançado por
período certo de tempo, o despacho referido neste artigo será renovado antes da expiração
de cada período, cessando automaticamente os seus efeitos a partir do primeiro dia do
período para o qual o interessado deixar de promover a continuidade do reconhecimento
da isenção.

§ 2.º O despacho referido neste artigo não gera direito adquirido, aplicando-se, quando
cabível, o disposto no art. 155.”

48 BORGES, José Souto Maior. Op. cit., p. 78.

49 SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Op. cit., p. 167.

50 BORGES, José Souto Maior. Op. cit., p. 114.

51 Revista Trimestral de Jurisprudência 36, p. 9, apud SEIXAS FILHO, op. cit., p. 168.

52 Revista Trimestral de Jurisprudência 107, p. 759 e 760, apud SEIXAS FILHO, op. cit.,
p. 170.

53 AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 269.

54 Idem, p. 269 e 270.

55 HARADA, Kiyosh. Direitofinanceiro e tributário. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 51.

56 MACHADO, Hugo de Brito. Op. cit., p. 227.

57 ROSA JR., Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. 16. ed.
Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 299.

58 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário cit., p. 195 e


196.

59 CARVALHO, Paulo de Barros. Op. cit., p. 496.

60 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário. 7. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2004, p. 870.

Página 33
A revogação das isenções tributárias e a não-surpresa
constitucional

61 O princípio da receptividade do Direito – expresso no art. 34, § 5.º, do ADCT


(LGL\1988\31) –, é aplicado a legislação anterior no que não seja incompatível com as
novas normas constitucionais. Deste modo, aplica-se, como lei complementar
instituidora de normas gerais de Direito Tributário do país, o Código Tributário Nacional
(LGL\1966\26) ( Lei 5.172, de 25.10.1966). É nele, portanto, que devemos encontrar o
conceito de tributos e suas diversas modalidades, bem como as demais determinações
do art. 146, III, da CF/1988 (LGL\1988\3), desde que não a contrariem. As omissões do
CTN (LGL\1966\26) tornam exigível a publicação de outras leis complementares para
tratar dos tributos que nele não tenham previsão.

62 Encontra-se esta pacífica posição, dentre outros, nos seguintes julgados do STF: RE
204.026, RE 101.431-8/SP, RMS 13.947, RMS 14.473, RMS 14.174, RE 57.567, RMS
15.466, RMS 14.202, REs 97.482, 99.346, 99.430 e 99.560, Ag 91.028 e 90.922, RE
97.482.

63 Decisão: O Tribunal, por unanimidade, apreciando a questão do princípio da


anterioridade, deferiu, em parte, a cautelar para, mediante interpretação conforme à
Constituição e sem redução de texto, afastar a eficácia do art. 7.º da LC 102, de
11.07.2000, no tocante à inserção do § 5.º do art. 20 da LC 87/96 e às inovações
introduzidas no art. 33, II, da referida lei, bem como à inserção do inc. IV. Observar-se-
á, em relação a esses dispositivos, a vigência consentânea com o dispositivo
constitucional da anterioridade, vale dizer, terão eficácia a partir de 01.01.2001.
Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por maioria, vencido o Sr. Min. Marco Aurélio
(Relator), indeferiu a cautelar no que toca ao mais. Votou o Presidente. Não votou o Sr.
Min. Carlos Britto por suceder ao Sr. Min. Ilmar Galvão que já proferira voto. Ausentes,
justificadamente, neste julgamento, os Srs. Ministros Gilmar Mendes e Nelson Jobim,
Presidente. Presidiu o julgamento a Sra. Min. Ellen Gracie, Vice-Presidente. Plenário,
23.09.2004” (MC na ADIn 2.325, Pleno, j. 23.09.2004, rel. Min. Marco Aurélio, DJ
06.10.2006).

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