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, Além do Brasil (Viena 2012: Museum für Völkerkunde)

Christian Feest

JOHANN NATTERER E AS COLEÇÕES ETNOGRÁFICAS


DOS NATURALISTAS AUSTRÍACOS NO BRASIL

A coleção etnográfica que Johann Natterer, e, em proporção me- diziam respeito aos procedimentos burocráticas e questões discipli-
nor, outros naturalistas austríacos reuniram entre os anos de 1819 nares.
e 1835 no Brasil, e que hoje é conservada em sua maior parte no Os viajantes deveriam coletar, além de “produtos naturais”, tam-
Museum für Völkerkunde de Viena, constitui o acervo mais abran- bém “artigos de comércio e entre eles sobretudo as espécies de
gente de objetos da herança cultural dos povos indígenas brasilei- madeira de lei mais nobres e refinadas, todas as plantas cultivadas
ros (e seus vizinhos não-indígenas) da primeira metade do século extensivamente e todos os animais domésticos e de criação, na
IX, e além disso está entre os acervos mais importantes de todos medida em que houver esperança de poderem de algum modo ser
os tempos dedicados ao assunto. O fato de uma coleção dessa en- transportados de forma adequada e posteriormente aclimatizados
vergadura e dessa importância permanecer quase completamente também na Europa”; dados como origem, nomenclatura local e
despercebida, sobretudo no Brasil, durante quase dois séculos, se outras observações úteis relativas aos objetos da coleção deveriam
deve ao efeito conjunto de diversos fatores: a história pessoal de ser pormenorizados por escrito, e as coleções deveriam ser remeti-
Johann Natterer, a história institucional das coleções etnográficas das somente ao Real e Imperial Gabinete de História Natural (Ima-
Em Viena, as barreiras linguísticas e ainda a dimensão e a diversi- gem 16). As instruções de qualquer modo não eram completamente
dade da própria coleção. desprovidas de contradições: por um lado era recomendado que
O presente texto se dedica primeiramente à questão de como foi fossem coletados diversos exemplares de comprovação, sobretudo
possível que um empalhador austríaco pudesse amealhar uma co- de espécies mais raras, e por outro era concedida preferência à
leção etnográfica tão abrangente, em seguida persegue as veredas maior cobertura possível da variedade de espécies, em detrimento
confusas que a coleção percorreu em Viena (e alhures) até chegar da quantidade de objetos coletados (Schmutzer 2011: 49–59).
ao lugar em que hoje se encontra, e por fim tenta buscar uma ca- Na prática, a instrução de Schreibers tinha uma utilidade apenas
racterização do acervo, sobretudo também em comparação com mediana, pois a maioria dessas decisões poderia ser tomada ape-
outras coleções semelhantes da primeira metade do século XIX. nas após o conhecimento das condições e possibilidades locais.
O ato de coletar dados etnográficos e, principalmente, de objetos
de interesse etnográfico, tinha um papel meramente subordinado
Naturalistas como etnógrafos nessa “Instrução de Serviço”. É mencionado apenas de passagem
que os naturalistas deveriam dedicar também alguma atenção aos
Durante os preparativos para a expedição que o imperador austrí- usos e costumes dos “primitivos semicivilizados” e fazer registros
aco Francisco I enviou ao Brasil por ocasião das núpcias de sua filha
Leopoldina com o sucessor do trono português Dom Pedro, que já
residia com a família real no país desde 1807, o diretor do Real e
Imperial Gabinete de História Natural, Karl von Schreibers, redigiu
uma “Instrução de Serviço aos Naturalistas designados à Viagem
ao Brasil”. O objetivo embutido nesse documento consistia em
contribuir “o máximo possível para a pesquisa e o conhecimento
essa grande e altamente estranha parcela de nosso planeta” e
sobretudo enriquecer em conhecimento e objetos “a ciência e os
estabelecimentos públicos da monarquia dedicados ao assunto”.
Na verdade Schreibers não dispunha de nenhuma experiência ati-
nente à organização de grandes viagens de pesquisa, de modo que
não causa surpresa o fato de suas indicações relativas à atividade
de coleta e pesquisa terem sido menos detalhadas do que as que Imagem 16: Provas de matérias-primas do Brasil. Col. Natterer “

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dos mesmos em palavras e imagens. Diante do fato de que o Gabi- diferentes, também documentos culturais no Brasil. Isso certa-
nete de História Natural desde 1806 também dispunha de uma mente tem a ver com sua permanência mais longa, se comparada
coleção etnográfica, a importância menor desse tema pode pare- com a de seus colegas – nenhum deles, ao que tudo indica, prin-
cer estranha. Schreibers, no entanto, não se mostrava especial- cipiou a colecionar objetos etnográficos antes da volta dos referi-
mente feliz com esse acervo sob sua responsabilidade – cuja exis- dos colegas. A coleção etnográfica também foi complementada
tência se devia ao desejo do imperador de adquirir parte da cole- através da intervenção da arquiduquesa Leopoldina, que tentou
ção das circunavegações de Cook –, e inclusive por várias vezes se de tudo para fazer com que sua nova pátria estivesse bem repre-
esforçou no sentido de transferi-lo à Coleção Real e Imperial de sentada na Áustria.
Ambras, localizada no palácio do Belvedere, a fim de abrir espaço Para determinar a origem e o objetivo desses objetos existem eti-
às tarefas fundamentais no já espacialmente limitado Gabinete de quetas e/ou listas de pacotes que se encontram aplicadas aos obje-
História Natural. tos dos, no total, doze comboios vindos do Brasil, ou então regis-
Nesse sentido, contudo, o imperador Francisco I talvez fosse mais tros de entrada que foram escritos após a chegada das remessas a
moderno do que o diretor de seu Gabinete de História Natural, Viena (vide mais detalhes em Feest 2014).
pois a etnografia havia surgido já no final do século XVIII como ci-
ência independente no âmbito das ciências naturais (juntamente
com a estatística ou as ciências estatísticas); o “Sistema Natural” de A arquiduquesa Leopoldina
Linnaeus serviu de exemplo também para a prática etnográfica da
coleta, da comparação e da classificação. Na Universidade de Göt- As remessas de Leopoldina, vindas do Brasil, não aparecem no Pa-
tingen, onde as palavras “etnografia” (Ethnografie) e “etnologia” norama geral do conteúdo de todas as remessas enviadas do Brasil
(Völkerkunde) haviam sido cunhadas em 1771, o interesse pela di- pelos naturalistas reais-imperiais durante os anos de 1817 a 1836, que
versidade cultural da humanidade se uniu também à identificação Josef, o irmão de Johann Natterer, havia esboçado em 1837 na con-
de sua variabilidade física no âmbito de uma antropologia de dição de curador do Gabinete de História Natural, uma vez que
cunho naturalista e medicinal, que buscava uma unidade das ciên- estavam destinadas em primeira mão como presentes a seu pai ou
cias que propiciavam o conhecimento do homem. Por isso, tam- a outros membros de sua família (Josef Natterer 1837). Entre os
bém, não causa surpresa o fato de Schreibers ter solicitado um referidos presentes havia um casalzinho de onças vivo, assim como
conselho especializado ao catedrático Johann Friedrich Blumenbach macacos e pássaros, que chegaram em 1819, e foram mantidos em
de Göttingen no que dizia respeito a esse assunto. No entanto parte no jardim zoológico, em Schönbrunn, em parte nas gaiolas
as observações de Blumenbach chegaram demasiado tarde para de animais raros do Burggarten (Riedl-Dorn 2000: 34). Com a quarta
poderem ser incluídas na “Instrução de Serviço”. Independente- remessa chegou a Viena, em 1821, “um acréscimo não menos es-
mente disso, Schreibers já havia solicitado encarecidamente a seus tranho”, como presente da princesa herdeira: “armas e utensílios dos
naturalistas prontos para a viagem que conseguissem “na medida já em parte civilizados Puris, uma tribo ancestral sul-ame- ricana que
do possível também um crânio” dos indígenas (Schmutzer 2011: habita às margens do rio Paraíba, na capitania do Rio de Janeiro”
60–61) – portanto a única indicação concreta para a coleção no (Wiener Zeitschrift 1821: 1229). A lista do pacote indicava 7 arcos e
que dizia respeito aos povos do Brasil era, no fundo, uma indicação 140 flechas de pontas diferentes; quando a coleção foi inventa-
típica das ciências naturais. riada, em 1882, foram encontradas inclusive 153 flechas que pa-
As coleções etnográficas do Gabinete de História Natural podem reciam ser oriundas desse mesmo acervo.
ter proporcionado estímulos sobretudo a Johann Natterer e Heinrich Para uma representação adequada da cultura material dos Puri, a
Schott, os dois naturalistas estabelecidos em Viena, no que dizia limitação a arcos e flechas naturalmente evidencia uma visão bas-
respeito a sua própria atividade de colecionadores. Isso vale não tante imprecisa das coisas. Mas ela não deixa de ser típica das pri-
apenas para os objetos das circunavegações de Cook, mas também meiras coleções etnográficas, e reflete por um lado o estereótipo
para a grande coleção da Groenlândia do ator e mineralogista Karl difundido da selvageria das populações indígenas, mas por outro
Ludwig Giesecke, que em 1815 – portanto pouco antes da viagem lado também a disponibilidade de grandes quantidades desse im-
ao Brasil – chegou às mãos do imperador como presente, e logo foi portante instrumento de caça para fins de troca, em oposição a
apresentada ao grande público (Heger 1908: 5–8). outros bens, que na condição de objetos isolados certamente eram
Caso não se queira considerar o fato de que os austríacos, na con- menos dispensáveis para seus donos. Sobretudo no passado mais
dição de cidadãos de um Estado composto por vários povos eram recente, pessoas vinculadas à administração de museus muitas ve-
confrontados com bastante frequência com a diversidade cultural, zes se desesperaram devido ao gigantesco acervo em flechas, ain-
não havia nada, na verdade, que pudesse contribuir no sentido de da que a diversidade e a característica específica de uma cultura,
ajudar os viajantes e naturalistas de um modo especial em sua ati- visível em suas formas, faça delas fontes importantes da história da
vidade de coletar objetos etnográficos. técnica, mas também da identidade indígena.
Entre os participantes da viagem, que haviam sido escolhidos por Não existe nenhuma indicação de que Leopoldina, apesar da pro-
sua especialização nos campos da zoologia, da botânica ou da ximidade relativa das regiões habitadas pelos Puri da capital Rio de
mineralogia, e não como etnógrafos, Heinrich Schott, Johann Janeiro, em algum momento tenha entrado em contato pessoal
Emanuel Pohl e Johann Natterer coletaram, em medidas bastante com os indígenas. É bem provável que os objetos da coleção sejam

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oriundos da coleção do pintor e naturalista prussiano Friedrich
Sellow, que havia chegado ao Brasil em 1814 a convite de Heinrich
von Langsdorff, e em 1815 acompanhara, junto com o ornitólogo
Georg Wilhelm Freyreiss, o príncipe Maximiliano de Wied em sua
visita aos Puri (HackethaI 1995). Em 1818, Johann Natterer relatou,
em duas cartas enviadas a Schreibers, acerca de um encontro com
Sellow e de seus presentes à arquiduquesa, compostos de uma
“significativa coleção de peles de pássaros e mamíferos, e também
de insetos [...] que em sua maior parte haviam sido reunidos na
região da Bahia pelo senhor Freyreiss” (Schreibers 1820–1822, 1:
140; 2: 11–12). Embora as armas dos Puri não sejam mencionadas
expressamente, vale a pena notar que elas não tinham a menor
importância para Natterer nesse momento (e menos ainda para
Schreibers).

Heinrich Wilhelm Schott


As informações bastante completas sobre a atividade coletora do
jardineiro Heinrich Wilhelm Schott podem ser colhidas não apenas
nas listas de pacotes, mas também em seu relatório acerca das duas
expedições na província do Rio de Janeiro (Schott 1822), que
Schreibers publicou nas Notícias dos naturalistas imperiais austríacos Imagem 17: Lista de palavras dos Coroado. Conforme Schott 1822: 44s
no Brasil e dos resultados de seu diligente trabalho. Na primeira des-
sas viagens Schott encontrou, em julho de 1819, nas proximidades Os objetos etnográficos da Coleção Schott que chegaram a Viena,
da fazenda de Luiz Lazar, alguns Puris por lá estabelecidos, aos correspondiam apenas em parte às indicações do relato de viagem.
qais insinuou através de sinais “que queria conseguir algumas de Entre os objetos do terceiro comboio (1821), “3 arcos, 10 flechas e
suas armas mediante uma troca”. Por um chapéu cheio de farinha, 1 trompete dos Coroado”, apenas o trompete é de origem incon
ele logrou se apossar de um arco e de um total de quatro flechas, testável; no processo de catalogação de 1882 os arcos e flechas
mas não obteve sucesso em seus esforços no sentido de conseguir também foram atribuídos aos Coroado, ainda que a lista não os
um número ainda maior dos instrumentos de caça. De qualquer identifique como tal e tenhamos apenas o relato de Schott acerca
modo, dedicou a eles uma descrição bem detalhada. (Schott 1822: da aquisição de um arco e de quatro flechas dos Puri. Uma notícia
21–26). de jornal de caráter oficioso fala de “armas e utensílios dos Coroa-
Quatro semanas depois o jardineiro viajante chegou à Aldeia da do e Coropo” (Wiener Zeitschrift 1821: 1229). Com a quinta re-
Pedra, uma colônia missionária organizada por frades capuchi- messa, que Schott acompanhou pessoalmente em 1821/1822,
nhos, com uma população mista composta de Coroado e Coropo, chegaram, além de amostras de fibras, mais três arcos, cinco fle-
onde presenciou uma dança dos Coroado, acompanhada de “ma- chas e um “machado de pedra para o combate” sem indicação de
racás e algumas espécies de trompetes. Alguns dos últimos, que procedência, “dois “cestos de transporte dos índios, feitos de folhas
tive oportunidade de amealhar, são feitos de bambu, dos anéis de palmeira”, atribuídos retroativamente aos Coroado, e “1 feixe
ósseos de rabo de tatu e de cera” (Schott 1822: 48). O conjunto inteiro com 10 flechas dos Coroado da região do rio Preto”. Prova-
das coisas que conseguiu adquirir com sua atividade de coleta, velmente Schott tenha adquirido no Rio de janeiro também o
Schott o resume conforme segue: “Além de duas caixas com plan- “guarda-chuva chinês” (Imagem 19), que aponta para o interesse
tas ressecadas e outras duas caixas com 46 plantas vivas, ainda dos naturalistas austríacos pela população chinesa do Brasil.
consegui 209 sementes diferentes, 29 amostras de madeiras, vá-
rias centenas de insetos, algumas cobras, arcos, flechas e trompe-
tes dos índios, um jacaré vivo de seis pés de comprimento e várias Johann Emanuel Pohl
outras coisas” (Schott 1822: 65). Seu interesse na população indí-
gena também é comprovado pelo registro de uma breve lista de Mais abrangente e ainda muito mais multifacetada do que a Cole-
palavras da língua Puri, vocabulários mais abrangentes e inclusive ção Schott, ainda dominada por arcos e flechas, é a coleção do
textos breves em Coroado (Imagem 17) e Coropo (Schott 1822: médico praguense Johann Emanuel Pohl. Pohl era um botânico res-
22s., 41–51). Um vocabulário da língua Gueren, da família linguís- peitado, mas foi incluído na equipe da expedição ao Brasil como
tica Botocudo, do qual restou um fragmento (Loukotka 1968: 73, mineralogista, porque o âmbito da botânica no princípio havia
383), deve ter sido registrado em outra oportunidade, talvez no sido reservado ao catedrático Johann Christian Mikan; este, no en-
Rio de Janeiro. tanto, acabou se revelando uma personalidade difícil e um pesqui-

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Morgenblatt für gebildete Leser [Folha matinal para leitores cultos],
publicado em Stuttgart, se mostrou tão fascinado com a “capa de
chuva trançada em junco, que por certo mal ultrapassaria a região
dos quadris de um homem mais ou menos alto, sendo que se mos-
tra extremamente simples no corte e nada menos do que elegan-
te”, quanto com um chapéu de palha trançada dos Kayapó, ao qual
atestou “uma forma assaz moderna”. Além disso, o correspondente
escreve que “os limpadores de dentes dos portugueses em Minas
Ferais são finamente trabalhados em formato de muito gosto, lon-
gos como agulhas de tricô e grossos como pequenos cabos de ca-
chimbos de argila” (Morgenblatt 1825: 208).
No entanto quem despertou um interesse ainda maior foram os
dois Botocudos, João e Francesca, que chegaram com o quarto
transporte a Viena em outubro de 1821, acompanhados do próprio
Pohl (Imagem 18). Eles eram parte de um grupo de 50 prisioneiros
que o comandante do 7° Distrito Militar de Minas Gerais, Julião
Fernandes Leão, presenteou ao rei português Dom João VI, e foram
mandados adiante pela nora Leopoldina a seu pai, o imperador
Francisco I. O imperador os colocou sob sua “mais expressa e su-
prema proteção pessoal”, devido à “bondade e comportamento
decente dos mesmos”, providenciando para que fossem alojados
“nas altas dependências dos jardins da cidade, onde desde então
Imagem 18: “Índios Botocudos”. Litografia de Carl Heinrich Rahl con-
se ocupam da jardinagem e se mostram bem dispostos e assaz sa-
forme um desenho de Carl von Saar. 1821. Arquivo tisfeitos” (Schreibers 1820–1822, 2: apêndice 101). Em seu aloja-
mento, os indígenas logo mereceram intensas visitações por parte
de vienenses curiosos, que lhes traziam presentes, e também eram
sador pouco exitoso, e já depois de um ano voltou para a Áustria. levados ao teatro e a bailes, e por fim ainda foram recriados como
Pohl, ao contrário, fez uma longa e espraiada viagem, que o levou figuras de cera e expostos. Francesca, cuja primeira filha, Barbara,
às províncias de Minas Gerais e Goiás entre setembro de 1818 e nascida em Mainz, faleceu logo depois da chegada a Viena, se ne-
fevereiro de 1821, e que está documentada com grande riqueza de gava obstinadamente a casar com João, e foi engravidada por um
detalhes em seu livro Reise im Inneren von Brasilien [Viagem ao inte- soldado, mas perdeu também o segundo filho logo depois do nas-
rior do Brasil] (1832–1837). A coleção etnográfica de Pohl abrange cimento e morreu ela mesma pouco antes da viagem de volta ao
cerca de 120 objetos de pelo menos oito povos indígenas (entre Brasil, solicitada por ela junto ao imperador, depois de permanecer
elas mais da metade dos Kayapó Meridionais e dos Krenak ou Bo- por dois anos em Viena. João, que jamais se sentiu realmente bem
tocudo), assim como da população neobrasileira das províncias do na cidade imperial, voltou sozinho à sua pátria em novembro de
Rio de Janeiro, de Minas Gerais, de Goiás e do Pará (os objetos da 1823 (Schmutzer e Feest 2014).
última provavelmente tenham sido adquiridos no Rio de Janeiro).
As descrições etnográficas de Pohl não apenas demonstram uma
visível simpatia pelos povos indígenas, que ele encontrou em um Johann Natterer
estado de completa dependência nas aldeias montadas pelo go-
verno, como também são bem mais detalhadas do que seria de se As coleções etnológicas e naturais amealhadas por Johann Natterer
esperar com base em suas permanências relativamente breves. no decorrer de quase 18 anos no Brasil superam as de seus colegas
Pode-se partir do pressuposto de que suas observações foram com- de tal maneira em quantidade e variedade que a designação “Co-
plementadas com informações que ele recebeu dos administrado- leção Natterer”, ainda que um tanto ilusória, acabou se tornando
res das aldeias; eles também lhe ofereceram apoio na aquisição dos sinônimo para as coleções de todos os naturalistas austríacos no
objetos coletados (Augustat 2014). É verdade que em casos isola- Brasil. Diferentemente de Schott e Pohl, Natterer no entanto jamais
dos existem discrepâncias entre as indicações de procedência das publicou uma apresentação coerente de suas viagens, e mesmo as
listas de pacotes e das etiquetas originais, ou entre as listas e as cartas do viajante publicadas por Schreibers na maior parte das
descrições impressas. No que diz respeito à descrição do cenário vezes de forma resumida, mal chegaram a ser avaliadas de fato
cultural, no entanto, são sobretudo os objetos indígenas da coleção pelos especialistas algum dia, porque apareceram de forma aleató-
que aparecem comparativamente bem documentados. ria em veículos de pouca representatividade. Ainda que trechos
Em sua primeira exposição no Museu Brasileiro (Brasilianisches Mu- maiores de seu diário tenham sido perdidos, e suas anotações lin-
seum) de Viena, os objetos etnográficos colecionados por Pohl des- guísticas e registros etnográficos por um bom tempo tenham per-
pertaram o interesse amistoso do público. Um correspondente do manecido inacessíveis (Kann 1989), a documentação da coleção de

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Natterer é fundamentalmente bastante boa, mas em muitos aspec-
tos ainda precisa ser devidamente decifrada (comparar com Johann
Natterer 2014a, b).
A abundância não diz respeito apenas ao número total dos objetos
(bem mais de 2.000), mas também ao dos grupos étnicos (mais de
70), à ampla gama dos objetos colecionados e (em grande harmo-
nia com a “Instrução de Serviço”), ao número de exemplares de
tipos de objetos isolados. Os dois pontos mencionados por último
valem sobretudo para os cinco grandes grupos de objetos dos Bo-
raro (217 objetos), dos Munduruku (193), dos “Uaupés” (265), dos
Baniwa/Baniva (137) e dos Makuxi (106). Na outra extremidade da
mesma escala estão grupos étnicos como os Naú-a, Kulina, Uirina
ou Calipuna, dos quais a coleção contém apenas um único objeto
(Heger 1908: 9–12; Feest 2014).
Assim como a Coleção Pohl, a de Natterer também contém varie-
gados exemplos da cultura material dos neobrasileiros, incluindo
Imagem 19: Guarda-chuva originário da China e sapatos originários
esteiras de Cantão (Guangdong) e sapatos de Macau (Imagem 19), de Macau. Adquiridos pelos naturalistas na cidade do Rio de Janeiro. Cols.
que haviam sido importados para uso da minoria chinesa. Diferen- Schott e Natterer, nºs de inv. 2566, 2568, 2569
temente de seus colegas, no entanto, Natterer dedicou seu interes-
se aos índios “mansos” que viviam nas estações missionárias e cida-
des, e isso em uma época em que o hibridismo cultural não se en- Em uma carta de 17 de outubro de 1828 a Joaquim José Gomes da
contrava especialmente em alta ante a “selvageria autêntica”. Silva, responsável por conduzir a expedição de uma milícia contra
Nesse sentido a Coleção Natterer se parece com a Coleção da Gro- os “cabixis”, Natterer faz gigantescos rodeios para fundamentar
enlândia de Karl Ludwig Giesecke, que Natterer viu no Gabinete de seu delicado interesse: “S.M. o Imperador de Áustria houve por bem
História Natural da Corte antes de viajar ao Brasil. enviar-me para estas terras remotas para fazer collecções das diversas
Um pequeno grupo de objetos do Japão, da Tailândia e do México producções da natureza deste vasto pais, juntamente com as armas
claramente não foi trazido do Brasil por Natterer. Mas eles refletem enfeitos e outros trastes dos indios silvestres, accompanhado com o
seu crescente interesse pela etnografia, mesmo além das experiên- esquelletto das cabeças de alguns d’elles, para ver a differença na
cias pessoais. Ele deve ter adquirido dois cestos mexicanos e um estructura do cranio. Por esta razão peço a V.S., que no caso, que
par de pantufas siamesas em Londres em 1835/1836, e um grupo aconteça ser mortos alguns Cabexis em alguma balroada, mandar
maior de trabalhos de cesta ria japoneses – uma grande raridade à cortar a cabeça a hum ou dous indios já feito homens, mandar tirar
época, devido ao fechamento das fronteiras do Japão para o oci- os miolos sem molestar o casco e secarias perto do fogo para não
dente – provavelmente seja oriundo da famosa Coleção sobre o podrecer muito. Eu mobrigo de dar a quem fizer este serviço 4/8 por
Japão do médico alemão a serviço da coroa holandesa Philipp cada cabeças de molhadura. De mais queria todo quanto os indios
Franz von Siebold, que Natterer havia visitado em Scheveningen e possuen de armas, maxados da petra, enfeitos e qualquer traste, que
Leiden na viagem de volta de Londres a Viena (Johann Natterer não faza grande incomodo para conduzir, tanto de homens como de
1836). mulheres para o mesmo fim de collecções, o que tambem não dei-
Johann Natterer também foi o único entre os naturalistas austríacos xarei de reconhecer aos portadores com molhaduras” (Johann Nat-
que se esforçou para conseguir crânios humanos, mesmo que en- terer 1828).
tre os 192 crânios que no final da expedição austríaca ao Brasil Embora o propósito de Natterer no que diz respeito aos crânios
acabaram incluídos no levantamento estatístico final do butim pareça ter sido vão, podem ser encontrados em sua coleção três
conquistado (e que haviam sido todos colecionados por Johann recipientes para guardar pontas de flechas envenenadas e duas fle-
Natterer) não houvesse exemplares humanos, mas sim de animais, chas dos “Cabixi”, que provavelmente tenham chegado até ele pe-
pois também na zoologia da época ossos cranianos imutáveis eram las mãos de Gomes da Silva. Segundo as anotações de Natterer,
considerados material mais confiável do que por exemplo empa- tratava-se, no caso das flechas (n°s de inv. 968, 969) daquelas com
lhamentos. as quais os Cabixi “mataram um negro nas proximidades de São
O trato com restos humanos e sobretudo com crânios era realmen- Vicente, em 1828. Usukwé, o referido negro, havia sido atravessa-
te um tema marcado por grandes e muitas vezes contraditórias do por 14 flechas” (Heger 1882). Provavelmente esse incidente te-
suscetibilidades, que também colecionadores de crânios eram e nha sido também o motivo para a milícia de ataque organizada por
continuam sendo obrigados a avaliar. O Botocudo Quäck, que o Gomes da Silva.
príncipe Maximiliano de Wied trouxe consigo a Neuwied de sua Essa espécie de informação acompanhando os objetos da coleção
viagem ao Brasil como criado de casa, diante dos muitos crânios da evidentemente se refere menos aos significados culturais específi-
coleção de Blumenbach, professor de Wied, não teria escondido cos do que ao esclarecimento das relações entre os povos indíge-
sua admiração ante esse guerreiro visivelmente tão bem sucedido. nas e os neobrasileiros. Ela transforma, ao mesmo tempo, os obje-

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tos em distintivos memoráveis concretos de acontecimentos, e não leiros. O fato de Natterer ter acrescentado à coleção o conjunto de
em abstrações de práticas culturais. Isso vale também para o único mate adquirido para uso próprio ilustra como o encontro com
crânio humano que Natterer ao que parece conseguiu adquirir, e Ninschirim e o princípio da coleção de objetos etnográficos indíge-
que de fato foi enviado com os objetos etnográficos a Viena (n° de nas repentinamente evocaram também uma consciência para o ca-
inv. 966) e só bem mais tarde foi integrado às coleções antropoló- ráter exótico da cultura popular da era colonial tardia no Brasil.
gicas do Museu de História Natural (Naturhistorisches Museum). Ainda assim se passaram quase quatro anos até que Natterer con-
Sua origem é descrita por Natterer conforme segue: “Crânio de um seguiu prosseguir em seus dois projetos, depois de sua chegada à
índio Schamucoco [Chamacoco]. Essa nação mora abaixo de Coim- província de Mato Grosso, em dezembro de 1824.
bra, na província do Chaco, e é severamente perseguida pelos Como já acontecera no caso dos objetos dos Cameh, Natterer na
Guaicurús e escravizada por eles. Este, do qual é o crânio, tinha maior parte dos casos conseguiu o material para sua coleção etno-
cerca de 20 anos de idade e morreu aqui, no hospital local [em gráfica, sobretudo no princípio, através de terceiros. Uma parte da
Cuiabá]. Ele pertencia ao comandante da cidade, tenente-coronel grande coleção dos Bororo (Imagem 20) já estava em seu poder
Jeronymo Joaquim Nunes, que o recebeu de presente dos Schamu- antes mesmo de um encontro pessoal com um grupo de Bororo da
cocos quando era comandante do Forte Coimbra, em uma oportu- Campanha em 1825/1826. É possível que ele tenha conseguido
nidade em que estes buscaram proteção junto a ele” (Heger 1882). esses objetos de alguns Guanás que caracterizava como “meus co-
Entre as cartas de Natterer ainda existentes, uma do ano de 1828 nhecidos de Cuiabá”, e que mais tarde providenciaram para ele
dirigida ao tenente-coronel Nunes, que na época era presidente da peças de butim dos Bororo do Cabaçal, contra os quais haviam
província de Mato Grosso, se refere à viagem que pretendia fazer guerreado na condição de integrantes da milícia do Mato Grosso
pelo rio Madeira. Se a aquisição do crânio de fato ocorreu mais ou (Johann Natterer 2014b). Um dos Guanás cedeu a Natterer tam-
menos à mesma época, isso representaria o indicativo de um esfor- bém um cachimbo de tabaco, uma bolsa e o adorno em penas de
ço objetivo do colecionador para cumprir a tarefa específica da um Enimaga (Lilei) que ele havia abatido.
“Instrução de Serviço” recebida onze anos antes (ou um desejo Natterer também conseguiu grande parte da coleção Munduruku,
expresso à parte por seu chefe). assim como também as peças dos Apiaká e Bakairi no final de 1824
O fato de Natterer ter começado a coletar objetos etnográficos de seu “aluno”, o capitão Antonio Peixoto de Azevedo, um oficial
apenas quando Schott e Pohl já haviam cessado sua atividade de brasileiro que havia conhecido em 1823, e, depois da morte do
coletores é um sinal de que a pesquisa etnográfica no princípio não capitão, em 1826, talvez também de sua viúva. As peças Mundu-
tinha prioridade para ele. Em sua terceira viagem, que o levou à ruku eram destinadas, na verdade, ao Museu Nacional do Rio de
parte sul da província de São Paulo (ao hoje Estado do Paraná), Janeiro fundado por Dona Leopoldina, e Natterer estava convenci-
Natterer entrou em contato, em Curitiba, com “uma jovem índia do com razão de que elas superariam em beleza a tudo “que até
Cameh [...], que pertencia ao juiz. Ela se chamava Ninschirim no agora se encontrava em Viena e provinha dos índios” (Johann Nat-
passado, mas havia sido batizada como Rufina. Por meio dela e de terer 1824; 1824–1825).
um português, que por muito tempo viveu em Guarapuaba e com- A longa doença de Natterer em Mato Grosso também foi respon-
preendia sua língua, fiquei muito feliz em reunir as palavras anexas. sável pelo fato de ele não conseguir realizar a planejada viagem
São aquelas que o senhor von Eschwege publicou em seu jornal e pelo rio Paraguai, na qual intencionava “visitar uma nação indíge-
que eu sempre voltarei a usar no futuro” (Johann Natterer 1821a). na, os Guató, que viviam na foz do São Lourenço. Eles são caçado-
À mesma época, Natterer recebeu do dr. Renow, estabelecido em res assaz exímios e destemidos, os únicos que se atrevem a atacar
Curitiba, um do “monstruosos arcos” dos Cameh (um ramo dos a onça e matá-Ia, e isso munidos apenas de uma lança de madeira”
Kaingang), “mais flecha [...] e duas machadinhas de pedra”, que (Johann Natterer 1824–1825).
mandou a Viena junto com alguns instrumentos feitos de pedra De modo que demorou muito até sua passagem pela Fazenda da
retirados de um sambaqui, e eles representam as primeiras peças Caiçara (de fins de setembro de 1825 a meados de junho de 1826),
que comprovam seu zelo de colecionador etnográfico. A essa re- localizada na região da nascente do rio Sangradorzinho, nas proxi-
messa Natterer ainda acrescentou uma caixa “com os utensílios midades de Cáceres, onde ele enfim entrou em contato mais estrei-
para beber mate – embora pertencentes a mim próprio, doo-os à to pela primeira vez com um grupo indígena, os Bororo da Campa-
coleção”, conforme escreve a seu irmão (Johann Natterer 1821b). nha, que viviam nos campos da região e sob os olhos alertas do
Com isso principiavam, no decorrer de poucos dias, dois dos gran- coronel João Pereira Leite, pelo qual haviam sido “pacificados”. (O
des projetos de coleção de Natterer, que lhe garantiriam, além dos fato de a filha de Pereira Leite, Maria, mais tarde ter casado com
resultados alcançados para a zoologia (Pelzeln 1871; 1883; Shino- seu primo, o filho do já mencionado Joaquim José Gomes da Silva,
hara e Cheung 2014), um lugar garantido na história da pesquisa é também um indício da rede que Natterer usava para se locomo-
dos povos indígenas do Brasil: a coleção de listas de palavras de ver no Mato Grosso.) Os Bororo estavam prontos a dar por assim
línguas indígenas, que através do uso de uma lista de palavras stan- dizer tudo em troca das mercadorias como tabaco, farinha, açúcar–
dard (que na maior parte das vezes se mostrava possível) facilitaria cândi, tesouras, facas e anéis que o colecionador havia levado con-
uma comparação linguística mais tarde (Adelaar e Brijnen 2014), e sigo – até mesmo um cinto largo feito de embira usado pelas mu-
a coleção etnográfica, que não apenas deveria documentar as cul- lheres, depois de uma resistência inicial mudou de dono em troca
turais materiais dos povos indígenas, mas também a dos neobrasi- de uma peça de tecido vermelho (Johann Natterer 2014b).

26
O destino das coleções em Viena
Ainda que a coleção, sobretudo de objetos naturais, fosse um dos
objetivos centrais da viagem ao Brasil e no interior do país, visivel-
mente a diligência dos colecionadores não foi avaliada corretamen-
te, tanto que não foi adotada nenhuma medida para o alojamento
de novas peças. Schreibers, cuja moradia por algum tempo teve de
servir de depósito provisório, conseguiu por fim mover o imperador
a concordar com uma solução temporária. Segundo ela, os objetos
vindos do Brasil deveriam ser expostos provisoriamente na condição
de “Museu Brasileiro” (Brasilianisches Museum) em uma construção
da Johannesgasse, em Viena, na qual já estava alojada a coleção de
múmias do Imperial Gabinete de Moedas e Antiguidades. O acesso
também seria permitido até que a descrição estivesse encerrada e
eles pudessem ser integrados ao Gabinete de História Natural.
Em abril de 1821 foi principiada a exposição, e, quando Pohl voltou
do Brasil em outubro do mesmo ano, foi nomeado diretor e rece-
beu uma moradia oficial no novo museu. Para os objetos etnográ-
Imagem 20: Vitrine XVII com objetos dos Bororo. Aquarela de artista ficos, que em 1821 existiam apenas em pouca quantidade, foi re-
deconhecido. Em torno de 1840. Arquivo
servada uma das treze salas de exposição (entre as coleções zooló-
gicas e botânicas). Os objetos estavam providos de etiquetas
No decorrer dos anos, Natterer desenvolveu não apenas um bom descritivas que se restringiam às indicações dos colecionadores.
olho para as diferenças culturais entre os povos indígenas, mas Em lugar de um inventário, havia apenas as reproduções das listas
também uma rotina no trato com eles, que facilitava a aquisição de dos pacotes, elaboradas por Josef Natterer, o irmão de Johann, na
objetos para sua coleção. Ele açulava o interesse das mulheres com condição de curador do Gabinete de História Natural (Feest 2014;
contas de vidro e anéis, e durante as festas deixava a aguardente comparar com Schmutzer e Feest 2014).
rolar solta, levando consigo sempre quantidades suficientes dos co- Com a chegada da última remessa, o acervo do museu, que até
biçados produtos manufaturados, a fim de que os indígenas lhe então já mostrava “35 diferentes povos e hordas, além de outras
oferecessem à venda, em oportunidades que ele mesmo providen- cinco da parte espanhola da América do Sul, fronteiriça ao Brasil”,
ciava, o que quisesse em armas, utensílios, roupas e adornos. Mes- foi ampliado em mais “500 peças de mais 32 tribos e hordas dife-
mo assim sempre havia determinados objetos dos quais os proprie- rentes” (Schmidl 1837: 193), o espaço disponível já devia estar tão
tários abriam mão apenas manifestando desgosto; mas mesmo dos lotado a ponto de o museu quase estourar com seus cerca de 2.350
cilindros de quartzo perfurados na longitudinal, que entre os Tuka- objetos. Com a volta de Johann Natterer a Viena no ano de 1836,
no e seus vizinhos do rio Uaupés eram usados apenas pelos caci- a expedição austríaca ao Brasil chegava definitivamente ao fim; Le-
ques como joias em torno do pescoço, Natterer ao final das contas opoldina já havia falecido em 1826 no Brasil, e seu pai, Francisco I,
conseguiu adquirir quatro peças, depois de algumas dificuldades falecera em 1835. Parecia chegado o tempo de botar um fim no
iniciais (Natterer 2014a). provisório e já envelhecido “Museu Brasileiro”, uma tarefa da qual
O transporte dos objetos colecionados, às vezes bastante volumo- foram encarregados Johann e Josef Natterer.
sos, certamente representava um problema maior, e Natterer pre- E para tanto as coleções etnográficas representavam um problema
cisava carregá-los consigo às vezes durante meses, quando não de caráter especial, e não apenas porque não podiam mais ser alo-
durante anos, antes de mandá-los de navio até Viena. Além disso jadas no Gabinete de História Natural devido a sua abrangência,
não deve ser esquecido que os objetos etnográficos constituíam mas também porque Schreibers já havia tirado de dentro dele os
apenas uma pequena parte de suas coleções. Ao que tudo indica, acervos mais antigos da mesma espécie em 1820, mandando-os à
eram surpreendentemente raras as vezes em que havia perdas ou coleção de Ambras, no palácio do Belvedere, onde no foram eram
anos sérios nas coleções em seu caminho do interior do país à expostas apenas como anexo e não registradas no inventário. Essa
costa, de onde sucedia o envio marítimo à Europa. Uma perda exposição no Belvedere também havia sido encerrada em 1836, e
dura, contudo, representou o saque do alojamento de Natterer du- Schreibers estava obrigado desde então a reinventariar às pressas
rante a revolta dos Cabanos, no Pará (Belém), no ano de 1835, no todas as peças novas que chegavam, a fim de juntá-Ias aos objetos
qual foi destruída uma parte dos objetos coletados a partir da dé- etnográficos brasileiros no “Real e Imperial Museu Etnográfico” su-
cima primeira remessa de outubro de 1834 ou não enviados na bordinado ao Gabinete de História Natural, que em 1838 havia
mesma (Anônimo 1835).
1 “Panorama Geral” feito por Josef Natterer (1837) indica o número de “armas e
utensílios” como sendo de 1.650 (dos quais 1.492 de Johann Natterer), sendo que
alguns grupos de objetos ao que tudo indica foram registrados com um só núme -
ro. A cifra de 2.350 se refere ao modo de contar usado hoje em dia, peça por peça.

27
Imagem 21: Vitrine III com objetos, principalmente dos Makuxi e Imagem 22: Vitrine XII com peças de vestuário de brancos ou para
Macuna-ui. Aquarela de artista desconhecido. Em torno de 1840. Arquivo brancos, originárias da Bolívia. Aquarela de artista desconhecido. Em
I torno de 1840. Arquivo

Imagem 23: Vitrine VII com objetos de grupos indígenas do norte do Imagem 24: Vitrine X VIII com objetos principalmente dos Guaná da
Amazonas. Aquarela de artista desconhecido. Em torno de 1840. Arquivo região do Gran Chaco (Bolívia). Aquarela de artista desconhecido. Em
torno de 1840. Arquivo

28
sido erguido na assim chamada “Casa Imperial” (Kaiserhaus), na Face a essa quantidade gigantesca, Hochstetter e Heger decidiram
Ungargasse. Johann Natterer foi encarregado de dirigi-lo e princi- não inventariar cerca de 10% do acervo (223 objetos) e deixá-los
piou a nova exposição com sua própria coleção, à qual se juntaram prontos, em uma reserva de trocas, a fim de complementar a cole-
a parte americana da coleção de Cook, a Coleção Giesecke da ção etnográfica do mundo inteiro através de trocas com outras ins-
Gröenlândia e os objetos da tribo Plains-Ojibwa, que o comercian- tituições ou pessoas. Lamentavelmente ao que parece não
te de peles de Görz, Josef Klinger, havia presenteado ao imperador restaram documentos nos quais o conteúdo exato dessa reserva
em 1825 (Hebenstreit 1840; Feest 2014). As coleções do Pacífico e de trocas esteja descrito, mas ele pode ser parcialmente recons-
da Ásia não chegaram mais a ser expostas, porque em 1840 a truído através da comparação com as listas de pacotes e as aqua-
“Casa Imperial” foi usada para os objetivos da então fundada guar- relas da “Casa Imperial”. Dos documentos que restaram, contudo,
da pessoal lombarda-veneziana. pode-se descobrir o destino de apenas a metade dessa parcela da
Da exposição dos objetos etnográficos americanos no Real e Impe- Coleção Natterer, que foi repassada nos anos de 1882 a 1887 aos
rial Museu Etnográfico de vida tão breve, existe uma série de 20 museus de Dresden, Berlim e Hamburgo (Feest 2014).
aquarelas (Imagens 27 a 24), provavelmente oriundas da mão de Não se tratava da primeira nem da última vez em que alguém se
um desenhista a serviço do Gabinete de História Natural, que con- desfazia de alguns dos objetos da Coleção Natterer.3 Já quando foi
cedem uma impressão vivaz das práticas expositivas daquela épo- dissolvido o Museu Brasileiro, foram entregues exatamente 100 ob-
ca, mas ao mesmo tempo também representam uma documenta- jetos ao Gabinete Tecnológico (Technologisches Kabinett) fundado
ção visual abrangente da Coleção Natterer. O que havia sido mos- em 1819 pelo futuro imperador Ferdinando I, que se dedicava à do-
trado em uma única sala no Museu Brasileiro, agora era exposto cumentação e preparação de matérias-primas e dos utensílios, má-
em 18 vitrines, em quatro salas e meia, ainda que apenas mais ou quinas e aparelhos usados nesse processo, e que já em 1819
menos a metade do acervo estivesse sendo mostrada. recebera produtos do Brasil, possivelmente como presente de Leo-
Após 1840 a coleção acondicionada em caixas pelos irmãos Natterer poldina a seu irmão (Technologisches Kabinett 1837). Durante sua
foi preservada primeiramente no sótão do Gabinete de História Na- passagem pelo Pará, pouco antes da volta à Europa, Natterer ad-
tural da Corte, em seguida transferida ao Palais Augarten, em Leo- quirira, entre outras coisas, “por 40 milréis, artigos de vidro pren-
poldstadt, antes de ser levada em 1847 à Modenserhaus, na Herren- sado fabricados em Boston [...] se esse tipo de artigos de vidro
gasse, e logo em seguida às garagens úmidas do palácio central da ainda não estiver sendo fabricado na Áustria, talvez eles sirvam
corte, o Hofburg, na praça Josef; em 1850, por fim, ela acabou che- para o gabinete tecnológico do imperador” (Johann Natterer 1836).
gando “a uma câmara sombria do segundo andar” do Gabinete Zo- Além disso, foram acrescentados à coleção mais de 30 objetos das
ológico da Corte. Pelo menos assim os objetos foram poupados da populações indígenas e não-indígenas do Brasil, assim como peças
destruição pelo fogo provocado pelo bombardeio enganoso da arti- do México e da Ásia oriental. O Gabinete Tecnológico se tornou
lharia do príncipe Windischgrätz, que durante a revolução de 1848 parte do Instituto Politécnico (a hoje Universidade Técnica de Viena)
emoliu parte do Gabinete Zoológico da Corte, bombardeio no na década de 1850, que em 1864 por sua vez entregou seus acer-
qual aliás foi perdida também parte da coleção zoológica de Natte- vos ao novo Museu Austríaco da Arte e da Indústria (hoje: Öster-
rer (Heger 1908: 10; Riedl-Dorn 1998: 123–128). Johann Natterer reichisches Museum für Angewandte Kunst/Gegenwartskunst –
faleceu em 1843 e não precisou vivenciar essa odisseia até o fim. MAK [Museu Austríaco da Arte Aplicada e da Arte Contemporâ-
Com a morte de seu irmão Josef Natterer, em 1852, a coleção etno- nea]), do qual em 1881 pelo menos alguns dos objetos oriundos
gráfica perdeu seu último conhecedor mais próximo e intercessor. do Museu Brasileiro chegaram à Coleção de Antropologia e Etno-
A Coleção Natterer foi despertada de seu sono de Bela Adormecida grafia do Museu de História Natural. Seu pertencimento à Coleção
apenas com a fundação do Museu de História Natural da Corte Natterer apenas foi percebido de maneira insuficiente. No mesmo
(Naturhistorisches Hofmuseum) no ano de 1876, quando o geólo- ano o Museu de História Natural assumiu do Museu Austríaco da
go Ferdinand von Hochstetter, o primeiro diretor do museu, esta- Arte e da Indústria também a coleção etnográfica do comerciante
beleceu uma Seção de Antropologia e Etnografia, na qual a área vienense de peles Johann Georg Schwarz, falecido em 1867 e se-
da etnologia foi exercida profissionalmente pela primeira vez na Áus- cretário da Fundação Leopoldina (Leopoldinenstiftung), fundada
tria. Franz Heger se dedicou, primeiro como assistente de Hoch- em 1829 em homenagem à falecida arquiduquesa, e que se dedi-
stetter e mais tarde como chefe da Seção, a examinar, trabalhar e cava a incentivar as atividades missionárias nos Estados Unidos
ampliar os acervos, e é a ele que devemos também o primeiro e até (Kasprycki 2007). Schwarz esteve em contato com Natterer depois
hoje único inventário da Coleção Natterer, que foi concluído em de este ter voltado a Viena, e é possível imaginar, pelo menos, que
1882/1883, e pôde se apoiar na documentação em forma de listas parte dos objetos etnográficos sul–americanos da Coleção
e etiquetas originais ainda existente. Nesse inventário, as coleções Schwarz na verdade tenham sido conseguidos com Natterer, que
etnográficas dos naturalistas austríacos no Brasil chegam a 1.169 mantinha um pequeno acervo de objetos etnográficos como sua
números; a partir da numeração separada de grupos de objetos propriedade privada (Feest 2014).
esse número aumentou para 2.126 em 1885 (Heger 1882).2
3 Em 1928 sete objetos das coleções de Pohl e Natterer foram trocados com a co-
leção etnolóqica do Vaticano, que acabava de ser exposta no Latrão. Duas das
2 A soma de 2.177 que aparece em Heger (1908: 12) é, ao contrário, o resultado de peças colecionadas por Natterer foram trocadas em 1967 com o hoje Museu das
alguns erros de cálculo. Culturas de Basel, na Suíça.

29
Imagem 25: Adornos com penas da coleção de Carl Friedrich Philipp continua sendo a maior coleção do continente americano do
von Martius, Brasil, entre os anos de 1817 e 1820. Doação Spitzy, n o s Museum für Völkerkunde de Viena. No final do século XIX, no
de inv. 179.769, 179.770a, 179.773, 179.775
entanto, a prioridade do museu teve de se deslocar à criação de
uma coleção mundialmente equilibrada, na medida do possível.
Essa coleção privada chegou, depois da morte de Natterer, às mãos de Para a seção que contava com poucos funcionários isso signifi-
sua filha Gertrude von Schröckinger, nascida no Brasil, cujo marido, o cou que, para além da exposição dos acervos, mal haveria tem-
funcionário público e naturalista amador Julius Ritter von Schröckin- po para se ocupar de seu estudo mais adequado. O guia que foi
ger-Neudenberg, havia honrado a memória de seu sogro com a uma publicado por ocasião da inauguração do Museu de História Na-
publicação em sua homenagem (Schröckinger-Neudenberg 1855; tural (Hauer 1889) ainda homenageia o trabalho de Natterer e
vide também Goeldi 1894–1896). Como herança testamentária, o Pohl, mencionando-os pelo nome, mas já na segunda edição
museu recebeu, depois da morte de Gertrude no ano de 1895, essa (Hauer 1902) essa indicação acabou sendo eliminada; afinal de
coleção constituída de 99 objetos etnográficos brasileiros e alguns asi- contas o que se queria era mostrar povos e culturas, e não cole-
áticos – os últimos oriundos da viagem ao mundo da fragata austríaca cionadores.
Novara (1857–1859), da qual havia participado também Ferdinand Também as exposições posteriores no Museum für Völkerkunde
von Hochstetter, e constituíam o presente de um dos participantes da de Viena, nas quais a Coleção Natterer desempenhou um papel
viagem, Georg von Frauenfeld, à viúva de Natterer. As peças brasilei- importante (p. ex. Becker-Donner et aI. 1970; 1972), não coloca-
ras se encontravam em excelente estado de conservação, e em parte ram Natterer em primeiro plano. Franz Heger (1908: 15), embora
ainda providas das etiquetas originais de Natterer (Feest 2014). homenageasse minuciosamente o acervo oriundo das aquisições
de Natterer como uma das “melhores e mais extraordinárias cole-
ções etnográficas que foram amealhadas em tempos precoces”,
Homenagem não tornou Natterer suficientemente conhecido, sobretudo no
Brasil, com sua publicação não ilustrada em língua alemã. Isso
À época de sua redescoberta, após 1876, a coleção dos natura- vale lamentavelmente também para as esporádicas publicações
listas austríacos no Brasil era, com folga, o maior acervo indivi- isoladas dos tempos posteriores (Nowotny 1949, Bauer 1965,
dual da Seção de Antropologia e Etnografia. Hoje em dia ela Becker-Donner 1970), para a publicação das anotações etnográfi-

30
cas de Natterer (Kann 1989)4 e para os resultados de um primeiro Da expedição russa ao Brasil, realizada também à mesma época da
projeto de pesquisa atinente à Coleção Natterer, encaminhado austríaca e comandada por Georg Heinrich von Langsdorff, resta-
entre 1998 e 2000 (Kann 2002). De modo que um artigo de Emi- ram 99 objetos dos Guató, Bororo, Apiaká e Munduruku na Câma-
Iio Goeldi (1894–1896) permaneceu sendo, durante mais de cem ra de Arte de São Petersburgo, dos quais uma seleção representati-
anos, a fonte de informação mais importante acerca do tema va foi reproduzida em desenho na publicação de Manizer (1967),
(comparar com Dorta 1997).5 traduzida também ao português. Especialmente valiosa devido a
Em comparação com isso, a coleção etnográfica amealhada pelos seus desenhos etnográficos é a coleção que Hercules Florence e
naturalistas bávaros Johann Baptist von Spix e Carl Friedrich Philipp Aimé-Adrien Taunay reuniram como membros da expedição de
von Martius, principiada também no âmbito da expedição austría- Langsdorff, e que em sua maior parte se encontra também em São
ca ao Brasil, desde o princípio despertou uma atenção maior e me- Petersburgo (comparar com Monteiro e Kaz 1988).
receu respeito internacional (comparar com Bujok e Helbig 2014). Por outro lado, a coleção amealhada pelo príncipe Maximiliano de
O fundamento desse interesse se situava sem sombra de dúvida na Wied em sua viagem ao Brasil entre os anos de 1815 e 1817, e que
publicação da obra de viagem (Spix e Martius 1823–1831), da qual se encontra em Stuttgart, permaneceu praticamente desconheci-
pelo menos o primeiro volume foi traduzido imediatamente ao in- da, ainda que seu relato de viagem e seus desenhos tenham sido
glês, e da qual também foi publicada uma edição portuguesa em devidamente homenageados por várias vezes (Wied-Neuwied
1938; em seu atlas ilustrado também haviam sido reproduzidos ob- 1820–1821, Löschner 1982, Brasilien-Bibliothek 1988).
jetos da coleção que hoje se encontra no Staatliches Museum für Por fim seja referida ainda a coleção do naturalista português Ale-
Võlkerkunde de Munique. A coleção foi exibida várias vezes em xandre Rodrigues Ferreira que, quarenta anos antes de Natterer, no
exposições (a última, Helbig 1994) e há um catálogo de acervo da âmbito de sua “Viagem Philosophica pela Capitania do Rio Negro”
mesma (Zerries 1980), a partir do qual fica claro que ela era com- (Ferreira 1885–1888), amealhou a primeira grande coleção de et-
posta, no ano de 1843, por 452 números com 575 objetos indivi- nografia brasileira. O acervo, que originalmente abrangia 933 ob-
duais. Devido a uma troca com o British Museum e também em jetos, desde o século XVIII está dividido entre o Museu Mayenense
razão de perdas e extravios, o número de objetos foi reduzido a da Academia das Ciências de Lisboa e o Museu Antropológico da
422 números com 510 objetos até 1919; em 1979 Zerries ainda Universidade de Coimbra, sendo que em Coimbra podem ser en-
conseguiu comprovar apenas a existência de 319 números em Mu- contrados 355 objetos e em Lisboa supostamente mais 723 obje-
nique. São 32 os povos indígenas representados na coleção; além tos, dos quais no entanto muitos não são oriundos nem de Ferreira
disso, há um grupo de objetos relativamente pequeno e limitado a e nem sequer do Brasil (daí, também, a soma demasiado elevada).
peças de cerâmica e cabaça oriundas do artesanato de índios “al- A coleção, cujo maior problema reside na inacessibilidade à docu-
deizados”. Em comparação com o tempo bem menor da perma- mentação de origem das peças individuais, se tornou acessível em
nência de Spix e Martius, o tamanho do acervo original é bem vários sentidos apenas através de uma nova e exemplar publicação
considerável, mas corresponde a apenas um quarto do acervo da (Soares e Ferrão 2005). Ainda que tenha apenas a metade do ta-
Coleção Natterer.6 manho da Coleção Natterer (mas o dobro da de Spix e Martius), a
Coleção Ferreira é comparável a de Natterer em muitos sentidos,
4 Os autores britânicos e brasileiros do catálogo da exposição Unknown Amazon por exemplo no que diz respeito ao número de objetos de tipos
(McEwan, Barreto e Neves 2001: 12, 244, 251), no British Museum, não toma - específicos de artefatos, e oferece, junto com ela, um fundamento
ram conhecimento dessas publicações, ainda que a exposição contivesse em -
préstimos da Coleção Natterer. De qualquer modo, também os objetos colecio- quantitativamente impressionante para possíveis comparações his-
nados por Spix e Mar tius no British Museum não possuem indicação. tóricas.
5 Ainda cinco anos antes Dorta (1992: 502) havia, em seu útil panorama das cole-
ções de etnografia brasileira, tomado conhecimento da Coleção Natterer apenas
através dos objetos que por meio de troca chegaram ao museu de Dresden.
6 Uma pequena coleção, que remete a Martius, foi entregue por Christine Spitzy,
uma tataraneta de Mar tius, ao Museum für Völkerkunde de Viena no ano de
2002 (Imagem 25).

31
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