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A HISTÓRIA DOS AFRICANOS NA II GUERRA

A participação dos africanos na Segunda Guerra Mundial significou para


países europeus como a França e colônias europeias na Africana como Etiópia
a chance de libertar-se da dominação e do racismo dos colonizadores.

Por Geferson Santana, bolsista PIBEX do Cahl / UFRB


E-mail: gefsdj@hotmail.com

Orientador PIBEX: Leandro Antonio de Almeida

A crise econômica mundial e a África


Não estamos acostumados a pensar Ocorreram na África mudanças
uma África caracterizada pela diversidade significativas iniciadas em 1929, se
cultural, política, religiosa e linguística prologando pela década de 1930 e
que lhes são próprias. As imagens que consolidadas na efervescência da Segunda
temos do continente é exatamente aquela Guerra Mundial no mundo e no continente
que o historiador africano Ali A. Mazrui africano.
expressa, ao afirmar que “alguns não A crise econômica de 29 deixou
temeram ofender simultaneamente as um rastro de destruição e a luta pelo poder
mulheres e a África, chegando ao ponto ocupando o centro da causa. Ela
até de denominar esta última como ‘o estremeceu as bases do sistema de
continente-mulher’, em alusão a uma produção dos países capitalistas, gerando
suposta passividade e penetrabilidade”. o subconsumo, mexeu com a Bolsa de
Hoje não seria estranho ainda Valores de Nova York, e exacerbou os
encontrarmos pessoas que se espantem ou nacionalismos com a fracassada tentativa
duvidem da informação referente ao em junho de 1933, para pensar numa saída
engajamento dos africanos e suas na Conferência Econômica Internacional
respectivas colônias na Segunda Guerra de Londres, discutindo as possibilidades
Mundial, e que não estavam motivados de entendimento e cooperação para driblar
pela fúria de seus colonizadores em caso a crise geral.
de resistência, e sim pela vontade de Desde a segunda metade do século
querer defender seus territórios, povos e XIX que o continente africano estava
respectivas culturas, além de alimentar inserido na dinâmica econômica que
esperanças de dias melhores. provocava a necessidade de expansão
imperialista no mundo. As colônias
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africanas dominadas por países europeus periferias das grandes cidades do norte da
passaram a sofrer os efeitos da decadência África. Logo, as favelas ganhariam espaço
financeira que abalava as “grandes e se ampliariam com êxodo rural. Muitos
civilizações” europeias. africanos sem muitas oportunidades de
Na África do Norte que emprego investiram na mendicância, mas
compreendia uma imensidão de espaços também optaram por uma vida dependente
geográficos colonizados por europeus, o do assistencialismo.
sistema econômico foi marcado por Ao leitor seria interessante uma
profundas transformações. Na colônia reflexão sobre as condições que a
francesa da Argélia o valor das depressão econômica iniciada em 1929 e
importações cai pela metade entre 1929 a alastrada pelas décadas de 30 e 40 causou
1935, mas igualmente decresceram as na economia mundial, sendo esta um dos
exportações, a produtividade na principais motivos da expansão
mineração e na agricultura em outras imperialista das potências como França,
partes do norte africano. Inglaterra, Alemanha, Itália e os Estados
Embora na Argélia as dificuldades Unidos. Como ponto de apoio verifique
econômicas não tenham origem na crise e no seu livro didático como a África
sim da própria condição de colônia, a aparece enquanto integrante e sofredora
irrupção da 2ª Guerra Mundial acabou do contexto das décadas de 20, 30 e 40.
gerando outros problemas sociais como a
emigração para a metrópole, que levou Envolvimento do chifre da África e da
África setentrional na guerra
para a França as primeiras ondas de
trabalhadores emigrados. Isso ocorreu
também com outras colônias do norte da
África como Tunísia e Marrocos.
Os surtos migratórios também
vigoraram no interior das colônias
africanas. Tornaram-se alicerces de um
continente sedento da vontade de
sobreviver aos efeitos da guerra e da
Imagem 01. O avanço das tropas italianas na Abissínia.
depressão econômica. As migrações que CHENNTOUF, Tayeb. O chife da África e a África
sententrional. In: História Geral da África, VIII: África
portavam um caráter de provisórias aos desde 1935. Brasília: UNESCO, 2010, p.49.

poucos emergiam enquanto permanentes


com as chegadas das famílias nas
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A imagem não apenas retrata a um sistema colonial marcado pelo racismo


expansão das tropas italianas pela Etiópia dos colonizadores.
(conhecido fora da África também como O engajamento dos africanos nos
Abissínia), considerada até 1935 o único esforços de guerra tem como plano de
Estado africano independente. Logo, fundo a esperança de abertura
supõe-se que a história dos africanos na democrática, o que acabou acontecendo
guerra não começa no mesmo período que em 1939 quando os Aliados (França,
na Europa (1939). Inglaterra e EUA) declararam guerra ao
No continente africano a guerra Eixo fascista (Alemanha, Itália e Japão).
começa quando Mussolini inicia o Mas, muitos outros africanos ligados às
processo de invasão da Etiópia em 1935, colônias de domínio fascista acabaram
mas a partir de 1939, as forças britânicas sendo recrutados forçadamente, estes em
junto com patriotas etíopes iniciam a um número aproximado de 190 mil
Campanha da África Oriental com o homens lutaram “(...) em frentes de
objetivo de garantir a soberania do Estado batalhas na Alemanha, Itália, Líbia,
africano em 1941, que cominou na Normandia, no Oriente Médio, na
soberania completa com a assinatura do Indochina e na Birmânia”, diz Leila Leite
Acordo Anglo-Etíope em 1944. Neste Hernandes.
intervalo de 1941-44 o então imperador Os confrontos nos desertos etíopes
etíope Haile Selassie, exilado na eram apenas uma pequena prévia de que a
Inglaterra, retoma seu império. Até hoje guerra estava apenas começando. Mas, a
ele é símbolo religioso no movimento perda de domínio sobre a Etiópia fora um
rastafári. fracasso militar considerável para os
A vitória etíope sobre os italianos fascistas, e com isso Hitler organizou o
representou muito no imaginário dos Afrika Korps em 1941, na tentativa de
africanos. As esperanças de dias melhores empurrar os exércitos ingleses de volta à
e de independência após o sombrio fronteira egípcia.
período de guerra estavam sendo O projeto Afrika Korps criado pelo
construídas em seus imaginários. Eles ditador nazista Hitler, e liderado pelo
acreditaram em uma vida de liberdade e general Erwin Rommel nas duas tentativas
sem os colonos opressores. A participação fracassadas de invadir e dominar o Egito.
dos africanos no esforço de guerra Em todas as tentativas os ingleses os
representou as esperanças na mudança em impediram de realizar a proeza da
conquista e dominação do território
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egípcio, forçando-os a fugir para a Líbia projetos alemães na Tunísia. Em 9 de


sob domínio italiano. novembro de 1942, uma centena de aviões
Os italianos já tinham empurrado alemães aterrissam na área de al -‘Awina,
os ingleses até as fronteiras do Egito, perto de Túnis, com um corpo de 1.000
contando dessa vez com contra-ataque dos homens”. A iniciativa alemã de invasão de
britânicos. A marcha para o Egito tinha o Túnis, capital da Tunísia, sem aviso
objetivo de conquistar o canal de Suez, e prévio na noite do dia 13 para 14 de
dali para o Iraque a fim de controlar as novembro do mesmo ano garante a
reservas de petróleo. Mesmo com os ocupação dos grandes centros urbanos
ataques das trovas italianas os britânicos como Sfax, Sousse e Gabès, diz Tayeb
causaram derrotas fatais ao exército de Chenntouf.
Mussolini. Forças militares dos Aliados
Da mesma forma é interessante iniciaram uma contraofensiva à invasão
refletir sobre a importância das vitórias alemã. Os britânicos e estadunidenses
dos britânicos sobre os alemães em 1942. alcançariam vitórias significativas cotando
Mas só os britânicos lutaram em prol da com a tomada da Tunísia pela fronteira da
vitória? Obviamente que não. Os africanos Argélia. Esta é usada como ponto de
foram arregimentados em prol do projeto partida das operações, iniciadas
de defesa da África e consequentemente primeiramente pelos britânicos, assim
dos interesses dos colonizadores. Está como africanos, permitindo que
claro, que muitos africanos queriam estar finalmente a conquista e tomada do
na guerra, pois como já explicado antes, território tunisiano do controle
eles criaram em seus imaginários a nazifascista se concretize em maio de
esperança de melhorias em suas situações 1943. Os conflitos militares
de colonizados e de seus respectivos compreendidos entre 1941 a 1943 devem
territórios, isso muito influenciados pela ser lembrados como fatores importantes
experiência dos etiópios. dentro de um processo maior, que foi a
A Itália representou para os derrocada do Eixo.
Aliados uma verdadeira “dor de cabeça”, Descreve Chenntouf que até “(...)
considerando que a partir da Líbia insistia junho de 1940, a África do Norte fornece
em querer ameaçar a Tunísia. A reação sozinha 216.000 homens, entre eles
britânica em alguns momentos fora 123.000 argelinos. De 1943 a 1945,
retardada, porque “o desembarque anglo- 385.000 homens originários da África do
americano acelera o desenvolvimento dos Norte (incluindo 290.000 argelinos,
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tunisianos e marroquinos) participam da foram reprimidas e tratadas com


liberação da França. O exército africano intransigência pelos europeus, com
intervém na liberação da Córsega exceção do Egito. As reivindicações
(setembro–outubro de 1943), na políticas não são oriundas da guerra.
campanha da Itália (atingindo Roma em Aos poucos as radicalizações
15 de junho de 1944) e na campanha da políticas seriam realidade nas colônias
Provence (em agosto de 1944), antes de se após a Segunda Guerra Mundial, em
redirecionar rumo ao norte para se unir ao especial na Argélia, Tunísia e Marrocos.
conjunto do exército francês”. A questão, é que com a perda do “capital
Os alistamentos para o front de de intimidação” como diz Chenntouf, os
combate aos eixistas não aconteceram partidos nacionalistas puderam sonhar
apenas militarmente, muitos partidos com a conquista da independência, já que
políticos nacionalistas se engajaram na durante a guerra o conflito fora pela
luta contra a ideologia fascista propagada defesa da democracia, que agora estava
pela Alemanha e Itália e que teve algum sendo solicitada pelos povos africanos que
eco no Egito. Mas, muitos outros foram, lutaram por ela.
igualmente, censurados, postos na Os movimentos nacionalistas
clandestinidade e, por consequência, ocorridos nas quatro primeiras décadas do
fadados ao desaparecimento no cenário século XX estimularam as reivindicações
político. Foi isso que acometeu ao Partido de independência que acabam se
do Povo Argelino com seu líder Messali consolidando nas décadas de 60 e 70. Os
Hadj e membros que foram presos ou Estados africanos independentes são fruto
condenados a trabalhos forçados em 29 de das ondas reivindicatórios das décadas
abril de 1941. anteriores. Na atualidade, os jornais do
Os nacionalismos reivindicativos mundo inteiro ainda registram
surgem no momento de crise iniciada na movimentos de residência política no
década de 1920, compondo um ativador continente africano. Eles aprenderam com
para as mobilizações sociais e políticas no seus opressores que a luta pela democracia
chifre da África e África setentrional. As é o alimento da vida em sociedade e o
movimentações políticas não foram bem caminho para alcançar a igualdade.
vistas pelos colonizadores, em especial as
que ocorreram nas colônias francesas.
Entre 1937 a 1938 as pressões
reivindicativas e nacionalistas africanas

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