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O Suposto anjo Rafael

Samuel S. Gomes, Th.B.1


São Paulo, setembro de 2015.

Introdução.
Este estudo tem como finalidade pesquisar a respeito do suposto anjo Rafael citado no
livro apócrifo de Tobias. Traçaremos o perfil desse anjo de acordo com o que nos é fornecido
na literatura apócrifa e nas tradições judaicas. Antes disso, faremos uma breve abordagem
sobre os livros apócrifos e como se deu o reconhecimento canônico a eles. Por fim, faremos
uma breve análise crítica sobre o que nos dizem os livros apócrifos sobre Rafael.
1. Os livros apócrifos.
No período que existiu entre o Livro de Malaquias e o Evangelho de Mateus houve um
vasto surgimento de literatura judaica que arrogava para si inspiração divina. O período em
que surge essa literatura recebe alguns nomes, dentre os mais conhecidos temos Período
Intertestamentário e Período Interbíblico. Esse período durou cerca de quatrocentos anos. Os
estudiosos chamam também esse período de “Séculos do silêncio” pelo fato de Deus não ter
levantado voz profética nessa época. Mesmo com esse “silêncio” de Deus, os autores dessa
literatura intertestamentário, por assim dizer, diziam terem sido inspirados por Deus. O fato é
que os judeus nunca aceitaram essa literatura como inspirada por Deus até o dia de hoje. Os
cristãos protestantes chamam essa literatura de livros apócrifos e os cristãos católicos a
chamam de livros deuterocanônicos.
Os livros apócrifos ganharam notoriedade por causa da tradução grega da Bíblia
chamada de Septuaginta. Esta tradução foi elaborada na cidade de Alexandria, Egito, por
setenta e dois sábios judeus (septuaginta em grego significa setenta) trazidos de Jerusalém à
Alexandria a pedido de Demétrio Falario, bibliotecário de Ptolomeu Filadelfo. Essa tradução
se tornara a versão padrão usada pelos judeus de fala grega, e também foi a versão bíblica
usada por Cristo e seus discípulos. Foi também largamente usada pela Igreja Primitiva. No
entanto, como já foi dito, os livros apócrifos nunca foram aceitos pelos judeus como livros
inspirados. Os cristãos também nunca os aceitaram.

1
Teólogo e linguista, especialista em Interpretação Bíblica. Estudou Teologia no Instituto de Discipulado por
Extensão (IDE, 2008-2009) Filosofia (Extensão Universitária, 2014) na Fundação Getúlio Vargas (FGV),
Interpretação de textos (Extensão Universitária, 2013) na Uniseb. Atualmente está cursando Métodos de Estudo
Bíblico e Hermenêutica no Southeastern Baptist Theological Seminary (EUA) com estudos adicionais em
Hermenêutica na Our Daily Bread Christian University (EUA).
Foi tão somente na data de 8 de Abril de 1546, no Concílio de Trento (1545-1563),
que a Igreja Católica Romana resolveu aceitar como canônicos os livros apócrifos. Esta
atitude tomada pela Igreja Romana foi uma de suas reações à Reforma Protestante. O Concílio
de Trento aconteceu na chamada Contrarreforma. Entrementes, a canonização dos livros
apócrifos – agora chamados pela Igreja de Roma como deuterocanônicos – não foi aceita por
muitos oficiais católicos. A Reforma Protestante acusava a Igreja de Roma de cometer
práticas que não possuíam base bíblica, e por isso Roma apelou para os livros apócrifos.
A respeito do caráter não canônico dos livros apócrifos, estamos de acordo com o que
dize a Confissão de Fé de Westminster e a Confissão Belga sobre os livros apócrifos. Veja o
que diz a Confissão de Fé de Westminster sobre o assunto:2
“Os livros geralmente chamados Apócrifos, não sendo de inspiração divina, não
fazem parte do cânon da Escritura; e, portanto, não são de nenhuma autoridade na
Igreja de Deus, nem de modo algum pode ser aprovados ou empregados senão como
qualquer outro escrito humano (Lc 24.27,44; Rm 3.2; 2Pe 1.21)” (CFW cap. I.1).

Veja também o que a Confissão Belga diz sobre o mesmo assunto:


“Distinguimos estes livros sagrados dos livros apócrifos que são os seguintes: 3 e 4
Esdras, Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc, os Acréscimos ao Livro de
Ester e Daniel, a Oração de Manassés e 1 e 2 Macabeus. A Igreja pode, sim, ler estes
livros e tirar deles ensino, na medida em que concordem com os livros canônicos.
Porém, os apócrifos não têm tanto poder e autoridade que o testemunhos deles possa
confirmar qualquer artigo da fé ou da religião cristã; e muito menos podem eles
diminuir a autoridade dos sagrados livros.” (CB, Art. VI).

2. Breve introdução aos anjos na doutrina judaica.


É importante conhecermos os desdobramentos da doutrina judaica sobre os anjos
depois do tempo do cativeiro, pois isso está relacionado com o surgimento de “novos” anjos
na crença e na literatura judaica.
Os anjos são personagens predominantes nas Escrituras. Eles aparecem desde Gn 3.24,
no Jardim no Éden, até Ap 22.8.3 Na história secular, os registros mais antigos sobre anjos
que foram descobertos pela arqueologia datam de 2250 a.C. Estas evidências foram
encontradas na cidade de Ur-Namus, onde anjos são vistos por sobre a cabeça do rei no seu
momento de oração. A crença na existência dos anjos estava presente em todas as religiões da
antiguidade.4

2
Confissão de Fé de Westminster, cap. I.1; Confissão de Fé Belga, Art. VI.
3
Este não é o último texto no livro do Apocalipse onde aparece a palavra anjo. Em Ap 22.16 lemos: “Eu, Jesus,
enviei o meu anjo, para vos testificar estas coisas na igrejas. Eu sou a raiz e a geração de Davi, a resplandecente
estrela da manhã”. O anjo (a´´;ggelo,n mou [angelon mou – meu anjo]), mencionado por Jesus, é uma clara
referência a João. Nesse caso, a palavra a;ggeloj deveria ter sido traduzida por mensageiro e não por anjo.
4
Camplin, 2013, Vol. 1, p. 171.
2.1. O significado do termo.
A palavra anjo é um termo alheio aos textos originais em hebraico e em grego. Em
hebraico temos a palavra K;; (m^l’`k) e em grego temos a;ggeloj (angelos). Ambas as

palavras são cognatas e significam mensageiro ou enviado.5 Nas passagens bíblicas onde
lemos a palavra “mensageiro”, no texto em hebraico é K;; e em grego é a;ggeloj. Fica fácil

de perceber que a palavra “anjo” por toda a Bíblia está prenhe de significado. Há algumas
passagens que a palavra hebraica seria mais bem traduzida por “mensageiro” do que por
“anjo”, o mesmo acontece com a palavra grega.
2.2. O termo arcanjo.
Segundo os textos de Ef 3.10 e 6.12, fica claro que existem graduações tanto entre os
anjos bons e os anjos maus. Os anjos bons são liderados Miguel e os anjos maus por Satanás,
Ap 12.7.
A palavra arcanjo aparece somente duas vezes nas Escrituras, em 1Ts 4.16 e Jd 9. Em
ambos os textos, encontramos o vocábulo grego arca,ggeloj (arcangelos) que significa
arcanjo. Este vocábulo é composto por duas palavras gregas. Uma delas é a palavra a;ggeloj
que já vimos. A outra é a palavra é o verbo polissêmico a;rcw (arcw) que significa
basicamente ser o primeiro no sentido de poder ou domínio, mas pode significar também
começar.6
2.3. Os anjos mencionados nas Escrituras.
Aqui trataremos sobre Miguel e Gabriel, os únicos anjos bons que nos são
mencionados por seus nomes.
2.3.1 Miguel.
O nome Miguel vem da língua hebraica e significa “quem é como Deus?”. Em
hebraico é (mîk`’}l) e em grego é Micahl (micahl).7

Miguel é o único arcanjo mencionado nas Escrituras, Jd 9. Aparece na narrativa


bíblica pela primeira vez no Livro de Daniel e é mencionado cinco vezes nas Escrituras. Em
Dn 10.13 ele é apresentado como “um dos primeiros príncipes”; em Dn 10.21 ele é
mencionado como “vosso príncipe”, isso é, o anjo da guarda de Israel; em Dn 12.1 é chamado

5
Mitchel, Pinto, Metzger, 2002, p. 50, 72; Gingrich, Danker, 1993, p. 10.
6
Pfeiffer, Vos, Rea, 2007, p. 176; Gingrich, Danker, 1993, p. 35; Sayão (ed.), 1998, p. 573, 684.
7
Elliger, Rudolph (eds.), 1997, p. 1406, 1409; Rahlfs, 2006, p. 1499, 1500; Sayão (ed.), op. cit., p. 707.
de “grande príncipe”; em Jd 9 ele é intitulado como “arcanjo”; em Ap 12.7 ele é descrito numa
batalha contra o dragão. Nos livros apócrifos Miguel aparece ao lado de outros anjos.8
2.3.2. Gabriel.
Este nome vem da língua hebraica e significa “homem [ou guerreiro] de Deus”. Em
hebraico é ;(G`brî}l). Na língua grega é Gabrihl (gabrihl).9

Gabriel é um anjo importante nas Escrituras, mas nunca é chamado de arcanjo. A


Bíblia o menciona apenas três vezes, duas vezes no livro de Daniel e uma no Evangelho
escrito por Lucas. Em Dn 8.16, Gabriel explica a visão de um carneiro e um bode. Em Dn
9.21, ele explica a profecia das setenta semanas para Daniel. Por fim, ele é enviado a Zacarias
e a Maria, Lc 1.19,26.10
3. A angelologia judaica na literatura Exílica e Pós-exílica.
Os judeus deram ênfase elevada aos anjos durante o cativeiro babilônico. É bem
provável que o judaísmo sofreu influência do Zoroastrismo (ou Zoroastrianismo)11 no que diz
respeito à doutrina dos anjos. No entanto, a crença judaica em anjos é mais antiga do que essa
antiga religião persa, apesar de que foi a religião persa que formalizou essa doutrina. O
Cristianismo preservou as ideias essenciais da angelologia dos hebreus. 12
3.1. Os sete arcanjos.
A Bíblia nos apresenta apenas um único arcanjo cujo nome é Miguel, Jd 9. Não há
qualquer outra menção sobre outros arcanjos nas Escrituras. Onde a Bíblia se cala, nós
devemos nos calar também. No entanto, os livros apócrifos fazem menção a outros arcanjos.
Segundo Champlin, os sete arcanjos são: Rafael, Gabriel, Uriel (também chamado de Fanuel
ou Eanuel), Miguel, Izidquiel, Hanael e Quefarel.13 Mas temos outros nomes mencionados
nos livros apócrifos, tais como Camuel, Jofiel e Zadiquiel.14
3.2. O livro de 2Esdras.
A partir de agora analisaremos três livros apócrifos que mencionam os supostos
arcanjos mencionados acima. Os livros que serão analisados serão: 2Esdras, Enoque e Tobias.
Iniciaremos com o livro de 2Esdras. Este livro pertence ao gênero apocalíptico, em que

8
Cf. Boyer, 1999, p. 417.
9
Elliger, Rudulph (eds.), op. cit., p. 1401, 1404; Rahlfs, op. cit., p. 1496, 1498; Sayão (ed.), op. cit., p. 154, 155.
10
Cf. Boyer, 1999, p. 284.
11
Religião persa com raízes no séc. VI a.C. Baseada nos ensinamentos do “profeta” Zarastustra, é um sistema
dualista que vê o mundo como uma luta entre o senhor da luz e o espírito do mal (Erickson, 2011, p. 214).
12
Ferguson, Wright, Parcker, 2009, p. 1218-1220;
13
Cf. Champlin, 2013, Vol. 5, p. 546.
14
Cf. Davis, [19-?], p. 393.
Esdras, em uma série de visões, lamenta a situação do povo israelita no exílio e procura por
uma figura messiânica que restaure a nação à sua glória anterior.
No capítulo 4, aparece a figura de um suposto anjo chamado Uriel, que em hebraico
significa “chama [de fogo] de Deus”: “E o anjo que foi enviado a mim, cujo nome era Uriel, me
deu uma resposta” (tradução livre feita a partir do texto em Inglês). No final do capítulo 3,
Esdras questiona Deus sobre o sofrimento do povo de Israel na Babilônia, sobre a destruição
de Jerusalém e sobre o porquê os ímpios prosperam e os justos sofrem (veja o apêndice 1 no
final desse trabalho). No texto de 2Ed 4.36, Uriel é chamado de arcanjo : “E a estas coisas
Uriel, o arcanjo, os deu a responder, e disse: Até quando o número de sementes é preenchido em
vocês; pois ele pesava o mundo na balança”. Na referência 5.20, Uriel ordenou que Esdras
jejuasse e chorasse por sete dias: “E assim eu jejuei sete dias, em luto e choro, como o anjo
Uriel me ordenou”. Este suposto anjo aparece em outros livros apócrifos, mas essas obras não
serão analisadas por nós aqui.
3.3. O Livro de Enoque.
A obra O Livro de Enoque, à semelhança do livro de 2Esdras, pertence ao gênero de
literatura apocalíptica, sendo que este é o mais importante livros dessa categoria. Este livro
teria sido escrito por Enoque, um dos ancestrais de Noé citado em Gn 5.18-24. Iremos
analisar alguns textos desse livro onde são citado nomes de supostos anjos. Neste livro lemos
os nomes de vários seres angelicais, mas nos restringiremos àqueles citados em Enoque 9.1.
O texto de Enoque 9.1 diz o seguinte: “Então Miguel e Gabriel, Radael, Suryal e Uriel,
olharam abaixo desde os céus, e viram a quantidade de sangue que era derramada na terra, e toda
a iniquidade que era praticada sobre ela, e disseram um ao outro; (sic) Esta é a voz de seus
clamores”. Miguel e Gabriel são os únicos anjos citados nas Escrituras. Por outro lado,
Radael, Suryal e Uriel não são mencionados nelas. Todos esses seres são considerados
arcanjos.
No texto de Enoque 10.1,2 lemos o seguinte: “Então o Altíssimo, o Grande e Santo
falou, e enviou a Arsayalalyur ao filho de Lamech”. Há três versões do Livro de Enoque, uma
em grego, outra em latim e a última em etíope. A versão grega traz o nome Uriel ao invés de
Arsayalalyur. Ao que parece, esse suposto anjo possuía formas alternativas para seu nome.
Em Enoque 10.6 há menção ao suposto arcanjo Rafael e ao demônio Azazyel:
“Novamente o Senhor disse a Rafael: Amarra a Azazyel, mãos e pés; lança-o na escuridão; e
abrindo o deserto que está em Dudael, lança-o nele”. Temos aqui outra menção ao suposto
arcanjo Rafael. Azazyel é o anjo que ensinou aos homens a fabricação de armaduras, facas e
espadas, segundo ensina o livro de Enoque.
Em Enoque 10.13 há outra menção ao anjo Gabriel: “A Gabriel também o Senhor disse:
Vai aos bastardos, aos réprobos, aos filhos da fornicação; e destrói os filhos da fornicação, a
descendência das Sentinelas de entre os homens; traga-os e excita-os uns contra os outros. Faça-
os perecer por mútua matança; pois o prolongamento de dias não será deles”.
Em Enoque 20 temos algumas descrições de alguns supostos arcanjos: “Estes são os
nomes dos anjos Sentinelas: Uriel, um dos santos anjos, o qual preside sobre o clamor e o terror.
Rafael, um dos santos anjos, o qual preside sobre os espíritos dos homens. Raguel, um dos santos
anjos, o qual inflige punição ao mundo e às luminárias. Miguel, um dos santos anjos, o qual,
presidindo sobre a virtude humana, comanda as ações. Sarakiel, um dos santos anjos, o qual
preside sobre os espíritos dos filhos dos homens que transgridem. Gabriel, um dos santos anjos,
o qual preside sobre as serpentes, sobre o paraíso e sobre o querubim”. Temos aqui seis anjos
mencionados: Uriel, Rafael, Raguel, Miguel, Sarakiel, Gabriel.
Em Enoque 40.8-9 temos outras descrições de quatro anjos: “Depois disso eu pedi ao
anjo da paz, que prosseguia comigo, para explicar tudo o que estava escondido. Eu disse-lhe:
Quem são aqueles que eu havia visto nos quatro lados e que palavras eram aquelas que eu havia
ouvido e escrito? Ele respondeu: O primeiro é o misericordioso, o paciente, o santo Miguel. O
segundo é aquele que preside sobre todo sofrimento e toda aflição dos filhos dos homens, o
santo Rafael. O terceiro, o qual preside sobre tudo o que é poderoso é Gabriel. E o quarto, o qual
preside sobre o arrependimento e a esperança daqueles que herdarão a vida eterna, é Fanuel.
Estes são os quatro anjos do Altíssimo Deus e suas quatro vozes, as quais naquele momento eu
ouvi”. Miguel é descrito como um anjo misericordioso e paciente. Rafael é o responsável por
todo sofrimento e aflição. Gabriel é responsável por tudo o que é poderoso. Fanuel, outro
nome aplicado a Uriel, é o anjo do arrependimento e esperança.
É importante ressaltar que não cremos que esses livros são inspirados por Deus. Nós
somente usamos estes livros aqui como fonte de pesquisa.
4. O suposto anjo Rafael.
Agora entraremos no assunto principal desta pesquisa. Trataremos sobre o suposto
anjo Rafael. Estudaremos a obra apócrifa Livro de Tobias. É neste livro apócrifo que o anjo
Rafael recebe notoriedade. Para esta parte da nossa pesquisa usaremos a Bíblia Apologética
de Estudo – edição ampliada (Geográfica,2006, p. 877,878), onde os pesquisadores do ICP
(Instituto Cristão de Pesquisas) fizeram algumas implicações ao livro de Tobias. A nossa
tarefa tem duas fases. Na primeira fase reproduziremos as implicações feitas ao livro de
Tobias pelos pesquisadores do ICP. Estas implicações foram publicadas pelo ICP na Bíblia
Apologética de Estudos. Feito isso, a segunda fase da nossa pesquisa será refutar os ensinos
contidos no livro de Tobias com base nas análises feitas pelo ICP.
4.1. O nome Rafael.
Nas Escrituras só existe uma única personagem com o nome Rafael. Este Rafael foi
um porteiro do Tabernáculo (1Cr 26.7). O nome Rafael significa curado por Deus ou Deus
cura. Em hebraico, o nome Rafael é ; (rep`’}l). Este nome é formado por duas palavras.

A primeira é o verbo (r`p`’) que significa curar. Esse verbo possui uma grafia

alternativa, a saber: (r`p>). A forma ; (r=p`’) é encontrada em Nm 12.13: “Clamou,

pois, Moisés ao Senhor, dizendo: Ó Deus, rogo-te que a cures [;]”.A segunda palavra que

compõe esse nome é o substantivo  (’}l). Essa palavra significa Deus. É uma palavra

bastante comum no Antigo Testamento, principalmente em nomes. 15


4.2. Considerações sobre o Livro de Tobias.
Este livro pertence o gênero de ficção histórica. Os livros apócrifos que pertencem a
este gênero foram usados para propósitos didáticos. Era uma espécie de propaganda judaica.
O livro de Tobias foi escrito no final do séc. III a.C. ou início do séc. II a.C. Os
estudiosos supõe que os eventos descritos nessa obra apócrifa tenham ocorridos durante o
século VIII a.C. Representa um alto tipo de piedade e éticas judaicas. Os temas que recebem
especial ênfase são os seguintes: obediência filial, sepultamento dos mortos, anjos, demônios
e axiomas morais e éticos. Há também o ensino contra o casamento misto. O autor não parece
ser um judeu da Palestina. Ele descreve as variadas aventuras dos judeus no exílio como
sendo um deles.16
4.2. Implicações no livro de Tobias.17
Tobias, um romance do período em que Israel esteve cativo pela Assíria, fala de um
demônio chamado Asmodeu (isoladamente dos demais livros bíblicos) cuja especialidade é
destruir matrimônios, matando os maridos, tantos quantos a mulher for entregue (Tb 3.8).
Na referência 4.10,18 o texto atenta contra a salvação pela fé, declarando seguinte: “...
a esmola livra da morte e impede que se caia nas trevas...”, o que, obviamente, está

15
Boyer, 1999, p. 525; Elliger, Rudolph (eds.), 1997, p. 234, 1505; Mitchel, Pinto, Metzger, 2002, p. 42, 65;
Brown, Driver, Briggs (eds.), 1939, p. 42, 950, 951.
16
Cf. Hale, 1983, p. 18.
17
ICP, 2006, p. 877, 878.
18
O texto está se referindo ao capítulo 4 e versículo 10 do livro em análise.
relacionado ao contexto espiritual. Sem dúvida, é um dos trechos dos quais Roma19 extrai a
ideia de que boas obras podem prover salvação.
A partir da referência 5.4, Tobias encontra-se com Rafael, um suposto anjo de Deus
que possui características particulares: é mentiroso e herege. Pela narrativa, nota-se o seguinte
sobre esta insólita criatura: a) é um dos filhos de Israel (5.5); b) se hospeda, com frequência,
na casa de certo Gabael (5.6); c) ensina curandeirismo a Tobias, afirmando que a fumaça do
coração ou do fígado de certo peixe apanhado por Tobias, quando queimados, afugenta
demônios para sempre e o fel (vesícula) cura determinado tipo de cegueira (6.7-9).
No capítulo 6, Tobias dá testemunho do já citado demônio Asmodeu, que, agora,
declara seu sentimento de “amor” por Sara, sua parenta, por isso matou seus sete maridos
durante as núpcias (6.15).
Para aniquilar esse suposto Asmodeu, o dito anjo pede para Tobias exercitar feitiçaria
quando Sara lhe for dada por esposa, colocando fogo no coração e no fígado de um peixe
durante as núpcias, para que a fumaça afugentasse Asmodeu para sempre da presença de Sara
(6.17,18).
No capítulo 8, após o encantamento realizado por Tobias para afugentar o demônio, é
dito que Rafael saiu atrás de Asmodeu e o seguiu até o Egito, para só então acorrentá-lo (8.1-
3). A vesícula (fel) do peixe, que o suposto anjo havia dito ter poder para curar determinada
cegueira, entra em ação no capítulo 11, promovendo a cura do pai de Tobias, Tobit. Esta cura,
segundo a promessa do próprio anjo, seria provida por Deus (5.10); entretanto,
posteriormente, a cura é atribuída por Tobias ao anjo herege e mentiroso (12.3). Em meio a
tantas contradições, não é possível concluir quem – ou o quê – teria curado a cegueira de
Tobit.
Em Tobias 12.7, Rafael faz uma declaração que contradiz a experiência de Jó, quando
diz: “Praticai o bem e desgraça não vos atingirá”, o que parece restringir Deus a uma
automaticidade que não existe.
O ápice da heresia na obra de Tobias aparece na frase: “A esmola livra da morte e
purifica do pecado”, pois o livro dos Hebreus, respaldado em toda a lei e cerimonial mosaico,
afirma que “sem derramamento de sangue não há remissão de pecados” (Hb 9.22).
Após isso, o falso anjo também profetiza falsamente, declarando: “Os que dão esmola
terão longa vida” (12.9). Depois disso, Rafael deixa a mentira e revela sua suposta identidade,
qual seja: ser um enviado de Deus para um benefício da família de Tobit (12.15).

19
O texto está se referindo à Igreja Católica Romana.
Por tudo isso, verifica-se, em Tobias, dificuldades insuperáveis que desqualificam a
obra até mesmo quando examinada historicamente.

BIBLIOGRAFIA.
Edição da Bíblia em Português.
A Bíblia Sagrada - Almeida Corrigida Fiel (ACF), © 2007, Sociedade Bíblica Trinitariana do
Brasil, Trinitarian Bible Society.

Bíblia de estudo.
Bíblia Apologética © 2000, 2006 ICP – Instituto Cristão de Pesquisas.

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