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Sobre Umbanda, estudo e intolerância

religiosa

Estou na religião há mais ou menos 3 anos como praticante, mas


nasci em berço católico. Atualmente, faço parte do Centro Espírita
Pai Joaquim de Aruanda localizado em Itapuã, Vila Velha. Julgo
este tempo suficiente para descrever alguns aspectos dela. Claro,
ainda não tenho todo o conhecimento, que certamente levaria uma
vida inteira estudando para, ainda assim, conhecê-la minimamente.

A Umbanda não é uma religião milenar, como algumas que já


conhecemos, como por exemplo o Catolicismo. Ela ainda
“engatinha” na história do homem. Fundada pelo Caboclo das Sete
Encruzilhadas através do médium Zélio de Moraes em 1908, a
religião completará seus 109 anos de existência no dia 15 de
Novembro.

Nesta religião, há uma crença em um Deus maior, criador do céu e


da terra, e nos santos, pessoas que são iluminadas e abençoadas.
Alguns dos santos católicos são os mesmos na umbanda, por isso
as imagens são as mesmas no altar. São Jorge, por exemplo,
recebe na umbanda o nome de Ogum, e Oxum seria a Nossa
Senhora e Xangô seria o São Pedro, São João ou Santo Antônio.
Mas o Deus é um só, independente da religião, e por isso eles não
entram em contradição com as diversas religiões e até apoiam
outras. É comum ver membros de umbanda oferecendo itens e
cumprindo promessas em feriados católicos.

A Umbanda é uma religião africana?


A Umbanda não é uma religião africana. Utiliza-se ritos e elementos
de religiões africanas, mas a Umbanda não é uma religião africana.
É o que então? Oras, brasileira! Descontraindo um pouco mais:
carioca!
Qual a diferença entre candomblé e umbanda?

O Candomblé e a Umbanda, apesar de suas semelhanças,


apresentam muitas diferenças entre si, como origem, a relação com
os orixás, rituais, o fenômeno da incorporação, entre outros.

O Candomblé veio da África, trazido ao Brasil por meio dos negros


africanos escravizados. Aqui, sofreu adaptações e é considerada
uma religião afrobrasileira.

Já a Umbanda é uma religião propriamente brasileira e seus


fundamentos foram revelados por Zélio Fernandino de Moraes. A
Umbanda é marcada pelo forte sincretismo entre catolicismo,
espiritismo e religiões afrobrasileiras.

Umbanda é uma religião


Candomblé é uma religião
brasileira que mescla elementos
Definição afrobrasileira, que foi trazida pelos
do catolicismo, espiritismo, e
africanos escravizados.
religiões afro-brasileiras.
Origem Africana. Brasileira.
Criação No final do século XVI. 1908.
Segue as leis da natureza. Suas Segue as leis da natureza e do
divindades são os orixás, que teriam o plano espiritual, além dos
Crença
papel de cuidar e equilibrar nossas princípios da fraternidade e da
energias. caridade.
Veem os orixás como ancestrais
Veem os orixás como espíritos
divinos, que são os deuses da natureza e
Orixás ancestrais e a manifestação do
representantes de um deus criador e
deus único.
único.

O que são Orixás?


Outra pergunta frequente. Há uma visão da mitológica dos Orixás,
que não me aprofundei ainda, mas admiro muito. ]
Interpreto os Orixás pela visão que obtive em aulas de Teologia de
Umbanda, com base em Rubens Saraceni, que muito contribuiu
com sua literatura e ensinamentos sobre a religião. Segundo
Rubens, resumidamente, os Orixás são manifestações de Deus. Ou
seja, sabemos que Deus é único e se manifesta conosco. Cada
Orixá representa uma qualidade Divina d’Ele. Temos Deus como
guerreiro na manifestação de Ogum. Temos Deus como mãe que
nos ama na manifestação de Oxum. Deus se mostra justo com
Xango. Assim em diante, como as coisas devem ser…

Casamento na umbanda – Ritual


A cerimônia da umbanda é o rito final que envolve o casamento,
abençoada pelos elementos da natureza. Serve para pedir a
benção a Deus para o novo casal. É um evento curto, que não dura
mais que meia hora, sendo rápido e preciso. Ela acontece a noite e
mesmo membros de outras religiões podem participar sem
problemas.

Assim como em outras religiões, há um ritual envolvido no


casamento na umbanda, e este rito é formado por diversas etapas.
A cerimônia acontece no local onde os cultos costumam ser
realizados, no terreiro, localizado na casa do pai de santo ou em
outro local. O casal deve ser membro da religião para poder se
casar na umbanda ou se converter antes da cerimônia, não no
mesmo dia.

A cerimônia começa com a entrada dos padrinhos, um para cada


noivo. Em seguida entram o pai de santo e sua ajudante, com sinos
nas mãos sendo tocados até chegar ao altar. Depois entram noivo e
noiva, um de cada vez, e ficam ao centro de uma roda. O pai de
santo, o principal e ancião do terreiro, começa então a cerimônia

A cerimônia segue então com orações a São Francisco, cânticos, a


leitura de escritos obrigatórios para a celebração. Os noivos são
abençoados, com uma dedicação do pai de santo em palavras
pessoais. São então servidas duas bebidas: uma amarga, para
lembrar das amarguras que podem surgir no casamento, e uma
doce, para lembrar do amor e doçura de formar uma nova família.

Há uma troca de alianças como no catolicismo, mas estas são


abençoadas por oxalá antes com a evocação das forças dos santos
antes de colocar nos noivos. Todos devem cantar juntos pedindo a
iluminação do casal.

Estudo e sua importância


Direciono esta questão em especial aos próprios Umbandistas, ao
afirmar que sim, o estudo tem sua importância. Muitos templos,
centros, tendas, núcleos de Umbanda e até mesmo os próprios
médiuns passam toda a responsabilidade do aprendizado para os
guias que trabalham em prol da caridade.
O próprio ensino de Teologia de Umbanda diz que incorporação é
uma espécie de divisão, de maneira simplificada: metade guia,
metade médium, 50% um, 50% outro. Então , nota-se a importância
de sempre estudarmos. Por mais que um guia de Umbanda tenha
conhecimento de tudo, ou grande parte desse tudo, como repassar
a um médium que não possui o estudo sobre a erva, a magia, o
ponto riscado? Como confiar no que um guia está passando se não
temos o conhecimento daquilo? Digo confiar não no sentido de que
um Guia da Luz possa nos enganar, até porque este não é seu
intuito, mas sim de nos auxiliar na prática da caridade.
O confiar a que me refiro é em nosso próprio mental. Somos seres
sensitivos, mas também dotados de uma razão — muitas vezes
maior do que nós mesmos. É difícil “derrubar” — acredito que seja
melhor o termo “deixá-la em segundo plano” — a razão sem o
conhecimento. Duvidamos de muitas coisas, principalmente de nós
mesmos. Alguns só passam a acreditar através de uma prova, algo
que “comprove” que tal fato é verídico. Sobre isso, faço uma dura
crítica: não estamos na Umbanda para recebermos provas! O Guia
de Umbanda não precisa provar nada a nós. Sabemos seu grau
evolucionário. Nós é que temos que provar até onde vai a nossa fé,
nosso amor pela religião. E não, não precisamos fazer “loucuras”
para demonstrar isso. A simplicidade e humildade por si só já
realizam isso.
Intolerância religiosa
A intolerância religiosa ganha cada vez mais destaque nos veículos
de comunicação. Vídeos de sacerdotes e sacerdotisas destruindo
as próprias imagens de santos, alguidares, guias são frequentes
nas redes sociais. O que fazer para combater esta corrente de ódio
que prejudica tanto uma religião como a Umbanda? Na verdade,
retifico minha fala anterior: o ódio prejudica a todas as religiões,
sem distinção. Como vencer este preconceito? A quem atribuímos a
“culpa” por tudo isso?
Sabe-se que mesmo com o fim da escravidão no Brasil as
desigualdades e racismo nunca deixaram de existir em nossa
sociedade. Este preconceito atinge até mesmo a crença do povo
negro. Basta abrir um livro de história do Brasil para estudarmos a
imposição do catolicismo nas senzalas, desencadeando o que mais
tarde a própria Umbanda utilizaria em sua forma de culto: o
sincretismo entre Orixás e santos católicos. Essa é uma das muitas
consequências que a opressão causou em religiões de matriz
africana.
No século XX, junto com o Candomblé e demais religiões de matriz
africana existentes, a Umbanda sofre com o preconceito. E estamos
aqui, mais um século depois vendo a mesma cena desse filme.
Muda-se o “antagonista” e o contexto, mas a vítima é sempre a
mesma.
Em Setembro, no dia 27, comemoramos Cosme e Damião. Muitos
terreiros se organizam para preparar as famosas “sacolinhas de
Cosme”, como chamo. Mas onde está o problema disso, muitos
devem estar se perguntando. “São apenas doces”. A história
começa a partir deste ponto.
A cada ano está mais e mais difícil sair às ruas para entregarmos as
sacolinhas. Difícil não no sentido de conseguir doces. Graças a
Oxalá, todos os anos conseguimos atingir a quantidade de
sacolinhas estimada. Mas a questão do próprio tratamento que
umbandistas recebem de outras pessoas. Na religião, prega-se o
livre-arbítrio. Deste modo, ninguém tem a obrigação de aceitar os
doces de Cosme e entendemos perfeitamente a opinião de cada um
sobre este assunto. Mas agora o que não podemos admitir são atos
intolerantes de tolos e pseudo-religiosos que utilizam a fé como
forma de diferenciação e forma de pregar o ódio, a atual “guerra
santa” entre as religiões do Brasil.

A intolerância é uma vida de mão dupla. Prejudica a religião da


vítima e prejudica a religião do opressor. Será que é tão difícil
entender isto? É necessário mais respeito!

Mas enfim, não quero que este escrito fique como uma ameaça a
outras religiões, muito pelo contrário. Não é necessário ser um
teólogo formado para compreender que em alguma coisa as
religiões são semelhantes. Há vários caminhos para se chegar até
Deus. Há vários caminhos até a sua morada. Compreendam este
ponto para que possamos agregar todas as formas de encontrá-Lo.
“Umbanda é a manifestação do espírito para a caridade” — Caboclo das Sete Encruzilhadas

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