Você está na página 1de 11

2.3.

A Lei de Finanças das Regiões Autónomas

2.3.1. Objectivos

A Lei das Finanças das Regiões Autónomas (LFRA)[15] surge numa altura em que se tornava
evidente que os défices orçamentais das regiões autónomas portuguesas continham uma forte
componente estrutural. O principal objectivo da lei foi, segundo o nº 1 do Artigo 1º

" … a definição dos meios de que dispõem as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira
para a concretização da autonomia financeira consagrada na Constituição e nos estatutos
político-administrativos."

Pretendeu-se, portanto, definir os meios financeiros postos à disposição das Regiões para que
elas possam cumprir as suas obrigações de prestação de serviços públicos e de tomada de
medidas de política económica.

O artigo 2º, por seu turno, clarifica o que se pretende com a autonomia financeira regional.
Segundo os nºs 3 e 4 deste artigo

"3. A autonomia financeira visa garantir aos órgãos de governo das Regiões Autónomas os
meios necessários à prossecução das suas atribuições bem como a disponibilidade dos
instrumentos adequados à promoção do desenvolvimento económico e social e do bem-estar
e da qualidade de vida das populações, à eliminação das desigualdades resultantes da situação
de insularidade e de ultraperiferia e à realização da convergência económica com o restante
território nacional e com a União Europeia.

4. A autonomia financeira das Regiões Autónomas deve prosseguir, com base no cumprimento
do modelo constitucional de cooperação, assistência e partilha de recursos financeiros, a
realização do equilíbrio sustentável das finanças públicas e o desenvolvimento económico das
economias das Regiões Autónomas, no âmbito da economia nacional."

Do nº 3 deve realçar-se que se pretende não só compatibilizar meios com obrigações como
também disponibilizar instrumentos adequados ao desenvolvimento económico e social, à
eliminação de desigualdades e à realização da convergência económica com o resto do país e
com a União Europeia.

Complementando o nº 3 , o nº 4 especifica que a autonomia financeira deve ainda prosseguir a


realização do equilíbrio sustentado das finanças públicas e o desenvolvimento das economias
das Regiões Autónomas.

Mais adiante, no artigo 3º, é referido que

“A coordenação das finanças das Regiões Autónomas com as finanças do Estado … terá
especialmente em conta o desenvolvimento equilibrado de todo o país, a necessidade de
atingir os objectivos e metas orçamentais traçados no âmbito das políticas de convergência ou
outras a que Portugal se tenha obrigado no seio da União Europeia, bem como a necessidade
de obter uma convergência real das economias, tendo em conta o estatuto de regiões
ultraperiféricas…”

Da conjugação destes três primeiros artigos poderá, sintetizar-se o objectivo, como o fizeram
Fortuna e Couto, da seguinte forma

"Criar nas Regiões Autónomas as condições para que haja um crescimento convergente
através da adopção de um modelo de gestão político-administrativa, caracterizado pela
descentralização das funções do Estado e que assegure o equilíbrio das finanças públicas
regionais num horizonte de médio prazo"[16]

2.3.2. Princípios

No campo dos princípios a Lei refere a legalidade, a economicidade, a solidariedade, o


tratamento igual de todos os cidadãos portugueses e a transparência. Os princípios da
legalidade e da economicidade são referidos no nº 2 do artigo 2º, que diz

"A autonomia financeira das Regiões Autónomas desenvolve-se no respeito pelos princípios da
legalidade, da economicidade, da despesa pública e da sua sujeição aos controlos
administrativo, jurisdicional e político nos termos da Constituição e dos estatutos político
administrativos de cada uma das Regiões Autónomas."

Por seu turno o artigo 4º refere o princípio da solidariedade cuja aplicação é delimitada no
artigo 5º. O nº3 do artigo 5º refere o princípio do tratamento igual de todos os cidadãos
portugueses. Por último, o princípio da transparência é referido no artigo 6º.

A preocupação dos princípios aqui referidos está associada unicamente à obrigação de


transferências do Orçamento do Estado (solidariedade) e à realização da despesa pública que
se pretende seja, portanto, executada com transparência, legalidade e economicidade, tendo
subjacente a preocupação de não descriminar contra os cidadãos portugueses, onde quer que
eles residam, na prestação de serviços públicos.

2.3.3. As Principais Alterações Introduzidas pela Lei

As principais alterações introduzidas pela Lei referem-se à especificação da forma que


assumem as transferências do Estado, à metodologia para o cálculo das transferências do
Estado, à forma como as políticas são acompanhadas, à definição do que são receitas
regionais, à capacidade de endividamento, tipos de dívida e respectivos limites, à definição
dos tipos de dívida admissíveis, à forma como é tratada a dívida para efeitos fiscais, à
capacidade de adaptação do sistema fiscal, à competência legislativa e regulamentar
tributária, à competência administrativa regional, à fixação de taxas e de preços públicos
regionais e à definição do que constitui património da Região.

Dentro destas alterações podemos identificar dois grandes grupos de formas de financiamento
do Orçamento de cada Região: são eles o financiamento por fontes internas e; o
financiamento por fontes externas. De forma esquematizada temos então

I - Fontes Internas

1- as receitas provenientes da cobrança de impostos sobre a actividade económica gerada


nos Açores, designadas por receitas regionais;

2- o endividamento;

II - Transferências
3- as receitas provenientes de transferências do Estado, que designaremos por
transferências;

4- as receitas que provenham de projectos de interesse comum e;

5- transferências pontuais.

Fora do âmbito das transferências podemos ainda identificar a assunção por parte do
Orçamento do Estado ou por organismos tutelados da "comparticipação nacional nos sistemas
comunitários de incentivos financeiros nacionais de apoio ao sector produtivo a ser assegurada
pelo Orçamento do Estado ou pelos orçamentos das entidades que tutelam as respectivas
áreas"[17].

Embora não se trate propriamente de uma transferência, este tipo de apoio, que já
anteriormente se praticava para projectos de determinadas características, não deixa de ter o
efeito de aliviar o orçamento regional de algumas obrigações. O seu reflexo nesse orçamento
será, no entanto, nulo.

Passaremos, de seguida, a uma análise mais detalhada de cada uma destas alterações.

2.3.3.1. A Forma das Transferências do Estado

As transferências do Estado, em cumprimento do seu dever constitucional e estatutário de


solidariedade[18], assumem, na LFRA, diversas formas que classificaremos de regulares e
pontuais.

As transferências regulares serão:

i. as designadas Transferências orçamentais e;

ii. as que são canalizadas pelo Fundo de Coesão;

O artigo 30º define o que são as Transferências orçamentais. Essas estão associadas aos
valores dos investimentos nacionais, definidos palas verbas do PIDDAC, ao peso populacional
das Regiões e a um factor de convergência definido para cada um dos dois casos.

O nº 5 do artigo 30º, por seu turno, vem contemplar uma situação que, durante vários, anos
suscitou conflitos entre os governos central e dos Açores, levando a que essa Região viesse a
assumir uma dívida[19] que resultou da não aceitação, por parte do Governo da República, do
encargo resultante de bonificações de juros à habitação, ao abrigo de programas nacionais.

O outro tipo de transferências, que classificamos de regulares, são as que provêm do Fundo de
Coesão[20]. Este fundo é dotado anualmente com verbas do Orçamento do Estado cujo valor
máximo depende do valor obtido pela aplicação da fórmula especificada no artigo 30º. Estas
verbas foram 25% do valor das transferências em 1999, 30% no ano 2000 e 35% no ano 2001.
Os valores a atribuir ao fundo a partir desta data serão determinados na revisão da Lei que
deve ocorrer até ao final de 2001.[21]

As transferências pontuais serão:

i. As que se justificarem devido a situações imprevistas resultantes de


catástrofes naturais e para as quais as Regiões não disponham de meios suficientes[22];

ii. As que forem destinadas ao financiamento de projectos que venham a ser


designados de interesse comum[23];

iii. As que resultarem de apoios à amortização das dívidas públicas


regionais[24].

O primeiro tipo de transferência pontual aqui referida enquadra-se na tradicional situação de


catástrofes naturais que justifiquem uma intervenção nacional e, porventura, internacional.
Trata-se de situações pontuais avaliadas caso a caso e, certamente, influenciadas pela
conjuntura de cada momento.

O segundo tipo de transferência ao qual atribuímos o atributo de pontual é o que se refere ao


financiamento de projectos considerados de interesse comum. Por projectos de interesse
comum entende-se

"aqueles que são promovidos por razões de interesse ou de estratégia nacional e ainda os
susceptíveis de produzir um efeito económico positivo para o conjunto da economia nacional,
aferido, designadamente, pelas suas consequências em termos de balança de pagamentos ou
de criação de postos de trabalho, e, bem assim, aqueles que tenham por efeito uma
diminuição dos custos da insularidade ou uma melhor comunicação entre os diferentes pontos
do território nacional."[25]

Como se pode deduzir da leitura desse artigo, estamos perante situações que, pelo menos
para o caso dos Açores, estão totalmente abertas, sem casos de referência claramente
identificados. O mesmo já não se poderá dizer relativamente ao caso da Madeira onde a
ampliação do aeroporto de Sta. Catarina o qual se configuraria com a tipologia adequada para
enquadramento como projecto de interesse comum.

Totalmente em aberto ficam também as condições de financiamento pelo Estado dos


projectos que vierem a ser incluídos nessa categoria. Está-se, portanto, perante situações
fortemente dependentes de negociações políticas.

A terceira categoria de transferências pontuais reporta-se à amortização, pelo Estado, de parte


da dívida pública das regiões. Com a aprovação da LFRA o montante desta amortização foi
fixado em 110 milhões de contos para cada uma das duas Regiões Autónomas.

Com a aprovação desta amortização o Estado desobriga-se relativamente ao anterior


compromisso de assunção de 50% dos juros da dívida de cada Região. Isto é, por um lado as
Regiões vêm a sua dívida reduzida e, por outro, passam a estar totalmente responsabilizadas
pelos encargos da dívida remanescente.

Conclui-se, assim, a descrição das transferências utilizando a classificação avançada. Na secção


seguinte revêm-se alguns pormenores da metodologia adoptada para a definição das
designadas Transferências orçamentais, por sua vez directamente relacionadas com os
montantes do Fundo de Coesão. As outras transferências, como se pode deduzir do descrito
acima, não obedecem a regras rígidas.

2.3.3.3. Acompanhamento das Políticas

O acompanhamento das políticas regionais foi sempre feito através dos múltiplos contactos
estabelecidos entre os membros dos governos regionais e do Governo da República.

A Lei de Finanças das Regiões Autónomas vem introduzir uma nova entidade neste processo, o
Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeiras[27]. Trata-se de um órgão a funcionar
junto do Ministério das Finanças com as seguintes competências:

a) Acompanhar a aplicação da LFRA;

b) Analisar as políticas com os objectivos da política nacional, sem prejuízo da autonomia


financeira regional;

c) Apreciar, no plano financeiro, a participação das Regiões Autónomas nas políticas


comunitárias, nomeadamente as relativas à união económica e monetária;

d) Assegurar o cumprimento dos direitos de participação das Regiões autónomas na área


financeira previstos na Constituição e nos estatutos político-administrativos;

e) Analisar as necessidades de financiamento e a política de endividamento regional;

f) Acompanhar a evolução dos mecanismos comunitários de apoio;

g) Pronunciar-se sobre o financiamento dos projectos de interesse comum;

h) Dar pareceres a pedido do Governo da República ou dos governos regionais.

A composição e funcionamento deste Conselho, que integraria representantes dos governos


regionais, e os demais aspectos relativos ao seu funcionamento seriam definidos por despacho
conjunto do Primeiro Ministro e do Ministro das Finanças. No processo deveriam ser ouvidos
os Governos Regionais. O Conselho acabou por não funcionar durante os primeiros anos de
vigência da LFRA.

Conselhos desta natureza são criados em muitos países para acompanhar o funcionamento
dos sistemas de transferência. Não ficam, no entanto, limitados ou controlados pelos governos
sendo recomendável que tenham características de independência, na sua composição, e de
transparência no seu funcionamento. O Conselho, conforme concebido, não tem estas
características.
2.3.3.4. Definição das Receitas Regionais

Um dos títulos da Lei de Finanças das Regiões Autónomas é dedicado às receitas regionais,
onde se incluem as receitas fiscais, a dívida pública regional e as transferências do Estado
(transferências orçamentais e Fundo de Coesão). Já foi feita referência às transferências
orçamentais e ao Fundo de coesão. Na presente secção aborda-se a definição de receitas
fiscais e, na seguinte, a dívida pública.

Constituem receitas das regiões:

(a) Os impostos sobre o rendimento (IRS e IRC);

(b) Os impostos sobre as sucessões e doações;

(c) Os impostos extraordinários;

(d) Os juros compensatórios e de mora;

(e) Multas e coimas;

(f) O imposto do selo;

(g) O imposto sobre o valor acrescentado;

(h) Os impostos especiais de consumo.

No caso das pessoas singulares constitui receita de cada Região o imposto sobre o
rendimento: devido por pessoas singulares consideradas fiscalmente residentes em cada
Região, independentemente do local em que exerçam a respectiva actividade e; retido, a título
definitivo, sobre rendimentos, pagos ou postos à disposição de pessoas singulares
consideradas fiscalmente não residentes em qualquer circunscrição do território português,
por pessoas singulares ou colectivas com residência, sede ou direcção efectiva em cada Região
ou por estabelecimento estável nelas situado a que tais rendimentos devam ser
imputados.[28]

Os impostos desta natureza atribuídos a cada Região Autónoma são não só os que dizem
respeito aos residentes como aqueles que respeitem ao rendimento de não residentes pagos
por entidades que tenham residência, sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável em
cada uma das Regiões.

Para o caso das pessoas colectivas a situação é semelhante à que acabámos de descrever.
Segundo o artigo 13º

"1. Constitui receita de cada Região Autónoma o imposto sobre o rendimento das pessoas
colectivas:

a) devido por pessoas colectivas ou equiparadas que tenham sede, direcção efectiva ou
estabelecimento estável numa única Região;

b) Devido por pessoas colectivas ou equiparadas que tenham sede ou direcção efectiva em
território português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou
quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica próprias em mais
de uma circunscrição, em termos referidos nos nºs 2 e 3 do presente artigo;

c) Retido, a título definitivo, pelos rendimentos gerados em cada circunscrição,


relativamente às pessoas colectivas ou equiparadas que não tenham sede, direcção efectiva
ou estabelecimento estável em território nacional.”

Relativamente ao imposto referido na alínea b) deste artigo 13º, as receitas de cada


circunscrição serão determinadas pela proporção entre o volume anual correspondente às
instalações situadas em cada Região Autónoma e o volume anual, total, de negócios do
exercício. O direito sobre os impostos está associado ao lugar de ocorrência do facto que os
gerou.

Note-se que o cumprimento destes preceitos exige uma elevada capacidade do sistema para
identificar o lugar a que os impostos cobrados devem ser imputados. Exige também, da parte
dos agentes económicos envolvidos, o cumprimento da obrigação de identificação do lugar
onde a actividade ocorreu.

Em situação semelhante estão os impostos especiais sobre o consumo. Segundo o artigo 22º
"Constituem receita de cada circunscrição os impostos especiais de consumo cobrados pelas
operações a eles sujeitas nela realizadas."

A este respeito, o nº1 do artigo 10º, com o título "Obrigações do Estado" estabelece que

"As Regiões Autónomas têm direito à entrega pelo Governo da República das receitas fiscais
relativas a impostos sobre mercadorias destinadas às Regiões Autónomas e às receitas dos
impostos que devam pertencer-lhes, de harmonia com o lugar de ocorrência do facto gerador
dos respectivos impostos, e outras que lhes sejam atribuídas por lei."

Nesta secção, merece ainda referência especial o que fica estipulado relativamente ao imposto
sobre o valor acrescentado (IVA). Com efeito, em termos finais, dadas as circunstâncias
actuais, é previsível que, a médio prazo, tudo fique como está. Isto é, aplica-se efectivamente a
regra da capitação para o cálculo das transferências dos valores devidos a cada Região, que é o
regime actualmente vigente. Segundo o artigo 21º

"1. Constitui receita de cada circunscrição o imposto sobre o valor acrescentado cobrado
pelas operações nela realizadas. 2. O Ministro das Finanças, ouvidos os governos regionais
regulamentará o modo de atribuição às Regiões Autónomas das respectivas receitas,
mantendo-se, entretanto, o regime vigente. 3. Em caso algum poderá ser adoptado um modo
de cálculo que origine um menor montante de receitas do que o auferido pelo regime
vigente."

2.3.3.5. Capacidade de Endividamento, Tipos de Dívida e Seus Limites

O endividamento continua a ser uma forma admitida para o financiamento dos Orçamentos
das Regiões. São admissíveis empréstimos a longo prazo destinados exclusivamente a financiar
investimentos ou a substituir e amortizar empréstimos.[29] Contrariamente ao que acontecia
anteriormente, para fazer face a dificuldades de tesouraria, as Regiões Autónomas poderão
recorrer a empréstimos de curto prazo, que deverão estar liquidados no último dia do ano e
que não deverão ultrapassar 35% das receitas correntes cobradas no exercício anterior.[30]

Por outro lado, até 31 de Dezembro do ano 2000, as Regiões deixam de beneficiar das contas
correntes gratuitas junto do Banco de Portugal[31]. Esta medida tem o efeito de agravar a
dívida de cada Região e aumentar os custos uma vez que novas formas de financiamento já
não serão gratuitas.

Em cada ano, sob proposta dos governos regionais, na Lei do Orçamento do Estado, serão
fixados, como já acontecia anteriormente, limites de endividamento para as Regiões
Autónomas. Estes limites, estabelecem que o serviço de dívida total, incluindo as amortizações
anuais e os juros, não pode exceder, em caso algum, 25% das receitas correntes do ano
anterior, com excepção das transferências e comparticipações do Estado para cada Região.

Ainda no que se refere a esta secção, mantém-se a exigência de que a contracção de


empréstimos externos ou em moeda estrangeira depende de aprovação prévia da Assembleia
da República bem como a possibilidade de o Estado garantir a dívida emitida.

A dívida pública Regional passa a gozar do mesmo tratamento fiscal que a dívida
pública do Estado.

2.3.3.6. Competências Legislativas e Regulamentares Tributárias

Uma das alterações mais significativas, se não a mais significativa, introduzidas pela LFRA são
as novas competências de adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais. O
tratamento desta matéria constitui o Título III da Lei que começa com uma secção de
enquadramento geral onde são especificados princípios gerais e definidas as competências
legislativas.

Os princípios a que devem obedecer as competências tributárias são enumerados no nº1 do


artigo 32º e são os seguintes:

a) O princípio da coerência entre o sistema fiscal nacional e os sistemas fiscais regionais;

b) O princípio da legalidade, no sentido de que a determinação normativa regional da


incidência, da taxa, dos benefícios fiscais e das garantias dos contribuintes, nos termos dos
artigos seguintes, será da competência da assembleia legislativa regional, mediante decreto
legislativo regional;

c) O princípio da igualdade entre as Regiões Autónomas;

d) O princípio da flexibilidade, no sentido de que os sistemas fiscais regionais devem


adaptar-se às especificidades regionais, quer podendo criar impostos vigentes apenas nas
Regiões Autónomas quer adaptando os impostos de âmbito nacional às especificidades
regionais;

e) O princípio da suficiência, no sentido de que as cobranças tributárias regionais, em


princípio, visarão a cobertura das despesas públicas regionais;
f) O princípio da eficiência funcional dos sistemas fiscais regionais deverá incentivar o
investimento nas Regiões Autónomas e assegurar o desenvolvimento económico e social
respectivo.

A competência legislativa é exercida pelas assembleias legislativas regionais e compreendem


os poderes de: criar e regular impostos, vigentes apenas nas Regiões Autónomas respectivas,
definindo a respectiva incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes,
nos termos da presente lei e; adaptar os impostos de âmbito nacional às especificidades
regionais, em matéria de incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes,
dentro de limites fixados na lei.[32]

As Regiões Autónomas podem criar impostos específicos que visem a tomada em consideração
da valorização de imóveis em virtude da realização de investimentos públicos regionais e
outros que tendam a compensar as maiores despesas regionais decorrentes de actividades
privadas desgastantes ou agressoras dos bens públicos ou do ambiente regional.

Para além dos novos impostos as regiões podem agravar os impostos nacionais até ao limite
de 10%[33] e desagravar o IRS, o IRC e o IVA até ao limite de 30%.[34]

As reduções dos impostos especiais de consumo (bebidas alcoólicas, tabaco e combustíveis)


fazem-se de acordo com a legislação em vigor para cada caso.

Para além destas situações as assembleias legislativas regionais podem conceder deduções à
colecta relativa aos lucros comerciais, industriais e agrícolas reinvestidos. Podem ainda as
assembleias autorizar os governos regionais a conceder benefícios fiscais temporários e
condicionados quando se trate de projectos de investimento significativos[35].

2.3.3.7. Competências Administrativas Regionais

No capítulo das competências administrativas regionais, as regiões podem criar serviços fiscais
competentes para o lançamento, liquidação e cobrança dos impostos de que são sujeitos
activos. Podem, por outro lado utilizar, a título oneroso, os serviços fiscais do Estado já
existentes nas Regiões Autónomas. A utilização destes serviços acarretará, portanto, o
respectivo pagamento ou então a sua contabilização como transferência.

Esta prática de imputar às regiões a totalidade ou parte dos custos dos serviços fiscais lá
sediados tem variado ao longo dos tempos evoluindo, mais recentemente, para
comparticipações cada vez mais reduzidas.

Ainda segundo o nº 1 do artigo 39º, as competências administrativas regionais, em matéria


fiscal, a exercer pelos governos e administrações regionais respectivas, compreendem: a
capacidade fiscal de as Regiões Autónomas serem sujeitos activos dos impostos nelas
cobrados, quer de âmbito regional quer de âmbito nacional e; o direito à entrega, pelo Estado,
das receitas fiscais que devam pertencer-lhes.
2.3.3.8. Taxas e Preços Públicos Regionais

Segundo o artigo 42º,

"Os governos regionais e as administrações regionais podem fixar o quantitativo das taxas,
tarifas e preços devidos pela prestação de serviços regionais, ainda que concessionados, pela
outorga regional de licenças, alvarás e outras remoções dos limites jurídicos às actividades
regionais dos particulares e pela utilização dos bens do domínio público regional."

2.3.3.9. Património da Região

Segundo o artigo 45º,

"As Regiões Autónomas dispõem de património próprio e autonomia patrimonial, nos termos
da Constituição, dos estatutos político-administrativos e da legislação aplicável."

3. Objectivos, Instrumentos e Financiamento das Regiões Autónomas

Conforme já referido, as transferências previstas na LFRA podem ser classificadas como


regulares e pontuais. As transferências pontuais são de atribuição discricionário e dependem
de ocorrências específicas e de negociações políticas. As regulares são determinadas segunda
fórmulas previamente estabelecidas. É sobre esta categoria de transferências que nos
debruçamos de seguida.

Como se viu, também, a formulação adoptada na LFRA faz depender as transferências


regulares de valores do PIDDAC, dos níveis de população de cada região e de um factor de
correcção.

A LFRA permite que cada região proceda a adaptações nas taxas dos impostos sobre as
pessoas singulares e colectivas.

Conclusão:

Estabeleceram-se marcos importantes na evolução das relações financeiras entre o Governo


Central e os Governos Regionais. Os principais marcos escolhidos foram a aprovação do
Programa de Recuperação Financeira da Região Autónoma da Madeira que introduz
compromissos como contrapartida de benefícios recebidos e estabelece uma primeira
abordagem formal e objectiva à determinação das transferências anuais ao introduzir uma
formula de transferências. Esta formula viria a ser adoptada mais tarde na Lei de Finanças das
Regiões Autónomas, cuja publicação estabelece uma nova fase nas relações financeiras entre
os dois níveis de governo.

Esta nova fase caracteriza-se: pelo alargamento dos instrumentos ao dispor das autoridades
regionais; pela introdução de uma abordagem mais objectiva, embora que facilmente
manipulável, à determinação das transferências; pela assunção, por parte das autoridades
centrais de uma parte do “stock” da dívida acumulada das regiões; pela clarificação de
situações de reforço excepcional das transferências e; pela correcção do nível de
transferências, através da introdução do Fundo de Coesão alimentado em função das
transferências.

A análise da forma como são definidas as transferências leva à conclusão de que não existe
qualquer garantia de que a formulação adoptada promoverá, nas regiões autónomas, o
impacto necessário para a promoção da convergência real, conforme explicitado em alguns
artigos da lei. Conclui-se igualmente que não existe qualquer mecanismo que faça
corresponder as transferências a necessidades de despesa claramente identificadas.

A aplicação da LFRA veio, desde 1999, o primeiro ano em que é aplicada, evidenciar que a
formula especificada não funciona, revertendo-se sempre para a regra de salvaguarda que
estabelece as transferências em cada ano como sendo os valores do ano anterior corrigidos
pela taxa de crescimento das despesas correntes do Orçamento do Estado. Em causa está a
sua sensibilidade à classificação de acções do PIDDAC e o próprio nível desta rubrica do
Orçamento do Estado.

Você também pode gostar