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LADAINHAS DE NOSSA SENHORA

EM PORTUGAL
(Idade Média e séc. XVI)

INTRODUÇÃO

Ladainha, escreve Enrico Cattaneo, «ha il senso generale di


preghiera ed ancor piu quello di supplica d'intercessione. Stilisti-
camente appare come una formola concisa mediante la quale l'as-
semblea Cristiana si unisce alia preghiera dei ministro sacro par-
tecipandone intimamente le sante intenzioni» (').
Esta definição anda longe de nos parecer perfeita, não só por
referir-se unicamente às litanias cristãs e deprecatórias, mas tam-
bém por haver fórmulas concisas de oração em que o ministro sa-
grado e os fiéis comungam intimamente nas mesmas intenções,
sem que por isso haja uma autêntica ladainha. É o caso de certas
jaculatórias rezadas em comum.
Giuseppe De Luca considera ladainhas «talune preci, distin-
te per la loro forma caratteristica di brevissime, successive invo-
cazioni (Sanda Maria; omnes Sancti et Sanctae Dei; ecc.) o sup-
plicazioni (Ut nos adjuvare digneris; ecc.), raccolte e concluse in
gruppi omogenei de identiche ricorrenti implorazioni (ora pro
nobis; libera nos, Domine; te rogamus, audi nos; ecc)» (2).

(1) E N R I C O C A T T A N E O , Litanie, «Enciclopédia Cattolica», 7 (Cidade do Vati-


cano, 1951) 1417.
12) Ó i r s E r r u D K L U C A , Litanie (Cristianesimo), «Enciclopédia Italiana», 21 (Ro-
ma, 1934) 275.
Está quase tudo certo. No entanto, tal definição esquece o
facto de haver litanias em que faltam as implorazioni, ocupando
o lugar destas uma saudação à Virgem Maria, por exemplo, Do-
minus teciim! E a mesma dificuldade podemos opor a Francis
Mershman, que, num artigo da Catholic Encyclopedia, afirma
que as litanias são «a well-known and much appreciated forme
of responsive pétition, used in public liturgical services and in
private dévotions, for common necessities of the Church, or in
calamities» (3).
É com vasta erudição que F. Cabral nos fala das ladainhas
e da sua evolução histórica, acentuando o seu carácter de súpli-
ca ou prece de intercessão. Contudo, nestas colunas atochadas
de documentos, em vão procuramos uma definição perfeita das
ladainhas, que convenha a todas elas e somente a elas (4).
Porquê? Porque basta 1er os textos citados por Du Cange (5)
para nos convencermos de que, já no séc. V, não se conciliavam
as opiniões, acerca do significado real de tal palavra.
Pela nossa parte, julgamo-nos incapazes de apresentar uma
fórmula aceitável para todos, enquanto não se chegar a acordo
sobre o objecto a definir e os seus limites exactos.
Com efeito, há orações que alguns consideram litanias e ou-
tros não. Explica-se tal divergência pela extrema fluidez destas
formas de oração — umas completamente evoluídas e outras em
estado mais ou menos embrionário, se tomarmos como termo de
comparação algumas ladainhas bem definidas dos nossos dias.
Sem querermos realizar o impossível e limitando-nos às lita-
nias plenamente evoluídas, podemos dizer que elas são, na sua
linha essencial, uma série de invocações (Santa Maria! Santa Mãe
de Deus!) e orações deprecativas ou laudativas bastante curtas
(Roga por nós! O Senhor é contigo!) em que a parte mutável pode
ser rezada por quem preside à cerimónia religiosa e a parte fi-
xa (em extensão maior ou menor da ladainha) pode ser repetida
pelo coro ou pelo povo, à maneira de refrém (Da fome, da peste
e da guerra, livra-nos, Senhor! Da morte eterna, livra-nos, Se-
nhor!)
(3) FRANCIS MERSHMAN, Litany, «Catholic Encyclopedia», 9 (Nova Iorque, 1913)
286.
(4) F. C A B R O L , Litanies, «Dictionnaire d'Archéologie Chrétienne», 9 (Paris, 1930)
1540-1571.
(5) D u C A N G E , Glossarium, 5 (Paris, 1 9 3 8 ) 1 2 1 - 1 2 3 .
Uma série de ave-marias não constitui uma ladainha, por-
que falta a diferença duma para outra. Jaculatórias sucessivas e
diversas também não, por faltar o refrém comum a todas elas ou,
pelo menos, a um ou mais grupos. Já não diríamos o mesmo du-
ma série de jaculatórias em parte diferentes e em parte iguais
entre si.
Todas as definições, no entanto, nos parecem precárias, ao
tratarem de coisas vivas. O leitor verá esta hesitação em mais
dum ponto do nosso estudo, derivada da própria hesitação das
coisas inacabadas e como que à procura da forma perfeita. Po-
deremos nós definir uma realidade ainda mal definida?
Encontraremos, por exemplo, uma série de invocações ma-
rianas que abrem por Ave! Apesar de ter uma parte fixa e uma
parte móvel, não seria fácil a sua reza alternada, pelo sacerdote e
pelo povo. E apesar disso, tem muito de ladainha:

Ave, digna!
Ave, Virga!
Ave, fios!
Ave, nubes!
Ave, regina!
Ave, theoteca!
Ave, imperatrix!

Perante estes factos, perguntamos a nós mesmo se não seria


melhor admitir duas espécies de litanias: individuais e colectivas.
Estas podem servir para rezar em comum. Aquelas, não. Se qui-
sermos, poderemos considerá-las incompletamente evoluídas.
Neste caso, a nossa definição de litanias aplicar-se-ia unicamen-
te às colectivas.
Temos a distinguir entre litanias deprecativas, laudativas e
mixtas. Nas ladainhas dos santos predomina esmagadoramente o
elemento deprecativo: S. Pedro, roga por nós! S. Paulo, roga por
nós! Ou então, após o nome de cada santo, tu illum adjuva! Pelo
Papa ...Salvador do mundo, ajuda-o! S. Pedro, ajuda-o! S. Paulo,
ajuda-o! Pelo rei coroado por Deus, a ele a vida e a vitória! Sal-
vador do mundo, ajuda-o! S. Maurício, ajuda-o! S. Sigismundo,
ajuda-o! Pela rainha, a ela a luz e a graça! Luz do mundo, ajuda-
-a! S. Perpétua, ajuda-a! Pelos juízes e pelos soldados cristãos, a
eles a vida e a glória! S. Jorge, ajuda-os; S. Teodoro, ajuda-os!
Cristo vence! Que Deus conserve o Papa! Feliciter! Feliciter! Fe-
liciter! Por muitos anos (6)!
Nas ladainhas de Nossa Senhora, temos frequentemente lou-
vor e deprecação. Damos um título glorioso à Virgem Maria (casa
de ouro, arca do Testamento, porta do céu) para depois acres-
centarmos uma súplica: roga por nós!
Porém, encontrámos um exemplar de ladainha mariana es-
magadoramente laudativa, em que, depois da invocação, o povo
responde com a frase do anjo à Virgem Maria: Dominus tecum!
O Senhor é contigo! No fim de tudo, uma curta oração depreca-
tiva e nada mais. Estamos na presença duma ladainha tipica-
mente laudativa.
Dissemos atrás que nem sempre é fácil dizer, diante de cer-
tos casos concretos, se estamos ou não perante uma ladainha au-
têntica. Esta incerteza vamos encontrá-la em Soror Maria do
Baptista, no Livro da Fundação do Mosteiro do Salvador da Ci-
dade de Lisboa. Na verdade, vemo-la chamar ladainha e, depois,
hino à mesma composição poética, cujo refrém comunica ao con-
junto uma sabor claramente litaníaco: Da nobis quod petimus!
Por este e outros motivos, pedimos ao leitor uma flexibilida-
de igual à do género literário que temos entre mãos.
Onde desencantámos nós as ladainhas marianas adiante pu-
blicadas? Em Livros de Horas e vários manuscritos (iluminados
ou não) da Torre do Tombo, da Biblioteca Nacional de Lisboa,
da Biblioteca Municipal do Porto, da Biblioteca Pública de
Évora, das bibliotecas do Palácio da Ajuda, do Palácio de Mafra
e do Museu Regional de Aveiro; finalmente, em livros impressos
em Portugal, que nomearemos a seu tempo.
Eram ladainhas rezadas em Portugal e no mundo português
(por exemplo, na índia) mas isto não significa que sejam de ori-
gem lusíada. Na maioria dos casos, nem sabemos onde elas nas-
ceram. A sua publicação tende a facilitar um possível estudo de
maior envergadura sobre as litanias marianas e as suas migra-
ções através do mundo.
Arquivamos somente as ladainhas marianas rezadas ou can-
tadas no mundo português, até final do séc. XVI. De duas delas,
conserva-se ainda a música, que também publicamos.

(6) PL.. 138, cols. 889-890.


Estas litanias são muitas e diversas. A todas elas damos um
nome concreto, derivado de qualquer nota mais característica
que as distingue das outras, do autor a que pertencem ou a quem
foram atribuídas, do lugar onde se rezavam ou do manuscrito
donde foram tiradas: Laudes-litanias de Mestre André Dias; La-
dainha do Pseudo-Boaventura; Ladainha do cód. ale. 37; Lada-
inha do Livro de Horas da Rainha D. Leonor; Ladainha peque-
na do Pseudo-Boaventura; Ladainha de Sancta Maria Mater; La-
dainha de transição do devocionário da Ajuda; Ladainha do Do-
minus tecum; Ave!; Hino-ladainha do Mosteiro do Salvador; La-
dainha de Nossa Senhora do Rosário; Ladainha da Sagrada Es-
critura; Ladainha do Ilum. 619, da Biblioteca Municipal do Por-
to; etc.
Não descobrimos nenhum exemplar da litania de Nossa Se-
nhora agora em uso e chamada lauretana, a não ser no primeiro
quartel de seiscentos e daí em diante. Apesar disso, devia re-
zar-se entre nós, a partir do século anterior, embora muito menos
do que hoje em dia. À frente diremos porquê.
Dissemos nós que, depois do séc. XVI, não tratamos nestas
páginas, a não ser por acaso. É tarefa para outros ou para outra
ocasião. Contudo, lançámos mão de impressos e manuscritos des-
ta época mais tardia, para mostrar a longa sobrevivência de cer-
tos tipos arcaicos de ladainhas.
Precisamos da paciência do leitor para o primeiro capítulo.
Talvez lhe pareça inútil. Porém, resolvemos publicar esse bosque-
jo rápido das litanias em geral, porque só neste enquadramento
será fácil situar geogràficamente (permitam-nos a expressão) as
ladainhas de Nossa Senhora, simples ramo duma vasta flores-
cência literária e religiosa. E também devemos compreender a
necessidade do segundo capítulo, sobre a génese das litanias ma-
rianas. Veremos que elas enraízam num estilo e numa atitude in-
terior, influenciando, por seu turno, outros géneros literários.
No final do Auto em pastoril português, Gil Vicente põe al-
guns clérigos a. cantar, diante da imagem da Virgem Maria:

Oo gloriosa senhora d o mundo,


excelsa princesa do ceo e da terra,
formosa batalha de paz e de guerra,
da sancta Trindade secreto profundo,
sancta esperança, oo madre d a m o r ,
ama discreta do filho de Deos,
filha e madre d o senhor dos ceos,
filha e madre d o senhor dos ceos,
alva do dia com mais resplandor.
[ ]
oo cedro nos campos, estrela no mar,
na serra ave feniz, hüa soo amada,
hüa soo sem macula e soo preservada,
hüa soo nacida sem conto e sem par.
oo porta dos paços do muy alto Rey,
camara chea de Spirito Sancto,
janella radiosa d e resplandor tanto
e tanto zelosa da devina ley.
Oo mar de sciencia, a tua humildade
que foy senam porta do ceo estrellado,
oo fonte dos anjos, oo orto cerrado,
estrada do m u n d o pera a devindade.

Senhora do mundo, princesa, segredo da SS. Trindade, mãe


do amor, mãe do Senhor, alva do dia, cedro, estrela do mar, sem
mácula, câmara do Espírito Santo, janela, porta do céu, fonte,
horto cerrado, caminho para Deus — tudo isto vinha também nas
ladainhas da Virgem Maria. Eram invocações que andavam, co-
mo notas de música, na atmosfera piedosa daqueles tempos im-
pregnados de lirismo religioso.

CAPÍTULO I

Preces Litânicas e Ladainhas

Vinham de muito longe, as ladainhas. Os pagãos rezavam


certas preces de forma litaníaca, nas cerimónias de Isis e de Zeus
Sosípolis. Conhecemos, igualmente, a famosa passagem de Lac-
tâncio, no Livro da morte dos perseguidores, contando-nos a vi-
são de Licínio, no séc. IV. Apareceu-lhe, de noite, o Anjo do Se-
nhor e ensinou-lhe uma oração em forma de ladainha, para ele
e os seus soldados rezarem, antes da batalha:
Summe Deus, te rogamus.
Sancte Deus, te rogamus.
O m n e m justitiam tibi c o m m e n d a m u s ,
salutem nostram tibi commendamus,
imperium nostrum tibi c o m m e n d a m u s .
Per te vivimus,
p e r te victores e t felices existimus.
S u m m e sancte Deus, preces nostras exaudi.
Brachia nostra a d te tendimus.
Exaudi, sancte s u m m e D e u s ( 7 ).

D a analogia entre as ladainhas cristãs e as pagãs, concluí-


r a m alguns liturgistas q u e o catolicismo herdara d o m u n d o gre-
co-romano o estilo litànico (o q u e e m si n a d a t e m q u e ver c o m o
dogma). E a propósito das ladainhas q u e principiam Christus vin-
cit, Christus regnat, Christus imperat, Kantorowicz escreve estas
linhas exactas:

T h e hails to the military qualities of Christ with the refrain Chris-


tus vincit have been considered reminiscent of tropes. They are, however,
the laudes Christi proper, the acclamations to Christ and his specified
virtues, which henceforth will b e referred to as the laudatory section. T h e s e
hails, too, can b e traced to the imperial acclamations of later Rome if w e
may trust the Historia Augusta. H e r e we find acclaims to the imperial
virtues, for example:

Alexander Auguste! Di te servent!


Verecundiae t u a e ,
P r u d e n t i a e tuae,
Innocentiae tuae,
Castitati t u a e . . .
Alexander Auguste! Di te servent!
or:
Antonine clemens! Di te servent!
Philosophiae tuae,
Patientiae t u a e ,
Doctrinae tuae,
Nobilitati tuae,
Innocentiae tuae;
Vincis inimicos,
Hostes exsuperas! Di te t u e n t u r ( 8 )!

(7) PL., 7 , col. 2 6 4 . E R N S T H . K A N T O R O W I C Z , Laudes Kegiae. A Study in Litur-


gical Acclamations and Mediaeval Ruler Worship (University of California Press, 1958)
20-21.
(8) lb., 18-19.
E a propósito das acclamationes cristãs, já e m uso pelo me-
nos no see. V, o b s e r v a o m e s m o autor:

The acclamations are the pith of chant and to this nucleus all the
other elements are contributive factors. This acclamatory figure is very
old. Within the Church ritual it is known since the fifth century at the
latest; for example:

Exaudi Christe! Augustino vital


or:
Exaudi Christe! Theodorico vita!
Exaudi Christe! Symmacho vita!

However, this combination was not first created by the Church; it is


considerably older. The vita-acclaim is of indeterminable age, and the
Exm/eh'-invocation is likewise pre-Christian. As in so many rites of the
Church, Christ has replaced the Roman emperor in the invocation. The
imperial form was:

Exaudi Caesar! Delatores ad leonem!


Exaudi Caesar! Speratum ad leonem ( 9 ).

Porém, n e m sempre precisamos de recorrer à tradição impe-


rial de Roma, sobretudo e m ladainhas doutros tipos. Muitas ve-
zes, as ladainhas podiam inspirar-se e m preces similares dos ju-
deus, como a doxologia, a anáfora e os cantos salmódicos. Era
coros e c o m refrém, cantavam-se t a m b é m os salmos 135 e 117,
n u m a procissão, à maneira das l i t a n i a s (10).

Considera-se, justamente, o salmo 135 como modelo de ora-


ção litaníaca, na Bíblia:

Glorificai ao Senhor, porque é bom, porque a sua misericórdia é


para sempre.
Glorificai ao Deus dos deuses, porque a sua misericórdia é p a r a
sempre.
Glorificai ao Senhor dos senhores, porque a sua misericórdia é para
sempre.
O que faz grandes maravilhas só, porque a sua misericórdia é para
sempre.
O que fez os céus com inteligência, porque a sua misericórdia é
para sempre.
(9) lb., 16-17.
F . C A U B O J - , Litanies,
(10) «Dictionnaire d'Archeologie Chrétienne» 9 (Paris, 1930)
1569. Nesta passagem, vem salmo 35, decerto por lapso tipográfico.
O que firmou a terra sobre as águas, p o r q u e a sua misericórdia é
p a r a sempre.
O que fez os grandes luminares, p o r q u e a sua misericórdia é para
sempre.
O sol para presidir ao dia, p o r q u e a sua misericórdia é para sempre.
A lua e as estrelas para presidirem à noite, p o r q u e a sua misericórdia
é p a r a sempre.
O que feriu o Egipto com os seus primogénitos, porque a sua mise-
ricórdia é para sempre.
O que tirou a Israel do meio deles, p o r q u e a sua misericórdia é para
sempre.
Com mão poderosa e braço excelso, p o r q u e a sua misericórdia é
para sempre.
O que dividiu em duas partes o Mar Vermelho, p o r q u e a sua mise-
ricórdia é para sempre.
E tirou a Israel por meio dele, p o r q u e a sua misericórdia é para
sempre.
E precipitou o Faraó e o seu exército no Mar Vermelho, p o r q u e a
sua misericórdia é para sempre.
O que conduziu o seu povo pelo deserto, porque a sua misericórdia
é para sempre.
O que feriu os grandes reis, p o r q u e a sua misericórdia é para sempre.
E matou os reis fortes, p o r q u e a sua misericórdia é para sempre.
A Sehon, rei dos amorreus, p o r q u e a sua misericórdia é para sempre.
E a Og, rei d e Basan, porque a sua misericórdia é para sempre.
E deu a terra deles em herança, p o r q u e a sua misericórdia é para
sempre.
Em herança a Israel, seu servo, p o r q u e a sua misericórdia é para
sempre.
Porque no nosso abatimento se lembrou d e nós, p o r q u e a sua mise-
ricórdia é para sempre.
E nos redimiu d e nossos inimigos, porque a sua misericórdia é para
sempre.
O que dá alimento a toda a carne, p o r q u e a sua misericórdia é para
sempre.
Dai glória ao Deus d o céu, porque a sua misericórdia é para sempre.
Dai glória ao Senhor dos senhores, porque a sua glória é para sempre.

Trata-se, pois, d u m salmo doxológico, cujos versículos termi-


n a m por u m a antífona uniforme, resto d a antiga liturgia judaica
e m q u e o p o v o ia r e s p o n d e n d o às preces d e estrutura litaníaca.

Neste c a s o , porque a sua misericórdia é para sempre e q u i -


vale ao ora pro nobis d a s l i t a n i a s m a r i a n a s a d i a n t e p u b l i c a d a s ,
p a r a n ã o f a l a r m o s d o u t r a s f ó r m u l a s : da nobis quod petimus; Do-
minus tecum!; libera nos, domina; intercede por me; etc..
A este salmo 135 podemos ajuntar o cântico litaníaco dos
meninos de Babilónia:

Anjos do Senhor, bendizei o Senhor,


louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Céus, bendizei o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Águas que estais por cima dos céus,
bendizei todas o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Forças do Senhor, bendizei todas o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Sol e lua, bendizei o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Astros do céu, bendizei o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Chuvas e orvalhos, bendizei o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Ventos, bendizei todos o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos.
Fogos e calores, bendizei o Senhor,
louvai-o e exaltai-o por todos os séculos ( u ) .

O resto segue tudo pelo m e s m o estilo: gelos e neves, noites e


dias, luz e trevas, m o n t a n h a s e colinas, m a r e s e rios, aves do céu,
animais selvagens e rebanhos — bendizei o Senhor, louvai-o e
exaltai-o por todos os séculos!

Os primeiros cristãos, sobretudo de procedência judaica,


conservavam muitos costumes e modos de rezar do Velho Testa-
mento e, através deles, as preces de sabor litânico espalhar-se-
-iam pelo m u n d o católico. N e m falta q u e m veja u m testemunho
deste fenómeno na recomendação de S. P a u l o a Timóteo: «Eu te
rogo pois, antes d e tudo, q u e se f a ç a m súplicas, orações, petições,
acções de graças por todos os homens, pelos reis e por todos os
que estão elevados e m dignidade, para que vivamos u m a vida
socegada e tranquila, e m toda a sorte de piedade e de honesti-
dade» (12).

E m que m o m e n t o exacto o dia se transforma e m noite? É


difícil responder. O m e s m o acontece nos géneros literários — al-
gumas vezes completamente evoluídos, outros ainda a meio ca-
minho, outros cruzados com diferentes formas de expressão, nu-

(11) D a n . . I I I 58-fifi
(12) I T i m . , II, 1 - 2 .
m a espécie de miscigenação fecunda, m a s desorientadora. E as-
sim, vêm-nos ao encontro preces de sabor litaníaco a q u e ainda
não p o d e m o s chamar ladainhas, e m b o r a a repetição de certos qua-
dros rítmicos e o refrém d a fórmula deprecatória nos encami-
n h e m nesse sentido. É o que notamos no sábado santo d a liturgia
moçárabe onde, a cada u m a d a s lições, sucedia u m a oração lita-
níaca, c o m o diácono a anunciar a intenção das preces. N ã o se
trata d u m a ladainha pròpriamente dita, m a s lembra-nos u m pou-
co o seu e s t i l o (13).

Depois desta litania de intenções, vazadas e m moldes inva-


riáveis, seguia-se a ladainha dos santos, c o m Nossa Senhora à
cabeça:

Sancta Maria Ora pro nobis.


Sancta Dei genitrix Ora pró nobis.
Sancta Virgo virginum Ora pró nobis ( M ).

F a m o s a entre todas e de grande repercussão na I d a d e M é -

dia é a prece litaníaca Dicamus omnes, talvez da autoria d o p a p a

Gelásio (t 496):

Dicamus omnes Kyrie eleison.


Domine Deus omnipotens patrum nostrorum.
Kyrie.
Respice de caelo et de sede sancta tua.
Kyrie.
Pro Ecclesia tua sancta catholica quam conservare digneris.
Kyrie.
Pro papa nostro illo et sacerdotio ejus.
Kyrie.
Pro universis episcopis cuncto clero et populo.
Kyrie.
Pro fâmulo tuo illo imperatore, et famula tua impératrice, et omni
exercitu ejus.
Kyrie.
Pro civitate hac omnibusque habitantibus in ea.
Kyrie.
Pro aerum temperie, et fecunditate terrarum.
Kyrie.
Libera nos qui liberasti filios Israel.
Kyrie.

(13) PL., 8 5 , cols. 4 4 8 - 4 5 8 .


(14) Ib., c o l . 4 6 1 .
In manu forti et brachio excelso,
Kyrie.
Exsurge Domine adjuva nos, et libera nos propter nomen tuum.
Kyrie Kyrie Kyrie (15).

A o atentarmos nestas orações, sentimos, como nunca, a quase


impossibilidade de achar u m a definição perfeita de ladainha, en-
quanto não concordarmos na realidade ou conjunto de realida-
des de características c o m u n s a definir. Q u a n t o a nós, parece-nos
q u e o Dicamus omnes constitui u m a litania, embora de tipo pri-
mitivo.

O estilo litânico nas suas repetições rítmicas e na acumu-


lação das invocações, nascidas d u m estado emocional, é fácil d e
verificar neste fim da Vida de S. Bernardo, e m português de qua-
trocentos:

Oliva speciosa, vide fructuosa, palma florida, cedro multiplicada, pia-


tano exaltada, vaso d e scolhimento, vaso de honra em a casa d e Deus,
vaso forte de ouro, ornamento d e toda pedra preçiosa, afortificado d e fe
e santidade e d e desvairadas karismas asy como pedras preçiosas orna-
do... (")

Todos e s t e s l o u v o r e s a S. B e r n a r d o d e Claraval b e m p o d i a m
aplicar-se a Nossa Senhora. E se n ã o constituem u m a litania prò-
priamente dita, perpassa neles o seu estilo. Este transcendia as
ladainhas e invadia muitas preces cheias de emoção, tornando-
-se por vezes difícil d e t e r m i n a r q u a n d o temos diante de nós u m a
ladainha perfeita ou simplesmente u m a ladainha e m formação. É
o que verificamos no Conto de Amaro, q u a n d o este e os seus
companheiros, no meio do mar, «começarõ de chorar m u y forte-
m ë t e e a chamar pella gloriosa virgê Maria, m a d r e de Ihesu
Christo: rraynha coroada dos altos ceeos, q u e se c h a m a estrella
d o mar, meezinha dos peccadores, castello forte e basticido d e
todo bem, vogada dos mizquinhos filhos d e E v a maldicta, oo
porto de saúde, rremedio dos q u e a n d a m e m periigos, coroa nobre
das virgêes, frol preciosa de boo odoor, esperança dos coytados,
tu es nobre e fremosa, tu es m a d r e e esposa d o Rey dos angos,
tu es fonte de bondade, tu es l u m e dos mizquinhos q u e a n d a m

(15) F . C A B R O L , Litanies, « D i c t i o n n a i r e d ' A r c h é o l o g i e C h r é t i e n n e » , 9 (Paris, 1 9 3 0 )


1563-1564.
(16) B i b i . N a c . d e L i s b o a , c ó d . ale. 2 0 0 , fl. 7 4 .
e m nas teebras, tu es precioso gualardam daquelles q u e te serve,

tu polia tua sancta virtude nos saca deste t a m g r a m periigo» (17).

Temos, aqui, u m a série d e invocações à Virgem Maria, c o m

a súplica final: Livra-nos deste tão grande perigo! P o n h a m o s es-

tas palavras após cada u m a das invocações e teremos u m a ladai-

nha acabada.

E m latim, encontramos várias preces, c o m os m e s m o s versos


no fim ou no c o m e ç o de cada estrofe, à maneira de refrém, u m a
súplica q u e se repete o u u m grito d e aflição levantado para Deus.
Vemos isso n u m a prece penitencial de Gottschal de Orbais:

O Deus, miseri
miserere servi;
ex q u o enim me jussisti
h u n c in m u n d u m nasci,
p r a e cuntis te amavi
vanitate pasci;
heu, quid evenit mihi!

O Deus, miseri
miserere servi;
tu me, D o m i n e , fecisti,
u t servirem tibi;
ego miser te dimisi
et l o n g e abivi;
heu, quid evenit mihi!

O Deus, miseri
miserere servi;
t u m e q u o q u e redemisti
de jugo servili,
et ego te non agnovi
nec a d t e redivi;
heu, quid evenit mihi!

O Deus, miseri
miserere servi;
m a n d a t a , q u a e praecepisti,
proli dolor, reliqui,
fateor voce lugubri,
nimium deliqui;
heu, quid evenit mihi!

" (17) T o r r e d o T o m b o , c ó d . ale. C Ç L X V I . fls. H 2 v . - 1 1 3 . Cf t a m b é m A Vida de


Saneio Amaro, p u b l i c a d a p o r O t t o K l o b , e m « R o m a n i a » 3 0 ( 1 9 0 1 ) 5 0 9 . A V,da de
Sancto Amaro o u Conto de Amaro abrange as p p . 507-518.
O Deus, mtseri
miserere servi;
a l m a m legem, q u a m dedisti,
d e n i q u e neglexi
et illa, q u a e vetuisti,
avide dilexi;
heu, quid evenit mihi (18)!

E a oração vai-se alongando por mais quinze estrofes, todas


elas c o m a prece inicial: Ó Deus, compadece-te deste pobre ser-
vo! É u m a prece litânica, e m q u e o pecador expõe os seus peca-
dos — e de cada vez suplica a misericórdia de D e u s e lamenta a
sua sorte, s e m p r e c o m a m e s m a s palavras.

Orações deste tipo surgem ainda no inglês arcaico d o séc.


X I V e XV, e m q u e o refrém fecha, por vezes, cada u m a das es-
trofes c o m u m verso latino sempre igual (19).

Atrás já v i m o s u m a prece constituída por u m a série de lou-


vores à SS. Virgem, c o m a súplica somente no fim, ao m o d o de
q u e m primeiro busca captar a simpatia d u m a pessoa para no
final lhe pedir qualquer coisa. Apresentamos, agora, outro exem-
plo:

D E V O T A O R A T I O A D B E A T A M V I R G I N E M MARIAM

D e p r e c o r te, domina mea, m a t e r Dei, pietate plenissima, summi regis


filia, m a t e r gloriosíssima, m a t e r orphanorum, consolatrix desolatorum, via
errantium, salus in te sperantium, virgo a n t e p a r t u m , virgo post p a r t u m ,
virgo in p a r t u , fons misericordie, fons salutis et gratie, fons pietatis et leti-
cie, fons consolationis et indulgentie ut intercedas pro me, f â m u l o tuo»,
etc. (»).

E m suma, o q u e nos parece caracterizar o estilo litânico é


a repetição, a insistência. Repetem-se as m e s m a s palavras supli-
cantes ou insiste-se n u m louvor e noutro e noutro, até cansar.

A l g u m a s vezes, as orações litânicas eram u m pouco compli-


cadas; noutros casos, bastante simples; às vezes reduziam-se a

( 1 8 ) F . J. E. RABY, The Oxford Book of Medieval Latiu Verse (Oxford, 1959)


122-123, n.° 91.
(19) CARLETON BROWN, Religious Lyrics of the XlVth Century (Oxford, 1 9 2 4 )
234-237, n.° 132; IDEM, Religious Lyrics of the XVth Century (Oxford, 1 9 3 9 ) 1 0 5 - 1 0 9 ,
N.° 7 0 71, 72, 73.
(20) B i b i . P ú b l . d e É v o r a , m s . C X X I V / 2 - 1 4 , fls. 3 1 v . - 3 2 .
u m a série d e invocações, implorando misericórdia. Basta recordar

a Precatio ad Christum, metida entre as obras de Alcuíno:

Miserere, Domine, miserere, Christe.


Tu misericórdia mea, miserere mihi.
Miserere, Domine, miserere, Christe, ut credam in te.
Miserere, Domine, miserere, Christe, ut cognoscam te.
Miserere, Domine, miserere, Christe, ut diligam te.
Miserere, Domine, miserere, Christe, ut sperem in te.
Miserere, Domine, miserere, Christe, ut anima mea vivat in te.
Miserere, Domine, miserere, Christe, ut caro mea exsultet in te.
Miserere, Domine, miserere, Christe, ut vita mea proficiat in te.
Miserere, Domine, Deus Pater, gloria mea, vita mea.
Miserere, Christe Salvator, salus mea, fortitudo mea.
Miserere, Spiritus Paracletus, consolatio mea, illuminatio mea.
Miserere, Domine, Deus Trinitas et Unitas.
Te laudo, te adoro, te confiteor.
Pax mea, spes mea, laus mea, lux mea.
Pulchritudo mea, beatitudo mea.
Tibi laus, tibi gloria, tibi gratiarum actio Semper ubique in saecula
sempiterna (21).

D o m e s m o tipo, temos a oração tantas vezes r e c o m e n d a d a

p o r S. I n á c i o d e L o i o l a , m a s j á c o n h e c i d a a m p l a m e n t e n a primeira

m e t a d e d o séc. X I V — u m a espécie de litania-sequência q u e

R e m y d e G o u r m o n t introduz gostosamente n u m capítulo sobre

as ladainhas (22):

Anima Christi, sanctifica me.


Corpus Christi, salva me.
Sanguis Christi, inebria me.
Aqua lateris Christi, lava me.
Passio Christi, conforta me.
O bone Jesu, exaudi me.
Intra tua vulnera absconde me.
Ne permittas me separari a te.
Ab hoste maligno defende me.
In hora mortis meae voca me
Et jube me venire ad te,
U t cum sanctis tuis laudem te
In saecula saeculorum. Amen ( a ) .

(21) PL., 101, cols. 6 4 9 - 6 5 0 .


(22) R E M Y D E G O U R M O N T , Le latin mijstique ( P a r i s , 1 9 3 0 ) 166.
(23) E s t a o r a ç ã o a p r e s e n t a v a r i a n t e s d e m a n u s c r i t o p a r a m a n u s c r i t o . N o Livro de
E q u e diremos d u m a p e q u e n a série de louvores d a SS. Vir-
gem, a começar por Ave? Se não admitimos as litanias puramente
individuais (como propusemos atrás) temos de admitir ao menos
q u e se trata d u m a ladainha embrionária, onde c h a m a m o s a Nossa
Senhora serva da SS. T r i n d a d e , esposa d o Espírito Santo, m ã e de
Jesus Cristo, irmã dos anjos, promessa dos profetas, rainha dos
patriarcas, mestra dos evangelistas, mestra dos apóstolos, confor-
tadora dos mártires, fonte e plenitude dos confessores, honra das
virgens, consoladora dos vivos e dos mortos:

SALUTATIO AD V I R G I N E M MARIAM

Ave, ancilla Trinitatis.


Ave, preelecta Dei patris.
Ave, sponsa Spiritus Sancti.
Ave, mater domini nostri Jhesu Christi.
Ave, soror angelorum.
Ave, promissio prophetarum.
Ave, regina patriarcharum.
Ave, magistra evangelistarum.
Ave, doctrix apostolorum.
Ave, confortatrix martirum.
Ave, fons et plenitudo confessorum.
Ave, decus virginum.
Ave, consolatrix vivorum et mortuorum, mecum sis in omnibus tri-
bulationibus et angustiis, necessitatibus et orationibus, amen ( M ).

Desta saudação d u m Livro de Horas, existente na Biblioteca


Pública de Évora, até à ladainha b e m estruturada de hoje e m
dia, vai a distância indefinível q u e separa u m h o m e m feito d u m
rapaz crescido, m a s q u e não é ainda u m ser adulto. Mas, e m
a m b o s temos a m e s m a pessoa, a nota temperamental t a m b é m
não difere e a linha de r u m o vital segue, nos g r a n d e s traços, u m a
direcção única e dominante. E de facto, n u m Livro de Horas da
Biblioteca d o Palácio de M a f r a vemos essa distância transposta
audaciosamente (25).

Horas do rei D. Duarte, f l . 3 6 1 , a l g u n s versos, p o r e x e m p l o , d i f e r e m l i g e i r a m e n t e d o


texto acima transcrito:
in hora mortis voca me
et pone me juxta te...
(24) B i b i . P ú b l . d e É v o r a , c ó d . C X X I V / 2 - 1 4 , f l . 2 1 5 - 2 1 5 v .
(25) B i b i . d o P a l á c i o d e M a f r a , I I - 7 1 - 6 - 1 1 , fls. 1 5 6 - 1 5 8 v . T r a n s c r e v e r e m o s adian-
te e s t a l a d a i n h a .
As ladainhas propriamente ditas (sobretudo dos santos e de
Nossa Senhora) variavam de terra para terra e de século para
século. C a d a país e cada geração gostava de invocar os santos
d o seu t e m p o e d a sua pátria. Porém, c o m o os Livros de Horas e
obras devotas emigravam de nação para nação e serviam d e
modelo para os copistas, muita gente rezava por ladainhas es-
trangeiras (se p o d e m o s c h a m a r estrangeira qualquer coisa q u e
seja católica). O Livro de Horas do rei D. Duarte, e m b o r a traga
as armas de Portugal, n a d a t e m de extraordinário quanto à
ladainha dos santos, igual a tantas outras q u e se rezavam e m
terras longínquas E m compensação, as Horas de Nossa Se-
nhora, e m medievo-português, do ilum. 4 da Bibi. Nac. de Lis-
boa, t ê m u m carácter mais português, pela língua e pela ladai-
nha. Nesta, c o m efeito, entre santos de vários povos, descobri-
mos, S a m Nuno e Sam Giraldo ("), nomes difíceis de encontrar
e m devocionários d e além-fronteiras, sobretudo o primeiro ( ).

Havia t a m b é m u m a grande diferença no n ú m e r o dos santos


invocados. Se as Litaniae Carolinae ( ® ) ostentam u m a lista b e m
superior à dos nossos dias, as Litaniae de sanctis patribus ( )
revelam u m a profusão ainda maior, c o m mais de 270 nomes de
bem-aventurados, entre eles Abel, Enoch, Noé, Macário, Sereno,
Pacómio, Pafnúcio, etc.

Q u a n t o à ladainha dos santos, d o Missal de Mateus ( ), e

s e m dúvida mais curta do q u e a dos nossos dias. E já q u e nos

referimos à variedade das ladainhas, poderíamos recordar a de

Aries (52), c o m o seu q u ê d e épico na sua concepção, à maneira


J3
das laudes e das acclamationes ( ).

(26) E x i s t e n t e n a T o r r e d o T o m b o , fls. 3 0 2 v . - 3 0 9 v .
( 2 7 ) B i b i . N a c . d e L i s b o a , i l u m . 4, f l . 8 5 v . ,
2 8 S e m f a l a r d o s Livros de Horas, c f „ p a r a l a d a i n h a s d o s s a n t o s , PL., 101, cols.
5 2 2 - 5 2 4 , 6 4 9 - 6 5 0 ; 1 3 8 , cols._ 8 8 5 - 9 0 2 ; 143, cols. 3 6 5 - 8 6 6 , e t c .

(30) í £ ' c o I s . ' 8 8 9 - 8 9 8 . S o b r e l a d a i n h a s d o s s a n t o s c f . t a m b é m MAURICE COKNS


Les plus ande,mes litanies de Stavelot, «Analecta Bollandiana», , 5 (Bruxelas, _ 1957)
5 - 1 6 , I B K M , Les saints vénérés à Huy d'apres un psautier recemment rapatneetle
MartyroloRe de la Collégiale, «Analecta Bollandiana», / 8 (Bruxelas, 1 9 5 8 ) 3 1 6 - 3 3 5 ,
IDEM Les litanies bavaroises du «Libellus Precum» dit de Fleury (Orléans Ms. 184),
«Analecta Bollandiana», 7 7 (Bruxelas, 1959) 373-391.
(31) D a p r i m e i r a m e t a d e d o s é c . X I I . A c t u a l m e n t e n a B i b i . P u b l . d e B r a g a .
( 3 2 ) PL., 138, cols. 8 8 9 - 8 9 0 .
(33) M u i t o p a r e c i d a s à s Litaniae Arelatenses, s ã o a s Litaniae Meteres Lccleswe
Bellovacensis. C f . PL., 1 4 3 , cols. 8 6 5 - 8 6 6 e p r i n c i p a l m e n t e E R N S T H . K A N T O R O W I C Z ,
Laudes Regiae. A Study in LitúrgicaI Acclamationes and Mediaeval Ruler Worship
' U n i v e r s i t y of C a l i f ó r n i a P r e s s , 1958) ( 1 5 - 1 7 , 1 6 7 - 1 6 8 , e t c .
Além das ladainhas de todos os santos e de Nossa Senhora,
havia muitas outras. P l u m m e r transcreveu t a m b é m e traduziu
para inglês as litanias irlandesas d a confissão, do Salvador, d e
Jesus, dos santos irlandeses, da SS. T r i n d a d e , da criação, etc. (M).
E e m Portugal?

Nascidas provavelmente na Península Ibérica, as preces li-


taníacas pelos mortos estenderam-se depois às terras d a Aqui-
tânia, conforme u m manuscrito d o séc. X.

Ce sont des textes p o u r les morts ou p o u r les jours d e pénitence, sorte


de litanie récitée p a r le célébrant, à laquelle le p e u p l e r é p o n d p a r u n e
invocation variable: Christe redemptor, veniam ei concede, ou bien-, O Jesu
bone, tu illi parce, ou encore: Deus miserere.
C e sont, partout, des litanies avec refrain; elles n'ont pas trouvé p l a c e
dans les livres romains, mais on les rencontre d a n s des livres portugais
postérieurs à la supression d u rite h i s p a n i q u e (35).

E ainda possuímos u m fragmento musical d u m a ladainha


desta espécie, cantada e m Braga, nos começos d o séc. XII, e m
M
letra visigótica influenciada pelos livros franceses ( ). Só gosta-
ríamos de saber se foi o u não c o m tal música que os portugueses
dos mares das índias cantavam as ladainhas de Nossa Senhora.

Mais tarde, até final d e quinhentos (para não falarmos d e


tempos posteriores) várias foram as ladainhas rezadas entre nós,
afora as litanias dos santos, de Nossa Senhora e dos agonizantes.

P o n d o de parte u m a oração litaníaca ao Coração de Jesus,


aparecida n o Tratato da Criaçam do Mundo e dos Mysterios da
nossa Redempção ( L i s b o a , 1 5 5 2 ) , s o b f o r m a d e aspirações, c o m o
d i z o a u t o r (37), b a s t a f i x a r - n o s n a o b r a d o P . " I n á c i o M a r t i n s , S. J . ,

(34) CH. PLUMMER, Jrish Litanies, «Henry Bradsshaw Society», 62 (Londres,


1925).
(35) SOLANGE CORBIN, Essai sur la musique portugaise au Moyen Age (Paris
1952) 323.
(36) lb.,327 e fotogravura II.
(37) JORGE D A S I L V A , Tratado da Criaçam do Mundo e dos Mysterios de nossa
Redempção (Coimbra, 1 6 7 7 ) , 1 6 5 - 1 7 6 . Transcrevemos a l g u m a s dessas aspirações:
O h coração d e Jesu, dulcíssimo esposo d a m i n h a a l m a , já estivera
n o i n f e r n o s e vos n o m f ô r e i s .
O h coração d e Jesu, ferido por meus amores.
O h coração d e Jesu, arca d o grão Noe, recolhei esta m i n h a alma;
em vos estará segura d o diluvio d a s muitas agoas.
O h coração d e Jesu, cofre d a Santíssima T r i n d a d e .
O h c o r a ç ã o d e J e s u , f i t o d e a l m a s s a n c t a s , q u e m a vos a t i r a n ã o
errará o alvo d e sua salvação.
Litaniae Sacrosantae Eucharistiae, et dulcissimi Nominis Jesu,
ac Spiritus Sancti Paracliti ex sacra scriptura collectae. I s t o é, três
ladainhas coligidas dos textos da Sagrada Escritura: ladainha d a
SS. E u c a r i s t i a , l a d a i n h a d o N o m e de Jesus e ladainha d o Espírito
Santo. Imprimiram-se e m Lisboa, no ano de 1592.

Finalmente, e m Littaniae
1600, quibussaíam e m Paris as
peccator per invocationem singularum personarum Sanctissimae
Trinitatis pro peccatis suis a Deo misericordiam deprecatur —
d o franciscano Fr. Diogo Carlos.

A proliferação pujante das ladainhas explica-se, e m parte,


pelo seu carácter emocional e simples. Correspondiam a u m a
necessidade íntima das massas, sobretudo q u a n d o rezadas ou
cantadas e m c o m u m , e e r a m fàcilmente acessíveis às inteligências
mais rudimentares. E m frases curtas, entusiásticas e suplicantes,
o povo tinha ali u m a sequência veemente de jaculatórias, c o m o
denominador c o m u m da (tende
prece final piedade de nós!) ou
do m e s m o louvor: o Senhor é contigo!
Além disso, u m a tradição secular e a prática constante d o
clero e dos fiéis tinha-as enraizado a p o u c o e p o u c o nos hábitos
e no coração de toda a gente.

Nas calamidades públicas, nas funções litúrgicas, e m certas


festas d o ano ou q u a n d o a l g u é m morria, a ladainha erguia-se
naturalmente, c o m o a prece do povo, simples, veemente e cheia
de ritmo. Era fácil rezar assim, c o m a procissão a desenrolar-se
pelos caminhos, c o m o nos cercos e clamores das terras norte-
nhas ( 38
) e nos ladairos trágicos e m q u e os fiéis se r e f u g i a v a m nas
grandes a f l i ç õ e s (39).

E m 572, n o segundo concílio bracarense, ordenava-se que,


no princípio d a quaresma, «reunindo-se as freguesias vizinhas
durante três dias e percorrendo as igrejas dos santos, c a n t a n d o
salmos, celebrem as ladainhas» (40). E através dos séculos, na fo-
me, na peste e na guerra, para a f u g e n t a r o s l o b o s (41), i m p l o r a r a
chuva benéfica, debelar a moléstia das searas ou pedir a b ê n ç ã o

d e D e u s p a r a os campos, o p o v o p u n h a - s e e m m a r c h a , c o m o clero

( 3 8 ) A L I I . V I E I R A B R A G A , Curiosidades de Guimarães. Cercos e Clamores (Braga,


1943) 34-35.
(39) V I T E R B O , Elucidário, 2 ( L i s b o a , 1 8 6 5 ) 5 0 , e m Ladalro.
(40) C a p . 9 d a s a c t a s d o m e s m o c o n c í l i o .
( 4 1 ) D U C A N G B , Glossarium, em Rogationes.
à frente, e as súplicas sucessivas, u m a após outra, erguiam-se
para o céu misericordioso.

Assim, na sexta-feira santa de 1199, diz o Livro da Noa de


Santa Cruz de Coimbra q u e o sol e s c u r e c e u , mais negro do que o
pez, e as estrelas e a lua apareceram no céu. Q u a n d o n o v a m e n t e
surgiu a luz, ajuntou-se n a igreja d e S a n t a C r u z u m a e n o r m e mul-
tidão de gente aterrorizada a gritar e m alta voz, à espera da
morte, e a implorar a misericórdia divina. Então, alguns religio-
sos do mosteiro, e m b o r a c o m dificuldade, conseguiram cantar o
Te Deum e as ladainhas, para q u e D e u s perdoasse a todos — e
D e u s teria enviado u m sinal maravilhoso (4Z).

Após a batalha de Aljubarrota, o senado d a C â m a r a de Lis-


boa determinou várias procissões e m acção de graças. U m a delas
dirigia-se a Santa Maria d a Graça, na véspera da festa da Assun-
ç ã o . H a v i a s e r m ã o , s e t e m i s s a s c a n t a d a s e m h o n r a d o s sete goivos
da Virgem Maria e , t a n t o n e s t e d i a c o m o n o s d o i s a n t e c e d e n t e s ,
c a n t a v a - s e a Salve Regina com a Ladainha na Seé e nas outras
Igrejas (43).
D. Luís Pires, arcebispo de Braga, na segunda m e t a d e
d e quatrocentos, procurava evitar certos desvios dos clamores
através dos campos, encaminhando-os para as igrejas, mosteiros
e santuários, e proibindo aos padres que, nessas ocasiões, cele-
brassem missa nos descampados: «E se acõteçer q u e ajam de
fazer alguúas proçissoões, d e f e n d e m o s e m ã d a m o s q u e nõ v a a m
aas dietas proçissoões ou clamores aos mõtes nê aos outros seme-
lhãtes lugares. M a s vaão aas egrejas e moesteiros e santuarios q u e
som lugares pera orar e ally clame e orem a Deus» (44).

O povo gostava de rezar as litanias, sobretudo e m m o m e n -


tos de aflição, e a Igreja dava-lhe o exemplo. N a agonia dos mo-
ribundos, por exemplo q u a n d o D. Afonso, filho d e D. João II,
estava para entregar a alma a Deus, junto de Santarém «com
todalas Ordeês e Clerezia e c o m Cruzes e Reliquias, se fez hüa
m u y solepne e devota procissam, e m q u e todos descalços e mui-

(42) ANTÓNIO CAETANO DE SOUSA Provas da História Genealógica, 1 (Lisboa,


1739) 378-379.
( 4 3 ) J o s é S O A R E S DA S n . V A , Collecçam de documentos com que se autorizam as
memórias para a vida delrey D. João I , 4 ( L i s b o a , 1 7 3 4 ) 3 6 6 .
(44) B i b i . P ú b l . d e B r a g a , m s . 8 7 1 , Constituições de D. Luís Pires, publicadas
e m 1 4 7 7 : Constituiçõ XLIII, que nõ celebrem missa nos canpos e nas praças, mas
dentro nas egrejas, nem vaão cõ proçissoões nê cõ clamores aos mõtes, etc.
tos nuus, c o m m u y piedosas lagrimas a n d a r a m per todalas Igrejas

e Moesteiros da Villa, e m q u e continoada e devotamente c o m os

giolhos e m terra e c o m vozes q u e r o m p i a m o C é o deziam todos

braadando: Senhor Deos misericórdia. E aa Ladainha q u e cho-

rando cantavam, e por elle se dezia, c o m lagrimas e saluços, res-

p o n d i a m todos homês e molheres, velhos e moços e mininos: Ora

pro eo»
Bastam estes exemplos, pois trata-se d u m a verdade histórica

q u e n i n g u é m põe e m dúvida.

c a p í t u l o ii

Génese e variedade das Ladainhas Marianas

C o m o nasceram as litanias d a SS. Virgem? R e m y de Gour-


mont escreveu, neste sentido, páginas bastante sugestivas C6).
N a verdade, muitos trechos de S. Bernardo e doutros escritores
m a r i a n o s ("), certas sequências e algumas poesias litúrgicas re-
vestem-se d u m tal a s p e c t o q u e nos l e m b r a m as ladainhas, tantos
são os títulos laudativos d a SS. V i r g e m acumulados e m piedosa
procissão, muitos deles iguais aos das litanias marianas. Assim
acontece nesta sequência d a festa d a Assunção, por A d ã o d e
S. V í t o r , n o séc. XII:

Salve, Mater Salvatoris,


Vas electum, vas honoris,
Vas coelestis gratiae.

Ab aeterno vas provisum,


Vas insigne, vas excisum
Manu sapientiae.

(45) RUY DE PINA, Croniqua delrey Dom Joham II (Coimbra, 1950) 136-137

(Cap.^50).^^ M G O U R M O N T . Le Latiu Mystique ( P a r i s , 1930) 1 6 2 - 1 8 2 .


( 4 7 ) C f . H I P Ó L I T O M A R R A C I , Polyanthea Mariana (Colónia, 1 7 1 0 ) . E u m e n o r m e
dicionário d e invocações d e Nossa Senhora, tiradas dos Santos Padres e dos autores
medievais.
Salve, Verbi sacra parens,
Flos d e spinis, spina carens,
Flos, spineti gloria.

Nos spinetum, nos peccati


Spina sumus cruentati,
Sed tu Spinae néscia.

Porta clausa, fons hortorum,


Cella custos unguentorum,
Cella pigmentaria.

Cinnamomi calamum,
Myrrham, thus et balsamum,
Superas fragrantia.

Salve, decus virginum,


Mediatrix hominum,
Salutis puerpera.

Myrtus temperantiae,
Rosa patientiae,
Nardus odorífera.

T u convallis.
Terra non arabilis,
Quae fructum parturiit.

Fios campi, convallium


Singulare lilium,
Christus ex te prodiit.

T u coelestis paradisus
Libanusque non incisus,
Vaporans dulcedinem.

T u candoris et decoris,
Tu dulcoris et odoris
Habes plenitudinem.

T u thronus es Salomonis,
Cui nullus p a r in thronis
Arte vel materia.

E b u r candens castitatis,
Aureum fulvum, charitatis
Praesignant mysteria (48).
(48) P L . , 196, cols. 1502-1503.
M ã e do Salvador, vaso d e honra, flor s e m espinhos, porta
fechada, medianeira, rosa d e paciência, n a r d o odorífero, flor c a m -
pestre, trono d e S a l o m ã o — t u d o isto e m u i t o mais é N o s s a
Senhora.

Será necessário copiar esta sequência até ao f i m ? M u i t o gos-


taríamos, p o r q u e o resto confirma o q u e já dissemos: M a r i a é
mais brilhante d o q u e a lua, m ã e d e piedade, triclínio d a SS. Trin-
dade, estrela do m a r — títulos estes q u e tornaremos a ver nas
ladainhas adiante publicadas. E por toda a parte a m e s m a cor-
rente de lirismo p e r f u m a d o , c o m o u m a pradaria florida a on-
dular ao vento.

Às vezes, as estrofes r e d u z e m - s e a u m simples conjunto ri-


m a d o d e belas c o m p a r a ç õ e s e n o m e s cheios d e simbolismo atri-
buídos à V i r g e m Maria, c o m u m verbo, d e longe e m longe, a
ligar a piedosa sucessão d e títulos marianos, alguns deles tirados
d a Sagrada Escritura:

Virga, virgo, nuncuparis,


Templum, vas, sacrarium,
Porta clausa, lux solaris,
Coeli luminarium.
Rubus ardens, madens vellus
Gedeonis area,
Fons signatus, ferax tellus,
Granum sine palea.
Gemma, jubar, lac, talentum,
Spes et laus prophetica,
Cinnamomus, ros, unguentum,
Quo f u g a n t u r toxica.
Gutta, nardus, mel, pigmentam,
Radix aromatica,
Palma, palmes, pavimentam,
Piscina probatica.
Botrus, uva, favus, hortas,
Thalamus, triclinium,
Arca, navis, aura, portas,
Luna, lampas, atrium.
Vitrum, urna, claustrum, cella,
Domus, aula, civitas,
Fios, fenestra, lúmen, stella,
Sol, aurora, claritas.
Tu columba, tu columna,
Tu vitta coccinea,
Tu es altrix, tu alumna,
Tu Engaddi vinea (49).

Acrescentemos, agora, u m ora pro nobis, no fim de cada


verso e ficamos c o m u m a ladainha de Nossa Senhora, à maneira
das antigas, isto é, a t u l h a d a s de títulos e b e m longe da simplici-
d a d e actual. E foi o q u e aconteceu. Insensivelmente, almas pie-
dosas vazaram todo este material mariano nos moldes d a ladai-
nha vulgar dos santos e assim nasceram as primitivas litanias
da M ã e de Deus.

Alguns Livros de Horas traziam a adaptação d o Te Deum


laudamus a Nossa Senhora — u m a composição de certa beleza
atribuída a S. Boaventura: Te Matrem Dei laudamus... A d a d a
altura, o cântico desprende-se m o m e n t â n e a m e n t e das raízes anti-
gas. Bastaria suprimir o Tu e acrescentar u m ora pro nobis a cada
título de louvor, para termos os versículos d u m a p e q u e n a ladai-
nha mariana:

Tu angelorum domina.
Tu scala celestis regni et glorie.
Tu thalamus sancte Trinitatis.
Tu archa pietatis et gracie.
Tu vena misericordie.
Tu mater et sponsa regis eterni.
Tu templum et sacrarium Spiritus Sancti ac tocius beatissime Trini-
tatis triclinium.
Tu mediatrix Dei et hominum, amatrix mortalium, reparatrix celes-
tium, illumimatrix fidelium, agonizatrix pugnantium, advocatrix pauperum,
miseratrix et refugium peccatorum, erogatrix munerum, superatrix et timor
demonum superborum.
Tu mundi domina, celi regina, post Deum sola spes nostra.
Tu salus invocancium, portus naufragancium, miserorum solacium,
refugium penitentium.
Tu mater omnium beatorum, gaudium plenum post Deum omnium
civium supernorum.
Tu protetrix justorum, congregatrix errancium, promissio patriarcha-
rum, ventas prophetarum, preconium apostolorum, magistra euvangelista-
rum, fortitudo martirum, exemplar confessorum, honor et festivitas vir-
ginum (50).

(49) FREI F O R T U N A T O D E S . B O A V E N T U R A , Commentariorum de Alcobacensi Ma-


nuscriptorum Bibliotheca Libri Tres ( C o i m b r a , 1827) 3 2 .
(50) T o r r e d o T o m b o , Livro de Horas do rei D. Duarte, fls. 109-110. Conser-
Alguns destes títulos laudativos vamos encontrá-los e m vá-

rias ladainhas. E se agora quiséssemos fazer mais uma, seria b e m

fácil:

Senhora dos anjos, roga por nós.


Escada celeste do reino e da glória, roga por nós.
Tálamo da Santa Trindade, roga por nós.
Arca de piedade e de graça, roga por nós.
Veio de misericórdia, roga por nós.
Mãe e esposa do eterno rei, roga por nós.
Templo e sacrário do Espírito Santo e triclínio de toda a beatíssima
Trindade, roga por nós.
Medianeira d e Deus e dos homens, roga por nós.
Amante dos mortais, roga por nós.
Reparadora dos bem-aventurados, roga por nós.
Iluminadora dos fiéis, roga por nós.
Defensora dos que lutam, roga por nós.
Advogada dos pobres, roga por nós.
Misericórdia e refúgio dos pecadores, roga por nós.
Despenseira das graças, roga por nós.
Vencedora e terror dos demónios soberbos, roga por nós.
Senhora do mundo, roga por nós.
Rainha do céu, roga por nós.
Nossa única esperança depois de Deus, roga por nós.
Salvação dos que te invocam, roga por nós.
Porto dos naufragantes, roga por nós.
Consolação dos desgraçados, roga por nós.
Refúgio dos penitentes, roga por nós.
Mãe d e todos os bem-aventurados, roga por nós.
Alegria plena, depois de Deus, de todos os habitantes d o céu, ro-
ga por nós.
Protectora dos justos, roga por nós.
Reunidora dos desviados, roga por nós.
Promessa dos patriarcas, roga por nós.
Verdade dos profetas, roga por nós.
Pregão dos apóstolos, roga por nós.
Mestra dos evangelistas, roga por nós.
Fortaleza dos mártires, roga por nós.
Exemplar dos confessores, roga por nós.
Honra e alegria das virgens, roga por nós.

C o m o se vê, n a d a tão fácil c o m o fazer u m a ladainha, à base


da literatura piedosa da I d a d e M é d i a e isto explica o grande
n ú m e r o de litanias marianas q u e encontramos no nosso cami-

vamos, aqui e nos outros lugares, a ortografia dos d o c u m e n t o s transcritos, substituindo


u n i c a m e n t e o u e o i p o r t! e j, q u a n d o t ê m o s e u v a l o r .
nho. Qual delas foi a primeira? É impossível responder, por en-
quanto, pois e m b o r a exista uma, n u m manuscrito do séc. XII,
não sabemos se haveria outras anteriores, dado o relativo atraso
neste género de investigações.

Q u a n t o à ladainha lauretana (assim c h a m a m o s à q u e reza-


m o s no nosso tempo) e m b o r a não se c o n h e ç a b e m a sua origem,
apresenta caracteres relativamente modernos, c o m o veremos.
A o ser aprovada oficialmente e m 1587, era já o resultado d u m a
longa evolução e temos de atender à existência anterior das suas
irmãs mais velhas. M e s m o o n o m e de ladainha lauretana ou d o
Loreto não corresponde, rigorosamente, à verdade histórica, pois
naquele santuário rezavam-se t a m b é m outras, e m b o r a esta viesse
a triunfar definitivamente.

N o final do séc. XIX, o jesuíta Ângelo de Santi publicava


u m a série de estudos, sob o título geral de Le Letanie Laure-
tane (5I). Refundidas e aumentadas, estas páginas saíram depois
e m v o l u m e (52). Mais tarde, e m 1909, A. de Santi voltou ao mes-
m o assunto (") e pôde, assim, levar a cabo u m a obra fecunda e m
resultados, e m torno das ladainhas de Nossa Senhora, antigas e
modernas. N ã o foi, é certo, o único a explorar, então, estes mares
mais ou menos d e s c o n h e c i d o s (M). P o r é m , fê-lo c o m segurança e
muitas das suas conclusões continuam a ser válidas, passados
tantos anos.

A l g u n s escritores, diz-nos ele, a f i r m a v a m c o r a j o s a m e n t e n a d a


saber da origem da ladainha lauretana. Outros recuaram o seu
nascimento até ao séc. X I I I ou ainda mais atrás. A crítica histó-
rica, no entanto, parece demonstrar a sua origem recente: pri-
meiros anos d o séc. X V I ou, q u a n d o muito, final d o séc. X V (55).
Antes desta época e t a m b é m durante ela, floresciam ladainhas

(51) Â N G E L O I>F. S A N T I , Le Letanie Lauretane, «Civiltà Cattolica». série 1 6 . 8


( R o m a , 1 8 9 6 ) 5 4 2 - 5 5 7 ; ib., s é r i e 16, 9 ( R o m a , 1 8 9 7 ) 1 6 1 - 1 7 8 5 2 7 - 5 4 3 ; ib., s é r i e 16,
10 ( R o m a , 1 8 9 7 ) 3 6 - 5 0 .
(52) Le Letanie Lauretane ( R o m a , 1 8 9 7 ) . T r . f r a n c e s a : Les Litanies de la Sainte
Vierge ( P a r i s , 1 9 0 0 ) ; t r . a l e m ã : Die Lauretanische Litanei ( P a d e r b o r n , 1 9 0 0 ) .
( 5 3 ) Â N G E L O D E S A N T I , Per la Storia delle Litanie Lauretane, «Civiltà Cattolica»,
4 ( R o m a , 1909) 3 0 2 - 3 1 3 .
( 5 4 ) S A U R E N , Die Lauretanische Litanei ( K e m p t e n . 1 8 9 5 ) ; S I C K I N O , Twee litanien
der H. Maagd, « D e K a t h o l i c k » ( L e i d e n , 1 9 0 0 ) 3 2 9 - 3 3 6 ; G A S S , Das Alter der laureta-
nischen Litanei, «Strassburger Diõcesanblatt», (Estrasburgo, 1 9 0 1 ) 2 6 4 - 2 6 8 ; J . H .
S C H Ü T Z , Die Geschichte der Rosenkranzes unter Berücksichtigung der Rosenkranz-Ge-
heimmisse und Marien-Litaneien (Paderborn, 1 9 0 9 ) ; etc.
( 5 5 ) Â N G E L O D E S A N T I , Le Letanie Lauretane, «Civiltà Cattolica», série 1 6 8
( R o m a , 1896) 5 4 5 e ss.; ib., s é r i e 16, 9 ( R o m a , 1 8 9 7 ) 1 6 1 e ss.
marianas doutros tipos, algumas justamente classificadas de pré-
-lauretanas, p o r já a p r e s e n t a r e m u m a acentuada semelhança c o m
a ladainha de hoje e m dia.

Esta, c o m o já dissemos, era u m a das várias ladainhas e m


uso no santuário de Nossa Senhora de Loreto. O primeiro do-
cumento que, c o m absoluta certeza, nos informa sobre u m a la-
dainha determinada q u e se cantava naquela igreja, aos sábados e
nas vigílias e festas d e N o s s a Senhora, acha-se entre as obras m u -
sicais d e ConstanzoLitaniae Deiparae Virginis Moriae ex
Porta:
Sacra Scriptara depromptae. Quae in Alma Domo Lauretana
omnibus diebus sabbati, Vigiliarum et Festorum eiusdem Beatae
Virginis decantari solent. Cum musica octo vocum Constantii Por-
tae eiusdem Almae Domus Musicae Magistri. V e n e z a , 1 5 7 5 .
O m e s m o texto surge, no ano seguinte, n u m a obra intitu-
lada Cause et Rimedii delia Peste (*) e n o l i v r o d e C i r i l o B e r -
n a r d i n o , a r c i p r e s t e d e L o r e t o : Trattato sopra 1'historia delia Santa
Chiesa et Casa delia gloriosa Madonna Maria Vergine di Lo-
reto ( " ) . T r a t a - s e d a s Litaniae Deiparae Virginis ex Sacra Scrip-
tura depromptae, quae in alma Domo lauretana omnibus diebus
Sabbathi, Vigiliarum et Festorum eiusdem Beatae Virginis de-
cantari solent. P o i s b e m , t a l l a d a i n h a n ã o é a q u e a g o r a r e z a m o s
e G. Candiotti, n u m a carta para o papa, a 5 de Fevereiro de 1578,
chama-lhe lettanie moderne Portugal levou-a para a Ín-
d i a (59), p e l o menos nos começos de seiscentos. Porém, logo de-
pois desta ladainha, no livro de Cirilo, d e s c o b r i m o s a litania lau-
retana de agora — o q u e prova o uso simultâneo de várias la-
dainhas, e m b o r a só u m a viesse a triunfar d u m m o d o universal.

Para falarmos c o m franqueza, interessam-nos principal-


m e n t e as velhas ladainhas da Virgem Maria, hoje totalmente es-
quecidas, c o m o os fósseis misteriosos das espécies desaparecidas.

O texto mais antigo d u m a ladainha de Nossa S e n h o r a foi p u -


blicado por Mone, nos Hymni
latini medii aevi ( F r e i b u r g , 1 8 5 4 ) ,
t i r a d o d u m m a n u s c r i t o d o s é c . X I I : Letania de domina nostra Dei
genitrice virgine Maria. Oratio valde bona. Cottidie pro quacum-

(56) M a c e r a t a , 1576.
(57) M a c e r a t a , 1576.
( 5 8 ) Â N G E L O D E S A N T I , LC Letanie Lauretane, «Civiltà Cattolica», série 16. 9
( R o m a , 1897) 167.
( 5 9 ) P." T O M Á S E S T Ê V Ã O , Doutrina Christam em Lingoa bramaria Canarim (Ra-
c h o l , 1 6 2 2 ) fls. 6 2 - 6 4 v .
que tribulatione recitanda est (60). A b r e pelo habitual Kyrie elei-
son e seguem-se as invocações das três pessoas da SS. Trindade,
m a s ampliadas: Pater de eelis Deus, qui elegisti Mariam semper
virginem, miserere nobis. D e p o i s , c h a m a m o s p e l a V i r g e m M a r i a ,
a m o n t o a n d o o s s e u s l o u v o r e s , a n t e s d e c a d a ora pro nobis:

Sancta Maria, porta celi, introitus paradisi, sacrarium spiritus sancti,


ora pro nobis.
Sancta Maria, stirps patriarcharum, vaticinium prophetarum, sola-
tium apostolorum, rosa martirum, predicatio confessorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, spes humilium, refugium pauperum, portus naufra-
gantium, medicina infirmorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, imperatrix reginarum, salvatrix animaram, ora pro
nobis.
Sancta Maria, lucidissima maris S t e l l a , salus mundi, ora pro nobis.
Sancta Maria, claritas celorum, destructio inferorum, restauratio et
t m u n d a t i o celi et terre, ora pro nobis.

À maneira da ladainha dos santos, t a m b é m aqui surgem sú-

plicas vazadas quase e m moldes iguais:

Ut ecclesiam suam sanctam pacificare, custodire, adunare et regere


dignetur benedictus ventris tui fructus, ora mater virgo Maria.
U t nostram congregationem et fainiliam omnesque amicos, familiares
nostros custodire et benedicere dignetur benedictus ventris tui fructus, ora
mater virgo Maria.
Ut cunctum populum christianum precioso sanguine suo redemptum
conservare et in die judicii redimere dignetur benedictus ventris tui fruc-
tus, ora mater virgo Maria.
Ut cordis compunctionem uberemque fontem lacrimaruin nobis im-
pendat benedictus ventris tui fructus, ora mater virgo Maria.
Ut animas omnium parentum et propinquorum nostrorum omnium-
q u e nobis commissorum et omnium fidelium defunctorum ab omni an-
gustia penarum et miseriarum liberare dignetur benedictus ventris tui fruc-
tus, ora mater virgo Maria.
Ut nos exaudire dignetur benedictus ventris tui fructus, ora mater
virgo Maria.
Fili matris virginis Marie, te rogamus audi nos.
Agne Dei, filius matris virginis Marie, qui tollis peccata mundi, parce
nobis domine.
Agne Dei, fios virginis Marie, qui tollis peccata mundi, miserere
nobis.
Kyrie eleison, Christe eleison, Kyrie eleison.

Pesadas e complexas, as ladainhas deste tipo custavam a

(60) ÂNGELO DE SANTI. Vie Lauretanische Litanei ( P a d e r b o r n , 1900) 5 8 - 6 2 .


fixar e l e v a v a m m u i t o t e m p o a rezar. Outras apareceram, ainda
semelhantes a estas, m a s já m e n o s sobrecarregadas. P o r é m , o pas-
sado custa a largar e surgem, d e v e z e m q u a n d o , longas e p e n o -
sas invocações. A i n d a assim, q u e diferença e m t u d o o mais!:

Sancta Dei genitrix, intercede por nobis.


Sancta virgo virginum, intercede pro nobis.
Sancta Maria excellentissima, intercede pro nobis.
Sancta Maria beatíssima, intercede pro nobis.
Sancta Maria omni lande digníssima, intercede pro nobis.
Sancta Maria clementíssima, intercede pro nobis.
Sancta Maria, benigníssima consolacio ad te confugentium, interce-
de pro nobis (61).

D o séc. XIII ou c o m e ç o d o séc. XIV, ficou-nos a ladainha


d u m códice d a Biblioteca d e S. M a r c o s d e Veneza, relativamente
perfeita pela c o n d e n s a ç ã o das formas invocatórias e pelo alija-
m e n t o de r e d u n d â n c i a s mais ou m e n o s inúteis:

Sancta Maria, Dei genitrix, adjuva me.


Sancta Maria, mater Christi sanctissima, ora pro me.
Sancta Maria, virgo virginum, ora pro me.
Sancta Maria, Dei genitrix et virgo, ora pro me.
Sancta Maria, mater innupta, ora pro me.
Sancta Maria, mater inviolata, ora pro me.
Sancta Maria, virgo perpetua, ora pro me.
Sancta Maria, gratia Dei plena, ora pro me (62).

E assim por diante, u m versículo (permitam-nos o termo)


depois do outro e, no fim, u m a curta oração. O s q u a d r o s d a la-
dainha dos santos, q u e vimos n a litania d o séc. XII, desapare-
ceram, ou antes, ficaram reduzidos ao mínimo.

N ã o falamos, aqui, d a ladainha do Pseudo-Boaventura, por


dela escrevermos adiante. Apesar d a sua p e s a d e z antiga, longa
foi a sua vida — talvez devido ao prestígio d o n o m e q u e a apa-
drinhava. Este facto e a existência d e ladainhas mais ou m e n o s
arcaicas, nos manuscritos portugueses d o séc. XVI, levam-nos a
não tirar conclusões apressadas, acerca d o q u e o p o v o ou a gente
dos claustros gostava ou n ã o gostava d e rezar. H a v i a ladainhas
para todos os feitios, cremos nós.

(61) Ib., 6-3.


(62) Ib. 70.
E m b o r a nascidas, primariamente, da devoção particular de
alguns fiéis, as ladainhas marianas foram-se espalhando pela
Cristandade e o povo rezava-as nas grandes calamidades, sobre-
tudo q u a n d o a peste ceifava impiedosamente vilas e cidades.
N u m incunábulo da Biblioteca Casanatense, lemos u m a refe-
rência segura e antiga sobre a recitação pública das ladainhas
da SS. V i r g e m , por ocasião das epidemias: Orationes devote con-
tra imminentes tribulationes et contra pestem. Incipiunt letanie
heate Marie virginis (63).
Veneza acabou por adoptar o uso litúrgico d e tais ladainhas,
nas procissões a pedir chuva e b o m t e m p o ou contra as doenças
desvastadoras. Porém, já antes, n u m códice da segunda m e t a d e
de quatrocentos, descobrimos notícias d e ladainhas marianas des-
tinadas a ser rezadas tempore pestis sive epydimie. N a d a prova
q u e Clemente VI (f 1352) fosse o autor desta ladainha. M a s (e
isto é o essencial) rezavam-se pelo menos u m pouco mais tarde,
no séc. XV:

Kyrie, etc.
Sancta Maria, ora pro nobis.
Sancta Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta mater creatoris, ora pro nobis.
Sancta mater Christi, ora pro nobis.
Sancta mater filii Dei, ora pro nobis.
Sancta mater Jesu Christi, ora pro nobis.
Sancta mater salvatoris, ora pro nobis.
Sancta mater misericordie, ora pro nobis.
Sancta mater clementie, ora pro nobis.

O mais vai seguindo no m e s m o tom: m ã e de bondade, m ã e


de justiça, m ã e de equidade, m ã e de piedade, etc. E no fim:

Per filium tuum, libera nos, domina.


Per nativitatem domini, libera nos, domina.
Per baptismum ejus, libera nos, domina.
Per mortem ejus, libera nos, domina.
Per resurrectioncm ejus, libera nos, domina.
Per ascensionem ejus, libera nos, domina.
Per spiritum sanctum, libera nos, domina.
Per assumptionem ejus, libera nos, domina.
Per gaudium, in quo regnas cum filio tuo, libera nos, domina.
Per gaudium, in quo concepisti filium tuum, libera nos, domina.

(63) ÂNGEJ.O DE SANTI, Le Letanie Lauretane, «Civiltà Cattolica» série 16 9


( R o m a , 1897) 5 3 6 .
Per regem celorum Jesum bonum, libera nos, domina.
Per septem gaudia tua, libera nos, domina.
A pressura peccatorum, libera nos, domina.
A cruciatu inferni, libera nos, domina.
A morte eterna, libera nos, domina.
A spiritu immunditie, libera nos, domina.
Ab inquinamento carnis, libera nos, domina.
A cogitatu maligno, libera nos, domina.
A spiritu blasphemie, libera nos, domina.
Ab ruina mortis eterne, libera nos, domina.
A malis operibus, libera nos, domina.
A morbo retundo, libera nos, domina.
In die judicii, libera nos, domina.
Peccator te rogo, audi nos.
Ub nobis parcas, audi nos.
Ut nobis indulgeas, audi nos.
Kyríe, eleison. Christe, eleison. Kyrie, eleison. Pater noster.

OREMUS

Sancta Maria, domina nostra dulcíssima, rogo te per illud gaudium,


quod habuisti, quum angelus tibi apparuit et per illam salutcm q u a te sa-
lutavit. Tu domina exaudire et letificare atque defendere digneris popu-
lum tuum istum ab omni maio et angustia et spetialiter a plaga pestis epy-
dimie. Per Christum dominum nostrum qui tecum vivit et regnat ( M ).

Enfim, saem-nos ao encontro as ladainhas pré-lauretanas —


ponte de passagem entre as litanias antigas e as do nosso tempo,
c o m o certas espécies zoológicas indeterminadas e hesitantes. D e -
las falaremos a seu tempo, ao compará-las c o m algumas do mes-
m o género, rezadas e m Portugal.

C A P Í T U L O III

Laudes-Litanias de Mestre André Dias

Para o beneditino Mestre A n d r é Dias, bispo de Mégara, re-


servamos u m capítulo à parte, e m b o r a pudéssemos introduzir os
seus versos no capítulo e m torno da génese das ladainhas maria-
nas. Procedemos assim, por as suas laudes estarem e m portu-

(64) ÂNGELO DE SANTI Die Lauretanische Litanei ( P a d e r b o r n , 1900) 8 1 - 8 3 .


guês e serem, nos dois casos adiante citados, u m exemplo do uso
do refrém à maneira da resposta do povo, na reza das litanias:
tende piedade de nós ou rogai por nós e ainda salve! ou ave!
D e Fr. A n d r é Dias, da sua vida e das suas obras, já tratá-
mos longamente n o u t r o s l u g a r e s (65). N a s c e u e m 1348, entrou para
a O r d e m de S. B e n t o , g r a d u o u - s e de doutor e m teologia, na Uni-
versidade de Viena de Áustria, percorreu vários países e d e v e ter
morrido depois de 1441.

L e v o u u m a vida complexa e agitada, participou no concílio


de Constança, escreveu, discutiu e entrou na história c o m vários
nomes: André Dias, A n d r é Hispano, A n d r é de Escobar, André
de R e n d u f e e, f i n a l m e n t e , André de Lisboa.

D a s suas obras, isolamos o Livro das Laudes e Cantigas Es-


pirituais, e m gótico de quatrocentos, actualmente na Biblioteca
Nacional de Lisboa (w).

Adaptadas, traduzidas ou influenciadas pelas lodi (laudes)


italianas, as suas cantigas destinavam-se à confraria d o boo se-
nhor Deus Jhesu, n a i g r e j a d e S. D o m i n g o s d e L i s b o a , p a r a ali se-
rem cantadas. Pelo menos, foi esta a intenção do seu autor:

Viinde ora e viinde todos vos outros c o n f r a d e s e servos d a confrarya


d o boo Jhesu, e commygo estes melodyosos cantares, hymnos, prosas e lau-
des, que a q u y em este livro conpiley e escrevy aa honrra do boom Jhesu,
[ c o m ] altas vozes cantade, baylade, d a n ç a d e , orade, tangede, em orgoons,
em atabaques, com trombas, com anafiis, com guytarras, com alaúdes e
com arrabiis, a n t e o seu altar (67).

E m estilo litaníaco, lemos u m a lauda e cantica de Nossa Se-


nhora, c o m o refrém a martelar no fim de cada louvor à Virgem
Maria:

Benedicta sejas tu m a d r e d e D e u s vyvente,


O gloriosa domyna.

Beenta sejas tu m a d r e do senhor regente,


p o r q u e tu pariste o p r e ç o d a h u m a n a i gente.
O gloriosa domyna.

( 6 5 ) M Á R I O M A R T I N S , Laudes e Cantigas Espirituais de Mestre André Dias ( M o s -


t e i r o d e S i n g e v e r g a , 1 9 5 1 ) ; I D E M , Estudos de Literatura Medieval (Braga, 1 9 5 6 ) 3 2 7 -
- 3 4 8 . C f . t a m b é m M a n u e l C a n d a l , S. J., n a i n t r o d u ç ã o a ANDREAS DE ESCOBAR O S.B.
Tractatus Polemico-Theologicus de Graecis Errantibus (Madrid/Roma, 1952). '
(66) Bibi. Nac. d e Lisboa, ilum. 61.
(67) B i b i . N a c . d e L i s b o a , i l u m . 6 1 , fl. 3 ; M Á R I O M A R T I N S , Laudes e Cantigas
Espirituais de Mestre André Dias, 1 7 .
Beenta sejas tu estrella m a t u t i n a ,
oo gloriosa dona,
q u e portaste a nossa luz divyna.
Oo gloriosa domina.

Beenta sejas tu m a d r e d e Jesu Christo,


oo gloriosa dona,
q u e portaste o nosso senhor D e u s m u y t o dulçissimo.
O gloriosa domina.

Benedicta sejas t u sobre toda crcatura,


o gloriosa dona,
q u e p o r t a s t e j i infiinda d e D e u s altura.
O gloriosa domina.

Benedicta sejas tu rosa do parayso,


o gloriosa dona,
p o r q u e per ty foy vençido
o d e m o nosso emmiigo.
O gloriosa domina.

B e n e d i c t a sejas t u das molheres a mayor,


o gloriosa dona,
p o r q u e de ty n a ç e o o q u e he
d e t o d o o m u n d o regedor e governador.
O gloriosa domina.

Benedicto seja o f r u y t o do t e u v e n t r e sanctissimo,


o gloriosa dona,
q u e foy pleno e conprido do Spiritu Sancto gloriosissymo.
O gloriosa domina.

Benedicta sejas tu d e todas as beenções,


o gloriosa dona,
e livranos d e todas as maldições, arnen.
O gloriosa domina. A m e n C68).

C o m o se vê, esta cantiga de Mestre A n d r é oscila entre dois

centros de gravidade, dois poios rítmicos: Bendita sejas e Ó glo-


riosa dona (senhora).

Está cheia de antigos motivos litúrgicos, c o m ecos de hinos


e sequências latinas, além de invocações de ladainhas ou coisa
parecida. E a exclamação final (Ó gloriosa dona!) l e m b r a - n o s
u m a cantiga de Gil Vicente, q u e termina o Anto da Feira:

(68) B i b i . N a c . d e L i s b o a , i l u m . 6 1 , fls. 3 8 v . - 3 9 ; MÁRIO MARTINS, I.audes c Can-


tigas Espirituais de Mestre André Dias, 114-115.
PRIMEYRO CORO
Blanca estais colorada,
virgem sagrada.

E m Belem, vila do amor,


d a rosa naceo a flor,
virgem sagrada.

SEGUNDO CORO
E m Belem, vila d o amor,
naceo a rosa do rosal,
virgem sagrada.

PRIMEYRO CORO
D a rosa n a c e o a flor,
pera nosso salvador,
virgem sagrada.

SEGUNDO CORO
Naceo a rosa do rosal,
D e o s e h o m e m natural,
virgem sagrada (69).

Destinavam-se estas p e q u e n a s estrofes a ser cantadas em


solfa, por dois coros alternados. Por seu lado, a cantiga de Mes-
tre A n d r é Dias podia t a m b é m servir para o m e s m o fim, entoada
alternadamente, imitando a salmodia monacal. E se u m dos coros
só dissesse O gloriosa domina, teríamos u m a p e q u e n a ladainha.
M a s é ainda u m mistério a maneira exacta como os irmãos da
confraria d o B o m Jesus rezavam as laudes e cantigas do bispo
de Mégara, e m b o r a ele as fizesse para serem cantadas.

D e tipo deprecativo, encontramos oraçom, c u j a s e s t r o -


u m a
fes a c a b a m sempre por u m a súplica, o miserere
a lembrar nobis
de certas litanias: havei, agora, senhora, de mim mercê! S i m , q u e
Nossa Senhora se amerceie de nós!

Oo virgem muy sancta,


p o r o teu m u y t o g r a n d e p o d e r ,
ave ora de mijrn merçee (70).

( 6 9 ) G I L V I C E N T E , Obras, ( L i s b o a , 1 5 6 2 ) , fl. 3 7 v .
(70) Aqui, c o m o nos outros lugares, o s u b l i n h a d o é d a nossa responsabilidade.
Oo virgem cortes puella,
m a d r e de D e u s e donzella,
q u e a lüa em sy n o m he tanto bella,
ave ora senhora de mym merçee.

Oo m u y t o clara e lympa fontana,


oo rosa e fructuosa olyva,
q u e a tua graça nunca esquyva
a q u e m te c h a m a com fe conprida,
ave ora de mym merçee.

Oo muyto fremoso lilio,


d a m e senpre boom conselho,
e roga p o r mym ao teu bendito filho
q u e me p e r d o e o meu peccado maledicto,
e porem senhora te r o g o
que ajas de mym merçee.

Oo virgem a n t e do p a r t o
e virgem ê no p a r t o
e virgem depoys do parto,
oo virgem sobre todas as virgeens,
senhora ave ora de mym merçee (71).

Mais u m a vez, pedimos a o leitor p a r a esquecer u m p o u c o a


relativa rigidez das ladainhas dos nossos dias, completamente
evoluídas e sem a flexibilidade perturbadora dos géneros literá-
rios que, nalguns casos, ainda não entraram nos moldes definiti-
vos. Só assim compreenderemos a larga amplitude c o m q u e te-
m o s de acolher formas incompletamente acabadas, a meio cami-
nho entre o ser e o não ser.

O jorro criador das ladainhas alastrava, então, e m tipos di-


versos e livres. N ã o podemos, por conseguinte, adoptar u m cri-
tério rígido para a avaliação e classificação das litanias.

Aliás, já Soror M a r i a d o Baptista, n o s c o m e ç o s d e seiscentos,


passava pela m e s m a dificuldade, c o m o notámos a t r á s (72).

(71) B i b i . N a c . d e L i s b o a , i l u m . 6 1 , f l . 3 8 - 3 8 v ; M Á R I O M A R T I N S , Laudes e Canti-


gas Esjiirituais de Mestre André Dias, 44.
( 7 2 ) S O R O R M A R I A D O B A P T I S T A , Livro da Fundação do Mosteiro do Salvador da
Cidade de Lisboa ( L i s b o a 1618) fls. 1 2 2 - 1 2 5 - v .
C A P I T U L O I V

Ladainha do Pseudo-Boaventura

E m latim, anglo-normando, inglês, francês e galaico-portu-


guês, corria, no séc. XIII, u m milagre antigo de Nossa Senhora,
e m torno d u m m o n g e devoto da Virgem Maria, a q u e m ela curou
maravilhosamente. Afonso o Sábio (t 1284) fala-nos dele, n u m a
das suas Cantigas de Santa Maria ( " ) . M u i t o a m a v a N o s s a S e -
n h o r a e s t e m o n g e sisudo e leterado! À s p o r t a s d a m o r t e , apare-
c e u - l h e a V i r g e m M a r i a , u n g i u - l h e a s chagas e d e i t o u - l h e na boca
et na cara do seu leite. L o g o m u d o u a c a r n e d o r o s t o e d a b o c a ,
como muda penas a andorynna. E i s t o p o r q u ê ? P o r e l e , d e p o i s
d o o f í c i o d i v i n o , c o s t u m a r r e c o l h e r - s e a u m a capela mui peque-
nina, r e z a n d o a l i a s Horas de Nossa Senhora e a l a d a i n h a (et a
ledaninna)!
E m q u e ladainha pensaria Afonso o Sábio, ao escrever os
versos deste milagre? N a de Nossa Senhora, claro, pois referia-se
à devoção do m o n g e para c o m a M ã e de Deus. M a s e m q u e lita-
nia mariana? N ã o sabemos.

U m a das mais antigas litanias marianas rezadas na nossa


Idade M é d i a e de que temos conhecimento certo é a d o Pseudo-
- B o a v e n t u r a , n o c a b o d o Fsalterium majus Beatae Mariae Virgi-
nis (7i). E s t a o b r a e s p ú r i a , c o m o s s e u s 1 5 0 salmos marianos ( c h a -
memos-lhes assim) correu o vasto m u n d o , até aos tempos moder-
nos, e m b o r a depois certas edições substituíssem a ladainha do
75
Pseudo-Boaventura pela dos nossos dias ( ). E m letra da pri-
meira m e t a d e de quatrocentos, vamos encontrar igualmente o
saltério da Virgem Maria e a ladainha pseudo-boaventuriana no
76
Livro de Horas do rei D. Duarte ( ).
Quais as relações entre este saltério e u m a obrinha desapa-
recida de D. João I, q u e parentesco t e m ele c o m u m Livro de
Horas e m medievo-português, cujo estudo temos entre mãos —
tudo isso fica p a r a mais tarde.

(73) A F O N S O o S Á B I O , Cantigas de Santa Maria, 1 ( M a d r i d . 1 8 8 9 ) e a n t . 5 4 .


(74) S. B O A V E N T U R A , Opera Omnia, 1 3 (Veneza, 1 7 5 6 ) 2 3 2 - 2 6 0 .
(75) Fsalterium B. Virgini. Mariae ( L i s b o a , 1 6 9 7 ) . M a n d a d o e d i t a r segunda vez
por Manuel Ribeiro, 283-288.
( 7 6 ) T o r r e d o T o m b o , Livro de Horas do rei D. Duarte, fls. 2 3 5 c ss.: Incipit
psalterium beate Marie virginis gloriose.
O q u e nos interessa, neste m o m e n t o , é a ladainha final.

D . D u a r t e rezá-la-ia gostosamente, tanto m a i s q u e sabia latim e

aprendera dos pais a venerar filialmente a SS. Virgem:

LETHANIE DOMINE NOSTRE

Kyrie, eleyson.
Christe, eleyson.
Kyrie, eleyson.
Christe, audi nos.
Pater de celis Deus, Marie virginis gloriosus conditor, miserere nobis.
Fili redemptor mundi Deus, Marie nobilis fecundator, miserere nobis.
Spiritus Sancte Deus, Marie mirabilis obumbrator, miserere nobis.
Sancta Trinitas unus [Deus], qui Mariam glorificas, miserere nobis.
Sancta Maria, que totum m u n d u m illuminas, ora pro nobis.
Sancta Maria, q u e tuos servientes extollis, ora pro nobis.
Sancta Maria, que pro peccatoribus supplicas, ora pro nobis.
Sancta Maria, illuminatrix cordium, ora pro nobis.
Sancta Maria, consolatrix flencium, ora pro nobis.
Sancta Maria, salvatrix pereuncium, ora pro nobis.
Sancta Maria, fons misericordie, ora pro nobis.
Sancta Maria, splendor sancte ecclesie, ora pro nobis.
Sancta Maria, flumen sapiencie, ora pro nobis.
Sancta Maria, a b angelo salutata, ora pro nobis.
Sancta Maria, Spiritu Sancto obumbrata, ora pro nobis.
Sancta Maria, in celis glorificata, ora pro nobis.
Sancta Maria, rosa veris graciosa, ora pro nobis.
Sancta Maria, virgo dulcis sponsa, ora pro nobis.
Sancta Maria, imperatrix amorosa, ora pro nobis.
Sancta Maria, a Deo Patre sponsa electa, ora pro nobis.
Sancta Maria, Verbi Dei mater preelecta, ora pro nobis.
Sancta Maria, a Spiritu Sancto virgo protecta, ora pro nobis.
Sancta Maria, que Deum in utero concepisti, ora pro nobis.
Sancta Maria, q u e Deum in tuis visceribus humanasti, ora pro nobis.
Sancta Maria, que Deum et hominem peperisti, ora pro nobis.
Sancta Maria, virgo virginum signifera, ora pro nobis.
Sancta Maria, virga Yesse christifera, ora pro nobis.
Sancta Maria, arbor vite fructifera, ora pro nobis.
Sancta Maria, feminarum pulcherrima, ora pro nobis.
Sancta Maria, humilium humílima, ora pro nobis.
Sancta Maria, sacrarium sanctissimum Dei, ora pro nobis.
Sancta Maria, super omnes excellencius magnificanda, ora pro nobis.
Sancta Maria, super omnes carius amanda, ora pro nobis.
Sancta Maria, super omnes reverencius celebranda, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater conditoris omnium, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater redemptoris hominum, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater pastoris ovium, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater mundo desiderabilis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater inferis terribilis, ora pro nobis.
Sancta Maria, virgo omnibus amabilis, ora pro nobis.
Sancta Maria, virgo plena gracia, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater plena clemencie, ora pro nobis.
Sancta Maria, pia fundens solacia, ora pro nobis.
Sancta Maria, fios et decor virginalis, ora pro nobis.
Sancta Maria, fluvius sapiencialis, ora pro nobis.
Sancta Maria, splendor et lux orientalis, ora pro nobis.
Sancta Maria, virtutum celi regina, ora pro nobis.
Sancta Maria, domus Dei cypressina, ora pro nobis.
Sancta Maria, celi fenestra cristallina, ora pro nobis.
Sancta Maria, perpetue lucis aurora, ora pro nobis.
Sancta Maria, virgo pulchra et decora, ora pro nobis.
Sancta Maria, dulcis melodia et sonora, ora pro nobis.
Sancta Maria, deliciarum Dei dapifera, ora pro nobis.
Sancta Maria, celestis curie pincerna, ora pro nobis.
Sancta Maria, paradysi porta previa, ora pro nobis.
Sancta Maria, placidum deitatis umbraculum, ora pro nobis.
Sancta Maria, purissimum celestis gracie vasciculum, ora pro nobis.
Sancta Maria, dignum Christi cenaculum, ora pro nobis.
Sancta Maria, virginum nova exultado, ora pro nobis.
Sancta Maria, mulienim prima benedictio, ora pro nobis.
Sancta Maria, miserorum pia consolado, ora pro nobis.
Sancta Maria, vera salus et beatitudo, ora pro nobis.
Sancta Maria, caritatis magnitudo, ora pro nobis.
Sancta Maria, pietatis latitudo, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater orphanorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, mamilla parvulorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, consolatio afflictorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, nobilis regina celorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, cui angeli obediunt et consecrantur, ora pro nobis.
Sancta Maria, cui sancti et sancte congaudent et congratulantur, ora pro
nobis.
Sancta Maria, quam omnia laudant et venerantur, ora pro nobis.
Propicia esto, parce nobis, domina.
Ab omni malo, libera nos, domina.
Ab omni mala temptatione, libera nos, domina.
Ab ira Dei et indignatione, libera nos, domina.
A periculosa desperatione, libera nos, domina.
A superbia precipitante, libera nos, domina.
A luxuria deturpante, libera nos, domina.
Ab avaricia devastante, libera nos, domina.
A peccato ire et invidie cruciantis, libera nos, domina.
A peccato gule et castrimargie (") maculantis, libera nos, domina.

(77) D e v e ser gastrimargie.


Ab incursu hostis raalignantis, libera nos, domina.
Per dulcorem et gaudium Christi incarnationis, libera nos, domina.
Per dolorem et angustiam ipsius passionis, libera nos, domina.
Per gaudium et leticiam ejus resurrectionis, libera nos, domina.
A mortis pavendo discrimine, libera nos, domina.
A judicii districto examine, libera nos, domina.
Ab inferni horribili cruciamine, libera nos, domina.
Peccatores, te rogamus, audi nos.
Ut sanctam ecclesiam, piíssima domina, conservare digneris, te rogamus,
audi nos.
Ut justis gloriam, peccatoribus gratiam inpetrare digneris, te rogamus,
audi nos.
Ut navigantibus portum, peregrinantibus reditum, infirmantibus salutem,
tribulatis consolationem, captivis liberationem impetrare digneris,
te rogamus, audi nos.
Ut fâmulos et famulas tuas tibi devote servientes consolari digneris, te ro-
gamus, audi nos.
Ut cunctum populum filii tui precioso sanguine suo redemptum conservare
digneris, te rogamus, audi nos.
Ut cunctis fidelibus defunctis requiem eternam impetrare digneris, te ro-
gamus, audi nos.
Ut nos exaudire digneris, te rogamus, audi nos.
Mater Dei, te rogamus, audi nos.
Mater caríssima domina nostra, miserere nostri et impetra nobis perpe-
tuam pacem, te rogamus, audi nos.
Per sanctam anunciationcm tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per sanctam descentionem et conceptionem tuam, domine Ihesu Christe
parce michi.
Per sanctam nativitatem tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per sanctum baptismjim tuum, domine Ihesu Christe parce michi.
Per sanctam apparitionem tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per sanctum jejunium tuum, domine Ihesu Christe parce michi.
Per sanctam passionem tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per piissimam mortem tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per crucem tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per sanctam descentionem ad inferos, descendentem et liberantem capti-
vos, domine Ihesu Christe parce michi.
Per sanctam resurrectionem tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per admirabilem ascensionem tuam, domine Ihesu Christe parce michi.
Per Spiritum Sanctum paraclitum, domine Ihesu Christe parce michi.
Per adventum tuum futurum, domine Ihesu Christe parce michi.
Dulcis domina nostra, exaudi oracionem meam et clamor meus ad te veniat.

OREMUS

Ave sanctissima mater Dei, fios et rosa speciei, aurora et lux diei,
dulcedo omnium carismatum, vera salus mundi pereuntis et humani gene-
ris reparatio salutaris, pone, gloriosa domina, super me peccatorem cie-
mentissimum aspectum tuuin, dulcem, pium et gloriosum, radiosum et
amorosum, sicque inebrier gratia quod laudes digneris recipere ex mea
peccatrice lingua. Tu es, enim, vas auri solidum, omni lapide precioso or-
natum, in quo rex angelorum placidum invenit habitaculum et umbra-
culum et reclinatorium amorosum. Tu es, enim, sancte Trinitatis nobile
triclinium preciosumque tabernaculum tante majestati amabile et gracio-
sum. Per te, enim, recreantur infirmi, consolantur gemebundi, resuscitantur
mortui, letificantur dolorosi; tua virtus et gratia confundit inferna, des-
truit peccata, restaurat perdita, letificat celestia, salvat erraneos, dulcificat
angelos, facit ridere celos. O mater pia et omnium gratiarum regina ple-
nissima, precor, per Dei Filium, conceptum t u u m et partum sanctissimum
ac gloriosum, ut amor tuus semper sit in meo corde, lux tua in pectore meo,
dulcedo in mente, devotio tua in anima, laus et jubilatio tua in lingua mea.
Adjuva me in necessitate, sana me in infirmitate, conforta me in adver-
sitate, sis michi solacium in tribulatione, fortitudo in temptatione, dulcedo
in afflictione, lucerna in opere et actione, per te servetur consciência mea,
per te dirigatur vita mea. Mors mea illustretur tua presencia gloriosa.
Egredientetn animam meam defende de manu adversarii, d e potestate
Acherontis et de flamma putei infernalis. Pro me ante thronum Dei sup-
plica, iram judieis demulce, placa tuis precibus, ut eripiar a b omnibus pe-
riculis, tuis meritis conjungi merear angelicis choris, tibi annuente Filio
Dei benedicto, in te pro nostra redemptione incarnato. Qui cum Pâtre et
Spiritu Sancto, in unitate et trinitate perfecta, vivit et régnât laudandus et
glorificandus Deus, per infinita secula seculorum. Amen.
Benedictum sit nomen domini Ihesu Christi et gloriose virginis Marie,
matris ejus, in eternum et ultra. In nomine Patris et Filii et Spiritus Sancti.'
Amen ( re ).

Valerá a p e n a traduzir todas estas invocações cheias d e liris-


m o e súplicas frementes? Talvez não, atendendo ao público para
q u e m se destinam estas páginas. N o entanto vertemos algumas:
Santa Maria, q u e alumias todo o m u n d o ; Santa Maria, q u e exaltas
os teus servos; Santa Maria, q u e intercedes pelos pecadores;
Santa Maria, q u e iluminas os corações; Santa Maria, consola-
dora dos q u e choram; Santa Maria, salvação dos q u e estão a per-
der-se; Santa Maria, fonte de misericórdia; Santa Maria, esplen-
dor da santa Igreja; Santa Maria, rio d e sabedoria; Santa Maria,
saudada pelo anjo; Santa Maria, sobre q u e m baixou o Espírito
Santo; Santa Maria, glorificada no céu; Santa Maria, graciosa rosa
d a primavera; Santa Maria, virgem e doce esposa; Santa Maria,
amorosa imperatriz; Santa Maria, esposa eleita — roga por nós!

E os títulos de louvor seguem-se uns atrás dos outros: vir-


g e m das virgens, vara d a Jessé, árvore da vida, a mais bela das

( 7 8 ) Jb., fis. 2 8 8 v . - 2 9 4 .
mulheres, h u m i l d e entre os humildes, sacrário santíssimo de D e u s ,
m ã e d o Criador, m ã e do Redentor, m ã e d o Pastor, m ã e terrível
para o inferno, virgem cheia d e graça, m ã e cheia d e clemência,
esplendor e luz do oriente, rainha d a s virtudes celestiais, casa d e
D e u s , janela do céu, aurora d a luz perpétua, doce e sonora m e -
lodia, porta do paraíso, primeira b ê n ç ã o das mulheres, piedosa
consolação dos desgraçados, verdadeira salvação e felicidade,
m ã e dos órfãos, seio dos pequeninos, consolação dos aflitos, no-
bre rainha do céu, etc.

M o l d a d a n a ladainha dos santos, esta ladainha encerra igual-


m e n t e u m a série d e súplicas-jaculatórias, para o Senhor nos li-
vrar d e tudo o q u e nesta vida nos a m e a ç a : D e todo o mal, d e todas
as m á s tentações, d a ira divina e d a sua indignação, do desespero
perigoso, d a soberba, d a luxúria, d a desvastadora avareza, d o
p e c a d o d a ira e d a inveja q u e atormenta, do p e c a d o d a gula, dos
ataques d o inimigo maligno — livra-nos, senhora! Sim, livra-nos
— pelas doçuras e alegrias d a e n c a r n a ç ã o d e Cristo, pelas dores
e angústias d a sua paixão, pelo gozo d a sua ressurreição!

O resto segue pelo m e s m o caminho, n u m interesse e c u m é -


nico por t u d o o q u e é cristão: Q u e Nossa Senhora d e f e n d a a
Santa Igreja, p e ç a o p e r d ã o para os pecadores, d ê o porto aos
navegantes, o regresso aos peregrinos, a consolação aos atribula-
dos e a liberdade aos cativos! Q u e ela se d i g n e consolar os servos
e servas consagradas ao seu serviço, q u e ela proteja o p o v o re-
m i d o pelo sangue d e Cristo e c o n c e d a o descanso eterno a todos
os fiéis defuntos!

Depois, voltamo-nos para Jesus. Por todos os seus mistérios,


pelo seu nascimento, pelo seu baptismo, pela sua paixão, m o r t e
e descida aos infernos, pela sua ressurreição e ascensão — q u e
ele nos perdoe! E t a m b é m pela descida d o Espírito Santo e pela
vinda d e Cristo no fim dos t e m p o s — parce michi (perdoa-me)!

A oração final c o n t é m louvores q u e c h e g a r i a m p a r a u m a pe-


q u e n a ladainha: Salve, m ã e d e D e u s , flor, rosa, aurora, doçura,
vaso d e ouro, triclínio d a SS. T r i n d a d e ! E m ti s e alegram os en-
fermos, consolam-se Quando
os tristes e os mortos v o l t a m à vida.
a minha alma partir, defende-a das mãos do inimigo, do poder
de Aqueronte e das chamas do abismo infernal!
Aqueronte, o rio dos infernos — eis u m a reminiscência lite-
«•ária d o m u n d o antigo. Os condenados atravessavam irremedià-
velmente as suas águas amargas e não voltavam mais.

Simplificada, mais curta e c o m u m a oração final diferente e


pequenina, tornaremos a ver esta ladainha do Pseudo-Boaven-
tura, no devocionário d u m a senhora portuguesa quinhentista,
mais leve e mais fácil de rezar (79).

N o entanto, vemo-la florescer ainda na exuberância primi-


tiva, ao longo d o séc. XVI, e foi u m a das que o P.* J o ã o Rebe-
lo, S. J., p u b l i c o u no Rosário de la Sanctissima Virgen Maria Ma-
80
dre de Dios ( ).

C A P I T U L O V

Ladainha do Códice Alcobacense 37

E m letra de duas mãos, dos fins do séc. XIII, este códice


de Alcobaça encerra u m m u n d o de coisas: meditações, orações
e cartas de S. Anselmo de Cantuária (ou a ele atribuídas), o
De anima, de Cassiodoro, u m tratadinho sobre a acentuação dal-
guns nomes latinos, segundo o costume de Cister, páginas e m
torno da c r u z e, p o r fim, u m a misteriosa narrativa marítima: In-
eipit Trezenzonii de solistionis insule magne — e deixamos o la-
tim c o m o está no códice.

Nas folhas preliminares, depois d u m a parte d o índice e d u m a


longa prece, m ã o anónima de quatrocentos acrescentou u m a lita-
nia mariana — mutilada, por ter desaparecido a folha seguinte,
m a s interessante a valer, ao menos pela sua raridade.

A eterna repetição de Sancta mater acentua a sua origem


antiga, embora aqui, c o m o noutras ladainhas, surjam certas invo-
cações que passaram, Sancta
mais tarde, para a litania d o Loreto:
Maria..., Sancta Dei genitrix..., Sancta virgo virginum..., mater
creatoris..., mater salvatoris..., mater Christi..., mater inviolata...,

(79) B i b i . d o P a l á c i o d a A j u d a , m s . 49-1-3, fls. 9 6 v . e ss.


(80) JOÃO REBEI.O, S, J., Rosario de la Sanctissima Virgen Maria Madre de Dios,
2 ( É v o r a , 1599) fls. 2 1 2 v . - 2 1 5 .
mater intemerata... L e m b r a u m p o u c o a l a d a i n h a c o n t r a a p e s t e ,
a t r á s c i t a d a : mater misericordie..., mater glorie..., mater sapien-
tie..., mater scientie..., mater gratie..., mater prudentie..., mater
obedientie..., mater pudicitie..., mater pacientie... Contudo, é
diferente a o r d e m das invocações ( m e s m o q u a n d o correspondem)
e o seu n ú m e r o é muito maior na ladainha alcobacense, apesar
d e truncada.

E m b o r a velha, tal ladainha libertou-se das ramificações inú-


teis, tornou-se leve e podia fàcilmente ser rezada e m coro. Só é
p e n a q u e o resto t e n h a desaparecido, ignorando nós, desta m a -
neira, a sua extensão e a m a n e i r a c o m o terminava.

Mais u m a vez, sentimos aqui a espontaneidade e n o r m e q u e


presidia à f o r m a ç ã o destas longas litanias, c o m os elogios d a
SS. Virgem alinhados uns atrás dos outros, m a s sem o r d e m n e m
método, a não ser no princípio. L e m b r a u m a procissão d e aldeia,
tendo à c a b e ç a o pároco, as confrarias e os anjinhos — m a s a o n d e
o p o v o segue, depois, à vontade, c a d a qual no lugar q u e lhe ape-
tece. Por vezes, temos a ilusão d e q u e a rima u n e os títulos e m
grupos maiores o u menos: pacientie, continentie, reverentie...
O u então (em rimas a l t e r n a d a s ) : rectitudinis, dignitatis, fortitu-
dinis, claritatis... Simples acaso, aliás vulgar e m muitas páginas
d a literatura mística e m latim medieval:

Kyrie, eleison.
Christe, eleison.
Kyrie, eleison.
Sancta Maria, ora pro nobis.
Sancta Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta virgo virginum, ora pro nobis.
Sancta mater filii Dei, ora pro nobis.
Sancta mater creatoris, ora pro nobis.
Sancta mater redemptoris, ora pro nobis.
Sancta mater salvatoris, ora pro nobis.
Sancta mater imperatoris, ora pro nobis.
Sancta mater Christi, ora pro nobis.
Sancta mater Ihesu, ora pro nobis.
Sancta mater salutaris, ora pro nobis.
Sancta mater bonitatis, ora pro nobis.
Sancta mater equitatis, ora pro nobis.
Sancta mater benedicta, ora pro nobis.
Sancta mater perpetua, ora pro nobis.
Sancta mater preclara, ora pro nobis.
Sancta mater speciosa, ora pro nobis.
Sancta mater inviolata, ora pro nobis.
Sancta mater incorrupta, ora pro nobis.
Sancta mater intemerata, ora pro nobis.
Sancta mater incontaminata, ora pro nobis.
Sancta mater immaculata, ora pro nobis.
Sancta mater nimis amanda, ora pro nobis.
Sancta mater nimis laudanda, ora pro nobis.
Sancta mater nimis predicanda, ora pro nobis.
Sancta mater nimis beatificanda, ora pro nobis.
Sancta mater nimis adoranda, ora pro nobis.
Sancta mater nimis benedicenda, ora pro nobis.
Sancta mater misericordie, ora pro nobis.
Sancta mater clemencie, ora pro nobis.
Sancta mater justicie, ora pro nobis.
Sancta mater munditie, ora pro nobis.
Sancta mater concordie, ora pro nobis.
Sancta mater glorie, ora pro nobis.
Sancta mater sapientie, ora pro nobis.
Sancta mater scientie, ora pro nobis.
Sancta mater gratie, ora pro nobis.
Sancta mater prudentie, ora pro nobis.
Sancta mater obedientie, ora pro nobis.
Sancta mater pudicicie, ora pro nobis.
Sancta mater pacientie, ora pro nobis.
Sancta mater continentie, ora pro nobis.
Sancta mater reverentie, ora pro nobis.
Sancta mater discipline, ora pro nobis.
Sancta mater consilii, ora pro nobis.
Sancta mater auxilii, ora pro nobis.
Sancta mater gaudii, ora pro nobis.
Sancta mater refugii, ora pro nobis.
Sancta mater refrigerii, ora pro nobis.
Sancta mater remedii, ora pro nobis.
Sancta mater pietatis, ora pro nobis.
Sancta mater pacis, ora pro nobis.
Sancta mater virginitatis, ora pro nobis.
Sancta mater etemitatis, ora pro nobis.
Sancta mater redemptionis, ora pro nobis.
Sancta mater dulcedinis, ora pro nobis.
Sancta mater benignitatis, ora pro nobis.
Sancta mater luminis, ora pro nobis.
Sancta mater decoris, ora pro nobis.
Sancta mater pulcritudinis, ora pro nobis.
Sancta mater rectitudinis, ora pro nobis.
Sancta mater dignitatis, ora pro nobis.
Sancta mater fortitudinis, ora pro nobis.
Sancta mater claritatis, ora pro nobis.
Sancta mater consolationis, ora pro nobis.
Sancta mater virtutis, ora pro nobis.
Sancta mater dilectionis, ora pro nobis.
Sancta mater filiorum Dei, ora pro nobis.
Sancta mater magnitudinis, ora pro nobis.
Sancta mater fidei, ora pro nobis.
Sancta mater spei, ora pro nobis.
Sancta mater caritatis, ora pro nobis.
Sancta mater salutis, ora pro nobis.
Sancta mater sanctitatis, ora pro nobis.
Sancta mater perfectionis, ora pro nobis.
Sancta mater jocunditatis, ora pro nobis.
Sancta mater benignitatis, ora pro nobis.
Sancta mater sublimitatis, ora pro nobis.
Sancta mater castitatis, ora pro nobis.
Sancta mater remissionis, ora pro nobis.
Sancta mater defenssionis, ora pro nobis.
Sancta mater splendoris, ora pro nobis.
Sancta mater speciositatis, ora pro nobis.
Sancta mater specialitatis, ora pro nobis (81).

M ã e do criador, m ã e d o salvador, m ã e d o redentor, m ã e d o

imperador, m ã e de Cristo, m ã e de bondade, m ã e bendita, m ã e

imaculada, m ã e de misericórdia, m ã e d a luz, m ã e da beleza,

m ã e de consolação, m ã e de fé, esperança e caridade — m ã e e

sempre mãe! E ouvimos, aqui, u m eco largo de toda a I d a d e M é -

dia, e m q u e a Virgem Maria aparece c o m o fonte carinhosa de

todas as graças, a m ã e n.° 1.

C o m o terminaria esta ladainha? A julgar pela citada litania


da peste, d e cujo tipo ela se aproxima, u m a vez acabados os títu-
los d a Virgem Maria, seguir-se-ia a série d e deprecações, e m uso
nas ladainhas dos santos (ou antes, vazadas nos m e s m o s moldes):

Per filium tuum, libera nos domina.


Per nativitatem domini, libera nos domina.
Per baptismum ejus, libera nos domina.
Per mortem ejus, libera nos domina (S2).

( 8 1 ) B i b i . N a c . d e L i s b o a , c ó d . a l e . 3 7 , n a fl. p r e l i m i n a r q u e a n t e c e d e a f l . 1.
( 8 2 ) Â N G E L O D E S A N T I , Die Lauretanische Litanei ( P a d e r b o r n , 1 9 0 0 ) 8 2 - 8 3 .
C A P Í T U L O VI

Ladainha do Livro de Horas da Rainha D. Leonor


Religiosa como era, D. Leonor, mulher de D. João II, reuniu
alguns Livros de Horas, além d u m breviário franciscano, agora
na Colecção Pierpont Morgan, e m N o v a Iorque, erradamente
classificado de Livro de Horas
U m dos Livros de Horas, iluminado a grisalha, pertence à
segunda m e t a d e do séc. X V D e é de tipo flamengo. N o fim,
vemos u m apêndice e m letra diversa, talvez m a n d a d o acrescentar
pela própria rainha.

N a d a prova que fosse António de H o l a n d a o autor deste


Livro de Horas, embora ele trabalhasse, de facto, para a mulher
de D. João II, assi para seu uso e devoção, como para suas ca-
pellas ( 85
). N a capa, por dentro, p o d e m o s ler estas linhas antigas,
c o m a assinatura de FreiEste livro
Luís de S. T i a g o , por baixo:
foi da rainha D. Leonor, não se pode dar de fora so pena de es-
comunhão.
O leitor moderno omitirá de b o m grado o conteúdo destas
páginas, e m l a t i m . A l i á s j á n o s r e f e r i m o s a e l a s (86). Q u a n t o às ilu-
minuras deste Livro de Horas, d e texto e m o l d u r a d o entre filetes a
escuro e ouro, não sucederá tanto assim. Gostará d e olhar para as
maravilhosas figurinhas: U m guerreiro minúsculo e m p u n h a u m a
haste c o m flâmula. N o m ê s de Janeiro, u m h o m e m de idade aque-
ce-se ao fogão, e assim por diante. Macacos mais ou menos có-
micos, dragões, animais ferozes, u m molosso de mitra na cabeça,
cenas da vida m u n d a n a , u m a d a m a a tocar harpa, outra a tocar
ferrinhos, cavalos e cavaleiros, miniaturas de frades e freiras,
u m a caçada ao urso — enfim, toda a vida e toda a fantasia da
Idade Média. Omitamos, porém, tudo isto e p a r e m o s na Letania
de beata Virgine (87), e m letra do primeiro quartel de quinhentos.

(83) R E I N A L D O DOS S A N T O S , Les Principaux Manuscrits à Peintures Conserves en


Portugal, « B u l l c t i n d e la S o c i é t é F r a n ç a i s e d e M a n u s c r i t s à P e i n t u r e s » (Paris, 1950) 18;
A D R I A N O D E G U S M Ã O , Iluminura Medieval. «Arte Portuguesa. Pintura» (Lisboa, s / d ) 1 0 6 .
( 8 4 ) B i b i . N a c . d e L i s b o a , i l u m . 165.
( 8 5 ) G A B R I E L P E R E I R A , Livros Preciosos ( C o i m b r a , 1 9 1 0 ) 1 2 . As palavras trans-
critas são d e Francisco d e H o l a n d a .
(86) M Á R I O M A R T I N S , A Rainha Dona Leonor e os Livros, « B r o t e m » , 6 7 (Lisboa.
1958) 249-257.
(87) B i b i . N a c . d e L i s b o a , i l u m . 165, fls. 1 6 1 - 1 6 2 v . N o m s . v e m Letani, sem po-
d e r m o s s a b e r se e s t á n o s i n g u l a r (letania) ou n o plural (letaniae).
É u m a ladainha pré-lauretana ou, c o m o gostaríamos de cha-
mar-lhe, ladainha de transição, igual à d o outro Livro de Horas,
t a m b é m pertencente à m e s m a r a i n h a (88), segundo parece. Este
é u m volume maneirinho q u e tem, na primeira folha, estas duas
palavras: da rainha. E por baixo, n o v a m e n t e a assinatura de Frei
Luís de S. T i a g o . N o convento da M a d r e de D e u s de Xabregas,
por a rainha entendia-se habitualmente a mulher d e D. João II,
q u e lá v i v e u e morreu, deixando às freiras todos os seus livros.
Pequenino e t a m b é m do séc. X V , as suas iluminuras são, n o en-
tanto, de estilo diverso d a s do Livro de Horas antecedente.

Flores, insectos, aves, u m cachorro, pavões, u m macaco a


tocar saltério, a m a t a n ç a dos Santos Inocentes, duas caveiras.
Nossa Senhora e o M e n i n o Jesus, etc., deixemos tudo isto, para
nos ocuparmos da ladainha, n u m apêndice, e m caracteres dos
89
começos do séc. X V I ( ).
Temos, pois, a m e s m a litania, e m dois apógrafos de igual

valor. Se preferimos o segundo, é por o copista ter aqui revelado

a sua nacionalidade portuguesa, acrescentado à ladainha estas

palavras suplicantes: Em a fim se diga hüa ave maria pollo escri-


vão n . 3 .
Águas d u m a só corrente, a marchar juntas e de igual ma-

neira, n e n h u m a diferença separa as devotas ladainhas, n u m e

noutro Livro de Horas. A n ã o s e r e s t a : Regina predicatorum et


levitarum, n o i l u m . 1 6 5 ; Regina predicatorum e Regina levitarum,
no ilum. 166:

Kyrife], eleyson.
Cfhriste, eleyson].
Kyri[e], eleyson.
Christe, audi nos.
Christe, exaudi nos.
Pater d e celis Deus, miserere nobis.
Fili redemptor mundi Deus, miserere nobis.
Spiritus Sancte Deus, miserere nobis.
Sancta Trinitas unus Deus, miserere nobis.
Sancta Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta virgo virginum, ora pro nobis.
Causa nostre letitie, ora pro nobis.
Mater Christi, ora pro nobis.

(88) Bibi. N a c . d e L i s b o a , i l u m . 1 6 6 . .
(89) P o s s i v e l m e n t e d a m e s m a m ã o q u e e s c r e v e u a l a d a i n h a m a r i a n a d o H u m . 100.
(90) Bibi. Nac. d e Lisboa, ilum. 166, fl. 204v.
Mater inviolata, ora pro nobis.
Mater castíssima, ora pro nobis.
Mater puríssima, ora pro nobis.
Mater intemerata, ora pro nobis.
Mater amabilis, ora pro nobis.
Mater divine gratie, ora pro nobis.
Mater mirabilis, ora pro nobis.
Mater redemptoris, ora pro nobis.
Mater creatoris, ora pro nobis.
Mater salvatoris, ora pro nobis.
Mater humilitatis, ora pro nobis.
Mater obedientie, ora pro nobis.
Mater sanctitatis, ora pro nobis.
Mater prudentie, ora pro nobis.
Mater, cum sanetissimo filio tuo adjuva nos.
Janua regni celorum, ora pro nobis.
Rosa vivifica, ora pro nobis.
Regina celorum, ora pro nobis.
Regina angelorum, ora pro nobis.
Regina prophetarum, ora pro nobis.
Regina apostolorum et evangelistarum, ora pro nobis.
Regina innocentium, ora pro nobis.
Regina martirum, ora pro nobis.
Regina confessorum, ora pro nobis.
Regina monachorum, ora pro nobis.
Regina predicatorum, ora pro nobis.
Regina levitarum, ora pro nobis.
Regina virginum, ora pro nobis.
Regina omnium sanctorum, ora pro nobis.
Speculum justitie, ora pro nobis.
Sedes sapientie, ora pro nobis.
Stella matutina, ora pro nobis.
Spiritus Sancti sacrarium, ora pro nobis.
Turris davidica, ora pro nobis.
Turris ebúrnea, ora pro nobis.
Turris aurea, ora pro nobis.
Virgo suavis, ora pro nobis.
Virgo fidelis, ora pro nobis.
Virgo clementíssima, ora pro nobis.
Virgo pulcherrima, ora pro nobis.
Virgo veneranda, ora pro nobis.
Virgo predicanda, ora pro nobis.
Vas coronabile, ora pro nobis.
Vas redemptionis, ora pro nobis.
Iesu Christe, fili Dei vivi, miserere nobis (91).

(91) lb„ fls. 2 0 3 - 2 0 4 v .


Aparentemente, esta ladainha não coincide c o m n e n h u m a
das litanias pré-lauretanas publicadas por Ângelo de Santi f2).
N o entanto, encerra as m e s m a s invocações do texto c (impresso
primeiramente e m 1503), afora p e q u e n a s e raras variantes. É q u e
existe u m a diferença enorme na ordenação dos versículos (per-
mitam-nos a palavra) de a m b a s as ladainhas. L e m b r a m duas irri-
tantes filas de soldados, c o m os pares quase todos desencon-
trados.

Será necessário pôr e m relevo a semelhança entre esta litania

mariana e a de hoje e m dia e t a m b é m as suas diferenças? M ã e

de humildade, m ã e de obediência, m ã e de santidade, m ã e de

prudência, rainha dos inocentes, rainha dos monges, rainha dos

pregadores, rainha dos levitas, torre de ouro, virgem suave, etc.

— todas estas invocações faltam na litania lauretana q u e se es-

palhou pelo m u n d o .

C A P I T U L O VII

Ladainha pequena do Pseudo-Boaventura

Aqui está u m p e q u e n o códice q u e lembra certas bacias geo-

lógicas, para onde, através dos milénios, as á g u a s carrearam, ca-

m a d a após c a m a d a , os fósseis de espécies desaparecidas. Este

d e v o c i o n á r i o f a l a - n o s já d o p a p a Júlio III (t 1555) e d e v e ser dos

m e a d o s de quinhentos ou u m pouco m a i s t a r d e ("). P o r é m , parte

do seu conteúdo é de cunho anterior, m e s m o bastante arcaico,

e m certos casos.

A m ã o anónima q u e o escreveu fez dele o nosso melhor repo-


sitório manuscrito de ladainhas de Nossa Senhora, n a d a menos
de t r ê s . À p r i m e i r a , c h a m a r - l h e - e m o s ladainha pequena do Pseu-
do-Boaventura. E m b r e v e d i r e m o s p o r q u ê . A s e g u n d a t e r á o n o -
m e d e Sancta Maria Mater ( p o r r e p e t i r e s t a s p a l a v r a s n a m a i o r i a
das suas invocações). A terceira é mais u m a ladainha pré-laure-
tana. E o facto de todas elas pertencerem ao m e s m o devocio-

( 9 2 ) Â N G E L O D E S A N T I , Die Lauretanische Litanei ( P a d c r b o r n , 1900) 106-109.


(93) B i b i . d o P a l á c i o d a A j u d a , m s . 4 9 - 1 - 3 . C f . M A R I D M A R T I N S , O devocionário
inédito duma senhora quinhentista, «Brotéria», 4 9 (Lisboa, 1949) 78-92.
nário prova a coexistência d e vários tipos de ladainha, nascidos
e m épocas diferentes, f e n ó m e n o este q u e c o n v é m não esquecer.
O passado existe no presente e este age no futuro.

V a m o s à primeira ladainha. Q u e r nas invocações (embora


menos numerosas) quer n a o r d e m por q u e estão distribuídas, quer
e m tudo o mais, deriva da litania d o Pseudo-Boaventura, c o m
u m a ou outra variante. Fica-nos a impressão de q u e a l g u é m pe-
gou na ladainha velha e começou a cortar, a resumir e a con-
densar, substituindo e n f i m a efusiva e lírica oração final p o r outra
mais sóbria e maneirinha. E assim nasceu a ladainha pequena do
Pseudo-Boaventura:

Kirie, eleison.
Christe, eleison.
Christe. audi nos.
Pater de cellis Deus. Marte virginis gloriosus conditor, miserere nobis.
í-ili redemptor mundi Deus, Marie nobilis fecundator, miserere nobis.
Spiritus sancte Deus, Marie mirabilis obumbrator, miserere nobis.
Sancta Trinitas unus Deus, qui Mariam glorificas, miserere nobis.
Sancta Maria, que totum m u n d u m illuminas, ora pro nobis.
Sancta Maria, q u e pro peccatoribus suplicas, ora pro nobis.
Sancta Maria, illuminatrix cordium, ora pro nobis.
Sancta Maria, consolatrix flentium, ora pro nobis.
Sancta Maria, salvatrix pereuntium, ora pro nobis.
Sancta Maria, fons misericordie, ora pro nobis.
Sancta Maria, splendor sancte ecclesie, ora pro nobis.
Sancta Maria, flumen sapientie, ora pro nobis.
Sancta Maria, a b angelo salutata, ora pro nobis.
Sancta Maria, Spiritu Sancto obuinbrata, ora pro nobis.
Sancta Maria, in celis glorificata, ora pro nobis.
Sancta Maria, virga Jesse christifera (*>), ora pro nobis.
Sancta Maria, arbor vite fructifera, ora pro nobis.
Sancta Maria, feminarum pulcherriiruv ora pro nobis.
Sancta Maria, humiliurn humílima (95), ora pro nobis.
Sancta Maria, cui saneti omnes congratulantur, ora pro nobis.
Sancta Maria, quam omnes laudant et venerantur, ora pro nobis.
Propicia esto servis tuis, domina.
Ab omni maio, libera nos, domina (96).
Per dulcorem et gaudium t u u m in Christi incamatione, libera nos, domina.
Per dolorem et amaritudinem in ipsius passione, libera nos, domina.

(94) N o m s . , christifira.
( 9 5 ) N o ms., humitia.
, <96) D a q u i p a r a d i a n t e , n o ms., o libera e o te ( d e te r o g a m u s ) c o m e ç a m p o r
maiúscula. I a r a maior uniformidade e t a m b é m por razões de ordem gramatical, mu-
damos para minúscula.
Per gaudium ineffabile de ejus resurrectione, ascensione et Spiritus Sancti
missione, libera nos, domina.
Peccatores, te rogamus, audi nos.
Ut (97) fâmulos tuos tibi devote famulantes consolari digneris, te rogamus,
audi nos.
Mater Dei, te rogamus, audi nos.
Mater Dei caríssima et domina nostra, miserere nobis et impetra nobis
perpetuam pacem. Amen.
Kyrie, eleison.
Christe, eleison.
Kyrie, eleison. .
Pater noster. Et n e nos. Sed libera nos. Ora pro nobis, sancta Dei
genitrix. Ut digni efficiamur promissionibus Christi. Domine exauch ora-
tionem. Et clamor.
OREMUS

Auxilium tuum, domine, nobis propiciatus inpende et, intercedente


pro nobis beata Dei genitrice senper virgine Maria cum omnibus sanctis,
fac nos a b omni maio liberari et in eterna beatitudine cum angelis glo-
riari. Per. Pater noster. Ave maria (98).

Já nos referimos ao facto da coexistência de ladainhas ar-

caicas, geralmente complexas e pesadas, e litanias modernas, a

tender para a simplificação e para a leveza. Esta ladainha peque-


na do Pseudo-Boaventura é u m exemplo típico dessa tendência
para a simplicidade.
Porém, foram necessários muitos anos para este m o v i m e n t o
se impor, porque a tradição t e m u m a grande força e h á sempre
q u e m a prefira às coisas novas, m e s m o superiores e mais fáceis.

C A P I T U L O VIII

Ladainha de Sancta Maria Mater

A repetição arcaica de Sancta Maria, e m cada u m a das invo-


cações, mantém-se ainda na ladainha a q u e c h a m a r e m o s de San-
cta Maria Mater, por quase todos os seus versículos começarem
dessa maneira, na maior parte da litania. Moldada, c o m o tantas
ladainhas marianas, na litania dos santos, n e m por isso é muito

( 9 7 ) N o m s . . Et. „ „
(98) B i b i . d o P a l á c i o d a A j u d a , m s . 4 9 - 1 - 3 , fl. 9 6 v . - 9 7 v .
pesada, como se o tempo e o uso dos fiéis tivessem suprimido
tudo o q u e nela haveria antigamente de exuberante e excessivo:

Kiri[e], eleison
Christe, eleison.
Kirie, eleison.
Sancta Maria, ora pro nobis( M ).
Sancta Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta virgo virginum, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater filii Dei, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater creatoris, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater redenptoris (10°), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater imperatoris, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater Christi, ora pro nobis. —-
Sancta Maria, mater Ihesu, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater bonitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater equitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater benedicta, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater perpetua, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater preclara, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater speciosa (101), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater inviolata, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater incorrupta (102), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater intemerata, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater incontaminata, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater immaculata, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater nimis amanda, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater nimis laudanda, ora pio nobis.
Sancta Maria, mater nimis predicanda, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater nimis beatificanda, ora pro nobis.
Sancta M a r i a , m a t e r nimis benedicenda, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater nimis adoranda, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater misericordie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater clementie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater justicie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater mundicie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater concordie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater glorie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater sapiencie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater sciencie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater g r a d e , ora pro nobis.
Sancta Maria, mater prudencie, ora pro nobis.

(99) N o ms., v e m s o m e n t e ora. T a n t o p o d e s e r ora pro nobis c o m o ora pro me,


p o r q u e a d i a n t e t r a z libera me, domina; dona nobis; miserere nobis; e t c .
(100) N o ms., redentoris.
(101) N o ms., especiosa.
(102) N o ms., incorruta.
Sancta Maria, mater obediencie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater pudicicie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater continencie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater reverencie, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater discipline, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater consilii, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater auxilii, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater gaudii, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater refugii, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater refrigerii, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater remedii, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater pietatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater pacis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater virginitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater eternitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater redenpeionis ( IOi ), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater dulcedinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater benignitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater luminis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater decoris, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater plenitudinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater pulcritudinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater rectitudinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater divinitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater fortitudinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater claritatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater consolationis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater virtutis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater dilectionis ( 1M ), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater filiorum Dei, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater magnitudinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater fidei, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater spei, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater charitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater salutis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater sanctitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater perfeccionis (105), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater jocunditatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater sublimitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater salutationis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater hereditatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater liberationis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater prosperitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater suavitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater sanitatis, ora pro nobis.

(103) No ms., redencionls.


(104) No ms., dileitionis.
(105) No ms., perfeicionis.
Sancta Maria, mater humilitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater gravitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater celsitudinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater protectionis (1C6), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater serenitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater novitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater celestis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater sobrietatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater beatitudinis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater reconciliationis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater retributionis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater exauditionis, ora p r o nobis.
Sancta Maria, mater tuitionis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater perpetuitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater reparationis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater restitutionis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater generositatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater virginum, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater justorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater pupilorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater miserorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater destrictorum (107), ora pro nobis.
Sancta Maria, mater p a u p e r u m , ora pro nobis.
Sancta Maria, mater virtutum regis, ora pro nobis.
O domina angelorum, ora pro nobis.
O regina celorum, ora pro nobis.
O presidium nostrorum, ora pro nobis.
O castitatis lilium, ora pro nobis.
O cela virtutum, ora pro nobis.
O christianitatis remedium, ora pro nobis.
O salutis (*08) comercium (109), ora pro nobis.
O suavitatis initium, ora pro nobis.
O consolatio merentium, ora pro nobis.
O salvatrix nostrorum, ora pro nobis.
O spes desperantium, ora pro nobis.
O scala celorum, ora pro nobis.
O tocius bonitatis exemplum, ora pro nobis.
Per filium tuum, libera me, domina.
Per annuntiationem ejus, libera me, domina.
Per nativitatem ejus, libera me, domina.
Per baptismum (110) ejus, libera me, domina.
Per passionem ejus, libera me, domina.

(106) N o ms., pproteitionis.


(107) N o ms., destreutoTum. É duvidosa a e m e n d a q u e fazemos
(108) N o ms., sdustis.
(109) Devia ser commercium, mas aqui, c o m o noutros lugares, deixamos passar
alguns erros d e ortografia. E r a quase u m a m o d e r n i z a ç ã o ortográfica d o latim.
(110) No ms., bautismum. Bautismo, bautizar, formas arcaicas vulgares.
P e r crucem ejus, libera me, domina.
Per jejunium ejus, libera me, domina.
P e r resurrectionem ( m ) ejus, libera me, domina.
P e r ascensionem (112) ejus, libera me, domina.
Per spiritum paracletum, libera me, domina.
A p o n d e r e peccatorum, libera me, domina.
A cruciatu inferni, libera me, domina.
A subitanea ( U J ) morte, libera me, domina.
A pestilentie malis, libera me, domina.
A spiritu inmunditie, libera me, domina.
Ab i n q u i n a m e n t o camis, libera me, domina.
A cogitatu maligno ( m ) , libera me, domina.
A spiritu blasfemie, libera me, domina.
A malis operibus, libera me, domina.
Ab ira mortis, libera me, domina.
A cecitate cordis, libera me, domina.
Ab omni malo, libera me, domina.
In hora ( U 5 ) mortis, libera me, domina.
In hora ( U 6 ) mortis, sucurre nobis, domina.
In die judicii, libera me, domina.
Peccatores, te r o g a m u s ( U 7 ), audi nos.
U t nos a u d i r e digneris, te rogamus ( U 8 ), audi nos.
Agnus Dei, n a t u s de Maria matre, miserere nobis.
Agnus Dei, d a t u s p e r Nlariam matrem ( n 9 ) , miserere nobis.
Agnus Dei, r e d e m p t o r noster, d o n a nobis pacem.

Vers.: In omni tribulatione et angustia nostra,


Resp.: Sucurre nobis, piissima virgo Maria. Amen.

OREMUS

D e u s qui nos conceptionis, nativitatis, apresentationis, anunciationis,


visitationis, purificationis ac asuncionis (120) b e a t e Marie senper virginis
gaudia recolendo letificas, concede nobis, quesumus, sic ejus laudibus digne
insistere et earn venerare et a m a r e in terris q u o d p e r ipsam et c u m ipsa
g a u d e r e m e r e a m u r in celis. P e r d o m i n u m ( m ) .

Se pusermos de parte o nome de Maria, ficando s6mente

(111) N o ms., resurectionem.


(112) N o ms., ascenssionem.
(113) N o ms., subbitanea.
(114) N o ms., maglino.
(115) N o ms., ora.
(116) N o ms., ora.
(117) N o ms., terrogamus.
(118) N o ms., terrogamus.
(119) No ms., Maria mater.
(120) D e v i a ser assumptionis.
(121) Bibl. d o Palacio d a A j u d a , 49-1-3, fls. 121-124v.
Sancta Mater, e t c . , e s t a enorme ladainha, até Mater sublimi-
tatis, s e g u e m a i s o u m e n o s a p a r e passo c o m a d o cód. ale. 37 ( m
).
M a s daí para a frente, as duas ladainhas diferenciam-se com-
p l e t a m e n t e , c o m o d u a s c o m p a n h e i r a s q u e se z a n g a r a m , i n d o cada
u m a para o seu lado. Até q u e ponto, não sabemos, por estar m u -
tilada a do códice alcobacense. U m a coisa é certa: as invoca-
ções finais (senhora dos anjos, rainha dos céus, nosso amparo,
lírio d e castidade, etc.) r e v e s t e m já u m a certa modernidade. Co-
m o se fosse d e m a s i a d o o cansaço de repetir o Sancta Maria Mater
e m t o d o s os versículos, tais p a l a v r a s caíram m a n s a m e n t e (não es-
quecidas n e m odiadas, m a s por serem preferíveis as formas den-
sas e curtas, sobretudo n u m a litania longa, c o m o esta).

C A P Í T U L O I X

Ladainha de transição do devocionário da Ajuda.


Outro exemplar da mesma litania, de tipo arcaico

A terceira ladainha do devocionário da Ajuda, podíamos


classificá-la delitania de transição o u pré-lauretana, c o m o fize-
m o s à dos Livros de Horas d a r a i n h a D . " L e o n o r .
Ângelo de Santi fala-nos de várias ladainhas deste tipo in-
termediário. U m a delas, foi copiada, e m 1524, pelo franciscano
Giovanni d e F a l e r o n e : Letanie devotissime in laude de la Ver-
gine Maria Advocata sollicita de' Peccatori. D e s a p a r e c e u o u s o
a n t i g o d e r e p e t i r Sancta Maria, a n ã o s e r d e v e z e m quando,
quase a dividir a ladainha e m estrofes rítmicas. A articulação
torna-se mais perfeita e surge algo de novo: a série de invocações
q u e c o m e ç a m por Regina, o t í t u l o d e Cansa nostrae laetitiae e ,
principalmente, o Vas spirittiale ( e m b o r a n ã o f a l t e m p o e s i a s m e -
dievais c o m este louvor à Virgem Maria). N o entanto, ainda ficou
muita coisa dos tempos passados, à maneira da ladainha dos san-

(122) Nesta l a d a i n h a d o cód. 37, h á mais q u a t r o invocações ausentes d a p r e s e n t e


ladainha d o devocionário d a Ajuda. E m compensação, existem, nesta última litania,
u m a s d u a s invocações q u e e m v ã o p r o c u r a m o s no cód. ale. 37. P o d í a m o s i g u a l m e n t e
a p o n t a r d u a s i n v o c a ç õ e s i g u a i s , m a s e m sítios d i f e r e n t e s .
tos e dalgumas de Nossa Senhora: Peccatores, te rogamus, audi
nos. Ut pro nobis intercedas, te rogamus, audi nos... (123).
Os anos foram passando e as ladainhas foram-se aproxi-
m a n d o das q u e rezamos agora. Ângelo de Santi publicou quatro
destas ladainhas p r é - l a u r e t a n a s (124). A primeira v e m n u m missal
manuscrito, e m letra gótica, dos princípios do séc. XVI, m a s é
possível q u e já existisse nos últimos decénios de quatrocentos.
A segunda foi impressa e m Veneza, no ano de 1513, n u m Offi-
cium Beatae Virginis. É mais curta, e m b o r a muito semelhante à
antecedente. A terceira lê-se no Officium Beatae Virginis q u e
Dulcibelli pôs e m letra de forma, e m Carpi, no ano de 1503. É
ainda mais p e q u e n a e c o m algumas invocações ordenadas doutro
modo. A quarta ladainha encontrou-a Vogel, n u m opúsculo edi-
tado e m V e n e z a (1561), c o m o título d e Compendium orationum.
Destinava-se ao t e m p o da peste ou de qualquer tribulação: Zn-
cipunt litaniae intemeratae Virginis Mariae quae dicenda sunt
tempore tribulationis et tempore quo immineat pestis, cum anti-
phonis, versiculis et orationibus infrascriptis.
P o d e m o s designá-las, respectivamente, por texto a b c d.
H á razões para julgar q u e o t e x t o c, e m b o r a impresso antes, nas-
ceu depois dos outros. Ora, tendo ele saído da tipografia e m 1503,
segue-se q u e os d e m a i s textos datam, mais ou menos, do final d e
quatrocentos.

É precisamente u m dos textos mais antigos (o texto b ) q u e


mais se aproxima da presente ladainha do devocionário d a Ajuda,
chegando m e s m o , pràticamente, a coincidir c o m ela, e m quase
toda a extensão. N e m falta, até ,o ó exclamativo, n o princípio de
certas invocações. Poucas são as diferenças, afora três invocações
e m lugar diverso, Lena castitatis e m vez de Vena castitatis e pou-
co m a i s O25). Q u a n t o a Lena, i s t o é , alcoviteira, no devocionário
da Ajuda, choca-nos bastante. N ã o sabemos c o m o entrou ali tal
palavra, se foi erro d o copista (por Gemma ou Vena) ou se esta-
mos perante u m propósito expresso d o autor d a ladainha. Nesta
hipótese, o q u e as m á s mulheres fazem e m favor d o vício, ser-
vindo de intermediárias, fá-lo-ia Nossa Senhora e m favor da cas-

( 1 2 3 ) Â N G E L O D E S A N T I , Die Lauretanische Litanei ( P a d e r b o r n , 1900) 1 0 1 — 103.


( 1 2 4 ) Ib., 1 0 6 - 1 0 9 .
( 1 2 5 ) Ib., p . 1 0 8 , Gemma castitatis, n o t e x t o a. L e n a t a m b é m p o d e s i g n i f i c a r co-
bertor, a c h a o u cavaca para a r d e r na fogueira, ctc.
tidade. Será de mau gosto, mas parece-nos exacto. Mas, vamos
à ladainha:

I N C I P I U N T L E T A N I E ( m ) D E BEATA (127) V I R G I N E

Kyrie, eleison.
Christe, eleison.
Christe, audi nos.
Christe, exaudi nos.
Pater d e celis Deus, miserere nobis.
Fili redemptor mundi Deus, miserere nobis.
Spiritus sancte Deus, miserere nobis.
Sancta Trinitas unus Deus, miserere nobis.
Sancta Maria, ora pro nobis.
Sancta Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta mater Christi, ora pro nobis.
Sancta mater castíssima, ora pro nobis.
Mater piíssima, ora pro nobis.
Mater inviolata, ora pro nobis.
Mater amabilis, ora pro nobis.
Mater admirabilis, ora pro nobis.
Mater intemerata, ora pro nobis.
Mater misericordie, ora pro nobis.
Mater divine gratie, ora pro nobis.
Mater creatoris, ora pro nobis.
Mater salvatoris, ora pro nobis.
Magistra humilitatis, ora pro nobis.
Magistra obediencie, ora pro nobis.
Magistra prudentie, ora pro nobis.
Virgo virginum, ora pro nobis.
Virgo fidelis, ora pro nobis.
Virgo potens, ora pro nobis.
Virgo prudens, ora pro nobis.
Virgo clementíssima, ora pro nobis.
Virgo pulcherrima, ora pro nobis.
Virgo veneranda, ora pro nobis.
Virgo predicanda, ora pro nobis.
Virgo sancta, ora pro nobis.
Virgo speciosa, ora pro nobis.
Speculum justitie, ora pro nobis.
Sedes justitie, ora pro nobis.
Causa munditie et letitie, ora pro nobis.
O vas spirituale, ora pro nobis.

(126) No ms., tetania.


(127) No ms., beate.
O vas insigne et devotionis ( m ) , ora pro nobis.
O vas totius sanctitatis, ora pro nobis.
Rosa mística, ora pro nobis.
Turris ebúrnea, ora pro nobis.
Domus et arca, ora pro nobis.
Federis arca, ora pro nobis.
Janua célica, ora pro nobis.
Stella matutina, ora pro nobis.
Lux meridiana, ora pro nobis.
Pulchrior luna, ora pro nobis.
Hospitium deitatis, ora pro nobis.
Cubile divinitatis, ora pro nobis.
Sacrarium Sancti Spiritus, ora pro nobis.
Sgiritus Sancti domicilium, ora pro nobis.
Spiritus Sancti solatium, ora pro nobis.
Calandra sancta, ora pro nobis.
Thronus Salomonis, ora pro nobis.
Hostium paradisi, ora pro nobis.
Lena castitatis, ora pro nobis.
Fios virginitatis (129), ora pro nobis.
Forma sanctitatis, ora pro nobis.
Salus infirmorum, ora pro nobis.
Refugium peçcatorum, ora pro nobis.
Consolatrix aflictorum, ora pro nobis.
Regina angelorum, ora pro nobis.
Regina patriarcharum, ora pro nobis.
Regina prophetarum, ora pro nobis.
Regina apostolorum, ora pro nobis.
Regina martirum, ora pro nobis.
Regina confessorum, ora pro nobis.
Regina virginum, ora pro nobis.
Regina sanctorum (I3°), ora pro nobis.
Agnus Dei qui tollis peccata mundi, parce nobis, domine.
Agnus Dei qui tollis peccata mundi, exaudi nos, domine.
Agnus Dei qui tollis peccata mundi, miserere nobis.
Vers.: Ora pro nobis, sancta Dei genitrix,
Resp.: U t digni eficiamur promissionibus Christi.

OREMUS

Deus qui beatissimam et gloriosam virginem Mariam, in conceptu et


in partu virginitate servata, duplici gáudio letificasti, quinque ejus gaudia
et filio tuo resurgente et ad celos ascendente multiplicasti, tribue, quesu-

(128) N o texto b, encontra-se i g u a l m e n t e a copulativa et.


(129) N o ms., virginis.
(130) N o texto b, Regina sanctorum omnium.
mus, ut ad illud ineffabile gaudium, quo tecum assumpta ( IJ1 ) gaudct in
celis, eius precibus et meritis pervenire valeamus. Per eundem ( 1J2 ).

E v i d e n t e m e n t e , Mestra de humildade, Mestra de obediên-


cia, Mestra de clemência, Luz do meio-dia, Mais bela do que a
lua — todos estes títulos e mais a l g u n s f o r a m f i c a n d o p e l o ca-
m i n h o e n ã o c h e g a r a m a entrar na l a d a i n h a m a r i a n a a g o r a re-
z a d a por nós. C o n t u d o , outras coisas p e r m a n e c e r a m , q u a s e por
s e l e c ç ã o natural, e n ã o é d i f í c i l descobrir, nesta litania, b o a
p a r t e do c o n t e ú d o s u b s t a n c i a l d a l a d a i n h a l a u r e t a n a d o s nossos
dias.
P e l a m e s m a é p o c a , r e z a v a - s e e m P o r t u g a l u m a l a d a i n h a pra-
t i c a m e n t e i g u a l à a n t e c e d e n t e , q u a n t o às i n v o c a ç õ e s , mas d e es-
trutura m e n o s s i m p l i f i c a d a e c u n h o arcaico. D e facto, tais invoca-
ções v ã o p r e c e d i d a s de Sancta Maria. Isto c o n f i r m a - n o s na cer-
t e z a d a coexistência, e m P o r t u g a l , d e f o r m a s mais ou m e n o s evo-
l u í d a s d u m m e s m o tipo de litanias:

Kyrie, eleyson.
Christe, eleyson.
Christe, audi nos.
Christe, exaudi nos.
Pater de Caelis Deus, miserere nobis.
Fili Redemptor mundi Deus, miserere nobis.
Spiritus sancte Deus, miserere nobis.
Sancta Trinitas unus Deus, miserere nobis.
Sancta Maria, ora pro nobis.
Sancta Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta Virgo Virginum, ora pro nobis.
Sancta Mater Christi, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater castíssima, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater piíssima, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater inviolata, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater intemerata, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater amabilis, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater admirabilis, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater misericordiae, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater divinae gratiae, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater creatoris, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater humilitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater obedientiae, ora pro nobis.
Sancta Maria, Mater prudentiae, ora pro nobis.

(131) N o ms., assunta


(132) Bibi. d o Palácio da A j u d a , ms. 49-1-3, fls. 109-110v.
Sancta Maria, Virgo fidelis, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo potens, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo prudentíssima, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo clementíssima, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo pulcherrima, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo veneranda, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo praedicanda, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo sanctissima, ora pro nobis.
Sancta Maria, Virgo speciosissima, ora pro nobis.
Sancta Maria, speculum justitiae, ora pro nobis.
Sancta Maria, sedes sapientiae, ora pro nobis.
Sancta Maria, causa nostrae laetitiae, ora pro nobis.
Sancta Maria, vas spirituale, ora pro nobis.
Sancta Maria, vas honorabile, ora pro nobis.
Sancta Maria, vas insigne devotionis, ora pro nobis.
Sancta Maria, vas totius sanctitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, rosa mystica, ora pro nobis.
Sancta Maria, turris ebúrnea, ora pro nobis.
Sancta Maria, foederis arca, ora pro nobis.
Sancta Maria, janua Caeli, ora pro nobis.
Sancta Maria, stela matutina, ora pro nobis.
Sancta Maria, pulchrior luna, ora pro nobis.
Sancta Maria, lux meridiana, ora pro nobis.
Sancta Maria, hospitium divinitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, Spiritus Sancti sacrarium, ora pro nobis.
Sancta Maria, thronus Salomonis, ora pro nobis.
Sancta Maria, ostium Paradisi, ora pro nobis.
Sancta Maria, gemma castitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, fios virginitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, forma sanctitatis, ora pro nobis.
Sancta Maria, salus infirmorum, ora pro nobis.
Sancta Maria; refugium peccatorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, consolatrix afflictorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina Angelorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina Caelorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina Patriarcharum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina Prophetarum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina Apostolorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina Evangelistarum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina Martyrum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina monachorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina virginum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Regina sanctorum omnium, ora pro nobis.
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, parce nobis Domine.
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, parce nobis Domine.
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, miserere nobis.
[Vers.:] Ora pro nobis, sancta Dei Genitrix,
Resp.: ut digni efficiamur promissionibus Christi.
182 LVSITANIA SACRA

OREMUS

Concede nos, misericors Deus, fragilitatis nostrae singulare praesi-


dium, ut qui sanctae Dei genetricis et Virginis Mariae memoriam agimus,
intercessionis ejus auxilio a nostris iniquitatibus resurgamus. Per Christum
Dominum nostrum. Amen ( 1Si ).

Apesar de se tratar duma ladainha substancialmente igual


à que a antecede, notam-se, aqui e além, algumas variantes, quer
na ordem das invocações, quer mesmo numa ou noutra das pró-
prias invocações. Por exemplo, em vão procuramos Regina mona-
chorum (Rainha dos monges) na primeira destas litanias. E as
orações finais duma e doutra diferem totalmente.

CAPITULO X

Ladainha do Dominus tecum


Em geral, as ladainhas marianas abrangem uma série de lou-
vores e de súplicas, numa espécie de balanço rítmico entre a glo-
rificação de Nossa Senhora e a oração deprecativa. Como uma
criança abandonada e cheia de angústia, o homem repete o refrém
ora pro nobis ou outro qualquer: miserere nobis; te rogamus, audi
nos; etc.
No entanto, mergulhamos agora na vasta ondulação de uma
ladainha simplesmente laudativa, excepto na oração final.
Vem ela num manual de orações, copiado no mosteiro cis-
terciense de S. Maria do Bouro, em 1558. É uma obra hesitante,
algo de intermédio entre o Livro de Horas (contém o Ofício de
Nossa Senhora, as Horas da Santa Cruz e as Horas do Espírito
Santo) e o devocionário moderno, difuso e menos litúrgico. Pois
bem, é nestas páginas que podemos ler uma Oratio devotíssima
dicenda die sabbati ad honorem Dei genitricis et virginis Marie.
Quer dizer: Oração devotíssima, para se dizer aos sábados, em

(133)J O Ã O R E B E L O , S . J . , Rosario de la Sanctissima Virgen Maria, Madre de


Dios, 2 (Évora, 1599) fls. 215-216v.
honra da Mãe de Deus, a Virgem Maria. O índice mete-a tran-
quilamente entre as ladainhas de Nossa Senhora: Letanie domi-
ne nostre (1J4). E tem razão.
Como um rio devoto e manso, toda a litania se desenrola ao
longo de vários e belos títulos da Virgem Maria: imperatriz das
rainhas, lírio dos vales, rosa sem espinhos, virgem bela, fonte de
misericórdia, horto fechado, fonte de águas vivas, mãe de pieda-
de, etc. E a dar unidade a estas invocações, em vez do ora pro
nobis, escutamos o Dominus tecum. A uma dada altura, termi-
nam os versículos curtos e começam os de longa metragem, como
diríamos em cinema. E temos a condensação da vida de Jesus,
desde a anunciação até ao fim dos tempos, sempre com a Vir-
gem Maria ao lado: Verdadeira virgem e mãe, que geraste o Fi-
lho de Deus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, o qual pela
anunciação do anjo foi concebido — o Senhor é contigo!
Verdadeira virgem e mãe, que geraste o Filho de Deus, ver-
dadeiro Deus e verdadeiro homem, o qual por amor de nós nas-
ceu em ti —o Senhor é contigo!
Verdadeira virgem e mãe, que geraste o Filho de Deus, ver-
dadeiro Deus e verdadeiro homem, o qual por amor de nós foi
recebido no templo, dentro das mãos do santíssimo Simeão — o
Senhor é contigo!
Verdadeira virgem e mãe, que geraste o Filho de Deus, ver-
dadeiro Deus e verdadeiro homem, o qual morreu por nós —o
Senhor é contigo!
O mais vai indo pelo mesmo lento caminho, até ao julga-
mento dos vivos e dos mortos, no Juízo Final. Porém, o melhor é
deixar a ladainha falar por si. Passamos, pois, à sua transcrição.
Muito antes de nós, em 1896, Dreves escreveu sobre ela linhas
sugestivas e Ângelo de Santi transcreveu-a em grande parte, du-
ma edição do final de quatrocentos (135). Era frequente no derra-
deiro quartel do séc. XV e princípios do séc. XVI e por isso nos
apraz publicá-la integralmente:

Missus est Gabriel angelus ad Mariam virginem desponsatam Joseph, nun-


cians ei verbum: Ave Maria, gratia plena, dominus tecum.
Missus est Gabriel angelus ad Mariam virginem desponsatam Joseph, nun-
cians ei verbum: Ave Maria, gratia plena, dominus tecum.

(134) Bibi. N a c . d e Lisboa, cód. ale. 85, fl. 135v.


( 1 3 5 ) A N C E L O D E S A N T I , Die Lauretanische Litanei (Paderborn, 1900) U4-1I0.
Missus est Gabriel angelus [ad Mariam virginem desponsatam Joseph,
nuncians ei verbum]: Ave Maria, gratia plena, dominus tecum.
Inperatrix reginarum, Dominus tecum.
Laus sanctarum animarum, Dominus tecum.
Vera salvatrix earum, Dominus tecum.
Excellentissima regina celorum, Dominus tecum.
Vcneranda domina angelorum, Dominus tecum.
Omnium plena virtutum, Dominus tecum.
Flos florum, Dominus tecum.
Lilium convalium, Dominus tecum.
Mediatrix Dei et hominum, Dominus tecum,
Indeficiens gaudium. Dominus tecum.
Rosa sine spina, Dominus tecum.
Stella matutina, Dominus tecum.
Virgo Dei inviolata, Dominus tecum.
Virgo innupta, Dominus tecum.
Virgo Dei intacta, Dominus tecum.
Virgo incorrupta, Dominus tecum.
Virgo Deo grata, Dominus tecum.
Virgo ante partum, Dominus tecum.
Virgo in partu, Dominus tecum.
Virgo post partum. Dominus tecum.
Splendor inextinguibilis, Dominus tecum.
Virgo inestimabilis. Dominus tecum.
Virgo inmarcessibilis vitis, Dominus tecum.
Uva germinans (13fi), Dominus tecum.
Virgo incomparabilis, Dominus tecum.
Virgo cui noil est nec erit similis, Dominus tecum.
Virgo generosa. Dominus tecum.
Virgo speciosa, Dominus tecum.
Virgo pulchra, Dominus tecum.
Fons misericordie cum omni copia, Dominus tecum.
Virgo eximia, Dominus tecum.
Virgo pia, Dominus tecum.
Virgo mater sine ruga, Dominus tecum.
Virgo dulcis Maria, Dominus tecum.
Laus prophetica, Dominus tecum.
Salomonis fabrica, Dominus tecum.
Mater Dei et virgo unica Dei filia, Dominus tecum.
Laus habitationis glorie Dei, Dominus tecum.
Ortus conclusus, Dominus tecum.
Fons signatus, Dominus tecum.
Aque vive puteus, Dominus tecum.
Paradisus cum pomorum fructibus, Dominus tecum.
Venter rore celesti rigatus, Dominus tecum.
Eternitatis domus, Dominus tecum.

(136) No ms., germinas.


Veteris et novi testamenti armarium, D o m i n u s tecum.
Spiritus Sancti sacrarium, D o m i n u s tecum.
Q u e angelo nunciante (137) virgo concepisti, D o m i n u s tecum.
(Die decies: Ave maria. Posted semel: Q u e angelo nunciante. Et adhuc die
decies: Ave maria).
Vera virgo et mater, D o m i n u s tecum.
Mater Dei veri et veteris hominis, D o m i n u s tecum.
Mater Iesu Christi, filii unigeniti Dei, D o m i n u s tecum.
M a t e r misericordie, D o m i n u s tecum (138).
Mater pietatis, D o m i n u s tecum.
M a t e r veritatis, D o m i n u s tecum.
Mater caritatis, D o m i n u s tecum.
D e c u s mulierum, D o m i n u s tecum.
Mater o r p h a n o r u m , D o m i n u s tecum.
Gonsolatio desolatorum, D o m i n u s tecum.
Compassio afflictorum, D o m i n u s t e c u m ( 139 ).
Salus omnium in te sperantium, D o m i n u s tecum.
Archa Dei, D o m i n u s tecum.
T e n p l u m Domini, D o m i n u s tecum.
Sacrarium Spiritus Sancti, D o m i n u s tecum.
Reclinatorium Iesu Christi, D o m i n u s tecum.
L u m i n a r e celi, D o m i n u s tecum.
Sponsa Dei, D o m i n u s tecum.
P r o p h e t a r u m oraculum, D o m i n u s tecum.
Dei unbraculum, D o m i n u s tecum.
Pastoris tabernaculum, D o m i n u s tecum.
C o n p l e t u m est in te consilium, Dominus tecum ( 140 ).
Vera virgo et m a t e r q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et v e r u m ho-
minem, qui angelo nunciante conceptus est, D o m i n u s tecum.
Vera virgo et m a t e r q u e filium Dei genuisti, v e r u m D e u m et v e r u m homi-
nem, qui p r o nobis in te natus est, D o m i n u s tecum.
Vera virgo et m a t e r q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, q u i pro nobis inter ulnas Simeonis sanetissimi in templo re-
c e p t u s est, Dominus tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui pro nobis cesus est, D o m i n u s tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et v e r u m ho-
minem, qui pro nobis spinis coronatus est, D o m i n u s tecum.
Vera virgo e t mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
m i n e m , qui p r o nobis clavis crucifixus est, Dominus tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et v e r u m ho-
minem, qui pro nobis in cruce p e n d e n s virginem m a t r e m virgini

(137) Esta f r a s e falta n o texto e d i t a d o por A. d e Santi.


(138) I d e m . ,
(139) N o texto e d i t a d o p o r A. d e Santi, Via errantium. Dominus tecum, loco de-
pois d e Compassio afflictorum, etc.
(140) A. d e Santi n ã o publicou o restante desta ladainha, d a q u i p a r a a I rente.
commendavit, ita dicens: mulier ecce filius tuus, d e i n d e a d discipu-
lum: ecce mater tua, D o m i n u s tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui pro nobis in cruce p e n d e n s exclamavit, dicens: heli, heli,
lama sabathani, et inclinato capite tradidit spiritum, D o m i n u s
tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum
hominem, qui pro nobis immolatus est, Dominus tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, cujus latus lancea perforatum est et continuo exivit sanguis
et a q u a , in redenptionem a n i m a r u m nostrarum et remissionem pec-
catorum nostrorum, pro salute m u n d i ad vitam eternam, Dominus
tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et v e r u m ho-
minem, cujus corpus de c r u c e p e r Joseph depositum est in sindone
m u n d a involutum, Dominus tecum.
Vera virgo et m a t e r q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, cujus corpus in lintheis c u m aromatibus in m o n u m e n t o no-
vo positum est, Dominus tecum.
Vera virgo e t mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et v e r u m ho-
minem, qui pro nobis sepultus est, Dominus tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui D e u s et homo tertia die resurrexit a mortuis, Dominus
tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui D e u s et homo primo b e a t e Marie Magdalene, postea
discipulis a p p a r u i t . Dominus tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, v e r u m D e u m et verum ho-
minem, qui D e u s et homo cum peregrinis cenavit. Dominus tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui D e u s et homo, videntibus galileis, ad celos ascendit, Do-
minus tecum.
Vera virgo et mater que filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui D e u s et homo ascendit super omnes celos et preparavit
sue castissime matri locum inmortalitatis, Dominuos tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui D e u s et homo a d dexteram Dei sedens spiritum paracli-
tum discipulis suis misit, Dominus tecum.
Vera virgo et mater q u e filium Dei genuisti, verum D e u m et verum ho-
minem, qui D e u s et homo venturus est judicare vivos et mortuos et
seculum p e r ignem, [Dominus t e c u m ] ,

OREMUS

T e deprecor, ergo, mitissimam, piissimam, misericordiosissimam, cas-


(issimam, speciosissimam Dei genitricem Mariam, senper virginum gem-
mam, ut in sancto, t r e m e n d o ac terribili judicio, in conspectu unigeniti fi-
lii tui, cui pater dedit omne judicium, m e liberes et protegas a penis in-
ferni et participem me facias celestium gaudiorum. Prestante eodem Do-
mino nostro Iesu Christo, qui cum Patre et Spiritu Sancto vivit et regnat
in secula seculorum. Amen. Pater noster. Ave maria (( M1 ).

Como nas outras ladainhas, também aqui florescem as com-


parações bíblicas que a piedade cristã foi aplicando à SS.ma Vir-
gem: lilium convalium... stella matutina...; hortus conclusus...;
fons signatus...; archa Dei... etc. Ainda assim, poucas, ao pé da
ladainha tirada da Sagrada Escritura, que nós levámos para a
Índia.
Embora mutilado e dividido em três troços perdidos, ao acaso,
num Livro de Horas dos começos de quinhentos, existe ainda ou-
tro exemplar da ladainha do Dominus tecum. Valerá a pena arran-
car esses trechos desarticulados às folhas de pergaminho deste có-
dice eborense (142)? Julgamos que não, embora gostássemos de fi-
xar algumas da suas variantes: Decor dormis Domini (Ornamento
da casa do Senhor); Doloris nostri terminus (Fim da nossa dor);
etc. E o mesmo diremos dos exemplares impressos nalguns Livros
de Horas franceses, vindos há séculos para Portugal. Com efeito,
achamos a ladainha mariana do Dominus tecum nas Hore heate
Marie virginis ad tisum Parisiensem, impressas em 1501 ( u l ), na
cidade de Paris, e nas Hore intemerate Virginis Marie secundum
usum Romanum, cum pluribus orationibus tam in gallico quam
in latino (1U), saídas no mesmo lugar, dois anos mais tarde. Era
para se rezar aos sábados: Oratio dicenda die sabbati ad virginem
Mariam (I45).
Estranho destino o desta ladainha agora ignorada e, no en-
tanto, das mais vulgares, segundo nos parece, nos Livros de Ho-
ras, entre o final de quinhentos e os princípios do séc. XVI! Fi-
camos com a impressão de que, em todos os géneros literários,
desabrocham tentativas que vêm a frustrar-se, por isto ou por
aquilo, sumindo-se quase todas ao longo dos anos, como um rio

(141) Bibi. N a c . d e L i s b o a , c ó d . ale. 8 5 , fls. 112-114.


(142) Bibi. P ú b l . d e É v o r a , ms. C X X I V / 2 - 1 4 , fls. 179-179v., 1 8 2 - 1 8 2 v „ 134-135v.
E s t e a p ó g r a f o t a m b é m n ã o c o i n c i d e c o m o e x e m p l a r p u b l i c a d o p o r ÂNGELO DB SANTI,

° P ' (143) Paris, 1 5 0 1 ( T h i e l m a n Kerver) fls. 123-127. Bibi. N a c . d e L i s b o a . Res.


323 V
(144) Paris, 1 5 0 3 ( T h i e l m a n Kerver) fls. 7 6 - 7 8 . Bibi. N a c . d e L i s b o a . Res. 3 2 2 V.
(145) lb., fl. 7 6 .
débil na areia escaldante. De tantas ladainhas marianas, só uma
conseguiu invadir todo o mundo católico, até ao dia de hoje.

C A P I T U L O XI

Ave!
Será possível meter entre as litanias marianas uma série de
títulos de Nossa Senhora, muitos deles comuns a outras ladainhas
e precedidas de Ave? Na esteira doutros autores, admitimos essa
possbilidade, embora confessemos tratar-se de ladainhas não to-
talmente evoluídas.
Uma delas, porém, aproxima-se da forma perfeita, começan-
do por Ave! e passando, depois, a ladainha deprecativa: intercede
pro me!... miserere mei! Mas, voltemos à primeira oração litânica.
Eu te saúdo, flor! Eu te saúdo, nuvem! Eu te saúdo, rainha!
Eu te saúdo, sacrário! Eu te saúdo, imperatriz! Eu te saúdo, pa-
cífica! Eu te saúdo, mãe de Deus! Eu te saúdo, virgem! Eu te
saúdo, imaculada! Eu te saúdo, senhora! Eu te saúdo, serva! Eu
te saúdo, luz dos olhos de Deus! Eu te saúdo, graça! Eu te saú-
do, horto! Eu te saúdo, fonte! Eu te saúdo, poço! Eu te saúdo, ca-
minho! Eu te saúdo, vereda! Eu te saúdo, aurora! Eu te saúdo,
lua!
Tudo isto forma uma litania laudatória de tipo individualista
(isto é, para ser rezada sòmente por uma pessoa), em que o orante
pensa pouco em si e muito na glória da Virgem Maria.
Foi seguramente uma pessoa de nacionalidade portuguesa
que ajuntou tais invocações ao velho Livro de Horas, fazendo-as
preceder dalgumas linhas a vermelho: ...e qualquer cousa que for
fusta, que se pedir a nossa senhora por estes nomes, ser lhe ha
outorgada.
Precedidos de Ave!, quantos nomes bonitos se aplicam à Vir-
gem Maria, em série ininterrupta!: Sol, exército, porta, velo, casa,
bendita, gloriosa, piedosa, palácio, sarça, escola, estrela, romã,
uva, vinha, torre, navio, bebida, redentora, libertadora, arca, tá-
lamo, cinamomo, bálsamo, amiga, vale, cedro, p o m b a , rola, tuba,
livro, pulcra, esposa, mãe, rosa, lírio, janela, c i d a d e , tabernáculo,
coluna, etc. M a s é difícil traduzir certas invocações, c o m o por
exemplo: Ave, sollaris! Sabemos q u e a Virgem Maria é compara-
d a a o sol, m a s f a l t a - n o s a p a l a v r a mágica e única, q u e acorde e m
nós todas as ressonâncias do latim.

N o entanto, estranhamos esta frase: Ave, homo! E u te saú-


do, h o m e m ! É u m a nota q u e desafina todo o conjunto, sobretudo
contraposta a Ave, femina! Qual a ideia íntima de q u e m escreveu
tais palavras? N ã o sabemos, e m b o r a possamos construir mil hi-
póteses mais ou menos frágeis. O melhor é transcrever esta ladai-
nha, que hesitou e m desabrochar de todo, para ficar eternamente
no limbo das coisas inacabadas:

Ave, digna! Ave, benedicta!


Ave, virga! Ave, gloriosa!
Ave, fios! Ave, pia!
Ave, nubes! Ave, aulla!
Ave, regina! Ave, rubus!
Ave, theoteca! Ave, scolla.
Ave, imperatrix! Ave, stella!
Ave, pacifica! Ave, malogranata ( M7 ).
Ave, Dei genitrix! Ave, uva!
Ave, virgo! Ave, vinea!
Ave, immaculata! Ave, turris!
Ave, domina! Ave, navis!
Ave, ancilla! Ave, potus!
Ave, theoma! Ave, redentrix!
Ave, gracia! Ave, liberatrix!
Ave, ortus! Ave, archa!
Ave, fons! Ave, tallamus!
Ave, puteus! Ave, cinamomum!
Ave, via! Ave, balsamum!
Ave! semita! Ave, generatio!
Ave, aurora! Ave, homo!
Ave, luna! Ave, femina!
Ave, sollaris! Ave, arnica!
Ave, acies! Ave, vallis!
Ave, porta! Ave, cedrus!
Ave, vellus! Ave, collumba!
Ave, domus! Ave, turtur!
Ave, templum (14<)I Ave, tuba!

(146) No ms., templo. .


( 1 4 7 ) N o m s . , mille granata. T a l v e z e r r o d o c o p i s t a , p o r malogranata (roma).
Ave, líber! Ave, civitas!
Ave, pulchra! Ave, tabernaeulum!
Ave, sponsa! Ave, magna!
Ave, mater! Ave, colíumba!
Ave, alma! Ave, collunna!
Ave, formosa! Ave, mulier!
Ave, benedicta! Ave, Maria!
Ave, rosa! Deo graçias.
Ave, lilium! Jhesus Christus (143).
Ave, janua!

E m vão procuramos meter a vida e m compartimentos b e m


definidos, c o m etiquetas b e m claras. A vida continua a ser u m a
coisa ondulante, mistura disto e daquilo, às vezes a caminhar não
se sabe para q u ê n e m para onde. E sentimos vontade de ordenar
à realidade esquiva: pára, a fim de te darmos u m nome! M a s as
coisas continuam a mudar, sem n o m e e por caminhos obscuros.
É u m a ladainha? N ã o sabemos dizê-lo. N ã o condenaríamos q u e m
assim lhe chamasse — e nós t a m b é m o fizemos, e m b o r a c o m he-
sitação.

Mais próxima d o tipo actual, m a s ainda c o m elementos hí-


bridos e mal definidos, temos a litania seguinte, tirada d u m Livro
de Horas d a Biblioteca do Palácio de Mafra.

Belamente iluminado e e m gótico de quatrocentos, este Li-


vro de Horas encerra u m a Oratio devota que, a d a d a altura, se
transforma e m autêntica ladainha deprecatória. É u m a espécie
de miscigenação literária digna de registo e lembra u m pouco
o u t r a l a d a i n h a r e z a d a p o r u m a s freiras a l e m ã s d o séc. X V (149\

Ave Maria, gratia plena, Dei genitrix, q u e es super solem pulcherrima (150).
Ave, cuius speciem rex celi et terre concupivit.
Ave, salu[ta]ta a b angelo.
Ave, obumbrata a Spiritu Sancto.
Ave, promanans (151) a Deo.
Ave, que ex tuis visceribus invenisti generare filium Dei.
Ave, que filium Dei incunabulis restituisti (152).
Ave, que filium Dei declinasti in presepio.
Ave, que filium Dei presentasti in templo.

(148) Bibi. d e Lisboa, ilum. 165, fl. 163-163v. Os pontos d e exclamação são d a
nossa responsabilidade.
( 1 4 9 ) Â N G E L O D E S A N T I , Die Lauretanische Litanei (Paderborn, 1900) 63-64.
(150) N o ms., pulcerrima.
( 1 5 1 ) N o ms., premanens.
(152) Leitura duvidosa.
Ave, que filium Dei vidisti carne, secundum carnem.
Ave, que ipsum audisti predicantem salutem nostram.
Ave, que ipsum misisti in... (153).
Ave, que filium Dei vidisti in cruce suspensum, pro redemptione nostra.
Ave, que filium Dei vidisti mortuum et sepultum pro nobis.
Ave, que ipsum vidisti resurgentem a mortuis.
Ave, que ipsum vidisti in ceio ascendentem ad patrem, cum carne illa
quam ex te, immaculata virgine, assumere dignatus est ( 1M ).
Ave, domina angelorum atque archangelorum.
Ave, regina celorum.
Ave, laus omnium sanctorum.
Ave, exultatio justorum.
Ave, recuperatio perditorum.
Ave, spes miserorum.
Ave, spes nostra.
Ave, salus mundi.
Ave, piissima omnium creaturarum.
Ave, omnium bonorum nostrorum virtus.
Ave, per misericordiam Dei nostri Ihesu Christi salvatrix.
Ave, virgo gloriosa, laude omni digníssima et a cunctis veneranda.
Christe, audi me.
Salvator mundi, salva me.
Sancta Dei genitrix, intercede pro me.
Sancta Maria, virgo virginum, intercede pro me.
Sancta Maria, excellentissima regina, intercede pro me.
Sancta [Maria], plena pietate et omni dulcedine, intercede por me.
Sancta Maria, mater regis eterni, intercede por me.
Sancta Maria, fios patriarcharum, intercede pro me.
Sancta Maria, laus martirum, intercede pro me.
Sancta Maria, glorificatio colenda venerabilium, intercede pro me.
Sancta Maria, immaculata virgo virginum, intercede por me.
Sancta [Maria], decus virginum, intercede pro me.
Sancta Maria, super omnes feminas benedicta, intercede pro me.
Sancta Maria, genitrix Christi, per misericordiam filii tui, salvatoris nostri,
intercede pro me.

Mater, extende manum tuam et tange cor meum, fiat voluntas tua ut illu-
mines et liberes me peccatorem.
Sancta Maria, Dei gloriosa [mater], qui in útero tuo incarnari voluit, mi-
serere mei, famule tue, et ora pro peccatis meis.
Sancta Maria, perpetua virgo virginum, pro dilectione filii tui q u a te di-
lexit, ut exaltaret t e super choros angelorum, exaudi et ora pro pec-
catis meis.
Sancta Maria, adjuva me et intercede pro me peccatore, ut custodiat me
Deus ab omni maio preterito, presenti et futuro.

(153) N o l u g a r d a s r e t i c ê n c i a s , u m a p a l a v r a q u e n ã o c o n s e g u i m o s l e r .
(154) N o ms., es.
Sancta Maria, spes miserorum, miserere mei.
Sancta Maria, decoratrix omnium virtutum, miserere mei.
Sancta [Maria], dulcis consolatio tribulantium, miserere mei.
Sancta Maria, omni pietate plenissima, miserere mei.
Sancta Maria, Stella maris lúcida, miserere mei.
Sancta Maria, porta celi mei, miserere mei.
Sancta Maria, cônscia secretorum Dei, miserere mei (155).

N i n g u é m pode negar o carácter litaníaco desta oração cheia


d e lirismo e emotividade: Maria, cheia de graça, muito mais bela
do que o sol — ave! O rei d o céu e d a terra desejou a tua beleza!
Saudada pelo anjo, o Espírito Santo desceu sobre ti, q u e vieste
de Deus! D e u s te salve, a ti q u e geraste o Filho de Deus, o re-
clinaste n u m presépio, o apresentaste no templo, o viste feito car-
ne, pregando a nossa salvação! Ave! senhora dos anjos e dos ar-
canjos! Ave! rainha do céus! Ave! l o u v o r d e t o d o s os santos! Ave!
alegria dos justos! Ave! r e c u p e r a ç ã o dos perdidos! Ave! esperança
dos infelizes! Ave! nossa esperança! Ave! salvação do mundo!
Ave! a mais piedosa de todas as criaturas! Ave! virtude de to-
dos os nossos bens! Ave, salvadora pela misericórdia de Jesus
Cristo, nosso Deus!

Cristo, escuta-me! Salvador d o mundo, salva-me! Santa M ã e


de Deus, intercede por mim! Santa Maria, virgem das virgens,
rainha excelentíssima, cheia de toda a piedade e doçura, m ã e do
eterno rei, flor dos patriarcas, louvor dos mártires — intercede
por mim! Mãe, estende a tua m ã o e toca o m e u coração, faça-se
a tua vontade, para q u e m e ilumines e m e livres a m i m , pecador!

Santa Maria, esperança dos infelizes, tem piedade d e mim!


Santa Maria, adorno de todas as virtudes, tem piedade de mim!
Santa Maria, doce consolação dos tributados, tem piedade d e mim!
Santa Maria, cheíssima de toda a piedade, tem piedade d e mim!
Santa Maria, lúcida estrela do mar, tem piedade d e mim!
Santa Maria, porta do meu céu, tem piedade de mim!
Santa Maria, conhecedora dos segredos de Deus, tem piedade de mim!

O resto afasta-se da ladainha pura, e m b o r a não completa-


mente. D e facto, surge de novo u m a série d e louvores, enquadra-
dos sempre da m e s m a maneira e que, não constituindo u m a la-
dainha propriamente dita, dela se aproxima longinquamente:

(155) B i b l i o t e c a d o P a l á c i o d e M a f r a , m s . I I - 7 1 - 6 - 1 1 , fls. 1 5 6 - 1 5 8 v .
Te laudo, t e adoro, virginitatem tuam magnifico; sancta Maria laudo et
adoro gloriam tuam (156).
L a u d o et adoro speciem tuam et sapienciam tuam.
Laudo et adoro castitatem tuam.
[ i
L a u d o et adoro víscera tua beata, q u e portaverunt Deum et hominem.
Laudo et adoro beata ubera tua, que (157) lactaverunt salvatorem mundi.
L a u d o et adoro b e a t u m ventrem tuum qui portavit (158) dominum D e u m
nostrum Jhesum Christum (159).

Depois desta última frase, encontramo-nos, enfim, na prosa

obscura e c o m u m de todas as orações à Virgem Maria, c o m pe-

ríodos largos e o ritmo vulgar das rezas d e todos os dias. M a s a

densidade emocional continua a ser grande, e m b o r a sem o vigor

das súplicas litânicas, e m q u e a própria repetição cria u m a ideia

fixa e dominadora.

C A P Í T U L O XII

Hino-Ladainha do Mosteiro do Salvador

Soror Maria d o Baptista entrou para o Mosteiro de S. Salva-


dor de Lisboa no ano de 1586. Filha de gente nobre, inteligente
e piedosa, esta dominicana, depois de ser mestra de noviças, su-
biu, mais tarde, a prioresa daquela comunidade. Foi então q u e
ela reduzio a boa ordem o Cartório do Convento, c o m o diz Bar-
bosa Machado. Isto teve as suas consequências, pois de tanto tra-
balho nasceu u m livrinho intitulado Livro da Fundação do Mos-
teiro do Salvador da Cidade de Lisboa.
Ora, escreve a boa freira q u e as dominicanas do seu mostei-
ro c a n t a v a m «muitas vezes pello discurso do anno h ü a L a d a i n h a
particular a Nossa Senhora, c o m sua toada a c o m o d a d a aos ver-

( 1 5 6 ) F r a s e c o n f u s a , n o m s . : Te laudo, te adoro, virginitatem tuam te magnifico


sancta Maria laudo et adoro gloriam tuam. S u p r i m i m o s te a n t e s d e magnifico, embora
pudéssemos reconstituir a frase doutro modo.
(157) N o ms., quam.
( 1 5 8 ) N o m s . , que portaverunt.
(159) Fls. 158v-159.
SOS» (16°). C o m o era a musica, o leitor p o d e ver na fotografia das
páginas onde Soror Maria do Baptista transcreve a toada. Q u a n t o
à ladainha, t a m b é m a publicamos, notando que a m e s m a freira,
mais adiante, lhe c h a m a hino, pedindo i n g e n u a m e n t e desculpa
d o latim assi tosco, por ser antigo: «Este H y m n o vay aqui posto
e m Latim assi tosco e mal concertado, porque não avia e m Por-
tugal outro melhor naquelle tempo; e não se m u d o u a estylo mais
puro, por não se d e m i n u i r n a d a da pureza de espirito e devação
c o m q u e foy f e i t o » (1<a). N ó s chamamos-lhe hino-ladainha, por
participar de a m b a s as coisas.

D e s d e q u a n d o se rezaria no mosteiro este hino-ladainha?


Pelo menos a partir d a peste grande, q u e principiou a flagelar
Lisboa no ano de 1569.

C o m efeito, escreve Maria do Baptista que, depois d e tal pes-


te, ficou sempre em custume nesta casa fazerem todos os annos
hüa festa, dia de nossa Senhora da Assumpção. À m e i a - n o i t e , h a -
v i a p r o c i s s ã o p e l a crasta d o m o s t e i r o , l e v a n d o a s f r e i r a s v e l a s a c e -
s a s e cantando seus hymnos. U m d e l e s e r a a l a d a i n h a q u e t e m o s
entre mãos.

N o entanto, está longe d e afirmar q u e tal litania só e n t ã o co-


m e ç o u a ser rezada pelas freiras. Limita-se antes a afirmar q u e
essa composição poética se cantava na festa sobredita e t a m b é m
Cantão também e muitas outras vezes pello discurso do
fora dela:
anno hüa Ladainha particular... ( 1 6 2 ) . T u d o l e v a a c r e r t r a t a r - s e
d u m uso antigo.

Digna l a u d e Angelorum, Creatoris creatura,


l ux et vita peccatorum, Pia, casta, dulcis, p u r a ,
l u , q u a e mater es reorum, Tu, q u a e boni es datura,
Da nobis quod petimus (1W). Da nobis quod petimus.

O Maria, t e m p l u m Dei, T u , q u a e plena es dulcoris,


Mater veri Nazarei, Vas virtutum, vas honoris,
T u , q u a m m a t r e m (164) vocant Dei, Q u a e es clemens cunctis horis.
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

(160) SOROR MARIA DO BAPTISTA, Livro da Fundação do Mosteiro do Salvador


da Cidade de Lisboa e de alguns casos dignos de memoria que nelle acontecerão (Lis-
b o a , 1 6 1 8 ) fl. 122.
(161) Ib., fl. 1 2 5 v .
(162) Ib., fl. 122.
(163) Sublinhamos a súplica-refrém.
(164) E m e n d a m o s mater p a r a matrem.
Peccatores et beati A d te clamo, nimis pia.
T e collaudant deviati. T u Coelestis Ierarchia,
Ad q u a m clamant tribulati, Tu, Mater virgo Maria,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

Virgo Sancta lucens una, O Regina honorata,


T e adorant Sol et L u n a , Dulcis, clemens et b e a t a ,
A d q u a m clamo voce una, Tu, q u a e cunctis donas grata,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

Piam a u r e m n u n c inclina, Defensatrix a ruina,


Esto mihi medicina, L i b e r a r e m e festina,
Tu, q u a e servas (165) a ruina, Tu, q u a e in Coelis es Regina,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

T u reformans ( 1 M ) in amorem Mater casta et decora,


Q u e m offendi creatorem, Roga pro me sine mora,
Tu, q u a e audis peccatorem, T u , q u a e juvas omni hora,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

D e p r e c a r e vultum Dei, Paradisi vera clavis,


Pro salute h u i u s rei, Tu, q u a e n u n q u a m indignaris,
Tu, q u a e m a t e r sitis (167) ei, Peccatorum misereris,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

P e r virtutem Sanctae Crucis, Virtuosa et puella,


Te clamantes a d te ducis, Pia, dulcis plus q u a m mella,
Tu, q u a e sitis (168) via lucis, T u , q u a e sitis ( m ) maris Stella,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

Virtuosa, tota clara, Dominatrix Angelorum


Aufer cordis n u n c amara, M a r t y r u m q u e et Confessorum,
Tu, q u a e D e o es t a m chara, Tu, q u a e porta es Caelorum,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

Propter t u a m bonitatem, O C o r o n a Virginum,


Sana mentis p r a v i t a t e m . Q u a e laudaris omnium,
Tu, q u a e donas sanitatem. Tu, q u a e es juvatrix h o m i n u m ( n 0 ) ,
Da nobis quod petimus. Da nobis quod petimus.

Vers.: Exaltata es, sancta Dei Genitrix,


Resp.: Super Choros (171) Angelorum ad Coelestia Regna.

(165) N o texto, serva.


(166) N o texto, reformens.
(167) T a l v e z erro, por sistis.
(168) Idem.
(169) Idem.
(170) N o texto, invatrix hominum.
(171) N o texto, Chorus.
OREMUS
O Maria, Mater Filii Dei, ad cujus nomen respicient rei.
O Virgo, placa D e u m , quia p r o nobis Dei Mater facta es. Surge, Ma-
ter nostra. Surge, advocata nostra. Surge, surge, amplectare filium pro
filiis. O s t e n d e mamillas sacras, expande m a n u s immaculatas pro ancillis
tuis, a n t e faciem Redemptoris, qui vivit in saecula saeculorum.
Resp.: Amen ( m ) .

V a m o s traduzir algumas das estrofes latinas, e m b o r a sinta-


mos que a sua poesia se evola como u m perfume:

Digna do louvor dos anjos, Criatura do Criador,


Luz e vida dos pecadores, Piedosa, casta, doce, p u r a ,
Tu, q u e és mãe dos culpados, Tu, q u e és dadora do bem,
Dá-nos o que pedimos! Dá-nos o que pedimos!

Ó Maria, templo de Deus,


M ã e do verdadeiro Nazareno,
Tu, a q u e m c h a m a m Mãe de Deus,
Dá-nos o que pedimos!

O resto vai indo sempre no m e s m o ritmo, c o m o refrém d a


súplica final: Dá-nos o que pedimos! A ti, v i r g e m s a n t a , a d o r a m o
s o l e a l u a , a ti c l a m a m o s a u m a só voz! Inclina para m i m os teus
ouvidos misericordiosos, sê medicina, tu que preservas da ruína!
Implora, junto de Deus, a minha salvação! Pela virtude da santa
cruz, tu guias os q u e c h a m a m p o r ti! Dá-nos o que pedimos!

Virtuosa, toda gloriosa, Ó rainha honrada,


Tira, agora, as amarguras do Doce, clemente e bem-aventuarada,
coração T u , que a todos dás coisas agradá-
T u , que és tão querida de Deus, veis.
Dá-nos o que pedimos! Dá-nos o que pedimos!

Pela tua b o n d a d e , Tu, q u e livras d a ruína.


C u r a a m a l d a d e d a alma, Apressa-te a libertar-me,
T u , q u e dás a saúde, Tu, q u e és rainha do céu,
Dá-nos o que pedimos! Dá-nos o que pedimos!

A ti clamo, ó muito piedosa, M ã e casta e bela,


Tu, jerarquia celeste, Roga p o r mim, sem demora,
Tu, mãe virgem Maria, Tu, que a j u d a s a toda a hora,
Dá-nos o que pedimos! Dá-nos o que pedimos!

(172) S O R O R M A R I A D O B A P T I S T A , Livro da Fundação do Mosteiro do Salva-


dor da Cidade de Lisboa ( L i s b o a , 1 6 1 8 ) fls. 1 2 2 v . - 1 2 5 v .
Verdadeira c h a v e do paraíso, D o m i n a d o r a dos anjos,
T u , q u e n u n c a te indignas, Dos mártires e dos confessores,
Compadeces-te dos pecadores, T u , q u e és a porta dos céus.
Dá-nos o que pedimos! Dá-nos o que pedimos!
Virtuosa e jovem, O coroa das virgens,
Piedosa, mais doce do q u e o mel, Q u e és por todos louvada,
Tu, q u e és a estrela d o mar, T u , q u e és a a j u d a d o r a dos
Dá-nos o que pedimos! homens,
Dá-nos o que pedimos!

Vers.: És levantada, santa Mãe d e Deus,


Resp.: Aos reinos celestiais, sobre os coros dos anjos.

OREMOS

Ó Maria, m ã e do F i l h o d e Deus, p a r a c u j o nome os culpados vol-


tarão o olhar!
ó Virgem, aplaca Deus, já que, p o r amor d e nos, toste leita Mae d e
Deus! Ergue-te, m ã e nossa! Ergue-te, nossa a d v o g a d a ! Levanta-te, levan-
ta-te, a b r a ç a o F i l h o em nome dos filhos! Mostra os sagrados seios, e r g u e
as mãos imaculadas em favor das tuas servas, d i a n t e do R e d e n t o r , q u e vive
pelos séculos dos séculos.
D e s d e q u a n d o se rezavam tais versos neste convento d o

séc. X I V ? C o m o já vimos, cantavam-se pelo menos a partir d a

peste grande. M a s nos começos de seiscentos, o t e m p o já tinha

estropiado o latim n u m ou noutro lugar (talvez por defeito das

cópias usadas pelas freiras) e Soror Maria do Baptista estava con-

vencida de q u e o seu autor era d u m a época de m e n o r cultura

humanística.

C A P Í T U L O XIII

Ladainha de Nossa Senhora do Rosário

Originariamente, articulava-se esta litania e m cinco partes,


conforme os mistérios d o terço, algumas delas f o r m a n d o outras
m
tantas pequenas ladainhas, terminadas por u m a oração ( ). Po-
rém, os exemplares portugueses q u e nós conhecemos, u m deles
e m letra d o século XIX, n u m manuscrito do convento das Alber-

(173) ÂNGELO DE SANTI, Die Lauretanische Litanei ( P a d e r b o r n , 1900). 131-134.


m
tas, e m Lisboa, outro mais antigo, da Torre d o T o m b o ( ), e o
terceiro e m gótico do séc. XVI, das dominicanas de Aveiro, cons-
tituem já u m todo único, como qualquer outra ladainha. Ò apó-
grafo do s é c . X I X i n t i t u l a - s e Ladainha milagrosa contra tempes-
tades, trovoadas, tormentas, a qual todos os sabbados se canta
na Minerva de Roma, e a quem a rezar ou cantar, ou assistir a
ella concedeo o Papa Gregorio XV cem dias de perdão de pecca-
dos ( ). O exemplar d a Torre do T o m b o , e m letra do séc. XVII,
chama-lhe Ladainha de Nossa Senhora do Rosário.
Por mais antigo, preferimos o apógrafo das dominicanas de
Aveiro, e m pergaminho e c o m iniciais simples, a vermelho. E m e n -
d a r e m o s o menos possível, m e s m o q u e a ortografia sofra c o m isso:

Chirie, eleison.
Christe, eleison.
Sancta Trinitas unus Deus, miserere nobis.
Virgo, audi nos.
Virgo, exaudi nos.
Santa Maria, ora pro nobis.
Santa Dei Genitrix (176), ora pro nobis.
Sancta virgo virginum, ora pro nobis (177).
Mater veritatis, ora pro nobis.
Mater pietatis, ora pro nobis.
Mater caritatis, ora pro nobis.
Virgo potentíssima, ora pro nobis.
Virgo prudentíssima, ora pro nobis.
Virgo clementíssima, ora pro nobis.
Ancilla domini mitis, ora pro nobis.
Ancilla Christi humilis, ora pro nobis.
Ancilla Dei fidelis, ora pro nobis.
Sponsa eterni Patris, ora pro nobis.
Filia sumi Régis, ora pro nobis.
Templum Spiritus Sancti, ora pro nobis.
Domus Dei, ora pro nobis.
Sanctuarium Christi, ora pro nobis.
Sacrarium Paracleti, ora pro nobis (177 bis).
Speculum yusticiae, ora pro nobis.
Sedes sapientie, ora pro nobis.
( 1 7 4 ) T o r r e d o T o m b o , B i b l i o t e c a , m s . 2 1 5 6 : A N T Ó N I O F B E I R R , O . P . Modo de
rezar a coros o Rosario da Gloriosa Virgem Maria Nossa Senhora, fls. 8 5 v . - 9 3 v T o d o s
o s a p o g r a os c i t a d o s a p r e s e n t a m v a r i a n t e s , e m b o r a d e m e n o r i m p o r t â n c i a , s o b o p o n t o
(le v i s t a d a i n t e g r i d a d e s u b s t a n c i a l d a l a d a i n h a .
(175) Bibi. Nac. d e Lisboa, F u n d o Geral, caixa X. 2 - 2 5 d o 1 - 8
(176) N o ms., Genitris.

i \ l V 1 N ( ? K,1*'' c
' d a í e m d i a n t e - o r a - D e s d o b r a m o s p a r a ora pro nobis.
( 1 / 7 Ins) N o ms., e s t a v a p r i m i t i v a m e n t e Sanluarium, e m vez d o Sacrarium.
Fons misericordie ( m ) , ora pro nobis.
Salus infirmorum, ora pro nobis.
Refugium miserorum, ora pro nobis.
Advocata pecatorum, ora pro nobis.
Stela rutilantior (179), ora pro nobis.
Luna pulchrior (180), ora pro nobis.
Sole splendidior, ora pro nobis.
Scala celi, ora pro nobis.
Porta paradisi, ora pro nobis.
Domina mundi, ora pro nobis.
Cedrus fragrans, ora pro nobis.
Mirra conservans, ora pro nobis.
Balsamum distilans, ora pro nobis.
Fios virginitatis, ora pro nobis.
Lilium castitatis, ora pro nobis.
Rosa puritatis, ora pro nobis.
Palma vincens (181), ora pro nobis.
Virga florens, ora pro nobis.
Gema refulgens, ora pro nobis.
Oliva speciosa (182), ora pro nobis.
Columba formosa (183), ora pro nobis.
Mulier graciosa, ora pro nobis.
Rubus incombustus (184), ora pro nobis.
Hortus conclusus, ora pro nobis.
Puteus signatus (185), ora pro nobis.
Velus Gedeonis, ora pro nobis.
Favus Sansonis, ora pro nobis.
Tronus Salomonis (186), ora pro nobis.
Vitis frutificans, ora pro nobis.
Navis abundans (187), ora pro nobis.
Arca salvans, ora pro nobis.
Gloria mundi, ora pro nobis.
Honor populi, ora pro nobis.
Nutrix (188) parvuli, ora pro nobis.
Regina angelorum, ora pro nobis.
Regina patriarcharum, ora pro nobis.
Regina prophetarum, ora pro nobis.

(178) N o ms., misiricordie.


(179) N o ms., rutilantíum.
(180) N o ms., pulchiror.
(181) E m e n d a d o p a r a virens. _
(182) N o ms., especiosa, p o r sua vez correcção d e especios.
(183) N o ms., fermosa. E m p o r t u g u ê s arcaico, era f r e q u e n t e escrever Jermosa
e daqui o lapso d e q u e m t r a n s c r e v e u a l a d a i n h a .
(184) N o ms. incubustus.
(185) N o ms., sinhatus.
(186) N o ms., Salamonis.
(187) N o ms., abundas.
(188) N o ms., nutris.
Regina apostolorum, ora pro nobis.
Regina martirum, ora p r o nobis.
Regina confesorum, ora pro nobis.
Regina p r e d i c a t o r u m , ora p r o nobis.
Regina virginum, ora pro nobis.
Regina sanctorum omnium, ora p r o nobis.
Regina sacratisimi (189) rosarii, ora p r o nobis.
19
Ab omni ( °) maio et peccato, libera nos, domina.
Per salutiferam (191) conceptionem tuam, libera nos, d o m i n a ( 192 ).
Per salutiferam (193) nativitatem tuam, libera nos, domina.
Per b e a t a m presentacionem tuam, libera nos, domina.
Per humilem visitationem tuam, libera nos, domina.
Per sanctam purificationem et celestem (194) vitam tuam, libera nos, domina.
Per admirabilem assumptionem et gloriosam coronationem tuam, libera
nos, domina.
Ut veram penitenciam et (»5) perseverantiam (196) nobis i m p e t r a r e digneris,
te rogamus, domina.
Ut ecclesiasticos ordines (197) et catholicos príncipes conservare digneris,
te rogamus, domina (198).
Ut h a n c nostram cunctasque (199) congregationes tibi devotas a u g e r e et
conservare digneris, te rogamus, domina.
U t p o p u l o christiano p a c e m , salutem, a b u n d a n t i a m obtinere (20°) digneris,
te rogamus, domina.
Ut navigantibus p o r t a m , p r o f i d e (201) p u g n a n t i b u s vitoriam, fidelibus vi-
tam, defunctis ( m ) requiem eternam impetrare (203) digneris, te ro-
gamus, domina.
Ave d e celis alma, sucurre nobis, domina.
Ave d e celis pia, fer nobis opem, domina.
Ave de celis dulcis, intercede p r o nobis, domina.
Pater noster, ave Maria.

Ver.: Sancta Maria, mater Christi, audi rogantes servulos (205).


[Resp.: E t impetratam nobis celitus tu defer indulgentiam].

(189) E s t a invocação foi acrescentada m u i t o p o s t e r i o r m e n t e e sacratisimi corri-


gido p a r a santisinii.
(190) N o ms., onni.
(191) N o ms., salutifira.
(192) A q u i e nas súplicas seguintes, falta libera nos domina.
(193) N o ms., salutifira.
(194) N o ms., e seleste.
(195) N o ms., e.
(196) N o ms., perseoerantia.
(197) N o ms., ordinis.
(198) N o ms., vem sòmente te r. e o m e s m o acontece nas súplicas seguintes.
(199) N o ms., nostra conctasque.
(200) N o ms., optinere.
(201) N'o ms., fidem, e m vez d e pro fide.
(202) No ms., difuntis.
(203) N o ms., impetrare.
(204) N o ms., sucure.
(205) N o ms., servolos.

CENTRO DE ESTUDOS DE HISTÓRIA RELIGIOSA


Ver.: O r a t e pro nobis omnes sancti Dei,
[Resp.: Ut digni efficiamur promissionibus Christi].
Vers.: Salvos f a c servos tuos et ancilas tuas,
[Resp.: D e u s meus, sperantes in te].

[Vers.: D o m i n u s vobiscum].
[Resp.: E t cum spiritu t u o ] .

OREMUS

Supplicationem servorum t u o r u m D e u s miserator exaudi, u t qui m


societate sancti rosarii (206) Dei genitricis et virginis Marie congre-
g a m u r , ejus intercessionibus a te de instantibus periculis eruamur.
Tribue, quesumus, Domine, omnes sanctos tuos jugiter ( m ) orare pro
nobis et eos ( m ) clementer exaudire digneris (210).
Ecclesie tue, Domine, preces placatus ( 2 n ) a d m i t e ut, destructxs ( a i )
adversitatibus et erroribus ( 21J ) universis, secura tibi serviat libertate et pa-
cem t u a m [nostris concede temporibus],

Vers.: Ave Maria, gratia plena, D o m i n u s tecum, b e n e d i c t a tu in mu-


heribus et b e n e dictus fructus [ventris tui, Jesus],
Resp.: Santa Maria, m a t e r Dei, ora pro nobis peccatoribus, amen.
Vers.: Nos c u m prole pia,
Resp.: Benedicat Virgo Maria ( 214 ).

N o q u e diz respeito à música, o leitor pode vê-la e m foto-


gravura, na sua toada de cantochão, grave e piedosa.
N ã o vale a p e n a traduzir os versículos desta ladainha, tan-
tas vezes cantada pelas dominicanas do Mosteiro de Jesus, d e
Aveiro. As invocações não diferem muito das q u e já escutámos
noutras litanias: M ã e da verdade, m ã e da piedade, m ã e d a ca-
ridade, virgem clementíssima, serva humilde d o Senhor, templo
d o Espírito Santo, casa de Deus, santuário de Cristo, espelho de
justiça, fonte de misericórdia, refúgio dos desgraçados, mais bri-
lhante do q u e u m a estrela, mais bela d o que a lua, escada d o
céu, rainha dos pregadores, etc. D e todo o mal e pecado, livra-

(206) N o ms., rosairii.


( 2 0 7 ) N o ms., jhenitricis.
(208) N o ms., jugeter.
( 2 0 9 ) N o ms., deos.
(210) N o ms., digneres.
( 2 1 1 ) N o ms., plactus.
( 2 1 2 ) N o ms., destrustis.
(213) N o ms., eroribus.
( 2 1 4 ) M u s e u R e g i o n a l d e A v e i r o , m s . d e 7 fls. e m p e r g a m i n h o , p o r n u m e r a r , e n -
c a d e r n a d o e m c a r n e i r a , d e 2 0 5 x 2 6 5 m m . , fls. l - 7 v . A g r a d e c e m o s a o P.° D o m i n g o s
M a u r í c i o , S. J . , a i n f o r m a ç ã o d a e x i s t ê n c i a d e s t e a p ó g r a f o .
-nos Senhora! Pela tua conceição salvadora, livra-nos Senhora!
Pela tua admirável assunção e gloriosa coroação, livra-nos Se-
nhora!

Ladainha para ser cantada nas confrarias d o rosário d e Nos-


sa Senhora, espalhou-se muito e durou muito tempo. E temos de
agradecer a D e u s ter-se salvado a música, ao menos n u m ma-
nuscrito.

C A P Í T U L O X I V

Ladainhas do Loreto e da Sagrada Escritura

A ladainha lauretana aprovada oficialmente por Sisto V, e m


1587, d e v e ter entrado e m P o r t u g a l pelos m e a d o s d o séc. X V I , em-
bora nos falte documentação segura neste sentido. Muitos por-
tugueses, sacerdotes, peregrinos e viajantes c h e g a v a m da Itália,
onde percorriam os lugares famosos, entre eles Nossa Senhora
d o Loreto. S. F r a n c i s c o Xavier foi u m deles, na c o m p a n h i a de D.
Pedro de Mascarenhas (215). E m Lisboa, erguia-se a igreja d e Nos-
sa Senhora d o Loreto, c o m u m capelão, sete clérigos e três con-
frarias d e mercadores i t a l i a n o s (216). N e s t e templo, as práticas re-
ligiosas moldavam-se, certamente, nas de Loreto, tratando-se,
principalmente, de negociantes italianos.

Aliás, pelos princípios do século s e g u i n t e , já tal l a d a i n h a en-


trara no reino cio C o n g o , levada pelos nossos missionários, pois
vamos encontrá-la, e m latim, n a versão c o n g o l e s a (217) d a Doutri-
na Cristã do P.° M a r c o s Jorge, S. J., f e i t a e n t r e 1619 e 1620, por
o r d e m do P." M a t e u s Cardoso, S. J . (218.) C o m as viagens lentas
daqueles tempos e sendo tal versão efectuada n o norte de An-

( 2 1 5 ) Epistolae S. Francisci Xaccrii. e d . por G . S c h u r h a m m e r e J. Wicki, 1


( R o m a , 1944) 3 0 .
( 2 1 6 ) C R I S T Ó V Ã O R O D R I G U E S D E O U V E I R A , Sumário em que brevemente se con-
tem alguns cousas... que ha na cidade de Lisboa ( L i s b o a , 1 9 3 9 ) 16.
( 2 1 7 ) Doutrina Christaã. Composta pelo P. Marcos Jorge da Companhia de lesu,
Doutor em 7 heologia. Acrescentada pelo Padre Ignacio Martinz. De n o u o traduzida na
hngoa do Reyno do Congo, por ordem do P. Matheus Cardoso, da Companhia de lesu
( L i s b o a , 1 6 2 4 ) fls. 1 0 5 v . - 1 0 7 .
„„ Monumento Missionaria Africana, ed. por António Brásio. 7 (Lislxja 1956)
287. J. CÜVBMER e L. J A D I N , VAncien Congo (Bruxelas. 1 9 5 4 ) 4 6 8 .
gola, p o d e m o s supor q u e tal l a d a i n h a havia muito se rezava e m

Portugal.

Teriam os tradutores encontrado esta litania do Loreto na


obrinha do P." Marcos Jorge, S. J., acrescentada pelo P." Inácio
Martins, S. J., ( t 1598)? F a z e m o s tal p e r g u n t a porque nessa épo-
ca, o jesuíta inglês, P.° T o m á s Estêvão (t 1619), q u e partiu de
Lisboa para a índia e m 1579, trasladava o m e s m o catecismo e m
concani. Ora, é a ladainha escriturística q u e lá encontramos (219)
e não a dos nossos dias. E m vão procurámos u m exemplar das
edições quinhentistas da Doutrina Cristã. U m a coisa é certa: tal
ladainha d o Loreto faltava na obra original do P.° M a r c o s Jorge,
S. J., e o P.8 I n á c i o Martins não a acrescentou, segundo nos pa-
rece, pois u m a edição Doctrina
de 1655 traz a seguinte portada:
Christam [...]. Pelo P. Marcos Jorge da Companhia de Jesu, Doc-
tor em Theologia. Acrescentada pelo P. Ignacio Martins da mes-
ma Companhia, Doctor Theologo. De novo emendada e acrescen-
tada hüa Ladainha de Nossa Senhora
Esta ladainha acrescentada é a do Loreto, tal c o m o a reza-
mos hoje e m dia, afora u m ou outro versículo q u e o t e m p o foi
ajuntando. Mas, repetimos, introduziram-na depois das e m e n d a s
e aditamentos d o P." I n á c i o Martins, S. J.

Apesar disso, suspeitamos q u e tal ladainha devia ser rezada


pelos jesuítas portugueses, talvez no final de quinhentos, para
se encontrar já n o catecismo congolês impresso e m 1624.

Isto não significa ser ela a mais vulgar, naqueles tempos.


C o m efeito, o P.° J o ã o Rebelo imprimia, e m 1599, três ladainhas
m
marianas d e vários tipos ( ). Pois bem, n e n h u m a delas é a litania
de Nossa Senhora vulgarmente usada nos nossos dias. Se ela fos-
se mais c o n h e c i d a e m Portugal d o q u e as outras, João Rebelo não
a teria deixado na sombra.

Q u a n t o às ladainhas tiradas da Sagrada Escritura, gozaram


d u m efémero triunfo, no final do séc. X V I , apesar de nova: letta-
nie moderne, chama-lhes Giulio Candiotti, e m 1578, n u m a carta
m
para o p a p a ( ). E sâo-no, de facto, não só por virem depois da

E
( 2 1 9 ) P. T O M Á S E S T Ê V Ã O , S . J . , Doutrina Christam em língua bramana canarim
( R a c h o l , 1622) fls. 6 2 - 6 4 v .
( 2 2 0 ) L i s b o a , 1 6 5 5 , fls. 7 6 - 7 8 .
( 2 2 1 ) P . ° J O Ã O R K B K L O S . J . , Rosario de la Sanctissinui Virgen Maria Madre de
Dios, 2 ( É v o r a , 1 5 9 9 ) fls. 2 Í 2 v . - 2 1 8 v .
( 2 2 2 ) Â N G E L O DF. S A N T I , Le Letanie Lauretane, «Civiltà Cattolica», serie 1 6 , 9 ,
(Roma, 1897) 167.
ladainha do Loreto m a s t a m b é m pela apressada artificiosidade
q u e revelam (ao contrário das outras, produto d u m a longa evo-
lução). E por q u e nasceram elas, se já havia tantas e u m a delas
estava a triunfar? É q u e Pio V, e m 1571, m a n d o u expungir o
Officium Beatae Virginis de algumas orações e litanias. C o m o no
Loreto já se c a n t a v a m as ladainhas da SS. Virgem e os clérigos
d o santuário desejavam continuar esta comovente devoção, p o d e
ser q u e se l e m b r a s s e m então de c o m p o r u m a litania m a r i a n a c o m
versículos tirados da Bíblia, para n i n g u é m ter n a d a q u e dizer ( w
).

Seja c o m o for, e m 1575 já elas e s t a v a m musicadas a oito vo-


zes: Litaniae Deiparae Virginis Mariae ex Sacra Scriptura de-
promptae. Quae in Alma Domo Lauretana omnibus diebns sab-
bati, Vigiliarum et Festorum ejusdem Beatae Virginis decantari
solent. Cum musica octo vocum Constantii Portae ejusdem Al-
mae Domus Musicae Magistri ( V e n e z a , 1 5 7 5 ) . E m b o r a o s n o s -
sos missionários a levassem para o Oriente, a sua decadência foi-
-se acentuando, a partir d o séc. XVII, até praticamente desapa-
recerem da generalidade dos livros piedosos.

Deixando e m paz a edição d o catecismo concani, podíamos


m
preferir u m p e q u e n o códice de 1602 { ), compilação levada a
cabo por u m jesuíta a n ó n i m o e valiosa pelo q u e nos revela sobre
as práticas espirituais e as orações dos m e m b r o s da C o m p a n h i a
de Jesus. Contudo, por ainda estar dentro do séc. XVI, publica-
m o s a e d i ç ã o f e i t a p e l o P.c J o ã o R e b e l o , S. J., n a o b r a a t r á s citada:

Kyrie, eleison.
Christe, eleison.
Kyrie, eleison.
Pater de caelis Deus, miserere nobis.
Fili Redemptor mundi Deus, miserere nobis.
Spiritus Sancte Deus, miserere nobis.
Sancta Trinitas unus Deus, miserere nobis.
Sancta Maria, ora pro nobis.
Sancta Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta Virgo virginum, ora pro nobis.
Mater viventium, ora pro nobis.
Mater pulchrae dilectionis, ora pro nobis.
Mater sanctae spei, ora pro nobis.
Paradysus voluptatis, ora pro nobis.
Lignum vitae, ora pro nobis.
( 2 2 3 ) Ih., 168.
( 2 2 4 ) B i b i . N a c . d e L i s b o a , F u n d o G e r a l , m s . 6 6 4 5 , fls. 1 2 v . - 1 6 .
D o m u s sapientiae, ora pro nobis.
Porta caeli, ora pro nobis.
D e s i d e r i u m collium aeternorum, ora pro nobis.
Civitas refugii, ora pro nobis.
Gloria Hyerusalem, ora pro nobis.
Sanctuarium Dei, ora pro nobis.
T a b e r n a e u l u m foederis, ora pro nobis.
Altare thymiamatis, ora pro nobis.
Scala Iacob, ora pro nobis.
Speculum sine macula, ora pro nobis.
Lilium inter spinas, ora pro nobis.
R u b u s ardens incombustus, ora p r o nobis.
Vellus Gedeonis, ora pro nobis.
T h r o n u s Salomonis, ora pro nobis.
Turris e b u r n e a , ora pro nobis.
F a v u s destillans, ora pro nobis.
H o r t u s conclusus, ora pro nobis.
F o n s signatus, ora pro nobis.
P u t e u s a q u a r u m viventium, ora pro nobis.
Navis institoris de longe portans p a n e m , ora pro nobis.
Stella matutina, ora pro nobis.
Aurora consurgens, ora pro nobis.
Pulchra u t luna, ora pro nobis.
Electa ut sol, ora pro nobis.
C a s t r o r u m acies ordinata, ora pro nobis.
Solium gloriae Dei, ora pro nobis.
A cunctis periculis, libera nos, Virgo gloriosa.
P e r salutarem conceptionem tuam, libera nos, Virgo gloriosa.
Per sanctam nativitatem tuam, libera nos, Virgo gloriosa.
Per admirabilem annunciationem tuam, libera nos, Virgo gloriosa.
Per gloriosam ascensionem tuam, libera nos, Virgo gloriosa.
Peccatores, te rogamus, audi nos.
U t veram poenitentiam nobis impetrare digneris, te rogamus, audi nos.
U t societatibus tibi peculiari obsequio devotas conservare et a u g e r e digne-
ris, te rogamus, audi nos.
Ut ecclesiae sanctae cunctoque populo christiano p a c e m et u n i t a t e m im-
p e t r a r e digneris, te rogamus, audi nos.
U t omnibus fidelibus defunctis requiem a e t e r n a m d o n a r e digneris, te ro-
gamus, audi nos.

Agnus Dei, qui tollis peccata m u n d i , p a r c e nobis, Domine.


Agnus Dei, qui tollis peccata m u n d i , exaudi nos, Domine.
Agnus Dei, qui tollis peccata m u n d i , miserere nobis.

Vers.: O r a pro nobis, sancta Dei genitrix,


Resp.: U t digni efficiamur promissionibus Christi.
OREMUS

Pietate tua, quaesumus, Domine, nostrorum solve vincula pecca-


torum et, intercedente beata Maria cum omnibus sanctis tuis, nos fâmulos
tuos, benefactores atque loca nostra in omni sanctitate custodi omnesque
consaguinitate atque familiaritate nobis conjunctos a vitiis purga, virtutibus
illustra, pacem et salutem nobis tribue, hostes visibiles et invisibiles re-
move, carnalia desideria repelle, aerem salubrem et fertilitatem indulge,
amicis et inimicis nostris charitatem largire atque oppidum nostrum cum
omnibus in eo habitantibus a b omni peste infideliumque feritate et potentia
illaesum conserva et omnibus fidelibus vivis et defunctis requiem aeter-
n a m concede, omnes praelatos et cunctum populum christianum ab omni
adversitate custodi et benedictio tua sit super nos semper. Per Christum
Dominum nostrum. Amen (225).

Porta do céu, tabernáculo do Testamento, lírio entre espi-


nhos, trono de Salomão, torre de marfim, poço de águas vivas,
estrela matutina, horto cerrado — todas estas e outras invoca-
ções v ê m na Bíblia. E por isso d i z e m o s ladainha da Sagrada Es-
critura.

C A P Í T U L O X V

Do canto das ladainhas de Nossa Senhora

N e m sempre é claro tudo o q u e lemos acerca das ladainhas


de Nossa Senhora, por exemplo, na C o m p a n h i a de Jesus. Q u e
elas se rezavam nos seus colégios (e c o m maior razão nas con-
gregações marianas) isso n ã o oferece dúvida. C o m o diz u m a edi-
ção quinhentista d o Ratio Studiorum (m), n a s r e g r a s c o m u n s d o s
p r o f e s s o r e s d a s c l a s s e s i n f e r i o r e s , Litanias Beatissimae Virginis
Sabbatho sub vesperum in sua classe recitari jubeat, vel, si moris
sit, in templum ad easdem cum ceteris audiendas ducat. N u m a
palavra, o professor, aos sábados de tarde, faria recitar, na sua
aula, as ladainhas da bem-aventurada Virgem Maria ou, se fosse

( 2 2 5 ) P . c J O Ã O R E B E L O , S. J . , Rosario de la Sanctissima Vireen Maria Madre de


Dios, 2 ( É v o r a , 1 5 9 9 ) fls. 2 1 7 - 2 1 8 v .
( 2 2 6 ) Ratio atque institutio studiorum Societatis Iesu ( N á p o l e s , 1 5 9 8 ) 1 1 8 , nas
Regulae communes professoribus classium inferior um, n . ° 7 .
costume, levaria os alunos à igreja, para assistirem a elas, c o m
os outros.
N u m a carta de Praga, a 3 0 de Abril de 1559, conta o P.°
Paulo Hoffaeus que, 110 c o l é g i o , aos domingos e dias santos da
quaresma desse ano, os jesuítas litanias lauretanas,
cantaram as
diz ele, conforme os nossos de Roma costumam cantar ( 2 2 7 ) . S e -
riam as ladainhas de agora, 011 o u t r a s diferentes? N ã o sabemos
c o m certeza.

Quando, a partir de 1563, as congregações marianas se es-


palharam pela E u r o p a católica, julgamos q u e as ladainhas can-
tadas iriam t a m b é m c o m elas. E m 1574, os estatutos das congre-
gações foram refundidos e t o m a r a m u m a forma mais jurídica.
Pois bem: prescreviam explicitamente várias práticas religiosas
e o canto das ladainhas de Nossa Senhora, 11a i g r e j a d a Annunzia-
m
ta, e m Roma. O m e s m o acontecia n o colégio de Clermont ( ) e
certamente noutras congregações, moldadas pela da Annunziata,
2M
cabeça de todas as mais congregações da Companhia ( ).
I n f e l i z m e n t e , o s Estatutos da Congregação de N. Senhora da
Doutrina dos Offiçiaes, sita na Casa de S. Roque da Companhia
de Jesu, da cidade de Lisboa, e s c r i t o s e m 1 6 2 3 , d i z e m - n o s s o -
m e n t e que, na tarde dos dias de comunhão, os congregados ou-
rl
virão a Ladainha de N. S. a que todos responderão em voz in-
telligivel ( 2 3 ° ) . C a n t a d a ? E i s o q u e g o s t a r í a m o s d e s a b e r , p o i s t a l
congregação devia seguir as práticas das suas irmãs mais velhas
do séc. XVI.

U m a coisa é certa: cantavam-se as ladainhas de Nossa Se-


nhora e m Portugal e na índia portuguesa, pelo menos. N o séc.
XVII, cantavam-se obrigatoriamente aos sábados, e m todas as
casas da o r d e m dominicana, depois d a salve-rainha. Porém, antes
desta determinação, já muitos conventos dos frades pregadores
seguiam tal costume: « V o l u m u s et ordinamus ut in o m n i b u s nos-
tri Ordinis Conventibus, locis, d o m i b u s ac Monasteriis, etiam
Monialium, ejusdem Deiparae Virginis Litaniae singulis diebus
Sabbati, prout in multis nostri Ordinis Conventibus pie fieri jam

(227) Monumenta Histórica Societatis Jesu, Litterae Quadrimestres, 6 (Madrid,


1925) 153.
(228) EMILE VILARET, Les Congrégations Mariales ( P a r i s , 1 9 4 7 ) 3 4 3 - 3 4 4 .
(229) Estatutos da Congregação de N. Senhora da Doutrina, ms. do Arq. d a Com-
panhia de Jesus em Portugal, no prólogo.
( 2 3 0 ) Ih. fl. 6 .
consueverat, post Salve Regina decantentur» (ai). N ã o fora cer-
tamente e m meia dúzia de anos q u e tal devoção se espalhara
entre os frades e freiras d e S. D o m i n g o s . T u d o isto d e v i a levar o
seu tempo, atendendo ao tradicionalismo conventual, e para se
generalizar (in multis...) devia tal devoção ter arrancado de
longe.

N o M u s e u Regional de Aveiro, existe ainda u m a ladainha


c o m música, a q u e já nos referimos. Pertencia ao convento de
freiras dominicanas daquela cidade. N o Mosteiro d o Salvador,
e m Lisboa, cantava-se igualmente outra litania da SS. Virgem
— e t a m b é m a sua música chegou aos nossos dias, c o m o vimos
anteriormente.

Cantavam-se as ladainhas e m latim e t a m b é m e m português,


pelo menos no m u n d o lusíada d o Oriente. N u m a carta d o vice-
-rei d a fndia, D. Afonso de Noronha, para o jesuíta Gaspar Bar-
zeo, escrita de Dio, a 16 d e N o v e m b r o de 1552, p e d e o vice-rei
que, aos sábados, rezem por ele u m a oração q u e lhe m a n d a , por
az
ocasião das ladatjnhas de Nossa Senhora ( ). T a m b é m aqui fica-
mos a ignorar se as c a n t a v a m ou não.
e
Porém, o P. Gonçalo da Silveira, S. J., ao escrever d e M o -
ç a m b i q u e para o P.° A n t ó n i o de Quadros, S. J., a 12 d e Fevereiro
de 1560, conta-nos a sua aventurosa viagem da índia para as
costas de África: «Aos sabados tomei eu pera dizer as ladainhas
da M a d r e de Deus, q u e lá dizíamos c o m os novicios [...]. H à s
ladaynhas d a M a d r e de D e u s vierão a gente d o navio a tomar
muita devação, e o piloto e outros as treladarão, do q u e eu fico
n a m pouco consolado aver a M a d r e de D e u s por b e m de imper-
mirmos sua devação especial até polas barcas. E pera lhes crecer
a devação da Virgem e suas excellencias serem mais familiares,
eu pus as ladainhas da Virgem e m lingoagem, c o m as suas ora-
çõis competentes pera ha navegação. Mando-as a V. R. pera as
ver e t a m b é m porque pedi e m casa dos novicios q u e m a s tiras-
sem, e q u a n d o cá has vi n a m m e faziam tanta devação c o m o as
de latim, e essas, q u e se tirarão cá, pello m a r faziam tanta h à
gente, q u e n a m podia ser mais, segundo parecia» (233).

(231) Regula S. Augustini et Constitutiones Fratrum Ordinis Praedicatorum (Ro-


m a , 1690) 25. O s u b l i n h a d o é nosso.
(232) Monumento Histórica Societatis Jesu. Documenta Indica, ed. por J. Wicki,
S. J . , 2 ( R o m a , 1 9 5 0 ) 4 0 4 .
( 2 3 3 ) Ib., 4 ( R o m a , 1 9 5 6 ) 5 2 6 .
Tais ladainhas traduzidas por Gonçalo da Silveira e m por-
tuguês, e m b o r a agora não saibamos onde param, c h e g a r a m ao
seu destino, juntamente c o m a carta. Por outro lado, diz-nos An-
tónio Franco q u e o futuro mártir d o M o n o t a p a ordenou humas
ladainhas mui devotas, e m honra d a Virgem Maria, que os Ir-
mãos Noviços rezávão í 2 3 4 ) . Rezavam-se, simplesmente, ou canta-
vam-se? António Franco não é claro. Fica-nos, ainda assim, a
consolação de saber q u e se c a n t a v a rijamente u m a ladainha m a -
riana e m português, nas calmarias estagnantes.

Efectivamente, a carta de Gonçalo d a Silveira continua deste


modo: «Nestas calmarias se começarão ha cantar has ladainhas
q u e antes se deziam rezadas. H o canto f o r m a d o faziam o vigairo
d e Çofala e o capellam d o capitão q u e as alevantavão, e nós c o m
o capitam e povo respondíamos e m canto de lavradores [...].
M a s o canto parece q u e se acordou pera os louvores da M a d r e
de D e u s resoarem pelos abissos do m a r até às alturas d o paraíso,
porque logo se sigio o sabado à noyte cantarem a sua ladainha,
c o m o ha lá mando. E certo que, asim soava nas orelhas e nas
almas ha alleluia virginal, q u e se e u fora peixe ou dos alcatrazes
q u e naquela parajem andavam, eu gritara ao Criador q u e as cal-
marias d u r a r a m mais d o q u e durarão, e q u e se tornassem as agoas
do m a r doces pera n a m nos quexarmos tanto hà Virgem c o m a
a i
m e s m a ladainha» ( ).

N u m a palavra: ladainhas de Nossa Senhora postas em lingoa-


gem e cantadas pelos passageiros, embarcadiços e clérigos d o na-
vio. N ã o era só a ladainha q u e subia ao céu, m a s t a m b é m a nossa
língua, nesses mares remotos. E m q u e música? N a d a d e oito
vozes, c o m o no Loreto, m a s o povo a responder e m canto de la-
vradores, c o m a música vulgar d a ladainha dos santos. Afora al-
g u n s clérigos, o resto era gente r u d e e n ã o seria c a p a z d e mais —
e talvez Nossa Senhora preferisse esta música de lavradores.
D e s d e aquele sábado de calmaria até M o ç a m b i q u e , no barco
martelado pelas ondas amargas, o P." G o n ç a l o da Silveira pediu
ao capitão q u e se dixesse a ladaynha da Virgem c a n t a d a , a p e -
dir vento propício e b o a v i a g e m . Asim se fez, e s c r e v e o grande

( 2 3 4 ) P . C A N T Ó N I O F R A N C O , S . J . , Imagem da Virtude em o Noviciado da Compa-


nhia de Jesus no Real Collegio de Coimbra, 2 (Coimbra, 1719) 3 6 .
(235) Monumenta Histórica Societatis Jesu. Documenta Indica, ed. por J. Wicki,
S. J . , 4 ( R o m a , 1956) 5 2 7 - 5 2 8 .
missionário, com todos a cantar os pregões virginais. E gostosa-
mente cantavam, por serem as cousas da Virgem de tanta mello-
dia (»).

CONCLUSÃO

Como nos caminhos enredados que conduzem ao Santo


Graal, quase nos perdemos nesta pequena floresta de ladainhas
marianas, umas grandes, outras pequenas, algumas de bom gosto,
outras estèticamente falhadas. Todas elas, embora diferentes,
apresentam um mesmo fundo doutrinal e, até, um certo lastro de
imagens e comparações iguais, a que poderíamos chamar deno-
minador comum.
Levar-nos-ia demasiado longe o estudo do seu conteúdo
teológico e a análise estética do seu estilo. Para isso, seria preciso
compor novos capítulos, de índole diferente dos que deixámos
escritos. Temos, pois, de esperar para outra ocasião.
Resta-nos chamar mais uma vez a atenção para o fenómeno
da evolução e sobrevivência de algumas ladainhas de Nossa Se-
nhora. Ao longo dos séculos vagarosos, muitas invocações caíram
em desuso, outras ganharam em leveza grácil e piedosa, algumas
surgiram de novo, como um transeunte que se mete numa pro-
cissão que já vem de longe.
Mesmo as ladainhas que praticamente morreram, nunca de-
sapareceram de todo, porque parte do seu conteúdo passou a
outras litanias, formando-se assim uma herança de belas invoca-
ções que o instinto cristão seleccionou lucidamente. E foi esse
mesmo instinto que isolou a actual ladainha lauretana do meio
das outras, concedendo-lhe um carácter ecuménico e espalhan-
do-a pelo mundo.
Por que triunfou esta ladainha e não qualquer das suas irmãs
mais antigas? Em primeiro lugar, porque Sisto V (t 1590) a apro-
vou oficialmente, no ano de 1587. Além disso, a 6 de Setembro
de 1601, a Sagrada Congregação do Santo Ofício decretou que,
das litanias da SS. Virgem, só as cantadas no Loreto se rezassem
(236) lb., p. 528.
oficialmente (237). Desta forma, muitas ladainhas marianas live-
ram de se limitar, desde então, ao culto particular, o que as tor-
nava cada vez menos conhecidas.
Em segundo lugar, temos os motivos de ordem estética e
mesmo histórica. De facto, algumas litanias eram pesadas e de
estrutura às vezes um pouco caótica. E uma delas, pelo menos,
além de nova parece-nos artificial. Queremos referir-nos à Ladai-
nha da Sagrada Escritura. Tudo leva a crer que, à data do refe-
rido decreto, ela ainda estava em uso no santuário do Loreto.
Apesar disso, foi fàcilmente superada pela ladainha mariana dos
nossos dias. É que esta, também curta e inspirada na Sagrada
Escritura, enraizava mais na tradição, tinha uma espontaneidade
que faltava à outra e reunia muito do que havia de mais belo
no mundo das ladainhas de Nossa Senhora.
Isto, porém, não implica necessàriamente a supressão total
das suas irmãs mais velhas e até doutras mais novas.
Na Collecção Sacro-Dolorosa do oratoriano Martinho Pe-
reira, publica-se uma Ladainha da Senhora das Dores e, logo a
seguir, outra litania da mesma Senhora para alcançar a casti-
dade D .
Já vimos que no Convento das Albertas, em Lisboa, em letra
do séc. XIX, copiada talvez doutro manuscrito mais antigo, exis-
tia o exemplar duma ladainha arcaica, com o título de Ladainha
milagrosa contra tempestades, trovoadas, tormentas, a qual to-
dos os sabbados se canta na Minerva de Roma, e a quem a rezar
ou cantar, ou assistir a ella, concedeo o Papa Gregorio XV cem
dias de perdão de peccados (239).
Ainda nos começos do século passado, rezava-se uma ladai-
nha de estrutura bem diversa da lauretana, tão diversa que um
dia não resistiremos ao gosto de a transcrever integralmente (M0).
Já vimos também como a ladainha do rosário conseguiu
sobreviver longamente entre nós (M1).
Por agora, limitamo-nos a arquivar, nestas páginas, as litanias
rezadas em Portugal, na Idade Média e no séc. XVI — bonitas

(237) G A S P A R R I , Codicis Júris C.anonici Fontes, 4 ( C i d a d e d o Vaticano, 1 9 5 1 ) 1 - 2 .


(238) P." M A R T I N H O P E R E I R A , Collecção Sacro-Dolorosa (Lisboa, 1791) 288-290.
(239) Bibi. N a c . d e Lisboa, F u n d o Geral, Caixa X, 2-25.
(240) Sete ladainhas para todos os dias da semana (Lisboa, 1806) 5 7 e ss.
(241) T o r r e d o T o m b o , Biblioteca, m s . 2156, fls. 85v.-93v.; Bibi. N a c . d e L i s b o a ,
F u n d o Geral, caixa X, 2-25, p p . 1-8.
ou feias, complicadas ou simples. Outras haveria, cuja notícia não
chegou até nós e que algum dia viremos a descobrir, pois em his-
tória nunca podemos dizer que sabemos tudo.
As ladainhas arquivadas nestas páginas ajudam os homens
de hoje a conhecer a vasta floração litânica em torno da Virgem
Maria. Em grande parte, trata-se dum mundo quase desaparecido.
Porém, o seu espírito ficou e, também, alguma coisa da sua es-
tética literária, mesmo em composições que não são propria-
mente ladainhas marianas.

APÊNDICE

Ladainha do Hum. 619, da Biblioteca Municipal do Porto

Embora venha num manuscrito medieval, só em apêndice


nos referimos à ladainha deste códice iluminado. É que não sen-
timos suficiente segurança para introduzir tal ladainha entre as
que se rezavam em Portugal. Não por estar num manuscrito de
além-Pirenéus, mas por fazer parte dum conjunto pouco acessível
ao leitor vulgar. Contudo, não queremos negar a possibilidade de
tal ladainha ser rezada em Portugal, pois o manuscrito interessou
a alguém e para cá veio.
É um manuscrito do séc. XV, quase todo em francês arcaico
(geralmente mais arcaico do que a letra do códice) e de conteúdo
variado, por exemplo: a Image du Monde, versificada em francês
pelo poeta Gossuin de Metz, nos meados do séc. XIII, preceitos
morais em rima, orações em verso, louvores de Nossa Senhora,
orações, uma explicação da missa, versos às dores da Virgem Ma-
ria, as Horas da Cruz, em prosa francesa, ladainhas em latim, o
Oficio de Nossa Senhora, na mesma língua, os sete salmos peni-
tenciais, sinais do fim do mundo e uma escada espiritual de trinta
degraus, etc..
Destas páginas isolamos a ladainha de Nossa Senhora, por
muita gente a desconhecer e na esperança vaga de alguns portu-
gueses dos tempos idos terem poisado nestas invocações maria-
nas o seu olhar curioso e devoto:
LA LETANIE

Kyrife], eleyson.
Christ[eJ, eleyson .
Christe, audi nos.
Pater d e celis Deus, miserere nobis.
Fili redemptor mundi Deus, miserere nobis.
Spiritus Sancte Deus, miserere nobis.
Sancta Trinitas unus Deus, miserere nobis.
Sancta Maria, ora pro nobis.
Sancta Maria, exeellentissima regina, ora pro nobis.
Sancta Maria benigníssima, ora pro nobis.
Sancta Maria beatíssima, ora pro nobis.
Sancta Maria, clementíssima domina, ora pro nobis.
Sancta Maria, consolatio ad te confugientium, ora pro nobis.
Sancta Maria plena omni pietate et dulcedine, ora pro nobis.
Sancta Maria, mater eterni regis, ora pro nobis.
Sancta Maria, pulchritudo angelorum, ora pro nobis.
Sancta Maria laude digníssima, ora pro nobis.
Sancta Maria, fios patriarcharum, ora pro nobis.
Sancta Maria, desiderium prophetarum, ora pro nobis.
Sancta Maria, gaudium apostolorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, laus m a r t y m m , ora pro nobis.
Sancta Maria, gloria sanctorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, virgo virginum, ora pro nobis.
Sancta Maria, Dei genitrix, ora pro nobis.
Sancta Maria, virgo inmaculata, ora pro nobis.
Sancta Maria, decus virginum, ora pro nobis.
Sancta Maria, castitatis exemplum, ora pro nobis.
Sancta Maria, super omnes benedicta, ora pro nobis.

Sancta Maria, extende m a n u m tuam et tange cor meum, ut fiat voluntas


Dei in me et illumines et liberes me, famulum tuum.
Sancta Maria, Dei genitrix, per manum filii tui Jhesu Christi, salvatons
nostri, qui in útero tuo incarnari voluit, miserere michi, famulo tuo.
Sancta Maria, virgo perpetua, pro dilectione filii tui, qui te exaltavit super
choros angelorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, adjuva me et intercede pro me, ut custodiat me Deus ab
omni maio preterito, presenti et futuro.

Sancta Maria, spes miserorum, ora pro nobis.


Sancta Maria, dyadema sanctorum, ora pro nobis.
Sancta Maria, decoratrix omnium, ora pro nobis.
Sancta Maria, dulcedo tribulationis, ora pro nobis.
Sancta Maria, lucida Stella maris, ora pro nobis.
Sancta Maria, porta celi potentíssima, ora pro nobis.
Sancta Maria, cônscia secretorum Dei, ora pro nobis.
Sancta Maria virgo, intercede pro toto mundo.
214 LVSITANIA SACRA

Kyrife], eleyson.
Christfe], eleyson.
Kyrife], eleyson.
Sancta Maria, ora pro nobis ( M2 ).

Deve ser do séc. XIV/XV e lembra, em boa parte, a litania


mariana dum Officium, Beatae Virginis, em caracteres do séc. XV,
dum convento de freiras alemãs Porém, estudando-as em to-
dos os seus títulos e até ao fim, encontramo-nos perante duas la-
dainhas diversas (embora com pontos de contacto, entre eles a
repetição final do Kyrie eleison, para não falarmos duma série de
invocações iguais). E só nos falta dizer: Santa Maria, excelentís-
sima rainha e clementíssima senhora, consolação dos que em ti
se refugiam, cheia de piedade e doçura, beleza dos anjos, flor
dos patriarcas, alegria dos apóstolos, louvor dos mártires, glória
dos santos, virgem imaculada, esperança dos desgraçados, coroa
dos santos, doçura na tribulação, luzente estrela do mar — roga
por nós e intercede pelo mundo inteiro!

MÁRIO MARTINS, S. J.

(242) Bibi. M u n . d o Porto, ms. ilum. 619, fls. 1 1 0 v . - l l l .


(243) À N 0 E J . 0 D E S A N T I , Die Lauretanische Litanei (Paderborn, 1900) 63-64.
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'não cuftuma fe poem aqui pera os


deuotos de noíía Senhora o canto
também; porque entoada bem faz
muita deuaçao-
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peccatorü/Tu quae mater cs reoi ü,


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SOROR MARIA DO B A P T I S T A , L i v r o de Fundação do M o s t e i r o do Salvador
da Cidade de Lisboa (Lisboa, 1 6 1 8 ) , f l . 122v
M o f l c i r o d o S a l u a d o r . j j , j

wttmmtmamm mu um i

j^H . B~ K Q i ^ ^ „l' • ~m

; D a nobis quod pctimus.

O Maria cemplum Dei


Mater veri Nazárei
Tu quam macer vocác Dei,
Da nobis quod peei mus.
Creator is creatura
Piajcaftajdulcisjpura,
Tu qux boni es datura
I D a nobis quod pctimus.
T u quae plena es dulcoris
Vas vircutum,vas honoris:
[ Qua: es clemens cunfós horis
[ ; Q i D»
SOROR M A R I A D O B A P T I S T A , Livro da Fundação do M o s t e i r o do Salvador
da Cidade de Lisboa (Lisboa, 1 6 1 8 ) , fl. 123

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