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O AZULEJO EM PORTUGAL

Cultura, Língua e Comunicação


UC7 – Saberes Fundamentais
DR4 – Leis e Modelos Científicos
“ […] A obra de arte não existe para nós se
não a recriarmos também […]. Recriarmos a
obra de arte quando a vemos, a ouvimos, a
lemos, porque penetramos nela e as pequenas
palavras, as pequenas imagens, libertam-se
subitamente dentro de nós.”
BRONOWSKY, J, A Arte e Conhecimento Diego Velasquez, 1656

“Uma obra de arte [é uma] forma completa e


fechada na sua perfeição […] e, apesar disso,
aberta […].”
ECO, Umberto, A Poética da Obra de Arte
Joel-PeterWitkin, 1987
Azulejo em Portugal:
suporte de tolerância entre o exotismo e a sensualidade
O AZULEJO é um elemento interiores dos edifícios e dos espaços
identificativo da Cultura portuguesa, urbanos.
revelando algumas das suas matrizes
3. Uma específica sensibilidade que em
profundas:
Portugal se orienta mais para valores
1. A capacidade de diálogo com de Sensualidade do que de Conceito,
outros Povos, evidente pelo gosto
manifesta logo pela preferência de um
por Exotismos em que aos temas de
uma cultura europeia se misturam, material colorido, reflector de luz,
por exemplo, os das culturas árabes e pela expressão imediata da pintura, e a
indianas.
2. Um expedito sentido prático, escolha das próprias imagens mais
revelado no uso de um material centrada na descrição do real.
convencionalmente pobre, o azulejo,
como meio de qualificação estética dos
espaços
O termo "azulejo" deriva, A partir dos finais do século
aliás, de uma palavra árabe (al XV, princípios do XVI, foi
zulej) que significa pedra lisa e estimulado o
polida. desenvolvimento do azulejo.
Eram feitas encomendas de
Foi durante a ocupação árabe da azulejos às cerâmicas
Península que os povos mouriscas de Sevilha e
ibéricos tomaram contacto então dominava o gosto por
com a cerâmica mural. superfícies
completamente cobertas
com azulejos, que
permitiam uma melhor
compreensão da organização
geométrica das formas.
Os artífices andaluzes
produziram grandes placas de
barro cobertas de vidrado
colorido uniforme que, uma
vez cozidas, cortavam em
fragmentos geométricos que
eram depois recombinados
em belos desenhos
decorativos. Este processo,
conhecido pelo nome de
“alicatado”, porque envolvia
a utilização de um alicate, era
moroso e difícil além de
exigir que o artífice
acompanhasse a encomenda
até ao local da sua aplicação.
No final do século XVI surge Azulejos de "corda seca" e de
uma transformação técnica "aresta" ficaram na História
que leva ao aparecimento do com o nome de mudejares,
azulejo tal como o hispano-árabes ou
conhecemos hoje: uma placa hispano-mouriscos.
de barro quadrangular com Durante o século XVI foram
uma face vidrada lisa ou importados em grande
decorada com desenhos quantidade para Portugal e
coloridos. Esta técnica, aplicados em igrejas e
conhecida pelo nome de palácios.
"corda seca" associava-se
quase sempre a uma elevação
em "aresta" da superfície do
barro, que funcionava como
barreira mecânica nas zonas
de separação dos vidrados.
Nos finais do século XVI surge Por influência das disposições
outro avanço técnico decisivo: saídas do Concílio de Trento, foi
graças à utilização do esmalte abolido tudo quanto pudesse
estanífero branco e dos lembrar a arte islâmica e em sua
pigmentos metálicos, passou a substituição passaram a
ser possível pintar directamente proliferar os motivos
sobre o vidrado. Esta nova ornamentais italo-
técnica conhecida pelo nome de flamengos.
"majólica" (provável
corruptela da palavra Maiorca,
porto de onde os azulejos eram
importados) foi trazida para
Portugal por Francisco
Niculoso.
Com ela vinha associada a estética
renascentista com a sua
gramática decorativa própria e
que evoluiria mais tarde para o
maneirismo.
No final do século XVI,  Na sequência destes exemplares,
Portugal cai sob o domínio dos surgiram os célebres "tapetes"
Filipes. As dificuldades do século XVII, formados pela
económicas, conduziram ao repetição de padrões
aproveitamento máximo do polícromos. Os vários "tapetes",
azulejo com material decorativo. cada um com o seu padrão
É então que aparecem diferente, justapostos e
numerosos exemplares de emoldurados por faixas,
composições geométricas revestiam de alto a baixo as
que vão desde as combinações paredes das igrejas e por vezes o
em xadrez até formas mais próprio tecto, produzindo
complexas como os "azulejos efeitos decorativos
de caixilho", que com as suas surpreendentes.
linhas oblíquas, decompõem e
modelam as superfícies onde se
encontram aplicados.
A partir do último quartel do  Ao mesmo tempo, alastrava pela
século XVII, vários factores Europa a estética do barroco cujos
provocaram profundas componentes de encenação e de
transformações na estética do teatralidade da vida e dos costumes
azulejo. Os navegadores se reflectiam sobre todas as formas
portugueses que tinham viajado de arte. Surge então o azulejo
pelo Oriente, divulgaram na historiado, em que os diversos
Europa a faiança chinesa azul e personagens são captados em plena
branca que rapidamente conquistou acção e em que as cenas
o gosto dos países do Norte da representadas são envolvidas por
Europa e se estendeu mais tarde aos molduras extremamente ricas que
países meridionais. A policromia funcionam como a "boca de cena"
dos azulejos foi então sendo de um palco. Tudo isto coincide
substituída pelo monocromatismo, com a reconquista da
começando a surgir então vários independência de Portugal
padrões de "tapetes" do século em 1640 e com o nascimento de
XVII, reproduzidos a azul e branco. uma nova aristocracia que
rapidamente prospera e procura
criar os seus próprios cenários.
Nas escadarias e vestíbulos dos  Mas foi sobretudo nas igrejas e
palácios mais abastados, surgem nos conventos que o azulejo
também as célebres "figuras barroco adquiriu a
de convite" que representam monumentalidade que o
porteiros ou soldados armados, imortalizou.
enquanto que nas casas de
recursos mais limitados, se
recorre aos alizares, com
módulos repetidos, em que
predominam as "albarradas".
Pela mesma altura, a "figura
avulsa", também de influência
holandesa, ganha em Portugal
uma expressão própria e uma
invulgar força decorativa, apesar
do seu desenho de traço
grosseiro e pouco cuidado.
Cerca de 1750, após a morte de D.  Mas a época pombalina ficou
João V e já em pleno consulado igualmente marcada por um
do Marquês de Pombal, a tipo de azulejaria utilitária que
azulejaria decorativa passou a ser surgiu após o Terramoto de
influenciada pela estética 1755. Os vestíbulos e escadas da
"rocaille". Desapareceram então Baixa lisboeta foram então
as exuberâncias decorativas do revestidos com azulejos de
período anterior, regressou o padronagem polícroma, com
policromatismo com uma desenhos simples mas
paleta de quatro cores e as extremamente decorativos, que
guarnições passaram a exibir as ficaram definitivamente ligados
asas de morcego e os à arquitectura pombalina.
concheados assimétricos, típicos
do estilo Luis XV. Na Fábrica do
Rato, fundada em 1764, foram
produzidos alguns dos mais
belos exemplares deste período.
 Mas cerca de 1780, já em pleno  Mas nessa altura, Portugal iria
reinado de D. Maria I, surge o mergulhar numa grave crise
estilo neo-clássico. O azulejo política e económica que afectou
português aderiu rapidamente a actividade produtiva,
às influências que chegavam da nomeadamente o fabrico de
Europa e exprimiu-se, azulejos. Primeiro as invasões
sobretudo sob a forma de francesas, depois a
alizares com enquadramentos independência do Brasil e mais
rectilíneos e elementos tarde a guerra civil de 1832-
decorativos polícromos em que 1834. Grande parte das olarias
predominam os florões, as portuguesas foram obrigadas a
grinaldas, as plumas, as fechar e deixaram de poder
"chinoiseries" e os medalhões responder às encomendas dos
com paisagens. O "estilo D. seus clientes habituais.
Maria", como ficou conhecido
em Portugal, durou até ao
princípio do século XIX.
 No Brasil, para onde desde o  As fachadas das povoações do Norte
século XVII eram enviadas grandes (Porto, Ovar, Aveiro) e mais tarde,
quantidades de azulejos as do Sul, vão cobrir-se da azulejos
portugueses, a azulejaria vai passar produzidos nas fábricas surgidas
a ter uma utilização diferente: o após a recuperação económica que
revestimento das fachadas. De se iniciou cerca de 1840.
início, foram aplicados apenas Esta azulejaria de fachada, de
azulejos brancos em fachadas de fabrico semi-industrial,
igrejas, mas posteriormente esta coexistiu com outra em que
prática estendeu-se aos prédios estavam presentes tendências
urbanos que se cobririam de românticas e revivalistas, marcadas
padronagem polícroma. A partir de por uma linguagem eclética.
meados do século XIX, esta
prática estendeu-se a Portugal,
trazida pelos emigrantes
endinheirados que regressavam às
suas terras e que ficaram
conhecidos na História pelo nome
de "brasileiros".
 A partir de 1950, os artistas plásticos
 Nas primeiras décadas do século XX, o
portugueses começaram a interessar-se
azulejo foi influenciado pela Arte Nova pela utilização do azulejo. Para isso
que aparece nos trabalhos de Rafael Bordalo contribuiram Jorge Barradas,
Pinheiro e em numerosos frontões e faixas considerado o renovador da cerâmica
decorativas produzidas nas fábricas de portuguesa e Keil do Amaral que, nos
Sacavém, Desterro, Carvalhino e Fonte contactos com os arquitectos
Nova. A Arts Deco, foi predominantemente brasileiros, redescobriu as
utilizada em vestíbulos, tabernas e num potencialidades deste material de
núcleo numeroso de fachadas em Vila revestimento cerâmico. Embora sejam
Franca de Xira. numerosos os artistas plásticos que
Durante os dois primeiros quartéis do ensaiaram experiências no campo da
século XX, a azulejaria revivalista azulejaria, alguns deles conquistaram
ocupou um espaço importante, sendo uma posição de destaque mercê da
numerosos os painéis de pendor historicista dimensão e da qualidade da obra
e folclórico produzidos durante este produzida, como é o caso de Maria
período. O principal representante desta Keil, Manuel Cargaleiro, Querubim
corrente foi Jorge Colaço, autor de uma Lapa e Eduardo Nery. Na sequência de
vasta obra em que a técnica da pintura a encomendas feitas por entidades oficiais
óleo se procurou adaptar ao azulejo. ou por particulares, a azulejaria
moderna portuguesa enriqueceu-se.
Azulejaria no Porto

Capela das Almas Estação de S. Bento

Igreja de
Massarelos
Igreja de Sto. Ildefonso

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