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Indústria recua em fevereiro, mas bens de capital avançam 13,3% no bimestre e

puxam o investimento

O investimento, pelo lado da demanda, e a agricultura, pela oferta, despontam no


PIB do 1º trimestre. E a produção de bens de consumo ainda desafina
3/4/2013 - 02:50 - Antonio Machado

Não tão surpreendente quanto o aumento de 2,6% da produção física da indústria em


janeiro, pois já prevista desde então, a redução de 2,5% em fevereiro (e de 3,2% sobre
igual mês de 2012, vindo de alta interanual de 5,5% em janeiro) confirma a retomada
errática do PIB (Produto Interno Bruto), mas com uma surpresa bastante promissora.

Das categorias de produção pesquisadas pelo IBGE, uma só registrou crescimento tanto
no mês como em relação a igual período de 2012, o setor de bens de capital, e isso não é
de todo ruim, ao contrário.

Para uma economia sustentada no impulso do consumo e há pelo menos duas décadas
sem incentivos para ampliar sua capacidade produtiva, é salutar que a produção da
indústria de bens de capital, prévia do nível de investimento, tenha crescido pelo segundo
mês consecutivo, 1,6% - ou 9% em relação a fevereiro de 2012, também a segunda taxa
positiva, depois de 16 meses em queda na comparação interanual.

Se isso configura uma tendência, é cedo para dizer. Mas a evolução dos resultados do
segmento de bens de capital é robusta, com avanço acumulado no bimestre de 13,3% em
relação aos dois primeiros meses de 2012, com retração de todas as demais categorias,
exceto bens de consumo duráveis - cuja produção subiu 4% nesse período, apesar de ter
recuado 6,8% em fevereiro sobre janeiro e 2,2% sobre 2012.

A retração dos bens de consumo é que levou o governo a manter até dezembro as
alíquotas vigentes do IPI sobre a venda de automóveis, a fim de estimular o consumo e,
indiretamente, a produção do setor.

A volta da indústria ao território negativo abala as perspectivas da economia ansiadas


pelo governo, amplia a contradição com o viés do varejo, do emprego e da renda real
(todos para cima, embora com alguma desaceleração) e embaraça o Banco Central
contra a inflação.

Limites do crescimento
Não só a inflação preocupa: a expectativa de redução do superávit da balança comercial
(que acumula no trimestre déficit de US$ 5,1 bilhões, contra saldo positivo de US$ 2,4
bilhões no mesmo período de 2012) também expõe os limites do crescimento movido pelo
mercado interno, sem a expansão da capacidade instalada da produção, cujo nível de
utilização (de 84% em fevereiro e 82,1% no bimestre) não é tão baixo como se supõe,
indicando demanda suprida por importação.

A levar com prioridade a execução do investimento, sem prejuízo do controle da inflação a


meia distância entre o centro da meta (4,5%) e o teto de variação anual (6,5%) e do
objetivo de conter o déficit em conta corrente abaixo de 3% do PIB em doze meses, tendo
atingido 2,79% em fevereiro, o resultado seria o enfraquecimento do nível de produção
corrente diretamente relacionada com o consumo. E, talvez, alguma desaceleração do
nível do emprego e do salário real.

A discussão sussurrada

Essa é a discussão sussurrada entre o BC e a Fazenda, que reflete a orientação da


presidente Dilma Rousseff, receosa de que o ataque à inflação desidrate o crescimento,
que continua chocho.

O problema é que em 2012, quando o PIB avançou somente 0,9% (e teria crescido
menos sem a exportação só contábil de três plataformas da Petrobras e o adiamento para
2013 do registro de importações de gasolina), a indústria e, sobretudo, os investimentos
foram os responsáveis pelo baixo crescimento. A política econômica está diante de
dilemas.

Se a demanda está em nível alto, mesmo indicando alguma perda de pique, e a produção
nacional integrada à globalização das cadeias produtivas sustenta as importações,
especialmente as “invisíveis”, de partes e componentes, além de se aproveitar do
mercado interno favorável para recompor margem de lucro, o investimento é a solução no
médio prazo, inclusive para elevar a produtividade. Dele virá mais produção. E, em tese,
mais competição, sossegando os preços.

Entre pibão e inflação

Mas, enquanto o investimento matura, não há produção, só gasto, ao qual deve adicionar-
se o da expansão da infraestrutura de logística por meio das concessões. Tudo isso,
somado à demanda corrente, pode dar o pibão sonhado por Dilma para coroar seu último
ano de mandato e facilitar a reeleição. A inflação é a pedra no meio do caminho.
Se o governo for hábil para romper os dilemas, o investimento pode desencantar. Em
termos do PIB, segundo a consultoria LCA, ele deve ter avançado 8,8% no primeiro
trimestre frente a 2012 (conforme os dados fechados), e 10% na margem, depois de virar
o ano com aumento trimestral de 0,5%.

Com tal toada, os destaques do PIB no primeiro trimestre teriam sido o investimento (pela
demanda) e a agricultura (pelo lado da oferta). Como numa corrida de obstáculos, porém,
não é baixo o risco de a economia capengar.

As defesas se afunilam

Com algum pragmatismo, pode-se dizer que a contração da indústria, contrastando com o
aumento da produção de bens de capital, conforta os tementes da inflação, já que isto
também viria da eventual alta dos juros pelo BC. O caso é que o problema não é a
indústria, mas a inflação de serviços, que deveria ceder em favor da recuperação do
preço industrial, que se ressente de baixa competitividade.

A opção difusa, mas que leva a resultado semelhante (e, por isso, tantos a propõem),
seria depreciar o câmbio. É o que virá, também sem ser explicitado, se se confirmar o que
surge de forma tênue: a queda do fluxo de capitais para países emergentes como o
Brasil.

Vão-se afunilando as defesas contra ajustes que ameacem o nível de emprego. Não é
impossível preservá-lo, mas sujeito a uma disciplina fiscal que se choca contra
compromissos já assumidos pelo governo. Essa falta de clareza aguça as incertezas,
ampliadas pela obsessão eleitoral.

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