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OLA ESCO

OLHAR DO O
cas Prátic
ativas educa
useu do Mu
te de Art
o do Rio
- 2015 2013 -
M986e

Museu de Arte do Rio


Escola do Olhar : práticas educativas do Museu de Arte do Rio 2013-2015 ;
Seminário Sustentabilidade, Educação e Arte / [organização] : Janaina Melo. Rio de
Janeiro : Instituto Odeon, 2016.
2 v. ; 25,4 cm.

Material educativo.
Inclui bibliografia e índice.
Conteúdo : v.1 Escola do Olhar : práticas educativas do Museu de Arte do Rio 2013-
2015 - v.2 - Seminário Sustentabilidade, Educação e Arte.
ISBN coleção : 978-85-68880-04-3
ISBN v.1 : 978-85-68880-02-9
ISBN v.2 : 978-85-68880-03-6

1. Arte-educação. 2. Arte – Brasil. 3. Museu de arte (instituição). 3. Sustentabilidade.
I. Melo, Janaina. II. Seminário Sustentabilidade, Educação e Arte.

CDU 37+7

Índice para catálogo sistemático:


Educação e arte – 37+7
Catalogação na publicação:
Bibliotecária: Andréa da Silva Barboza – CRB7/6354
Escola do Olhar
Práticas educativas do Museu de Arte do Rio
2013-2015
O Museu de Arte do Rio, composto
de dois edifícios interligados por uma
passarela: o Pavilhão de Exposições
(à direita) e o edifício modernista que
abriga a Escola do Olhar (à esquerda).
12 20
APRESENTAçÃO REJUVENESÇA
Um convite a experimentar

24 32 40
GIRA DA RIO DE ONTEM, A FOTO NOSSA
BAIANA RIO DE HOJE DE CADA DIA
CORTEJO E Roda DE Jogo da memória que Imersão fotográfica na
conversa sobre culinária, provoca reflexões sobre região portuária do Rio
música e religiosidade as transformações de Janeiro que relacionou
negras na construção do ocorridas na cidade ao memória, fotografia e
imaginário carioca. longo do tempo. desenho na produção de
um livro de artista.

58
ORGANIZÁRIO
DAS COISAS
DO MUNDO
Um livro colaborativo
composto de módulos
móveis tem como proposta
categorizar todas as
coisas do mundo.

70 78
SETOR DE PIRATA
BUSCA E MEIA-PORÇÃO
APREENSÃO Uma história incluindo
charadas é contada
DO REAL durante a visita às
exposições do museu.
TUDO O QUE EXISTE SERÁ
ORDENADO EM DUAS
CATEGORIAS: REAL E NÃO REAL
94 102
CORPOS PENSE COMO
MOLDADOS UMA CARTA SORTEADA
CONVIDA A VER AS
Este jogo propõe a OBRAS EXPOSTAS DE UMA
experimentação de PERSPECTIVA DIFERENTE.
comportamentos
inusitados para o
corpo no museu.

110 118
QUER TC? DIMENSÕES
Corpos experimentam COLETIVAS
o espaço, tecidos
e outros corpos a DA ARTE
partir de tensões
ProfessorAs em formação
criadas coletivamente.
criaram um coletivo
temporário e realizaram
intervenções no museu a
partir de interesses comuns.

130 138
FORMA DAS CARTAS
PALAVRAS AO VENTO
Criação de poemas POR escrita livre de
MEIO da combinação de uma carta com
recortes de palavras e destinatário incerto.
frases fixadAs no vidro
da entrada do museu.

146 154 164


OBSOLESCÊNCIA CORTE E Bibliografia
PROGRAMADA DOBRA
Criação de objetos, a partir Com o corte cria-se o espaço;
de lixo eletrônico, que com a dobra, o volume. Dois
ganham outras funções cortes e uma dobra ou três
imaginadas. dobras e um corte, uma
folha de papel e um desafio:
criar uma escultura.
O MAR visto da Praça
Mauá, região portuária
do Rio de Janeiro.
Um
convite a
experimentar

Esta publicação reúne algumas das proposições desenvolvidas pela


equipe educativa do Museu de Arte do Rio ao longo de seus três
primeiros anos de atuação, a partir de sua inauguração em março
de 2013. Elas se constituíram a partir de visitas com público escolar
e não escolar, programas de formação com professores da edu-
cação formal e não formal, oficinas e atividades que envolveram o
público em geral, moradores da região portuária do Rio de Janeiro,
crianças, jovens e adultos – um convite a experimentar.
Dividido em dois cadernos, este livro é um recorte da atuação
pedagógica do MAR. O primeiro caderno apresenta 14 proposições
realizadas em visitas educativas, oficinas e atividades de formação
com professores. O segundo caderno documenta o Seminário Sus-
tentabilidade, Educação e Arte, uma correalização MAR e Dow, que
refletiu sobre questões ambientais e de sustentabilidade a partir
das relações com processos educacionais e artísticos.
Ao dividir com o leitor estas atividades, consideramos que elas
possam colaborar para a prática do educador. Cada ação aqui
apresentada foi experimentada pela equipe do museu, que
habitou lugares e contextos diversos, da exposição, das salas da
Escola do Olhar e do Pilotis do museu à praça e às ruas do bair-
ro onde se localiza o MAR, convocando e sendo convocado pelo
público para a participação e a imersão em ações sempre abertas
ao diálogo e à colaboração.
Uma boa prática pode ser completamente reescrita na relação com
o público, apontando caminhos que, num primeiro momento, tal-
vez não estivessem mapeados. O método é duvidar do próprio mé-
todo para se dedicar ao lugar da pesquisa, invenção e descoberta.
Esse conjunto de práticas envolveu 151 educadores e quase 200
mil participantes, 150 mil deles em visitas educativas, que propicia-
ram o desenvolvimento de um espaço vivo criativo e experimental.
A publicação está organizada a partir de notas ou hiperlinks sobre
as atividades que entrecruzam disciplinas, saberes e olhares pre-
sentes nas exposições, mas, fundamentalmente, na relação que
os educadores estabeleceram com o público. Esses hiperlinks são

13
alguns fios soltos que oferecem possibilidades de desdobramentos
e novas abordagens. São laboratórios de ideias constituindo refe-
rências que podem ser exploradas na sala de aula ou em outros
espaços de educação. O que resulta de tais ações são percursos de
aprendizagens e intervenções efetuadas pela equipe durante esse
processo. Na vida do museu, essas atividades continuam a passar
por adaptações, aprofundamentos, reinvenções, complementações
e novas derivas.
As práticas compartilhadas aqui estão divididas em quatro eixos
temáticos, constituídos a partir de questões levantadas pela equipe
de educação para investigar os conteúdos das exposições do MAR.
Assim como o educador ou professor que agenda um encontro de
seu grupo conosco, você pode abrir este livro em qualquer ponto,
começar pelo eixo ou pela atividade que desejar, fazendo seu pró-
prio trajeto por estas páginas:
Vejo o Rio de Janeiro
Quantas cidades existem em uma mesma cidade? De quantos
tempos uma cidade é feita? O que faz com que eu me identifique
como pertencente a uma cidade? Propõe-se um diálogo sobre
os diferentes olhares e percursos relacionados ao Rio de Janeiro
presentes nas exposições do MAR. Interessa-nos discutir como as
representações da cidade e seus aspectos socioculturais contri-
buem para a constituição de um imaginário carioca por meio das
artes, da arquitetura e da prática urbana.

Guardar para lembrar


Eixo destinado a pensar sobre as relações entre memória e coleção
e sobre os museus como espaços de construção de identidades
coletivas a partir da constituição de um patrimônio.
APRESENTAÇÃO

Meu corpo no museu


Este eixo se propõe a refletir sobre as questões do corpo na
arte, na sociedade e no museu. Discute as formas de representa-
ção e construção dos corpos e as relações individuais e coletivas
com o espaço.

Práticas artísticas contemporâneas


Como nasce uma obra de arte? Você já se pegou alguma vez se
perguntando: “Isto é arte?” Neste eixo são investigados os proces-
sos de pesquisa e construção artísticas presentes em exposições
de arte contemporânea, bem como as diferentes linguagens utiliza-
das pelos artistas na construção de uma obra de arte.

...
 O projeto
DE EDUCAÇÃO do MAR.
Quando o museu
é uma escola.
O Museu de Arte do Rio nasce como museu da cidade do Rio de
Janeiro. Ter o Rio como eixo transversal das ações significa reconhecer
que nossas experiências educativas se constituem no movimento da
própria cidade. É necessário, portanto, levar em conta os fluxos que
dela emanam ou são por ela atravessados. Localizado na região por-
tuária, o MAR envolve-se com a porosidade da cidade como território
fértil de questões, não para instaurar respostas definitivas e totais,
mas, ao contrário, para proporcionar reflexões capazes de ativar com

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o público, em cada contexto específico, formas distintas de participa-
ção e formação junto à experiência estética. A integração entre arte
e educação é o horizonte do MAR, que, no trânsito entre essas duas
áreas, concebe, potencializa e mantém públicas todas as suas ações.
O que é educar-se em um museu? O que o museu tem a nos
dizer? Inversamente, o que nós temos a lhe dizer? Sabemos que,
se não todos, boa parte dos museus hoje conta com programas
formativos e departamentos de educação. Mas como essas ques-
tões se colocam para o MAR, que também é uma escola? Para a
instituição, é preciso continuamente atravessar a educação para
se chegar à arte – é nesse sentido que, simbólica e fisicamente, a
circulação do museu inicia-se pela Escola do Olhar, nome de um de
seus edifícios, onde se concentra boa parte das ações que realiza.
Nos espaços do olhar ocorrem cursos, seminários, oficinas práticas,
rodas de conversa e encontros para tomar café da manhã.
A Escola do Olhar se projeta em direção à sociedade e articula parce-
rias com universidades, redes públicas de ensino, instituições muse-
ológicas, a sociedade civil e programas de educação não formal. A
fim de cumprir seus propósitos pedagógicos, a Escola do Olhar criou
seis programas, dentre eles a Biblioteca e Centro de Documentação
e Referência. Há ainda o programa de Visitas Educativas, que envolve
público escolar e não escolar em visitas mediadas às exposições; o
programa de Formação com Professores, que reúne cursos e oficinas
práticos e teóricos para o professor; o programa Arte e Cultura Visual,
que oferece cursos e oficinas sobre pensamento, práticas e linguagens
da arte contemporânea e da história do Rio; o MAR na Academia, que
objetiva o intercâmbio nacional e internacional e a cooperação entre
os centros de pós-graduação em arte; e, por fim, o programa Vizinhos
do MAR, que fomenta o envolvimento e a participação da comunida-
APRESENTAÇÃO

de da região portuária em suas ações e atividades.


A Escola do Olhar é, portanto, um espaço que transborda para o lu-
gar em que o museu foi implantado. Assim sendo, a região portuária
do Rio de Janeiro é fundamental na constituição de situações e rela-
ções de aprendizado. Ela foi porto de chegada do maior contingente
de pessoas escravizadas trazidas de diferentes regiões do continen-
te africano entre os séculos XVIII e XIX. Nela localiza-se o Cemitério
dos Pretos Novos, onde, sem lápide, sem nome, sem marca de
terreno funerário, encontram-se os restos mortais daqueles que não
resistiram à brutal viagem do tráfico negreiro. Tornou-se para as ge-
rações de descendentes de escravos um lugar de resistência, memó-
ria e produção cultural. Aqui nasceu o samba, mas também outros
elementos que forjaram a cultura brasileira presentes na culinária,
nas religiões, na música e na literatura. O MAR compreende que tal
contexto geográfico constitui um ponto de partida para a imersão na
cidade e no ser carioca em suas diferentes densidades: história, me-
mória, produção artística, visual e cultural, seus espaços públicos, de
disputa e de trocas invisíveis – afetivas e sensíveis – que concretizam
a cidade para cada um de nós.
O programa de educação compreende-se, pois, como um lugar
propositor de situações e relações. Um território poroso, cujas
relações se constroem nas especificidades, interesses e desejos
de reconhecimento e articulação de cada indivíduo. Essa condi-
ção implica a possibilidade de desenvolver, seja na pesquisa e
envolvimento com o acervo, seja na mediação, cursos e atividades
práticas, ambientes de experiência que proponham um contexto
alargado de convite ao engajamento pessoal de cada participante
– criança, jovem ou adulto – com a arte e a cultura visual.
A cada encontro e com cada grupo, em uma situação específica,
maneiras distintas de apresentação, apreensão, ativação e partici-
pação promovem formas de relação por meio de justaposição de

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vivências que permitam ao público construir seu próprio percurso de
fruição e aprendizagem. O MAR objetiva, portanto, instaurar espaços
de possibilidades. Fundamenta-se e acredita na potência de sujeitos
que identificam oportunidades de reconhecimento, trocas e desloca-
mentos. Inscreve-se na cidade como uma situação favorável para a
partilha de conceitos, ideias e saberes. Também interfere na consti-
tuição de comunidades que operam de distintas maneiras a prática
da educação, criando espaços de diálogo continuado no qual entre-
tecemos inquietações e dúvidas. Dispor-nos ao risco, à intervenção e
ao desvio enriquece nossas perspectivas e amplia nossas possibilida-
des de atuar com e nesse território chamado museu.

Janaina Melo
Gerente de Educação
Museu de Arte do Rio - MAR
APRESENTAÇÃO

Reunião da equipe de educação MAR-2016, em que foi


realizada atividade que tem como base a metodologia
diagramática proposta por Mônica Hoff durante o IV
Curso de Formação de Mediadores da Escola do Olhar.
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Ao longo deste livro estão espalhados registros, como o da página
ao lado, da atividade Rejuvenesça. Ela se inicia a partir da escrita da
palavra “Rejuvenesça” numa folha de papel e, em  seguida, como
num jogo de telefone sem fio, a próxima pessoa a colaborar copia
a palavra em outra folha. Um próximo participante copia a cópia,
sendo neste procedimento de sucessivas cópias da cópia da cópia
que se busca a dissolução da palavra, até que esta se transforme em
imagem. Já que o resultado é o esvaziamento, outras palavras, como
“Paralelepípedo”, também podem ser o ponto de partida.
Rejuvenesça é uma atividade inspirada no P
  oema enterrado 
(1960), de Ferreira Gullar. A ideia do manuseio do poema em
Gullar começa com a publicação de um poema concreto que só
funcionaria com a leitura seguida da palavra “verde”, que se repe-
tiria até explodir na palavra “erva”. Só que o leitor, ao perceber a
REJUVENESÇA

repetição, não fazia a leitura necessária para realizar o poema. Isso


levou Gullar a construir um livro-poema, escrito palavra a palavra,
e a impulsionar o poema cada vez mais para sua dimensão espa-
cial. O projeto do  Poema enterrado f  oi publicado no Suplemento
Dominical do J  ornal do Brasil e, em seguida construído com Hélio
Oiticica, numa sala de 2 metros quadrados, no fundo do chão.  Ao
descer as escadas e abrir a porta do poema, via-se no centro da
sala um cubo vermelho. Dentro dele, um cubo verde e, dentro des-
te, um cubo branco em que estava escrita a palavra “Rejuvenesça”. 
21
VEJO
O
RIO DE
JANEIRO
23
CORTEJO E Roda DE conversa sobre
culinária, música e religiosidade negras
na construção do imaginário carioca.
Um corpo
que quer
ser música
e um museu

25
que quer
ser
roda.
“Oh, velho Deus dos homens, As kitandas eram um fenômeno tipicamente
africano antes do transporte forçado de africanos
eu quero ser tambor ao Brasil. Mulheres escravizadas, forras e livres,
armavam seus tabuleiros nas ruas de Salvador, Rio
e nem rio
de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais para vender
e nem flor alimentos e produtos. Vestiam diversos trajes e
adornos e provinham de diferentes partes da
e nem zagaia por enquanto África. A partir de 1830, mulheres vindas da Bahia
começaram a chegar ao Rio com roupas e turban-
e nem mesmo poesia.
tes brancos, enfeitadas de balangandãs. “Desde
Só tambor ecoando como a canção da força e da vida então, as ‘baianas’ – que nem sempre eram baia-
nas de fato, mas ganharam esse nome genérico
Só tambor noite e dia pela forma como se apresentavam – desbancaram

dia e noite só tambor as ‘quitandeiras’ como personagens dos relatos


urbanos da época.” Selma Pantoja.
até a consumação da grande festa do batuque!
Batuque, bunda, cachaça, caçula, cafuné,
Oh, velho Deus dos homens,
dengo, gogó, mangue, moleque, neném, qui-
deixa-me ser tambor tanda, zangar, samba e xodó são exemplos de
palavras de origem africana. A contribuição afro-
só tambor!” -brasileira à língua portuguesa vai muito além
dos vocábulos e da tradição oral, e se exem-
(Trecho da poesia “Quero ser tambor”, de José Craveirinha)
plifica por meio de escritoras como Ana Maria
GIRA DA BAIANA

Gonçalves (Um defeito de cor, 2006) e Carolina


Maria de Jesus (Quarto de despejo, 1960).
Quero ser tambor. Quero ser conga, alfaia, caixa, xequerê,
“Uma palavra escrita não pode nunca ser apa-
agbê, chocalho, ganzá, reco-reco, agogô, pandeiro e apito.
gada. Por mais que o desenho tenha sido feito
Um corpo que quer ser música e um museu que quer ser a lápis e que seja de boa qualidade a borracha,
o papel vai sempre guardar o relevo das letras
roda: em meio a uma exposição sobre o Rio de Janeiro escritas. Não, senhor, ninguém pode apagar as

no século XVIII, uma educadora negra de turbante e saia palavras que eu escrevi.” Carolina Maria de Jesus

rodada convida a tocar, dançar e cantar samba de roda, Já no final do século XIX, com a presença das
tias baianas, os laços culturais com a ancestra-
maracatu, jongo, coco e ciranda. Experimenta-se cocada
lidade africana eram celebrados em festas que
, tem saia rodada para vestir e instrumentos para tocar. reuniam artistas, músicos e compositores que mais
tarde dariam origem à geração de sambistas que
Tudo pronto, inicia-se um cortejo pelas galerias e diferen- conformou a cultura musical carioca. Tia Perciliana,
Tia Bebiana, Tia Amélia, Tia Rosa e Tia Ciata são
tes espaços do museu. Faz-se, então, a Gira da Baiana.
alguns dos nomes lendários que remontam às
origens do samba no Rio. Hilária Batista de Almeida
ou Tia Ciata (Santo Amaro da Purificação, 1854 -
Rio de Janeiro, 1924) foi uma baiana de saberes
religiosos e culinários. Sua casa tornou-se tradicio-
nal ponto de encontro onde se reuniam grandes
nomes, como Donga, Pixinguinha, João da Baiana,
Sinhô e Heitor dos Prazeres.
A palavra “gira”, nijra no idioma quimbundo , significa “Os mortos enterrados à flor da terra na Gam-
boa clamavam com o lamento dos antepassados,
caminho ou rua. A Gira da Baiana é um cortejo cantado e não demorou para que seu culto fosse celebra-
do.” Rafael Cardoso.
que parte de sambas e cantos religiosos. Após o cortejo,
organiza-se uma roda de conversa e contação de his- A região próxima à Praça Onze e à zona portuá-
ria do Rio de Janeiro, conhecida como Pequena
tórias sobre nossa cultura e memória afro-brasileiras. A África, vincula samba e religiosidade, vida e morte.
No Rua do Valongo, a poucos quarteirões do MAR,
gira também faz referência ao importante papel das tias
situava-se o mercado de escravos do Rio de Janei-
baianas na conformação da cultura carioca. Mulheres ro. Pessoas eram trazidas da Costa da Mina, Guiné,
Luanda e até do Cabo. Entre 1700 e 1740, o mo-
negras quituteiras, benzedeiras e mães de santo eram vimento negreiro no porto carioca quase triplicou:

lideranças sociais que em suas casas, nas ruas próximas de cerca de 28 mil africanos entre 1700 e 1710,
passou para cerca de 66 mil entre 1731 e 1740. Na
ao museu, situado na zona portuária do Rio de Janeiro década de 1750, passaram 75 mil cativos pelo Rio
e, na seguinte, mais de 80 mil pessoas, o que fez
, conformaram espaços de sociabilidade, acolhimento,
do Rio o maior porto de escravos das Américas.
participação e festa. A roda provoca discussões sobre a
Sueli Carneiro, feminista negra, atenta para o
cultura e tradição afro-brasileiras, relacionando samba e fato de que o discurso sobre a opressão feminina
não tem reconhecido a experiência histórica dife-
poesia, ritmo e resistência, dança e feminismo , tradi-
renciada da mulher negra. O mito do sexo frágil,
ção oral e racismo. que justificou o paternalismo com relação à mulher
branca, nunca se aplicou a essas mulheres:

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“Fazemos parte de um contingente de mulheres
que trabalharam durante séculos como escravas
nas lavouras ou nas ruas, como vendedoras, qui-
tuteiras, prostitutas... Mulheres que não entende-
ram nada quando as feministas disseram que as
mulheres deveriam ganhar as ruas e trabalhar!”

“Quando falamos em romper com o mito da rainha


do lar, da musa idolatrada dos poetas, de que
mulheres estamos falando? As mulheres negras
fazem parte de um contingente de mulheres que
não são rainhas de nada, que são retratadas como
antimusas da sociedade brasileira, porque o mo-
delo estético de mulher é a mulher branca.”

Sueli Carneiro, citada na tese “Traçando o caminho


em outras definições”, de Claudia Pons Cardoso.
GIRA DA BAIANA

Gira da Baiana, com participação do


grupo Tambor de Cumba, iniciada na
exposição Rio Setecentista, quando
o Rio virou capital, que ocorreu no
Museu de Arte do Rio de 7 de julho
de 2015 a 8 de maio de 2016.
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GIRA DA BAIANA
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Jogo da memória que provoca reflexões
sobre as transformações ocorridas na
cidade ao longo do tempo.
Em nossos corpos
há algo
do começo dos tempos
que perdura,
há vestígios
do passado mais remoto

33
que o gênio
humano
foi capaz
de conceber.
Cláudia Cerqueira do Rosário
Este jogo da memória formado por cartas com ima- “Em nossos corpos, se estão certos nossos ho-
mens da ciência, está presente algo do início do
gens de lugares da cidade é composto de diferentes mundo.  Em suma, a memória não está apenas no
passado trazido à tona pela recordação, mas está
etapas. A primeira etapa consiste em encontrar duas
presente em nossos corpos, em nosso idioma, no
imagens idênticas. Na segunda rodada, novas cartas que valorizamos, no que tememos e no que espe-
ramos. A memória nos identifica como indivíduos
entram em jogo: o par é feito com duas imagens de e como coletividade. A memória permite mesmo
que estas linhas sejam escritas em sequência
um mesmo lugar, porém de tempos históricos diferen-
coerente.” Cláudia Cerqueira do Rosário.
tes – passado e presente se entrecruzam, propiciando
“Na Atenas contemporânea, os transportes
diálogos. Numa etapa posterior, o jogo torna-se mais coletivos se chamam metaphorai. Para ir para

instigante, pois o critério para relacionar o par de ima- o trabalho ou voltar para casa, toma-se uma
‘metáfora’ – um ônibus ou um trem. Os relatos
gens passa a ser estabelecido pelo jogador a partir de poderiam igualmente ter esse belo nome: todo
dia, eles atravessam e organizam lugares; eles os
suas próprias memórias e afetos. Assim, surgem pares
selecionam e os reúnem num só conjunto; deles
formados por lugares e tempos distintos, revelando que fazem frases e itinerários. São percursos de
espaços.” Michel de Certeau.
a relação passado/presente é sempre uma construção.
Um exemplo de mapa mental são os palá-
RIO DE ONTEM RIO DE HOJE

cios da memória. O palácio da memória é um


O jogo envolve uma conversa sobre os lugares que os método mnemônico do século XVI descrito por
Matteo Ricci, jesuíta que viveu na Índia e na
participantes conheceram, percorreram e onde convi- China. Ele consiste na imaginação de lugares
específicos para cada memória: um palácio com
veram. Trata-se de constituir uma experiência com o
diferentes andares, cômodos e móveis. Cada
passado por meio da narrativa. De um relato a outro, nova informação é guardada num local específi-
co do palácio e para acessá-la posteriormente é
descobrem-se várias cidades dentro da mesma cidade. necessário percorrer sua arquitetura imaginária.

Cada pessoa traça um mapa mental repleto de lugares


que se conectam, revelando meandros, margens, centros
e linhas de fuga.
35
RIO DE ONTEM RIO DE HOJE

Primeira etapa do jogo: encontrar pares idênticos.


37
RIO DE ONTEM RIO DE HOJE

Segunda etapa do jogo: pares de tempora-


lidades e geografias distintas são formados
a partir de relações subjetivas.
39
Imersão fotográfica na região portuária
do Rio de Janeiro que relacionou
memória, fotografia e desenho na
produção de um livro de artista.
Num mundo de
excesso de imagens,
o desafio:
realizar uma única
fotografia

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por dia
com
uma câmera
analógica.
FOTO NOSSA DE CADA DIA
43

Alunos da Escola Municipal Vicente Licínio Cardoso


(Ginásio Experimental de Arte - GEA) elaboram livros de
artista na Escola do Olhar do Museu de Arte do Rio.
A Foto Nossa de Cada Dia foi realizada pelo Coletivo Em seu livro Sobre fotografia (1977), Susan
Sontag, mesmo antes do surgimento das selfies
Cidades Possíveis, da região portuária do Rio de Janeiro, e do amplo compartilhamento de fotos de even-
tos cotidianos nas redes sociais, alertava para
com alunos da Escola Municipal Vicente Licíno Cardoso
a compulsão relacionada à imagem fotográfica.
(Ginásio Experimental de Arte − GEA) em 2013 . A rapi- Hoje tudo no mundo existe para terminar nos
celulares. Com o advento da câmera analógi-
dez da fotografia digital foi substituída pelo ritmo lento de ca, Walter Benjamin, em seu ensaio “Pequena
história da fotografia”, comparou a aceleração
produção de imagens analógicas, antecedida pela escolha
do processo de produção de imagens, antes
decisiva do lugar e da situação. Propunha-se a experiência marcado pela lentidão da pintura, à profusão da
fala. O que dizer, então, do número incontrolável
do clique, do instante fotográfico , como registro único. de imagens surgidas na era digital?

“Não seria errado falar de pessoas que têm uma


Com a fotografia do dia fixada sobre uma folha de papel, compulsão de fotografar: transformar a expe-
riência em si num modo de ver. Por fim, ter uma
cada participante acrescentava uma frase e um desenho
experiência se torna idêntico a tirar dela uma
à situação fotografada. Como uma legenda, a frase colava foto, e participar de um evento público tende,
cada vez mais, a equivaler a olhar para ele, em
um sentido à imagem, ao passo que o desenho ora sub- forma fotografada. Mallarmé, o mais lógico dos
estetas do século XIX, disse que tudo no mundo
vertia, ora reiterava os elementos presentes na fotografia,
FOTO NOSSA DE CADA DIA

existe para terminar num livro. Hoje, tudo existe


ampliando seus sentidos e possibilidades. Esse acúmulo para terminar numa foto.” Susan Sontag

de camadas gerou um livro-objeto. Posteriormente, os “Um modo de atestar a experiência, tirar fotos
é também uma forma de recusá-la − ao limitar
livros foram expostos em uma instalação, mas poderiam
a experiência a uma busca do fotogênico, ao
também ser disponibilizados numa sala de leitura. converter a experiência em uma imagem, um
suvenir.” Susan Sontag

“Pela primeira vez no processo de reprodução


da imagem, a mão foi livrada das responsabi-
lidades artísticas mais importantes, que agora
cabiam unicamente ao olho. Como o olho
apreende mais depressa do que a mão desenha,
o processo de reprodução das imagens experi-
mentou tal aceleração que começou a situar-se
no mesmo nível que a fala.” Walter Benjamin
As transformações da paisagem urbana afetam nosso coti- Na comemoração de um ano do museu, o
programa Vizinhos do MAR, de relacionamento
diano, alteram nossas rotas e nossa percepção da cidade e com os bairros próximos, desenvolveu uma série
de ações comemorativas com os moradores da
seus fluxos. A atividade teve como disparador refletir sobre
região. A Foto Nossa de Cada Dia é uma dessas
as mudanças recentes ocorridas na região portuária do Rio ações, proposta ao MAR pelo Coletivo Cidades
Possíveis em parceria com o GEA. O GEA é uma
de Janeiro, além de discutir as mudanças tecnológicas Escola da rede municipal de educação que tem
seu currículo voltado para a experimentação em
ao retomar o fazer analógico em plena era digital.
artes visuais e história da arte, e estabelece uma
relação continuada com o MAR.

O ensaio “O instante decisivo” (1952), do fotó-


grafo Henri Cartier-Bresson, tornou-se um marco
na história da fotografia. Nele, Cartier-Bresson
demonstra que o exato momento de acionar o
clique é decisivo: trata-se da captura de uma
imagem irrepetível que, uma fração de tempo
depois, estaria para sempre perdida:

“O fotógrafo deve se assegurar, ainda na pre-


sença da cena que está se desenrolando, de
que não deixou nenhuma lacuna, de que deu
verdadeiramente expressão ao significado da
cena em sua totalidade, pois depois será tarde

45
demais. Nunca poderá repetir a cena para voltar
a fotografá-la.” Henri Cartier-Bresson

Assim que a fotografia surgiu, o fotografado


precisava ficar muitos minutos imóvel, posando,
para que a luz fosse capturada pela câmera e
sensibilizasse a placa de prata sobre a qual era
gravada a imagem. Essa placa ainda era uma
peça única e frágil, guardada em estojos, como
uma joia.
FOTO NOSSA DE CADA DIA
47

Páginas internas dos livros


criados pelos alunos do
Ginásio Experimental de
Arte durante a oficina A
Foto Nossa de Cada Dia.
FOTO NOSSA DE CADA DIA
49
Capas e interior
dos livros criados
durante a oficina.
FOTO NOSSA DE CADA DIA
51
FOTO NOSSA DE CADA DIA
53

Instalação com livros criados na oficina A Foto Nossa de


Cada Dia, no Pilotis do MAR de 1º a 4 de maio de 2014.
REJUVENESÇA
55
GUARDAR
PARA
LEMBRAR
57
Um livro colaborativo composto de
módulos móveis tem como proposta
categorizar todas as coisas do mundo.
Organizário:
s.q. 1. Cada uma
das classes em que
se dividem
as ideias, os termos

59
ou as coisas.
2. Gradação em uma
hierarquia.
3. Tudo que se inventa.
ORGANIZÁRIO DAS COISAS DO MUNDO
61
O Organizário das Coisas do Mundo é um grande livro, Na obra Biblioteca dos Enganos, Walmor
Corrêa (Porto Alegre, 1962) cria seres imaginá-
mas também um método de classificação , ordenação rios utilizando como referência as expedições
científicas realizadas no Brasil e em outros
e categorização das coisas do mundo. Tem suas bases na
países da América durante o século XIX. Delas
pesquisa científica e retoma, por isso, alguns procedimen- participavam geógrafos, zoólogos, botânicos e
artistas que misturavam observação científica e
tos comuns aos naturalistas do século XIX, assim como imaginação. Em seu trabalho, Walmor relaciona
arte e ciência retomando as descrições de plan-
aos navegadores que, a partir do século XV, rompendo o
tas e animais catalogados.
limite do mundo desconhecido, lançavam-se por mares e
O autor argentino Jorge Luis Borges (1899-
terras ainda não vistas, porém imaginadas. A imaginação 1986) é um clássico da literatura fantástica.

é central para a descoberta e a invenção. Sua obra O livro dos seres imaginários é uma
espécie de manual inventado de zoologia. Nesse
bestiário fantástico, Borges descreve 116 animais
exóticos, entre monstros, elfos, gnomos e fadas.
Classificar em categorias por analogia, afinidade ou qual-
quer outro elemento comum todas as coisas do mundo
possibilita refletir sobre o modo como cada um nomeia
ORGANIZÁRIO DAS COISAS DO MUNDO

e interpreta palavras, objetos e coisas. O Organizário tem


como premissa organizar sempre e coloca, assim, em
evidência como nos constituímos por uma multiplicidade
de pontos de vista que são simultâneos e, por vezes, jus-
tapostos. Constitui-se como obra colaborativa em aberto,
em que os participantes, autores-leitores desse livro de
artista , propõem novas categorias e reorganizam as já
existentes, inserindo anotações, comentários, colagens e
desenhos que dão formas e acumulam camadas. As pági-
nas estão em constante construção, pois não existe cate-
goria que não possa ser reinventada, deslocada, retirada
ou acrescentada.
Na reflexão sobre como apreendemos o mundo, dis- Livros de artista são obras de arte que
remetem à ideia de livro ou se apropriam de
cutem-se os sistemas de classificação e categorização seu formato. Há muitas definições para livro de
artista. Segundo uma delas, livro de artista é
presentes no método científico e na prática dos museus.
qualquer livro feito por um artista. Seriado ou
Abre-se a possibilidade de jogar com a criação de múlti- único, o livro pode ser o próprio objeto artístico
ou o relato de um processo criativo. Lygia Pape,
plos sentidos sobre temas diversos por meio da memória Wlademir Dias-Pino, Artur Barrio e Waltercio
Caldas são exemplos de artistas que exploraram
individual ou coletiva.
esse formato. O Livro de carne, de Artur Barrio,
por exemplo, é todo feito de carne bovina. Para
o artista, “a leitura do livro seria feita a partir
Ao se apropriar de um método de classificação, esta ativi- do corte/ação da faca do açougueiro na carne”.

dade investiga como as ciências e as instituições artísticas Wlademir Dias-Pino, um dos fundadores da
poesia concreta, criou livros-poemas em que
são processos de invenção e também meios legitimado- explorava todas as possibilidades do espaço
gráfico da página, como em A Ave. Nos Poemó-
res de formas do saber. Quem tem o poder de organizar
biles de Augusto de Campos e Julio Plaza, os
e nomear as coisas do mundo? textos nas três cores primárias (amarelo, azul e
vermelho) surgem em estruturas tridimensionais
que saltam da superfície do papel quando as
páginas são abertas. O MAR possui uma impor-
tante coleção de livros de artistas brasileiros e
estrangeiros, com mais de 1.000 itens.

63
ORGANIZÁRIO DAS COISAS DO MUNDO
65
ORGANIZÁRIO DAS COISAS DO MUNDO
67

O livro Organizário das Coisas do Mundo possui


uma estrutura sanfonada com páginas móveis.
ORGANIZÁRIO DAS COISAS DO MUNDO

Estudantes de escolas públicas do Rio de Janeiro participam da atividade


Organizário das Coisas do Mundo no Pilotis e no Pavilhão do MAR.
69
TUDO O QUE EXISTE SERÁ
ORDENADO EM DUAS
CATEGORIAS: REAL E NÃO REAL
Finalidade do setor:
investigar
a veracidade das coisas
e situações
pelas quais seus
integrantes passam.

71
Duração:
até a última
coisa real
do mundo
ser
identificada.
É possível determinar o que é real e o que é não real? No “Crianças de 10 anos de idade decidiram que
‘real’ era tudo o que já tinha existido e ‘não real’
Setor de Busca e Apreensão do Real, o desafio é mapear era o que não tinha existido. Perguntei se elas
conheciam tudo o que já existiu. O critério de
e identificar rastros de realidade nos lugares por onde
realidade, então, mudou: ‘real’ seria tudo o que
se passa: no museu, na escola, na casa, na rua. Todas já existiu, mas que era conhecido por elas.”
Mariana Vilanova, educadora.
as coisas disponíveis no ambiente passam pelo crivo do
O poeta mato-grossense Manoel de Barros
setor e nelas são colados post-its ou pequenos papéis de
afirmou que 90% do que escrevia era invenção
diversos tamanhos e cores carimbados com as palavras e só 10% era mentira. A separação da ideia de
ficção da ideia de mentira é algo próprio da arte.
REAL e NÃO REAL. Arte é ficção, não mentira. Ficcionar ou fingir
“não é propor engodos, porém elaborar estrutu-
ras inteligíveis”, como afirmou o filósofo Jacques
No museu, o setor investiga o que se encontra ao longo do Rancière em seu livro A partilha do sensível.
Essas estruturas inteligíveis, coordenação entre
caminho: obras nas exposições, corredores, janelas, esca-
atos, organização de signos, palavras e imagens
das e até pessoas. A dúvida sobre o caráter real ou não que se reúnem para compor uma obra de arte
são semelhantes àquelas usadas pelos historia-
real das coisas converte-se em oportunidade de discutir
SETOR DE BUSCA E APREENSÃO DO REAL

dores e analistas da realidade social. Escrever


histórias – ou inventar obras de arte – e escrever
os processos de construção da realidade , o caráter
a História “pertencem a um mesmo regime de
discursivo da verdade, a relação entre vida, ficção e arte. verdade”. Isso não equivale a dizer que tudo é
ficção, ou que a História é feita apenas de histó-
Os participantes podem optar por designar um mesmo rias que nós contamos. Tanto os historiadores se
utilizam dos modelos de conexão entre a apre-
objeto como real, não real, ou como real e não real simul-
sentação dos fatos e a razão da ficção quanto os
taneamente. Não apenas as categorias já existentes po- artistas, por sua vez, se utilizam do real e suas
invenções fazem efeito no real.
dem entrar em conflito, como outras surgem: muitas vezes
extrapolam-se as noções de ‘real’ e ‘não real’ e aparecem
outras palavras, como ‘surreal’ e ‘mentira’.

Tudo é real. Tudo é invenção .


73

Papeis carimbados com as expressões “Real “ e “Não Real”


colados nas paredes do Pavilhão de Exposições do museu.
SETOR DE BUSCA E APREENSÃO DO REAL

Carimbos utilizados na atividade.


75
SETOR DE BUSCA E APREENSÃO DO REAL

Obras de Pierre Verger (acima) e Rosana Paulino (abaixo).


77
Uma história incluindo
charadas é contada
durante a visita às
exposições do museu.
“HÁ UM DITO
ENTRE OS MAIS
VELHOS MARUJOS
QUE FALA

79
QUE PIRATA
QUE SE PREZE
JÁ NASCE
NO MAR”.
PIRATA MEIA-PORÇÃO
Rabo de sereia e rosa dos
ventos do livro do Pirata
Meia-Porção, elaborado
pelos educadores.

81
“Não sei se é verdade (ou se é conto lorotoso dos conta- Uma das formas de operar que resultam na
constituição de algumas coleções pode ser com-
dores de lá), mas foi no mar mais revolto, da noite mais parada àquela de um pirata. Para criar uma cole-
ção, o objeto deve sair de seu contexto, do lugar
escura, no seio da maior das tormentas, envolto em uma
que ocupa no mundo, para ingressar no museu.
imensa escuridão que nasceu, sem mais nem menos, sem Ele deve ser “roubado” de sua vida anterior. Se
analisarmos a história das grandes coleções de
chorar e sem muita força, o Pirata Meia-Porção. Não se objetos do mundo, encontraremos episódios
de conquistas, guerras, saques e disputas que
enganem, senhoras e senhores, com esse nome, pois a
levaram esses objetos aos centros de poder.
grandeza de um pirata se mede mais pela glória de seus
O que faz um curador?
feitos; pela sua força de comando; pela fama espalhada
aos ventos e pelo tamanho de seu tesouro do que pela “Curadores pesquisam, escrevem, educam,
facilitam, levantam fundos, planejam, dirigem,
sua estatura. De fato, Meia-Porção era um tanto pequeno produzem, criam e cuidam dos artistas, obras e
exposições desde seu estágio inicial como ideia
em tamanheza perto de outros piratas, mas, assim como
até muito depois que acontecem. Documentam,
Napoleão, que mesmo sendo um cotoco de gente se fez promovem, apresentam e reapresentam projetos
passados, enquanto buscam novos projetos o
imperar pelas velhas terras da Europa, Meia-Porção se tempo todo. Formam redes, reúnem ideias e
constroem públicos; trabalham de forma fluida e
fez reinar soberano sobre os mares, de forma que seus
independente, dentro, através de, em relação a,
PIRATA MEIA-PORÇÃO

inimigos o temiam como a um gigante.” com e fora de instituições. Articulam conceitos,


vendem branding e projetos, e medeiam polos
e atores do campo da arte. São pêndulo entre
a prática e a teoria, entre a arte e sua história.
O trecho acima é um fragmento do papiro do pirata. Com
Curadores também fazem as vezes de críticos,
ele, inicia-se a contação de história que também inclui um quando estes se ausentam.” Sara Rifky

livro concebido e feito manualmente pelos educadores:


o diário de bordo do pirata. Abre-se o diário, da página
salta um barco e, com ele, inicia-se uma navegação ima-
ginária. A partir de charadas deixadas pelo pirata com os
educadores, as obras expostas tornam-se pistas, indícios,
aproximações, possibilidades de encontrar relações entre
a história, a obra e nossa imaginação.
A conversa que acontece entre visitantes e educadores Até o surgimento dos primeiros museus
públicos, no século XIX, colecionar era um pri-
sobre a história na exposição é uma possibilidade de vilégio e um passatempo privado de príncipes.
Acumular objetos que se privavam de seu uso
investigar com o grupo o que é curadoria , o que é co-
cotidiano, objetos que aguçavam o desejo de
leção, o que guardamos no museu ou no baú do pirata . possuí-los, fosse pela raridade, pela estranheza,
pela antiguidade ou pela beleza. Para colecio-
As múltiplas leituras sobre as obras ocorrem individual e nar, era necessária uma ampla disponibilidade
de tempo e dinheiro para adquirir o objeto do
coletivamente, disparando uma conversa sobre os modos
desejo quando se apresentasse a oportunidade.
como o museu se constitui. Os precursores dos museus eram os gabinetes
de curiosidades ou câmeras de maravilhas. Eles
guardavam verdadeiros tesouros, que ocupavam

Como toda história de pirata, a nossa também tem um baú todos os espaços das paredes e até do teto: não
apenas objetos e obras de arte, mas principal-
do tesouro. Dentro dele há diversos objetos, todos relacio- mente espécimes dos reinos animal, vegetal
e mineral. Ainda assim, tampinhas de garrafa,
nados à história de Meia-Porção: uma luneta, uma bússola
bolinhas de gude, figurinhas para o álbum, selos,
e um mapa. No final da visita, os educadores lançam uma revistas em quadrinhos e conchinhas do mar
estão aí para comprovar que todos podem cole-
pergunta: o que é um tesouro para você? cionar, e o valor atribuído ao objeto colecionado
é subjetivo.

A partir de então, o grupo é convidado a criar outros te-

83
souros (relatos, desenhos, palavras, objetos), impressões e
registros gerados pela experiência na visita.
Luneta, papiro, livro
e charadas do pirata,
feitos pelos educadores
do museu.
PIRATA MEIA-PORÇÃO
85
PIRATA MEIA-PORÇÃO

Ilha vista da luneta do


Pirata Meia-Porção.
87

Charadas elaboradas para a


atividade do Pirata Meia-Porção.
PIRATA MEIA-PORÇÃO
89
REJUVENESÇA
91
MEU
CORPO
NO
MUSEU
93
Este jogo propõe a
experimentação
de comportamentos
inusitados para
o corpo no museu.
Fique um minuto
carnavalizando.
Feche os olhos e
descreva o que há
na sua visão.
Escolha

95
um som pra ser seu.
Faça uma competição
de caretas.
Conte até dez com
o corpo.
CORPOS MOLDADOS
O número tirado no dado
define o envelope a ser aberto
e a proposição a ser realizada
pelo participante da atividade
Corpos Moldados.

97
Quais os limites do corpo? De que forma um movimento Michel Foucault (1926-1984), historiador e
filósofo francês, no texto “Corpos dóceis”, do livro
distante de nossa rotineira gestualidade pode despertar Vigiar e punir, investigou como instituições como a
escola e o quartel, por exemplo, disciplinam nossos
nossos sentidos? Corpos Moldados é um jogo em que
corpos para organizar e controlar nossas ativida-
os lances de um dado definem a ação dos jogadores. A des. Para Foucault: “É dócil um corpo que pode ser
submetido, que pode ser utilizado, que pode ser
partir de proposições incomuns, conversamos sobre o transformado e aperfeiçoado”.

condicionamento de nossos corpos e como mudamos


“A disciplina fabrica assim corpos submissos e
de postura e comportamento dependendo do lugar exercitados, corpos ‘dóceis’. A disciplina aumenta
as forças dos corpos (em termos econômicos de
onde nos situamos. Os jogadores também investigam utilidade) e diminui essas mesmas forças (em ter-

como a relação do corpo com o espaço da escola, da mos políticos de obediência) […] a coerção discipli-
nar estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma
cidade e do museu afeta e influencia os processos de aptidão aumentada e a dominação acentuada”.

aprendizagem e criação. O jogo permite observar as ca-


Lugares e arquiteturas podem nos transmitir
madas de memória, vivência e experiência acumuladas sensações espaciais específicas. Neles podemos
nos sentir, por exemplo, observados ou anônimos,
em nossos movimentos. acolhidos ou pequenos diante da amplidão. Os
espaços institucionais, como tratou Foucault em
Vigiar e punir, agem de forma coercitiva sobre nos-
CORPOS MOLDADOS

sos corpos, requerendo comportamentos bastante


específicos. Muitas pessoas mudam de postura
sem nem se dar conta ao entrar em museus.
Supostamente, o museu é um lugar para caminhar
lentamente, fazer silêncio, não tocar, não comer,
não beber, não sentar no chão, não fotografar,
não levar animais e uma série de outras proibi-
ções. Mas, se os museus são também espaços de
experiência e convivência, essas regras valem para
todos os museus, o tempo todo?
99
CORPOS MOLDADOS

O lance do dado define a ação.


101

Competição de caretas e jogos com o bambolê.


UMA CARTA SORTEADA CONVIDA
A VER AS OBRAS EXPOSTAS DE
UMA PERSPECTIVA DIFERENTE.
Pense como

103
No museu ou no mundo, diante das coisas, muitas vezes Na Óptica, Euclides (300 a.C.) contrapunha cer-
tas correntes filosóficas que afirmavam que cada
nos perguntamos: o que é isso? As coisas têm nome e as objeto era exatamente do tamanho que o vemos,
defendendo a hipótese de que vemos pequenas
obras também. Mas nem sempre a dureza de certos no-
as coisas distantes porque estão longe, e não por-
mes consegue romper a tensão que encerra o significado que sejam de fato menores do que as que estão
mais próximas. Para os gregos, as coisas mais dis-
do real. Nomes são parte de narrativas inventadas sobre tantes pareciam menores por uma “deformação”
do mundo imposta por nossa condição humana.
as coisas. Sendo assim, se criarmos outras narrativas para
Por isso eles corrigiam na realidade as deforma-
as obras, podemos inventar novos títulos para elas? A ções causadas pela nossa visão. Assim, um templo
parecia ter linhas absolutamente retas justamente
proposta desta atividade é criar novos nomes para as porque não o eram. Enquanto Euclides buscou

obras a partir da perspectiva de um personagem. formular matematicamente as leis da visão natural,


a perspectiva artificial tentava ser um método
útil para a construção de imagens em superfícies
bidimensionais. No século XV, com a invenção do
Em um baralho, o participante é convidado a sortear um
ponto de fuga central localizado na linha do hori-
personagem que determinará seu modo de se relacionar zonte, para onde se dirigiriam todas as diagonais
de um desenho, criou-se um ponto de vista ideal
com lugares e coisas. Se eu sou um sapato, por quanto e racionalizado, distante do universo medieval
teocêntrico. Até ter sua validade questionada por
tempo permaneço em frente a uma pintura abstrata? E,
artistas modernos como Cézanne, a perspectiva
se sou um canário, de que ponto de vista observo uma
PENSE COMO

renascentista se estabeleceu, desde então, como a


única forma “correta” para retratar o espaço.
escultura? E se, de uma hora para a outra, eu começasse
Influenciados pela psicanálise de Sigmund
a olhar o mundo com os olhos de minha mãe? Que narra-
Freud, os surrealistas estavam interessados
tivas eu poderia criar sobre a cidade a partir da perspec- em produzir uma arte atenta aos processos
inconscientes, que fugisse da lógica e da razão e
tiva de um robô, um louco, uma rainha ou uma melancia? assumisse o repertório dos sonhos. Por um lado,
Salvador Dalí manipulava imagens conhecidas,
como seus famosos relógios derretidos. Por
outro, Joan Miró e Max Ernst produziam pinturas
sem controle da lógica. Na literatura, a livre asso-
ciação de ideias de André Breton, no cinema, a
crítica de Luis Buñuel aos valores burgueses, no
teatro, o absurdo de Antonin Artaud. Interessado
no abismo do inconsciente e criticando o racio-
nalismo ocidental, Breton, autor do Manifesto
surrealista, afirmou: “A mania incurável de redu-
zir o desconhecido ao conhecido, ao classificável,
só serve para entorpecer cérebros”.
Ao sugerir novas situações dentro ou fora do museu, o Na perspectiva do urubu, a carniça é um
delicioso peixe assado. Para a onça faminta, o
absurdo surge como possibilidade inventiva no proces- homem não é homem – apenas carne suculenta.
Pedras, para o rio, são por onde escorrer? Terra,
so de ressignificação das coisas. Ao explorar formas de
para as nuvens, é onde penetro quando me des-
ver e perceber o mundo a partir de outros sujeitos , faço? Lago é espelho para a lua? Formigas são
cócegas para a terra? A borboleta reina sobre
a ideia de que há uma interpretação predeterminada o universo, depois de duas horas imóvel sobre
a mesma pedra? De acordo com o antropólogo
ou única verdade, norma ou modelo para ver a arte e o
Eduardo Viveiros de Castro, o “perspectivismo
mundo é desconstruída. No museu, os participantes de ameríndio” refere-se à “concepção indígena
segundo a qual o mundo é povoado de outros
Pense Como são incentivados a criar novas legendas para sujeitos, agentes ou pessoas, além dos seres

descrever as obras, a partir da perspectiva de seu perso- humanos, e que veem a realidade diferentemen-
te dos seres humanos”. Cada um desses agentes
nagem. A legitimidade da legenda é posta em questão constitui uma espécie de “centro do mundo”,
concebendo-se como subjetividade. Assim, os
em prol de novos sentidos e significações.
animais não se compreendem como bichos; pelo
contrário, veem-se dotados de estatuto humano.

A relação da obra com o mundo ultrapassa as


intencionalidades do artista para alcançar uma
dimensão plural e descentralizada. Uma mesma
obra pode gerar reações distintas: emoção, cho-

105
que, recusa, reflexão, empatia, desgosto, indife-
rença. Quando o público se percebe como agente
ativo na constituição de sentido das obras, seu
papel deixa de ser o de espectador para se tornar
cocriador e coautor. Para Umberto Eco, criador
da teoria da obra aberta, “cada recepção de uma
obra de arte é tanto uma interpretação quanto
uma execução dela”. Toda obra de arte assume,
assim, uma dimensão performativa. Para ele, há
uma colaboração psicológica entre público e autor:

“(...) qualquer trabalho de arte, mesmo que não


tenha sido disponibilizado ao receptor em um
estado inacabado, demanda uma resposta livre,
inventiva, simplesmente porque não pode real-
mente ser apreciado a menos que seja de alguma
maneira reinventado por aquele que o reencena
em colaboração psicológica com o próprio autor.”
PENSE COMO
107
PENSE COMO

Cartas do baralho com os personagens da atividade educativa Pense Como.


109
Corpos experimentam o espaço,
tecidos e outros corpos a partir de
tensões criadas coletivamente.
FORMA COR
CORPO
COMPOR

111
COM POR
COM COR
FORMA COM CORPO
Crianças e educadores experimentam
tecidos no Pilotis do MAR.
113
Nossos corpos são conjuntos de formas e cores. Nossas O concretismo no Brasil foi um movimento ar-
tístico e literário ocorrido nas décadas de 1950 e
roupas também formam composições cromáticas com 1960, no qual artistas como Waldemar Cordeiro,
Geraldo de Barros, Luiz Sacilotto, no caso de São
planos diversos. Com tecidos elásticos jogamos no espaço.
Paulo, produziam obras sem buscar qualquer
Criamos tensões entre azuis, vermelhos e amarelos. Rede- conotação simbólica. Utilizando apenas cores e
formas geométricas, seguiam os princípios da
finimos o volume e a geometria dos corpos coletivamente. racionalidade e da matemática para compor em
busca da pura visualidade. No Rio de Janei-
Nos transformamos em esculturas vivas e experimentamos
ro, porém, artistas como Hélio Oiticica, Lygia
a relação de um corpo com o outro, pois é necessário ao Clark e Lygia Pape, que se autodenominavam
neoconcretos, reagiam a favor de uma maior
menos um segundo corpo para tensionar o tecido. Com os experimentação das linguagens e dos sentidos,

tecidos esticamos, enrolamos, encolhemos, envolvemos, aproximando a experiência da arte e a vida.

abaixamos. Construímos . Compomos. Os Parangolés, de Hélio Oiticica, e Divisor,


de Lygia Pape, ambos do final da década de
1960, são exemplos de trabalhos artísticos em
Esta atividade é uma experimentação corporal que que as potencialidades do tecido e da cor são
exploradas a partir do movimento, imersão e
explora a relação entre corpo, forma e cor por meio de incorporação completa do antes espectador que
se convertia em participador.
tecidos elásticos coloridos que podem ser amarrados, esti-
cados e envolvidos nos participantes. Esses jogos suscitam
QUER TC?

reflexões sobre o campo da arte: o contraste e a composi-


ção das cores, a experiência performática e escultórica do
corpo, a sensorialidade e o deslocamento no espaço como
exercício de composição geométrica e abstrata.
115
QUER TC?
117
ProfessorAs em formação
criaram um coletivo
temporário e realizaram
intervenções no museu a
partir de interesses comuns.
“O ‘nós’,
primeira pessoa
do plural,
contém
a multiplicidade
de relações

119
que se esconde
dentro
do sujeito
que age”
Pedro B. Mendes e Fernanda Kutwak
Dimensões coletivas da arte é um curso de formação com Zona de poesia árida apresentou mais de 55
trabalhos de 16 coletivos de arte e ativismo de
professores que teve como base a exposição Zona de São Paulo presentes no acervo do Museu de Arte
do Rio. Esse conjunto foi formado a partir do
poesia árida .
Prêmio do Edital Marcantonio Vilaça (Funar-
te) e constitui o Fundo Criatividade Coletiva/
Doação Funarte. Vídeos, fotografias, gravuras,
Grupos de professores da educação básica de escolas pú- intervenções e performances constituem uma
zona poética que tem a cidade como centro e a
blicas e privadas experimentaram coletivamente processos
intervenção em espaços públicos como prática.
artísticos como práticas pedagógicas, políticas e de so- Coletivos presentes na exposição: A Revolução
Não Será Televisionada | BijaRi | Catadores de
ciabilidade. A partir da exposição e pensando na ideia de Histórias | Cia. Cachorra | COBAIA | Contrafilé |

coletivo, coletividade e rede, o grupo dedicou-se a debater Dragão da Gravura | EIA | Elefante | Espaço Co-
ringa | Esqueleto Coletivo | Frente 3 de Fevereiro
a seguinte questão: podemos criar espaços de partilha | Mico | Nova Pasta | ocupeacidade | Política do
Impossível
para o desenvolvimento de uma ação comum?
“O ‘nós’, primeira pessoa do plural, contém
a multiplicidade de relações que se esconde
dentro do sujeito que age. Mas, mais que conter,
DIMENSÕES COLETIVAS DA ARTE

os ‘nós’ da rede de pessoas que somos libera a


diferença subsumida em uma suposta unidade
da ação.” Pedro B. Mendes e Fernanda Kutwak
O desafio inicial era identificar uma questão comum e, “Estávamos em um grande devir tentando
criar táticas de sobrevivência por meio das
a partir dela, propor uma intervenção no museu. Em um trocas de interesses, conteúdos e afetos. Produ-
zíamos fora do circuito financeiro, trabalhando
dos cursos, o grupo de professores era formado unica-
coletivamente, criando coletivos, articulando
mente por mulheres e elegeu a opressão vivenciada por uns com os outros. (...) Posicionávamo-nos
radicalmente contra a cultura espetacular e a
elas como tema. Em um movimento ao mesmo tempo espetacularização em geral, ou seja, contra a
não participação, a alienação e a passividade
coletivo e individual, cada uma começou a experimentar
da sociedade. Propúnhamos a participação dos
o próprio corpo como plataforma de expressão e pro- indivíduos em todos os campos da vida social,
principalmente na cultura.” Túlio Tavares
testo contra assédios morais e sexuais, silenciamentos e
situações de racismo diárias. Em uma caminhada lenta No livro A sociedade do espetáculo (1967),
Guy Debord apresenta a vida das sociedades
e silenciosa, mulheres com bocas ou olhos vendados, modernas como “imensa acumulação de espetá-
culos”, em que nada é vivido diretamente, tudo é
cabeças cobertas e palavras de indignação escritas em
apenas representado. A relação entre as pessoas
cartazes ou na própria pele interrompiam o trajeto da- é mediatizada pela televisão, pelos celulares,
pelas propagandas, e o mundo real é convertido
queles que passavam pelos espaços do museu. Ao expe- em meras imagens. Debord fazia parte da Inter-
nacional Situacionista, um movimento político e
rimentar todo o processo de pensar uma ação como um
artístico que se posicionava contra o espetáculo
coletivo , e de efetivamente realizá-la, os professores como fábrica de alienação e atuava contra trans-

121
formação de pessoas em espectadores.
vivenciaram a relação entre arte e ativismo , produção
artística e esfera pública, criação coletiva e gesto poético
na arte política.
DIMENSÕES COLETIVAS DA ARTE

Professoras da educação básica realizam intervenção


coletiva em diferentes espaços do museu.
123
DIMENSÕES COLETIVAS DA ARTE
125
REJUVENESÇA
127
Práticas
artísticas
contempo
râneas
129
Criação de poemas POR MEIO da combinação
de recortes de palavras e frases fixadAs
no vidro da entrada do museu.
AO CRIAR
NOVAS ESCRITAS
A PARTIR DE
FRAGMENTOS,
PARTICIPANTES
REORGANIZAM

131
UMA SÉRIE
DE RECORTES
DE PALAVRAS
OU TRECHOS
DE POEMAS.
A proposta é criar algo novo a partir de um tipo de matéria Um dos poetas que motivaram esta atividade
foi Mário Chamie, criador da poesia práxis, que
palavra, tão manipulada e desgastada pelos tantos usos surgiu como dissidência da poesia concreta. A
poesia práxis adotava a palavra como organismo
de outros poetas, para refletir, na experimentação e reutili-
vivo gerador de novos organismos vivos, ou seja,
zação dessas frases, sobre a noção de originalidade. de novas palavras. No concretismo, o uso das
possibilidades gráficas das palavras suplantava a
ideia de começo, meio e fim do texto e elimi-
nava o uso do verso para concentrar-se em sua
Relações formais vão sendo constituídas a partir da inte-
materialidade e no aproveitamento do espaço
ração com o suporte e da maneira como os textos produ- branco da página. Por esse uso espacial da pa-
lavra, muitos desses textos foram chamados de
zidos são dispostos para a apreensão do leitor. No museu, poema-objeto. Como Mário Chamie expressou

poemas foram montados sobre as paredes de vidro da em um de seus poemas, “Por trás da palavra”,
esta atividade tenta libertar as palavras de sua
fachada, fazendo com que a transparência e o espaço condição de clausura: “Por trás / de toda palavra
/ há uma trama / cavada. / Só não se cava / nem
vago entre as palavras acrescentassem camadas ao texto.
se sagra / a palavra / enclausurada. / A clausura
Forma das Palavras é fruto da caça de seus autores pelos / da palavra / é a palavra / lacrada; / é a usura
/ da palavra / que não abre / suas veias / se se
sintagmas disponíveis. Os poemas que surgem podem envenena / de nada.”

ser coletivos ou individuais, além de irem mudando com a


FORMA DAS PALAVRAS

intervenção de pessoas diferentes em momentos distintos.

Somos atravessados pelas palavras todo o tempo. Um


grito na rua, uma música que toca no rádio, letreiros pu-
blicitários, embalagens, manchetes. Os diversos canais da
linguagem nos contaminam e influenciam a maneira como
vemos as coisas e as pessoas. Como é fazer poesia partin-
do da combinação de variadas referências cotidianas?
FORMA DAS PALAVRAS
135
FORMA DAS PALAVRAS

Livro-objeto criado pelos educadores para


registrar alguns resultados da atividade realizada
no vidro de entrada do museu.
137
escrita livre de
uma carta com
destinatário incerto.
“Dedico
a você
o ar
de Olinda”

139
Paulo Bruscky
Convidaram-me a escrever “uma carta para ser lida” por “A arte postal está literalmente inscrita na
translocalidade. Carrega as marcas do lugar nos
alguém. Em uma mesa com diversos materiais, encon- selos colados nos envelopes e nos endereços do
remetente e do destinatário. No entanto – o que é
tro papéis, canetas, lápis com cor ou sem cor, carimbos,
importante – situa-se também além do lugar: viaja
giz de cera, bico de pena, carvão, nanquim, máquina de ou transporta essas marcas de seus contextos a
uma localização distinta. Assim, é enraizada e con-
escrever, selos e envelopes. textual, um movimento que responde a condições
políticas e sociais específicas do lugar, ao tempo
que transcende essas mesmas condições e catego-
Escolho as ferramentas que darão forma aos meus pen- rias.” Zanna Gilbert

samentos e experimento a escrita. Penso nesse alguém “A Arte Correio (Mail Art), Arte por Correspon-

que ao mesmo tempo é indefinido e notável e como dência, Arte Postal, Arte a Domicílio ou qualquer
outra denominação que receba não é mais um
receberá as impressões do que está próximo a mim: dos ‘ismo’, e sim a saída mais viável que existia para
a arte nos últimos anos, e as razões são simples:
lugares que conheci, das pessoas que encontrei, do
antiburguesia, anticomercial, antissistema etc.
que vi, ouvi e senti. Ao redigir a carta, ativo meus senti- Essa arte encurtou as distâncias entre os povos e
países, proporcionando exposições e intercâmbios
dos entre desejos e anseios, dúvidas e certezas, críticas, com grande facilidade, onde não há julgamentos
nem premiações dos trabalhos, como nos velhos
questionamentos e denúncias. Transformo em palavras,
salões e nas caducas bienais. Na Arte Correio, a
CARTAS AO VENTO

riscos, desenhos, colagens, cortes, marcas e rasuras a ci- arte retoma suas principais funções: a informação,
o protesto e a denúncia.” Paulo Bruscky
dade que tenho em mim. Ao final, com a carta dentro do
Como a arte pode questionar as regras de um
envelope ou o envelope como carta, planejo seu destino
sistema? Mesmo sabendo que seria barrado, o artis-
ao acaso do encontro. ta Paulo Bruscky (PE, 1949) levou um envelope de
2 metros a uma agência do correio, acompanhado
por uma multidão. A polícia foi chamada, e ele que-

O destino da carta era variado. O remetente poderia ria que lhe explicassem por que a carta não poderia
ser enviada. A lei do correio, que não estabelecia
optar por entregá-la a uma pessoa específica, deixar que um limite de tamanho para o envelope, teve de ser
modificada. Na ação Sem destino (1970), Bruscky
fosse entregue aleatoriamente a anônimos ou participar
distribuiu a seus amigos envelopes que tinham
de uma troca: deixar uma carta e pegar outra. Esta ativi- o endereço do artista como remetente e a frase
“sem destino” no campo reservado ao endereço do
dade explora a dimensão afetiva da correspondência em destinatário. Depois de fazer intervenções no enve-
lope, bastava colocá-lo numa caixa de correio. De
papel e suas várias formas de escrita. Dialoga também
acordo com a lei da União Postal Universal, cartas
com a arte correio , a história dos meios de comuni- sem destino retornam ao remetente. Assim, Bruscky
recebeu todas as cartas de seus amigos de volta,
cação e suas transformações. As cartas funcionam como sem que eles se preocupassem com o selo.

fragmentos de um relato sensível, por meio da descrição


íntima de seus remetentes, além de provocarem uma in-
teração de potencialidade poética entre os participantes.
141

Depois de escrever a carta, o participante a deixava


nesta caixa de correio, com destino incerto.
CARTAS AO VENTO

As cartas colocadas pelos educadores


nas pilastras poderiam ser retiradas,
lidas e guardadas por quem desejasse.
143
CARTAS AO VENTO
145
Criação de objetos, a partir de
lixo eletrônico, que ganham
outras funções imaginadas.
Vistos de outro
modo, objetos
podem ser
combinados

147
para gerar
outra coisa,
com novo sentido
e atribuição.
OBSOLECÊNCIA PROGRAMADA
149

“Reprodutor para desenhar” criado por uma


das crianças participantes da atividade.
Estamos cercados de coisas incompletas, antiquadas, que Um volume crescente de lixo é resultado da
obsolescência de produtos de alta tecnologia. De
não funcionam mais. Qual o tempo de vida útil dos apare- acordo com previsões da ONU, serão 50 milhões
de toneladas em 2017. Países pobres e em
lhos eletrônicos? Quantos anos separam o disquete do car-
desenvolvimento, sobretudo a China, são destino
tão de memória? O que fazemos com sua carcaça depois? de 80% do lixo eletrônico de nações ricas
que, em vez de ser reciclado nos países que o
produziram, são descartados ou comercializados
de forma ilegal. O mercado global de resíduos
Esta atividade é um convite à invenção. Circuitos e fios,
é estimado em 410 bilhões de dólares por ano
CDs e fitas cassetes, placas e carcaças, coisas que não e representa uma solução econômica imediata
para famílias da África e do Sudeste Asiático que
servem mais configuram os materiais a partir dos quais vivem na miséria. Entretanto, esses detritos tra-

se desenvolve um projeto científico. O cientista apresenta zem também graves riscos à saúde humana pela
presença de materiais tóxicos, como mercúrio,
seu objeto, respondendo às seguintes perguntas: chumbo, cádmio e arsênico.

Em 1913, o artista francês Marcel Duchamp


O que é? fixou uma roda de bicicleta sobre um banquinho
de madeira. A simples junção de dois objetos
Para que serve? encontrados, previamente fabricados, resultou, as-
sim, na obra Roda de bicicleta. Ao enviar a obra A
OBSOLECÊNCIA PROGRAMADA

Como funciona?
fonte (1917), um urinol assinado, a um júri de arte,
Quem vai utilizar? Duchamp – o inventor do ready-made – estava
colocando em xeque o sistema da arte, questio-
nando o status do objeto de arte. Desde então,
e especialmente nas décadas de 1950 e 1960,
a apropriação de objetos industriais que podem
ser recombinados, acumulados, justapostos e
incorporados tornou-se um procedimento corrente
nas artes visuais.
Para realizar o desafio, é preciso desmembrar equipa- Se você tivesse que colocar tudo o que
precisa para viver numa mala, o que teria dentro
mentos obsoletos, desmontar e desparafusar todas as dela? Somos 7 bilhões de pessoas no planeta
e já deixamos de ser um agente biológico para
roscas, como um processo de reconhecimento da natu-
nos tornarmos uma força geológica capaz de
reza de cada fio, engrenagem e traquitana. Com tudo modificar seu clima e, assim, ameaçar nossa
existência e a de outros seres. A obsolescên-
desmontado, é hora de inventar novos objetos a partir cia programada é uma estratégia da indústria
para aumentar o consumo e obter mais lucros:
dos existentes : seres, máquinas e ferramentas que,
produtos são feitos para ter vida breve. Quando
assim como as peças utilizadas, também se tornarão quebram, muitas vezes não possuem peças de
reposição, obrigando a uma nova compra. Por
obsoletos no futuro. um lado, consumidores devem pressionar os
governos para regular as indústrias e, por outro,
praticar um consumo consciente. A redução do
Crianças e adultos podem construir engenhocas e com- consumo deve ser orientada por uma redistribui-
ção radical da riqueza, já que, por exemplo, um
partilhar juntos o processo de feitura, discutindo o que os
cidadão médio dos EUA consome o equivalente
motivou a inventar seus objetos e que funções ele teriam. ao que é consumido por 32 cidadãos do Quênia
ou da Etiópia.
É aos poucos, na troca, invenção e descoberta, que o signi-
ficado dessa estranha palavra, obsolescência , se revela.

151
OBSOLECÊNCIA PROGRAMADA
153
Com o corte cria-se o espaço; com a dobra,
o volume. Dois cortes e uma dobra ou três
dobras e um corte, uma folha de papel e um
desafio: criar uma escultura.
Faça sua própria escultura
1. Sorteie dois números.
2. Sorteie um papel
colorido.
3. Faça no papel colorido,

155
com a ajuda de uma
tesoura, na ordem que
quiser, o número de cortes
e o número de dobras
sorteados.
CORTE E DOBRA

Dois cortes, três dobras e uma escultura.


157
Corte e dobra; dois atos, uma escultura. A referência Amilcar de Castro (1920-2002) foi um artista
brasileiro que utilizou o corte e a dobra como
principal para esta atividade é a obra do artista mineiro recurso recorrente em suas esculturas. Inte-
ressado na construção geométrica, participou
Amilcar de Castro . A partir do corte e da dobra, Amil-
do movimento neoconcreto no Rio de Janeiro,
car desenvolveu, prioritariamente com aço, esculturas tendo assinado seu manifesto em 1959. O artista
defronta-se com o problema da escultura que
que ressignificam nossa relação com o espaço. O espaço perdeu seu aspecto massivo por meio do gesto
simples, único, reto, com o mínimo de recursos.
está dado? Ou pode ser criado? A atividade começa com
Não há inspiração, apenas o ato sobre a matéria
o sorteio de números em duas urnas, uma com núme- do aço. Um corte radical... e o volume é agora
criado junto com o espaço, a escultura despo-
ros que indicam a quantidade de cortes e a outra, a jada ao máximo de terceira dimensão. Muitas

quantidade de dobras. O acaso determina os elementos de suas obras podem ser vistas em espaços
públicos, dialogando com a paisagem.
definidores da experimentação da proposta do artista,
“Eu gosto de fazer uma escultura que não
permitindo investigar as possibilidades de transposição
deixa resto. Não deixa pedaço nenhum sem
do plano bidimensional para o tridimensional na constru- solução perfeita.”

ção de uma pequena escultura com sustentação própria. “Minha primeira escultura de dobra foi de cobre.
Dobrada. Depois disso continuei cortando e
Com a forma pronta, pode-se experimentá-la de diferen-
dobrando e cortando e dobrando. Isso foi feito
CORTE E DOBRA

tes maneiras no espaço, criar curvas no papel e voltar a em 1952. Tem um tempinho aí fazendo a mesma
escultura o tempo todo. Eu gosto do ferro, gosto
dobrá-lo. A cada gesto, a forma se altera. Pode-se ainda da chapa de ferro, da cor do ferro, é fácil de
trabalhar, não há mistério.” Amilcar de Castro
descobrir o encaixe com outras esculturas de papel.

Como pensar a passagem da forma bidimensional à tridi-


mensional utilizando materiais acessíveis, como o papel,
a tesoura e um jogo? Além de trabalhar os elementos da
linguagem visual, como linha, cor, forma e volume, este
exercício aproxima o participante de alguns princípios da
experiência construtivista na arte e da abstração geomé-
trica presente nos movimentos concreto e neoconcreto
nas décadas de 1950 e 1960 no Brasil.
159
CORTE E DOBRA

As esculturas feitas a partir da atividade Corte e Dobra podem ser dispostas


de diferentes maneiras no espaço, o que modifica sua percepção.
161
REJUVENESÇA
163
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MATERIAL EDUCATIVO Jessica Goes, Juan Selva, Juliana Ângelo, Eloisa Elena Nascimento, Nilton Carlos Silva da Concei-
Karen Aquini, Katiucia Pregioni, Laiz Gomes, Monica Moreira Esteves Bernardi ção, Regina Ferreira Barbosa, Renato da
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Todas as fotografias são de autoria Neuma, Thyago Corrêa, Thiago Muiz, Ulisses GERENTE de produção Gerência de Produção
de Thales Leite, exceto: Silva, Vinicius Bragança, Vinicius Motta, Wal- Daniel Bruch Alex Ferreira, Ana Rodrigues, Ana Terra,

FICHA TÉCNICA
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educação do MAR Ynaê Cortez, Yuri Baptista. Equipe Soares, Márcia Rego, Stella Paiva.
p. 42-43 (vol. 2) | Francisco de Souza
p. 53 (vol. 1) | Roxane Oliveira Núcleo de projetos e processos * Estagiário ** Jovem aprendiz
p. 39 e 41 (vol. 2) | Observatório-móvel MUSEU DE ARTE DO RIO Bruna Bindes Nascimento Machado*, Clei-
de Machado da Rocha, Deborah Balthazar Equipe DE EDUCAÇÃO
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Branca Zuma, Bruna Camargos, Bruno Cultura] Diego de Deus da Conceição, Inês Rosa Educadores 2 André Vargas, Daniel Bru-
Machado, Bruno Oliveira, Camilla Gomes,  Helena Bomeny [Secretária Municipal de Castilho, Jaqueline Pacheco Fonseca, Leo- no, Daniel Santiso, Diego Xavier, Georges
Carolina Burnier, Casimiro Veloso, Cassia Educação] nardo Caldeira de Souza, Letícia de Lima Marques, Ismael Gonçalves, Janine Maga-
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rina Vieira Medeiros, Christine Alves, Clarissa nio da Humanidade] sa, Marivanda Batista Cerqueira, Suzanne Ricardo, Leticia Caetano, Mariana Vilanova,
Godoy, Crislane Rocha, Cristina Gonçalves,  Alberto Silva [Companhia de Desenvolvi- Dias Moreno, Tania Berman, Thais Maria Matheus Gonçalves, Max Morais, Noan
Cristina Peres, Dally Schwarz, Daniel Bruno, mento Urbano da Região do Porto do Rio Borges Boaventura, Vanessa Nascimento Moreira, Pedro Ricardo, Priscilla Gabrielle,
Darlan Santos, Daniel Santiso, Dayana Pereira de Janeiro S/A] lima, William Vieira Jardim. Rodrigo Batista, Wallace Ramos.
de Carvalho, Deborah Paris, Diego Xavier,
Douglas Ponso, Dulcinéia Emídio Guedes, Conselho do MAR Gerência operacional Administrativo
Emilio Fávro, Emmanuel Costa, Erica Oliveira, Márcio Fainziliber Alverindo Clemente Borges, Caroline Dias Crislane Rocha, Douglas Ponso, Fabiana
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Georgia Ramos, Gleyce Kelly Heitor, Guilher- Pedro Paulo Carvalho Teixeira Menezes Júnior, José Russi Degliexporte, de Jesus, Bruno Machado, Bruno Oliveira,
me Dias, Gustavo Valentim Alves Pereira, Josecleiton dos Santos Amaro, Josias Guilherme Dias, Lucas Assumpção, Luis
Hamilton Ferreira, Helen Dantas Rodrigues, Conselho do Instituto Odeon Dutra Ferreira**, Josivan Dias Ferreira, Lívia Otávio, Nádia Alexandre, Wesley Ribeiro.
Helen Polycarpo, Igor Castro, Igor Vidor, Eder Sá Alves Campos Pontes da Silva, Marcus Vinícius Gonçalves
Isabel Ribeiro, Ismael Gonçalves, Janaina Afonso Henriques Borges Ferreira da Silva, Maria de Fatima Gomes de Sousa, Jovens aprendizes
Melo, Jandir dos Santos Junior, Jaqueline Edmundo de Novaes Gomes Maria Janaina Alves Mesquita, Marlon Maria de Fátima Gomes, Marcos Franklin
Mello, Jonathan Agra, Janine Magalhães, Bruno Pereira Vinícius Jorge das Neves, Mateus Costa do e João Perri.
A tipografia deste livro sofreu intervenções criativas do EstUdio Cru, feitas
especialmente para a Escola do Olhar do Museu de Arte do Rio. Ela está
disponível para download em museudeartedorio.org.br

Este livro foi composto na fonte Amis Pro e impressso pela gráfica Stilgraf sobre
papel Offset 90 gramas (miolo), Offset 180 gramas (capa) e Supremo Alta Alvura
300 gramas (luva) para o Instituto Odeon/Museu de Arte do Rio – MAR.
ISBN 978-85-68880-02-9

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