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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

FLAVIA FERNANDA ROMÃO

A DIMENSÃO ESPACIAL DA ESCOLA DE


EDUCAÇÃO INFANTIL ENQUANTO
AMBIENTE DE DESENVOLVIMENTO
HUMANO E PEDAGÓGICO

AMERICANA
2006
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO

FLAVIA FERNANDA ROMÃO

A DIMENSÃO ESPACIAL DA ESCOLA DE EDUCAÇÃO


INFANTIL ENQUANTO AMBIENTE DE
DESENVOLVIMENTO HUMANO E PEDAGÓGICO

Memorial apresentado ao Curso de Pedagogia/PROESF


Programa Especial de Formação de Professores
em Exercício nos Municípios da Região
Metropolitana de Campinas,
da Faculdade de Educação
da Universidade Estadual de Campinas,
como um dos pré-requisitos para a
conclusão da Licenciatura em Pedagogia.

AMERICANA
2006
© by Flávia Fernanda Romão, 2006.

Ficha catalográfica elaborada pela biblioteca


da Faculdade de Educação/UNICAMP

Romão, Flávia Fernanda.


R661d A dimensão espacial da escola de educação infantil enquanto ambiente de
desenvolvimento humano e pedagógico : memorial de formação / Flávia
Fernanda Romão. -- Campinas, SP : [s.n.], 2006.

Trabalho de conclusão de curso (graduação) – Universidade Estadual


de Campinas, Faculdade de Educação, Programa Especial de Formação de
Professores em Exercício da Região Metropolitana de Campinas (PROESF).

1.Trabalho de conclusão de curso. 2. Memorial. 3. Experiência de vida.


4. Prática docente. 5. Formação de professores. I. Universidade Estadual de
Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.

06-438-BFE

2
“Para mim basta entrar em seu local
para saber se interessa, ao povo,
a instrução de seus filhos, se os quer
e se respeita e estima o professor”

Luis Bello
(colunista do El Sol)

3
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................5

1) APRESENTANDO O TEMA...............................................................................7

2) O ESPAÇO FÍSICO DAS ESCOLAS MATERNAIS........................................10

3) DA FAMÍLIA À ESCOLA: UM POUCO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO


INFANTIL ......................................................................................................................14

4) DOS DOCUMENTOS ATUAIS.........................................................................18

5) AS ESPECIFICIDADES DA CRIANÇA...........................................................21

CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................25

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................26
Introdução:

Este trabalho tem como propósito, não versar sobre descobertas, enfoque
contrário ao já conhecido, nem mesmo oferecer soluções para problemáticas levantadas.
Visa a levantar um tema pouco discutido e sobre o qual há poucas informações ou
pesquisas e discorrer sobre o mesmo entremeado pelas memórias da prática profissional
e pelas contribuições do curso a essa prática. Esse assunto diz respeito às implicações
entre o espaço físico escolar e aprendizagem e será aqui apresentado nas páginas
seguintes constando de quatro capítulos e as considerações finais.
Tem início uma apresentação do surgimento (descoberta) do eixo de trabalho,
importante para explicitar as motivações e relações entre minha vida pessoal e
acadêmica. A considerar o contexto histórico-social para a elaboração deste trabalho.
Ideal para entender as motivações, as argumentações teóricas buscadas a partir das
primeiras conclusões frutos deste histórico e como se dá as considerações finais.
Logo em seguida discorrerei sobre o espaço físico.
Depois haverá um capítulo destinado à história da educação infantil, necessário
para entender os contextos e sentimentos relacionados à infância e como ainda somos
influenciados por eles nas concepções atuais.
No capítulo quatro serão abordadas leis e propostas oficiais relacionadas à
arquitetura escolar. E por fim, o capítulo quinto será destinado às especificidades das
crianças entre 0 e 6 anos, dando conta de aspectos necessários para seu desenvolvimento
enquanto ser completo.
Todos os capítulos serão entremeados por minhas memórias enquanto professora
e também alguma lembrança dos tempos de aluna.
Durante a elaboração deste Memorial, processo árduo e complexo, desde a
escolha do eixo de trabalho às pesquisas e a elaboração do texto final muitas
dificuldades foram encontradas. Primeiro a escolha do tema foi um processo que aos
poucos ganhou forma, entre tantas opções, sempre importantes para a prática docente.
Definido o tema, a busca por informações sobre o eixo de trabalho foi muito trabalhosa
visto que, mesmo entre os autores que se dedicam ao assunto, pouca bibliografia pode
ser encontrada e no curso do PROESF apenas algumas pinceladas foram dadas, não
havendo maior aprofundamento. Por fim, a parte que talvez tenha sido a mais difícil foi
a escrita deste texto. Por compilar um repertório muito vasto e complexo, relacionar os

5
diversos universos que fazem parte do assunto foi exaustivo e mesmo após a escrita fica
o sentimento que talvez devesse ter sido diferente...

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1) APRESENTANDO O TEMA.

Desde o início do curso de Pedagogia/PROESF, quando soube da proposta para


o trabalho de conclusão do curso, passei a imaginar qual poderia ser o tema a ser
apresentado, porém não chegava a um acordo, ou melhor, não havia um tema específico
que me chamasse a atenção.
No dia 08 de setembro de 2004, assistia uma a aula magna referente à disciplina
de Avaliação, ministrada pelo Profº Drº Luis Carlos de Freitas, quando suas palavras e
sua explanação desencadearam em mim uma idéia daquilo que viria a ser o tema de meu
trabalho. Ele abordara a questão do espaço e do tempo na educação, um panorama da
história das escolas e como, em seu desenvolvimento, foi sendo moldada a organização
escolar seriada ou em ciclos e a forma de organização das escolas enquanto espaço
físico, para atender as demandas e também como forma de legitimar a ideologia da
classe dominante.
Devido à minha formação anterior em Arquitetura e Urbanismo, me incitou a
reflexão sobre os espaços físicos das escolas e as possíveis relações com a educação.
Todos os seres humanos gostam de estar em ambientes confortáveis e convidativos,
sendo assim, a escola tem que cativar os alunos para a aprendizagem por meios
didáticos, pedagógicos e, porque não, arquitetônicos.
Essas reflexões ganharam força ao escolher o tema para a realização de um
artigo para a disciplina de Políticas e Reformas Educacionais. Como trabalho com
educação infantil, gostaria de ter abordado as edificações destinadas ao ensino infantil,
porém a bibliografia sobre essa faixa etária era muito pequena. Optei por escrever o
artigo e pesquisar sobre as instituições escolares como um todo.
Durante aquele mesmo semestre e no atual, as aulas das disciplinas Crianças de
0 a 6 anos e Educação Infantil reforçaram a minha idéia. Foi possível estreitar o assunto
e definir o tema de meu memorial: estudar as escolas de ensino infantil direcionando o
olhar para os aspectos físicos. E encontrar relações entre o ambiente e o processo
ensino/aprendizagem.
Um texto específico tratou do tema na disciplina Educação Infantil, afirmando a
idéia original da qual parti para esse trabalho: “O espaço físico como um dos elementos
fundamentais para uma pedagogia da educação infantil” de Ana Lúcia Goulart de Faria,
seguido de uma aula magna com a arquiteta Ana Beatriz Goulart de Faria ministrada em

7
30 de Novembro de 2005 e que foi de grande valia para demonstrar que minhas idéias
estavam no caminho certo.
Houve contribuições de diversas outras disciplinas, pois apesar de ser
aparentemente um eixo muito específico, ele envolve mais disciplinas do que se
pensava e se pode perceber sua influência.
Já na fase final da graduação, a realidade vivenciada em sala de aula foi
determinante para focar ainda mais a importância do espaço físico enquanto uma das
dimensões da escola. Sentir na pele a dificuldade da falta e inadequação desse espaço
para realizar um trabalho significativo com as crianças a fim de desenvolver sua
dimensão humana, sem dúvida fortaleceu a intenção inicial deste trabalho.
A princípio seriam relatadas as experiências em algumas escolas onde lecionei –
durante um dos três anos de exercício da profissão fui professora substituta e tive
diversas oportunidades de conhecer escolas diferentes por conta desta rotatividade –
mas, ao final do ano de 2005, a unidade escolar onde sou efetiva foi desativada e os
alunos e funcionários divididos em duas outras unidades.
Éramos uma EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) que atendia
crianças de 0 a 4 anos e com essa divisão, as crianças menores (de 0 a 2 anos) foram
para o local onde uma outra EMEI funcionava, EMEI esta que foi realocada para a
mesma unidade que as crianças de maternal III (3 anos). O destino foi uma EMEFEI
(Escola Municipal de Ensino Fundamental e Educação Infantil) que há pouquíssimo
tempo recebe crianças de educação infantil.
O prometido pela Secretaria Municipal de Educação foi a realização de algumas
adaptações para atender a nova demanda, contudo a realidade foi bem diferente.
Somente após o início das aulas começaram a ser feitas intervenções pontuais e que não
atendiam as necessidades. Só podemos fazer uso do pátio coberto por curtos períodos
do dia uma vez que o intervalo as crianças do ensino fundamental é extenso para
atender a todas as salas. O parque existente é para crianças maiores e ainda assim não
está em condições seguras de uso, mesmo àquela faixa etária. Foi iniciada a construção
de um tanque de areia, contudo ele serve como criadouro de mosquitos da dengue visto
que a areia nunca chegou a ser colocada e, durante os finais de semana as crianças e
adolescentes do bairro a utilizam como piscina. A entrada e saída das crianças do
Infantil ocorrem pela entrada única da escola e eles são obrigados a percorrer um longo
corredor (cerca de 90m de comprimento) para chegar e sair de suas salas de aula e
também para freqüentar o pátio coberto. O refeitório fica superlotado no horário de

8
lanche, com crianças do Jardim I, II e Pré, sem contar que a cozinha fica logo no início
do corredor já citado, assim como a sala de professores e banheiro dos funcionários. Os
banheiros finalmente receberam bacias de tamanho adequado, porém algumas torneiras
foram modificadas enquanto outras permaneceram muito altas e acabam molhando os
alunos. Somente um chuveiro masculino e um feminino podem ser utilizados (as turmas
de Maternal III permanecem na escola por período integral) e a troca de roupa deve ser
efetuada na própria sala de aula já que nos banheiros não há espaço suficiente para fazê-
lo, o que ocasiona muito transtorno aos que saem do banho e têm que passar pelo
corredor para chegar à sala de aula.
Todo esse contexto tornou (e torna) o exercício da atividade uma aventura por
mares nunca dantes navegados! E que mais que oportunamente serão relatados.

9
2) O ESPAÇO FÍSICO DAS ESCOLAS MATERNAIS:

Qualquer atividade humana precisa de um espaço e de um tempo


determinado. Assim acontece com o ensinar e o aprender, com a
educação. Resulta disso que a educação possui uma dimensão espacial
e que, também, o espaço seja junto com o tempo, um elemento básico,
constitutivo, da atividade educativa. (VINÃOFRAGO: 2001, p. 61)

O ambiente onde ocorre a educação – lembrando que aqui nos referimos à


Educação Formal – é denominado escola. A escola é tanto um espaço físico, quanto
social (onde as relações entre os indivíduos acontecem) e pedagógico (já que a escola é
um espaço formal de aprendizado). Mas entre as diversas dimensões que compõe o
ambiente educativo vou me ater especificamente a sua dimensão espacial.
O homem, os professores, a criança e as metodologias de trabalho são
constantemente objetos de estudos, discussões e reflexões. Já para a dimensão espacial
da escola não se pode observar muitos estudos, não é dada a devida importância, como
confirma o trecho abaixo extraído de documento preliminar do Ministério da Educação
de 2004, um dos raros documentos oficiais encontrados sobre o tema:

Mesmo reconhecendo a importância desse enfoque sobre a temática


Arquitetura Escolar, entendemos que ainda existe uma lacuna entre a
reflexão teórica e a realidade concreta das edificações escolares,
especialmente as destinadas à Educação Infantil (...). (BRASIL: 2004,
p.5)

Existem muitas razões que me fazem acreditar que as relações entre o espaço e a
aprendizagem são diretas. A começar pelo mais óbvio: um ambiente agradável, limpo e
organizado transmite bons sentimentos a qualquer pessoa, que procurará mantê-lo como
o encontrou (sentimento de cuidado e de permanência). O oposto também é verdadeiro.
Uma escola escura, sem ventilação, com equipamentos em mau estado, paredes pixadas,
tendem a gerar um comportamento de repulsa, fazendo com que o vandalismo seja um
comportamento natural e a permanência no local intolerável.
Repensar o espaço físico para que se ele se torne verdadeiramente pertencente à
criança e desenvolva todas as dimensões humanas deveria ser parte do processo de
estudos sobre a pedagogia, a fim de que os ambientes possam ser construídos com vistas
a esse aspecto e, inversamente, os professores possam se utilizar de espaços adequados

10
para desenvolver atividades concretas, propiciando uma aprendizagem significativa,
entremeada pelo lúdico e respeitando as diversas especificidades das crianças.
No entanto, o espaço físico continua sendo pensado em contraponto às
concepções pedagógicas. Mesmo que a intenção seja promover o aprendizado segundo
as correntes pedagógicas resultantes de diversos estudos ao longo das últimas décadas,
sua configuração espacial ainda reflete as antigas concepções e ideologias advindas do
ensino tradicional e bancário1, reproduzindo o sistema no qual está inserida e de que faz
parte.
As concepções pedagógicas sofreram diversas mudanças durante a história da
educação, no entanto, a estrutura física das escolas pouco tem mudado ao longo dos
anos.
Por incrível que pareça a escola que permeia minhas lembranças deve ser a
mesma que invade as lembranças de você leitor que teve a oportunidade de freqüentar
uma escola de ensino infantil. Mas pode-se tomar por base a lembrança da escola
primária, quer ela seja pública, quer seja particular.
Ainda que nem tão padronizada quanto às escolas de ensino fundamental, elas
pouco tem sido modificadas ao longo dos anos e tampouco respeitam as especificidades
de seus usuários, seja nos aspectos pedagógicos propriamente ditos, seja no respeito de
sua história e cultura. São dois discursos distintos sobre um mesmo assunto e numa
mesma prática.
Projetos padrão são adotados para qualquer que seja a localidade onde esteja
inserida a escola. Isso é uma herança de décadas anteriores, da parceria entre o governo
e organismos internacionais que financiaram as políticas públicas. Para atender a
demanda deveriam conciliar múltiplas questões “como construir um grande número de
edifícios e de que forma administrar esse processo garantindo qualidade do resultado,
economia do processo de execução e manutenção, além do cumprimento de prazos.”
(http://www.aprenda450anos.com.br).
Essa realidade típica das escolas pode ser considerada ponto comum em todos os
projetos de edifícios escolares em plena função na atualidade, mas muitos educadores e
arquitetos procuraram pensar a escola de maneira diferente. Como é o caso de Vilanova
Artigas, arquiteto, que dizia: “a proposta de ensino não era vista separadamente do
projeto do prédio da escola.” (http://www.aprenda450anos.com.br).

1
Expressão utilizada por Paulo Freire para se referir ao ensino onde a figura do professor representa a
autoridade e é o detentor do conhecimento, enquanto o aluno é submisso.

11
Infelizmente a concretização desse ideal não é compartilhada pelas políticas
públicas. Estas são submetidas a organismos internacionais, como o Banco Mundial
(BM), que em seu primeiro documento de política para o setor educativo nos anos 80,
declara “menor importância concedida às construções escolares” nas prioridades de seus
empréstimos e, passando a ser considerado um insumo, “vem sendo desestimulado em
favor de outros insumos” (TORRES: 2000, p.129). O BM chega a exemplificar com
Platão e as aulas por ele dadas ao ar livre em meio às árvores, como sendo a primeira
academia da Europa, e alguns países que ainda hoje não possuem edifícios exclusivos
onde se dá a aprendizagem, para validar o discurso que “estas despesas (em
construções) não são imprescindíveis para a obtenção de resultados acadêmicos
desejados”. (TORRES: 2000, p.129).
Ainda mais triste fiquei quando propus à Secretária Municipal de Educação da
minha cidade para participar de reuniões onde seria definida a proposta para uma nova
unidade escolar e a resposta foi “Já possuímos um padrão e vamos segui-lo”. Por essas e
outras (como por exemplo, as adaptações (não) feitas para receber os alunos na minha
atual unidade), fica muito claro que as instituições destinadas às crianças menores são
muitas vezes locais adaptados e não construídos para atender as especificidades dessa
faixa etária, ainda que o próprio governo reconheça:

Além da carência de infra-estrutura básica, consideramos que a


maioria dos edifícios escolares restringe o processo educativo, ao não
explorar as possibilidades pedagógicas do espaço físico e de seus
arranjos espaciais no desenvolvimento infantil. (BRASIL: 2004, p.5)

Não que toda escola esteja em péssimas condições, mas os espaços existentes
precisam estar de acordo com o ideal de escola que desejamos. Dificilmente paramos
para pensar qual é o tipo de escola que gostaríamos de ter, quantos dos profissionais de
educação ao menos tiveram a oportunidade de pensar sobre o modelo de escola se
enquadra na proposta de trabalho. Apenas nos adaptamos ao que existe e nos
contentamos em poder escolher a melhor sala de aula e nos esquecemos que a nova
escola é uma “escola para todos”, mas o “todos” não participa nem de sua criação nem
se apropria da escola como lugar que pertence a comunidade. Afinal, uma gestão
democrática é o desejado.

12
Se a sala de aula e a escola são o nosso ambiente de trabalho e as crianças
passam mais tempo lá que em suas próprias casas, porque não nos debruçamos sobre tão
importante questão? Em nossas casas queremos o melhor, estamos sempre mudando a
fim de ter mais qualidade de vida e nos sentirmos mais confortáveis, seguros, felizes.
Porque não pensar o mesmo com a escola?
Mas antes acho conveniente entender um pouco mais quais foram os contextos
de infância e como eles ainda hoje refletem na concepção das escolas e da própria
pedagogia. Seguiremos para um próximo capítulo dedicado a esse assunto.

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3) DA FAMÍLIA À ESCOLA: UM POUCO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
INFANTIL

Na Idade Média a educação ocorria no próprio ambiente familiar ou social e se


dava com a convivência entre crianças e adultos, segundo Ariès. A família não tinha a
função afetiva e, neste cenário, a criança e o sentimento de infância eram
negligenciados perante a sociedade. Ou a criança era vista como um adulto em
miniatura ou enquanto as crianças eram pequenas, delicadas e graciosas era comum
cultuar-se o sentimento de “paparicação”. Tão logo essa fase passasse, suas vidas eram
confundidas com a dos adultos. A educação se dava no âmbito familiar ou na
socialização com adultos de seu círculo social e “a criança aprendia as coisas que devia
saber ajudando os adultos a fazê-las”. (ARIÈS: 1981)
Com o surgimento da sociedade industrial, as mães começaram a trabalhar fora,
uma nova organização espacial garantiu maior privacidade, já que até então diversas
famílias compartilhavam uma mesma casa, proporcionando a afetividade entre os
membros da família. Em conseqüência, as crianças se tornaram o centro das atenções.
Os filhos deixaram de ser educados em casa ou em sociedade para freqüentar a escola
(muito ligada à Igreja e com isso às idéias moralistas). Temos, portanto, o segundo
sentimento da infância: a moralização. Disciplina e racionalização dos costumes
externos à família, ganharam também o âmbito familiar, assim como a preocupação
com a higiene.
A escola surge durante esse período, totalmente contrário ao anterior, que separa
completamente adultos e crianças, como modo de isolamento e adestramento,
preparando-as para a vida adulta dos tempos modernos e sendo um complemento do lar.
Os primeiros rumores de instituições voltadas à faixa etária primeira da infância
são aquelas que recebiam crianças sem família, provenientes das rodas, abandonados,
frutos da “maternidade negada”2. Esses abandonados eram cuidados por amas até que
atingissem idade para freqüentar os internatos. Estes continuaram a existir até boa parte
do século XX.
As instituições específicas para crianças entre 0 e 6 anos surgem somente no
século XIX, na França, podendo ser divididas em duas categorias: os asilos de primeira

2
Expressão usada em referência ao texto Maternidade Negada de Renato Pinto Venâncio da disciplina
Educação de 0 a 6 anos.

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infância (ou como conhecemos, creches) e os “jardins-de-infância” (escolas para a
segunda infância).
Os asilos de primeira infância são para pobres e sua função é auxiliar a família
no cuidado das crianças, podendo servir de modelo de como educá-las. Atendiam as
crianças pobres, cujas mães trabalhavam fora para ajudar no provento do lar, e
precisavam deixá-las com alguém de confiança. Eram vistos com certa resistência pela
sociedade que achava que crianças deveriam estar com a mãe e a família.
Posteriormente os asilos foram chamados de escolas maternais.
Por não possuírem caráter de obrigatoriedade e como essas modalidades estavam
à parte do sistema regular de ensino, estavam subordinados aos órgãos de saúde ou de
assistência.
Já as escolas “jardins-de-infância”, que atendiam crianças entre 3 e 6 anos,
serviriam a todas as camadas sociais (para seu desenvolvimento e de bons hábitos). Para
a sociedade, as crianças mais velhas não precisariam ficar tempo integral com suas
famílias.
No Brasil, é relativamente recente a história das escolas maternais visto que seu
surgimento data de meados de 1870, ou seja, há pouco mais de um século.
No período republicano é possível encontrar referências sobre a criação de
creches no Brasil. A primeira era vinculada a uma fábrica de tecidos no Rio de Janeiro,
datada de 1899. A primeira instituição pública é o jardim da infância anexo a Escola
Normal Caetano de Campos em São Paulo, em 1896. “Materializando a proposta
educacional do Partido Republicano Paulista.” (pg.477) servindo de modelo para as
escolas de todo o estado.

Aí se conservou a Creche até 24 de fevereiro de 1909, dia em que


passou a instalar-se, também provisoriamente na rua das Marrecas, em
casa nova, mas sem as acomodações necessárias – sabido que um
estabelecimento desta ordem exige espaço e conforto, sendo para
acrescentar que a instituição espera completar-se com a criação de um
Jardim da Infância, para as crianças de 3 a 7 anos, idade esta com que
poderão passas às escolas. (KUHLMANN JR: s/d, pg. 477)

As escolas maternais e de jardim da infância começam a se espalhar por diversos


municípios no país todo, vinculadas aos organismos educacionais ou de assistência
social ou de saúde, destinadas às crianças pobres. São instituições assistencialistas, uma
“dádiva” e não um direito, visão que desobriga o estado de suas funções. Quase sempre

15
ocupando espaços provisórios, que não atendiam às necessidades específicas das
crianças. Até 1929, segundo Moncorvo Filho, não há uma política nacional para a
infância.
Após a década de 30, algumas regulamentações a esse respeito entram em vigor
– facilitação da amamentação, proximidade de creches ao lugar de trabalho. Mais ou
menos nos anos 40/50 a demanda por escolas infantis aumentou, mas preferencialmente
atendia-se a escola primária, e para administrar essa demanda havia o discurso de que
era muito melhor deixar a criança em casa a ser educada pela família do que levá-las as
escolas superlotadas.
Nas décadas de 60/70 houve uma considerável diminuição de recursos públicos
aplicados à educação e o ano de 1974 foi o auge. O país ainda não se recuperou desse
prejuízo. Segundo Kuhlmann, um século após o surgimento da educação infantil,
portanto, a demanda era muito grande, mas o Estado não assumiu seu papel e para
suprir essa expansão elevada, algumas instituições (entidades sociais) assumiram a
educação infantil.
Falta de verbas, atuação de pessoas sem formação – são voluntários que atuam
como profissionais – e utilização de galpões para abrigar as “escolas”. Esses fatores
sucatearam a educação infantil, sinônimo de péssima qualidade de educação. A
educação ganhou um caráter assistencialista e era também, caminho para a má
qualidade do ensino fundamental. As mães que trabalhavam fora, frente a essa
realidade, passaram a reivindicar educação de qualidade para seus filhos.
Esse processo levou alguns municípios a assumirem as creches que se tornaram
instituições de educação, com qualidade. Também algumas empresas privadas
colaboram com as instituições que mantêm as creches ou mesmo as mantêm no seu
espaço.
Com a CLT e a Constituição de 1988, a educação infantil torna-se obrigatória
para pais e mães trabalhadores e passam a compor os sistemas educacionais, mas essa
conquista nunca foi aplicada no geral.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 enfatiza essa condição quando
promove a educação infantil como parte do ensino básico. Segundo Nascimento (1999),
a inclusão da educação infantil como nível de ensino acarreta algumas mudanças
importantes. Uma das principais mudanças é a incorporação do processo educativo no
cotidiano de creches, que antes eram caracterizadas pelo assistencialismo. Corre-se o
risco de enfatizar o educar em detrimento do cuidar, que é de suma importância para o

16
desenvolvimento humano. E a educação infantil é na verdade desenvolvimento de todas
as dimensões humanas.

A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como


finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade,
em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade. (BRASIL: 1996,
art. 29)

Essa citação proveniente da Lei de Diretrizes e Bases da Educação retrata a atual


concepção de educação infantil, mas que por sua vez muitas vezes é burlada, ou melhor,
distorcida em função de viabilizar determinadas situações.
Entre as instituições infantis, a creche foi sempre relegada à última preocupação
nas propostas educacionais, sendo sempre tratada com “planos de emergência”, carência
de recursos e de material e são até hoje vistas como centros de recreação mais que
espaços de educação por uma parcela considerável de usuários ou pelo poder público.
Todo o histórico levantado acima traz os elementos que refletem ainda hoje a visão
muitas vezes preconceituosa sobre essa faixa etária e sua educação. Também apontam
para o assunto em questão: se não havia a preocupação com essas crianças, os seus
espaços são o espectro desse descaso.

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4) DOS DOCUMENTOS ATUAIS:

O documento preliminar redigido pelo MEC (Ministério de Educação e Cultura)


em co-autoria com universidades de alguns estados brasileiros demonstra um princípio
de preocupação com o tema. Isso é uma grande conquista embora seja sabido que ainda
há um longo caminho a ser percorrido.
Já há resquícios da necessidade de interação entre e escola e a comunidade,
sendo todos os envolvidos importantes nas decisões e atuantes “desde a concepção do
projeto, passando pelo conhecimento das atividades da escola e do processo educacional
praticado”. Esse envolvimento faz com que a comunidade sinta-se incluída
“proporcionando o cuidado e a segurança da escola” (BRASIL: 2004, p.6), ou seja,
gerando o sentimento de pertencimento, conforme considerações de Ana Beatriz G. de
Faria em aula magna do dia 30 de Novembro de 2005.
Mas como pode a escola construir um projeto político-pedagógico baseado em
uma gestão democrática sendo que as pessoas não são bem-vindas à escola? A maioria
dos Conselhos é simplesmente formada para cumprir processos burocráticos e quem
chega é atendido em um guichê, muitas vezes através de vidros. Constrangedor, inibidor
com certeza. Pessoalmente odeio ser recebida em um lugar, qualquer que seja ele, onde
exista um vidro entre eu e o outro. A participação da comunidade de fato é um assunto
delicado. Pois quando alguém que não seja da escola (funcionários e alunos) adentra seu
espaço, logo imaginamos que há mais alguém para vigiar, e certamente atrapalhar a
dinâmica das aulas. Na verdade, falamos tanto sobre a flexibilidade e sobre aproveitar
os imprevistos a favor do conhecimento, mas quando essas situações ocorrem conosco,
é difícil ter atitude condizente, pois recorremos às premissas inculcadas em nós, uma
vez que o espaço físico escolar, sua organização, sua arquitetura, foi sempre constituído
do partido da vigilância, do controle, da disciplina. A disposição do mobiliário, a
ocupação do terreno e a organização dos ambientes são claras quanto a esses aspectos.
Também não há respeito à comunidade ao não considerar suas especificidades
na elaboração dos projetos de arquitetura e, muito menos, de seus usuários, crianças
pequenas, que requerem atenção especial.
Contudo, ao trabalharmos com pedagogias diferenciadas, os ambientes deveriam
também mudar. E neste documento algumas propostas são:

18
Relacionar o desenvolvimento da criança com a leitura do ambiente
físico escolar, propõe-se pensar o espaço físico destinado à Educação
Infantil como motivador e promotor da aventura da descoberta, da
criatividade, do desafio, da aprendizagem, da interação criança-
criança e criança-adulto, além da formação da responsabilidade social.
(BRASIL: 2004, p.8)

As prefeituras, que atualmente são as principais responsáveis pela rede de


escolas públicas de educação infantil não estão preparadas ou não querem estar, mas
deveriam. Segundo o Plano Nacional de Educação que entrou em vigor a partir da data
de sua publicação, portanto, 9 de janeiro de 2001. Dispõe:

2) Elaborar, no prazo de um ano, padrões mínimos de infra-estrutura


para o funcionamento adequado das instituições de educação infantil
(creches e pré-escolas) públicas e privadas, que, respeitando as
diversidades regionais, assegurem o atendimento das características
das distintas faixas etárias e das necessidades do processo educativo
quanto a:

a) espaço interno, com iluminação, insolação, ventilação, visão para o


espaço externo, rede elétrica e segurança, água potável, esgotamento
sanitário;

b) instalações sanitárias e para a higiene pessoal das crianças;

c) instalações para preparo e/ou serviço de alimentação;

d) ambiente interno e externo para o desenvolvimento das atividades,


conforme as diretrizes curriculares e a metodologia da educação
infantil, incluindo o repouso, a expressão livre, o movimento e o
brinquedo;

e) mobiliário, equipamentos e materiais pedagógicos;

f) adequação às características das crianças especiais.**

3) A partir do segundo ano deste plano, somente autorizar construção e


funcionamento (grifo meu) de instituições de educação infantil,
públicas ou privadas, que atendam aos requisitos de infra-estrutura
definidos no item anterior.

4) Adaptar os prédios de educação infantil de sorte que, em cinco anos,


todos estejam conformes aos padrões mínimos de infra-estrutura
estabelecidos.

Pode-se afirmar que a preocupação com a qualidade de educação reflete-se na


infra-estrutura oferecida, nos espaços e na arquitetura das escolas.
É típico das construções “padrão” do meu município unidades escolares com
pouca ventilação, algumas com bastante espaço disponível, porém com paredes escuras,

19
situadas em terrenos com bastante área verde, mas que de dentro da sala de aula é
impossível visualizar a beleza do exterior. Isso sem falar da falta de infra-estrutura para
receber alunos com necessidades especiais: degraus, banheiros onde uma cadeira de
rodas não entra, enfim, adequações necessárias e que por si só renderiam um novo
trabalho, o que não cabe neste momento.
No caso especifico da minha atual unidade, o desrespeito aos direitos das
crianças a espaços que possibilitem a exposição ao sol e ao ar livre, aos cuidados de
higiene pessoal, ao movimento, é marcante demais. Nem mesmo o parque foi
viabilizado! O que temos são apenas promessas e já estamos praticamente no meio do
ano letivo. Já foi, por duas vezes, solicitada à SME uma reunião onde professoras e
monitoras pretendem esclarecer essas questões e, finalmente, uma data nos será
concedida em breve. Esperamos alcançar nossos objetivos de mudança!

5) AS ESPECIFICIDADES DA CRIANÇA:

20
Um documento do MEC (Padrões de infra-estrutura para o espaço físico
destinado à educação infantil) é o primeiro a demonstrar preocupação com as diversas
dimensões humanas a serem atingidas no processo educativo de crianças pequenas e sua
correlação com o espaço físico.

A organização do espaço físico das instituições de educação infantil


deve levar em consideração todas as dimensões humanas
potencializadas nas crianças: o imaginário, o lúdico, o artístico, o
afetivo, o cognitivo, etc, etc. (FARIA: 1997, pg. 74, falando do
documento do MEC Critérios para um atendimento em creches que
respeitem os direitos fundamentais da criança).

Entender a criança como um ser completo que está vivenciando uma fase de sua
vida, assim como qualquer outra fase do desenvolvimento humano, e que é, portanto,
transitória e provisória, como diz Faria (1997), torna-se muito importante para valorizar
a criança e prepará-la para o futuro e para o entendimento de que a hierarquia social
existe e é igualmente provisória.
No processo educativo uma única proposta pedagógica, imutável durante anos, é
tudo o que não queremos. Há a necessidade da construção constante da pedagogia para
atender as dimensões humanas que, sendo parte da vida, está sempre em mudança.
Afinal, nada permanece igual o tempo todo.

A origem do debate sobre a qualidade da Educação Infantil foi


marcada pela abordagem psicológica. No início, a preocupação com os
supostos efeitos negativos da separação entre mãe e criança pequena
levou a um questionamento da creche centrado principalmente nos
aspectos afetivos do desenvolvimento infantil. Em um segundo
momento, sob efeito das teorias da privação cultural, a partir da
década de 1960, houve um deslocamento do foco para o
desenvolvimento cognitivo da criança, visando ao seu aproveitamento
futuro na escola primária. (BRASIL: 2004, p. 56).

As contribuições da psicologia foram importantes para o entendimento do


processo de construção do conhecimento pelas crianças e nos dão o gancho necessário
para explorar o que isso tem a ver com o espaço onde ele se dá.
Quer seja Piaget, quer seja Vigotysky, enfatizam a importância do aprendizado
concreto e, no entanto, poucas unidades escolares pela qual passei possuem ambientes
com espaços adequados para que isso ocorra. Tudo é muito tradicional e inibe a
participação e interação dos indivíduos no processo. E a escola deveria ser

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(...) um lugar onde se torna criança, onde não se trabalha, onde se
pode crescer sem deixar de ser criança, onde se descobre (e se
conhece) o mundo através do brincar, das relações mais variadas com
o ambiente, com os objetos e as pessoas, principalmente entre elas: as
crianças (FARIA: s/d, p. 6).

Temos aqui uma ligação com os ideais de Vigotysky sobre as relações e da sua
importância no processo de construção de conhecimento. E nas salas de aulas ou nos
espaços de convivência da escola, as crianças estão sempre controladas por adultos.
Existem certos espaços que deveriam ser mais explorados sobre o ponto de vista da
interação social. Mesmo a grade de horários prejudica essa interação, pois cada sala tem
o seu horário para realizar suas atividades e o encontro entre diferentes turmas nunca
acontece, salvo em festividades escolares, mas isso uma ou duas vezes ao ano.
Os espaços podem contribuir para o desenvolvimento das dimensões humanas
(aulas de Educação de 0 a 6 fala disso). Mayumi de Souza nos dá a dimensão do que
deveria ser a escola para isso quando diz que os espaços devem ser o “pano de fundo”
ou “moldura” da pedagogia e, mais que isso devem ser ambientes. Em contradição a
Mayumi, Viñao-Frago diz: “este não é apenas um cenário onde se desenvolve a
educação, mas sim uma forma silenciosa de ensino”. (FRAGO: 2001, p. 69).
Considerar aqui que nem todo espaço é necessariamente um ambiente, visto que
ambiente é carregado de emoções, impressões e intenções.

O espaço físico isolado do ambiente só existe na cabeça dos adultos


para medi-lo, para vendê-lo, para guardá-lo. Para a criança existe o
espaço-alegria, o espaço-medo, o espaço-proteção, o espaço-mistério, o
espaço-descoberta, enfim, os espaços de liberdade ou de opressão.
(SOUZA: 1989, p. 30 apud FARIA: s/d, p.70)

São espaços que permitem o imprevisto, não são estáticos e definitivos. Assim
como a vida e a pedagogia devem estar em constante transformação, atendendo as
necessidades do momento e o que se pretende atingir ou explorar.
Os italianos fazem referência a esses ambientes como lugares onde ambientes de
vida em contexto educativo são a escola. Reproduzir ambientes da própria vida,
permitindo a identificação, o reconhecimento pelos alunos, mas num contexto
educativo, afinal na escola ocorre a sistematização do mundo real.

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Existe para isso um espaço ideal, mas que não pode ser definido por metros
quadrados, e sim, como Regina de Assis citando texto de Ana Beatriz Goulart de Faria
resume, o tamanho ideal de sala de aula é: “uma sala de aula do tamanho do mundo”. O
que significa oportunizar as diversas dimensões humanas num ambiente, independente
de seu tamanho físico. Sim, tamanho não é documento. Envolve posicionamento,
atitude e também, a organização do espaço.
A escola segundo Faria precisa proporcionar a construção da “cultura infantil”
bem como a “cultura da infância”. Entenda-se que cultura infantil é produzida pela
própria criança, onde ela com as relações com o outro produz conforme sua vontade e
não conforme imposição de outros. Afinal, mesmo quando um adulto tenta prever,
detalhar e impor uma brincadeira ou um brinquedo à criança, ela mesmo faz o uso que
lhe convier.

Jamais são os adultos que executam as correções mais eficazes dos


brinquedos – sejam eles pedagogos, fabricantes ou literatos -, mas as
próprias crianças, durante as brincadeiras. (Walter Benjamim: 1984,
p.65 apud FARIA: s/d)

E uma das questões mais importantes no desenvolvimento humana das crianças


é o lúdico. Pode-se dizer que a criança é um ser duplo: ao mesmo tempo é um indivíduo
no presente e um projeto de futuro. Essas duas dimensões se encontram nos jogos
simbólicos e na ludicidade, simplesmente brincando.

É no lúdico que se encontra a costura entre essa dupla dimensão


infantil, uma polaridade que a própria ludicidade torna distendida,
flexível e mutuamente recorrente, sem fronteiras arbitrárias, sem
passagens forcadas de um âmbito a outro. (MIRANDA: 2001, p. 25)

Brincar é a forma que a criança encontra de relacionar o mundo na qual vive


com o seu próprio mundo, estabelecendo vínculos entre ele, o mundo e os outros.
Um dos lugares primordiais para uma pedagogia que respeita as especificidades
da criança é o parque infantil:

A inexistência (ou a precariedade) de parque infantil, por exemplo,


priva as crianças da convivência e da exploração do espaço e das
atividades e movimentos ao ar livre, comprometendo seu
desenvolvimento físico e sociocultural. (BRASIL: 2004, p.5).

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E sob este aspecto, a não presença de um parque infantil para os meus alunos de
Maternal III, é a certeza de que eles estão sendo privados das condições necessárias para
o desenvolvimento de sua dimensão humana. É um momento que não substituí outros
momentos onde as crianças brincam livremente, onde estão em contato com outras
crianças. Não é a mesma coisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Chego ao fim deste trabalho re(considerando) a importância do espaço físico na


pedagogia da educação infantil. Além de considerá-lo sob a dimensão espacial, temos

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que considerar suas outras dimensões – humana e pedagógica – e desta forma, como
profissionais, apropriar-se dele como tal e, havendo necessidade, reivindicar as devidas
providências.
Podemos considerar a educação infantil muito recente na história da educação
brasileira, especialmente a questão da construção de unidades de escolas maternais, que
até ontem (na realidade ainda hoje) se valem de espaços adaptados e sem preocupações
mais condizentes com as especificidades desta faixa etária.
Na prática docente tentamos fazer de nossas salas, de nossas escolas, um lugar
mais aprazível. Fazer dele um ambiente que acolha as crianças e que dele elas se sintam
pertencentes. Mas é óbvio que esbarramos em questões que, como profissionais de
educação, não temos autonomia de modificar.
Perante este cenário, unir forças enquanto classe e reivindicar melhorias é o
caminho para aprimorar aquilo que já fazemos em sala de aula.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar
Editores, 1981.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Infantil e Fundamental.


Padrões de Infra-estrutura para as Instituições de Educação Infantil e Parâmetros de
Qualidade para a Educação Infantil - Documento Preliminar. Brasília, 2004.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Infantil e Fundamental.


Plano Nacional de Educação. Brasília, 2000.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Brasília, 1996.

FARIA, Ana Lúcia Goulart de. O espaço físico como um dos elementos fundamentais
para uma pedagogia da educação infantil. Trabalho apresentado no III seminário sobre
“Estabelecimento de critérios para credenciamento e funcionamento de instituições de
educação infantil”. Brasília, 1997.

FARIA, Ana Lúcia Goulart e PALHARES, Marina Silveira (orgs.). Educação infantil
pós LDB: rumos e possibilidades. 3. ed. Editores Associados, 2001 (Coleção Polêmicas
de Nosso Tempo).

KUHLMANN JR., Moysés. Educando a Infância Brasileira. (texto da disciplina


Criança de 0 a 6 anos - sem dados).

MIRANDA, Danilo Santos de. (org.). O Parque e a Arquitetura – Uma Proposta


Lúdica. Papirus Editora, Campinas/SP, 2001.

NASCIMENTO, Maria Evelyna Pompeo do. Os Profissionais da Educação Infantil e a


Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. In: FARIA, Ana Lúcia Goulart e
PALHARES, Marina Silveira (orgs.). Educação infantil pós LDB: rumos e
possibilidades. 1. ed. São Carlos: Editora UFSCar, 1999.

TORRES, Rosa Maria. Melhorar a qualidade da educação básica? As estratégias do


Banco mundial. In: TOMMASI, L.; WARDE, M. J.; HADDAD, S. (orgs). O Banco
Mundial e as políticas educacionais. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2000.

VIÑAO FRAGO, Antonio; ESCOLANO, Augustín. Currículo, espaço e subjetividade:


a arquitetura como programa. DP&A Editora, Rio de Janeiro, 2001.

SÃO PAULO 450 ANOS – desenvolvido pela Prefeitura Municipal de São Paulo.
Disponível em http://www.aprenda450anos.com.br. Acesso em 15 de maio de 2005.

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