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Curitiba: Artembap, 2014.
Resumo
O artigo faz uma apreciação das peças didáticas para piano do compositor paranaense
Henrique Morozowicz (1934-2008), com base em características de didatismo do repertório
de ensino apontadas por Jacobson, Lancaster e Rabinoff. A presença de tais elementos é
demonstrada através de exemplos de diversas peças para piano do compositor, de níveis
básico e intermediário de dificuldade. O artigo pretende resgatar este repertório discutindo
sua utilidade pedagógica e comprovando sua qualidade musical.
Abstract
The article makes an assessment of didactic piano pieces by the Brazilian composer Henrique
Morozowicz (1934-2008), based on characteristics of the didactic teaching repertoire
highlighted by Jacobson, Lancaster and Rabinoff. The presence of such elements is
demonstrated by examples from several piano pieces by composer, basic and intermediate
levels of difficulty. The article intends to redeem this repertoire discussing their pedagogical
usefulness and proving their musical quality.
Keywords: Piano pedagogy; Piano technique; Music from Paraná (Brazil); Piano idiomatic
writing; Contemporary music
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Professora Associada III da UNIRIO (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro). Concertista.
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O próprio compositor afirma: “Mas foi só mais tarde, em 1950, depois de ser organista da Catedral, que
escrevi minha primeira peça original, o Para dormir, um acalanto para vozes femininas, e A Capella para
embalar meu irmãozinho Norton, que tinha então um ano” (MOROZOWICZ: 1995a, p. 92).
3
O catálogo de obras de Henrique Morozowicz inclui as seguintes instrumentações: coral, canto e piano, piano
solo, 2 pianos, piano a 4 mãos, órgão, piano e instrumentos de percussão, cravo solo, duos a quinteto de
instrumentos de sopro e de cordas com e sem piano, e orquestra de câmera.
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Considero 2 peças para uma nota só e 2 Invenções como experimentações, provavelmente influenciadas pelas
aulas com Koelreutter na década de 1950, e não como peças com propósito didático, embora sejam de nível de
dificuldade não avançada. Essa questão fica mais clara no decorrer do artigo.
5
A peça Sentimento Latino foi composta após a publicação de Gandelman. Inseri aqui no nível Intermediário II,
seguindo os mesmos critérios de classificação.
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Esta ideia nos remete ao pensamento do compositor tcheco Karel Husa (1921), seu
professor no Programa de Mestrado em Composição, na Universidade de Cornell (EUA), no
início dos anos 1980, e que ele muito admirava e considerava na sua formação. Nas palavras
de Husa:
Não quero ser um compositor cerebral. Quero ser inventivo, produzir uma
partitura que revele algo interessante, instigante e sofisticado para o intérprete ou
o maestro, ou outro compositor. Ao mesmo tempo, deve ser musical e terno, e
7
demonstrar que eu me importo com as outras pessoas (apud DUFFIE).
Morozowicz cultivava o estilo improvisatório na sua escrita, o que vai de acordo com
a prática de improvisar, sempre presente na sua atividade musical.
7
I don’t want to be a cerebral composer. I want to be inventive, to have a score that will reveal something
interesting and intriguing and sophisticated to the performer or conductor, or to another composer. At the
same time, it must be musical and warm, and show that I care about other people.
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Podemos listar muitas indicações originais e de fácil entendimento musical, como por
exemplo: ‘movido com graça’, na primeira peça da Pequena Suite; ‘balançando quase
caipira’, na quarta peça da Pequena Suite; ‘afetado e pipocante’ em 4 Pequenos estudos, No
4; ‘piccante’ em O Picapau amarelo, primeiro movimento de Pour Martina; ‘amavelmente’
no primeiro movimento de Sonatina I; ‘bem alegre’ em Cai, cai balão, No 2 e em Ti-ri-la-la-la,
No 4 do 1º Caderno de Karina; ‘pulandinho’ em Fuks Du hast, No 8 do 1o Caderno de Karina;
‘com movimento de boneca’ em Mietze, Mietze, Katze, No 10 do 1o Caderno de Karina; ‘bem
brincalhão’ em Wlas kotek na plotek, No 11 do 1o Caderno de Karina; ‘um pouco teatral e
germânico’ em Marchas lúdicas No 4.
O mesmo equilíbrio é encontrado na escrita para piano a quatro mãos, tanto entre as
partes primo e secondo como entre as mãos de cada pianista:
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o
Exemplo 6: MOROZOWICZ, H. 1 Caderno de Karina, 6. Teresinha de Jesus, cc.1-5
o
Exemplo 7: MOROZOWICZ, H. 1 Caderno de Karina, 7. Frère Jacques, cc. 1-11
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o
Exemplo 8: MOROZOWICZ, H. 4 pequenos estudos, N 1, cc. 1-4
g) encontramos várias peças que soam mais difíceis do que realmente são. Um dos
melhores exemplos é a Suite Pour Martina. No Exemplo 9, a facilitação motora é conseguida
pela alternância das mãos em padrões métricos regulares:
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Outra característica marcante de Morozowicz, tanto nas peças didáticas como nas de
pianismo mais adiantado, é a utilização de escolhas dadas ao intérprete. Nas peças de que
tratamos aqui, isto já aparece de diversas formas:
Exemplo 14: MOROZOWICZ, H. 1º. Caderno de Karina, 6. Teresinha de Jesus, cc. 6-10
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Exemplo 15: MOROZOWICZ, H. Pour Martina, III. Borboletas psicodélicas, cc. 14-22 (o compasso 16 pode ser
repetido quantas vezes o intérprete quiser, e o compasso 19 pode iniciar uma oitava abaixo e terminar uma
oitava acima do que está escrito)
o
Exemplo 16: MOROZOWICZ, H. 4 pequenos estudos, N 4, cc. 32-34
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pretas. Para isto, leia todas as notas com bemóis, e dó sustenido e fá sustenido como
naturais”8.
Essas diferentes escolhas na interpretação das peças despertam o aluno para
possibilidades de improvisação musical. A importância da atividade de improvisar é
confirmada por pedagogos como Sylvia Rabinoff:
Henrique parecia já estar ciente destas ideias pedagógicas, bastante avançadas para
o Brasil na época (décadas de 1950 a 1970).
A habilidade de transposição também é utilizada no primeiro movimento da Sonatina
I, na qual a repetição do trecho entre os compassos 2 a 9 deve ser feita “lendo em bemóis”.
Ao lado da improvisação, a transposição é uma das principais habilidades funcionais do
piano, e deve ser desenvolvida desde os níveis iniciais10. São raras as oportunidades onde
estas habilidades são integradas ao repertório, como nos oferece Henrique Morozowicz11.
8
Na partitura, em inglês e italiano: “Si pio suonare questo pezzo sui tasti neri. Per questo leggi tettu Le note
come bemolli e Il Do# e Il Fa# come naturali. This piece can be played in black-keys. For that, read all notes as
flats and the C# and F# as natural”.
9
The ability to improvise will help make the student a better performer. It is not only a question of filling in
missing interludes (…) or of adding ornaments; rather it is a matter of improving both technical and
interpretative faculties. Improvising gives a superior tactile relationship to the keyboard, an aural awareness,
and a sense of “at homeness” in any key, better memory and sight-reading ability, a gift for compositional
analysis, security, and poise. (…) Improvisation is a step beyond acquiring a musical vocabulary: it is applying
that vocabulary creatively.
10
Kowalchyk e Lancaster alertam que os métodos de ensino tendem a deixar de lado a habilidade de
transposição no nível intermediário, quando o aluno passa a tocar peças do repertório tradicional, mas que
este treinamento deve continuar a ser desenvolvido em todos os níveis (KOWALCHYK; LANCASTER, 1995, p.
225).
11
Entre compositores que utilizam habilidades funcionais integradas em peças de ensino podemos citar os
húngaros Z. Kodaly (1882-1967), G. Kurtag (1926) e o americano R. L. Finney (1906-1997), além das sugestões
deixadas por B. Bartók (1881-1945) no Prefácio dos cadernos do Mikrokosmos.
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Exemplo 18: MOROZOWICZ, H. 4 Pequenos estudos, 3. Bem ritmado, cc. 1-2
12
O compositor não indica fórmula de compasso em nenhum dos 4 Pequenos estudos, provavelmente
o o
acreditando que isto daria uma ideia de maior complexidade à notação musical. Os estudos N 1 e N 3
o o
trabalham com métricas assimétricas, o N 2 com polirritmia e o N 4 com variação no tamanho do compasso
mantendo pulsação e unidade de tempo estáveis.
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o
Exemplo 19: MOROZOWICZ, H. Prelúdio Melancólico N . 2, cc.1-4
13
A obra Sentimento Latino foi escrita para uma encomenda de Piotr Lachert, diretor da editora Chiola Music
Press, seguindo a ideia de uma série de peças fáceis para treinamento de ritmo de pianistas europeus.
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Exemplo 22: MOROZOWICZ, H. Suite acessível (1958), II. Sesta e seresta, cc.1-9
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o
Exemplo 23: MOROZOWICZ, H. Três estudos breves (1958), Estudo N . 1, cc.1-2
CONCLUSÃO
Tal música soa prazerosa de forma que o ouvinte a percebe e a entende harmônica,
melódica, rítmica e expressivamente. Além disto, é bom tocar (...) Os padrões se
encaixam na configuração da mão (...) e utiliza as características do piano (teclas
brancas e pretas, características acústicas, registros). Esta música prepara os alunos
para o repertório mais adiantado, mas é também música para apreciar, pelo prazer
14
da música em si (MARIS, 1995, p. 184).
14
Such music sounds pleasing in ways that a listener can perceive and analyse harmonically, melodically,
rhythmically, and expressively. Further, it feels good (…) to play. The patterns fit the configuration of the hand
(…) and utilize the characteristics of the piano (black and white keys, acoustical traits, registers). Such music
prepares students for more advanced repertoire, but it is also music to enjoy now, for its own sake.
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REFERÊNCIAS
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Fundação Cultural de Curitiba, 2002.
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2008. p. 231-244.
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<http://www.bruceduffie.com/husa.html>. Acesso em: out. 2012.
GANDELMAN, S. 36 Compositores brasileiros – obras para piano (1950/1988). Rio de Janeiro:
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KOWALCHYK, G.; LANCASTER, E. L. Functional skills and the intermediate student. In:
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