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Amiga Minha

Dizia palavras bonitas sobre flores, estrelas cadentes, o gosto e o cheiro da terra
molhada. Tão animado falava sobre o que é todo e que não existe parte. Cantou afinado e
desafinado Era todo Deus, gozo e frigidez

Ela que permaneceu calada sorriu. E disse: "Dá até vontade de dizer que te amo"

Ele entao calou Ternura de ser e estar n´aquilo sobre o que não se fala

Ser-me

O que no corpo dramatiza ser eu E que insiste em te dar ois É uma cicatriz
constrangedora Talhada pelo desejo de ser-me teimando em recordar-me que há muito
esqueci o que viria a ser aquilo que sou

Eu sei Assim vou sendo Ser-me é não encontrar em mim o eu que em mim vejo aprisionado
Esconder-me, calar-me, maldizer-me, inconformar-me... Pura manifestação do verbo. Estou
certo e não concordo Me anulo Me esqueço Por um instante sou Como sou sempr

Sob o chapeu

Eu É Tu É Ele É Nós É Vós É Eles É

E preciso

O passado que reste sob as solas de meus sapatos Fazendo restea sobre meu chão O
futuro que reste esquecido e adormecido E translúcido não faça restea Para que de tudo que
que encontro em minhas maos Faça um instante agora

Do Homem e do Verbo

Eu sou Eu só Eus Eu é

(!)

O verbo coagulara as horas

Será que era sempre agora?

Sem palavras
Há algo por trás da palavra Algo que cala Mas é mais que palavra

Na ausência da "fome" há o inominável Há o que contrai as tripas O que sai em busca de


alimento

Na ausência da "gozo" há um silencio Há o que geme Há o que espasma

Apenas calando E não apenas calando Mas esquecendo a palavra

Impera algo na ausência da palavra

Senhor

Deus está na papa que como Em noites perdidas de sono Deus caiu no chão Foi um real que
perdi

Ele está nos versos da lavadeira É desarranjo de fim de feira Está no canto em que choro
calado

Deus... Deus é ponto na reticencia É cona, falo, inocencencia É briluz nos olhos do cão

Verde que chove em Edir Macedo Sotaque de Padre Quevedo Deus acenou pra mim -Oi!-

Senhor estrela faceira Olho de vidro de rezadeira Cabeça de Lampião a rolar

é quartinho de cana na mesa do bar

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É uma relíquia falsa no altar Senhor primeira regra de menina

É o válido e o desvalido É o pedido não atendido O caminho da danação

Nele me encontro e rendo graças

Ele é o "É" no meio da frase no parachoque do caminhão


(Mudo)

Do verbo se sentia inútil Não por saber-se analfabeto

Era por ser incompleta a palavra

Queria que as pessoas fossem-lhe Por que no fundo as era

Para isso possuía apenas a palavra Que era mesmo nervosa e rasteira

Queria abarcar o mundo Já o havia abarcado

Lutava por ser Sentido não fazia Eles(não era possível singularizar-lhe) entendia Que tudo é

São VIII

Precisava ser Mas não era E em não ser Era também

Precisava fazer coisas Para que elas fossem E ao não fazer Elas já eram em também não ser

E assim seguia e não seguia Porque era sempre agora E agora estamos sempre parados

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Hallelujah

Não como quem ora Mas como quem repousa os olhos no firmamento

E o sumo da maçã que escorre da boca

Não de um golpe de sorte Mas como quem bate beija e goza E não precisa trilhar o Caminho
de Santiago Nem precisa se banhar nas águas do Ganges De si mesmo esquecer-se sob a
aurora boreal para perceber que é infinito E que simplesmente É.

Pó e vento

Vento Sinto frio Tempo Sou frio

Com o tempo de tudo esqueço Do telefone de casa Do caminho de volta Das pessoas que amo
Das que não amo Do numero de meu sapato

Então esqueço os dias da semana O aniversario de minha mãe O nome de meu filho Que quero
ir ao banheiro Que não fui

Com o tempo me esquecem


Tempo Pó Vento

De um poeta apaixonado

Fogos de artificio Oficio Oleiro de palavras Lavrador Inocentemente Mente


apaixonado

Caleidoscopicolorido

Hoje o dia é de brinquedo Mamãe morre de medo

Hoje o dia amanheceu num chapéu Caleidoscopicolorido Holotropica visão

Psicodelicamente as serpentes tomam banho de rio

-Rio

Eu seria dia e não Estrelas todas cadentes Meus são os olhos das videntes

Ser todo "É"

A Besta Fera

Um corpo que a ferrugem rói Uma peça desgastada Caixa da mais descompassada
musica Sou a Besta-fera Das densas florestas dos infernos Do bom tempo e do mais traiçoeiro
inverno

Sou canaleta que leva água barrenta lavando a sede de quem tem sede sou peixeira cega
sangrando a fome de quem tem fome

A todos amo com ódio e para que o todo não me odeie ou ame todo dia me invento um santo
nome:

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Cantiga de acauã Corda de caranguejo Esporão no pescoço do galo Asa branca nos olhos do
sertanejo

Sou a camada d´água sobre a qual caminha o mosquito sou de tudo não poder A negação
daquilo que resta E o que me sobra de conforto É saber que a ferrugem no meu rosto há de
conhecer um dia em que não encontrará mais o que roer

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