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A Reforma Protestante e a Contra Reforma Católica

Andressa Barroso de O. Moreira1


Paula Cristina da S. O. Carvalho
Ravania Calasans M. Silva

Resumo: Este trabalho tem por objetivo dissertar a cerca da problemática envolvendo as causas e
conseqüências da reforma protestante e subseqüente contra-reforma católica. O texto inicia-se com a fundação
da Igreja Católica Apostólica Romana, cujo marco inicial fora o nascimento de Jesus Cristo (Yeshua
Ben(bar)-Yoseph), tal acontecimento tornou-se o estopim do movimento messiânico que mudou a história da
civilização ocidental. Durante sua trajetória, a Igreja católica, acumulou grande poderio econômico e político,
regendo assim a vida de milhares de fieis, transformando-se na instituição mais poderosa da Idade Medieval.
Entretanto, as mudanças no espírito humano decorrentes da evolução do pensamento e de novas práticas
comerciais aliadas aos abusos clericais dão as bases ao movimento da reforma Protestante, abrindo uma
profunda fresta no poderio até então incontroverso do Catolicismo.

Palavras-chaves: cristianismo, catolicismo, protestante, reforma, contra-reforma, capitalismo.

O cristianismo, religião monoteísta, encarada inicialmente como mais uma seita


judaica, teve com Cristo (o messias) e seus discípulos um início tímido, mas que
rapidamente tornou-se a religião dominante de todo o império romano. Fundada no século I
d.C. e regulamentada pelo imperador romano Constantino através do Concílio de Nicéia no
séc. IV derrubou a velha religião politeísta, trazendo agora a “novidade libertadora” tão
almejada pela classe oprimida e escravizada da civilização latina. Mudaram-se as crenças,
mudou-se a concepção de Estado e política. Com tamanha força a seu lado, a fé cristã fora
difundida por todo o mundo através da Igreja Católica Apostólica Romana. Fustel de
Coulanges2 chega afirmar em sua Cidade Antiga que:

“a religião, em vez de ser como antes, entre os povos da Grécia e da Itália, onde
não passava de um conjunto de práticas, uma série de ritos repetidos sem qualquer
sentido, uma seqüência de fórmulas que muitas vezes não se compreendia porque a
linguagem envelhecera , uma tradição que se transmitia de época em época e que só tinha

1
Alunas do 5º período do Curso de Licenciatura em História da Faculdade José Augusto Vieira – FJAV.
como caráter sagrado a sua antiguidade, em vez disso, a religião passou a ser um conjunto
de dogmas e um grande objetivo proposto à fé” (Fustel de Coulanges, 2001. p. 483)

Através dos primeiros séculos da Era Medieval, a Igreja Católica consolida-se


como a instituição mais poderosa da Idade Média, ultrapassando temporalmente o próprio
império que a edificou e de seus fundamentos mais característicos. Suas possessões agora
alcançam toda a Europa e sua influência ultrapassa o campo religioso e adentra a política, a
guerra e a economia. Conhecida neste período como a "Senhora Feudal" possuía poder
decisivo nas mais diversas áreas do cotidiano humano, desde a esfera estatal até o mais
ordinário assunto familiar.
Administrando um complexo mercado de arrecadação de fundos por meio da
venda de indulgências e relíquias religiosas, aumentando progressivamente o acúmulo de
metais preciosos utilizados na expansão do número de igrejas e construção de portentosas
obras como a exemplo da basílica de São Pedro (sede mundial da Igreja, situada na cidade
do Vaticano, em Roma), tornou-se ainda mais influente. Tais práticas ainda somavam a
seus domínios as melhores e mais valiosas terras, consolidando assim seu status de
grandeza, afastando-se de seus princípios religiosos originais e enquadrando-a no
materialismo característico do período final da Idade Média e princípio da Idade Moderna –
a acirrada disputa mercantilista pelo acúmulo de metais preciosos e poder político.
Em meio a este turbulento cenário, surgem grupos de clérigos insatisfeitos com os
rumos morais que a Igreja agora tomava. Havia entre eles diversas idéias entorno da nova
orientação a ser tomada por tal instituição. Entre eles estavam defensores de urgentes
reformas que trouxessem de volta a moral e a reputação características de seus primórdios.
E também os defensores de uma reforma de cunho econômico visando uma melhor
adequação da Igreja ao mundo moderno, saindo assim, das retrógradas e já improdutivas
amarras feudais.Os historiadores Adhemar Marques, Flávio C. Beirutte e Ricardo Faria,
sobre os rumores clericais a favor de reforma da Igreja afirmam em seu livro: História
Moderna através de textos, que
“Importa, inicialmente, verificar que dentro da própria Igreja católica já faziam
ouvir vozes reformistas desde o período medieval. No entanto essas vozes não conseguiam
sensibilizar os elementos da cúpula da hierarquia católica, o que aprofundava cada vez
mais a crise.” (Marques, Beirutte e Faria, 2005. p. 103).
O pensamento da época começava a passar por fortes mutações, ocasionadas pelas
práticas Renascentistas, que faziam oposição a certos preceitos da igreja, dando ênfase ao
estudo da razão, ou seja, racionalização das explicações através da experimentação,
"usurpando" um conhecimento que era tido como posse exclusiva do clero, escondido nas
bibliotecas das igrejas e monastérios e afastando-se das explicações transcendentais
empurradas pelo clero. A sociedade, formada majoritariamente por analfabetos, executa
seus primeiro passos em direção a aquisição de um certo grau de cultura, principalmente as
classes burguesas emergentes, e à medida que adquirem este conhecimento voltam-se ainda
mais contra a Igreja.
Neste “caldeirão de insatisfação” diante da Igreja Católica Apostólica Romana,
eclode a primeira afronta a seus ditames centenários: Martinho Lutero (monge Alemão)
afixa na porta da Igreja de Wittenberg, em 1517, suas 95 teses criticando algumas práticas
litúrgicas do catolicismo que se afastavam dos mais básicos preceitos bíblicos e propõe o
Luteranismo, (nova doutrina baseada na salvação do homem de acordo com a sua fé),
apoiado por muitos Reis e Príncipes, principalmente alemães e suíços. Este ato de Lutero
deu margem ao nascimento de outros levantes religiosos sob a égide de Movimento
Protestante.O pensamento dos três historiadores a cima citados, sintetiza no trecho a baixo
a importância do Movimento de Reforma e suas ramificações:

“Em pouco tempo, o movimento luterano ganhou corpo na Alemanha, chegando


mesmo a outros países. Novas religiões foram criadas como o calvinismo e o
Anglicanismo. Assim o protestantismo expandia-se rapidamente e provavelmente teria
sido maior ainda sua expansão, se a igreja católica não tomasse uma posição no sentido
de ‘frear’ a onda protestante” (Marques, Beirutte e Faria, 2005. p. 103).

Em resposta aos vários levantes protestantes, espalhados por todo o continente


europeu, a Igreja Católica empreendeu medidas com o intuito de conter o crescimento dos
reformadores; aproveitou também para lançar medidas doutrinárias combatendo os hereges
(pessoas acusadas de blasfemar contra a Santa Igreja Católica) e reformulou algumas de
suas práticas que davam margem ao surgimento cada vez mais poderoso de críticas contra
sua autoridade eclesiástica. Essas providências foram sancionadas num concílio na cidade
de Trento (Itália) que contava com a cúpula da Igreja responsável por prover as ações mais
urgentes contra os reformadores, entre elas estavam: o Index (lista de livros com leitura
proibida à população por opor-se aos dogmas e práticas da Igreja); e a medida mais
controversa, que fora a criação do Tribunal da santa Inquisição, dotado do poder de julgar
os atos de toda sociedade – clerical ou não – conferindo-lhe a pena, que a seu ver fosse
mais cabível para a expiação do pecado humano e contenção do desrespeito à Instituição
Sagrada, com penas leves, confisco de bens materiais até mesmo a morte na fogueira.
A historiografia mundial há muito discute a origem do movimento de Reforma.
Entre as várias escolas de pensamento destacam-se as teorias de cunho marxista
obedecendo à lógica da explicação dos fenômenos sociais pelo víeis econômico, pois Karl
Marx defendia a economia como "a mãe universal de todas as sociedades humanas". Engels
em 1850 escrevera:

“Inclusive as chamadas guerras de religião do século XVII aconteceram, antes de


tudo por interesses materiais de classes muito concretas. Estas guerras foram lutas de
classes, da mesma forma que os conflitos internos que mais tarde se produziram na França
e na Inglaterra. Que estas lutas tivessem certas características religiosas, que os
interesses, necessidades e reivindicações de cada uma das classes tenham sido
dissimulados com uma capa religiosa, não modifica a situação em nada e se explica pelas
condições da época” (Engels, apud Marques, Beirutte e Faria, 2005 p. 104)
A Reforma estudada sob a luz do materialismo de Karl Marx e Engels, traduz a
importância ofertada à economia, nas modificações sociais, extraindo-se todas as
explicações não econômicas ou relegando-as a segundo plano. O historiador Óscar A. Marti
em 1922 salienta sobre os primórdios da Reforma dos protestantes:

“(...) As raízes da Reforma se encontram num subsolo constituído por questões de


dinheiro e pelas transformações econômicas fundamentais que estavam a ponto de
produzir-se. Somente sob esta nova luz é que tais fatos podem ser compreendidos com
claridade.” (Óscar A. Marit, apud, Engels, apud Marques, Beirutte e Faria, 2005. p. 105)
A base do pensamento marxista sobre as Reforma esta calcada no fato de que a
Igreja por ser muito ligada aos pareceres medievais, pois auferiu grande poderio com as
estruturas rurais deste período, estando em franca desvantagem se comparada a emergente
economia urbana, burguesa e capitalista. O movimento de Contra-Reforma é tido como a
tentativa de restituir a ordem antiga (aumentar o poderio da Igreja gradativamente e
subjugar todos ao seu comando), mas para os Marxistas a revolução ocorre de forma
inevitável e derruba as forças econômicas e sociais já defasadas.
Outros estudiosos como Henri Hauser, em estudos voltados para a explicação da
origem e disseminação do protestantismo em regiões específicas, deixando de lado
explicações sobre causa generalizadoras, mostra este movimento como um emaranhado de
fatores (econômicos sociais e religiosos) indissolúveis:

“A reforma do século XVI teve um duplo caráter de revolução social e revolução


religiosa. As classes populares não se sublevaram somente contra a corrupção dos dogmas
e os abusos do clero. Também o fizeram contra a miséria e a injustiça. Na bíblia não
buscaram somente a salvação pela fé, mas também a prova da igualdade original de todos
os homens” (Henri Heuser, apud, Engels, apud Marques, Beirutte e Faria, 2005. p. 105).

Muitos críticos das explicações marxistas acusam-nas de anacrônicas, pois


remetem a uma realidade somente vivenciada em meados do século XIX, quando o
capitalismo já estava em sua fase industrial.
A escola dos Annales com Lucien Febvre defende uma análise, mas comedida
sobre as causa dos movimentos de Reforma. O próprio Febvre entende que: “É necessário
buscar causas religiosas para uma revolução religiosa”. Ele também propõe o estudo das
mentalidades, pois acredita que a sociedade é produto de sua época, e esta sociedade em
questão relegava maior importância ao componente religioso. O autor G. R. Elton, em seu
capítulo de introdução do volume II da New Cambridge Modern History: The Reformation
Era, noticia:

“O ódio contra o clero, muito extenso, desempenhou o seu papel (...). A cobiça, o
endividamento e os cálculos políticos, também devem ser levados em conta. Mas a
mensagem dos reformadores, respondeu – isto é indubitável – a uma intensa sede
espiritual que a igreja oficial foi incapaz de satisfazer...os pregadores da reforma não
necessitaram de nenhum apoio político para atrair seus partidários, ainda que esse apoio
se fizesse necessário para consolidar os resultados alcançados pelo ataque inicial dos
profetas. Não se pode esquecer que, em seus inícios, a Reforma foi um movimento
espiritual com uma mensagem religiosa” (Lucien Febvre, apud, Marques, Beirutte e Faria,
2005. p. 112)

Já o movimento de contra-reforma expedido pela Igreja Católica, é entendido


como positivo a esta instituição pois lhe renovou as força, já ofuscadas pelos movimentos
Reformistas, à medida que se intitulava “Igreja Suprema”, acima das demais religiões,
empreendendo sua decisões alcançadas no concílio de Trento, disseminando-as por todo o
mundo, até mesmo nas Terras Recém “descobertas”, localizadas no continente Americano,
ou Novo Mundo, como era até então intitulado. Michael Mullett, disserta acerca das origens
da Contra-reforma, e sobre a coerção imposta pelas reformas protestantes:

“A Reforma católica constava dos projetos de um sem-número de bispos e


teólogos, desde a Idade Média. No entanto vinha sendo protelada pelos papas. Com a
eclosão da Reforma Luterana, tornou-se imperativo para a igreja agilizar a sua, mas
agora já com o caráter negativo: o de ser contra a Luterana” (Michael Mullet, apud,
Engels, apud Marques, Beirutte e Faria, 2005. p. 122)

A maioria dos historiadores e estudiosos concordam com a urgência em se fazer


mudanças doutrinárias e disciplinares, apontando soluções para os problemas clericais e
realizando as devidas sanções aos que não se enquadravam nos novos termos da instituição
católica, que além de modificar algumas de suas práticas, assimilando-as aos seus, e
acrescendo valores mais condizentes com a mentalidade moderna que a cada dia ganha
maior notoriedade entre as diversas classes. Mas muitas medidas contra os protestantes,
principalmente aquelas que causavam o dolo físico, causaram pânico e um maior apego à
igreja católica, mas não pelo temor ao Deus que eles se intitulavam representantes, mas sim
pelo temor às perseguições que passaram a fazer parte do cotidiano de todos.
Tanto o movimento de Reforma protestante como o de Contra-Reforma católico,
propiciaram uma nova era diante das convicções religiosas, independentes de suas origens
econômicas sociais ou culturais. A partir de então a luta pela liberdade religiosa inicia o
movimento que mais tarde trará ao homem um extenso leque de opções religiosas que
disputam sua atenção e devoção.

Bibliografia:
MARQUES, Adhemar Martins; BERUTTI, Flavio costa, FARIA, Ricardo de Souza.
História Moderna Através de Textos – 11 ed. São Paulo: Contexto, 2005 (coleção textos e
documentos); 3.

COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. Aurélio Barroso Rebello e Laura Alves.
1. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. pp 483.

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