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FACULDADE IMED

ESCOLA DE DIREITO

Patricia Santos da Silva

O ESTUPRO DE VULNERÁVEL E A ADOÇÃO DO ERRO DE TIPO PELO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

PASSO FUNDO
2017
Patricia Santos da Silva

O ESTUPRO DE VULNERÁVEL E A ADOÇÃO DO ERRO DE TIPO PELO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado


para obtenção do grau de bacharel no curso de
Direito, Escola de Direito, da IMED.

Orientador: Prof. Dr. Felipe da Veiga Dias

PASSO FUNDO
2017
Patricia Santos da Silva

O ESTUPRO DE VULNERÁVEL E A ADOÇÃO DO ERRO DE TIPO PELO


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado


para obtenção do grau de bacharel no curso de
Direito, Escola de Direito, da IMED.

Passo Fundo, 05 de dezembro de 2017.

BANCA EXAMINADORA

Prof. – Felipe da Veiga Dias - Doutor - (IMED) – Orientador

Prof. – Raquel Tomé Soveral - Mestre - (IMED) - Integrante

Prof. – Rowana Camargo - Mestre - Integrante


AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pela força, e por iluminar meu caminho nessa trajetória.
Agradeço a minha família, pela confiança que depositaram em mim, minha
mãe Rosane pelo amor e carinho que sempre me deu, aos meus avós pela
dedicação que tiveram comigo, minha tia Adriana, minha maior incentivadora,
sempre me apoiando, me ajudando, e acreditando no meu potencial.
À Kiki, pelo companheirismo canino, durante as longas jornadas de estudo.
Ao meu grande amor, Júlio, pelo apoio, incentivo, companheirismo, paciência
e compreensão nos momentos de angústia. Obrigada por estar sempre ao meu lado,
inclusive nos momentos difíceis, me dando suporte, me amando e me fazendo uma
pessoa feliz, sem você nada disso seria possível, te amo muito.
Aos professores que tive durante minha graduação, que direta ou
indiretamente contribuíram para que eu chegasse até aqui, especialmente ao meu
orientador Felipe da Veiga Dias, pelas orientações, por todo o incentivo, atenção,
paciência, disponibilidade em sempre ajudar, pelos conhecimentos passados, e por
sempre me transmitir calma, esse trabalho é nosso.
Aos meus amigos pela paciência e compreensão nesse momento de
ausência, principalmente a minha irmã de coração Janaina, por sempre ouvir meus
desabafos, por ser meu refúgio, pelo companheirismo de sempre, por todo apoio e
incentivo, amo você.
Aos meus colegas e amigos “top’s do direito”: Ana Paula, Diana, Franciele,
Francieli, Luana, Magali, Marcelo, Robson, Rubiane, Silvana e Viviane. Obrigada
pela parceria nesses 5 anos de faculdade, vocês fizeram com que essa jornada
fosse mais fácil e divertida.
Enfim, a todos que de alguma forma contribuíram para essa conquista, meu
muito obrigada.
RESUMO

O presente trabalho é resultado de uma pesquisa bibliográfica tendo como


referencial obras que abordam sobre o crime de estupro de vulnerável com foco nas
vítimas com idade inferior a 14 anos, assim como doutrinas sobre o erro de tipo. A
abordagem do assunto justifica-se na importância do desvio da regra geral do crime
de estupro de vulnerável no caso de o agente ter sido conduzido em erro em relação
a percepção da vulnerabilidade da vítima. O objetivo desta pesquisa é realizar um
estudo dos casos em que há reconhecimento do erro de tipo no estupro de
vulnerável, com base na análise da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul, a fim de determinar seus parâmetros para o reconhecimento. A partir
da pesquisa jurisprudencial acerca do assunto, no período dos anos de 2015 a 2017,
concluiu-se que a falsa percepção sobre a vulnerabilidade da vítima, sendo este
devidamente comprovado, é, para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o
principal aspecto analisado para o reconhecimento do erro de tipo nos casos de
estupro de vulnerável.

Palavras-chave: Estatuto da Criança e do Adolescente; Estupro; Estupro de


vulnerável. Erro de tipo.
ABSTRACT

The present work is the result from a bibliographical research having as reference
works that deal with the crime of rape of vulnerable focusing on victims under the age
of 14, such as doctrines about the mistake of kind. The approach of the subject
matter justify itself in the importancy of the deviation from the general law of crime of
rape of vulnerable in case the agent has been made in error in relation to the
perception of the victim's vulnerability. The objective of this research is to conduct a
study of the cases in wich there is the recognition of the mistake of kind in the rape of
vulnerable, based on the jurisprudence analysis of the Court of Justice of Rio Grande
do Sul, in order to determine its parameters for the knowledge. Based on the
jurisprudential research on the subject, from the period of 2015 to 2017, concludes
that the false perception about the victims vulnerability, being it properly proven, is,
for the Court of Justice of Rio Grande do Sul, the main aspect analysed for the
recognition of the mistake of kind in the cases of rape of vulnerable.

Keywords: Child and Adolescent Statute; Rape; Rape of Vulnerable. Mistake of Kind
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 7
2 DO ESTUPRO DE VULNERÁVEL A PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA INFÂNCIA
.................................................................................................................................... 9
2.1 AS NOÇÕES BÁSICAS DO ESTUPRO CONFORME O DIREITO PENAL .......... 9
2.2 DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A PROTEÇÃO DA
DIGNIDADE E INTEGRIDADE SEXUAL .................................................................. 15
3 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO
GRANDE DO SUL .................................................................................................... 27
3.1 RECONHECIMENTO DO ERRO DE TIPO NO CRIME DE ESTUPRO DE
VULNERÁVEL........................................................................................................... 27
3.2 ANÁLISE DAS DECISÕES ACERCA DO ESTUPRO DE VULNERÁVEL E DO
ERRO DE TIPO NOS ANOS DE 2015 – 2017 NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO
GRANDE DO SUL..................................................................................................... 31
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 43
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 47
7

1 INTRODUÇÃO

O antigo título do Código Penal “dos crimes contra os costumes”, foi


modificado pela Lei 12.105/2009, dando nova denominação “dos crimes contra a
dignidade sexual”, trazendo mudanças significativas ao texto penal, principalmente
em relação às crianças e adolescentes, incluindo um novo tipo penal denominado
estupro de vulnerável.
O estupro de vulnerável, assim como a tutela que preserva as pessoas
vulneráveis são temas de significativa relevância social, devido ao crescimento
assustador da ocorrência de violência sexual contra crianças e adolescentes e pela
maior parte dessas incidências acontecerem dento do âmbito familiar. A presente
pesquisa tem como enfoque específico os vulneráveis menores de 14 anos de
idade, por fazerem jus à maior proteção estatal.
Com a presente pesquisa, pretende-se tratar sobre o afastamento da regra
geral do crime de estupro de vulnerável com o erro de tipo, ou seja, os casos em que
o agente ter incorrido em erro pela falsa percepção da vulnerabilidade da vítima
dado ao seu precoce desenvolvimento físico e mental.
Ponderar de forma absoluta esses casos pode acabar gerando sérias
consequências para a vida do acusado, que terá que cumprir pena por crime que
não sabia estar cometendo, além de se estar ofendendo princípios como a dignidade
da pessoa humana, ampla defesa, presunção de inocência, adequação social, entre
outros.
Dito isso, a questão problema que se pretende resolver com essa pesquisa é
identificar quais os parâmetros utilizados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul nos casos de reconhecimento do erro de tipo no estupro de
vulnerável a partir do ano de 2015 até 2017.
Para isso, serão feitas pesquisa e análise da jurisprudência do Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul no período de 2015 – 2017, buscando e comparando
diferentes entendimentos e técnicas relacionados às decisões assim como suas
bases de argumentação, a fim de identificar quais os aspectos considerados para se
ter configurado o reconhecimento do erro de tipo no crime de estupro de vulnerável.
No primeiro capítulo será realizado a conceitualização de estupro e seus
aspectos gerais, tratando sobre as mudanças na redação advindas da Lei
12.105/2009, em sequência será abordado estupro de vulnerável, assim como os
8

direitos da criança e do adolescente e a atenção que se dá a esses direitos visando


a proteção da dignidade e integridade sexual da criança e do adolescente.
No segundo capítulo será conduzida a realização de um estudo acerca do
erro de tipo, estabelecendo sua importância e o que ele estabelece e garante ao
acusado. E num segundo momento, será realizada a análise de julgamento de casos
concretos, trabalhar-se-á com decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul, no período dos anos de 2015 a 2017, a fim de identificar os
parâmetros utilizados pela jurisprudência para reconhecer o erro de tipo no estupro
de vulnerável.
A presente pesquisa terá natureza bibliográfica, o método de abordagem
dedutivo, o qual parte do raciocínio geral para chegar a uma conclusão particular, ao
passo que o método de procedimento utilizado é o monográfico, mirando a
contextualização e análise dos conceitos em termos teóricos. No que tange à técnica
de pesquisa, se valerá da documentação indireta, utilizando-se de referências
doutrinárias publicadas em documentos científicos, como livros, artigos, periódicos e
revistas, dentre outras. Ainda, se contará com o conhecimento lançado na
jurisprudência dos tribunais. Desta forma, pretende-se recolher informações e
adquirir conhecimento acerca do tema, polarizando entendimentos que irão
diversificar e prestar fundamentação ao trabalho.
9

2 DO ESTUPRO DE VULNERÁVEL A PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA INFÂNCIA

Os crimes sexuais não são resultados da sociedade moderna, haja vista que
perduram na humanidade desde muito tempo, apresentando desde sempre altos
índices de estupro no Brasil, ainda mais pelo fato de que a maioria das vezes o
abusador é alguém do convívio da vítima.
Os dados de ocorrência de abuso sexual contra crianças e adolescentes é
uma questão preocupante, pois acontece em uma quantidade tão considerável que
é apontado como um problema de saúde pública, pois acarreta em uma série de
prejuízos as vítimas, muitas vezes irreparáveis. A Lei n° 12.015/2009 trouxe o novo
tipo penal titulado como estupro de vulnerável, a fim de dar maior proteção a esses
que estão em fase de desenvolvimento e ainda não tem o necessário discernimento
para consentir com a prática sexual.
A violência sexual contra crianças e adolescentes é um tema bastante
discutido pela sociedade, haja vista que o maior entrave detectado para dar fim a
esse tipo de violência é o silêncio da vítima. As estatísticas apontam que a maior
incidência dos casos se dá em âmbito familiar, ambiente em que a criança teria de
obter cuidado e proteção. Ademais, tais delitos geralmente não são testemunhados,
e muitas vezes não deixam vestígios, restando, portanto, apenas o depoimento da
vítima. Diante disso, foi elaborado o Depoimento Especial, tendo como finalidade a
redução de danos psicológicos acarretados pela revitimização da criança ou
adolescente. Perante a gravidade que os crimes sexuais contra crianças apresenta,
convém uma análise mais profunda sobre o assunto.

2.1 AS NOÇÕES BÁSICAS DO ESTUPRO CONFORME O DIREITO PENAL

A Lei n° 12.015/2009 modificou a lei penal em seu Título VI “Dos Crimes


Contra os Costumes” recebendo nova denominação, passando a ser “Dos Crimes
Contra a Dignidade Sexual”. A lei revogou o dispositivo sobre o atentado violento ao
pudor e uniu sua matéria a do estupro, a qual passou a configurar do ato de
“constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou
a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” (BRASIL, 1940).
Assim, a unificação dos dois dispositivos (atentado violento ao pudor e
estupro) excluiu a possibilidade de concurso material de delitos, tornando-o crime
10

único. Desse modo, se um agente constrange a vítima a ter conjunção carnal com
ele e em sequência a constrange para a prática de outro ato libidinoso, responde
somente por um único crime.
À vista disso, o Superior Tribunal de Justiça entende:

[...] com as inovações trazidas pela Lei n. 12.015/2009, os crimes de estupro


e atentado violento ao pudor são agora do mesmo gênero - crimes contra a
dignidade sexual - e também da mesma espécie - estupro -, razão pela qual,
desde que praticados contra a mesma vítima e no mesmo contexto, devem
ser reconhecidos como crime único (BRASIL, 2015).

Anteriormente a lei referida, a consumação do crime dava-se da conjunção


carnal do homem contra a mulher, porém atualmente, há de se tratar de uma lei que
abrange o sexo feminino e também masculino, devido à substituição do sujeito
passivo “mulher” pela expressão “alguém” na redação vigente. A consumação
conforme redação anterior era somente quando houvesse cópula vagínica, sendo
que na atual redação, a prática de qualquer ato libidinoso configura o crime de
estupro.
Ressalta-se também a alteração da ação penal, que antes era privada e com
a nova redação passou a ser ação penal pública condicionada à representação da
vítima (autorização da parte passiva para dar continuidade à averiguação da
infração), exceto nos casos de vítimas menores de 18 anos de idade ou considerada
vulnerável, que então será ação penal pública incondicionada (PEREIRA, 2016, s/p).
Os capítulos do Título VI do Código Penal receberam um novo formato com a
Lei. O capitulo I trata sobre os delitos contra a liberdade sexual e busca tutelar a
autonomia sexual dos indivíduos, sendo indispensável nesses casos, analisar a
existência ou não do consentimento da vítima no ato sexual.
Em se tratando da questão de gênero, apesar da possibilidade de violação
contra qualquer gênero, tanto antigamente como nos dias de hoje, os casos de
estupro são na grande maioria contra mulheres. A conservação deste padrão é
assegurada pelo que é chamado de cultura do estupro, que é uma cultura vinda de
uma sociedade patriarcal, que tende a culpabilizar a vítima a partir do pensamento
que a responsabilidade pelo estupro é da mesma, por estar caminhando na rua à
noite, por não usar roupas recatadas, por estar embriagada, etc. Nesse sentido, a
voz da mulher é tão desvalorizada socialmente que foi preciso a atuação do
movimento feminista, para poder fazer com que a sociedade escute e acredite
11

quando a mulher diz que sofreu violência, e que entendam que sexo sem
consentimento é estupro.

A oposição da mulher ao ato sexual não precisa ser justificada, nem


motivada. Basta que ela não o queira. Seja porque não o quer com a
pessoa do agente, seja porque não quer naquele momento ou nas
condições propostas ou sugeridas. Simplesmente porque não quer, porque
está em sua liberdade querer ou não, qualquer que seja a razão (TELES,
2004, p. 52 apud MARCÃO, 2015, p. 58).

Muitos homens tendem a naturalizar o estupro em ocasiões do dia a dia,


atribuindo caráter sexual a quase tudo. “Se uma mulher é gentil, é porque está
dando mole”. “Se uma mulher convida um amigo pra sair, é porque quer transar com
ele”.
Lamentavelmente, a negativa da mulher é julgada como um método de
sedução, o não é interpretado como um “ela quer, só está fazendo charme”. A falta
de consentimento por mais clara que reste, é ignorada. A questão é simples, se uma
mulher diz não, ela não quer dizer nada além de não, seja o que for que viole isso é
estupro, mesmo que não haja violência ou constrangimento, ocorrendo penetração
ou não, é o corpo da mulher sendo usufruído sem sua autorização. Nenhuma vítima
pede para ser estuprada, e nenhuma delas deve ser culpada pelo abuso sofrido.
Segundo um levantamento feito em 2013 pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da
Saúde, no Brasil acontecem em média 527 mil estupros ao ano, porém, apenas 10%
dos casos chega à polícia, sendo que 90% sequer são investigados (IPEA, 2014).
O ato criminoso do estupro é tão humilhante que a vítima prefere eximir-se de
prestar queixa, diante do medo, constrangimento, desinformação, ligados à atuação
opressiva que o sistema de poder opera perante a mulher, quando conduz
questionamentos para induzir respostas, inverte o dever de prova direcionando-o
para a vítima de modo a responsabilizá-la parcialmente pelo fato, etc. Diante disso, a
violência além de física torna-se psicológica em decorrência do comportamento do
sistema de poder em relação ao depoimento da mulher, consequência dos efeitos de
uma herança cultural patriarcal e, portanto discriminatória, deixando de cumprir sua
função de proteção, e resultando no desestímulo de novas denúncias.

Tem sido reiteradamente posto em relevo a maneira como as demandas


femininas são submetidas a uma intensa “hermenêutica da suspeita”, do
12

constrangimento e da humilhação ao longo do inquérito policial e do


processo penal que vasculha a moralidade da vítima (para ver se é ou não
uma vítima apropriada), sua resistência (para ver se é ou não uma vítima
inocente), reticente a condenar somente pelo exclusivo testemunho da
mulher (dúvidas acerca da sua credibilidade). [...]não apenas não são
consideradas vítimas, mas podem ser convertidas, com o auxílio das teses
vitimológicas mais conservadoras, de vítima em acusadas ou rés num nível
crescente de argumentação que inclui ela ter “consentido”, “gostado” ou
“tido prazer”, “provocado”, forjado o estupro ou “estuprado” o pretenso
estuprador, especialmente se o autor não corresponder ao estereótipo de
estuprador, pois, correspondê-lo, é condição fundamental para a
condenação (ANDRADE, 2004, s/p).

Verifica-se a partir disso, que o sistema de justiça criminal reproduz a visão


estereotipada e desigual dos gêneros, quando destina o foco da investigação para a
vida íntima da vítima, seu comportamento, assim como o relacionamento entre
agressor e a vítima, procurando elementos que indiquem relação do ofensor e
ofendido ao padrão de estuprador e vítima.
Pode-se perceber que o estupro em vez de ser uma manifestação de desejo
sexual é mais uma questão de poder, é uma necessidade de inferiorizar e humilhar a
vítima para demonstrar superioridade, “que se ocupa muito mais com o status,
agressão, controle e domínio do que com o prazer sexual ou a satisfação sexual. Ele
é comportamento sexual a serviço de necessidades não sexuais" (ANDRADE, 2004,
s/p). As mulheres são objetificadas, sendo tratadas como objetos ao invés de seres
humanos, que podem ser usadas e destruídas.
Ademais, engana-se quem pensa que quem faz isso são homens estranhos,
há inúmeros casos de mulheres que são estupradas pelo próprio marido, que as
julgam como propriedade deles, e, portanto, acham que as mesmas tem obrigação
de satisfazê-los sempre que os mesmos quiserem. Segundo o Ipea, 70% dos
estupros são cometidos por parentes, namorados ou amigos/conhecidos da vítima, o
que indica que o principal inimigo está dentro de casa e que a violência nasce dentro
dos lares (IPEA, 2014).
No que se refere a sexualidade do homem, Nye, por meio do pensamento de
Dworkin, discorre:

Dworkin via a sexualidade masculina como inerentemente violenta. Os


homens são os matadores e as mulheres os judeus nos campos de
concentração nazistas, socializadas na docilidade pela ideologia
masculinizante [...]. Apresentar uma sexualidade feminina inocente e
essencialmente suave era negar às mulheres a plena gama de expressão
humana. Devia-se permitir às mulheres a sua vez como sujeitos (1995,
p.123).
13

Esta comparação feita por Dworkin remete-se a conduta sexual do homem


que por vezes é caracterizado pela violência, assim como procede nos dias de hoje.
Essa conduta nada mais é do que o reflexo da sociedade patriarcal e machista que
determinou a regra de que menina tem que ser criada para os afazeres de casa,
tendo que sempre estar disponível para o marido, tendo que obrigatoriamente
satisfazer suas vontades e desejos, relacionando a prática sexual meramente à
procriação, sempre inibindo a mulher de ter vontade, se expressar, ter opinião.

É plausível, portanto, nessas circunstâncias que já duram milênios,


conceber o estupro como método perverso de controle social e dominação
nessas sociedades fundadas sob a égide do patriarcado. Os movimentos
sociais de subversão do poder patriarcal engendrados pelo feminismo são
fatores de mudança que, desde a década de 60 do século passado, vêm
angariando conquistas. Mas a grande mudança apenas será possível
quando os efeitos perversos dessa cultura levarem à autofagia da
sociedade patriarcal (CAMPOS, 2016, p. 12).

O delito de estupro constitui crime hediondo tanto em sua forma tentada ou


consumada, simples ou qualificado (Lei n° 8.072/90, artigo 1°, V), mesmo que não
resulte em lesão corporal grave ou morte da vítima. Este entendimento decorre do
julgamento de recurso repetitivo do Superior Tribunal de Justiça, em decisão
unânime dos ministros que entendem que a hediondez está no alto nível de
gravidade da violação contra a liberdade sexual da vítima.

Liberdade sexual é categoria mais concreta, que significa uma esfera de


ação em que o indivíduo — e só́ ele — tem o direito de atuar, e atuar
livremente, sem ingerências ou imposições de terceiros. A liberdade sexual
diz respeito diretamente ao corpo da pessoa e ao uso que dele pretende
fazer. Ao punir condutas que obriguem o indivíduo a fazer o que não deseja,
ou a permitir que com ele se faça o que não quer com o próprio corpo, a
norma penal está tutelando sua liberdade sexual (MARCÃO, 2015, p.46).

Diante disso, verifica-se que a liberdade sexual tem caráter personalíssimo,


visto que o objeto do delito de estupro é o corpo da vítima, que é usado contra sua
vontade e mediante violência para satisfazer o desejo sexual de outrem.
A liberdade sexual é o bem jurídico tutelado e consta do direito de exercer e
expressar de forma livre sobre a própria sexualidade seja na escolha do (a) parceiro
(a), como o momento, o ambiente, etc. É o poder dado a todas as pessoas sobre si
14

mesmas, visando assegurar a capacidade da autodeterminação sexual exercida com


liberdade de escolha e vontade consciente (BITENCOURT, 2017, p.50).
Em questão da consumação do crime de estupro, quando da conjunção
carnal ocorre com o coito vagínico, ou seja, a introdução do pênis na vagina,
completa ou parcial. Na modalidade outros atos libidinosos os quais são atos de
satisfação do desejo sexual, a consumação acontece na prática de ato distinto da
conjunção carnal, como por exemplo, sexo oral, masturbação, toques em partes
íntimas do corpo, etc. sendo necessário que haja uma interferência sobre o corpo da
vítima coagida.

Doutrinariamente, é admissível a tentativa, embora a dificuldade prática de


sua constatação. Caracteriza-se o crime de estupro na forma tentada
quando o agente, iniciando a execução, é interrompido pela reação eficaz
da vítima, mesmo que não tenha chegado a haver contatos íntimos. No
estupro, como crime complexo que é, a primeira ação (violência ou grave
ameaça) constitui início de execução, porque está dentro do próprio tipo,
como sua elementar. Assim, para a ocorrência da tentativa basta que o
agente tenha ameaçado gravemente a vítima com o fim inequívoco de
constrangê-la à conjunção carnal (BITENCOURT, 2017, p.62).

Admite-se portanto, o delito na forma tentada, que acontece quando o sujeito


não consegue alcançar seu objetivo da prática da conjunção carnal ou outro ato
libidinoso, devido à circunstâncias alheias à sua vontade. Importando, contudo, que
fique claro o propósito do indivíduo de praticar o ato delitivo.
As qualificadoras do crime de estupro estão previstas nos parágrafos 1° e 2°
do artigo 213 do Código Penal, que dispõem “§ 1º - Se da conduta resulta lesão
corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14
(catorze) anos: Pena- reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2º - Se da conduta
resulta morte: Pena - reclusão,de 12 (doze) a 30 (trinta) anos” (BRASIL, 1940).
Portanto, as formas qualificadas serão caracterizadas quando o crime resultar na
lesão corporal de natureza grave, morte, e quando for a vítima menor de 18 anos e
maior de 14 anos, endo fundamental a existência de nexo causal entre o tipo e o
resultado que o qualifica.
A conduta típica do crime previsto no artigo 213 do Código Penal consta em
constranger (coagir, obrigar, forçar) alguém (mulher, homem ou transgêneros),
mediante violência (ação física para suprimir a resistência da vítima) ou grave
ameaça (promessa de um mal grave), à conjunção carnal (cópula vagínica). O
15

núcleo do tipo está no verbo “constranger”, considerando que a vítima é forçada a


realizar o ato sexual sem seu consentimento devido à conduta violenta do indivíduo,
ocorrendo assim um constrangimento ilegal da vítima mediante violência e grave
ameaça.
O elemento subjetivo é o dolo consolidado na vontade consciente do agente
de constranger, forçar a vítima a praticar ato sexual por meio de violência ou grave
ameaça, exigindo-se também o dolo específico, este constituído na finalidade de ter
conjunção carnal ou executar outros atos libidinosos, sendo indispensável a vontade
livre e consciente do indivíduo.
O capítulo II do Título VI do Código Penal refere-se aos delitos contra
vítimas vulneráveis e visa resguardá-las da exploração causada por terceiros, a fim
de evitar o seu acesso precoce na vida sexual. Nesses casos não há o que se
discutir sobre existência de consentimento, pois a tipificação do delito independe
deste (ESTEFAM, 2009, p.21), conforme se trará especificadamente no item
subsequente.

2.2 DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A PROTEÇÃO DA


DIGNIDADE E INTEGRIDADE SEXUAL

A lei alterou significativamente o texto penal, principalmente no que tange as


crianças e adolescentes, trazendo um novo tipo penal denominado estupro de
vulnerável, o qual se destina a proteger os que são incapazes de discernir ou
consentir sobre atos ligados a atividades sexuais, quais sejam pessoas menores de
14 anos, deficientes mentais e pessoas com a capacidade de resistência diminuída.
Ademais, como bem analisado por Rassi:

Obviamente, cada uma das situações guarda sua peculiaridade, uma vez
que, [...], a vulnerabilidade comporta graus e tem consequências penais
diferentes, a depender da avaliação que o legislador faz do grau de abuso
dessa condição, e, também, a avaliação que fará o julgador, tendo em vista
o bem jurídico tutelado pela norma (RASSI, 2011, p.834).

Anteriormente às mudanças referentes aos crimes sexuais, o capítulo II


continha somente dois dispositivos, o artigo 217 que já havia sido revogado pela Lei
n° 11.106 de 2005, e o artigo 218 que versava da corrupção de menores. A punição
do crime sexual contra vulneráveis se sucedia com a conjuntura da conduta prevista
16

no artigo 213 (estupro) ou 214 (atentado violento ao pudor) conciliado com as


circunstâncias da vítima elencadas no disposto no artigo 224 do Código Penal, o
qual previa presunção de violência nos casos em que a vítima fosse menor de 14
anos; alienada ou débil mental, e o agente tinha ciência desta circunstância; ou por
qualquer outra causa, incapaz de oferecer resistência (BRASIL, 1940).
Todavia, com as alterações, foi introduzido ao capítulo II quatro crimes novos.
O primeiro desses novos crimes é o estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A, o
segundo é a mediação para satisfazer a lascívia de outrem envolvendo vulnerável, o
terceiro é a satisfação da própria lascívia perante a presença de vulnerável, e o
último é o crime de prostituição de vulneráveis.
O capítulo II do Código Penal passou então a ter a denominação “Dos crimes
contra vulnerável”, ganhando uma espécie própria de tipo penal, o estupro de
vulnerável.
A lei estabelece o vulnerável como a pessoa menor de 14 anos de idade ou
pessoa que tenha enfermidade ou deficiência mental, e em decorrência deste não
tem o necessário discernimento para a prática do ato sexual. Assim como preceitua
Estefam:

[...] são vulneráveis as pessoas que não têm, por qualquer causa,
capacidade de resistir. A elasticidade do termo utilizado na norma importa
em que a origem da incapacidade pode ou não ter sido provocada pelo
agente. Assim, por exemplo, dar-se-á a situação prevista em lei quando o
agente ministrar substância que retire a consciência da vítima ou quando
isso for feito por terceiro, aproveitando-se o sujeito da situação. São
exemplos: enfermidades, paralisia transitória dos membros, idade
avançada, desmaios, embriaguez, hipnose (ESTEFAM, 2009, p.61-62).

Destarde, são vulneráveis as pessoas que são incapazes de conferir


consentimento à prática sexual, pois não possuem discernimento para isso. Como
dito, constam do título de vulnerável: as pessoas com idade inferior a 14 anos, as
que tenham deficiência mental ou as que devido ao uso de alguma substância tem
sua capacidade de discernimento diminuída. Todavia, para a proposta que se
pretende nesse trabalho, serão objetos de destaque no estudo as vítimas menores
de 14 anos de idade.
O estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A do Código Penal consiste em
“ter conjunção carnal ou praticar ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos”
(BRASIL, 1940).
17

Portanto, o sujeito ativo do crime de estupro de vulnerável pode ser qualquer


pessoa, homem, mulher ou transgêneros, inclusive do mesmo sexo que a vítima, o
sujeito passivo pode ser qualquer pessoa que se encaixe nas condições
especificadas no artigo 217-A que estabelecem a vulnerabilidade. O bem jurídico
tutelado é a dignidade sexual dos vulneráveis prezando pela proteção da sua
integridade, como afirma Estefam (2009, p.58) o intuito é possibilitar às pessoas um
livre desenvolvimento da personalidade no âmbito sexual, fazendo com que tenha
um crescimento saudável e equilibrado em relação ao respectivo tema.
A pena para o crime tipificado no artigo 217-A do Código Penal é bastante
severa, tendo como elemento subjetivo o dolo específico, a pena é a de reclusão de
8 (oito) a 15 (quinze) anos, admitindo-se duas formas qualificadas sejam elas as
previstas nos parágrafos 3° e 4° do dispositivo: “§ 3º Se da conduta resulta lesão
corporal de natureza grave: Pena reclusão de 10(dez) a 20(vinte) anos; § 4º Se da
conduta resulta morte: Pena – reclusão de 12 (doze) a 30 (trinta) anos” (BRASIL,
1940), a severidade na punição pode até mesmo advir da Constituição, a qual prevê
que a violência sexual contra crianças e adolescentes será severamente coibida.
(BRASIL, 1988) Além de, por fim, ser considerado crime hediondo, conforme artigo
1°, inciso VI, da Lei n° 8.072 de 1990 (BRASIL, 1990).
O foco do legislador é na proteção do “mais fraco”, merecendo esses uma
proteção diferenciada, com o intuito de resguardar sua dignidade sexual,
preocupando-se em proporcionar um saudável desenvolver, para que tenha uma
vida digna e sem traumas psicológicos (OLIVEIRA, 2010, s/p).
A ação penal para o crime de estupro de vulnerável segue os termos do
parágrafo único do artigo 225 do Código Penal, sendo ação penal de iniciativa
pública, incondicionada, por ser a vítima pessoa vulnerável. Deste modo,
resguardando ainda mais o vulnerável.
Muito se discutia sobre a presunção de violência no estupro de vulnerável, se
seria ela relativa ou absoluta, fazendo com que cada julgador decidisse através do
uso de critérios subjetivos, se a vítima teria ou não proteção estatal, além de abrir
uma série de opções para a defesa do acusado, que poderia alegar a ausência de
violência devido ao consentimento da vítima para o ato sexual. Porém, em 2015 a
jurisprudência foi pacificada, ficando definido que a presunção de violência para o
crime tipificado no artigo 217-A do Código Penal é absoluta, sendo irrelevante o
consentimento ou experiência anterior da vítima para a tipificação do delito,
18

conforme voto que seguiu de forma unânime na 3° Seção do Superior Tribunal de


Justiça o relator Ministro Rogério Schietti defendeu:

Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art.


217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal
ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O
consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a
existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não
afastam a ocorrência do crime (BRASIL, 2015, p.37).

Apesar de o tema ter sido pacificado, o debate doutrinário se mantém


acirrado. De um lado os que concordam com a decisão e defendem a presunção
absoluta, e do outro, os que defendem a relativização da vulnerabilidade daquelas
vítimas que se encontram com idade de 12 ou 13 anos, argumentando que a lei tem
que acompanhar o avanço da sociedade, na qual o acesso a informação está
disponível e a educação sexual sendo ministrada nas escolas, concluindo que
adolescentes com 12 anos de idade ou mais têm conhecimento e discernimento dos
assuntos relacionados à sexualidade.
Nesse sentido, Nucci leciona:

[...] o legislador, na área penal, continua retrógado e incapaz de


acompanhar as mudanças de comportamento reais na sociedade brasileira,
inclusive no campo da definição de criança ou adolescente. [...] A tutela do
direito penal, no campo dos crimes sexuais, deve ser absoluta, quando se
tratar de criança (menor de 12 anos), mas relativa ao cuidar do adolescente
(maior de 12 anos). Desse modo, continuamos a sustentar ser viável a
capacidade de consentimento de quem possua 12 ou 13 anos, no contexto
do estupro de vulnerável (NUCCI, 2016, p.878).

Sem dúvidas, este ainda será tema de uma série de debates doutrinários,
pois muitos questionam o grau de vulnerabilidade dos que possuem entre 12 e 14
anos de idade, sendo que ao analisar as normas presentes no Estatuto da Criança e
do Adolescente, verifica-se que reconhecem a relativa capacidade de discernimento
para os adolescentes (maiores de 12 anos de idade), no momento em que prevêem
a imposição de sanções como as medidas socioeducativas.
Todavia, sendo a favor ou não, a jurisprudência está unificada e clara, na
ocorrência de estupro com vítima menor de 14 anos de idade, a presunção de
violência é absoluta, sem possibilidade de discussão sobre o consentimento da
vítima, pois sua anuência é inválida.
19

Faz-se mister mencionar a evolução dos direitos da criança e do adolescente,


visto que não havia diferenciação no tratamento dos mesmos em relação aos
adultos. A primeira legislação foi o Código de Menores de 1927, que se referia as
crianças e adolescentes com o termo “menor”. Tal legislação previa a possibilidade
de julgamento dos “menores” por cometimento de infrações com caráter de
irregularidades, estabelecendo procedimentos psicopedagógicos a fim de erradicar
os problemas oriundos da delinquência e abandono, porém não havia menção que
indicasse atenção e cuidado especial aos mesmos (CUSTÓDIO, 2009, p.16-17).
Este padrão que se estendeu até 1941, ocasião em que surgiu o Serviço de
Assistência a Menores (SAM), com o intuito da prestação de assistência social aos
“menores institucionalizados”, todavia somente reforçou-se o cunho punitivo e
repressor perante estes (CUSTÓDIO, 2009, p.17).
Após, surgiu a Doutrina da Situação Irregular do Menor, instituída pela Lei n°
6.697 de 1979, na qual começaram a surgir os interesses da criança, desenvolvendo
o que hoje se conhece por princípio do melhor interesse, objetivando assegurar
assistência, proteção e vigilância as crianças e adolescentes, porém tal código era
mais tendente ao cunho de repreensão de “menores” em situações irregulares.
(CUSTÓDIO, 2014, p.121).
Depois foi criada a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança de
1989, que influenciou positivamente o ordenamento jurídico brasileiro. Através dela o
Brasil adotou na Constituição de 1988 a “Doutrina da Proteção Integral”, consagrada
em seu artigo 227, que dá cuidado e proteção especial à criança e ao adolescente
considerando sua vulnerabilidade (BRASIL, 1988).
A respeito da Proteção Integral assegurada de direito às crianças e
adolescentes:

Significa que, além de todos os direitos assegurados aos adultos, afora


todas as garantias colocadas à disposição dos maiores de 18 anos, as
crianças e os adolescentes disporão de um plus, simbolizado pela completa
e indisponível tutela estatal para lhes afirmar a vida digna e próspera, ao
menos durante a fase de seu amadurecimento. [...] Aliás, a Constituição
Federal esmera-se na previsão de dispositivos que contemplem os direitos e
as garantias fundamentais da criança e do adolescente, buscando a
efetividade da denominada proteção integral (NUCCI, 2017, p. 4).

Nasce então, com a Doutrina da Proteção Integral, o Direito da Criança,


procurando proteger e impulsionar a cidadania desses, como sujeitos de direito
20

sendo que violados alguns desses direitos, a família, sociedade e Estado, ficam com
o dever de recompô-los, pois “a proteção, com prioridade absoluta, não é mais
obrigação exclusiva da família e do Estado: é um dever social” (PEREIRA, 2000,
p.14). Atenta-se ao tratamento especial a essas pessoas, por encontrar-se em fase
peculiar de desenvolvimento.
É notória a grande preocupação que se dá ao saudável desenvolver da
criança e do adolescente, o Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe em seu
artigo 17 sobre o direito ao respeito, o qual consiste na preservação da integridade
física e psíquica da criança e do adolescente, levando em conta a fase de
desenvolvimento em que se encontram (BRASIL, 1990).

A ideia central da proteção integral à criança e ao adolescente foi capaz de


articular uma teoria própria em determinado momento histórico, porque
conseguiu, ao mesmo tempo, conjugar necessidades sociais prementes aos
elementos complexos que envolveram mudança de valores, princípios e
regras, e, neste contexto, conviver com a perspectiva emancipadora do
reconhecimento dos direitos fundamentais à criança e ao adolescente
(CUSTÓDIO, 2009, p.30).

Além disso, a própria Constituição Federal que é a Lei Maior, ampara e dá


proteção rígida à pessoa vulnerável, conforme previsto em seu artigo 227, que dá
prioridade absoluta aos direitos destinados à criança e ao adolescente, assim como
atribui responsabilidade a todos de protegê-los e mantê-los a salvo de qualquer ato
de violência. Ainda, o § 4º do referido dispositivo prevê uma punição severa para os
que violarem de alguma forma a dignidade sexual das crianças e adolescentes
(BRASIL, 1988).
O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 2° faz a distinção entre
criança (pessoas menores de 12 anos) e adolescentes (pessoas com idade entre 12
e 18 anos) (BRASIL, 1990). Para o Código Penal, foi definido que a criança e
adolescente menor de 14 anos de idade devem ter a total proteção penal contra os
crimes sexuais, por não terem o desenvolvimento adequado para consentir em atos
sexuais.
Portanto, como visto anteriormente, a presunção de violência nos casos de
prática sexual com menores de 14 anos de idade é absoluta, não se podendo falar
em consentimento, pois conforme entendimento do legislador, nessa faixa etária a
pessoa está em fase de desenvolvimento psicológico, biológico e moral, por isso, ao
dispor proteção integral nesses casos, procura-se “assegurar a evolução e o
21

desenvolvimento normal de sua personalidade, para que, na fase adulta, possa


decidir conscientemente, e sem traumas psicológicos, seu comportamento sexual”
(BITENCOURT, 2017, p.101).
Ao analisar o artigo 15 do Estatuto da Criança e do Adolescente, percebe-se
que o princípio da dignidade da pessoa humana compreende especificamente as
crianças como indivíduos em processo de desenvolvimento, violar sua dignidade e
integridade é grave, pois essa conduta pode afetar negativamente o progresso
emocional da criança ou adolescente. O referido dispositivo também alude direito à
liberdade e ao respeito, esse último já analisado anteriormente.
No que tange a liberdade, é de entendimento de Cústodio:

Falar em liberdade de crianças e adolescentes na sociedade contemporâ-


nea possibilita reafirmar um desafio eminente de reconhecê-los como
sujeitos históricos aos quais se deve garantir o exercício e a ampliação de
suas liberdades substantivas. Liberdade não implica necessariamente a
satisfação plena dos desejos, mas estabelecer um espectro de proteção
capaz de garantir o desenvolvimento integral do sujeito como detentor de
sua própria história, valores e cultura. Isso implica o repensar das práticas
históricas de vigilância e controle sobre a infância, e também reafirmar que,
para o exercício da liberdade, requer-se a plena garantia do acesso às
oportunidades igualitárias e justas. (CUSTÓDIO, 2009, p.48)

O Estatuto da Criança e do Adolescente ainda em seu artigo 18 dispõe que “é


dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo
de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou
constrangedor” (BRASIL, 1990), portanto, prezar pela dignidade da criança e do
adolescente é dever atribuído a todos, seja família, Estado, ou qualquer indivíduo da
sociedade.
Porém, mesmo com toda essa proteção atribuída pela lei aos vulneráveis, os
dados estatísticos referentes ao estupro no Brasil, revelam que a teoria não está
sendo colocada em prática. De acordo com o levantamento feito pelo Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), tendo como base dados de 2011 do Sistema
de Informações de Agravo de Notificação do Ministério da Saúde ( Sinan), revelou
que 70% das vítimas de estupro no Brasil são crianças e adolescentes, e em 50%
dessas ocorrências há um histórico de estupros anteriores (IPEA, 2014).
A mesma pesquisa mostrou que 24,1% dos agressores das crianças são os
pais ou padrastos e 32,2% são amigos ou conhecidos da vítima, evidenciando que a
principal ameaça encontra-se dentro do próprio lar.
22

A pesquisa aponta que:

Tal dado é absolutamente alarmante, uma vez que as consequências, em


termos psicológicos, para esses garotos e garotas são devastadoras, uma
vez que o processo de formação da autoestima - que se dá exatamente
nessa fase - estará comprometido, ocasionando inúmeras vicissitudes nos
relacionamentos sociais desses indivíduos (IPEA, 2014).

Nesses casos, os abusos são chamados intrafamiliares, nos quais as pessoas


que desempenham a função e dever de cuidado são os maiores violadores da
dignidade sexual da criança ou adolescente. Consequentemente, por mais que a
violência sexual mais noticiada seja a que ocorre fora do lar, a maior fonte de
violência são as que ocorrem dentro do ambiente familiar. Como destaca Dias (2008,
s/p) “É preciso que todos se dêem conta de que este é o crime mais hediondo que
existe, pois tem origem em uma relação afetiva e gera como consequência a morte
afetiva da vítima”. A criança abusada por algum membro da família vê derrubada
toda a concepção de instituição familiar, rompendo a relação afetiva.
O abuso sexual intrafamiliar, quando não ocorre no lar, pode acontecer em
ambientes, como a escola, a residência de vizinhos, a igreja, entre outros. Pessoas
do convívio da vítima e sua família, ao conquistar sua confiança, usam disso para se
aproximar da criança, dando atenção e carinho especial a fim de criar um laço
afetivo e possibilitar uma situação oportuna para abusar da criança
Constata-se que além da lesão física e psíquica, um dos maiores obstáculos
nesses casos, está no medo da vítima em denunciar o agressor diante do fato de
conviver diretamente com ele, de correr o risco de ser desacreditada e
consequentemente castigada pela família diante da “mentira”, pela ausência de
credibilidade no sistema jurídico e o sentimento de culpa por não ter conseguido
evitar o ato. Esse conjunto de fatores acaba estabelecendo automaticamente um
acordo de silêncio entre vítima e agressor (SILVA, 2012).
Dessa forma, considerando a fase de desenvolvimento psicológico em que se
encontram as crianças e adolescentes, estes são incapazes de oferecer qualquer
forma de consentimento ao agressor. Razão pela qual por diversas vezes a vítima
acaba aceitando o fato, por não ter o real conhecimento referente aos prejuízos que
pode originar, tendo a crença de que está fazendo o certo, haja vista a confiança
que tem na pessoa mais velha. Igualmente, pela ocorrência de ameaças feita por
este, referentes à vida da criança ou de seus familiares, ocasionando o silêncio
23

como modo de proteção a si e a estes, o que permite que o abuso se prolongue no


tempo.
A criança ou adolescente sofre um grande abalo emocional, acabando por
causar uma confusão em sua cabeça, fazendo com que não seja mais capaz de
identificar a real função do pai e da mãe. Tendo como consequência o sentimento de
desrespeito, falta de proteção e amparo, e a culpa, na qual a criança se julga
responsável pelos abusos.

O segredo é mantido pela criança a um alto preço, que coloca em risco seu
desenvolvimento psicossocial, bem-estar, qualidade de vida e segurança.
As ameaças sofridas geralmente versam sobre a vida ou a integridade física
da própria criança ou de pessoas próximas e queridas e a vítima, ao tentar
proteger a si mesma e a seus familiares, acaba por ser submetida a mais e
mais situações abusivas, até que o ciclo se rompa com a revelação
(HABIGZANG, KOLLER & cls., 2012, p.57).

Este é um dos motivos que impossibilitam as denúncias e o andamento dos


processos judiciais, pois há uma relutância por parte da família da vítima em aceitar
que seja verdade que a pessoa próxima, membro da família, teria capacidade de
cometer um ato abusivo.
Em relação aos danos decorrentes da violência sexual intrafamiliar contra
crianças e adolescentes:

Os danos causados pela violência sexual às crianças e aos adolescentes


vitimizados repercutem de modo global no desenvolvimento e bem-estar
das vítimas. Os agravos à saúde física, decorrentes da violência praticada,
envolvem lacerações anogenitais, doenças sexualmente transmissíveis,
gravidez etc., e, com frequência, demandam tratamentos
diversos.15 Entretanto, os danos que interferem no desenvolvimento
psicossocial e na estruturação da personalidade da vítima são mais
frequentes e podem repercutir ao longo de sua vida.
São efeitos iniciais negativos da violência sexual, como reações emocionais
e autopercepção: medo excessivo, inibição, depressão, agressividade,
comportamento antissocial, distúrbio de comportamento, raiva, hostilidade,
autoagressão, sentimentos de inferioridade e autodesvalorização. São
efeitos na sexualidade, também relatados em diversos estudos: alterações
no comportamento sexual (SILVA; FERRIANI; SILVA, 2012, s/p).

Cumpre ressaltar a importância de se manter um diálogo entre a família, para


a obtenção de uma relação de confiança. Dessa forma, a vítima do abuso, sentir-se-
ia segura e confiante para encorajar-se a fazer a revelação, que pode ser à mãe, pai
ou outro familiar. Assim como se torna importante que se esteja sempre atento aos
24

comportamentos de crianças e adolescentes, pois estes podem expor os sintomas


que indicam o abuso sexual.
Essas situações são bastante delicadas, porém, estabelecer uma relação de
confiança entre membros familiares e dar atenção especial ao comportamento da
criança, seriam de alguma forma, um início esperançoso para se romper o ciclo
abusivo. Em relação a denúncia, dispõe a cartilha da campanha contra o abuso
sexual e pedofilia:

Sabemos perfeitamente que é somente denunciando que poderemos


combater o problema, pois a omissão, além de permitir a continuidade do
abuso e a impunidade do abusador, favorece a perpetuação dos crimes e
produz vítimas com perturbações de toda ordem, que futuramente haverão
de possuir e acarretar mais problemas para toda a sociedade (CORRÊA,
p.6).

Porém, quando o obstáculo da denúncia é ultrapassado, o próximo entrave


está nos meios para comprovação da ocorrência do abuso sexual, entre os quais
podemos elencar: a) prova testemunhal, a qual possibilita a comprovação do delito
através de relatos de testemunhas; b) prova documental viabilizada por meio de
registros com fotografias gravações, entre outros; c) confissão na qual o acusado
reconhece a autoria dos fatos, embora nos casos de abuso intrafamiliar a tendência
ser de negação do acusado; d) Inspeção consiste na verificação direta da “cena do
delito” a fim de conseguir coletar evidências como fotografias, vestígios de sêmen,
dentre outros elementos probatórios. Porém, quando a vítima fala sobre o abuso o
momento de ocorrência do mesmo já se passou há muito tempo; e) prova pericial
realizada por um perito oficial, tem a finalidade de esclarecer fatos de maneira
científica e técnica (MORALES; SCHRAMM, 2002, p.268-269).
Contudo, ao analisar a forma de ocorrência do estupro nos casos contra
vulnerável, principalmente contra crianças, o fato dificilmente é presenciado por uma
testemunha, e não é frequente haver penetração. Dessa forma, quando o resultado
do laudo do exame de corpo e delito é negativo, a família tende a reconsiderar.
Todavia, para ocorrer crime de estupro, não é preciso ocorrer penetração, atos
libidinosos como o contato com partes íntimas, manusear mãos de maneira erótica,
masturbação, entre outros, também caracterizam estupro, conforme previsto em lei.
Mas quando não há provas convincentes é mais fácil deduzir que não aconteceu o
abuso sexual contra o menor de idade sendo que essas dificuldades na
25

comprovação conduzem a impunidade e um possível agravamento do abuso sexual


(MORALES; SCHRAMM, 2002, p.269).
Visto que estes crimes possuem determinadas peculiaridades, pois como
exposto anteriormente, dificilmente deixam sinais, na maioria das vezes a única
prova que se tem é o depoimento da vítima. Dito isso, um ponto que se faz
relevante, é a forma como é feita a inquirição dessa vítima, pois se cumprida de
forma inadequada, trará mais danos.
Cumpre ressaltar que além dos danos imediatos resultantes do abuso em si,
há os danos secundários, mais conhecidos por revitimização, que compreende a
traumatização subsidiária pelo processo em âmbito familiar, interdisciplinar,
individual, e pela estigmatização social, decorrentes da intervenção inapropriada
relacionada com o modo de escuta das vítimas, por parte do atendimento dos
operadores jurídicos.
No procedimento tradicional de inquirição, a criança presencia todas as
discussões, exposta a um ambiente formal e solene, há o encontro da vítima com o
réu, a criança tem de repetir o depoimento várias vezes no processo, o que refere
ser um procedimento carente de eficácia para a finalidade almejada, pois faz com
que as vítimas sejam revitimizadas no momento em que são levadas a recordar o
ocorrido. Nesse sentido, a Childhood Brasil pondera:

O desconforto e o estresse psicológico que crianças e adolescentes vítimas


de violência sexual sofrem durante a oitiva no sistema processual vigente,
em grande medida decorrentes de um emanharado de sentimentos e
complexos, reiteradas vezes contraditórios, de medo, vergonha, raiva, dor e
ressentimento, têm sua origem, em grande medida, em uma cultura
adultocêntrica e formalista das práticas judiciais tradicionais. Esse
desconforto, por sua vez, está na base da dificuldade que crianças e
adolescentes experimentam ao prestar e sustentar seus depoimentos
durante as várias fases da investigação. A dificuldade de obtenção de
provas consistentes é parcialmente responsável pelos baixos índices de
responsabilização de pessoas que cometem violência sexual contra
crianças e adolescentes. Dessa maneira, o desconforto, o estresse
psicológico e o medo que crianças e adolescentes sentem ao depor em
processos judiciais, conectam-se com a impunidade (GOODMAN, 2008, p.
13).

Diante disso, com o objetivo de reduzir os danos, buscou-se outras


possibilidades de métodos para a inquirição dessas vítimas, dentre essas
possibilidades encontra-se o “depoimento especial”, antes denominado “depoimento
sem dano”, idealizado pelo Desembargador José Antônio Daltoé Cezar. Esse
26

método consiste em uma nova técnica de oitiva de crianças e adolescentes na


esfera jurídica, tendo como finalidade disponibilizar um espaço mais acolhedor ao
depoente o qual respeite sua privacidade e, especialmente, reduzir a revitimização
da criança ou adolescente.
O método conta com a atuação de uma equipe integrada de assistentes
sociais, psicólogos, e outros profissionais especializados em técnica de entrevista
forense. O ambiente consiste em uma sala reservada, com recursos tecnológicos de
vídeo e áudio, grande parte dos tribunais usa a videoconferência com transmissão
em tempo real para a sala de audiências. O magistrado por telefone/microfone,
realiza os questionamentos ao profissional que está entrevistando a criança, e este
adapta a pergunta antes de fazê-la a criança, utilizando técnicas de modo a garantir
“respostas fidedignas” e preservar o emocional da criança ou adolescente (CNJ,
2015).
Em 04 de abril de 2017, foi sancionada a lei n° 13.431/2017 que determina o
sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de
violência, alterando a Lei n° 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), e
tornando obrigatória a adoção do depoimento especial para todo o país.
Portanto, compreende-se como um avanço positivo, devido à gravidade da
questão do abuso sexual contra crianças e adolescentes. É provável que isso não
interfira muito nos números de incidências desses repugnantes atos. Todavia,
quanto mais sejam desenvolvidos métodos que pelo menos consigam reduzir os
danos causados as crianças e adolescentes vítimas, mais se acharão meios para
elucidação desse entrave.
27

3 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO


GRANDE DO SUL

Verifica-se que referente aos crimes contra a dignidade sexual, tratados com
certa severidade pelo legislador, principalmente no que tange as vítimas vulneráveis,
inúmeras são as particularidades que devem ser objeto de minuciosa análise, de
modo que a repreensão prevista para a ofensa ao bem jurídico tutelado, não acabe
se tornando mais prejudicial, frente à incoerência de um caso concreto peculiar.
Dessa forma, diante de casos em que o agente comete o crime, não sabendo
estar cometendo, pois as circunstâncias do fato o levaram a incidir em erro sobre
elementos do tipo. Faz-se mister nesse capítulo, aprofundar os estudos acerca da
teoria do tipo, assim como analisar casos concretos de estupro de vulnerável contra
crianças e adolescentes oriundos da jurisprudência a fim de comparar os diferentes
entendimentos e técnicas proferidos nas decisões, afim de estabelecer os
parâmetros decisórios.

3.1 RECONHECIMENTO DO ERRO DE TIPO NO CRIME DE ESTUPRO DE


VULNERÁVEL

Erro é a noção falsa sobre alguma coisa ou pessoa, um engano. O erro de


tipo reflete sobre as elementares constitutivas da figura típica, é a falsa
representação de qualquer dessas elementares, sendo importante que o objeto do
erro integre a estrutura do tipo penal (BITENCOURT, 2013, p.150), ocorre no
momento em que o agente comete conduta considerada como crime, mas não sabe
disso, e por uma falsa percepção da realidade acaba incidindo em erro sobre o
elemento que constitui o tipo. Um exemplo bastante usado na doutrina para ilustrar
esse conceito, é o do caçador que dispara projétil contra outra pessoa, por acreditar
que fosse um animal, ocorrendo a ausência de percepção da realidade.

Em outras palavras, considerando que o conhecimento de todos os


componentes objetivos do tipo é o que configura o elemento intelectual do
tipo subjetivo doloso (esse conhecimento dos elementos objetivos do tipo é
requisito para a existência do dolo), em não havendo esse conhecimento
pelo agente, inexistirá o elemento intelectual do tipo, culminando em uma
atipicidade, portanto (PACELLI; CALLEGARI, 2017, p. 305).
28

Há duas formas de erro de tipo: erro de tipo essencial e erro de tipo acidental.
O erro de tipo essencial recai sobre os elementos indispensáveis para a ocorrência
do delito, o agente opera com a ausência do elemento intelectual do dolo,
acarretando a exclusão do mesmo. Impossibilita o agente de compreender o cunho
incriminador no fato ou na circunstância. O erro de tipo essencial divide-se em
invencível ou vencível. O erro invencível é o erro inevitável de modo que a conduta
do agente ocorreu quando não se poderia evitar, não agindo dolosa ou
culposamente. Dessa forma, o erro invencível exclui o dolo e a culpa. Já no erro
vencível ao contrário do anterior, a conduta do agente poderia ter sido evitada se
agisse com o devido cuidado, provando-se que “o homem médio, colocado diante da
mesma situação, não erraria” (PACELLI; CALLEGARI, 2017, p. 306). O erro vencível
exclui o dolo, mas não exclui a culpa se o crime culposo estiver previsto em lei.

Em qualquer caso, o erro de tipo significa defeito de conhecimento do tipo


legal e, assim, exclui o dolo, porque uma representação ausente ou
incompleta não pode informar o dolo de tipo. Mas é preciso distinguir: o erro
inevitável exclui o dolo e a imprudência; o erro evitável exclui apenas o dolo,
admitindo punição por imprudência (SANTOS, 2014, p. 145).

O erro de tipo acidental reflete sobre o objeto material, sobre a pessoa, no


modo de execução. a) O erro recai sobre o objeto no momento em que o agente
acredita que sua conduta reflete sobre certa coisa, mas na verdade ela recai sobre
outra; b) o erro sobre a pessoa ocorre quando o agente opera a conduta atingindo
uma pessoa acreditando ser a que intencionava lesionar. O erro sobre a pessoa está
previsto no artigo 20, § 3º, do Código Penal o qual dispõe que não se excluirá a
tipicidade do fato; c) o erro na execução acontece no momento em que objetivando
atingir a pessoa desejada, erra no momento da execução e acaba atingindo um
terceiro; d) resultado diverso do pretendido: o agente pretende atingir certo bem
jurídico, mas acaba atingindo outro.
Para um melhor entendimento da teoria do erro, torna-se necessário um
estudo breve sobre o erro de proibição, assim como diferenciá-lo do erro de tipo.
Antes da reforma penal de 1984, que trouxe a denominação erro de tipo e
erro de proibição, falava-se em erro de fato que recaia sobre a situação fática o que
condiz com o atual erro de tipo, e erro de direito que recaia do tipo penal, da
proibição do comportamento, hoje dito como erro de proibição.
29

O erro de proibição consiste no erro sobre a ilicitude do ato, o agente sabe o


que faz, mas desconhece que o seu comportamento contraria o direito. O erro de
proibição está previsto no artigo 21 do Código Penal que prevê: “O desconhecimento
da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se
evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço” (BRASIL, 1940). Portanto, é a
exceção do princípio que refere que ninguém pode alegar o desconhecimento da lei.

Erro de proibição, por sua vez, é o que incide sobre a ilicitude de um


comportamento. O agente supõe, por erro, ser lícita a sua conduta. O objeto
do erro não é, pois, nem a lei, nem o fato, mas a ilicitude, isto é, a
contrariedade do fato em relação à lei. O agente supõe permitida uma
conduta proibida. Faz um juízo equivocado daquilo que lhe é permitido fazer
em sociedade (BITENCOURT, 2013, p.152).

O erro de proibição classifica-se em direto, indireto e mandamental. O erro de


proibição direto refere sobre o comportamento, o indivíduo acredita realmente que
seu ato é lícito, trata-se, desse modo, de crime comissivo, pois não conhece a lei
que proíbe ou não a conhece bem. No erro de proibição indireto o agente sabe que
a conduta é ilícita, porém supõe a existência de uma “proposição permissiva”,
alguma excludente de ilicitude. Um exemplo seria o agente agir supondo legítima
defesa. O erro mandamental sucede nos crimes omissivos, reflete sobre norma
mandamental, imperativa, um exemplo é a omissão de socorro, no qual o agente crê
erroneamente que prestar o socorro lhe traria riscos, quando estes inexistem
(BITENCOURT, 2013, p. 165-167).
Uma das principais diferenças entre erro de tipo e erro de proibição, é que o
erro de tipo como já mencionado anteriormente, é o que recai sobre elementos
objetivos que fazem parte da figura típica, sobre os requisitos de fato de uma
circunstância justificadora. Já no erro de proibição o agente não erra sobre o fato
que realiza, mas crê de forma errônea que o mesmo é lícito, quando a falta de
conhecimento sobre a ilicitude do fato tenha justificação.
Outra diferença é que o erro de tipo exclui o dolo e o delito, salvo se previsto
ser punível a título de culpa. O erro de proibição não exclui o dolo nem o delito, mas
exclui a culpabilidade e por consequência, a sanção penal.
O dolo refere-se à consciência sobre um ato e seu resultado e o desejo
consciente de praticar uma conduta e obtê-lo. No crime de estupro o dolo genérico
consta na vontade de constranger. O dolo específico consiste do intuito de adquirir
30

benefícios ou “favores sexuais”, sendo necessária a intenção do agente para


caracterizar o delito (MARCÃO, 2015, p.183).
Para a caracterização do crime, o dolo é essencial, na sua ausência tem-se a
possibilidade de alegação sobre erro de tipo, trazendo atipicidade para o fato e
exclusão do delito.
O erro de tipo conforme previsto no artigo 20 do Código Penal pode excluir o
dolo (BRASIL, 1940), no qual o agente que comete o crime intencionalmente (dolo)
conhece os elementos que constituem o tipo e tem a vontade de praticar o fato tido
pela lei como crime. No caso do delito em análise o indivíduo deverá
obrigatoriamente conhecer a idade (menor de 14 anos) da vítima, e no caso de
dúvida sobre a idade da pessoa ofendida permanece a tipicidade do delito por dolo
eventual.
Nos casos de crime de estupro de vulnerável, o erro de tipo ocorre quando o
agente tem relação sexual com pessoa menor de 14 anos de idade, não tendo
conhecimento de sua idade, acreditando que tenha certa maturidade, devido á
compleição física precocemente desenvolvida da mesma, assim como seu
comportamento, bem como outros indícios (identificação ou local em que se
encontra).

Em outras palavras, ter-se-á́ a falsa ideação da realidade, motivada pela


errada compreensão da situação fática. Se um rapaz pratica ato libidinoso
com uma adolescente de 13 anos, que conheceu em local onde só́ se
permitia o ingresso de maiores, tendo ela omitido sua verdadeira idade e se
mostrado desinibida sexualmente, o autor não terá́ cometido crime algum ao
realizar com ela, consensualmente, atos libidinosos, pois o equívoco quanto
à idade exclui o dolo do agente [...] (ESTEFAM, 2009, p.62).

Torna-se interessante ilustrar esse raciocínio com o julgado do Habeas


Corpus n° 73.662-9 de 1996, relator Ministro Marco Aurélio:

Nos nossos dias não há crianças, mas moças de doze anos. Precocemente
amadurecidas, a maioria delas já conta com discernimento bastante para
reagir ante eventuais adversidades, ainda que não possua escala de
valores definida a ponto de vislumbrarem toda a sorte de consequências
que lhes pode advir. Tal lucidez é que de fato só virá com o tempo, ainda
que o massacre da massificação da notícia, imposto por uma mídia que se
pretende onisciente e muitas vezes sabe-se irresponsável diante do papel
social que lhe cumpre, leve à precipitação de acontecimentos que só são
bem-vindos com o tempo, esse amigo inseparável da sabedoria (BRASIL,
1996).
31

Nestes casos, em que a falsa percepção da idade da vítima, ocasiona o


cometimento pelo agente da conduta típica, a doutrina e a jurisprudência entendem
que não houve dolo, pois o agente incidiu em erro sobre elementar do tipo penal
(idade da vítima), portanto não havendo dolo não há tipicidade, não podendo o
acusado ser condenado.

3.2 ANÁLISE DAS DECISÕES ACERCA DO ESTUPRO DE VULNERÁVEL E DO


ERRO DE TIPO NOS ANOS DE 2015 – 2017 NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO
GRANDE DO SUL

Em face a questão problema ora apresentada, neste momento dedica-se os


estudos a análise da pesquisa realizada na jurisprudência do Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Sul, quanto aos casos em que foi acolhido o erro de tipo no crime de
estupro de vulnerável contra menor de 14 anos de idade, no período dos anos de
2015 a 2017, analisando quais os parâmetros utilizados para a decisão a partir de
então.
Como já dito anteriormente neste trabalho, acirradas foram as discussões
referente ao consentimento da vítima menor de 14 anos de idade para a prática de
atos sexuais, sobre a presunção de violência se relativa ou absoluta. Apesar de
causar hesitação de algumas pessoas, a realidade é que não são incomuns os
casos que menores de 14 anos tem relacionamentos amorosos estáveis.
O caso que foi examinado na decisão do Superior Tribunal de Justiça, que
unificou a jurisprudência em relação a essa discussão, consistia em recurso
repetitivo (RESP 1.480.881/PI), referente à uma relação amorosa, que deu início
quando a vítima tinha 8 anos de idade e o acusado 21 anos de idade, que era amigo
de confiança da família. A vítima contou em seu depoimento que mantinha um
relacionamento amoroso com o acusado desde os seus 8 anos de idade, que
quando começaram eram somente beijos e abraços, e quando a vítima tinha 11
anos de idade é que tiveram a primeira relação sexual. Disse ainda que manteve
várias vezes relação sexual com o acusado, mas que nunca sem sua vontade. O
próprio acusado admitiu a ocorrência dessas relações.
Como alhures apontado, a divergência na doutrina está nesse âmbito, de
relação sexual com consentimento da vítima menor de 14 anos de idade.
32

Posto que semelhante posicionamento dos tribunais superiores, como dito,


nem sempre se tenha mostrado unívoco e talvez até pudesse suscitar
alguma dúvida a quem julgou a questão quando ainda vigente o texto do art.
224 do Código Penal – que cuidava da presunção de violência nos "crimes
contra os costumes" – as alterações legislativas incorporadas pela Lei nº
12.015/09 ao TÍTULO VI – DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE
SEXUAL, especialmente ao seu CAPÍTULO II – DOS CRIMES SEXUAIS
CONTRA VULNERÁVEL, do Código Penal, não mais permitem qualquer
dúvida razoável quanto à irrelevância, para fins de aperfeiçoamento do
tipo penal inscrito no art. 217-A, caput, do Código Penal, de eventual
consentimento da vítima ao ato libidinoso, sua anterior experiência
sexual ou a existência de relacionamento amoroso entre ela e o agente
(grifo do autor) (BRASIL, 2015, p. 16).

Dessa forma, mesmo que o relacionamento com menor de 14 anos de idade


seja com o consentimento desse, de conhecimento de sua família, e ainda se a
vítima já tivesse anterior experiência sexual, nenhuma dessas hipóteses é capaz de
afastar o tipo penal trazido pela Lei n° 12.015/09, no artigo 217-A do Código Penal.
Portanto, em relação a discussão em torno da presunção de violência absoluta ou
relativa, “criando um tipo penal autônomo, do qual não consta o elemento
constranger, aparentemente elimina a dúvida sobre ser necessário o dissenso do
vulnerável” (MARCÃO, 2015, p. 192).
O acórdão cujo recurso objetificou essa decisão de uniformização, utilizou-se
de uma fundamentação focada no “grau de discernimento” da vítima, alegando que
esta não se encontrava em situação de vulnerabilidade, tendo consciência da
situação que se passava, assim como argumentando que ela consentiu de maneira
válida com o ato sexual, tornando clara sua vontade.
Observa-se que a decisão seguiu idealizando “um padrão de comportamento
tipicamente patriarcal, amiúde observado em crimes dessa natureza, nos quais o
julgamento recai sobre a vítima da ação delitiva para, a partir daí, julgar-se o réu”
(BRASIL, 2015, p.17). Dessa forma, recuperam-se os argumentos “antigos”, que
voltam a culpabilizar a vítima, a partir do momento em que o foco das investigações
iniciam-se no comportamento da vítima.

Corriqueiro, assim, o uso de qualificativos ou etiquetas ao comportamento


das crianças, de modo a desviar a análise da conduta criminosa ou a
justificá-la. Expressões como “amadurecimento sexual da adolescente”,
“experiência sexual pretérita da vítima” ou mesmo a utilização das
expressões “criança prostituta” ou “criança sedutora” ainda frequentam o
discurso jurisprudencial, como se o reconhecimento de tais circunstâncias
33

em alguma medida justificasse os crimes sexuais perpetrados (BRASIL,


2015, p.17).

Vale ressaltar que a vítima à época dos fatos possuía apenas 8 (oito) anos de
idade, sendo que nesse momento não praticaram ato sexual, apenas trocaram
“beijos e abraços”, porém, esses atos podem ser considerados atos libidinosos, que
como já tratado nesse trabalho, também caracterizam o crime de estupro de
vulnerável. Além do que, com oito anos idade (considerada criança pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente), falar em consentimento e discernimento é ignorar ao
máximo a conduta do réu (BRASIL, 2015, p.19).
Apesar da existência de grandes divergências pela parte da doutrina e
jurisprudência, o Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo pacificou seu
posicionamento, e por fim propôs, conforme conclusões que se extraiu do
julgamento sob exame a seguinte tese:

Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art.


217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal
ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O
consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a
existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não
afastam a ocorrência do crime (BRASIL, 2015, p. 37).

No entanto, mesmo o entendimento pacificado do Superior Tribunal de


Justiça, certamente a decisão não será capaz de pôr fim aos debates divergentes na
doutrina, dada a intensidade do delito em pauta. Permanecendo, assim, posições
sobre a desproporcionalidade de uma pena grave para as situações em que a vítima
e sua família consentiram com a relação. Verifica-se que dificilmente se encontrará
uma resposta unânime ou que seja adequada a todo e qualquer caso concreto.
Contudo, o foco desse trabalho está no afastamento da regra geral,
pretende-se então, neste momento, conduzir os estudos aos casos em que o agente
não tem conhecimento da idade da vítima, e por isso acaba por incidir em erro sobre
as elementares constituintes do tipo penal, ou seja, quando ocorre o erro de tipo no
estupro de vulnerável, direcionando o foco para a análise de jurisprudência do
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
Para o estudo, foi utilizado a ferramenta do site oficial do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul, na seção de pesquisa jurisprudencial, em que também foram
34

utilizadas diversas combinações de palavras chave relativas ao erro de tipo no crime


de estupro de vulnerável.
Cabe referir que um ponto de corte para apreciação decisória foi o critério
temporal, demarcado pelo ano de 2015, pois somente após esse período foi
determinada a uniformização jurisprudencial sobre a presunção absoluta de
violência nesses casos.
Assim, toma-se o período decisório compreendido entre os anos de 2015 e
2017, a fim de traçar o posicionamento da Corte do Rio Grande do Sul, sobre os
casos de estupro de vulnerável.
A partir das palavras chave “erro de tipo e estupro de vulnerável” foram
obtidos o total de 104 (cento e quatro) resultados, dentre eles somente 6 (seis)
encaixaram-se no pretendido tema, qual seja “reconhecimento do erro de tipo no
crime de estupro de vulnerável”, os quais seguem:

APELAÇÃO CRIME. CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL.


ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RELAÇÃO CONSENTIDA ENTRE VÍTIMA
E RÉU. ABSOLVIÇÃO. APELO MINISTERIAL. DESPROVIMENTO.
Os elementos de convicção colacionados demonstram que a ofendida, com
pouco mais de 13 anos de idade, e o denunciado, com maioridade penal
recém implementada, mantiveram relação sexual após encontro amoroso –
conduta que, em tese, subsume-se ao tipo do artigo 217-A do CP.
Inobstante, a prova angariada evidenciou que a conjunção carnal entre os
jovens ocorreu de forma voluntária e consentida, desprovida de violência ou
grave ameaça. Igualmente com base nos substratos colacionados, cogita-se
que a adolescente não possua compleição física adequada à idade
cronológica, dando ensejo a erro de tipo. Verificado, ainda, que a menor
apresentava discernimento à prática do ato. Por consequência, impositiva a
manutenção da absolvição decretada nos moldes da sentença, na qual
afastada, de modo extraordinário, a vulnerabilidade inserta na norma pelo
legislador infraconstitucional. APELAÇÃO MINISTERIAL DESPROVIDA.
POR MAIORIA (BRASIL, 2015a).

Na decisão acima, o entendimento deu-se em razão das particularidades do


caso, os dois eram jovens, ele tendo completado 18 anos recentemente em relação
à data do fato e ela com pouco mais de 13 anos, não houve emprego de violência,
muito menos o ato aconteceu sem a vontade da vítima, pois como ela mesma
relatou foi por vontade própria. O acusado em nenhum momento a obrigou a nada.
No quesito etário o acusado afirmou em seu depoimento que a vítima teria lhe
dito que possuía 15 anos, também uma das testemunhas relatou que acreditava que
a vítima possuía 17 anos, devido à sua desenvolvida compleição física que não
condiz com sua real idade, tanto como sua forma de agir mostrando discernimento à
35

prática sexual, a forma como se autodetermina, não restou dúvida pelo réu quanto à
sua idade. Dessa forma, todo conjunto levou a concluir pela ausência de
vulnerabilidade da vítima. Também pelo fato de o acusado possuir 18 anos na época
do fato e a vítima 13 anos, a presidente da câmara criminal e relatora do acórdão
considerou que seria “relativamente pequena a diferença de idade entre eles”
(BRASIL, 2015a, p.18). Seguindo essa linha de pensamento, é mister a transcrição
da pontuação feita pela juíza singular Solange Moraes, que foi citada inclusive no
acórdão, que aduz:

A solução desse fato social está para além do frio processo judicial, que
muitas vezes serve mais à exposição da intimidade daquela que se aponta
vítima do que a qualquer solução efetiva.
É preciso atentar, no presente caso, que os envolvidos são sujeitos ainda
em formação e os fatos aconteceram no frescor da adolescência, em
período fundamentalmente marcado por transformações, boa parte delas,
ligadas à sexualidade, impulsionada pelas modificações hormonais.
Longe de ser uma idade de certezas, é um período naturalmente conflitante
- muitas vezes, inclusive, de falsas convicções -, não havendo, em regra,
pleno discernimento das consequências e desdobramentos de muitas
condutas, entre elas do contato afetivo e sexual, que são pouco a pouco
absorvidos nesta fase da vida (BRASIL, 2015a, p.18-19).

Referente à presunção de vulnerabilidade da vítima o relator aduziu não ser


viável a discussão acerca da relativização, haja vista ao entendimento uníssono da
Corte Superior, ocorrendo a caracterização da vulnerabilidade, tão somente o fato
de a vítima possuir idade inferior a 14 anos, entendendo que as provas dos autos
seriam suficientes para condenar o réu nas penalidades do artigo 217-A, caput, do
Código Penal.
Já a presidente e relatora argumentou que o consentimento da vítima em
conjunto com as peculiaridades do caso, possibilitam a relativização da
vulnerabilidade, referindo que “o julgador deve sopesar as particularidades de cada
caso trazido à apreciação do Poder Judiciário, avaliando se a vítima se insere em
um contexto de vulnerabilidade a atrair a incidência da regra em questão” (BRASIL,
2015a, p.16). Ademais, analisou o conceito de criança e adolescente constantes na
Lei n° 8.060/90, concluindo ser viável a relativização da vulnerabilidade nos casos
em que figuram adolescentes entre 12 e 14 anos de idade, como no presente caso.
Torna-se oportuno, ilustrar esses argumentos com o entendimento do doutrinador
Nucci, que alude:
36

Verifica-se, pois, que a definição de patamar etário para a caracterização da


vulnerabilidade é baseado numa ficção jurídica, que nem sempre encontrará
respaldo na realidade do caso concreto, notadamente quando se leva em
consideração o acentuado desenvolvimento dos meios de comunicação e a
propagação de informações, que acelera o desenvolvimento intelectual e
capacidade cognitiva das crianças e adolescentes (NUCCI, 2014, s/p).

Neste julgado, verificou-se a análise da vida íntima da vítima, a fim de


relativizar sua condição de vulnerabilidade. Entretanto, a discussão não se limitou a
isso, e desde o juízo singular, procurou-se esclarecer que o estilo de vida da vítima
não era o que estava em julgamento, tendo sido necessária a menção somente pela
particularidade do caso em que se fez necessário analisar o contexto onde inseriam-
se ambas as partes, e pelo fato de possuírem “tenra idade”, exigindo-se então uma
solução diferenciada, a modo de evitar a destinação dos “inúmeros casos de estupro
de vulnerável diariamente trazidos à apreciação do Poder Judiciário” (BRASIL,
2015a, p.19).
Enfim, na decisão por maioria, negaram provimento à apelação, vencido o
relator, que votou pela condenação do acusado. E “com base nos substratos
colacionados, cogita-se que a adolescente não possua compleição física adequada
à idade cronológica, dando ensejo a erro de tipo” (BRASIL, 2015a).
No segundo caso analisado, a ofendida em seu depoimento disse que havia
conhecido o acusado em um bar, onde conversaram e depois foram à casa dele
onde acabaram tendo relação sexual, ato que não foi contra a vontade da ofendida
que na época tinha 13 anos de idade, informação desconhecida pelo acusado. A
menina ficou na casa do ofendido durante cinco dias, alegou que o acusado havia
forçado ela a ficar lá, obrigando que mantivesse relações sexuais com ele. A vítima
nesse tempo adoeceu (depois acabou descobrindo que era portadora de HIV),
momento em que o acusado ligou para a mãe dela vir busca-la (BRASIL, 2015b).
No caso, as provas dos autos não restaram suficientes para condenar o
acusado. Dentre as inconsistências do depoimento da ofendida, esta declarou que
estava sob cárcere privado, no entanto, no mesmo depoimento afirmou que o
acusado a deixaria ir embora quando ligasse para sua mãe pedindo para que fosse
busca-la, que somente a entregaria diretamente para a mãe.
Verifica-se que no acórdão proferido, várias foram as passagens que levaram
o foco para a vida íntima da vítima, como no momento da inquirição da vítima no
qual os questionamentos direcionados foram referentes a sua vida sexual regressa,
37

fatos que foram levados em consideração para a decisão, O que traz a reflexão, de
que ainda se operam fundamentos herdados da sociedade patriarcal, que tendem a
culpabilizar a vítima, operando julgamento moral das vítimas, trazendo reflexões
como:

A vítima relatou que já com 11 anos de idade havia tido sua primeira
experiência sexual, tenho tido outros namorados com os quais mantivera
relações sexuais, portanto antes de relacionar-se sexualmente com o
apelante. A prova é clara no sentido de que a vítima, ao conhecer o réu, já
gozava de ampla espontaneidade (liberdade) sexual, tanto assim que
conheceu o recorrente no fim de uma tarde, em um bar (ou boate), e, ainda
na mesma noite (tencionavam ir a uma festa juntos) dirigiu-se, em sua
companhia, à residência dele, local onde mantiveram relações sexuais – na
ocasião a vítima tinha 13 anos (BRASIL, 2015b, p.19).

Além disso, também houve a menção de a vítima ter denunciado o acusado


como forma de vingança, dado ao fato de supor que o mesmo a teria contaminado
com o vírus HIV.
Outro ponto que merece destaque é o do depoimento da mãe da menina, a
qual sendo questionada sobre a relação que tinha com a filha, relatou que depois a
partir dos 11 anos de idade, a vítima começou a apresentar mal comportamento,
querendo frequentar festas, o que a mãe não permitia, razão pela qual começou a
fugir de casa para a casa das amigas, sem dar notícia, e demorando cerca de dois
meses para voltar pra casa. Observa-se que o uso das palavras da mãe servem
como um mecanismo para retirar credibilidade das palavras da vítima, trazendo
afirmação sobre sua vida desregrada, de modo a sustentar a tese de culpabilização
da vítima. Como entendem:

A vítima, portanto, conforme ela própria deixa entrever em suas


declarações, já tinha experiência sexual, gozava de liberdade de
movimentação e escolha, decidiu manter relações sexuais com o réu no
mesmo dia em que o conheceu em um bar/boate, elementos que, ausente
prova concreta de coerção, reclamam a flexibilização da norma penal,
retirando, no contexto fático, a tipicidade material da norma penal (grifo
nosso) (BRASIL, 2015b, p.20).

Tal fundamento não tem coerência, visto que a norma penal é clara ao
estabelecer que relação sexual com menores de 14 anos de idade configura crime
de estupro de vulnerável, pois não usufruem de capacidade para se autodeterminar,
e, no entanto, consentir ao ato sexual. Sendo que a única possibilidade de se afastar
38

a tipicidade na norma, é se ocorrer erro da parte do acusado, das elementares do


tipo, como no caso em tela, o desconhecimento da verdadeira idade da vítima.

Deste modo, percebe-se aqui a inexistência de fidelidade às bases


constitucionais, principalmente no que diz respeito à teoria da proteção
integral, já que o “menorismo” judicial é claro ao apontar para a conduta da
vítima como a causa da acusação, sendo, portanto, tal linha de pensamento
ofensiva a um dos elementos essenciais do perfil hermenêutico ora
permeado (CUSTÓDIO; DIAS, 2013 p.13).

Diante de todo o exposto, devido ao fato de que o conjunto probatório da


condenação não restou suficiente para condenar o réu, ensejou o enquadramento
do erro de tipo.
A terceira decisão resultante da pesquisa, diz respeito ao mesmo caso. Não
satisfeito com a sentença, o Ministério Público interpôs recurso especial, que
retornou os autos ao mesmo colegiado para reexame da matéria, considerando a
orientação pautada pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo (RESP
1.480.881/PI) a que ensejou na unificação do entendimento sobre presunção de
violência absoluta. O relator ressaltou em seu voto que a absolvição do réu não se
deu pela relativização da vulnerabilidade da ofendida e sim pelas circunstâncias
peculiares do caso que não permitiram afastar o erro de tipo, mantendo a decisão
nos mesmos termos proferidos (BRASIL, 2016a).
Como entendeu o relator Carlos Alberto Etcheverry:

Neste contexto, a existência do crime de estupro de vulnerável decorre da


idade da vítima, que era menor de 14 anos à época do fato. Aqui, resta
saber se o réu tinha conhecimento de que a vítima contava apenas 13 anos
de idade, e nada há nos autos que torne tal informação indubitável. A
ofendida possuía vida sexual ativa desde os 11 anos, disse ter conhecido o
réu em um bar, não sendo impossível que, nessas circunstâncias, o réu não
pudesse supor que a vítima contava com tão pouca idade. Assim, entendo
que a prova dos autos não permite afastar o erro de tipo, no que diz respeito
aos crimes de estupro imputados ao réu, razão pela qual a absolvição é a
solução para o caso (BRASIL, 2016a)

No quarto julgado também foi reconhecido o erro de tipo, pois se trata de um


caso onde a vítima levou o acusado a crer que possuía idade maior do que
realmente tinha. A vítima lhe teria dito que possuía 16 anos, e que possuía um filho
de um ano de idade que estava sob guarda do pai, e depois que foi morar com o
acusado disse que seus documentos haviam sido queimados e que posteriormente
teria de pedir a segunda via. O acusado com inocência procurou informações junto
39

ao Conselho Tutelar de como poderia proceder para fazer os documentos de sua


namorada, para que pudesse voltar a estudar, e depois de longo diálogo, a vítima
acabou revelando sua real data de nascimento (BRASIL, 2016b).
Os fatos demonstraram que o acusado não sabia a real idade, em audiência
as testemunhas foram unânimes ao dizer que a vítima afirmou a todos que possuía
16 anos, o que não gerou dúvidas para ninguém, haja vista a sua compleição física,
frisado por todos que se tratava de uma “moça bem grande”, assim como a forma
em que se expressava, passando a imagem de uma “pessoa bem vivida”. Para dar
maior credibilidade a sua “mentira”, a vítima disse ao acusado que tinha um filho, o
qual estava sob a guarda do pai, levando o acusado a acreditar que possuía
superior idade, até mesmo as conselheiras tutelares não suspeitaram da veracidade
desse fato.

Contudo, a prova acostada conduz à conclusão no sentido de que o


denunciado não tinha consciência em relação à verdadeira idade da vítima
– elemento constitutivo do delito previsto no art. 217-A do Código Penal –,
incorrendo em erro de tipo escusável ou inevitável – que exclui o dolo da
conduta, permitindo a punição a título de culpa, caso prevista em lei. Na
hipótese em apreço, ausente modalidade culposa para o crime de estupro
de vulnerável, a absolvição é o caminho a trilhar (BRASIL, 2016b, p.4).

Na fase policial, a vítima afirmou que decidiu espontaneamente ir morar com


o acusado, e que lhe teria dito que possuía 15 anos de idade. Relato que foi
reafirmado em juízo.
Devido à particularidade do caso, o tribunal entendeu que havia ausência da
vulnerabilidade da vítima que tinha visível discernimento sobre os atos. Concluiu-se,
portanto, que o acusado não tinha consciência que seu comportamento era ilícito,
porque foi levado a acreditar que sua namorada possuía “idade biológica que
tornaria legítima a conduta de com ela manter relações sexuais” (BRASIL, 2016b,
p.8). Na decisão por unanimidade, negaram provimento à apelação, determinando a
ocorrência de erro de tipo, pela falsa percepção da idade da vítima, excluindo-se o
dolo da conduta, e mantendo a absolvição.
O quinto julgado resultou do caso que a vítima (12 anos de idade) faltou aula
para se encontrar com o acusado (20 anos de idade), a diretora da escola foi
informada sobre a ausência da vítima na sala de aula, mas como ela tinha chegado
com o ônibus escolar, a diretora imediatamente saiu a sua procura, foi até a casa da
40

avó da menina, onde a encontrou no quarto da casa na companhia do denunciado,


ocasião em que contatou a mãe da vítima e o conselho tutelar (BRASIL, 2016c).
Em seu depoimento, o acusado não negou a relação sexual com a vítima,
contudo, relatou que conversava com a ofendida pelo “facebook”, na qual constava
registrado que a mesma era maior de idade, depois começaram a manter contato
por telefone, e posteriormente, encontravam-se pessoalmente, próximo à casa dela,
até que determinado dia, combinaram um encontro no qual mantiveram relações
sexuais consentidas.

Portanto, em que pese a presunção de vulnerabilidade seja calcada em


critério objetivo e etário, é possível, em situações excepcionalíssimas,
flexibilizar a presunção, como no caso em exame. Em que a compleição
física da vítima, que media 1,68 e pesava 70 kg. Note-se que, conquanto as
famílias se conhecessem, não havia qualquer intimidade entre elas, ou
melhor, convivência, de sorte que o réu, com 20 anos de idade, e a ofendida
com 12, passaram a conversar, inicialmente, pelo “facebook”, depois por
telefone para, a seguir, se encontrarem próximo à casa de A. R. R. até que,
no dia apontado na denúncia, de comum acordo, mantiveram relação sexual
na casa da avó do acusado (BRASIL, 2016c, p.12).

Diante disso, a decisão de uniformização referente a essa questão, foi clara


no sentido de que a vulnerabilidade não é uma elementar do tipo do crime de
estupro de vulnerável. A passagem colacionada acima assevera que mesmo depois
do entendimento ter sido pacificado pela jurisprudência, ainda assim, muitos
julgadores se utilizam da fundamentação acerca da relativização da vulnerabilidade
da vítima.
A decisão de primeiro grau foi favorável a absolvição do réu, pois diante do
conjunto probatório, o qual amparou a tese de erro de tipo. Dessa forma, concluiu o
juízo singular:

Desse modo, inexistentes elementos aptos a comprovar que o réu conhecia


a real idade da vítima, o que, aliado à afirmação da adolescente - de que
tinha idade superior a quatorze anos na data do ocorrido-, conjugada com
sua constituição física (1,68 cm de altura e 70), evidencia a ocorrência de
erro de tipo.
De referir que, a despeito de não ser considerada a compleição física para
aferição da violência, em razão da presunção absoluta, a análise desse
elemento auxilia na verificação da presença de erro sobre elemento
constitutivo do tipo penal – erro de tipo –, o que reconheço como havido no
caso em testilha.
De todo o contexto, tenho por acolher a tese do erro de tipo, razão por que
a absolvição é impositiva, eis que tal exclui o dolo e não havendo previsão
na modalidade culposa, não se cogita da aferição se o essencial era
vencível ou não, tratando-se de conduta atípica (BRASIL, 2016c, p.10-12).
41

O Ministério Público interpôs recurso de apelação postulando pela


condenação do réu as penalidades do artigo 217-A, caput, do Código Penal,
alegando a presunção de violência absoluta, decorrente da idade da vítima. A
decisão dos Desembargadores da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do
Estado foi unânime em negar provimento ao recurso ministerial, mantendo a
sentença recorrida, a qual acolhe a tese do erro de tipo pelo desconhecimento do
acusado sobre a verdadeira idade da vítima, pois foi induzido a erro devido ao fato
de que no “facebook” da vítima constava que era maior de idade, assim como a falsa
percepção de vulnerabilidade dela devido ao seu precoce desenvolvimento físico.
Por fim, o sexto e último julgado refere-se ao caso em que a vítima, no dia do
fato, falou para sua genitora que iria passar uns dias na casa de sua madrinha, mas
ao invés disso ligou para acusado pedindo socorro, haja vista alguns meninos
haviam tentado pegá-la a força. O acusado então imediatamente foi ao encontro da
vítima, encontrando-a disse que a levaria pra casa, mas a vítima disse que sua mãe
estava viajando e que não queria ficar sozinha, pedindo então para ir pra casa do
acusado. Os dois encaminharam-se até a residência do acusado, onde praticaram
relações sexuais (BRASIL, 2017).
A vítima possuía 12 anos de idade na época dos fatos, e o acusado 21 anos,
ambos conheceram-se através de uma rede social. Todavia, a vítima afirmou ao
acusado que possuía 15 anos de idade, motivada pela ideia de não querer que o
mesmo a visse como uma “criança”. O acusado afirmou que praticou atos sexuais
com a ofendida quando ela possuía 12 anos de idade, no entanto alegou que
desconhecia essa situação, pois ela disse que tinha 15 anos, sendo que descobriu a
verdadeira idade dela posteriormente, através de sua genitora. Ocasião em que se
afastou da vítima por um tempo, mas posteriormente reataram o relacionamento
(BRASIL, 2017).
A mãe da vítima em seu depoimento relatou que é a favor do relacionamento,
pois sua filha passou a ser uma pessoa melhor, sendo que o acusado ajudou-a com
o problema que tinha com drogas.
O entendimento do julgador, é que a hipótese configura erro de tipo essencial,
consistente na falsa percepção da realidade sobre uma elementar do delito, oriunda
da idade da vítima. Durante o tempo em que passaram juntos, o denunciado
42

acreditava que a ofendida tinha 15 anos, idade permissiva para consentir sobre o ato
sexual, portanto não pressupunha relação com pessoa vulnerável.
Vale ressaltar que além desse quesito, era de conhecimento do acusado que
a ofendida sempre saia a noite, era usuária de drogas, ambos não tinham o mesmo
ciclo de amizade, o desenvolvimento físico e psicológico da vítima, elementos que
colaboraram para a convicção do réu em relação a idade alegada por essa (BRASIL,
2017).
Sobre a vulnerabilidade da vítima, interessante foi a posição do julgador que
compreende que:

Com relação ao fundamento absolutório, reforço, de modo a guardar


coerência com julgados anteriores, que a vulnerabilidade de que trata o
artigo 217-A do Código Penal é absoluta, o que retira da vítima a
possibilidade de consentir com a relação sexual, não se encontrando o
julgador autorizado a flexibilizar a norma, especialmente quando a mitigação
da vulnerabilidade caminharia em desalinho com a doutrina da proteção
integral, vigente em nosso ordenamento jurídico. A opção legislativa, no que
se refere à primeira parte do preceito primário do artigo 217-A do Código
Penal, possui critério objetivo, não estando o aplicador da norma autorizado
a interpretá-la em descompasso com os motivos que determinaram a sua
criação, que se vinculam, no caso em exame, à proteção da criança e do
adolescente (BRASIL, 2017, p.10).

O voto do relator se deu no sentido de negar o provimento ao recurso


ministerial com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código Penal, que prevê
que quando não houver prova suficiente para a condenação o juiz absolverá o réu.
No caso em tela, a absolvição deu-se pelo fato de o acusado ter agido em erro de
tipo essencial, pois no momento imputado na denúncia, desconhecia a elementar da
condição etária da ofendida.
Faz-se oportuno esclarecer que o restante dos julgados que foram
encontrados nessa pesquisa não puderam ser objeto de análise, pois não tinham
correlação com a proposta da pesquisa. No total foram descartadas 95 (noventa e
cinco) decisões por não tratarem do reconhecimento do erro de tipo, após a leitura
de ementas e votos, foi verificado que tratavam sobre o delito do estupro de
vulnerável, todavia, relacionando a questões processuais sem referir sobre o erro de
tipo, direcionando-se sobre o erro material no dispositivo da sentença.
43

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A violência sexual é um tema muito discutido, tanto pela doutrina como pela
jurisprudência e sociedade. A Lei n° 12.105/2009 reformulou o Titulo VI do Código
Penal que trazia a denominação “Dos crimes contra os costumes”, passando a titular
como “Dos crimes contra a Dignidade Sexual”. Referida lei introduziu significativas
alterações no texto penal, cumprindo o destaque nesse trabalho a inclusão do novo
tipo penal intitulado estupro de vulnerável.
Em um primeiro momento do trabalho, buscou-se fazer um estudo sobre os
aspectos gerais do crime de estupro conforme a esfera penal, analisando as
modificações oriundas da Lei n° 12.105/2009. Declinou-se ao debate acerca da
questão de gênero, trazendo fatos que alicerçam um fundamento de que as
mulheres ainda são vítimas de violência pelo motivo de serem mulheres, sendo o
estupro uma ferramenta de manutenção de poder oriunda da necessidade de
inferiorizar a mulher, fatos que resultam da herança cultural patricarcal,
extremamente machista.
Contudo, o ponto mais revoltante nisso, é referente a culpabilização da
mulher pelo sistema de justiça criminal, que projeta a percepção estereotipada do
gênero, quando conduz uma investigação focada na vida íntima da vítima, o que
acaba desmotivando novas denúncias, sendo um dos motivos de o estupro ser o
crime mais subnotificado.
Registra-se a necessidade do corte transversal de gênero, tendo em vista que
ignorar esse aspecto seria realizar uma apreciação parcial do problema, o qual
congrega tanto aspectos dessa parcela significativa da população, quanto nuances
da seara da infância.
Em relação ao abuso sexual de crianças e adolescentes, sabe-se que a
ocorrência desses delitos não é advindo da sociedade moderna, visto que
acompanha a evolução da sociedade desde os tempos mais remotos. De maneira
que a ocorrência de abusos com crianças e adolescentes era frequentemente
praticado por adultos. Fatos que objetivaram o enfoque da presente pesquisa nas
vítimas com idade inferior a 14 anos.
A introdução desse tipo foi necessária, visto o preocupante aumento de
incidências de crimes sexuais contra crianças e adolescentes, sendo que o maior
número desses casos ocorrem em âmbito intrafamiliar, a pessoa que tem o dever de
44

proteção e cuidado para com a vítima, são os que causam os danos extremamente
prejudiciais ao seu desenvolvimento saudável.
Diante da relação parental, o obstáculo encontra-se em relação a revelação
dos abusos. O abusador usa de sua influência e poder sobre a criança, de modo a
fazer ameaças sobre sua vida e de sua família para evitar que revele a alguém sobre
os abusos sofridos, estabelecendo portanto um pacto de silêncio entre ambos, pois
perante o medo, a criança acaba se submetendo ao ciclo abusivo. Outro obstáculo
refere-se a prova dos fatos, pois como o delito é cometido (em inúmeros casos)
dentro do próprio lar, não tendo testemunha, e pelo fato de que muitas vezes os
abusos não deixam vestígios, torna-se difícil provar, restando o depoimento pessoal
da vítima.
Referente a isso, foi trabalhado no presente estudo que o método de
inquirição dessas vítimas é na maioria das vezes inadequado, pois tende a
revitimizar a criança ou adolescente, acarretando prejuízos secundários a estes,
assim como o aumento de relatos sob falsas memórias. Diante disso, foi criado o
projeto do “Depoimento sem Dano” ou como passou a chamar “Depoimento
Especial”, o qual é um método especializado em oitiva de depoimento de crianças
vítimas de abuso, fazendo com que a criança retrate uma única vez sobre os fatos,
visando assim reduzir os danos e a revitimização da vítima, assim como a obtenção
de respostas “fidedignas”.
O progresso para reconhecimento das crianças e adolescentes como sujeitos
de direito foi demorado, sendo que apenas com a promulgação da Constituição
Federal, se convencionou e reconheceu as crianças e adolescentes, tendo como
base a Doutrina da Proteção Integral, que estimulou as normas de proteção destes.
Posteriormente, surgiu o Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual
simbolizou um marco histórico para a esfera da Infância e Juventude, trazendo um
importante avanço na defesa dos direitos da criança e do adolescente, os quais
passaram a ser tratados como indivíduos em condição peculiar de desenvolvimento
físico, psíquico e social. Razão pela qual merecem especial proteção estatal.
Uma grande discussão doutrinária e jurisprudencial se desencadeou referente
a presunção de violência nos casos de estupro de vulnerável. Contudo, com o
advento da Lei n° 12.105/2009, o artigo 224 da lei penal foi revogado e criado o
crime de estupro de vulnerável a fim de esgotar as discussões acerca do fato. Assim
como, em 2015 o entendimento foi pacificado pela jurisprudência proferida pelo
45

Superior Tribunal de Justiça (o qual realizou um exercício de uniformização de


jurisprudência). Todavia, as discussões ainda estão à tona.
O objetivo dessa pesquisa foi realizar um estudo dos casos em que há
deslocamento da norma geral constante do crime de estupro de vulnerável, em
relação aos casos em que o agente incorre em erro pela falsa percepção da
condição de vulnerável da vítima, tendo em vista o seu precoce desenvolvimento
físico e psicológico.
Para isso, realizou-se uma pesquisa na jurisprudência do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul acerca do assunto, no período dos anos de 2015 a 2017,
sendo que o requisito temporal deu-se em razão de que em 2015 pacificou-se a
jurisprudência referente a discussão sobre presunção de vulnerabilidade, restando
como absoluta, assim, a pretensão foi verificar os efeitos que a mesma trouxe para
as decisões posteriores.
Com a análise da jurisprudência, buscou-se comparar os resultados a fim de
identificar quais os parâmetros utilizados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul nos casos de reconhecimento do erro de tipo no estupro de
vulnerável, sendo essa a questão problema que se pretendeu resolver. Neste
sentido, houve a concentração apenas em casos que atentassem para
vulnerabilidade com base na idade das vítimas (menores de quatorze anos),
dispensando-se as demais vertentes.
A partir da análise das decisões, pode-se observar que muitos dos
fundamentos constantes nos acórdãos tratavam sobre a vida sexual pregressa da
ofendida, a fim de relativizar a sua vulnerabilidade, argumentos que condizem com a
tendência da culpabilização da vítima. Novamente, a importância do componente de
gênero registrado no início da pesquisa se reforça com a demonstração fática do
comportamento decisório no sentido de estigmatizar a mulher enquanto ser dotado
de sexualidade.
Em busca da resolução da questão problema, na análise das decisões foi
possível perceber que diante do fato de o agente praticar relação sexual com a
vítima menor de 14 anos de idade, sem o conhecimento da sua condição etária,
juntamente com o conjunto das circunstâncias como o seu precoce desenvolvimento
físico e mental, não condizente com a sua real idade, assim como o lugar onde a
conheceu em que só permite a entrada de pessoas maiores de idade. Induzem o
agente a incidir em erro de tipo, o qual se dá sobre uma das elementares do tipo.
46

Dessa forma, permitiu-se concluir que a falsa percepção sobre a


vulnerabilidade da vítima, sendo este devidamente comprovado, é, para o Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul, o principal parâmetro analisado para o
reconhecimento do erro de tipo nos casos de estupro de vulnerável. Entretanto, em
alguns casos ainda permanecem as desnecessárias alusões a vida sexual ou a
culpabilização da vítima, as quais não são necessárias diante de situações claras de
erro de tipo, os quais são suficientes para fundamentar decisões absolutórias em
casos concretos diferenciados.
47

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