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Como se promove o

sentido patriótico
português segundo a
herança cristã?
João Paulo Freitas

Partida das naus do Tejo. Imagem retirada do livro História da Colonização do Brasil.
I NTRODUÇÃO
Portugal é desde o início um país de guerreiros, aventureiros, conhecedores da
beleza natural, artística, literária – um povo combatente e resistente. Já desde a altura do
império Romano que conferimos isto, quando os Romanos governavam grande parte da
Europa e partes da Ásia e da África. A Península Ibérica na altura era constituída por
povoações como os Lusitanos. Enquanto os povos costeiros do mediterrâneo não ofereciam
resistência, os Celtiberos (povo que vivia na zona onde nascem os rios Douro, Tejo e
Guadiana) e os Lusitanos eram povos que se revoltavam e causavam grandes perdas no
exército Romano. Os Lusitanos eram conhecidos pelo seu ardor combativo, e, comandos por
um pastor chamado Viriato conseguiram expulsar os Romanos e obter a liberdade da
Lusitânia. Contudo, isto durou poucos anos, pois Viriato foi morto.

Isto para demonstrar que já desde o início somos um povo que tem orgulho à pátria,
um povo que lutou arduamente pela sua independência e que consegui expulsar o mais
poderoso império do mundo do seu pequeno território.

O patriotismo está ligado à caridade, pois é um sentimento de amor à pátria, de


devoção e familiaridade perante o país, perante a sua história e a sua cultura. Na tese
apresentada, é exposto o facto de Portugal ter sido um povo em que o cristianismo teve um
papel vital no desenvolvimento da sua cultura e individualidade. Veremos então, a maneira
como se desenvolveu e comportou o cristianismo desde a queda do império romano até à
época dos descobrimentos e, ao longo da tese, iremos formular uma tese para responder à
pergunta de investigação: Como é que a herança cristã promove o nosso sentido de
patriotismo?

D ESENVOLVIMENTO
A Igreja Romana teve um papel tremendo na história de Portugal, e deixou
profundas marcas na nossa herança e nos nossos costumes, acabando por se tornar uma
parte preciosíssima da nossa pessoa e da nossa história. Durante a queda do império
Romano e das invasões dos Bárbaros, era a Igreja que exercia não só, a função espiritual e
moral, mas também médica, social e económica. Os padres e bispos defendem os
habitantes contra as violências dos conquistadores, contra as injustiças e violência dos
tiranos. A Igreja deu aos homens e mulheres medievais a dignidade que lhes era negada,
enquanto proporcionava orfanatos, escolas, hospícios e ainda direcção espiritual. Além do
mais, a função económica que desempenhava era de enorme relevância; havia a plantação
massiva de vinhas (apoiado pelos monges de Borgonha, França, enviados por S. Bernardo de
Claraval), o que dava emprego a muitos, além de permitir também a libertação de muitos
escravos.
Portanto, tentando esquecer e ultrapassar as atrocidades e as misérias que haviam
vivido, o Homem medieval tenta-se refugiar com a Paz e Espiritualidade proporcionadas
pela Igreja. Este modo de vida reflecte-se em todas as manifestações das suas vidas; desde a
poesia cristã, até aos vitrais e pinturas nas igrejas, e até à escultura. Estas manifestações
serviam de exemplo para as gerações futuras, como incentivo de levarem também uma vida
com extremo valor espiritual, uma vida cristã; uma vida de caridade, obediência, fortaleza e
pobreza.

Este sentimento da caridade, de amor ao próximo, nota-se profundamente no


carácter do Homem medieval. Este demonstra um amor profundo para com Jesus, para com
a pessoa de Jesus, visto como um modelo e amigo. Aliado a isto surge um amor também
para com Santa Maria, a mãe de Jesus, vista como a mãe da humanidade. Este amor a Jesus
resulta então, no crescimento do amor ao próximo; na cura dos enfermos, dos leprosos, dos
doentes, na ajuda dos pobres. O amor de Jesus leva a que o Homem sinta misericórdia e
compaixão – caridade – pelo amigo/a, pela família, pela humanidade inteira.

Em 1084, os muçulmanos (Turcos Seljúcidas) invadiram e conquistaram a terra santa.


Motivados pelo discurso do papa Urbano II, em 1095, organizam-se para a guerra santa
formando as chamadas cruzadas, para expulsar os muçulmanos. Muitos homens viam isto
como uma oportunidade de serem perdoados pelos seus pecados, aos cavaleiros de
proteger os mais fracos, de atingir a prosperidade; de resolverem a sua ansiedade e
angústias. Numa peregrinação do papa Silvestre II, toma-se conhecimento que os Turcos
estão a destruir templos e a escravizar populações inteiras simplesmente por serem cristãs.
Nos dois séculos seguintes, deram-se as lutas entre os cruzados e os cristãos continuaram
em luta com os muçulmanos, até desistirem após a segunda derrota do Rei de França S. Luís
IX, que era um homem/Rei extremamente religioso e respeitado.

As cruzadas haviam parado, até um povo pequeno e pouco conhecido no ocidente


decidir ir guerrear contra os muçulmanos no norte da África e no Oriente. Na altura, a
Península Ibérica estava a ser invadida pelos Almorávidas, muçulmanos do deserto do Saara
que haviam entrado pela Península adentro ao derrotar os cristãos na batalha de Zalaca em
1087. O papa Urbano II declara uma nova cruzada, a cruzada ocidental, que irá ajudar a
Península Ibérica a lutar contra os Almorávidas. A cruzada foi um sucesso, os muçulmanos
foram progressivamente expulsos da Península enquanto se iam formando reinos como os
de Navarra e de Leão.

Entretanto, já no século seguinte, nasce D. Afonso Henriques que é responsável pela


formação do Reino de Portugal. Na batalha de Ourique (1139), D Afonso Henriques invoca
Cristo crucificado e, nessa batalha, Cristo dá a Afonso Henriques as suas armas, no chamado
Milagre de Ourique. Em memória do milagre de Cristo, Afonso Henriques utiliza no brasão
de armas de Portugal as cinco chagas de Cristo integradas nas quinas. Continuando, Afonso
Henriques contribuiu para a fundação do Mosteiro de Santa Cruz (Coimbra), restaurou as
Dioceses de Lamego e Viseu (1147), Lisboa (1148) e Évora (1166), trazendo também os
monges da Ordem de Cister, que dominavam as técnicas agrícolas e ajudavam com o
crescimento demográfico nas grandes dimensões territoriais, que tinham fraca densidade
populacional.

Antes de mais, é necessário referir o que aconteceu antes dos descobrimentos. No


início do século XIV foi abolida a Ordem do Templo (que como visto antes foi criada para
proteger os movimentos de peregrinação à Terra Santa), contudo, D. Dinis queria a
continuação desta ordem, alegando que precisava de se defender dos povos muçulmanos
no sul de Portugal. Apesar da abolição da ordem, o papa da altura, papa João XXII, concede
a D Dinis autorização de instituir a Ordem Militar Defensora de Jesus Cristo (com esta
pequena mudança diplomática, mudando o nome da Ordem de Templário para Cristo, D
Dinis consegue a permissão do papa). Os templários ou cavaleiros regiam-se pelos valores
da castidade, da pobreza e da obediência, com o objectivo de combater a ameaça
muçulmana, eram como as tropas de elite, motivados pela fé e cheios de fortaleza e
perseverança.

A cruz da Ordem de Cristo

No início do século XV seguinte, o Infante D Henrique é nomeado (devido à morte de


seu pai) para governar e reger a Ordem de Cristo. Com ele inicia-se uma série de reformas,
os cavaleiros já não seguem mais a Ordem de Cister mas sim a Ordem de Calatrava,
podendo assim abrirem-se a outra áreas como à exploração dos mares, tornando-se
navegantes. Junto a estes “cavaleiros” navegantes, iam frades de ordem militar e religiosa,
para espalhar o cristianismo pelas novas terras descobertas e povoá-las. Contudo, é mais
tarde, já no reinado de D Manuel I, que a Ordem se dedica ao máximo na expansão da fé,

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Como sugerido por Hernâni Cardoso no seu blog, a cruz da Ordem de Cristo é constituída por duas cruzes. A
vermelha era a cruz da Ordem do Templário, mas quando se deram as perseguições, o Rei João XXII juntou
uma nova cruz; a branca, que na cristandade simboliza a pureza e inocência, sendo portanto utilizada para
demonstrar a inocência dos cavaleiros da Ordem.
convertendo povoações nas terras do alto-mar, e onde alguns membros da Ordem ficaram a
viver. Os barcos que partiam para o desconhecido tinham nas suas velas e bandeiras a cruz
da Ordem de Cristo, que é um principal símbolo da época dos descobrimentos e da
actividade cristã que se desempenhou. As cruzes impressionavam os inimigos, exibindo a
grandeza de Portugal e de Cristo, e o poderio que tínhamos na altura.

As cruzes de cristo nas velas nas naus. Ilustração retirada do livro/manuscrito de Lisuarte Abreu intitulado a História das
Armadas Portuguesas.

C ONCLUSÃO
Parafraseando Joaquim de Carvalho no seu livro “Compleição do Patriotismo
Português” que fala do patriotismo como uma “alma dos povos”: «a História dá-nos assim,
simultaneamente, o testemunho real e as dimensões existenciais da compleição da alma dos
povos, da capacitação, qualidades e defeitos que a constituem, da hierarquia de valores que
a singularizam, das tradições que a mantêm, das aspirações que a alentam e das vicissitudes
dos ideais que a orientam». Joaquim de Carvalho refere a tremenda importância de um
passado histórico, pois desenvolve as tradições e os costumes, define o povo, a terra e os
valores. O sentimento cristão que nos tem ajudado desde sempre a desenvolver o
português, a elevar a sua persona a uma pessoa com fortaleza, caridosa, aventureira,
determinada. Deixou-nos fabulosos monumentos, esculturas, literatura, poesias, pinturas,
os conventos e mosteiros. Deixou-nos a honra das explorações marítimas, e formou os
valentes cavaleiros das Ordens que lutavam e nome de Cristo e de Portugal. Devemos, como
portugueses, orgulhar-nos do nosso passado, consolidado sobre forte bases cristãs que se
foram enraizando na terra, e no homem e na mulher de Portugal, e não se esquecer que
somos apenas anões «a hombros de gigantes», citando o filósofo platónico Bernardo de
Chartres.

A herança Cristã é a mais preciosa herança, e segundo o apóstolo Pedro, “Nisso


exultais” (1 Pedro 1:6). A herança cristã é diferente de todas as outras, é uma em que a
chama não se apaga, “Toda herança terrena irá apodrecer, oscilar e cair, mas nossa casa
celestial nunca apodrece” (Hebreus 11:9-10,13-16).

Convento de Tomar ou Convento de Cristo – Antiga sede da Ordem de Cristo. Imagem tirada do sítio do Convento de
Cristo.

R EFERÊNCIAS B IBLIOGRÁFICAS
BRAGANÇA, José Vicente de; As Ordens Honoríficas Portuguesas, in «Museu da Presidência da República», Museu da
P.R. / C.T.T., Lisboa, 2004

ESTRELA, Paulo Jorge; Ordens e Condecorações Portuguesas 1793-1824, Tribuna da História, Lisboa, 2008

MELO, Olímpio de; Ordens Militares Portuguesas e outras Condecorações, Imprensa Nacional, Lisboa, 1922

Cf. IGREJA CATÓLICA. Papa, 1978- (João Paulo II) – Ex. Apost. A Igreja na Europa, n.120.

Abreu, L. d. Armadas da Índia. Pierpoint Morgan Library, Portugal.

Cardoso, A. M. (2011). D. Afonso Henriques - Os Mistérios e a Lógica. Sintra: Edições Amadora-Sintra.

Cardoso, H. (9 de Janeiro de 2015). A Cruz da Ordem de Cristo. Obtido de http://hernanicardoso.pt/viagem/a-cruz-


da-ordem-de-cristo/
Carvalho, J. d. (1953). COMPLEIÇÃO DO PATRIOTISMO PORTUGUÊS. Coimbra: Atlântida.

Convento de Cristo. (s.d.). A Ordem de Cristo. Portugal.

Dias, C. M., Gameiro, R., & Vasconcelos, C. E. (1921). História Portuguesa da Colonização do Brasil. Porto: Litografia
Nacional.

Mattoso, A. G. (1962). Compêndio de História Universal. Lisboa: Livraria Sá da Costa.

Mattoso, J. (1992). Portugal Medieval novas interpretações. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda.

Sousa, M. d. (2001). Reis e Rainhas de Portugal. Mem Martins: Sporpress.

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