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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO FÍSICA

MÔNICA REHDER BONON

O ENSINO DA GINÁSTICA NA
ESCOLA:
Linguagem e criatividade

Campinas
2008
MÔNICA REHDER BONON

O ENSINO DA GINÁSTICA NA
ESCOLA:
Linguagem e criatividade

Trabalho de Conclusão de Curso


(Graduação) apresentado à Faculdade de
Educação Física da Universidade
Estadual de Campinas para obtenção do
título de Licenciado em Educação Física.

Orientador: Profª. Dra. Silvia Cristina Franco do Amaral

Campinas
2008
MÔNICA REHDER BONON

O ENSINO DA GINÁSTICA NA ESCOLA:


Linguagem e criatividade

Este exemplar corresponde à redação


final do Trabalho de Conclusão de Curso
(Graduação) defendido por Mônica
Rehder Bonon aprovado pela Comissão
julgadora em: 27/11/2008.

Profª. Dra. Silvia Cristina Franco do


Amaral
Orientador

Profª Doutoranda Paula Cristina da Costa


Silva

Profª. Dra. Elizabeth Paoliello Machado de


Souza

Campinas
2008
Dedicatória

Dedico este trabalho a todos que estiveram ao meu lado durante toda minha jornada e
muito me apoiaram. A minha família que muito me ensinou e me apoiou; aos amigos e
namorado que nunca faltaram nas horas que mais precisei.
Agradecimentos

Agradeço as professoras que me permitiram a realização desse


trabalho, são elas: Larissa Graner Pinto com que fiz o estágio da licenciatura
e quem muito me inspirou para fazer este trabalho; Andréa Desiderio, quem
permitiu que a minha pesquisa fosse completa e me ajudou ao longo do
processo das aulas.

Agradeço também a minha orientadora Profª.Dra. Silvia Cristina Franco


do Amaral, por tão bem ter me orientado e me ajudado a chegar neste
trabalho.

Agradeço a paciência de todos, especialmente dos meus amigos,


namorado e família, comigo nos últimos meses.

Agradeço em especial as meninas que moram comigo,e o meu


namorado pois foi deles a paciência do dia-dia.

Agradeço ao Grupo Ginástico Unicamp por ter me proporcionado


muitas experiências com a ginástica. Além de muitos amigos.
BONON, Mônica, Rehder. O ensino da ginástica na escola: linguagem e criatividade.
2008. 45f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação)-Faculdade de Educação
Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2005.

RESUMO

Este estudo tem por objetivo investigar a possibilidade de pedagogizar a ginástica na


escola, entendendo-a como linguagem dialógica. Tomo o conceito de linguagem de
Bakhitn e os conceitos de ensino e aprendizagem de Vigotski como fundamento. E,
desenvolvo as intervenções observantes em uma escola particular situada na cidade
de Campinas, com alunos do quinto ano, pautadas em metodologias que permitem a
participação do aluno no desenvolvimento das aulas. Portanto, trata-se de uma
pesquisa participante em que foram observadas a apropriação da ginástica pelos
alunos e a mediação intencional do professor durante o processo.

Palavras-Chaves: Ginástica, linguagem, ensino-aprendizagem da ginástica.


BONON, Mônica, Rehder. The teaching of gymnastics at school: language and
creativity. 2008. 45f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação)-Faculdade de
Educação Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2008.

ABSTRACT

This study focused on the possibility of Pedagogized the gym at school, considering it
as dialogical language. I take the concept of language Bakhitn and concepts of
teaching and learning of Vygotsky as unfounded. And, develop interventions in a
private school located in the city of Campinas, with pupils of the fifth year, based on
methodologies that allow the participation of students in the development of lessons.
Therefore, it is a participant in that study were the ownership of the gym by students
and the teacher's intentional mediation during the process.

Keywords: Gymnastics, language, teaching and learning about gymnastics.


LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

GA Ginástica Artística
GR Ginástica Rítmica
GG Ginástica Geral
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SUMÁRIO

1 Introdução 10
2 A ginástica 15
3 Uma forma de pedagogizar a ginástica. 21
4 As aulas 25
4.1 A escola 27
4.2 O processo 28
4.3 Avanços e contradições 32
Considerações Finais 36
Referências Bibliográficas 37
Anexos 39
10

1-INTRODUÇÃO

Ao ingressar na Faculdade de Educação Física, me deparei com coisas que


jamais imaginei. Apesar de ter um contato maior com a dança, antes da Faculdade, a
ginástica foi algo que me encantou. No primeiro ano, aqui em Campinas, conheci a
Ginástica através das disciplinas da faculdade e do Grupo Ginástico Unicamp.
Inicialmente conheci as apresentações do mesmo e algum tempo depois passei a ser
integrante deste grupo. A partir disso, fui para os espaços abertos de Ginástica Geral
(proposta pedagógica do grupo Ginástico Unicamp) e passei a conhecer um pouco
mais da Ginástica. Ao mesmo tempo, eu queria descobrir tudo que a Universidade tinha
a me oferecer, foi quando comecei a me envolver com o movimento estudantil. Hoje,
devo grande parte de minha formação também a este movimento, que me mostrou
coisas que eu não conheceria dentro das salas de aulas, como por exemplo, a situação
do profissional de Educação Física e seu conselho, as diretrizes de bases que regem a
Educação Física. Estes caminhos me levaram a licenciatura.
Em meu estágio de licenciatura tive ótimas experiências, a professora com quem
eu fiz estágio me deixou grandes espaços para participar das aulas e ministrá-las. O
contato com a ginástica e a vontade de compartilhar meu conhecimento, me fez pensar
este trabalho. Perguntava-me como poderia desenvolver o ensino da Ginástica nas
aulas de Educação Física.
A ginástica é um dos elementos da cultura corporal, logo é parte da nossa cultura
e foi construída historicamente. A ginástica, sendo uma linguagem do corpo, permite
aos seres humanos conhecimento e interpretação, configurando-se como forma de
comunicação. Enxergar a ginástica como uma forma de linguagem nos faz pensar que
ela pode ser entendida, refletida e transformada. Na sociedade em que vivemos, nos
deparamos com as práticas corporais como reflexos do sistema em que vivemos, na
qual a ginástica é ensinada mais como uma técnica corporal do que como linguagem.
A linguagem, segundo Bakhtin, não possui significado se separada do contexto
social, é através dela que apropriamos1valores que estão em nossa sociedade. Assim,

1
O termo apropriação refere-se a modos de tornar seu; também, tornar adequado, pertinente, aos valores
e normas socialmente estabelecidos. Mas há ainda outro significado, relacionado à noção elaborada por
11

podemos dizer que é o contexto social em que nos encontramos que nos faz aprender
coisas que estão presentes em nossa sociedade. É- também através da linguagem
construímos valores ideológicos. (Jobin e Souza, 1994). Podemos complementar o que
diz Bakhtin com a teoria de Vygotsky, de que a aprendizagem é interacional e a cultura
socialmente construída (Daniels, 1994). Para que possamos nos comunicar com o
contexto social em que nos encontramos, é preciso compreensão. A partir do momento
em que compreendemos o que nos é passado, conseguimos dialogar, conseguimos dar
continuidade ao processo que está acontecendo. Para dialogar também é preciso
criatividade. É ela que permite a continuação do diálogo.
Segundo Bakhtin a primeira voz falante é quem a produz, o ouvinte, a segunda
pessoa do diálogo, faz uma reflexão da mesma e usando de sua criatividade, dá
continuação ao diálogo (Jobin e Souza 1994).
Ao aprender com o contexto social, o dialogo é elaborado com alguém e há a
compreensão e a continuação do mesmo por outrem e o conhecimento é apropriado. A
partir disso, é possível transformar o que está sendo aprendido. Somente pelo fato de
cada pessoa ter uma forma diferente de enxergar o conhecimento e de responder a ele,
esse conhecimento já se torna diferente ao ser apropriado por cada um. Ao fazermos
isso estamos construindo nosso conhecimento, ele não é algo que está pronto, é
processual.
É importante que o processo de aprendizagem propicie aos alunos espaços
aberto para atuarem por si próprios. O foco deste trabalho é a ginástica pensada como
linguagem, e sendo assim, cada aluno terá uma interpretação e uma resposta aos
movimentos e exercícios da mesma. Como professora, devo possibilitar espaços para
que os alunos possam se expressar com relação à ginástica.
Pensando na ginástica como linguagem, é possível pedagogizá-la na escola
desde esta perspectiva?
Neste trabalho tenho a ginástica como um conteúdo da educação. Busco
apresentar uma forma de pedagogizá-la. Durante o processo de aprendizagem é

Max e Engels, na qual o tornar próprio implica “fazer e usar instrumentos” numa transformação recíproca
de sujeitos e objetos, constituindo modos particulares de trabalhar/produzir. (Smolka, 2000, p. 28)
Smolka, A. L. B., - O (im)próprio e o (im)pertinente nas apropriações das práticas sociais. Caderno
Cedes, anoXX, nº 50, Abril/00
12

preciso que os alunos tenham espaços abertos para intervirem e que esse processo
contribua na formação de cada um. A ginástica deve ser entendida por cada um dos
alunos, como algo que também os pertence e que pode ser modificada por eles, e que
tenham autonomia suficiente para construir sua própria ginástica, para transformá-la.
Elaborei um modelo de como seria o diálogo da ginástica. A enunciação, que
seria o conhecimento da ginástica, e de seus elementos tradicionais. Isso faria os
alunos compreenderem a ginástica, e a partir disso, usando de criatividade, dariam
continuidade ao diálogo da ginástica. O resultado de todo a compreensão e apropriação
da ginástica apareceria na coreografia final. Como um todo, o conteúdo foi entendido
como linguagem, pois essas etapas aconteceram, mesmo que não em toda aula, mas
durante o processo. E a coreografia final é uma prova disso. Porém, os conteúdos de
cada aula, algumas vezes não passaram por esse processo completo, mas
contribuíram para o processo todo.
Para que este processo seja possível, é preciso pensar como se darão as aulas,
como cada etapa será construída. Para isso busquei algumas teorias norteadoras da
Educação Física, que para mim são de grande importância, pois me fazem acreditar ser
a melhor forma de se pensar e de ensinar os elementos da cultura corporal. Desenvolvi
um cronograma de aulas que foram realizadas em uma escola particular situada em um
bairro de classe média, localizado em um distrito de Campinas. Essa escola atende a
população local, crianças aparentemente de classe média. A turma escolhida foi uma
turma de quinto ano, entre dez e onze anos. As atividades foram feitas em grupos, em
sua maioria, precedidas de conversa em roda para contextualização do conteúdo e
possíveis discussões. As atividades não foram apenas reproduções de modelos,
permitiram aos alunos usarem sua criatividade e apresentarem novas formas de
elementos ginásticos. As aulas foram contextualizadas pela história da ginástica, assim
os alunos vivenciaram como ela se iniciou e algumas das diferentes ginásticas que
temos hoje. Além da vivência, os alunos foram estimulados a pensar como essas
ginásticas, mesmo que tradicionais, podem ser feitas de maneira diferente, ou seja,
transformadas por eles. Finalizamos o conteúdo com a ginástica geral, pois esta
permite uma síntese, em forma de coreografia, na qual os alunos poderiam utilizar tudo
que vivenciaram durante o processo de desenvolvimento do estudo.
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Durante o processo das aulas fui uma observadora participante, pois além de
observar o que se passava na aula estava totalmente inserida nas mesmas,
ministrando-as. Esta é uma estratégia segundo Ludke (1986), que combina análise
documental, a participação e observação direta e a introspecção. Para delimitar minhas
observações, construí um roteiro inicial que privilegiou os seguintes pontos:
• Perfil dos alunos;
• Planejamento, e a aula de fato;
• Como o conteúdo da ginástica foi apropriado pelos alunos;
• Espaços da escola;
• Ambiente social da escola.
Ainda como observante, dei ênfase aos pontos chaves das aulas, como
por exemplo, atividades que desencadeassem diversas interpretações, por parte
dos alunos. A partir desses acontecimentos/ fatos que poderiam ocorrer durante
as aulas me auto-observei, procurando perceber como eu, no papel de
professora, poderia dar continuidade ao diálogo2 da ginástica. Observei também
como se deu a apropriação da ginástica, a partir do contexto social em que os
alunos estão inseridos.
Observei os gestos que desencadearam diversas interpretações e
modificações ao longo das aulas, eles foram o ponto chave para a análise dos
dados. Muitas vezes para dar continuidade à aula, eu precisei intervir para fazer
com que os gestos que constituíram as aulas pudessem ter uma compreensão, e
usando da criatividade, uma resposta. Acredito que estas observações e este
trabalho em si permitirão a mim e aos meus colegas de profissão uma outra
visão e uma nova possibilidade sobre o ensino da ginástica. Nesta perspectiva, é
possível pensar que a ginástica além de ser sociabilizada, pode incitar novas
formas de praticá-la, além disso, este processo pode possibilitar uma formação
processual para todos o que nele se envolveram (pesquisador, professor,
alunos).
Este estudo está dividido em quatro capítulos. No primeiro capítulo é
discutida a ginástica e como ela pode ser pensada como linguagem. Como se

2
Uso o termo diálogo, pensando a teoria de Bakhtin, substituindo as palavras pelo gesto ginástico.
14

deu a constituição da ginástica e a relação dela com a linguagem, seguindo os


conceitos de linguagem segundo Bakhtin.
No capítulo II trato da pegagogização da ginástica. Neste capítulo explorei
duas das teorias metodológicas da Educação Física, são elas: a teoria crítico-
superadora, e a concepção de aulas abertas. A partir delas e do conteúdo
discutido no capítulo anterior pensei em como a ginástica entendida como
linguagem pode ser pedagogizada.
No Capitulo III apresento como o planejamento das aulas foi pensado,
alguns pontos importantes a serem ressaltados para a elaboração das aulas.
Ainda neste capítulo mostro como se deu o processo das mesmas.
No último capítulo trato dos avanços e das contradições encontradas
durante todo o processo de investigação teórica, das aulas, e a relação da teoria
com a prática. As dificuldades e as realizações que encontrei pelo caminho ao
dialogar teoria e prática.
15

2 - A GINÁSTICA

A ginástica nem sempre se configurou nos moldes que temos hoje. Por muito
tempo a ginástica foi considerada toda e qualquer atividade física. Segundo Ramos
apud Souza (1997, p. 21) a ginástica era entendida como a prática do exercício físico e
acompanhou o homem por toda sua história.
Segundo Souza (1997, p. 21), na Grécia surgiu o conceito de beleza humana, a
atividade física era muito valorizada, tanto como educação do corpo, em Atenas como
preparação para guerra, em Esparta. Além da Grécia, muitos outros países utilizavam a
atividade física como forma de preparar o corpo para a guerra. No período da idade
Média não foi diferente, a atividade física era feita para preparação dos soldados para
as cruzadas.
Mas, foi na Idade Moderna que o exercício físico passou a ter grande valor na
educação. (Souza, 1997). A partir de 1800, segundo Soares (2004, p. 51), começou a
sistematização dos movimentos ginásticos. Na Europa surgiram quatro grandes
movimentos ginásticos, sendo que um deles aconteceu na Inglaterra e teve o esporte
como foco. Os outros três movimentos Ginásticos eram: o movimento do Oeste (escola
Francesa); o movimento do centro (escolas de ginásticas Da Alemanha, Áustria e
Suíça); e o movimento do norte (escola Sueca e abrangeu os demais países nórdicos).
Essas escolas segundo Soares:
de um modo geral, possuem finalidades semelhantes: regenerar a raça (não
nos esqueçamos do grande número de mortes e doenças); promover a saúde
(sem alterar as condições de vida); desenvolver a vontade, a coragem, a força,
a energia de viver (para servir a pátria nas guerras e na indústria) e, finalmente
desenvolver a moral (que nada mais é do que uma intervenção nas tradições e
nos costumes dos povos) (2004, pg. 52)

Esses movimentos trouxeram à ginástica uma característica de atividade


embasada no conhecimento científico. Segundo Soares (2004, p.52), com a
sistematização da ginástica, esta se tornou importante na sociedade industrial,
corrigindo vícios de postura causados pelo trabalho, passou a ser relacionada com a
medicina e por isso ganhou status. Mesmo com objetivos comuns, essas escolas de
ginástica possuíam característica de seus contextos sociais. A Alemanha ainda não
havia se tornado um país no período que a escola Alemã de ginástica foi criada. Por
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isso, a preocupação da formação dos cidadãos, fortes e saudáveis para a qualquer


momento defender a pátria em uma suposta guerra (Soares, 2004, p. 53). É na
Alemanha que surgem os primeiros aparelhos de ginástica. “Em suas formulações
práticas para execução dos exercícios físicos, Jahn cria “Obstáculos Artificiais” que
mais tarde serão denominados aparelhos de ginástica” (Soares 2004, p.54). O
idealizador da Ginástica Alemã, Friederich Ludwig Jahn acreditava que para a formação
total do homem era preciso estimulá-lo (Soares, 2004, p. 54).
Podemos notar como a ginástica era utilizada como técnica e meio para fins
políticos, de guerra e de controle social. Mesmo sem nenhuma abertura para
contestação dos métodos, a ginástica possuía características de uma população e foi
pensada para a mesma, ou seja, não havia espaços para os praticantes de ginástica
contestarem os métodos que estavam praticando.
Apesar de pensada para uma determinada população, a história da ginástica foi
construída junto à história do mundo. No Brasil a maior influência do exercício físico
sistematizado foram essas escolas Européias. Segundo Bracht et. al (2003) somente no
sec. XIX é que Educação Física chega ao Brasil, porém é feita de forma militarista e de
acordo com as escolas de ginástica européias. A ginástica era chamada de ginástica
elementar e possuía conteúdos como:
exercícios de flexibilidade, equilíbrio, lutas, forças, saltos e, ainda,
exercícios pírricos, de natação, volteios e exercícios militares. Assim seu
método exigia um pórtico no qual se adaptavam barras fixa, argolas,
trapézio, escada de cordas, paus e cabos volantes, barras paralelas,
escadas de madeira, graduador de saltos, além de pesos cordas, cabos
e tamboretes.(Bracht et. al, 2003, p.19)

Além desses exercícios modelos de ginástica elementar eram trazidos da


Europa: “Duas propostas são apontadas, O novo guia para o ensino da ginástica nas
escolas públicas da Prússia [...] e que se adotasse o sistema de Dr. Barnetts.” (Bracht
et. al. 2003, p.20). O caráter higienista e militarista sempre esteve presente nas
atividades físicas, o que acontecia na Europa era trazido para o Brasil, como um
modelo, tudo isso para a construção de uma nova ordem social. (Soares 2004, pg. 83).
Ainda hoje a ginástica carrega muito desse histórico, pois afinal faz parte da
história do ser humano, com ele se transformou e ainda hoje é transformada. Como, por
exemplo, os obstáculos artificiais foram transformados e hoje temos aparelhos de
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ginástica. Assim como esta, inúmeras outras transformações aconteceram, seja no


modo de utilizar aparelhos, seja na forma de realizar os exercícios. Nos primórdios da
ginástica ela era usada como forma de educar o corpo, uma educação voltada para o
controle social. Hoje a ginástica se faz diferente do que era antes, existem outros
espaços, entre eles espaços abertos e outras formas de propostas pedagógicas. Como,
por exemplo, a proposta da Ginástica Geral. Segundo Souza (1997, p.83) o que
acontece no Brasil é que devido à sua diversidade geográfica e cultural serem
conservados, o povo brasileiro possui diferentes formas de organização, de solução de
problemas que são expressas em várias manifestações culturais como a dança, jogos
entre outros, e:

todos esses aspectos são levados em conta ao se definir o conteúdo a ser


desenvolvido nas aulas de Ginástica Geral [...] Esta proposta procura investigar
novas formas de atuação, onde sejam respeitados os valores culturais, as
características, as expectativas e as necessidades de quem as pratica. (Souza,
p. 83)

A proposta da Ginástica Geral é uma das propostas que pensam a Ginástica de


maneira pedagógica, e que permite ao praticante uma forma de refletir e acrescentar
algo de si na mesma.
A ginástica, assim como outros exercícios físicos, muitas vezes, é pensada por
apenas uma via. Os exercícios são aprendidos de forma a ter apenas um significado.
Geralmente são ensinados de forma que não possam dar margem para outra
interpretação, são vistos de forma unívoca, por exemplo, o rolamento deve ser feito de
uma forma somente, apenas como rolamento. Porém, algumas propostas deixam
abertura para que esse rolamento seja feito de forma diferente. Cada pessoa possui
uma experiência diferente, devido à sua formação, ao contexto social em que está
inserido, ou seja, um rolamento por mais que tenha a técnica para ser feito, será
diferente em cada pessoa. A ginástica não deve ter apenas uma forma de executar os
movimentos, deve estar aberta para que se possa acrescentar algo à mesma.
A ginástica segundo Soares et, al., (1992) se constitui um dos elementos da
cultura corporal, e deve ser pensada como linguagem. Pois acompanha a história do
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homem e como construímos nossa linguagem por meio do contato com nossa cultura,
assim toda manifestação da cultura corporal pode ser pensada como linguagem.
A linguagem é o que nos permite uma interação com o mundo. Construímos
nossa linguagem a partir do diálogo, utilizamo-nos de símbolos e signos que estão
presentes no contexto social em que estamos inseridos, para o construirmos. Utilizamo-
nos de palavras que estão presentes no nosso dia-dia, convivemos, com essas
palavras e nos apropriamos delas, as fazemos terem sentido para nós. A partir disso
construímos o significado de cada palavra, e sem o contexto a mesma não tem sentido.
Com os gestos que constituem uma determinada prática corporal, no caso a ginástica,
isso não é diferente. Apropriamo-nos de gestos e maneiras de nos portarmos no
contexto social em que estamos inseridos. Ao executarmos uma atividade, teremos um
repertório cultural que configurará o gesto. Ao partirmos para a aprendizagem de uma
prática, em específico, carregamos conosco essa bagagem, essa linguagem que
podemos chamar de linguagem corporal. Cada elemento da cultura corporal teve um
significado e ainda hoje é ressignificado, está sujeito a mudanças. Nossos gestos nos
permitem nos comunicarmos com o mundo, sem sequer dizer uma palavra falada, eles
fazem parte da constituição de nossa linguagem.
Segundo Jobim e Souza 1994:
É na linguagem e por meio dela que construímos a leitura da vida e de nossa
própria historia. Com a linguagem somos capazes de imprimir sentidos,
sentidos que por serem provisórios refletem a essencial transitoriedade da
própria vida e de nossa existência histórica. (Jobin e Souza, p. 21)

A ginástica é uma linguagem quando o seu significado é construído pela


apropriação de seus elementos. Nem sempre esta apropriação se dá nos espaços das
aulas de Educação Física, ou em uma escolinha de ginástica. Podemos notar que os
elementos da ginástica estão presentes no dia-dia de todos, a ginástica não é somente
aprendida na escola, ou em espaços próprios, podemos vê-la pelas ruas, ou mesmo
quando nos deparamos com crianças na escola que trazem uma bagagem de
elementos corporais de seus contextos sociais. Muitas vezes elas trazem elementos da
ginástica que estão presentes em seu contexto social.
Segundo Bakhtin (apud, Jobin e Souza, 1994), construímos nossa consciência a
partir da dialogia, da linguagem. Porém, essa linguagem só existe, pois estamos
19

inseridos em um contexto em que signos, símbolos gêneros de constituição de


linguagem foram construídos, e utilizamo-os, mesmo sem saber de sua existência.
Ainda, segundo esse autor, durante um diálogo, o falante inicia a fala com elementos de
sua cultura, o receptor, tem uma interpretação do que foi dito, de acordo com os
símbolos que carrega de seu contexto histórico, isso é chamado de linguagem social. O
sujeito carrega em seu discurso elementos de sua classe social, de acordo com o
tempo histórico que está vivendo. (Smolka, apud Daniels 1995, pg. 129)
Estas linguagens sociais possuem variações que caracterizam os gêneros da
fala, aqui troco a fala e a palavra pelos gestos. Estes gêneros:
correspondem a situações característica de comunicação [...] a temas
característicos e conseqüentemente, correspondem também a contatos
específicos entre significados das palavras e a realidade concreta do momento
sob determinadas circunstâncias características. (Bakhtin, 1986, p. 87, apud
Daniels, 1995, p.130)

Cada gesto possui um significado em um determinado contexto social, existem


os gestos característicos de alguma prática corporal, mas ao executá-la cada pessoa
terá sua forma de fazê-lo. Os elementos da ginástica sempre serão os mesmos: saltos,
balanços, giros, etc. Mas cada população, cada pessoa, os fará de acordo com o
contexto em que se encontra. Os gêneros da fala podem ser utilizados de duas formas,
uma delas é a unívoca e a outra é a dialógica. Este conceito é apresentado por Lotman,
como dualismo funcional. (apud Daniels, 1995, p.133). Na primeira situação a
enunciação tem apenas um significado, busca a informação. Na segunda situação a
enunciação permite um espaço para a construção do conhecimento. Cada pessoa a
partir de sua bagagem constrói um determinado exercício conhecendo o tradicional,
porém acrescentando algo de si.
A segunda situação é a que mais nos interessa, pois possibilitará a nossos
alunos construírem a ginástica com a bagagem que possuem.
A ginástica como linguagem assumiria duas formas de ser ensinada. Podemos
dizer que a ginástica sempre foi utilizada e ensinada apenas em sua forma unívoca, de
acordo com o já dito anteriormente. Poucos espaços possibilitaram que os alunos
construíssem seu conhecimento. Assim, a técnica foi priorizada. É preciso dar espaço
para que a Ginástica seja tratada como linguagem e não apenas como técnica. Espaço
20

para que cada pessoa possa contribuir para a construção de um elemento, assim este
elemento terá características diferentes vindas de várias pessoas.
A ginástica como manifestação dialógica permitirá que cada pessoa acrescente a
sua interpretação a respeito da mesma. Desta forma, novos elementos aparecerão e o
processo de transformação continuará por parte de cada um, esses elementos serão
apropriados e farão parte da bagagem de cada aluno, tendo assim um significado para
eles. Somente quando algo possui um significado é que conseguimos perceber que
aquilo faz parte de nossas vidas. Para cada pessoa e para cada cultura haverá uma
interpretação do que estamos vivendo, porém com significado diferente. Estes
significados serão construídos socialmente, através da sociabilização; segundo a teoria
de Vygotsky, citada por Smolka, na “abordagem do funcionamento mental humano,
onde o conhecimento é internalizado, a dimensão social da consciência é primordial”
(Smolka, apud Daniels, 1995, pg. 121). Isso nos leva a entender que a construção do
conhecimento se dá socialmente. A apropriação do mesmo acontece, pois o contexto
social é quem/ o que possibilita a construção do conhecimento. Construímos nossa
linguagem a partir de nossos corpos, conhecemos a realidade a partir deles, toda a
transformação de nossas vidas se dá a partir de nossa linguagem e de nossas
apropriações.
Por mais que os professores buscassem manter a técnica estritamente como foi
criada, sempre ensinando os elementos da ginástica com uma única forma de executá-
los, mesmo assim, a ginástica foi e é sociabilizada, transformada, apropriada. Por mais
que pareçam insignificantes estas transformações aconteceram. Seja nas escolas de
ginástica, seja na rua, em espaços de treinamento; a ginástica é um conteúdo da
cultura corporal, construído historicamente que faz parte da construção de nossa
linguagem. Linguagem construída e apropriada do contexto social em que cada pessoa
está inserida. Por mais que a ginástica possua elementos e gestos característicos, a
forma de executá-los e de apropriá-los dependerá do contexto social de cada pessoa.
21

3 - UMA FORMA DE PEDAGOGIZAR A GINÁSTICA

O conhecimento, como já dito anteriormente, foi construído pelo homem, e é


parte da cultura universal, porém é preciso dar significado ao conteúdo (processo de
aprendizagem do que consideramos importante que os alunos saibam), é preciso trazê-
lo para a realidade dos alunos, e pensar o que de fato é conteúdo universal. Temos o
conteúdo clássico. O clássico não é o que é ultrapassado, ou o antigo, mas sim o que
de fato persistiu até os tempos de hoje, que se adequou aos tempos e ao contexto
social, algo que é de fato importante.
O trato com o conhecimento reflete a sua direção epistemológica e informa os
requisitos para selecionar, organizar e sistematizar os conteúdos de ensino.
Pode-se dizer que os conteúdos de ensino emergem de conteúdos culturais
universais, constituindo-se em domínio de conhecimentos relativamente
autônomos incorporados pela humanidade e reavaliados, permanentemente,
em face da realidade social. (LIBÂNEO, 1985, pg.39, apud SOARES ET. AL.
1992, pg. 30

O ensino deve ser aberto para mudanças, sempre estará em transformação,


temos assim outro princípio curricular que é:
O da provisoriedade do conhecimento. A partir dele se organizam e
sistematizam os conteúdos de ensino, rompendo com a idéia de terminalidade.
É fundamental para o emprego deste principio apresentar o conteúdo o aluno,
desenvolvendo a noção de historicidade retraçando-o desde a sua gênese, para
que este aluno se perceba quanto sujeito histórico. (Soares et. Al., 1992 p.33)

Além de trazer os elementos para a realidade do aluno, é preciso permitir a ele


abertura suficiente para que possa intervir no conteúdo tratado. Segundo Hilderbrandt
(1986, p. 10) muitas das formas tradicionais de tratar a Educação Física, pensa a
mesma como algo que não pode ser mudado, assim, as aulas não possuem abertura
para os alunos se expressarem. O professor faz um planejamento fechado. O
conhecimento parte do professor e os alunos não possuem abertura para tomar
decisões que direcionarão os objetivos da aula: “Quase sempre se pode comprovar,
nestes casos, que a aula de Educação Física não é adequadamente preparada para o
aluno, de modo que este se sinta não como sujeito, mas sim como objeto da aula.”
(Hilderbrandt 1986, p. 10).
O professor se encontra na sala de aula como um mediador das atividades,
segundo Hilderbrandt (1986), o professor deve propiciar aos alunos espaços para que
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eles possam repensar a atividade em que estão trabalhando, proporcionando


possibilidades de escolhas, em que eles possam ser sujeitos de suas próprias ações.
O professor deve estimular os alunos a colocarem suas idéias em prática para
que possam de fato contribuir com o processo de aprendizagem. (Hilderbrandt, 1986,
pg. 33). O autor propõe as aulas abertas com o intuito de que os alunos possam
pensar o esporte independentemente de um professor os guiar futuramente.
Essa idéia também pode ser associada ao que Vygotsky chama de zona de
desenvolvimento proximal, pois é:
na qual se reflete a relação interna entre educação e desenvolvimento mental.
O sentido geral dessa “zona” é que, em um determinado estagio de seu
desenvolvimento, uma criança consegue resolver uma certa gama de
problemas apenas sobre a orientação de adultos e em colaboração com
colegas mais experientes, mas não consegue fazê-lo independentemente. Os
problemas resolvidos pela criança, inicialmente sob a orientação e em
colaboração com outros, serão, mais tarde, solucionados de forma
completamente independente. (Davydov e Zinchenco, apud Daniels, 1994, pg.
162)

Sociabilizando o conhecimento, estimulando os alunos a trabalharem em grupos


e fazendo-os perseguir respostas para seus questionamentos, é assim que o professor
deve interagir com seus alunos. Para que possam se tornar sujeitos de suas ações. O
intuito das aulas abertas é que haja participação dos alunos nas tomadas de decisões,
e não deixá-los em atividades livremente, há um conteúdo a ser tratado, mas é possível
que haja a participação do aluno na construção do mesmo. O professor como
mediador, deve contextualizar o conteúdo, mostrar aos seus alunos como estes
conteúdos foram historicamente construídos, e em se tratando de Educação Física
estamos falando dos elementos da cultura corporal.
Os elementos da cultura corporal devem ser compreendidos pelos alunos como
uma construção histórico-cultural. Sendo histórica pode ser transformada, está sujeita a
mudanças. E estas mudanças pertencem a eles também, os alunos, que deverão ser
sujeitos de suas decisões.
Uma forma possível de proporcionar a construção do conhecimento é a
sociabilização. No caso da Ginástica, as crianças podem experenciar em grupos,
estimuladas pelo professor. Criar novas situações em que mais coisas serão
23

acrescentadas e enriquecidas com a sociabilização do conhecimento por parte de


todos.
O trabalho em grupo inicialmente pode trazer conflitos, opiniões diferentes, isso
só irá enriquecer as experiências que eles terão. Cada aluno terá uma visão diferente
de cada elemento da mesma, para cada um existirá uma interpretação diferente. São
essas diferenças que trarão as transformações, que possibilitarão novas formas de
fazer os elementos já conhecidos, neste caso, os elementos da ginástica.
O professor deve estimular os alunos a descobrirem, além dos elementos
tradicionais da ginástica, outras formas de executá-los, despertando-lhes a curiosidade
para o conteúdo que é tratado. E quando os problemas surgirem o professor deve
estimular os alunos à por as possíveis respostas em prática. (Hilderbrandt, 1986, pg.
34).
O professor deve proporcionar aos alunos formas de vivenciar esses elementos
dos quais se compõe a ginástica. Porém, sem descartar as possibilidades apresentadas
pelos alunos, e permitir que esses também sociabilizem o conhecimento que já
possuem, ou seja, que já foi apropriado. Contextualizar e mostrar de onde vem a
ginástica é uma contribuição importante que o professor deve dar a seus alunos para
que eles possam acrescentar mais ao conhecimento tratado, e refletir sobre o mesmo.
A sociabilização do conhecimento se dará em atividades em pequenos grupos, algumas
vezes, em grupos maiores. De forma que os alunos possam construir a ginástica da
escola e não uma prática reproduzida, dos meios de comunicação de massa sem
nenhuma reflexão.
O que vemos hoje, muito presente na ginástica escolar é sua esportivização. A
ginástica sempre é vista nos parâmetros olímpicos, assim as atividades de ginástica
quase não são desenvolvidas nas escolas, pois se buscam sempre os materiais
tradicionais e de grande porte para o desenvolvimento da ginástica.
A ginástica, especialmente na escola, deve ser pensada de forma que seus
elementos sejam vivenciados e experimentados por todos. Seguir os parâmetros
Olímpicos é apenas reproduzir uma prática já existente, não há transformação, não há
a representação do que está sendo vivenciado por cada um. Há apenas a restrição
desta prática. É preciso trazê-la para a realidade escolar.
24

Pode-se entender a ginástica como forma particular de exercitação onde, com


ou sem o uso de aparelhos, abre-se a possibilidade de atividades que
provocam valiosas experiências corporais, enriquecedoras da cultura corporal
das crianças, em particular, e do homem em geral. (Soares ET., AL., 1992, P.
78)

O professor pode utilizar os espaços da escola inicialmente para o


desenvolvimento das aulas, após a exploração desses espaços é que o professor deve
partir para a utilização dos materiais tradicionais da ginástica. As atividades também
devem ser pensadas de forma que faça os alunos terem experiências cognitivas como:
prazer, medo, tensão, desagrado, enrijecimento, relaxamento; experiências que
proporcionem o sucesso de todos e que o coletivo realize atividades com os elementos
citados anteriormente.
Para a elaboração das aulas o professor deve “constar, interpretar, compreender
e explicar” (Soares, et. al. 1992 p.87). Ao mesmo tempo em que o professor deve
passar os conteúdos para os alunos, também deve ser um observador. Podemos nesta
passagem, associar a idéia de observador participante, alguém que deve observar o
que acontece ao mesmo tempo em que está inserido no contexto. (Soares et al.1992).
Para trabalhar a ginástica foi preciso pensar como o cronograma das aulas
aconteceria. Primeiramente para contextualizar a ginástica passei por várias etapas da
mesma, desde seu surgimento, a utilização da ginástica para preparação do corpo.
Posteriormente, trabalhei com três tipos de ginástica: a Ginástica Artística, fazendo uma
transição da calistenia para a GA; a ginástica acrobática e a ginástica Rítmica.
Pensando como os elementos característicos dessas ginásticas poderiam vir para a
escola, como poderiam se pensados de uma forma diferente. Por exemplo, como a
leveza da GR poderia ser feita por pessoas que não a praticam e não possuem
capacidades como as das ginastas.
Terminei o conteúdo com a Ginástica Geral, pois ela permite a síntese de tudo o
que já foi visto. Esta síntese se deu através de uma coreografia. Esta coreografia foi
elaborada pelo grupo de alunos, o que permite com que a sociabilização estivesse
bastante presente entre os mesmos. Na GG os alunos puderam trazer elementos de
outras práticas corporais, enriquecendo a síntese final com seus saberes e conteúdos
apropriados.
25

4 - AS AULAS

O planejamento foi elaborado tendo como base as teorias didático-pedagógicas


discutidas anteriormente, contextualizando todas as fases da Ginástica. Para a
elaboração deste estudo, primeiramente, pensei como seriam as aulas para que a
ginástica fosse entendida como linguagem.
Para isso não me prendi a apenas uma ginástica. Como já dito no capítulo
anterior, a ginástica é um conteúdo universal, construído historicamente; ao me remeter
a ginástica nestes termos, não abordei apenas uma ginástica, como a GA, por exemplo.
Abordei a ginástica como um todo e apresentei algumas de suas modalidades. Durante
o planejamento destas aulas, pensei em socializar o máximo da ginástica, quanto mais
os alunos conhecessem-na, mais poderiam compreender sobre ela. Cada modalidade
possui algo em comum que vem de uma raiz comum, acreditei que conhecendo isso e
como cada modalidade da ginástica se concretizou, os alunos poderiam dar mais
sentido ao conteúdo. De acordo com o que discuti no primeiro capítulo, segundo
Bakhtin, é preciso compreensão da enunciação para que haja continuidade do diálogo.
Se a ginástica é uma linguagem, para que os alunos consigam dar continuidade a esse
diálogo, a enunciação deve ser o que eu como professora apresentaria a eles a
respeito da ginástica, ou um ponto de partida, que lhes mostrasse os conteúdos
clássicos de cada ginástica. A partir disso, eles dariam continuidade ao diálogo de
acordo com a compreensão que tivessem sobre o mesmo.
Outro fato de destaque foi o de eu elaborar este planejamento sem conhecer a
turma. A princípio pensei que qualquer planejamento caberia a qualquer turma, desde
que aberto às mudanças que poderiam acontecer, e as solicitações da turma no
decorrer das aulas. O planejamento seria um norte a seguir, como eu abordaria o
conteúdo, mas não uma cartilha, tendo obrigatoriamente que segui-lo de cabo a rabo.
Isso de fato me ajudou muito, pois tive que fazer alterações nas aulas no seu decorrer.
Algumas vezes isso se deu por imprevistos que aconteceram durante as aulas, outras
vezes, procurei prestar atenção ao que já havia acontecido e modificar a próxima aula,
mesmo que os alunos não tivessem me solicitado. Não sabia o que iria acontecer, mas
de acordo com as aulas que passavam tentava prever como algumas coisas
26

aconteceriam. Um exemplo disso foi a forma de abordar o conteúdo da GG. Nas aulas
em anexo, podemos ver que eu iria trabalhar um elemento de cada vez: os saltos, os
giros e os equilíbrios. Além de trazer outros elementos que não os da ginástica para a
aula. Na primeira aula de GG, notei que os alunos tiveram dificuldade em trazer para a
ginástica os elementos do esporte, que foi o mais utilizado. Os alunos não conseguiam
se desvincular da imagem que possuem dos esportes. Traziam elementos exatamente
como são: a cesta do basquete como cesta de basquete, a cortada do vôlei como a
cortada do vôlei. Era preciso lembrá-los de transformar isso em algo ginástico. A
composição feita neste dia foi rica em elementos como saltos, giros entre outros
elementos ginásticos, além dos elementos do esporte que com muito custo os alunos
trouxeram para a ginástica. Por isso modifiquei as aulas seguintes, deixando-as para a
composição da coreografia em grupo. O princípio das aulas abertas, discutida
anteriormente, nos orienta para que os alunos possam de fato intervir nas aulas, até
mesmo no planejamento do conteúdo. Neste trabalho o conteúdo já foi estabelecido,
era preciso trabalhar a ginástica. A participação dos alunos aconteceu muito mais nas
aulas e nas atividades, do que no planejamento. Pelo conteúdo ser pré-determinado e a
forma de abordá-lo, eu procurei deixar as aulas com espaços para que os alunos
interviessem, para isso elaborei atividades em grupos, além disso, estava sempre
atenta a novas propostas para a elaboração das atividades.
Vejamos uma passagem da aula de GG:
“Sugeri que se dividissem em trios ou em duplas para pensar em algum
elemento que poderia vir de outra área para a ginástica. Alguns alunos me pediram se
poderiam ser dois grandes grupos. Consultei a sala toda e todos acharam que era
melhor os dois grupos. Não me opus à decisão da turma.”
Apesar de me terem como um símbolo de autoridade, isto de modo algum
representou autoritarismo, pois eu procurava dar a eles espaços para que de fato
contribuíssem com as aulas. E não apenas que me obedecessem, porém em alguns
momentos acabei me contradizendo, falarei disso mais a frente.
27

4.1 A ESCOLA

A escola em que foram realizadas as aulas é uma escola particular situada em


um bairro de classe média, localizado num distrito da cidade, que atende a população
deste bairro e de todo o distrito, aparentemente os alunos são de classe média. Apesar
de ser uma escola particular, os recursos não são abundantes. A escola possui um bom
espaço físico, que mesmo não sendo grande, comporta bem a quantidade de alunos
que possui. Na escola existe uma quadra poliesportiva, ao ar livre. Há um pátio coberto
onde as crianças lancham. Este espaço também é usado para as aulas de educação
física quando chove, pois a quadra se torna inutilizável. A escola possui uma sala de
vídeo, pequena, mas que comporta uma turma da escola tranquilamente, pois as
turmas não possuem mais que 20 alunos. Os materiais de educação física são
suficientes e com bastante variedade, por exemplo, aparelhos de ginástica rítmica, de
ginástica artística, o que é difícil de encontrar em outras escolas.Há também o
parquinho que possui brinquedos que foram usados como aparelhos de grande porte
da ginástica durante as aulas. Há também muitas árvores e um bom espaço verde
dentro da escola.
Os alunos não usam uniformes, diferente de outras escolas, eles parecem poder
de fato opinar e participar da construção da escola. Em geral todos os alunos possuem
uma relação bastante próxima com os professores e funcionários da escola, a troca de
conhecimento se torna mais fácil. Mas, como em toda escola, existem os papéis de
professor, aluno, funcionário e quando preciso estes papéis são lembrados a todos. A
turma escolhida foi o quinto ano de acordo com a nova legislação; antiga quarta série.
Nesta turma existem 14 alunos, 7 meninas, uma delas com atraso no desenvolvimento,
pode-se notar que ela é mais velha que as outras, 7 meninos, três deles com condições
especiais. Apesar de terem entre 10 e 11 anos, os alunos são bastante maduros e
responsáveis se comparados às crianças de mesma idade. Pode-se dizer que esta
turma é bastante ativa fisicamente do que muitas outras que tive contato. Em geral,
foram muito curiosos, e investigativos.
Quando cheguei à escola, para falar da pesquisa eles se sentiram importantes,
pois, segundo o relato da professora, estes alunos gostariam de ter algo diferente, uma
28

experiência nova, visto que são os mais antigos alunos da Professora de Educação
Física que me recebeu. E a forma como a professora colocou a pesquisa os fez pensar
que faziam parte de algo muito importante, acredito que isto contribuiu muito para terem
colaborado bastante em quase todas as aulas. Desde o primeiro ano, estes alunos têm
contato com a ginástica, pois a professora procura trabalhar os conteúdos da Educação
Física de uma forma completa. Em especial, eles possuem um contato maior com a
ginástica acrobática, pois em um ano eles vivenciaram vários educativos, e puderam se
aprofundar um pouco mais nestas técnicas. Acredito que as aulas de Educação Física
nos anos anteriores contribuíram para a formação destes alunos e para a bagagem que
possuem. Assim, quando cheguei à escola os alunos me receberam com entusiasmo,
muito curiosos e ansiosos para começarmos. Ter alunos participativos era um grande
passo para alcançar meu objetivo, ou seja, o de ensinar a ginástica como linguagem.

4.2 O PROCESSO

Ao chegar à escola me senti insegura, apesar da experiência com Ginástica, o


contato maior que tive com escolas foi durante o meu estágio de licenciatura. Achei que
minha insegurança poderia atrapalhar no desenvolvimento da pesquisa, pois domino o
conteúdo de ginástica, mas não havia feito um trabalho como esse, sozinha. Sendo
assim como poderia dar andamento as aulas e tratar a ginástica como linguagem? As
aulas começaram com um clima de curiosidade. Os alunos pareciam investigar o novo,
a pessoa nova que estava na frente deles. Para mim era algo novo também. Quando
as aulas começaram, eles pareciam decepcionados, pareciam esperar mais das aulas,
por eu ser uma pessoa de fora que levaria a eles uma coisa nova. A forma como
comecei o conteúdo, acredito ter sido muito diferente do que eles estavam esperando.
Isso me fez achar que o trabalho não andaria. Que os elementos que eu havia
imaginado que surgissem, não surgiriam por desinteresse por parte dos alunos. Mas
isso não aconteceu, os alunos pareciam mesmo desapontados, muito respeitosos, pois
eu era como uma convidada. Ao longo das aulas esse sentimento foi mudando, pois os
alunos pareciam mais motivados. Isso de certa forma contribuiu para a construção da
ginástica como linguagem, pois mesmo no começo das aulas em que os alunos
29

pareciam desmotivados, o compromisso em participar das aulas acontecia, parecia um


código de honra feito com a professora de Educação Física. Por outro lado, só pude
perceber a espontaneidade deles com o passar das aulas, e a contribuição para tratar a
ginástica como linguagem quando se tornaram motivados para a mesma, a partir deste
momento é que fatos importantes como a criatividade afloraram.
Antes de começar o conteúdo, fiz uma breve investigação a respeito do que eles
sabiam sobre a ginástica, muitos deles me responderam que ela é um esporte olímpico.
Não respondi logo no começo a essa pergunta, queria que eles descobrissem as
demais possibilidades da ginástica. Queria que eles construíssem um significado
diferente desse. Que a partir do diálogo que faríamos, eles pudessem fazer isso.
Para que a ginástica fosse tratada como linguagem e de uma maneira dialógica,
era preciso um enunciado, esse enunciado era a forma de mostrar aos alunos os
elementos clássicos e tradicionais de cada ginástica e como surgiram, para que após
isso eles dessem continuidade ao diálogo. Muitas vezes, procurei instigá-los a
chegarem nesse enunciado, nos elementos tradicionais. O fato de instigá-los fez com
que eles perdessem bastante tempo pra chegar aos elementos clássicos. Por um lado
isso é bom, pois permitiu que eles construíssem o conhecimento, e não recebesse de
forma mastigada. Eu temia que se eles conhecessem os elementos já mastigados, não
criariam algo novo, e mais uma vez como em outras abordagens eu estaria fazendo-os
reproduzir uma técnica. Por outro lado, o tempo sempre foi apertado ao longo das
aulas, pois para chegar aos elementos tradicionais eles gastavam muito tempo
sozinhos, pensando, explorando, etc. O momento, de dialogar com a ginástica, ficava
para a aula seguinte, o que fazia se perder um pouco do que foi feito na aula anterior.
Por outro lado, o momento de construírem o movimento era o momento em que a
criatividade aflorava. Vejamos uma aula em que isso aconteceu:
“Para começar a prática da ginástica fiz com que eles pensassem em atividades
físicas para curar vícios de postura causados pelo trabalho, contextualizando isso com
o período histórico que de fato aconteceu, o período do surgimento das escolas
Européias de Ginástica e do surgimento da indústria e a necessidade de trabalhar.
Neste caso, pedi que pensassem como poderia ser feita a educação do corpo e
associassem essa educação com exercícios que conhecem. Quando o contexto das
30

academias chegou à discussão, perguntei se achavam que tudo era da mesma forma
que é hoje. A resposta foi não. A questão agora era quais e como eram feitos os
exercícios. Para isso usei os elementos presentes na ginástica Natural, usei essa
palavra, mas não foi suficiente, muitas dúvidas surgiram a respeito do que seria natural
para o ser humano. Quando me referi ao que fazem os bebês, as respostas foram
imediatas. Os exercícios citados foram: rastejar, engatinhar, etc. Pedi então que os
fizessem. Neste momento temi que a aula fosse dar errado, pois todos apenas
andavam desmotivadamente. Improvisei rapidamente, pedindo que explorassem os três
planos: alto, médio e baixo, a partir disso a aula aconteceu. Continuamos com a idéia
de dificultar esses movimentos, minha idéia era que eles chegassem a movimentos que
conhecemos como: correr ao invés de andar, fazer um grande agachamento antes de
saltar, entre outros. Eles encontraram outras formas de dificultar os movimentos. Como
por exemplo, para dificultar a forma de andar, eles amarraram os sapatos de duas
pessoas; para dificultar a forma de engatinhar, colocaram uma pessoa sentada nas
costas da outra, pularam segurando o pé de sua dupla, um de frente para o outro”.
Algumas vezes ao apresentar a ginástica para eles, me detive na ginástica em
sua forma unívoca, fazendo com que vissem a técnica como ela realmente é. Apesar de
temer que reproduzissem apenas o que estavam vendo, como já dito anteriormente.
Era preciso experimentar as duas possibilidades para saber se daria errado ou se daria
certo. No caso da GR, isso deu certo:
“Procurei usar vários artifícios para que conhecessem tudo ou quase tudo sobre
a ginástica. Para falar da GR, passei um vídeo. Neste vídeo continha imagens das
Olimpíadas deste ano, essas imagens expressavam o mais alto nível técnico existente
na GR. Antes de começarmos a assistir questionei-os a respeito da GR, o que
conheciam sobre ela. E o mais conhecido eram os aparelhos. Conforme fomos
assistindo ao vídeo, perguntas foram surgindo. Só após essas perguntas foi que fiz a
contextualização da GR, como surgiu, porque, e como se dá nos dias de hoje.
Conforme respondia cada pergunta outras surgiam. Em meio aos vídeos pedi que
pensassem o que tinha em comum, entre as ginastas. Concluímos que a leveza, os
giros e o equilíbrio eram comuns. Pedi que pensassem então, como poderíamos trazer
esses elementos para a escola, para pessoas que não são atletas [...] O resultado disso
31

foram exercícios em câmera lenta, saltos e giros suavizados; parada de mãos


terminando em silêncio. Essa foi a forma de eles trazerem a GR do alto rendimento
para a escola, para a realidade deles.”
Primeiro os alunos conheceram a técnica como ela realmente é, e em seu
modelo de maior perfeição. Perguntas e questionamentos surgiram, de forma que os
alunos queriam saber mais sobre o conteúdo para melhor compreendê-lo. Quando
mostrei a eles a técnica, e questionei-os a fazer diferente eles foram criativos o
suficiente para dar continuidade ao diálogo. Acredito que este conteúdo foi um dos mais
completos, pois houve a enunciação, momento de conhecer a GR, a compreensão, e
resposta feita pelos alunos usando sua criatividade e de elementos presentes no
contexto social em que cada um se encontrava, idéia essa discutida no primeiro
capítulo.
É possível inferir desta observação anterior que para que a forma dialógica de
ensino ocorra é preciso que o professor tenha uma razão pedagógica3 clara, ou seja,
que ele transmita aos seus alunos o conteúdo clássico, que use da forma unívoca de
diálogo.
A criatividade, que para Bakhtin é um elemento importante no diálogo, não faltou.
Em todos os momentos em que pedi que descobrissem a ginástica, como, por exemplo,
a passagem que diz respeito a dificultar os exercícios, citada no começo deste tópico os
momentos em que eles respondiam as perguntas, sempre foram momentos ricos em
criatividade. Porém, a aula que acreditei que seria aula mais criativa por ter sido tratada
de forma lúdica, não foi tão rica quanto às outras aulas. Esta aula tratava do conteúdo
de Ginástica Acrobática, e para contextualizar esse conteúdo, contei a eles sobre os
bobos da corte. Para a realização das atividades em grupos propostas, eles fizeram
muitos dos exercícios que já conheciam, foi uma reprodução de técnicas. Quando se
trata de ginástica acrobática, devemos sempre pensar em cuidados, pois se feitos de
forma incorreta, os exercícios podem trazer dores, machucados aos alunos. Talvez por
isso, nesse conteúdo a criatividade não foi tanta. Porém, há inúmeros exercícios que

3
Para pensar que a mediação do professor é intencional e não se pauta em não diretividade, tomo
emprestado o termo razão pedagógica segundo Bonte e Izard apud Dauster apud Tibau (2007 p. 87).
Segundo estes autores o termo razão pedagógica se justifica por ser um “processo educativo enquanto
inculcação de valores d disposições duráveis, matriz de percepções, juízos e ações desenvolvidas por
uma cultura para transmitir seus valores”.
32

poderiam ser feitos sem causar danos a ninguém, mas que não foram sequer
cogitados. Além de outros elementos que poderiam ter sido acrescentados ao
conteúdo, pois se tratava de algo lúdico. Como já dito anteriormente, os alunos dessa
turma possuem grande bagagem em ginástica acrobática, quando tratamos do assunto,
eles somente relembraram o que já haviam vivenciado em outras ocasiões. Neste
conteúdo apesar de ter sido tratado de forma lúdica, foi uma forma unívoca de ver a
ginástica, o que era para ser criativo, foi apenas uma reprodução de técnicas já
conhecidas.

4.3 AVANÇOS E CONTRADIÇÕES

Acredito ter conseguido alcançar alguns objetivos deste trabalho, citados no


tópico anterior. Ao tratar a enunciação como sendo os elementos clássicos deixei um
padrão bastante complexo, para dar continuidade a todas as etapas do diálogo, mas ao
tentar chegar a esses elementos clássicos os alunos já dialogavam com a ginástica,
trazendo para ela algo de seu contexto social, algo de sua bagagem. Desta forma, o
diálogo da ginástica não se deu somente nos moldes que eu imaginava, mas permitiu
que os alunos dialogassem com os conteúdos tratados ao longo das aulas.
Durante o processo os alunos ao buscarem as informações, instigados por mim
ou pela professora, usaram de muita criatividade, o que segundo Bakhtin é
importantíssimo para dar continuidade ao diálogo. O conteúdo como um todo, as 13
aulas, permitiram que os alunos apropriassem a ginástica de forma diferente do que já
conheciam. Posso dizer que o diálogo aconteceu durante todo o processo e não aula
por aula somente. Apesar de terem tido contato com a ginástica em anos anteriores,
nunca haviam visto a ginástica por essa perspectiva4.
Acredito que meus avanços aconteceram nesta perspectiva, de conseguir
trabalhar a ginástica como linguagem. Porém, acredito que houve contradições,
também importantes para o avanço do conhecimento.

4
Em nenhum momento foi declarado aos alunos o objetivo desta pesquisa, ginástica tratada como
linguagem.
33

Mesmo tendo conseguido (na maioria das aulas) tratar a ginástica como uma
linguagem dialógica, em alguns momentos me voltei para a linguagem unívoca. Um
desses momentos foi durante a aula de Ginástica Calistênica:
“Os alunos pensaram em casa como os exercícios realizados na aula anterior
poderiam ser feitos dentro de um quadrado. Após a apresentação de vários
movimentos feitos por eles, (com essa idéia do quadrado) que poderiam perfeitamente
se encaixar nos exercícios da ginástica clalistênica, foram dados alguns exemplos da
mesma pela professora, esses exemplos serviram de base para pensar a transição
entre a ginástica calistênica e a GA.”
Ao dar os exemplos, a ginástica serviu apenas como fonte de informação para
dar continuidade aos elementos que viriam depois.
Acredito ter me contradito em vários outros momentos. Os momentos em que os
alunos apenas recorriam à técnica que já conheciam, ao invés de criarem coisas novas,
aconteceram, pois eu não fui clara o suficiente para que eles conseguissem
compreender o que eu estava buscando, que era fazer com que eles respondessem a
enunciação trazendo para ela sua linguagem social, como já dito anteriormente. Os
alunos seguiram as instruções, mas não interagiram como eu imaginava, acredito que
isso aconteceu por eu não ter sido clara, e por algumas vezes, não saber direito como
apresentar o conteúdo a eles. Isso se deu pela minha inexperiência como docente.
Vejamos uma aula em que isso aconteceu:
“Na aula anterior eles deveriam ter pensado como fazer os elementos da GA, de
forma diferente, [...] Foi preciso colocá-los em filas para que demonstrassem o que
haviam feito, para que os demais experimentassem o exercício de cada um. Saíram
exercícios combinados, como: chassé lateral e rolamento, rolamento a frente e
rolamento a trás. Um aluno não sabia o que fazer, me pediu ajuda. Dei o exemplo do
rolamento do palhaço, uma forma diferente de fazer o rolamento (como eu esperava
que iriam acontecer os elementos trazidos por eles, não necessariamente com nomes
diferentes). Mas mesmo assim os elementos clássicos continuaram, apenas
combinados.”
Esta passagem mostra que somente o fato de pedir para que fizessem os
movimentos de uma forma diferente não foi o suficiente para que compreendessem que
34

poderiam acrescentar algo mais aos elementos clássicos. Algo como o rolamento do
palhaço. Eles compreendiam da forma que eu explicava, e essa forma algumas vezes
não foi completa para que chegassem aonde eu esperava.
Outra contradição foi com relação à metodologia. Busquei me orientar pelas
concepções das aulas abertas e teoria crítico-superadora, como já dito e discutido no
capítulo II. Em alguns momentos não permiti que os alunos se expressassem, sendo
autoritária, dessa forma, não permiti que os alunos contribuíssem para o diálogo da
ginástica que estava acontecendo, durante as aulas. Algumas vezes, tomei este tipo de
atitude, pois não possuímos tempo hábil para tantas discussões, e se não
colocássemos em prática tudo o que estávamos discutindo, não sairíamos do lugar com
o conteúdo. Outras vezes, isso se deu, pois os alunos solicitaram um conteúdo que não
era parte da ginástica, vejamos esta aula:
“Nesta aula eu havia tido problemas com o ônibus e cheguei atrasada. Esta foi
uma aula em que a professora da turma estava ausente e havia uma professora
substituta que sabia que eu daria a aula desta turma, e que seria uma aula de ginástica,
mas ela não estava interada com o meu planejamento. Por isso enquanto eu ainda não
havia chego, deixou que eles escolhessem o que teriam na aula, temendo que se ela
desse continuidade ao conteúdo de ginástica interviria na minha pesquisa. Meu atraso
não foi o suficiente para sequer começarem a outra atividade, que era vôlei. Ao chegar
os alunos me abordaram perguntando se poderiam jogar vôlei. Sentia-me culpada por
ter chegado atrasada, neste momento fiquei pensando o que a teoria dizia sobre
ensinar aos alunos o que eles querem aprender, mas vôlei sairia do contexto da
ginástica (foco desta pesquisa), e não tive criatividade suficiente naquele momento para
unir a duas coisas. Consultei a outra professora e deixei que os alunos jogassem por 15
minutos, o que é bastante para uma aula de 50 minutos. [...] Passados 15 minutos, pedi
que voltassem para a ginástica, os alunos relutaram, usei de minha autoridade para
retomar o conteúdo.”
Se ao invés de fazê-los voltar para o conteúdo da ginástica, eu tivesse tentado
conciliar as duas coisas, os alunos poderiam trazer novos elementos para a ginástica, o
que teria sido bastante interessante, mas quando me deparei com uma situação muito
35

inesperada, a ponto de mudar o conteúdo da aula, recorri ao recurso mais próximo, e


mais fácil, que era usar do autoritarismo.
Essas contradições foram importantes para a reflexão sobre a prática, pois ela é
diferente da teoria. Além de apontar mudanças a serem feitas para aproximar a teoria
da prática.
36

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ginástica passou por muitas denominações, por muito tempo foi confundida
com toda e qualquer atividade física. A sistematização da ginástica em escolas de
ginástica acontece em um contexto em que a educação do corpo estava sendo
valorizada, pois a educação física era capaz de corrigir vícios de postura causados pelo
trabalho, como vimos no primeiro capítulo. As técnicas para isso foram se aprimorando
até chegarmos ao que temos hoje, diferentes tipos de ginástica, como esporte, como
atividade lúdica, como uma atividade física, como ginástica. Neste trabalho pensei em
como a ginástica que passou por tantos contextos, sendo assim construída
historicamente, pensando que ela pode ser ensinada na escola como linguagem.
Para isso utilizei de Bakhtin e seu conceito de linguagem, discutido no primeiro
capítulo. Pensei como trazer as idéias de Bakhtin para a Ginástica e como fazer dela
um diálogo, permitindo que ela fosse uma linguagem dialógica. Desenvolvi onze aulas,
que acreditei contemplarem essa idéia, e propus-me a desenvolvê-las em uma escola,
usando de duas metodologias da Educação Física, foram elas: a teoria crítico-
superadora, e as concepções de aulas abertas.
Procurei verificar como ocorria a mediação intencional da professora (que no
caso era também a pesquisadora) e como os alunos se apropriaram deste conteúdo.
Durante este caminho, houve algumas contradições. Mas acredito que elas
aconteceram em grande medida pela minha inexperiência como docente, e por
imprevistos que podem acontecer com qualquer pessoa, em qualquer aula, em se
tratando de qualquer conteúdo e que são fundamentais para o avanço do
conhecimento.
Entre avanços e contradições, posso dizer que os primeiros prevaleceram,
acredito ter alcançado meu objetivo, qual seja, de ensinar a ginástica como linguagem
dialógica na escola.
37

REFERÊNCIAS

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2003, 128 p. (Coleção Educação Física).

DANIELS, Harry (Org.). Vygotsky em foco: Pressupostos e desdobramentos. 5ª ed.


Campinas: Papirus Editora, 2001. 296 p.

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esboço de análise. Caderno CEDES, 3ª Ed. Campinas, 2000, nº24, p. 60- 75

________.A linguagem como gesto, como jogo, como palavra: Uma forma de ação
no mundo. Leitura: Teoria e Prática no 5,
ano 4, junho de 1985.

SOARES, Carmen. Educação Física: Raízes européias e Brasil. 3ª ed. Campinas:


Autores Associados, 2004. 144 p.

SOARES, Carmen Lucia et al. Metodologia do ensino de Educação Física. 12ª


reimpressão São Paulo: Cortez, 1992. 120 p. (Formação do Professor).
38

SOUZA, Elizabeth Paoliello Machado de. Ginástica Geral: Uma área do conhecimento
da Educação Física. 1997. 163 f. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educação Física,
Campinas, 1997. Cap. 1.

SOUZA, Solange Jobim e. Infância e Linguagem: Bakhtin, Vygotsky e Benjamin.


Campinas: Papirus Editora, 1994. 176 p.

TIBAU, Anderson. Acerca da socialização e sociabilidade no grafite. In: DAUSTER,


Tânia (org.) Antropologia e educação um saber de fronteira. Rio de Janeiro: Forma e
Ação, 2007.

WERTSCH, James V., SMOLKA, Ana Luiza B. Continuando o diálogo: Vygotsky,


Bakhtin e Lotman. In: DANIELS, Harry (Org.). Vygotsky em foco: pressupostos e
desdobramentos. São Paulo: Papirus, 1994. 296p. Cap. 4, p.121-149.
39

ANEXOS
40

Anexo A

Aula 1

Ressurgimento das práticas corporais após o período da Idade Média:


preparação do corpo para o trabalho e para Guerras. Contextualização da Ginástica
Calistênica. Pensar o corpo apenas em eixos e planos, mas que tenha uma educação
do corpo por inteiro.

Atividades
• Fazê-los explorar atividades que pareçam naturais ao ser humano:
rastejar, engatinhar...
• Pensar o corpo como máquina: nesta atividade estimular os alunos
a criarem atividades que faça o corpo representar/funcionar como máquina. E
dificultar os exercícios tidos como naturais. Atividade feita primeiro em duplas e
depois em grupos.
• Circuito de exercícios de preparo físico: esta atividade pode ser
montada a partir dos exercícios criados na atividade anterior, ou, pode ser criada
pelo professor, sendo a primeira sugestão a melhor aceita.
Swing dinamarquês (exercícios de pêndulo e movimentação do corpo)

Aula 2

Ginástica Artística. Vivenciar alguns elementos da GA, porém proporcionar para


que a partir de dicas os alunos possam criar novos exercícios.

Atividades
• Transição entre calistenia e ginástica artística. Dar um exemplo de
exercícios de pêndulo. Dar alguns exemplos de Exercícios calistênicos. Estimula-
los a criar novos exercícios que façam a transição entre a ginástica calistenica e
a ginástica Artística.
41

• Passagens pela diagonal fazendo atividades conhecidas da GA


(rolamentos, estrelas, paradas de mãos).
• Após essa passagem individual, em trios uma passagem livre, e
uma passagem que mostre um ou mais elementos da GA modificados por eles,
por esse trio.
• Conhecimento dos aparelhos. Pensar como os elementos que eles
acabaram de fazer podem ir para os aparelhos.

Aula 3

Ginástica Artística. Continuação.

Atividades

• Relembrar elementos criados aula anterior, no solo. Prosseguir com


novos elementos.
• Exploração dos aparelhos.
• Transpor para os aparelhos, os exercícios feitos na aula anterior.
• Compor pequena seqüência de movimentos, nos aparelhos em
duplas.
• Duas duplas devem escolher um aparelho e compor uma seqüência
com os movimentos criados anteriormente e apresentá-la.

Aula 4

Conhecendo a Ginástica Rítmica, contextualização, ginástica para mulheres,


malabarismo, e contorcionismo. O que eles conhecem da GR.

Atividades
42

• Vídeo de Ginástica Rítmica


• Identificação dos elementos em comum (giros, equilíbrios,
elementos de flexibilidade.
• Identificação do aparelho
• Nova exploração, coisas diferentes que podem ser feitas a partir do
visto no vídeo.

Aula 5

Ginástica Acrobática. Ginástica relacionada aos Funâmbulos (bobos da corte).


Como ela é hoje. O que eles conhecem sobre acrobacia.

Atividades

• Atividade lúdica: os alunos deveriam imaginar que se apresentariam


para um rei. Na apresentação deveriam criar formas diferentes de “subir um no
outro”. Atividade feita primeiramente em duplas.
• Construção de elementos acrobáticos a partir de dicas a respeito de
qual parte do corpo deve estar no chão ou em contato com o amigo. Exemplo:
em duplas, sem perder o contato com o amigo, apenas dois pés e uma mão no
chão.
• Em trios, criar posturas para ensinar os demais colegas.

Aula 6

Ginástica de Campinas. A partir de tudo vivenciado nas aulas anteriores,


perguntas sobre a ginástica do dia-dia, a que eles conhecem e que está mais próxima
deles.

Atividades
43

As atividades desta aula serão de acordo com os exemplos que as crianças


citarem. A aula será constituída de exemplos e logo em seguida uma nova forma de
representar o exemplo citado, e assim por diante.
A construção das atividades, desta aula, deve ser em grupos de quatro pessoas,
ou de acordo com o que os alunos preferirem. Se as crianças não apresentarem
exemplos, retomaremos a ginástica rítmica e artística, pensando uma seqüência de
elementos criada por eles a partir do vivenciado.

Aula 7
Ginástica Geral. Como surgiu a Ginástica Geral, e a riqueza de elementos
presente nela.

Atividades

• Explorar aparelhos tradicionais de forma diferente. Em grupos.


• Acrescentar novos elementos a ginástica, como elementos da
dança, da capoeira, ou mesmo a mistura de elementos existentes na ginástica.
Em duplas, cada dupla, demonstra um exercício.
• Elemento foco desta aula: saltos Reconhecer e explorar todos os
tipos de saltos que conhecem.
• Após reconhecerem todos os saltos, em trios e em grupos, criarem
novos tipos de salto.
• Montar pequena seqüência e apresentar para a sala.

Aula 8

Ginástica Geral. Continuar com o projeto de elementos e cada dia explorar um


diferente.

Atividades
44

• Elemento foco da aula: Giros


• Construção em trios, duplas ou quartetos.
• Pequena composição, acrescentar o elemento da aula passada.

Aula 9

Ginástica Geral

Atividades

• Elemento foco da aula: equilíbrios


• Relembrar Giros e saltos
• Pequena composição, se possível dando continuidade à
composição da aula passada.

Aula 10

Ginástica Geral, construção de uma coreografia em grupos.

Atividades

Aula em que os grupos começarão a criar uma coreografia com todos os


elementos conhecidos e reinventados.

Aula 11

Ginástica Geral. Finalização das composições e apresentação para a sala.

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