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Resenha aula 8

José Luis Fiori e a teoría do universo em expansão continua do poder global

A presente resenha ocupa-se da reflexão acerca do Sistema Mundial Capitalista, seu surgimento e funcionamento
baseado na analise dos mecanismos de competição entre Estados. A analise aborda a perspectiva alternativa da
Economia Política Internacional de José Luis Fiori, com o escopo de entender os fenômenos da hegemonia e da lógica
do sistema interestatal contemporâneo. A pesquisa de José Luis Fiori parte de uma matriz braudeliana de história e
analisa os desdobramentos da formação do sistema de poder mundial, revelando o caráter competitivo da relação
entre Estados. Fiori constrói sua linha de pesquisa na teoria do universo em expansão contínua, onde o poder
econômico-político exerce a função de motor propulsor das relações internacionais. A incessante atividade
competitiva entre os Estados – criadores de ordem e desordem, de paz o de guerra – nos conduz a entender as
possibilidades e as consequências futuras desse sistema interestatal. Com o conceito de “Estados-economias
nacionais” Fiori identifica as máquinas de conquista militar e a expansão econômica dos estados, cujas potência e
capacidades já haviam refletido Maquiavel e Hobbes.

Nos tempos modernos, para o autor, a conquista militar de territórios fiscais e coloniais teria dado vida à conquista
de “territórios econômicos supranacionais”, onde os “Estados-economias nacionais” impõem suas moedas e seus
capitais privados ocupam posições monopolistas que lhes rendem lucros extraordinários. Os Estados que dessa forma
se conseguem impor tornam-se “Estados-economias imperiais”.

Partindo da formação do sistema


Estados-economias-nacionais -
concebido como o primeiro sistema
interestatal – o autor mostram
como a competição entre Estados e
economias nacionais europeias
portam a formação da “máquinas
de acumulação de poder e riqueza,
dotadas de compulsão
expansiva”(FIORI, 2007: p.27), ou
seja a formação do sistema de
mundialização da lógica de poder
europeia primeiro, e estadunidense
depois. Desde da revolução comercial dos séculos XII e XIII as guerras e os tributos passaram a ser a principal atividade
dos príncipes, dos reis e, depois, dos Estados, para a acumulação de mais poder. O financiamento das empreitadas
bélicas por meio do multiplicador contínuo da dívida pública e a, subsequente e vitoriosa, expansão mundial do
século XVI mostram como para os Estados europeus a acumulação de poder e do excedente produtivo eram
prerrogativas essenciais para ocupar uma procissão hegemônica no tabuleiro geopolítico das relações internacionais.

“O conceito de poder político tem mais a ver com a ideia de fluxo do que com a de estoque. O exercício do poder requer instrumentos materiais e
ideológicos, mas o essencial é que o poder é uma relação social assimétrica indissolúvel, que só existe quando é exercido; e para ser exercido,
precisa se reproduzir e acumular constantemente. A conquista, como disse Maquiavel, é o ato fundador que instaura e acumula o poder, e ninguém
pode conquistar nada sem ter poder, e sem ter mais poder do que o conquistado. Num mundo em que todos tivessem o mesmo poder, não haveria
poder” (FIORI, 2009: p. 334)

Quanto mais poderosa é a atividade de um Estado, maior é sua preocupação com a guerra. Ao expor sua teoria do
universo em expansão, Fiori afirma que a competição sistêmica é o primeiro fator que propulsiona a luta pelo poder,
pelas guerras, pela capacidade de tributar e pela busca incessante pela acumulação do excedente. No século XVI, com
a configuração do sistema interestatal, os Estados-economias nacionais, na corrida da acumulação de capital,
resultam aquele com maior possibilidade de implementar estrategia política defensiva de ataques preventivos contra
outros entidade política territorial. Fazendo da moeda um dos principais instrumentos na luta pelo poder global, a
competição dos Estados-economias-nacionais europeus criam impérios coloniais, internacionalizando a economia
capitalista. Seguindo a linha de pensamento da teoria do Imperialismo, Fiori interpreta o fenômeno da globalização
como o resultado da expansão dos Estados-economias nacionais, os quais riusciram a impor próprio poder sobre um
território ou um modelo de econômica supranacional sempre mais grande, impondo assim sua moeda, seu sistema de
crédito, sua dívida pública, seu capital financeiro e suas várias formas indiretas de tributação. Para o teórico brasileiro
o conceito de hegemonia não resulta ser um fator estabilizador do sistema-mundo; ao contrário, o poder hegemônico
constrói e desconstrói as estruturas da organização mundial, como forma de acumulação do poder. Critico em relação
as posições de de Arrighi e de Wallerstein sobre o assunto, Fiori afirma que:

“Muitos autores falam em hegemonia para referir-se à função estabilizadora desse líder dentro do núcleo central do sistema. Mas esses autores não
percebem que a existência dessa liderança ou hegemonia não interrompe o expansionismo dos demais Estados, nem muito menos o expansionismo
do próprio hegemon. Por isso, toda potência hegemônica é sempre, ao mesmo tempo, autodestrutiva, porque o próprio hegemon acaba
desrespeitando as regras e instituições que ajudou a criar para seguir acumulando seu próprio poder, como se vê no caso americano após o fim da
Guerra Fria(...) Neste universo em expansão que nasceu na Europa, durante o longo século XIII, nunca houve nem haverá paz perpétua10, nem
sistemas políticos internacionais estáveis. Porque se trata de um universo que precisa de preparação para a guerra e das crises para poder se
ordenar e se estabilizar. E através da história, foram quase sempre essas guerras e essas crises que abriram os camihos da inovação e do progresso
na história desse sistema inventado pelos europeus.” Em seu artigo denominado “O Sistema Interestatal Capitalista no início do século XXI (FIORI,
2007: p.31).

O exemplo mais facundo desse


fenômeno de sistema imperial do poder
nacional seria o caso dos EUA. O “poder
global” desse país estaria fundamentado
sobre as bases de um enorme “território
econômico supranacional”, que passa a
envolver e afetar o mundo inteiro, após
da Guerra Fria. Desde as últimas décadas
do século passado, o avanço da
“globalização econômica” reflecte o
alargamento do “território econômico
supranacional” dos EUA. Afastando-se
das analise de Wallerstein e Arrighi –
que preveem o declínio do poder dos
EUA e, em sequência, o colapso do “sistema-mundo” - Fiori admite que os Estados, quando perdem
posições econômicas, inevitavelmente perdem a capacidade de sustentar a própria supremacia militar.
Nada obstante isso, em quanto sistema de acumulação de poder e riqueza em constante expansão, o
funcionamento do “sistema-mundo” permanece dinamizado pela competição econômica e pelo conflito
armado, indicado pela ascensão, queda e sucessão de impérios e hegemonias. Ao explicar as diretrizes que
direcionam a expansão mundial a partir do 1990, Fiore constrói sua linha de analise partindo das relações
internacionais, da geopolítica e da crítica as bases de teorias liberais. Propondo uma leitura alternativa do
sistema mundial, fundamentada na teoria do universo em expansão contínua, ele releva como a desordem,
sob a forma de crise e de guerra não seriam, necessariamente, sintomas do declínio americano. Segundo
esta teoria o aumento da pressão competitiva dentro do sistema interestatal provoca a corrida imperialista
entre as grandes potências. Os EUA necessitam, portanto, da competição interestatal para manter e
expandir seu poder. Fiori defende a tese, segundo a qual, a relação de estabilidade do sistema
internacional é garantida pela ameaça de um grande conflito entre as potências que baseia-se sobre forma
de hegemonia transitória. Movida pelo imperativo da “competitividade sistêmica” a potência hegemônica
termina por se separar das regras e instituições que sustentam sua supremacia. Os EUA são utilizados pelo
autor como exemplo desse comportamento “autodestrutivo”. Os exemplos expressivos de rompimento
com compromissos internacionais da parte do EUA concernem ao caso da falência do sistema de
convertibilidade ouro-dólar de 1973 e a crise que essa potência hegemônica provocou ao invadir o
Afeganistão no 2001 e o Iraque em 2003, à revelia da ONU.

A tese da expansão continua - momento em que a competitividade é acirrada e no qual as potências mais
fortes ampliam seu terreno em detrimento das mais fracas – baseia-se sobre a periodização de quatro
momentos de competitividade históricas, quais: 1150 - 1350; 1450 - 1650; 1790 - 1914; 1970 e os
primeiros decênios do século XXI. Segundo essa reconstrução a era imperialista é europeia até 1914, e
americana, pós-1970; não evidencia a fase de declínio destes estados-economias-nacionais mas mostra as
consequências da explosão expansiva do sistema. Ante a ameaça de sua condição privilegiada, os Estados
Unidos retomaram as rédeas do controle financeiro por meio da imposição ao mundo do seu domínio da
moeda internacional. A ruptura unilateral da ordem de Bretton Woods, criada pelos próprios
estadunidenses, possibilitou o surgimento do sistema dólar-flexível. Esse poder financeiro ligado a
supremacia militar garantem ao país uma posição hegemônica, o que afasta, segundo o Fiori, o mito do
colapso do poder americano.

A construção do “sistema mundial moderno” se identifica com três categorias de Estados-economias


nacionais em posição inferior na hierarquia internacional. Em primeiro lugar estão os Estados que se
desenvolvem sob os auspícios das
potências centrais - fenômeno de
desenvolvimento associado; em segundo
os Estados que adotam a estratégia do
catch up, para alcançar as economias
líder; e em terceiro os Estados da
“periferia”, que fornecem insumos para
as potências do “centro”. O autor
identifica também cinco transformações
estruturais de longo prazo operantes no
início do século XXI: a expansão do
sistema internacional com a integração
de novos Estados soberanos; o
deslocamento do eixo articulador da economia mundial para a Asia; o crescimento da importância da China
como centro articulador e “periferizador” da economia mundial; a consolidação do sistema monetário
internacional do “dólar flexível”, a aceleração da globalização e a expansão do “poder global” dos EUA; e,
por fim, o assentamento de um fulcro geopolítico da competição entre EUA e China.

Portanto, ao longo de sua teorização, Fiori sustenta que o sistema interestatal contemporâneo não foi
consentidamente construído, mas conquistado pelos europeus - desde seu movimento expansivo iniciado
no século XIII - sob a dinâmica da acumulação de riqueza e de poder. O deslocamento, nas últimas
décadas, do centro dinâmico da acumulação capitalista mundial para o Leste asiático, mostra como a China
se retorna o centro articulador e “periferizador” do resto da economia mundial. Fiori ressalta, atualmente,
a importância do matrimônio conveniente estabelecido entre a globalização americana e o milagre
econômico chinês para a sustentação da estrutura de poder americano.

“o balanço da primeira década do exercício do poder global e unipolar americano [pós-1991] não correspondeu às expectativas e às previsões
teóricas: não houve paz, nem estabilidade política dentro do Sistema Mundial. (...)Por outro lado – como preconizaram Kindleberger, Gilpin e
Strange – os Estados Unidos concentraram nas suas mãos, durante a década de 1990, todos os instrumentos de poder indispensáveis ao exercício da
liderança ou hegemonia econômica mundial, arbitraram a desregulação das demais economias nacionais, defenderam o livre comércio e
promoveram ativamente a convergência das políticas macroeconômicas de quase todos os países capitalistas relevantes. Além disto, mantiveram e
aumentaram seu poder no plano industrial, tecnológico, militar, financeiro e cultural. Mas, apesar de tudo isto, o mundo viveu nesse período uma
sucessão de crises financeiras, e a maior parte da economia mundial entrou num período de baixo crescimento prolongado com a notável exceção
dos próprios Estados Unidos, da China e da Índia” (Fiori, 2004, p. 14-15).

Segundo a analise do Fiori esse robusto crescimento chinês não ameaça o controle dos EUA sobre o sistema
monetário internacional, ao contrário, o fortalece. O sistema dólar-flexível não possui outro padrão de
referência que não seja o poder global dos EUA, o que envolve a credibilidade dos títulos de sua dívida
pública, que, por sua vez, tem como um de seus grandes financiadores o capital chinês. O fato do centro
nevrálgico da nova competição geopolítica mundial residir no eixo EUA-China não implica dizer que o poder
americano está em decadência ou o próprio sistema interestatal anglo-saxão aproxima-se de seu
apocalipse.

Para concluir, podemos afirmar que Fiori sustenta que - com periódicas expansões e retrações - desde os
anos 70, o sistema-mudo entrou em fase de crescimento, propiciado pela explosão expansiva sistêmica.
Desde a década de 1990 esse mecanismo baseia-se sobre a ilusão do crescimento econômico contínuo, os
rendimentos financeiros gigantescos e a promissa da prosperidade global. Entre as previsões para o futuro,
o autor enuncia algumas conclusões dentre as quais cabe ressaltar a ideia que as grandes potências não
buscam manter sua posição, mas sim incrementá-la; todos os países estão insatisfeitos e dispostos a
aumentar seu poder e riqueza –portanto,
não está à vista o fim dos Estados-
economias-nacionais – e por fim, a
ascensão de uma potência emergente será
sempre um fator desestabilizador do
núcleo central do sistema, não obstante, a
condição de maior desestabilizador
permanecerá sempre nas mãos do poder
hegemônico.

Seguindo estas conclusões podemos


ressaltar três, dos múltiplos, fenômeno
consequências e contrapostos que o
sistema mundial moderno vem
instaurando, ou seja, a deslocação e /o
aumento da concentração de riqueza e de poder, a deterioração das condições sociais em escala global,
o nascimento, provavelmente ainda tímido, de situações de autogestão politica e autogoverno populares
anti-estatal e anti-capitalistas. A partir da leitura dos textos, para a formulação das questões, escolhi
algumas imagens que dão força - ao longo da resenha- a necessidade de se repensar as formas de
resistências civis a hegemonia oligárquica dos Estados-economias-nacionais. A implementação de praticas
criadoras de poder horizontalmente autogeridos, como no caso dos movimentos de okupas gregos, a
criação de grupos políticos da multidão, como no caso da Espanha e da Itália, e os movimentos de Occupy
Wall Street nos EUA, mostram como, em diversas formas, os movimentos sociais dos países centrais estão se
re-organizando para enfrentar a deterioração das condições sociais derivadas da perversa explosão
expansiva sistêmica do sistema-mundo. O caso da Espanha e da Itália são interessantes do ponto de vista
político em quanto, a partir da situação de crise econômica e da instabilidade política dos governos, vem
crescendo o poder de associações da multidão como “Podemos” e “Movimento 5 Stelle” que defendem
uma forma de política anti partidária baseada na democracia direta. Os movimentos de okupas gregos são
formas de resistência antiautoritária que lutam contra a política econômica europeia e o sistema global.
Um ótimo exemplo a ser mencionado é o caso de Exarchia, o bairro baseado no autogoverno do povo no
centro de Atenas, que através das
ocupações de fábricas, imóveis e
espaços públicos cria uma
comunidade baseada na troca
solidária, no voluntariado
comunitário e na autogestão do
sistema econômico, cultural, politico
e até sanitário. Exarchia é uma das
experiências mais intensas de
produção coletiva da cidade, que
através da manufatura do espaço
urbano tenta de (re)construir o lugar para a definição de novos territórios humanos. A criação de coletivos
que formulam e constroem modelos alternativos de sociedade, no contexto contemporâneo, são a
resposta, a meu ver, as crises impostas pelo sistema hegemônico. O pessimismo, de certa forma, de Fiori
em relação a expansão do sistema mundo pode ser reformulado através a analise, nos contexto acadêmico,
daquelas realidades que hoje em dia estão mostrando que alternativas anti-autoritária são possíveis.

Evidenciando a necessidade de destabilizar o poder dos Estados-economias-nacionais e de propor ações de


autogestão territorial, concluo dizendo que os
acontecimento de revolta e auto-organização ao
longo do globo mostram como um sistema de
comunidades baseadas sobre o autogoverno e a
troca - portanto, não mais voltados a acumulação
da riqueza - ainda se tímidos, provavelmente,
pode ser realizável. A academia não pode
ignorar essas realidade e portanto, precisamos
estudá-los para construir novas alternativas as
formulações teóricas existentes. A auto-
organização e suas estruturas, a solidariedade
participativa e igualitária com um mundo que
não pode existir sem os “outros”, a democracia
direta, a justiça social, a luta pelo anti-poder
social, é vivência, e está aqui, frente a vós, mais
uma vez!

Bibliografia

FIORI, José Luis . Formação, Expansão e Limites do Poder Global. In: FIORI J. L. (org.) O poder americano.
Petrópolis: Vozes, 2004

_____. O Poder Global e a Nova Geopolítica das Nações. São Paulo: Boitempo Editorial, 2007

_____. “O Poder Global dos Estados Unidos: formação, expansão e limites”. IN: FIORI, José Luis. O Poder
Americano. Petrópolis: Ed.Vozes, 2004.

_____. “Formação, Expansão e Limites do Poder Global.” IN: FIORI, José Luis. O Poder Americano.
Petrópolis: Ed.Vozes , 2004

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