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PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO PENAL

MÓDULO - FUNDAMENTOS DO DIREITO PENAL MODERNO

Professor: Yuri Carneiro Coelho

1. Material pré-aula

a. Tema

Teoria da Lei Penal - aspectos atuais e controvertidos

b. Noções Gerais

b.1. No tempo

O direito de punir abstrato do Estado surge com o advento da lei, ou


seja, com a sua criação. Será somente com o respeito e cumprimento
do princípio da legalidade que possibilitará ao Estado a exigência de
punição pela conduta delitiva cometida pelo cidadão.
O estudo do ciclo da lei penal entre sua entrada em vigor, o período
de vigência e a revogação é de suma importância para dirimir os
conflitos das leis penais e também para constatar se houve ou não a
revogação de uma lei anterior pela posterior, efetivando ao Estado,
então, o exercício seu direito de punição.  
Inicialmente esclarece que a Lei entra em vigor apenas quando
aprovado o seu processo legislativo e sancionado pelo Presidente da
República, e depois se esvai seu período de vacatio legis, que é o
intervalo de tempo entre a publicação e a entrada em vigor de uma
lei.
Determinadas leis penais após a entrada em vigor passam por um
período de vigência que, após o avanço da sociedade, podem ser
revogadas ou alteradas e substituídas por outras novas.
Atentar-se para o estudo da aplicação da Lei penal significa, portanto,
saber qual a lei aplicável a determinado caso concreto, ou seja,
significa dirimir o conflito de leis penais, que inicia “quando duas ou
mais leis penais, que tratam do mesmo assunto de modo distinto, se
sucedem. Isto acarreta diversas questões, denominadas direito
intertemporal”1.
Neste estudo, verifica-se de antemão que a regra geral que se extrai
é a atividade (tempus regit actum), ou seja, que a lei penal que
deverá ser aplicada para determinado fato seja a lei que estava em
vigor na data da prática do delito.
 Em contrapartida, a exceção é a extra-atividade da lei penal, que
significa aplicar a lei fora do seu período de vigência. Neste caso,
poderá retroagir para beneficiar o réu, ou será ultra-atividade, que é
a aplicação de uma lei depois de sua revogação.

Pode-se concluir, em síntese, que:


a) a lei penal, de regra, somente se aplica a fatos praticados sob sua
vigência (atividade);
b) a lei penal benéfica (lex mitior) retroagirá, atingindo fatos anteriores
à sua entrada em vigor;
c) a lei penal revogada deverá aplicar-se depois de sua revogação,
quando o fato for praticado sob sua égide e for sucedida por lei mais
gravosa (lex gravior).2

Em outra vertente, também se estuda a lex mitior, cuja regra é


retroagir para se aplicar a lei penal mais benéfica, visto que foram
revogadas por leis mais gravosas. Neste caso, dividi-se em novatio
legis in mellius e abolitio criminis.
O fenômeno da abolitio criminis ocorre quando uma lei posterior não
considera mais uma conduta típica criminalmente. Como por
exemplo, o crime de sedução do Código Penal. A consequência desta
hipótese é a extinção da punibilidade do agente, em qualquer fase do
processo, seja ação penal ou execução penal, com fundamento no
artigo 107, III do CP. Observa Nucci que, “mesmo sendo o caso de se
julgar extinta a punibilidade, a natureza jurídica da abolitio criminis é
causa extintiva da tipicidade”3.
A novatio legis in mellius, por sua vez, mantém a incriminação,
porém, a nova lei tipifica com um tratamento mais brando do que a
lei anterior, como por exemplo, reduzindo-se a pena.

1
ESTEFAM, André. Direito Penal. V. 1. Parte Geral. 7a edição. São Paulo: Saraiva, 2018.
2
ESTEFAM. op. cit.
3
NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
A lex gravior, que é a lei penal gravosa, divide-se em novatio legis in
pejus e novatio legis incriminadora.
A novatio legis in pejus mantém a incriminação e a nova lei apresenta
apenas um tratamento mais rigoroso, como por exemplo, o aumento
de pena. Neste caso, aplicar-se-á a lei mais benéfica aos fatos
ocorridos até a entrada em vigor da nova lei.
A novatio legis incriminadora é a criação de novos tipos penais,
definindo o fato e a conduta como ilícitos penais, seja contravenção
ou crime.
Elucida ESTEFAM que caso houver dúvida do que seria mais benéfico
entre duas leis, como por exemplo, “uma lei que permite o
cumprimento da pena privativa de liberdade em regime aberto ou
outra que autoriza o livramento condicional a este fato, se antes era-
lhe negado”, a solução será a de consultar o réu. “Trata-se da saída
adotada no Código Penal espanhol de 1995 (art. 2º, n. 2 – “en caso
de duda sobre la determinación de la ley más favorable, será oído el
reo”) e encontra apoio de boa parte da doutrina. Entre nós, Hungria
já a defendia a seu tempo”4
Outro ponto a ser estudado é acerca do instituto da combinação de
leis penais. “Dá-se quando o intérprete, verificando que uma nova lei
favorece o agente num aspecto e prejudica-o noutro, apenas a aplica
no aspecto benéfico, mantendo, no mais, a regra branda oriunda de
lei anterior”5.
O posicionamento da doutrina é pela possibilidade de aplicar o
instituto da combinação de leis, pois “se o juiz pode aplicar o todo,
nada impede que aplique somente parte da lei, sobretudo porque
buscaria uma solução justa”.
Na jurisprudência o tema é pacificado pela inaplicação da combinação
de lei, visto que o juiz estaria aplicando uma nova lei se realizasse a
combinação de leis, vedando-lhe, pois, a sua aplicação no
6
ordenamento jurídico .

4
Op. cit.
5
ESTEFAM. op. cit.
6
Exemplos: “A Terceira Seção desta Corte Nacional consolidou que é vedada a combinação de leis, em
face do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica (art. 5º, XL, da Constituição da República),
"que impõe o exame, no caso concreto, de qual diploma legal, em sua integralidade, é mais favorável"
(STJ. REsp 1493485/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em
24/10/2017, DJe 06/11/2017). No mesmo sentido: STJ. HC 409.800/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS,
QUINTA TURMA, julgado em 28/11/2017, DJe 01/12/2017.
O STJ inclusive editou a Súmula nº 501: “É cabível a aplicação
retroativa da Lei n. 11.343/2006, desde que o resultado da incidência
das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o
advindo da aplicação da Lei n. 6.368/76, sendo vedada a combinação
de leis”.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (RE 600.817-RG, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski) consolidou o entendimento de que não é
possível a aplicação retroativa da causa especial de diminuição de
pena do art. 33, § 4º, da nº Lei 11.343/2006, em benefício de réu
condenado por crime de tráfico de drogas cometido na vigência da
legislação anterior (Lei nº 6.368/1976)7.
No que pertine às leis excepcionais, dispõe o Código Penal, em seu
artigo 3º, que “A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o
período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a
determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência”.

Lei excepcional é a lei elaborada para incidir sobre fatos havidos


somente durante determinadas circunstâncias excepcionais, como
situações de crise social, econômica, guerra, calamidades etc.
Temporária é aquela elaborada com o escopo de incidir sobre fatos
ocorridos apenas durante certo período de tempo8.

Conforme explanado por Estefam, essas leis excepcionais são


ultrativas, e a consequência disso é a produção de efeitos mesmo
após o término de sua vigência, visto que, “com o passar da situação
excepcional ou do período de tempo estipulados na lei, ela continua
em vigor, embora inapta a reger novas situações”9.
Conclui-se a temática de lei penal no tempo, portanto, disposto no
artigo 4º do Código Penal “considera-se praticado o crime no
momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do
resultado”, esclarecendo que rege a teoria da atividade.

Várias teorias disputam o tratamento do tema relativo ao tempo do


crime, podendo-se destacar as seguintes:
a) teoria da atividade;
b) teoria do resultado;

7
STF, HC 103617, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, julgado em 18/03/2014.
8
ESTEFAM. Op. cit.
9
Ibidem.
c) teoria mista ou da ubiquidade.
Pela teoria da atividade, tempo do crime será o da ação ou da omissão,
ainda que outro seja o momento do resultado. Para essa teoria, o que
importa é o momento da conduta, comissiva ou omissiva, mesmo que
o resultado dela se distancie no tempo.
Já a teoria do resultado determina que o tempo do crime será, como
sua própria denominação nos está a induzir, o da ocorrência do
resultado. Aqui, sobreleva-se a importância do momento do resultado
da infração penal.
A teoria mista ou da ubiquidade concede igual relevo aos dois
momentos apontados pelas teorias anteriores, asseverando que o
tempo do crime será o da ação ou da omissão, bem como o do
momento do resultado. O Código Penal adotou a teoria da atividade,
conforme se verifica no seu art. 4º.10

Assim, adotada a teoria da atividade, o momento da ação ou da


omissão torna-se o marco inicial para o estudo da aplicação da lei
penal. A exceção a este entendimento levou ao STF editar a súmula
711, que diz que a lei penal mais grave aplica-se ao crime
continuidade ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à
cessação da continuidade ou permanência. Neste caso, o que o STF
consolidou o entendimento pela possibilidade de se aplicar a lei penal
que revogar a outra lei, ainda que mais grave, nos casos em que há
continuidade delitiva ou permanência.

b.2. No espaço

Para se identificar o lugar do crime, o Código Penal adotou a teoria da


ubiquidade no art. 6º (considera-se praticado o crime no lugar em
que ocorreu a ação ou a omissão, no todo ou em parte, bem como
onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado).

Três teorias têm como escopo a determinação do lugar do crime, a


saber:
a) teoria da atividade;
b) teoria do resultado;
c) teoria mista ou da ubiquidade.

10
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 18ª edição. Impetus: 2016.
Pela teoria da atividade, lugar do crime seria o da ação ou da omissão,
ainda que outro fosse o da ocorrência do resultado. Já a teoria do
resultado despreza o lugar da conduta e defende a tese de que lugar
do crime será, tão somente, aquele em que ocorrer o resultado. A
teoria da ubiquidade ou mista adota as duas posições anteriores e aduz
que lugar do crime será o da ação ou da omissão, bem como onde se
produziu ou deveria se produzir o resultado.11

O intuito de estabelecer o lugar do crime do art. 6º não é de


competência, em que solucionará o Código de Processo Penal, mas
sim em definir o critério de aplicação da lei penal brasileira.
Este artigo foi elaborado para solucionar os crimes à distância, cuja
conduta e resultado ocorreram em países diferentes. Assim, bastará
que a infração penal atinja no território brasileiro para justificar a
aplicação dessa lei no caso concreto.
Conforme o art. 5º, caput, do CP, “aplica-se a lei brasileira, sem
prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao
crime cometido no território nacional”. Impõe-se com esta redação
legislativa a regra do exercício do princípio da territorialidade, no qual
preleciona que deve ser aplicada a lei penal brasileira ao crime
cometido dentro do território brasileiro.
Porém, o princípio da territorialidade não é adotado de forma
absoluta, mas sim de forma temperada, mitigada, relativizada, pois
há situações em que o Brasil permite que uma lei estrangeira seja
aplicada quando o crime é cometido em território nacional brasileiro
(princípio da extraterritorialidade).

Por território, no sentido jurídico, deve-se entender todo o espaço em


que o Brasil exerce sua soberania, que abrange: 1) os limites
compreendidos pelas fronteiras nacionais; 2) o mar territorial brasileiro
(faixa que compreende o espaço de 12 milhas contadas da faixa
litorânea média – art. 1º da Lei n. 8.617/93); 3) todo o espaço aéreo
subjacente ao nosso território físico e ao mar territorial nacional
(princípio da absoluta soberania do país subjacente – Código Brasileiro
de Aeronáutica, art. 11, e Lei n. 8.617/93, art. 2º); 4) as aeronaves e
embarcações: a) brasileiras privadas, em qualquer lugar que se

11
Ibidem.
encontrem, salvo em mar territorial estrangeiro ou sobrevoando
território estrangeiro; b) brasileiras públicas, onde quer que se
encontrem; c) estrangeiras privadas, no mar territorial brasileiro12.

Separa-se a extraterritorialidade em condicionada, incondicionada e


hipercondicionada.
A incondicionada, com previsão no art. 7º, I, do CP, “é a possibilidade
de aplicação da lei penal brasileira a fatos ocorridos no estrangeiro,
sem que, para tanto, seja necessário o concurso de qualquer
condição”.

Art. 7º Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no


estrangeiro:
I – os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República (princípio da
defesa, real ou de proteção);
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de
Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de
economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no
Brasil13.

Nestes casos do inciso I do artigo 7º, aplicar-se-á a lei penal


brasileira mesmo que o indivíduo vier a ser absolvido ou condenado
no estrangeiro, observando-se apenas o disposto no art. 8º do
Código Penal, que diz que “a pena cumprida no estrangeiro atenua a
pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela
é computada, quando idênticas”. Dessa forma, não haverá dupla
punição e nem a ocorrência de bis in idem.
Por outro lado, a extraterritorialidade condicionada diz respeito ao
inciso II do art. 7º do CP, na qual dependerá do adimplemento de
algumas condições para aplicar a lei do Brasil:

Art. 7º Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no


estrangeiro:

12
ESTEFAM. Op. cit.
13
GRECO. op. cit.
II – os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir
(princípio da universalidade, da justiça universal ou cosmopolita);
b) praticados por brasileiro (princípio da personalidade ativa);
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou
de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não
sejam julgados (princípio da representação).

As condições que deverão ser cumpridas estão dispostas no mesmo


artigo, no parágrafo 2º:

§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do


concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira
autoriza a extradição; 
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí
cumprido a pena; 
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo,
não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável

Por fim, a hipercondicionada mantém a necessidade do cumprimento


das condições acimas impostas e também de outros anais:

§ 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por
estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições
previstas no parágrafo anterior:
a. não foi pedida ou foi negada a extradição; 
b. houve requisição do Ministro da Justiça. 

c. Legislação

- Constituição Federal.
- Código Penal.
- Lei 9455/97
d. Julgados/Informativos

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. DIREITO PENAL. ESTUPRO DE


VULNERÁVEL. ART. 217-A DO CP. TEORIA DA ATIVIDADE.
CONTINUIDADE DELITIVA, INICIADA SOB A VIGÊNCIA DE LEI
ANTERIOR MAIS BENÉFICA. APLICAÇÃO DE LEI POSTERIOR MAIS
GRAVOSA. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
SÚMULAS 7 E 211/STJ. ADOÇÃO DO PARECER MINISTERIAL COMO
RAZÃO DE DECIDIR. LEGALIDADE. 1. Em atenção aos princípios da
instrumentalidade e da economia processual, devem ser recebidos
como agravo regimental os embargos declaratórios com pretensão
infringente. 2. No caso da configuração da continuidade delitiva,
aplica-se a lei nova, ainda que mais gravosa ao réu, quando a sua
vigência é anterior à cessação da continuidade do fato criminoso. 3.
Mesmo em se tratando de nulidades absolutas e de condições da
ação, é imprescindível o prequestionamento, pois este é exigência
indispensável ao conhecimento do recurso especial, sem o qual não
se pode reconhecer nem sequer matéria de ordem pública, passível
de conhecimento de ofício nas instâncias ordinárias (Súmula
211/STJ). 4. Desconstituir a conclusão a que chegaram as instâncias
ordinárias, na forma pretendida pelo agravante - sob o fundamento
de ausência de provas para a adequada condenação -, implica
necessariamente incursão no conjunto probatório dos autos,
revelando-se inadequada a análise da pretensão recursal em função
do óbice da Súmula 7/STJ. 5. O agravo regimental não merece
prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são
incapazes de infirmar o entendimento assentado na decisão
agravada. 6. Agravo regimental improvido. (STJ. AgRg nos EDcl no
REsp 1529955/MT, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA
TURMA, julgado em 03/03/2016, DJe 14/03/2016)

EMENTA: OPERAÇÃO LAVA-JATO. RECURSO EM HABEAS CORPUS


OBJETIVANDO TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CRIMES DE
LAVAGEM DE DINHEIRO E EVASÃO DE DIVISAS, COM USO DE
CONTAS NO EXTERIOR. ALEGAÇÃO DE ILICITUDE DA PROVA
ORIUNDA DA SUÍÇA, POR IRREGULARIDADES NA COOPERAÇÃO
JURÍDICA INTERNACIONAL: INEXISTÊNCIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA E
AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA AÇÃO PENAL. REQUISITOS PARA A
DENÚNCIA DEVIDAMENTE PREENCHIDOS, E LASTRO PROBATÓRIO
MÍNIMO EVIDENCIADO, AUTORIZANDO O PROCESSAMENTO DA
AÇÃO PENAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE
(ART. 5º CAPUT, CP), ANTE ALEGAÇÃO DE QUE OS CRIMES TERIAM
SIDO PRATICADOS NO EXTERIOR. CASO DE APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA EXTRATERRITORIALIDADE, ANTE INDÍCIOS DE QUE
OS VALORES ESPÚRIOS SÃO PRODUTO DE CRIME PRATICADO
CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL BRASILEIRA (ART.
7º, I, "B", DO CP). INDEFERIMENTO DE PROVA PERICIAL PARA
APURAR VALOR DO DANO CAUSADO PELO CRIME. ALEGAÇÃO DE
VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA
DEFESA. NÃO CONHECIMENTO DA QUESTÃO PELA VIA DO HABEAS
CORPUS. I - A transferência de investigação criminal inicialmente
aberta na Suíça para o Brasil, com concordância das autoridades
respectivas de ambos os Países, sem ressalvas, encontra respaldo em
convenções internacionais de cooperação jurídica das quais o Brasil é
signatário, pois há previsão de ampla cooperação entre os países. II -
Havendo descrição na Denúncia de que os valores existentes em
conta no exterior são oriundos da prática de crimes, e existindo
elementos probatórios mínimos a embasar tal imputação, não há que
se falar em falta de justa causa para a Ação Penal ou inépcia da
denúncia por inexistência de descrição dos crimes antecedentes. III -
Embora os supostos atos de lavagem de dinheiro tenham sido
praticados no exterior, aplica-se a lei brasileira caso haja indícios de
que tal lavagem é decorrente de crimes praticados contra a
Administração Pública Brasileira, aplicando-se, no caso, o princípio da
extraterritorialidade (art. 7º, I, "b", do CP). IV - Discussões acerca do
valor do dano causado pelo crime não são cognoscíveis pela via do
Habeas Corpus, eis que tal remédio constitucional destina-se a tutelar
o direito de ir e vir, de modo que a questão do valor do dano, por si,
é estranha ao writ. V - Recurso conhecido parcialmente, e
desprovido. (STJ. RHC 80.618/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, julgado em 16/05/2017, DJe 12/06/2017)

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL


PENAL. CRIMES DO ART. 35, C.C. O ART. 40, INCISO I, E DO ART.
37, TODOS DA LEI N.º 11.343/06. PRISÃO TEMPORÁRIA
CONVERTIDA EM PREVENTIVA. SUPOSTAS CONDUTAS DELITIVAS
COMETIDAS NO BRASIL. INCIDÊNCIA DO ART. 5.º DO CÓDIGO
PENAL. OFENSA À ORDEM PÚBLICA BRASILEIRA. RECORRENTE, EM
TESE, FINANCIADOR DE UM ESQUEMA CRIMINOSO VOLTADA PARA A
PRÁTICA DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. APREENSÃO DE
VULTOSA QUANTIDADE DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES
(181,6KG DE COCAÍNA NO ESTADO DA BAHIA E 121,85KG DA
MESMA DROGA NO ESTADO DE SÃO PAULO). FUGA DO DISTRITO DA
CULPA. GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL. FUNDAMENTAÇÃO
SUFICIENTE. RECURSO DESPROVIDO. 1. A Polícia Federal recebeu
informações da Agência inglesa de combate ao crime organizado de
que uma organização criminosa internacional estaria atuando no
Brasil. O esquema criminoso consistia na compra e depósito de
drogas (especialmente cocaína), com conexão na Bolívia, para
posterior envio do entorpecente para a Europa através dos portos
brasileiros. 2. As diligências efetuadas pelo Órgão de Segurança
Federal, mediante monitoramento de membros do grupo e
interceptações telefônicas judicialmente autorizadas, revelaram que o
Recorrente financiaria um dos núcleos da quadrilha. E as
investigações resultaram na apreensão de vultosa quantidade de
drogas - 181,6kg de cocaína (23/10/2013, em Camaçari/BA) e
121,85kg de cocaína (22/02/2011, em São Paulo/SP) - além da
prisão em flagrante de integrantes do bando, alguns, inclusive, da
mesma nacionalidade do Recorrente. 3. As condutas delituosas
imputadas ao Recorrente ocorreram no Brasil, o que autoriza a
aplicação da lei brasileira, nos termos do art. 5.º do Código Penal
(princípio da territorialidade). Irrelevante, assim, a alegação de que o
Réu não vulnerou a paz social de seu país de domicílio (no caso, a
Alemanha). 4. A condição de foragido do Recorrente persiste desde a
decretação de sua prisão temporária, situação que não se altera por
sua eventual liberdade no estrangeiro. E os fatos indicados pelas
instâncias ordinárias demonstram a pertinência da manutenção da
prisão processual, como forma de assegurar a aplicação da lei penal,
sem resultar em eventual punição antecipada ou cerceamento do
direito de defesa. 5. Incide, na espécie, o entendimento de que "[a]
necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes
de organização criminosa, enquadra-se no conceito de garantia da
ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e
suficiente para a prisão preventiva" (STF, HC 95.024/SP, 1.ª Turma,
Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, DJe de 20/02/2009). 6. Recurso ordinário
desprovido. (STJ. RHC 39.715/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ,
QUINTA TURMA, julgado em 08/05/2014, DJe 16/05/2014)

EMENTA: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.


POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. CRIME COMETIDO NA VIGÊNCIA
DA LEI N. 9.437/1997. ABOLITIO CRIMINIS. 1. De acordo com a
jurisprudência deste Tribunal Superior, "a regra do art. 30 da Lei n.
10.826/2003 alcança, também, os crimes praticados sob a vigência
da Lei n. 9.437/1997, em respeito ao princípio da retroatividade da
lei penal mais benéfica" (AgRg no AREsp 684.081/DF, Rel. Ministro
Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 16/6/2015, DJe
26/6/2015). Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido. (STJ.
AgRg no REsp 1611883/DF, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA
PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 28/11/2017, DJe 04/12/2017)

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO EM


SUBSTITUIÇÃO A RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. ARTIGO 16,
PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DA LEI N. 10.826/2003. AUSÊNCIA DE
LESIVIDADE DA CONDUTA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. POSSE DE
ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E NUMERAÇÃO RASPADA.
TIPICIDADE. ABOLITIO CRIMINIS. INAPLICABILIDADE. CONDUTA
PRATICADA NO ANO DE 2009. ARTIGO 311 DO CÓDIGO PENAL.
SUPRESSÃO DO SINAL DE IDENTIFICAÇÃO DE VEÍCULO.
TIPICIDADE. NEGATIVA DE AUTORIA. REVOLVIMENTO DE PROVAS.
INVIABILIDADE. ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO. NÃO OCORRÊNCIA.
HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. (...) 2. A ausência de
manifestação do Tribunal de origem quanto à ausência de lesividade
da conduta de possuir arma de fogo com numeração raspada impede
o seu exame direto por esta Corte sob pena de indevida supressão de
instância. 3. É atípica a conduta relacionada ao crime de posse de
arma de fogo, acessórios e munição, seja de uso permitido, restrito,
proibido ou com numeração raspada, incidindo a chamada abolitio
criminis temporária, se praticada no período compreendido entre
23/12/2003 e 23/10/2005. O respectivo termo final foi prorrogado
até 31/12/2008 pela Medida Provisória 417, de 31/1/2008,
convertida na Lei 11.706/2008, que deu nova redação aos artigos 30
a 32 da Lei 10.826/2003, somente para os possuidores de
armamentos de uso permitido, não mais albergando o delito previsto
no artigo 16 do Estatuto do Desarmamento. Na mesma esteira, a Lei
11.922, de 13/4/2009, prorrogou o prazo previsto no artigo 30 da Lei
10.826/2003 até 31/12/2009 apenas no que toca ao crime de posse
de arma de uso permitido. 4. "[...] o Decreto nº 7.473/2011 não
ensejou extensão do prazo de descriminalização quanto ao delito de
posse irregular de arma de fogo de uso permitido, ressaltando a
necessidade de entrega espontânea à autoridade competente para
que se presuma a boa-fé do possuidor" (HC n. 262.895/RS, Rel. Min.
FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, Dje 3/11/2014). 5. Os termos do
Decreto n. 7.473/2011 e a Portaria n. 797/2001, por serem normas
de hierarquia inferior à lei, não podem estender o prazo para a
regularização de arma de fogo. Logo, típica a conduta do agente
flagrado com a guarda e posse de arma de fogo com numeração
raspada em sua residência, em desacordo com determinação legal ou
regulamentar, em 27/3/2009. 6. "É típica a conduta quando o
agente, por meios diversos - modificação, substituição, supressão,
acréscimo etc. -, pratica os verbos do tipo penal, violando a
intangibilidade de sinal a que a lei atribui valor jurídico" (HC
344.116/RS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA,
julgado em 17/03/2016, DJe 31/3/2016). 7. "O habeas corpus, como
é cediço, não é meio próprio para pretensão absolutória, porque
trata-se de intento que demanda revolvimento fático-probatório, não
condizente com os estreitos lindes do writ" (THEREZA DE ASSIS
MOURA, Sexta Turma, julgado em 17/12/2015, DJe 2/2/2016). 8.
"Inexiste inversão do ônus da prova quando a acusação produz
arcabouço probatório suficiente à formação da certeza necessária ao
juízo condenatório" (AgRg nos EDcl no REsp 1292124/PR, Rel.
Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2017, DJe
20/09/2017). 9. Writ não conhecido. (STJ. HC 405.337/SP, Rel.
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado
em 03/10/2017, DJe 11/10/2017)

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL.


APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 83, § 2º, DA LEI N.
9.430/1996. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA PROMOVIDA PELA LEI
12.386/2011. NOVO PARCELAMENTO DO DÉBITO APÓS O
RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. NOVATIO LEGIS IN PEJUS.
SUSPENSÃO DO PROCESSO E DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL.
NATUREZA DA NORMA. CARÁTER MATERIAL EVIDENCIADO.
ULTRATIVIDADE DA LEGISLAÇÃO MAIS BENÉFICA. I - Cinge-se a
controvérsia a saber acerca da aplicação da lei no tempo,
demandando, para tal, a definição da natureza jurídica do art. 83, §
2º, da Lei 9.430/96, com redação determinada pela Lei 12.392/2011,
se norma eminentemente penal ou processual penal, definindo a
subsunção, ou não, dos crimes cometidos anteriormente a sua
vigência, mas cujo parcelamento ocorreu sob sua égide, após o
recebimento da denúncia. II - O art. 83, § 2º, da Lei 9.430/96, com
redação determinada pela Lei 12.392/2011, disciplina a suspensão do
processo e da prescrição da pretensão punitiva estatal, tema afeto à
punibilidade do agente, evidenciando a natureza penal material da
norma em comento. III - Com efeito, aplica-se a regra da lex mitior,
razão pela qual, nos crimes em que a constituição definitiva do
crédito tributário se deu até 28/02/2011, data de vigência da lei
posterior mais gravosa, terá o acusado direito à suspensão do
andamento do feito, caso concedido o parcelamento,
independentemente de ter havido ou não o recebimento da denúncia
na ação penal. Recurso especial não provido. (STJ. REsp
1524525/MG, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado
em 28/11/2017, DJe 06/12/2017)

EMENTA: PENAL. RECURSO ESPECIAL. LEGITIMIDADE DO


MINISTÉRIO PÚBLICO. COMPROVAÇÃO DE MISERABILIDADE DA
VÍTIMA. SÚMULA N. 7 DO STJ. RÉU MENOR DE 21 ANOS. NOMEAÇÃO
DE CURADOR. DESNECESSIDADE. LEI N. 12.015/2009. APLICAÇÃO.
PREJUÍZO. INEXISTÊNCIA. COMBINAÇÃO DE LEIS.
IMPOSSIBILIDADE. REGIME FECHADO. CABIMENTO. QUANTIDADE
DE PENA E CIRCUNSTÂNCIAS DESFAVORÁVEIS. AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. RECURSO ESPECIAL NÃO
PROVIDO. EXECUÇÃO IMEDIATA DA PENA DETERMINADA. 1. A
desconstituição das conclusões adotadas pelas instâncias
antecedentes - a família aufere renda insuficiente para afastar a
condição de pobreza processual - demandaria profundo reexame de
matéria fático-probatória, o que é vedado pela Súmula n. 7 desta
Corte Superior. 2. O Superior Tribunal de Justiça firmou o
entendimento de que, "após a edição do Código Civil de 2002,
quando a maioridade foi estabelecida em 18 (dezoito) anos, não é
mais necessária a nomeação de curador especial, no processo penal,
para os acusados com idade entre 18 (dezoito) e 21 (vinte e um)
anos" (AgRg no AREsp n. 404.293/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio
Bellizze, 5ª T., DJe 7/4/2014). 3. Os preceitos da Lei n. 12.015/2009
não são prejudiciais ao recorrente, uma vez que, conquanto a norma
penal secundária seja fixada em patamares superiores (de 8 a 15
anos), não mais incide a causa especial de aumento de pena
positivada no art. 9º da Lei 8.072/1990, que acrescia de metade as
penas fixadas in concreto. 4. A Terceira Seção desta Corte Nacional
consolidou que é vedada a combinação de leis, em face do princípio
da retroatividade da lei penal mais benéfica (art. 5º, XL, da
Constituição da República), "que impõe o exame, no caso concreto,
de qual diploma legal, em sua integralidade, é mais favorável" (EREsp
n. 1.094.499/MG, Rel. Ministro Felix Fischer, 3ª S., DJe 18/8/2010).
5. Pela quantidade de pena final imposta (8 anos e 4 meses de
reclusão) - além de haverem sido consideradas desfavoráveis
circunstâncias judiciais na primeira fase da dosimetria - o regime
fechado é o devido, nos termos do art. 33, § 2º, "a", e § 3º, do CP.
6. Agravo em recurso especial não conhecido. Recurso especial não
provido. Execução da pena determinada. (STJ. REsp 1493485/SP,
Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em
24/10/2017, DJe 06/11/2017)

e. Leitura sugerida

- ESTEFAM, André. Direito Penal. Parte Geral. 7a edição. São Paulo:


Saraiva, 2018.

f. Leitura complementar

- BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral,


São Paulo: Saraiva, 2017.

- GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 18ª edição. Impetus:


2016.
- PRADO. Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro - Parte Geral.
Vol. I - 15ª Ed. 2017.

- SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal. Parte geral. 3ª edição. Lumen


Juris.

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