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A PRODUÇÃO DE
TEXTOS NA ESCOLA
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aprender, ou seja, além de aprender a escrita como dos diferentes tipos de texto. Por este mo-
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tivo, seu trabalho limitava-se a permitir e a tes propósitos comunicativos e expressivos. O que
propiciar um contato geral dos alunos com se observa, entretanto, é que nem sempre a prática do
tais textos, porque faltavam ao professor fer- professor reflete uma consciência dessa orientação.
ramentas mais específicas para enriquecer Em vários anos de experiência, ministrando
este contacto, que otimizaria o aprendizado. cursos de formação de professores, observamos que
Na escola, os procedimentos para trabalhar estes constantemente criticam o desempenho dos
com textos ainda privilegiam uma abordagem alunos em suas práticas de escrita. Não é difícil cons-
desvinculada das situações de comunicação viven- tatar também dificuldades apresentadas pelos pró-
ciadas pela criança, sem, ao que parece, considerar prios professores, não só quanto ao conhecimento
aspectos relativos ao processo de desenvolvimento da literatura que deve fundamentar sua prática de
da competência textual. ensino, mas também quanto ao modo como condu-
zem o processo de produção textual em sala de aula.
Como advertem as autoras citadas acima, ape-
Em razão da multiplicidade de atitudes e pro-
sar do avanço das pesquisas e da mudança con-
cedimentos relatados, julgamos oportuno traçar um
ceitual, o ensino da escrita em algumas escolas ainda
perfil das atividades que o professor desenvolve com
se dá pela correção puramente gramatical e gráfica
seus alunos na escola, relativas à produção de tex-
do produto final, sem que o aluno e até muitas
tos, no que diz respeito à concepção desse proces-
vezes o professor conheçam o processo de elabo-
so e ao tratamento dado aos gêneros e tipos de tex-
ração das atividades de produção. O ensino da pro-
to. Para tanto, estamos iniciando uma pesquisa com
dução escrita reduz-se, assim, à classificação e quan-
professores, em que se avalia a abordagem dos gê-
tificação de erros, o que resulta em trabalho estéril
neros discursivos tratados na escola em relação à
e improdutivo.
sua aplicação na vida dos alunos. Esta avaliação par-
Pode-se dizer que a orientação para o ensino te do princípio de que a sociedade espera que a es-
da produção textual passa por mudanças que refle- cola capacite sua clientela para produzir textos fun-
tem as pesquisas lingüísticas sobre o assunto. Nos cionalmente relevantes, o que exige dos professores
Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Por- um trabalho que inclua não apenas textos literários,
tuguesa (1998), que direcionam conteúdos e mas também textos informativos e e aqueles vincu-
metodologias a serem adotados no ensino funda- lados às demandas sociais e propósitos comunica-
mental (30 e 40 Ciclos), afirma-se que: tivos dos alunos, que visem prepará-los para aten-
Os textos organizam-se sempre dentro de der às necessidades que terão vida afora no exercício
certas restrições de natureza temática, com- da cidadania. Ou seja, um trabalho que leve o aluno
posicional e estilística, que os caracterizam ao domínio do gênero, exatamente como este fun-
como pertencente a este ou aquele gênero. ciona nas práticas de linguagem de referência.
Desse modo, a noção de gênero, constitutiva Nessa perspectiva, realizamos um estudo pre-
do texto, precisa ser tomada como objeto de liminar, com a ajuda de professores, alunos do Cur-
ensino. (p. 23). so de Especialização em Ensino da Língua Portu-
guesa, da Universidade Regional do Cariri (URCA),
Para isso, a escola deverá organizar um con- em 4 escolas de 1o e 2o graus, envolvendo 75 alu-
junto de atividades que contemplem: nos, no período de janeiro a outubro de 1997, com
(...) nas atividades de ensino, a diversidade o objetivo de investigar a concepção do processo
de textos e gêneros, e não apenas em fun- de produção textual praticado na escola.
ção de sua relevância social, mas também
pelo fato de que textos pertencentes a dife- O processo de produção textual na
rentes gêneros são organizados de diferen- prática escolar
tes formas. A compreensão oral e escrita,
bem como a produção oral e escrita de tex- Os dados que serão analisados brevemente a
tos pertencentes a diversos gêneros, supõem seguir foram obtidos nas escolas onde os professo-
o desenvolvimento de diversas capacidades res, alunos do Curso de Especialização, trabalhavam,
que devem ser enfocadas nas situações de muitos deles envolvendo suas próprias turmas. Para
ensino. É preciso abandonar a crença na se ter idéia de como é conduzido o ensino da produ-
existência de um gênero prototípico que ção de textos, decidimos investigar os planos de aula
permitiria ensinar todos os gêneros em cir- dos docentes e os livros didáticos usados por estes,
culação social. (p.23-24). para depois aplicar um questionário a ser respondi-
do pelos alunos das escolas pesquisadas.
Pelo menos nos documentos que difundem Os questionários foram produzidos pelos pes- Revista
uma política de ensino da língua, já se percebe um quisadores, todos professores de Língua Portugue- do GELNE
direcionamento no sentido de mostrar a importância sa do ensino fundamental e médio, alunos do Curso Ano 1
dos fenômenos enunciativos e textuais, enfatizando, de Especialização, já referido. Estes fizeram duas No. 1
sobretudo, a noção de gênero, com a preocupação listas de textos diferentes, que poderiam ser pro- 1999
de preparar o aluno para atender, por meio do uso da duzidos em atividades escolares e outros que o alu-
linguagem, múltiplas demandas sociais e diferen- no provavelmente produziriam fora da escola, isto
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é, em suas práticas sociais, em situações corriquei- de outro modo, não se aprende globalmente
ras de sua vida quotidiana (na família,entre amigos, a escrever; aprende-se a narrar, a explicar,
no trabalho, na igreja...). Tais listas foram apresenta- a expor, a argumentar, a descrever, a redigir
das pelos próprios professores aos alunos das esco- atas, a escrever diversos tipos de cartas etc.
las selecionadas para que estes indicassem os textos
O distanciamento da prática dos professores
que eles produziam nas diversas situações de prática
em relação a essa concepção de ensino da produção
da língua escrita. O que se resume e analisa aqui são
de textos fica mais evidente quando se analisam os
os relatos dos professores, suas impressões a res-
questionários elaborados por esses docentes. Cada
peito dos planos de aula e dos livros didáticos, os
pesquisador concebeu uma lista diferente, tanto
questionários por eles elaborados e os resultados
quando pensou nos textos produzidos na escola como
obtidos na aplicação destes.
fora desta. A lista com maior número de itens (44),
Segundo afirmam os professores, os planos de
considerava os textos produzidos na escola e apre-
aula são baseados na proposta do livro didático e
sentava as seguintes opções: adivinhações, aponta-
estruturam-se em etapas cuja aplicação é acompa-
mentos, apostilas, ata, aviso, bilhete, bula, cantorias,
nhada pela coordenação pedagógica da escola. Estes
carta, cheque, cartaz, contos, cordel, crônicas,
planos propõem exercícios estruturais que prepa-
curriculum vitae, desafios–repente, descrição,diário,
ram o aluno para as diversas etapas de elabora-
disparate, dissertação, entrevista, esquema, exercí-
ção de variados tipos de texto, sempre levando em
cio, histórias em quadrinhos, monografia, música,
consideração a audiência e o propósito comuni-
narração, novela, oração, peças teatrais, pesquisa,
cativo. Há ainda atividades que abordam a geração
piadas, poesias, procuração, provérbios, questioná-
de idéias; ensinam a planejar o texto de acordo com
rios, receitas, relatório, requerimento, resumo, ro-
seu objetivo e audiência; treinam o uso dos elemen-
teiro, síntese, telegrama e tese.
tos de coesão; trabalham o vocabulário, pontuação,
Os questionários que buscavam investigar os
regência e concordância. Planeja-se também, como
textos produzidos fora da sala de aula, ou seja, nas
rotina nas aulas de produção de texto, a prática da
práticas sociais de referência, sugeriam que os alu-
auto-correção e da correção por sugestão dos cole-
nos escolhessem dentre: poema, lista de compras,
gas antes de dar ao texto a sua forma final.
carta, bilhete, mensagem, recibo, diário, artigo para
A análise dos livros didáticos (foram exami-
jornal ou revista, ata, ofício, memorando, promis-
nados três livros diferentes, já que em uma das es-
sória, circular, curriculum vitae, telegrama, crônica,
colas - pública - eram usados jornais ou textos
cartão, convite, texto de propaganda, receitas. Um
mimeografados nas aulas de língua portuguesa) de-
outro questionário apontou os seguintes textos:
monstrou que os professores estão satisfeitos com
música, carta, diário, poesia , bilhete, peça teatral,
a orientação dada pelos livros adotados. Segundo
pensamento, história em quadrinhos, charada, con-
estes professores, os livros demonstram uma preo-
tos, telegrama, propaganda; e mais um outo pedia que
cupação com a lingüística textual, pois trabalham o
os alunos selecionassem dentre: bilhetes, cartas,
aperfeiçoamento do texto por meio de exercícios
receitas culinárias, mensagens, lembretes, diários,
de coesão e coerência.
avisos, lista de filmes, escalação de times e outros.
Conforme os mestres, as propostas dos livros
Ao se fazer a análise dos questionários elabo-
didáticos são adequadas às atividades realizadas em
rados pelos professores constata-se que o conceito
sala de aula. Além de apresentarem vários tipos de
de gênero discursivo é mesmo dificil de precisar.
textos: literários, informativos e “práticos”, os li-
Além da confusão entre gêneros e tipos (ou seqüên-
vros adotados nas escolas consideradas propõem
cias) de textos, como narração, descrição e disser-
exercícios de reestruturação, reconstrução e
tação, foram incluídas como um gênero distinto:
refacção do texto, encarando este como o resultado
a) atividades que não envolvem autoria ou cri-
de um processo, na perspectiva de que o sujeito pro-
ação, como cópia, exercício, esquema, síntese, apon-
dutor precisa se preocupar com as idéias, a organi-
tamentos, pesquisa, roteiro;
zação, os elementos característicos do tipo de tex-
b) atividades de escrita que se inserem em ou-
to, a escolha de informações específicas, a adequação
tros textos, tais como regras, definições, gráficos,
da linguagem ao destinatário e com a correção orto-
tabelas, comparações, mensagem;
gráfica e gramatical.
c) portadores de texto, como cartões, diários,
A análise dos planos de aula e dos livros didá-
apostilhas;
ticos demonstra que as propostas ainda estão distan-
d) gêneros cuja prática não se realiza na esco-
tes da forma como vem sendo pensado o ensino e
la fundamental e média, como monografia e tese.
que é muito bem traduzida nas palavras de Pasquier e
A apreciação dos questionários não deixa de
Revista Dolz (1996: 32): ser reveladora da concepção que os professores têm
do GELNE devemos enfocar o ensino da produção de das práticas sociais de escrita, considerando o que
Ano 1 textos não como um procedimento único e dizem Schnewly e Dolz (1996:10):
No. 1 global, válido para qualquer texto, mas Para compreender bem a relação entre os
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como um conjunto de aprendizagens espe- objetos de linguagem trabalhadas na es-
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cíficas de variados gêneros textuais. Dito cola e os que funcionam como referência é
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preciso, então, a nosso ver, partir do fato çam a mudança e a promoção dos alunos a um me-
de que o gênero trabalhado na escola é sem- lhor domínio dos gêneros e das situações de comu-
pre uma variação do gênero de referência, nicação que lhes correspondem. Ou seja, trata-se,
construída numa dinâmica de ensino/apren- fundamentalmente, de se fornecer aos alunos os
dizagem, para funcionar numa instituição instrumentos necessários para progredir.
cujo objetivo primeiro é, precisamente este.
Referências Bibliográficas
Como justificar um modelo didático em que o
aluno produz apenas: descrição, narração, questio-
BIBER, D. (1988) Variation across speech and
nário, poesia, bilhete, resumo, cartazes, fichas de
writing. Cambridge: Cambridge University Press.
leitura, apontamentos, respostas de exercícios, ano-
tações em agenda, avisos? Ou, ainda, redações, men- BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto.
sagens para confecção de cartazes, biografias, pes- Parâmetros Curriculares Nacionais - 30 e 40
quisas, cópias, resumos, questionários, interpretação Ciclos. Língua Portuguesa. Brasília: 1998.
de textos, leituras (sic!), como nos revelam as res- BAKHTIN, M. (1997). Estética da criação verbal.
postas dos alunos de uma turma de 6ª série? São Paulo: Martins Fontes.
O que dizer das atividades de produção escrita DANIELEWICZ, J. (1984) The interaction between
cuja prática se resume à produção de letras de músi- text and context. In: A. Pelegrini e T. Yawkey (eds.)
cas religiosas, letras de hinos, tradução de letras de The development of oral and written language
música nas aulas de inglês? No primeiro caso, o alu- in social contexts. Norwood, N.J.: Ablex.
no copia, supõe-se que também no segundo. Prova- KATO, M. A. (1986) No mundo da escrita. Uma
velmente, o mesmo acontece com outros textos cita- perspectiva psicolingüística. São Paulo: Ática.
dos: biografias, pesquisas, resumos, questionários,
interpretação de textos; quando muito o estudante faz KAUFMAN, A. M. e RODRÍGUEZ, M. E. (1995)
uma editoração de outros textos. Na verdade, na esco- Escola, leitura produção de textos. Porto
la, o aluno produz redações, cuja finalidade, destina- Alegre: Artes Médicas.
tário e conteúdo definem–se estritamente na relação PASQUIER, A. e DOLZ, J. (1996) Um decálogo
professor/aluno em da sala de aula. para enseñar a escribir. Cultura y Educacion,
2: 31– 41.
Comentários finais SCHNEWLY, B. e DOLZ, J. (1996) Os gêneros es-
colares: das práticas de linguagem aos obje-
Observando os textos que, na visão dos pro- tivos de ensino. Mimeo.
fessores, circulam e são experienciados pelos alu- ROCKWELL, E. (1987). Os usos escolares da lín-
nos dentro e fora da escola, constata–se que nem gua escrita. In: E. Ferreiro e M. Gomez Palá-
sempre se consideram os parâmetros situacionais que cio (coord.). Os processos de leitura e escrita.
condicionam a escolha de um gênero. Na escola, o Porto Alegre: Artes Médicas.
aluno se restringe, de fato, à realização de atividades TANNEN, D. (1982) The oral/literatte continuum
de transcrição, reprodução e decalque, tarefas em que in discourse. In: TANNEN, D (ed.) Spoken and
não se exercita a autoria e a criação de textos. written language: exploring orality and
O desafio que se coloca para todos os pesquisa- literacy. Norwood, N.J.: Ablex.
dores preocupados com as questões que o ensino da
produção escrita apresenta é como influenciar uma TEBEROSKY, A. (1982) Construcction de escri-
política lingüística para a educação brasileira e como turas a través de la interacction grupal. In: E. Fer-
tratar da formação continuada do professor dos cur- reiro e M. Gomez Palacio (eds.) Nuevas pers-
sos de Letras e das escolas de nível fundamental e pectivas sobre los procesos de lectura y escri-
médio, de modo que as estratégias de ensino possam tura. Mexico: Siglo XXI Editores, p.155-178.
supor, como ensinam Schnewly e Dolz (1996:8), a VIGOTSKY, L.S. (1978) Pensamento e Lingua-
busca de intervenções no meio escolar que favore- gem. Lisboa: Antídoto.
Revista
do GELNE
Ano 1
No. 1
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