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História da Maçonaria

Então, o que
é Maçonaria? Aula 11

É
Objetivos:
possível identificar, dentro da ordem maçônica internacional, três diferen-
¡ Comentar as diferentes vertentes interpretativas
tes vertentes principais. Essas “vertentes” não se confundem com Potências da maçonaria;
(Obediências) Maçônicas, constituindo linhas interpretativas da história, ¡ Ressaltar o significado e historicidade da Verten-
te tradicional.
filosofia e objetivos da Maçonaria. Um aspecto curioso que precisa ser ressaltado é
a possível presença das três vertentes, conjuntamente, entre irmãos de uma mesma
Loja.

¡ A primeira delas, que chamaremos ¡ A segunda, que podermos chamar de


histórica/tradicional, é praticada originaria- agnóstica, não obriga a crença em Deus,
mente nos países de língua inglesa, manifes- eliminou a invocação À glória do Grande
tando-se também em quase todos os países Arquiteto do Universo de seus rituais e teve
do mundo. Exige a fé em Deus, entendido manifestações políticas e espírito anticlerical,
dentro do conceito judaico/cristão e utiliza tem como sua principal manifestação na
a bíblia como livro da lei, sobre a qual são França, existindo também na Itália e países
tomados os juramentos. latinos.
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¡ A terceira vertente é aquela que, partindo proibir”, associando toda idéia de disciplina a
da tradicional, aplicou com toda intensidade repressão, e como tal, rejeitada. É uma pro-
a interpretação mística aos símbolos, história posta de desenvolvimento do ato reflexivo. O
e filosofia da instituição. Encontra-se princi- homem precisa se conhecer visando melhor
palmente entre os povos latinos da Europa se estruturar para: “impormos um freio salu-
e Américas, mas se manifesta também em tar a essa impetuosa propensão [o vício], para
outras regiões. elevarmo-nos acima dos vis interesses que
atormentam o vulgo profano e acalmarmos
o ardor de nossas paixões...”, 1 como diz um
A Vertente tradicional texto conhecido de todos maçons.

A linha tradicional propõe o aperfeiçoamento Esse aperfeiçoamento preconizado não tem qual-
humano dentro do pensamento que pode ser quer associação com conotações religiosas, seu
refletido no antigo conselho do oráculo de objetivo é claramente identificado, não se tratando
de nenhum aprimoramento espiritual para levar o
Delfos: Conhece-te a ti mesmo. Desenvolve- homem a um nível de aceitação por Deus, como
se a idéia de que pelo trabalho consciente propunham as religiões do passado em suas práti-
cas e ritos de purificação. Quando se fala em espí-
de eliminar suas imperfeições o homem rito, no contexto maçônico, é uma referência à luz
adquire autodisciplina, pondo em ordem da razão, a atributos intelectuais, não a qualquer
hierarquicamente adequada razão, emoções e interpretação religiosa sobre a natureza do ser.
Não possuindo nenhuma doutrina filosófica
sentidos. É a cabeça que deve dominar sobre específica sobre ontologia – a natureza do ser – e
o corpo; a razão sobre as emoções e sobre os sua interação com o divino, a Maçonaria afirma
sentidos. A prática em loja, com momento e apenas que o homem deve estar vinculado à idéia
de um criador e da continuidade da vida, mas não
a maneira apropriada de falar, sem possibi- apresenta qualquer desenvolvimento doutrinário
lidade de réplica já induz uma disciplina e sobre esses dois aspectos, entendendo que eles
um comedimento raramente encontrados constituem temas apropriados para o desenvol-
vimento dos conceitos religiosos que cada um
em nossa civilização atual, cuja palavra de livremente adota
ordem tem sido por muito tempo “é proibido

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A vertente Agnóstica ça dos governos e das Igrejas, atraiu também


intelectuais de diferentes tendências e escolas
A manifestação do agnosticismo na maçona- que se filiaram à nova instituição, levando
ria, como já vimos em aula anterior, levou ao consigo suas idéias filosóficas e práticas ri-
extremo a idéia de liberdade de pensamento, tualísticas dando aos antigos símbolos novas
admitindo que seus membros podem não interpretações com as quais os operativos
apenas ter qualquer religião, como até não jamais tinham sonhado. Alguns desses novos
ter nenhuma. iniciados procuravam apresentar a instituição
como um novo florescimento das mesmas
É bom lembrar que o agnóstico não nega a exis- antigas raízes que haviam originado as esco-
tência de uma realidade transcendental, como faz las de mistério do Egito, Índia e Grécia. Da
o ateu, ele apenas afirma nada conhecer sobre mesma forma como os antigos construtores
esse tema. Como vimos, a eliminação da invocação
ao G∴A∴D∴U∴ levou a extremos materialistas e an- procuravam enobrecer suas origens fazendo-
ticlericais que causou grandes celeumas, desvian- as remontar primeiro ao construtor da torre
do com essa postura contestadora, a maçonaria de
sua origem tradicional. Esta tendência manifesta-
de Babel e depois à Salomão e seu templo,
se ainda hoje em algumas potências e lojas. alguns dos novos maçons queriam vincular
sua instituição às antigas filosofias religiosas
do oriente próximo e distante. Assim, encon-
tramos em nossos símbolos referências her-
A vertente mística méticas, cabalísticas, rosa-cruzes, templárias
etc, refletindo o simbolismo e a formulação
A nova versão da maçonaria, que foi chama- filosófica que os codificadores das mutações
da especulativa e teve sua eclosão pública no da instituição podiam justapor ao acervo de
início do século , desde cedo atraiu so- significados da associação de construtores
bre si atenções diversas. Além da desconfian- operativos.

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na Índia, Egito e em muitos outros pontos


As interpretações de origem místicas acrescenta-
das compõem uma verdadeira colcha de retalhos do oriente próximo e Europa Oriental exis-
simbólico/filosófica que podemos chamar de sin-
cretismo maçônico e que foi penetrando, sendo tem atualmente cultos que preservam muito
do pensamento e da prática daquelas antigas
aceito e incorporado em diferentes graus nos pa-
íses para onde a maçonaria se expandiu.
religiões, e que são hoje em dia suas herdeiras.
Todas são cultos ou seitas religiosas em sua
O que a maioria dos autores que abordam configuração, prática e objetivos, nada tendo
este tema parecem não compreender é que, em comum com a maçonaria além de um ou
quando descrevem os ritos egípcios, os misté- outro elemento simbólico.
rios de Elêusis, ou a cabala, estão falando de
específicas manifestações filosófico/religiosas Entre as organizações ocidentais que mais
dos egípcios, gregos e judeus, não de maço- apropriadamente poderíamos considerar como
naria. O que existe de comum entre a Ordem herdeiras (filosófica e espiritualmente, não histo-
ricamente) das antigas escolas de mistérios estão:
maçônica e aquelas antigas manifestações re- a Teosofia, de Helena Blavatsky, Anie Besant e C.
ligiosas é, em certa proporção o método ini- W. Leadbeater, com suas derivações; as Ordens
Rosa-Cruz (AMORC e outras); os novos Gnósticos
ciático e alguns elementos simbólicos, mas a de Samael Aun Weor e outras assemelhadas. Estas
maçonaria não constitui, de maneira alguma, instituições são completamente dissociadas da
uma versão atualizada daquelas organizações. maçonaria em suas organizações e objetivos.
Os símbolos antigos presentes no acervo
maçônico foram recolhidos daquelas antigas
instituições por aqueles que formularam as É verdade que, por exemplo, a maçonaria tem
alterações da guilda operativa e codificaram em seus símbolos e rituais muitos elementos
os diversos graus e seu simbolismo. Uma hebraicos, como mostram as referências ao
primeira evidência disso é o fato de que ne- templo de Salomão, à lenda de Hiram, as pa-
nhuma daquelas escolas de sabedoria evoluiu lavras de passe e sagradas, as lendas de graus
em sua região de origem para qualquer coisa superiores, contudo e claramente, a maçona-
que se assemelhe à maçonaria. Sabemos que ria não consiste por isso numa versão ociden-

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talizada de judaísmo. Do mesmo modo fo- Como vemos, seus objetivos não são os da maço-
ram incorporados ao simbolismo maçônico, naria. A maçonaria não detém nenhuma verdade
mística transcendental a ser comunicada a seus
elementos do pitagorismo, cabala e teosofia, adeptos, nem se propõe servir de ponte entre o
utilizados em associação à tradicional simbo- neófito e qualquer suposta consciência superior. A
instituição maçônica enfatiza a necessidade do uso
logia dos construtores medievais. Todavia, a
da decisão racional e do empenho da vontade
presença destes elementos não torna a maço- para a eliminação dos defeitos de personalidade
naria uma escola de cabala, um culto pitagó- para que o homem torne-se melhor, mais ajustado
e capaz de auxiliar seus irmãos humanos.
rico ou teosófico, como querem alguns auto-
res. O que dava a cada uma daquelas escolas
suas características essenciais era o conteúdo Para aqueles leitores que se incluem
teórico/ filosófico ministrado, seus objetivos, na vertente mística sugiro que, exa-
suas práticas ritualísticas coletivas e individu- minando a prática real e cotidiana
ais . As escolas de mistérios eram imbuídas de suas lojas reflitam sobre as
de caráter fortemente religioso e propunham, seguintes questões, que descrevem características
através de uma série de iniciações, pôr o neó- comuns às chamadas escolas de mistérios:
fito em contato com verdades cada vez mais
esclarecedoras, contidas em dois grandes 1. Tem a maçonaria alguma instrução, prática
títulos, os pequenos mistérios e os Grandes coletiva ou individual que ensine exercícios res-
mistérios.2 Supunha-se que acompanhavam piratórios, técnicas para o desenvolvimento da
as revelações destas grandes verdades reais consciência, ou o despertar de centros psico-ener-
mutações interiores no indivíduo, que as- géticos (chacras) ou práticas assemelhadas?
cendia a níveis de consciência ultrafísicos,
adquirindo o poder de realizar maravilhas. 2. Existe, em alguma instrução, algum ritual,
Cada uma delas tinha uma maneira especial algum grau, cerimônia ou exercício de invo-
de codificar sua verdade, que era transmitida cação de poder ou poderes místicos, guias ou
a seus componentes em cerimônias especiais. mestres espirituais?

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3. Por acaso algum grau desenvolve culto a ritos, rituais, liturgia, e exige de seus membros
alguma divindade, ou desenvolve-se qualquer a crença num princípio criador, o Grande Ar-
cerimônia onde se procure controlar ou mani- quiteto do Universo e na continuidade da vida,
pular supostas forças ou energias sutis de cará- cuja definição, como já vimos, deixa a cada
ter humano ou transcendente? um , segundo sua opção religiosa. Esta exigên-
cia reflete o reconhecimento da necessidade
4. Existe alguma cerimônia ou instrução de humana de um relacionamento íntimo com
algum grau que ensine ou comente métodos os aspectos transcendentes da realidade e a re-
para alcançar salvação da alma, espírito, ou jeição de uma visão cosmogônica materialista.
qualquer contraparte transcendente do ser Este reconhecimento congrega também uma
humano? admissão implícita de que o aprimoramento
pessoal pregado pela instituição não poderá
A resposta para todas e cada uma das questões ser alcançado por alguém que destes aspectos
acima é única: um retumbante e sonoro Não, a esteja dissociado, pois:
menos que, em algum recanto deste imenso e
diversificado país, algum maçom esquecendo- Todo maçom é obrigado, por sua condição, a obe-
se dos rituais e da tradição, tenha dado asas à decer à lei moral; e se compreende bem a arte, não
sua imaginação e criatividade desenvolvendo será jamais um ateu estúpido nem um libertino
irreligioso.
um produto híbrido incorporando algum dos
aspectos mencionados aos trabalhos maçôni-
cos, criando um rito esdrúxulo e disforme, ca- Valorizando a religiosidade, a maçonaria in-
paz de incorporar qualquer adjetivo esotérico, centiva a disciplina e o cultivo dos valores do
mas que jamais seria maçonaria. espírito.

A maçonaria constitui uma organização sui ge- Num meio sócio-cultural como o nosso bra-
neris; Não sendo religião ou seita, tem, contu- sileiro, onde a maioria está de uma maneira
do, atitudes de conformação religiosa: possui ou de outra ligada ao Cristianismo, é natural

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que seus membros adotem o conceito do tram-se em toda parte, especialmente em ce-
∴∴∴∴ de acordo com os preceitos das rimônias ritualísticas.
várias denominações cristãs a que pertencem,
porém dada a índole sincretista predominan-
te, muitos se sentem mais atraídos pela inter- Se alguém a princípio com dificuldade
pretação mística dos símbolos, e encontram de concentração nos estudos planejar
nas cerimônias praticadas em loja conotações, uma série de movimentos preliminares,
repetidos regularmente, como posicio-
associações, que outros de tendência diversa
nar a cadeira de certa forma, posicionar
não chegam a considerar. Assim encontra-
o livro, abrir a janela, ajeitar a cortina, e
mos escritos que vêm valor místico em todos depois iniciar o estudo, verificará que
os procedimentos em loja, sejam eles tradi- após a repetição deste ritual algumas
cionais ou recém inventados. vezes ao sentar-se para iniciar a leitura
já estará no nível desejado de con-
Esclarecendo melhor meu pensamento: é cer- centração para executar sua tarefa.
to que o simples ato de respirar é maravilhoso Estudos sobre este campo têm sido
e que podemos desenvolver considerações de publicados, falando também no poder
grande profundidade filosófica apenas pela do pensamento positivo, planejamen-
observação da queda de uma folha de uma to neurolinguístico além de outros
árvore. O ato de pensar libera energia, e enfoques no campo da auto ajuda e
nossos processos psíquicos são diretamente aprimoramento pessoal. Como estas
influenciados por fatores externos. Assim, ar- idéias em geral não são novas, mas sim
traduções em linguagem atualizada de
ranjos geométricos, movimentos simétricos,
conceitos já existentes disseminados
repetições, ritmos, alternância planejadas de
pelas diferentes culturas do globo,
som e silêncio impressionam profundamente, podemos encontrar seus reflexos
ficando gravadas em nossos desconhecidos também na maçonaria.
processos interiores. Estes elementos encon-

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Mas a Ordem maçônica não A Mística e a Arte Real


possui: Um corpo de verdades
esotéricas transcendentes comuni- A atitude filosófica da Maçonaria é a de in-
cadas aos neófitos nas sucessivas vestigação da verdade, e seus rituais definem
iniciações; um conjunto de instruções sistemá- a Arte Real como o aperfeiçoamento na arte
ticas desenvolvendo as doutrinas decorrentes do pensamento. Como já comentamos, esse
destas revelações; sistemas de exercícios de espírito crítico tem sido comumente exercita-
introspecção que conduzam a obtenção de do na contestação de dogmas religiosos, mas
níveis diferenciados de consciência induzindo tem sido esquecido quando se trata de afir-
uma nova cosmo-visão facilitando a assimila- mações de conteúdo místico/esotérico.
ção e prática dos novos conceitos. Por todos os
aspectos já levantados, repetidos e acentuados, Os termos: místico, misticismo,
acreditamos ter estabelecido com clareza que a mistério, estão obviamente relacio-
maçonaria é completamente desvinculada das nados, sendo derivados da raiz grega
práticas e objetivos característicos das escolas µ (mu), que representa o ato de por os
de mistérios da antiguidade, não pretendendo dedos nos lábios para pedir silêncio,
constituir qualquer via, paralela ou transversal, fazendo parte da palavra grega muein
de acesso a Deus, em qualquer sentido que que pronunciada mueîn significa fechar-
seja definido, evitando qualquer formulação se, estar quieto, em calma, sem ativida-
religiosa, como claramente estabelecem seus de; se a pronúncia for múein, significa
princípios fundamentais.
fechar os olhos, iniciar-se num segredo.
Assim, Mystikós significa “relativo ao
mistério”, segredo, envolvendo tudo o
que se relaciona com uma realidade não
acessível com os instrumentos ordiná-
rios do conhecimento.

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Na civilização ocidental, a Igreja constituiu- como o “rastro” deixado por uma nave estelar,
se, desde a idade média na autoridade má- numa mensagem para os fiéis escolhidos. Al-
xima em questões transcendentais. A partir gumas posturas parecem transmitir a idéia de
do século  descobertas arqueológicas e que todas as descrições lógicas e descobertas
científicas trouxeram à discussão muitos dos científicas são falsas e apenas os conceitos eso-
antigos dogmas e até meados deste século ex- téricos transcendentes, por mais desvairados
perimentou-se um ceticismo científico. que pareçam, trariam finalmente a verdade.

Com o renascimento do interesse pela es- Existe um pensamento bem divulgado nos
piritualidade, no surto de misticismo que círculos esotéricos, que embora tenha em si
invadiu o ocidente a partir dos anos 60, ve- uma certa coerência, pode e é utilizado como
rificou-se uma proliferação de cultos e dou- argumento final, que liquida qualquer ques-
trinas orientais, trazendo consigo posturas tionamento para o qual não se tenha uma
curiosas.Certos grupos aceitam sem qualquer resposta adequada. Ele diz mais ou menos o
reflexão informações absurdas e interpreta- seguinte: “Se não consegues aceitar a evidên-
ções esotéricas que são puro Non Sense. Na cia de que nossas afirmações são verdadeiras,
capa de um livro de um dos prolíficos autores é porque não estás suficientemente evoluído
atuais, uma foto mostrava o efeito simples da para compreendê-las.” E o questionador,
decomposição da luz solar em suas diferen- para não ser considerado primitivo involuí-
tes cores, que a legenda dizia ser uma foto do, engole sua dúvida e deixa de exercer seu
especial da “Energia Ozozone” que permeia pensamento crítico, acabando por indução,
todo o espaço; outra de um fósforo aceso mo- pelo hábito, pela repetição, a aceitar aquelas
vido sobre um fundo escuro era apresentada afirmações como verdade.

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A expressão “conhecimento esotérico”, na


É certo que para compreender
determinadas realidades torna-se maioria das vezes em que é utilizada, traduz
necessário um acervo prévio de o significado de “ fé esotérica”, pois se refere
conceitos adequados. É impossível, à crença na correspondência das teorias des-
por exemplo, ensinar mecânica critas em obras sobre o tema com o universo
quântica a um transeunte qualquer, observável. Existe abundante literatura sobre
que passa pela rua. Ë necessário esoterismo, apresentando desenvolvimento de
primeiro “iniciá-lo” num curso de física conceitos transcendentes sobre a constituição
até que ele interiorize as condições de do corpo, do ser, do planeta e universo. Fa-
alcançar os conceitos da física lam da formação do cosmos, sua hierarquia e
quântica. De modo semelhante, as finalidade, posicionando a humanidade como
concepções de caráter transcendental um todo e o indivíduo dentro desse contexto,
desenvolvem-se gradativamente.
segundo diferentes escolas de pensamento.
O que não se admite é o uso daquele
Predominam as interpretações teosóficas, ori-
pensamento para fugir ao questiona-
ginadas na obra de Helena P. Blavatsky, seus
mento, induzindo mesmo a idéia que
questionar significa não estar apto. sucessores e discípulos, dentre numerosas
outras vertentes. Muitas dessas formulações
são atraentes, exibindo alto grau de coesão,
Voltamos a comentar agora a ordenadas seqüencialmente com lógica.
possibilidade de haver entre os lei-
tores destas páginas alguém exi- As informações apresentadas são atribuídas à
bindo sorriso de condescendente três fontes principais, sobre as quais fizemos
superioridade, considerando: “Esses comentá- curto comentário no início desta seção. A
rios refletem falta de conhecimento esotérico”. primeira delas refere-se à supostas capacida-
Examinemos então, de perto, esse tema. des cognitivas transcendentes de seus autores,

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com as quais teriam acessado arquivos de Ora, nós reconhecemos como verdade aque-
memória universal gravados no cosmos, co- las proposições que se alinham com nosso
nhecendo de forma direta a história da terra modo de pensar, que encontram ressonância
desde milhares (por vezes milhões) de anos. em nosso particular acervo conceitual, ou
Outra indica como sua origem a revelação que pelo peso das evidências apresentadas,
de mestres de sabedoria, seres extra terrestres, são irrefutáveis.
ou outra classe de orientadores espirituais. A
terceira fonte aponta para tradição ancestral Bem sei da dificuldade de transferir para
oculta, revelada apenas ao autor (e seus dis- nível intelectual insights alcançados em mo-
cípulos mais próximos), devido a seus dotes mentos de contemplação. Também é verdade
individuais superiores, sendo sua missão pes- a impossibilidade de inteligir aspectos da
soal a divulgação daquelas informações. realidade para os quais não se disponha de
pré-requisitos conceituais adequados, mas
Não pode ser considerado conhecimento esotéri- a frase acima referida pode ser utilizada
co a simples assimilação das informações contidas simplesmente como escudo para evitar exi-
nessas obras, acompanhada da crença ingênua na bir fragilidade (ou falsidade) de conceitos e
veracidade de tudo o que contêm, pois a página
em branco de um livro aceita o que quer que sobre afirmações. Aqueles que defendem as teorias
ela se imprima. Mesmo aqueles que admitem a de certos autores, tomando-as como verdade,
possibilidade de aquisição de conhecimento por
via transcendente, refletindo sobre o tema serão
sem ter comprovação de sua veracidade, es-
confrontados com a questão: Como diferenciar tarão simplesmente exercendo seu direito de
os relatos fiéis (refiro-me àqueles nos quais o au- crer no que mais lhes agradar, podendo di-
tor acredita estar dizendo a verdade) de outros
exibindo apenas grandes dotes de imaginação, vulgar e defender sua crença, como têm feito
por vezes verdadeiros delírios? É nesse contexto milhares de indivíduos em todos os tempos.
que costuma surgir o pensamento comentado Isso, porém, repito, não é conhecimento, mas
anteriormente, numa de suas variantes: “Quem
está suficientemente adiantado na senda saberá sim fé.
reconhecer a verdade”.

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Quando ressalto a necessidade de comprovação possuir e um enorme desprezo por aqueles que
tenho em mente não apenas referência docu- não partilhavam dessa ilusão”.3
mental ou prova de laboratório. Meu conceito
de verdade não é o de Lord Kelvin: “... o que se
pode pesar e medir...” entendo que a realidade Mais adiante, no mesmo livro, comenta sua
cotidiana transcende em muito esses parâmetros
compreensão do transcendente:
limitados. Admito como conhecimento também a
experimentação a nível pessoal, da realidade ultra
física, com seus múltiplos níveis de consciência e “Cremos que é no próprio centro da realidade
existência. Quem quer que fale sobre esse tema
que a inteligência, por muito pouco excitada
sem ter experimentado a realidade de suas afirma-
ções, não pode alegar ter qualquer “conhecimento que seja, descobre o fantástico. Um fantástico
esotérico”, possuindo, quando muito, informações que não convida à evasão, mas antes a uma
acerca de teorias veiculadas na literatura disponí-
vel no mercado. mais profunda adesão.

É por falta de imaginação que os literatos, os ar-


Bastante pertinente sobre esse tema é o que tistas vão procurar o fantástico fora da realidade,
diz Louis Pawels, em seu livro escrito em par- entre as nuvens. Trazem apenas um subproduto.
ceria com Jacques Bergier, comentando seu O fantástico, a semelhança das outras matérias
vínculo com grupos de estudos esotéricos: preciosas, deve ser arrancado às entranhas da
terra do real. (...)
“Esforçava-me por me separar das minhas emo-
ções, dos meus sentimentos, dos meus impulsos, Geralmente o fantástico é definido como uma
a fim de encontrar, para além, qualquer coisa violação das leis naturais, como a aparição do
de imóvel e permanente, uma presença muda, impossível. Para nós não é nada disso. O fantás-
anônima, transcendente, que me consolaria da tico é uma manifestação das leis naturais, um
minha pequena realidade e da incongruência resultado do contato com a realidade quando
do mundo. (...) Supunha possuir os segredos do esta nos chega diretamente, e não filtrada pelo
governo do espírito e de todo o conhecimento. véu do sono intelectual, pelos hábitos, pelos pre-
Na verdade eu não possuía mais que a ilusão de conceitos, pelos conformismos.(...)

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Repito, o fantástico, a nossos olhos, não é o ima- te definida por Louis Pawels e Jacques Ber-
ginário. Mas uma imaginação poderosamente gier na citação acima.
aplicada ao estudo da realidade descobre que é
muito tênue a fronteira entre o maravilhoso e o Ou seja, a realidade palpável, cotidiana, quando
positivo, ou, se preferem, entre o universo visível observada, experimentada com livre atenção, traz
e o universo invisível.” 4 em si mesma um sabor do maravilhoso e ecos de
transcendência.
O termo esotérikos, significando restrito, reser-
Considero de extrema importância aplicar vado foi utilizado pelas escolas filosóficas gregas
da antiguidade para qualificar o ensinamento
a liberdade de pensar defendida por nossa reservado a um círculo fechado de discípulos. O
instituição, também à análise de proposições pensamento místico moderno, especialmente
esotéricas, comumente aceitas como verdades aquele com raízes teosóficas, refere-se a uma linha
única de pensamento a respeito das verdades últi-
estabelecidas, talvez pela constante repetição mas da vida e existência humanas que teria sido a
e citações cruzadas de vários autores, sem que fonte original das inúmeras variações encontradas
jamais se tenha investigado a propriedade de nos mitos e lendas religiosas de todos os povos.
Comenta-se que em épocas e povos diferentes
tais proposições. surgiram mestres que ensinavam novamente as
mesmas antigas verdades em roupagens novas,
Não estou absolutamente propondo uma apropriadas a cada povo, época e local. Eles re-ve-
lavam a verdade, ou seja, davam a ela novos véus,
negação da realidade transcendental, como nova expressão, nova forma.
espero ter deixado em meus comentários Cabalista contemplando o Cosmos

anteriores. Acredito com Pascal que “A maior


aquisição da razão é perceber que existem O estudo comparativo da religião e mitologia
coisas que estão além da razão”, mas creio que dos povos, seja do oriente e ocidente, norte e
existe uma profusão de exageros, uma ânsia sul, mostra conceitos com raízes comuns, ape-
pelo maravilhoso, pelo inusitado, que podem nas revestidos do caráter cultural específico
nos impedir de captar as imensas maravilhas de cada um. Carl G. Jung considerava esses
do cotidiano. Esta posição foi magistralmen- fatos como evidência da existência do que ele

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chamou de inconsciente coletivo, uma espécie


Na década de 60, sob influência
de acervo psíquico comum a toda humanida- do movimento hippie observou-se
de, onde em estados alterados de consciência uma explosão de temas esotéricos
e através dos sonhos, iríamos buscar aqueles na literatura. Obras antigas foram
conteúdos conceituais que vemos expressos nas reeditadas e novos autores surgi-
religiões e mitologias conhecidas. As histórias ram escrevendo sobre este tema, e
sobre a criação, contato com os deuses, sagas o que antes era dito “de boca para
de heróis e semideuses repetem-se em parale- ouvido”, passou a ser proclamado
los sem fim. Comenta-se, entretanto, que to- para “quem tiver ouvidos, que ouça
das essas histórias e lendas constituíam apenas e quem ler, entenda”. Em meio a
as religiões das massas, que o verdadeiro saber, essa enxurrada de textos de auto-
o conhecimento esotérico em essência, a in- res que se diziam grandes autorida-
des, swamis de nomes indianos, al-
terpretação adequada dos mitos e lendas com
gumas poucas vozes se levantavam
suas conseqüências filosóficas e práticas eram
para alertar sobre a irresponsabili-
dados apenas a homens escolhidos, passando
dade com que o tema estava sendo
“de boca para ouvido”, preservando assim esses tratado, bem como do perigo sub-
valores para serem transmitidos continuamen- jacente a esse conhecimento, tão
te a quem deles se tornasse digno. avidamente procurado. Lembravam
que não era por espírito egoísta
Ao longo dos séculos têm surgido grupos, que esse conhecimento fora uma
que se apresentam como possuidores do co- vez mantido apenas ao alcance de
nhecimento antigo. Assim surgiram os rosa- poucos, mas por razões mais sérias.
cruzes, teósofos, gnósticos, novos templários,
etc. numa multiplicidade de movimentos e Existem hoje vários cursos que se propõem
instituições que se apresentam como capazes ensinar o “domínio da mente”, o “poder do
de transmitir os segredos da verdadeira sabe- pensamento”, onde se ensinam técnicas que
doria arcaica. permitem ao homem comum produzir efeitos

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palpáveis. Todo esse conhecimento pode tor- Comentam os estudiosos do tema que a ênfa-
nar-se uma faca de dois gumes, pois se ensina se das antigas escolas de sabedoria não residia
apenas as técnicas de um pseudo controle de em técnicas para um suposto domínio da
um “poder” do qual não se conhece a origem, mente, mas sim em práticas para a purifica-
a natureza, extensão e possíveis efeitos secun- ção dos atos, moral e pensamentos do prati-
dários. Assim, ao lado dos propalados efeitos cante, para que, quando ou se o poder viesse,
positivos sobre a vida dos praticantes paira a o homem já dispusesse de estatura suficiente
possibilidade do desencadeamento das conse- para manejá-lo, se ainda nele tivesse interesse,
qüências das práticas em si. quando certamente o faria visando o bem
comum. Aquele cujo objetivo fosse tornar-se
Temos assim hoje em dia um pequeno núme- poderoso, não seria admitido nem nos níveis
ro aprendizes de feiticeiro, querendo ser ma- iniciais daquelas escolas. Consta que elas
gos ou apenas experimentar os efeitos desses adotavam o princípio refletido nas palavras
poderes, sem mesmo saber com o que estão de Jesus: “quem quiser ser o maior entre vós,
lidando. A fonte dos possíveis transtornos seja o vosso servo.” A ânsia em aprender a
liberados por essas práticas prende-se ao fato produzir prodígios observáveis é comparável
de que entramos aqui em terreno desconhe- ao desejo de aprender os malabarismos e con-
cido, não existem placas de sinalização (ou torcionismos dos artistas circenses – suscitam
melhor, existem, mas têm sido ignoradas), aplauso mas não produzem qualquer real
aqui tocamos em um aspecto mais essencial evolução pessoal – ; ou a alguém que praticas-
e sensível do ser humano: sua insondável es- se halterofilismo com um só braço, deixando
trutura psíquica. todo o resto do corpo por desenvolver, en-
quanto que o crescimento desejável trata de
uma evolução completa de todos os aspectos
da personalidade do indivíduo.

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História da Maçonaria
Aula 11 Então, o que é Maçonaria?

O cerne do conhecimento esotérico é o conhecido pensará em considerar a lei da gravidade in-


aforismo grego: Conhece-te a ti mesmo, Conside- justa por tratar os dois de igual modo.
rando-se como objetivo primordial do ser humano
alcançar a manifestação plena de sua essência. A
idéia motivadora considera o ser real consistindo No que se refere a exercícios para desenvol-
na essência interior e não a “máscara” externa da
vimento pessoal, lembramos o que disse o
personalidade conscientemente reconhecida. Em
nossa consciência comum, objetiva, estamos semi- apóstolo Paulo em sua primeira carta aos
despertos, sonolentos, envoltos no fluxo ininter- coríntios, após comentar o valor dos prodi-
rupto dos pensamentos verbalizados, que nos
distanciam do ato de perceber o que nos rodeia,
giosos dons de cura, profecia etc.:
e nossa autoconsciência é ainda mais reduzida.
Fazer a mente funcionar em níveis superiores de “... Passo a mostrar-vos caminho sobremodo ex-
conhecimento teria o objetivo de tornar o homem
mais harmonizado consigo mesmo e com os ou- celente; ainda que eu fale a língua dos homens e
tros, não a obtenção de “poderes”. dos anjos, se não tiver amor/caridade serei como
o bronze que soa, ou como o símbalo que retine.

Práticas como exercícios de controle de respi- Ainda que eu tenha o dom de profetizar, e co-
ração e outros artifícios de exercícios psíqui- nheça todos os mistérios e toda a ciência, e ain-
cos são desaconselhados pelos eruditos pes- da que eu tenha tamanha fé, a ponto de trans-
quisadores dessa área, pois os encadeamentos portar os montes, se não tiver amor/caridade
de causa e efeito liberados são leis inflexíveis, nada serei.
a exemplo do mundo físico, onde, por mais
puro e bem intencionado que seja o indivíduo, Ainda que eu distribua todos os meus bens para
ao lançar-se para fora da janela de um terceiro os pobres, e entregue meu próprio corpo para
andar, cairá do mesmo modo que o pior dos ser queimado, se não tiver amor/caridade, nada
criminosos em idêntica situação, e ninguém disso me aproveitará.”

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História da Maçonaria
Aula 11 Então, o que é Maçonaria?

É nos embates da vida, no relacionamento com


O grego tem três diferentes palavras
para o conceito que em português é os que estão ao nosso redor que encontramos
traduzido pela palavra amor: Eros, que campo fértil e farto para o “desbaste da pedra
é o amor sensual, entre homem e mu- bruta”, para o desenvolvimento daqueles va-
lher; Philia, que é o sentimento que une lores que nos tornarão indivíduos mais puros,
amigos, pais e filhos, irmãos; e Agápe, mais nobres, e seres humanos mais completos
que representa uma forma mais profun- e realizados. Este é o conhecimento esotérico
da de amor, que transcende as outras que precisa ser propagado, defendido e prati-
duas. Quando lemos na 1a carta de João cado; o conhecimento de que nossa natureza
“Deus é amor”, a palavra traduzida por real não está presa apenas ao aqui e agora do
amor não é eros, nem philia, mas sim mundo tridimensional, e que todo crescimen-
agápe. A palavra latina utilizada para to vertical no conhecimento de Deus, como
traduzir esse termo foi Caritas, que deu
quer que o definamos, deve necessariamente
caridade em português, mas que infe-
refletir-se em nosso relacionamento horizon-
lizmente não mais traduz seu completo
tal com nossos semelhantes.
sentido, pois hoje em dia entende-se O Grande Arquiteto em seu ato criador,
caridade como fazer doação aos ne- tela de William Blake, cerca de 1827.
cessitados, e agápe vai muito além, é o Encerramos por aqui nossa décima primeira
amor-ação, é perceber a necessidade aula. Nela comentamos sobre as diferentes
do outro em todos os termos, como vertentes interpretativas da maçonaria e pu-
se no lugar dele estivesse, e agir movido demos, também, ressaltar o significado e his-
por este sentimento. É deste conceito toricidade da Vertente tradicional. Em nossa
profundo que Paulo fala e no final do próxima e última aula, vamos estabelecer
capítulo citado (para espanto de mui- com precisão as características da maçonaria
tos fundamentalistas) coloca acima da tradicional, bem como comentar a opinião
esperança e da própria fé. de outros autores sobre o tema.

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