Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Eu:
Esqueçam as apostas dessa madrugada.
Só vou estar por aí amanhã.
Brandon cuzao:
Dando pra trás, fdp?
Nós já trocamos os pneus.
Ryus Yag:
Qual foi, Alien? A localização já foi
compartilhada, geral vai tá lá.
Benedete ruiva:
Eu falei que ele daria uma de "mestre dos magos".
Eu:
Tenho um compromisso, vão sfd!
Encheção de saco do caralho!
Benedete ruiva:
Vai foder quem?
Ryus Yag:
Se falar "você" eu te mato, Alien
Eu:
Tô no John, porra.
Benedete ruiva:
Ihhh ah lá…
Brandon cuzao:
Ah, suave.
Eu:
Vocês mudam pra caralho quando o assunto é meu
irmão, parça.
Benedete ruiva:
Você já deve saber o motivo.
Eu:
Vsf.
Brandon cuzao:
A gente se fala amanhã.
Benedete ruiva:
Se ele voltar vivo…
Eu:
Vai lavar uma louça, Benedete.
Não fazia ideia de como aquilo mexia com a minha cabeça, até ver o
quanto mexia. A vingança parecia uma droga desgraçada e tudo que me fazia
promessas de tê-la se tornava algo intocado, que eu mantinha longe de tudo e
todos.
Foi ali que percebi isso, porque nunca pensei que odiaria ver os
bundões dos meus amigos como odiei naquela hora, enquanto saía da
cobertura.
— Com pressa, Alien? — Benedete e seu tom de mãe protetora me
atingiram primeiro. Seus braços se cruzaram, e assisti a ela se encostar no
capô do meu carro com os olhos afiados.
Mesmo que negasse, ela parecia querer copiar a porra de agiota que
tinha como tio. Ele cuidava dela como uma filha adotiva e, pelo visto, além
do mau exemplo, a ruiva também copiava sua síndrome de acolhimento a
órfãos com problemas.
Com as mãos nos bolsos, como uma dupla de almofadinhas deslocados,
Ryus e Brandon se juntaram a ela. Com seriedade e imponência, me
encararam. Era o poder que eu dava somente a eles, de me tratar de igual para
igual, porque conquistaram aquilo.
E era algo engraçado, porque se, anos atrás, me dissessem que o filho
de um criminoso morto faria parte do meu círculo, eu até acreditaria. Esse era
o caso do Ryus. Mas o filho do Governador de Manhattan? Eu duvidaria se
não soubesse quem Brandon era. O pior entre todos os outros e o mais
próximo a mim.
— O que tá pegando, cara? — ele perguntou com a cara inexpressiva.
— O que que tá pegando? — Ri. — O óbvio! Vocês são idiotas?
— Nós sabemos que está mantendo a garota aí. — Benedete olhou nos
meus olhos. — Mas ninguém sacou o porquê de se fechar sobre o assunto
com a gente. — Franzi as sobrancelhas, sabendo exatamente sobre o que
estava falando.
— Tá falando de que merda, ruiva?
— A mina não é um segredo, cara. A gente falou que ia te ajudar. —
Ryus se posicionou ao lado da namorada.
— Ajudem ficando longe dela. — Olhei para a Benedete. — Afinal, ela
é a minha única carta.
— Vai massacrar a garota. Ninguém seria pior nisso, logo… — Me
seguiu até a porta do carro. — É uma grande hipocrisia da sua parte dizer que
afastou a gente para manter a sua presa segura, já que o perigo é você.
— Benedete… sei onde bater, essa é a grande questão. — Semicerrei
os olhos. — Sou o dono, domino, e a corrente da coleira está nas minhas
mãos — completei. — Sei como tirar tudo dela antes que perca a capacidade
de falar.
Fui abrir a porta, mas me impediram.
Era Brandon.
— Ela está cooperando? — indagou, seus olhos fixos em mim.
— Não do jeito que eu gostaria — falei, um sorriso sinistro brincando
em meus lábios. — Já tinha percebido que ela banca a marrenta, mas todo
mundo tem um limite. — Abri a porta. — Vou cavar até encontrar o dela.
Uma vez dentro do carro, assisti a cada um assumir seus volantes.
Nós tínhamos uma linguagem só nossa.
Aquele único diálogo resolveu muita coisa. O fato de terem me deixado
em paz dizia que tinham superado a exclusão da minha parte.
Mesmo que fosse complicado, eu entendia como nós funcionávamos,
mas ao contrário disso, nada explicava toda aquela concentração na vingança.
Eu tinha todos os detalhes, todos os planos, tudo que faria com a filha do
porco, na cabeça, repassando isso a cada segundo.
Sempre coloquei muita intensidade nos meus passos. A Abernathy era
o meio para um fim e, enquanto não colaborasse, iria conhecer esse meu lado
até ceder.
Eu só pensava em apertar, arranhar e morder aquela garota. Nutria a
certeza de que, quando tudo terminasse, ela ainda sentiria minha presença há
quilômetros de distância. Seria como uma sombra, surgindo todas as vezes
que corresse em direção à luz.
Ela nunca teria paz.
Nunca.
— Só mais um… pouco… — Tentei conter o ardor no meu abdômen
enquanto me dobrava para terminar de puxar uma parte fina e longa da
estrutura de madeira da cama.
Bati nela a noite inteira, tentando manter a adrenalina para não
congelar, mas não adiantou tanto para mim. Meu corpo tremia mais do que
antes, sentia que minhas forças iam embora a cada segundo decorrido e meus
lábios estavam roxos, assim como as pontas dos dedos.
Pela manhã, a neve estava lá, colando em mim, enfeitando meus
cabelos, me deixando quase azul. No fim, ainda estava sofrendo com o frio, e
agora tinha um ombro quase deslocado, mas para alguma coisa o esforço
valeu: tinha algo longo para tentar derrubar o meu telefone dali mesmo, sem
precisar sair do raio de meio metro ao qual estava presa.
Levantei um dos pés, mirei a base da cama e dei um chute, a ripa fina
caiu comigo. Gemi quando minhas costas bateram no chão e comecei a me
sentar, zonza, quase morta, mas envolvida em esperança.
A madeira era pesada para caralho, mesmo sendo fina. Sinal de que era
boa, dizia minha mãe.
Fechei os olhos. Lembranças dela eram tudo que eu tinha e o que me
dava forças ali. Cada movimento era uma tortura, mas, com muito esforço,
consegui derrubar o telefone e comecei a puxá-lo pelo piso polido.
Com um progresso considerável, me livrei da madeira. Minhas mãos,
que já tremiam, pioraram ao me aproximar. Estendi os dedos ao máximo,
tentando alcançar o que poderia ser minha única conexão com o mundo
exterior.
— Ah… por favor…
Finalmente, meus dedos roçaram a tela fria do celular. A sensação foi
como encontrar água no deserto. Meus olhos se encheram de lágrimas
enquanto eu digitava freneticamente o número de Meg. Quando a chamada
foi atendida do outro lado, meu corpo inteiro pareceu esquentar.
— Alô? Quem está aí? — Sua voz soou distante e preocupada.
— Meg, sou eu, Brianna. Estou presa... preciso de ajuda. — Minha voz
saiu fraca e trêmula, mas a sensação de falar com alguém me trazia uma certa
onda de alívio.
— Onde você está? — Soou afobada. — Estou indo aí agora mesmo!
— exclamou do outro lado da linha e meus olhos piscaram algumas vezes.
Deus. Onde eu estava? Não fazia ideia de onde eu estava.
— Você precisa ir até a polícia e pedir para que rastreiem… — Antes
que terminasse, um estalar me chamou a atenção.
Olhei para a porta. Alguém estava chegando. Ele estava chegando.
Meu coração doeu quando ouvi Meg chamando o meu nome
repetidamente, em desespero, e apertei o botão desligar. Engoli o choro com
o corpo tremendo e enfiei o celular embaixo de mim. Fechei os olhos, a
cabeça encostada na madeira da cama e um pouco de cabelo no rosto.
Eu esperava que ele entrasse, me visse e fosse embora. Só isso.
Vá embora…
A porta se abriu. O uivo do vento batendo nas cortinas pareceu se
intensificar, e então lá estavam os seus passos.
Um.
Dois.
Três.
Compassadamente, como um maníaco. Um predador.
Ouvi quando parou diante de mim. O som do tecido de sua calça
esticando ficou mais alto quando ele se agachou.
Senti a mão quente entrar pelos meus cabelos e acomodar a minha
bochecha na palma. Era forte, imponente até no toque. Era bom, eu estava
com tanto frio.
Ele segurou os meus ombros, mantive os olhos fechados e o corpo
mole. Seus dedos tiraram os fios de cabelo do meu rosto e, por um momento,
pude sentir a intensidade do seu olhar sobre minha pele. Mas, antes que meu
corpo aproveitasse a pouca quentura que suas mãos me transmitiam, ele se
afastou e passou a caminhar para longe.
Abri um pouco os olhos quando a claridade absurda começou a
enfraquecer.
Está fechando as janelas?
Mais passos. Ele estava voltando. Fechei os olhos. Silêncio.
No ar, somente o meu corpo tremendo incontrolavelmente e sua
respiração podiam ser ouvidas.
— Não é tão frágil assim, ratinha — murmurou firme, e um arrepio
diferente cobriu a minha espinha. — Não pode morrer agora.
Ele abaixou de novo. Senti suas pernas me envolverem, me puxou para
perto.
Deus, o que ele está fazendo?
Quando menos esperei, Aaron me fez encostar em seu peito e apertou
os braços ao meu redor, deixando clara a sua intenção: aquilo era uma
tentativa de me manter viva, me esquentar. Ele não conseguiria nada se eu
sucumbisse, e sabia disso.
A vontade de empurrar aquele infeliz para longe era desumana, mas a
sensação quente envolvendo meu corpo malroupido e frio, o peito que
continha os meus espasmos, suas mãos grandes passando por minhas
costas…
Me aconcheguei nos braços do meu fantasma, do mais novo pesadelo
da minha vida. Ele me puxou um pouco mais para perto, fazendo meu
coração começar a sacudir no peito. Era como se não achasse suficiente me
ter colada nela, e eu não pensava diferente. Era calor o que o meu corpo
pedia, eu queria mais, muito mais, e foi ali que, por um fio, pude sentir que o
celular começava a escorregar por baixo das minhas pernas. Não tive tempo
de segurar, eu tremia mais do que pensava, queria seu corpo quente mais que
qualquer coisa, e com isso, assisti ao desenrolar do fim da linha para a minha
esperança.
A risada que ele soltou ecoou por todo o lugar. Um som que seria
difícil de se esquecer.
— Eu estou impressionado — falou no meu ouvido. Quando eu tentei
pegar o aparelho, ele o empurrou para longe com uma das pernas e fez meu
rosto permanecer junto ao dele, segurando-me com força, apertando minhas
bochechas. — Tirei a camisa, coloquei você no meu peito… — Seus olhos
dançaram junto aos meus. — Eu estava te dando o meu calor, ratinha. — O
dedo polegar passou pelos meus lábios, quando ele voltou a se afastar, franzi
as sobrancelhas sem pretensão alguma de o fazer.
Por tristeza? Raiva? Devido à falta de seus braços quentes ao meu
redor?
Eu não sabia.
Forcei meus olhos a acompanharem cada passo e o vi pegar o telefone
no chão. Estava desbloqueado, e, ao perceber minha primeira e única ligação
ali, eu poderia afirmar que seu suspiro foi audível por todo o bairro.
— Teve a oportunidade de chamar o seu papai, e ligou para Meg
Girard? — Seu cenho franziu. — Sério? — Ele colocou o telefone de volta
no chão. — Só tinha uma chance e a desperdiçou. — Sua sola esmagou o
meu celular com um único golpe.
— Não! — gritei ao som dos estalos.
Acabou. Lá se foi a minha chance.
— Não vou esperar que rastreiem e saqueiem você de mim. — O
desgraçado continuou: — Seu pai conseguiria te encontrar se fizesse isso,
estou errado? — Me encostei na cama em silêncio, com os olhos fechados. —
Começo a achar que ele quer mais é que você se foda. — Riu. — Mas eu vou
ter que provar a hipótese.
Sem forças, meus olhos caíram em algo pendurado em sua calça. Não
eram mais chaves, como antes, era algo…
— Gostou dela? — perguntou e tirou de lá. Era uma máscara. — Posso
colocar para você. — O elástico esticou e eu tinha um ghostface maníaco,
tatuado e sem camisa na minha frente. — Qual é o seu filme de terror
favorito, Brianna? — A frase de Scream fizeram meus pelos se arrepiarem
duas vezes mais.
Em passos lentos, ele passou para trás da cama. Senti as correntes
ficarem folgadas, pareciam estar sendo soltas de algum lugar e maiores. Mas,
quando pensei em me levantar, ele as puxou de novo.
Confirmei que eram longas, ele as trazia nas mãos. No entanto, voltei a
ter um pedaço curto para me movimentar quando o desgraçado começou a
enrolá-las pelo meu corpo, prendendo-me na estrutura da cama.
Cada volta me fazia estremecer sob metal gelado, ele circulou minhas
coxas passando pelo meio das pernas, sobre a virilha, e reforçou as voltas em
meus pulsos, elevando-os para cima. As correntes passaram por dois orifícios
circulares da moldura da cama, e tendo certeza de que eu estava apertada o
suficiente, seus passos o levaram até uma cadeira a poucos passos de mim.
Eu não sabia distinguir os diferentes sentimentos que me tomavam
quando via o modo como segurava as pontas das correntes nas mãos,
ofegante e mascarado, enquanto eu sentia cada parte sensível da minha pele
sendo castigada pelo metal.
— Vou fazer algumas perguntas. — Começou a puxar as correntes de
onde estava e meus braços seguiram para cima conforme elas iam para ele,
enrolando-se na parte vazada da cama. — Acho bom me responder.
Ele balançou um pouco minhas mãos, movimentando as corrente. Eu
podia enxergar seu sorriso por baixo da máscara antes que a voz grossa
abafada reverberasse pelo lugar.
— Já que diz não saber onde ele está, vamos pensar em outros pontos
importantes… acho que você pode ter visto mais alguém com ele, ouviu uma
conversa, talvez? Um telefonema?
— Não sei de nada… — murmurei, meus olhos nos dele, suplicando
em silêncio. Suas mãos puxaram mais das correntes, me fazendo encostar na
madeira pesada da cama, com o punho latejando. Minhas pernas já se uniam,
sendo forçadas a dobrar. — Não ouvi nada, juro… — Ele parou.
Não disse uma palavra. Apenas ficou me observando, sua máscara
parecia impenetrável. Era como se estivesse pensando em como intensificar a
dor, a agonia.
Naquele momento, uma faísca de coragem surgiu dentro de mim.
— Você acha que essa máscara vai te esconder? — Soou mais firme do
que eu esperava. — O que você está tentando esconder? — Puxei as
correntes. — Sei que não quer fazer isso… — Era uma tentativa.
Meio merda, mas era minha única opção.
Ele permaneceu em silêncio por um momento, seus olhos expressando
algo indecifrável por trás do tecido fino da máscara.
— Você não me conhece, vadia — murmurou com a voz baixa. — E
nunca vai me conhecer completamente, ninguém foi capaz até hoje. — Com
isso, ele puxou as correntes de uma só vez.
Senti meus punhos serem apertados, as minhas mãos formigaram,
pareciam querer explodir. A emenda me obrigou a erguer as coxas, eu podia
sentir minha virilha queimando, o ferro fazia uma pressão inigualável nas
bordas da minha calcinha agora completamente à mostra. Gemi e me
contorci, tentando fazer o sangue voltar a circular, mas era em vão.
Eu comecei a entrar em desespero quando olhei para cima e vi meus
punhos sendo espremidos, envoltos pelo ferro, meu corpo sendo forçado a
obedecer às suas rédeas, mas quando olhei para ele, sentado na cadeira com
aquela máscara, com total controle sobre mim, eram minhas pernas que
esquentavam, tremiam, me faziam parecer uma desgraçada que gemia.
— Mais apertado? — A voz saiu abafada e seus dedos hábeis fizeram
com que só as correntes nas minhas pernas se movessem. Ele as abriu um
pouco mais e começou a fazê-las subir. — Não fique excitada, eu vou matar
você.
— Já chega… — exclamei. Ele parecia não ouvir.
Com mais um puxão, senti as correntes chegarem ao limite, unindo-se
em cima da minha calcinha, meus grandes lábios latejavam enquanto eu
buscava por ar.
— Oh… você quer que eu pare? — brincou, se levantando com as
pontas das correntes envolvidas nas mãos. Seus dedos deixaram um pouco
escapar, me dando uma trégua, e eu choraminguei. — Quer que eu pare,
ratinha? — Puxou mais uma vez e minha voz já não saía mais. — Você não
me disse nada sobre o seu papai ainda e já quer que eu pare, hum?
Mais forte. O aperto parecia cada vez mais forte, e ele estava perto, de
pé, assistindo enquanto eu perdia a cor.
Depois de alguns segundos, constatei que Aaron poderia me manter ali
pelo tempo que quisesse. Eu já não sentia o fluxo da minha corrente
sanguínea. Com certeza iria apagar, mas percebendo isso, quando eu já estava
quase desmaiando, ele soldou as correntes. Meu corpo caiu para frente e
tentei reagir.
Força nas mãos. Fixei as duas no chão com um impulso. Impedi uma
queda de cara ao mesmo tempo em que sentia o guinchar do sangue voltando
a correr por minhas veias como fogo, ardendo.
Ele caminhou até mim e abaixou devagar. Sua mão tirando os fios de
cabelo do meu rosto suado.
— Isso é tudo que você vai ter se continuar lutando.
Olhei em seus olhos, exausta, o tecido fino da máscara me permitia vê-
los, mas eu queria mais.
Ergui a mão com dificuldade e segurei a base da máscara.
Ele deixou.
Comecei a levantá-la livrando seus lábios, nariz e então olhos, do
disfarce para só então sussurrar, cara a cara. Olho no olho.
— Eu vou te fazer pagar — soprei, quase sem forças.
Ele segurou o meu braço em um piscar de olhos e eu engoli outro
gemido, quando o senti apertar minha pele levemente.
— Eu vou devorar você primeiro. — Sua língua passou pela minha
orelha e não consegui conter o franzir das sobrancelhas. — Ratinha…
Seguir para mais uma aula era o mesmo que andar em direção à tortura.
Essa seria a definição para quem quer que me perguntasse. Mas nem sempre
foi assim, confesso.
Contrário do que meu irmão achava, não frequentava a universidade
para ganhar a aprovação de Emília Walker, afinal nem se eu quisesse teria
aquilo. Era a Libert University, fundada por bandidos, comandada pelos seus
descendentes. Frequentava o lugar, porque acreditei em seguir alguma coisa
no início.
Mesmo em um ponto de elite, que decaiu nos últimos anos e, no fim, só
servia para conter os piores, formar criminosos, o fato era que a maioria não
pensava apenas em destruição. Aquele também era o lugar para quem estava
indeciso ou queria se munir de conhecimento de alguma forma para seus fins
pessoais.
A princípio, eu gostava do que estudava, depois passei a almejar
conhecer para comandar, mas agora? Agora, só tinha um motivo para estar
ali, e eu já a tinha amarrada em um lugar seguro e distante.
Nada era mais importante naquela joça. Claro, com exceção da minha
soberania.
O lugar era dividido por quadrantes, literalmente, e em cada um, uma
"gangue" diferente tomava seu troninho de merda. Não passavam de grupos
de filhos da mãe que se achavam no direito de ter alguma coisa, quando na
real tudo era comandado por mim.
E isso era refletido no movimento, que permanecia em sua plena
normalidade. Bastava passar diante dos ditos líderes para ouvir nada mais do
que silêncio. Os corredores eram repletos de olhares assustados que recuavam
quando me viam. Regalias não solicitadas, e bocetas acenando pelos quatro
cantos do campus.
A autoridade me fazia ficar excitado de tão prazerosa. Ter onde pisar,
em quem pisar e, com um simples olhar, ter quem limpasse o sangue, depois
que eu o derramasse pelo chão, fazia parte do meu dossiê. Chamava-se
poderio e corria por minhas veias. Era o meu tipo sanguíneo.
Ninguém batia de frente comigo, e isso me entregava carta branca para
qualquer coisa ali dentro, principalmente quando se dizia respeito aos meus
assuntos.
— Meg… — Me aproximei devagar. Ao som da minha voz, a garota
quase se enfiou dentro do próprio armário. — Parece que você está em um
estado de desespero. Algum problema? — Eu adorava falar assim quando
sentia o cheiro do medo nas pessoas.
Ela olhou para mim com olhos suplicantes.
— Só estou preocupada… — Engoliu. — É a minha colega de quarto...
— Sorri de lado, estava me divertindo com o pânico dela. Só não era melhor
que o da ratinha.
— Então o que você acha que deve fazer? Ir até a polícia? Talvez seja
uma boa… Eles adoram lidar com casos perdidos como esse. — Ela me
encarou, os olhos se estreitando com desconfiança e apreensão. Ergui as
mãos como quem fala por falar. — Talvez, se você for até a polícia, o pai
dela apareça. Quem sabe? Talvez, ele finalmente encontre uma razão para se
importar.
A expressão da vadia se transformou de confusão para compreensão,
misturada a um medo palpável.
— Você... você quer que eu faça isso! Quer chamar a atenção do pai
dela. — sussurrou baixo. — Está com ela, não é?
Minha risada foi áspera, ecoando pelos corredores vazios.
— É mais inteligente do que parece. Achei que demoraria um pouco
mais para sacar. — Abaixei o tom de voz. — Parece que você finalmente tem
uma razão para ainda estar andando. Faça seu trabalho e, quem sabe, eu até
considere não brincar com a sua vida também.
Me afastei, passando uma linha em mais uma investida. Àquela altura,
ele já sabia, mas pelo visto estava pagando para ver até onde eu seria capaz
de ir.
A única certeza que eu tinha era a que vinha dos meus demônios, e eles
berravam sobre a perda que o delegado de merda teria se não mostrasse a
cara. Isso aconteceria mais cedo do que tarde.
Parei no estacionamento particular da cobertura, saí do carro e bati a
porta do carro com força, mirando a fachada com os olhos semicerrados.
Passaram cinco dias.
Cinco dias e o infeliz não apareceu, mesmo que a notícia tenha corrido
pelos quatro cantos de Nova Iorque como um cavalo preto, mesmo que
ninguém soubesse da garota.
Cinco dias e ela não abriu a boca, mesmo não tendo nada a que segurar,
sentindo fome diante das migalhas que eu lhe dava, sede com o mínimo de
água para sobreviver.
Olhei para o céu, as nuvens densas cooperavam para que o sangue
borbulhasse em minhas veias, decepando o oxigênio e me entregando
moléculas de raiva. O componente vital para a minha sobrevivência.
Essencial para que eu respirasse.
Enquanto a avenida abastada pela classe alta cheirava a dólar, caminhei
até a porta sentindo o fedor de pneu queimado entranhado às narinas, a
máscara pendurada na calça, como de costume depois das corridas, e minha
atípica presença solitária por ali, para mais do que apenas uma olhada na
prisioneira. Eu a faria falar.
A bandeja de comida e a garrafa de água tinham acompanhamento. A
ratinha só ergueria o cloche mediante pagamento. Informações. Precisas,
verdadeiras e sem enrolação. Só se cooperasse, conseguiria evitar que
dissecasse por longos meses naquele chão gélido.
Assim que entrei, seus olhos agarraram minhas mãos. Era o que ela
movia, como se apalpasse à distância, salivando. Garganta seca, sem água
suficiente por dias, clamando por uma gota, lambendo o próprio corpo
molhado. As roupas rasgadas me davam a visão do sutiã vermelho úmido, o
corpo esguio tremia levemente, o quarto estava um pouco mais quente com as
janelas fechadas, seus cabelos desgrenhados, a pele seca e os olhos mortos
não mudava o fato de que ela parecia ser feita de porcelana; sem defeito
algum.
— Booking — falei, antes de colocar a água e a bandeja sobre a peça
de madeira atrás de mim. — Os salgadinhos de lá são ótimos. — Ela molhou
os lábios.
— Eu tô morrendo de fome e…
— Sede, eu sei. — Cruzei os braços. — Está sem banho por cinco dias
também, e olha… você não cheira a um animal morto, meus parabéns. — Ri
e ela franziu o cenho. Como uma bonequinha expressiva.
Seus olhos não saiam da comida e água, então me coloquei na frente
delas. Percebi as narinas dilatadas. Ela encarou para o meu abdômen e
começou a subir, à medida que eu subia a máscara de volta para o rosto. O
olhar mudou e, como da última vez, suas pernas apertaram um pouco mais. O
pequeno vão se abriu entre os lábios.
— Percebi que fica excitada quando uso isso — pontuei, sentindo o
suor que dava viço ao meu abdômen. — Só vai me ver assim agora.
Ela se recostou na madeira da cama, seus olhos oblíquos cintilando. Era
difícil decifrar se era desejo de me morder para se alimentar, saciar a raiva ou
outra coisa.
— Uma resposta e algo para comer ou água para beber. Você escolhe.
— Sorri. — Onde ele está? — De tanto pressionar essa tecla, já parecia
querer se soltar do teclado da mente de Brianna. Percebi, porque seu corpo
amoleceu um pouco mais.
— Eu não… — Fechou os olhos, uma lágrima traçou um fino percurso
pela bochecha.
— Não sabe — falei, sério. — O seu pai conversou com algu…
— O antigo delegado do Brooklyn, o que será exonerado — respondeu,
e a linha da minha testa começou a sumir. Eis uma informação relevante.
— Sobre o que conversaram? — Eu queria mais.
— Não sei… — respondeu. — Só vi os dois juntos… — Ergui a
garrafa e seus olhos abriram um pouco mais. — Juro…
Soou convincente diante urgência no tom de voz.
— Foi difícil? — Comecei a me aproximar, a água reluziu em seus
olhos. — Com sede? Hum?
— Só um pouco, por favor… — suplicou. Abaixei a mão e passei as
pontas dos dedos em sua bochecha, a respiração ofegante fazia minha pele
formigar. Era como cócegas.
Abri a garrafa, seus olhos hipnotizados em meus dedos, seguindo o
movimento circular, engolindo a pouca saliva. Ergui a mão, os olhinhos dela
quase saltaram para fora. Fechei os meus.
Em instantes, a água cristalina escorreu pelo meu peito. Senti o toque
gelado e líquido que ela almejava ter em sua garganta desenhar na minha
pele, percorrendo cada músculo, respingando em minha calça.
Gemeu. Ela gemeu pelo desperdício, como a planta seca quando a
primeira gota do orvalho cai a centímetros de distância de sua estirpe na
manhã de mais um dia escaldante.
Dei mais um passo em sua direção, as correntes em seus punhos
balançaram.
— Se quiser matar a sede… — Coloquei meu abdômen a centímetros
de seu rosto. — Use a língua, ratinha.
— Você é um idiota! — Percebi que sua pele tremeu mais que o
normal. As sobrancelhas franziram mais, formando um vinco perfeito na testa
lisa.
Eu a irritei.
— Um idiota pronto para matar a sua sede, enquanto tem boa
vontade…
— Chega mais perto que te mostro! — Evidenciou os dentes e meus
dedos inclinaram a garrafa. Derramei um pouco mais de água.
Silêncio.
Ofegos.
Eu sentia sua sede.
Por conta própria, começou a trazer o rosto para perto. Sua respiração
soprou quente contra a mim enquanto ela mirava uma gota generosa no vão
de um dos meus gomos.
Seus lábios tocaram na minha pele. A pouca força que usou para
pressioná-los em mim fez com que algumas gotas de água se juntassem e
sublinhassem meu músculo, formando o que lhe serviria um gole generoso
em um dos vãos.
A água estacionou em seus lábios secos e ela a engoliu como o último
gole do melhor vinho existente.
Olhos fechados de alívio.
Eu via o alívio. Via que queria mais. Buscaria por mais.
Sua boca começou a chupar minha pele, procurando por qualquer
vestígio que pudesse matar a sede, me puxando para perto.
— Oh… você quer mais? — Estendi a mão e agarrei seus cabelos. Eu
queria aqueles olhos em mim. — Quer mais? — refiz a pergunta, firme.
— Sim, por favor… — Soou como música para os meus ouvidos.
A garrafa girou entre meus dedos e parou com a boca para baixo, me
banhando, escorregando de cima. Ela abria os lábios com os olhos fechados,
as mãos em minha calça enquanto engolia cada gota que conseguia aparar ali,
colada em mim.
Suas unhas me arranhavam, a língua fria serpenteava por mim sem
controle algum de seus impulsos. Ela queria mais, e eu não tinha certeza se
falávamos sobre água agora.
Me afastei devagar e puxei seu cabelo para trás. Ela lambia os lábios
quando seus olhos miraram o que havia restado na embalagem plástica, e
como uma boa quantidade caiu fora de sua boca pequena, ela ainda tinha
sede.
— Mais? — Balançou a cabeça, afirmando, e coloquei o polegar em
seus lábios. Adorava fazer aquilo. Ela tinha a boca macia, estando molhada
então… — Implore — sussurrei pela máscara e seus olhos se estreitaram.
A visão de cima me deixava animado de um jeito que ela não fazia
ideia. Uma súplica faria a minha noite e eu mataria sua sede de uma vez.
— Por favor, me dê mais…
— Meu nome — impus, por saber que seria um sacrifício. Para ela, eu
era um filhote de meliante, aspirante a criminoso. — Seja uma boa garota e
me chame pelo nome.
— Aaron — falou, de uma vez. — Por favor…
Abaixei, fiz da minha mão uma concha e derramei mais um pouco lá. A
garota não esperou ao menos que eu levasse até seus lábios, quase engoliu
minha palma, como um animalzinho sedento. Estendi os últimos quatro
dedos que restavam na garrafa e pisquei para ver que ela a tinha vazia entre
as mãos. Meus dedos acariciaram seu cabelo, sorri enquanto ela lambia a
boca, suspirando.
— Boa menina. — Olhou em meus olhos através da máscara assim que
falei, como uma presa indecisa, sem saber se corre ou se entrega para morrer.
Eu particularmente adoraria uma caçada.
Percebi que seus lábios se curvaram devagar e as duas pontas me
mostravam um sorriso fino. Mal tive tempo para semicerrar os olhos e a
vadia cuspiu o último gole de água que mantinha na boca na minha cara.
Puxei a máscara, agarrei seu rosto e o trouxe até o meu enquanto ela
relutava.
— Vai se foder! — rosnou.
— Depois de você, Abernathy.
Meu dispositivo tocou no exato momento. Era o fone especial que me
mantinha em contato com os babacas. Levei-o para a orelha sob seu olhar
atento e me afastei devagar, reconhecendo a voz de Brandon.
— Estão correndo? — perguntei.
Aqueles fones só eram usados em emergência ou quando estávamos
correndo, para nos comunicar. Afinal, tirar os outros carros da pista exigia
uma certa rede de olhos e ouvidos em variadas posições.
— Chegando na pista livre, vamos finalizar uma aposta com a
Benedete — respondeu, a voz cortando por causa da velocidade que o
embuste investia na lata dele.
— Apareço aí daqui uns minutos.
— Aaron! — Pisquei uma vez.
Vinha dela. Brianna.
Sua voz estava mais firme, não podia negar, mas não foi o que me fez
parar. Foi por a ouvir me chamar pelo nome, sem que estivesse esperando.
Isso, sim, me deixou um tanto quanto surpreendido.
— Quando vou poder ir embora? — perguntou, e me virei para olhar
em sua direção. — Por favor, me deixa ir embora.
Saquei o plano.
— Tá com quem aí, cara? — Brandon questionou.
— Cuidando de alguns assuntos — respondi sem dar evidências de
quem estava comigo ao telefone.
— Até quando vai me manter aqui? O que mais você quer de mim? —
gritou e Brandon ficou em silêncio. Não era só ele que podia nos escutar,
Ryus e Benedete também. Nossa linha era compartilhada e, naquele
momento, passou a compartilhar silêncio.
— Me deem cinco minutos. — Desliguei a conexão e caminhei até ela.
— O que foi isso? Acha mesmo que vai conseguir algum tipo de ajuda? Pelo
visto, não faz ideia de com quem eu estava falando.
— Qualquer um deve ser melhor que você — cuspiu as palavras.
— Você acha? — Entreguei um sorriso frio.
— Eu tenho certeza, desgraçado, infeliz! Me solta! — Começou a se
debater, de novo.
— Então foi só matar a sede e a rebeldia voltou? — Minhas pálpebras
tremeram. Sinal de que a paciência estava indo embora, e a vadia continuava
se batendo, sacudindo correntes…
— Mandei me soltar!
Dei um pulo para perto dela. Suas costas bateram na estrutura de
madeira. Apertei seu rosto com a mão. Olhos nos olhos.
— Melhor calar a boca, filhinha abandonada. — A marra definhou
diante das minhas palavras. — Cadê o seu papai que não veio te buscar,
hum? Sequer mandou os amiguinhos fardados. Como é um covarde, era o
mínimo a se esperar. Ele te deixou aqui, para morrer, e você prefere me
atazanar a cooperar.
— Meu pai sabe que eu sei me cuidar! — falou com dificuldade, a boca
presa por meus dedos.
— Por isso deixou você sozinha na universidade mais perigosa de Nova
Iorque? Porque sabe se cuidar? Onde você está agora, ratinha? Segura?
Confortável? Que belo cuidado… — Seus olhos latejavam, me mataria com
eles se pudesse. — Mas não foi culpa sua, foi algo inevitável… — Franzi as
sobrancelhas junto às dela. — Nem se você fosse para o inferno estaria longe
disso. Eu te encontraria e pegaria. Eu te teria. — Sorri e me afastei devagar.
— Ainda acredito que, mais cedo ou mais tarde, ele vai aparecer. Afinal… —
Meus passos me levaram à maçaneta da porta. — Seu pai se importa com
você. — Ela me encarou com uma frieza indecifrável. — Ou estou enganado?
Os poucos raios de sol banhavam minha pele, como se fosse nada,
enquanto eu marchava até a casinha do porco exonerado. Empurrei a porta
sem bater, para ver o lugar desgastado e sem cor, que cheirava a papel velho
e café amargo.
Jamar estava lá, encurvado pela idade e pelas escolhas duvidosas.
Olhou para mim com os olhos inchados. O velho burro ainda trabalhava,
mesmo não tendo obrigação alguma, sem ao menos receber por aquilo.
Era como se tivesse uma dívida impagável que crescia todos as noites
em que colocava a cabeça no travesseiro para tentar descansar. Ele parecia
nunca ter dormido direito.
— Achei que estaria apodrecendo a essa altura, neste lugar — falei e
passei os dedos pelo nariz. A poeira cintilava pelo ar como as minúsculas
lâminas de água congelada do inverno.
— Não como os que estão nas celas, acredite — murmurou, me
arrancando uma risada que reverberava ameaças não ditas. — O que veio
fazer aqui, rapaz?
Levei a mão por baixo de sua mesa velha de madeira, sendo seguido
por seu olhar cauteloso, e agarrei uma garrafa de vinho. Para estar ali o dia
todo, aquele cabrito deveria mesmo ter álcool. A rolha estava intacta.
Arranquei com o dente e tomei um gole generoso.
As bolhas dançaram por minha língua, doce e ácido. Leve e gelado,
acionando papilas que nem sabia que ainda existiam ali. Fazia um tempo que
eu não tomava vinho. Vai ver a sede da ratinha me fez ter sede também,
mesmo que inconscientemente.
— Achei que encontraria o novo verme que substituirá você por aqui,
no estábulo do Brooklyn. — Arranhei a garganta quando o vinho me deu a
sensação de rasgo à pele, empurrando o nó que se mantinha ali e roubava
minha atenção, para que não me concentrasse em esganar aquele velho. — A
gente precisa trocar uma ideia. — Cruzei os braços. — Mas soube que ele
fugiu, e você foi o último a ser visto com ele. — O velho semicerrou os olhos
com a boca fina entreaberta.
Ele se sentou e apontou para a cadeira, para que eu fizesse o mesmo.
Continuei de pé. Braços cruzados e olhos atentos em seus movimentos.
Seu suspirou silvou como o planar do vento pela janela. Olhou as
próprias mãos em cima da mesa e se voltou para mim.
— Sabe quando foi que decidi ser delegado, Walker? — Os ossos que
chamava de dedos alcançaram chaleira e xícara. — Este velho que você vê,
tinha dez anos e assistia a uma série de TV todos os dias pela manhã quando
voltava da escola. — O líquido quente passou a preencher o recipiente. — Se
chamava “Os donos da lei”. Era para crianças, e ensinava a como se portar
perante autoridades. — Encostou-se na poltrona, a xícara branca nos dedos.
— Meus olhos viam aquilo com um certo encantamento e não importava
quantas vezes repetissem a mesma frase no fim de todo episódio. Sempre
tinha significado para mim. — Olhou para cima. — Os donos da lei —
soprou, como um infeliz deprimido.
— Corte o discurso de merda! Não vim para ouvir suas historinhas —
pontuei, mas ele parecia estar viajando.
— Cresci, segui a carreira e estou aqui hoje. — Olhou para mim. —
Sabe a única certeza que eu tenho hoje em dia, Aaron Walker?— A porcelana
intocada foi posta sobre a mesa. — A de que vivi uma grande mentira quando
criança. Os donos da lei são marginais. Não se pode fazer justiça como ela é,
nunca se pôde. A convicção contrária a isso não passa de uma farsa. Sou a
prova viva disso. — Estalou a língua. — Coopero com a gangue do seu irmão
desde que fui encaminhado para o Brooklyn. Fui forçado a isso, a fechar os
olhos, fingir que não os vejo. Me fazer de cego, surdo e mudo. Esses são os
atributos agora, são as qualidades, habilidades.
— Foda-se, Jamar! Eu não vim até aqui…
— E sabe quem me obrigou a fazer isso? — me interrompeu. Queria
dar continuidade ao relatório, à história do seu próprio fracasso. — Não
foram os bandidos. Foi o nosso próprio sistema. — Olhou nos meus olhos. —
O Delegado Abernathy matou o peão que mantinha essa dinâmica em
equilíbrio, seu irmão. — Pegou a xícara. — Se eu soubesse de alguma
informação te diria, afinal, com vocês, é isso ou a morte, mas não, não sei. —
Encarei-o, minha expressão dura como aço. — Em nossa última conversa, a
única coisa que saiu da minha boca foram palavras similares a essas, um
breve resumo do que ele teria, caso conseguisse se manter vivo, seguido do
manto que eu lhe passaria para tomar o meu lugar e um genuíno "muito boa
sorte".
— Então foi contar historinhas ao colega?
— Fui informá-lo sobre como as coisas funcionam. Mas, acredite, não
foi como se ele tivesse aceitado tão bem, sequer ouviu tudo.
— Aconselhou seu amigo a fugir, Jamar? Por acaso sabe onde ele se
enfiou?
— Digo não a todas as suas perguntas. — Tomou um gole do maldito
chá, finalmente. — Ele se escondeu, porque sabia que seria um homem
morto. Pelo sistema ou pelos vingadores de John Walker. — Olhou para
mim. — Vejo que você tomou a liderança do rancor coletivo.
— Não só tomei como já estou me movendo.
— Percebo, sim… afinal, chegou até mim, mesmo que os Skulls já
tenham me visitado para gentilmente me perguntar sobre Abernathy —
pontuou. — Eles só não me disseram terem sabido que estive com Magnus.
Como soube?
Ri. Ele estava conseguindo me tirar a paciência. A criatura interna,
submetida às minhas correntes, rugia para mostrar as garras e cartas do meu
jogo.
— Que tal chutar? Pense em um metro e sessenta e cinco, cabelos
escuros, olhos amendoados… — Quando percebi sua expressão perdendo os
traços, me aproximei, sorrindo. — Se conseguir, envie um recado ao
"grande" Abernathy. Diga a ele que para cada dia que não aparecer, a filha
perde um dedo. — O homem estreitou os olhos. — É engraçado que, pela sua
cara, parece surpreso. O que foi? Achou que eu não encontraria ela? Na
Libert University? — caçoei, diante de sua apreensão disfarçada de inércia.
A sala ficou tensa, carregada com a gravidade das minhas palavras. Saí
por onde entrei, ciente de que Jamar iria tentar intervir em meus planos, mas
fracassaria, e quando acontecesse, havia grandes chances de se comunicar
com meu alvo outra vez.
Acenei furtivamente para Rufos, o designado a liderar os homens que
estavam à espreita. Se Jamar desse algum sinal de que falava com Abernathy,
seria pego.
Arrematei mais uma investida. Uma das inúmeras que fechavam o
círculo do infeliz. Mas que só funcionaria se ele se importasse com a filha.
E disso, eu estava começando a duvidar.
Alguns meses antes
— Pai, trouxe seu café. — Acomodei o capuccino na ponta da mesa
polida de madeira. Meu dorso enxugava o suor da testa pela corrida. Ele não
gostava de atrasos, e eu tentava dar o meu máximo para fazer tudo direitinho.
No fim, não recebia ao menos um “obrigado”.
No entanto, o fato que me fazia questionar a veracidade do pedido se
apresentava a mim pela poltrona vazia. Não havia ninguém lá. O estalo do
relógio contando os segundos sussurrava o aviso de que eu deveria sair dali.
Era estritamente proibido estar no escritório do delegado sem sua
presença. Eu sabia, mas resolvi arriscar minha cabeça, só daquela vez. Nunca
tive acesso a nada relacionado a sua profissão. Nada relacionado a ele, na
verdade.
Considerava um milagre ter recebido aquele pedido, por ele deixar tão
claro quanto a luz do sol que odiava quando eu ia à delegacia, seja em qual
cidade estivéssemos.
Talvez ele quisesse me dizer alguma coisa, e descartando a
possibilidade de outra mudança, só restava uma coisa: minha mãe.
Como um aviso bom do Universo, reparei que existia uma fotografia
dela em uma pasta. Eu sabia o que era. O que significava. Estava bem na
minha frente, ao alcance das minhas mãos. Bastava um passo.
Suspirei, nervosa. Meu pai contou a verdade sobre ela ter saído de casa
por escolha própria, mas eu não entendia o porquê de nunca ter entrado em
contato comigo desde então, por isso ele abriu uma investigação quando
percebeu que ela havia, de fato, desaparecido. Minha insistência o venceu, fiz
bom uso dela quando podia e agradecia a mim mesma por isso.
A investigação durou meses sem respostas, mas finalmente eu o via
remexendo aquelas coisas de novo.
Além da etiqueta que nomeava os dados confidenciais da investigação
de Elizabeth Abernathy, percebi que alguns documentos também estavam
espalhados sobre a mesa. Era hora de usar a cabeça.
Comecei a fotografar folha por folha. Se fossem pistas, eu as
investigaria também, sozinha, sem que ele soubesse. Faria o que mamãe
sempre instigou em mim, a ruptura da normalidade de uma jovem que se via
presa pelo resto da vida. Ela me ensinou que deveria voar. Para isso, tinha
asas.
Eu o faria. Por ela. Assim como aprendi a atirar por mim, e meu pai só
soube quando acertei a perna de um tarado na rua.
Garota impertinente, ele dizia quando me via trilhar os caminhos
proibidos para mim. Eu deixava meu chapéu de capitã de lado, esmorecida.
Você é brilhante!, ela dizia quando eu erguia o remo do nosso navio
imaginário e me intitulava capitã, aos cinco anos de idade, fazendo escolhas,
mandando nos tripulantes.
— Vamos lá, mãe… — Voltei minha atenção às folhas. As letras
minúsculas sendo captadas pela minha câmera. E, então, uma chave.
Uma chave?
Em cima da pasta. Escorregou quando a abri, mas era tão estranha que
me chamou atenção mesmo de lado. Como um objeto amaldiçoado,
procurando os dedos do desatento. Uma estrela de seis pontas esculpida em
sua base. Era tetra, quatro segredos em seus dentes.
Isso não pertencia à minha mãe.
O que diabos estava fazendo ali?
— E você está remexendo nas minhas coisas de novo. — Meu pai
surgiu, me fazendo pular.
— Só vim trazer o café.
— Mandei deixar na recepção, não na minha sala! — Sua mão bateu
forte contra a mesa, por cima dos papéis.
— Procurando pela mãe?
— Organizando documentos antigos — falou e engoli em seco, lutando
contra a raiva.
— Nós vamos ficar quanto tempo até pular em outro galho? —
perguntei firme, segurando o celular contra o peito, me referindo ao seu
deslocamento constante entre as delegacias da vida.
— Pergunte ao diretor geral. Se ele olhar para a sua cara, considere
uma vitória.
Diante daquilo, me retirei. Não valia a pena debater com o meu pai e,
se insistisse, com certeza iria ser humilhada ou pior.
Cansei de esconder os machucados pelo corpo causados por uma
simples pergunta. E cansei de me mostrar forte, mesmo depois do primeiro
golpe, era o que ele precisava para continuar.
Dias atuais
A chave.
Pisquei algumas vezes. Sirenes, buzinas, barulhos ambientes, todos
assobiavam desde o cume da cidade, como um aviso de que tudo estava em
movimento, menos eu.
O sono me tomava. Dias mal dormidos, fome e sede. Eu já via vultos
furtivos, a tontura era parte da rotina. Fechei os olhos.
A chave…
Senti meu cérebro pinicar. Precisava me levantar e tentar fazer alguma
coisa. Mas o quê? Meu corpo se via preso em nuances vivas todas as vezes
que eu apagava. Era como agarrar uma passagem para outra realidade.
Uma realidade onde tudo de ruim me acometia, como algo
predestinado.
— Levanta, Brianna! Ficou acordada até que horas? — meu pai
berrou, ao meu lado.
Minha cama com o cobertor cor-de-rosa mesclava entre uma bagunça e
algo impecável.
— Eu não dormi, não consegui… tinha uma chave. — Franzi o cenho.
— Yume não estará aqui para sempre. Faça alguma coisa que seja útil
e ao menos arrume essa joça de quarto!
Pisquei.
Em meio segundo, estávamos na sala.
O carpete alvo sob meus pés pequenos reluzia com gotas de sangue
vermelho. Meu nariz ardia.
— Eu mandei limpar o sangue! Quer que eu acerte seu nariz de novo?
— Não pai, vou limpar! — Minha voz tremeu, me abaixei.
Tudo girou, de novo.
Era a casa de Mavi. Daquela vez, o cenário me deixou um pouco mais
confortável.
Até que uma mão fria tocou em meu ombro.
— Bri, ele quer falar com você. — Mavila estendeu o telefone na
minha direção. Inerte. Séria.
— Quem é?
— Ele disse que vai matar você.
— Ele? — Não me respondeu mais. Dei alguns passos em sua direção.
— Eu preciso sair daqui, Mavi, mas antes… — Olhei nos olhos dela. — A
chave. — Estendi a mão.
— Qual chave? — Piscou algumas vezes, a franjinha engraçada que
sua mãe fazia em seu cabelo se mexeu junto dos cílios. — Você não precisa
de chaves para abrir portas. Você morreu, Brianna.
Abri os olhos.
Eu estava sufocando até perceber que era só mais um pesadelo.
Só um pesadelo…
Contrário do que o imbecil dizia, ele não aparecia em nenhum. As
únicas coisas que eu via eram inúmeras faces do monstro que me fez crescer
debaixo de suas asas, e a chave.
A maldita chave da qual me lembrei de onde tinha visto e que não saía
da minha cabeça, enquanto tentava relacioná-la a Aaron Walker e sua cópia
quase idêntica, no molho que ele tinha pendurado no cós da calça.
Me recostei de novo. A pele tremendo. Conseguir descansar naquele
chão duro, sem sentir os braços, parecia ser impossível, mas o cansaço me
vencia de novo e de novo.
A cada cinco minutos.
Meu olhos pesaram. Não queria, mas estavam tentando fechar. Eu não
resistiria, sabia e provei disso. Era o cansaço vencendo minha vontade, meu
medo.
Alguns minutos se passaram. Sem pesadelos.
Minha carne latejava suplicando para que tivesse mais alguns minutos
com os olhos fechados, mas eu os abri tão rápido quanto a força da porta
sendo arrombada.
Meu coração deu um salto, comecei a ter uma crise de pânico.
— Brianna? — Uma voz soou estranha em meio aos meus gritos.
Meus olhos se arregalaram quando quem quer que fosse apareceu. Era
o senhor Jamar, o antigo delegado do Brooklyn.
— Sou eu! — Ele abaixou a arma que mantinha em uma mira de linha
reta e se aproximou de mim, jogando um tecido denso sobre meus ombros. —
Você vai ficar bem. — Seus olhos travavam uma dança entre me inspecionar
e avaliar as correntes.
Comecei a regular a respiração com um pouco de dificuldade, minha
garganta arranhava a cada mísera tentativa de engolir saliva. O delegado
Jamar trabalhou depressa, em poucos segundos minhas mãos estavam livres e
permiti meu tronco cair para frente, mole, sem forças para me manter firme.
— Vamos sair daqui. — Ele segurou meus braços e começou a me
levantar. — Você precisa vir comigo.
— Eu não vou — sussurrei e ele parou no caminho, seu rosto se virou
para me olhar com calma. Continuei: — Eu tenho que voltar para a
universidade.
O homem me encarou como se eu fosse uma louca.
E eu era. Mas era uma louca que faria tudo para encontrar a mãe.
A chave me daria respostas. O Alien me daria respostas. Existia alguma
relação. Não era pura coincidência, não podia ser, e eu precisava descobrir
mais.
— Preciso descobrir qual a relação — respondi. — Vou ficar, sou a
capitã dessa merda de navio — completei e o homem franziu o cenho. Meus
olhos se reviraram sozinhos, me forçando a desligar.
— Pode fazer o que quiser depois, mas agora tem que vir comigo. Foi
sorte ter te encontrado tão rápido. Sermos pegos não é uma opção — falou,
olhando em meus olhos e não tive tempo para debater, porque tudo ficou
escuro.
Apaguei.
Só voltei a acordar depois do que pareceu ser séculos, no sofá em uma
casa grande. Era dia e parecia ser a manhã fria de uma quinta-feira qualquer.
Minha mente girava, meu corpo estava repleto de suor. Não fazia ideia
de que lugar era aquele até ver o velho arrastando os pés até mim e me
lembrar, mesmo que quase vagamente, do que havia acontecido.
O tempo em que passei oscilando entre o mundo real e os delírios de
exaustão me levaram a perguntar qual era a data, e quando descobri que
aquele desgraçado me manteve presa por duas semanas, quase voltei a
desmaiar.
Devagar, o homem me acomodou sentada e buscou roupas —
masculinas —, água e comida. Me viu atacar tudo como um monstrinho
faminto.
— Espero que não tenha achado que eu estava delirando — falei
enquanto mastigava um pedaço de lasanha à bolonhesa. — Vou ficar na
universidade. — Quase engoli o copo junto da água fresca, para obrigar a
comida a se acomodar no estômago dolorido.
— Quem sou eu para dizer o contrário? — questionou. — Se quer
voltar, fique à vontade. — Se abaixou para olhar em meus olhos enquanto,
desta vez, eu engolia um pedaço de torta. — Só não seja pega de novo.
— Eu não vou — respondi.
— O que é tão importante para que volte para os pés de Aaron Walker?
— Não vou voltar para os pés daquele desgraçado. — Dei a ele uma
careta. — E são meus assuntos. — Impus limites. Ninguém deveria saber
qual era minha intenção.
A testa riscada por linhas de surpresa suavizou e ele riu.
— Igualzinha a seu pai.
Ele se levantou e começou a procurar alguma coisa na gaveta da sala
cinzenta. Fiquei ali olhando, pensando que estava sendo fácil demais.
— Não vai mesmo tentar me impedir?
Era bom demais para ser verdade.
Ele pareceu finalmente ter encontrado o que estava procurando e veio
até mim.
— Você toma suas próprias decisões, mocinha. E acredite se quiser,
mas esse era o pedido que estava pensando em como fazer a você.
— Você quer que eu volte para lá? — Pude ver o desenho da minha
confusão em seus olhos.
— Não só eu. — Levantou o envelope que tirou do fundo da gaveta. —
Antes de ir, seu pai me mandou entregar isso a você. — Com o olhar
semicerrado, ele me entregou e se recostou no estofado ao meu lado, como se
esperasse que eu lesse. — Eu o alertei sobre a universidade, sabia? Falei
quem são os alunos da Libert University, naquele mesmo dia que você saiu
para o alojamento. Me fiz de bobo, porque era óbvio que ele tinha
conhecimento do lugar onde estava enfiando você, eu só queria saber o
porquê. — Olhou para o envelope nas minhas mãos. — Concordei com ele
pela primeira vez desde que o conheci. — Me olhou sério.
— E por que além de ler, só o está me dando agora?
— Porque quando avaliei sua ficha de inscrição percebi que ao menos
uma coisa decente ele fez: escondeu que você era filha dele. Você não
precisava se envolver em nada dessas coisas ou se colocar em perigo, caso a
camuflagem funcionasse, mas pelo visto as coisas não deram muito certo.
Logo, acho que está na hora de você saber a intenção do seu pai e colocar
isso em prática, já que está determinada a voltar para lá.
E a intenção de Magnus Abernathy estava escrita por extenso, seguindo
sua tara em me mandar usar folhas para pontilhar ou anotar, dizendo as
seguintes palavras:
"Você tem uma lista em branco e uma caneta barata. Entre lá, faça o
dossiê de cada filhote de meliante e entregue em minhas mãos, sabendo que
levará meu sobrenome aos livros da história da justiça. Iremos riscar um a
um junto às suas famílias e limpar esse lugar de uma vez por todas.
Espero que não me decepcione".
Dobrei aquele papel na força do ódio.
— Então essa era a intenção dele? — esbravejei entredentes. — Ele
prometeu procurar pela minha mãe! Afirmou que viria a trabalho e que eu
teria um lugar para continuar os estudos aqui enquanto… — Amassei meu
rosto, impaciente. — Ele me trouxe para cá com planos para mim? De me
transformar em um de seus soldados?
O velho me estudou com cautela, mantendo silêncio como se esperasse
pelo cessar da minha indignação.
Não iria passar. Nunca iria.
No fim, Magnus Abernathy havia me ludibriado. Tinha conseguido,
mais uma vez, me enganar para fazer o que ele queria. E o pior era saber que
voltar para lá era um desejo meu, mas ao mesmo tempo dele também. Eu
estaria cumprindo suas ordens, mesmo sem intenção de o fazer, e isso me
fazia ferver.
Me levantei, sentindo fraqueza nas pernas. Queria sair dali como um
raio, cortando desde os céu ao inferno nomeado Libert University, com a
convicção de que era eu quem me mandava, não meu pai.
— Viu do que eles são capazes, menina. Já que vai voltar para lá, volte
com uma missão. — Jamar colocou uma arma na minha mão. O metal frio
enviou arrepios pela minha pele. Era a melhor arma em que eu tinha tocado
na vida. — Seu pai me disse que sabe atirar. Acredito que tenha aprendido
com o melhor.
— Aprendi sozinha. — Virei o rosto de lado. Abri o zíper da mochila
que me acompanhou desde o dia em que pisei na universidade, ao canto do
meu cárcere e agora ali. Puxei a arma e a coloquei na mochila, dois
hambúrgueres e uma coca dividiam espaço com ela no segundo instante.
Meus dedos amassaram o bilhete e o atirei nos pés do velho.
— Vou entender como um “sim” à ordem de seu pai. — Ignorei-o,
investindo força para atravessar a porta principal. — Você estará fazendo um
favor à Manhattan! — Seus passos desenharam o mesmo percurso que eu
fazia. — Se soubermos mais sobre eles, chegaremos aos que estão acima
deles. É o início do cintilar da justiça neste lugar!
— Justiça essa que você não foi capaz de manter no Brooklyn. — Sorri.
— Mas não faz mal, meu pai também fugiu.
— Seu pai não fugiu, ele continua lutando. Essa ordem é a prova.
— Errado! — Dei a ele o pior dentre os meus olhares. — Ele fugiu e
colocou uma carga nas minhas costas. Aquela merda de bilhete é a prova.
Impulsionei a quase corrida. Não queria ouvir sequer vestígios da voz
dele.
— Cuidado ao entrar mais uma vez naquele lugar, Abernathy. Espero
que esteja ciente de que a Libert University não forma profissionais, mas
criminosos.
Segui, colocando forças nos pés com os olhos atentos em algum táxi.
Manhattan que se foda. Os criminosos que se ferrem. Meu pai que
suma! É o que ele faz de melhor.
Me arrastar até a Libert não seria uma tarefa fácil, mas, com tudo que
eu tinha nas mãos, era hora de fazer o que o Delegado Abernathy não teve
capacidade de fazer.
E, sim, anotaria os nomes de cada um daqueles imbecis em uma lista.
Mas não para o meu pai ou seu ego, para mim. Por mim. Para eliminar um
por um, na ordem que me confrontassem.
Aaron Walker estava no topo dela.
Tive certeza de que quase causei um ataque cardíaco em Ryus quando
bati a porta do meu carro como um animal.
Apertei o tecido da camisa na mão e marchei até ele, nos fundos do
campus, onde estava fumando.
— Tá virado, cara? — Me encarou de longe, ciente de que aquilo não
era eu, e, como confirmação, joguei-o contra a parede em um único golpe.
— Quem foi? — Senti minhas narinas se dilatarem, meus olhos
arderem como se banhados ao fogo.
— Segura a onda, porra! — balbuciou. As sobrancelhas quase
tampando os olhos de tão franzidas. Só não tanto quanto as minhas. — O que
que tá pegando?
Não tinha sido ele, percebi no instante que me encarou com aquela cara
de quem estava perdido.
Sem deixar ao menos uma palavra, avancei para a sala de aula de
Brendon e Benedete, os aspirantes a matemáticos. Puxei-os para fora e os
empurrei contra a parede também.
— Quem foi? Quem libertou ela? — rosnei tal como um animal.
Brendon tentou argumentar, mas eu não estava disposto a ouvir nada
além de um nome. Um culpado. Minha paciência havia se esgotado e já era
substituída por uma ira incontrolável.
— Quem libertou Brianna? — Minha voz era um trovão, ecoando pelo
corredor vazio.
— Ninguém, Alien! Pra que diabos alguém aqui faria isso? —
Benedete tentou cobrir meu tom de voz. — Poderia ao menos contar essa
história direito antes de tentar nos matar?
— Pelo visto a garota sumiu — Ryus se adiantou.
— Ela conseguiu fugir? Da cobertura? — A ruiva franziu o cenho em
descrença.
— Ela não iria sair sozinha daquela merda! — vociferei.
— Quem mais sabia? — Brandon perguntou e uma chave girou na
minha cabeça.
Jamar.
Fechei os olhos, sentindo a raiva ganhar uma forma diferente dentro de
mim.
Como aquele filho da puta descobriu a agulha no palheiro? Eu fiz
questão de usar a cobertura por ser impenetrável, impensável. O último lugar
em que procurariam por alguém. O mistério perfeito para atrair o porco
Abernathy e deixá-lo sem rumo, tateando no meio do campo, para que eu o
atacasse.
— Vou matar aquele velho infeliz! Mas, antes, mato os homens de
John — grunhi entre dentes, me lembrando dos infelizes que mandei ficar de
olho nele.
— Está trabalhando com os caras da gangue do seu irmão? — Ryus
perguntou.
— Mandei ficarem de olho no Jamar, mas pelo visto foram passados
para trás.
— Olha, ele agora dá ordens e os peões obedecem — cantarolou
Benedete.
— Todos nós queremos o mesmo, Benedete: a morte do novo delegado.
E não é como se eles fossem diferentes de nós. — Minha voz era áspera.
Contida por um fio. Ela ergueu as mãos em sinal de rendição.
— Ainda acho melhor ouvir a gente, ir com calma, pensar antes de
fazer merda. — Brandon se posicionou.
— Passo. — Me virei para sair. Eu já não tinha atenção em mais nada
além da procura pela fujona.
— Aonde você vai, cara?
— Ensinar àquele porco o que acontece com quem interfere em meus
planos e depois… — Puxei as chaves no bolso, caminhando na direção do
meu carro. — Caçar a minha presa.
Eu:
Pai?
Não vai mesmo me responder?
Eu:
Oi
Oi, pai! Tá aí?
Oi, pai?
Estou bem, se quiser saber. Mesmo que tenha passado dias presa,
sentindo frio, sede e fome.
Oi?
Cada palavra digitada, cada pergunta sem resposta, era um grito interno
de frustração. Me perguntava constantemente o que havia feito para ser tão
odiada por ele, porque essa era a única explicação: ele me odiava.
O lugar em que me colocou, a posição em que me deixou… isso não se
fazia nem ao pior filho. E mesmo que eu insistisse, o silêncio persistente era
o único eco que recebia.
Joguei o telefone de lado e suspirei, amassando o rosto com as mãos.
Meg surgiu como um vulto, xingando a maquiagem que se espatifou no
chão enquanto se arrumava. Estava se arrumando para a festa do Alien do
inferno no subsolo, como chamavam. Perguntar o porquê de se misturar era
pedir para sentir raiva com a resposta.
Ela dizia que os bons sangues lutavam para ser invisíveis e evitar ser
fantoche da elite de criminosos. Ir às festas deles era como ganhar pontos.
Fazer parte da plateia de plebeus pouparia alguém de muita coisa. E era o
melhor a se fazer, além de ter uma diversão a cada noite de desordem.
Seus olhos me encararam com preocupação quando peguei o celular de
novo e, pela milésima vez, reli as mensagens.
— Se eu sugerir que vá à festa, vai soar como uma loucura? — Franziu
o cenho diante de suas próprias palavras. — É, vai… — Estalou a língua. —
Olha, sei que é difícil, mas talvez seja uma boa ideia sair um pouco, se
distrair — sugeriu. Sua voz suave tentava quebrar o silêncio tenso que
pairava sobre nós.
Balancei a cabeça com determinação, apertando meu celular com força.
— Não, Meg. Não consigo encarar Aaron depois do que ele fez sem
querer arrancar a pele dele com os meus dentes. — Apertei as pernas. A
simples menção a ele fazia minha barriga boiar. — A raiva ainda está fresca
demais — acrescentei, tentando me livrar da sensação intrusa.
Meg suspirou, sua expressão refletia uma mistura de pena e
preocupação.
— Tudo bem, mas, por favor, se precisar de algo, me chame. Vou estar
lá embaixo, aproveitando um pouco. — Ela tocou em meu ombro antes de
sair do quarto.
Assim que se foi, fechei os olhos com força.
Aaron Walker pagaria pelo que me fez, podia jurar que sim, mas
naquele momento precisava focar no que era ainda mais importante do que
minha raiva por ele. Mergulhei na galeria de fotos do meu celular, e fiquei
horas vendo a imagem que me trouxe de volta à universidade.
A chave que encontrei nos documentos relacionados ao
desaparecimento da minha mãe.
O que ela significava? E por que Aaron tinha uma semelhante?
Foi ali que decidi fazer merda. Decidi que precisava de respostas.
A festa era a oportunidade perfeita para investigar discretamente.
Mesmo que não quisesse admitir, no fim, o Alien do inferno era a razão de eu
ter voltado.
Olhei no relógio, eram quase três horas da manhã. Vestindo um short
curto, feito de um paninho fino, uma blusinha com o desenho de mil
morangos, fazendo conjunto com a parte de baixo, um cardigã preto e a arma
que Jamar me deu bem presa no elástico da minha calcinha, desci as escadas
do alojamento da irmandade com o coração batendo forte. Aquela,
infelizmente, era uma das reações do meu corpo diante do simples ato de
pensar em ver aquele desgraçado de novo.
Enquanto me aproximava, a atmosfera parecia mudar e uma mistura de
curiosidade e repulsa me impulsionava em direção ao estacionamento
subterrâneo, cenário de uma parte da minha aflição.
A batida alta da música reverberava pelo meu corpo. Escuridão era
interrompida por luzes coloridas piscando de maneira frenética. Convidativas,
inebriantes. Desci as escadas do subsolo devagar percebendo o espaço lotado,
meus olhos procuraram por ele, e o encontrei. No centro das atenções, como
sempre.
Um brutamontes barbudo tatuava algo abaixo do peito dele, e quando
me arrisquei olhar mais de perto, percebi que era uma representação dos
meus próprios olhos, capturados naquele momento de vulnerabilidade
durante o trote, quando estavam me aterrorizando com os carros.
O homem parecia estar nos últimos detalhes, porque ela estava pronta.
Cintilava como se fossem as minhas pupilas vivas ali, sentindo medo,
impotência e raiva. Cada movimento da agulha na pele me fazia estremecer,
ao mesmo tempo que uma raiva intensa queimava dentro de mim.
Como ele podia ser tão sádico e insensível? Por que registrar a minha
vulnerabilidade, como quem registra significados marcantes?
Sentimentos conflitantes fizeram meu estômago revirar. Precisava sair
dali, mas vi quando Aaron abriu os olhos, como se tivesse cochilado
enquanto a pele era perfurada. Prendi o ar nos pulmões e passei a traçar
passos para trás, mas parei ao perceber que ele inclinava o rosto na minha
direção, e mesmo à distância, seus olhos encontraram os meus.
Era como se ele soubesse que eu estava ali, escondida, assistindo. Era
quase como uma ligação extraterrestre.
Um sorriso cínico brincou em seus lábios, antes que piscasse para mim.
Ele piscou para mim?!
Aquilo desencadeou uma teia de sensações que deixavam turva a linha
tênue entre elas, isso tornava a maioria inexplicável, mas ainda identifiquei a
raiva. E era uma raiva desumana.
Quase vacilei quando ele acenou para o homem, levantou-se e começou
a vir em minha direção, nas sombras.
Seu olhar era intenso e parecia cheio de emoções conflitantes que eu
não conseguia interpretar. Percebi, pela primeira vez, o modo como a
repetição em seu abdômen era perfeita, logo abaixo dos meus olhos, tatuados
ali.
Inspirei fundo.
Mesmo que ele parecesse ser de outro mundo sem aquela camisa, com
os cabelos ao vento e o maldito sorriso matador, eu o via como um pesadelo.
Por tudo o que ele representava, por me manter prisioneira, por forçar um
jogo perigoso que não pedi para jogar.
Decidi que não iria mostrar fraqueza na sua frente, apesar da confusão
que sentia por dentro. Segurei a ponta da minha arma e tentei manter a
postura ereta. Era a primeira vez que estaríamos cara a cara depois que voltou
e, ali, eu não iria conseguir ignorá-lo, mesmo se quisesse.
Seus passos cessaram na minha frente. Nossos olhos se fixaram um no
outro enquanto fitas luminosas nos rodeavam.
— Parece que gosta de estar nas minhas mãos, já percebeu isso? —
Riu, cruzando os braços. — Você sempre volta, não importa onde ou como.
Senti minhas mãos formigarem e o encarei, com os olhos quase
saltando para fora. Estar ali não tinha nada a ver com ele! A insinuação
parecia até um insulto.
— Costumo registar uma lembrança no corpo a cada mau ato. —
Referiu-se à tatuagem. — A sua é uma das mais evidentes, acho que sabe que
isso é um forte indicativo de que só estou começando… — Deu mais um
passo até mim e, em um deslize, apertei a arma na cintura.
Seu sorriso aumentou. Suas mãos me empurraram contra a parede e
desceram ali, apalpando até encontrá-la.
Os dedos deslizaram levando minha calcinha para baixo. Olhos nos
meus olhos. Lábios tão próximos que me faziam sentir sua respiração. Meus
seios tocavam no peitoral dele e eu me via cada vez mais encurralada.
Aaron segurou a arma devagar, livrando minha pele do metal gelado
até que ela aparecesse diante de seus olhos.
— Isso não é brinquedo para você — falou, olhando para a pistola
pesada. Fiquei em silêncio. Esperando o momento certo de tomar e o fazer
implorar para não levar um tiro. — Onde conseguiu? — Sua sobrancelha se
ergueu. — Por acaso, se encontrou com o seu papai? — Ele destravou a arma
e olhou para mim. — Eu fiz uma pergunta, ratinha. — A ponta fria do metal
roçou a base dos meus seios.
Prendi a respiração. A mão dele era pesada e desenhava caminho pelo
meio deles com firmeza, separando o meu decote quase inexistente, expondo
a minha pele.
— Não vai me responder, hum? — Seu rosto voltou a se aproximar do
meu. — Odeio quando você é assim teimosa, sabia? — soprou no meu
ouvido e minha respiração falhou. — Se lembra do que fiz para que abrisse a
boca da última vez? — Me empurrou um pouco mais contra a parede e senti
seu calor familiar.
— Vai para o inferno! — Senti minhas cordas vocais mais trêmulas do
que gostaria e, quando pensei em golpeá-lo, vi que se separou e sumiu,
simplesmente. Pisquei algumas vezes, assim que me livrei da tontura na qual
ele me submergiu. Não havia sinal do desgraçado ou da minha arma.
Comecei a entrar na festa, amaldiçoando a hora em que pensei que ir ali
seria uma boa ideia. Avistei Brandon. Parado em um dos cantos e tentei me
recompor. Ele poderia saber onde a unha se enfiou, já que lhe era como
carne.
— Curtindo a festa? — Ele me olhou por um momento e virou uma
bebida entre os lábios. — Soube que você é filho do governador… — Tateei,
sem saber o que falar. — O que faz aqui? — Mantive a expectativa,
esperando sequer uma resposta, mas ele parecia um carcereiro mudo. — Pelo
que percebi, o caladão é o loiro. Você fala. Por que tá me ignorando? —
Franzi o cenho. Diante da confusão no meu rosto, ele soltou um sorriso. Algo
ligeiro. Como se não pudesse segurar. — Olha… ele ri.
Quando se virou para mim os fios de cabelo caíram em cima dos olhos
e a barba por fazer brilhou sob as luzes fortes do lugar.
— Aaron não quer ver você conversando por aí — falou, sério. Seus
olhos semicerraram. — Muito menos perambulando. Ele sabe que você tá
aqui?
Minha expressão de confusão só não foi tão expressiva quanto o grito
que ouvimos vindo de um carro.
A música parou e avistei Meg em cima da estrutura do som,
completamente bêbada.
— Meg! — Comecei a correr até ela, mesmo sabendo que se fosse eu
em seu lugar, ela iria sumir, como em todas as outras vezes. Mas eu não
deixaria ela ali, e como imaginava, Aaron surgiu na minha frente como um
raio.
— Acho que ela está se divertindo — falou, com os olhos fixos em
mim. — É uma altura considerável se pensarmos que essas caixas de som
podem subir automaticamente, se um botão for acionado. — Apertou
levemente um ponto vermelho e a estrutura deu um leve pulso para cima.
Meg gargalhou.
— Vem, Bri! É divertido…. Opa! — Meu coração quase pulou para
fora quando a ponta do salto dela deslizou um pouco para a beirada, antes que
se equilibrasse e voltasse a tomar mais um pouco da bebida.
— O que você quer? — Fuzilei o infeliz com os olhos e ele cruzou os
braços, encostando-se no carro. — Me diz! O que você quer de mim? —
gritei, fazendo minha voz reverberar pelo estacionamento agora silencioso.
— Diga onde ele está.
— Eu não sei! — exclamei, meus olhos estudando sua expressão séria.
Olhei dele a Meg e de Meg a ele.
Fechei os olhos. Punhos cerrados. Precisava pensar em alguma coisa.
E pensei.
Uma pistola de pressão que liberava fogo, do lado de um dos pneus do
carro. Era igual a que ele usou para me aterrorizar em frente ao campus. Era a
minha chance.
Fingi a minha melhor cara de derrota e comecei a ir até ele devagar,
com os ombros caídos, colocando os fios de cabelo atrás da orelha.
— Já que você quer tanto saber… — Olhos nos olhos, ele sorriu. Sem
esboçar qualquer tipo de expressão, joguei o corpo para o lado e agarrei a
arma. — Então toma!
As chamas rugiam, criando uma cortina de fogo na direção dele, que
recuou para o lado com os olhos se alargando em surpresa e choque.
Apertei o botão que vinha na sequência do vermelho, torcendo para não
estar fazendo merda. A estrutura desceu. Segurei Meg pelo braço e a forcei a
me acompanhar em uma corrida para fora dali.
Começamos a subir a escada. Cada batida dos nossos corações parecia
sincronizada, um lembrete constante de que estávamos vivas, mas ao mesmo
tempo à beira da morte.
Olhei para trás. Ele estava vindo.
Ninguém ousou tentar impedir e, se eu estivesse em seus lugares,
também não me colocaria na frente daquele furacão.
Seus olhos brilhavam no escuro, refletindo fúria e descontrole. Eu
podia ouvir a respiração junto a grunhidos, como se estivesse bem próximo
ao meu ouvido. Aquilo reverberou pelos meus ossos e fez minha pele tremer.
— Meu Deus! Rápido, Meg! — Assim que fechei a boca, ela tropeçou.
Tropeçou e levou meu coração junto.
Seu corpo caiu no chão, como uma fruta podre. Ela gemeu de dor e
começou a chorar, fedendo à bebida alcoólica. Senti as solas dos meus pés
formigando quando o vi avançar enquanto estávamos paradas ali.
A risada que ele soltou me fez estremecer.
— Ah… quando eu alcançar vocês… — Aaron mancava, nos seguindo
como uma sombra. Um predador.
— Levanta, Megan! — Segurei-a pelos braços e quase a joguei para
cima, não sabia de onde tirei tanta força, mas o fiz. — Você está bem? —
Minha voz ondulou e de sua boca não saía nada além de um choro baixinho.
Coloquei o braço dela em meu ombro e continuei guiando nossa corrida
o mais rápido que conseguia.
Arrisquei olhar para trás depois de alguns passos mais lentos do que eu
gostaria e calculei poucos sete metros de distância entre nós e a destruição em
pessoa.
— Você acha que correr vai me impedir, ratinha? — Sua voz rouca e
carregada de ameaça ecoou pelo lugar aberto. — Acha que vai se salvar?
Meus olhos arderam, coloquei força nos pés e continuei nos arrastando,
mas Megan estava muito pesada e não me ajudava em quase nada, além de
sustentar uma parte do peso do próprio corpo com dificuldade.
— Aaron! — Era Brandon. Me virei para olhar e ele corria atrás do
amigo, como se tivesse tomado coragem para o impedir de nos massacrar.
— Agora não, porra! — Olhei por cima do ombro de novo e percebi
que eles estavam discutindo, mas Aaron ainda insistia em andar, mesmo que
pouco.
No entanto, já era alguma coisa, uma chance.
A garota já estava com a cabeça jogada para um lado e seu peso me
fazia envergar junto dela. Bati os pés no chão.
— Acorda, Megan! Você quer morrer, caralho? Temos uma chance! —
Ela sacudiu a cabeça e se concentrou nos pés, soluçando com o choro
entalado.
Foi a caminhada mais sofrida da minha vida. Quando chegamos nas
escadas e olhei para trás, consegui discernir sua silhueta da penumbra.
Brandon não nos deu muito tempo. Nem mesmo perguntei a ela se
conseguia subir, dei alguns passos nos degraus e, quando a vi tropeçar,
coloquei os braços por baixo de suas axilas.
Olhos fechados. Inspirei fundo e comecei a arrastá-la para cima.
Quando os degraus acabaram, Aaron pulou no primeiro lá embaixo e
meu corpo gelou.
— Espere por mim, ratinha…
Não tinha tempo para mais nada, então só continuei arrastando Megan
pelo longo corredor, até a porta do nosso quarto, que era perto da entrada.
Para a minha felicidade, ou não, só ali ela reagiu. Sua mão segurou a
maçaneta, ajudei a abri-la e nos joguei lá dentro. Trancamos a porta com
pressa, esperando que fosse suficiente para nos proteger.
Fechei os olhos. O silêncio reinava no lugar, anunciava que tinha dado
certo. Me aproximei da porta nas pontas dos pés. Prendendo a respiração.
Pálpebras tremendo. Fiz sinal de silêncio para Meg, que choramingava
incontrolável e encostei a orelha na madeira.
Nada.
Meu suspiro veio do mais íntimo e se dissipou no ar em forma de
alívio.
Pelo visto, desistiu da perseguição.
— Acha mesmo que pode se esconder de mim? — ele sussurrou, sua
voz rouca me fazendo tremer.
Pulei para longe da porta, o som dos punhos de Aaron contra a madeira
ressoavam pelas paredes.
Meg recuou com os olhos arregalados de medo e eu me via paralisada
com o corpo tenso, olhando para a porta. As investidas faziam o chão tremer.
A cada golpe, a estrutura ao redor da porta ameaçava desmoronar e levar meu
coração junto.
Com um estrondo ensurdecedor, a fechadura cedeu. A porta foi lançada
contra a parede.
Ele entrou no quarto, sua presença dominante parecia invadir o lugar
como um oceano em uma tempestade noturna. E tal como um, ele veio até
mim.
Recuei até me ver presa contra a parede enquanto seus olhos tentavam
me engolir e nossos ofegos se misturavam. Ele apertou os dedos em meus
cabelos e eu apoiei as mãos em seu peito.
Forte, suado, com os meus olhos tristes tatuados ali, na carne.
— Aaron… — chamei seu nome, com a voz cortada pela respiração
irregular. Não sei por qual motivo, só veio e o liberei.
Lutamos com os olhos. Sem armas, armaduras, nada.
Nus e crus.
E naquele momento, tudo sumiu. Minha barriga parecia um pedaço da
galáxia, fria, flutuante, cheia de energia granulada.
Eu queria odiá-lo, queria resistir àquela sensação magnética que parecia
nos puxar um para o outro, mas algo em seu olhar me segurava, me mantinha
cativa, submersa, desarmada.
Não houve movimento, não houve palavras. Apenas a sensação
avassaladora de que algo grande e incontrolável estava se formando ao nosso
redor. Me fazendo sentir ao mesmo tempo atraída e repelida por ele.
Os alunos do matutino já movimentavam os corredores da universidade
quando, depois de termos levado as minhas coisas e as de Meg para um
quarto novo, me vi sentada em uma cadeira na sala fria da Reitora Freyer, a
senhora séria de cabelos grisalhos puxados para trás em um coque apertado e
que tinha uma verruga exuberante perto da sobrancelha esquerda.
Sua roupa era repleta de pregas e o cetim parecia menos brilhante que o
normal.
Fechei os olhos e os abri de novo.
A saia era preta, ela usava o que parecia ser um scarpin, também preto,
e uma meia fina.
Detalhes…
Tinha um óculos pequeno, menor do que seus olhos, eu diria, e ficava
na ponta do nariz.
Fechei os olhos de novo. Respirei fundo.
Eu precisava focar em mais detalhes, desviar a atenção.
Dizia isso a mim mesma enquanto meu dedo indicador batia
freneticamente contra o joelho.
Dias atrás, eu fechava os olhos e via um morto, agora mesmo sem
fechá-los, conseguia ver os olhos dele, do Alien.
Esquecer daquela sensação de estar em um vendaval enquanto eu
olhava para ele no meio do quarto com a porta quebrada e uma tensão
palpável no ar, ainda parecia impossível, mesmo depois de algumas horas.
Acho que isso se devia ao fato de que ainda o ouvia ofegar. Tanto em
pensamentos quanto ali, ao meu lado.
Aaron estava fervendo. Eu podia sentir o quão quente sua energia
vibrava, e o compararia facilmente ao sol, se me pedissem um exemplo.
Para completar, algemaram-no na cadeira, por segurança. Mesmo que
ele não me tivesse feito sequer um arranhão, ao contrário de mim, que fiz ele
torcer o tornozelo para desviar do fogo.
E ainda assim, preso, ele conseguia sacudir as minhas estruturas.
A reitora o fitava com uma expressão severa. Ela parecia ter a firmeza
de um general, mas seus olhos tinham um toque de receio por trás da
autoridade que tentava impor. Isso era perceptível.
Ela tinha acabado de dar um discurso sobre bons modos e nos
comparado a crianças do colegial. Convenhamos, crianças sequer sonhavam
em fazer algo como o que acontecia naquele lugar. Mas o que ela estava
apontando era "nossa" imaturidade.
Fiquei em silêncio o tempo todo, escutando apenas o estalar da língua
do Aaron e suas risadas de desdém. Piorou quando ela fechou o discurso
dizendo que nos aplicaria uma penalidade no nível da nossa maturidade:
cartas.
Eu escreveria uma para ele. Ele, uma para mim. Um pedido de
desculpas e juramento de que tentaria ser melhor.
Essa parte arrancou mais que uma simples risada, mas uma gargalhada
dele.
— Acho que não ouvi direito. — Passou os dedos pelas sobrancelhas
grossas. — A senhora poderia repetir?
A mulher ajeitou o óculos na ponta do nariz e deu o seu melhor para
refazer a frase, dando um ar de credibilidade à ideia, mesmo sabendo que não
iria adiantar.
— É uma forma de melhorar o convívio neste ambiente acadêmico, Sr.
Walker.
— Tô farto, tira isso de mim — falou, balançando a mão algemada.
— Nós vamos tirar, sim, só preciso que você…
— Eu mandei me soltar! — gritou, e me segurei na cadeira ao lado.
De alguma maneira, aquilo era contraditório a mim. Aquele desgraçado
de cabeça quente nunca se deixaria ser preso, mas ele permitiu e aguentou o
sermão da senhora por quase dez minutos inteiros.
Ela deveria agradecer por ele só estar surtando agora. Deve estar
usando de uma força desumana para não a atirar pela janela. Pensei, me
nomeando expert quando o assunto era ele.
Depois de entregar a chave, a Senhora Freyer pegou duas folhas de
papel, canetas e as colocou na mesa. Começou a falar enquanto, impaciente, o
Alien se livrava da algema.
— Escrevam uma carta de desculpas um para o outro. Não é apenas
uma tarefa, é um exercício para refletir sobre suas ações e mostrar… —
Antes que terminasse, Aaron estava saindo.
A porta se fechou e ela tirou os óculos. Seu suspiro de exaustão
reverberou pela sala. Olhou para mim, ainda séria.
— É meu penúltimo dia aqui. Pensei em agir como uma líder de
verdade pelo menos por um ou dois dias. — Seus dedos empurraram um
pouco mais a folha até mim. — Faça a sua carta.
— Mas… eu…
— Não vai querer criar uma rivalidade com Aaron Walker. Só escreva
um pedido de desculpas, entregue-o e se mantenha o mais longe possível —
falou, me olhando com cuidado. — É o conselho que dou à minoria que
estuda aqui, aos filhos de pessoas do bem que não puderam recusar uma
bolsa de estudos, mesmo que fosse para este lugar — completou, e segurei a
caneta em silêncio. — O seu pai te colocou em maus lençóis, minha filha,
mas você sobreviveu até aqui. — Sua boca fina me mostrou um sorriso. —
Se quiser continuar respirando, peça desculpas e suma dos corredores antes
que não sobre nada de você.
Fiquei ali por mais alguns minutos, encarando a folha. A mulher abriu
seu notebook e começou a trabalhar. Depois de quase uma hora, ela abaixou a
tela e olhou para mim.
— E então? — indagou. Suspirei, deixando a minha vontade falar mais
alto que a noção do perigo.
Apertei a caneta e escrevi um grande "foda-se" em letras bastão para
enfim dobrar o papel. Meu sorriso mais sincero foi entregue à diretora e saí
de lá em direção ao alojamento da fraternidade dos meninos, do outro lado do
Campus.
Com certeza ele não merecia menos do que aquilo e eu até entregaria,
se tivesse coragem suficiente para encará-lo sem a minha arma, por isso a
primeira coisa que fiz foi desviar o percurso e começar a caminhar até o
alojamento da irmandade. Eu ainda tinha coisas embaladas que não iriam
para seus lugares sozinhas.
No entanto, mesmo com os olhos fixos no caminho, percebi que estava
sendo observada, de longe. Pelo canto dos olhos, descobri a diretora.
Acompanhando cada um dos meus passos pela janela do prédio de
administração.
Era uma droga que ela tinha tanto medo quanto todos ali, e queria que
eu me ajoelhasse aos pés do Aaron para evitar ser alvo de suas tiranias.
Como se eu já não fosse seu brinquedo preferido.
E lá estava eu, indo até ele, sendo seguida pela supervisão da senhora
que já me fazia desejar antecipar a sua aposentadoria para ontem.
Quando alcancei o corredor dele, vi que a porta estava entreaberta,
alguns barulhos estranhos pareciam vir de lá, mas eu já estava de pé ali, a um
passo de mandar Aaron Walker se foder depois de quase matarmos um ao
outro horas atrás.
Era promissor.
Empurrei a madeira devagar, usando as pontas dos dedos e ouvi a voz
rouca dele reverberar pelo lugar.
— Porra, Brandon! Mandei me dar um minuto! Você pode pegar essa
merda depois, mas essa vadia tem aula em dez minu… — Parou de falar
quando me viu.
Prendi a respiração quando o vi nu. Uma professora de olhos escuros e
cabelos castanhos estava com a saia embolada na cintura, ajoelhada diante
dele, segurando a ereção com as duas mãos e a empurrando goela abaixo.
Puta merda!
Seus seios estavam à mostra. Ele apertava um dos mamilos dela
enquanto a outra mão segurava o cabelo com força — como ele segurava o
meu — forte, apertando os fios entre os dedos.
A mulher parecia faminta, sugando o pau que mal cabia na boca. Boa
parte ainda estava fora, mostrando veias saltadas e uma vermelhidão suave.
Os testículos balançavam à medida que ela movimentava a boca, envolvendo
desde a glande. Seus gemidos eram contidos, mas estavam lá, misturados
com o barulho da sucção que me fazia arrepiar.
Aaron me olhava de modo indecifrável enquanto a mulher o chupava,
tornando minha situação ainda mais caótica, porque eu já sentia o filete de
líquido quente escorrer devagar pela parte interna da minha coxa. Pude jurar
que o vi empurrar a pelve um pouco mais contra o rosto dela, ao mesmo
tempo que olhava para mim, e depois bateu na cara dela. Forte. Fazendo-a
gemer e abrir um pouco mais os lábios, nos quais ele se acomodou com mais
espaço.
A mulher tateou a extensão do membro e o tirou da boca, deixando-o
balançar sozinho até parar e apontar para cima, escorregadio, brilhando com
sua saliva. Seus dedos abaixaram ainda mais o decote e ela se aproximou
para enfiar aquilo tudo entre os seios. Seus olhos subiram na direção dos dele
e, reparando no olhar fixo que ele lançava para longe, ela o seguiu, parando
em mim.
Sua expressão se mostrou inexplicável. "Vergonha nua e crua" parecia
ser raso demais para expressar.
As mãos dela trabalharam depressa, agora longe daquela coisa enorme.
Em segundos a roupa estava no lugar e seu dorso limpava a umidade ao redor
dos lábios, queixo e bochechas. Ela passou por mim com a cabeça inclinada
para baixo, ajeitou a roupa com uma pasta na mão e olhou para trás sem
graça alguma, me vendo boquiaberta na porta, com a carta meio amassada
nas mãos.
Cerrei os punhos, tentando engolir o sentimento estranho que aquela
merda me fez sentir, e perdi a noção de que, assim como ela, eu já deveria
estar longe. Antes que eu saísse de lá, Aaron me puxou pelo braço e me
empurrou contra a parede. Meus seios foram amassados contra a superfície
lisa e ele se aproximou do meu ouvido.
— Começo a ter certeza de que você me irrita de propósito, ratinha. —
Senti o ar quente que soprava contra mim e fechei os olhos.
Eu não podia apertar as pernas. Não ali. Ele iria perceber. Mas também
não conseguia disfarçá-las, tremendo.
— Me solta, Aaron — pedi, minha vontade oscilando entre ir e ficar,
meu senso me sacudia por ainda existir outra escolha além de sumir dali.
— Claro, só preciso pegar a sua cartinha de amor — falou, e me
lembrei da razão de ter ido lá. Por um momento, tudo aquilo havia sumido da
minha cabeça.
Ele me libertou quando pegou o envelope entre os dedos, mas não me
movi. Continuei virada de costas, em silêncio.
— A porta está aberta, ratinha. Pode fugir quando quiser. — Sua voz
soou um pouco mais rouca. Pelos distintos sons, ele segurava a folha com
uma mão e o pau com a outra. — Espero que saiba que vou pensar em você.
— Não vi, mas pude sentir que sorria.
Minha saliva entalou na garganta. Tateei a porta com os olhos fechados
quando percebi que sua respiração ofegante se movia pelo cômodo. Ele
seguiu até o banheiro, a poucos passos dali, com os olhos no papel dobrado,
massageando a ereção. Daquela vez, percebi porque, enquanto se afastava,
virei um pouco o rosto, curiosa. Foi o suficiente para que eu voltasse para a
parede de novo, quente como o inferno.
A porta de saída estava do meu lado, aberta. Só precisava girar a
maçaneta e ir embora, mas aquilo era uma merda. A vontade de ouvir
permanecia. O meu desejo obscuro vencia a razão.
Ouvi o barulho da fricção mais alto, seguido de ofegos que faziam
alguma coisa dentro de mim transbordar. O som do papel desdobrando
atingiu um nervo no meu cérebro. Algo específico que me fez arregalar os
olhos.
O banheiro parecia estar com a porta aberta, eu ouvia tudo como se ele
estivesse ao meu lado. Senti a gota de suor percorrer a minha testa quando ele
parou.
Silêncio.
Estava lendo.
O vão entre os meus lábios começou a aumentar. Engoli em seco,
virando um pouco o rosto. Olhos semicerrados, ouvidos atentos e respiração
presa até que…
Mais movimentos começaram a surgir. Fortes, em conjunto com o
papel sendo embolado. Sua risada alta se misturou com um gemido e me fez
morder a mão.
— Oh… amor… me odeia tanto assim, hum? — Ele continuou
batendo, os movimentos ficavam ainda mais rápidos e um calor desumano
subia por minhas pernas.
Mesmo que não visse nada, continuei de costas. Era uma proteção
contra aquele desejo desumano. Contra a mistura de sentimentos assustadora
que crescia dentro de mim. Meus dedos tremeram e senti tudo molhar lá
embaixo. O infeliz voltou a falar.
— Queria estar entre as suas pernas agora. — Puxou o ar com força e
suspirou depressa, soltando um som rouco do fundo da garganta. Apertei
minha boca com mais força quando quase gemi junto dele. — Eu abriria você
devagar… penetraria com calma, e então daria o que você merece. — Meu
coração pulsou, descompassado. — Nós iríamos ver quem estaria fodido no
fim do dia.
O som reverberava pelo banheiro e ficava mais alto com o eco
ambiente. Cruzar as pernas trêmulas já não adiantava muito. Ele rugia, me
causando arrepios incalculáveis.
— Ainda aí, ratinha? Eu gostaria muito que estivesse… — soprou,
antes de bater contra a parede. — Gostaria que me ouvisse até o fim. Que me
imaginasse gozando, mas não na minha mão. — Riu, os ofegos fazendo sua
voz ficar ainda mais grave. — Na sua bocetinha. — Minha calcinha, além de
molhada, passou a esquentar.
Me virei de frente para ver os dedos de sua mão segurando a base da
parede. Deu um passo para sair do banheiro, ainda hiperventilando.
Estava completamente vermelho. As veias pulsavam ao redor enquanto
o apertava com a mão grande.
Franzi as sobrancelhas, assistindo a ele movimentar o punho para cima
e para baixo.
— Oh… Brianna… — Soltou meu nome em um rosnado. Os olhos
meio fechados, aquelas sobrancelhas grossas querendo franzir.
A glande rosada parecia crescer cada vez mais sob a pressão que ele
investia com o polegar. A pele fina subia e descia pela extensão dura, longa e
grossa o bastante para tomar boa parte de sua palma, que também não era
pequena.
Meus olhos não saíam de lá. Minha boca acumulava a saliva, que era
engolida a cada segundo decorrido. Chegou mais perto e fui dando alguns
poucos passos para trás, sentindo minha calcinha colar na pele e deixando
tudo escorrer pela minha coxa. Abri a porta, e ele me seguiu com a boca
entreaberta, os olhos em mim, peito suado, a respiração de um animal.
Não poderia ficar mais ou iria me arrepender. Sequer deveria ter
permanecido ali, na verdade. Tinha certeza de que mais um pouco e eu
também estaria sem roupa.
Desenhei um passo maior para fora. Quando aquela coisa enorme
atravessou a porta, segurei a maçaneta, puxando-a com força.
Era a minha resposta àquela merda toda.
Aaron agarrou a porta tão forte que quase me levou ao seu encontro,
impedindo que ela se fechasse.
— Vadia! — soltou, e as veias do pescoço saltaram enquanto ele se
masturbava mais rápido. — Oh… eu vou acabar com você! — Comecei a
quase correr quando o vi revirar os olhos.
O grunhido alto alcançou meus ouvidos, antes de começar a se dissipar
no ar, e ele rosnou entredentes.
Não havia um ser vivente pelos corredores, e agradeci aos céus por
isso. Eu parecia estar tendo um treco ao tentar chegar no alojamento da
irmandade.
Entrei pela porta do novo quarto, quase derretendo de tão suada. Meg
me olhou com uma sobrancelha arqueada. O último quadro, com a foto de
quando ela era bebê, estava quase sendo posto em sua estante.
Passei direto para o banheiro, ela me acompanhou e parou na porta para
receber a porta na cara.
— Foi mal — ciciei enquanto arrancava a roupa e abri o chuveiro
gelado.
— Posso saber o que tá acontecendo? — perguntou. Pelo tom de voz,
ela ainda estava no mesmo lugar.
Sentia a energia caótica irradiando de mim. Não iria contar nada
daquilo a ela, sequer voltaria a pensar naquilo de novo.
E não. Não era como se eu nunca tivesse visto um pau antes, um cara se
masturbar ou gemer o meu nome.
Mas era Aaron Walker, o Alien do inferno. O cara a quem eu deveria
odiar por incontáveis motivos, mas era por quem queimava feito palha no
fogo, cedendo às suas provocações, dando ouvidos ao demônio no meu
ombro esquerdo.
Eu preciso me internar.
— Aquela tour ainda está de pé? — Abri a cortina, como se ela fosse
me ouvir melhor. — Podemos ir agora? Estou precisando espairecer — falei,
segurando o nervosismo, e ela ficou em silêncio, como se me estudasse pela
voz.
— Claro. — A animação no tom de voz me pareceu um pouco
duvidosa. — Por onde quer começar? Temos a sede, as quadras esportivas, a
biblioteca, esse alojamento, que você já conhece, o alojamento dos menin…
— A sede! Ou a quadra, não sei… — Suspirei. — A biblioteca também
seria legal!
— Quando sair do banho comemos alguma coisa e…
— Certo, eu já estou saindo! — gritei, afobada, e fechei os olhos.
Mal senti quando entrei debaixo da água fria, e isso me parecia um
problema, pois não estava fazendo efeito. Parecia que nada nunca iria fazer.
Depois de vestida, enxuguei o cabelo com uma toalha enquanto me
olhava no espelho. Meg se aproximou com os braços meio cruzados. Os
olhos em mim não escondiam a confusão.
— Então…. como foi na diretoria? — Só ali me lembrei de que fomos
à diretoria pela manhã. Eu e… ele.
— Foi normal.
— Normal?
— É… ela só reclamou e…
— A reitora não tem muita autonomia por aqui. Na verdade, ninguém
tem. Eles só tentam manter as aparências mesmo, mas já são dominados há
anos. O que aconteceu? Você chegou tensa.
— Ficar no mesmo ambiente que ele me deixa tensa — pontuei.
— Ele? O Alien? — Não respondi, estava engolindo em seco quando
ela me olhou, esperando uma confirmação. — Sinto muito que tenha que
passar por isso, Bri, e agradeço mais uma vez pela ajuda. — Olhou para os
lados. — Você agiu bem diferente de mim, deve estar se arrependendo agora
que a adrenalina passou.
— Não me arrependo. — Vi quando ela voltou a erguer os olhos na
minha direção. — Poderia ter sofrido fraturas graves. — Sacudi a toalha e fui
pendurá-la no banheiro. — Está bem calma. Muito mais do que eu achei que
estaria — destaquei e ela riu.
— Estudo aqui há anos. Você está falando com uma veterana que já
presenciou de tudo. — Pareceu afobada. — Aquela não foi a primeira vez
que tentaram me matar aqui no campus, mas também não é como se
acontecesse com frequência. Costumo me misturar bem. Ou pelo menos
costumava…
Suspirei.
A situação era mais caótica do que eu imaginava. E conseguia enxergar
que a culpa da recente tormenta era minha.
— Sou eu quem está atraindo isso, e você estando comigo…
— Pode ir parando. — Meg ergueu a sobrancelha. — Não vou abrir
mão de dividir esse quarto com você! Estamos começando a ter regalias que
só o Alien e seu pessoal tem.
— Regalias? Por quê?
— Ele anda berrando por aí que você é dele, então… — Franzi a cara
inteira. Ela continuou: — Resquícios da veneração que você recebe, estão
respingando em mim. — Apontou para a porta. — A Jennifer não liga mais o
som de madrugada para disfarçar a transa com o namorado. Acho que eles
nem passam mais a noite nesse alojamento. — Apontou para o banheiro. —
Não temos mais que dividir nada porque esse quarto é para líderes da
irmandade, tem dois banheiros. — Olhei, confirmando o fato e tentando
entender como tomei banho ali e não percebi. Meg girou pelo lugar. —
Metade do que tem aqui não caberia naquele cubículo em que estávamos, e…
— Aproximou-se de mim. — Me pagam bebidas e lanches no refeitório. Já
tenho até alguns encontros… — Diante da minha reação perplexa, ela sorriu
sem graça. — Mas então qual o motivo desse seu colapso por distração?
— Ao contrário de você, sou nova aqui, e o alvo preferido do pior
arruaceiro deste lugar. Mesmo sendo filha de um delegado, não passei por
tantas aventuras mortais como nos últimos dias. — Olhei para ela. — Eu
preciso de um ar.
— Agora mesmo, patroa!
Saímos da caverna e seguimos direto para a pista livre, não tão longe
dali. Era o lugar no Brooklyn onde aconteciam os rachas que cortavam
Manhattan e atravessavam as tábuas da lei, como tijolos inúteis empilhados.
Era revigorante saber que, além de correr, eu mandava ali agora. E
mesmo que aquilo não fosse um racha, me trazia a mesma adrenalina que
aqueles momentos proporcionavam, o mesmo prazer que me tomava quando
eu estava com as mãos no volante, sentindo o cheiro de pneu queimado e o
balanço das molas sobre a pista. Mas ainda conseguia ter um toque diferente,
porque não iríamos correr, iríamos matar.
Fixei o olhar afiado, percorrendo o grupo que se reunia ao redor dos
carros. Cada rosto era uma máscara, escondendo intenções obscuras e desejos
destrutivos. Benedete, Ryus, Brandon, todos ali tinham seus motivos para se
juntar a mim, e iam além do nosso vínculo. Eram pessoais, e ainda assim nos
ligava pelo fio invisível do crime e da lealdade distorcida.
— Benedete, você abre caminho. Ryus, fique na retaguarda. Brandon,
cubra o lado leste. Souberam de movimentos estranhos por lá. Provavelmente
os rivais que nos roubaram e tomaram uma porcentagem do que é nosso,
estão estabelecidos lá. — Minhas ordens eram curtas e precisas, um reflexo
da autoridade que agora pesava sobre meus ombros. — Vamos brincar um
pouco com os inimigos.
A noite se desdobrou diante de nós. Carros rugiam como feras
famintas, rasgando o asfalto na direção do que buscávamos. Sob o meu
comando, o reinado de metal retorcido e pneus em chamas.
Cada curva, cada derrapagem controlada era uma declaração de poder.
Eu sabia que não havia mais volta. As sombras do meu passado se estendiam
sobre o Brooklyn, uma lembrança constante de que nasci para ser e qual era o
meu objetivo estando ali.
Nunca haveria paz para mim. Apenas poder, controle e a eterna busca
pelo próximo movimento no jogo mortal que eu liderava. Porque, o
Submundo em que vivíamos, a dor era nossa aliada e a vingança, nossa
amante.
"Estou cuidando do caso de sua mãe. Sabia que iria resistir, continue.
Quero o nome de todos, todos os detalhes. Conto com você".
Completaram dois dias que tinha lido aquela mensagem no meio de um
dos pátios da universidade. Estava relendo a cada cinco minutos e o que me
prendia, todas as vezes, era a primeira parte.
Ele estava cuidando do caso da mãe! Finalmente!
Minhas mãos tremiam sempre que pensava naquilo e na minha cabeça
só se passava uma coisa: eu precisava manter o Alien longe dele. Precisava
servir de saco de pancadas, dar cobertura.
Me esquecia até de quem meu pai era, do monstro que se tornou na
ausência dela. Porque, no final, se ela voltasse, tudo estaria resolvido.
Tudo vai melhorar.
— Bri? — Meg me chamou, talvez pela milésima vez. — Diz que
ouviu uma palavra do que falei, eu imploro.
Franzi o cenho para ela.
— Pode repetir?
Depois de bufar, Meg começou a tecer o resumo do resumo.
— A nova Reitora acabou de tomar posse do cargo. Dizem que foi
designada para cá pelo próprio governador.
— Legal. — Tentei colocar o máximo de ânimo possível na fala e
voltei para a telinha.
— E tem mais. — Ela tomou meu telefone e jogou de lado.
— Cara?!
— Você também foi anunciada como líder da irmandade, garota!
— O quê? Já anunciaram?
— O resultado sairia hoje, junto com a nova liderança da secretaria.
Você se inscreveu e não leu sobre as datas? — perguntou e minha cabeça se
embolou em uma confusão.
— Mas como ganhei se…
— Glenda? — Ela riu. — Estou depositando as minhas cartas que você
teve um grande poder de influência.
— Devido a?
— Aaron Walker. — Franzi o cenho e ela continuou. — Ser o centro
dos recentes shows dele te fez se tornar intocável, Brianna. Ele literalmente
anunciou que você é dele.
— É um babaca maluco e obcecado pelo meu pai.
— E, por saber disso, as pessoas não querem vê-lo irritado. Por isso,
você ganhou.
Suspirei. Tudo parecia girar em torno daquele infeliz.
— O que vai fazer agora?
Além de manter uma barreira entre Aaron e meu pai, recuperar minha
arma, descobrir qual é a da chave e registrar tudo que puder sobre os mini
criminosos ali?
— Vou pegar o meu crachá de líder e anunciar festas o ano inteiro. —
Deixei escapar somente o que uma pessoa normal diria.
— Essa é a garota que esperei ver o semestre inteiro! — exclamou.
Sair do prédio de administração foi uma verdadeira luta. Precisei
improvisar o meu discurso, mostrar estratégias acadêmicas de um post de
dicas na internet, e sorrir o tempo inteiro para a direção. em uma sala bege
com o ar condicionado gelado, enquanto a nova reitora do campus me
encarava com os olhos de uma víbora.
Depois que tomei posse da liderança, tive ainda mais certeza de que
preferia não ter conhecido Glenda. A sala inteira precisou aturar quase duas
horas, em que ela tagarelava e apresentava provas de que a votação foi uma
fraude. A boneca cor-de-rosa estava na frente, mas bastou eu colocar o meu
nome no painel de votação e o jogo virou aos quarenta e cinco do segundo
tempo.
Eu não tinha um discurso, não tinha uma chapa, sequer participei dos
encontros com a direção, mas meu nome estava lá, como líder da irmandade
segundo a votação contabilizada.
Parecia até loucura, mas esse era o poder da influência daquele
desgraçado.
Caminhei rápido pelos corredores do alojamento dos meninos. Os que
passavam por mim com a cara feia recebiam uma careta pior da minha parte,
mas nenhum me dizia sequer uma palavra.
O que eu estava fazendo ali? Aproveitando a minha carta branca de
líder, inventando uma reunião com o líder da fraternidade para conversarmos
sobre a união dos grupos e projetos em comum. Cartada que consegui
elaborar durante a reunião, e que me levaria direto ao quarto do Alien.
Com o sinal de vida do meu pai e tendo decidido que o manteria longe
do alcance do Alien enquanto procurava pela minha mãe, precisava me sentir
segura perto daquele maníaco, logo, recuperar a minha arma parecia ser uma
boa.
O problema era que não seria tão fácil assim, e eu sabia disso.
Segundo a folha a que tive acesso na sala da diretora, o quarto dele era
o maior. Por que será, não é? Tinha a droga de uma porta diferente e isso me
fez perder algum tempo para averiguar a fechadura com um pouco mais de
calma.
Minha experiência não era tão vasta para aquelas coisas, mas eu sabia
usar um grampo, e foi no que investi. Os minutos se arrastavam enquanto me
via pendurada na porta trancada, tentando mover o maldito grampo de cabelo
ali dentro.
Agradeci aos céus os dias que passei abrindo portas sem a permissão do
meu pai, para treinar com as armas dele, ou eu levaria um século ali.
Os cliques agressivos ressoavam pelo corredor e minha testa já pingava
suor. Manter um olho no serviço e outro ao redor, para garantir que ninguém
me veria. Estava sendo um horror.
Quando a fechadura cedeu, um leve estalo reverberou pelo lugar e eu a
empurrei suavemente.
Ao entrar no lugar, a primeira coisa que percebi foi o quarto limpo e
cheiroso, o que era um milagre. Não vi nenhum daqueles marmanjos com
cara de quem arejava um chão.
Percebi que tinham duas camas lá, o que indicava que ele dividia o
lugar com um colega.
Enfim, gente como a gente.
Fechei a porta atrás de mim e mergulhei na atmosfera intensa. Paredes
com pôsteres desgastados de bandas de rock, CDs e vinis espalhados,
marcados por incontáveis riscos de rotação, miniaturas de carros
cuidadosamente posicionadas em prateleiras na parede. Uma jaqueta de couro
pendurada em um gancho na parede exalava o cheiro dele. Fresco, forte e
imponente.
Avistei minha arma em cima da escrivaninha, esbanjando a
despreocupação do rei daquele lugar em expor armas de fogo como enfeites
de cômoda. Agarrei-a primeiro e a coloquei na cintura, depois passei a abrir
as gavetas dando um "olá" à minha curiosidade de saber o que tinha no
dormitório de filhotes de criminosos.
Preservativos, uma boca sintética de borracha que preferia não ter visto,
coisinhas embaladas que facilmente os fariam pegar alguns anos na cadeia,
chicletes, barrinhas energéticas, suplementos — afinal, aqueles músculos
tinham que sair de algum lugar — e mil e uma latinhas de álcool em um
refrigerador maior do que seus próprios guarda-roupas.
Nada parecia de meu interesse até que eu olhasse na cabeceira.
— Isso!
Estava lá. O molho de chaves e a cópia do que meu pai tinha junto às
coisas da investigação. Tirei-a de lá e olhei um pouco mais de perto,
comparando com a foto no meu celular.
Era igual, e eu não sabia onde enfiar tanto entusiasmo. Não até ouvir
passos se aproximando da porta, aí enfiei o entusiasmo, a chave, a arma e a
mim mesma debaixo da cama mais próxima.
Apertei os olhos e prendi a respiração quando vi os pés entrarem. Seja
quem fosse, fechou a porta, caminhou para dentro e se sentou na cama.
Segundos depois uma bermuda caiu no chão, ao redor dos pés. Ele tirou
a cueca também, vi quando o tecido caiu sobre o jeans e comecei a entrar em
desespero silenciosamente.
A maçaneta girou e mais alguém entrou no lugar.
Era a voz de Aaron.
— Pior do que foder com a minha privacidade é entrar aqui e te ver
pelado, cara — falou.
— Sei que você entra em depressão quando vê o tamanho do meu. O
seu chega a quanto? Sete centímetros? — Brandon finalmente respondeu e eu
ergui as sobrancelhas.
Tinha me esquecido completamente de que era com ele que o Alien
dividia o quarto.
— Sua mãe e sua irmã não conseguiram mamar sozinhas — o
desgraçado rebateu e Brandon riu.
— Vai se foder!
— Aí, punheteiro, manda esse molho de chave. — Ouvi quando
Brandon pegou a penca e jogou para ele.
— Seu irmão deve estar se revirando debaixo da terra. Você se apossou
de tudo que era dele. Até às chaves de carcereiro. — Riu, apertei a chave que
tinha pegado entre os dedos e me encolhi um pouco mais ali.
As chaves eram de John?
Minha cabeça sacudiu. Saber que pertencia ao irmão dele não aliviava
as coisas, mas pelo menos ele as tinha. Era provável que soubesse bem onde
usar cada uma.
Só voltei a respirar quando Aaron saiu do quarto. Mas ainda tinha
Brandon. Pelado.
Esperei ele entrar no banheiro ou algo assim para sair dali o mais
rápido possível, mas percebi que sua respiração começava a ficar mais forte.
Quando o som da fricção surgiu duvidei dos meus ouvidos.
Eu iria presenciar mais uma punheta? Esses caras não tinham uma
garota para aliviar a tensão?
Engoli as interrogações no exato momento que ouvi o nome que ele
sussurrou enquanto ofegava.
Era a porra do meu nome.
Loucura.
Era pura loucura, mas me deixou excitada também, admito.
Os pelos nas pernas dele se eriçaram e eu via suas panturrilhas
tremerem. Tampei a boca e continuei ouvindo. Não tinha muito o que fazer, e
o calor no meu corpo clamava involuntariamente por mais.
Brandon era diferente do Aaron. Suas investidas eram firmes, mas ao
mesmo tempo mais lentas. Ele ofegava baixo, contendo aquilo tudo no peito,
e parecia ronronar a cada pausa.
Apertei a chave em uma das mãos e a arma na outra quando voltou a
murmurar o meu nome, batendo com força e rosnando entre dentes. No
entanto, o movimento começou a parar devagar. Em um piscar de olhos,
puxou a roupa para cima e ficou de pé.
Nossa, ele nem gozou?
Que porra de punheta foi aquela? Segurei a vontade de sair ali debaixo
e perguntar por que parou, mas, poucos segundos, depois senti sua mão
envolver o meu pé. Brandon me arrastou para fora do meu esconderijo.
— Que merda você está fazendo aqui? — Seu rosnado me golpeou, os
cabelos escuros caindo sobre o rosto me fizeram lembrar do Aaron.
Tudo me fazia ver, comparar e me lembrar daquele imbecil. Devagar,
comecei a ficar de pé.
— Como você soube que eu…
— O seu cheiro. Doce e irritante. — Me encarou.
Pisquei algumas vezes sem saber muito bem o que dizer, até que ele viu
a arma na minha mão. Aproveitei sua atenção ali para esconder a chave no
meu bolso.
— É minha. Aaron roubou na festa, só vim pegar de volta. — Encarei-o
também, percebendo seu olhar ao redor, como se soubesse de cada mísero
objetivo e estivesse conferindo se estavam em seus lugares.
Me senti ofendida, mas engoli a indignação.
— Posso saber… — engoli em seco — o que foi aquilo? — Olhei um
pouco para baixo e ele ergueu as sobrancelhas.
— É meio que uma necessidade masculina, você não vai entender.
— Necessidade? — Foi a minha vez de erguer as sobrancelhas.
— Aaron não quer que sequer olhemos pra você. Eu só tô sendo um
backstabber (talarico) de um jeito menos errado.
— Mas não tenho nada a ver com aquele imbecil! O termo backstabber
não faz sentido aqui.
— O que torna isso ainda menos errado. — Riu. — Mas continua sendo
proibida, como se fosse dele, fantasiar com você fica mais gostoso. — Meus
lábios se abriram devagar. Ele continuou. — Juro que se assumirem namoro
um dia, nunca mais te imagino nua. — Ergui as mãos.
— Eu desisto de homens! Quer dizer… — Voltei atrás. — Vocês não
passam de riquinhos metidos a criminosos. — Me preparei para sair de lá
como um raio, tentando esconder o rubor que me assolava, quando ouvi o
infeliz mandar um áudio para o amigo.
— Aí, Alien, adivinha quem estava aqui dentro como uma ratinha
debaixo da minha cama? — Me virei para olhar para ele com sangue nos
olhos.
— O que você está fazendo?
— O óbvio. Ele vai perguntar pela arma.
— E em vez de a tomar de mim, você me deixa sair com ela e avisa a
ele?
— Qual parte do "ele não quer que ninguém toque em você" ainda não
entendeu? — questionou, e minha raiva borbulhou pelas veias.
— Então o que acha que ele vai fazer se souber que você se masturba
pensando em mim? — desafiei.
— Falando assim, até parece que namoram… Não foi você quem disse
que não tem nada a ver com ele? — Cruzou os braços, rindo, mas enquanto
se aproximava, seu tom voltava à seriedade. — Aaron divide todas comigo,
ratinha, só com você está sendo diferente. Ele te tem como um tesourinho
intocado.
— Não me chama de "ratinha", idiota! — esbravejei e ele se afastou
voltando a rir.
— Claro, só ele te chama assim. — Caminha até o frigobar. — Aaron
mantém tudo sobre você só para ele, sabia? — Abriu uma lata, o álcool
chiou, fazendo o efeito borbulha, e eu assisti a ele tomar um longo gole. —
Ele está completamente obcecado por você e pela vingança. Só não diz que te
contei isso. — Tomou mais um pouco. — Acho que ele nem chegou à parte
boa ainda, pelo menos isso ele me diria. — Ergueu a sobrancelha. — Ou
vocês já…
— Ele não está louco o bastante para tentar fazer isso!
— Ah… Então essa pode ser uma das razões das tantas regras quando o
assunto é você. Ele quer ser o primeiro daqui a experimentar.
— Então acho que o Aaron perdeu a vez. — Me aproximei. — Você
será o primeiro a experimentar… — ergui a arma — balas na cara!
— Por que não fala isso a ele? — Seus dedos agarraram o celular. —
Alien já viu minha mensagem e deve estar voltando para cá agora mesmo.
Engoli o xingamento e saí de lá correndo.
Pior do que suportar Brandon, com certeza, seria suportar Aaron. E eu
precisava esconder aquela arma, antes que ele a tirasse de mim de novo.
Olhei no relógio.
Passei duas horas com a chave na mão, meu crachá de líder na outra e a
certeza de que Aaron me colocaria contra a parede quando soubesse que
estive em seu quarto.
Meu desejo era de correr para a casa do meu pai, ali em Manhattan, e
procurar por qualquer coisa relacionada àquela chave enquanto ainda estava
livre, mas inventei de iniciar um projeto naquele mesmo dia, em
comemoração à minha vitória, para mostrar o quão engajada estaria na
liderança.
Agora, eu estava na mira do Alien e da reitora.
Minha expressão moribunda levou um tapa de Meg, que parecia
animadíssima com o novo projeto que propus ao corpo acadêmico.
Ele surgiu da primeira coisa que pairou a minha cabeça durante a
reunião. Tratava-se de um trabalho com pessoas de cursos distintos. Uma
proposta de interação e junção de diferentes ciências para resolução de
problemas ambientais. Os ganhadores iriam concorrer ao destaque na revista
de Manhattan em trabalhos acadêmicos.
Viva o ensino, viva a união estudantil, as ciências e suas importâncias,
blá-blá-blá. E viva a minha burrice de inventar essa merda.
Caminhei rápido pelo pavilhão administrativo. Iríamos nos reunir no
auditório de lá por ser maior do que a quadra esportiva, e só de olhar pela
porta dupla, pude perceber que estava lotado.
Entrei bem rápido, tentando disfarçar que estava atrasada, circulei as
cadeiras muito bem organizadas e subi no palco, para me sentar junto aos
líderes e secretários, sob a atenção meticulosa de Penélope, a nova reitora.
Ela era uma mulher mais jovem que a Senhora Hunter, exibia cabelos
cacheados curtos e uma pinta no nariz. Seus olhos eram claros e, assim como
na reunião, me fitavam como os de uma serpente.
A secretaria estava em peso e os funcionários também, além dos
universitários mais compromissados e o corpo docente.
O primeiro a falar foi Doug, líder reeleito da fraternidade, e devo dizer:
me surpreendi com suas propostas. Confesso que o arrependimento de não ter
ido até ele, em vez de me enfiar no quarto de Aaron, bateu como um balde de
água fria. Eu teria uma bela bagagem para apresentar, se tivéssemos entrado
em acordo para unir irmandade e fraternidade, ou mesmo só trocando
algumas ideias.
Mas foi para um bem maior. Agora, eu tinha com o que me defender do
Alien, e tinha a chave.
Quando o garoto branco de cabelos ralos terminou, foi a minha vez de
discursar e colocar o que eu havia prometido em jogo. Me levantei da cadeira
e, com os olhos em cima de tanta gente, decidi que seria breve, o nervosismo
estava me matando, apresentei minha satisfação em fazer parte do corpo da
liderança, destrinchei detalhes sobre a minha proposta e finalizei com um
sorriso forçado para, com um aceno, a direção concordar com o meu projeto
relâmpago.
— Já pode começar a se organizar, Brianna — Penélope pontuou. —
Estou curiosa para ver o rendimento dos universitários. São desses tipos de
projetos que se extraem os novos Einsteins das classes. — Seus olhos
permaneceram fixos em mim. — Se me permite saber, e que sirva até para
que os demais usem como exemplo no ato de escolha…— Ergueu a
sobrancelha. — Com quem pensa em fazer dupla para o projeto?
Soltei o ar devagar. Não era uma pergunta difícil.
— Bom, desde o início do projeto tive em mente que a união entre a
Medicina e outra área do conhecimento, que preferencialmente não esteja
enquadrada nos limites dessa ciência, poderia resultar em algo esplêndido,
então por que não…
— Medicina e Engenharia Mecânica? — A voz masculina me fez
vacilar. Todos viraram as cabeças para ver quem abriu as portas do lugar com
tamanha falta de educação e não pareciam nem um pouco surpresos quando
viram Aaron. Meu coração, no entanto, faltou saltar pela boca e
cumprimentá-lo na porta. — O que acha, reitora? Equipe? — perguntou alto,
enquanto caminhava até a frente e eu prendia a respiração. Quando
finalmente chegou à primeira fileira de cadeiras, seus olhos miraram os meus
e, em seguida, passaram das pessoas sentadas ali à reitora, que suspirou como
se já soubesse o que estava vindo. — Como está o governador, senhora? —
perguntou a ela, como se fossem íntimos.
Foi bem ali que minha esperança de ter um final de dia normal morreu.
— Receio não saber sobre a vida de políticos, Walker. — A mulher se
desviou dele, sacudindo a perna cruzada e acenou para que eu prosseguisse.
— Alguma ideia para um projeto assim, Brianna Abernathy? — Sua voz
feminina e firme me atingiu como um tapa, depois do soco do Alien.
— Não… não mesmo, eu iria dizer Medicina e Artes…
— Então comece a pensar no que fazer em um projeto com Engenharia
Mecânica — determinou.
— O quê? Mas…
— Você falou que os universitários precisam sair da zona de conforto e
que sua proposta visa isso, ou entendi errado? — Baixei levemente a cabeça e
ela continuou: — Essa é a hora de ser o exemplo para a irmandade. Não vai
colocar em prática o que já iniciou planejando, vai sair da sua zona de
conforto — Pontuou me deixando perplexa em cima do palco. Sua voz
aumentou um pouco mais. — Diante disso, vou escolher as duplas, para que
não haja situações cômodas de afinidade ou algo similar. A relação estará
pronta em alguns minutos nos murais da universidade. Agradeço a atenção e
presença de todos. — Levantou-se para sair, levando todos presentes consigo.
Meu olho esquerdo piscou sozinho enquanto a sombra sorridente do
desgraçado se aproximava do palco.
— O que mais você quer de mim? — Olhei para ele, o colar ainda
balançando no pescoço, ele não o tirou desde que o pendurou ali. — Eu já
falei tudo que sabia!
— Quer que eu seja sincero? — Mordeu o lábio inferior. — Não quero
assistir a você definhar.
— E por que não iria querer isso? Você me odeia tanto quanto te odeio.
— Semicerrei os olhos.
— Você vale a minha vingança. Não posso perder a oportunidade de
amassar a cara do seu pai, e é a minha melhor carta para isso. — Lá estava, a
razão principal. — Sei que já espremi tudo de você, mas continua sendo a
filha do delegado, e uma bela moeda de troca. — Inspirei fundo e olhei para a
pasta na minha mão, o nome de Meg, ao lado do meu, pronto para dar lugar
ao daquele infeliz.
— Por que todo mundo parece obedecer você nesse inferno?
— Nesse inferno e fora dele, e é o que eu espero de você também, já
que conseguiu pegar a arma de volta. — Seus braços cruzaram. — Não está
pensando em me atacar, está?
— O que você acha?
— Acho que precisa tentar, vadia, mas sabendo que vou foder com a
sua vida de um jeito ou de outro — pontuou, e virei o rosto para o lado.
Era o inferno que escolhi, não tinha como voltar atrás. Mas seria breve.
Pelo menos, eu esperava que terminasse logo. Saí de lá formando fogo a cada
passo que dava, mas, antes de desaparecer, sua voz alcançou meus ouvidos.
— Ah, e eu vi a planilha! — Olhei para a pasta, o ponto vermelho de
reuniões entre Meg e eu. — Já que seremos eu e você, passo na biblioteca
mais tarde?
A biblioteca estava uma zona. Mais especificamente, a minha parte da
mesa, para ser sincera.
Minha cabeça era uma confusão e eu ainda tinha Meg fazendo
perguntas.
— Aturou a Glenda a reunião inteira? — Ela apertou os olhos,
querendo rir.
— Por um milagre — respondi, tentando formular o pedido que iria
fazer a ela.
Eu precisava do carro e de cobertura, para sair furtivamente e ir até a
casa em que estive com meu pai. Não tinha certeza de nada, mas aquele era o
único lugar propenso a encontrar alguma coisa, visto que passamos dois dias
lá quando chegamos do Brooklyn.
— Eu imagino… — Percebi que suas mãos trabalhavam sem vontade
alguma, enquanto ela empilhava alguns livros no meio da biblioteca
movimentada, e constatei que aquela não era hora de pedir favores.
— Também tô mal por ter dado errado, Meg… E agora você vai ter que
fazer dupla com Benedete… — Meu suspiro soou pesado.
— Amiga, você tem Aaron como dupla. Estou no céu, se compararmos.
— Colocou alguns fios atrás da orelha. — Vi que ele te manteve por mais
tempo no auditório. O que houve?
— Pelo visto, o desgraçado sabe que não tenho nada a oferecer sobre o
paradeiro do meu pai.
— Finalmente!
— Depois de me torturar e quase me matar inúmeras vezes, é… mas
ele ainda quer me usar como moeda de troca ou qualquer outra coisa que
sirva como ponte para chegar ao delegado.
— Seu pai não falou com você desde aquele dia… — Disse, e olhei
para o meu celular. O número dele suspenso em uma aba invisível à qual só
eu tinha acesso. — Sei que pode ser para a segurança dele, mas e a sua? Ele
te mandou pra cá e é isso?
Se ela soubesse que desde o início o plano era que eu fosse uma espiã,
e nem eu mesma sabia disso, ficaria chocada.
— Não quero pensar no meu pai agora, Meg. Mas no meu problema
maior: Aaron Walker.
— O problema que escolheu quando decidiu voltar para cá.
— Esse mesmo. — Meg riu de mim e cruzou os braços.
— Você é uma incógnita, Brianna… não dá pra te entender, sabia? —
Esticou as mãos, pegou seus livros e começou a sair.
— Às vezes, nem eu mesma me entendo… — murmurei sozinha e
voltei a folhear meu livro.
A filha com o nome dele estava lá, dobrada entre as páginas, com os
poucos dados que eu tinha de sua vida, família e amigos. Embolei-a e a atirei
no lixo mais próximo.
Eu tinha coisas maiores para me preocupar do que ficar escrevendo
sobre cada filhote de bandido naquele lugar. Tudo que descobri sobre eles
estava embalado na minha cabeça, se necessário, eu saberia o momento exato
para usar.
Não demorou para que a familiar sensação de estar sendo observada
ressurgisse das cinzas.
Com certeza, era um dos capanguinhas do Alien, me vigiando.
Essa certeza se desvaneceu quando ergui os olhos e vi o próprio Aaron
passando pela porta, com os olhos em mim.
O lugar já poderia pegar fogo sozinho agora e todos achariam normal,
porque algo mais icônico acontecia: Aaron Walker estava entrando na
biblioteca.
Ele tinha um livro na mão. Algo novo, em uma case preta que não me
deixava saber sobre o que se tratava. Vi quando o acomodou na mesa, entre
os inúmeros outros que eu tinha espalhado ali.
Por incrível que parecesse, as pessoas falavam com ele, sorrindo. E, por
um momento, distraíram-no com bajulações, mas logo se voltou para mim.
Continuei em silêncio, sentindo seu olhar cortante. O ar ficava tenso a cada
minuto decorrido, e folhear aquela enciclopédia já não me livrava daquele
suor frio na espinha.
Puxei uma cadeira, um pouco distante dele, segurei o livro e comecei a
me sentar. As tábuas de madeira me pareceram ser mais macias que o normal,
e eu não quis acreditar no que aquele desgraçado fez quando me dei por mim.
Eu estava no colo dele.
— O que você…
— Quietinha. — Suas mãos apertaram a minha cintura, me forçando a
ficar lá, a sentir aquele volume todo tocando o exato lugar que eu sentia
esquentar.
— O que você quer com isso? — Minha pergunta saiu entredentes.
Estávamos sussurrando no meio da biblioteca.
— Eu só quero um pouco mais de proximidade.
— Vai ter proximidade com o…
— Shh… tem alunos exemplares estudando aqui, ratinha, seja uma boa
menina. — Ele me fez virar para si com uma facilidade que me deixou
perplexa. Sua boca estava estrategicamente perto da minha nos próximos
instantes.
— Sua nova jogada é tentar me seduzir para conseguir o que quer?
— Você tem o que quero?
— Sabe que não, seu desgraçado — sussurrei, apertando os olhos, e ele
riu.
— Estive me perguntando o que você estaria fazendo aqui, por que
voltou… — segredou, olhando para mim enquanto brincava com uma mecha
do meu cabelo.
— Talvez eu só queira uma vida normal, estudar e morar num lugar
fixo.
— Mesmo que eu more a poucos passos de você? — Seus dedos
colocaram um pouco do meu cabelo atrás da orelha e ele aproximou o rosto,
me deixando hipnotizada. — Eu pediria uma prova de que está aqui porque
quer. — Olhou nos meus olhos, seus lábios se entreabrindo devagar a cada
palavra levaram os meus a fazer o mesmo. — Mas não confio tanto assim em
você. — Me desviei de sua boca, e percebi os olhos desafiadores. — Sei que
está escondendo coisas, e vou descobrir. Tudo. — Puxei o ar quando o vi
jogar a cabeça para trás e vir com tudo contra a minha testa.
O baque me fez perder os sentidos e amoleci de forma instantânea,
caindo em seus braços enquanto me segurava com força.
— Shh… tudo bem. Pode dormir no meu ombro… eu deixo.
Senti sua respiração leve no meu pescoço e deixei escapar um sorriso.
Minhas mãos apalparam sua calça e puxei o telefone do bolso de trás. Passei
Brianna do meu colo para a cadeira e acomodei a cabeça dela sobre a mesa.
Os fios de cabelo caíram pela madeira maciça, e eu podia ver seu rosto na
minha direção.
É adorável quando não fala, ratinha.
Sua mão pequena à mercê da minha curiosidade e desconfiança, tinha o
dedo indicador deslizando sobre o leitor de impressão digital segundos
depois. A tela acendeu e eu tinha seu baú secreto, aberto bem diante dos
meus olhos.
Em tudo havia astronomia, e isso ia desde nebulosas no papel de parede
a icons personalizados organizados por tons de azul e violeta com planetas
flutuantes sobre a tela. O telefone era literalmente uma galáxia ambulante.
Fez um santuário para mim?
O ícone da galeria de fotos brilhou em meus olhos primeiro e segui
para lá. Uma pasta com um emoji de pêssego me chamou a atenção mais do
que qualquer coisa naquela seção e eu não pude medir o tamanho da minha
perplexidade quando vi o que ela guardava lá.
Imagens de seu corpo seminu.
No subtítulo do álbum, algo como "moda praiana" — ou fosse lá qual
fosse a merda que tinha a ver com praia — reluzia.
Empurrei a sequência de imagens olhando uma a uma só para ter
certeza de que ela não guardava nada ali — nunca se sabe —, mas parei
quando cheguei em um conjunto vermelho.
Meus dedos descobriram o zoom.
A porra do tecido fino que marcava os mamilos da vadia e a fenda no
meio da calcinha me fez abrir um pouco mais as pernas e passar os dedos
pelo cabelo, suando frio como um animal no período de acasalamento.
Soltei o ar quente pelas narinas e fechei todo o aplicativo. Bastava de
fotos. Eu não tinha tempo para ficar duro.
Percorri rapidamente as mensagens, tentando encontrar algo que
justificasse sua presença ali, algo que explicasse por que diabos ela voltou, ou
talvez uma conversa com o porco, para que eu pudesse rastrear.
Perdi tempo na conversa com uma garota. Mavi. Pelo visto, eram
amigas íntimas e moravam distante uma da outra. Só falavam sobre a ratinha,
seu gosto duvidoso para homens — coisa que me pareceu interessante — e
trocavam sugestões sobre qual roupa usar para ir a algum lugar —
mulheres… Ela tinha umas cinquenta mensagens não respondidas daquela
garota, e a julgar pelas últimas, em caixa alta, era uma amizade a menos.
Logo em seguida, fui bombardeado por grupos disciplinares da
universidade e grupos de leitura de livrinho de romance.
— Isso é romance? — Enruguei a testa para uma capa com serpentes,
sangue e rosas vermelhas. As figuras que elas mandavam ali beiravam ao
insano. — Você tem um gosto duvidoso para literatura também, docinho. Seu
pai sabe sobre seus livros de histórias para dormir?
No entanto, não demorou muito para encontrar algumas outras
mensagens. Eram caras da universidade, de outras gangues. Meus olhos
quiseram latejar.
Onde diabos conseguiram o número dela?
Mais mensagens começaram a surgir, como se estivessem zombando da
minha paciência. Não sabiam ao menos abordar uma garota. Era uma pior
que a outra.
Peguei o meu telefone no bolso e registrei todos os números. Depois,
selecionei as conversas iniciadas nos últimos trinta dias e exclui
absolutamente tudo.
Aqueles imbecis eram um risco aos meus planos. Ninguém chegaria
perto da vadia quando valia tanto para mim.
Assim que a limpeza foi concluída, uma aba suspensa pulsou sob meus
olhos, alegando ser impossível excluir, e sem paciência joguei o telefone de
lado.
Brandon apareceu em frente à biblioteca no momento ideal, caminhei
até ele. Pela sua cara, eu não aparentava algo agradável com a minha.
— Encontrou alguma coisa? Vai matar quem? — perguntou, seguindo
os meus passos.
— Esquece o telefone. — Meu resmungo saiu pelas narinas.
— Como assim esquece o telefone, cara?
— Temos que pegar uns caras.
Acordei em um sobressalto.
Meu coração estava acelerado e buscava ar para os pulmões com
dificuldade, sob a exigência das pontadas que tomavam minha cabeça
dolorida. Eu estava sozinha na biblioteca, que tinha poucas luzes acesas,
pronta para fechar.
Aaron!
O nome dele foi a única coisa que reverberou na minha mente.
Ainda desnorteada, avistei o meu celular um pouco distante. Agarrei-o
e o trouxe até mim. Com certeza Meg estava pirando com o meu sumiço,
eram quase onze da noite.
Precisava ver as mensagens.
Abri o aplicativo e fiquei por exatos cinco minutos ali, inerte, me
perguntando: quais mensagens? Tinha porra nenhuma lá.
Indignada, saí da biblioteca e me arrastei para fora do pavilhão,
seguindo o caminho iluminado pelas luzes fracas do campus. O vento frio da
noite cortava minha pele enquanto caminhava em direção ao alojamento.
— Ainda não acredito que ele me fez apagar e fuçou meu telefone! —
reclamei sozinha, querendo rir da minha surpresa.
Era o Alien. O que deveria esperar?
Meu aplicativo de mensagens podia estar zerado. Mas eu ainda estava
aliviada pelo fato dele não ter tido acesso à principal. Suspensa na tela, em
modo invisível e que só eu sabia como abrir, com uma senha segura especial.
Estava em vantagem. Pelo menos, por enquanto.
Depois daquilo, a urgência em adiantar a minha busca por respostas
não parava de apitar. Não podia mais perder tempo.
Ao entrar em nosso quarto, fui direto ao ponto.
— Meg, preciso da chave do seu carro. — Abri a gaveta da minha
cômoda e peguei a chave que roubei do Aaron e a minha arma. — Eu... tenho
que fazer algo. Algo importante. — Coloquei tudo em uma bolsa, sob o olhar
desconfiado dela.
— Garota, onde se enfiou? E que merda é essa que você tirou da gaveta
e colocou na mochila? Uma arma? — balbuciou.
— É uma proteção — falei, e ela ainda pareceu ficar abalada. — Sou
filha de delegado, Meg. Sei o que estou fazendo. — Suspirei. — Me empresta
o carro? — A garota de cabelos curtos franziu ainda mais o cenho. Estalei a
língua com as mãos nos bolsos de trás da calça. — Juro que não é nada ilegal
— implorei, sentindo a urgência em minhas palavras. — Só preciso ir a um
lugar, verificar algo. É relacionado ao meu pai, Meg.
Ela hesitou por um momento, antes de suspirar e pegar as chaves do
carro na mesa ao lado da cama.
— Troquei os pneus a menos de um mês…
— Entendi, obrigada! — Mal a ouvi e saí do quarto, dirigindo-me ao
estacionamento. A noite estava cada vez mais fria, mas a determinação me
aquecia por dentro.
A cada passo que dava até o carro, o rosto de Aaron piscava em minha
mente. O infeliz não queria aproximação, não estava me dando trégua, nunca
me daria. Ele estava diversificando as estratégias.
Até então, sua insistência não conseguiu nada de mim, e isso me era
como alívio e lembrete de que precisava ser mais esperta do que ele.
— "Bom dia, gata. Vi você no refeitório mais cedo, te achei
interessante" — vociferei, apertando o pescoço de Karl Deep. O terceiro que
eu esmurrava nos fundos do campus. — Onde conseguiu o número dela?
— Quando soube que ela era assunto seu, parei de mandar mensagens,
cara, juro! — Tentou se esquivar.
— Perguntei onde conseguiu a porra do número! — Amassei a cara do
imbecil.
— A amiga dela! — Me deu o nome de Megan. — Pedi quando a vi
com a ficha da caloura, antes das aulas começarem.
— E como os outros conseguiram? Todos eles disseram que alguém
mandou num grupo.
— Eu repassei. — Ergueu as mãos, tentando se livrar de mais das
minhas investidas, mas ultrapassei a barreira. — Não achei que você ficaria
bolado por causa de um papo, cara. Ninguém pegou a mina. Ela ignora geral
— falou com dificuldade, e meus olhos flamejaram.
— Acha que sinto ciúmes? — Apertei os dentes. — Aquela rata é a
minha isca. Ninguém chega perto das minhas iscas.
— Não vou. Nunca mais. — Suplicou.
— Acho bom. — Dei um último golpe e ele ficou no chão.
Enquanto puxava as ataduras das minhas mãos para o lugar, Brandon
acenou na direção de uma sombra que se aproximava.
Era Luke, o cara que deixei na cola da Abernathy.
— Sua garota tá saindo de carro. — Já chegou falando e com os olhos
no quase morto atrás de mim. — Deixa eu adivinhar, esse aí respirou perto
dela — falou e o encarei com o maxilar cerrado.
— Pra onde ela está indo? — Me olhou com cautela.
— Não sei. Só vi e achei melhor vir avisar… — Passei por ele, sendo
seguido por Brandon. — E esse cara? O que faço com ele? — perguntou.
— Deixa aí ou ateia fogo. — Dei meu último murmúrio.
— Sério? Mas ele ainda tá vivo.
— Leva pro alojamento, porra. — Brandon desenhou para o burro e
seguimos até o estacionamento com os olhos atentos.
Ainda conseguia ouvir o motor pesado se distanciando da universidade.
Entrei no carro sozinho e fechei a porta. Pela janela, Brandon assistiu quando
girei a chave.
— Ela acabou de cortar a avenida. Quer reforço?
— Não. — Puxei a marcha e segurei o volante. — Vou sozinho. — Ele
bateu na traseira, antes dos meus pneus girarem pelo asfalto.
A perseguição se deu à distância. Ela não poderia me ver, então
priorizei isso.
Minha atenção estava nela enquanto estacionava debaixo de uma
árvore, à beira da rua iluminada, o motor do carro ainda ronronando. Esperei
alguns segundos antes de me aproximar, movendo os pneus como uma
sombra.
Esfreguei o rosto com o dorso da mão. Suor e sangue da luta pareciam
ter grudado na minha pele. Eu estaria batendo em mais uns dois dos que
tentaram contato com ela, se não tivesse sabido que saiu às pressas, no meio
da noite.
A máscara estava em meu rosto em segundos. Ajustei os olhos olhando
no retrovisor, antes de abrir a porta.
Minhas intenções eram claras: eu a seguiria até descobrir o que estava
planejando.
Desconfiança voltou a piscar em meu cérebro quando a vi na porta da
frente de um lugar imponente. Aquela, provavelmente, era a casa do porco
Abernathy, e se eu estivesse certo, ela poderia estar me levando até o próprio,
ou a pistas sobre ele.
Segui até lá a pé e dei passos silenciosos em sua direção. Brianna não
percebeu minha presença até que a agarrei pelo braço, girando-a para mim.
— Oi de novo. — Meu sussurro foi seguido do vislumbre de suas
pupilas diminuindo e se dilatando, quando me reconheceu.
— Me larga! — gritou.
Ela era rápida, esperta. Mas não tão forte quanto eu. Segurei meu cinto
e destruí a fivela com uma única mão, trouxe até seus pulsos e os amarrei sob
aquele olhar enraivecido. Segurei-lhe o rosto, erguendo uma arma diante de
seus olhos.
— O que você está fazendo aqui? — silabei, minha voz carregada de
raiva contida.
— Só vim pegar algumas coisas. — Pareceu ser uma desculpa fajuta.
— Então nós vamos pegar suas coisas juntos, que tal? — Fiz sinal de
silêncio e abri caminho para que ela tivesse acesso à porta.
Depois que a abriu, empurrei-a para dentro da casa, mantendo minha
arma apontada para ela. Cada passo que dávamos dentro da escuridão o vazio
ecoava.
Fiquei em alerta máximo, pronto para agir a qualquer sinal de perigo,
mas à medida que explorávamos os cômodos marrons e sem vida, ficou claro
que não encontraríamos nada além de móveis vazios ali. O lugar estava
silencioso como um túmulo, exceto pelo som distante de carros na estrada lá
fora.
Paramos na porta do que parecia ser o quarto dela, e soltei um suspiro
frustrado.
— O que quer de mim? — insistiu naquela pergunta idiota. — Já falei
que não tenho nada para você.
— Que tal começar respondendo por que voltou? Não acha melhor
admitir que sentiu saudades?
— Aonde está querendo chegar? — Arqueou as sobrancelhas. — Acha
que voltei por sua causa?
— Estamos falando da mesma garota com problemas de escolha dos
interesses amorosos?
— Então, antes de ser um completo maluco e apagar todas as minhas
mensagens, você as leu? — Seus olhos arregalaram. — É claro que as leu…
— Sorri por baixo da máscara e pareceu saber exatamente o que mais eu
tinha visto. — Você também viu as… — O queixo caiu devagar.
— Gostei do conjunto vermelho. Deu para ver que a sua bocetinha tem
carne.
— Idiota! Imbecil! — Ela se contorceu de raiva e a empurrei para
dentro do quarto.
Sua pequena corrida parou perto da mesinha vazia ao lado da cama
meio empoeirada, e ela levantou as mãos atadas.
— Me solta!
— Pra tentar me bater? Acho que não. Odeio cócegas.
— Não sei se percebeu, mas não tem ninguém aqui. A casa está vazia e
só vim pegar alguns objetos pessoais! — Bateu o pé no chão como uma
mimadinha do caralho, depois de jogar a bolsa com dificuldade em cima da
cabeceira da cama.
— E o que você quer levar, hum? — Circulei pelo lugar e comecei
abrir portas e gavetas de um grande guarda-roupas de madeira. Tudo vazio.
— O que pensa que está fazendo?
— Vou te ajudar, ratinha, mas não acho que tenha pertences por aqui.
— Me aproximei de uma caixa à parte, feita de palha trançada e com alguns
laços.
— Não abre ess… — Abri. Ela fechou os olhos, suspirando.
Tinha um vibrador no meio de algumas revistas e papéis coloridos.
Aquilo me arrancou um riso sincero. Mordi os lábios e ergui uma
sobrancelha junto à máscara. Pude sentir sua tensão quando meu dedo tocou
o botão do dispositivo e ele começou a vibrar.
Segui até ela, encostada na parede, com as mãos atadas e o rosto de
lado, vergonhosa.
— Pelo visto, encontrei o que você veio buscar...
— Desliga isso!
Me aproximei, puxei-a pela cintura e pressionei o botão outra vez, a
velocidade do dispositivo aumentou, me fazendo curvar os cantos da boca
para baixo em surpresa.
— Aguenta isso tudo, ratinha?
— O que você acha? — Me desafiou. Ela borbulhava de raiva.
— Acho que não. — Olhei para o vibrador pulsando entre meus dedos.
— Em quem você pensa quando enfia um desses entre as pernas, hum?
— Pode ter certeza de que não é em alguém como você.
— E se o usar olhando para mim? — Seus olhos se arregalaram. — Vai
pensar em quem? — Pressionei o botão de novo, o vibrador passou a pulsar.
Captei seu suspiro contido. A pele dela tremia, suas pernas se apertavam uma
na outra. — Está se contorcendo por quê, vadia? — Deixei meu aperto em
sua cintura um pouco mais forte.
— Você está me excitando, caralho!
— Com isso aqui? — Ergui o aparelho. — Está derretendo por causa
dessa merda que vibra? — Apertei seu corpo contra a parede, meus lábios
alcançaram seu ouvido. — Tenho algo muito maior e melhor para você. —
Me afastei, depois de sorrir contra sua pele.
Brianna trouxe o rosto para perto do meu com as sobrancelhas
franzidas e dentes cerrados. Seu movimento rápido levou a cabeça para trás e
ela voltou com o rosto na direção do meu.
Uma tentativa de fazer o que fiz na biblioteca. Uma falha que a deixou
com a boca sangrando. Seu gemido me fez molhar os lábios, vi quando
apertou os olhos lacrimejando com o queixo trêmulo.
— Oh… você está sangrando, ratinha. — Segurei o rosto dela, sentindo
que respirava pesado. Um filete vermelho escorria pelo canto da boca, me
chamando para mais perto, fazendo com que a ponta do meu nariz roçasse em
sua bochecha.
Coloquei a língua para fora e lambi devagar, subindo do queixo ao
canto do lábio contornado por um tom marrom, sentindo aqueles olhos
arregalados se fechando junto a um suspiro instável. O gosto metálico parecia
doce na minha língua, me fazia querer a engolir inteira, chupar cada cantinho
enquanto ouvia seus xingamentos, sentia suas unhas arranharem minha pele
em súplica, com certeza por mais.
Me afastei devagar, dando alguns centímetros para que respirasse.
Meus olhos estudaram o modo como sugou o lábio machucado, em uma
tentativa de me manter longe dali.
— Odeio você. Com todas as minhas forças — sussurrou, colocando
toda sua atenção em mim.
— Já me odiava antes, então nada mudou — murmurei em resposta.
— A diferença é que vou ter mais um motivo para isso.
— Qual motivo?
Não respondeu. Apenas juntou a boca com a minha.
Puxei-a para mim, apertando levemente a parte sensível com os dentes.
Ela gemeu tão gostoso que pareceu ter sido tudo que precisava para sentir as
veias bombearem mais sangue pelo meu corpo.
— Sabia que era isso que você queria. Só não estava sabendo pedir. —
Atirei o vibrador para o lado e a puxei para cima.
Suas pernas entrelaçaram a minha cintura e as mãos atadas laçaram
meu pescoço. Pressionei as costas dela contra a parede, me alimentando
daquela boca pequena, suguei sua energia e chupei a língua macia, os lábios
carnudos.
Uma parte da minha cabeça dizia que seguir adiante poderia me trazer
problemas, mas a outra parte era uma filha da puta que fazia parecer ser certo,
de algum modo. Como se, no fundo, fosse aquilo que eu queria.
E eu queria. Percebi que queria pra caralho.
— Sua boca é tão gostosa quanto parece ser — sussurrei e ela sorriu
pela primeira vez, me encarando.
Algo passageiro, um erro visível que não conseguiu conter. Parei com
os olhos ali e segurei seu rosto, assistindo a ele desvanecer enquanto me
olhava ofegante.
Seu sorriso me deixava submerso em ira e atração ao mesmo tempo.
Era bom e ruim. Eu queria morder e beijar ao mesmo tempo.
— Deus, acho que estou ficando louca. Era você quem deveria estar
estonteado depois da pancada, não eu. — Ri da fala.
— Quando vai perceber que não pode me atingir? — Brinquei com
seus lábios enquanto falava. — Sou eu quem brinca, castiga, maltrata e
mantém você respirando, ofegante, sem ar… escolho, faço seu corpo reagir,
tiro o melhor de você como um ladrão, um impostor, o vilão da sua historinha
sem graça. Faço o que quero, sabe disso. — Apertei a polpa da bunda com
uma das mãos e ela enrijeceu. — E quero foder você, ratinha. Agora.
Aquelas palavras reverberam pelo lugar e pelos meus ossos. Cada
célula em meu corpo clamava por ele, almejava se entregar.
Eu queria fazer aquela loucura. Quis desde as primeiras provocações.
Era como se, no fundo, ele fosse o que sempre procurei. A adrenalina que eu
precisava, o prazer inumano que bombeava mais sangue pelas veias. Me fazia
mal na maior parte do tempo, mas me sentia viva de alguma forma. Atenta.
Era como uma droga que entregava perigo e prazer inigualáveis, simultâneos.
Já sentia a ereção roçar minha coxa, olhos nos olhos, nossas pupilas
pareciam valsar em uma dança infernal e proibida. Meus lábios estavam
trêmulos, seios que subiam e desciam roçando aquele peitoral tatuado de
forma impiedosa, o suficiente para enrijecer meus mamilos.
Ele ergueu uma das mãos e envolveu meus punhos, mantendo-os para
cima. Sua outra mão me segurou ao redor da cintura. Ele estava sussurrando
em minha orelha no segundo instante.
— É isso que quer? — Sem respostas. Meu corpo gritava por si só,
mas, mesmo percebendo, ele insistia em perguntar. Seus músculos me
pressionaram com um pouco mais de força contra a parede, o gemido que
deixei escapar o fez mordiscar meu lóbulo. — Quer mesmo que eu acabe
com você? Quero ouvir da sua boca… — sussurrou.
Era óbvio que ele queria me ouvir falar aquilo em voz alta, seu ego era
grande demais para apenas me ler o corpo, Aaron queria ganhar em tudo, e,
naquele momento, eu estava disposta a lhe entregar os troféus.
Cerrei os dentes, a respiração já ofegante começou a ganhar mais ritmo.
Senti o aperto de sua mão livre em minha coxa, me fazendo encaixar
perfeitamente em cima do pau ereto, me dando estímulo para falar mais
rápido.
— Sim… — Escapou de forma trêmula, como uma súplica. Ele se
afastou da minha orelha e colocou o rosto a centímetros do meu.
— Não ouvi…
— Me fode, Alien. — Fechei os olhos, cada mínimo movimento me
fazia sentir o quão dura era sua ereção. Não suportei segurar a vontade de me
esfregar ali.
Mesmo que ele usasse a calça grossa do fardamento da fraternidade,
pude sentir seu tamanho e formato por cima da minha calcinha. A saia do
uniforme da irmandade contribuiu, levantando com o movimento.
Agora, ele tinha as duas mãos na minha bunda e, concentrado,
empurrava para cima o tecido branco da saia e a minha cintura para baixo,
fazendo-me sentir melhor, perceber que crescia e ficava ainda mais duro a
cada segundo.
Olhei para ele, sua boca entreaberta junto da expressão séria, meio
surpresa, era impagável e me tirava o pouco fôlego. Não demorou para que
me encarasse de volta, como quem tinha fome, sede e tudo que houvesse
necessidade de ser sanado na hora, não com uma mordida, uma chupada, uma
faísca; ele queria tudo que eu poderia oferecer, e me vi disposta a entregar.
Ele levou os lábios aos meus, devagar, atiçando. Fechei os olhos e,
quando me aproximei, recuou. Fez isso mais uma vez, e outra. Na quarta ação
de castigo, minha pelve queimava e meus lábios formigavam, sedentos.
Aaron parecia saber controlar muito bem a vontade, mas eu? Eu o
morderia se conseguisse alcançar.
— Está jogando comigo? — sussurrei a pergunta entredentes e abri os
olhos.
— Com raiva porque não alcança a minha boca? — Permiti que minhas
pupilas explorassem cada canto daquele rosto esculpido enquanto ele me
espremia contra a parede. — Só estou procurando ter certeza de que você
quer tanto quanto eu. — Puxou as alças da minha blusa para baixo usando
apenas os dentes. — Mas não se preocupe, ratinha vou te dar o que deseja —
falou, colocando a língua em meu mamilo.
A sensação gelada e persistente me fez arquear a coluna. Seus lábios
seguiram mesclando de um a outro, envolvendo-os e os sugando tão forte que
salpicava arrepios por toda a minha pele.
Aaron mordiscou levemente um deles e um gemido mais alto escapou
da minha garganta.
— Começo a ter certeza de que cada canto do seu corpo é delicioso. —
Ele juntou os dedos em um dos mamilos sensíveis e o apertou, me fazendo
lacrimejar. — Mas, para isso, preciso provar.
Ele me girou tão rápido que meus cabelos derrubaram a bolsa na
cabeceira da cama e todos os objetos se espalharam por ali. Meu corpo pulou
sobre o colchão e só parou quando o peso dele caiu sobre mim. Era um
homem de quase dois metros de altura, que me mantinha debaixo de si como
se eu fosse nada.
Seu corpo me empurrou um pouco para cima e mantive as mãos atadas
na cabeceira. Com a saia embolada na cintura, ele me fez abrir as pernas para
lhe dar a visão que almejava.
— Vamos ver como está aqui embaixo? — Os dedos grandes passaram
pelo tecido da calcinha e, quando achei que a arrancaria, recebi um tapa forte
ali. Foi como uma descarga elétrica. Diante da minha contorção, suas mãos
me seguraram pelas pernas com força. — Vai ser pior quando for o meu pau,
ratinha. — Mais um tapa e gemi, tremendo. — Isso, geme pra mim, vadia. —
Outro golpe e senti minha boceta encharcada por baixo do tecido. Meus
choramingos tiraram um meio sorriso dele. — Boa menina — soprou,
lambendo os lábios devagar e a atenção voltou para as minhas pernas.
Finalmente puxou o elastano, pude sentir o ar frio acariciar aquela parte
quente e molhada, que latejava devido aos tapas. Olhei para ele, percebendo
que apreciava a vista sem ao menos piscar. Meu rosto pareceu pegar fogo e,
em segundos, seus olhos miraram os meus. Desviei, minhas pernas se
fechando ligeiramente, mas suas mãos me apertaram as coxas e as puseram
de volta ao lugar, completamente abertas, à mercê de suas vontades.
Aaron segurou as extremidades das duas alças e rasgou a calcinha no
meu corpo. Segurei a respiração quando ouvi o tecido, sendo destruído e
jogado no chão.
— Hum… caralho, se pudesse ver… — Ele aproximou o rosto das
minhas pernas, passando a ponta do nariz ali. — Me dê suas mãos —
ordenou em um murmúrio e abaixei os braços para vê-lo separar dois dos
meus dedos, o olhar predatório me fez vacilar. — Coloca o dedinho aqui. —
Levou minha mão até lá querendo provar que eu estava molhada pra caralho.
— Enfia o dedo lá dentro — falou, e me vi seguindo sua ordem. Deslizei com
facilidade as pontas dos dedos sob sua supervisão e logo percebi que não
estava satisfeito. — Você não usa vibradores, vadia? Enfia mais fundo. —
Empurrei para dentro com mais força por pura raiva, meu corpo vibrou
pedindo menos e puxei de volta. — Agora, chupa o dedinho — completou
com a voz rouca e os olhos acesos. Coloquei o dedo entre os lábios, sentindo
o gosto salgado. — Mais uma vez. — Repeti o ato enquanto tiravaei os dedos
molhados de lá, sua mão forte me impediu de chupar. — Dá aqui pra mim. —
Colocou-os na língua, seus lábios os envolveram e meu corpo inteiro tremeu
quando o vi fechar os olhos.
Logo foi a vez dele usar os seus, em círculos, massageando a minha
entrada. Seu rosto se inclinou ao meu e, quando alcançou os meus olhos,
senti os três dedos sem piedade.
— É assim que você merece. — Apertei o braço dele e liberei um
gemido trêmulo. Quando os tirou dali, minha boceta pingava sob seu
estímulo. — Está do jeito que eu gosto. — O sussurro enviou incontáveis
arrepios pela minha espinha. — Abra as pernas. — Obedeci, como a boa
menina que era, e quase lacrimejei quando senti seus lábios lá embaixo. Eram
gelados e precisos.
Me fez revirar e balançar o corpo sob o poder de sua língua e beijos
naquela parte sensível. A respiração quente cobria meu clitóris e seus dedos
me abriam para que explorasse mais, intercalando entre chupar e mordiscar.
Sua língua aumentou a velocidade e ofeguei feito uma condenada. Era
impossível conter os gemidos, manter as unhas longe da cabeceira da cama
ou sentir o lençol embolar sob meu corpo completamente molhado. A
sensação de que a barriga flutuava estava lá, e minha boceta latejava dentro
de sua boca.
Mesmo que tentasse fechar as pernas, ele me mantinha parada, fazia
com que meu corpo sentisse todo aquele prazer de uma só vez, e murmurava
coisas ali embaixo.
— O seu gosto é tão bom, vadia… — Puxou minha pele com os dentes
e passou a língua em seguida. — Eu a chuparia a noite inteira. — O modo
como sugou meu clitóris me induziu a arquear sobre a cama. Quando achei
que iria gozar, ele se ergueu passando a língua pelos lábios. Seu sorriso era
de outro mundo e, com os olhos nos meus, segurou o pau, massageando-o
entre os dedos.
Aaron fez a glande passear por toda a extensão lubrificada, pincelando
devagar, espelhando o molhado entre nós. Suas mãos separaram ainda mais
as minhas pernas e usando apenas a ereção dura, passou a subir e descer
friccionando, esfregando-se em mim. Massacrou minha boceta, me fazendo
ver toda aquela cena. Quando mirou a entrada, comecei a tremer.
— Você não vai usar…
— Acha mesmo que eu vou te foder com camisinha? — perguntou,
sorrindo. — Quero sentir cada parte dessa sua bocetinha molhada e te fazer
conhecer a sensação da minha porra quente forrar o seu útero. Então peça. —
Seu dedo tocou em minha boca. — Peça como a puta que você é. — Tentei
mordê-lo, mas ele o tirou e me roubou um beijo. — Delícia.
Ergui o rosto para continuar com sua boca na minha, mas se afastou.
— Quantas vezes precisa ouvir? — sussurrei.
— O necessário para que me lembre de você como uma putinha
implorando pelo meu pau nessa sua boceta. — Aumentou a fricção e eu
revirei os olhos.
— Por fav… — Ele entrou com tudo, me fazendo engasgar no final da
frase.
— Vadia do caralho! Vou te dar o que você quer. — O pau me
preenchia e esvaziava freneticamente, levando ar, batendo forte na pele e
reverberando como palmas molhadas. Quando ele empurrava para dentro, eu
o sentia deslizar em mim e alcançar o ponto certo.
Aaron cravou os dentes em meu ombro e fez a cama balançar debaixo
de nossos corpos. Cada estocada era complementada por um de seus urros e
meus gemidos cantarolados ao fundo.
Eu estava quase delirando quando, com as mãos atadas, cravei as unhas
em algo gelado na cabeceira.
Meu celular. Ele tinha escorregado da bolsa junto das outras coisas.
Minha mente lutava para me fazer pensar, mas toda vez que aquele
filho da mãe metia em mim, tudo virava uma bagunça.
Ele diminuiu o ritmo, mexendo o quadril devagar e beijando meu
pescoço. Com os olhos revirando, tentei repassar o que fui fazer ali e o fato
de que precisava ficar sozinha naquela casa. Talvez, eu não tivesse outra
chance, então tinha que fazer algo.
Lutando contra aquela sensação de prazer que me fazia querer gritar,
tentei calcular como tocaria a tecla digital de chamada de emergência que
deixei programada no meu telefone, por precaução. Ela enviaria uma
mensagem à unidade policial mais próxima com a minha localização. Com os
dedos tremendo e sem conseguir enxergar a tela do telefone, senti a vibração
de confirmação. Funcionou.
— Abra essa bocetinha apertada, ratinha. Eu quero tudo. — Ele sorriu
contra o meu pescoço, fazendo a voz reverberar pela minha carne trêmula,
penetrar minhas veias como mel quente.
— Oh… Aaron… — O nome escapou com uma súplica.
— Sim, Brianna… — Ele aumentou a velocidade outra vez e meu
corpo inteiro começou a amolecer mais depressa.
Seus rugidos no meu ouvido arrancaram minha pouca sobriedade, meus
dedos vacilaram e o telefone escapou caindo no chão.
Sem parar os movimentos, ele olhou na direção do ruído e eu o segui.
Na tela, a imagem de confirmação de mensagem entregue brilhava e,
instantaneamente, sirenes surgiram em um raio de poucos quilômetros.
Aquele homem virou o rosto para mim com os olhos escurecendo.
— Surpresa… — Foi o que consegui sussurrar recebendo suas
investidas.
— Vadia! — grunhiu e sua pelve me acertou em cheio. Senti os
testículos baterem forte contra mim, minha boceta engoliu seu pau por inteiro
e ele começou a se movimentar mais rápido, com uma força desumana.
— Aaron! — gritei, sentindo que ele acabaria comigo.
Uma de suas mãos juntou meus cabelos com força e a outra envolveu
meu pescoço. Seus lábios pressionaram contra os meus e ele grunhiu, rouco:
— Vou acabar com a sua raça! — A intensidade me fez afundar no
colchão. Meus gemidos eram cortados pela maneira impiedosa com que ele
me fodia e se misturavam ao aumento do som das viaturas.
Cravei as unhas em suas costas, soltando um riso de quase morte, mas
eu morreria satisfeita. Aquele prazer me tomava de uma forma inimaginável,
meu único desejo era que o Alien tomasse tudo de mim, descontasse aquela
raiva daquele jeito, que acabasse comigo.
— Só saio daqui depois de deixar essa sua bocetinha cheia de porra,
para aprender! — Bateu com mais força e gritei. Minhas pernas estavam
molhadas. Senti que seu pau crescia ainda mais dentro de mim, pulsando
enquanto batia lá dentro, escorregadio e grande, e alcançando uma parte
dentro de mim que nunca soube que existia, que me fazia salivar, ficar tonta.
Meu clitóris latejou, uma dor prazerosa e fina na vagina me fez
contorcer, abrir mais as pernas e me empurrar contra ele. Perdi a noção de
espaço e tempo, já não enxergava nada além de seus músculos, seus olhos, o
tamanho daquele homem e o quão forte ele se fazia em cima de mim. Senti a
barriga flutuar, os bicos dos meus seios balançando esquentavam, as pontas
dos pés enrijeceram e eu parecia entrar em um colapso iminente de tanto
prazer.
— Eu acho que vou…— Apertei os olhos quando Aaron mordeu meu
ombro com mais força, e continuou metendo em mim como um selvagem.
Não consegui segurar e gozei. Era como se tentasse expulsar ele de dentro,
mas o teimoso permanecia e pulsava, me fazendo ter espasmos de tão
deliciosa que era a sensação. Esguichei ainda mais forte quando senti que ele
gozava também em uma última estocada, forte e bruta, que me fez sentir a
porra quente se espalhar por minha carne e escorrer quando ele deslizou para
fora.
As sirenes só não eram mais altas que nossas respirações quando se
aproximou do meu rosto com aquela ereção ainda pulsando, gozando, e
salpicou seu gozo em minha pele suada.
Satisfeito por ter deixado minha boceta escorrendo e meu rosto sujo,
ele empurrou a glande inchada na minha boca.
— Engole o que sobrou do seu leite, vadia. Engole tudo. — Uma gota
generosa ganhava impulso escorrendo pela cabeça rosada. Sua outra mão
apertou minhas bochechas e não resisti.
Abri os lábios e deixei que entrasse, com meu corpo completamente
anestesiado por espasmos, quebrei a dormência do paladar ao sentir seu gosto
salgado. Chupei com os olhos fechados, ouvindo-o suspirar, antes de arrancar
dos meus lábios.
Vi quando puxou a calça para cima sem tempo a perder além do que
usou para me encarar da porta, ofegante, suado e estonteante, me deixando
ali, jogada, com as pernas bambas, sem ar.
Seu último olhar era uma mistura de tudo que ele podia me oferecer
junto a algo que nunca tinha visto antes. Algo novo.
Mas eu não tinha tempo para descobrir do que se tratava, não tinha
tempo para ficar perplexa comigo mesma, me dar um soco no meio da cara
ou gritar feito louca pela casa. Ele estava saindo e a polícia estava chegando.
Me sequei como consegui e ajustei a roupa, saindo do quarto e
segurando pelas paredes. Já não havia sinal do Alien, mas pude ouvir o ronco
de seu motor em algum lugar daquele bairro quando me aproximei da porta e
a abri, antes mesmo de baterem.
— Peço mil desculpas, houve um mal-entendido. — O policial de
Manhattan me encarou por alguns segundos com a sobrancelha arqueada.
Juntei as pernas que ainda tremiam completamente úmidas e me segurei na
porta sem forças. Um sorriso instável surgiu em meu rosto. — Eu estou bem
e estou sozinha.
Fechei a porta do banheiro no quarto do alojamento, pela segunda vez
no dia. Me sentei no chão, abri meu notebook e puxei a folha na qual anotei
os e-mails do meu pai. Foi tudo que eu tinha encontrado em casa, na noite
anterior, em um computador velho que ele deixou para trás.
Com certeza, algum dentre eles estava ativo. Mesmo escondido, o
Delegado Abernathy estava trabalhando, isso era certo, mas tão certo quanto
isso era o fato de que ele não trataria de assuntos investigatórios importantes
por e-mail. Mesmo assim, queria tentar.
Era aquilo que eu passava a maior parte do tempo fazendo:
investigando, dando ouvidos à minha válvula de escape daquelas lembranças
frescas.
Quando não se quer pensar tanto num erro, tentamos nos esquecer
dele, certo?
O que aconteceu entre mim e Aaron, naquele lugar, foi o pior que
poderia ter acontecido, pior do que um erro, mas eu estava trabalhando duro
para me esquecer, já que parecia ser quase impossível.
Segurei a cabeça por mais um minuto. Os pensamentos ainda estavam
lá, me fazendo remover o fato de que gostei, me entreguei. Nem tudo fez
parte do plano. Sequer pensei em um plano, inicialmente. Chamar a polícia
foi algo de última hora. Não fiz aquilo para o distrair, parecia vir de mim
também, não foi contra a minha vontade, e isso me irritava de modo
desumano.
— Presta atenção, porra! — gritei, voltando a olhar ao meu redor.
Eu tinha tudo que precisava ali. Tudo que consegui de pistas, e um
diário.
Sim, um diário que contava a história de um romance entre um buraco
negro e uma estrela.
Esse era o livro que o desgraçado do Alien estava lendo, na biblioteca,
quando se distraiu e o deixou por tempo suficiente junto aos inúmeros que eu
tinha aberto sobre a bancada.
Agora, ele tinha uma cópia do volume três de anatomia humana da
biblioteca e eu, um romance fofo, escrito à mão com letra feminina, desenhos
bonitos e com poucas palavras.
A primeira página era uma graça, contava sobre o encontro dos dois.
Como o sombrio ajudou a iluminada e a manteve com ele. E só por isso eu o
guardei. Porque estava fascinada.
“A última estrela e seu devorador”.
"Quando o vi pela primeira vez, em minha passeata, condensei todo o
medo que uma galáxia podia conter nas minhas pontas douradas. Ele
flutuava, imponente. Meu percurso beirava suas bordas e o horizonte de
eventos parecia borbulhar ao meu redor. Eu sabia que era meu fim. Vi
muitas sendo sugadas, espaguetizadas e explodidas. Eu as vi morrer. Nunca
pensei que justo comigo pudesse ser diferente, mas foi. Foi como se ele
tivesse calado sua própria natureza para me ver passar. Impossível, o
Universo diria, mas aconteceu. Nunca mais consegui sair do horizonte, e o
via todos os dias me observar perambulando sozinha. Foi assim que, no fim
de um passeio, fiquei presa em meio à escuridão, mas sem amarras,
brilhando. Ele mantinha minha luminosidade acesa. Viva. Quando perguntei
o porquê, disse que fui a última, porque há muito me poupava. Ele achou
minha luz bonita e me manteria ali, como um dos últimos vestígios da
galáxia. Brilhante como um broche. A última ainda acesa, mas flutuando
somente em seus horizontes”.
Fechei o diário e suspirei.
Era poético. Irreal e impossível, mas poético. Dizia muito a uma mente
aberta à interpretação, e era disso que eu precisava: interpretações e
especulações sobre o Universo. Distrações enquanto eu não estava submersa
na investigação sobre aquela chave ou nos meus estudos.
Distribuir a atenção em tantas lacunas era o meu segredo de sucesso,
porque se eu pensasse na minha vida naquele momento, iria enlouquecer.
Olhei para a capa forrada por galáxias. Ela estava sendo coberta por
uma case preta enquanto ele lia.
O ruído da minha risada baixa reverberou pelo banheiro.
Com certeza, não era dele. Eu julgava que talvez tivesse tomado de
alguma pobre coitada e a usado para fazer chacota, mas, no fim, de muito
estava me servindo; isso, eu não podia negar. Afinal, tudo que me servisse
para me esquecer da noite passada era bom, para mim, para minha sanidade.
Mavi:
Eu vou matar você, Brianna!
Eu:
Não precisa. Acho que quando me
Encontrar, já vou estar morta.
Mavi:
Que merda aconteceu nesses últimos dias?
Deixa eu adivinhar, você escolheu um outro cara
problemático como par romântico.
Eu:
Nunca pensou que talvez, pelo menos
uma vez, o maluco poderia me escolher?
Eu:
Se eu te contar, você não vai acreditar,
então esquece. Te mando mensagem depois.
Pai:
Estou na casa. Preciso falar com você
pessoalmente.
Foi fácil acordar cedo. Na verdade, quase não dormi, e agora com
certeza passaria a manhã inteira no banheiro, tentando esconder aquelas
marcas. Foram horas com bolsas de gelo e pomadas para suavizar as manchas
arroxeadas e seguir para a maquiagem.
Sabia que o dia seria longo e que em algum momento alguém chegaria
perto o suficiente para ver meu estado, então, além de quase cem camadas de
corretivo e base, decidi usar dois cachecóis. Os hematomas estavam
distribuídos por quase todo o meu corpo e, mesmo que eu estivesse de calça e
blusa de mangas longas, meus ombros e pescoço estavam um pouco à mostra.
Saindo do banheiro, virei olhando para Meg e seu olhar impaciente. Na
noite anterior, quando abri a porta, me deitei e não troquei uma palavra com
ela. Agora, a veterana estava tal como um guarda na porta. Eu não tinha para
onde correr.
— Vai conversar comigo agora? — perguntou, seu tom envolvido por
cautela.
— Preciso ir pra aula. — Mantive a cabeça baixa a todo momento e
passei por ela para pegar meus materiais.
— O que foi que aconteceu? — Como previ, a garota me seguiu pelo
quarto.
— Meg, não tenho tempo… — Foi tarde quando tentei desviar de suas
mãos. Eu estava muito fraca e ela conseguiu me manter na sua linha de visão
ao segurar meus ombros.
Quando viu meu estado, sua boca entreabriu ligeiramente.
— Brianna, que aconteceu com você? Foi o Alien? — Ela olhou em
meus olhos, minha pele a latejou sob a tensão que emanava de suas
perguntas.
— Não. — Me virei tocando suavemente o lugar dolorido.
— Você está quebrada. Quem fez isso?
— Não importa agora. — Segurei meus livros. — Preciso ir.
— Mas…
— Não quero falar sobre isso, Megan. — Saí pela porta e segui pelo
corredor.
Só precisava chegar na sala de aula e me debruçar sobre a mesa para
captar as explicações do dia, antes de me trancar ali de novo.
O movimento estava ainda maior que nos últimos dias, provavelmente
a chegada de mais universitários era um dos motivos. Fechei os olhos, o
sopro do vento frio silvava pelas grandes janelas do pavilhão e o som dos
meus passos se misturavam às conversas, burburinhos, pessoas sugando o
capuccino em seus canudos nada recicláveis, gemidos abafados em uma das
salas em manutenção.
Nada novo sob a pouca luz solar.
O cheiro característico de drogas sendo inibido pelo perfume das flores
de cerejeira molhadas era um acalento. Dizia muito sobre como o diferente
apaziguava. Trazia equilíbrio.
Inspirei fundo. Mesmo que fosse impossível, desejei não encontrar
nenhum membro da gangue, pelo menos naquele dia. O anseio de permanecer
invisível intensificava quando me lembrava do Alien.
Seria pedir demais?
No entanto, para provar ser inevitável, não precisei ao menos erguer os
olhos para percebê-lo no canto de um dos corredores.
Aaron.
Seu cheiro familiar me alcançou as narinas e, pela visão periférica,
percebi seu vulto.
Abaixei um pouco a cabeça, mantendo os livros no peito enquanto
caminhava com certa dificuldade. Eu não queria olhar na cara daquele
desgraçado. A culpa daquilo tudo era dele.
Seus passos me acompanharam, permaneceu em silêncio, mas pude de
sentir que me encarava e mordi os lábios, com os olhos dançando por nossos
pés.
Ele usava a calça preta com listras azuis da fraternidade, o que
raramente acontecia, e o tênis caro riscava a porcelana, seguindo lado a lado
comigo. Quando percebeu que eu o ignorava, tão rápido quanto um flash de
luz, colocou-se na minha frente.
— O que foi? — Fiquei em silêncio, procurando por uma válvula de
escape. — Soube que não saiu do quarto a manhã inteira — complementou e
me virei para entrar na sala, mas sua mão agarrou o meu braço, para o meu
azar, justamente na parte mais dolorida. Soltei um gemido de dor, deixando
os livros caírem no chão.
Aaron arregalou os olhos, afrouxando os dedos, e me pegou pelos
ombros.
— O quê… — Sua mão ergueu meu rosto e pude sentir, como se uma
imensidão de pura escuridão me encarasse. Abri os olhos, lacrimejando, e vi
os dele transformados em algo irreconhecível.
Antes que eu pudesse lutar, me atirou em seus ombros e caminhou
comigo até o banheiro feminino naquele corredor.
— Sumam daqui! — gritou com um grupo de meninas, que evaporou
em um piscar de olhos. Ele me colocou de pé e voltou a erguer o meu queixo,
mantendo uma força desumana ali, contra a qual eu não conseguia lutar.
— Me deixa em paz! — ciciei. Seus olhos continuavam dançando por
meu rosto com as sobrancelhas franzidas e uma seriedade perturbadora.
Em um impulso, tirou a camisa que estava usando e abriu a torneira da
pia atrás de mim, umedecendo-a. Seus dedos levaram o tecido ao sabão perto
da pia e ele o esfregou ali. Quando me debati, me prendeu ao seu corpo com
um de seus braços.
— Não resista! — Me segurou com força passando o pano pelo meu
rosto. Gemi quando a fricção apertou a bolsa debaixo de um dos meus olhos.
Estava tão roxo e dolorido que parecia pegar fogo. Custou para que eu
conseguisse cobrir com maquiagem e, agora, Aaron desmanchava tudo.
— Para com isso! — Era uma merda estar tão fraca quando eu queria
dar um soco na cara dele. Estreitei as sobrancelhas, entregando a raiva que
sentia, mas foi olhar para ele e perceber que tinha as pupilas tão escuras
quanto um abismo, narinas dilatadas e respiração acelerada.
— Quem fez isso com você? — Jogou a camisa no chão e me puxou
para perto. — Fiz uma pergunta, Brianna! — Fiquei em silêncio, sentindo
seus olhos me examinarem, mesclando entre algo assustador e reconfortante
ao mesmo tempo. — Quem foi? — Virei o rosto. Estava tudo entalado na
garganta e, ao mesmo tempo que queria falar, todas as palavras sumiam. —
Quem fez isso, Brianna? — Me sacudiu e, quando puxei o ombro dolorido,
ele arrancou meus cachecóis e baixou a blusa de uma vez. Os hematomas em
meus seios, clavícula e pescoço estavam à mostra. Sua boca entreabriu e os
dentes cerraram com força.
— Me deixa em paz! — gritei e empurrei suas mãos. Ele sacudiu a
cabeça em negação, o maxilar travado.
— Nem por um caralho. — Me segurou ali e, quando captei que faria a
mesma pergunta, ergui a voz.
— A culpa é sua. — Senti como se sua energia escaldante desse trégua,
farfalhando com o vento, diminuindo aos poucos em um franzido
acinzentado. — A culpa é sua, Aaron Walker.
Silêncio.
Ele sabia o que tinha acontecido. Sabia quem tinha feito aquilo e
porquê fez.
— Mas olha pelo lado bom. — Ergui os ombros, segurando o choro de
raiva. — Funcionou dessa vez. Você só não estava lá para pegar ele. —
Funguei. — E não estou danificada a ponto de perder o meu valor para seus
planos, Alien. Ainda continuo sendo a filha do delegado, pode tentar de novo.
— Meu sorriso falso morreu e o empurrei com dificuldade, puxei minha
roupa de volta ao lugar, peguei os cachecóis e saí de lá sem olhar para trás.
“A culpa é minha”.
Era a única coisa que pairava a cabeça enquanto assistia ao papà
arrastar John para uma das salas vazias da mansão.
Me arrependi de ter falado sobre a mãe e o Dimitri ao meu irmão. Ele
tentou passar adiante, mas nosso pai não acreditou nele. Era como se John
já soubesse que iria acontecer e preferisse se ferir a me ver ferido.
Segurei em uma das extremidades da porta, estudando os materiais de
tortura de nosso pai. Ele escolhia a dedo quando levava quem o desobedecia
até lá. Eu esperava que, daquela vez, fosse o idiota do Dimitri, mas ainda
será John, “o mentiroso”.
E, assim como em todas as outras vezes, Giordano Bonanno olhou
para mim. Distinguindo minha imagem da penumbra escura do cômodo,
mostrando que me via ali.
Na minha cabeça, era como se afirmasse saber da minha culpa, da
tentativa de proteção que John exercia para comigo. No entanto, era mais
que isso. Papà sabia que, se eu visse meu irmão sofrer em meu lugar, doeria
mais do que se fosse eu ali. Por isso, permitia que eu assistisse.
A dor me tornaria inumano, e ser inumano, naquele mundo, era
essencial para a sobreviver.
Seria louco dizer que eu queria guardar todos os meus materiais, passar
no quarto, vestir algo confortável e correr de carro por aí com o marginal de
quem eu deveria manter distância?
Sendo loucura ou não, foi o que fiz, e fugindo dos olhos perspicazes de
Megan, pousei no pátio principal da universidade, onde o movimento
frenético se estabelecia.
Meu sapato batia contra a porcelana com reflexo amadeirado e as
mangas longas da minha blusa voavam junto ao movimento. Pelas grandes
janelas do pavilhão, percebia que a neve tinha dado trégua por um momento e
a luz do sol atravessava um pouco mais as nuvens densas. O ar puro que
encheu meus pulmões foi o mais satisfatório que senti há dias, e me fez
relaxar a um passo de parar no topo da escada que dava para a fachada da
universidade.
O sopro frio do vento acariciou meu rosto e fez os meus cabelos
balançarem. Procurei por ele, juntando as mãos na barra saia, e continuei
andando para fora.
A gangue do Aaron não era a única que fazia coisas legais sobre quatro
rodas, logo o campus estava infestado de carros esportivos modificados.
Inspecionei um a um à distância, mas achei um de estilo parecido com o que
ele usou na última corrida. Se não levasse em consideração o fato de que
trocavam de carro como trocavam de roupa, era algo parecido com aquilo que
ele teria.
No entanto, quando tentei tocar a maçaneta, um estranho saiu de lá.
— Tá perdida? — Ele tinha tatuagens até no rosto, os dentes amarelos
me fizeram arrepiar. Nunca tinha visto aquele cara na universidade.
— Só me confundi, mas já tô saindo. — Me virei rápido, mas seus
dedos ásperos seguraram o meu braço.
— Pra que tanta pressa? Gostou do meu carro? — Sua voz se projetou
em um sussurro. — É com ele que vou passar por cima de Aaron Walker.
— Sabe de onde saí ontem, boneca? — O aperto se intensificou em
meu braço. — Da cadeia. Estávamos presos. Eu e meus manos, no lugar do
seu namorado. — As palavras saíam compassadas, como se ele se desligasse
e voltasse de novo.
Mesmo que eu não tivesse namorado, já tinha uma ideia de sobre quem
ele falava. No entanto, não perdi tempo em responder.
— Não tenho namorado. — Puxei o braço com força.
Sua língua estalou e, com um franzir cínico nas sobrancelhas, ele
começou a me puxar dali para trás do carro, dificultando as chances de
sermos vistos.
— Os boatos são sempre uma mentira, não é? — ironizou, balançando
meu corpo com força. — Mas é bom saber que não tem vínculos.
Cravei as unhas na carne, olhando direto nas pupilas infelizes dele.
— Furo seus olhos se não me soltar agora. — Meu grunhido não lhe
arrancou mais que uma risada ridícula.
— Corajosa… nunca me senti tão ameaçado em toda a minha vida! —
exclamou e senti a raiva borbulhar nas veias.
— E nunca senti tanta falta da minha arma como agora — murmurei
com a força que o ódio me proporcionava no momento.
— Tenho uma. Você quer? — A pergunta reverberou pelo lugar. Não
soube dizer o que era aquilo que crescia feito uma raiz fasciculada no meu
coração, medo ou raiva.
Ele levou a mão ao cós da calça jeans batida e puxou uma pistola velha.
— Só não te faço engolir as balas porque vale mais viva que morta. —
Fungou o meu cheiro. — Gosto de comer carne quente. — A risada voltou a
reverberar e o encarei com puro ódio.
— Vou acabar com você! — Me ignorou, olhando ao redor como um
maluco chapado.
— Quanto tempo acha que vai levar para que ele perceba que sumiu e
apareça aqui?
— Nem mais um minuto. — A voz masculina ressoou atrás de nós.
Aaron.
O homem fraquejou ao receber a pancada de um bastão na cabeça. Seus
dedos afrouxaram e me soltei dando alguns passos para longe com o coração
a mil.
— Vai! — Aaron gritou, mantendo o cara no chão. Minhas pernas
tremeram. — Anda, Brianna! Eu cuido disso!
Foi tão intenso que saí de lá sem olhar para trás e me escondi atrás do
primeiro muro que encontrei dentro do campus, era um dos que cercavam o
jardim, o pior lugar para se estar em uma possível perseguição, porquE as
plantas tinham espinhos e, só de olhar para eles, eu imaginava a ardência na
pele.
Molhei os lábios, ouvindo o som da luta entre os dois. Estavam
trocando socos até que um tomou o controle e surrou o outro. Percebi porque
os intervalos entre as batidas eram sincronizados, era um nocaute. O som de
vidro estilhaçando precedeu o alarme do carro que começou a apitar feito
louco até que…
Tun tun, desativado.
Silêncio.
Meu coração gelou. Apenas o uivo do lá ventos preenchia o lugar.
Pisquei algumas vezes, fosse quem fosse, estava se aproximando do
muro. A tensão crescia à medida que os passos ecoavam como um eco
ameaçador. Olhei para cima, o vento frio sussurrava entre as folhas das
árvores, tão intenso quanto as batidas do meu coração.
Estava chegando perto e, quando o arrastar dos pés me alcançou e
alguém emergiu de trás dos tijolos, meu corpo inteiro pareceu congelar em
resposta ao reconhecimento tardio.
— Aaron! — Abraçá-lo foi algo automático.
— Tô aqui, ratinha. — Parecia ofegante, e jogou o taco, que não faço
ideia de onde tirou, de lado para me abraçar.
Me afastei devagar e percebi o olho esquerdo roxo. Seu corpo me
prendeu contra a parede.
— Você está bem? — perguntou.
— Sou eu quem pergunto. — Passei o dedo sobre a bolsa que inchava
ao redor da linha d'água. — Vai precisar de pontos…
— Sabe dar pontos? — Seus lábios se esticaram, a pintinha na
bochecha emoldurando o sorriso de criança que não quer ir ao hospital.
— Vou fazer o meu melhor — ciciei e ele apontou para o carro. —
Você vai dirigindo?
— Vou fazer o meu melhor… — sussurrou me arrancando um sorriso e
seguimos até lá.
Andar de carro em Manhattan não era cem por cento seguro. Com o
Aaron dirigindo, piorava. Com um olho a menos, a coisa ficava mil vezes
mais sinistra. Mas quando ele abria aquele sorriso…
Ah, aquele sorriso…
Puxou a marcha e pegou o celular, segurando o volante com uma mão
só. Seu dedo desbloqueou a tela e começou a falar.
— Parando na encruzilhada, chama a galera. — Olhei para ele, séria,
meu coração começou a acelerar e talvez tenha percebido, porque colocou
uma mão na minha perna. — Não se preocupe, ratinha. Cuido de você antes
de cuidar de mim.
Suas mãos deixaram o volante em uma reta e se aproximou de mim
para afivelar meu cinto. Entrei em desespero.
— Aaron! Dirige! Eu coloco o cinto! — Usou o dedo indicador para
calar meus lábios. — Aaron… — Minha voz saiu em tom de aviso.
— Vai gostar — respondeu. E eu não duvidava, só de estar com ele,
meu corpo parecia flutuar.
Sua máscara estava no rosto pouco tempo depois e agora ele colocava
uma em mim, esticando o elástico sobre o meu cabelo.
— Fica bem em você, ratinha. — Olhei em seus olhos por aquele fino
tecido preto e ele se afastou.
Quando segurou firme o volante, apertei o banco. Estávamos em um
atalho, percebi porque, com um giro rápido, entramos na rodovia
movimentada.
O carro correu até o ponto que a dividia em quatro retas distintas,
formando uma encruzilhada e, Deus, quando ele girou aquelas rodas, fazendo
com que derrapássemos no meio da pista, meu corpo inteiro se arrepiou.
Apertei a perna dele, fazendo-o rir.
— Nem começamos, ratinha. — Buzinas e mais buzinas ressoavam, o
trânsito parou ao redor do carro, que girava ali no meio, deixando marcas no
asfalto e levantando fumaça.
Eu via automóveis por todos os lados, seus faróis viraram borrões e
meu coração seguia a mesma linha quando Aaron fazia os pneus rasgarem o
asfalto.
— Uhuuuul! — gritou e comecei a rir.
Não sei se pelo nervosismo, adrenalina… eu mal me lembrava de que
tinha fobia de sons altos demais.
Ele abriu as janelas e sob o sopro agressivo do vento, assisti a mais
carros se juntarem a nós, girando feito peões e induzindo o trânsito à
loucura.
Fechei os olhos, sentindo o vento bagunçar meus cabelos, e coloquei a
cabeça para fora.
Era errado. Um crime. Surreal, e era bom, muito bom!
Ficamos ali, vivendo o momento de maior adrenalina da minha vida até
que uma sirene tocou.
Ele olhou na minha direção.
— Se quiser, pode segurar em mim. — O vidro fechou feito um flash,
só tive tempo de apertar a barra da camisa dele e o carro entrou em uma das
vias feito um furacão na contramão, desviando de outros veículos.
— Aaron! Você é maluco! — gritei sob o barulho do motor e tampei os
ouvidos.
— Quando descobriu, ratinha?
Voltei a rir com o corpo inteiro tremendo, sentindo que minhas veias
iriam explodir de tanta adrenalina, e sentindo que vinha dele. Era ele. Era de
outro mundo.
“Não me pergunte como, mas eu sabia que você chegaria aqui antes da
polícia. Era isso ou eu não reconheceria a garota que enfiou um sanduíche e
uma arma na bolsa e saiu rumo a Aaron Walker, decidida a encará-lo”.
“Se estiver lendo isso, saiba que já não estou mais neste plano, e não
consegui evitar minha morte. Foi seu pai”.
Parei ali. Bem ali, naquele trecho, e fechei os olhos. Suspirando, voltei
a olhar para a folha, mas não enxergava nada além da ansiedade. O que me
fez ver uma localização, no final.
Associei uma coisa à outra e, sem ao menos ler o restante, corri até a
garagem. A chave estava no carro, tinha gasolina e eu tentava ligar o meu
celular ensopado.
O nervosismo me impedia de enxergar tudo, menos aquelas
coordenadas e o fato de dar a entender que eu poderia encontrar minha mãe
ou algo sobre ela naquele lugar.
— Brianna é uma cabeça dura! Ingênua! Uma… — Passei as mãos
pelo rosto, impaciente.
Megan havia contado tudo a mim e aos babacas, sentados na sala de
estar da cobertura.
O ambiente azulado transmitia tensão e perdia o ar da última lembrança
que tinha de nós ali. Assim como eu, estavam todos indignados, podia
afirmar somente olhando suas caras.
— Por que fazer isso para ajudar aquele desgraçado? — vociferei, uma
tempestade caía lá fora e refletia dentro de mim.
— É a mãe dela, Alien! — Benedete pontuou. — E, pelo visto, o pai
sabe muito bem como usar isso a seu favor.
— Quase a matei por causa dele! — Segurei a base da mesa de centro e
a lancei longe. Megan se encolheu e Benedete veio até mim.
— Mas não matou, cara! Mesmo achando que ela era culpada, não iria
matar, percebemos isso enquanto assistíamos de longe... — deixou escapar e
eu ri, nervoso.
— Claro! — Meus dedos mergulharam nos cabelos e os joguei para
trás.
— Foi por precaução, cara — Brandon gritou do computador, não tão
longe dali, onde se concentrava em sua tarefa, junto ao Ryus. — Você estava
transtornado… — Encarei-o, nervoso, e comecei ir até lá.
— Como estão aí? Encontraram ela?
— Ainda não. — Seus olhos semicerraram e o barulho do teclado sob
seus dedos me causavam agonia. — Tem certeza de que ela está com o
celular?
— Tenho. Não tirei nada dela, nem mesmo a arma… — Funguei,
cruzando os braços, a perna mexendo, impaciente.
— E tem certeza de que esse microchip funciona?
— Eu mesmo instalei para monitorá-la, ainda funciona… — Dei uma
pausa para a ressalva.— Se ela estiver com o aparelho ligado.
Nessa hora, passos desconhecidos ressoaram, adentrando a sala.
— Isso que eu chamo de nível elevado de controle. — Meu pai riu,
ajustando a gravata. Meus passos se fizeram precisos até ele, deixando fogo
pelo caminho.
— O que você está fazendo aqui? — Cerrei os dentes.
— Deixou a porta aberta da última vez e tomei a liberdade de fazer
uma visita. A propósito — apontou para o quarto —, gostei da banheira.
Todos os meus amigos ficaram tensos. Sabiam de quem se tratava,
reconheciam o tom de voz e sarcasmo que eu descrevia quando falava sobre
ele, o CDC. Benedete foi a primeira e única a erguer a voz.
— Então esse é o seu pai? — perguntou, tensa.
— E isso é o quê? Um encontro de delinquentes? — Ergueu a mão. —
Não precisa responder, eu ouvi toda conversa. — Seu riso espalhou pelo
rosto. — Abernathy achou mesmo que distrair Aaron seria o mesmo que me
distrair? A cabeça dele é um presente para o meu filho, mas não quer dizer
que eu só a pegaria quando meu filho quisesse. — Bateu as mãos. — Aaron
consegue ser rebelde até quando recebe ajuda. Iria demorar para aceitar e isso
não daria tempo a Abernathy.
— Eu não pedi ajuda. — Dei a ele um olhar caótico. — E tenho coisa
mais importantes para resolver. — Me virei para a garota de cabelos curtos.
— Megan, não sabe mais nada sobre Brianna? Nada que não contou ainda?
— Não… — falou, nervosa. — Além de ter ficado na universidade por
conta da mãe… bom, ela disse que você tinha algo que a ajudaria a encontrá-
la, e disse que tinha pego, mas não sabia onde usar?! — Franziu o cenho e eu
fiz o mesmo.
— Onde usar?
— É… pelo visto, era importante.
— O que mais? Ela não disse o que era? Onde colocou?
— Não, mas andava pra cima e pra baixo com aquela arma e uma
chave.
— Chave? — questionei.
— Aqui! Encontrei ela! — Ryus bradou e seguimos até lá. — Brianna
está se movendo numa estrada. — Seu dedo desenhou a tela.
— É do lado oposto à antiga rodovia, a que foi interditada — falei.
— Mas não tem nada lá — Brandon pontuou e olhei para ele.
— Não, nada além do… — Meus olhos se arregalaram e os dele
seguiram a mesma linha.
Corri feito um louco até o molho de chaves. Uma estava faltando, uma
chave de John.
— Ela era com a chave do armário de John!
Benedete pareceu lacrimejar.
— Acho melhor ir pra lá agora, Aaron.
“Descobrir que as leis não servem para muita coisa, na maioria das
vezes nem mesmo são seguidas, e que a justiça já tarda para falhar, foi como
um soco no estômago da criança”.
Adentrei uma área mais aberta e precisei iluminar cada cantinho antes
de pisar.
Era enorme, tinha uma parede repleta de armários. Do outro lado, uma
mesa grande e velha caía aos pedaços, vazia e sem cor. A paredes eram lisas,
sujas, mas sem detalhe algum. Parecia um antigo escritório, emoldurado em
algo mórbido e sinistro.
Os armários, no entanto, me chamaram mais a atenção e segui até lá.
Meus olhos captaram pequenas fechaduras em cada um deles. Abaixei um
pouco e averiguei seus buracos. Pareceu familiar.
Coloquei o celular entre os dentes para continuar tendo luz da lanterna
e peguei minha arma. Desfiz o laço que prendia a chave ali e a peguei nas
mãos. Cada armário tinha um símbolo, e a chave também tinha um.
Estrela de seis pontas.
Encontrei uma desenho igual, meio amassado, cravado no metal de um
deles, e meu coração saltitou.
— Seja lá o que John mantém aqui, meu pai também manteve, ou não
teria a posse de uma chave igual. — Minha voz ecoou pelo lugar, mesmo
saindo em um sussurro.
Diante da chave e da porta que tanto procurei, fechei os olhos. Não
acreditava que estava acontecendo, mas, sim, estava.
Meu corpo inteiro se arrepiou. O papel caiu das minhas mãos e tudo
começou a girar. Puxei a porta e um saco plástico vazio caiu em meus pés. O
cheiro era insuportável. Me afastei tão rápido que bati na mesa e caí no chão
junto dela. Minha cabeça bateu forte contra a madeira.
O grito que dei soou como meu último suspiro de vida, da alma. Fez
uma manada de morcegos voarem sobre a minha cabeça. Comecei a perder ar
dos pulmões.
— A minha mãe não, por favor… — Os ossos sob a pele vibravam,
minha carne latejava, sabia que precisava sair dali, eu precisava respirar. Não
conseguia abrir a boca, estava sem voz, já via tudo embaralhando em minha
cabeça, principalmente, lembranças.
Quando eu tinha cinco anos, ela me deu um kit de papelaria, porque eu
disse que queria ser CEO como ela e ter meu próprio escritório em casa. Em
troca, pediu para que quando percebesse a voz do pai muito alta vindo do
quarto, fosse brincar de escritório o mais longe possível, porque uma boa
CEO precisava de silêncio para se concentrar.
Quando eu tinha cinco anos, ela disse que iria me ensinar a andar de
bicicleta, também me mostrou como usar as rodinhas para acertar a cabeça de
piratas que tentassem tocar em mim.
Aos meus cinco anos, ela colou estrelas que brilhavam no escuro
embaixo da minha cama, porque sabia que eu as adorava. Me fez prometer
que apagaria as luzes e as admiraria, caso ouvisse algum barulho estranho na
cozinha quando o pai chegava irritado.
Minha mãe disse que eu era forte e capitã do meu próprio navio, mas
foi ela que me protegeu de tudo que conseguiu, até onde conseguiu.
E então tudo se apagou.
Sem estrelas.
Sem galáxia.
Sem vida para ela ou para mim.
— Brianna! — Ouvi uma voz ao longe, alguém parecia destruir tudo
enquanto entrava ali, e um farol o acompanhava.
Era o Alien.
Senti que me agarrava e ergui os olhos.
— Me desculpa, Aaron.
— Não, não, não, não, não. — Segurou meu rosto, mas a fraqueza já
me dominava. — Olhe pra mim…
Alguns dias depois
Se existia alguém bom com planos, era meu pai. E não, eu não me
arrependia de dizer que, para acabar com a raça do delegado, me juntei a ele.
O silêncio se instalou na sala esfumaçada de um galpão no subsolo,
lugar designado por ele para determinadas atividades. O eco da reportagem,
que passava em uma tela ampla, trazia mais informações sobre o caso que
deixou a população estarrecida e entregava a falta de esperança.
Um avião com três tripulantes e um piloto estavam desaparecidos há
alguns dias.
Nele estavam o Governador de Nova Iorque, um delegado
recentemente nomeado no Brooklyn, e Don Salvatore, um empresário
italiano. As buscas já estavam sendo consideradas suspensas e não havia
indícios que indicassem algum tipo de crime acometendo as “vítimas”.
Meu pai interrompeu abruptamente a voz da repórter ao desligar a TV
com um gesto casual. Me virei para vê-lo como uma figura imponente no
assento atrás da mesa de mogno. Seus olhos, frios como o aço, encontraram
os meus.
— O avião cumprindo seu papel na peça enquanto o verdadeiro
espetáculo acontece nos bastidores. — Seu sorriso, uma expressão
cruelmente complacente, e a inclinação para trás na poltrona indicavam que
iria se levantar.
Fiz o mesmo, acompanhando-o pelo corredor extenso, como em todos
os outros dias, e tendo que ouvir, como sempre, detalhes sobre suas
ambições.
— Pense em Salvatore como um pino de boliche, faltam mais três —
falou, se referindo às outras famílias da aliança, duas que se uniram a
Salvatore e uma que se deixou de fora do impasse.
Bonanno almejava dar continuidade ao que começou, e já estava
tentando tomar decisões por mim quanto a isso.
— Ainda não entendo o porquê da conversa. — Olhei para ele. — Sabe
que não quero e não vou…
— Sabe de suas obrigações — me interrompeu —, mas não vou falar
sobre elas agora. — Riu, me observando. — Sempre achei que deveria ter
sido o primeiro, John…
— Não vai falar do meu irmão — avisei.
— Seu irmão não aceitou ser moldado, mas você estava aceitando.
— Fala das vezes que me fazia assistir às torturas? — grunhi. —
Aquilo era moldar?
— Aquilo se chamava aprendizagem. Com o tempo e com os estímulos
certos, eu o veria planando ao meu lado, inumano, inabalável. No entanto, o
estorvo Salvatore, ou o que ainda existe dele, fez questão de atrasar esse
processo.
— Esse processo nunca terá progresso — afirmei e passei por ele
quando vi seu sorriso surgindo.
Quando entramos no lugar, uma sala esverdeada com uma mesa repleta
de instrumentos para tortura, ele agarrou seu avental, a sensação que tive foi
de nostalgia. Era exatamente daquele jeito que ele punia quando estávamos
na Itália.
Me lembrava de quando John implorava para que não o colocasse na
maca dos que eram castigados.
De um lado, o Delegado Abernathy, com o corpo marcado por torturas
há semanas; do outro, Salvatore, ou o que sobrou dele. O governador,
poupado, em uma sala ao lado. Meu pai dizia que ele iria servir para alguma
coisa.
— Acho que alguém tirou mais um pedaço desse aqui. — Referiu-se a
Salvatore, que já não tinha boa parte da pele sobre os ossos, mas era mantido
vivo, para sentir até o último segundo sua pele sendo arrancada e a carne,
moída.
Abernathy tossiu, engasgando com o próprio sangue quando nos
percebeu ali.
— E eles chegaram — declarou, sem voz. — Vou ser agraciado com a
morte hoje?
— Se depender de mim, nunca. — Bonanno voltou a falar como o
CDC. — Mas não sou eu o seu carrasco.
— Vou acabar com isso — falei, meus dedos enrijecendo ao redor do
cabo de um machado, que puxei da mesa de ferramentas. Pude sentir a
intensidade do olhar de meu pai em mim.
— Mas já? — Riu. — Não se fazem mais açougueiros como antes…
— Só tô cansado de sumir todos os dias por duas horas e inventar
desculpas.
— Fala sobre Brianna Abernathy? — perguntou e fiquei em silêncio.
— Ela não sabe que o pai está pagando pelos pecados na Terra?
— Ela sabe, mas… — Engoli o grunhido.
— Você tem receio. — Tirou as luvas e se aproximou de mim. —
Conselho de pai: aproveite as férias e a leve para algum lugar.
— Acha mesmo que vou seguir seus conselhos? — Ergui as
sobrancelhas. — Não vou repetir o que fez com a minha genitora.
— Sua mãe foi a mulher a quem mais tive apreço em toda uma vida.
Uma pena que não teve equilíbrio mental suficiente para se manter em
minhas mãos. — Virou-se e andou até a mesa, mudando de assunto. —
Poderia estar matando dois hoje, Aaron. — Olhou para mim. — Se
conseguisse algo sobre Fillippo Salvatore.
— Não sei nada sobre o filhote de abutre, já falei.
— Ele será um problema no futuro. — A rigidez de como tirou a faca
de um faqueiro me atingiu como um aviso.
— Só se for pra você. Comigo, ele não tem vez — pontuei, ouvindo seu
riso e me virei para o porco. — Se arrepende do que fez a ela? — Meus
dentes cerraram. O homem estava pendurado, a pele das pernas esticando
como a de um animal abatido no gancho, ele soltou um sussurro que exalava
à carne crua.
— Não. E eu faria tudo de novo, seu verme… — Ergui a lâmina e
enfiei em seu pescoço, vendo-o se engasgar com o próprio sangue.
Quando a puxei de volta, o corte jorrou sobre minha roupa e braço.
Fiquei ali, assistindo à sua morte dolorosa e dedicando aquele momento à
memória do meu irmão, à raiva que sentia por ele e a vontade de destroçá-lo
por ter feito Brianna passar por tanto.
Um suspiro trêmulo me fez piscar os olhos inertes.
— Como entrou aqui? — Bonanno vociferou e me virei para ver
Brianna, com os olhos enormes em cima da cena. — Aaron, não.
Deixei a lâmina cair e a segui, sentindo o sangue nas mãos.
— Brianna! — Meu grito reverberou pelos corredores vazios. O
silêncio que me entregou era ensurdecedor, e a preocupação se enraizou ainda
mais em mim.
Tive medo, porra! Eu tive medo pra caralho de ela me odiar, mesmo
sabendo que fiz o certo, medo de não me querer por perto, de se lembrar que
também a machuquei.
Dobrando um corredor, vislumbrei seu vulto desaparecer à distância.
Seu rosto expressava algo indecifrável me fez cerrar os punhos. Ela tinha
testemunhado a brutalidade que infligi ao pai. Meu passo se acelerou, a
urgência se transformando em desespero.
— Aonde você vai? Aaron! — A voz do meu pai ecoou, misturando-se
ao som dos meus próprios passos. Parei por um momento, relutante em
responder, mas a verdade me puxava de volta.
— Vou cuidar da minha garota. — As palavras escaparam de meus
lábios, carregadas de uma determinação feroz. Não era apenas uma promessa;
era um compromisso de reparar o que estava quebrado.
Corri em sua direção, alcançando-a no momento que ela parou,
chorando.
— Ei… — Ousei erguer o queixo dela na minha direção. Seus olhos
encontraram os meus. Era uma confusão que eu não conseguia identificar.
— Aaron... — murmurou, sua voz trêmula.
— Sei que parece errado, mas eu tinha que proteger você, fazê-lo
pagar. — Minha explicação saiu apressada, como se eu pudesse justificar
todo aquele sangue. — Acabou, ratinha… acabou.
Ela me olhou por um momento, e então avançou para mim, me
envolveendo em um abraço apertado.
— Acabou…. — Sua voz era suave, mas firme.
— Vou fazer tudo que estiver ao meu alcance, e o que não estiver, para
consertar isso — murmurei as palavras com uma sinceridade desesperada,
enquanto ela permanecia enlaçada em meus braços. O silêncio pairou entre
nós, mas, nas entrelinhas daquele abraço, era como se um entendimento
mútuo estivesse se formando.
Naquele momento, desejei com todo o meu sofrido e desgraçado ser
que ela voltasse a sorrir de novo, que voltasse a sorrir para mim, e jurei que
faria acontecer, não importava quanto tempo levaria.
Alguns meses depois / primeiro dia de aula do novo semestre
Nossos olhos miravam o teto do avião, mas não um avião comum; ele era totalmente acolchoado,
desde o teto ao chão, onde estávamos deitados. Brianna segurava minha mão com força, eu sentia sua
respiração soprando suave ao meu lado.
— A estudante exemplar de medicina deveria estar na universidade agora — falei e virei o rosto
na direção dela, percebendo o cintilar dos olhos.
— Eu não vou a lugar algum, Aaron… — Seu sussurro contrastou com o riso fino e meu coração
bombeou mais forte.
Começamos a subir e a sensação de que o corpo pesava toneladas atingiu a nós dois ao mesmo
tempo. Não consegui mover um músculo.
— Parece que vou ser esmagado por mim mesmo — grunhi e ela sorriu.
— É normal em um voo parabólico. — Parecia estar adorando a sensação. — Respire devagar e
mantenha a calma.
— Mas eu tô calmo. — Tentei virar a cabeça para ela, mas só consegui fazer os olhos irem até lá.
— Então por que está apertando a minha mão? — Tiu.
— Não estou apertando a sua mão, espertinha. Só estou mais pesado que o normal.
— E eu estava zoando você! — Sua risada soou alta e com um impulso, o piloto inclinou a
aeronave e subimos um pouco mais rápido. Ela se calou e sua mão quase espremeu a minha.
— Quem está apertando a mão de quem agora? — perguntei e seus olhos se arregalaram.
— Aaron, meus pés! — Estavam subindo, devagar, flutuando. Era sinal de que alcançamos a
sensação de gravidade zero.
— Uooooou! — Segurei a mão dela com mais força quando a vi, literalmente, voar, e fui junto.
— Não vou atravessar paredes! — Riu, nervosa.
— E não vou te deixar nem por um minuto — respondi. — Não quero arriscar.
A sensação era como se não tivéssemos corpo, nada que pesasse. Era como se, de fato,
pudéssemos voar.
Segurei os braços dela e a mantive perto de mim. Nossos olhos se encontraram e passei a ponta
do nariz no dela.
— Gostou da surpresa, ratinha? — perguntei, um sorriso brincando nos lábios enquanto
observava a mistura de emoções em seu rosto.
— Isso é incrível, Aaron! — Os olhos brilharam para mim. Ali, eu soube que podia fazê-la feliz
de novo e que faria isso todos os dias da minha vida.
— Não é nada mal, não é? — sussurrei, olhando de relance para sua boca.
— Não, não é… — ela soprou de volta.
Unimos nossos corpos e descemos devagar sobre o acolchoado. Passamos a ciciar com os rostos
colados, acariciando um ao outro.
— Está gostando da nova experiência?
— Estou amando, mas não é como se fosse toda nova pra mim. — Acrescentou: — Eu já flutuava
todas as vezes que você me tocava, me beijava e… — Puxei-a para mim e passei os lábios pelos dela.
— O que sente agora?
— Sinto que vou explodir.
— Isso é bom.
— É, isso é muito bom. — Seus lábios roçaram nos meus e os fisguei. Ela gemeu quando a
empurrei contra a estrutura macia e lancei meu corpo por cima.
— Agora, faz sentido me chamar de Alien?
— Com certeza.
— Então me dá essa boquinha pra cá…