Você está na página 1de 493

COPYRIGHT © 2022 ANNIE BELMONT

Todos os direitos reservados

Esta obra foi revisada conforme o Novo Acordo Ortográfico.

Estão proibidos o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte desta obra, através de
quaisquer meios ― tangível ou intangível ― sem o devido consentimento. A violação dos direitos
autorais é crime estabelecido pela lei nº 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Esta obra literária é uma ficção. Qualquer nome, lugar, personagens e situações são produtos da
imaginação do autor. Qualquer semelhança com pessoas e acontecimentos reais é mera coincidência.

Capa: Annie Belmont


Recurso de Imagem: VistaCreate
Diagramação: GB Design Editorial (Genevieve Stonewell)
Revisão: Fernanda Barroso
Leitura Sensível: Evelyn Fernandes
Leitura Crítica e Copydesk: Ayla Shaiane
Ilustração do Casal: Wendrel Soares
Broken Hearts
[Recurso Digital] / Annie Belmont — 1ª Edição; 2022
1. Romance Contemporâneo 2. Literatura Brasileira 3. New Adult 4. Ficção I. Título
SUMÁRIO
NOTA DA AUTORA E AVISO DE GATILHO
PLAYLIST
DEDICATÓRIA
EPÍGRAFE
00 | Prólogo
01 | Saint Vincent
02 | Você está pronta para jogar, anjo?
03 | Blackwell x Underwood
04 | Você me quer arrastando de volta para você?
05 | Partes para me destruir
06 | Xeque-mate
07 | Nossa pior versão
08 | Tome uma verdade
09 | Pequena Blackwell
10 | Abstinência
11 | Sentimentos controversos
12 | Cada parte de seu ódio
13 | Válvula de escape
14 | Temporada de jogos
15 | Vestiário
16 | Corações Quebrados
17 | Passado - Parte I
18 | Passado - Parte II
19 | Revelações
20 | Boston
21 | Processo de cura
22 | Um jogo sujo
23 | Pesadelos
24 | Dance comigo, anjo
25 | Carona
26 | Eu te desafio
27 | Estrelas binárias
28 | Aprenda a se perdoar
29 | Venha comigo, anjo
30 | Recital de Natal
31 | Seja corajosa
32 | Rei e rainha do caos
33 | Fio vermelho
34 | Feliz Ano-Novo
35 | Acordo com o diabo
36 | Sinto muito
37 | Fogo e gelo
38 | Convite
39 | Encontro de família
40 | Nosso último jogo sujo
EPÍLOGO
LOGAN UNDERWOOD
BÔNUS | A festa na Fraternidade
NOTAS FINAIS
AGRADECIMENTOS
Sejam bem-vindos à nossa cidade caótica!

Caro leitor, eu sou a Annie, a garota que descobriu que em meio às


palavras, é possível se construir um lar. Há dois anos, quando peguei um
arquivo Word e decidi que era o momento de realizar um sonho que me
acompanhou por diversos anos, eu não acreditava que seria realmente
possível, que eu estaria nesse momento me preparando para mostrar ao
mundo, esse livro que é tão importante para mim, que me ensinou dezenas de
coisas.
Broken Hearts é o meu primeiro livro e o primeiro volume da Série Saint
Vincent. Uma série que nasceu em um momento em que eu precisava de um
abrigo, de um lugar onde eu pudesse sonhar, e que me fizesse esquecer que
estava insegura e quebrada, assim como Verônica e Logan. Eles gritaram
durante anos dentro do meu peito para que eu contasse a suas histórias, para
que vocês tivessem a experiência de conhecer cada um dos seus amigos, que
tivessem a oportunidade de xingar, se apaixonar e viver essa experiência
como eu vivi durante todo o tempo que escrevi os capítulos.
Encontrei em Saint Vincent a minha terapia, encontrei personagens
incríveis e conheci leitoras sensacionais. Encontrei um lar, um aconchego e
um paraíso caótico. Por isso, espero de coração que este livro, mesmo que
seja um romance fictício, passe para vocês todas as sensações que eu senti e
sinto neste momento.
Embora eu também deva alertar que nem tudo são rosas. A história do
nosso primeiro casal é dolorosa, crua, traz sentimentos reais e, muitas das
vezes, eles erram, sentem medo e tomam atitudes que nos fazem
questionar a sua moral. Afinal, são pessoas que estão quebradas, cada um à
sua maneira. E por isso, peço que tenham paciência, mas prometo que valerá
a pena.
Além disso, o livro possui gatilhos. BH é um livro new adult que aborda
negligência familiar, daddy issues, aborto espontâneo (não possuí cenas
gráficas), morte, superação de perdas, luto, menção a uso de drogas,
linguagem imprópria, cenas de sexo e uso de alcóol explícito e não
explícito. Portanto, não é recomendável para menores de 18 anos.
Esta obra não compactua com relacionamentos abusivos, violência física
e psicológica ou qualquer outro tipo de abuso. E todas as atitudes tomadas
pelos personagens no decorrer da história, fazem parte da construção de
enredo.
Sem mais, desejo a cada leitor uma ótima leitura e que essa cidade caótica
conquiste você!
Com todo o meu amor,
Annie Belmont
Ouça a Playlist de BROKEN HEARTS
no Spotify.
“Para todas as
Verônicas espalhadas
pelo mundo que
precisaram superar
suas cicatrizes, seus
medos e seus piores
fantasmas. E para
minha mãe, que me
ensinou a continuar
dançando, mesmo
quando não havia
música.”
Quando você duvidar
Que é capaz de renascer
Através da dor
Repare nas estrelas
E em como elas se transformam
Os fins em matéria-prima pra existir

Todas as coisas que eu te escreveria se pudesse


— Igor Pires
Eu diria que você quebrou meu coração
Mas você quebrou muito mais do que isso
Agora eu não quero sua simpatia
Enough For You | Olivia Rodrigo

NOVA YORK | ALGUNS DIAS ANTES

Sabe o que as pessoas dizem sobre o luto?


Que a dor é passageira, que com o tempo ela vai diminuindo, até restar
apenas as boas lembranças. Mas aqui vai a verdade sobre isso: tudo é uma
bela mentira. A dor não passa, as cicatrizes não se curam e nem a culpa se
desprende de seu ombro. O sentimento de vazio permanece, a saudade, o
desejo de ouvir a voz novamente e a sensação de que todas as palavras ditas
não foram o suficiente queimam em nosso peito.
Porque a morte é cruel. Cruel num nível absurdo, que chega sem fazer
muito barulho, escurece tudo à nossa volta, leva a nossa alegria e traz o
sofrimento, aperta o peito e sufoca, fazendo com que lutemos contra a
escuridão, até que ela se torne apenas uma mancha em nossos corações.
— Noite ruim? — O barman sorri para mim enquanto enche meu copo
novamente.
— Vida ruim! — digo, levando o objeto em meus lábios e sentindo uma
pequena queimação em minha garganta.
— Se quiser, posso ser um bom ouvinte. — Encaro o homem à minha
frente, os olhos verdes piscaram em um flerte nada inocente e o sorriso que
lançou, me mostrou que não estava apenas a fim de escutar. — Uma mulher
linda como você não deveria afogar as mágoas no álcool.
— Quantas clientes já caíram nesse papo barato de fim de noite? —
pergunto enquanto estendo a mão para a garrafa que havia deixado em cima
do balcão, pegando-a e levo-a até meus lábios. — Se quer foder, seja breve.
Eu não gosto de papos moralistas!
— É uma garota que prefere a atitude à palavras? — Ele sorriu travesso.
— Sou uma mulher que prefere o álcool aos homens! — Sorrio, me
levantando e jogando algumas notas em cima do balcão, que cobrirá tudo que
tomei antes, mais a garrafa de Malt Scotch, que hoje me fará companhia.
Enquanto caminho para a fora do bar do hotel onde acontecia uma das
festas anuais das empresas da minha família, posso perceber alguns
convidados já saindo do salão principal. Levo a garrafa até minha boca e
bebo o líquido âmbar, enquanto meu vestido preto brilhante se arrasta pelo
chão reluzente. Coloco uma mecha do meu cabelo atrás da orelha e começo a
caminhar entre as dezenas de convidados. Posso ouvir os murmúrios de
algumas senhoras que veem meu estado lastimável, o que me faz revirar os
olhos e proferir algumas palavras sujas demais para seus ouvidos, que
ostentam brincos caríssimos, mas que as almas não valem um centavo.
Estou cansada demais para ficar nesse lugar com pessoas superficiais, e
quando passo pelas enormes portas giratórias, o frio abraça minha pele e eu
sorrio, por enfim poder respirar um ar que não está contaminado com tanta
hipocrisia. Aceno para o manobrista ao meu lado e ando até o enorme
parque conhecido da cidade, durante o caminho, cambaleio um pouco nos
meus saltos. Talvez eu não devesse beber desta forma, talvez eu devesse ter
ficado naquele evento de merda que meu pai me obrigou a ir e talvez eu
devesse ligar para Oliver, meu melhor amigo, e dizer que hoje era uma
daquelas noites onde eu precisava de sua ajuda.
Mas não, eu não estava a fim de fazer nenhuma dessas coisas, não quando
eu fodi com tudo novamente. Fodi com minha universidade, com meus
irmãos, com a felicidade da minha mãe e com as dezenas de outras pessoas
durante toda a minha vida.
Isso não deveria me surpreender, não é? Não quando eu sou a responsável
pelo sofrimento da minha família. Não quando eu fui a responsável por
trazer aqueles olhos azuis para dentro das nossas vidas, quando confiei e
entreguei a minha alma a ele, enquanto mentia e me dilacerava pouco a
pouco.
Porque Logan Underwood foi isso. Ele foi como uma erva daninha, que
se enraizou em meu peito, destruiu cada parte boa de mim e, no fim, causou o
pior colapso da minha existência.
Balanço a cabeça, expulsando o intruso que já começa a se instalar em
meus pensamentos e observo o lugar onde vim parar. O Upper East Side é
um bairro movimentado de Nova York, onde as pessoas caminham entre as
outras sem perceber o que está ao seu lado. Onde as pessoas não te
cumprimentam, não param para conversar, é frio e vazio. Não é como lá.
Não como a cidade considerada meu inferno privativo.
Onde as pessoas te enxergam, te abraçam e te fazem sentir em casa. Onde
o vento traz novidades e o céu ilumina cada parte.
Onde era nomeada por Saint Vincent, a minha cidade caótica, a minha
ruína e o meu pior pesadelo.
O som da trovoada me faz erguer os olhos para o céu, observando a
escuridão. Minha pele arrepia e meu coração acelera, eu sabia o que viria
desta temporada de chuvas. E quando as pequenas gotas finalmente tocam o
meu rosto, fecho meus olhos por alguns segundos, esperando que o pânico
tome conta do meu corpo, fazendo com que as imagens daquela noite
reverberem em minha mente.
Talvez não tenha sido uma boa ideia ter saído daquele bar chique no hotel
para andar sozinha durante uma noite tempestuosa como agora. Estava
prestes a me virar e voltar para lá, quando uma garota de cabelos ruivos e
um casaco branco na entrada do parque me chama atenção. Me apresso a
andar em sua direção, ignorando o bom senso que gritava dentro de mim que
não era ela, que não podia ser. Mas a esperança ainda corria entre minhas
veias, a esperança de que toda aquela noite fatídica possa ter tido um final
alternativo.
Porém, quando ela se vira e me encara, toda a esperança que nasceu em
meu peito nesses poucos segundos, vai por água abaixo, porque a garota não
era ela. Esta tinha os olhos azuis e a pele branca, tinha um sorriso bonito,
mas não tão lindo como o dela. A garota tinha tudo para ser ela, mas não era.
Ninguém poderia ser. Nem hoje e nem nunca.
Porque ela, Sophie Blackwell, a minha irmã gêmea, está morta há quatro
anos. Ela havia morrido em meus braços e ainda posso sentir sua pele macia
enquanto a abraçava naquela noite, enquanto limpava o sangue de seu rosto.
Ainda podia escutar sua voz suave sussurrando as últimas palavras, ainda
podia sentir tudo, mas não podia trazê-la de volta. Eu nunca poderia.
Sinto as lágrimas se misturarem com a chuva, posso sentir meu vestido
colar em meu corpo e o vento frio arrepiar cada célula do meu corpo. Posso
sentir tudo e ao mesmo tempo não sentir nada.
Respire fundo, Verônica. Não deixe seus monstros te pegarem. Não deixe
que eles te levem para aquele lugar escuro novamente. A voz da minha
psicóloga invade meus pensamentos, fazendo com que recuasse e seguisse
até a outra entrada do parque. Eu precisava caminhar e pensar, precisava
expulsar esse pânico de mim antes de voltar para o apartamento, não queria
que meus irmãos ou Oliver me vissem neste estado, não poderia dizer a eles
que estava com medo da chuva, medo de ficar em casa e ter os mesmos
pesadelos de sempre, e por isso aceitei em participar daquele baile ridículo.
— Pequena Blackwell? — A voz rouca de meu melhor amigo me faz virar
meu corpo para sua direção.
— Ela não vai voltar, Ollie... — sussurro entre as lágrimas.
— Eu sei, eu sei... apenas deixe essa dor sair! — Ele dá um passo à
frente, abrindo os braços para me abraçar, mas levanto a mão o impedindo.
— Se eu te abraçar agora, irei me quebrar! — Meus lábios tremem. — E
eu não quero me quebrar novamente.
Oliver me observa com tantos sentimentos. Seu Smoking preto está todo
molhado e seu semblante me diz que estava à minha procura a mais tempo do
que necessário. Ele era tudo o que eu precisava e tudo o que não deveria ter.
Oliver Wright é meu amigo desde sempre e, mesmo que uma parte de mim
quer que ele dê meia volta e volte para o hotel onde a festa está acontecendo,
a outra parte, a parte que sabe que precisa de ajuda, está agradecida por ele
estar aqui.
— Você está tendo um daqueles momentos e está tudo bem, pequena! —
Ele anda a passos rápidos até mim. — Eu sei o que as tempestades trazem,
sei que está com medo.
— E-eu não posso voltar, Ollie! — Passo a mão pelo meu rosto, frustrada
por não conseguir aplacar essa dor dentro de mim. — Eu não posso voltar
para lá.
Ele sabia que não estava dizendo sobre a festa.
— Você precisa, Pequena Blackwell! — Suas mãos chegam até meu rosto.
— Você precisa ir e se formar. E então estaremos livres.
— Tudo estará lá…
— Não se pode fugir do passado para sempre, Vee! — Ele deixa um beijo
casto em minha testa. — Está na hora de enfrentá-lo.
— E se… se ele estiver lá? — Oliver me encarou com a expressão
fechada ao mencionar alguém que não mencionamos há anos. Meu amigo
sempre soube o quanto andava sobre a linha tênue entre o amor e ódio por
ele. E eu me martirizava, porque a única coisa que queria que existisse em
mim era o ódio, o mais puro e verdadeiro sentimento de amargura.
Eu sabia que ele estaria lá. Sabia que o responsável por muitas das
minhas partes destroçadas depois daquela noite em que minha irmã morreu, e
poucos minutos depois que ele partiu meu coração em pedaços que não
poderia mais ser reconstruído, ainda mora em Saint Vincent. Sabia que
Logan Underwood não é mais o garoto que um dia cruzou meu caminho, não
é o garoto que soprou promessas sem meu ouvido e me amou, amou cada
pedaço que eu achei que era impossível de se amar. Hoje eu tenho a certeza
de que o homem que irei encontrar quando eu pisar naquela cidade, será o
meu pior inimigo.
— Então você terá que ser forte, ser a garota que colocou Nova York aos
seus pés! — Ele solta um sorriso. — Aquela que prometeu nunca mais se
dobrar para pessoas que a machucaram. Será a minha Pequena Blackwell, a
amiga da qual me orgulho e será todas outras dezenas de coisas que sempre
foi.
— Eu queria que viesse comigo… — choraminguei, porque ele, por muito
tempo, foi meu porto seguro, o meu cavalo, sempre pronto para proteger sua
rainha a cada movimento nesse tabuleiro de merda.
— Eu não posso... — lamenta. — Você sabe que meu pai quer nós dois
separados depois da última merda.
— Aquilo não foi nossa culpa! — Suspiro.
— O conselho da faculdade não achou isso... — Ele solta um meio
sorriso, tentando aliviar o clima.
— Obrigada, Ollie, obrigada por tudo! — agradeço verdadeiramente.
— Eu sou seu melhor amigo, é meu trabalho te salvar! — Me lança um
sorriso, que até mesmo sobre a brisa da chuva, pude perceber o quão
incrível era.
Acaricio seu rosto por um momento, até que ele passa os braços sobre
meus ombros e me puxa para caminharmos entre a chuva. E durante essa
caminhada, eu pensava nas próximas semanas e no que era preciso fazer.
Oliver estava certo em uma coisa: não podemos fugir do passado para
sempre.
O meu estava batendo à porta novamente e estava na hora de abri-la,
mesmo que signifique libertar todos os monstros escondidos atrás dela.
Se eu precisasse voltar ao inferno para conseguir minha liberdade, tudo
bem, eu voltaria.
Mas não voltaria como a princesinha que precisava de um príncipe para
ser salva.
Entraria com a coroa de rainha e destruiria qualquer um que tentasse me
quebrar novamente.
O amor não é aleatório, somos escolhidos
E nós poderíamos usar a mesma coroa
Continue abrandando o seu coração
Nós somos os deuses agora
Infinity | James Young

SAINT VINCENT | ATUALMENTE

Shakespeare dizia que “o inferno está vazio e todos os demônios estão


aqui.”
Quando li essa frase em algum livro velho jogado pela biblioteca, achei
hipocrisia. Achei que era apenas uma frase aleatória.
Então um dia conheci Logan Underwood.
E ele me destruiu. Gradualmente.
Pedaço por pedaço. Até restar somente os estilhaços do meu coração.
Então, meu caro Shakespeare, você está certo em uma coisa: os demônios
realmente estão aqui, mais precisamente em Saint Vincent.
Por esse motivo, seis anos depois de cruzarmos nossos olhares, de ter uma
conversa simples e amena enquanto ele me acompanhava até minha casa, eu
estou aqui, encarando a cidade que já foi minha ruína, mas também meu
pedaço de paraíso. Entretanto, desta vez, eu já não sou capaz de sentir a
mesma paz que sempre emanava daqui.
Sinto medo! Medo de reencontrá-lo e não conseguir me afastar, mesmo
com todo o ódio percorrendo minhas veias, porque Logan e eu sempre fomos
assim, viciados um no outro. Éramos incompatíveis, inseparáveis e, acima
de tudo, perigosos.
Me sento sobre a mureta, olhando de esguelha para a estátua do homem
que apelidei de “o sereno”. Ele ainda continua aqui, observando a cidade
com seus olhos irradiando paz, distante de todo o caos que a cidade de Saint
Vincent testemunha. Uma brisa suave balança meu cabelo preso em um rabo
de cavalo. A vista daqui de cima é esplêndida, a cidade está iluminada,
principalmente pelo brilho da lua, as estrelas estão tão cintilantes que eu
ouso compará-las aos grandes diamantes vendidos nas melhores joalherias
de Paris. Suspiro fundo, me culpando por sentir essa sensação, porque esse
lugar já não deveria ser tão importante para mim, não depois de tudo. Apesar
disso, sinto como se o encanto ainda fosse o mesmo. O sorriso que surgiu em
meus lábios trouxe aquela sensação de nostalgia. E eu sabia, bem no fundo
do meu ser, que também significava saudade.
A escola em que estudávamos está como há anos, a pintura impecável e as
mesmas divisórias das quadras. Um pouco acima do colégio, a divisória da
cidade já é perceptível. A parte alta de Saint Vincent era composta pelas
propriedades das famílias mais poderosas do condado. Magnatas, juízes
infames, empresários e todos os outras pessoas que possuem dinheiro
suficiente para limpar a sua sujeira para debaixo do tapete. E a parte baixa
era onde a outra parte da sociedade vivia, aqueles que não são lembrados
para os bailes anuais e outras merdas que inventam apenas para esfregar o
dinheiro na cara uns dos outros.
Saint Vincent não é uma cidade honesta, todos aqui são artificiais,
ambiciosos e, o pior de tudo, são cobras, injetando veneno uns nos outros,
despertando os piores sentimentos que alguém pode despertar.
Há outra coisa que eu odeio nesta cidade: as lembranças. Tudo o que
havia vivido aqui ainda me assombra, principalmente as lembranças dele.
Porque eu ainda me lembro de tudo, cada maldita coisa que era referente a
Logan. Principalmente de como ele dirigia, de como se sentia em paz atrás
do volante e como a adrenalina fez parte de nossa vida. Por isso, quando
ouvi o ronco de um motor ao longe, eu sabia que era ele quem estava vindo.
Mesmo assim, rezei para que todos os deuses me escutassem, rezei para
estar enganada. Mas algo dentro de mim, algo se agitava, era como um
panapaná alçando vôo. Me senti nervosa e não queria sentir aquilo. É algo
que quero deixar no passado, ele não deveria mais me afetar, e me
amaldiçoei mentalmente, sabendo que, mesmo sem ele ter chegado, eu já
estava sendo afetada.
Quando estacionou ao lado do meu carro e a porta do motorista se abriu,
meu coração deu um salto e minhas pernas ficaram bambas.
A sombra projetada em todo o meu corpo pela noite, impossibilita Logan
de me identificar, penso em olhar para ele, mas tudo dentro de mim me dizia
que era errado.
Mesmo assim, inclino levemente meu rosto para o lado, a fim de encará-
lo, mesmo com receio. A curiosidade estava me matando. De lado, vejo-o se
aproximar, suas botas rangem contra o cascalho, parando a uma distância
segura. Esquadrinho seu corpo, observando o quanto ele mudou e, ao mesmo
tempo, continua o mesmo. Seus típicos coturnos, sua calça, agora mais justa
nas pernas, e a camiseta de alguma banda que ele adorava quando
adolescente, escondida por sua jaqueta. Todo o conjunto é negro, assim
como sua alma. Ele leva as duas mãos em concha, segurando um isqueiro
entre os dedos próximo à boca, para acender o cigarro. Sua boca continua
carnuda e levemente rosada, o nariz afilado. O cabelo cai sobre a testa em
cascatas negras. Ele levanta o rosto para olhar em minha direção, fazendo
com que o encarasse por alguns segundos.
E mesmo depois de quatro anos, eu ainda me afoguei naqueles olhos azuis
como o oceano.
— Você tem uma bela máquina. — Ao ouvir sua voz rouca e melodiosa,
prendo a respiração, sentindo meu coração perder o compasso. — Não é
todo dia que vejo um Bugatti nessa parte de Saint Vincent.
Por um momento, tive vontade de gargalhar, porque o seu bom humor não
duraria muito tempo, não quando ele percebesse quem é a sua companhia,
quem está embaixo das sombras projetadas pela enorme estátua ao meu lado
e pela noite. E tive a certeza disso, quando viro totalmente meu rosto em sua
direção, fazendo com que as luzes do ambiente me iluminassem.
— Se você desejar a mesma sensação de voar, os esportivos podem ser
uma boa opção — digo, passando minhas pernas sobre a mureta e ficando de
frente a ele.
Underwood para com o cigarro a centímetros dos lábios, primeiro seus
olhos se arregalaram e depois se estreitaram, me fuzilando como quem não
quer acreditar no que está vendo. Ele me observou como se eu fosse um
fantasma que tinha acabado de ressurgir dos mortos, pronta para atacá-lo.
— O que você está fazendo aqui, Blackwell? — O tom de sua voz era
extremamente enojado. Como se ao dizer meu sobrenome, causasse repulsa.
Mas eu entendia, porque dizer o seu também me causava a mesma sensação.
— Coisas que não te dizem respeito, Underwood! — Ajeito uma mecha de
meu cabelo que insiste em sair do rabo de cavalo. — Agora, se não se
importa, eu desejo voltar a ficar sozinha.
— Resolva suas merdas e volte para Nova York, Verônica! — Sua voz era
rouca, um pouco mais madura do que da última vez que nos encontramos.
— Eu piso em Saint Vincent quando eu bem entender, Logan. — Com
minha mão, impulsiono meu corpo para frente, caminhando até ele para
confrontá-lo. — Permita-me lembrá-lo, de que minha família é dona de
praticamente tudo isso, então você ou qualquer outra pessoa não vai me tirar
daqui.
— Não tente usar a sua influência em cima de mim, Blackwell! — Dá a
sua última tragada, jogando a bituca perto dos meus pés, com escárnio. —
Mas, sendo assim, não cruze meu caminho novamente, Verônica, ou não
respondo por mim
— Pois é melhor você ir se acostumando com a minha presença. — Cruzei
os braços frente ao corpo o encarando com desafio. — Porque eu voltei para
ficar! — Me viro pronta para sair, deixá-lo sozinho com sua arrogância.
— Se isso for verdade, Verônica, se prepare, porque eu vou te mostrar o
inferno, da mesma forma que um dia me mostrou. — Ouço o cascalho voltar
a romper sobre suas botas, fico ansiando para ele sair, para ir embora de
uma vez, mas ele não terminou sua ameaça. — E você irá implorar para sair
da cidade ou vai fugir como fez da última vez.
Meu sangue ferve ao ouvir suas palavras horríveis, porque ele sabe
perfeitamente que eu nunca havia fugido. E quando me viro para ir atrás para
fazê-lo engolir tudo o que disse, me arrependo amargamente, por que ao
invés dele seguir para seu carro, ele dispara até mim. Sua aproximação
gelou o sangue em minhas veias, ele estava tão próximo que eu podia contar
as pintas em seu rosto.
Logan Underwood tem os olhos mais intensos que já presenciei em toda a
minha existência. Suas íris são nubladas por algum sentimento que eu não
poderia ler, nem mesmo se quisesse.
Balanço a cabeça, me xingando mentalmente por meus pensamentos serem
inapropriados para o momento, e o vejo fazer a mesma coisa, como se a
nossa proximidade não tivesse apenas me afetado. Suspiro profundamente,
arrumando meu cabelo e encaro seu rosto com a mesma expressão. Nojo.
— Eu já conheci o inferno, Logan, e ele era mais amedrontador do que
você e sua postura de badboy fodido. — Dei um passo, nos aproximando
ainda mais. Por um milésimo de segundo, fraquejo e olho para sua boca, mas
rapidamente me recupero. Encaro seus olhos e cuspo as palavras: — Então
faça o seu melhor, capitão, porque nada mais me surpreende!
Eu podia ver a fúria em seus olhos. E ele podia ver a minha.
Porque como Holly Black disse em um de seus livros:
Você é uma faísca. E eu sou altamente inflamável.
Se eu estou morta para você,
Por que você está no velório?
Xingando meu nome,
Desejando que eu tivesse ficado
My Tears Ricochet |Taylor Swift

Eles estão de volta.


Toda a família que fodeu com a minha vida está de volta a Saint Vincent
depois de anos. É como se estivéssemos novamente no início do jogo e o
placar estivesse zerado, esperando qualquer movimento brusco para que um
touchdown fosse realizado.
Quando aqueles olhos castanhos recaíram sobre os meus, me lembrando
de como um dia cheguei a amá-los, revivi todo o sentimento que havia
guardado dentro de mim, me perguntando se ela algum dia sentiu a minha
falta como um dia senti a dela, se me odiou como eu a odiei, se me culpou
como a culpei por tudo o que aconteceu naquela última semana há quatro
anos.
Eu a odeio. E isso não é uma novidade. Cada célula do meu corpo é um
misto de ódio e repulsa por aquela mulher. A sensação amarga que senti
quando me apunhalou pelas costas ainda estava lá, me lembrando de tudo, de
como me culpou por erros que não eram meus, de como chorei como uma
criança, quando precisei ajudar Aidan a arrastar o pouco que tínhamos para
a caminhonete do meu pai, fazendo com que precisássemos voltar para
Atlanta e morar com Audrey, mesmo sabendo que minha tia não daria conta
de tanta responsabilidade. Éramos dois adolescentes perdidos e
irresponsáveis que não tinham a mínima ideia de que seu mundo destroçado,
agora se tornava completamente destruído.
A garota que um dia foi meu sonho, agora é o meu pior pesadelo. E nós
somos uma lembrança de que pessoas como nós não devem se misturar e que
quando nos forçamos a ficar juntos, nós sangramos, queimamos e nos
tornamos uma ferida constante que se necrosa dia após dia.
E agora que ela está de volta, sua presença deixa o que havia de pior em
mim vir à tona.
Quando a encontrei no patamar da cidade, observei seus olhos e me
lembrei do que minha mãe sempre dizia: “os olhos são o portal para a alma”.
Mas se esse ditado popular for realmente verdade, então Verônica não tem
uma. Os olhos âmbares estão como da última vez que eu os encarei, mas
dentro deles, são apenas opacos e vazios.
— Há algum motivo para estar bebendo no primeiro dia do semestre,
Underwood? — A voz rouca de Josh me faz virar.
— Alguma vez eu precisei de um motivo para beber? — Solto um sorriso
sarcástico.
— Algo me diz que hoje, existe, sim.
— Você acha demais, Brown. — Bufo, revirando os olhos com força.
— E você não está bem! — Ele se senta ao meu lado, lançando uma careta
de desaprovação.
Eu sabia que por baixo daquela pose de destemido, ele estava
preocupado, porque Josh, melhor do que ninguém, tem a noção do quanto
sofri depois que aquela garota destruiu meu coração e tomou tudo aquilo que
era importante para mim. Mas meu amigo também sabia que eu não
precisava de ninguém querendo resolver meus problemas. Eu posso lidar
com eles, eu sempre lido.
— Josh, eu gosto pra caralho de você, mas antes que me dê um sermão, eu
preciso dizer que você não ficará igual uma babá em cima de mim. —
Bebo o resto líquido do meu copo. — Porque eu não me importo se aqueles
fodidos Blackwell estão de volta, apenas desejo que vão para o inferno.
Antes que ele pudesse responder, os demônios em pessoas entram pela
porta principal do bar.
Dylan Blackwell, o filho primogênito da família, foi o primeiro, ele não
tem mais o rosto de garoto feliz que colocava as pessoas acima de seu
próprio bem estar, seu semblante é fechado e me lembrou muito quando seu
pai foi até minha antiga casa e riu de nossa cara. Atrás dele, Edmund, o
caçula, caminha olhando para o celular, sem ligar para quem estivesse em
seu caminho. Ele levantou a cabeça por um segundo, arrumando o casaco, e
quando nos viu, soltou um sorriso singelo. Seu cabelo não era mais
totalmente preto, como o do irmão, ele está bem claro, com algumas mechas
castanhas. Mas o que me chamou a atenção, é que ainda possui uma pequena
luz de bondade emanando de seu olhar. Edmund pode não ser mais a mesma
pessoa, no entanto, não aparentava aquele ar cruel que os irmãos carregam.
Então entendi o sorriso que nos fora dado. Ele queria me preparar para a
entrada do meu tormento.
Ela entrou lentamente, balançando as madeixas pretas, deslizando os
óculos escuros para o topo da cabeça. O vestido preto era totalmente colado
ao seu corpo, mas não havia nenhum decote, apenas um casaco vermelho que
quase se ligava a suas botas de salto, que subiam até seu joelho. Por mais
que eu quisesse negar, ela estava vestida para matar. Minha ex-namorada
sempre teve um incrível senso de moda. Mesmo quando ela dá um sorriso
malicioso para um garoto em uma das mesas próximas, a sua pose fria não
fraqueja.
E aquilo não me surpreende, porque Verônica Blackwell não é mais a
garota altruísta que um dia cruzou a minha vida. Ela agora é perigosa,
devassa, a personificação do próprio diabo, vestida em roupas de alta
costura, salto alto e batom vermelho. Ela ressurgiu das cinzas do meu
passado, e claramente estava pronta para destruir qualquer pessoa que
estivesse na frente do seu objetivo.
Naquele momento, não pude deixar de comparar sua energia corporal à
escuridão da noite, porque mesmo que fosse incrivelmente linda, ela havia
se tornado obscura, vazia e fria.
Olho de relance para Josh e percebo que ele encara a mesma coisa que eu.
Mas diferente de mim, meu amigo esperava que eles dissessem algo e vi seu
olhar decepcionado quando passaram por todos sem olhar para ninguém,
focados apenas em si mesmos, como se fossem os donos do mundo e nós,
meros servos.
— Eles são os mesmo que eram nossos amigos no colégio? — indaga,
apontando com o polegar por cima do ombro.
— Não, Josh! Aqueles são só a casca do que um dia foram — digo, me
desencostando do balcão. — E eles não merecem a nossa atenção.
Mesmo com ódio percorrendo as minhas veias, meu olhar me trai e viaja
até a mesa no canto, onde eles estão. Ela não me encara. Nem em uma porra
de segundo. Era como se tivesse me apagado de sua vida e esquecido o mal
que havia me feito. Eu queria ir até lá e gritar em sua cara, despejando todo
o veneno acumulado durante anos de palavras não ditas, mas sabia que seria
em vão. Verônica nunca demonstra sentimentos quando é atacada. Ela usava
a beleza e o poder que seu sobrenome tem, a seu favor.
Seria uma batalha perdida. E nem sabíamos se já estávamos guerreando.
Caminho em direção oposta, indo direto à saída, e agradeço quando o frio
do outono agarra meu corpo. Gosto deste tempo, do vento frio e das folhas
caindo nos parques, era uma época de renovação e Saint Vincent sempre
ficava no auge de sua beleza quando essa estação chegava.
Ando até o estacionamento, me xingando mentalmente por saber que
aquela garota ainda tinha um controle sob a minha mente. Preciso de uma
distração, um cigarro ou uma garrafa de whisky ou qualquer coisa que me
fizesse esquecer que ela estava de volta.
— Eu achei que depois de tantos anos, você soubesse controlar seus
sentimentos, Underwood! — A voz de Verônica chega até meus ouvidos,
assim como o cheiro do seu perfume caro me envolve. Seguro as chaves do
meu carro com tanta força que os nós dos meus dedos ficam brancos. Com
relutância, me viro em sua direção.
— E eu achei que mesmo depois de anos, você havia deixado de ser uma
patricinha insensível, Blackwell! — Quando vejo seu nariz empinado e sua
postura inabalável, a raiva me consome e a vontade que tenho é de ir contra
ela e a fazer sofrer das formas tórridas que um dia alguém sofreu, mas
apenas me limito a dar alguns passos largos, chegando perto dela, que nem
por um minuto fraqueja. — Acho que ambos nos enganamos. Pelos malditos
minutos que tenho passado com você, já deu pra perceber que você continua
a mesma pirralha insignificante.
Encaro a garota à minha frente. Ela umedece os lábios e sorri friamente,
mas antes que ela pudesse cuspir suas palavras, me afasto, desviando meu
olhar do seu, vendo Analu Parker atravessar o estacionamento e sorrindo
para a nossa cena. Nunca fiquei tão aliviado em ver a loira como estou
agora.
Enquanto caminha em nossa direção, pude observá-la melhor. Ela ainda é
a mesma garota que conheci no ensino médio, principalmente a
personalidade. Seus cabelos loiros estão presos em um rabo de cavalo e o
conjunto todo preto de frio, destaca seus olhos castanhos.
Hazel me mataria quando descobrisse o que eu estou prestes a fazer,
porque, segundo ela, eu deveria parar de usar garotas aleatórias para tampar
minhas feridas e meus sentimentos. Mas o que adiantaria parar? Meus meios
de distração estavam ficando escassos, e se uma transa me distraísse por
algumas horas, eu não ligaria de lidar com as consequências depois.
— Parker — digo quando ela chega perto de mim e deixa um beijo rápido
em minha bochecha. — Você está atrasada.
— Estava com meus pais, Underwood! — diz enquanto passa os braços
pelo meu pescoço e vira o rosto para poder olhar para minha outra
companhia. — Verônica Blackwell, então é verdade que está de volta!
— Analu Parker — desdenha, soltando um sorriso frio. — É lindo ver que
o time de traidores finalmente se juntou.
— É uma pena que você ainda continue sendo uma vadia… — Analu
devolve com um sorriso, fazendo com que Verônica estreite por um segundo
seus olhos, logo depois recuperando a sua pose.
— E por que eu abandonaria uma das minhas melhores qualidades? —
Verônica questiona enquanto se vira para voltar para o bar sem ao menos
ouvir qualquer resposta que viria da loira.
— Agh! Eles não deveriam ter voltado! — Analu exclama, revirando os
olhos e me encara com uma das sobrancelhas erguidas. — O quê?
— Não entre no caminho deles! Você, melhor do que ninguém, sabe do que
são capazes de fazer — digo enquanto minha mandíbula se aperta.
— E você não caia no papo dela só por causa daquele rostinho perfeito e
seu passado de merda, Underwood, ela é capaz de tudo para ter o que quer!
— Cuide de sua vida, Parker! — rosno, me esquivando de seus braços.
Retiro o maço de cigarro de meu bolso traseiro junto com o isqueiro que era
de meu pai e levo um cigarro à boca, formando uma concha com a mão na
frente da chama.
— O treinador adoraria saber que seu melhor jogador é um viciado em
nicotina! — Ela sorri friamente e retira o cigarro de meus lábios, levando
direto até os seus. — Deus, eu precisava disso! — A fumaça tóxica se junta
à fumaça feita por meu hálito quente, contrastando com a temperatura fria.
Não devolvo o sorriso e nem respondo sua provocação, apenas a puxo
para meu carro. Eu preciso de distração, necessito tirar aqueles olhos
âmbares e aquele cabelo escuro da minha mente, e a garota loira ao meu lado
seria perfeita para isso, porque sei que também está apenas atrás de
distração, apenas tentando fugir da sua realidade. E nós usamos um ao outro,
mesmo que quando a adrenalina e a excitação fosse embora e o sentimento
que toma nosso peito, voltasse.

— Eu adoraria não ter que topar com aquela garota na minha sala
novamente, Logan! — Ergo a cabeça, seguindo a voz forte que veio do
corredor.
Levi Johnson, um dos meus melhores amigos desde a minha infância, está
parado, escorado na parede, e me olhava com uma cara de desgosto. Ele
puxa sua blusa do time de natação da Saint Vincent University, tampando
toda a sua pele negra retinta. Josh e Summer aparecem ao seu lado, enquanto
o primeiro caminha até o outro sofá e se joga nele, Summer vai até a cozinha
e tira um suco de dentro da geladeira e quando volta, percebo que está
vestindo uma blusa do Homem de Ferro, que já disse milhões de vezes que
era horrível, mas nunca me escuta. A loira à minha frente tinha um gosto
peculiar para roupas casuais e a cada dia que topamos com ela em casa, está
vestida de uma maneira que me faz querer queimar todo o seu guarda-roupa.
— É sério? Analu? — A sua voz enojada me faz sorrir.
— Ela é uma boa companhia! — digo e vejo o desgosto da minha amiga
aumentar. — E não me olhe assim, não é a primeira vez que uma garota sai
do meu quarto.
— Você realmente precisa parar de transar com garotas aleatórias!
— Não virarei celibatário, Summer! — Me deito no sofá novamente.
— Ser celibatário por algum tempo, talvez seja bom para você,
Underwood! — Josh gargalha quando levanto o dedo médio para eles e jogo
uma das almofadas em sua direção, enquanto Levi some pelos outros
cômodos do apartamento.
Observo a sala quando o silêncio me abraça, me fazendo companhia.
Éramos um grupo de amigos inseparáveis, e pensávamos que nada poderia
nos abalar, que sempre estaríamos juntos, principalmente pelo fato de
morarmos na mesma cidade em que crescemos.
Mas depois daquela noite, depois dos meus sonhos terem escorregado de
minhas mãos, aprendemos que nada disso faria sentido, principalmente
depois que nosso grupo havia sido desfeito e que havia restado apenas nós
cinco. Tomamos então a decisão de nos mudarmos para um apartamento
longe de toda a nossa realidade, principalmente depois que Levi e Josh
decidiram que odiavam morar com seus pais na parte alta; Summer deixar
claro o seu ódio pelo alojamento, porque sua colega de quarto dizia que
todos seus HQ’s eram coisa de criança, e por eu estar a ponto de violentar
um dos meus companheiros de time na fraternidade.
Suspiro fundo, jogando a almofada sobre minha cabeça. São em momentos
assim, quando meus amigos estão em silêncio e não há ninguém para
conversar ou brigar, que minha mente começa a vasculhar memórias que
deveriam permanecer esquecidas. Lembranças que ficaram guardadas em
mim e nem mesmo eles sabem o quanto me afetam. Mesmo escondendo esse
meu lado, tenho a consciência de que cada machucado, que se tornou cicatriz
hoje, é parte de quem eu sou. E mesmo que não me orgulhe de muitas atitudes
que tomo, eu as aceito.
Encaro o celular à minha frente, a mensagem era clara e objetiva:

Hazel: Se você furou comigo por causa de uma mulher, é melhor você
ter um plano de saúde ou um funerário, Underwood.

Praguejo, sabendo que Hazel está falando sério, principalmente porque já


havia experimentado seu gancho de direita, e aquela garota quase deslocou
meu maxilar.

Eu: Me perdoa, estava precisando de uma distração.

Hazel: Não me dê desculpas de merda, Logan!


Preciso do meu amigo sem ser a versão
babaca dele. 20 minutos no Oásis.
Uma parte de mim realmente gostaria de ficar procrastinando em cima
desse sofá, mas a outra parte, a parte que gosta de manter meu rosto e minha
bolas intactas, concorda que furar com a minha melhor amiga duas vezes no
mesmo dia, era a mesma coisa que pedir para que ela cometesse um
homicídio. E por essa motivação, levanto-me e sigo até meu carro.
Saint Vincent University era deslumbrante, o campus se dividia em três
blocos, o primeiro, ao lado direito, servia para acomodar os cursos voltados
para ciência exatas, toda a decoração em tons azuis. O segundo, ou principal
bloco, como é conhecido, era para abrigar os de ciências humanas, e nunca
entendi o conceito de ser todo decorado em tons vermelhos; e por fim, o
bloco que demora mais tempo do que minhas aulas de computação gráfica
para chegar, fica o de ciências biológicas. O tom verde se destaca de um
jeito único aqui, desde a entrada até as enormes árvores que revestiam o
ambiente. Entre as calçadas de pedras cinzas, enormes jardins foram
construídos, alguns com parques onde as pessoas usufruíram com atividades
ao ar livre, e alguns para se sentarem sob a sombras das enormes árvores.
Mais à frente, tinham estacionamentos que continham carros que valiam mais
que todo o valor de alguns cursos, e por fim, minha parte favorita, os que
continham os restaurantes e cafés.
— Você está atrasado. — A voz irritada da garota à minha frente me faz
sorrir abertamente. O cabelo castanho da pequena criatura estava totalmente
bagunçado em um coque, e pelo olhar cansado, ela estava escondida naquele
laboratório de medicina outra vez.
— Culpa da minha carteira. — Levanto-a, mostrando o objeto com cara
de piedade. — Ela não estava a fim de ser encontrada.
— Existe uma coisa chamada telefone, aprenda a usar! — A encaro,
incrédulo, e mesmo assim ela apenas se virou e entrou na cafeteria, como se
nada tivesse acontecido. Algo estava completamente errado, Hazel sempre
estava estressada, mas não ao ponto de me deixar falando sozinho ou ser
grossa.
— Desembucha — resmungo assim que a alcanço no balcão e me viro
para a atendente. — Um cappuccino e um café extraforte, por favor.
— É sério que trocou nosso café por aquela garota? — Ela lançou um
olhar porco em minha direção quando nos sentamos no fundo do
estabelecimento, se isolando das pessoas que entravam e saiam.
— Não foi por querer, beleza? — Bufo. — Eu estava tendo um momento
ruim e ela apareceu, então uma coisa levou a outra.
— Não tenho nada a ver com suas transas casuais. — Sorri para a menina
que traz nossos pedidos. — Só não marque nada comigo quando está
disposto a continuar enfiando seu pau em garotas aleatórias.
— Você tem um péssimo vocabulário, sabia? — Solto uma gargalhada. —
Agora fale de uma vez, o que está te deixando nervosa?
— Aquilo. — Apertou os lábios e apontou com a cabeça para a entrada.
Quando volto meu olhar para onde indicava, faço uma careta nada
amigável. Dylan Blackwell havia entrado e estava conversando com alguns
garotos que faziam parte do time. Eu podia perceber que quem o rodeava
estava tentando puxar seu saco, como faziam há anos. Mas a sua atenção
voltou para onde estávamos sentados. Ele encara minha amiga, com um
brilho diferente, como se ele se lembrasse de como eram há alguns anos.
Hazel e ele haviam se aproximado bastante antes dele sumir de nossas vidas,
porém, ninguém nunca soube o que realmente aconteceu entre eles. E talvez
por isso que se encaravam daquela maneira.
Então ele apenas sorri abertamente para ela e vai embora, acompanhado
de um dos garotos.
— É sério que está nervosa por ele estar de volta? — Ergo uma
sobrancelha.
— Logan, não sou como você e a Verônica, que gostam desse joguinho de
gato e rato. — Ela estremeceu. — Eu sei que tínhamos coisas inacabadas,
mas não sei se estou pronta para encarar o que deixamos no passado!
— Ele foi atrás de você? — Todo o meu rosto se fecha em uma linha dura.
— Não acho que deveria ter esperanças, Hazel, eles ignoraram Josh de uma
forma que o decepcionou. Não quero que aconteça o mesmo com você.
— Conversamos um pouco mais cedo, quando ele estava fazendo a
transferência.
— Então eles realmente voltaram? — Minha voz sai fria. — Não achei
que ela estivesse falando sério.
— Não queriam, mas voltaram por ela. — Sorri fracamente, tomando um
pouco do seu cappuccino.
— Por ela? — Inclino minha cabeça de lado. Só pode ser brincadeira,
né? Por que ela iria querer voltar?
— Não sei o que aconteceu, mas dizem que a Vee foi expulsa da última
faculdade e os pais dela tiveram que mandá-la para cá. — Ela suspira
enquanto coloca a xícara novamente na mesa. — Dylan foi bem cauteloso ao
dizer isso, acho que existem mais coisas aí do que realmente divulgam.
Estremeço ao som do antigo apelido que todos usavam para se referir a
garota que um dia foi minha ruína.
— Espero que seja expulsa daqui e volte para o inferno — digo, tentando
não soar afetado, e então me levanto. — Preciso ir até a biblioteca assinar
um documento para Audrey, me acompanha?
— Tenho que encontrar Summer, ela disse algo sobre você reclamar das
roupas dela e ela querer te mandar ir morar debaixo de uma ponte. — Revira
os olhos. — O que aconteceu?
— Ela precisa renovar seu guarda-roupa, Hazel! — Dei um sorriso torto.
— Não aguento mais ver o rosto de Robert Downey Jr nas camisetas dela.
— Para quem odeia o mundo dos super-heróis, você sabe demais. — Ela
gargalha.
— Ela me obrigou a ver toda a franquia dos vingadores, não me julgue. —
Faço uma careta ao me lembrar das inúmeras vezes que Summer me obrigou
a ir ao cinema apenas para acompanhá-la. — Julgue ela.
— Logan? — Sua voz agora é cautelosa. — Tome cuidado, você e
Verônica são como uma bomba-relógio e isso nos preocupa.
— Eu sei me cuidar, Hazel.
Beijo sua testa e percorro o caminho até meu carro. O clima ameno do
outono dava lugar ao inverno, o vento começou a ser um pouco frio demais
para mim. E essa época sempre me lembra que o Natal está chegando e
Melany se apresentaria pela primeira vez no concerto. Seria o momento de
entrar em contato com Aidan, para comprarmos o que ela precisasse.
Quando percebo, estou chegando ao estacionamento do outro lado do
campus. Respiro fundo ao sair novamente naquele frio e subir aquelas
escadas infernais. A Biblioteca é um enorme prédio de três andares, todo
decorado com peças antigas. Sorrio ao encontrar minha tia, Audrey, mexendo
em um dos computadores.
Quando soubemos o que os Blackwell haviam feito, passamos algum
tempo com ela em Atlanta, até conseguirmos dinheiro o suficiente para
voltarmos para Saint Vincent, onde ela se instalou rapidamente e conseguiu
um trabalho como bibliotecária na universidade da cidade.
— Onde ela está? — Me escoro no balcão e beijo o topo de seus
cabelos.
— Aula de balé e depois tem algum curso que inventou de fazer — Sorrio.
— Antes de assinar os papéis, pegue para mim os livros que estão no
terceiro andar, por favor.
— Você sempre me coloca para trabalhar quando venho aqui. — Faço
uma careta, seguindo para a escada.
— Não reclame, agora vá — diz um pouco alto, atraindo alguns olhares.
— Diga à Mel que a pegarei para nossa noite de cinema, amanhã! —
Profiro, soltando uma piscadela antes de me virar, ela leva o dedo indicador
até a boca, pedindo silêncio.
Quando terminei de subir, sorri para um par de garotas que estavam
descendo. Uma boa estratégia para quem queria dar uma rapidinha pelo
campus sem chamar atenção, era dar um pulinho no andar superior da
biblioteca, já que havia mesas dispostas ali, mas que ninguém
verdadeiramente usava, pelo menos, não para estudar. Meu sorriso logo
morreu ao perceber que a pilha de livros que teria que levar para Audrey,
era enorme. Havia pelo menos cinquenta livros espalhados pelas mesas.
Caminho lentamente até as mesas e começo a recolher um por um, mas
quando me aproximo da última, percebo que havia um pequeno planner
aberto, com um copo de café ao lado e alguns livros distribuídos, uns três
empilhados e uns dois abertos. Pelo conteúdo, dava para perceber que a
pessoa fazia algum curso relacionado a moda. Olhei ao redor, tentando ver
se conseguia descobrir de que eram aqueles materiais, mas não havia
ninguém por ali. Deve ser de uma daquelas garotas. Me inclino sobre a mesa
e pego o planner ainda aberto, na página que se encontrava, havia uma foto,
duas crianças vestidas de bailarinas seguravam um troféu, a primeira sorria
abertamente e seus cabelos pretos estavam soltos, já a segunda garota tinha
cabelos mais claros, encarando sua parceira como se ela fosse a sua pessoa
favorita no mundo. Ao lado, uma frase estava escrita: Lembre-se, Vee, do
que Sophie Rambaldi, minha poeta preferida dizia: "Na ponta de cada
sofrimento somos a luz de cada espetáculo. Treinadas na técnica de não
desistir e aprendizes na arte de sorrir.” Com amor, Soph.
O objeto queima minha mão como brasa e deixo cair quase que
instantemente. Não poderia ser.
Verônica e Sophie.
— Não deveria bisbilhotar as coisas alheias, Underwood! — Meu
semblante, que antes parecia de uma pessoa que acabou de perder a mão por
tocar algo tão tóxico, muda, dando lugar a uma expressão fria.
— Acredite quando digo que se soubesse que isso era seu, Blackwell…
— Faço uma careta, me afastando um pouco da mesa, sem me dar o trabalho
de recolher o objeto que ainda está no chão. — Eu não o teria tocado!
Verônica apenas me encara e emite uma risada fria, e mesmo que fosse
puro sarcasmo, algo dentro de mim se apertou ao escutar aquele som.
— Você não mudou nem um pouco, não é? Ainda continua se achando o
dono do mundo.
— Não sou o dono do mundo, Blackwell, longe disso! Mas posso dizer
que sou bastante influenciável neste campus. — Cruzo meus braços, me
escorando na superfície de madeira.
Era perceptível que Verônica está na defensiva, tentando esconder todas
as suas faces atrás daquela máscara fria que veste sobre seu rosto e eu
desejava que ela a abaixasse, que me mostrasse o quê, diabos, ela havia se
tornado durante esse tempo longe de Saint Vincent.
— Não deveria entregar todas as peças do jogo antes da partida, capitão.
Ela caminha até onde o planner estava, se abaixando lentamente, o
pegando. Ainda agachada, olha para mim com os olhos incendiando, fazendo
com que pensamentos pecaminosos inebriem a minha mente, ao imaginá-la
nesta mesma posição em outra situação.
Ela levanta para ir até a mesa, mas me coloco no seu caminho, fazendo
com que pare alguns centímetros de mim, seu cabelo escorria dos dois lados
de seus ombros, que estavam tampados pelo mesmo casaco vermelho que
havia visto mais cedo. Subo o olhar até seu rosto e me arrependo no exato
momento em que seu olhar se encontra com o meu. Aqueles olhos claros e
fascinantes me prendem. E percebo que o vazio não está lá como há alguns
dias, eles agora eram sublimes e, acima de tudo, perversos. Quando ela
molha os lábios com a língua, meus olhos se desviam e se mantém lá, vendo
como o batom vermelho a deixa extremamente atraente. Uma vontade de
tocá-la começa a subir por meu corpo, como se fosse uma corrente elétrica
que estava adormecida há muito tempo e agora estivesse despertando. Xingo
mentalmente por estar pensando essas merdas. Essa foi a mulher que quase
acabou com sua vida, Logan. Tomo um respiro raso e então a encaro com o
rosto impassível.
— E você está pronta para jogar, anjo?
Minha boca se curva num sorriso maléfico quando percebo que se remexe
ao escutar a menção do apelido dito anos atrás com tanto carinho, mas que
agora não significa nada. Porém, diferente de qualquer outra garota que já
encontrei, ela não tenta me seduzir ou se ruborizar, apenas devolve o sorriso
e se aproxima.
— A rainha é a peça pilar do tabuleiro, Logan — sussurra. — Então sou
eu que te pergunto, você está pronto para jogar… — Seu rosto se ilumina. —
Capitão?
A encaro por alguns segundos, absorvendo o novo apelido que havia me
dado. Enquanto ela pega suas coisas em cima da mesa, a manga do casaco
subiu um pouco, expondo a pequena tatuagem em seu pulso. Uma bailarina
dançando em volta de uma lua e acima dela havia três estrelas, estava claro
que aquilo era uma homenagem para Sophie e seus irmãos.
Verônica é aquele tipo de mulher fatal. Inacessível. E como Hazel mesmo
diz, era quem não gostaríamos de ter como inimiga. Mesmo assim, por
baixo de toda essa personalidade, a devoção pelos irmãos ainda está lá,
como uma corrente que não pode ser quebrada.
— Um dia, a rainha vai cair. E eu espero estar vivo e saudável para ver
isso de camarote.
No momento em que as palavras saíram de minha boca, eu percebi que
tinha passado dos limites, cumprido com o que falei no auge da raiva, de que
faria da sua vida um inferno. E tinha dado o primeiro passo. Agora era saber
como ela iria reagir.
— Não jogue esse jogo comigo novamente, porque se um dia a rainha vier
a cair, o rei irá junto. — Sorri friamente, dando um passo à frente, ficando
cara a cara comigo.
Ela se virou e saiu andando, como se realmente fosse a rainha e não
temesse nada. E eu continuei encarando, com um ódio percorrendo todo o
meu corpo.
Verônica Blackwell havia dado o play no nosso jogo. E Saint Vincent
estava prestes a pegar fogo.
Você sabe que nosso amor seria trágico
Então você não se importa, não se importa
Não importa, vivemos sem mentiras
Você é meu tipo favorito de noite
Earned It | The Weeknd

Havia me esquecido das sensações que Logan Underwood causava em


mim. Do ódio que só ele conseguia fazer com que fervilhasse em meu
sangue, da confusão que se estendia sob meu ser e da dor que meus olhos
carregavam. E aquele bastardo sabia exatamente onde me afetar, onde
cutucar para o pior que habitava em mim despertasse.
Durante todos esses anos, me preparei para esse momento, aceitei o fato
de que não deveríamos nunca estar no mesmo lugar novamente e aqueles
sentimentos relacionados a nós dois me acompanharam. Quando eu achasse
que não aguentaria aquela dor, eu começaria a ignorá-los, até que fosse algo
que já não me incomodasse a ponto de querer tomar alguma atitude que
provavelmente me colocaria de frente a meus pais. Ter que encará-los e ver
a decepção de minha mãe outra vez, como semanas atrás, quando fui expulsa
da faculdade em Nova York, era algo que estava fora de cogitação.
Não iria fazer isso, não depois que nossa família se quebrou totalmente,
não depois de assistir meu pai desistir do pingo de humanidade que ainda
tinha, focando toda a sua atenção no maldito império que construía; de ver
minha mãe finalmente se desprender das amarras da sua relação tóxica com
ele para ser uma pessoa melhor, e de observar Dylan e Ed tentarem nos
manter unidos. Toda vez que eu encarava os dois garotos que me protegem,
me forçava a lembrar de que era por eles que ainda continuava a ser forte,
para enfrentar todos os fragmentos que estavam dentro de mim; e me
orgulhava por tê-los ao meu lado, por serem bondosos e gentis. E, por eles,
tentava ser boa, mesmo que dentro de mim já não houvesse nada, apenas o
vazio.
Uma garota problema para o legado da família perfeita.
Enquanto dirigia pelas ruas da cidade, a imagem de uma garota de dezoito
anos perdida e frustrada me veio à cabeça, de quando me mudei para Nova
York para tentar corrigir isso em minha vida, tentar superar toda aquela
situação de merda. Eu realmente estava disposta a esquecer o que havia
acontecido em meu passado, tentei me dar uma chance para viver longe de
toda a obscuridade que fazia parte de mim.
Mas não se pode fugir de você mesmo, não se pode esconder suas
cicatrizes, elas fazem parte de quem somos e deixam marcas incorrigíveis,
não necessariamente na pele, e, sim, na alma. Então, quanto mais corremos
para longe delas, uma hora somos pegos, isso é inevitável.
— Achei que nunca me visitaria. — Uma voz suave me faz levantar o
rosto assim que saio do carro. — Vocês, Blackwell, esquecem muito rápido
de quem limpou suas bundas.
— Não seja dramática, Emmy. — Bufo, revirando os olhos. — Você não
parece tão controladora como antes, o que fez seu coração de gelo derreter,
treinadora?
— Soph — A encarei confusa e então vejo um sorriso gentil surgir em
seus lábios. — Minha filha.
— Você…v-ocê — Me embolo nas minhas próprias palavras e então vejo
uma pequena garotinha sendo guiada por uma mulher até a treinadora. A
menininha aparentava ter no máximo um ano e meio, e era perceptível que
fazia pouco tempo que aprendeu a caminhar. Por um momento, me lembrei da
minha irmã quando criança, o cabelo tinha a mesma tonalidade e o sorriso da
menina era tão verdadeiro quanto o que minha irmã direcionava para mim e
meus irmãos, inúmeras vezes naquele escritório. Mas a lembrança que veio e
se fixou em meu pensamento, foi a de quando ela havia decidido que seria
ruiva, abandonando seu cabelo e sua personalidade. — Uau.
— Eu as vi crescer, Vee, quando aquilo aconteceu com Sophie… me
despedaçou e foi esse anjinho aqui que me trouxe de volta. — Pega a criança
no colo e beija sua testa, a menina começa afagar seu rosto, fazendo sons de
difícil compreensão. — E achei que ela merecia ser homenageada.
— Obrigada. — Tento devolver o sorriso, mesmo que dentro de mim tudo
ainda doesse com as lembranças. — Isso… é algo que nunca irei esquecer.
— Eu sei e sei também que não está aqui para falar de coisas que não está
pronta para conversar. Pensou no que eu disse no e-mail? — pergunta,
alisando o cabelo de sua filha e abaixando para colocá-la no chão com
cuidado.
— Sim. — A encaro impassivelmente. — E a resposta ainda continua
sendo não.
— Verônica…
— Não danço mais Emmy, a última vez que coloquei meus pés em um
palco com um público, foi no dia da morte da minha irmã. — Minha voz se
torna fria. — E agradeço que tenha pensado em mim para uma apresentação
magistral, mas, por favor, não me peça mais isso.
Ela para por alguns segundos, apenas me encarando como se eu fosse uma
incógnita sem resolução, e então solta um suspiro e diz calmamente:
— Venha, há algo que quero que veja.
Não tive tempo de opinar, apenas encarei meu braço que ela puxava pelos
corredores da antiga academia de dança, até o grande salão. Era como
caminhar no passado, como se eu sentisse as sapatilhas e os collants sobre
meu corpo, sentisse a dança renascendo em mim.
O espaço era todo revestido de espelho, o piso imitava madeira e enormes
lustres se espalhavam pelo teto. Algumas garotas estavam escoradas na barra
ao lado esquerdo do salão, tentando um Frappé, mas não teriam êxito, não
até alinharem seus tornozelos no apoio, e enfim esticar a perna para fazer o
movimento. Aquilo não prendeu minha atenção, mas sim uma garota solitária
no canto da sala, fazendo seus próprios passos. Ela rodou a perna com
facilidade e quando não conseguiu repetir o movimento com perfeição,
soltou um grunhido exasperado, tive vontade de ir até lá e ajudá-la,
principalmente quando percebi qual era seu erro.
— Ela me lembra você — minha antiga treinadora sussurra ao meu lado.
— Você odiava dançar com as outras alunas, preferia sempre aquele canto
ou estar com Sophie. Nunca dançava para chamar a atenção, nunca para ser a
melhor, mas para viver o momento, sentir a dança.
— Sophie amava este lugar... — sussurro. — Era a vida dela.
— Ela seria uma grande bailarina...
— Não, ela não gostaria de ter se tornado uma bailarina profissional. —
Solto um sorriso fraco. — Ela se tornaria uma grande treinadora... teria sua
própria companhia e ensinaria as pessoas o real sentido de dançar!
Não sei o porquê, mas não esperei sua resposta, apenas atravesso o salão,
sabendo que o barulho dos saltos da minha bota chamaria os olhares
curiosos das outras bailarinas e seus rostos ficaram brilhantes quando me
reconhecessem da foto de Sophie e minha pendurada no lado oposto da sala,
onde ficava a recepção.
— Você está jogando o seu peso para sua perna errada — digo, parando
na frente da garota que estava de costas para mim. — Jogue de trás para
frente, levante sua postura e respire devagar. Se fizer no ar, sua perna sairá
para fora e fará um círculo e a coxa não irá se mexer.
— Não preciso de ajuda — resmunga nervosa.
— E eu não gosto de ajudar, então estamos quites! — devolvo no mesmo
tom. — Eu apenas te dei uma instrução, a escolha é sua se usará ou não.
Respirei fundo e me virei para procurar Emmy novamente. Mas a garota
disse algo inaudível e repetiu o movimento algumas vezes. Não sabia o
motivo, mas apenas a observei de longe, e mesmo que a sala fosse repleta de
espelhos, eu não conseguia ver seu rosto por inteiro, apenas os cabelos
pretos e um lado de suas bochechas rosadas. Mas conseguia perceber que
ela não se importava em estar sozinha, parecia manter sua atenção focada na
melodia e no seu corpo. E aquilo realmente me fez compará-la a mim quando
me trancava em alguma sala e deixava que a sintonia da música e a
gravidade tomasse todo o meu corpo para si, me fazendo esquecer todos
meus problemas.
Quando finalmente conseguiu completar o movimento com perfeição,
comecei a caminhar em direção a sala onde sabia que minha antiga
treinadora estaria. Mas o som de passos vindo em minha direção e a voz
regada, agora de simpatia, me fez parar.
— Obrigada. — Sinto um resmungo baixo por não ter me virado para
encará-la. — Eu só… não estou acostumada com pessoas me ajudando.
— Repita todos esses passos, todos os dias, e não precisará de muita
coisa para finalizar sua coreografia — digo, dando um passo, seguindo meu
caminho.
— Como sabe tanto sobre balé? — Sua voz era curiosa e eu decidi que
preferia a sua versão calada.
— Eu passei quase metade da minha vida sendo treinada pela sua
treinadora — respondo ainda sem me virar.
— Então você conheceu aquelas garotas naquela parede? — Percebi que
falava com receio.
— Eu sou uma daquelas garota — digo, finalmente me virando e dando de
cara com uma garota de olhos extremamente azuis, com um tom cristalino,
eles eram vividos, incríveis e seu sorriso me lembrava alguém. Mas não
seria possível, não quando a garota que estava em minha cabeça durante
todos esses anos, provavelmente estaria longe desta cidade. Não, não podia
ser. — E não há nada de interessante para saber sobre mim, não desperdice
seu tempo.
— Uma pergunta, apenas uma — diz, cruzando os braços frente ao corpo,
como se estivesse se protegendo de algo.
— Apenas uma! — A encaro com interesse.
— Por que não dança mais? — Sua voz era cautelosa.
— E por que acha que não danço mais?
— Você encara o salão com um sentimento quase de tristeza e você me
ajudou mesmo assim…
— Eu ainda danço — a interrompo, me aproximando, deixando que as
palavras saíssem naturalmente de meus lábios. — Mas não em público.
Aquela garota ao meu lado na foto é minha irmã e o seu sonho era virar uma
instrutora profissional, infelizmente isso não acontecerá, então não
desperdiçarei meu tempo aqui te ajudando, porque sei que quando alguém
tem um talento como o dela, não deve o desperdiçar...
— Mel — A encaro com uma dúvida estampada em meu rosto. — Meu
nome é Mel.
— Treine! — digo me virando, ignorando o nome que era parecido com o
da criança que eu havia contribuído para destruir no passado. — Você pode
chegar aonde muitas não puderam.
Algo naquela menina, fez com que inúmeras memórias que eu havia
trancado a sete chaves voltassem para minha mente. Talvez fosse a maneira
como dançasse com amor e me lembrava de minha irmã, ou pelo fato dessa
cidade trazer sensações que eu não deveria sentir. Eram motivos demais e eu
estava começando a sentir minha traqueia se fechar, o pânico retornar e, por
isso, praticamente corri para fora daquele local.
Quando meus pés tocaram a calçada e o ar frio entrou em contato com meu
corpo, uma parte daquela sensação se esvaiu. Mesmo assim, não era
suficiente, eu precisava de mais, precisava fazer algo que não fosse regado à
nostalgia ou a ódio. Precisava de adrenalina. E só havia uma pessoa que
sabia meus gostos nesta cidade e que me acompanharia em qualquer
aventura. Foi a primeira pessoa que procurei quando cheguei. Mike Burhan
havia se tornado um bom amigo durante todo esse tempo que passei longe
daqui, já havia me acompanhado em algumas noites de diversão quando
visitava NY e me carregou bêbada inúmeras vezes para meu apartamento,
então sabia que não negaria uma rodada do que poderíamos fazer.
Tiro meu celular e procuro por seu número, mas, antes, observo as
mensagens de Dylan e Ed. Aquela preocupação me irritava, me fazia sentir
impotente. Respirei fundo e apenas respondi uma só mensagem em nosso
grupo: “estarei em casa logo, parem de bancar a mamãe!” Sorrio e então
finalmente acho o número que estava procurando, e no terceiro toque ele me
atende.
— Achei que nunca mais me procuraria, Blackwell! — Reviro os olhos
ao escutar sua voz rouca.
— Você ainda continua sensível, Burhan? — digo abrindo a porta do meu
carro. — Ainda há algo para fazer nessa cidade que realmente seja
divertido?
— Já disse o quanto amo sua delicadeza, Verônica? — Sorrio ao escutar
o resto da frase. — Tem uma corrida no antigo parque de diversões e
depois podemos comemorar no Oásis, vai acontecer uma apresentação de
karaokês com bandas amadoras.
— Qual a chance de nos colocar na corrida? — Solto um sorriso,
ignorando seu convite.
— Pouca! Posso tentar, mas não posso prometer.
— Tente. — Acelero pelas ruas da cidade até a parte alta da cidade.
— Se tudo ocorrer como quer, passe na minha casa em uma hora.
Não tinha a menor vontade de ir a um Karaokê de merda com Mike, mas
ele me colocaria na corrida, então enfrentaria essa porra de bom grado. A
mensagem chegou em menos de cinco minutos depois:
Mike: Consegui! Como pagamento, vai me acompanhar no show!
Tinha cinquenta minutos até que eu precisasse dirigir até a segunda quadra
depois da minha casa e pegar Burhan. Então acelerei até os portões da casa
dos meus pais e larguei meu carro na garagem. Não havia tempo para escutar
os sermões de meus irmãos, então entrei pela porta de serviço e sorri para
Mada, a nossa governanta, que estava distraída na cozinha. Podia escutar as
vozes de Ed e Dylan na sala de jogos. Se eu arriscasse ir por aquele lado,
eles me escutariam e viriam me checar. Então dei a volta, abrindo uma porta
que ligava ao hall, e subi correndo até meu antigo quarto. Algumas caixas
que vieram do meu apartamento há alguns dias ainda estavam espalhadas
pelo chão, apenas desviei delas até chegar ao closet e tirei de lá uma calça
preta e um cropped totalmente rendado da mesma cor. Adoraria não me
desfazer dos meus saltos, mas usá-los durante a atividade desta noite, era a
pior escolha. E por esse motivo, puxo de umas das prateleiras as minhas
botas Prada, com um pequeno salto que não me incomodaria quando pisasse
no acelerador.
Corri até o banheiro e retoquei o batom. Vermelho Escarlate brilhava
sobre meus lábios. Mas foi meus olhos que encarei no enorme espelho.
Quem os encarasse, podia ver cada armadura que subi ao redor deles,
escondendo o caos e todas as vezes que desmoronei e me quebrei para que
eu pudesse me reerguer novamente.
Encaro o celular e então decido sair, Mike já havia enviado dezenas de
mensagens e eu podia jurar que pela última recebida, ele desistiria de me
acompanhar até onde fosse a corrida. Agradeci mentalmente por nenhum dos
meus irmãos estarem no primeiro andar quando finalmente atravessei a sala,
indo até a garagem. Coloquei minha jaqueta preta e encarei a coleção de
carros que ainda estava lá. Meu coração se alegrou ao ver o Bugatti Veyron
estacionado no final do salão. Ele era perfeito e apropriado para hoje.
Assim que deslizo para o banco do motorista, inalo o cheiro do couro e
sorrio ao finalmente sair da garagem. O ronco do motor era como música
para meus ouvidos. Quando ultrapassei os limites da propriedade, acelerei.
A adrenalina já começava a correr pelo meu corpo e nem me dei conta que
em poucos minutos estava em frente à casa de Mike.
— Ganharemos muito dinheiro hoje. — Os cantos da sua boca curvaram-
se em um sorriso cruel quando atravessou um enorme portão preto.
— Eu quero saber o motivo desse sorriso? — pergunto, franzindo a testa.
— Você vai competir com o corredor mais disputado, amor. — Faço uma
careta ao escutar o apelido. — E será um prazer vê-lo perder.
— Não estou indo para uma corrida para disputar suas merdas, Burhan. —
Reviro os olhos e volto a dirigir. — Tenha isso em mente.
Antes que ele possa responder, ligo o som e volto a prestar atenção na
estrada. O parque não era tão longe, ficava entre a parte alta e parte baixa da
cidade, um pouco perto do lago. Quando entrei pelo portão lateral, fechei os
olhos por uns segundos, respirando fundo. Era o mesmo parque, os
brinquedos não tinham mais a vida de antes, eram todos enferrujados e
amedrontadores. Mesmo assim, havia inúmeras pessoas naquele local.
Quando passei entre os carros, podia ver os olhares sobre o meu. Mike havia
abaixado sua janela e sorria para cada idiota que nos olhava, como se
estivesse fazendo uma entrada no Metgala. Estava prestes a jogá-lo pela
janela, quando vi uma vaga e agradeci mentalmente.
Ele não espera muito tempo para sumir, dando a desculpa que havia ido
pegar alguma coisa com o organizador, então apenas fico escorada no capô,
esperando a sua boa vontade de voltar. Não tinha desejo de vagar por aquele
local, havia pessoas demais ali e meu desejo de socializar era nula. Não
percebo quando a figura de cabelos escuros e olhos castanhos, quase pretos,
para do meu lado e sorri. Tento devolver o sorriso. Ainda estava me
adaptando a essa cidade e voltar a ver meus antigos amigos, ainda era
estranho.
— Oi — A voz de Hazel continua doce, mesmo depois de anos.
— Ei — devolvo, tentando não soar fria.
— Eu… — A encaro sem saber o que ela realmente está tentando dizer.
— Achei que viria nos ver.
— Desculpe. — Minha voz é quase um sussurro inaudível. — Você sabe,
com a transferência e tal, eu fiquei sem tempo.
Era uma desculpa de merda, eu sabia. Mas não queria colocar Hazel e
todos os meus antigos amigos em uma posição ruim. Não quando eles eram
amigos de Underwood e não mereciam estar no meio dessa batalha entre
mim e ele.
— Eu imagino… — Seu sorriso era decepcionado. — Eu só achei que se
lembraria do que me disse aquele dia.
— Sinto muito — digo com sinceridade.
— Eu também. — Seu sorriso é fraco, doloroso. — É bom saber que está
bem.
Eu não estou bem, talvez nunca fique bem. Minha vontade era gritar,
deixar explícito que por dentro eu estava quebrada, ainda sentia uma dor
insuportável toda vez que acordava ou respirava. Era como se o luto nunca
passasse, como se eu estivesse presa naquele limbo desde que minha irmã
sangrou em meus braços. Mas apenas me limito a sorrir e encarar o garoto
que estava caminhando até nós com um papel na mão.
— Está na hora. — Mike me entrega um recibo e eu apenas jogo no banco
do motorista.
— Vai me acompanhar ou ainda é medroso? — Sorri friamente e encarei
Hazel enquanto se despedia de mim e atravessava entre as pessoas. Decido
que o melhor para ela é se manter realmente afastada, não queria machucá-la
como sempre faço com as pessoas que eu amo.
— Prefiro apenas assistir — diz sorrindo e eu começo a gargalhar.
— Você é um frouxo, Burhan! — Solto uma última risada e entro no meu
carro.
Assim que o posicionei na linha indicada, uma garota com um vestido
vermelho para entre o meu carro e o do meu adversário. Era apenas um
garoto que julgava ser da minha idade. O sorriso que me direcionou era
daqueles que deveriam ser intimidantes, mas, para mim, foi apenas ingênuo;
ele realmente pensava que já havia ganhado. Quando acelerei e apenas o
esperei na linha de chegada minutos depois, devolvi o sorriso que havia me
dado, não havia sido uma corrida difícil. E foi assim durante mais três
rodadas. A corrida era dividida em três fases, dois pares por vez. Enquanto
eu ganhava de um lado, o outro corredor ganhava todas do outro.
Todos estavam ansiosos pelo nosso confronto e eu nem ao menos sabia de
quem se tratava. Assim que terminei minha última corrida e o organizador
nos chamou no palco improvisado, eu quis pular em cima de Mike e o deixar
em picadinhos por não ter me contado quem eu enfrentaria no final.
O sorriso do meu oponente morreu quando seu olhar encontrou o meu.
Porque à minha frente estava Logan, e ele me inspeciona desde os pés à
cabeça. Quando fiz o mesmo, pude sentir seus olhos queimando em minha
pele, como se fosse o fogo do inferno. Senti o desgosto em sua expressão
quando ele percebeu quem enfrentaria naquela noite.
Todos ali sabiam quem éramos e o que significamos um para o outro. E
aquilo parecia aumentar a ansiedade.
Sabíamos que nossa presença era devastadora, principalmente quando as
apostas começaram a aumentar. O homem que falava com a multidão
percebeu o clima em que se encontrava seus corredores, então apenas
apertou um botão e nossos sobrenomes aparecem em um telão sobre nossas
cabeças que não sabia da existência até aquele momento.
Blackwell x Underwood
Solto um sorriso voraz para ele. E ele me devolve.
— Tem certeza de que pode fazer isso, anjo? — diz e então seus olhos
ardem em excitação.
— Não só posso, como vou, capitão. — Podia sentir meu corpo se
acender. — Talvez você saia daqui com o segundo lugar.
Ele gargalha e sem mais nenhuma palavra, seguimos para nossos carros,
com a multidão liberando o caminho. E aquilo me lembrou quando
andávamos pelos corredores do colégio, como se fossemos os reis daquele
lugar. Naquele momento, éramos intocáveis, éramos o centro da
atenção. Assim que entramos em nossos carros e nos alinhamos, a mesma
garota de antes apareceu com a bandeira. Arrisquei um olhar para Logan e
percebi que ele já me encarava, seus olhos tinham um brilho animalesco.
Nunca estivemos em lados diferentes da pista, nunca havíamos nos
enfrentado daquela maneira.
Ele me lança uma piscadela e eu reviro os olhos.
— Vai se foder — grito enquanto levanto meu dedo médio.
— Apenas se vier junto — devolve da mesma maneira e solta um sorriso
que conquista quase todas as garotas do campus. — E acredite, anjo, você
não vai se arrepender se vier comigo!
Não deveria ter soado tão sexual, mas a imagem de Logan Underwood me
fodendo dentro de um carro depois de uma corrida como essa, serpenteia por
toda a minha mente, fazendo com que esfregasse as pernas uma na outra,
tentando aplacar a vontade que começava a subir por dentro de mim. Encaro
o painel à minha frente, contando até dez, tentando expulsar as imagens.
Então a melodia de Earned It ressoou pelo som do meu carro e a contagem
começou. Finalmente pisei no acelerador, esperando o sinal. Encarei Logan
pela última vez e seu olhar ainda estava em mim. Não havia mais
provocações, nem sorrisos. Era euforia, ansiedade. Eu entendia aquela
sensação de adrenalina percorrendo nossas veias. E ao mesmo tempo que o
refrão da música emergiu, a garota levantou a bandeira.
Então foi dada a largada.
Éramos apenas eu, Logan e nossa velocidade.
Duas pessoas quebradas, tentando provar para si mesmo que era melhor
que a outra.
Mas o que Logan não sabia, era que eu já vinha treinando em corridas
daquele porte há muito tempo. Quando o ultrapasso, acelerando até o limite,
sinto todas as sensações aumentarem. Continuei naquele ritmo até que uma
curva fechada apareceu, não haveria como continuar naquela velocidade, e
quando precisei diminuí-la para realizá-la, por uma fração de segundo, ele
me ultrapassou.
Filho de uma mãe.
Respirei fundo e fiquei em sua cola, um jogo de zigue-zague, um
ultrapassando o outro em cada curva, estávamos muito próximos um do
outro, seria uma vitória acirrada, então percebi que a linha de chegada
estava próxima. Eu tinha apenas alguns segundos para fazer algo, Logan
havia relaxado, achando que a corrida estava ganha. E por puro ódio, piso
com toda força no acelerador e viro meu volante para a esquerda. Ele não
estava preparado para aquilo, e agora estávamos lado a lado. Sorri
abertamente quando percebi que tinha uma chance de ultrapassá-lo. Um
momento decisivo. Ele percebe meu sorriso, e então solta um também. Culpo
a adrenalina por gostar daquele momento, de saber que, como eu, ele ainda
amava essa sensação. E então percebo que o seu limite havia sido atingido,
não havia mais como acelerar, mas diferente dele, o meu carro ainda estava
estável, me dando a oportunidade perfeita. Respiro fundo e forço mais o pé,
o painel indicava que a velocidade subia rapidamente, um calafrio subiu
pela minha espinha e então cruzei a linha de chegada.
Blackwell 1, Underwood 0.
Quando paro meu carro, abaixo a cabeça no volante, respirando fundo, e
assim que saio, a primeira coisa que vejo é o sorriso de Mike. E seus lábios
sussurram: “você é demais, Blackwell”. A adrenalina ainda corria pelo meu
corpo, então não penso muito quando pulo em seus braços, o abraçando. Seu
aperto é forte, como se realmente estivesse feliz por mim, e desejasse
aquilo. E quando ele roça seu rosto ao meu, traçando um caminho para meus
lábios, eu não o impeço. Porque uma parte de mim também quer, aquela
mesma parte que desejava dissipar algo que não sabe o que é. Então apenas
abro o caminho, juntando nossos lábios. É um beijo lento, Mike não coloca
segundas intenções nele, é como se quisesse me dizer algo, me mostrar seus
sentimentos. Contudo, eu não preciso lidar com sentimentos alheios nesse
momento, preciso dissipar aquela adrenalina. Então aprofundo o beijo,
mostrando a ele o que desejo. E dou um pequeno sorriso quando ele
entende.
Nós nos separamos quando precisamos respirar. E então meus olhos foram
até o outro lado da pista e encontraram o dono dos olhos azuis nos quais um
dia me afoguei, me encarando com desdém. Eu apenas devolvo o sentimento,
mas seus olhos já não estavam mais em mim, eles desceram lentamente até
minha cintura, onde Mike segurava com força. Alguma parte de mim soube o
que aquele olhar significava, mas expulso aquele pensamento, dando de
ombro e voltando minha atenção ao garoto à minha frente
Eu havia ganhado aquela noite.
E mesmo que o olhar de Logan me incomodasse, eu o deixei para lá.
Porque eu era capaz de fazer coisas piores que beijar Mike se caso Logan
Underwood realmente fizesse da minha vida um inferno.
Então, você criou coragem?
Fico pensando se seu
coração ainda está aberto
E se estiver, quero saber
que horas fecha
Do I Wanna Know | Arctic Monkeys

A raiva corria dentro de mim, em cada átomo do meu corpo.


Eu aceitava perder, não havia nenhum mal naquilo. Mas perder para
Verônica Blackwell era perturbador. Porque setenta por cento de todo o
público nos conhecia, sabia do nosso passado e com certeza comentariam
essa merda por todo o campus no dia seguinte. E eu não estava com nenhuma
paciência para aturar um bando de babacas me enchendo a porra do saco.
Para completar minha gloriosa derrota, ainda tive que ver minha ex-
namorada beijar um dos meus colegas de meu time e saber que ele se gabaria
durante toda a semana sobre aquilo, me deixou ainda mais irritado.
— Não faça nada no qual vai se arrepender depois! — Summer diz ao
parar do meu lado.
— Do que você está falando, Sum? — Encaro friamente a minha amiga,
que cruzava os braços frente ao corpo.
— Você está com cara de quem vai matar alguém, Logan. Não seja cínico!
— É lógico que quero matar alguém, eu perdi muito dinheiro hoje. —
Bufo alto o bastante. — E o pior: para alguém que pode limpar a bunda com
cédulas de cem dólares se quiser.
— Logan Underwood, pare de ser um babaca! — A voz da minha amiga
que sai fria. — Você está parecendo uma criança birrenta que escutou não
pela primeira vez!
— Me deixe em paz, Sum! — resmungo, levando a mão até meu bolso,
puxando meu celular. Mas quando volto a encarar minha amiga, me
arrependo de ter proferido aquelas palavras, porque ela não tinha culpa dos
meus sentimentos, não tinha culpa da minha situação de merda. — Desculpa,
eu só… merda! Precisa de carona para ir até o Oásis?
— É lógico que preciso! — esbraveja. — Acha que estou aturando seu
surto atoa?
Eu realmente gosto da ideia dela me deixar em paz, mas xingar Summer ou
até mesmo afastá-la, é como tomar uma atitude em vão, porque ela sabe que
mesmo que se discutirmos, eu estaria ligando para seu celular daqui a
algumas horas pedindo perdão. Porque a garota loira ao meu lado sabia que
ela e Hazel eram como irmãs para mim, e que sempre estaria lá para elas.
Como estiveram para mim em momentos que eu não sabia como suportar a
minha própria presença e me ajudaram a me reerguer de uma forma eu não
sabia se era possível. E por saber de todas essas coisas, apenas a chamo
para meu carro e começo a dirigir até o bar que é nosso ponto de encontro.
Não sei onde estava o resto dos meus amigos, mas sabia que nos
encontrariam lá, antes do nosso momento. Era assim todas as noites de
corridas, quando o dono do Oásis realizava um show com bandas amadoras.
Ainda me lembro da nossa primeira apresentação. Estávamos todos bêbados
e Levi achou que seria uma boa ideia que subíssemos no palco e fizéssemos
um show. E aquela brincadeira, mesmo que tivesse sido um show de merda,
agora havia se tornado nosso ritual. Nosso momento.
O momento que meus amigos me encaravam com orgulho, onde éramos
cúmplices e a diversão era mais importante que todos os nossos problemas,
onde sentíamos paz, e onde o momento com meus amigos me levava para
algum lugar longe de todo este caos. Mesmo que fôssemos uma banda de
merda, que mal decorava as letras das músicas.
Quando estacionei, encarei Levi encostado na parede lateral. Ele estava
ocupado demais, arrumando algo em sua jaqueta, que não nos reparou. E
quando finalmente o faz, ignora totalmente a minha presença, focando na
loira ao meu lado. Um sorriso surge em seus lábios, me lembrando que ele
estava de quatro por ela, e Summer nem ao menos percebia isso. Minha
vontade era rir, e dizer para ele se declarar logo. Mas apenas tiro um maço
da minha jaqueta e levo um cigarro até minha boca, deixando a nicotina
preencher meus pulmões.
— Achei que nunca fosse aparecer, caralho! — Apesar da palavra de
baixo calão, sua voz era calma, como se só dissesse aquilo para não perder
o costume. — Foi uma corrida de merda, Underwood!
— Você diz isso em todas as corridas, Johnson! — Constatei e então volto
a minha atenção ao meu cigarro, sentindo a fumaça entrar em contato com
minha garganta. — Vamos acabar logo com isso, porque quero afogar todo o
meu fracasso nas corridas de hoje com whisky barato que servem aqui.
Meu amigo apenas dá de ombros e passa a mão por cima do ombro de
Summer, dizendo algo que a fez gargalhar. Eles caminhavam à minha frente,
Levi mostrava algo em seu celular para a loira, que solta uma lufada de ar e
depois volta a sorrir como se ele fosse a pessoa mais engraçada do universo.
Se um dia ele decidisse confessar seus sentimentos por ela, eles seriam bons
juntos. E mesmo que aquilo me alegrasse, uma pontada de inveja surgiu em
mim, por saber que nunca teria aquilo novamente, não conseguiria me
prender a outra pessoa. Meu coração havia sido quebrado em tantos lugares
que não havia restado nada para se aproveitar.
Assim que passo por eles e entro, me arrependo amargamente, foi
impossível não emitir uma careta para o bar lotado. Eu poderia dizer que
basicamente todos os universitários que estavam na corrida, vieram para cá.
As garçonetes corriam de um lado para o outro com bandejas recheadas de
bebidas e porções, enquanto algumas pessoas já se concentravam perto do
palco, esperando para que as bandas de hoje fizessem suas apresentações.
Quando enxergo nossa mesa no final do estabelecimento, caminho até lá.
Hazel já ocupava seu lugar de sempre e estava entretida demais em seu
celular, que não reparou quando nos aproximamos. Josh devorava uma
porção de batata frita e sorri ao perceber que havia pedido uma porção extra
com um molho especial que nós amávamos. Quando Levi e Summer
finalmente se juntaram a nós, uma conversa aleatória foi iniciada, mas Hazel
se limitava a responder apenas o necessário, como se sua atenção estivesse
realmente presa ao celular.
— Underwood! — Suspiro fundo ao reconhecer a voz atrás de mim.
Quando virei, a garota tinha um sorriso maior que o meu. Eu não posso negar
que Analu está linda, seu cabelo loiro está preso em um rabo de cavalo e sua
pele branca se destaca no vestido vermelho.
— Parker! — digo, enquanto passo meus braços por cima da mesa até
chegar nas batatas-fritas.
— Sinto muito pela corrida! — lamenta, mas o que me surpreendeu foi o
tom verdadeiro em sua voz, não é tom de deboche ou as respostas ácidas que
espalha pelo campus, mas antes que eu pudesse responder, percebo seu
sorriso morrer ao encarar Hazel. Eu sabia que minha amiga não gostava da
garota à minha frente e não fazia nada para esconder isso. — Ela…
realmente voltou para ficar?
A voz da garota é suave, como se tivesse um receio de perguntar ou da
resposta que viria. Mas quando acenei positivamente com a cabeça, ela
suspirou. Um suspiro que apenas eu entendia, um sentimento de derrota, por
saber que alguém que um dia destruiu seu mundo, poderia ter esse poder
novamente. Levi ignora nossa reação e inclina a cabeça, sorrindo
maliciosamente.
— A coroa voltou para a verdadeira abelha rainha, Parker! — Ele
debocha, piscando para ela. — Sinto muito.
— Não se iluda tanto, Johnson! — Ela devolve, encarando duramente meu
amigo. — Nem toda rainha é boa, às vezes elas são como nos contos
infantis.
Então, pela primeira vez na noite, Hazel solta uma gargalhada. Mas não
como as que estamos acostumados, essa é fria, como se estivesse se
preparando para a batalha, se preparando para defender Blackwell, porque
todos sabíamos que ela, Summer e Verônica eram como irmãs antes de tudo
acontecer. Mas ela não teve tempo de continuar, porque Dylan entrou
acompanhado de Ed. Eles conversavam entre si, enquanto caminhavam em
direção ao balcão, onde uma veterana servia alguns drinques. O primogênito
da família que eu tanto odeio olha de relance para nossa mesa e solta um
sorriso fraco para minha amiga, mas a única coisa que consigo perceber era
que ela não estava com eles. Não havia feito sua entrada triunfal como
sempre faz. E uma parte de mim, aquela parte idiota, se sentiu estúpido por
imaginar que ela fosse aparecer. Por querer ver aqueles olhos feito fogo me
encarando.
E soube naquele momento que estava começando a percorrer caminhos
perigosos. Porque Verônica é minha inimiga, a garota que fodeu com a minha
vida. Eu não posso desejá-la. Nem por um segundo.
— Logan, é a nossa vez! — Josh bate em meu ombro me tirando dos meus
devaneios.
Caminho lentamente até o pequeno palco. Havia algumas garotas em volta
dele e sorrio para elas quando me sento no banquinho atrás do microfone. Eu
não era um astro, não cantava bem o suficiente, e só estava fazendo aquilo
pelos meus amigos. A verdade era que o único lugar onde eu me sentia feliz
com todos esses olhares, era em um estádio, enquanto corria pelo campo
atrás de uma bola. E quando Levi pega uma guitarra branca e passa a faixa
de apoio pelo seu corpo, Josh se senta no banco atrás da bateria, eu suspiro.
Estávamos prontos. Era o nosso momento.
Respiro fundo e olho mais uma vez para a pequena multidão que se
formava. Quando os acordes da guitarra se misturam com a da bateria, eu
soube que era o momento, a melodia de Do I Wanna Know? começou e
emergiu por todo o local. Solto um sorriso de lado, tentando aplacar o
nervosismo, e fecho meus olhos por alguns segundos, deixando que esse
momento me consumisse.

Você está com as bochechas coradas?


Você já teve aquele medo de não poder mudar

Quando voltei a abri-los, ela estava lá agora, seu batom vermelho sangue
destacava entre toda roupa preta, e seus olhos brilhavam em admiração.
Verônica Blackwell era o centro das atenções, principalmente as masculinas,
como um espetáculo para ser visto. Mas toda a sua atenção era minha.

Você não faz ideia de que é minha obsessão?


Sonhei com você quase todas as noites essa semana.

Seus olhos me reivindicaram para si, era como a última vez que cantei e
ela estava no mesmo espaço. Não havia mais ninguém, toda aquela
aglomeração se tornou invisível aos meus olhos, era apenas nós dois. Senti
vontade de pedir para que ela dançasse, que me acompanhasse naquela
queda.

Porque existe essa música que encontrei.


Que me faz pensar em você de alguma forma

Seus olhos estavam vivos, vivos para mim. E soube que sua armadura
estava se abaixando.

Que as noites foram feitas principalmente.


Para dizer coisas que não se pode dizer no dia seguinte

Me mostrando que estava como eu, destruída, que a bela fachada era
apenas uma máscara para esconder o quão quebrada estava. Mas ela me
mostrou mais que isso, ela me fez perceber que um resquício do meu anjo
ainda estava vivo dentro daquela casca, escondida em algum lugar. Mesmo
que nunca mais pudéssemos ficar juntos, por mais que nossa história não
pudesse mais se repetir.

Já pensou em ligar quando você tomou umas?


Porque eu sempre penso

Eu a odiava. E ao mesmo tempo ainda a desejava. Sabia que aquilo seria


a nossa ruína novamente. Sabia também que o jogo em que estávamos, era
perigoso. Não éramos a caça e o caçador. Éramos dois caçadores tentando
se matar em uma selva rodeada de animais sedentos por sangue. Prometemos
fazer da vida do outro um inferno, mas mal sabíamos que já vivíamos nele há
tempo demais.

Talvez eu esteja ocupado demais sendo seu para me apaixonar


Já pensou em ligar, querida?
Você me quer arrastando de volta para você?

Quando finalmente aquela música acaba, eu encaro o lugar onde ela


estava, seu olhar ainda queimava em mim, mas, diferente de antes, todas suas
barreiras já estão de volta ao lugar. E se não fosse por uma pequena lágrima
em sua bochecha, eu poderia jurar que aquela mulher não tinha sentimentos.
Ela se virou, caminhou até o balcão, pegou uma garrafa de tequila e se
virou para sair daquele local. Mas antes de finalmente ir embora, Verônica
se virou e encarou meus olhos com tanta dor que me fez devolver aquele
olhar.
E era um olhar que eu desejava que não tivesse me lançado, porque sem
ele, seria mais fácil ignorar a cicatriz que havia voltado a se abrir dentro do
meu peito.

Existe uma coisa pior que o começo de semestres. Acordar de ressaca no


primeiro dia de aula. E para completar, acordar em um apartamento que não
é o seu. Minha cabeça é um misto de flashes onde envolvia uma garota de
cabelos rosas, muita cerveja, o whisky barato do Oásis e uma festa
aleatória.
— Achei que não fosse acordar, gatinho. — Encaro a dona da voz com
um olho fechado, tentando lembrar o nome dela, era algo com M, talvez
fosse Maria ou Mary. — Não me diz que não está pensando qual o meu
nome.
— Me desculpe? — resmungo.
— Te salvei de uma fria ontem, amigo, o máximo que poderia fazer é
lembrar meu nome — diz sorrindo, mas por trás de seu sorriso, eu podia ver
a decepção. — Dá próxima vez que beber, tente não arrumar briga.
— Acredite em mim, princesa — resmungo sentindo uma dor de cabeça
—, brigas são normais para mim.
Continuei a encarando por alguns minutos, até que a garota decidiu jogar
minhas roupas e meu celular em minha direção e praticamente me expulsar
de seu apartamento. Não tive tempo para agradecer, porque no instante em
que a porta se fechou em minha cara e eu peguei o aparelho, a mensagem de
Josh me fez descer as escadas em um tempo recorde. Eu estava atrasado para
o treino, no primeiro dia, e com certeza o treinador me comeria vivo quando
eu chegasse no vestiário.
Não penso muito, apenas corro em direção à saída dos dormitórios das
garotas e agradeço mentalmente ao ver meu carro estacionado ao lado de um
Jeep rosa. Digito uma mensagem rápida para um dos jogadores, pedindo
para segurar a barra enquanto eu não chegasse, e então dirijo até o outro lado
do campus e tento vestir meu uniforme em tempo recorde.
Quando atravessei os limites do campo, segurando meu capacete, soube
que estava fodido. O treinador Danforth, me encarava com sangue nos olhos
e eu suspirei, já me preparando para a bronca, porque sabia que viria.
Danforth era uma boa pessoa, havia me treinado desde o ano sênior e me
ajudava quando precisava, mas odiava quando não levava o treino tão a
sério.
— Devo dar um discurso? — Sua voz era letal.
— Não é necessário. — Forço um sorriso. — Sei que vacilei hoje.
— Você é o capitão, Underwood! — Seus olhos estreitaram-se, enquanto
ele cruzava os braços, fazendo com que a prancheta em sua mão fique mais
visível. — Não comece a agir como se não fosse.
Eu sabia que ele estava certo. O treino era uma das coisas mais
importantes para mim, só havia me atrasado duas vezes até hoje, uma quando
Mel havia ficado doente e outra quando tive uma prova exaustiva que
precisei estudar até mais tarde, o que me fez perder a hora. Mas hoje não
havia provas ou minha irmã doente, me atrasei porque fui imbecil demais
para cantar uma música que eu sabia que afetaria a minha ex-namorada e
então, quando havia ganhado nossa batalha da noite, me deixei levar pela
bebida.
Corri até a minha posição e cumprimentei os meus colegas de time, Mike
se limitou a acenar com a cabeça. Respiro fundo e ouço o apito do treinador.
Dou a volta na barreira de trás e começo a correr, aguardando que Ambrose
me jogasse a bola; quando ele o faz, pego e desvio de dois jogadores,
precisava apenas correr duas jardas, mas quando dou um passo, sinto o
cotovelo de alguém me acertar em cheio. A próxima coisa que sinto é meu
corpo colidindo com o chão.
— Precisa de ajuda aí, Underwood? — Mike diz com sarcasmo.
Reprimo um palavrão.
— Não! E se fizer isso outra vez, vou te fazer engolir esse sorriso de
merda! — digo, me levantando.
Não fico para ouvir sua resposta, apenas volto para minha posição e volto
a refazer meus lances. O restante do treino é extremamente exaustivo e
quando finalmente entro no vestiário, deixo a água quente do chuveiro
escorrer pelo meu corpo, livrando-o de todo o cansaço. Pouco tempo depois,
saio de lá, indo em direção ao bloco onde teria aula em alguns minutos,
assim que entro na sala sigo em direção às últimas fileiras. Encaro a figura
de cabelos pretos sentada à uma distância considerável da minha.
Verônica estava focada em seu livro, os cabelos estavam presos em um
coque desarrumado. Quando meus olhos recaem em seu rosto, vejo que
usava óculos de grau com a armação preta. Se Verônica Blackwell em si já
era a personificação da sensualidade, agora, enquanto ela usava aqueles
malditos óculos e mordia a ponta de um lápis, enquanto estava focada em
uma página de um livro, como se estivesse quase morrendo de ansiedade, ela
era o próprio paraíso.
Quando sente que estava a encarando, seus olhos se erguem em minha
direção e me encaram como se eu estivesse com alguma doença contagiosa.
Pude ver em seu olhar que estava se preparando para dizer algo ofensivo,
mas quando abriu a boca, a voz de Jenna, a professora de Ilustração Digital,
ecoou por todo o lugar, fazendo com que desistisse. Eu gostava dessa
disciplina, o que era um milagre, então por isso dou de ombros e volto meu
olhar para frente, decidindo ignorá-la, mesmo que minha vontade fosse
continuar aquele nosso jogo de ofensas.
— Bom dia, pessoal — Volto a me escorar na cadeira e encarar a pequena
mulher que estava no centro da sala. — Esse semestre trabalharemos sobre
ilustrações, desde a direção de arte que a compõem, até o manuseio dos
programas.
Esse era o lado bom de cursar designer, colocar em prática tudo o que
sempre gostei. Quando era adolescente, sempre amei carros, de todos os
tipos. Aprendi diversas coisas na antiga oficina de meu pai. E quando
precisei de algo para não surtar, comecei a desenhá-los. Entender como eles
eram feitos, recriar conceitos e produzir novos modelos era o que eu queria,
mesmo que meu coração apenas se acelerasse quando pisava em um
campo, quando escutava o clamor das pessoas e a felicidade do meu time.
— Teremos um trabalho final que contará com oitenta por cento da nota
final. — Seu rosto se ilumina. — E como estamos com três cursos nesta
disciplina, não aceito trabalhos em uma qualidade inferior à profissional.
Eu podia fazer isso. E ela sabia disso, desde meu primeiro ano aqui, eu
havia sido seu aluno diversas vezes. E em todas elas, sempre conseguia ser o
aluno com a maior nota.
— E como será a divisão dos grupos, senhora McCarthy? — alguém
pergunta.
— Já os dividi em grupos que contêm participantes de cada curso e a
partir da próxima aula começarão os projetos — ela responde, dando de
ombros e seguindo até a sua mesa.
Eu não deveria estar surpreso por ela ter escolhido a dedo os grupos, não
quando Jenna era o tipo de professora que sempre fez isso, desde o primeiro
ano da faculdade. Então apenas suspiro fundo e começo a desenhar as
defesas do time para conversar com o treinador no próximo treino. Uma hora
depois, estou recolhendo minhas coisas e respirando fundo quando vejo que
preciso encarar Verônica novamente.
Desço os degraus lentamente, esperando que ela pegasse sua folha com
seu grupo e então saísse da sala. Puxo o zíper da mochila e caminho até a
mesa onde Jenna está sentada, me inclino para pegar o papel com meu nome
e sorrio ao começar a ler os participantes do meu grupo. Pettersen e Brianna
eram bons, faríamos um bom trabalho. Mas quando leio o último nome, meu
sorriso morre.
— Você pode mudar, não pode? — Ergo uma sobrancelha.
— Não, não posso! — diz sorrindo. — E saia da minha sala, Underwood.
— Senhora McCarthy, a senhora não sabe o erro que está fazendo em
colocar Blackwell e eu no mesmo grupo. — Praticamente pulo na sua frente
enquanto segurava a alça da minha mochila.
— A senhorita Blackwell não me pareceu decepcionada, apenas pegou
seu papel e saiu. — Deu de ombros e me encarou com um olhar letal. — O
que você também deveria ter feito, garoto!
— Senhora…
Sou interrompido pelo som de saltos batendo contra o chão atrás de mim.
— Me desculpe, senhora McCarthy, mas não posso fazer esse trabalho
com… — Verônica me olha dos pés à cabeça. — Ele.
— Eu disse. — Ergo a cabeça para a garota ao meu lado.
— Vou dizer apenas uma coisa: pouco me importa qual a briga de vocês!
Dentro dessa sala vocês são alunos como qualquer outro e nenhum terá
tratamento preferencial. — Ela sorri friamente. — Então façam o trabalho,
tirem uma boa nota e sumam da minha disciplina!
Mal ouço o restante do que ela diz, meus olhos encaram Verônica, como
se ela fosse a culpada por nos colocar nessa situação. E pelo seu olhar, ela
pensa o mesmo. Quando a professora passa por nós, o ar se torna incômodo,
quase pesado. Meu maxilar fica tão tenso que as palavras mal saem.
— Vamos fazer essa merda juntos, depois, mantenha distância de mim.
— Não será preciso pedir uma segunda vez! — ela devolve enojada.
Passo por ela, deixando-a no centro da sala sozinha e sigo para o
corredor. Sinto meu estômago se revirar e então o ódio se acumular dentro
de mim, me fazendo ir em direção ao único lugar que não cometeria uma
loucura, a pista de treino para as corridas.
Eu odiava Verônica Blackwell, mas uma parte de mim ainda era
consumida por cada parte daquela mulher. Cada uma dessa parte sussurrava
sob minhas veias que eu deveria ceder a esse desejo que crescia dentro de
mim.
No fim, eu sabia que queria pecar com o próprio diabo.
Eu sei que gosto de te assustar, só pra ver
Quanto você se importa
Eu nunca vou a lugar nenhum, mmhm
E eu sei que você joga os mesmos jogos também
Mas você continua perdendo, eu sou muito bom
Eu sou muito bom
A Little Messed Up | June

O pensamento e a simples esperança de que eu conseguiria viver em paz


nesta cidade – quando meu pai me obrigou a voltar – escorreu esgoto abaixo,
pois Logan, estava cumprindo com suas palavras de merda de fazer da minha
vida um inferno. Estou cansada, cansada não, esgotada de apenas assisti-lo
me atacar.
Quando eu era criança, meu avô tentou me ensinar a jogar xadrez, ele dizia
que “a nossa melhor jogada, é quando todos achavam que o oponente havia
ganhado, porque ninguém mais coloca esperança no outro jogador, apenas
esperam a derrota dele, então é nesse momento que ele deve mostrar o seu
ataque, dar o xeque-mate”. E no meu tabuleiro, com Logan como meu
adversário, ele está ganhando. Sua grande vantagem é ter essa universidade
aos seus pés. E agora está na hora de eu usar a minha jogada contra ele.
Certa vez, reneguei meu nome, consumida por sua grandeza e influência.
Toda a destruição que um Blackwell podia causar a si e a todos a seu redor.
Um dia não liguei para o meu sobrenome, assumi uma vulnerabilidade ao
acreditar nele, no menino dos cabelos negros e olhos azuis como o oceano,
neguei aquilo que eu era, o que eu tinha. Mas hoje, depois de anos, visto a
minha verdadeira máscara. Afinal, eu sou uma Blackwell. Nada é
impossível para nós. E se tem uma coisa que amo mais que botas da Prada e
batons vermelhos, é a reputação e o poder que esse sobrenome me dá.
Porque reputação é poder. Quando alguém te coloca em um pedestal
apenas por ter dinheiro o suficiente, você aprende os benefícios daquilo,
aprende que é impossível tentar fugir da podridão que vem com ela. E o pior
de todas as coisas: eu não podia negar ou ser hipócrita em dizer que não
havia aprendido a adorar todo esse poder. Havia aprendido como é o jogo,
como atravessar o tabuleiro e finalizar uma partida sem me machucar. Mas,
desta vez, eu usaria todas essas artimanhas, para mostrar que estava cansada
de fingir que era apenas uma garota quebrada que engolia tudo calada,
amordaçada.
Eu sei que estou estilhaçada, que nunca conseguirei juntar meus cacos,
mas me lamentar pelos cantos dessa cidade não adiantaria porra nenhuma.
Constantemente preciso me lembrar de quem me tornei, alguém que as
pessoas temem apenas por estarem no mesmo recinto que elas, por ter a
cidade aos pés, assim como tenho Nova York.
Minhas passadas fortes e brutas anunciam minha chegada à sala, nivelo o
salto de minha bota prata sobre a beira do último degrau da escada,
descansando o peso de meu corpo sobre o corrimão, pigarreio, chamando a
atenção de meus irmãos, encaro minhas unhas pintadas em um vermelho
vivo, sorrindo da magnífica ideia que me ocorreu.
— Não estou gostando desse olhar. — Dylan estende sua mão para apoiá-
la ao lado de meu braço, me curvo um pouco mais sobre a grade,
descansando minha cabeça em seu ombro. — Esse sorrisinho diabólico quer
dizer muita coisa, o que você está pensando em aprontar?
— Nós vamos dar uma festa! — exclamo alegremente e vejo meu irmão
me encarando como se eu estivesse dizendo uma coisa insana. — Vamos lá,
Dylan! Estou cansada desse silêncio, desta casa vazia.
— Não caia na lábia dela, Dylan, a última vez nós tivemos grandes
problemas — Ed resmunga do outro lado da sala, sem levantar o rosto de
seu Ipad.
— Ah, parem de ser chatos! — Bufo, revirando os olhos, caminhando até
onde meu irmão estava sentado. — É apenas uma festa, não é como se nunca
tivéssemos feito isso antes.
— Qual o motivo da festa? — Dylan me encara enquanto me deito,
deixando minha cabeça em suas pernas.
— Não há um motivo, apenas estou com saudades das que dávamos em
NY. E Oliver está fazendo esse mochilão pelo mundo, não vai voltar tão
cedo... — pontuo, encarando seus olhos com uma expressão de súplica. — E
ao contrário do que Ed diz… — Lanço um olhar de esguelha ao caçula, que
apenas dá de ombros. — Nós dávamos as melhores festas, Dylan!
— Vai se comportar? — diz cautelosamente.
— Você vai? — devolvo.
— Verônica, você prometeu! — Ed censurou, finalmente nos encarando.
— Ed, eu concordei em vir para essa cidade porque papai não me
deixaria em paz no meu apartamento até conseguir a porra de um diploma
para esfregar em seus sócios, mas isso não significa que vou fingir ser algo
que não sou. — Devolvo o olhar, franzindo o cenho. — É apenas uma festa
de comemoração ao início de semestre.
— Me prometa que vai se comportar — Meu irmão caçula me encarava
com toda desconfiança do mundo.
— Me prometa que vai se divertir. — Me levanto, sorrindo ao ver sua
careta. — Vamos lá, Ed, nós precisamos disso!
— E como diabos vai organizar uma festa em tão pouco tempo? — Dylan
questiona, dando de ombros.
— Eu tenho Mike — cantarolo. — Vocês sabiam que ele é popular agora?
— sussurro como se estivesse contando o segredo do universo, o que faz
Edmund me encarar com uma careta e eu começo a gargalhar. — O que foi?
— Vocês…? — Concordo com um sorriso malicioso, indo em direção ao
segundo andar.
— Não me olhe assim, ele realmente é bom no que faz.
— Deus, Verônica! Eu achei que havia deixado suas transas casuais de
lado depois de Nova York! — Dylan reclama assim que começo a seguir até
as escadas.
Era impossível não soltar uma gargalhada enquanto seguia para o segundo
andar. Sigo até o final do corredor principal e então encaro a porta fechada
em frente ao meu quarto. Fazia anos que não entrava ali, mas mesmo sem
olhar por entre a porta, sabia que tudo ainda estava no mesmo lugar, da
mesma forma que ela deixou. E mesmo que minha vontade fosse andar até lá
e rever as suas coisas, eu ainda não estava preparada para isso, para
enfrentar tudo o que aquela porta guardava; havia lembranças demais que
talvez eu não aguentasse. Suspiro fundo e apenas entro para meu quarto,
ignorando o de minha falecida irmã, minha melhor amiga.
Encaro algumas caixas de papelão jogadas pelo quarto e decido que está
na hora de finalmente abri-las, ou Mada, nossa governanta que dá vida a essa
casa, me pegaria pela orelha e me obrigaria a arrumá-las.
As primeiras eram apenas alguns sapatos que eu havia trazido junto
comigo, então os peguei e joguei em algum lugar do closet, decidiria se
realmente ficaria com eles em uma outra hora. Passei alguns minutos
organizando as que eram algumas roupas que minha mãe havia enviado antes
do seu próximo lançamento e juntando as outras caixas que faltavam. Quando
finalmente cheguei à última, parei antes mesmo de terminar de abri-la,
aquela caixa era a que eu havia deixado escondida no fundo do closet,
aquela que continha memórias de uma fase que eu ainda não havia decidido
se foi meu inferno ou paraíso pessoal.
Caminho lentamente com ela em meu colo e me sento no tapete que havia
no centro do quarto. Quando tiro de dentro o cropped do uniforme de líder
azul com o emblema do Saint Vincent College, foi como puxar meu passado
de volta. Havia tantas coisas que eu jurei manter afastadas de minha mente e
que agora estavam ali, me mostrando que não pode se esconder do próprio
passado. Foi como se toda a confiança que havia reunido mais cedo,
estivesse escorregando de minhas mãos. Quando pego a coroa do show de
talentos, uma foto cai entre minhas pernas, ao virá-la, prendo a respiração, já
não me lembrava dela e a recordação retorna como um raio tomando todo
meu corpo; sinto como se estivesse lá, posso sentir a brisa do vento gelado
cortando minha face, até sentir o beijo dele em minha bochecha, me fazendo
soltar risada. Logan envolveu minhas mãos com as suas em uma concha,
levando aos lábios para aquecê-las e foi neste exato momento que Summer
fotografou. Estávamos sorrindo um para o outro, sua coroa estava totalmente
torta em sua cabeça e a minha perfeitamente alinhada ao meu penteado. Ali,
naquele momento, estávamos felizes, nada podia nos abalar.
A próxima foto que puxo de dentro daquela caixa, foi a de nosso grupo.
Estávamos todos sentados em um enorme sofá na biblioteca do colégio,
todos vestidos com o uniforme do colégio. Summer segurava minha mão,
enquanto olhava para Hazel, que estava deitada em um dos meus ombros, eu
estava sentada ao lado de Logan, sorrindo para Sophie, que estava sentada
no chão, com as costas escoradas nas pernas de Ed, Levi fazia uma careta
estranha para Dylan, enquanto Logan gargalhava da situação. E os olhos de
Josh brilhavam ao encarar Ed sorrindo. Éramos um fodido grupo unido e às
vezes eu sentia falta de tê-los ao meu lado. Eles eram como um lar, um
aconchego para mim.
E com eles aprendi que quando se tem amigos que se tornam sua família,
não precisamos de mais nada. Uma pena que tudo o que o tive foi apenas
uma miragem, daquelas que se olharmos de longe, tudo reluz como ouro, mas
ao olhar de perto, tudo escorre como areia por entre os seus dedos.
— Eu sinto falta disso. — A voz de Ed me faz sobressaltar.
— Porra, Edmund! — esbravejo, levando uma das mãos até meu coração.
— Não foi minha intenção te assustar — diz, se sentando ao meu lado
esquerdo e então Dylan aponta a cabeça na fresta da porta, segurando uma
garrafa de tequila.
— Realmente, não foi. — Meu irmão mais velho sorri enquanto entra e se
joga do meu outro lado.
— O que estão fazendo aqui? — Ergo a sobrancelha.
— Não sei, só queremos ficar um pouco juntos! — Dylan diz cabisbaixo.
— Vocês estão carentes de atenção, irmãos? — Deixo a foto dentro da
caixa e Dylan a pega.
— Pega leve, Vee, você anda nos evitando... — Ed acusa e uma ponta de
culpa me preenche. — E nós nunca nos separamos.
A verdade era que eu não estava os evitando, só não queria que eles
arranjassem uma oportunidade de falar sobre a corrida e sobre o show,
porque sabia que eles fariam perguntas que eu nem ao menos tinha as
respostas.
— Lembro de quando tiramos essa foto — Dylan diz com um sorriso
enorme no rosto. — Eu subornei a bibliotecária para que a tirasse.
— Eu odiava esse uniforme. — Ed faz uma careta.
— Azul nunca foi sua cor, Ed! — Sorrio para meu irmão.
— Eu a odiava por ficar tão bem nesse uniforme — ele devolve.
Eu o encarei sorrindo e então me lembrei da minha visita à minha antiga
treinadora e seu convite. Não havia compartilhado com eles até o momento e
talvez estivesse na hora, principalmente porque eles sempre teriam uma
palavra certa para isso. Suspiro fundo, voltando o olhar para frente,
encarando a caixa.
— Emmy quer que eu dance no recital de Natal em uma apresentação
magistral — solto de repente.
Um silêncio incômodo surge no quarto. E por alguns segundos, eu me
arrependo de ter dito.
— E você quer dançar? — Dylan pergunta cautelosamente. — Desde
aquele dia… você não pisa em um palco com um público...
— Mas tudo bem se quiser, Vee — Ed completa com solta um sorriso
encorajador. — Dançar era parte de você também e nós sempre te
apoiaremos no que você precisar.
— Eu não quero — digo com relutância. — Quando eu estou dançando
apenas para mim, é como se eu pudesse senti-la ao meu lado, como nos
velhos tempos.
— Vee… — Dylan pega a minha mão e aperta.
— E eu quero manter isso para mim, quero mantê-la por perto de mim. —
Solto um suspiro e sinto Ed deitar a cabeça em meu ombro. — Se eu dançar,
seu eu subir naquele palco, vou sentir como se eu estivesse traindo a
memória dela, porque isso sempre foi o nosso sonho, nós duas juntas.
— Vee... Você não precisa se anular porque ela não está mais aqui. — A
voz de Ed era calma como se quisesse me tranquilizar, mas aquilo não
aconteceria, não agora que eu havia deixado os sentimentos dolorosos me
abraçar novamente, destruindo todo o meu bom humor.
— Será que isso um dia passa? — Lágrimas encheram a borda dos meus
olhos, mas eu já estava cansada de deixá-las cair.
— Não, Vee! A gente nunca supera uma dor como essa, nós a
ressignificamos. — Dylan beija minha testa quando me viro para ele. — Até
que conseguimos suportá-la.
— Eu estou tão exausta… sufocada de estar quebrada. — A tristeza
nublou as feições dos meus irmãos. — De fingir que esta cidade não é minha
ruína, de deitar a cabeça no travesseiro e lembrar do sangue dela em minhas
mãos, dela nos confidenciando seus segredos, eu só estou… exaurida de
tentar ser forte quando na verdade, não sou.
— Olhe para mim, Verônica. — Ed levanta a cabeça e segura meu rosto.
— Você é tão forte, tão resiliente. E eu tenho tanto orgulho se ser seu irmão,
de ter a dádiva que estar ao seu lado de todas as maneiras possíveis e de
poder te ver superar seus medos, como ela gostaria que superasse. Sophie
estaria orgulhosa por ver quem você se tornou, Vee.
— Ela merecia mais. — Solto um sorriso fraco.
— Você também merece — Dylan sussurra. — O que aconteceu não foi
sua culpa.
— Fui eu quem os trouxe para nossas vidas… — Pego a garrafa que
Dylan havia trazido e bebo uma quantidade considerável. — Deixei que uma
vingança por um coração partido tirasse a minha irmã de nós, eu destruí
pessoas inocentes. Então sim, eu tenho culpa.
— Verônica... — Dylan começa a dizer algo, mas o interrompo.
— Eu amo vocês dois, muito mesmo. — Passo cada um dos meus braços
pelos ombros deles. — Mas não tente me dizer coisas motivacionais para
aplacar essa culpa, porque nada fará com que mude a realidade.
— Um dia você verá que estamos dizendo a verdade — Ed diz.
— Enquanto esse dia não chega, eu prefiro ignorar esses sentimentos! —
digo enquanto Dylan recupera sua garrafa e bebe. — Alias, verde não é sua
cor Dylan, você está ridículo com essa blusa.
Eles me encararam incrédulos, como se eu estivesse louca. Mas a
verdade, era que estava apenas mudando o trajeto da conversa, antes que eu
me destruísse mais um pouco.
— Ela voltou a ser cruel, Dylan, nosso trabalho está concluído! — Ed diz
e nós caímos na gargalhada.
Encaro os dois homens à minha frente e penso como o tempo passou
rápido, há pouco tempo atrás eles não passavam apenas de garotos, eles são
a melhor parte dessa família. Por esses dois eu morreria e mataria. Edmund
e Dylan são muito mais que meus irmãos, são onde ficava meu abrigo, meu
lar.
Por ser filha de uma grande estilista da alta costura, desde minha infância,
aprendi a amar o mundo da moda. E com essa paixão, eu havia criado um
hábito, um lema: “Compre um vestido, se sinta um pouco aliviada. Compre
uma sessão inteira, e se sinta em paz”. E exatamente por isso, caminho nesse
momento entre as dezenas de lojas. Eu precisava de uma distração,
precisava fazer com que aqueles pensamentos que me rondavam, deixassem
de existir.
Deixo algumas sacolas no chão e me sento em uma cadeira fora de uma
cafeteria. Eu estava faminta e com uma puta ressaca, meus irmãos não
aguentavam beber tanto, mas ontem pareciam que queriam acabar com toda
adega que nossa família deixara em Saint Vincent. Dylan estava acabado
quando o encontrei no café da manhã e Ed não estava diferente quando
passou por mim na garagem, enquanto se arrastava até seu carro, xingando
até a última geração da nossa família por tê-lo deixado beber tanto.
Sorrio sozinha, pegando o cardápio e tentando decidir o que pedir. Não
havia tanta opção, mas havia algo que eu era apaixonada, donuts com
confetes coloridos. E quando finalmente a garçonete os trouxe, junto com um
café expresso, me senti no paraíso. Até uma sombra entrar em meu campo de
visão, me fazendo olhar sob os óculos escuros.
— Oi. — A voz de Summer era hesitante.
— Oi. — Ergo uma sobrancelha, encarando a garota loira à minha frente.
Summer estava com uma T-shirt do Capitão América e uma calça jeans
skinny. Sempre adorei o jeito dela de se vestir, mesmo que por dentro eu
adoraria fazer uma repaginada nela. Mas tudo era tão… Summer, que acabei
amando cada detalhe dela. Contraio a boca, tentando esconder o leve sorriso
que tenta me trair, lembrando de quando ela me induziu a me fantasiar de
She-ra para o Halloween da escola. E por baixo de todas essas roupas de
heróis, existe uma garota incrível. Um pigarro me fez desviar minha atenção
dela para seu companheiro. Josh me encarava com relutância, como se
estivéssemos em cima de um vidro e qualquer movimento ele se quebraria.
Mas quando voltei meu olhar para a garota loira, meu sorriso foi verdadeiro.
— Você ainda ama a Marvel!
— Que bom que não se esqueceu desse detalhe sobre mim, apesar de ter
me ignorado por todo esse tempo. — Ela dá de ombros e aponta para as
cadeiras vazias do outro lado da mesa. — Nós… podemos? — Eu sabia que
é apenas uma pergunta retórica, porque Sum não espera realmente por uma
resposta minha.
— Fiquem à vontade. — Reviro os olhos para minha antiga amiga. Uma
parte de mim, queria pedir desculpas por tê-los ignorado depois do
aconteceu, mas a outra parte, aquela que sabe que eu havia voltado a cidade
para um propósito que não inclui ressuscitar antigas amizades, me faz engolir
as desculpas garganta abaixo. — É meio impossível esquecer suas
predileções, Summer, principalmente quando tive que barganhar com meu
pai por uma seção de um dos seus filmes preferidos e, acredite, aquilo me
custou muito caro.
— Caro? O que seu paizinho te cobrou? — debocha estreitando os olhos
em minha direção e se inclinando para pegar o cardápio. — Um mês sem o
seu carro luxuoso? Ou ele recolheu todos os seus cartões de créditos e não
deixou a princesinha Blackwell comprar seus sapatos caros?
— Summer? — Josh a advertiu.
— Ah, Summer, como você pode ser ordinária! — Estalo a língua, lhe
lançando um sorriso malicioso. — A Marvel parou de lançar aqueles filmes
idiotas que tanto ama? Ou você se desiludiu com o Homem-Aranha e
descobriu que ele não é tudo aquilo que os quadrinhos prometiam?
— Também senti sua falta, sua pirralha mimada! — Ela gargalha e eu
sabia que estava se lembrando de como sempre nos alfinetamos antes que eu
me mudasse para Nova York, em uma época em que eu era feliz, que tudo
corria bem entre meus amigos. A garota loira a minha frente era uma das
minhas melhores amigas antes de tudo, e, Deus, eu sentia falta da nossa
cumplicidade.
Ficamos em silêncio por alguns minutos encarando uma à outra, o sorriso
que antes estávamos contendo se escancarou, seu olhar não deixou o meu,
como se um filme se passasse em nossas mentes dos melhores momentos que
estivemos juntas. Era estranho estar com eles, ver que ainda me enxergavam
como a Vee que abraçaram no corredor do colégio anos atrás, e aquela
situação estava começando a ficar desconfortável. Até Josh quebrar o
silêncio.
— Você está diferente — ele murmura, sua voz é quase hesitante.
— E vocês estão agindo como se eu fosse a rainha da Inglaterra e isso é
estranho pra caralho. — Sou interrompida pela garçonete que anota nossos
pedidos, voltando a nos deixar sozinhos.
— Não sabemos o que dizer, vocês desapareceram sem dar uma
explicação, quando voltam é como se o mundo em que vivemos não fosse o
suficiente para vocês, ficamos sem saber o que fazer e como agir, Vee... —
Ele respira fundo.
— Ainda sou eu mesma, Josh… A que te carregou bêbado na primeira
festa do semestre, que te ajudou a conseguir uma identidade falsa… —
Reviro os olhos para meu antigo amigo. — Nada mudou entre nós!
— Realmente sentimos sua falta — a loira admite, me encarando com
afeto.
Tento devolver o sentimento, mas algo dentro de mim me lembra que
agora eles podem não ser mais os meus melhores amigos, a lealdade deles
agora é direcionada a apenas uma pessoa, Logan. Apesar de toda a raiva que
tenho acumulada dentro de mim, jamais seria capaz de colocá-los em uma
situação de escolha. Eu precisava fazer o mesmo que havia feito com Hazel,
porque nunca os colocaria em uma posição de desconforto, em que
precisariam presenciar todas minhas brigas com Underwood. Contudo,
mesmo que haja um conflito dentro de mim, não consigo esquecer que um dia
eles também foram meus amigos, participaram da minha vida, assim como eu
participei da deles, e por isso suspiro e os encaro.
— Eu e meus irmãos iremos dar uma festa. — Sorrio, tentando mudar de
assunto. — Vocês deveriam ir.
— Vão voltar com a tradição do high school? Um monte de adolescente
bêbado. — O rosto de Josh se ilumina.
— Shh… não entregue nossos segredos por aí. — Pisco, vendo se o
sorriso de Josh se alargar e a Summer me presentear com umas de suas
caretas de desgosto. — E, aliás, agora já somos todos adultos, passíveis de
prisão, por isso, meus caros amigos, se comportem. — Josh gargalha. — É o
nosso último ano da faculdade, precisamos que seja memorável — concluo,
enquanto entrego meu cartão a mesma garota que trouxe meu pedido. — Eu
preciso ir, mas eu realmente gostaria de ver vocês lá.
Summer não consegue esconder o sorriso enquanto concorda em aparecer.
Me levanto, pegando as sacolas, eu realmente preciso encontrar Mike e fazer
com que ele concorde em me ajudar a planejar a festa e a levar o máximo de
pessoas que ele puder, e sabia exatamente onde o idiota estaria.
Durante todo o caminho até a The Falcons, fraternidade dos jogadores do
time de futebol americano da SVU, observo o campus abarrotado de
universitários. Quando passo em frente ao prédio de Medicina, meus olhos
param em Dylan e Hazel. Meu irmão se escora na parede e solta um sorriso
galanteador para ela, percebo que minha antiga amiga está com um jaleco
totalmente branco, com os cabelos amarrados em um rabo de cavalo e segura
um copo branco igual ao de Dylan. Não me surpreenderia se fosse ele que
tivesse ido até lá, apenas para passar um tempo com Hazel, principalmente,
quando sabia que eles tinham algo que havia ficado inacabável quando
fomos embora. O ver ali, todo sorridente para ela, me fez querer ajudá-los,
me fez querer fazer todo o possível para que conseguissem se acertar e
viverem a sua história, porque Dylan e Hazel mereciam um amor, mereciam
viver aquele sentimento. Eles eram bons um para o outro.
Sorrio, voltando minha atenção para a estrada e depois de alguns minutos
dando voltas intermináveis naquele local, finalmente estaciono em frente a
uma casa enorme, em estilo vitoriana. As janelas são pintadas de marrom e
se contracenavam com a madeira que faziam parte da decoração da fachada.
A casa era cercada por um jardim — que precisava de um cuidado extra
— enorme. Subo as escadas, tentando achar meu celular e quando finalmente
o encontro, um garoto esguio abre a porta e sorri para mim.
— Burhan? — pergunta, dando uma inspecionada em meu corpo e então
abre um sorriso malicioso. — Terceira porta, no segundo andar, gatinha.
— Idiota — resmungo enquanto passo por ele e entro, seguindo até as
escadas. Eu esperava uma casa toda suja, mas me surpreendo em ver tudo no
seu devido lugar e com um cheiro ótimo vindo da cozinha.
— Você parece surpresa demais por causa de uma casa. — Mike sorri do
alto da escada, vestindo apenas uma bermuda. Percorro o olhar por seu
corpo, passando lentamente pelo seu peitoral, eu não podia negar que o dele
era realmente bonito.
— Esperava uma casa toda bagunçada, com universitários bêbados em
todos os lugares. — Dou de ombros, terminando de subir.
— Nosso capitão é exigente demais, então temos que manter as coisas no
lugar aqui. — Apenas assinto, seguindo até seu quarto, ignorando a menção a
Logan e também o pingo de admiração por conseguir manter todos aqueles
babacas na linha. — Nossa sorte é que ele mal fica na fraternidade, prefere
ficar com os amigos em um apartamento fora do campus.
— Ninguém conseguiria ficar com vocês por muito tempo, Burhan. —
Paro em sua frente. — Vocês são insuportáveis.
— O que está fazendo aqui, Vee? — Sorri galante assim que fecha a
porta.
— Preciso de sua ajuda — digo, o observando chegar perto, até ficar
alguns centímetros longe de mim, eu podia sentir seu cheiro amadeirado e
meu corpo começava a dar sinais de que sabia o que queria.
— E em como posso te ajudar, Blackwell? — Sua voz saiu em um
sussurro enquanto passava as mãos pelo meu pescoço desnudo. Eu sabia
aonde Mike queria chegar e daria isso a ele, mas antes precisava ter certeza
de que me ajudaria.
— Vou dar uma festa e preciso que me ajude a planejá-la. — Encaro seus
olhos escuros e seu sorriso cresce mais ainda enquanto deixo que tire meu
casaco, fazendo com que caia no chão.
— Você não precisa de mim, é só dizer que está dando uma festa — se
abaixa sussurrando e deixando um beijo leve em meu ombro. — E todo o
campus irá correndo.
— Mesmo assim, eu preciso de ajuda! — Dou passagem para que ele
possa chegar até meu pescoço novamente. — Vamos lá, Mike, é apenas um
favor.
Me afasto por alguns segundos para encarar seu rosto, seus olhos estão
nublados de desejo, mas não darei o que ele quer, não até que concorde em
me ajudar. Preciso dessa festa, e meu sorriso aumenta quando Mike assente e
volta a se aproximar.
— Eu nunca falo não para você, amor! — declara.
Não tenho tempo para dizer mais nada, porque no minuto seguinte, Mike
cola nossos lábios em um beijo cheio de desejo. Solto um gemido suave
quando ele desce as mãos até minha bunda, me alavancando e me sentando
em sua escrivaninha, passando a mão por toda a superfície e derrubando os
objetos que estavam lá. Sua língua invade a minha em uma dança
sincronizada e quando o beijo começa a ficar mais quente, Mike me inclina
um pouco para trás, olhando meu vestido subir um pouco mais, mostrando
parcialmente minha calcinha. Ele lambe pecaminosamente os lábios feito um
lobo ao encontrar sua indefesa presa, então desliza suas mãos até a barra,
puxando-o para cima, finalmente libertando meu corpo, me deixando apenas
na minha langerie, um conjunto preto rendado.
— Você é gostosa pra caralho, Vee! — ele murmura, apoiando as mãos em
minhas coxas.
No fundo da minha mente, eu sabia que deveria avisá-lo que a porta
estava destravada, mas a sensação do perigo de que alguém pudesse entrar a
qualquer momento, me excitava ainda mais. Mike começa a se abaixar,
beijando meu pescoço, depois descendo mais um pouco e deixando beijos
em minha clavícula. Quando finalmente chega aos meus seios, ele os envolve
em suas mãos dando um leve aperto, cheirando minha pele. O traçar de seu
nariz sobre o vão de meus seios, me faz jogar a cabeça para trás, gemendo
ao senti-lo mordiscar meu mamilo ainda por cima do sutiã. Olhá-lo enquanto
sua língua se diverte me molhando, me deixa em êxtase; Mike devolve o
olhar, sorrindo maliciosamente sobre minha pele. Suas mãos abandonam
meus seios, percorrendo minhas pernas, apertando com força minha cintura,
enquanto seus dentes ainda me mordiscam. Levo minhas mãos aos seus
cabelos, puxando. Me remexendo sobre a mesa, afasto minhas costas do
tampo, dando passagem para que Mike possa tirar meu sutiã e brincar ainda
mais. Assim que seus dedos chegam ao fecho do sutiã, a porta é aberta de
uma maneira brutal. Um resmungo sai de meus lábios e quando levanto o
olhar para encarar o infeliz que havia atrapalhado meu momento, preciso
morder meu lábio inferior para segurar a risada. Logan está parado na porta
com as sobrancelhas erguidas em minha direção, seus olhos são uma mistura
de sentimentos incompreendidos, mas antes que eu possa desvendar qualquer
coisa, suas íris azuis se tornam o pior dos icebergs.
— Espero que esteja fazendo algo realmente interessante por não estar lá
embaixo junto com o resto do time, Burhan! — exclama, cruzando os braços
frente ao corpo e inclinando a cabeça.
Eu estava praticamente nua, sentada em uma escrivaninha, com Mike entre
minhas pernas e meu ex-namorado me encarando como se eu fosse a última
pessoa que ele quisesse encarar em toda sua vida.
— Eu posso te garantir que ele estava, capitão! — Solto um sorriso
diabólico. — E, no momento, eu preferiria ter a atenção do meu
companheiro apenas para mim. — Passo a mão pelo peitoral de Mike,
enquanto lanço as palavras em direção a Logan. — Então se puder fechar a
porta e começar a reunião sem ele, eu ficaria eternamente grata.
Mike apenas me encarou como se eu fosse muito corajosa ou muito idiota
por provocar Logan. Mas o que ele não sabia, era que Logan e eu vivíamos
para provocar um ao outro.
— Eu sou o capitão do time, anjo. E se ele quiser manter um lugar na
equipe, é melhor descer agora — responde, enquanto solta um sorriso
descarado em minha direção e se encosta no batente da porta.
O sorriso é daqueles que eu tenho certeza que fazem qualquer garota dessa
universidade cair aos seus pés, mas não sou uma dessas garotas. Nós
jogamos no mesmo nível. E exatamente por isso, saltei de cima da mesa, me
apoiando nela com os braços inclinados atrás de meu corpo, elevando meu
seio, esperando o que eu sei que veria em seguida. O seu olhar. Seus olhos
percorreram todo meu corpo, o desejo estampado em suas íris. Eu sabia que
o havia abalado. Sorri, passando meus dedos por meus lábios
despretensiosamente lento, assim que nossos olhos voltam a se cruzar, lhe
lancei uma expressão doce, quase angelical.
— Está com ciúmes, capitão? — pergunto, inclinando a cabeça e fingindo
confusão.
— Não se iluda, anjo! — Ele leva a mão até o queixo, quando percebe o
que estava fazendo. — Você é apenas uma peça descartada do baralho.
Mike me entrega meu vestido e quando estou apropriadamente vestida,
passo meu casaco pelos meus braços e caminho até ficar a poucos
centímetros de Logan. Sua respiração é descompassada. Pela primeira vez
seus olhos não contêm ódio ou repulsa, é algo mais atroz, mais violento e
animalesco. E eu reconheço aquilo, reconheço dos momentos em que ele me
deitou sobre o capô de sua antiga caminhonete e me fez esquecer meus
problemas, de quando éramos um só e jogávamos nossos piores jogos.
— Então por que está me encarando como se desejasse estar no lugar de
Burhan, capitão? — Estendo meu braço para pegar a bolsa que está atrás
dele, aproveitando a aproximação para sussurrar em seu ouvido, sentindo
sua respiração em minha bochecha: — Cuidado, desejar aquilo que é
proibido, pode te levar a ruína novamente!
Abaixo meus olhos até suas mãos fechadas em punhos e deixo um beijo
em sua bochecha enquanto me afasto. Eu havia irritado Logan Underwood,
da mesma forma que ele havia feito na noite do show, cantando aquela
música que fodeu com meu psicológico.
Solto um sorriso de escárnio enquanto caminho pelo corredor estreito e
saio daquele lugar antes que ele pudesse proferir alguma ofensa em minha
direção. Logan já tinha partes suficientes minhas para me destruir, e não
estava disposta a dar mais nenhuma.
Contudo, isso não significava que não destruiria as partes dele que ainda
havia sobrado, caso ele ficasse em meu caminho para conseguir o que eu
desejava.
Estou acostumado com a escuridão, estou acostumado com a escuridão
Eu sou apenas um homem, sou apenas carne e osso
Eu não posso refazer tudo que eu fiz
E agora não há mais ninguém para amar
Estou acostumado com a escuridão
Used To The Darkness | Des Rock

Dizem que o primeiro amor, deixa marcas para a vida inteira. E talvez
isso seja verdade, talvez eu esteja marcado por Verônica Blackwell desde o
momento que meus olhos recaíram sobre os dela. E talvez eu carregue isso
para sempre. Mas algo dentro de mim me dizia que estava na hora de deixar
aquele sentimento ir, deixar que o ódio parasse de nublar todo o meu ser
quando se tratava daquela família.
Porque eles mal haviam voltado e Verônica e eu já estávamos de volta em
um ciclo vicioso, tóxico e infantil, um ciclo no qual sabíamos que não
haveria como sair ileso. E eu sabia que na minha memória congestionada, no
meio de todo o meu caos, ela ainda estava lá, dançando em volta de mim e
sorrindo como se eu fosse a sua pessoa favorita em todo o mundo. Cada vez
que eu pensava na garota dos olhos âmbares, podia sentir a dor que senti
todos esses anos, podia sentir como ela quebrou meu coração em tantas
partes, mesmo sabendo que estava dentro, como não se importou em me
expulsar da minha própria casa, e muito menos deixou algum sentimento
transpassar dentro de si.
No passado, eu costumava achar que Verônica Blackwell era a minha
salvação, mas no fim, ela estava certa, desejar algo proibido acabou sendo a
minha própria ruína.
E eu não estou disposto a me destruir novamente.
— Você não parece estar bem… — Melany diz, entrando no meu quarto e
se escorando na porta com uma das mãos, enquanto força um sorriso em
minha direção.
— Como entrou aqui? — pergunto, ignorando sua frase e devolvendo o
sorriso, afastando o edredom de meu corpo e batendo duas vezes no colchão
para que ela se deitasse ao meu lado.
— Existe uma campainha e mais pessoas que moram nesta residência,
irmãozinho. — Seu sorriso aumenta quando se ajeita na minha cama. —
Agora me conte o porquê de estar em casa em um sábado, com um livro entre
as mãos e não naquelas festas que todos ficam bêbados e fazem merdas.
— Por que estou preferindo ler? — Ergo uma sobrancelha, balançando o
meu livro levemente e lhe lançando uma careta, como se eu estivesse
dizendo o óbvio. — Não vivo apenas de festas, minha querida irmã.
— Qual livro desta vez? — diz, tomando o exemplar de minhas mãos e
lendo o título. Quando finaliza a sua pequena averiguação, Mel ergue uma
sobrancelha. — Eu não sabia que era fã de fantasia.
— O quê? Você acha que eu só leio livros com ação, carros e violência?
— Reviro os olhos com sua incredulidade. — Curto fantasia, sim. E esse,
nossa… realmente estou em êxtase com o plot desse livro! — Solto uma
gargalhada. — Estou em um loop eterno para saber o tamanho da
filhadaputagem do Maven, como ele lança um: “não, eu acho que não”.[1]
Foi assustador, Melany!
Melany encosta a cabeça na cabeceira da minha cama e solta uma
gargalhada. É doce e singela, como se eu fosse a pessoa mais engraçada de
todo o universo.
— Você, Logan Underwood, é sem dúvidas, um bookstan de péssimo
gosto! — ela exclama, fazendo com que uma sobrancelha se erga. — O quê?
É a verdade!
— Vou te obrigar a ler essa saga, Melany Underwood! — debocho,
atrapalhando seu cabelo. — Agora desembucha, o que veio fazer aqui?
Ela solta um suspiro e me lança um pequeno sorriso que chegava a ser
receoso.
— Audrey quer fazer um almoço em família, vai apresentar o novo
namorado.
— Ela finalmente decidiu desencalhar? — Solto um sorriso travesso e
fecho o livro, deixando-o na mesa de cabeceira. — Eu fico feliz por ela,
estava na hora.
— Eu também! — exclama com animação e então respira fundo aos
poucos, deixando o sorriso sumir, dando lugar a um olhar perdido. —
Logan…
— Por que eu tenho a impressão de que vem merda por aí, Mel? — A
interrompo e a encaro sério.
— Eu sei que ela está em Saint Vincent. — Melany morde o lábio inferior
e suspira como se fosse contar algo que talvez se arrependesse. — E eu… e-
eu a conheci…
— Blackwell foi atrás de você? — Tento manter meu tom suave, mas por
dentro eu podia sentir todo o ódio sendo despertado. Verônica poderia ser
cruel comigo, poderia jogar seus jogos maquiavélicos, mas ela não faria
nada a Melany, não dessa vez.
— Não! — Revira os olhos como se eu tivesse dito uma coisa estúpida.
— Ela foi visitar Emmy e era meu horário de aula, então a gente meio que se
esbarrou.
— Por que ainda sinto que não foi aí que isso terminou? — Franzi a testa.
— Não sei se devo te contar. — Melany estudou meu rosto, buscando
algum sinal de raiva ou algo do gênero e quando não encontrou, ela
prosseguiu: — Agh! Tudo bem… Ela não me reconheceu e então me ajudou
com alguns passos.
Aquilo não me surpreendia, Verônica sempre foi altruísta, sempre que via
algo em que pudesse ajudar, ela o fazia. Mas é Melany, a minha irmã, a
mesma que foi enviada para o abrigo por culpa da minha ex-namorada.
Antes, eu não teria duvidado que ela faria tudo de bom grado, mas essa nova
versão de Verônica, essa mulher que voltou agora, não é mais a garota que
um dia conheci. Pude olhar em seus olhos e constatar, ela só se importava
apenas consigo mesmo, não se importaria de passar por cima de qualquer um
que fosse apenas para mostrar que ainda detém o poder.
— Espero que não tente se aproximar dela novamente, Melany — Cerrei a
mandíbula, sentindo raiva da ingenuidade de minha irmã caçula. — Não
preciso te lembrar do quão desumana Verônica é.
— Se ela é tão desumana como você mesmo diz, por que você um dia
chegou a amá-la? — ela pergunta calmamente, me lançando um olhar
curioso.
— Porque eu tenho a tendência a fazer as piores escolhas para minha
vida! — respondo encarando o vazio à minha frente, com um olhar perdido.
— Eu amei uma versão de Verônica que não existe mais, Melany, uma versão
que poucas pessoas tiveram a chance de conhecer e que foi quebrada no dia
que sua irmã morreu.
— Logan, alguma vez você já pensou em perdoá-la, por tudo que ela fez?
— pergunta hesitante, enquanto brinca com seus próprios dedos. — Porque
eu já a perdoei…
— Você ainda é uma criança, Mel… — digo, a encarando, tentando não
soar ignorante. — Não entende as consequências dos atos das pessoas
ainda.
— E você entende? — Me encara do mesmo jeito que eu a encaro. —
Porque, pelo que eu sempre soube, vocês eram adolescentes, imaturos e
inconsequentes quando tudo aconteceu.
— Você não sabe do que está falando, Melany! — censuro com voz agora
regada a rispidez. Olho para ela realmente sem querer acreditar no que ela
acabou de dizer, peço espaço para que eu possa sair da cama. Paro, olhando
para minha irmã, exasperado, e levo minhas as mãos a cintura, deixando
prender minha cabeça, ela não era tão pequena quando tudo aconteceu, mas
isso significava que entendia o quão grave foi as consequências das ações de
Verônica. Levanto meu rosto quando ouço o suspiro de minha irmã.
— Nossa família também os machucou, Logan. — Ela suspira, como se já
esperasse pela reação que eu estou tendo no momento.
— Nós não estávamos dentro daquele maldito carro, Mel — declaro com
os olhos ardendo em raiva — Nós não fizemos com que Sophie capotasse e
morresse, ela deveria ter entendido isso. Mas não! — Passo as mãos pela
cabeça, suspirando fundo, eu não posso aceitar que ela a defenda. —
Verônica precisou fazer todas aquelas coisas atrozes, precisou te deixar
desamparada e ainda comprar a casa que era da nossa mãe… Ela fez isso
para se vingar de uma coisa que nós não tínhamos como controlar! —
Respiro fundo, tentando manter o resto de calma que ainda havia dentro de
mim. — Então não, não penso em perdoá-la.
— Eu nunca estive desamparada. — Suspira. — E espero que um dia
entenda…
— Entenda o quê? — Vejo ela se levantar e se preparar para ir embora.
— Que eles podem ter nos separado por alguns anos, mas eu ainda estou
aqui, Logan. — Solta um sorriso fraco. — Você ainda pode conversar, rir e
tudo mais comigo, ainda pode ter a sua irmã ao seu lado. Mas a Verônica
não, ela não pode ter o que nós temos, porque, pelo que eu soube, o nosso
irmão não se importou com porra nenhuma, além dele mesmo. Talvez nós
não tenhamos culpa, mas ele quis jogar um jogo perigoso. — Melany
caminha até a porta e a abre. — E todos nós viramos peças dele, mas o
problema é que o Xeque-Mate veio do outro lado do tabuleiro.
— O problema, Mel, é que esse Xeque-Mate não machucou apenas
Aidan, machucou todos nós! — Solto uma lufada de ar erguendo minha mão
até meus cabelos e bagunçando-os.
— Eu amo você, Logan, muito! Porém, você pode até estar machucado
por ela ter destruído o que tinham por uma retaliação. — Ela suspira como
se estivesse desistindo dessa conversa. — Já a Verônica, Logan, está
quebrada de uma tal forma, que talvez ela nem acredite que possa juntar os
cacos.
Não respondo, apenas a deixo ir. Eu não queria aceitar que talvez Mel
estivesse certa, porque aceitar isso é ter que dar o braço a torcer, deixando
ela vir até mim. É deixar Verônica Blackwell para trás e trazer a Vee à tona
mais uma vez. E eu não estou disposto a isso. Porque Verônica Blackwell
era como uma droga, e a sua abstinência ardia, doía e até mesmo chegava a
sangrar.

Existia algo que odiava na faculdade: às segundas-feiras, o campus ficava


lotado e as cafeterias extremamente aglomeradas, o que me fazia dirigir até o
centro apenas para tomar um café da manhã decente. E para completar minha
manhã caótica, meus amigos decidiram que hoje querem me acompanhar. E é
exatamente por isso que estou entre todos eles, escutando como eu havia
perdido uma festa em alguma fraternidade no final de semana e em como
Hazel e Dylan haviam se aproximado durantes todos esses dias desde que
ele havia voltado, o que, pelas minhas contas, havia sido há duas semanas.
— Agh! Eu odeio começos de semestres! — Summer diz ao meu lado,
encarando seu celular que vibrava incansavelmente, enquanto leva a xícara
até seus lábios e bebe o líquido fumegante.
— Você fala isso desde quando começamos a estudar nessa faculdade,
Sum! — Levi, que está sentado à minha frente, afirma, levando seus olhos
brilhantes até a loira.
— É sério! É a quarta caloura que me liga pedindo monitoria. — Bufa
nervosa, passando as mãos pelo rabo de cavalo. — Estou começando achar
que devo ser a única monitora esse ano.
— Pense pelo lado positivo — Hazel finalmente diz algo, ela se manteve
quieta desde que se sentou ao lado de Levi —, são mais créditos para o seu
currículo.
— Summer não precisa de mais créditos — afirmo encarando Hazel e
apontando minha mão que estava ocupada com um donut meio mordido para
a loira —, ela é a melhor aluna do curso de psicologia.
— Não me culpem por ser inteligente. — Ela dá de ombros, sorrindo,
fazendo com que todos nós erguêssemos uma sobrancelha.
— Não seja soberba, Sum! — Josh repreende, sorrindo. — É um dos
grandes pecados.
— Vou te ensinar o que é soberba quando precisar de uma ajuda com
algum trabalho, babaca! — Ela devolve, fazendo um gesto nada gentil e
todos nós gargalhamos.
— Eu preciso de ajuda para comprar a comida da semana, queridos
amigos! — Levi anuncia com a voz arrastada, enquanto leva o copo até os
lábios. — Quem se habilita?
— Tenho treino — digo pegando minha mochila, antes que sobrasse para
mim. — E depois uma aula extremamente importante.
— Tenho que me encontrar com a treinadora — Hazel diz, erguendo os
olhos do celular e pega sua bolsa, quase que correndo, seguindo o mesmo
caminho que eu. — Eles querem alguém para ser a capitã e não acham
alguém que realmente seja boa.
— E por que você não se candidata? — Josh pergunta o óbvio.
— Quase me matei para suprir a falta da Verônica no colegial, não quero
ter essa experiência novamente — responde e solta um sorriso quando lê
algo em seu celular. — E a faculdade está me esgotando demais para ser
capitã.
— Eu tenho que me encontrar com Ed, não posso ajudar! — Josh se
levantou e nós o encaramos incrédulos, até mesmo Hazel desgrudou o olhar
do celular. — Por que estão me encarando assim? Ele precisa de ajuda para
se adaptar à faculdade e eu me ofereci.
— E-eu só não esperava por isso, não depois… — Levi começa a falar,
eu dou um tapa de leve em sua nuca, antes que dissesse alguma merda. —
Que porra, Logan!
— Cuida da sua vida, babaca! — xingo, me aproximando da mesa e
pegando o último Donut. — Summer será a encarregada de ajudar nosso
amigo.
— Eu? — indagou confusa enquanto eu dou uma mordida.
— Óbvio! Você está surtando com as monitorias, então faça disso um
bônus para não precisar enfrentar os calouros hoje! — Solto o meu melhor
sorriso, indicando a porta para Josh e Hazel. — Tentem não comprar
porcarias demais.
— Vai para o inferno, Underwood — Levi diz, gargalhando.
Quando ultrapassamos o estacionamento, sorrio ao ver meu Ford Mustang
estacionado em uma das vagas da cafeteria, Hazel apenas me deu um beijo
em minha bochecha e na de Josh e seguiu até o outro lado da rua, onde uma
Land Rover preta estava estacionada. Meu amigo soltou um sorriso e Dylan
abaixou o vidro e deu um leve acesso com a cabeça para ele, mas quando
seu olhar voltou para mim, que estava encostado em meu carro, ele
simplesmente ignorou a minha presença e eu fiz o mesmo.
Quando eles somem pelas curvas da cidade, acendo um cigarro,
apontando para Josh entrar no carro, então faço o mesmo. Precisava chegar à
universidade em quinze minutos ou meu treinador me comeria vivo desta
vez.
— Eu preciso alertar Hazel para tomar cuidado? — pergunto, colocando
meus óculos escuros e acelerando.
— Não acho que deve se meter. — Josh dá de ombros. — Do mesmo jeito
que ela não se intromete nesse jogo de gato e rato que você e a Verônica
travaram.
— Ela é minha melhor amiga! — Solto a fumaça entre meus lábios,
dizendo o óbvio. — Aquela família não é confiável.
— Para de ser babaca, Underwood. — Josh se escora no banco, me
encarando. — Hazel não tem nada a ver com o fato de você não ter aceitado
que Verônica transou com Mike e cagou para a sua presença quando invadiu
o quarto.
— Como é que é? — Ergo a sobrancelha olhando de relance para seu
rosto sereno.
— Seja sincero consigo mesmo, Logan, os jogadores te avisaram que ela
estava lá com ele e você praticamente surtou e invadiu o quarto do cara com
uma desculpa de merda. — Ele fez uma pausa, estudando o meu rosto e então
soltou um sorriso. Volto minha atenção para a estrada, ignorando seus
argumentos. — Então para de agir como se ela fosse o problema, quando, na
verdade, é você.
— Você está completamente errado. — Cerro os dentes.
— Não, não estou. — Seus olhos brilham. — E sabe por quê?
— Não e nem pretendo saber. — Solto um suspiro de alívio quando
percebo que já chegamos em frente ao bloco de Josh, mas antes que saísse
do carro, ele me encara sério.
— Porque, por mais que você queira odiá-la pelas merdas que
aconteceram no passado de vocês — seu sorriso cresce e suas palavras
saem com convicção —, você ainda a deseja e está surtando porque não
sabe lidar com isso.
— Saia do meu carro antes que eu repense sobre você ser meu amigo,
Brown! — Respiro fundo.
— Eu sou essencial na sua vida, Underwood. — Ele abre a porta e se
prepara para sair. — Sei que não conseguiria outro amigo como eu.
— Levi ocuparia esse lugar sem nem mesmo praguejar! — Solto um
sorriso, encarando-o. Quando ele fecha a porta, e se abaixa, eu inclino meu
corpo para olhar para seu rosto. — Ah! E pela sua petulância, arrume outra
carona.
— Ele é o nosso Maria-fifi, Logan, ele nunca pragueja de nada! — Solta e
então me encara com uma expressão de piedade. — E não seja uma criatura
cruel que leva ódio para o coração, eu preciso de carona até que meu carro
saia da oficina.
— Por mais que você me irrite, eu não te negaria uma carona. — Solto um
suspiro bem longo. — Mas tenho um treino agora e depois uma aula que vai
me tirar toda a paciência, Josh. — Ele apenas assentiu, me lançando um
sorriso de conforto e começa a caminhar.
Fico observando-o até que um Bugatti estaciona a duas vagas da minha.
Edmund sai do banco do carona, ele inclina seu corpo para pegar algo que
vejo ser sua mochila e ajeita o moletom preto pelo corpo. Do outro lado,
ainda com a porta aberta, vejo as pernas que por tantas vezes circularam
minha cintura. Edmund move os lábios, dizendo algo ininteligível e Verônica
enfim sai do carro, fechando a porta com o pé. Tendo sua bolsa nas mãos,
ela dá a volta no carro, dizendo algo ao irmão e levando um Donut que sei
que contém confetes coloridos como cobertura até seus lábios. Ed faz uma
careta e responde algo que a faz gargalhar. E mesmo que o som não pudesse
ser ouvido daqui, eu o escutei em meus pensamentos. Ainda me lembrava de
quão inebriante era o som da sua risada, de como trazia uma sensação de
calmaria e conforto.
Por mais que você queira odiá-la pelas merdas que aconteceram, você a
deseja.
A voz de Josh em meu pensamento me faz balançar a cabeça em
descrença. Ele está errado. O caralho que desejo aquela mulher demoníaca,
eu apenas estou sedento por alguma maldita atração física.
Todo mundo tem esse lado incontrolável, todos sentem vontade de
pertencer a um corpo. E essa era a minha situação, eu precisava apenas de
contato físico de alguma mulher, seja lá quem for.
Não de Verônica. Não da garota que me faz queimar por dentro.
Acelero novamente, ignorando os três que agora estavam em uma
conversa agitada. Volto a dirigir por alguns metros até o estacionamento da
área esportiva, encaro alguns colegas de time conversando na entrada do
campo, então apenas pego minha mochila e meu casaco e sigo em direção à
entrada. Aceno quando passo por eles e vou até ao vestiário. Contudo, sou
impedido de fazer o que pretendia por um dos calouros assim que ultrapasso
a seção dos armários. Ele para à minha frente e solta um sorriso acanhado,
fazendo com que eu respire fundo, já esperando algum problema.
— Desembucha, Mackenzie — digo enquanto me encosto no meu
armário.
— É-é sobre a festa — gagueja, tentando ajustar sua postura. — Eu e os
outros jogadores gostaríamos de saber se estamos dispensados esse final de
semana.
— Não sou o treinador, Mackenzie — digo impassível, digitando o meu
código. — É para ele que vocês devem perguntar.
— Mas você é o capitão, Underwood! — Insiste. — É a primeira festa do
semestre e os caras acham que devemos todos aparecer juntos para causar
uma boa impressão.
— Você sabe de quem é a festa e o porquê deles te colocarem para vir
falar comigo, não sabe? — questiono, respirando fundo, enquanto ele nega.
— Diga a porra do Mike que se ele quiser levar o time nesta festa, que leve,
mas não espere que eu apareça por lá.
— Isso é um sim? — Ergue a sobrancelha, esperançoso.
— É um foda-se — resmungo enquanto finalmente abro meu armário e
retiro meu uniforme de lá.
Quando me viro novamente, o garoto havia sumido. E mal tive tempo para
respirar aliviado, porque levo os olhos até onde o treinador me encara de
sua sala e o observo apenas erguer o dedo me chamando. Eu sabia que o dia
não seria um dos melhores, então apenas bufei e segui até a pequena sala
regadas de bolas Wilson autografadas por diversos ex-estudantes da Saint
Vincent University que passaram no Draft e que agora jogam nos melhores
times do país.
— Posso saber o que disse para o pequeno Mackenzie saísse tão
amedrontado? — pergunta sério, enquanto se senta em sua poltrona.
— A verdade! — digo e me jogo na cadeira à sua frente.
— Vai me contar o porquê de estar tão frustrado? — Seu olhar estava
preocupado, como sempre fez desde que nos conhecemos. — Está mais
nervoso do que antes e por mais que eu adore essa reação dentro do campo,
fora dele me preocupa.
— Não irei prejudicar o time, pode ficar despreocupado treinador — digo
o encarando.
— Eu sei que não vai. — Sua voz se torna suave, ele inclina o corpo para
frente e apoia o cotovelo na superfície da mesa, me encarando. — E não
estou preocupado com isso, mas, sim, com você.
— Não há nada de errado comigo! — Me empertigo na cadeira,
incomodado.
— Não, mas você é o capitão do meu time, Logan. — Suspira, tenso. —
Nosso primeiro jogo é em algumas semanas, então eu preciso saber se seu
rendimento irá cair por conta dos seus problemas pessoais.
— Meus problemas pessoais nunca interferiram em meu desempenho, essa
não será a primeira vez — balbucio, me levantando. — Estou dispensado?
— Está, mas não para o treino. — O encaro confuso. — Tenho uma
reunião com reitor agora sobre a temporada de jogos, liberarei todos do
treino hoje. — Respiro fundo, assentindo e me preparando para sair de sua
sala. — Logan? — O encaro novamente. — Você vai à essa festa.
— Nem fodendo — respondo no automático.
— Irei ignorar a palavra de baixo calão. — Solta um sorriso fraco. —
Preciso de alguém que tome conta desses irresponsáveis.
— Não irei em uma festa para ficar de babá. — Faço uma careta. —
Ainda por cima de dez jogadores.
— Preciso lembrar quem você é? — resmungo alto e ele solta um sorriso
triunfante.
— Não irei me responsabilizar pelas atitudes deles — digo, me virando
para sair.
Caminho até meu armário e retiro minha mochila novamente, jogando-a
sobre os ombros, e sigo andando até a saída do vestiário. Eu tinha apenas
uma aula à tarde, então decidi caminhar até a biblioteca, não estava nem um
pouco a fim de voltar para meu apartamento ou ir até a fraternidade. E lá era
a melhor opção, o caminho não era tão longe e ninguém me incomodaria. Em
menos de dez minutos, estava subindo as escadas do enorme prédio. Audrey
não estava aqui hoje, então apenas caminhei até o terceiro andar e me sentei
entre a última fileira, retirando meu caderno de desenhos.
Precisava urgentemente terminar um projeto para a aula de design, se não
entregasse pelo menos o esboço, meu professor com certeza iria decidir que
falar com meu treinador seria uma ótima opção. E eu estava fugindo de
conversas motivacionais, principalmente depois de hoje.
Não prestei muita atenção ao meu redor pelas próximas horas, para ser
sincero, apenas rabisquei alguns esboços abstratos, tentando ocupar minha
mente com algo que não fosse minha ex namorada ou minha conversa com
Josh, porque aquilo estava realmente me tirando do sério. E quando
finalmente decidi me levantar e procurar algo que não me fizesse pensar na
minha realidade, o barulho de saltos e a voz nervosa de Verônica me fizeram
paralisar. Merda, nem escondido consigo escapar de meus pensamentos e
da presença dela.
Me ponho de pé rapidamente, tentando não fazer barulho, recolho minhas
coisas e encosto na prateleira atrás de mim, olho por sobre o ombro, vendo
por uma brecha ela parada, depositando algumas coisas sobre a mesa e
segurando o celular entre a orelha e o ombro.
— Não, Oliver, ele não está certo! — Ela parou, pegou o celular com uma
mão, levando a outra livre à cintura. Ficou em silêncio por alguns segundos,
ouvindo a resposta. — Não, não concordo. Nós saímos da NYU por outros
motivos, não por conta daqueles idiotas. — Segura o celular com força,
como se estivesse descontando sua raiva nele. — Ollie, não precisa voltar
porque ele quer que você volte. Seja egoísta pelo menos uma vez na sua
vida, você escolheu isso porque precisava ser livre, precisa de um tempo
longe de toda essa toxicidade, eu te apoiei. — Moveu a cabeça em
concordância, sorrindo. — E sempre vou te apoiar. Então se aparecer aqui,
eu juro que vou chutar sua bunda em direção ao aeroporto.
Encarei a parede à minha frente, me xingando mentalmente. Não deveria
estar aqui escondido, escutando essa conversa, mas uma parte de mim queria
saber qual a relação que Verônica tinha com Oliver. Sabia que ele era
apaixonado por ela quando éramos namorados, mas o carinho com que ela
falava com ele agora era diferente daquela época, me dizia que talvez ela
retribuísse os sentimentos dele.
— Você deveria parar de bisbilhotar todas as vezes que nos esbarramos
aqui, Logan — ela diz friamente atrás de mim, me fazendo sobressaltar.
Merda! Merda! Merda!
— Não que seja da sua conta, Verônica. — Me viro para encará-la.
Percorrendo os olhos por seu corpo lentamente. Preciso engolir em seco,
porra, não havia um maldito dia que ela não estava vestida para foder com o
meu psicológico. Ela está incrivelmente linda, o vestido branco simples que
torneava seu corpo, ia até no meio de suas coxas, por cima dele um casaco
preto de botões dourados. Abaixei os olhos até seus sapatos, que iam até
seus joelhos, e que com certeza era mais caro que meu aluguel, a deixam
ainda mais intimidadora e é impossível não imaginar suas pernas em volta
da minha cintura, enquanto eu a fodia. — Mas eu já estava aqui primeiro.
— Não tenho dúvidas disso! — debocha, apontando para minha mochila,
me mostrando que estava pronto para sair. — Mas não deveria escutar
conversas que não lhe dizem respeito.
— Não tenho culpa se escolhe lugares públicos para derramar seus
segredos para seu… — dou de ombros — Amigo.
— Estamos em um jogo de descobrir segredos agora, uh? — Ela coloca a
mão no coração, fingindo surpresa. — E você acha que pode jogar esse jogo
comigo, capitão?
— Não estamos sempre jogando um jogo, anjo? — digo, dando um passo
em sua direção. — Acredito, que assim como antes, não é tão difícil
descobrir seus segredos.
— Você terá uma decepção enorme em perceber que é sim difícil de
descobri-los, capitão! — Ela dá um passo em minha direção, mostrando que
não tem medo de ameaças. E aquilo me fez querer sorrir, porque eu sabia o
quão forte ela pode ser.
— Talvez sim, talvez não! — Dou mais um passo, quebrando a nossa
distância. Abaixo meu rosto para que pudéssemos nos encarar. Mas quando
aqueles olhos âmbares encontraram os meus, pude enxergar que existia um
universo a ser desvendado ali. — Afinal, você é boa em fingir sentimentos,
não é mesmo?
— Ainda de coração partido pelo nosso caso no passado? — Sua voz
deveria sair forte, mas saiu abalada, como se também sentisse essa energia
entre nós. — Não me encare assim.
— Assim como? — Ignoro sua primeira pergunta, eu poderia mentir, dizer
que já havia superado aquilo, mas nem eu mesmo sabia se realmente havia
esquecido aquela merda toda.
— Como se quisesse me jogar entre essas prateleiras e me beijar —
sussurra.
— Eu acho que você anseia por isso, anjo — digo, levando minhas mãos
até seu queixo e o levantando, fazendo com que nossos rostos quase se
encostassem. — Acho que nesse momento, está imaginando as coisas que eu
poderia fazer com a minha boca, em como eu poderia me abaixar aqui. —
Toco a bainha de seu vestido com a outra mão. — E te mostrar como alguém
realmente deveria foder você, com um ou dois dedos e depois com a língua.
— Não deveria dizer coisas que nunca irá conseguir cumprir, capitão! —
Seu sorriso se torna travesso, então leva sua mão até o cós de minha calça e
dedilha lentamente a borda. — Porque nós sabemos que isso é tensão sexual
reprimida, e se precisa de tanta ajuda assim para dissipá-la, talvez eu deva
me abaixar também, e te mostrar o que a minha língua pode fazer com seu
pau.
Filha da puta. Penso em todas merdas que possam fazer com que meu pau
não fique duro. Mas, porra, é obvio que ele não irá cumprir com meu desejo.
— Você fica extremamente sexy quando tenta ser uma vilã, anjo! —
Devolvo o sorriso, sabíamos que estávamos jogando um jogo perigoso
naquele momento, porque ali eu esqueci o quão fodida estava a minha
realidade e por um momento, eu sabia que ela também.
— Nós somos vilões, capitão! — ela sussurra com a voz suave, quase
melódica. Afastando minhas mãos. — Não ache por um momento que nós
somos heróis, Underwood, porque ninguém irá te ajudar a salvar o mundo.
— Somos parceiros, Blackwell. — Solto um sorriso malicioso me
afastando um pouco. — Por todo um semestre, então guarde seu veneno para
que tenha o suficiente para destilar até lá.
— Não preciso economizá-lo, Underwood! — Ela devolve o sorriso,
descendo as unhas pintadas de um vermelho escarlate pela extensão da
minha jaqueta. — Porque quando se trata de você, ele se renova
automaticamente. — Ela umedece os lábios e afasta, ajeitando sua postura.
— É um aviso, Logan: mantenha suas mãos longe de mim ou da próxima
vez, às encontrará no fundo de um tambor com ácido fluorídrico.
Ela não me dá nenhum tempo para responder, apenas se vira e caminha
devagar, com uma sensualidade que apenas ela tem, chamando a atenção dos
pequenos grupos de estudantes que haviam chegado durante a nossa pequena
discussão. Ela sorri para os garotos, como se amasse ser admirada.
Verônica sabia o poder que tinha e eu tinha a total certeza de que ela
recuperaria sua coroa após a festa que daria nesse final de semana.
E ela começou a dançar, romântico e sensual
Provocante, mas ela é incrível, a própria obra-prima Mona Lisa
De onde você é? Me pergunto se tem outras de você
Ela tem toda a minha atenção, ela é confiante
Confident | Justin Bieber feat. Chance The Rapper

Eu tenho um problema. Um enorme problema para ser sincera.


E não estou nem um pouco feliz por constatar isso, porque ignorar as
coisas sempre foi o melhor para mim. Fingir que nada me afeta ou que está
tudo bem, porra, isso é fácil.
Mas não neste momento, não quando meu problema tem olhos azuis, um
cheiro que me deixava inebriada e, principalmente, me faz sentir aquela
eletricidade que traz a sensação de estar viva e poder percorrer caminhos
desconhecidos apenas por tê-lo ali ao meu lado novamente.
Eu desejei que Underwood me tocasse, ansiei para que ele se inclinasse
somente mais alguns milímetros e me beijasse, e depois fizesse exatamente o
que havia proferido em suas palavras sujas.
Mas quando a realidade bateu em mim e finalmente saí daquela biblioteca,
precisei de mais tempo do que o normal para chegar ao meu carro e
devolver os sorrisos falsos que algumas garotas lançaram em minha direção.
E assim que deslizei para o banco do motorista, joguei minha bolsa sobre o
banco do passageiro e escorei a cabeça no volante. Respirei fundo dezenas
de vezes, tentando fazer com que a excitação e o nervosismo esvaíssem do
meu corpo. Porém, eu sabia que apenas aquilo não era necessário. Eu
precisava de tempo para me recompor e estava pouco me fodendo para a
minha aula seguinte ou para Mike, que me ligava incansavelmente.
Precisava de ar, de espaço e, principalmente, de uma distância bem
considerável entre mim e Logan.
Quando acelero, sigo em direção à saída do campus. Não havia nenhum
destino em mente, apenas comecei a vagar pelas ruas já conhecidas.
Observando as pessoas no caminho, desejei que minha vida fosse fácil como
a delas, que eu pudesse andar por aí sem essas sensações que percorriam
meu corpo, que eu pudesse sorrir fácil e sentisse a felicidade, mas isso é
algo impossível para pessoas como eu.
Suspirei quando estacionei ao lado da academia de dança de Emmy, não
estava a fim de entrar e escutar seu sermão mais uma vez sobre eu voltar a
dançar. Precisava apenas distrair minha cabeça, até que a imagem de Logan
não me perturbasse mais. E esse lugar me pareceu ser um bom lugar para
fugir de tudo, de todos, porque eu sabia que seria o último lugar que iriam
me procurar.
Puxo minha bolsa, retirando um cigarro de lá e caminho até o capô do
carro, me sentando e fechando uma mão em concha, riscando o isqueiro com
a outra, tentando impedir que a brisa fria não me deixe acender. Quando a
nicotina entra em contato com meu sistema nervoso, minha ansiedade começa
a se dissipar e a sensação do entorpecimento finalmente me ajuda a
conseguir ter controle sobre minhas emoções.
— Cigarros fazem mal para a saúde. — Uma voz suave me faz saltitar.
Viro meu rosto, seguindo o som da voz e respiro fundo ao ver que estou
em frente à garota curiosa da minha última visita. Ela segura uma bolsa rosa
em uma mão e na outra, um livro. Um que eu conhecia bem o suficiente. Seus
cabelos escuros estavam presos em um rabo de cavalo. Abaixo o olhar,
esquadrinhando a blusa preta da Nirvana, as calças Skinny e o all-stars
preto.
— Cuidar da vida dos outros também! — Levo meu cigarro até meus
lábios novamente, dando uma tragada e a encaro enquanto se senta ao meu
lado. — Não lembro de tê-la convidado para ser minha companhia.
— É uma pena, porque decidi ficar aqui até dar o horário do início da
minha aula! — Seu sorriso é confiante.
— Eu definitivamente não gosto de você! — resmungo.
— Que pena, novamente, porque eu realmente não ligo. — Ela dá de
ombros, abrindo seu livro, a capa branca me chamou atenção, me lembrando
das inúmeras vezes que folheei um exemplar idêntico e, mesmo não
querendo, solto um sorriso. — O que foi?
— Ela o engana no final do livro. — Apago a ponta do cigarro, atirando a
bituca na lixeira próxima a nós. — Ela acha que o colocar como rei de
Elfhame[2] seria seguro para seu irmão.
— Eu não gosto de spoilers! — Ele me encara, fingindo estar nervosa.
— É uma pena, porque eu realmente não ligo — devolvo sua frase com
um sorriso falso. — Agora se não se importa, eu adoraria voltar a ficar
sozinha.
— Preciso de sua ajuda — diz suspirando, enquanto fecha o livro com
força.
— A resposta é não! — digo, me levantando. — Agora saia do capô do
meu carro.
Ela desceu lentamente, mas não seguiu seu caminho, apenas caminhou até
ficar cara a cara comigo e me encarou como se estivesse em uma luta interna
entre me dizer algo ou deixar para lá.
— Você vai me ajudar! — Determinação irradiava sua voz.
— Não, não vou! — Ergo uma sobrancelha.
— Você deve isso, depois de tudo que fez com a minha família! —
esbraveja nervosa.
Por um momento não entendo o que ela quer dizer com aquilo, mas quando
volto a encará-la com mais afinco, é como se uma luz se acendesse dentro do
meu cérebro.
Como havia sido tão ingênua em não a reconhecer desde a primeira vez?
Seus olhos, sua boca e até o jeito de se vestir são idênticos aos de seus
irmãos.
Minha mão começa a suar frio, o ar começa a me faltar, é como se eu
estivesse novamente no escritório de minha mãe, enquanto ela me contava
tudo o que havia acontecido e como tudo havia saído do controle. Melany foi
a consequência do pior dia da minha vida e a lembrança do meu pior
pecado.
Ela não deveria estar me olhando como se eu fosse sua salvação para
algo, deveria estar me olhando com nojo, com ódio, como seu irmão me
encara todas as vezes que nossos olhares se cruzam.
Minha garganta começa a se fechar com as lembranças, me viro
rapidamente, tentando afastar algumas lágrimas que ameaçam rolar pelo meu
rosto. Não chore, Verônica! Não vá por esse caminho, não desta vez! A
realidade finalmente esmurra meu rosto com força e precisão, me fazendo
compreender a gravidade daquela situação. Eu estava em frente à Melany
Underwood, a garota que eu uma vez havia destruído, mesmo sendo
inocente. Aqueles olhos azuis me lembravam que eu havia vendido o resto
de minha alma para realizar uma promessa infantil e cruel.
Porque Sophie realmente merecia uma vingança, mas aquilo não
significava que deveria ter sido pelas minhas mãos e nem que a garota à
minha frente fosse a vítima. Aquilo havia custado muito mais do que deveria,
e toda essa situação pode até não ter matado, mas sem dúvidas, algo dentro
de mim havia morrido.
— E-eu… — Tento formular alguma frase, mesmo sendo em vão.
— Não me dê explicações para algo que não quero saber, Verônica… —
Ela me interrompe, dando a volta no meu corpo para que possa olhar em
meus olhos novamente, mas mantenho os olhos baixos. Ela é a única que
aceito abaixar minha cabeça, porque ela foi o efeito colateral. — Eu preciso
me sair bem nas apresentações para conseguir uma bolsa em alguma
faculdade de dança e se você for quem eu preciso para conseguir isso, eu
vou ter!
— Não! Não me trate como se eu fosse a sua salvadora, Melany. — Cruzo
os braços. — Porque nós duas sabemos que não sou.
— Eu sei que você não é. — Sua voz é suave, suave demais. E isso está
me irritando, porque não deveria ser assim. — Mas você também não
precisa mais ser a vilã.
— Ser considerada a vilã é o que me mantém intacta! — exclamo a
verdade, deixando que as palavras que sempre guardei para mim, saíssem
como uma dança coreografada.
— Por quê, Verônica? — pergunta, erguendo a sobrancelha em confusão.
— Por que você prefere ser temida a ser amada, quando nós duas sabemos a
verdade?
— Porque quando se está quebrada e alguém te olha com pena, como se
precisássemos de alguém para nos salvar, nos consertar, como você está
fazendo agora... faz com a gente se quebre mais um pouco, faz com que a
ferida se abra e não cicatrize. Faz com que eu me sinta fadada ao fracasso,
pequena e, principalmente, fraca. E não posso e não vou me sentir assim
novamente. — A encaro profundamente. — Então, Melany, eu prefiro que as
pessoas achem que sou uma vadia insensível, que liga apenas para o
dinheiro da minha família, com as festas e tudo que o meu sobrenome pode
me proporcionar, do que deixar com que elas me quebrem novamente ou
tente consertar algo que não tem conserto.
— Eu sinto muito por tudo que aconteceu — sussurra sinceramente.
— Não sinta! — Aconselho, abrindo a porta do carro e pegando minha
bolsa que está em cima do capô. — Você também foi machucada.
— Não como você foi — devolve. — Eu sei o que você fez depois de
tudo, por mim!
— Não faça disso uma grande coisa, Melany. — Volto a encará-la. — Não
procure por partes boas em mim, porque não vai encontrar!
— Me ajude a ganhar o concerto de Natal. — Seus olhos brilham. —
Apenas isso!
— Não preciso de mais problemas com seu irmão, nós dois já temos
merda o suficiente para lidar um com o outro. — Arquejo, me virando. —
Emmy é uma das melhores professoras de ballet com a qual tive o prazer de
estudar, você está em boas mãos.
— Você me disse que eu tenho um talento como o de sua irmã. — Ignoro a
dor ao escutar o nome de Sophie. — Me ajude a ter o que ela não pode ter.
Eu queria dizer não. Queria que ela entendesse que nós duas juntas, era
uma síntese de problemas que eu não estava disposta a ter.
Se Logan já estava fazendo a minha estadia em Saint Vincent um inferno,
quando descobrisse que sua irmã estava atrás de mim, me implorando para
ajudá-la, ele com certeza iria fazer com que eu conhecesse o diabo com
meus próprios olhos.
Mesmo que por outro lado, alguma parte de mim precisasse de algum
propósito, precisava fazer com que me sentisse útil. Porque estava cansada
de apenas esperar as ordens de meu pai, cansada de ser obrigada a fazer
coisas com as quais não tinha opinião própria. Eu fui obrigada a voltar para
Saint Vincent, fui obrigada a dar de cara com meu passado, a encarar
pessoas que foram a minha ruína, fui obrigada a ser uma marionete por muito
tempo por conta dos meus erros e minhas escolhas.
E estava cansada disso, cansada de não ter controle sobre minha própria
vida.
— Eu não posso, Melany... — digo mais para mim mesma do que para ela.
— Você pode, Verônica! — Ela inclina a cabeça para o lado. — Você
pode e você quer, está explícito em seu rosto o quanto a vontade de dizer sim
está te corroendo!
— Merda! Segunda-feira, às 17h — Entro no carro, fechando a porta com
um baque que demonstra minha irritação, abaixo o vidro da minha janela,
sem querer acreditar que estou cedendo. Porra. — Não deixe ninguém saber
sobre isso, Melany, ou nossa parceria irá acabar antes mesmo de começar.
— Me chame de Mel. — Ela sorri abertamente. — É assim que meus
amigos me chamam.
— Não somos amigas! — Dou a ignição no carro, o que faz a garota ter
que aumentar um decibel de sua voz:
— Ainda! — Dá uma piscadela e então se vira correndo até a porta
traseira do estúdio.
Pego a via principal, pensando em como Melany pode ter passado por
muitas coisas durante a sua vida, mas ela ainda tem uma luz, uma esperança,
que não deveria jamais ser apagada. E se ela estava confiando em mim para
ajudá-la em um sonho, eu faria com que se tornasse realidade.

Eu não havia mentido para Melany quando disse que preferia ser
conhecida por ser uma vadia insensível do que uma garota quebrada.
Porque foi esse título que me manteve em pé durante esses anos e me
colocou no topo da cadeia alimentar em NYU, e era o que me colocaria no
mesmo lugar em Saint Vincent novamente.
E tive a certeza disso enquanto encarei a casa de meus pais inundada de
universitários bêbados. Eles se aglomeram no hall de entrada e nos outros
cômodos da casa, segurando copos vermelhos e balançando seus corpos.
Observo o primeiro andar, onde inúmeras pessoas dançam na pista de dança
improvisada e outras vão em direção à piscina na lateral da casa. A música
ecoa por todo o ambiente e meu sorriso só aumenta quando alguns dos
convidados passam por mim e meus irmãos e nos cumprimentam como se
essa fosse a melhor festa que já tivesse acontecido na universidade.
— Eu estava com saudades disso! — Dylan confidencia, escorando as
mãos no vidro de proteção à nossa frente.
— Eu disse que seria uma boa ideia — digo sorrindo para um garoto
escorado na parede no andar de baixo e depois volto minha atenção para
meu outro irmão, que mantém uma carranca estampada em seu rosto. —
Vamos lá, Ed, anime-se!
— Assim que toda essa gente bêbada sair da minha casa, pode ter certeza
de que ficarei animado! — diz, tomando um pouco de sua bebida. — Irei
achar alguém que também odeie essa palhaçada para me acompanhar nesse
meu martírio!
Antes que eu ou Dylan pudéssemos dizer algo, ele some entre as pessoas,
fazendo com que eu e meu irmão mais velho soltássemos uma gargalhada.
Nós sabíamos que Edmund se trancaria em sua sala de jogos antes mesmo da
meia noite. Mas antes que possamos terminar nosso momento, a porta do hall
de entrada é aberta e todos os jogadores do time de futebol entram. A
primeira coisa perceptível eram suas jaquetas azuis com o brasão de um
falcão estampado na parte frontal. Eles sorriem como se fossem os donos do
lugar e meu olhar foi direto para Mike. Ele olhou para cima, me procurando,
e quando me encontra, solta um sorriso, como se eu fosse a sua pessoa
favorita no mundo.
— Eu acho que Burhan não vai aguentar esse lance de relacionamento
casual de vocês por muito tempo — Dylan debocha. — Já posso esperar por
outro coração partido, maninha?
— Eu nunca prometi um relacionamento e seria uma pena perder uma boa
transa por conta disso! — digo, lhe lançando uma careta e virando o resto do
líquido do meu copo em meus lábios.
O sorriso de Dylan logo se desmancha, fazendo com que eu olhasse para o
mesmo lugar onde seus olhos estão, e quando faço isso, me arrependo. O
último integrante do time ultrapassa a porta e a tensão se instala no meu
corpo, fazendo com que meus ombros se transformem em pedra.
Diferente de todos os outros, ele traja suas roupas casuais, sua jaqueta
preta se mistura no mesmo tom de sua camiseta com o emblema dos The
Beatles estampada em uma cor cinza. Logan Underwood anda como se fosse
um deus em terras inimigas. E todos que nos conhecem intercalam os olhares
entre nós dois. Quando seu olhar recai sobre o meu, nos encaramos com ódio
e principalmente em desafio, uma promessa de um novo jogo. Estávamos nos
perguntando silenciosamente quem de nós dois faria o primeiro escândalo da
noite. Não rompemos a conexão que se criou ao azul de suas pupilas se
encontrarem com o castanho das minhas. Uma troca ofensiva que pode ser
comparada à labaredas neste momento, chamas que queríamos usar para
tentar queimar um ao outro. Todos ali estavam ansiosos por alguma atitude,
algo para que pudessem comentar no dia seguinte, mas não darei o que ele e
todos querem, não estragaria minha festa o expulsando.
Estou decidida a aproveitar minha noite sem nenhum problema. Então
apenas estampo o meu melhor sorriso e levanto o copo, cumprimentando
todos os jogadores, inclusive meu ex namorado. E pelo olhar decepcionado
que me lança, eu soube que ele esperava outra atitude.
— O que esse filho da puta está fazendo aqui? — Dylan esbraveja ao meu
lado.
— Ele é parte do time, Dylan! — Dou de ombros. — E nós convidamos
todo o time, o que inclui esse babaca.
— Então eu lhe mostrarei o caminho da porta por meio do meu soco! —
Meu irmão dá a volta por mim e prepara para descer, mas antes que tivesse
êxito, seguro seu braço, apertando minhas unhas em volta de sua pele.
— Se fizer isso, irá magoar Hazel. E se magoá-la, a única pessoa que
levará um soco aqui é você e será pelos meus punhos, irmãozinho! —
Rosno, o encarando friamente. — Além disso, você irá estragar meus
planos!
— E que porra você quer, Verônica? — Cruza os braços, enquanto volta a
ficar ao meu lado.
— Aprenda uma coisa, Dylan: reputação é poder! — Devolvo o sorriso.
— Eu prefiro que as pessoas saibam que nós ainda a detemos, que ainda
somos os fodidos Blackwell que ninguém ousava se meter, o grupo fechado
no qual ela se orgulhava. E, principalmente, que não achem que precisamos
da benevolência delas por conta do que aconteceu com Sophie.
— Não se destrua como se destruiu em Nova York apenas pra mostrar que
é inabalável. — Avisa, preocupado.
— Eu já estou destruída há um bom tempo, Dylan! — Solto um sorriso
frio, virando o resto de minha bebida.
Antes que possa responder, passo por ele, descendo as escadas.
Cumprimento algumas pessoas que começavam a subir. E quando estou
quase no último degrau, Mike aparece segurando dois copos. Ele se
aproxima, deixando um beijo em minha bochecha e me entregando um deles.
Sorrio, levando o líquido em meus lábios e o puxo entre as pessoas até a
pista de dança. Porém, meus planos foram interrompidos por dois rostos
familiares que me encaravam do outro lado da sala. Hazel estava escorada
em um dos sofás e sorria para mim, enquanto Summer me encarava com uma
careta ao perceber quem é minha companhia.
E sem pensar, me desvinculo do meu companheiro de dança, sigo em
direção à elas, desviando de alguns convidados. Está na hora de me
aproximar das minhas amigas novamente, sinto falta de alguém para
conversar, de alguém para rir comigo de coisas aleatórias como fazíamos e
de me sentir em casa. Eu estou colocando minha rixa com Logan em segundo
plano, começando a priorizar o que realmente me importava.
Quando paro alguns centímetros à frente da dupla, solto um sorriso.
— Eu espero que vocês ainda bebam! — digo, mordendo o lábio inferior.
— Porque estamos prestes a ficar bem bêbadas.
— E-eu não sei… — Summer diz. — Não sou uma boa versão de mim
quando estou bêbada.
— Ninguém é, Summer! — digo sorrindo. — Mas você pode parar se não
se sentir bem.
— Nós aceitamos... apenas se aceitar um almoço entre nós três. — Hazel
me encara esperançosa.
— Feito! — Levanto as duas mãos para elas, puxando-as. — Agora
vamos.
Levo-as até o bar improvisado e sirvo algumas doses de tequila. Na
primeira rodada, o álcool já não queimava quando entrava em contato com a
minha garganta. Mas a careta que Hazel me lançou me fez gargalhar e só
piorou quando Summer engoliu o líquido, nos xingando de quase todos os
nomes por arrastá-la para aquilo.
E nas próximas rodadas que se passaram, eu já podia sentir meu corpo
ficar anestesiado. A adrenalina já começava a correr pelo meu sangue,
liberando sensações que me faziam sentir viva. Mas meu corpo ansiava por
algo a mais, algo além de apenas uma dose de tequila e olhares cheios de
luxúria que os homens nos lançavam. Arrasto minhas parceiras até a pista de
dança quando uma música animada começa a tocar por todo o ambiente. Meu
olhar se volta para Hazel e Summer, éramos uma mistura de álcool e alegria,
um misto de saudades e, principalmente, de alívio. Alívio por saber que
nada havia mudado em nossa amizade. E nas horas que se passaram, nos
revezamos em dançar e correr até o bar para nos servirmos de mais algum
tipo de bebida, como sempre fazíamos nas festas que dávamos antes de tudo
acontecer.
Em algum momento da noite, nós havíamos achado que seria uma boa
ideia subir em cima do enorme balcão da cozinha que dava ligação à sala de
estar. Summer segura uma garrafa de tequila, enquanto eu e Hazel nos
movemos ao som de Labrinth, alguns jogadores sorriem em minha direção.
Solto uma piscadela para um deles, que me encara a tempo suficiente para
que eu saiba que seu flerte não é nada inocente. Summer me passa a garrafa e
percebo que a loira já está em seu estado caótico, e quando volto meu olhar
para frente, solto um resmungo junto a Hazel em direção a Levi que aparece
em frente ao balcão e ergueu uma de suas sobrancelhas.
— Você é uma péssima amiga, Blackwell! — ele grita sobre a música
alta.
— Você está ferido porque não o convidei para subir aqui, Johnson? —
digo, gargalhando.
— Alguma dúvida? Eu estaria conquistando todas as calouras se
estivesse rebolando ao lado de vocês!
— Nah! Você é um dançarino de merda! — Summer grita, fazendo uma
careta.
— Não fira meus sentimentos enquanto está bêbada, loirinha! — Levi leva
as mãos até o coração, fingindo-se ofendido. — Venha eu vou te levar para
casa…
— Não seja um estraga diversão, Levi! O que foi, não encontrou ninguém
para te contar a última fofoca? — Hazel reclama, puxando a garrafa de
tequila das minhas mãos, fazendo nosso amigo revirar os olhos. — Sum está
ótima, não é, Sum?
— Claro… — A loira solta um sorriso arrastado. — Olhe só isso...
Antes que eu e Hazel pudéssemos segurá-la, Summer tenta fazer uma
posição imitando o número quatro com as pernas, mas tropeça em seus
próprios pés e se desequilibra. Solto um grito, tentando segurá-la, porém,
antes de seu corpo tocar o chão, Levi consegue pegá-la e nós, que ainda
estávamos em cima do balcão, a encaramos, assustadas, ao contrário de
Summer, que gargalha no colo de Levi como se fosse a cena mais icônica da
noite.
— Chega de álcool para você, Sum! — Johnson diz, segurando Summer
em seu colo.
— Você vai me levar para casa, Levi? — Summer pergunta com uma voz
que faz Levi arregalar os olhos, ela aproxima a boca de seu ouvido, dizendo
algo que faz ele prender a respiração. Porra eu estou louca ou a Summer
acabou de flertar com ele? É, acho que realmente já chega de bebida pra ela.
— Merda, eu acho que vou passar mal!
Levi faz uma careta para a nossa amiga, a apoiando no chão, ele envolve
um braço dela nos ombros e a ajuda a sair, tendo cuidado para que ela não
tropece nos próprios pés. E assim que sumiram entre as pessoas, encaro a
minha única companheira que havia restado e soube, naquele momento, que
estávamos pensando o mesmo. Mas desta vez, ela quem me passou a garrafa
e começou a remexer o corpo sensualmente em sincronia com a música.
Neste momento não há problemas, nem minha realidade de merda. Há apenas
eu e minha antiga amiga em cima de um balcão, dançando e dividindo uma
garrafa de tequila, enquanto estávamos bêbadas, arrastando todos os olhares
para nós.
As pessoas nos olham admiradas, como se desejassem estar aqui, ao
nosso lado. E aquilo nos faz dançar ainda mais sensualmente.
Sei que Dylan daqui a pouco irá arrancar sua garota daqui e a levará para
seu quarto. Mas Hazel está feliz, suas bochechas estão coradas pelo calor e
seus olhos brilham quando se encontram com o meu.
— Eu senti sua falta, sua cadela insensível! — Hazel exclama de repente,
me tomando a garrafa e bebendo. — Meu-u Deus… Você era a minha melhor
amiga, não podia ter sumido daquele jeito.
— Agh! Não seja uma vadia dramática, eu estou de volta… Somos nós
três de volta, a porra de um trio incrível! — sussurro, puxando a garrafa de
sua mão e a levando até a boca.
— Se sumir outra vez, eu mesmo irei atrás de você em Nova York e vou
quebrar esse seu rosto perfeito. — Ela abre os braços, me puxando para um
abraço.
— Não quebre meu rosto, ele é a razão pela qual metade dos garotos estão
nos rondando agora! — digo, gargalhando, me ajeitando em seus braços.
— Agh! Vee… nós estamos chamando muita atenção! — Me lança um
sorriso embriagado.
— Nós somos a sensação dessa festa, Hazel — A solto. — As fodidas
estrelas da noite!
— E você está adorando isso, não é?
— Óbvio! E você também. Olha a forma como meu irmão olha pra você!
— Indico a direção com o queixo, onde meu irmão está quase babando
olhando para ela.
Eu estou em cima de uma mesa, abraçando Hazel e ignorando sua ameaça
sobre eu ir embora, a minha parte sóbria sabe que é impossível prometer
ficar. Eu sei que minha estadia nessa cidade será breve, apenas um semestre,
até que eu conseguisse terminar esse semestre e pudesse voltar para minha
casa, minha verdadeira casa, em Nova York. Mas não pensaria nisso agora,
eu apenas apreciaria a sua companhia.
Pelo menos eu pensava isso, até que Dylan se aproxima e Hazel
praticamente pula em seu colo, me lançando uma piscadela.
— Me desculpe te abandonar, Vee, mas seu irmão é gostoso demais para
deixar nas mãos de outra garota — grita e a minha única reação foi
gargalhar.
Uma gargalhada que chamou a atenção de Logan. Ele está escorado em
uma das paredes perto da saída, com um copo em uma das mãos. Uma garota
de pele branca e cabelos azuis conversa com ele, ela é linda. Mas o
problema é que ela estava se esforçando demais para mantê-lo naquela
conversa.
E o pior de tudo é que ele não está prestando atenção nela. Ele me encara,
como se estivesse fascinado com aquela cena e como se eu fosse seu sonho e
seu pior pesadelo. Como se me tocar significaria realizar sua maior fantasia,
mas também o levaria a cometer o pior dos pecados capitais.
E eu entendo aquela sensação, porque passei a noite toda o evitando para
não ter que sentir aquilo, não pensar no calor de suas mãos em minha pele ou
em como ele está gostoso para um caralho naquela roupa, mas agora é
impossível, porque nossos olhares finalmente haviam se cruzado e se
prendido um ao outro.
A sua escuridão abraçou a minha de um jeito peculiar e todo o resto
desapareceu. Não existia mais festa ou qualquer outra coisa. Existia apenas
eu e ele. Havia um universo caótico nos seus olhos, e mesmo que nossos
corações fossem pálidos, frios, nesse momento é como se fossemos uma
performance rebuscada. Somos arte causando impacto em meio a tantos
quadros cinzas. Somos o centro do universo, um universo criado para nós
naqueles segundos.
E eu não julgava a garota ao seu lado, compreendia a fascinação que ela
tem nesse momento por ele. Sei como é ficar presa nessa sensação de que
ele pode fazer o mundo parar apenas por nos encarar com aqueles olhos
azuis.
Mas o que aquela garota não sabe é que aquele mesmo olhar, carregava as
mesmas cicatrizes que as minhas.
E também não sabia que nós nos destruímos e pulamos de um penhasco,
mesmo sabendo que era suicídio.
E que após essa queda, nos tornamos a nossa pior versão.
Porque quando estou ao seu redor,
Eu costumo continuar mudando de ideia. Eu prometo
Eu prometo a mim mesmo não voltar aos velhos hábitos
Porque a decepção amorosa está clara e o amor é uma vadia.
Love Is A Bitch | Two Feet

Foi impossível desviar o olhar de Verônica.


Ela está incrível naquele vestido preto que torneia suas curvas e deixa
suas costas à vista. A única conclusão que eu tenho, é que pessoas egoístas
como Blackwell, não deveriam nascer com um rosto fodidamente atraente.
Principalmente quando esse rosto é ridiculamente popular.
Quando ela soltou aquela gargalhada para Hazel e olhou em minha
direção, eu soube que precisava desviar o olhar, fingir que ela não estava me
afetando de uma maneira extremamente irritante. Mas era impossível, porque
naquele momento foi como se as lembranças do dia da biblioteca tivessem
invadido a minha mente. Eu podia sentir seus toques em minha pele, seus
traços me encarando com louvor, repúdio e nossas palavras em um misto de
loucura e obsessão.
Mas a verdade é que pela primeira vez desde que coloquei os pés nessa
maldita festa, não quis correr por aquela porta afora e ir embora. Eu quis
assisti-la dançar, remexendo o corpo em um ritmo despreocupado, como se
estivesse em paz. Uma parte de mim odiava como meu corpo reagia a essa
mulher, como se fosse desequilibrado, atraído e, principalmente, como se
estivesse em queda livre, sem a menor vontade de aterrissar.
E quando a melodia de Love Is A Bitch, de Two Feet, começa a ressoar
por todo ambiente, Verônica volta a mexer seu corpo de forma lenta e
sensual, voltando a dar o seu show, mas, ao contrário de como foi das outras
vezes, ela está fazendo para mim. Ela estende o braço para cima com a
garrafa de tequila, enquanto a outra desliza pelo seu corpo, e posso imaginar
minhas mãos no lugar da sua. Me escoro na parede, de forma que tivesse a
melhor vista. Levo o copo de whisky aos lábios, ainda a olhando por cima
da borda, ela gira, ficando de costas para mim, me encarando sobre os
ombros, soltando um sorriso endiabrado, como se eu fosse a caça e ela, a
caçadora. Meu pau pulsa sob minha cueca, pedindo por liberdade, para ser
corajoso o suficiente e se entregasse ao desejo que pairava entre mim e
Verônica. Coloco minha mão livre em punho no bolso da calça.
Estávamos a uma boa distância um do outro, mas para ser sincero, a
tensão que invadia o ar enquanto nosso olhar se prendia uma ao outro com
volúpia, fez com que parecesse que estávamos lado a lado, sozinhos.
— Você me ouviu? — A voz da garota ao meu lado me fez despertar dos
meus pensamentos.
— Desculpe, me distraí! — A encaro e minha boca se curva em um
sorriso falso.
— Tudo bem… — Ela devolve o sorriso. — Estava perguntando quando
seria a estreia dos jogos, estou ansiosa para te ver jogar!
— Em algumas semanas — Dou um gole da minha bebida.
Estava tentando ao máximo prestar atenção no que ela dizia, mas era
quase impossível, principalmente quando minha ex namorada estava agora
quase beijando um dos meus jogadores. Ele se aproximou da mesa, sorrindo,
achando que realmente beijaria a sensação daquela festa, mas ao contrário
disso, ela apenas sorriu e disse algo e então ele a ajudou a descer.
Algo dentro de mim, sorriu em alívio por finalmente não a ter mais à
minha frente dançando, mas quando seu corpo ficou colado ao dele de uma
maneira sensual e começaram a dançar, eu soube que meu sossego não
chegaria tão cedo. E tudo só piorou quando Analu surgiu entre as pessoas,
virando uma dose de algum tipo de bebida, encarou a garota de cabelos
pretos com repugnância e começou a caminhar em direção a pista, onde
Blackwell estava dançando.
Sabia que ela não estava ali para tentar uma reaproximação, Analu quer
que Verônica sofra, assim como a fez sofrer no passado, quando beijou seu
ex-namorado em uma festa por conta de uma vingança que apenas as duas
sabiam o motivo. Ela queria que Verônica soubesse que não era mais o
centro do mundo, que seu momento de reinar sobre essa cidade havia
acabado.
Mas o que Analu não sabia era que, por mais que Verônica Blackwell
fosse uma cadela egoísta, que agora fazia o que bem entendesse, ela jamais
deixaria de ser uma abelha-rainha. A popularidade a seguia aonde quer que
fosse. Ninguém conseguiria roubar a sua coroa, porque ela já havia gravado
seu nome nela e nesta cidade há muito tempo atrás.
— Merda! — murmuro, dando um passo para frente, procurando Josh ou
Levi, para lidar com essa situação.
Eu já tinha onze jogadores bêbados para lidar e não estava a fim de
intervir em uma possível briga. Principalmente quando uma das envolvidas é
a garota que mantinha uma relação amigável comigo, e a outra é a que detém
todo meu ódio.
Suspiro aliviado quando encontro o primeiro escorado em uma mesa de
beer-bong ao lado de Ed, mas quando me despeço da garota e dou alguns
passos indo em direção a eles, percebo que Analu já está ao lado de
Verônica. Seu rosto estava frio, calculista, e ela tinha a mesma expressão da
última vez que a chamou para um confronto em uma das festas do ano sênior;
já Blackwell, sorria como se aquilo não a abalasse. E para completar toda
situação de merda, o DJ decide que seria uma boa hora para baixar a
música.
— Verônica Blackwell! — a loira exclama com a voz um pouco arrastada,
batendo palmas, se aproveitando do pequeno silêncio para chamar a atenção
de algumas pessoas. Parker está bêbada e todos nós sabemos que ela solta
seus piores insultos quando está nesta situação. — É um desprazer te ter em
Saint Vincent novamente.
— Eu pensei que os anos a deixariam menos amarga, Parker! — Verônica
devolve, enquanto se senta na mesa que estava a momentos atrás, cruzando
as pernas. — Fico triste em saber que estava equivocada.
— Antes amarga, que uma vadia traiçoeira, não é mesmo? — Sorri
friamente enquanto Verônica leva a garrafa até a boca despreocupadamente.
— Eu soube que foi expulsa da NYU. Transou com o namorado de alguma
amiga novamente, ou desta vez foi com algum professor, uhn?
— Nah! Eu aprecio um age gap[3] apenas nos livros! Você ainda mantém
essa rivalidade infantil por conta de um garoto que te largou no ensino
médio, Parker? — pergunta diabolicamente, enquanto arruma uma mecha no
seu cabelo. — Isso é muito infantil para uma mulher da sua idade.
— Não seja dissimulada, Verônica! — responde um pouco alterada.
— Se ainda guarda rancor por causa de Mike… — Ela se levanta e fica a
alguns centímetros de sua antiga rival. — Eu não ligo em dividi-lo, podemos
até marcar uma noite a três se preferir… Eu adoraria uma diversão dupla.
Analu, para por alguns segundos a encara incrédula, como se decidisse se
sairia dali antes que fosse humilhada mais um pouco ou se tomaria coragem
o suficiente para dar um tapa no rosto de Verônica. Mas então ela ajeita a
postura e devolve o sorriso.
— Você nunca ligou de dividir, não é mesmo? — diz enquanto Vee a
encarou confusa. — Afinal, se Sophie morreu, foi porque nunca se decidiu
qual dos irmãos Underwood queria, não é mesmo? Você chegou a dividir
Aidan com ela, talvez tenha adorado a diversão dupla.
Nesse momento, eu já não ligava se Verônica e eu nos odiávamos, apenas
comecei a andar entre os alunos bêbados. Analu havia tocado em um assunto
que não a envolvia. Havia mexido em cicatrizes que pertenciam apenas à
minha família e à de Verônica. Ela poderia brigar à vontade com Blackwell,
poderiam se humilhar o quanto quisessem, contanto que não envolvesse essa
história em suas merdas, ou falassem de alguém que não podia se defender.
Mas paro alguns centímetros delas, assim que escuto a voz nervosa de
Verônica.
— Que merda você disse?
— Vamos lá, Vee, não negue para mim que o boato de que você teve um
caso com Aidan e ele usou Sophie para se vingar, não é verdade — diz,
sorrindo maliciosamente. — É uma pena que você foi uma vadia com a sua
própria irmã…
Antes que ela terminasse a frase, o barulho do tapa estalou por todo o
ambiente. O pouco das pessoas que fingem não escutar a briga que havia se
formado entre as duas, agora as encaravam com total curiosidade. E só
piorou quando Analu a encarou perplexa e tentou devolver o tapa,
fracassando miseravelmente. Antes que ela pudesse perceber, Verônica
pegou em seus cabelos e a jogou no chão, subindo em cima dela e começou a
distribuir inúmeros socos.
— Eu vou te ensinar algo, Analu! — Verônica grita fora de si. — E quero
que se lembre disso a partir deste momento.
O tapa que deu logo em seguida, foi alto o suficiente para que as pessoas
que as rodeavam, se afastassem um pouco e então escuto sua voz voltando a
gritar descontrolavelmente com a garota embaixo de si:
— Nunca, em hipótese alguma, toque novamente no nome da minha irmã.
— Outra tapa estalou e então o gemido doloroso da garota embaixo de
Verônica foi o suficiente para me fazer agir. — Nunca tente me afetar usando
esse assunto, porque da próxima vez, não será só apenas seu rosto que sairá
machucado.
E quando ela já iria transferir mais alguns outros socos, me aproximo,
agarrando sua cintura a puxando para cima, antes que se machucasse ou
terminasse com o rosto de Analu.
Verônica se debatia, tentando voltar para cima de Parker. E numa tentativa
de se soltar, ela tenta me desferir um soco, e acaba arranhando a pele do meu
braço exposto pela minha jaqueta.
— Merda, Verônica! — rosno.
— Me solta, caralho! — ela grita. — Ainda não terminei com essa vadia!
Mas antes que eu possa responder, Ed surge na minha frente, com uma
expressão que poderia colocar medo em metade desta festa. E nesse
momento, percebi que mesmo que fosse o mais altruísta de seus irmãos, não
anula o fato de ser um Blackwell e quando se mexe com um deles, eles
iniciam uma guerra, sem se importar se irá machucar pessoas ao seu redor ou
não, eles apenas protegem os seus.
Então, o irmão da garota nos meus braços me encarou, com sangue nos
olhos e suspirou:
— Tire-a daqui, por favor, eu lido com Parker! — Ele cerrou os dentes.
— Não a deixe voltar para a festa até que se acalme, porque isso o que
minha irmã acabou de fazer no rosto de Analu, é apenas o começo do que ela
é capaz quando a raiva toma conta dela.
— Não acho que eu seja a melhor pessoa para acalmar a sua irmã,
Edmund! — digo, tentando controlar Verônica em meus braços.
— Acredite em mim, quando digo que, infelizmente, você é um dos únicos
que ainda tem esse poder! — Ele suspira, me dando as costas e tirando o
celular do bolso.
Verônica estava ocupada demais se debatendo entre meus braços para
escutar a revelação que seu irmão acabara de soltar. E sabia que ele não
havia soltado isso por conta da adrenalina que corria pelo seu corpo, mas
porque ele ainda confiava em mim. Sabia que jamais machucaria a garota em
meus braços, que por mais que nos abominássemos em um nível
estremecedor e por sermos responsáveis por cada pedaço quebrado um do
outro, nós ainda tínhamos algo.
Algo que queimava como inferno e colocava até o maior dos icebergs em
erupção.
Então, mesmo entre os gritos e os socos em meu corpo, segui com ela até
onde eu sabia que ela não tentaria voltar para lá e terminar o que tinha
começado com a garota. Ou, pelo menos, até que eu pudesse fazer com que
ela se acalmasse e voltasse a ser a garota calculista e fria que estava sendo
desde que havia pisado aqui novamente.
Meus olhos voltaram por alguns segundos até o andar de baixo, quando
finalmente chego ao patamar da escada e vejo Dylan andando entre as
pessoas com uma de suas mãos entrelaçada à mão de Hazel. Assim que
param ao lado de Edmund, minha amiga ergue o olhar até mim e me encara
com as sobrancelhas franzidas ao perceber quem era a garota que estava em
meus braços. E quando Dylan abaixa e cochicha algo em seus ouvidos, foi
como se o álcool tivesse se esvaído de todo o seu corpo e seu rosto se
tornou frio. Precisei de um tempo a mais para assimilar que ela o soltou e
caminhou até Analu, que estava entre duas garotas, e puxou seus braços com
força em direção à saída. Respirei fundo, porque sabia que se não a
impedissem, Hazel daria outra surra na garota, apenas por tentar tocar em
sua amiga.
— É melhor você me soltar agora, Underwood! — Verônica grita quando
passamos por um corredor que sabia que estaria vazio e que ligava aos
quartos. — Ou a promessa de jogar suas mãos em um latão com ácido,
realmente será válida!
— Fico feliz em saber que está consciente o suficiente para fazer
ameaças, mas sinto em lhe dizer que não é a pessoa mais indicada a ficar
solta no momento — resmungo, virando uma curva de outro corredor. —
Está parecendo um animal selvagem.
— Acredite em mim, estou consciente o suficiente, e nesse momento, eu
sou pior que um animal selvagem. — Ela se debate. — E irei piorar se não
tirar essas malditas mãos de mim, Logan.
— Pare de reclamar, Blackwell. — Respiro fundo. — Perdi a minha
companhia por conta dessa briga infantil entre vocês duas.
— O problema é exclusivamente seu, não pedi para que me tirasse de
cima daquela filha da puta! — esbraveja.
— Eu te ajudei, caralho! — xingo respirando fundo. — Não seja ingrata e
me deixe te levar para o quarto e voltar para encontrar a garota que estava
comigo, merda.
Respiro fundo ao ouvir sua gargalhada cínica.
— Não seja cínico, capitão. — Verônica debocha. — Nós dois sabemos
que não é bem a sua antiga companhia que você estava imaginando foder
antes de toda essa merda.
— Não seja tão baixa, anjo! — Minha voz aumenta enquanto a coloco no
chão assim que chegamos à porta de seu quarto.
— Não precisa fingir que é mentira, Logan! — Ela dá um passo à frente e
solta um sorriso diabólico. — Eu senti seus olhares, senti a fodida tensão
sexual que emanava de você a cada vez que eu rebolava em cima daquela
mesa.
— Você quer mesmo entrar nesse jogo? — A encaro friamente e me
abaixo para sussurrar em seu ouvido: — Porque se estiver preparada, eu vou
entrar nesse seu joguinho sujo e não serei bonzinho.
— Eu nunca gostei dos bonzinhos… — sussurra de volta. — Você já
deveria saber.
— A única coisa que eu sei, anjo, é que você fodeu com a minha noite por
conta de uma briguinha infantil. — Cruzo os braços na frente do meu corpo,
encarando-a, sério — É sério que estavam brigando pelo Burhan?
— Não estava brigando por ninguém, ao contrário, estava aproveitando a
minha festa até ela surgiu do inferno para encher a porra do meu saco por
conta de um assunto que deveria ficar no passado. — Ela suspira e encara
meu rosto com um brilho divertido nos olhos, como se não quisesse mais
falar sobre isso. — Mas já que está dando uma de bonzinho comigo essa
noite, me diga o nome daquele seu jogador que estava dançando comigo...
— Fique longe dos meus jogadores! — exclamo antes que terminasse a
frase.
— Ah, vamos lá, capitão, não seja cruel… — Ela faz um bico
extremamente sexy. — Ele tem uma pegada, aquelas mãos, meu deus… eu
daria tudo para tê-lo entre minhas pernas essa noite.
Eu podia sentir um gosto amargo subindo pela minha garganta ao imaginar
Walter transando com a mulher à minha frente. Eu sabia que Verônica,
mesmo que não estivesse totalmente bêbada, queria me provocar para deixá-
la sozinha e voltar para festa, mas a encarando enquanto seus lábios se
curvam em um sorriso malicioso, me pergunto como ela conseguiu agredir
Analu com tanta maestria, saindo apenas com alguns arranhões em seus
braços por conta da unha de Parker.
— Mike não vai gostar de saber que está dando em cima de seus amigos
— digo, fazendo uma careta.
— Nunca prometi um relacionamento sério a ele. — Dá de ombros,
abrindo a porta de seu quarto e entrando.
— Você deveria pensar em tomar um banho gelado e ir dormir! — digo,
me encostando no batente da porta.
Ela não responde, apenas some dentro de seu enorme closet. Aproveito
para encarar o quarto à minha frente e foi como se tivéssemos dezessete anos
novamente. A decoração ainda era toda branca e diversas fotos estavam
espalhadas por uma das paredes, ao lado de uma enorme estante de livros.
Meu olhar se prende à coroa da sua última apresentação em cima de sua
escrivaninha, o objeto que guardava todos os segredos daquela noite, que
representa o dia mais fatídico da nossa vida.
Respiro fundo, me preparando para entrar naquele lugar e ser invadido
por dezenas de lembranças que eu gostaria que jamais viessem à tona. E
quando paro de andar, bato levemente na porta do closet, que agora está
fechado, temendo por entrar e encontrar uma Verônica nua. Mas a sua falta
de resposta me fez abrir uma fresta e a encontrar de costas, seus cabelos
caem pelas suas costas nuas e as duas mãos apertam a borda da penteadeira
com uma força sobrenatural. Encarei seu rosto pelo espelho do móvel,
observando seus olhos fechados fortemente, ela é linda. Uma mistura de caos
e calmaria. Sua respiração é lenta, como se estivesse tentando conter todas
as suas emoções que estavam à flor da pele. Seus lábios vermelhos estão
entreabertos, puxando o ar firmemente.
— Você já pode ir embora! — ela diz secamente sem abrir os olhos.
Sua postura me diz que finalmente o peso da noite havia caído sob suas
costas e ela precisa ficar sozinha. Ela deixa um vislumbre de sua armadura
cair, me mostrando que, naquele momento, não é mais a Verônica atrevida
que todos haviam presenciado durante toda a noite, ou a mulher que agora
tinha a universidade aos seus pés. Ali, naquele cômodo, entre suas roupas,
estava a mulher que se esconde por trás de inúmeras barreiras.
Eu sei quais poderiam ser os efeitos do álcool causando aquela reação
nela, mesmo assim, algo dentro de mim se retorceu ao vê-la frágil. Eu queria
que ela gritasse comigo, me insultasse e demonstrasse que me odiava,
porque é assim que eu sei que ainda estava viva por dentro, ainda não tinha
se entregado à escuridão, que ainda lutava contra isso, como eu lutava.
— Eu disse que já pode ir embora, Logan! — repete, dessa vez
fortemente, abrindo os olhos e me encarando pelo reflexo do espelho. —
Não devia nem estar aqui para começo de conversa.
— Não faça isso! — digo, dando um passo em sua direção. — Não se
feche e tente ser a pessoa que está sendo desde que voltou.
Eu não sei o porquê de dizer estas palavras, mas eu sentia que precisava.
Mesmo que meu subconsciente grite que é errado, que eu não deveria chegar
tão perto do precipício novamente.
— Não tenho uma dupla personalidade, se é isto que está insinuando. —
Ela se vira, nervosa. — E, por Deus, não tente pagar de bom samaritano.
— Não estou tentando ser isso. — Faço uma careta. — Nós dois sabemos
que não somos os mocinhos dessa história, Blackwell.
— Não tente me tratar como se tivesse algum tipo de compaixão. — A sua
face fechou-se, dura. — Esse é um dos últimos sentimentos que temos um
pelo outro!
— Não fale de sentimentos, quando não está preparada para saber a
verdade! — Dou um passo à frente.
— E qual a porra da verdade, Logan? — ela berra, nervosa. — Que me
odeia? Que me culpa por toda a merda que aconteceu há quatro anos atrás e
que destruí tudo o que tínhamos? Tome uma verdade: o sentimento é
totalmente mútuo, capitão! — Ela respira fundo, tomando um fôlego e
continua: — Eu também o odeio, odeio o babaca que se tornou e toda vez
que sou obrigada a te encarar, é como se estivesse enfiando uma estaca em
meu coração, me fazendo sangrar como sangrei há anos atrás. Então não me
venha com esse papo de sentimentos e de não estar preparada, porque eu sei
que temos coisas inacabadas e sei que se mexermos nisso, a merda vai
piorar.
— Você quer jogar verdade na minha cara? Tudo bem, faça isso. Mas
tome uma verdade também, Verônica: toda vez que eu também sou obrigado
a te ver, toda vez que você desfila pelo campus com esse sorriso falso, eu só
consigo enxergar a garota egoísta que se tornou e o quão idiota fui por um
dia me apaixonar por você — grito no mesmo tom. — Mas sabe o que é
pior? É que toda vez que fecho a porra dos meus olhos, eu enxergo a garota
que eu conheci no parque quando tínhamos quatorze anos, que eu entreguei
todo o meu coração e me ajudou quando ninguém mais fez, para logo depois
me destruir de uma maneira irrevogável. E mesmo assim, quando eu tento te
odiar, uma parte de mim não consegue, porque, infelizmente, eu ainda te
desejo. Um desejo que corre pelas minhas veias e me deixa maluco.
— Agora a culpa é minha por você cobiçar algo que não deveria? — ela
grita, perto o bastante para que eu possa sentir o seu cheiro. — Quer que eu
sinta muito por isso? Porque eu serei hipócrita em dizer isso.
— Não seria a primeira vez! — proferi dando um passo à frente.
— Não, não seria — ela sussurra, fazendo com que seus olhos criem uma
conexão com os meus. — Mas se estamos sendo sinceros agora, por que
colocar uma mentira no meio?
— Não faça isso — respiro fundo, observando seus olhos nublados de
desejo. — Não me encare como…
— Como se fossemos duas misturas químicas que juntas, explodem? —
Ela sorri diabolicamente.
— Sim, como se fossemos isso. — Respiro fundo.
— Nós somos tóxicos e destrutivos, Logan — ela confessa, umedecendo
seus lábios. — Você sabe disso, mesmo assim, vivemos nos aproximando,
esperando que essa explosão aconteça.
— Isso não vai acontecer. — Encaro seus olhos, que agora brilhavam. —
Porque toda vez que acontece, nós temos que juntar a porra dos pedaços que
se estilhaçam e nenhum de nós estamos dispostos a deixar que isso volte a
acontecer.
Ela me encara por alguns segundos, seus olhos se fixaram nos meus e
então foi abaixando o olhar. Como se estivesse gravando cada linha, cada
pinta que meu rosto continha. Havia sentimentos infinitos em seu olhar, como
se estivesse carregando o peso do mundo, como se quisesse transbordar. E
eu sabia que também a encarava dessa maneira, principalmente quando meus
olhos fixaram em sua boca, como se aqueles lindos lábios estivessem me
convidando para tocá-los. Quando voltei a encarar o âmbar de seus olhos,
eles se tornam frios, como se ela tivesse subido todas as suas barreiras
novamente e se dado conta do que está acontecendo aqui.
Verônica havia se tornado seu próprio caos, com uma máscara escondendo
quem realmente era. Balancei a cabeça em negativa, deixando que as minhas
também voltassem a subir, escondendo tudo o que não estava pronto para ser
dito e feito dentro daquelas quatro paredes.
— Já tive minha cota de dramas para essa noite, Underwood! — ela diz
friamente. — Não irei fazer nada com Analu, já fiz o suficiente para que
aprendesse a lição. Então pode voltar para seu mundinho perfeito e me
deixar em paz.
— Você pode ser uma garota má, Blackwell, mas ainda tem um pingo de
humanidade dentro de você, não a deixe se esvair como todo o resto. —
Minha voz se torna arrogante.
— Você está errado, porque não existe mais essa coisa de humanidade
para pessoas como nós, capitão.
— Prefiro acreditar que não estou e que existe esperança para todos! —
Dou de ombros.
— Não seja filosófico.
— Não seja uma megera!
— Impossível! — Ela solta um sorriso e aponta para a porta. — Boa
noite, capitão.
— Boa noite, anjo.
Quando saio do seu quarto, é como se a realidade tivesse me dado um
soco. Durante os últimos quatro anos, eu nunca imaginei estar nesse lugar
novamente, mas, para falar a verdade, eu nunca imaginei que a veria outra
vez. E depois de algumas verdades jogadas ao vento, eu já não sabia se
conseguiria ignorá-la.
Podíamos lutar contra essa coisa que havia entre nós, mas não
ganharíamos. Nunca ganhávamos. Sempre saíamos quebrados, vazios, e isso
não estava certo.
Underwood e Blackwell são uma combinação perigosa quando colocados
na mesma equação.
Mas a verdade dessa equação, era que cada pedaço quebrado do meu
coração se encaixava aos do dela.
Porque nós éramos responsáveis por cada ruptura.
Consegui sair do labirinto
Para encontrar o meu um em um milhão
E agora você é apenas uma página rasgada
Da história que eu estou vivendo
Dynasty | MIIA

— Por que, diabos, vocês estão gritando?


A voz de Dylan invade a cozinha onde Ed e eu estávamos conversando
sobre alguns acontecimentos da noite passada e quando olhamos sobre meu
ombro, a visão de Hazel ao seu lado, vestindo apenas com uma camisa do
New York Giants, fez com que soltasse um sorriso.
— Eu preciso dizer que é estranho vocês dois estarem com um sorriso
sincronizado? — ela pergunta, fazendo uma careta.
— Bom dia, casal! — Ed cantarolou com uma animação que não existia há
minutos atrás. — E respondendo a sua pergunta, nós somos irmãos, cunhada,
com apenas um ano de diferença, então nós sempre fazemos coisas
estranhas.
— O único que faz coisas estranhas aqui é você, não me inclua nisso. —
Dou de ombros, pegando meu celular. — Bom dia Hazel!
Ela soltou um sorriso gentil e se arrastou para se sentar ao meu lado. Seu
rosto me dizia que estava com puta ressaca, mas seus olhos brilhavam a
cada vez que encarava Dylan, e eu estava realmente feliz por estarem se
acertando, por finalmente ter seu antigo amor ao seu lado.
Sempre admirei o fato de Hazel Smith ser tão bondosa com todos à sua
volta, ela é como uma luz no fundo do túnel e seu jeito amigável conquista
qualquer um que se aproxima. Saber que ela é a pessoa que conquistou o
coração do meu irmão, me fazia torcer para que a história deles desse certo,
porque eles mereciam aquilo, mereciam a chance de se resolverem e
viverem aquele amor que não tiveram tempo de viver, e eu faria tudo que
estivesse ao meu alcance para ajudá-los.
— Como você não está destruída? — ela pergunta enquanto pega a xícara
que Ed havia estendido em sua direção.
— Por quase ter mandado Analu para o hospital ou pela bebida? — Dylan
pergunta por mim, tomando o lugar ao seu lado.
— Ambos? — sugeriu ainda me encarando.
— Já tive brigas e porres piores que o de ontem. — Levo a xícara até a
boca e quando o café entra em contato com minha garganta, quase solto um
gemido de aprovação. — E Analu queria um espetáculo, eu dei isso a ela.
Ela não estende o assunto, apenas volta a sua atenção para meus irmãos e
começa uma conversa animada. Essa era mais uma das qualidades que eu
apreciava naquela garota, ela respeitava o seu espaço pessoal. Não forçava
conversas que sabia que não estava preparada para ser ditas ou se intromete
onde achava que não deveria.
Mas a verdade era que eu havia sido verdadeira com ela, estava
perfeitamente bem pela briga ou pela ressaca. Mas o que ninguém sabia, era
que mesmo que estivesse embriagada na noite passada, eu me lembrava de
cada palavra que Analu havia proferido sobre Sophie. E o pior de tudo, era
que eu não havia perdido o controle e a agredido por tentar prejudicar a
minha festa, mas sim porque algumas das palavras que ela disse, haviam
sido uma verdade, uma verdade que sempre me atormentou. Cada maldita
frase sobre Aidan ou minha irmã, me atingiu de uma forma que acabou
despertando um lado de mim que poucos sabiam que existia. Um lado que
perdia totalmente a noção da realidade, um lado em que a raiva me
dominava, que implorava com que eu fizesse aquela dor sumir.
E para completar a minha situação de merda, estava me corroendo por
dentro por conta do dono dos malditos olhos azuis, que me encarou com todo
tipo de sentimento existente no mundo e disse coisas que não deveria. Logan,
ele não deveria ter me levado até meu quarto ou tentado ser gentil, ele
deveria ter deixado que Edmund cuidasse de mim, que visse meu lado frágil,
quebrado.
E não deveria ter falado sobre sentimentos ou ter me feito gritar todas
aquelas palavras, e muitos menos ter as devolvido, porque agora estávamos
guardando segredos um do outro, coisas que as pessoas nem sonhavam que
ainda existiam entre nós.
Por isso eu não estava nem um pouco contente em topar com ele no
campus da universidade. E eu tinha a sensação de que meu ex namorado
também compartilhava daquela vontade. Porque nós sabíamos lidar com
nossas respostas ácidas, nossos momentos de cão e gato, nosso ódio
expresso em cada olhar, mas o que não sabíamos, era lidar com toda a
enxurrada de sentimentos que despejamos um no outro naquela madrugada.
E saber que, além de toda essa merda, eu tinha que lidar com uma cópia
feminina dele na segunda-feira, porque algum lado idiota do meu cérebro
decidiu que fazer uma boa ação livraria um pouco de culpa dos meus
ombros, estava piorando tudo.
— Desembucha. — Dou um sobressalto ao escutar a voz suave de Hazel e
encaro a cozinha, percebendo que havia só sobrado nós duas. — Você está
colocando tanta força que está quase quebrando essa xícara.
— Se eu te contar algo, você vai precisar guardar um segredo e talvez
escolher um lado. — A encaro. — E por mais que eu seja egoísta, não quero
que faça isso.
— O que você e Logan aprontaram? — Ela solta um suspiro.
— Nada. — Faço uma careta. — Não até o momento, pelo menos.
— Vocês parecem dois adolescentes que estão saindo da puberdade e
precisam de monitoração vinte e quatro horas, sabia? — Ergo uma
sobrancelha quando ela faz uma careta. — É sério, nós sabemos que vocês
não suportam estar no mesmo lugar, mas vocês procuram estar perto um do
outro o tempo todo e está difícil lidar com todo esse drama todas as vezes
que vocês discutem.
— É difícil porque vocês são bons amigos um para o outro, Hazel — digo
sinceramente, mudando a direção do assunto. — E uma amizade verdadeira é
rara nos tempos de hoje.
— Você e seus irmãos também são bons uns para o outro. — Ela solta um
sorriso genuíno.
— Você não falaria isso a um ano atrás! — Solto uma gargalhada e ela me
acompanha.
— Não tente mudar o foco do assunto, Vee — resmunga assim que volta
ao normal. — O que está escondendo?
— Você vai precisar ser mais clara que isso. — Pego meu celular e o
desbloqueio.
— Uma pergunta então. — Ela encarou meus olhos e então solta a última
coisa que eu esperava: — Você ainda o ama?
Meu peito vibrou e voltei meu olhar para frente. Eu deveria negar de
primeira, era o certo a se fazer, mas apenas encarei a cozinha vazia, fugindo
de sua expressão ansiosa. Deixei com que minha mente pensasse em uma
resposta certa para sua pergunta, mas talvez meu silêncio lhe deu uma
resposta errada.
Amar é conexão, é troca. E sinceramente? Havia anos que não sentia
aquilo. Não sentia a raridade de uma sintonia perfeita, de um olhar quente e
uma troca de almas. Então a resposta para a sua pergunta finalmente
escorregou pela minha boca, mesmo que tivesse saído com um gosto azedo:
— Não, eu não o amo. — Encaro seus olhos enquanto digo. — Minha
história com a dele já teve um final e ela não precisa de um novo capítulo.
Eu não o amava, porque para amar é necessário sentir algo, e eu era
apenas uma caixa cheia de fragmentos que não tinha encanto, ao contrário,
era podre, medonha e, principalmente, vazia. Todos esses fragmentos eram
resultados de um passado que me torturava até hoje.
— Então parem de se machucar, Vee! — Suspirou preocupadamente. —
Parem de brigar por motivos idiotas, porque você me falar aqui que não o
ama, mas a cada vez que se veem, os dois agem como se o mundo parasse ao
redor de vocês apenas por se olharem, isso não faz com que acreditemos
nessa sua resposta.
— Eu não tenho culpa se seu amigo vive em meu encalço — protestei, me
levantando e indo até a pia.
— Não, a culpa por isso não é sua. — Ela sorri fracamente. — Mas tem
culpa por se deleitar em cada momento que ele vem ao seu encontro. Talvez
esteja na hora de conversarem, colocarem tudo isso para fora.
— Hazel… — Respiro fundo, mas sou interrompida antes mesmo de
continuar.
— Eu não acredito que vocês se odeiem nesse nível, mas eu digo uma
coisa: o amor sempre vai te custar algo, Verônica. — Ela se levantou,
parando em minha frente. — Talvez não seja ele, mas alguém vai querer te
amar e você precisará baixar a sua armadura para poder sentir algo
novamente.
— O amor não pode me custar mais alguma coisa, Hazel, porque ele já me
tirou tudo. — Sorrio dolorosamente e sigo meu caminho para fora da
cozinha.
E eu estava certa sobre isso. O amor poderia ser lindo para alguns, ser
motivo de suspiros e esperança. Mas para mim, era o oposto disso. Havia
uma parte bonita minha que havia sido roubada, uma que ninguém percebeu.

A segunda-feira chegou e a sensação de pisar em uma pista de dança


novamente, foi como soltar uma descarga de eletricidade do meu corpo. As
barras de metal circuladas em volta dos enormes espelhos, me faziam
lembrar das inúmeras horas que pratiquei uma coreografia neste mesmo
lugar, com Emmy gritando instruções e xingando até que meus passos
ficassem finalmente sincronizados com a música.
A luz fraca do sol atravessa as enormes janelas de vidro e ilumina o chão
onde Melany está sentada, terminando de arrumar suas sapatilhas. Algumas
cortinas em tons pastéis deixam o ar mais gracioso. É estranho olhar para
baixo e me ver dentro de um collant e uma saia rose novamente.
— Você está bem? — A voz suave de Melany me faz levantar o rosto e
encará-la. — Está encarando suas sapatilhas como se elas estivessem te
machucando.
— Estou ótima — resmungo, arrumando meu rabo de cabelo. — Vamos
começar.
Alternei meu olhar entre a garota à minha frente e minha antiga treinadora,
que nos encarava do segundo andar com uma expressão de entusiasmo. Fitei-
a por alguns segundos, esperando que dissesse algo, mas apenas acenou com
a cabeça em direção ao salão e se posicionou como se estivesse ali apenas
para assistir. Os olhos de Melany brilham ao me seguir até o centro e eu sei
que sua empolgação acabaria quando percebesse que tínhamos muito
trabalho a fazer, até que conseguíssemos finalizar uma boa apresentação para
a audição da faculdade que desejasse.
— Eu preciso que me mostre como você dança — soprei enquanto
alongava uma das minhas pernas. — Será mais fácil definir um ritmo se eu já
souber como lidar com seu próprio espaço.
— Eu posso fazer isso! — falou com uma voz doce que eu havia
percebido que usava sempre que estava feliz. — Qual coreografia você quer
que eu apresente?
— Uma que te faça querer dançar. — Cruzo meus braços, indo até uma
das barras e me escorando.
Melany apenas assentiu e se posicionou no meio do salão, enquanto eu me
encostei em uma das barras, encarando seu rosto por alguns segundos.
Algumas mechas do cabelo preto que estava preso em um rabo de cavalo,
recaíram sob seus olhos. Ela os afastou e então respirou fundo, focando em
si mesma.
Ela havia se inclinado um pouco para frente e quando percebi o que
queria fazer, um sorriso brotou em meus lábios. Ela estava se preparando
para um giro. Suas mãos ficaram leves sob seus movimentos. Então, em uma
contagem regressiva de três segundos, ela girou o corpo, parando
perfeitamente com uma perna esticada e a outra formando um triângulo. Os
próximos movimentos foram simples, mas me deu uma noção de como ela
tinha estabilidade, força e, principalmente, paixão. Paixão por estar ali e por
saber controlar seu corpo e suas emoções enquanto a melodia da música
corroía cada espaço daquele local.
— Coloque peso na perna direita — digo finalmente. — Gire lentamente e
finalize esse passo em um Plié.
Quando o faz, seu passo sai praticamente perfeito, mas ainda havia algo
faltando, algo que meus olhos sabiam estar lá, mas ainda não conseguia
distinguir. Então a resposta veio como se uma lâmpada estivesse acendendo
em minha cabeça. Melany é uma ótima bailarina, mas não conseguia colocar
o que estava sentindo nos seus movimentos. Ela imitava os passos, girava e
concluía tudo o que a mandavam fazer, mas o seu rosto era indiferente e não
me entregava que estava colocando os sentimentos que deveria em suas
manobras. Ela estava apresentando uma coreografia, não estava a sentindo.
— Melany? — pergunto assim que finaliza.
— Sim? — diz entre fôlegos.
— Algumas coreografias como essa, tratam-se mais de sentimentos do que
de passos perfeitos.
— Como assim? — pergunta erguendo a sobrancelha.
— Dançar… é expressar nossos sentimentos, é contar uma história através
de movimentos, mas, acima de tudo, é uma conexão íntima e profunda
conosco — digo, a encarando. — Você precisa fazer com que o seu público
enxergue apenas você e sinta tudo o que você quer transmitir.
— Eu acho que posso fazer isso — murmura.
— Melany… — Seus olhos me encontraram. — Se você não sentir o que
está fazendo, não acreditar que isso é possível… ninguém mais vai.
— Em que você pensa quando dança? — Ponderou cautelosamente.
— Ultimamente? Em coisas que me deixam com raiva. — Solto. —
Preparada?
Esperei a sua confirmação e quando veio, eu fiz com que a melodia da
música ressoasse pelo salão, e assim que as primeiras notas chegaram até
mim, não havia mais nada. Deixei com que cada sentimento tomasse conta de
mim, senti a presença de Melany ao meu lado, nosso corpo no ritmo da
música, e a cada vez que seus olhos encontravam os meus, eles brilhavam.
Nos deixamos envolver completamente por aquele momento. Normalmente
não conseguia me soltar daquela forma, mas algo ali era libertador, como se
finalmente estivesse fazendo a coisa certa.
Eu amava dançar, amava ser controladora e precisa, adorava fazer com
que meu corpo me deixasse levar a sensações que só ali sentia. Eu estava
completamente imersa; algo havia deixado que eu me levasse completamente
pelas batidas, movia o corpo sincronizadamente com minha parceira, e podia
sentir o coração palpitando.
Porém, quando os meus olhos se abriram e pousaram na foto em cima do
balcão, me desestabilizei, todas as preocupações voltaram e sabia que
estava pensando demais, ao invés de apenas me deixar sentir a melodia,
como havia instruído Melany a fazer. Mas a imagem de Sophie ao meu lado,
sorrindo enquanto finalizamos essa mesma coreografia há anos atrás, me
atingiu como um tapa na cara. Naquele dia éramos imbatíveis, tínhamos
acabado de ganhar um campeonato e estávamos dançando para comemorar.
Eu queria que apenas isso tivesse invadido minha mente, porque memórias
felizes eu podia controlar, mas a imagem de seu sangue sujando meu collant
naquela noite, enquanto ela me fazia prometer coisas que iriam contra
qualquer coisa que já fizemos e o pior de tudo, interferido na vida da garota
ao meu lado, que era apenas uma criança inocente. E no meio de tantas
memórias, eu perdi completamente o ritmo, me fazendo tropeçar.
Meu corpo perdeu o equilíbrio, e a próxima coisa que senti foi minhas
costas no chão e então minha cabeça. A dor em primeiro momento foi bem
vinda, me fez perder a linha de raciocínio, esquecendo um pouco sobre as
merdas que me rodeavam. Mas quando a adrenalina baixou, eu xinguei em
alto e bom som.
— Verônica? Ah, meu deus! — A voz preocupada de Melany me fez abrir
meus olhos. — Você se machucou?
— Estou bem! — Suspiro entre dentes, fechando os olhos novamente. —
Quedas fazem parte.
— Não como essa… — Faço uma careta, enquanto ela estende o braço
para me ajudar a me levantar. — Você estava dançando de uma maneira
incrível e no momento seguinte, caindo.
— Eu perdi a concentração. — Ignoro seu rosto preocupado. —
Terminamos por hoje, preciso de um banho gelado para fazer essa dor nas
costelas passar.
— Nos vemos amanhã? — pergunta com entusiasmo.
Respirei fundo, tentando ignorar a dor que ainda estava queimando em
meu corpo e encarei a garota à minha frente. Eu não estava nem um pouco
animada em encarar dois Underwood no dia seguinte, principalmente quando
já sabia que o primeiro tiraria toda a minha paciência no trabalho que
teríamos que fazer juntos.
— Tenho alguns compromissos amanhã, podemos tentar novamente na
quinta-feira? — digo, me abaixando e apoiando as mãos em meus joelhos.
— Apenas ensaie essa coreografia novamente.
— Até quinta, Vee — diz sorrindo.
— Até, Melany! — devolvo, ainda escorando minhas mãos e fechando
meus olhos.
Eu daria tudo para estar em casa nesse exato momento, porque só de
pensar em dirigir até minha casa, meu corpo reclama. E para ser sincera,
estava cogitando a ideia de ligar para meus irmãos e implorar para que
trouxessem seus traseiros até essa parte da cidade, apenas para me darem
uma carona. Mas sou impedida de fazer tal ato, quando passos soam pelo
piso e uma voz sensual invade todo o ambiente. Não impedi o sorriso idiota
que se formou em meus lábios e quando levantei a cabeça, a primeira coisa
que reparei foi em seu sorriso perfeitamente alinhado e nos olhos verdes que
conquistavam toda Nova York. Percebi que seu cabelo loiro sujo estava um
pouco maior do que a última vez que nos vimos, mas o caminhar continuava
o mesmo, como se fosse o próprio Zeus caminhando entre reles humanos.
— Foi um tombo feio. — Sua boca se curvou em um sorriso debochado.
— Eu daria uma nota bem baixa para sua performance.
— Você ainda continua um babaca, Oliver? — Faço um beicinho, que se
transformou em uma careta.
— Apenas com você, pequena Blackwell. — Se gabou, dando de ombros.
— Eu acho que preciso de uma atualização, desde quando Underwood e
Blackwell são amigos novamente?
— Não somos. — Deixo minhas mãos caírem do joelho e me levanto,
sentindo minhas costas doerem. — E não seremos.
— Tive uma alucinação ao ver a pequena Underwood ensaiando com
você? — Ergue uma sobrancelha.
— Estou fazendo um favor para a garota — justifiquei, soltando um
suspiro. — E cuide de sua vida.
— Estava com saudade de seu humor ácido — diz sorrindo ao vir ao meu
encontro, me puxando para um abraço. — A África não é nada divertida sem
você.
— Nenhum lugar é, Wright! — Solto uma gargalhada. — Espero que não
tenha vindo de carro, porque vai dirigir o meu.
— Você está me fazendo pensar seriamente em voltar para o aeroporto e
pegar o primeiro voo para longe de você — resmunga, pegando minha bolsa
em cima do banco.
O encarei enquanto andávamos para fora do prédio e então soltamos uma
gargalhada quando eu choraminguei por permitir que ele dirija meu carro.
Enquanto me sento no banco do passageiro, encaro meu amigo.
Oliver sempre foi calmaria para mim, um amigo no qual daria a minha
vida se fosse preciso. E saber que ele estava aqui novamente, mesmo que
seja por alguns dias, fazia com me sentisse melhor, forte e menos solitária.
— Quantos dias vai ficar? — pergunto quando chegamos ao meu carro.
— Pequena Blackwell, assim como você, eu voltei para ficar. — Solta um
suspiro nada feliz.
O encarei preocupada, porque eu sabia que ele não desejava estar aqui. E
se assim como eu, ele foi obrigado a voltar para essa cidade, significa que
alguma merda estava para acontecer.
Porque se havia uma coisa que eu tinha certeza, era de que meu pai e o
dele eram pessoas egoístas, manipuladoras e, acima de tudo, perversas.
Você já se perguntou o que nós poderíamos ter sido?
Você disse que não o faria, e você fez, porra
Mentir pra mim, depois se deitar comigo, arrume essa merda
Agora todas as minhas bebidas e todos os meus sentimentos
I hate u, I love u | Gnash feat. Olivia O’Brien

Eu odiava os treinos de terças-feiras, o treinador sempre estava de mau


humor e o time parecia que ainda estava se recuperando de algum final de
semana fatídico. Hoje em especial, estava tudo muito pior, nenhum dos meus
colegas conseguia treinar em sincronia, não acertávamos um passe sequer.
Sem dúvidas, isso nos renderia um sermão e tanto mais tarde, porém, aquilo
não estava me irritando tanto quanto Mike Burhan, que havia sido escolhido
para ser minha dupla. Toda vez que seus olhos encontravam o meu, eu
percebia o puro desdém estampado em suas íris, o que não era
surpreendente, não quando se considera todo o nosso histórico.
Só que a minha cota de paciência para lidar com esses dramas já havia
estourado. Principalmente agora que Melany andava bem estranha com nossa
tia e comigo. Sem contar a bomba que está sendo armada e que vai estourar
bem na minha cara, porque, Aidan, a porra do meu irmão mais velho, está
voltando à cidade, não há um momento mais impróprio para o seu retorno,
logo agora que as pessoas que mais o odeiam estão de volta a Saint Vincent.
— Preste atenção no treino, Underwood! — Mike grita quando meu
arremesso não atinge o local que o treinador havia indicado.
— Não me irrite, Burhan, não hoje! — grito de volta.
— Então preste atenção, caralho!
Respiro fundo, tentando não o agredir. Se eu perdesse a paciência com o
babaca à minha frente, confirmaria os boatos que corriam por todo o campus
de que Verônica havia acabado com Analu por conta dos assuntos mal
resolvidos entre nós quatro. E para ser sincero, estou farto de problemas que
envolvam Verônica, principalmente quando ela tem a irritante mania de me
tirar do sério.
— Burhan, Underwood, parem de agirem como duas crianças birrentas e
treinem de maneira correta! — A voz do treinador me dizia que não era
apenas eu que estava a um fio de explodir hoje. — Tente novamente,
Underwood, faça certo dessa vez.
Resmungo mais alto do que deveria, fazendo com que alguns jogadores
escutem. Kennedy, o tight end[4], solta uma gargalhada irritante.
— Kennedy, posição de largada — vocifero, o encarando friamente,
enquanto ele engolia a risada.
Apoiei minhas mãos em meus joelhos e gritei os comandos para que o
resto entendesse a jogada que iríamos fazer, todos se posicionaram,
deixando de lado a diversão de ver minha irritação e se concentrando no
treino. Seria uma jogada ousada, e se não corrêssemos rápido o suficiente, o
outro time teria a vantagem. Precisava mostrar aos meus companheiros que
teríamos que jogar em conjunto, deixando rivalidades fora do campo, do
contrário, o campeonato estaria certamente perdido. Esperei a aprovação do
treinador; quando seu aceno veio um tanto orgulhoso, eu gritei com meus
jogadores.
Encarei Mike por alguns segundos e levantei meus dedos, fazendo um
sinal para que trocássemos nossas bases, como havíamos feito em dois
treinos táticos da temporada passada. Eu sei que ele odeia ter que fazer isso,
afinal, ele teria que me dar cobertura, e principalmente porque é uma das
nossas jogadas arriscadas, uma das que usamos apenas quando não temos
muita opção para reverter o placar do jogo. Respiro fundo, enquanto meu
companheiro corre até o outro lado do campo com a bola, e assim que seu
grito veio alto e claro, me dizendo para me preparar, logo faço isso, me
posicionando entre outros dois jogadores. Observo sob o capacete, Burhan
levantar o braço e fazer com que a Wilson voe até mim, dou um salto para
conseguir pegá-la.
Um sorriso surge em meus lábios quando sinto a textura entre meus dedos,
mas não tínhamos tempo para isso, precisávamos correr contra o tempo, por
isso, traço uma rota até a jarda que nos daria uma vantagem. Precisávamos
passar pela defesa e por dois lannerbacks[5] à direita. E eu tinha certeza de
que tínhamos menos de um minuto para atravessar o campo, por esse motivo,
esvazio minha mente, forçando-a a esquecer a garota que ocupava todos
meus pensamentos desde que voltou para a cidade. Quando consigo fazer
isso, corro e pulo sobre alguns caras que haviam se jogado para formarem
uma barreira no intuito de me atrasar.
Cinquenta jardas…
Quarenta…
Trinta...
Vinte.
Estávamos quase lá, minhas pernas já começavam a reclamar do esforço
extra que precisei fazer para pular sobre os jogadores que caiam. Entretanto,
aquilo não seria um empecilho. Nunca era. Eu terminaria essa partida da
melhor forma, assim como terminei dezenas outras durante os anos que
passei neste campo.
Dez… Touchdown.
Abaixo meu corpo, apoiando minhas mãos em minhas pernas, tentando
estabilizar minha respiração descompassada. O resto do time comemorava
como se tivéssemos ganhado a final da NFL e a adrenalina correndo em
minhas veias me fazia sorrir como se essa realmente fosse a sensação que
estivesse sentindo. O coração acelerado e o suor correndo pelo meu rosto,
me fazendo sentir vivo, elétrico, fez com que uma alegria surgisse, porque eu
amava aquilo, amava estar no campo e sentir essa conexão com esse esporte.
— Bom garoto! — Olho sobre o ombro para o treinador, que sorria como
uma criança que havia ganhado seu primeiro campeonato. — Você deveria
escutar meu conselho e participar do Draft esse ano, Logan.
— Estou bem com a minha profissão, treinador! — digo, me levantando.
— Acredito que estará melhor em campo. — Danforth tira seu boné,
coçando sua cabeça, e o recoloca. — Você tem talento e sei que irá se
arrepender se não tentar. Mas por agora, vá tomar um banho. Acabamos por
hoje.
Assinto em sua direção, porém, demoro alguns segundos para finalmente
caminhar em direção ao vestiário, ignorando algumas conversas paralelas,
estava cansado demais para tanto falatório. E quando finalmente entro na ala
de chuveiros e a água escorre pelo meu corpo, eu gemo em aprovação,
sentindo meus músculos se relaxarem instantemente. Minha vontade é
terminar meu banho e correr para o apartamento, para eu poder finalmente
dormir durante todo o dia, mas sei que seria impossível.
Então me limito apenas a terminar meu banho e correr em direção ao meu
bloco.
E cada passo até lá, eu só conseguia pensar que seria um longo e doloroso
dia.

— Você está atrasado. — Verônica enuncia sem se dar o trabalho de tirar


os olhos do livro que tem em mãos.
A forma que ela falou me faz revirar os olhos enquanto me jogo na
cadeira a sua frente, nossos outros dois parceiros de trabalho estão em uma
conversa acalorada sobre algum assunto que não faço a mínima ideia e não
estou com nenhuma vontade de saber.
Quando volto o olhar para a garota à minha frente, tenho um leve momento
de dejavú. Suas botas brancas de salto fino estão em cima da mesa, enquanto
ela se escora na cadeira, segurando um livro que não consegui ver o título.
Os óculos de grau com armação quadrada e preta fazem com que os
castanhos de seus olhos se destaquem, ela morde levemente o lábio inferior,
como se estivesse nervosa com algo que está acontecendo ali. Verônica
encara o livro em suas mãos com tanta fascinação, que preciso desistir de
atormentá-la apenas para admirá-la.
Naquele momento, ela não é a mulher com respostas ácidas ou cruel que
destrói quem mexe com as pessoas que ama, ali ela é apenas uma versão da
garota que um dia foi a minha garota, com suas inúmeras caretas por conta
de um plot que a surpreendia e prendia a sua atenção. Naquele segundo, ela
é uma leitora voraz, interpretando seja quem for o personagem, em um
mundo diferente.
De repente, ela solta suspiro tão alto, como se não esperasse por aquilo
que acabara de ler. Cruzando os braços frente ao corpo, solto um sorriso,
não um sorriso sarcástico ou frio que dávamos um para o outro, mas um
sorriso verdadeiro, nostálgico. Quando seus olhos encontraram os meus, eu a
admirei mais uma vez.
Mesmo sabendo que é errado, eu quis ir até onde estava sentada e beijá-
la, vislumbrei nitidamente meus dedos passeando por toda sua pele macia.
Quão irresistível isso parece? Porém, a expressão em seu rosto foi como se
a realidade batesse em minha porta e me puxasse de lá com uma
agressividade que apenas Verônica tem.
— Se precisar de uma foto para guardar de lembrança, posso te conceder
uma, Underwood! — Solta, enquanto baixa as pernas e fecha o livro.
E ali estava a versão da mulher que eu realmente odeio, a que me faz
lembrar dos inúmeros motivos pelo qual não deveria ter pensamentos bons
ou desejá-la da forma como estava desejando.
— Não é necessário, anjo — Seu sorriso morreu enquanto um surgia em
meus lábios, inclino minha a cabeça, passando minha língua pelos meus
lábios, antes de continuar: — A sua linda imagem é bem fixa em minha
mente.
— Babaca! — resmunga.
— Megera — devolvo, me inclinando à sua frente e cruzando as mãos
sobre a cadeira, apertando uma à outra para não ter que levá-las ao rosto da
diaba e a beijar.
— Vamos começar? — Pettersen intervém com um sorriso gentil, enquanto
se senta ao lado de Blackwell.
— Por favor! — resmungo, me ajeitando na cadeira sem interromper o
contato visual.
Os olhos de Verônica varrem toda a extensão da biblioteca atrás de algo
que eu não tinha a mínima ideia do que é, mas não nego que gostaria de saber
o que a deixa tão ansiosa. Então, quando voltam para mim, ela lança um
olhar porco e abre um caderno preto, anotando algumas coisas que nosso
colega começa a dizer. Durante os minutos que se passam, ela não emite
nenhum som, apenas ouve com atenção o que eles dizem, fazendo algumas
caretas quando não concorda com algo. Entretanto, foi quando Peterssen
lançou a ideia de que poderíamos fazer uma coleção juntando todas as
vertentes do curso, eu soube que aquilo não daria certo.
— Não pense em nenhum momento que aceitarei isso! — digo
incomodado.
— Logan, você estuda design, Verônica moda e nós dois aqui publicidade
— Briana aponta para cada um enquanto diz. — Não há como juntar todas
essas coisas, sem colocar a mão na massa.
— E você quer que nós dois — Verônica diz intercalando o dedo entre
mim e ela — elaboremos uma coleção juntos?
— Vocês dois são talentosos. Então a resposta, é sim! — Peterssen diz
sorrindo e se vira para mim. — Verônica desenha as roupas e você as molda
em 3D, então nós realizamos o lançamento.
— Onde diabos é que essa ideia tem a ver com a nossa matéria? — Ergo
uma sobrancelha enquanto cruzo meus braços.
— Simples… Verônica desenhando será a parte ilustrada, você moldando
as peças será o manuseio dos programas — Brianna explica orgulhosa. — E
nós criando o site para a divulgação e todo o resto, seremos a direção de
arte e empreendedorismo.
Não há o que pensar e nem dizer, eles conseguiram nos prender em um
canto sem nenhum argumento. A única saída seria se um de nós dois
tivéssemos uma ideia bem melhor que aquela merda, mas pelo olhar que
Verônica me dá, ela tem o mesmo pensamento. O suspiro que soltei deu-lhe
uma resposta.
E quando ela ergue os ombros e olha diretamente para os dois que estão
agora em pé, eu soube que estaria fodido. Porque tudo bem fazer um trabalho
no qual ela está envolvida, mas se aceitarmos, significa que trabalharemos
em dupla, sozinhos. Não haverá ninguém para ser nosso interceptor e isso
não é nada animador.
Porra, é péssimo!
— Tudo bem, nós faremos essa merda acontecer — a expressão de
Verônica endurece enquanto profere. — Mas teremos a liberdade de criar o
que quisermos e sem vocês dois se meterem.
— Mas… — Brianna começou, mas a interrompi.
— É pegar ou largar — digo, soltando um sorriso, voltando a me encostar
em minha cadeira. — Vocês jogaram essa merda em nosso colo, agora é
nosso problema!
A respiração que eles soltam foi o suficiente para saber que estão se
arrependendo de nos ter dado tamanha responsabilidade. Eles conhecem o
nosso histórico, sabem que não nos suportamos e que brigamos todas as
vezes que estamos juntos, mas se existe uma coisa que Verônica e eu somos
bons, é provocar as pessoas que nos desafiam.
— Tentem não se matarem no processo. — Peterssen sorri e puxa sua
colega para a escada. — Nós temos aula agora, então deixaremos vocês
decidirem o tema, qualquer coisa é só mandar mensagem.
Antes que pudéssemos dizer algo mais, os dois idiotas já estavam
correndo em direção aos degraus até o primeiro andar da biblioteca. Por
longos minutos, minha parceira não diz nada, apenas encara o celular com a
expressão de tédio, como se estivesse esperando por algo e isso começa a
me irritar, porque quanto antes terminarmos essa merda, menos tempo
teremos juntos.
Junto as minhas mãos, entrelaçando meus dedos e encostando os cotovelos
na mesa, encarando-a profundamente, seus olhos encontram os meus e sem
nenhum motivo, ela imita a minha posição. Nossos rostos agora estão a
poucos centímetros de distância, se eu me aproximar mais alguns
centímetros, conseguirei sentir a sua respiração, porém, temo por minha
segurança e principalmente por minha sanidade, então me limito apenas a
encarar seus olhos com o máximo de ódio que posso transparecer em minhas
íris.
— Guarde seu ódio para o momento certo, Underwood! — ela diz
lentamente. — Mas já que está me encarando como se quisesse me matar,
vamos direto ao ponto.
— Por favor — insisto, inclinando levemente a cabeça. — E seja breve.
— Eu, desenharei essa coleção idiota, e você não dará nenhuma opinião
sobre meu trabalho. — Ergo uma sobrancelha.
— E você quer que eu faça os moldes como, anjo? — pergunto, sorrindo
sarcasticamente. — Porque sou muitas coisas, mas ainda não sou vidente.
— Eu irei te enviar os croquis, babaca! — xinga, revirando os olhos.
— Atualize seus palavrões, anjo! Este já está repetitivo.
Verônica se levanta de repente e dá a volta na mesa, parando à minha
frente. Percorro os olhos lentamente pelo seu corpo, encarando sua calça
preta, que se agarra em cada curva de seu corpo e o pequeno decote de seu
body rendado, que faz com que meu pau ganhe vida em minha cueca. Eu não
podia negar que minha ex é gostosa, ela não é uma menininha tímida, que
cora quando um homem a encara, ela é mulher travessa, má, que quando quer
algo, pega sem ao menos pedir.
Quando finalmente encontro seu olhar, ela está me encarando com uma
expressão vitoriosa, como se eu acabara de fazer exatamente o que ela
queria. Observo seu rosto, enquanto inclina seu corpo, ficando cara a cara
comigo e solta um sorriso cínico enquanto diz:
— Pare de me olhar como se quisesse me foder, capitão! — Uma de suas
sobrancelhas perfeitamente desenhada se ergue. — Porque isso também está
repetitivo.
As madeixas pretas caem para a frente, criando um véu entre nós dois e o
mundo lá fora. Nesse momento eu quis gargalhar, não porque ela diz tal
coisa, mas porque os seus olhos me entregam o quanto ela deseja que isso
seja verdade.
Verônica Blackwell me encara com uma luxúria que faz com que minha
boca fique completamente seca e um sorriso cresce em meus lábios,
acompanhando o dela. Lanço o foda-se para todas as coisas ao nosso redor.
Eu quero Verônica, quero beijá-la até que essa necessidade se esvaia e
nosso ódio volte a reinar, quero jogá-la entre essas enormes estantes, deixar
com que meu pau entre nela, enquanto geme meu nome deliberadamente.
— Eu vou te foder, Blackwell! — sussurro, me aproximando de seu
ouvido. — E no momento em que eu estiver dentro de você, quero que se
lembre que eu ainda sou inimigo, que sou seu pior pesadelo.
— Enquanto estiver dentro de mim, Underwood… — Ela se aproxima e
morde o lóbulo de minha orelha, soltando um sorriso. — Eu quero que me
mostre o quanto me odeia.
E com isso, se afasta alguns centímetros, apenas para encontrar meus
lábios.
Nosso beijo não é carinhoso. É intenso, pecaminoso. Cheio de sentimentos
confusos. Estamos expostos nessa biblioteca, qualquer um pode chegar e nos
pegar aqui enquanto nós nos devoramos. E isso me deixa ainda mais louco,
porque quero que vejam essa cena, desejo que observem que estamos aqui e
ninguém pode mudar isso. Seguro sua cintura enquanto ela sobe em meu
colo, sua língua explora cada centímetro da minha boca com uma voracidade
surpreendente. O atrito de sua calça com o tecido da minha faz com que eu a
levante e a coloque sentada na mesa, me colocando entre suas pernas. Desço
as mãos por suas costas sentindo o pouco de sua pele exposta se arrepiar ao
meu toque. Eu preciso de mais, preciso estar dentro dela desesperadamente.
Solto um resmungo quando ela separa nossos lábios por alguns segundos,
me afastando e me encarando com suas íris nubladas de desejo. Eu me
preparo, esperando que ela chute minhas bolas ou até mesmo me jogue pelas
escadas. Mas ela faz ao contrário, Verônica pula da mesa e me beija
enquanto caminhamos às cegas para o fundo da biblioteca, onde há pouca
iluminação.
Cruzamos uma linha quando permitimos esse beijo e pela maneira que me
devora, ela, assim como eu, está pouco se fodendo para isso ou para as
consequências que isso trará para nós dois.
Meu pensamento é cortado quando ela me dá um puxão assim que se senta
na última mesa, minhas mãos vão direto para sua nuca, puxando-a para um
terceiro beijo. Um que eu não quero que termine. É urgente, desleixado,
como se estivéssemos sedentos um pelo outro. Suas unhas arranham a minha
nuca e é a porra da sensação mais inebriante que já senti enquanto beijava
uma garota. Verônica solta um gemido que me faz aprofundar o beijo mais
ainda. Nossa respiração é profunda quando nos afastamos para respirar, e
assim que voltamos a encostar nossas bocas, seus dedos começam a
trabalhar contra o botão da minha calça, enquanto eu luto desesperadamente
contra os seus.
Mas antes que pudéssemos ter êxito, um arranhar de garganta faz com que
afastemos nossos rostos e olhássemos por cima do meu ombro. Oliver
Fodido Wright está parado com os braços cruzados, me encarando como se
eu fosse um assassino em série e estivesse pronto para cometer um
homicídio com a garota sentada na mesa.
Uma raiva inexplicável surge em mim, e eu nem sabia explicar o motivo,
porque eu já havia sido interrompido antes. Porém, nesse momento, desejei
que nenhuma alma entrasse aqui. Seus olhos vão até onde seguro a cintura de
Verônica, fazendo com que volte a encará-la. Seu rosto está assustado, como
se em uma fração de segundo ela tivesse se dado conta de quantas pessoas
iríamos magoar apenas em nos darmos o luxo de viver esse momento.
E por esse motivo, eu quis me esmurrar por deixar com que o desejo por
Blackwell tomasse conta de todo bom senso. Afasto a mão de seu corpo,
arrumo minha camiseta, que agora está totalmente amassada, e pego a jaqueta
do SVU, jogando-a sobre meus ombros.
Enquanto faço isso, ela me encara, como se pensasse o mesmo. Havíamos
sido inconsequentes neste momento, não calculamos o tamanho do desastre e
agora havíamos nos atirado em um poço sem fundo.
E mesmo que pudesse negar para todos sobre o que esse momento havia
representado, jamais conseguirei mentir para mim mesmo, porque soube, no
momento em que nossos lábios se tocaram, que meus fragmentos
completaram os dela e que éramos como uma arte abstrata que havia sido
feita para durar anos, mas, no final, foi apenas efêmera.
— Não se preocupe, anjo — sussurro enquanto me inclino para perto de
seu ouvido, deixando um beijo casto em sua bochecha. — Guardarei nosso
segredo sujo.
Com isso, me afasto e sigo em direção à saída, em busca de ar fresco.
Para ser sincero, aquele beijo reacendeu uma parte de mim que eu nem sabia
que ainda existia.
E por mais que eu negasse, Verônica Blackwell havia me dado um pingo
de sua pior droga com aquele beijo, e eu sabia que me viciaria, porque,
naquele momento, era como se eu já estivesse em abstinência.
Conheço algumas pessoas, elas morreriam por mim
Nós fugimos juntos, eles são minha família
Quando eu me levantar, eles irão às alturas comigo
Eu ficarei pra sempre, minha família
Family (feat. Kygo) | The Chainsmokers

Uma vez, minha mãe me disse que eu deveria saber escolher as batalhas
que teria que travar, mas o que ela não me disse, é que a pior das batalhas
que um dia enfrentaria, seria com meu próprio coração.
Em um momento eu estava beijando Logan Underwood, e no outro estava
encarando seu rosto com pavor, como se eu tivesse tocado em algo proibido.
A culpa se instalou em meus ombros, fazendo com que toda a minha
respiração se esvaísse do meu corpo. Não me mexi enquanto ele descia as
escadas como se fosse o rei daquele local e muito menos quando Oliver
caminhou até mim, me encarando como se eu tivesse perdido todos os
neurônios da minha cabeça, o que não contribuiu em nada para me fazer
sentir melhor.
— Que merda você tem na cabeça, Verônica? — pergunta severamente,
enquanto se escora na estante à minha frente. — Se Dylan ou Edmund
tivessem pegado esse flagra, eles com certeza jogariam Underwood por
aquela maldita escada.
— Seria um problema a menos, não? — Solto um sorriso frio para ele,
tentando não demonstrar quão abalada estou. — Não faça disso um drama,
Wright.
— Um drama? Caralho, Verônica! — Ele passa as mãos pelos cabelos, do
mesmo jeito que faz quando está nervoso. — Você passou quatro anos
odiando aquele cara e algumas semanas na cidade já retrocedeu todo esse
sentimento?
— Eu nunca disse que deixei de odiá-lo, acredite quando digo, esse
sentimento está bem vivo dentro de mim — vocifero no mesmo tom que o
dele. — Não me dê um sermão Oliver, eu sei a cagada que acabei de
cometer. E agora preciso tomar providências para que essa merda não
ocorra nunca mais…
Deixo a frase morrer, porque não sei qual a gravidade da situação agora e
muito menos sabia como lidaria com ela, mas o amargor das consequências
daquele fatídico momento já começava a inundar minha mente.
Eu perdi o controle, me afoguei naquele beijo e me esqueci de tudo. Das
noites em claro, dos pesadelos e da dor... Da dor que senti ao ver minha irmã
morrendo, dos sorrisos falsos que me deu enquanto mentia descaradamente
para mim, dos beijos doces que eram como veneno e de todas as vezes que
me sacrifiquei para que tudo desse certo.
— Ei, ei, pequena Blackwell, volte para a realidade, agora! — A voz
preocupada de Oliver me faz sair dos meus devaneios. — Talvez queira um
abraço?
— Não se atreva. — Faço uma careta, percebendo o que ele queria fazer
com aquela súbita troca de assunto. Pego minha bolsa e aponto para a
escada. — Você é um idiota, sabia?
— Você faz questão de me lembrar… — Ele sorri abertamente. — Todas
as vezes que nós nos vemos, o que não é pouca. Agora vamos, precisamos
tirar esse cheiro de jogador de você!
— Eu tenho que me encontrar com Hazel e Summer no Oásis agora, isso
precisa esperar! — digo o puxando para sairmos da biblioteca.
— Ótimo, estou com fome. — Sua face iluminou-se com alegria.
— Você não foi convidado.
— E desde quando eu me importei em ser convidado, Pequena Blackwell?
Irei pela comida, não pelas companhias. — Dá de ombros. — Além do mais,
preciso de uma carona.
— Você é fodidamente rico, compre um carro! — resmungo.
— Porque que eu teria um carro se tenho uma piloto profissional como
motorista? — Seu sorriso estava começando a me irritar e para não fazer
nada que me arrependesse, abro a porta do carro e me sento, jogando minha
bolsa para o banco traseiro. — Aliás, quando será a próxima corrida?
— Não sei — digo, acelerando pelas ruas do campus. — Não correrei
nesta temporada, é o pior momento do ano para fazer coisas regadas a
adrenalina, você sabe bem disso.
E estou falando a verdade, quando a temporada de tempestades começa,
evito ao máximo fazer coisas que podem resultar em alguma merda. Nessa
época já tenho muitas coisas para lidar. Sei que Edmund se fechará para
qualquer conversa, Dylan irá concentrar toda a sua atenção no final do
semestre, dando a desculpa que, por ter entrado um ano atrasado na
faculdade, ele precisaria se formar com honras ou nosso pai acabará com
qualquer chance que possa ter no futebol. E o pior de tudo, meus pesadelos
irão voltar, irei acordar assustada todas as noites quando os trovões
entrarem pelas janelas e o barulho da chuva me assustar o suficiente,
pensando estar em uma pista molhada e escorregadia, eu, com minha irmã
nos braços, rodeada de sangue. E descontarei toda essa frustração em
bebidas, festas e muita das vezes, na dança. E quando nada disso conseguir
me manter sã, eu perderei o controle sobre mim, trancarei meus sentimentos
em uma cápsula e fingirei que nada mais importa, que a máscara fria que
ocupa meu rosto em momentos como esse, é algo normal, como aconteceu na
última temporada.
— Você pode ligar para sua psicóloga a qualquer momento. — Oliver
suspira no banco do passageiro, me tirando dos meus pensamentos. — E não
estamos mais em Nova York, talvez consiga superar tudo o que te atormenta,
Verônica.
— Estamos na cidade onde tudo começou, Oliver. — Essa não é uma
conversa que quero ter enquanto dirijo. Então dou seta e encosto o carro no
acostamento, solto meu cinto de segurança e me viro para o encarar. — É
pior, do que quando estávamos em Nova York, lá eu podia fingir ter uma
vida normal, podia fingir que toda essa merda ficou no passado.
— Quando estávamos em Nova York perdíamos a porra da realidade,
Verônica. Você quer aquilo de novo? Quer que seu pai coloque uma coleira
em você e te trate como marionete? Quer que voltemos para aquele campus e
agir como se fossemos cruéis e superficiais como fazíamos? — O rosto do
meu amigo estava severo, como se ele estivesse dando uma bronca em uma
criança. — Eu amo você, Vee. Você é a minha melhor amiga, mas eu não
posso deixar você voltar a se destruir como fez naquela cidade.
— Tudo o que aconteceu em Nova York não foi sua culpa, Ollie! —
Estendo a mão até seu rosto, acariciando. — Você sabe disso, não sabe?
— Fomos expulsos da NYU por colocarmos fogo na universidade, Vee.
— Fomos convidados a nos retirar gentilmente. — Solto um sorriso falso,
tentando aliviar o clima. — Eles foram uns filhos da puta, não tivemos culpa
do que realmente aconteceu.
— Me prometa que não seguirá os mesmos passos que seguimos em Nova
York.
— Não posso prometer nada. Você sabe que as merdas sempre estouram
na minha cara. — Viro meu corpo para a frente novamente. — E se
seguirmos os mesmos passos de antes, nós foderíamos com nossas vidas
antes mesmo do fim do semestre, você não gostaria de foder com tudo?
— Seu convite é tentador, mas não repetirei isso novamente — ele diz,
fazendo uma careta engraçada.
— Não posso discordar disso. — A gargalhada que soltamos fez com que
o clima ficasse suave.
Esse é um dos motivos pelo qual Oliver é o meu melhor amigo, ele esteve
comigo desde que Sophie morreu, o garoto de cabelos loiros sujos e olhos
verdes, limpou minha bagunça, me acordou quando meus pesadelos me
aterrorizavam, tentou me distrair enquanto eu me afogava em um poço de
autodestruição por conta do luto e, principalmente, fez com que a realidade
não acabasse com o resto de luz que ainda estava escondida dentro de mim.
Por todos esses motivos, eu sei que se existe alma gêmea no que quesito
amizade, Oliver Wright é a minha.
Quando estacionei em frente ao Oásis, o vento frio do começo do inverno
bateu em meu corpo, fazendo com que me arrependesse amargamente por não
ter trago um agasalho. Porém, sei que Dylan virá ao resgate de Hazel antes
mesmo que terminássemos nosso almoço. Então, enquanto entramos no
estabelecimento, retiro o celular da minha bolsa, deslizando o dedo pela
tela, ignorando as inúmeras notificações das redes sociais, entro no chat com
meu irmão mais velho, digito uma mensagem pedindo que fosse um bom ser
humano e trouxesse um casaco para mim quando viesse e volto a jogar o
objeto em minha bolsa.
Assim que levantei minha cabeça, a primeira coisa que vi foi o coque
loiro de Summer, ela encara um livro com capa verde e as laterais pretas e
sem olhar para o lado, puxa algumas batatas da bandeja que está em cima da
mesa. Hazel encara o celular com um ódio mortal, como se algo estivesse
completamente errado.
Me aproximo lentamente e jogo minha bolsa na cadeira desocupada ao
lado de Hazel, fazendo com que essa desse um pequeno sobressalto e
olhasse para cima com as sobrancelhas arqueadas. Quando percebe que sou
eu, ela solta um sorriso, como se estivesse aliviada que eu realmente
aparecesse. Um barulho de cadeira se arrastando faz com que nós duas
encarássemos o lugar que antes estava vago ao lado de Summer. Oliver se
jogou na cadeira, cruzando os braços em frente ao corpo e encarando a blusa
vermelha do Homem-Aranha que nossa amiga veste. Uma careta nada
agradável se estende no rosto do meu amigo e antes que eu pudesse dizer
algo para ele, uma voz nervosa preenche o ambiente.
— Alguém já te disse que é desrespeitoso encarar os seios de uma mulher,
babaca? — Summer xinga, direcionando a Oliver um olhar digno do duende
verde.
— Por mais tentador que seja, eu sinto em lhe dizer que não eram eles que
estava encarando, loirinha. — Ele solta um sorriso malicioso.
— Sendo assim, mantenha seus olhos longe de qualquer parte do meu
corpo. — O rosto de Summer não é nada amigável, ela se vira para mim e
solta uma lufada de ar. — Pensei que esse almoço seria apenas de amigos,
Vee.
— Eu sou um amigo, loirinha — Oliver responde por mim, quase que
ofendido e eu realmente estou pensando na hipótese de jogá-lo pela janela ao
nosso lado. — Não seu, claro! Não gosto de amizades onde a cobra morde a
própria espécie.
— Oliver! — repreendo.
— Tome cuidado, playboyzinho! — Ela solta um sorriso frio e aponta
para si mesmo. — O veneno desta cobra é letal.
Antes que Oliver possa responder, eu o chuto por baixo da mesa. Fazendo
com que ele solte um resmungo, porém mantém sua boca fechada. Hazel
havia me pedido esse momento e eu não deixaria que meu amigo estragasse
isso, não quando passei tanto tempo sem aquelas garotas. Mesmo que eu não
estivesse entendendo o porquê de sua reação a Summer. Ele pode ser um
mulherengo de péssimo nível, mas ainda assim é gentil, conquista todos ao
seu redor.
— Eu nunca a vi tão nervosa por conta de alguém — Hazel sussurra
confusa, enquanto aponta o queixo para a loira sentada à minha frente, que
havia voltado sua atenção para seu livro.
— Eu nunca o vi tentando provocar uma garota desta maneira — sussurro
de volta.
— Levi não gostará de saber que talvez tenha concorrência… — Ela solta
um sorriso.
— Eles… — Minha boca se abre em surpresa. — Oh, meu Deus!
— É platônico, ele gosta dela, mas pensa que pode estragar a amizade
deles. — Ela solta um sorriso fraco. — Então não toma nenhuma atitude a
não ser observá-la de longe.
Por um momento, encaro minha amiga do outro lado da mesa, que ignora
Oliver com toda força possível. Summer e Levi sempre foram amigos
inseparáveis, sempre estiveram lá quando um precisava do outro. Eles eram
como Oliver e eu, e se realmente sentissem algo um pelo outro, eu ficaria
feliz por aquilo. Ambos mereciam um amor, mas algo me diz que ela não
corresponde às suas expectativas, a não ser um sentimento fraternal.
Antes que eu pudesse dizer algo, Ed e Dylan entram caminhando até nossa
mesa com Josh e Levi. O sorriso que meu irmão mais velho esboça para
Hazel fez com que me sentisse feliz por eles, principalmente quando ele
parou atrás de minha amiga e se abaixou, sussurrando algo em seu ouvido
que a fez corar. Enquanto Ed se abaixou e deu um leve beijo em minha testa,
me entregando um casaco que havia pedido a Dylan.
Summer, por um momento esqueceu o livro em suas mãos e nos encarou,
como se aquilo fosse algo que jamais presenciou. E não é. Porque antes de
tudo acontecer, não tínhamos esse elo tão solidificado. Sabíamos que se
precisássemos, moveríamos o mundo apenas para ajudarmos um ao outro,
mas depois de toda aquela tragédia, percebemos que o amor entre nós três
era o que nos salvaria e foi como se aquela noite fosse um divisor de águas,
fazendo com que nos tornássemos inseparáveis. Como sempre deveria ter
sido.
— Achei que tinha deixado sua sombra em Nova York, Vee — Dylan
resmunga, soltando um sorriso.
— Você ainda sente ciúmes pela pequena Blackwell me amar mais do que
te ama, Dylan? — Oliver solta um sorriso sarcástico enquanto encosta os
cotovelos na mesa, lhe lançando uma expressão de falso pesar. — Isso é
deprimente para um homem da sua idade.
— Somos irmãos, Wright! — ele resmunga, fazendo uma careta,
colocando as mãos no ombro de Hazel. — Uma ligação muito maior do que
essa que vocês dois tem, então aproveite um pouco, porque sempre serei eu
o preferido.
— Podem brigar à vontade crianças, mas todos sabem que eu sigo sendo
o preferido dela! — Ed diz, dando de ombros, enquanto puxa uma cadeira
para se sentar ao meu lado.
— Desde quando vocês brigam pela minha atenção? — Ergo uma
sobrancelha, pegando uma batata da bandeja de Summer enquanto ela encara
a briga dos três como se fossem extraterrestres. — Estão parecendo crianças
brigando pelo último doce.
Os três soltam uma gargalhada, mas antes que um deles possa continuar o
assunto, Summer encara a porta da lanchonete e arregala os olhos
instantaneamente, fazendo todos seguirmos o seu olhar. Me arrependo logo
em seguida. Logan Underwood caminha lentamente pelo grande espaço, com
os braços ao redor de uma loira bastante conhecida por todos. Ela não sorri
para o babaca ao seu lado, pelo contrário, seu semblante está todo fechado,
como se ele estivesse levando-a para a cova dos leões, e quando seu olhar
encontra o meu, seus olhos transmitem um pequeno pavor, e eu sei que está
se lembrando do nosso último encontro.
— Oh, merda, eu deveria ter comprado um balde de pipoca para esse
momento! — Levi debocha, se jogando do outro lado de Summer. — Será
que eles vendem aqui?
— Não seja idiota, Levi! — Summer xinga, enquanto lhe dá um beliscão
em seu antebraço.
Ignorei os dois, porque meu olhar estava focado em Logan que dizia algo
inaudível para Analu, que solta um pequeno sorriso e me encara como se
estivesse desfilando pelo Met Gala e sua companhia fosse o artista mais
cobiçado do momento. Aquilo trouxe lembranças de uma cena parecida que
havia acontecido no ano sênior quando tínhamos terminado e ele havia
desfilado com Parker como se fossem o casal do ano no colégio.
Voltei meu olhar para meus amigos e Oliver me encara como se dissesse:
“Eu te disse que esse bastardo era um babaca”, mas foi o olhar que Dylan
emitiu ao meu ex namorado que me fez ficar apreensiva. Não estou a fim de
mais uma confusão entre meu irmão e Underwood, não quando eu tinha
certeza de que ele usaria o beijo que aconteceu horas antes para ter uma
vantagem.
— Vocês querem ir embora? — A voz de Josh fez com que deixasse meus
pensamentos de lado.
— Não se preocupe conosco, Josh. — Ed sorri calorosamente para nosso
amigo. — Tenho certeza que meus irmãos são civilizados o bastante para
conseguir ficar no mesmo lugar que seus… — Ele lança um olhar a Analu
sem saber se ela realmente era uma amiga ou se estava ali apenas por estar.
— Amigos.
— Eu vou precisar de uma bebida — Dylan profere me encarando. —
Talvez duas?
— Talvez mais? — resmungo, voltando meu olhar para Oliver. — Você
dirige.
Quando Wright abre a boca para responder, o casal em questão finalmente
chega até a nossa mesa. Logan se separa da garota apenas para caminhar até
Summer e beijar o topo de sua cabeça, mas não repetiu o ato com Hazel e eu
sabia o porquê, ela está entre mim e meus irmãos e nós o encaramos como se
ele fosse a última pessoa que gostaríamos de ter visto na face da terra. E o
olhar que nos direcionou é totalmente mútuo, até que encontrou o meu rosto e
um sorriso de escárnio se abre em sua face.
A vontade de levantar e jogar cada copo que estava em cima daquela
mesa no rosto daquele babaca começa a subir por todo o meu ser, porém,
antes que concluísse esse desejo, Oliver me chuta por baixo da mesa, como
fiz a momentos atrás, bebe um pouco d’água e olha para os dois, soltando um
enorme sorriso, um que eu sei que não era verdadeiro.
— Analu Parker! — diz sorrindo falsamente, enquanto encara a loira, que
observa Logan puxar duas cadeiras para se sentarem.
— Oliver Wright! — A voz doce da garota fez com que uma careta
surgisse em meu rosto. — Pensei que odiasse Saint Vincent como os nossos
queridos Backwell.
— Ah, eu odeio, mas gosto de Vee o suficiente para aturar o caos dessa
cidade.
Oliver me encara e solta uma piscadela, enquanto uma das garçonetes traz
uma bandeja de Donuts, alguns deles eram com cobertura de chocolate e
outros com algumas que não sabia exatamente qual o sabor. Mas meus olhos
brilharam quando encarei os dois que estavam com a cobertura recheada de
confetes coloridos. É o meu preferido desde criança e todos ali sabem
disso. Levo uma das minhas mãos até um deles e Logan faz o mesmo. Nossos
dedos roçam um no outro, e é como se a corrente elétrica que passa sobre
meu corpo estivesse parando o tempo.
Como se eu precisasse desse toque, dessa vibração que percorre cada
membro do meu corpo enquanto me lembro de como ele me tocou mais cedo.
E isso é errado. Sei disso perfeitamente, porque meu peito fala mais alto
sobre essa necessidade de estarmos perto um do outro, as palavras que
ninguém entenderia, a não ser nós dois.
— Uh, eu sempre soube que acabariam juntos! — Analu bate palminhas
sem perceber que Logan e eu ainda nos encarávamos enquanto segurávamos
o doce em nossas mãos. — Eles não formam um belo casal, Underwood?
Uma das minhas sobrancelhas se ergue involuntariamente ao escutar o tom
de provocação que Analu está usando, não para mim, mas para Logan. Como
se ela quisesse que ele visse algo que nenhum de nós sabíamos o que é. E
quando meu olhar varre a mesa, percebo que todos ali têm a mesma
expressão que a minha. Logan abre a boca para dizer algo que eu tenho
certeza que não é nada amigável, mas Summer solta um sorriso nervoso e
diz:
— Pensei que estaria fazendo um trabalho na biblioteca o dia todo, Logan!
Seguro o doce em uma das minhas mãos e com a outra pego o copo de
água que está em cima da mesa e o levo até meus lábios, evitando o olhar
divertido que Underwood me lança, então o idiota solta um suspiro que
deveria parecer chateado, mas que saiu como se estivesse eufórico por
poder dizer tais palavras:
— Acredite, fiz bem meu trabalho, Sum! — Seu sorriso estava realmente
me incomodando. — Minha dupla é incrivelmente experiente.
— Agh! Conheço esse sorriso. — Levi solta uma gargalhada. — Você
transou com a sua parceria de trabalho!
Eu engasgo assim que ele profere as palavras, fazendo com que Ed bata
algumas vezes em minhas costas e me encarasse confuso.
Filho de uma mãe.
Minha vontade agora é realmente de correr desse lugar apenas para não
encarar meus amigos quando souberem que a parceira de Logan — com a
que todos agora acreditam que ele transou — sou eu. E o pior é que eu não
posso soltar uma palavra sobre isso sem me prejudicar, porque aquele
babaca tinha sua língua enfiada em minha garganta há algumas horas.
Analu resmunga, mas todos ignoramos, porque meus amigos encaram
Logan, que mantém seus olhos em mim por alguns segundos, até desviar sua
atenção para Summer.
— Infelizmente não. — Ele solta um sorriso perfeitamente alinhado. —
Mas isso não significa que não irá acontecer eventualmente.
Certo, minhas opções são levantar desta cadeira, socar a cara bonita de
Underwood até me cansar e pagar uma indenização milionária por espancar
o capitão do time de futebol da universidade, fazendo com que eles percam o
campeonato, porque, porra, não estive em nenhum de seus jogos, mas o que
ouço é que ele é o capitão mais jovem que SVU já teve. Ou ignorar esse
imbecil até Oliver entender a gravidade da minha situação e inventar uma
desculpa para me arrastar para fora dessa lanchonete. Infelizmente, eu
deveria escolher a segunda opção, porque se um de nossos amigos ou um dos
meus irmãos sonharem que eu estava prestes a foder com Logan Underwood
em uma biblioteca, porque havíamos perdido o controle de nossas ações,
estarei condenada a sermões eternos.
— Eu tenho pena dessa garota! — Oliver se engasga ao escutar as
palavras de Hazel.
— O que diabos tem nessa água para você e Verônica ficarem se
engasgando? — Dylan ergue uma sobrancelha em confusão.
— O gosto! — Eu e Oliver dizemos em uníssono, enquanto Logan se
escora em sua cadeira e me lança um pequeno sorriso debochado.
— Por que você teria pena dela? — Analu interrompe com um sorriso
malicioso, enquanto fixa seus olhos castanhos em minha direção. —
Underwood é um ótimo parceiro de cama!
— Não acho que precisamos saber sobre o que você e Logan fazem na
cama, Parker! — Summer fala fazendo uma careta.
— Vee, talvez seja melhor nós irmos embora. — Ed sugere quase em um
murmuro, e sei que não estava sugerindo aquilo por acaso, mas sim, para
evitar uma possível discussão entre mim e Logan. Ou outra briga entre mim e
Analu.
— Não pense em mover sua bunda daí, Edmund! — profiro levando o
copo novamente até meus lábios. — Eu prometi isso às garotas, eu
cumprirei.
— Você promete muitas coisas, Blackwell! — A voz de Logan preenche o
ambiente e Summer solta um suspiro, enquanto Levi se escora na cadeira,
como se realmente estivesse apreciando aquele momento. — Chega a ser até
repetitivo.
— Você ainda se mete em assuntos que não te dizem respeito,
Underwood? — pergunto, me virando para ele.
— É a minha especialidade, anjo! — Dá uma piscadela e logo após dá
uma mordida no seu donut.
— A única especialidade que você realmente tem, e diga-se de passagem,
todos nós concordamos, é de ser um babaca! — devolvo, o encarando
friamente, levando o meu donut até meus lábios e dando uma mordida
generosa.
— Voltamos a fase em que te explico que este palavrão está ficando
repetitivo, Verônica?
— Não se iluda a esse nível, pensando que estamos em alguma fase,
capitão! — Vejo seu olhar se tornar fogo, fazendo com que desviasse antes
que alguém entendesse o real significado dele. — Supere que existem
momentos em que minha falta de sanidade é maior que minha inteligência.
Sou salva quando Analu se levanta, envolvendo os ombros de Logan com
as mãos, enquanto vira seu rosto para mim com um sorriso voraz e diz com
um brilho contemplativo nos olhos:
— Quer saber? Estou cansada dessa merda, não adianta vocês brigarem
vinte e quatro horas, é muito cansativo, por isso vou dar o primeiro passo —
ela diz e todos, que ficamos totalmente de boca aberta, mas meu espanto não
acabou por aí, não até ela proferir as próximas palavras. — Vee, você
deveria ir à festa na fraternidade dos garotos este final de semana.
— Isso é algum tipo de brincadeira? — questiono, contudo, ela mantém a
postura e não responde, apenas olha para suas unhas e solta um sorriso. —
Para quê quer que eu vá a essa festa? Para ver você ficar bêbada e falar
merda? — pergunto, devolvendo o sorriso. — Não, obrigada!
— Estou levantando uma bandeira de paz, Verônica, aceite, mulher!
Desvio minha atenção para Oliver sentado à minha frente com a boca
aberta. Minha expressão já diz tudo: você caiu nessa?
— Pequena Blackwell, é uma festa. — Bufo já sabendo qual a sua
resposta. — E nós nunca dizemos não a uma.
— Você não foi convidado, Wright! — Logan rosna do outro lado da
mesa.
— É uma pena que não ligo para isso, Underwood!
— Foda-se você, Logan! — Meu amigo e eu dizemos ao mesmo tempo. —
Eu vou. E não é você quem deve me dizer quem me fará companhia.
Logan lambe os dedos, retirando os últimos resquícios do chocolate,
passando seu polegar vagarosamente por seus lábios, quase me hipnotizando.
Ele me encara sob os cílios, como estivesse me desafiando a ir, então foi a
minha vez de soltar um sorriso de escárnio e me levantar, finalmente
colocando o casaco que Edmund havia me entregado e jogando meu cabelo
para o lado, enquanto caminho até Summer e me abaixo para abraçá-la.
— Me desculpe por te abandonar, mas preciso sair daqui antes que eu
jogue seu amigo por essa janela e precise pagar uma indenização milionária
por isso! — sussurro, enquanto ela solta uma gargalhada fraca. — Nos
vemos na festa, Sum!
— Eu não...
— Você vai sim! — A interrompo. — Preciso das minhas companheiras
de tequila.
Não precisei dizer nada a Ed, ele apenas se levanta e começa a caminhar
ao meu lado, enquanto Oliver lança um olhar cheio de significados para
Summer e depois segue pelo mesmo caminho que estávamos indo. Hazel e
Dylan haviam ficado para trás, apenas para se despedir dos nossos outros
amigos.
Realmente preciso ficar longe de Logan, ainda mais depois do momento
que aconteceu na biblioteca e dos olhares que me lançou durante nosso
pequeno momento dentro do Oásis.
Sei que nada nesse olhar era simples, puro.
Porque Logan Underwood não é isso, ele é uma daquelas poesias
indecifráveis, com versos tortos e metáforas sujas, que foram escritas para
serem efêmeras, mas que nos marcam a pele, chegando a deixar cicatrizes e
nos faz cultivar sentimentos controversos.
E tenho quase toda a certeza do mundo de que me provaria todas essas
afirmações nesta festa.
Insano, por dentro, o perigo me deixa louco
Não consigo me ajudar, tenho segredos que não posso dizer
Eu amo o cheiro da gasolina
Eu acendo o fósforo para saborear o calor
Eu sempre gostei de brincar com fogo
Play With Fire | Sam Tinnesz

Existe um lado terrivelmente péssimo nas festas de fraternidade:


todas elas são lotadas, principalmente as que envolvem qualquer equipe dos
esportes da Saint Vincent University.
Sei que a de hoje será uma dessas, porque a música já ressoa por todos os
cantos da casa e as pessoas gritam pelo corredor; algumas ainda têm a
coragem de esmurrar minha porta em busca de lugares que tenho a plena
convicção que serão usados para transar. Mesmo que eu ainda não esteja no
andar de baixo, já posso imaginar como a sala de estar está repleta de
universitários bêbados, sedentos por uma diversão momentânea e por uma
fofoca para comentarem no próximo dia em todo o campus.
Respiro fundo ao ouvir o som do meu celular do outro lado do quarto,
solto um resmungo enquanto me levanto calmamente da minha cama e
atravesso o quarto até chegar na escrivaninha. Meu olhar vasculha o quarto,
mesmo sabendo que não há quase nenhum item meu aqui, mesmo que esse
quarto seja um dos privilégios que vem junto com o título de ser capitão da
SVU; praticamente todas as minhas coisas estão no apartamento que divido
com Josh, Levi e Summer. E por falar neles, o segundo é o responsável por
lotar a porra do meu celular com mensagens desde que havia chegado à festa
e não me encontrado. Suspiro fundo enquanto desbloqueio o telefone e abro
o aplicativo de mensagens, ignorando as notificações do Instagram, reviro os
olhos ao ver o conteúdo das mensagens que havia me enviado e uma foto
dele mostrando o dedo do meio enquanto bebe alguma coisa ao lado da
equipe de natação.

Levi: Eu realmente vou precisar


levantar a minha bunda desse sofá,
apenas para te buscar?

Eu: Me dê dois motivos para que


eu largue o conforto do meu quarto
e desça até aí para te ver encher a cara.

Levi: Puff...isso é fácil: Bebida grátis e o


principal, a sua querida Blackwell acabou de
atravessar a porta e um spoiler: ela tá gata pra
caralho!

Respiro fundo algumas vezes, amaldiçoando Analu por ter sido uma filha
da mãe em convidar Verônica e todo o bando que com certeza se arrastaria
junto dela para essa festa, mas sabia que fez aquilo para me irritar por não a
ter levado para minha casa quando sugeriu. Como diabos eu transaria com
uma garota, quando minha mente ainda tinha a porra da visão de Blackwell
sobre aquela mesa e minha memória auditiva ainda guarda aquela melodia
suave que ela emitiu quando gemeu em meus ouvidos? Não tinha como, e
Analu entendeu o motivo quando Verônica saiu da biblioteca não muito
melhor do que eu. E por esse motivo, e por Parker querer foder com a minha
vida quando a dela não é fodida o suficiente, terei que lidar com todos os
irmãos Blackwell e um Wright que sempre deixou claro seu desgosto por
mim. Ou seja, minha noite será uma merda.
E sei que minhas opções para essa festa realmente são limitadas, quase
inexistentes, porque assim que descer o último degrau da escada, meus
amigos do time irão me puxar para o centro da festa, não me dando a
oportunidade de colocar uma distância segura entre mim e a garota que
ocupava meus sonhos nada inocentes.
Suspiro fundo, finalmente pegando a jaqueta azul do time de SVU em cima
da cadeira e saio do quarto. A voz de Dua Lipa & Sean Paul cantando No
Lie fica ainda mais alta enquanto sigo pelos corredores, indo em direção a
escada. Alguns copos vermelhos já estão espalhados por todo o lugar e eu
começo a ter pena dos calouros que serão recrutados para ajudar na limpeza
dessa casa no próximo dia.
Quando finalmente piso no primeiro andar, o caos se revela, duas garotas
estão em cima da bancada dançando, e isso me faz lembrar da última festa,
onde Verônica e Hazel estavam naquela mesma posição, mas diferente das
duas que agora ocupam um lugar semelhante, minha amiga e sua companheira
estavam realmente apreciando o momento, dançando para se divertir e
tinham um brilho incomparável nos olhares.
— Underwood! — Levi me grita do outro lado da sala. — Finalmente!
Solto um suspiro enquanto caminho até onde ele está. Assim que paro em
sua frente, me viro para cumprimentar meus outros amigos que estão
espalhados em dois sofás escuros. Josh segura um copo azul em uma das
mãos e conversa com Hazel, que está bastante alegre, e apenas desvia a sua
atenção da conversa para me encarar com os olhos brilhantes e solta um
sorriso, fazendo com que eu o devolvesse verdadeiramente. Meu amigo se
limita apenas a acenar a cabeça. Volto meu olhar para Levi, que agora encara
algo do outro lado da sala com uma atenção exagerada, como se estivesse
fascinado.
— Onde diabos está Sum? — pergunto, erguendo a sobrancelha.
Summer não é fã de festas como todos nós, mas é uma das maiores
apoiadoras de um grupo unido e por esse motivo, ela comparece na maioria
delas.
— Com Blackwell! — Levi responde sorrindo, apontando o queixo na
direção oposta à nossa. — Olhe só.
Quando meu olhar encontrou o que ele deseja me mostrar, eu tive a certeza
de que minha noite realmente seria uma merda. Merda. Eu preciso de
algumas doses de bebidas para conseguir manter meus olhos longe de
Verônica Blackwell, porque o termo vestida para matar foi criado para ela.
O vestido preto brilhante com duas tiras o sustentando ia até mais ou menos
um palmo abaixo de sua bunda, o tecido torneia cada uma de suas curvas,
como se fosse um paraíso a ser descoberto, desço o olhar até seus sapatos e
não me surpreendo com a sandália de salto alto envolvida em algumas tiras,
que parecem pequenas estrelas brilhando que vão até seu tornozelo. Ela sorri
para Summer, entregando um copo com um líquido âmbar, que todos nós
sabemos que é tequila, e pega um idêntico; elas os erguem, dão um leve
brinde e logo após, os vira em seus lábios, engolindo a bebida. A loira solta
uma careta, que em questão de segundos se transforma em uma gargalhada, e
remexe o corpo de uma maneira que me faz sorrir.
Summer Miller é, definitivamente, uma péssima dançarina. Abaixei os
olhos por um momento e então percebo que ela não veste suas roupas
habituais. Sum havia abandonado suas blusas da Marvel e trajou um conjunto
que se baseava em uma saia branca e um cropped da mesma cor, as sandálias
não eram tão altas como as de Vee, mas ainda assim a deixam incrivelmente
bonita. E eu sei que Blackwell precisou de muita chantagem para que ela
usasse aquelas roupas, mas minha ex namorada adora um desafio, então, sem
dúvida alguma, ela adorou cada um dos momentos que precisou para
convencer Sum a vestir essas peças. Quando encarei Levi, eu entendi o
fascínio que ele a encarava, Summer rouba a sua atenção como se fosse a
única coisa que existisse na nessa festa, mesmo que outras garotas o encarem
com fome, com desejo de poder compartilhar um momento com o infame
capitão do time de natação.
— Ela nunca vai saber dos seus sentimentos se não demonstrar — solto
para meu amigo, que me encara como se eu fosse um estranho.
— Vamos mesmo falar sobre sentimentos, Underwood? — resmunga
enquanto nos viramos e seguimos para a cozinha, deixando Verônica e
Summer curtirem sua noite.
— Se quiser, sou todos ouvidos. — Sorrio, roubando um copo de cerveja
que um dos jogadores acabou de se servir. — Sou um ótimo apreciador dos
romances.
— Aham, até parece. — Ele enche um copo de cerveja, o leva até os seus
lábios e me encara de um jeito que não aprecio, — Por isso está encarando
Blackwell desta forma? Está apreciando o romance?
Eu paro o copo que está quase chegando à minha boca e lhe lanço um
olhar porco, quase parecido com que ele me lança no momento. E é um
daqueles que só damos a quem realmente nos irrita.
— Não seja um idiota! — advirto.
— Não me pergunte sobre meus sentimentos — devolve no mesmo tom
—, se é tão babaca quando se trata do seus.
Me viro, o abandonado e seguindo para onde o resto dos nossos amigos
estão, não estou com vontade de discutir com Levi, não quando ele trará o
assunto Verônica para a roda e estou muito bem ignorando tudo o que a
envolve desde aquele beijo na biblioteca. Nós guardamos aquilo como se
realmente fosse um segredo sujo, fingimos que não foi real e continuaremos
assim, precisamos fazer com que momentos como aquele não se repitam, mas
o problema é que a mulher que mais parece um diabo do que anjo, está
rondando a porra do meu pensamento desde que voltou, e a minha única
vontade é arrastá-la para o andar de cima e me aterrar entre suas pernas,
como fazíamos no ensino médio.
Quando finalmente me jogo no sofá onde meus amigos estão, percebo a
presença de três pessoas que eu realmente gostaria que não estivesse aqui
nesta noite. Summer já havia voltado da pista de dança e está conversando
com Edmund, que mostra algo em seu celular para a loira como se fosse um
precioso diamante e a atenção dela era toda dele. Hazel agora está sentada
no colo de Dylan, que passa suas mãos pela sua cintura, cochichando algo
em seu ouvido. Levi aparece logo atrás de mim e se joga ao lado de Josh,
confidenciando algo que não entendi.
Meus olhos vão até o canto da parede, para Oliver, que conversa com uma
garota que eu tenho uma vaga lembrança de ser cheerleader, porém, seus
olhos se mantém em Summer, que às vezes lhe devolve o mesmo gesto, seus
olhos queimavam um no outro, não em simpatia ou desejo, é algo a mais,
como se eles estivessem lutando por algo. Observo por alguns segundos e
tenho a impressão de que aquele olhar de Sum, é quase o mesmo que
Blackwell sempre me lança quando se lembra do quanto me odeia.
Meus olhos vagam pela multidão, procurando algo para ocupar minha
mente até que meus amigos decidam ir embora, mas meu olhar recai
novamente sobre Verônica, que agora dança com Mike Burhan e sorria
maliciosamente. Blackwell desliza a mão pela cintura dele e desce
sensualmente até o chão, fazendo com que praticamente todos os garotos
parem para encarar essa cena, então ela se vira para o lado e me vê, suas íris
viram o pior dos incêndios, Verônica solta um sorriso maquiavélico em
minha direção e sem desviar o olhar, volta a subir novamente, dessa vez
rebolando lentamente, me dando a visão perfeita de sua bunda tampada pelo
pouco tecido.
Ela está me convidando para um jogo. Um jogo sujo, que só nós dois
sabemos as regras e que nossas jogadas definirão o final desta noite. E,
porra, eu estava realmente seguindo meu pensamento de querer mantê-la
longe, mas depois disso, é impossível.
Quando ela se aproxima e beija o pescoço de Mike, como eu fiz com ela,
eu soube exatamente o que desejava. O jeito como suas pupilas se dilatam,
me revela que ela me imagina ali, deseja que fosse eu o responsável por
tocar em cada curva sua, ajudando-a a se mexer conforme a melodia. E, por
Deus, eu nunca desejei tanto dançar como uma garota como nesse momento.
E realmente estou cogitando a ideia de ir até lá e puxá-la dos braços de
Burhan, até que sinto um toque gentil em meus braços, me fazendo cortar o
contato visual com Blackwell.
Num primeiro momento quis xingar todos as divindades por isso, mas
quando me viro para o lado, uma caloura com a pele levemente bronzeada e
os cabelos cacheados se aproxima de mim e solta um sorriso sagaz,
deslizando uma de suas mãos pelo meu ombro e se inclina, indo até perto do
meu ouvido. Apenas solto um sorriso.
— Oi gatinho! — sussurra. — Tá a fim de dançar?
Volto meu olhar para Blackwell, que agora cochicha algo para Mike, ele
se abaixa e sorri abertamente, como se tivesse ganhado a noite. Encaro a
garota a minha frente, devolvendo o sorriso, e seguro sua mão, puxando-a
para mais perto e sussurrando de volta:
— Me mostre o que sabe fazer, querida!
Não precisou de um incentivo maior para ela me levar até onde todas as
pessoas dançam. Minha parceira coloca as mãos em meu abdômen,
dedilhando suas pequenas unhas em minha pele coberta pela minha camiseta
e começou a rebolar, seu vestido rosa sobe um pouco com o movimento, mas
pela sua expressão, estava pouco se importando com isso. Ela se aproxima
para deixar um beijo em meu pescoço e meu olhar se volta para Verônica,
que me encara sobre os ombros de Burhan, e imita o mesmo gesto da minha
companhia. Nossos olhos criam uma conexão quente, excitada e familiar. E
com um rosto regado a desafio, ela move os lábios sem emitir nenhum som:
— Babaca!
— Megera! — Solto um sorriso de lado.
Mike a gira, fazendo com que perdêssemos o contato visual, minha
parceira de dança volta a me encarar com fome, como se apenas uma dança
não fosse a saciar. Ela se vira de costas e começa a se abaixar, fazendo com
que nossos corpos se juntem, mas eu não estou apreciando esse show que me
dava. Estou apreciando o olhar divertido que Verônica me lança do outro
lado da sala a cada vez que Mike a encara com a mesma fome que a minha
companheira.
Sorri ardilosamente, passando a língua pelo meu lábio, porque sabíamos
que eles poderiam nos desejar, mas não passaria disso. Porque nós dois não
queríamos matar essa fome que nos consome com eles, queremos mais.
Queremos nos deleitar sobre o caos, reinar sobre o perigo.
Verônica Blackwell e eu queremos misturar fogo e gelo novamente.
Pecar da melhor forma possível. Com os piores demônios.
Quando me afasto da garota, Verônica já não está mais lá. Por um
momento, acho que tivesse levado Mike para o quarto e fizesse aquilo que eu
desejo fazer com ela nesse momento, mas o vi conversando com um dos
nossos jogadores na entrada da cozinha, então sigo para o único lugar que
ela poderia estar. Passo entre os convidados e subo as escadas, desviando
de algumas pessoas que me chamam. Não consigo dizer se é a adrenalina, a
endorfina, ou seja lá quantos outros hormônios que percorrem as minhas
veias nesse exato momento, fazendo com que me sinta vivo, inalcançável. E
esse sentimento é algo que se instala em meu peito, me mostra que isso deve
acontecer e que estou em êxtase por isso.
Assim que viro o corredor onde os quartos ficam, eu a avisto. Ela vira o
rosto por cima do ombro e sorri como se eu fosse o melhor prêmio da noite;
eu só consegui devolver o sorriso. Uma parte de mim sabe que se pensarmos
muito, iremos desistir desse momento, mas estamos excitados demais e
precisamos nos libertar dessa sensação. E, principalmente, precisamos saber
que esse desejo que nos corrói, irá acabar assim que terminarmos de foder.
Caminho rapidamente em sua direção e ela começa a fazer o mesmo, e
assim que nossos lábios se colidem ferozmente, eu tenho a certeza de isso é
a porra mais certa que fiz nesta noite.
O meu anjo é realmente como uma droga, que cada vez que eu provo, me
vicio mais.
Seguro sua cintura e giro seu corpo, prensando na parede mais próxima,
intensificando o beijo. A língua dela desliza pela minha, me indicando que
ela não deseja um beijo tímido, calmo, ao contrário, ela me dá um furioso,
desesperado. Uma das minhas mãos segura seu pescoço e a outra aperta sua
cintura, como se tivesse medo que por algum instante, ela desista dessa
nossa brincadeira. Mas sou pego de surpresa quando ela dá um impulso e
pula em meu colo, fazendo com que eu rapidamente a segure pela bunda.
Verônica solta meus lábios apenas para passar sua língua por toda a extensão
do meu pescoço, mordendo o lóbulo da minha orelha, enquanto suas pernas
serpenteiam o meu quadril, me trazendo para mais perto. Ela respira e se
aproxima de meu ouvido sussurrando:
— Não pense por um segundo que o que está acontecendo aqui muda o
sentimento que tenho por você, Underwood! — Sua voz deveria ser
ameaçadora, mas saiu sensual, tão sensual que meu pau latejou.
Eu me abaixo, beijo o seu decote, depois subo pelo seu pescoço e solto
um sorriso depravado.
— Eu vou foder você, Blackwell — sussurro, deixando um beijo perto de
seu ouvido —, de uma maneira que todos os seus átomos saberão o quanto te
odeio. — Passo a minha língua pela extensão do seu pescoço da mesma
maneira que ela fez segundos atrás. — E eu não vou parar, eu vou te comer
contra todas as paredes do meu quarto, firme e forte, enquanto você grita
meu nome, para que todos os babacas lá embaixo que te desejaram com os
olhos enquanto dançava, escutem e saibam que mesmo que nós nos odiemos,
essa boceta ainda deseja o meu pau!
Antes que ela respondesse, volto a beijá-la. Caminhando até a porta do
meu quarto e abrindo-a, mesmo que minha real vontade fosse fodê-la ali.
Mas saber que qualquer babaca poderia aparecer naquele corredor e a
desejasse, fez um ódio percorrer meu corpo.
Verônica não me solta enquanto eu chuto a porta e tranco. Ela apenas se
delicia com meus lábios, como se estivesse provando o seu doce favorito.
Quando finalmente nos separamos em busca de ar, é impossível dizer quem
está mais ofegante. Seguro sua bunda para que não caísse sobre o chão, mas
ela apenas se desvincula de mim e dá alguns passos para trás, virando-se de
costas e me dando uma puta vista de suas mãos indo até o zíper de seu
vestido, me olhando sobre o seu ombro em desafio para que me levantasse e
a ajudasse. Por um segundo, eu apenas quis observar aquela cena, mas
minhas mãos querem o contato de sua pele quente e macia e quando dei por
mim, estou caminhando em sua direção, a ajudando a se livrar de seu maldito
vestido. Assim que finalmente o retirei, deixando-a apenas de calcinha e
sutiã, jogo o vestido em algum lugar do quarto e observo enquanto ela se
vira e faz suas mãos trabalharem em minha jaqueta, jogando no chão; depois
minha camisa e então começa uma luta com minha calça. Éramos um
emaranhado de mãos e braços, e antes de percebermos, já estávamos nus. E
fodida seja Blackwell e seu corpo perfeito.
— Não irei te oferecer uma foto desta vez, Underwood! — ela diz
sensualmente.
— Eu não preciso, anjo! No momento, o que eu preciso é apenas da minha
língua em cada curva do seu corpo — devolvo.
— Não tão rápido! — Ela tomba a cabeça de lado, fazendo com que as
cascatas de seu cabelo caíssem sobre seus seios. — Sente-se, agora!
Eu não desejo discutir com Blackwell, não com uma versão dela nua na
minha frente, então pelo bem do resto da minha sanidade, caminho de costas
até a beirada da cama e ela sorri quando me alcança, Verônica se ajoelha
entre minhas pernas e lambe seus lábios da maneira mais gostosa que alguém
pode fazer.
— Aproveite a vista, Underwood! — ela sussurra, passando as unhas
pelas minhas coxas nuas, fazendo com me arrepiasse. — Porque não será
sempre que verá um Blackwell de joelhos para você.
E sem mais nenhuma palavra, ela se abaixa e lambe a extensão do meu
pau. Começa leve, como se estivesse apenas se preparando, mas a verdade é
que eu deveria estar me preparando, porque quando ela envolve seus lábios
na minha glande, solto um gemido alto o bastante para quem quer que
estivesse passando pelo corredor no momento escute. Filha da puta gostosa.
Ela segura a base do meu pau com uma das mãos, enquanto contorna o
restante com seus lábios lindos e quentes. Eu estou nas nuvens e Verônica
Blackwell é a responsável por isso. Minhas mãos vão até seus cabelos e os
prendo entre meus dedos, forçando-a a me encarar enquanto fodo sua boca e
um sorriso sagaz se forma em meus lábios, mas aquilo não a intimida, ao
contrário, ela se delicia com cada segundo, brinca com minhas bolas
enquanto engole meu membro, depois volta a colocar meu pau novamente na
boca, chupando, olhando para cima, encontrando o meu olhar.
Verônica Blackwell é linda diariamente, porra, ela é deslumbrante, mas
nesse momento não há comparação melhor que não fosse com uma deusa. As
bochechas levemente coradas, os olhos brilhantes em excitação e com meu
pau entre os lábios, isso é a como a porra de um paraíso, que eu não tenho
intenção de sair. E mesmo se ela fosse a cobra que me ofereceria o fruto
proibido, eu o comeria. Pecaria de bom grado.
— Porra… anjo! — digo entre gemidos. — Não pare!
Ela não o faz, ao contrário, esboça sua melhor cara de safada e volta a se
deliciar novamente com todo meu membro, eu posso sentir o meu próprio
êxtase chegando, posso sentir que não aguentarei mais que alguns pequenos
minutos. E, pelo amor de Deus, eu preciso prová-la. Com o pensamento de
que realmente preciso disso, volto a prender seus cabelos, firmando o aperto
enquanto ela me engolia por inteiro e acelero o movimento, quando sinto
meu orgasmo chegando, Vee não se afasta, ela continua chupando, lambendo
e assim que explodo, ela engole cada gota.
Minha respiração está totalmente descompassada e quando lambe minha
virilha e se levanta, limpando o cantinho da boca, eu perco o resto de
controle que ainda tinha. Eu me levanto, pego sua cintura e a jogo na cama de
pernas abertas, assim que suas costas tocam o colchão, ela me puxa para um
beijo. Nossas bocas se chocam e é como a explosão mais caótica que o
mundo já presenciou. Desço, deixando algumas mordidas seguidas de
pequenos beijos pelo seu pescoço, depois a clavícula, dou uma atenção a
mais aos seus seios, então vou descendo até chegar em sua boceta. Meu
sorriso apenas se alarga quando passo lentamente meus dedos pela sua
entrada, observando o quão excitada está. Levo dois dedos na boca, antes de
me ajoelhar e começar a beijar toda sua perna torneada, até chegar
novamente em sua vagina. Quando minha língua toca sua entrada, ela solta
um gemido e leva suas mãos até meus cabelos. Um sorriso se estende em
meus lábios, fazendo com que movimente minha língua lentamente,
mergulhando no seu centro.
O contato fez Vee soltar gemidos que me deixam louco, meus dedos
deslizam dentro dela em um movimento rápido, movendo para baixo e para
cima em suas dobras, revestindo todo o seu prazer.
— Logan — ela diz entre gemidos.
— Você se lembra de quando disse que gozaria em minha boca, anjo? —
profiro maliciosamente, lambendo outra vez antes de me afastar e sorrir
como um louco. — Prepare-se, porque esse é o momento!
Eu sei que ela não cederá tão fácil, mesmo que esteja amando o momento,
então abaixo meu rosto mais uma vez, lambendo enquanto meus dedos a
fodem. Eu realmente poderia gozar apenas de ver Blackwell dessa maneira,
com as pernas entre meu rosto, com os olhos fechados e os lábios levemente
entreabertos. A melodia de seus gemidos é uma maldita música para meus
ouvidos. E uma necessidade imensa de estar dentro dela fez com que levasse
meu polegar e começasse a circular até seu clitóris, movendo de uma forma
que seu orgasmo chegasse, e em poucos segundos suas costas arquearam e
um prazer irrompeu daquele ponto. O êxtase de Verônica se espalhou como
eletricidade.
Ela ergue o quadril, enquanto espasmos enchem o seu corpo. E puta
merda, é a coisa mais linda e sensual que havia presenciado em toda a minha
vida.
— Não pense que acabamos, anjo! — digo enquanto subo, cobrindo seu
corpo com o meu. — Eu prometi te foder com força, até que soubesse o
quanto te odeio.
— Não espero menos que isso, Underwood! — profere sensualmente,
soltando um sorriso travesso. — Mostre-me até onde pode me odiar.
— Vire-se e segure a cabeceira da cama, anjo — sussurro em seu ouvido.
— E se prepare… porque não terminaremos até que estejamos esgotados.
Ela se vira, me dando a visão de sua bunda perfeita, eu me abaixo e
distribuo leves mordidas em suas costas, fazendo ela se remexer, trazendo
seu corpo para perto do meu pau. Alcançando o preservativo na mesinha de
cabeceira, rasgo o papel alumínio e rolo látex sobre meu comprimento, logo
após, posiciono em sua entrada e então deslizo para dentro de Verônica.
Aquela sensação de preenchimento está de volta, e é como se todos os
nossos fragmentos estivessem se completando.
Dei um impulso lento e profundo, a enchendo-a completamente. Quando o
corpo de Vee se acostumou, deslizei para trás e depois entrei novamente com
força, uma, duas, três vezes, e começo a ir rápido o bastante, provocando
nela gritos de prazer.
— Grite assim novamente, anjo — profiro segurando sua cintura enquanto
estocava na mesma medida. — Deixe que todos escutem que está sendo
fodida.
— Merda… Logan! — choraminga movendo o quadril — Eu preciso de
mais, agora.
Com isso, perco toda a sanidade que ainda me resta, faço com que minhas
estocadas percam o ritmo. A penetro com mais força, mais rápido e mais
fundo, várias vezes. Tudo de uma vez, balançando em Vee desenfreadamente.
Nossos corpos colidem enquanto eu seguro sua cintura e observo seu corpo
se desfazer sob meu toque. A palma da minha mão entra em contato com sua
bunda, transferindo um tapa, o barulho se instalou por todo o quarto. E
depois outro, enquanto ela grita por mais, grita para forçar mais rápido e
com mais força.
— Eu quero tudo, Logan… — resmunga enquanto deslizo meus dedos até
seu clitóris e o massageio. — Q-quero cada parte de seu ódio.
— Eu lhe darei, anjo — grunhi em seu ouvido.
Seguro seu cabelo, forçando a se levantar um pouco, enquanto me
abaixava sobre suas costas. Ela virou o rosto em minha direção, encontrando
meus lábios e os reivindicou para si. Éramos o pior dos incêndios e
estávamos adorando aquilo, cada vez que eu a preenchia, ela gemia e gritava
meu nome como se eu fosse a sua prece.
O suor se estendia por toda a nossa pele, desci uma de minhas mãos para
frente de seu corpo e dedilhei cada parte de seu abdômen, até finalmente
chegar em sua entrada, fazendo com que sentisse meu pau a preenchendo.
Dois dedos foram em direção ao seu clitóris o esfregando, o atrito se
intensificou e a fez soltar um gemido.
Sua boceta se contraiu em meu pau e logo em seguida, o meu membro
seguiu por esse caminho também. Podia sentir nosso êxtase chegar. Quando
finalmente Vee chegou ao seu limite, enquanto me desfazia, a preenchendo
por completo. Abaixo meu rosto suado sob suas costas, fechando meus
olhos.
Ficamos ali mesmo, quietos, ouvindo as batidas de nossos corações.
Quando finalmente saio de dentro dela, ela apenas se deita em minha cama,
exausta. E eu a entendia, porque apenas caminho até o banheiro, me limpo e
trago uma toalha úmida para que se limpasse. Assim que meus olhos recaem
sobre ela, percebo que estava sonolenta, então me sento ao seu lado,
passando a toalha sobre toda sua parte sensível e puxo o cobertor sobre seu
corpo quando a vejo fechar os olhos. Ela se vira e os cabelos negros se
esparramam pelo meu travesseiro, o corpo ocupando metade da cama e o
rosto parecendo um anjo. Me levanto, jogo a toalha no cesto de roupa suja e
volto a caminhar até ela, passo os dedos pelas suas bochechas coradas
enquanto ela se desfazia no seu próprio sono. Não havia mais a música lá
fora, o único barulho que me interessava era a respiração calma de Verônica,
a forma como estava tranquila e em paz e quando me levanto, ela segura uma
de minhas mãos.
— Logan? — diz sonolenta, sem abrir os olhos.
— Hum?
— Eu ainda te odeio, ok? — Solto um sorriso, enquanto vou até o outro
lado da cama e me deito. — Muito.
— Eu sei, anjo! — devolvo, me ajeitando em meu travesseiro.
— Mas eu gostaria que não precisássemos nos odiar, capitão… — Eu
conhecia aquela voz, e sabia que ela não se lembraria daquela confissão
quando acordasse, por conta de estar sonolenta. E uma parte de mim queria
dizer que também não queria odiá-la, mas essa é a nossa vida e nós não
tínhamos controle sobre isso, não mais.
— Durma, anjo, amanhã voltaremos ao nosso jogo sujo.
Amanhã. Porque hoje, nesse momento, eu não a odiava. Porque um pedaço
de Verônica Blackwell foi meu nessa noite. Por poucas horas, mas o
suficiente para me fazer sentir vivo novamente.
Se eu estivesse morrendo de joelhos
Você seria aquele que me salvaria
E se você estivesse afogado no mar
Eu te daria meus pulmões, para que você pudesse respirar
Eu estou com você, irmão
Brother | Kodaline

Eu tenho uma lista de coisas proibidas, coisas que eu sabia que deveria
seguir à risca, e talvez isso fosse loucura, porque ela consistia em apenas
três itens: Não usar botas coloridas, não atender meu pai após às 17h e não
foder com Underwood.
E estava seguindo-as perfeitamente. Até hoje.
Essa situação me lembra quando minha mãe lançou uma coleção de roupas
e seu co-estilista aconselhou-a a usar botas coloridas com uma peça que já
era totalmente colorida, o que, obviamente, me fez surtar. Mas o que tem a
ver com isso agora? Eu estou tendo a mesma reação neste exato momento,
enquanto sinto o braço de Logan me segurando pela cintura, fazendo com seu
corpo fique aconchegado ao meu e pudesse sentir sua respiração lenta em
meu pescoço. Merda. Eu nem tenho desculpa para explicar esse momento,
porque não estava bêbada ou dormindo quando nos atacamos no corredor ou
quando fiz sexo oral nesse bastardo, e muito menos quando ele chupou,
lambeu e se me fez enxergar estrelas cada vez que sua língua desbravava a
extensão do meu corpo, e não me surpreenderia se eu tiver marcas em toda
minha pele.
Pisco novamente, expulsando aqueles pensamentos pecaminosos e tento
traçar um plano de fuga. Um que não envolva meus irmãos me interrogando,
Mike me pegando saindo furtivamente deste quarto e me fazendo perguntas
idiotas, ou Oliver descobrindo essa situação. Ok, talvez eu esteja
literalmente fodida. Seguro a mão de Logan calmamente, levantando-a,
enquanto rolo para o outro lado da cama. Se eu tiver sorte e ele ainda
possuir o sono profundo, conseguirei sair sem passarmos por aquele
momento constrangedor em que sabemos que tudo o que rolou nesta
madrugada será engolido por uma briga. E para minha sorte, ele apenas solta
um resmungo e passa seu braço, que antes me segurava, por baixo do
travesseiro, voltando a dormir pesadamente. O movimento faz com que os
músculos de seu corpo apareçam e o edredom caia um pouco de lado,
liberando aquele corpo incrivelmente gostoso. E, por Deus, esse homem só
pode ser um deus grego vindo direto do Monte Olimpo.
Bato a mão em minha testa, me repreendendo por estar secando
Underwood dessa forma, enquanto eu deveria estar colocando meu vestido e
saindo desse quarto antes que ele acorde. Quando começo a percorrer meus
olhos pelos quatro cantos do quarto, procurando minhas roupas, coloco
minha calcinha que estava jogada ao lado da cama queen-size, respiro fundo
ao constatar que meu vestido não está em nenhum lugar, então faço o que
nunca imaginei que faria. Roubo a camisa que Logan estava vestido ontem à
noite, ela ia até o meio das minhas pernas e não esconde mais do que o
vestido escondia. Preciso sair daqui rápido o suficiente para que os
jogadores não acordem, por isso pego minhas sandálias e meu celular e abro
a porta lentamente, saindo do quarto de Underwood.
Respire, Vee. Ok, passamos pelo primeiro e pior obstáculo. São poucos
passos até a porta de entrada, então desbloqueio meu celular e ligo para a
única pessoa que pode me salvar desta situação de merda. O primeiro toque
veio quando pisei no primeiro degrau da escada e quando estava no meio
dela, Hazel finalmente atendeu.
— O que diabos você fez para me ligar a essa hora, Verônica? — ela
resmunga, o barulho de uma buzina de algum carro me fez respirar
aliviadamente.
— Uma merda. — Suspiro, mordendo meu lábio inferior. — Uma merda
bem grande.
— Acho que hoje todas minhas amigas decidiram fazer alguma merda. —
Hazel acusou. — Onde você está?
— Fraternidade, mais especificamente saindo dela — profiro quase
chegando à porta. — Preciso de uma carona, quantos minutos acha que pode
chegar aqui?
— Estou do lado de fora, agora ande logo antes que eu me arrependa e
volte para casa — ela manda e desliga sem esperar por uma resposta.
Quando abro a porta, uma Hazel com um pijama que eu sei que é de
Dylan, com cara de sono e um cabelo todo bagunçado, me encara irritada. Eu
me pergunto se ela já esperava que ligasse para me salvar ou se tem outros
motivos que a trouxesse até aqui antes das sete horas da manhã. Porém, no
momento, não me importo com isso, ao contrário, eu poderia ajoelhar e
beijar seus pés apenas por me salvar desta situação.
Solto um sorriso envergonhado para ela, enquanto amarro meu cabelo em
um coque e quando abro a boca para dizer algo, a porta volta a se abrir. Meu
coração para e eu oro rapidamente para não ser Logan. Mas quando olho por
cima dos ombros e encontro uma Summer assustada, com as roupas
embaralhadas e me encarando com a sobrancelha erguida, finalmente solto a
respiração presa em minha garganta.
— Eu odeio vocês duas, por me acordarem às sete horas da manhã para
salvar a bunda de vocês — Hazel resmunga, caminhando até a Land Rover
preta estacionada do outro lado da rua, que eu sei que é de Dylan. — Você
tem sorte por Dylan ter bebido um pouco demais essa noite e não quis me
acompanhar até aqui, Verônica.
— Nunca fiquei tão aliviada por meu irmão estar de ressaca. — Abro a
porta do banco do carona, enquanto Summer desliza para o banco traseiro e
Hazel para o motorista.
— Do que caralhos vocês estão fugindo daquela fraternidade a essa hora
da manhã? — Ela me ignora e praticamente grita.
— Ninguém — dizemos rapidamente em uníssono.
— Você está com a blusa que Logan estava na festa ontem, Verônica! —
Hazel tira os olhos da estrada por um momento. — É sério? Vocês dois
decidiram que as merdas que os envolve se resolveria se transassem?
— Merda!
— Deixe-a em paz, Hazel! — Summer intervém e eu queria beijá-la por
isso.
— E com quem diabos você estava? — Hazel a encara pelo retrovisor do
carro.
— Me desculpe se você é a única que pode transar, Smith! — resmungo e
ela me lança uma careta séria por tê-la chamado pelo seu sobrenome que
odeia. — E sei que está nervosa por termos te acordado cedo, mas pelo
amor de Deus, pare de surtar!
— Eu não estou surtada por transarem, estou surtando porque estou
preocupada com vocês, isso sim! — Ela estaciona em frente a uma
cafeteria, respira fundo e o tom de sua voz desce uma nota quando volta a
falar. — Vou comprar algo para comermos e então as duas irão me contar
tudo o que aconteceu nesta festa, ok?
— Certo, mãe! — Summer resmunga.
Hazel puxa sua bolsa e sai, quase batendo a porta do carro. E tenho uma
suspeita de que apenas não bateu porque Dylan ama essa Land Rover mais
do que ama a mim e Edmund. Olho pela janela e solto um sorriso quando os
poucos clientes encaram seu pijama como se tivesse agredido a moda por
andar pelas ruas de Saint Vincent daquela maneira. Summer solta um suspiro
no banco de trás, se jogando no banco, me viro em sua direção, observando
seus olhos fechados e uma leve marca roxa em seu pescoço.
— Desembucha — digo. — Se quiser uma desculpa para usar com Hazel,
é melhor falar agora para que eu possa te ajudar.
— E-eu… caí no sono em um dos quartos... — mentiu.
— Você é uma péssima mentirosa, Sum! — Solto uma gargalhada e me
aproximo um pouco, sentindo o cheiro de perfume masculino, sabendo que
ele pertence a um dos nossos amigos.
— Merda, Vee!
— Relaxe, eu transei com Logan! — Foi minha vez de suspirar. — Minha
situação é pior do que a sua.
— Eu não deveria ficar feliz por isso, mas é inevitável! — Ela solta uma
gargalhada.
— Se não estiver pronta para dizer sobre isso, apenas diga a ela que
bebeu demais e que realmente dormiu em um dos quartos vazios, todos nós
vimos você beber, mas creio que ela não acreditará! — Sorrio calmamente.
— Vee, eu não deveria ter feito o que fiz hoje…
— Se não estiver pronta para falar sobre isso, não fale! — Seguro sua
mão. — É a sua vida, e está tudo bem não querer compartilhar tudo, Sum!
Antes que ela possa responder a porta do carro é aberta e Hazel entra, se
sentando no banco atrás do volante; percebo que está mais calma, ela me
passa uma bandeja com três copos e uma sacola com alguns donuts. Ela
apenas liga o carro e volta a dirigir silenciosamente até a mirante da cidade,
assim que estaciona novamente, deixa com que uma música do One Direction
ecoe pelo pequeno ambiente. Por alguns segundos eu apenas bato minhas
unhas em meu colo, prestando atenção nas vozes dos garotos que cantam
Night Changes, mas a respiração que Hazel solta me faz perceber que esse
silêncio que mal havia começado, acabou.
— Vamos definir isso por tópicos principais — ela diz passando o café
para mim e um cappuccino para Summer. — Você transou com Underwood e
você, Summer, sumiu da festa e só apareceu agora. Que merda vocês
ingeriram naquela pista de dança?
— Tequila! — falamos em uníssono novamente, o que nos fez olhar para
Summer e soltar um sorriso cúmplice.
— Puta merda! Vocês parecem duas adolescentes que aprontaram alguma
merda e estão tentando esconder de seus pais e não duas adultas de vinte e
dois anos. — Ela suspira, apontando para mim. — Você, Verônica, eu já
deveria suspeitar que estava com Logan, porque assim que sumiu, ele
evaporou, deixando uma caloura bastante irritada para trás. — Ela levou seu
copo até os lábios e ingeriu a bebida, ficando em silêncio por alguns
segundos. — Aliás, todos nós sabíamos que isso aconteceria mais cedo ou
mais tarde... — Ela se virou para Summer, antes que pudesse dizer algo. —
Agora o suspense aqui é você, Miller!
— Hazel…
— Não, Vee, vocês não estavam bêbadas, e caralho, eu realmente fiquei
preocupada quando Sum me ligou e depois de alguns minutos você... — Ela
me interrompe. — Eu achei que algo tinha acontecido.
— Ele, eu estava com ele! — Summer solta e então bebe seu café como se
aquilo fosse seu escudo contra os olhares que nós lançamos para ela. —
Merda! Quando dei por mim… aconteceu.
— Ele? A mesma pessoa que você falou que nunca transaria? — Tanto a
minha boca, como a de Hazel se abre em choque pela confissão de Sum. —
Você… Verônica, sabia disso?
— Eu estou tão surpresa quanto você. — Balanço a cabeça, dando de
ombros e solto um sorriso travesso. — Ela transou, Hazel, fique feliz por
nossa amiga.
— Vocês são duas idiotas! — Hazel gargalha. — E eu achando que tinha
sido precipitada por ter voltado com Dylan. Mas, porra, vocês duas…
— Ela está bem? — Ergo uma das minhas sobrancelhas, me virando para
Summer, que mantém uma careta voltada para nossa amiga.
— Ela sempre faz isso quando está surpresa com alguma coisa, não ligue!
— Summer dá de ombros.
Levei o copo até meus lábios, absorvendo o gosto do café, enquanto Hazel
se recupera lentamente de sua crise de gargalhada. Mas quando nos encarou,
eu soube que o modo mãe estava de volta. Fingi uma súbita curiosidade
pelos donuts dentro da sacola, enquanto ela bebia silenciosamente o seu café
e afiava o olhar para mim. Mas quando meus olhos a encontraram
novamente, ela soltou um sorriso malicioso e se escorou no banco, cruzando
os braços.
— Eu salvei vocês duas, agora preciso da sua ajuda — disse
ingenuamente para mim.
— Neste momento, eu realmente estou me arrependendo de ter te ligado.
— Bufo, pegando o doce e levanto até a boca. — Desembuche.
— Precisamos de uma capitã na equipe das cheerleaders — diz
calmamente. Minha mão fica parada, enquanto segura o Donut na boca,
sabendo que alguma merda está prestes a vir à tona. — E você é a melhor
pessoa para isso.
— Não — respondo, quando finalmente recupero o ar e abandono meu
café da manhã quase que intacto. — Me peça outro favor, qualquer outro e
eu farei.
— Ela nos salvou de uma caminhada da vergonha, Vee… — Summer
sussurra.
— Isso não significa que eu tenho que fazer algo nesse nível para
agradecer. — Me defendo, quase que em uma voz inaudível.
— É o único favor que preciso, depois disso… nunca mais toco neste
assunto sobre ter salvado você e Summer desta saída vergonhosa. — Ela
junta as mãos e me encara como se eu fosse sua salvação.
— Merda! — Eu estava realmente pensando na ideia de que ter que
encarar o olhar de Ed e Dylan seria melhor do que aquilo. Não, não seria,
eles surtariam pior do que minha amiga neste momento. Mas a ideia de
voltar a vestir um uniforme azul e roxo e treinar uma equipe, faz uma
agitação entrar pelas minhas células, me faz querer voltar a correr pelos
estádios defendendo um time, sentir aquela vibração, comemorar com Hazel
e Summer em uma festa após uma vitória. É isso que eu quero, e isso que me
assusta, porque há anos que não penso nisso, que não desejo coisas tão
banais. Mas a culpa que ainda corre pelas minhas veias sobre aquela noite
do recital há quatro anos atrás diz que eu não mereço essa oportunidade, que
eu não sou digna de ter essas coisas que eu sempre amei, porque ela não
teria. — Eu não posso…não depois de tudo.
Eu realmente não podia? Ou eu estava sendo covarde porque tudo aquilo
me lembrará Sophie? Me lembrará das nossas últimas brigas, do seu último
pedido que me destruiu completamente por dentro. Porque eu sei que meus
irmãos e Oliver estarão lá, sei que essas duas malucas que me ajudaram a
sair daquela fraternidade e gargalharam comigo a momentos atrás, também
irão me segurar caso eu cair, porque isso é a nossa amizade; é saber que
poderíamos confiar de olhos fechados, é deixar que saibam sobre nossas
cicatrizes, saber que estaremos lá quando todo o mundo ruir.
Mas então, o que me segura? O que me faz estagnar dessa forma, fazendo
com que eu não tenha forças nem mesmo para… correr atrás dos meus
próprios sonhos?
— Vee, você pode! — Summer aperta meu ombro, me lembrando que
meus irmãos fazem a mesma coisa quando preciso de apoio. — Você
consegue fazer qualquer coisa.
— E se não conseguir, estaremos aqui. — Hazel coloca a mão por cima da
de Summer. — Juntas, como o trio das três espiãs demais, sabe?
— Ugh, Hazel! Seu gosto para desenhos é péssimo! — Summer faz uma
careta.
— Cale a boca e concorde, Miller! — Ela devolve e então solta um
sorriso, como se não estivesse discutindo sobre desenhos a alguns segundos
atrás.
— Vocês são ridículas! — Eu começo a gargalhar e quando recupero o ar,
seguro a mão delas e suspiro fundo. — Tudo bem, eu posso tentar entrar para
a equipe, mas não posso prometer que eu vá conseguir!
Eu não sei se me arrependerei desta decisão, porém, uma parte do meu
coração me diz que isso deve acontecer, que eu não estou ofuscando Soph da
minha vida, mas, sim, que apenas estou finalmente me livrando daquele peso
que a culpa me faz carregar durante esses anos. Eu estou enfrentando meus
medos, minhas cicatrizes e meus pesadelos. Eu posso fazer isso.
Hazel me puxa para um abraço, me tirando dos meus pensamentos e sinto
que Summer vem logo em seguida, nos envolvendo com seus braços finos.
Eu sempre achei que apenas Oliver e meus irmãos me entendiam,
conseguiam me fazer sentir digna de algo. E estava errada.
Summer e Hazel também estão ali para mim, me mostrando que são
minhas amigas e estarão ali caso eu caia.
E eu também estarei se caso for ao contrário.

— Você está pensando demais, Melany! — digo, quando a garota erra


mais um passo, um passo que deveria ser simples. — Enquanto não esvaziar
a mente, não conseguirá finalizar esse movimento da maneira correta.
Encosto minhas costas em uma das paredes de espelho do estúdio de
dança, cruzando meus braços na altura dos seios, e a observo tentar e
fracassar diversas vezes em um passo simples, que se baseia em pular e
girar. Suas pernas não estão tendo a força necessária para aguentar o peso
quando pousa no chão. Eu sei que algo está errado, sei que ela não erra
tantas vezes assim. Algo realmente está a incomodando de uma forma que
está começando a me fazer pensar em tomar alguma atitude.
— Se você ficar aí tentando ler a mente dela, nunca conseguirá saber a
fonte do problema — Emmy diz, parando ao meu lado. — O que te torna uma
treinadora de merda.
— Bom, então você é uma treinadora de merda também. — Dou de
ombros. — Porque você nunca soube que estávamos com problemas, e olha
que tínhamos vários.
— Exatamente por isso que estou te aconselhando a não cometer os
mesmos erros que eu. — Ela sorri. — Era o sonho dela ser uma treinadora,
você se lembra?
— É impossível esquecer, ela carregava aquele planner para cima e para
baixo anotando coisas. — Sorrio, encarando Mel. — Ela, sim, seria uma
treinadora incrível.
— Ela seria! — Acompanho um sorriso enquanto me desencosto do
espelho e começo a andar até onde Melany estava praticando. — Verônica?
Me viro novamente para a minha treinadora, ela estampa um sorriso
verdadeiro em seus lábios e seus olhos brilham com um orgulho que eu
conheço muito bem.
— Ela ficaria feliz em saber que você se formou com honras em Julliard
um mês antes de voltar a Saint Vincent! — ela confessa.
Não me movo por alguns segundos. Poucas pessoas sabiam sobre isso, fiz
com que apenas um pequeno ciclo de pessoas soubessem que quando eu saí
de Saint Vincent toda destroçada, me afundei nas aulas de danças, como se
fossem o meu refúgio para esquecer o que havia acontecido. Esse é um dos
poucos segredos que eu não deixo que saibam, porque eu não posso deixar
que elas pensem que apenas porque eu consegui finalizar a minha graduação,
consegui pisar em um estúdio sem me quebrar por dentro, ou havia superado
o medo dos palcos.
— Você não foi uma treinadora de merda, mas poderia ter sido mais
simpática — digo, mudando de assunto.
— Eu sei, apenas deixo você acreditar que tem razão em tudo! — diz atrás
de mim, sabendo que não queria aprofundar a conversa sobre a minha
primeira faculdade. — Qualquer coisa estarei na minha sala, preciso
resolver uma merda sobre o concerto.
— Algum problema grave? — Ergo uma sobrancelha.
— Acho que Melany irá querer te contar. — Ela passa por mim e aperta
meu ombro.
Mel parou por um momento e colocou as mãos em seus joelhos,
respirando descompassadamente, como se estivesse esgotada por treinar. A
observei por alguns segundos. Ela não estava bem, estava cansada demais
para uma garota da sua idade, olheiras, que não reparei antes, começam a se
formar abaixo de seus olhos. E isso fez com que uma preocupação surgisse
em mim.
— Paramos por hoje. — Cruzo meus braços.
— O quê? Não, não podemos parar agora. — Ela se levanta rápido
demais.
— Você está com olheiras, cansada e não consegue focar — digo
friamente. — E eu conheço esses sinais perfeitamente para dizer que não
irei te treinar até que pare de forçar seu corpo como está fazendo.
— Como você sabe que estou forçando? — Ergue uma sobrancelha.
— Eu também sou bailarina, Melany, também já fiquei nervosa com uma
apresentação e treinei até meu corpo quase se definhar de cansaço. — A
encaro. — Então não tente me fazer de boba e falar que não é o que estou
pensando.
— Eu não durmo muito bem às vezes. — Ela solta de repente, me
surpreendo. — Às vezes sonho com minha mãe, acho que você sabe de tudo
o que já aconteceu, então irei poupar de todo o papo sentimental sobre o
acidente… e não sei por que eu estou te contando isso, mas talvez precise…
então, Vee, a verdade é que quando os sonhos voltam, eu danço, até que eles
não sejam assustadores.
Encarei a garota na minha frente por mais tempo que o necessário. Eu
podia negar o quanto fosse, mas Melany Underwood é uma pessoa na qual eu
estou me apegando, a garota de olhos azuis e sorriso doce é uma garota forte,
altruísta e sonhadora. E saber que também é frágil, que ainda tem a inocência
em seu olhar, faz que me sente no chão desse estúdio e aponte para que ela se
sente à minha frente. Eu nunca havia dito as palavras que estou prestes a
dizer para alguém e uma parte de mim quis me socar por dar a alguém um
fragmento tão importante das minhas cicatrizes.
— Quando Sophie morreu e meus pais nos tiraram da cidade, eu fiquei
perdida, porque Saint Vincent sempre foi meu pedaço de paraíso. Eu tinha
amigos, tinha esse estúdio, eu… tinha uma vida aqui até aquela noite. —
Puxo minhas pernas até a altura dos meus seios, para que eu pudesse
encostar meu queixo. — Minha mãe sabia que nós amávamos Nova York,
então nos mudamos para lá. Na cabeça dela, uma nova cidade, uma nova
faculdade e uma nova casa, substituiria a falta que minha irmã estava
fazendo. E eu me agarrei a isso, me agarrei na esperança de que se eu não
pisasse aqui novamente, eu poderia afastar todo aquele caos, todas aquelas
lembranças.
— Eu sinto muito… — diz sinceramente.
— Isso não é o pior de tudo, Melany. Eu fiz com que meus pais me
colocassem em duas faculdades ao mesmo tempo, fiz com que eu pisasse em
minha casa apenas para dormir. E tudo isso resolveu uma parte dos
problemas por alguns meses. — Podia sentir minha garganta secar, começo a
apertar meus dedos, me distraindo das sensações que as lembranças trazem.
— Até que os pesadelos começaram. Eu acordava todas as noites gritando
por ela, minha mãe me embalava em seus braços como se eu fosse uma
criança, meus irmãos dormiam na minha cama como fazíamos quando éramos
crianças e tínhamos medo de algo, Oliver entrava sorrateiramente em meu
quarto para garantir que eu estivesse bem e às vezes o pesadelo era tão real
que eu precisava tomar inúmeros banhos, porque eu ainda enxergava o
sangue dela pelas minhas roupas. Melany… era a pior sensação do mundo.
Então um dia, eu acordei de um deles, não havia choro ou grito, nem meus
irmãos ou minha mãe. Era apenas eu e minhas lembranças. Nesta noite, eu fui
até o estúdio de dança que havia em nossa casa. E senti como se minha irmã
estivesse lá, me chamando para dançar, para estar ao lado dela. E eu o fiz,
encontrei naquele cômodo uma válvula de escape para meu próprio
precipício.
Nesse momento, eu sei que minha voz está embargada. Sei que posso
ceder a qualquer momento, mas eu não quero parar, eu não posso parar. Não
quando eu posso fazer dessa história uma motivação para que a garota à
minha frente não faça o mesmo que eu fiz, que não se torne sua própria bolha
de destruição como eu havia me tornado. Ela escuta atenciosamente, então
apenas solto um sorriso sem mostrar os dentes e continuo:
— Eu passava o dia todo nas minhas aulas e durante à noite eu dançava,
tinha medo de dormir e acordar da forma que acordei diversas vezes, então
levei meu corpo ao limite. E quando estava cansada demais para continuar,
eu utilizava substâncias que me ajudavam a ficar acordada. — Minha voz se
quebra ao lembrar. — Quando meu corpo não aguentava, eu caía, ficava
horas apagada. Minha vida se baseava em fingir para o mundo que estava
bem, mas quando os portões da mansão se fechavam, eu tomava o caminho
para a minha destruição, eu drogava meu corpo com a desculpa de que era a
minha única saída. Então um dia, meu organismo falou por si mesmo. Eu
estava ensaiando uma coreografia e meu corpo chegou ao seu limite, ele se
definhou e então tudo foi escuridão. Acordei três dias depois em um hospital
e descobri que havia desmaiado e batido a cabeça quando caí.
— E aonde você quer chegar com isso, Vee? — pergunta enquanto cruza
os braços.
— Até você. — Aponto em sua direção. — Depois desse episódio, eu
precisei de tratamento, Melany, precisei de reabilitação, de psicólogos e
diversos outros médicos capacitados ao meu lado. E hoje eu vejo o quão
necessário foi. Não que eu esteja totalmente curada, mas a cada dia, é um
novo passo, cada dia que acordo com vontade jogar tudo pelo ar, eu ligo
para minha médica e ela conversa comigo, me ouve até que eu me sinta bem
novamente.
— Eu não vou seguir pelo mesmo caminho que você, Verônica! — ela fala
como se finalmente entendesse onde eu gostaria de chegar.
— Não estou dizendo que vai. A dança pode ser nossa válvula de escape,
mas não é a solução de tudo, Melany. — A encaro, meus olhos são
determinados quando continuo a dizer as palavras que precisei repetir para
mim mesmo durante muito tempo. — Você pode se sentir em paz quando a
melodia percorre suas veias e seu corpo se incendeia toda vez que pisa em
um palco, em um estúdio, mas quando a música acaba, as luzes se apagam…
nossos problemas ainda estarão lá, nossas cicatrizes estarão nos esperando.
E a cada vez que você leva seu corpo a ficar tão cansado, uma parte de você
deixa de ver a magia que essa arte tem. Então não faça isso, não se
corrompa, não se destrua como está fazendo.
— Eu só… — Ela suspira, puxando suas pernas para que ficasse na
mesma posição que a minha. — O concerto foi cancelado por falta de
verba… e lá estariam os melhores olheiros das melhores faculdades de
dança do país. Era a minha chance, Vee.
Então é isso. Melany está treinando para que fosse boa o bastante para ter
uma oportunidade, para que conseguisse agarrá-la com todas as suas forças.
Eu a admirei, mesmo que eu soubesse que é errado uma garota de dezesseis
anos fazendo isso consigo mesmo. Eu quis socar Logan nesse momento por
não perceber que sua irmã está precisando do irmão, precisando que ele
dissesse a ela que tudo ficaria bem, que ficasse ao lado dela e não deixasse
que alguma coisa acontecesse.
— Eu prometi que você iria fazer as audições que precisar para entrar na
faculdade que deseja, e eu cumprirei, Melany — digo encarando seu rosto.
— Se preocupe em se manter saudável e feliz, eu cuido do resto. Então
agora leve sua bunda até sua casa, descanse e só volte aqui quando estiver
bem.
Ela se levanta e caminha até sua bolsa, pegando um livro de dentro dela, e
caminha novamente até mim, estendendo-o.
— Tome. — O pego, observando a capa enquanto dedilho meus dedos
pela borda. — É o meu livro favorito, mas quero que fique. Você me lembra
a personagem principal.
Corte de Névoa e Fúria. Eu tinha um exemplar dele em minha estante e é
um dos meus favoritos, mas não falaria. Não estragaria aquele momento
apenas por já tê-lo, eu o guardaria, colocaria em um lugar especial.
— E por que você acha que temos algo em comum?
— Ela estava machucada, quebrada por dentro, contudo, ainda assim não
desistiu de quem amava. — Ela sorri. — Não deixou que a quebrassem mais
do que já estava, ela acreditou, Vee, ela conheceu uma nova versão dela
mesmo, uma forte, poderosa e altruísta. Você, Verônica Blackwell, me
lembra dela por isso, porque você está machucada, mesmo que negue, eu sei
que está. Mesmo assim você não desiste, você estende a mão, você luta pelo
seus… Você não deixa que ninguém te destrua.
Eu estou assustada demais, admirada demais para falar algo. Porque ela
sabe sobre mim muito mais do que eu imagino, e não sobre as fofocas ou as
coisas que ouvira falar de mim, ela realmente olhou para mim, olhou dentro
de mim. E um calafrio percorre minha espinha. Até que ponto eu realmente
me blindei, para deixar uma adolescente de dezesseis anos, me dar uma bela
lição de vida?
Quando ela caminha até a saída. Eu respiro fundo e a chamo.
— O concerto de Natal irá acontecer, Mel. — Solto um sorriso. — Eu irei
fazer até o impossível para que você e todas as garotas se apresentem.
Ela solta um sorriso aberto, daqueles que damos quando estamos felizes,
inclina a cabeça e praticamente grita:
— Eu sempre soube que seríamos amigas, Vee.
Foi então que percebi que havia a chamado de Mel, o apelido que apenas
os amigos a chamam.
Piralha, pensei balançando a cabeça e sorrindo.
E naquele momento, eu soube que Melany Underwood acabara de entrar
em meu coração.
Ela tem sangue frio como gelo
E um coração feito de pedra
Mas ela me mantém vivo
Ela é a besta em meus ossos
Ela consegue tudo o que quer
Horns | Bryce Fox

O barulho dos punhos encontrando o metal dos armários grita que está
começando mais uma temporada de jogos. A adrenalina percorre meu corpo,
enquanto visto a última peça de meu uniforme, sentindo o cheiro da grama
fresca recém preparada para nos receber. Acima de nós, posso ouvir os
passos dos torcedores seguindo seus caminhos até as cadeiras, prontos para
ver nosso espetáculo.
Sou o capitão e sei que deveria prestar atenção no que o treinador começa
a gritar assim que entra no vestiário, mas a porra da minha mente verbera em
apenas uma pessoa: Verônica Blackwell. Nela fugindo do meu quarto,
deixando apenas seu vestido como lembrança da noite quente que tivemos.
E essa lembrança, a imagem dela sobre minha cama, enquanto eu a
penetrava, se fixou em minha cabeça a semana toda, mesmo que a dona desta
memória esteja me evitando como se eu fosse seu pior pesadelo. E eu
deveria estar feliz com isso, afinal, havíamos prometido nos mostrar o
quanto nos odiávamos, o quanto poderíamos ser o pesadelo um do outro.
Mas tudo fugiu do controle, principalmente porque fui idiota o suficiente
para acordar e passar o braço pelo enorme colchão atrás da mulher e
perceber que ela havia ido embora no meio da noite.
E, porra, o que aconteceu naquela festa deveria realmente significar que
nossa atração era carnal, apenas uma necessidade regada à luxúria. Mas
depois que a provei, beijei cada curva daquele corpo, eu não acredito mais
nisso. Porque a parte mais afetada nessa merda toda não foi meu pau, foi a
porra do meu coração.
Mas não estávamos preparados para isso e tive a conclusão disso quando
ela me enviou metade do trabalho via e-mail, não discutiu ou mandou alguma
frase sarcástica, apenas mandou uma frase cordial e me disse que
resolveríamos todos os problemas que vier a acontecer junto com todos os
integrantes do grupo, ou seja, ela não estava a fim de me encarar.
Verônica Blackwell está sendo uma covarde de merda.
— Onde caralhos está sua atenção, Underwood? — O treinador grita do
outro lado do vestiário.
Levanto meu rosto em direção a sua voz. Ele está parado com os braços
cruzados e uma prancheta em mãos. É raro vermos Danforth sem suas blusas
polos ou seu boné da SVU, mas hoje, ele está vestido a caráter para o
momento. Sua blusa social azul marinho, junto com uma calça social que eu
sei que está odiando usar. Diferente de todos nós, que vestimos o manto azul
e roxo da universidade. O falcão grita em nosso peito que é hora de
voltarmos, hora de mostrar a todos que traremos a taça da temporada para a
universidade que pertence.
E tenho certeza de que meus companheiros também sentem o mesmo,
porque neste momento, eles gritam por todo o enorme vestiário, levantam
seus capacetes e sorriem uns para os outros. É uma bagunça, mas mesmo
assim, é onde me sinto bem. Confortável. Mesmo que o peso desta noite irá
recair sobre mim, porque mesmo que seja apenas o primeiro jogo, ainda sim
estamos em casa, precisamos mostrar que somos fortes e unidos. E que
mesmo que seja o capitão mais jovem que o time já teve, nós continuamos
sendo os fodidos The Falcons.
— Desculpe, estou pensando em um trabalho de uma disciplina difícil —
minto, passando a mão pelo meu cabelo e me inclinado para escorar meus
cotovelos no meu joelho para tentar prestar atenção no que ele diz.
— Guarde isso para depois, o nosso jogo de estreia é daqui a alguns
minutos — ele praticamente rosna em minha direção. — Se precisar de
tempo para fazer seu trabalho, o libero do treino essa semana, mas no
momento, foque a porra da sua atenção aqui.
— Sim, treinador! — solto suspirando fundo.
— Me desculpe, treinador, mas que eu saiba, não podemos jogar, sem que
as cheerleaders balancem aquelas bundas pelo estádio — Michael, um dos
veteranos, grita do outro lado, tirando a atenção do homem de mim.
Fecho a cara, lançando uma careta de desaprovação para meu
companheiro, enquanto nosso colega, Kennedy, ergue a mão e lhe dá um tapa
por se referir às garotas desta maneira.
— Tenha respeito, porra! — ele xinga, lhe lançando um olhar fulminante.
— Obrigado pela sensatez, Kennedy — Danforth diz ainda olhando para
Michael, que revira os olhos. — Mas para o bem de seu pau adolescente,
que não pode ver uma mulher, esse problema já foi resolvido.
Isso me faz erguer a sobrancelha, porque as líderes treinam quase todos os
dias no mesmo horário que nós e em nenhuma vez essa semana elas
treinaram ou apresentaram a nova capitã. E isso é estranho pra caralho,
porque todas as garotas que já carregavam a coroa de capitã, gostavam de
exibi-la por todo o campus, principalmente com um dos jogadores do seu
lado.
Me viro lentamente para perguntar a algum dos meus colegas o que diabos
eu havia perdido nessa semana, quando minha cabeça apenas estava focada
em esquecer Verônica e a porra do seu gosto. Porque estava me sentindo um
capitão de merda por não saber que o nosso principal problema foi
resolvido e ninguém havia me comunicado. Droga, eu deveria saber quem
assumiu o posto, afinal, nós entraríamos juntos na porra do estádio com a
bandeira da universidade, para que os patrocinadores, e até mesmo os
diretores, vejam uma fachada unida entre as duas equipes. Mas sou
interrompido por uma voz:
— Chega de conversa fiada, quero que se lembrem de tudo o que
planejamos nos últimos treinos. — O treinador começa a andar pelo lugar,
olhando para todos nós. — Nós iremos jogar em casa, a torcida espera uma
vitória e estamos a dois meses do Draft, então, garotos, esse é o momento de
decidirem quem desejam ser.
Ele diz a última parte olhando para o meu rosto. Como se fosse um aviso
ou algo similar. Apenas aceno para ele e pego meu capacete. Sigo para a
saída, com Mike em meu encalço. Burhan tem uma expressão de desgosto e
até mesmo de raiva estampada em seu rosto e assim que paro do lado de
fora, arrumando meu capacete, ele fica a minha frente e me encara como se
eu fosse seu pior inimigo.
— Um aviso, Underwood: não faça nenhuma gracinha com a minha garota
enquanto estiverem entrando neste estádio! — falou com os punhos
cerrados. — Ela não é uma das garotas da sua lista que você quer foder e
depois esquecer o nome, então tome cuidado!
Minha garota? Lista? Que caralhos ele quer dizer com aquilo? Eu
realmente não estou nem um pouco animado para criar um tumulto com
Burhan nesse momento por conta de algum caso que esteja tendo com uma
das meninas da equipe. Até porque, eu não estou interessado em nenhuma
delas. E felizmente o treinador me intercepta antes que eu possa dizer algo
sobre essa garota aleatória que ele provavelmente está apaixonado.
— Sua parceira está te esperando no final da rampa, então arraste sua
bunda até lá, Underwood! — o treinador grita, me empurrando pelos
ombros.
Suspiro fundo caminhando na direção que indicou, deixando todos para
trás. E quando meus olhos recaem sobre a figura esbelta no topo da rampa
que liga ao campo, eu entendi o que Burhan quis dizer.
O universo só pode estar de sacanagem com a minha cara.
Verônica Blackwell é a nova capitã das cheerleaders do SVU, e ela está
exatamente do mesmo jeito de quando nos reencontramos há anos atrás. O
uniforme azul e roxo ainda desenha perfeitamente seu corpo e aqueles
malditos olhos castanhos que me atormentam desde o final de semana, me
encaram com brilho e uma excitação de estar de volta a aquilo que todos nós
sabemos que sempre amou fazer. O laço roxo com algumas listras azuis
compõe seu rabo de cavalo no alto de sua cabeça e o tênis branco finaliza
todo o uniforme. Ela está impecável e isso me despertou diversas
lembranças das temporadas durante o high school, que para outras pessoas
não deve ter nenhum significado, mas para ela, um dia significou tudo. E
peço ao universo que com essa decisão de ela voltar ao posto que sempre
lhe pertenceu, aquela parte de Vee, determinada e radiante, retorne junto.
Caminho lentamente até onde ela estava, o suspiro que me deu quando
parei ao seu lado foi recebido com uma batida forte do meu coração. Eu
sabia que ela desejaria muito mais a companhia daquele babaca do Burhan
do que a mim neste exato momento. Mas eu não desejava mais ninguém. Não
tinha mais como imaginar outra garota caminhando comigo por todo o
campo. Porque, neste momento, a universidade nos consideraria intocáveis.
E a realidade caiu sobre mim como se fosse um soco no rosto. Não é o
simples fato de Verônica ter dormido na minha cama no último final de
semana que vem me atormentando, é a vontade de tê-la novamente ao meu
lado, caminhando os mesmos passos que os meus, como um dia tanto
planejamos. Acabo vendo um passado voltando aos seus eixos. Este é o
lugar dela, este é o meu lugar.
Mas ao mesmo tempo que isso se esclarece em minha mente, não sou
capaz de esquecer tudo que aconteceu durante esses anos. Quantas noites tive
que perder o sono por dar duro para tentar recuperar o pouco que um dia foi
meu. Por isso, o que sinto é incerteza, mas não posso mais enganar a porra
do meu coração, então só me resta força-lo mais um pouco, tentar deixar
esse sentimento que pensa em despertar novamente e me focar naquilo que
deve ser sempre minha prioridade.
Fecho os punhos, tentando conter o nervosismo. Que merda é essa? Desde
quando ultrapassei esse limite?
— Pare de me encarar como se eu fosse uma estranha, Underwood! —
diz, fazendo uma careta e me tirando dos meus pensamentos.
— Em trajes assim, anjo? — Solto um sorriso provocador. — Você é
tudo, mesmo uma estranha.
— Não seja um babaca.
— Não haja como uma megera.
Sorrio levemente para ela, orando para que ela não perceba quão afetado
fiquei por conta de meu pensamento. Mas quando nossas íris se fixam um no
outro e se tornam chamas, eu esqueço disso e tudo o que nos rodeia. Por
alguns segundos, ficamos ali, devolvendo aquele olhar um para o outro,
como se sentíssemos as descargas elétricas nos nossos corpos antes mesmo
de nos tocarmos, como se ela estivesse se lembrando de quando minha mão
encontrou suas curvas e como aquilo nos fez sentir em pleno curto-circuito.
Nós éramos fogo que não apagava, e a vontade imensurável de só colocar
mais lenha até nos consumir, começou a aumentar dentro de mim.
Antes que eu pudesse beijá-la ou arrastá-la até um vestiário vazio, alguém
arranhou a garganta, fazendo com que quebrássemos aquela troca de olhares.
Quando me virei em direção ao som, encontrei uma Hazel vestida da mesma
forma que minha ex namorada e com um sorriso aberto, como se ver aquela
cena tivesse dado a ela todas as respostas de uma prova importante.
— Estamos todos prontos, até mesmo aqueles babacas da outra
universidade — diz cruzando os braços.
— Nós também estamos — dizemos em uníssono.
— Ótimo, destrua-os no campo, Underwood! — Hazel levanta a mão para
que eu faça um hive-five com ela e pula em meus braços, me abraçando. —
Não perca ou eu irei acabar com você na festa.
— Não pretendo perder, Smith! — Solto um sorriso ao ver sua careta por
mencionar o seu sobrenome que tanto odeia.
— Babaca — resmunga se virando para Verônica que apenas nos
encarava. — Arrase como sempre arrasamos no Saint Vincent College, e
Vee… obrigada por fazer isso, de verdade!
Ela apenas assente e nossa amiga a puxa para um abraço. Verônica passa
os braços pelos ombros de Hazel desajeitadamente, como se não esperasse
pela ação da nossa amiga. Solto um sorriso fraco vendo a cena, porque
mesmo que a odeie, sei que Verônica ama Hazel, como eu amo a minha
amiga que me obriga tomar cafés todas as terças com ela e a ver todas as
temporadas de Grey’s Anatomy quando está entediada em um final de
semana. Elas foram amigas inseparáveis quando éramos adolescentes e uma
parte de mim ficou feliz ao ver aquele vínculo intacto, mesmo depois de
anos.
Assim que Hazel a solta, um grupo de garotas se alinham atrás de nós,
todas elas trajam o uniforme das cheerleaders. Um pouco atrás da fila que
formam, o time de futebol se posiciona, gritando loucamente por finalmente
estarmos de volta. Meus olhos brilham quando Verônica e eu caminhamos até
a saída dos vestiários, já escutando os gritos animados de todo o estádio. As
arquibancadas são uma mistura de azul e roxo, algumas pessoas levantam a
bandeira da SVU e gritam. Um calouro, vestido com uma fantasia de falcão,
símbolo da delegação de esportes da universidade, aparece ao nosso lado e
fez uma reverência exagerada demais para Verônica, que gargalha como se
não esperasse por isso, mas se inclina ligeiramente, devolvendo o gesto com
uma elegância que apenas ela tem.
Hazel e outra garota aparecem atrás de nós, segurando a enorme bandeira
do time e levantando o dedão, fazendo um sinal positivo para nós. Os meus
colegas começam a gritar animadamente, porém são silenciados pelo nosso
treinador assim que o diretor sobe os poucos degraus de um palco
improvisado no centro do campo.
— Boa noite a todos! — Ele cumprimenta assim que se ajeita atrás do
microfone. — Como diretor da Saint Vincent University, eu dou boas-vindas
a todos vocês! — O diretor leva a mão até sua gravata, enquanto solta um
sorriso falso. — É uma honra sermos escolhidos para abrigar a estreia da
temporada de jogos das maiores universidades do condado, e, por isso,
chamo o capitão do time da SVU, Logan Underwood e a capitã das
cheerleaders, Verônica Blackwell, junto dos capitães da Columbia, para que
possamos abrir oficialmente a temporada de jogos das universidades do
condado.
Verônica se vira apenas para me encarar, suspirar fundo e apontar o
queixo para que possamos caminhar juntos até onde o diretor estava. Vejo
ela apertar seus dedos fortemente, como se estivesse nervosa, como se
estivesse a um passo de surtar.
Então, antes que eu pudesse pensar no que estou fazendo, seguro a sua
mão. Apertando levemente, como em uma frase silenciosa de que tudo ficará
bem. Ela encara nossas mãos por alguns segundos e suspira fundo, se
afastando lentamente e olhando sobre seus ombros, diretamente para Hazel,
que tinha suas íris castanhas voltadas para nossas mãos. Vee olha para frente
e dá um passo, me indicando que está bem o suficiente para fazermos isso e
o grito animado da universidade nos faz sorrir quando finalmente meus pés
tocam o gramado impecável.
Eu realmente amo quando a temporada chega, amo os gritos, a felicidade e
todo o caos que ela traz. E, acima de tudo, eu amo estar neste campo,
correndo atrás de uma bola Wilson, amo a sensação que é ter um time me
dando suporte, me apoiando e sendo cúmplice em cada jogo.
Quando finalmente subimos no palco improvisado e nos posicionamos ao
lado do diretor, pude ver o olhar que o capitão do time da universidade rival
deu à Verônica; ele a encarou com desejo, como se ela fosse o maior prêmio
que pudesse ganhar naquele jogo. E um sentimento começou a subir pela
minha bile, me fazendo o encarar com uma expressão nada agradável, que
ele entendeu quando os olhos escuros dele encontraram os meus.
Ignoro todo o discurso que deram sobre a temporada, meu foco é apenas a
garota ao meu lado, que sorri falsamente para cada um que a cumprimenta ou
diz algo sobre a equipe. Verônica e eu sempre odiamos pessoas superficiais,
a bajulação sem sentido e, assim como eu, ela deseja que todo esse momento
passe rápido. Quando finalmente nos liberam, desço do pequeno palco, me
separando de Blackwell, que aperta o laço no topo de sua cabeça e corre até
o centro do campo onde as outras garotas já a esperam.
No caminho, ela levanta os braços se alongando e vira um mortal, parando
perfeitamente no centro. Ela junta as mãos, grita para toda a equipe se
preparar e pega dois pompons de uma das garotas. Quando a música que elas
sempre dançam invade todas as caixas de som do estádio, Verônica recita
algumas palavras com as suas parceiras e sem mais, corre até o final da fila
junto com outra menina, abandonando os pompons no processo, elas se
posicionam, formando a famosa torre. Percebo que Verônica e sua
companheira serão o topo, e a cada andar que formam, cada vez que escala,
um frio se instala em meu estômago, com medo de que ela se desequilibre e
caia.
— Sua garota é boa pra caralho, Burhan! — um dos jogadores diz.
— Eu sei, ela sempre foi foda! — Ele devolve e eu sei que está sorrindo
orgulhoso.
Dou uma olhada por cima do meu ombro, encarando Mike com olhos
semicerrados. Ele percebe o meu olhar e me encara, erguendo os ombros.
Respiro fundo algumas vezes para não dizer algo que sei que me
arrependerei mais tarde, principalmente porque Burhan sabe que Verônica
não é a sua garota só porque eles já transaram. E tenho quase certeza de que
ela havia deixado claro para ele que o que tinham era apenas casual, porque
está explícito no rosto de Vee que ela não procura nenhum relacionamento.
Quis me virar para ele e dizer isso, dizer que ela não é a garota dele, nunca
seria. Não por todos esses argumentos acima, mas sim porque ela pertence
apenas a si mesma. Mas não valia a pena, não quando eu sou o capitão e
estamos a cinco minutos de entrar em campo. Arrumar uma briga por uma
mulher seria algo idiota de se fazer, mesmo que me trouxesse uma satisfação
enorme em quebrar a cara de Mike.
Volto meu olhar para frente, observando duas das garotas posicionarem a
bandeira no qual entraremos, então apenas grito para que todos se preparem.
Assim que Verônica me encara e acena com a cabeça, nos indicando que é o
momento de entrar, eu levando a mão, chamando meu time, e corro até onde
as líderes de torcida estão. Assim que passamos correndo e rasgamos a
bandeira no meio, balançando o capacete, posso escutar a felicidade inebriar
o estádio e a torcida se levantar animadamente. O time rival fazia o mesmo
do outro lado do campo, mas a única coisa que eu posso perceber é o sorriso
que Blackwell lança para sua equipe. Um sorriso nostálgico, verdadeiro.
As cheerleaders finalizam a apresentação e se posicionam nas laterais do
campo, nos dando a liberdade para ocupar todo o espaço necessário para
que possamos realizar todas as jogadas.

Olho para o placar a fim de perceber quanto tempo falta para o final da
partida e descubro que faltam poucos minutos. Solto uma lufada de ar
frustrado. Por termos subestimado nossos oponentes, agora nos encontramos
em uma posição arriscada. O jogo é acirrado de uma forma que não
esperávamos; e o que parecia fácil, se tornou quase impossível. Nos
posicionamos na jarda dez, de frente para o time rival. Alguns deles nos
encaram com fogo nos olhos, outros com uma felicidade genuína em seus
rostos por terem a chance de nos vencer pela primeira vez em anos, mas
quando finalmente começamos a partida, o caos se instala. A defesa nos dá
cobertura, enquanto Burhan corre até o outro lado do campo, arremessando a
bola para Kennedy, que é interceptado por um dos atacantes.
Merda. Precisamos ser mais agressivos ou isso será um massacre total.
Grito por Burhan e ele corre até meu lado.
— Nós precisamos fazer a jogada que ensaiamos no treino — digo com
dificuldade pelo cansaço já adquirido durante a partida.
— Você está louco, Logan? — Mike olha para o treinador do outro lado
do campo, gritando para que nós dois continuemos com a partida, pois os
minutos correm. — Aquilo foi jogada de criança, eles irão conseguir te
interceptar antes mesmo que você consiga dar um passo.
— Eles não estão esperando por essa jogada, confie em mim. Porra, deixe
toda nossa merda entre nós dois fora desse campo, haja como equipe. Vença
comigo, Burhan! — Ele me encara por uns segundos, concorda com a cabeça
e diz:
— Vamos acabar com eles, capitão.
É isso aí! Junto o pessoal em círculo, dando o comando.
Juntamos as mãos, levantando nossas vozes para que todo o estádio saiba
quem somos:
— Quem nós somos? — puxo o coro.
— SVU! — eles respondem.
— O que nós trazemos?
— Força, foco e determinação.
— Nós lutamos como?
— FALCÕES!
Nos dispersamos, tomando nossos lugares. Troco minha posição com
Burhan e corro até o outro lado. Assim que o grito de Mike veio alto e claro
me dizendo para me preparar, faço isso, me posicionando entre outros dois
jogadores. Vejo ele levar o braço para cima e atirar a bola, fazendo com que
a Wilson voe até mim. Dou um salto para conseguir pegá-la.
E como no treino, um sorriso surge em meus lábios assim que sinto a
textura entre meus dedos, precisamos passar pela defesa e de dois
lannerback a direita, corro e pulo sobre alguns jogadores que haviam se
jogado para formarem uma barreira no intuito de me atrasar. Meus colegas
me dão apoio, tirando alguns dos oponentes da minha frente.
Estávamos perto, quase lá. Olho para o lado, no intuito de ver se tinha
algum dos jogadores ao meu alcance, mas a única coisa que vejo é Verônica,
pulando, gritando para que eu não fosse um idiota e perdesse esse lance.
Uma alegria se formou em meu peito por vê-la ali, torcendo, gritando para
conseguirmos.
E nós conseguimos. Quando eu consigo realizar o touchdown. O grito dos
torcedores não foi o motivo que me fez sorrir. Foi a garota dona dos meus
pensamentos, que comemorava do outro lado do campo, pulando abraçada à
Hazel e que depois se virou para mim, sorrindo de verdade, o riso que há
muito tempo ela havia direcionado a mim.
— Babaca. — Ela move os lábios sem emitir som nenhum, fazendo os
pelos de todo o meu corpo se arrepiar. Arranco o capacete da cabeça,
passando a mão livre pelo cabelo, tentando dissipar um pouco do suor.
— Megera — grito para que ela ouça de bom tom.
E pela primeira vez, eu não quis que ela sumisse, eu quis aproveitar cada
minuto. Porque a fome que tenho agora por essa mulher, fala muito mais alto
do que o meu raciocínio lógico. E mesmo que eu tente negar, sei que quero
me perder entre os fios dos seus cabelos castanhos e o cheiro do teu
pescoço.
Quero a sensação de combustão que emana de nós todas as vezes que
nossos corpos se colidem.
Quero Verônica Blackwell, de todos os jeitos, formas, mesmo que todo o
mundo odeie que ficássemos juntos. Eu a quero e isso me assusta.
Meus companheiros de equipe me envolvem, fazendo com que eu perca o
contato visual com Verônica. Meu corpo é suspenso, sendo levado a sentar
nos ombros deles. Ouvindo a algazarra e as vozes gritando pelo meu nome,
mas aproveito minha visão privilegiada para procurar mais uma vez por ela.
Os torcedores invadem o campo e tudo vira uma grande confusão de
abraços, palmas e risos. Consigo me desvencilhar de meus companheiros, a
procuro entre a aglomeração. Quero olhar para ela, quero ver aquele brilho
em seu olhar novamente. Porra, eu apenas quero vê-la, mesmo que eu saiba
que é errado. Caminho entre a multidão que se forma no campo, desviando
de algumas pessoas que vêm ao meu encontro para me parabenizar e dos
gritos do treinador. Meu único intuito é encontrar com a capitã das
cheerleaders, mesmo que todo o meu subconsciente grite que isso é errado.
Quando a encontro, Mike está correndo em sua direção balançando o
capacete em uma das mãos tentando chamar sua atenção e sorri como se ela
fosse a sua pessoa favorita no universo. Verônica inclina a cabeça distraída,
ao ouvir mais uma vez seu nome sendo gritado, ela vira em direção ao som.
Quando ela vê Mike correndo em sua direção, Verônica se lança em seus
braços, circulando seus braços no pescoço dele, deixando que ele gire com
ela. Não posso ouvir seu riso enquanto segura os ombros de Burhan para não
cair. Porém, quando ele a abaixa e vai em direção ao seu rosto para beijá-la,
todo o meu corpo ferve e dou um passo para atravessar a distância que nos
separa e socá-lo, mesmo que eu saiba que a minha atitude será ridícula.
Entretanto, paro abruptamente e fico surpreso com a ação que ela toma,
Verônica se afasta, recusando o beijo e segura seus ombros com uma
delicadeza que apenas ela tem, dizendo algo que o faz erguer uma
sobrancelha em descrença. Então dá de ombros e caminha na direção oposta,
onde Oliver a espera.
Eu não sei qual a relação deles agora, mas sei que Oliver é importante e
sempre a protegeria de qualquer perigo que acontecesse. Isso ficou
perceptível quando ele nos flagrou na biblioteca e me lançou um olhar
mortal. Não de ciúmes ou de inveja, era preocupação. Como se pouco
importasse quem Vee beijasse ou transasse, ele apenas estaria preocupado
com o seu bem estar, em saber que ela não sairá machucada ou algo similar.
Sou tirado dos meus pensamentos por uma das líderes que joga charme
para mim enquanto se aproxima e passa os braços pelo meu pescoço, me
puxando para um abraço. Eu deveria estar devolvendo o gesto com vontade,
deveria esquecer Blackwell e focar em tudo o que conquistei até aqui.
Deveria aproveitar a companhia de garotas que não foderiam com a minha
vida e comemorariam por isso.
Mas eu não consigo.
— Você arrasou no campo, capitão! — A morena diz, mas o apelido não
me causa a mesma sensação de quando quando ela diz.
— Obrigado! — Sorrio. — Todo o time fez um excelente trabalho.
— Oh, sim! Você vai à festa? — pergunta esperançosa.
— Não perderia por nada! — falo para a garota, seus cabelos roxos estão
presos no rabo de cavalo e a covinha a deixa ainda mais bonita.
— Nos vemos lá então! — Ela se afasta, ainda sorrindo.
A encaro por alguns segundos. Ela é bonita e eu estou em um limbo entre
tentar descobrir se ela está flertando comigo ou se estava apenas sendo
gentil, mas quando se aproxima novamente, encarando meus lábios com
desejo, eu entendi a sua real intenção. Deveria me abaixar e beijá-la, ela é
linda e seus olhos chocolates brilham enquanto chega cada vez mais perto.
Mas no momento, não quero e nem posso usar uma garota aleatória para me
distrair dos meus problemas, já havia feito isso demais. Então apenas assinto
com a cabeça, desconverso, dizendo que preciso ir para o vestiário e
encontrar a equipe para o pós jogo. Porque a única garota que desejo beijar,
está me evitando a todo custo.
Então o que está tentando fazer comigo?
Não conseguimos parar, somos inimigos
Mas nos damos bem quando estou dentro de você
Você é como uma droga que está me matando
Animals | Maroon 5

Durante a semana, enquanto treinava com as garotas, senti a insegurança


se instalar em meu corpo como se eu tivesse tomado a pior decisão desde
que voltei. Mas quando entro no vestiário feminino e vejo o olhar que elas
me lançam, me lembro do porquê amo isso tudo, como amo vestir um
uniforme. E isso foi o suficiente para dissipar qualquer sentimento negativo
que corre em mim.
— Você foi incrível, Vee! — Hazel aparece batendo palmas na minha
frente, enquanto levo a garrafinha de água até meus lábios.
— Nós fomos, Hazel! Nós fomos! — Solto um sorriso para ela, enquanto
escuto o grito de nossas companheiras atrás de nós.
— Obrigada por fazer isso. Obrigada de verdade! — Ela sorri, me
puxando para um abraço, é como um daqueles abraços que sempre me deu
quando éramos adolescentes, aqueles que dizem inúmeras coisas sem
precisar proferir alguma palavra. E enquanto seus braços me apertam
fortemente, posso sentir que ela estará ao meu lado caso precise, mesmo que
eu acredite que não mereço.
Quando ela se afasta e caminha até seu armário, ainda fico a encarando.
Algo dentro de mim, talvez gratidão ou algo semelhante, começa a subir pelo
meu peito, como uma luz que dissipa a escuridão. A sensação é bem-vinda,
porque é uma sensação que me faz sentir que está tudo bem em deixar as
outras pessoas entrarem novamente, tudo bem me permitir sentir.
— Dylan está me esperando para irmos à festa, quer carona?
— Vim no meu carro e antes preciso de um banho! — Inclino a cabeça
sorrindo e aponto para meu corpo suado. — Encontro vocês lá!
Assim que ela e as outras garotas começam a sair, fazendo com que fique
apenas eu e todo o espaço silencioso, caminho até o meu armário, retirando
tudo o que era preciso para me arrumar e ir para a fraternidade dos The
Falcons. Sei que tenho tempo suficiente, principalmente quando todos os
chuveiros estão vagos e todas minhas colegas estavam ansiosas demais para
a festa na fraternidade que não perderam tempo aqui. Por isso, puxo todo o
tecido para fora do meu corpo e chuto meus tênis para debaixo de um dos
bancos azuis que estão no centro do vestiário. Caminho em direção ao
chuveiro, soltando meu cabelo, e assim que o ligo, um vapor quente preenche
o ambiente, fazendo com que os azulejos brancos sumam entre a fumaça.
Meu corpo relaxa quando entra em contato com a água, todo o estresse,
toda a adrenalina de voltar a um estádio começa a se esvair, permito que
meus olhos se fechem e deixo que a água molhe meu rosto e encharque meu
cabelo. Mas um barulho faz com que toda a tensão volte, fazendo com que eu
feche lentamente o jato de água e me vire, puxando a toalha e a enrolando em
meu corpo.
Sabe aquela cena que acontece em filmes de terror, onde a protagonista
está indo direto para onde o assassino está e começamos a gritar dizendo o
quão burra ela é? Talvez seja esse o momento que eu deveria escutar esse
conselho, porque faço o mesmo. Caminho para fora do banheiro segurando
com força a pequena toalha em volta do meu corpo, a água ainda escorre por
todas as minhas curvas e meu cabelo se gruda sobre a pele das minhas
costas.
— Hazel? — grito mesmo sabendo ser em vão.
Minha imaginação corre solta quando passos e um barulho em um dos
armários me faz ter um sobressalto, talvez seja um idiota que está a fim de
fazer alguma graça ou realmente poder ser um serial killer procurado mais
uma vítima, não sei. Porém, estou farta de ser a garota assustada nessa
história, então agarro um taco de lacrosse que deve ser de alguma jogadora
da equipe feminina que deve ter esquecido ali e vou em direção ao barulho,
mas paro instintivamente quando dou o primeiro passo. Porque Logan
aparece entre as fileiras de armários e se escora em um deles. Ele ergue uma
sobrancelha em direção ao objeto que seguro em minhas mãos e o pequeno
medo que ainda percorria em meu corpo se transforma em ódio.
— Que merda você tem na cabeça, seu idiota? — grito.
— Você pode me explicar por que diabos está segurando um taco de
lacrosse, anjo? — pergunta, enquanto esquadrinha meu corpo seminu, com
uma toalha enrolada que está a ponto cair. Logan leva a mão à boca,
passando o polegar pelos lábios.
— Saia, Underwood! — profiro, rangendo os dentes, porque sei que se
ele não sair dali, não serei capaz de me conter por muito tempo. — Ou vou
gritar.
— Eu não te contei que a ducha da ala masculina está quebrada e que por
isso tenho a permissão de entrar aqui? — Se encosta no armário, cruzando
os braços em frente ao corpo. Seus músculos se retesam por baixo do tecido
de sua camisa do uniforme que está colada ao corpo. Nesse momento me
imagino no meio deles, sendo apertada e sugada por ele enquanto segura
minhas pernas com os braços fortes, me deixando ter a visão privilegiada de
sua cabeça enfiada entre elas. Logan pigarreia, me trazendo à realidade e
agradeço por ele estar longe, porque ele conseguiria ver todos os meus
poros arrepiados. — Somos os últimos aqui e o treinador me pediu para
trancar os vestiários. — Ele pondera, dando um passo à frente.
Logan inclina a cabeça para o lado e me lança um sorriso descarado
quando interrompo nosso contato visual para olhar em direção à única saída.
Se eu for rápida, consigo sair antes que ele chegue até mim, o grande
problema é: será mesmo que é isso que eu quero? Fugir dele mais uma vez.
O desgraçado escancara o sorriso ao adivinhar o que acabei de pensar.
Ele me olha faminto, com aquele olhar que deveria fazer qualquer garota
com boa sanidade correr, mas eu não sou desse tipo, eu jogo no mesmo nível
que ele. E exatamente por isso, deixo o taco de lacrosse de lado e jogo meu
cabelo molhado para trás, apoiando minha perna sobre um dos bancos do
vestiário, me inclinando sobre ele, dando a Logan a visão do topo dos meus
seios ainda tapados pela pequena toalha. Seus olhos descem calmamente até
onde minha pele está exposta e seu olhar demora lá. Ele pigarreia, tentando
não soar afetado e continua:
— Perdoe minha falta de educação, anjo, mas você sabe: líderes de
torcida molhadas e enroladas em toalhas me fazem perder o raciocínio
lógico.
É isso mesmo o que eu ouvi? A raiva sobe na minha cabeça ao imaginar
ele flertar com alguém assim, ele arrancar a toalha de outra mulher e fazer
aquilo que ele deveria estar fazendo comigo. Merda. Merda. É sério,
Verônica, com ciúmes desse babaca?
— Não me importo se as líderes fodem com o pouco de neurônios que
ainda lhe resta, capitão. — esbravejo, mas minha voz é quase um sussurro,
mesmo quando volto a minha posição inicial e aperto a toalha em meu corpo,
fazendo com que as pontas dos meus dedos fiquem brancas. — A-agora saía!
Logan não me ouve, e para ser sincera, nem eu mesma ouço, porque a
minha voz sai quase em um murmúrio inaudível, um tom que nós dois
sabemos que eu não desejo que ele faça isso. Não me surpreendo quando
Logan faz exatamente o oposto. Ele acaba de uma vez com toda a distância
entre nós, segurando em meus ombros e me encostando no armário, apoiando
suas mãos ao lado de minha cabeça, impossibilitando que eu faça o que
pensei a alguns segundos atrás. O cheiro do copo dele suado me inebria,
mordo meus lábios, amaldiçoando meu corpo por me trair, quando minha
respiração entra no mesmo compasso da aceleração da dele.
Sua mão direita toca meu rosto de uma forma lenta, desenhando a
saliência de meu queixo. Controlo minha vontade de fechar os olhos e
relaxar com o seu toque. Com muita força de vontade, volto a encará-lo, me
empertigando, e levanto, o queixo o desafiando. O que Logan toma como
uma indicação de que pode percorrer meu maxilar, meu pescoço, seguir
deslizando seu dedo por minha clavícula, pelo desenho de meus seios, que
agora estão saltados pelo tamanho da força que faço ao segurar a toalha.
Logan pode ser um filho da puta de primeira mão, mas pode muito bem ser
considerado a personificação de um deus, um deus alto, sensual e com uma
língua que me fez ver estrelas durante uma noite toda.
Caralho, Verônica, foque em tirá-lo daqui, não em foder com ele
novamente!
Isso é o que eu deveria fazer, escutar a voz sensata que grita em minha
cabeça, talvez eu deva correr até meu carro de toalha e dirigir até minha
casa, ninguém estará lá e se estiver não será a primeira vez que isso
aconteceria. Sim, posso fazer isso, é melhor que estar em um ambiente com
Logan depois de toda aquela noite que tivemos. A imagem dele ajoelhado
entre minhas pernas, como sua língua desbravou cada parte do meu corpo,
em como ele me bombeou forte e firme e como acordamos outras vezes
durante a madrugada para repetirmos tudo novamente, escorrega pela minha
mente. Merda! Antes que eu possa perceber, esfrego minhas pernas uma na
outra, como fiz na primeira vez que corremos juntos. Mas dessa vez, não há
carros entre nós, não há como fugir. Ele sorri maliciosamente, quando
percebe o que eu faço, aproxima seu corpo do meu, encaixando uma perna
entre as minhas, permitindo que o tecido de sua roupa entre em contato com
o meu corpo, com a porra do meu clitóris, me obrigando a engolir um
gemido. E, por Deus, por mais um pouquinho ele me possibilitaria gozar ali,
sentindo suas mãos que agora estão em meu cabelo, puxando meu rosto para
olhá-lo diretamente nos olhos.
— Eu preciso soletrar para você sair daqui, Logan? — agradeço
mentalmente por minha voz não sair afetada.
— Eu irei, anjo! — aproxima sua boca, sussurrando sobre a minha. —
Mas antes, acredito que precisamos ter uma conversa amigável.
— Nós não temos que conversar, muito menos ter uma conversa amigável!
— digo, empurrando seu peito com uma das mãos, sem surtir nenhum efeito.
— Não seja tão mal educada, anjo! — Move sua perna, me causando um
leve espasmo ao sentir a fricção de sua perna com minha intimidade.
— Merda — digo com a boca semi fechada, para não soltar um gemido,
piscando os olhos brevemente.
— Você fugiu do meu quarto como uma garotinha assustada… — O hálito
quente dele toca minha pele. Sua boca passeia a milímetros de me tocar. Isso
é uma tortura.
— Nós fodemos e eu fui embora, capitão! — interrompo-o, erguendo seu
rosto, tentando fazê-lo afastar sua boca de mim, mas me arrependo no
momento em que vejo seus olhos. — Se esperava alguém que trouxesse seu
café da manhã na cama, deveria ter transado com outra!
— Oh! Não poderia foder com outra garota daquela festa… — Ele se
abaixa deliberadamente, arrastando seu lábio pela minha orelha e então
sussurra: — Não quando meu pau tinha o desejo de se enterrar em uma
boceta mimada da parte alta.
Merda! Merda! Merda!
— Não seja egocêntrico... — Logan paira seu rosto sobre o meu, fazendo
com que eu perca o sentido da frase que sai de meus lábios.
Eu deveria sair, deveria realmente ir embora de toalha. Mas, porra, é
como se meus olhos tivessem se fixado nos dele e minhas pernas se
enraizado no piso, é como se seu cheiro amadeirado tivesse impregnado
minhas narinas. Não tenho controle sobre meu corpo agora; engulo uma,
duas, três vezes. Enquanto isso, os olhos de Logan recaem sobre meus lábios
e seus dedos sobem lentamente sobre a toalha, desenhando círculos até
chegar em minha clavícula, onde dedilha como se minha pele fosse o
algodão mais macio de todo o universo. Mas quando seus dedos sobem mais
e desenham o meu lábio, eu perco o resto da minha sanidade.
— Eu não deveria estar aqui, Blackwell! — ele murmura rouco, passando
o dedo médio pelo meu lábio inferior. — Não deveria querer te foder, mas
estar dentro de você é como a porra de uma droga, anjo!
Seus olhos são chamas incandescentes, são intensos e misteriosos. Mas
não importa, não mais, não quando entendo o que ele diz. Porque eu também
sinto isso, sinto como se toda vez que nossos corpos se colidem, toda vez
que está dentro de mim e me beija como se eu fosse a obra prima mais
preciosa de todo o universo, eu me sinto completa.
— Talvez já estejamos viciados, capitão! — murmuro, deixando enfim a
luxúria transparecer em minha voz, no semblante de meu rosto.
E sem mais, ele abaixa a cabeça e pressiona os lábios nos meus. Nunca
um beijo doce, suave, mas sempre um depravado, desesperado. Quando
nossas línguas se encontram, nós gememos. É como se estivéssemos levando
um choque, como se estivéssemos pulando de paraquedas e a sensação única
que nos rodeia aliviasse a queda, como se estivéssemos nos intoxicando um
do outro, como nicotina, heroína, morfina e todas as outras drogas presentes
no mundo.
Somos viciados, mesmo que errados, mesmo que inconsequentes.
Sua mão começa a percorrer uma de minhas coxas, enquanto ele sente o
meu desejo ao me esfregar nele. Logan percorre seus dedos por baixo do
tecido da toalha, apertando minha bunda, cintura, deslizando sobre minha
barriga envolvendo meus seios, eu amoleço sobre ele. A outra mão segue
para o nó da toalha que ainda mantenho agarrado sobre minha mão esquerda,
ele a tira, fazendo com que a toalha caia no chão, me deixando
completamente nua.
Interrompo nosso beijo, desejando senti-lo da mesma forma que eu. Subo
a barra da sua camiseta, ajudando-o a tirá-la, que a joga no chão,
envolvendo mais uma vez meu corpo com os braços, nos afastando um pouco
de onde ele me prendia. Ajudo Logan com o resto de sua roupa, enquanto ele
chuta seus sapatos, indo parar debaixo do banco, junto aos meus tênis.
Somos um misto de mãos, braços e desespero. Como se não
conseguíssemos manter nossas bocas longe uma da outra, como se precisasse
estar em contato com a pele um do outro para saber que isso é real. E antes
de perceber, ele nos gira e me deita no enorme banco azul, abrindo minhas
pernas e se ajoelhando entre elas.
— Caralho, anjo, você está tão molhada! — ronronou enquanto passava
um dos dedos em minha abertura.
Estou, porra, como não estar? Com a visão de Underwood ajoelhado entre
minhas pernas e me encarando como se eu realmente fosse o seu paraíso e ao
mesmo tempo seu pior pecado.
Ele agarra minha bunda e puxa para frente, seus dedos cravam em minhas
coxas e quando seu rosto foi de encontro a minha entrada e sua respiração
fez cócegas em minha pele sensível, eu soube que seria meu fim.
— Me conte, anjo... — ele diz, movendo seus lábios para mais perto,
seguindo o caminho até meu clitóris, enquanto minhas mãos agarravam a
borda do banco com uma força sobrenatural. — Me conte como é saber que
hoje todos estavam desejando-a, querendo foder com você, mas você não
tinha olhos para nenhum deles, porque estava bastante ocupada desejando o
nosso jogo sujo, desejando o homem que tanto odeia?
Sem esperar por uma resposta, ele corre sua língua lentamente por toda
minha extensão e me prova de novo e de novo. Logan me lambe, me consome
como se estivesse me reivindicando. Suas mãos agarram minhas nádegas, me
dando um tapa, que me faz gemer seu nome, o que parece deixar ele ainda
mais louco. Ele, olhando para minha parte íntima com aquele sorriso que me
faz ficar ainda mais molhada, a sensação de seu tato com minha lubrificação,
me faz ver estrelas. E quando ele desliza seus dedos até minha entrada, deixa
um dedo derivar e então desliza para dentro, alcançando um ponto sensível e
me empurra para o limite, fazendo com que eu choramingue. Já não tenho
controle sobre minhas ações, estou me movendo descaradamente contra o
rosto dele e puxando os fios de seus cabelos, fazendo com que vá mais
fundo. Quando ele acrescenta mais um dedo e vai ainda mais fundo e com
mais força, eu posso sentir minhas paredes se apertando.
— Logan... — gemo, puxando seu cabelo com mais força.
— Diga de novo, anjo! — ordena levantando a cabeça e lambendo seus
lábios. — Diga anjo, diga novamente como se meu nome fosse a porra de
uma oração.
Eu faço, merda, eu faço isso inúmeras vezes enquanto ele me fode com a
língua. E quando sinto que estou prestes a gozar, ele adiciona um terceiro
dedo. Movendo para dentro e para fora, me levando ao limite novamente. E
assim que acontece, grito o seu nome como se realmente fosse uma prece,
enquanto meu corpo solta inúmeros espasmos.
Ele se abaixa até sua nécessaire abandonada no chão do vestiário, pega
um preservativo e me puxa para seu colo, me deixando envolvê-lo com
minhas pernas. Reivindica minha boca e caminha comigo até o chuveiro
abrindo o jato d'água, fazendo com que a água quente nos encharque. Levanto
minha cabeça para que meu cabelo molhe e se desgrude de minhas costas,
mas quando faço isso, encontro os olhos de Logan, o azul intenso me olha,
me olha de verdade. Não a Verônica que fodeu com sua família, não a garota
imatura que quebrou seu coração, não eu, não essa versão de mim.
Ele me olha como me olhou pela primeira vez, quando éramos meros
adolescentes que se conheceram em um parque em uma noite estrelada. E
isso é errado, porra, errado pra caralho, porque eu também estou enxergando
o garoto que eu amei, o garoto que me desconstruiu, camada por camada, me
ensinou sobre seu mundo e logo após, me quebrou.
Não sei quanto tempo ficamos ali, nos encarando apenas com nossa
respiração entrecortada. Não poderíamos mais fazer isso, não poderíamos
foder para depois nos enxergarmos como duas pessoas quebradas que podem
voltar a ser amigos ou amantes. Não, não poderíamos.
Por isso, quando o puxo para um beijo, foi como das outras vezes. Frio,
calculista e depravado. E, Deus, como desejei que não fosse assim, como
desejei que ele me beijasse, como me beijou inúmeras vezes no passado,
como amou cada pedaço meu que eu acreditava que não deveria ser amado.
Seus lábios se separam dos meus apenas para respirar e ir em direção ao
meu pescoço, fazendo com que minha pele se arrepie. Estamos em um
silêncio acolhedor, como se a realidade ainda não tivesse estourado essa
bolha na qual nos enfiamos.
Ele nos vira e encosta o meu corpo no azulejo, abaixando o rosto até
encontrar meus seios, seus lábios entraram em contato com meu mamilo e,
Deus, é como se todo o meu corpo voltasse a fervilhar novamente. Minhas
pernas se prendem mais forte em sua cintura, se esfregando contra seu
membro duro. Eu não aguentaria, não por muito tempo. Preciso que Logan
entre em mim, preciso que seu pau me foda firme e forte, que me faça
esquecer esses sentimentos que observei em seu olhar poucos minutos atrás.
— Logan… — murmuro quase sem conseguir proferir tais palavras. — Eu
preciso de você, agora!
— Se acalme, anjo... — sussurra entre minha pele, levando uma de suas
mãos até meu clitóris inchado.
Eu não posso me acalmar, não quando todo o meu corpo anseia por ele.
Logan segura minhas nádegas com uma das mãos e outra ele alcança o
preservativo, abre e o escorrega por todo o seu membro duro. Logo após, ele
se posiciona na minha entrada e me encara enquanto se afunda dentro de
mim, bombeando lentamente. Como se estivesse se acostumando com o
espaço.
A água escorre pelo nosso corpo e seus cabelos negros estão colados em
sua testa, assim como os meus. Penso em levar uma das minhas mãos até eles
e os acariciar, mas sou impedida quando Logan começa um movimento de
vai e vem, fazendo com que eu afunde minhas unhas em seus ombros e
gemesse incansavelmente. Levanto o queixo e inclino a cabeça ligeiramente
para trás, entreabrindo os lábios. Ele aproveita o pouco acesso e crava
levemente os dentes contra a minha carne, quando se afasta, poucos segundos
depois, eu sei que ele havia deixado um belo chupão abaixo da clavícula.
Quando profiro um palavrão, ele sorri contra a curva do meu pescoço e
passa a língua, se orgulhando do seu feito.
Os meus lábios se movem em direção ao seu pescoço livre, me abaixo e
imito o mesmo movimento, colocando mais pressão que o necessário, me
afasto vendo o pequeno roxo que está se formando sobre sua pele, um
sorriso voraz se forma em meu rosto. Logan gargalha e então deixa um último
beijo fumegante em meus lábios antes de empurrar mais forte dentro de mim,
fecho meus olhos quando minha boceta quente e úmida se aperta contra ele
com força. Ele continua com as estocadas, agora estabelecendo um bom
ritmo, resultando em nós dois gemendo palavrões.
Começo a empurrar o quadril contra ele, igualando nossas estocadas para
que seja ainda mais fundo. A água cai entre nossos corpos, fazendo com que
eu precise limpar as gotas que escorrem pelos nossos rostos. Logan se ajeita,
erguendo seu tronco, segurando minha cintura e enfia seu pau mais fundo em
mim, me fazendo gritar seu nome, não me importando se alguém possa entrar
aqui e nos pegar nessa posição.
— Porra, anjo! — rosna com os dentes cerrados e abaixa o corpo, fazendo
com que o jato de água molhe todo o seu cabelo novamente.
Abaixo o meu olhar quando ele se ergue novamente e mordo meu lábio
inferior, tendo a visão de seu pau empurrado para dentro de mim.
Underwood arrasta as mãos pelo meu corpo para que ele possa começar a
esfregar meu clitóris. Eu sei que não irei aguentar muito, e quando menos
percebo, sinto que minha boceta aperta seu pau e eu me desfaço, agarrando o
seu ombro, enquanto ele geme meu nome assim que chega ao seu clímax.
Nós dois estamos ofegantes e cansados quando encostamos nossas testas e
fechamos nossos olhos, apenas sentindo o jato de água cair sobre nossas
cabeças e os nossos corações batendo rapidamente. Não sei quanto tempo
ficamos assim, apenas escutando a respiração um do outro, mas quando
Logan finalmente sai de dentro de mim e estica a mão para desligar o
chuveiro, eu finalmente caio na realidade. Me desvinculo dele, colocando
minhas pernas no piso molhado e caminho até onde nossas roupas estão
jogadas. Enquanto me visto, tento ignorar a presença dele do outro lado da
sala, caminhando com aquele corpo perfeito até suas roupas e faz o mesmo
que eu.
Puxo o vestido preto sobre meu corpo e calço meus saltos, bufando alto o
bastante quando constato que não daria tempo de secar meu cabelo antes de
ir para a festa ou produzir uma maquiagem que esconda o quão corada estou.
Quando finalmente me viro para Logan, ele ainda segura a blusa azul do
SVU nas mãos, mesmo na fraternidade eu não havia observado suas
tatuagens, mas agora de frente a ele e em um lugar totalmente iluminado, não
posso deixar de admirar os únicos três desenhos gravados em sua pele que
me chamam a atenção. A primeira tatuagem é uma frase em sua costela que
estou longe o bastante para que eu possa descobrir do que se trata. A
segunda são pequenos desenhos abstratos em volta de uma bússola que se
estende pelo seu ombro direito, descendo até seu cotovelo. Mas é a terceira
que é responsável por eu ter caminhado lentamente até ele e levar minhas
mãos até o seu peito e dedilhar a pequena tatuagem ali.
Minha respiração toma uma nota alta e meu coração se acelera de uma
forma que eu não posso suportar, porque Logan Underwood tatuou uma
bailarina com um par de asas de anjo.
A pequena bailarina se firma em um pé, como se estivesse se preparando
para um giro, e as asas estão abertas, como se estivesse ajudando-a a se
estabilizar. É linda, autêntica e uma verdadeira obra de arte.
Levanto meu rosto para encará-lo e percebo que ele já estava me
observando. Seus olhos não são mais chamas, não tem mais aquela áurea
como a minutos atrás. Seu olhar agora é frio, vazio e doloroso. Como se meu
toque o queimasse, como se eu estivesse quebrando-o e o lembrando do
quão errado somos juntos.
Eu deveria estar aliviada por isso, deveria devolver o olhar. Deveria
dizer algo e caminhar para fora, deixar minhas armaduras me protegerem de
tudo o que isso pode resultar a partir de agora. Mas as palavras haviam
fugido de meus lábios, e mesmo quando ele dá um passo para trás e ergue o
queixo com desprezo, me mantenho quieta.
— Nós já jogamos o nosso jogo sujo, anjo! — A sua face fechou-se dura e
sua mandíbula trava quando ele profere, mas seus olhos me dizem que as
palavras que saem de seus lábios, machucam tanto ele, quanto eu. — Você
não precisa me encarar como se fosse uma princesa em busca de salvação,
porque nós sabemos que não sou seu príncipe em um cavalo branco!
E sem esperar por uma resposta, ele passa por mim, segurando a porra da
sua camisa e some entre os armários. Respiro fundo, me virando e
encostando a testa no armário gelado, tentando fazer um pouco de seriedade
voltar para mim. E depois de minutos que pareceram uma eternidade,
finalmente sigo o mesmo caminho que Underwood, indo em direção ao meu
carro. No caminho, tento me distrair dando um jeito em meu cabelo e chego à
conclusão que apenas um rabo de cavalo serviria naquele momento. Não me
importo com minha aparência hoje, não quando minha mente está cheia de
pensamentos que não devem existir.
Enquanto corro pelas ruas da cidade, minha cabeça está ocupada demais
com o que eu havia visto no vestiário. O que está acontecendo entre mim e
Logan deveria ser apenas uma coisa carnal, apenas uma transa como foi com
todos antes dele. Não deveria ser algo complicado, nem trazer sensações que
eu havia trancado dentro de mim, sob uma barreira inquebrável desde aquela
noite, desde que nós nos quebramos de uma maneira irrevogável. Porém,
agora sinto que entramos em um limiar que pode terminar de ferrar com tudo;
e agora existia essa tatuagem. Porra, esse desenho se fixou em mim, como se
fosse uma marca eterna em mim, não nele. Então uma coisa me vem à
cabeça: ela não pode significar o que estou pensando.
Não, não tem a menor chance. Melany também é uma bailarina, é a garota
que ele protege a qualquer custo, é a sua irmã e com certeza é o verdadeiro
anjo dele.
Não eu, nunca seria eu.
Não quando eu havia despedaçado seu coração por conta de uma
promessa sem sentido algum e que havia o tornado um lugar não habitável.
Mas por que isso ainda dói? Mesmo depois de anos, mesmo sabendo que
isso deveria ser normal, ainda dói. É uma dor insuportável, uma dor que me
conduz por caminhos desconhecidos e que me deixa ser levada como o vento
de uma noite fria de inverno, que arde e fere, que faz parecer que todo o
sistema solar repousou em minhas costas, fazendo com que eu carregue toda
a dor do universo, me lembrando das minhas cicatrizes, aquelas que habitam
minha alma, que doem, doem para um caralho.
Mas nenhuma dessas dores pode se comparar à que sinto quando
atravesso a porta da fraternidade e o vejo. Meus pés se enraízam na porta de
entrada, enquanto todos observam Logan parado ao seu lado com um rosto
nervoso e as mãos fechadas em punhos. O homem ao lado de Underwood
ainda é o mesmo de anos atrás, mas agora seu rosto é envelhecido, seus
traços são duros e cansados, e seu cabelo preto, que antes eram como o de
Logan, agora estão cortados em um corte militar. Sua mandíbula se trava
quando finalmente me vê e seus olhos azuis se tornaram o pior dos icebergs.
Sempre me perguntei o que sentiria quando o visse, sempre me preparei
para gritar, socá-lo ou até mesmo matá-lo, mas nunca imaginei que a única
coisa que viria a minha mente quando o encontrasse, seria a imagem de
Sophie ensanguentada em meus braços, chorando por perder uma parte dela,
por ter seu coração quebrado e por não ter tido a dádiva de gerar seu filho.
Me preparei para tudo, menos pela dor que invade meu corpo.
Aidan Underwood, o irmão mais velho de Logan, o homem que Sophie
amou, o meu verdadeiro significado de pesadelo e o responsável por essa
dor, estava a poucos metros de mim, me levando a lugares escuros, onde não
existe ar, não existe nada, a não ser desespero.
E quando caminho em sua direção, pronta para atacá-lo, eu já não enxergo
mais nada. Não enxergo os universitários rindo e conversando ao meu lado,
as líderes me gritando, jogadores cantando ou meus amigos tentando me
alcançar, me pedindo para me acalmar.
Mas eu não poderia, não quando o pânico já me abraça, não quando tenho
apenas um alvo. E ele não desvia quando minha mão alcança seu rosto,
fazendo com que um enorme estalo ressoe pelo ambiente, finalmente
chamando a atenção das pessoas ao redor. Aidan não se move nos próximos
golpes que desfiro sobre seu corpo, ele não me toca, não diz nada, apenas
aceita toda a minha dor como se compartilhássemos dela.
Cada vez que minhas mãos entram em contato com alguma parte do seu
corpo, uma lágrima escorre pelo meu rosto.
Um soco por Sophie. Um por tudo o que causamos e vários outros para
aplacar a dor que começa a subir pela minha garganta.
É como se eu estivesse liberando toda a dor que guardei por anos,
liberando tudo o que eu senti naquela noite, tudo o que deveria ter feito
quando senti o último suspiro de Sophie, quando precisei abraçá-la enquanto
seu sangue escorria pelo meu corpo, quando a retirei do carro todo destruído
e de como me contou todas aquelas coisas.
É doloroso.
Cruel.
E sei que perdi o controle sobre mim. Quero poder parar, poder me
controlar.
Mas posso sentir a escuridão bater à minha porta, pedindo passagem. E
mesmo que seja errado, eu a recebi e logo após, a abracei.
Se você me disser que está indo embora
Eu facilitarei, vai ficar tudo bem
Se não podemos parar o sangramento
Não temos que repará-lo, não temos que ficar
It’ll Be Okay | Shawn Mendes

O rosto de Aidan está todo arranhado.


E mesmo assim, ele não faz um movimento para afastar Verônica. Meu
irmão aceita cada tapa como se merecesse essa dor, como se ele entendesse
o que Vee está sentindo nesse momento.
E por mais que eu também saiba que ele merece uma parte desse ódio que
ela tenta desferir sobre ele, eu posso vê-la se quebrando, se partindo em
todas as vezes que levanta seu braço e transfere aqueles socos. Então, por
um motivo, por ela, eu apenas seguro sua cintura com cuidado e viro seu
corpo, fazendo com que ele se colida com meu peito, tento protegê-la de
qualquer coisa que possa tocá-la ou machucá-la ainda mais.
Vee é forte, ela se retorce em meus braços, exatamente como fez quando
havia brigado com Analu, mas desta vez, quando ela bate em meu peito
descontroladamente, sou eu quem está tendo um ataque de pânico, e uma
preocupação corre em minhas veias. Eu preciso acalmá-la, preciso que ela
volte à realidade, volte para nós, mas sou surpreendido quando ela ergue seu
rosto e seus olhos âmbares encontram os meus. Eles carregam tanta
escuridão, tanta dor. Me surpreendo quando o pensamento de abraçá-la, de
secar suas lágrimas que descem pelas suas bochechas e morrem perto de
seus lábios, é maior do que qualquer outro sentimento no momento. Suspiro
fundo, tentando me acalmar e não me virar e socar Aidan por ter sido o
responsável por tê-la feito perder o controle de seus sentimentos.
A verdade é que a única coisa que desejo, enquanto olho para a mulher à
minha frente, é destruir todo o mundo apenas por vê-la chorando.
Mesmo que eu tivesse sido um idiota no vestiário, quando ela descobriu a
tatuagem. Foi como se Verônica tivesse me desconstruído novamente,
descoberto todas as minhas fraquezas e isso me assustou, me fez correr para
longe dela. Mesmo sabendo que é imaturo, que eu deveria ter explicado para
ela o significado daquele desenho.
Mas não consegui, tive receio de dar um passo até ela e quebrar o que
estávamos começando a construir. Preferi ser um covarde de merda do que
dar mais um pedaço de mim para ela poder destruir quando tudo ruir
novamente.
— Tire as mãos da minha irmã, Underwood! — Dylan gritou atrás de
mim.
— Não tente encostar um dedo em meu irmão, Blackwell! — Aidan rosna,
dando um passo à frente, limpando os pequenos resquícios de sangue de sua
bochecha.
Verônica e eu estávamos entre os dois, centralizados no meio de uma nova
guerra, uma na qual eu desejava que não acontecesse.
— Calem a porra da boca! — grito sobre os ombros e volto minha
atenção para Vee, as lágrimas ainda descem e o desespero para ajudá-la
percorre sob minha pele. Levo uma das minhas mãos até seu rosto e tento
secá-las, acariciando lentamente o lugar onde elas molham. — Anjo? Olhe
para mim, por favor! — Ela levanta o rosto e o mais profundo dos castanhos
não brilharam em diversão, nem em desdém, em nada. Apenas me encara,
como se ainda não me enxergasse, como se eu fosse um desconhecido. Dei
um passo à frente, colidindo nossos corpos, nos protegendo de todo o caos
que nos rodeia, tentando fazer com que ela voltasse a ser a garota que
brigava comigo por tudo novamente. — Está tudo bem, ok? Nada vai te
machucar.
Ela não responde, apenas me encara enquanto tenta respirar, e quando
seco outra lágrima, uma mão segura meu ombro.
Olho mortalmente por cima e Oliver Wright apenas balança a cabeça em
negação, como se implorasse para que eu não brigasse com ele agora. Mas
eu não faria isso, não quando sei que ele está tão preocupado quanto eu.
Wright pede passagem para que ele e Edmund cheguem perto de Verônica
e mesmo que eu não queira soltá-la, que eu deseje apenas mantê-la em meus
braços, segura e confortável, e por mais que fosse difícil pra caralho me
afastar dela, dou um passo para trás, dando espaço suficiente para Edmund
chegar até sua irmã. Porque sei que ela precisa dos irmãos e do seu melhor
amigo.
Assim que paro ao lado de Levi, que olha preocupado para Vee, levo uma
das mãos até meus cabelos, frustrado, e me viro para finalmente observar a
sala, que agora está praticamente vazia. Ergo uma sobrancelha em confusão
para Josh, que está do outro lado da sala, com Summer em seus braços, que
olha para sua melhor amiga e deixa uma lágrima descer em seu rosto
preocupado. Ele aponta com o queixo para onde Mike e todos os outros
jogadores estão expulsando os convidados, como se quisessem que esse
momento fosse apenas de quem esteja realmente envolvido e não para gerar
uma nova fofoca em todo o campus no dia seguinte.
Burhan volta o seu olhar para o meu e aponta com a cabeça para Vee,
suspirando profundamente, ele mexe os lábios sem emitir nenhum som:
— É por ela, não pelo merda do seu irmão!
Quando aceno com a cabeça, ele apenas some para o segundo andar,
seguido de outros jogadores. Mike muitas das vezes pode ser um babaca,
mas sei que se preocupa com Blackwell desde que éramos adolescentes. E
sou grato por isso, sempre seria. Quando volto meu olhar para a minha
frente, para a única pessoa que realmente me importa nesta sala, observo
Edmund chegar perto o bastante dela e a puxar para um abraço, um daqueles
que são protetores e cuidadosos, daqueles que significa que ele destruirá o
mundo se isso for necessário para ela ficar bem, como se tivesse medo de
que sua irmã se quebre mais do que acha que está quebrada.
— Vee, está tudo bem... — Ed sussurra, enquanto a aperta contra o peito,
afagando seus cabelos. — Lembre-se, respire profundamente e inspire
lentamente.
Ela o faz. Durante alguns segundos, Verônica apenas repete o movimento,
como se finalmente estivesse retomando o controle de suas próprias ações. E
quando se sente um pouco melhor, ela deita a cabeça no peito de seu irmão,
ficando alguns minutos em silêncio, tomando coragem para encarar o que
vem a seguir. Mas assim que se afasta de Ed e fecha os olhos, respirando
novamente, juntando todas as suas forças, sei que a sua pior versão está
vindo à tona, tomando cada parte do seu corpo, construindo muralhas ao seu
redor, fazendo com que ela voltasse a ser a mulher fria e calculista que eu
tanto odeio.
Oliver caminha até onde estou e cria uma barreira entre nós dois, como se
estivesse protegendo-a de mim e de Aidan, mas isso não é necessário, não
quando ela se sentiu confiante o suficiente para encarar meu irmão.
Seus olhos ainda estão vazios, mas desta vez são mais que isso, há todos
os sentimentos ruins que alguém pode sentir.
— Vocês destruíram minha família uma vez e eu fiz o mesmo com vocês, e
não desejo que aconteça de novo! — declara e me surpreendo por ter me
incluído na frase, porque por um momento eu me esqueci que estamos em
posições opostas. — Então, Underwood, não entrem em meu caminho, não
testem o limite da minha raiva, porque o que eu já tirei de vocês é o mínimo
do que realmente posso fazer e realmente não quero isso! — Ela volta seu
olhar para mim, é intenso e misterioso, como se estivéssemos nos engolindo
em um oceano profundo, e por um momento eu quis ler tudo o que ronda em
suas íris escuras. — Não quero mais viver neste ciclo infantil, não quero
mais me vingar e nem ter que olhar para vocês, porque eu fiz uma promessa
a uma garota, eu prometi coisas que há anos não fazia e se preciso passar por
cima de vocês para cumprir, eu passarei!
Eu não sei o significado dessa frase, mas sei que cada palavra que havia
proferido é verdade.
Porque Verônica Blackwell não faz promessas vazias. Não, ela sempre
cumpre cada sílaba que sai de sua boca.
Eu e minha família somos a prova viva disso, e mesmo que suas palavras
cortem o meu peito na mesma medida que seu choro escorre pela sua face, eu
sei que não jogaria mais esses jogos.
Com relutância, dou um passo para trás até ficar ao lado de Aidan,
fazendo com que Verônica, Edmund e Dylan ficassem frente a frente a mim e
meu irmão, como um campo minado sendo desbravado em uma batalha
sangrenta, daquelas que sabemos que apenas um exército sai vivo. E então
percebo que isso não me importa, o que me importa é saber se a garota à
minha frente, que agora tem os olhos vulneráveis e as bochechas vermelhas,
está bem. Se o ataque de pânico havia passado e se ela precisa de algo para
que se livre da dor.
Meus batimentos cardíacos se aceleram quando percebo o que está
acontecendo. Eu ainda me importo com Verônica Blackwell. Ainda que eu
saiba que é errado. Eu me importo, porque ela havia me marcado, havia
carimbado a porra do meu coração.
E mesmo que eu saiba que deveria odiá-la, eu não poderia, eu nunca
poderia.
Encarei Vee mais uma vez e seus olhos brilharam em minha direção.
Olhos cheios de mistérios, sentimentos e escuridão. E eu quis entrar
novamente naquele ambiente, quis fazer morada ali, mesmo sabendo que é
impossível.
Porque por mais que eu e meu anjo sejamos a porra de almas gêmeas um
do outro, nós somos e sempre seremos péssimos em amar.
— Vamos embora! — profiro, soltando um suspiro doloroso e encaro meu
irmão mais velho. — Agora, Aidan!
Ajeito minha postura e encaro meus amigos que estão do outro lado da
sala, preparados para intervirem caso um de nós cinco comece uma briga
novamente. Mas Dylan apenas segura os ombros de Vee e a puxa para trás,
fazendo com que eu liderasse o trajeto até a saída. Com um último olhar para
ela, caminho atrás de Aidan até a calçada e decido que lidarei com esse
sentimento conturbado outra hora.
Caminhamos lentamente até meu carro e meu irmão é o primeiro a deslizar
para dentro dele, mas quando decido fazer o mesmo, alguns passos soam
atrás de mim. Viro meu corpo lentamente em direção ao barulho de cascalho
sendo chutado e ergo uma sobrancelha para a forma esguia de Dylan
Blackwell à minha frente. A camisa branca está escondida por baixo de um
casaco de frio preto e suas calças são da mesma tonalidade, me lembrando
de como sua irmã ama essa cor.
Ele caminha lentamente até ficar a alguns centímetros longe de mim.
Percebo Aidan se remexer no banco do carona, quando o primogênito dos
Blackwell lhe lança uma careta de nojo. Contudo, apenas me limito a acenar
para que fique onde está. Não preciso lidar com mais uma merda que o
envolva. Dylan apenas suspira fundo e passa as mãos em seus cabelos,
bagunçando-os.
— Eu realmente não queria ter o papo de irmão mais velho com você,
Underwood! — profere enquanto cruza os braços frente ao corpo.
— Nunca achei que fosse necessário, Blackwell! — declarei enquanto
imito o seu gesto.
— Bom, agora é! Fique longe de Vee — esbraveja e seus olhos se
estreitam.
— Acho que Verônica é adulta o suficiente para decidir quem ela quer por
perto ou não! — Observo com um incômodo. Dylan pode ser irmão mais
velho de Verônica, mas isso não significa que ele pode escolher quem fica
perto dela.
— O problema, Underwood, é que vocês dois são como a porra de uma
bomba relógio que pode explodir a qualquer momento! E eu não me sentarei
e observarei minha irmã se auto destruir novamente porque sente algo por
você! — Os olhos de Dylan não emitem nada além de uma preocupação
genuína por Vee. — Então darei apenas um aviso: Fique-longe-de-Verônica.
Eu deveria concordar com ele, não é? Deveria saber que Verônica e eu
juntos sempre seríamos a pior síntese. Mas por que algo dentro de mim grita
que ele está errado? Que mesmo que alguma merda possa vir a acontecer, eu
e Vee devemos enfrentar juntos, e que mesmo que nós nos tratemos como um
jogo sujo, com a desculpa de que estamos apenas usando nossos corpos para
aplacar essa necessidade que cresce dentro de ambos todas as vezes que nos
encontramos?
Eu não posso ficar longe dela, longe do meu anjo, mesmo que quisesse,
mesmo que fosse certo, mesmo que ainda sinta uma dor por tudo o que
fizemos um com o outro.
— Você sabe que eu não irei conseguir! — digo verdadeiramente.
— Você não a conhece, Logan! — Suspira, exasperado. — Não sabe quão
machucada ela está desde a morte de Sophie, não sabe nada sobre ela a não
ser o que ela mostra a todos. Então, por favor, pare de imaginar que ainda
está em frente a garota que um dia namorou, pare de pensar que isso pode
dar certo!
— Você tem razão em uma coisa, Dylan: eu não estou em frente a garota
que um dia namorei. — Sorrio fraco. — Mas isso não significa que todos os
fragmentos de quem um dia ela foi não estão mais lá! Ao contrário,
Blackwell, eles estão esperando que alguém pare de tratá-la como um vidro
que se estilhaça a todo momento, como vocês fazem, e a ajude se tornar
quem um dia já foi.
— Como quer ajudá-la se está tão quebrado quanto ela?
— Somos corações quebrados, Dylan! — Sorrio abrindo a porta do meu
carro. — O que significa que a minha parte se encaixa na dela!
É verdade, nós sempre iremos nos encaixar, mesmo que o passado não
esteja a nosso favor.
Um coração partido é tudo o que restou
Eu ainda estou consertando todas as rachaduras
Perdi algumas peças quando
Eu o levei, o levei, levei para casa
Arcade | Duncan Laurence

4 anos antes

Subo lentamente as escadas que ligavam os vestiários e o teatro de Saint


Vincent College, escutando as batidas do meu coração. Algum tipo de música
tocava no palco, indicando que as apresentações já estavam acontecendo.
Pessoas passavam por mim, sorrindo, me desejando sorte. Eu apenas sorria,
um sorriso automático, treinado por anos. Antes que eu pudesse chegar ao
patamar da escada, ela apareceu. Seu cabelo, que antes era castanho escuro
como o meu, agora tem o tom de ruivo acobreado, estava preso em um
penteado elaborado, trajando um figurino vermelho, composto por um
collant cheio de cristais, e nos braços, um tule transparente, parecendo que
sua pele brilhava, a saia rodada. Nós pés, a sapatilha vermelha. Sophie
estava linda, mas no seu rosto não havia felicidade, lágrimas se acumulavam
nos seus olhos e quando me viu, correu até mim e me abraçou. Era um
abraço com um sentimento diferente, como se fosse uma despedida, e por
algum motivo eu a abracei mais forte ainda, tentando mostrar que eu estava
ao seu lado, que sempre estaria, independente de tudo e todos. Quando me
afastei um pouco, sem deixar de soltá-la, a encarei, não havia mais aquele
brilho que esteve sempre lá. Em meio ao choro, existia uma Sophie
diferente, machucada, uma versão da minha irmã que jamais havia visto, uma
versão quebrada. E soube, naquele momento, que algo não estava certo.
— Não vou conseguir me apresentar, Vee... — Ofega entre as lágrimas.
— Por que não, Soph? — Levanto uma sobrancelha. — Você se dedicou
tanto a isso.
— E-eu...eu só… Não posso — gagueja. — Consiga esse troféu, ok? Por
mim, por nós, Vee!
— Verônica, é a sua vez. — A voz de nossa coreógrafa nos assusta,
fazendo com que nos afastemos uma da outra. — Seu parceiro já está te
esperando.
— Me espere no vestiário, assim que eu terminar, resolvemos o que quer
que tenha acontecido! — sussurrei.
— Vee? — Ela me chama e eu me viro novamente para seu rosto que está
inundado de lágrimas.
— Me desculpe pelas nossas últimas brigas, eu estava apenas te
protegendo! — ela confessa quase que em um sussurro.
— Sempre juntas, certo? — digo. Ela sabia que essa frase sempre seria o
nosso elo, sempre mostraria que poderia acontecer qualquer coisa, porém,
sempre estaríamos juntas.
— Sempre.
Podia sentir seu medo, eu deveria ter largado tudo e ter ido com minha
irmã. Uma premiação não era mais importante que seu bem-estar ou mais
importante que qualquer um dos meus irmãos, porque por eles, eu faria
qualquer coisa. Aquelas três pessoas, eram toda a minha força, meu coração,
a minha vida. Porém, sabia o que aconteceria se uma de nós duas não
conseguisse ganhar. Se ela não se apresentasse, eu não teria opção a não ser
ir e ganhar aquele troféu. Por ela, por mim, por todos nós.
Olho para trás pela última vez, buscando minha irmã, mas ela já não
estava mais lá. Quando finalmente cheguei às divisórias do palco, Logan
estava do outro lado, próximo a Josh, que segurava uma guitarra, e a Levi,
que caminhava até a bateria colocada no lado esquerdo do palco. E fiquei
sem saber o que aqueles dois estavam fazendo ali, meus ensaios não
envolviam Levi e Josh, era somente Logan e eu. Levantei uma sobrancelha
em questionamento para meu namorado, ele sorri se posicionando no lugar.
Assim que todos estavam prontos em suas marcações, me olharam,
esperando a confirmação de que poderiam começar, respirei fundo e acenei
positivamente.
Pela última vez, o olhar de Logan queimava em mim, como se quisesse
transparecer tudo o que sentia naquele momento.
A primeira batida da bateria ressoou no grande teatro, depois podia-se
ouvir os acordes da guitarra dando finalmente vida à música, a melodia
perfeita. Logan me olhou de canto e deu um pequeno sorriso, aquele que
sempre me dava quando precisava me encorajar a fazer algo, aquele que
dizia que estaria sempre ao meu lado.
Logan Underwood sabia que eu não estava bem, sabia que eu precisava
daquilo, ele me passou confiança. Olhei nos fundos dos seus olhos azuis, e vi
o amor, a sincronicidade, a intensidade.
Quando sua voz finalmente invadiu todo o espaço, eu comecei a dançar.
Meu corpo se movia em perfeita sincronia com o som rouco de sua voz
emitida por todos os cantos daquele teatro. Éramos como fogo e gasolina,
como um fósforo e o pavio, como um jogo perigoso.
Eu podia sentir seus olhos queimando toda a minha pele, enquanto eu
abaixava, girava e pulava. A sensualidade estava presente desde sua voz
rouca, até meus movimentos coreografados.

Um coração partido é tudo o que restou. Eu ainda estou consertando


todas as rachaduras

A letra de Arcade, de Duncan Laurence, dizia. Eu o encarei, porque


mesmo que naquele momento não soubéssemos, aquilo era verdade. A sua
voz e a minha dança hipnotizavam todo o público. Éramos o centro da
atenção. Era como se existisse apenas nós dois naquele teatro. Cada palavra
dita, cada nota tocada, era como se fosse destinada a nós. Eu me sentia
única, desejada.

Eu gastei todo o amor que eu guardei


Sempre fomos um jogo perdido
Garoto de cidade pequena em um grande fliperama
Eu me viciei em um jogo perdido

Naquele momento, esqueci os problemas que me rodeiam e todos nossos


problemas pessoais, esqueci tudo, apenas enxergava seus olhos brilhantes e
sua voz.

Tudo que eu sei, tudo que eu sei. Amar você é um jogo perdido

A sua voz rouca fazia todos prestarem atenção, ela hipnotizava qualquer
um. E quando andou até onde eu estava, se posicionou à minha frente e
cantou apenas para mim, observando cada passo, sussurrando promessas que
sabíamos que nunca poderiam ser cumpridas, todos entenderam, todos
sentiram.
Éramos a própria química juntos. Éramos um misto de ódio e amor,
substâncias que não se misturavam, mas se completavam. Éramos o nosso
próprio paraíso caótico. E quando terminamos, estávamos suados,
esgotados, mas sorrindo um para o outro.
— Desculpe por ser tão babaca — Logan sussurrou, colando nossas
testas. — Eu não te mereço, mas não consigo me afastar de você, anjo.
Mesmo que eu tente, mesmo que eu saiba ser o certo a se fazer, é como se o
universo me puxasse de volta para você, porque você, Verônica Blackwell,
você é a minha casa, a melhor parte do meu dia e dessa maldita cidade.
— Eu amo você, Logan! — Me aproximei, deixando um beijo rápido em
seus lábios. — É você quem sempre vou escolher, não tente me afastar,
porque encontraremos sempre o caminho de volta um para o outro.
Naquele momento, antes que toda adrenalina fosse embora e a dor
voltasse, eu acreditei que eu e ele éramos para sempre, mesmo sabendo, lá
no fundo, que nada dura tanto tempo assim. E quando nos entregaram o troféu
e uma coroa de rei e rainha, nós gargalhamos juntos. A única coisa que nos
fez cair finalmente na realidade, foi o flash de uma câmera capturando a
nossa melhor foto.
Mas o que não sabíamos, era que realmente éramos o rei e a rainha de
Saint Vincent e aquela seria a última vez que reinaríamos juntos e que nunca
teríamos tempo para comemorarmos a nossa vitória juntos, porque quando
tudo terminou e a bolha de felicidade que nos envolvia se foi, a realidade
bateu com força. E a única coisa em que eu pensava, era em Sophie. A forma
como me abraçou e as coisas que me disse me deram um calafrio, até
parecia que ela queria se despedir. Todo o sentimento positivo havia sumido
e agora eu estava totalmente apavorada, não sentia nada mais a não ser isso.
E por isso eu o larguei em cima do palco e corri até meus irmãos,
explicando o que aconteceu momentos antes. Podia ver o misto de confusão e
medo invadir o semblante de cada um deles.
Olhamos todas as alas do colégio e nenhum sinal de nossa irmã, a não ser
sua mochila, jogada sobre uma mesa na biblioteca. E no meio de todo o
desespero que corroía meu corpo, disparei entre os corredores até o lado de
fora, como se minha vida dependesse daquilo, na esperança de que ela
estivesse lá, mas a única coisa com que me deparei, foi com uma tempestade.
A chuva caía com força total e o vento era tão forte que fazia as árvores
próximas ao estacionamento chacoalharam. Não me lembro de ter visto
tamanha tempestade em Saint Vincent.
Sophie podia ser dramática quando queria, mas eu sabia que não estava
chateada por não ter vencido o show de talentos, era algo pior. Conseguia
sentir o desespero que emanava dela quando me abraçou, e por algum
motivo, sabia que naquele momento ela havia ido atrás da pessoa que
guardava os seus segredos, da pessoa responsável por ela andar tão estranha
nos últimos dias. E o que me deixava aturdida, era que ninguém sabia quem
era essa pessoa, quem havia conquistado o coração da minha irmã.
Quando me dei por vencida, caminhei até onde meus irmãos e meus pais
estavam, vendo Logan do outro lado do salão, balançando a cabeça em
negação ao encontrar meus olhos. Sua resposta me fez xingar baixinho.
Sophie era tudo para minha família. Era a garota otimista, a que
adicionava beleza em tudo que tocava. Era o nosso porto seguro, a irmã que
nos tirava do quarto quando a tristeza invadia, a quem eu recorria quando
precisava de ajuda, minha melhor amiga. A minha maior ligação de sangue.
Quando meu celular tocou, todos os olhares se voltaram para mim. E um
frio rapidamente subiu pela minha espinha quando encarei o nome no meu
visor. Sophie. Um alívio percorreu todo meu corpo e pude respirar por
alguns segundos.
— Sophie? — murmurei, passando as mãos pelo meu cabelo, tentando
conter o nervosismo.
— Verônica! Agh, suponho que preciso de uma bebida ainda mais forte!
— ela zombou e um barulho de vidro se chocando contra algo ecoou em meu
ouvido — Você consegue uma garrafa para mim, talvez tequila, você gosta
de tequila, não gosta?
— Onde você está? — pergunto, puxando meus irmãos para uma sala
vazia perto de onde estávamos. — O que aconteceu?
— E-ele me usou, Vee. — A sua voz saiu dolorosa, como se estivesse
chorando. — Aquele babaca me usou. E o pior é que Logan me disse para
não me envolver com ele, ele me pediu para que não me envolvesse com seu
irmão.
— Soph, do você está falando? — digo cautelosamente. — Me diga onde
você está, nós podemos te ajudar.
— Não preciso de ajuda, eu preciso de uma bebida! — Sua voz saiu
falhada. — Você sempre foi a gêmea perfeita, sabe? Melhores amigos,
melhores notas, melhores coreografias e agora tem o melhor irmão.
— Soph, você está bêbada… — sussurro com a voz embargada de medo.
— Deixe-me te ajudar.
— Eu já disse que não preciso de ajuda, Vee, eu preciso apenas esquecê-
lo! — ela vocifera. — Eu estarei em casa logo.
Antes que pudesse dizer algo, ela desligou, o pânico se estendeu por toda
a minha pele, fazendo com que eu passasse as mãos sobre meu rosto
enquanto tentava controlar minha respiração, eu não precisava de um ataque
de pânico naquele momento. Eu precisava estar bem, minha família
precisava de mim, minha irmã principalmente. Ergui meus olhos para meus
irmãos, a minha voz falhou um pouco quando disse:
— E-edmund, preciso que rastreie o celular de Sophie. — Percebo sua
cara de confusão. — Agora, por favor!
— O que aconteceu, Vee? — Dylan aperta meus ombros, preocupado.
— Sophie… ela está bêbada, ela… — Deixo uma lágrima escorrer. — Eu
acho que ela vai fazer alguma besteira, Dylan.
— Fique calma, vamos no meu carro. — Ele aponta para a porta e a visão
de nossa mãe sorrindo para o diretor fez com que outra lágrima descesse
pelo meu rosto. — Eles não podem saber, não agora pelo menos.
Corremos em direção ao estacionamento, sem nos importarmos com os
gritos de nossos amigos. E quando finalmente paro em frente a Land Rover
de Dylan, deslizo para o banco do motorista. Eu era a melhor motorista entre
nós três, mas minhas mãos tremiam em um nível insuportável e eu sabia que
pela primeira vez, não estava em condições de dirigir. Então, quando Dylan
trocou de lugar comigo e assumiu o controle, não o impedi.
Durante todo o caminho, meu coração dizia que algo estava errado,
principalmente quando Ed nos mandou entrar pela rodovia principal, onde
era considerada a divisa entre a parte alta e a parte baixa de Saint Vincent. A
chuva estava nos impossibilitando de enxergar claramente, mesmo assim,
consegui ver o carro do outro lado da pista. Era como o que ela havia
ganhado de presente há alguns meses atrás em nosso aniversário de dezoito
anos, a pintura branca se destacava entre a escuridão, mas ele não estava
normal, ao contrário, estava totalmente destruído, como se tivesse capotado
diversas vezes. Eu orei para que não fosse o dela, pedi que aquilo fosse um
pesadelo e quando abrisse os olhos, minha irmã estaria deitada em meu colo
naquele sofá que ela sempre amou, me contando como Emmy havia acabado
com ela nos ensaios e que quando tirássemos férias, a primeira coisa que
iria fazer, era sair de Saint Vincent.
Mas quando abri a porta do nosso carro e caminhei até o lado de fora,
atravessando a pista entre as gotas de chuva que me molharam
instantaneamente, vi o adesivo da dançarina que colamos há algumas
semanas no vidro traseiro. Era ele. Era o carro de Sophie. O carro da minha
irmã.
— Sophie! — Nós três gritamos em uníssono com todas as nossas forças.
Era difícil enxergar o caminho entre as lágrimas enquanto corria, era mais
difícil ainda correr e escutar o soluço de meus irmãos ao meu lado, mas foi
mais difícil ainda, me abaixar ao lado da janela do motorista e ver minha
irmã quase sem vida, o sangue escorria por todo o seu rosto. Dylan lutou
contra a porta do motorista para conseguir abri-la, mas eu consigo atravessar
a janela quebrada, alguns vidros rasgam minha pele, mas ignoro a dor. Eu
precisava salvá-la, essa era a minha prioridade.
— S-sophie? — sussurro entre as lágrimas quando alcanço seu corpo. —
Por favor, fale comigo, Soph.
— Vee? — Escuto seu choro doloroso. — V-você me encontrou.
— Eu sempre irei te encontrar, Soph! — Estendo a mão até seu rosto. —
Sempre juntas, lembra?
— Eu preciso te contar. — Fungou enquanto estendia a mão até o meu
rosto. — Você merece saber de tudo.
— Você terá todo tempo do mundo para me contar as coisas. — Levo
minha mão, tirando alguns pedaços de vidro de seu corpo. — Mas me deixe
te ajudar, não se mova, ok?
— Vocês precisam sair daqui Vee. — Ela aponta para onde a gasolina
estava começando a escorrer e o fogo se aproximando. — Não posso correr
o risco de perder vocês por uma estupidez minha.
Eu sabia que tirá-la de dentro daquele carro poderia ser perigoso, mas se
ficássemos ali, poderíamos morrer caso tudo explodisse. Respirei fundo,
olhando para trás, pedindo ajuda de um dos dois. Levei minha mão até a
trava da porta do motorista e com muito cuidado a abri. Dylan se abaixou,
me ajudando a soltar o cinto de Sophie e a pegou no colo, levando-a para
fora, enquanto Ed segurou minha mão e me puxou delicadamente para que eu
não me machucasse com os vidros estilhaçados por todo o carro. Quando
finalmente conseguimos nos afastar do carro que agora estava em chamas, eu
me sento no chão, colocando a cabeça de Soph no meu colo e me permito
suspirar em busca de ar.
Olho para cima e vejo que Dylan agora está xingando ao telefone e
Edmund está totalmente paralisado. Ele balança a cabeça, voltando à
realidade, e corre, se abaixando ao meu lado. Observo as lágrimas
escorrerem pela face do meu irmão caçula, o menino de dezesseis anos que
não deveria presenciar cenas como estas.
Soph tosse e abre seus olhos lentamente. Percebo o quão fraca está, quase
não conseguia se manter acordada. Encarei nossas roupas, ainda estávamos
vestidas com a mesma roupa da apresentação, mas dessa vez, não era apenas
a dela que estava tingida de vermelho. Um vermelho que agora manchava
não só nós duas, mas toda a camisa branca de Dylan. Meu irmão mais velho
caminhou até onde eu estava sentada abraçada à nossa irmã e se abaixou,
passando a mão pelo cabelo dela.
— Papai e mamãe estão vindo e chamei uma ambulância — Dylan
sussurra — Nós podemos levá-la, seria mais rápido.
Se a movermos naquele momento, poderíamos causar uma fratura ou algo
pior, então nego com a cabeça, pedindo aos céus que aquela maldita
ambulância chegasse logo.
— Vee? — escuto Sophie. — Eu vou morrer.
— Não, Soph, você não vai. — O terror ultrapassou o meu rosto. — Eu
me recuso a perder você, Sophie Blackwell, então não me diga isso.
— Vee, fique tranquila...V-você — Ela sorri e então uma crise de tosse a
faz parar de falar. — Você se lembra de quando roubamos a primeira garrafa
de tequila da adega?
— Ed se cagou inteiro — Dylan diz enquanto se senta ao meu lado e
continua acariciando seu cabelo. — Vee precisou de um esforço extra para
distrair nossa mãe.
— Aquilo não foi fácil, ela ficou falando de tecidos e leis o tempo todo
— resmungo, sorrindo entre as lágrimas.
— Eu lembro que no outro dia... tínhamos que fingir não estar de ressaca.
— Ela gargalhou e logo em seguida fez uma careta de dor. — E durante todo
o almoço no colégio, ninguém chegava perto de nós quatro, por medo de
nossas expressões sombrias.
— Éramos como zumbis naquele dia, Soph, ninguém gostaria de estar
perto de nós — Ed diz, fazendo uma careta.
— Era assim que éramos felizes, Ed! — ela retrucou. — Quando as
pessoas não chegavam perto do nosso ciclo, não tinham o poder de nos
destruir.
— Onde você quer chegar com isso, Soph? — Ed a encarou, as lágrimas
desciam pelo seu rosto, se misturando às gotas da chuva.
— Eles nos destruíram, destruíram o que tínhamos sem nem ao menos
lutarmos. — Uma lágrima desce pelo seu rosto. — Eu sempre soube que
quando deixássemos alguém entrar em nossas vidas, algo aconteceria, mas
nunca imaginei que eu pagaria o preço por isso.
— Soph… — Dylan hesitou.
— Quero que me p-prometam uma coisa.
— Qualquer coisa — digo, ignorando a sensação de que o que ela estava
prestes a dizer não era algo bom.
— Aidan. Aidan Underwood. — Ela faz uma careta de dor. — Ele tirou
algo de mim, sem eu ao menos o conhecer, ele nem nasceu, Vee…
Sua voz era dolorosa, mas não era algo físico, era algo a mais. Então eu
finalmente entendi o que ela estava dizendo.
— O que ele tirou de você, Sophie? — pergunto suavemente, temendo a
resposta.
— A pessoa que teria todo o meu coração. — Vejo a tristeza em seu olhar.
— Ele me tirou o meu filho.
— Sophie... — Passo a mão pela sua testa, tirando o excesso de água.
— Eu descobri antes do show de talentos, fiquei apavorada — diz com
dificuldade. — Por isso abandonei a competição e corri para a casa dele...
— Eu vou matar aquele desgraçado! — Escuto Ed atrás de mim.
— Mas quando cheguei lá, ele estava com outra, Vee. — Percebo que sua
voz está cada vez mais baixa. — E ele riu da minha cara, ele disse que
jamais me amou, que a intenção dele era apenas provocar Logan… Eu saí de
lá desesperada e te liguei, mas quando desliguei, eu senti, Vee… — Ela
deixa um soluço doloroso. — O sangue descendo pelas minhas pernas, eu o
senti indo embora, Verônica.
Eu não sabia o que ela me pediria, mas sabia que eu destruiria cada
pessoa que atravessasse meu caminho até Aidan. Porque eu o destruiria, nem
que fosse a última coisa que eu fosse fazer na vida. Nem que isso soasse
infantil ou coisa de outro mundo. Pela primeira vez, eu usufruirei do
sobrenome da minha família, eu faria com que ele sofresse.
— E o que você quer que eu faça, Soph? — digo, a encarando.
— Destrua-o. — Ela diz com dificuldade. — Tire tudo o que ele ama!
— E o que ele mais ama? — Ergo a sobrancelha.
— Sua família... — ela diz quase sem conseguir.
Quando as palavras saíram de sua boca, eu compreendia que destruir
Aidan, seria destruir Logan. Eu estaria pronta para pagar o preço? Estava
pronta para perder Logan à custa de uma vingança? A resposta era simples,
eu nunca estaria pronta. Eu nunca conseguiria machucá-lo verdadeiramente,
mas isso não deixava de doer, porque eu precisava tomar aquela decisão,
mesmo que significasse perder tudo o que tínhamos. Entre ele e minha
família, eu sempre escolheria as três pessoas ao meu lado.
— Eu irei fazer isso, Soph. — Encarei meus irmãos por um momento. —
Eu irei...
Ela apenas acenou e depois soltou um sorriso para cada um de nós. Sua
mão foi até meu rosto e dedilhou cada curva dele, como se estivesse
memorizando cada detalhe para que levasse junto a ela.
— Sempre juntos, ok? — ela pergunta.
— Sempre! — respondemos juntos.
— Eu amo tanto vocês — Soph sussurra quase sem voz. — Me perdoe por
abandoná-los.
Paro por alguns segundos, tentando entender o que aquilo significava,
então vejo seus olhos se fecharem lentamente e um som de sirene invade o
ambiente. Minha única reação foi gritar. Meus irmãos choravam de uma
maneira que me quebrava ainda mais, não estava certo. Ela não poderia
partir dessa maneira, ela não podia me deixar aqui. E por isso gritei seu
nome, perdendo todo o controle do meu corpo.
Grito por ela estar machucada.
Grito porque ela não estava acordada.
Grito porque não consegui salvá-la.
E quando não havia mais forças para gritar, eu deixei que todas as minhas
lágrimas terminassem de cair. Estava em estado de negação, não conseguia
assimilar quando os médicos finalmente chegaram, nem quando Dylan me
pegou no colo e me tirou de cima do corpo de Sophie, sussurrando para que
eu me acalmasse, que tudo ficaria bem. Eu sabia que nada ficaria bem, a
minha irmã morreu em meus braços, eu não podia deixar que a levassem. Eu
vi minha mãe cair de joelhos, chorando, e depois nos abraçar, como se
tivesse medo de que acontecesse o mesmo com um de nós três. E só me
acalmei quando um dos médicos injetou algo em meu braço, me fazendo cair
sobre os braços fortes de meu pai, que pela primeira vez me segurou como
se eu fosse a peça mais preciosa que ele tivesse.
E quando acordei novamente, eu não me lembrava de como chegamos ao
hospital, não me lembrava como cheguei aquele quarto. Eu apenas caminhei
em direção ao corredor, seguindo o barulho das pessoas correndo, das
enfermeiras assustadas e só me dei conta de que estavam assim porque
minha irmã estava ali.
Caminhei em direção onde aquelas pessoas saíam e entravam
desesperadamente, eles estavam tão ocupados que não me enxergaram
entrando. A primeira coisa que vi foi a mão de Sophie caída ao lado de seu
corpo, vi os médicos gritando para ela não desistir. Eu queria correr e gritar
para ela voltar para nós, que precisávamos dela, mas meu corpo não tinha
reação.
— Recarregue — uma voz feminina gritou.
Ela era calmaria, a minha calmaria.
— Afaste.
Era um passo perfeito de uma coreografia bem ensaiada.
— Tente mais uma vez — a médica diz quase esperança.
Ela era protetora com os seus.
— Recarregue.
E gentil com os outros.
— Afaste.
Ela era luz.
— Recarregue.
A minha luz. E eu havia a perdido.
— Hora do óbito: duas horas e oito minutos da manhã.
Sophie Blackwell era apenas uma lembrança. E, agora, uma promessa.
E quando minha ficha caiu, eu desmoronei. Caí de joelhos em frente à
maca e gritei sobre seu corpo ainda quente e sobre nossas roupas
encharcadas de sangue. Eu não podia aceitar. Eu não queria aceitar, que a
única coisa que restava de Sophie era uma promessa feita.
Quando Dylan e Ed me tiraram daquela sala, eu sabia que também
estavam no mesmo estado que eu. Dylan me abraçou fortemente quando
chegamos ao estacionamento, nós desabamos no chão molhado. Os braços do
meu irmão mais velho me seguravam com força, enquanto Ed se abaixou à
minha frente e segurou meu rosto, procurando pelos meus olhos e sussurrou:
— Eu preciso que você seja forte, Vee! — Ele retirou uma mecha do meu
cabelo do meu rosto. — Seja forte, por ela, por nós.
Eu não era forte, não conseguia ser. Naquele momento, eu só precisava da
minha irmã, precisava chegar em casa e saber que ela ainda estaria lá.
Não conseguia encontrar mais forças, eu precisava voltar para dentro,
precisava obrigá-los a salvá-la.
De repente, meus olhos focaram sobre os ombros de Ed. Toda a minha
falta de controle se passou, uma frieza que nunca antes tinha tido, cresceu em
meu peito e quando me levantei secando as lágrimas e caminhei até onde ele
estava, senti tudo o que eu não deveria sentir. Eu o vi, admirei pela última
vez. Eu olhei para Logan, assustado na porta do hospital, com as roupas
encharcadas, e eu desejei que ele não tivesse me conhecido, que ele não
fosse um Underwood, porque eu estava prestes a destruí-los.
Ele me encarou com o rosto preocupado. Num primeiro momento, quis
correr até seus braços, deixar que me consolasse, mas ele havia mentido
para mim. Enquanto eu estava tentando fazer com que nosso relacionamento
desse certo, mesmo que nossas realidades fossem diferentes, Logan sabia
que seu irmão estava usando minha irmã e não fez nada, apenas sentou e
esperou que toda a merda acontecesse.
Naquele momento, eu me lembrei do porquê que eu não podia deixar que
aquela dor me dominasse totalmente, não agora, não quando eu ainda tinha
coisas a fazer, para cumprir tudo o que havia prometido à minha irmã.
Suspirei fundo e caminhei até ele, cada passo era como se alguém estivesse
ficando uma estaca no meu coração. O sentimento de luto e traição corroía o
que havia de bom dentro de mim.
— Você sabia? — rosnei friamente, mesmo que já soubesse a verdade,
mas precisava escutar de sua boca.
— Verônica… — Sua voz era regada a dor.
— Você sabia que seu irmão estava usando minha irmã? — grito.
Silêncio. Era a única coisa que fluía do garoto à minha frente.
— Diga a verdade, Logan. — Uma lágrima escorre, mesmo que meu rosto
ainda parecesse uma pedra de gelo. — Por favor.
— Sabia... — Uma lágrima também desceu do seu rosto. — Eu estava
com medo de te contar…
— Por que você não me contou, Logan? — questiono, passando a mão
pelo meu rosto e o sujo de sangue. — Por que me deixou no escuro? Por quê,
Logan?
— Porque... — Ele hesita, Logan nunca hesitava. Mesmo que fosse o pior
dos acontecimentos, ele sempre era honesto comigo.
— Você não vai me contar? — Minha voz sai dolorosa, quase um sussurro
inaudível contra o barulho da chuva.
— Eu... não posso — ele diz, deixando que uma lágrima descesse pelo
seu rosto. — Se eu fizer isso… Eu não posso, anjo, eu sinto muito!
— Eu já esgotei minha cota de perdão em relação às suas atitudes, Logan.
— Coloquei para fora, engolindo o choro. — Perdoei todas as vezes que sua
insegurança pelas nossas realidades foi maior que o sentimento que tínhamos
um pelo outro, perdoei quando me tratou como lixo todas essas semanas, e
estive ao seu lado quando ninguém mais esteve. Eu te escolhi, Underwood!
Não Aidan, não Mike, ninguém, apenas você! E você se acostumou tanto a
me machucar e eu o perdoar, que não enxerga mais as consequências dos
seus atos.
— Verônica…
— Não, Logan, eu não terminei. — Dou um passo à frente, ficando cara a
cara. — A minha irmã morreu essa noite, nos meus braços, enquanto meus
irmãos choravam ao meu lado, e tudo por uma atitude infantil de seu irmão.
Irei te dar um aviso para que não diga que foi pego de surpresa: eu vou
destruí-lo, cada coisa que ele ama. Eu destruirei sua família da mesma forma
que destruíram a minha!
Quando recuei, eu tive a certeza de que ele viu a luz que sempre tive, se
apagar.
Cada sentimento bom havia ficado naquela maca fria junto com Sophie. A
minha parte boa, aquela que se importava com os sentimentos alheios, com a
alegria do mundo, seria enterrada a sete palmos do chão, junto à minha irmã.
— Eu quebrei seu coração, mas você, Logan… você me destruiu.
— Eu sinto muito por te destruído, Verônica — diz dando um passo para
trás.
— Eu também sinto, Underwood.
Eu vejo aquele olhar em seus olhos
Que me faz ficar cego
Me cortam profundamente, estes segredos e mentiras
Tempestade no silêncio
Madness | Ruelle

4 anos antes

Sophie Blackwell morreu no dia nove de janeiro.


E eu sabia que uma parte de Verônica também havia morrido junto com
sua irmã. Vi quando algo se partiu dentro da minha garota, quando seus olhos
deixaram de ser um monte de constelações brilhantes e começaram a ser
apenas um vazio infinito.
Eu queria correr, abraçá-la, protegê-la do mundo, contudo, cheguei tarde
demais. Não cheguei até ela em tempo de conseguir com que não me
afastasse. Mas com a perda de Sophie, de sua melhor amiga, sua irmã gêmea,
eu sabia que ela se fecharia para mim. E desta vez, não seria
momentaneamente, desta vez, realmente perdi a única pessoa que um dia fez
sentido na minha vida.
Mas eu não podia, eu nunca poderia fazê-la sofrer mais do que já estava.
Eu precisava guardar todas as minhas palavras, precisava conviver com
todos os segredos.
Cada passo até minha casa, era desgastante. Cada lágrima que descia pelo
meu rosto, me dava força para saber o que precisava ser feito.
Vee foi meu porto seguro quando precisei, meu abrigo quando a
tempestade me alcançou, foi meu abraço quando o meu coração chegou a
apertar. Ela foi minha melhor amiga, minha alma gêmea, e eu havia
contribuído para destruí-la, mesmo sem saber.
Subi lentamente as escadas da minha varanda, deixando gotas de água por
onde passava. Minha roupa estava ensopada, não sabia se era por minhas
lágrimas ou pela chuva que peguei durante o trajeto.
De qualquer jeito, minha forma externa combinava perfeitamente com a
interna, um caos.
E quando finalmente respirei fundo e abri a porta, meu irmão estava
escorado sobre o balcão da varanda, encarando algo em seu celular. Não
havia risadinhas, humor ou até mesmo a ignorância que sempre o cercou. Ele
estava preso em seu próprio mundo, pensando em alguma coisa. Naquele
momento, ele não parecia ser a pessoa que destruiu uma das famílias mais
poderosas de Saint Vincent.
Ali ele era um simples garoto. O garoto que me protegeu várias vezes
quando nosso pai chegava em casa caindo de tão bêbado. O garoto que me
ensinou a jogar futebol americano e que esteve lá para me abraçar quando
vimos nossa mãe morrer. Naquele momento, Aidan parecia o irmão que eu
sempre conheci.
— Eu fiz uma merda, Logan — diz sem levantar seus olhos do aparelho.
Sua voz eriçou minha pele, nela não havia alegria nem dor, é como se ele
tivesse parado de sentir, como se sua alma tivesse sido sugada. — Uma das
grandes.
— Eu sei — devolvo no mesmo tom.
— Sophie veio aqui. — Ele coça a cabeça estressado. — E, merda, tenho
que ir até ela pedir desculpas. Já liguei várias vezes, mas não atende a porra
do celular — diz, guardando o aparelho no bolso, se afastando do parapeito,
enquanto jogo minha jaqueta sobre o sofá e arregaço as mangas da minha
blusa de frio, me preparando para o que farei. — Eu preciso contar a
verdade para ela…
— Que verdade? Que você é um filho da puta egoísta? Que não se importa
com nada além de si mesmo? — interrompo, soltando uma risada amarga. —
Quer ir até ela e dizer que o garoto perverso, sem sentimentos, criou uma
paixão pela minha cunhada?
— Você não sabe de nada do que aconteceu, Logan, então sugiro que fique
fora disso... — Bufa. — Vou atrás dela e explicar, contar o que realmente
aconteceu antes dela chegar aqui. — Ele caminha a passos rápidos, seguro
em seu cotovelo, fazendo ele estancar no lugar. Ele olha mortalmente para
minha mão envolvida em seu braço.
— Não, você não vai — digo de uma forma autoritária e ele apenas puxa
seu braço com um solavanco.
— Não fode, Logan, é lógico que vou! Eu preciso contar a verdade para
ela... — diz meio desconexo. — Preciso dizer que nada do que ela viu era a
verdade. Porra, Logan, eu preciso vê-la.
— Você não pode vê-la — grito, deixando que minha voz se torne fria,
desprovida de emoções, me lembrando das palavras de Verônica. — Sabe
por quê? Porque Sophie Blackwell está morta, Aidan, ela sofreu um acidente
há poucas horas e morreu nos braços da minha namorada enquanto a porra
da ambulância não chegava.
Os olhos dele se arregalaram, como se de todas as coisas que eu pudesse
dizer, essa fosse a coisa mais impossível. Mas Aidan estava em estado de
negação e continuou assim, mesmo quando o acertei com um soco, o
derrubando no chão. Também não desviou enquanto eu continuava a tirar
sangue de seu rosto. Em nenhum momento, ele se protegeu, aceitou cada
golpe como se merecesse, como se aceitasse a culpa que agora carregaria
para sempre.
— A garota que eu amo perdeu alguém que é importante para ela, perdeu a
irmã gêmea, tudo por culpa sua, porque é egoísta demais para ver a
felicidade alheia — grito, dando o último soco. — Eu vi a alegria deixando
seus olhos, vi quando trancou tudo dentro de si e deixou apenas o pior de sua
personalidade à tona.
Aidan se rasteja até a parede lateral e escora a cabeça na superfície
branca. Seus olhos se fecham e as lágrimas finalmente cedem, deslizam em
enormes gotas pelo seu rosto.
— Eu amo Sophie, Logan! — sussurra mais para si do que para mim,
ignorando tudo que disse.
— Não se machuca a pessoa que se ama, Aidan — rosno para ele,
passando a mão pelos meus cabelos, exasperado.
Quando a frase saiu de meus lábios, foi como se eu estivesse levando um
soco no rosto, porque eu também havia machucado Verônica. Machucado de
uma forma imperdoável.
— Eles não vão deixar isso barato e eu não preciso de proteção, Logan,
nossa irmã sim! — Aidan passa as mãos ensanguentadas nos jeans. — Ela é
a única coisa boa na nossa vida, Logan. Não podemos deixar que cheguem
até ela!
Existe um momento realmente decisivo, onde você precisa escolher qual
caminho irá seguir. Proteger a todo custo minha família, ou correr até o amor
da minha vida e tentar fazê-la me enxergar novamente.
Mas a verdade é que a partir deste momento eu não poderia mais escolher
Verônica Blackwell, porque eu sabia que ela não abandonaria as pessoas
que carregavam o seu sangue por causa do que sentíamos.
Estávamos entrando em uma partida de xadrez, onde cada jogada poderia
ser nossa ascensão ou nossa ruína. Nosso tabuleiro era diferente, a arena era
perigosa. Sabia que o jogo que todos os Blackwell travariam não seria
inofensivo ou uma brincadeira, seria algo que machucaria, porque eles
sabiam que Verônica continha estratégias que me afetariam, me provocariam
dor e sofrimento.
Era realmente o nosso fim. Um fim que sabia que seria cruel e doloroso.
Um fim que não merecíamos.

A última vez que a vi, Verônica usava preto, desde os pés à cabeça. E o
cemitério de Saint Vincent estava cheio, todos os alunos e todas as famílias
importantes de parte alta da cidade decidiram participar do sepultamento de
Sophie Blackwell.
Eu me mantive longe, bem distante dos olhos de qualquer um da família
dela, mas, ainda sim, a mantive em linha de visão. E me surpreendi quando
todos à sua volta choravam, menos ela. Seus olhos estavam fixos no caixão
preto, como se nada ali mais importasse, como se apenas seu corpo estivesse
presente.
Verônica ergueu o queixo, arrumou seu chapéu e colocou os óculos
escuros, saindo dali quando eles finalmente baixaram o corpo de sua irmã.
Ela não se despediu, não chorou e nem gritou.
Ela apenas era fria e distante. Foi a personificação do que se tornou
naquela noite.
E agora, enquanto a observo caminhar pelo Saint Vincent College, vestida
com um conjunto Chanel preto e branco e saltos altos, eu tenho certeza de
que ela não é mais a garota de antes. O salto de seus sapatos são o único
barulho que se pode ouvir nos corredores. Não existe nada naquela garota
que pudesse expressar algum sentimento.
A caixa em seus braços indicava que havia desocupado o armário de sua
irmã. Ela caminhava lentamente pelo local, sua pose nunca fraqueja, era
como se fosse uma rainha dando adeus a seu reino, como se estivesse se
preparando para colocar fogo em cada parte do ambiente.
Seus irmãos apareceram no final do corredor, atrás dela, carregando mais
três caixas. Os olhos de Ed estavam vermelhos, como se tivesse chorado a
noite toda, e as expressões de Dylan eram a cópia de Vee, frios, calculistas
e, acima de tudo, perigosos. Se não os conhecesse, juraria que eles, sim,
eram os gêmeos Blackwell.
Meus olhos foram para a mão de Dylan e vi que em uma daquelas caixas,
o uniforme de líder de Verônica estava aparente. Meu coração afundou um
pouco quando eu entendi o que estava acontecendo.
Toda a família Blackwell estava indo embora.
Eles não olharam para Analu ou Mike, que os encaravam com algum tipo
de pena. Ou para Josh e Levi que sorriram gentilmente. Verônica apenas se
distanciou de seus irmãos para caminhar até Hazel e Summer, e envolver o
pulso da primeira com a pulseira que indicava que era a capitã das
cheerleaders. Antes de se virar, sussurrou algo incompreensível para ambas
e então as puxou para um abraço, um abraço de despedida.
Mas quando finalmente se aproximou de mim, me encarou com tanto
desdém, tive vontade de gritar que jamais havia desejado o rumo que todas
essas merdas levaram. Ela deu um passo à frente, ficando cara a cara comigo
e sussurrou próximo a minha boca:
— Eu destruirei você e sua família de merda, Underwood!
E então seguiu seu caminho, como se eu fosse uma pessoa qualquer, que
jamais me conheceu ou dividiu a cama comigo. Uma parte de mim, aquela
que a amava incondicionalmente, olhou para trás e viu a pior das imagens
que poderia ver. Verônica estava nos braços de Oliver, abraçada, ele a
segurava como se fosse a coisa mais sensível que alguém pudesse tocar. E
continuei os encarando enquanto ele passava as mãos pelo seu rosto,
gentilmente, dizendo algo inaudível. Minha vontade era de socá-lo quando se
abaixou e deixou um beijo em sua testa, pegando a caixa e entrelaçando sua
mão livre na dela enquanto seguiam até as portas duplas da entrada do
colégio.
Mesmo que algo dentro de mim estivesse queimando por vê-los tão juntos,
uma parte ficou grata por ter alguém que ela confiava ao seu lado.
— Você está bem? — A voz doce de Summer ressoou, enquanto me
sentava no chão.
— Não, eu... não sei o que fazer.
— Você mentiu para ela, Logan. — Hazel cruza os braços enquanto
desliza até o chão e se senta ao lado do meu armário. — E não foi a primeira
vez.
— E a irmã dela morreu, cara. — Levi se senta ao meu lado. — Dê um
tempo a ela.
— Não sei se um tempo será capaz de resolver isso, Levi. — Suspiro. —
E nem sei onde ela vai atacar para se vingar.
— Só tem três dias que enterraram a irmã dela, Logan. — A loira suspirou
dolorosamente. — Ela disse a mim e a Hazel que deveríamos nos mudar
para Nova York quando nos formarmos.
— Ela está indo para Nova York? — questiono, sentindo o bolo em minha
garganta.
— Hoje à noite — Hazel responde, mordendo o lábio inferior. — Sinto
muito, Logan.
— Você e Dylan? — pergunto quase que em um sussurro.
— Ele terminou o que tínhamos hoje pela manhã, não está com cabeça
para seguir com algo… — ela responde com voz fina, e sabia que estava se
segurando para não chorar.
— Sinto muito.
Sorri fracamente para eles e me levantei, caminhando até a saída.
Precisava descansar, tínhamos uma viagem para a próxima semana até
Atlanta e ficar naquele colégio, lembrando de tudo o que vivemos, não era o
que eu precisava.
Caminhei lentamente até a antiga caminhonete do meu pai e dirigi até meu
bairro, quando estacionei, me assustei assim que vi duas SUVS extremamente
caras em frente à minha casa. Sabia que algo estava errado. Eu podia sentir
dentro de mim que alguma merda aconteceria. A primeira pessoa que vi, foi
Dylan. Ele estava encostado em um dos automóveis e encarava a casa, como
se sentisse repulsa.
— Um dia eu te falei que você não desejaria ver um Blackwell
machucado. — A sua face fechou-se dura. — Nós te trouxemos para nossa
casa, o colocamos na porra do nosso círculo íntimo e mesmo assim você
mentiu para nós, você machucou a minha irmã.
— Eu não a matei, Dylan — rosno. — Parem de me tratar como se eu
estivesse dirigindo aquele maldito carro.
— Você não a matou — a voz fria de Ed ressoa atrás de mim, me viro
lentamente para ver o caçula dos Blackwell —, mas esconder a verdade,
contribuiu para aquilo acontecer.
— Onde ela está? — pergunto, os ignorando.
— Não aqui. Nunca mais aqui! — Ed proferiu com suspiro.
Respiro fundo e decido encarar o que quer que estivesse acontecendo
dentro de casa. Se eles vieram para travar a guerra, que seja. Vamos à luta.
Mas não perderia aquilo de cabeça baixa. Estava cansado de ser tratado com
o vilão, de ficar com toda a fodida culpa por algo que eu não sabia como
evitar.
Quando entrei na pequena sala, a primeira pessoa que vi foi a mãe de
Verônica. Ela encarava uma foto que tiramos um pouco antes que minha mãe
morresse. Seu sorriso era verdadeiro, doloroso. A próxima pessoa que
entrou em meu campo de visão, foi um homem alto, com um terno sob
medida. Os olhos âmbares estavam frios, machucados, mas ainda assim, ele
ainda parecia o magnata. Sua pose de rei da cidade o acompanhava por todo
o lugar. O pai de Verônica, diferente de sua mãe, me encarava como ela me
encarou no hospital, como se fosse o pior demônio que habitava a terra.
— Logan — A voz de Aidan era nervosa.
— Olá, garoto — diz a mulher, finalmente me encarando, enquanto deixa a
foto em cima da mesinha de centro. — Estávamos à sua espera.
— Posso saber o que fazem na minha casa? — pergunto receoso.
A risada falsa do homem à minha frente fez com que minha raiva
começasse a percorrer todas as minhas veias, eu sabia que eram perigosos,
que não mediriam esforços para nos destruir.
— Viemos por nossas filhas — ele diz friamente, arrumando a gravata. —
Verônica deveria fazer isso, mas está com tanto nojo de você que nos pediu
que fizesse.
— E vocês decidiram fazer algo por elas, finalmente? — Aidan diz.
— Nós sempre fazemos o que eles pedem, querido! — A voz da mulher à
minha frente era dura, como se estivesse falando com um maltrapilho, mas
antes de continuar a falar seu sorriso desaparece, dando lugar a uma
expressão dura. — Quem vocês acham que pagam a clínica do alcoólatra
que chamam de pai? — ela diz, me encarando. — Você não sabia que minha
filha convenceu seu pai a ir se tratar, para que vocês pudessem ter uma vida
melhor?
Meus olhos arregalaram. Sempre achei estranho o fato de meu pai ter
aceitado um tratamento sem nenhum tipo de ameaça. E agora, saber que Vee
havia feito aquilo para ele, para mim, me quebrou um pouco mais.
— Verônica sempre teve um bom coração, mesmo que ela o escondesse. E
você o corrompeu. — A voz dura do homem volta a surgir, então ele se
levanta e se põe à minha frente. — Imagine, Underwood, segurar seu irmão
nos braços, quase sem vida, e perder o controle de suas próprias ações
quando os médicos declararem que o fim dele chegou. E então, me diga,
como minha pequena garota ainda continuará com aquele brilho especial que
apenas ela tinha?
Aquilo havia doído de uma maneira inexplicável. Eu sentia cada pedaço
que ainda restava do meu coração sendo destroçado, não queria que aquilo
fosse real, não queria aceitar que aquilo estava acontecendo.
Eu precisava que fosse um pesadelo. Precisava que tudo aquilo passasse.
— Creio que não vieram aqui para falar sobre como me sinto, Senhor
Blackwell — forço minha voz para não parecer abalado.
— Você tem razão, não viemos — diz, soltando um sorriso malicioso,
enquanto se vira um pouco e pega duas pastas, estendendo uma para mim e
outra para meu irmão.
— Acredito que saibam que também sou advogada. — O rosto da
matriarca dos Blackwell não tinha um brilho, era cansado, doloroso. — E
para não terem nenhuma dúvida, explicarei cada papel que está aí dentro.
Encaro o casal à minha frente e depois de um longo suspiro, decido abrir
o conteúdo em minhas mãos, mas me arrependo logo em seguida.
Não, ela não fez isso.
Verônica não poderia ter tomado aquela decisão.
Meu coração parou por alguns segundos quando vi o nome de Melany, o
de meu pai e a escritura da nossa casa. O pavor que percorreu todo meu
sangue foi amedrontador e pude ver a mesma reação no rosto de meu irmão.
Então entendi quando diziam que aquela família era poderosa e destruía
quem os machucava.
— Antes que minha filha morresse, ela pediu a nossa Verônica algo que
ela não poderia negar. — A voz do homem era insensível. — Ah! E peço que
não nos dê os créditos por todo o conteúdo deste papel, Verônica planejou
tudo, até nos mínimos detalhes. — Esta afirmação destroçou todo o meu
coração, aquela não era minha namorada, a garota a quem prometi meu
coração, mas, pelo jeito, ela levou a sério demais, porque ela acabou de e o
tomar entre os de dedos e o esmagar.
— Como ia dizendo... — Volto meu olhar para a mãe de Vee, que falava
agora. — Aí está o processo que seu irmão deu entrada para conseguirem a
guarda definitiva da sua irmã caçula, para ela poder estudar no SVC, mas
sinto muito em dizer, que para poderem conseguir ser guardiões de uma pré-
adolescente de quatorze anos, precisam de uma casa estável, com pessoas
responsáveis para criá-la.
— O que quer dizer com isso? — Aidan arregala os olhos.
— Quero dizer, querido, que com o histórico de alcoolismo presente
nesse âmbito, com as negligências por parte de seu pai e por não terem
responsabilidade com os estudos, com exceção de você, Logan. — Seu
sorriso aumenta. — O juiz decidiu que ela ficará melhor nos próximos anos
em algum abrigo do estado.
— Vocês não fizeram isso… — digo fracamente.
Eu não podia acreditar que eles descontaram todo o seu ódio na pessoa
mais inocente dessa história. O pior, eu não podia acreditar que Vee fez
aquilo, que me destruiu daquela maneira, sabendo que Melany é a pessoa
mais importante da minha vida.
— Não acabamos. — A voz do homem se altera. — Aqui está todo o
valor que terão que pagar para a clínica onde o seu pai está internado a
partir da data inicial nos registros dele. Verônica finalmente deu fim à
caridade que estava prestando a vocês. E como nosso último presente, vocês
têm duas semanas para desocupar essa casa.
— Por que sairíamos da nossa própria casa? — Meu irmão ergue a
sobrancelha.
— Porque essa casa não é mais de vocês, ela pertence à Verônica!
Abaixo meus olhos até o terceiro papel em minhas mãos. Eu não queria
acreditar, não podia. Ela havia feito seu último movimento no jogo.
E eu nem ao menos sabia que tínhamos começado a partida.
Na última linha do documento, as cinco palavras que me levariam ao
inferno: a atual proprietária, Verônica Blackwell.
Não disse nada, não porque não quis, mas, sim, porque todas as palavras
haviam sumidos de minha boca. Quando ela me contou o que fez com a
família de Analu por tentarem um golpe contra eles, tentei compreender, mas
agora sei o quão cruéis eles realmente eram, então apenas os observei
saindo vitoriosos da minha casa. Não tinha reação, havíamos perdido nossa
irmã, nossas lembranças, nossa casa. Não tínhamos mais nada. Eles haviam
nos tirado tudo.
Todo o amor que eu sentia por Verônica Blackwell foi tomado por ódio,
nojo e arrependimento.
Havíamos destruído um ao outro. Gradualmente, pedaço por pedaço.
E o que eu havia visto sumir no olhar dela naquela noite, acontecia o
mesmo comigo naquele momento. Fui o condutor para despertar o pior que
havia dentro dela e ela havia matado o que havia de melhor dentro de mim.
Verônica Blackwell me quebrou que nem um vidro e agora cada fragmento
dele serviria para cortá-la.
— Eu não pedirei desculpas pelas atitudes da minha família. — A voz de
Ed me faz virar e nem me incomodei em secar as lágrimas que desciam pelo
meu rosto. — E nem as justificar, mas você foi um bom amigo para mim, por
isso estou aqui.
Ele sorri e deixa um envelope em cima da mesa de entrada.
— Não preciso da merda da sua caridade, Blackwell! — rosno.
— Eu sei, mas não seja infantil no momento — diz se virando. — Trate
isso como um empréstimo, quando nos vermos novamente, me pague.
— Espero nunca mais ver nenhum de vocês, Edmund. — Dou um passo à
frente.
— Eu sei, Underwood. — Sorri fracamente. — Mas mesmo assim, foi
bom te conhecer.
Antes que possa dizer mais alguma coisa, bato a porta em sua cara. E
então me permito desabar.
Meus joelhos batem contra o chão, mas não há dor. Não há nada.
Eu não sinto nada, como se estivesse em um estado inerte. Como se meu
sistema tivesse desligado, como se eu fosse o zero entre números positivos e
negativos.
Há apenas o vazio.
Desta vez, Verônica me quebrou e nem se importou em catar os cacos que
ficaram. Ao contrário, ela se deleitou em cada fragmento que caiu sob a
superfície, como se fosse uma fodida vadia má.
Algo dentro de mim, sabia que precisava de um último confronto com ela.
E, por esse motivo, saí de casa e peguei a caminhonete velha do meu pai.
Tinha certeza de que ela não estaria em casa. Quando as coisas estão fodidas
nesse nível, ela precisa de ar puro, precisa encarar o céu e sentir que tudo
ficaria bem.
E só havia um lugar em Saint Vincent onde a visão era privilegiada. O
nosso lugar.
Quando estacionei o carro a alguns metros, pude ver um dos carros que
havia visto nas enormes garagens daquela família de merda. Acertei, ela se
tornou previsível demais para mim.
Caminhei como se tivesse mil pedras em meus sapatos, porque mesmo
sabendo ser necessário, eu não queria encará-la agora. Não com todo o ódio
queimando dentro de mim.
— Você não deveria vir atrás de pessoas que não desejam a sua presença
— diz friamente, ainda de costas.
— Me disseram uma vez que não deveríamos colidir nossos mundos,
Blackwell. — Minha voz saiu carregada de nojo. — Deveríamos ter ouvido.
— Você é ingênuo, Logan — fala firmemente. — Nosso mundo nunca se
colidiu, porque não se pode misturar fogo e gelo.
— Antes a ingenuidade do que ser igual a você, Verônica. — Não a deixo
perceber o quão abalado estou. — Que destrói tudo o que toca.
De todas as pessoas do mundo, ser cruel com ela, não só me abalou, como
também quebrou o último pedaço do meu coração.
Quando volto a encarar, a vejo andar alguns passos até ficar perto o
suficiente de mim. Eu queria me mover, ficar longe o possível dela, mas
meus pés não me obedeciam, haviam se enraizado no chão. Minha respiração
começou a ficar ofegante. A cada vez que se aproximava mais um pouco, era
perceptível a tensão que se forma entre nós dois. Nos encarávamos com
ódio. Minha vontade era agarrá-la e mostrar a ela como o sentimento ainda
queimava dentro de mim, mas não posso me dar ao luxo, porque a garota na
minha frente não era mais a minha Vee, não era mais a garota que enfrentou
seus medos porque estava ao seu lado, não era quem uma vez me fez ansiar
por poder ver seu sorriso. Aquela pessoa à minha frente, era vazia, cruel, e
havia me separado de Melany. Mas eu não esperava que ela ficasse nas
pontas dos pés e deixasse um beijo em minha bochecha e sussurrasse:
— E mesmo assim, seu corpo anseia pelo meu toque. — Consigo sentir
meu ódio subir pela garganta. — É hipocrisia dizer palavras que nem mesmo
você acredita.
Ela se virou para sair e quando começou a caminhar em direção ao seu
carro, não consegui conter a gargalhada, porque Verônica Blackwell é a
hipocrisia em pessoa.
Quando ela me encara, sem conseguir entender como eu ainda podia sorrir
depois de tudo aquilo, deixo que ela saiba que todo o amor se foi, que
morreu assim como sua irmã. Sophie não levou somente o seu destino, levou
de todos que estavam ao nosso redor.
— Hipocrisia é achar que uma garota como você, sente algo a não ser por
si mesma. — Solto um sorriso doloroso, minha garganta queimava. — Mas
não a culpo, está na sua genética ser assim, ser uma casca vazia. Agora,
Verônica, eu posso dizer que você finalmente deixou sua máscara cair. Seu
pai deve estar orgulhoso pela sua princesinha ser uma cópia idêntica a
dele... — Dou um passo à frente, quase pairando nossos rostos um sobre o
outro, sentindo sua respiração descompassada. — Afinal, como diz aquele
ditado: fruta podre nunca cai longe da árvore.
Seus olhos, por um momento, me mostraram o quão machucada estava e
uma parte de mim se arrependeu por aquelas palavras, mas a outra parte,
aquela que teve o mundo virado de cabeça para baixo, ficou feliz por tê-la
atingido.
— Uma vez Summer te disse que eu quebraria seu coração, Logan…
deveria ter escutado. — Sorri tristemente.
— Eu te odeio, te odeio de uma forma que eu nem sei explicar, mas ainda
assim, sinto muito por ter feito o mesmo com você… — Nossos olhos se
encontram por uma última vez. Não havia brilho, não havia nada. Apenas
duas pessoas quebradas. — Adeus, Verônica.
— Adeus, Logan.
Ela caminha lentamente até seu carro, como se uma coroa invisível de
orgulho e ódio ornasse sua cabeça, ela não demonstrou nenhum sentimento
quando encarou a cidade, colocou os óculos escuros e então finalmente
entrou no Bugatti, dando partida, acelerando como se o mundo dependesse
daquilo, e eu a encarei sumir de vista.
Aquele dia, no lugar mais alto da cidade, onde fizemos de lá o nosso lugar
preferido, o lugar onde fizemos amor pela primeira vez, hoje tivemos a
nossa última memória.
Verônica havia ganhado aquele jogo, havia saído da cidade como se
realmente fosse uma rainha cansada de reinar sobre uma cidade caótica.
E como dizem: As máscaras caem e os monstros se revelam.
E ela trouxe à tona todos os nossos.
Comecei a trazer o passado à tona
Como as coisas que você ama não duram
Mesmo que isso não seja justo para nós dois
Talvez, eu seja apenas um tolo
Eu ainda pertenço a você
Em qualquer lugar que você estiver
Minefields | Faouzia feat. John Legend

Acho que é melhor não levar Aidan para o apartamento que divido com
os meus amigos. Dirijo até o bairro de classe média onde Audrey mora e
estaciono na vaga da garagem que sempre deixa reservada para mim.
Observo a casa com a pintura toda branca, as janelas escuras e um pequeno
jardim na lateral. É pacato e familiar, e por um momento tenho saudades de
quando morei aqui durante as semanas que eu me organizava na SVU. Sou
tirado dos meus pensamentos pelo resmungo de meu irmão, que reclama por
tê-lo trazido para cá desde o momento em que percebeu o trajeto que
estávamos fazendo.
Ele odeia esse lugar, assim como odeia toda Saint Vincent.
Quando finalmente estou do lado de fora do meu automóvel, levanto o
olhar até o segundo andar, que está todo apagado, o que significa que minha
irmã provavelmente já está dormindo, o que é um alívio, ela não merece
escutar a conversa que teríamos. Principalmente quando sei que nada de bom
sairá daquele momento. A única luz acesa é a da sala de estar, o que não é
surpresa nenhuma, não quando minha tia ainda está acordada por conta da
mensagem que eu enviei no caminho para cá. Assim que subo os únicos dois
degraus da varanda na parte frontal, encaixo minha chave e abro a porta, sou
recebido por uma imagem de tia Audrey sentada em um dos sofás com uma
xícara amarela nas mãos.
Seu cabelo preto está preso em um rabo de cavalo, seu pijama todo
amassado e o óculos de grau está sobre os olhos azuis idênticos aos de
minha mãe. Seu semblante não é afetuoso, é apenas preocupado, porque
minha tia sabe como minha relação com Aidan vive na corda bamba desde o
que aconteceu há quatro anos atrás.
— Sente-se! — ela diz, se levantando — Vou buscar um chá para os dois.
— Não acho que seja necessário, estou indo embora, Audrey! — digo,
girando a chave do meu carro entre os dedos. — Tenho treino amanhã cedo.
— Não foi um pedido, Logan! — profere, me encarando com um
semblante fechado.
Com um suspiro, caminho até o sofá oposto ao que meu irmão está jogado
e me sento, colocando meus cotovelos em minhas coxas e abaixando a
cabeça. Estou esgotado. O jogo havia sido pesado e o momento com
Verônica no vestiário logo após a partida, ainda reverbera na minha cabeça,
me lembrando de todas as coisas que fizemos. Mas não é isso que está
fodendo com minha mente, mas sim o que eu disse a Dylan no
estacionamento. Merda! Eu não deveria ter dito tais coisas, não deveria ter
deixado explícito que ainda sentia algo por Verônica, mas quando a vi tão
vulnerável, tão machucada, eu quis mover o mundo para que aquele
sentimento se esvaísse, quis protegê-la.
— Você está fodendo com Blackwell novamente! — Não era uma
pergunta, mas a voz regada a desdém de Aidan me fez levantar a cabeça. —
De todas as garotas disponíveis na porra dessa universidade, você decidiu
estar entre as pernas de uma Blackwell!
— Não se intrometa na minha vida, Aidan! — vocifero, estreitando os
olhos.
— O caralho que não irei! — ele devolve, se levantando. — Eles foderam
com nossa vida, com a casa que era da nossa mãe, Logan, com a nossa irmã,
caralho!
— E você quer entrar nesse assunto, quer que eu vomite em cima de você
o porquê de todas as atitudes que eles tomaram? — proponho, me levantando
e ficando frente a frente com meu irmão.
Somos do mesmo tamanho. Os olhos de Aidan são de um tom azul
acinzentado e contém toda uma confusão nublada em cada parte de suas íris.
Ele solta uma lufada de ar e não desprende o olhar por nenhum segundo.
Enquanto procuro o garoto que um dia foi meu melhor amigo, que me
protegeu e me ajudou a superar todas as coisas ruins da minha, que
compartilhou sonhos e pesadelos, que apenas... foi meu irmão, contudo, ele
me encara como se eu fosse um bastardo por ainda sentir algo por Verônica.
— Chega! — A voz firme de Audrey me fez dar um passo para trás. —
Não aqui, não quando a única pessoa inocente está dormindo no quarto
acima de nós!
Audrey está a alguns centímetros longe de mim, com duas xícaras em suas
mãos. Ela anda até onde estamos e entrega uma para cada um. Tento relaxar
meu corpo, voltando a me sentar, mas não é o suficiente. Quando levo o
objeto até meus lábios, sinto o gosto forte de camomila com um pingo de
mel. Era o preferido de nossa mãe, e me trouxe lembranças de quando ela
fazia o mesmo todas as noites antes de nos colocar na cama.
Sinto falta dela e talvez, se ela ainda estivesse viva, conseguiria nos
controlar, conseguiria fazer que não nos odiássemos tanto e vivêssemos
como uma família novamente.
— Por que você voltou, Aidan? — Audrey questiona, colocando sua
caneca na mesa de centro.
— Daqui a algumas semanas é o Natal e todos sabemos que é a época
preferida de Mel! — explica como se fosse o óbvio. — E eu não perderia
esse momento!
— O Natal é apenas em sete semanas, Aidan! — digo, cruzando os braços
e me escorando nas almofadas do sofá. — Fale a porra da verdade!
Ele me encara por alguns segundos, como se estivesse praguejando se
dizia ou não, mas minha postura não vacila em nenhum momento, fazendo
com que ele suspire.
— Eu voltei, porque sei a merda na qual está se metendo e, acredite em
mim, irmãozinho... — Ele coloca os cotovelos em suas coxas e me encara
severamente. — Não deixarei você foder com seu futuro e com sua vida por
conta de uma pirralha mimada!
— Aidan, nós já temos problemas demais! — Minha tia interveio antes
que eu pudesse respondê-lo. — Não seja mais um.
— Não serei um, Audrey!
— Você está com a garota Blackwell novamente, Logan? — Ela vira seu
rosto em minha direção com os olhos semicerrados.
— Não! — O que era uma verdade, conviver Blackwell e estar junto dela
são coisas distintas. — O fato de sermos obrigados a convivermos, não
significa que temos algo!
— Então por que diabos você estava a ponto de matar qualquer um
naquela festa, incluindo a mim, quando foi ela que me atacou? — Ele ergue
uma sobrancelha.
Não tenho resposta para isso, porque eu nem ao menos sabia. Em um
momento estávamos no vestiário, em nossa própria bolha de felicidade,
enquanto ela dedilhava a porra da tatuagem meu peito, quase me fazendo
confidenciar o real motivo de ter eternizado aquele desenho em minha pele,
o que fez subir todas minhas muralhas contra ela, a tratando friamente; e no
outro, eu estava entrando na fraternidade, dando de cara com meu irmão e o
único pensamento que me veio à cabeça, era que deveria protegê-la, deveria
fazer com que eles não se encontrassem e ela sofresse.
Finalmente a verdade sobre aquele momento recaiu sobre mim e não é
bom, porque eu estava pronto para fazer qualquer coisa contra meu próprio
irmão ou qualquer um naquela festa se aquilo significasse que eles a
colocariam em perigo.
E isso é ruim, porra, muito ruim!
— Logan... — Minha tia faz com que eu a encare e repete a pergunta que
eu não havia escutado, calmamente. — Você ainda sente algo por ela?
— Ela machucou minha irmã, Audrey... — Minha voz vacilou, porque isso
é a única coisa que mantém a nossa linha tênue intacta. — Não há lugar para
sentimentos quanto a isso.
— Pelo menos ainda é sensato! — Aidan murmurou.
— Você quer falar sobre sensatez? — Ergo meu rosto para ele. — Porque
posso trazer o assunto Sophie Blackwell para essa sala e te dizer o quanto a
sensatez te faltou, irmão.
A expressão de deboche de Aidan morre ao tocar no nome da garota
proibida. Ele dá um passo para trás, como se eu tivesse lhe desferido um
soco, levando as mãos em seu cabelo, e fecha os olhos por alguns segundos,
como se estivesse expulsando lembranças e tentando não voltar para aquele
mar de lamentações que havia se tornado quando tudo aconteceu.
Sei que toquei em um assunto proibido, mas estou cansado de fingir que
tudo está bem, cansado de colocar um sorriso no rosto, mesmo que eu esteja
destroçado por dentro.
— Não faça isso, Logan... — Audrey sussurra.
— Não faça o quê, tia Audrey? Falar a verdade? Porque sinceramente, eu
estou farto! — esbravejo. — Estou farto de vocês andarem em corda bamba
quando se trata daquela família, estou farto de ainda ter que olhar para
Verônica e enxergar tudo o que fizemos um para o outro, saber que ela sofre
pela morte de Sophie e que tenho que odiá-la por ter tentando destruir a
minha vida. Estou farto de ter que ser forte, de ter que fingir para vocês que
isso também não me afetou, de presenciar Aidan se desmoronar toda vez que
alguém diz o nome dela perto dele e de ver o quanto te esgotou ter que lutar
por Melany e que eu não a vi durante um ano inteiro… E-eu estou cansado
Audrey, apenas cansado.
— Você quer o que, Logan? — Aidan praticamente grita. — Que eu diga
que sinto muito pela morte da garota que eu amei? Porque fiz isso dezenas de
vezes, fiz isso para você, para Audrey e para dezenas de outras pessoas que
viram meu estado lamentável. Fiz isso na porra da lápide dela! Chorei como
uma criança ajoelhado no chão do cemitério todo o aniversário de morte
dela! Eu estive lá, Logan... Enquanto a própria família dela nunca foi visitá-
la…
— Ela está morta porque você a traiu, porque ela dirigiu em uma
tempestade enquanto você fodia uma garota qualquer, e mesmo que tente se
explicar… lembre-se de que você — desabafo apontando um dedo em sua
direção — foi o cara que ela entregou tudo, para que no final fosse egoísta o
bastante para machucá-la!
— E você acha que eu não sei disso, caralho? — Ele dá um passo à
frente. — Você não sabe como eu tenho me sentido todo esse tempo. Todas
as vezes que fecho meus olhos sou capaz de ver o rosto dela banhado em
lágrimas e decepção. Que a porra das palavras que eu disse a ela não me
perseguem diariamente? A porra do cheiro dela está impregnado em mim,
Logan. A imagem do caixão dela sendo baixado, coberto pela terra e eu
saber que nunca mais poderia olhar nos olhos dela, ver o tique nervoso que
ela tinha quando mexia naquele cabelo ruivo. — Encaro o rosto do meu
irmão e me surpreendo ao ver seus os olhos inundados em lágrimas. Aidan
tenta contê-las, mas é impossível. — Como acha que eu me sinto quando sei
que fui o culpado por ter fodido com a sua vida e a de minha irmã? — Ele
limpa as lágrimas, enxugando as mãos nos jeans escuro de sua calça. —
Como acha que eu me sinto quando sei que perdi a única coisa boa que já me
aconteceu?
— Você não merecia Sophie, Aidan… — sussurro.
— E você acha que merece, Verônica Blackwell? — Ele dá um passo à
frente, sorrindo amargamente. — Acha que merece que ela volte para seus
braços, quando você ocultou o meu relacionamento com sua irmã, quando a
fez chorar mais do que sorrir e que a destruiu, assim como eu fiz com sua
irmã? Não tente ser mocinho dessa história, quando se é tão sujo como eu,
irmão!
— Logan? Aidan? — A voz suave faz com que virássemos em direção à
escada.
Melany está parada no último degrau com um pijama azul e os olhos
inchados de sono. Ela inclina a cabeça em confusão para mim e para meu
irmão. E por um segundo, eu acho que ela vai correr até Aidan e pular em
seu colo, como sempre fez das últimas vezes que ele veio visitá-la. Mas não
dessa vez, desta vez ela encarou Audrey com uma súplica no olhar, como se
estivessem compartilhando um segredo.
Como se ela suplicasse para que nossa tia diga algo que não temos a
mínima ideia do que seja.
— Você nunca viu Mel durante aquele ano... — minha tia começa a falar e
sua voz faz com que um frio suba pela minha espinha. — Porque eu não
queria que soubessem que ela nunca foi tirada de nós, que Mel nunca pisou
em um abrigo!
— Como é que é? — Minha voz se sobressalta.
— Que merda você está dizendo, Audrey? — Aidan ergue uma
sobrancelha. — Eu vi os papéis, aqueles fodidos Blackwell esfregaram em
nossas caras!
— Eram falsos! — sussurra, erguendo os olhos em minha direção. — As
únicas coisas que tiraram de vocês, foram a casa e o pagamento da clínica de
seu pai.
— Audrey... — murmuro, quase sem voz.
Não pode ser verdade, não posso ter odiado Verônica por tanto tempo por
um motivo que não é verdadeiro. Ela fez aquilo, eles nos jogaram na sarjeta,
ficaram com tudo o que nos pertencia e haviam levado minha irmã com eles.
— Uma semana antes de vocês voltarem para Atlanta, eu recebi uma visita
inesperada. — Ela se senta e fecha os olhos por alguns segundos, enquanto
Melany caminha até ela e aperta seu ombro, a confortando. — Era uma
mulher elegante e eu a conheci das inúmeras vezes que seu rosto estampou
uma revista. E eu a achei parecida com a garota que você sempre postava
foto nas redes sociais. Ela se sentou no café onde eu cobria um turno e me
entregou dois papéis, um sobre a venda da casa e outro sobre uma bolsa
integral em um dos melhores colégios do país, em Saint Vincent College. —
Nossa atenção está toda em minha tia, os olhos de Aidan estão arregalados e
eu não consigo ter uma reação para isso. — Ela disse que não poderia
causar dor em uma criança, não quando ela mesmo acabara de perder uma
filha…
— Amber Blackwell, mãe de Sophie e de Verônica, fez isso? — Aidan a
interrompe, erguendo uma sobrancelha.
— A que custo? — pergunto. Conheço perfeitamente a família de Verônica
e sei que não fariam isso sem segundas intenções, todos nós sabíamos
perfeitamente disso.
— Que todos achassem que Verônica havia tirado Melany de vocês. Que
vocês a odiassem, a ponto de Logan ficar longe dela. — Ela olha para Mel
por alguns segundos. — Era uma oportunidade de Mel ter uma educação
como você teve no SVC, Logan! E a sua irmã era uma criança inteligente,
acima da média, por isso aceitei, conversei com Mel sobre ela ir para um
internato durante algum tempo e depois voltaria para nós, mas nunca disse
como havia conseguido a bolsa, até que ela viu os papéis!
— Você não deveria ter feito isso, Audrey... — digo, ainda absorvendo
isso. — Não deveria ter escondido a verdade.
— Você já odiava Verônica Blackwell, Logan! Aidan estava devastado e
eu precisava cuidar de todos nós, porque seu pai não tinha condições de
cuidar nem dele mesmo! — ela vocifera, se levantando. — Então me diga
como não aceitaria uma proposta quando sabia que seria a única
oportunidade da sua irmã?
— Logan... — Mel começa a dizer, mas a interrompo de imediato.
— Você sabia disso, Mel, por isso todo aquele papo de perdão, por isso
sempre achava um meio de trazer Verônica para nossas conversas — digo,
colocando meus dedos na ponte do meu nariz e depois ergo meu olhar para
minha tia. — Por que você nunca me disse isso, Audrey? Por que me deixou
a odiá-la por tanto tempo?
— Porque isso não anula o fato deles terem tomado a casa da minha irmã!
E nem o fato de que seu pai morreu logo após vocês se mudarem para
Atlanta, porque ele voltou a beber de uma maneira que o corroeu por dentro.
— Ela se levanta e dá um passo à frente. — Isso não anula o fato de que
todos eles acabaram com a nossa família. Pagarem a educação de Melany foi
o mínimo que deveriam ter feito para nós!
— Meu pai morreu por conta de sua doença com o álcool, não por atitude
de terceiros! — Um músculo na minha mandíbula contraiu-se. — Todos nós
sabemos disso e por mais que ainda os odeie, não posso deixar que assumam
uma culpa que não deve ser deles!
Melany me encara com preocupação e mesmo que eu saiba que na época
ela não entendia o que estava acontecendo, uma parte de mim desejou que
ela tivesse me contado, tivesse dito que todo o tempo em que achava que
estava em algum lugar no estado, sofrendo, ela estava bem, confortável e
tendo uma boa educação.
Mas eles não fizeram isso.
Minha família me deixou no escuro, haviam me feito acreditar que ela
tinha jogado minha irmã em um abrigo qualquer, tinham me deixado acreditar
que eu não poderia salvá-la, que Mel não retornaria para casa.
— Estou indo embora, e-eu… preciso ficar sozinho! — digo.
Passo as mãos em meus cabelos e começo a caminhar em direção à saída,
escutando a voz de Mel me chamando e o choro de Audrey. Eu realmente
preciso de ar puro, preciso me lembrar que minha vida é uma montanha russa
de emoções. Quando entro em meu carro e dirijo pelas ruas de Saint Vincent,
não tenho um lugar em mente, não sei nem ao menos o que realmente farei
quando estacionar o carro ou quando eu encontrar Verônica.
O barulho de pedras sob os pneus do meu carro faz com que eu saiba que
estou chegando onde finalmente decidi ir. Os faróis iluminam a enorme
forma e encaro a enorme estátua que ainda está lá centralizada em frente a
todos os bancos que decoram o lugar. O mirante de Saint Vincent é o lugar
mais calmo que encontrarei na cidade, principalmente por ser isolado e frio.
A vista daqui sempre me prendeu, sempre fez com que me sentisse livre,
que ninguém poderia me dizer como ser ou agir. Era onde eu poderia chorar
ou gritar, sem que ninguém percebesse. Aqui, eu não preciso ser o capitão
que a universidade admira, o irmão que faz de tudo para manter o resto da
família unida e nem o garoto que havia sido quebrado e que nunca demonstra
isso.
Aqui eu posso ser apenas eu, o Logan.
Escoro as mãos na mureta branca e abaixo minha cabeça, tentando, por
alguns segundos, não pensar em todo caos que havia se instalado em minha
vida nessas últimas semanas.
Mas antes mesmo que eu pudesse relaxar, o barulho de saltos contra as
pedras do chão me faz erguer o rosto e me virar em direção ao som. Não me
surpreendo quando vejo Verônica caminhando despreocupadamente com uma
garrafa lacrada de tequila entre as mãos e a maquiagem borrada, como se
estivesse chorando a alguns minutos. Ela ergue o rosto em minha direção e
solta uma lufada de ar, enquanto revira aqueles lindos olhos, parando à
minha frente.
— Sem ofensas hoje, ok? — propõe, levantando as mãos e imitando o
balançar de uma bandeira. — Estou em missão de paz esta noite!
— Você nunca está em missão de paz, anjo! — Respiro fundo, enquanto
cruzo os braços em frente ao corpo. — Nunca mesmo!
— Acredite em mim, capitão, depois desta noite, não estou a fim de
arrumar outra briga com algum Underwood tão cedo — diz, tirando o lacre e
levando a garrafa até os seus lábios, ingerindo uma grande dose.
Ela passou por mim, indo até a mureta e passando as pernas, se sentando.
Seu rosto agora está virado na direção da cidade e a única visão que tenho
da mulher que estava fodendo com meu psicológico, são de seus cabelos
pretos caindo sobre os ombros até o meio da sua cintura, que esconde um
pouco da pele tampada pelo vestido.
Caminho em direção onde ela está e imito o seu gesto, fazendo com que
ficássemos sentados lado a lado. Sei que é errado, sei que tenho coisas
demais em minha cabeça e devo deixá-la sozinha para tentar resolver os seus
próprios problemas, mas há algo na maneira em como seus olhos estão
tristes e machucados, em como ainda está frágil. E algo me diz que mesmo
que mostre a todos que prefere a solidão, ela não gostaria de ficar sozinha,
não hoje, assim como eu; que não estava preparada para enfrentar todos os
pensamentos que rodeavam sua cabeça.
— Eu sempre senti falta desse lugar… — confidencia, erguendo a garrafa
para mim, que aceito e levo até meus lábios. — Eu costumava ir até o
Empire State Building e imaginar estar aqui, mas nunca era o mesmo.
— Sentir falta de um local que a destruiu não é saudável, anjo! — digo,
devolvendo a garrafa.
— Transar com ele também não, capitão! — Me encara com os olhos
vazios e solta um sorriso frio. — E é o que mais fazemos ultimamente!
— Pensei que estivesse em missão de paz! — digo encarando a cidade.
— Minha missão de paz vai até um certo limite, não me culpe por isso!
Ela sorri e eu apenas devolvo o sorriso. Verônica volta o olhar para
frente, para a cidade abaixo de nós e suspira fundo.
— Como você conseguiu o posto de capitã novamente? — pergunto,
tentando fazer com que ela não se perca nos seus próprios pensamentos.
— Hazel. Ela me ajudou a fugir de seu quarto no dia da festa da
fraternidade. — Ergo uma sobrancelha enquanto ela solta uma pequena
gargalhada. — Então ela cobrou esse favor, me convencendo a ser a capitã
das cheerleaders.
— Isso é muito a cara dela — resmungo, também soltando uma
gargalhada.
— Ela tinha boas intenções, não posso culpá-la. — Verônica umedece os
lábios e volta o olhar para frente. — Afinal, não é todo dia que sua amiga te
liga pedindo ajuda para fugir de uma fraternidade.
— Você não precisaria ter concordado com isso, se não tivesse fugido
como uma criminosa do meu quarto — digo, mas um sorriso travesso
estampa meus lábios.
— Oh, eu precisava! Isso impediu um momento constrangedor e uma
possível briga entre nós pela manhã. — Ela solta um sorriso fraco e me
encara.
— Sexo com raiva é um dos melhores — murmuro ainda mantendo o
sorriso no rosto.
Verônica devolve o sorriso, mas de repente seus lábios ficam em uma
linha fina e ela engole seco.
— Precisamos acabar com o quer que esteja acontecendo entre nós,
Logan!
Suas palavras não são rudes ou uma ameaça, são apenas tristes. E eu
gostaria que fosse o álcool que a estivesse fazendo falar isso, mas não é.
Não quando ela não bebeu o suficiente para estar bêbada. E talvez fosse o
que aconteceu hoje, mas enquanto me encara com todo tipo de sentimento,
ela não é aquela garota que discutiu comigo durante todas essas semanas. A
frase que havia proferido era apenas uma confissão, uma que doeu em mim,
porque sei que está certa, sei que precisamos parar com isso. Mesmo que
agora eu saiba que boa parte do meu ódio por ela havia sido por conta de
uma verdade que me foi escondida, mas isso não significa que anula os
outros motivos.
Não anula o fato de que nunca seremos compatíveis.
— Eu sei! — sussurro, ainda a encarando.
— Preciso que volte a me odiar da maneira que me odiava há algumas
semanas atrás!
— Por que precisaria disso?
— Porque assim... sei que somos errados juntos! — Uma lágrima ameaça
a descer pelo seu rosto.
— Eu não posso, anjo! — Minha voz sai regada a angústia enquanto
estendo a minha mão até seu rosto, acariciando-o. — Porque fingir que a
odeio como odiava, seria mentir para mim mesmo!
— Isso é tão errado, capitão…
— Os amantes não vêem as mais belas loucuras que cometem — sussurro,
aproximando meu rosto do dela, nossos lábios pairando um sobre o outro.
— Não cite Shakespeare para mim, Logan… — murmura, olhando para
meus lábios.
— Te traz lembranças, anjo? — devolvo, me aproximando e passando
minha língua pelo seu lábio inferior, enquanto ela fecha os olhos apreciando
o momento.
— Me faz querer te beijar! — Seu tom não é malicioso, mas quando suas
íris voltam a se encontrar com a minha, há desejo ali.
— Sorte a minha então! — Sorrio fracamente enquanto a puxo para um
beijo.
Não é como os outros beijos. Não há nada carnal nele. É doce, é como
todos aqueles beijos que trocamos há anos atrás. Mas desta vez, com cada
nuance que estamos descobrindo um sobre o outro.
Como um quebra-cabeça que finalmente havia sido montado sem faltar
nenhuma peça.
Uma dança entre a poesia e o caos, uma combinação perfeita.
Quando finalmente se afasta, aqueles olhos âmbares me encaram com
algum tipo de decepção e confusão, como se aquele beijo realmente fosse um
fim, um adeus para o que havíamos começado desde que havia voltado.
— Eu ainda não encontrei o antídoto para te esquecer, capitão… — Meu
coração para por alguns segundos, mas ela se afasta do meu toque e desce da
mureta, fazendo com que eu imite seu movimento. — Mas isso não significa
que irei parar até conseguir!
E então ela se vai.
Deixando algo estranho em meu coração e uma garrafa quase inteira de
tequila.
O capítulo a seguir é um crossover com o livro Forever You, da autora
April Jones, que também está disponível na Amazon e no Kindle Unlimited.
Minha solidão está me matando (e eu)
Eu devo confessar, eu ainda acredito (eu ainda acredito)
Quando não estou com você, eu perco a minha cabeça
Baby One More Time | Britney Spears

Estou o evitando desde a noite no mirante.


Para ser sincera, eu sei que era uma atitude infantil, mas é a única que
encontrei para manter Logan Underwood longe de mim.
Principalmente depois que os nossos treinadores disseram que iríamos
viajar todos juntos até Boston, apenas para participarmos de uma festa de
confraternização entre os principais times de futebol americano do país.
Sei que nada pode sair bem desta viagem, principalmente porque estamos
todos esgotados da semana. Logan e eu estamos sendo capitães de merda e
uma viagem dessas não resolverá nada, e me lembrarei disso quando
estivermos voltando para o SVU amanhã à noite depois do jogo contra
Connectuin e todos eles estiverem brigando dentro de um maldito ônibus.
Suspiro fundo, encarando o bar à minha frente, o barman com certeza está
farto de me servir apenas água durante todos esses minutos que estou sentada
aqui. Eu deveria começar a beber, deveria imitar o grupo de universitários
que está no canto esquerdo, em frente a uma enorme mesa com dezenas de
copos de tequila. E fazer igual a uma das garotas que pega a rodela de limão
em uma mão e coloca um pouco de sal sobre a pele entre o indicador e o
dedão da outra e então vira o líquido âmbar em seus lábios.
Mas se eu fizer isso aqui, se eu me embebedar na porra desse hotel,
baterei na porta do quarto de Logan alguns andares acima, falarei coisas que
não devem ser ditas e me arrependerei disso no próximo dia. Principalmente
porque estou o evitando desde a última festa, desde o momento que ele me
dobrou sobre o banco do vestiário feminino e me fez enxergar maravilhas
enquanto desbravava cada curva do meu corpo. Merda!
Preciso esquecê-lo, preciso me lembrar de quem somos e do que fizemos
uma para o outro. Preciso esquecer aquele momento no mirante, de como me
olhou e de como me fez sentir, ainda mais agora que Aidan voltou para Saint
Vincent e que nada estará bem, não quando não podemos nos encarar sem eu
tentar socá-lo.
Solto um suspiro alto o bastante e me levanto do enorme banco, enquanto
lanço um sorriso em direção ao barman que está atrás do balcão. Ele
devolve o gesto, mas não é tão gracioso como o meu, ao contrário, é como se
estivesse agradecendo por finalmente eu estar cedendo o lugar para alguém
que realmente desejava beber algo.
Caminho calmamente entre as pessoas e foco minha atenção no barulho
dos meus saltos batendo contra o piso brilhante que reluz as luzes do
ambiente. Abaixo levemente a cabeça para conferir as horas em meu celular
e antes mesmo que eu possa realizar tal ato, sinto alguém trombando comigo.
Viro lentamente meu rosto em direção a pessoa. E percebo que ela sorri
gentilmente para mim, como se pedisse perdão por esbarrar em mim. Ela é
linda, suas íris são azuis cristalinas e me lembra por um momento os olhos
intensos de Melany. Dou um passo para trás, dando espaço para ela poder
passar, mas ela apenas inclina a cabeça levemente para mim, como se
estivesse amando o vestido que estou trajando no momento. E eu faço o
mesmo, porque o dela é incrivelmente impecável, é de um tom vermelho
escarlate, que eu sei que minha mãe amaria se visse essa mesma imagem que
presencio agora. Ergo meu olhar até seus cabelos longos e loiros que caem
em cascatas sobre seus ombros.
E quando seu olhar recai sobre o meu novamente, é como se já nos
conhecêssemos, como se a nossa conexão fosse instantânea. Ela me lembra
Summer e talvez fosse esse o motivo pelo qual eu me identifico tanto com
ela agora.
— Me desculpe! Estou um pouco distraída — digo, finalmente quebrando
o silêncio.
— Oh, eu que peço — devolve, enquanto levanta as mãos.
— Está tudo bem! — Solto um sorriso compreensivo. — Prazer, eu sou
Verônica, Verônica Blackwell!
— Sou Ana Lawrence. Prazer — declarou.
— Talvez soe estranho eu perguntar isso… — Dou um olhar apelativo
para ela. — Mas você sabe onde diabos vende bebida de verdade nesta
cidade?
— Eu estava indo exatamente encontrar minhas amigas em um bar próximo
do hotel. Se quiser… posso levá-la. — Ela dá de ombros, sugestivamente.
— Suas amigas não vão se importar? — Inclino uma das sobrancelhas. —
Porque é provável que uma boa parte dos alunos do Saint Vincent University
vá parar neste bar quando eu avisá-los de onde estou.
— Na verdade, seria uma boa conhecer universitários além dos da CBU
— Divaga, curvando meus lábios para o canto. — E acho que elas também
irão gostar da ideia! — Ela coloca uma mecha intrusa contra o lóbulo.
— Duas universidades, significa mais jogadores juntos… — Faço uma
pausa dramática, pensando que talvez seja uma boa ideia. — Eu espero que
você conheça os jogadores da sua universidade, Lawrence, porque eu estou
a fim de conhecer novas pessoas hoje!
— Confesso que estou um tanto curiosa sobre os alunos da sua
universidade, Blackwell, há boatos interessantes sobre Saint Vincent
University — cochicha com a mão em concha sobre a boca como se contasse
um segredo, o que me faz rir com uma adolescente.
— Oh! Então você tem todo o caminho até o bar para me atualizar sobre
esses boatos! — Franzo o cenho enquanto digito a senha em meu celular,
conferindo se Hazel havia respondido. — Porque os jogadores do SVU são
babacas que não sabem nem onde estão seus próprios paus!
— Então nada de diferente dos Crows Blue Legs. São uns perfeitos
canalhas, diga-se de passagem! — resmunga, rolando suas íris.
— Sem querer generalizar, mas acho que é estereótipo de muitos dos
jogadores! — confesso, soltando uma risada e apontando para a saída do
hotel. — Lidere o caminho, Lawrence!
— Há um pequeno problema, Blackwell. Você não se importa em irmos
andando, não? Não gosto de entrar em carros… — disparou, contraindo os
lábios.
— Fique tranquila! Eu não estava cogitando a ideia de entrar em um carro
hoje! — profiro, olhando em seus olhos, mas esperava que algum dos nossos
amigos esteja, porque tenho uma pequena certeza de que não voltaremos sãs
para esse hotel.
— Gostei de você! Então, vamos logo. A noite está apenas começando,
Blackwell!
Enquanto caminhamos, apenas observo a paisagem. O enorme hotel havia
ficado para trás há alguns minutos, e só pela fachada que havíamos visto, sei
que o conselho da universidade havia gastado uma boa quantia para
hospedar toda a equipe de futebol e das cheerleaders. Ana sorri para mim
sempre que eu pergunto algo sobre Boston, principalmente porque eu estou
perdida entre essas ruas. O que me lembra de todas as cidades que eu havia
ido durante minha estadia em Nova York com Oliver, e agora lamento por
Boston não ter feito parte do nosso itinerário.
O bairro em que caminhamos é tranquilo e se parece com o Parque de
Saint Vincent onde acontecem as corridas. O que me lembra que quando
voltarmos, devo procurar Mike para conversarmos sobre a próxima partida,
está na hora de voltar. E estou começando a sentir falta da adrenalina.
Quando viramos uma das esquinas, me lembro de um comentário que
Lawrence havia proferido no bar do hotel e sem me segurar mais, eu
praticamente solto uma lufada de ar alto o suficiente para que ela me encare
confusa, fazendo com que pergunte:
— Ok! Eu tenho um amigo que apelidamos de Maria-Fifi, e se estivesse
aqui, ele já teria feito você contar todos os boatos que sabe sobre SVU —
comento, soltando uma gargalhada. — Mas também não posso negar que
estou curiosa. Então, Lawrence, conte-me sobre esse boato sobre a minha
universidade.
— Certo… — Ela contraiu os lábios, como se estivesse pensando em
algo. — Há boatos que uma das garotas da SVU derrotou o capitão do time
em uma corrida clandestina em um dos parques de Saint Vincent —
cochichou, cobrindo sua boca com uma palma como se estivesse contando
um dos segredos mais sádicos da minha cidade.
Encaro a garota loira à minha frente. Me recordando disso, a memória
escorrega pela minha mente como água cristalina. A corrida, eu e
Underwood e porra da discussão antes de tudo. Um sorriso surge em meus
lábios, me lembrando do quão incrível foi ver o rosto do bastardo me vendo
receber todo o dinheiro que deveria ser dele.
— A garota, Lawrence, sou eu! — confesso orgulhosa enquanto mordo
meu lábio.
— Espera, o quê?! Era você?! Céus… isso é… — Ela se perde em suas
próprias palavras desajeitadas. — Certo, eu posso esperar mais alguma
surpresa vindo de você, Verônica Blackwell? — Ergueu uma sobrancelha
sorrateiramente.
— Ah, Lawrence! Tenho minhas facetas, mas eu deveria te preparar
apenas para uma coisa, acho… — Eu a encaro, soltando uma careta quando
me lembro que os jogadores estariam no bar e entre eles estaria Logan. E
depois do que aprontamos, ele seria a última pessoa que deveria lidar com
uma Blackwell bêbada. — O capitão é meu ex-namorado e provavelmente
estará neste bar. Nós dois não somos fãs um do outro.
— Um encontro entre ex-namorados pode acontecer na noite das garotas?
— ela questionou, murchando seus ombros. — Ex-namorados são um pé no
saco. Principalmente o meu!
— Acredite em mim, eles são! — Solto uma risada irônica. — Eu não sei
o que rolou entre você e o seu ex, mas eu posso dizer que Logan Underwood
é, de fato, a pessoa que eu não desejo lidar hoje!
— Ugh, posso imaginar! Nathaniel é, definitivamente, um tremendo
canalha de quinta categoria! — dispara enquanto solta uma careta em minha
direção. Suas bochechas estão levemente coradas e belo brilho nos seu
olhar, eu entendo que seu ex, não tão ex assim.
— Lawrence, você está com uma cara de que ainda transa com ele! —
Encaro-a com um sorriso malicioso nos lábios, porque eu entendia aquela
expressão perfeitamente, principalmente porque eu sempre estava com ela
em meu rosto.
— Está tão na cara assim? — Ela brinca, suas bochechas se tornam
vermelhas, e quando solta um sorriso envergonhado, eu soube que ela ainda
é apaixonada. — Digamos que eu tive uma pequena recaída, mas, em
compensação, o deixei com uma ereção para que ele pudesse cuidar
sozinho… — sussurra a última parte em um tom carregado de divertimento,
piscando em minha direção. Em poucos segundos as minhas feições
maliciosas adotam uma expressão genuinamente surpreendida. — E o pior,
estamos dividindo o mesmo quarto!
— Puta merda, Ana! P-u-t-a-m-e-r-d-a! — grito pausadamente, incrédula.
Aquela garota nasceu para ser uma das minhas amigas, sem dúvidas! — Eu
deveria ter feito isso com Underwood todas as vezes que ele me irritou!
— Irritou? — Suas sobrancelhas se unem em confusão.
— Digamos que não tomamos as melhores atitudes por conta do nosso
passado… — falo, mas minha voz se torna cabisbaixa. Sentindo um nó se
formar em minha garganta. Não irei pensar nisso agora, não agora! Não
hoje! Mesmo que a ideia seja boa, mesmo que pudesse ouvir minha
psicóloga me dizendo que tudo bem se permitir sentir a dor, eu não iria fazer
tal ato. Não serei vulnerável, não posso ser. — Enfim, é uma longa história!
Uma na qual eu não estou pronta para compartilhar com mais pessoas, não
quando aquilo ainda é um dos principais motivos do ódio de Logan por mim.
— Pelo visto, isso é um lance complicado, não é? — murmurou, fazendo
com que eu abandonasse meus pensamentos.
— É bem mais complicado do que imagina… — digo baixo e me viro
para encarar seus olhos, decidindo que aquele assunto não arruinaria minha
noite. — Mas vamos esquecer isso… Hoje não é uma noite para
lamentações!
— É, você está certa, Verônica! — declarou, por fim, drenando um sorriso
em retorno. — Vamos? Ou minhas amigas irão mandar cortar meu pescoço
caso eu não chegue logo.
— Sim! Summer e Hazel talvez apareçam! — Sorrio, entrelaçando nossos
braços e começando a andar. — E acredite em mim, elas são piores do que
eu quando estão bêbadas!
— Então, terei que descobrir com meus próprios olhos — Ana murmurou,
enquanto seguíamos até a entrada principal do hotel.
O caminho até um dos bares mais conhecidos em toda Boston foi
definitivamente mais rápido do que pensei que seria, talvez fosse por conta
dos assuntos aleatórios no qual eu e Ana compartilhamos, ou das dezenas de
histórias sobre Saint Vincent que havia confidenciado à garota loira ao meu
lado. Quando dei por mim, já estávamos em frente ao bar Beverley's. Ainda
do lado de fora, podíamos perceber a movimentação no estabelecimento,
estava incrivelmente lotado e aquilo não me surpreendia, não quando todos
os times do condado haviam movido suas bundas para cá, para a
comemoração das temporadas estaduais.
A iluminação das letras brilhando entre as luzes neon ofuscam nossa
atenção enquanto seguimos em direção à porta de entrada. Os dedos de Ana
tocam a superfície lisa do vidro transparente e assim que ela empurra as
portas, um sino acima de nossas cabeças sinaliza nossa chegada.
Meu olhar, assim como o de Ana, percorre toda estrutura do
estabelecimento, percebendo o som alto tocando, enquanto ela procura por
alguém por cima da música Into It, da banda Chase Atlantic. Ergo meu rosto
em direção aos universitários e um deles, com a pele negra retinta e um
sorriso incrivelmente lindo, lança uma piscadela em minha direção e eu a
devolvo. Talvez mais tarde eu possa conhecê-lo melhor e tirar Logan da
minha cabeça.
— Ali estão elas! — Ana se virou para mim, sinalizando seu rosto em
direção ao canto do bar. — Vamos! — declarou, me puxando.
— Ok! — grito entre a música e tento caminhar em meio aos inúmeros
universitários espalhados pelo local. — Eu não pensei que teria tantos
universitários assim. Meu Deus!
— Nem eu — murmurou, franzindo os lábios. Enquanto eu tentava não
pisar acidentalmente em algum pé com meus saltos.
— A vadia loira deve ter morrido no meio do caminho, Hannah! — Uma
voz suave resmungou para sua companhia.
Ana apoiou suas mãos em volta da cintura de uma garota negra, que se
virou para ela emitindo uma careta nada agradável e ergueu uma
sobrancelha. Ela é muito linda, seus olhos verde-florestas brilham em
direção à minha nova amiga.
— Ainda não — a loira soprou, segurando a borda da cadeira. —
Demorei muito?
— Ela ainda pergunta — a garota que eu ainda não conheço murmurou,
batucando seus dedos contra a mesa. Seus olhos deslizaram em minha
direção e franziu os lábios. — Olá… Quem é você?
— Oh, Verônica, essas são Stefany e Hannah — declarou.
— Oi! — cumprimento, soltando um sorriso para as duas garotas
sentadas, que me encaram com curiosidade. — Eu sou Verônica Blackwell!
— Olá, Verônica. Sou Stéfany Taylor! — Stéfany soprou, percorrendo
seus olhos sobre mim. — Gostei do seu vestido!
— Sou Hannah Peterson. — A outra garota divagou, curvando seus lábios
em um sorriso genuíno enquanto erguia uma mão para me cumprimentar.
— Olá, Hannah! — Lanço-lhe um sorriso, igual ao que estava me dando e
então me viro para Stéfany, que ainda me encarava com aqueles olhos
brilhantes — Eu espero que vocês gostem de tequila!
— Bom, então você acertou em cheio, Verônica! Estávamos indo pedir
algo para o Barman. — Os seus lábios pintados com o batom
escandalosamente vermelho selaram um sorriso de canto. — Vão ficar em pé
até o fim da noite? — Ana deu de ombros enquanto puxava uma cadeira. —
Então, o que aconteceu? — Sté questionou, semicerrando seus olhos em
direção de sua amiga.
— Muita coisa… — Ana murmurou em direção a sua amiga. — Acabei
esbarrando em Verônica e aqui estamos.
— Eu diria que Ana me salvou de uma fria! — exclamo, me lembrando
do olhar de raiva que o barman daquele hotel estava me lançando apenas por
estar ali consumindo apenas água enquanto eu tentava ignorar a vontade de
subir até o quarto de Logan, que estava apenas a alguns andares de mim.
— Uau, Ana salvando alguém? Isso não se vê todo dia — Stéfany zombou.
— Na maioria das vezes é ao contrário, Verônica. Vai por mim!
— Oh! Eu preciso saber mais sobre isso, porque ela me pareceu ser uma
ótima salvadora de pessoas indefesas! — falo com a voz carregada de
humor.
Uma risada nasal exalou de Stefany, fazendo com que eu a acompanhasse.
Era um clima leve, gostoso, como se estar ali entre elas fosse certo.
— Espero que a "senhora indefesa" saiba dançar, além de se meter em
apuros, pois estou esquentando essa cadeira tempo demais! — Taylor
resmungou, murchando os ombros esguios.
— Meu Deus, eu já te adoro apenas por isso! — exclamo, sorrindo,
enquanto levo meu dedo anelar até uma mecha solta de meu cabelo e a
colocando atrás de minha orelha. — Mas, antes, merecemos um drink!
— Por favor! — Sté retrucou. — Onde você estava todo esse tempo?!
— Puf! Saint Vincent, vocês deveriam visitar um dia! — profiro, as
encarando. — É uma cidade de merda, mas temos as melhores festas
universitárias!
— Quem sabe um dia não damos as caras por lá? — Sté declarou em um
tom sugestivo. — Já estou farta dos universitários da CBU. Ugh! —
Estremeceu, adotando uma expressão insatisfeita. — Nossa sorte é que eles
não estão aqui. Eu espero.
— Eu não comemoraria tão cedo assim… — Franzo o cenho, levantando
meu celular. — Os jogadores do SVU estão rodando todos os bares da
cidade, e creio que logo eles chegarão aqui, junto com os da sua
universidade!
— Espera! Eles juntos?! — Ana exclamou insatisfeita, antes de perder a
fala.
— Infelizmente sim! — Ergo meu celular para as três, mostrando uma foto
que Logan havia postado a alguns minutos em seu Instagram acompanhado
dos garotos do SVU e mais alguns que eu tinha certeza que não pertenciam a
nossa faculdade — Eu não faço a mínima ideia de quem são os outros, além
dos garotos com a blusa azul do SVU, então… creio que seja da de vocês!
— Espera, de quem vocês estão falando? — Sté perguntou, confusa.
— Nathaniel e o ex-namorado de Verônica estão atrás de nós, Sté — Ana
contou.
— Ok, e por que eles estão atrás de vocês? — A amiga de Ana retruca,
com as sobrancelhas franzidas. Eu não lhes contarei que o meu ex namorado
está atrás de mim porque estou o evitando, então apenas observo que Ana
leva as mãos até seu pescoço e Sté acompanha o movimento. — Espera,
você não… você transou com ele?
Eu abaixo meu olhar para meu celular, procurando pelo número de
Summer ou Hazel para me encontrarem aqui e ignoro a conversa que havia
se formando entre elas sobre o momento de Ana com Nathaniel. Assim que
ergo meu rosto para Ana, ela me encara, soltando um suspiro.
— Céus, então vamos torcer para eles não nos acharem. Preciso beber
algo — Ela notifica, levando o olhar até o barman do outro lado do balcão.
— Contanto que o Underwood não atravesse aquelas portas, nós estamos
bem! — esbravejo, erguendo um dedo para o barman assim que Ana pediu
quatros doses de tequila. — Duplique a dose, por favor!
— Oh, sim, por favor. — A voz de Ana saiu arrastada, enquanto dedilhava
meus dedos sobre o balcão. Não demorou muito para ele servir as oito doses
de tequila em uma bandeja metálica.
— Vamos brindar a algo? — Hannah questionou, pegando o shot de
tequila.
— Algo em especial? — Ana indagou para mim que já mantinha uma dose
entre meus dedos.
— Por uma noite sem jogadores de futebol idiotas! — respondo
levantando o meu shot.
— Por uma noite sem jogadores de futebol idiotas! — Hannah, Stefany e
ela declararam em uníssono, erguendo nossas tequilas para o alto. Depois de
brindar, levamos o shot em direção aos nossos lábios. A bebida desliza com
dificuldade em minha garganta, deixando-a apertada. Meu corpo estremeceu,
enquanto bebia tudo de uma só vez.
Depois de alguns minutos ou horas, não sabia ao certo, nós estávamos
bêbadas o bastante. Stéfany havia me puxado para uma pequena pista de
dança improvisada no meio do bar e Ana já se remexia conforme a música
que ressoava nas caixas de som. Talvez estivéssemos em nosso oitavo ou
nono drink, não sabia bem qual o número exato, principalmente porque
Hannah sempre aparecia com novos a cada vez que ia até o balcão, não
dando tempo para que o álcool se extinguisse de nosso organismo.
Quando terminei meu último shot e já sentia todo o salão girando, a
melodia de Baby One More Time, da Brithey Spears, começou a preencher
todo o ambiente. Stéfany me encarou do outro lado do bar e correu em minha
direção, puxando Ana. Hannah soltou uma gargalhada enquanto observava a
garota de olhos verdes puxando uma cadeira e subindo em cima do enorme
balcão e depois estendeu a mão para nos ajudar subir.
— Eu amo essa música, Britney nunca errou! — Sté exclamou sob a
música alta, enquanto movimentava seus quadris lentamente em sincronia
com a música. — Certo, você sabe a coreografia? — questionou, olhando
para mim. — Me diga que sim!
— Seria uma humilhação uma dançarina não saber dançar Britney,
Stéfany! — grito para que possa me escutar. — Me respeite, mulher!
Uma gargalhada salta da sua boca.
— Certo, você instrui Hannah, que eu dou meus comandos para a vadia
loira — sinalizou em minha direção, enquanto eu erguia uma sobrancelha.
Disposta a fazer isso, eu me viro para Hannah, sorrindo e colocando as
mãos em torno de sua cintura, e aponto para que ela dê um passo para o lado,
quando ela o faz, começo a instruí-la a remexer seu corpo conforme os meus
movimentos. Era uma coreografia fácil, apesar de não estarmos com roupas
adequadas para uma dança tão sensual, nós fizemos o nosso melhor.
— Você é uma boa dançarina, Hannah! — Solto uma gargalhada quando
ela imita um dos meus movimentos.
— Creio que não! — declarou, balançando a cabeça em negação, rindo,
enquanto olhávamos para o lado e observamos Ana seguindo a condução de
Stefany. A segunda, sem dúvidas, sabia o que fazer. Ana tentou movimentar
seus quadris sutilmente, sem ao menos ligar para a movimentação de
pessoas, que lotavam ainda mais o bar. Olhares nos cercavam. Éramos a
atração do Beverley's. Era como se estivesse repetindo a cena da minha
primeira festa com Hazel e Summer, quando fizemos o mesmo em cima da
mesa da casa dos meus pais.
Ergui o braço para que Hannah me ajudasse a me movimentar até a
superfície do balcão, mas quando começo a me abaixar, Ana emite um
chiado.
— Olhem! — sibilou, enquanto meu olhar seguiu sua voz arrastada.
— Merda! — xingo alto o bastante para que todas as garotas pudessem
ouvir.
Logan estava parado à porta, ao lado de mais três garotos. A blusa azul do
SVU contracenava com seus olhos da mesma tonalidade, mas não havia
nenhum tipo de brilho evidente ali. Ao contrário, estavam escuros,
queimando feito chamas, e me encarava como se eu estivesse cometendo um
crime atroz. Meu olhar recaiu sobre ele mesmo que estivesse nublado por
conta do álcool que havia consumido esta noite, ainda sim, eu podia o
enxergar. Ele estava gostoso pra caralho e, Deus, eu poderia deixá-lo me
foder dentro do banheiro deste bar. Poderia me agarrar ao preto de seus
cabelos que brilhavam sob a luz do bar e beijar sua boca carnuda até que nos
faltasse ar.
Ao seu lado, estava um garoto do seu tamanho que encarava Ana. Seus
olhos pareciam ser de um tom cinzento e seus cabelos escuros estavam
terrivelmente bagunçados, como se nas últimas horas tivesse passado seus
dedos entre eles. Ainda estava estática, Ana analisou sua mandíbula
apertada. O outro garoto era loiro e encontrava-se ao seu lado, mantendo
uma sobrancelha erguida, seus cabelos loiros jogados para trás. E por fim, o
último garoto tinha os lábios franzidos, como se estivesse tentando decifrar o
que estávamos fazendo em cima desta mesa, suas íris castanhas percorreram
por todas nós, aproximando-se a cada passo.
— Certo, acabou o showzinho particular, idiotas! — o garoto de olhos
cinzentos declarou, exalando frieza em casa sílaba para os caras que
rodeiam nossa mesa. E pela expressão que encarou Ana, eu soube de quem
se tratava.
— Esse é o cara que você deixou com uma ereção, Lawrence? —
resmungo, lançando uma careta para ele e, meu deus, se não fosse pelos
olhos cinzentos eu poderia jurar que ele se parecia com Logan. Certo, talvez
fosse o álcool que estivesse me fazendo enxergar tais coisas.
— Deus, sim! — ela declarou, contraindo os lábios. O rosto de seu ex se
transformou em uma massa pateticamente engraçada. — Então, esse é o cara
que você derrota em corridas clandestinas? — Ela sinalizou, guiando seus
olhos para Logan, que mantinha uma carranca, enquanto me fitava com
dureza.
— Puf! Foi uma vitória fácil! — Dou de ombros e me viro para encarar
Logan. — Você quer contar para minhas novas amigas qual a sensação de
perder para sua ex, capitão?
— Caralho, Verônica! — Logan esbraveja, passando a mão pelos cabelos.
— Desça sua bunda daí antes que caia e se machuque! — Quando não faço o
que solicitou, ele se vira para o garoto ao seu lado, que ainda encarava Ana
com uma expressão rigorosa e murmura: — Cara, é melhor tirá-las de lá
antes que uma delas caia ou uma merda aconteça!
— Cair? Estamos perfeitamente sãs, cara — Ana declarou, cruzando os
braços na altura dos seios. — É impressão minha ou eu realmente estou
vendo-os praticamente idênticos? Céus, isso é insano!
— Cacete, você está completamente bêbada, abelhinha. Venha, por favor
— o sósia de Logan notificou, inclinando seus passos até a mesa, mas antes
de ter êxito, Ana ergueu um dedo em sua direção.
— Não ouse! — ela exclamou, e como se não desse a mínima, ele veio até
a mesa inclinando sua mão na direção dela.
— Por Deus, venha logo, abelhinha!
— Esperava qualquer coisa, menos vê-las dançando em cima de uma
mesa — o garoto de olhos castanhos zombou.
— Muito menos eu — Nathaniel resmungou.
— A ereção deixou você ranzinza demais, Sullivan! — Ana provocou,
umedecendo os lábios, fazendo com que eu soltasse uma gargalhada.
— Caralho, loirão! — Alex gargalhou se juntando a mim.
— Ugh, vocês são um porre! — Sté resmungou, enquanto mantinha suas
mãos envolta da cintura.
— Quem está completamente bêbada em cima de uma mesa é você,
Taylor. Sugiro que desça — o loiro notificou, drenando seu olhar em Stéfany.
— E eu sugiro que você vá para o inferno, Peterson! — Expõe ao torcer a
ponta do nariz perfeitamente afilado, quando seus olhos verdes escuros
fixam ao garoto. Ele ainda mantém seu maxilar marcado, enquanto suas íris
azuladas se transformam em deboche.
— Aí! — Dou uma gargalhada enquanto observo a briga que havia se
formado entre eles. — Stéfany, mulher, você é incrível!
— O que posso fazer? — zombou, movimentando seus ombros.
— Verônica? — Logan resmunga perto o suficiente do balcão — Desça!
Merda, anjo, por favor, faça isso, antes que eu suba aí e te faça descer contra
sua vontade!
— Beleza, tentamos do jeito convencional. Já que não deu certo, será do
nosso! — Nathaniel adotou um tom sério, antes de olhar para Logan e
assentir. Merda! Merda! Merda! Essa troca de olhares não é boa.
— Não pense em fazer o mesmo, Underwood! — sibilei, o encarando com
uma expressão dura.
— Peço desculpas antecipadas então, Blackwell! — Antes que eu
pudesse dizer mais alguma palavra, Logan segura em minha cintura e puxa
para seu colo, fazendo com que uma de suas mãos subisse até um pouco
acima das minhas costas desnudas e a outra segurava a barra do meu vestido
para ele não subisse e eu ficasse nua. Um arrepio consciente do toque sobe
sobre minha espinha assim que sinto a palma de sua mão entrar em contato
com minha pele, era áspero e fazia cócegas enquanto se mexia para não tocar
alguma parte indevida.
E quando finalmente ele me coloca sobre o chão, tento me equilibrar. Mas
infelizmente, não tenho êxito, principalmente porque entre os braços de
Logan, me sinto confortável, como se o álcool fosse o menor dos meus
problemas. Dou um passo à frente, tentando enxergar minhas novas amigas, e
sinto um braço circular pela minha cintura, me dando estabilidade para não
cair. Levanto minha cabeça em direção a ele e seus olhos me dizem para não
sair dali.
Talvez Nathaniel e Logan estivessem certos em nos tirar daquele local,
estávamos bêbadas demais e uma merda poderia ter vindo a acontecer, mas
valeu a pena. Cada momento em que passei ao lado dessas garotas foi como
se o caos que minha vida se encontrasse longe desse bar, não existisse, como
se fosse fácil estar aqui, fácil viver longe de tudo. Mas nada era tão fácil e já
havia aprendido aquela lição. Por esse motivo, apenas solto um suspiro.
— Você pode me soltar agora, Underwood! — resmungo contra seus
braços na tentativa de me libertar e tentar respirar algo que não seja sua
colônia amadeirada, mas perco a linha de raciocínio quando escuto a voz de
Stéfany atrás de nós, fazendo com que todos olhassem em sua direção.
— Mas que diabos você está fazendo, seu babaca!? — Ela vocifera, no
segundo em que Eric circulou suas mãos firmes nela.
— Acredite, mesmo odiando-me amanhã, irá agradecer por ter tirado você
daqui, my heart! — O loiro exalou, enquanto Stefany se remexia em seus
braços. — Porra, Hannah. Até você? — Seus olhos intensamente azuis
seguem em direção a Alex, que ainda encarava Hannah, atordoado. Vejo Eric
inspirando fundo. — Ajude Hannah a descer, James.
— Não, eu quero dançar! — exclamou quando o amigo delas se
aproximou. — Não me toque!
— Seu namoradinho idiota não vai se importar, Jane, já que deixou você
sozinha em uma sexta à noite! — Alex zombou, deslizando a língua entre os
lábios.
— Mas que merda! Vocês não têm mais o que fazer do que atrapalhar a
nossa noite? — esbravejo, encarando os quatro idiotas que estão com uma
expressão nada amigável.
— Beleza, Underwood, já encontramos elas, então vamos indo —
Nathaniel declarou, enquanto girava seu rosto delineado na direção de
Logan.
— Também estamos indo! — Logan abaixou o olhar em minha direção,
como se estivesse dizendo para não discordar e quando decido contrariá-lo,
ele continua: — Nós precisamos descansar, amanhã temos um jogo e depois
uma longa viagem até Saint Vincent!
— Meu Deus, Nathaniel. Por que está tudo girando?! — Ana perguntou,
atordoada. Enquanto eles seguiam até as portas do bar, olhares nos cercavam
por todo estabelecimento. Éramos uma atração, garotas sendo carregadas por
caras que odiávamos, ou tentávamos.
— Talvez seja porque você está completamente bêbada, abelhinha — ele
declarou, antes de puxar a porta.
Do lado de fora, uma movimentação se instalou. Havia alguns guardas de
trânsito cercando os carros estacionados, entre eles estava o Mustang e o
Ford Mustang Mach preto que eu tenho certeza absoluta de que não é o de
Logan, mas sim de um dos seus companheiros de time e um Jeep Azul-
celeste.
— Vocês são os donos deles? — Um senhor com o uniforme da polícia de
Boston pergunta assim que paramos na calçada.
— Sim! — Logan responde dando um passo a frente, me puxando junto. —
Algum problema?
— Sim, ambos vão ser multados — ele murmura nervoso. — Estavam
apostando corrida, garotos? Pela velocidade, não me admira.
— Digamos que foi por uma causa justa! — Logan diz com a mandíbula
apertada e volta seu olhar para Nathaniel, que o encarava com a mesma
reação.
— É uma pena, pois essa causa justa não irá justificar. Poderiam ter
causado um acidente! — o guarda retorna a falar.
— Merda! — Ouço Nathaniel xingando.
— Isso não será bom para o nosso próximo combate, capitão! — Solto
com a voz arrastada e deixo um sorriso sorrateiro nascer em meus lábios.
Observamos o guarda anotando algo em um bloco, em seguida, entregou
para Nathaniel e Logan. Ambos olharam para o papel, no segundo seguinte,
vejo seus queixos caírem.
— Porra, 500 dólares, cara?! — Nathaniel esbravejou, olhando para o
papel amarelado.
— Tá de sacanagem com a minha cara! — Logan diz, passando uma das
mãos sobre os cabelos, bagunçando-os. — Eu deveria fazer você pagar,
anjo!
— Não era eu quem estava ao volante, Underwood! — Solto um sorriso
frio. — E nós dois sabemos que se fosse eu, essa multa não existiria!
— Hoje realmente não é seu dia, Sullivan, querido… — Uma mão
deslizou em sua mandíbula, fazendo-o estremecer, enquanto suas íris
cinzentas escureciam.
Nathaniel abaixou o rosto até as alturas dos ouvidos de Ana e disse algo
inaudível.
— As crianças acabaram com a cena? — o guarda esbravejou a nossa
frente. — Paguem a multa e não façam mais merdas como esta, garotos!
— Não faça merda como esta, Sullivan... — Ana imitou o guarda,
entrelaçando seus braços em volta do pescoço de Nathaniel.
— Nós deveríamos tomar mais um shot para comemorar a multa de vocês,
não é todo dia que isso acontece! — digo inclinando a cabeça em direção a
todos.
— Sabe, é uma ótima ideia, Verônica! Me solte no chão, Nathaniel — Ana
pede, curvando seus lábios sorrateiramente, no segundo seguinte ele solta
uma risada nasal.
— Nem ferrando, já falei que vamos para o hotel! — Ela solta uma cara
decepcionada e seus ombros murcham.
— E chega de álcool para você, Blackwell! — Logan resmunga, me
segurando. — Amanhã você tem a merda de uma apresentação no jogo e nós
sabemos como fica insuportável de ressaca!
— Hazel pode fazer isso por mim. Aliás, onde está ela e Sum? —
pergunto emitindo uma careta. — Aquelas vadias me falaram que me
encontrariam!
— Hazel está no hotel com seu irmão e Sum não conseguiu vir! —
resmunga e se vira para Nathaniel. — Cara, eu preciso levá-la embora antes
que consiga levar sua garota para dentro de novo!
— Beleza, Underwood. — Nathaniel acenou em sua direção enquanto
seguíamos para lados opostos.
— Ana! — grito me virando na direção da garota loira. — Você realmente
deveria vir para Saint Vincent algum dia desses e trazer Stéfany e Hannah!
— Seria perfeito! — ela devolve gritando na mesma proporção.
— Nathaniel, cuide bem da minha nova amiga! — Solto um sorriso e me
viro novamente para minha amiga. — Lawrence, eu realmente amei te
conhecer! Obrigada pela noite!
— Eu também amei nossa noite, Vee!
— Foi bom conhecer você, Verônica! — Sté disse, se despedindo.
— O mesmo, Taylor! — Dei um sorriso torto para a garota. — E diga a
Hannah que ela é uma péssima dançarina!
— Direi a ela quando acordar amanhã! — Sté retornou em resposta,
gargalhando. Hannah dormia como um bebê nos braços de Alex.
— Oh, meu Deus! — Solto uma gargalhada quando finalmente vejo
Hannah. — Ela está péssima!
— Estará ainda pior amanhã! — Ana resmungou, contraindo seus lábios.
— Até mais, Verônica!
Elas acenaram enquanto Logan apenas me deu a mão e me ajudou a
caminhar até a porta do passageiro de seu carro. Mas antes de entrar, viro
meu corpo novamente em direção das garotas e aceno. Era como se já nos
conhecêssemos há anos, como se uma amizade tivesse sido formada ali entre
universitários bêbados, shot de tequilas e músicas da Britney Spears.
E quando finalmente eu me joguei sobre o banco de couro do carro de
Logan e ele passou o cinto de segurança pelo meu corpo quase adormecido,
eu apenas deixei que minhas pálpebras se fecharem.
Amanhã eu voltaria a lidar com meus problemas.
Onde há desejo, haverá uma chama
Onde há uma chama alguém está sujeito a se queimar
Mas só porque queima não significa que você vai morrer
Você tem que se levantar e tentar, e tentar, e tentar
Try | Pink

Minha cabeça dói pra caralho.


É a primeira coisa que constato quando finalmente abro meus olhos. A
segunda, é olhar para baixo e soltar um suspiro de alívio ao perceber que
estou vestida. Mesmo que não seja meu vestido da noite anterior, mas sim
uma camisa azul do Saint Vincent University. Pisco uma, duas vezes para
espantar o sono e assim que me levanto, sentando sobre a cama, percebo que
a blusa é grande demais para meu corpo, ela chega até o meio das minhas
coxas e é larga o bastante.
Ok, Vee, você não transou com um estranho, você se lembraria disso!
Certo?
Mordo meu lábio inferior enquanto tento me lembrar de como parei em um
quarto de algum jogador do SVU, talvez fosse Mike ou Kennedy. Não,
Kennedy não seria, ele é amigo de Logan o suficiente para não querer se
meter entre nós. Merda, eu preciso me lembrar de como vim parar aqui.
Mesmo que eu saiba que Ana não me deixaria sair daquele bar com qualquer
garoto, pelo menos tento me agarrar a isso, já que ela não estava em seu
melhor julgamento depois de tantas doses de tequila.
Caminho até a mesinha de cabeceira, tentando encontrar minha bolsa ou
algo que me dê uma pista de quem foi meu companheiro durante a noite, mas
a única coisa que encontro é uma jaqueta de couro que está jogada em uma
cadeira do outro lado do quarto, ao lado do meu vestido dobrado. Além
disso, e da cama bagunçada, todo o lugar estava impecável. O que não me
ajuda em nada na missão de descobrir a identidade do desconhecido.
Solto uma lufada de ar e decido que a melhor decisão a tomar é sair desse
quarto, antes que o dono dele volte e tenhamos a cena constrangedora de uma
noite casual que eu tanto evito. Puxo a camiseta por cima da minha cabeça,
ignorando a dor latejante que a ressaca me dá e, assim que volto a abaixar o
tecido, fico estática por um momento. Não, não é possível. O quarto não é de
um jogador qualquer, não é o sobrenome de Mike ou de Kennedy que está
estampado nas costas, mas sim do capitão deles.
Underwood.
O destino só pode estar fazendo a porra de uma brincadeira de mal gosto
com a minha cara, porque não pode ser possível que entre todos os
jogadores disponíveis neste hotel, eu tenha transado com Logan Underwood
novamente. Merda! Merda!
A fuga com certeza é a melhor opção neste momento e é exatamente por
isso que praticamente corro até a cadeira onde meu vestido está e o visto em
um tempo recorde, me preparado para correr, mas assim que me abaixo,
pegando meus saltos e levo a mão até minha bolsa, a porta se abre, fazendo
com que solte um palavrão por não ter sido rápida o suficiente.
— Você tem problemas em sair de um quarto civilizadamente, anjo? — A
voz rouca de Logan me faz virar.
E, puta merda! Logan Underwood está à minha frente com um moletom dos
Beatles, os cabelos bagunçados e os olhos ainda inchados do sono. Ele é
incrivelmente lindo, a porra de um deus grego com um sorriso travesso e
sobrancelhas arqueadas. Não há como definir ele de outra maneira, ele é
como uma obra de arte que chama a atenção de todos. E antes que eu possa
dizer algo, abaixo meu olhar para suas mãos e encaro a bandeja recheada de
comida que pode servir um batalhão inteiro.
— Eu nem deveria estar aqui! — digo quando finalmente recupero minha
voz.
— Não foi isso que disse quando tentei te levar para seu quarto. — Ele
solta um sorriso malicioso. — Você foi bem específica em seu desejo em
dormir em minha cama.
— Por Deus, Underwood, eu estava bêbada! — rosno em sua direção. —
E não se leva a palavra de uma pessoa bêbada a sério, merda!
— Você nunca ouviu dizer que uma pessoa bêbada é a pessoa mais
verdadeira no recinto?
— Não, Logan, eu nunca escutei isso. Para ser sincera, acho que está
inventando essa merda agora — murmuro, alcançando minha bolsa. — E não
deveria transar com garotas bêbadas, isso não é certo, nem para você,
capitão!
— E você acha que toquei em você enquanto estava quase inconsciente?
Não seja tão megera, Blackwell! — ele diz, erguendo uma sobrancelha com
uma expressão nebulosa. — Mas, para sua informação, você mesma tirou sua
roupa, agarrou a minha camisa e então desmaiou na minha cama.
— Merda! — murmuro mais para mim do que para ele mesmo. — Me
desculpe por tê-lo acusado disso, ok?
— Vindo de você, não é algo que me surpreenda! É uma megera por
natureza. — Ele sorri, me lançando uma piscadela, e ergue o queixo para a
enorme caixa. — Agora coma, não quero Dylan em minha porta por saber
que deixei a sua irmã desmaiar por ter saído em jejum depois de uma noite
fatídica de álcool em uma fuga desnecessária.
— Não estou com fome! — minto e meu estômago resolve que é uma boa
hora para expressar seu estado de espírito.
— Acho que sua barriga discorda disso! — Ele ergue uma sobrancelha
enquanto sorri. — Temos um treino em uma hora, Verônica, não complique
nossa situação.
Odeio a sensação de ter que concordar que ele está certo, mas não teria
tempo de ir até meu quarto tomar um banho e encontrar uma cafeteria para
tomar café até o horário do treino com as garotas, não quando tínhamos um
jogo na cidade vizinha à noite e eu precisava de toda a minha disposição
para aguentar um ônibus lotado e depois dançar em um estádio. Por esse
motivo, caminho até onde ele está e me sento na pequena mesa em frente a
varanda. Logan me passa um dos dois copos de café do Starbucks que tinha
na caixa e assim que o líquido quente toca meus lábios, fazendo com que o
gosto da cafeína me preencha, é como se estivesse inebriada, como a melhor
sensação do universo estivesse preenchendo meu corpo.
Era, até Logan abrir a caixa rosa e tirar de lá dois Donuts com confete
coloridos e me entregar um. Paro por alguns segundos, porque aquele doce
era o nosso favorito, o que comíamos sempre que íamos àquela lanchonete
que agora havia se tornado o Oásis. Meus olhos vão de minhas mãos até seus
olhos e então percebo que ele me encara como se também se lembrasse
daquilo, como se fosse um segredo que compartilhamos e não estávamos
preparados para falar.
E isso é demais, não posso enfrentar mais lembranças, não quando minha
cabeça lateja e meus sentimentos estão confusos. Minha mente já está
confusa demais para ter que lidar com mais isso. Por isso, apenas seguro o
Donut em uma mão e com a outra, me abaixo, pegando meu sapato e minha
bolsa e me levanto desajeitadamente.
— Verônica... — ele diz, me encarando.
— Hum… — Mordo meu lábio inferior, procurando por um
agradecimento apropriado. — Obrigada por ter me ajudado ontem à noite…
— finalmente digo, já me afastando. — Mas não precisa mais ser gentil.
— É isso que acha que eu fiz? — pergunta incomodado.
— Não me surpreenderia se fosse.
— Definitivamente prefiro sua versão bêbada! — exclama, largando o
copo em cima da mesa e se levantando.
— Isso é um alívio, porque a minha versão sã também não suporta você!
— A mentira escorrega pelos meus lábios como se fosse um suco amargo.
— Sabe por que larguei a porra do meu treino tático para te procurar,
Verônica? — Ele dá um passo à frente. — Porque estava preocupado demais
depois que vi a porra de um vídeo seu em cima de uma mesa, dançando
como se estivesse prestes a cair e fiquei louco, porque estávamos em uma
cidade desconhecida para ambos e poderia acontecer alguma merda! Levei a
porra de uma multa com um carro que nem ao mesmo era meu para te
encontrar e isso nunca me aconteceu, anjo. Então, acredite em mim, o que eu
fiz não foi por gentileza!
Estou parada a poucos centímetros de Logan, mas parece que respiramos
o ar um do outro, porque não sinto mais nada além do homem à minha frente.
Seus olhos queimam em mim, seus braços param em frente ao seu corpo,
cruzados próximo ao seu peito, fazendo com que as suas poucas tatuagens me
chamem a atenção. Assim que levo meu olhar até seu rosto novamente,
percebo que ainda está esperando uma resposta minha.
Mas o que posso responder? Que havia bebido daquela forma porque
estava tentando aplacar a vontade de ir bater em sua porta porque o rosto
dele atormentava todos meus pensamentos? Que ele havia se tornado meu
vício em tão pouco tempo? E que sinto falta dos seus lábios nos meus e de
como temos uma conexão na cama e fora dela?
Não, não falarei nada daquilo, não quando já dei partes suficientes de mim
para ele poder pisar e machucar.
— Eu te falei que devemos parar com isso, capitão! — solto enquanto me
viro a caminho até a porta, mas assim que a abro, olho sobre meu ombro, em
direção ao homem que é o responsável por toda a bagunça que está no meu
coração. — Não tente me salvar novamente.
E quando o ar frio do corredor abraça meu corpo, eu finalmente consigo
respirar.
Eu preciso urgentemente me livrar de todo esse sentimento por Logan,
porque isso está nos consumindo dia após dia.
E é perigoso, quente e destruidor.

Chegamos a UConn[6] faltando apenas quarenta minutos para o jogo e não


tivemos muito tempo para nos preparar e passar alguns detalhes que ficaram
faltando. Durante todo o caminho até aqui, ignorei a presença de Logan, não
olhei para ele desde o momento que saímos do hotel ou quando embarcamos
aqui, apenas me mantive focada em conseguir terminar esse dia sem mais um
confronto. E agradeci mentalmente por ele ter feito o mesmo. Quando entro
em campo, já posso sentir meu corpo pedindo por descanso e, por Deus, eu
farei isso assim que possa deitar em minha cama e ignorar toda a existência
da humanidade.
Os gritos das arquibancadas me fazem caminhar até o lado oposto do
campo e me sentar em um dos bancos disponíveis para as equipes de
cheerleaders. E não sei se me sinto tão esgotada pela dor de cabeça que
havia me acompanhado o dia todo, ou pelo cansaço que a ressaca e mais o
dia corrido me proporcionou, mas a única coisa que sei é que preciso
urgentemente terminar esse jogo e ir embora para casa.
O time de SVU está ganhando e toda vez que eles conseguem um novo um
ponto extra ou um Field Goal, a arquibancada se levanta em comemoração,
mas é perceptível que os jogadores estão levando esse jogo apenas por
serem obrigados, porque todos estamos esgotados por conta dessa semana e
não víamos o momento de podermos entrar no ônibus da faculdade e
finalmente partir para Saint Vincent.
— Você está péssima, Blackwell! — Uma voz calorosa soou ao meu lado,
me fazendo o encarar de esgueira.
Levi Johnson sorri alegremente para mim e coloca as mãos no bolso da
frente de sua calça jeans escura. O seu corpo abraça perfeitamente a
camiseta preta e branca da Adidas. Ele ainda tem aquele ar de garoto
travesso e amigável que tinha há anos atrás, o que me faz soltar um sorriso
fraco para meu antigo companheiro de natação e inclinar a cabeça levemente
para o lado.
— Isso deveria ser um elogio, Johnson? — provoquei, erguendo uma
sobrancelha.
— Oh, não! Eu não seria tão falso em dizer que fica perfeita até quando
está acabada — choraminga, colocando uma mão no coração. — Seria uma
afronta a educação que meus pais me deram, Blackwell!
— Oh, o juiz Johnson com certeza ficaria ferido em saber que seu filho
destruiu a autoestima da filha do amigo dele! — Gargalho.
— Me lembrarei disso quando estiver naqueles bailes insuportáveis que
nossos pais dão e você precisar de companhia para beber uma garrafa de
tequila, Blackwell! — provoca, soltando uma piscadela.
— Você nunca compareceu em nenhum deles durante o tempo que eu
estive fora, Levi — pondero, cruzando os braços na altura dos seios.
— Ah, eu compareci! Você que estava ocupada demais com algum
herdeiro idiota pelas salas vazias, Verônica! — Ele me lança um olhar
malicioso. — É realmente uma pena que tenha chegado tarde todas as vezes.
— Está flertando comigo, Johnson? — pergunto, lhe lançando uma careta
de confusão.
— Oh, com certeza não! Gosto de manter meu rosto intacto e minhas
amizades preservadas, Blackwell! — Ele gargalha, se aproximando e me
puxando para um abraço. — Mas não poderia deixar de zoar com a tua cara
bonita, agora... bem-vinda oficialmente de volta ao bando, princesinha
Blackwell!
— Você é um idiota!
— Você sentiu saudades, eu sei! — zombou, me soltando.
Eu senti. Não só dele, mas de todos os outros; de todas as vezes que
éramos um fodido grupo de amigos que se protegiam de tudo e todos, que
estavam ali caso precisássemos e caso caíssemos, que me seguraram depois
de tudo o que aconteceu, mesmo quando os abandonei aqui para tentar
superar aquela dor que a ausência dela me causava.
— Não seja tão cruel com ele... — Levi sussurra ao meu lado quando
finalmente me solta, apontando a cabeça em direção a Logan, que
conversava com o treinador. — Ele tem essa máscara de que nada o afeta,
mas, ainda sim, continua sendo o garoto com um coração gigante.
— E por que está me dizendo isso? — pergunto, erguendo uma
sobrancelha.
— Porque você, Verônica, consegue ser uma vadia quando se trata dele!
— Seu rosto emite uma careta. — E ele consegue ser um idiota quando se
trata de você, o que me leva a ser o apaziguador entre vocês dois!
— Não fique entre mim e Underwood, Levi! — digo o encarando. — As
pessoas tendem a saírem machucadas quando isso acontece.
— Não mais que vocês. — Ele sorri para mim, gentilmente. — Então aqui
vai um conselho: vocês têm um passado de merda, mas nada do que estão
fazendo um para o outro, irá mudar isso. Então mesmo que eu ame todo esse
rolê de vocês brigarem e me darem informações para contar a nossa turma,
eu também me preocupo com vocês...
— Levi… — Tento interromper, mas ele levanta a mão.
— Sei que vai dar aquele sermão de “eu não preciso de Underwood”,
mas precisa, sim. E ele também precisa de você, porque vocês conseguem
lidar com a dor um do outro como ninguém nunca conseguiu, conseguem se
salvar de todo o caos!
Solto um sorriso para ele, sem conseguir respondê-lo, porque, por mais
que uma parte minha gostasse de acreditar nisso, a outra sabe que não é
possível, porque não podemos salvar ninguém, a não ser nós mesmos.
Demorei para entender isso, demorei para aceitar que posso ter amigos, ter
uma família e que talvez possa ter tido Logan ao meu lado por um breve
momento, mas as minhas dores, meus machucados, são apenas meus.
Sou responsável pela cura, mesmo que seja lenta, mesmo que no caminho
doa, ainda sim, eu devo fazer isso. Devo superar toda essa escuridão que me
acompanha, todos os meus fantasmas.
— Ninguém deve ser responsável pelo caos do outro, Johnson!
— Não, não deve! — Ele abre um sorriso que eu sabia que conquistava
todo o campus e que eu apenas conseguia enxergar o garoto que brincou
comigo diversas vezes no playground. — Mas isso não significa que você
não precise de pessoas ao seu lado que te ajudem a sair da água quando
estiver se afogando!
E ele poderia estar certo, não poderia?
As minhas dores, meus medos e meus piores pesadelos são meus. Eu
deveria realmente me curar sozinha, mas isso não significa que eu precise
estar só durante esse caminho para o meu processo de cura.
Eu convoquei você, por favor, venha até mim
Não enterre os pensamentos que você realmente quer
Eu te encho, beba do meu copo
Dentro de mim está o que você realmente quer
Middle Of The Night | Elley Duhé

Quando chegamos a Saint Vincent, o clima estava ameno. Os jogadores


haviam descido do ônibus e corrido para suas casas antes que o treinador os
barrasse e pedisse por algo. Eu gostaria de fazer o mesmo, gostaria de poder
ir direto para o apartamento e dormir por horas, mas as responsabilidades
como capitão me tiram essa dádiva.
Antes que possa entrar na universidade, caminho até onde meu carro está
estacionado desde a sexta-feira quando viajamos e jogo minhas coisas no
banco de trás. Quando o tranco novamente, me viro para encarar o
estacionamento vazio, além do meu Ford Mustang, havia apenas outro carro
que está ali. O Bugatti está a algumas vagas longe da minha, o que me diz
que ela ainda está por aqui, provavelmente pelo mesmo motivo que eu.
Suspiro fundo, indo em direção à sala do treinador e quando finalmente
ultrapasso a porta de seu pequeno escritório onde ele já está me esperando,
observo-o cruzar os braços em frente ao seu corpo e inclinar a cabeça para o
lado, indicando a cadeira à sua frente. Os seus olhos escuros me encaram
com cansaço e seu semblante fechou-se enquanto encostava suas costas na
cadeira de couro.
— Uma multa de trânsito, Underwood?! — pontua respirando fundo. —
Você é o capitão, garoto, onde estava com a cabeça de correr pelas ruas de
Boston como um idiota em um carro de um dos jogadores da CBU?
— Creio que foram por motivos justificáveis! — Hesito, considerando
que poderia me deixar em maus lençóis caso diga a ele que o motivo pelo
qual tomei uma multa foi por conta de estar atrás de Blackwell.
— Ah, essa justificativa por acaso seria a capitã das cheerleaders? —
desdenha, erguendo a sobrancelha, enquanto eu o encaro, confuso. Como,
diabos, ele poderia saber tanto se nem do hotel havia saído? — Não me
encare assim, garoto, não é todo dia que recebo uma ligação de um amigo
que trabalha na polícia de Boston me contando que meu melhor jogador,
junto ao capitão do CBU, haviam tomado uma multa por alta velocidade e o
próprio treinador dele me liga me contando que o carro em questão, era de
seu sobrinho.
Merda! Merda! Merda!
— Estou encrencado? — Suspiro fundo.
— Com certeza está! — admite. — Você e Verônica Blackwell estão!
— Verônica?
— Óbvio, creio que neste momento ela está tendo uma mesma conversa
com sua treinadora... — Suspira.
— Estamos muito encrencados mesmo? — pergunto, erguendo uma
sobrancelha.
— O hotel estava cheio de conselheiros da faculdade, Underwood. Eles
viram vocês dois chegando... — Ele leva a mão até a ponte de seu nariz. —
E, por Deus, você estava praticamente carregando-a, então, sim, estão
bastante encrencados!
— Apenas me diga o que teremos que fazer...
— Não podíamos cogitar a ideia de suspendê-los por muitos jogos, por
conta de estarmos em plena temporada, então conseguimos aliviar a barra de
vocês frente ao conselho. Você e Blackwell, ficarão suspensos do próximo
jogo! — ele diz a contragosto enquanto eu soltava uma careta.
— É apenas uma multa e um porre, treinador!
— Eu não julgo, quando era aluno também fazia coisas estúpidas! — Ele
dá uma risada, aliviando a pressão em meus ombros. — Mas vocês estavam
sob responsabilidade da universidade e hospedados em um hotel cheio de
babacas de terno!
Merda! Ele estava certo. Não tinha parado para pensar nesta hipótese,
principalmente porque estava focado demais em Blackwell para me lembrar
que eles poderiam saber sobre a multa e sobre como chegamos ao hotel
naquela noite.
Após conversarmos sobre esse assunto e sobre os jogos que viriam nas
próximas semanas e de como os novos jogadores haviam evoluído, ele
finalmente me libera. Suspiro fundo enquanto caminho para a saída e me
deparo com Verônica Blackwell saindo da sala de sua treinadora com uma
expressão nada amigável. Seus cabelos estavam amarrados em um rabo de
cavalo e seu semblante era cansado, assim como o meu.
Ela caminhou até onde eu estava e seus olhos âmbares me encararam com
ódio. Se apenas um olhar pudesse matar, eu estaria no chão neste exato
momento.
— Você é um desgraçado, Underwood!
— Eu? — Ergo uma sobrancelha. — Deixe-me lembrar uma coisa, anjo:
você estava bêbada e eu atravessei a cidade para salvar essa sua bunda
bonita.
— Eu não pedi ajuda! — exclama, inclinando a cabeça.
— É uma pena, porque ficou bastante confortável quando a trouxe para o
hotel e não a deixei que fodesse com qualquer universitário enquanto mal
sabia onde estava — rosno, dando um passo à frente.
— Então o problema era esse? Eu foder com alguém que não seja você?
— Ela grunhe, olhando para cima, diretamente para os meus olhos. — Não
seja tão babaca, capitão!
— O problema, anjo, é você! Meu problema sempre será você e que
também sou fodido o suficiente para me preocupar com você! — exclamo,
dando um passo para trás e bagunçando meus cabelos. — Mas, infelizmente,
ainda é uma megera para não perceber isso!
— Babaca! — murmura, como se não tivesse argumento suficiente contra
minhas palavras.
— Megera! — Solto um sorriso, mesmo que não fosse um melhor
momento para isso. — Voltamos a esse jogo sujo, anjo?
— O único jogo que iremos jogar, capitão, é de você entrando nesta porra
de carro e levando a sua bunda para longe de mim, antes que eu tome a pior
atitude do meu dia.
— Você me agrediria ou me beijaria? — pergunto estampando um sorriso
em meu rosto.
— Primeira opção, óbvio! — ela mente descaradamente.
— Não acho que me agrediria, principalmente porque já nos encrencamos
demais, mas para que não fique tão frustrada, vamos fazer o que sabemos
fazer de melhor, anjo. — Dou um passo à frente, levantando a mão até seu
queixo e encarando aqueles olhos. — Nós vamos correr! — Solto um sorriso
malicioso em sua direção quando ela ergue uma sobrancelha. — Se você
ganhar, eu mantenho a distância e terminamos esse nosso jogo sujo...
— E se você ganhar, capitão? — pergunta, erguendo uma sobrancelha.
Dou um passo à frente, meu sorriso aumentando, e então me abaixo
lentamente, deixando um beijo em sua bochecha, sussurrando em seu ouvido:
— Se eu ganhar, irei foder você dentro do meu carro e fazer com que goze
novamente em minha cara, anjo!
Ela suspira, um suspiro fodidamente lindo enquanto passa a língua pelo
lábio inferior. Porém, um sorriso frio escorrega pelos seus lábios, aceitando
o desafio. Verônica dá um passo para trás, se desvinculando de mim e sem
mais nenhuma palavra, se vira e caminha até seu carro. Ela abre a porta e
escora o seu antebraço no metal, me encarando. Vee ainda tem aquele
maldito sorriso no rosto, como se gritasse que está pronta para me fazer
comer poeira como na nossa última corrida, mas há uma diferença enorme
entre a nossa primeira corrida e essa.
— A corrida não pode começar sem que os dois estejam dentro do carro,
capitão!
Eu solto um sorriso, percebendo que ainda estou parado onde ela me
deixou. Não respondo, apenas caminho até o meu carro e deslizo para o
banco. Sei que não deveria ser assim, sei que temos que lidar com outros
assuntos e que não deveríamos continuar com isso, mas não consigo
abandonar a sensação que sinto quando Blackwell me desafia, como me faz
sentir vivo sempre que brigamos, como seus lábios travam uma guerra contra
os meus sempre que se colidem ou em como ela fica gloriosa quando geme
meu nome assim que chega em seu ápice. Mas a realidade é que nada disso
se compara a quando ela me encara com os olhos brilhantes e um sorriso
lindo se forma em seu rosto, destacando a pequena covinha nas suas
bochechas.
Sou tirado dos meus pensamentos quando nossos carros ficam lado a lado
em frente ao último semáforo da SVU. Olhei para o lado, como da última vez
que fizemos isso, e ela se virou no mesmo momento. Um sorriso estampava
seus lábios, fazendo com que um idêntico cresça nos meus.
Quero essa mulher, em níveis não compreendidos por ninguém. E eu a
terei, porque sei que o sentimento é recíproco.
E pela primeira vez desde que comecei a correr, tenho a convicção de que
não posso perder.
Quando o semáforo pisca à minha frente, me preparo. Encaro a rua
deserta, levando meus pés até o acelerador.
Vermelho.
Amarelo.
Verde.
Nós aceleramos no mesmo segundo, corremos pelas ruas conhecidas como
se estivéssemos apenas andando num dia ensolarado, viramos uma esquina
onde ficam alguns bares e restaurantes, e percebo, pela minha visão
periférica, que alguns curiosos viram seus rostos em nossa direção para
encarar a cena, o que me faz sorrir. Estamos sendo o centro das atenções,
mesmo que isso fosse errado e proibido. Seguro o volante com força,
nivelando nossos carros em uma rua que sei que não tem movimento, e me
preparo para ultrapassá-la, mas Verônica é mais rápida e desliza seu carro
para frente, com uma velocidade surpreendente. Quando alcançamos a pista
principal onde é a divisa entre a parte alta e a parte baixa, uma sirene ressoa
atrás de nossos carros.
Verônica diminui a velocidade para finalmente nivelarmos nossos carros e
quando faço isso, ela me encara com uma dúvida no rosto.
— Merda! — resmungo.
Olhei de relance para o carro de Vee novamente e como se fosse uma
conexão, ela se vira para mim. Ela sabe que estamos em apuros, sabe que se
quisermos, poderemos nos livrar dos polícias, mas isso não seria bom.
Porra, seria péssimo. Porque se parássemos ali, seríamos pegos e estaríamos
muito encrencados, mas se continuássemos, corríamos o risco de nos
rastrearem por conta de nossas placas. Um de nós deveria parar para que o
outro possa ter a chance de se livrar, independentemente da consequência de
nossos atos.
Levo uma das mãos até meu rosto e aperto a ponte do meu nariz, tentando
pensar em algo que não fodesse com todos nós e aceno para ela. Ela sabe o
que quero dizer com isso, sabe que estou mandando-a acelerar e me deixar
para trás. No instante que fizer isso, eu pisarei nos freios, fazendo com que
meu carro pare no acostamento e ela se livre de uma multa ou de uma prisão.
Suspiro fundo, pisando no freio e encostando no acostamento. Estou
ferrado pra caralho! Levo minha cabeça até o volante, enquanto digito uma
mensagem rápida para o grupo dos nossos amigos e fecho meus olhos. Isso
vai me resultar em uma merda muito grande. O treinador com certeza vai
fazer picadinhos de mim quando descobrir que entrei em uma confusão
relacionada a outra multa quando mal havia saído de sua sala a menos de
uma hora.
Levanto meu rosto novamente, me surpreendo quando vejo o carro de
Verônica parado à minha frente. Não, não, ela não seria tão estúpida de ter
parado. Fodida seja Blackwell! Eu havia ficado para que ela se salvasse e
ela havia parado à minha frente para que nós dois nos fodêssemos!
— Saia do carro, garoto! — o policial diz assim que para em frente à
minha porta, enquanto sua colega de trabalho vai em direção ao Bugatti um
pouco a frente.
— Claro, senhor! — Sorrio enquanto faço o que havia instruído.
Caminho com ele até em frente ao meu capô e quando finalmente me
encosto nele, Verônica sai resmungando algo com a policial. Ela suspira
fundo, arruma as madeixas negras e caminha até onde estou com uma
expressão nada agradável. Seus olhos são como facas afiadas em minha
direção e ela não se surpreende quando percebe que meu olhar não é tão
diferente. Assim que finalmente para ao meu lado, ela se encosta no capô do
meu carro e solta uma lufada de ar.
— Vocês estão cientes que apostar um racha é crime, certo? — a policial
diz, cruzando os braços.
— Não estávamos fazendo isso, policial… — digo, contraindo meus
olhos até o sobrenome bordado em seu uniforme. — Jones!
— Até porque não haveria como apostar uma corrida contra esse idiota!
— Verônica resmunga ao meu lado. — Ele dirige como uma velhinha de
noventa anos!
— Eu diria que você estava dirigindo com uma criança que ainda está
aprendendo a andar! — murmuro, virando o rosto em sua direção.
— Não fui eu quem parou o carro e desistiu, seu idiota!
— Fiz isso para você poder chegar em casa, megera!
— Calem a boca, os dois! — O policial esguio bufou em nossa direção.
— Pelo que vejo, é melhor resolvermos isso na delegacia!
— Merda! — dizemos em uníssono.
Encaro Verônica por um segundo, enquanto ela sussurra um palavrão
inaudível para mim e se vira para os policiais, que estendem a mão em nossa
direção para podermos entregar as chaves de nossos carros. Suspiro fundo,
levando a mão até meu bolso e puxando a minha de lá, enquanto Vee fazia o
mesmo. Enquanto um deles caminha até os devidos automóveis, o outro nos
guia até o carro branco e azul com o emblema do departamento policial de
Saint Vincent.
Suspiro fundo, me sentando ao lado de Verônica no banco traseiro e
encosto minha nuca no apoio, enquanto encaro o teto. Eu realmente espero
que Levi não esteja com alguma garota entre suas pernas ou que, pela
primeira vez, tenha esquecido a porra do celular em casa, porque ele será a
nossa única saída para conseguir sair dessa confusão sem ter que acionar
minha tia ou os pais de Verônica. Mesmo que meu amigo ainda não tenha
completado sua graduação em direito, ele poderá nos ajudar.
Quando finalmente estacionamos em frente ao enorme prédio de tijolos
antigos, os dois policiais nos levam até uma sala com apenas duas cadeiras e
uma mesa, logo após somem, dizendo algo sobre preparar os papéis. A
sensação que essa sala exala é como se estivéssemos em um episódio de CSI
ou qualquer outra série investigativa e nós fossemos os suspeitos do crime.
Se algum investigador aparecesse por aquela porta, dizendo que precisa
fazer algumas perguntas, eu realmente não me surpreenderia.
— Eu ganhei! — A voz de Verônica me faz erguer uma sobrancelha.
— É sério? Nós fomos presos e você ainda acredita que ganhou alguma
coisa?
— Não seja rabugento, Underwood! — Ela caminha até a mesa e se senta,
cruzando as pernas. — Você desistiu, logo, eu sou a vencedora.
— Se pelo menos tivesse sido inteligente e tivesse continuado, eu lhe
concederia a vitória... — Dou um meio sorriso e caminho até ficar perto o
suficiente dela.
— Um acordo é um acordo, capitão! — contesta.
— Um acordo é um acordo quando uma das partes envolvidas cumprem
com o combinado, anjo! — declaro, levando minha mão até seu rosto e me
abaixando um pouco para sussurrar: — Neste caso, você tem duas opções:
uma revanche ou deixar que eu a faça gozar em meu rosto, como havia
prometido!
Ela abre a boca uma, duas vezes tentando responder, mas quando seus
olhos nublados de desejo encaram os meus, eu me abaixo mais um pouco,
lentamente, até que nossos lábios possam se encostar um no outro e uma das
minhas mãos deslizam até sua cintura. Posso sentir sua respiração, ver cada
pinta de sua pele e sentir como aqueles olhos castanhos me dominam,
fazendo com que toda a minha atenção seja apenas dela, mesmo quando
estamos em uma sala lotada de pessoas.
Os olhos nos quais estou obcecado se fecham lentamente, se preparando
para a ação que virá a seguir. E eu faço o mesmo, colo nossas testas e raspo
levemente seus lábios no meus, me preparando para beijá-la, mas antes que
eu possa fazer isso, a porta é aberta e uma fila de pessoas caminha para
dentro da sala, como se fossemos uma exposição que todos gostariam de ver.
Olho por cima dos ombros de Verônica, que está virada de costas para a
porta, e ergo uma sobrancelha enquanto Vee se vira de lado para entender o
que está acontecendo e emite uma careta para todos nossos amigos que estão
parados em uma fileira quase que organizada. Dylan, Hazel, Oliver, Summer,
Levi, Edmund e Josh estão parados, cada um nos encara de uma forma
diferente. Meu olhar se volta para Verônica, que segura uma gargalhada e
mesmo que eu não quisesse, uma se formou em meu peito.
Porque é a única reação que podemos ter no momento. Nós fomos presos,
quase nos beijamos em uma delegacia e agora havíamos sido pegos por
todos nossos amigos em uma situação comprometedora.
— Eu sabia! — A voz de Levi ressoou por todo o lugar. — Josh, você me
deve cinquenta dólares.
— Vocês apostaram que eles estavam tendo algo? — Hazel questiona
encarando meu amigo. — Por que diabos não me disseram, eu teria ganhado
muito dinheiro em cima de vocês, babacas!
— Você também sabia? — Oliver gargalha, olhando para Hazel. — Deus,
pequena Blackwell, você é péssima com segredos!
— Eu a ajudei a fugir do quarto de Logan, Wright, me respeite! — Hazel
ponderou dando de ombros.
— Você fez o quê? — Dylan protesta pela primeira vez, encarando minha
amiga.
— Desculpa, meu amor, mas amizades em primeiro lugar! — ela zombou,
dando dois tapinhas em seu peito.
Uma discussão sobre mim e Verônica havia começado entre eles, enquanto
nós dois apenas nos encaramos, tentando entender a dinâmica que estava
acontecendo entre eles. Summer nos encara quase que entediada e apenas
bufa, puxando Edmund e Josh com ela para fora da sala, deixando de lado a
discussão que havia se formado entre Levi, Hazel, Dylan e Oliver.
— Calem a boca, pelo amor de Deus! — Verônica grita sobre as vozes. —
Nós dois já estamos fodidos demais, não queremos mais problemas!
— Oh, vocês queriam... — Levi contrapôs sorrindo maliciosamente. —
Se não tivéssemos entrado, vocês transariam nessa mesa e, acredite em mim,
a fiança por atentado ao pudor é bem mais alta do que por alta velocidade!
— Não me diga que você vai ser o advogado hoje! — Vee diz, encarando
Levi.
— Eu sou o único disponível, princesinha Blackwell, me respeite! —
choraminga, franzindo a testa.
— Você nem é formado ainda, Johnson! — Verônica adverte.
— Eu realmente deveria deixar vocês dormirem em uma cela hoje, seus
ingratos! — entoou, nos lançando uma careta.
— Você só pagou as fianças, Johnson, vá com calma! — Dylan comenta e
se vira para Verônica. — Vamos embora antes que você arrume outro motivo
para ser presa.
Ela não responde, apenas pula da mesa e me encara por alguns segundos,
para enfim sair com Oliver e Dylan. Ela não olhou para trás, nem resmungou
uma só palavra, só seguiu como se fosse o certo. E antes mesmo que
atravessasse o batente da porta, eu já sinto falta do clima leve que se
instalou entre todos nós nesses poucos minutos.
Solto uma lufada de ar e balanço a cabeça, ajeito minha jaqueta no meu
corpo e sigo com Hazel e Levi pelo mesmo caminho que Verônica fez. Foi
um longo final de semana e não estou nem um pouco a fim de procurar mais
nenhum problema, principalmente porque eu já estou encrencado demais com
o treinador e não posso correr o risco de ser expulso do time agora.
— Tome cuidado na próxima, garoto! — o policial Jones declara do outro
lado do balcão da recepção. — Não é todo dia que aparece um bando de
universitários para pagar duas fianças altas!
Minha vontade é de soltar uma gargalhada, porque aquilo não me
surpreende, não quando sei que todos os meus amigos sempre fazem coisas
assim.
Nós podemos ser pessoas de merda, termos nossos próprios segredos e
fazer coisas que às vezes magoam um ao outro, mas sempre estamos ali um
para o outro.
E eu não ligo se eu cantar fora do tom
Eu me encontrei nas minhas melodias
Eu canto por amor, eu canto para mim
Eu grito como um pássaro liberto
E eu não ligo se eu cantar fora do tom
Bird Set Free | Sia

A chuva bate forte contra os vidros e os relâmpagos que ressurgem no céu


iluminam todo o salão de Emmy.
Nós não deveríamos ter saído de casa esta tarde, principalmente quando
sabia que Soph odeia tempestades. Ela sempre diz que um temporal é como
um presságio para coisas ruins e hoje minha irmã não está bem, porque me
encara do outro lado da sala com uma expressão triste, como se quisesse
chorar. Eu deveria ir até ela e perguntar o que está acontecendo, deveria
protegê-la, afinal, ela é a minha outra metade, mas quando dou um passo em
sua direção, ela me olha, solta um sorriso brilhante e logo após mexe os
lábios, me enviando um pedido simples:
— Dance comigo, Vee! — Sorrio, erguendo a minha mão e a chamando
para perto de mim, porque eu nunca negaria um pedido seu. E ela sabe disso,
sabe que sempre que pedir, dançarei, porque eu sempre estarei ao seu lado.
E ela vem. Suspiro profundamente, puxando o ar para meus pulmões e
espero a contagem começar. Um, dois, três, quatro... e nós começamos.
Seu corpo se move como vento, leve e livre. A melodia começa a guiá-la
e sei que ela ama isso tanto quanto eu. Dançamos desde que aprendemos a
andar, mas diferente dos passos graciosos de Soph, eu danço de forma
intensa, sinto a adrenalina percorrer todas minhas veias, me entrego
totalmente ao momento. Como se estar ali fosse o correto, a sensação de ter
nascido para isso percorre meus pulmões, me faz sorrir como em uma noite
estrelada.
A dança é uma paixão mútua que nos consome e somos boas, uma dupla
imbatível.
— Continue dançando, Verônica. — A voz doce de Sophie me faz erguer
uma perna para que eu possa girá-la da forma correta. — Sei que está se
segurando, que está se guardando dentro de si e que está com medo, mas
preciso que continue, Vee... por mim, por nós!
Balanço meus braços, formando um semicírculo, enquanto a música
clássica entra por meus ouvidos. Dou voltas, deslizando minha sapatilha, e
corro pelo salão dando saltos. E como ela me pede, me solto, deixo que meu
corpo fale por mim em cada passo e quando volto a abrir meus olhos, minha
irmã está ao meu lado. Nós nos mexemos sincronizadamente, é como se
fôssemos um espelho. Nossos braços fazendo movimentos leves, nossos
corpos sendo levados pela melodia. Fecho novamente meus olhos,
absorvendo o escuro e conseguindo efetuar toda a coreografia já ensaiada.
Dissipo tudo aquilo que me machuca, tudo aquilo que me corrói por dentro.
Por um momento, posso deixar toda a máscara cair, me permito ser eu, a
Vee, a que tem problemas, que é real, a versão de mim que sabe que é
quebrada por dentro e com uma imagem perfeita por fora, que muitas das
vezes é cruel, obscura e que se machuca mesmo que não transpareça.
De repente uma gota caí em meu rosto, depois outra e assim
sucessivamente, fazendo com que meu rosto fique encharcado. Pisco algumas
vezes e levanto os olhos, tentando adivinhar de onde vem essa água. Ergo
uma sobrancelha em confusão quando vejo que não estou mais no estúdio e
que Soph não está mais ao meu lado.
— Soph? — chamo mordendo meu lábio inferior e cruzando meus braços
frente ao corpo, me protegendo do frio.
Observo a escuridão ao meu redor. A paisagem nublada, os relâmpagos,
seguidos de trovões que emitem sons assustadores. Sinto o pânico corroer
meu interior, despertando algo, um medo que não entendo. Não tenho medo
de chuva, nunca tive, ao contrário, sempre a protegia quando ela se encolhia
com os barulhos. Mas meu corpo não parece compreender isso, porque
sinto-o começar a tremer, sinto a minha respiração ficar engatada na garganta
e um medo escurecer tudo à minha volta.
A chuva que agora havia ensopado não só o meu rosto, mas todo o meu
corpo, ainda cai fortemente, fazendo com que eu precise erguer minha mão
até meu rosto, para protegê-lo. Dou um passo à frente quando escuto um urro
de dor e por um feixe de luz, observo um carro branco todo amassado e uma
fumaça saindo de toda a lataria que antes era impecável.
Caminho a passos lentos a fim de ajudar quem quer que esteja dentro e
procuro um celular para pedir ajuda, mas constato que é impossível, já que
nem eu mesma sei como vim parar aqui. Assim me aproximo, assustada, e
me abaixo, minha respiração morre e uma lágrima desce pelo meu rosto.
É Soph. Seu cabelo agora se mistura ao seu sangue e ela chora de dor.
Não. Não. Não pode ser, eu não posso perdê-la.
Não hoje, não, nunca.
— Soph... — grito desesperadamente. — Por favor, Soph fale comigo!
Começo a puxar as portas desesperadamente, fazendo com que machuque
meu braço no processo, mas a dor não me incomoda, não enquanto sei que a
minha prioridade é salvar a minha irmã, a minha melhor amiga e confidente.
— Por favor, Soph, eu preciso de você!
Quando finalmente consigo entrar dentro do carro todo destroçado e a
alcanço, ela apenas maneou a cabeça e soltou um sorriso, enquanto erguia
sua mão até meu rosto e dedilhava cada curva dele. Seus dedos enxugaram
as lágrimas que escorriam pelo meu rosto.
— Eu amo tanto você. Eu sempre vou amar — murmura quase sem voz. —
E Vee? Continue a dançar, mesmo quando não houver música.
Paro por alguns segundos, tentando entender o que aquilo significa. Ela
não pode nos abandonar, não ela, não hoje. Mas quando vejo seus olhos se
fecharem lentamente, o desespero toma conta do meu corpo. Minha única
reação é gritar de uma maneira que me quebra ainda mais.
Não, não... não está certo. Ela não pode partir dessa maneira, ela não
pode me deixar aqui. E por isso continuo gritando, perdendo todo o controle
do meu corpo.
E percebo que grito desesperadamente por não conseguir salvá-la pela
segunda vez.
— Verônica, acorde! — Uma voz diferente surge entre os barulhos
incessantes da chuva, mas eu não me agarro a ela, eu me agarro à Sophie. Eu
preciso salvá-la desta vez, preciso fazer com que abra seus olhos
novamente. — Vee, volte para nós, por favor...
— Soph… não, não, não! — grito.
Meus olhos se abrem e a única coisa que consigo observar por baixo das
lágrimas, são os olhares assustados de Dylan e Edmund enquanto me
seguravam. Respiro fundo, encarando o rosto do meu irmão mais velho e
notando uma lágrima que finalmente desce pelo seu rosto, como se estivesse
aliviado por conseguir me acordar.
Então entendi o porquê de estarem ali. Eles haviam voltado. Os meus
pesadelos haviam voltado para me atormentar.
Solto um suspiro doloroso enquanto me jogo sobre meus irmãos, os
abraçando como se eles fossem a minha âncora, e escuto o momento em que
eles também deixam um soluço sair de suas gargantas e me apertam contra
seus braços, como se estivessem tentando me proteger do mundo.
— Está tudo bem, Vee, foi apenas um pesadelo... — Dylan murmura,
acariciando meus cabelos.
— Foi tão real, Dy! — choramingo. — Era como... se ela estivesse aqui
comigo…
— Apenas respire, Vee… — Ed fungou ao meu lado. — Nós estamos
aqui, você não está sozinha!
Não, eu não estou!
Penso, mas não respondo, apenas os aperto mais um pouco e os deixo me
envolver novamente em meus edredons, enquanto se deitam ao meu lado,
como se estivessem formando um casulo de proteção ao meu redor. Edmund
se alinha ao meu corpo e começa a conversar sobre seu novo jogo e sobre
como a faculdade estava o irritando. Por alguns minutos eu apenas o escutei,
fechei meus olhos e deixei que o tom rouco de sua voz me ajudasse a me
acalmar, porque sei que só está tagarelando dessa forma para eu possa
esquecer o pesadelo e conseguisse dormir.
Porém, a verdade é que não vou conseguir pregar os olhos novamente, não
enquanto todas as imagens ainda estiverem vivas em minha mente. E sei que
meu corpo pede por uma válvula de escape, por um banho longo ou horas na
sala de espelho da nossa casa e por isso apenas espero que eles consigam
dormir e me jogo para fora da cama.
Caminho descalça pelos corredores, até finalmente chegar à cozinha e
quando me jogo sobre a cadeira da bancada, abaixo a cabeça na pedra fria,
tentando pensar em algo que me consumiria pelo resto da noite, mas que não
faça destruir o pouco de equilíbrio que construí nos últimos meses, apenas
algo no qual eu possa suprir esse sentimento que abrigará meu peito pelo
resto da noite.
Talvez eu possa ligar para Oliver, Summer ou até mesmo Hazel, sei que
eles deixariam tudo e viriam para me ajudar, mas quando pego meu celular,
desbloqueio e deslizo meu dedo até o aplicativo de mensagens, o único nome
que me chama atenção é o dele.
Penso por alguns segundos, que pareceram séculos, mas acabo
bloqueando o aparelho novamente, o deixando sobre o balcão e decido que
preciso fazer isso sozinha, preciso aprender a me acalmar.
Decido que talvez uma caminhada possa me ajudar a deixar que todo o
pesadelo voltasse a adormecer em meu subconsciente. E por isso, ando até
as portas francesas que ficam na lateral da cozinha e a abro calmamente,
tendo a visão do enorme jardim e da piscina.
Mesmo sabendo que faltam poucas horas para o nascer do sol, tomo a
decisão de que é ali que permanecerei até que me sinta pronta para encarar a
realidade, até que o episódio de hoje volte a adormecer dentro de mim. Me
sento em uma das espreguiçadeiras de madeira escura na borda da piscina e
observo o enorme jardim que dá a vista para as outras casas que se estendem
por essa rua. Uma delas me prende a atenção, ela não fica muito longe e não
é tão grande como a dos meus pais, mas ainda sim, eu a conheço
perfeitamente. A luz de um quarto no andar superior que eu sei perfeitamente
a quem pertence, está acesa, mesmo que seja quase quatro horas da manhã.
Uma figura loira se escora na janela e olha diretamente para onde estou
sentada. Ela fica ali me encarando por alguns segundos e então some, junto
com a luz do seu quarto.
Suspiro e decido esquecer isso, já tenho problemas demais para lidar.
Fecho meus olhos e, por um momento, a imagem de Soph sorrindo vem à
minha mente. Ela era linda e eu sinto falta das vezes que esteve ao meu lado,
sinto falta dos pequenos segredos que compartilhamos e daqueles que ela
levou junto dela, porque eles seriam a resposta de tudo. Esses malditos
segredos poderiam ter feito com que o final daquela noite fatídica fosse
diferente, mas o problema é que, mesmo que eu não aceite, eu não conhecia
minha irmã. Talvez eu nunca saiba quem ela realmente foi.
E mesmo que eu não a conheça totalmente, ainda sim sinto sua falta, como
se fosse alguma parte de mim que tivesse sido retirada.
E essa parte deixou um vazio. Um vazio que tento preencher com
distrações idiotas e com a nossa dança, porém, por mais que eu tente, nada é
o suficiente. E eu tento não deixar que a falta dela afete meus dias, mesmo
que eu sinta tanta saudade do que éramos e de tudo que nós não tivemos
tempo de ser.
Sou tirada dos meus pensamentos quando um resmungo soa atrás de mim,
fazendo com que eu erga o rosto sobre meus ombros e me vire em direção ao
som. Minhas sobrancelhas se juntam ao perceber quem é a pessoa que está
parada em pé, cruzando os braços na grama do jardim, segurando uma
garrafa que eu sei que é Whisky.
Analu Parker caminha até ficar na minha frente. Meus olhos descem para o
pijama vermelho e dourado com um leão estampado que vestia, aquilo grita
Harry Potter e sei que ela não se importa, não quando nós duas sabemos que
a mulher de vinte e dois anos na minha frente é obcecada pela saga desde
que éramos adolescentes.
Eu deveria estar preocupada em como conseguiu atravessar o jardim sem
disparar os inúmeros alarmes, mas quando encaro aqueles olhos castanhos,
eu não me importo com isso, porque eles estão vermelhos e inchados, como
se estivesse chorando por horas. Então apenas aponto o queixo para a
espreguiçadeira ao meu lado e me viro novamente para encarar a paisagem
escura à nossa frente.
— Vocês ainda têm um alarme de merda, Blackwell! — resmunga, se
jogando na cadeira e levantando as pernas para estendê-las.
— Nós não precisamos de um alarme tão eficaz, principalmente porque
não é todo dia que alguém invade meu jardim, Parker! — solto sem a
encarar. — O que está fazendo aqui?
Ela não responde de primeira, apenas se ajeita no banco e suspira fundo,
como se estivesse em uma luta consigo mesma.
— Eu... e-eu não sei! — murmura. — Eu a vi sentada aqui, solitária e
pensei: por que não juntamos nossas merdas por uma noite?
— Está meio tarde para reaproximações, Analu. — Suspiro. —
Principalmente depois do que aconteceu naquela festa.
— Me desculpe… — ela disse verdadeiramente, sem sorrisos
sarcásticos, sem máscaras e sem nenhum tipo de hipocrisia à qual estamos
acostumadas. Isso faz com que eu finalmente olhe para o lado, fixando meus
olhos nos seus. — Foi uma atitude de merda, infantil e inconsequente... E
mesmo que não justifique, eu estava bêbada e frustrada com toda a minha
realidade, que achei mais fácil descontar em alguém que eu sabia que não
abaixaria a cabeça, mas sim que devolveria a ferida na mesma proporção!
— Existem palavras que cortam mais do que facas — declaro ainda a
encarando. — E as que proferiu em minha direção são um exemplo disso.
Soph não é um assunto no qual eu goste de falar e muito menos um que
deveria usar para me provocar.
— Você se lembra no primeiro ano sênior, quando você beijou Mike,
mesmo sabendo que eu era sua melhor amiga e que o amava? — ela
murmura, abrindo a garrafa que havia trago consigo e a leva até os lábios. —
Aquilo me feriu, Verônica! Eu nunca tive a oportunidade de te falar, mas
aquilo me feriu, não pelo idiota do Burhan, mas pela nossa amizade. Éramos
como irmãs e você preferiu seguir ordens dos seus pais a me proteger. Então,
acredite em mim, mesmo que eu odeie ser a vilã da situação, eu não vou
negar que essa era a única brecha que encontrei para te atingir.
— Quando você entrou em minha casa e roubou os papéis de meus pais
porque seu pai queria dar um golpe na minha família, Analu, aquilo também
me feriu! — confidencio. Estou cansada o suficiente esta noite para esconder
as coisas. — Eu nunca pensaria em te machucar como fiz, se não tivesse
feito aquilo comigo, se também não tivesse traído a nossa amizade!
— Meu pai é um bastardo de merda, Blackwell... E você sabia disso —
diz enquanto me passa a garrafa e eu deixo que o líquido desça pela minha
garganta. — Mas eu nunca imaginei que ele me obrigaria a fazer coisas
daquela forma...
— Você era minha melhor amiga, Parker, e nós não traímos aqueles que
confiamos!
— Eu fiz aquilo para proteger quem eu amava, Vee, da mesma forma que
você faria e faz qualquer coisa pelos seus irmãos! — Analu deixa uma
lágrima descer pelo seu rosto. — Fiz aquilo porque ele havia ameaçado o
meu irmão…
— E você acha que o meu pai deixaria isso barato, Analu? Acha que ele
não me faria te machucar apenas por ter sido petulante o bastante por roubá-
lo? — Ergo uma sobrancelha.
— Eu preferia acreditar que você nunca se tornaria a vilã que todos
diziam que era no ano sênior. — Ela solta com um sorriso cansado, logo
após leva a garrafa até os lábios e suspira fundo. — Temos uma vida de
merda, Blackwell!
— Nós somos da parte alta de Saint Vincent, Analu, já nascemos fadados
a sermos fodidos pela vida!
Ela solta uma gargalhada fria, enquanto me devolve a bebida, que levo até
meus lábios e bebo uma quantidade considerável para que minha garganta
possa queimar e meus pensamentos se dissiparem, porque nós sabemos como
é a parte ruim de ser pertencer a essa parte da cidade. Sabemos que todo o
status que nossos sobrenomes nos dão e todas as regalias que nos oferece
são como um teto de vidro que a qualquer momento pode ser estilhaçado,
que tudo aqui exala o cheiro de dinheiro e as pessoas são artificiais,
ambiciosas, que despertam os piores sentimentos que alguém pode despertar.
— Eu estava no hospital... quando sua irmã morreu — ela sussurra
tristemente. — Minha mãe havia acabado de ser internada novamente e
quando todo o hospital parou para atender você e sua irmã... observei tudo.
Vi o momento que se ajoelhou no chão e gritou quando não conseguiram
salvá-la. — Ela deixa uma lágrima escorrer pelos seus olhos, se perdendo
nas suas próprias memórias. — Eu vi tudo, Vee, e sabe o que eu queria
fazer?
— Não, eu não sei! — sussurro, sentindo a minha garganta se fechar ao
lembrar aquele momento.
— Eu quis correr até você e segurar o seu mundo, como fez com o meu...
nas dezenas de vezes que minha mãe esteve internada. Quis te levar para
casa, comprar aqueles donuts coloridos que você ama e maratonar Harry
Potter, mesmo sabendo que odeia… — Ela suspirou. — Eu apenas quis te
proteger como me protegeu, mas eu não tinha coragem de enfrentar meus pais
e os seus. — Analu encarou meus olhos com um sentimento verdadeiro que
há anos não o vi em ninguém. — É por isso, Verônica, que eu sempre fui
hostil com você... porque, no fundo, eu me culpo de ter sido uma pessoa de
merda quando precisou de mim...
— Você usa uma máscara — digo a verdade quando uma lágrima
finalmente desceu pelo meu rosto. — E eu nem posso te julgar...
— Porque você também usa uma! — Analu me interrompe. — Podemos
ser consideradas vadias por toda a SVU, mas o que ninguém sabe, Verônica,
é que somos tão quebradas por dentro que precisamos mascarar tudo isso,
porque fomos criadas para que ninguém enxergue nossas fraquezas.
Protegemos aqueles que amamos, mesmo que isso signifique que o resto do
mundo pode nos odiar.
— Eu nunca pensei que diria isso, Analu, mas eu senti sua falta! —
Quando as palavras saem de minha boca, é como se um peso tivesse sido
removido dos meus ombros. Eu não odeio Parker, nós fomos obrigadas a
vivermos nesta realidade cruel que nossas famílias criaram.
— Eu também, Vee! — Ela leva sua mão até a minha e aperta. — É
exaustivo ser sua inimiga.
Ergui uma sobrancelha na direção da garota loira e a gargalhada que solta
é exatamente como há anos atrás, quando tínhamos dez anos e estávamos
prontas para colocar Saint Vincent College a nossos pés. Essa gargalhada me
lembra de quando ficamos horas nos balanços amarelos que existia em sua
casa, com vários tipos de flores em volta, formando uma cerca, que a mãe de
Analu havia plantado com a nossa ajuda.
A lembrança de quando nós ficávamos plantando cada semente,
imaginando que de um dia para o outro, as flores simplesmente floresciam,
escorregou pela minha mente. É incrível como um dia chegamos a acreditar
que as coisas viriam fácil e hoje percebemos que estávamos muito
enganadas, porque aquilo demorou semanas, porém, dia após dia, estávamos
ali, no mesmo balanço observando as fases de uma mera flor.
E agora percebo que a minha relação com Analu foi como um processo de
florescimento. Mas que não seguiu os passos certos, ao contrário, nós a
negligenciamos, fizemos com o que era para ser belo, se tornasse frio e
escuro, que as cores se tornassem pálidas. E agora temos a chance de
reverter isso, a chance de provar que talvez duas pessoas consigam superar
suas atitudes infantis e inconsequentes.
— O que aconteceu? — Aponto com a cabeça em direção a sua casa.
— Mamãe está sendo internada novamente… — ela diz quase que em um
sussurro.
— Eu sinto muito pela saúde dela... — murmuro.
— Ela vai se recuperar, ela sempre se recupera! — Não havia esperança
em sua voz, mesmo assim eu sorri. — E você, por que está aqui fora a essa
hora?
— Tive um pesadelo com a morte de Soph.
— Isso é uma merda. — Ela suspira.
— Isso é.
Mordo meu lábio e volto a encarar a parte alta da cidade, Analu ou eu não
precisamos de alguém para lhe dizer que precisamos ser fortes, acreditar ou
qualquer coisa do tipo, precisamos apenas de alguém que entenda o que
estamos sentindo, que saiba que, mesmo machucadas, estaremos ali caso
precisassem, porque não somos do tipo que chora e pede que alguém tire
nossa dor, não, nós a enfrentamos. E Parker me entende, ela sabe tudo sobre
como é viver em uma gaiola dourada, por isso fazemos desses sentimentos a
nossa força.
E Analu Parker, a mulher que mantém os homens em seu encalço e um
sorriso frio no rosto, mantém suas máscaras, mantém o sarcasmo e as
atitudes infantis, para esconder suas feridas e toda a sua realidade. Ela é
forte, guerreira e poucas pessoas conhecem essa sua versão.
Antes que eu pudesse dizer algo, ela se levanta e ajeita o pijama, me
lançando um olhar que me diz que me acolheria sem receio, quase
precisasse.
— Analu… — chamo enquanto ela se vira em minha direção. — Ainda
acredito que você não se encaixaria na Grifinória!
— Óbvio que não, eu me encaixaria na Lufa-lufa e Cedrico Digorry seria
predestinado a se casar comigo! — ela declara, soltando um sorriso como se
realmente acreditasse nisso.
— Tenho quase certeza de que Cedrico já tem uma namorada nos livros,
mas se você está dizendo, só me basta concordar! — exclamo, devolvendo o
sorriso para ela, enquanto observamos os primeiros raios de sol.
— Obrigada pela companhia, Vee! — diz enquanto começa a caminhar,
mas antes que pudesse atravessar o jardim. Ela se vira para mim e solta um
sorriso. — E eu não tenho mais nada com Underwood… Nós nunca tivemos
algo para falar a verdade.
— E por que eu deveria me importar com isso? — pergunto, erguendo
uma sobrancelha.
— Porque por mais que adore ver a briga entre vocês dois... — Ela
inclina a cabeça para o lado. — Sei que se gostam e não ficarei no meio
desse romance!
— Você sente algo por ele? — Odeio a maneira como minha voz sai,
como se eu realmente me importasse.
— Eu não seria ingênua de me apaixonar por uma pessoa que já é
apaixonada pela mesma garota desde a primeira vez que a viu, princesinha
Blackwell! — Ela sorri descaradamente com o apelido que Levi criou
apenas para me chamar. — Mereço alguém que me ame na mesma proporção
que o amarei, mereço ser a primeira opção, não aquela que ele procurará
quando estiver entediado.
— Fico feliz que pense assim, Parker! — Solto um sorriso em sua
direção.
— Mas isso não significa que irei parar de me divertir enquanto não
encontro essa pessoa! — Ela dá de ombros. — E, Verônica? Não é porque
estou saindo do seu caminho, que significa que todas as garotas de SVU
seguirão os meus passos.
— Boa noite, Parker! — Solto um sorriso enquanto me levanto.
— Boa noite, Blackwell! — diz enquanto se vira e caminha para fora da
propriedade.
Você está em meus pensamentos
Sempre, sempre, sempre
As rachaduras não vão se consertar e as cicatrizes não irão desaparecer
Acho que eu deveria me acostumar com isso
Always | Gavin James

Tenho um livro favorito, ele não é um romance contemporâneo como


aqueles que Melany carrega para qualquer lugar ou como os calhamaços de
fantasia que Verônica deixa empilhados ao lado de sua cama. Ele é um
clássico e é do meu caro amigo William Shakespeare.
Mas a razão pela qual Romeu e Julieta é o meu livro favorito, não é
porque conta uma história entre dois adolescentes de famílias rivais que
desafiam a rixa familiar e sonham com um impossível futuro. Não, ele é
especial para mim porque era o favorito de minha mãe, uma das poucas
lembranças que guardei dela.
E Melany Underwood havia entrado em meu quarto sorrateiramente e o
pego escondido enquanto eu estava no treino esta amanhã. A pequena ladra
sabe que odeio que o peguem e, mesmo assim, o fez. E por esse motivo estou
dirigindo igual a um idiota até o estúdio de dança do outro lado da cidade,
onde sei que está, apenas para pegá-lo de volta.
Quando estaciono em uma das vagas em frente ao antigo prédio, a
lembrança das dezenas de vezes que me esgueirei pelos corredores deste
mesmo prédio, enquanto corria atrás de Verônica, inunda meu subconsciente.
Summer havia deixado escapar que ela não dança mais em público e algo
dentro de mim quer que isso seja uma mentira, quer que ela ainda dance da
maneira como fazia quando éramos adolescentes, porque isso é o sonho dela,
é o que a faz queimar por dentro e não deve ser desperdiçado.
Eu nem deveria estar pensando nela, mas sim tentando tirá-la do meu
pensamento, principalmente porque está me evitando desde que quase fomos
flagrados pelos nossos amigos. E, merda, nós precisamos conversar,
precisamos colocar todos os nossos problemas na mesa e resolver. Não
adianta mais negar o que sentimos, não adianta adiar o inadiável e dizer que
eu não a desejo.
Preciso ter a coragem de dar esse passo, preciso dizer para a garota que
nublou todos os meus pensamentos durante todos esses anos, que apesar de
nós dois sermos um caos completo, eu nos escolheria novamente.
Escolheria ver aquele sorriso que me ilumina como a porra de um sol,
escolheria os arrepios que seu toque me traz, escolheria tudo isso que o meu
peito grita, mas que o dela ainda não compreende.
Suspiro alto o bastante e saio do meu carro, trancando-o. Preciso pensar
em uma forma disso acontecer, de mostrar que ela não é mais apenas um jogo
sujo ou uma partida para saber qual de nós éramos o melhor. E exatamente
por esse motivo, eu a encontrarei e direi todas essas coisas, mas, no
momento, preciso lidar com outra garota que faz parte da minha vida e que é
responsável por eu estar caminhando entre inúmeras bailarinas sorrindo
felizes em minha direção. Assim que ultrapasso a entrada, aceno para
algumas garotas que desciam os poucos degraus em frente ao estúdio e
finalmente entro.
Sei que minha irmã não está junto delas porque tem aulas extras às terças-
feiras e que Emmy a deixa na casa de Audrey quando elas terminam, mas
hoje ela precisaria adiar esse treino. Temos que resolver algumas coisas
sobre sua apresentação e preciso de um tempo com ela, porque não via a
pequena encrenqueira desde que voltei de Boston e quase fui preso por conta
da corrida com Blackwell; e isso não é normal, desde que Mel voltou para
Saint Vincent, nós sempre estamos juntos, seja apenas para lermos juntos ou
conversar, sempre fazíamos companhia um para o outro e agora isso havia
mudado repentinamente durante essas últimas semanas.
Todos esses pensamentos que me acompanharam até aqui, são arrancados
da minha mente quando paro no batente da porta que dava acesso ao enorme
salão e observo as duas figuras femininas dançando.
Verônica e minha irmã estão sorrindo uma para a outra, como se fossem
velhas amigas e estivessem apenas fazendo algo comum no seu dia a dia.
Mel dá um giro para a direita, enquanto minha ex namorada gira para o lado
oposto.
Elas são como uma melodia que transborda emoções, que contam suas
próprias histórias por meio de movimentos sincronizados.
É lindo, poético e intenso.
Dou um passo à frente, me escorando em uma das pilastras para observar
a cena, nunca havia presenciado Melany dançar daquela forma. Ela se move
com precisão e leveza, e seus olhos brilham todas as vezes que Verônica
sorri ou a lhe ensina um novo passo.
O sorriso de Vee é a coisa mais linda que eu já presenciei em toda a
minha vida. Porque ela sorri como se minha irmã fosse a sua pessoa favorita
e fosse capaz de protegê-la do mundo caso fosse preciso. E toda a doçura
desse momento, trouxe uma sensação de compensação por todo o nosso
amargo de anos.
Infelizmente, Melany olha para onde estou e para abruptamente, seus olhos
se arregalaram e dá um passo à frente. Aquelas íris azuis idênticas às minhas
se fixam em meu rosto com um pedido de desculpas silencioso e um medo de
que tenho certeza que é de uma possível briga entre mim e sua treinadora,
que não é Emmy, como todos da minha família pensavam. Vee cruza os
braços em frente ao corpo, fazendo com que o collant preto desenhasse todas
as suas curvas. E, por Deus, esse uniforme deve ser o meu purgatório
privativo, porque no momento imagino cada parte que eu posso tocar e me
deliciar, mesmo sabendo que ela não está afim de repetir nosso momento no
vestiário ou na festa. Ao contrário, quando aqueles malditos olhos vêm em
minha direção, o olhar que dirige a mim é afiado, como se quisesse me
cortar em pedacinhos.
Mas ela não precisava daquilo, porque eu não estava nervoso. Estou
fodidamente maravilhado com a cena que presenciei.
— Logan... — minha irmã diz suspirando.
— Eu resolvo isso, Melany! — Verônica interveio, ela finalmente desvia
o olhar do meu para inclinar a cabeça para Emmy, que nos observa do
segundo andar. — Leve-a para casa, por favor, eu resolvo esse assunto com
Underwood!
— Tranque tudo quando for embora, Verônica! — a treinadora diz,
enquanto me encara com os olhos frios, em um aviso silencioso e então se
vira, indo em direção a escada.
— Eu não acho uma boa ideia... — Mel sussurra.
— Vá, Melany! — digo, passando uma das minhas mãos em meus cabelos.
Estava na hora disso acontecer e eu não desejo que Mel esteja presente para
as palavras que possivelmente diremos. — Eu e Verônica temos mesmo que
conversar.
— Eu deveria ficar calma, sabendo que podem colocar fogo um no outro?
— Mel ergue uma das sobrancelhas.
— Prometo, querida irmã, que não colocarei fogo em sua nova
treinadora! — declaro, enquanto um sorriso escorrega pelo meu rosto.
— E eu já fui presa uma vez por culpa do seu irmão, Melany — Vee diz
enquanto franze os lábios. — Não pretendo repetir a experiência.
Mel suspira fundo, como se estivesse se entregando à derrota de ter que ir
embora com Emmy, e caminha até a lateral da sala, pegando sua mochila e o
meu livro. Solto um resmungo quando começa a caminhar até a saída e então
levanto uma das mãos em sua direção.
— Eu sabia que estava com você!
— Não irei te entregar, quero ler as anotações da mamãe! — ela
resmunga, o colocando sobre o peito. — Não aja como um bebê chorão,
Logan, irei te devolver assim que terminar!
— Se uma folha estiver marcada ou amassada... você terá um enorme
problema, Mel! — Pontuo em sua direção.
— Verônica realmente deveria chutar a sua bunda! — xinga, virando o
rosto em desgosto e segue o caminho para fora do salão, me deixando com
uma sobrancelha erguida.
Quando volto a encarar Vee, ela está parada no mesmo lugar e me encara
com o semblante fechado. Aproveito o momento apenas para observá-la,
alguns fios de seu cabelo se grudam em sua testa por conta do suor e suas
bochechas estão coradas. Ela é linda. Nunca me canso de admirá-la.
Seus olhos me examinam calmamente antes de se virar e caminhar até uma
garrafinha de água que está perto de uma parede espelhada.
Seus passos e sua postura são impecáveis, ela nunca abaixa a guarda, nem
mesmo quando está em seu habitat natural. A sapatilha encosta no chão com
uma leveza que só ela tem e quando se vira novamente para mim, ela suspira
fundo, como se estivesse se preparando para uma possível briga. Verônica
fecha os olhos por um momento e seu semblante me indica que está vestindo
sua armadura, projetando suas muralhas e se escondendo atrás delas, se
protegendo de mim.
E isso me incomoda, porque não estou mais nisso. Não a insultarei ou
terei as atitudes infantis que estamos tendo desde que voltou. Está na hora de
acabar com isso. Não posso entrar em uma batalha com ela, não quando essa
guerra está nos destruindo mais do já estamos.
— Eu não irei parar de treiná-la! — A voz fria de Verônica ressoa pelo
salão, me tirando dos meus pensamentos. — Então guarde todas as merdas
que está se preparando para jogar em mim!
— Por quê, Verônica? — Ignoro sua frase, dando um passo à frente.
— Por quê, o quê, Logan? — Ergue uma sobrancelha.
— Por que a está ajudando? Por que a encara como se ela fosse alguém
que você protegeria a qualquer custo? — pergunto enquanto ela dá um passo
para trás. — Eu não irei fazer disso uma batalha se você realmente me contar
o porquê de estar ajudando minha irmã, quando deixa claro que odeia toda a
minha família!
— Porque... — Ela me encara, enquanto deixa as palavras morrerem em
seus lábios.
— Diga-me a verdade, anjo... — Dou mais um passo à frente, ficando cara
a cara com ela e sussurro: — Apenas, diga-me!
— Porque nossa história já destruiu pessoas demais, capitão... — ela diz
com a voz fraca, enquanto fecha os olhos. — Porque eu já errei uma vez com
ela por uma atitude infantil, porque ela merece uma chance e porquê... ela me
lembra Sophie. Cada vez que ela sorri, dança ou até mesmo quando apenas
se senta ao meu lado e fica em silêncio, é como se estivesse ao lado da
minha irmã...
— Você não errou, anjo… — sussurro, me lembrando das palavras de
Audrey.
— Mas esse não é o motivo pelo qual ajudo sua irmã com a dança... —
Ela me interrompe, ignorando minhas palavras. — Eu a ajudo, porque, no
fundo, é como se ela amortecesse a dor por não ter minha irmã ao meu lado!
Não respondo, encaro seus olhos que se enchem de lágrimas enquanto
proferia essa confissão. E pela primeira vez, eu não enxergo a garota que
havia travado inúmeras brigas comigo, a que havia conquistado toda SVU em
poucas semanas de estadia, nem a que carrega uma coroa invisível e nem a
sua versão que eu passei anos odiando.
Eu a enxergo como o meu anjo, que dançou comigo em um mirante sob as
estrelas no meu aniversário de dezessete anos, que esteve ao meu lado
quando mais ninguém o fez. Enxergo a garota que dançou em um recital,
enquanto eu estava ao seu lado. A mulher que tem medo de altura e de rodas
gigantes, que ama donuts com confetes coloridos porque era o único doce
que conseguia comer quando era criança e odeia filmes de terror.
Enxergo a garota que um dia foi a minha namorada e que agora está
quebrada e que seus próprios estilhaços estão a machucando.
Nesse momento, enquanto levo minhas mãos até sua bochecha e levanto
seu rosto, fazendo com que ela abra seus olhos e os fixam nos meus, sei que
todo aquele sentimento que havia se instalado em meu peito durante os anos
que ela esteve longe de Saint Vincent, não foi ódio puro, daqueles que se
tornam escuridão, foi uma linha tênue que encontrei para mascarar todo o
meu verdadeiro sentimento por ela. Eu me senti perdido, quebrado e
machucado. Sabia que deveria odiá-la por tudo que havia feito, por ter
comprado a casa onde minha mãe viveu e por ter mandado minha irmã para
um lugar onde eu não poderia visitá-la.
E por isso eu deveria e tentei odiá-la, porém, por mais que eu tentasse,
por mais que distraísse meu tempo com o futebol, com as garotas e com
todos os outros meios que aparecessem, a verdade é que eu ainda a amo.
E agora que todo o muro de mentiras que criamos está cedendo, eu não
consigo mais ignorar isso. Não consigo mais fingir que toda vez que ela pisa
em um lugar onde estou, o meu coração não palpita e toda minha atenção não
se torna dela.
Encaro seus olhos por mais alguns segundos e digo a única coisa que sei
que trará uma lembrança de um tempo em que não existiam todos esses
problemas que nos rodeiam:
— Dance comigo, anjo! — Levo minhas mãos até as suas e aproximo meu
corpo, fazendo com nossos corpos colidissem.
Uma de suas mãos vai até meu ombro e a outra segura a minha enquanto
balançamos pelo enorme salão repletos de espelhos. Ela rodopia pelo lugar
de uma maneira que me faz não ter receio de mergulhar na nossa história
novamente. E quando seus olhos brilhantes encaram os meus, percebo, nesse
momento, que sem ela, nesses últimos anos, a minha vida foi toda cinza e não
carregou a menor graça. Porque ela traz novas cores, cores nas quais eu nem
sabia ao menos que existiam, até esse momento.
Verônica Blackwell foi e sempre será a única responsável por todas as
partes do meu coração, mesmo que esteja quebrado. E por mais que meu
anjo ainda não estivesse comigo, enquanto eu existir, ainda sim, estará em
mim, pedaço por pedaço.
— Me diga uma verdade, capitão… — ela murmura enquanto rodopia
mais uma vez.
— É um jogo sobre verdades agora? — Ergo uma sobrancelha enquanto
um sorriso se forma em meus lábios.
— Gosto desse jogo! — admitiu, passando a mão pelo meu ombro
tampado pela jaqueta do time.
Sinto falta de conversar com você sem precisar manter a máscara.
A frase quase escorrega pelos meus lábios, mas a seguro, ela ainda não
saberá disso, não quando sei que não está preparada para falar sobre
sentimentos entre nós dois. Eu preciso ir com calma, fazer com que confie
em mim novamente, que não me enxergue mais como seu inimigo.
— Estou sendo considerado uma opção para participar do draft e estou
com medo por conta disso — solto, suspirando, enquanto aperto sua cintura.
— E por que está com medo? — Fico surpreso por ela estar realmente
curiosa para saber o motivo.
— Porque é o meu sonho, anjo, e um passe para conseguir um futuro bom
para minha irmã! — murmuro, fechando os olhos por alguns segundos,
enquanto giramos mais uma vez pelo salão. — Se eu fracassar...
— Você não vai! — Ela me interrompe.
— Como você pode saber? — Abro meus os olhos, encarando-a.
— Eu não sei, apenas acredito! — Vee morde o lábio inferior e então
continua: — Você é o capitão e um dos melhores jogadores do SVU, sempre
foi, então se estão cogitando a te colocarem do Draft, vá e participe! E se
não conseguir ser convocado, está tudo bem também!
— Obrigado! — Sorrio fracamente, eu sentia falta desse lado leve de
Verônica, de como ela sabe escutar e dizer coisas certas para o momento. —
Agora estou em desvantagem, já que sabe tantas verdades sobre mim. —
Sorrio. — Então, me conte uma sobre você, anjo!
Ela examina meu rosto por algum tempo, procurando por algo que não sei
exatamente o quê. Talvez seja uma mentira, talvez um motivo para me soltar
e ir embora, mas fico surpreso quando ela para a nossa dança e fica a minha
frente apenas olhando para meu rosto.
— Eu não danço para um público — Verônica para por alguns segundos e
toma fôlego, como se o que estiver prestes a dizer fosse como arrancar um
pedaço seu para mim. E mesmo sabendo que é doloroso, eu quero que
continue, quero que confie em mim uma única vez. E ela o faz. Ela olha
dentro dos meus olhos e derrama as palavras que sei que são uma confissão:
— Não porque eu não quero, mas porque não consigo. Toda vez que penso
em estar em um palco, toda vez que tentei estar, eu nos via felizes,
comemorando, ganhando um recital... Enquanto minha irmã estava tendo o
seu coração destroçado e logo depois morrendo de uma forma dolorosa.
Quero abraçá-la, quero dizer que sinto muito, que desejo que não
tivéssemos mergulhado nessa escuridão, nos fazendo colecionarmos
rachaduras, que essas lacunas em nosso passado não se tornassem
inseguranças para confiar em outra pessoa novamente.
— Eu não pisei em Saint Vincent College depois que você foi embora…
— digo quando o silêncio se instala sobre nós. — Não consegui entrar lá e
encarar todas as lembranças, não conseguia encarar Aidan e nem sair do
poço no qual caímos…
— Você mentiu para mim! — ela murmura me interrompendo, finalmente
deixando uma lágrima escorrer pelo seu lindo rosto. — Você era como a
minha âncora, o meu melhor amigo, e você mentiu para mim, Logan… Mas o
problema é que eu entendo, porque nós não sabíamos a gravidade da
situação, nós éramos adolescentes, não tínhamos a responsabilidade de
cuidar de todo o mundo. — Ela não seca as lágrimas, apenas continua a
derramar suas palavras sobre mim: — Sophie não teria parado de se
relacionar com Aidan só porque você ou eu desejava isso... Eu só precisava
de alguém para descarregar toda aquela dor, e eu realmente sinto muito que
tenha sido você!
— Eu não contei sobre o relacionamento de Sophie, porque ela me
ameaçou de nos separar, Vee... — Solto a verdade que sempre guardei sobre
aquele dia. — Eu sabia que ela era sua irmã e que você a amava, mas eu
sabia que ela me separaria de você, caso o envolvimento dela com meu
irmão viesse à tona, porque você é membro da parte da alta e eu sou da parte
baixa, nunca daríamos certo. E eu não poderia, Vee, eu não poderia te
colocar contra uma pessoa que você ama desde sempre. Eu não poderia ser o
responsável por criar uma lacuna entre vocês duas. Então eu preferi sofrer
com o fato de ter que mentir para a garota que eu amava, de ter uma
probabilidade de te perder do que ter que presenciar você sofrer por não ter
o mesmo vínculo com sua irmã.
— Eu sempre a coloquei em um pedestal, sempre a olhei como se minha
irmã fosse a irmã perfeita, mas eu estava enganada. Logan… — Ela funga,
fechando os olhos por um momento. — Porque se ela fosse realmente
perfeita, nunca teria me pedido o que me pediu, nunca teria aproveitado seus
últimos minuto me pedindo aquelas atrocidades… E hoje sinto muito por
tudo o que eu fiz com sua família por conta de uma promessa… Eu
realmente sinto muito mesmo — ela profere com a voz baixa. — Mas eu não
posso mentir e dizer que não destruiria seu irmão novamente... porque ele já
tirou coisas suficientes de mim!
— Eu sei — devolvo, com os ombros caídos.
— E é por isso, Logan, que eu não posso mais permitir que você chegue
até mim — admitiu, dando um passo para trás. — Porque eu não posso te
machucar mais do que machuquei, eu não aguentaria isso novamente.
Não, eu não posso perdê-la, quando nem tive a chance de chegar até ela.
Verônica Blackwell não me afastará novamente, eu lutarei por isso, lutarei
para que enxergue, que mesmo que sejamos errados juntos, desde o dia que a
encontrei perto daquela roda gigante, havíamos nos tornado um do outro.
Mesmo que fossemos dois complicados, complexos e totalmente opostos, ela
tem algo que me faz ficar e eu tenho algo que não a deixa ir.
E eu não desistirei disso.
— Você sabe o Shakespeare dizia sobre anjos?
— Logan... — Ela ergue uma sobrancelha em confusão pelo rumo que a
conversa havia tomado.
— “Fale, anjo, outra vez, pois você brilha” — murmuro me
aproximando, pairando meu rosto sobre o seu, me abaixo apenas um pouco
para beijar cada uma de suas lágrimas. — Quando te vi pela primeira vez,
foi como se estivesse visto um anjo e quando me contou sobre você, foi
como se brilhasse dentro do meu peito, e é por isso que não desistirei de
você, Verônica, porque naquele dia você reivindicou cada parte do meu
coração para si.
— Eu não acho que tenho uma verdade boa para se igualar a essa... — ela
solta quase sem voz.
— Não se preocupe com isso, meu querido Shakespeare tem várias!
— Ele sempre tem… — Ela sorri levemente.
— E se gosta tanto de literatura assim, anjo — sussurro como se estivesse
lhe contando o maior segredo do universo —, saiba que ele dizia que: Se por
te beijar, eu tivesse que ir depois para o inferno, eu faria isso...
— Assim poderei me gabar aos demônios de ter estado no paraíso sem
nunca entrar — Verônica completa, fazendo com que eu erga as minhas mãos
até seu rosto, acariciando-o.
Me aproximo lentamente até que seus lábios encontram os meus. E então
nos beijamos.
Uma de suas mãos sobe até meu pescoço, trazendo-me para mais perto,
como se eu fosse uma miragem e estivesse pronta para desaparecer. O beijo
começa doce, suave, com um fogo baixo, como se estivéssemos preparando
o terreno para algo mais quente, mais ardente. Até finalmente o fogo se
intensificar. Verônica solta um gemido baixo, me puxando para si, fazendo
com que uma das minhas mãos voe até sua cintura.
Então, em menos de quinze segundos, nós caminhamos até que suas costas
batessem em um dos espelhos na parede. Seguro suas coxas e a levanto,
fazendo com que suas pernas serpenteassem para cada lado de meu quadril.
Ela se inclina para chegar aos meus lábios novamente e o ataca com fome,
como se estivesse me reivindicando.
A boca de Verônica é quente e, porra, muito voraz. Cada vez que sua
língua dança com a minha, meu sistema nervoso inteiro começa a se disparar.
Posso sentir a nossa urgência a cada vez que nos separamos para respirar.
Quando nos separamos e encaramos nossos rostos, observo seu olhar
nebuloso e seus lábios inchados. Nesse momento tenho certeza de que somos
como a pior das tempestades, como aquela que chega trazendo o pior dos
furacões.
Mas o que ninguém sabe, é que vínhamos de tantas tempestades que
perdemos o medo da chuva.
— Eu e você, anjo... merecemos acontecer novamente!
Não é uma pergunta, é uma afirmação. E apenas a encarei, esperando
alguma ação, uma resposta, mas o suspiro que me dá, me diz que esse beijo
não é um novo começo, mas sim um novo final.
— Merecemos acontecer, porém, isso não significa que devemos, capitão!
— Ela passa a mão pela minha mandíbula, deixando uma leve carícia,
enquanto solta as palavras que nem ela mesmo acredita: — Ainda acredito
que somos almas gêmeas, mas ainda assim, somos péssimos em amar, porque
todas as vezes que fazemos isso acontecer, nós saímos com nossos corações
quebrados!
— Verônica…
— Você sempre será parte do meu coração, Logan, mas eu não sou digna
de amar novamente. — Ela solta um sorriso doloroso em minha direção. —
Você é, mesmo que haja como se odiasse relacionamentos, você merece a
chance de viver um amor menos complicado do que o nosso.
Ela se desvincula de mim e caminha até o outro lado da sala.
Enquanto penso em várias formas de prová-la que desta vez ela está
enganada.
Porque o único amor que mereço e quero, é o dela.
Eu digo a mim mesma que você não significa nada
Que o que nós temos, não tem nenhum poder sobre mim
Mas quando você não está lá, eu simplesmente desmorono
Digo a mim mesma que eu não me importo muito
Mas eu sinto que estou morrendo até eu sentir o seu toque
Only Love Can Hurt Like This | Paloma Faith

A sala de estar está pouco iluminada, os barulhos da chuva caindo lá fora


fazem com que todo meu corpo todo trema. Ando em direção às escadas,
procurando por algum dos meus irmãos, mas quando piso no primeiro
degrau, um barulho vindo do antigo salão de festas onde acontecem os bailes
anuais de nossa família, me faz estagnar. Viro meu corpo lentamente na
direção do barulho, encosto minha mão no corrimão no mesmo tempo que um
clarão emerge no chão, fazendo com que a enorme sala fique assustadora.
Engulo em seco e finalmente começo a caminhar lentamente até onde os
barulhos haviam vindo.
— Ed? Dylan? — chamo, mas não tenho nenhuma resposta.
Quando finalmente toco a superfície de madeira com minhas duas mãos e
a empurro, fazendo com que eu tenha a vista de todo o salão que deveria
estar vago, mas não está. As cortinas escuras estão abertas, me dando a
visão de inúmeras gotas escorrendo pelo vidro. O piano que Dylan tanto ama
está posicionado na lateral e uma confusão começa a rondar a minha cabeça
quando meus olhos recaem na garota de cabelos vermelhos dançando no
centro da sala.
— Sophie? — questiono, colocando minhas mãos em minha boca, vendo-
a se alongar no centro da sala.
— Fale — diz sem fôlego.
Dou um passo em sua direção, mas antes que eu pudesse dar outro passo,
meus olhos descem para seu uniforme. Prendo o ar quando as lembranças me
atingem com força, as lágrimas preenchem toda a borda dos meus olhos e
meu queixo começa a tremer com intensidade. Seu collant é o mesmo do que
iríamos nos apresentar naquela noite e ele está coberto de sujeira e com todo
o seu sangue. Não pode ser real. Abaixo o olhar para minha própria roupa, o
soluço se agarra a minha garganta e a primeira lágrima desce pela minha
face. O tecido que está agora em meu corpo, é idêntico ao seu, uma cópia do
que vestimos na pior noite de nossas vidas.
— Eu sinto sua falta… — sussurro.
— Nosso vínculo sempre estará aqui, Vee — declara, apontando para meu
coração.
— Por que você fez aquilo, Soph? — pergunto, dando um passo à frente,
cruzando um braço frente ao corpo, me protegendo da dor que estava me
sugando. — Por que fez tantas escolhas erradas?
— Todos nós temos nossos próprios segredos, Verônica — diz, sorrindo
fracamente, um sorriso doloroso, que quase nunca lançava em minha direção.
— Você não enxergava que tudo girava ao seu redor? As pessoas te amavam
mesmo que vestisse uma máscara, interpretando a princesinha Blackwell,
quando, na verdade, sabia que éramos fodidos na mesma medida...
— Pare, Soph! — A interrompo mesmo com minha garganta se fechando
com lágrimas. — Você me colocou à sua sombra, você quis me provar que
eu não posso caminhar sozinha. Nós éramos irmãs, Sophie! — Sinto as
lágrimas molharem minha pele. — Eu também tinha e ainda tenho
sentimentos, eu era a sua irmã e você me manipulou, Sophie… A sua própria
irmã!
— Você sabe por que se culpa tanto? — Seu tom agora era alto, quase
enojado. — Porque você sabe que aquela noite não teria acontecido se não
tivesse os arrastados para nossas vidas. Você, Verônica Blackwell, destruiu
os meus sonhos porque era egoísta demais! — Ela dá um passo à frente, seus
olhos nunca deixando os meus e uma dor crescente me consome. — Você
deveria ter percebido, você, Vee, deveria ter feito com que ficássemos todos
juntos, mas você preferiu um garoto a nós.
Fecho os olhos, tentando respirar, mas o ar não entrava. O pânico já havia
se instalado em meu peito. Minhas mãos tremem e palpitações começam a
crescer em meu peito. Eu não posso perdê-la novamente, não depois de tudo.
Mesmo que ela tenha feito escolhas ruins, mesmo que uma parte de mim
esteja decepcionada pelas suas palavras, eu não posso perdê-la. Abro os
olhos para encarar a minha irmã outra vez, contudo, ela havia sumido. E um
sentimento de perda me preenche, um sentimento de impotência é derramado
sobre minha cabeça.
Então tudo é escuridão, tudo é frio e vazio.
Abro meus olhos assustada, o suor escorre pelo meu pescoço e minha
respiração fica irregular. Feixes de luz preenchem meu quarto, me indicando
que já é de manhã e que toda aquela cena havia sido apenas mais um
pesadelo. Porém, a sensação de realidade ainda não havia deixado meus
ombros.
Suspiro fundo, me sentando e passando a mão pelo rosto, frustrada, todos
esses sonhos já estão ultrapassando um limite no qual eu não consigo lidar
sozinha. E isso precisa parar, mesmo que eu saiba que não será uma tarefa
fácil, não posso mais viver dessa maneira, esperando que assim que eu feche
meus olhos, eles venham com forma e precisão.
Está na hora de pedir ajuda e de assumir que eu não conseguirei superar
todo esse trauma sozinha. E por isso, a primeira coisa que faço quando me
levanto, é caminhar até minha escrivaninha e mandar uma mensagem para
única pessoa que pode me ajudar. Eu preciso começar do zero novamente,
preciso que ela me guie neste caminho enquanto busco minha própria cura.
E quando faço isso e finalmente termino de me arrumar, sigo em direção a
cozinha. Durante o percurso até lá, começo a repensar nas palavras que
minha irmã proferiu no sonho. Havia sido real demais, intenso demais e não
sairá da minha cabeça tão cedo. Assim que meus pés tocam o último degrau
da escada lateral, as vozes animadas dos meus irmãos, acompanhando de
mais algumas que sei exatamente de quem pertencem, chegam até mim. Solto
um sorriso e chego à conclusão que eu não posso ficar pensando nesse
pesadelo o dia todo.
Hazel e Oliver estão sentados em duas cadeiras próximas, enquanto meus
irmãos estão tentando preparar o café da manhã. O primeiro a me ver é Ed,
um sorriso animado é estampado em seus lábios e os olhos âmbares brilham
em minha direção, como se estivesse feliz por eu finalmente aparecer. Dylan
solta um resmungo quando algo que está sobre o fogão espirra em sua camisa
branca, fazendo com que Hazel gargalhe.
— Pequena Blackwell! — Oliver praticamente grita, se levantando. — Eu
estava começando a cogitar que havia entrado em coma.
— O que você está fazendo aqui a essa hora, Ollie? — resmungo, indo até
uma das bancadas e retirando uma xícara de um dos armários.
— Eu preciso de um motivo para vir ver minha melhor amiga? —
pergunta erguendo a mão até o coração e fingindo que algo o havia
perfurado.
— Não seja falso, Wright, você nunca foi uma pessoa matinal! —
exclamo, me sentando ao lado de Hazel. — Bom dia!
Minha amiga sorri para mim, levando a xícara até seus lábios.
— Bom dia, Vee! — devolve alegremente.
— Preciso do seu carro emprestado! — Oliver pondera, me fazendo virar
meu rosto lentamente para encará-lo.
— Nem fodendo! — rebato, erguendo uma sobrancelha.
Edmund me encara sobre os ombros e solta uma pequena gargalhada,
quase derrubando alguma das panquecas que tenta fazer. Mada, sem dúvidas,
irá cometer um homicídio assim que ver a situação que meus irmãos estão
deixando sua cozinha.
— Vamos lá, pequena Blackwell! — Oliver insistiu, me lançando uma
careta de piedade. — Eu já te salvei de inúmeras furadas.
— Existem outros carros na garagem! — ironizo, me servindo um pouco
de café. — Escolha um e pegue.
— Fique longe do meu — Dylan resmunga, ainda virado de costas para
Ollie.
— E do meu! — Ed acrescenta, se virando para nós. Ele segura uma
colher com uma mão e com a outra, mantém uma xícara quase intacta de café.
— Eu preciso exclusivamente do seu carro!
— Não, Ollie! — Nego com cabeça e levanto minha xícara.
— Vamos lá, Vee… — ele implora, juntando as duas mãos.
— O que está acontecendo entre eles? — Hazel murmura para Dylan.
— Não tente entender a dinâmica desses dois, apenas eles entendem! —
meu irmão responde baixinho, me fazendo erguer uma sobrancelha em sua
direção. — O quê? Apenas disse a verdade a ela!
Ignoro Dylan e volto meu olhar para Oliver, que ainda me lança um olhar
suplicante.
— Me dê um motivo, e que ele seja bem convincente, para deixar meu
filho em suas mãos, Wright! — exclamo, encostando meus cotovelos na
bancada e levando a xícara novamente até minha boca.
— Puff, eu posso citar vários! — Ele me lança um sorriso travesso que
morre logo em seguida, quando percebe que ainda o estou encarando sobre a
xícara. — Ok, eu realmente preciso de sua ajuda!
— Você tem até SVU para me convencer! — proclamo, revirando meus
olhos e me levantando para ir até meus irmãos para me despedir. — Você vai
participar do treino, Hazel?
— Não, tenho uma prova agora pela manhã! — responde, levando a xícara
até os lábios. — Boa sorte com a nova coreografia!
— Me ligue mais tarde, eu e Sum iremos visitar uma biblioteca nova! —
digo assim que passo por ela.
— Você vai arrastar a minha namorada para uma biblioteca? — Dylan
pergunta, me lançando uma careta.
— Dylan, agradeça que seja para uma livraria, não para uma festa como
sempre fizemos quando éramos adolescentes! — Solto uma piscadela.
— Sinto tanto que sua namorada seja amiga da nossa irmã! — Edmund
gargalha do outro lado da cozinha. — Você nunca terá paz, irmãozinho!
Solto uma gargalhada abandonando-os e indo em direção ao outro lado da
casa. Passo pela sala de estar, por um dos corredores do primeiro andar,
parando em frente a uma foto minha e de Sophie quando éramos crianças.
Mesmo sendo gêmeas, nunca fomos parecidas, a não ser pelos mesmos olhos
castanhos, a boca e o nariz empinado. Ela me lembrava de nossa avó, os
cabelos castanhos claros, o corpo esguio, desprovido de muitas curvas. O
que mudou com a adolescência, quando abandonou os fios castanhos,
optando pelo ruivo e, junto dele, sua personalidade brilhante.
Suspiro fundo, deixando o quadro de lado e seguindo o meu caminho.
Assim que atravesso enormes portões escuro da garagem, Oliver já está
parado ao lado do meu carro. Corro os dedos pela superfície preta da Land
Rover de Dylan, depois pelo Mustang vermelho de Edmund e por mais
alguns outros carros que minha família deixa guardados nesse ambiente por
alguns serem peças de colecionadores, até finalmente parar a poucos
centímetros de meu amigo.
Não há como negar que Oliver Wright é bonito, seus olhos verdes brilham
em minha direção como safiras preciosas e um sorriso nervoso escorrega de
seus lábios enquanto inclino a cabeça, porque sei que meu melhor amigo está
me escondendo algo. E ele nunca esconde.
Dou uma rápida olhada em seu rosto e solto uma lufada de ar.
— O que está acontecendo, Ollie? — questiono, cruzando os braços até a
altura dos meus seios.
— Por que você acha que há algo acontecendo, pequena Blackwell? —
Pondera sem ao menos olhar em meus olhos.
— Ollie, eu sou sua melhor amiga — afirmo com minha voz suave —, a
pessoa que te conhece melhor do que ninguém e sei quando algo não está
certo com você. Então me diga o que está havendo, para que possamos
resolver juntos.
— Você também está estranha desde o último ensaio com Melany e eu não
disse nenhuma palavra sobre isso! — ele alfineta, passando as mãos pelo
rosto e deixa os ombros caírem quando observa que aquilo não me fará
desistir de saber o que estava acontecendo. — Meu pai está de volta.
— E por que diabos você não me disse nada? — questiono, jogando
minha bolsa sobre o meu capô.
— Relaxe, Vee! — Meu amigo suspira, passando a mão pelos cabelos. —
Ele disse que veio para resolver alguns problemas na empresa, mas que logo
voltará para Nova York. Mas, não sei, ele estava diferente desta vez...
— Diferente como? — indago enquanto umedeço os lábios.
Não existe possibilidade de Brandon Wright ser diferente, não quando ele
quase destruiu a vida dos filhos na sua jornada pelo poder. E eu sei, em
experiência própria, que ele está no mesmo patamar que Jonathan Blackwell,
porque ambos são sujos, perversos e cruéis. E eu nunca me esquecerei
disso.
— Eu não sei explicar, mas algo está errado! — pontuou com uma voz
preocupada, uma que ele usou dezenas de vezes quando seu pai não o
poupou de sua ira, quando todos os problemas que sua família tinham caíram
sobre seu próprio ombro. — Eu só estou com receio de que seja algo com
Andrew.
— Ele está bem!
— Como podemos saber? — Ele ergue uma sobrancelha.
— Porque seu irmão me envia fotos a cada hora, me mostrando que estou
perdendo a temporada de desfiles em Milão! — resmungo tentando aliviar o
clima e indo até a porta do motorista. Oliver não se abriria comigo enquanto
não estivesse pronto. — Ele é cruel, Oliver!
— Ele só tem dezessete anos, Verônica, é lógico que é cruel! —
Contrapõe, se jogando no banco do passageiro, ele apenas encosta a cabeça
no banco e suspira quando começa a sair da propriedade.
— Se ele soubesse de algo, ele já teria nos contado — digo para meu
melhor amigo, na intenção de fazê-lo ficar tranquilo.
Ollie não responde, apenas suspira fundo e encosta a cabeça no banco.
Durante o caminho até a universidade, Oliver se mantém quieto, e mesmo
que eu saiba que ele gostaria de resolver seus problemas sozinho, eu estou
realmente cogitando a ideia de faltar ao treino para acompanhá-lo, seja lá
onde ele estiver disposto a ir. Eu só desejo que ele volte a agir como meu
amigo, como o Wright que me carregou dezenas de vezes enquanto
voltávamos de alguma festa, o mesmo que ama a natureza e odeia pessoas
artificiais, que está ao meu lado desde sempre. Mas sei que ele odeia se
sentir pressionado e exatamente por isso, eu o esperarei até que esteja pronto
para conversar. Sei que ele virá, que me contará seus problemas e eu o
ajudarei como sempre fazemos um pelo outro.
Mas, por ora, eu apenas ficarei ao seu lado, mesmo que em silêncio.
Ele suspira fundo e me lança um olhar cheio de significado, antes de
proferir:
— Eu preciso do seu carro porque se eu chegar com qualquer outro, a
garota que preciso conversar, vai fugir de mim!
Olho para ele por alguns segundos, lhe lançando uma careta desagradável.
— Se ela precisa ter você em um carro de luxo para te dar bola, acredito
que essa história não terminará bem! — confesso, virando uma curva.
— Deus, Verônica, não é nada do que está pensando! — Ollie gargalha
enquanto solto uma lufada de ar em alívio por estar errada. — Ela não vai
fugir de seu carro... porque são conhecidas e... acredito que ela não se
esconderá de mim se achar que é você que está chegando!
— Isso é perseguição, Wright! — ironizo, deixando com que meus óculos
caiam sobre meus olhos. — Não vou compactuar com um crime.
— Eu só preciso pedir desculpas, não vou persegui-la! — ele declara
exasperado.
Estaciono o carro na minha vaga perto da entrada do estádio da
universidade e me viro em sua direção, puxando minha bolsa do banco
traseiro. A expressão de Oliver está cansada, fazendo com que a minha
preocupação aumente. Ele escora a cabeça no couro do banco e a levanta em
direção ao teto, fechando os olhos.
— O que você quer com Summer? — questiono, fazendo com que ele abra
os olhos e me encare assustado.
— Como diabos…
— Eu sei de tudo, Ollie! — O interrompo. — Apenas diga.
— Nós… merda, nós transamos na festa da fraternidade! — Ele confessa,
me encarando como se esperasse um xingamento. Mas eu apenas indico para
que continue. — E acho que devo desculpas para ela!
— Não creio que ela queira alguma desculpa! — retruco, inclinando a
cabeça. — Summer está bem e a festa já foi há semanas, Ollie!
— Eu fugi do quarto, Verônica! — advertiu e sua boca transformou-se
numa linha dura. — Eu acordei de madrugada e ela estava olhando para elas
— Ele não diz o que, mas não precisa, eu sei exatamente do que está falando.
— Então, entrei em pânico por ter sido tão descuidado e acabei dizendo
algumas palavras que ela não merecia.
Meu coração se aperta quando eu entendo o que Ollie está dizendo.
Merda. Eu entendo o porquê dele ter tido essa reação, mas também sei que
Summer não é uma garota que deixa com que homens a tratem de qualquer
forma, apenas por terem seus próprios segredos.
— Primeiro: se Summer tivesse algo para conversar, ela já teria feito! —
enumero, levantando o dedo. — Segundo: Você não vai perseguir minha
amiga por conta de um assunto que nós dois sabemos que não irá querer
explicar. Terceiro e não menos importante: nem todas as garotas vão cair aos
seus pés, só por ter transado com elas, Ollie, seja adulto!
— Quero seu carro emprestado. — Ele ignora meus argumentos. — Além
desse motivo que não se trata de querer as garotas aos meus pés, irei
almoçar com meu pai e ele odeia carros esportivos.
— Você quer o provocar! — Decifro, lhe lançando um sorriso maléfico —
Oh, eu gostaria de presenciar esse momento.
— Óbvio, ele é um bastardo arrogante! — exclama, me lançando uma
piscadela.
— Se arranhá-lo ou algo do gênero, eu espero que tenha um bom plano
funerário! — ameaço, jogando as chaves em sua direção.
— Eu já te contei o quanto venero suas ameaças, pequena Blackwell? —
ele diz, soltando um sorriso letal.
Abro a porta, finalmente saindo, enquanto meu amigo dá volta até o lado
do motorista e se joga no banco que eu ocupava momentos atrás. Me abaixo
um pouco quando ele me passa a minha bolsa e solto um sorriso voraz para
ele.
— Incontáveis vezes. Aliás, Ollie… — Levanto o óculos para dar-lhe
uma piscadela. — Eu a ajudei a fugir da fraternidade, Wright!
Ele me encara perplexo, enquanto eu me viro e sigo até a entrada do
estádio que ligava até o vestiário.
Seria um longo dia e eu já estava cansada antes mesmo de tudo começar.

O vento frio, seguido de algumas gotas de chuva, caem sobre mim assim
que começo a seguir em direção ao estacionamento logo após o treino. O
meu uniforme azul e roxo ainda está sobre o meu corpo, não por opção, mas
sim porque todos os chuveiros do vestiário haviam decidido não funcionar
hoje, o que significa que precisaria ficar com a mesma roupa até chegar em
casa.
Enquanto atravesso o enorme local, observo algumas das garotas correndo
até seus carros. E eu apenas caminho lentamente, deixando com que as
poucas gotas de chuvas caiam sobre mim. Meu pensamento está em apenas
não focar que um possível temporal pode vir a cair e que meu medo de
chuva não me deixe chegar a um lugar seguro, onde posso controlá-lo e ligar
para um dos meus irmãos, até porque Summer, que seria a minha companhia
para hoje, precisou desmarcar por conta de uma consulta com seus pais.
Oliver ainda está ocupado com seu pai e não devolverá meu carro até a
noite. Dylan havia desaparecido do mapa, junto com Hazel. E Edmund achou
que seria uma boa ideia desligar a porra do celular logo hoje.
Eu preciso pensar em algo, antes que as pequenas gotas se transformem
em uma tempestade, mas minhas opções são limitadas e se baseiam em
apenas duas: ligar para Mike, o que será uma péssima decisão, ou pedir um
Uber.
E obviamente opto ir pela segunda, principalmente porque Burhan não
está contente depois que o boato que eu e Logan havíamos aparecido no
hotel em Boston juntos percorreu toda a faculdade.
Solto uma lufada de ar quando o terceiro Uber cancela a viagem e
resmungo alto o bastante. Nesse momento, todo o meu uniforme já está todo
molhado e o laço do meu cabelo já está desfeito. É uma situação de merda e
eu já estou ficando frustrada.
Assim que o quarto Uber cancela, um Ford Mustang bem conhecido para
à minha frente. A janela do passageiro se abaixa lentamente, me dando a
visão de Logan sorrindo como um idiota e me encarando com uma das
sobrancelhas erguidas. Abaixo o olhar para a roupa que traja e tenho a
certeza de que não é apenas os chuveiros femininos que estão com
problemas, porque ele ainda veste o uniforme do SVU, e pela maneira que
está todo encharcado e o tecido se agarra ao corpo, ele também acabara de
finalizar o treino.
Eu não poderia negar que estava evitando-o desde a semana passada,
quando o momento no estúdio de dança aconteceu.
Eu e Logan não funcionamos bem juntos e precisávamos entender isso.
Éramos ruins, nocivos e tomávamos atitudes que muitas vezes nos deixavam
no fundo do poço.
— Se está tentando pedir um Uber, desista! — exclama, dando de ombros.
— Eles odeiam rodar pela universidade.
Ergo uma sobrancelha em sua direção, mudando o celular de uma mão
para a outra, expulsando todos aqueles pensamentos que começavam a
preencher meu pensamento.
— Isso é sério? — questiono com uma carranca nada gentil.
— Muito sério, anjo! — exclama, enquanto seu rosto se ilumina. — Entre,
eu te levo para casa!
— Não, obrigada! — digo, soltando uma lufada de ar.
— Tudo bem então! — Ele dá de ombros ainda sem quebrar o contato
visual. — E sinto em lhe informar que este uniforme não é feito para o vento
e nem para o frio.
— Talvez encontre alguém que seja gentil o bastante para me dar seu
agasalho! — Sorri friamente o que tive certeza de que se transformou em
uma careta. — Você sabe como os jogadores da SVU adoram se jogar para
as cheerleaders.
— Eu diria que é ao contrário, as cheerleaders que adoram se jogar para
os meus jogadores! — Ele gargalha, dando de ombros.
Logan me encara com um sorriso debochado em seus lábios, porém seu
sorriso logo morre quando a chuva voltar a aumentar, fazendo com que me
arrepie e precise usar as mãos como concha para poder observá-lo.
— Entre no carro, Verônica! — Seu tom não é mais brincalhão, ele inclina
o corpo, abre a porta do passageiro e as escancara. — Você pode brigar
comigo, mas entre antes que fique resfriada!
Eu não conseguirei um carro, não tão cedo pelo menos e não serei imatura
o suficiente para dizer que ele não está certo, eu poderia ficar doente caso
ficasse muito debaixo dessa chuva. E com esse pensamento, eu me jogo no
banco do carona de seu carro, enquanto ele sorri e se vira para frente, no
intuito de começar a dirigir entre as ruas da universidade.
Porém, no momento em que saímos do campus e ele diminuiu a
velocidade, soube que essa carona demoraria mais do que o necessário.
Se eu não tivesse você não haveria nada sobrando
Só o casco de um homem que não pôde ser seu melhor
Se eu não tivesse você, eu nunca veria o sol
Você me ensinou a ser alguém, yeah
Drag Me Down | One Direction

Eu deveria ter esperado um uber.


Para ser sincera, “deveria” é uma palavra que ultimamente vive rondando
meus pensamentos e em todas essas vezes, eu penso em coisas que poderia
ter feito para evitar essa catástrofe que está se tornando minha vida, e não
fiz.
Mas neste momento, enquanto observo Logan dirigir como um senhor de
noventa anos que tem medo de perder sua licença, a única coisa que penso
que eu realmente deveria fazer, é trocar de lugar com ele e assumir a direção
deste carro, porque o silêncio junto ao movimento lento do automóvel faz
com que minha cabeça exploda de pensamentos nada inocentes enquanto
observo seu uniforme se agarrar em todo o seu corpo definido. Minha palma
coça para dedilhar os desenhos que aparecem no pouco de sua pele desnuda.
Preciso de uma distração antes que eu faça uma merda dentro deste carro
e ferre com a pouca distância que construímos nesta semana.
— Posso jurar que acabei de ver uma tartaruga nos ultrapassar, Logan! —
resmungo, finalmente quebrando o silêncio que havia se instalado dentro do
carro e afastando as imagens pecaminosas que rodeiam minha mente.
— É mesmo? Uma pena eu ter perdido essa cena tão icônica! — debocha
e observo seus olhos brilharem em diversão.
— Não se faça de idiota, Underwood! — esbravejo.
— Não seja tão ranzinza, Blackwell! — declara, soltando um sorriso. —
Apenas relaxe, estamos quase chegando.
— Nessa velocidade toda? — Aponto o dedo para a estrada à minha
frente, devemos estar no máximo em 40 km por hora, na porra de uma via
expressa. — Desse jeito, quando chegarmos na minha casa, já terá
anoitecido! — Bufo, levando minhas mãos até o som, enquanto ele me
ignora.
Quando ele me olha de esguelha, desisto de tentar falar mais alguma coisa,
me acomodo no banco, estendendo a mão para o som. Logan desvia os olhos
da estrada para meus dedos, que começam a se mover, procurando alguma
coisa na sua playlist. Ele estreita os olhos em minha direção e eu balanço a
cabeça perguntando mentalmente "o quê?'', ele arqueia a sobrancelha e
responde com um olhar de "ninguém toca no meu carro". Dou de ombros,
revirando os olhos, ainda procurando por alguma música, enquanto ele bufa
e volta sua atenção para a estrada.
A melodia de Drag Me Down, de One Direction, ressoa por todo o carro,
eu me encosto no banco e fecho os olhos, absorvendo a sensação boa que a
música traz, mal percebendo que havia soltado um pequeno sorriso por estar
escutando uma das minhas músicas favoritas. Por algum motivo, quando
volto a abri-los, Logan está encarando o meu rosto com a testa franzida,
como se meu gosto por músicas fosse péssimo. Seus fodidos olhos azuis
contêm uma diversão que eu estou a ponto de fazer com que se torne dor
após desferir um soco.
Quando ele sorriu para mim de lado, me amaldiçoo mentalmente, porque
aquela expressão em seu rosto não é comum em seu semblante, é a expressão
de quem acabou de perceber que eu gosto da música, e isso me irrita, porque
é como se ele estivesse me descamando, como fez no passado, como se
estivesse descobrindo meus segredos que não pertencem a ninguém além de
mim mesma.
— Você é fã da boy-band. — Não é uma pergunta.
— E isso é seu problema desde quando? — Ergo uma sobrancelha.
— Não é, mas agora estou curioso, anjo! — Ele solta um sorriso
malicioso para mim e sei que boa coisa não está vindo por aí. — Você
declarou seu amor para qual deles? Escreveu uma fanfic sobre eles e colou
pôsters em seu quarto de todos os integrantes? Ou fez aqueles testes
disponíveis na internet para saber com quem você mais combina?
— Você-é-um-idiota! — profiro pausadamente, encarando seus olhos.
— E você é uma directioner! — Ele levanta a cabeça para cima,
gargalhando. — Uma gracinha de fato.
Ele não espera a minha resposta, apenas estaciona o carro na rua deserta,
solta o cinto de segurança e se vira para me encarar. O seu rosto tem uma
expressão divertida, como se estivesse amando este momento. E quanto mais
ele gargalha sobre a minha reação por ele saber que eu gosto da banda, mais
algo dentro de mim borbulha, porque mesmo que fosse um motivo de merda
que trouxe essa reação, seu riso não é algo forçado, ao contrário, é uma
melodia gostosa de escutar.
E mesmo que não seja o correto, a sua risada voltou a se tornar o meu som
preferido.
— Estou pensando seriamente em caminhar até a minha casa. — Tento
manter a voz irritada, mas sinto que estou fracassando miseravelmente,
principalmente porque eu seguro uma risada.
Volto o meu olhar para fora do carro a fim de realmente nos manter
afastados, mas quando levo minha mão à porta para abri-la, a chuva decide
que é uma boa hora para aumentar, fazendo com que gotas grossas deslizem
pelo vidro, me obrigando a ficar dentro do carro.
— Eu poderia te dar inúmeras verdades sobre o porquê que você não irá
fazer isso, anjo! — Ele dá de ombros.
— Não iremos jogar esse jogo de verdades novamente, Logan! —
anuncio, me virando para o seu lado e encarando seu rosto.
— E qual jogo você quer jogar hoje, anjo? — ele questiona, descendo o
olhar até meus lábios. — Eu tenho vários em mente.
Não respondo de imediato, apenas continuo observando seu rosto. As íris
azuis brilham em um novo desejo, não aquele visceral e sujo que
compartilhamos durante as semanas que sucederam a minha chegada, não o
ódio que uma vez se enraizou entre nós.
É diferente. Algo que ainda não compreendo, mas que me dá medo de
desbravar.
— Guarde-os para si, capitão! — digo quase em um sussurro.
Ele se aproxima lentamente, parando seu rosto quase sobre o meu. Um
sorriso perfeitamente alinhado é estampado em seus lábios e eu o admiro.
Subo o olhar para seu rosto e venero o oceano que me convida a mergulhar,
que é como um quadro raro, um no qual tenho certeza de que Van Gogh teria
inveja.
As suas poucas pintas em sua pele faz com que eu deseje dedilhá-las, que
eu possa criar arte ali, entre o pouco espaço entre elas, eu poderia desenhar
uma constelação completa, apenas com aquelas pequenas marcas pretas
estampadas em seu rosto.
E seria a minha constelação, a minha via láctea, que eu moraria sem que
ninguém me impedisse.
— Eu acho que irá gostar deste... — murmura, fazendo com que sua
respiração pairasse em minha bochecha. — Eu desafio você a uma coisa,
anjo...
— Será um jogo de desafios? — balbucio lentamente, quase inerte na
sensação que acontece entre nós.
Seu sorriso se torna escancarado, me dando a resposta para minha
pergunta, e mal noto quando sua mão se levanta e vai até uma mecha solta de
meu cabelo. Ele a enrola em seu dedo médio, brincando por alguns
segundos, logo após a coloca atrás do lóbulo da minha orelha.
— Eu te desafio a me beijar, anjo!
Eu preciso ficar longe dele, certo? Preciso me lembrar de tudo que disse a
mim mesma nestes dias, preciso sair desse carro e manter distância de
Logan.
Mas eu não faço isso.
Eu me aproximo de seu rosto e selo nossos lábios como se ele fosse minha
perdição; e eu esteja faminta.
As mãos de Logan envolvem meus cabelos, dando leves puxões, me
trazendo para mais perto. Deixo que meus dedos escorreguem pelo seu
pescoço, aprofundando o momento, querendo que o mundo pare de girar e
que fiquemos aqui inertes um no outro.
E quando fica difícil de respirar, nós separamos nossas bocas, sugando o
ar um do outro, ele solta um sorriso travesso. Sem aviso prévio, me puxa
para seu colo, fazendo com que minhas pernas fiquem cada uma de lado de
seu quadril e minhas costas se encostem no volante. Logan volta a me beijar,
dessa vez como se todo o seu corpo estivesse fervilhando.
Ele desliza suas mãos sobre o tecido do meu uniforme até finalmente
chegar em minhas nádegas, apertando-as, fazendo com que eu solte suspiro
de aprovação.
É como uma dança, uma bela dança. Nossas respirações entram em
sincronia. Beijamos como se nossa vida dependesse disso, como se
tivéssemos sido impedidos de sentir essa sensação por tempo o suficiente.
A parte consciente do meu cérebro diz que eu devo me afastar dele, que
somos perigosos juntos, mas não consigo, porque nós somos como dois ímãs
que se atraem um para o outro.
E mesmo sabendo que é errado, meus lábios se desgrudam dos seus
apenas para morder o nódulo de sua orelha. Deslizo a língua por toda a
extensão de seu pescoço, indo até bem próximo da gola de sua camiseta. A
respiração de Logan fica cada vez mais frenética e, Deus, estou perdendo o
controle sobre meu corpo, porque quando ele me afasta para beijar minha
pele, é como se eu tivesse entrado em curto circuito, assim que puxa o tecido
da minha blusa para o lado e lambe a minha clavícula, eu arqueio as costas,
excitada. Enquanto Logan me prensa contra o volante, sua outra mão roça
meu seio, fazendo com que solte um suspiro e ele se ergue, se esfregando em
mim, me mostrando o quanto me deseja também.
Beijo sua boca com vontade, mordendo seus lábios, mostrando a ele que
também estou entrando em erupção. Cada vez que repetimos o movimento,
fico ainda mais molhada. Preciso que ele faça tudo o que fez comigo nas
últimas vezes que transamos, preciso senti-lo em mim, dentro de mim.
E por isso, quando afasta seus lábios dos meus, me inclino para frente
encostando minha testa na sua. Ficamos em silêncio, apenas esperando que
nossas respirações voltarem ao normal.
— E-eu... — sussurro, tentando encontrar minha voz sem romper nosso
contato visual, então solto a única coisa que faz sentindo no momento — Te
desafio a me foder, capitão!
Ele sorri maquiavelicamente e depois ataca a minha boca como se eu
fosse um oásis em meio a um deserto.
Logan puxa minha blusa para cima, fazendo com que ficasse apenas com
meu sutiã preto de renda e o short-saia, seus lábios encontram a minha pele
segundos depois, fazendo com que eu arqueei as minhas costas e ele precise
se inclinar para ter acesso a mim novamente. Aproveito o pequeno espaço
que se forma entre nós para puxar a sua blusa e exibir todo o seu abdômen
perfeitamente esculpido. Levo meus dedos calmamente até a sua pele
bronzeada e dedilho as tatuagens, mas quando chego perto do anjo esculpido
em seu peito, eu o encaro. Seus olhos me dão todas as respostas que eu não
desejo saber.
Aquela bailarina com asas de anjo não é para Melany, nem para outra
pessoa. É para mim.
E mesmo que negue, mesmo que deseje que isso seja apenas uma ilusão,
eu sei que Logan Underwood acabara de derrubar minha última barreira que
me mantinha intacta a todos os nossos sentimentos.
Ele percebe que meus olhos encaram sua tatuagem por tempo suficiente e,
como se fosse uma conexão, Logan entende que se continuasse assim, eu me
afastaria. Por isso, ele se aproxima e colide nossos lábios novamente,
excluindo todos os meus pensamentos, fazendo com que eu foque apenas
nesse momento. Apenas nele.
— Eu quero que me diga, anjo. — Suspira, quase sem deixar que sua voz
saísse. Ele se abaixa e deixa um beijo o topo dos meus seios ainda tampados
pela renda, enquanto desce seus dedos até a borda do meu short. — Me diga
o quão forte eu devo te comer… — Um sorriso se forma em seus lábios,
enquanto eu mordo os meus pela sensação que ele me dá. Logan desce mais
sua mão, encontrando o tecido da minha calcinha todo encharcado. — E
quero que me conte se está tão molhada assim por saber que iremos foder em
uma via onde qualquer um pode passar e nos ver.
— Merda… Logan! — murmuro rouca, com meus olhos fechados.
— Você gosta de foder com pessoas te observando, anjo? — pergunta com
a boca prensada em minha pele.
Eu abro a boca para responder, mas perco todo o raciocínio lógico, toda a
minha sanidade se esvai do meu corpo, porque Logan abaixa o meu sutiã e
envolve meu mamilo com sua boca. Enquanto ele se ocupa em chupar um dos
meus seios, a outra mão, a que não está dentro do meu short, sobe até o outro
seio e seus dedos o apertam, fazendo com que eu solte um grunhido.
Logan é bom nisso, porra, é sensacional! Ele sabe com que intensidade
deve chupar, onde morder e mesmo que eu soubesse que estava a ponto de
me colocar de quatro no banco de trás e me foder como das outras vezes, ele
faz os movimentos com maestria, como se pudesse fazer aquilo o dia todo.
Me esfrego contra seus dedos, fazendo com ele enfie um dentro de mim e
começa um movimento de vai e vem, enquanto seu dedão pressiona o meu
clitóris. Ele solta um gemido nervoso, por não ter total acesso a minha
boceta, Logan me afasta, fazendo com que o ar frio toque meus seios,
contraindo-os, mas não tenho tempo para sentir essa sensação, porque ele me
levanta e abaixa o meu short até meus pés, tirando-o e o jogando no banco
traseiro, me deixando apenas de calcinha. Ao mesmo tempo que ele se
inclina para cima e retira a calça do seu uniforme, junto de sua cueca,
fazendo com que eu solte um sorriso voraz quando olho para baixo e vejo
seu membro duro. Ele devolve o sorriso, porque sabe o que eu desejo, sabe
que preciso dele. Porra, eu precisava dele dentro de mim.
— Por favor, abra as pernas para mim, anjo! — ele murmura rouco em
meu ouvido.
E, Deus, eu faço o que pede. Mesmo que a posição não me facilite tanto,
eu as abro um pouco mais. Sua mão afasta minha calcinha para o lado e sem
nenhum aviso, ele enfia dois dedos dentro de mim, fazendo com que solte um
gemido alto o suficiente para que quem esteja passando, ouça. Ele não se
importa com isso, apenas volta a se abaixar, lambendo o meu seio, enquanto
me fode com os dedos.
É erótico e devasso.
É a melhor sensação que alguém já me fez sentir.
Mordo o meu lábio inferior enquanto ele retira os dedos apenas para levar
até sua boca e provar o meu gosto. Logan coloca o primeiro dedo em sua
língua e me olha enquanto chupa tudo o que retirou de mim. A safadeza é
explícita em suas pupilas dilatadas e uma onda de excitação percorre todo o
meu corpo.
— Eu nunca me canso de seu gosto, anjo! — provoca com a voz rouca.
Engulo em seco.
Eu não encontro minha voz, porque estou fascinada demais com a visão de
Logan. Estou tão molhada que ele poderia escorregar para dentro de mim
com facilidade. E ele sabe disso, porque ele ergue a mão entre nós e com um
puxão, rasga o tecido da minha calcinha e depois abaixa o encosto de seu
banco. Logan sorri maliciosamente em minha direção e puxa um embrulho
laminado de sua carteira e o escorrega por todo o seu membro, e então
segura os dois lados da minha cintura, me erguendo.
Mordo o lábio, conforme ele me penetra devagar, quase lentamente. Um
gemido sai de nossos lábios quase que simultaneamente. O atrito é bom, tão
bom que quase não percebo que começo a cavalgar forte e rápido, como se
estivesse perdendo o controle e não estivesse a fim de recuperá-lo. Uma
expressão feroz atinge o rosto de Logan e antes que eu possa fazer algo, a
sua mão aperta a minha bunda, tomando o controle de cada investida. Ele me
ergue e depois me força para baixo. Dentro de mim, seu membro pulsa cada
vez que eu rebolo. Seus dedos descem deliberadamente pelas curvas do meu
corpo, até finalmente chegar ao meu clitóris, acariciando e me provocando.
Ele leva a outra mão até meu pescoço e puxa meu corpo para si, fazendo com
que nossas bocas se colidam. Enquanto devora minha boca, ele aplica uma
pressão em meu pescoço, fazendo com que eu rebole mais firmemente. O
único barulho dentro do carro são os nossos gemidos, misturados com o
ruído de nossos corpos todas as vezes que se chocam. Logan nos mantém
assim, até que finalmente me desfaço como a porra de um foguete prestes a
ser jogado na atmosfera.
Mas ele não me deixa recuperar, ao contrário, Underwood entra bem mais
fundo, fazendo com que eu levante a cabeça para o teto e feche meus olhos,
sentindo-o me penetrar como se quisesse me marcar, me mostrar algo. Ele
solta o meu pescoço apenas para segurar a minha bunda, então desfere um
tapa e depois outro, até que eu grite quando o prazer volta a tomar conta de
todo o meu corpo.
Até que, de repente, ele treme, totalmente entregue, com sua respiração
entrecortada. E caí para trás, fazendo com que eu vá junto. Uma parte de mim
deseja me deitar e apreciar esse momento, mas a outra parte, aquela que não
está nublada com todas as sensações dentro desse carro, grita para que eu
acorde para a realidade e faça com que isso acabe.
— Anjo... — ele sussurra, quase inaudível.
— Não diga nada, capitão! — Suspiro, fechando os olhos por alguns
segundos. — Apenas deixe-me recuperar!
— Vamos para minha casa... — ele diz, mas antes de terminar a frase eu
levanto meu rosto, levando seu olhar até o meu.
— Logan... — murmuro.
— Verônica! — ele diz, sério, encarando meus olhos. — Eu te desafio a ir
para casa comigo!
Tão jovens, tão burros
Então eu afogo isso como sempre faço
Dançando pela nossa casa com o seu fantasma
E eu o persigo, com um tiro de verdade
Que meus pés não dançam como costumavam dançar com você
Ghost Of You | 5 Seconds of Summer

Ela não me acompanhou.


Verônica me encarou por alguns minutos antes de vestir suas roupas e me
pedir para dirigir até sua casa. E quando saiu do carro e me lançou um olhar
triste, como se estivesse escondendo mais segredos do que já tínhamos, eu
soube que ela estava tentando se proteger de algo, de mim. Algo dentro do
meu peito, algo que me manda correr, me diz para ficar longe dela, antes que
nos transformemos novamente em uma bomba prestes a explodir.
Mas eu não posso, não quero. Verônica pode negar o quanto quiser, mas
nós nos pertencemos, nós fomos feitos para sermos eternos. Eu guardei a
nossa história entre as coisas mais lindas que já tive na minha vida, mantive
nossas lembranças, nossos segredos à sete chaves de tudo e de todos. Deixei
que acreditassem no que eu queria que acreditassem, deixei que pensassem
coisas, que na verdade era apenas uma ilusão do que eu sentia e sinto.
E agora, eu apenas quero que ela volte a acreditar no amor, volte a
acreditar em mim. Quero que nos dê uma chance, mesmo que isso signifique
que ainda somos como tempestades, daquelas que abala as estruturas e bate
portas como toda a força.
Suspiro fundo, estacionando o carro na vaga do estacionamento do prédio
e assim que saio do carro e o tranco, sigo até o elevador e fico feliz por
estar vazio. Quando as portas se fecham e emite um bip, indicando que
começa a subir até meu andar, eu encosto minha cabeça na superfície de
metal e penso nas possibilidades de fazer com que Verônica dê um passo em
minha direção, que pare de me afastar, que… apenas comece a me enxergar
da mesma maneira que eu a enxergo.
Assim que as portas se abrem novamente, sigo até o apartamento. Antes
mesmo de abrir a porta, já posso escutar os murmúrios vindos de dentro do
ambiente e assim que entro na sala de estar, a visão de Summer deitada
sobre o tapete da sala, vestida com um moletom vermelho e preto da Marvel,
calça Legging e meias, me faz sorrir. Hazel está ao seu lado, segurando uma
taça de vinho, com um short de malha e um cropped preto, enquanto Josh está
deitado em um dos sofás, lendo algum livro e Levi está sentado no balcão
com uma cerveja em mãos.
Dou um passo à frente e constato que eles não precisam das minhas
merdas.
Não precisam saber que eu estou mais que ferrado por estar novamente
apaixonado por Verônica Blackwell.
— Você está com uma cara péssima! — Hazel diz, erguendo uma das
sobrancelhas.
— Ele sempre está, Hazel! — Josh debocha sem ao menos levantar o
rosto do livro.
Pela primeira vez, eu não devolvo a brincadeira, apenas sigo até onde
estão e me jogo no sofá oposto ao de Josh, pegando uma almofada em
formato de uma bola Wilson e começo jogá-la de uma mão para outra,
encarando o teto. Todos eles ficam em silêncio por alguns segundos, me
encarando. Até mesmo Levi abandona sua cerveja para se sentar ereto e me
encarar com um semblante sério.
— Você perdeu o título de capitão para alguém? — Summer questiona,
preocupada.
— O quê? Não! — respondo, emitindo uma careta em sua direção. — Por
que diabos você acha que eu perdi o meu posto?
— Porque a última vez que ficou desta maneira, foi porque o treinador
ameaçou te tirar do time? — Levi responde, mas soa como se fosse uma
pergunta.
Suspiro fundo, lançando a meus amigos um olhar perdido. O que eu devo
dizer? Que estou confuso? Que toda a situação com Verônica está fodendo
com a minha cabeça e que, acima de tudo, eu a desejo mais que qualquer
outra coisa? Que eu não resisto a atração entre nós? Não, eu não posso dizer
tais coisas, porra, eu nem sei o que eu poderia dizer para ser sincero.
Porque eu não tenho certeza de nada no momento, a não ser que eu e
Verônica somos como estrelas binárias, criadas quando duas estrelas são
atraídas uma pela outra e que quando estão muito próximas, não podem
resistir à atração que sentem, então, ficam presas para sempre, rodopiando
pela galáxia como um par. A gravidade não está em nenhuma delas, e sim no
meio, segurando ambas, juntas.
Nós podemos até ser uma dessas estrelas, mas nosso amor não, ele é mais
como uma estrela cadente, porque não cabe em apenas uma órbita.
Porra, pensando bem, Verônica Blackwell sempre foi meu céu, e acho que,
na verdade, se tivéssemos tido tempo e oportunidade, nós teríamos sido até
mesmo uma galáxia inteira juntos.
— Desembucha, Logan! — Hazel declara, seus olhos emitem uma certa
preocupação que me faz ajeitar a postura e suspirar fundo.
— Vamos dizer que, hipoteticamente, eu queira conquistar uma garota... —
digo calmamente.
— O apocalipse ainda é apenas um mito, Underwood! — Levi profere,
enquanto leva lata de cerveja até seus lábios.
— Não seja um idiota, Johnson! — resmungo, encostando minhas costas
no sofá e cruzando os braços frente ao corpo.
— Hipoteticamente, essa garota é quem estamos pensando? — Summer
cruza as pernas enquanto se ajeita no tapete.
Apenas balanço a cabeça, confirmando sua pergunta.
— Hipoteticamente, eu digo para ir com cuidado... — Hazel comenta,
soltando um sorriso confortante. — Porque ela está machucada demais para
ser apenas mais uma conquista em sua lista, Logan!
Encaro minha amiga por alguns segundos, quase que insultado. Eu nunca
faria isso com Verônica. Porra, eu sei que sou um idiota quando se trata de
relacionamentos. Todos meus amigos sabem que após aquela noite em que
Sophie morreu e Verônica se quebrou na minha frente, fazendo com meu
próprio coração fosse junto, eu jurei que nunca mais deixaria nenhuma outra
garota entrar em meu coração. Jurei que apenas ela já havia bastado para
enraizar todas as vertentes dele e o reivindicar como seu.
— Nunca existiu uma lista para mim, Hazel! — afirmo seriamente. —
Porque tudo sempre foi dela, cada pedaço fragmentado do meu coração,
cada memória, sempre foi… do meu anjo!
— Então porque você ainda vive brigando com ela, se diz que seu
coração ainda é dela? — Summer cruza os braços frente ao corpo, imitando
minha posição.
Olho para a minha amiga, a mesma que me presenciou no meu pior
momento. Que ficou ao meu lado. Mas que agora, está claramente protegendo
Verônica de qualquer que fosse o perigo que eu represento. Não porque não
somos amigos, ao contrário, mas porque elas são como um trio fechado, com
uma sociedade secreta que faz tudo para se protegerem. E mesmo que Sum e
Hazel sejam minhas amigas também, o elo que as três construíram desde o
primeiro ano sênior é mais forte do que qualquer coisa.
— Porque se ela precisa de alguém para despejar todo o sentimento
guardado durante todos esses anos, alguém que devolverá a briga na mesma
proporção, que mostrará a ela que ela pode estar machucada, mas que ainda
está viva... que ela não precisa se esconder em uma máscara na qual foi
obrigada a viver… — solto as palavras que me acompanham desde que vi
que Verônica está machucada, desde que aqueles olhos opacos travaram uma
guerra contra os meus. — Então, eu estarei aqui.
— Por quê, Logan? — A voz de Josh finalmente verbera pela sala. — Por
que fingir todos esses sentimentos, quando você pode apenas contar para ela
que ainda a ama?
— Porque eu estou disposto a receber o que ela está pronta para me dar!
— exclamo, deixando meus ombros caírem. — Verônica foi tratada como
vidro que pode se quebrar a qualquer momento, ela viveu um inferno e
quando viu em mim uma forma de derramar tudo o que ela guardou, eu o
aceitei, fiz de bom grado, porque eu prefiro ter nossos jogos sujos, ter todas
as nossas brigas, do que assisti-la se destruir.
É a verdade. Eu aceitaria as coisas que me dava, aceitaria nossos desafios
e nossas brigas que muitas vezes saíram do controle. Eu aceitaria tudo, se
isso significasse que ela está colocando todos aqueles sentimentos para fora,
que ela pudesse se livrar do peso da culpa, que ela apenas pudesse ter uma
nova válvula de escape, um motivo para querer continuar a lutar.
— Hipoteticamente, eu diria para você mostrar a Vee o porquê dela ter se
apaixonado por você anos atrás! — É a voz de Josh que faz sair dos meus
devaneios. — Porque vocês podem ser dois orgulhosos, que beiram a
narcisismo, mas, ainda assim, são loucos um pelo outro, e tudo o que
carregam agora, são parte de quem se tornaram, e isso, Logan, ela não
conhece, ela não conhece a pessoa que se tornou. Não conhece o amigo que
nos defende como se fôssemos a sua família, não conhece o capitão que vira
noites estudando os jogos para melhorar o rendimento da equipe e nem
conhece o Logan que guarda todas as fotos de vocês dois em uma caixa em
cima do guarda-roupa.
— Ela conhece o Underwood inimigo! — Levi exclama, vindo até onde eu
estava e se jogando ao meu lado. — Mostre a ela o Underwood que um dia
ela chegou a amar.
— Vee está machucada, Logan, ela precisa se curar para enxergar que
merece o amor! — Summer afirma, me lançando um olhar apelativo.
— Não quero machucá-la Sum, nunca! — admito, suspirando fundo — Eu
estou cansado dessas brigas, desses momentos que preciso jogar com ela
para que me enxergue, quando na verdade eu só a quero.
— Ela te enxerga, Logan! — Sum confessa. — Ela te enxerga melhor que
qualquer outra pessoa…
Me levanto, passando as mãos pelos meus cabelos, por mais que meus
amigos quisessem me ajudar com aquilo, eu deveria decidir como lidar com
isso.
— Logan? — Hazel me chama.
— Sim?
— Ela está indo para Nova York essa noite e só voltará em dois dias,
acho que pode tirar esse tempo para você! — ela diz sorrindo. — E nós
iremos sempre estar aqui, por você e por ela. Ok?
Solto um sorriso fraco, eu sabia que aquilo era verdade, sabia que mesmo
que eu quisesse lidar com todas as minhas merdas sozinho, eles estariam ali
para mim, como sempre estiveram.
O caminho até os subúrbios de Saint Vincent foi devastador.
As imagens de quando morei aqui invadem a minha mente como água
cristalina. Algumas crianças correm pelas ruas pavimentadas e algumas das
pessoas que conheço de quando morava aqui, acenam para mim.
Quando estaciono meu carro em frente ao pequeno galpão que servia
como oficina do meu pai, antes dele se afogar no seu próprio desespero e
esquecer que tinha família, eu solto um suspiro, foi a única coisa que ele
havia nos deixado, o único resquício de nossa vida aqui, a única lembrança
de que um dia fomos uma família. Uma família que se desconstruiu quando
minha mãe morreu em um acidente de carro, quando ia visitar tia Audrey em
Atlanta há alguns anos atrás. E após aquele dia, depois que meu pai percebeu
que havia a perdido, toda a sua vida se baseou em álcool e a essa oficina.
Balanço a cabeça, expulsando os pensamentos que começam a preencher
minha cabeça, e olho em direção a meu irmão. Aidan está sentado na calçada
em frente ao lugar, com uma pequena mala preta ao seu lado. Sua blusa preta
desgastada e as calças jeans rasgadas nos joelhos são quase idênticas às que
estou vestindo no momento.
Ele olha para cima, fazendo com que o sol invada suas íris claras e seja
obrigado a levar a mão até a testa, formando uma concha para protegê-los.
Meu irmão tem o rosto cansado, olheiras se formaram sob a borda de seus
olhos e seus ombros estão caídos, como se não tivesse tido uma boa noite de
sono em semanas.
E por mais que uma parte de mim queira socá-lo, a outra parte, a que
ainda o vê como o meu irmão mais velho que me protegeu, ficou preocupada.
— Você trouxe? — ele questiona assim que paro à sua frente.
Encaro seu rosto por alguns segundos, enquanto levo minha mão até o
bolso traseiro da calça e retiro o chaveiro com pequenas miçangas coloridas
que Mel havia feito e dado de presente para meu pai antes de tudo. A única
chave que balança em minha mão, ficou jogada dentro de minha gaveta todo
esse tempo. Eu nunca havia pisado aqui depois daquele dia, nunca quis vir a
esse bairro novamente e nem encarar a última casa da rua, a única casa de
dois andares com a pintura branca e as janelas escuras e fechadas.
Não havia nada mais lá. É como se toda a casa tivesse sido abandonada
por mim e pela sua atual proprietária.
— É o único motivo pelo qual estou aqui — digo finalmente voltando
minha atenção para ele. — Você tem certeza disso?
Franzo o cenho em sua direção. É uma péssima ideia deixar que Aidan
fique na antiga oficina de nosso pai durante os dias que ficar na cidade.
Contudo, eu não posso levá-lo para a fraternidade ou para o apartamento. E
a relação entre ele e Audrey anda em uma corda bamba desde a última vez
que haviam conversado.
Então não há muitas opções, a não deixá-lo ficar onde todas as nossas
lembranças estão.
— Alguém precisa abrir esse lugar novamente, Logan! — Ele solta um
sorriso fraco. — Preciso de dinheiro e pelo menos aquele velho nos ensinou
a consertar carros de forma correta.
Eu não respondo. Falar sobre nosso pai e como ele havia morrido, não
traz boas lembranças para nenhum de nós dois, e já temos problemas demais
para resolver, para ter que lidar com mais um. Apenas solto uma lufada de ar
e caminho até a enorme porta de metal, assim que ela é aberta e a poeira
atinge meu rosto, é como se tivéssemos entrado em uma máquina do tempo e
tendo acesso às imagens minhas, dele e de Melany correndo por todo esse
local, enquanto meu pai sorria e dançava com nossa mãe.
Caminho entre as inúmeras ferramentas, algumas delas estão enferrujadas,
outras cobertas de poeira. Observo alguns dos móveis que havíamos deixado
aqui quando precisamos desocupar a casa e vou em direção ao antigo
escritório, me aproximo de um porta-retrato empoeirado em cima da mesa e
o pego, passando a mão pelo vidro e observando a foto.
Era o último aniversário de Aidan antes do acidente que havia mudado
toda a nossa vida. Meu irmão segura Mel em seu colo, enquanto eu estou ao
lado de nossos pais. A vela acesa no topo de um bolo decorado com alguns
carrinhos de brinquedos é um convite para Aidan apagá-la, mas ele não fez
isso, ele deixou que Melany realizasse o ato por ele, para que ela pudesse
fazer um pedido em seu lugar.
Naquela época, meu irmão não era um homem egoísta e insensível, ele
colocava a família em primeiro lugar, ele nos amava e lutava para que
ficássemos juntos.
Mas aquilo mudou, aquela imagem era apenas uma vaga lembrança de
quem um dia ele havia sido.
E é doloroso. Chega a arder.
— O recital de Natal é neste final de semana… — A voz rouca de Aidan
ressoa atrás de mim, fazendo com que eu abandone as lembranças.
— Eu sei! — exclamo, me virando em sua direção. — Melany está
entusiasmada com isso, todas as mensagens que me envia são sobre como
será a apresentação mais importante de sua vida.
— Eu irei ficar aqui para o recital e depois esperarei até o aniversário
dela, irei visitá-la como fiz nos últimos anos e então irei embora. — Sua voz
é baixa, como se estivesse confessando algo que não desejava compartilhar.
— Aidan…
— Não, Logan! Não me venha com discursos... — Ele me interrompe. —
Você pode me xingar, pode jogar coisas na minha cara, eu irei aceitar, sei
que mereço boa parte do ódio que sente por mim, mas não tente me impedir
de visitá-la, não tente me impedir de sofrer pela garota que eu amei.
Olho para Aidan, é como se ele tivesse se tornado opaco, vazio e nublado,
como se ninguém pudesse o tirar desse lugar no qual caiu, como se o mundo
tivesse tirado tudo o que existiu de bom em sua vida. E observando seu
rosto, eu finalmente entendi que ele também havia saído quebrado por todos
esses conflitos, que mesmo que por fora ele seja o homem insensível e cruel
que mostra ao mundo, por dentro, ele ainda tem algum resquício de bondade.
E eu espero que um dia ele possa mostrar ao mundo outra vez o seu lado
bom, o lado que ele mostra a Melany e acredito que tenha mostrado a
Sophie, antes de tudo ter acontecido.
— Eu sinto muito pela vida ter te quebrado de forma tão visceral! —
confesso, deixando meus ombros caírem.
— As coisas são como são, Logan! — Ele diz seco, enquanto passa a mão
pela borda da mesa e caminha até onde está o outro porta retrato que contém
uma foto minha, dele e de Mel e o segura, passando a mão pelo rosto de
nossa irmã. — Papai costumava dizer que amar é como pular de um
precipício, onde nós nos jogamos e torcemos para que o chão nunca chegue.
É ficar vulnerável, renunciar ao controle. — Ele solta o porta-retrato e me
encara. — Uma vez, eu pulei, achei que o chão nunca chegaria, até que ele
chegou, Logan, e o meu tombo não foi apenas um arranhão, ele me quebrou,
me destruiu e eu realmente espero que isso não aconteça com você!
— Nem todos os amores são iguais, Aidan, alguns deles não vão te
machucar! — Suspiro cansado. — Eu espero que um dia você encontre um
desses e entenda que nem tudo na vida é sombrio.
— Você a ama? — É uma pergunta simples, e eu sei de quem ele está
perguntando, mas a resposta dela é mais complexa do que qualquer outra
resposta que eu já dei em minha vida.
— Amar é pouco para o descrever que eu sinto por ela! — admito. — É
um sentimento mais profundo, algo mais íntimo e eterno. O que Verônica
Blackwell significa para mim é bem mais que clichês românticos e palavras
vazias.
— Amá-la será a sua ruína, Logan!
— Não, você está errado… — profiro, encarando seus olhos idênticos
aos meus. — Amá-la será minha ascensão!
Começou com o beijo perfeito, então
Podíamos sentir o veneno se instalar
A perfeição não pôde manter este amor vivo
Você sabe que te amo demais
Eu te amo o suficiente para te deixar ir
Sleeping At Last | Already Gone

Eu não consegui dormir durante o voo até Saint Vincent.


Estou esgotada demais sobre tudo o que precisei fazer em dois dias e
ainda preciso encontrar um momento para conversar com Logan. Nós não
podemos continuar sem que todas as cartas sejam jogadas na mesa, sem que
os segredos sujos que nos rondam finalmente sejam revelados.
Está na hora de contar o porquê de eu não ter participado de toda aquela
infantilidade que tínhamos tramado contra a sua família, do porquê eu ter o
esperado no mirante naquele dia para um último combate. Eu sabia que ele
iria, sabia que Logan precisava olhar nos meus olhos e dizer suas últimas
palavras para me fazer sofrer como minha família havia o destruído, e eu
esperei lá, esperei que ele dissesse tudo o que estava entalado em sua
garganta, pois eu sabia que ele precisava daquilo, precisava me ferir, como
eu deixei que acreditasse que havia o ferido. E por mais que suas palavras
tenham doído de uma forma irreparável, eu as aceitei. Não porque eu fui uma
pirralha mimada, mas sim porque eu precisava que aquele ódio fosse mútuo,
precisava fazê-lo acreditar que havia machucado Melany de uma forma tão
cruel, mesmo que jamais tivesse coragem de fazer tal ato, eu apenas
precisava que ele me odiasse.
E agora está na hora da verdade e eu não adiaria mais.
Quando os primeiros raios solares nasceram e finalmente o avião pousou
no pequeno aeroporto, decido que preciso esvaziar minha cabeça antes de
fazer o que eu pretendo. E exatamente por isso dirijo até a parte baixa da
cidade e estaciono em frente de uma loja em estilo vitoriano com dois
andares. As portas de madeira estão abertas e já posso ver as enormes
prateleiras de livros esperando para que eu os folheasse.
Mesmo que ainda seja cedo demais, algumas pessoas já estão sentadas em
algumas almofadas coloridas espalhadas pela pequena varanda e outras se
jogam na grama verde em frente do local, cantando, conversando e
esquecendo um pouco da vida fora daqui.
Subo os poucos degraus pintados de branco e entro no estabelecimento, o
silêncio se instala e o único barulho é a minha bota, que bate no piso e emite
um pequeno som. Ninguém está zanzando pelas enormes prateleiras ou
sentados nas poucas mesas espelhadas pelo primeiro andar, é como se todos
esses livros estivessem me chamando, gritando para que eu desbrave todas
as histórias que querem me contar.
Thea, uma mulher de cabelos cacheados e pele negra, sai de seu balcão e
caminha até mim. Seu sorriso é como um pôr do sol, gracioso e acolhedor.
Seu vestido roxo, que vai até seus pés, balança, fazendo com que seus
pequenos saltos apareçam. E quando para diante de mim, apenas me puxa
para um abraço. Como se eu tivesse finalmente voltando para casa.
— Eu não acredito que você voltou, doce Vee — diz assim que me solta.
— Eu estava sem tempo para te visitar, Thea! — Encaro seus olhos, eles
são tão escuros. Uma escuridão calorosa, que te encara com simpatia, amor e
simplicidade.
— Esse problema não é meu! Trate de trazer sua bunda para minha
livraria sempre! — Dá de ombros.
A gargalhada que saí de meus lábios é o suficiente para saber que quando
decidi que precisava vir até aqui, havia tomado a decisão certa. Thea
sempre foi uma amiga, sempre me esperou em dias de chuvas com seus
chocolates quentes e histórias sobre o mundo encantado, sempre me mostrou
o lado bom de passar horas em meio a páginas, ignorando a realidade.
Sempre desejou que eu sonhasse, que vivesse vidas sem que precisasse
sair deste lugar.
— Eu conheço esse olhar e ele não é bom! — exclama, erguendo a
sobrancelha. — Conte-me, doce Vee, o que aconteceu?
— Eu acho que preciso mais do que um chocolate quente para conseguir
contar tudo o que aconteceu durante estes quatro anos! — Solto um suspiro.
— Você não está bem — ela afirma, levando suas mãos até minhas
bochechas e encara meus olhos procurando por algo. — Amber me disse que
uma hora você apareceria aqui, mas não me disse que estaria tão triste…
Existe uma coisa sobre a mulher na minha frente que eu amo, ela é sincera.
Mesmo que seja fodidamente rica e odeie metade da parte alta de Saint
Vincent, ela continua sendo fiel à sua essência. Talvez essa seja uma das
suas principais qualidades. Theodora Stokes é a mulher mais forte que já
passou pela minha vida, ela é a melhor amiga de mamãe desde quando eram
universitárias, e mesmo depois que ela se casou com meu pai, a amizade
delas não foi deixada de lado. E mesmo que meu pai odiasse que eu
frequente a parte baixa, isso não impediu de mamãe me trazer aqui e me
apresentar à Thea, e de Thea ter me adotado como sua afilhada, fazendo com
que eu me apaixonasse por este lugar, que eu conhecesse diversos livros
quando era criança e que criasse uma rota de fuga momentânea da minha
vida.
— É a temporada de tempestade. — Suspiro, jogando minha bolsa atrás
de seu balcão e lhe conto a verdade. — Isso sempre me lembra dela, sempre
me faz regressar em meu processo de superação da perda dela, é quando não
sei se um dia conseguirei me recuperar.
— Você sempre se lembrará dela, Verônica, mas não precisa ser desta
maneira — ela diz suavemente.
— Às vezes a lembrança dela dói demais, Thea. — Dou de ombros,
mordendo meu lábio. — Por isso que fugi para cá, porque eu preciso de uma
fuga, preciso saber que em algum lugar eu posso me sentir em paz.
— Seu ponto de paz sempre estará onde seu coração está, doce Vee. —
Ela aponta para meu peito e sorri calmamente. — E enquanto não se curar,
não entender que o luto precisa ir embora, nenhum lugar será o suficiente
para você.
— Se eu me permitir me curar, eu a deixo...
— Não! Se você permitir que todas as suas feridas se cicatrizam, você a
eterniza! — Ela coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha. —
Aprenda a se perdoar, aprenda a confiar em seus sentimentos e supere o seu
luto, doce Vee, aí sim, você conseguirá viver sem que todo o seu passado te
atormente.
— Eu não sei como fazer isso! — Solto um suspiro doloroso, deixando
que uma lágrima escorregue pelo meu rosto.
— Você não precisa saber como fazer imediatamente, a superação não
acontece de um dia para outro! — Ela sorri fracamente. — Mas o primeiro
passo, você já deu.
Ela continua sorrindo e quando sussurra para que eu suba logo e pegue os
livros que havia trazido de Londres especialmente para mim, eu a deixo ir
até seus clientes.
Subo lentamente até o segundo andar e quando meus olhos encontram a
última prateleira, solto uma pequena gargalhada. Thea havia escrito em
letras enormes uma mensagem para quem quer que fosse o idiota, para não
tocar naqueles livros ou seriam expulsos da casa de leitura. Isso é a cara
dela, desde que vinha aqui apenas para ler, ela sempre deixava recados
como este. Puxo o primeiro exemplar e me jogo sobre as dezenas de
almofadas.
Num primeiro momento, me acostumo com a escrita, aprecio a maneira
como a autora dá vida aos personagens. Sinto como se estivesse em um
portal, onde a minha imaginação cria todo aquele mundo, como se os
personagens principais me dessem a mão e me mostrassem suas feridas, suas
alegrias, suas angústias, como se me deixassem escamar todo o seu interior,
para que contassem como foi a jornada até ali. E em muitas dessas histórias,
eu me sinto parte daquele ambiente, não quero que a última página chegue,
ao contrário, eu desejo ser um membro permanente naquele universo.
Porque aquelas palavras, aqueles personagens, muitas das vezes me
salvaram, me mostraram que tudo bem sonhar, tudo bem desejar.
Ler é esperança. É saber que mesmo que o dia esteja nublado,
tempestuoso, no fim o sol voltará a brilhar mais uma vez.
— Verônica? — Uma voz rouca e familiar me faz desviar os olhos do
livro e olhar para cima.
— Josh. — devolvo.
— Não sabia que frequentava essa livraria ainda. — Ele se encosta em
uma das prateleiras, com um livro em mãos.
— Algumas coisas nunca mudam! — Solto um sorriso simples.
Ele devolve o sorriso e encara as outras almofadas jogadas pelo chão e
aponta com o queixo.
— Posso?
— Fique à vontade! — Sorrio.
Josh se joga ao meu lado e por alguns minutos, ele apenas mantém a sua
atenção no livro.
— Eu sei que não é problema meu, mas você está bem? — pergunta de
repente, em um tom que não consigo diferenciar.
— Eu estou bem — respondo sua pergunta. — Só estou dando um tempo
de toda aquela vida de merda na parte alta.
— Thea consegue nos fazer esquecer que somos de lá, ela é especial! —
solta genuinamente.
— Thea abriu essa casa de leitura exatamente para isso, para que as
pessoas que frequentam este lugar, esqueçam que fazem parte de algo —
explico. — Quando se está com um livro em mãos, não importa quem você é
ou de onde é, o que realmente importa, é o que você quer ser. Se você quer
ser fada, feérico ou se quer experimentar um romance de época, ou até
mesmo uma fantasia. Se quer ser um guerreiro em uma guerra sangrenta ou se
quer apenas encontrar seu parceiro em meio a tantos obstáculos. Isso
importa, saber que aqui você pode ser você mesmo e pode amar, desejar e
conquistar qualquer coisa.
— Uau! Você realmente ama este lugar! — Ele sorri, se sentando em uma
das almofadas.
— Thea me ensinou a amar os livros, esse lugar é parte de mim! — Solto
um sorriso.
Por alguns minutos voltamos a ficar em silêncio, apenas lendo as inúmeras
páginas, até que ele passa a mão pelo zíper de seu moletom, inquieto e então
solta um suspiro.
— O que está acontecendo entre você e Logan? — ele pergunta de
repente, fazendo com que minha atenção vá para seu rosto. — Eu sei que não
tenho nada a ver com isso, mas ele é meu amigo, Vee, e eu me preocupo.
— Josh — Deixo o livro em cima de uma almofada e encaro seus olhos.
— Se ele não se sentiu confortável para dizer, não será eu que quebrarei
esse silêncio.
— Vamos fazer um acordo então! — Ele espera a minha resposta e eu
apenas aceno para que ela continue. — Eu respondo suas perguntas e você
responde as minhas.
— Você sempre foi péssimo com jogos, Brown! — respondo, soltando
uma risada baixa. Josh é uma pessoa leve, gentil, que sempre faz com que eu
queira prolongar a nossa conversa. — Mas tudo bem.
— Eu permito que comece! — Ele solta um sorriso fraco. — Apenas…
pegue leve.
Encaro o garoto de cabelos e olhos castanhos à minha frente, tentando
imaginar o que eu gostaria de saber sobre ele. Então abaixo o olhar para a
pequena tatuagem em seu pulso, franzo o cenho em direção a um boneco
verde com uma capa, segurando um sabre de luz.
Ergo uma sobrancelha. Aquilo é estranho, nunca havia visto um desenho
daquela maneira.
— Primeira pergunta: o que diabos significa a sua tatuagem? — Faço uma
careta, apontando o dedo em direção a seu braço.
— Merda, Blackwell! — diz quase ofendido, colocando a mão em seu
coração. — Mestre Yoda, Star Wars?
— Você tem certeza de que isso é um personagem de verdade? — Fico
surpresa ao perceber que minha voz sai regada a humor e meu corpo
estivesse se acostumando com a presença do garoto. — Parece uma arte bem
abstrata.
— Maratona de Star Wars, eu e você, esse final de semana! Céus, eu
preciso te ensinar o que é entretenimento de verdade! — responde, me
lançando uma careta engraçada. — Minha vez: qual o lance entre você e
Logan?
— Não existe lance entre mim e Underwood, Josh! — respondo, dando de
ombros, mesmo que dentro de mim aquilo grite que é uma mentira.
— Então por que brigam tanto? — Joga sem me dar tempo para que
formulasse uma pergunta.
— Uma pergunta de cada vez! Jogue conforme suas regras, homem! —
Franzo a testa.
— Ok, me desculpe, me empolguei — ele murmura, soltando um sorriso
gentil — Apenas… não me pergunte sobre minha tatuagem mais!
— Por que está tão preocupado com a minha relação inexistente com
Logan? — indago, puxando minhas pernas para cruzá-las.
— Porque você e ele são meus amigos e nós protegemos uns aos outros!
— contrapôs como se não acreditasse na minha resposta.
Fecho meus olhos por um momento, pensando em sua resposta. Amigos
realmente são isso, são como uma segunda família, aquela que escolhemos,
que ansiamos por estar juntos. Eu apreciava aquilo, porque nós realmente
protegemos uns aos outros.
Sempre estaríamos lá caso caíssemos.
— É… são isso que os amigos devem fazer! — minha voz sai quase como
um sussurro.
— Minha vez: Por que quando voltou, preferiu que as pessoas te
enxergassem com uma vilã? — pergunta.
— Porque é mais fácil lidar com os olhares julgadores do que os de pena!
— declaro.
— Então prefere que as pessoas te julguem de todos os nomes e te coroam
como uma vilã sem escrúpulos, do que aceitar que foi a vítima pela primeira
vez? — Ergue uma sobrancelha.
— O vilão só é um vilão se você ouvir apenas um lado da história —
digo, me levantando.
Limpo os resquícios de poeira da minha roupa e me preparo para sair
dali. Josh pode ser uma boa companhia, mas alguns assuntos não devem ser
ditos ainda, não até que eu tenha a oportunidade de conversar com Logan.
Até lá, algumas coisas devem ficar guardadas até que a cicatriz se feche e o
coração volte a bater normalmente.
— Vee? — chama assim que me viro.
— Sim?
— Você não é a vilã, não para mim, para nossos amigos! — Sorri.
— Vocês são importantes para mim, Josh, muito mesmo!
— É bom saber que você não se transformou em uma rainha má! —
Devolve o sorriso.
Caminho até a escada, indo em direção a Thea e a abraçando.
Josh havia acertado em uma coisa, eu não sou uma rainha má, eu ocupo o
trono de princesa quebrada.
Todos querem roubar minha garota
Todos querem levar seu coração
Às bilhões de pessoas no mundo
Procurem outra pessoa, porque ela é minha
Steal My Girl | One Direction

A sexta-feira chegou mais rápido do que eu imaginava.


E quando o jogo contra a universidade de Ohio acabou, eu não fiquei no
campo para comemorar, não esperei que cheerleaders corressem em nossa
direção para festejar, não prestei atenção nos gritos de meus colegas de time
ou encontrei com o treinador após todos saírem.
Não, desta vez eu corri o mais rápido possível até o vestiário e me
arrumei em tempo recorde. Puxei a camiseta preta e amarela do Nirvana
pelo meu corpo, enquanto subia a rampa do estacionamento correndo e
joguei minha mochila em minhas costas. Quando finalmente chego perto do
meu carro, Levi pula do capô onde está sentado e joga minha jaqueta na
minha direção, enquanto Josh abre a porta traseira e escorrega para o banco.
Não tínhamos tempo de conversas, nós precisávamos chegar no Oásis antes
que todos os universitários chegassem e pegassem os melhores lugares,
porque hoje a noite de Karaokê não será como as outras.
Desta vez, ela será especial. Dedicada apenas a uma pessoa.
— Você está preparado para hoje? — Levi questiona, enquanto se senta no
banco do passageiro e leva a lata de cerveja até seus lábios. Ele se inclina e
liga o som, deixando que Swin, de Chase Atlantic, ressoe baixo dentro do
carro.
— Por que não estaria? Sempre fazemos isso! — declaro forçando um
sorriso.
Porra nenhuma que estou preparado para o que estou prestes a fazer hoje.
Todas as outras vezes que subimos naquele palco, ou estávamos bêbados
demais para nos lembrar do que fizemos, ou com alguma coisa na cabeça que
precisávamos esquecer, como o dia que eu havia derramado aquela música
em direção a Verônica. Porém, mesmo que não seja um cantor bom, daqueles
que ganham um Grammy ou algo do gênero, eu dou conta de terminar as
letras das canções sem sair humilhado do bar.
Mas desta vez é diferente. Desta vez eu cantarei para que apenas uma
garota me enxergue, para que pare e entenda o que eu quero dizer, da mesma
forma que ela sempre diz quando está dançando, quando fecha seus olhos e
rodopia pelo salão. Quero que se lembre de quando fizemos isso há alguns
anos atrás, de quando existia apenas nós dois, por pelo menos alguns
minutos, em cima do palco, com uma música ressoando atrás.
E como antes, eu apenas desejo que Verônica Blackwell entenda que ainda
queima dentro de mim, de uma maneira irrefreável.
Quero que se lembre de quando éramos pura urgência, de como
desejávamos nossas mãos entrelaçadas e a nossa companhia, até mesmo no
silêncio, de como encontrávamos o paraíso toda vez que nossas bocas se
uniam e de como éramos certos juntos.
Quero que se lembre de nós.
Da nossa combustão e de como nós nos pertencemos.
— Você vai ficar parado aí, Logan? — Josh pergunta, erguendo uma
sobrancelha quando finalmente estacionei em frente ao bar. — Nós
precisamos nos preparar!
Engulo o ar com força, tomando coragem, e saio do carro, seguindo até a
entrada junto com meus amigos e percorro o enorme local até o palco
improvisado.
Não há muitas pessoas ali, o que facilita para que possamos passar a
música algumas vezes. Cumprimento o dono do bar e caminho até a guitarra
preta abandonada na lateral do palco, me viro e a jogo para Levi, que sorri
dedilhando. Josh balança a cabeça sorrindo e se senta no banco atrás da
bateria e começa a batucar levemente as baquetas uma na outra e começamos
a passar a música que venho ensaiando com eles desde que Verônica viajou
para Nova York há dois dias atrás.
Mas quando alguns universitários passam pelas portas do
estabelecimento, eu sei que o momento finalmente chegou. Suspiro fundo e
cruzo meus braços frente ao corpo, observando o aglomerado de estudantes
que começam a ultrapassar as portas duplas do estabelecimento.
O time de futebol é o primeiro a entrar e quando me enxergam em cima do
palco, eles erguem as mãos e acenam em minha direção, me chamando para
me juntar a eles na mesa da lateral, porém apenas recuso com a cabeça. As
próximas pessoas que preenchem o lugar são exatamente o grupo que estou
esperando. As cheerleaders. Elas ainda estão vestidas com seus uniformes e
seguem para a mesa de sempre, ao lado da minha equipe. Mas ela não está
junto de nenhuma de suas companheiras e eu sei o porquê, sei que Hazel e
Summer haviam feito-a se atrasar para que tudo estivesse pronto.
Outros alunos começam a ocupar todo o lugar, fazendo com que o Oasis se
torne uma aglomeração de universitários prontos para se embebedar e
curtirem mais uma vitória do time. E isso me dificulta de achar a verdadeira
razão pela qual estou sentado em um palco, com Josh e Levi, que estão
ansiosos o bastante para poderem curtir a noite de vitória da SVU.
Então a porta se abre novamente e mesmo entre as inúmeras pessoas, eu a
enxergo. Eu sempre a enxergarei.
As madeixas pretas balançam enquanto ela se vira para gargalhar de algo
que Hazel ou Summer diz. O trio adentra o bar caminhando calmamente.
Verônica não olha para o palco ou para qualquer outro lugar, ela está
entretida demais com suas amigas para perceber o que está acontecendo.
Contudo, Hazel olha em nossa direção por cima de seu ombro e me lança
uma piscadela, sorrindo abertamente enquanto segue suas companhias até o
bar. Vee se inclina no balcão e sussurra algo para o barman, que estende
duas doses de um líquido âmbar, que todos nós sabemos que é tequila. E
assim que está prestes a levar o copo até os lábios, ela finalmente olha em
volta, mas especificamente para frente e seu olhar se fixa em mim. Uma
sobrancelha da minha garota, se eleva e ela inclina a cabeça em confusão. E
eu solto um sorriso travesso, daqueles que ela sabe que estou prestes a
aprontar algo.
O seu olhar me diz tudo o que eu preciso saber e é como se estivéssemos
sendo atraídos um para o outro, como fogo em brasa quente.
Suspiro fundo, mantenho um sorriso de canto enquanto puxo o microfone
para perto de meus lábios.
Respiro uma, duas, três vezes.
— Eu ouvi dizer que a SVU levou mais uma vitória para casa? — Os
jogadores começam a bater desenfreadamente suas mãos na mesa, gritando o
nosso grito de guerra que sempre fazíamos no começo dos jogos, enquanto as
líderes sorriem abertamente para nós. — E eu também ouvi dizer que temos
uma directioner aqui essa noite… — digo enquanto umedeço os lábios e
lanço uma piscadela para Verônica, que tenta segurar uma risada. Ela volta a
levar o copo até sua boca e vira os dois shots, um seguido do outro, então se
vira e dá alguns passos à frente. — Bem, essa é para você, anjo!
Josh leva a guitarra até o pescoço e dedilha as primeiras notas de Steal
My Girl, enquanto eu ainda encaro a garota pelo qual estou caindo em um
precipício sem ter medo.

Ela é a minha rainha desde que tínhamos 16


Nós queremos as mesmas coisas
Sonhamos os mesmos sonhos, certo, certo
Eu tenho tudo porque ela é a escolhida

Verônica ergue a cabeça para trás, gargalhando, fazendo com que um


sorriso escorregue novamente pelos meus lábios.

A mãe dela me chama de amor


e o pai me chama de filho
Certo, certo
Eu sei, eu sei, eu sei, com certeza

Desta vez ela lança uma careta. Talvez essa parte não seja bem uma
verdade quando se trata de nós dois.
Ela caminha mais um pouco até finalmente estar a poucos centímetros do
palco e mesmo entre todas as inúmeras pessoas que andam pelo
estabelecimento, é como se apenas ela existisse, como se o som da sua
risada tivesse ido diretamente para o meu peito, causando uma pequena
arritmia em meu coração.

Todos querem roubar a minha garota


Todos querem seu coração
Bilhões de pessoas no mundo
Encontrem outra, porque ela é minha

Verônica me encara com intensidade, como se não existisse mais ninguém


ali além de nós dois, como ela me encarou na primeira vez que fizemos um
karaokê, apenas porque a desafiei no colegial. Ela me olha como eu desejei
que olhasse, ela me enxerga. Não o Logan que brigou centenas de vezes com
ela, não o Logan no qual ela odiou, mas eu, a pessoa que ganhou o apelido
de capitão e disputou corridas ao seu lado, que foi preso e a protegeu
durante um ataque de pânico.
Estendo minha mão para que ela pegue, mesmo que o medo de rejeitá-la
seja grande, mas Vee não faz isso, ela entrelaça nossos dedos e sobe no
palco, ficando cara a cara comigo. Sorrio enquanto canto os últimos trechos,
e os mais incríveis olhos âmbares no qual eu sou completamente apaixonado,
me observam e brilham para mim, fazendo com que tudo dentro de mim se
agite, de uma forma que nem eu mesmo consigo explicar.
E eu entendo, entendo o significado desse momento, porque aqui em cima
desse palco, Verônica é tão minha, como eu sou dela.

Ela sabe, ela sabe


Que eu nunca a decepcionei
Ela sabe, ela sabe
Que não vou deixar ninguém
Levar seu amor para longe de mim

Quando finalmente a música cessa e todo mundo começa a gritar nossos


nomes, me aproximo dela, praticamente colidindo nossos corpos, não me
importando se praticamente toda a universidade está presente, se eles
comentarão sobre nós no próximo dia. Eu me importo apenas com a mulher à
minha frente, que sorri abertamente. E, por Deus, eu poderia iluminar todo o
universo com o brilho desse sorriso. Verônica aproxima sua cabeça
lentamente em minha direção e eu faço o mesmo, eu espero o impacto de
nossos lábios.
E quando acontece, é como se eu realmente estivesse visitando o paraíso.
Seus lábios tem gosto de tequila e seu cheiro floral me faz querer nunca
soltá-la.
Mas o gritos dos meus colegas de time e dos nossos amigos faz com que
nós nos separemos. E quando eu olho para seu rosto, ela solta uma
gargalhada, como se eu fosse uma pessoa maluca. Mas, porra, eu sou
maluco. Maluco pela mulher à minha frente e tudo que ela representa. Seus
braços rodeiam meu pescoço, enquanto minhas mãos seguram sua cintura
com força.
— Oi, capitão — diz fracamente, enquanto seus olhos brilham.
— Oi, anjo.
— Você ainda canta bem! — ela exclama, olhando para meu rosto.
— Você ainda ama tequila! — constato o óbvio, umedecendo meus lábios.
Ela assente com a cabeça, e quando estou prestes a beijá-la novamente,
sinto alguém puxá-la de mim. Ergo uma sobrancelha, já me preparando para
brigar com quem quer seja, mas o rosto de Levi aparece entre nós, ele sorri
com malícia para nós dois e depois leva um copo vermelho até os lábios,
intercalando seu olhar entre mim e Verônica.
— Por mais que eu ame cenas românticas, e, por Deus, vocês estão dando
um show nesse quesito! — ele debocha, erguendo o seu dedão em um sinal
positivo. — Eu preciso dizer que vocês estão em praticamente todos os
storys no momento, então aconselho a descerem e escolherem outro lugar
para terminar o que quer seja o que estavam prestes a fazer.
Eu ergo uma sobrancelha para nosso amigo, enquanto Verônica vira a
cabeça em direção às pessoas que estão perto do palco e morde o lábio,
segurando uma risada. Eu apenas a puxo em direção a pequena escada e a
ajudo a descer. Levi me grita, dizendo algo que não consigo escutar por
conta da música que agora ecoava pelo bar. Quando volto a olhar para
frente, percebo que Vee não me esperou, apenas caminhou até o balcão do
bar. Assim que paro ao seu lado, ela pede dois shots e espera o barman os
servir. Verônica levanta um dos copos para cima e me indica o copo ao lado
do que estava o seu para fazer o mesmo. Eu o pego, levantando-o e
brindando com o dela e, por fim, levo o objeto até meus lábios, virando de
uma só vez, fazendo com que o líquido desça queimando a minha garganta.
Verônica abaixa o copo agora vazio, se vira para mim, me encarando sob
os cílios, e batuca as unhas pintadas de preto levemente pela extensão do
balcão, os olhos âmbares se destacam na maquiagem leve e o batom
vermelho é quase que um convite para submergir novamente em um paraíso
caótico.
Eu me aproximo deliberadamente, fazendo que nossos rostos fiquem
parados um sobre o outro. É uma luta de azul e castanho, céu e inferno. Mas
não nos movemos, apenas ficamos ali sugando a respiração um do outro.
— O que você quer, Logan? — ela pergunta calmamente, fazendo com que
uma lufada de ar voe até minha bochecha.
— Eu quero você, anjo, sempre você! — respondo verdadeiramente, me
aproximando e deixando um beijo casto em sua bochecha.
— Logan…
— Eu sei o que você vai me dizer, Verônica — interrompo-a. — Sei que
não se acha digna de amor, mas você é, e eu irei te provar isso!
Ela se afasta, puxa a garrafa de tequila que se encontra atrás de mim e que
tenho certeza de que o barman havia abandonado ali para atender outro
cliente.
— Isso pode ser um jogo perdido, capitão! — exclama, bebendo direto do
gargalo e se levantando.
— Acabamos de nos beijar em frente a universidade toda, anjo… —
Sorrio, levantando meu dedo até seu rosto e colocando uma mecha atrás de
sua orelha. — Não há nada de perdido nisso…
— Nós precisamos…
— Venha comigo, anjo! — A interrompo antes que ela acabe com nosso
momento, estendo a mão em sua direção, fazendo com que as borboletas no
meu estômago comecem a se movimentar.
Ela ergue uma sobrancelha para a minha mão estendida e quando acho que
ela vai dizer algo ofensivo ou se virar para sair, Verônica solta uma lufada
de ar e a segura, fazendo com que eu a puxe para fora do Oásis, longe de
todo o caos de universitários bêbados, de nossos amigos e de qualquer coisa
que pode acabar com nosso pequeno momento.
Porque desejo que toda a sua atenção seja minha essa noite.
Quando finalmente paramos em frente ao meu carro, ela para abruptamente
e se vira em minha direção.
— Onde, diabos, você está me levando? — questiona com o cenho
franzido.
— Apenas entre no carro e eu prometo não te sequestrar! — Me escoro
na porta fechada com os braços cruzados e lanço um sorriso descarado. — A
não ser que queira ser sequestrada.
— Você não irá desistir, não é? — Ela inclina a cabeça em minha direção
e solta um meio sorriso quando nego a sua pergunta com a cabeça. — Não
dirija como um senhor de noventa anos novamente, capitão!
Eu sorrio enquanto abro a porta e observo ela escorregar para o banco do
passageiro.
E ela se mantém quieta enquanto corro pelas ruas de Saint Vincent,
Verônica apenas observa a paisagem quase que perdida em seu próprio
pensamento. Quando levo a minha mão até a caixa de marcha e nossos dedos
se roçam, ela não se move, ao contrário, um pequeno sorriso de canto se
forma em seus lábios e ela mantém o pouco contato, mantendo nossas mãos
perto uma da outra, até que finalmente paro em frente ao enorme portão
agora pintado de dourado. Vee se vira lentamente em minha direção, sua
boca está meio aberta e me encara com os olhos arregalados.
O antigo parque de diversões da cidade, o nosso parque, o lugar onde eu a
vi pela primeira vez, havia sido todo restaurado e estava incrivelmente
lotado. Assim que finalmente encontro uma vaga para estacionar, Vee ainda
está encarando o ambiente com o brilho conhecido nos olhos.
Alguns brinquedos já estão funcionando, solto um sorriso ao observar
algumas crianças correndo com enormes algodões doces coloridos e alguns
artistas mostrando suas artes para as dezenas de pessoas que passam pelo
seu caminho. E durante as voltas que demos, apenas deixando com que as
lembranças preenchessem o nosso pensamento, eu não percebo que estamos
caminhando até a roda gigante.
Mesmo de longe, constato que ela ainda continua a mesma, mesmo depois
de tanto tempo, enormes ferros pintados de branco e vermelho e com um
enorme Mickey desenhado no centro. Eu tenho quase certeza de que esse
brinquedo é um grande plágio das rodas gigantes da Disneylândia. Mas isso
não importa, não quando estou bastante ocupado observando a garota do meu
lado, que segura um algodão doce rosa em uma das mãos e encara as pessoas
que sobem no brinquedo com um misto de curiosidade e inveja.
Embora eu tenha certeza de que ela não conseguiria entrar na fila e nem
em outro brinquedo que fosse alto o bastante, porque a mulher que é linda
como um pecado, que nesse momento olha para cima com receio, tem medo
de altura.
Ela havia me confidenciado isso quando nos conhecemos neste mesmo
lugar, havia se descamado para um desconhecido, tinha contado coisas que
guardava para si, havia confiado em mim para guardar seus sonhos e eu fiz o
mesmo.
Fomos nossa melhor versão aquele dia. Fomos verdadeiros, completos e
únicos. Mostramos nossas dores perenes, nossas frustrações e as pequenas
alegrias.
Nós fomos a síntese de todas as coisas boas que o mundo pode oferecer.
Mas a vida e nossas atitudes corromperam isso e eu desejo reverter essa
situação.
— Nós iremos! — exclamo, puxando-a até a entrada do brinquedo que
agora está vazio.
— Nem fodendo! — Ela dá um passo para trás, fazendo com que eu a
segure para não tropeçar em seus próprios saltos e cair.
— Seja corajosa, anjo! — insisto, colocando uma mecha de seu cabelo
atrás de sua orelha. — Apenas seja corajosa...
— Logan… — sussurra, puxando o ar algumas vezes, como se estivesse
tentando controlar suas emoções. — Eu não posso.
— Confie em mim, anjo — murmuro, me aproximando, e beijo
rapidamente sua testa. — Está na hora de tirar esse medo de você.
— Eu estou bem confortável com ele, obrigada — diz ainda me
encarando.
— Tente, apenas tente. — Minha mão aconchega a sua bochecha
lentamente. — E se não ajudar, eu faço com que esse brinquedo pare e te tiro
do alto o mais rápido possível, nem que eu precise quebrar a cara do garoto
que é responsável por ele para que isso aconteça.
— Você promete? — pergunta, insegura.
— Eu nunca deixaria nada te machucar, anjo! — digo verdadeiramente. —
Nem que eu precise destruir o mundo para te manter segura e feliz.
Ela reluta, mas acaba balançando a cabeça levemente, concordando.
Verônica caminha lentamente até o banco e se senta, suas pernas se encostam
na minha e eu as sinto ficarem trêmulas, sei que o medo está tentando tomar
conta dela e que não irá demonstrar. Verônica sempre será assim, ela sempre
mostrará sua face mais forte, mais corajosa, mesmo que por dentro ela não
esteja se sentindo assim.
E quando o rapaz responsável pelo brinquedo nos dá um aceno positivo,
ela não consegue ficar com os olhos abertos, ela os fecha fortemente, como
se precisasse da escuridão que está nos rodeando, como se ela fosse
confortável e afastasse aquele medo.
Sinto quando o brinquedo começa a se movimentar, lentamente. Subindo,
como se não fosse parar. Até que, de repente, ele realmente para. Verônica
aperta a superfície de metal com força, como se o pânico estivesse
começando a subir dentro dela, se arrastando pela sua pele. Ela leva a outra
mão até a minha e as entrelaça, e depois as aperta com força, fazendo com
que suas unhas cravem em minha pele.
Aperto sua mão em um sinal de apoio e percebo que elas estão frias.
— Verônica, abra seus olhos — meu sussurro é quase inaudível.
— E-eu… não consigo — ela praticamente gagueja. — Peça para me
descerem, Logan.
— Anjo, abra seus olhos e olhe para mim. — Ela suspira, uma, duas
vezes, e finalmente faz o que peço. Quando os mais incríveis dos castanhos
me encaram com medo e ansiedade misturados, levanto minha mão e
acaricio sua bochecha. — Não deixe que seu medo impeça você de viver
coisas inesquecíveis, Vee.
Eu sei que ela precisa ouvir isso, sei que terá significados maiores do que
apenas um medo de altura. Porque viver com medo, é deixar de viver coisas
incríveis e eu não quero que ela deixe de vivenciar as melhores sensações
que a vida pode nos proporcionar.
Eu quero o melhor que a vida possa proporcionar para Verônica
Blackwell. Eu não desejo que ela apenas sobreviva, não, eu desejo que ela
encontre a sua própria calmaria depois de tanta tempestade.
Quando ela finalmente foca seu olhar no meu, eu apenas a enxergo. Seu
sorriso brilha mais que a própria lua acima de nós e a expressão de orgulho
no seu rosto, me faz sorrir como ela está sorrindo. Somos dois idiotas
sorrindo um para o outro, como se tivéssemos experimentado o melhor doce
da melhor doceria do mundo. E desejei que aquele momento nunca acabasse.
E então ela finalmente olha para frente, a enorme lua brilha no centro do
céu, estrelas a rodeiam, uma mais brilhante que a outra, mas cada uma com
sua própria beleza. Algumas nuvens se movimentam lentamente, deixando a
vista ainda mais incrível. Mas nenhuma se compara ao brilho da garota
sentada ao meu lado. Enquanto seus olhos brilham e seu sorriso se abre em
felicidade, é lindo o suficiente para conquistar toda a cidade.
Lá embaixo, luzes coloridas iluminam o enorme parque e pessoas vivem o
seu próprio mundo, me pergunto como ninguém está olhando para cima e
vendo o quão espetacular é essa paisagem.
— Isso é… Uau… — Ela se perde entre suas palavras. — Essa vista é
linda, como uma obra de arte!
— Sim, ela é! — digo, mas não estou olhando para a vista, mas, sim, para
Verônica.
Porque ela é a porra da obra prima mais perfeita que já esmurrou meu
coração e depois o levou sem nenhuma permissão.
— Obrigada — ela sussurra ainda encarando o céu. — Você não imagina
o quanto isso significa para mim.
Eu sei que estava sendo sincera. Ninguém nunca havia tratado seu medo
daquela forma, ninguém deu importância necessária para algo que é
considerado tão desnecessário. Mas nós dois somos diferentes, nós sempre
ligamos para as pequenas coisas que nos envolviam, mesmo elas sendo as
coisas mais banais do universo.
— Tudo que se refere a você, significa muito para mim, Verônica. — Eu
me aproximo de seus lábios, pairando nossos rostos um sobre o outro e
sentindo sua respiração ficar descompassada — Sempre significou.
Eu a beijo, calmamente, apreciando o momento e quando estamos sem ar,
eu me afasto devagar, levo as mãos até meu bolso traseiro e retiro de lá uma
caixinha vermelha que está comigo desde a fatídica noite, desde que
interrompemos nossa história. Ergo o pequeno objeto para ela e a entrego,
Vee ergue uma sobrancelha em confusão, mas estende a mão direita e o
aceita, meu coração se acelera e eu respiro fundo com uma insegurança de
que ela não goste.
— O que é isso? — pergunta, passando as unhas pela superfície
aveludada.
— Um presente — digo, inclinando a cabeça e indicando para ela abrir.
Quando faz o que eu peço, eu vejo seus olhos se arregalarem e um brilho
diferente preencher suas íris. Ela passa a mão pela pulseira de prata com
duas partes de um coração quebrado.
— Logan… — ela sussurra, passando a mão pelo pingente da pulseira e
depois olha para mim com os olhos repletos de lágrimas. — Isso é lindo,
meu deus, é mais que lindo.
— Eu comprei há alguns anos atrás, para te dar no dia do recital, mas…
— Deixo minha frase morrer no ar, não queria trazer lembranças ruins para
essa noite. — Não tive a chance de te entregar, então eu guardei, não sabia o
motivo, mas eu queria guardar. E agora eu sei porque eu nunca consegui me
desfazer desse presente…
— Por quê? — Seus olhos encontram os meus.
— Porque um dia você disse que sempre encontraríamos o caminho de
volta um para o outro. — Solto um sorriso, levando minha mão até sua
bochecha. — E você estava certa, anjo, nós sempre encontraremos. Por isso,
eu guardei, porque eu ainda tinha esperanças de que um dia você voltasse
para mim.
— Sempre… — ela sussurra, abaixando o olhar para a pulseira. —
Mesmo que sejamos corações quebrados, capitão, sempre encontraremos
esse caminho, independente de qualquer obstáculo.
Não é sua culpa eu estragar tudo
Não é sua culpa que eu não sou o que você precisa
Amor, anjos como você não podem voar para o inferno comigo
Eu sou tudo o que eles disseram que eu seria
Angels Like You | Miley Cyrus

Pisar em Saint Vincent College novamente foi como abrir uma ferida.
O colégio que sempre foi conhecido por todo o estado pelos seus
inúmeros troféus e como uma das melhores instituições da elite, constituídos
basicamente por filhos de magnatas da cidade, é podre por dentro. E
enquanto fecho as portas do meu carro e olho para o prédio à minha frente,
concluo que eu realmente odeio esse lugar, porque tudo aqui cheira a
falsidade, frieza e todas as sínteses de coisas ruins que o dinheiro pode
trazer.
Mas sei que não posso desistir, sei que Melany precisará de mim.
Por isso, por ela, pela promessa que eu havia feito, subo lentamente as
escadas que dão acesso ao enorme prédio principal do colégio. Quando
meus pés tocam o piso e os inúmeros armários azuis preenchem a minha
visão, eu suspiro fundo com a enxurrada de lembranças que passam pela
minha cabeça. As várias vezes que corremos por aqui com os uniformes
impecavelmente arrumados, quando apenas nos sentávamos do lado de um
dos armários e ficávamos rindo, de Summer desesperada porque se atrasou,
de Hazel rindo com Dylan, das inúmeras vezes que Logan e eu pulamos um
em cima do outro, como se quiséssemos que todos soubessem o quanto nos
amávamos.
Eu não queria pensar em Logan agora, não quando eu havia deixado que
ele me distraísse com meu medo ontem, que cantasse aquela música que
havia me feito esquecer quem éramos e que precisávamos resolver a nossa
situação.
Porra, toda essa catástrofe que se tornou a minha vida está fodendo
comigo e eu nem sei como parar. E eu preciso fazê-la parar antes que se
transforme em algo que eu não consiga lidar.
E eu farei com que Logan me escutasse. Hoje. Nenhum minuto a mais.
— É estranho, não é? — A voz de Edmund me faz ter um sobressalto. —
Pisar aqui e saber que nada é como antes.
— Pisar em qualquer lugar de Saint Vincent é estranho, Ed! — respondo
com um suspiro, enquanto passo as mãos pelos meus cabelos, frustrada,
tentando não estragar o penteado.
— Você está bem? — meu irmão pergunta.
— Eu não consegui conversar com ele, Ed… — confesso, suspirando,
sabendo que meu irmão caçula é a pessoa que sempre saberia me dar os
melhores conselhos. — E eu não vou conseguir me entregar totalmente se
não resolvermos a nossa situação.
— Faça hoje, Vee, quando o recital terminar. — Ele dá um passo em
minha direção. — Faça antes que vocês se afastem e perca o elo que criaram
desde que voltou…
— Eu irei! — digo convicta, farei com que Logan me escute e não passará
de hoje. Abaixo o olhar para meu celular e vejo que estou atrasada. —
Preciso ir para o teatro, te vejo depois?
Ele acena positivamente e começo a andar a passos rápidos até onde
Emmy e as garotas estão, porém, antes que eu ultrapassasse o corredor que
liga ao teatro, meu irmão me grita, fazendo com que eu me vire e o encare
com as sobrancelhas erguidas.
— Você vai arrasar, ok? — Ed levanta os dois dedões em sinal de
positivo e sorri para mim — E eu estou orgulhoso de você, Verônica!
Solto um sorriso para meu irmão que ainda me encara. Eu posso fazer
isso, eu posso voltar a dançar para um público, posso voltar a viver e posso
contar a verdade ao homem que vive em meu coração.
Sim, eu posso.
Quando me viro e caminho a passos confiantes até o outro lado do prédio
e vejo Mel sentada em uma das escadas, segurando um celular em mãos, com
os olhos preocupados, eu me aproximo. E assim que o salto da minha bota
bate contra o piso brilhante do corredor, fazendo um barulho alto, ela levanta
o olhar e suspira aliviada, como se o significado de seu medo fosse eu não
aparecer.
— Você vai me dizer o porquê desses olhos cheios de preocupação,
Melany? — pergunto, cruzando os braços e erguendo uma sobrancelha em
sua direção.
— Eu achei que… não fosse vir! — ela confessa em um sussurro.
— E por que acha isso? — A encaro com uma confusão perceptível.
— Porque não apareceu nos treinos desta semana! — Ela suspira. — E
Emmy disse que havia ido viajar, eu pensei que tinha ido embora sem…
— Eu fui para Nova York porque precisava lidar com alguns assuntos
familiares, Mel! — A interrompo enquanto me sento ao seu lado. — Não
porque estava indo embora.
— Obrigada! — Ela suspira e leva sua mão até a minha, entrelaçando
nossos dedos e os apertando. — Obrigada por enfrentar o seu medo por
mim!
— Vocês, Underwoods, têm a tendência de me fazer enfrentar meus piores
medos! — exclamo apertando sua mão. — Agora vamos, temos poucos
minutos antes do recital começar.
Melany não fala muito durante os próximos minutos que passamos nos
arrumando e, para ser sincera, eu não prestei muita atenção, minha mente
está na conversa que eu precisaria ter com seu irmão mais tarde. Mas toda
vez que ela se virava em minha direção para dizer algo, eu sorria e na
maioria das vezes, tentava responder. Quando percebeu que eu não estava
muito bem, ela respeitou o meu silêncio, como eu respeitava o seu nas
diversas vezes que precisava dele durante os nossos treinos. Depois de
alguns minutos, que pareceram horas, Emmy entra no camarim junto com
outra mulher que eu não conheço. Enquanto elas caminham para dentro do
ambiente, eu apenas me escoro na enorme penteadeira, observando-as. A
mulher que eu não reconheço se aproxima de Mel e dá um beijo em sua
cabeça desejando sorte, como se fossem próximas.
Quando aqueles olhos azuis se voltam para mim, eu a reconheço. Audrey
Underwood, tia de Logan e uma das mulheres que mais me odeia. Ela deixou
isso claro para minha mãe quando ela foi atrás dela para fecharem o acordo
sobre a bolsa de Melany.
Audrey anda até mim, seu rosto é uma máscara de frieza e quando fica a
poucos centímetros do meu corpo, ela arrasta o olhar pelo rosto. A tia de
Melany é um pouco mais baixa que eu, mas não se importa com isso. Ela
inclina a cabeça para cima, fazendo com que meus olhos gélidos se
encontrem com seus, eles são um misto de sentimentos que não consigo
definir.
— Verônica Blackwell! — ela cumprimenta, levantando as mãos. — Acho
que não nos conhecemos pessoalmente, sou Audrey!
— É um prazer, Senhora Underwood! — Levo minha mão até a sua e solto
um pequeno sorriso sem mostrar os dentes, observo seu aperto se tornar
forte.
— Você tem os olhos de sua mãe… — murmura apenas para que eu
pudesse escutar e antes que pudesse agradecer, ela continua e me lança uma
careta de desdém. — Mas é uma pena que tenha a alma sombria de seu pai.
Antes que eu pudesse responder, Audrey se vira, jogando os cabelos para
trás, e caminha para fora do camarim junto a minha ex-treinadora, que
apenas me encara como se estivesse percebendo o meu cenho franzido pela
frase que a mulher havia proferido.
Ela está errada. Não tenho a alma de meu pai, não, eu nunca poderia ter.
Eu não sacrificaria toda a minha família, o próprio bem estar dos meus
irmãos e nem minha própria mãe apenas por dinheiro. Não faria as outras
dezenas de coisas que ele fez apenas para que fosse quem é hoje.
Mas uma parte de mim sentiu suas palavras como se fossem uma faca
fincando em algo macio, abrindo uma ferida que demoraria para estancar, e
mesmo que eu tentasse não demonstrar, sei que minhas rachaduras ficaram
transparentes. Por um momento, eu vi um vislumbre das palavras que meu
pai transferiu em nossa direção, vi quando ele me obrigou a fazer a pior das
atrocidades depois da morte de Sophie. Encarei meu rosto no espelho e em
meus olhos aquela dor brilhou, como se minha alma tivesse sido despida ali.
Assim que anunciam que é a minha vez e a de Melany de nos
apresentar, eu respiro fundo, jogando toda essa dor para um lugar que não
pode me machucar, e caminho para fora do camarim, fazendo o mesmo
trajeto que eu havia feito há anos atrás. Contudo, travo em frente a escada
onde vi minha irmã bem pela última vez. É como se fosse um dejavú, como
se ela fosse aparecer a qualquer momento com os olhos nublados de
lágrimas e me daria um abraço de despedida. Como se meu coração fosse
ser partido mais uma vez e eu precisasse tomar a pior das decisões.
Eu não consigo. Não, eu não sou corajosa o suficiente.
Eu nunca poderia ser.
Eu sempre estarei presa nesse trauma, sempre serei quebrada ao ponto de
nunca mais realizar meus próprios sonhos e nem de ajudar os outros a
realizarem os seus.
— Anjo — A voz rouca de Logan atrás de mim faz com que lágrimas
preencham a borda dos meus olhos e meu queixo treme enquanto seguro as
gotas que ameaçam descer pelo meu rosto.
— Eu não consigo, Logan… — minha voz sai embargada. — Eu nunca
vou conseguir!
— Você vai, anjo, você pode conseguir tudo o que você quiser! — ele
sussurra quase perto do meu ouvido e o seu calor envolve o meu corpo.
Quando ele leva uma de suas mãos até a minha cintura e me gira, fazendo
com que nossos corpos se colidam levemente, eu prendo a respiração. Logan
segura levemente meu queixo e o levanta, fazendo com que eu encare seus
incríveis olhos azuis. — Você é forte, é a garota mais guerreira que eu já
conheci em toda a minha vida, é quem enfrentou seus piores demônios e
mesmo assim se manteve de pé, é quem corre em corridas e as ganha, mesmo
que não precise. É quem protege seus amigos como se eles fossem sua
família. Você é tudo, anjo! E você, Verônica Blackwell, nasceu para os
palcos, para dançar, para brilhar e eu sei que Sophie nunca te perdoaria se
desperdiçasse esse talento, porque nós sabemos que ela queria que você
conquistasse seu lugar, que você dançasse para o mundo, então, meu amor,
faça isso, volte a dançar, volte a viver!
Eu fecho meus olhos, absorvendo as palavras de Logan, fazendo com que
aquele pânico se diluísse em meu peito. E quando volto a abri-los, eu me
deparo com Dylan, Hazel, Edmund, Summer, Oliver, Melany, Josh e Levi
parados em volta de mim, sorrindo, como se estivessem ali a tempo
suficiente para escutar as palavras de Logan.
Cada um dos meus amigos me olhavam com tanto orgulho, que uma
lágrima finalmente desceu pela minha bochecha, porém Logan ergueu sua
mão e a secou antes que ela manchasse minha maquiagem. E quando todos
eles nos envolvem num abraço em conjunto, como se quisessem me mostrar
que sempre estarão ao meu lado. E mesmo que não tivessem feito isso, eu
saberia.
Porque esse grupo que nasceu durante o último ano sênior, são a minha
família.
E fariam qualquer coisa por mim, enfrentariam uma batalha se isso fosse
necessário, tomariam todas as minhas cicatrizes, se caso isso significasse
que eu serei feliz.
Eles são o meu porto seguro, a minha paz e as melhores pessoas que eu
poderia amar.
E por eles, eu suspiro fundo, limpo a lágrima que ameaça descer
novamente e subo lentamente as escadas, com Mel ao meu lado, que estende
uma mão em minha direção e assim que estendo a minha para ela, a minha
nova companheira de dança a aperta fortemente, me mostrando que também
estará ao meu lado.
Assim que chegamos ao palco, me desvinculo dela e pego o microfone
das mãos de Emmy, que sorri para mim, e caminho até o centro dele sozinha,
observando a pequena bagunça que meus amigos aprontam para se sentarem
na primeira fileira. Quando finalmente se arrumam e me lançam um sinal
positivo, eu solto um pequeno sorriso e levo o objeto até perto dos meus
lábios.
Eu poderia fazer isso, por mim, por ela, por nós.
— Primeiramente, boa noite a todos! — começo, suspirando fundo. —
Quando me chamaram para apresentar uma coreografia magistral a alguns
meses atrás, eu recusei… recusei dezenas de vezes para falar a verdade! —
Solto um sorriso fraco enquanto balanço uma das mãos, impedindo de as
lágrimas descerem. — Mas um dia eu fui até a academia de dança, porque
precisava de uma distração, e conheci uma garota que me chantageou de uma
forma impressionante e conseguiu me convencer que daríamos certo juntas.
Ali, eu soube que talvez estivesse na hora de dar um passo à frente e
enfrentar medos que me estagnaram no lugar desde que minha irmã morreu.
— Suspiro fundo e olho para meus amigos, que sorriem. — Sophie
Blackwell foi a pessoa que eu mais amei na vida, ela era como uma luz, a
minha luz, o meu abrigo quando era necessário, ela era… uma parte de mim
que eu jamais vou conseguir recuperar. E ela amava a dança, amava se sentir
livre e em casa, ela havia feito da dança o seu próprio lar. A minha irmã
amava saber que quando colocasse um collant e sua sapatilha, ela poderia
ser quem nasceu para ser. E ela tinha um sonho, ela carregava um planner
para cima e para baixo, planejando como seria a sua própria academia de
dança. E por isso, quando o recital foi cancelado por falta de verbas, eu
arquei com tudo, eu assumi a responsabilidade de tornar isso possível,
porque existem inúmeras Sophies espalhadas pelo mundo que precisam
disso, que precisam saber que existem outras pessoas que apoiam os seus
sonhos. E exatamente por apoiar o sonho delas, o meu, o da minha irmã e o
da garota que me fez enxergar a beleza na dança novamente, que a partir de
hoje, a academia de dança de Emmy, passa a se chamar The Sophie
Academy, porque o sonho da minha irmã era abrir a sua própria companhia e
eu farei desse sonho realidade.
Suspiro fundo quando Logan se levanta lentamente batendo palma e sorri
em minha direção, eu conheço aquele sorriso melhor do que ninguém, eu sei
que significa orgulho e muitos outros sentimentos.
Olhando para ele, eu soube que não posso mais negar, eu quero esse
olhar mais de uma vez, eu quero que Logan Underwood me olhe como ele me
olhou nas últimas semanas, quero que ele esteja ao meu lado como esteve
quando me ajudou a enfrentar os meus maiores medos.
Porque eu não posso mais negar que eu amo Logan Underwood.
Não há como mais negar esse sentimento irrefreável que havia se
enraizado em meu peito desde a noite que nos conhecemos em um parque,
desde que ele me ensinou todas as suas facetas, me ensinou sobre o seu
mundo, me desconstruiu camada por camada e desde que seus olhos azuis
enxergaram a minha alma.
Logan sempre será a parte que falta em meu coração quebrado, e sei que
essa parte se encaixa perfeitamente nele.
Quando Melany veio até mim e nós dançamos como eu havia feito
dezenas de vezes nos ensaios e em outras centenas de vezes com minha irmã,
eu soube que finalmente eu estava abandonando meu passado.
Estava me libertando de todas as amarras, me libertando das minhas
feridas e as deixando cicatrizar.
E tive certeza disso quando entregaram a coroa à Melany e o troféu do
recital, fazendo com que eu sorrisse orgulhosa, com a sensação de dever
cumprido.
Então eu me virei para frente e encontrei aqueles outros pares de olhos
intensos recaindo sobre mim e o meu sorriso morreu lentamente. Aidan
Underwood está parado no fim do teatro com os braços cruzados e é como
se ele estivesse querendo criar fogo e me puxar para queimarmos juntos. Eu
entraria nesse fogo uma última vez, porque estava na hora do nosso combate
final.
Me viro rapidamente para a saída e caminho até o corredor. Assim que
paro na porta do camarim, soube que ele estava vindo pelo barulho de
passos raivosos sobre o piso impecável do teatro, mas eu já estou me
preparando para a batalha, já tinha juntado todas as minhas armaduras e
colocado minhas máscaras no caminho até aqui.
Eu farei isso, eu preciso lutar desta vez.
Porque Aidan Underwood não me fará perder o controle, não, desta vez eu
mostrarei quem eu realmente sou.
E nós finalizaremos essa história. Está na hora do passado ficar no
passado e dos segredos serem revelados.
— Acho que finalmente está na hora de termos uma conversa, Blackwell!
— ele rosna, fechando a porta, impossibilitando de qualquer aluno curioso
espionar o que aconteceria aqui.
— Contanto que não conte apenas mentiras, Underwood! — devolvo na
mesma medida, me virando para encará-lo.
— Vamos falar de mentiras? Tudo bem, princesinha Blackwell! — Ele
solta um sorriso de desdém quando profere o apelido e passa a mão pelos
cabelos escuros. — Tudo bem, vamos falar que é mentira quando me beijou
em sua festa de dezessete anos apenas para colocar ciúmes em meu irmão e
depois me despachou, como se eu fosse uma bolsa que estava enjoada e por
isso acha que eu me apaixonei pela sua irmã? Vamos falar como você
machucou Logan apenas para se sair melhor, por que tinha dinheiro o
bastante para esfregar na cara de qualquer idiota nesse colégio? — Ele dá
mais um passo à frente, com os olhos irradiando ódio. — Ou vamos falar de
como você está destruindo meu irmão novamente porque é vadia o suficiente
para não aceitar que não o destruiu totalmente há quatro anos atrás?
— Você quer vir com acusações para cima de mim, quer se fazer de
vítima? Ok, Aidan, podemos fazer isso! — Me aproximo, dando um passo
até ficarmos centímetros de distância. O nojo, o arrependimento de tê-lo
usado por uma noite para esquecer Logan por conta de uma briga estúpida, a
vontade de quebrá-lo ainda estava lá, ainda me corroía por dentro, mas eu
não faria isso, não mais, por Logan e por Melany, eu faria com que esse
assunto morresse. — Você machucou minha irmã porque eu amei seu irmão,
você destruiu o que ela mais amava porque é um egoísta de merda. Você a
rejeitou quando ela mais precisou de você, e nós dois sabemos que não fez
aquilo por uma vingança, fez porque é um idiota fodido e sem alma, que
destrói tudo o que toca. É alguém que deveria viver sozinho.
— Estamos no mesmo patamar, não? — Ela dá um passo para trás,
coçando a barba por fazer. — Nós destruímos quem amamos por sermos
egoístas, nós fazemos o que for preciso para termos o que queremos. Então
não me trate como vilão, porque é tão má quanto eu e sabe que nós somos
feitos para apodrecermos sozinhos, princesinha Blackwell!
— Não Underwood, você está enganado! — Engulo antes de afastar as
mechas do meu cabelo. — Nós somos totalmente opostos…
— É mesmo? — ele debocha. — Então me conte: onde você esteve
quando seu pai de merda expulsou seu namorado de dentro da própria casa,
quando minha irmã foi tirada de nós e meu pai obrigado a abandonar a
clínica e voltar para o vício? Aonde, caralhos, você esteve? — ele grita a
última pergunta. — Deixe-me responder por você: você, Verônica
Blackwell, estava assinando o cheque para que tudo isso acontecesse, você
assinou a sentença para o coração quebrado de Logan. Você, Verônica,
ninguém além de você!
— E onde você esteve quando Sophie morreu? Aonde você, Aidan, estava
quando ela saiu desesperada em uma tempestade e capotou o carro? Aonde
você esteve quando eu precisei tirá-la de um carro destruído, coberto de
sangue e que poderia explodir a qualquer momento? Aonde você estava
quando ela descobriu que estava grávida e logo após sofreu um aborto
espontâneo? — Aidan dá um passo para trás, depois outro e arregala os
olhos em minha direção. — Deixe-me responder para você também: você
estava fodendo uma garota aleatória, porque é um filho da puta asqueroso!
Aidan suspira e uma lágrima desce pelo seu rosto, como se minhas
palavras finalmente tivessem perfurado seu coração, como se a realidade
estivesse batendo tão forte que não conseguia mantê-lo de pé. Como eu
fiquei quando a vi morrer, como eu me senti impotente quando descobri que
ela havia perdido um filho sem ter tido a dádiva de viver a experiência de
ser mãe.
— Não brinque comigo, Verônica! Não me leve ao meu limite, não
despeje mentiras em cima de mim para me cortar! — ele exclama com a voz
alterada. — Não seja tão baixa a ponto de sujar o nome de sua própria irmã!
— Sujar? Você sabe do que me sujei, Aidan? De sangue, dela e do meu
sobrinho que não nasceu! Sabe o porquê fui tão baixa, tão imoral, fui contra
tudo o que defendi? — eu grito quase perdendo o controle. — Porque foi o
último pedido dela! Sabe por que Melany não foi para um orfanato? Porque
eu fiz um acordo com meu pai de que se Melany tivesse a melhor educação,
o melhor futuro, eu deixaria Logan, deixaria que ele me odiasse pelo resto da
vida dele e não ousaria mais me relacionar com alguém da parte baixa. E
sabe por que eu fiz isso, abdiquei do homem que eu amo? Porque eu sabia
que o maior sonho de Logan era conseguir uma boa vida para sua irmã, e por
isso, por ele, eu deixaria que meu pai fizesse vocês acreditarem que havia
destruído sua família, o deixaria fazer com que Logan me odiasse, mesmo
que aquilo terminasse de me destruir.
— Isso é verdade, Verônica? — A voz rouca de Logan invade o camarim,
ele caminha com os olhos arregalados até ficar entre mim e seu irmão. Logan
olha para Aidan com raiva e depois seu olhar se volta para mim. — Você
pagou por tudo, por toda a educação de Melany, por mim?
— Eu cansei, Logan, cansei de manter a máscara, de manter as mentiras!
— admito, respirando fundo. — Vocês querem a verdade, então tomem a
verdade: A casa de sua mãe está em seu nome, Logan, sempre esteve, eu
nunca a tirei de você, quando visitei seu pai e nós conversamos, ele
realmente me vendeu a propriedade, mas quando ele foi assinar o contrato
não era o meu nome que estava lá, era o seu, Logan. A clínica do seu pai, eu
paguei por mais um ano, mas ele decidiu que não queria mais ficar, decidiu
que odiava a benevolência da minha família. A educação de Melany, eu
sempre estive por trás, não minha mãe, não Audrey, eu! Eu sempre mexi os
pauzinhos para que ela tivesse as melhores oportunidades aqui no SVC, eu
fiz com que Emmy a convidasse para ter aulas de balé, para que ela, assim
como eu, tivesse uma válvula de escape depois de tudo o que passou. Eu fiz
tudo isso, fiz porque mesmo que eu tentasse te odiar, mesmo que fosse
errado, eu sabia que seu sonho era proteger Melany! Eu prometi para minha
irmã, eu prometi que os destruiria, mas eu jamais poderia fazer isso, eu
nunca poderia te destruir, porque te destruir, Logan, é me destruir também.
— Deixo que uma lágrima desça por todo o meu rosto. — E por isso, Logan,
eu viajei esses dias para Nova York, porque eu tinha uma reunião com a
reitora de Julliard, para que Melany conseguisse uma audição para a bolsa
de estudos. Por isso eu não aceitei ir para sua casa com você, porque eu não
suportava a ideia de ficarmos bem sem antes eu te contar toda a verdade.
Quando a verdade finalmente sai, é como se meus ombros finalmente
estivessem livres, como se o fardo de guardar tantos segredos, finalmente se
esvaísse.
Eu estou livre, livre de todos os segredos que rondam o meu passado,
livre de promessas não cumpridas e palavras sussurradas em meio a dor.
— Você sabe por que Logan nunca te contou sobre meu relacionamento
com Sophie? — Aidan suspira.
— Aidan… — Logan suspira amedrontado.
— Não, Logan! Está na hora de você também soltar os seus próprios
segredos! — Aidan o interrompe, sua voz estava quebrada, como se ele
ainda estivesse se recuperando da notícia sobre minha irmã. — Porque eu e
Sophie o chantageamos, ela estava com medo de você achar que eu estava
com ela por vingança e surtar ou tomar alguma atitude para prejudicar nosso
relacionamento, então nós fizemos com que Logan ficasse quieto ou ela
destruiria suas chances de entrar no recital. E, como sempre, ele te protegeu,
Verônica. Mesmo quando você fodeu conosco, ele manteve isso em segredo,
porque não destruiria a imagem perfeita que você tem da sua irmã! — Ele
suspira, enquanto eu olho diretamente para Logan. Ele já havia me contado
uma parte daquilo, mas isso não significava que deveria ser assim, não
significava que ele deveria guardar tudo para si. — Quando me beijou
naquela festa, eu não senti nada, não tinha a intenção de fazer porra nenhuma
contra Logan, porque eu já estava afim de sua irmã, e todas as vezes que eu o
ameacei foi por ela, não por você, eu o fiz acreditar que eu realmente estava
a fim de você porque isso faria com ninguém suspeitasse do meu
relacionamento com Sophie. Eu sacrificaria o seu relacionamento com meu
irmão, sem pensar duas vezes, se isso significasse que eu manteria o meu
com Soph.
— Vee… — A voz de Logan surge entre o barulho da chuva que
finalmente percebi que caía do lado de fora.
— E sabe por que eu estava com outra garota quando Sophie chegou em
minha casa? — Aidan interrompe com a voz fria. — Porque o seu pai me
obrigou a terminar tudo, ele havia ido até minha casa dias antes, me
chantageado para que eu e Logan ficássemos longe de vocês, ele ameaçou
toda a minha família, ele fez com que fingisse que estava traindo-a para que
ela terminasse comigo, para que tivesse nojo o suficiente para nunca chegar
perto de mim. E exatamente por isso, Logan estava estranho com você, por
isso ele te tratou daquela forma fria durante aquela semana, quando precisou
perdoá-lo por ele ter sido negligente com o relacionamento de vocês. Bem,
Verônica, culpe seu pai!
— Não, ele… — A palavra fica presa em minha garganta, porque meu pai
teria coragem de fazer aquilo sim.
— Eu não sabia que Sophie estava grávida, não sabia de muita coisa
naquela noite... — Aidan suspira. — Mas eu sei de uma coisa, Verônica, eu
amei sua irmã como eu nunca vou poder amar alguém e se eu pudesse voltar
naquele dia, eu teria feito de tudo para protegê-la de você e de sua família,
porque durante o tempo em que eu fiquei ao lado dela, eu conheci um lado de
sua irmã que ninguém mais o fez. Ela não era a princesa de porcelana que
vocês moldaram, não, ela era forte, altruísta e verdadeira.
Eu não estava mais ouvindo, eu estava me fechando, escutando apenas a
voz de meu pai, a maneira como ele lidou com o luto, como ele me segurou
naquela noite, como lutou para eu me aproximasse nos primeiros dias.
Ele não tinha medo de perder outro de seus filhos, não, ele apenas sentia
culpa.
Culpa por todas as atitudes que tomou e que acarretaram a morte de uma
de suas filhas.
Eu não… eu não estou bem. A minha garganta se fecha e o ar começa a me
faltar.
Respire lentamente e inspire. A voz de Ed emergiu em meu pensamento,
como todas as outras vezes que o pânico me levou para lugares escuros, e eu
faço o que a voz do meu irmão caçula grita em meu subconsciente.
Faço uma, duas, três vezes.
Mas não está adiantando, o ar não corre pelo meu pulmão.
A jogada final que ninguém esperava não veio de Logan ou de mim, veio
de alguém de fora do tabuleiro, alguém cruel e vazio.
Veio do meu próprio pai.
— Verônica… respire. — A voz preocupada de Logan soou no fundo da
minha mente. — Anjo, olhe para mim.
Não está adiantando, eu preciso de mais, preciso sentir o meu sangue
correr por toda as minhas veias. Preciso pensar, preciso apenas aplacar a
dor que começa a queimar como se estivesse me rasgando de dentro para
fora.
Preciso de adrenalina.
Eu preciso correr.
E quando Logan se aproxima e me chama novamente, eu me desvinculo,
correndo para fora do colégio. As gotas de chuvas molham todo o meu traje
da apresentação enquanto corro pelo estacionamento que está vazio por
conta da tempestade, e é como se eu estivesse vivenciando aquela fatídica
noite.
Mas hoje eu não sou quem estava preocupada por alguém ter sumido.
Dessa vez, os papéis estão invertidos. E quando finalmente chego ao meu
carro, as gotas de águas caem desesperadamente sobre o capô dele, minhas
sapatilhas estão escorregadias e o traje se agarra ao meu corpo, enquanto
minhas lágrimas se misturam com a chuva e molham todo o meu rosto.
Assim que acelero para fora do Saint Vincent College, eu soube que
estava me fragmentando.
Era como no dia nove de janeiro. A tempestade, o recital e segredos
sendo descobertos.
Mas naquela data, uma pessoa não sobreviveu.
Se isso me tornar um rei
Uma estrela em seus olhos
Culpado ou inocente
Meu amor é infinito, estou dando ele
All For Us | Labrinth feat. Zendaya

A chuva bate contra o para-brisa do carro, enquanto as inúmeras gotas


escorrem pelo vidro, outras caem pelo rosto, molhando toda a minha pele.
Um relâmpago ressurge no céu, iluminado a rodovia, e o barulho é
endurecedor até para os meus ouvidos. O pânico começa a emergir dentro de
mim, lentamente, ele percorre pelas minhas veias, trazendo um suor frio e um
desespero que eu não consigo controlar. É como se a escuridão estivesse
batendo em minha porta novamente.
Minhas mãos apertam o volante com tamanha força, que as pontas dos
meus dedos ficam brancas. Meu queixo treme enquanto as grossas gotas
descem pela minha pele, fazendo com que a maquiagem se borre.
Eu preciso respirar, preciso controlar toda essa dor.
Ele o chantageou. Ele fez o que me prometeu que nunca faria. Ele me
destruiu novamente.
O grito está preso em minha garganta, mas nada sai, nada pode parar a
dor.
Ele foi o responsável por ela ter se destruído. O nosso próprio pai.
A dor faz com que tudo dentro de mim arda, como se a qualquer momento
eu fosse ceder à escuridão, como se eu fosse cometer os mesmos erros que
Sophie. Não, eu não farei isso, eu não perderei o controle como ela um dia
fez.
Eu não posso.
Por Edmund, que sorri para mim todas as vezes que corro para seu quarto
atrás de conforto, por Dylan, que me segurou quando mais ninguém
conseguiu, por Ollie, que esteve lá por mim quando meu mundo ruiu, por
Logan, que segurou nossa história quando eu mesma não fiz, e por todos os
nossos amigos. Aqueles que me aplaudiram de pé, que enxugaram as minhas
lágrimas, que me fizeram sorrir e me ajudaram a enfrentar meus medos.
Por eles, eu não posso desistir, não posso deixar que esse pânico me
destrua, como a destruiu. E com esse pensamento, piso no freio com força,
fazendo com que o carro rode na pista escorregadia. Fecho os olhos,
esperando a batida ou algo do gênero, mas ela não vem. O automóvel gira e
logo após para abruptamente no acostamento.
Quando o motor fica em silêncio e os únicos barulhos dentro do pequeno
espaço, são os meus fungos e a chuva que está caindo lá fora, abaixo a
cabeça no volante e tento engolir o ar, uma, duas, três vezes, mas nada entra.
Nada consegue parar a dor que me atinge.
É como se apenas ela existisse.
Como se todo o mundo fosse novamente opaco. Cinza. Nublado. Vazio.
Como se não houvesse ninguém que possa me tirar desse lugar, porque eu
não quero sair, há algo nessa dor, algo que aperta meu coração, como se esse
fosse explodir em mil partículas, e que me faz querer ficar aqui, em meio a
essa escuridão. Ela faz com que eu não me desperte, ela me mantém firme
quando eu acho que vou ceder, e se eu soltá-la, eu sei que irei me desfazer, e
eu não quero soltá-la neste momento, não posso repetir aquele processo
novamente, não posso começar do zero, como fiz quando ela morreu, eu não
sou forte o bastante.
Escancaro a porta do meu carro, jogando minhas pernas que estão
trêmulas para fora, e saio para a tempestade, desabando de joelhos no
asfalto molhado, caio com toda a força, fazendo com que meus joelhos doam
quando se encostam no chão, mas a dor ainda é bem-vinda, é como se meu
corpo pudesse se partir assim que minhas pernas entram em contato com a
superfície cheia de pedrinha que fincam minha pele, levo as mãos até o chão,
abaixando a cabeça e deixo que o grito finalmente se liberte.
Deixo que a dor saia do meu corpo.
Grito por ela, por mim e por tudo.
Grito por Sophie ter feito escolhas más, que acarretaram tudo o que
aconteceu.
Grito pelo meu pai, que é o pior monstro que já presenciei em toda a
minha existência.
Grito por mim, por querer ser livre quando as amarras me prendem no
lugar.
E eu apenas grito. Deixo que aquela dor guardada por tanto tempo
finalmente saia de dentro da minha alma, deixo que meu coração tenha seus
últimos fragmentos.
Grito até que um carro para violentamente no meio da pista, o dono dele
escancara a porta bruscamente e vem correndo, se jogando à minha frente
com força, não se importando com a dor que aquilo lhe causara mais tarde.
Ele leva as mãos até meu rosto, segurando-o como se quisesse ter certeza de
que eu estou bem, que estou viva.
Mãos quentes tocam cada parte do meu rosto com alívio e esperança, sem
se importar com a chuva que molha toda a sua roupa. E quando me chama,
como se meu nome fosse uma oração, como se eu realmente fosse um anjo,
um anjo que havia caído em terras inimigas e ele fosse o meu salvador, eu
me desfaço ainda mais. Ele havia destruído todas as minhas barreiras, feito
com que eu me apaixonasse novamente, fez com que um coração que não
sabia mais como amar, voltasse a fazer tal ato. E desejei que pudesse ter
forças para deixá-lo chegar até mim, desejei deixar tudo o que me quebrava
para trás e focar apenas nele.
No garoto de olhos azuis que contêm um oceano tão profundo, que poderia
me engolir, mesmo que eu saiba nadar, mas eu não tenho mais medo de
mergulhar nessa imensidão cristalina. Ao contrário, eu tenho medo de perder
essa maré, eu tenho medo de perdê-lo para sempre.
E por isso, por saber que ele ainda é a pessoa que eu amo, jogo meus
braços em seu pescoço e o abraço. E ele devolve o aperto, ele me prende ao
seu corpo como se tivesse medo que eu fosse desaparecer, como se
prometesse coisas sem proferir palavra alguma. Logan me mostra tudo o que
eu preciso saber e deixa que eu faça morada em seus braços.
— O que você veio fazer aqui, Logan? — sussurro, respirando fundo,
deixando que a chuva molhe meu rosto. — Não me diga, por favor, que veio
para terminar o que começou naquele camarim, porque se for, você chegou
tarde. Todo o meu coração já foi quebrado e dessa vez você não foi o
culpado, talvez você tenha sido a minha salvação.
Ele aperta o meu corpo contra o dele, bem como se eu fosse um vidro e
estivesse pronta para se estilhaçar, e que quisesse me proteger de todo o
mundo. Mas ele não precisa se preocupar com isso, porque eu já estou
estilhaçada e todos esses fragmentos, apenas estão servindo para me cortar.
— Eu não vim te machucar, anjo, nunca! — ele sussurra.
— Não tem mais o que machucar, Logan! — Solto um sorriso doloroso
entre as lágrimas enquanto ele se afasta e me encara, subindo suas mãos até
minhas bochechas e a segurando. — Não existe mais onde enfiar uma estaca
para me fazer jorrar sangue, porque eu…e-eu já sangrei o suficiente.
— Eu estou aqui para te ajudar a estancar esse sangue, Vee. — Ele passa
os dedos pelo meu rosto, secando as minhas lágrimas e se aproxima,
beijando o caminho por onde elas descem, e quando se afasta, Logan me
encara com amor, com afeto. — Eu estou aqui por você, sempre por você. E
se quiser me esmurrar para que essa dor se dissipe, então me esmurre. Se
precisar gritar, então grite. Mas saiba que eu ainda estarei aqui, ainda te
segurarei quando achar que está caindo. Eu ainda vou ser o seu capitão,
amor!
— Você não deveria…
— Não, anjo, eu deveria ter feito isso desde a primeira vez. — Ele solta
um sorriso, mas quando o encaro sob as lágrimas, vejo que os seus olhos
também brilham, aqueles globos oculares brilham para mim e, Deus, eu
nunca me senti tão idiota por um dia ter o machucado, por ter cedido a um
pedido que eu sabia que não deveria ter sido levado a sério. — E sinto tanto
por não ter feito isso, mas agora, eu estou aqui, anjo, eu sempre estarei aqui!
— Ele nos enganou, Logan. Ele fez com que minha amizade com Analu
acabasse… Ele me manipulou até que eu a humilhasse para todo o colégio e
beijasse Mike, porque o pai dela o enganou. — Pauso, tentando respirar e
percebo que o único barulho ao nosso redor é a chuva caindo. — Ele… nos
fez escondermos a gravidez de Sophie, para que a sua imagem não fosse
manchada, para que nada saísse nas manchetes ou nos sites de fofoca… Ele
te chantageou, ele usou você e Aidan. — Encaro os olhos de Logan enquanto
profiro as palavras que me atormentam desde que saí daquele teatro. — E
Sophie fez o mesmo, ela me manipulou e depois fez o mesmo com você,
Logan, ela era a minha irmã e ela…
— Ela fez isso porque achou que te protegeria, anjo! — Logan sussurra
com uma voz calma, quase hesitante.
— Não, Logan, ela fez aquilo porque era egoísta, e mesmo que eu a ame,
mesmo que eu sofra com a sua partida, eu preciso aceitar isso! — Suspiro,
deixando que a dor finalmente comece a parar. — Preciso aceitar que minha
irmã nunca foi inocente, ela errou, ela tomou atitudes que a levaram àquela
noite. Aidan pode ter errado, meu pai, todos nós erramos em um determinado
momento — minha voz sai firme, mas dentro de mim nada estava daquela
maneira —, mas preciso aceitar que não existe vítima nessa história, nós
todos fomos vilões em algum capítulo, todos nós, e eu estou cansada de
tentar ser alguém que não sou!
— Anjo…
— Eu deveria ir embora, Logan! — digo a ele a verdade que sempre
guardei desde que vim para essa cidade. — Eu nunca voltei para ficar, e
agora, depois de tudo, depois de todas as verdades estarem finalmente
postas à mesa, eu preciso ir, preciso deixá-lo viver sua vida sem que a
sombra da minha família fique sobre você, sem que precise se preocupar se
eu ou meu pai a destruirá novamente, você pode finalmente ser feliz, capitão.
— Mesmo que isso custe a sua felicidade? — Seu olhar me diz coisas que
eu não estou preparada para ler. — Mesmo que isso signifique não ter o que
você lutou tanto para ter.
— Algumas lutas foram feitas para perder, Logan… — digo levando a
mão até seu rosto. — E essa, a nossa, é uma delas.
— Não, não a nossa, não quando nos foram tirados tanto tempo… — ele
sussurra dolorosamente. — Não quando finalmente você está aqui e não é
mais uma pessoa que eu preciso fingir odiar, não quando eu lutei por você,
anjo, quando eu te vi sendo forte, quando presenciei todas as suas pequenas
coisas, não quando eu finalmente a tenho comigo.
— Não faça isso, Logan!
— Eu preciso fazer, anjo. Porque, eu não posso mais fingir que nós somos
apenas um jogo sujo! Não posso olhar para você e dizer que te odeio,
quando na verdade eu não sinto isso. Você sabe que não fomos feitos para
essa guerra, sabe que nunca deveríamos ter estado de lado opostos do
campo. — Ele se afasta, como se precisasse de coragem para continuar a
falar. — E, porra, Verônica, eu prometi que não sentiria isso por você,
prometi que você não me quebraria de novo, mas é impossível não te amar, é
impossível não desejar que você olhe para mim quando todos te olham, é
impossível não querer ouvir sua risada ou querer que você me xingue por
coisas banais. É impossível não te admirar quando está ao lado dos nossos
amigos, é… impossível não te querer, anjo!
— Eu não posso, Logan… — Deixo todas as lágrimas que me restam
descer. — Não posso te machucar de novo, eu não aguentaria… não dessa
vez.
— Então não machuque! — Ele volta a aproximar os nossos rostos,
nossos olhos se encontram e um brilho se acende. — Eu amo você, Verônica
Blackwell, eu sempre amei, então seja corajosa e me ame de volta.
Ser corajosa? Como ser corajosa quando sei que nunca poderei ser para
Logan o que ele realmente merece? Como ser corajosa quando eu mais o
machucaria, do que o amarei? Não há como realmente ser o que ele está me
pedindo, porque Logan Underwood é um filho da mãe com um coração tão
generoso, que causa inveja em qualquer babaca que tente se comparar com
ele. Ele é como aquelas dádivas que a vida só lhe dá uma vez, aquela coisa
que você quer guardar a todo custo.
Logan é a personificação de tudo o que eu amo e tudo o que não posso ter,
porém, mesmo assim, ele é tudo o que estou disposta a sacrificar apenas
para que ele continue me olhando como se eu fosse única no mundo.
— O que pode ser mais forte que nossos corações, Logan? — pergunto
acariciando seu rosto.
— Não sei, por quê? — Suas sobrancelhas se erguem enquanto ele leva as
mãos até meu rosto e imita o meu gesto delicadamente.
— Porque o nosso se quebrou em milhares de pedaços e mesmo assim
bate, ainda sim, sente e o pior... ainda deseja que sejamos donos um do
outro. — Fecho meus olhos por um momento, sentindo a sua pele macia
contra a palma da minha mão. — Eu queria que pudéssemos voltar naquele
parque há alguns anos atrás, queria poder fazer com que todo nosso passado
doloroso desaparecesse. Porque você, Logan Underwood, é e sempre será a
minha alma gêmea. Eu não vou sair daqui dizendo que não te amo apenas
para te manter longe, porque eu cansei de evitar isso, cansei de fingir que
você não reivindica meu coração a cada momento que cruza seu olhar no
meu, cansei de fingir que não é você a pessoa que eu desejo ao meu lado
sempre que algo bom acontece, mas eu também não posso deixar de te dizer
que eu não sei se posso te dar o melhor de mim agora, Logan. — Solto um
sorriso fraco, fungando entre as malditas lágrimas que nunca param de cair.
— Porque ainda estou tentando recuperar os meus fragmentos, eu estou
tentando me curar, estou tentando ser forte por mim, porque se eu não fizer
isso, se eu não tentar me curar, eu nunca conseguirei viver feliz novamente e
quero ser, Logan, eu mereço ser.
— Eu não quero o seu melhor, anjo. — Ele passa os dedos por todo o meu
rosto, lentamente, em uma carícia única, enviando arrepios por todo meu
corpo. — Eu quero que voe, quero que brilhe, quero te ajudar a colar cada
um desses fragmentos e no final, ainda sim, quero apenas estar ao seu lado,
quero poder amá-la e quero ver você voltar a ser o meu anjo!
Seja corajosa, Verônica. A minha voz grita dentro de mim. Eu deveria
gritar e dizer a ele que eu sinto o mesmo, que sinto muito por todo o tempo
que perdemos, mas por algum motivo, minha voz havia sumido e eu estou
petrificada no mesmo lugar, olhando para seu rosto.
Como se tivesse medo de dizer algo errado e todo esse momento
escorregue pelos meus dedos.
Mas eu preciso dizer, eu preciso que finalmente saiba. E exatamente por
esse motivo, eu suspiro fundo e encaro seus olhos, aqueles olhos no qual eu
me apaixonei quando ainda éramos dois adolescentes que não sabíamos o
que a vida significava.
— Eu cansei de fingir que não me importo, Logan! — sussurro, limpando
as gotas de chuva que escorriam por todo o seu rosto. — Estou cansada de
fingir, porque eu amo você, Logan Underwood. É por você, capitão, que eu
procuro entre os jogos da universidade, é por você que eu espero sempre nas
nossas aulas em conjunto, apenas para termos nossas brigas matinais, porque
quando seu olhar encontra o meu, eu peço desesperadamente que o mundo
pare e as horas congelem. É a sua risada que eu amo e sinto falta de escutar,
é seu beijo que anseio. — Aproximo nossos lábios, sua respiração
brincando com minha boca. — E a saudade que eu senti de você nesses
últimos anos, pesou mais que uma tonelada. — Estamos em sincronia, em
todos os sentidos. E quando um sorriso se estende pelo seu rosto, iluminando
tudo, eu sinto todas as borboletas no meu estômago alçarem voo, sinto como
se fôssemos os únicos no mundo e todo aquele momento atrás não tivesse
existido. Levanto meu rosto e encosto minha testa na dele, pego sua mão
direita e levo até meu coração, para que ele sinta o quão desenfreado ele
bate apenas por estar perto dele. — O meu coração sempre foi e sempre será
seu, Logan Underwood.
Ele não diz mais nenhuma palavra, apenas aproxima o seu lábio do meu e
me beija.
Um beijo que começa lento. Com gosto de saudade, de cumplicidade e de
perdão.
E termina necessitado. Como se tivesse passado décadas desde a última
vez que nos beijamos.
E aquilo me fez pular por dentro. Porque eu finalmente estou em casa.
Logan Underwood, capitão da Saint Vincent University, que um dia foi o
meu pior inimigo, é a minha casa. Uma casa formada por uma coleção de
átomos, uma coleção extraordinária.
Preciso que você saiba
Jamais seria tão forte assim sem você
Você viu como cresci
Você tirou todas as minhas dúvidas
Porque você era meu lar
Control | Zoe Wees

— Nunca mais, Verônica Blackwell, nunca mais! — o grito de Dylan faz


com que eu olhe sobre meu ombro, para a sua Land Rover, na qual ele havia
descido, seguido de Hazel, Levi e Josh. Nenhum deles se preocupou em
fechar as portas, apenas correram em direção onde nós estávamos
ajoelhados na chuva. — Nunca mais me faça quase ter um ataque cardíaco
como hoje, Vee, nunca mais!
Antes que eu pudesse dizer algo, Verônica se levanta e dá um passo para o
lado e ele a puxa para um abraço apertado, fazendo com que ela suma entre
seus braços fortes. Outro carro, um Mustang vermelho, para violentamente
atrás do de Dylan, as portas se abrem bruscamente e a visão de Edmund,
Oliver e Summer invade toda a pista escura. O melhor amigo de Vee tem o
semblante fechado e os olhos são preocupados, e eu entendo a sua reação,
porque há minutos atrás, também estava assim. Quando finalmente pararam
ao nosso lado, eles respiram fundo e percebem que ela está bem.
— Você quer me matar do coração, Blackwell? — A voz da garota loira
emerge enquanto ela corre em direção a Vee, faz com que todos nós
erguêssemos uma sobrancelha, porque Sum não chora. Ela nunca fez isso
durante todo o tempo em que moramos juntos. Suas bochechas estão
vermelhas e os olhos marejados e assim que para, ela puxa Verônica dos
braços de Dylan e Hazel se aproxima delas, fazendo com que se abracem
firmemente. Nenhum de nós interferimos no momento das três, porque todos
nós entendemos. Sum e Hazel sempre tiveram medo de perder a amiga, medo
de que algo acontecesse. E agora precisam uma da outra mais que qualquer
coisa no momento. — Você sabe o quanto eu fiquei preocupada?
Verônica suspira, limpando os resquícios das gotas de água que ainda
escorrem pelo seu rosto e se afasta delas, sussurrando que está tudo bem,
que havia sido apenas um ataque de pânico. E quando todos os nossos
amigos finalmente estão ao nosso redor, ela me encara e eu apenas me
aproximo novamente, abaixo minha mão até a sua e as entrelaço, apertando-
a, em um sinal de cumplicidade. Um sinal de que eu estarei aqui por ela,
sempre.
Porque eu realmente estarei ao seu lado caso precise, estarei aqui quando
ela finalmente soltar a verdade para seus irmãos.
— Ele os chantageou... — A voz quebrada de Verônica sai quase que um
sussurro em direção a seus dois irmãos. Ela morde o lábio inferior para
tentar conter o choro, mas não tem êxito, porque a ação apenas faz com que
seu queixo trema. — Nosso pai fez com que acreditássemos nas mentiras que
ele sempre nos contou e Soph... ela não é totalmente a vítima desta história.
— Ninguém nunca foi vítima, Vee! — Ed responde dolorosamente. Ele
caminha até a sua irmã, ficando frente a frente. Eu sei que não precisará de
mim nesse momento, ela, Dylan e Ed precisam finalizar um ciclo que apenas
eles compartilham e por isso solto calmamente sua mão e dou um passo para
trás, fazendo com que ela e Ed fiquem frente a frente para conversarem. —
Soph morreu pelas escolhas dela, nosso pai se tornou um monstro pelas
escolhas dele, não pelas nossas, e você sabe disso!
— Você sabe Verônica que não poderia protegê-la de todo o mundo,
mesmo que quisesse! — Dylan complementa, dando um passo até ficar do
lado de Ed, e abre os braços para a sua irmã. Ela não pensa duas vezes antes
de correr em direção ao seu irmão e sumir entre seu abraço. Ele leva a mão
até os cabelos de sua irmã e os afaga enquanto continua: — Eu sei que você
gosta de salvar as pessoas, sei que mesmo que negue, você possui um
coração enorme, mas pare de ruir o que sobrou de você, Vee, pare de tentar
manter coisas que deveriam ir embora, pare de se destruir para manter a
imagem perfeita de nossa irmã, porque nada mais te prende ao passado, você
merece viver, você merece reencontrar a sua felicidade, e mesmo que tudo
isso seja ruim, nós sempre estaremos aqui, Vee, sempre seremos o pilar um
do outro!
— Aceite a partida dela, Verônica, aceite que Sophie foi embora... — Ed
diz, se juntando ao abraço. — Porque aí sim, você se enxergará da mesma
forma que todos nós enxergamos, como a mulher que é tão forte, incrível e
tão resiliente. Você se verá como sempre deveria ter se visto!
— E nós estaremos ao seu lado nesse ciclo — Oliver finalmente fala
enquanto lança um sorriso em direção a sua melhor amiga e se aproxima. —
Todos nós!
— Sempre juntos… — Dylan sussurra para seus irmãos — Lembra?
— Você é parte de nós, Vee, é como irmã para mim e eu sempre estarei
aqui por você! — Sum confidência, enquanto caminha até onde eles estão,
seguida de Josh e Levi.
— E se você fugir para Nova York novamente, eu mesma irei atrás de
você! — Hazel murmura, sorrindo, deixando que uma lágrima desça pelo seu
rosto. — Porque eu nunca mais deixarei você ir, Verônica. Eu preciso de
você, eu preciso de seus gostos ruins para bebidas e suas manias de comprar
botas de saltos, eu preciso que passe a noite comigo e com Sum, apenas
sendo as mesmas garotas que fomos no ano sênior, eu apenas preciso que
nunca desista de lutar, porque sempre haverá luz no fim do túnel, Vee, nem
que seja preciso que eu mesma crie essa merda de luz para você.
Verônica solta uma pequena gargalhada enquanto junta sua mão a dela. Ela
inclina a cabeça em direção a Hazel e Sum e seus olhos brilham em
agradecimento. E eu soube que mesmo que tenha sido uma metáfora clichê
sobre luz no fim do túnel, uma coisa é verdade, aquelas garotas sempre
seriam a luz uma da outra, sempre se ajudariam, colocariam a amizade delas
à frente de tudo e eu fico grato por isso, grato por saber que elas sempre
terão uma a outra para lutarem.
Quando volto dos meus devaneios, percebo que eu ainda sou o único que
não está no meio do abraço em conjunto. Inclino minha cabeça para o lado e
os observo. Observo como Levi sorri abertamente para Hazel, como Sum
encara Vee, como Dylan sorri para Ed e Josh. Aquela saudade que sempre
viveu dentro de mim, que me dizia que eu sentia falta disso, de todos nós
juntos, fez com que eu sorrisse. E quando Verônica levanta o rosto em minha
direção e estende o braço para que me junte, eu vou de bom grado.
Porque finalmente todas as peças estão no lugar.
O jogo havia acabado.
E os placares zerados, não há perdedores. Não há mais dois lados em uma
guerra.
Finalmente Saint Vincent deixará de ser nosso inferno pessoal e se
transformará em nosso paraíso.
— O momento é lindo, mas eu estou com fome e, porra, com frio! — A
voz de Levi faz com que todos nós nos separássemos e franzíssemos uma
sobrancelha em sua direção. Eu sei que está fazendo isso para aliviar o
clima, para que Verônica não se afunde em pensamentos essa noite. — O
quê? Princesinha Blackwell, eu realmente te amo, mas pegar uma pneumonia
está fora de cogitação para todos nós, ok?
— Vamos para o apartamento, seu idiota. — Hazel dá um tapa em sua
nunca e ele sussurra um palavrão. — Vou pedir pizza no caminho.
— Vamos assistir a um filme! — Josh propõem já indo em direção ao
carro de Dylan com Hazel. — Mel não se importará de comemorarmos sua
vitória no apartamento.
— E que filme você propõe? — Levi questiona, olhando diretamente para
Summer e tenho vontade de dar outro tapa em sua nuca, porque Sum abre um
sorriso brilhante, um daqueles que ela só nos lança quando um dos seus
lançamentos preferidos está chegando e vai nos obrigar a irmos juntos para
assisti-lo.
— Vingadores, toda a franquia! — exclama animadamente, batendo as
mãos, e isso não surpreende ninguém.
— Nem sonhando, loirinha! — Oliver contrapõem, a interrompendo e
balançando a cabeça. — Não mesmo!
Summer arrasta o olhar por toda a roupa de Wright, primeiro para a calça
jeans preta, depois para o cinto e para a blusa social, que está com dois
botões abertos. Seu olhar é desdenhoso, quase que enojado e é como se ele
fosse um objeto sujo que ela gostaria de jogar no lixo. Ela finalmente ergue o
queixo, observando seu rosto, e uma sobrancelha se eleva em direção a ele.
— Oh, prefere assistir documentários de moda, playboyzinho? — Sum
debocha. — Talvez Vee possa te indicar alguns, talvez você aprenda a
diferença entre Fendi e Chanel.
Oliver ergue uma de suas sobrancelhas como nossa amiga e devolve o
gesto, arrastando o olhar por toda a roupa de Summer, desde a calça jeans
escura, até a T-Shirt do Homem de Ferro, que esconde todas as suas curvas
por ser larga o suficiente. Quando finalmente volta o olhar para o rosto dela,
ele passa os dedos calmamente pela mandíbula marcada, fazendo com que o
Rolex dourado em seu pulso se destaque entre a sua pele clara e inclina a
cabeça para o lado.
— Permita-me dizer, loirinha, que acredito que não saiba a diferença entre
elas — ele desdenha lançando um sorriso canalha —, a julgar pelas suas
próprias roupas que parecem ser da seção masculina do Walmart!
Todos nós ficamos quietos, ninguém iria se meter na discussão deles, não
quando eu sei onde geralmente discussões como essas levam. Havia passado
um semestre todo soltando farpas com Verônica e não estou a fim de me
meter em outras brigas por conta de nossos amigos. Meus olhos vão até Levi,
que encara Oliver como se ele fosse o pior ser humano na face da terra,
como se ele estivesse roubando seu bem mais precioso e Verônica percebe
isso também, porque ela me lança um olhar cheio de significado e pigarreia
a garganta, fazendo com que a atenção volte para ela.
— Deixe Summer escolher o filme, Ollie! — A troca de olhares entre
Oliver e Vee é pesada, como se ela estivesse fazendo juras de como o
mataria se discordasse dela.
E eu não duvido da minha garota, porque ela poderia fazer isso
tranquilamente.
Sem mais nenhuma palavra, Verônica joga suas chaves em direção ao seu
melhor amigo e caminha comigo até meu carro, enquanto nossos amigos
seguem para os outros que estão a poucos metros de nós.
Eu sei que esse momento entre Summer e Oliver não passou despercebido
por nenhum de nós e que não será a última vez que acontece, o que significa
que preciso conversar com Levi, ele não pode observá-la de longe para
sempre, não pode esperar que Sum perceba que ele sente algo a mais,
contudo, isso ficará para depois, porque no momento eu preciso apenas fazer
com que Vee fique bem novamente.
Então durante todo o caminho até o apartamento, me ocupo a prestar
atenção na mulher ao meu lado que sorri fracamente. E se mantém assim por
toda a noite de filmes com nosso grupo completo, mas quando ela se deitou
ao meu lado no meu quarto no apartamento, se ajeitou em meus braços e se
ocupou apenas em me mostrar que tudo ficará bem, eu finalmente me deixei
relaxar.

Respiro fundo enquanto subo a rampa do estádio de SVU, o nosso último


jogo do semestre será hoje. Uma semana depois do recital de Natal e dois
dias antes das férias. E mesmo que dentro de mim tudo grite que tudo correrá
bem e a adrenalina serpenteia o peito, um pequeno medo ainda me assombra.
Porque eu preciso jogar o meu melhor jogo hoje, é a minha melhor chance.
Sei que todos os olheiros dos melhores times do condado estão nas
arquibancadas. E desde que tomei a decisão de participar do Draft, mesmo
faltando um ano e meio para me formar, a sensação de que estou fazendo a
coisa certa corre dentro de mim. Eu me preparei para isso a minha vida toda,
mesmo que tenha negado a mim que eu não desejava isso, que eu tenha
anulado esse sonho por tempo o suficiente. Jogar é o que sempre quis.
Sempre amei a sensação de pisar dentro de um campo, de colocar um
capacete e correr atrás de uma bola, de ter companheiros de times e algo que
me trouxesse a sensação de pertencimento. E por isso farei o possível para
que ganhássemos a partida.
E exatamente por isso eu não irei mais me abster desse sonho, eu o
realizarei.
Dylan caminha até onde eu estou e balança o capacete que usará hoje. Seu
sorriso é enorme, quase idêntico ao meu, porque ele também sente isso, ele
ama o campo tanto quanto eu. E a cinco dias atrás, quando o treinador o
convocou para o time principal para preencher uma vaga que havia surgido
no time de última hora, por conta de um dos nossos jogadores ter sofrido
uma lesão no nosso último jogo, eu soube que aquele seria um dos nossos
melhores jogos.
Ele para ao meu lado e suspira profundamente, encarando o enorme
estádio que está repleto de pessoas, tanto universitários quanto os moradores
de Saint Vincent. Enormes bandeiras azuis e roxas estampadas com um
falcão, movimentadas de um lado para o outro, fazem meu corpo vibrar.
Arrasto meu olhar até as cheerleaders, que estão no meio do campo
formando a enorme torre, enquanto outras viram um mortal perfeitamente
coreografado, me mostrando que aqui realmente sempre será o meu lugar, o
que eu sempre quis para minha vida.
— Eu estava com saudades disso — Dylan murmura contente.
— É como se finalmente tudo estivesse no seu devido lugar! — digo,
virando meu rosto em sua direção e cruzando os braços frente ao corpo.
— Acho que nunca cheguei a dizer, mas sinto muito por ter te tratado
como um idiota! — Ele aperta meu ombro, balançando a cabeça. Seus olhos
âmbares emitem um brilho orgulhoso e sei que está falando a verdade. — Eu
só queria protegê-la. Vee e Ed são tudo o que eu tenho desde que Soph
morreu, Logan, e eu moveria o mundo para não vê-los tristes novamente, eu
sempre os colocarei em primeiro lugar.
Maneio a cabeça em sua direção, porque eu entendo. Se alguém
machucasse os sentimentos de Melany, eu também teria uma reação como a
que ele teve, eu também destruiria o mundo para protegê-la.
— Me desculpe por ter sido um idiota na maioria das vezes! — Solto um
sorriso fraco em sua direção e ele se junta a mim. — Senti sua falta nos
campos, Blackwell!
— Nós éramos os melhores parceiros nos jogos, Underwood! — Ele dá
de ombros, mas seus olhos brilharam em ansiedade. — Não tem como não
sentir.
Não respondo, porque não é necessário, sabíamos que realmente tínhamos
uma boa dinâmica juntos e que todos admiravam a forma como jogamos as
eliminatórias no colegial. E hoje temos a chance de repetir isso novamente,
temos a chance de vencer em nosso primeiro jogo juntos. Quando finalmente
caminhamos até a entrada do estádio, os gritos de euforia, as bandeiras
sendo balançadas de um lado para o outro faz com que me sinta vivo.
Um calouro vestido de Falcão corre pelo campo, fazendo a torcida ir à
loucura. Minha equipe se posiciona atrás de mim, enquanto observo
Verônica gritando no meio do campo. Ela está trajada com seu uniforme de
líder e se preparando para algum movimento. Vee e Hazel caminham até o
final de um corredor humano, montado por toda a sua equipe e começam a
correr rapidamente. Quando atingem metade do percurso, ambas levantam os
braços e se preparam para virar um mortal. Elas dão um pequeno pulo,
tomando impulso e jogam todo o peso de seus torsos para frente, virando
dois mortais perfeitamente sincronizados. O movimento faz com que minhas
mãos suem e meu coração se acelere em meu peito.
Dylan, que ainda está ao meu lado, não se concentra mais em nada a não
ser em sua namorada e em sua irmã. E quando achamos que vão finalizar a
apresentação, Vee levanta um pompom azul, enquanto Hazel levanta um roxo
e correm em direção a dois grupos que se formam em extremidades opostas,
e percebo que eles começam a finalmente formar a torre final. Verônica
escala a primeira torre rapidamente, enquanto Hazel escala a segunda na
mesma velocidade. Elas estão sincronizadas, como se tivessem decorado a
coreografia há muito tempo atrás. Quando chegam ao topo e encaram uma à
outra sorrindo, eu não consigo desviar o olhar. Elas são impecáveis juntas,
uma dupla que todos ao meu lado admiram. De repente, as líderes abaixo
delas as impulsionam para cima, fazendo com que voltem a olhar para frente
e girem seus corpos no ar, caindo deitadas no colo de dois garotos que
estavam ao lado da torre.
Assim que Verônica aterrissa e se estabiliza, ela se vira em minha direção
e os lábios vermelhos me lançam um sorriso verdadeiro, orgulhoso. E nesse
momento, eu não tive dúvidas do que eu estou fazendo é o certo, de que
quando decidi ir por esse caminho, eu estava tomando a decisão que mudaria
minha vida.
— Elas são incríveis! — Dylan balbucia ao meu lado, encarando a sua
garota.
— Sim, elas são! — respondo sem tirar os olhos do meu anjo.
Vee sempre é magnífica, quando está vestida com esse uniforme, mas hoje
ela está espetacular, seus olhos brilham de uma forma impressionante e pela
primeira vez percebo que está leve, livre e fazendo o que ama. E todos
sabem que nada a abala, nada pode tirar esse sorriso de seu rosto. Assim que
ela volta a correr e pular no ar, virando outro mortal, eu me preparo,
colocando o capacete e gritando para que os outros jogadores fizessem o
mesmo, porque eu sei que em menos de um minuto ela olhará para cá
novamente e gritará que esse era o momento de fazermos a nossa entrada.
E assim ela faz, gritando para a sua equipe liberar o caminho, indo para a
parte lateral do campo, enquanto uma faixa é estendida no lugar que estavam
a poucos segundos para que possamos entrar correndo. E nós fazemos isso,
nós corremos até o centro do campo, enquanto a torcida se levanta e grita o
nome do The Falcons, bandeiras da SVU emergem entre as dezenas de
pessoas e o garoto vestido como um falcão corre alegremente entre as
arquibancadas, fazendo com que todos se animem ainda mais.
— Underwood! — A voz rouca do treinador me faz erguer a cabeça em
sua direção. Ele está parado na lateral do campo vestido com a jaqueta do
time e uma prancheta em mãos. — É nosso último jogo, traga aquela taça
para o lugar de onde ela pertence!
E sem esperar pela resposta, ele caminha até o seu lugar e se senta com
seu assistente. Suspiro, indo em direção à minha posição, observando a linha
de defesa já sendo formada. Meu parceiro me encara como se estivesse
perdendo um cérebro e solta uma lufada nervosa, vindo em minha direção.
Mike Burhan é de longe um dos meus fãs, principalmente depois que
Verônica havia acabado com tudo entre eles.
— Burhan, posição de largada! — grito em sua direção quando ele para
ao lado de Kennedy. — Blackwell, posição de defesa. — Aponto para Dylan
e ele apenas se abaixa. — Mackenzie posição de ataque.
Os olhos de todos cintilavam em algo que soube definir, é euforia, alegria
e ansiedade para que a Wilson voe pelo campo e que conseguíssemos as
melhores pontuações. Nós precisamos e iremos trazer aquele troféu ao lado
do campo, perto dos diretores da SVU e da Harvard, para o lugar de onde
pertence, para a nossa universidade.
Quando dou por mim Stephen, nosso kicker[7], chuta a bola, fazendo com
que comêssemos o primeiro down[8]. Kennedy recebe e atira para que Burhan
possa correr em direção a outro de nossos jogadores. Mike sabia que o
passe deveria vir para mim ou outro recebedor, que um de nós dois deveria
receber após o seu arremesso e conseguir atravessar as jardas certas para
que conseguíssemos um touchdown, mas o problema do Burhan, é que, pela
primeira vez, ele está sendo imaturo demais para jogar com pessoas que não
gosta e levando todas as rixas para dentro do campo, em vez de deixá-las no
limiar.
Não foi uma surpresa quando perdemos a bola para a defesa rival,
fazendo com que eles conquistassem jardas, o que me fez xingar todos os
palavrões que rondam a minha cabeça. Retiro o capacete, enquanto passo a
mão pela minha testa que começa a suar, e caminho a passos duros até Mike,
que está do outro lado do campo, os poucos jogadores que estão em meu
caminho e observam meu rosto tempestuoso, não precisam de pedidos para
liberar espaço até que eu chegue no motivo da minha fúria, mas o sorriso
debochado que o bastardo me lança faz com que minha raiva aumente. Se
não estivéssemos em um campo e durante um jogo importante para o time e
para mim, eu quebraria sua cara sem nem mesmo praguejar. Mas isso é a
final e eu sou o capitão da SVU, não posso deixar que um idiota mimado me
tire do sério, não quando eu tenho pessoas que confiam em mim para trazer
aquele troféu para a nossa universidade.
— Não seja um babaca por completo, Burhan! — xingo batendo o meu
dedo médio em seu peito, assim que estamos cara a cara. — E não foda com
o time apenas porque não gosta de seus companheiros.
— Você está levando muito para o lado pessoal, Underwood! — Dá de
ombros, retirando o capacete e passando a mão pelo cabelo castanho claro.
— Eu apenas pensei em uma jogada perfeita para o momento e a realizei.
— Foi tão perfeita que perdemos a porra da bola antes mesmo de
atravessarmos quinze jardas — contesto, sentindo os olhares dos outros
jogadores. — Você pode estar no time há bastante tempo, Burhan, porém isso
não significa que pode fazer o que achar melhor apenas porque tem dinheiro
suficiente para comprar seu lugar aqui. E não se engane achando que irei
deixar você foder com o todo o nosso trabalho!
— Isso é uma ameaça, Logan? — questiona, erguendo uma sobrancelha.
— Isso é um aviso, contudo, entenda como quiser! — respondo, ainda
irado.
— Não me dê um sermão sobre o time, Underwood! — Dá um passo à
frente.
— Deixe-me esclarecer uma coisa, Burhan: eu sou o capitão! — rosno
alto o suficiente para que todos escutem. — Então aconselho que jogue
conforme as regras e o como foi definido no treino tático, não foda com o
meu time ou eu juro que as coisas ficarão feias para você!
Ele leva os olhos até o meu, irradiando ódio, mas não contrapõe, apenas
ajeita seu capacete e caminha em direção a seu ponto de partida. Assim que
a bola volta a circular pelo campo, todos os jogadores da SVU correm para
que possam reverter a situação e ultrapassar o time rival. Pego a Wilson,
corro em direção à lateral do campo e faço sinal para Dylan se preparar.
Assisto Kennedy se jogar em um jogador e Burhan chocar com o outro. Ergo
o braço, finco meu olhar em Blackwell e lanço a bola em sua direção com
força suficiente para que consiga pegar.
Quando ele pega, corre, se desviando de alguns jogadores que pulam em
sua direção, na esperança de derrubá-lo, mas hoje não seria o dia deles
realizarem tal ato. Um deles se jogou sobre Dylan, mas antes mesmo de
encostar em alguma parte do seu corpo, ele pula e desvia, seguindo o seu
caminho. Nada iria pará-lo, nem jogadores rivais, nem a pressão de que o
futuro do jogo está sobre sua cabeça. Nada. Porque ele, assim como eu, sabe
que nós iremos trazer aquela taça para Saint Vincent University, nós
ganharemos e voltaremos a ser a melhor dupla em campo. O cronômetro zera
poucos segundos depois, indicando que conseguimos o que tanto lutamos
para conseguir. Nós, a SVU, a universidade mais caótica do condado, havia
ganhado o NCAA Football Championship[9].
Mas nenhuma alegria é maior do que quando vejo Verônica correndo em
minha direção enquanto todos assistem, o uniforme azul e roxo se agarra em
suas curvas e o laço em seu rabo de cavalo está um pouco torto por conta da
apresentação mais cedo, mas nada disso importa. Não quando ela sorri
orgulhosa, sorri como eu sempre quis que sorrisse para mim. Seus olhos são
brilhantes e confiantes. Aquelas orbes castanhas que roubam meu fôlego
desde a primeira vez que se fixou com o meu mar azul, são como a estrela
mais brilhante de todo o universo. E não me importo com a plateia, apenas
inclino minha cabeça em sua direção, que agora balança os dois pompons
azuis em suas mãos enquanto corre impecavelmente pelo campo abarrotado
de gente, e me preparo para que pule e meu colo. E quando finalmente o faz,
eu solto um sorriso, como se a única coisa que importasse fosse nós dois.
— Belo jogo, capitão! — ela exclama, mordendo o lábio inferior,
enquanto se segura em meu pescoço.
— Bela apresentação, anjo! — devolvo, observando seu rosto e me
aproximo, fazendo com que nossos lábios quase fiquem colados.
Ela levanta o rosto e eu encaro aqueles olhos novamente, olhos esses que
muitas das vezes inundaram meus pensamentos, que me fizeram querer que
estivesse ao meu lado; aquele rosto lindo com poucas pintinhas que eu amo.
Eu encaro a mulher que arrebatou meu coração quando éramos apenas
adolescentes imaturos e que mesmo assim nunca deixou de morar lá, aquela
que eu imagino um futuro junto e que eu nunca deixaria que ninguém a
tirassem de mim novamente.
E quando me aproximo e beijo seus lábios, eu posso sentir o olhar de
todos à nossa volta, confirmando para toda a universidade o que já
desconfiam. Nós finalmente estamos juntos, nós voltamos a ser o casal que
muitos temiam no ensino médio.
Rei e rainha do caos.
Mas nada disso importa, nada, a não ser Verônica Blackwell.
E enquanto provo de seus lábios, tenho a certeza de que beijá-la é melhor
do que ganhar qualquer taça..
Então vamos aproveitar o nosso tempo
Para falar o que quisermos
Use o que nós temos
Antes que tudo isso acabe
Não, não nos é prometido o amanhã
Like I'm Gonna Lose You ft. John Legend | Meghan Trainor

Existe um momento depois de tanta tempestade, de tanta luta, que a vida


dá algumas pequenas alegrias.
E no momento, a minha é ver Verônica dançar para um grupo de
adolescentes que a encaram como se ela fosse algo surreal. Vee rodopia pelo
enorme espaço como se fosse uma brisa de verão, que chega de repente e
traz aquele alívio instantâneo, quando ela se prepara para dar um pulo, eu me
inclino e encosto meu cotovelo na grade de proteção do segundo andar da
academia de dança e a admiro. Eu nunca entenderei como ela conseguiu ficar
tanto tempo sem dançar, sem mostrar para o mundo esse talento que carrega
dentro de si. Verônica é feita de passos e melodia, eu nunca me cansaria de
observá-la fazer aqueles movimentos graciosos. Sorrio para mim mesmo
quando Mel, que está longe de Vee, percebe que eu encaro a sua treinadora.
Minha irmã não diz nada, apenas sorri, pede licença para algumas de suas
amigas e caminha até onde eu estou.
Quando finalmente para ao meu lado, imitando a minha posição, ela solta
um sorriso lindo e encosta a cabeça em meu ombro. Nós não falamos durante
alguns segundos, apenas observamos Verônica dançar pelo enorme salão,
entretida demais na melodia que sai da caixa de som, para olhar para cima e
nos ver. Porém, eu não me importo em ficar aqui sem a sua atenção, não
quando a esperaria até o fim de seu ensaio para levá-la para casa, já que
Oliver havia pego seu carro emprestado para, segundo ele, um almoço com
seu pai.
— Você sabia que Vee chegou a se formar em Julliard? — Mel pergunta
de repente, ainda olhando para frente.
— Não, eu achei que ela cursava Moda na NYU — respondo, erguendo
uma sobrancelha.
— Ela cursava os dois. Emmy me contou que Vee começou a frequentar as
aulas na Julliard quatro semanas depois do acidente de Sophie, ela fazia isso
como válvula de escape para tudo… — confessa em um sussurro, como se
fosse um segredo. — E no seu tempo livre, ela estudava Moda.
— Isso é bom, ela ter se formado em algo que ama — digo enquanto
encaro Verônica. A felicidade por saber que mesmo que ela estivesse
machucada por todos os eventos que aconteceram, não deixou com que
desistisse de cursar o que realmente ama, mesmo que fosse uma forma de
tirar toda aquela dor, tomou conta de mim. Verônica, merece essas pequenas
vitórias, merece conseguir voltar a se apresentar e a viver. Merece se curar
depois de tudo. — Quando é a sua audição?
— No fim de janeiro. Conversei com a reitora da Julliard depois da
apresentação — Melany diz confiante. — Ela me disse que se tudo der certo,
eu devo me mudar assim que eu terminar o ano sênior.
— Eu não acredito que será seu último ano na SVC, parece que foi ontem
que eu precisava te impedir de comer barro do nosso quintal, Mel! —
exclamo, lançando uma careta para minha irmã.
— Por Deus, Logan, ainda falta um ano! — Ela gargalha alto o bastante
para chamar a atenção de algumas garotas que estão perto. — Deixe de ser
dramático.
Sorrio enquanto ela ainda continua gargalhando e logo após volta a se
encostar em meu ombro. Olho para onde minha irmã se mantém escorada, ela
sempre buscou contato físico, sempre precisou fazer com que nos
sentíssemos bem ao seu lado. E isso sempre me lembra de nossa mãe. Todas
as vezes que olho para o sorriso de Mel, toda vez que esses olhos azuis se
voltam em minha direção, eu me lembro da mulher que nos amou, nos fez
sentir especiais e mesmo que algumas das vezes sentisse saudades dela, eu
me sentia grato por ela ter nos dado Melany, por ter me dado a dádiva de ter
uma irmã e aprender a amá-la.
— Eu amo você, Logan, mesmo que às vezes você me irrite, ok? — ela
murmura sem levantar o rosto.
— Eu amo você, Mel, mesmo que você roube meus livros! — exclamo,
virando o rosto e beijando o topo de seus cabelos escuros.
Ela não diz nada, apenas observa Vee dançar com uma garotinha de
cabelos cacheados e pele negra que deve ter pelo menos uns cinco anos.
Verônica rodopia para o lado esquerdo e se prepara para ficar na ponta do
pé, mas antes que consiga realizar o movimento, a garotinha se desequilibra
e cai no chão, soltando um grito assustado. Vee para a perna no ar e vira a
cabeça por cima do seu ombro para ver o que está acontecendo e quando
percebe sua pequena companheira no chão, ela abaixa a sua perna, se
ajoelha, sorri gentilmente e ajuda a pequena a se levantar, depois segura sua
cintura guiando até que consiga se firma sozinha.
O sorriso que elas trocam no decorrer da música é a coisa mais linda que
eu poderia presenciar no momento.
O carinho, o afeto e o cuidado com que Verônica trata a garotinha
preenche meu peito de uma forma que não há como descrever em palavras. E
quando ela finalmente finaliza e olha para cima, nos vendo, Vee caminha em
nossa direção com uma garrafinha de água em uma das mãos e uma toalha
branca na outra. Eu só consigo admirá-la, não apenas a sua beleza exterior,
mas a interior. A beleza que ela não mostra para todos, mas que existe,
mesmo que seja em momentos sutis.
Ela sobe as escadas calmamente e sorri assim que para à nossa frente,
alguns fios de seu cabelo estão grudados em sua testa e sua respiração está
um pouco acelerada. Percebo quando deixa seus ombros caírem, que está
cansada.
— Você deveria parar por hoje, anjo — digo em tom preocupado,
enquanto ela dá um passo firme em minha direção. Aproveito o movimento
para beijar sua testa e a puxar contra meu peito.
— Eu irei, capitão! — exclama, soltando um sorriso, se alinhando a meu
abraço. — Preciso apenas fechar a academia e podemos ir embora, ok?
— Precisa de ajuda? — pergunto quando ela se afasta e acena
positivamente.
— Eu adoraria ajudar também, mas marquei de me encontrar com a tia
Audrey — Mel confessa, sorrindo envergonhada. — E estou atrasada.
— Sem problemas, Mel! — digo soltando um sorriso. — Nós damos
conta de tudo.
— Nos vemos amanhã? — Verônica pergunta sorrindo.
— Eu nunca perderia a primeira festa de Ano Novo com vocês! — Minha
irmã responde com um sorriso, enquanto se vira para ir embora.
Melany corre em direção à saída sem nos dar tempo de despedir. E
enquanto passa pelas enormes portas francesas que dão a saída, eu ergo uma
sobrancelha, porque minha irmã ainda não se incomoda de tirar a roupa do
treino e ela nunca saía sem se trocar, sempre tira seu tempo para se arrumar
e sair impecável da academia, mas apenas balanço a cabeça, deixando isso
para outro momento, e me viro novamente para Vee, que encara a mesma
coisa que eu estava encarando a segundos atrás. Ela dá de ombros e aponta
para que eu fechasse as janelas deste andar enquanto ela se despede das
poucas alunas que sobraram e tranca a porta principal, para que pudéssemos
sair pela dos fundos quando terminássemos.
Vinte minutos mais tarde, eu já estava sentado nos últimos degraus da
escada, esperando que Verônica volte para irmos embora, mas quando volto
meu olhar para o enorme salão repleto de espelhos, a imagem de quando
dançamos juntos a algumas semanas atrás invade a minha mente, fazendo
com que eu a veja rodopiando pelo salão ao meu lado, me incentivando a
correr atrás dos meus sonhos, me mostrando que deveria lutar por nós, pelo
seu amor.
Durante os poucos dias após finalmente resolvemos todos os nossos
problemas, que deixamos que nossos segredos e nossas angústias, nossos
machucados cicatrizarem, eu entendi que éramos para acontecer neste
momento. Não antes, não depois, mas agora. Nós precisávamos de uma
pausa, precisávamos aprender sobre a vida, sobre nós mesmos. Porque
quando éramos adolescentes, não sabíamos o peso de nossas
responsabilidades, não sabíamos como enfrentar o sentimento que havia
nascido em nossos peitos e que precisávamos enfrentar nossos pesadelos,
nossos medos, antes de encontrar o nosso caminho de volta um para o outro.
E agora que encontramos, agora que não estamos mais em uma guerra, que
apenas serviu para ferir quem amávamos, eu apenas quero ajudá-la a passar
pelos seus dias tempestuosos, pelo seu caos e quero segurá-la nos braços
quando o mundo desabar.
Porque eu quero que ela saiba que estarei aqui para amortecer as nossas
quedas, para escutar nossos desabafos. Havíamos nos tornado um porto
seguro um para o outro depois de tudo, aquele tipo de apoio que ligamos
quando ganhamos um campeonato ou depois de uma apresentação, aquele
apoio que procuramos quando a tempestade chega e o único aconchego que
queremos é nos braços um do outro, ou quando nosso mau humor nos toma
por completo, por coisas banais.
Mas acima de tudo, eu e Verônica, sabemos que temos com quem contar,
não importa o que aconteça, nós sempre teremos. Porque eu sei que, por
muitas das vezes, a solidão havia nos roubado a alegria de viver um dia
ensolarado ou até mesmo um nublado, nos sentimos como que nada mais
valia a pena.
— Um dólar pelos seus pensamentos! — Vee exclama, parando à minha
frente ainda vestida com sua roupa de treino.
Levanto meu rosto, encontrando seu olhar brilhante. Abaixo lentamente o
rosto por toda extensão de seu corpo, o collant preto se agarra às suas
curvas, ela leva os braços até a altura dos seios e os cruza, fazendo com que
eles fiquem em um ângulo incrivelmente lindo, mesmo que esteja tampado
com o tecido. Umedeço os lábios e sorrio de lado, enquanto levo uma das
minhas mãos até meu queixo.
— Estou pensando em como essa sua roupa me dá pensamentos nada
inocentes! — Solto um sorriso travesso para ela, que rola os globos oculares
e depois se encosta no corrimão da escada ao meu lado e solta um sorriso
ainda mais malicioso.
— Vamos dançar então, capitão, talvez você esqueça os pensamentos
pecaminosos que minha roupa te dá — ela debocha, estendo a mão para mim
e erguendo uma sobrancelha. — Ou não consegue me acompanhar enquanto
tem esses “pensamentos nada inocentes”?
— Eu dancei com você há algumas semanas com os mesmos pensamentos,
anjo, tenho certeza de que consigo te acompanhar perfeitamente! — exclamo,
sorrindo deliberadamente e erguendo a minha mão para ela.
Quando finalmente paramos no centro do salão, Verônica clica em um
controle pequeno que havia pego em cima de uma mesa perto da parede
espelhada, e a música clássica ressoa por todo o salão. Pela pequena fresta
da cortina, os últimos raios de sol iluminam apenas o lugar onde estamos,
fazendo com que nós fiquemos em contato com a pouca iluminação que se
estende pelo ambiente. Verônica segura uma de minhas mãos, enquanto a
outra vai até meu ombro. A minha mão livre desce até sua cintura e a seguro
fortemente contra mim, enquanto giramos pelo enorme espaço.
As delicadas sapatilhas mal encostam no chão, ela se move com total
elegância, provando que aqui é o seu habitat natural, onde se sente
confortável.
— Eu me lembro da primeira vez que dançamos juntos… — Verônica diz
de repente, fazendo com que eu a olhe profundamente. — Era o baile anual
da minha família e você entrou sorrateiramente na festa com os garçons e fez
com que Dylan te mandasse para a sala de espelhos na mansão.
— Eu precisava te ver naquele dia, precisava saber se estava bem! —
digo sinceramente, enquanto damos mais alguns passos lentos. — Tinham
sido dias de merda e tínhamos brigado a semana toda. Eu só precisava te
ver…
— Quando eu te vi, meu primeiro pensamento foi dar um soco em sua cara
bonita! — ela confessa sorrindo. — Mas não durou muito, porque eu sabia
que você odiava aquela vida, aquelas pessoas e mesmo assim, você vestiu
um terno e foi até mim.
— Eu sempre irei até você, anjo, sempre! — admito enquanto me separo
dela por alguns segundos para girá-la.
— Eu sei e tenho medo de que essa felicidade acabe, Logan, tenho medo
que isso seja como aquela noite — ela sussurra, sua voz sai tão frágil, como
se estivesse me entregando um dos seus segredos. — Tenho medo que
alguma coisa nos tire o pouco que conseguimos construir até aqui. Eu…
apenas tenho medo.
Eu paro a dança, desvinculo minha mão da dela e a levo até seu rosto.
Acariciando sua bochecha e depois ergui seu queixo, fazendo com que
aqueles lindos olhos castanhos me encarasse, e vejo o universo que sempre
quis construir ali.
Ela observa os meus olhos com o mesmo sentimento que eu encaro os
seus. Ela sabe que não precisamos de palavras para definir a conexão mútua
que sentimos um pelo outro. Não é necessário que façamos demonstrações
exuberantes para provar que somos um do outro.
Somos como aquela lenda chinesa sobre o fio vermelho do destino.
Aquela lenda que diz que quando uma pessoa é destinada a outra, ambas têm
um laço vermelho que as ligam, no dedo mindinho. E esse laço pode
embaraçar, emaranhar, mas ele jamais se quebrará. Ele não é visível a olho
nu, mas está lá desde o momento do nascimento. Quanto mais longo estiver o
fio, mais longe as pessoas estão de sua alma gêmea e mais tristes estarão. E
sequer a morte o rompe, apenas o alarga para se encontrarem em outra vida.
Acredito que eu e Verônica temos esse fio do destino. Acredito que
sejamos destinados um ao outro desde que soltamos o nosso primeiro
suspiro. Porque não há como a gente ser menos que épico nessa mistura
explosiva que nos tornamos.
Nosso fio vermelho deu-nos um nó forte e não dá para ignorar o que o
destino designou como certo, passe o tempo que for.
— Não há o que temer, anjo, eu prometo que sempre encontraremos o
caminho de volta um para o outro! — exclamo, me aproximando de seu
rosto.
— Mesmo que todo o mundo nos queira separados, capitão, eu quero que
saiba que você é o dono de todos os pedaços quebrados do meu coração! —
ela sussurra, puxando meu rosto de encontro com o seu.
— Eu sei, eu sempre soube! — murmuro pairando meu lábio sobre o seu.
— E eu sempre te amarei por isso.
Eu não dou tempo para que ela responda, apenas selo nossos lábios em um
beijo doce, calmo e repleto de sentimentos. Deixo que nossos corpos tomem
controle de nossas ações. Apenas aproveito todos os segundos para sentir a
pele macia de Verônica sobre a palma da minha mão.
Quando ela se afasta para respirar, nossos olhares se chocam. E não há
nada inocente mais ali, há desejo, luxúria e amor. Há uma fome que começou
a emergir por todo o meu corpo, fazendo com que eu a puxe novamente para
mim, chocando nossos lábios, em um beijo quente, necessitado.
Um beijo no qual dizemos tudo o que precisamos saber.
Dizemos o quanto meu corpo deseja o dela, o quanto eu preciso dela, e ela
me devolve a sensação da mesma forma.
Suas mãos delicadas vão até minha jaqueta e a empurram para o chão,
depois ela se afasta, suas pupilas estão dilatadas e depravadas. Verônica
passa a língua por todo o seu lábio antes de mordê-lo e dá um passo em
minha direção, segurando a barra de minha camisa e a erguendo para cima,
fazendo com que tenha o mesmo destino que minha jaqueta. Sua mão brinca
com o botão da minha calça jeans e quando finalmente a abaixa, eu me livro
dela, fazendo com que fique apenas com a minha cueca box. Levo uma das
minhas mãos até a alça de seu collant e as arrasto pelo seu braço, fazendo
seus seios saltarem livres para fora e depois o abaixo lentamente,
distribuindo beijos por toda a sua barriga, enquanto me ajoelho e a ajudo a
sair do seu traje, deixando-a totalmente nua.
Quando volto a ficar em pé, observo ela fechar os olhos enquanto ergue a
cabeça para cima, me dando caminho para seu pescoço. Deixo um beijo
casto em seu ponto de pulsação e depois arrasto minha língua desde sua
orelha até sua clavícula. Verônica solta um som baixo, tentando se controlar,
e quando encosto minha boca em seu mamilo, ela grunhiu, impulsionando seu
corpo para frente, me dando a liberdade para chupá-los.
Antes que eu possa fazer isso, caminho com ela a passos rápidos até a
parede espelhada e encosto suas costas na superfície gelada. Enquanto
seguro suas coxas nuas, eu a ergo para cima, fazendo com que suas pernas
circulassem na minha cintura. Assim que estamos em uma posição favorável,
eu volto a dar atenção para seu seio desnudo.
Passo a língua calmamente por um de seus mamilos e depois arrasto minha
boca até o outro, enquanto isso, desço minha mão por seu abdômen definido
até chegar em sua calcinha e quando meu dedo médio encontra suas dobras e
percebo o quão molhada está, chupo seu mamilo com mais força, fazendo
com que Verônica arqueie suas costas.
Não perco meu tempo, apenas seguro suas costas e puxo bruscamente uma
mesa de madeira, que as garotas usam para deixar alguns de seus pertences,
até nós. Deito Verônica sobre a superfície lisa e a observo, a posição em que
a deixo dá uma visão incrível para Verônica de sua própria boceta, o
espelho ao nosso redor faz com que tenhamos uma vista privilegiada de
nossos corpos. E, por Deus, eu estou prestes a perder todo o meu controle
apenas por observá-la aberta sobre a mesa como a porra de um banquete.
Levo dois dedos até sua entrada e dedilho lentamente, dando a ela um
momento para se preparar. Paro quando Verônica arquea as costas, como se
clamasse para ir mais rápido. Mas não me movo, apenas a observo abrir os
lábios em busca de ar enquanto meu corpo arde em febre de prazer. Me
posiciono entre as suas pernas e as abro ainda mais, para me acomodar
melhor.
— Abra seus olhos, anjo, eu quero que mantenha-os aberto em direção ao
espelho, enquanto eu provar seu gosto! — murmuro rouco, enquanto me
inclino sobre seu corpo e distribuo pequenos chupões por toda a sua pele
impecável.
A minha língua roça a curva do seu seio antes de dar atenção ao outro
novamente e chupá-lo com força, a deixando extasiada entre a dor e o prazer.
Desço a língua pelo seu corpo, dando leves mordidas por toda a extensão de
sua pele e a observo começar a tremer de antecipação do que virá.
Quando finalmente minha boca está perto de sua entrada, eu me afasto
para beijar a parte interna de sua coxa e depois da outra. Minha língua prova
toda a sua pele deliberadamente, e assim que meus lábios chegam às suas
dobras, eu a escuto ofegar, sabendo que não está mais no controle de seu
próprio corpo.
— Logan… — ela grunhe entre fôlegos.
— Abra os olhos, Verônica! — rosno, segurando suas coxas com força,
sabendo que quando terminamos, uma marca ficará.
Vee abre seus olhos e encontra os meus nublados de desejo. Solto um
sorriso maquiavélico em sua direção quando percebo que ela está quase
implorando por libertação. Observo enquanto ela morde o lábio inferior com
força e faz uma súplica silenciosa com aquelas íris âmbares que são a minha
perdição.
Aponto a cabeça para o espelho em uma ordem, e quando ela acena
positivamente para com a cabeça, como se fosse incapaz de proferir uma
palavra, eu me abaixo até minha boca encontrar seu clitóris.
Verônica nunca desprende o olhar do espelho e enquanto eu chupo toda a
sua extensão, fico observando a forma como sua respiração toma uma nota
alta. Ela segura os meus cabelos, indicando para ir mais fundo, e eu faço,
não apenas a chupo, eu arrasto toda a minha boca por sua boceta encharcada
e sem nenhum aviso, introduzo dois dedos, fazendo com que ela arqueie as
costas da mesa e feche os olhos. Eu me afasto quando ela não os abre
novamente e volto meu olhar para o espelho.
— Abra os olhos, anjo, ou não deixarei você gozar! — exigo com a voz
ofegante, enquanto passo minha língua pelos meus próprios lábios, provando
o gosto de Verônica.
Ela suspira e os abre novamente, fixando seu olhar no espelho às minhas
costas. Quando minha boca volta a devorá-la, Verônica arqueia o corpo para
trás e abre mais as pernas, me entregando tudo, deixando que eu a absorva.
Seu corpo começa a soltar espasmos fortes e em poucos segundos ela se
desfaz rápido, forte e sedenta. Mas antes que chegasse ao fim, eu a ergo,
puxo uma camisinha da minha carteira que está no bolso de trás da minha
calça e a penetro com força, dando continuidade aquele intenso prazer que
ela sente no momento. Espalmo as minhas mãos na sua cintura com força e
sinto seu corpo ir para frente e para trás. Enquanto eu a observo pelo
espelho à minha frente, os olhos de Verônica estão em meu pau, que sai e
entra de sua entrada. E quando os ergue em minha direção e morde o lábio
inferior, eu perco o controle. Bato dentro dela com força, indo mais fundo,
fazendo com que seus gritos ecoem pelo salão. Suas mãos delicadas descem
até seus seios e começa a apertá-los, enquanto uma das minhas próprias
mãos solta sua cintura para ir de encontro com seu clitóris e o massagear,
nunca deixando nossos olhares se desgrudarem. Nossa pele se torna
escorregadia e seus gritos de prazer se misturam aos meus urros. A boceta
de Vee se contrai quando o orgasmo vem mais uma vez e aperta meu pau,
deixando-me louco e sem opção a não ser entregar-me ao momento e gozar
junto dela.
Suspiro, caindo sobre Verônica quando tudo termina e ela passa seus
braços pelos meus ombros, me abraçando, enquanto nossas respirações se
normalizam.
— Anjo? — murmuro contra sua pele.
— Hum? — ela responde com um sussurro.
— Acho que precisamos passar na cafeteria e pegar aqueles Donuts que
você tanta ama para nos recuperar! — exclamo, dando um beijo em sua
barriga. — Porque eu realmente ainda não terminei com você!
— Eu não discordo, capitão! — ela responde, soltando uma gargalhada
gostosa, enquanto deixa um beijo em minha cabeça.
Enquanto me levanto e a puxo para irmos até o vestiário tomar um banho,
eu sinto como se todo o medo que ela havia sentindo antes do nosso
momento tivesse me perfurando, porque eu também tenho medo de que algo
possa nos separar novamente.
Mesmo que nossa conexão fosse inquebrável.
Porque viver em um mundo onde Vee e eu estávamos separados não é
mais uma opção na qual eu estava disposto a cogitar.
Se o mundo inteiro estivesse assistindo, eu ainda dançaria com você
dirigiria por rodovias e cruzaria atalhos para estar com você
o tempo todo, a única verdade,
é que tudo me lembra você
This Town | Niall Horan

Caminho lentamente até a porta giratória que fica em um dos arranha-céus


no centro de Saint Vincent. A cada vez que meus saltos batem sobre o piso
escuro, um medo se estende sobre meu ser. Eu não pisei aqui desde o dia
anterior àquela noite. E mesmo que minhas mãos comecem a suar frio e o
tremor em meu corpo me incomode, eu sigo em frente. Farei com que todos
os traumas, angústias e fantasmas que vivam dentro de mim, desapareçam e
que eu volte a ser a Verônica.
Quando o elevador apita, indicando que cheguei ao andar certo, eu
caminho até a porta e ergo a mão, batendo duas vezes. Esperando que ela
abra e quando o faz e me vê ali, tão frágil, tão vulnerável, sua reação é
apenas sorrir gentilmente.
Anelise Young, a melhor psicóloga de toda a cidade, que está parada à
minha frente, é minha médica desde que havia entendido que nunca
conseguiria curar certas feridas sozinha; a pessoa que eu havia ligado há
dias atrás, quando percebi que precisava de ajuda. Ela dá um passo para
trás, me dando passagem e eu caminho até o sofá dentro de seu escritório,
enquanto ela se senta em uma cadeira de frente para mim. A decoração é
toda harmônica, as paredes em tons pastéis, as poucas cortinas fazem com
que a luz entre pelo ambiente e o deixe tudo iluminado, e há um enorme sofá
centralizado no centro da sala, onde eu caminho e me sento, ainda me
sentindo inquieta.
— Eu fico feliz que tenha me ligado para dar continuidade ao seu
tratamento, Verônica! — ela diz sorrindo e se escorando em sua poltrona. —
Mas conte-me, como está a estadia em Saint Vincent?
Eu suspiro fundo, me preparando para derramar todas as coisas que estão
em cima de mim, que me fizeram muitas das vezes retroceder, de como eu
havia caminhado a passos lentos até realmente me reencontrar. Eu me
encosto calmamente no apoio do sofá, encaro seus olhos escuros e conto;
digo para ela todas as vezes que precisei ser forte, todas as vezes que o meu
passado bateu com força, e que eu não tinha forças para devolver na mesma
intensidade, e todas as vezes que pensei que a dor seria tão forte que eu não
superaria.
Conto como foi ter meus irmãos e meus amigos me ajudando a caminhar
lentamente, como foi preciso que eu sangrasse o suficiente para que eu
entendesse que enquanto não deixasse todas as lembranças ruins de Sophie
fossem embora, eu nunca conseguiria seguir com a minha vida; em como eu
me senti livre quando todas as verdades foram reveladas; em como eu estava
pronta para finalmente seguir sem que todas as amarras dos passados me
prendessem. Digo como olhava em todos os espelhos pelos quais eu
passava, encarava meus olhos e desejava que a pessoa que um dia fui,
retornasse.
Porque eu sinto falta de quem eu era, sinto falta de ver as cores com
alegria, de sorrir quando a verdade é que na minha vida tudo era cinza, tudo
automático, como se eu não estivesse vivendo, mas apenas existindo; como
eu me acostumei com esse sentimento, mesmo que tivesse Oliver e meus
irmãos, me aconcheguei a sensação de que nunca conseguiria me curar, de
que eu merecia essa dor, mesmo que no fundo, eu soubesse que era apenas
uma mentira que havia inventado para não aceitar a verdade.
Então eu voltei para essa cidade, precisei encarar o meu passado e todas
as consequências das minhas ações. Precisei olhar para pessoas que eu
pensei que nunca olharia novamente, precisei reconhecer que aquele jogo
estava em sua última partida e que nenhuma das partes seria vencedora,
porque não há vencedores quando são corações que estão em jogo, quando a
vitória significa que perderemos quem somos e o que amamos.
E eu conto como foi encontrar paz na pessoa que sempre julguei ser o meu
tormento.
— E você foi visitá-la? — ela pergunta calmamente, deixando sua
prancheta ao seu lado e me encara. — Você superou muitas coisas nessa
caminhada, Verônica, e isso é ótimo! Mas em nenhum momento você citou se
foi até lá visitá-la depois de tudo, depois que começou a caminhar sem o
peso do passado em suas costas… Porque, pelo que me lembro, você não
conseguiu ficar até o final do velório e nunca conseguiu dizer um adeus
definitivo a ela.
— E-eu... tentei algumas vezes! — Engulo em seco. — A primeira foi
quando cheguei à cidade, eu estacionei em frente ao cemitério e tentei entrar,
mas foi como se meus pés estivessem se enraizado no chão e eu não
conseguisse me mover… — Fecho meus olhos e respiro fundo, tentando
aplacar as lembranças daquele dia, de como fiquei em frente ao portão e
apenas deixei as lágrimas descerem pelo meu rosto quando percebi que não
era forte o suficiente. — Em alguns dias é o aniversário da morte dela e eu
acho que eu deveria estar lá, deveria finalmente me despedir dela, como ela
se despediu de nós quando tudo aconteceu.
— É um passo grande em sua jornada pela cura, Verônica, e se realmente
estiver preparada para isso — ela apoia as mãos nos joelhos e sorri —,
saiba que será como se estivesse se desprendendo da sua última amarra com
seu passado, o último ciclo do luto. Porque você os enfrentou, você passou
por todos os estágios dele desde que tudo aconteceu, você foi forte e
acreditou em si mesma, você continuou quando tudo te mandava parar.
— Às vezes eu tenho a sensação de que se eu finalmente der adeus a ela,
será como estar apagando-a da minha vida! — confidencio enquanto deixo
que uma lágrima desça.
É a verdade. Mesmo que eu aceite que Sophie não foi quem um dia
pensamos que fosse, que ela tenha feito escolhas que a tornaram
irreconhecíveis para todos nós, eu ainda a amo. Eu sempre amarei. Ela
sempre será parte de mim, porque ela é a minha irmã, aquela que me
protegeu quando nossos pais não o fizeram, que chorou e segurou minha mão
nas dezenas de vezes que nosso mundo desabou.
— Verônica, olhe para mim. — Eu o faço, encaro o rosto da minha
psicóloga com o semblante perdido em memórias. — Sophie nunca poderá
ser apagada da sua vida. Ela sempre será um pedaço seu. — Anelise olha
diretamente para meu rosto, sem nunca desviar o olhar e então continua: — E
se Sophie estivesse aqui agora, Verônica? O que ela diria sobre toda essa
situação?
— Ela diria… — Suspiro fundo, encarando o teto. O que minha irmã
diria? Ela com certeza chutaria a minha bunda quando soubesse as inúmeras
merdas que aprontei nesses últimos quatro anos, mas ela não aprovaria que
eu continuasse vivendo dessa forma, não aceitaria que eu me anulasse apenas
porque ela não pode mais realizar os seus sonhos. Então eu soube, soube o
que ela falaria, mas eu não estava preparada para aceitar essas palavras, não
até agora, não até esse momento. — Ela diria que eu deveria viver, diria que
a minha vida não acabou porque a dela não poderia continuar, que mesmo
que não estivesse ao meu lado, ela sempre estaria em mim, sempre seguraria
minha mão e caminharia ao meu lado. Porque éramos irmãs, metade uma da
outra. Éramos aquelas que nunca poderiam parar de dançar, porque o
espetáculo jamais poderia parar enquanto uma de nós ainda estivesse de pé e
porque nós devemos continuar a dançar, mesmo quando não houver música.
— Então acho que você tem a suas respostas! — Ela sorri para mim. —
Nós fizemos um ótimo progresso, Verônica, podemos finalizar por hoje.
Continuamos semana que vem?
— Claro!
Me levanto, pronta para ir embora, mas antes que eu possa atravessar o
batente, ela me chama novamente, fazendo com que eu pare com a mão na
maçaneta e me vire para encontrar seu sorriso verdadeiro.
— Quando um girassol não tem uma luz solar, ele apenas olha para baixo,
ele espera que o sol chegue para poder brilhar! — Ela sorri. — Você é com
um, Verônica, você viveu tanto tempo no escuro, acreditou que nunca mais
poderia olhar para cima, que quase se acostumou com a sensação de
escuridão ao seu redor, mas quando olhou para cima, quando viu motivos
que te fizeram brilhar, você se tornou a mais bela das flores. Aquela que
floresceu no seu próprio tempo!
Eu sorri, porque eu acredito nisso.
Acredito que os momentos sombrios não haviam acabado, mas que agora
eu saberia lutar contra eles.
E a sensação se solidificou quando pisei de fora do prédio e observei
Logan encostado em meu carro, com um sorriso estampado em seu rosto
enquanto me esperava.

Eu sempre acreditei em romances clichês, em amores épicos. Queria


sentir aquela sensação que os personagens dos mais diversos livros sentiam,
queria que meu mundo colidisse com o de alguém e aquilo fosse a catástrofe
mais linda que já havia acontecido na história.
E isso aconteceu quando conheci Logan Underwood.
E agora, enquanto o observo sorrindo para Oliver do outro lado do
jardim, tenho a certeza disso, principalmente porque hoje é uma data
importante, uma data que havia deixado de comemorar, uma que preferia
fingir que não existia, para que as lembranças não me sufocassem. Mas que
agora faz todo sentido voltar a comemorar, porque as pessoas dizem que um
novo ano é um novo recomeço.
E talvez seja isso que todos nós precisemos.
Por esse motivo, eu e todos os meus amigos estamos neste momento no
jardim da casa dos meus pais, aguardando o relógio marcar zero horas e um
novo ano se iniciar.
Hazel se senta na borda da piscina junto a Edmund, eles afundam os pés
na água cristalina e sorriem enquanto conversam sobre algo. Josh se joga ao
lado de Levi, do outro lado do jardim, em um dos sofás que havíamos
arrastado para cá mais cedo, e observo os olhos do segundo buscarem
Summer a todo momento. Mas a loira está absorta demais para notar isso,
principalmente porque está ensinando Dylan a jogar algum tipo de jogo que
eu não faço a mínima ideia de qual seja.
Oliver está sentado em uma mesa, discutindo algo com Logan, que mantém
os olhos vagando sempre em minha direção, e todas as vezes que suas íris se
chocam com a minha, ele sorri alegremente.
— É bom ver ele assim! — Melany exclama quando para ao meu lado. —
Ele sempre sentiu falta de todos os amigos juntos.
— Eu também senti! — Sorrio, levando minha taça até meus lábios. —
Vê-los assim me lembra quando éramos adolescentes imaturos e aprontamos
as piores coisas nessa cidade.
Ela solta uma gargalhada, como se quisesse dizer que nós não deixamos
de aprontar as piores coisas nessa cidade, e logo após caminha em direção a
Hazel, se sentando ao seu lado. Não tenho tempo para ir até lugar algum,
porque a mais nova convidada do nosso grupo para ao meu lado com uma
taça de Champagne e a leva até seus lábios. Analu saboreia a bebida e
depois olha para mim, seus cabelos loiros estão amarrados em um rabo de
cavalo, fazendo com que sua franja destaque seus olhos castanhos.
— Eu achava que sua mãe não permitiria que você vestisse outra marca
que não fosse apenas a dela! — exclama, soltando um sorriso para o vestido
branco curto com alças finas e decote quadrado da Fendi que eu trajo para a
ocasião.
— Eu e minha mãe apreciamos a alta-costura, Analu, não há lugar para
ciúmes bobos em nossa vida! — digo, devolvendo o sorriso para a mulher
loira ao meu lado. — Então, nós sabemos que mesmo que suas coleções
sejam as minhas favoritas, eu não deixarei de me vestir bem para agradá-la.
— É bom saber disso, tenho um desfile sobre a nova coleção da Burberry
em algumas semanas para ir, talvez você queira me acompanhar — ela
declara olhando para frente, como se não importasse com a resposta, mas eu
podia ver seus olhos se iluminarem em antecipação. Analu deseja uma
reaproximação depois daquela noite e ela realmente está tentando e eu não
serei megera o bastante para não dar isso a ela.
— Seria um prazer! — exclamo, virando o resto da minha bebida e me
virando para caminhar até Summer. — Mas se prepare, eu nunca gasto o
suficiente quando se trata de roupas!
Ela não responde, apenas caminha até Edmund, que agora estava
conversando com Josh, enquanto Hazel discute algo com Levi no canto da
piscina. Meu irmão ergue uma sobrancelha para a nova integrante, mas logo
a introduz no assunto que conversa com sua companhia. Caminho até onde
Summer e Dylan estão e descubro que o jogo em questão é uma aposta sobre
quem ficaria bêbado primeiro antes que os fogos de artifícios soassem por
toda a cidade.
E não me surpreendo quando a aposta de ambos foi em Josh, que sempre
some entre os quartos para dormir quando sente que está quase caindo em
algum cômodo das festas que participamos. E exatamente por isso, eu
também aposto nele. Sabendo que quando ele souber disso, chutará nossas
bundas para outro país.
É fácil estar entre eles quando não há mais segredos ou algo para
interferir em nossas amizades. Estamos todos em uma perfeita sintonia e
quando o relógio soa 23:59h, todos nós paramos em frente à piscina que tem
a vista da cidade toda, todos nós temos um sorriso no rosto, como se
estivéssemos ansiosos para que o relógio batesse meia noite e finalmente
abandonássemos esse ano.
E quando isso acontece e os fogos iluminam todo o céu, eu apenas me viro
em direção a Logan e sorrio. Sorrio porque nós acreditamos que será um
novo recomeço, porque finalmente deixamos o passado no seu devido lugar
e agora olhamos para o futuro. E sorrio por todos nós estarmos juntos em
uma data tão importante.
— Feliz ano novo, anjo! — Logan sussurra, segurando minha cintura.
— Feliz ano novo, capitão! — devolvo, deixando que o sorriso
estampado em meus lábios, aumente.
Quando ele se aproxima e deixa um beijo casto em meus lábios, eu apenas
passo a mão pela extensão do seu pescoço, aproveitando o momento. Nós
finalmente tínhamos conseguido acabar com a guerra e tínhamos todo o
tempo do mundo para apreciar a paz que agora reina.
— Summer? — A voz de Levi faz com que me separe de Logan e nós
olhemos em sua direção.
— Sim? — ela responde sorrindo, enquanto leva a taça até seus lábios.
Sum inclina a cabeça levemente para o lado e sorri para nosso amigo. Eu
sei que ela está um pouco bêbada depois de algumas taças de vinho tinto que
ela tanto ama, mas isso não a impossibilita de caminhar até ficar perto o
bastante de Levi para ouvir suas palavras.
— E-eu… é você sabe que somos amigos desde a infância, certo? — Levi
gagueja, fazendo com que uma das minhas sobrancelhas se levante. Ele nunca
fala dessa maneira, ao contrário, Johnson sempre teve o ego elevado quando
se trata de conversar com as garotas, seja ela nossas amigas ou não.
Então eu entendo o que ele está tentando fazer.
E merda, isso é ruim. Porra, muito ruim.
— Onde diabos você quer chegar com isso, Levi? — ela o questiona,
lançando uma careta, enquanto leva novamente a taça até sua boca e engole o
resto do líquido roxo.
— Que eu gosto de você! — Ele solta e vejo seus lábios se fecharem em
uma linha fina. Isso não é bom. Se Summer for a primeira garota na qual ele
se declara, isso pode sair do controle, principalmente porque sabemos os
sentimentos de nossa amiga em relação a Levi. — Não como amigos, como,
ah… você entendeu!
Todos nós arregalamos os olhos. A bebida que Hazel havia acabado de
tomar voa de sua boca, molhando toda a blusa de Dylan, que está à sua
frente. Ela levanta o rosto, procurando pelo meu e uma conversa silenciosa
entre nós duas começa. Merda. Ela sabe a mesma coisa que eu sei e essa
noite não tem como piorar, ou, pelo menos, eu espero que não. Josh leva uma
das mãos até a boca para tentar tampar a surpresa. Analu para ao meu lado,
surpresa com tudo isso, mas leva a taça até seus lábios e vira o resto do seu
Champagne, já se preparando para o que viria. Todos nós, um a um, nos
viramos para Summer, esperando a sua reação.
Mas ela havia congelado. Seus olhos se mantêm em Levi, contudo ela não
diz nada ou até mesmo respira.
E isso está me preocupando.
Deus, eu sei que isso não terminará bem.
— O que eu perdi? — A voz de Oliver soa por todo o jardim quando ele
para do meu lado, sorrindo.
— Você não estava aqui? — Analu ergueu uma sobrancelha em sua
direção, enquanto morde os lábios.
— Não, precisei usar banheiro! — Ele dá de ombros como se fosse
óbvio. — Então… por que todo mundo está encarando a loirinha como se ela
estivesse morrendo ou prestes a cometer um homicídio?
— Porque Levi acabou de se declarar para ela e ela não respondeu nada.
E nós estamos esperando a sua resposta pra saber como isso vai terminar!
— Ed conta a Oliver como se estivesse notificando o tempo e levanta um
prato de salgadinhos em nossa direção, enquanto leva um deles até seus
lábios. — Alguém aceita?
Summer finalmente solta um suspiro, fazendo com que nossa atenção se
volte novamente para ela. A nossa amiga olha para Levi com lágrimas nos
olhos e cruza os braços frente aos seios, como sempre faz quando está
insegura. Enquanto ele dá um passo para trás, tentando entender o porquê
dela estar tendo essa reação.
— Eu… não posso, Levi! — Sum sussurra. — Sinto muito.
— Por que não, Sum?
— Porque… porque eu… — Ela olha em todas as direções, buscando
uma saída, e quando seus olhos recaem em Oliver, eu sei o que ela fará e não
será uma boa opção. — Eu transei com ele!
— Merda… — Eu e Hazel soltamos ao mesmo tempo.
Olhos de Levi saltam de Summer para Oliver, e diferente do que ele já
havia dado para ela, o que destila em direção ao meu amigo é cheio de ódio
e ciúmes, como se quisesse jogá-lo nesta piscina com intenções nada gentis.
— Foi apenas uma vez cara, juro! — Oliver exclama, pegando a garrafa
de Whisky em cima da mesa ao nosso lado. — E, pelo amor de deus, vocês
nem estavam juntos.
Quando eu disse que nós precisávamos de um recomeço, eu não imaginei
que seria esse. Logan solta um resmungo e então leva o seu copo até seus
lábios e com a outra mão livre, puxa meu corpo para perto do seu, como se
quisesse me proteger caso Levi decidisse jogar algo na direção do meu
amigo. Porque tanto eu, quanto ele, sabíamos que isso não terminaria bem.
— E agora vocês têm algo? — Levi questiona.
— Sim… — Summer suspirou.
— Não! — A resposta uníssona de Oliver fez com que todos olhassem em
sua direção. Mas quando a voz de Summer recai sobre ele, Wright levanta
uma sobrancelha e sorri maliciosamente em sua direção. — Nós temos,
loirinha?
Olho entre eles e decido que alguém precisa tomar a rédea dessa situação
antes que alguma merda aconteça.
Então encaro Logan, fazendo com que uma conversa silenciosa paire entre
nós e foi suficiente para que, mesmo que ele não quisesse interferir,
caminhasse até Levi, enquanto eu ia em direção a Summer, não dando tempo
dela responder a pergunta que Oliver havia proferido em sua direção.
— Amanhã vocês resolvam isso, ok? — digo calmamente. — Quando
estiverem sóbrios e sozinhos.
— Você vem comigo, antes que faça algo que se arrependa pela manhã! —
Logan puxa Levi em direção a seu carro.
Quando deixa seu amigo dentro do carro, junto a Josh, ele corre em minha
direção, deixa um leve beijo em meus lábios e pega sua chave no bolso
traseiro de sua calça, sumindo com ele da mansão.
Mas eu sei que ele voltará.
E enquanto ele lida com Levi de coração partido, eu irei lidar com uma
Summer que havia começado a ingerir todas as bebidas alcoólicas
disponíveis em nossa festa.
Suspiro fundo enquanto Hazel escora a cabeça no meu ombro, leva a
garrafa de tequila até sua boca e observa Analu parar ao nosso lado, me
passando a outra que está pela metade, enquanto leva a sua própria até seus
lábios assim que se joga no sofá.
Antes de ingerir o álcool, olho para céu completamente estrelado e solto
as palavras que sei que serão verdade:
— Mais um ano caótico em Saint Vincent está prestes a começar!
Eu me lembro de quando você me beijou
Eu sabia que você era único
E, oh, minhas mãos tremiam
Quando você tocou minha música preferida
My Only One | Sebastián Yantra Feat. Isabela Moner

Acordo com um braço transpassado pela minha cintura.


A respiração fraca de Logan escorrega por toda a extensão do meu
pescoço, enquanto um pequeno feixe de luz entra pela cortina semiaberta do
meu quarto. Levanto o braço de Logan calmamente enquanto rolo para o
outro lado e saio da cama, indo em direção ao meu banheiro. Eu preciso de
um banho antes de começar o dia, principalmente porque sei que teremos que
lidar com o assunto de Summer e Levi e isso não será fácil, não quando sei
que a nossa amiga evitará nosso amigo a todo custo. Além disso, precisamos
levar Melany para a casa de Audrey, já que não tivemos como fazer isso
ontem à noite por conta de tudo o que aconteceu na festa.
Enquanto retiro meu pijama e ligo a ducha d’água, olho para trás, onde
Logan ainda está dormindo. Eu nunca me cansaria disso, nunca me cansaria
de acordar ao seu lado, de fazer promessas e querer realizá-las. E do
silêncio gostoso que reina entre nós quando precisamos apenas da
companhia um do outro. Porque são em instantes assim que tenho a
convicção de que frases não são necessárias, a quietude consegue dizer tudo
e soa alto o suficiente, como o badalo do sino de uma igreja.
Contudo, no fundo, se eu quisesse pronunciar alguma palavra, eu sempre
declararia o quanto gosto quando nossos olhares se chocam, dos sorrisos
discretos que lançamos um para o outro, de como nossas provocações se
completam e de como gosto de ouvi-lo falar demais sobre coisas que, por
sinal, me interessam, mesmo que sejam banais.
Amar alguém é assim, acredito, é ouvir coisas que não ouviria antes por
não fazer parte do seu dia a dia, mas quando os corações se unem e a
realidade passa ser a mesma, o único tom calmo e diferenciado, os desgostos
ou desinteresses, começam a fazer todo e qualquer sentido.
— Estou decepcionado, anjo! — A voz rouca de sono de Logan faz com
que eu levante a cabeça, o movimento dá liberdade para que a água
escorregue por todo o meu corpo.
— Eu poderia saber o por quê? — Ergo uma sobrancelha.
— Acordei e você não estava! — ele murmura quase realmente
decepcionado. — Eu tinha planos incríveis para te fazer acordar!
Solto uma gargalhada e o barulho ecoa por todo o banheiro. O vapor da
água faz com que todos os vidros fiquem embaçados, abaixo o olhar pelo
tronco de Logan e chego à conclusão que deveria ser pecado ele andar sem
camisa por algum ambiente que não fosse apenas dentro desse quarto. Ele dá
um passo para trás, ignorando minha análise sobre seu corpo perfeito, deixa
a cueca box cair pelo piso e entra no box, se juntando a mim.
— Estou interessada em saber mais sobre esses planos incríveis! —
provoco, puxando-o para mais perto do meu corpo nu.
— Deixe-me te mostrar quais são meus planos. — Logan sorri
descaradamente se abaixando, pairando rosto perto do meu. — Pensei em
beijar aqui… — sussurra, deixando um beijo em meu pescoço. — Depois
aqui… — Outro beijo em minha clavícula. — Depois eu desceria até aqui…
— Ele se abaixa na altura no meu seio, deixando um leve beijo. — E então
eu faria isso…
Logan chupa meu seio com força enquanto a sua mão livre dá atenção ao
meu outro seio.
Ele lambe, chupa e imita os movimentos novamente, intercalando entre os
meus dois peitos. Sua perna direita afasta as minhas, fazendo com que eu
fique aberta e exposta para ele. Logan se abaixa lentamente, beijando toda a
extensão da minha barriga, traçando um caminho diretamente para minha
boceta.
E quando finalmente está ajoelhado no piso branco, ele olha para cima,
como se eu fosse a sua refeição preferida, e eu soube que ele me faria gritar.
Logan levanta uma das minhas pernas e a escora em seu ombro. Enquanto
se abaixa, lambendo o interior da minha coxa molhada. Ele sobe lentamente
até sua língua entrar em contato com a minha pele macia, deixando vários
beijos pelas minhas dobras, e então finalmente sua língua me invade, fazendo
com que eu solte um gemido descarado.
Logan perde o controle, ele lambe toda a extensão da minha boceta, desde
o meu clitóris até o ânus. Ele leva dois dedos e, sem aviso prévio, os envia
dentro de mim, fazendo com que me arraste pelo seu rosto, tentando aplacar
a vontade que queima dentro de mim.
E quando eu acho que finalmente irei conseguir gozar, Logan tira um dos
dedos de minha boceta e os enfia novamente com força, arrastando
vagarosamente, até que começa um movimento de vai e vem, fazendo com
que eu exploda e perca o controle, o puxando para cima e o beijando.
— Porra, anjo! — Ele sorri contra os meus lábios.
— Eu preciso de você... agora! — rouquejo, mordiscando seu lábio.
— E-eu estou sem camisinha aqui! — ele pragueja rouco.
— Primeira gaveta do lavabo, capitão! — Beijo a extensão de seu
pescoço enquanto murmuro em seu ouvido.
Ele sorri maquiavélico para mim, corre até o lavabo branco a poucos
metros de nós, e tira uma pequena caixinha de preservativos que havia
comprado desde que voltamos a frequentar a cama um do outro. Observo ele
rasgar a embalagem, arrastar o látex por todo o seu membro e vir em minha
direção, segurando minhas coxas, me puxando para cima e escorando com
força as minhas costas contra a parede molhada pelo vapor do chuveiro.
Logan arqueia a coluna e pincela seu pau na minha entrada, fazendo com que
eu resmungue para ir mais rápido.
Quando ele me preenche com força e freneticamente, solto um gemido
alto o suficiente para toda a casa acordar e ouvir o que estamos fazendo
nesse momento em meu banheiro. Ele começa novamente um movimento de
vai e vem, mas desta vez não é delicado, nem lento, é bruto e a cada vez que
estoca mais forte, nossos gemidos tomam uma nota mais alta.
— Oh, meu deus! — praticamente grito, arranhando as costas de Logan.
— Meu deus!
— Não anjo, não é o nome dele que você deveria estar gritando! — ele
exclama, mordendo o lóbulo da minha orelha e indo fundo mais uma vez. —
Porque sou eu que estou te comendo forte contra essa parede!
Sem nenhuma dúvida, se uma frase pudesse me fazer gozar, seria essa.
Logan agarra minha bunda com mais robustez e me levanta um pouco,
fazendo com que entre em mim profundamente. E a cada vez que bombeia
dentro de mim, é como se eu estivesse visitando o paraíso. E, por Deus, eu
visitaria esse lugar a qualquer momento se isso significasse que ele transaria
assim todas as vezes.
Eu sinto o momento que ele estoca pela última vez, antes de finalmente
explodir dentro de mim em êxtase, me levando junto.
Abaixo a cabeça em seu ombro. Logan pega a esponja atrás de mim e
esfrega minhas costas lentamente, enquanto me recupero do nosso momento.
Quando finalmente saio de seu colo, ele me vira e ensaboa todo o meu corpo
e depois imito o seu gesto, fazendo o mesmo com ele. Deixo com que a água
quente caia como uma cortina entre nós e apenas aprecio o momento. E me
deixo levar por todas essas sensações, até que tenhamos coragem para
finalmente sair do pequeno espaço e começar o dia.
Contudo, quando fazemos isso, ele apenas me puxa para a cama
novamente e me embala em seus braços, fazendo com que dormíssemos mais
algumas horas antes de descermos.
E eu me ajeito entre seus braços, sem me preocupar com qualquer coisa
que possa acontecer.

Logan foi o primeiro a acordar, ele se levantou, vestiu suas roupas da


noite passada, e se sentou em minha escrivaninha, observando todas as fotos
coladas na parede à frente. Fotos as quais eu nunca tive coragem de retirar.
Nunca consegui me despedir das lembranças, e hoje percebo que fiz o certo
em mantê-las em minha vida. Quando finalmente visto um conjunto Chanel e
calço um salto confortável, nós olhamos para o relógio, mostrando que já se
passava do meio-dia, e descemos para a cozinha.
Melany com certeza está querendo matar seu irmão por demorar tanto para
descer e Sum deve estar com uma ressaca digna de várias xícaras de cafés.
Logan entrelaça nossas mãos e caminhamos entre os corredores, indo em
direção à sala de estar. Durante o percurso, eu apenas gargalho das inúmeras
coisas aleatórias que ele diz, mas o meu sorriso morre quando paro
abruptamente no topo da escada e encaro a figura alta e esguia que está no
primeiro degrau, olhando para meu rosto com suas feições fechadas.
O terno Armani preto está perfeitamente alinhado ao seu corpo, os cabelos
escuros penteados para trás e os olhos âmbares, frios com o pior dos
icebergs. Sua mandíbula se cerra enquanto encara minha mão, que segura a
mão de Logan com força.
Um frio sobe pela minha espinha, porque agora eu sei que para ele o
dinheiro sempre virá acima de todos nós. De tudo, na verdade. A voz
quebrada de Aidan quando me contou a verdade, o choro da minha mãe
quando ele nos obrigou a escondermos as causas da morte da minha irmã e
de todo o sofrimento que ele causou a mim e aos meus irmãos. Jonathan
Blackwell nunca havia nos poupado de nada para conseguir o que queria, ao
contrário, meu pai sempre nos moldou conforme fosse bom para a imagem
dele. Sem nem mesmo nos questionar se era aquilo que queríamos.
Toda a minha adolescência tínhamos vivido em uma ideia simples, que se
resumia apenas a fazer o que ele dizia, gastar nosso dinheiro e fingir sermos
felizes. Sempre posamos para as fotos, participamos de seus eventos e
atuamos em frente ao público como uma família feliz, mesmo que por trás,
por dentro desta casa ou das inúmeras outras que possuímos, nada era real.
Nada.
— Vejo que voltou aos velhos hábitos, Verônica! — ele desdenha e torce
o nariz, enquanto encara Logan dos pés à cabeça. — Não adianta ter sangue
nobre se deixa qualquer lixo entrar entre suas pernas!
Logan dá um passo à frente, a fim de começar uma discussão, mas o puxo
para trás, balançando a cabeça em uma súplica para não revidar. Não quando
eu sei do que ele é capaz, não quando apenas eu e meus irmãos sabemos que
ele descontará toda a sua merda em cima de sua família e depois foderia
com as nossas vidas, apenas para me observar e me humilhar para pedir
desculpas.
— O que está fazendo aqui? — questiono no mesmo tom que havia usando
comigo a poucos segundos atrás, fazendo com que meus olhos se tornem
frios e calculistas como os dele.
Mesmo que estivesse vestindo a máscara que sempre fui acostumada a
usar quando era obrigada a estar no mesmo lugar que ele, meu pai havia
visto o meu sorriso, havia visto que eu amo Logan como amei no passado.
E que ele voltará a ser um ponto fraco que poderia usar contra mim.
— É a minha casa, volto sempre que achar necessário! — cospe em minha
direção e dá um passo para trás.
— Você não viria a Saint Vincent se não tivesse motivos suficientes! —
devolvo em sua direção. — E nós temos um acordo!
— Esse acordo acaba de ser rompido! — diz como se fosse óbvio,
olhando novamente de cima a baixo para Logan. — Seu tempo acabou, irá
voltar para Nova York comigo e seus irmãos!
— Não! — Desço um degrau.
Ele me ignora, focando suas irís em Logan.
— Diga-me, Underwood, Verônica te contou o porquê foi expulsa da NYU
e voltou para estudar na universidade medíocre dessa cidade? — Ele
debocha com um sorriso frio, quando Logan não responde. — Não? Deixe-
me te esclarecer, já que minha filha não teve culhões suficientes, ela e Oliver
Wright colocaram fogo em uma sala de Biologia enquanto eram pegos em
situações comprometedoras, digo sexuais.
Logan ergue uma sobrancelha em minha direção e eu suspiro. Talvez eu
deveria ter explicado essa parte no dia da nossa conversa, mas estava tão
absorta em nós, em nossos outros assuntos que isso não foi algo que passou
pela minha cabeça.
— Eu irei te contar tudo, ok? — digo rapidamente. — Eu prometo.
Apenas não deixe que ele entre em sua mente, como fez no passado!
Logan concorda com a cabeça, mas não diz nada, apenas mantém seus
olhos fixos em meu pai, que agora o ignora.
— Em vinte minutos, no meu escritório, Verônica. — Ele dá um passo em
direção ao corredor que leva a ala silenciosa da casa. — E o tire da minha
casa antes que eu mesmo faça isso.
Suspiro fundo, encarando as costas de meu pai enquanto ele caminha pelo
ambiente. E assim que levanto os olhos, Dylan e Edmund estão me encarando
com os olhos cheios de dúvida do meio da sala. Melany, Hazel, Summer e
Analu aparecem atrás deles, pelo corredor oposto ao que meu pai entrou, e
eu soube que meus irmãos haviam às escondido na cozinha quando escutaram
a voz dele. Agradeci mentalmente por isso, não seria bom lidar com
Jonathan Blackwell sabendo que havia dois Underwood e a herdeira dos
Parkers dentro desta casa.
— Você quer que eu fique? — Logan pergunta atrás de mim, fazendo com
que eu me vire em sua direção.
— Eu preciso lidar com isso sozinha! — Tento soltar um sorriso que
apenas se transformou em uma careta. — Leve Mel, Sum e Hazel para casa,
cuide de Levi e mais tarde nós conversamos, ok?
Logan segura meu rosto com calma e deixa um beijo em minha testa.
— Você tem certeza? — pergunta hesitante. — Eu não me importo de
quebrar o rosto dele, se isso significar que você ficará bem, anjo.
— Sim, conheço meu pai perfeitamente para saber que não saíra uma
conversa boa daquele escritório — digo, soltando uma lufada de ar. — E
não quero que entre em confusão por minha causa.
— Eu faço qualquer coisa para que fique bem, anjo! Mas, sendo assim, me
ligue se precisar de qualquer coisa. — Ele se aproxima, deixa um beijo
casto em meus lábios e se afasta novamente. — Qualquer coisa mesmo!
Assinto lentamente, eu faria isso assim que conseguisse enviar meu pai
para Nova York novamente.
Logan suspira e então desce as escadas e aponta para Mel e as nossas
amigas, que apenas o acompanham até a saída, mas, antes, elas erguem o
rosto em minha direção e lançam sorrisos encorajadores, enquanto eu desço
os degraus já perdida em pensamentos. Assim que estou em frente dos meus
irmãos, eles me encaram com o mesmo medo.
Porque meu pai não viria até Saint Vincent atoa, não quando todos nós
finalmente estamos bem.
— Qual a merda da vez? — Edmund suspira.
— Eu realmente não tenho nada a ver com essa visita repentina — digo,
mesmo que eles saibam que é verdade.
Me sento em um dos enormes sofás na sala de estar e encosto a cabeça,
olhando para o lustre acima de nós. Todas as vezes que papai me procurou
foi para me obrigar a participar de um dos seus bailes fúteis ou para jogar
em minha cara alguma merda que eu havia cometido nas vezes que eu estava
fora de controle. E eu não estou com paciência para lidar com todo seu
temperamento tempestuoso, não quando ambos sabemos que temos o mesmo
comportamento quando estamos nervosos.
— Eu irei lidar com ele — Dylan declarou, se jogando ao meu lado e
imitando a minha posição.
— Se for você a entrar naquele escritório e não eu, acredito que as
consequências não serão boas! — Suspiro.
— Mamãe sabe que ele está aqui? — Edmund se joga do meu outro lado e
encara o teto da mesma forma que eu e Dylan.
— Acredito que não, ela o castraria se soubesse que está em Saint Vincent
atrás de nós! — digo, emitindo uma careta. — Você se lembra do que ela fez
com o rosto dele quando ele disse que eu voltaria para cá?
— Eu tenho ótimos sonhos com o barulho da palma dela no rosto dele! —
Sorrimos com a voz de Dylan. — Acho que preciso fazer uma ligação para
Nova York.
Solto uma gargalhada e me levanto, enquanto ele retira o telefone do bolso
e segue para o segundo andar.
Eu sei que ele falará para mamãe que nosso pai está aqui e ela virá a
nosso auxílio, mas algo me diz que o assunto é mais importante do que uma
reunião sobre a minha expulsão da NYU.
Deixo que uma lufada de ar saia de meus lábios e caminho em direção ao
escritório no primeiro andar. A sala fica em um corredor pouco iluminado,
repleto de quadros que meus avós compraram em diversos leilões no
passado. Alguns realmente são bonitos, mas outros me dão vontade de jogá-
los no lixo.
Quando finalmente paro em frente a porta escura e a empurro, a primeira
coisa que vejo é a foto de toda nossa família pendurada acima de sua
cabeça. Nela, Dylan está com uma bola Wilson em mãos, eu e Sophie
estamos vestidas com uma roupa de bailarina, Ed está sentado em volta de
alguns brinquedos e meus pais sorriem, como se fossemos uma família
perfeita.
A fachada que sempre havíamos apresentado para o mundo exterior.
Abaixo meu olhar para o homem sentado atrás da mesa de mogno com um
Macbook aberto. Chego à conclusão de que ele é apenas uma casca vazia do
homem fotografado acima. Ele não é o mesmo que me carregou dezenas de
vezes para cama quando adormecia na sala de cinema do outro lado dessa
mansão quando eu era apenas criança inocente ou que ensinou a Dylan como
jogar. Ele se perdeu no poço de ignorância e ambição, depois que meus avôs
morreram.
— Sente-se! — Aponta para a cadeira à sua frente.
— Estou bem em pé — proferi.
— O assunto não é uma brincadeira, então não aja como uma pirralha
mimada, Verônica! — vocifera com o rosto contraído. Encaro aqueles olhos
novamente, tentando não transparecer raiva ou medo. Tudo bem, Vee! Sente-
se, escute o que ele quer e vá embora, é simples. Eu desejo mandar meu
subconsciente para o inferno, mas não o faço, apenas emito um estalo com a
língua, caminho em direção a poltrona à sua frente e me sento, cruzando as
pernas, deixando que meu salto fizesse um barulho que eu sei que ele odeia.
— Você é uma vergonha para os Blackwell! — rosna em minha direção.
— É um elogio comparado a pessoa que você é! — Sorrio friamente em
sua direção e encosto minhas costas na cadeira, cruzando os braços e
erguendo o queixo. — Não me enrole pai, o que está fazendo aqui?
— Você me lembra a mim quando jovem. — Ele se encosta em sua
cadeira, imitando meu gesto, me lançando um sorriso de escárnio. —
Contudo, por mais que eu adoraria ter uma conversa paternal, temos assuntos
mais importantes para tratar!
— E que assuntos seriam esses? — Ergo uma sobrancelha.
— Quero te fazer uma proposta, filha, uma que você terá que escolher
sabiamente.
— Sou toda ouvinte, pai! — resmungo enquanto me levanto, ando até a
mesa e me sirvo do mesmo líquido âmbar que ele estava bebendo.
— Eu sei sobre o que você fez para a pirralha Underwood e isso vai
contra nosso acordo de quatro anos atrás. Sei que Dylan voltou para a garota
que não tem onde cair morta e sei todas as coisas que aprontou durante esses
meses. — Meu corpo todo fica tenso, mas me limito apenas a encará-lo
sobre meus ombros, deixando meu rosto nublado de confusão como se não
estivesse entendendo do que ele estava falando. — Não se faça de sonsa,
Verônica. Você achou mesmo que eu os deixaria aqui nessa maldita cidade
sem uma supervisão?
Encaro aqueles fodidos olhos, havia escuridão, crueldade e frieza. Não
adianta fingir que eu sou ingênua, porque nesse momento, o homem à minha
frente, me encara como se eu fosse um dos seus parceiros de negócios, não
sua filha, não sua família. E sei que precisarei proteger meus irmãos e meus
amigos. Então me limito a deixar aquela parte de mim que ele acha que é
igual a dele, venha à tona. Meus olhos se tornam frios como gelo e caminho
até a minha cadeira novamente, me sentando com toda a elegância possível,
enquanto viro o líquido em minha garganta.
— Eu vou dizer apenas uma coisa e não irei repetir, pai: se você tocar em
fio de cabelo de meus amigos ou qualquer pessoa importante para mim… —
Apoio meus cotovelos na mesa e o encaro mortalmente. — Eu mesma farei
da sua vida um inferno e acredite quando digo que colocar fogo na NYU será
apenas uma faísca do que eu realmente posso fazer quando quem eu amo é
prejudicado!
— Não seja tão dramática, Verônica! — Faz uma careta de desdém. — Já
disse que tenho uma proposta para te fazer.
— Então não ocupe muito do meu tempo — retruco friamente. — Apenas
faça seu jogo inescrupuloso.
— Os Wright querem expandir seus negócios para o Ocidente Médio e se
tiverem êxito serão a multinacional mais poderosa no mundo. — Ele solta o
copo sob a mesa de centro, leva a mão até sua mandíbula e arrasta o dedo
pela barba por fazer. — E você sabe que eu odeio ser o segundo em
qualquer segmento, nós somos donos de quase todas as indústrias
petrolíferas do condado e patrocinadores das corridas de automobilismo
mais reconhecidas do mundo e continuaremos assim.
— Isso é um problema exclusivamente seu! — Dou de ombros, me
encostando na poltrona novamente.
— É aí que você se engana. — O sorriso frio que me lança, faz com que
todos os pelos do meu corpo se arrepiem e tenho a impressão de que eu não
sairei bem desse escritório quando acabarmos. — O pai de Oliver não acha
sensato seu filho viver de aventuras como está fazendo, então ele voltará
para a faculdade e será oficialmente o herdeiro da Wright Enterprise.
— E você quer que eu faça o quê? — Ergo a sobrancelha. — Implore a
ele que não faça negócios e deixe a empresa da sua família definhar?
— Oh não, querida! — Eu sabia que o que diria a seguir poderia ser ruim,
mas não nunca imaginei que seria a pior das barbaridades. — Quero que se
case com ele…
Encaro meu pai por alguns segundos e então faço a coisa mais inesperada
para o momento, solto uma risada que se tornou uma gargalhada. Uma
gargalhada fria, que não tem emoção, apenas perplexidade. E assim que
finalmente tomo controle do meu corpo novamente, olho para o homem
sentado do outro lado da mesa como se tivesse perdido toda a sanidade do
universo.
— Você sabe que casamentos arranjados aconteciam apenas na era
regencial e em alguns livros, certo? — Ergo uma sobrancelha, secando uma
das lágrimas que ainda desce por conta da crise de risos.
— Não brinque com a minha cara, Verônica Blackwell! — A sua voz
ressoou pela sala como um aviso.
— Você quer que aja como, me conte? Porque concordar com uma
proposta absurda e sem contexto nenhum, está fora de cogitação! — devolvo
na mesma medida. — Você quer ser parte da empresa deles, case-se você
mesmo com aquele homem asqueroso que chama de amigo!
— Você quer saber por que irá aceitar essa proposta? — Ele sorri com
escárnio em minha direção. — Porque se não fizer isso, eu irei retirar a
bolsa para Julliard que a pirralha Underwood irá conseguir após a audição,
irei fazer com que nenhum time contrate seu namorado de merda e ainda
tirarei todos os acessos de seus irmãos ao nosso dinheiro. E talvez eu faça
com que Hazel perca sua bolsa de medicina, você sabia que ela é a melhor
da turma?
— Você não teria coragem! — rosno, me levantando e batendo a mão na
superfície da mesa.
— Você sabe que eu teria. — Ele inclina a cabeça com uma expressão
fria, calculista. — Você sabe muito bem que quando eu quero algo, eu faço!
— Sim e da última vez que pagou o preço foi Sophie! — grito em sua
direção. — Porque você, Jonathan Blackwell, é a pessoa mais repulsiva que
eu já vi na vida, você não passa de uma casca vazia que se importa apenas
com o dinheiro.
— Eu sou muitas coisas, Verônica! E se quer nomear desta maneira — ele
dá de ombros —, que seja.
— Não seja um monstro pela primeira vez em sua vida medíocre, pai! —
praticamente imploro.
— Quem você vai escolher, Verônica? — ele questiona, ignorando a
minha súplica. — Você ou as pessoas que ama?
Quando minha voz sai com a resposta, ela não passa de um sussurro,
mesmo não sendo uma resposta que ele deseja.
Saio batendo fortemente a porta e caminho em direção ao meu quarto,
retirando meu celular e enviando uma mensagem para a única pessoa que
entenderia, sinto todos os sentimentos me atingirem com força total. Algumas
lágrimas insistem em rolarem por todo o meu rosto, mas eu as seguro.
Não chore, Verônica! Levante a cabeça e mostre ao mundo para que
veio!
Mas eu não poderia, não conseguiria ser forte nesse momento, porque a
realidade finalmente esmurra meu rosto, me fazendo compreender a
gravidade dessa situação: eu precisei decidir o que faria, precisei saber se
iria colocar a minha felicidade a frente ou faria um acordo com o diabo,
venderia o resto da minha alma para que as pessoas que eu amo tivessem
todas suas chances de viverem bem.
Não quero decepcionar você
Mas meu destino é o inferno
Embora tudo isso seja para você
Não quero esconder a verdade
Demons | Imagine Dragons

Eu sabia que nada correria bem na casa de Verônica assim que meus olhos
recaíram em seu pai. Deixá-la lá para enfrentá-lo, fez com que minha
preocupação aumentasse. É como se tivéssemos regressado no tempo, em um
salão de festas, e ele enchesse o salão com postura esnobe e como exalava
poder de seus poros.
Eu sempre soube que Jonathan Blackwell tinha todos os imbecis de Saint
Vincent comendo na palma de sua mão por tudo o que ele representa. Ele
poderia destruir qualquer um facilmente se quisesse e, naquela época, eu
estive frente a frente a ele, enquanto o próprio me fazia acreditar que todo o
meu mundo estava sendo tirado de mim. Como se olhar para o rosto frio, me
lembrasse de como me senti quando ele deixou extremamente claro que
poderia realmente fazer algo contra mim ou contra minha família por ter me
envolvido com uma de suas filhas e após alguns dias, ele tenha tirado tudo o
que eu achava importante para mim, apenas por ser egoísta demais e não
conseguir ver sua própria filha feliz.
Mas hoje, enquanto ele encarava Verônica com um misto de desaprovação
e vergonha, eu quis quebrar seu rosto, quis descer aquela escada e apenas
fazer com que sumisse da vida minha garota. Contudo, sabia que se eu
realmente fizesse isso, foderia com ela e com sabe se lá o acordo que eles
tinham.
Suspiro fundo, estacionando em frente à casa de Audrey, e abaixo minha
cabeça no volante enquanto levo minha mão até o porta luvas e retiro o
chaveiro azul que Verônica havia me entregado a alguns dias atrás. Eu não
estava com ânimo de viver mais com esse assunto e precisava colocar um
ponto final nisso.
— Você está bem? — Mel sussurra do meu lado, eu estava tão absorto em
meus pensamentos que havia esquecido que minha irmã ainda estava ao meu
lado. — Está quieto desde que saímos da casa de Vee.
— Não sei te dizer se estou bem, Mel… — murmuro, me encostando no
apoio do meu banco e levantando a cabeça para o teto. — Saber que Vee
está lidando com seu pai sozinha neste momento, não é algo que me traz
alegria.
— Verônica vai ficar bem, ela sempre fica! — Mel leva sua mão até a
minha apertando-a.
— Você tem certeza que possui dezesseis anos mesmo? — Ergo uma
sobrancelha, sorrindo. — Às vezes eu realmente acho que você é a mais
velha de nós!
— Tia Audrey diz que puxei a personalidade da mamãe! — Ela sorri e
vejo seus olhos brilharem.
E é a verdade. Melany me lembra nossa mãe desde a fisionomia até o
temperamento. E eu estou realmente feliz que nossa tia comenta com ela
sobre mamãe, quero que minha irmã tenha o máximo de lembranças
possíveis dela, mesmo que isso não fosse suficiente para preencher as
lacunas que a presença dela havia deixado em nossas vidas após sua morte.
— Sim, você puxou. — Devolvo o sorriso e vejo os olhos dela se
tornarem distantes. — O que foi, Mel?
— Você sente falta dela? — Mel suspira tristemente. — Às vezes eu
sonho com o acidente, eu sei que eu era uma criança e não deveria me
lembrar... Mas às vezes é como se o acidente viesse em minha mente, sabe?
— É normal você se lembrar, Mel… — Suspiro, levando minha mão até a
dela novamente. — Você era uma criança, mas isso não impede de você se
lembrar.
— Eu tenho pesadelos com o grito dela…
— Eu também. — Ela me encara surpresa. — Não é frequente, mas às
vezes é como se eu estivesse no carro novamente e… tudo acontecesse.
— Em algum momento iremos superar isso? — pergunta insegura, como
se já soubesse a resposta.
— Talvez… — Minha voz sai no mesmo tom que o da minha irmã, porque
eu não sei se isso pode acontecer, não sei se as coisas podem ser esquecidas
e superadas facilmente. — Mel, acredito que você deva voltar a fazer as
sessões de terapia.
— Eu irei — ela exclama, me dando um sorriso verdadeiro. — Agora
vamos que Audrey deve estar surtando.
Decido não prolongar esse assunto, eu teria uma conversa com nossa tia
depois sobre isso. Então apenas assenti e abri a minha porta, seguindo em
direção às escadas da casa de Audrey. Quando Mel abre a porta e nossa tia
está sentada em frente à televisão sem focar a sua atenção na imagem que
refletia na enorme tela plana, eu soube que ela estava preocupada.
E tive a minha confirmação quando ela se virou em nossa direção e
suspirou aliviada.
— Você me disse que ela estaria em casa cedo, Logan! — Minha tia
reprova severamente.
— Ela está aqui agora e está segura! — Reviro meus olhos enquanto me
jogo no sofá. — Não faça um drama sobre isso, tia Audrey!
— Não faça mais isso, eu fiquei preocupada! — Melany solta uma lufada
de ar e segue em direção às escadas. — Aonde você vai?
— Tomar um banho! — Ela grita quando está quase chegando ao patamar
da escada.
Audrey suspira e volta a sua atenção para a televisão, enquanto eu
caminho até ela e estendo o chaveiro. Ela se vira em minha direção e ergue
uma sobrancelha, enquanto apenas dou de ombros, indicando para que as
pegue. Está na hora de finalmente acabarmos com todo esse ódio, de cortar
as raízes e deixar que o futuro comece.
Porque eu estou cansado de viver tendo que olhar para trás, estou cansado
da briga entre minha família e a de Verônica.
E mesmo que eu saiba que algumas coisas nunca poderão ser perdoadas,
eu tentarei. Porque eu amo Verônica Blackwell e não esconderei mais isso,
não farei com que os problemas dos outros interfira em nossa relação
novamente, não deixarei que os erros dos outros estejam entre nós, nunca
mais.
— O que é isso? — A voz de Audrey me desperta.
— É a chave da casa dos meus pais, Verônica me entregou há alguns dias
e como você sempre falou sobre ela, sobre como sentia falta de entrar e sabe
que era o lugar preferido da minha mãe, acho justo que fique responsável por
ela — respondo com o rosto impassível, porque eu sabia o quanto tia
Audrey poderia ser dramática quando queria.
— Ela decidiu devolver para vocês? — pergunta calmamente.
— Ela não precisou devolver, porque sempre foi minha… — digo a
verdade sem rodeios. — Verônica confessou para mim e para Aidan que
quando meu pai a vendeu, ela transferiu a escritura para o meu nome.
— Por que ela faria isso? — Audrey questiona desconfiada.
— Porque ela fez um acordo com seu pai, o qual envolvia Mel e nossa
casa. — Solto o chaveiro em suas mãos. — Eu não vou entrar em detalhes,
Audrey, é um assunto que envolve a mim, Verônica e a Aidan, e não foi fácil
colocar tudo para fora, então quando o meu irmão estiver preparado para
compartilhar, ele fará isso, mas até lá, esse assunto morre aqui!
— Obrigada por me deixar responsável pela casa da sua mãe... era
realmente o lugar preferido dela... — Ela sorri tristemente, como se
lembrasse de minha mãe naquele momento. — Obrigada de verdade, Logan!
— Aidan também está com uma cópia e acredito que ficará lá por algum
tempo e não está sendo um bom momento para brigar com ele — comento,
sabendo que uma tristeza nubla minhas feições por me lembrar de tudo o que
foi derramado entre eu, Aidan e Vee na noite do recital. — Então mantenha
seus comentários frios para outro momento.
— Não pretendo brigar com meu próprio sobrinho — ela se defende,
ofendida.
— Mas não consegue segurar seus comentários frívolos quando se trata do
assunto entre nossa família e a de Verônica — contraponho.
— Agora que todas as verdades estão sobre a mesa, não há o porque de
continuarmos com essas brigas, Logan! — exclama, deixando que seus olhos
se tornem calmos. — Se você a ama, viva o seu relacionamento, assim como
sua mãe lhe diria para fazer.
Eu apenas balanço a cabeça em confirmação e sigo em direção à porta,
aliviado por deixar tudo isso para trás. Eu sempre soube que mesmo que ela
desse seu apoio em meu relacionamento com Vee, uma parte da minha tia se
ressentia da minha namorada, porque ela havia a impossibilitado de visitar o
único lugar onde tinha lembranças boas de sua irmã. Era a melhor amiga da
minha mãe, sempre esteve ao lado dela, seja nos momentos bons ou ruins, e
sabia que o primeiro lugar que iria, seria o lugar favorito de mamãe, o ateliê
dentro da garagem. E agora ela poderia sempre voltar lá, poderia até se
mudar se quisesse.
Sou tirado dos meus pensamentos quando meu celular toca em meu bolso
assim que paro em frente ao meu carro, o pôr do sol já está acontecendo, o
que me indica que logo anoitecerá. Quando o levanto e abro a mensagem de
Verônica, meu peito se aperta, porque eu sei que nada está bem.

Anjo: Eu preciso de você!

Eu: Aonde você está, anjo?

Aperto para enviar a mensagem assim que deslizo para meu banco. A
resposta chega poucos segundos depois.

Anjo: Estou indo para a pista, me encontra lá?

Eu: Chego em 20 minutos.

Ela não me responde, então apenas digito uma mensagem para Hazel e
Summer para irem para o parque e acelero pelas ruas da cidade com a
intenção de chegar antes do tempo que havia dito para Verônica. Eu sei que o
parque hoje não estaria funcionando por conta das festividades do ano novo,
e que hoje eles aproveitariam para realizar a primeira noite de corridas.
Mesmo que eu adorasse esse evento, rezei para que Marcus, o organizador,
tivesse cancelado por algum motivo, porque eu sabia que se Verônica não
estivesse realmente bem, ela procuraria algo para se distrair, algo para
apaziguar a sensação que estivesse dentro dela.
Ela joga com sua própria dor, Vee faz com que aquilo que a machuque se
torne beleza, ela se reconstrói das suas próprias feridas, Verônica Blackwell
é forte, é a mulher mais forte que já entrou em minha vida e às vezes essa
força a sobrecarrega, porque ela não cede, ela nunca o faz, porque sente
medo de que se um dia fizer isso, ela se desmorone.
Mesmo quando ela veste suas máscaras, quando age friamente e usa o
sarcasmo como arma.
E eu sei que hoje ela estará assim, sei que seu pai havia conseguido trazer
o seu pior à tona. E tenho certeza disso quando entro pelos portões do
parque e encontro uma pequena multidão já formada.
Não me surpreendo, principalmente porque já está quase escurecendo e
quase todos os universitários que não foram viajar, estão se deslocando para
esse lado da cidade. Algumas garotas reconhecem o meu carro e sorriem
para mim, os estudantes da SVU que já sabem que eu participo algumas
vezes das corridas, acenam em minha direção.
Eu não devolvo o sorriso ou até mesmo o aceno, porque estou inerte em
minha preocupação. A única coisa que me importa é era a garota de cabelos
pretos e olhos brilhantes que havia desaparecido em meio às pessoas.
Percorro o olhar por todo o estacionamento e quando estou prestes a enviar
uma mensagem no nosso grupo de amigos, avisto o Bugatti estacionado entre
duas vagas de onde eu estou. Verônica está sentada no capô, sozinha, ela tem
o celular em uma das mãos e um cigarro aceso na outra, que leva até seus
lábios. Seu cabelo solto cai para o lado quando ela inclina a cabeça para
soltar a fumaça, me dando a visão de seu rosto esbelto e percebo que seu
olhar é distante, como se não enxergasse que algumas pessoas passam por
ela e a cumprimentam.
Ela levanta as pernas para cruzá-las e então eu percebo que está trajada
para a corrida. As calças pretas, o cropped dourado com pequenos brilhos
que estão tampados pela jaqueta de couro. Abaixo meu olhar para seus pés e
não me surpreendo quando avisto uma bota de salto.
Caminho até ela e me sento ao seu lado, observando a movimentação das
pessoas. Por alguns segundos, eu apenas respeito o seu silêncio e deixo que
ela absorva seus pensamentos. E quando ela finalmente suspira fundo e deita
sua cabeça em meu ombro, eu me viro um pouco para poder beijar o topo de
sua cabeça.
— Você vai correr? — pergunto quebrando o silêncio.
— Você vai me acompanhar? — devolve levantando o rosto para me
encarar. Seus olhos estão escuros, cheio de sentimentos que, pela primeira
vez, eu não sou capaz de ler.
— Sempre, anjo! — Eu não estou dizendo apenas na corrida e ela sabe
disso. Me aproximo, deixando um beijo em sua testa e continuo: — E eu
preciso de uma revanche.
— Aquela corrida foi há meses, capitão, supere! — Verônica solta um
sorriso fraco que não alcança seus olhos e, por Deus, eu estou preocupado
com ela. — Vamos?
Assinto com a cabeça. Mesmo que isso esteja me corroendo, quero saber
o que estava a afetando, quero que ela se abra comigo, contudo eu não irei
invadir seu espaço pessoal, não a forçarei a dizer as coisas apenas porque
eu desejo ouvir.
Algumas vezes todos nós precisamos de silêncio, precisamos ficar
perdidos em nossa própria cabeça para resolvermos o que esteja nos
afetando. Se fosse o caso dela e Vee precisasse de alguém que apenas o
acompanharia naquele silêncio, eu seria seu companheiro, escutaria as suas
músicas favoritas, abraçaria caso fosse necessário e correria novamente com
ela, mesmo que uma parte de mim desejasse que ela resolvesse seus
problemas de uma forma mesmo perigosa.
— Os meus melhores corredores estão de volta? — Marcus pergunta
assim que paramos em frente à mesa de apostas. Ele sorri galanteador para
Vee e ela apenas ergue uma sobrancelha e entrelaça nossos dedos. —
Verônica Blackwell, está mais linda do que a última vez que a vi.
Vee solta um sorriso que se torna uma careta, como se não estivesse no
clima para brincadeira, e logo após me dá um beijo rápido e se vira para
caminhar até onde Hazel e Summer haviam acabado de chegar,
acompanhadas de todos os nossos outros amigos. Eu apenas acerto tudo
sobre a minha rodada com a da Verônica e me viro para sair, mas antes o
encaro sobre o meu ombro.
— Não flerte com a minha garota novamente, Marcus! — resmungo,
enquanto ele solta uma gargalhada e me entrega dois papéis para a corrida.
Não espero uma resposta. Apenas sigo para onde Verônica está, encosto
meu queixo em seu ombro, passando as mãos pela sua cintura, e a puxo
contra meu corpo. Quando ela se ajeita em meus braços, observo a conversa
que flui entre todos nossos amigos. Durante o tempo em que estamos ali,
percebo que Dylan e Edmund estão tensos, eles tentam disfarçar, mas eu os
conheço e sei que nenhum deles está bem. E desconfio mais ainda quando
percebo que Oliver não está entre nós.
Algo está fodidamente errado.
Eu sei que Levi havia decidido viajar para Miami hoje pela manhã com
seus pais depois do que aconteceu ontem e aquilo não me surpreendeu. Ele
está dando um espaço para Sum, para que ela pense na sua declaração. Mas,
por outro lado, a ausência do melhor amigo de Verônica é estranha, porque
ele nunca a larga, independente de qualquer coisa, Oliver sempre está ali por
ela.
— Underwood? Blackwell? — Olhamos sobre nossos ombros em direção
a voz de Marcus. — É a vez de vocês!
— Boa sorte! — Hazel exclama em nossa direção, com um sorriso tenso e
olha para Dylan procurando por respostas, como se quisesse dizer algo que
não deveria.
Nós sorrimos tensamente e seguimos para os nossos carros. E quando
paramos na linha de largada, olho para Verônica como da primeira vez. Ela
devolve o olhar e pela primeira vez na noite aqueles olhos brilham em
excitação. Vee deixa que um sorriso se estenda por todo o seu lábio e então
solta um grito.
— Você tem certeza de que pode fazer isso, capitão?
— Não só posso como vou, anjo! — devolvo as mesmas palavras que ela
me lançou na primeira vez que corremos juntos.
Ela solta uma gargalhada gostosa, mesmo que o som não tenha atingido
totalmente os meus ouvidos, eu sei que é o melhor som. Nenhum barulho que
o ambiente emite pode se comparar àquele.
Quando um calouro com o moletom do SVU aparece no meio da pista com
a bandeira colorida, nós nos preparamos. O painel acima de nós inicia a
contagem regressiva. Os números neons vão de dez a zero. E quando chega
às seis, eu escuto o rugido dos nossos motores, no cinco tudo está preparado.
Quatro.
Três.
Dois.
Um.
A largada foi dada. Somos apenas nós dois novamente, como nos velhos
tempos.
Verônica sai com a vantagem, o carro dela é mais leve, o que a deixa
concluir os movimentos com destreza. Quando viramos em uma curva
fechada, eu inclino o volante com força, fazendo com que ela precise me dar
passagem ou bateremos em uma cerca que serve como delimitação de pista.
Assim que entramos em outra curva, preciso diminuir a velocidade para que
o carro não saia de sua estabilidade e quando ela vai me ultrapassar, jogo o
carro para o lado que ela está tentando concluir a ação, a impedindo.
Mas em uma das curvas acentuadas eu preciso fazer com que meu carro
ganhe estabilidade novamente, o que dá a Verônica a oportunidade perfeita
de me ultrapassar. Nós mantemos as ultrapassagens até o limite por boa parte
do trajeto e quando chegamos a curva final e finalmente estamos na linha
reta, eu faço como a nossa última corrida, fazendo com que nossos carros
fiquem nivelados, lado a lado.
Ela me encara de relance e sorri, um sorriso que eu sempre achei que
seria minha ruína, mas que no final acabou sendo a minha salvação. Seus
olhos brilham em minha direção por alguns segundos e um sorriso lindo,
daqueles que nos tiram suspiros sem nem mesmo percebermos, se estende
pelos seus lábios. E sem dúvidas, nenhuma melodia que já cheguei a tentar
cantar em nossas noites de karaokê ou nenhum jogo ganho em qualquer final,
será capaz de se comparar com o sentimento que Verônica trás para dentro
de mim. O seu sorriso, aquele que ela dá quando está feliz, faz minhas pernas
se estremecerem. Ela é como um mistério que amo desvendar pista por pista
e que agora sei que poderia passar anos ligando as pintas de suas costas
como se fossem constelações. Mas nada disso importa perto do jeito que ela
me faz sentir por dentro, como se fosse um vulcão prestes a explodir, como
se qualquer chama fosse pequena perto da combustão que emitimos quando
juntos.
Eu a amo. Porra, amo tanto que às vezes nem eu mesmo consigo entender
esse sentimento.
E quando a ultrapasso, fazendo com que meu carro chegue primeiro à
linha de chegada, a primeira coisa que faço é sair dele, é correr em sua
direção. Ela não se importa em perder, apenas corre em minha direção e
pula em meu colo, colidindo nossos lábios.
O beijo é lento, faz com que eu a aperte mais em meu colo. Vee explora
cada parte da minha boca, ela me puxa mais firme, como se quisesse que
esse momento jamais acabe, como se estivesse com medo de se afastar,
quando sinto uma lágrima descer pelo seu rosto, molhando a minha
bochecha, soube que realmente algo está errado e tenho certeza disso quando
me separo dela.
Verônica me encara com os olhos tristes e quebrados, é o mesmo olhar
que ela me lançou quando ainda me odiava, o mesmo que lutei para que
abandonasse, mas ele ainda estava lá.
E, por Deus, eu quero que ela me conte, quero que confie em mim, que
despeje o que quer que tenha acontecido em sua casa mais cedo.
Porém, mesmo que eu quisesse que ela confiasse em mim, eu não estava
preparado para as suas próximas palavras, porque elas me pegam
desprovido de qualquer reação. Verônica sai do meu colo levanta o rosto e
profere as palavras que eu jamais imaginei que um dia sairia de seus lindos
lábios:
— Meu pai quer que eu fique noiva de Oliver, Logan… — Outra lágrima
desceu pelo seu rosto. — Sinto muito.
Não é adorável estar completamente sozinha?
Coração feito de vidro e a mente feita de pedra
Rasgue-me em pedaços, da pele ao osso
Olá, bem-vindo ao meu lar
Lovely (feat. Khalid) | Billie Eilish

Logan me encara com os olhos arregalados, como se estivesse esperando


que eu diga que é uma gozação, que fosse algo impossível de acontecer, e
quando acho que vai dizer algo, ele joga a chave do seu carro para Summer,
que as pega assustada e me puxa para meu carro, ele não me pergunta se eu
desejo dirigir, apenas estende a mão, me pedindo a chave, abre a porta do
passageiro para mim e logo após toma a direção do Bugatti, dirigindo
rapidamente até o nosso mirante.
O silêncio se mantém durante todo o caminho, Logan não olha em minha
direção ou profere nenhuma palavra. Ele segura o volante com força e
suspira fundo algumas vezes, como se estivesse trabalhando para não
proferir algo errado.
Eu nunca desejei tanto que tudo isso realmente fosse apenas uma piada de
mal gosto, porque eu queria que nós pudéssemos ter a chance de viver o
nosso amor, que pudéssemos finalmente ter a chance de sermos felizes, mas
sempre soubemos que éramos errados juntos.
Sempre soubemos que éramos incompatíveis desde o primeiro momento,
mas Logan Underwood me conquistou, me ensinou sobre seu mundo, seus
olhos azuis enxergaram a minha alma, me desconstruiu camada por camada e
nós nos acendemos, brilhamos, mas no fim, nós nos tornamos efêmeros.
E isso dói, como se eu estivesse perdendo parte da minha alma outra vez.
— Me diga que é brincadeira, anjo... — ele sussurra quando estaciona o
carro na nossa vaga de sempre. — Por favor.
— Eu queria que fosse, capitão… — minha voz sai fraca, quase que um
murmuro. — Eu queria que pudéssemos ter a eternidade juntos, mas eu
preciso fazer isso, preciso proteger todos aqueles que eu amo.
— E nós, Verônica? Quando você vai querer nos proteger? — Ele aperta
o volante com força, fazendo com que os nós de seus dedos fiquem brancos.
— Quando você vai nos colocar como primeira opção…
— Eu estou te protegendo, Logan! — minha voz sai rouca. — Eu não estou
fazendo isso porque quero, mas porque é necessário! Porque meu pai vai
destruir você, Mel e meus irmãos se eu não aceitar toda essa merda!
Encaro os olhos de Logan enquanto profiro as palavras que me
atormentam o dia todo.
— Eu sei me proteger, Verônica, pare de querer segurar o mundo, pare de
tentar ser a heroína, por favor… — Eu não sabia distinguir se seu tom era
ódio ou preocupação. — E, caralho, como Oliver aceitou essa palhaçada?
— Oliver vai fazer isso porque ele também precisa proteger alguém —
confesso, deixando uma lágrima descer pelo meu rosto.
— Você aceitaria se casar com ele? — Logan perguntou.
— O problema não é aceitar, é se sacrificar por quem amamos, Logan! —
Respiro fundo. — Se isso significar que você conseguirá conquistar tudo o
que sempre sonhou, que Dylan e Hazel estão felizes e Mel conseguir uma
bolsa em Julliard, então eu vou me sacrificar para que esse casamento
aconteça, mesmo que o único homem no qual eu desejo me casar está na
minha frente.
— Mesmo que isso custe a sua felicidade? — Seu olhar me dizia coisas
que me machucam, porque eu não poderia voltar atrás.
— A minha felicidade são vocês, Logan, vocês são a minha família e eu
não posso deixar que ele tire as suas melhores oportunidades... — respiro
fundo, deixando que as palavras saiam de meus lábios. — Se eu ficar aqui,
se eu observar vocês perdendo tudo o que conquistaram pelo meu egoísmo,
eu nunca vou me perdoar.
— Então você tomou a sua decisão? — ele questiona, me encarando.
Seus olhos azuis me suplicam para dizer que não, para dizer que eu nos
escolheria, mas se eu fizesse isso, se escolhesse nós dois, eles sairiam
perdendo tudo o que lutaram para conseguir e eu não poderia ser egoísta e
insensível.
Eu nunca poderia voltar a ser assim.
E mesmo hesitando, mordo meu lábio inferior enquanto as últimas
lágrimas descem pelo meu rosto e digo as palavras que saíam como facas de
minha garganta.
— Sim, Logan! — Suspiro fundo enquanto lágrimas grossas escorriam
pelo meu rosto. — Eu vou me casar com Oliver.
Ele me encarou por alguns segundos, mas quando olhou para o teto do meu
carro, suspirou fundo algumas vezes e voltou seu olhar para mim. Eu
esperava tudo, esperava que gritasse, que xingasse ou até mesmo me
implorasse para ficar, mas isso não aconteceu, Logan me encarou friamente,
como se tivesse desistido de nós.
Eu deveria ficar contente, deveria agradecer por isso, mas a verdade é
que tudo dentro de mim grita para dizer a ele que eu lutaria por nós, que eu
faria o impossível para ficarmos juntos.
— O que aconteceu em Nova York para que te fizesse voltar a Saint
Vincent, Verônica? — Logan pergunta de repente.
— Eu e Oliver tínhamos saído de uma festa de fraternidade, nós
estávamos muito bêbados e tínhamos apostado a invadir um dos laboratórios
de NYU e deixar uma surpresinha para um professor idiota que era machista
com as suas alunas…
— Vocês tinham algo? — ele perguntou e eu ergui uma sobrancelha. —
Pelo que eu me lembro, ele era apaixonado por você quando estávamos no
ano sênior!
— Não, ele não era! — Suspiro fundo. — Oliver e eu tivemos essa mesma
conversa quando saí de Saint Vincent, ele achava que sentia algo por mim
por termos problemas parecidos, achava que era certo estarmos juntos
quando nossas vidas eram fodidas demais para aguentarmos e que
poderíamos ajudar um ao outro, mas percebeu que o sentimento que sentia
em relação a mim, era como de irmãos. — Solto um suspiro, me lembrando
de quando tivemos essa conversa e ele se sentiu um idiota por ter confundido
sentimentos. — Nós nunca tivemos nada, porque sabíamos que nossos
corações nunca se pertenceriam dessa forma e que estaríamos destruindo a
nossa amizade por nada. — É a verdade, eu nunca me esqueceria de como
ele me olhou arrependido quando tivemos essa conversa e por ter medo de
perdemos o nosso vínculo. — O dia que invadimos a NYU, Oliver sem
querer acabou esbarrando dois produtos que juntos são inflamáveis, o que
resultou em nós dois tentando apagar um pequeno incêndio, e como
estávamos bêbados demais, acabamos piorando a situação, fazendo com que
o alarme de incêndio fosse disparado. — Eu odiava aquela história, odiava
o quão irresponsável havíamos sido. — Eu acabei me assustando e caindo
em cima dele e quando os seguranças nos acharam, eles presumiram que
estávamos transando ali e nos levaram para a delegacia.
— E foram expulsos da universidade? — Logan pergunta calmamente.
— Como nossas famílias eram influentes e doaram uma grande quantia
para a reconstrução do laboratório, os reitores nos deram a opção de passar
um semestre longe de NYU para abafar o caso e depois poderíamos voltar
sem nenhum problema ou poderíamos sair definitivamente com uma carta de
recomendação de todos os professores influentes. — Solto uma careta ao me
lembrar dessa reunião, de como meu pai me encarava com ódio por ter saído
nos tabloides de fofoca da cidade. — Meu pai não me deixaria ficar aqui até
o final da faculdade, então fizemos um acordo de que eu me manteria aqui
por um semestre e depois voltaria para Nova York.
— Então nunca pretendeu ficar definitivamente? — A pergunta veio com
uma letalidade que me fez arrepiar, como se ele estivesse mascarando seus
sentimentos e querendo se afastar.
— Minha casa era em Nova York, Logan! — confesso soltando uma lufada
de ar. — Minha vida toda era lá, eu nunca imaginei que Saint Vincent me
receberia dessa forma.
— Então você sabia que iria voltar para Nova York, sabia que nós nunca
tínhamos chance e mesmo assim me fez acreditar? — perguntou friamente. —
Porque eu entendo que seu pai te aprisionou em uma armadilha e, porra, eu o
odeio ainda mais, porém, Verônica, você sabia que iria embora quando esse
semestre acabasse.
— Eu disse que iria embora, Logan… — Suspiro fundo, fechando os
olhos e depois os abri olhando diretamente para ele. — Quando disse que
me amava eu te disse que eu nunca voltei para ficar, mas…
— Mas o quê, Verônica? — Ele suspira, passando a mão pelo cabelo. —
Você me deu esperança, não só para mim, mas para nossos amigos! A
Summer, a Hazel e até mesmo Analu, elas te amam e vão ficar devastadas
quando você for embora, eu vou ficar!
— Você não acha que eu irei ficar? — grito em sua direção. — Acha que
estou feliz por deixar tudo para trás, por te que te abandonar novamente?
Não, Logan, eu não estou, mas estou fazendo o necessário para que todos
aqueles que eu amo, sejam felizes!
— Pare de falar de felicidade, quando você é apenas um peão no tabuleiro
de seu pai! — ele grunhe nervoso em minha direção. — Está tão acostumada
com isso, com os jogos sórdidos dele, que apenas aceita as decisões!
— Não tente entender o jogo, não quando não se está nele, Logan! — grito
na sua cara.
— Pelo menos estou de fora, não sou uma princesinha que serve apenas
como rosto bonito para a família! — ele desdenha, seus olhos são de um tom
mais intenso, como se quisesse me mostrar o quão nervoso estava com essa
situação. — Ah, e também não derrubo meus aliados e os jogo para fora,
como se fossem uma simples poeira.
— Não aja como uma criança birrenta apenas porque está nervoso,
Underwood! — devolvo o tom.
— Eu não estou nervoso, estou cansado, Verônica, eu joguei todos os seus
jogos, me desdobrei para te trazer de volta e me machuquei no caminho. Mas
se você quer colocar outras coisas como prioridade, eu vou fazer o mesmo
— ele diz irritado e escancara a porta do carro, se preparando para sair, mas
antes seus olhos me encararam pela última vez. — Volte a ser a vilã, volte a
ser cruel, a ser a princesinha Blackwell que estampa capas de revista e se
esconde por trás das suas máscaras, porque, Verônica, talvez esse sempre
tenha sido a melhor personagem para você!
Por um momento minha respiração para. Ele havia me acertado, fazendo
que eu recuasse como se o tiro tivesse acertado diretamente o meu coração.
Uma parte de mim sente suas palavras como se fossem uma faca fincando em
algo macio, abrindo uma ferida que irá demorar para estancar, minhas
rachaduras ficam transparentes nesse segundo. Por um momento, meus olhos
se enchem de lágrimas, como se minha alma tivesse sido despida para ele.
Seus olhos voltam a se encontram com os meus. Diferente do azul que
sempre me lembrou um oceano profundo, esses que me encaram agora, são
como um azul acinzentado, um dia nublado depois de várias semanas
ensolaradas. Suspiro, lançando a única frase que eu posso dizer no momento:
— A crueldade às vezes é necessária quando se trata de proteger quem
amamos!
Ele não responde, apenas me dá as costas e se afasta. Eu o observo sair da
minha vista, da minha vida, e sumir pela escuridão.
Tínhamos blindado nossos corações, para que no final, nós os
quebrássemos novamente com tanta facilidade.
E isso não deveria me surpreender, afinal, somos como fogo e gelo,
fadados ao fracasso desde o começo.
E nunca havia como isso dar certo.

Quando cheguei na mansão dos Wright no dia seguinte, a governanta


apenas me observou por alguns segundos e sorriu gentilmente, apontando
para o segundo andar, onde fica o quarto de Oliver, com esperança e um
brilho de preocupação em suas íris escuras. Eu sabia que ela está aqui por
conta de Lucy Wright, avó de Oliver, e que provavelmente deve estar
gastando o dinheiro da família em algum shopping por perto. Enquanto subo
as inúmeras escadas, penso em como nossas vidas conseguiram dar um giro
de 360 graus em menos de quarenta e oito horas.
Partiremos para Nova York em algumas horas e Ollie não havia dado as
caras desde o ano novo, o que está me deixando preocupada, mesmo
sabendo que tenho outros inúmeros assuntos para resolver.
Paro em frente a enorme porta escura, levanto o meu braço e bato com
força, apenas escutando um chiado e depois alguns barulhos de algo batendo
contra a madeira ainda fechada, tento mais algumas vezes, orando para que
eu não precisasse ter que arrombá-la.
— Vá embora! — Oliver grita com a voz arrastada.
— Sou eu, Ollie! — devolvo com minha voz também tomando uma nota
alta.
— Vá embora você também, Verônica! — Ele está bêbado, sem dúvidas.
— Abra a porra dessa porta ou eu mesma irei abrir! — Eu orei para que
ele fizesse o que eu estava pedindo, porque não faço a mínima ideia de como
arrombar. — E não vai ser de uma maneira educada, Oliver!
Esperei por alguns segundos, jogando o peso do meu corpo sobre o meu
salto de um lado para o outro. E quando ele não se mexe dentro do quarto, eu
me abaixo e escoro minha bolsa no chão, me preparando para chutar ou fazer
qualquer outro movimento que fizesse com Ollie abra essa maldita porta,
mas então ouço o barulho de algo caindo e depois da fechadura sendo
destrancada. Assim que ela se abre, me dando a visão de um Oliver
acabado, com os olhos pequenos, um cheiro de álcool e a mesma roupa que
usou em nossa última festa, eu suspiro dolorosamente. Contudo, ele não está
bêbado como eu havia achado a minutos atrás, ele está triste. Observo que
seus olhos estão vermelhos de chorar e aquilo me destrói mais uma vez,
porque ninguém entende o meu melhor amigo. Ninguém sabe que por baixo
de toda essa fachada sarcástica, por todos esses sorrisos, esconde um garoto
assustado, quebrado e cheio de cicatrizes, que tenta encontrar conforto em
qualquer coisa que o faça se sentir melhor.
— Então é verdade? — Oliver pergunta, me dando espaço para entrar,
logo após pegar minha bolsa do chão e me lança uma careta. — Vamos nos
casar?
— Eu sinto muito. — Solto um suspiro enquanto ele fecha a porta atrás de
mim. — Eu tentei…
— Não tente justificar as atitudes de merda de nossos pais, Verônica. —
Ele se joga na cama, e eu me sento em uma poltrona à sua frente, retirando
meus saltos. Encaro seus olhos, que agora perdem a alegria. O verde que
todas as vezes que me encaravam brilhantes, agora eram quase vazios, como
na época do ano em que as lembranças de seu passado o consome; faz com
que se torne uma sombra do que realmente é. — Nós sabíamos que eles
foderiam com nossas vidas, era só uma questão de tempo.
— Eu não sinto muito por eles, eu sinto muito que nós precisamos
renunciar a tudo por conta da ambição das nossas famílias. — Cruzo minhas
pernas olhando em sua direção. — Meu deus, Oliver, eu queria tanto que
houvesse outra solução para essa merda.
— Você sempre se sacrifica por todos, Vee. — Ele se levanta, pega a
minha mão e acaricia. — Não deveria ser assim.
— Vale a pena se sacrificar pelas pessoas que amamos, Ollie.
— Até mesmo quando significa que irá perder, Logan? — pergunta
gentilmente.
— Eu o amo, mas nós sempre soubemos que estávamos condenados a esse
fim. — Solto um sorriso fraco.
— O amor de vocês nunca será fadado ao fim, Verônica, mesmo que passe
o tempo que for, sempre se pertencerão! — ele diz me dando um sorriso que
não chega até seus olhos. — Ele já sabe?
— Não podia esconder algo tão importante dele. — Suspiro, soltando sua
mão. — Já tivemos muita falta de comunicação todos esses anos, não seria
justo deixá-lo no escuro.
— E como ele reagiu? — perguntou hesitantemente.
— Não muito bem... — Eu não havia o visto depois de ontem a noite e
quando acordei, apenas vim para cá, precisava de alguém que entendesse o
que eu estava sentindo. E precisava ficar longe de Logan, precisava de um
tempo para conseguir me recompor e achar uma maneira de não machucá-lo
ainda mais, principalmente depois que havíamos dito palavras fortes demais
e eu realmente não desejava ir embora com ele me odiando outra vez.
Mas se eu fosse atrás dele, se pedisse desculpas, eu nunca conseguiria ir,
eu não conseguiria largá-lo.
E eu preferia que ele não me odiasse outra vez, mas deixá-lo com
esperanças de algo que era impossível para nós, era algo que machucava
mais que ódio.
— Eu sinto muito que você precise desistir do homem que ama por conta
de seu pai... — Ele suspira tristemente. — Eu realmente sinto muito,
Verônica!
— O que te custou? — pergunto, deixando que as lágrimas nublarem os
meus olhos. — O que te fez concordar com isso...
— Andrew! — Eu solto um sorriso fraco. — Ele é tudo o que me resta
depois do que aconteceu com nossa mãe e eu não posso deixar que nada
aconteça com ele, Vee…
Eu assenti. Porque ambos tínhamos o que proteger. Ambos sabíamos que
teríamos que fazer aquilo.
— Você se lembra quando assistimos Lá Casa de Papel juntos? —
pergunto de repente, me virando para encará-lo.
— É impossível não lembrar do seu péssimo gosto para séries, Pequena
Blackwell — debocha, soltando um sorriso. — Mas onde isso se encaixa
neste assunto?
— Na quinta temporada uma das personagens diz que: você não precisa
ter muitos amigos, você precisa senti-los. — Minha voz sai suave. — E eu
te sinto, Ollie, mesmo que tenhamos tomado decisões de merda no começo,
eu sinto cada momento que passamos juntos e você segurou meu mundo,
segurou minha mão todas as vezes que eu usava o álcool como válvula de
escape, quando o meu luto nublou minhas decisões e você esteve lá por mim,
e por isso, eu digo que sinto muito por você ter que se sacrificar pela
ambição da minha família.
— Vee…
— Não, Oliver, Andrew é seu irmão, ele merece ser amado e cuidado
depois de tudo o que vocês passaram — respondo. — E não posso ser
egoísta ao ponto de sacrificar aqueles que nós amamos, então eu estou dando
adeus a Logan, estou aceitando que vamos nos casar mesmo que não nos
amemos nesse sentido, mas iremos fazer isso por eles.
— Quando estamos indo? — ele pergunta quase em um sussurro.
— Em algumas horas, Mada já arrumou minhas malas… — Dou uma
pausa, tentando respirar fundo. — E-eu… eu sei que preciso ser forte por
todos nós, mas não quero ir, Ollie…
— Eu sei, Pequena Blackwell — Ele pula da cama e me abraça, enquanto
eu finalmente deixo as lágrimas saírem.
Depois de tantas horas tentando ser forte, eu finalmente cedo.
Choro por perder Logan novamente, por ter que abandonar meus amigos e
minha vida.
Choro por ter uma família tão cruel.
E choro por não conseguir ser forte o suficiente para enfrentar meu pai.
Eu não sei quanto tempo fiquei ali apenas chorando nos ombros de Oliver,
mas finalmente levanto o meu rosto, meu amigo levanta meu rosto e enxuga
as poucas lágrimas que ainda escorriam pelo meu rosto.
— Vamos conseguir sair disso, ok? — ele garante, mas sua voz não sai
confiante como antes.
— Ok! — Concordo mesmo que seja em vão.
Assim que finalmente saí da casa de Oliver, fiz o meu caminho para casa
em silêncio, pensando em como minha vida havia sido virada de cabeça para
baixo novamente. Quando entro pelo enorme portão escuro da mansão da
minha família, estaciono o carro entre a porta de entrada e caminho para
dentro, Edmund e Dylan já estão prontos para irmos até o pequeno aeroporto
da cidade. Observo meu irmão caçula, que está sentado no sofá com um
tablet em mãos e um conjunto de moletom preto que tampa todo o seu corpo
esguio. Meu irmão mais velho está escorado em um dos sofás, me encarando,
e diferente de Ed, Dylan veste apenas uma calça jeans e uma blusa cinza por
baixo da jaqueta jeans. Eu não estava com ânimo para nada, então apenas
caminho até a garagem, deixo a chave do meu carro no compartimento que
guardávamos todas as outras e subo para pegar minha mala.
Quando volto para a sala e nós saímos da casa, paramos em frente à
enorme mansão, observando-a. Por muito tempo, achamos que essa casa
guardava nossas piores lembranças, nossos piores momentos, mas estávamos
equivocados, essa casa, Saint Vincent, é o nosso verdadeiro lar. É onde Soph
foi feliz, onde nós fomos. E desistir disso uma outra vez, é doloroso, cruel.
Me viro suspirando fundo e cumprimento o motorista antes de entrar na
enorme SUV que meu pai havia deixando para irmos embora, já que ele
mesmo havia partido mais cedo para Nova York. Durante o caminho até o
aeroporto, me mantive quieta, esperando apenas que tudo isso fosse um
pesadelo e que quando acordasse, eu estaria ao lado de Logan e ele beijaria
minha têmpora, me dizendo que estava tudo bem, que estávamos bem, mas eu
não podia me agarrar aquilo, não poderia acreditar nisso.
— Você está bem? — Ed pergunta quando o carro estaciona em frente ao
nosso destino.
— Vou ficar… — sussurro, pegando minha mala e a arrastando para
dentro do ambiente quase vazio por ainda ser de manhã. — Vocês deveriam
ficar, eu dou conta de tudo em Nova York.
— Vee, vai dar tudo certo! — Dylan vem até mim e me puxa para um
abraço. — Sempre juntos, lembra?
— Nunca deixaríamos você lidar com tudo sozinha. — Ed se junta ao
abraço.
Tento soltar um sorriso em agradecimento, mas nada sai, apenas os aperto
firmemente e volto a caminhar para onde o jatinho da empresa já estava nos
esperando. Oliver já estava lá quando chegamos e ele apenas acenou
levemente com a cabeça quando nos sentamos em nossos lugares e voltou
atenção para seu livro.
Assim que o avião começou a levantar voo, minha garganta voltou a se
fechar e as lágrimas voltaram a escorrer pelo meu rosto.
Desta vez, quando encarei Saint Vincent, eu não sentia alívio em
abandoná-la, eu me sentia como se estivesse abandonando minha casa, minha
vida.
E não tinha mais como voltar.
Lábios vermelhos e bochechas rosadas
Diga que irá me ver de novo
Mesmo que seja apenas em seus sonhos mais loucos
Sonhos mais loucos, oh
Wildest Dreams | Taylor Swift

A música alta ressoa por todos os cantos da fraternidade. Alguns dos


jogadores que não haviam ido para suas casas comemorar as festas de fim de
ano, estão sentados em volta de um sofá escuro com bebidas baratas que
compramos em uma loja de conveniência e outros já sobem para seus
devidos quartos para evitar o barulho irritante que a caixa de show de
Mackenzie emite. A pouca decoração vermelha e branca de natal que
Kennedy havia espalhado pela casa ainda estava lá, ninguém tem ânimo o
suficiente para retirar e eu tenho certeza de que esperaremos ele voltar de
sua viagem para obrigar os calouros deste ano a tirar.
Levi havia voltado de Miami a poucas horas e decidiu passar algum
tempo aqui, mesmo não sendo um jogador e ninguém se opôs a isso, afinal, o
idiota consegue ser idolatrado até pelos meus jogadores. Vasculho a sala
agora repleta de universitários bêbados à procura de meu amigo e o encontro
do outro lado da sala, com uma companhia feminina que sorri
maliciosamente em sua direção, a garota de pele pálida passa os dedos
lentamente pelo ombro desnudo dele e morde o lábio em um flerte
silencioso. Eu sei que não demorará para que subam para o segundo andar,
principalmente porque Levi está assim desde a noite da última festa, quando
teve seu coração partido por Summer.
Eu deveria levantar minha bunda desse sofá e dizer a ele que usar uma
garota aleatória e ficar bêbado não adiantaria, não quando o rosto da mulher
que ele realmente gosta que irá nublar seus piores sonhos e o cheiro de seu
perfume irá invadir seu nariz a todo momento.
Mas como eu poderia dar uma lição de moral em Johnson se eu mesmo
estou num estado lamentável igual a ele? A única diferença é que enquanto
ele mantém uma garota em seu colo beijando seu pescoço, eu mantenho uma
garrafa de tequila quase pela metade em minhas mãos e o celular aberto na
última conversa que tive com Verônica, na esperança de que ela mande
alguma mensagem ou até mesmo me ligue para que pudéssemos nos
desculpar pela nossa última conversa, por termos saído do controle quando
deveríamos ter achado uma solução juntos.
— Melhore essa cara, capitão, isso é uma festa, não um funeral! — Levi
grita do mesmo lugar que estava a momentos atrás, antes de virar o rosto e
beijar a garota em seu colo.
Não respondo, apenas levo a garrafa novamente até meus lábios, sentindo
o líquido âmbar queimar minha garganta e me levanto para seguir até o lado
de fora da casa. Estou farto dessa festa de merda. Cambaleio no meu
processo de chegar até a porta e quando finalmente me sento na escada, levo
a mão até a parte de trás da minha calça, tirando um maço de cigarro e
levando a outra mão livre até minha boca, formando uma concha, o
acendendo.
Eu tinha parado com essa merda, tinha abandonado esse vício e focado em
minha saúde, mas em momentos assim, onde preciso de uma distração, um
motivo para não querer entrar no próximo voo para Nova York e arrastar
Verônica para Saint Vincent novamente, como se eu fosse um maldito homem
das cavernas, eu deixo que ele volte por alguns minutos.
É como Augustus Waters disse em “A Culpa é das Estrelas”: você coloca
a coisa que te mata entre os dentes, mas não dá a ela o poder de completar
o serviço. Contudo, eu faço ao contrário, eu dou a essa coisa o total poder de
foder com a minha vida, mesmo sabendo que é errado, mesmo sabendo que
isso pode afetar meu desempenho no campo, eu dou a ela total liberdade.
E ela, o meu maldito anjo, odiava isso, mesmo que muitas vezes também
cedesse a esse vício infernal. Toda vez que Verônica me encontrava com um
cigarro em mãos, ela o jogava fora e eu fazia o mesmo com os dela.
Agora não temos mais isso, não podemos mais interferir nos vícios um do
outro, não podemos mais nada, porque nesse momento, a minha garota, a
porra da dona de todo o meu coração, está embarcando com seus irmãos e
seu futuro noivo para a cidade que ela chama de lar.
E eu estou aqui, outra vez, segurando nossas memórias e tentando me
reconstruir.
Jogo o cigarro em meus pés, o apagando, e depois, com toda a força que o
álcool ainda não consumiu, atiro o maço e o isqueiro longe o bastante de
mim.
— Eu ia perguntar como você está, mas pela sua reação — a voz rouca de
Josh me faz erguer a cabeça para frente e ver meu amigo parado no primeiro
degrau da varanda —, a resposta é clara como água.
— O que você está fazendo aqui, Brown? — questiono, lhe lançando uma
careta.
— Ajudando meus amigos a tomarem um pouco de juízo. — Ele sorri
enquanto se senta do meu lado. — Espere um momento, está faltando um.
Antes que eu pudesse responder algo, a porta de entrada da fraternidade é
aberta e Levi sai cambaleando, ele derruba um vaso de flor que algum dos
jogadores havia deixado ali e sorri para a proeza que acabara de fazer. Ergo
uma sobrancelha em direção meu amigo, que levanta o celular aberto no
aplicativo de mensagens e tenho a certeza de que ele está bêbado pra
caralho. Nós com certeza teremos problemas com ele, porque Johnson
sempre passa mal quando exagera na bebida.
— O que diabos vocês estão fazendo sentados aí? — Ele se aproxima e se
joga do meu outro lado vazio, quase caindo da escada no processo.
— Te esperando! — Josh responde calmamente.
— Decidiu fazer uma reunião de irmãos, Josh? — Levi pergunta com a
voz arrastada e depois sorri abertamente. — A princesinha Blackwell, me
ensinou a fazer aquelas máscaras verdes que vivia fazendo para Sum, se
quiserem, podemos fazer uma noite de meninos e ver um filme de romance
juntos, o que acham?
— Eu acho que chega de bebida para você! — respondi, me inclinado e
escorando os meus cotovelos na minha coxa, o arrependimento de ter jogado
meus cigarros fora começou a me consumir, ele seria uma boa distração para
o que que esses dois aprontariam.
— Você é um porre, Underwood! — resmunga, puxando a garrafa que
estava ao meu lado e bebendo. — O que está fazendo aqui, Josh?
— Colocando juízo em meus amigos! — repete o que havia me dito a
alguns minutos antes. — Vocês dois estão agindo como dois adolescentes,
está na hora de superar essas merdas.
Ergo uma sobrancelha em direção ao nosso amigo e Levi se inclina para
imitar o gesto, fazendo com que eu segure a parte de trás da gola de sua
camisa para não cair escada abaixo. Isso só pode ser brincadeira, e pela
expressão de Johnson, ele também tinha a mesma opinião sobre isso, não que
a dele contasse muito, já que não se lembraria de quase nada amanhã de
manhã.
— Não me encarem assim, vocês sabem que estou falando a verdade! —
Josh suspira. — É uma merda o que aconteceu com você, Logan, mas você
sabe perfeitamente que voltar a agir assim não vai mudar o fato de que ela
foi embora. — As palavras de meu amigo vieram calmas, gentis, porém me
acertou como se fosse uma bala vindo a milhares de quilômetros por hora.
— E, Deus, Levi, você é um adulto, pare de querer foder as garotas de SVU
apenas porque levou um fora de Sum!
Levi solta um resmungo em resposta para Josh. Nós sabemos que ele gosta
da loira há tempo suficiente, e quando finalmente abriu seu coração, ele não
foi recebido conforme esperava. Mas sabemos que ele estava desta maneira,
não porque ela não correspondesse a seus sentimentos, mas porque estava
com medo de perder uma das suas melhores amigas.
O problema é que Levi é tão orgulhoso quanto eu, ele não admitiria isso,
não até perceber que um ego ferido ele poderia se curar, mas a ferida de
perder um amigo, essa é irreparável.
— Como ela está? — ele pergunta para Josh. — Eu não a vi desde que
voltei.
— Você ficou fora apenas três dias, Johnson. — Josh revira os olhos. —
Mas ela está preocupada.
Isso não me surpreende, Sum sempre colocou as amizades em primeiro
lugar. E eu sei que mesmo que Levi e ela estivessem em corda bamba por um
tempo, eles voltariam a ser como eram antigamente, ou pelo menos eu
esperava, principalmente porque meu amigo havia voltado às pressas de
Miami apenas porque soube que Verônica havia ido embora e teve medo de
que eu voltasse a ficar no estado lastimável que me enfiei na primeira vez
que isso aconteceu.
Então o motivo dele estar aqui afundando o seu coração partido em
garotas aleatórias e em bebidas baratas, é exatamente porque ele é um dos
meus melhores amigos e nunca me deixaria sozinho em um momento como
esse.
— Eu não vou desistir dela! — ele confessa, fazendo com que nós dois o
encarássemos. — Eu vou dar um tempo para ela pensar e esfriar a cabeça...,
mas lutarei pela Summer!
— Você tem certeza disso? — Josh engole em seco. — Talvez…
— Eu tenho! — o interrompe. — Ela vale a pena, ela sempre vai valer.
Tudo ficou em silêncio. A não ser pelo barulho abafado de dentro da casa
e dos gritos de alguns universitários, não há nada. Eu apenas encaro Levi,
tentando encontrar palavras em meio a minha visão um pouco alcoolizada e
escuto Josh suspirar.
Isso é ruim, porra, muito ruim. Se Levi decidir que quer Summer, ela fará
o impossível para afastá-lo e, Deus, ela odiaria machucá-lo.
— Você tem certeza? — questiono calmamente, o álcool já estava
abandonando meu organismo, fazendo com que toda essa conversa se
tornasse mais clara em minha mente.
— Óbvio, Summer é alguém especial para mim, Logan! — ele retruca. —
Se alguém dissesse para você desistir de Verônica, eu tenho certeza de que
não faria.
Eu não desistiria, mas ela mesmo fez isso por nós dois.
A menção a ela estava fazendo com que todos os sentimentos que estou
evitando desde que terminamos naquele carro, voltem com força. Eu sinto
falta dela, uma falta que não posso nem explicar para eles.
— Minha história com a Verônica é diferente, Levi! — Suspiro fundo. —
Você e Sum são amigos antes de tudo…
— E eu mostrarei a ela que vale a pena ser mais do que isso! — ele diz,
convicto. — Porém, no momento, eu preciso dormir, minha cabeça está
girando pra caralho.
Solto um sorriso fraco e o ajudo a levantar, Josh passa por mim e pega o
outro braço de Levi, enquanto o carregamos para o quarto que ele agora
ocupava. Durante o caminho, ele grita com alguns jogadores que tiraram
sarro dele por estar a ponto de cair e tentou flertar com algumas garotas que
descem as escadas que ligam ao segundo andar. Mas quando o colocamos
sobre a enorme cama, ele cai em um sono profundo, sem nem tirar as roupas
que veste.
— Logan? — Josh me chama quando apago a luz e fecho a porta do
quarto.
— Hum?
— Tem outro assunto que queria conversar com você… — ele falou,
apontando o queixo para o meu quarto.
Assim que fecho a porta e me viro, Josh já está sentado na minha cadeira
perto da escrivaninha. Ele segura um envelope branco em suas mãos e sorri
para mim. Um sorriso orgulhoso, daqueles que compartilhamos quando um
dos nossos conquista algo que almeja. Ergo uma das sobrancelhas e caminho
até minha cama, me jogando sobre ela, e viro meu rosto para onde meu
amigo está.
— Sou todos ouvidos, Josh! — exclamo, pegando uma Wilson que estava
jogada sobre o colchão e começo a jogá-la de uma mão para a outra.
— O seu treinador foi até nosso apartamento hoje mais cedo e queria te
entregar isso… — Ele estende a mão em minha direção. — Ele disse que
gostaria de te entregar pessoalmente, mas não conseguiria, porque tinha uma
viagem e não queria se atrasar.
Pego o papel e o abro lentamente, com receio do que encontraria lá
dentro. As últimas vezes que alguém estendeu um envelope ou uma pasta em
minha direção, não ocorreu de uma boa maneira.
— Ele disse do que se tratava? — pergunto hesitantemente.
Josh não responde, apenas aponta com a cabeça para que eu enfrentasse o
que quer que esteja dentro do envelope.
— Você conseguiu, Logan! — Ele estampa um sorriso enorme, um sorriso
que me dizia que estava orgulhoso.
Assim que levanto o papel timbrado, meus olhos correm pelas palavras
escritas e pela logo azul e vermelha. Meu coração para por um segundo, é
uma sensação diferente de tudo o que já provei antes de tudo.
Porque o que está dentro do envelope que meu amigo me entregou, é um
convite. Um convite para uma reunião com a diretoria do New York Giants,
um dos maiores times de futebol americano do país, o favorito do meu pai, o
meu time favorito, para discutirmos uma possível contratação para a próxima
temporada.
Um sorriso iluminou todo o meu rosto.
Eu consegui, estou a um passo de realizar o meu sonho.
Um sonho que uma vez eu achava impossível, que eu não tinha coragem de
correr atrás. E que agora estava ali entre minhas mãos.
E eu só desejo que ela estivesse ao meu lado nesse momento, que
comemorasse comigo essa nova fase da minha vida.

Quando a música parou de ressoar pela casa e o silêncio se estendeu por


todo o ambiente, eu vesti uma calça de moletom e uma blusa desgastada da
SVU e caminhei para a varanda do meu quarto. O vento frio bate contra
minha pele e alguns arrepios surgem pela extensão do meu braço nu. Me
sento em uma das cadeiras esquecidas ali e observo algumas das outras
fraternidades próximas a nossa.
Meu celular apita algumas vezes e quando o pego, a foto de Melany
aparece na tela de mensagens, dizendo que me fará uma visita amanhã à tarde
para assistirmos a algum filme ou apenas conversar sobre os livros que ela
está lendo. Eu sorrio e a respondo rapidamente, logo após, deixo meu celular
em cima da mesa ao meu lado, com a tela virada para baixo e volto minha
atenção para o céu pouco estrelado.
Algumas nuvens se movem pela escuridão da noite e outros pontos
brilhantes surgem ali. Meu pensamento vacila e viajo para um lugar onde
apenas uma pessoa habita, para onde eu não estou afim de ir esta noite.
Mas o sorriso de Verônica e aqueles olhos brilhantes estão marcados de
uma forma incorrigível em minha mente. Suspiro fundo, porque uma parte de
mim sempre soube que éramos como um caso que ia dar errado, mas que
achei que valeria a pena sangrar.
Valia a pena porque eu senti cada momento, senti todas as sensações que
eu deveria, ri das manias incomuns que ela possuía, de como mordia o lábio
inferior quando estava nervosa, de como ela procurava o meu olhar em meio
à multidão. O sorriso dela mastigou meu juízo, ao mesmo tempo que minhas
pernas se enlaçaram nas tuas e fazíamos do mundo nosso paraíso particular.
Levo uma das minhas mãos até meus cabelos e abaixo a cabeça, fechando
os olhos por alguns segundos, tentando entender o porquê de que as histórias
das outras pessoas pareciam fáceis, enquanto a minha e de Verônica era
como se nunca conseguíssemos encontrar um final feliz. Mesmo que
lutássemos, mesmo que fizéssemos tudo o que era necessário para estarmos
juntos, algo sempre acontecia.
Sou tirado dos meus pensamentos quando o meu celular começa a vibrar
incansavelmente ao meu lado. Eu sabia que poderia ser Hazel preocupada
comigo e com Levi, ou até mesmo Summer, e deixá-las esperando por uma
resposta não seria a coisa sensata a se fazer, mesmo que a minha vontade de
conversar fosse quase nula.
Mas quando pego o aparelho e viro a tela para cima, minha respiração se
prende e meu coração toma um ritmo acelerado, porque não é o nome de
Summer ou de Hazel que está brilhando na tela, nem de qualquer outra
pessoa.
É o nome dela. Do meu anjo. Da mulher que possui todas as partes do meu
coração.
Observo a minha foto e da Verônica, que havia colocado como foto de
perfil do seu contato, por mais alguns segundos, tentando imaginar se aquilo
é uma ilusão causada pelo álcool de mais cedo ou por qualquer outro
motivo. Mas é real, a vibração do aparelho, as minhas mãos suando e meu
nervosismo subindo pela minha garganta. Tudo é real. Quando deslizo meu
dedo para atender e o rosto perfeito de Verônica aparece, eu apenas a
observo, orando para que aquilo não fosse um sonho prestes a acabar.
O cabelo preso em um rabo de cavalo destaca suas bochechas coradas
pelo frio de Nova York. E assim como eu, ela está em uma varanda. Suas íris
brilham em direção ao meu rosto e um pequeno sorriso se estende pelos seus
lábios.
— Oi, capitão! — ela murmura, fazendo com a borda de seus olhos se
encham de lágrimas.
— Oi, anjo… — devolvo suavemente, me ajeitando na cadeira.
— Eu sei que é injusto te ligar, sei que fui injusta com você outra vez…
— Uma lágrima desce pelo seu rosto e minha vontade é estender minha mão
para secá-la, como sempre fiz quando os ataques de pânico delas a faziam
perder o controle. — Mas, eu… sinto sua falta, Logan, sinto tanto que eu não
sei se vou ser capaz de suportar isso novamente.
— Eu sei como é, anjo, porque eu sinto o mesmo, eu sinto como se uma
parte de mim tivesse sido tirada… — digo calmamente. — E eu sinto muito
por tudo que disse naquela noite, mas o pensamento de que estava te
perdendo foi algo que eu não soube lidar…
Ela caminha até uma cadeira, fazendo que um pouco de neve caísse pelo
seu cabelo e então se senta, me dando a visão de seu rosto novamente e da
cidade brilhante abaixo dela.
— Você não precisa pedir desculpas, Logan, porque você está certo! —
ela exclama e uma das minhas sobrancelhas se erguem. — Eu não deveria
ser a heroína, não deveria querer salvar todos quando a minha felicidade
está em jogo, mas somos o que somos, certo? — pergunta, mas ela não me dá
tempo para responder. — Nós lutamos para que aqueles que amamos não
sejam prejudicados pelas nossas atitudes, nós amamos quando devemos
odiar e acreditamos no nosso amor.
— E o sacrificamos sempre que achamos que alguém está em perigo… —
digo quando ela finalmente deixa o silêncio recair sobre nós.
— Porque nós sabemos que nosso amor se perpetua, ele se mantém ali à
nossa espera, e isso, capitão, é um erro! — Verônica morde o lábio inferior
antes de continuar a falar. — Um amor não deve esperar que o pior aconteça
para ser provado que é verdadeiro, ele não precisa sempre estar em uma
batalha. O amor, Logan, ele precisa de paz, ele precisa florescer em campos
que não vão ser pisoteados toda vez que uma briga acontecer. O amor é
forte, mas não é invencível. E o nosso está cansado disso, ele está cansado
de tantas batalhas, de tanto sofrimento.
— O que você quer dizer com isso, Verônica? — questiono com uma voz
vacilante.
— Que eu amo você com todo o meu coração, capitão! — Vee solta um
sorriso, um sorriso lindo, enquanto outra lágrima desce. — Mas eu estou
cansada de nos colocar frente a uma guerra que não somos responsáveis, e
por isso, eu te prometo, Logan, que eu vou voltar para você, eu voltar para
Saint Vincent. Mas antes, eu preciso terminar isso, preciso acabar com tudo
o que nos mantém estagnados. E mesmo que isso demore, mesmo que eu
precise abdicar do meu sobrenome para que possamos ser felizes, eu irei até
você capitão, porque uma vez eu havia te dito que não éramos heróis, e se
for preciso que eu volte a ser a vilã, a ser cruel para manter você em minha
vida, eu farei isso!
— Eu amo você, anjo, faça o que precisa fazer e volte para casa! — digo,
devolvendo o sorriso.
— Boa noite, capitão!
— Boa noite, anjo!
Sou imparável, Sou um Porsche sem freios
Sou invencível, Sim, eu ganho todos os jogos
Sou tão poderosa, Não preciso de baterias para funcionar
Estou tão confiante, sim, hoje eu sou imparável
Unstoppable | SIA

Quando finalmente desligo o telefone e observo a cobertura atrás de mim,


sinto o frio, não o frio que está lá fora, mas um frio diferente, daqueles que
junto, traz um vazio incorrigível. As enormes janelas de vidros que vão do
teto ao chão, dando uma vista privilegiada do Central Park, não são
convidativas mais. Volto a encarar as luzes da cidade, retiro meu salto e
caminho até a borda de proteção. A neve cai lentamente sobre a cidade,
contribuindo para a formação de uma paisagem digna de cartões postais. As
buzinas ressoam pelas ruas, mesmo já sendo tarde. Uma lufada de ar gélido
atinge o meu corpo, mas o frio de inverno não me incomoda, é como se ele já
fizesse parte de mim, como se meu corpo estivesse voltando a ser inerte de
emoções, como se a pouca felicidade que eu havia construído estivesse
sendo arrancada de mim.
As armaduras estavam voltando a seus devidos lugares, as máscaras
postas e a frieza percorrendo minhas veias.
Eu nunca conseguiria me sentir em casa como da última vez que estive
aqui, sempre me sentiria como uma intrusa em uma das propriedades do meu
pai, mais um lugar que continha o sobrenome Blackwell na escritura, mas
não poderia chamar de lar. Porque eu aprendi nesse meio tempo que passei
em Saint Vincent que lar é mais que apenas um lugar que você pode deitar a
cabeça no travesseiro e se proteger dos perigos que rondam a sociedade.
Lar é saber que quando nos sentimos cansados e fracos, nós temos um
lugar para voltar. É saber que quando todo o peso do mundo recair sobre
nossas cabeças, teremos a quem recorrer. Porque lar não precisa ser
necessariamente um objeto, um ambiente, ele pode ser como o meu, feitos de
átomos e que possuem corações gigantescos.
Meu lar são meus amigos, minha família.
E mesmo que uma parte deles estejam aqui comigo neste ambiente frio, a
outra está onde nós pertencemos, esperando que um dia eu volte.
E, por Deus, é o que eu mais desejo. Eu faria tudo o que eu disse a Logan,
eu lutaria para que toda essa situação acabasse, para que eu pudesse voltar a
cidade que um dia eu chamei de minha ruína, mas que na verdade, sempre foi
o meu paraíso.
— Você está parada aí a tempo suficiente para me preocupar! — A voz de
Dylan faz com que vire a cabeça e o encontre atrás de mim com os braços
cruzados. Ela já havia trocado sua roupa e abandonado os jeans e a camisa
de antes por calça moletom e uma blusa surrada verde e branca do New York
Jets.
— Você gostava de morar aqui? — pergunto, cruzando meus braços e
encarando a paisagem. — Antes de voltarmos a Saint Vincent.
— Eu sempre soube que nossa estadia aqui era temporária. Mesmo que eu
soubesse que Saint Vincent sempre nos traria lembranças ruins, eu não deixei
de enxergá-la como nossa casa — ele diz calmamente, enquanto passa os
braços pelos meus ombros, fazendo com que me encoste nele. — Acho que
você também tinha esse pensamento, mas estava afundada em seu próprio
sofrimento para perceber isso.
— Eu me anulei tanto depois que ela morreu, Dylan... — confesso. — Eu
deixei de viver, de enxergar a felicidade, porque me culpava das nossas
últimas brigas e agora eu me pergunto se valeu a pena, se valeu todas as
noites que me auto sabotei para que a memória dela existisse.
— Nós sempre te dissemos que você não era a vilã, que deveria seguir
sua vida, Vee! Você não teve culpa de nada, não teve culpa pelas escolhas da
nossa irmã. — Ele beija o topo da minha cabeça. — E não teve culpa por se
apaixonar por Logan, todos nós sempre soubemos que foram feitos um para o
outro.
— Agora eu sei disso... — Solto um sorriso fraco. — E eu preciso fazer
com que papai pare de ser tão ambicioso a ponto de achar que a empresa é
mais importante que a felicidade da sua própria família.
— Nem tudo está perdido! — Ele suspira e se prepara para ir em direção
ao segundo andar. — Amanhã é o dia que odiamos.
— Eu sei… e ela está vindo! — sussurro, abraçando meu próprio corpo.
— Eu sei, ela é a sua última jogada. — Dylan solta um sorriso de vira
para subir as escadas.
Solto um suspiro aliviado e me viro para seguir pelo mesmo caminho que
Dylan havia traçado poucos minutos atrás. Quando piso em meu quarto nada
é familiar, a decoração harmônica, a falta de cores e as caixas espalhadas
pelo piso, me fazem querer correr em direção oposta a esse ambiente. E
exatamente por isso, apenas pego um pijama de cetim preto e entro no
banheiro para um banho rápido. Quinze minutos mais tarde, caminho para
fora do meu quarto e vou em direção ao de Edmund.
Observo a porta entreaberta no final do corredor e entro sorrateiramente,
meu irmão está sentado em sua cama com um tablet em mãos e quando me
vê, ele sorri abertamente, puxa o edredom escuro e indica para mim deitar
ao seu lado. Eu não preciso usar palavras, não preciso me explicar, ele
apenas sabe que quando apareço em seu quarto em uma noite assim, é porque
meus pensamentos me consumiram ao ponto de não conseguir dormir.
— Você está bem? — ele pergunta quando se ajeita ao meu lado.
— Eu vou ficar — sussurro, sumindo entre os enormes edredons. — Você
está feliz, Ed?
— Felicidade possui muitas vertentes, Vee… — meu irmão diz em voz
baixa, deixando o tablet de lado e se virando para mim. — Mas acredito que
estamos no caminho certo para encontrar a nossa!
— Eu espero que sim, Ed... — confesso, me ajeitando no travesseiro e
fechando os olhos. — Porque já vivemos na escuridão por tempo suficiente.
— Você vai encontrar a sua felicidade, eu prometo isso a você, Vee! —
meu irmão sussurra, deixando um beijo rápido em minha testa.
— Eu já encontrei, Ed, eu só preciso garantir que ela não será tirada de
mim! — murmuro de volta.
Nós merecíamos viver sem receio de ter que sofrer, sem precisar se
preocupar com o que poderia acontecer no próximo momento.
E eu faria que isso acontecesse.

Quando desci para a cozinha na manhã seguinte, eu não esperava encontrar


Mada parada em frente ao balcão segurando uma caixa azul e branca da
doceria que amávamos. Ela sorri gentilmente para mim, como se soubesse
que eu precisaria dessa carga extra de açúcar para aguentar um dia ao lado
de meu pai. Quando retiro a tampa e o cheiro doce invade as minhas narinas,
meus olhos brilham. Três Donuts com confetes coloridos estavam ali,
prontos para serem devorados.
— Eu não sei o que faria sem você, Mada! — profiro, levando um deles
até meus lábios.
— Eu imaginei que precisaria deles depois de ter sido obrigada a voltar
para essa cidade — ela confessa com a voz aguada, mesmo que eu soubesse
que estava fazendo aquilo porque hoje é um dos piores dias para nossa
família.
— Eu não sabia que viria para cá — digo enquanto passo a língua pelos
meus lábios. — Achei que ficaria em Saint Vincent para cuidar da casa.
— Quando soube que estavam voltando, eu conversei com o Senhor
Blackwell e ele me permitiu vir cuidar de vocês! — comenta, se virando e
indo até a geladeira. — Vocês não durariam dois dias aqui sem uma das
minhas refeições, doce Vee.
Eu solto um sorriso fraco que não chegou até meus olhos e antes que
pudesse responder algo, Dylan e Edmund entram na cozinha e sorriem para
Mada, ela apenas os encara com as sobrancelhas erguidas e solta um bufo.
— Eu limpei a bunda de vocês três e nenhum teve a coragem de me dizer
que estavam me abandonando em Saint Vincent? — ela questiona para meus
irmãos, com uma falsa careta.
— Você odeia aviões, Mada! — Ed diz sorrindo e indo até ela para
abraçá-la.
— Não arrume desculpas, seu ingrato! — xinga enquanto passa os braços
pelo corpo magro de meu irmão e o aperta.
— Nós estamos prontos para ir até a sede da Blackwell Enterprise, Vee...
— Dylan fala hesitantemente, quando se senta ao meu lado. — Saímos em
alguns minutos.
— Eu preciso apenas me trocar... — respondo, deixando o doce sobre a
caixa.
Não é uma tarefa fácil enfrentar meu pai em um dia como hoje, mas eu
faria. Mesmo que hoje, durante o aniversário de Sophie, minhas armaduras
não estivessem fortes o suficiente e minhas feridas visíveis. Mas eu faria
isso por meu irmão, eu acabaria com tudo isso, me manteria de pé e forte.
Depois de finalmente me arrumar em meu closet e retirar de lá um salto
preto e um vestido da mesma cor com alguns brilhos na parte das costas, que
ficariam ocultos pelo casaco branco que eu carregava em uma das minhas
mãos, enquanto a outra estava ocupada com minha bolsa, desço novamente
para o primeiro andar, onde Ed e Dylan já estão me esperando na sala de
estar. Sem dizer nenhuma palavra, nós seguimos em direção ao elevador, não
havia carros aqui e tinha a certeza de que meu pai não mandaria um de seus
motoristas nos buscar. Por isso não me surpreendi quando um táxi estava à
nossa espera em frente ao prédio.
O caminho é feito em silêncio, nenhum de nós estava com ânimo para
dizer algo, não quando estávamos presos em nossa própria bolha de
memória, quando a noite da tempestade estava clara em nossa mente, como a
neve que caía de fora do carro.
O taxista estacionou em frente ao enorme arranha-céu na 34th Street. O
prédio é todo espelhado e quando entramos no saguão onde dezenas de
pessoas corriam de um lado para o outro sem se importar com alguém além
de si mesmo, não paramos na recepção, todos eles nos conheciam, todos
sabiam quem éramos e por isso, apenas seguimos para o elevador privativo
e um dos seguranças nos acenou brevemente antes das portas se fecharem.
— Eu odeio esse lugar! — Ed exclama, guardando seu telefone no bolso
da calça e se encostando na parede de metal espelhada.
— Todos nós odiamos! — Dylan devolve suspirando fundo.
Assim que as portas se abrem novamente, nos dando a visão da enorme
recepção, é a minha vez de respirar fundo. Enquanto caminhamos até onde o
secretário de papai estava, observamos de relance algumas funcionárias
olharem impressionadas para meus irmãos e algumas arrastarem seus olhares
para mim com um torcer de nariz. Eu sabia que não havia causado uma boa
impressão nas vezes que estive aqui e talvez seja por isso que eu realmente
levava o título de princesinha mimada por cada ser vivo deste andar e talvez
até mesmo por toda Nova York.
Sorrio para o homem sentado atrás de sua mesa, que ergue a sobrancelha
para nós três e depois solta um suspiro exasperado, sabendo que seu dia
ficaria bem ruim quando nós saíssemos daqui e o deixássemos lidar com
nosso pai. Então seguimos em direção a sala no final do corredor,
observando todas as revistas emolduradas onde nosso pai ou nossa família
estavam estampadas na capa. E quando finalmente chegamos em frente as
portas fechadas da maior sala de todo o andar, apenas a empurro.
— O que vocês estão fazendo aqui? — Meu pai ergue os olhos dos papéis
que estavam sobre sua mesa e depois encara o homem que estava ao seu lado
segurando algo. — Depois continuamos Alexander!
— Claro, chefe! — Ele nos encara e solta um sorriso aliviado por ser
liberado. — Blackwells!
— Agora vocês três podem responder a minha pergunta? — ele grunhiu
em nossa direção sem nos dar a chance de responder ao cumprimento de seu
diretor de operações.
— Tendo um momento de família! — Sorrio friamente enquanto jogo meu
casaco e minha bolsa sobre a poltrona à sua frente. — Não era isso que
queria quando me obrigou a voltar, papai?
— Eu não os chamei aqui… — ele começa, mas é interrompido.
— Eles não precisam de permissão para entrar nesta empresa! — Uma
voz harmoniosa e autoritária ressoa atrás de mim. — Porque, pelo que me
lembro, Jonathan, meus filhos têm mais direitos aqui do que você!
Eu me viro lentamente, sorrindo, para encontrar o rosto sério de mamãe.
Observo o quão bem ela está vestida. Seu vestido azul royal moldava todo o
seu corpo curvilíneo. O louboutin em seus pés me diziam que ela estava
pronta para a batalha. Os cabelos escuros estavam presos em um rabo de
cavalo e quando seus olhos, que são idênticos aos meus, me encararam, um
suspiro aliviado sobe pela minha garganta.
Ela caminha até onde estamos e beija a minha testa e depois as de meus
irmãos, mas quando se vira para meu pai, ela caminha a passos rápidos, joga
sua bolsa em cima da cadeira e escora as duas mãos na borda da mesa, se
inclinado.
— O que você tem na cabeça de chantagear a nossa própria filha para se
casar com um Wright, Jonathan? — ela praticamente grita.
Ed dá dois passos para trás e fecha a porta, impossibilitando os
funcionários de escutarem a conversa, porque nós sabíamos que nada bom
sairia dessa sala.
— Eu fiz o necessário para que ela criasse juízo! Você realmente acha que
eu deixaria nossa filha continuar com o romancezinho com aquele garoto? —
Ele se levanta e fica cara a cara com minha mãe. — O mesmo que mentiu
para ela, que escondeu a merda que Sophie estava fazendo.
— Não fale de Sophie! — ela explode, o encarando com fúria. — Não
quando você perdeu todo o direito de agir como pai, quando fez com que
todos escondessem as consequências da morte dela!
— Não haja como se fosse uma santa, Amber, você também é responsável
por toda a ruína dos nossos filhos! — ele desdenha, se sentando novamente e
arrumando a gravata.
— A diferença entre mim e você, Jonathan, é que eu aprendi com meus
próprios erros! — minha mãe exclama, arrumando as madeixas que caíam
pelo seu ombro e respira fundo. — Eu procurei evoluir, apoiá-los e ajudá-
los a superar a dor de uma perda. E você? O que você fez, além de se sentar
aqui e se esconder do mundo atrás de seus ternos caros e suas atitudes de
merda?
— Eu mantive essa família de pé! — ele se exalta mais uma vez. — Eu
tirei Verônica das dezenas de confusões que ela se meteu durante esses anos,
eu lidei com as merdas que sua família carregou, lidei com Edmund e Dylan,
enquanto você fazia o papel de mãe arrependida! — Meu pai inclina a
cabeça para o lado e sorri friamente. — Um papel que não fez com
perfeição, porque fugiu para Milão depois que todas as merdas foram
varridas para debaixo do tapete.
— Você está errado! — ela grita e aponta para nós três, que agora
estávamos escorados no sofá, apenas observando a briga. — Eu estive lá
quando Verônica acordou assustada por conta dos pesadelos, eu estive lá
quando Edmund se trancava no quarto porque não conseguia falar sobre
aquela noite, e quando Dylan quis carregar todo o mundo nas costas, porque
não conseguiu salvar sua irmã! Eu estive Jonathan, eu, mais ninguém!
— Você quer o quê? Que eu te dê os parabéns por finalmente agir como
uma mãe? Ou que eu diga que não estava lá, porque sempre que pisava em
minha própria casa, a voz de Verônica e Sophie quando crianças sorrindo,
invadiam a minha mente; que eu sempre ia até o quarto dos três para saber
que eles estavam bem e não tinham morrido também junto com sua irmã? Ou
que eu fechei a merda desse acordo porque sei que é o melhor para a minha
filha! — ele grita e eu arregalo os olhos pela confissão dele. — Bem,
Amber, eu te digo, eu agi como um pai de merda, mas se isso significa que
meus filhos estão bem, eu não me importo!
— Isso não me surpreende, principalmente porque hoje é aniversário de
morte de nossa filha e cá estamos nós em uma briga, quando deveríamos
estar juntos, superando isso, porque todos nós estamos machucados! —
mamãe devolve. — Mas obrigar sua filha a se casar com Oliver por conta de
um acordo entre dois homens desprezíveis, isso, Jonathan, eu nunca esperei
de você!
— Já fizemos coisas piores, esposa! — ele diz, como se me vender para
obter mais dinheiro fosse normal.
— Não contra nossos próprios filhos! — a voz de minha mãe sai
controlada, como se ela entendesse que não adiantava brigar. — Você vai
cancelar este acordo.
— Eu vou? — Ele ergue a sobrancelha. — Verônica se casar com um
Wright a impedirá de continuar a se envolver com pessoas de classe inferior
a ela.
— Não se esqueça que você também era considerado de classe inferior à
minha, Jonathan, e que a única coisa que não o impediu de continuar na parte
baixa de Saint Vincent foi que me casei com você e o meu sobrenome o
assegura de ser prestigiado. — Ela ajeita a sua postura, como sempre fez
quando estava em frente a um cliente importante ou prestes a ganhar um caso.
— Não se esqueça também, marido, que se eu desejar que você seja retirado
da presidência da Blackwell Enterprise, eu tenho o poder de fazer isso,
então não me teste!
— Não me ameace, Amber! — ele rosna em direção a minha mãe.
— Não mexa com meus filhos, Jonathan! — ela devolve no mesmo tom.
— Você tem exatamente um dia para finalizar toda essa merda ou, acredite
em mim, a partir de amanhã essa cadeira será ocupada por outra pessoa!
Meu pai olha em minha direção. Não havia ódio ou qualquer sentimento
negativo, é como se, pela primeira vez, ele entendesse a gravidade de suas
atitudes, como se aceitasse que minha mãe não renunciaria a nossa felicidade
pela ambição dele, que ela, sim, lutaria por nós como ele deveria fazer. Ele
suspirou fundo e olhou para a foto em cima de sua mesa, a mesma que ele
mantinha no escritório em Saint Vincent.
Eu apenas desejava que parasse de nos enxergar como peças em um
tabuleiro sujo e desonesto e passasse a nos ver como filhos, como um dia ele
fez quando éramos crianças.
— Eu preciso de um minuto com meu pai! — exclamo, fazendo com que
todos me olhassem com a sobrancelha erguida.
Mas eles sabiam que eu precisava dar um fim nisso, que essa era uma
batalha que apenas eu e meu pai deveríamos terminar, porque havia
começado comigo, ele e Sophie, quando tínhamos nos apaixonado por
pessoas que não faziam parte dos ciclos sociais que haviam limitado para
nós.
Havia começado quando meu pai se apaixonou por minha mãe quando eles
eram adolescentes, quando Sophie havia entregado seu coração para Aidan e
quando Logan roubou o meu de bom grado, assim como eu fiz com o dele.
E assim que escuto a porta sendo fechada atrás de mim, caminho até a
cadeira à sua frente e me sento na mesma posição que me sentei no escritório
de nossa casa em Saint Vincent há alguns dias atrás.
— Eu não vou perder nosso pouco tempo aqui, pai, então serei direta! —
minha voz sai fria, desprovida de emoções, igual a dele nas dezenas de
vezes que se dirigiu a mim para me obrigar a fazer algo. — Você pode achar
que por defender quem eu amo, por me sacrificar para que fiquem bem, eu
desaprendi a jogar conforme o seu jogo, mas permita-me lembrá-lo de que
vovô me ensinou os melhores movimentos durante uma partida de xadrez e
que eu sou uma jogadora excepcional quando quero! — Levo minha mão até
a mexa do meu cabelo que havia se soltado e a coloco atrás do lóbulo da
minha orelha, logo após minha boca se curva em sorriso controlado. —
Então talvez esteja na hora de usá-las conforme o seu próprio jogo, pai!
— Não brinque com os adultos, Verônica, quando sabemos que não
conseguirá levar isso até o final! — ele desdenha enquanto se escora na sua
própria cadeira.
Eu me levanto calmamente, caminhando até a pequena adega do canto do
enorme escritório, sirvo duas doses de Whisky, mesmo que essa não seja a
minha bebida favorita e volto para o meu lugar, lhe entregando um dos
copos.
— Você mesmo ordenou que eu não agisse como uma pirralha mimada,
papai, estou apenas seguindo o seu conselho. Sendo uma adulta! — exclamo,
me sentando e sorrindo falsamente, como os sorrisos que dava para seus
amigos nas dezenas de festas que fui obrigada a participar. — Mas sabe o
que é engraçado? É que durante a viagem até Nova York eu pensei em algo
que o vovô havia me dito antes de morrer: que ele o odiava o suficiente para
não deixá-lo como dono de tudo.
— Não faça rodeio, Verônica! — meu pai resmunga, seu rosto é
impassível, nada ali me dizia que ele poderia voltar a ser alguém no qual
poderia chamar de família novamente.
— Certo, farei isso! — Movo meu celular para cima da mesa e aperto o
último número. Enquanto a pessoa não atende, observo os olhos que
deveriam me confortar no dia de hoje e não me fazer usar das mesmas armas
que ele estava acostumado a usar. — Bom dia, Doutor Michael, aqui quem
fala é Verônica Blackwell.
— Bom dia, Senhorita Blackwell! — A voz grave do advogado da nossa
família ressoa pelo ambiente agora silencioso. — Como poderia ajudá-la?
— Oh, certo! Ontem à noite, eu solicitei uma cópia do testamento de meu
avô e vocês me enviaram por e-mail… — Sorrio quando vejo a rosto do
meu pai tomar uma cor pálida, como se soubesse o que estava por vir. —
Você pode me confirmar se a informação que está na última linha está
correta?
— A senhorita me incomoda de ler esse trecho para mim? — ele pergunta
hesitantemente. — Estou saindo de uma reunião e não tenho acesso ao
arquivo no momento!
— Claro, um momento, por favor! — Puxo o notebook de meu pai sem
aviso prévio, pegando-o de surpresa e acesso o meu e-mail rapidamente. —
Aqui diz: Aos meus netos, Dylan, Verônica, Sophie e Edmund Blackwell,
deixo os meus cinquenta por cento de ações de capital fechada na Blackwell
Enterprise, fazendo com que, após eles completarem seus vinte e um anos,
sejam os acionistas majoritários.
— Está correta, senhorita! — ele exclama calmamente. — E como a sua
irmã gêmea faleceu, os cinquenta por cento deve ser dividido entre vocês
três.
— Muito obrigada pela atenção, Doutor Michael! — agradeço suavemente
sem tirar os olhos de meu pai. — Tenha um ótimo dia!
Quando ele deseja o mesmo e desliga, eu umedeço meu lábio e volto a
encostar na minha poltrona com um sorriso aberto.
Xeque-Mate, Jonathan Blackwell!
— Mesmo que Edmund ainda não possa mexer em suas ações até o seu
aniversário em Maio, eu tenho certeza de que se contar as minhas ações, a de
Dylan e a de mamãe, junto com as dos meus tios que, vale ressaltar, te
odeiam, você perderá o posto de presidente dessa empresa… — constato o
óbvio. — E nós sabemos que não deseja isso!
— O que você quer, Verônica? — ele questiona irritado, enquanto meu
rosto dói de tanto sorrir em sua direção.
— O que vai acontecer, é simples, pai, você irá cancelar este acordo
ridículo com os Wright, não irá chantagear nenhum de nós, muito mesmo
fazer com que nós nos dobremos à sua vontade e irá passar a mansão de
Saint Vincent para o meu nome e de meus irmãos! — respondi ainda calma,
sabendo que nesta partida, eu sairia com a vitória. — Então você pode ficar
com a presidência da Blackwell Enterprise.
Meu pai me encara por alguns segundos, seu olhar nunca vacila, ele estava
finalmente percebendo que, quando eu desejava, conseguia lutar com as
mesmas armas que os grandes. Porque eu fui criada para isso, criada para
não deixar que ninguém me diga o que eu deva fazer, que não caia nas
pequenas armadilhas da vida e nem que seja fraca quando todos esperam
isso. O homem à minha frente havia me ensinado tudo isso, havia me
ensinado a usar meu sobrenome, meu poder e nunca me ajoelhar perante a
ninguém.
— Contanto que vocês apareçam nos eventos anuais, temos um acordo! —
ele finalmente diz com sua voz autoritária. — Eu irei acabar com o acordo
com Brandon e não me envolverei na vida de vocês outra vez, Verônica!
— Ótimo! — Aceno com a cabeça e me preparo para sair.
Quando abro a porta, meus irmãos estão escorados na parede em frente a
porta do escritório com um sorriso, como se soubessem o que havia
acontecido entre mim e meu pai. E assim que aceno positivamente, eles se
aproximaram e me abraçaram. Minha mãe deixa uma lágrima rolar pelo seu
rosto perfeito e se aproxima de mim, quando Dylan e Ed se afastam.
— Eu tenho tanto orgulho de você! — Ela passa a mão pelo meu rosto. —
Você merece conquistar o mundo, minha pequena mulher!
— Eu já tenho o suficiente dele, mãe! — respondo sorrindo.
É a verdade.
Não precisava de mais nada porque eu já tinha minha família, meus
amigos e Logan. E eles são o meu mundo.
— Amber? — papai chama antes que pudéssemos sair do corredor e ela
se vira em direção a voz dele. — Volte para casa, volte para Nova York.
— Eu irei voltar para casa, para meus filhos, para Saint Vincent, porque
você deixou de ser a minha casa quando se tornou alguém desconhecido,
alguém que prefere o dinheiro à família, Jonathan! — ela responde e posso
perceber a dor em sua voz. — A única coisa que ainda me mantém ligada a
você é o contrato que assinamos antes de nos casarmos e os nossos filhos, ao
contrário disso, não somos nada além de desconhecidos um para o outro!
Quando nós nos viramos e saímos do prédio, suspiro aliviada. Eu estava
definitivamente livre. Não havia mais o que me prendia em Nova York.
E pela primeira vez em dias, eu finalmente sorri verdadeiramente.
O aniversário de morte de Sophie, pela primeira vez em quatro anos, não
havia sido um dia em que eu me jogaria nas lembranças ou choraria a noite
toda.
O dia nove de janeiro sempre seria um dia triste em nossa vida, mas hoje
é um sinal de recomeço.
— Aonde você está indo, meu amor? — mamãe pergunta quando estendo
minha mão e chamo um táxi.
Eu a encarei, sorrindo. Não poderia esperar, não mais.
— Eu estou indo para casa, mãe! — digo segurando a porta do carro,
enquanto Dylan e Ed se juntavam a mim.
Ela sorriu de volta e beijou minha testa. Não precisava de mais
explicações.
Porque eu estava indo para Saint Vincent.
A minha casa.
Dois poderiam jogar esse jogo, mas você sempre me vence
Todos antes de você foram uma perda de tempo
Pois é, você me pegou
Break My Heart | Dua Lipa

Nós chegamos a Saint Vincent à tarde.


Assim que o avião pousou e saímos do aeroporto, eu apenas sorri para
Hazel e Summer, que me esperavam do lado de fora, escoradas em meu
carro, que havia pedido para trazerem assim que embarquei. O vestido
vermelho de bolinhas brancas de Hazel ilumina sua pele bronzeada e o
cabelo escuro estava amarrado em um coque bagunçado. Não me surpreendi
quando voltei meu olhar para Sum e encontrei uma T-Shirt vermelha da
Feiticeira Escarlate. Elas sorriram em minha direção com os olhos cheios de
lágrimas e alívio, e correram em minha direção, me puxando para um abraço
em conjunto. Assim que se afastaram, Hazel jogou as chaves em minha
direção e correu até meu irmão, pulando em seu colo, enquanto ele a
abraçava fortemente, como se tivessem ficado anos separados novamente.
Contemplei aquela cena por alguns segundos e então apontei a cabeça
para eles entrarem no carro. Quando deslizei para atrás do volante e senti o
cheiro familiar do couro, deixei que um sorriso se estendesse pelo meu
rosto.
— Como diabos eu consegui ir embora e deixar meu carro aqui? —
questiono, passando a mão pelo volante como se ele fosse a coisa mais
preciosa do mundo.
Meus irmãos e minhas amigas apenas gargalharam com a minha pergunta.
E sem mais, eu acelerei.
Corri pelas ruas conhecidas da cidade, sentindo todo o meu peito inflar de
alegria. Senti o vento bater em meu rosto e o burburinho das vozes fora do
meu carro. De relance, observei as pessoas se abraçando, a alegria da
cidade contagiar e o cheiro familiar me invadir.
Eu me senti quase completa. Quase.
Porque eu sabia que ainda tinha outra coisa que precisava fazer antes de ir
atrás do motivo pelo qual eu ansiei voltar para cá.
Deixei Hazel e Summer no apartamento que elas dividiam com os nossos
amigos e segui em direção ao final da cidade, a parte que tinha muitas
pessoas evitam ir, a parte que guarda memórias, sofrimentos e saudade.
Quando finalmente estacionei e caminhei para fora do carro, suspirei fundo.
Eu já podia observar as centenas de lápides alinhadas pelo enorme jardim.
O lugar é calmo e silencioso e quando parei no portão para caminhar até
onde eu desejava, senti uma pequena dor aguda, uma que se espalhava pelas
minhas veias e ia direto ao meu coração.
— Nós iremos te dar um tempo sozinha lá, depois nos juntamos a você,
ok, Vee? — A voz de Edmund é calma, mas eu ainda podia sentir o toque de
preocupação.
Mas sabíamos que eu precisava fazer isso sozinha, sabia que eu precisava
me despedir dela, precisava enfrentar meus demônios, minhas dores e meu
luto pela primeira vez desde o dia em que a enterramos, e isso nunca foi algo
que eu me imaginei fazer. Quando decidimos que sair dessa cidade era o
melhor para nossa família, eu não quis vir aqui, não quis encarar o que eu
ainda não podia acreditar que havia acontecido com uma das pessoas mais
importantes do mundo para mim. E hoje o sentimento é diferente, eu já não
sinto o vazio, nem a dor, ou as lágrimas que deixei escorrer naquele dia em
diante. Eu já não esperava que Sophie fosse aparecer em meu quarto, me
puxando para que corrêssemos até o antigo escritório, ou que dançasse
comigo como sempre fazíamos, ou não me sentaria em frente a porta para
tentar enfrentar as nossas lembranças, não, eu a deixaria ir.
Havia aceitado que ela havia partido para sempre e que eu deveria
continuar a viver.
Quando cheguei em sua lápide, observei a bailarina esculpida em cima
dela, o símbolo que sempre representaria ela, porque onde minha irmã
estiver, ela estará dançando, fazendo o que sempre amou. Sophie sempre
estará eternizada em nossos corações, ela sempre será parte de nós. E hoje
eu finalmente a estava deixando ir, estava me libertando de toda a culpa que
carrego desde o acidente.
Levanto meu rosto e solto um sorriso ao perceber que esse era o momento
preferido dela, quando o céu ganhava um degradê meio alaranjado,
indicando que o sol estava se pondo. Ela sempre se sentava na sacada de seu
quarto e encarava esse momento, sempre me dizia que o sol estava apenas se
despedindo, indo de encontro com a lua e prometendo que amanhã voltaria e
iluminaria a vida das pessoas como sempre faz.
Meu sorriso foi acompanhado de lágrimas. Lágrimas de saudades.
Lágrimas por tentar preencher o vazio que havia deixado em minha vida e
lágrimas de aceitação, por saber que mesmo que aquele final não era o que
ela merecia, é o final que ela teve e ninguém poderia mudar isso.
Estava tão envolvida em meus pensamentos que não senti quando uma
presença masculina parou ao meu lado. Aidan suspirou e se abaixou para
deixar um buquê de rosas brancas ao lado da foto de minha irmã. Ele
colocou as mãos no bolso de sua calça e não disse nada por alguns segundos,
nós apenas respeitamos o silêncio um do outro.
Apenas ficamos ali, dando adeus a pessoa que amamos. Estávamos
finalmente fechando o nosso último ciclo do luto.
— Eu sinto muito, por tudo o que aconteceu! — ele sussurra com a voz
embargada e eu viro meu rosto em sua direção. Pela primeira vez, eu não vi
o homem que eu abominei durante todo esse tempo, eu vi o garoto quebrado
que guardava suas mágoas, vi o menino que perdeu sua mãe e depois
precisou criar seu irmão e sua irmã, porque seu pai era egoísta o suficiente
para se preocupar com sua própria dor e esquecer dos filhos. Eu apenas o
enxerguei como Logan enxergou diversas vezes.
— Eu sinto muito que você não teve tempo de conhecê-la como eu
conheci! — comento, soltando um meio sorriso, deixando que uma única
lágrima desça pela minha bochecha. — Se ela te amou, Aidan, foi porque
enxergou algo especial em você, não deixe que isso se apague apenas porque
ela não está mais aqui…
— Você era a pessoa que ela mais amava, ela nunca deixava de dizer isso,
e sei que ela errou, mas Sophie sempre foi verdadeira com você, Verônica,
nunca duvide do amor dela por você ou pelos seus irmãos! — ele confessa,
tirando as mãos do bolso e as leva até seus cabelos, bagunçando-os. — E sei
que eu não a merecia, mas ela foi o grande amor da minha vida, mesmo que
da maneira errada.
— Alguns amores não foram feitos para durarem a vida toda, Aidan! —
digo, me abaixo para deixar as flores que havia comprado no caminho para
cá. — E está tudo bem!
— Quando disse a você que não sabia sobre o bebê, eu fui sincero, se eu
realmente soubesse que teríamos um filho, eu teria feito o impossível para
protegê-la de seu pai… — ele murmura, cabisbaixo. — E não espero que um
dia me perdoe por ter machucado sua irmã, mas saiba que Logan não tem
culpa das minhas escolhas, ele não teve culpa de precisar escolher um lado
para proteger. Você foi luz para ele quando toda a nossa vida era escuridão.
— Nós nunca poderemos olhar um para o outro sem conseguir deixar de
enxergá-la, mas Logan é o meu ponto final, é o capítulo que eu esperei que
chegasse. E o amo, amo de uma maneira que faz todas as minhas rupturas se
moldarem nas deles, e se é preciso que precisemos deixar o passado no
passado para sermos felizes. — Umedeço meus lábios, levando meu olhar
até o irmão do homem que contém todo o meu coração. — Então eu farei.
— Você merece o amor dele, assim como ele merece o seu, Verônica! —
Ele sorri e se prepara para ir embora. — Faço-o feliz, por favor!
— Eu pretendo! — Sorrio verdadeiramente.
Observo enquanto ele some entre as inúmeras lápides. Volto minha
atenção para a foto de Soph, ela sorria abertamente e tinha os olhos
brilhantes. Eu me lembraria dela desta maneira, me lembraria das vezes que
fomos cúmplices, das vezes que ela entrava em meu quarto e se jogava sobre
mim e de quando precisávamos de um abraço que só encontrávamos no
braço uma da outra.
Sophie Blackwell é e sempre será eterna em minha vida.
Quando finalmente o sol se pôs e a noite começou a recair sobre a cidade,
eu sinto Dylan e Edmund caminhando até mim e ficando ao meu lado. Meu
irmão mais velho buscou minha mão, entrelaçando nossos dedos, enquanto
Ed apenas encostou sua cabeça em meu ombro e levou sua mão até a minha
outra que estava livre.
— Você demorou a vir aqui... — Ed sussurra.
— Eu não estava preparada, acho — digo fracamente — Eu demorei a
passar por todos os estágios do luto e hoje percebo que finalmente posso me
despedir dela.
— Eu fico feliz que estejamos ao seu lado, Vee. — Dylan me encarou
orgulhoso. — E, principalmente, que tenha dado esse passo.
— Eu não sei qual o motivo te fez finalmente fazer o que nossa psicóloga
nos indicou. — Ed ergue sua cabeça. — Mas eu quero que saiba que poder
contar conosco.
Eu sabia disso, sempre soube.
— Sempre juntos, lembra? — pergunto, soltando um sorriso enquanto nos
abaixamos.
— Sempre juntos! — eles sussurram em uníssono.
Ficamos em silêncio por alguns segundos, apenas encarando a bailarina
em cima da lápide de Sophie. Mas foi Ed que suspirou fundo e disse:
— Eu sinto saudades, Soph... — Ed confessa baixinho depois de algum
tempo. — Às vezes eu entro em seu quarto e imagino que vá entrar pela
porta e brigar comigo, como fazia quando éramos crianças, por estar
invadindo seu espaço pessoal. Às vezes, quando eu me atraso para o jantar,
eu me lembro de quando você sempre guardava o meu lugar, sempre me
esperava para comermos juntos… Agora eu faço isso por você, Soph, eu
guardo o seu lugar ao meu lado e eu te guardo em mim, eu sempre guardarei.
Deixo com que as lágrimas desçam incessantemente pelo meu rosto com
as lembranças dela guardando a cadeira ao seu lado para Edmund, para que
ele se sentasse ao lado dela e frente a mim e Dylan, porque sabíamos que
quando nossos pais brigassem, nós seguraríamos as nossas mãos, nós sempre
estaríamos juntos, sempre.
— Quando eu ganhei o meu primeiro jogo, você e Vee estavam lá… —
Dylan diz com a voz embargada. — Eu estava com medo de decepcionar
nosso pai e você ficou ao meu lado, você me deu força para conseguir a
minha primeira vitória, Soph. Você e Vee entraram na equipe de líderes para
que pudessem me acompanhar em todos os jogos, porque ninguém mais faria
isso por mim. E vocês fizeram, sempre fizeram tudo para nos manter juntos.
E por isso, eu sempre estava ao seu lado nas suas apresentações, sempre
segurava sua mão quando seu medo era maior que sua vontade de dançar,
porque eu queria que tivesse a mesma sensação que tive quando fez aquilo
por mim.
Eu solto um sorriso em meio às lágrimas. Mesmo que doesse dizer um
adeus, um alívio preenchia meu peito, porque ela merecia isso. Merecia
saber que nós sempre a amamos e sempre a amaremos.
— São tantas memórias que temos juntas, que eu não sei qual te dizer
Soph. — Eu umedeço meus lábios e fecho meus olhos por alguns segundos.
— Você sempre foi a minha melhor amiga, a pessoa que eu recorria quando
estava perdida. E nunca imaginei que um dia te perderia, mas você me
ensinou tantas coisas no tempo que nos foi permitido, Soph, você mostrou
que eu deveria amar, viver, criar feridas e me curar. Você esteve ao meu lado
nas minhas maiores experiências, e eu sinto muito que eu tenha apenas me
focado nas memórias ruins durante esses quatro anos, sinto muito que
tenhamos feito escolhas erradas. Mas eu sei que você chutaria minha bunda
para outro universo se eu deixasse de viver porque você não pode, então,
Soph, eu farei isso, farei tudo aquilo que sonhamos em fazer! — Aperto as
mãos dos meus irmãos, em busca de conforto. — Quando tínhamos dez anos
e apresentaríamos nosso primeiro recital, eu tive medo, um medo que me
estagnou no lugar e fez com que quase desistisse de nosso momento. Mas
você segurou minha mão, sorriu e me deu forças. Você me mostrou que os
palcos era o nosso lugar, me mostrou que sempre deveríamos enfrentar
aquilo que queima em nosso peito, você me ensinou a ser forte, mesmo
quando você mesma tinha medo do que o mundo estava reservando para
você. Mas, ainda sim, você nunca desistiu e eu também não o farei.
Solto um sorriso, sentindo as gotas de águas descerem pela minha
bochecha. Olho para a lápide à minha frente, me lembrando de seus olhos
âmbares que sempre me passavam confiança, de suas mãos segurando as
minhas e que foram responsáveis por me acalmar quando algo de ruim
acontecesse em nossas vidas, para a foto da garota que compartilhou comigo
o amor pela dança e por donuts com confetes coloridos, que eram
contrabandeados pela nossa governanta. E por ela, pela minha irmã que um
dia foi independente e doce.
Eu continuaria a dançar, continuaria por mim. Por ela. Por nós!
Eu não estava nem um pouco a fim de correr hoje, mesmo que meus
amigos tivessem me arrastado para cá, com a desculpa de que tínhamos com
que comemorar o meu contrato assinado com o New York Giants, eu
desejava apenas ir para casa e me afundar em uma garrafa de tequila até que
dormisse e não me lembrasse que a garota que nublou meus pensamentos
estava em outra cidade e que estava lutando pelo nosso futuro.
Porra, eu realmente desejava uma bebida nesse momento por não saber
como ela está.
Quando estaciono o carro na minha vaga de sempre, me sento sobre o
capô, esperando que Levi corra até Marcus e ajeite tudo. Observo Summer
vir até mim, ela sorria abertamente, como se estivesse aliviada que eu
realmente tivesse vindo.
Mas a verdade era que eu não tinha muita opção, não desde que Hazel
chegou no apartamento mais cedo e me obrigou a sair da cama. E ela odeia
vir às corridas, minha amiga sem dúvidas preferiria ficar em casa
maratonando Grey’s Anatomy, porque a pequena mulher conseguiu assistir
dezessete temporadas em quase um mês e mesmo assim amava aquilo.
Às vezes eu realmente sentia pena de Dylan, que era obrigado a assistir a
essa série junto com ela e não podia nem reclamar quando estava sangrenta
demais. Porém, eu sabia que ele assistiria outras dezessete temporadas
apenas para vê-la sorrir.
— Você está com uma cara péssima! — Sum diz se sentando ao meu lado.
— Você também não está no seu melhor dia, Miller! — debocho, olhando
para as olheiras sob seus olhos. — O que diabos aconteceu com você?
— Estou passando uma temporada com meus pais! — ela confessa com
uma careta e eu entendo o porquê de estar tão cabisbaixa assim.
— Você não pode o evitar para sempre, sabe disso, certo? — questiono,
cruzando meus braços frente ao corpo.
— Eu posso fazer isso até que ele esqueça essa ideia de sermos mais que
amigos! — Ele solta um sorriso hesitante.
— Mas...
— Boa sorte na corrida, Logan! — Ela me interrompe e saí praticamente
correndo, se esquivando da conversa.
Encaro o lugar onde Summer se enfiou, ela estava entre Hazel e Josh e
ambos gargalhavam para algo que a loira disse assim que chegou. Eu não
estava a fim de ir até lá e conversar, eu só queria que tudo isso acabasse
para que eu pudesse ir para o apartamento ou a fraternidade, o que fosse
mais perto, apenas para descansar até amanhã.
Meu celular apita em um dos meus bolsos e quando retiro de lá e vejo o
nome de Verônica, ergo uma sobrancelha. Ela não falava comigo desde que
me ligou para dizer que não desistiria de nós. Eu sabia que as coisas
poderiam estar feias em Nova York e que provavelmente seu pai estava a
obrigando a participar de qualquer festa grandiosa.

Anjo: Você está pronto para jogar, capitão?

Tento decifrar aquela frase, mas sou impedido por Levi, que caminha
rapidamente até o meu lado, sua respiração é descompassada, como se
estivesse correndo por um bom tempo.
— É a sua vez! — ele disse tomando fôlego, quando não me mexo, ele
ergue uma sobrancelha. — Ande, homem! — Ele escora o cotovelo nas na
janela do motorista quando finalmente entro em meu carro, fazendo com que
a jaqueta subisse um pouco, mostrando o pulso com uma pulseira de couro
que havia ganhado de seu pai. — Não perca essa corrida, eu apostei muito
em você hoje!
— A única pessoa capaz de ganhar de mim está em Nova York nesse
momento, Johnson! — retruco com uma careca e então ligo o carro, dirigindo
até a largada.
Quando estaciono no meu lugar de sempre, observo que meu adversário
ainda não está lá, então apenas me escoro no meu banco e ergo meu celular
para a conversa com Verônica que ainda estava aberta.
O que diabos essa mensagem significa? Eu não estou pronto para jogar, ao
contrário, eu estava farto de jogos. Respiro fundo e me preparo para
começar a digitar uma resposta, mas sou impedido quando um carro para ao
meu lado. O barulho dos motores era familiar demais, então viro lentamente
o meu rosto para o carro ao meu lado. E, puta merda, meu coração quase sai
pela boca quando avisto o Bugatti que estava parado ali. A minha respiração
fica presa na garganta quando observo os vidros da janela descerem
lentamente, me dando a visão dela. Os olhos âmbares brilhavam em
excitação e os dedos delicados apertavam o volante, Verônica mordia o
lábio inferior, que estava pintado de um vermelho escarlate.
Eu queria gritar, queria dizer tantas coisas, mas minha voz parecia ter
sumido. Eu só conseguia admirá-la. A saudade dos dias longe um do outro
pesaram uma tonelada nesse instante e eu estava cogitando a ideia de correr
até o outro lado, tirá-la de seu carro e beijá-la. Porra, eu só precisava tocá-
la para saber que aquilo é real, que conseguiu acabar com tudo por nós, que
meu anjo havia voltado para mim.
Mas quando uma garota apareceu no meio da pista com a bandeira de
sempre, eu soube que aquilo ficaria para depois, porque agora faríamos o
que fazíamos de melhor.
Nós jogaríamos nosso último jogo sujo.
E desta vez, eu nem me importava quem seria o vencedor, contanto que ela
esteja comigo na linha de chegada.
Assim que foi dada a largada, nós aceleramos. Porém, pela primeira vez
desde que começamos com isso, nós não olhamos para o lado, não nos
provocamos, queríamos finalizar essa corrida o mais rápido possível,
porque a única coisa que desejávamos era chegar no final da pista, e poder
matar a saudade que nos consumiu por tempo o suficiente.
Quando Vee, virou o volante, me impossibilitando de ultrapassá-la, eu
sorri. Não porque ela estava competindo, mas porque ela sabia que não
precisávamos de ajudar um ao outro quando estávamos na pista. Então por
isso, esperei que ela relaxasse e quando fez isso, eu a ultrapassei sem pensar
duas vezes.
Era o nosso último jogo, mas não significava que não jogaríamos da
maneira correta.
Na última curva, ela conseguiu igualar nossos carros, fazendo com que
ficássemos lado a lado. E como da primeira vez, eu olhei para o lado,
encontrando aquele sorriso estampado em seu rosto e aquela adrenalina
correndo sob suas íris. A sensação de sermos únicos, imbatíveis, estava de
volta e eu não queria que aquilo acabasse, não desejava que quando
saíssemos de nossos carros, a realidade batesse com força.
Mas quando aceleramos juntos, fazendo com que nossos carros chegassem
à linha de chegada ao mesmo tempo, eu gargalhei. Nunca havia empatado
com ninguém, nunca desejei isso. Mas se ela quisesse uma revanche, eu
faria.
Contudo, não agora. No momento, a única coisa que eu fiz, foi escancarar
a porta do meu carro e sair correndo enquanto ela fazia o mesmo. Quando
estávamos a centímetros de distância, Verônica pulou em meu colo, fazendo
seus cabelos voarem, me dando a imagem de seu rosto perfeito, os olhos
âmbares, as bochechas coradas e os lábios carnudos. Eu queria estender a
mão e dedilhar aquelas pequenas pintas em volta de sua pele, queria tocá-la
para ter a certeza de que não estava sonhando e quando ela soltou um sorriso
iluminado, eu o devolvi.
Devolvi, porque eu estava com saudade de vê-la feliz, saudade de saber
que eu era o motivo dessa felicidade. E mesmo que sentisse medo de ela
estar aqui apenas para se despedir, eu apreciei aquele momento, apreciei o
brilho em seus olhos e o sorriso escancarado em seus lábios.
— Você voltou... — digo surpreso.
— Eu voltei — ela responde ainda com o sorriso estampado em seu rosto.
— Por quê?
— Porque eu precisava vir para casa! — Vee inclina a cabeça para o
lado.
— Nova York é a sua casa, anjo! — digo, mesmo sabendo a resposta.
— Não, capitão... — Ela aproxima a cabeça, me dando a chance de
encarar seus olhos. Aqueles olhos no qual sou apaixonado, aqueles que um
dia foram minha ruína e que agora são a minha salvação. — A minha casa é
onde você e nossa família estiver!
— Seu noivado? — Ergo uma sobrancelha.
— Não existe noivado mais, não existe ninguém, apenas você, sempre
será apenas você, Logan Underwood! — ela diz com firmeza e eu selo
nossos lábios em um beijo cheio de tantos sentimentos. Não me importava se
tínhamos uma plateia, eu apenas me importava com a garota à minha frente.
— Eu amo você, anjo!
— E eu amo você, capitão!
Soltamos um sorriso, um de vários que soltaríamos a partir dali.
E nós sabíamos que poderíamos ter nossos corações quebrados, mas, no
fim, nós sempre encontraríamos o caminho de volta um para o outro. Porque
nosso mundo se colidiu de uma maneira linda e, ao mesmo tempo, perigosa,
trazendo caos e, acima de tudo, poesia.
Uma poesia que coleciona rachaduras e rupturas e que nós dois
consertaremos juntos.

F I M.
E que o destino está te levando para muito longe
E pra fora do meu alcance
Mas você está aqui no meu coração
Então, quem pode me parar se eu decidir
Que você é meu destino?
Rewrite The Stars | James Artur (feat. Anne-Marie)

ALGUNS ANOS DEPOIS


Positivo.
É o que o quarto teste de gravidez me diz.
Talvez eu esteja hiperventilando no momento. Não, talvez eu esteja tendo
um ataque cardíaco. Ou talvez eu esteja sonhando, não sei, apenas não
consigo acreditar e muito menos respirar. Não consigo entender em que
momento entre a minha lua de mel, os playoffs de Logan e a minha
apresentação, nós conseguimos fazer um filho.
Merda. Nós praticamos o ato o tempo todo, é óbvio que em algum
momento isso aconteceria.
— Talvez eu deva fazer mais alguns testes… — comento categoricamente
para as três mulheres à minha frente, Hazel ergue uma sobrancelha, Summer
solta uma lufada de ar e Analu se joga na minha cama, proferindo um
palavrão. E eu apenas indico a pilha de testes que nós compramos no
caminho para a cobertura minha e de Logan em Nova York. — Afinal, um
falso positivo deve ser normal, certo?
— Quatro vezes? — Summer questiona, inclinando a cabeça.
— Faça um maldito teste de sangue, Blackwell! — Analu resmunga,
revirando os olhos. — Vamos até o hospital mais próximo, eu posso até te
emprestar minha identidade, caso não queira usar a sua.
— Você é loira, Parker! — Hazel resmunga do outro lado do meu quarto,
levando um salgado à boca, algo que ela passou a amar de um tempo para cá.
— Eles nunca acreditariam que são a mesma pessoa.
— E você é médica! Aliás, não estou vendo você ajudar com essa
situação. — A loira dá de ombros.
— Não estou ajudando porque cansei de constatar o fato… — Hazel se
levanta, alisa seu vestido colorido e me encara. — Você está grávida e vai
ter um mini Logan ou uma mini Verônica correndo pela enorme mansão de
Saint Vincent em alguns meses, apenas aceite isso.
Eu me jogo sobre a minha cama, fechando os olhos. Ok, isso não é ruim,
eu posso ser uma boa mãe. Eu tenho uma família — bem grande — ao meu
lado. Talvez eu apenas não deva deixar meu filho ou filha com Levi ou
Oliver, eles não são a melhor influência para uma criança. Também devo me
lembrar que não posso deixar esse bebê perto de Analu e sua influência com
baladas. Talvez eu deva me mudar permanentemente para Saint Vincent e
parar de sobrevoar a cidade de um lado para o outro durante as temporadas
de jogos de Logan e talvez eu deva abandonar o balé por ora, pelo menos até
essa criança nascer.
— Ela está surtando — Summer comenta da minha janela, abaixando o
livro que está lendo.
— Devo chamar Logan? — Hazel questiona com a voz abafada, o que me
indica que voltou a comer os malditos salgados.
— Não se atreva — resmungo ainda com os olhos fechados. — Chame
Ollie. — Quando Analu está quase na porta, eu grito, acrescentando: — E
Dylan… Ah, meu Deus, chame Ed também.
— Você não quer postar uma foto no Instagram, não? Será mais fácil do
que achar todos eles nesta enorme cobertura — Parker grita já no corredor.
Eu a ignoro.
Isso ia ser muito chamativo, postar uma foto. Meu nome com o de Logan
estaria nos maiores tabloides antes mesmo dos meus amigos verem as
postagens. E eu preciso contar a Underwood antes de todo o mundo saber,
mesmo que metade de nossa família já saiba.
Levo um enorme travesseiro até meu rosto e tampo meu rosto, suspirando
fundo.
Poucos minutos depois, meu quarto é invadido por meus irmãos e meu
melhor amigo. Mas quando levanto a cabeça, Levi e Josh também entram
despreocupadamente. O primeiro anda até minha cama e se joga nela,
sorrindo abertamente para mim.
— Grávida, uhn? — ela comenta. — Você e Logan levaram a sério o meu
presente de casamento.
— Eu estou começando a desgostar de você, Jonhson! — digo, apoiando
meu cotovelo no colchão e lhe lançando uma careta.
— E eu te amo ainda mais agora que vai trazer um monstrinho para a
família — ele zomba, se esticando e deixando um beijo em minha bochecha.
— Você me ama porque eu irei ficar inchada e emocional? — pergunto
querendo socá-lo.
— Não, eu amo você porque apostei com Logan no primeiro ano da
faculdade quem de nós dois seria pai primeiro — ele confidencia sorrindo.
— Ele me disse que nunca se casaria, tampouco seria pai, então estou
prestes a ficar um pouco mais rico a custas do seu marido.
— Eu realmente odeio você dois juntos — resmungo, me jogando
novamente no colchão.
Oliver se aproxima de Summer, rouba seu livro e ergue uma sobrancelha
para o título. Enquanto Dylan cruza os braços, observando Hazel comer seus
malditos salgados e Ed se joga ao meu lado, deitando a cabeça perto da
minha.
— Como está se sentindo? — ele pergunta calmamente.
— Grávida — respondo baixo. — Eu não sei se posso ser uma boa mãe,
Ed.
— Mamãe deu conta de nós quatro, você consegue dar conta dele — ele
comenta sorrindo. A menção a Soph, mesmo que indiretamente, me faz sorrir,
ela ficaria feliz em saber que teria um sobrinho ou sobrinha. E mesmo depois
de anos, sei que ela ficaria ainda mais feliz em saber que finalmente estou
bem.
— Eu acho que é ela. — Levi comenta do meu outro lado. — A nova
Princesinha Blackwell.
— Eu acho que são gêmeos. — Josh diz pela primeira vez.
— Oh, meu deus! Onde está meu marido? — pergunto, emocionada por me
lembrar de minha irmã.
— Ele tem um jogo hoje, Pequena Blackwell! — Oliver responde do
outro lado do quarto. — Um no qual todos nós deveríamos estar indo neste
momento.
Merda, o jogo.
Me levanto e ando até minha bolsa, procurando meu celular, e quando o
encontro, pego e deslizo para o aplicativo de mensagens, vendo que tem
algumas de Mel e várias outras de Logan.
Eu fiquei tão preocupada com os testes que havia esquecido que hoje é dia
de jogo e que todos nós deveríamos estar nesse momento chegando ao
estádio. E com o trânsito de NY, sem dúvidas, se sairmos agora chegaremos
atrasados.
Então me ocorreu que eu poderia usar esse jogo para dar a notícia para
ele.
Um momento em que sei que será especial para ele.
— Eu preciso do meu uniforme de cheerleader! — exclamo indo até meu
closet, seguida por todos meus amigos.
— Gravidez afeta a memória, Smith? — Analu pergunta.
— Óbvio que não! — Hazel responde ainda olhando para mim.
— Então por que, diabos, Verônica está indo atrás de seu uniforme de
líder de torcida, se todos nós já nos formamos? — é Levi que pergunta.
Reviro os olhos, já retirando o traje do cabide e indo até meu banheiro.
Emito uma careta para todos não me seguirem e quando volto meia hora mais
tarde, vestindo as cores da SVU e um tênis branco, todos meus amigos estão
na sala de estar, e alguns deles usam uma blusa da nossa antiga universidade
que guardamos no quarto de hóspedes, Dylan está vestido com seu uniforme
do time e Hazel com o mesmo uniforme que o meu. Solto um sorriso,
ajustando meu laço na cabeça.
— Vamos até aquele estádio contar ao meu capitão que nossa família irá
crescer.
O estádio está lotado quando chegamos.
Estaciono o meu carro na vaga de equipe, seguida do carro de Dylan e de
Ed. Quando todos nós estamos fora dos automóveis, podemos escutar alguns
paparazzis nos chamarem e alguns flashes sendo disparados. Todos nós
ignoramos, seguindo para a entrada lotada de seguranças.
Assim que estamos dentro, seguimos para a área do estádio. Está quase na
hora do intervalo e nós nos preparamos para entrar juntos. A minha agente e
a de Logan caminham até mim com uma caixinha preta com um laço escuro
em cima e me entregam. Eu sei o que está ali, porque nós ligamos para elas
quando saímos da cobertura e pedimos que alguém arrumasse aquilo o mais
rápido possível.
Quando o intervalo começa, o time se prepara para ir ao vestiário. E
quando o vejo, minha respiração fica presa na garganta. Logan ainda
continua o mesmo de anos atrás, seus olhos azuis são intensos e cristalinos,
seu cabelo preto está suado por conta de todo o esforço no campo e o
capacete está em uma das suas mãos. Ele leva uma mão até a testa, retirando
o suor, e inclina a cabeça em confusão quando me vê parada ali, vestida
como uma líder de torcida.
Um sorriso nasce em seus lábios e quando começo a caminhar em sua
direção, ele faz o mesmo. E é como há anos atrás, quando nosso time vencia
a temporada de jogos universitário e nós nos perdíamos um no outro, como
se nunca fosse suficiente.
E quando seus olhos criam uma conexão com os meus, eu sei que nunca
será suficiente. Nós sempre estaremos viciados um no outro, sempre
procuraremos encaixar nossas partes quebradas no quebra-cabeça que é o
nosso coração.
— Oi, anjo.
— Oi, capitão.
— Eu quero saber o por quê de você estar vestida como uma cheerleader,
segurando um presente e nossos amigos estão vestindo como se fossem
universitários novamente? — Logan pergunta ainda sorrindo para mim.
Eu solto uma gargalhada quando olho por cima do ombro e Levi levanta
os dedos em um positivo, me incentivando a continuar a contar.
— Eles são a minha comitiva de apoio.
— E por que você precisaria de uma comitiva de apoio, anjo?
Suspiro fundo. Uma, duas, três vezes.
— Porque nós seremos pais e talvez eu tenha surtado quando descobri.
Logan arregala os olhos e quando abro a caixinha, tirando de lá dois
chaveiros, um com uma sapatilha de balé rosa e outro com uma bola em
formato de uma Wilson, ele sorri abertamente, depois dá um passo em minha
direção, segura minha cintura e me gira.
— Nós teremos um filho?
— Ou uma filha — respondo quando ele finalmente me leva ao chão
novamente. — Mas, sim, nós seremos pais, capitão.
— Eu amo você, anjo.
— Diga isso novamente quando eu estiver inchada e emocional, por favor
— digo mordendo o lábio inferior, encarando seus olhos.
Aqueles malditos olhos azuis que me conquistaram desde que tínhamos
dezesseis anos e que agora me conquistam a cada vez que se fixam aos meus.
Aqueles olhos azuis nos quais eu vi novas versões de nós, que se curaram
de feridas incuráveis e que agora brilham em apenas um sentimento: amor.
— Eu direi isso para sempre, anjo!
E eu acredito nisso.
Porque nós nos fizemos lembrar de sentir o céu, mesmo em dias não
coloridos.
ALGUNS ANOS DEPOIS

Caminho entre as inúmeras fileiras do teatro da academia de dança em


Saint Vincent, a gravata do terno se enrola em meu pescoço, fazendo com que
a todo momento eu precise ajustá-la. Sem dúvidas minha sogra escolheu a
pior peça de todo a sua coleção para mandar para mim. Olho de relance para
baixo enquanto corro até a porta de entrada dos camarotes e percebo que as
luzes no palco ainda estão apagadas, o que me indica que o espetáculo ainda
não começou e que ela não irá me xingar por ter me atrasado pela primeira
vez em sete anos.
A primeira pessoa que vejo quando finalmente entro na enorme sala
reservada para a família e os nossos amigos, é Levi. Ele mantém um copo de
whisky em uma de suas mãos livres e sorri em direção a Edmund, que
gesticula para que ele foque no que está dizendo. Os dois estão vestidos à
caráter para o evento e eu agradeço aos céus por não ter sido o único a ter
que abandonar as minhas roupas habituais. Ao seu lado, Oliver está
abaixado conversando com uma pessoa bastante conhecida, sua companhia
lança uma careta em sua direção e depois mostra algo em sua mão, como se
estivesse mostrando o objeto mais raro do mundo, e quando a conversa
parece ficar entediante o companheiro de Oliver, ele olha em minha direção
e solta o sorriso mais doce do mundo.
Eu me abaixo, abrindo os braços, já esperando pelo impacto. Seus
cabelos castanhos iguais aos de sua mãe e os olhos azuis como os de sua tia,
me encaram com alegria e saudade, mesmo que fosse apenas dois dias que
havíamos ficados separados. Quando ele corre em minha direção e joga os
braços ao redor do meu pescoço, me abraçando fortemente, tenho certeza de
que o pequeno terno irá se amassar se ele não sossegar em meu colo.
— Papai! — grita quando o levanto do chão, ajeitando-o em meu colo. —
Você está atrasado.
— Será nosso segredo, ok, capitão? — sussurro no seu pequeno ouvido.
— Eu não acho que posso guardar um segredo da Atena, papai! — ele
confessa como se realmente estivéssemos trocando um segredo, mas sua voz
sai alta o bastante para que a garota em questão o escutasse.
— Você é um bundão, Noah! — Atena exclama parando à minha frente e
cruza os braços, enquanto leva um copo, que eu realmente espero que seja
refrigerante, até seus pequenos lábios.
— Eu posso saber quem te ensinou essa palavra, Atena? — Ergo uma
sobrancelha, já imaginando a resposta.
— Tio Levi, ele diz que você se tornou um bundão depois que se casou
com a mamãe! — Ela termina de beber o líquido e depois olha para mim
com as sobrancelhas erguidas. — O que é um bundão, afinal, papai?
— Pergunte a sua mãe, princesa! — Solto um sorriso para ela. — E diga
que tio Levi te ensinou essa palavra.
Ela solta um sorriso que sabia que significava encrenca e se vira
caminhando calmamente pela sala, fazendo com que a borda do vestido rosa
e preto se arrastasse pelo chão. O cabelo preto cai em cascatas pelas
pequenas costas e quando chega perto de Levi outra vez, ela arruma a
pequena tiara de pérolas no topo de sua cabeça e me encara, os olhos azuis
idênticos aos meus estão cheios de significados que apenas nós dois
entendemos.
— Ela vai arrumar problemas… — Noah sussurra em meu colo.
— Ela vai, capitão, ela vai! — sussurro de volta, mantendo o olhar em
minha filha, que agora está no colo de Levi.
Atena é a cópia perfeita de Verônica, desde a maneira de agir à
fisionomia. E isso fez com que se tornasse a protegida de todos os seus tios e
de todos os meus companheiros do New York Giants. Minha filha os tinha à
seus pés desde que era apenas um bebê. E ela sem dúvidas estava se
tornando a próxima Princesinha Blackwell.
Olho para o garoto em meu colo, ele me lembra meu irmão quando éramos
crianças. O olhar sereno, as poucas palavras e uma calma absurda para lidar
com sua irmã, mesmo que fosse apenas quinze minutos mais velho que ela.
Noah pode ser parecer com Aidan na fisionomia, mas a personalidade, sem
dúvidas, é de seu tio Edmund. O tio no qual ele é mais próximo. Beijo o topo
de sua cabeça, assim que o coloco no chão e o observo correr para o colo de
Ed, que o pega e o gira no ar, fazendo com que o meu pequeno gargalhe.
Quando me aproximo das enormes janelas do teatro, Oliver vem em minha
direção, uma taça de Champagne está em uma das mãos e a outra ele carrega
o celular. O terno sob-medida é impecável, e eu tenho certeza de que Amber
também foi responsável por vesti-lo essa noite.
— Se a Pequena Blackwell descobrir que chegou atrasado logo hoje, ela
irá te matar! — Ele sorri maquiavélico em minha direção. — E não de uma
maneira convencional.
— Quando você diz Pequena Blackwell, eu nunca sei se está falando da
minha filha ou da minha esposa! — debocho, dando de ombros. — E ela não
me matará, porque sabe que meu voo atrasou.
— Vá com calma, Underwood, eu ainda estou me acostumando que
temos uma nova Blackwell na família! — Ele sorri e olha em direção a Levi,
que brinca com Atena. — Não vejo o momento dela colocar SVC e SVU aos
seus pés, como a mãe dela fez.
— Não dê ideias a ela, Atena só tem três anos, Wright! — O encaro com o
semblante fechado. — Pelo amor de Deus, se minha filha for um terço do que
Verônica foi, nós estaremos bem encrencados.
— Ela é uma Underwood-Blackwell, Logan, problemas estão no sangue
dela! — Oliver exclama sorrindo, enquanto leva a taça até seus lábios.
— Não se esqueça que você poderá ter filhos num futuro próximo, Oliver!
— Dou de ombros.
— Minha quase esposa prefere os filmes às pessoas, estou bem tranquilo
em relação a isso! — ele debocha, soltando um sorriso em minha direção.
Antes que eu pudesse dizer algo, as luzes do palco se acendem, fazendo
com todos nós caminhássemos até nossos devidos acentos e nos preparamos.
Atena corre até mim e se senta em meu colo, apoiando a cabeça em meu
peito, enquanto Noah vai até Dylan, que faz o mesmo com meu filho.
Sorrimos assim que Melany aparece no centro do palco e sorri em nossa
direção ao mesmo tempo que Hazel, Analu e Summer adentram o camarote e
caminham até seus próprios lugares.
Assim que elas se sentam, a luz do palco volta a se apagar e acender,
Verônica aparece ao lado de Melany com um traje rosa e preto idêntico ao
de minha irmã. As duas se encaram sorrindo e assim que uma melodia suave
começa a ressoar pelo enorme teatro, elas se movimentam lentamente, a
intensidade de Verônica intercala com a suavidade de Mel, fazendo com se
tornem uma dupla impecável. Cada movimento sincronizado, cada passo
coreografado.
E como na primeira vez que as assisti, é lindo, intenso e poético.
Verônica gira rapidamente para o lado esquerdo, enquanto minha irmã vai
para o lado direito. Luzes coloridas passam por elas, formando linhas
coloridas em volta de suas curvas, fazendo com que o espetáculo fique ainda
mais incrível, e mesmo que elas sejam consideradas as melhores bailarinas
do condado, eu só consigo ver as duas mulheres que ensaiavam em uma
academia de dança que fazia parte de nossa história, que superaram seus
medos e suas inseguranças.
Vejo a mulher que eu amo, fazer do palco sua morada, como sempre
deveria ter sido. Observo como ela amadureceu durante esses anos, como
curou cada ferida, superou suas dores e fez delas um motivo para continuar.
Porque Verônica continuou dançando, mesmo quando achava que não
conseguiria. Ela foi forte, foi guerreira e eu me orgulhava por estar ao seu
lado, por ela ter me dado a dádiva de dividir uma vida ao seu lado.
Quando elas terminaram e todo o teatro se levantou para aplaudi-las,
ambas olhavam para o nosso camarote e sorriam. Porque nossa família
estava ali, apoiando-as, todas as pessoas que elas se importavam as
aplaudiam de pé e continuaremos assim, até o fim.

— Onde, diabos, você está me levando, Logan? — Verônica questiona


quando estaciono o Porsche em frente ao parque da cidade.
Havia vendado seus olhos quando saímos do teatro e a obrigado a ficar
assim até o nosso destino final. E enquanto caminhamos calmamente pelo
parque vazio, tomo cuidado com as pequenas pedras no caminho, por conta
dos saltos de suas botas. Ela segura minha mão fortemente, com medo de
tropeçar e cair, mas quando paro em frente à enorme roda gigante, que girava
calmamente e emitia as luzes coloridas, eu me coloco atrás dela e retiro
lentamente a sua venda.
Verônica pisca uma, duas, três vezes, tentando acostumar seus olhos às
inúmeras luzes brancas que compunham a decoração à nossa frente. E
quando finalmente tem sucesso, encara o lugar com um sorriso lindo. À
nossa frente há uma enorme mesa decorada com flores que eu não fazia a
mínima ideia do nome delas, atrás do objeto de madeira, nossos amigos
estão todos em pé, segurando suas próprias taças, sua mãe segura Atena em
seu colo, que brinca com o colar de sua avó como se ele fosse a peça mais
preciosa do mundo, enquanto minha tia Audrey segura Noah, que levanta os
dedões em sinal de positivo para mim.
Eu respiro fundo algumas vezes e circulo sua cintura fina com meus
braços.
Summer olha para Vee e sorri abertamente, enquanto passo meus olhos por
todos os nossos amigos que estiveram ao nosso lado desde sempre, que nos
ajudaram quando não sabíamos o que fazer, que seguraram nossas mãos
quando achávamos que não merecíamos.
— Eu acredito, anjo — Umedeço meus lábios, levando a minha mão até o
bolso do terno e abrindo a caixinha preta. —, que não há forma melhor de
comemorar nossos quatro anos de casados do que no lugar onde você me
mostrou que tudo é possível, onde nossos caminhos se cruzaram e que eu me
apaixonei perdidamente pela pirralha mimada da parte alta.
— Foi onde o capitão idiota da parte baixa fez com que eu enfrentasse
todos os meus medos — ela sussurra soltando um sorriso lindo. —
Obrigada, Logan, por nunca ter desistido de nós, por ter me mostrado que
vale a pena continuar vivendo.
— Você mostrou isso para si mesmo, anjo, você lutou até se curar! —
Deixo um beijo casto em seu ombro e a solto para caminharmos até nossos
amigos. — E eu amo você por ter sido tão forte.
Verônica apenas sorri para mim, enquanto se dirigia até nossos filhos.
Atena foi a primeira a pular em seu colo. Os olhos azuis brilharam em
direção a sua mãe, enquanto as pequenas mãos foram até as bochechas de
Verônica e as acariciaram, como se Vee fosse a obra prima mais linda do
universo. E eu a entendia, todas as vezes que a encarava, mesmo depois de
anos, ela ainda conseguia me arrancar suspiros, ainda conseguia fazer com
que meu peito disparasse e minhas mãos suassem.
Noah correu em minha direção e pulou em meu colo, colocando sua
cabeça em meu ombro, enquanto estendia a mão para que Atena, que agora
estava ao nosso lado ainda no colo de Vee, e entrelaçou seus dedos nos de
sua irmã gêmea. Como uma promessa, como se dissesse que sempre estariam
juntos, como um dia Soph esteve com Verônica quando ela mais precisou e
Aidan esteve comigo quando achei que eu não suportaria o peso do mundo.
Eles eram o nosso futuro, o nosso capítulo final, porque depois de tantos
momentos em que o mundo fez com que lutássemos para conseguirmos ficar
juntos, nós finalmente conseguimos, nós mostramos que um amor nascido em
uma noite estrelada, sob uma roda gigante, entre dois adolescentes separados
por uma cidade caótica, poderia se perpetuar para sempre.
E agora mostramos ao mundo que sempre seremos o capitão babaca e o
anjo que ama batom vermelho e botas de saltos.
E que sempre seremos os donos dos nossos corações quebrados e, sem
dúvidas, o casal mais caótico de Saint Vincent.
Cuidado com o que você deseja
Estilhaçado no chão frio
Milhões de pedacinhos
Se apaixone e faça guerra
Cuidado com o que você deseja
Estilhaçado no chão frio
Você sabe que fiz tudo isso por você
I'll Make You Love Me | Kat Leon

Respirei fundo uma, duas, três vezes, enquanto passava o olhar pela minha
roupa no espelho. O conjunto branco realça minha pele um pouco bronzeada
pelo clima de Saint Vincent. A pouca maquiagem faz com que meus olhos
castanhos, quase negros, fiquem mais brilhantes e o batom nude me fez
erguer as sobrancelhas. Essa não sou eu.
Nunca seria.
Essa visão que está frente ao espelho é apenas uma que minha mãe
adoraria que eu fosse e que Vee moldou porque eu me apaixonei pelo
conjunto em seu closet quando o vi. E minha amiga, ama fazer isso, ela ama
brincar com roupas e montá-las conforme a personalidade das pessoas.
Porém, enquanto escuto a música ressoar fora deste quarto que eu sei que
está vago desde que Declan Williams se formou no ano passado e nenhum
outro calouro conseguiu a vaga para entrar na fraternidade, eu me sinto como
uma fraude. Não uma fraude daquelas que você olha e sente desgosto, mas
uma que se sente vazia, sem nenhum sentimento para ficar lá embaixo e
comemorar a nova temporada de jogos que está chegando com meus amigos.
Talvez eu devesse virar toda essa garrafa de tequila barata que Verônica
havia roubado da cozinha dos jogadores quando chegamos, talvez eu devesse
ir atrás dela, já que havia sumido poucos minutos atrás quando saí para ir no
banheiro; o que resultou em todos nós procurando Logan e não nos
surpreendendo quando percebemos que ele também havia abandonado a
festa, deixando uma caloura bastante irritada por ter sido trocada na sua
primeira festa.
Mas o que ela não sabia é que o capitão tão aclamado da Saint Vincent
University não havia a trocado por qualquer garota, ele está com a mulher
que consome todos seus pensamentos desde que eram meros adolescente, e
sabemos que quando essa noite acabar, quando ele voltar para o
apartamento, o seu temperamento estará em um nível que não conseguiremos
suportar, porque desde que os irmãos Blackwell voltaram, desde que ele e
Verônica votaram a seus jogos sádicos de provocação, não havia um dia que
tínhamos paz.
Suspiro fundo, deixando Logan e seus problemas para lá. Levo a garrafa
em meus lábios novamente e me viro para caminhar até o quarto, porém,
assim que atravesso o batente do banheiro, a porta é aberta e Oliver Wright
entra suspirando fundo. Ele passa a mão pelos cabelos loiros sujos e suspira
outra vez, quase que cansado. Sua blusa cinza de frio está arregaçada até
seus cotovelos, ele está com a atenção focada em seu celular e ainda não me
percebe aqui.
— Merda, pequena Blackwell, onde você se meteu? — ele resmunga para
si mesmo.
— Eu acredito que você sabe muito bem onde nossa amiga está, Oliver!
— digo me encostando na parede e cruzando meus braços. — Não seja tão
inocente.
Ele dá um sobressalto, finalmente olhando para frente e me encarando.
Seus olhos estão arregalados pelo susto, mas Wright esconde isso
rapidamente e solta um sorriso malicioso em minha direção.
— Por que diabos você está se escondendo em um quarto, loirinha? —
questiona, erguendo uma sobrancelha. — Não me diga, por favor, que tem
um jogador nesse banheiro e que atrapalhei a foda de vocês.
Eu lanço uma careta de desgosto em sua direção e levanto a garrafa de
tequila novamente até meus lábios, bebendo um pequeno gole. Eu não sou de
beber, mas hoje eu realmente preciso do álcool para conseguir passar toda
essa festa sem surtar com algum universitário.
— Não, não há nenhum jogador. Mas você está me atrapalhando a ficar
sozinha, então permita-me dizer que a porta é serventia da casa! — Sorrio
falsamente para ele, apontando para a porta fechada.
— Eu estou fugindo de algumas calouras, então você terá que me suportar
até que eu consiga sair e encontrar o quarto de Logan para entregar a chave
do carro de Verônica, para que eu finalmente possa voltar para casa. — Ele
dá de ombros, balançando o chaveiro do Bugatti de Vee em uma das mãos e
caminha até a porta da pequena varanda.
Suspiro fundo, me juntando a ele, mesmo que ainda não goste da presença
de Wright no mesmo lugar que eu. Ele não é alguém que eu quero perto de
mim ou até mesmo dos meus amigos. Oliver Wright, por mais que tenha uma
beleza assustadoramente encantadora, é alguém que eu sei que não mostra a
verdadeira face para as pessoas, algo dentro de mim me diz que tudo isso é
apenas uma máscara que ele utiliza para esconder o que mantém sob sua
pele.
— Por que não pede a Dylan para levá-lo embora? — pergunto, chegando
até ele e escorando minhas mãos no braço de proteção.
— Porque ele já foi embora com Hazel e Edmund, fiquei para levar a
Pequena Blackwell versão bêbada para casa porque estou com chave do
carro dela. — Ele suspira olhando para alguns universitários bêbados no
primeiro andar. — E agora acredito que eu fiz a pior escolha da noite em
esperá-la. — Oliver ergue uma sobrancelha e se vira para mim. — E por que
você está se escondendo em um quarto vago com uma garrafa de tequila?
— Porque…Verônica e Hazel me abandonaram na pista de dança e eu
estava odiando ficar lá embaixo. — minto. Eu não falaria para Oliver que
estava me sentindo vazia em uma festa repleta de pessoas. — E você por que
está se escondendo aqui?
— Eu já te contei, loirinha, estou fugindo das calouras. — Ele sorri
abertamente.
— Oliver Wright fugindo de uma garota? — Solto uma gargalhada, me
sento no piso da varanda e vejo meu novo companheiro fazer o mesmo. —
Isso é uma fofoca que poderia correr pela SVU amanhã.
Ele sorri puxando a garrafa das minhas mãos e virando em seus lábios.
— Eu não me importo com isso, mas para você saber, eu não estou afim
de transar com ninguém — Ele dá de ombro.
— Não? — Ergo uma sobrancelha, me virando para ele, me lembrando de
que ele estava conversando com uma garota linda quando voltei da pista de
dança.
— Não, estou bem em apenas aproveitar apenas a companhia de uma loira
que me odeia sem motivos. — Ele sorri abertamente para mim. — E você,
por que realmente está aqui? Seja sincera, Sum.
— Eu estava me sentindo… vazia — confesso, deixando meus ombros
caírem. — E sou uma péssima dançarina.
Ele me olha por alguns segundos, espero que ele solte uma gargalhada ou
diga algo irônico, mas Oliver apenas acena levemente, leva a garrafa até os
lábios, ingere uma quantidade considerável e se levanta, esticando a mão
para mim. Mesmo sem saber o porquê, eu a pego, ele me puxa, fazendo com
que nossos corpos quase se colidam e pela primeira vez eu vejo como
aqueles olhos safiras são hipnotizantes e como sua boca se curva em um
lindo sorriso.
— Vamos ensiná-la a dançar, então — ele diz como se estivesse
notificando o tempo.
— Não.
— Sim! — Ele contrapõe e me puxa para o centro do quarto pouco
iluminado. — Vamos lá, loirinha, você não gosta de mim, eu não gosto de
você, mas estamos nos escondendo aqui até que tudo se acalme lá fora para
irmos embora, então por que não aproveitar esse pouco tempo para
aproveitar e te ensinar a dançar decentemente?
— Até onde eu sei, a única dançarina profissional entre nossos amigos…
— Olho para seu rosto com o cenho franzido. — É Verônica.
— Eu sou o melhor amigo dela, o que logo me faz parceiro de dança dela,
então acredite em mim quando eu digo que sei os melhores passos para você
conquistar todos os universitários dessa festa — ele sussurra, virando meu
corpo e colidindo minhas costas com seu peito, sem me dar a oportunidade
de responder.
Prendo minha respiração quando ele me olha de relance, pedindo
permissão com os olhos para me tocar. Eu fico o encarando enquanto penso
na resposta. Não há nada para fazer até que tudo se acalme e eu consiga uma
carona para voltar para casa, porque todos nós sabemos que nenhum Uber
aceitaria uma corrida a essa hora, então por que não aceitar uma aula de
dança, mesmo que ela seja irrelevante, apenas por algum tempo? Suspiro
fundo e assinto levemente com a cabeça.
Mas me arrependo no momento em que suas mãos se fecham em minha
cintura, porque é como se o pequeno toque estivesse soltando a pior das
descargas elétricas por todo meu sistema. Uma música lenta começa a tocar
no lado de fora do quarto e eu apenas fecho meus olhos enquanto Oliver me
diz para me mover lentamente, deixando que a melodia guiasse meus
próprios movimentos. Mas eu não estou mais escutando suas palavras.
Merda, eu apenas sinto seu corpo se mover atrás de mim, seu cheiro me
atormenta e sua voz doce é como um cântico de uma sereia, que me
entorpece, me faz esquecer os segundos, minutos e até mesmo as horas.
— Relaxe seu corpo, loirinha! — ele pede baixinho no pé do meu ouvido.
Não respondo, apenas faço o que ele pede, obrigo meu corpo a relaxar,
enquanto ele move meu corpo em sincronia com a música que toca. Oliver
solta um palavrão quase inaudível e me gira, fazendo com que nossos corpos
voltem a se colidir, ele segura minha cintura novamente, como se a ideia de
não me tocar nesse período de tempo fosse demais para ele. Eu deveria dizer
que poderíamos parar, que eu já tinha tido uma aula suficiente para a noite,
mas eu não consigo, a voz havia me abandonado. Ergo meu rosto para
enxergar o seu e meus olhos se chocam com o dele, como se estivéssemos
próximos a mergulhar em algo desconhecido, algo errado, mas que não
dávamos a mínima.
Oliver afasta minhas pernas para colocar uma das suas entre elas e me
girar calmamente, o movimento não deveria ter sido erótico, mas foi. Sem
que percebêssemos, sua coxa roça em minha parte sensível, fazendo com que
atrito torne a experiência de dançar ainda mais intensa, íntima, me causando
sensações que eu não consigo nomear no momento. Mordo meu lábio
inferior, segurando o gemido que se formou em meus lábios e quando volto
meu olhar para Oliver, seus olhos estão nublados em algo perigoso,
selvagem e pecaminoso.
Eu não deveria desejar isso, não, eu deveria me afastar antes que façamos
algo que nos arrependeremos no dia seguinte, mas é como se estivéssemos
conectados. Oliver umedece seus lábios enquanto seus olhos se abaixam até
os meus, ele encara minha boca com intensidade e, por Deus, eu faço o
mesmo. Os lábios carnudos do homem à minha frente são como um convite,
um labirinto que sei que se eu entrar, nunca conseguirei achar a saída.
Encaro Oliver Wright como se ele fosse a minha pior perdição, como se
mesmo que esse momento fosse efêmero, ainda sim, ele iria se perpetuar em
nossa carne.
E por um momento eu tive medo de continuar, medo de tomar a atitude
errada.
— Summer — ele murmura.
— Oliver.
— Eu vou te beijar — ele confessa rouco. — E se você não deseja isso,
eu aconselho a sair desse quarto agora mesmo, porque eu não sei se serei
capaz de parar quando eu começar.
— Eu achei que não estivesse afim de transar com alguém hoje — digo
quase que em um sussurro inaudível.
— Eu tenho a impressão de que você é a minha exceção, loirinha.
Eu tinha a sensação de que ele não estava falando apenas disso, mas não
tenho tempo para pensar nisso. Eu apenas levantei meu rosto e encontrei
aqueles olhos, esses malditos olhos lindos, e mordo meu lábio inferior antes
de respondê-lo:
— Então beije-me, por uma noite, apenas beije-me!
E Oliver me beija. Não, ele me devora.
Seus lábios são macios e suas mãos sobem até minha nuca, aprofundando
ainda mais o momento.
Nós caminhamos cegamente até a parede mais próxima, sem nunca
deixarmos nossos lábios se desgrudar. Oliver segura minha cintura e com a
outra mão, ele aperta a minha nuca, segurando-a quando descemos para o
paraíso.
Ele me solta por um momento, apenas me encara calorosamente e então
abaixa seus lábios até meu pescoço, deixando uma pequena pressão em meu
ponto de pulsação. Quando solto um gemido fraco, Oliver emite uma
pequena risada nasal, como se perguntasse em sua mente onde estava a
mulher que há poucos minutos atrás estava o mandando para fora do quarto.
E isso me irrita, porra, eu não posso pensar nisso agora. Não, eu preciso que
todos nossos pensamentos fiquem longe desse lugar por ora.
Por isso, levo a minha mão até a borda da sua camisa e a retiro de seu
corpo, depois faço o mesmo com sua calça, deixando-o apenas com uma
cueca box branca, que faz minha boca ficar seca instantaneamente quando
percebo a protuberância que está seu membro. Ele não me dá tempo de dizer
algo, porque Oliver segura meus ombros com uma pequena força e me vira
contra a parede, fazendo com ele tenha a visão de minhas costas ainda
tampadas por todo o tecido do meu conjunto. Só então percebo que ele faz o
movimento para ter acesso ao zíper do cropped e da saia.
Oliver desliza o dedo lentamente, abrindo minha roupa e causando
sensações que eu nunca poderia descrever no momento. Quando finalmente
todo o tecido caí no chão, fazendo com fiquemos os dois nus, eu giro meu
corpo e pulo em seu colo, o surpreendendo, e sem dar tempo para pensar, o
beijo intensamente. Ele segura minha nádega, caminha comigo até a enorme
cama no centro do quarto e me coloca lentamente sobre o colchão, se
colocando entre minhas pernas. Quando levanta o rosto, colidindo com os
seus malditos olhos verdes nos meus, minha respiração fica presa na
garganta por um momento.
Estou prestes a transar com Oliver Wright. O melhor amigo da minha
melhor amiga, o homem que guarda segredos e que mantém todos longe de si,
o homem que ao mesmo tempo que me leva ao limite, também me faz sentir
viva, elétrica e, acima de tudo, consegue fazer com que o vazio que eu sinto,
se dissipe.
E mesmo que seja errado, mesmo que eu saiba que eu não devo fazer isso.
Eu seguro seu rosto e colo nossos lábios, faço com que o beijo seja intenso e
ao mesmo tempo que perpetue o nosso momento, deixando todo o resto fora
desse quarto.
No momento, existe apenas o agora, nada mais, nada menos.
Saio dos meus pensamentos quando noto que Oliver se abaixa, beijando
meu pescoço, depois minha clavícula e finalmente meus seios. Ele dá
atenção a ambos, morde e chupa, fazendo com que meus gemidos se
intensifiquem, ele se eleva novamente até meu rosto, me dá um beijo rápido
e desce seu rosto até a minha boceta. Oliver para pôr um momento, olhando
em direção a minha intimidade, solta um sorriso malicioso e sem se segurar
mais, se abaixa, fazendo com que eu sinta sua respiração em minha pele
sensível.
Sem aviso prévio, ele suga minha intimidade com força, me fazendo
contorcer e gemer alto. Assim que se afasta um pouco e geme, passando a
língua pelos lábios, sentindo meu gosto, eu inclino a cabeça para trás e solto
um gemido que estava preso em minha garganta. Oliver percebe o quão
afetada estou, então fecha os olhos, tentando aproveitar cada sensação e
volta a foder minha intimidade com sua boca. A forma como lambe e me
empurra para um limite desconhecido, me faz gemer descontroladamente,
minhas pernas tentam se fechar ao redor de sua cabeça em razão do prazer
que estou sentindo, minhas mãos vão até seu cabelo claro e puxam os fios
sedosos, o calor sobe por todo meu corpo, sinto os arrepios cada vez que
escuto os sons que ele faz, e quando ele suga fortemente, sei que estou perto.
— Ollie… — grito entre gemidos, esfregando minha boceta em seu rosto.
Retirando uma de suas mãos da minha coxa, ele introduz dois dedos em
minha intimidade enquanto ainda me chupa, escutando meus gemidos. Ele
sorri em resposta, sabendo que está me levando à loucura, inclinando
levemente os dedos dentro de mim. Sinto minhas pernas começarem a tremer
quando Oliver encontra meu ponto sensível. Ele abre os olhos agora para
observar cada uma das minhas reações.
— Goze, loirinha, apenas goze em minha boca… — ele rosna, lambendo a
minha intimidade.
Eu não consigo responder. Porra, as palavras que ele emite em minha
direção são como gasolina sendo jogada em um fogo. E quando tudo está
prestes a explodir dentro de mim, sinto a minha intimidade se contrair ao
redor de seus dedos. Oliver não me dá tempo de respirar, ao contrário, ele
aumenta os movimentos para que eu chegue mais rápido ao ápice. Percebo a
minha respiração morrer na garganta, impedindo que qualquer som seja
emitido, e com mais alguns movimentos, me sinto desfazer seus dedos e boca
enquanto gemo o nome dele de forma alta.
Sentindo o meu olhar sobre si, ele se levanta. Um sorriso maquiavélico
nasce em seu rosto, não há timidez em Wright, ele sabe que é fodidamente
lindo e quando se vira para caminhar até sua calça do outro lado do quarto,
procurando por um preservativo em sua carteira, percebo pequenas marcas
em suas costas, marcas que não consigo definir o que é por conta da minha
visão nublada pelo orgasmo e a pouca iluminação do quarto, então apenas
balanço minha cabeça, pensando que estou enxergando demais, talvez seja as
luzes que entram no quarto e formem aquele desenhos em sua pele.
— Oliver… — tento dizer algo enquanto Oliver coloca adequadamente a
camisinha em seu membro e volta para a cama, se posicionando sobre meu
corpo. Ele se inclina para me beijar e é notório o quão excitado está.
— Nós ainda não terminamos, loirinha, isso é apenas o começo da nossa
noite! — sussurra, deixando beijos em meu corpo.
Ele toma meus lábios com suavidade, enquanto se posiciona em cima do
meu corpo. Oliver se afasta por alguns segundos e encara os meus olhos
enquanto suspira fundo, levando seu pau até minha entrada e me
preenchendo. E pela primeira vez na noite, o medo me consome, porque não
há vazio, não há sentimentos confusos, é como se Oliver tivesse preenchido
não só meu corpo, mas toda a minha alma. Meu corpo inteiro parece pegar
fogo e clamar pelo seu toque.
Oliver se move com força e fecha os olhos em puro deleite quando o puxo
para baixo, colidindo nossos lábios em um beijo desesperado, como se eu
dissesse a ele para não ser gentil, para não me fazer sentir de uma maneira
que eu não deveria. E ele entende, porque quando seu rosto se eleva sobre o
meu novamente, seus olhos também me encaram com um sentimento
desconhecido
Ele move seu quadril duramente contra o meu, sem se importar com gritos
que saem de meus lábios, as mãos de Oliver deslizam por cada centímetro
do meu corpo, ele se inclina um pouco, chupando os meus seios e de repente,
ele nos gira e nos senta na cama, fazendo com que eu fique por cima e seu
rosto fique nivelado ao meu. Aqueles globos oculares me encaram com
louvor e admiração, como se nunca tivesse sentido tanto prazer como
estamos sentindo agora, como se nossos corpos estivessem conectados como
um só. Sentindo meu próprio ápice chegando, começo a cavalgar com mais
força, arrancando gemidos mais intensos de nós dois. Oliver leva a mão até
meu clítoris e movimenta seus dedos em minha boceta, fazendo-me contrair
ao redor de seu pau.
Ele não tira os olhos do meu rosto e eu desejo guardar cada reação em
minha mente, mesmo que seja errado, mesmo que eu não devesse querer que
esse momento acabe. Levo minha mão até suas costas e corro minhas unhas
pela sua pele, sentindo pequenas ondulações por toda extensão de suas
omoplatas. Mas não me importo com isso, apenas sinto as estocadas que ele
emite dentro de mim e após alguns minutos, Oliver se desfaz no
preservativo, chegando ao ápice e me levando junto.
Sinto meu corpo cansado e fraco, então deito minha testa em seu ombro,
mas assim que percebo o que fiz, tento me levantar. Contudo, Oliver se
inclina, deitando sobre o colchão e me puxando para fazer o mesmo, ele me
vira para o lado e saí de dentro de mim, indo até o banheiro e retirando o
preservativo. Minhas pálpebras estão pesadas, o sono está me atingindo e
quando acho que ele vai me deixar sozinha no quarto enquanto durmo, ele se
aproxima, beija o meu pescoço e se deita ao meu lado, puxando um lençol
sobre nossos corpos.
E a última coisa que escuto, enquanto Oliver me puxar para si e passa as
mãos pela cintura, é sua voz também sonolenta:
— Boa noite, loirinha.

A primeira coisa que constato quando acordo é que eu odeio cortinas


abertas e o sol invadindo meu rosto. A segunda é que tem alguém atrás de
mim. A respiração calma do meu companheiro, faz meu corpo se arrepiar e
quando sinto uma pequena dor entre minhas pernas, eu me recordo de quem
está ao meu lado.
Oliver Wright.
Oh, isso é ruim.
Não que eu não tenha gostado de tudo o que fizemos, ao contrário, eu
gostei o suficiente para saber que não posso ficar aqui até ele acordar,
porque nós sabemos que será um momento constrangedor entre nós dois.
Por isso, suspiro calmamente e me levanto da cama. Quando caminho na
ponta dos pés até minhas roupas e me viro para começar a me vestir, eu paro
abruptamente, derrubando todas minhas coisas no chão, fazendo com que
Oliver resmungue um palavrão e se levante, o lençol caí e exibe as marcas
que me deixaram paralisada.
Oliver Wright contém inúmeras cicatrizes em suas costas, não cicatrizes
de pequenos machucados. Não, são piores, são marcas que parecem ser de
chicote ou algo que não sei identificar qual objeto foi responsável por
marcá-la.
Minhas mãos voaram para minha boca, meus olhos estão presos em suas
costas e quando ele se vira, erguendo uma sobrancelha para meu rosto, eu
não consigo emitir uma palavra. Porque estou paralisada, tentando saber
quem seria tão cruel a ponto destruir a pele de uma criança, porque aquelas
marcas não são recentes, é como se estivessem ali a vida toda.
— Summer? — ele diz meu nome, preocupado.
Mas quando não consigo responder, apenas continuo encarando na altura
de suas costas, é como se uma luz iluminasse em sua cabeça, porque vejo o
momento que Oliver sobe todas as suas muralhas em volta de si mesmo e me
expulsa para onde quer que eu tenha penetrado. Ele suspira fundo, caminha
até suas roupas e se veste em tempo recorde. Quando está apropriadamente
vestido, para à minha frente, ignorando minha nudez e cruza os braços.
— Oliver…
— Não me encare como se fosse a Madre Teresa e estivesse prestes a me
salvar, loirinha, porque eu não preciso de salvação. — Sua voz é ríspida,
como se eu tivesse feito ou visto algo proibido. — Vamos ser diretos, a noite
foi ótima. — Ele solta um sorriso canalha, mas ainda assim, frio. — Mas
acabamos por aqui, ok?
— Como é que é? — questiono, saindo do meu transe, não por estar
sendo dispensada, mas pelo tom que está usando comigo, como se eu fosse
uma intrusa em terras inimigas.
— Você me ouviu, você é uma boa transa… — ele diz dando de ombros.
— Quente pra caralho. Mas, ainda sim, acabamos por aqui. O que você viu
não é problema seu, não é algo que deve sair por aí comentando para nossos
amigos ou pelo campus… Então acredito que estamos conversados e que
manterá a boca fechada.
— Você-é-um-idiota — xingo pausadamente.
— Obrigado, escuto muito isso por aí! — Oliver solta outro sorriso frio,
mas seus olhos me mostram outra coisa. — Agora se me der licença, preciso
ir para casa. — Ele se vira, caminhando até a porta, mas para antes mesmo
de sair e se vira para mim novamente. — Acredito que seja melhor manter
esse pequeno erro que aconteceu esta noite apenas entre nós dois.
— Pelo menos um dos seus neurônios ainda está funcionando — digo com
raiva, fechando minhas mãos em punhos.
— Tenha um ótimo dia, loirinha! — ele diz com uma falsa alegria,
enquanto pego o abajur ao meu lado e jogo em sua direção, ao mesmo tempo
que ele bate a porta atrás de si, me deixando sozinha no quarto.
Paro por alguns segundos, absorvendo o que aconteceu aqui e sem chegar
a nenhuma conclusão, apenas me abaixo e pego minhas coisas. Durante todo
o momento que me visto, ligo para Hazel e espero que ela me busque, penso
em como eu havia tomado a pior decisão em ter transado com Oliver Wright.
E só tenho a certeza disso algumas semanas depois, quando nós dois
estamos em uma situação complicada e precisamos da ajuda um do outro.
Agora é a vez deles, a vez de nos apaixonarmos por Summer e Oliver.
Esse casal nasceu por conta de um capítulo, um surto que todas as leitoras
tiveram por conta de um diálogo. A química foi instantânea e a história logo
gritou em meu peito sem aviso prévio.
Então, eu digo que estamos longe do fim e que nós nos veremos logo em
War of Hearts, o segundo volume da Série Saint Vincent.

REDES SOCIAIS
TWITTER | INSTAGRAM
Broken Hearts é um livro onde aprendemos que não podemos curar nossas
cicatrizes, medos e inseguranças sozinhos, que mesmo quando achamos que
nunca haverá luz no fim do túnel, ela pode surgir inesperadamente. E assim
como Verônica e Logan, eu não teria chegado até aqui sozinha, não teria
passado do primeiro capítulo se não tivesse um time de pessoas por trás de
mim, me incentivando e me dizendo que meu sonho também é possível.
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer à minha mãe, por ser meu
exemplo de vida e que muita das vezes me perguntou o que eu tanto fazia
com o Word aberto, mal sabia ela que escrevia um romance. Mãe, mesmo
que eu seja cabeça dura, eu amo você, mais do que posso expressar em
palavras.
À minha irmã, Maria Júlia, que me deu inspiração para escrever Dylan e
Edmund, que me ensinou que eu sempre terei um abraço no fim de um dia
destruidor. Eu amo você até a lua ida e volta, meu anjo.
Ao meu grupo de leitoras no Whatsapp, que me incentivaram
incansavelmente até que esse livro chegasse até vocês, que surtaram a cada
capítulo postado e que ainda estão comigo. Vocês foram luz para a minha
vida e sempre serei grata.
À Ayla Shaiane, a segunda mãe de BH, minha irmã de coração e o meu
melhor presente que a escrita me deu. Amiga, quando você entrou na minha
vida, eu não imaginava o quão importante você se tornaria; e hoje agradeço
por cada momento que compartilhamos, cada vez que você trouxe ideias
mirabolantes e surtou por conta dos capítulos de BH. Mas acima de tudo,
obrigada por acreditar no meu sonho, por não me deixar desistir quando a
insegurança bateu à minha porta e por lutar por Saint Vincent ao meu lado.
Obrigada por me ajudar a encontrar saídas em momentos escuros, obrigada
por ter sido a minha Summer quando precisei e por ter chutado minha bunda
quando foi necessário.
À April Jones, a pessoa que caiu de paraquedas em minha vida e sem
dúvidas foi um dos meus melhores presentes que ganhei no ano passado.
Amiga, obrigada por criar meu gêmeo favorito, por me apoiar em terminar
BH e trazê-lo para a Amazon. Obrigada por tudo e principalmente por
embarcar no crossover entre BH e FOREVER YOU, foi incrível escrever ao
seu lado.
À Amanda, minha melhor amiga, a minha inspiração para a Hazel e a
única pessoa que realmente conhece a Annie por inteiro, que me apoiou e
segurou minha mão quando eu quis desistir. Amiga, nós conseguimos, BH
finalmente nasceu e eu sempre serei grata pela sua ajuda.
À Fernanda Barroso, pelo trabalho impecável na revisão ortográfica, e
acima de tudo, obrigada por me proporcionar momentos únicos em nosso
grupo e pelos surtos durante toda a revisão.
À Evelyn Fernandes, por ter feito a leitura sensível, por ter me dado
suporte para que Broken Hearts fosse escrito de forma responsável e por me
ajudar em todo o processo de lançamento, obrigada amiga, você foi incrível.
À Laura Santos, leitora e beta de BH, obrigada por abraçar Saint Vincent
com todas as suas forças. Você foi importante em cada processo de Broken
Hearts.
Às minhas leitoras no Wattpad, que me acompanham desde o início da
primeira versão de BH, que surtaram em cada comentário, que trouxeram
suas teorias e suas mensagens de carinhos até minhas redes sociais e que se
tornaram minhas amigas. Obrigada! É por vocês que o nosso bando ganhou
uma série inteira, por vocês que agora eles gritam para contar suas próprias
histórias.
E por fim, à Annie de 2020, que se sentou em frente a um notebook sem
saber o que fazer, que estava insegura e quebrada, mas que finalmente deixou
que as palavras finalmente saíssem, deixou que os personagens falassem e
que Saint Vincent nascesse. A nossa coragem de sair de nossa bolha, que
criamos para nos proteger, de renascer em um momento tão difícil, nos
fizeram chegar aqui e eu hoje vejo que foi a melhor decisão que tomamos.
Com todo o meu amor,
Annie.

[1]
Citação do livro A Rainha Vermelha da autora Victoria Aveyard
[2]
Livro O Príncipe Cruel da autora Holly Black
[3]
Livros onde os personagens principais têm diferenças de idades
[4]
O tight end fica posicionado ao lado do tackle e tem função híbrida, pode tanto funcionar como
bloqueador como um recebedor de passes.
[5]
São os jogadores se posicionam algumas jardas atrás da linha defensiva, para parar o jogo corrido e
os passes curtos. Ou seja, eles são responsáveis por controlar o avanço pelo meio da defesa.
[6]
A Universidade de Connecticut, também conhecida como UConn, é uma universidade
pública do estado de Connecticut, nos Estados Unidos.
[7]
responsável por chutar os field goals e os kickoffs.
[8]
nome dado a cada tentativa de avanço de um time durante seu
ataque.
[9]
NCAA Football Championship é o principal campeonato nacional de futebol americano
universitário nos Estados Unidos.
Table of Contents
SUMÁRIO
NOTA DA AUTORA E AVISO DE GATILHO
PLAYLIST
DEDICATÓRIA
EPÍGRAFE
00 | Prólogo
01 | Saint Vincent
02 | Você está pronta para jogar, anjo?
03 | Blackwell x Underwood
04 | Você me quer arrastando de volta para você?
05 | Partes para me destruir
06 | Xeque-mate
07 | Nossa pior versão
08 | Tome uma verdade
09 | Pequena Blackwell
10 | Abstinência
11 | Sentimentos controversos
12 | Cada parte de seu ódio
13 | Válvula de escape
14 | Temporada de jogos
15 | Vestiário
16 | Corações Quebrados
17 | Passado - Parte I
18 | Passado - Parte II
19 | Revelações
20 | Boston
21 | Processo de cura
22 | Um jogo sujo
23 | Pesadelos
24 | Dance comigo, anjo
25 | Carona
26 | Eu te desafio
27 | Estrelas binárias
28 | Aprenda a se perdoar
29 | Venha comigo, anjo
30 | Recital de Natal
31 | Seja corajosa
32 | Rei e rainha do caos
33 | Fio vermelho
34 | Feliz Ano-Novo
35 | Acordo com o diabo
36 | Sinto muito
37 | Fogo e gelo
38 | Convite
39 | Encontro de família
40 | Nosso último jogo sujo
EPÍLOGO
LOGAN UNDERWOOD
BÔNUS | A festa na Fraternidade
NOTAS FINAIS
AGRADECIMENTOS

Você também pode gostar