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COPYRIGHT © 2023 MILENA SEYFILD

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Esta obra literária é uma ficção. Qualquer nome, lugar, personagens e
situações mencionadas são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com pessoas e acontecimentos reais é mera coincidência.
CAPA
Thais Alves
DIAGRAMAÇÃO
Milena Seyfild
REVISÃO
Gabrielle Andrade
ILUSTRAÇÃO
@olhosdtinta
Insistir Até Conseguir
[Recurso Digital] / Milena Seyfild
— 1ª Edição; 2023
1. Romance Contemporâneo 2. Literatura Brasileira
3. Jovens Adultos
4. Ficção I. Título
Esta obra foi revisada conforme o Novo Acordo Orto gráfico.
NOTA DA AUTORA
AVISOS
Dedicatória
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
EPÍLOGO
Agradecimentos
E chegamos ao meu último livro publicado em 2023. Pra quem começou a
carreira há dois anos, chegar até aqui parecia um sonho impossível.
Principalmente quando por muito tempo não tinha mais sequer a
empolgação de abrir o word, ver que tenho pessoas tão especiais querendo
ler as minhas histórias é a realização de um sonho.
Primeiro de tudo, só quero avisar que Insistir Até Conseguir é um spin-off
de Fingir Até Conseguir. Você NÃO precisa ler o primeiro para entender
esse, tendo em vista que o casal do primeiro livro aparece pouco por aqui.
Mas caso depois de ler essa história você queira conhecer melhor Logan e
Calliope, recomendo a leitura do anterior.
Samantha sou eu. Não inteiramente, mas bastante. Ela perdeu o avô, e eu
perdi meu pai. Perdi todos os meus avós também, e dois tios. Em cada
perda, vi a minha família desmoronar. Vi minha mãe chorar pelos irmãos.
Chorei pelo meu pai, vi meus irmãos sofrerem como nunca. Vi meus tios,
irmãos do meu pai, entrarem em desespero. E nunca tinha me sentindo
preparada para falar sobre o luto. Esse é o meu maior gatilho, e falar, nem
que seja um pouco sobre isso aqui, despertou sentimentos que eu finalmente
me senti pronta para encarar.
Meu pai foi uma criança órfã. Perdeu o pai jovem e pouco tempo depois a
mãe. Aos 16 anos ele já estava sozinho no mundo com mais 5 irmãos.
Minha tia Carla, que é a minha segunda mãe, também exerceu esse papel na
vida dos irmãos. Ela é uma grande inspiração pra mim, porque mesmo
escutando essa história a vida toda, não sei se conseguiria passar pela perda
devastadora de dar adeus a ambos os pais e pegar para mim a função de
criar todos os irmãos.
Alguns dos pensamentos e coisas escritas aqui, não são minhas. Resgatei
conversas que tive com o meu pai quando ele me contava sobre como
perdeu os seus. Frases e conversas que nunca deixaram a minha mente e
que eu senti que precisava compartilhar. Talvez algumas pessoas precisam
ler isso. O capítulo 31 é um compilado desses pensamentos, junto com o
que eu senti naquele fatídico dia de 2019, onde tudo pareceu desmoronar
para mim de vez.
Mas tenho uma boa notícia pra você que está passando por isso. Um dia,
esse sentimento feio, destrutivo e desesperador é substituído por saudade e
gratidão. E quando esse dia chega, você ri. Ri das memórias, zoa, e mal
pode esperar pelo momento em que vai poder abraçar e matar a saudades de
quem se foi.
Não sei qual a religião de quem está lendo isso, ou se você sequer acredita
que somos mais do que matéria, carne e osso. Mas depois que meu pai foi
dessa para uma melhor, o sentimento de esperança que desabrochou em
mim me fez ter a certeza de que um dia, vou vê-lo de novo.
No México, eles comemoram o Dia de Los Muertos. Acreditam que todos
nós temos três mortes. A primeira delas é quando nos damos conta de que
vamos morrer um dia. A segunda é quando, de fato, morremos. E a terceira,
é quando a última pessoa viva que se lembra de você, vai embora.
Nesse livro, quero eternizar a memória do meu pai e dos meus avós. Livros
são eternos, e espero que, através deles, todos vivam para sempre.
Com amor,
Milena Seyfild.
Esse livro vai tratar sobre o luto. Menção a doenças terminais, hospitais e
perdas são frequentemente mencionados. Ademais, existe uma leve menção
à homofobia e bullying. Se não se sentir confortável, pare de ler
imediatamente. A sua saúde mental deve estar sempre em primeiro lugar.
Reforçando que esse é um livro para maiores de dezoito anos, ou seja:
vamos ter palavras de baixo calão, sexo, álcool e mais coisas relacionadas.
Para o meu pai, que sempre me ensinou que a arte salva vidas.
Legião Urbana e Guns N’ Roses o ajudaram quando ele mesmo
perdeu os pais e se tornou órfão aos 14 anos de idade.
Marvel e Star Wars se tornaram um alívio quando a vida adulta
ficava pesada demais. Ele voltava a ser criança quando entrávamos na
disputa para conseguir um ingresso na pré-estreia do cinema.
Friends, True Blood e How I Met Your Mother arrancavam as
risadas mais altas dele.
E quando você se foi, todas as suas coisas favoritas se tornaram
minhas. Hoje, mais do que nunca, eu entendo a conexão que você tinha com
todas as coisas que os seus pais amavam antes de partir.
Esse livro é para você que, assim como a minha família, encontra na
arte o conforto necessário para passar por dias ruins. E, em outros casos,
para se lembrar de pessoas especiais que não estão mais aqui.
Socorro, eu ainda estou no restaurante
Ainda estou sentada em um canto que passei a assombrar
De pernas cruzadas na luz fraca
right where you left me | Taylor Swift

Dizem que o karma existe para fazer você colher os frutos do que
você plantou. Não importa a religião ou no que você acredita, sempre
haverá consequências pelas suas ações.
É óbvio que eu me recusava a acreditar nessa baboseira.
Principalmente agora que o meu avô, o homem que eu mais amo no mundo
e que passou a vida inteira fazendo o melhor pela família, estava dando os
últimos suspiros de vida em uma cama de hospital.
Já perdi as contas de quantas madrugadas passei aqui. Os corredores
não começam a parecer mais familiares, os médicos não ficam mais
bonzinhos. A única luz natural que entra pela janela chega a ser uma piada
em comparação ao que todos nós estamos enfrentando aqui.
Consigo reconhecer essas pessoas em qualquer lugar do mundo. A
dor do luto faz isso com você. Todos os dias nos sentamos nessas mesmas
malditas cadeiras, encarando-os nos olhos com a expressão mais mórbida
que você pode imaginar.
Um senhor aparece todos os dias com a bíblia na mão. Ele fecha os
olhos, os lábios sussurrando uma prece silenciosa, enquanto implora pela
vida do único filho. O garoto está na última fase de um câncer agressivo,
mas ele ainda acredita em um milagre.
E embora odeie admitir, eu também. No fundo, bem lá dentro, eu
realmente acredito que o meu avô vai sair dessa. Ele vai contar como um
anjo entrou pela sua janela e fez todas as células cancerígenas sumirem. E
então vai se preparar para mais um verão no acampamento que ele
administra há tantos anos, o Frozen Lake.
Passei muitos verões ali. Era um rito de passagem na nossa família,
e os Samuels sempre honraram suas tradições. Assim que completávamos
quinze anos, meu avô aparecia com a sua caminhonete barulhenta e um
saco de balas para nos entreter durante o caminho.
Eu costumava odiar. Enquanto todos os meus amigos estavam
curtindo as férias com as festas e aproveitando o verão para perder a
virgindade, lá estava eu, gritando com adolescentes por saírem de seus
chalés durante a noite.
Deus, se eu pudesse voltar no tempo… Se eu tivesse a chance de
passar nem que fosse apenas algumas horas com ele saudável novamente,
eu faria. Eu jamais reclamaria.
— Temos que ir, Sam. — A voz do meu irmão mais novo, Seth, me
faz virar o rosto. Ele anda mais abatido do que o normal, e eu sei que isso
não é só pelo vovô. A melhor amiga dele mora em outra cidade, e agora que
a nossa rotina é basicamente esse hospital, ninguém consegue levá-lo para
vê-la. O motivo de ele estar sendo tão insistente é justamente porque está
prestes a reencontrá-la. — Temos que pegar um avião.
Sim, nós temos.
Se eu acredito em milagres? Não. Eu definitivamente não acredito
mais.
Mas em anjos? É, talvez eu possa
começar a reconsiderá-los.
Porque não existe outra explicação plausível para a oportunidade
que eu consegui. Depois de meses com a ideia de vender o acampamento do
vovô para conseguir arcar com o restante de suas despesas médicas, eu
recebi uma proposta que vai conseguir segurar as pontas por mais um
tempo.
Aparentemente, em seu último verão no Frozen Lake, vovô
conseguiu que um jogador famoso de um time de beisebol fosse ao
acampamento. Isso atraiu mais gente do que ele esperava, mas melhor do
que isso, o cara acabou se tornando um grande amigo do Seth. Ele está se
casando neste final de semana, e a noiva dele me ligou implorando para eu
levar meu irmãozinho até lá.
Não sou uma megera. Sei o quanto Seth também queria fazer parte
desse momento, mas eu não podia sair daqui e deixar meus pais
encarregados sozinhos do vovô. Principalmente agora, que ele pode partir a
qualquer segundo.
Mas a garota era insistente e não desistiu até entrar em contato com
o CEO da agência que eu trabalho. É uma empresa de comunicação que
cresceu bastante nos últimos tempos, e embora eu queira um dia trabalhar
sozinha, é impossível conseguir seus próprios clientes quando você não tem
contatos.
Então, eu preciso continuar na agência até ficar conhecida no meio
esportivo, que é o meu foco principal. Cuidar da imagem de atletas
problemáticos pode não ser o sonho da maioria das pessoas, mas um
profissional de relações públicas é responsável por cuidar de toda a parte
midiática do cliente. É através da imagem dele que você cresce, e se estiver
com a pessoa certa, pode conseguir contratos milionários com empresas que
nunca sonhou.
Quero ser a melhor do mercado. Quero conseguir dinheiro o
suficiente para arrancar a minha família do buraco que nos enfiamos por
causa da maldita doença que está arrancando vovô de nós.
E é por isso que quando Calliope Romano, a noiva insistente, me
disse que conseguiria arranjar um cliente famoso e promissor que precisava
urgentemente de uma relações públicas agora que estava prestes a ser
negociado, eu não hesitei. Lembrei na hora de que seu noivo era um atleta
famoso, e com certeza seus colegas de time também estariam presentes na
festa.
É a minha chance.
Vou conseguir reerguer esse jogador das cinzas, e depois disso, o
céu será o limite. Não precisaremos vender o acampamento da minha
família e finalmente meus pais poderão viver administrando o sonho que
vovô lutou tanto para realizar.
Você só precisa controlar a respiração, Sam. Um, dois, três…
Devagar.
Você vai conseguir.
O som das minhas malas caindo no chão não são o suficiente para
me tirar do transe que acabei de entrar.
Inspira.
Respira.
Se acalme.
Mas nenhum dos comandos que eu costumo repetir para mim
mesma quando a ansiedade surge parece dar jeito. Porque, caramba, onde
foi que eu me enfiei?
— Temos que ir para a festa, Sam — Seth resmunga, irritado por eu
ainda não ter terminado de me arrumar. — Quero ver o Logan.
Marjorie está com o cenho franzido enquanto ele continua
murmurando sobre a minha lentidão, mas não consigo processar nada do
que Seth diz. Porque, puta merda, eu não consigo acreditar no que meus
olhos acabaram de ver.
Quando Calliope nos buscou no aeroporto e nos levou direto para a
igreja, ainda estava com um bom pressentimento. Algo me dizendo que
tudo daria certo e que meus pais ficariam orgulhosos de mim, mas eu já
deveria saber que nada viria tão fácil.
O meu karma chegou.
E eu não poderia estar mais ferrada.
Ele estava parado ao lado do noivo. Pisquei diversas vezes para ter
certeza de que meus olhos não estavam vendo uma miragem, um
fantasma… Mas Lance Moreau era inconfundível.
Olhos claros, cabelo castanho meio rebelde, corpo musculoso, alto.
Um sorriso cretino de canto e a pose de galinha continuam os mesmos
mesmo depois de dois anos.
Dois malditos anos.
Ainda me lembro como se fosse ontem. Nos conhecemos no trote da
faculdade — um trote que eu me recusei a participar, mas que decidi
fotografar para tentar entrar no jornal do meu departamento.
Ele me lançou um sorriso e posou para a foto. Depois, pediu para
que eu não a publicasse. E em algum momento depois de eu ter me
recusado, acabei me apaixonando por ele.
A maior burrice que eu já fiz.
seis anos atrás
— Você tem certeza que não quer participar do trote? — Sabrina, a
minha colega de quarto, perguntou.
Como caloura, a minha maior preocupação era sobreviver. A
Universidade do Texas não era a minha escolha número um, mas consegui
uma bolsa que custeava todos os meus materiais, além de cobrir também o
meu plano de alimentação.
Apesar de não ser uma Ivy League, era uma excelente escolha. Eu
só precisava lidar com a saudade dos meus pais, do meu irmão mais novo e
principalmente do meu avô, a quem eu sempre fui muito apegada.
— Olha, não é querendo dizer nada… — continuou Sabrina,
pintando os lábios com um batom vermelho de tirar o fôlego. — Mas os
jogadores de futebol estão aprontando alguma coisa para os calouros deles
também. E vai ter uma festa depois, o que significa que podemos nos dar
bem.
Cruzando os braços, eu torci o nariz para o que ela me oferecia.
Eu não era puritana, tampouco estava planejando passar os
próximos anos sem beijar na boca ou transar com alguém. Mas eu tinha um
lema de não me envolver com nenhum atleta desta universidade. Não era
nada pessoal, apenas uma escolha.
Por ser uma universidade de primeira divisão, o futebol
universitário era realmente importante. Os caras eram tratados como
celebridades, os jogos transmitidos para todo o país, fãs que enchiam
estádios. Qualquer um que decidisse se tornar um jogador profissional
precisaria abdicar de muita coisa nesses próximos quatro anos, e eu só não
estava a fim de acompanhar isso de perto.
Tirando todo o ego também. Podia estar sendo um pouco
precipitada, mas tinha a impressão de que todos esses jogadores
musculosos eram do tipo “fale demais, faça de menos”.
— Você que sai perdendo… — Minha colega ajeitou os cabelos
mais uma vez, conferindo no espelho o resultado da sua produção. — O
trote vai acontecer em uma das fraternidades. Delta Theta Nu. Se ficar
entediada, pode aparecer por lá.
Eu assenti, mesmo com vontade de dizer que isso não iria acontecer.
Tinha muitas coisas para adiantar, e isso incluía a leitura de um livro
teórico sobre comunicação que provavelmente iria consumir toda a minha
semana.
Mas passar a noite de sexta trancada em um quarto enquanto
escutava risadas e sons de música ao fundo era mesmo deprimente. Tão
deprimente que eu decidi ligar para a minha família via Skype, ansiosa
para ver algum rosto familiar.
Seriam longos quatro anos.
Quando nenhum deles atendeu, decidi dar uma olhada pelo site da
universidade em busca dos programas que eu gostaria de me inscrever. O
jornal era a minha opção número um, então comecei a ler sobre as formas
de ingressar nele.
Eu poderia enviar alguns dos textos que escrevi quando eu estava
no ensino médio. Também fiz parte do jornal da escola, e gostava da rotina
de escrever notícias, embora nem todas fossem interessantes.
— Merda… — murmurei, procurando no meu e-mail todas as
matérias que eu já havia publicado.
Problemas com a comida do refeitório, a saída do zelador favorito
dos alunos, o olheiro que descobriu dois jogadores de beisebol em um jogo
amistoso. Nenhuma dessas parecia boa o suficiente para eu enviar como
uma forma de inscrição.
Então, eu tive uma brilhante ideia.
Uma ideia que mudaria toda a minha experiência na universidade
para sempre.
Eu decidi escrever sobre o trote dos jogadores de futebol.

Não deveria ter vindo. É isso que eu penso quando vejo o


pandemônio instalado em uma das casas vitorianas antigas usada como
“fraternidade” da universidade.
Alguns garotos estão de cabeça para baixo, apoiados em um barril
de cerveja enquanto bebem o líquido direto da fonte. Eu costumava
participar desse jogo no ensino médio e modéstia a parte, era a melhor.
Mas, caramba. O barril estava um pouco aberto na lateral, sem
contar na temperatura nada propícia para manter a bebida em um clima
agradável.
Meu nariz se retorceu de nojo. Essa merda devia estar quente e com
gosto de mijo, mas acho que cada um sabe o que é melhor para si.
Pesquei meu celular do bolso, evitando fazer caras e bocas
conforme ia passando pelo amontoado de corpos suados no chão. Os
gemidos, o barulho de música alta, as pessoas agindo como animais… É,
isso definitivamente era a minha praia. Não sabia que existia abstinência
de festa até agora.
— Porra, vem logo! Temos que começar! — um garoto chamou com
o semblante irritado.
Ele estava segurando um grande saco de gelo, e mais à frente
avistei a fileira de garotos seminus, um do lado do outro.
Engoli em seco, pensando no quanto aquilo deveria ser humilhante.
Eu jamais conseguiria passar por algo assim, mas eles não pareciam
desconfortáveis. Alguns sorriam, outros davam risadas, e dois deles
começaram a acariciar os próprios paus de maneira sugestiva.
Que nojo.
— Seguinte, seus filhos da puta… — um homem usando a jaqueta
oficial do time da universidade começou, mostrando os dentes. — Não
podemos comprometer vocês fisicamente porque precisamos dessas lindas
perninhas e braços para destruir outros filhos da puta. Nossos rivais vão
adorar tentar esmagar vocês sem piedade, então precisam estar inteiros
para aguentar essa merda.
Ok, aparentemente eles amavam usar esse termo. Anotação mental
para a matéria que vou escrever para enviar para o jornal da universidade.
Um assovio é ouvido ao longe, e eu viro a cabeça para assistir a
pequena multidão se formando ao redor dos calouros.
— O que vamos ter que fazer? — um dos novatos perguntou, a pele
arrepiada pelo frio.
— Quem decidirá isso são as meninas da Theta Rho Beta. De vez
em quando elas são boazinhas, mas às vezes pegam realmente pesado. —
Ele sorriu, mordaz. — Na minha vez envolveram limão, esparadrapos e
muita cera quente. Não gosto muito de lembrar a experiência.
Uma risada cínica ecoou no lugar, e absolutamente todo mundo deu
um passo para trás. Sem saber muito bem como agir, imitei.
Dez meninas perfeitamente arrumadas apareceram. Elas andavam
uma ao lado da outra como se fossem supermodelos, o queixo erguido
enquanto nem se davam ao trabalho de observar as pessoas que estavam
assistindo-as ao redor.
Discretamente, cliquei no botão de gravar do meu iPhone. Deixei a
mão cair, com a câmera apontada na direção da cena que se desenrolava
na minha frente.
Desviei o olhar para ter certeza de que ninguém havia percebido.
Hoje talvez fosse o meu dia de sorte.
— Essa safra está bem melhor do que a sua — a menina do meio,
uma ruiva, zombou. Ela estava secando os garotos enfileirados sem
vergonha alguma, e todos eles lançaram sorrisos envaidecidos.
Segurei a vontade de revirar os olhos. Que cena mais patética.
— Assim você me magoa, Meg. Achei que tínhamos algo especial —
o veterano debochou, dando um passo para que ela ficasse de frente para
os garotos.
Ela lambeu os lábios, secando um por um de cima a baixo. Parecia
que eles eram pedaços de carne. Em determinado momento, um deles
arqueou a sobrancelha, atraindo toda a atenção para si.
— Ah, qual é? Se quer pegar um pedaço, é só dizer. Acho que
ninguém aqui negaria. — Apesar da zombaria, era perceptível um traço de
irritação em seu tom de voz.
Ele, definitivamente, era o garoto mais lindo que meus olhos já
haviam visto. Rosto anguloso, corpo definido, maxilar travado, cachos
castanhos, olhos escuros. Havia um traço de ironia em seu rosto que me
deixava nervosa, embora ele sequer tenha dirigido o olhar para mim.
Que merda é essa? Por que meu coração estava começando a
acelerar?
Se concentra, Samantha. É só um garoto bonito. Existem vários
desses por aí, não havia nada de especial.
— Esse aqui tem a língua bem afiada… — a ruiva sibilou, passando
a unha asperamente pelo peito dele. — Vamos ver se você vai gostar de
correr pela universidade só com uma peça de roupa.
Ele balançou a cabeça, sorrindo.
— Esse será um favor que você vai fazer pelas pessoas daqui. Sou
gostoso demais. — Ele flexionou os bíceps, se exibindo.
Mais uma rodada de gritos empolgados recomeçou, e era evidente
que o cara estava começando a tirar aquela garota do sério. Ela
pressionou os lábios juntos, estudando-o com atenção.
Depois de alguns segundos, perguntou:
— Qual o seu nome, gostoso?
Os garotos em volta começaram a gargalhar.
— Lance. Lance Moreau.
Lance. Não sei bem o porquê, mas um sentimento estranho me
dominou. Era parecido com dejá vù… Como se eu já o conhecesse, mas
não me lembrava exatamente do motivo.
— Muito bem, Lance. O trote vai começar com você. — Sorriu,
maquiavélica. — Tire todas as suas roupas. Depois, vai deixar todas nós
pintarmos você. Não pode reclamar de nada do que fizermos. — Ela
inclinou a cabeça para o lado. — Sabe alguma música da Taylor Swift?
Uma risada alta explodiu, e eu me encolhi com o susto.
— Sei.
— Que bom. Você vai cantar essa merda alto o suficiente para
acordar até o reitor, se necessário. Todo pintado e seminu. Sua meta é
conseguir entrar no ginásio e pular na piscina para se limpar. Se for pego,
está ferrado. Entendeu?
Um arrepio desconfortável subiu pela minha espinha. Merda. Isso
não era nada bom, e pelo que eu havia lido nas regras da universidade,
podia gerar até mesmo uma expulsão!
Que loucura.
Mas Lance não vacilou. Ele continuou com o sorriso cretino mais
arrogante do mundo no rosto, o que apenas elevou o nível de irritação da
garota.
— É só isso?
— OOOOH! — As vaias e os urros podiam ser ouvidos do outro
lado do campus.
Tudo bem, eu não precisava falar sobre tudo o que foi feito. Não
conseguiria dormir em paz ao pensar que prejudiquei o futuro de alguém, e
além do mais, com certeza descobririam que eu havia sido responsável.
E eu já estava com medo dessa galera o suficiente.
Lance desceu as calças, ficando apenas de boxer. Era impossível
não secar seu corpo musculoso, mas tentei desviar o olhar por respeito. O
que, devo acrescentar, só partiu de mim.
As garotas soltavam risadinhas quando começaram a pintá-lo da
cabeça aos pés. Frases cômicas e sexuais, desenhos de flores e borboletas e
até mesmo de pênis enormes… O pacote completo.
Tinha me esquecido do celular que continuava gravando a cena
discretamente, então ajeitei um pouco mais o ângulo dele.
E é então que senti.
Uma presença.
Como se estivesse sendo observada.
Ao erguer o queixo, me deparei com aqueles olhos escuros olhando
diretamente para mim. Ele semicerrou os olhos, inclinando a cabeça na
direção da minha mão.
Merda.
Ele tinha percebido o que eu estava fazendo.
Eu era uma garota morta.
Me perguntando, para onde meu amor foi?
Os tempos rápidos, as luzes brilhantes, o carrossel
Desculpe por não fazer de você minha prioridade
coney island | Taylor Swift (part. The National)

Fantasmas não existem.


É isso que eu repito para mim mesmo quando eu vejo a imagem que
assombra meus sonhos por tantos anos.
Esfrego o rosto, arrumo o colarinho, prendo a respiração. Mas, puta
merda, aquela garota de braços cruzados é a Sam?! A mesma garota que me
empurrou na porra da piscina no dia do trote que quase custou as nossas
vagas na universidade?
Não pode ser.
Caralho. Isso não pode estar acontecendo.
— Lance? — Minha irmã mais velha, Lydia, semicerra os olhos
para mim. — Por que está com essa cara? Parece constipação. Quer usar o
banheiro, maninho?
Lanço um olhar envaidecido para a irmã mais insuportável que Deus
poderia ter me arranjado.
Arrumo o colarinho, subitamente me sentindo sufocado. Puta que
pariu, que merda é essa? O que Samantha Samuels está fazendo na porra
do casamento do meu irmão?
Lucian e Lydia continuam conversando com suas esposas na mesa
como se tudo estivesse normal. Como se um fantasma não estivesse
andando por essas mesas e abrindo sorrisos amigáveis para todos que a
chamam para uma conversa.
Uma sensação de dejá vù sobe por todo o meu corpo. Quantas vezes
eu não sonhei em aparecer com Samantha em um dos jantares da minha
família, orgulhoso, exibindo-a por aí? Costumava pensar que seríamos
aquele tipo de casal meloso que não consegue manter as mãos longe um do
outro por muito tempo.
Mas tudo isso não passava de um desejo do meu inconsciente. Não
imaginava que um dia veria essa cena se desenrolando bem na frente dos
meus olhos.
A lei da atração não pode ser tão rápida assim.
— Lanceeeeee! — Um Logan levemente alterado grita no meu
ouvido, apertando meu ombro com um pouco de força. — Tá goxtando da
fessssta? — Ele enrola a língua e prolonga o “s” de propósito. — Tenho
uma surpresinhaaaaa pra você!
Fechando a cara, eu me levanto para colocar Logan de pé. Calliope
também está virando mais taças de champagne do que eu recomendaria, e
isso diz muito. Parece que os papéis se inverteram. Esses dois que são
chatos pra cacete e todos certinhos, eu não.
— Chega de beber, campeão — mando, lançando um olhar de
advertência para Lydia. A minha irmã se apressa para conseguir um copo
d’água. Com muito custo, conseguimos colocar Logan sentado, obrigando-o
a beber o máximo de H20 que conseguimos.
— É A NOSSA MÚSICA! — Calliope berra, agarrando meu irmão
pela mão.
Uma versão bem pervertida da música infantil “Simon’s Says”
começa a tocar. Os dois cantam a plenos pulmões, se jogando na pista de
dança com a empolgação de duas crianças.
Hein?
Logan se ajoelha para ficar de frente para Calliope. Em seguida,
joga o corpo todo para trás, fingindo tocar uma guitarra imaginária
enquanto Callie segura um microfone de mentira. Ambos cantam, os olhos
começando a escurecer pelo desejo aparente.
— Meu Deus, eles vão acabar nos dando um show e tanto — zomba
Lydia, se divertindo à beça. — Alguém deveria ir lá impedir essa tragédia.
Rio pelo nariz.
— É verdade. Alguém deveria.
— Ou… — Os olhos da minha irmã começam a brilhar com as
infinitas possibilidades. — Poderíamos filmar.
— Poderíamos filmar — concordo, já pegando meu celular do
bolso. O gesto também me causa um sentimento de nostalgia, e eu sei
exatamente o porquê. — A culpa não é nossa se eles querem transar no
meio dos convidados.
— E além do mais, uma imagem dessas pode ser útil. Há muitas
possibilidades de chantagem.
— Lydia, ainda bem que você é minha irmã. Não queria ter você
como inimiga jamais.
Ela ri, passando as mãos uma sobre a outra tal qual esses vilões de
desenho animado.
— E quem disse que você está seguro só porque é meu irmão?
É, ela tem um ponto.
Lydia não pegou leve com nenhum de nós enquanto crescíamos. Ela
costumava resmungar que não aceitaria irmãos cuzões que destruíam
corações de pobres garotas. Ela dizia que tínhamos que ser cavalheiros,
educados e beijar o chão para que nossas mulheres pisassem.
É óbvio que eu só ignorava toda essa porra e fazia o que eu
precisava fazer escondido. De vez em quando, atrás das arquibancadas do
colégio. Na maior parte das vezes, na casa da árvore que Logan e Calliope
construíram juntos para se pegar.
Pelo menos é o que eu pensava que faziam. Uma vez entrei lá de
surpresa para zoar a cara deles, mas vi os dois jogando palavras cruzadas.
O desgosto e desapontamento no meu rosto foi tanto que até eles
ficaram sem graça. Acabaram pedindo para eu participar e como não tinha
mais nada para fazer, acabei topando.
Pobre Logan. Passou a vida toda com as bolas doendo pela nossa
vizinha, mas finalmente estava laçando essa mulher para valer. Antes tarde
do que nunca, é o que dizem.
— Puta merda! — é a vez de Lucian exclamar, quando um Logan
muito bêbado começou a tirar a cinta-liga da Calliope com a boca.
Na frente de todos os convidados.
— Lance! Tira ele de lá! — Lydia berra, com as bochechas
vermelhas.
Porra, até eu estou sem palavras. Nunca vi meu irmão mais novo tão
solto, com esse brilho animalesco no olhar. Cacete, até Calliope parece
como um leão prestes a dar o bote.
Eles precisam de um quarto e de muita privacidade. Pelo jeito as
coisas vão ser selvagens hoje à noite.
— Ei, calma aí. — seguro Logan pelo colarinho, dando um puxão
para trás. Ele solta a cinta-liga de Callie, mas parece irritado. — Você vai
me agradecer por isso amanhã, pode apostar.
— Precisamos arrumar esse vestido — uma voz doce diz, como
quem não quer nada. — Onde fica o banheiro?
Eu travo.
Congelo.
Minha boca fica seca.
De repente, não controlo mais os meus movimentos.
Ergo o resto, dando de cara com o meu fantasma.
Samantha Samuels. O cabelo escuro continua na altura dos ombros,
as covinhas ainda são as coisas mais lindas que eu já vi. Ela está usando um
vestidinho rosa que deixa suas pernas à mostra, e é impossível não me
lembrar de todas as vezes em que estive com o rosto enfiado entre elas.
Quando seu olhar encontra o meu, ela fica paralisada.
Continuo segurando Logan, tentando impedir meu irmão de avançar
na direção de sua esposa. Tenho certeza que ele seria preso se eu o soltasse
agora — atentado ao pudor e tal.
— Sam… — murmuro, sentindo o nome dela deslizar pela minha
língua. — Quanto tempo.
Ela não hesita.
— Lance… Que prazer te encontrar aqui.
Um prazer me encontrar aqui?
Não parece a mesma Samantha que eu vi pela última vez.
— Vou levar a noiva para o banheiro. O vestido dela está uma
bagunça — justifica, arrastando Callie na direção dos reservados.
Logan balbucia alguma coisa, mas eu dou um apertão em seu ombro
para ele ficar em silêncio. Embora seja o casamento do meu irmão, sou eu
que acabei de me deparar com uma assombração.
Samantha Samuels está de volta.
E que os céus nos ajude.
seis anos atrás
Essa garota só podia estar pedindo para morrer.
Quer dizer, não julgo. Cada um com seus fetiches e suas vontades,
mas filmar o trote dos calouros de faculdade na cara dura assim? Preciso
admitir que ela tinha coragem. Eu mal conseguia encarar o líder da nossa
fraternidade nos olhos.
— É só isso? — debochei, tentando manter os olhares de todos
sobre mim. Queria que ela entendesse que estava na hora de guardar
aquele aparelho porque se eu percebi o que estava rolando, era só questão
de tempo até as outras pessoas também sacarem tudo.
E aí, meu amigo, ela estava ferrada.
— Acha pouco? — A ruiva estava ficando cada vez mais vermelha.
Meu dom de ser irritante foi conquistado com muito esforço, obrigado.
— É que eu acho clichê. Mas tudo bem, eu faço.
Ela apertou os lábios com tanta força que pensei que veria um filete
de sangue escorrendo pela boca carnuda. A garota era bonitinha, mas um
tanto quanto temperamental.
— Você deveria tomar cuidado com essa língua.
— Não me pediria isso se soubesse todas as habilidades que eu
possuo com ela — devolvi, sabendo muito bem o quanto eu soava babaca.
Vamos, garota. Fuja daqui. Se vire, suma, antes que seja tarde
demais.
Mas ela parecia envolvida demais filmando a minha interação com
a ruiva. Já conseguia ver as manchetes com “o escândalo do trote dos
calouros do futebol da Universidade do Texas”. Meus pais pegariam o
primeiro avião para me dar uns puxões de orelha, e essa nem era a pior
parte.
Isso poderia acabar com a carreira que eu mal tinha começado.
— Essa piadinha também é muito clichê — ela atirou de volta,
revirando os olhos ao me dar as costas.
Desviei o olhar para encarar os outros caras do time. Eles
continuavam enfileirados, com a cabeça baixa. Alguns soltavam risinhos e
gritos de incentivo, mas a maioria só parecia querer estar em qualquer
outro lugar do que aqui.
Covardes. Eu jamais deixaria alguém cagar na minha cabeça, por
mais poderoso ou influente que fosse.
Quando as pessoas em volta começaram a entoar o hino da
universidade, um pico de adrenalina descarregou sobre o meu corpo.
— Você tem trinta minutos para fazer o percurso até o ginásio.
Cantando. Três de nós estarão esperando você por lá, então saberemos se
você cumpriu o desafio ou não — a garota continuou, com o dedo em riste.
Segurei a vontade de revirar os olhos.
Quanta infantilidade. Confesso que quis vir para o trote porque
pensei que seria algo no estilo American Pie. Ou pelo menos que chegasse
ao nível de filmes adolescentes que sempre acabavam em uma festa de
arromba e uma casa destruída.
Cantar Taylor Swift enquanto atravesso a porra do campus parecia
brincadeira de criança perto das ideias que tive.
Que os calouros do meu último ano se protegessem.
— Farei em dez — rebati, sabendo muito bem que estava
começando a soar insolente.
Bom, foda-se. Eu poderia cair, mas cairia atirando.
O que me leva à garota que continua com o celular apontado
justamente na nossa direção. Ela realmente achava que não estava na cara
o que estava tentando fazer? Tinha que ser muito inocente para achar que
não seria descoberta.
Comecei a me alongar quando a contagem regressiva começou.
Meus colegas de time começaram a entoar o hino do time, enquanto eu
lancei um olhar de advertência para a garota do celular.
Ela me encarou de volta. E, como em um grande filme ruim de
Hollywood, senti minhas entranhas se contorcerem.
A garota era gostosa pra caralho.
Arregalou os olhos, enfiando o aparelho de qualquer jeito entre as
roupas para evitar que alguém percebesse e eu respirei aliviado. Morte não
seria a causa de uma provável expulsão minha, ainda bem.

Estava quase alcançando o ginásio quando senti a presença de


alguém ao meu lado. Desviei o rosto, alarmado, com medo de acabar sendo
pego sozinho por um grupo por causa da minha boca grande. Meu rostinho
era lindo demais para ficar deformado.
Mas não era nenhum daqueles babacas. Era ela.
— Ei! — A garota estava ofegante, o rosto vermelho encharcado de
suor. — Meu… Deus! Será que você poderia ir mais devagar?
Lancei um sorriso superior.
— Por quê? Pra você me filmar melhor?
Ela abriu um sorriso inocente.
— É sobre isso que eu queria falar…
— Não se preocupe, ninguém vai saber sobre aquilo. Jamais iria
querer ser responsável pela morte de alguém — joguei como se não fosse
nada, porque sabia que ela ficaria assustada.
Na mosca.
— E quem é que está falando em morte?
— Ué, se você quer filmar o trote do time no meio de todos aqueles
psicopatas, só posso supor que você está louquinha para se meter em
encrenca. Não confio em nenhum deles.
Ela recuou, colocando as mãos sobre os joelhos em busca de ar.
Eu poderia ter me virado e continuado o meu caminho.
Eu deveria ter me virado e continuado o meu caminho.
Mas não. Eu fiquei para ajudar a socorrer a engraçadinha,
mandando-a inspirar e soltar o ar com calma por pelo menos dez minutos.
Se estava cruzando o campus tentando me alcançar e era uma pessoa
sedentária, tinha sorte de ainda não ter desmaiado.
— Desculpa. Não sou muito fã de exercícios.
— Percebi.
Ela virou o rosto furioso tão rápido para mim que precisei sufocar
uma risada.
— Foi mal, não quis ofender. É só que você mal consegue ficar de
pé, e eu preciso terminar isso. — Apontei para o meu corpo, ciente de que
estava levando seu olhar diretamente para o meu abdômen manchado de
tinta.
Meus irmãos costumavam dizer que eu não valia nada e que as
mulheres eram loucas por se envolverem comigo. Eles só não sabiam que
as minhas táticas de sedução eram infalíveis.
— Sou Lance.
— Eu sei quem você é.
Arqueei a sobrancelha.
— Minha fama já chegou até aqui? Caramba, sou melhor do que eu
pensava.
A garota finalmente conseguiu se levantar, me dando uma
cotovelada nas costelas ao passar por mim.
— Corta essa, Moreau. Você disse seu nome na apresentação.
Putz. Ela tinha razão.
Mas não deixei meu sorriso vacilar e nem abalei a minha postura.
Foi assim que me tornei o rei do baile na minha escola, mesmo depois de
Nancy, uma das garotas que eu costumava pegar, espalhar para toda a
escola que eu tinha passado clamídia pra ela.
E nós não tínhamos feito quase nada! Só uns beijinhos com as mãos
nos países baixos.
— E qual é o seu?
— Não interessa.
Que mulher insolente.
Gostei dela.
Cruzando os braços, eu dei duas passadas longas para alcançá-la.
Ela colocou a mão sobre o peito, assustada quando deu de cara comigo.
— Interessa assim. Ainda mais que você tem imagens feitas sem o
meu consentimento no seu celular. Sabe como é, talvez eu possa dedurar
você para uns babacas aí e subir a minha moral.
Eu jamais faria isso. Não só porque eu realmente estava irritado
com as pessoas dessa universidade, mas porque também estava adorando o
fato de que uma garota tinha conseguido burlar uma das maiores regras da
fraternidade bem debaixo dos narizes empinados daqueles mimadinhos e
nenhum deles percebeu.
— Olha, começamos com o pé esquerdo, mas acho que dá para
reverter essa situação. — A encrenqueira piscou os olhos enormes para
mim, forçando um sorriso amigável.
Intrigado, me aproximei um pouco mais do seu corpo. Ela era alta,
praticamente do meu tamanho, e foi incrível não precisar me abaixar para
conseguir sentir o seu cheiro.
Era cítrico, como uma flor. Daria tudo para saber qual era.
— Por que estava nos filmando? — perguntei, abaixando o tom de
voz.
Aparentemente estávamos sozinhos, mas como a ruiva disse que
alguns deles me encontrariam em frente ao ginásio, preferia não arriscar.
Ela parecia apreensiva. Passou o peso de uma perna para a outra,
sem saber muito bem o que me dizer. Quando fiz que iria me virar, ela
colocou a mão sobre o meu braço.
Nossos olhares desviaram para lá imediatamente. Ela recolheu a
mão, parecendo surpresa com a energia que pareceu passar do contato dos
seus dedos até a minha pele.
Que porra era essa?
— Nosso tempo está acabando — resmunguei.
Ela prendeu a respiração novamente. Em seguida, deixou os ombros
caírem, se dando por vencida.
— Quero entrar para o jornal da escola e preciso escrever uma
matéria boa e que chame atenção. Minha colega de quarto me contou sobre
o trote e eu acabei me lembrando disso. Minha filmagem é apenas para fins
literários. Meu nome é Samantha, a propósito.
Soltei a risada mais irônica que consegui. Era uma mistura de
deboche e estado de choque, tudo ao mesmo tempo, e adorei vê-la precisar
cerrar os punhos e guardá-los bem rente ao corpo para impedir de me
socar bem na cara.
Devia estar pensando: quem esse garoto acha que é?
Típico.
— Sabe que vou precisar pegar esse celular, não sabe? — perguntei
como quem não quer nada.
Segurou o aparelho com mais força entre os dedos, escondendo-o
atrás das suas costas.
— Não vai mesmo.
— Olha, é um prazer te conhecer, Samantha. Em outras
circunstâncias, eu até iria jogar uma cantada barata em você e te chamar
para sair, mas a questão é que meu tempo está acabando e eu preciso
terminar esse trote.
— E quem é que está te impedindo?
Estreitei os olhos para ela.
— Você. Agora me entrega o celular, vou apagar todas as imagens
que você fez de mim, e aí você pode voltar para o seu dormitório.
— Como se eu fosse obedecer a algum comando seu. Tá achando
que eu sou um cachorro?
Porra. Ela não deveria ter dado essa brecha.
Porque o sorrisinho convencido que se formou no canto da minha
boca não restava dúvidas: eu tinha adorado a deixa.
— Definitivamente não. Mas confesso que a imagem de você de
quatro pra mim não é nada repulsiva.
— Você é um porco.
— E você uma encrenqueira. Com tantas coisas interessantes nessa
universidade, jura que se meter com os jogadores de futebol e os psicopatas
das fraternidades é a melhor opção?
— Era isso ou eu enviaria os meus artigos escolares. Acredite em
mim, não vão me aceitar. Na verdade, podem até questionar o reitor sobre
eu ter sido aceita.
Soltei uma risadinha.
— Aí já é um problema exclusivamente seu. Não vou deixar um
vídeo meu rodando sem camisa e todo sujo de tinta cantando músicas da
Taylor Swift, caramba. Que tal ser uma boa garota e não arranjar mais
confusão, hein?
A tal Samantha foi ficando cada vez mais vermelha. Soltou o peso
de um pé para o outro, ajeitou a postura, desviou o olhar. Fiquei me
perguntando o que essa espertinha estava tentando fazer.
— Tudo bem — se deu por vencida, abaixando a cabeça. — Eu te
entrego o meu celular. Desculpa, eu sei que fui sem noção e que isso não
deveria ter acontecido. Sabe como é, sou caloura e tal, ainda estou
aprendendo sobre…
Mas ela não terminou a própria frase. Em determinado momento,
Samantha girou nos calcanhares e começou a correr.
Que porra é essa?
Ela estava indo na direção do ginásio, e eu apenas fiquei ali,
parado, incrédulo, sem conseguir acreditar no que meus olhos estavam
vendo. Ela achava mesmo que ia escapar de mim? Ainda mais dessa
maneira desengonçada?
Em três passadas, eu alcancei Samantha. Ela conseguiu se desviar
da minha mão, esbarrando de propósito em um dos caras que me
aguardavam em frente ao ginásio.
Puta que pariu.
Graças ao universo, nenhum deles me questionou. Entramos no
local sem resistência, com a encrenqueira correndo na direção das
piscinas.
— Samantha, pare com isso! — ralhei, extremamente irritado. No
início, a nossa interação foi bonitinha e engraçada, agora, beirava o
insuportável. — Você vai cair.
— Você não pode censurar a imprensa! Tenho direito de ser livre!
Revirei os olhos.
— Você não é a imprensa. Ainda. Só uma enxerida que está
procurando confusão!
— Censura!
— Bom senso!
— Vivemos em um país livre! Cala a boca já morreu!
— Pelo visto é você que está querendo morrer. Não viu o olhar
maníaco no rosto daqueles estudantes, não?
— Você não pode me tocar sem o meu consentimento. Se vier pegar
o meu celular, vou gritar.
— Samantha…
— Posso borrar seu rosto, tá legal? Não vou te expor.
— Samantha!
— Caramba, ninguém vai saber que é você! Para com isso! E
também…
Mas ela não conseguiu terminar a frase.
Estava tão concentrada em fugir de mim e retrucar minhas
respostas que não percebeu que a cada passo que dava para trás, se
aproximava ainda mais da piscina de dez metros. Ela ainda tentou se
equilibrar, mas foi em vão.
E com um barulho estridente, Samantha caiu na água.
Com o celular na mão.

Não hesitei.
Sequer pensei.
Apenas me joguei na piscina atrás dela, o coração martelando em
meus ouvidos ao escutar seus guinchos de desespero. Será que a garota não
sabia nadar? Porra.
Segurei Samantha pelas axilas, nadando com ela até a beira da
piscina. Ela respirava fundo e audivelmente, tentando capturar o máximo
de ar que conseguia. Os olhos brilhavam de pânico e desespero.
Não entendi porque, mas meu coração doeu ao ver a expressão de
seu rosto. Samantha parecia tão indefesa. Começou a se agarrar a mim
como se eu fosse seu bote salva-vidas e isso fez minha pulsação acelerar.
Gostei disso.
Gostei demais disso.
Talvez eu não devesse ter gostado tanto disso.
— Ei, calma… — sussurrei, segurando seu rosto com calma entre as
mãos. — Respira fundo. Devagar. Isso, assim…
Os olhos dela estavam arregalados. Inspirou profundamente,
tentando assentir com a cabeça. Por puro instinto, minhas mãos foram
parar na sua cintura. Eu mal conseguia sentir a água gelada, porque a
sensação da pele dela contra a minha já estava ocupando todos os meus
sentidos.
— Eu não sei nadar — resmungou entredentes.
Precisei segurar a risada. Ela achava mesmo que isso não estava
óbvio? Por Deus.
— Notei.
— Me tira daqui, por favor.
Eu podia ser um degenerado que não sabia controlar a própria
língua, mas não um covarde. Impulsionei seu corpinho para fora da água
gelada, deixando-a sentada na beirada.
Só então percebi que, teoricamente, tinha acabado de cumprir com
o trote. E, merda… A lambança de tinta por todo o lugar estava feia.
Precisava tirar Samantha daqui o mais rápido possível ou estaríamos
encrencados.
— Você está todo sujo. — Ela torceu o nariz.
Impressionante. Ela estava toda molhada, rangendo os dentes e
tremendo de frio. Mesmo assim, empinava aquele nariz e me olhava com
desdém como se a tinta escorrendo pelo meu corpo fosse o pior dos nossos
problemas.
— Acontece. Temos que sair daqui — respondi, dando impulso para
sair da piscina olímpica também. — Que foi?
— Você vai chamar atenção desse jeito.
— Não importa. Se alguém pegar a gente aqui, estamos ferrados.
Mas a tal Samantha não se importava com o tempo escasso que
tínhamos ou sobre a possibilidade de acabarmos indo parar em uma
universidade qualquer no meio do nada — porque uma expulsão não era
vista com bons olhos pelos reitores.
— Lance, temos que dar um jeito de te limpar.
— Não, não temos. Anda, Samantha.
Ela bufou.
— O que você acha que vão pensar quando virem você andando por
aí molhado e coberto de tinta? Principalmente depois de virem essa
lambança na piscina? É mais fácil você se entregar de uma vez.
Rangendo os dentes, travei o maxilar com força. Eu sabia que o que
ela estava dizendo tinha fundamento, mas ainda assim me recusava a dar
razão para essa espertinha.
— Tudo bem. E o que você sugere?
Ela desviou o olhar, parecendo procurar algo. Qualquer coisa… Até
que os olhos castanhos brilharam mais ainda.
Apenas observei, confuso, quando Samantha se levantou e
caminhou até a entrada do vestiário. Meu coração saltou pela boca quando
a vi agachar, vasculhando os armários em busca de alguma coisa.
— Ah! Sabia — comemorou baixinho.
Engoli em seco quando a vi chegar com uma camiseta branca nas
mãos.
Ah, merda.
— O que você pensa que está fazendo?
Samantha apenas revirou os olhos, ficando de joelhos para me
alcançar novamente.
Me esquivei quando ela enfiou a camiseta na água e se aproximou
de mim, mas isso a fez guinchar como um esquilo.
— Fica quieto. Preciso ser rápida.
— O que você está…
— Cala a boca, Lance.
Porra. Eu não deveria ter ficado excitado com a forma irritada que
ela pronunciou o meu nome, deveria? Jesus, eu definitivamente precisava
de terapia.
Samantha começou a esfregar o tecido pela minha pele, o rosto
retorcido em uma careta linda. Parecia concentrada quando tinha que
passar alguns segundos a mais em uma mancha. Meu corpo ficou todo
arrepiado, aproveitando aquele carinho mesmo que eu tentasse dizer a mim
mesmo que não significava nada.
Ela só estava me limpando para não sermos pegos.
Era só isso.
— Acabei — comemorou, animada. — Vem, Lance!
Precisei de mais alguns segundos para entender onde estava e quem
era. A garota tinha me deixado baqueado por alguns segundos, e eu não
fazia ideia do porque.
— Vamos para onde? — perguntei com o tom de voz rouco.
— Ué, para onde seus colegas de time estão esperando. Você
terminou o desafio, não terminou? — Arqueou a sobrancelha, me olhando
por cima do ombro. — Já eu, por outro lado… Meu celular deu perda total.
Estou ferrada.
— Eu te ajudo a comprar outro.
— Lance, não.
— A culpa em parte também é minha. Não é justo.
— Ah, você só estava tentando evitar que eu escrevesse sobre você.
— Ela balançou a mão, como se me dispensasse. — Vou lidar com as
consequências. Além do mais, meu avô estava querendo mesmo saber o que
me dar de aniversário.
— Ainda assim, não me parece justo.
— Você vai sobreviver.
Eu ri, acompanhando-a até o ponto de encontro. Meus colegas de
time encaravam os relógios em seus pulsos, provavelmente querendo saber
se eu conseguiria terminar tudo a tempo.
Quando virei para o lado, vi Sam se afastando. Toquei seu braço,
vendo-a me encarar.
— Vai fazer alguma coisa amanhã à noite? — perguntei, receoso.
Essa garota me intimidava. Não entendia isso muito bem porque,
porra, as meninas se jogavam aos meus pés, não o contrário.
— Acho que vou estudar. E talvez ir atrás de um assunto para a
minha matéria que não acabe com o meu iPhone embaixo d’água —
zombou, abrindo um sorriso de canto.
Mordi a bochecha por dentro, sentindo um arrepio percorrer o meu
corpo. Adrenalina.
— Posso te ajudar.
— Acho que você é ocupado demais para esses assuntos triviais de
calouras de comunicação. Deveria perguntar se uma líder de torcida ou
algum membro da fraternidade precisa de ajuda para recarregar o barril
de cerveja.
— Que espertinha. Isso por acaso é uma forma de insulto?
— O quê? Jamais. Sou totalmente a favor de cerveja barata dentro
de barris. Já bebi muito dessa fonte.
Dei de ombros.
— Então talvez você devesse aparecer na festa da fraternidade
amanhã. Vamos ser membros do time oficialmente, então vou estar bem
vestido e com o cabelo penteado. Prometo muita cerveja de barril.
Ela pareceu ponderar por um instante.
— Acho que tudo bem. Preciso fazer novos amigos.
Isso aí, caramba.
Assisti-a se afastar com um maldito sorriso no rosto. Meu coração
continuava acelerado, minhas mãos suadas e meu rosto congelado em uma
expressão de felicidade.
— Ei, Lance? — Ela se virou para me encarar. — Gosto de ver você
assim. Bagunçado.
E eu caí do pedestal
Direto para a toca do coelho
Para encurtar a história, foi um momento ruim
long story short | Taylor Swift

— Meu vestido está todo sujo. — A voz arrastada de Calliope


denuncia o quanto ela está bêbada.
Forço um sorriso amigável, pedindo um milhão de desculpas
enquanto enfio a mão sob a sua saia. Ela chia, jogando as mãos sobre o meu
pescoço, e nós duas quase perdemos o equilíbrio.
— Desculpa. Eu não estou bêbada. Só um pouquinho alta…
Ergo a sobrancelha.
— Um pouquinho?
— Ei, é o dia do meu casamento. Eu mereço encher a cara!
— Você tem razão. Beba o bastante para se esquecer de que casou
— brinco, molhando a mão na torneira para passar suavemente sobre seus
olhos borrados com o rímel.
Está aí algo que eu vou querer replicar um dia no meu casamento se
esse dia acontecer. Vou querer beber e me acabar na festa como se não
houvesse amanhã já que, particularmente falando, acredito que é mesmo a
melhor parte de assinar os papéis concordando em dividir toda a sua vida
com alguém.
— Eu não quero esquecer que eu me casei — ela diz, franzindo a
testa. — Na verdade, estou bebendo de felicidade por finalmente colocar
um anel no dedo daquele cara. Não é querendo me gabar, mas ele é muito
bom com a boca.
Ai, meu Deus. Ela não vai começar a tagarelar bêbada sobre a
performance de seu marido, vai?
Calliope suspira, sonhadora.
— E a forma como ele consegue usar aquele pau… Estou falando, é
quase sobrenatural. Já fizemos uma maratona de vinte e quatro horas
seguidas, sem conseguir parar. Precisei tomar quase um litro de isotônico
depois daquilo e com certeza dormimos por quase dois dias inteiros, mas
valeu a pena.
É, ela ia tagarelar sobre a performance do marido.
Isso com certeza não estava nos meus planos quando embarquei
naquele avião hoje. E, caramba, vinte e quatro horas?! Tudo bem que eles
são atletas de alto rendimento — porque Calliope é uma tenista profissional
e seu marido um notório jogador de beisebol —, mas isso parece extenuante
na minha opinião.
E um pouquinho exagerado também. Sempre tem aquela amiga que
conta vantagem sobre o quanto trepou no final de semana e você nunca sabe
se é de fato verdade ou se há uma grande dose de exagero no meio.
— Fico feliz por você. — Sorrio, encabulada.
— Eu também fico feliz por mim. Vou trepar com ele hoje à noite
até perder as forças das pernas.
— Espero que sim.
— Obrigada por ter vindo até aqui, Samantha. Marjorie e Seth são
realmente importantes para nós. Sei que não deve estar sendo fácil…
Ai, não. Por favor, que ela não comece a dizer sobre como vovô é o
homem mais maravilhoso que conheceu e que se solidariza com a minha
dor. Não vou suportar mais um olhar condescendente ou de pena.
— Tudo bem, Calliope. A vida é assim — desconverso, conferindo
o resultado de sua aparência depois de ter ajeitado o que eu pude.
O cabelo ainda está espetado para todos os lados, uma bagunça de
fios loiros entrelaçados com o véu de noiva que ela ainda está usando.
Arrumei também a cinta-liga que seu marido fez questão de arrancar com a
boca. Já quanto a saia do vestido, bom… Digamos que nessa altura do
campeonato, os convidados devem estar tão bêbados que não irão notar.
Mas, repetindo: fiz o que pude.
— Espero que você se dê bem com meu cunhado, o Lance. Apesar
de estar com a pior reputação possível no momento, eu juro que ele é um
cara legal. Costumava assar biscoitos com a mãe dele em casa nos finais de
semana. E embora tivesse uma fila de garotas suspirando por onde passava,
não se gabava tanto disso. Não sei onde ele acabou perdendo a cabeça —
murmura ela, divagando. — Mas eu acho que só uma neta de Sam Samuels
seria capaz de uma façanha dessa.
— Vou considerar isso um elogio. E o que você quis dizer com essa
parte sobre o meu avô?
Calliope coloca a mão sobre a boca, abafando uma risadinha.
Reprimo a vontade de segurar seus ombros e balançá-la até conseguir
formar uma frase que preste porque, bem… Isso não adiantaria nada.
E ainda é o casamento dela, pelo amor de Deus.
— Não me leve a mal… Gosto muito da sua família, mas seu avô é
um pouco maluco. Ficava com aquela espingarda andando para cima e para
baixo e nos ameaçava a cada cinco segundos. Minha experiência no
acampamento Frozen Lake foi incrível, e fico triste por precisarem vendê-
lo. Sam construiu um paraíso naquele lugar.
Não chora, Samantha. Não chora. Não chora.
Engulo a pontada que sobe sobre a minha garganta, reprimindo
aquela dor incômoda que pode me desfazer em um monte de lágrimas e
catarro.
— É, ele construiu mesmo. Temos muito orgulho dele.
Ela me abre um sorriso encorajador.
— Mas, sobre o Lance… Você tem uma reunião com o agente dele
amanhã. Talvez vocês possam se conhecer melhor. Sei que ele pode dar
trabalho e ser um pouquinho difícil, mas se você não desistir, prometo que
ganhará um amigo companheiro em troca.
Assinto lentamente, mas sem abrir a boca. Aparentemente Calliope
não faz ideia do meu passado com Lance, e embora essa constatação me
cause uma fisgada estranha, tento não pensar muito a respeito. E daí que as
pessoas mais próximas a ele não sabem sobre a minha existência? Não é
como se eu tivesse perdido meu tempo contando sobre aqueles primeiros
anos na universidade também.
— Samantha… — A voz lacônica de Calliope me faz erguer a
cabeça novamente. — Por favor… Não deixe que ele seja transferido. Ele
pode ter feito merda e estar bastante inconsequente, mas sair desse time vai
matá-lo. É o grande sonho dele.
Umedecendo os lábios, eu apenas a encaro, sem esboçar reação.
Porque é uma verdade. Lance conseguiu a vida dos sonhos. Me
lembro de todas as noites que passamos deitados na sua cama, pelados,
exaustos pelas horas descobrindo melhor sobre o corpo um do outro.
Quando conversávamos sobre nossos objetivos, os Texans sempre
apareciam. Os olhos de Lance brilhavam com a empolgação de fazer parte
dessa equipe.
Por que então ele estava tentando destruí-la?
seis anos atrás
Lance não mentiu quando disse que teria muita cerveja de barril
nessa festa.
O que ele esqueceu de mencionar, talvez, é que também haveria um
grupo de novatos do time fazendo uma espécie de striptease em cima de
uma grande mesa oval. Não entendia como aquele pedaço de madeira
estava conseguindo aguentar todos eles sem desmoronar.
Guerreira, viu?
— Você está vendo o seu amigo em algum lugar? — perguntou
Sabrina, com um tom sugestivo. Ela não tinha acreditado muito quando,
depois de contar sobre meu encontro com Lance, eu disse que não havia
rolado nada demais.
Enfiei minhas mãos dentro dos bolsos da minha calça jeans.
— Não. Acho que ele não deve ter vindo…
Minha colega de quarto bufou, ficando na pontinha do pé para
vasculhar o ambiente. Virou tanto o pescoço para começar a sua busca que
me preocupei com ela tendo um torcicolo mais tarde.
— Lance Moreau não faltaria a uma festa. O cara está aqui há uma
semana e já conseguiu uma bela fama.
Ótimo. É tudo o que eu estava precisando mesmo, me envolver com
o maior galinha em potencial da universidade.
— Acho que vir até aqui foi um erro.
— Não foi um erro. Calma, nós vamos… EI! — Ela soltou um grito,
cobrindo a boca com as mãos imediatamente. Franzindo o cenho, tentei
acompanhar o seu olhar, confusa.
Meu Deus do céu.
Agora eu entendia o motivo de tanta histeria. Como não percebi
antes que um dos garotos tirando a roupa em cima daquela mesa era ele?
Lance abriu um sorriso, o que deixou suas covinhas evidentes. Ele
já tinha tirado a camiseta e a calça, então estava só de cueca e meias. As
pessoas gritavam, excitadas, em êxtase pela cena que estavam
presenciando.
Ele era… Sexy. Os olhos ficavam mais claros refletidos na luz da
casa em que estávamos, os cachos do cabelo lhe conferindo um visual
muito mais doce do que eu me lembrava.
Não tinha como descrever esse garoto sem mencionar o magnetismo
que o acompanhava. Lance quase reluzia, sua risada hipnotizava, seus
movimentos chamavam a atenção. Éramos como mariposas sendo atraídas
pela sua luz, seu brilho sem igual.
— Ah, Samantha… Se ele já não fosse seu, eu iria até lá e o
arrancaria daquela mesa. Arrastaria o garoto para o primeiro andar e o
deixaria fazer o que quisesse comigo — babava Sabrina, sem conseguir
desviar o olhar de Lance. Ele dançava ao som de alguma música
eletrônica.
Engoli em seco.
— Ele não é meu.
— Ainda, querida. Ainda. Pelo jeito que você me contou ontem, isso
está prestes a mudar.
— Lance deve ter chamado mais umas dez meninas para essa festa.
Sou muito idiota. Não devia ter vindo.
— É mesmo?
— É.
— Então por que ele parou de dançar, desceu da mesa e está vindo
diretamente na sua direção? — Arqueou a sobrancelha, balançando a
cabeça sugestivamente para frente.
Arregalando os olhos, desvio o olhar de Sabrina para dar de cara
com um Lance muito suado, sorrindo e me segurando.
Ele estava mesmo me segurando, não estava? E não de uma forma
superficial. Muito pelo contrário! Estava mesmo agarrando meus ombros
como se eu estivesse prestes a cair, o que dado a velocidade dos meus
batimentos cardíacos, podia muito bem ser uma verdade.
— Você veio! — exclamou ele, atraindo todos os olhares daquela
festinha para nós.
Ótimo.
— Eu vim. Estou esperando aquela cerveja de barril que você me
prometeu.
Seu sorriso ficou ainda maior, se é que era possível.
— Estava só esperando você chegar para começar. Vai ter uma
competição. — Seus olhos brilhavam de empolgação. — Você é a minha
parceira.
Reprimindo uma risada, eu balancei a cabeça.
Eu não amava festas quando era adolescente, mas o meu irmão
mais velho, Scott, era popular. Sempre era convidado para festas e meus
pais tinham aquela mania chata de dizer “você só pode ir se a sua irmã
também for”.
Embora eu não ficasse muito entusiasmada com a aglomeração de
adolescentes enchendo a cara, Scott sempre tinha ótimas formas de
barganha. Em uma dessas festas, eu descobri a cerveja de barril, e por
mais que ela tivesse um gosto de mijo — e quase sempre estava quente! —
percebi que as brincadeiras envolvendo aquele líquido diabólico eram
melhores do que passar a noite inteira emburrada no sofá.
— Quem nós temos que derrotar? — Esfreguei as mãos uma na
outra, forçando uma risada maléfica.
Lance jogou a cabeça para trás, gargalhando. Quem diria, não é
mesmo? Nem parecia que no dia anterior estávamos discutindo por causa
de um celular.
Sabrina pigarreou ao meu lado, sem graça.
— Hm, Lance? Essa aqui é a minha colega de quarto, Sabrina. Ela
que me arrastou até aqui hoje.
Ela estendeu a mão para ele na mesma hora. O jogador apertou
seus dedos, abrindo um sorriso amigável.
— Obrigado por ter feito ela vir. Seria terrível não ter um par no
desafio do barril.
— Ah, qual é? — reclamei. — Você nunca ficaria sozinho.
Lance deu de ombros.
— Mas eu não estaria com quem eu quero.
Okay…
Pelo pouco tempo que passei com ele, já tinha um veredito: Lance
era intenso. Podia ser uma tática de conquista barata que ele usava com
todas as garotas que tentava conquistar? Podia.
Mas eu não estava mais nem aí. Só queria curtir essa festa como
uma universitária normal. Prometi a mim mesma que no primeiro semestre
eu iria me concentrar cem por cento nas aulas, mas depois que essas
acabassem… O céu seria o limite. Queria me jogar em todas as festas e
jogos alcoólicos que me privei na adolescência.
Se não fosse agora, não seria nunca mais.
— Quando vamos começar? — instiguei, abrindo um sorriso de
canto para ele.
Lance primeiro sorriu, depois nos chamou com um aceno de cabeça
na direção dos jardins. O frio da noite me atingiu em cheio, então passei as
mãos sobre os meus braços para aliviar o desconforto.
— Finalmente, Moreau! Estava com medinho? — um dos garotos
desdenhou. Eu só conseguia prestar atenção em como todos eles
aguentavam ficar sem camisa em um frio desses.
O que uma bebida barata não faz com o corpo do ser humano…
— Medinho de você, cara? Pelo amor de Deus — meu “parceiro”
no jogo de cerveja de barril zombou, passando sorrateiramente os braços
pelo meu ombro descoberto.
Tinha quase certeza de que Lance sabia que eu estava morrendo de
frio. Poderia ter sido minha pele arrepiada ou a forma como eu cruzei os
braços, mas fato é que passou os dedos pelos meus ombros como se
quisesse me aquecer. Em seguida, colocou a jaqueta do time sobre mim.
Ergui o rosto, um pouco confusa, e ele só me lançou uma piscadinha
charmosa.
— Vamos começar ou não, porra? — o garoto mal-humorado nos
chamou novamente.
Nós dois desviamos nossos olhares, um pouco sem jeito.
O jogo não era muito difícil e consistia em basicamente uma coisa:
conseguir ficar de cabeça para baixo enquanto bebe o máximo da cerveja
quente. Nunca fui uma pessoa atlética, mas por algum milagre divino,
sempre tive uma elasticidade que nem mesmo meus pais conseguiam
explicar.
Passei a vida toda escutando coisas como “você deveria ser
ginasta!” ou mesmo “por que não tenta entrar na aula de dança?”, mas aí
eu dei uma olhada na minha estante de livros e entendi que eu queria
mesmo era trabalhar com letras. Escrevendo, lendo ou revisando, sabia que
precisava disso todos os dias da minha vida para ser realizada.
— Vem, Sam. — Lance estendeu a mão para mim, e sem nem um
pingo de hesitação, eu a peguei.
Sabrina começou a dar pulinhos e gesticular muito com as mãos na
minha direção. Não entendi direito o que ela queria dizer quando as
separou bem longe uma da outra, dando a impressão de que, bem… Lance
era um cara bem-dotado.
Sibilando palavras inaudíveis na direção dela, eu a encarei por
cima do ombro. “Vou te matar” foi o que ela entendeu, com certeza.
— O que foi? — Lance virou a cabeça para ver também.
Eu segurei seu pescoço, forçando-o a continuar olhando para
frente.
— Nada não. É só uma mosquinha chata.
— Sei.
— Mas então… Quem vai começar?
Ele não parecia totalmente convencido de que a minha agitação era
por causa de uma “mosquinha chata” mas foi um cavalheiro ao não me
perguntar mais sobre o motivo. Eu, definitivamente, mataria Sabrina assim
que saísse daqui. Não teria outra forma de fazê-la pagar.
O jogo começou com a menina ruiva do dia anterior. Desviei o rosto
quando ela me encarou porque, caramba, ela me dava arrepios. Ela tinha
como dupla um dos novatos do time de futebol, e quando ele a ajudou a se
equilibrar no barril, posso jurar que vi seus olhos brilharem de admiração.
Mas também… Quem não ficaria assim? A garota é simplesmente
linda.
— Vira, vira, vira, vira! — O coro começou, enquanto ela sorvia do
máximo da bebida pelo cano ligado ao barril que conseguia. Mesmo
estando de cabeça para baixo e com certeza extremamente desconfortável,
ela continuava graciosa e exalava elegância.
Que injustiça.
— Um minuto e meio! — um dos garotos ralhou assim que ela foi
colocada de volta no chão.
Gritos e comemorações explodiram em meus ouvidos. A próxima
garota também aguentou bastante, mas não conseguiu chegar ao tempo da
ruiva. A que veio depois dessa também — embora tenha passado de um
minuto e quase conseguido bater o recorde anterior.
— Agora é a sua vez, espertinha — Lance sussurrou bem perto do
meu ouvido. Não sei se foi de propósito ou não, mas sua voz me causou
arrepios.
Uma sensação de adrenalina tomou conta do meu corpo quando eu
usei seus ombros para me apoiar sobre o barril. Ele me encarou, lançando
um sorriso encorajador na minha direção. Segurei a mangueira da cerveja
entre os dentes, colocando as duas mãos sobre a madeira enquanto Lance,
me pedindo licença diversas vezes, segurou minhas pernas até erguê-las
para cima de uma vez.
Ok. Então agora eu estava de cabeça para baixo.
Desliguei a minha mente de tudo. Esse era o meu truque quando
meu irmão me levava para as festas da escola e me usava nessa
competição. Enquanto bebia a cerveja quente não me permitia prestar
atenção no gosto, no desconforto que estava sentindo ou nas vozes agitadas
ao meu redor. Tudo o que eu permitia deixar minha mente se concentrar é
no equilíbrio.
Não podia perdê-lo. Tinha que aguentar.
Digamos apenas que eu fui uma criança bem competitiva. Meus
pais achavam que isso iria melhorar com o passar dos anos, mas sou neta
do meu avô e gostamos de vencer.
Por isso que quando meu corpo dispara para mim que não tem mais
como continuar, eu permaneço por mais alguns segundos. Antes de
engasgar com a cerveja pela primeira vez, fiz um sinal com a mão para
Lance me colocar no chão.
— Puta merda, Samantha! — Ele segurava meu rosto com ambas as
mãos, o rosto maravilhado. Depois que se certificou de que eu estava bem,
Lance me abraçou pela cintura e começou a me girar.
Merda.
— Lance! — gritei, sentindo a minha cabeça começar a doer.
Ele parou na mesma hora, mas o sorriso continuava enorme em seu
rosto.
— Caralho, garota. De onde foi que você saiu?
— Eu sou da Califórnia. San Diego.
Ele riu, jogando a cabeça para trás.
— Três minutos inteiros, Sam. Duvido que alguma caloura quebre
esse recorde. Isso foi impressionante.
— Só mais um dos meus talentos. Você devia me ver em uma
competição de Jelly Shots. Meu irmão mais velho costumava me levar para
todas as festas de seus amigos só para ganhar apostas.
Lance continuava me encarando, o rosto congelado em uma
expressão admirada.
Estávamos ficando cada vez mais próximos, e por algum motivo,
isso não me deixava desconfortável. Do mesmo jeito que me senti quando
limpei a tinta de seu corpo musculoso, é como se fosse algo rotineiro.
Ai. Meu. Deus. Seria agora que ele finalmente iria me beijar?
Seu rosto não estava bem na frente do meu há um minuto atrás. Eu
consigo sentir seu hálito e sua respiração, e meu corpo se arrepiou
novamente.
E não, não era por causa do frio.
— CARALHO, LANCE! — um dos jogadores nos interrompeu,
colocando o braço sobre o ombro dele. — Essa menina é incrível! Quero
ela como parceira na próxima!
Ele apenas bufou, revirando os olhos.
— Vai sonhando.
— É sério, cara. Não seja egoísta. Podemos revezar.
— Só nos seus sonhos mais profundos, Charles. Samantha e eu
agora somos uma dupla.
Eles continuaram discutindo e por algum motivo, isso me pareceu
estranhamente confortável. Charles me arrancou boas risadas enquanto
conversava com Lance, e depois de uma aposta não implícita sobre tomar
jelly shots na próxima festa da fraternidade, Sabrina finalmente apareceu
querendo ir para o nosso dormitório.
Lance nem tentou esconder a decepção quando me virei para ir
embora.
— Sam?
Encarei-o por cima do ombro.
— Nos vemos por aí? — perguntou, sem jeito.
Sorri.
— Nos vemos por aí.
O frio de novembro e sua cura de flanela
Este dormitório já foi um hospício
Eu fiz uma piada: Bem, foi feito para mim
champagne problems | Taylor Swift

— Você não tem escolha. É pegar ou largar — meu agente, Sean,


resmunga. A xícara de café preto está quase transbordando e não sei por
que, mas vê-lo mexer em seus ovos com a ponta do garfo está me distraindo
mais do que o normal. — A garota é boa. Estava trabalhando com a
Amanda Sulky esses tempos, a atriz famosa. Conseguiu reduzir os danos de
imagem da garota em menos de seis meses. Se você não quer ser negociado,
é melhor ficar quieto e aceitar. Você não está em posição de escolher,
Lance.
Puta que pariu.
Sei muito bem que todos devem estar me vendo como a porra de um
garoto mimado. Sean deve estar se odiando por ter aceitado me agenciar
depois que fui draftado, mas a culpa não é minha se acabei me tornando
amigo de Charles.
O garoto era doido e gostava de uma farra. Tudo bem, não vou
mentir. Também sempre gostei. Mas não a ponto de ser pego nu em um
hotel com dez mulheres seminuas como os jornais estavam noticiando por
aí.
— Mas por que ela? Não tinha outras relações públicas disponíveis?
— Ela foi a que te aceitou. Preciso lembrar dos outros três que você
colocou para correr? Volto a repetir: você não está em posição de fazer
exigências.
— Que droga.
Ele se inclina levemente para frente, muito interessado.
— Por que está agindo assim? Tem alguma coisa especial nela? Eu
vi que ela se formou na mesma universidade que você.
Bufo, irritado.
— Samantha e eu… Não podemos ficar muito perto um do outro.
Vai ser um desastre, Sean. Confie em mim. Tenho certeza que ela é a
melhor do ramo e que conseguiria reverter a minha imagem, mas…
— Então não existe nenhum “mas”. — Ele desenha aspas no ar, com
deboche. — Você já está começando a ser cortado das coletivas de
imprensa. Foi bem no último jogo, mas está deixando seu time em uma saia
justa. O próximo passo seria a negociação, e cá entre nós… Você não iria
para um time melhor. Na verdade, pode dar adeus à sua vontade de ganhar o
primeiro Super Bowl. Patrocínios? Cortados pela metade. É isso mesmo que
quer?
É isso mesmo que eu quero? Que merda de pergunta é essa?
É óbvio que é o que eu menos quero no mundo. Preciso jogar
futebol como preciso de oxigênio para respirar.
E se ela for a minha única chance…
Balanço a cabeça, determinado.
— Não podemos tentar com outro profissional? Pelo menos por
poucos meses.
Sean respira fundo, levando a xícara até a boca para sorver grandes
goles do líquido escuro.
— Vamos tentar com ela por alguns meses. Caso não dê certo, eu
mesmo procuro outro. Mas vai por mim, Lance. Escute a garota e não fique
rebatendo as ideias que ela tem. Você precisa de mais ajuda do que pensa.
Ele não está sendo justo e deve saber disso muito bem. Um dos
meus antigos relações públicas sugeriu um namoro de fachada para
melhorar a minha fama de “mulherengo”. Trouxe uma pasta com fotos de
garotas como se fosse a porra de um catálogo. Ainda teve a coragem de
abrir um sorriso malicioso e dizer que qualquer uma toparia transar comigo
durante esse período por causa de “quem eu era”.
Quase soquei o babaca no rosto. Diversas vezes.
— Se ela vier com ideias como a dos antigos, manterei a minha
posição — resmungo, travando o maxilar.
Mas tenho certeza que Sam jamais iria sugerir algo assim. Ela é
muito certinha para usar as pessoas em benefício próprio.
— Ela parece ser melhor do que todos os outros, diga-se de
passagem. Deve estar chegando a qualquer momento para conversarmos
melhor sobre as possíveis estratégias.
Sabe o tinido do Homem-Aranha? Quando ele se arrepia inteiro
porque sente que há algo de errado, que está em perigo?
Acho que eu tenho isso em relação à Sam.
Porque assim que ela passa pela porta, eu sinto. Eu sei. Meu corpo
inteiro fica arrepiado, minhas mãos começam a suar e a minha garganta, de
repente, fica seca. Aposto que se eu tentar formar uma frase agora, vou
gaguejar igual a porra de um adolescente.
— Boa tarde. — A voz melodiosa dela chega aos meus ouvidos
quando finalmente alcança a nossa mesa. — Desculpem o atraso. Precisei
levar o meu irmão e a amiga dele até o aeroporto. Não podem perder aula.
Sean faz um sinal com a mão.
— Tudo certo, Samantha. Estávamos pensando no que pedir. Já
almoçou?
Correção: ele estava pensando no que deveria pedir. Eu só estava
assistindo Sean brincar com o que sobrou dos seus ovos mexidos do café da
manhã.
— Eu já comi, muito obrigada. Podemos começar?
É engraçado observar como Samantha não olha na minha direção.
Ela se mantém conversando apenas com Sean e isso está me deixando
muito puto. É como se os dois fossem os adultos e eu a criança birrenta que
está ouvindo enquanto decidem sobre seu castigo.
— Eu estou bem aqui — resmungo, levantando a mão como se
estivesse na sala de aula. — Podem me incluir na conversa. Eu também sou
adulto.
— Não parece — murmura Sam, franzindo o cenho. — Bom,
existem estratégias batidas que não precisamos replicar. O namoro de
fachada para limpar a imagem é eficiente, mas muito fácil de ser
desmascarado. Além do mais, achar uma pessoa confiável o bastante para
isso pode levar um tempo que não temos.
Sean olha para ela.
— E o que você sugere?
Samantha respira fundo.
— Isolamento. Lance estava estampado em jornais, revistas, vídeos
no TikTok e principalmente no Twitter não tem muito tempo. Apagar isso da
memória das pessoas não será uma tarefa fácil.
— Mas isolar ele de todos não parece uma ideia muito viável. Lance
ainda precisa aparecer em coletivas de imprensa e posar para ações
publicitárias. O dinheiro dele está vindo todo basicamente daí.
— Não será um isolamento total. Ele ainda vai aparecer nos treinos,
nas reuniões com o time e poderá trabalhar normalmente. Só precisamos
colocá-lo em um lugar que não seja tão visado. Os paparazzi sabem onde
Lance mora. Ficam de tocaia lá, esperando qualquer coisa para fotografar e
tirar de contexto. Vários veículos não precisam de uma história concreta
antes de publicar, mas sim de provas. Se tirarem foto dele perto de duas
mulheres, isso se torna um escândalo. Consegue me entender?
Sean parece ponderar sobre o assunto por alguns segundos.
— Lance nem sempre consegue se comportar. Mesmo estando
isolado, provavelmente seria visto em alguma festa ou entraria em um
ménage com um dos colegas de time.
— Ei — interrompo, ofendido. — Que merda é essa, Sean?
— Só estou falando a verdade, cara. O que você realmente precisa é
de uma babá.
Samantha limpa a garganta.
— Ele não vai se meter em mais confusão porque eu não vou
permitir. E se for para ser uma babá, dane-se, eu faço o serviço completo.
Mas o que precisamos fazer de imediato é tirar Lance do radar da mídia. Ele
precisa ir para algum lugar mais afastado, onde vai poder gastar a energia
com coisas mais saudáveis. Natação, corrida…
— Tem um resort muito bom a poucos quilômetros da cidade.
Pacific Dreams Resort & Spa. Eles estão acostumados a receber
celebridades e pessoas envolvidas na política. Acho que consigo uma
reserva. Para quantos dias?
— Vamos tentar por dois meses. Durante esse tempo, eu consigo
agendar coletivas de imprensa, entrevistas e até mesmo ações de caridade
para Lance começar a mudança de imagem.
É a minha deixa para intervir.
— Dois meses? Vocês querem me deixar presos em um resort por
dois meses?
Samantha finalmente lança um olhar em minha direção. E, merda,
meu coração começa a acelerar. Esses olhos escuros antigamente me
encaravam com adoração e desejo. Me lembro do dia que fugimos de uma
chuva no campus e Samantha me pegou pela mão e nos enfiou dentro da
biblioteca. Todos achavam que ela era a estudante de comunicação
boazinha e eu o descarado, mas ninguém imagina que foi ela que colocou a
minha mão sob a sua saia naquele dia.
Uma das experiências mais excitantes da minha vida.
— Ou você fica em um resort isolado por dois meses, ou vai embora
do time. O que você prefere?
Vejo uma faísca brilhando em seus olhos e isso, por algum motivo,
me incendeia por dentro. Senti falta da animosidade que sempre existiu
entre nós — uma espécie de flerte com implicância.
— Eu só quero me manter no time. Prometo não ir mais à festas, ir
da academia para o trabalho e até desativar minhas redes sociais.
— Você já me prometeu isso outras vezes — diz Sean, se recostando
na cadeira. — O que Sam está sugerindo faz mais sentido.
Eu bufo, me jogando sobre a cadeira como um garotinho. Não estou
suportando a ideia de me isolar como se eu fosse um maldito criminoso.
— Não sou uma criança, Sean. E eu não vou.
É a vez de Samantha pigarrear, chamando a nossa atenção
novamente. Seus olhos são inflexíveis e a postura, muito séria. É meio triste
pensar que a garota que conseguia ficar mais de três minutos virada de
cabeça para baixo tomando cerveja de barril esteja com um semblante tão
pesado e triste ultimamente. Por algum motivo desconhecido, só quero
puxá-la para um abraço.
— Escuta, Lance, não vou ficar aqui sentada fingindo que não te
conheço porque isso seria uma grande mentira. Sei quem você é, já nos
conhecemos antes e estou muito feliz por você ter conseguido a carreira que
sempre sonhou. Mas agora é a minha vez de conseguir a minha, e eu
preciso mesmo disso. Preciso demais. — Apesar de manter o semblante
sério, sua voz fica trêmula na última sentença. — Posso finalmente levar o
meu trabalho para onde sempre quis, e você pode recuperar a sua reputação
de volta. É uma via de mão dupla que será muito mais fácil se você parar de
agir como um mimado e começar a colaborar. E aí, como é que isso vai ser?
Eu sei tudo o que você não quer que eu saiba
Sua boca é um veneno, sua boca é vinho
Você acha que seus sonhos são os mesmos que os meus
Poison & Wine | The Civil Wars

Eu posso fazer isso. Eu posso fazer isso. Eu posso fazer isso.


Repetir isso para mim mesma há mais de dois minutos não está
surtindo o efeito desejado.
Porque Lance Moreau ainda está dentro do restaurante, com seu
sorriso charmoso, olhos hipnotizantes e corpo de matar. Ele não mudou
nadinha durante esses seis anos, ao contrário de mim.
Eu mudei.
Eu precisei mudar.
Eu cresci e amadureci para conseguir sobreviver. Sobrevivi a
quando vovô descobriu a sua doença maldita, e vou continuar sobrevivendo
quando ele der seu último suspiro.
— Samantha?
Hein?
Encaro meu reflexo no espelho, um pouco estarrecida. A voz que
me chama novamente é inconfundível.
É ele.
— Oi, Lance — respondo, ainda em choque. Leva alguns segundos
até que eu me recupere totalmente, mas em seguida decido abrir a porta do
banheiro.
Lá está ele. Nunca vi Lance usar uma roupa social — pelo menos
não tão de perto. Quando começamos o nosso breve relacionamento,
éramos dois ferrados. Mal tínhamos grana para comer em um restaurante
legal nos finais de semana, e quando ele começou a ganhar um pouco a
mais pelo uso da sua imagem ainda na faculdade, concordamos que o
melhor era guardar todo esse dinheiro.
— Você fugiu.
Suas palavras me atingem em cheio. Passando a língua suavemente
sobre os lábios, eu prendo a respiração.
— Fiz o que eu precisava fazer.
— E como tem sido a sua vida, Sam? Boa?
Chamar a vida que eu vivo de boa é um grande eufemismo. Posso
estar em um trabalho na qual ganho bem, ter uma boa família, mas estou
prestes a me afundar em dívidas hospitalares e passar o resto da vida sem o
grande pilar da nossa história. Meu avô.
Então, é. Podemos usar a palavra “boa” para descrever.
— Tentando sobreviver à fase adulta. Os anos passam rápido
demais.
Ele concorda lentamente com a cabeça, o semblante triste de novo.
— É verdade.
— Mas quero que você saiba que estou muito feliz e orgulhosa de
você, ouviu bem? Conseguiu o time que sempre quis, está jogando
profissionalmente e vi você estampar mais capas de revista do que qualquer
outro calouro. Isso sem contar nos edits do TikTok. Você com certeza é o
favorito da maioria delas.
Isso arranca uma risada sincera dele, e eu gosto disso. Sempre gostei
de como Lance sorria com os olhos. De como sempre soltava uma piadinha
inconveniente só para amenizar o clima. Quando eu o conheci, pensei que
ele era só mais um atleta gostoso que pensava ser melhor do que todo
mundo ali. Depois… Percebi que Lance era muito mais do que isso.
— Está gostando de como eu estou fodendo a minha carreira
também? — zomba, brincalhão.
Aperto meus lábios em uma linha fina.
— Essa parte podemos dizer que vou resolver. Qual é, Lance? Você
não é assim. Costumava agir igual um idiota quando estava no futebol
universitário porque era o único jeito de passar despercebido, mas agora?
Isso é só idiotice. Está desperdiçando seu futuro e deixando tudo passar e a
troco de quê?
Seus ombros ficam tensos de repente.
— Não quero falar sobre isso aqui.
— Tudo bem. Mas você entende que precisamos falar sobre isso em
algum momento, certo? Porque você vai seguir as regras, Lance. Você
precisa.
Ele abre um sorriso de canto e eu sei o que está por vir antes mesmo
dele abrir a boca.
— Seguir as regras? Esse nunca foi o meu forte, Sam.
— Pois agora vai ter que ser. Preciso desse dinheiro, Lance. E você
precisa de juízo.
— Nunca tive muito disso também. Lembra quando nos
conhecemos? Você me fez trapacear no trote. Ninguém nunca descobriu,
mas nós sabíamos.
— Trapacear? Você cumpriu todas as regras!
— Eu precisava chegar lá cantando, mas você surgiu no meu
caminho antes e nós brigamos pelo seu celular.
— O mesmo que foi parar no fundo daquela piscina. Você nunca me
agradeceu por ter limpado toda aquela tinta de você.
— E você nunca agradeceu por eu ter pulado na piscina para te
salvar. De nada, aliás.
Um sorriso imperceptível começa a nascer no canto da minha boca,
mas eu o controlo. O nosso problema sempre foi exatamente esse. Nossa
intimidade não sumia, não evaporava. Podíamos passar dias sem nos falar
pelo campus, mas quando a gente se esbarrava… Era como se tudo
estivesse exatamente como antes.
Lance e eu tínhamos esse superpoder.
— Nós dois nos dávamos bem — divaga ele, sem jeito. — Não
quero corromper essas memórias. Não sou mais aquela pessoa, Samantha.
Isso, por algum motivo, bate fundo. E não de uma maneira boa.
Não vou bancar a ingênua. De vez em quando eu pesquisava sobre
Lance no Google. Sempre aparecia notícias sobre seu time ou mesmo
entrevistas em coletivas de imprensa. Abria um sorriso contido e meu
coração enchia de alegria por saber que ele também estava realizando seus
sonhos.
Lance merecia muito.
Parei de pesquisá-lo quando vi sua primeira aparição pública com
uma mulher. Não era da minha conta e já fazia um tempo que não nos
víamos, mas mesmo assim, doeu. Percebi que estava na hora de seguir em
frente e deixá-lo fora da minha cabeça.
O único problema é que Lance ficava maior a cada dia. Era difícil
esquecê-lo quando estava em um outdoor do lado do meu prédio.
— Isso não é só sobre você, Lance. Eu preciso mesmo do cargo.
Você sabe que eu sempre quis trabalhar na área esportiva, e é um meio
muito fechado. O seu caso em específico me ajudaria bastante.
Ele fica ainda mais sério.
— Sam, não sei se vou conseguir conviver com você de novo.
Espera… O quê?
Magoada, dou um passo para trás. Lance e eu não terminamos com
uma briga, muito menos com raiva e mágoa. Foi chato, desconfortável e,
sinceramente? Um pouco confuso. Mas sempre gostei de pensar que vê-lo
novamente seria algo mais positivo do que negativo.
Talvez eu fosse a única que pensasse assim.
— Desculpa se a minha presença é tão incômoda — cuspo, irritada.
— Mas ninguém vai me impedir de realizar o meu trabalho, Moreau. Nem
mesmo você.
Frustrado, ele passa os dedos pelos cabelos. Estão bem mais curtos
do que eu me lembrava, o que lhe confere uma aparência bem mais velha.
— Samantha.
— E tem mais, o que você acha que eu vou fazer? Impedir você de
sair com seus casinhos românticos? Não tô nem aí para o que fizer, contanto
que não apareça nos jornais no dia seguinte. Entendido?
— Samantha.
— Lance, não adianta. Não vou desistir.
— Não quero que você desista, caramba! — diz ele, rangendo os
dentes. — Não quero ter você de volta na minha vida porque não dá. Não
posso. Não vou conseguir te ver todos os dias e fingir que nada aconteceu
entre nós. Foi impossível te esquecer da primeira vez, e não quero ter que
passar por isso de novo. — Ele respira fundo, fechando os olhos. — Não
espero que você me entenda. Mas estou pedindo que reconsidere.
Me calo no mesmo instante. Depois, observo Lance se desprender
do umbral da porta e andar até a saída do restaurante. Ele não se vira para
me olhar mais nenhuma vez.
— Como ele está, Scott?
Meu irmão suspira do outro lado da linha.
— Está na mesma. Continua sendo constantemente sedado.
Tratamento paliativo não tem muita novidade para contar. — A amargura
de sua voz reflete a minha própria.
— Ele perguntou sobre mim?
— Só todos os dias. Coisa pouca.
Isso me arranca uma risada sincera.
— Quando receber o adiantamento do meu próximo cliente, já vou
transferir metade para a sua conta. Você consegue pagar o restante dos
boletos médicos?
— Calma, Sam. Não vai dar todo o dinheiro e ficar sem nada. Você
precisa de uma reserva de emergência.
— E o vovô precisa viver o resto da vida sem dor.
— É por isso que ele nos deixou a escritura do acampamento e das
duas casas. Vamos vender, Sam. Não tem outra escolha.
— Ainda não, Scott. Me deixa tentar primeiro — praticamente
imploro. — Se até o final do ano eu não conseguir o montante, deixo para
lá. Eu mesma te ajudo a vender todos os imóveis.
Meu irmão grunhe. Ele odeia que eu esteja me matando de trabalhar,
fazendo freelas como jornalista enquanto continuo com meus clientes de
relações públicas. O fato de eu amar o meu trabalho não deixa a minha
rotina menos cansativa.
— Sam, isso é perda de tempo. Nós mal vemos você. O vovô mal
está vendo você. — Seu cansaço é nítido, e isso parte o meu coração. —
Acha mesmo que ele prefere que você viaje a maior parte do tempo ao invés
de passar os últimos dias da vida dele ao seu lado? Pense um pouco. O
Seth precisa de você. Eu… — Ele engole em seco. — Eu preciso de você,
Sam. Por favor, volte pra casa.
As lágrimas enchem meus olhos. Eu os fecho, sentindo o nó na
garganta quando sinto-as escorrerem silenciosamente pelo meu rosto. Sei
que tudo o que Scott está dizendo faz mais sentido do que eu fiz até agora.
Ainda assim, não consigo parar de pensar nas palavras de Lance.
Ele ainda gostava de mim? Ainda me queria? E, pelo amor de Deus,
por que isso se tornou algo tão importante agora?
— Dois meses, Scott. Vou passar dois meses com Lance Moreau em
um resort. Não é só pelo vovô. Se eu conseguir melhorar a imagem dele,
vou conseguir novos clientes do ramo esportivo.
— E esse sempre foi seu sonho. — A voz dele parece mais amena.
— Que coisa boa, Sam. Fico feliz demais por você.
— Valeu. Por favor, não deixe de me dar notícias. Coloquei o Seth
em um avião hoje pela manhã.
— Ele já chegou aqui com a Marjorie. A família dela ligou pedindo
para que alguém a levasse até em casa — diz ele com uma entonação
esquisita. — Acho que eles não vão se ver com mais tanta frequência.
Isso me faz parar de picar as cebolas. Estou na minha cozinha
terminando de cozinhar o meu jantar enquanto me atualizo sobre o caso do
vovô, mas subitamente tudo deixa de ter importância.
Seth é meu irmão mais novo, e ele é completamente apaixonado
pela melhor amiga de infância. A história é engraçada, porque meu avô
odeia o avô dela. Foram rivais desde sempre, mas tudo mudou com as
nossas mães. Elas também se odiavam a princípio, mas logo se tornaram
melhores amigas. As duas engravidaram na mesma época, mas embora
fossem próximas, os filhos só foram começar a conviver com uns oito anos
de idade.
Desde então, são inseparáveis.
— O que você quer dizer com isso, Scott? Seth vai ficar arrasado
sem a Marjorie.
Ele suspira.
— Eu sei, Sam. Mas a família dela não está colaborando…
— Como assim?
— Olha, não queria te sobrecarregar com isso agora. Mas digamos
que Bob está começando a fazer propagandas sobre o seu próprio
acampamento usando a derrocada do vovô. Mamãe não ficou nada feliz,
mas a filha dele o defendeu. O clima agora está estranho.
Caramba.
Vovô e Bob são rivais desde sempre. Reza a lenda que ambos
jogavam beisebol na escola e disputaram o draft, mas nenhum dos dois
conseguiu entrar em um time profissional. Meu avô sempre culpou Bob por
distraí-lo em uma das partidas; já Bob o acusa de sabotá-lo de propósito
antes de sua grande jogada.
Quando o colegial acabou, todos pensaram que a rivalidade também
ficaria para trás. Mas o que ninguém esperava era que ambos pensariam no
mesmo empreendimento: acampamentos de verão com foco em esportes.
Nem preciso continuar, certo? Eles disputavam campistas todos os
anos, mas agora com vovô fora da jogada, Bob já teria seus antigos alunos.
Que grande canalha.
— Billie realmente ficou do lado do pai? — pergunto, genuinamente
em choque. A mãe de Marjorie sempre foi muito sensata.
— Ela disse que era uma situação triste e que sentia muito por
todos nós, mas que o pai já teve prejuízo por causa do último verão do
Frozen Lake. Vovô conseguiu um jogador dos Red Sox como voluntário,
Sam. O acampamento de Bob teve muito desfalque de última hora.
— Mesmo assim, Scott. Isso não é algo que se faça. Ele nem se foi
ainda… — Minha voz fica trêmula mais uma vez. — E Bob já está fazendo
propaganda?
— Basicamente dizendo por aí que o Frozen Lake não existirá mais.
Agora só terão o Lake Sun.
— Não consigo acreditar.
— Pois é, nem eu. Se eu não tivesse visto um dos folhetos com meus
próprios olhos…
— Que escroto! — Coloco a mão sobre meu rosto, ainda incrédula.
— Seth vai ficar arrasado. Marjorie também.
— Eles vão ter que superar. Gosto muito da menina, mas dessa
família dela não quero chegar perto nem tão cedo.
— Você conversou com Seth?
— Conversei, mas ele não entende. Ficou revoltado. Já está sendo
muito difícil para ele aceitar a perda do vovô, ficar sem a Marjorie vai
terminar de destruí-lo. Precisamos mesmo de você por perto, Sam. Depois
que seu período com Lance terminar, volte pra casa.
Engulo em seco, sentindo a culpa me invadir lentamente. Meu irmão
tem razão. Não deveria estar pensando em Lance quando todos à minha
volta estão tendo perdas irreparáveis.
— Vou voltar, Scott. É uma promessa.
A única coisa que está na minha mente
Tenho sonhado que você também sente isso
Eu me pergunto como é ser amado por você
Wonder | Shawn Mendes

— O lugar é mais bonito do que eu pensei — murmura Sean,


concentrado ao volante, enquanto passamos pela entrada do resort que me
manterá afastado das câmeras dos paparazzi pelos próximos dois meses.
Continuo em silêncio quando estacionamos, e permaneço assim
quando observo Sean fazer o check in. Samantha nos mandou um
memorando dizendo que estaria no resort por volta das duas horas da tarde,
então daqui meia hora nos encontraremos de novo.
E é claro que eu não estou nervoso. Por que eu estaria, afinal? Só
porque abri a minha boca grande e acabei deixando meus sentimentos
falarem mais alto, talvez?
Samantha deve estar me achando o homem mais patético do mundo.
— Você deveria melhorar essa cara — meu agente resmunga,
terminando de assinar a papelada que me manterá preso nesse lugar. —
Aqui tem piscina, sauna, hidromassagem, um milhão de atividades ao ar
livre e muros tão altos que será impossível uma câmera te pegar.
— É impressão minha ou você acabou de descrever um centro de
reabilitação?
— Pode considerar isso se faz você se sentir melhor. A questão aqui
é melhorar essa sua imagem de jogador fanfarrão pelas próximas semanas,
mostrar alguém mais comprometido e sério. E cá entre nós… Vai ser muito
mais fácil aqui.
Decido ignorá-lo, já que obviamente convencê-lo de que isso aqui é
uma merda não vai rolar. Mas uma coisa eu preciso admitir: Samantha é
realmente uma das melhores do ramo. Não levou nem vinte minutos para
ela convencer o meu agente — o mesmo que trabalha para mais outros três
jogadores importantes e têm anos de experiência no ramo — de que me
manter em um SPA seria mesmo a melhor decisão de todas.
— Tá, tanto faz — bufo, sem a mínima vontade de discutir.
Recebo o cartão do meu quarto junto com uma piscadinha da
recepcionista do lugar.
Talvez não seja tão ruim assim, afinal.
— Se comporte, Lance. Estou falando sério. Tenho mantido contato
com o corporativo dos Texans para segurar as negociações, mas as notícias
não são as melhores.
— Fiz muita besteira, não é?
Ele quase tem uma síncope ao ouvir meu tom condescendente.
A questão é que ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, eu
não sou burro. Sei que fiz merda, sei que estou na corda bamba e bem ou
mal, sei que todas as restrições são para o meu bem.
Sei também que aos olhos de todos aqueles que ainda compram
jornal ou acompanham Instagrams de fofoca, eu pisei na bola feio. Do tipo
que não tem volta.
Mas que culpa eu tenho se a minha vida é uma série de eventos de
mal-entendidos, porra?
Quando Charles me chamou para beber um dia, eu não pensei: será
que ele vai chamar uma dúzia de garotas seminuas para dançar para a gente
no caralho do saguão? Não, porque isso nem passou pela minha cabeça.
Nem mesmo quando ele me mandou tirar a camisa. Pensei que
faríamos algumas gracinhas para as nossas fãs, no máximo um vídeo
duvidoso para postarmos no TikTok.
Resumindo, eu estava errado e agora todo mundo pensa que eu
participei de uma orgia em um hotel com meu colega de time. Passaram-se
semanas de pessoas comentando sobre o caso enquanto eu ameaçava acabar
com a vida de Charles em todas as oportunidades que eu tinha.
— Lá está ela — diz Sean, com os olhos brilhando de admiração.
E eu não posso nem culpá-lo.
Samantha está linda como sempre. Os cabelos escuros estão
amarrados em um rabo de cavalo, e não escondo a minha surpresa ao ver
que ela está usando um shortinho com uma camiseta social.
Ela vem caminhando na nossa direção e a minha boca fica seca.
Meu corpo reagir a ela não é exatamente uma novidade, mas não deixa de
ser irritante.
— Desculpem a demora novamente, estava desfazendo as malas.
Estamos prontos para começar?
— Com certeza.
O olhar de cobiça de Sean a segue conforme Sam nos guia até os
elevadores. Começo a me sentir desconfortável pela forma como o meu
agente a seca, mas até agora a minha relações públicas não parece
incomodada.
E além do mais, isso não é da minha conta.
— Vou precisar sair para os treinos pela manhã. Como vou fazer
isso e despistar os paparazzi até aqui?
— Já pensei nisso — murmura Sam, sacando um iPad de sua bolsa
transversal. Nem reparei no tamanho dessa coisa quando ela chegou.
Provavelmente porque você estava só de olho nas pernas dela,
minha mente mau-caráter acusa.
Mas… Não posso negar que é uma verdade.
— Vamos alugar uma minivan — diz ela, com a maior naturalidade
do mundo.
— Uma minivan? — zombo, levemente em choque.
— Sim, Lance. Nunca viu? É tipo um carro grande que cabe várias
pessoas. Normalmente se usam em excursões e também com pessoas que
têm vários filhos. Pensei que a sua família fosse grande.
— E ela é, mas tínhamos dois carros. Nunca entrei em um negócio
desses.
Ela deixa escapar uma risadinha.
— Sempre tem uma primeira vez.
— Não vou entrar em uma minivan, Samantha. Eu tenho um
conversível.
— Não estou nem aí para o carro que você tem, Lance. Todo mundo
já sabe qual é. Vamos usar um carro de excursão para deixar você
estrategicamente perto do seu centro de treinamento. Como ninguém sabe
de onde você está saindo, é tranquilo ir a pé até lá.
— Você só pode estar zoando.
— Estou falando bem sério. Vamos testar assim por alguns dias, se
não sair mais nenhuma matéria a respeito de você ou do seu peitoral nas
páginas de fofoca, podemos continuar.
— Meu peitoral?
— Aparentemente sempre tem um espaço para ele nos Instagrams
de celebridades — murmura ela, ainda de olho em suas anotações no iPad.
— Se você se concentrasse na sua carreira como se concentra na academia,
o próximo Super Bowl seria seu.
Ai. Essa doeu.
Semicerrando os olhos, eu abro um sorriso cínico.
— Anda secando muito o meu peitoral por aí, Sam?
Ela ergue o rosto, piscando diversas vezes. Eu a deixei
desconcertada por alguns segundos.
Mas é de Samantha Samuels que estamos falando, e é claro que isso
dura pouco tempo. Ela tem uma resposta afiada em seguida.
— Já vi maiores por aí, Lance. A culpa não é minha se você é
incapaz de vestir uma camiseta.
Travo o maxilar, me odiando por gostar de ter essa interação com
ela novamente. É sempre tão fácil discutir e provocar Samantha que acaba
se tornando um vício, e se continuarmos assim, em poucos dias seremos
tudo um para o outro.
Mas Sam e eu somos amaldiçoados. Nunca é uma boa ideia
recomeçar essa espécie de relação que temos.
É por isso que ela é e sempre será o meu fantasma.
cinco anos atrás
No segundo ano da faculdade, eu já tinha definido as minhas
prioridades.
Eu me tornaria o melhor jogador universitário do campus. Depois,
me formaria com honras — tá, eu sei que não se pode ter tudo. Mas eu
precisava ganhar o troféu Heisman. Era uma questão de honra para mim.
— E aí, Lance, vai para a festa hoje à noite? — Charles perguntou
quando nos encontramos no vestiário.
Não sabia muito bem o que responder. Normalmente eu estava indo
para todas as festas, mas por algum motivo, comecei a enjoar. Eram
sempre as mesmas pessoas, os mesmos jogos, o mesmo ambiente.
E também as mesmas garotas.
Costumava ficar com algumas fixas por aí. Nos encontrávamos nas
festas e curtíamos juntos, mas nem isso estava me animando ultimamente.
Precisava de algo mais… Estimulante.
— Ainda está pensando na garota do barril? — zombou ele,
balançando a cabeça feito um cachorro. O cabelo molhado espirrou gotas
de água pelo meu rosto, e eu grunhi. — Ela já está em outra, cara. Você
mesmo viu.
Engoli em seco.
Sim, eu vi.
Samantha e eu não nos vimos mais desde aquela primeira festa. Nós
nos esbarramos pelo campus algumas vezes, mas era complicado. Ela
conseguiu entrar para o jornal da faculdade e esse era o único motivo de
eu comprar constantemente as edições. Já eu, comecei a minha carreira no
futebol americano universitário e, irmão, o negócio é mais frenético do que
eu pensava.
Acho que por algum motivo desconhecido, eu internalizei que nós
tínhamos alguma coisa. Mas tudo mudou quando eu a vi caminhando de
mãos dadas com um veterano de jornalismo. Eles se beijaram
apaixonadamente em um dos corredores da universidade, e eu os segui com
os olhos até entrarem em um dos prédios dos alojamentos estudantis.
Não foi preciso muito para adivinhar o que estava prestes a
acontecer ali.
— Acho que vou aparecer na festa, sim. Mas sei lá… Não estou
muito no clima — desconversei. Meus ombros estavam tensos só de pensar
em mais uma noite enchendo a cara e tentando me desviar de pessoas que
só queriam ser vistas ao meu lado por status.
— Qual é, Lance? Nem parece que você estreou tão bem no jogo da
semana passada. Você merece se divertir.
Eu sabia que Charles tinha razão. Não podia me esconder no meu
dormitório para sempre — não agora que estava prestes a me mudar para
dividir um apartamento com ele, aliás. E já estava começando a ficar meio
irritado com o fato de não conseguir aproveitar uma festa como
antigamente.
Depois que saímos do vestiário, fui direto para o meu quarto. Como
já havia tomado banho, só terminei de passar um gel no cabelo e escolhi
bem o perfume dessa noite. Graças aos céus, a minha mãe sempre fez
questão de nos presentear com os melhores do mercado.
Charles terminou de se arrumar dez minutos depois de mim. Nós
estávamos usando camiseta polo simples, bermuda e a jaqueta do time. Não
é querendo me gabar, mas até senti vontade de lançar um beijinho para o
espelho quando me vi através dele.
Estou gato pra cacete.
— Porra, Lance. Não vai sobrar mulher nenhuma para mim hoje à
noite — resmungou Charles, fingindo irritação.
Ele sabe muito bem que não vai precisar nem abrir a boca antes de
uma dúzia delas se jogarem sobre seu colo. Uma das muitas vantagens de
ser um atleta em ascensão.
Nós fomos de táxi até a festa e não consegui evitar abrir um sorriso
ao ver a quantidade de gente com o rosto pintado com as cores da
universidade. Era sempre bom ver essa animação, principalmente quando o
motivo se dava pela nossa vitória. Empatamos no primeiro jogo, mas
vencemos por uma diferença de dez pontos no seguinte.
— CHARLES! CHARLES! CHARLES! — começaram a entoar em
coro ao ver que um dos meus melhores amigos desceu do carro. Revirei os
olhos ao vê-lo exibir seus músculos e abrir um sorriso convencido, mas ele
merecia a glória. Ele foi o responsável pelo ponto que garantiu a nossa
vitória, afinal.
— LANCE! LANCE! LANCE! — Bom, essa era a minha deixa.
Abri um sorriso arrogante ao desfilar até a entrada do enorme
casarão. Um dos membros da fraternidade era incrivelmente rico, e sua
família sempre disponibilizava a casa para as nossas “festinhas”.
Um dos garotos nos ofereceu um baseado, e por que não? Eu ainda
tinha alguns dias até o próximo jogo e estava a fim de relaxar.
— Calma aí, cara — brincou Charles, tirando o cigarro da minha
mão. — Você tem que aprender a dividir.
Soltei a fumaça devagar, correndo os meus olhos pela festa.
Algumas garotas tinham acabado de despertar a minha atenção, mas nada
demais. Eu só consegui encostar as costas na Ferrari estacionada no
jardim. Não estava a fim de entrar na casa também.
Charles e eu ficamos por mais um tempo jogando conversa fora
com as pessoas que estavam do lado de fora, até que um movimento me
chamou atenção.
Não apenas um simples movimento.
Era uma combinação de tudo.
Sua risada estridente, a voz petulante, a forma como se
movimentava.
Samantha Samuels estava aqui.
— Lance. — Charles semicerrou os olhos, ligeiramente perdido. Em
seguida, virou o rosto para conseguir ver o que eu encarava e deixou os
ombros caírem em frustração. — Já entendi tudo.
— Eu já volto — respondi, sem parar para pensar muito bem nos
meus próximos movimentos.
Eu a alcancei em poucos passos. Ela estava conversando com a
mesma garota que levou para a primeira festa que eu a convidei, e esperei
alguns segundos antes de cumprimentá-la só para me assegurar de que ela
não estava em uma espécie de encontro.
Aparentemente estavam sozinhas.
— Senhoritas. — Sorri, abrindo bem os braços, como se fosse o
anfitrião.
Samantha deu um pulo, o reflexo tão rápido que nem consegui
perceber o que ela estava prestes a fazer.
A garota simplesmente me nocauteou!
Usou o cotovelo para pressionar minhas costelas e quando perdi o
equilíbrio, me acertou em cheio nas bolas. Segurei meu pau enquanto via,
literalmente, estrelas. A dor começou a subir pela minha espinha e achei
que podia ter desmaiado.
Mas era só um palpite.
— Ai, meu Deus! Lance?! — A voz preocupada dela me trouxe de
volta para o mundo real. — Desculpa! Eu não percebi que era você e tinha
um cara muito chato que tentou me agarrar não tem nem dez minutos e…
— Samantha, vamos embora daqui! — E esse tom estridente só
podia pertencer à colega de quarto dela, Sabrina. — Você acabou de
derrubar um dos jogadores de futebol. Vão nos matar.
— Não posso deixar ele jogado aqui!
— Já estão vindo. Ai, meu Deus, Sam! Estão vindo pra cá. Vamos
embora agora, te garanto que não faltarão meninas prontas para ajudar
ele com esse machucado.
— Você só está me deixando pior.
— Vamos logo!
Respirando fundo, me atrevi a abrir os olhos. Vi dois rostos
preocupados e com o cenho franzido me encarando como se eu fosse uma
criança que caiu do balanço e quebrou a perna.
— Sinto muito! — Samantha foi a primeira a falar, gesticulando
bastante. Seu olhar alternava entre mim e o que eu presumia ser uma
multidão caminhando em nossa direção. — Lance, por favor, me perdoe! Eu
juro que não notei que era você!
Eu a dispensei com um aceno, finalmente conseguindo me sentar.
Meu pau ainda estava latejando com a pancada, mas eu forcei meu rosto a
não demonstrar toda a dor que eu sentia.
Ela prontamente me ajudou a ficar de pé, apoiando minhas costas
com as mãos delicadas. O gesto, por alguma razão desconhecida, foi
estranhamente reconfortante.
— Puta que pariu, Lance! — Charles correu até nossa direção,
segurando meu queixo como um irmão mais velho preocupado. — Ela te
acertou em cheio, cara.
— Eu mereci. Devia ter me anunciado antes de me aproximar tanto
— desconversei, estreitando os olhos para a minha nocauteadora.
Ela abriu um sorriso sem graça e se afastou. Franzi o cenho, triste
por perder o seu contato.
— Lance está bem, pessoal! — meu amigo anunciou para os
curiosos que assistiam a cena com muito interesse. — Só não vai poder ter
filhos pelos próximos dez anos.
Uma onda de risadas fez Samantha ficar visivelmente mais
tranquila.
Me aproximei novamente, forçando uma careta.
— Depois dessa surra, eu acho que mereço uma acompanhante
para o próximo desafio do barril.
— Vou ter que passar, infelizmente. Agora faço parte do jornal da
universidade, então eu só cubro as loucuras que acontecem nas festas. Mas,
olha, se quiser se arriscar nos Jelly Shots, prometo que vou publicar seu
melhor ângulo.
Isso arrancou uma risada sincera de mim.
— Eu até posso posar para uma dessas fotos, mas não garanto estar
vestindo todas as roupas — arrisquei uma cantada, mesmo sabendo que
essa foi uma das piores que já inventei.
Samantha, no entanto, abriu um sorriso sincero.
— Posso aceitar essa oferta.
— Pode, é?
— Posso. Claro, isso se eu também não estiver usando roupas.
Direitos iguais, sabe?
Porra.
Agora a imagem de Samantha usando apenas uma lingerie
enquanto me fotografava completamente nu invadiu a minha mente com
tudo. Eu, com certeza, iria me exibir para ela.
E ela adoraria cada segundo.
— Você não tinha um namorado? — Não queria que a minha voz
saísse tão afetada, mas foi inevitável.
A cena dos dois se beijando ainda me embrulhava o estômago.
— Namorado?
— Eu vi você e um garoto de óculos se beijando. Depois entraram
em um dos apartamentos…
— Você, por acaso, estava me espiando, Lance?
— E se eu estivesse?
Ela balança a cabeça, sorrindo.
— Bom, eu acharia um pouco estranho, não vou mentir. — Sam fez
uma pausa. — Mas, na verdade, eu nunca namorei. Carlson era só um pau
amigo, sabe como é.
É, eu sabia bem como isso funcionava. E esse era o motivo da
minha pele arrepiar e não de uma maneira boa.
Porra, o que era isso? Minha boca tinha ficado seca, meu coração
acelerado, e eu posso jurar que essa pontada desconfortável e possessiva é
algo que eu nunca senti antes na minha vida.
Por ninguém.
Eu não podia estar com ciúmes, podia?
— Ah, qual é, Lance? — Ela continuava com o sorriso brilhante no
rosto. — Vai me dizer que não entende? Uma garota também precisa
satisfazer as suas necessidades. Tenho certeza que você tem uma porção de
amigas coloridas.
No fundo, eu sabia que ela tinha razão. Sexo não era algo que
estava exatamente em falta na minha vida, mas por que pensar em
Samantha com alguém estava me deixando tão irritado?
— Que tal se pararmos de falar de outras pessoas, hein? — sugeri,
me aproximando ainda mais de seu corpo lindo.
Sam estava usando um short jeans de cintura alta e uma blusa com
mangas bufantes. O decote deixava parte dos seus seios à mostra e eu
salivei de vontade de prová-los na boca.
— Eu concordo. Vamos voltar à parte em que eu estou tirando fotos
de você sem roupa.
Sorri.
Então ela é atacante.
— Aí sim, hein? Vamos continuar até a parte em que você não se
aguenta e cai de boca em mim — atirei de volta, porque também era muito
bom nesse jogo.
E nos próximos dez minutos, acabei me pegando com Samantha em
um armário no quarto dos pais do anfitrião.
Não foi a ideia mais brilhante, mas sabe como é… Ele iria entender.
Sim, sei que ele é o meu ex
Mas duas pessoas não podem se reconectar?
Só vejo ele como um amigo
A maior mentira que já contei
bad idea right? | Olivia Rodrigo

O resort tem muros altos, é extremamente isolado e também muito


bem protegido. Isso me deixa satisfeita, porque parte da minha estratégia
consiste em deixar Lance fora do radar dos paparazzi por enquanto.
Isso se ele colaborar.
Nós fomos colocados em quartos no mesmo andar. Além disso, dois
bangalôs exclusivos foram solicitados para o caso de Lance querer curtir a
praia. Ele vai ficar fora da vista de todos e contar com um atendimento
especial, em uma área da praia afastada das demais.
Queria eu que todos os meus problemas fossem resolvidos com
álcool de graça e um hotel cinco estrelas.
— Preciso ir até o centro de treinamento — o emburrado murmura,
mal conseguindo me encarar nos olhos. — Sean disse que é importante eu
me manter presente.
Balanço a cabeça em concordância. Também penso o mesmo.
— Já conseguimos a minivan. Sean conseguiu alguns membros da
sua equipe de marketing para fazer volume no carro. Ninguém vai ver você.
Lance bufa, bagunçando os cabelos em irritação.
— Qual é, Sam? Você não pode esperar que eu realmente fique
usando esse carro.
— Você não está usando nenhum carro, Lance. Lembre-se que agora
tudo o que você vai ver do mundo está dentro dessas paredes.
— Isso não é justo.
— Também acho. — Reviro os olhos, marcando no meu iPad todas
as coisas que já consegui resolver. — Acabei de conseguir uma coletiva de
imprensa para você. É daqui um mês, e até lá quero seu foco
completamente voltado para o seu time. Ouviu bem?
— Sim, senhora.
— Nem precisa me agradecer por salvar a sua carreira depois —
alfineto, adorando sentir as borboletas no estômago que implicar com Lance
me causa.
Ele praticamente rosna perto do meu rosto.
— Aposto que a sua conta bancária farta nesses últimos dias já
fizeram isso por mim.
Nem me dou o trabalho de responder, embora minha língua esteja
coçando para jogar na sua cara que só estou aqui por causa das merdas que
ele mesmo está fazendo.
Observo Lance sumir dentro do elevador e decido ficar sentada no
saguão enquanto espero ele voltar. Meu coração está acelerado — e parte
disso vem do medo que começou a se infiltrar sorrateiramente em mim. Eu
sou uma boa profissional? Modéstia à parte, eu me considero uma das
melhores no mercado.
Eu posso lidar com Lance Moreau? Bom, isso aí já é algo que eu
não tenho tanta certeza. Ele me conhece bem demais e isso é um problema.
Dos grandes.
Quando Lance e eu rompemos de vez, eu decidi nunca mais
pesquisar sobre ele no Google. Isso era torturante por diversos motivos, mas
o principal deles é que eu queria saber se pelo menos um jogador
profissional ele tinha conseguido se tornar.
Sorte a minha que isso nem foi necessário pesquisar. Era só olhar
para as propagandas de roupas esportivas no shopping ou nos grandes
outdoors com seu rosto estampado. Merda, até quando eu ligava a TV dava
de cara com ele.
Decidi que se Lance estava aparecendo tanto para mim de qualquer
maneira, não faria diferença se eu desse uma pesquisadinha na sua vida. Só
para saber como ele estava, sabe? Para fins jornalísticos e tal.
O soco no estômago que me atingiu ao ver como ele voltou aos
velhos hábitos foi horrível. Vê-lo com mulheres diferentes, sorrindo para a
câmera e lançando sorrisinhos sedutores foi doloroso, mas reconheço que
também necessário. Passei muito tempo me sentindo de certa forma “presa”
a Lance. Essa coisa de história mal-acabada pode ferrar com a cabeça de
alguém — e embora eu não ficasse necessariamente parada e fosse para a
cama com um considerável número de pessoas, sentia como se não
conseguisse dar o próximo passo.
Nesse dia, eu me libertei dele de vez. Ou pelo menos foi isso que eu
tentei me convencer.
Lanço mais um olhar na direção dos elevadores. Nenhum sinal de
Lance ainda, e uma pontada de curiosidade me invade. Tecnicamente, agora
sou relações públicas do senhor Moreau. Preciso saber em todas as
confusões que ele se envolveu e remediar essas situações.
Sem pensar muito a respeito, jogo o nome dele no Google. Antes
mesmo de aceitar o trabalho, eu já vinha reunindo informações técnicas
sobre a carreira dele, além de pesquisar sobre a fatídica noite em que Lance
foi pego nu com mais de dez mulheres no saguão de um hotel.
Os resultados que aparecem me deixam ansiosa. É como assistir um
acidente de trem — você sabe que ver aquilo vai te causar mal, mas por
alguma razão desconhecida, não consegue desviar o olhar.
Várias matérias sobre antigos affairs de Lance aparecem. Modelos
deram entrevistas falando sobre a performance dele na cama, e até uma
trend no TikTok sobre jogadores que algumas delas já pegaram. Ele está em
praticamente todas as listas, sendo citado como um dos “melhores”.
Que nojo.
Reviro os olhos ao ver postagens dele com um dos seus amigos mais
antigos, Charles. Os dois acabaram sendo draftados para o mesmo time
depois da faculdade, o que só deve ter fortalecido ainda mais essa amizade
disfuncional.
Charles sempre foi um pouco irresponsável e bem porra louca. Não
posso necessariamente julgá-lo por isso, já que Sabrina também nem
sempre foi o ápice da sensatez. Mas é que quando um homem quer fazer
merda, ele não sabe apagar os rastros. É sempre pego, e essa quantidade de
vídeos e fofocas cifradas sobre Lance são a prova disso.
— Está me investigando? — o babaca sussurra bem perto do meu
ouvido, o que me faz, literalmente, PULAR.
E não, não é uma hipérbole.
O susto me faz saltar da cadeira acolchoada. Meu iPad voa pelos
ares, me desequilibrando totalmente, o que ocasiona em uma queda digna
de virar meme.
Mas que merda?
— Que inferno, Lance. Por que não disse nada?
O infeliz abre um sorrisinho convencido enquanto cruza os braços.
Em seguida, se abaixa para ficar cara a cara comigo.
— Porque te achei uma gracinha concentrada nesse tablet. Depois
percebi que estava lendo matérias sobre mim e gostei demais da visão para
interromper.
— Você continua sendo um grande babaca convencido.
— E você ainda é a enxerida que não consegue largar do meu pé —
diz, mas noto seu tom brincalhão. — Vou te ajudar a levantar.
Mas eu o dispenso com um gesto de mão, orgulhosa demais para
admitir que estava mesmo o stalkeando pelas redes sociais.
— Valeu, mas eu não preciso. Está pronto para ir?
Ele coça a nuca com a ponta dos dedos.
— Estou… Mas antes queria fazer um tour pelo resort. Se vamos
mesmo ficar aqui por dois meses, acho importante conhecer esse lugar. E os
funcionários.
Concordo brevemente com a cabeça. Ele tem razão.
— Tudo bem.
Nós vamos até a recepção em silêncio. É um pouco estranho e
constrangedor — pelo menos para mim — pela cena que acabamos de
fazer. Cara, não consigo acreditar que Lance me pegou stalkeando ele pelo
Google.
Eu não poderia ser mais patética.
— Bom dia! Como posso ajudá-los? — A recepcionista do hotel
abre um sorriso nervoso. O cabelo ruivo é de um vermelho-vivo e eu me
sinto mal pelo tanto de pó descolorante que ela deve ter usado para
conseguir essa tonalidade. Tive cabelo colorido uma vez e cheguei a cruzar
o olhar com a tesoura diversas vezes em momentos de desespero.
Lance abre um sorriso sedutor para ela.
— Bom dia… Anna. — Ele se inclina para o lado para conseguir ler
o crachá dela. — Será que você conseguiria uma pessoa para nos apresentar
o lugar? Nós vamos ficar aqui por um tempo.
— Ah, vocês estão no último andar, correto? Vão ficar conosco por
dois meses.
— Exato. — Ele continua sorrindo. — Não sei se você está me
reconhecendo, mas…
Sem pensar duas vezes, dou uma cotovelada na costela de Lance.
Ele estreita os olhos para mim, confuso, e eu forço a minha expressão mais
brava para ele.
O que esse cara tem na cabeça, pelo amor de Deus? O ponto de se
isolar neste resort é justamente passar batido na mídia. Ele quer sair
anunciando quem é para todo mundo que encontrar?
— Eu sei quem você é. — Anna fica vermelha, desviando o olhar de
Lance. — Meu pai é um grande fã seu.
— Fico feliz em saber. Talvez ele goste de receber uma camiseta
oficial autografada. O que acha?
Viro o rosto para ele, cruzando os braços. Para onde isso está indo?
Porque, para mim, cheira à chantagem.
— Meu Deus, ele ficaria muito feliz! — O rosto dela ilumina. — O
que eu posso fazer para ajudar você?
— Sei que pode parecer um pouco estranho, mas eu não gostei
muito do meu quarto. Ele é pequeno demais, Anna. Tá vendo o meu
tamanho? — Ele aponta para o corpo grande e musculoso. — A cama não
consegue comportar tudo isso aqui. Cá entre nós, minhas costas estão
acostumadas com mais espaço.
Revirando os olhos, dou um chega para lá em Lance. Ele finge se
irritar, colocando a mão sobre o ombro como se eu tivesse acabado de bater
nele para valer.
Homens são tão dramáticos.
— Acho que ela não precisa saber sobre os seus padrões, Lance.
Além do mais, o quarto é grande o bastante — retruco, lançando-o um
olhar de aviso.
Mas é claro que esse bebê chorão não deixaria essa história de
querer um quarto maior para trás. Na verdade, ele chega a murchar os
ombros e fazer uma expressão sofrida.
Sofrida, gente. Pode uma coisa dessas? O cara está em um resort,
caramba.
— Só queria saber se existia a possibilidade de um quarto maior.
Mas sinto muito se estou incomodando…
A recepcionista coloca a mão sobre o peito, parecendo
profundamente tocada com a ceninha de Lance. Ele faz sua melhor
expressão de “cachorrinho que caiu do caminhão da mudança”, mal
erguendo os olhos para falar com ela. Anna nem precisa terminar de ouvir a
baboseira dele sobre ter um problema sério com janelas sem blackout e que
se um mísero raio solar atrapalhar seu sono durante a noite, seria capaz de
ele errar todos os movimentos no próximo jogo.
— Você não acha que seu pai ficaria triste se eu não conseguisse
marcar um ponto em uma final decisiva? E tudo isso porque meu sono foi
prejudicado!
Ah, faça-me o favor. O pior de tudo é ver a garota com o nariz
vermelho, cada vez mais emotiva, caindo na lábia dele sem nem disfarçar.
— Na verdade, acho que consigo colocar você em um quarto maior.
Tem uma suíte aqui, fica no último andar. Mas tem um problema… — Ela
nos encara, agora com uma expressão receosa. — É o dobro do valor do
quarto de vocês dois. Eu teria que cancelar a reserva anterior e colocá-los
na mesma suíte.
Seguro a vontade de gargalhar na cara de Lance. Sendo sincera,
estou quase fazendo uma dancinha da vitória que consiste em rebolar até o
chão e apontar para o seu rosto presunçoso diversas vezes enquanto grito
“engole essa, bebê chorão!”.
Mas é claro que ele não desiste tão fácil.
— Tem certeza que é a única forma, querida?
Argh. Querida? Agora ele já está apelando.
A recepcionista balança a cabeça, amuada. Nem ela está feliz com
essa situação, aparentemente.
— O rapaz que fez a reserva de vocês já deixou tudo pago. Você
poderia inteirar o valor pago, claro, mas como eu disse: é o dobro da diária.
Não é como se Lance fosse pobre, porque o cara já está na NFL
desde que se formou. Mas ele também está construindo sua fortuna aos
poucos e, cá entre nós, está com grandes chances de vê-la escorrer pelo
ralo, principalmente se for mesmo negociado.
Seria uma irresponsabilidade sem tamanho.
É por isso que lanço mais um olhar de aviso. Ele junta as
sobrancelhas, movendo-as em um tom sugestivo. Aperto os lábios em uma
linha fina, balançando a cabeça sutilmente. Mas isso, por algum motivo, faz
Lance abrir um sorrisinho.
— Ficamos com a suíte principal, Anna. E muito obrigada por
quebrar esse galho para nós — murmura, um segundo antes de passar o
braço pela minha cintura e me puxar para perto.
Espera aí… O quê?
— Lance, não.
— Nós dois estamos em uma lua de mel, inclusive. Se quiser enviar
uns docinhos e ideias do que um casal pode fazer por aqui, eu agradeceria
muito.
— Lance — sibilo, tentando agarrar seu pescoço.
Mas nem preciso dizer o quanto é em vão. O cara é praticamente
uma porta, tão alto e musculoso que me faz sentir uma formiguinha em seus
braços. Não tenho a menor chance.
— Nossa, não sabia que você tinha se casado. Não saiu em lugar
nenhum — Anna murmura.
— É que nós não oficializamos ainda. Estamos fazendo um teste,
sabe? Pra ver se somos mesmo compatíveis. Cá entre nós, essa mulher aqui
consegue ser difícil de vez em quando.
Ah, pelo amor de Deus. Até eu tenho os meus limites para o que
aguentar.
Sem pensar duas vezes, dou um pisão no pé de Lance. Ele range os
dentes, ficando cada vez mais vermelho, mas finalmente me solta. Assim
que me vejo livre de seu aperto, encaro Anna com fogo nos olhos.
— Pode desfazer essa palhaçada. Não quero ficar no mesmo quarto
dele.
— Qual é, Sam? — Lance se aproxima, abaixando o tom de voz
para que só eu escute. — Você já viu o cubículo que Sean reservou para
nós? O banheiro não tem nem banheira! Eu gosto de mergulhar na água
gelada depois do jogo, faz bem pra caramba para os meus músculos. E se
me lembro bem… Você adora tomar um banho de espuma com
aromatizantes depois de um dia estressante. Sem contar que essa suíte deve
ser fabulosa e imensa. Tão imensa que nem vamos precisar nos cruzar.
Suas palavras tentadoras me chamam atenção, não vou negar. Mas,
caramba, é o Lance. Ele é o meu ex-namorado e mais importante, agora é o
meu cliente. Não posso cruzar essa linha.
— Não vai pegar bem, Moreau. Tecnicamente, você é o meu chefe.
Não podemos dividir um quarto.
Ele levanta as sobrancelhas para mim.
— E quem é que vai saber? Porque a única pessoa além de você
que saberia disso, é o Sean, e vamos combinar que a prioridade máxima
dele agora é me tirar de confusão, não me enfiar em uma nova. Confia em
mim, Sam.
Aperto os lábios em uma linha, pensativa. Em seguida, viro o rosto
para Anna, que nos encara com uma expressão confusa. Para um casal
“recém-casado” e em “lua de mel” nós estamos discutindo muito.
— Essa suíte que você comentou… Ela é boa? — pergunto,
curiosa.
Anna começa a teclar e a mexer no computador à sua frente.
— É maravilhosa. O banheiro é gigante, tem uma hidromassagem
na banheira, além de duchas com jatos triplos. A cama é king, os lençóis são
sensacionais. Tem até uma adega com bebidas à vontade. É praticamente
um apartamento — diz, com um brilho orgulhoso no rosto.
Encaro Lance sobre o ombro, vendo-o com uma expressão tão
presunçosa que me dá vontade de lhe desferir um tapa. Odeio quando ele
está com a razão.
Ele me alcança em poucos passos, passando a mão pela minha
cintura novamente. Dessa vez, eu permito o contato, abrindo o sorriso mais
fofo e caloroso que consigo para a recepcionista.
— Nós vamos ficar com essa suíte.
Anna balança a cabeça em concordância.
— Tudo bem. Vou pedir para transferirem as malas de vocês para o
novo quarto. Aqui estão as chaves novas. — Ela nos entende um cartão,
que faço questão de pegar e enfiar na bolsa. Lance balança a cabeça. —
Preciso agora dos cartões antigos.
Nós dois devolvemos para ela ao mesmo tempo. Nossos braços
roçam nesse movimento, mas eu decido deliberadamente ignorar o arrepio
que percorre a minha pele ao entrar em contato com o corpo de Lance.
Meu Deus. Como ele ainda pode ter todo esse feito sobre mim
depois de todos esses anos?
Não é justo.
Não é justo nem um pouco.
— Muito obrigado por ter feito isso por nós, Anna. E pode ter
certeza de que vamos deixar um elogio para o gerente. Ah se todos os
funcionários fossem como você…
Ele continua bajulando a recepcionista mesmo depois de conseguir o
que queria. Não posso negar que acho fofo, de um jeito meio estranho, mas
continua sendo. Uma das melhores qualidades de Lance sempre foi em
como ele conseguia fazer com que todos o amassem tão facilmente.
— Você é muito gentil, senhor Moreau — ela diz, ainda mais
vermelha. Se é que isso é possível.
— Ah, para. Não precisa me chamar de senhor Moreau. Vou achar
que está se referindo ao meu pai. Me chame de Lance.
Ela solta uma risadinha.
— Tudo bem, Lance.
Eu só continuo assistindo a cena, perplexa em como Lance continua
conversando com Anna. Parece até que agora eles são amigos de infância.
Depois de toda a bajulação e puxação de saco (de ambos os lados),
Anna acaba oferecendo uma porrada de cortesia para Lance, que não
esconde o olhar superior ao me encarar. São tantas opções que eu preciso
enfiar os convites na minha bolsa, chocada demais para formular qualquer
frase.
O que acabou de acontecer aqui?
— Se vamos ficar aqui por tanto tempo, vamos precisar de
entretenimento — diz ele, simplesmente. — Ou pretende ficar na suíte
vendo o jornal todos os dias?
Engulo em seco. Ele tem um ponto.
— Agora vem, Sam. Preciso ir até o centro de treinamento e parece
que você é a minha babá pelos próximos dois meses.
Meu coração, meu quadril, meu corpo, meu amor
Tentando encontrar uma parte de mim
Que você não tocou
Death By A Thousand Cuts | Taylor Swift

Irritar Samantha Samuels nunca foi tão fácil e tão bom.


Ela passa o trajeto inteiro até o meu centro de treinamento com uma
carranca. Tenho certeza de que se arrepende de ter cedido em dividir o
quarto comigo, e tudo isso porque dei uma paquerada na recepcionista para
conseguir algumas cortesias de graça.
— Qual é, Sam? Juro que divido com você. Dei uma olhada nesses
folhetos e alguns deles são para massagens e esfoliações no rosto com
pepinos. Fica de presente de aniversário.
Ela me encara, furiosa.
— Não quero nenhum dos presentinhos que a recepcionista te deu,
Moreau. Pode engolir tudo.
Merda. Por que diabos ela me chamou de Moreau? Quando Anna
disse, realmente parecia que estava falando com o meu pai, mas saindo da
boca da Samantha? Me soa muito sexual, para ser honesto. E isso faz meu
pau acordar.
— Está chateada porque viu o folheto do SPA? Eu posso dividir
isso com você.
— Não, obrigada.
— E o que acha da manicure?
Ela vira o rosto para mim com rapidez.
— Você ganhou até cortesia para a manicure?!
— Sim. — Exibo para ela. — E também massagem com pedras
vulcânicas. Cara, nem sei o que é isso, mas estou dentro.
— Me dá isso aqui! — Samantha arranca os folhetos da minha
mão, examinando tudo atentamente. — Caramba, Lance. Ela te deu alguns
milhares de dólares em desconto. Tem até entrada para baladas e saraus que
vão acontecer no hotel daqui dois meses! Temos que devolver.
Hein?
Pego todos os convites de volta na mesma hora.
— Nem vem. Eles são meus agora.
Samantha parece exasperada.
— Lance, isso pode colocar ela em problemas. São muitas
cortesias! Uma coisa ou outra até vai, mas acho que se o gerente dela
descobrir, Anna vai estar com um grande problema.
— E quem disse que o chefe dela vai descobrir, Samuels? —
rebato, usando o sobrenome dela de propósito. — Nós vamos ser dois
recém-casados bonzinhos que vão ficar de boca fechada.
Bufando, ela cruza os braços.
Cara, vê-la irritada desse jeito está me trazendo vida novamente.
Acho que senti falta de adrenalina, e por algum motivo, a dose que
Samantha injeta em mim é mais poderosa do que qualquer outra.
— Que palhaçada foi aquela, afinal? Fingir que nós nos casamos?
Você só pode ter enlouquecido.
— Era isso ou deixar a recepcionista pensando que eu estou
recebendo uma garota qualquer na minha suíte. Não foi isso que me
colocou em problemas, em primeiro lugar?
— Então você admite. — Ela ri, sarcástica. — Que bom. Pelo
menos tiramos essa pedra do caminho.
— Do que você está falando?
— De você admitindo que se colocou nessa situação. Ponto. Fico
feliz que saiba que só estamos dentro de uma minivan, abaixando a cabeça
sempre que pensamos ver uma câmera, é culpa sua.
— Você é inacreditável.
— Eu sei. Você também é — pontua, estufando o peito. — Mas
mesmo que suas intenções dizendo aquela mentira fossem boas, ainda assim
isso foi uma má ideia.
— Bom, Sam, mas agora você embarcou na mentira junto comigo.
E sabe o que eu acho que foi uma má ideia para começo de conversa? Sean
ter te contratado para cuidar da minha imagem. Pior ainda foi você ter
aceitado. Eu disse que isso não iria funcionar.
O corpo dela fica tenso. Samantha respira fundo, recostando a
cabeça no vidro do carro enquanto a paisagem passa por nós. Fico parado,
encarando-a sem piscar. Tenho esperança de que ela se levante e comece a
me ofender de volta, que me provoque.
Mas Sam não faz isso. Ela só fecha os olhos e finge que está
dormindo.

Encarar meus colegas de time e mais precisamente o meu treinador


não está sendo uma tarefa fácil. Ultimamente, sempre que me apresento no
CT, preciso lidar com olhares de pena e até mesmo alguns com muito
julgamento.
Tenho tentado ficar mais na minha. A próxima temporada começa
daqui três meses, e se tudo der certo, ainda estarei jogando pelos Texans.
Ainda poderei correr atrás da taça para o time que sempre quis fazer parte,
pelo meu time do coração.
Charles também está correndo esse perigo. Nós dois vacilamos
muito e pior do que isso, entregamos muito menos do que somos capazes.
Se só estivéssemos com a imagem ferrada na mídia, seria menos mal. Mas o
meu melhor amigo, por exemplo, andou perdendo alguns dias de treino.
Isso o fez ficar no banco de reservas em alguns jogos que tivemos, e não sei
como ele não está pirando. Eu já teria entrado em pânico.
— E aí, cara? — ele me cumprimenta, colocando a proteção
bucal.
Faço o mesmo e nós começamos a nos aquecer.
Samantha saiu assim que entrei no CT. Ela disse que tinha que dar
algumas ligações e resolver coisas da sua vida pessoal, e eu fingi não me
importar. A verdade é que a pontada de curiosidade que me atingiu ao vê-la
teclando furiosamente no celular foi grande.
E, de certo modo… Tenho um espírito fofoqueiro. Isso está no
sangue da minha família, afinal. Não é à toa que Lydia, Lucian e eu fizemos
uma aposta sobre o tempo que levaria para Logan e Calliope ficarem juntos
para valer.
Depois que nosso treino chega ao fim, Charles e eu seguimos para o
vestiário junto com todos os outros jogadores. O clima é tenso e estranho,
como se não soubessem muito bem como agir ao nosso redor.
Ainda somos colegas de time? Estou com os dias contados? Se
falarem comigo, também estarão na corda bamba? Tantas questões…
— Fiquei sabendo que Sean arranjou mais um relações públicas
para cuidar da sua imagem. Que barra — comenta Charles quando voltamos
do chuveiro, ambos molhados e com uma toalha amarrada na cintura.
Estalo o pescoço.
— Essa nem é a pior parte. Você lembra daquela menina que eu
costumava sair quando estávamos na faculdade?
Ele abre um sorriso irônico para mim, abrindo as mãos.
— Ah, sim. Você está falando da metade do corpo estudantil, se eu
me lembro bem. Me ajuda aí, Lance.
— Cara, a menina do barril. Lembra?
Os olhos dele brilham com a menção à Sam e isso me deixa irritado.
Charles nunca escondeu o quanto a achava incrível, mas eu fingia não
perceber para não acabar fazendo alguma besteira.
— Porra, aquela era das boas! Que nostalgia. — Ele balança a
cabeça, ainda sorrindo. — Mas por que a pergunta?
Charles sendo Charles. Nem se Samantha surgisse do nada e o
atacasse por trás ele entenderia o que eu quis dizer.
— É ela.
— É ela o quê?
— Porra, Charles. É ela a minha relações públicas.
Ele franze o cenho.
— Mas ela não fazia jornalismo?
— Na verdade, ela fazia comunicação. A área é grande,
aparentemente e… Como você sabe que curso ela fazia?
Charles abre um sorriso sem graça.
— Eu posso ter visto ela andando na direção do departamento de
jornalismo algumas vezes. Você não lembra que a minha prima Michelle
também fazia parte do jornal da universidade?
Ranjo os dentes, desviando o olhar para me certificar de que
ninguém está prestando atenção na nossa conversa.
— Eu continuo confuso pra caralho. Você sabia onde a Sam
trabalhava?
— Não era bem um trabalho, né? Mas eu sabia sim. Eu disse, tinha
achado a garota legal.
E, de repente, é como levar um soco no estômago. E depois levar
diversos chutes na cara. Porque o olhar sem graça de Charles e a forma que
ele tenta se esquivar das minhas perguntas só pode significar uma coisa…
— Você pegou a Sam?!
Ele deixa os ombros caírem.
— Cara, foi só uns beijos. Eu juro. Encontrei ela numa festa,
dançamos, ficamos. Como eu disse, a minha prima e ela se conheciam,
então a Michelle me apresentou a Sam. É claro que eu me lembrava de
quem ela era, mas na época você estava saindo com uma líder de torcida.
Lembra da Linda?
Porra, é claro que eu me lembro da Linda. Era uma garota divertida
e que costumava se meter em bastante encrenca. Ela foi praticamente
expulsa — ou melhor, convidada a se retirar — da universidade quando
descobriram que ela estava dormindo com um dos professores.
Garota legal.
— E você nunca se importou de dividir comigo — relembra, sem
jeito. — Já perdi as contas da quantidade de meninas que foram para a
minha cama depois de terem passado pela sua e vice-versa. Não tem motivo
para ficar com raiva.
Tenho certeza de que estou vermelho e com praticamente
fumacinhas saindo do ouvido. Charles e Samantha?! Eu só posso estar na
porra de um pesadelo, cara.
— Você sabia que ela era importante para mim — digo,
endurecendo o maxilar.
Ele suspira longamente.
— É, eu sabia. Mas ela era muito divertida. E sexy. E, porra, Lance.
A menina detonava qualquer um no desafio do barril. A garota é perfeita
sem tirar nem pôr. E estava solteira… Então, sim. Nós ficamos.
Engulo em seco, sufocando a raiva e o ciúme que me atravessam
sem dó e nem piedade. Eu nunca fui ingênuo ou mesmo hipócrita. Sempre
soube que quando Sam e eu ficávamos meses sem nos ver, ela também saía
com outros caras. Eu mesmo a vi pelo campus com um deles a tiracolo
vezes demais para o meu gosto.
Mas pensei que um limite havia sido estabelecido. Eu nunca peguei
ou dei em cima de nenhuma garota que eu já tinha visto perto dela.
— Não pira por causa disso, Lance.
— Não estou pirando.
— Está sim, e não deveria. Isso já faz muito tempo. Aposto que ela
nem deve se lembrar mais. — Dá de ombros, se virando para pegar suas
roupas. Charles começa a se trocar e eu me lembro que devo fazer o
mesmo. — Fico feliz que Sam esteja de volta. Vai dar uma animada nas
coisas.
— Não vai dar “animada” em nada. — Desenho aspas no ar,
sarcástico. — Ela precisa desacelerar a minha vida, lembra? Graças a você,
estamos no fundo do poço.
Embora haja um toque de humor na minha voz, há também mágoa e
uma acusação no fundo. Sei que sou responsável pelas minhas ações, e
embora Charles tenha sido um irresponsável desde que nos conhecemos,
não exime a minha culpa de ter participado de seus joguinhos.
Mas, porra. Estou muito puto por ter descoberto sobre o
envolvimento dos dois. Tão puto que estou escolhendo feri-lo
deliberadamente. Como ele pôde ficar com a Sam? Era a minha Sam! Eu
disse isso para ele na época.
— Essa doeu, cara. Você sabe que eu sinto muito.
— É, mas o seu sinto muito não vai consertar as coisas. Estou preso
em um resort com a Samantha pelos próximos dois meses!
— Hein? Por quê?
— Porque ela acha que me isolar do mundo e me manter sob a rédea
curta é a melhor estratégia agora. Está tentando mudar a minha imagem de
garoto fanfarrão para um menino quieto e que só pensa no trabalho.
Charles começa a rir. Na verdade, ele ri tanto que seus ombros
balançam. Ele também precisa se apoiar nos armários para não perder o
equilíbrio, porque as gargalhadas o deixam desorientado.
Que porra?
— Mano, não acredito nisso. Você está mesmo irritado por ficar
preso em um resort com uma das melhores garotas que já conheceu? — Ele
finge limpar uma lágrima do olho. — De nada, Lance. Nem precisa me
agradecer.
Eu o observo ir embora com um misto de ultraje, raiva e… Alívio.
De repente, não me sinto mais como um menino por ficar secretamente
animado em estar vivendo isso com Samantha ao meu lado.
Ela não pode saber que fiquei feliz pra caralho quando ela topou em
dividir o quarto comigo.
Ela não precisa saber que o cheiro do seu cabelo continua sendo a
melhor coisa que eu já senti. E que se eu tivesse acesso à sua fragrância,
faria um perfume dela para espirrar no travesseiro e me embriagar nele até
que Samantha invadisse meus sonhos.
Pouco a pouco, o vestiário começa a ficar vazio. Depois de terminar
de me vestir, busco meu celular no armário para enviar uma mensagem à
Sam e avisar que estou livre para voltar para a minha prisão.
Que grande ironia, não é?
Ela me responde com um “ok” seco e diz que vai chegar com a
porra da minivan em dez minutos.
Uma minivan. Ainda não acredito que é nisso que estou vindo para
o CT a partir de agora.
Samantha é má. Má e um pouco maluca também, só para constar.
E, aparentemente, mentirosa. Porque se passam quinze minutos e
não tenho nem sinal de onde ela ou a van estão. Ando de um lado para o
outro, agoniado. Lanço sorrisos simpáticos para os funcionários que me
param para tirar fotos, bebo mais um gole do meu isotônico, balanço os pés
como uma criança irritada.
Pego meu celular, pronto para enviar uma dúzia de mensagens mal-
educadas para a minha RP. Acontece que Samantha já havia me deixado
uma primeiro.
Samantha:
desculpa o atraso, precisei resolver uma coisa de um cliente
antigo. chego em no máximo meia hora. seja bonzinho!

Puta que pariu. Meia hora?!


Passo as mãos sobre o rosto, exasperado. O que vou fazer aqui por
meia hora, caramba?
Me sinto muito tentado a responder Samantha com alguma gracinha
pelo “seja bonzinho” que ela me enviou, mas me contenho.
Ao invés disso, decido ocupar meu tempo com algo mais produtivo
e funcional. Já que ela se divertiu hoje mais cedo pesquisando sobre a
minha vida no Google, é o que eu faço com ela. Jogo “Samantha Samuels”
no Google, mas só o que aparece são sites e matérias sobre o acampamento
Frozen Lake.
O acampamento que Logan e Calliope passaram no verão passado.
Ela como instrutora, e ele como voluntário. Meu irmão topou passar duas
semanas preso em um chalé com ela, no meio do mato, simplesmente
porque se ela pedisse para ele pular da ponte, ele ia feliz.
Acontece que o maldito acampamento pertence à família da Sam.
Mais especificamente ao seu avô, com quem eu já tive um breve contato.
Finalmente entendi a personalidade excêntrica de Samantha.
O cara também não bate muito bem.
O Instagram dela é o que me dá mais pistas sobre como esteve a sua
vida durante todos esses anos. Samantha é uma garota do insta. Do tipo que
faz posts dump com fotos da sua semana. Ela também curte fotos mais
conceituais e, porra… Ela é tão linda. Não consigo evitar o sorriso ao ver
todos os lugares que ela visitou. Todos os jogos de basquete que ela assistiu.
Me lembro vagamente de Samantha comentando sobre seu pai e como ele
amava o esporte. Ela cresceu muito fã dos Lakers.
Mas é em uma dessas fotos que um comentário me chama atenção.
É de um cara.
E a foto não é tão antiga assim. Foi postada seis meses atrás.
A bile volta pela minha garganta quando eu releio a mensagem mais
uma vez.
@olivernilsen95:
a noiva mais linda do mundo. te amo.
E eu teria morrido
Eu teria amado você toda a minha vida
Você está perdendo a sua memória agora
Losing Your Memory | Ryan Star

— Seth, você não pode mais fazer isso. Me prometa — imploro, me


esforçando ao máximo para que ele não perceba o quanto estou segurando
as lágrimas.
— Não vou prometer nada.
— Seth!
— Não, Sam. Isso não é justo.
Scott, ao lado do meu irmão, suspira. Estamos em uma chamada de
vídeo por mais de vinte minutos e eu sinto como se fossem por horas.
Seth fugiu para tentar encontrar Marjorie. Os dois combinaram pela
internet de se encontrarem em um ponto de ônibus, e quando Scott
percebeu, já era tarde. Ninguém teve notícias dos dois e decidiram não me
contar para não me deixar preocupada.
Aparentemente, foi a família dela que conseguiu uma pista. Marjorie
anotou no diário onde eles tinham combinado de se encontrar. Não levou
mais de duas horas de carro para emboscarem os dois que estavam prestes a
entrar em um ônibus que os levaria para a cidade vizinha.
Foi uma gritaria, de acordo com Scott. Quando meus pais chegaram
até lá, a discussão se transformou em uma briga. Minha mãe berrou com a
mãe de Marjorie. É tão estranho imaginar essa cena, já que elas eram
amigas desde o ensino médio. Cresci com a tia Billie em casa. Ela já me
buscou em festas durante a madrugada quando eu não queria ligar para a
minha mãe porque estava com medo de ficar de castigo.
E hoje, pelo que Scott disse, ela praticamente acusou os nossos pais
de estarem corrompendo Marjorie. Também disse que Seth era uma péssima
influência e que mamãe não estava conseguindo controlar o próprio filho.
— As duas começaram uma briga física depois disso — foi tudo o
que o meu irmão me contou.
Ainda vou fazer Scott me destrinchar a cena com detalhes, mas,
nossa… É bizarro sequer pensar que isso acabou mesmo de acontecer.
É claro que minha mãe e Billie concordaram que Marjorie e Seth
não deveriam mais se ver. E nem preciso comentar o quanto o meu
irmãozinho está arrasado por causa disso.
— Eles ficaram lá, de mãos dadas, assustados com a cena enquanto
os pais se xingavam. Fiquei triste por eles, mas as coisas são assim agora
— finalizou Scott antes de chamar um Seth muito cabisbaixo para ouvir o
sermão da irmã mais velha.
Estamos aqui e tudo o que eu mais queria era poder abraçar meu
irmão até cansar.
Se eu estivesse lá, poderia remediar essa situação. Eu me ofereceria
para levar Seth e Marjorie para sair. Billie sempre gostou de mim e,
modéstia à parte, sempre fui a filha mais responsável. Meus pais confiam
em mim.
De repente, lágrimas queimam em meus olhos. A constatação de
que nada disso teria acontecido caso eu estivesse presente em casa é como
uma tijolada na cabeça. Sem precedentes e muito dolorosa.
— Não posso ficar sem ela, Sam. Ainda mais agora que o vovô está
nos deixando — murmura ele, emburrado.
É muito difícil não cair no choro agora.
— Eu entendo que vocês realmente se amam, Seth. Acredite em
mim, não duvido disso nem por um segundo. Mas se continuar agindo desse
jeito, só vai piorar as coisas. Marjorie precisa obedecer os pais e não é justo
que você a coloque nessa posição.
— Não quero colocar ela em problemas.
— Eu sei que não, Seth. É por isso que você precisa mesmo me
ouvir — abafo um resmungo. — Escuta, eu preciso resolver algumas coisas
do trabalho agora. Posso te ligar amanhã?
Nós nos despedimos rapidamente e antes de desligar, deixo claro
para Scott que ele precisa me ligar no primeiro sinal de problemas. Meu
coração está mesmo partido por Marjorie e Seth, mas preciso pensar no
bem-estar do meu irmãozinho em primeiro lugar. E ele parece bem capaz de
se enfiar em qualquer buraco só para conseguir ficar mais perto da melhor
amiga.
— Pode deixar, Sam. Te ligo se qualquer coisa acontecer.
Fiquei com vontade de murmurar um “é bom mesmo”, mas engoli
as palavras afiadas. Não estou em posição de exigir nada já que não tenho
estado presente nesses últimos dias.
Mas é por uma boa causa. Você está trabalhando e juntando um bom
dinheiro para conseguir pagar as despesas médicas do vovô.
Tudo bem. Posso viver com a culpa por estar ausente se isso acabar
salvando o acampamento Frozen Lake.
E é com esse pensamento positivo que eu chego no centro de
treinamento para buscar Lance.
Caramba.
Ele fica tão lindo depois de terminar o treino. Os cabelos ondulados
estão brilhando por terem sido lavados recentemente, os músculos
ligeiramente mais inchados. A roupa esportiva que ele está usando deixa
pele demais à mostra e por um segundo, eu me pego pensando como eu
agiria se ainda estivéssemos juntos.
Será que eu me jogaria sobre ele e atacaria a sua boca primeiro? Ou
eu seria aquele tipo de namorada de atleta que sai passando a mão no
tanquinho antes mesmo de perguntar se ele está bem?
Bom, me conhecendo… Opção número dois.
Uma garota precisa se alimentar.
Mas ao encontrar o olhar de Lance, todo o meu bom humor
momentâneo evapora. Sou transportada para o sentimento de impotência e
chateação que estava experimentando minutos atrás com os meus irmãos
pelo telefone.
— O que foi? — pergunto.
Ele grunhe.
— Você está atrasada demais. Estou aqui te esperando por quase
quarenta minutos!
— Desculpa, Lance. Eu disse que estava ocupada — minto.
Tudo bem, não é tecnicamente uma mentira. Não uma das grandes,
pelo menos. Eu estava resolvendo problemas, mas eles não tinham nada a
ver com o trabalho.
— Acho que você poderia ter mandado alguém me buscar já que se
atrasaria. Sabe que os paparazzi podem chegar a qualquer momento, né?
Basta uma ligação e dezenas aparecem por aqui.
Ele tem razão.
Suspirando, eu passo o peso de um pé para o outro.
— Sinto muito. Não vai se repetir.
— Ótimo.
Mas o descontentamento não some de seu rosto. Para ser franca,
conhecendo Lance, ele jogaria o fato de eu admitir estar “errada” por muito
tempo. Provavelmente, uma piadinha sem graça acompanharia seu
comentário e então entraríamos em uma disputa silenciosa que não nos
levaria a lugar algum.
— Está tudo bem mesmo? — volto a perguntar quando nos
aproximamos da minivan.
Ele não me responde. Cobre o rosto com o capuz e eu me certifico
de que não fomos vistos por ninguém. Depois que entro no banco traseiro,
faço um sinal positivo para o motorista. Sean me garantiu de que ele era
confiável o bastante para fazer esse trajeto e eu confio nele.
Ao voltarmos para o resort, confiro o meu celular rapidinho antes de
chegarmos até o elevador. Nenhuma mensagem de Scott, o que me deixa
aliviada por alguns segundos.
Lance tenta espiar a minha conversa sobre o ombro. Quando ergo o
rosto para confrontá-lo, ele desvia o olhar, sem graça. Mas, mesmo com
vergonha, não deixa o orgulho de lado.
Ainda está irritado comigo.
— Tá bom, Lance, o que você quer que eu diga pra você me
perdoar?
— Eu já disse que estou bem.
— Então comece a agir normalmente, caramba. Vai ficar me
respondendo monossilábico por mais quanto tempo?
Ele bufa, deixando o corpo cair contra a parede do elevador.
— Estou respondendo você como sempre.
— Não está, não. Hoje de manhã estávamos nos dando bem.
Lance arqueia a sobrancelha.
— Você chama aquilo de “se dando bem?”
— Ué, para os nossos padrões, você sabe muito bem que é sim. Por
acaso se esqueceu de como você me jogou na piscina quando nos
conhecemos?
Ele arregala os olhos, inflando as narinas.
Xeque-mate, Sam. Conseguiu o que queria.
— Eu não te empurrei na piscina, Samantha. Você caiu sozinha.
Segurando a risada, cruzo os braços. Espero que ele não perceba o
brilho divertido em meu olhar quando continuo mentindo na sua cara
descaradamente.
— Claro, porque eu queria mesmo me afogar, não é? Você com
certeza me empurrou.
— Eu nem toquei em você, sua maluca. Tentei te avisar sobre a
piscina, mas é claro que você estava ocupada demais gritando comigo para
ouvir.
— Só estava gritando com você porque não queria apagar as fotos
do meu celular. Fotos essas que foram perdidas, aliás.
— Agora a culpa é minha por você também não fazer backup — ele
bufa, passando a mão pelo cabelo macio. — Acho que eu mereço isso,
sabia?
Encaro Lance com o olhar mais inocente que consigo projetar.
— Merece o quê?
— Lidar com você. Eu realmente tenho sido uma pessoa terrível.
Ai. Essa doeu.
Desvio o olhar, irritada. Quando as portas do elevador se abrem,
passo por Lance como um furacão.
O lado bom do dia de hoje se materializa bem na minha frente.
Porque, puta merda, esse quarto é realmente fabuloso.
Prendo a respiração quando vejo a adega. É realmente gigante e,
cacete! Aquilo na sacada é uma piscina privativa? Tem até uma luz de led
que a deixa ainda mais azul. Mal posso esperar para mergulhar na água
quentinha sob as estrelas.
Escuto os passos de Lance atrás de mim.
— Uau. Isso aqui é incrível.
— É mesmo. Nem o seu mau humor pode sobreviver a uma vista
dessas — alfineto, fazendo um meneio de cabeça na direção da sacada.
— Que engraçadinha.
Pisco os olhos dramaticamente.
— Sou mesmo.
Lance revira os olhos, seguindo na direção do quarto.
Como a recepcionista nos avisou, tem apenas uma cama. Mas ela é
tão grande que eu não tocarei Lance mesmo se eu me esforçar muito para
isso.
O que vamos combinar? Não vai acontecer. Tipo, nunquinha!
— Eu sou mesmo um gênio. Isso aqui é muito melhor do que o
cubículo que Sean colocou a gente.
Não posso concordar mais.
A suíte é mesmo luxuosa. Tem dois banheiros e os dois possuem
banheiras incríveis. O quarto tem uma cama imensa, um closet de deixar
qualquer um morto de inveja, e ele tem até mesmo uma cozinha acoplada.
Isso sem contar na adega de bebidas e na varanda com a piscina privativa.
Finalmente vou viver uma vida de luxo. Depois desses últimos anos,
não é prepotência pensar que eu mereço.
— Olha, eu odeio concordar com você, mas tem razão. Isso aqui vai
facilitar muito os próximos dois meses.
Lance pigarreia e isso atrai a minha atenção. Seu queixo marcado
está travado, seu olhar me escaneia da cabeça aos pés. Há uma pontada de
dúvida em seus olhos e isso me leva ao meu limite.
Cruzando o caminho da sala de estar até a entrada da adega, viro o
rosto para continuar encarando-o por cima do ombro.
— Desembucha, Lance. O que tá rolando?
Não deveria falar de forma tão informal com um cliente, mas
teoricamente já acabou o meu horário de trabalho. Dizem que os
profissionais de comunicação são funcionários vinte e quatro horas por dia
e que devemos estar prontos para trabalhar a qualquer segundo e para essas
pessoas eu digo meu bom e velho: vai se foder.
— Nada.
Argh.
— Vai continuar com esse papinho de que não tem nada rolando?
Fala sério. Você mal consegue me encarar.
Ele se retesa.
— Não quero falar sobre isso. Não é da minha conta.
Escolho um dos vinhos e leio o rótulo com cuidado. Tenho certeza
de que isso deve custar uma fortuna, mas hoje eu mereço. Despejo um
pouco na taça e a levo imediatamente até a boca.
— Ah, mas eu não tenho dúvidas de que isso não deve ser mesmo
da sua conta. O que só está me deixando ainda mais irritada. Pode falar,
Lance. Vamos tirar essa pedra do caminho.
Seus olhos castanhos se enchem de coragem quando ele ergue o
rosto.
— Você está noiva?
Ai, não.
cinco anos atrás
— Calma, garanhão. Não posso voltar pra lá com um chupão no
pescoço — gemi, mesmo que eu não estivesse dando espaço para Lance se
afastar.
Afundei mais ainda os meus dedos em seu cabelo ao sentir sua boca
macia chupar um ponto específico da minha pele.
Céus, que língua era essa?
— Deixa eu te marcar como minha.
— Não sou de ninguém — rebati. — E isso é um pouco cafona.
A risada dele ecoou sobre mim. Não resisti ao cair na risada
também, e logo estávamos os dois rindo feito idiotas. O armário dos pais
do anfitrião da festa da noite bem que poderia ser um pouquinho maior.
— Você acabou de me chamar de cafona. Não consigo acreditar.
Meus ombros se encolheram.
— Ei, eu não disse que você era cafona. Só disse que a sua atitude
era.
— Dá na mesma, Samuels. E você sabe a verdade.
— A verdade é que você está querendo me deixar um chupão no
meio de uma festa. Não temos mais treze anos, né?
Ele ergueu o rosto do meu pescoço para conseguir encarar meus
olhos. Eu simplesmente amava quando Lance ficava com essa expressão
admirada.
— Você aos treze anos costumava receber chupões no pescoço? E
eu pensei que tinha sido um adolescente precoce.
Dei um tapa em seu ombro, estreitando os olhos.
— Você tem que parar de levar as coisas para o lado literal. Eu só
fui beijar a primeira vez com quinze anos. E tá, confesso, teve uma festa em
que o capitão do time de beisebol me deu mesmo um chupão. Foi horrível.
Precisei esconder aquilo com corretivo por semanas.
— E ninguém percebeu?
— Não. Dá pra acreditar? Meus pais achavam que eu estava
passando por uma fase do tipo “obcecada por maquiagem”. Já o meu
avô… Ele desconfiou, acho. Ficava me perguntando porque eu tinha
começado a gostar de usar tantos lenços no pescoço. Acredita que ele não
caiu no meu papo de que era a nova moda em Paris?
Lance jogou a cabeça para trás, rindo. Em seguida, escondeu o
rosto na curva do meu pescoço novamente para abafar as risadas.
Meu coração errou uma batida. A forma como ele estava me
apertando tão forte contra si enquanto se entregava tão intensamente para
as próprias emoções causou algo em mim.
Admiração. Fascinação.
Paixão?
Não. Definitivamente não.
Isso devia ser o efeito de seu sorriso matador. Porque, cacete, que
sorriso lindo esse cara tinha. Os dentes eram perfeitos, a boca
perfeitamente desenhada. Mas muito além do que isso, ele era uma
daquelas pessoas. Aquelas que riam com os olhos e que fazia você pensar:
“tá aí. Essa é uma pessoa feliz de verdade”.
— Quero muito ver a sua interação com o seu avô algum dia. Deve
ser hilário.
Bufando, eu escondi um sorriso.
— Vovô não é um velhinho fofo que convida você para tomar chá e
biscoitos. Ele é um cara durão que gosta de ameaçar todos os meus
namorados com uma espingarda. De vez em quando usa umas pantufas
estranhas, mas eu diria que é um charme.
Lance finge uma expressão de quem sabe das coisas.
— Agora eu entendi tudo. É por isso que você é assim.
Torci o nariz.
— Assim como? O que você quer dizer?
Ele segurou meu queixo com suavidade. Abaixou a cabeça o
suficiente para me dar um beijo rápido e na mesma hora eu senti. Era um
arrepio gostoso que subiu pela minha espinha e chegou até no meu couro
cabeludo.
Era alguma coisa.
Lance estava mesmo despertando algo em mim. Eu só não tinha
certeza se eu queria descobrir o quê.
— Espetacular. Única. Maluca — sussurrou ele contra a minha
boca, ainda sorrindo. — É por isso que você é perfeita pra mim, Sam.
Porque você é muito sexy, linda
E todo mundo quer provar
É por isso
Eu ainda fico com ciúmes
Jealous | Nick Jonas

— E aí, Samantha? Não vai me responder? — provoco, mesmo


sabendo que não tenho mais esse direito.
Ela fica ainda mais pálida. O olhar fica perdido, a boca entreaberta.
Não sei o que pensar da reação, mas de uma coisa eu tenho certeza: eu a
atingi. De alguma forma, mas eu o fiz.
— Não sei do que você está falando, Lance.
É claro que ela diria isso. Não sei porque me surpreendo. Samantha
sempre foi especialista em fugir.
— Ué, não foi sua ideia tirar a pedra do caminho? — ironizo, dando
as costas para me jogar no sofá. Depois, ligo a TV no canal de esportes,
mesmo sem saco para ouvir os comentaristas me detonando. — Eu não
tenho nada a ver com a sua vida. É só uma curiosidade.
Samantha cruza os braços. Ela está recostada contra a parede,
parecendo um pouco desconfortável.
Caramba. Eu não sabia que citar seu noivo poderia deixá-la tão
irritadiça e isso acaba me inflamando ainda mais. Não gosto de pensar em
Sam com outros caras — o que me lembra também sobre o que ela teve
com Charles.
— É só que eu não entendo — diz ela. — Por que você me
perguntaria algo assim?
Dou de ombros.
Meu Deus, eu preciso mesmo de uma cerveja.
Vou até o minibar e pego as mais geladas do freezer. Samantha
grunhe, desaprovando a minha bebedeira noturna. Eu parto do pressuposto
que é melhor estar enchendo a cara no meu quarto do que em uma balada
qualquer.
— Lance.
— Não tô nem aí, Samantha. Relaxa. Eu só estava curioso.
Ela suspira.
— Sei. É por isso que tem agido estranho desde que eu te busquei
no CT? Porque você acha que eu tenho um noivo?
Sim, tenho vontade de dizer. E também por você ter pego um dos
meus melhores amigos quando estávamos na faculdade.
— Não — minto. — Só estou com um péssimo humor hoje.
Ela ri, irônica.
— Então você sempre está com um péssimo humor.
— Tá bom, Samantha. Pode tirar sarro de mim. Não ligo.
— Meu Deus, Lance! — Ela joga as mãos para o alto, exasperada.
— Não estou tirando sarro de você, caramba. É só muito confuso. Acho que
não dei nenhum sinal de que poderia estar em um relacionamento. Quero
dizer, eu posso ter… Ah!
Os olhos dela brilham de empolgação. Quando percebo o sorrisinho
vitorioso no canto da boca, fecho os olhos.
Merda.
Ela, com certeza, já deduziu o que aconteceu e, para variar, deve ter
acertado em cheio.
— Você estava me stalkeando, Lance?
Não falei?
— Não faço ideia do que você está dizendo.
— É mesmo? Porque a única maneira de você ter pensado que estou
noiva é se tiver entrado no meu Instagram. E descido muito. Tipo, muito.
Porque eu não estou comprometida há meses.
— Ahá! Então você estava mesmo noiva? — pergunto, triunfante.
Mas logo em seguida, murcho, porque isso não é um motivo de vitória para
mim.
Samantha deixa os ombros caírem. Em seguida, se senta ao meu
lado no sofá, agarrando uma das cervejas em cima da mesa para virar toda
de uma vez.
— É uma história bem longa.
Dou de ombros.
— Se tem uma coisa que temos, é tempo.
— É mesmo — concorda, um pouco tensa. — Mas não estou a fim
de contar sobre essa parte da minha vida para você. Além do mais, não
quero deixar você pra baixo.
Isso me deixa tenso. Eu posso não ser muito fã da ideia de Samantha
com outro cara, mas uma coisa eu sei: se o homem que ela escolher não
tratá-la como uma princesa, vai ter que se ver comigo.
— Ele fez algo com você? — pergunto.
Ela abre um sorriso irônico.
— Só o que todo homem faz.
— Samantha.
— Esquece isso, tá legal? Ele foi um idiota, mas eu consegui dar o
troco.
— Onde ele mora? — Eu tenho certeza que meus olhos demonstram
toda a raiva que estou sentindo desse cara que eu nem conheço. Travo o
maxilar. — Eu vou até lá.
Ela parece estar se divertindo.
— E vai fazer o quê?
— Eu cresci com uma irmã, Samantha. E meu irmão mais novo tem
uma coleção de tacos de beisebol. Vamos até a casa dele e você vai tocar a
campainha. Quando ele aparecer, vou acertar as bolas dele de uma vez.
Depois que o idiota estiver caído no chão, você vai gritar “você sabe o
porquê!”.
Sam começa a rir na mesma hora. Ela gargalha, quase cuspindo toda
a cerveja na minha cara. E embora seja nojento pra caralho vê-la babando
assim, também não deixa de ser fofo.
— Isso não é Jogo de Amor em Las Vegas? Aquele filme com a
Cameron Diaz? — questiona, risonha.
— Talvez seja. Mas não me importo. A ideia é boa.
— É verdade. Mas eu não preciso que você me defenda, Lance. Eu
já me vinguei dele. — Dá de ombros, como quem não quer nada. — E
agora que tiramos isso do caminho, podemos por favor voltar ao normal?
— Normal como antes?
Ela se retesa. Eu sei que esse é um tópico delicado, mas não ligo.
Samantha e eu costumávamos ser tudo um para o outro, mas de repente isso
se perdeu.
E… Acho que quero recuperá-lo novamente.
— Normal como relações públicas e cliente — diz. — Tenho muito
carinho por você e por tudo que vivemos quando estávamos na faculdade,
mas agora crescemos. Seguimos em frente. Vamos só conviver
pacificamente e colocar você de volta nos trilhos, tudo bem?
Bom, isso é melhor do que eu pensei. Não vamos ficar pisando em
ovos um perto do outro nem agir com hostilidade.
— Tipo… Como se fôssemos adultos? — pergunto só para ter
certeza.
Ela ri novamente. Caramba, essa é a primeira vez que eu percebo o
quanto ela faz isso quando está perto de mim. Não deveria me sentir tão
feliz por conseguir arrancar umas risadas dela, mas aqui estamos nós.
— É, Lance. Como se fôssemos adultos.
— Que chato. Odeio ter que fingir que sou adulto.
— Também acho um porre, mas fazer o quê?
— Sabe o que devíamos fazer ao invés disso? — sugiro, fingindo
inocência. — Deveríamos agir como adolescentes. Acho que tem um barril
por aqui em algum lugar…
Ela se levanta na mesma hora.
— Boa noite, Lance.
— Qual é, Sam? Você era a rainha do barril de cerveja!
— Eu disse “boa noite, Lance”. Está na hora das crianças irem para
a cama.
— Você vai me colocar para dormir, né?
Sam me lança um olhar por cima do ombro.
— Você bem que gostaria, não é?
É. Eu adoraria.
Mas não digo em voz alta. Eu deixo que meu olhar malicioso
acompanhando-a até o quarto diga isso por mim.

— Ela insistiu muito, mano. E você sabe como a Calliope pode ser
insistente — meu irmão mais novo, Logan, se explica. Ele já veio entrando
no meu quarto como se não fosse nada demais.
Olha, não costumo reclamar tanto. Mas esse SPA definitivamente
vai receber um e-mail bem mal-educado. Tudo bem que o panaca abrindo
um sorriso sem graça para mim às seis da manhã é o meu irmão mais novo,
mas e se fosse um paparazzi? Uma fã maluca? Ou pior, um stalker que quer
me matar para conseguir fama? Nisso eles não pensam, não?
Semicerro os olhos para Calliope, que agora está encarando os pés
como se fossem a coisa mais interessante do mundo. Essa pirralha foi nossa
vizinha a vida inteira e, por consequência, acabou se tornando quase uma
irmãzinha para todos nós.
Bom, menos para o meu irmão Logan. Ele só pensava em fazer
sacanagens com ela (pelo menos era o que eu pensava), e por um tempo
pensei que tudo não tinha passado de uma quedinha na adolescência. Os
dois se reencontraram depois que Callie rompeu um noivado e, bem…
Estão casados.
— Pensei que vocês já tinham voltado para Boston — resmungo,
dando passagem para esses dois intrometidos entrarem.
Ambos vão diretamente para o sofá.
— Nosso voo é hoje à tarde. Fizemos o checkout do hotel e
deixamos as malas no carro. Mas estamos exaustos, então pensei em vir
fazer companhia para o meu irmão lindo ao invés de passar o dia no
aeroporto — Logan diz, sonolento. Até dá um pouco de pena.
Callie se recosta contra o peito dele.
— E eu acho que mereço uma recepção melhor do que essa, Lance.
Graças a mim, você conseguiu uma nova RP, e pelo que eu estou vendo nas
manchetes, a garota é boa.
Franzo o cenho.
— O que saiu de mim por aí?
— Nada. E esse é o ponto. — Callie sorri como a diabinha que ela
sempre foi. — Lance longe dos tablóides por quase uma semana? Isso só
pode ser um milagre.
— Vi uma teoria no Twitter que diz que você está trancado no porão
do treinador dos Texans. Também dizem que uma das suas ex-namoradas
pode ter te assassinado. — Logan sorri, macabro. — Adoro essa teoria.
— Você é um cara bem esquisito, meu irmão. Bem esquisito.
— Agradeça por eu ter vindo checar você ao invés da Lydia. Era
isso que queria?
Porra, não. Estremeço só de pensar na minha irmã mais velha
aparecendo aqui nesse horário. Não há um ser humano na Terra que consiga
impedir a Lydia de conseguir o que quer.
— Cruzes. Tá, você venceu. Prefiro muito mais vocês dois.
Os idiotas dão um high-five animado.
Reviro os olhos, caminhando até o telefone da cobertura. Ligo para
a recepção e peço um café da manhã farto para ser entregue no quarto.
Ainda não conversei com Samantha sobre isso, mas aposto que ela vai
achar essa uma opção muito melhor do que comer com uma dúzia de
desconhecidos todas as manhãs.
— Que bonitinho você se preocupando com a nossa refeição —
zomba Callie, deixando os pés esticados no sofá. — Mas e aí, como a Sam
está se saindo?
Estreito os olhos para ela. Como se Calliope não soubesse.
— Isso foi ideia sua?
— Dã. Claro que sim.
Viro meu rosto tão rápido para Logan que meu irmão mal tem
tempo para reagir. Abre um sorriso sem graça após um tempo e finge coçar
a própria nuca.
— Ela não sabia de nada. Foi tudo uma grande coincidência, eu
juro.
Cruzo os braços.
— Desembucha.
Logan lança um olhar apreensivo para a esposa antes de virar o
rosto para mim novamente. Suspirando, ele explica:
— Olha, quando você me contou sobre a Sam, eu associei na mesma
hora, e eu sei que você também. Tínhamos ficado no acampamento Frozen
Lake. O mesmo que pertence à família dela.
— Tá, Logan. Essa parte eu já sei.
Ele hesita por alguns segundos.
— A questão é que eu acabei ficando muito próximo de um garoto
no acampamento. O nome dele é Seth. E coincidência ou não, ele também é
neto do senhor Sam. Acontece é que isso faz dele…
— Irmão ou primo da Samantha — completo, mortificado.
Logan assente.
— Eles são irmãos. E Calliope queria fazer uma surpresa para mim
no nosso casamento, então ela acabou entrando em contato com a
Samantha. A garota estava ocupada demais e atolada em trabalho para
trazer Seth e Marjorie para o casamento, então a minha garota propôs um
trabalho para ela. Parecia que estávamos resolvendo todos os problemas de
uma vez só, tendo em vista que nenhuma RP conseguiu ficar com você por
mais de três semanas.
— Logan, por que diabos você não pediu para o avô dela trazer o
menino? Precisava mesmo ser a Samantha?
E, de repente, vejo a expressão mais triste e melancólica do mundo
no rosto do meu irmão. Ele deixa os ombros caírem, e meu coração acelera
ao ver Callie se aproximando para consolá-lo de alguma forma. Depois de
sussurrar alguma coisa no ouvido dele, meu irmão finalmente me responde:
— O avô dela está morrendo, Lance. Samantha não te contou?
Eu pisco uma vez. Depois, começo a andar de um lado para o outro
pela sala sem saber muito bem o que dizer.
Não, ela não me contou. Porra, por que ela não me contou?
Porque talvez vocês não sejam mais próximos, mas é só um palpite,
minha mente maldita relembra.
De repente, repasso toda a interação que tive com Samantha até
agora. Ela era extremamente apegada ao avô e isso com certeza deve estar
matando-a também. Espero não ter agido como um babaca — pelo menos
não de forma irreversível — e ter deixado as coisas ainda piores.
Merda, e pensar que eu estava agindo como um menino birrento
ontem à noite só pela mera possibilidade de Samantha estar noiva de outro
cara. Me sinto tão idiota.
— Você já sabe? — pergunto para Calliope, sem jeito.
Ela mal ergue o rosto para me encarar, mas assente lentamente com
a cabeça.
— Não sabia quando chamei ela para o nosso casamento, mas
Logan acabou me contando no dia seguinte. Ela parece ser uma garota
realmente legal, Lance. E me ajudou pra caramba na cerimônia depois que
fiquei bêbada.
Seguro a risada. Calliope e Logan deram um verdadeiro show no
próprio casamento. Só de lembrar que ainda tenho as filmagens de Logan
tentando despi-la na pista de dança…. Esses dois mal perdem por esperar.
A vingança é um prato que se come frio.
— Eu vou matar você. — Aponto para Logan. — E depois vou
incriminar você pelo assassinato. É, acho um bom plano.
— Você não pode nos matar — meu irmão diz, ofendido. — Prefere
mesmo ficar com a Lydia e o Lucian? Aqueles dois são bem chatos. E além
do mais, vão sumir com a sua cerveja.
— Não tô nem aí, cacete. Fico sóbrio pelo resto da vida, mas acabo
com a sua raça, Logan. Você não podia ter feito isso.
— E por quê? A garota é linda, divertida, e aparentemente, bem
profissional. Você quer ficar no time, não quer? E eu quero que o meu
irmão tenha um futuro brilhante. Qual o problema?
Passo os dedos pelo meu cabelo, um tanto quanto furioso.
— Porque eu ainda gosto dela, Logan. E você sabe muito bem disso.
Sabe como é ficar tão perto de uma pessoa que você deseja mais do que
tudo e mesmo assim não pode tocá-la? Sabe como é doloroso saber que
Samantha teve uma vida sem mim por todos esses anos?
Meu irmão engole em seco. Em seguida, vira o pescoço para encarar
Calliope. O brilho feroz em seu olhar me faz engolir as minhas palavras. É
claro que Logan sabe exatamente o que é isso. Afinal, ele se apaixonou pela
melhor amiga desde que eram adolescentes e demorou muito para que ela
finalmente retribuísse seus sentimentos.
— Eu sei exatamente como você se sente, Lance. E se eu me lembro
bem… Foi você que me deu uma bronca dizendo que eu deveria correr atrás
do que eu queria ao invés de ficar choramingando. Que tal seguir o próprio
conselho?
Porra. Eu disse isso mesmo para ele quando Calliope tentou afastá-
lo novamente. Foi nesse dia que eu contei sobre a minha breve história com
Samantha também.
Callie suspira.
— Logan tem razão, Lance. Se você gosta mesmo dela e quer
mantê-la na sua vida, é preciso agir.
Grunho, me sentindo como um adolescente tentando conquistar a
primeira namoradinha. Porque, caralho, eu não faço ideia do que é preciso
para fazer Samantha Samuels ceder. Ela não é mais a menina do barril de
cerveja.
— Não é tão simples — respondo.
— É sim — rebate Calliope, bem séria. — Sabe esse café da manhã
que você pediu pra gente? Comece a pedir pra ela todos os dias. Seja um
cavalheiro, Lance. Abra a porta, compre flores, convide-a para jantar.
— E aí quando vocês se pegarem, dê o melhor sexo da vida dela —
meu irmão completa, deixando Callie vermelha. — Vá por mim, é a receita
perfeita.
Sorrio, um pouco sem graça. Por mais que eu esteja fingindo não
prestar atenção nas baboseiras que eles estão sugerindo, por dentro eu me
pergunto: e se? E se Samantha e eu tivéssemos ficado juntos? E se isso tudo
der certo?
Respiro fundo.
— Vocês dois são completamente malucos, mas têm um ponto. Vou
tentar. E apenas isso: tentar. Não contei a história completa para você,
Logan — digo, encarando-o diretamente. — Mas Sam e eu temos uma
tendência para atrair o azar. E pelo que você acabou de me dizer, é tudo o
que ela menos precisa agora.
Naquela época não sabíamos
Que fomos construídos para desmoronar
Quebramos o status quo
Então nós quebramos o coração um do outro
The Very First Night | Taylor Swift

Acordo com a luz natural entrando pela janela de manhã. Já fazia


tempo que eu não tinha uma noite de sono tão reparadora.
— Bom dia. — A voz de Lance soa rouca, mas é o necessário para
me fazer abrir os olhos.
Oh-oh.
Eu esqueci totalmente que agora estamos dividindo não apenas a
cobertura, como também uma cama. Ontem à noite acabei pegando no sono
depois de sair do banho e nem vi quando ele veio se deitar. A cama é tão
grande que nem notei a presença de Lance.
— Bom dia — respondo, piscando várias vezes para acostumar meu
olhar com a claridade. — Acordei muito tarde?
— Na verdade, não. Meu irmão apareceu por aqui com a noiva às
seis da manhã. Fui fazer companhia para eles e tive que levantar.
— Caramba. Seis da manhã? Isso é amor de verdade. Uma vez meu
irmão mais velho mandou uma mensagem pedindo para eu abrir a porta
para ele de madrugada. Estava voltando de uma festa com o namorado da
época e eles queriam se esgueirar sem que meus pais vissem. Prometi que
estaria acordada, mas acabei pegando no sono. Scott me ligou várias vezes
e eu até tinha acordado por uns dois segundos, mas estava cansada demais
para descer. Lembro de pensar que se ele estava batendo na porta daquele
jeito, então estava tudo bem não atender. Pelo menos ele não estava jogado
em uma vala qualquer.
Lance nem faz questão de segurar a risada.
— Que maldade, Samantha. E ele te perdoou?
— Ficou meio irritado por um tempo, mas eu joguei na cara dele
que não contasse comigo antes das onze da manhã. Demorou para Scott
aprender a lição, mas eventualmente ele entendeu.
Me sento sobre a cabeceira da cama para observá-lo melhor. Lance
está encostado no batente da porta segurando uma bandeja grande.
Franze o cenho, confusa.
— O que é isso?
Ele dá de ombros.
— Seu café da manhã.
Espera, o quê?
— Você está trazendo o meu café da manhã na cama, Lance?
— Sim. Não sabia bem do que você gostava, então acabei pedindo
um pouco de tudo. A salada de frutas está com uma cara ótima.
Ele traz a comida até a cama e a posiciona entre o meu colo e o
colchão. Eu continuo sem entender completamente nada, ao contrário do
meu estômago, que parece muito satisfeito. Morro de vergonha ao perceber
a minha barriga roncando, mas Lance só ri.
— Você foi para cama sem jantar ontem à noite, Sam. Não deveria
fazer isso.
Assinto lentamente com a cabeça, mesmo sem ter certeza do que
está acontecendo aqui.
— Eu sei.
— Olha só, tem panquecas com chocolate também. E cookies. Eu
me lembrei daquela vez no seu dormitório quando você me fez sair no meio
da noite para conseguir uns pra você, e…
— Lance. Desculpa te interromper, mas por que você está me
trazendo comida na cama?
Ele respira fundo. É difícil decifrar seu olhar sem graça, mas acho
que um resquício de culpa aparece ali.
Lance procura um espacinho na cama para se juntar a mim. Me dou
conta de que estou vestindo um pijama minúsculo e que não deixa muito
para a imaginação, mas nem isso me incomoda. Não é como se ele nunca
tivesse me visto nua.
— Acho que começamos com o pé esquerdo, Sam. Só quero
compensar qualquer coisa negativa que eu tenha feito com você.
Sorrio, um pouco mais aliviada. Depois da nossa conversa de ontem
à noite a respeito do meu possível noivado, eu estava esperando uma outra
bomba.
— Você não fez nada, Lance. Relaxa. Eu também estava com os
nervos à flor da pele quando cheguei aqui. Acho que o nosso passado está
afetando muito o nosso relacionamento profissional.
— Eu também acho. E, cara, tivemos uma história tão legal. Tirando
todas as coisas malucas que você me fez fazer naquela época…
— Você era mais louco que eu, Lance!
— Eu amava a sua companhia. E, de certa forma, você foi a minha
única ex-namorada oficial. Será que podemos passar uma borracha no que
aconteceu com a gente naquela última semana antes de cada um seguir em
frente?
Engulo em seco.
Eu não pensava naquele dia há séculos. Acredito que meu cérebro
apagou boa parte daquela conversa porque preferiu fingir que ela nunca
existiu para evitar danos permanentes.
Lance e eu éramos jovens e estávamos nos apaixonando cada dia
mais. O desfecho ruim que tivemos era completamente inevitável. Ainda
mais com o futuro promissor dele em contraste com a minha vida presa em
um escritório.
Às vezes, alguns amores não são feitos para durar.
— Eu ficaria muito feliz com isso, Lance. Gostava muito de você —
confesso baixinho. — Acho que podemos passar por essa situação muito
mais fácil se formos amigos de novo. O que acha?
— Amigos?
— É. Amigos. Posso até preparar aquele macarrão especial para
você em nome dos velhos tempos — ofereço, vendo-o abrir um sorriso.
O “macarrão especial” na verdade tinha apenas um nome:
manjericão. Em uma noite chuvosa na Universidade do Texas, eu tinha
convencido Lance a assistir o filme “Sem Reservas”, estrelado pela
Catherine Zeta-Jones. Ela interpretava uma chefe de cozinha que herdava a
guarda da sobrinha depois da irmã ter morrido em um acidente fatal.
Acontece que a menina não comia nada. Era uma verdadeira luta
para fazê-la engolir qualquer coisa, então, um dia o chefe rival dela
preparou um macarrão especial que finalmente a fez comer. Era com um
molho de tomate simples, mas por cima ele colocou algumas folhas de
manjericão.
Fiz essa mesma receita para Lance depois que fomos em um
restaurante e ele me disse, como se fosse a coisa mais natural do mundo,
que não comia macarrão.
— Não curto o gosto da massa pura com molho. Acho meio nojento
— disse, retorcendo o nariz para o carbonara no meu prato.
É claro que eu fiquei horrorizada. Que tipo de gente não come
macarrão?!
Acabou virando uma espécie de desafio entre nós. Eu sempre fazia
massas diferentes e o forçava a experimentar. Lance fazia cara de nojo e
cuspia tudo fora assim que eu terminava de cozinhar, então eu já estava
pronta para jogar a toalha e desistir.
Isso até esse bendito filme acontecer.
Já fiz um molho béchamel perfeito.
Assei tomates frescos e preparei o melhor molho napolitano da
minha vida.
O gorgonzola que usei no molho de quatro queijos custou mais de
cinquenta dólares.
E o que ganhou Lance Moreau foi a porcaria de uma folha de
manjericão.
— Então… Amigos — confirma ele, embora seu olhar esteja um
pouco estranho.
— Sim. Amigos.
— Vou querer mesmo o macarrão, Sam.
Sorrio.
— Eu já imaginava, Moreau.

Tirar o resto do dia de folga foi a melhor decisão que eu poderia ter
tomado. O resort possui uma dezena de opções para relaxar, e cá entre nós?
Depois de todo o peso que tenho tirado dos meus ombros nessas últimas
semanas, eu estava precisando mesmo disso.
Depois de uma massagem nas costas extremamente relaxante e uma
sessão de limpeza de pele que me deixou nas nuvens, decidi colocar meu
maiô e curtir uma praia. As espreguiçadeiras estavam perfeitamente
dispostas na frente do mar escuro, e eu coloquei óculos escuros antes de me
afundar em uma delas para me bronzear.
— A senhorita gostaria de algum drink especial? — um dos garçons
me pergunta, abrindo um sorriso simpático.
Sei que tecnicamente estou no meu ambiente de trabalho, mas um
gole de álcool não faria mal, não é?
E além do mais, hoje vou partir do pressuposto de que eu mereço.
— Vodka com cranberry, por favor.
Ele assente rapidamente e se afasta.
Abro um sorriso, avaliando-o dos pés à cabeça. Ele é bem bonito e
estava me secando hoje mais cedo. Não seria nada mal transar para aliviar o
meu estresse depois de tudo.
Sei que tenho reclamado por estar tão cansada, mas… Estou tão
exausta. É como se meu cérebro não conseguisse desligar nunca.
Passo o dia torrando no sol sem remorso algum. Bebo (algumas)
vodkas com cranberry e termino o dia com duas Piñas Coladas. Já estou
sentindo minha mente mais leve quando uma voz familiar e intrusa aparece
por cima do barulho das ondas do mar.
— Que dia lindo — grita Lance, colocando o par de óculos escuros
no topo da cabeça. Espreguiça os músculos impressionantes e minhas
sobrancelhas vão parar quase no meu couro cabeludo ao assistir a cena.
Sério, universo? Ele precisava mesmo ser tão gostoso? Pior ainda,
ele precisava gostar de se exibir sem camisa para mim?
— Ei, Sam. Nem te vi por aqui… Amiga. — O tom malicioso em
sua voz deixa claro a ironia ao usar a palavra. Cretino. — Posso me sentar?
— Na verdade, eu já estava indo em…
— Ah, que sensação boa! — Lance coloca as mãos atrás da cabeça,
abrindo um sorriso mordaz. — Você já passou o protetor? Não quero que
você se queime.
Reviro os olhos, me deitando novamente sobre a espreguiçadeira.
— Já passei sim. E o que você está fazendo aqui?
— Eu estava entediado pra caralho naquele quarto. Fiquei magoado
de não ter sido convidado para o seu dia de praia. Não concordamos em ser
amigos?
— Amigos não precisam viver grudados. E não força a barra, Lance.
Estamos voltando a nos dar bem. Pra quê estragar?
Ele mostra os dentes para mim.
— E quem disse que estou tentando estragar alguma coisa? Olha só
para nós! — Ele aponta para o próprio corpo seminu e depois para mim. —
Somos só dois amigos tomando sol um do lado do outro. Poderia ficar horas
conversando com você sobre tudo.
— Lance, podemos só relaxar? Em silêncio, por favor? — sugiro,
ajeitando melhor os óculos escuros sobre o rosto. — Entrar em contato com
a Mãe Natureza faz bem.
Ele balança a cabeça para cima e para baixo freneticamente.
— Tudo bem. Mas como fazemos isso?
Suspiro.
— Feche os olhos e preste atenção nas ondas do mar. Sinta a
energia. Curta os raios do sol. Ou talvez não pense em nada, sabe? Só
relaxe. Tente se conectar com o seu “eu” interior. Eu gosto de cochilar
escutando esse barulho. Consegue escutar os pássaros?
— Aham.
Nós dois ficamos em silêncio. Aproveito o momento para tentar tirar
um cochilo, hipnotizada pelas minhas próprias palavras. Não sou a maior fã
da natureza assim, mas a minha conexão com a praia sempre foi grande.
Acho que por ser um lugar onde eu sempre ia com a minha família.
Depois de (poucos) minutos de paz, escuto Lance resmungando
outra vez:
— Sam?
— O quê?
Ele bufa.
— Estou entediado. Não gostei disso de se conectar com a natureza.
Dá-me paciência…
— E o que você está a fim de fazer, Lance?
— Não sei. O que amigos costumam fazer? Podemos fazer juntos.
— Amigos deixam os outros amigos em paz.
— Desde quando? Sempre gostei de azucrinar os meus amigos.
— E quantos deles você ainda tem?
— Atualmente? Acho que só o Charles…
Abafo uma risada.
— Acho que tudo está explicado agora.
— Ei, eu sou um ótimo amigo. Perdi as contas de quantas vezes
participei de brigas e confusões que eu nem estava a fim só porque um
deles se meteu com a pessoa errada. Isso sem contar a quantidade de fotos
autografadas que já enviei pelo correio porque queriam impressionar
alguém.
— Retiro o que eu disse, Lance. — Pisco os olhos, inocente. —
Você é um ótimo amigo.
— E não sou?! — Ele sorri, convencido. — O que acha de
conversarmos sobre coisas mais íntimas? Pessoais, talvez.
— Íntimas e pessoais?
— É. — Ele se senta na cadeira, ficando de frente para mim. É
impossível não descer o olhar para o seu abdômen trincado. E pensar que já
passei a língua ali tantas vezes…
Foco, Samantha.
— Hã… Acho que eu vou dar um mergulho agora — desconverso.
— Foi mal, Lance.
Corro na direção do mar como se ele fosse o meu salva-vidas, o que
é uma grande ironia. Lance me grita conforme vou entrando na água, mas a
sua versão pegajosa está sendo demais para mim. Ele me lembra muito o
Lance que eu conheci na faculdade e eu estou fazendo de tudo para
esquecê-lo.
Tenho que esquecê-lo.
Preciso esquecê-lo.
Estou tão concentrada em tentar entender as minhas emoções que
ignoro solenemente o que Lance ainda está gritando para mim. Sequer
presto atenção na onda enorme que está se formando bem na minha frente,
e quando ergo a cabeça…
É tarde demais.
Já era.
É o fim.
Será mesmo que esse vai ser o modo que vou partir desse mundo? E
por tudo que é mais sagrado, será que eu não poderia estar um pouco mais
vestida?
Por alguns segundos, eu só consigo pensar no vovô. Talvez ele me
encontre do outro lado alguns dias depois. Além do mais, estou morrendo
de saudades da vovó. Ela nos deixou cedo demais. Podemos ficar juntinhos,
os três.
Mas e o Seth?, minha consciência questiona. E o Scott? Eles vão
sofrer demais sem você.
Às vezes, as pessoas que mais amamos vão embora sem avisar e
deixam um buraco enorme, mas a intenção delas nunca seria essa se
tivessem escolha. Fatalidades acontecem com todo mundo — até aqueles
que achamos que nunca deveriam partir.
Sinto a onda gelada sobre mim e faço o que posso para me proteger.
A água está mais fria do que eu havia percebido, e prendo a respiração
quando sinto que estou submersa. Abro os braços e tento nadar de volta até
a superfície, mas… Não sei nadar.
Que bela maneira de morrer.
— Samantha! SAM? AGUENTA FIRME!
Lance? É ele mesmo? Veio até aqui só para me salvar?
Podem ter se passado segundos ou até mesmo dias inteiros. Não
saberia responder com precisão. A única coisa que tenho certeza é dos
braços fortes que me puxam de dentro da água.
Tusso o máximo que posso, dando um verdadeiro banho em Lance
conforme ele me carrega nos braços. Se eu ainda estivesse conseguindo
falar, diria alguma piadinha sobre como estamos parecendo uma cena de
SOS Malibu.
— Que susto, Sam — murmura ele, conferindo meu rosto com
preocupação. — Tentei te avisar para não entrar. O mar não está tão calmo
quanto aparenta e você não sabe nadar.
Ele ainda se lembra disso? Caramba.
Por um momento, sou consumida pela vergonha ao perceber o
quanto eu espirrei água em Lance ao tossir. Mas logo em seguida, me
lembro das vezes em que ele segurou o meu cabelo depois de passar a noite
inteira vomitando ao tentar manter o meu posto como a “rainha do barril de
cerveja”.
— Desculpa. — Forço a minha voz, ocasionando em mais uma crise
de tosse.
Lance me encara com intensidade, fazendo um chiado com os lábios
para que eu faça silêncio.
— Não precisa me pedir desculpas, Sam. É melhor sair daqui, tudo
bem? Você precisa se secar.
Assinto lentamente, sentindo a culpa me atravessar com tudo.
Eu te devo desculpas, sim, Lance. E esse pedido está há dois anos
atrasado.
Todos querem ele, esse foi o meu crime
No lugar errado, na hora certa
E se eu desmoronar, então ele vai me apanhar
Em um mundo de garotos, ele é um cavalheiro
“Slut!” | Taylor Swift

Samantha vai direto para o chuveiro quando voltamos da praia. Ela


não conversou muito comigo a respeito do que acabou de acontecer e
confesso que isso mexeu um pouquinho com o meu ego.
Não que eu estivesse esperando um gesto grandioso ou um pedido
de casamento, mas acho que estava esperando uma abertura. Qualquer
coisa.
— Quer que eu peça a nossa comida aqui? — pergunto quando ela
aparece, já de banho tomado e trocada.
Sam dá de ombros, visivelmente incomodada.
Suspiro. Não quero atrapalhá-la, então dou as costas e começo a
repassar a nossa interação na praia. Fui um grande cretino? Talvez tenha
sido. Meus irmãos sempre reclamam de como eu era uma matraca
ambulante.
— Lance?
— Hm?
Ela passa a língua suavemente sobre os lábios.
— Obrigada. Por… Tudo. Eu não deveria ter me jogado no mar
daquela forma.
Assinto brevemente com a cabeça, uma sugestão de sorriso
brincando em meus lábios. Por dentro? Estou soltando fogos de artifício,
porra.
— Disponha, Sam. Estou sempre aqui para salvar você de quedas
que resultem em afogamentos — brinco, descontraído.
Isso também arranca uma risada dela.
Ufa. Acho que o clima tenso pós-salvamento definitivamente está
nos dando adeus.
Já não era tempo.
— O que planeja fazer hoje à noite? — pergunto, aproveitando a
minha maré de sorte com minha fantasminha particular. Tá aí, gostei. Acho
que vou passar a chamá-la assim.
— Não sei ainda. Acho que vou descer para almoçar.
Franzo a testa.
— São quase duas da tarde!
— Eu não estou me alimentando como deveria. — Dá de ombros,
sem jeito. — Além do mais, tirei o dia de folga. Não quero ficar olhando
para a sua cara hoje, Lance.
Isso me faz parar. Felizmente, o sorriso gigante no rosto de Sam me
tranquiliza. Preciso me lembrar de como ela sempre me dizia frases assim
quando estava tentando me levar para cama. A garota não perde uma.
— Ai, Sam. Isso magoa.
— É praticamente impossível te magoar. — Revira os olhos,
conferindo no espelho ao lado do aparador a própria aparência. Os cabelos
molhados estão desembaraçados e perfeitamente alinhados. Samantha nem
se preocupou em passar maquiagem, o que para mim não faz diferença. Ela
fica linda com e sem.
— Posso te encontrar no restaurante? — sugiro, arriscando mais
uma cantada.
Ela ri.
— Bem que você gostaria. Mas, sério, quero ficar um pouco sozinha
hoje. Preciso fazer umas ligações pessoais.
Dou um passo para trás, assentindo.
O avô dela.
— Como quiser.
— Ah… E Lance?
— Sim?
— Se o Sean ligar, tem a minha permissão para não atender.
Precisamos explicar a questão do quarto presencialmente.
Isso arranca uma risada de mim. Ainda não contamos para o meu
agente a respeito do arranjo que fizemos para conseguir um quarto melhor.
Pisco os olhos docemente.
— Pode deixar.

Passo o restante do dia de bobeira. Faço uma hora a mais na


academia, descontando no treino pesado toda a frustração dos últimos dias.
O suor escorre do meu rosto e com a minha visão periférica observo
algumas hóspedes se aproximando.
Duas delas começam a fazer agachamentos na minha frente e eu
seria um mentiroso se dissesse que não notei como as bundas firmes
pareciam convidativas. Meu pau acorda com a visão de seus quadris
subindo e descendo. De repente, me pergunto quando foi a última vez que
eu transei com alguém.
Há três semanas. Pouco tempo antes de Samantha Samuels voltar
para a minha vida.
Vou embora assim que percebo o lugar ficando mais cheio. Ainda
preciso me manter o mais anônimo possível, e essas pessoas sabem
claramente quem eu sou.
— Já vai, lindo? — uma delas me pergunta, e isso me pega de
surpresa.
Adoro quando a garota é segura o suficiente para chegar em mim.
Essas costumam ser as que eu escolho para passar a noite, mas não estou
interessado em mais ninguém além da minha ex-namorada.
— Preciso voltar ao trabalho. — Lanço uma piscadinha educada,
vendo-a morder o lábio em resposta.
Caramba.
Vou direto para o chuveiro quando chego na cobertura. Passo bons
minutos debaixo da água quente, aproveitando a sensação de relaxamento
para fechar os olhos e, confesso, cochilar um pouquinho. Não consigo
acreditar que Logan e Calliope acharam uma ótima ideia me arrancar da
cama às seis da manhã, cacete.
— Lance? Está em casa? — A voz de Samantha me arranca de meus
devaneios.
Não leva mais do que dois minutos para eu procurar a toalha mais
próxima e enrolar na minha cintura. Saio do banheiro pingando, sem me
preocupar com a lambança que vou deixar pelo caminho. O que é uma
ironia do caralho, porque acabo escorregando na poça de água que caiu pelo
chão.
Caio de bunda no chão. Na verdade, é tudo tão rápido que eu não
percebo o que está acontecendo até sentir a dor subir pelo meu corpo.
Samantha coloca as mãos sobre a boca, preocupada.
— Ai, meu Deus, Lance! Não precisava vir correndo! Está tudo
bem?
Minhas orelhas ficam vermelhas de vergonha. Porra, acho que não
tem uma única parte minha que não queira se enterrar em um buraco e
sumir de vez.
— Está tudo bem.
— Tem certeza? Não machucou?
— Tenho. A única coisa ferida foi a minha dignidade, mas de
resto…
Samantha ignora solenemente meu murmúrio. Me ajuda a levantar e
quando me equilibro novamente, percebo suas bochechas vermelhas. Ela
fixa o olhar por bastante tempo em uma parte específica minha, e eu sigo a
direção… Notando a toalha jogada no chão.
Porra.
A toalha acabou caindo depois da minha queda ridícula.
— Hã… — ela balbucia, parecendo se dar conta do tempo que ficou
me secando.
Não me incomodo nem um pouco por ela ter me olhado. Na
verdade, só com esse pensamento o meu pau cresce mais ainda. Com
certeza vou bater uma pensando nela mais tarde.
— Desculpa — peço, colocando a toalha de volta no lugar onde
estava. Depois, abro um sorriso malicioso. — Sabe que não precisa só
olhar, não sabe?
Samantha arregala os olhos lindos para mim.
— Lance, não.
Levanto as mãos em sinal de rendição.
— Só estou dizendo… Não é como se você só pudesse olhar. Estou
completamente à sua disposição, Sam.
— Você é ridículo.
— Sou mesmo. Mas você por acaso se esqueceu de como éramos
bons juntos?
Ela umedece os lábios.
— Faz muito tempo. Não somos mais aquelas pessoas.
Dou de ombros.
— É verdade. Somos bem melhores do que aqueles universitários
ferrados. Agora eu posso te levar para jantar em um restaurante de verdade
e não me importar com a conta.
Samantha inclina a cabeça para o lado, divertida.
— Ah, para. Eu até que curtia comer com você no restaurante
universitário. Sinto saudades até hoje daquela pizza.
— Até que era boa mesmo — concordo, sorrindo. — Qualquer dia
desses vou te levar para comer uma pizza em Chicago. Já experimentou? —
Ela nega com a cabeça. — Você vai adorar, Sam. A massa é bem diferente,
e o molho de tomate… — suspiro.
O olhar de Samantha muda de sonhador para temeroso em poucos
segundos. Não sei o que pode ter acabado de cruzar a sua mente, mas tenho
um palpite.
— Podemos ver isso depois? Vou sair daqui a pouco.
Cruzo os braços.
— De novo?
Ela encara os próprios sapatos. Porra, o que está acontecendo? Por
que ela está agindo dessa forma?
— Sim. Eu… Tenho um encontro.
— Um encontro?
— Sim, Lance. Um encontro.
— Tipo… Um encontro, encontro?
— Um encontro, encontro. Do tipo que pessoas interessadas em
transar uma com a outra têm para descobrir se possuem afinidade.
O ciúme vem em ondas sobre mim. É violento, feio e esse
sentimento mesquinho começa a subir pelo meu corpo. Não gosto da ideia
de Samantha saindo com outro homem. O mero pensamento de outro cara
olhando para ela já é o suficiente para me fazer perder a cabeça.
Não consigo acreditar que ela ainda possui todo esse efeito sobre
mim depois de todos esses anos.
— Hm. Eu posso saber com quem? — Encontro a minha voz,
finalmente.
— Não.
— Não?
— Não.
— Ué, por que não? Pensei que fôssemos amigos.
— Nesse momento você é só meu ex-namorado, Lance. E seria bem
esquisito saber com quem vou sair.
— Qual é, Sam? — insisto, mesmo sabendo que a informação só vai
me derrubar. — Preciso saber se o cara é decente. Além do mais, sou a
coisa mais próxima de uma família que você tem aqui. Já pensou se ele for
um psicopata? Um assassino? Quem deve aparecer para te socorrer caso ele
coloque algo na sua bebida? Seus irmãos estão longe demais para chegar a
tempo.
Samantha parece ponderar sobre as minhas palavras. Em seguida, se
dando por vencida, finalmente balança com a cabeça.
Porra, nem eu acredito que essa realmente funcionou.
— Você tem razão. É bom alguém saber onde estou. Eu mando a
minha localização em tempo real para você me acompanhar.
E então ela pisca os olhos inocentemente para mim.
— Vou me arrumar, grandão — zomba, passando por mim até
chegar no banheiro.
— Samantha, com quem você vai sair?
— Isso não é da sua conta — cantarola ela, de costas. Depois, sem
parecer ligar com a minha presença, começa a se despir.
Na minha frente.
É… Acho que meu cérebro pode estar começando a derreter. Sam
tira cada peça de roupa com uma destreza impressionante. O montinho de
tecido é jogado no chão e ela fica de costas para mim.
Cacete. A sua silhueta é de dar água na boca. Minha memória não
estava fazendo jus ao corpo maravilhoso que Samantha possui. E como se
não estivesse sendo tortura o suficiente assistir a isso, ela ainda faz questão
de se curvar o máximo que pode ao tirar o short. Ela empina a bunda em
minha direção e eu salivo.
Adoraria enfiar o rosto ali e chupar Samantha até ela esquecer o
babaca que está levando-a para sair essa noite.
Merda. Meu pau está apontando diretamente para ela e a toalha não
esconde isso muito bem.
— Melhor cuidar desse problema aí, Lance — debocha ela, com as
mãos nos seios perfeitos.
— Hã…
— Terra para Lance?
Mas eu continuo completamente vidrado nela. Porra, a garota está
só de calcinha. Isso é tortura. Deveria ser usado como uma tática de guerra,
inclusive.
— Não é como se você nunca tivesse me visto nua. — Revira os
olhos, fazendo um meneio em direção à porta. — Pode ir embora, por
favor?
Pisco uma dúzia de vezes, confuso. Do que será que ela está
falando?
— LANCE!
— Oi?
— Cai fora.
Balanço a cabeça, finalmente voltando ao mundo real. Dou as costas
para ir embora, mas percebo um lampejo de desejo no olhar de Samantha.
A química entre nós dois é um verdadeiro perigo. Espero que, assim
como eu, ela acabe cedendo a esse desejo crepitante entre nós.
— Vou enlouquecer — murmuro ao entrar no quarto.
Atiro a toalha para longe, ficando completamente nu. Não penso
duas vezes antes de me aliviar, com o barulho do chuveiro ao longe. E na
minha fantasia… Samantha não só me deixa chupá-la como um homem
esfomeado, como também faz o mesmo por mim. E depois passamos as
próximas horas completamente consumidos pela vontade de fazer o outro
gozar.
Merda.
Minha pele arrepia com as imagens sacanas que meu cérebro
começa a formar. Me masturbo mais rápido, concentrado no barulho da
água caindo. Preciso terminar isso antes dela. A garota já me pegou levando
uma queda, não precisa me ver tocando uma pensando nela.
Existem limites para a humilhação, até mesmo para mim.
Parece que está experimentando vidas diferentes
Sinto falta do que éramos
Você não precisava mudar
Now That We Don’t Talk | Taylor Swift

Eu menti sobre o encontro.


Mas a culpa não dura muito tempo. Logo penso em todas as
manchetes que li sobre Lance e toda a vontade de me explicar evapora.
A verdade é que, por coincidência, eu havia retomado o contato com
a minha antiga colega de quarto da época da faculdade, Sabrina. E ela
estava na cidade por alguns dias por causa do trabalho. Quando me
convidou para uma festa com o intuito de relembrar “os velhos tempos”,
aceitei sem hesitar.
É meio estranho pensar que todo o meu passado chegou sem avisar
na minha vida. Primeiro, Lance, depois, Sabrina. Bom, vou lidar com cada
um de uma vez.
E falando no meu ex…
A água quente está caindo sobre mim por mais tempo do que o
planejado, e não por uma causa nobre. Ver Lance pelado depois de tantos
anos despertou partes do meu corpo que eu nem me lembrava que eu tinha.
Seu pau continuava sendo o mais perfeito que eu já vi. Me lembrei na hora
de todas as vezes que fiquei de joelhos para ficar de frente com aquela
perfeição.
E pela forma como ele me recebeu, aposto que Lance também.
Depois de terminar o banho (e de gozar pensando no meu ex), me
troco em poucos segundos. Sabrina já está enchendo o meu celular de
mensagens, e se me lembro bem, paciência não é o seu forte.
— Tome cuidado, Samantha — diz Lance, recostado no batente da
porta.
Ai. Meu. Deus.
Ele está sem camisa e vestindo apenas uma calça de moletom. Seu
rosto anguloso está sério e completamente focado em mim.
Minha pele arrepia. Por que pensar em Lance emburrado me deixa
com tanto tesão?
— Pode deixar — respondo, com um meio sorriso.
Ele range os dentes.
— E não volte muito tarde.
— Volto a hora que eu quiser.
— Antes das cinco.
— Depois das cinco.
— Samantha.
— Lance.
Nossos olhares travam uma batalha silenciosa. Eu sei que o que ele
deve estar sentindo por mim é ciúmes, não sou tão ingênua assim.
Além do mais, ainda me sinto possessiva sobre ele também. Acho
que é porque nunca tivemos a nossa história resolvida de verdade. Sempre
pensei em Lance como uma grande possibilidade, um enorme “talvez”.
Acredito que é recíproco.
Suspirando, ajeito melhor a alça da bolsa sobre o ombro.
— Olha, eu sei me cuidar. Já não nos vemos há anos, lembra? E
estou vivinha. E bem.
— Você não conhece essa cidade, Samantha. O Texas não é a
Califórnia.
Reviro os olhos.
— É, porque Los Angeles é bem mais perigoso que Houston, Lance.
Como eu disse: relaxa. Vou tomar uns drinques e jogar conversa fora. Eu
diria para você chamar alguém para sair, mas você estava sendo um menino
bem levado e agora está de castigo.
— Haha, que engraçada — zomba ele. — Mas falando sério. Por
favor, não chegue muito tarde.
— Tudo bem. Amigo — friso. — Vou tentar voltar antes do
amanhecer.
— Tentar?
— É, ué. Se eu gostar do cara, talvez traga ele para um dos bangalôs
disponíveis no hotel. Não sou maluca de ir para a casa dele de primeira.
— Samantha…
— Boa noite, Lance.
Deixo-o falando sozinho quando disparo na direção do elevador.
Sua voz me chamando é grave e tem uma pontada de raiva, mas isso não
me detém.
Ao me recostar na parede do elevador, um sorriso surge no canto da
minha boca.
Eu não deveria gostar tanto de provocá-lo assim.

— Você definitivamente era bem mais maluca que eu.


— Sabrina, pelo amor de Deus. Você transou com um dos nossos
professores.
— É, mas foi só por causa do bigode. Era sexy demais e eu
precisava saber qual era a sensação na minha boceta.
— Que finesse, hein?
— Eu poderia ter sido mais óbvia se tivesse dito que era pelas notas,
mas não estaria sendo sincera.
Balanço a cabeça, completamente embasbacada ao ouvir as novas
aventuras de Sabrina.
Minha ex-colega de quarto não mudou praticamente nada durante os
dois anos que perdemos contato. O comprimento do cabelo está um pouco
mais curto, e acredito que tenha sido uma escolha consciente por causa
também da profissão. Sabrina comentou uma vez que manter as madeixas
na altura do ombro a deixava com mais “cara de jornalista”.
Seja lá o que isso for.
Nós decidimos jantar juntas antes de irmos para a balada exclusiva
que Sabrina descolou convites. Aparentemente ser uma jornalista de
sucesso e ter contatos por todo o país lhe proporciona coisas assim.
— Você não valia nada, mas é por isso que nos demos tão bem —
suspiro, bebericando a minha bebida. — Eu era do mesmo jeito.
Ela explode em uma risada.
— E como! Lembra daquele cara que você ficou no segundo ano? O
rato de biblioteca que adorava recitar Edgar Allan Poe quando vocês
transavam?
— Aff, pra quê me lembrar de uma coisa dessas?
— Eu falei que essa fase sua ia passar, mas você não me escutou.
— Ele era legal no começo. Interessante. Mas, sei lá… Alguma
coisa entre nós não encaixou — desconverso.
Sabrina lança um olhar condescendente para mim.
— Ah, vocês até que se encaixavam sim. Ele gostava de passar as
tardes de sábado na biblioteca assim como você. Também queria um
emprego estável e pelo que eu ouvia de madrugada, durava bastante tempo.
Vocês só não foram mais longe por causa do jogador.
— Não tem nada a ver.
— Não? Porque eu me lembro de todos os seus casinhos, Samantha.
Os garotos ficavam apaixonados por você, mas aquele cara parecia ter um
sensor. Toda vez que a gente conversava sobre a chance de um
relacionamento seu ir pra frente, ele aparecia novamente. Vocês começavam
a sair juntos de novo, se pegavam por um tempo, mas aí a temporada de
futebol americano começava e você pirava com a quantidade de trabalho no
jornal. Se afastavam, você arranjava outro e a coisa toda recomeçava.
Limpo a garganta.
— Com sensor ou não, é hora de seguir em frente.
Ela sorri.
— Isso até Lance Moreau farejar você.
— Ele não é um cachorro.
— Não? Porque eu me lembro de um cara diferente. E na minha
memória, ele era bem cachorro, sim. E falando nele, teve notícias?
Droga.
Bebo um longo gole do meu martini, na esperança de fazer Sabrina
esquecer o assunto Lance por enquanto. É óbvio que ela não engole essa.
Arqueando a sobrancelha, ela começa a batucar as unhas grandes e bem-
feitas sobre a mesa.
Tic. Tac. Tic. Tac.
O corpo esguio se inclina para frente, e agora sou eu que tenho a
impressão de que estou lidando com uma espécie de animal. Porque, juro
por Deus, é como se ela conseguisse sentir o cheiro da minha omissão a
quilômetros.
— Desembucha, Samuels.
Largo o copo sobre a mesa.
— Tá, tudo bem. Lance voltou pra minha vida.
— Sabia!
— Mas não é como você está pensando.
— Claro que não é — diz com sarcasmo. — Com todo o respeito,
minha amiga, eu tomei a liberdade para pesquisar fotos dele no Google. E,
cara, que bom que você não está passando fome. Ele dobrou de tamanho, se
é que isso era possível. Já achava ele enorme demais. Como isso funciona,
hein? Ele não te esmaga, não?
— Sabrina. Lance e eu não temos mais nada. E pode apostar, da
última vez que ele esteve dentro de mim, seu peso era a menor das minhas
preocupações.
Ela abre um sorriso safado.
— Ah, eu me lembro bem de como você ficava no dia seguinte.
Dormindo pelos cantos. O cara não te dava folga um minuto.
— A questão é — eu a interrompi antes que ela pudesse evocar
imagens que não sairiam da minha mente tão facilmente depois. — Hoje
nós estamos trabalhando juntos. Se pesquisou a vida do cara na internet,
então sabe que a imagem dele está péssima. Orgias, brigas com jornalistas e
paparazzi, péssimo rendimento na última temporada, o pacote completo.
Ele já havia tentado outros profissionais de RP antes, mas não deu certo.
Os olhos de Sabrina se abrem tanto à medida que vou contando a
história, que por um momento me pego pensando se não estou na verdade
descrevendo uma cena sórdida de filme pornô.
— Que delícia, Sam. Você chama ele de chefinho quando está por
cima?
— Sabrina, não tem por cima! Lance e eu não temos nada!
— Ainda. Só espero que seja a última vez que vocês terminam e
voltam. Era bonitinho e até fofo na época da faculdade, mas agora só está
sendo um pouquinho irritante.
Reviro os olhos.
— Você é irritante. Eu só queria poder beber e jantar com uma velha
amiga sem ter todo esse interrogatório.
— Mentirosa. Você quer ouvir alguém dizer o quanto vocês dois são
péssimos um para o outro, mas não passa de uma grande bobagem. Vocês se
davam tão bem naquela época, Sam. Só eram jovens e um pouquinho
burros.
— Obrigada, hein?
— Eu disse um pouquinho — reitera, sorridente. — Vocês agora são
adultos. Imagina todo o sexo selvagem, cheio de mágoa e saudade? Se eu
fosse você, não perderia tempo.
— É claro que não perderia. — Reviro os olhos, fazendo um sinal
com a mão para chamar a atenção do garçom. Peço a conta e pago por nós
duas, mesmo sob protestos dela. — Você me prometeu uma festa, Sabrina.
E eu quero uma festa.
Ela vira todo o conteúdo restante no seu copo de uma vez só.
— Você terá uma festa, Samantha Samuels.
cinco anos atrás
Eu pensei que o primeiro ano da faculdade seria o pior.
Foi isso que todos me prometeram.
“Passe pelo primeiro ano e tudo ficará bem.”
“O primeiro ano é o mais difícil, Sam. Só sobreviva e nunca mais
vai perder tantas noites de sono”.
Sinceramente? Vou me lembrar de cada uma dessas palavras pelo
resto da minha vida. Porque, cacete, essa merda não está ficando mais
fácil. Muito pelo contrário. Quanto mais eu avanço na minha graduação,
mais parece que estou emburrecendo.
É sério.
Eu já deveria saber todas essas coisas, não é? Essas teorias
complexas e estudos de caso não cairiam nas provas se já não fossem algo
que eu deveria saber.
Vou morrer.
Minha rotina nesse segundo ano estava ficando cada vez mais
impossível. De manhã eu ia para aula, nas tardes de segunda, quarta e
sexta eu passava na redação do jornal da universidade — que nada mais
era do que uma grande sala com computadores e uma impressora —, e as
minhas noites pertenciam inteiramente a ela: a biblioteca.
Já tinha perdido as contas de quantas horas passei debruçada sobre
os livros que precisava terminar. Até tentei estudar no meu próprio quarto
uma vez, mas não era justo pedir para Sabrina ficar em silêncio mortal só
por minha causa. Ela tinha um dia estressante pra caralho e merecia poder
relaxar em paz quando voltava para casa.
Então tudo o que me sobrava era isso aqui. Livros, poeira, milhares
de anotações e um punhado de canetas coloridas que eu ainda me
perguntava se eram mesmo necessárias.
— Eu só posso ter sido um bom menino o ano inteiro. Porque,
caramba, Papai Noel. Esse presente aqui é melhor do que tudo que já pedi.
— O sussurro baixinho me fez sorrir.
Lance.
Tentando esconder o sorriso, virei o rosto para enxergá-lo melhor.
Ele estava usando um moletom da universidade, segurando os livros na
mão com a melhor expressão inocente.
Recostei na cadeira, avaliando-o da cabeça aos pés.
— Você conhece a biblioteca? Estou surpresa — tirei uma com a
cara dele.
— Pois é. Dá pra acreditar? Descobri esse lugar há poucos dias. —
Ele fingiu uma expressão surpresa. Em seguida, fez um gesto com as mãos
como se a mente dele estivesse explodindo.
Precisei segurar a risada.
— O que está fazendo aqui, Lance?
Ele não perdeu tempo e correu para ficar do meu lado.
— Estou pegando uma matéria do seu curso.
— Jura?
— Aham. E vou ter uma prova na semana que vem. Sei que existe o
estigma de atleta burro, mas juro por Deus que tentei entender isso daqui
sozinho. Mesmo assim, continua não fazendo sentido na minha cabeça.
Mal sabia ele que eu o entendia como ninguém. Ultimamente,
estava me sentindo a mulher mais burra do mundo. Impressionante como
eu conseguia ler as frases e entender o que estavam dizendo, mas ao pensar
no contexto geral da teoria, parecia que meu cérebro havia derretido.
— Entra na fila — brinquei, abrindo um espacinho para ele poder
se sentar.
Lance abriu um dos livros e me surpreendi com a quantidade de
marcação. Não que eu realmente acreditasse que todo atleta era burro, mas
foi legal ver o quanto ele estava se esforçando.
— Não sei como você vai se formar nisso. É muito difícil.
— É o mesmo que eu penso em relação ao futebol. É tão violento.
Você vai acabar parando no hospital.
Ele riu.
— Cara, eu espero mesmo. Isso significa que vou jogar muito.
— Sinto muito pelos seus ossos. — Mostrei a língua, brincalhona. —
E agora sobre o seu curso… Tá gostando?
Lance deu de ombros.
— É interessante, mas não é a minha paixão. Até pensei em cursar
Jornalismo para ter uma segunda opção caso a carreira não fosse para
frente, mas não aguentaria mais aulas sobre isso. Acabei optando por
Administração.
— Uma boa escolha — salientei. — Achei legal também tentar uma
aula de comunicação. As pessoas sempre me diziam o quanto seria fácil
esse curso, mas agora estou prestes a enlouquecer.
Lance balançou a cabeça, assobiando baixinho.
— Quem disse isso pra você não passa de um mau-caráter. Ou não
entende nada sobre comunicação.
— Ou os dois — completei, rindo.
Nós ficamos estudando em silêncio por quase uma hora. De vez em
quando ele esbarrava o antebraço no meu e os pelinhos da minha nuca se
arrepiavam. O mesmo acontecia quando Lance se espreguiçava feito um
gato e um pedaço do seu abdômen musculoso aparecia.
Era difícil me concentrar com ele bem ali. A presença de Lance não
passava despercebida pelo meu corpo.
— Acho que vou tomar uma água— disse ele, do nada. — Quer vir
comigo?
Olhei para ele, confusa. Lance ergueu as sobrancelhas o máximo
que podia e fez um breve aceno em direção às estantes mais reservadas da
biblioteca.
Meu coração acelerou.
Assenti rapidamente, segurando o riso ao passar correndo por um
grupo de estudantes que secavam Lance com os olhos sem nem tentar
disfarçar.
Danadinhas.
— Lance? — perguntei, quando ele segurou a minha cintura com
possessividade.
Em seguida, nos girou de modo que fiquei com as costas apoiadas
na prateleira. O corredor estava vazio, e apreciei o cuidado que ele teve em
verificar se alguém estava por perto.
Ninguém.
— Estava louco de vontade de fazer isso — murmurou, rouco, antes
de abaixar a cabeça e me beijar.
Correspondi na mesma hora. Lance gemeu quando sentiu a minha
língua entrar com avidez em sua boca, e eu fiquei na pontinha dos pés para
conseguir alcançar seu pescoço. Enlacei meus braços ao seu redor e
aproveitei a sensação de seu corpo firme contra o meu.
Ele sabia beijar. Normalmente, os caras usavam o beijo como uma
preliminar para o sexo, apalpando e tocando no máximo que conseguiam
alcançar do corpo feminino. Lance não. Ele mordiscava meu lábio com
delicadeza ao mesmo tempo em que segurava a minha nuca, firme. Depois,
brincava com a minha boca. Deixava selinhos delicados e deliciosos antes
de voltar a usar a língua para me enlouquecer.
— Você cheira tão bem — sussurrou, descendo o rosto para
alcançar o meu pescoço.
Nunca pensei que sentir um cara me cheirando poderia ser tão sexy,
mas aqui estamos nós.
Agarrei um punhado de seus cabelos, apreciando cada beijo
molhado que Lance estava deixando pela minha pele.
Quando deixei escapar um gemido que estava tentando segurar , ele
subiu o rosto rapidamente.
— Silêncio, Sam. Não podemos ser pegos, lembra?
O olhar dele estava brilhando com malícia.
— Não é justo.
— Eu sei… — Ele voltou a enterrar o rosto no meu pescoço,
inspirando fundo. Prendi a respiração. — Mas temos que ficar quietinhos.
Você não quer que todos os estudantes da universidade saibam o que eu
gosto de fazer com você, quer?
— Acho que não — respondi.
Lance sorriu contra a minha pele e eu senti um arrepio gostoso
subir pela minha espinha.
— Isso mesmo. Além do mais, não quero que outras pessoas vejam o
quanto você fica corada quando está excitada pra mim.
Precisei morder a língua para não deixar um gemido escapar.
Lance estava sendo mais traiçoeiro do que uma cobra. Porque
enquanto sussurrava as coisas mais deliciosas no meu ouvido, usava o
polegar para traçar círculos despretensiosos pela minha barriga. Subiu um
pouco a camiseta que eu estava vestindo — e graças ao universo eu estava
usando uma saia justa —, e começou uma carícia.
Abaixei a cabeça, completamente fascinada pelos seus movimentos.
Lance se colocou entre as minhas pernas. Uma mão subia na
direção dos meus seios enquanto a outra repousava na minha coxa.
— Posso ver se você está molhada pra mim? — perguntou,
praticamente sem voz.
Nem hesitei. Assenti algumas vezes, inebriada por seu cheiro e por
todas as sensações que aparentemente só ele podia causar em mim.
— Que garota boazinha — disse, mordiscando a minha orelha.
Agarrei seu cabelo, abrindo mais as pernas para dar mais acesso
até a minha boceta que, diga-se de passagem, estava encharcada.
Lance deslizou a mão sobre a minha calcinha. Ele gemeu contra
mim, praguejando baixinho ao sentir como a peça estava arruinada.
Quando afastou a renda para o lado e me tocou sem nenhuma barreira,
precisei abafar meus chiados.
Gemendo, ele se moveu para tentar cobrir o meu corpo o máximo
que conseguia. Os dedos não parando de me masturbar um minuto
enquanto as pessoas ao nosso redor continuavam suas rotinas.
Girei os quadris, tentando acompanhar seu toque. Lance introduziu
um dedo dentro de mim, fazendo uma expressão sofrida ao me sentir.
— Merda, Sam. Sua boceta está apertando meus dedos.
Ele soava fascinado.
Isso só intensificou ainda mais o meu tesão.
— Estou tão duro por você, Sam. Estou quase arrancando essa
calcinha e metendo em você aqui mesmo. E aposto que você adoraria.
— Sim — gemi, fechando os olhos para me concentrar na imagem
deliciosa que ele havia colocado em minha mente.
— Vamos, Samantha. Goza pra mim.
Ele usou os dedos para estimular o meu clitóris, alternando entre
fazer os círculos e me penetrar com seus dedos. Abafei um gemido
mordendo seu ombro, completamente dominada pelo prazer que Lance me
proporcionou.
Merda. Nunca gozei tão rápido na vida.
E, principalmente… Nunca havia sentido tanto prazer ao ser
masturbada por um cara. Normalmente a combinação de dedos e língua me
deixava louca, mas só dedos? Era definitivamente uma novidade.
Quando a sensação inebriante do orgasmo passou, abri um sorriso
fraco. Lance estava fazendo um carinho suave no meu cabelo, exibindo
uma expressão de satisfação que me deixou louca para recomeçar tudo de
novo.
— Está a fim de sair daqui? — perguntou com o tom de voz rouco.
Eu simplesmente o peguei pela mão e corri na direção da saída,
sem me importar com a sua risada estridente ao fundo.
Só comprei esse vestido para que você pudesse tirá-lo
Gravei seu nome na cabeceira da minha cama
Porque eu não quero você como um melhor amigo
Dress | Taylor Swift

Estou andando de um lado para o outro, sem conseguir me conter. O


motivo? Samantha!
Ela me enviou a localização em tempo real — que até então dava
mesmo em um restaurante —, mas faz vinte minutos que isso mudou. Pelo
que eu pesquisei no Google, o novo endereço pertencia a uma casa de
festas.
Samantha estava em uma balada. Enquanto isso, aqui estou eu,
usando moletom e me preparando para dormir às onze horas da noite. Meu
Deus, o que foi que eu me tornei?!
Ligo para Charles.
— Fala, Lance!
— Cara, será que você poderia fazer um grande favor pra mim?
Ele hesita.
— Depende. Você não teria um corpo pra eu enterrar, né?
Reviro os olhos. Charles sendo Charles.
— Claro que não. Eu só preciso que você vá a uma festa.
— Uma festa?
— Sim. Samantha saiu com um cara e pela localização, os dois
estão em uma boate que fica perto do centro de treinamento. Só preciso
saber se ela está bem.
A risada anasalada dele me arrepia a espinha.
— Ela está numa festa, Lance. É óbvio que está bem.
— Você não tem como ter certeza. Existem loucos à solta.
— É verdade, e eu estou falando com um agora mesmo. Olha, vou
te dar um conselho de amigo. Desencana dessa garota, Lance. Vocês se
pegaram e você gamou. Eu entendo, de verdade. Sam é divertida, bonita e
sabe agitar um lugar. Sem contar na capacidade impressionante que ela
tem quando se trata de bebida. — Ele não precisava mencionar isso. Tudo
que eu consigo pensar agora é que Charles já pegou Samantha e isso não
está ajudando em nada. — Deixe ela curtir. Deus sabe como você fez isso
por todos esses anos.
Fiz mesmo e não é algo que eu me arrependa. Estava solteiro, no
auge da vida, cheio de tesão e com muitas mulheres dispostas a passarem
uma noite comigo. Nunca fui santo — e talvez tenha me enfiado em mais
confusões do que o necessário enquanto crescia —, mas Samantha
tampouco. Ela também passava o rodo nos caras da universidade, e pelo
pouco que soube da sua vida adulta, as coisas não mudaram tanto assim.
Mas talvez Charles tenha razão. Ela provavelmente está bem. Deve
ter decidido curtir a noite com o cara que está saindo. Se estivesse
precisando de alguma ajuda, teria dado um jeito de me avisar.
Certo?
— Obrigado pelo conselho, Charles. Embora você seja o último
homem do mundo que eu devesse ouvir.
— Ai, Lance. Assim você me magoa.
— Eu duvido muito.
— Estou falando sério. Mas agora mudando de assunto. Se quiser
sair para pegar alguém essa noite, estou disponível.
Nem me dou o trabalho de responder. Só desligo na cara do infeliz.
Pensando bem, Charles tem uma grande parcela de culpa em tudo o que
estou vivendo agora. Foi por causa dele que acabei naquele hotel — e tudo
bem, eu estava aparecendo frequentemente em sites e páginas de fofoca —,
mas o que selou o meu destino e quase acabou com a minha carreira foi
aquele maldito hotel.
Ainda bem que ele não concordou em ir atrás de Samantha. É
melhor assim.
Pelas próximas duas horas, divido o meu tempo em assistir jogos
antigos, beber cerveja e tentar não pensar tanto em Samantha. É óbvio que
eu falho miseravelmente na última parte.
Quando dá meia-noite, tento dormir. Mas, infelizmente, a minha
mente está a milhão e eu passo mais de vinte minutos rolando na cama,
inquieto. Tento me convencer de que estou assim por causa da próxima
semana. Sean me avisou que precisarei comparecer a uma coletiva de
imprensa e isso tinha mesmo me deixado ansioso.
No entanto, eu sei o motivo de estar tão agitado assim e não estava
adiantando nada me enganar.
— Merda — suspiro.
Me troco em poucos minutos e nem me preocupo em pedir a
minivan quando passo pela recepção do hotel. Peço para buscarem o meu
carro e tento não pensar muito no que estou prestes a fazer.
Samantha vai me matar.
Sean vai me matar.
Merda, talvez eu deva mesmo ficar na porra da suíte.
Mas não é isso que eu faço. Eu entro no carro, coloco a festa no
GPS e sigo na direção da festa.
Só estou querendo cuidar dela. Não tem nada de errado nisso, não é?
Além do mais, não estou querendo arranjar uma cena. Vou chegar
educadamente e perguntar sobre a Samantha. Depois de vê-la com meus
próprios olhos e atestar a sua segurança, vou dar meia-volta e voltar para
cama.
É, me parece um bom plano.

— LANCE MOREAU ESTÁ NA ÁREA, GALERA! REPITO: O


WIDE RECEIVER DOS TEXANS ESTÁ NA NOSSA
FESTAAAAAAAA! — o DJ anuncia, o que faz todos irem ao delírio.
Ai, merda.
Tá, talvez o lance de passar despercebido tenha ido pelo ralo. Mas
ainda não desisti do meu objetivo principal.
Ah, lá está ela. Engraçado, não me lembro de ter visto Samantha sair
com um vestido tão curto. Talvez ela tenha se trocado porque, caramba, a
imagem dela sair usando isso não me daria paz de jeito nenhum.
Samantha mira os olhos furiosos em minha direção. Em seguida, faz
um sinal de decapitação em frente ao pescoço. Abro um sorriso sem graça,
sendo prontamente engolido por fãs.
— Você pode tirar uma foto comigo?
— Lance, o que está acontecendo contigo, cara? Te deixaram de
fora dos dois últimos jogos!
— Você pode gravar um vídeo para o meu pai? Ele é um grande fã!
— Não acredito que é você mesmo! Você é mais gostoso
pessoalmente!
Tento acompanhar a enxurrada de comentários, mas é praticamente
impossível. Algumas pessoas tiram foto comigo, outras de mim. Sinto a
culpa me invadir lentamente. Amanhã isso vai estar estampado em todos os
jornais e revistas.
Mas a farra não dura por muito tempo. As pessoas começam a ser
dispensadas pelos seguranças da festa, e eu abro um sorriso agradecido.
Isso até eu dar de cara com a minha relações públicas. Ela está com
os braços cruzados e o rosto retorcido em uma expressão severa.
Sam me puxa pela mão até um local mais reservado. O que, diga-se
de passagem, é a mesma coisa que nada. Todos os olhares estão voltados
para a gente.
— Que merda é essa, Lance? — sibila ela, o desespero nítido em
seus olhos.
Engulo em seco. Nunca me senti tão idiota na vida.
— Só queria saber se você estava bem. A sua localização mudou…
Ela guincha, irritada.
— E não passou pela sua cabeça que eu tenha vindo para uma
balada porque eu quis?!
— Olha, sinto muito. Agi por impulso. Mas caramba, Sam. Você
poderia ter me ligado para avisar. Evitaria tudo isso.
— Eu não te devo satisfação, Lance.
Aperto os olhos, irritado.
— Não estou dizendo que você deve. Só disse que estava
preocupado.
— Sério? Porque, do meu ponto de vista, isso tem cheiro de outra
coisa.
— Que coisa?
— De ciúmes!
Sou pego totalmente de surpresa. De soslaio, faço questão de
conferir se alguém escutou alguma coisa. Felizmente, parece que não.
— Samantha, isso não tem nada a ver.
— Sério? Porque eu não vejo outra razão para você ter arriscado
tudo o que estivemos fazendo nesses últimos dias! O que foi, Lance? Será
que você ainda não entendeu que não temos mais nada?
— Somos amigos, Sam.
— Não, Lance. Não podemos ser amigos. — Ela prende a
respiração. Dou um passo para trás, magoado. — Como você pode
continuar assim?
Pisco uma vez.
— Assim como?
— Gentil. Preocupado. — Samantha arregala mais os olhos.
Percebo um lampejo de lágrimas querendo descer, mas ela segura bem o
choro. — Por que continua se importando comigo? Por que não grita? Sabe,
eu não me importaria se você explodisse. Eu mereço.
Do que ela está falando?
— Samantha?
— É sério. Fui horrível com você na última vez que nos vimos. —
A voz dela está embargada. — Falei coisas das quais eu me arrependo
muito, mas não é justo, Lance. Você não deveria continuar se importando
tanto. Você deveria me odiar.
— Eu não consigo odiar você, Sam. Nunca poderia.
— Você deveria.
— Eu não vou. — Percebo uma quantidade considerável de câmeras
apontadas na nossa direção, e me inclino o suficiente para sussurrar isso
para Sam.
Ela está cheirando a bebida. Agora tudo faz sentido.
— O que foi?
— É melhor sairmos daqui. Já chamamos muita atenção.
Samantha parece atordoada por alguns minutos, mas logo se
recupera. Assente algumas vezes com a cabeça conforme me segue em
direção à saída. Uma multidão curiosa nos acompanha, e começo a pensar
em maneiras de despistá-los.
É quando Sam segura meu pulso, tentando se equilibrar.
— A Sabrina. Vim com ela. Não posso ir embora sem avisar.
Merda.
Mas… Puta que pariu. Se Sam veio com a ex-colega de quarto,
então significa que ela não estava em um encontro. Maldita. Ela sempre
arranja uma maneira de me provocar.
Vamos conversar sobre isso amanhã. Definitivamente.
Samantha aparece com uma Sabrina muito bêbada em poucos
segundos. Vejo um lampejo de reconhecimento nos olhos da garota quando
me vê, mas não temos tempo para os clichês do reencontro. “Ah, quanto
tempo! Você deixou o cabelo crescer?” e coisas assim.
Antes de corrermos na direção do meu carro, tiro uma nota de cem
dólares no bolso e entrego para um dos guardas da festa.
— Não deixe ninguém nos seguir, por favor.
Ele faz um aceno de cabeça, e lhe dou um tapinha nas costas em
agradecimento.
Sam e Sabrina não estão conseguindo nem andar em linha reta. Sei
que não tenho esse direito, mas ela vai escutar umas poucas e boas amanhã.
Sair para beber não tem problema, entretanto, ficar nesse estado estando
desacompanhada, sim. E se eu não tivesse aparecido hoje à noite?
Estremeço só de pensar.
— Meu Deus, Sam, sua safada! Você deveria ter me contado que
está transando com ele!
— Não estou transando com ele! Nós só estamos morando juntos!
— AHÁ! Você não vale nada, Samuels. Mas não te culpo. Ele é
muito gostoso. Deve saber fazer tudo direitinho…
Samantha suspira contra o banco. Coloquei as duas atrás para
conseguir ter uma visão de ambas pelo espelho retrovisor. Agora estou
entretido com uma conversa bêbada extremamente aleatória.
— Ele sabe fazer mesmo. Mas acredita em mim, não fazemos isso
há muito tempo.
— Mas vocês estão morando juntos!
— Temporariamente!
— Não entendo isso. Qual a graça de morar com uma pessoa se
você não está transando com ela? Quero dizer, olha pra ele! Não é possível
que você resista. Espera aí… — Sabrina se embola um pouco com as
palavras. — Como é o pau dele?
Espera, o quê? Que merda é essa?
— É bonitinho.
Bonitinho?!
Quase viro a cabeça para trás tal qual a protagonista de O Exorcista.
— Deve ser por isso. — Sabrina usa um tom de voz como “quem
entendeu tudo”. — Não deve ser tão bom.
— Mas é bom!
— E por que chamou de bonitinho?
Boa pergunta, Sabrina. Também estou louco para saber.
Samantha suspira.
— É só um modo de dizer. O pau do Lance não é feio, é bem bonito.
E grande.
— Grande quanto?
— Grande assim… — Pelo espelho retrovisor, consigo visualizar
Samantha afastando as mãos. Sabrina solta um gritinho.
— Meu Deus. Desse tamanho?
— Eu juro.
— Agora eu entendi sua fixação por ele.
Elas continuam tagarelando por todo o caminho até o resort e
confesso que me arrancam boas risadas. Estão tão entretidas no próprio
mundo que nem escutam os murmúrios baixinhos de concordância que eu
solto.
Mas aprendi coisas bem importantes hoje. A primeira delas é que
Samantha sempre amou o que eu fazia com a língua. A segunda é que acha
meu pau bonito. E a terceira… É que recusou um menáge proposto pela
própria Sabrina quando estávamos na faculdade.
Isso me surpreendeu. Não a parte de Samantha recusar, porque ela
sempre foi bem clara sobre me “dividir”. Enquanto estávamos juntos, eu só
poderia transar com ela e isso nunca foi um problema para mim. Também
exigia a mesma exclusividade dela. Contudo, a parte do menáge foi algo
que eu definitivamente não esperava. Nunca senti Sabrina me olhando com
desejo.
Quando as duas entram na suíte, começam a tirar os sapatos.
Começo a catá-los, e Sam choraminga.
Puta merda.
Ela está tentando passar o vestido pela cabeça, mas ele não está
saindo com facilidade. Estende os braços na direção de Sabrina, que
começa a puxar o tecido.
— Não quer sair — explica, dando um puxão que faz Sam chiar.
Ela está machucando Samantha.
— Deixa comigo — peço gentilmente, tentando engolir o incômodo
que a cena me causou. Não gosto de pensar na ideia de Sam com dor.
Sabrina dá um passo para o lado, deixando o caminho livre para
mim. Percebo o problema na hora: elas não haviam sequer descido o zíper.
Preciso segurar a risada quando Sam me abraça. Ela enche meu
rosto de beijos enquanto murmura “obrigada, obrigada, meu herói!”
repetidas vezes.
— Tá bom, Sam. Já para o chuveiro — mando, mesmo adorando
sentir o corpo dela pressionado contra o meu.
Enquanto as duas estão no chuveiro, ligo para o serviço de quarto do
hotel e peço um café forte junto com uma porção de frutas. Elas precisam
combater a ressaca de amanhã, Deus sabe que a ressaca moral já vai ser o
suficiente.
A comida chega pouco tempo depois das duas aparecem trocadas e
limpas na sala. É nítido que estão um pouco mais sóbrias do que antes, mas
ainda assim não é muito.
— Que fofoooo! Você pediu comida pra gente! — É Sabrina quem
vem saltitando. Ela aceita a xícara de café de bom grado, e Samantha faz o
mesmo.
Cruzando os braços, me recosto na bancada da adega.
— Vocês duas precisam dormir.
Samantha bufa.
— Então por que trouxe café pra gente?
— Pra vocês não acordarem amanhã com vontade de morrer,
espertinha. É por isso. Já pedi para o hotel me arranjar um analgésico
também. Depois vocês vão me agradecer.
Elas terminam o café e dão um fim nas frutas. Fico parecendo um
irmão mais velho orgulhoso, mas a luta de verdade começa quando vou
levá-las até a cama. As duas acham uma ótima ideia brincar de lutinha
comigo antes de caírem no sono.
Fazem de tudo: sobem em cima de mim, gritam “atacar” e tentam
me fazer cosquinhas, e posso jurar que senti um soco na costela também.
Jesus, é pior do que as festas de fraternidade.
Quando finalmente ficam quietas e prontas para dormir, vou em
direção ao sofá. Esmurro o travesseiro até senti-lo macio o suficiente para
deitar.
E caio no sono no mesmo instante.
Então podemos dizer que estamos quites
Você pode me chamar de “amor” no fim de semana
Esta é a maldita estação, anote isso
‘tis the damn season | Taylor Swift

Minha cabeça está latejando.


Abro os olhos devagar. Depois, rolo na cama até encontrar o corpo
desmaiado ao meu lado.
É de uma mulher.
Mais precisamente de Sabrina.
Por que estamos na cama da suíte que divido com Lance? E por que
diabos a cortina está aberta? A luz do sol está me fazendo sentir como um
vampiro: prestes a queimar e morrer.
— Que inferno de claridade — diz Sabrina com um grunhido.
Porra.
Seu sussurro é capaz de me tirar de órbita. Porque, merda, qualquer
barulho será capaz de arruinar o meu dia.
Por que eu tinha que inventar de beber tanto? Por quê?
— BOM DIAAAAAA! — Lance está segurando uma bandeja de
café da manhã com tudo o que temos direito, inclusive dois comprimidos
que me chamam bastante atenção.
Sabrina segura um dos travesseiros sobre a sua cabeça.
— Silêncio. Pelo amor de Deus, silêncio.
Grunhindo, eu também faço o mesmo.
— Lance, você trouxe analgésicos? — pergunto, fazendo um
esforço descomunal para não soar tão mal-humorada.
— SIM! — Ele nem esconde o quanto está se divertindo com a
nossa ressaca. Atiro um dos travesseiros nele, mas não faz nem cosquinha.
— Ei! Você não deveria tentar agredir a pessoa que está com as drogas.
Sabrina me atropela, se inclinando sobre mim para alcançar Lance.
— Passe pra mim, por favor
— Às ordens, Sabrininha.
— Argh. Já disse o quanto odeio esse cara? — Ela revira os olhos
para mim. Em qualquer outro momento, isso me arrancaria uma risada.
Agora eu só penso em uma maneira bem dolorosa de manter esses dois de
boca fechada.
Lance me estende um comprimido com um copo cheio de suco de
laranja. Pego, lançando um olhar agradecido.
— Qual é, Sabrina? Você não me odeia. Na verdade… Fiquei
sabendo de uma história ontem.
Isso me chama atenção.
Desvio o olhar para Sabrina, que está tão estática quanto eu.
Lentamente, nós duas viramos o rosto para Lance. Ele nem consegue
disfarçar a satisfação no rosto quando começa a preparar uma torrada de
ovos mexidos e bacon para mim.
— O que você quer dizer com isso, Lance? — pergunto com
rispidez.
Ele dá de ombros, lambendo um dos dedos.
— Posso ter escutado uma coisinha ou outra ontem no carro, quando
fui buscar vocês. Fiquei decepcionado pelo seu encontro ter sido com a
Sabrina, Sam.
Ranjo os dentes.
— Eu te mandei mensagem?
Só podia estar muito bêbada para não me lembrar disso, o que é uma
grande ironia. Eu sempre dou um jeito de bloquear meu telefone e deixá-lo
o mais longe possível de mim justamente para não correr o risco de ligar
para alguém quando o álcool entrar no meu corpo.
O sorriso de Lance não vacila, no entanto.
— Não, você não ligou. Fica tranquila. Esqueceu que eu estava te
rastreando? Vi que você mudou de rota e decidi verificar se estava tudo
bem.
Sabrina se joga contra os lençóis.
— Não estou entendendo nada. Você rastreia ela?!
Faço um gesto de desdém com as mãos.
— Eu enviei minha localização em tempo real para ele. Só por
questão de segurança. Mas não muda de assunto, Lance. — Estreito os
olhos em sua direção. — O. Que. Você. Ouviu?
O cafajeste sorri novamente.
Isso não é um bom sinal.
— Tirando a parte em que você elogiou o meu pau e disse que
estava morrendo de saudades? Só a história a respeito de um ménage que
quase aconteceu. De acordo com a Sabrina, você estava quase cedendo. —
Ele pisca para mim, sacana. — Usando meu corpinho para conseguir
vantagens, Sam?
Ai. Meu. Deus.
Se eu achava que a dor de cabeça e a boca seca eram a pior parte do
meu dia, estava sendo muito otimista. A ressaca moral é muito pior.
Sabrina, ao meu lado, praticamente derrete na cama. É sério, acho
que se ela tivesse o poder de se fundir a esses lençóis e desaparecer, faria na
mesma hora.
— Por que tanta timidez, meninas? — Lance posiciona a bandeja
sobre a cama. Não posso negar que a atitude é fofa. — Sou gostoso pra
caralho mesmo. De acordo com a Sam, então…
Merda. Merda, merda, merda.
Acho que eu posso realmente morrer de vergonha. Não tenho
palavras quando viro o rosto para me esconder.
Sim, voltei a ter quinze anos e fujo da humilhação fingindo que não
existo.
Lance ri.
Na verdade, pelo som estridente que faz, aposto que está
gargalhando. Aquele tipo de risada que desequilibra uma pessoa e deixa os
ombros tremendo.
Cretino.
— Estarei esperando vocês na sala.
Quando escutamos a porta fechar, Sabrina me lança um olhar
irritado.
— É proporcional, não é? Ele é irritante no mesmo tanto que é
gostoso.
— Sim.
— Isso não é justo.
— Não, não é.

Sabrina recebe uma ligação a respeito do trabalho pouco tempo


depois de descermos para almoçar. Ela se despede rapidamente de nós com
um sorriso amigável no rosto. Não esperava chorar ao abraçar minha amiga,
mas é o que acontece.
— Vamos marcar de sair quando você terminar de salvar a imagem
desse aí — brincou, bagunçando o meu cabelo de propósito ao me dar as
costas.
Lance não disse uma palavra quando me viu com os olhos inchados.
Esperei uma piadinha de mau gosto ou mesmo uma provocação bem-
humorada, mas ele só me encarou, complacente.
Fiquei imensamente agradecida, embora não tenha verbalizado.
— Obrigada por ter cuidado de mim ontem à noite — digo, sem
graça. Estamos no restaurante do SPA, cercados de hóspedes. Por alguma
razão, nenhum deles se alarma com a presença de Lance.
Bom.
— Não precisa agradecer, Sam. Eu disse que faria isso.
— Eu sei. É só que… — suspiro. — Não acho que você me deve
nada, ok? Embora tenhamos um passado, isso não significa que você
precisa correr para me ajudar sempre que achar que estou em perigo.
Seus olhos brilham com diversão. Curioso, ele se inclina para frente.
— E o que te faz pensar que eu fui atrás de você ontem à noite por
pensar que te devo algo? Pelo amor de Deus, Samantha. Eu só faço o que eu
quero.
Eu só faço o que eu quero.
A frase, por algum motivo, acende um fogo dentro de mim. Lance
está mesmo querendo dizer que me quer, mesmo indiretamente?
Acorda, Sam.
— De qualquer forma, obrigada.
— Ao seu dispor, gatinha. Sempre que precisar.
Gatinha. Céus, faz quanto tempo que eu não o escuto me chamar
assim?
Lance sempre gostou de usar apelidos fofos e cafonas para todas as
garotas que saía. “Gatinha, bebê, linda, princesa”, o repertório não tinha
fim. Um dia estávamos assistindo a um episódio de Friends na televisão
quando ele me chamou de “gata”. Não controlei o riso e nós acabamos em
uma discussão bem séria a respeito desses apelidos.
— É fofo — ele argumentava.
— É cafona — eu retrucava.
E depois de horas discutindo a respeito, nós chegamos à conclusão
que só era brega e cafona se o cara usasse com desconhecidas.
— Faz você parecer um cafetão dos anos noventa. Aquele tipo de
cara idiota que diz “ah, chame ela por um apelido para não precisar decorar
o nome!” e coisas assim — expliquei com um ar triunfante.
— Então se estamos em um relacionamento duradouro e bom, está
tudo bem eu te chamar por um desses nomes?
— Acho que sim.
— Então por que você riu quando eu te chamei de gatinha?!
E então voltamos para o ponto de discussão.
Lance e eu éramos assim. Nos dávamos bem ao mesmo tempo em
que nos irritávamos. Concordávamos em discordar. E, no final do dia, ele
sempre terminava dentro de mim.
Limpo a garganta.
— Você tem uma coletiva de imprensa semana que vem —
relembro, dando uma garfada no meu salmão. — Precisamos repassar as
suas respostas.
Lance assente algumas vezes.
— Sim, Sean me disse. E falando nele…
Seu tom de voz me preocupa. Largo o talher na mesma hora,
encarando-o com pesar.
— O que aconteceu?
Lance suspira.
— Eu fui atrás de você ontem à noite, certo? E pensei que seria
tranquilo te encontrar. Mas a fila de espera estava enorme, e não parecia ter
previsão de andar.
— É, a Sabrina conseguiu convites para gente porque conhece o
dono da festa.
— Então… Acabei descobrindo que ele era um grande fã. Precisei
usar meu nome para entrar.
E então o que aconteceu ontem volta em flashes.
Já mencionei como eu odeio perda de memória alcoólica? Não?
Porque eu odeio essa vagabunda mais do que tudo no mundo. Como eu
posso ter me esquecido da chegada triunfal de Lance?
O DJ o anunciou para a balada inteira. As pessoas correram em sua
direção e tiraram fotos de todos os ângulos possíveis. Merda, a quantidade
de vídeos que devem estar rodando a internet…
Tanto esforço para nada.
— Lance…
— Fica tranquila, Sam. Estou monitorando as notícias desde cedo.
Me fotografaram em uma festa, mas nada aconteceu. Algumas pessoas
conseguiram fotos nossas juntos, mas não é nada comprometedor. Sean
chegou a comentar que a repercussão foi até positiva.
— Como isso pode ter sido positivo?
— Porque eu estava em uma festa e não fiz nada demais. Entrei,
curti, fui embora. Algumas pessoas estão até dizendo que isso mostra um
amadurecimento — ele zomba, risonho. — Não é o ideal, mas já é algo.
Engulo em seco.
De certa forma, ele tem razão. Poderia ser bem pior.
— Isso não pode voltar a acontecer — afirmo, balançando a cabeça.
— Concordo. Chega de encontros para Samantha.
Estava demorando…
— Estou falando de tudo isso. Olha, eu não deveria ter tirado o dia
ontem de folga. A partir de agora, vou trabalhar vinte e quatro horas por
dia.
— Para com isso, Sam. Você não é de ferro. Tudo bem sair e se
divertir de vez em quando.
— Mas não se isso acabar em páginas de fofoca — reitero. —
Vamos controlar esse dano. Você vai treinar hoje?
— Não. Hoje é domingo. — Ele sorri. — Mas amanhã eu volto com
tudo. Normalmente passo o dia no centro de treinamento, mas vamos ter um
jogo na quarta. Vai ser em casa, então não deve afetar muito a nossa rotina.
— Ótimo. Enquanto isso, vou começar a ligar para o escritório em
Los Angeles. Estive conversando com alguns deles sobre eventos
beneficentes para você comparecer e preciso saber quais deles batem com a
sua agenda.
Nós terminamos de alinhar as próximas semanas e quando
finalizamos o almoço, Lance me lança uma piscadinha.
— Nós ainda temos o dia de hoje para aproveitar.
— Já aproveitei mais do que eu devia. — Reviro os olhos, sentindo
a culpa lentamente me invadir. — Não vou sair da suíte nunca mais.
— Perfeito. Também não estava planejando te tirar de lá.
— Lance…
— Confia em mim, Sam. Podemos continuar nos provocando e
implicando porque eu sei que, assim como eu, você adora. — E é verdade.
— Mas também podemos fazer as coisas que sempre amamos fazer juntos.
Eu morro de saudades.
Engulo em seco. Merda, será que ele estava falando, tipo… De
Sexo?
Minhas bochechas devem estar mais vermelhas do que um tomate,
porque ele começa a rir descontroladamente.
— Não estou falando disso, sua pervertida. Embora eu sinta
saudades também.
Ah. Menos mal.
— De você a gente só espera baixaria — retruco, tentando me
recompor. — Além do mais, essa coisa de passar muito tempo junto nunca
acaba bem pra gente.
— Fale por você. Eu adorava passar um tempo com você. Lembra
de quando eu fui estudar na biblioteca do seu departamento? Nós nos
divertimos bastante…
A primeira vez em que eu gozei nas mãos de um cara, literalmente.
Nem sabia que beijinhos no pescoço podiam deixar uma pessoa com tanto
tesão até conhecer Lance.
Péssima ideia lembrar disso quando você está prestes a subir para
a suíte com ele, Samantha.
Péssima ideia.
— Lembra quando a gente ficava tão entediado no seu quarto que a
solução era maratonar aqueles filmes estranhos que ninguém gostava além
de você? — provoca assim que passamos pela porta.
Girando nos calcanhares, dou meia-volta. Em seguida, ergo o dedo
para apontar diretamente para o seu peito.
Lance observa tudo com uma malícia no olhar.
— Primeiro de tudo, meus filmes eram incríveis.
— Claro que eram…
— Segundo, Heathers e Cruel Intentions não são “filmes estranhos
que ninguém gosta”. Eles são incríveis.
— Só tem gente psicopata.
— E qual o problema? Nem todo mundo precisa ser bonzinho na
arte, sabia? De vez em quando a gente só quer assistir ou ler algo absurdo
demais. Algo que jamais aconteceria na vida real.
— É por isso que aquele Sebastian mereceu o fim que teve. O cara
era bem louco.
Sorrio.
— É mesmo. Isso não posso negar. Mas fala sério, temos Reese
Witherspoon no seu auge. A cena dela dirigindo o conversível do Sebastian
na última cena é uma obra de arte. Me arrepio sempre que escuto
Bittersweet Symphony por causa desse filme.
— Eu me lembro de como você ficava arrepiada mesmo… — Ele
vai abaixando o tom de voz. Perigo! Eu repito, perigo! — Mas se não me
falha a memória, a causa não era por causa de nenhuma cena do filme.
Não disse?
Pigarreando, eu desvio o rosto. Minhas bochechas com certeza
devem estar mais vermelhas do que um tomate.
Lance sabe muito bem o que está fazendo.
— O que você quer assistir? — pergunto por fim.
Afinal, assistir um filme juntos não significa nada demais. Já
fizemos isso milhares de vezes — e embora algumas dessas acabassem
comigo por cima dele ou vice-versa — tinha dias que estávamos cansados
demais para fazer qualquer coisa. Acabávamos cochilando juntinhos no
sofá e acordando horas depois.
Hoje bem que poderia ser um desses dias.
Sem a parte de “dormir juntinhos”. Cada um fica no seu canto do
sofá.
Tudo o mais profissional possível.
— Não sei. — Lance aponta para o sofá, e eu o sigo prontamente.
— O que você sugere?
— Hm… Podemos assistir Cruel Intentions mesmo. Já faz um
tempinho que eu não assisto.
Ele balança a cabeça.
— Quer mesmo ver aqueles adolescentes encapetados aprontando
uma para uma garota virgem?
— Eu vejo de outra forma. Vejo uma adolescente que foi alvo de
uma aposta por escolher não transar, e mesmo que seus algozes sejam ricos
e bem-relacionados, perdem tudo por causa dela. A garota é a minha
heroína.
— Vou fingir que você não usou a palavra “algozes”. — Desenha
aspas no ar, desdenhando. — Mas tudo bem. O que eu não faço por você,
hein?
Estremeço.
E pela próxima meia hora, tento controlar os batimentos do meu
coração. Ouvi-lo dizer que faz tudo por mim nos colocou em um território
perigoso, mas por algum motivo, eu não vou embora.
Eu fico.
E eu espero nunca te perder, espero que isso nunca acabe
Eu nunca mais andaria na rua Cornélia
Esse é o tipo de decepção amorosa que o tempo nunca poderia consertar
Cornelia Street | Taylor Swift

três anos antes


Samantha e eu ainda não transamos.
Quer dizer, já passei mais de duas horas com a cabeça enfiada entre
as pernas dela. E sem querer me gabar, mas já perdi as contas de quantas
vezes fiz essa mulher gozar com os meus dedos ou a minha língua. Ainda
assim, nunca fomos até o fim.
Cheguei a pensar que era por nunca termos tido um relacionamento
propriamente dito, mas logo me veio na mente todas as garotas sem nome
que eu levei para cama. Samantha também era adpeta do sexo casual, o
que só tornava tudo mais confuso.
Acho que não queríamos transformar a nossa relação em algo tão
banal quanto isso. Quando fôssemos para cama, seria algo diferente.
É uma breguice sem fim, mas tem fundamento.
— Ei, Lance — Charles me chamou, fazendo um meneio de cabeça
na direção da porta do vestiário. — A garota do barril está aqui.
Samantha abriu um sorriso sem graça, acenando. Não perdi tempo
e a alcancei em poucos segundos.
— Olá… — ela murmurou, chocada quando eu a agarrei pela
cintura. Nós giramos por alguns segundos, e eu estava pouco me fodendo
para os caras me zoando ao fundo.
Ela veio.
Ela estava aqui.
Não achei que conseguiria fazer Samantha desistir de uma noite de
festas na fraternidade do cara que Sabrina estava pegando, mas
aparentemente consegui, sim.
Ela me deu um tapinha no peito quando a coloquei novamente no
chão.
— Eu acho bom você ter uma ideia sensacional de encontro para
nós dois, Lance. Estou perdendo bebida de graça e comida de procedência
duvidosa. E você sabe o quanto essas coisas são importantes pra mim.
Ah, eu sabia muito bem, sim.
— Não se preocupe com isso, Sam. Conheço um lugar que vende as
bebidas mais vagabundas do mundo. E sobre a comida, vou arranjar
aqueles tacos com molho extra picante que deixa todo mundo com dor de
barriga depois.
— É disso que eu estou falando, cara. Espírito universitário! — ela
comemorou, e eu não conseguia tirar o sorriso da porra do rosto.
Só voltei no vestiário para buscar a minha bolsa esportiva.
Coloquei todos os meus objetos pessoais lá dentro e corri para encontrar
Sam na saída do ginásio. Quando a alcancei, no entanto, percebi que
estávamos em uma grande enrascada.
— Puta merda — praguejei.
O mundo estava caindo na Universidade do Texas neste momento.
Nunca tinha visto um temporal como aquele.
— Somos amaldiçoados, Lance. Isso é claramente um sinal —
brincou Sam, mas não gostei da pontada de morbidez que detectei em seu
tom de voz.
Amaldiçoados é o cacete.
— Eu penso diferente. Não vamos conseguir ir até o restaurante,
mas acho que podemos cozinhar.
Ela arqueou a sobrancelha.
— Você sabe cozinhar?
— Eu disse que podemos. Não prometi que seria bom.
Samantha balançou a cabeça, sem palavras.
— Você é mesmo um cara bem insistente, Lance. Mesmo depois de
todos os sinais e evidências de que não deveríamos estar juntos, você
continua persistindo.
— Sabe como é, né? Insistir até conseguir. Tem até um ditado assim.
— Tenho certeza que o ditado é diferente.
Dei de ombros.
— Não importa. Essa é a nossa versão dele, e é perfeita.
Ela mordeu o lábio, pensativa. Mas logo percebi um sorrisinho de
canto nascendo em seu rosto, e me considerei um homem de sorte.
Porque estava na cara que Samantha Samuels tinha caído na
minha.
E eu estava, sem dúvida alguma, na dela.
— Vem — chamei, estendendo a mão para ela.
— Você está louco?
— Sim. Por você. — Meu sorriso não vacilou um segundo. —
Segura a minha mão, Sam.
— Lance…
— Você confia em mim?
Ela hesitou por poucos segundos, e meu coração quase parou.
— Eu confio, mas estou preocupada com você. Acho que a
adrenalina do pós-jogo pode estar controlando o seu cérebro ainda. Não
sei se percebeu, mas essa chuva está com alerta laranja. E sinceramente?
Somos jovens demais pra morrer.
Segurei uma risada.
De fato, ainda existia uma faísca de adrenalina por termos
derrotado Chicago essa noite. Soube por alto que alguns dos comentaristas
esportivos chegaram a dizer que eu era definitivamente a principal
promessa do futebol americano universitário, o que é um feito e tanto. O
nosso quarterback não ficou muito feliz por ter sido ignorado.
— Confia em mim, Sam.
Ela continuou hesitante, mas, dessa vez, concordou em me estender
a mão. Não contive o sorriso quando ela entrelaçou os nossos dedos. Para
mim, isso aqui era uma vitória.
Samantha Samuels era mais escorregadia do que uma enguia. Ao
mesmo tempo em que parecia estar tendo o melhor dia da sua vida quando
estávamos juntos, ela se fechava no minuto seguinte. Cheguei a pensar na
possibilidade dela realmente me achar um zero à esquerda.
Segurando sua mão com mais firmeza ainda, saí correndo na
direção da chuva. Sam protestou, meio em choque, quando as gotas
pesadas começaram a cair sobre nossas cabeças. No entanto, ela não fez
nem um movimento para voltar.
— LANCE! VAMOS MORRER! — berrou em meio à chuva
torrencial que estava caindo na gente.
— NÃO VAMOS! TEMOS QUE ALCANÇAR O CARRO DO
CHARLES! ELE ME EMPRESTOU!
Ela grunhiu algo inaudível, e suspirei de alívio quando percebi seus
movimentos ritmados com os meus.
Depois de entrarmos no carro de Charles, soltei uma risada.
— O que foi? — perguntou ela, com os lábios tremendo.
Apontei para a sua roupa completamente encharcada.
— Você está parecendo um ratinho.
Samantha me deu um soco diretamente no peito, irritada. Não
contive a risada, segurando seu pulso com certa firmeza.
— Você também não está parecendo nada sexy, Lance.
— Eu não disse isso. Estou achando você supersexy toda molhada.
— Deve ser por isso que você continua me levando para qualquer
lugar que tenha a ver com água. Primeiro, foi a piscina, e agora, a chuva…
— Tem razão, me pegou. Sou culpado por querer ver você sempre
molhadinha.
Samantha praticamente engasgou. Depois, virou para o lado,
colocou um dedo dentro da boca e fingiu vomitar.
— Ai, meu Deus. Agora você se superou.
— Eu sei, foi horrível. Mas eu não consegui me conter. Você me deu
a deixa perfeita.
— Vou lavar a sua boca com sabão, Lance Moreau. Talvez com um
pouco de ácido também.
— Qual é, Sam? Não é pra tanto. Além do mais, estou guardando os
meus comentários sexuais mais sujos para quando formos sérios. Não vou
mostrar todo o meu repertório agora.
Samantha riu, tirando a camiseta branca de manga que ela estava
usando. Ficou só com a regata justa de alcinha, o que me fez engolir em
seco. A blusa estava agarrada em seu corpo esguio. Seus mamilos duros
despontavam no tecido, e meus olhos foram atraídos imediatamente para
lá.
Nem tentei disfarçar.
— Meus olhos ficam um pouco mais em cima, Moreau.
Pisquei.
— Foi mal. É que eles chamam bastante atenção.
— Ah, eu sei disso. Eles são mesmo incríveis — brincou, lambendo
o lábio inferior. — Mas acho que é melhor você começar a dirigir.
— Acha?
— Acho. Porque eu estou ansiosa para descobrir mais sobre o seu
repertório de baixaria.
Eu demorei mais do que deveria para processar o que Samantha
tinha acabado de propor. De qualquer forma, não levei mais do que cinco
segundos para arrancar com o carro o mais rápido que eu consegui. Foi a
merda mais imprudente que eu poderia ter feito, porque estava chovendo
pra caralho. Mas, merda… Essa garota era gostosa pra caramba. Era sexy,
divertida, livre, sabia exatamente o que queria de mim.
E isso estava me dando muito tesão.
Mas quando cheguei no apartamento que eu dividia com Charles,
ela não fez nenhuma menção a sexo. Na verdade, cheguei a pensar na
possibilidade quando me pediu uma toalha emprestada e uma blusa minha
para vestir e se livrar das roupas molhadas.
— Quer companhia? Às vezes, o gerador de energia pode cair.
— E por que eu precisaria de companhia para isso?
Abri o sorriso mais cafajeste que eu consegui.
— Algumas pessoas têm medo do escuro.
— Sorte a sua que eu não tenho — disse ela, arqueando uma
sobrancelha para mim. — Mas talvez eu precise de uma ajudinha sua.
— Ajudinha?
— É. Para ligar o chuveiro e deixá-lo quente pra mim.
— Só se você prometer que não vai acabar com toda a água quente
— rebati, semicerrando os olhos. Na mesma hora, um trovão reverberou e
um clarão nos pegou de surpresa.
Puta merda.
— Está com medo, Lance? — zombou ela, com os olhos faiscando
de empolgação.
Samantha não era uma garotinha frágil. E eu estava amando ver o
quanto ela adorava tirar sarro da minha cara. Normalmente, era apenas eu
zombando de todos à minha volta.
Aposto que meus pais iriam amar essa garota.
— Eu não tenho medo de nada, Sam.
— Duvido. Todo mundo teme alguma coisa.
— Jura? Eu não.
— Para de mentir, Lance. Vai dizer que nunca sentiu aquela
adrenalina de medo subindo pela espinha?
Bufei, parando para pensar seriamente nessa pergunta. Não é como
se eu de fato não tivesse medo de coisas que eu não conseguia controlar,
mas as fobias que a maioria das pessoas tinha, eu não possuía.
— Tenho medo de ser assassinado. De ser sequestrado, de perder
uma jogada importante na final do Super Bowl, de perder a minha família.
As coisas que todos temem — expliquei, sem conseguir entender como
fomos parar nessa conversa.
Sam balançou a cabeça em concordância.
— Eu entendo.
— E você? Do que tem medo?
Ela sequer hesitou.
— Tenho medo do luto.
— Do luto?
— Sim. Tenho medo de não conseguir me recuperar depois de
perder alguém importante pra mim. A morte é cruel, mas existem maneiras
mais fáceis de lidar com ela. Quando a minha avó morreu, eu era uma
criança. Nem me lembro muito de como foi estar com ela no hospital.
Minha mãe sofreu demais, era insuportável assistir. Mas o meu avô… Ele
disse que estava feliz. Porque ela partiu depois de ter a chance de se
despedir. Embora tenha tido dias finais em uma cama de hospital, ela
morreu cercada das pessoas que mais amava. Esse é um privilégio que eu
desejo para todo mundo. Imagina estar ali com a pessoa, saudável, jovem,
vivendo o ápice da vida… E do nada ela ser arrancada de você. Um
acidente. Um ataque do coração. Um assalto que deu errado. Estar no
lugar errado e na hora errada. — O olhar dela estava perdido. Engoli em
seco, sentindo que havia muito mais naquelas entrelinhas do que Samantha
estava me deixando saber. — Meu medo é esse. A morte arrancar alguém
de mim do nada… Sem me preparar.
Gostaria muito de puxá-la para um abraço e sussurrar palavras
bonitas. Garantir que isso jamais vai acontecer com ela. Mantê-la segura
comigo de alguma forma.
Mas o destino é incontrolável. E não há nada que possamos fazer a
respeito.
Samantha foi para o banho depois de pegar uma das minhas
camisetas. Escolhi uma do time com o meu número atrás, e fiquei
esperando-a sair do chuveiro.
Depois que a sua figura familiar surgiu, abri um sorriso satisfeito.
— Você ficou linda.
E era a mais pura verdade.
Minha camiseta estava batendo nas coxas de Samantha. O cabelo
dela estava molhado, o rosto com uma expressão indecifrável. E naquele
momento, eu senti.
Naquele momento, eu soube.
Não teria como eu esquecer Samantha Samuels.
Não apenas pela boca suja, a forma como conseguia me colocar no
meu lugar sem esforço ou mesmo por se esquivar tanto de mim.
Eu jamais a esqueceria porque ela conseguia transformar qualquer
ocasião simples em algo extraordinário. Porque ela conseguiu deixar a
minha blusa desbotada a coisa mais sexy do mundo.
E porque… Puta merda.
Porque estava me apaixonando por ela.
Eu estava fodido.
Foi a melhor noite, nunca me esquecerei como nos movemos
Todo lugar estava vestido elegantemente
E nós dançávamos, dançávamos
Como se fôssemos feitos da luz das estrelas
Starlight | Taylor Swift

— Ele precisa de terapia.


— Mas a primeira cena do filme é ele literalmente na terapia, Lance.
— Aquilo não conta, Samantha. O cara transou com a filha da
mulher e tirou fotos para provocá-la. Ele é completamente louco.
— Não discordo. Mas existe uma camada sobre o personagem que
deixa ele irresistível.
— Tá me zoando.
— Ué, ele é um gato. E um grande bad boy. E sarcástico. E…
— Tá bom, Samantha, já entendi. Você acha ele um gostoso e por
isso tá tudo bem.
— Não tá tudo bem. Eu adoro ver ele se ferrando no final do filme.
Mas vamos combinar, Lance. Esse é um clássico dos anos noventa. Eu
adoro ver filmes com gente má. Moral duvidosa, sabe? Heathers, Cruel
Intentions, Mean Girls, I Know What You Did Last Summer… Toda essa
estética dark com protagonistas sem moral alguma me fascina. Não é à toa
que esse é meu filme favorito.
— Estética dark. Uau.
— Eu sei. Você aprende muito comigo e blá-blá-blá.
— Ei, eu não falo assim.
— Claro que não fala, querido — brinco, gesticulando com as mãos
para ele “deixar pra lá”.
Lance semicerra os olhos para mim. Em seguida, voltamos a prestar
atenção no filme passando na televisão. Estamos assistindo agora a cena em
que Sebastian e Katherine firmam a aposta valendo o carro conversível
dele. Eles são irmãos postiços, e caso ele consiga tirar a virgindade da
garota que escolheu esperar, ela vai deixá-lo fazer o que quiser com ela.
Sim, nesse sentido mesmo que você entendeu.
— Ela me dá arrepios — estremece Lance, chocado com todas as
cenas envolvendo a Katherine.
Quem acha que Regina George é cruel, não conhece Katherine. O
livro que a garota criou com o irmão para registrar todas as maldades que
fazem se tornou um marco na cultura pop muito antes do Burn Book virar
uma febre.
— Ela pode até ser ruim, mas precisa admitir que é muito sensual
assistir essa mulher chantageando as pessoas.
— Terapia, Samantha. Você precisa de uma. E urgente.
Rio, completamente embasbacada pelo diálogo aleatório que
acabamos de ter. Ele é muito parecido com a forma que Lance e eu
costumávamos nos falar na época da faculdade. Sempre amei nossas
discussões bem-humoradas.
Lance está jogado sobre o sofá enquanto eu me encontro encolhida
na outra ponta. Pode parecer exagero, mas achei essa uma forma eficaz de
evitar uma possível recaída.
— É impossível esse cara estar realmente se apaixonando por ela —
comenta ele, indignado, como se já não tivesse assistido comigo diversas
outras vezes.
— É claro que é possível. Quem consegue resistir à Reese
Witherspoon?
— Você tem um ponto.
— Eu sempre tenho um ponto. É por isso que você deveria me ouvir
sempre.
— Ah, mas não é pra tanto. Lembra quando nós acabamos expulsos
daquela festa porque você achou que gritar com o anfitrião seria uma ótima
ideia? Levei um soco por sua causa.
Ergo o rosto para encará-lo, irritada. Ele sabe muito bem que o
motivo de eu ter começado um verdadeiro escândalo naquela festa foi
porque acabei descobrindo que o agora ex-namorado do meu irmão Scott
estava traindo-o na cara de pau com o anfitrião da festa. Posso ter xingado
(e, tá bom, até ameaçado de morte um dos dois), mas fala sério. Eu estava
na razão. Ninguém passa meu irmãozinho para trás.
— Eu queria ter revidado o soco por você, mas se me lembro bem,
fui puxada pra longe.
Lance bufa, ainda com os olhos fixos na televisão.
— É óbvio que eu tive que puxar por você. A coisa podia acabar
indo longe demais. Depois daquele dia, fui banido de todas as festas da
galera do basquete. Muito obrigado.
— Eu não pedi pra você me defender.
— Até parece que eu ia te deixar no meio de dois jogadores enormes
e furiosos. Aliás, foi nesse dia que eu percebi que a sua loucura veio da sua
família. Nenhum de vocês bate muito bem.
Atiro um travesseiro com força em Lance, mas ele o intercepta com
um sorriso irritante e arrogante no rosto.
— Que foi, Samantha? Só estou sendo sincero. Você começou uma
chamada de vídeo com o seu irmão, Sebastian…
— Scott — corrijo.
— Isso. E ao invés de acalmar você, o cara começa a gritar pra você
usar a cadeira e acertar o garoto que ele estava saindo. Eu ri, pensando que
você provavelmente só iria gritar com ele mais um pouco. Qual não foi a
minha surpresa quando você realmente pegou a maldita cadeira?
— Eu só queria proteger o meu irmão — respondo, com um sorriso
inocente no rosto. — Ninguém mexe com um Samuels e fica vivo pra
contar a história.
Lance estremece, arregalando os olhos.
— Eu que o diga. Ainda me lembro de quando o seu avô quase me
matou do coração.
E com essa frase eu sou obrigada a sorrir.
Vovô nunca me visitava na faculdade. Ele dizia para os meus pais
que era um período de liberdade que eu precisava viver sem a interferência
da minha família. Porém, quando eu estava no terceiro ano da graduação e
já trabalhando na área, ele acabou passando alguns dias na cidade.
E veio me ver.
Por coincidência ou puro azar, encontrou Lance completamente nu e
enrolado comigo nos lençóis do meu dormitório.
Nem preciso dizer que uma tentativa de homicídio foi feita, preciso?
— Ele estava prestes a me matar — resmunga Lance, apoiando o
queixo nas mãos como um garotinho emburrado.
Reviro os olhos, sorridente.
— Ele não estava tentando matar você. Acredite em mim, você não
estaria aqui se ele tivesse.
— O cara apontou uma espingarda para a minha bunda, Samantha.
Experimente acordar um dia com um cano de uma arma nas suas partes
íntimas. A experiência não é boa.
— Quanto drama. Foi só um sustinho.
— Eu quase morri.
— Você precisa crescer — digo, embora o meu tom de voz tenha um
toque de diversão.
Meu coração acelera. Senti saudades de Lance e eu juntos. Minha
mente começa a repassar todas as coisas que vivemos juntos, as situações
engraçadas, os momentos em que eu percebia que estava praticamente me
apaixonando. O brilho em seu olhar. A forma como nunca nos cansávamos
um do outro. As horas que ele passava dentro de mim. Como seus lábios
sussurravam sobre a minha pele.
Ai, Deus… Não deveria estar deixando a minha cabeça me levar
para esses momentos novamente.
— Sam… — O olhar de Lance é intenso e agora está sobre mim.
Engulo em seco.
Estou ferrada.
Quando ele me encara novamente, o mundo parece parar. O clima
fica mais pesado. O ar rarefeito. De repente, sou teletransportada para a
primeira vez que nossos olhos se encontraram e perco o fôlego.
Lance se aproxima de mim. É tão sutil que eu mal percebo. Só me
dou conta de que estamos próximos quando sinto seu hálito atingir meu
rosto.
— É melhor eu ir para o quarto — sussurro, encarando seus lábios.
Ele, no entanto, não faz nenhuma menção de se afastar.
— Eu também acho uma boa ideia — responde, com o tom de voz
rouco.
— Ir para o quarto sozinha, Lance.
— Posso te acompanhar. Tem algum problema?
Se havia algum problema?! Bom, podemos começar com o maior
deles. Meu ex-namorado, que é um jogador gostoso pra cacete, está
querendo ir até o nosso quarto comigo.
Quantas chances têm de isso acabar dando muito errado?
Passo a língua suavemente sobre meu lábio inferior, e ele
acompanha com o olhar faiscando de desejo. Praticamente gemo.
— Sam…
— Lance.
Nossos olhares continuam fixos um no outro. Na televisão,
Sebastian está conversando com Katherine sobre acabar com a aposta. E
meu coração acelera, porque de uma forma distorcida, esse momento está
perfeito.
Meu filme favorito está passando na TV.
O único garoto que já teve um pedaço do meu coração respirando
bem pertinho de mim.
Não sou de ferro. Meu corpo reage na mesma hora. É instintivo.
Quando Lance se aproxima mais ainda de mim, perco a noção de
onde estou ou quem sou. Só consigo prestar atenção em sua expressão
determinada. Não há nada impedindo o que ele está prestes a fazer, e acho
que gosto disso.
Merda. Eu estou amando isso, não estou?
Ele coloca uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, sorrindo. Não
me afasto. Ao contrário disso, me ajeito ainda mais no sofá, consciente de
que nossas pernas estão se tocando agora.
Quando seus lábios estão a centímetros de tocar o meu, ele sussurra:
— Gosto de ser justo. Quer que eu me afaste?
— Cala a boca, Lance.
E então o puxo pelo colarinho da camiseta, finalmente sentindo a
maciez de sua boca contra a minha. É lento a princípio, uma exploração
minuciosa de duas pessoas que não se beijam há muito tempo.
É muito bom. Mais do que bom. É melhor do muito orgasmo que
tive com outras pessoas depois dele. É nesse nível de “bom”.
A língua de Lance é habilidosa e não tem a mínima pressa. Ela está
reconhecendo o território com uma paciência que só aumenta ainda mais a
sensualidade do momento.
Lance entrelaça a mão sobre o cabelo da minha nuca, puxando mais
ainda o meu rosto na sua direção. Seguro suas bochechas, desesperada para
sentir mais dele.
— Você é tão linda, Sam.
Estremeço com o tom grave de sua voz. Enquanto isso, Lance vem
deitando sobre mim em cima do sofá.
Só mais cinco minutos. Vou continuar beijando-o só por mais cinco
minutos, e então eu paro.
Entretanto, Lance logo mostra que não veio para esse jogo com o
intuito de perder. Ele se afasta minimamente de mim quando nos ajeitamos
melhor sobre o estofado, e eu grunho em protesto.
Calo a boca assim que sinto seus lábios no meu pescoço.
Desgraçado. Ele está no meu ponto fraco.
Sua língua começa a traçar círculos na minha pele, e juro por tudo
que é mais sagrado que isso me faz revirar os olhos de tanto prazer. A
sensação de sua boca quente contra o meu pescoço faz o meu corpo inteiro
se arrepiar.
— Está tudo bem aí, Sam? — pergunta ele, bem-humorado.
Mas não me dou ao trabalho de responder. Apenas afundo ainda
mais minhas unhas em seu couro cabeludo, entrelaçando as pernas ao redor
de sua cintura.
Movimento perigoso. Movimento perigoso!
Porque assim que abro as pernas, Lance tem contato com a minha
boceta latejante. E eu consigo sentir o quanto ele está duro para mim.
— Porra — mururmura ele, sem fôlego.
— Porra — concordo, encarando-o em choque.
Ficamos imóveis. Estáticos. Porque nossas partes íntimas continuam
pressionadas uma contra a outra e não deveria ser tão gostoso senti-lo
assim. Nem fizemos nada, e meu corpo exigente quer mais. Quer Lance em
todos os lugares até que eu não consiga pensar em mais nada além da
sensação dele em mim.
Depois de torturantes segundos, ele finalmente move o quadril. É
sutil, lento, mas me faz morder o lábio inferior para impedir um gemido.
— Por que isso é tão bom? — pragueja, encontrando um ritmo para
continuar a me dar prazer.
— Porque somos nós — respondo por fim. Essa é a verdade.
Grunhindo, Lance balança a cabeça.
— Tira essa calça — mando, sabendo muito bem que estamos
prestes a entrar em um território perigoso.
Mas dane-se. Agora que começamos isso, quero aproveitar o
máximo.
Lance nem sequer hesita. Ele joga a peça de roupa longe, ficando
apenas com a cueca boxer. Quase salivo ao ver o tamanho do volume que
está me esperando. Fico tentada a usar a frase mais clichê do mundo, como
“isso tudo é pra mim?”, mas seria apenas para tirar uma onda e não estou a
fim de estragar o momento.
Ele tira o meu short pelas minhas pernas, me deixando apenas de
calcinha. Estamos adentrando em um terreno muito perigoso a partir de
agora, mas a minha cabeça está muito concentrada na sensação da boca de
Lance contra o meu pescoço para se importar.
Lance segura o meu quadril, e eu o arqueio instintivamente. Ele
solta uma risadinha convencida quando começo a me esfregar nele sem
vergonha nenhuma. Uma sensação deliciosa começa a subir pela minha
espinha, e preciso segurar a vontade que tenho de cometer uma loucura.
Como arrancar nossas peças íntimas e fazê-lo entrar em mim de uma
vez.
— Eu estava com tantas saudades, Sam. Tantas saudades de você.
De nós — murmura ele entre beijos que deixa na minha pele.
Cala a boca, Lance. Isso não vai significar mais nada na manhã
seguinte. Só aproveite o momento.
Ele começa a descer seus beijos molhados do meu pescoço até a
altura do colo. Abrindo um sorriso maquiavélico, Lance segura meus seios
com vontade por baixo da minha regata. Observo seus movimentos,
hipnotizada. Adoro como ele nunca tem pressa quando o assunto é explorar
o meu corpo.
Tínhamos essa diferença na cama. Eu sempre queria arrancar as
roupas de Lance, jogá-lo no primeiro lugar que encontrava e cavalgá-lo até
gozar. Ele, por outro lado, sempre curtiu as preliminares. Queria beijar,
tocar, passar horas acariciando meu corpo antes de finalmente me comer.
Me deixava louca. E nem sempre por um bom motivo. Quando eu
queria um orgasmo rápido, às vezes, eu precisava assumir o controle e usá-
lo como se fosse meu brinquedinho sexual particular. Lance normalmente
ficava emburrado, dizendo que eu tinha acabado de usá-lo.
Por conta disso, acabamos decidindo que a primeira transa seria
mais rápida. Sempre estávamos afoitos e desesperados para gozar, então
argumentei que não tinha necessidade de passarmos minutos só apreciando
um ao outro. Depois do primeiro orgasmo, tínhamos o sexo lento e
demorado que Lance tanto gostava.
— Quero te comer — confessa ele, em meio a um suspiro.
Não respondo. Não quero dizer “então venha me comer”, porque
ouvir essas palavras saindo de mim pode ter o efeito contrário. Pode me
fazer acordar para a realidade do que estamos fazendo, e então vou precisar
afastá-lo.
Mas, caramba, eu preciso tanto transar. Preciso tanto me distrair e
esquecer os problemas. E Lance sempre foi tão bom em me fazer fugir de
mim mesma…
Sem dizer uma palavra, ele começa a deixar beijos de boca aberta
nos meus peitos. Prendo a respiração, amando a sensação da língua quente
de Lance sobre mim. Ele chupa um mamilo com a delicadeza de sempre, e
a cada sucção, sinto a minha boceta ficar ainda mais molhada.
Deus, estou encharcada para ele.
Alternando entre os dois seios, sua mão para entre as minhas pernas.
O toque de seus dedos é tão leve que mal sinto. É como uma promessa do
que estou prestes a conseguir.
Começo a erguer os quadris, e Lance solta uma risadinha entre os
meus peitos.
— Você está louca pra gozar, né?
— Lance, para de brincar.
Seus olhos castanhos brilham com malícia.
— Eu adoro brincar com a minha comida, Sam.
Merda.
Merda, merda, merda, merda.
Seus dedos afastam a minha calcinha para o lado. Jogo a cabeça
para trás, concentrada em perseguir a sensação deliciosa que sua mão causa
ao tocar o meu clitóris inchado. Ele começa a passar o dedo para cima e
para baixo numa calma irritante, subindo e descendo sobre a minha entrada
como se tivéssemos todo o tempo do mundo.
Sua língua não para de chupar os meus peitos nem por um segundo.
Lance sempre teve muitas habilidades, mas a arte de fazer todas as partes
do meu corpo se sentirem bem é a minha favorita.
Ele começa a usar a minha lubrificação para me excitar. Espalha-o
pela minha boceta, trabalhando em círculos enquanto sugere uma
penetração, enfiando só a pontinha do dedo em mim. Depois de longos
segundos nessa brincadeira, solto um grunhido, irritada.
Lance ri.
— Você está tão molhada que está me dando água na boca, Sam.
Preciso experimentar isso.
Atordoada, nem presto atenção no que suas palavras realmente
significam. Suspiro, frustrada, e começo a protestar pela perda de contato
com a sua mão.
Isso até senti-lo descer entre as minhas pernas. Lance agarra as
minhas coxas com força, virando o rosto para morder uma delas com força.
Solto um grito, adorando cada segundo. Eu amava quando ele me
marcava durante o sexo.
Ele inspira com força, enfiando o rosto entre as minhas pernas.
Depois, rasga a minha calcinha como se ela não passasse de uma mera
inconveniência.
— Seu cheiro continua sendo o meu afrodisíaco favorito. Adorava
quando você passava horas sentada na minha cara. Eu ia trabalhar com ele
no meu rosto todo — diz, um segundo antes de começar a me chupar.
E, puta merda.
Praticamente derreto no sofá. Toda mulher deveria ter a experiência
de ser chupada por um cara que sabe muito bem o que está fazendo. Lance
alterna beijos suaves e delicados sobre a minha boceta com sucções
molhadas no meu clitóris.
Ele desce e sobe o rosto pela minha pele, me deixando ainda mais
encharcada do que antes. Subo uma das coxas, me abrindo ainda mais para
a sua língua ávida. Ele me imobiliza com as mãos, me deixando
completamente à sua mercê. É como se eu fosse o seu almoço favorito e,
caramba, isso é extremamente bom.
Estou tão excitada que perco um pouco a noção de onde estou.
Reviro os olhos, tomada pela sensação de prazer que sua boca maravilhosa
está me causando. Lance continua sussurrando o quanto adora o meu gosto
e o quanto está ansioso para me comer, e eu agarro seus cabelos para
começar a me esfregar mais ainda em seu rosto.
Estou tão perto…
Persigo o meu orgasmo sem nenhuma vergonha. Lance continua me
chupando, sem trégua, sem me dar tempo nem de respirar, quando sinto a
doce dor do orgasmo quebrar sobre mim em milhões de pedaços. Minhas
pernas tremem, e eu grito, rouca, completamente tomada pelo gozo que me
tira de órbita.
Meu.
Deus.
Ainda estou com as pernas bambas quando volto do meu torpor.
Lance, no entanto, não para de me lamber. Ele está ainda mais ávido,
concentrado em me dar mais um orgasmo.
— Lance…
Eu o observo, completamente sem palavras. Ver esse homem
enorme me chupando vai ser algo que eu vou usar futuramente para novos
orgasmos com toda certeza.
— Quero continuar fazendo isso pra sempre — diz ele, antes de
continuar me chupando.
Quero que você faça isso para sempre, penso, antes de me jogar em
mais um orgasmo que estilhaça o meu mundo.
Acertei cento e cinquenta no painel, virei a esquina
Então ela virou para mim de lado, uh
Eu talvez tenha que transar com ela na rodovia
OHMAMI| Chase Atlantic

Meu pau está praticamente babando e implorando para entrar em


Samantha de uma vez.
Seu cheiro me inebria. Continuo chupando sua boceta, adorando ver
como ela se contorce na minha boca. Suas mãos agarram meu cabelo, e eu
tremo a língua, passando de um lado a outro suavemente. Isso tudo sem
desviar o olhar da mulher que está prestes a ter um novo orgasmo.
Adoro fazer Samantha gozar. Amo como ela perde o controle e se
entrega inteiramente a mim, sem hesitar. Adoro ver a sua armadura no chão
enquanto ela mantém as pernas abertas para mim.
— Lance… — geme ela, arfando, rebolando os quadris contra o
meu rosto quando goza mais uma vez.
Seguro suas pernas, extasiado. Ela volta do seu orgasmo ainda mais
relaxada. Suas coxas tremem contra mim, e eu finalmente deixo-as caírem
contra o sofá.
— Quero entrar em você — digo sem rodeios. — Tudo bem?
Ela me encara, sem falar uma palavra.
Meu coração para com a expectativa. Se Sam não estiver a fim de
levar isso tão longe, vou me recolher no banheiro e bater a punheta mais
triste da história. Ainda assim, sei que vou gozar feito um louco só por ter
passado mais de meia hora chupando-a.
Talvez ela me deixe levar sua calcinha comigo…
Mas antes que eu continue fazendo planos de me satisfazer caso
Sam decida que nossa brincadeirinha já foi longe demais, minha incrível
ex-namorada balança a cabeça em afirmação.
Puta que pariu. Se isso for um sonho, não me acorde.
Deslizo a cueca boxer pelas minhas pernas e a jogo no chão. Meu
pau salta livre, duro e desesperado para sentir a boceta molhada de Sam.
Ela lambe os lábios, hipnotizada. Me chama com o dedo em sua
direção, e como se eu tivesse uma porra de ímã com ela, vou em sua direção
feito um cachorrinho.
Merda, se ela me mandar deitar e rolar aqui, farei sem pestanejar.
— Deixa eu sentir seu sabor um pouco. Não é justo que só você
tenha se divertido — provoca, me encarando com tesão.
E aí está. Essa é a velha Sam. A garota que me fez fodê-la antes de
um jogo no meio do vestiário porque queria me assistir com a minha porra
escorrendo por sua calcinha.
A mesma mulher que costumava me jogar no chão e me cavalgar até
atingir o próprio orgasmo quando queria um alívio rápido. Eu sempre
resmungava de como me sentia um mero objeto sexual, mas, porra, como
eu adorava ser usado por ela. Não tem coisa mais excitante do que ver uma
mulher enlouquecendo de prazer com o seu pau.
— Ele está bem maior do que eu me lembrava. Andou tomando
alguns remedinhos, Lance?
Abafo uma risada.
— Não preciso de remedinho, Sam. Tenho certeza de que você se
lembra.
— Ah, eu me lembro mesmo. Te cansar era uma tarefa difícil.
— Não mais do que você, amorzinho. Me lembro bem de como eu
tinha que te evitar antes de um jogo importante. Você drenava até a última
gota de porra de mim.
Samantha se aproxima de mim, ficando de joelhos no sofá. Eu paro
em pé à sua frente, esperando. Não entendo como tem homem que não curte
essa expectativa. É tão gostoso saborear um ao outro antes de começar a
trepar de fato.
Ela lambe os lábios mais uma vez, dessa vez segurando meu pau.
Merda.
Porra.
Puta que pariu.
Inferno, eu deveria ter me masturbado antes de começarmos isso.
Posso acabar passando vergonha, o que vai ser uma pena, porque eu
realmente quero comer essa garota por horas.
— Calma, Lance. Não precisa ficar todo tenso — zomba ela,
divertida. — Consigo te fazer gozar em dois minutos se eu quiser. Lembra?
Ela deve estar se referindo a quando fizemos uma aposta.
Queríamos saber quem dava o melhor oral, valendo um jantar no melhor
restaurante da cidade. A conta de duzentos dólares assustava aos dois, então
ficamos mais de uma hora e meia em um meia nove sem fim. Ninguém
queria ceder, mas a cada minuto ficava ainda mais difícil de resistir.
Fui o primeiro a gozar, mas não me arrependo. Foi o melhor
orgasmo da minha vida.
— Me chupa logo.
Ela me lança um olhar safado antes de me obedecer prontamente.
Sua língua lambe suavemente a cabeça do meu pau, saboreando.
Passo meus dedos por seu cabelo longo, bombeando em sua boca
devagar. Sam segura a base do meu pau, apertando com força, do jeito que
ela sabe que eu gosto. Não consigo desviar o olhar de sua boca me
recebendo, tão faminta e desesperada.
Ela vai me matar. É isso que vai acabar acontecendo aqui. Já
imagino as manchetes: Wide Receiver dos Texans encontrado morto após ter
o orgasmo mais intenso de sua vida.
Mas pensando bem, é uma causa nobre para partir.
Sam me dá uma chupada intensa. Ela quase faz uma garganta
profunda, engasgando de propósito no meu comprimento. Grasno, pego de
surpresa. A fisgada que sinto nas bolas faz a minha perna direita tremer.
Que porra é essa? Samantha aprendeu novas técnicas?
Merda, Lance. Pare de pensar em Sam com outros caras, seu idiota.
— Samantha, puta merda…
Ela agarra a minha bunda, tomando o máximo que pode do meu
pau. Minha visão escurece por alguns segundos, e eu jogo a cabeça para
trás, completamente em choque.
Acho que estou gozando.
Porra, eu estou gozando!
Nem tenho tempo de avisar a minha fantasminha preferida sobre
isso, porque me pega de surpresa. Gozo com tudo o que há em mim,
despejando cada gota na boca ávida de Sam. Ela bebe tudo, engolindo como
se adorasse o meu sabor.
Perco o equilíbrio, completamente tomado pela sensação mais
inebriante do mundo. O orgasmo atinge cada célula do meu corpo, me
devastando por completo.
Num piscar de olhos, Samantha se afasta. Uma gota de sêmen
escorre de sua boca, e sendo a boa safada que é, faz questão de usar a ponta
do dedo para se limpar. Depois, chupa tudo, me fazendo gemer.
— Que merda, Sam. Você não costumava ser tão má assim.
— Tem razão. — Sorri. — Eu era pior.
Ataco seus lábios sem pensar duas vezes. Nós dois mergulhamos em
um beijo apaixonado, completamente entregues ao momento. As mãos de
Sam apalpam minha barriga, sentindo o que anos de musculação pesada
fizeram com o meu corpo.
Eu, por outro lado, aproveito para segurar os peitos mais deliciosos
que já provei. Toco Samantha em todos os lugares, querendo demonstrar
através dos meus toques o quanto sou desesperado por ela.
E o quanto somos perfeitos juntos.
Ela abre a boca, me dando mais passagem para explorar seus lábios
com a minha língua. Nós ficamos nos beijando, sem pressa, por vários
minutos. Amo como ela abre as pernas para me receber, e meu pau longo e
grosso começa a se esfregar em seu abdômen.
— Que gostoso — murmura ela, quando começo a esfregar meu pau
em sua boceta molhada.
Perco a noção do tempo quando continuamos no amasso mais sexy
da minha vida. Ela arranha as minhas costas de leve, o que faz meu corpo
inteiro se arrepiar. Enquanto isso, vou passando os dedos suavemente sobre
o rosto de Sam. Quero que ela perceba o quanto estou me esforçando para
ser carinhoso apesar de tudo.
Brincamos com as nossas línguas enquanto nos acariciamos. Em
determinado momento, meu pau começa a brincar também com a entrada
de sua boceta. Sam geme em meus lábios, e eu os devoro com mais anseio
ainda.
Pisco uma vez, admirando seu corpo torneado embaixo de mim. É
impressionante como ela conseguiu ficar ainda mais gostosa anos depois.
Suas pernas abrem um pouco mais, e o movimento é o suficiente
para me fazer escorregar para dentro dela. Entra só a pontinha, e é o
bastante para Sam suspirar contra mim.
Começo a arremeter contra ela. Sempre com delicadeza e paciência,
embora eu esteja praticamente morrendo. Estou louco para foder Samantha
loucamente, mas também quero muito que isso dure. Quero ficar dentro
dela por um bom tempo.
Nos beijamos intensamente quando meu pau começa a entrar e sair.
Sam está tão molhada que o estado do sofá deve estar uma verdadeira
bagunça. E, porra, só pensar nisso já faz o meu pau inchar ainda mais.
Um choque de prazer varre sobre mim quando Sam aperta as pernas
ao redor do meu quadril. Deslizo para dentro dela com tanta facilidade que
a sensação de me afogar em sua boceta finalmente faz sentido. É isso que
estou fazendo.
Estou me perdendo dentro dela da maneira mais deliciosa do
mundo.
— Puta merda — gemo contra seu ombro, dando uma mordida que
eu sei bem o quanto ela adora.
Arremeto com vontade quando Sam ergue os quadris, ansiosa para
receber tudo de mim.
É insano.
É enlouquecedor.
E é uma delícia.
Não tem como descrever o frenesi de prazer que começou a tomar
conta de nós dois. Não consigo evitar o formigamento nas bolas, muito
menos o choque que faz as minhas pernas tremerem por alguns segundos.
Eu deveria mesmo ter me masturbado antes de começarmos isso.
Porque, como a porra de um garoto que está iniciando sua vida
sexual, eu gozo. Dentro de Sam e com força.
Preciso de alguns segundos para recuperar o meu fôlego. Minha
visão escurece e por um momento penso que vou realmente desmaiar de
tanto prazer. Por sorte, Samantha é a minha âncora e me segura contra seu
corpo firme.
Ainda estou tremendo quando o orgasmo ameniza.
Ela sorri, me lançando um olhar convencido.
— Já gozou duas vezes, Lance. Isso não está nem um pouco justo.
— Desculpe — peço, embora meu pau não esteja nem perto de ficar
mole.
Ainda estou duro por essa garota. Meu pau dentro dela implorando
para começarmos isso de novo.
E é isso que eu faço.
Samantha me joga sobre o sofá, sentando por cima de mim. Meu
gozo começa a escorrer de dentro dela, melando nós dois conforme ela
começa a subir e descer no meu pau.
Estou dizimado. Não consigo pensar. Meu cérebro virou gelatina, e
a única coisa que estou vendo é o quadril de Sam se movimentando como a
porra de uma máquina. Ela quica em cima de mim em uma velocidade
impressionante, tão molhada da própria excitação e do meu gozo que
desliza facilmente.
Quando suas mãos apertam o meu pescoço, dou um tapa em sua
bunda. Ela geme, soltando o gritinho mais delicioso do mundo para mim.
Bato novamente, dando um apertão para incentivá-la.
— Lance, você me come tão gostoso… — ela provoca, apertando os
próprios seios ao terminar de gemer.
Jogando a cabeça para trás, Sam expõe seu pescoço delicioso para
mim. Afundo meus dentes ali, marcando-a. Foda-se que todas as pessoas
verão isso, foda-se o que podem pensar. Preciso que quando Samantha se
olhe no espelho, lembre-se de como adorou ser fodida por mim.
Ela está quase gozando. Consigo perceber isso pelo brilho feroz em
seu olhar. Sam começa a esfregar o clitóris contra a minha pélvis, fazendo
uma espécie de massagem para ajudá-la a atingir o orgasmo. Enquanto isso,
brinco com seus seios, chupando-os com vontade.
Seus quadris moem os meus. Ela arfa, pega completamente de
surpresa quando o orgasmo a atinge.
— Ai, meu Deus — geme ela com a voz falhada.
A visão de Sam derretendo sobre mim é o suficiente para que eu vá
para a maravilhosa terra do orgasmo pela terceira vez. Meu gozo preenche a
boceta dela conforme Sam continua me cavalgando.
Porra.
Acho que dessa vez eu realmente vou desmaiar.
Samantha beija meus lábios suavemente, encharcada de suor. Sua
testa está pingando.
— Isso foi… — ela começa, mas eu a interrompo, capturando um
beijo de seus lábios macios.
— Não está justo.
— Como assim?
— Eu gozei três vezes e você só duas. Não está certo — respondo,
empurrando seu corpo no sofá novamente.
Samantha arregala os olhos em choque. Mas não contesta meus atos.
Ela observa, admirada, enquanto eu mergulho a língua entre as suas pernas.
Meu gozo ainda está escorrendo dela, e essa é a porra mais linda que meus
olhos já viram.
Chupo o clitóris, adorando sentir os dedos de Sam alisando o meu
cabelo enquanto faço isso. Ela abre ainda mais as pernas, me deixando à
vontade para explorar sua boceta com meus dedos e língua.
— Você ficou muito bom nisso — murmura ela, sem fôlego. — Não
lembrava de ser tão gostoso.
Eu hesito.
— Mas você parecia gostar bastante naquela época.
— Não disse que você era ruim. Só comentei que você ficou muito
bom — retruca, cantarolando.
Maldita.
Volto a me concentrar no paraíso no meio das suas coxas. Ela ergue
uma perna, lambendo os lábios quando minhas sucções passam a ser mais
ritmadas. Em seguida, remexe os quadris, ansiando por mais contato.
Continuo saboreando Samantha com lentidão. Ela geme, ecoando
meu nome por todo o quarto conforme a minha língua continua fodendo-a.
Espero que essa suíte seja a única do andar. Caso contrário, vamos receber
uma reclamação formal amanhã pelo excesso de barulho.
Quando enfio um dedo dentro dela, Sam arqueia as costas. Ela
sempre gostou da combinação da minha mão com a minha língua na hora
de gozar. Dizia que amava sentir que estava sendo fodida enquanto tinha
alguém chupando seu clitóris.
Dou exatamente o que sei que vai levá-la à loucura.
Quando sua respiração fica ainda mais rarefeita, começo a tremer a
língua em sua boceta. Ela geme alto, colocando a mão sobre a boca para
tentar abafar um pouco mais o som.
Balanço o rosto, faminto, adorando saber que seu cheiro vai estar
impregnado em mim pelo resto do dia. Afundo minhas mãos em suas coxas,
lambendo e chupando a boceta de Samantha com força, enquanto ela treme
sem parar acima de mim.
E então ela goza.
Seu grito rouco logo se transforma em cânticos de prazer. Ela
murmura meu nome como uma prece, agarrando meu cabelo conforme
continua se esfregando em mim. Quando finalmente volta da sua ida até a
Terra do Orgasmo, ergo o rosto de suas pernas para encará-la.
Samantha está com lágrimas nos cantos dos olhos. O rosto está
completamente vermelho. Os seios subindo e descendo sem parar. A boca
entreaberta.
Eu diria que ela está com cara de que foi fodida muito bem.
— Meu Deus — diz, embasbacada.
— Eu sei. Sou muito bom nisso.
Ela solta uma risada, me dando um tapa no braço com força.
Caio ao seu lado no sofá, puxando-a para se deitar em cima de mim.
Estamos ambos nus, exaustos, completamente esgotados pelo prazer que
proporcionamos um ao outro.
E mesmo assim, a única coisa que me vem à mente é como eu quero
fazer isso de novo. E de novo. E de novo. E de novo. E de…
— Lance?
— Hm?
— Nós não podemos fazer isso de novo.
— O quê?
— Isso pode complicar as coisas. Quero dizer… — Ela começa a
traçar círculos preguiçosos pela minha pele suada. — Mais do que já serão
complicadas.
Abaixo a cabeça para encará-la.
— As coisas já vão estar complicadas, Sam.
Ela engole em seco.
— Eu sei.
Suspiro.
— Você sabe que vai ser muito mais difícil resistir a essa atração
agora que nós trepamos, não sabe?
— Também sei disso.
— E… — Faço uma pausa. — Você sabe que vamos acabar fazendo
de novo.
Sam não responde mais nada, mas balança a cabeça em afirmação.
É claro que ela sabe.
Nós dois não conseguimos manter as mãos longe um do outro.
Nunca conseguimos. E agora que abrimos a caixa de Pandora, eu não quero
mais fechar.
Vou ter essa mulher de volta.
E ela finalmente será minha.
E, querido, você transformou minha cama em um oásis sagrado
As pessoas começaram a falar, nos avaliando
Eu sabia que não havia ninguém no mundo que pudesse aguentar isso
Dancing With Our Hands Tied | Taylor Swift

Acordo na manhã seguinte com um sorriso no rosto.


Meus músculos estão latejando e sinto partes do meu corpo que nem
me lembrava mais que possuía. Sinto que posso dormir mais dez horas,
relaxada e completamente em paz.
Até sentir um beijo carinhoso no meu ombro.
Ai, merda.
Lance e eu transamos ontem à noite. Bastante, na verdade. Depois
da nossa rapidinha no sofá, ele me arrastou para o banheiro. Começamos a
festa lá e terminamos na cama. Acho que já estava amanhecendo quando
finalmente percebemos que não dava mais para continuar transando.
Sério, não dava. Minhas pernas já estavam na consistência de
gelatina, e tive falta de ar umas duas vezes quando fiquei de quatro. Lance é
um atleta, e eu, uma pobre relações públicas.
— Bom dia. — Sua voz rouca causa arrepios na minha pele.
— Bom dia…
— Está com muita dor?
— Não muita, mas algumas partes minhas estão latejando. Foi muita
atividade para uma noite só.
Lance ri. Depois, escorrega uma das mãos para a minha barriga. Nós
dormimos completamente nus, então ainda estou pelada.
Ele coloca a mão entre as minhas pernas, apertando levemente a
minha boceta.
— Ela está doendo?
Preciso conter um gemido. Isso está sendo fofo de uma forma muito
estranha.
— Um pouco. Você não pegou leve com ela ontem à noite.
— Sinto muito por isso. Falha minha. Mas posso cuidar bem dela
agora… — Ele escorrega o dedo um pouco mais, apenas uma sugestão do
que planeja fazer.
Mas já amanheceu, e eu preciso pensar racionalmente agora. Afasto
a mão de Lance e pulo da cama, procurando alguma roupa.
— Temos muito o que fazer hoje — argumento, evitando lançar um
olhar em sua direção. — Vou tomar um banho, tudo bem?
Não espero Lance responder, no entanto.
Me enfio dentro do chuveiro e começo a repensar sobre tudo o que
aconteceu entre nós dois ontem. É nítido que Lance quer voltar. Está
estampado em seu rosto o quanto me quer de volta.
E poderíamos voltar.
Pena que as coisas não são tão fáceis assim.
Depois que termino de me lavar, vou direto para o nosso quarto.
Jesus. Estamos dividindo um quarto. Por que eu pensei que isso
seria uma boa ideia, pelo amor de Deus?
— Surpresa — Lance diz, o que me faz dar um passo de volta para
trás.
Socorro.
Ele simplesmente preparou o melhor café da manhã do mundo. São
tantas opções de comida e bebida que meus olhos nem conseguem
acompanhar.
— O que é isso? — pergunto, genuinamente chocada.
Ele dá de ombros, acanhado.
— Achei que seria uma boa forma de começar o dia. Depois de
ontem, principalmente.
Não consigo evitar o rubor nas minhas bochechas depois de ouvir
esse comentário. Ele está certo, mas ainda me acho uma idiota.
Lance e eu transamos ontem à noite. E foi maravilhoso, do jeitinho
que meu corpo ainda lembrava. Como vou conseguir trabalhar com ele e ser
profissional depois disso?
— Lance… Você não precisava.
— Eu sei. Quis fazer isso.
— Tá bom. Mas… Você sabe que isso não vai nos levar a lugar
algum, não sabe? Foi só sexo. Uma despedida.
Ele pisca.
— Ah, claro. Não sou um desses garotos pegajosos — brinca,
balançando a cabeça. — Acho que você deveria comer, de qualquer forma.
Ontem gastamos muita energia e mais tarde temos que nos preparar para a
coletiva de imprensa. Sean disse que quer falar com você.
Ah, droga. Esqueci desse pequeno detalhe.
O agente de Lance deve estar bem confuso.
— Vou ligar pra ele daqui a pouco — respondo, apertando mais
ainda a toalha ao redor do meu corpo.
Quando Lance passa por mim em direção ao banheiro, eu finalmente
consigo trocar de roupa. As marcas de chupões e mordidas no meu pescoço
são uma prova viva de como amei senti-lo dentro de mim ontem à noite.
Depois que termino a minha maquiagem, decido dar uma olhada no
café da manhã que Lance me trouxe. Acho fofo o fato dele pedir o serviço
de quarto todos os dias antes de eu acordar? Sim. Mas normalmente acaba
exagerando.
São tantas opções de comida que eu me pergunto se ele quer mesmo
me agradar tanto assim ou se acha que eu como tudo isso. Não sou uma
pessoa de café da manhã. Para mim, café preto com algumas frutas são o
suficiente para me manter saciada até a hora do almoço.
Como uma banana e viro uma mistura de leite com café. Antes
mesmo de Lance voltar do banheiro, jogo boa parte de tudo fora. Dá uma
certa dorzinha no coração me desfazer de tanta comida, mas eu sei que se
ele não ver essa bandeja vazia, vai insistir para que eu coma mais do que eu
quero.
Estou a caminho do elevador quando decido finalmente aceitar o
meu destino e ligar para Sean.
— Ah, então você existe. Está sendo mais fácil conversar com a
rainha da Inglaterra do que com você — diz ele com deboche.
Mordo a bochecha.
— É… As coisas estão sendo intensas.
— Eu imagino. Seguimos à risca todos os seus conselhos, e o que
ganho com isso? Lance estava estampando em todos os Instagrams de
fofoca! E com você, inclusive.
— Sinto muito por isso.
— Besteira. Até que essa saída fez bem pro garoto. Não apareceu
seminu com mais ninguém por aí.
— Ainda assim, Sean. Não deveria ter acontecido. Vou tomar mais
cuidado a partir de agora.
— Não é sobre isso que eu quero falar. Na verdade… O resort me
ligou.
Ai, não.
— E disseram que o Lance solicitou uma mudança de quarto.
Meu Deus.
— Com a esposa dele.
Que merda.
— Sean, eu posso explicar.
— É isso mesmo que eu espero. Uma explicação. Porque, juro por
Deus, Samantha… Isso está estranho.
— Eu sei, eu sei. Deveríamos ter contado. Lance solicitou uma
mudança de quarto para uma suíte. Achamos que seria mais privativo e
também melhor. Só que… Pelo valor que você pagou, teríamos que desistir
dos dois quartos. Não consegui impedir e também não queria causar uma
cena.
— E por isso concordou em se passar por esposa dele, Samantha?
Não quero soar rude, mas isso não parece nada profissional.
Um tapa na cara doeria menos.
Fecho os olhos, segurando as lágrimas. Eu sei que ele tem razão. O
que fiz com Lance ontem à noite é mais uma prova do quanto não estive
sendo uma pessoa profissional. Ainda assim… Dói.
— E não foi mesmo, Sean. — Limpo a garganta. — Não fui
totalmente honesta com você. Lance e eu… Nós tivemos um passado. Nos
conhecemos na faculdade, éramos jovens, nos apaixonamos. Não existe
mais nada entre a gente. Nada. Mas eu não podia deixar essa oportunidade
passar. O meu avô… — Minha voz embarga, e então eu paro. Não estou
pronta para isso ainda. — Eu preciso desse emprego, tudo bem? Preciso
mesmo.
Ele suspira do outro lado da linha.
— Então é por isso que o garoto olha pra você como uma criança
vendo as luzes de Natal. Pensei que era só o Lance sendo, bem… O Lance.
Devia ter percebido.
Percebido o quê? Ele estava ficando louco?
— Bom, preciso conversar com ele sobre isso. Por enquanto vamos
mantê-la. Pelas referências que eu tive de você, sei que é boa no que faz.
— Obrigada, Sean.
— Não me agradeça ainda, Samantha. Preciso conversar com
Lance. Entro em contato amanhã.
Que maravilha. Meu destino está nas mãos de Lance Moreau.
Ironicamente ou não, meu corpo reage na mesma hora. O que essas mãos
são capazes de fazer…
Foco, Samantha. Foco!
O que me leva a pensar nos funcionários do resort. Tudo bem
comunicar a mudança de quarto, mas dar detalhes da história que
inventamos para a recepcionista? Golpe baixo.

Passo o dia inteiro trabalhando nas próximas estratégias do Lance.


Ele saiu para o centro de treinamento um pouco depois do café da manhã e
eu aproveitei a suíte para ler e imergir sobre o futuro da carreira dele.
Cheguei em algumas conclusões.
Primeiro de tudo: Lance não pode ser negociado. O time pagou uma
nota por ele, e o contrato foi assinado seis meses atrás.
Seis. Meses.
Francamente, o que ele estava pensando? Colocar tudo a perder com
pouco tempo na casa?
O prejuízo que ele terá se realmente trocar de time nessa altura do
campeonato pode ser irreversível. Lance precisa mesmo sair do banco no
próximo jogo e mais que isso, precisa dar o melhor de si.
As pessoas sempre perguntam qual a pior parte de trabalhar com a
imagem de alguém. Eu diria que é essa. Depender da ação de terceiros para
você ser bem-sucedido.
Depois que termino de organizar algumas planilhas e encerrar uma
ligação com o escritório em Los Angeles, decido telefonar para o meu
irmão. Scott sempre me manda mensagens de texto para me atualizar sobre
o vovô e Seth, mas não é o suficiente.
Assim que ele aceita a chamada de vídeo, seu rosto lindo aparece na
tela do meu celular.
— Ei, mana. — Sorri. — O que está fazendo?
Bebo um longo gole da minha água com gás, arrumando o cabelo
em um coque.
— Terminando mais um dia exaustivo no trabalho. E você?
Ele arqueia a sobrancelha.
— Exaustivo? Eu fiquei sabendo de outra coisa.
— Tá ficando maluco, Scott?
— Ué… Eu também tenho internet, Samantha. Esqueceu? E meus
amigos sabem que você é minha irmã. Quando as suas fotos com Lance
apareceram em todos os portais de notícias, quase não acreditei. Pensei
assim: ah, ela é a minha irmãzinha, mas também minha parceira no crime.
Ela não se atreveria a ter uma recaída com o ex sem me contar.
— Não estou tendo recaída nenhuma.
— Você transou com ele?
— Só estou tentando seguir em frente de forma profissional e…
— Você. Transou. Com. Ele?
— Lance e eu somos adultos, Scott. Nós sabemos conviver e…
— Porra, Samantha, corta esse discurso. Você trepou com ele ou
não?!
Suspiro.
Os olhos de Scott faíscam com diversão. É claro que ele não vê
problema nenhum nisso.
— Ah, disso eu gostei. E aí, foi tão bom como era antigamente?
— Pelo amor de Deus. Maldita hora que eu fiquei bêbada e te contei
sobre tudo. Sabia que tirar vantagem de uma pessoa chapada não é nada
ético?
— Me impressiona você usar a palavra “chapada” e “ético” na
mesma frase — debocha, desenhando aspas no ar. — Agora, pode ir
contando tudo. Quero saber todos os detalhes. Até os mais sórdidos. Tá
bom, eca, pode manter algumas coisas pra você. Mas o resto da fofoca eu
quero na minha mesa.
— Não tem fofoca, Scott. Acho que eu caí naquela cilada de “ah,
vamos só ver um filme…” — explico, sem graça. — Quando percebi, já
estava quase amanhecendo e ele ainda estava dentro de mim.
— Caramba, mana. Você é mesmo selvagem, hein? — Scott balança
a cabeça e o movimento faz com que ele se afaste da câmera. Consigo notar
um braço tatuado no canto da tela.
Franzo a testa.
— Você está acompanhado?
Meu irmão arregala os olhos. Em seguida, ajeita melhor a posição
do celular, cobrindo a imagem anterior.
Maldito.
— Não adianta esconder, Scott. Eu não tenho mais cinco anos.
— Merda, Sam. Isso vai ser embaraçoso.
— Nem vem. Não é como se eu nunca tivesse conhecido um dos
seus peguetes…
Ele limpa a garganta, desviando o olhar para o seu acompanhante.
Pelo sorriso sem graça que meu irmão estampa no rosto, sei que me vinguei
de todas as vezes em que ele afugentou algum garoto que eu levava para a
casa dos nossos pais.
Quando ele finalmente vira a câmera para mostrar o cara que
obviamente está muito à vontade no seu apartamento, meu sorriso morre.
Que. Porra. É. Essa?
Meu coração começa a acelerar, minha garganta fica seca, e se eu
não estivesse apoiando o celular na garrafa de vinho que pretendia abrir
depois de terminar o expediente, provavelmente o teria derrubado no chão.
— Oscar? — pergunto, embasbacada.
Ele faz um aceno com a cabeça, sem graça.
Devo estar com a expressão mais estúpida do mundo, mas foda-se.
Eu, definitivamente, não estava esperando por isso.
Meu irmão leva o celular até seu rosto novamente. Em seguida,
cruza o apartamento até entrar em seu quarto. Depois que ele fecha a porta e
respira fundo, eu suspiro.
— Você é um traidor, Scott.
— Sam, não.
— Você é sim. E me deixou falando sobre o meu possível
relacionamento com Lance na frente dele. Você sabe que Oscar vai contar
tudo para o Oliver assim que for embora daí, não sabe?
— Ele não vai, Sam. Ele não é mais assim.
— E como é que você pode saber disso? Você não conviveu com ele
por anos, Scott. Eu convivi.
Meu irmão prende a respiração. Está nítido que quer me contar algo,
mas se segura. Quando me despeço e estou pronta para desligar o telefone,
ele grita, me pedindo para esperar.
— O que foi?
— Oscar e eu… Nós… Bem, estamos juntos. Ele não é só um amigo.
Ele é meu namorado. Há seis meses.
Puta que pariu.
— Seis meses?
Por coincidência, é o mesmo tempo que Lance está nos Texans
como jogador profissional.
— Eu queria te contar, Sam. Eu juro. Mas… Com a situação do
vovô, depois você precisando trabalhar com o seu ex da faculdade, e ainda
mais o Seth nessa fase rebelde… Parecia que todo mundo estava
precisando lidar com um grande problema. Eu só não queria piorar.
— Piorar? — Balanço a cabeça, incrédula. — Você não tem noção
do que fez.
— Eu tenho sim, tá legal? Oscar não era uma pessoa boa no ensino
médio. Fez bullying comigo, foi um porre com você, era insuportável. Mas
preciso te lembrar que não éramos muito diferentes? Porque quando ele
fazia, a gente devolvia dez vezes pior.
— É, colocamos Oscar no lugar dele naquela época. Mas você sabe
muito bem que não é por isso que eu estou assim. Como você pôde, Scott?
Depois de tudo que Oliver fez comigo…
— Ele não é o irmão. E eles nem estão se falando mais.
Abro um sorriso carregado de ironia.
— Ah, e quem foi que te disse isso? O falso do Oscar? O mesmo
cara que fazia um inferno na minha vida só porque eu segui em frente
depois do irmãozinho dele me mandar fazer justamente isso? Ele é mais
sorrateiro do que uma cobra.
— Ele não fala mais com Oliver porque está namorando comigo —
diz Scott, sem rodeios. Me calo na mesma hora. — Olha, Sam, eu não
deveria estar contando isso pra você. É um assunto particular dele. Mas,
sim… A família daqueles dois é sinistra, para não dizer coisa pior. Nem
todo mundo viveu na nossa bolha. Nem todo mundo tem pais e familiares
que os apoiam e aceitam em qualquer circunstância. E conhecendo os
parentes dele, você realmente achou que seria fácil? Cai na real.
As palavras de Scott são como um soco no meu estômago.
Ele tem razão, é claro. Não importa o quanto Oscar fez — e o
quanto encobriu o próprio irmão ao longo dos anos quando o assunto era
“enganar a Sam” —, é inadmissível ver uma família virar as costas para
alguém simplesmente porque a pessoa escolheu ser feliz.
Escolheu ser ela mesma.
— Eles são todos uns cretinos — digo, irritada. — E uns filhos da
puta.
— E imbecis.
— E babacas.
— E ridículos. Todos eles são ridículos.
— Principalmente o Oliver.
— Especialmente o Oliver — meu irmão concorda, balançando a
cabeça. — Ele não vai contar nada sobre você e o Lance. Mas eu diria que
você tem um problema maior do que esse agora.
— E o que seria?
— A sua cara estampada em todos os Instagrams de fofoca a
centímetros de Lance Moreau. Acha mesmo que Oliver já não viu?
— Eu quero mais é que ele se foda, Scott.
Meu irmão revira o olho.
— Péssima forma de falar sobre o seu noivo, não acha?
Nem sequer respondo. Irritada, apenas desligo o telefone.
Não estive pensando em Oliver Nilsen há bastante tempo. Cinco
meses, para ser mais precisa.
Nos conhecemos em meio a uma tragédia. E ela, sem dúvida
alguma, nos uniu. Quando você tem treze anos e acaba presenciando uma
coisa horrível, algumas coisas mudam em você.
Perder alguém muda você.
É um daqueles momentos em que a vida realmente parece algo
frágil e efêmero. Algo que pode acabar em um piscar de olhos, em poucos
segundos. E por qualquer motivo.
Essa conexão acabou gerando uma dependência. Oliver e eu nos
tornamos a âncora um do outro, o motivo de irmos para a escola todos os
dias, mesmo sem entender mais qual o sentido da vida.
Sempre tivemos algo casual. Estava implícito que tínhamos um
compromisso, mas não era monogâmico e eu definitivamente participei de
mais jogos da garrafa do que eu devia naquela época. Mesmo assim, Oliver
não mudava comigo. Ele também tinha alguns casinhos e interesses
românticos, mas, de acordo com ele, eu era a garota destinada a ele.
Oliver me pediu em casamento no último dia do colegial. Quando
estávamos no baile de formatura, ele me trouxe o anel da avó e oficializou o
noivado.
Eu disse sim.
E então fomos para faculdades diferentes. Decidimos — de forma
bem madura, aliás — que poderíamos aproveitar nossos anos na
universidade. Estávamos com essa espécie de relacionamento desde os
quinze, e se iríamos passar o resto da vida juntos, qual o problema de
aproveitar e ter novas experiências durante esse tempo?
O problema é que eu me apaixonei.
Perdidamente.
Por outra pessoa.
E Oliver… Deixou a máscara cair.
Finalmente.
Deixe a música tocar, nós vamos fazer a nossa dança
Deixe que duvidem, eles não são importantes
Porque essa vida é muito longa e esse amor muito forte
Never Let You Go | Justin Bieber

O alarme do meu celular dispara exatamente às seis e quinze da


manhã todos os dias. Coloquei esse horário porque sei que Sam costuma
levantar às sete em ponto, e até ela abrir aquele lindos olhos, eu já estou
arrumado e com uma bandeja de café da manhã esperando por ela.
Soa um pouco patético, mas não se preocupe. Eu tenho um plano.
Um plano para reconquistar a garota que me deixou há dois anos,
assim que nos formamos. Não sei exatamente o motivo, mas consigo
imaginar. Estava prestes a entrar de cabeça nessa coisa de ser um grande
astro, e nós dois éramos muito jovens.
Sam estava certa em querer pular fora.
Mas… Depois da melhor noite de sexo que tivemos, não posso estar
ficando louco. Sei que ela sentiu o mesmo. Nós ainda estamos conectados,
por mais bizarro que isso soe.
E não só pelo carnal. A forma como nos entendemos, a conversa
fácil e fluida… Tudo isso só pode significar uma coisa.
Somos Almas Gêmeas, ué.
Unha e Carne.
E toda essa baboseira que você encontra na internet quando pesquisa
sobre todos os reencontros que tem com uma mesma pessoa.
Depois de terminar o banho e receber nosso café da manhã, me
preparo para dar o bom dia habitual para Sam. Acho bonitinho como ela se
acostumou fácil a nossa rotina (viu, só? Coisa de alma gêmea).
Seu rosto amassado de sono é diferente dos outros dias, entretanto.
Desde ontem ela parece estranha. Por um momento cheguei a pensar que o
sexo realmente tornaria as coisas entre nós desconfortáveis, mas essa teoria
veio por água abaixo quando Sam fez uma piadinha envolvendo os ovos da
cozinha e as minhas bolas.
Sim. Isso mesmo que você leu.
A garota às vezes desce bastante o nível.
Do jeitinho que eu gosto.
— Só queria poder dormir o dia inteiro — resmunga ela, atirando os
cobertores para o lado.
Sua primeira atividade do dia é ir até o banheiro e escovar os dentes.
Depois, toma um banho demorado que deixa o quarto com cheiro de
morango. Em seguida, depois de se vestir, ela sai pegando um pouco do
café. Depois de bebericar uns goles, pega uma tigela de frutas e começa a
comer.
Hoje fico um tempo no quarto para me certificar de que Samantha
está mesmo comendo tudo. Posso estar ficando louco, mas juro que vi parte
da comida que trouxe para ela ontem no lixo minutos depois.
Essa mulher precisa se alimentar melhor. Estou a ponto de contratar
um cozinheiro particular só para me certificar de que ela está ingerindo
todas as vitaminas necessárias no dia.
— Repassei com Sean as possíveis perguntas dos jornalistas hoje —
digo, me aproximando para roubar uma das panquecas.
Ela suspira.
— Perdi até a fome. Não acredito que a coletiva de imprensa é hoje.
Dou de ombros.
— Coma mesmo assim, Samantha. Seu corpo precisa de energia. O
dia vai ser longo.
— Nem me fale. Só queria ter um controle remoto onde eu pudesse
adiantar certas horas do meu dia. Pular, sabe? Eu, com certeza, pularia essa
coletiva de imprensa.
Abro um sorriso.
— Eu também. Provavelmente acabaria pulando para o momento
em que nós dois estamos casados, com uma casa cheia de crianças
correndo.
Ela arqueia a sobrancelha.
— As garotas realmente costumam cair nesse tipo de cantada,
Lance? Esperava um pouco mais de classe.
— Seu problema é esperar muito de mim.
— Nisso eu concordo.
Atiro um travesseiro na direção dela, e Sam intercepta com uma
mão só. Depois joga de volta em mim, e quando percebo, estamos em uma
verdadeira guerra de travesseiros.
Ela corre pelo quarto, tentando escapar dos meus golpes, mas sou
mais rápido. Consigo segurá-la pela cintura, arrancando uma risada sincera
de Sam quando a viro contra a parede.
Nossas respirações estão ofegantes.
Nossos sorrisos começam a perder intensidade lentamente.
Ela sempre teve olhos tão brilhantes assim?
Sempre teve bochechas tão rosadas?
Seu corpo longilíneo está inclinado levemente para a frente. Eu
estudo sua expressão atentamente, tentando captar qualquer sinal de
desconforto ou mesmo arrependimento.
Mas não é isso que eu encontro.
Samantha está com os olhos faiscando de tanto desejo. Sinto seu
hálito quente contra a minha bochecha, e só consigo pensar em como
acabamos nesta situação.
Merda.
Meu pau se contrai, com certeza se lembrando de como foi delicioso
deslizar para dentro de Sam por horas a fio. Queria muito fazer o mesmo
agora, mas sei que preciso encontrar Sean em pouco mais de uma hora.
— Lance…
Sorrio.
— Sam…
— Você está me encoxando.
Pisco lentamente.
— O quê?
Ela abre um sorriso lento, quase diabólico.
— Só queria chamar a sua atenção. Seus olhos não saíam da minha
boca.
Dou de ombros, sem jeito.
— Talvez eu esteja pensando em te beijar. Já parou para pensar
nisso?
— E por que não beija de uma vez? Não é como se estivéssemos
todo o tempo do mundo…
Mas que inferno…?
Samantha é, sem sombra de dúvidas, a mulher mais confusa com
quem já me relacionei.
Ela continua tagarelando sobre tudo o que temos que fazer durante o
dia, mas decido calar a sua boca com a minha. Capturo seus lábios com
avidez, praticamente gemendo ao sentir sua língua quente contra a minha.
Sam enfia os dedos entre o meu cabelo, agarrando meu rosto e
puxando em sua direção. Me desequilibro por um segundo antes de
finalmente agarrar sua bunda, fazendo-a cruzar as pernas ao redor da minha
cintura.
Antes de jogá-la na cama, olho de soslaio para o meu celular.
Preciso encontrar Sean em cinquenta e quatro minutos.
— Lance… Podemos fazer rapidinho dessa vez?
Fecho os olhos.
Porra. Vou ter que fazer isso. Sean vai ter que me desculpar.
— Não me bagunça, por favor — pede ela, lambendo os lábios. —
Já estou pronta. Só coloca a calcinha para o lado e entra em mim.
Devagarinho…
— Caralho, Sam. Você falando assim me dá muito tesão.
Ela sorri.
— Eu sei.
Faço exatamente como ela me pediu. Arrasto o tecido da sua roupa
íntima para o lado e, sem cerimônia, entro de uma vez. Antes mesmo de ir
mais fundo, Sam arregala os olhos, sem jeito.
— A camisinha, Lance.
— O quê?
— Nós não usamos. Nem na primeira vez, nem nessa.
Atordoado, eu a encaro. Ainda estou dentro dela e definitivamente
não existe uma barreira entre nós. Merda, o que estamos fazendo?
— Não tenho camisinha aqui — explico com a voz baixa.
Sam suspira, balançando a cabeça. Pela expressão triste em seu
rosto, é bem o que ela já estava imaginando.
— Fomos muito descuidados — diz por fim.
Mas também não se mexe. Ela não tem a menor pretensão de sair de
onde está.
— Acho que esquecemos porque quando começamos a transar na
faculdade, raramente usávamos — eu a lembro.
Naturalmente, quando Samantha e eu fomos para a cama pela
primeira vez no terceiro ano da faculdade, tudo mudou entre nós. Não
cheguei a fazer um pedido de namoro oficial, mas conversamos sobre
exclusividade e decidimos que o nosso lance com certeza seria
monogâmico. Sendo assim, fomos até o posto de saúde da universidade e
fizemos todos os exames juntos.
Quando recebemos os resultados, ela começou a tomar pílula. E
então foram dois bons anos transando sem nada entre nós.
— Eu devo sair? — pergunto, ainda imóvel.
Ela morde o lábio inferior.
O mundo parece girar.
Mas quando Sam finalmente balança a cabeça em sinal de
concordância, eu me movo. É uma dor quase física, mas eu a entendo. É a
coisa certa a se fazer.
— Precisamos refazer os testes — digo, dando de ombros. — E a
pílula?
Samantha fica mais pálida do que o normal.
Ela balança a cabeça, depois esconde o rosto em um dos
travesseiros. Estava prestes a chupá-la antes de sairmos para encontrar
Sean, mas aparentemente o clima acabou de morrer.
— Que droga, Lance. Eu não estou tomando nada.
Porra. Porra. PORRA.
— Você sabe se estava no seu período fértil?
Mas Samantha está tão aérea que nem presta atenção no que eu
disse. Começa a murmurar coisas como “ai, eu sou tão estúpida!” enquanto
pragueja de um lado para o outro. Eu a intercepto, colocando as mãos
protetoramente sobre seus ombros.
— Calma, Sam. Respira. Agora volta pra mim — peço. Meu
desespero está refletido em seus olhos, mas faço o meu melhor para ela não
perceber que estamos na mesma situação. — Já não transo com alguém há
meses. E mesmo assim, sempre usei camisinha. Não teve uma vez sequer
que eu me arrisquei. De qualquer forma, vamos fazer os exames amanhã
mesmo. Tudo bem? — Quando ela balança a cabeça, eu suspiro. — E
quanto a segunda preocupação, relaxa. Não é tão fácil assim ficar grávida.
Ela bufa.
— É, mas eu preciso mesmo te lembrar de quantas vezes você
gozou dentro de mim ontem à noite?
Sinto uma fisgada nas bolas ao vê-la falar sobre a nossa noite de
sexo enlouquecedora. Ela não precisava mesmo me lembrar disso.
Pisco.
— Não vale a pena entrar em desespero com uma possibilidade,
Sam. Vamos esperar umas duas semanas e então você faz um teste.
Enquanto isso, vou me certificar de que sempre tenha uma camisinha por
aqui.
— Você está bem confiante, hein? Quem garante que vai haver uma
próxima vez?
Arqueando a sobrancelha, eu me aproximo de Sam. Ela dá um passo
para trás, sem jeito. Quando seus olhos caem sobre a minha boca, abro um
sorriso malicioso.
— A sua boceta apertando o meu pau há poucos segundos.
Completamente encharcada. É isso que me garante que teremos uma
próxima vez, Samantha.

Sean não está feliz.


É claro que imaginávamos as perguntas capciosas dos jornalistas
antes de chegarmos aqui. Afinal, sou o maior “mulherengo” e
“irresponsável” que esse time já teve.
Palavras de um dos comentaristas da ESPN, não minhas.
Na minha mesa estão presentes mais três jogadores. É claro que
Charles fez questão de se sentar ao meu lado, com a pompa habitual de
sempre. Acho incrível a habilidade que ele tem para se sair bem em
momentos como esse.
— Lance, você não acredita que as suas polêmicas recentes possam
acabar prejudicando o time de alguma forma?
A jornalista que fez essa pergunta me encara com a expressão séria.
Não esboça nenhuma reação quando sorrio, nervoso. Devo dizer que é uma
profissão que eu admiro pra caralho. Não sei se conseguiria ficar desse jeito
depois de perguntar casualmente a alguém se suas ações podem estar
afundando o próprio trabalho.
— Na verdade, sim — respondo. Samantha me encara intensamente
no canto da sala. Sean está quase arrancando os cabelos. Toda vez que uma
pergunta é dirigida a mim, vejo-os esperando o pior. Isso faz a criança
atentada que vive em mim ter ideias, não vou negar. — Não para o time em
si. Temos jogadores excelentes e um time de colaboradores fenomenal. Mas
acho que as polêmicas desnecessárias que me envolvi podem afetar a marca
da empresa que me contratou. E isso é inadmissível. Eu reconheço.
A jornalista faz um meneio de cabeça, anotando mais algumas
informações em sua prancheta.
Estou bem menos nervoso do que antes. Quando chegamos na sala
oval e fui direcionado até a mesa no centro, me senti péssimo. Era como
estar no corredor da morte. Me preparei mentalmente para o que seria um
balde de sangue, mas no fim das contas, nada fugiu muito do esperado.
Os jornalistas começaram averiguando as minhas estatísticas. Eu
estava ciente de que seria o mais cobrado e que, inicialmente, quase todas
as perguntas seriam para mim. Meus companheiros de time bebericavam
água e, vez ou outra, complementavam as minhas respostas. Lancei um
olhar agradecido para Charles quando ele respondeu, ironicamente, um dos
jornalistas que sugeriu que as minhas estatísticas haviam caído porque eu
não estava aparecendo nos treinos com frequência.
Porra, eu queria mesmo saber de onde é que as pessoas tiram essas
coisas. Elas falam sobre a minha vida com tanta certeza que chega a ser
assustador. É muito fácil convencer alguém de uma mentira se ela for bem
contada.
— A última pergunta do dia é para o Lance Moreau — o
intermediador avisa, e eu me preparo.
Dizem que as últimas perguntas em uma coletiva de imprensa
geralmente são as mais capciosas.
É por isso que eu me reteso, balançando a perna debaixo da mesa
sem parar.
Só mais uma e posso voltar para o hotel. Só mais uma e isso acaba.
Só mais uma e…
— Senhor Moreau, é um prazer conhecê-lo — a jornalista baixinha
diz, com um sorriso nervoso. Está usando um crachá vermelho, e eu me
distraio por alguns segundos tentando decifrar qual é o seu nome. — Quero
começar dizendo que ao contrário do que muitos colegas acreditam, eu não
acho que o incidente no saguão daquele hotel pode ser resumido em uma
única foto. Gostaria de uma entrevista no futuro para conseguir decifrar o
que causou tamanho estrago. Com vocês dois. — Ela aponta para mim, e
em seguida para Charles. Basta um olhar na direção do meu melhor amigo
para eu perceber que essa garota chamou bastante a atenção dele.
É, talvez ela esteja mais perto de conseguir a entrevista do que
imaginou.
— A minha pergunta se refere a uma das suas últimas aparições
públicas. Estivemos monitorando o seu sumiço midiático já tem um certo
tempo. Festas famosas e de grandes pessoas públicas, amigas suas,
inclusive, não contaram com a sua presença. Não sei se esteve
acompanhando, mas há diversos perfis de teoria nas redes sociais que
afirmam que esse seu desaparecimento seria uma forma de preparar os fãs
para uma possível venda. — Ela me lança um olhar por cima da armação
dos óculos escuros, mas eu não caio nessa. Continuo parado, com os braços
cruzados, esperando pelo bote. — Foi uma surpresa ver seu rosto em tantos
posts no Instagram depois de tantos dias. E com uma mulher, inclusive. —
Ela vira o rosto para a esquerda, e meu coração acelera.
Fodeu.
— Pode parecer uma pergunta incomum, mas me parece que a
mulher daquela foto é a mesma que está nessa sala. Perto do seu agente. É
verdade?
Antes mesmo de eu abrir a boca para responder, uma chuva de
flashes e cliques começa em direção à Sam.
Ela arregala os olhos, visivelmente desconfortável. Sean faz um
sinal para dispersar as câmeras, e vejo alguns jornalistas se aproximando
dela sorrateiramente.
O caos se instala em poucos segundos. Meu coração martela de
agonia ao vê-la exposta dessa maneira.
Não é nem um pouco justo.
Eu preciso fazer alguma coisa.
Preciso dizer alguma coisa.
Antes que a situação fique ainda maior, eu dou algumas batidinhas
no meu microfone, limpando a garganta em seguida. Todos os olhares se
voltam para mim.
É então que abro um sorriso charmoso, sabendo muito bem que essa
parte vai acabar virando edit no TikTok em poucas horas.
— Essa é Samantha Samuels. Minha namorada na época da
faculdade, e também a minha noiva. Isso é tudo por hoje, gente. Obrigado.
E você acha mesmo que eu não te vi? Tinha luzes piscando
Pelo menos eu tive a decência de manter as minhas noites em segredo
Só rumores sobre os meus quadris, e minhas coxas, e meus suspiros
Is It Over Now? | Taylor Swift

Eu vou matar ele.


Pior. Vou arrancar as bolas dele com alicate. E só depois, quando ele
estiver agonizando lentamente na minha frente, vou finalmente matá-lo.
— Eu posso explicar — ele começa dizendo assim que ficamos a
sós.
— Ótimo. Pois explique-se!
Ele respira fundo.
— Conversei com Sean ontem à tarde. Estávamos pensando em
estratégias para essa possível pergunta…
— E falando no diabo — desdenho, vendo o agente de Lance surgir
logo atrás dele.
Ao me ver praticamente bufando, ele deixa os ombros caírem. Em
seguida, suspira.
— Samantha, foi necessário.
— Necessário?! Vocês dois agiram pelas minhas costas. Pensei que
fôssemos um time!
— Samantha, você é uma funcionária. Foi contratada pela equipe do
Lance para dar um jeito na imagem dele. Parabéns, estamos conseguindo
evoluir bastante. Mas até você precisa reconhecer que aqueles vídeos de
vocês dois naquela festa poderiam reverter todo o nosso progresso.
— Sean, pega leve — Lance intervém, se colocando na nossa frente.
Seus ombros largos são as únicas coisas que eu consigo enxergar daqui.
Mas seu agente não parece disposto a atender o pedido.
— Eu não quero saber sobre o seu romance, Lance. Temos algo
mais importante em jogo. Você!
Engulo em seco.
Ele tem razão.
— Olha, eu só gostaria de ter sido avisada — intervenho, me
sentindo impotente. — Esse é o meu trabalho. Eu gostaria de ter a minha
opinião levada em consideração quando for algo que interfere diretamente
nele. Caso contrário, estou aqui por quê?
Lance vira o rosto para me encarar, a expressão pesarosa. É óbvio
que não queria me chatear, isso está visível em seu semblante. Ainda assim,
não deixa de doer.
É muito difícil ser uma mulher tentando entrar no ramo esportivo.
Não importa qual seja, jornalista, assessora, agente, relações públicas…
Sempre vão tentar desqualificar a sua opinião, mesmo que você seja a
melhor do mercado.
Acho que eu só não esperava isso vindo dele também.
Embora Lance e eu não tenhamos mantido contato nos últimos dois
anos, acho improvável alguém mudar tanto de personalidade. E pelo que eu
me lembro, sempre me incentivou a trabalhar com futebol. Ele me ouvia.
Seguia os meus conselhos. E repetia sempre que eu seria a melhor do
mercado.
— Sinto muito, Sam. Você está certa. Eu não deveria ter dito aquilo
antes de combinar com você.
— Ah, pelo amor de Deus — Sean bufa, colocando a mão sobre o
rosto. — Vocês dois estão dividindo uma suíte. Mentiram para os
funcionários que estavam em lua de mel. Acham mesmo que essa merda
não teria vazado uma hora ou outra? Pessoas estão vendo você ali, Lance.
Dois jornalistas já me ligaram pedindo uma confirmação a respeito desse
casamento. Blind Itens, fofocas cifradas, já foram publicadas em blogs por
aí, sabiam? E muitas pessoas já colocaram o seu nome, Lance. — Ele ajeita
o colarinho da roupa social, o olhar irritado focado diretamente em mim. —
Vamos seguir assim daqui pra frente. Um namoro midiático também
funciona bem. É tradicional, algo dos velhos tempos.
Sean vai embora logo em seguida. Está nítido que não tem mais
paciência para discutir a questão com a gente, mas suas palavras ainda
martelam na minha cabeça.
Ele tem razão, não tem?
Engulo em seco.
Eu sei que ele tem razão. Cometi muitos deslizes desde que
começamos isso. Deus, onde eu estava com a cabeça? Dividir uma suíte
com Lance em um resort com pessoas passeando livremente?
Mesmo que fiquemos quase sempre no quarto e raramente
aparecemos juntos pelo saguão ou dependências do resort, não deixa de ser
arriscado.
— Samantha, eu só não queria te chatear. Isso não muda nada.
— Isso muda tudo, Lance. Tudo.
Ele trava o maxilar.
— Muda em quê? Vamos continuar dividindo a suíte. Vamos
continuar trepando. E vamos continuar fingindo que o sentimento de dois
anos atrás não voltou com tudo desde que nos encontramos novamente. É
isso que estamos fazendo, não é?
Suas palavras são quase um soco no estômago.
Cambaleio para trás, em choque. Lance nunca foi tão duro comigo.
Mesmo quando estávamos estranhos perto um do outro, ele jamais usou
esse tom.
— Não quero ter essa conversa agora — digo, piscando diversas
vezes para controlar as lágrimas.
Ele abre um sorriso fraco. Em seguida, balança a cabeça.
— Claro. É claro que você não quer conversar. Assim como não
tivemos uma conversa há dois anos.
— Lance…
— Tudo bem, Sam. Desculpa se eu me alterei. É melhor voltarmos
para o hotel. Lá a gente conversa sobre a contenção de danos a respeito da
mentira que eu contei para aquela jornalista.
A forma que ele pronuncia a palavra “mentira” me acerta em cheio.
Eu sou mesmo uma mentirosa.
Menti pra Lance desde o primeiro dia em que nos encontramos.
Ele é o meu karma. Vê-lo sem poder tê-lo é o meu castigo por ter
sido tão egoísta.
Por não ter sido corajosa.
Fechando os olhos, eu me permito lembrar daquela última noite.
A noite em que parti o coração de Lance Moreau.
dois anos atrás
Passei os quatro anos na faculdade contando os minutos para me
formar. Eu amava as fraternidades, as festas, ser considerada a rainha da
cerveja de barril e, com certeza, eu amava Lance.
Nós nos esbarramos por dois anos. Sempre que acontecia,
gostávamos de nos pegar e ficar juntos, mas nada muito sério. Isso até
transarmos pela primeira vez.
Foi depois da tempestade que causou uma série de acidentes pelo
campus. As ruas ficaram irreconhecíveis. Mas enquanto o mundo
desmoronava ao nosso redor, eu só conseguia pensar em como as mãos
dele eram macias contra mim. Como nossos corpos se encaixavam
perfeitamente bem.
Como eu o amava.
Merda. Era isso, não era? Eu amava o cara mais galinha da
universidade. O jogador universitário mais promissor do time. A primeira
escolha do draft. Um cara com uma família maluca, divertida e que estava
louco para me apresentar a ela.
Estava terminando de arrumar as minhas malas quando encarei
novamente o anel que trouxe comigo. Era engraçado pensar que esse
pequeno pedaço de metal já chegou a significar o mundo para mim, e
agora não passava disso. Metal.
Consegui um emprego em uma grande agência de Los Angeles.
Lance ficou feliz por mim, mas como tinha sido draftado para o time de
Chicago, as coisas ficariam um pouco complicadas. Jogar no Bulls não era
seu sonho, então ele esperava ser negociado para o Texans em breve.
Amei morar aqui também. Vou sentir falta da cidade. Das pessoas.
Da música. Da comida. E embora morar em Los Angeles tenha sido um
grande sonho por anos, hoje eu enxergo a cidade como algo grande demais
para mim. Não quero mais a confusão e a parte caótica.
Uma batida na porta me faz prender a respiração.
Só não chore, Sam. Por favor, por favor, não chore na frente dele.
— Entre, Lance.
Meu cara entrou dentro do meu dormitório agora vazio com um
sorriso de ponta a ponta. Ele continuava usando a jaqueta do time, mesmo
que oficialmente não seja mais uma parte dele. Era muito lindo ver todo o
seu orgulho estampado dessa maneira.
— O que foi, amor? Precisando de ajuda com as malas?
Respiro fundo.
— Na verdade, não. Meu avô está chegando com a caminhonete.
Vou passar umas duas semanas na casa da minha família em San Diego até
o apartamento ficar pronto pra mim em Los Angeles. — Dei de ombros,
sem jeito. — Estou com saudades deles. Meu irmãozinho é praticamente um
adolescente agora.
Lance abriu um sorriso genuíno.
— Eu sei bem como é. Meu irmão mais novo, Logan, está
praticamente do meu tamanho.
— É o que preferiu se tornar profissional ao invés de ir para a
faculdade?
— Esse mesmo. O que joga beisebol nos Red Sox. Estou pensando
em ficar um tempo em Boston para matar a saudade dele também.
— Isso é bom. Ele vai gostar de ter você por perto.
Lance se aproximou de mim devagar. Depois, se sentou ao meu lado
na cama e passou os braços enormes ao meu redor.
Meu Deus. Por que ele fazia isso? Por que ele tinha que ser tão
carinhoso comigo? Eu não merecia.
— Vamos fazer dar certo, Samantha. Você vai ver. No início vai ser
bem chato termos que viajar sempre, mas vamos nos acostumar com o
tempo. Além do mais, talvez você consiga um emprego ainda melhor em
Chicago. Talvez eu seja negociado para o time de Los Angeles.
Me desvencilhei de seu aperto confortável, virando o rosto para
encará-lo nos olhos. O sorriso esperançoso em seu rosto estava me
matando lentamente. Estava prestes a matá-lo de vez.
— Não podemos mais ficar juntos, Lance.
Sua expressão vacilou por um segundo. Depois, o sorriso voltou
ainda maior.
— Isso é uma espécie de teste, Sam? Uma pegadinha? Porque eu
não vou a lugar algum, entendeu? Não me importo com um namoro à
distância. Quero dizer, nunca me imaginei em um, mas não acho que vá ser
um problema pra gente.
Aproveitando a sua brecha, me levantei. Cruzei o quarto até chegar
na porta, encostando as minhas costas na parede.
Lance me encarou, confuso pra caramba.
— Como você pode saber se isso não vai ser um problema pra
gente, Lance?
Ele se levantou.
— Porque somos nós dois, Sam. Eu e você.
— Sim. E isso não significa muita coisa. — Balancei a cabeça, me
odiando por precisar dizer isso. — Não sei se posso confiar em você. Você
vai se tornar um dos maiores jogadores do nosso país. Vai viver cercado de
modelos, mulheres inteligentes e lindas que vão se jogar aos seus pés.
Ele pisou duro até me alcançar. O rosto lentamente retorcido em
uma expressão irritada.
— Samantha, pare. Isso são as suas inseguranças falando. Estamos
juntos há quase dois anos. Você me viu saindo com alguém nesse meio
tempo?
— Isso não significa nada. Você poderia ter me traído se quisesse.
Todo mundo iria te encobrir.
— Que porra, Samantha? Do que você está falando?
Respira fundo, Sam. Você consegue. Crave a faca mais fundo.
— De todas as vezes em que você foi para festas de fraternidade e
pegou garotas até cansar. De todos os rumores, fotos, vídeos, coisas que
circularam sobre você. Vai me dizer que não sente falta?
Lance deu um passo para trás, piscando os olhos. Ele estava
incrédulo. Eu mesma não o culpo. Nem eu acredito no que estou falando.
— Samantha. Eu estava solteiro naquela época. E você também
costumava passar o rodo nessas festas. Ouvi de mais de um cara do time
sobre terem ficado com você — respondeu ele a contragosto. Dava para
notar que a ideia de me ver com outro o deixava bastante abalado. — Isso
não torna o que nós temos algo menos verdadeiro.
— É claro que torna, Lance. Você… — Respirei fundo. — Você é o
tipo de cara que uma garota namora antes de casar. O cara bombado,
divertido, mulherengo, que ensina a gente o que é ter um orgasmo de
verdade antes de conhecermos alguém bom o bastante.
Depois de despejar essas palavras cruéis, eu sabia.
Eu apenas sabia.
Eu o perdi.
Usar uma referência direta de “Qual O Seu Número?” para magoá-
lo não estava nos planos. Entretanto, a citação não poderia fazer mais
sentido com o que a minha vida se transformou.
Encarar Lance nunca foi tão difícil como agora. Ele está abalado.
Abriu a boca diversas vezes, mas em nenhuma delas ele encontrou palavras
o suficiente para me responder.
— Eu vou embora agora, Samantha. Acho que não é uma boa ideia
termos essa conversa hoje. — Passou por mim até a porta, mas antes que
eu pudesse fechá-la, ele deu meia-volta.
A expressão decidida em seu rosto me quebrou por dentro. Por que
ele só não podia ir embora de vez?
Lance se aproximou de mim, colando os lábios na minha testa.
Beijou por alguns segundos, sussurrando palavras inaudíveis.
Depois que me soltou, me encarou intensamente nos olhos.
— Eu te amo.
Porra.
Desviei o olhar do seu, sentindo as palavras entaladas na minha
garganta. Ele não esperou muito antes de finalmente se virar e ir embora.
Ele disse que me amava e eu fiquei em silêncio. Que espécie de
monstro faz algo assim?
Por que você (por que você)
Me faz te amar? (Me faz te amar?)
Eu disse: Eu te amo (eu disse: eu te amo)
Você não diz nada de volta
Say Don’t Go | Taylor Swift

Os dias passam voando desde a coletiva de imprensa. O efeito


colateral do anúncio do meu noivado falso tomou proporções épicas, como
imaginávamos. Minha família não para de me ligar, meu agente parece
finalmente feliz, e o time está satisfeito com o que anda saindo sobre mim
nas notícias.
Tudo deveria estar perfeito, mas não está. Porque Sam e eu estamos
mais estranhos do que o normal um com o outro desde que discutimos na
coletiva de imprensa. Acho que foi legal ter dito que estávamos noivos para
todos aqueles jornalistas sem o consentimento prévio dela? Não, não acho.
Reconheci isso na mesma hora e me desculpei.
Mas, porra… Ela não precisava ter agido daquela maneira. Ter
fugido de mim como normalmente faz.
Fico louco por não saber o que ela está sentindo. Isso me deixa a
ponto de arrancar os cabelos. Mas mais do que isso, sei que tem algo
acontecendo. Ela não precisa me dizer, mas eu sempre achei estranha a
forma como ela pensava no futuro.
Não no nosso futuro como casal. No dela.
Durante a faculdade, eu costumava pensar que isso acontecia por
causa do desejo de ser livre. Samantha tinha aquela aura de garota do
interior que finalmente estava sem a supervisão dos pais. Mas hoje, mesmo
dois anos depois, ela continua com o mesmo brilho estranho nos olhos.
Como se escondesse um segredo grande demais para suportar.
Continuo agindo normalmente, no entanto. Acordo Sam todos os
dias com o café da manhã na cama. Ela me ignora, toma um banho, come
um pouco e depois desce para trabalhar em um dos coworkers que o resort
oferece. Eu vou até o centro de treinamento e depois que o treino chega ao
fim, volto para a suíte. Normalmente jantamos em silêncio.
E não, não fodemos de novo desde a última (desastrosa) vez.
Comprei algumas camisinhas, mas não estou com esperança de usar.
Samantha e eu temos que lidar com coisas mais importantes agora.
Como o fato dela não estar falando muito comigo ultimamente.
— Nós temos que dar uma entrevista — diz ela, dando um longo
gole no seu suco de laranja. — Lembra daquela última jornalista? A de
óculos? Ela perguntou se podemos dar uma exclusiva… Para falar sobre o
casamento.
O tom amargo da sua voz me deixa apreensivo. Pigarreio.
— Você acha que é uma boa ideia?
Sam dá de ombros.
— Por que não seria?
— Bom, porque você mal está falando comigo ultimamente. Foram
duas semanas confusas.
— Desculpa, Lance, se o fato de eu não conseguir lidar com a minha
família inteira me ligando para perguntar sobre o nosso noivado tenha te
afetado. — Ela revira os olhos, saindo da cama bruscamente. — De
qualquer forma, não tem mais razão para lamentar. Isso não muda nada.
Precisamos de uma solução prática para o nosso problema.
— Certo.
— Eu sugiro essa entrevista. Podemos fingir que estamos
apaixonados por aí, levantar a sua moral como um bom garoto do Texas.
Um pai de família, talvez — diz ela, sorrindo. — Depois que você renovar
o contrato com o time, nós podemos nos distanciar publicamente. Em
menos de um ano essa farsa acaba.
A palavra “farsa” me atinge mais do que deveria. É uma flechada no
peito que me faz cambalear para trás.
Samantha, no entanto, continua com os olhos focados em seu
celular.
— Podemos falar com ela amanhã, depois do jogo. O que acha?
— O que você quiser.
Estou cansado de discutir. Tudo o que eu mais quero é voltar para a
zona confortável que Samantha e eu construímos durante esses últimos dias.
Sinto falta da risada dela.
Sinto falta de vê-la morder o lábio sempre que está pensando em
uma forma de rebater meus comentários sarcásticos.
— Vou marcar na sua agenda.
Faço um sinal de positivo com a cabeça, e Samantha se estica para
pegar uma panqueca da enorme bandeja de café da manhã. Antes mesmo de
morder um pedaço, ela coloca a mão sobre a boca. Sua expressão de nojo
me pega de surpresa, mas não mais do que o refluxo que ela tenta segurar.
Ela passa correndo por mim até chegar ao banheiro. Largo o meu
café, pulando da cama para alcançá-la.
Mal tenho tempo para processar o que está acontecendo quando
escuto um gemido. Entro no banheiro tempestivamente, me deparando com
uma cena desesperadora.
Samantha está vomitando. E muito.
Não perco um segundo de tempo e corro até ela. Sam solta um
chiado, protestando, mas não dou ouvidos. Seguro seus cabelos em punho,
fazendo um carinho em suas costas quando ela termina de colocar tudo para
fora.
Merda. Já tem quase três semanas que nós transamos sem nenhum
tipo de proteção.
Fizemos os exames dois dias depois e felizmente nenhum de nós
dois tinha algo. Acho que estávamos mais preocupados com a possibilidade
de uma doença do que uma gravidez, então Sam sequer fez o teste.
Quando finalmente termina de vomitar, ela se levanta e vai direto
para o chuveiro.
Não saio do lugar.
Fico parado, com os braços cruzados. Observando-a em silêncio.
Sam se despe sem cerimônia. Liga o jato do chuveiro no quente e
deixa a água cair sobre seu corpo trêmulo.
— Sam.
— Estou bem, Lance. Isso não significa nada. Acho que pode ter
sido alguma coisa que eu comi.
Bufo, sem conseguir segurar.
— Eu trago esse mesmo café da manhã pra você todas as manhãs. E
só hoje você teve um problema.
— Talvez os ingredientes usados hoje possam ter algum problema.
Dou de ombros.
— Pode ser que sim, mas também pode ser que não. Precisamos
descobrir o que pode estar causando isso.
Samantha respira fundo, colocando as mãos sobre os seios nus.
— Não estou grávida, Lance.
— Não estou dizendo que você está, mas sim que existe uma
possibilidade. Temos que descobrir, Sam.
— Lance...
— Isso não está em discussão. Amanhã eu tenho um jogo
importante. O primeiro que não vou ficar no banco depois de semanas.
Temos uma entrevista importante depois. Acha mesmo que vou conseguir
me concentrar sabendo que você está passando mal?
— Eu estou bem — argumenta, mas seu tom de voz não passa tanta
confiança.
Arqueio a sobrancelha.
— Podemos ir ao hospital agora pela manhã ou eu compro um teste
de farmácia. O que você prefere?
— Lance!
— Samantha.
Seu queixo tremula. Sam fecha os olhos, arqueando o pescoço lindo
para trás. A água cai em abundância sobre seu corpo, e eu não consigo
desviar o olhar. Por mais que esse momento não tenha nada de erótico ou
mesmo excitante, ela é uma visão e tanto.
Samantha Samuels é deslumbrante.
Quando finalmente desliga o chuveiro e procura por uma toalha, eu
mesmo busco e entrego. Sam se enrola no tecido felpudo como uma
garotinha assustada.
E é então que percebo. Ela está praticamente chorando.
— Ei... — Me aproximo, hesitante. — Não precisa ficar assim, Sam.
Estou aqui com você. Vou ficar, não importa o que aconteça.
— Lance...
— Estou falando sério. Não vou a lugar algum. Você nunca vai estar
sozinha.
Ela me encara, os olhos inchados de quem não dormiu muito bem.
Merda, como eu pude não ter notado isso? Samantha está visivelmente tão
cansada.
Tão exausta.
Ela prende a respiração. Quando finalmente solta o ar, algumas
lágrimas também caem.
— Eu sou muito egoísta.
— Sam...
— Como eu posso estar grávida, Lance? Como eu pude ser tão burra
e descuidada assim? Meu avô... — Ela hesita. Em seguida, fecha os olhos e
continua falando: — Meu avô está morrendo, Lance. Está em uma cama de
hospital em tratamento paliativo. Não há nada que possamos fazer para
melhorar a condição dele. Seth está se tornando um adolescente rebelde.
Scott começou a namorar a pior pessoa do mundo. — Ela nem está mais
segurando o choro. Os ombros tremem e as lágrimas escorrem sem parar
por seu rosto. — Eu não tinha o direito de arranjar mais um problema para
essa família, Lance. Não eu. Eu sempre fui a garota centrada. Sempre fui o
orgulho do meu avô. A que resolvia os problemas. Sempre tive uma cabeça
forte. Nunca dei trabalho. Nunca. E agora que ele está doente, eu resolvo
engravidar? Que merda de pessoa faz isso?
Puxo Sam para um abraço com meu coração acelerado.
— A culpa não foi só sua, Sam. Eu fui um inconsequente. Eu
deveria ter parado, devia ter percebido que estávamos sem camisinha. Mas,
porra, estávamos com saudades. Costumávamos fazer isso o tempo todo na
época da faculdade. Tínhamos essa familiaridade que pode ter afetado o
nosso julgamento — explico, amparando-a. — Seu avô sempre vai ter
orgulho da neta que ele criou. Você é uma mulher incrível, Samantha.
Sempre foi.
Ela começa a balançar a cabeça furiosamente.
— Não sou, Lance. Eu sou um monstro.
— Você não é.
— Sou sim. Você mais do que ninguém sabe disso. — Ela esfrega o
nariz em meu peito, me molhando com as suas lágrimas. — Você não
deveria ser tão legal comigo. Você deveria me odiar.
— Te odiar? Eu jamais poderia.
— Você deveria.
— E por quê, Samantha? Por que você não correspondeu o meu
amor quando estávamos entrando na vida adulta? Por ter decidido seguir a
sua vida como você bem quis? — Ela estremece. — Ninguém nunca
criticou o estilo de vida que eu levo. Quero dizer, não antes de começar a se
tornar manchete em todos os lugares. Sendo assim, não tenho o direito de
cobrar o mesmo de você.
Mas minhas palavras não parecem amenizar o seu desespero. Sam
continua soluçando, inconsolável em meus braços. A parte mais triste de
tudo isso é que ter um bebê comigo não a desespera tanto quanto a ideia de
decepcionar a sua família.
E isso me faz ter raiva deles. Desde o momento em que conheci
Samantha, tudo o que ela me dizia era sobre como estava correndo atrás de
seu sucesso pela família. Ela os ama profundamente. Para o desespero estar
sendo tão palpável, talvez haja algo que eu ainda não sei.

Depois de conseguir acalmar Samantha e convencê-la de que ir ao


hospital não seria uma boa ideia, pedi para a farmácia entregar alguns testes
aqui. Fiquei com um medo do caralho do entregador me reconhecer e ligar
dois mais dois, portanto, coloquei um boné de beisebol sobre o rosto e
fiquei com a cara grudada no celular enquanto recebia a entrega.
Ao voltar para a suíte, encontro Sam sentada no canto da cama. Ela
está abraçando os joelhos, o cabelo molhado ainda embaraçado.
— Sam, chegou a hora.
Ela franze o cenho ao me ver segurando a caixinha rosa. Não faz
nenhuma menção de movimento e por um momento não reconheço a
mulher assustada que me encara.
Essa não é a mesma Sam que me ameaçou assim que me conheceu.
Que me desafia e não abaixa a cabeça para ninguém.
Essa garota apavorada é uma nova versão da Samuels que eu ainda
não tinha conhecido.
— Meu amor... — murmuro, sem me importar em como isso vai
soar. Só quero protegê-la do mundo e abraçá-la até que sinta que está
segura. — Podemos fazer isso juntos. O que acha?
Ela abre a boca para mim.
— Não vou deixar você me ver fazendo xixi, Lance.
— Ah, qual é? Já temos intimidade pra isso. Além do mais, já estive
com o meu rosto enfiado em você inteira.
Ela estremece.
— Mas isso é diferente. Uma coisa é você estar com o rosto lá em
um momento específico, outra coisa é você me ver usando o banheiro.
Balanço a cabeça, abrindo um sorriso de canto. Estou estranhamente
satisfeito por ter conseguido distraí-la por alguns segundos.
Procuro sua mão para entrelaçar nossos dedos.
— Fico te esperando do lado de fora. Vamos olhar o resultado
juntos. Tudo bem?
Samantha parece pensativa por alguns segundos, mas logo faz um
meneio com a cabeça em concordância. Estendo os dois testes para ela, que
os agarra sem cerimônia alguma.
São os três minutos mais demorados de toda a minha vida.
Samantha desaparece dentro do banheiro, recostando a porta. Juro
que não quero parecer um esquisitão, mas chego a colar a orelha na porta
para conseguir ouvir alguma coisa.
Estou tentando parecer forte e passar confiança para ela, mas a
verdade é que também estou quase arrancando os cabelos com a
possibilidade de tê-la engravidado.
Quando Sam murmura um “pode entrar”, empurro a porta na mesma
hora. Ela está sentada sobre o chão, os dois testes em cima da bancada.
Ainda não deu o tempo certo para vermos o resultado, então tudo o que me
resta é sentar ao seu lado.
Seguro seu queixo, forçando-a me encarar. Grudo nossas testas,
aspirando seu cheiro doce. Seria uma cena linda de casal se não fosse toda a
situação de merda que estamos vivendo agora.
Eu quero ser pai.
Eu quero construir uma família.
E a única mulher com quem pensei em fazer isso é a mesma que
está sentada comigo nesse chão frio. Eu deveria estar feliz pra caralho.
Deveria estar cruzando os dedos para dar positivo.
Mas não estou.
Porque eu sei que não é o que ela quer. Não agora, pelo menos. E
principalmente por tudo o que ela vem carregando sozinha.
— Estou com medo de olhar — me confessa baixinho. — Estou
com muito medo, Lance.
Seguro seu pescoço com delicadeza.
— Eu sei. Também estou — confidencio. — Mas independente do
resultado, vamos tirar de letra, Sam. Te prometo isso.
Ela balança a cabeça várias vezes, embora não pareça tão segura.
— Vou olhar — aviso, sentindo o meu coração disparar.
Samantha não faz menção de me soltar. Começo a murmurar
palavras de encorajamento, prometendo estar com ela independente do
resultado. Leva mais algum tempinho até que uma onda de coragem varra
sobre ela.
— Pode ver.
E eu vejo.
Quando leio “grávida +2” não sei direito como me sentir. Por um
segundo, não sinto o desespero que estava esperando. É uma mistura de
adrenalina com ansiedade, mas o pavor definitivamente não faz parte dessa
mistura.
— Sam. — Me viro para encarar a mulher ainda abraçada aos
joelhos na minha frente. — Sam, olha pra mim.
Ela começa a chorar na mesma hora.
Não preciso dizer mais que isso para ver a mulher mais forte que eu
conheço desmoronar. Os ombros tremem, e ela esconde o rosto entre as
mãos enquanto chora copiosamente.
Não consigo evitar. É uma visão muito triste para testemunhar
sozinho.
Então... Eu choro também.
Abraçando-a.

— O que vai ser de mim, Lance? — questiona Sam, com o rosto


afundado em meu pescoço.
Demorou quase duas horas até que ela finalmente se acalmasse.
Cancelou todos os compromissos, então fiz o mesmo. Estamos abraçados
na enorme cama, nosso tratamento de silêncio completamente esquecido.
Ainda estou fazendo carinho em seu cabelo, servindo de apoio
enquanto escuto-a chorar. Por dentro, só consigo pensar em planos e em
como vamos ser daqui para frente.
Samantha criar essa criança sozinha está completamente fora de
cogitação.
— Você vai ser uma mãe incrível caso queira ser, Sam — digo com
convicção.
Ela suspira.
Essa decisão só caberá a ela tomar.
— Estou tão confusa.
— Com o quê?
Sam traça uma linha invisível em meu peito, e o movimento me
causa calafrios.
— Com tudo isso. O bebê. A gente. Esse noivado midiático. A
minha profissão. O meu avô. Meus irmãos. — A cada palavra dita, ela
deixa um suspiro escapar. — É muito irônico.
— Você estar grávida?
— É. Na verdade, é irônico eu ter ficado grávida no pior momento
possível.
Faço uma careta.
— Não temos como controlar tudo na vida, Sam. Algumas coisas
simplesmente acontecem.
— É, eu sei. É só que... Com o meu avô doente, só consigo me
lembrar de todas as vezes que ele me alertou sobre gravidez na
adolescência. Me fez prometer uma vez que eu só teria um bebê quando
encontrasse o cara certo e fosse me casar. — Ela limpa a garganta, forçando
uma voz grave para imitar o avô: — “Sam, minha querida, lembre-se que
todos esses idiotas que você vai encontrar farão de tudo para entrar em suas
calças. Não deixe. Você sabe que sempre terá a sua família para te apoiar,
mas cuidar de um bebê sozinha não é uma tarefa fácil”. — Desenha aspas
no ar. — É irônico eu ter deixado de seguir seu conselho mais importante
quando ele...
A voz dela fica trêmula.
Meu coração dispara.
É tudo muito rápido. Sequer penso.
Apenas seguro Sam pelo queixo, trazendo seu rosto para perto do
meu. Quando nossos lábios estão quase se tocando, pergunto:
— Samantha Samuels, você quer se casar comigo?
Você guarda a camisa dele
Ele mantém sua palavra
E, pela primeira vez, você esquece
Dos seus medos e seus fantasmas
You Are In Love | Taylor Swift

Ai. Meu. Deus.


Meu corpo fica rígido assim que as palavras saem da boca de
Lance.
Espera, eu escutei isso certo mesmo? O cara simplesmente acabou
de me pedir em casamento?
Me afasto de seu corpo, confusa.
— Você não pode estar falando sério.
— Eu estou, Sam. Quero me casar com você.
Seguro a vontade de chorar. De chorar e de gritar ao mesmo tempo,
tudo isso enquanto arranco meus cabelos.
E não é exagero.
Será que é normal o corpo humano passar por tantas emoções em
um dia só? Porque Lance está me fazendo viver uma verdadeira montanha-
russa.
Eu estou grávida de Lance Moreau. E ele acabou de me pedir em
casamento.
Como pode algo que já foi um sonho se tornar um pesadelo em
poucos segundos?
— Lance, não. Isso não está certo.
Ele bufa.
— Talvez nunca existisse um momento certo, Sam. Tudo o que
temos é o agora. Além do mais, todo mundo acha que já estamos noivos. A
sua família te ligou a semana inteira para saber os detalhes, não é?
Por esse lado... Ele tem razão. Seria mesmo um choque tão grande
eu adicionar um bebê à equação? Minha família já está esperando por um
casamento a qualquer momento, de qualquer forma.
— Posso pelo menos pensar a respeito?
Ele assente.
— Pode. Estarei aqui pelo tempo que precisar.
— Meu Deus. Será que você pode parar de ser perfeitinho pelo
menos uma vez?
— Não consigo, Sam. Ser perfeito é mais forte do que eu. — O
idiota abaixa a cabeça, fingindo uma expressão cansada. — Eu tento ser
básico e meio blasé, mas é impossível. Sou incrível demais pra isso.
— E voltamos com o velho Lance.
— Pode apostar. E só para você saber, também espero ver a velha
Sam. Podemos fazer isso. Se você quiser, é claro.
— O casamento ou o bebê?
— Os dois.
Mordo o lábio inferior. Em seguida, desvio o olhar do seu. Lance
busca meu rosto e até chega a segurar meu queixo com a ponta dos dedos,
mas desvio na mesma hora.
Ele franze o cenho, confuso.
— O que foi?
— Lance... Tem muita coisa que você não sabe sobre mim. Muita
coisa mesmo.
— Não me importo, Sam. Mas espera... — Ele semicerra os olhos.
— Você não matou ninguém, matou?
Encolho os ombros, forçando a minha melhor expressão culpada.
Lance dá um pulo para fora da cama na mesma hora, horrorizado.
— Puta merda, Samantha. Você matou alguém?! Quando, onde,
como?! Espera, não me conta! Se você não foi presa, podem me chamar
para prestar depoimento. Olha, tenho ótimos advogados. Vamos conseguir
te tirar dessa e...
Sem conseguir aguentar mais, jogo a cabeça para trás, gargalhando
com vontade.
Chego a levar um susto com a potência da minha risada.
— Você está mesmo disposto a me livrar de um crime?
Lance me encara com uma expressão óbvia.
— É claro que sim. Você é a mãe do meu filho.
Mãe do meu filho.
Mãe do meu filho.
Mãe do meu filho.
Meu Deus do céu. Eu vou ser uma mãe. Como eu vou ser uma mãe?
— Isso se você quiser ser, claro — se apressa em dizer, acanhado.
— Estou aqui para o que der e vier.
Lanço um olhar complacente na direção de Lance. Não poderia estar
nessa com uma pessoa melhor. Tenho certeza disso.
Mas antes...
— Precisamos conversar — digo, amuada. — Tenho segredos,
Lance.
Ele me lança um olhar como quem diz “ah, jura?”, e eu me retraio.
Em seguida, me puxa para mais um abraço. É inevitável o sentimento de
medo, mas por alguma razão, estar perto de Lance me anestesia. A minha
mente simplesmente desligou.
— Conversar sobre o nosso futuro ou sobre o nosso passado?
Suspiro.
— É complicado.
— Isso é bem óbvio, Sam. Se eu quero saber o motivo de você ter
fugido há dois anos e continuar fugindo ainda hoje? É claro que sim. Mas
não acho que seja uma prioridade nesse momento.
— Na verdade, é sim. Existe um motivo para não ficarmos juntos.
Ele trava o maxilar. Na verdade, a expressão de Lance está mais
para receosa do que qualquer outra coisa. Se aproxima de mim devagar,
segurando meu queixo com a ponta dos dedos.
Sempre amo quando ele faz isso.
— Você não precisa me contar nada.
Mas a verdade é que eu precisava, sim.
Reunindo toda a coragem que eu já não possuo mais, viro o rosto
para encará-lo. Lance franze o cenho ao ver a minha expressão.
— Você me perguntou se eu estou noiva.
— Sim…
— Por que quis saber isso?
Ele simplesmente deu de ombros.
— Vi o comentário de um garoto chamado Oliver. Ele dizia que
você “é a noiva mais linda de todas”. — Desenha aspas no ar com uma
expressão de repulsa. — Mas eu te conheço, Sam. Você não teria ido pra
cama comigo se estivesse comprometida. Esquece o que eu falei.
— Lance, essa é a questão. Eu fui sim pra cama com você estando
comprometida — respondo, atropelando suas palavras. — Preciso te contar
tudo.
Ele dá um passo para trás, desorientado. Parece que acabei de atingi-
lo com um soco potente.
— Samantha…
— Não sou traidora. Não traí ninguém. Tecnicamente — explico,
sem graça. — Eu tinha uma amiga. Uma melhor amiga. O nome dela era
Emma.
— Tudo bem.
— Emma e eu vivíamos grudadas. Não conseguíamos fazer nada
sem a companhia uma da outra. Costumava pensar nela como a minha
versão boazinha. Enquanto eu gostava de ir para festas e beijar garotos,
tudo o que ela queria era ficar presa naquele quarto com o rosto enfiado em
livros. O que chega a ser irônico, porque o sonho dela era ser médica,
enquanto o meu, jornalista. Crescemos juntas, éramos inseparáveis. Até
entrarmos para o ensino médio. — Encolho os ombros. — Meu irmão mais
velho era popular, e eu consequentemente acabei me tornando também.
Scott tinha um magnetismo difícil de explicar. Enquanto isso, os irmãos
mais velhos de Emma, nem tanto. Oliver era até legal, mas o Oscar… —
Estremeço. — Ele costumava implicar com o que considerava “mais fraco”.
Começou a pegar no meu pé desde o primeiro dia. Costumava usar
expressões extremamente ofensivas para dizer que eu não prestava por
beber nas festas e beijar garotos. Sempre dizia para Emma o quanto eu era
uma péssima influência, uma garota baixa. Scott ficou louco quando
descobriu. Ele e Oscar costumavam se hostilizar em público, uma situação
péssima. Meu avô quis se meter, claro. — Rio pelo nariz, perdida em
pensamentos. — Aquela situação foi virando uma bola de neve, mas
tentávamos seguir em frente. Isso até uma coisa mudar tudo. — Respiro
fundo. — Emma estava mesmo a fim de um cara do time de basquete. Eu
não fazia ideia de quem era, ela não costumava me confidenciar segredos
assim. Esse garoto e eu ficávamos sempre que estávamos em uma festa. Era
algo tão recorrente que eu me assustei quando ela apareceu, aos prantos, me
mostrando uma foto nossa aos beijos. Gritou comigo e perguntou porque eu
tinha feito aquilo. Eu estava confusa pra caramba. Me desculpei, e depois
me ofereci para arranjar um encontro para os dois se ela quisesse. Ela… Me
xingou das mesmas coisas que via o seu irmão mais velho me chamar. Foi
difícil ouvir todas as minhas inseguranças despejadas da pessoa que eu mais
confiava.
Lance ameniza sua expressão. Seus dedos fazem uma carícia suave
sobre a pele da minha coxa, e eu abro um sorriso em agradecimento.
— O que aconteceu depois?
Dou de ombros.
— Nós paramos de nos falar. Ela começou a me ignorar na escola, e
eu estava magoada demais para tentar me reconciliar com ela. Parei de ficar
com o garoto imediatamente, claro. Mas por dentro eu me perguntava se eu
era mesmo tudo o que diziam que eu era. — Minha voz fica mais grave,
rouca. — Poucos meses depois, ela sofreu um acidente de carro. Estava
bêbada e não prestou atenção em um sinal vermelho no meio de um
cruzamento. Não teve chances. — Uma lágrima solitária começa a escorrer
pela minha bochecha, mas eu a limpo rapidamente. — Oscar e Oliver
ficaram inconsoláveis. Eu fiquei arrasada. Todos nós não conseguimos
entender o motivo daquela tragédia ter acontecido. Mas Oscar, como
sempre, deu um jeito de tentar me culpar. Ele disse para todos que o motivo
de Emma estar bebendo era eu. Eu tinha sido o motivo dela entrar naquele
carro completamente alterada.
— Você não teve culpa, Sam. Por favor, me diga que você sabe
disso.
Dou de ombros novamente, abraçando meus joelhos.
— Acho que me convenci por um tempo que eu tinha, sim,
responsabilidade naquilo. Mesmo que Emma não tivesse me contado sobre
a sua paixão, eu deveria ter percebido os olhares furtivos que lançava
sempre que o time de basquete entrava no refeitório. Eu deveria ter
adivinhado. Amigas boas fazem isso, certo?
Lance balança a cabeça sem parar, em choque.
— Meu Deus, Sam. Você não pode estar falando sério.
— Foi mesmo muito complicado entender que eu não tinha culpa
naquilo. Meu avô garantiu que eu fosse a todas as sessões de terapia, e foi
isso que me manteve em pé. Isso e… Oliver. Ele discordava do irmão. Dizia
que eu não tinha culpa nenhuma. Nós dois estávamos sempre juntos depois
disso. Era bom conversar com alguém que me entendia. A dor do luto é
específica demais. Dói demais. É difícil demais, Lance. Conversar com
alguém que não vai te encarar com uma expressão de pena e querer detalhes
do que aconteceu é extremamente importante. Em algum momento durante
a nossa recente amizade, Oliver confessou que sempre foi a fim de mim.
Acho que nos consolamos naquela época. A minha família achou estranho,
mas não interferiu. A família dele, por outro lado… — Inclino a cabeça,
sem jeito. — Eles me odiavam. Odiavam Scott. Odiavam toda a minha
família. Achavam que nossos pais não colocavam limites na gente.
Costumavam falar mal de tudo que fazíamos.
— Por que não estou surpreso?
— É. Não eram pessoas tão fáceis de lidar — suspiro. — Mas
Oliver e eu estávamos conseguindo cuidar de tudo. Nunca assumimos um
namoro. Não era esse tipo de relacionamento que tínhamos. Costumava sair
com outros garotos, ele também tinha encontros com outras meninas. Não
era nada sério. Até o último ano do ensino médio. Ele me pediu em
casamento na noite do baile.
— Ah.
— É. Ah — brinco, embora a expressão de Lance esteja mais dura
agora. Ele é tão ciumento. — Eu aceitei. Nem sei porque fiz isso. Gostava
tanto de Oliver e era tão jovem que pensei “ah, por que não?”. Acho que, no
fim, pensava estar agradando Emma, mesmo que à distância. Costumava
imaginar ela feliz por eu estar ajudando seu irmão. Cuidando dele. Não sei,
era a forma que eu tinha encontrado para me desculpar. Mas um dia antes
de irmos para a faculdade, conversamos. Decidimos que tínhamos que viver
intensamente os anos universitários. Era melhor do que ficar morrendo de
ciúmes à distância e deixar tudo deteriorar.
Os olhos de Lance escurecem. Uma nuvem sombria repassa seu
rosto, e isso me freia. Engulo em seco algumas vezes antes de tomar
coragem para continuar contando sobre tudo.
— Conhecer você no meu primeiro dia não estava nos meus planos,
mas aconteceu. Acho que me apaixonei por você desde aquele primeiro dia.
Ver você enfrentando os garotos da fraternidade, andando com o peito
estufado. Não sei. Achei você hipnotizante — explico. — Nosso
relacionamento nos primeiros anos nem chegava a ser casual. Ficávamos
em festas, mas também tínhamos outras pessoas. Era confortável pra mim.
Não muito diferente do acordo que eu tinha com Oliver, de qualquer
maneira. — Encolho os ombros. — Mas então… Começamos a ser
exclusivos.
— Pra mim, você era a minha namorada, Sam. Não só “exclusivos”.
— Desenha aspas no ar, irritado.
— Eu sei. Errei muito com você, Lance. Mas como não houve um
pedido oficial, gostava de pensar que, apesar de monogâmicos, não
tínhamos nada sério. Pra mim, nosso relacionamento tinha uma data de
validade.
Ele balança a cabeça.
— Eu devia ter desconfiado. Você sempre fugia de mim quando eu
falava sobre o nosso futuro depois da universidade.
— Não queria te magoar. Gostava do que tínhamos e sabia que você
iria me arruinar para todos os outros garotos. Sabia que não voltaria inteira
para Oliver, porque tinha dado uma parte minha para você que jamais
conseguiria recuperar de novo.
Lance engole em seco, inconformado.
— Então por que voltou pra ele, Samantha? Por quê?
Dou de ombros novamente. Acho que esse é o único movimento
seguro que estou disposta a fazer hoje.
— Liguei para Oliver disposta a terminar tudo. Mas algo na voz
dele… Não sei explicar. Ele estava tão feliz. Fez planos para nós. Alugou
um apartamento. Estava procurando emprego em Los Angeles porque sabia
que eu tinha conseguido um emprego na minha agência dos sonhos. Parecia
errado jogar tudo para o alto quando ele já estava tão entregue. — Meus
olhos se enchem de lágrimas ao ver a expressão no rosto de Lance. Ele está
devastado. — Era mais fácil deixar você ir. Sabia que seu futuro seria
brilhante. Nunca tive dúvidas disso, Lance. E estou falando sério.
Costumava pensar que você lembraria de mim com carinho um dia. Que
nossos filhos poderiam ser amigos. Essas coisas.
— Samantha, eu nem sei o que dizer.
— Eu sei.
— E você ainda está com Oliver?
Por um momento, me sinto extremamente ofendida por ele pensar
que eu estaria grávida dele agora caso ainda estivesse comprometida. Mas,
não tiro a sua razão. De certa forma, eu o enganei.
Balanço a cabeça.
— Não. Terminei com ele há seis meses.
— Puta que pariu.
— Eu sei. Não tem muito tempo. — Abro um sorriso fraco. — Meu
avô ficou doente, e acabei percebendo a merda de pessoa que eu tinha ao
meu lado. Costumava pensar que Oliver era o irmão diferente. O cara que
salvava aquela família disfuncional. — Solto uma risada sem humor. — A
única pessoa que prestava ali era Emma, e minha amiga tinha partido.
Demorou bastante para eu entender isso de uma vez por todas.
— O que ele fez?
— Foi burro o bastante para deixar o celular desbloqueado. Li
conversas dele com Oscar. Li coisas dele com a Emma. — Pisco os olhos
rapidamente para segurar as lágrimas. — Foi ele que tirou a foto, Lance. De
mim com o garoto de basquete. Ele mandou para a própria irmã mesmo
sabendo o quanto isso iria deixá-la irritada. Oliver se fazia de bonzinho,
mas me chamava de coisas piores pelas costas. Mentia para os amigos.
Dizia que eu deixava ele me filmar nos nossos momentos íntimos. Nunca
senti tanto nojo na minha vida ao ler ele contando detalhes do que
supostamente fazia comigo durante o sexo para os amigos da faculdade
dele.
— Que filho da puta.
— É, mas essa nem é a pior parte.
Lance arqueia a sobrancelha.
— Não vejo como isso poderia ficar pior.
Prendo a respiração por alguns segundos.
— Oliver também teve um caso especial na universidade. Ele
engravidou uma garota. A criança já tem praticamente cinco anos. —
Sorrio. — Fui muito burra para ser enganada tantas vezes. Mas depois que
eu descobri, fiz o que sei fazer de melhor.
— Que é…?
— Eu fugi, Lance. Um dia antes do nosso casamento. E nunca mais
olhei para trás.
Se eu pudesse, então eu iria
Iria aonde quer que você fosse
Lá em cima ou lá embaixo
Wherever You Will Go | The Calling

Samantha fugiu um dia antes do seu casamento.


Porra.
Definitivamente não deveríamos ter tido essa conversa antes de um
jogo tão importante. Não vou conseguir me concentrar em mais nada.
— Você fugiu?
— Sim.
— E ele ao menos sabe o motivo de você ter fugido? — questiono,
tropeçando nas palavras.
Ela simplesmente dá de ombros.
Ela. Dá. De. Ombros.
Caralho! A garota nem se dá ao trabalho de se explicar. Ainda bem
que eu amo essa mulher ou já estaria bufando e virando as costas nesse
exato momento.
— Acredito que ele tenha adivinhado. Deixei um bilhete.
— Um bilhete? Depois de tudo que esse canalha fez, o que ele
recebeu como vingança foi um bilhete?
Os olhos dela brilham com diversão quando ergue o queixo perfeito
na minha direção.
— Também mandei um link para todos os convidados. Queria que
eles soubessem a verdade antes de Oliver decidir contar a sua versão. Todos
os vídeos, fotos e conversas que encontrei foram anexadas no e-mail. Tenho
quase certeza que cometi um crime, mas a sede de vingança foi bem maior.
Sorrindo, estendo a minha mão na direção dela. Sam não consegue
se segurar e bate na minha. Depois do nosso toque, eu a puxo para um
abraço novamente.
Ela suspira em meus braços.
— Estamos ferrados, Lance. O que vai ser da gente?
— Por mim, a gente se casava de uma vez. Já te disse isso.
— Casamento não resolve todos os problemas. E eu ainda trabalho
para você, tecnicamente.
— E quem disse que você não continuaria trabalhando pra mim? A
diferença é que seus interesses seriam outros. Porque a preocupação maior
seria manter o seu maridinho bem na fita.
— Vou fingir que não escutei isso.
— Claro que vai — zombo, dando um beijo em sua testa. — Queria
poder ficar com você hoje. Temos muitas coisas para pensar.
— Eu sei. Mas você precisa entrar naquele campo hoje e dar o
melhor de si, Lance. Não só por você… Mas pela gente.
Meu coração acelera. De repente, minhas mãos estão suando frio e
eu sinto o meu pescoço amolecer. Ela disse “pela gente”, não disse? Ou é
isso, ou estou ficando louco.
Com cuidado, me afasto um pouco de Samantha.
— Isso significa que você vai ter o bebê? — pergunto, cauteloso.
Ela parece receosa. São poucos segundos que poderiam passar a
minha existência inteira.
Sam lambe o lábio inferior. Seus olhos castanhos encontram os
meus mais uma vez, e então ela faz um meneio de cabeça.
— Sim. Vou manter a gravidez — diz, como quem não quer nada.
— Talvez meu avô consiga conhecê-lo. Pelo menos um bisneto antes de…
— Sua voz falha, e isso parte o meu coração.
Embora eu esteja pulando de alegria por saber que vamos mesmo ter
um filho juntos, não consigo parar de pensar que se for pelo motivo errado,
pode nos custar muito.
— Sam, você sabe que não precisa fazer isso, não sabe? Seu avô não
pediria isso para você.
Ela suspira.
— Eu sei. Mas… É o que eu quero. Pelo menos por enquanto.
Assinto lentamente com a cabeça.
Minha mente começa a trabalhar furiosamente para repassar todas as
coisas que vamos ter que preparar agora. Tenho um apartamento grande em
Austin, mas o melhor será vendê-lo e comprar uma casa enorme. Quero que
o nosso filho possa correr no quintal, convidar os amiguinhos para a piscina
e, principalmente, quero providenciar um quarto vasto com direito a todos
os brinquedos que eu sonhava em ter enquanto crescia.
Samantha vai poder ter seu próprio escritório, e eu posso construir
uma academia particular em casa.
Vai dar certo.
Tem que dar certo
.

O jogo está muito acirrado.


Tennessee é o nosso maior rival. Sendo assim, é claro que toda a
mídia esportiva está cobrindo cada porra de passo que damos. A
arquibancada está eufórica, ninguém quer desgrudar os olhos do que está
acontecendo nesse campo.
Estamos empatados. E faltam poucos segundos para anunciarem o
fim da partida, o que faz a minha espinha gelar.
Estou jogando bem essa noite. Charles, nosso Linebacker, está
conseguindo segurar as pontas. Andou bebendo mais do que podia no
último final de semana, mas graças aos céus não tem afetado o seu
desempenho.
Hoje também é um jogo decisivo para ele.
— Merda. Precisamos de um ponto extra — nosso quarterback diz,
concentrado, quando nos organizamos para a última jogada.
Nesse ponto do jogo, quando a sua mente está tão concentrada e
sedenta pela vitória, é meio difícil raciocinar. Nossos rostos estão pingando
de suor por baixo do capacete, as respirações rarefeitas.
Adrenalina criptando à nossa volta.
E tudo o que importa é aquele maldito relógio no telão. Porque, a
depender da vitória desse jogo, posso ser negociado. Talvez não chegue a
ganhar nem um terço do que estou recebendo agora.
Vou ser pai. Não posso colocar tudo a perder agora.
Nós estamos no ataque desta vez. O quarterback do time, Michael,
me puxa pelo colarinho ao gritar:
— Vou lançar pra você nessa próxima jogada.
Assinto rapidamente com a cabeça, enquanto ele continua
distribuindo funções para os outros caras do time. Todos estão concentrados
em suas palavras, a animosidade está crescendo.
Odeio quando o jogo se arrasta tão apertado assim. Tudo pode
mudar a qualquer segundo.
— Vamos ganhar essa porra! — berra Charles, os olhos faiscando de
ódio.
Escutei algumas provocações que os caras do time rival gritaram
para ele no campo. Eu mesmo já teria sido expulso do time se tivesse
cabeça quente.
Ter uma mente forte na partida também é o que compõe um bom
atleta. Se deixar levar por provocações é inadmissível.
Quando o árbitro autoriza a jogada, faço uma prece baixinho. Não
sou religioso, mas estou aceitando qualquer tipo de sorte extra essa noite.
Michael me lança mais um olhar. Não faço nenhum movimento para
não ficar na cara, mas continuo encarando-o, determinado.
O Cornerback do Tennessee responsável por me cobrir nesse jogo
recomeça com os xingamentos. Ele está fazendo de tudo para me tirar do
sério.
— Vou comer aquela sua noivinha hoje à noite. Ela vai gostar de ter
um pau para montar que não seja de um perdedor — provoca, me
encarando com desprezo.
Preciso fechar os olhos e respirar fundo. Meu sangue ferve com a
menção à Samantha, ainda mais por saber que ela agora está grávida.
Definitivamente não vou dar o gostinho para esse babaca perceber que está
obtendo algum tipo de vitória.
— Vamos ver quem será o perdedor essa noite, Stevens — devolvo,
seco.
Ele não continua falando muito depois disso.
Quando inicia a partida, começo a correr. Tento desligar a mente de
tudo que não seja esse campo.
Stevens continua ao meu lado, a poucos centímetros de mim. Ele me
empurra, disputando espaço. Viro o rosto, ansioso para encontrar Michael,
que protege a bola com tudo o que tem.
Ele arremessa na minha direção, e eu pulo para pegar a bola.
Stevens também.
Ele é tão alto quanto eu, e por poucos segundos seus dedos não
tocam na bola. Quando a intercepto, protejo-a sob o braço, me virando para
correr o máximo que posso.
A arquibancada está gritando. Todos estão completamente
ensandecidos e eu quase consigo escutar a narração dos comentaristas
esportivos na minha mente.
Consigo avançar quatro jardas.
Sinto um puxão no uniforme, uma cotovelada nas costelas, um
empurrão nada sutil sobre o ombro. Me remexo, usando a pouca brecha de
espaço para conseguir avançar mais duas jardas.
Já foram seis.
Quando estou alcançando as dez, escuto um rosnado frustrado ao
meu lado. Stevens deve estar pensando em todas as maneiras de acabar
comigo.
Ele então se joga contra mim, pronto para me derrubar. Azar o dele
é que eu percebi rápido o suficiente. Quando meu adversário cai no chão,
percebo que o jogador que tentava me interceptar ao seu lado está a poucos
centímetros atrás do corpo caído no gramado.
E então eu corro.
Corro como nunca corri na vida.
Corro pensando em como todo o meu futuro pode estar sendo
definido por esse momento.
E quando chego à EndZone do Tennessee, grito.
O grito mais libertador da minha vida.
Estou de volta, porra.

Vencemos por quatro pontos no total. O campo já foi invadido por


jornalistas e fotógrafos prontos para tirarem uma casquinha da nossa vitória
histórica. É muito raro vencermos nosso maior time adversário assim.
— Lance, pode nos conceder uma entrevista rápida?
— Lance, como se sente ao saber que foi o responsável pelo
touchdown definitivo da noite?
— Moreau, acha que ainda existe a possibilidade de negociação
depois dessa vitória incrível?
Eles enfiam microfones na minha cara, sedentos por qualquer
resposta. Mas eu ignoro todos, porque hoje sou um homem em uma missão.
Samantha não estava tão a fim de vir ao jogo, mas eu a convenci.
Fui bastante persuasivo e ofereci muito chocolate para que ela viesse. Disse
que não gostava da ideia de deixá-la sozinha na nossa suíte enquanto eu
jogava — o que não deixa de ser uma verdade —, mas eu também tinha
outros planos.
Quando ela me vê caminhando em sua direção, arregala os olhos.
Abro um sorriso convencido.
Ela balança a cabeça, incrédula.
Os torcedores vibram. Sinto mãos me agarrarem pelos ombros, meu
uniforme é puxado tantas vezes que aposto as minhas bolas de que alguns
pedaços estão faltando.
— Lance! Você está maluco? — questiona Sam, embora esteja
abrindo um sorriso fofo.
Esse sorriso. Tudo o que tenho feito nessas últimas semanas, nesse
último mês, foi por causa desse sorriso.
— Ganhei, Sam. Ganhei por vocês — respondo baixinho.
Espero que ninguém tenha escutado isso, caso contrário, é mais uma
coisa para sair nas manchetes no dia seguinte.
Os olhos de Samantha se enchem de lágrimas. Ela balança a cabeça
várias vezes, sem conseguir acreditar. Em seguida, segura meu rosto com as
mãos, carinhosa.
O muro da arquibancada ainda nos divide, e embora eu sinta todos
os olhares voltados para nós, não estou dando a mínima. Preciso que ela
saiba que agora é a coisa mais importante da minha vida.
— Você é incrível, Lance. Eu sempre soube que o seu futuro seria
brilhante — diz, com os olhos brilhando. — Estou feliz pra caramba.
Sorrio.
— Também estou feliz. Acho que eu não sabia o que era isso de
verdade até você voltar para a minha vida. E não estou mentindo, Sam. Não
sou o mesmo sem você. Não consigo ser o mesmo Lance. Essa parte só
volta à vida quando você está por perto — disparo, me atropelando com as
palavras.
A adrenalina do jogo ainda está bem viva na minha mente.
E antes que eu possa esperar por uma resposta, Sam solta um
grunhido. Depois, puxa meu rosto na direção do seu, me roubando um beijo
que me faz sorrir contra seus lábios.
Agarro sua nuca, maravilhado por poder sentir seu gosto novamente.
Escuto os cliques das câmeras desesperadas ao nosso redor, mas não
dou a mínima. Tudo o que importa para mim é a mulher que estou
segurando em meus braços.
E vou fazer de tudo para mantê-la aqui.
Um tiro no coração
E você é a culpada
Querida, você dá ao amor uma má fama
You Give Love a Bad Name | Bon Jovi

Talvez seja muito cedo para culpar os hormônios da gravidez por


isso, mas a verdade é que estou praticamente subindo pelas paredes de tanto
tesão. Posso dizer que a visão de Lance vindo diretamente na minha direção
quando fez aquele touchdown com certeza ajudou.
Estamos no elevador quando começo a atacar o seu pescoço.
Afundo meu rosto em sua pele, chupando um ponto específico, me
embriagando com seu cheiro. Ele tomou banho no vestiário antes de me
enfiar na sua minivan e nos trazer de volta para o hotel. A fragrância do
sabonete também está me deixando louca.
— Calma aí — brinca ele, agarrando meu quadril com força. —
Estamos quase no quarto. Não quer dar um show para a camareira, quer?
Racionalmente, eu sei que ele tem razão. A última coisa de que
estamos precisando agora é de mais escândalo. Ainda assim, não consigo
deixar minhas mãos longe de Lance.
Nós entramos na suíte em uma mistura de mãos, línguas, dedos,
toques. Sua boca desce suavemente pelo meu pescoço, e quando ele se
aproxima da minha orelha para dar uma mordida, me arrepio inteira.
Lance me pressiona contra a primeira parede que encontra. Estou
usando uma calça jeans e um cropped que deixa bastante da minha barriga
de fora, então é justamente onde ele decide atacar.
Ele lambe o meu abdômen enquanto desabotoa a minha calça
rapidamente. Solto um grunhido, impaciente, quando ele desce a peça de
roupa devagar. Com ele é sempre assim.
— Pode parecer um pouco louco, mas saber que você está
esperando um filho meu está me deixando ainda mais fascinado por você —
diz, sem ressalvas. — Amo saber que vai ter um pedaço nosso correndo por
aí.
Mordo meu lábio inferior.
— Você não vai mais conseguir se livrar de mim, Lance Moreau —
digo, sorrindo.
— É a melhor notícia do dia, porra.
Lance enfia o rosto entre as minhas pernas, o que me faz perder o
equilíbrio. Ele chupa meu clitóris por cima da calcinha, e eu preciso segurar
o grito alojado na minha garganta. Quando ele raspa os calos dos dedos
sobre as minhas coxas, eu as abro ainda mais.
Sem cerimônia, Lance arranca o pedaço de pano que eu costumava
chamar de calcinha e joga os pedaços restantes no chão. Sua língua começa
a passear pela minha boceta, lambendo e chupando com vontade. Gemendo,
eu levanto uma das pernas para apoiar meu tornozelo em suas costas.
Lance me segura quando começo a inclinar as costas para trás.
Somos uma bagunça de gemidos, suspiros e risadinhas, tudo misturado.
Quando ele raspa os dentes suavemente sobre a minha pele, grunho.
— Você está molhada pra caralho pra mim, Sam.
Ele nem espera chegarmos ao quarto. Arranca o cinto de uma vez,
deixando o pau duro balançar livre. Quando se aproxima de mim, lambo os
lábios. É uma visão e tanto, e já aceitei o fato de que jamais vou me
acostumar com isso.
— Admite, nenhum outro homem faz você gozar do mesmo jeito
que eu.
Inclino a cabeça para o lado, completamente excitada. Minha pele
com certeza está vermelha, já que meu pulso começou a disparar.
— Só se você admitir que nenhuma outra mulher te deixou tão
louco assim — rebato, provocando.
Lance agarra minha cabeça com ambas as mãos, dando uma
mordida na base do meu pescoço. Seguro seus cachos escuros com força,
pegando impulso para passar minhas pernas ao redor da sua cintura.
— Isso não é nenhuma surpresa, Samantha. Isso é um fato — é a
última coisa que ele diz antes de entrar em mim de uma vez.
Pisco, vendo estrelas. Posso estar ficando ainda mais sensível por
causa da gravidez, mas, minha nossa. É impressão minha ou o sexo com
Lance está ficando cada vez mais gostoso? Ele tem uma confiança que
deixa qualquer mulher louquinha.
Suas estocadas começam lentas, quase demais, para falar a verdade.
Ele enfia a língua quente na minha boca, engolindo meus gemidos enquanto
me come com carinho. Estou amando sentir seu corpo imenso contra o meu.
Ainda estou usando o cropped, ele permanece com a blusa do time. Por
algum motivo, isso só torna o momento ainda mais sensual.
Estávamos com tanta pressa que nem nos preocupamos com as
roupas, caramba.
— Como você pode ficar cada vez mais gostosa?
— Eu estava me perguntando isso — respondo, em meio a um
suspiro.
Mordo o lábio para evitar que um grito esganiçado escape. Lance
agora está inteiro dentro de mim, indo tão fundo que faz os dedos do meu
pé se retorcerem com a sensação. Finco minhas unhas em sua nuca, tão
perdida em pensamentos que a única coisa que consigo fazer é murmurar
seu nome sem parar, como se fosse uma prece.
— Nunca mais quero sair de dentro de você — suspira entredentes.
Faço um barulho de confirmação, começando a arquear os quadris
para encontrar suas estocadas. Minhas unhas arranham suas costas, e eu me
perco na sensação deliciosa que é sentir Lance entrando e saindo de mim.
— Segura em mim com força — ele manda, e eu obedeço sem
pestanejar.
Lance espalma as mãos na minha bunda, agarrando a carne com
força antes de me desgrudar da parede. Estou completamente no ar, com ele
entrando e saindo sem parar. O atrito é tão bom que preciso morder seu
ombro para abafar meus gemidos.
— Porra… Que gostoso — geme ele, e meus olhos correm para as
costas largas, cujo reflexo consigo ver pela janela a nossa frente. Elas
flexionam conforme ele se impulsiona mais e mais para dentro de mim.
Lance desliza com facilidade e é uma delícia. Nós caímos no sofá,
uma bagunça de braços e pernas se encontrando, e suspiro na boca dele
quando sinto suas mãos entrando sorrateiramente para dentro da minha
blusa.
— Tira isso — pede ele, impaciente.
— Tira você, Moreau. Estou muito ocupada.
Ele arqueia a sobrancelha.
— Ah, é? Com o quê?
— Admirando a vista. Embora ela ficasse melhor sem toda essa
roupa — provoco, agarrando a barra da sua camiseta.
Ele me ajuda a puxá-la pela sua cabeça, se livrando daquela peça.
Eu faço o mesmo com o meu cropped, e quando estamos nos observando
nus, tenho uma ideia que me faz abrir um sorriso malicioso.
— Me passe o seu uniforme, Lance.
— Por quê?
— Apenas me passe.
Lance faz o que eu digo, e coloco a peça sobre o meu corpo nu. Seu
gemido me faz lançar um olhar vitorioso para ele.
— Porra, Sam. Olha só o que você está fazendo comigo. — Ele
aponta para o próprio pau, que está parecendo ficar mais duro a cada
segundo.
— Olha só o que você está fazendo comigo — devolvo, puxando a
mão dele para colocá-la entre as minhas pernas.
Ele solta um suspiro parecido com um grunhido ao sentir o quão
molhada estou. Começo a me esfregar ainda mais em suas mãos e, ai, meu
Deus, a sensação é tão deliciosa que eu perco o equilíbrio por alguns
segundos. Movimento meus quadris em um vai e vem lento, sem tirar os
olhos dele. Lance me encara com uma mistura de desejo e paixão, e quando
penso que isso não pode ficar ainda mais sensual, sinto seu polegar esfregar
meu clitóris devagar.
Amo fazer tudo devagar com ele. Experimentar cada sensação,
degustar o gosto de sua pele. Mesmo quando começamos apressados,
arrancando as partes de baixo um do outro sem nos preocupar com
preliminares, Lance sempre faz questão de voltar para esse ponto.
— Você vai gozar na minha mão, Sam? Como nos velhos tempos?
— me provoca, avançando sobre mim para dar uma mordida no meu
pescoço.
Agarro seu cabelo, adorando sentir seus dentes em minha pele.
Rebolo ainda mais em seus dedos, consciente demais da bagunça que estou
fazendo no sofá dessa suíte.
— Lance — suspiro, completamente entregue ao momento.
Ele desce a cabeça para alcançar meus seios, levantando o uniforme
do time o suficiente para abocanhá-los. Lance chupa, mordisca e continua
brincando com a língua quando eu aumento ainda mais a velocidade dos
meus quadris.
Solto um gritinho de prazer, completamente pega de surpresa por ele
enfiar um dedo em mim, depois, agarra meu rosto, puxando-me em sua
direção. Nossas bocas se encontram, desesperadas, e eu o beijo com tudo
que há em mim.
É delicioso sentir o meu orgasmo subir quando estou agarrando seus
ombros com tanta força. Ele continua murmurando o quanto eu sou gostosa
gozando em sua mão, enquanto eu jogo a cabeça para trás, completamente
absorta na sensação inebriante do orgasmo que acabou de me atingir.
Estou nocauteada. Completamente fora de órbita.
E a culpa é desse cara.
— Preciso que você me coma agora, Lance — digo, com a
expressão mais séria que consigo fazer.
Ele ri.
— O seu desejo é uma ordem.
Nem me preocupo em parecer sexy ou menos desesperada do que
estou. Sento sobre seu pau, gemendo com a sensação de ter Lance todo
dentro de mim novamente. Estou ainda mais molhada do que antes por
causa do orgasmo, então ele desliza com muita facilidade.
— Não consigo me cansar de você, linda. Acho que nunca vou
conseguir — murmura, meio trôpego, com os olhos nublados de desejo.
Passo minhas mãos ao redor da sua nuca, abraçando-o.
— Acho bom mesmo. Agora vamos ficar presos por um bom tempo
— brinco, embora essa realização seja um choque de realidade para mim
também.
Amanhã eu lido com os problemas, penso. Hoje não.
Lance segura meu queixo com suavidade, me dando um beijo
carinhoso.
— Vamos ficar presos para sempre, Sam. Acha mesmo que vou
deixar você sumir da minha vista agora que vamos ter um filho? — Arqueia
a sobrancelha, arremetendo para dentro de mim de uma vez. Suspiro, pega
de surpresa pela sensação maravilhosa. — Você vai casar comigo um dia.
— Mete outra vez, dessa vez me dando uma mordida no ombro. — Vai
levar nosso filho ao jogo e vão torcer por mim — completa, subindo o rosto
para me beijar no pescoço. Maldito. Ele sabe o quanto isso me deixa
completamente derretida. — Se você quiser, é claro. Vamos ser uma
família, Sam. Eu quero ter isso com você.
Mordo o lábio inferior.
Eu também quero ter uma família com Lance. Ainda não
conversamos sobre o meu avô, e não terminamos a conversa que tivemos
sobre Oliver. A minha vida sempre foi complicada, enquanto a dele… Fácil
demais. Me sinto a pior pessoa do mundo por agarrar a oportunidade de
poder viver como ele. Mas será que sou mesmo um monstro por escolher a
mim mesma uma única vez? Por escolher justamente o que eu quero?
Balançando a cabeça, eu apoio minhas mãos em seu peito largo,
empurrando-o contra o encosto do sofá.
Lance abre um sorriso arrogante.
— Pode ficar à vontade para me usar, Samantha.
E é exatamente isso que eu faço. Uso seu corpo de apoio para
cavalgá-lo, subindo e descendo o mais rápido que consigo. Ele joga a
cabeça para trás, revirando os olhos de prazer. Abro um sorriso convencido,
amando ouvir os suspiros de Lance.
Eu estou fodendo-o agora.
Eu.
Quando ele segura minha cintura com força, sei bem o que está por
vir. E não consigo impedir o sorriso malicioso quando vejo-o metendo em
mim, fincando os dedos na minha pele para conseguir o apoio. Por mais que
seja uma delícia vê-lo tão concentrado em me comer, não posso deixar que
ele faça o trabalho sozinho.
Continuo subindo e descendo sobre seu pau, usando a minha boca
para beijar e lamber cada centímetro de pele que Lance tem à mostra. Ele
grunhe sempre que eu jogo o cabelo para o lado, expondo a logo do seu
time na altura dos meus seios. Seu nome e o número “10” do seu uniforme
nas minhas costas também podem ser vistos através do reflexo da televisão
atrás de mim, e nunca agradeci tanto por termos escolhido essa suíte.
— Gostou de levar uma fã para casa hoje, senhor Moreau? —
sussurro baixinho, antes de morder o lóbulo de sua orelha.
— Adorei. Ela é bem safada, do jeitinho que eu gosto.
Quando Lance se inclina novamente para frente, atinge um ponto
específico dentro de mim que me faz arquejar, arqueando as costas para
trás. Suas mãos firmes agarram a minha bunda, me ajudando a continuar
cavalgando seu pau quando ondas de prazer começam a subir pela minha
espinha.
Porra. Que delícia.
Ele faz os barulhos mais sensuais quando continua metendo em
mim, revirando os olhos, murmurando o quanto eu sou a mulher mais linda
do mundo. E quando sinto o pau dele endurecer mais ainda dentro de mim,
suspiro. Lance usa os dedos habilidosos para masturbar meu clitóris,
arrancando um gritinho esganiçado de mim.
Quando o segundo orgasmo me atinge em cheio, sinto como se
pudesse derreter. Minhas pernas ficam com consistência de gelatina e ele só
continua, enfiando cada vez mais fundo, grunhindo baixinho na minha
orelha quando seu próprio prazer toma conta de seu corpo.
Lance e eu estamos à beira de um precipício, e nos jogamos de lá
sem medo. Sem receios. Sem a mínima vontade de dar um passo para trás,
onde é seguro.
Quando nossos olhares se encontram, tomados pelo desejo e a
paixão desenfreada que nos possuiu desde a primeira vez que nos vimos,
meu coração palpita.
E eu sinto. Sinto tudo o que eu vinha reprimindo a respeito dele nos
últimos anos. Cada sentimento, cada gota de saudade. Tudo volta de uma
vez só, me atingindo em cheio.
— Eu te amo, Sam — murmura ele, sem fôlego. Os lábios
pressionam a minha pele suada, e eu fecho os olhos, absorvendo suas
palavras. — Nunca deixei de te amar. Não teve um dia em que eu não
olhava a sua foto, morrendo de saudades. Não teve um segundo que você
significou menos pra mim. Estou feliz que você voltou pra minha vida,
Samuels.

Lance não me pressionou por uma resposta depois de confessar seus


sentimentos daquela maneira. Estou passando por um turbilhão de
sentimentos, sem saber exatamente o que fazer a partir de agora. Se eu
correspondo ao seu amor? Sim. Se eu estou disposta a enfiá-lo na bagunça
que é a minha vida?
Não sei dizer.
Mas fico grata quando Lance muda de assunto logo em seguida,
deixando o clima mais divertido e descontraído como antes. Nós
conversamos um pouco sobre filmes, depois ele me contou sobre o irmão e
a esposa no acampamento Frozen Lake no verão passado. Não consigo
segurar a risada quando ele me conta sobre o dia que meu irmão mais novo
soltou a Missy, sua cobra de estimação, no meio do lago. Logan e Calliope
estavam passeando de canoa e acabaram caindo na água de tanto desespero.
— É sério, Sam. Seu irmãozinho Seth é muito doido — diz ele,
balançando a cabeça. — Mas a sorte é que o meu irmão também não tem a
cabeça no lugar. Deve ser por isso que eles deram certinho.
Não posso concordar mais.
Continuamos nus, nos abraçando no sofá macio da suíte, quando
Lance escuta a minha barriga roncar. Assim que sugere cozinhar algo para
nós, eu arqueio a sobrancelha, curiosa.
— Cozinhar? Mas, pelo que eu me recordo, você não sabe nem
fritar um ovo.
Ele coloca a língua para fora.
— Modo de dizer, Sam. Vou pedir comida. O que você prefere?
Italiana, Tailandesa, Chinesa…?
— Italiana. Mas, na verdade, acho que eu mesma posso cozinhar. —
Arqueio a sobrancelha. — O que acha de eu fazer o macarrão da Zoe para
nós?
Olhos dele brilham de empolgação.
— Caramba, sim! Faz tanto tempo que eu não como. É a melhor
massa do mundo.
— É só manjericão. Você sabe, não é?
— Não é só manjericão. Tem toda uma mágica envolvendo esse
macarrão. Não assistiu o filme, não, Samantha?
Ergo as mãos em sinal de rendição, me divertindo à beça. Adoro
como Lance consegue me fazer sentir.
— Tudo bem, senhor “eu-não-como-macarrão-sem-manjericão” —
zombo, desenhando aspas no ar. Lance semicerra os olhos para mim. —
Você pode ir tomando um banho enquanto eu cozinho. O que acha?
Ele se inclina para roubar um beijo dos meus lábios.
— Parece bom pra mim. Depois podemos assistir algum filme
juntos, como nos velhos tempos.
— Fechado.
E, simples assim, a vida parece ganhar novos caminhos. Novas
possibilidades. Novas chances. Novo recomeço.
Lentamente, coloco a minha mão sobre a minha barriga lisa. Meu
Deus. Vou ter um bebê com Lance Moreau. Há apenas seis meses, eu estava
avaliando toda a minha vida, pensando se o meu futuro deveria mesmo ser
com Oliver, e, agora, estou prestes a entrar na loucura de criar uma criança
com um astro do futebol americano.
Balançando a cabeça, eu lavo as mãos. Mas antes mesmo de pegar a
massa para colocar na água fervendo, meu celular começa a tocar.
É Scott.
Ainda estou um pouco brava por descobrir seu envolvimento com
Oscar totalmente por acaso, então decido ignorar a ligação.
Estou picando cebolas para o molho de tomate caseiro quando meu
iPhone vibra novamente em cima da mesa.
Dessa vez, é Seth.
Franzo o cenho.
Isso é ruim.
Atendo na mesma hora, sentindo meu coração disparar feito louco.
— Seth, está tudo bem?
Silêncio. A única coisa que eu escuto é o fungar baixinho do outro
lado da linha, misturado com um soluço abafado.
Meus olhos enchem de lágrimas na mesma hora.
— Seth…
— Sam, você precisa voltar pra casa. Hoje.
— Aconteceu alguma coisa?
— É o vovô. — Sua voz treme mais uma vez, dessa vez com um
choramingo ao fundo. — Os médicos acham que ele não passa de amanhã,
Sam. Ele está partindo.
Não sei explicar o que acontece a seguir. Não sei dizer se o grito
desesperado que saiu da minha garganta foi real ou uma memória falsa. Só
sei que, de repente, Lance está na minha frente, segurando a toalha com
força ao redor dos quadris e me encarando com o olhar arregalado.
Ele arranca o celular das minhas mãos, extremamente preocupado.
E a partir daí, tudo é um borrão.
Ah, ah, quando eu era mais jovem
Eu, eu deveria ter sabido mais
E eu não consigo sentir nenhum remorso
Ophelia | The Lumineers

Conseguir um avião de última hora foi uma tarefa fácil.


A parte difícil foi conseguir colocar Samantha embaixo do chuveiro.
Difícil foi lavar seu cabelo, ouvindo seus soluços altos. Difícil foi sentir seu
corpo tremer quando eu coloquei uma roupa e disse que já tinha preparado
tudo para a nossa viagem.
Difícil foi vê-la se esforçando tanto para segurar as lágrimas.
Difícil foi ver seu mundo ruir.
— Não posso, Lance. — Balança a cabeça, completamente atônita.
— Não posso ir até lá. Não posso dizer adeus.
Respiro fundo. Ela está partindo o meu coração com cada palavra
que diz, e o meu desespero vem de justamente não conseguir fazer nada
para ajudá-la.
— Temos que ir, Sam. A sua família está nos esperando.
Quando peguei o celular de Samantha, escutei o choro baixinho de
seu irmão mais novo, Seth. Não entendo o motivo do irmão mais velho dela
não ter ligado para lhe dar essa notícia, mas assim que escutei a voz infantil
e trêmula murmurando um “alô?”, pedi para falar com Scott.
Ele me passou o próprio número de telefone para mantermos
contato e disse estar nos esperando no aeroporto. Pensei seriamente em
fretar um jato para fazermos isso da forma mais sigilosa possível, mas havia
um voo comercial daqui duas horas para San Diego, o que achei mais
viável. Quanto antes chegarmos lá, melhor.
Samantha não se impressiona com a primeira classe. Seus olhos
mostram uma frieza que eu jamais vi. Mesmo quando eu pensava que havia
feito algo para ela me odiar, mesmo quando tinha certeza de que ela estava
querendo que eu desaparecesse da sua frente, ela nunca esteve dessa forma.
Como se nem estivesse mais aqui. Como se estivesse deixando uma
parte de si para trás.
— Sam. — Cutuco-a com o cotovelo, logo depois do nosso avião
decolar. Ela estava tão aérea que nem conseguiu arrumar a própria mala. Só
peço ao universo por eu ter acertado em todas as escolhas. — Quer deitar?
Ela apenas balança a cabeça em negação.
Não consigo me imaginar em uma situação assim. Nem conheci os
meus avós, mas meus pais e meus irmãos são tudo para mim. São irritantes?
São. Eu tento evitá-los muitas vezes durante o ano? Com certeza. Mas
jamais me recuperaria se um deles me deixasse de forma tão trágica.
— Só quero ficar em silêncio, Lance. E pensar.
O voo dura pouco mais de três horas, e Sam não come nada. Tento
fazê-la engolir um pouco de água, mas até isso é feito com muita
dificuldade. Quando uma turbulência faz o avião tremer, me inclino para
abraçá-la, embora ela continue estática.
Imóvel.
Sem respirar.
Sem se mover.
— Seria uma grande ironia se morrêssemos aqui, não é? — disse,
tentando soar brincalhona.
Tentei não levar seu tom mórbido para o lado pessoal. Nem consigo
imaginar o quanto ela está sofrendo agora.
— Turbulência não derruba um avião, Sam. Pode ficar tranquila.
Ela simplesmente desviou o rosto para a janela do seu assento,
perdida em pensamentos. Daria tudo para que ela me deixasse entrar nem
que fosse um pouquinho, mas também sabia que não podia exigir isso dela.
Tudo ao seu tempo. E estarei aqui para quando ela decidir se abrir
para mim.

Scott está nos esperando assim que pousamos.


Samantha não quis descer do avião quando chegamos a San Diego,
mas eu a convenci. Algumas aeromoças me lançaram olhares animados,
provavelmente me reconhecendo. Não dei a mínima para as possíveis fotos
ou falatórios que poderiam surgir depois de hoje. Eu estava mais
preocupado em como manter Samantha inteira.
Seu irmão está com o rosto abatido. E, caramba, se eu achava que
Samantha estava mal, é porque não tinha visto-a interagir com a própria
família.
Assim que os olhos deles se cruzaram, algo aconteceu. Uma espécie
de conexão mágica que só acontece com quem está passando exatamente
pela mesma coisa que você. Um fio que os liga de maneira tão profunda que
palavras não são necessárias.
Eles caem no choro. De uma forma praticamente impossível de
descrever, Sam se joga nos braços do irmão. Ela soluça, os ombros
balançando violentamente.
De repente, sinais de alerta voam sobre mim. Ela está grávida. Todo
esse estresse pode acabar afetando o nosso bebê, não pode?
Me sinto na obrigação de tentar acalmá-la, mas me contenho. Vamos
conversar a respeito mais tarde. Por agora, vou continuar afastado e
observando a interação dos dois.
— Você não me atendeu, Sam — acusa Scott, magoado. — Ele…
Ele…
— Não queria falar com você.
Ele bufa, limpando o canto dos olhos. Não adianta muito, porque o
rosto está vermelho e totalmente molhado por causa das lágrimas já
derramadas.
— Seth te ligou antes mesmo que eu pudesse tentar. Disse pra eles
que talvez fosse melhor esperar a noite passar. Vimos o jogo ontem à noite
na televisão. — Seu olhar encontra o meu brevemente, e faço um aceno de
cabeça em agradecimento. — Achamos que seria bom você ter um
momento feliz antes de receber a notícia.
— O que aconteceu, Scott?
— Ele não está aguentando mais, Sam. Ele queria morrer em casa.
Não queria sequer fazer o tratamento. Lembra a última coisa que ele fez
quando descobriu sobre o câncer?
Samantha fecha os olhos, as lágrimas escorrendo copiosamente por
sua bochecha. Não consigo aguentar mais isso. Sem cerimônia, me
aproximo dela para envolvê-la em um abraço protetor.
Os olhos de Scott se arregalam para a cena, surpresos. Não faço
ideia do que eles provavelmente devem saber a respeito do nosso
relacionamento, mas agora não haverá mais dúvidas.
— Ele foi para o acampamento Frozen Lake e levou o Seth.
— Exatamente. Era isso que ele queria fazer, Sam. Aproveitar seus
últimos dias no acampamento que ele tanto ama, cercado do bem mais
precioso que ele construiu. Nós.
— E o que isso quer dizer?
— Ele estava sedado a maior parte do tempo. Tomando remédios
para dor que o derrubaram completamente, você se lembra muito bem de
como as coisas estavam indo…
— O. Que. Aconteceu. Scott? — repete ela pausadamente. O irmão
está com os ombros tensos, cansados.
Eles estão na casa dos vinte, com a vida inteira pela frente. Mas
olhando agora, parecem crianças carregando um peso enorme nas costas.
— Ele pediu para ir embora do hospital, Sam. Não quer mais fazer o
tratamento paliativo. Os médicos alertaram que ele provavelmente vai
sobreviver poucos dias.
— Mas a medicação…
— Não estava fazendo mais efeito, Sam. A quimio não funcionou.
Ele estava tomando remédios para dor apenas para aguentar seus últimos
dias. Você sabe que o vovô odiaria morrer numa cama de hospital.
— Você não tinha o direito de tirá-lo do hospital, Scott! Nenhum de
vocês tinha!
— Assim como não tínhamos o direito de vender o acampamento,
Sam? — rebate ele, amargo. — Tentamos segurar as pontas porque você
não estava conseguindo deixá-lo ir. Todos nós nos afundando em dívidas,
vendendo tudo o que não tínhamos para conseguir pagar o tratamento
hospitalar do vovô. E sabe de uma coisa? Ele está odiando tudo isso. É
nítido para qualquer um o quanto o incomoda saber que estamos indo para o
buraco por causa dessa doença maldita. Ela já está levando ele para longe
de nós. Não podemos deixá-la arruinar a nossa família também.
Samantha estremece em meus braços, mal conseguindo se sustentar
em pé. Abraço-a ainda mais apertado, vendo em seu rosto chocado o quanto
as palavras do irmão a magoaram.
Ela abre a boca, sem ar.
— Como você ousa dizer algo assim, Scott?! Como você pode falar
do vovô como se ele fosse um fardo?
O irmão dela fecha os olhos, inclinando o pescoço para trás para
respirar fundo. É nítido o quanto a exaustão está afetando a sua aparência.
— Escuta, Sam, não foi isso que eu quis dizer. Não é assim que eu
enxergo o vovô, mas é assim que ele se vê agora. E ele odeia. Falei isso
com você pelo telefone uma vez, lembra? Ele odiava saber que você estava
trabalhando em tempo integral para conseguir mais dinheiro só para manter
o acampamento. Ele ama aquele pedaço de terra mais do que tudo, só não
mais do que a gente. E saber que você estava desistindo de tudo, até mesmo
dos últimos dias de vida dele para trabalhar apenas porque você acha que
precisa resolver tudo, acabou com ele. Juro por Deus, Samantha, nunca vi o
vovô tão abalado. É por isso que ele decidiu por vontade própria ir embora
do hospital. Ele quer ir para o acampamento Frozen Lake passar o final de
semana, e quer toda a família junto. Será que tem como você fazer isso?
Sam abre a boca para responder, mas, na mesma hora, sinto seu
corpo pesar ainda mais em meus braços. Desesperado, eu passo meus
braços ao redor de suas pernas, carregando-a no colo.
— Que merda é essa, Sam? — grita Scott, desesperado.
Eu entendo que o cara está assustado e que ele é o irmão mais velho
dela, mas da próxima vez que aumentar o tom assim para a minha mulher,
teremos um grande problema.
— Você tem um carro aqui em algum lugar ou só quer fazer mais
perguntas? — disparo, irritado.
Nossos olhares se encontram. O dele está chocado, como se
parecesse surpreso por ter outra pessoa aqui. Acho que estava tão entretido
em discutir com a irmã que nem se deu conta de lembrar da minha
presença.
Atordoado, ele balança a cabeça, apontando para uma caminhonete
vermelha estacionada não muito longe da saída.
Corremos até lá, Scott já abrindo a porta de trás para eu entrar com
Samantha em meus braços.
Ela está desmaiada.
— Merda — resmunga Scott, antes de ligar o carro. — O que está
acontecendo com a minha irmã? Ela já desmaiou desse jeito antes?
Coloco a cabeça dela deitada sobre as minhas coxas, sentindo o
sabor amargo do desespero começar a se infiltrar lentamente sobre mim.
Vamos, Sam. Acorde. Diga que tudo está bem. Por favor. Por favor.
Por favor. Por favor.
— Lance!
— Eu não sei! Ela nunca desmaiou quando estava comigo, se é isso
que quer saber. Mas as coisas estão diferentes agora.
— Diferentes como?
— Eu acho que é melhor ela mesma dizer pra você.
— Diferentes como, porra?
— Só dirige esse carro para o hospital mais próximo que você
encontrar, Scott. Agora.
Ele grunhe alto o suficiente para me fazer estremecer.
— Diferentes. Como. Caralho? Minha irmã está doente? — O
desespero em seu tom de voz faz meu pulso disparar. — Juro por Deus, se
algo estiver acontecendo com ela e você não me contar…
— Ela está grávida, porra! Está no começo e a discussão de vocês
estressou ela demais. Samantha está mais sensível do que o normal.
E, de repente, um silêncio mortal reina no carro. Ele balbucia
palavras desconexas, mas eu não dou a mínima. Só consigo prestar atenção
no rosto pacífico de Sam, que continua desacordada.
Merda. Não vamos chegar nunca nesse hospital, inferno?
— Eu não sabia. Não teria ligado pra ela se eu soubesse — murmura
Scott, arrancando com o carro em um sinal vermelho. Uma grande
imprudência que vou deixar passar porque, bem, eu mesmo faria isso agora.
— Que merda, Sam. Por que você não me contou?
Scott continua se lamentando baixinho, e um monstro cheio de
satisfação começa a arranhar a superfície. Não é justo eu me intrometer em
uma relação de irmãos, mas não gostei da forma que ele falou com ela.
Ainda mais porque, se me lembro bem, Sam sempre fez de tudo por ele. A
primeira vez que competiu em um barril de cerveja foi porque queria ajudá-
lo a impressionar uns amigos.
Espero mesmo que ele se arrependa e se desculpe com a irmã mais
tarde.
Quando chegamos ao hospital, sequer espero Scott terminar de
estacionar. Pulo do carro ainda em movimento, escutando seus gritos de
protesto atrás de mim enquanto corro pelas portas que vão fazer tudo ficar
melhor.
Precisam fazer tudo ficar melhor.
— Trago boas notícias, pessoal. Samantha teve uma queda de
pressão, provavelmente por não ter se alimentado nas últimas horas. Ela e o
bebê estão bem, no entanto. Só precisam de um pouco de repouso e nada de
situações estressantes por agora. Tudo bem? Vamos mantê-la em
observação por algumas horas só por precaução, mas logo estará liberada
para ir pra casa.
Limpo a garganta, chamando atenção do médico simpático para
mim. Ele faz um aceno de cabeça na minha direção, me incentivando a
prosseguir.
— Podemos visitá-la agora?
— Ela está dormindo, na verdade. Mas assim que acordar uma das
enfermeiras vai chamá-los para entrar.
Faço um meneio de cabeça em sua direção, e então ele sai. Ninguém
diz mais nenhuma palavra.
O primeiro a quebrar o silêncio é Seth. Ele solta uma risada irônica,
bem diferente do que eu esperava.
— Seth… — repreende Scott, lançando um olhar afiado na direção
do caçula.
— O que foi? É engraçado, só isso. Ele pediu para a Sam não se
estressar, mas estamos no meio do drama mais fodido de todos.
— Olha a boca!
Ele apenas dá de ombros, revirando os olhos. Ah, as delícias da
adolescência. Vi meus pais passarem por isso quatro vezes, e não desejo
para ninguém.
Os pais de Samantha também estão presentes. A mãe está com uma
expressão abatida, completamente arrasada e abalada. Ela está perdendo o
pai para essa doença, e hoje passou por um susto com a filha do meio.
— Obrigada por ter vindo, Lance. Significa muito — diz ela,
abrindo um sorriso educado.
Tento retribuir o mesmo, mas com certeza sai mais forçado do que
eu planejei.
— Sua filha é muito importante pra mim.
Seth solta outra risada irônica.
— É bom mesmo que ela seja. Ou então você não teria engravidado
ela — dispara ele, sem papas na língua.
Quem disse que crianças são cruéis, não conhecia um pré-
adolescente passando por uma fase conturbada. Esses são piores que satã.
— Seth Samuels! — A voz grave de seu pai faz todos nós darmos
um pulo. — Isso não é jeito de falar com as pessoas!
Faço um sinal com a mão, dispensando a reprimenda. Ele não está
nem um pouco errado em defender a irmã. Deus sabe quantos pobres
coitados eu afugentei a vida inteira por causa de Lydia.
Um dia, fiquei sabendo que Dean Masterson estava espalhando por
aí que queria perder a virgindade com ela no último dia de aula. Eu sabia
muito bem que a minha irmã jamais olharia duas vezes para aquele babaca,
mas mesmo assim não podia deixar passar batido. Fui junto com os outros
caras do time até o armário dele e roubamos todas as roupas depois da aula
de educação física. Quando saiu de banho, apenas de toalha, apareci com
um megafone pedindo para ele repetir o que pretendia fazer com a minha
irmã. Posso ter sugerido que seu pau não tinha um tamanho decente
também.
Foi um clássico, embora não me orgulhe disso.
Não totalmente.
Ah, tá bom. O cara era um otário e estava dizendo por aí que iria
“comer a irmã gostosa do Lance”. Tudo o que eu fiz ainda foi pouco.
— Espero que você defenda a sua irmã sempre, Seth — respondo,
tentando abrir um sorriso de canto.
Ele semicerra os olhos para mim.
— Não é porque você é irmão do Logan que vou ser bonzinho com
você. Minha irmã não vai criar essa criança sozinha.
Uau. Então ele é do tipo superprotetor. Gostei dele.
— Seth — é a vez de sua mãe sibilar, irritada.
Mas eu apenas sorrio em sua direção.
— Ela não vai, campeão. Vou colocar um anel no dedo dela assim
que a sua irmã parar de ser tão cabeça-dura.
Isso arranca o esboço de um sorriso do seu rosto abatido. Por
alguma razão, a mera ideia de que ele pode ter se divertido por um segundo
que seja por causa de mim, me deixa feliz.
— É que ela puxou o meu avô — responde ele, simplesmente.
E sempre que você sentir dor
Ei, Jude, vá com calma
Não carregue o mundo em seus ombros
Hey Jude | The Beatles

— Oi, querida. Como está se sentindo?


Pisco os olhos, sem conseguir entender onde estou. O teto branco e
a luz da janela incomodam a minha visão, mas nem tanto quanto o
choramingo baixinho que escuto ao meu lado.
— Mamãe? — balbucio, um pouco tonta.
— Estou aqui, minha filha. Mamãe está aqui com você.
Caio no choro na mesma hora. Não consigo evitar. Passei muitos
anos me fazendo de durona e tentando lidar com tudo sozinha, carregando o
mundo nas costas. É bom ser vulnerável de vez em quando.
— Mãe… Me diz que tudo isso é mentira. Me diz que o vovô não
está indo embora.
Ela aperta os lábios em uma linha fina. Depois, pisca os olhos
rapidamente para afastar as lágrimas.
— Não é uma boa ideia conversarmos sobre isso agora, Sam. Você
passou por muita coisa, e não é bom… Para o bebê.
O bebê?
Ai, meu Deus.
Meus pais sabem? Como isso foi acontecer?
— Eu posso explicar — começo, tentando me sentar na cama do
hospital. Minha mãe me impede, colocando a mão delicadamente sobre o
meu ombro.
— Você não tem nada a explicar, Samantha. É uma mulher adulta
que paga as próprias contas. Essa criança vai ser uma coisa boa na nossa
família depois de tudo que passamos — diz ela, e eu realmente quero
acreditar em suas palavras.
Juro que sim.
Mas a sensação de culpa que me engolfa de uma vez só não me
permite pensar assim. Só consigo repetir para mim mesma o quanto estou
sendo uma péssima neta por incluir uma gravidez inesperada nessa equação.
— Quem mais sabe?
Ela suspira.
— Seu pai e seus irmãos. Você não lembra do que aconteceu?
Se eu lembro da discussão acalorada que tive com Scott pouco antes
de perder os sentidos? Ah, isso com certeza.
— Um pouco.
— Lance e Scott trouxeram você pra cá. Está tudo bem com o bebê,
você só teve uma queda de pressão. Sam, você não pode ficar sem se
alimentar desse jeito, minha filha. Você não pode fazer isso com você
mesma e nem com seu filho.
Meu filho. É tão surreal escutar isso.
— Eu sei. Sinto muito.
— Pare de me pedir desculpas — pede ela, exasperada. — Só
queremos que você fique bem.
Me ajeito melhor sobre a cama, sentindo um pesar inexplicável.
Preciso saber como o meu avô está. Preciso vê-lo.
— O vovô vai para o acampamento hoje?
Minha mãe não me responde. Na verdade, ela balbucia algo
inaudível e tenta mudar de assunto algumas vezes, mas eu continuo
chamando a sua atenção para a única coisa que me importa de verdade.
Suspirando, ela finalmente se dá por vencida.
— Sim. Nós todos vamos para lá daqui algumas horas. Vamos fazer
uma fogueira e cantar, como costumávamos fazer — diz, com a voz
embargada. — É o que ele nos pediu.
— Assim que eu tiver alta, vou pedir para o Lance nos levar até lá.
— Sam, não. Vai ser muito estressante pra você, e os médicos
aconselharam a…
— Mãe, com todo o respeito, mas não estou nem aí para o que os
médicos disseram. Nunca vou me perdoar se perder os últimos dias de vida
do vovô. Não existe a possibilidade de eu não ir.
Bufando, ela balança a cabeça. Quando seus olhos encontram os
meus novamente, estão marejados.
— Eu sempre me perguntei como consegui criar uma menina tão
teimosa. Você sempre foi assim, sabia? Vivia batendo o pé e bufando pelos
cantos, saindo escondido à noite e fazendo tudo ao contrário do que
pedíamos. Costumava rezar para que algum juízo entrasse na sua cabeça,
sempre desesperada em como você ia sobreviver ao mundo. Meu pai, por
outro lado, achava que a neta mais promissora seria você. Me dizia que
tinha ganhado na loteria contigo, Samantha. Enquanto Scott sempre
precisou de todos nós para resolver burocracias, você simplesmente me
avisava que já estava tudo pronto. Sempre foi tão independente… Às vezes
isso me assustava. Me deixava triste. Minha filhinha não precisava da
mamãe para ir a uma consulta médica ou para conseguir um trabalho
voluntário. — A voz da minha mãe me faz amolecer, e agora nós duas
estamos lutando contra as lágrimas. — Até eu descobrir que ele sempre
esteve lá por você. Era pra ele que você costumava ligar pedindo socorro
quando não queria nos aborrecer. A ligação que você tem com o seu avô,
Sam… Nem eu tive com ele, mesmo sendo o meu pai. — Balança a cabeça,
deixando uma lágrima solitária escapar. — Quando eu estava grávida de
você, ele sempre conversava com a minha barriga. Te chamava de
“princesinha”. Foi assim durante os nove meses, e mesmo quando o seu pai
achava que falar com você ainda em formação era uma besteira, meu pai
não parava. Depois que você nasceu, ele passou dois meses preparando o
acampamento para o verão e não conseguiu te visitar. Mas quando ele
apareceu… — Seu sorriso fica maior, e meu coração erra uma batida. —
Ele chegou perguntando: “cadê a minha princesinha?”, no tom brincalhão
dele, e você só tinha dois meses, Sam. Dois meses. Mas arregalou os olhos
de emoção, procurando pela voz dele. Reconhecendo. Essa cena ficou
marcada em mim pra sempre, e foi ali que eu soube.
Mesmo com a garganta queimando por causa da vontade de chorar,
me arrisco a perguntar, com a voz trêmula:
— Soube o quê?
— Que você sempre foi mais filha dele do que minha.
Consigo alta do hospital poucas horas depois. Minha mãe ainda
tentou me convencer de que não seria uma boa ideia ir até o acampamento
para me despedir do vovô, mas eu já estava convencida. E nada me
impediria de vê-lo pela última vez.
— Tudo bem, Sam. Você pode ir. Mas não vai passar o final de
semana todo lá — interveio meu pai, com a expressão neutra. — Você e
Lance chegaram hoje e vão embora pela manhã. É melhor assim.
Ainda tentei protestar, mas a maioria venceu. E infelizmente meus
irmãos, assim como meu noivo falso traidor, concordaram com os meus
pais na mesma hora.
É claro que para eu conseguir o passe livre de ir até o acampamento,
precisei fazer algumas barganhas. Uma delas estou prestes a cumprir agora.
Preciso me alimentar direito, garantir que não vou passar mal igual
aconteceu no aeroporto.
Lance me levou até a casa da minha família para poder tomar um
banho e me alimentar, e me dei conta de que ele veria o meu quarto de
adolescente pela primeira vez.
Merda.
— Harry Styles? — zomba ele, apontando para a enorme quantidade
de pôsteres espalhados pela minha parede. — Eu não estava esperando isso
de você, Sam.
Reviro os olhos.
— E esperava o quê? Eu era uma adolescente descobrindo o próprio
corpo, e o senhor Styles foi muito importante nessa fase. Além de lindo e de
cantar bem, ainda tinha o sotaque britânico. Era impossível não se
apaixonar.
Lance coloca a língua para fora, genuinamente surpreso pela minha
honestidade. É o que dizem, fale o que quer…
— Não precisava saber desses detalhes. — Finge estremecer,
largando uma das fotos do Harry no chão. — Achava que você era mais
Tom Brady, sabe? Músculos e estamina. Atlético e dedicado.
Abro um sorriso ao constatar seu ciúme.
— Você está se sentindo ameaçado pelo Harry Styles, Lance
Moreau? — brinco, colocando a mão sobre a boca. Seus olhos me perfuram
como uma faca, e ele endurece o maxilar.
— Eu não. Ele não tem a mínima chance com você.
Finjo me abanar.
— Não sei, não, hein… Aqueles olhos verdes ainda me causam
coisas. É difícil superar um primeiro amor.
Lance estreita os olhos para mim.
— Já para o banho. Agora!
Não consigo segurar a risada quando faço exatamente o que ele
acabou de pedir.

Depois de terminar de me vestir — com a combinação de roupas


mais improvável de todas graças às escolhas de Lance na hora de arrumar a
minha mala —, nós colocamos todas as caixas com comida e bebidas que
meus pais me pediram para levar. Como todos acabaram indo às pressas,
sobrou para mim a missão de passar no mercado.
Quando Lance termina de arrumar as compras no porta-mala do
SUV do meu pai, sinto a minha boca secar. A constatação de que estamos
mesmo a caminho do Frozen Lake para eu me despedir do vovô é um baque
e tanto. De repente, não estou tão certa de que deveria mesmo ir.
— Vamos ficar parados pelo tempo que você precisar, Sam — diz
Lance, com um sorriso de compreensão.
Assinto rapidamente com a cabeça, usando todas as técnicas de
respiração que aprendi com a minha psicóloga para tentar aliviar o
sentimento crescente de ansiedade que tenta lentamente se infiltrar em mim.
Fecho os olhos.
Puxo o ar. Prendo a respiração por cinco segundos.
Solto lentamente.
Puxo. Prendo. Solto.
Faço isso por alguns minutos, até sentir meus batimentos cardíacos
desacelerarem. Quando sinto que as minhas emoções finalmente estão
controladas, faço um aceno em direção a Lance, que começa a dirigir.
Vai ficar tudo bem. Vai ficar tudo bem. Vai ficar tudo bem.
Lance é o melhor parceiro de viagem que existe. Ele brinca,
entrelaça nossos dedos diversas vezes, me beija sempre que o sinal fica
vermelho. Ele é incrível, sensacional… E eu não o mereço. Não mereço
tanta bondade e respeito, não depois de ter sido tão escrota com ele no
passado.
Deixe para resolver essa história depois, Sam. Se concentre no seu
avô.
Quando a fachada do acampamento Frozen Lake aparece, sou
tomada por uma sensação arrepiante de déjà vu. Eu odiava passar os meus
verões aqui. Odiava ter que fazer atividades ao ar livre, cercada de
bichinhos que me picavam e me deixavam cheia de hematomas.
Detestava ter que tomar conta dos adolescentes também.
Principalmente quando me era delegada a tarefa de ser a estraga-prazeres,
afastando dois namorados durante a madrugada. Já vi mais cenas
perturbadoras por essas trilhas do que sou capaz de contar.
— Que lugar lindo — murmura Lance, virando o rosto para encarar
o lago.
Já está de noite, então ele realmente não faz ideia de como o Frozen
Lake fica lindo pela manhã. Ou no pôr do sol. Ou… Quando está cheio de
gente. Cheio de vidas e sonhos.
Por mais que não seja o meu lugar preferido, é só quando perdemos
algo que percebemos a importância disso. Saber que não vou mais andar
por essas terras berrando ordens, recolhendo equipamentos de tênis do chão
ou ajudando vovô a prender as canoas de volta no deque… É um baque.
— Tem certeza de que está pronta para isso, linda? Podemos dar
meia-volta e esperar a sua família em casa. Tenho certeza de que eles iriam
preferir assim.
É, eu também.
Mas não posso dar as costas para ele agora. Preciso me despedir ou
nunca vou ser capaz de me perdoar.
Engolindo em seco, faço um meneio de cabeça.
Depois que Lance estaciona, vejo Seth caminhando em nossa
direção. Meu irmãozinho está deixando o cabelo escuro crescer, e os olhos
estão mais sombrios do que nunca.
Isso parte o meu coração em milhões de pedaços.
— Vim ajudar com a comida — diz ele, em um tom de voz rouco.
Mas antes que ele consiga alcançar as caixas no porta-malas, puxo-o
para um abraço. Demora alguns segundos antes de seus braços me
envolverem pela cintura, mas logo as lágrimas quentes salpicam o meu
rosto.
Lance nos dá licença, saindo com a comida sorrateiramente até onde
o restante da minha família está reunida. Não é muito longe de onde
estamos, então não me preocupo em perdê-lo de vista.
— Seth, meu amor… — murmuro, segurando seu rosto em minhas
mãos para conseguir encarar seus olhos castanhos. Ele tenta desviar o rosto,
mas eu o mantenho no lugar.
Ele já está praticamente do meu tamanho, e isso me assusta. A vida
passa muito rápido, e o sentimento de culpa que toma conta de mim dessa
vez é diferente. Ele vem junto com uma voz interior que me diz o quanto
fui uma péssima irmã.
— A Marjorie não veio, não é? — pergunto, mesmo sabendo muito
bem a resposta.
Seth dá de ombros, chutando uma pedrinha no chão. A expressão
entediada é uma máscara que ele está aprendendo a usar bem demais.
— A família dela não quer mais que sejamos amigos.
Aperto os lábios em uma linha fina.
— Vou conversar com a mãe dela. Vamos conseguir resolver isso —
digo, confiante.
— Ela não quer ir contra a família. Disse que todos estão
decepcionados depois que ela fugiu. Não quero colocá-la em problemas.
— Todos nós estamos passando por um momento difícil, querido.
Confie em mim, as coisas vão se ajeitar. O tempo que você e Marjorie vão
passar separados não vai durar muito. Eu prometo.
Ele tira um punhado daquele cabelo da frente do rosto, e eu reprimo
um suspiro aliviado quando vejo um esboço de um sorriso surgir em seu
rosto lindo.
— Nós ainda conversamos todos os dias. Vamos entrar para a
mesma faculdade. E quando formos adultos, ninguém vai poder se meter
entre a gente. Ninguém.
Mordo o lábio inferior, balançando a cabeça em concordância.
Seth precisa começar a terapia. Por mais que eu ache bonitinho e
apoie o amor que ele sente pela melhor amiga, sempre me preocupei em
como esse sentimento estava perto de uma dependência emocional. Ainda
mais agora, que ele está prestes a passar por uma perda tão grande.
Talvez o afastamento entre eles vai ser bom. Pode acabar resultando
em um amadurecimento de ambas as partes.
O que, é claro, eu não me atrevo a dizer em voz alta.
— Vem, Sam. Ele quer ver você. — Meu irmão me arranca dos
meus pensamentos, me puxando pela mão.
Sigo seus passos com o coração na boca. Sentindo o meu corpo
inteiro se arrepiar e minhas mãos suarem.
Ainda assim, não deixo de apertar seus dedos. Procurando força
enquanto também tento servir como sua rede de apoio.
Quando passamos pelas portas do chalé principal, meu coração
acelera.
Ele está sentado no sofá novo que compramos como um presente
para ele antes das férias do verão passado. Uma manta de Monstros S. A
está jogada sobre seu colo, e alguns fios saem de um cateter ligado ao seu
pulso.
Vovô está sorrindo.
Como pode estar sorrindo?
Eu não entendo.
Quando nossos olhos se encontram, no entanto, o sorriso é
lentamente substituído por uma outra expressão.
Apreensão. Misturado com um pouco de saudades também.
E então não sinto mais minhas pernas. Eu desabo.
Lá vem o sol
Lá vem o sol
E eu digo
Está tudo bem
Here Comes The Sun | The Beatles

Existem momentos na vida que ficam gravados para sempre. A


primeira vez que você toma um sorvete que acaba se tornando o seu
favorito. A primeira vez que anda de avião, que coloca os pés no mar.
Quando realiza um dos sonhos de infância, como ir no show de um artista
que fez parte da sua vida.
E existem momentos que ficam gravados por serem as coisas mais
tristes que você já viu. Uma decepção. Quando descobre que a magia da
infância um dia vai embora. E, principalmente, quando se dá conta de que
terá que se despedir de quem você ama incondicionalmente.
Seus pais. Seus irmãos mais velhos. Suas tias. Primos. Amigos de
infância. Todos eles. Todos nós. Temos uma data de validade nesse mundo,
e embora possamos viver sessenta anos rodeado de todos aqueles que
amamos, uma hora eles terão que partir. E a dor vai ser dilacerante em todas
as vezes.
Não tem como ficar mais fácil. Não tem como doer menos.
E essa constatação quase me rouba o ar. Penso nos meus pais, nos
meus irmãos, em todas as pessoas que são importantes para mim de alguma
forma.
Reconheço a dor nos olhos de Sam. É quase insuportável demais
para observar. Preciso piscar os olhos algumas vezes quando ela,
finalmente, se aproxima do avô.
Ele a recebe de braços abertos.
Samuel Samuels está tão frágil que quase não o reconheci. Está com
um sorriso fraco no rosto abatido, a aparência de alguém que vem travando
uma batalha árdua contra uma doença cruel. Mesmo assim, seu estado de
espírito parece o mesmo de quando eu o conheci.
Ele é o cara mais durão que existe.
— Minha princesinha — murmura ele incontáveis vezes, passando a
mão suavemente pelo cabelo da neta que agora está aos prantos. — Senti
muitas saudades.
— Desculpa, vovô. Desculpa por ter ido embora. Eu queria muito
salvar o acampamento.
— Você não deveria se preocupar com problemas de adultos, Sam.
Isso arranca uma risada sincera de todos nós.
— Eu meio que sou adulta agora, caso o senhor não se lembre. Na
verdade… — Ela morde o lábio inferior. Em seguida, leva as mãos até a
barriga lisa. — Vou ter um bebê.
A notícia pega o senhor Samuels de surpresa. Erguendo as
sobrancelhas, ele faz um gesto com a mão para que ela se aproxime.
Quando está perto o suficiente, senhor Samuels coloca a mão suavemente
sobre o estômago de Sam.
— Que notícia maravilhosa, princesinha. Ele vai te fazer
companhia. — Balança a cabeça, sorrindo. — Quem é o pai?
Silêncio.
Silêncio mortal.
Mas logo todas as cabeças se viram sutilmente em minha direção,
então não tenho muita opção além de abrir um sorriso sem graça e dar um
passo à frente.
Ele estreita os olhos, parecendo querer lembrar de quando nos
vimos. Silenciosamente, estou rezando para que ele não se recorde.
— Ah, eu conheço você. Foi o safado que eu peguei se esgueirando
da cama da minha neta quando ela estava na faculdade — diz em um fio de
voz. — Pensei que depois da ameaça com a arma você iria entender o
recado.
— Vovô! — repreende Samantha, sem graça.
Coço a nuca, visivelmente acanhado. Não sei nem que argumento
usar para me defender.
Mas Samuels parece estar longe de querer acabar com essa
conversa. Ele faz um gesto com as mãos, me chamando para perto. Não
hesito em obedecer seu comando, e quando estou perto o bastante, ele pede
para que eu me agache.
Ideia errada.
Ideia MUITA errada.
Porque assim que faço isso, ele enfia os dois dedos em um lugar
específico do meu ombro que me coloca, literalmente, de joelhos.
Gritos desesperados podem ser ouvidos de todos os cantos do chalé.
Samantha balbucia palavras desconexas, mas tudo o que eu consigo prestar
atenção é no olhar ferino que ele está lançando para mim.
Engulo em seco.
— Preste atenção, garotinho. Posso estar indo embora desse mundo,
mas isso não significa que Samantha estará desamparada. Está vendo
aqueles dois ali? — Aponta para trás de mim, e eu viro o pescoço. Scott e
Seth estão com suas melhores expressões “malvadas”, de braços cruzados.
O mais velho acena com a mão, ambos com o semblante fechado. — Eles
vão continuar o meu trabalho de tomar conta da Sam. Pise na bola com ela
e você vai apanhar tanto que não será capaz de jogar futebol nunca mais. E
se pensa que não vou continuar checando a minha neta mesmo depois de ir
para um outro plano espiritual, está enganado. Vou continuar por perto. De
olho em você. Capiche?
Capiche? O que é isso? O Poderoso Chefão?
Ele aplica mais pressão nos dedos, e eu solto um grunhido.
— Certo, entendido.
— Ótimo, então resolvemos essa parte. Ah, e claro… É melhor você
colocar uma aliança no dedo dela antes desta criança vir ao mundo.
Assinto rapidamente, desesperado.
Quando Samuels finalmente me solta, eu viro o rosto para
Samantha, que nem tenta esconder o sorrisinho que está nascendo em seu
rosto.
Semicerro os olhos em sua direção.
— Agora faz todo o sentido.
— Faz todo o sentido o quê?
— Você ser meio… Você sabe. — Gesticulo com as mãos, movendo
os lábios para dizer “maluca” sem ser ouvido. Sabe-se Deus o que eles
podem fazer comigo aqui neste fim de mundo.
Samantha passa o braço ao redor do meu pescoço, se divertindo.
— Sabe como é… Eu sou neta do meu avô.
O restante da noite é acompanhado de muitas risadas e uma sopa
que aquece a minha alma. A mãe da Sam é uma cozinheira maravilhosa, e
depois de terminarmos o jantar, Scott é o primeiro a puxar o violão, então o
pai deles acende a lareira.
Apesar do clima triste, todos se esforçam ao máximo para manter o
ambiente leve. Relembram histórias do passado, dão risadas das coisas que
passaram no acampamento, reclamam do sobrenome “Samuels”.
Quando Scott dedilha o violão, é senhor Samuels que diz, limpando
a garganta:
— Tem uma música que eu queria que vocês pensassem daqui pra
frente como uma mensagem minha para vocês. Sempre que acharem que eu
não estou ouvindo ou que precisam de um conselho… Escutem Here
Comes The Sun, dos Beatles. Escuto essa todos os dias pensando na Mary, a
avó de vocês. Ela nos deixou cedo demais. Muito antes de testemunhar
todas as coisas lindas que vocês construíram. Mas estou com saudades —
desabafa ele, com a voz começando a ficar trêmula. — Estou com tantas
saudades que, às vezes, é difícil respirar. E não teve um dia sequer que não
tive certeza de que minha Mary continuava entre nós, iluminando-nos com
a sua luz. Percebi que era besteira adiar esse momento. Minha partida não
tem que ser triste ou mesmo agonizante. Vou reencontrar o amor da minha
vida. Com certeza vou receber uns puxões de orelha por ser tão protetor
com todos vocês, mas fiz o que pude. E vou embora sabendo que cumpri a
minha missão com todos vocês. — Ele olha na direção de Sam, que agora
se encontra soluçando em meus braços. — É a lei da vida. Um dia, todos
nós estaremos juntos novamente. Vou estar de braços abertos e prontos para
receber cada um de vocês. Só me prometam que vão tentar adiar esse
encontro o máximo que puderem, tudo bem? O mundo precisa dos Samuels.
Ele ainda precisa de nós.
E, por mais que as palavras do senhor Sam sejam lindas, elas
também deixam um gosto amargo em todos os presentes. Porque,
inevitavelmente, ele vai partir a qualquer momento.
— Amo todos vocês. Com cada fibra do meu ser, cada pedaço meu,
com todo o ar que eu respiro. É um amor tão grande que não tem como
mensurar. Mas estou cansado. — Seus olhos escuros ficam ainda mais
marejados. — E sinto falta da Mary. Tanta falta… Estou pedindo, com todo
o meu amor, para que vocês me deixem partir. Vocês precisam deixar que
eu vá. Não segurem esse sentimento em vocês, sintam a minha falta, mas
vivam. Sigam em frente. Vou estar muito bem e continuarei tomando conta
da vida de todos, não se preocupe. Mas preciso que me prometam isso.
Tudo bem?
Todos acenam positivamente com a cabeça, mas, por dentro, com
certeza tentam engolir o bolo sufocante na garganta.

No dia seguinte, Samantha e eu acordamos às cinco da manhã, antes


mesmo de seus pais se colocarem de pé. Arrumamos colchões infláveis para
que todos nós pudéssemos dormir juntos. Embora triste, foi uma noite
realmente agradável.
— Avisem quando pousarem em Houston — a mãe de Sam pede,
nos esmagando em um abraço confortável.
— Pode deixar — respondo.
O caminho de volta é tranquilo, embora Samantha não diga uma
palavra sequer. Estou morrendo de medo de vê-la se fechar em sua casca
novamente.
— Você pode ficar mais tempo na cidade se quiser, Sam. Vai
precisar da sua família — sugiro, quando chegamos ao aeroporto. — Meu
próximo jogo só acontece daqui dois dias. Posso ir sozinho e voltar quando
acabar.
— Não, Lance. Também é o meu trabalho.
— E estou sugerindo que você tire uma licença. O Sean vai
entender.
Mas ela continua irredutível.
— Temos uma entrevista agendada. Não podemos simplesmente
cancelar. — Balança a cabeça. — Além do mais… Acho que vou precisar
me distrair da tristeza pelas próximas semanas. Quero mesmo que o meu
avô veja o quanto estou tentando seguir em frente. Eu prometi isso ontem
para ele.
E, simples assim, eu me calo.
Nós embarcamos em trinta minutos, e depois de um voo de três
horas e meia e um cochilo merecido, finalmente chegamos no Texas. Meu
agente, Sean, disse que iria conseguir um carro discreto para nos levar de
volta para o resort.
Que não seja a minivan. Que não seja a minivan. Que não sej…
Ai, merda.
Não é a minivan.
É uma van.
Uma bem grande, por sinal.
— Que beleza, hein? — zombo, dando um tapinha nas costas de
Sean quando ele sai do veículo para nos ajudar com as malas.
— Não seja ingrato. Ainda estou tentando processar porque raios
você viajou de última hora com a sua relações públicas.
— Com a minha noiva. Não foi isso que você me aconselhou a dizer
para a mídia? — rebato, sarcástico.
Samantha não diz uma palavra sequer, o que me deixa ainda mais
apreensivo. Seu olhar perdido encontra o meu algumas vezes enquanto
fazemos o caminho até o resort e, quando finalmente descemos da van, ela
se vira para Sean.
— Depois da entrevista, vamos tirar o Lance daqui. Ele já foi
fotografado diversas vezes por Houston e as manchetes não foram ruins.
Vamos continuar com o noivado de fachada e nos concentrar na carreira
dele dentro do estádio a partir de agora.
Meu agente faz um sinal de concordância com as mãos, assentindo.
Quando Sam se vira para ir embora, faço menção de acompanhá-la, mas ele
me segura pelo cotovelo.
— Falta pouco para conseguirmos renovar o seu contrato, Lance. As
notícias são boas, principalmente depois do seu touchdown no último jogo.
Os executivos estão realmente entusiasmados com o seu desempenho. —
Ele bate as mãos, animado. — Em breve vai poder voltar a sair com
Charles, mas pegue leve dessa vez. Não queremos que você volte para onde
estava.
É engraçado o tom de aviso que ele usa comigo. Como se fosse um
irmão mais velho dando uma bronca no caçula. E o toque sugestivo em sua
voz também não me passou despercebido.
— Não vou voltar para vida nenhuma, Sean. Aquele Lance não
existe mais.
Ele me encara.
— Por causa da sua relações públicas? A garota é linda, eu entendo
você não ter superado ela. Mas qual é, Lance? A última modelo contratada
da Victoria’s Secret me pediu seu número de telefone.
— Espero que você não tenha passado. Não quero mais nenhuma
mulher.
Ele dá um passo para trás, surpreso.
— Uau. Então você se apaixonou mesmo.
— Sim. Samantha não vai a lugar nenhum daqui pra frente, assim
como eu.
— E o que isso quer dizer?
— Que vou pedi-la em casamento. De verdade.
Omiti o fato de que, tecnicamente, eu já havia pedido. Ela encarou
como uma grande brincadeira e mudou de assunto, o que está me
incomodando bastante. Não quero que ela pense que quero mantê-la comigo
para sempre só por causa da ameaça de seu avô e seus irmãos.
Minha nova missão é fazê-la dizer sim. E nessa eu vou insistir…
Até conseguir.

Samantha passa os próximos dias mais apreensiva do que o normal.


Sempre checando o telefone, dando pulos de susto sempre que eu me
aproximo dela quando está na cozinha. O pacote completo.
Scott e Seth nos ligam pelo menos duas vezes por dia. E embora eu
tenha tentado distraí-la, nunca funciona. Quando não está pensando no avô
e se sentindo culpada por não poder ficar no acampamento, está preocupada
com a entrevista que vamos conceder no dia seguinte para a jornalista que
fez a última pergunta na coletiva de imprensa.
Enquanto Sam se afundava no trabalho, eu também fiz o mesmo.
Ela não queria comparecer ao meu jogo, mas depois de ligar para Sabrina e
perguntar se poderia vir até a nossa suíte, pareceu finalmente entender que
eu não deixaria a minha mulher grávida e passando por um luto sozinha em
casa.
Sem chance.
Nós vencemos o jogo por pouco mais de três pontos, o que significa
que foi mais uma disputa acirrada. Dessa vez, a minha participação não teve
tanto destaque, mas ainda assim me saí bem. O nosso treinador chegou a me
dar um tapinha no ombro e sussurrar um “mandou bem” quando voltei para
o vestiário.
Quando chega o grande dia, meu estômago fica embrulhado. Uma
ansiedade crescente começa a se instalar em mim, e preciso respirar fundo
algumas vezes antes de finalmente pedir o carro para nos levar ao estúdio.
— Está pronto para a entrevista? — pergunta ela, terminando de
passar a maquiagem.
Nós avisamos para toda a sua família a respeito da entrevista, então
Samantha estava mais nervosa do que o normal. O avô também veria na TV,
o que tornava tudo muito maior.
— Pode ser que essa seja a última vez que ele veja a minha imagem
— murmurou ela, uma noite, quando estávamos nos braços um do outro.
Quando nosso carro chega, eu peço que ela desça na frente enquanto
termino de ajeitar a minha gravata. Maior baboseira de história.
Só estou ganhando tempo para ligar para a recepção e confirmar a
surpresa que preparei para ela depois da nossa entrevista. A caixinha com o
anel que Calliope me ajudou a escolher já está escondida estrategicamente
no meu paletó e, de repente, é como se pesasse uma tonelada.
Dou uma última olhada no meu reflexo no espelho antes de dar
meia-volta e ir atrás da Sam.
A mulher da minha vida.
O único amor que eu já tive.
Eu te seguirei pelo parque
Pela floresta, pela escuridão
Garota, nunca amei ninguém como você
Home | Edith Whiskers

— E como vocês se conheceram?


Lance e eu nos entreolhamos. Faço um gesto com a mão para que
ele prossiga, e é o que ele faz.
— Nos conhecemos na faculdade.
— Faziam o mesmo curso?
— Não! Eu estava passando por um trote e a Sam apareceu por lá.
Eu tinha que cumprir esse desafio e ela meio que me seguiu.
— Te seguiu com que objetivo?
Os dois se viram para mim, e é a minha vez de abrir um sorriso sem
graça.
— Eu queria filmar o trote para escrever uma matéria para o jornal
da universidade. Queria entrar para a redação e pensei que expor o que os
garotos do futebol faziam seria uma boa ideia.
As sobrancelhas da repórter se juntam tanto que eu repasso
mentalmente o que eu acabei de dizer para ter certeza de que não soltei
nada inapropriado.
— Uau. Você foi corajosa. Conseguiu entrar para o jornal?
— Sim, mas não com essa matéria. Lance deu um jeito de acabar
com as minhas provas. Meu celular acabou parando no fundo de uma
piscina.
— Ei, a culpa não foi minha — intervém ele, sorrindo. — Eu gritei
para você se afastar da beirada, mas continuou indo para trás.
— Porque eu achei que você queria pegar o celular de mim.
Os olhos da jornalista passam de um para o outro como se
estivéssemos em um jogo de Ping-Pong.
Mal posso esperar para poder voltar para a nossa suíte.
— E vocês começaram a namorar logo depois disso?
Lance e eu soltamos uma risadinha, nos encarando como quem diz:
“ah, não sabe de nada mesmo…”
É ele que responde dessa vez.
— Samantha era mais escorregadia que uma enguia. Nós nos
encontramos em uma festa dias depois e deixe-me dizer, essa menina
aqui… — Ele aponta o dedo para mim, fazendo uma expressão de garoto
atentado. — Sabe beber litros de cerveja sem ficar tonta. Virou a rainha dos
jogos que envolviam barril de bebida. Não tinha como eu não me apaixonar.
Estreito os olhos em sua direção, me forçando a sorrir.
Cretino. Ele sabe muito bem que a minha família inteira está na
frente da televisão nesse momento. Jesus, já vou precisar procurar
desculpas para enrolar meus pais no telefone mais tarde.
— E por que você se esquivava tanto, Samantha? — Os olhos da
repórter brilham de curiosidade.
Engulo em seco.
— Não era bem esquivar… Eu só não queria apressar as coisas,
entende? E Lance vivia cercado de meninas muito bonitas. Sozinho eu
posso garantir que ele não ficou.
Sinto um cutucão sutil nas minhas costas, mas decido ignorar
deliberadamente.
Dois podem jogar esse jogo.
— Eu imagino. Mas então… Quando tudo se tornou oficial entre
vocês?
— No último ano — respondo. — A gente sempre se esbarrava nas
festas e costumava ficar junto, mas tínhamos rotinas que não se
encaixavam. Lance sumia na época dos jogos universitários, e eu estava
cada vez mais ocupada. Consegui um ótimo estágio, participava do jornal
da universidade e ainda pegava matérias extras. — Dou de ombros. —
Quando as coisas se acalmaram, decidimos tentar. Durou pouco mais de um
ano esse relacionamento.
— O namoro foi tranquilo?
Coloco a língua para fora, fazendo uma careta.
— Eu não chamaria de namoro. Esse cara aqui… — Dou uma
cotovelada de brincadeira em Lance, que sorri. — Nunca me pediu em
namoro oficialmente. É até estranho pensar em nós dois dessa maneira.
— Pensei que estava implícito — rebate ele com bom humor.
Dou de ombros.
— Sou uma garota tradicional. Preciso de gestos grandiosos e de um
belo pedido.
A repórter solta uma risadinha, balançando afirmativamente a
cabeça.
— Vou precisar ficar do lado da Samantha nessa. E falando nisso…
Como foi o grande pedido?
Puta que pariu.
O pedido.
Nós repassamos todas as possíveis perguntas um milhão de vezes,
menos a merda do pedido de casamento.
Lance limpa a garganta, abrindo o sorriso mais charmoso que eu já
vi.
— Foi na praia. Samantha e eu tínhamos acabado de voltar,
completamente tomados pela paixão. Naquela época em que você não
consegue sair do quarto, sabe? — Viro meu rosto para encará-lo, lançando o
meu olhar mais mortal em tom de aviso. — Enfim… Convidei ela para ver
as estrelas em uma noite quente. Quando chegamos até lá, a praia estava
completamente decorada com várias velas e pétalas de rosa. Tinha uma
mesinha no centro de tudo, com um jantar realmente maravilhoso. Depois
que terminamos de comer, me ajoelhei e disse tudo o que estava sentindo
naquele momento. Sobre ela se a minha alma gêmea e tal — diz, com um
sorriso nos lábios. — E é claro que ela disse sim.
— É claro que eu disse sim — repito, alcançando a pele exposta de
suas costas para dar um beliscão sutil.
Lance finge que não tem nada demais acontecendo. Se ajeita na
cadeira, toma a minha mão entre as suas e dá um beijo carinhoso na minha
palma.
Ele vai ter o que merece em breve.
— Uau. Estou realmente surpresa. — A jornalista balança a cabeça.
— Como vocês ficaram tanto tempo separados se o amor parece tão forte?
Lance me encara com uma expressão complacente. Respiro fundo.
— Éramos muito jovens. Não que dois anos façam realmente tanta
diferença, mas acho que o futuro nos assustava. Se estava difícil conciliar
tudo na faculdade, fazer isso enquanto tentávamos nos estabilizar como
profissionais seria ainda pior. Concordamos que o melhor a se fazer era nos
separar. Mas como o destino é engraçado… Acabei precisando trabalhar
para ele.
— Isso é quase um roteiro de cinema — a repórter concorda. —
Mas tem uma pergunta que não quer calar. Todas as polêmicas do Lance, as
fotos com milhares de modelos e uma possível negociação com outros
times seria uma estratégia para trazê-la de volta para a vida dele?
Pisco uma vez. Depois outra.
Abro a boca, mas palavras não me saem.
O que ela está tentando insinuar?
— Hã…
— Pode reformular essa pergunta? — pergunta Lance, seco.
— Claro. Então, senhor Moreau, pode nos explicar um pouco mais
sobre o período sombrio que estava vivendo na época que foi fotografado
com mais de dez mulheres seminuas em um saguão de hotel?
Merda. Essa é das boas.
Mas Lance, por incrível que pareça, não se deixa abalar pelo tom
incisivo da pergunta. Ele abre mais um dos sorrisos sedutores que adora
esbanjar, repleto de presunção.
Sua armadura favorita.
— Acho que você já explicou o bastante. Foi mesmo um período
sombrio. Não me orgulho de todas as coisas que saíram sobre mim nas
páginas de fofoca, embora a grande maioria não seja verdade. O incidente
do hotel, por exemplo. Charles e eu realmente demos uma festinha e
convidamos algumas garotas. Mas ao contrário do que foi veiculado nos
jornais, não houve nenhum tipo de “ato sexual em grupo” — responde,
desenhando aspas no ar. — Estávamos bêbados e decidimos entrar na
piscina. Para ir até a piscina precisávamos passar pelo saguão. E é claro que
o mesmo estava repleto de paparazzi.
A jornalista assente, balançando a cabeça ao escutar palavra por
palavra da fofoca mais comentada da América nos últimos meses.
— Mas uma das garotas presentes era uma namorada de longa data
sua. Na verdade, você chegou a comparecer a um dos desfiles dela e se
sentou em uma fileira especial — ela continua, cravando ainda mais a faca.
Um monstrinho ciumento começa a crescer dentro de mim. O
incômodo com certeza não passa despercebido por Lance, pois ele me lança
um olhar preocupado antes de desviar a atenção de volta para a jornalista.
Ele se remexe na cadeira desconfortavelmente.
— Sim. Sophia e eu tínhamos um relacionamento casual e de vez
em quando eu aparecia em seus desfiles, assim como ela tinha o costume de
ir até os jogos. Nada demais.
— Ela disse em um podcast que esperava um pedido de namoro seu
— rebate. — Vocês até tinham fã clubes do casal que soltavam edits com
frequência com todas as aparições públicas que vocês faziam. O que tem a
dizer a respeito?
— Essas perguntas não estavam acordadas — intervenho, sentindo
um gosto amargo na boca.
— Tudo bem, Sam. A única coisa que eu tenho para comentar a
respeito desse assunto é que não posso culpar ninguém por ter expectativas.
Sempre deixei claro para Sophia que nunca haveria nada sério entre nós,
assim como para todas as mulheres que passaram pela minha vida depois da
Samantha. Ela é a mulher da minha vida, sempre foi e sempre será. Não
existia a possibilidade de namorar outra pessoa quando meu coração sequer
me pertencia mais. Ficou com essa mulher por anos, e finalmente o tenho
de volta. Agora eu tenho meu coração de volta.

— Lance, mais uma foto aqui, por favor! — Os flashes são capazes
de cegar uma pessoa.
Uma pequena multidão se forma ao nosso redor assim que saímos
da emissora. Lance faz um sinal para que Sean me leve até o carro enquanto
ele autografa camisetas e se abaixa para tirar foto com alguns fãs.
Meu coração erra uma batida ao ver a cena. Ele mexe no cabelo,
sorri, faz piadas, abraça e tira sarro das pessoas que gritam histericamente
por estar em sua presença. Lance sempre foi incrível como ídolo, e poder
presenciar isso de novo me faz sentir a mulher mais sortuda do mundo.
Quando ele entra no carro, não hesito em me aproximar e apoiar a
minha cabeça em seu ombro. Lance dá um beijo na minha testa,
entrelaçando os nossos dedos carinhosamente.
Sean nos encara através do espelho retrovisor um tanto quanto
desconfiado, mas ignoramos.
— Amanhã você precisa estar no centro de treinamento cedo,
Lance. O próximo jogo é daqui cinco dias — relembra ele, assim que
chegamos no resort. — O checkout de vocês está marcado para as duas da
tarde de amanhã.
Nós concordamos e ele vai embora sem dizer mais nenhuma
palavra.
Quando estamos a caminho do elevador, Lance me segura pelos
ombros. Seus olhos castanhos estão repletos de um carinho não dito. Franzo
o cenho, sem conseguir entender muito bem o que ele está tentando fazer.
— Que tal caminhar comigo?
— Agora? Estou exausta. — Me jogo dramaticamente sobre seu
ombro, e ele ri pelo nariz.
— Quero ver as estrelas.
— Podemos ver da nossa suíte. Aquela janela não pode ser
desperdiçada. Além do mais, ainda não usamos a piscina privativa juntos.
Mas nem todas as segundas intenções do mundo convenceriam
Lance a mudar de ideia. Porque ele refuta cada uma das minhas sugestões,
argumentando que a praia daqui fica um espetáculo quando escurece e nós
não a aproveitamos o suficiente.
— Estou morrendo de fome — resmungo, quando ele me pega
delicadamente pela mão e começa a caminhar na direção da praia.
Alguns funcionários acenam em nossa direção, animados por nos
verem juntos. Imagine quando a entrevista for ao ar…
— Preparei uma coisa pra gente. Você vai gostar.
— Tem comida?
— Tem. — Ele ri mais uma vez. — Isso é por causa da gravidez?
— Provavelmente. Inclusive, você está me fazendo andar mais do
que o necessário quando tudo o que eu quero é uma cama quentinha e um
orgasmo intenso para relaxar. Acho que você como o pai dessa criança tem
a obrigação moral de me prover tudo isso — argumento, erguendo o queixo.
— Vai ser um prazer servir a todas as suas vontades, Sam. Mas
antes…
E então finalmente chegamos à praia.
Meu queixo vai ao chão.
Não estou brincando.
Porque a combinação do céu escuro repleto de estrelas é só um
adorno a mais para o que Lance preparou para nós. Várias velas foram
espalhadas pela areia branca, luzinhas piscando no chão conforme pisamos
nelas. E, ao continuar a trilha, nos deparamos com uma mesa para dois.
Igualzinho ele descreveu para a jornalista.
— Lance…
— Já que você está com tanta fome, vamos fazer isso primeiro. —
Ele aponta para a mesa, já puxando a cadeira para que eu possa me sentar.
— Embora eu não seja o maior fã do mundo de macarrão, sei que você ama.
Então pedi um carbonara com trufas vindas diretamente da Itália.
Coloco a mão sobre a boca, em choque.
— Meu sonho é fazer um tour gastronômico em Roma.
— Eu sei. Você me contou isso um dia. — Pisca ele, sorrindo.
Lance escolheu para si mesmo um prato delicioso de salmão com
arroz negro que me deixou com água na boca. Nós comemos enquanto
conversamos, dando risada sobre o passado e inevitavelmente pensando no
futuro.
O que será de nós daqui para frente? Qual o nosso destino?
— Samantha.
— Lance — repito, brincalhona.
Ele semicerra os olhos para mim.
— Eu venho treinando para falar com você a respeito, mas nunca
parece ser o momento certo. Depois do que aconteceu com o seu avô, decidi
que não poderia esperar muito mais para te dizer.
— Me dizer o quê?
Ele respira fundo.
— Eu te amo, Sam. Para ser honesto, sempre amei. Desde o
primeiro dia em que nos vimos, quando você me filmou sem nem fazer
questão de esconder.
— Espera aí! Eu estava escondendo, sim!
Ele revira os olhos, um sorriso sarcástico brincando em seus lábios.
— Se você acredita nisso… — Dá de ombros, mantendo o bom
humor. — Nós sempre tivemos uma ligação. Você precisa admitir isso. Mas
vou confessar… Só tive certeza de que seríamos para sempre depois
daquela tempestade. Quando fomos para o meu apartamento e você me
confessou que a dor do luto te assustava. Que o fato de podermos ir embora
a qualquer momento te apavorava. Não sabia que isso provavelmente tinha
a ver com a perda da sua amiga Emma — ressalta ele, fazendo meu coração
apertar. — Mas mesmo depois de você ter ido embora e desaparecido da
minha vida, sempre me perguntei quando iríamos nos encontrar novamente.
Porque sempre tive certeza, Sam. Isso ia acontecer. Um amor como o nosso
não iria sumir. E se em quatro anos na universidade a gente sempre achava
uma forma de voltar um para o outro, era só uma questão de tempo até
ficarmos juntos para sempre — completa, me fazendo lacrimejar. — Talvez
eu tenha dado um empurrãozinho me envolvendo em tanta confusão. Talvez
eu estivesse rezando para você acabar aqui, como está agora.
Arfo, completamente em choque.
— Lance…
— Mas a verdade é que eu não suporto a ideia de deixar você partir
mais uma vez, Sam. Fico apavorado de pensar nisso, para ser sincero.
Quero criar essa criança com você, mas mais do que isso. Quero que você
seja minha. Quero ser seu. Quero que você use o meu nome, que esteja em
todos os camarotes destinado à família nos meus jogos. Quero que sejamos
um só.
Ele tira uma caixinha azul do bolso do paletó, se ajoelhando naquela
areia bem na minha frente.
Coloco as duas mãos sobre a boca, as lágrimas escorrendo
copiosamente dessa vez. Meu coração está batendo tão rápido que é quase
possível ouvi-lo.
— Samantha Samuels, rainha do barril, minha relações públicas, a
garota mais maluca que eu já conheci. Você quer…
Mas antes que Lance possa terminar a sua pergunta, nossos
telefones começam a tocar.
No mesmo instante.
Sincronizados.
Agarro o meu na mesma hora, o instinto de assessora que está
sempre pronta para lidar com uma crise falando mais alto.
Mas quem me dera fosse isso. Quem me dera fosse uma matéria
sensacionalista de jornal plantando mentiras sobre Lance. Quem me dera
fosse uma mensagem enviada de qualquer pessoa, qualquer uma mesmo,
menos ele.
Menos Scott.
Scott:
Ele se foi, Sam.
E quando a noite está nublada
Ainda há uma luz que brilha sobre mim
Brilha até o amanhã
Deixe estar
Let It Be | The Beatles

três meses depois


O funeral aconteceu no dia seguinte após recebermos a notícia. Foi
tão difícil para Sam processar no início, que acabei levando-a ao hospital
mais próximo. Ela insistia que estava bem, mas fiz questão de que fosse
assistida naquelas primeiras horas. Deus sabe o desespero por saber que não
havia nada que eu pudesse fazer para aliviar a pressão de seu peito
Quando finalmente se acalmou, me pediu para acompanhá-la até o
funeral. Precisei pedir permissão para faltar a um dos treinos, mas Sean me
assegurou que estava tudo bem.
Sendo sincero, não me importei tanto assim com o aval deles. Eu
iria para onde Sam precisasse de mim.
Foi um completo borrão para mim. O velório foi simples, cercado
das pessoas mais importantes para aquela família. Logan apareceu para
consolar Seth, e foi estranho ver o meu irmão mais novo ali, servindo de
ombro amigo para o irmãozinho da Sam.
— Nunca vou ser capaz de agradecê-lo por tudo que ele faz pelo
Seth — murmurou Sam, em um fio de voz, ao meu lado.
Não sabia o que dizer. Apenas fiquei ali, em silêncio, fazendo uma
massagem em suas costas enquanto sentia meu coração se partir com cada
soluço ou choro baixinho.
— O que me conforta é saber que nos despedimos dele do jeito que
ele queria — disse Scott em certo momento, abraçando um cara pela
cintura. Presumi que fosse o tal Oscar.
Samantha assentiu para o comentário, mas a verdade é que ela não
estava falando com o irmão. Pelo que eu soube, Scott agora namorava o ex-
cunhado e por muito tempo o nêmesis de Sam na escola, o que estragou
completamente a dinâmica dos dois.
Mas não durou muito tempo.
Depois do funeral, fomos todos para a casa da família Samuels em
San Diego. O clima estranho entre os irmãos não passou despercebido por
seus pais, que os fizeram sentar e conversar cara a cara sobre o que estava
incomodando a ambos.
— Ele o trouxe aqui — sibilou Samantha, apontando para o homem
de cabeça raspada que observava tudo com um olhar de pesar. Não estava
tentando dar uma de advogado do diabo, mas o cara realmente parecia
arrependido. — Depois de tudo o que aconteceu, Scott simplesmente
decidiu começar a namorar Oscar Nilsen. Só pode ser uma piada de mau
gosto.
— Nem tudo gira em torno de você, Samantha.
— Realmente. Sempre girou em torno de você, não é? Me levando a
todas aquelas festas, exibindo sua irmãzinha como se eu fosse uma espécie
de bichinho de estimação. Nunca reclamei porque amava que você me
levasse contigo, mas ser traída desse jeito é um golpe baixo.
Scott revirou os olhos, cruzando os braços por cima do suéter azul
que estava usando.
— Quanto drama. Acabamos de enterrar o vovô e agora eu preciso
lidar com você reclamando do meu namorado.
O olhar magoado de Sam me colocou em alerta na mesma hora. Por
mais que estivesse um pouco mais sensível do que o normal por causa dos
hormônios, era meu dever garantir que ela não iria se estressar.
O que, vamos combinar, tirar Samantha do sério estava sendo mais
fácil do que o normal.
— Scott, já chega. Não se esqueça que a sua irmã está grávida — a
mãe dela relembrou, checando o rosto de Sam para ter certeza de que ela
estava bem.
Fiz um aceno de cabeça rápido, murmurando que eu estava de olho
nisso.
— Sim, enterramos o vovô e você fez a sua escolha. Lance, será que
podemos ficar em um hotel essa noite? Não quero ficar na mesma casa que
eles.
Murmurei que poderia fazer isso, enquanto Scott soltou um chiado
baixinho. Acho que ele estava pronto para brigar com a própria irmã mais
uma vez, até que Oscar resolveu sair das sombras.
— Você não tem que ir para lugar nenhum, Samantha. Eu sou o
problema, então vou embora — disse ele, visivelmente sem graça.
Cara, vou confessar. Deu um pouco de dó da situação. Quase insisti
para que ele ficasse, mas Scott foi mais rápido.
— Nós não vamos sair. Samantha está sendo infantil.
— Scott, menos — pedi, lançando um olhar de advertência para ele.
— Vamos acalmar os ânimos.
— Lance tem razão — foi a vez do pai deles entrar nessa equação.
— Samantha não pode se irritar. Portanto, vamos resolver isso de uma vez
por todas. Vocês dois são irmãos, pelo amor de Deus. Sua mãe e eu somos
os próximos na ordem natural das coisas para partirmos deste mundo, e
então só terão uns aos outros. Quem vai começar pedindo desculpas?
Sam voltou para a sala como um furacão. Me coloquei ao seu lado,
preocupado. Essa coisa de ter que acalmar uma mulher grávida não estava
fazendo muito bem para o meu estado de espírito, sendo sincero.
— Eu que não vou. Pai, ele nem se deu ao trabalho de me contar
sobre essa traição. Descobri por causa de uma videochamada.
Scott rangeu os dentes, dando um passo à frente.
— Eu não queria deixá-la ainda mais chateada. Estávamos passando
pela pior dor do mundo e ainda precisando lidar com a rebeldia de Seth. E
eu sabia muito bem como a Samantha trataria esse assunto.
Os olhos dela se encheram de lágrimas mais uma vez.
— Sinto muito por não conseguir superar o bullying que eu sofri
durante anos, Scott. Realmente deve ser um inconveniente bem chato pra
vocês dois. Talvez eu devesse me desculpar por ter cancelado o casamento
com o canalha do Oliver também. Imagina que lindo se nós dois
entrássemos para a família. Aposto que Emma adoraria isso — respondeu,
irônica.
Um silêncio mortal reinou naquela casa depois disso. É só uma
hipótese, mas criei a teoria de que esse era um assunto pouco falado entre
eles.
Parecia que anos haviam se passado quando Oscar finalmente
limpou a garganta e deu um passo à frente.
— Você tem razão, Sam. Não fui uma pessoa boa. Não tenho
ninguém para culpar além de mim mesmo e de como decidi agir em nome
dos meus sentimentos. Eu… Eu sentia ciúmes — confessou ele, sem graça.
— De você com a Emma. A minha irmã era a minha melhor amiga. Eu a
amava mais do que tudo, e, de repente, ela só andava com você. Oliver
sempre teve uma quedinha por você e tudo parecia tão mais fácil. Os irmãos
Samuels eram os favoritos de todos. Davam as melhores festas, chamavam
atenção por onde passavam, tinham tantos amigos. Por que você queria
andar tanto com a Emma sendo que tinha tantas outras amigas? — Sua voz
errou um tom, e ele pigarreou. — Hoje eu vejo o quanto isso era errado.
Emma não tinha mais ninguém por ela até você chegar, e foi egoísta da
minha parte querer privá-la disso. Sam… Eu só queria te pedir desculpas.
Não só pelo meu comportamento horrível nessa época, mas também pelo
que eu te disse depois que a Emma morreu. Você não tinha culpa de nada.
Se alguém precisava ser responsabilizado pela morte dela, era Oliver e eu.
Na noite em que Emma estava bebendo, falávamos de você. Ela sentia tanto
a sua falta que irritava. Sempre se lamuriava sobre o quanto tinha sido
injusta contigo e que queria ser sua amiga de novo. — Ele fez uma pausa,
deixando todos nós na expectativa. — Estávamos tentando convencê-la de
que seria uma péssima ideia. Que você jamais a perdoaria. Que ela tinha
passado dos limites depois de ter te xingado daquele jeito. Emma não quis
saber e pegou a chave do carro. — A voz dele treme, e, do nada, pareceu
ficar mais difícil de engolir. Um “não” baixinho foi ouvido, e vi Sam
arregalar os olhos, o queixo tremendo por causa das lágrimas não
derramadas. — Eu não a impedi de pegar as chaves do carro, Sam. Nem
Oliver. Apenas assistimos ela sair com o carro, achando que o máximo que
poderia acontecer seria ela levar uma multa e ficar de castigo por anos. —
Quando Oscar virou o rosto para encará-la nos olhos, me deu muita vontade
de abraçá-lo.
Por sorte, Sam decidiu fazer exatamente isso. Envolveu-o em seus
braços e continuaram conversando em particular. Confirmações de cabeça e
sussurros eram tudo o que tínhamos quando, então, ela segurou Oscar pelo
ombro e murmurou, emocionada:
— Eu te perdoo.
Viu? Foi fácil assim. Às vezes, tudo o que as pessoas precisam é de
um verdadeiro arrependimento e uma boa conversa. Talvez até de…
— Mas não estou pronta para conviver com você. Respeito que você
esteja com o meu irmão e juro que vou tentar deixar o passado lá atrás, mas
ainda não estou pronta. Principalmente depois de descobrir o que o seu
irmão tramou para mim anos atrás. O que, a propósito, com certeza você
sabia — respondeu, arqueando as sobrancelhas. — Mas pode dormir. Lance
e eu vamos para um hotel.
Ok, então…
Depois que pegamos nossas malas para ir para o nosso hotel, Scott
abriu a porta da casa para nós dois. Era nítido o seu descontentamento ao
ver a irmã caçula indo dormir em um hotel, principalmente após o funeral
do avô.
Ainda assim, ele ficou em silêncio e a respeitou.
Quando colocamos as malas no Táxi, Samantha o chamou.
— O que foi?
— Eu não te odeio mais.
Ah, os irmãos…

É engraçado o quanto as coisas podem mudar em poucos meses.


Depois de sairmos do resort, Samantha veio morar comigo. Para ser
honesto, não é como se ela tivesse muita escolha. Depois que a nossa
entrevista foi ao ar, nosso noivado passou a ser mais vigiado do que o do
príncipe Harry com a Meghan Markle. Juro, existia um paparazzo
escondido em cada esquina.
Estávamos nos preparando para anunciar a qualquer momento sobre
o bebê. A barriga de Sam ainda está praticamente imperceptível, mas
sabemos que é só questão de tempo para ficar nítida.
O que me leva à questão do casamento. Não tocamos mais no
assunto desde que voltamos a San Diego. O fato de que eu entrei em um
ritmo insano de trabalho com certeza colaborou, mas eu estava louco para
fazer a pergunta.
— Já decidiu como vai fazer o pedido dessa vez? — me pergunta
Charles quando estamos no vestiário do CT.
— Eu já pedi. Duas vezes.
— Cara, a primeira nem contou. Você tinha acabado de descobrir
sobre a gravidez. Nenhuma mulher vai levar a sério. — Revira os olhos, me
encarando como se eu fosse o homem mais burro do mundo. — E a
segunda vez foi até fofinha, mas sabemos que pedidos têm prazo de
validade. Infelizmente, uma tragédia acabou acontecendo na noite que você
escolheu fazer a surpresa, mas temos que lidar com isso.
— É mesmo?
Ele assente lentamente com a cabeça.
Eu, por outro lado, suspiro.
— Sei lá, cara. Sam não se recuperou totalmente do luto. Tem dias
em que ela lembra do avô com carinho e passa horas conversando sobre ele,
só para cair no choro em seguida e se recusar a sair da cama. Acho que ela
precisa de um tempo para se recuperar.
Charles me puxa pelo ombro, me dando um abraço meio torto antes
de colocar a boca na minha orelha.
— Lance, sinto muito em te dizer isso, mas não se recupera de um
luto. Você aprende a conviver com ele. A dor do início é insuportável. Você
começa a perder o sentido da vida, se questiona sobre tudo. Começa a
cogitar, inclusive, se não quer se juntar à pessoa que se foi. — Seus olhos
normalmente tão brincalhões estão nublados por uma seriedade que me
pega de surpresa. — Olha, odeio falar nesse assunto, mas sinto que você é
meu parceiro de verdade, então vou contar.
— Opa, valeu. Anos de amizade que até então você não
considerava, era isso?
Ele revira os olhos.
— Não seja tão dramático, Lance. Mas então, perdi minha mãe
quando tinha quinze anos. A minha sorte foi ter tido o futebol. Ele me
ajudou a não me afundar em um poço de autopiedade e depressão. Todo
mundo fala sobre como é difícil o ato de perder alguém, mas pouco se fala
no depois. E, acredite em mim, o depois é cruel. Chorar no funeral não é
nada se comparado a quando você consegue o que sempre sonhou, mas não
tem mais a pessoa que sempre te incentivou ao seu lado para comemorar. O
dia em que consegui a minha bolsa na universidade? Disquei o número dela
no meu celular. Foi involuntário. Chamou por um tempo, e depois um cara
atendeu. Me caiu a ficha de que ela não existia mais nesse universo para
ouvir as minhas conquistas. Foi o dia em que eu mais chorei depois de
perdê-la. — Ele balança a cabeça, o olhar perdido. — Com o tempo, a Sam
vai conseguir olhar para tudo o que viveu com o avô e dar boas risadas. Ela
vai sentir saudade, mas também gratidão. Vai querer voltar no tempo, mas
entender que ele está em um lugar melhor. Confie em mim, o melhor que
você pode fazer por ela nesse momento é lembrá-la de que ela ainda está
viva. Não desista de vocês dois, não desfaça os planos. Faça-a viver. Tudo
bem?
— Uau. Acho que eu nunca te vi conversando assim antes. Tão…
Sério.
Ele dá de ombros, abrindo um sorriso presunçoso tão característico
dele.
— Eu tenho os meus momentos, mas valeu.
— Não sabia que você tinha perdido a sua mãe, cara. Sinto muito.
— Tudo bem. Como eu disse, não costumo sair falando pra qualquer
um. As pessoas fingem que se importam, mas na verdade não estão
confortáveis com a dor do outro. A vulnerabilidade assusta mais do que a
raiva. Então, eu preferi ter raiva. Fui um adolescente rebelde antes de entrar
para a faculdade. Meu pai teve muito trabalho comigo.
— Depois vou precisar de uns conselhos sobre isso também. O
irmão mais novo dela, Seth, aparentemente também escolheu a raiva.
— Sempre às ordens. Mas acredite em mim, o melhor é dar tempo
ao tempo.
— Entendido.
— E faça um pedido de casamento legal dessa vez, Lance. Sem
luzes e florzinhas. Uma coisa mais a nossa cara na época da faculdade.
Traga um barril de cerveja e vamos comemorar!
Reviro os olhos, reprimindo a vontade de dar um soco de
brincadeira em seu ombro. Mas, por outro lado… Ele até que me dá uma
ideia interessante para o terceiro pedido de casamento que estou prestes a
fazer para Sam.
O. Terceiro. Pedido.
Nem vou ficar pensando nisso por muito tempo ou então é capaz de
eu entrar naquele apartamento, me ajoelhar e implorar para aquela mulher
ser minha esposa de uma vez.
— Valeu mesmo, Charles. Você é um bom amigo. Tirando as vezes
em que me enfiou em mais confusões do que eu poderia contar.
Ele ergue as mãos como quem diz “eu sou o maioral”.
— Não há de quê.
Antes que ele possa sair do vestiário, eu o chamo uma última vez.
Quando ele está perto o suficiente, eu seguro seu ombro com uma
mão, enquanto uso meu joelho para acertá-lo nas bolas. Ele cai, gritando de
dor enquanto segura seu bem mais precioso com as duas mãos.
— Isso foi por você ter ficado com a Sam na faculdade. Agora
estamos quites.
Eu tive tudo, e então a maior parte de você
Um pouco, e agora nada de você
Me leve de novo para a noite que nos conhecemos
The Night We Met |Lord Huron

Vovô adorava borboletas.


Ele costumava dizer que lembravam a minha avó Mary. O bater das
asas o confortava, pensando que ela poderia ter assumido a forma de uma
borboleta azul antes de partir.
Não me lembro muito bem de como ela era ou do que mais amava
fazer. Mas quando penso na minha avó, o gosto de panquecas com mirtilo
automaticamente preenche as minhas lembranças.
Ela adorava cozinhar para a gente. Ela adorava passar horas
cantarolando qualquer música dos anos setenta enquanto assistia sitcoms na
televisão. Sua risada também era contagiante. A forma como ela rodopiava
pela sala, sempre arrancando risadinhas do meu avô quando se
desequilibrava e caía.
Vovó era bem estabanada. Do tipo que sempre aparecia com uma
mancha roxa na perna e não sabia nos dizer de onde tinha vindo. Ela
adorava usar um robe de seda pela casa porque achava as roupas normais
desconfortáveis.
Ela enchia a nossa casa de vida.
Me lembro vagamente de como tudo ficou sem brilho depois que ela
nos deixou. Me recordo vividamente de como tudo mudou para o meu avô
desde então.
— Vovô, está triste? — perguntei, na minha inocência de criança,
quando o vi enxugar uma lágrima em uma tarde qualquer.
Ele conseguiu abrir um sorriso para mim, embora este não chegasse
aos seus olhos.
— Estou, minha princesinha. Estou de coração partido — respondeu
ele, sendo modesto até demais a respeito da própria tristeza. — Perdi a
minha melhor amiga.
— E nós não vamos ver mais a vovó? Nunca mais?
— Nós vamos vê-la sim, princesa. Torço para que eu seja o primeiro
a reencontrá-la. Mas todos nós estaremos juntos um dia. Isso eu posso
garantir.
Não entendi na época o que ele queria dizer. De uma maneira
superficial, eu sabia o que era a morte. Mas eu não a entendia como um
todo, não sabia o que significava morrer.
— Mal posso esperar para reencontrar ela, vovô.
Os olhos dele encheram de lágrimas. Eu não entendia. Por que ele
ficava tão triste sendo que aquilo não era um adeus, mas sim um até breve?
Como eu gostaria de voltar atrás. Se eu pudesse pedir um desejo
para o universo, um apenas, eu pediria, pelo amor de Deus, que me desse
um dia comum. Um desses dias que não tem nada de especial e você mal se
lembra do que comeu, quem dirá de tudo que fez. O dia que a sua mãe tira
para lavar a roupa, que seu irmão passa a tarde jogando videogame, que seu
pai lê o jornal à mesa. Um dia que seus avós aparecem de surpresa com
doces e entregam escondido para você quando ninguém está olhando.
Todos jantam macarrão com queijo. Alguém faz um comentário
sobre a escola, e você revira o olho porque é descolada demais para ouvir
sermão de todas aquelas pessoas mais velhas. Seu irmão não para de mexer
no celular, porque tem uma festa acontecendo em algum lugar e ele queria
muito ir. Não deixam. Ele se irrita, e você tira sarro dele por isso.
Vocês discutem. Brigam. E, depois, alguém muda de assunto. Todos
dão risada. Fica muito tarde e está na hora de todos irem para a cama, mas a
conversa, de repente, ficou interessante.
E você encara aquela cena. A mesa cheia com as pessoas que você
mais ama no mundo interagindo entre si. É algo tão comum e rotineiro que
nem sequer passa pela sua cabeça que um dia você não terá mais aquilo
sempre. Que um dia as pessoas vão partir. Que, pouco a pouco, aquelas
cadeiras vão ficar vazias. Algumas novas irão se juntar, e outras vão virar
lembranças.
Deus, como eu queria um desses dias. Um dia comum. Um dia que
até então fazia parte da minha rotina.
A caminhonete velha e que eu vivia reclamando por não ter ar-
condicionado. Os verões no Acampamento Frozen Lake quando eu queria
estar com as minhas amigas em festas durante as férias.
A pior parte do luto, de perder alguém, não é enterrá-lo. Não é
quando você recebe a notícia. Passado o desespero inicial, você até
consegue se convencer de que vai ficar tudo bem. Vai ficar tudo bem.
Muitas vezes, nem se lembra de como tudo aconteceu. Seu cérebro apaga as
memórias para preservar a sua saúde. Ele não quer que você entre em pane
e acabe tendo um problema sério.
E então, numa quarta-feira qualquer, você está andando na rua e vê
uma promoção do perfume favorito. Aquele que a pessoa sempre usava.
Sua primeira reação é pegar o celular e tirar uma foto para avisar, e então a
ficha cai.
Você fica sem chão.
Procura por ar, mas, de repente, tudo voltou.
E a realização de que não existe mais aquela pessoa ali tira você do
rumo. Te deixa fora de si. Aérea. Confusa. Irritada. Com raiva. Com medo.
Com ódio. Angustiada.
Com saudade. Tanta, tanta, tanta saudade que é como sufocar. Como
as pessoas vivem normalmente depois de perderem alguém que amam
tanto? Como sobrevivem a isso?
E então eu me lembro da minha avó Mary. E em como, lentamente,
toda a dor do luto começou a ser substituída pelo sentimento doce da falta
que ela fazia.
Em breve, todas as lembranças que mais causam dor, sofrimento e
desespero vão trazer acalento. Vão fazer você abrir um sorriso bobo e se
sentir tão grata por viver aquilo que você se sentirá a pessoa mais sortuda
do mundo.
Com o tempo, vocês voltarão a se sentar na mesa do jantar. Novas
pessoas podem fazer parte daquele momento. Seu irmão casa e tem filhos.
Você se casa e tem filhos. E um domingo à noite, vocês vão lembrar de
quando os seus avós apareceram com doces escondidos. Todos vão rir. As
crianças vão pedir por mais histórias, e todos vão lembrar das melhores para
contar. Seu coração vai apertar com a saudade, mas também vai encher de
alegria ao ver aquelas pessoas emocionadas por escutarem aquela história
hoje tão distante.
Na cultura mexicana, você só morre quando a última pessoa se
esquecer de você. No Día De Los Muertos eles celebram aqueles que
partiram para relembrá-los e mantê-los vivos.
É então que você percebe que, de certa forma, esses momentos
sempre acontecerão. Na sua cabeça, na mente de novas pessoas, mas
estarão ali. Ninguém pode arrancá-los de você.
Depois dessa realização, você passa a ter esperança. E o conforto de
que, um dia, você vai poder encher a mesa de jantar novamente. Não só
com aqueles que você perdeu, mas também com os que não teve sequer
chance de conhecer.
O que morreu, não permanece morto
O que morreu, não permanece morto
Você está vivo, você está vivo na minha cabeça
Marjorie | Taylor Swift

Se passaram três meses desde que dei adeus para o vovô. Meu maior
conforto está sendo imaginá-lo agora ao lado de seu grande amor, a vovó
Mary, cercado de todos os amigos e conhecidos que foi perdendo conforme
os anos se passaram.
Lance e eu começamos a morar juntos imediatamente depois de
deixarmos o resort. Tivemos uma conversa sobre o futuro do nosso bebê e
como gostaríamos de cuidar da nossa família.
É, ainda não me acostumei totalmente com isso. Para ser sincera,
uma parte de mim não se sente totalmente confortável em pegar Lance de
volta pra mim. De certa forma, é como se algo pairasse sobre nós. Como se
a qualquer momento tudo fosse desmoronar.
Meu receio pode ter fundamento, mas também me deixa apreensiva
com relação a ele. Quero dizer, nós transamos quase todos os dias, muito
obrigada. Além do mais, sei que ele não está saindo com mais ninguém,
assim como eu. Teoricamente, estamos em um relacionamento sério, mas
ele não me pediu em casamento de novo. Nem tocamos no assunto —
provavelmente por causa do trauma causado pela perda do meu avô.
Secretamente, eu sempre agradeço Lance por respeitar o meu tempo.
Perder Emma quando éramos tão jovens me trouxe cicatrizes e
traumas que não estão sendo fáceis de curar. E a pior parte de tudo isso é
colocá-lo nessa posição. Estou sempre esperando o pior. Sempre dando um
jeito de fugir. Acostumada a ver o castelo ir abaixo depois de poucos
minutos de felicidade.
Não fomos a público anunciar a gravidez ainda, embora alguns fãs
já tenham começado a especular. Um dia, fui até o mercado comprar
algumas coisas para preparar o nosso jantar, e um paparazzo conseguiu um
ângulo bom da minha barriga.
Lance me assegurou que não precisava me preocupar. De acordo
com ele, todos receberiam a notícia muito bem. Isso acabou nos levando até
Sean, que quase saltou de felicidade ao saber do bebê.
Aparentemente, uma gravidez seria perfeita para o nosso noivado
(nem tão) falso.
— Fico feliz que o nosso filho seja conveniente para os seus
negócios — debochei, mesmo entendendo o lado profissional.
Não estou mais trabalhando para Lance. Não formalmente, pelo
menos. Sean contratou uma agência renomada do Texas para lidar com o
seu gerenciamento de carreira, e enquanto isso, aproveitei para me
recuperar do baque que estava vivendo. Decidi ficar em casa e curtir a
gravidez com o máximo de tranquilidade possível. Já tinha tido a minha
cota de estresse para o resto da vida.
Lance, é claro, concordou na mesma hora. Ainda não conversamos
sobre como vou manejar a minha carreira depois que o bebê nascer, mas
essa é uma questão que vou deixar para a Samantha do futuro.
É uma manhã de quarta-feira quando acordo com o meu celular
tocando. Ultimamente, tenho dormido até às dez, e quando levanto, Lance
já está no centro de treinamento há horas. Mesmo assim, ele ainda continua
com o hábito de deixar o meu café da manhã pronto.
Fofo.
Ao pegar meu celular, me surpreendo com a quantidade de
mensagens vindas de um número que não reconheço. Franzindo o cenho,
desbloqueio a tela para conseguir visualizar.
— Que merda é essa?
Meu coração acelera conforme vou me dando conta do que está
acontecendo. Meu ex-noivo sem noção, mais conhecido como Oliver, está
me bombardeando com mensagens agressivas.
“Você terminou comigo para dar mesmo pra ele, não é, Samantha?
Você está grávida? Diz que isso é mentira!”
“Estava convencido de que todas aquelas notícias e fotos
comprometedoras de vcs era uma farsa. Disse para os meus pais que aquela
entrevista era forjada pq ele estava com a imagem ferrada. Realmente achei
que você era uma profissional, mas não passa de uma vagabunda.”
Por mais que eu tenha plena consciência de que esse verme não tem
o direito de me cobrar a respeito de nada, ainda assim dói. Sou
imediatamente transportada para o ensino médio, quando Oscar murmurava
palavras parecidas quando passava por mim nos corredores.
As risadas altas ao meu redor. As pessoas erguendo as sobrancelhas
de maneira sugestiva.
Ele não tem mais poder sobre você, Samantha.
Nem me dou o trabalho de responder. Apenas bloqueio o número,
me sentindo mais vulnerável do que nunca. Quando estou com o corpo
imerso na água quente da banheira, me permito derramar algumas lágrimas.
Não por causa desse babaca, mas por causa de todo o resto. Por Emma, que
infelizmente cresceu com Oliver sendo seu exemplo de irmão mais velho.
Por termos nos afastado por causa de um mal-entendido. E por ela ter
perdido a vida tão jovem.
Depois que termino de tomar café da manhã, a campainha começa a
tocar.
Estranho.
Lance e eu não recebemos muitas visitas. Seus irmãos estão
tentando marcar uma visita conjunta à cidade faz semanas, mas eles teriam
avisado se decidissem aparecer do nada, não é?
— Samantha! — O tom de voz rouco me faz arrepiar.
A pessoa está claramente bêbada. Continua esmurrando a porta,
apertando a campainha do apartamento incessantemente.
Como ele conseguiu subir até aqui?
— Eu sei que você está aí, porra. Abra a porta!
Vai sonhando, meu querido.
Eu estou sempre assistindo programas de True Crime sobre Serial
Killers. Não abro essa porta nem a pau.
Mas… A curiosidade está falando mais alto, e por isso me aproximo
um pouco mais da porta. Enquanto tento escutar os murmúrios irritados do
ser humano do outro lado dela, envio uma mensagem para Lance. Sou curta
e grossa, apenas comunicando que alguém pode ter invadido o nosso
apartamento.
Em seguida, mando uma mensagem para a segurança do prédio.
— Olha, não sei quem você é — resmungo em resposta. — Mas a
segurança já está ciente da sua tentativa de invasão. Eles vão aparecer a
qualquer momento e tirar você daqui. É melhor ir embora.
Uma risada sinistra ecoa.
— Você não está mesmo me reconhecendo, amor?
Arfo.
— Oliver? O que está fazendo aqui?
— O que você acha, Samantha? Estou atrás da porra da minha
noiva!
— Você andou bebendo e com certeza não sabe o que está fazendo.
Nós não temos mais nada, seu maluco.
— Você decidiu sozinha que queria acabar. Nunca tivemos uma
conversa a respeito. Não concordo com o término.
Era só o que estava faltando para terminar o meu ano com grande
estilo. Ser presa por homicídio após ouvir uma frase dessas.
— Você pode ir se foder, Oliver. Que tal? Você está de acordo?
Escuta aqui, seu idiota. Nós terminamos. Não tenho nada com você e quero
que me deixe em paz.
Ele soluça.
— Você acabou com a vida da minha irmã.
Cretino. Maldito. Filho da puta do mais baixo nível.
— Não adianta usar a Emma contra mim. Eu sei que você foi o
responsável por mostrar a foto para ela. Além do mais, Oscar e eu
conversamos sobre o assunto. Ele me contou o que aconteceu na noite em
que ela pegou o carro — respondo, determinada. — Se acha que vai
conseguir me manipular como fez naquela época, está enganado. Não sou
mais a menina assustada que perdeu a melhor amiga, Oliver. E você deveria
ter vergonha de se prestar a esse papel. Caramba, você é pai!
— Você prometeu que ia me esperar. Você aceitou o meu pedido de
casamento!
— Éramos crianças, pelo amor de Deus. A maior burrice da minha
vida foi ter levado esse compromisso a sério quando você, obviamente, não
o fez.
— Eu também levei a sério! Larguei tudo pra voltar pra você!
Suspiro, encostando a testa na porta.
É a mesma coisa que conversar com uma parede. Ele não vai me
ouvir. Está convencido de que fui infiel, quando, na verdade, nunca
deveríamos ter ficado juntos. Pensando a respeito, eu aceitaria ver o Lance
com outras meninas enquanto esperamos para nos casar?
Nem por cima do meu cadáver.
— Oliver, vai pra casa. Não existe mais nada entre nós.
Escuto um fungado baixinho.
— Não me importo que você esteja grávida. Nossos filhos podem
ser amigos — divaga ele, embolando a língua. Deve ter passado a noite
virando doses de tequila, como sei que gosta de fazer. — Nossa família não
precisa ser tradicional. Eu te perdoo, você me perdoa, e vamos ser felizes.
Jesus. Interdição urgente.
Estou quase abrindo a porta para pedir com jeitinho para esse idiota
se mandar, quando escuto-o engasgar. Em seguida, um barulho estridente
me faz dar um pulo.
Oliver faz um barulho inaudível. Como se estivesse sendo
engasgado. Ao longe, consigo ouvir um “repete isso, filho da puta!” com
um tom mortal.
Abro a porta na mesma hora, já ciente do que meus olhos estão
prestes a ver.
Lance está segurando Oliver contra a parede. A mão está apertando
seu pescoço, enquanto meu ex implora por ar.
Ai, meu Deus.
Ela se foi para o paraíso
Então eu tenho que ser bom
Assim poderei ver o meu amor
Quando deixar este mundo
Last Kiss | Pearl Jam

— Repete isso, filho da puta! — desafio, observando o cuzão abrir a


boca em busca de ar.
Um som reverbera atrás de mim, e escuto o arfar chocado de
Samantha.
— Lance!
— Entra, Sam. Você não deveria ver isso.
Mas ela, sendo petulante como é, não consegue fazer isso. Muito
pelo contrário, ela para ao meu lado e começa a tentar empurrar minha mão
para longe.
— Pelo amor de Deus. Você vai fazer o quê? Matá-lo? — Revira os
olhos. — Não vou visitar o pai do meu bebê na prisão.
Rangendo os dentes, eu pressiono ainda mais o corpo daquele
desgraçado contra a parede. Quem ele pensa que é para falar daquele jeito
com a minha mulher?
— Isso não pode ficar assim, Samantha. Ele não pode tentar invadir
o nosso apartamento sem sofrer as consequências.
— Eu concordo. Mas vamos chamar a polícia e deixar que eles
lidem com Oliver — responde, de queixo erguido. — Esse babaca vai ter o
que merece.
Meio a contragosto, solto o infeliz. Ele começa a respirar fundo, os
olhos injetados desviando de Samantha para mim e vice-versa. Arqueio a
sobrancelha, vendo-o engolir em seco.
— Se você se aproximar dela de novo, isso vai terminar bem
diferente — ameaço.
O imbecil parece finalmente ter caído em si. O cheiro de bebida
barata não me deixa dúvidas de que deve ter enchido a cara a noite inteira.
A polícia não demora muito para chegar. Samantha não quer prestar
queixa por consideração ao cunhado, Oscar, mas eu estou cagando para
isso.
— Eu quero prestar queixa — digo, travando o maxilar.
Sam me encara com certo receio, mas respeita a minha decisão. Ela
pode não ter medo desse idiota, mas eu jamais vou aceitar colocá-la em
risco novamente. Só de pensar que ela esteve sozinha com ele… Meu
coração aperta.
Os policiais o mantém detido enquanto eu levo Sam de volta para a
nossa casa. O caminho é silencioso, com nenhum dos dois tendo muito o
que dizer.
Quando estamos de volta na minha sala, ela é a primeira a quebrar o
silêncio:
— Sinto muito.
Franzo o cenho.
— Você não precisa me pedir desculpas.
— Preciso sim — responde, determinada. — Preciso pedir
desculpas por ter hesitado na hora de prestar queixa. Por não ter te dito
imediatamente que Oliver me mandou uma mensagem agressiva essa
manhã. Por estar fugindo de você desde que nos reencontramos. E
também… — Ela engole em seco. — Por ter ido embora, em primeiro
lugar.
Dou um passo à frente.
— Sam, não. Você tinha os seus motivos.
— Mas é aí que está. Eram motivos idiotas!
Bufo.
— Não eram idiotas. Oliver é um manipulador e um canalha. Ele
sabia muito bem o que estava fazendo quando fez você acreditar que tinha
alguma culpa na morte da sua melhor amiga. Ele se aproveitou da sua
empatia para te prender em um relacionamento completamente
disfuncional. Você era só uma menina, Samantha.
— Tive uma boa criação, Lance. Isso não deveria acontecer com
uma garota como eu — diz, culpada. — Meu avô teria vergonha de mim se
soubesse…
— Ei… — Coloco minhas mãos em seu rosto, fazendo-a me
encarar. — Jamais, em hipótese alguma, repita isso novamente. Seu avô
tinha um orgulho do caralho de você, Sam. Além do mais, não existe isso
de “tive uma boa criação, manipuladores não deveriam poder me enganar”.
Esses caras usam qualquer brecha para se infiltrar, e até mesmo a filha do
presidente está correndo risco. Gente assim usa da vulnerabilidade das
pessoas para controlá-las. E repito: você era só uma menina.
Os olhos de Samantha se enchem de lágrimas. Ela morde o lábio
inferior, o queixo tremendo. Ela está cada vez mais emotiva e com certeza é
por causa da gravidez, mas evito falar a respeito.
Sei muito bem que não é necessário muito para deixar uma grávida
furiosa.
— É só que… Eu te amava, Lance. De verdade.
Meu coração dispara.
— Eu também te amava, Sam.
— Tínhamos uma coisa rara. Eu deveria ter me agarrado naquilo ao
invés de ter voltado para Oliver por causa de um sentimento de culpa.
Não poderia concordar mais, penso.
Mas não digo isso. Apenas anuio, abrindo os braços para recebê-la.
E é o que ela faz, encostando o nariz gelado no meu pescoço quente.
Estremeço com o contato, o que a faz sorrir.
— Eu ainda te amo — digo, após alguns segundos em silêncio. — E
espero que, com o tempo, você aprenda a me amar novamente.
Ela literalmente congela. Seus movimentos param por completo,
enquanto ela ergue o rosto para me encarar.
— Lance, eu…
— Não precisa me dizer isso agora. Você está grávida, talvez os
hormônios estejam te influenciando. Só quero que saiba que estou aqui por
você. Para sempre, Sam. Eu quero estar com você mais do que tudo, mas
quero, principalmente, a minha melhor amiga de volta.
Samantha pisca os olhos rapidamente, tentando conter as lágrimas
que ameaçam transbordar a qualquer momento. Em seguida, recupera o
fôlego, voltando a se aninhar contra mim.
E quer saber? Não ligo se essa não é uma história de amor
tradicional. Não ligo se ainda temos uma longa caminhada para percorrer.
Quero essa mulher com tudo que há em mim. Estou disposto a lutar.
E como aconteceu na primeira vez…
Samantha será minha. E quando finalmente admitir isso para si
mesma, será para sempre dessa vez.

Oscar nos liga no dia seguinte para se desculpar em nome do irmão.


Ele explicou que teve que pagar uma fiança para conseguir tirá-lo da cadeia,
e jurou que Oliver parecia envergonhado quando contou o que aconteceu.
Aparentemente, ele ainda não havia superado Samantha. Não posso
dizer que o culpo por isso, mas é inadmissível o que aconteceu. Digo para
Oscar que se houver uma segunda vez, o desfecho será bem diferente.
— Ele está ciente, Lance. Nossos pais também decidiram intervir.
Eu sinto muito, de verdade — disse, com as bochechas vermelhas.
Por mais que o clima entre Scott e Samantha tenha começado a
amenizar, sinto que teremos uma longa jornada. Traumas não são superados
de um dia para a noite, mas vou dar um voto de confiança para Oscar. Ele
parece estar se esforçando.
— Seus irmãos já decidiram quando vão nos visitar? — pergunta ela
como quem não quer nada.
Samantha quer ser oficialmente apresentada à minha família assim
como eu fui à sua, e acho justíssimo. Meus pais estão mais ansiosos do que
nunca para conhecê-la, e meus irmãos… Bom, Logan e Lucian estão bem
animados para dar as boas-vindas oficiais à Sam.
Ela ainda vai ter que passar pelo crivo de Lydia, no entanto. E já
venho preparando-a para esse momento.
— Sua irmã não deve ser tão ruim assim.
— Ela não é ruim de maneira alguma, só muito superprotetora.
Recomendo não comentar sobre o fato de você ter quebrado o coração do
irmãozinho dela na época da faculdade.
Sam abre a boca, ultrajada.
— Eu jamais diria isso.
— Então vai ficar tudo bem. Na pior das hipóteses, ela vai soltar
alguns comentários ácidos e depois virar sua melhor amiga. Ela finge ter
esse ciúme porque é a única menina, mas tem um coração bem mole.
— Anotado.
Coloco a mão atrás das costas, envergonhado.
— Mas não diga a ela que eu disse isso. Ou então é capaz de eu ser
banido da família.
— Vou usar essa informação como barganha, então. Você está na
minha mão, Moreau.
Cruzo os braços.
— E desde quando não estive?
Ela enrubesce e eu sinto um calor subir pelo meu peito.
Hoje é o grande dia e eu mal posso esperar.
Charles conseguiu arranjar tudo com os outros caras do time. Eles
passaram horas me ajudando a escolher a melhor forma de pedi-la em
casamento, oficialmente dessa vez. E enquanto não tínhamos a liberação do
nosso treinador, fui tentando amaciar o terreno.
Continuei preparando o café da manhã dela todos os dias.
Fiz maratonas de filmes de baixo orçamento todas as noites.
Assisti a mais de duzentos episódios de Friends sem parar.
Me tornei expert em massagem nos pés e nas costas.
E, claro, a fazia gozar todas as noites.
Lentamente, comecei a perceber uma abertura maior de Samantha
com relação a mim. Um olhar demorado quando me observava de longe.
Um sorriso admirado quando acompanha os meus treinos.
Uma confiança que estava sendo lentamente estabelecida.
Não a culpo por não querer se jogar de uma vez. Ela passou por
muita coisa, enquanto eu, não.
É óbvio que todos nós temos momentos ruins na vida. Mas por pura
sorte, não experimentei nenhuma perda na família ou de alguém próximo.
Minhas ex-ficantes são todas muito gente boa, além de nunca terem surgido
novamente na minha vida para me infernizar. Meus irmãos são incríveis e
nunca fizeram nada que colocasse à prova o amor deles por mim.
Quero dizer, a mulher tem um milhão de motivos para ter um pé
atrás com as pessoas. E mesmo assim, ver como ela está tentando dar uma
chance a nós, só faz a minha admiração aumentar ainda mais.
Se tem uma palavra que descreve perfeitamente bem a Sam, essa é
resiliência.
— Por que estamos indo para o centro de treinamento tão cedo,
hein? — resmunga ela, bocejando.
A barriga já está mais aparente. Sinto meu coração saltar do peito
sempre que me cai a ficha de que em poucos meses teremos um ser humano
com as nossas características correndo por aí.
Metade eu, metade ela.
— Porque tenho que entrar às seis da manhã, amor.
— Mas por que eu tenho que ir? — Ela faz um biquinho tão fofo
que eu não resisto.
Dou um beijo carinhoso em seus lábios, mandando-a direto para o
chuveiro.
— Porque não quero deixar você sozinha aqui hoje. Não enquanto
não nos mudarmos.
E, tecnicamente, não é uma mentira. Estamos em busca de um
apartamento maior por causa do bebê, mas também por causa da falha de
segurança. Descobrimos que Oliver se passou pelo irmão mais velho da
Sam para entrar, e os canalhas nem se preocuparam em ligar para ela antes
de autorizar a entrada.
Inadmissível.
Quando chegamos ao estádio, minhas mãos estão suando. Samantha
está sonolenta, coçando os olhos conforme passamos em direção ao
vestiário. Prometi para ela que poderia ficar dormindo na sala da família
enquanto eu trabalho, mas na verdade tenho outros planos.
— Não estamos fazendo o caminho até a sala da família — observa
ela, arqueando a sobrancelha para mim.
Dou de ombros, como quem não quer nada.
Ela estreita os olhos pra mim.
— O que você está aprontando, Moreau?
— Nada, Samuels. Só siga em frente.
Mesmo desconfiada, Sam faz exatamente o que pedi. Quando
estamos na entrada do campo, ela dá um passo para trás. Eu incentivo que
continue andando, e ela o faz, desconcertada.
— Meu Deus. — Coloca a mão sobre a boca, completamente pega
de surpresa.
Os caras foram incríveis. Estão todos enfileirados, igualzinho no
trote da faculdade em que nos conhecemos. No gramado, há um coração
enorme feito com pétalas de rosa. Tentei argumentar que essa era a ideia
mais brega de todas, mas Charles contra-atacou dizendo que todo pedido de
casamento em público acabava sendo brega de uma forma ou de outra.
— Essa é a graça, irmão.
Acabei concordando. Não tinha muito o que reclamar, já que boa
parte dessa ideia maluca tinha vindo dele.
— O que está acontecendo? — pergunta Samantha, abrindo um
sorriso ao ver a cena. — O que está escrito nas camisetas?
Faço um meneio de cabeça na direção dos caras.
— Por que você não vai ver?
Ela morde o lábio inferior, hesitando por poucos segundos até
finalmente tomar coragem e ir até eles.
Sigo logo atrás, com meu coração martelando em meus ouvidos.
Todos eles estão usando camisetas com uma frase. Uma pergunta.
Algo que eu já estava querendo perguntar há tempos.
“Samantha… Você quer se casar comigo?”.
Quando ela lê a primeira camiseta, arfa. Enquanto ela termina de
vasculhar o restante dos meninos, fico de joelhos, finalmente pegando a
caixinha verde-água com as mãos tremendo.
Porra, Lance. Não estrague tudo.
Assim que Samantha gira nos calcanhares lentamente para me
encarar, abro um sorriso. Lágrimas já estão escorrendo de seus olhos, e isso
só torna o momento ainda mais especial.
Abro a caixa, expondo o anel que comprei exatamente para ela. É
corte princesa, e tem um diamante bem no meio.
— Cadê o discurso? — brinca ela, caminhando lentamente em
minha direção enquanto limpa o rosto manchado de lágrimas.
Mantenho o sorriso complacente no rosto.
— Eu já fiz o discurso. Eu faço ele todos os dias — respondo. —
Brincadeiras à parte, acho que vai ficar repetitivo o quanto eu quero que
você seja a minha esposa, Samantha. É a terceira vez que eu te peço. Mas
muito mais do que palavras, quero provar com ações. Quero continuar
fazendo o seu café da manhã todos os dias pelo resto de nossas vidas. Quero
que os seus problemas sejam meus. Quero ter você comigo para sempre.
Você também quer?
É o minuto mais demorado de toda a minha vida. Ela dá um passo
para frente, hesitante, mas logo se joga em meus braços. Quando grita um
sonoro “sim!”, eu passo meus braços ao redor de sua cintura, alçando-a do
chão.
Nós começamos a girar enquanto os meus companheiros de time
gritam de alegria atrás da gente.
— Lance, vou acabar vomitando! — avisa ela, batendo no meu
ombro para conseguir colocá-la no chão novamente.
Quando seus olhos encontram os meus, tão cheios de esperança e
amor, não consigo resistir. Grudo nossos lábios, capturando sua boca com
irreverência. É como se fogos de artifício explodissem ao nosso redor. Meu
coração parece que vai saltar para fora do peito a qualquer momento, e eu
exploro sua boca, abrindo, pedindo passagem, sugando, desesperado para
ter o máximo que posso dela.
Por sorte, Sam também parece ter sido acometida pelo mesmo
sentimento. Ela afunda as unhas no cabelo da minha nuca, me puxando
ainda mais em sua direção. Isso me faz perder o equilíbrio por alguns
segundos, e eu seguro seu corpo firme contra o meu.
Alguns caras começam a pigarrear atrás de nós, enquanto outros
soltam risadinhas.
— Ei, arrumem um quarto! — é Charles quem grita, brincalhão
como sempre. — Ninguém é obrigado a ver vocês dois se comendo, não.
Nem me preocupo em responder. Apenas mostro o dedo do meio,
arrancando mais algumas risadas.
Viro o rosto para me certificar de que Samantha está bem. Seus
olhos continuam brilhando, as maçãs do rosto levemente coradas. Ela está
excitada.
Porra. A gravidez tem deixado Sam com muito mais tesão, e não
posso reclamar de estar sendo usado com cada vez mais frequência.
— Tudo bem? — pergunto com o tom de voz rouco.
Os olhos injetados encontram os meus, e sendo a grande
provocadora que ela é, Sam lambe o lábio inferior suavemente.
— Você ainda tem treino hoje, correto?
— Sim.
— Quanto tempo acha que temos antes de você precisar entrar em
campo? — pergunta, cheia de segundas intenções.
Sem dizer mais nenhuma palavra, eu agarro seu punho, correndo
com ela na direção do vestiário.
Uma salva de palmas ressoa atrás de nós, e a risada estridente de
Sam faz meu coração saltar.
É… Sonhos se realizam mesmo, no fim das contas.
Seus olhos são as mais brilhantes de todas as cores
Eu não quero algum dia amar outra
Você sempre será o meu trovão
Thunder | Boys Like Girls

Mal coloco o pé dentro do vestiário quando o sinto. Lance deixa


escapar um grunhido de satisfação quando me coloca contra a parede, as
mãos percorrendo toda a extensão do meu corpo sem parar.
— Meu Deus, como eu te amo… — sussurra entre os beijos
molhados que começa a deixar na minha pele.
Ele inspira, um segundo antes de descer a boca quente até o meu
pescoço. Não consigo segurar o suspiro aliviado que escapa dos meus
lábios quando sinto sua boca se mover na direção do meu queixo, onde ele
deixa uma mordidinha que me faz arrepiar.
— Você vai ser minha esposa, Sam — diz ele, com um sorriso bobo
nos lábios.
Mordo o canto da boca, sem graça.
— Estou mais do que pronta.
— Vai abrir mão do nome Samuels por mim?
Enlaço minhas mãos ao redor do seu pescoço, puxando-o ainda mais
para mim.
— Não. Vou acrescentar o Moreau, mas o Samuels vai continuar
sendo quem eu sou — digo.
Eu realmente odiei o meu nome por muito tempo. Achava ridículo,
assim como os meus irmãos também. Samantha Samuels não combinava.
Um dia, cheguei a perguntar aos meus pais porque eles me odiavam tanto
por continuarem com a tradição desses nomes combinados.
Hoje, fico mais feliz do que nunca por saber que carrego a marca
registrada do meu avô comigo para sempre.
Os dedos longos de Lance deslizam até a frente da minha roupa.
Não era intencional, mas graças a Deus escolhi um vestidinho de verão
antes de vir aqui. Ele abaixa as alças, afobado, libertando meus seios.
Ele grunhe, levando as mãos diretamente até eles.
— Nunca vou me cansar dessa visão.
É, nem eu,
Lance abaixa a cabeça para capturar um mamilo com a boca, e eu
suspiro. Meus seios estão cada vez mais sensíveis por causa da gravidez, e a
sucção lenta que ele está fazendo deixa tudo muito mais intenso. Minha
boceta se contrai à procura de algo que a alivie, e como se lesse meus
pensamentos, ele começa a descer cada vez mais a mão.
Não espero muito até retribuir o favor. Tiro a sua camiseta, jogando-
a no chão. Em seguida, minhas mãos trilham o caminho do seu abdômen.
Caramba, ele precisa mesmo ser tão lindo?
A barriga sarada é durinha contra os meus dedos, e embora eu tenha
consciência de que estamos com os minutos contados aqui, não consigo me
obrigar a ter pressa. Quero explorá-lo. Quero senti-lo. Quero que ele sinta
que eu o amo, porque é a verdade.
Amo Lance Moreau desde a primeira vez que o vi. Soa piegas e bem
clichê, mas eu realmente não acreditava na expressão “amor à primeira
vista” até que nossos olhos se encontraram naquele trote. As estrelas
pareceram se alinhar, o universo poderia ter colapsado ao nosso redor.
Houve magia. Reencontro. Talvez até tenhamos afetado linhas temporais
em outros universos.
Foi poderoso assim.
— Adoro como você me olha — diz ele, abaixando para alcançar a
minha boca novamente.
Quando nossos lábios se encontram dessa vez, estão cheios de uma
fome que me rouba o ar. Abro a boca, permitindo a passagem de sua língua.
A mão de Lance encontra a minha coxa, e eu abro as pernas, deixando que
ele se posicione no meio delas.
— Segure em mim — pede, um segundo antes de me alçar até que
eu fico com as pernas cruzadas logo acima do seu quadril.
Seus lábios não perdem tempo. Com o novo ângulo, os meus peitos
estão diretamente em sua cara. Ele faz um som engraçado, começando a
beijar e chupar os mamilos duros suavemente.
Solto um gemido ao sentir seu pau duro pressionando a minha
entrada, e não hesito em começar a me esfregar contra a sua rigidez.
Enquanto isso, Lance continua com o rosto enfiado entre os meus seios.
— Por favor… — imploro, começando a perder o fôlego.
Lance me coloca novamente no chão, dessa vez com uma
determinação no olhar que faz minha pele arrepiar.
Ele se ajoelha lentamente à minha frente, subindo meu vestido com
delicadeza conforme fica de cara com a minha boceta latejante. Reprimo
um suspiro quando ele segura a minha bunda, posicionando o meu corpo na
melhor posição para a sua boca.
Lance começa devagar. Usa primeiro os lábios para deixar um rastro
de beijos molhados no interior da minha coxa, apenas atiçando. Sua boca é
uma promessa distante que está me deixando louca. Minha visão está
embaçada de tanto tesão, seu cabelo curto sumindo entre as minhas pernas.
É a cena mais erótica que eu já vi.
Então, quando estou quase derretendo apenas com a promessa de
seus lábios em mim, ele passa a língua levemente sobre o tecido da minha
calcinha. A sensação é diferente; minhas pernas começam a tremer de
expectativa. Lance usa os dentes para deixar uma mordidinha carinhosa, e
eu sinto que posso começar a babar a qualquer momento.
Quando finalmente (finalmente!) coloca o tecido da minha calcinha
de lado, estou por um fio. Sua boca habilidosa me devora sem dó e nem
piedade, lambendo a minha boceta como se fosse sua refeição favorita. Ele
usa os lábios e na verdade todo o rosto para me dar prazer.
Suas mãos correm até os meus quadris, me mantendo paradinha
enquanto ele me chupa com vontade. Os barulhos de sucção só me deixam
ainda mais em chamas, desesperada, precisando de mais contato. Começo a
mover a cintura, cavalgando seu rosto em busca do meu prazer.
— Você fica tão linda quando esfrega a sua boceta na minha cara,
Sam — diz ele, olhando diretamente para mim.
Em seguida, me lambe devagarzinho, sem nunca desviar o rosto do
meu. A imagem é quase uma profanação. Não aguento mais a pressão de
sua boca contra mim, chupando e lambendo tudo o que encontra pela frente,
pressionando nos lugares certos. Um fio elétrico de prazer percorre a minha
coluna, e sinto que posso desmaiar a qualquer momento.
Esse homem… Ele vai acabar me matando.
Quando Lance enfia um dedo em mim, é praticamente o meu fim.
Coloco as mãos sobre a boca, com medo de ser ouvida. O gemido é abafado
quando um orgasmo poderoso estilhaça sobre mim, me deixando
momentaneamente desorientada.
É sério. Minha visão escurece, minhas pernas tremem, meu corpo
inteiro incendeia quando sou arrebatada pela sensação mais deliciosa do
mundo.
Lance continua me chupando até que volto a me recompor. Quando
percebe que já estou de volta, vai subindo os beijos até a minha barriga,
depois até o meus seios, então no meu pescoço, no queixo, e finaliza
atacando meus lábios.
Agarro seu rosto com possessividade, adorando sentir o meu próprio
gosto em sua boca.
Nós nos separamos segundos depois, ofegantes, apaixonados, sem
conseguir desviar o olhar um do outro. Seguro a barra da sua calça,
abaixando-a junto com a sua cueca até seu pau saltar livre.
Lance ri do meu desespero, murmurando um “calma” quando eu me
coloco de joelhos para retribuir o que ele acabou de me proporcionar.
Não tenho como ficar calma. Esse homem me deixou em um estado
que se eu não tiver ele na boca nesse exato momento, vou morrer.
— Que fome é essa, Sam? — provoca ele, passando o pau sobre a
minha boca devagar.
Separo os lábios, ansiosa para recebê-lo. Quando a minha língua
finalmente o toca, Lance semicerra os olhos. Começo a brincar, sem a
mínima pressa, usando os lábios para subir e descer por sua extensão.
Uso a língua para rodear seu pau, adorando sentir o gosto salgado na
boca. Ele bufa, um tanto quanto impaciente, por eu não abocanhá-lo de vez.
Sinto vontade de dizer algo do tipo “é bom quando é na sua vez, hein?” mas
prefiro guardar as minhas provocações por enquanto.
Quando ele enreda os dedos pelo meu cabelo solto, não aguento
mais esperar. Abro a boca, recebendo-o o máximo que posso. Escuto Lance
gemer, sem se preocupar com quem esteja nos ouvindo, e isso me deixa
ainda mais excitada.
— Você me deixa louco, Sam — pragueja, movendo os quadris para
frente a fim de aprofundar ainda mais o contato.
Apoio minhas mãos nele, movendo a minha cabeça para frente e
para trás sem parar. Engulo o máximo que posso dele, intercalando com
lambidas e beijos. Quando ergo o rosto para checar se Lance está gostando,
vejo-o me encarando com admiração.
Gosto pra caramba disso.
Continuo usando a boca para levá-lo ao limite, amando ver como ele
retorce os dedos entre o meu cabelo ou revira os olhos. Assim que decido
aumentar um pouco mais a velocidade, Lance se retrai. Em seguida, toca no
meu ombro, me pedindo para levantar.
— O que foi?
— Quero gozar dentro de você.
Ah, então tá bom.
Nossas bocas se encontram mais uma vez, e ele ri.
— Está cansada, Sam?
— Sim. Estou grávida, Lance. Transar contra a parede é muito
divertido e vamos fazer muito isso na nossa vida, mas acho que eu prefiro
me sentar.
Ele ri, incrédulo. Em seguida, me puxa pela mão e caminhamos em
direção aos bancos do vestiário. Lance senta, separando as coxas e dando
um tapinha em seu colo.
— Pode sentar.
— Como você é engraçadinho — resmungo, revirando os olhos. —
Mas ao invés da sua perna, tenho uma ideia de lugar muito melhor.
Lance arqueia a sobrancelha, parecendo se divertir pra caramba.
Toco seu ombro com delicadeza e isso é o suficiente para fazê-lo se
inclinar o bastante para trás. Em seguida, com toda a pressa do mundo — e
ignorando o fato de que o vestiário estará cheio de atletas já, já —, passo
minhas pernas ao redor dos seus quadris.
O pau dele está pronto para me receber, e deixo escapar um gemido
ao sentir a cabeça atiçando a minha entrada. Lance brinca um pouco, do
jeito que sempre gostou, me provocando e aumentando ainda mais o meu
tesão por ele.
Mordisco o ombro dele, afundando meus dentes sem dó quando
Lance, lentamente, começa a me preencher. A sensação dele em mim é tão
maravilhosa que não consigo evitar o gemido que escapa dos meus lábios,
ansiando por mais disso, mais dele.
Lance abaixa o rosto para conseguir alcançar meus seios com a
boca. Ele chupa um mamilo com força enquanto agarra meus quadris para
me manter na melhor posição.
— Você é tão gostosa, Sam. Tão gostosa… — ele grunhe um
gemido esganiçado, metendo ainda mais fundo em mim. Perco o equilíbrio
por alguns segundos, colocando um pé no chão para evitar uma queda
realmente desastrosa. — A sua boceta é incrível. Eu poderia ficar dentro
dela por horas…
— Então fique — respondo em meio a um suspiro de prazer.
Lance desliza uma mão entre nós, começando a acariciar meu
clitóris com os dedos enquanto continua me fodendo. Seus quadris são
como uma máquina, indo e vindo, indo e vindo, e toda vez que mais um
centímetro entra em mim, sinto meus olhos lacrimejarem com a sensação.
É poderoso. Maravilhoso. Transcendental.
Ele se afasta um pouco para conseguir encarar meu rosto. Meus
olhos estão nublados de prazer, tão entregue ao momento que nada poderia
me arrancar dessa bolha que criamos.
Nossos gemidos começaram a reverberar pelo vestiário quando
Lance alcançou um ponto totalmente novo dentro de mim. As ondas de
prazer começaram a crescer e tomar conta de cada pedacinho do meu corpo.
Jogo a cabeça para trás, expondo o meu pescoço para a sua boca ávida.
E ele não perde tempo. Chupa, beija, morde e adora cada parte do
meu corpo com uma devoção que me deixa completamente estática. Sou
um monte de vibrações e sentimentos ambulantes, sendo comandada pelo
toque de seus dedos.
— Não estou te machucando, estou? — pergunta em um fio de voz
quando me escuta soltar um gritinho.
Abro um sorriso. Ele tem estado cada vez mais preocupado com a
minha gravidez, mesmo que não esteja tão avançada ainda. Minha
ginecologista já avisou que podemos continuar com as nossas atividades
sexuais sem nenhum problema, mas Lance continua receoso. Eu acho até
fofo.
— Você está me fazendo sentir maravilhosamente bem — respondo,
sorrindo também.
Lanço um olhar encorajador em sua direção, e é tudo o que ele
precisa antes de recomeçar de onde paramos.
Arremete o pau para dentro de mim uma, duas, três, quatro vezes,
até eu voltar para o ponto onde não sei onde ele começa e eu termino. Meus
dedos dos pés estão se retorcendo quando a dor familiar de prazer
recomeça, e arqueio os quadris, ansiosa para receber cada centímetro dele
em mim.
Lance não segura mais os gemidos, e se antes eu me preocupava
com alguém entrando aqui e nos pegando no flagra, agora já não dou a
mínima. Com certeza estão nos ouvindo, mas não estou nem aí. Para ser
honesta, isso até aumenta meu tesão.
— Estou quase gozando, Sam — me avisa ele, com um tom
estrangulado na voz.
— Eu também — anuncio do mesmo jeito.
Começo a descer e subir em seu colo, agarrando seu cabelo e
puxando um punhado com força na minha direção. Ele grunhe,
enlouquecido e completamente embebido de prazer, afundando o rosto entre
o vão dos meus seios enquanto continua me fodendo sem parar um
segundo.
O suor escorre de nossos corpos, mas continuamos em frente. Lance
sobe as mãos suavemente na direção do meu rosto, cobrindo a minha boca
com a mão quando seus movimentos começam a ficar cada vez mais
rápidos.
— Sam…
Seu tom de voz me leva ao limite. Seus dedos continuam
massageando meu clitóris e, antes mesmo que eu possa raciocinar sobre o
que está acontecendo, o orgasmo começa a tomar conta do meu corpo.
Grito, completamente entregue ao momento, quando sinto Lance
estremecer abaixo de mim.
Ele está gozando.
Seus dentes afundam mais ainda na minha pele, e acho que nunca
me senti tão feliz.
Lance descansa a testa no colo dos meus seios, inspirando fundo
quando os tremores de prazer finalmente cessam. Passeio os dedos
distraidamente em seu cabelo, adorando sentir a maciez de seus cachos.
— Essa é a coisa mais linda que eu já vi — diz ele, fazendo um
meneio de cabeça na direção da minha mão.
O anel está ali, brilhando em toda a sua glória. Sorrio,
completamente anestesiada.
— Você não economizou nesse aqui.
— Não mesmo. A minha mulher merece o melhor sempre —
argumenta, finalmente levantando a cabeça para conseguir me encarar. —
Quando chegarmos em casa, quero você sem nada. Usando apenas esse
anel.
— Casamento te deixa mesmo excitado, hein? — provoco, adorando
saber que ele queria tanto isso.
Lance abre um sorriso irônico, balançando a cabeça lentamente.
— Com certeza. Mas o que está me deixando assim é a ideia de que
finalmente terei você pelo resto da vida. — Ele se abaixa para dar um beijo
carinhoso em meu ombro, e meu coração erra uma batida. — Mal posso
esperar para encontrar você naquele altar, Sam.
É. Eu também.
Será este o fim de todos os fins?
Meus ossos quebrados estão sarando
Com todas essas noites que estamos passando juntos
King Of My Heart | Taylor Swift

seis meses depois


— Você é um traidor, Lance. É isso que você é — minha irmã mais
velha, Lydia, resmunga.
Ignoro solenemente o tom de repreensão quando meu irmão, Lucian,
a segura pelos ombros.
— Isso não é traição, Lydia. Vamos pegar leve.
Ela estala a língua no céu da boca, ainda estressada.
Senhor, por que me deu uma família tão dramática?
— Eu não tive tempo de avisar. Foi em cima da hora — explico,
mesmo sabendo que é totalmente em vão.
— Em cima da hora? Tá de sacanagem comigo? — continua ela,
irritada. — Fui sua advogada por anos, Lance! ANOS!
— E eu agradeço por isso, mas…
— Quer saber? Não estamos mais falando com você. Vem, Lucian.
Você também, Logan. E avise a Calliope que cortamos relação com Lance
para sempre.
Meu irmão mais novo ajeita o boné sobre a cabeça, sem saber muito
bem como agir. Desvia o olhar de um para o outro, até que deixa os ombros
caírem.
— O Lance tinha um motivo para não contar. Ele é uma figura
pública, precisa evitar essa exposição — Logan tenta me defender, abrindo
um sorriso encorajador para mim.
Mas minha irmã mais velha está irredutível.
— Ah, faça-me o favor. Uma coisa é não revelar para um jornal,
outra bem diferente é mandar uma mensagem dizendo: “ah, oi, então…
Meu filho acabou de nascer” para os seus irmãos! IRMÃOS! Laço de
sangue, sabe como é? Estamos juntos desde sempre!
— Não vou negar que fiquei magoado — intervém Lucian. — Mas,
repetindo, não é para tanto. Quando vamos poder visitar o nosso sobrinho?
Isso me faz abrir um sorriso sincero.
Quando Samantha me acordou no meio da madrugada resmungando
de dor, achamos que poderia ser algo normal da reta final da gravidez. Mas
acabou que aquele incômodo começou a ter pausas cronometradas, e depois
de um breve desespero em nossa nova casa — o qual, confesso, fui
responsável —, viemos para o hospital.
Sam não quis vir imediatamente porque preferia ficar na água
quente. Eram quase sete da manhã quando finalmente me pediu para buscar
o carro, e depois que entrou para a sala de parto, não demorou mais do que
uma hora para o meu filho vir ao mundo.
Meu filho.
Meu e da Sam.
Isso continua sendo a coisa mais surreal de todas para mim.
— Ele é um bebê saudável e, modéstia à parte, lindo — digo aos
meus irmãos. — Teve muita sorte de puxar o pai.
É Lydia que sorri, revirando os olhos.
— Se ele é tão lindo como você diz, com certeza é obra da mãe.
Você tem cara de fuinha, Lance.
— Ei! Retire o que você acabou de dizer!
— Faça-me o favor. Todo mundo sabe que nossos pais te
encontraram no lixo — continua ela, cravando mais ainda a faca.
— Isso é mentira. Antes de mim, estava você lá, cercada de moscas
e… Cocô de cavalo!
Lydia abre a boca, ultrajada, e se aproxima para me dar um soco no
ombro. Massageio a área atingida, estreitando os olhos para ela.
Lucian respira fundo.
— E esse cara acabou de se tornar pai…
Todos nós vamos até o quarto de Sam, embora Lydia ainda esteja
resmungando no meu ouvido por eu ser um grande traidor. No entanto, tudo
muda assim que abro a porta e deixo com que eles entrem na frente.
Samantha está embalando nosso bem mais precioso nos braços, o
rosto um pouco mais vívido do que o de horas atrás. Ela abre um sorriso
sincero ao perceber os novos visitantes.
Seus dois irmãos estão babando no bebê. Seth, embora um pouco
receoso, até pediu para segurar o pequeno por alguns minutos. Já Scott,
pediu folga do trabalho para nos ajudar em casa por um tempo junto com os
pais de Sam. Oscar acabou sendo convidado para ficar na nossa casa, e
nunca me senti tão grato e aliviado por todos estarem finalmente se dando
bem.
Oliver sumiu de vista, e acho que também precisamos agradecer ao
Oscar por isso. Scott não quis entrar em detalhes, mas o namorado foi bem
enfático ao dizer para o irmão se afastar.
— Olá, pessoal — minha noiva diz, mostrando orgulhosa o nosso
filho. — Querem conhecer o sobrinho de vocês?
Lydia é a primeira a sair correndo e segurá-lo nos braços. Chega a
ser irritante como ela se recusa a soltá-lo. Logan e Lucian resmungam por
ela estar tanto tempo monopolizando o neném, mas não ligo. Me aproximo
de Sam, dando um beijo na sua testa quando sinto meu coração disparar.
Meu amor por essa mulher não tem limites. Não tem fim. E a partir
de agora, seremos nós três contra o mundo.
— Vocês já decidiram o nome dele mesmo, não é? — minha irmã
mais velha pergunta, fazendo um carinho suave no meu filho.
Samantha e eu nos entreolhamos, sorrisos bobos brincando em
nossos lábios.
— Samuel — respondemos em uníssono.
FIM.
Obrigada a Deus por mais um livro escrito e publicado. Meu oitavo!
Como pode, gente? Isso está passando rápido demais!
Obrigada aos meus irmãos, Geovana e Bryan por todo o apoio. À
minha mãe, Neide, e meu pai, André, que não está mais aqui fisicamente,
mas seu espírito vive em mim e em todos da nossa família que o amavam
incondicionalmente.
Ao meu noivo, Matheus, por entender que quando eu entro na reta
final do livro, eu praticamente sumo. A sua paciência é uma grande prova
de amor, hahaha.
Obrigada Gabrielle Andrade pela revisão impecável de sempre.
Você é incrível, Gabi!
Obrigada às minhas amigas, ao meu squad por estar sempre por
perto! Tati, Bruna, Malu, Stef, Aline, Adrielle, Carol… Como é bom saber
que eu tenho vocês sempre!
Às minhas parceiras maravilhosas, o meu mais sincero obrigada!
Sem vocês nada disso seria possível. Sério mesmo, nem tenho palavras para
agradecer o suficiente. Aline, minha assessora, obrigada por segurar as
pontas e não me deixar enlouquecer nessa reta final.
E aos meus leitores maravilhosos, obrigada por nunca soltarem a
minha mão. Pelas mensagens lindas no Instagram. Por vibrarem e torcerem
por esses dois sempre! Respondendo o que eu sei que será a maior pergunta
de todos os tempos: sim, vamos ter um livro sobre o Seth e a Marjorie.
Fiquem de olho no meu Instagram para saber mais detalhes: @mseyfild.

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