Você está na página 1de 438

COPYRIGHT © 2022 VITÓRIA MENDES

Todos os direitos reservados.


É proibida a reprodução total ou parcial desta obra de qualquer
forma ou em quaisquer meios de comunicação sem a autorização
da autora. A violação aos direitos autorais é crime disposto na Lei
9.610/98 e punido pelo art. 184 do Código Penal.
Esta obra é fictícia. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos
são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com a
realidade é mera coincidência.
DIAGRAMAÇÃO | CAPA: Vitória Mendes
REVISÃO: Stephany Cardozo Gomes e Camille Gomes
LEITURA SENSÍVEL: Mariana Tomázio
LEITURA CRÍTICA: Ana Ferreira
ILUSTRAÇÕES: Gabriela Gois, Anamin Dario
Notas & Avisos
Playlist
Epígrafe
Prólogo
Capítulo 01
Capítulo 02
Capítulo 03
Capítulo 04
Capítulo 05
Capítulo 06
Capítulo 07
Capítulo 08
Capítulo 09
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Epílogo
Agradecimentos
Até Mais!
Por tudo que é mais sagrado nesse mundo, não pule essa
parte!
Olá querido leitor, primeiramente eu gostaria de agradecer
imensamente por você escolher ler esse livro diante de tantos.
Em segundo lugar eu preciso lhe alertar que esse é o
segundo livro da minha série chamada beyond, portanto, é
extremamente necessário que você já tenha lido o primeiro livro da
série que se chama Além Do Que Vemos e conta a história de
Heaven e Axel, pois nele irá conter várias ligações com esse
segundo livro que são extremamente para que você possa conhecer
e se aprofundar ainda mais na história de Sadie, que é uma garota
cheia de segredos e problemas internos, com isso quero deixar
claro que aqui você não irá encontrar nenhum personagem perfeito,
pois eles têm que lidar com os seus próprios demônios, até mesmo
o nosso querido celibatário Elliot, que a gente conhece como um
cara leve, carrega também uma escuridão dentro de si.
Como provavelmente você já é meu leitor sabe que eu amo
causar um misto de sentimentos na hora da leitura, então sim, você
vai se apaixonar, mas também vai chorar, rir, sentir raiva, querer
matar a autora e principalmente, pedir terapia a ela, então deixa eu
deixar claro uma coisinha aqui: eu também preciso de terapia
(risada interna e nasalada com som de porco aqui kkkkkk). Então,
eu não pago terapia de ninguém, e é sobre...
Este livro é sobre amar além da mentira e conseguir se
perdoar além da verdade, então se eu posso te dar um conselho é
que os enxergue, sinta-os, grite com eles, chore por eles e acima de
tudo, ame-os. Lembre-se também que nenhum assunto aqui será
romantizado, por mais pesado que seja, você irá encontrar uma
história crua, vai doer, vai chocar, vai dar nojo, mas vai fazer você
entende-los.
Gostaria de lembrar também que todos os personagens
encontrados na história como secundários, eles são essenciais, não
foram jogados na história por acaso, então se algo ficar em aberto
saiba que foi proposital.
Agora, gostaria de te alertar sobre os gatilhos do livro:
depressão, ansiedade, pensamentos suicidas, afogamento,
acidentes de carro, violência sexual infantil (como esse é o tema
mais pesado haverá um alerta antes do capítulo para caso você
deseje pular ele), violência contra mulher, menção ao uso de drogas
ilícitas, consumo de álcool em excesso, uso de palavras de baixo
calão e cenas de sexo explícitas. Se qualquer um deles lhe causa
angústia e/ou desconforto não leia a obra, se mesmo assim você
decidir continuar e no meio da leitura se sintir mal, pare
imediatamente, preserve a sua saúde mental.
Esse livro é indicado para maiores de dezoito anos, por favor,
respeite a faixa etária e só o leia se você for maior de idade.
Conhece algum caso de violência sexual infantil? Não hesite,
ligue 100 ou 190.
Conhece alguém que tenha pensamentos suicidas,
ansiedade ou depressão? Ajude-o, e caso essa pessoa seja você,
procure ajuda! Ligue 180, procure um especialista, não deixe que
seus demônios lhe controlem, livre-se deles.
Deseja conversar comigo durante ou depois da leitura,
visualizar conteúdos exclusivos sobre os livros, e até mesmo me ver
surtar? Minhas redes sociais estão logo abaixo, e nelas contém o
link que leva também direto para o grupo de leitores no whatsapp:
Instagram: @autoravitoriamendes
Tiktok: @vitoriaautora
Twitter: @autoravitoria
Agora que deixei tudo claro, gostaria de convidar para
conhecer a história da Sadie minha mocinha mentirosa e cheia de
segredos, e de Elliot, meu celibatário que eu sou apaixonada por
tudo o que ele faz.
Acesse a playlist do livro através do QR acima com sua câmera no
aplicativo do spotify, ou clique aqui!
Para todos que um dia já mentiram e acreditaram na própria farsa,
saiba que você não está sozinho nessa.
Somos todos belos mentirosos.
Te amar foi idiota, obscuro e sem valor
Te amar ainda me machuca
Descobri que te amar foi luz do sol, mas então caiu uma tempestade
E perdi muito mais que meus sentidos
Porque te amar teve consequências
CONSEQUENCES | CAMILA CABELLO
Porque eles vão te perseguir
Até a escuridão
Sim e eles vão perseguir você
Até você cair
WAY DOWN WE GO | KALEO

Um ano e três meses atrás

Eu nunca tentei suicídio antes, nunca deixei chegar tão longe,


porque apesar do fato de estar completamente fodida e com muita
dor, eu tenho medo.
Sim, eu tenho medo de machucar outras pessoas, é por isso
que eu não me deixo ir tão longe. Não importa o quanto eu queira
desistir de tudo, eu tenho mais medo de como as outras pessoas
irão se sentir. Então eu sofro.
Sozinha.
Eu não quero incomodar ninguém.
Porém, eu não me importaria em incomodar ou magoar meus
pais cometendo o homicídio do meu irmão.
— Eu não quero mais fazer parte dessa merda, Trevor —
digo ao sair do Dodge Charge 70 do meu irmão.
Caminho em passos duros até a entrada da nossa casa,
quando tento abrir a porta uma mão forte e calejada sobrepõe a
minha, o toque das nossas peles faz com que o gosto da bile suba e
engulo em seco o seu sabor amargo.
— Olhe para mim, Sady — Trevor murmura o pedido.
Não faço o que ele me pede, mas ainda consigo enxergar
seu corpo assim que o olho de esguelha. Sempre tão grande e
presente onde quer que esteja.
— Olhe para mim! — dessa vez ele fala um pouco mais alto.
E eu não só olho para ele, como me viro e espalmo minhas mãos
em seu peitoral.
— Me deixa em paz — esbravejo enquanto o empurro.
— Você perdeu a porra da sua cabeça, sua ridícula? — ele
fala entredentes à medida que se aproxima de mim.
— Eu perdi a minha cabeça desde o dia em que você passou
a me usar como um objeto para as suas porcarias, ao invés de me
tratar como a sua irmã. Seu cretino idiota.
No instante em que calo minha boca Trevor dá três passos
em minha direção, aproximando-se de mim outra vez. Agora que
estamos novamente frente a frente, ele se abaixa o suficiente para
que fiquemos na mesma altura. Então ele estreita o olhar para mim,
evidenciando suas írises cor de mel, iguais as minhas.
— Eu não faço a mínima ideia de onde você tirou essa
bravura espontânea, mas acho melhor você começar a abaixar um
pouquinho a sua bola antes que as coisas fiquem piores para você.
Cruzo os braços por cima do peito e ergo o queixo, tentando
ao máximo demonstrar que estou pouco me importando com sua
ameaça evidente, mesmo que todos os ossos do meu corpo estejam
tremendo nesse exato momento.
— E eu acho melhor você começar a ficar calado, pois o
único aqui que tem algo a perder, é você. — Minha voz sai firme o
bastante enquanto eu conto o segredo que apenas nós dois e nosso
pai sabemos. — Ou você vai fazer comigo o mesmo que fez com
ele?
Trevor ameaça chegar ainda mais perto de mim, entretanto
ele é interrompido logo que escutamos vários carros estacionarem
em frente à nossa casa. Ele não ficou contente em apenas ganhar a
corrida, teve que convidar todos os presentes no local para uma
festa. A sua grande sorte é que os nossos pais viajaram, só que na
hora em que eles descobrirem que o meu querido irmão voltou a
aprontar, as coisas vão ficar piores para ele do que já estão.
Dessa forma, Trevor levanta as mãos para o alto, em forma
de rendição.
— Tudo bem, você ganhou. No entanto, se sua boquinha se
abrir sobre essa merda mais uma vez, eu não vou lhe ameaçar,
apenas irei fazer — ele sussurra, uma vez que algumas pessoas já
caminham em nossa direção. Trevor se vira para seus amigos, e
então ele faz o que faz de melhor: age como o babaca que ele é. —
Vamos beber, porra!
Obviamente, ele é ovacionado por aqueles que tanto o
adoram, ao contrário de mim.

Nem sempre eu odiei meu irmão, houve uma época em que


ele era o meu melhor amigo e meu confidente. Apesar da nossa
diferença de idade de quatro anos, eu fui muito apegada a ele. Mas
então fomos crescendo e a diferença de idade entre nós dois se
tornou cada vez maior.
Quando Trevor tirou a sua carteira de motorista, aos
dezesseis anos, ele foi presenteado pelo nosso avô com um carro, o
qual, juntos, eles transformaram em uma “máquina”, como eles
costumavam dizer. Então Trevor começou a ser convidado para
participar de algumas corridas clandestinas que acontecem em
Montgomery — uma cidade vizinha — e ele ficou viciado na
adrenalina que era participar dos rachas, até o dia em que os
nossos pais descobriram aonde ele estava indo com tanta
frequência.
A partir dali tudo ruiu de vez, e foi assim que eu comecei a
frequentar as corridas com ele, para que ele pudesse ir. Era sempre
uma desculpa diferente como: “a Sadie quer ir à casa de uma
amiga”, “a Sadie e eu vamos ao parque”, ou até mesmo “posso levar
a Sadie no cinema hoje?”, contudo o destino sempre era apenas
um, muito diferente daquele que dizíamos aos nossos pais.
Nessa época meu corpo estava começando a se desenvolver
e foi por isso que ele começou a me usar como isca para seus
adversários nas corridas, pois assim as chances de ele ganhar eram
sempre maiores. Quando chegávamos nas corridas, Trevor me
deixava em um ponto estratégico, para que ninguém desconfiasse
que eu era sua irmã e para que, dessa forma, pudesse chamar a
atenção da pessoa contra quem ele iria competir.
Aos poucos, eu comecei a me sentir usada pelo irmão, pelos
seus adversários. Eu já tinha perdido tanto tão nova e continuei
perdendo cada vez mais, dali em diante eu decidi começar a me
entregar, mas se naquele tempo eu soubesse todas as
consequências que enfrentaria até hoje, eu jamais teria me doado. A
Trevor ou a qualquer outra pessoa.
— Eu tenho um irmão — a voz, já conhecida por mim há
anos, me faz pular em surpresa.
Dessa vez eu não consegui sentir sua presença, como
normalmente acontece, pois a minha casa está cheia de pessoas
totalmente estranhas para mim. A primeira que eu realmente sei
quem é, é Drew, ele se senta na bancada da cozinha, bem onde eu
estou me servindo de cerveja.
— Não sabia que sua mãe estava grávida — digo ao tomar
um gole da minha bebida.
— E não está — afirma Drew. — Eu sou adotado.
Sua declaração me surpreende tanto ao ponto de eu cuspir o
líquido que havia acabado de pôr na boca. Drew me estende um
guardanapo vermelho, que prontamente eu aceito, limpando a
minha boca e parte da minha blusa, que sujou com o álcool.
— Obrigada. A propósito, muito engraçado você, hahaha —
finjo uma risada sarcástica.
Eu conheço Drew há anos, ele é o quarterback do time de
futebol da escola e fazemos parte do mesmo grupo de amigos. Que
consiste em: três atletas do time de futebol americano, dois
alucinados por teatro, a futura rainha do baile e eu, a vadia.
Certo que eles, nem ninguém, nunca falaram isso na minha
frente, entretanto, eu sei o que eles pensam, porque eu também
penso assim. Afinal, eu tenho apenas dezoito anos e já fui para a
cama com pelo menos oitenta porcento da população masculina da
escola, isso sem contarmos os que já se formaram nos anos
anteriores. Os únicos que eu posso afirmar que eu não fui e talvez
nunca vá, são: Elliot, que é filho de pastores e por isso pratica o
celibato – até onde se sabe Elliot perdeu a virgindade durante um
ménage, mas desde então nunca mais praticou o ato – e Drew, esse
no caso não é filho de pastor algum, muito menos uma pessoa que
elimine o sexo da sua vida antes do casamento, ele é apenas o
namorado da Heaven, minha amiga, e mesmo antes de eles
começarem a namorar, há dois anos, eu já sabia que ela gostava
dele. E como eu disse anteriormente: eu tenho medo de machucar
as outras pessoas.
Isso já aconteceu uma vez, há cinco anos, quando eu dei
meu primeiro beijo no Grey, em sua festa de aniversário de treze
anos. Então, no ano passado, eu acabei ficando novamente com
ele. Na época eu não fazia a mínima ideia de que Allison, sua irmã
postiça e minha amiga, gostava dele. Eu só tive ciência dos seus
sentimentos pelo filho da sua madrasta no momento em que ela me
pegou saindo do quarto dele em uma madrugada. Porque eu juro,
se eu soubesse que existiam quaisquer sentimentos entre eles além
do fraternal, eu jamais teria me submetido a transar com o Grey.
— Eu juro, eu sou adotado — insiste Drew.
— Ok — concordo.
A minha descrença quanto a situação não afeta Drew, por
isso ele passa a contar a história mais triste que eu já escutei em
toda minha vida. Como pode um pai simplesmente se desfazer de
um filho como se ele fosse um lixo descartável? Ao final, quando ele
me conta que o que mais o magoou foi o seu suposto irmão não o
ter reconhecido após anos se passarem, é impossível impedir que
as lágrimas, já formadas em meus olhos, não desçam.
— Eu realmente não imaginava que você tinha passado por
tanto Drew... meu Deus, eu sinto muito. — O abraço.
De início, Drew permanece imóvel à minha demonstração de
afeto, porém alguns segundos depois, ele acaba retribuindo o gesto
pelo tempo em que ficamos com nossos corpos tão próximos.
— Como a Heaven reagiu assim que você contou a ela? —
questiono ao desfazer o nosso abraço.
— Ela não sabe — divaga Drew.
— Como assim ela não sabe? E por que você está me
contando? — indago, espantada.
— Porque eu sei como as relações entre irmãos podem ser
complicadas e agora, nós somos mútuos, um tem o segredo do
outro.
Espera... o que.... o que ele quer dizer com...
— Um tem o segredo do outro? O que isso significa, Drew?
— Significa que, você sabe que eu tenho um irmão e eu que
eu sei o que seu irmão fez, e agora nós dois podemos conversar
sobre como nossos irmãos...
— Cala a boca — interrompo-o. — Você não sabe nada
sobre o meu irmão — afirmo.
Drew levanta-se da bancada da cozinha e chega próximo a
mim, o suficiente para que possa passar uma mecha do meu
cabelo, que está na frente do meu rosto, para trás da orelha.
— Eu ouvi a conversa de vocês na entrada da casa mais
cedo.
Eu arregalo os olhos surpresa, porque eu nunca iria ter dito o
que disse a Trevor se imaginasse que alguém estaria por perto.
Tudo o que aconteceu entre nós, deve permanecer entre nós.
— Drew... — digo hesitante, pois as próximas lágrimas que
irão rolar por meu rosto não são de tristeza, devido a horrível
história do meu amigo, e sim por conta do segredo tenebroso que
eu escondo juntamente com minha família. — Você não pode... você
não... — Minha voz embarga e eu não consigo continuar a falar.
E agora quem toma a frente para o abraço é Drew, que com
seus braços fortes enlaça o meu corpo.
— Eu não vou falar nada a ninguém, nunca — eu ouço a
promessa em suas palavras, mas não confio nelas.
— Você não pode — repito.
— E eu não vou — promete mais uma vez. — Eu apenas
preciso de alguém que me escute e agora acho que você também.
Não, eu não preciso. Eu só preciso achar uma forma de que
você esqueça tudo o que escutou.
Afasto-me de Drew e olho para o teto, pensando em como
fazer ele nunca abrir sua boca.
— O que você quer? — pergunto, voltando a encará-lo. —
Basta me dizer, eu convenço meu pai a te dar. O que você quer,
Drew?
Eu escuto uma risada rouca e encaro Drew mais uma vez,
sem entender o motivo pelo qual ele ri tanto, pois eu não estou
vendo nenhuma graça em toda essa situação.
— Eu estou falando sério, Drew, o que você quer?
Isso apenas o incentiva a rir ainda mais, ele ri ao ponto de
pôr a mão sobre sua barriga.
— Drew — o chamo, porém sem muita eficácia. — Drew —
digo novamente, dessa vez o puxando pelo braço. — O que você
quer?
— Eu não quero nada — diz ele, limpando os olhos. — Eu
juro, eu não quero nada — repete, se controlando para não rir outra
vez. — Por que eu iria querer alguma coisa de você ou da sua
família?
— Você não é nenhum idiota, Drew e o que você sabe é
muito grave, então o que você quer? — insisto.
— Eu já disse, porra! Eu não quero nada. — Ele hesita por
um segundo. — Para falar a verdade, eu quero sim.
— Nesse caso, fala de uma vez — peço.
Dessa vez, Drew se aproxima de mim, não para tirar uma
mecha do meu cabelo do meu rosto ou para me abraçar como fizera
momentos antes, e sim para me lançar um olhar sombrio. Seus
olhos, já escuros, tornam-se pretos à medida que suas pupilas se
dilatam. Desse modo, olhando em meus olhos, ele diz:
— Eu realmente não estava interessado em nada, mas já que
você mencionou. Eu quero você.
— O quê?! — pergunto atônita.
— Eu quero você — diz mais uma vez.
— Você namora com a Heaven, Drew, você está louco?
— Eu não quero transar com você, Sadie. Eu quero que as
pessoas, incluindo a Heaven, pensem que eu transei com você.
Agora é a minha vez de rir, porém, uma risada irônica.
— Você é tão engraçado, Drew.
— Estou falando sério. — Suas pupilas oscilam enquanto ele
me observa, já que seus olhos nunca abandonam os meus. —
Heaven é a atriz, só que nos próximos meses você terá que atuar.
Vai fingir que dormiu comigo e não só isso, vai dizer que se
apaixonou. Que me amou e ainda me ama.
— Você está louco, Drew — afirmo.
— Eu sou louco — ele diz tão seriamente, que faz todos os
meus pelos se arrepiarem. Não de uma forma boa e sim de medo.
Medo esse, que eu nunca senti nem mesmo pelo meu irmão, apesar
de tudo o que ele já fez comigo. — As coisas entre Heaven e eu
estão ficando cada vez piores, então, a partir do momento em que
as aulas na Stout começarem, você será a minha amante.
— A Heaven não merece isso, Drew — tento persuadi-lo.
— Eu sei que não, por isso eu nunca a trairia. Entretanto, eu
preciso que ela pense que isso aconteceu, pois só assim as coisas
entre nós não estarão prestes a se acabarem de uma vez por todas.
Se Heaven vir que eu estou interessado em outra mulher ou vice-
versa, ela fará de tudo para que eu volte a enxergar apenas ela.
— Você é doente — enuncio com nojo. — Eu não vou fazer
isso com a minha amiga.
— Tudo bem.
Drew diz ao se afastar, me dando as costas. Ele vai até a
geladeira, pega uma long neck lá de dentro e após abri-la com os
dentes e tomar um gole, ele começa a sair da cozinha, mas antes
ele dá meia volta, me olha e diz:
— Bom saber que você preferiu escolher a sua amiga invés
do seu querido irmão.
Dito isso, Drew dá as costas uma outra vez, fugindo
totalmente do meu campo de visão, ao olhar pela janela da cozinha
vejo meu irmão no deck da piscina, juntamente de alguns dos seus
amigos. Logo aquele, que até minutos atrás eu pensava ser
realmente meu amigo, aproxima-se de Trevor e o cumprimenta, em
seguida ambos olham para a cozinha, justo no ponto onde eu me
encontro.
Ainda faltam três meses para darem início às aulas na Stout,
torço que esse tempo seja o suficiente para que Drew esqueça tudo
o que ele escutou e disse.

Um ano atrás

Drew: tic tac, tic tac, o relógio faz tic tac.


Essa foi a mensagem que eu recebi do Drew mais cedo, olho
para ela, mais uma vez, no momento em que Heaven se aproxima
da mesa em que já estou sentada ao lado de Allison. Nós somos
amigas desde os treze anos e no ano passado, como eu já havia
apostado, ela acabou sendo a rainha do baile de formatura da
escola. Quando Heaven senta-se à mesa ao lado de Wes, outro que
também tornou-se meu amigo durante a época da escola, os três
começam a observar um garoto que está de frente para a máquina
de barras de cereais, ele está de costas para mim, no entanto eu sei
de quem se trata.
Axel Davenport.
O irmão gêmeo bivitelino de Drew.
A princípio eu pensei que toda a história, a qual Drew havia
me contado no início do verão passado, não passava de uma
mentira para me causar medo e pânico. Porém, ele insistiu no
assunto ao longo dos meses e até mesmo chegou a me mostrar
uma cópia da certidão de adoção.
Eu continuo relutante quanto ao seu plano de deixar a
Heaven com ciúmes, porque isso é, no mínimo, doentio da parte
dele e eu não estou pronta para arriscar, não só nossa amizade,
como a amizade com todo o restante do nosso grupo. Mas o seu
atual namorado continua com essa ideia ridícula e com ameaças
piores, eu até pensei em fazer o mesmo e ameaçá-lo com o seu
segredo, só que ele me tirou do jogo quando estampou a verdade
na minha cara.
“— O meu segredo não me leva a cadeia, já o seu leva não
só o seu irmão, como seu pai e até mesmo você, querida.”
Um enjoo toma conta de mim sempre que eu me lembro da
forma como ele fala comigo desde a noite em que soube de tudo e
agora, estou vivendo um imenso dilema entre perder a amizade de
todos que eu prezo ou acabar com a minha vida e de toda a minha
família.
Meus pensamentos são dispersados assim que escuto Wes
dizer:
— É o carinha que passou por nós mais cedo, acho que ele é
atleta.
— Eu diria que ele pratica artes marciais — eu digo, pois
Drew não apenas me mostrou fotos do seu suposto irmão, como
também vídeos dele lutando na cidade onde morava em
Washington.
Basicamente, Drew sabe tudo sobre sua família biológica,
enquanto eles nem mesmo têm conhecimento do que aconteceu
depois que foram embora, ao menos, essa é a versão que ele
insistiu em me contar ao longo dos três últimos meses de ameaças.
— Escuta aqui, Sadie — Allison me ameaça com um garfo.
— Nem pense em chegar perto dele, ele é meu.
Eu apenas rio do seu comentário, mal sabe ela que eu estou
pouco me importando com o Axel, porque a todo o momento eu só
consigo ouvir a voz do Drew me ameaçando. No entanto, para fingir
que eu ainda estou dentro da conversa, digo:
— Ele já sabe que você tem a posse dele?
— Engraçada você, né? — Allie retruca. — Estou falando
sério, Sadie. Todos os caras que eu fico a fim, você pega antes.
Então por favor, deixa ele pra mim.
— Tudo bem. — Eu sorrio, levantando as mãos em forma de
rendição. — Ele é todo seu, até porque eu tenho em vista outra
conquista.
Dito isso, arrisco pôr o grande e fracassado plano de Drew
em ação e olho para Heaven, dando-lhe uma piscadela e dessa vez,
o enjoo volta a tomar conta de mim, pois como eu já sabia, o meu
ato não passa despercebido por seus olhos azuis.
— E essa “conquista” — ela retruca, fazendo aspas com as
mãos. — Tem nome?
— Segredo — devido ao meu enjoo, é o máximo que eu
consigo responder, porém ele não me impede de levar o dedo até os
meus lábios.
Por sorte, o restante do grupo, formado pelo cretino do Drew,
Elliot e Grey, juntam-se a nós no segundo seguinte. Logo todos eles,
incluindo o sonso do Drew, que finge não conhecer o Axel,
começam a conversar sobre ele, aproveito esse instante para
mandar uma mensagem para o namorado da minha amiga, o
informando que finalmente comecei a fazer o que ele me pediu.

Todas as manhãs o Drew me manda mensagens me falando


como iremos agir. Dois dias atrás, por exemplo, ele disse que
teríamos que fingir estar mandando mensagens um para o outro e
parar com a encenação assim que Heaven se aproximasse de nós
dois, entretanto tudo foi pelos ares no momento em que eles dois
começaram uma briga na frente de todo o corpo estudantil da Stout,
na hora do almoço.
Hoje é sábado, e ele me mandou uma mensagem dizendo
que à noite iríamos até o armazém, onde o seu irmão irá lutar. Com
isso, ele quer que Axel veja que “estamos juntos” para testar a
amizade entre ele e Heaven.
Todos, incluindo o Drew, sabemos o quanto a Heaven sofreu
quando a amizade dela com o Axel acabou há anos atrás e agora,
ele simplesmente quer jogar com isso. Já não basta toda essa farsa
de traição e tudo o que vou perder devido a essa encenação, ele
ainda quer que nós dois fiquemos na frente de outras pessoas para
que chegue aos ouvidos da Heaven. Fingir estar a fim dele, tudo
bem, mas ficar com o namorado da minha amiga é mais do que
nojento, é horrível.
Eu não quero mais fazer isso, é por isso que estou ligado
para ele durante toda a manhã, porque nós já estamos passando de
todos os limites.
Logo que Drew sai de dentro do seu carro, de prontidão o
notifico:
— Nós não vamos fazer isso, Drew.
— Vamos sim — contrapõe.
— Deixa eu te dizer uma coisa — digo, me aproximando dele
enquanto aponto o dedo em sua cara. — Toda essa situação que
você está criando só vai fazer com que a Heaven se afaste ainda
mais de você, você tem medo de perder ela para o teu irmão, só
que você não está percebendo que quem está entregando-a a ele, é
você! — esbravejo.
Sou pega de surpresa quando ao invés de me responder,
Drew coloca as mãos nas extremidades do meu rosto e me beija,
simples assim, ele sela os nossos lábios. Eu demoro pouco mais de
três segundos para entender o que está acontecendo, porém no
segundo em que isso acontece, imediatamente o empurro, sem
nunca ter retribuído seu beijo. Em puro desprezo, eu cuspo no chão
e assim que olho para Drew novamente, ele já está na porta do seu
carro limpando sua boca na manga da camisa, mas antes de entrar
ele diz:
— Não é tão difícil assim beijar outra pessoa Sadie, então
você escolhe, ou você me beija ou seu irmão vai parar atrás das
grades.
O dilema se acaba quando eu finalmente concordo com seu
plano maluco, talvez Drew esteja fazendo essa maluquice para
proteger seu relacionamento, entretanto eu vou fazer isso para
proteger a minha família.
Porque pessoas com fome comem qualquer coisa.
Alguns erros são cometidos
Tá tudo bem, tudo ok
No final, é melhor para mim
Essa é a moral da história, meu bem
MORAL OF THE STORY | ASHE

Atualmente

— Eu já tentei suicídio antes — anuncio pela primeira vez em


voz alta.
— E como você se sente quanto a isso? — a pergunta vem
da Rayna, minha mais nova terapeuta.
Após meses relutando, eu finalmente decidi começar a
terapia, logo após o meu afogamento no início desse ano. Eu
brinquei, dizendo ao Axel que todos precisávamos de terapia, mas
para falar a verdade, eu sempre tive receio de deixar alguém saber
todos os sentimentos que guardo para mim. Porém, em três dias se
inicia um novo ano acadêmico e uma nova oportunidade para
começar a acertar todos os erros que eu cometi no ano passado.
Tenho certeza de que nada disso será fácil, no entanto hoje
eu acordei decidida a fazer tudo diferente e isso inclui falar como me
sinto... eu acho.
— Como uma casa mal-assombrada — reflito.
— Você pode me explicar melhor?
Ajeito minha posição no divã, pois se eu vou começar a fazer
terapia e falar sobre os meus mais enigmáticos pensamentos, que
seja da forma correta. Por isso, entrelaço meus dedos sobre minha
barriga e cruzo minhas pernas, permanecendo deitada no móvel
vermelho e felpudo.
— Eu não me conhecia mais, era como se eu fosse um
fantasma vivendo dentro de uma casa mal-assombrada.
— E hoje, você acredita que se conhece? — indaga Rayna,
dando-me ainda mais abertura para me abrir.
Antes de respondê-la, eu engulo em seco.
— Não tanto quanto antes, ainda é difícil me reconhecer.
Houve um momento em que eu comecei a confundir todas as coisas
que eu estava vivendo, eu nem mesmo sabia mais o que era
mentira e o que era verdade.
— O que você quer dizer com isso?
— Sabe quando você lê um livro e gosta tanto da história que
se afoga nela? E de repente você sente como se todas as atitudes,
movimentos e falas, que acontecem com o personagem principal,
fosse você que estivesse sentindo?! — pergunto retórica. Como
Rayna não me responde nada, eu acredito que deva seguir minha
linha de pensamento. — Se o personagem está feliz, você está feliz,
se ele está triste, você está triste. Quando ele se magoa e chora,
você também chora e quando ele se apaixona, você tem aquelas
mesmas sensações. Sente borboletas voando por seu estômago,
sorri feito boba e então aquele personagem toma a sua vida e agora
você vive a vida dele. Entretanto, assim que chega a última linha,
você se pergunta: e agora, o que acontece?! Eu vivi um ano de
mentiras e no momento em que tudo acabou, eu continuei insistindo
na mentira, porque era o caminho mais fácil a seguir. E agora eu
não faço a mínima ideia de como conseguir o perdão das pessoas
que eu magoei ao longo do caminho. A coisa que eu mais tinha
medo em minha vida era de magoar outras pessoas e hoje, eu não
sei como pedir perdão.
— Que tal começando com um pedido de desculpas?
— O quê?! — pergunto atônita, levantando-me do divã e me
firmando com os cotovelos.
— Você já tentou pedir desculpas às pessoas que você
magoou?
— Não... quer dizer, já. — Penso por mais alguns segundos e
sacudo a cabeça. — Não, não. Eu não pedi desculpas.
— Você pediu ou não desculpas a elas? — Rayna insiste.
— Pedi, mas não pelos motivos certos. Não pela verdade.
— E qual é a verdade Sadie?
Qual é a verdade?
Sento-me no divã e encaro Rayna, ela deve ter cerca de um
metro e setenta, sua pele negra contrasta com os cabelos
castanhos encaracolados. A ideia de vir ao encontro da mulher que
me pergunta qual é a verdade que eu tanto escondo — ou sequer
tenho ciência — foi do Axel.
Obviamente ele não me disse para vir até ela e sim para
procurar por ajuda, durante todo o verão, sempre que eu estava um
pouco mais calada, ele tentou me convencer de que seria bom dar
início às sessões e procurar por ajuda. Até mesmo nas últimas
semanas, enquanto esteve no Caribe, Axel me mandou mensagens
perguntando se eu já havia ido procurar um especialista, uma vez
que eu ainda não tinha me aberto com ninguém desde o episódio
em que ele me salvou.
Bom, eu já assumi o que eu fiz, porque eu sei o que fiz, mas
ainda é complicado falar sobre como eu o fiz, mais complicado
ainda é saber que nada do que eu tentei foi adiante. Entretanto, eu
não acredito que a minha terapeuta irá gostar de escutar que eu não
estou arrependida do que fiz e que se tivesse coragem, eu tentaria
fazer tudo novamente.
— De que verdade você está falando? — pergunto à Rayna.
— Qual a verdade por trás da mentira que a fez magoar
outras pessoas?
— Sabe de uma coisa?! — digo ao me levantar e pegar
minha bolsa. — Eu acho que não foi uma boa ideia vir até aqui.
Logo que começo a andar em direção à saída da sua sala,
estanco os meus passos e me viro de volta para ela, assim que a
escuto dizer:
— Não há problema em mentir, Sadie. Para falar a verdade, o
problema da mentira é quando você passa a enganar a si mesma e
começa a se acostumar com tal situação. Como você disse, você
mentiu por um ano e tudo aquilo fazia você se sentir como um
personagem de um livro, para você ser verdadeira com os outros,
você precisa primeiro começar a ser sincera consigo mesma.
— A questão é que eu não sei se eu consigo mais ser sincera
comigo. — Levanto minhas mãos ao alto e volto para o divã,
deitando-me novamente nele.
— Você disse que tentou suicídio uma vez, esse é um grande
passo para se auto entender.
— Mas eu nunca disse o porquê de eu ter tentado suicídio —
alego.
— Eu sinceramente não esperava escutar isso de você no
nosso primeiro encontro, então não estou te pedindo para me dizer
os motivos que te levaram a tal situação, pois pelo que vejo nem
você consegue entender ainda... Haverá um dia em que você irá
passar por aquela porta e sem nem mesmo eu ter tocado no
assunto, você irá me contar todos os motivos. Nesse momento, eu
quero apenas saber qual a sua comida preferida.
Sua última frase me faz levantar novamente, então volto a me
sentar.
— O quê?
— Qual a sua comida preferida, Sadie?
— Batata talvez — respondo pensativa.
A minha resposta sobre a sua pergunta inusitada, é a
primeira coisa que Rayna escreve em seu bloco de notas.
— O que isso tem a ver com suicídio e tudo o que eu vivi no
ano passado?
— O que você viveu no ano passado?
— Eu fingi amar uma pessoa.
— A resposta sobre a sua comida preferida fez com que você
ficasse curiosa e automaticamente, quando te perguntei sobre algo
que muito provavelmente você não iria me contar hoje, fez com que
você dissesse espontaneamente.
Ela acabou de me fazer de trouxa?
— Você acabou de me fazer de trouxa?
— Por que você fingiu amar uma pessoa?
— Porque ele me ameaçou — simplesmente sai da minha
boca, sem eu ao menos ter pensado na resposta. — Você fez isso
de novo. — Aponto para Rayna. — Você é boa!
— Sim, eu sou boa. — Rayna sorri para mim, o que me faz
sorrir para ela de volta.
Assim que eu cheguei na consulta, eu pensei que esse era o
momento que eu iria usar apenas para chorar e afogar todas as
minhas mágoas. No entanto, não foi isso que aconteceu.
— E por ser boa o suficiente eu sei que você ainda tem muito
a processar, por isso eu não vou insistir em nenhum assunto até que
você esteja com todos os seus pensamentos em ordem.
Em seguida, Rayna me pergunta como eu me sinto no dia a
dia e também durante o sono, por ora ela diz que não acha
necessária a receita de qualquer remédio. Por enquanto ela também
não faz ideia do tamanho da confusão que toma a minha cabeça.
Viver uma mentira às vezes pode ser tão viciante, que ela
acaba se tornando uma realidade que consome você e sua alma.
Mesmo nas muitas vezes em que eu dizia que aquilo não passava
de uma farsa e em todas as vezes em que engoli um enjoo entalado
em minha garganta, eu dizia a outras pessoas que eu o amava. Eu
tinha que acreditar que aquilo era verdade, pois senão, qualquer
deslize meu poderia piorar toda uma situação que já estava
excessivamente catastrófica.
Eu fiz tudo o que o Drew me mandou fazer, eu o beijei
incontáveis vezes durante inúmeros fins de semana.
Ele me mandou chorar e dizer o quanto eu amava e estava
apaixonada por ele, e eu fiz.
Nós brigamos feio ao ponto de ele me machucar fisicamente,
porque eu estava farta da sua obsessão e das suas ameaças. Eu
procurei pela Heaven para lhe dizer tudo e enquanto ela me dizia
palavras de força, para superar um possível relacionamento
abusivo, eu chorava em seu colo com um grande nó preso em
minha garganta. Nó esse que estava querendo se soltar e gritar
para ela e Axel ouvirem que, na realidade, tudo o que aconteceu
não passava de uma maldita farsa.
Eu fiz de tudo para o Drew parar de persegui-la, porque em
algum momento eu notei que ele passava incontáveis horas do lado
de fora do prédio do nosso dormitório.
Todavia, ele tinha uma mente tão fodida que chegou a pensar
que na verdade eu estava realmente apaixonada por ele, só que
isso seria impossível de acontecer. Sua fixação por sua ex-
namorada foi tão extrema que ele chegou a quase tirar a vida dela e
eu tenho uma parcela de culpa em tudo isso, porque eu poderia ter
me aberto com ela ou com seu então namorado Axel, ou até mesmo
com seus pais sobre tudo o que estava acontecendo, tudo o que eu
sabia, mas muita coisa estava em jogo para eu simplesmente abrir
minha boca.
Eu chorei quando ele morreu, eu chorei como eu nunca havia
chorado antes na minha vida, entretanto o que ninguém sabia era
que todas as lágrimas que desciam por meu rosto eram todas de
felicidade, pois depois de muito tempo, eu me senti aliviada.
A verdade nua e crua é que morte de Drew foi como uma
carga de uma tonelada tirada das minhas costas.
A viagem de Stone Bay até o campus da Stout em Beaufort
dura em torno de uma hora, decidi ir à consulta antes de voltar à
faculdade e pretendo continuar indo todas as sextas. Não sei até
onde eu irei com ela, contudo por enquanto, o melhor que eu posso
fazer por mim é prosseguir com a terapia.
O retorno das aulas está previsto para começar na segunda e
hoje ainda é sexta, porém mesmo morando a poucas milhas de
distância, preferi voltar três dias mais cedo para poder arrumar
minhas coisas no dormitório e também organizar um plano de
estudos. Devido a toda turbulência do ano passado, eu acabei
ficando mais tempo do que o necessário no final do ano letivo, uma
vez que eu havia tomado bomba em várias matérias.
Eu nunca disse que cursar Arquitetura era uma tarefa fácil, o
que me fez escolher esse curso, além da minha mãe ser engenheira
e isso não ter influenciado em absolutamente nada, foi a minha
paixão pela arquitetura clássica. A influência, claro, vem dos vários
livros que li ao longo da minha infância e adolescência, sempre que
leio um romance de época e utopias consigo imaginar as casas,
palácios e igrejas no estilo neoclássico.
Dizer que eu leio muito é um eufemismo, ambos os meus
quartos, em casa e no dormitório, têm uma biblioteca particular, sem
contar as horas que passo lendo e-books. Não tenho uma leitura
favorita, eu apenas gosto de ler, pois para mim a leitura se tornou
um ato de liberdade, afinal, porque viver uma vida, se eu posso viver
milhares?
Carregando minha caixa recheada de livros com apenas um
braço — porque sim, eles vêm antes das minhas roupas quando se
trata de trazer as coisas do carro até o apartamento do dormitório
—, tiro as chaves do meu bolso, entretanto para a minha surpresa,
eu não preciso girar a chave para abrir a porta, pois a mesma está
apenas encostada, então eu apenas empurro-a com meu pé.
No ambiente compartilhado eu não vejo ninguém, mas como
a porta estava aberta, eu presumo que já há alguém no local. Por
isso, no momento em que coloco a caixa no chão, chamo:
— Olá?! — anuncio hesitante. — Alguém aqui?
No instante em que me calo duas pessoas saem do quarto
que costumava ser de Madelyn, minha antiga colega que se mudou
para a UCLA nesse semestre. A primeira que sai do quarto é alta,
tem cabelos pretos, ondulados e volumosos, aproxima-se e estende
a mão ao se apresentar.
— Oi! — cumprimenta ela. — Me chamo Lynnox, você deve
ser a Sadie, sou a sua nova companheira de quarto.
— Eu mesma — respondo, apertando sua mão.
— Aquela ali — Lynnox aponta para a ruiva que está
encostada na porta do quarto, essa também é alta, seu tom de ruivo
não é como meu, é mais alaranjado, e no topo da cabeça ela usa
um laço azul, sua pele alva é quase que inteira coberta de
tatuagens, pelo menos a que está amostra, como braços e pescoço.
— É a Valerie, minha amiga, mas na maior parte do tempo uma
inconveniente que vive na minha sala.
— Ei — reclama a ruiva.
Valerie então se aproxima de nós duas e também estende a
mão, cumprimentando-me.
— Você tem namorado? — indaga Valerie.
— Não — respondo ao arquear uma sobrancelha.
— E namorada? — continua ela, sua expressão facial é séria,
porém seus olhos brilham.
— Também não.
— Quer ter?! — sugere ela.
Meus olhos se concentram na ruiva em questão enquanto eu
tento formular uma resposta, e também ter a certeza de que ela
acaba de dar em cima de mim ou se eu estou apenas ficando doida.
Porém, minha resposta é interceptada quando Lynnox decide puxar
os cabelos de Valerie.
— Regra número um desse ano, você não vai mais dar em
cima de nenhuma colega de quarto minha, por isso nós fomos
expulsas da UCLA — reclama Lynnox.
— Vocês foram expulsas? — pergunto.
— Felizmente sim — Valerie responde.
— Infelizmente sim — contrapõe Lynnox.
— Felizmente Lyn, eles eram caretas demais, a expulsão foi
um favor que eles fizeram a nós.
— Por que vocês foram expulsas? — decido perguntar ao me
encostar na bancada do espaço compartilhado, que é composto por
uma junção de sala e cozinha.
— A Valerie decidiu que era uma boa ideia dar uma festa no
dormitório em uma segunda-feira pós prova.
— Só por isso? — indago boquiaberta.
— A entrada da festa tinha um preço — Lynnox diz.
— A roupa era o valor da entrada — Valerie completa. —
Todo mundo nu.
— No meu quarto.
— E digamos que, em algum momento, as coisas
começaram a esquentar.
— E então todo mundo saiu do dormitório sem roupa
enquanto o meu quarto — enfatiza Lynnox. —, pegava fogo.
— Literalmente.
Eu começo a rir lembrando de uma cena do ano passado,
Drew estava tão louco para que Heaven sentisse ciúmes dele, que
fez de tudo para que ela descobrisse que ele a estava traindo, foi aí
que ele teve a brilhante ideia de fingirmos transar no seu carro, no
entanto ele não contava com o fato de que Heaven iria atear fogo
contra nós dois. Naquele dia eu me desesperei, claro! Hoje, se
tornou uma memória boa, principalmente quando lembro da grande
surra que ele levou do Axel, Elliot, Kane e Grey, além de ter perdido
o carro.
— Eu conheço uma pessoa que vai amar conhecer vocês —
digo me referindo à Heaven.
Nesse mesmo instante meu celular vibra no bolso da calça,
assim que eu o pego vejo que trata-se de uma mensagem da
mesma.
Heaven: Festa na fraternidade hoje, não adianta dizer não.
Você vai!!
No ano passado, devido a todos os acontecimentos, nós nos
distanciamos, entretanto logo após a morte do Drew nos
reaproximamos. Heaven, assim como os outros, pensavam e ainda
pensam que a minha quietude e rejeição para estar com todos,
trata-se de um luto por alguém que eu supostamente amei, quando
o motivo por eu não estar frequentemente com eles, na realidade, é
porque eu não consigo encará-los enquanto escondo várias coisas
deles.
De toda forma, eu decidi levar esse ano por outro caminho,
talvez até mesmo voltar a ser a Sadie que eu era durante a escola,
ou pelo menos cinquenta por cento do que ela era, por esse motivo,
levanto o celular com a tela acessa e pergunto à minha
companheira de quarto e à companheira dela:
— Festa na fraternidade do time de futebol hoje?
— É claro que sim! — a primeira a responder é Valerie,
Lynnox tem um grande sinal de reticência estampado em sua testa.
— Lynnox? — a chamo.
— Por acaso você não conhece nenhum Kane, conhece?!
— Se eu disser que não conheço isso lhe fará dizer sim? —
arrisco.
— Talvez — responde ao dar de ombros.
— Então eu não conheço — respondo, me afastando da
bancada e pegando a minha caixa de livros que havia deixado no
chão.
— Eu gostei de você, Sadie. — Valerie sorri e eu retribuo. —
E você, vê se esquece a porra do Kane — repreende a amiga,
obviamente irritada.
Na verdade, eu não só conheço o Kane, como sei que ele,
além de estar na festa mais tarde, também faz parte do meu grupo
atual de amigos, porém eu não sei o que aconteceu entre a Lynnox
e o Kane e eu acabei de conhecê-la, então não vou perguntar nada
agora. Durante a consulta com Rayna mais cedo, fizemos uma lista
de pequenos passos e realizações para esse ano, e nela está
inclusa conhecer novas pessoas. O bom é que já conheci duas, por
isso é bom ficar na minha para não espantar nenhuma das duas.
— Eu também gostei de vocês — respondo por fim.
Assustado pela mordida
Embora ela não seja pior que o latido
No meio de uma aventura
Um lugar tão perfeito pra começar
505 | ARCTIC MONKEYS

— Vocês sabiam que a história do Titanic não é inspirada nas


pessoas que estavam no Titanic? — indaga Grey, se juntando a
mim, Kane e Axel no sofá do apartamento deles.
— Sim — Kane responde. — Quando eu descobri que não
era baseado em uma história real fiquei em choque por dias.
— Não é?! — pergunto atônito, pois até então eu pensava
que a história de Jack e Rose era real.
— Não, não é — Axel confirma. — É apenas baseado em
uma história em potencial que poderia ter acontecido no Titanic.
— Eles não são pessoas de verdade — Kane solidifica o
argumento de Axel.
— Mas a velha no final, ela é velha e louca e estava no navio
— eu digo, lembrando da velha Rose do filme.
— Primeiro, ela não estava lá — Kane contrapõe. —
Segundo, você é louco e um dia vai ser velho também.
— A questão é que Jack e Rose não existem — diz Grey
consternado.
— Existem sim — insisto.
— Você sabe quando o Titanic afundou? — Axel me
pergunta.
— Sim, há muito tempo atrás e quando o filme foi filmado, ela
estava extremamente velha.
— Vou pesquisar — Grey diz, já pegando o celular. — Jack e
Rose realmente existiram? — divaga Grey enquanto digita no
celular.
Kane, por sua vez, já está com a pesquisa aberta e informa:
— O Titanic afundou em 1912, Elliot.
— 1912! — argumento. — Quando o filme saiu?
— Jack Dawson e Rose, retratados no filme por Leonardo
DiCaprio e Kate Winslet, são quase inteiramente fictícios — Grey
fala em voz alta enquanto lê.
— Foda-se isso! — eu declaro. — Ela era velha! Foda-se —
ressalto ao jogar as mãos para o alto.
— Qual o seu problema com os velhos? — Axel pergunta.
— Nenhum, porra! Estou apenas fazendo uma analogia de
que a Rose estava sim no Titanic e aquela velhinha estava contando
a história de como ela não quis dividir a porta com o Jack.
— Sim, cara! — Kane bate com as mãos nas pernas. — A
Rose foi uma egoísta.
— A porta claramente dava para os dois — avalia Axel.
— O Jack e a Rose não existem! — Grey grita. — Eu acho
que eu vou vomitar — diz ele, já se levantando com a mão na boca.
Assim que ficamos apenas Axel, Kane e eu, noto que o
segundo olha para o primeiro com uma ruga se formando em sua
testa, enquanto o primeiro lhe lança o dedo do meio. Isso deve se
dar ao fato de que Axel desistiu do futebol americano e deve
começar o curso de Medicina nesse semestre, com Heaven, sua
namorada.
No ano passado, quando ainda éramos calouros, nós três,
juntamente com Grey e Drew, irmão gêmeo do Axel, jogávamos
juntos, mas bem antes disso, ainda no ensino médio, também
jogamos juntos. Eu nunca gostei muito do Drew, principalmente
porque ele deu a minha localização à minha mãe, logo após
vencermos um jogo, no segundo ano.
Margaret Tanner me pegou completamente despido,
acompanhado de duas líderes de torcida na sala de máquinas em
cima do auditório. Claro que minha mãe sabia o que estava
acontecendo ali, pois ela não só me pegou nu, como também viu a
exata cena onde Judy, uma loira alta, cavalgava no meu pau,
enquanto a minha boca estava colada na abertura de Emma, a
capitã das líderes de torcida da St. Crawford, apenas um metro e
sessenta, entretanto suas coxas torneadas e bunda arrebitada eram
o que mais chamava atenção na garota, além é claro, da sua pele
negra e o cabelo preto trançado.
Aquela cena ficaria na mente de qualquer mãe pelo resto da
vida. E foi ali, que a doce e querida pastora Tanner teve um ataque
cardíaco, segundo ela, só que conforme os médicos disseram, ela
estava tendo uma crise de pânico em grau um. Ainda assim,
tivemos que chamar uma ambulância e ela foi parar no hospital.
Naquela noite eu perdi minha virgindade, mas também fiz uma
promessa a Deus e à minha mãe, que só iria fazer sexo novamente
após o casamento. Claro que quando eu comecei a faculdade essa
promessa se tornou um pouco mais difícil de cumprir, porém eu
venho conseguindo administrá-la com muita excelência, eu prometi
não transar mais, no entanto isso não me impede de me tocar ou
então beijar algumas garotas.
Contudo, o que me fez sentir uma raiva avassaladora de
Drew Jones, aquele maldito quase filho de uma puta, não digo
completo porque gosto muito da antiga senhora Íris Davenport,
agora Morris, sua mãe biológica e também admiro para caramba a
antiga diretora Jones, sua mãe adotiva. O real fato da minha
estranheza com Drew veio logo após eu desconfiar do que ele fazia
com Heaven enquanto eles namoravam, e que se concretizou
quando ele a espancou até a sua quase morte.
Ele fez a escola do Ryle e Hardin tão bem ao ponto de se sair
pior do que os babacas literários. O idiota mereceu morrer, mesmo
com sua condição mental, nada apaga o que ele fez Heaven passar
e se há uma pessoa nessa vida que eu admiro para caramba, é
essa garota, porque mesmo diante de tantas adversidades, conflitos
internos e externos, e toda a catástrofe que aconteceu em sua vida
no ano passado, ela ainda mantém um belo sorriso no seu rosto. Ela
aprendeu a superar tudo o que era ruim para que pudesse semear o
bem, parte disso, obviamente, é responsabilidade de Axel, seu
então namorado, que ao contrário do irmão gêmeo do mal, ele é
bom e não é um psicopata.
Eles formam um casal de realmente dar inveja, aquele que a
gente olha e pensa: um dia eu quero encontrar um amor assim.
— Cara você tem que superar isso — Axel diz a Kane,
abaixando seu dedo do meio.
— Você abandonou o time por uma garota — Kane fuzila o
companheiro de quarto.
— Eu não abandonei por uma garota, a Heaven não me
impediu de jogar futebol — Axel se defende. — Eu apenas não sinto
o mesmo prazer que você sente com o esporte, e você sabe muito
bem disso desde a época em que nós tínhamos espinhas na testa,
então vê se cresce e para de franzir a porra da sua testa para mim.
— Pensa pelo lado positivo cara — eu interfiro. — Nós não
vamos precisar de seguro de saúde porque teremos não um, mas
dois amigos médicos. — Mostro os dois dedos enquanto argumento
me referindo também à Heaven.
— Você vai pagar seguro de saúde sim — Axel diz.
— Não vou nada! Por que eu vou precisar de um seguro se
vou ter consultas gratuitas sempre que precisar?!
— Ele tem um ponto — Kane concorda ao dar de ombros.
— Eu tenho um ponto.
— E se você precisar de uma cirurgia? Ou então seus filhos
precisarem tirar o apêndice, ou sua futura mulher sofrer um acidente
e precisar ir para a emergência? Como você vai pagar a conta
gigante do hospital?
— Agora o Axel tem um ponto — Kane diz ao levantar sua
cerveja e tomar um gole dela.
— Tá... talvez você tenha um ponto — digo, revirando os
olhos.
Grey se joga no sofá ao nosso lado, seu rosto está coberto
de consternação quando ele diz:
— Eu vou precisar beber muito hoje à noite para esquecer o
fato de que Jack e Rose não existem.
“Ou esquecer o fato de que você é apaixonado por sua irmã
postiça”, penso.
Eu não sou nenhum especialista no amor, ou sequer paixão,
eu nunca namorei nem mesmo fiquei sério com alguma garota
durante meus bons dezenove anos, porém o fato é que eu vejo a
forma como Grey olha para Allison sempre que eles estão no
mesmo local e não só isso, todas as vezes em que estamos em um
jogo, desde a escola, são os olhos de Allison que ele procura, todas
as malditas vezes, no meio da multidão. Seus olhos brilham e é
obvio, para qualquer um que dê um minuto do seu tempo para
prestar atenção neles dois, que não existe nada de amor fraternal
entre eles.
O único problema é que seus pais são casados há seis anos
e parece que nenhum dos dois sabe dos sentimentos do outro. Ou
seja, se isso não é um maldito amor proibido, eu não sei mais o que
é.
Talvez um dia eu possa até aproveitar e usar meus amigos
como inspiração para escrever um livro de romance estilo Romeu e
Julieta, com certeza eu tiraria um dez na aula de redação, mas ao
invés disso eu prefiro deixá-los se enganarem pelo resto de suas
vidas do que incentivá-los a cometerem qualquer pecado. E nesse
momento eu prefiro muito mais me levantar desse sofá, verificar
meu relógio e constar que já se passam das nove da noite e dizer:
— Está na hora da festa, bebês!
Dito isso, pego meu casaco do time onde tem estampada a
nossa mascote, que se trata de nada mais, nada menos do que um
jaguar com a boca aberta na parte das costas, combinando com o
nome, um tanto óbvio, do nosso time, Jaguars. Grey e Kane imitam
meu movimento, enquanto Axel pega uma jaqueta preta e veste por
cima da sua camisa branca.
— Você era mais gostoso quando usava uma dessas — digo
para o provocar e em troca recebo um belo e comprido dedo do
meio.
Após sairmos do apartamento, descemos um lance de cinco
andares de escadas e saímos do condomínio onde meus amigos
moram. Axel ficou de pegar Heaven, Allison e Sadie no dormitório,
por isso ele entra em seu Mercedes Classe G juntamente de Kane.
Grey e eu daremos uma carona a Wes, que mora em um loft à duas
quadras do apartamento dos caras, entramos no Lexus LFA que
Grey ganhou do seu padrasto, pai de Allison, e partirmos em busca
do nosso amigo.
Ao chegarmos em frente ao prédio, onde tem vários lofts,
Wes já está no pórtico à nossa espera, ele usa uma calça vermelha,
uma camisa listrada de botões, aberta até a metade, e óculos com
lentes amarelas, seus cabelos pretos e encaracolados estão presos
em tranças. Ele aderiu ao novo visual com tranças desde o
casamento de Íris, mãe de Axel, com Marlon, tio de Heaven, no
início desse verão, que infelizmente acaba hoje.
— Eu quero muita emoção essa noite — Wes diz assim que
entra no carro pela porta traseira.
— Eu quero sexo — Grey concorda.
— E eu quero apenas virar um litro de Jack na boca —
completo.
Durante os últimos três meses, eu, Grey e Wes ficamos em
Stone Bay, mas isso não nos impediu de festejar quase todas as
noites. Em algumas, fomos para o armazém onde acontece lutas
clandestinas, Grey apanhou em várias, porém ganhou em outras,
fazendo um bom dinheiro. Segundo ele, ele pretende juntar grana o
bastante para poder comprar um carro e devolver este ao seu
padrasto. Não faço a mínima ideia do que acontece dentro da casa
dos Fosters, só que sinto, lá no fundo, que meu melhor amigo não
se dá muito bem com o marido da sua mãe.
Nós três também fomos, todas as quartas, para as corridas
clandestinas que acontecem em Montgomery, cidade que fica entre
Beaufort, onde está localizada a faculdade na qual estudamos, e
Stone Bay, somos suburbanos que sabem aproveitar a vida. O
pessoal de Los Angeles costuma pensar que a vida noturna
acontece apenas na cidade que eles intitularam de “A Cidade dos
Pecados”, quando na realidade, o real pecado existe mesmo nas
cidades pequenas que contornam a grande metrópole californiana.
Foi durante esses meses e também devido às minhas
incansáveis saídas, que minha mãe decidiu que eu deveria começar
a namorar e claro, eu a ignorei da melhor forma: saindo de casa em
todas as oportunidades que tive, principalmente no momento em
que ela veio com a ideia de me apresentar alguma garota.
Porém, o verão chegou ao fim e como forma de
comemoração, quase cem porcento dos alunos veteranos da Stout
voltaram três dias antes para darmos adeus ao nosso primeiro verão
na faculdade e boas-vindas ao novo ano que se inicia.
Meus amigos, obviamente, vão acabar suas noites em
alguma cama. Wes com algum cara muito bonito, misterioso e
gostoso, enquanto Grey, que acaba de se descobrir bissexual
durante o verão, também poderá acabar com a mesma sorte de
Wes, ou então, com alguma garota loira, que se pareça com Allison.
E eu... bom, eu vou acabar a noite bêbado, uma vez que não
pretendo descumprir minha promessa com Jesus e minha mãe.
Ao chegarmos em frente à fraternidade, onde grande parte
dos jogadores de futebol mora, Grey desacelera o carro, levando-o
até a garagem que fica no subsolo da mansão. Por morarmos nela,
temos direito ao estacionamento da mesma, já as outras pessoas
que vêm para as nossas festas, estacionam na rua.
Quando saímos do carro, já ouço o som de uma batida agitar
o pessoal que se encontram no andar de cima. Subimos a escada
que dá acesso ao térreo e encontramos vários dos nossos colegas
de time jogando beer pong, além de algumas líderes de torcida
fazendo body shot umas nas outras, olha que ainda nem são dez da
noite e as coisas já estão animadas assim.
— Nós ainda chegamos atrasados — digo ao apontar o dedo
para as duas meninas, uma bebendo a tequila que se encontra
entre os seios da outra.
Grey leva seus olhos até elas e assim que percebe que
ambas são loiras, parte na direção das mesmas.
— E ele ataca novamente — constato ao levantar as mãos
para o alto.
— Eu sabia que era só voltarmos ao campus que ele iria
voltar à sua obsessão por loiras — diz Wes ainda ao meu lado.
— E se nós falarmos algo, nós somos idiotas.
— Quando na realidade quem tem um QI bem mais baixo é
ele.
— Concordo, mas agora preciso mesmo de uma bebida —
digo, indo em direção ao bar onde se encontram as bebidas e
pegando uma garrafa de Absolut na mesa, que se encontra em
menos da metade.
Não faço questão de pegar nenhum copo, por motivos óbvios
de que prefiro beber diretamente da garrafa. Logo que dou meu
primeiro gole, Wes informa que já encontrou o restante do pessoal,
então vamos na direção de onde Axel se encontra com as meninas
e Kane. Junto deles também estão mais duas garotas, uma morena
alta de pele bronzeada e cabelos cacheados, que está com cara de
poucos amigos, e quanto mais me aproximo delas, sinto que tenho
uma vaga lembrança da ruiva tatuada ao seu lado, tudo se
concretiza quando Wes grita em sua direção com os braços abertos:
— Valerie! — Os dois se abraçam.
Rapidamente eu me recordo da noite que passamos em Los
Angeles no início do campeonato do ano passado, após vencermos
a UCLA fomos convidados para uma festa em uma das
fraternidades e tudo ficou muito louco rapidamente. Valerie estava lá
e ficou com Wes durante um jogo da garrafa ou “verdade ou
consequência”, não lembro muito bem, porém me recordo mesmo é
do dia seguinte, quando minha mãe me encontrou no saguão do
hotel morto de ressaca e jogou sua bolsa da Hérmes em mim.
— Elliot! — Valerie exclama eufórica no momento em que se
desfaz do abraço de Wes, demonstrando que agora é a minha vez
de ser abraçado e eu apenas o retribuo.
— Vocês se conhecem de onde? — Heaven, que agora se
encontra com a pele extremamente bronzeada e os cabelos com
algumas mechas loiras, combinando com um estilo praiano que ela
deve ter adotado durante as duas semanas que passou no Caribe,
pergunta.
— UCLA — eu digo.
— Hum — ela murmura, fechando a cara e fuzilando Axel
com os olhos, ele por sua vez a agarra pela cintura e começa a
beijar seu pescoço.
— Eu já te disse, amiga, mais fácil eu te chupar do que um
dia colocar a minha linguinha em qualquer pênis — Valerie se
explica ao tirar a garrafa de vodka da minha mão e tomar um gole.
Eu tomo de volta a garrafa de Valerie e viro um gole da
bebida quente, que deveria descer ardendo por minha garganta,
porém a mesma se encontra quase que calejada. Eu não sou
alcóolatra, claro que não, bebo somente quando é necessário e no
meu caso, é sempre, pois se eu for levar em consideração meus
hormônios, eu deveria estar transando agora e a bebida é a minha
grande aliada para que eu consiga concluir esse celibato até me
casar.
E é nesse momento que eu lembro da mensagem que a
minha mãe me enviou mais cedo, onde ela dizia estar ansiosa para
me apresentar a uma pessoa. Um enjoo toma conta de mim só de
imaginar o que a minha mãe está aprontando, por isso tomo mais
dois goles da bebida, já sentindo tudo o que ela pode me
proporcionar: euforia e paz, na medida certa.
— Que saudade da UCLA — a morena de cabelos
cacheados divaga.
— Está com saudade? Só voltar, lindona — responde Kane.
— Porque você não vai para o inferno, Kane? — a morena
esbraveja.
— Porque você já está lá, Lynnox Grace e o diabo tem pena
de qualquer pessoa que esteja ao seu redor. — Presumo então que
esse seja o seu nome.
Eu não entendo absolutamente nada dessa troca de farpas
entre os dois, apenas dou de ombros para qualquer que seja o
problema deles.
— Sabe o que seria bom nesse momento? — eu indago. —
Todos vocês mexerem a droga das suas bundas na pista de dança.
Dito isso, uma música da Doja Cat começa a explodir nas
caixas de som e eu caminho direto para a pista improvisada.
Chegando lá, levanto minhas mãos para o alto, juntamente com
minha bebida, e começo a dançar ao som de Woman, até mesmo
fazendo a famosa coreografia do TikTok e isso, claro, arrasta várias
meninas comigo. Algumas delas começam a rebolar na minha frente
enquanto eu fecho os olhos com força, tentando me concentrar em
meu real objetivo.
Porém, quando uma garota de cabelos pintados de pink
começa a esfregar seus seios em mim, eu faleço naquele mesmo
momento. Passando meus dedos em seus cabelos finos, levo minha
mão até sua nuca e após um sorriso, dou um selinho no canto da
sua boca, a garota não fica contente com nosso breve contato, por
isso faz questão de enfiar sua língua diretamente na minha boca. E
eu deixo, o que mais eu poderia fazer se não deixar, não é mesmo?
Assim que a música acaba, começa uma batida frenética,
nosso beijo continua por mais alguns minutos e ao separar nossas
bocas, levo a garrafa até a minha, tomando mais alguns goles da
bebida, só que isso não impede a garota de chegar no meu ouvido e
dizer:
— Por que não arranjamos um lugar mais reservado? — ela
pergunta e eu limpo o pouco de líquido que escapou da minha boca
com a manga da minha jaqueta.
— Porque eu não faço sexo — respondo simplesmente, o
sorriso malicioso que havia na boca da garota que eu acabei de
beijar se desfaz, dando espaço a um grande “O”. — Não que eu não
queira fazer sexo com você, é só porque eu sou quase virgem
mesmo.
A abertura da boca da garota, que eu não sei o nome, se
abre ainda mais. Para que não entre nenhuma mosca ali, eu fecho
sua boca e aliso seu rosto macio com as pontas dos dedos,
beijando-a em seguida novamente.
— Eu nunca fiquei com um virgem antes — ela diz quando
nosso beijo cessa uma outra vez.
— Quase virgem — a lembro. Levo a garrafa de bebida
quase vazia para minha boca, tomando mais um gole. Percebendo
que a bebida acabou, olho para garota outra vez, dando de ombros.
— De qualquer forma foi bom beijar você, me liga.
Dessa forma, me afasto do meu primeiro beijo do ano e vou
em busca de mais bebida, chegando no bar a única coisa que
encontro são garrafas de gin, tequila, licor e cerveja. Avisto Colin do
outro lado da mesa.
— Onde estão as bebidas quentes, cara? — pergunto ao
nosso quarterback, que tem a pele bronzeada e cabelos pretos que
imitam um topete bagunçado. Assim como o restante do time, Colin
usa a jaqueta do Jaguars.
— Ao que parece acabaram — ele responde simplesmente.
— Como assim acabaram?! — pergunto. — A festa começou
agora.
— Parece que você não é o único com vontade de tomar
todas hoje, cara.
— Que seja! — respondo ao me lembrar que mantenho um
estoque particular no meu quarto.
Começo a desviar das pessoas que estão na pista de dança
e vou em direção à escada. Chegando na mesma, trombo com
Grey, que está quase transando com uma das loiras do body shot
que acontecia há um tempo atrás lá embaixo. Ao alcançar o primeiro
andar vejo que Kane está em uma discussão calorosa com a tal
Lynnox Grace, eu nunca havia visto essa garota na minha vida até
hoje, mas meu amigo parece ter uma grande história com ela, se
não isso, os dois devem ter se odiado desde o momento em que
esbarraram pela primeira vez.
Ignorando ambos, subo outro lance de escadas, uma vez que
agora meu quarto fica no segundo e último andar, deixando o
primeiro para os calouros que devem chegar amanhã ou domingo.
Ao contrário do primeiro, o segundo encontra-se mais calmo,
não há ninguém brigando pelo corredor, nem enormes filas no
banheiro, já que os banheiros desse andar ficam todos nos quartos
e é totalmente proibida a entrada de pessoas estranhas nos nossos
quartos.
Chegando na terceira porta à esquerda, eu a abro.
Lembra que eu disse que estava calmo e era proibida a
entrada nos quartos?! Então cancela, porque eu acabo de dar de
cara com duas ruivas de topless se pegando em cima da minha
escrivaninha.
Quando a porta se fecha atrás de mim enquanto engulo em
seco, eu devo estar com uma cara de total idiota pela cena que vejo,
pois uma das ruivas me lança um olhar juntamente da proposta:
— Quer participar?!
E assim eu constato cada dia que passa que é impossível ser
celibatário na faculdade!
Você não sabe o que você fez, fez comigo
Seu corpo leve fala comigo
Eu não sei o que você fez, fez comigo
UNDER THE INFLUENCE | CHRIS BROWN

Já passa das nove horas quando me encontro com Allie e


Heaven do lado de fora dormitório, essa é a primeira vez que vejo
Heaven desde que ela retornou da sua viagem ao Caribe, uma vez
que faz apenas um dia que ela chegou.
— Meu Deus! — exclamo no momento em que a vejo.
— E então?! — ela pergunta, animada. — Gostou?
— Eu amei! — Sou sincera.
Heaven está parecendo uma garota realmente praiana, seus
cabelos castanhos agora estão com algumas mechas douradas e
sua pele acompanha o mesmo tom.
— Vocês devem ser Lindsay e Valerie, certo?! — Allie indaga
à minha mais nova colega de quarto e sua inseparável amiga.
— Lynnox — digo ao apontar para a morena que usa um
vestido preto com um belo decote entre seus seios. — E Valerie. —
A ruiva usa um conjunto de saia e top, ambos vermelhos, que
combina com o batom encarnado em seus lábios.
Mais cedo, logo que Heaven me enviou a mensagem dizendo
que iríamos à festa, perguntei se teria vaga para mais duas e foi aí
que mencionei sobre as meninas. Ambas se animaram para a festa,
a Valerie bem mais do que a Lynnox, até mesmo me ajudou a
escolher a roupa que eu iria vestir hoje, optamos por um top verde
musgo trabalhado na renda, shorts de um tecido branco e bota na
mesma cor.
As quatro garotas rapidamente se apresentam com abraços.
— Eu te conheço de algum lugar — Heaven declara
pensativa quando se desfaz do abraço de Valerie.
Não dá tempo de Valerie ou qualquer uma de nós
respondermos, pois no segundo seguinte o Mercedes Classe G de
Axel estaciona ao nosso lado e Kane abre a porta do passageiro.
Percebo o exato momento em que ele fica estático, com um pé
dentro e outro fora, nos encarando, mais especificamente
encarando Lynnox, como se estivesse vendo um fantasma na sua
frente.
— Você só pode estar de brincadeira comigo — os dois falam
em uníssono. — O que você está fazendo aqui? — eles continuam.
— Quer saber? Vai à merda.
Enquanto Lynnox leva suas mãos ao alto, Kane finalmente
sai do carro. Eu e a outras meninas, exceto por Valerie, observamos
toda a situação entre os dois completamente atônitas. Os dois
ficaram calados, porém em contrapartida, continuam se encarando
com tanto ódio que falta apenas sair fumaça de suas orelhas.
— Bom te ver também, grandão — Valerie cumprimenta ao
se aproximar de Kane e dar dois tapas em seu ombro. Em seguida,
a mesma entra no carro pela porta traseira.
Heaven segue o mesmo caminho, no entanto toma o lugar
que antes Kane ocupava, eu também decido deixar de assistir a
batalha de ódio entre Kane e Lynnox e adentro o carro, tomando o
lugar do meio ao lado de Valerie e Heaven diz:
— Você é a ruiva que estava com o Axel na UCLA.
— Eu estava com você na UCLA, Heaven — Axel se defende
de uma suposta acusação.
— Mas vocês estavam se abraçando...
— Sinto muito te cortar, Hea — Valerie a interrompe. — Mas
eu não chuparia teu namorado nem por um milhão de reais, já
você... — finaliza, deixando sua proposta no ar e tocando a pele
exposta da minha perna com as pontas dos dedos. Quando levo
meus olhos aos dela, ela me lança uma piscadela.
Por um mero segundo eu fico totalmente petrificada.
Entretanto, tudo cessa no momento em que Allison se senta no meu
colo e uma gritaria começa do lado de fora do carro.
— Eu vou de Uber, não me sento no seu colo nem que você
seja o último homem da terra — Lynnox esbraveja enquanto Kane
segura a porta do carro.
— Se você tem medo de que eu fique duro com essa sua
bunda mole, pode parar com as suas preocupações porque isso é
impossível — Kane responde friamente.
— Ei, vocês dois — Axel grita, entrando com sua cabeça no
vão entre seu assento e o do carona para ter a visão dos dois que
estão do lado de fora. — Não estamos mais no ensino fundamental,
então façam o favor de entrarem nesse carro porque temos uma
festa para ir.
Dessa forma, Lynnox adentra rapidamente no carro,
sentando-se ao meu lado, à medida que Kane revira os olhos, ela
diz:
— Agora você escolhe, vai correndo, de Uber ou no meu
colo. — Eu não consigo ver seu rosto, só que aposto que ela está
sorrindo.
Quando Kane finalmente entra, fechando a porta, ele senta-
se no colo de Lynnox e murmura:
— Eu quero que você se foda, mas se foda de uma forma
bem fodida.
Axel faz um movimento de negação com a cabeça assim que
dá a partida no carro e Kane tenta se ajustar pois sua posição não é
muito favorável, uma vez que ele mede cerca de um metro e
noventa. Ao passo que ele se mexe, a morena dá um soco em suas
costelas, fazendo com que ele se mova uma outra vez sibilando um
palavrão.
— Eu gostaria muito que alguém me explicasse o que está
acontecendo aqui — eu decido finalmente perguntar.
— Eu também — Allison diz.
— E eu. — A voz de Heaven surge com certa curiosidade.
— Nós quatro estudamos juntos em Hastings — Axel informa.
— E esses dois se odeiam desde que tinham apenas dez
anos de idade — Valerie complementa.
— Quem começou foi ele — Lynnox se defende.
— Não, quem começou foi você com aquela cola ridícula —
Kane acusa, ainda se movendo para ajustar sua posição.
Os dois começam uma discussão calorosa dentro do carro,
um xingando o outro durante os dez minutos de viagem até a
fraternidade onde acontece a festa. Eu não consegui entender muito
bem a história deles, mas basicamente eles viviam em pé de guerra
quando estudavam juntos. Tão logo finalmente descemos do carro,
eu respiro aliviada, pois a música alta e estrondosa dentro da
mansão encobre as vozes deles dois, me trazendo um pouco de
paz.
— É por esse motivo que “enemies to lovers” só é bom nos
livros — eu digo ao descer atrás de Allison, que revira os olhos.
— E eu pensava que esse ano iria ser um tédio.
— Desde quando nossa vida é um tédio com os amigos que
temos? — pergunto ao apontar com o queixo para Heaven, que está
com a cara fechada e Axel, que a chama de linda.
— Tem razão. — Allie ri.
— Então, vamos entrar ou o quê?! — Valerie chama.
Dessa forma, todos nós começamos a caminhar em direção à
casa, que já está lotada. A cada passo que damos a música torna-
se ainda mais alta, porém não o suficiente para que possa aquietar
as batidas frenéticas e fortes do meu coração, que ameaça sair pela
boca a qualquer momento.
Ao contrário da maioria dos universitários que frequentaram
essa casa no ano passado para festejar, se embebedar e fazer sexo
como loucos, todas as vezes em que vim até aqui foram apenas
para escutar gritos e ameaças que me deixavam com medo e
angustiada. Nós brigamos no jardim da casa, que agora está lotado
de pessoas caminhando em direção à varanda, onde também
discutimos algumas vezes, uma delas eu até mesmo chorei,
implorando para ele me libertar daquele jogo sádico, que não só me
feria, mas afetava as outras várias pessoas ao nosso redor.
A catástrofe que Drew fizera enquanto ainda estava vivo, foi o
bastante para que mesmo hoje, sete meses após a sua partida,
ainda existam inúmeros fragmentos em minha memória, que ainda
me dão vontade de correr e me perguntar o porquê eu ainda
aceitava tudo o que ele fazia e dizia.
No entanto, o pior de tudo não era isso e sim todas as
malditas vezes em que eu voltava para casa e meu irmão, vestido
em um belo conjunto de roupa social, sorria para mim durante o
almoço ou jantar em família. Pois se não fosse por seu erro, anos
atrás, eu não teria que ter vivido tudo o que vivi.
Eu não teria mentido, magoado e enganado a todos aqueles
que eu apreciava.
Mas eu fiz, e me arrependo amargamente de tudo aquilo e
mesmo hoje, eu faria tudo de novo. Ou faria ou desistiria de tudo.
Embora eu até tenha tentado uma vez, aquela tentativa foi o
suficiente para me assustar por todos os meus dias e noites até
hoje.
Me dou conta de que estou agindo em modo automático
quando percebo que já estamos dentro da casa e Elliot levanta as
mãos juntamente com a sua grande companheira Absolut, nos
convocando para a pista de dança.
Logo que Elliot parte para a pista de dança, Heaven puxa a
mim e Lynnox para o bar, acompanhada de Allison e Valerie, que ao
contrário de nós quatro, que optamos por doses duplas de tequila,
decide tomar três copos de cerveja seguidos um do outro e é
ovacionada por todos ao redor. Após virar o copo na minha boca,
sinto a ardência da tequila fechar a minha garganta por cerca de
dois segundos e em seguida o calor do líquido descer por meu
corpo, indo em direção ao meu centro e também tomando conta do
meu rosto, com isso, começo a me abanar.
Fazia muito tempo que eu não bebia dessa forma, acredito
que desde antes de entrar na faculdade, uma vez que no ano
passado eu não vivi nada do que a vida universitária é capaz de
proporcionar, pelo contrário, estava totalmente enclausurada, tinha
medo até mesmo da minha sombra, viver dentro da minha cabeça
era como ter uma arma pronta para puxar o gatilho a qualquer
momento.
Talvez seja isso que me dá coragem o suficiente para olhar
no fundo dos olhos de Valerie, que agora se serve de uma dose de
tequila. Noto o fogo em seus olhos escuros no instante em que eu
mordo meu lábio inferior, porque se ela não entendeu o que eu
quero, talvez enquanto eu elimino o pequeno espaço entre nós, ela
consiga fazer isso.
Estando frente a frente com Valerie, levo meus lábios até o
lóbulo da sua orelha, dando-lhe um selinho ali.
— A Lynnox disse que não queria que você ficasse com
nenhuma colega de quarto dela, mas ela não disse nada quanto a
colega de quarto dela ficar com você.
Tenho a certeza de que ela entendeu o que eu quero assim
que retorno meus olhos aos dela, a assinalada que ela dá com a
cabeça é quase imperceptível para as outras pessoas, porém para
mim, é o único sim de que eu precisava.
Eu não sei exatamente em qual momento surgiu essa minha
vontade de ficar com ela, afinal, nos conhecemos há menos de doze
horas. Talvez tenha sido quando a vi escorada na soleira da porta
do quarto de Lynnox ou quando ela me ajudou a escolher a roupa
que eu usaria hoje, também pode ter acontecido no carro quando
ela piscou para mim, a única certeza que eu tenho é que agora, é
que todos os pequenos acontecimentos entre nós duas e a pequena
porção de álcool no meu corpo, foram capazes de me dar coragem
o suficiente para fazer o que eu quero.
Há muito tempo eu não faço nada que eu realmente queira.
Que eu realmente preciso.
E nesse instante, eu preciso beijar.
Com isso em mente, levo minhas mãos até o pescoço de
Valerie, passando os dedos diretamente para a sua nuca, e trago
seu rosto para o meu. No primeiro momento, eu não beijo
diretamente a sua boca, apenas mordisco seu lábio inferior, em
contrapartida, ela sorri para mim.
— Eu sabia que você era quente, garota — ela diz antes de
finalmente juntarmos nossas bocas, eu lhe dou abertura e nossas
línguas se encontram.
Nosso beijo dura mais alguns segundos e a todo o momento
o meu centro palpita em excitação, quando nossas bocas se
separam eu decido puxá-la pela mão, conduzindo o caminho até as
escadas. Ao subir o primeiro lance dou de cara com Grey, que beija
uma garota loira, ele está com os olhos abertos no instante em que
passo por ele, por isso ele faz um sinal de legal com a mão ao me
ver.
Olho para o corredor do primeiro andar da mansão e o
mesmo está lotado de pessoas, então decido subir mais um lance
de escada.
— Para onde você está nos levando? — Valerie pergunta. —
Pensei que era proibido usar os quartos.
— Eu te conheço há pouco tempo Val, mas acho que coisas
proibidas não fazem muito o seu estilo... ou fazem? — Dou de
ombros assim que chegamos em frente à terceira porta à esquerda
e abro-a. — Tenho certeza de que o Elliot não vai se importar se
usarmos o quarto dele por alguns minutos.
No momento em que calo a minha boca a porta se fecha em
um baque surdo pelo chute que Valerie dá ali, imediatamente ela
leva suas mãos até as alças do top rendado que eu uso, descendo-
as. Eu não a impeço de realizar seu próximo ato, que é deixar meus
seios amostra, o ar frio do ar-condicionado toca a minha pele, que já
está delicada o bastante, fazendo com que meus mamilos
intumesçam.
Valerie traz seus olhos ao meu busto e me agarra pela
cintura, criando uma estabilidade entre nossos corpos para que ela
possa abocanhar um dos meus peitos.
Eu quase não tenho experiência com mulheres e se contar o
fato que faz um ano não fico com ninguém de verdade, eu tenho
propriedade para dizer que hoje eu não tenho experiência com
nenhum dos sexos. Fiquei com apenas uma garota durante o último
ano da escola e pelo que eu me lembro, aquela foi uma sensação
ótima, mas ter meus peitos chupados por Valerie é delicioso.
O top que ela usa, ao contrário do meu, não é de alças, então
eu não preciso investir muito para também deixar os seus seios
despidos, apenas trago a faixa para baixo.
Com ambas de topless, Valerie abandona a investida que
dava em meu peito e traz sua boca novamente para a minha, dando
início a um encontro voraz de duas línguas. Ela dá alguns passos
para frente, fazendo com que eu ande de costas, logo que minha
bunda se depara com algo que eu diria ser uma mesa, ou
escrivaninha, a porta do quarto, que não fora trancada, se abre e
separamos as nossas bocas.
Meus olhos saltam diretamente para o homem que veste a
jaqueta do time de futebol americano da Stout, seus cabelos
castanhos e lisos estão bagunçados e seus olhos verdes brilham. A
porta atrás de Elliot se fecha e seu pomo de adão sobe e desce no
instante em que Valerie pergunta:
— Quer participar?!
Sua pergunta tem um tom retórico, porém Elliot apenas nos
encara e não fala uma palavra sequer, então eu me lembro do seu
juramento.
— Ele é celibatário — murmuro para Valerie e seus olhos,
carregados de luxúria, se embebedam de malícia.
— Você não acha que é pecado assistir duas garotas se
pegando, Pequeno Elliot, acha? — provoca Valerie enquanto abre o
fecho do meu short.
Eu não escuto a resposta de Elliot pois meus olhos estão nos
movimentos da garota que passa suas unhas levemente sobre
minha pele à medida que desce o tecido branco por minhas pernas,
fazendo com que meus pelos se ericem. Uma vez que a roupa está
abaixada, com o mesmo toque Valerie retorna suas mãos até a
parte inferior das minhas coxas.
Nesse momento arrisco olhar para Elliot, que se despe da
sua jaqueta, permanecendo com a sua camisa branca e calça jeans
escura, seus olhos não piscam em instante algum. No entanto, a
minha atenção retorna à Valerie quando sua língua pousa em cima
da bainha da minha calcinha, subindo por meu umbigo e seguindo o
caminho do meu abdômen até o meio dos seios, onde suas mãos os
agarram com força.
Sua língua continua a tocar minha pele até a garganta, me
fazendo estremecer pela primeira vez, me dou a permissão de
pegar seus cabelos laranjas, puxando-os e sua boca de volta ao
patamar da minha, tomando-a novamente. Enquanto nos beijamos
Valerie continua a massagear meus seios e meus olhos se abrem,
encontrando os de Elliot, que agora está passando a mão sobre sua
virilha, evidenciando assim a protuberância do seu pau duro.
Por um mero segundo sinto que o que estamos fazendo com
ele é pura maldade e por essa fagulha de arrependimento, eu digo:
— Fique à vontade para se tocar. — Eu não preciso dizer
mais nada para que Elliot abra o fecho da sua calça e liberte sua
ereção. Sentindo os toques de Val e assistindo meu amigo se tocar
ao mesmo tempo em que nos vê, minha boceta palpita, fazendo
com que eu solte um pequeno e vacilante gemido.
Elliot suspira com o som, levando sua mão até a glande
rosada e brilhante pelo pré-gozo que se espalha ali.
Tiro meus olhos dos seus quando o beijo entre Valerie e eu
cessa, ela também leva seus olhos até o nosso amigo.
— Você tem um belo instrumento aí, Elliot. — Valerie morde o
lábio inferior. — Já imaginou como seria ele... — Ela hesita por um
segundo para afastar o tecido que cobre o meu centro. — Dentro de
uma boceta apertada e molhada? — completa no instante em que
introduz dois dedos em minha abertura.
Seu movimento faz com que minhas costas arqueiem e eu
feche os olhos, eu não tinha percebido até o momento do seu
comentário, mas eu estou realmente molhada. Fazia tanto tempo
que eu não me sentia assim, que nem mesmo me permiti enxergar e
sentir os sinais que o meu corpo dá.
— Porra, Val — escuto a voz de Elliot murmurar.
— No entanto, se você prefere se tocar, eu posso lhe dizer
qual a sensação de estar dentro dela. — Ela conduz a situação
enquanto dá a sua primeira estocada. — Quente... — Ela sai. —
Úmida... — Entra e sai outra vez, fazendo com que minha boceta
aperte seus dedos. — E palpitante, louca para se libertar. — Ela me
estoca novamente, porém mais fundo.
Sua outra mão vai de encontro ao meu clitóris,
massageando-o em círculos ao passo que eu solto o ar quente e
pesado pela boca.
— Abra os olhos — sussurra Valerie e assim eu faço, quando
a olho, ela nega com a cabeça e estala a língua. — Assista-o se
masturbar enquanto eu te como meus dedos.
Um arrepio súbito sobe por minha coluna com suas palavras
e eu olho para Elliot, sua mão faz movimentos contínuos,
bombeando a sua ereção à medida que Valerie entra e sai de mim
avidamente durante vários segundos. Quão mais próxima eu chego,
mais a minha boceta pulsa nas mãos de Valerie e mais rápidos se
tornam os movimentos de Elliot em seu pau.
Meu sexo, cada vez mais desperto, traz sensações antigas,
agora completamente novas ao meu corpo, eu nunca fui
masturbada dessa forma e nunca assisti alguém se masturbar para
mim, ambos me deixam com tesão na mesma intensidade, esse é
definitivamente o primeiro e melhor quase ménage que eu tivera em
toda a minha vida.
Eu me perdi durante um ano inteiro sobre o que eu era, o que
eu queria ser e o que eu podia ser.
Me privei de coisas simples e também complexas para doar
tudo o que eu fui para uma pessoa, uma mentira, uma ameaça.
E agora, enquanto eu assisto o homem, o qual um dia eu
disse que nunca iria para a cama, liberar o seu gozo olhando no
fundo dos meus olhos, eu consigo sentir o gosto da minha liberdade
outra vez, pois é o seu nome que sai dos meus lábios assim que
libero aquilo que estava preso dentro de mim por tanto tempo.
— Elliot... — arfo seu nome logo que minha boceta se
comprime pela última vez, soltando o meu gozo.
Mesmo com uma pessoa ainda entre nós dois, meus olhos
não vacilam, porque o único que eu enxergo à minha frente é Elliot.
A sensação estranha que toma conta do meu peito vai além de um
simples orgasmo, é como se ele estivesse me avisando que algo
enorme está prestes a acontecer em minha vida e então, eu me
perco no fundo dos seus olhos verdes.
Contudo, nosso contato visual é perdido quando ouço o toque
do meu celular reverberar no cômodo ocupado por três pessoas
cheias de tesão.
Com medo da minha própria imagem
Com medo da minha própria imaturidade
Com medo do meu próprio teto
Com medo de morrer de incerteza
O medo pode ser a minha morte
O medo leva à ansiedade
Não sei o que está dentro de mim
DOUBT | TWENTY ONE PILOTS

— Deixa de birra, Sady, eu prometo que após ganhar a


corrida de hoje, divido os lucros com você — Trevor diz quando
passamos pela divisa entre Beaufort e Montgomery.
— Eu não estou com birra, Trevor. Eu apenas não acredito
que depois de tudo que eu passei no ano passado por você, você
ainda quer que eu continue fazendo essas merdas, isso sem contar
o fato de que você já tem vinte e três anos, já passou da hora de
você crescer e deixar essas idiotices de racha para lá — esbravejo.
Até vinte minutos atrás eu estava bem. Não, não. Eu estava
ótima, como nunca! Sabe quanto tempo fazia que eu não gozava?
Pois é, nem eu!
Mas todo o prazer que eu senti foi embora no momento em
que meu celular começou a tocar e assim que eu vi o contato do
meu irmão piscando na tela, eu sabia que coisa boa não viria dali.
Vesti minhas roupas apressadamente e fugi do quarto de Elliot,
como o diabo foge da cruz, deixando-o a sós com Valerie. Quando
atravessei a porta, deslizei o dedo na tela e atendi a ligação de
Trevor, que perguntou onde eu estava e disse que precisava de
mim.
Dessa vez, o tempo que ele me deixou em paz, durou menos
do que a última. Oito meses, apenas oito meses que eu não fazia
mais isso para o Trevor, até mesmo durante todo o verão em que
passamos debaixo do mesmo teto, ele não teve a audácia de me
chamar, de dizer que precisava de mim, contudo, exatamente no dia
em que volto para a faculdade, em que me vejo finalmente longe do
meu irmão usurpador, ele me chama novamente.
A grande questão é que ele ama ter o controle sobre mim.
— Eu agradeço tudo o que você fez por mim, maninha. — A
forma como ele me chama, me dá nojo. — Tudo o que aconteceu
também foi culpa sua, se você tivesse mantido a droga da sua boca
fechada, nada teria acontecido. Agora, eu acredito que isso tenha
servido de lição para você nunca mais tocar nesse assunto. Certo?!
Ele tira seu rosto da estrada por alguns segundos para me
encarar, em contrapartida eu o mostro o dedo do meio, Trevor
segura o meu dedo e morde.
— Deixa de ser psicopata, porra — esbravejo.
— Você ainda não me respondeu, Sady.
— Certo, idiota. Eu não abro mais minha boca, tudo para
você e por você, vossa majestade — debocho ao revirar os olhos.
— É assim que eu gosto — ele diz com sua voz convencida.
Enquanto Trevor entra no terreno onde acontecem as
corridas, percorrendo o caminho de terra, eu averiguo meu dedo. A
mordida que ele deu ali não foi tão forte, porém as marcas de seus
dentes estão presentes. Idiota!
Às vezes eu ainda tenho uma vontade intensa de me tornar
filha única dos meus pais, principalmente quando ele age com o
grande babaca e idiota que ele é. No entanto, o meu maior desejo
ainda é que um dia meu irmão volte a ser aquele que era durante a
nossa infância, antes da maior tragédia das nossas vidas acontecer.
Eu poderia muito bem me abrir, exclamar, gritar ao mundo todo o
que aconteceu, porém eu sei tudo o que pode acontecer se eu abrir
a minha boca de novo.
Consequências são o que não faltam, eu sei disso muito
bem, na época ele já tinha idade o suficiente para se responsabilizar
por todas elas, por isso meu pai fez questão de esconder e entocar
tudo, enquanto Trevor ficou com a responsabilidade de se tornar um
grande babaca, eu me senti obrigada a cuidar dele. E isso incluiu
estar disposta a pagar todo e qualquer preço que seja preciso.
Por essa razão eu me ofereci e me entreguei ao Drew,
durante todo o tempo em que estive sob o seu poder, Trevor não
mexeu comigo e eu até mesmo cheguei a cogitar que ele havia
parado, até a sua ligação há alguns minutos atrás.
— Você sabe o que fazer — Trevor diz quando estaciona o
carro atrás da arquibancada improvisada.
— Claro que eu sei — digo ao sair do carro.
Mesmo há tanto tempo sem fazer isso, eu sei exatamente o
que fazer. Afinal, eu fiz isso durante muitos anos.
As corridas clandestinas acontecem em uma arena que
possui um terreno de cinco hectares, onde costumava ser uma
fazenda até o início do século vinte e um, no entanto após a morte
do dono, as terras foram abandonadas. Pela história que eu
conheço e que tanto é contada para os que costumam frequentar o
local, alguns universitários da Stout costumavam vir aqui para
apostarem corridas amigáveis pela terra e aos poucos foram dando
forma ao circuito, que hoje é cheio de curvas, declives e aclives
contornados por cerca de dois quilômetros pavimentados, as
competições podem variar entre uma e seis voltas, isso irá depender
dos adversários.
No início, Trevor fazia apenas uma volta e com o tempo, de
acordo com o motor do seu carro e também a estabilidade que ele
foi criando na pista improvisada, ele foi aumentando. Hoje ele corre
as seis tranquilamente e conhecendo meu irmão, ele faria questão
de fazer o percurso vinte vezes seguidas.
Ao lado de onde é dada a largada, e também o final de cada
racha, fica uma arquibancada improvisada. Logo que começamos a
frequentar o local, ele suportava cerca de cem pessoas, entretanto,
a cada nova disputa, mais conhecidas as corridas foram ficando e
com isso mais pessoas passaram a frequentar. Hoje sei que, no
mínimo, quinhentas pessoas cabem ali, brincando.
Já passa das duas da manhã, o que significa que meu irmão
irá ser o último a competir e como de praxe, ele juntamente com a
pessoa contra quem ele irá competir, terão de escolher quem dará a
largada na partida, é aí onde eu entro. Pois caso aconteça algum
empate técnico a mesma pessoa que deu a largada é a responsável
pelo desempate.
Trevor viu a chance de ganhar todas as corridas que
participava assim que notou que eu estava criando corpo de mulher.
Quando criança eu sempre chamei atenção pelas sardas no
meu rosto e pelo cabelo cor de cobre, é um tom único, semelhante
às folhas laranjas amarronzadas que caem no final de todo outono,
intenso e ao mesmo tempo muito frio. Igual também aos meus
olhos, que têm cor de mel, por mais que esteja em um ambiente
escuro, as írises douradas sempre se destacam em meio à
multidão. Então eu fui crescendo, minha cintura tomando forma,
meus seios crescendo o suficiente para não serem grande, nem
pequenos.
Minha bunda arrebitou e minhas pernas engrossaram
gradativamente.
Ali estava, a juíza perfeita, que todos os homens que pousam
seus olhos sobre, querem garantir o seu corpo além da vitória no
final da noite.
No momento em que vejo Trevor estacionar seu inseparável
Dodge Charge 70 no grid de partida começo a caminhar em direção
à multidão, mais especificamente, na direção de onde ficam as
meninas que geralmente eles escolhem para serem o centro da
atenção na noite.
Enquanto ando faço um truque para que o short branco se
torne um pouco mais curto, pois assim, além de deixar mais da
minha pele amostra, também me favorece na questão de alongar as
pernas, eles adoram garotas de pernas longas, parece que quanto
mais longas, mais eles se interessam.
Chegando ao local, Trevor já está encostado no capô do seu
carro, ele pisca para mim e em seguida passa seus dedos em seus
cabelos, que são de um ruivo mais intenso que o meu, dessa forma
eu sei que é a minha deixa para desfilar até eles. E assim o faço, ao
invés de ir ao encontro do meu irmão, vou até o carro do seu
adversário, que trata-se de um Gran Torino 72 na cor vermelha.
Passo meus olhos rapidamente pelo interior do carro, notando os
bancos de couro marfim que foram instalados.
Levanto meus olhos no instante em que uma mão é posta em
minha cintura.
— Te ajudo em alguma coisa, baby? — um cara de pele
negra e cabelos trançados pergunta, o mesmo é o dono das mãos
bobas que agora adornam minha cintura.
— Que tal me deixar dar a largada na corrida? — sugiro em
um sussurro, o que faz com que o homem dê um sorriso de canto,
mostrando seus dentes brancos.
— O que eu ganho com isso? — ele pergunta, claramente
com segundas intenções.
Agarro a gola da sua camisa para que eu possa trazê-lo para
mais perto de mim.
— O prêmio completo — sussurro em seu ouvido, minha voz
pode parecer sedutora para ele, porém tudo o que existe em mim é
nojo.
Sim, nojo!
Pois se o Trevor ousar perder a droga dessa corrida ou ficar
muito atrás, no final da noite eu terei que cumprir com a minha
palavra. E aqui está um dos grandes segredos que eu partilho com
meu irmão, basicamente eu sou sua prostituta particular. Foram
poucas as vezes em que as coisas precisaram ir tão longe, só que
não muda o horror e a repulsa que eu sinto sempre que eu sequer
penso em fazer essas coisas.
Foi por esse motivo que, em um passado não muito distante,
eu optei por ir para a cama com quem eu quisesse e quando eu
quisesse, pois pelo menos daquela forma eu me sentiria no controle
de alguma coisa. A questão é que em poucas das vezes o sexo foi
realmente por prazer para mim, a grande parte das vezes em que
eu me entreguei a alguém, com nojo ou por vontade própria, não me
fizeram sentir um terço do que eu senti enquanto estava naquele
quarto sendo masturbada por Valerie e assistindo Elliot se tocar.
— Aguarda um segundo — ele finalmente responde,
mordendo o lóbulo da minha orelha.
Assim que o, até então, desconhecido por mim se afasta,
arrisco a me limpar do seu toque. Eu nem mesmo o conheço, não é
nada ligado a ele ou contra ele, trata-se apenas da repulsa que eu
sinto de mim mesma todas as vezes em que venho a esse local.
Trevor, mais do que ninguém, sabe tudo o que eu sinto quando
estamos aqui, mas ele age com total indiferença aos meus relatos,
às vezes ele promete que não irá acontecer, em outras ele ri e diz
que não é nada demais. No começo eu tentei me convencer de que
fazendo isso, um dia ele se arrependeria e olharia para mim como
sua irmã outra vez, só que o tempo foi passando e não adiantou de
nada. E mesmo que se passem anos e eu diga que não vá mais
fazer parte disso, Trevor sabe que ele sempre terá certo controle
sobre mim.
Ao finalizar minha tentativa falha de me desintoxicar dos
toques de um anônimo qualquer, me assusto ao ouvir a voz,
daquele que um dia já foi meu amigo, atrás de mim.
— O que você está fazendo aqui, vaca? — a voz de Wes
reverbera em meus ouvidos.
Eu nunca havia o visto aqui antes, por isso, para ter certeza
de que essa voz realmente pertence a ele, me viro em sua direção.
Meu olhar é de espanto, tenho certeza disso, já o de Wes é de puro
desdém.
— O que você está fazendo aqui? — eu pergunto ao invés de
responder.
— Eu curto homens fora de lei — ele responde, dando de
ombros. —, e você?! — pergunta novamente, afiado.
Antes que eu possa lhe responder, reconheço Mark acenar
ao longe para mim. No ano passado ele era o organizador das lutas
que aconteciam no armazém e parece que agora o seu negócio
clandestino se expandiu, uma vez que, ao que tudo indica, ele
também é o novo responsável pelas corridas.
— Ruiva, vem aqui! — ele fala em seu megafone.
— Eu tenho que...
— Você não vai fazer o que eu estou pensando que você vai
fazer. Vai, Sadie? — Wes questiona.
— O que você pensa que eu vou fazer? — desconverso.
— Não faz a sonsa, garota. Você sabe muito bem e se você
sabe disso, sabe também que você é prêmio final deles.
— Será que sou mesmo?! — questiono ao arquear uma
sobrancelha.
Wes me observa dos pés à cabeça, faz um bico e depois
nega com a cabeça. Mark me chama outra vez e quando me viro
para ele, meu amigo/pessoa que não me suporta, olha na direção
do organizador e então enxerga o mesmo que eu. Trevor está ao
seu lado e só para afirmar a sua negação, Wes balança novamente
a cabeça, porém não deixa de me desejar boa sorte.
Não faço questão de me despedir dele, apenas vou em
direção a Mark, meu irmão e seu adversário.
— Parabéns, você será a bandeirinha. — Mark me entrega o
tecido vermelho. — Iê! — ele debocha, fingindo felicidade e
simpatia. Em seguida, ele ergue seu megafone novamente para
anunciar a última corrida da noite. — Senhoras e senhores, vamos
agora a tão aguardada competição pela qual vocês esperaram a
noite inteira. Em seu Dodge Charge 70 o nosso veterano, Trevor —
a multidão grita e aplaude, ovacionando meu irmão que apenas
ergue o queixo, como se demonstrasse ser melhor do que todos ali
presentes. — Versus, Ethan, que pilota o seu maravilhoso Gran
Torino 72. — Dessa vez, o público presente no local também
aplaude, só que alguns, acredito eu que sejam aqueles que
frequentam o local a mais tempo, vaiam.
Isso não faz com que Ethan abaixe sua cabeça, pelo
contrário, ele solta um uivo. Literalmente um uivo, igual um lobo, e
então ambos caminham em direção aos seus carros e eu paro a
dois metros, em frente ao grid. Assim que ambos adentram os
carros e ligam seus motores, acelerando suas máquinas, eu levanto
a bandeira vermelha, que me foi entregue, com uma mão e com a
outra, ergo os cincos dedos.
Enquanto eles aceleram e fazem jogo de luz, eu desço um
dedo de cada vez, em uma contagem regressiva, e o público
acompanha gritando.
— Cinco... quatro... três... dois... — Hesito por três segundos
antes de abaixar o dedo mindinho juntamente com a bandeira que
ergo com a outra mão. — Um!
Desse modo, os dois carros dão a partida, levantando poeira,
para efetuarem a primeira volta na pista. Eu corro até o
acostamento, pegando a bandeira quadriculada em branco e preto
para que possa estar pronta para o final da sexta e última volta. O
barulho dos motores zune em meus ouvidos quando eles finalizam a
primeira volta, Ethan lidera por uma fração de segundo e assim, o
gosto amargo da bile sobe até minha boca, tornando a minha
ansiedade, com sua possível vitória, em pânico.
“Minha noite começou muito boa para terminar dessa forma”,
penso no instante em que eles passam por nós pela segunda vez.
Minhas mãos começam a suar e meus dedos tremem
enquanto eu seguro a haste da bandeira com força, o enjoo
tomando conta do meu estômago a cada segundo que passa, e na
terceira volta concluída, Trevor está à frente por cerca de cinco
segundos de diferença, logo eu me permito respirar aliviada.
— O Wes não mentiu quando disse que você realmente
estava aqui — Elliot comenta ao meu lado, fazendo com que eu me
assuste com sua aparição repentina. — Espero que você saiba que
participar dessas corridas vai muito mais além de levantar as
bandeiras.
— O que você está fazendo aqui, Elliot? — eu pergunto. A
última vez que o vi, ele estava respirando com certo esforço.
— A festa estava chata, Wes, eu e Grey decidimos vir até
aqui. Fiquei mesmo surpreso em ver que logo você estaria dando a
partida da corrida, contudo o que me surpreendeu ainda mais foi
reconhecer o seu irmão e pensar, por um segundo, que ele é o
responsável por isso.
Os carros passam por nós pela quarta vez, Trevor ainda está
na frente, mas por pouco.
— Eu não estou conseguindo entender a sua linha de
raciocínio, Elliot — comento sincera, porque nenhuma das suas
palavras fazem qualquer sentido para mim.
— Resumidamente?! — ele fala retoricamente ao franzir o
cenho, que está coberto por seu cabelo úmido. — Seu irmão dá
medo em qualquer pessoa que cruze o caminho dele, por isso agora
eu me pergunto e também te pergunto, ele não é nenhum psicopata
igual ao Drew, é? — Finalmente seus olhos me encontram de novo
e se minhas contas estiverem certas, essa é a quarta vez que isso
acontece, entretanto agora, não há luxúria ou sequer desejo, é um
certo tipo de frieza, eu diria que até mesmo ódio.
— Vou repetir, Elliot. Eu não estou entendendo a sua linha de
raciocínio. — Nesse momento, a ansiedade que eu sentia antes, foi
embora.
— O que eu quero dizer é que o Drew era mau, ele usava as
pessoas ao seu redor para se dar bem, o que eu estou perguntando
é se seu irmão também é assim.
Nesse instante, Trevor e Ethan passam tão rapidamente por
nós que o preto e vermelho de seus carros não passam de um
simples borrão.
— Claro que não — o asseguro.
— E por que ele te traria até aqui para se prestar a um papel
desse? — Elliot insiste.
— Sem querer te ofender, Elliot — tomo o meu posto
defensivo. — O que aconteceu há algumas horas atrás foi apenas
para nos distrair, nada mais do que isso, nós três nos divertimos,
nós dois gozamos e é isso aí — digo secamente.
— Você acha mesmo que eu estou confundido alguma coisa
entre nós por conta de uma punheta, Sadie? — Elliot questiona,
perplexo. — Eu estou perguntando sobre seu irmão, apenas para ter
a certeza de que todos nós não iremos ter um Drew 2.0 em nossas
vidas novamente.
— Ele é meu irmão, ele não é o Drew — me defendo.
— Drew era o irmão do Axel e namorado da Heaven, veja
todo o estrago que ele fez.
— Eu sei muito bem todo o estrago que ele fez, porque eu
também estava lá — respondo amargamente. — Agora eu preciso ir
— anuncio quando vejo os faróis dos carros se aproximarem.
Me afasto de Elliot, apesar disso ainda sinto seus olhos
queimando em minhas costas. Assim que começo a balançar a
bandeira, anunciando o fim da corrida, eu olho para o lado e ele
continua ali, parado, me encarando. Os dois carros passam pelas
laterais do meu corpo e eu sequer pude ver quem ganhou ou se
houve algum empate técnico, porque meus olhos continuam ligados
aos de Elliot, e suas palavras reverberam em minha mente, como se
ele estivesse me avisando para manter distância do meu próprio
irmão.
Que por sinal, foi o campeão da noite e sei disso pois ele fica
de frente para mim e me levanta, como fazia anos atrás, quando
éramos crianças. Eu ficava o esperando no portão de casa e
sempre que ele descia do ônibus escolar, eu corria em sua direção e
ele me levantava em seus ombros com um grande sorriso em seu
rosto.
São por momentos como esses que eu ainda vejo o meu
irmão dentro dessa casca forte e impenetrável que ele criou ao
longo dos anos. Por mais que Elliot, um amigo de longa data,
suspeite que o meu irmão me usa e mesmo que suas suspeitas
estejam completamente certas, nada disso elimina o fato de que em
momentos como esses, eu reencontro o Trevor com quem cresci,
aquele de quem chamei o nome antes mesmo de chamar mamãe e
papai, aquele que eu tanto admiro e que antes de uma tragédia
acontecer em nossas vidas, era o meu super-herói favorito.
Quando Trevor me põe no chão novamente, ele me abraça e
em seguida, segura meu rosto com força para depositar um beijo no
topo da minha cabeça, sua felicidade também torna-se a minha e ali
eu sorrio, livre, espontânea e verdadeira. Como não fiz por anos.
Aquela vontade que senti de me livrar do irmão logo que o
encontrei mais cedo, foi embora, apenas me entrego à adrenalina e
felicidade por sua vitória.
Não há ninguém para culpar além da bebida em minhas mãos inquietas
Esqueça o que eu falei
Não era o que eu queria dizer
E não posso retirar o que disse
FALLING | HARRY STYLES

Minha cabeça lateja ao ouvir as inúmeras vozes masculinas


que transitam pela casa. Quem disse que viver com um monte de
homens em uma casa era uma experiência incrível para se viver na
faculdade, com certeza não conheceu os meus colegas.
Pego um travesseiro e cubro minha cabeça, a fim de abafar
as conversas aleatórias que rolam pelo corredor, mas não adianta
de muita coisa quando escuto a porta do meu quarto ser aberta
abruptamente e logo em seguida, um corpo pesado se jogar por
cima do meu, me sufocando em uma dor aguda.
— Que merda! — esbravejo ao retirar o travesseiro do rosto e
encarar Colin.
— Levanta, princesa — ele manda ao se levantar e puxar
minhas cobertas, revelando o meu corpo nu. — Primeira regra do
ano: você terá que sair dessa merda de celibato porque o seu amigo
está duríssimo. — Levanta um dedo ao anunciar. — Segunda: vê se
começa a dormir vestido, ninguém merece ficar vendo o seu pau.
Ergo minha mão, lhe mostrando o dedo do meio.
— Primeira e única regra: não se entra no quarto dos outros
sem permissão e muito menos se deita em cima de um cara que
acabou de acordar, porque claramente ele estará tendo uma ereção.
— Alguém falou ereção? — Grey pergunta ao colocar a sua
cabeça dentro do quarto.
— O Elliot está duro para cacete — Colin aponta para mim,
Grey olha rapidamente para meu quadril e em seguida se retira dali.
Pegando o travesseiro, que há pouco estava cobrindo meu
rosto, e arremesso contra Colin, que ainda se encontra no cômodo.
— Sai da merda do meu quarto, Colin — digo ao cobrir
minhas partes íntimas novamente, arrancando uma risada do
capitão do time.
— Tudo bem. — Ele levanta as mãos ao alto. — Eu saio,
desde que você me prometa transar esse ano.
Outra vez o mostro o dedo do meio.
— Minha única promessa é com Jesus, agora dá o fora —
imploro pela última vez.
— Jesus não vai te matar se você fizer um pouco de sexo,
Elliot — insiste.
— Vai embora! — exclamo, me levantando e indo em direção
a ele, que dessa vez decide por boa e livre pressão sair do
aposento.
Assim que estou na porta, pronto para fechá-la, Austin, um
dos defensores do time que também mora conosco, me flagra.
— Credo, Elliot! Suas bolas estão enormes, cara. — Outra
risada de Colin explode no corredor e eu fecho a porta do quarto
abruptamente, trancando-a, por via das dúvidas.
Ponho as mãos na cintura e levo meus olhos para baixo,
também encarando a minha ereção, que está completamente em pé
e lembrando do motivo pelo qual meu pênis está tão duro dessa
forma e minhas bolas tão inchadas que estão roxas, de tanto
sangue concentrado no local.
— Vê se aprende a se controlar, Grande Tanner — chamo
seu apelido ao dar um tapa no mesmo.
Dizer que isso acontece todas as manhãs quando eu acordo,
seria um eufemismo. Certo que é completamente normal um homem
acordar com uma ereção, o que não é normal é ter sonhos sórdidos
lembrando do que aconteceu há duas noites.
Poxa! Eu só precisava de uma bebida e sempre deixo o
estoque no meu quarto. Mas, logo que entrei em meu quarto e vi a
cena da Sadie e Valerie se beijando, justamente no meu quarto,
aquilo foi demais para mim. As coisas se tornaram piores quando
Val decidiu me provocar, chamando-me para participar, contudo,
aquilo não foi o ápice e sim os olhos âmbares de Sadie que
imploravam por uma libertação, eu fiquei duro para cacete!
Realmente não sabia se estava pecando ou se aquilo faria
com que Deus me castigasse futuramente, porém apenas eu e meu
pau, prestes a explodir, sabíamos o que precisava ser feito naquele
momento, então eu o fiz. Era necessário.
Eu não participei tão avidamente como fizera da primeira e
única vez em que estive com uma mulher, ou melhor, duas. No
entanto, eu assisti a tudo e me deliciei a cada movimento que as
duas faziam, a cada palavra que saia da boca de Valerie e suas
provocações repletas de malícia, assim como me bombeava, com
ainda mais força, com todos os gemidos e lufadas de ar que saiam
da boca inchada de Sadie. A minha entrega total aconteceu tão logo
meu nome saiu sussurrado em forma de súplica de seus lábios.
Poderia dizer que tudo o que aconteceu durante aqueles
minutos foi totalmente estranho, só que não foi nada disso. Foi bom
o suficiente para me fazer sonhar com isso por duas noites seguidas
e despertar com uma ereção extremamente grande.
Também é válido lembrar que nunca fui o melhor amigo do
mundo da Sadie, mesmo que nós dois tenhamos estudado juntos
durante anos, ainda assim, nunca fomos tão próximos como eu sou
do Grey, por exemplo, nossa relação sempre foi algo platônico,
temos os mesmos amigos há anos e é isso. Eu mal a conheço,
entretanto sei o bastante para me preocupar com ela.
E foi isso que aconteceu naquela noite logo após nós dois
gozarmos quase que no mesmo segundo.
Depois de ela sair do meu quarto às pressas, com o celular
em mãos, eu me limpei e vesti minhas roupas novamente.
Encontrando Valerie, em frente ao espelho do closet retocando o
batom vermelho, que me lançou um:
— Belo trabalho, campeão. — O deboche era explícito em
sua voz, então, apenas para provocá-la, desci o zíper da sua saia,
que rapidamente caiu no chão.
Ao sair do quarto me deparei com Grey do lado de fora,
dizendo que ia ter uma corrida insana em Montgomery e assim nós
dois, juntamente com Wes, viajamos até a cidade vizinha.
Chegando lá, me surpreendi ao saber que Sadie seria a mulher que
estaria dando a largada. As poucas vezes em que frequentei o local
bastaram para ficar ciente do que acontecia naquele lugar, porém o
que me deixou puto, não foi o fato de ela estar ali e sim, o seu irmão
estar participando da corrida para qual ela foi selecionada para dar a
partida.
Logo me veio à mente que ele poderia ser um novo Drew em
nossas vidas, isso fez com que Sadie me dissesse que o que havia
acontecido minutos antes, durante a festa, não era nada demais.
Óbvio que eu sabia que não era nada demais, apenas quis ter
certeza de que nada de ruim estaria acontecendo com ela, afinal ela
faz parte do nosso grupo, nossa found family, como costumam
chamar nos livros, e nós cuidamos uns dos outros.
Eu estava cuidando dela.
Que, em contrapartida, me assegurou que não era nada do
que eu estava pensando. Entretanto, quando ela correu até o meio
da pista para encerrar a corrida e me encarou, algo cintilava em
seus olhos, algo que me dizia que as palavras que ela proferia não
passavam de ensaio, de algo que ela decorou ao longo dos anos
para dizer que estava tudo bem.
De toda forma, ao invés de me preocupar com ela durante o
restante da noite, eu dormi e sonhei com o momento em que ela
gozava na mão de Valerie, o sonho se repetiu na noite seguida e
nessa também.
E agora eu me pergunto se essa cena irá se repetir em minha
mente como um maldito pornô, e se eu vou ter que seguir em frente
com os conselhos estúpidos de Colin.
A resposta para essa pergunta é que com certeza eu não irei
seguir em frente com as alternativas que o meu QB me deu, pois no
momento em que termino minha higiene matinal, a tela do meu
celular brilha na mesa de canto ao lado cama. Ao encarar o mesmo
vejo o contato da minha mãe piscando, deslizo o dedo pela tela e,
em suspiro forte e audível, atendo a ligação.
— Elliot, você está aí? — a voz da minha mãe soa do outro
lado linha.
— Sim, mãe — respondo enquanto procuro uma cueca limpa
para vestir na gaveta da cômoda. — Em que posso ajudá-la, pastora
Tanner?
— Olha a malcriação — repreende. — Estou ligando para
avisar que vou estar no campus em alguns minutos e preciso
encontrar você.
— Mãe... — tento cortá-la, mas é em vão.
— Nos encontramos em frente ao prédio de Literatura, você
vai amar a minha surpresa — ela finaliza a ligação genuinamente
feliz.
Conhecendo Margaret Tanner como eu conheço, eu tenho
quase certeza de que ela está aprontando algo para que eu possa
“me aquietar”. Ela não aceitou muito bem as minhas saídas durante
o verão, o certo para ela era que eu estivesse em algum retiro com
os outros jovens da igreja. Que em sua grande maioria, sempre
retornam o assunto à castidade.
E quando eu penso em castidade automaticamente penso em
sexo e se penso em sexo, penso no ménage onde eu supostamente
deveria ter perdido a minha virgindade, porém nem mesmo cheguei
ao ápice naquele dia. Vale ressaltar que a lembrança do ménage
agora me traz malditas memórias da noite de sexta.
Ótimo!
Já não bastava tudo o que eu tinha em mente antes, agora
ainda tenho que viver a minha vida pensando em Valerie metendo
seus dedos na boceta de Sadie, que nem mesmo cheguei a ver a
cor.
E simples assim, estou duro de novo.
Após vestir minhas roupas, pego o que é necessário para o
primeiro dia de aula do semestre, ou seja: nada. Saio do meu
quarto, descendo as escadas e indo em direção à cozinha,
encontrando Grey, que devora os sucrilhos diretamente da
embalagem, já o meu café da manhã é simples, apenas café preto e
pronto.
Vou até o armário, pego uma caneca e sigo até a bancada da
cozinha compartilhada, me servindo da cafeína que algum bom
samaritano já deixou pronta.
— Escuta só — chamo a atenção de Grey ao me virar de
volta para ele, que agora limpa as mãos em sua calça. — Minha
mãe está vindo para o campus nesse exato momento e assim que a
virmos você vai dizer que sentimos muito, mas temos muito treino
hoje — digo rapidamente, antes de tomar o primeiro gole de café. —
Entendido?
— Por que faríamos isso com a pastora Tanner? — Grey
pergunta inocentemente.
— Só faz o que eu estou pedindo, por favor — peço.
— Tudo bem! — Grey concorda ao dar de ombros.
— Então vamos nessa.
Grey, assim como eu, não carrega nada para o primeiro dia
de aula, na realidade ele nem mesmo precisa, pois tudo o que ele
tem basicamente está na mala de seu carro, até mesmo suas
roupas. Quando ele precisa usar uma, ele não tira do guarda-
roupas, cômoda ou closet, ele apenas vai até o seu carro, abre o
porta-malas e escolhe o que vestir. O mesmo funciona para sapatos,
livros e tudo o que um ser humano decente necessita para ser bem
apresentável.
Como de costume, pego carona com Grey para a faculdade.
Mesmo que a fraternidade fique dentro do campus, a caminhada
daqui até os prédios principais, onde acontecem as aulas, e também
para o polo esportivo da Stout, dura cerca de quinze minutos. De
carro, o percurso dura cerca de cinco minutos, o que demora
mesmo é encontrar uma vaga de estacionamento.
Por hoje ser o primeiro dia de aula tudo está uma confusão,
uma mistura insana de veteranos, calouros e, obviamente, seus
pais. Muitos passam o fim de semana que antecede o primeiro dia
de aula na cidade, se preparando e conhecendo o território,
enquanto outros chegam exatamente às oito da manhã.
Logo que Grey finalmente encontra uma vaga, ele estaciona.
Mal damos três passos para fora do carro quando encontro minha
mãe a apenas dez metros de distância, ela segura uma de suas
bolsas da Hérmes com uma mão, tendo a certeza de que ela não
escapará do seu ombro, enquanto com a outra acena para nós.
— Não esquece o que eu te disse — murmuro, puxando Grey
pelo pescoço à medida que caminhamos lentamente em direção à
minha mãe.
— Estamos atolados de treino hoje e sentimos muito — Grey
responde dando um sorriso falso e acena para minha mãe.
— Aí estão vocês. — Margaret Tanner nos recebe de braços
abertos, nos abraçando ao mesmo tempo. — Meus meninos — ela
diz calorosa, e é exatamente por isso que eu tenho certeza, mais
que absoluta, que a minha mãe está tramando um plano muito
grande.
Minha mãe conheceu meu pai logo após se formar na
faculdade, os dois se conheceram durante um retiro, reconstruindo
as casas dos que perderam tudo durante uma temporada de
furacões nos anos noventa. Os três meses que passaram juntos
foram o suficiente para se apaixonarem e sem demora meu pai
pediu a mão da minha mãe em casamento, que aconteceu cerca de
dois anos depois. Enquanto meu pai é alto, forte e robusto, com
cabelos pretos como carvão e olhos azuis, tendo a aparência do
Superman, minha mãe é baixinha, cabelos castanhos curtos e olhos
castanhos escuros, que nesse momento cintilam enquanto me
encaram.
— Pastora Tanner — Grey a cumprimenta. — É sempre um
prazer te encontrar.
— Digo o mesmo, agora sai da minha frente porque eu
preciso ver o meu bebê — ela responde quando ele tenta beijar seu
rosto, mas minha mãe praticamente o empurra para o lado, para
que possa ficar frente a frente comigo. — As aulas mal retornaram e
eu já sinto tanto a sua falta — fala, apertando minhas bochechas.
— Eu também sinto a sua, mãe — respondo sincero. Não é
porque às vezes minha mãe pega no meu pé, é um pouco mandona
e que nos momentos em que faço algo que não a agrada ela
ameaça jogar suas bolsas em mim, que eu não a ame.
Muito pelo contrário, eu diria que amo mais a minha mãe do
que o meu pai. Pensar que um dia eu posso perdê-la, mesmo diante
das suas loucuras inimagináveis, chega a doer no fundo da minha
alma, uma dor quase que dilacerante. Por isso, dou o meu máximo
para agradá-la, mesmo sabendo que não sou o filho perfeito e não
passo de um pecador, eu tento ser aquele que ela tanto sonhou.
Ao menos aos seus olhos.
— Já estou sentindo você mais magro — ela diz ao analisar
meu corpo. — Vou fazer algumas comidas essa semana e levar
para a fraternidade.
— Comida?! — Grey pergunta atônito.
— Ah, como eu sou esquecida. — Ela bate na testa, não
dando a mínima atenção a Grey. — Essa é a Amber, ela é filha do
pastor Kennedy — diz ao apontar para a garota loira que estava ao
seu lado todo esse tempo e só agora eu me dei conta. — Ela veio
de Austin, no Texas, para estudar aqui em Beaufort e pensei, já que
sou amiga da família dela e meu filho é cavalheiro, com certeza
seria uma honra para ele apresentar o campus a ela.
— Ah, oi! — Amber cumprimenta ao levantar a mão, o rubor
em suas bochechas e a oscilação dos seus olhos verdes, mostram
que claramente a garota está morrendo de vergonha. — Para falar a
verdade eu já conheci o campus durante o final de...
— Bobagem. — Minha mãe desdenha com a mão ao
interrompê-la. — Ela apenas está com vergonha de você —
sussurra em meu ouvido.
— Ou de você, mãe — jogo a verdade, usando o mesmo tom
de voz. — Olha a forma como você está nos apresentando, isso é
vergonhoso até para mim.
Minha mãe faz uma cara de ofendida e eu espero a sua bolsa
voar em meu peito ou até mesmo minha cabeça, porém ela não o
faz, apenas solta um sorriso falso para mim.
— Sou o Elliot, prazer em conhecê-la, Amber. — Estendo
minha mão para cumprimentá-la. — E esse é meu amigo Grey. —
Aponto para o mesmo, que está ao meu lado, mas que come Amber
com os olhos.
É claro que ele a notaria, afinal, ela faz exatamente o seu
tipo, baixa, cintura de violão, cabelos loiros em um tom dourado e
olhos claros. Inclusive, ela lembra muito a sua irmã postiça, o que
atiça ainda mais o desejo evidente nos olhos de Grey.
— Grey, prazer! — Ele também estende a mão,
cumprimentando-a.
Amber solta um “oi” quase que sem força e morde o lábio
inferior.
— Prazer em conhecê-los — dessa vez ela fala um pouco
mais alto.
— Então, já que vocês se conhecem o suficiente, por que não
vão andar pelo campus? — minha mãe sugere.
E aí está a Margaret Tanner que passou o verão inteiro
dizendo que eu precisava me aquietar, segundo ela estava na hora
de eu arranjar uma “moça de futuro”, e acredito que essa moça seja
a Amber. Para falar a verdade não me surpreende que ela tenha
trazido justamente uma filha de pastor, que segue os mesmos
princípios da nossa família para me apresentar, a já sabendo como
isso pode acabar, tento me esquivar novamente dela, e da garota,
que provavelmente não tem culpa alguma das loucuras da minha
mãe.
— É que nós temos treino — digo ao arquear a sobrancelha
para Grey, só que ele não presta nem um pouco de atenção em
mim, com seus olhos ainda vidrados em Amber. — Não é mesmo,
Grey?! — Tento estimular meu amigo a me olhar usando um tom de
voz mais alto.
Grey coça a garganta e de certa forma eu começo a escutar
os seus pensamentos, não porque ele está falando, e sim porque
ele está tentando raciocinar o que acaba de acontecer.
— Ah, sim! — Finalmente um apoio moral, ele olha
consternado para minha mãe, entretanto quando leva seus olhos de
volta à Amber, ele muda todo o nosso percurso. — Com certeza o
treinador não iria se importar em você fazer um tour com a Amber.
Eu arregalo os olhos em resposta, dando um meio sorriso
com os lábios, querendo não fazer a mínima ideia do porquê ele iria
andar tantas casas para trás em um jogo de tabuleiro. Porém,
lembro que estamos falando de Grey e com certeza, ele não é a
pessoa mais confiável do mundo.
Nesse momento eu me arrependo de ter pego carona com
ele, pois com certeza o Kane ou o Axel, até mesmo o droga do
Colin, que me manda fazer sexo o tempo inteiro, inventaria uma
desculpa qualquer para me livrar disso.
— Eu não posso — insisto, intercalando meus olhos entre
minha mãe, Grey e Amber. — Temos treino em breve, fora todas as
conversas que o treinador Willians pretende ter com a gente e
também a apresentação dos calouros...
— Eu falo com o treinador por você — Grey interrompe.
Porra! Por que ele mesmo não faz esse tour, já que
claramente está muito interessado na Amber?
— Perfeito! — A voz da minha mãe soa animada.
— Perfeito — Grey assente ao encarar Amber com um
sorriso.
— Perfeito... — digo hesitante e nenhum pouco animado.
Começo a imaginar qualquer situação possível para me tirar
dessa enrascada. Porque sim, isso é uma cilada enorme.
Minha mãe nunca me apresentou para uma garota antes em
todos os meus anos de vida, se ela está fazendo isso agora, é
porque tem algo por trás disso. Tudo bem que eu já estava com um
pé atrás desde que ela me ligou dizendo que tinha uma surpresa
para mim.
De toda forma, eu esperava tudo vindo dela, menos uma
garota, quer dizer.
A não ser que...
Eu não acredito que minha mãe está tentando me arranjar
uma namorada. Isso é o cúmulo, ela está me jogando na toca dos
leões, até já imagino ela planejando meu casamento com Amber,
nossas famílias cristãs reunidas em uma igreja, meu pai, juntamente
com o pastor Kennedy, dando a benção da nossa união, Grey sendo
o meu padrinho, Amber chorando enquanto cito meus votos de
casamento, nós dois partindo o primeiro pedaço de bolo, tomando
champanhe com os braços cruzados um no outro, a primeira dança
dos noivos. Amber jogando o buquê, Heaven pegando-o e logo em
seguida, Axel lhe mostrando um anel de diamantes caríssimo que
ele comprou com seu primeiro salário de cirurgião.
Três meses se passam e anunciamos às nossas famílias que
estamos grávidos, à espera do nosso primeiro bebê, e em um
ultrassom descobrimos que são três crianças. Toda a fanfic já está
pronta na minha cabeça.
Minha cabeça gira rapidamente, vendo minha futura mulher,
minha mãe e meu padrinho de casamento, e mais todo o campus
em uma movimentação intensa de primeiro dia de aula.
Não.
Não.
Não.
Eu não posso deixar que esse seja o meu futuro, o ar escapa
dos meus pulmões quando enxergo, mais à frente, a solução de
todos os meus problemas futuros andando em direção ao prédio de
História, com meia dúzia de livros em suas mãos.
Um sorriso se expande em meu rosto e eu levanto a mão,
acenando para Sadie com todo o esforço possível para que ela me
note.
“Por favor, Sadie, me nota”. Peço mentalmente.
E assim que ela o faz, largo a minha mãe e ando em sua
direção.
Minha barriga parece que está cheia de borboletas e uma
vontade insana de vomitar toma conta de mim, mas isso não faz
com que eu pare de andar em sua direção. Por mais nervoso que eu
esteja, o sorriso não abandona o meu rosto em momento algum e
dessa forma, quando estou frente a frente com Sadie, digo:
— Não me empurra, apenas me beija.
Você diz que está arrependida
Não pensou que eu viraria pra você e diria
Que é tarde demais para se desculpar
APOLOGIZE | ONE REPUBLIC

Primeiro dia de aula e eu já estou atrasada.


Certo que no primeiro dia não rola nada de muita importância,
porém eu quero levar esse ano a sério para não tomar uma bomba
como foi no ano passado. Me envolvi em problemas que não eram
meus, me responsabilizei por pessoas que pouco se importavam
comigo e quase joguei o meu futuro fora.
Mas isso não vai acontecer nesse semestre.
Pelo menos era o que eu pensava até ter meu espaço
pessoal invadido em questão de segundos. Pois em um, Elliot
estava acenando para mim, no outro eu parei e no seguinte ele
praticamente me mandou calar a boca e o beijar.
Certo, não foi exatamente isso. Contudo, ele me deu a
instrução de não o empurrar e apenas beijá-lo, eu até poderia não
seguir a sua recomendação, entretanto todos os livros que carrego
em uma pilha em minha mão cairiam no chão, e eu não paguei caro
por eles para simplesmente vê-los no chão.
É por isso que eu estou entregue ao seu beijo, ou quase
entregue, pois seus lábios estão apenas grudados nos meus
enquanto eu, estou com os olhos arregalados encarando Elliot e
perguntando mentalmente o que ele está fazendo, seus olhos estão
cintilando de uma forma estranha, como se fosse um cachorrinho
que acaba de cair do caminhão de mudanças.
Na madrugada de sexta, eu pensei que nós tínhamos
chegado ao concesso de que tudo o que havia acontecido em seu
quarto não tinha passado de uma diversão e que nada mais iria sair
dali. Mesmo que eu tenha o encarado durante o final da corrida,
tentando contato com seus olhos da forma mais estranha possível,
não muda o fato de que não era para isso estar acontecendo agora.
Assim que Elliot finalmente para de me dar o beijo mais
esquisito de toda minha vida — e olha que eu já beijei o Drew
Jones quando ainda era vivo e quis vomitar na cara dele —, ele
continua segurando as extremidades do meu rosto e um sorriso
vacilante toma conta de sua feição.
— Desculpa. — Ele mexe os lábios, porém nenhum som sai
deles.
Tão logo estou pronta para interrogá-lo sobre o motivo do
beijo, Elliot é tirado da minha frente por uma bolsa preta que
praticamente voa entre nós dois, embora atinja apenas ele, acaba
nos separando.
— Que pouca vergonha é essa, Elliot James Tanner? — a
voz da pastora Tanner ecoa em meus ouvidos, fazendo com que eu
fique ainda mais confusa com toda essa situação.
Enquanto ela pega a bolsa e arremessa novamente em Elliot,
duas mãos amparam meus ombros, e percebo que se trata de Grey.
— Você está bem? — ele pergunta e eu assinto com a
cabeça, porque por pouco a bolsada não pegou em mim.
— Eu só quero entender o que está acontecendo aqui —
digo.
— Você está pedindo explicação à pessoa errada — Grey
responde em contrapartida.
No entanto, para a felicidade de todos, minha, da mãe dele,
do nosso amigo e do pequeno público que se forma em nossa volta,
Elliot decide se pronunciar.
— Se você parar de jogar essa maldita bolsa em mim eu
posso explicar, mãe! — exclama quando finalmente consegue parar
o próximo movimento da sua mãe ou eu diria, da bolsa dela?!
A mulher ama uma bolsa de marca e eu sempre pensei que
era para manter as aparências de uma pessoa elegante, mas hoje
eu acredito que esse fascínio dela com Hérmes, Louis Vuitton e
Prada é mesmo pela qualidade do material, pois assim qualquer
pessoa pode apanhar dela e a bolsa continuará intacta. Como se
nada tivesse acontecido com ela.
— Olha a boca — ela repreende o filho, talvez por ele ter
chamado a sua preciosa parceira de maldita, o que me faz soltar um
riso fraco e a mulher baixinha, contudo bastante forte se vira para
me encarar e rapidamente eu fecho a boca. — Agora me explica
que baixaria é essa — ela exige ao mesmo tempo que o filho passa
as mãos nos cabelos, ajustando os fios que saíram do lugar.
— Não seria uma baixaria se ela não agisse feito uma louca
— uma garota loira murmura ao lado de Grey.
Da mesma forma como havia feito quando eu ri, a senhora
Tanner olha em nossa direção, nos fulminando com os olhos e eu
concordo com a garota que acaba de chamá-la de louca.
— A Sadie e eu estamos namorando — Elliot diz em um
sorriso.
— Vocês o que?!
— A gente o que?!
— Parabéns, cara!
Margaret Tanner, eu e por último Grey, falamos em uníssono.
Não bastando a sua declaração, Elliot ainda se aproxima de
mim e passa o braço por meu ombro. Eu estou completamente
perdida, só que tudo vira uma confusão pior ainda assim que ele
decide continuar falando.
— Começamos a namorar no sábado. — Eu abro a boca
para interrompê-lo, mas Elliot pega meu rosto com sua mão livre,
apertando-o para que forme um bico de peixe, e então ele me beija
uma outra vez com um selinho. Me deixando ainda mais confusa,
meus pensamentos estão tão atordoados que nem mesmo consigo
formar as palavras corretas para confrontá-lo. — Eu ia anunciar
domingo na igreja, entretanto logo que a vi passando não me
aguentei. — Elliot sorri torto.
— Você está apaixonado e isso é tão lindo — Grey responde,
emocionado.
Eu tento formar qualquer palavra, todavia é impossível, já
Elliot avança com as ilusões dele.
— Você está realmente falando sério, filho? — Margaret
murmura a pergunta, engolindo em seco.
— Como nunca antes, mãe.
— Então domingo vocês vão à igreja? — pressiona.
— Com certeza! — ele responde, sua mãe se apronta para
falar outra coisa, mas Elliot nos vira, dando as costas a ela. —
Agora tenho que ajudar minha garota com algumas coisas —
declara ao retirar os livros das minhas mãos.
Dessa forma, começamos a caminhar em direção ao prédio
de Literatura, durante a curta caminhada eu levanto o dedo, ainda
tentando entender o que acabou de acontecer. Minha cabeça está à
mil.
Elliot não pensa que aquela casualidade que aconteceu entre
ele, Valerie e eu é o início de um relacionamento. Pensa?! Onde eu
fui me meter quando decidi invadir justamente o quarto de um quase
virgem, que agora pensa que namoramos?
Nesse momento eu preferiria mil vezes estar sendo a Sadie
introspectiva que fui durante um ano inteiro, pois só assim nada
daquilo e nada disso estaria acontecendo.
— Nós não estamos namorando, Elliot — eu reflito logo que
chegamos em frente à entrada do prédio.
— “É natural esperar o pior das pessoas, mesmo que a
desconfiança dure apenas um segundo” — cita uma das frases de
Verity, primeiro livro que está na pequena pilha que agora ele
carrega. — Não, nós não namoramos, Sadie — concorda ele. —
Mas eu preciso que você seja minha namorada.
— Elliot...
— Não tem nada a ver com o que aconteceu na festa — me
interrompe — ou na corrida. Tem a ver comigo e com as loucuras da
minha mãe.
Meu celular começa a vibrar no meu bolso, avisando que
faltam apenas cinco minutos para o início da primeira aula.
Rapidamente o pego, para desativar o som emitido por ele.
— Justo, isso é coisa sua e da sua mãe, por que me envolver
nessa história? — confronto.
— Eu não sei. — Ele passa a mão pelos cabelos, os quais eu
nunca toquei, porém que parecem ser tão macios, tão hidratados...
Eu estou começando a me perder novamente.
— Se você não sabe, então por que inventou tudo isso?
— Porque minha mãe, muito provavelmente, está querendo
me arranjar alguma namorada. Você entende isso?! Minha mãe, a
mulher que morre de ciúmes de mim, que cuida de mim como se eu
ainda fosse um bebê, está tentando me arranjar uma namorada.
— Diante disso, você simplesmente me viu e decidiu que eu
seria a sua namorada ao invés da pretendente que sua mãe lhe
arranjou — debocho.
— Exatamente isso. — Ele faz uma cara como se tudo isso
fosse óbvio demais.
— Agora, faça o favor de inventar uma desculpa para o nosso
término — digo ao pegar meus livros de volta.
— Eu preciso de você — ele insiste.
— Você precisa de juízo, Elliot Tanner, não de mim —
constato ao dar as costas para ele.
— Eu disse a ela que no domingo vamos à igreja — ele tenta
outra vez, com sua voz um pouco distante, pois eu ainda caminho
para longe de Elliot e suas loucuras.
— Eu sou judia — grito.
— Se fosse o Drew eu tenho certeza de que você não
pensaria duas vezes antes de concordar com ele. — Suas palavras
gritadas fazem com que meus pés estaquem.
Lentamente eu me viro em sua direção e da mesma forma
caminho ao seu encontro outra vez, ele está com a boca aberta,
como se tivesse entendido que o que ele acaba de falar foi uma
besteira. E foi mesmo. Ninguém fala sobre o Drew, sequer pensam
nele e se pensam, mantém para si mesmos desde que ele morreu, o
máximo que chegamos a falar sobre ele foram dois dias após seu
funeral, onde Axel me presenteou com o escapulário que havia lhe
pertencido antes do pai deles simplesmente abandonar Drew.
Naquele dia minha mente estava extremamente perturbada,
tanto que eu não sabia mais distinguir a mentira da verdade, por
isso, quando Axel declarou que uma pessoa que realmente havia o
amado deveria ficar com o cordão, eu o aceitei. Embora, no
momento em que cheguei em casa, tenha guardado em uma gaveta
da minha penteadeira e nunca mais a aberto, o aceitei da mesma
forma.
No entanto, nada do que aconteceu comigo no passado,
justifica Elliot simplesmente pôr o nome de Drew na sua boca para
comparar as situações.
— Desculpa, Sadie, eu não quis...
— Você quis — interrompo-o. — E a questão não é o que
você quis dizer e sim o porquê de você ter dito. Para você tudo foi
sempre preto no branco, não?! Vocês dizem que eu estou perdoada
por ter sido uma grande vaca, mas na primeira oportunidade
mostram que não é nada disso, pois eu sempre vou ser a vadia que
transa com todos, inclusive com o namorado da amiga. Daí, se eu
sirvo para ser uma amante, por que eu não sirvo também para ser
uma namorada de mentira? Afinal, a Sadie é aquela que apenas
está ali para ser usada, na hora que vocês bem entenderem.
— Você está entendendo tudo errado, Sadie.
— Talvez sim. — Dou de ombros. — Talvez não. Contudo, já
entendi o suficiente para saber que essa conversa está encerrada e
que eu tenho aula agora, portanto, você vai voltar lá na sua mãe e
dizer que tudo não passou de uma piada e nunca mais vai falar o
nome do Drew como forma de ameaça outra vez.
Escuto as desculpas de Elliot de novo, porém quando dou as
costas a ele mais uma vez, não há nada que ele diga que me faça
voltar atrás.
Drew também chegou a me pedir desculpas, mas ele também
me fez pedir desculpas por algo que eu nunca tive a intenção de
fazer.
“Seu rosto está coberto de hematomas, ambos os olhos
roxos, sangue seco cobre seus lábios e seu abdômen coberto de
sangue preso, eu não sou uma médica e acredite, estou longe de
ser. Entretanto, se eu aprendi alguma coisa nas últimas dezessete
temporadas de Grey’s Anatomy é que Drew está com, pelo menos,
uma costela quebrada e pela forma como suas pupilas oscilam,
provavelmente ele pode ter sofrido algum traumatismo craniano.
Ou estão dessa forma apenas pelo fato de ele ter alguma
psicopatologia.
Também não sou estudante de psicologia, nem nunca fui a
qualquer tipo de terapia, por mais que eu acredite que precise, não
acho que seja tão necessário assim. De toda forma, é claro que
esse garoto tem problemas bem sérios quando se trata dos seus
pensamentos e ideias perturbadoras.
— Eu preciso que você explique tudo à Heaven — gemendo
de dor, ele finalmente fala algo desde que entrei em seu quarto no
hospital.
Obviamente eu já pensava em entrar em contato com a
Heaven, explicar o que aconteceu e como aconteceu e agora, saber
que o Drew me ligou depois de tudo o que houve ontem para que eu
finalmente possa dizer a verdade a ela e além disso, abrir seus
olhos diante do grande problema que ela tem vivido nos últimos
anos, me alivia.
Ao menos toda essa ameaça que o Drew tem feito contra
mim vai servir para o bem, afinal de contas.
Ele transformou os últimos meses da minha vida em um
inferno, me afastei dos meus amigos, traí a minha amiga, mesmo
seu namorado sendo um inferno de um babaca, ela não merece
esse tipo de traição. E ainda tenho que escutar os planos diabólicos
do Drew sobre querer matar o próprio irmão. Juro que não sei o que
o Axel fez a ele, mas o conhecendo e sabendo o pouco que sei, eu
diria que ele não fez absolutamente nada para que o seu irmão
tenha tanto ódio dele assim.
Ok, o Axel não o reconheceu no corredor da escola quando
eles tinham dez anos de idade, só que o que custa o Drew chegar
nele hoje e dizer: “eu sou seu irmão”? Nada!
Não custa nada.
Ao invés disso, o Drew fica fantasiando a morte dele, tanto
que apostou quinze mil dólares, que sabe lá Deus de onde ele tirou
toda essa quantia para fazer uma aposta, acreditando fielmente que
o JC iria conseguir nocautear o Axel, contudo o tiro saiu pela culatra
e naquele momento, eu me permiti rir da cara de bunda do Drew
quando viu que além de ganhar a luta, o Axel ainda levou Heaven
por cima do ombro para o vestiário.
Não sei o que aconteceu lá, porém torço fielmente para que
ela tenha posto um belo par de chifres na cabeça desse idiota.
Ainda assim, esse não foi o ponto alto da noite. De início, o
plano do Drew era que a Heaven nos visse juntos na luta, após o
Axel ser “humilhado”, mas ele decidiu mudar tudo de última hora,
dizendo que nós dois íamos transar. Obviamente eu fui contra
àquela ideia dele, só que isso não foi o suficiente para ele não me
arrastar até o estacionamento, me beijar à força e me empurrar para
dentro do carro. Em algum momento ele rasgou a minha blusa, me
deixando apenas de sutiã, em contrapartida eu mordi seus lábios,
com tremenda força, ao ponto de fazê-los sangrarem. Por isso que
enquanto olho para ele com nojo, eu acredito que todo esse sangue
seco no canto da boca seja por minha culpa.
Já os restantes dos seus ferimentos foram causados pelos
meninos, logo após a Heaven colocar fogo no seu carro com nós
dois dentro.
Devo admitir que naquele instante eu senti medo, por isso
liguei para a polícia e por um mísero segundo, assim que largaram o
corpo dele ferido ao meu lado, eu o abracei, porém logo que lembrei
a forma animalesca como ele havia me tratado minutos antes, eu o
soltei no chão.
— Não precisa pedir duas vezes — respondo com nojo.
— Você vai dizer que se apaixonou por mim — ele diz
calmamente enquanto tenta liberar a passagem do soro, que está
conectado ao seu acesso venoso.
— Nem fodendo — respondo imediatamente.
— Você vai dizer que se apaixonou por mim durante o verão,
inventa alguma coisa sobre o nosso primeiro beijo, não sei, se vira.
— Ele tenta mexer na válvula do soro novamente. — Por que não
sai nada dessa merda? — esbraveja.
Me aproximo minimamente de Drew e verifico a válvula,
levando-a para cima e liberando o soro, que começa a pingar
rapidamente.
— O fato é que eu não estou apaixonada por você —
respondo com desdém, o que faz Drew pegar meu pulso,
aproveitando o momento em que eu ainda estou segurando a
mangueira do seu soro.
— Você está apaixonada por mim — diz entredentes.
Com força eu faço com que ele solte o meu pulso e em
seguida dou um grande tapa na sua cara.
— Você está louca? — grita.
— Toque em mim outra vez e eu faço muito pior — ameaço.
— Você me fazer de fantoche em um plano idiota de querer que sua
namorada nunca te largue é uma coisa, você me agredir é outra
muito diferente. Você tem algo contra mim e minha família, mas não
significa que você pode me atacar física e sexualmente.
Drew ri secamente, como se o que eu acabei de falar fosse
engraçado e ao mesmo tempo absurdo para ele. Ou talvez essa
seja apenas a sua forma psicopata e sem sentimentos de rir.
— Você acha mesmo que alguém irá acreditar que eu tentei
te estuprar ou qualquer outra coisa que você esteja querendo
insinuar?! Você é uma vadia, Sadie, você transa com todo mundo
de graça, então não vem com ameaças sem base para cima de
mim. Porque assim como eu, você sabe que ninguém jamais
acreditará no que você diz, porque você é fácil.
Engulo em seco com suas palavras enquanto meus olhos
ameaçam transbordar a qualquer momento.
Sempre acreditei e me vi como uma vadia, porém nunca
ninguém me falou algo assim na cara, de uma forma tão brutal, tão
crua. Fazer uma autodepreciação é algo triste, mas ouvir alguém te
depreciar com a sua maior insegurança é sórdido.
— Agora que estamos entendidos, você irá procurar pela
Heaven e pedir desculpas por ter se apaixonado por mim, diz que
eu dava a entender que o nosso relacionamento estava no fim, faz
alguma coisa para ela voltar para mim. Você é inteligente, você
consegue.
Secando a lágrima que começa a descer no meu rosto,
respondo:
— Se a Heaven for realmente inteligente, ela pode até
acreditar nas minhas palavras, só que jamais ela irá perdoar a mim
ou a você.
— Se ela não me perdoar, você sabe que eu posso te
destruir, Sadie.
— Acredite em mim quando eu digo que você me destruiu no
momento em que decidiu entrar na minha vida.
— Me sinto lisonjeado. — Ele sorri e vejo o sangue preso em
sua gengiva.
— E eu me sinto nauseada.
— Sempre tão culta.
— Sempre tão asqueroso.
— Cuidado, que dessa forma, algum dia, eu vou acreditar
que você realmente está apaixonada por mim.
— Cuidado, que dessa forma um dia você vai acabar atrás
das grades.
— Só pede desculpas a ela de uma vez — ele responde
sonolento, finalmente a medicação está fazendo efeito.”
Eu pedi desculpas à Heaven e ela foi sábia o suficiente para
me perdoar e me manter longe da sua vida por muito tempo, mais
sábia ainda por manter o Drew longe da sua vida o tanto que pôde.
No entanto, se ela fosse realmente inteligente teria se tocado que
enquanto eu pedia desculpas a ela, na realidade eu pedia por
socorro.
Eu havia dito que estava apaixonada por seu ex-namorado
tantas vezes, que a mentira me engoliu, ao ponto de fazer com que,
em algum momento, ela fosse verdade ou apenas me fizesse
pensar aquilo.
Mentir faz com que eu me sinta perdida, sem rumo, sem
direção.
Por mais que a sugestão de um namoro falso, proposta pelo
Elliot, seja provavelmente algo sem qualquer malícia e que ele não
seja nada parecido com o Drew, todas as mentiras que eu contei ao
longo da minha vida feriram inúmeras pessoas e eu fui uma delas.
Eu me perdi em uma mentira ao ponto de não saber mais
quem eu era ou o que eu realmente sentia, estar dentro da minha
cabeça tornou-se um trabalho sufocante. E quando eu finalmente
começo a reencontrar aquela que um dia eu fui, por mais vadia que
fosse, como o Drew um dia disse e eu sempre acredite, eu era
alguém.
Havia convicção em tudo o que eu fazia, ou pelo menos em
grande parte, eu era parte de algo, eu era notada não por ser uma
traidora, eu era notada por ser eu.
E agora, se eu concordasse com a ideia do Elliot eu seria
vista como o quê? A puta que trouxe a liberdade ao celibatário ou a
pecadora em busca de redenção?!
A resposta vem em forma de mensagem.
Allison: Como assim você e o Elliot estão namorando????
Eu não acredito que ele saiu do celibato antes que eu
pudesse me livrar do meu hímen.
E eu não acredito que os boatos já se espalharam em menos
de uma hora. Acredito que ficamos com a primeira opção de como
eu seria vista, afinal.
Pressiono a primeira mensagem de Allie e encaminho para o
número de Elliot.
Eu: Pq todo mundo já está sabendo de algo que nem é
verdade, em primeiro lugar?
Três pontinhos aparecem na tela do celular enquanto eu
espero a resposta de Elliot, contudo ela não chega para mim.
De todas as mentiras em que eu já me envolvi, algo me diz
que essa será a mais complicada de toda a minha vida.
Não vem olhar para mim com esse olhar
Você realmente não vai embora sem uma discussão
Você não se convence e eu estou cansada de ser educada
FRIENDS | ANNE-MARIE FT. MARSHMELLO

Eu estava certa quando disse que essa mentira seria


complicada e nada parecida com algo que eu já tenha passado em
minha vida. A bagunça toda começou com a mensagem da Allison,
logo em seguida foi a vez do Wes investigar o que estava
acontecendo, óbvio que eu disse a ele que nada estava
acontecendo, mas Wes sendo Wes, é claro que ele não acreditou
em mim.
Durante o almoço, Heaven me abraçou e me parabenizou
pelo meu novo relacionamento, ela parecia genuinamente feliz por
mim. Já Valerie me olhava de forma interrogativa, pois obviamente
ela não entendeu o que estava acontecendo e a minha única
resposta para seus olhares nada sutis foi um dar de ombros.
Sei que ela, assim como eu, sabe que tudo o que aconteceu
durante aqueles vinte minutos no quarto de Elliot não passou de
diversão, sua mensagem no outro dia foi clara o suficiente ao me
dizer que eu não precisava ter vergonha dela assim que eu
atravessei o espaço compartilhado do dormitório e ela dormia com
outra garota no sofá, mas eu não abaixei minha cabeça por timidez
e sim para respeitar a privacidade dela e da moça que estava com
ela.
Lynnox falou realmente sério quando descreveu sua amiga
como uma pegadora implacável, e eu fui bastante consciente no
momento em que decidi me arriscar ficando com ela.
E falando na minha colega de quarto, as farpas que ela troca
com Kane estão ficando piores a cada minuto que eles passam
juntos. Não são apenas provocações, são também inúmeros
xingamentos, eles realmente se odeiam. Tão logo alguém toca no
assunto sobre eles precisarem amadurecer, os dois se juntam para
implicar com quem se incomoda com o comportamento deles, que
nesse caso foi o Axel.
De toda forma, todos apareceram durante o almoço no
refeitório, o único que não deu as caras foi o Elliot e eu espero, de
coração, que sua falta de respostas às minhas mensagens e o
sumiço repentino sejam porque sua mãe está lhe dando várias
bolsadas e dizendo o quanto ele pecou por mentir para ela. Sei que
a mulher tem um parafuso a menos, quando se refere a como ela
trata seu filho, entretanto eu estou completamente ao lado dela e da
sua preciosa bolsa da Hérmes para bater em Elliot, nessa situação
específica.
A minha raiva pelo balburdio que ele criou só aumenta no
momento em que eu atendo a ligação do meu irmão e a primeira
coisa que ele diz é:
— Que história é essa que você está namorando?
— Como você sabe disso? — pergunto em resposta, ao invés
de negar.
— Sinceramente eu não sei nem porque estou me
importando para quem você dá ou deixa de dar. Eu só espero que
esse seu namorinho sem futuro não estrague os nossos planos.
— Você quis dizer os seus planos, não? — desafio em
resposta, entrando no prédio dos dormitórios.
— Meus, nossos, tanto faz.
— Eu já te disse que sábado foi a última vez.
— Você sempre diz isso, pequena Sady.
Ele tem razão, todas as vezes eu digo que é a última vez e
nós dois sabemos que eu nunca falo sério, pois não há nada que
meu irmão me peça que eu não faça, só que dessa vez eu preciso
falar sério. Eu me envolvi em muitos problemas ao longo dos meus
poucos anos de vida por conta do meu irmão, sempre que pensei
que estava em paz, ele veio e desgraçou tudo novamente.
Sei que eu poderia simplesmente me negar e dizer não a ele
e a tudo o que ele quer que eu faça por ele, no entanto quando se
trata de Trevor, é quase impossível que essa simples palavra
escape da minha boca. Ele me deixou quieta durante alguns meses
enquanto esteve na faculdade, mas o período em que ele realmente
não fez questão da minha presença em suas trapaças, foi durante
todo o ano passado, embora não tenha adiantado de muita coisa,
uma vez que ainda por sua causa, eu me envolvi em um labirinto
onde em todas as vezes em que eu procurava a saída, ela
simplesmente se fechava diante dos meus olhos.
— Dessa vez eu estou falando sério — respondo, começando
a subir as escadas até o quarto andar.
A resposta que eu tenho de Trevor não passa de uma risada
cínica e blasé.
— De qualquer maneira, o aviso está dado, eu não quero
problemas com seu namoradinho quando eu precisar de você.
— Você nem ao menos sabe de quem se trata, sabe?!
— Não faço questão.
— Agradeço por você ser um irmão tão bom que nem mesmo
tem o desejo de proteger sua única irmã — ironizo ao revirar os
olhos, mesmo que ele não veja esse ato, faz sentido para mim.
— Você é bem grandinha e sabe se cuidar sozinha. — Ele ri
do outro lado da linha. — Eu também não tenho tempo para as suas
bobagens, inclusive tenho um cliente para atender agora.
De repente a ligação é encerrada, ele nem sequer fez
questão de se despedir, apenas desligou.
Trevor se formou há um ano em Logística e trabalha na
mesma empresa que meu pai, apesar de ele não precisar viajar
como o meu pai, para mim seria um alívio viver longe do meu irmão.
Mesmo amando-o incondicionalmente e tendo a ciência de que
tenho carência da sua atenção e do que um dia fomos e
representamos um para o outro, hoje eu reconheço quão instável eu
sou se tratando de Trevor.
Eu poderia simplesmente ligar o foda-se para ele e todos os
seus problemas, afinal, ele já é formado, na idade em que ele se
encontra atualmente deveria estar criando um rumo para sua vida e
seu futuro, não procurando por problemas como ele fez durante toda
a sua adolescência.
Mas quando você ama alguém e quer o bem dela, às vezes
você é capaz até mesmo de destruir o mundo inteiro para que essa
pessoa esteja segura. É exatamente isso que eu faço sempre que
tenho a oportunidade, eu tento trazer segurança a Trevor, por mais
que ele não mereça tudo o que eu dou a ele, a ligação que tenho
com ele sempre irá falar mais alto do que qualquer princípio que eu
tente seguir.
Chega a ser doentio da minha parte amar tanto alguém,
independentemente do que ele faça comigo ou com ele mesmo, e
eu acabe aceitando tudo apesar de dizer que não vai mais
acontecer. No entanto, é isso que eu faço desde sempre, porque eu
simplesmente não sei como dar um fim a isso.
Falando em fim, a hora de acabar meu namoro, de menos de
oito horas, chega no instante em que eu alcanço o quarto andar e
encontro Elliot sentado no batente da porta do meu dormitório.
Soltando uma leve lufada de ar eu caminho até onde ele está,
o mesmo trocou de roupa, não usa mais a jaqueta do time e sim
uma camiseta branca com a logo azul do Jaguars e o número 19, o
qual ele representa em campo, nas costas. No momento em que
Elliot percebe a minha presença, ele rapidamente fica de pé e limpa
suas mãos no short de treino que ele usa.
Antes que ele possa abrir a boca, eu falo.
— Deixa eu adivinhar, você veio aqui me convencer de todos
os benefícios que eu vou ter ao namorar com você.
— Como você sabe disso? — ele pergunta surpreso.
— É o que se espera quando uma pessoa propõe um namoro
falso a outra — digo ao abrir a porta do dormitório e entrar. Faço um
gesto para que Elliot me acompanhe e logo em seguida fecho a
porta. — Fique à vontade para divagar todas as suas ideias, a
Lynnox foi para o teste de líder de torcida.
Ela havia me dito ainda na sexta que iria participar da
seleção, juntamente com Valerie, e segundo ela, essa seleção
“estúpida” deve durar toda a semana até as seis da tarde.
— Obrigado por me dar essa oportunidade em primeiro lugar
— ele diz ao coçar a nuca. Pela primeira vez vejo que Elliot está
sem jeito e não sabe nem mesmo como começar a falar.
— Eu te deixar falar sobre o seu plano não significa que eu
vá aceitar — enuncio ao abrir a geladeira, tirando duas garrafas de
água, abrindo uma e entregando outra a Elliot.
— Isso é um começo para que tudo dê certo, não é?! — ele
sugere e eu apenas franzo o cenho para ele. — Ao menos nos livros
funciona dessa forma.
— Nos livros as pessoas começam um relacionamento falso
porque as duas pretendem tomar proveito da situação de alguma
forma, o que não é o caso aqui. — Aponto para nós dois.
— Como você pode ter tanta certeza disso?
— Se eu entendi bem, você quer explanar ao mundo que
estamos namorando para que sua mãe não faça nenhum
casamento arranjado. Ou eu estou errada? — Junto as
sobrancelhas ao perguntar, Elliot concorda com um aceno e eu
sorrio em retribuição. — Nesse caso, o único que se beneficiaria
com um relacionamento falso seria você — concluo.
— É aí que você está errada, minha cara Watson.
— Você está fazendo o uso dessa fala erroneamente,
Sherlock — aviso.
— Espere eu terminar e verá, Watson. — Ele pisca para mim.
Elliot se apodera do sofá, sentando-se ali e em seguida,
como se fosse o dono do lugar, dá dois tapinhas no espaço ao seu
lado, em um convite para que eu me junte a ele, e assim eu faço.
— Veja bem, entrando em um relacionamento comigo, você
terá a chance de dizer por aí que namora com um quase virgem e
gostoso do time de futebol americano, fazendo inveja em todas as
garotas que quiseram possuir o meu corpo e nunca conseguiram.
— Eu não conhecia esse seu lado narcisista, Sherlock —
interrompo-o.
Elliot sorri para mim e passa as mãos em seus cabelos
extremamente lisos e longos, eu juro que ao final dessa conversa eu
vou perguntar qual condicionador ele usa.
— Eu sou o cérebro, Watson, o resto é mero apêndice — cita
Sherlock.
— Apenas siga o seu monólogo, Elliot, quero ver até onde
você vai chegar com todo esse amor-próprio — digo ao encarar
seus olhos verdes e vibrantes.
Agora sim Elliot está confortável, dada a animação das suas
falas e também a sua postura confiante, como sempre foi e talvez
nunca mude. Eu queria ter um pouco de toda essa convicção que
ele tem.
— Além de todas as qualidades, em poder dizer que está
comigo, você ainda poderá se livrar da obrigação que seu irmão te
impõe de participar das corridas.
Nesse momento, sinto minha cara fechar e todas as minhas
barreiras subirem.
— O Trevor não me obriga a fazer nada — respondo na
defensiva.
— Repita isso mais cem vezes e talvez em alguma delas
você consiga acreditar em si mesma — Elliot desdenha.
— Se ele me obrigada ou não a estar ali, um namoro com
você, ou com qualquer outra pessoa, não irá surtir efeito algum em
nada do que fazemos durante as corridas.
— Tudo bem — sobe as mãos em sinal de rendição. —
Talvez eu realmente não tenha nada para te dar em troca caso você
aceite entrar nessa trapaça comigo, mas pensa comigo. — Ele olha
para frente, junta as suas mãos e logo em seguida as separa, como
se estivesse vendo uma cena na sua frente. — Imagina que durante
toda a sua vida você foi extremamente protegida pelos seus pais,
nunca soube qual era o sabor da liberdade, se firmou em romances
escritos por mulheres para poder saciar a sua vontade de ter uma
vida amorosa porque você nunca encontrou alguém suficientemente
bom para apresentar à sua mãe como namorado.
— Eu nunca apresentei nenhum namorado à minha mãe —
ressalto, porém isso não impede Elliot de continuar.
— Então um dia, você simplesmente decide jogar tudo para o
alto e experimentar o gosto da liberdade, em contrapartida a sua
mãe lhe pega no flagra e para no hospital. Dali em diante, você
promete nunca mais ficar com ninguém na sua vida, só que aí a
faculdade chega e junto dela, as festas, as bebidas, as tentações. —
Nesse instante meu rosto queima, lembrando do que aconteceu
conosco na última festa.
Elliot também para de falar para engolir em seco, acredito
que assim como eu, ele acaba de ter uma lembrança daquele
momento.
— Entretanto, você não segue em frente com elas, pelo
menos tenta não seguir...
— Tudo bem, Elliot — digo de repente, me levantando.
porque não só meu rosto pega fogo, como também todo o resto do
meu corpo começa a esquentar. — Eu já entendi o que você quer
dizer.
— Entendeu mesmo? — questiona ao arquear a sobrancelha.
Eu apenas dou de ombros em resposta.
— Eu só quero um tempo para que ela possa entender que
eu cresci e que eu posso tomar minhas próprias decisões sem que
ela queira me dar uma bolsada por qualquer coisa que não a
agrade.
— Se as forças armadas soubessem os danos que uma
bolsa da Hérmes causa a você, com certeza eles suspenderiam as
vendas — penso alto.
— Não é?! — ele diz, também se levantando. — A questão é
que eu comecei essa mentira e se eu voltar atrás não é só uma
bolsada que eu vou ganhar, mas também a desaprovação da minha
mãe e em seguida, ela vai tentar novamente sugerir que algo
aconteça entre mim e a Amber.
— Por que você simplesmente não diz a sua mãe que não
quer nada com a garota e segue com a sua vida?
— Porque você simplesmente não diz um “não” — Faz aspas
com as mãos. —, à Margaret Tanner.
— Pior do que dizer “não” — imito seu movimento — à
Margaret Tanner, é ter que contar a ela que você mentiu para ela.
Com minha fala, Elliot volta a sentar no sofá e solta uma
lufada de ar pesada e audível, apoiando os cotovelos em seus
joelhos ele abaixa a cabeça e começa a coçar o cabelo.
Olhar para ele dessa forma faz com que um déjà-vu passe
em minha cabeça, pois na noite em que eu contei ao meu pai a
verdade sobre tudo o que aconteceu, meu irmão sentou-se em sua
cama nessa mesma posição. Naquele instante, Trevor não sabia
qual rumo teria a sua vida depois que a verdade foi revelada,
durante aqueles minutos, meu irmão perdeu toda a esperança.
Eu vi um pouco de vida se esvair de seus olhos nos
pequenos movimentos que ele fazia para abaixar a cabeça.
Sei que o que Elliot está pedindo que eu faça não tem nada a
ver com os traumas que eu carrego junto à minha família, sei
também que o que ele está fazendo não é por maldade, como Drew
fizera comigo no passado, ele apenas quer ter algo que insistem em
roubar dele a todo momento.
Controle.
Por mais diferentes que Elliot e eu possamos ser, existe algo
que nos interliga, a falta de controle sobre nossas vidas.
A dele é dirigida pela sua mãe, enquanto a minha é por
qualquer um que queira me ter em suas mãos. A insegurança é uma
droga que eu insisti em me viciar e luto para sair dela, embora não
tenha força suficiente para isso.
Mesmo que eu esteja prestes a concordar com Elliot no
próximo minuto, quero deixar claro para ele que no momento em
que as coisas ameaçarem passar dos limites permitidos, isso deverá
acabar.
— Há vidas em jogo, Sherlock. Vidas de verdade. Eu só
gostaria de saber se você se preocupa com elas.
Ao fazer o uso de uma citação de Watson, Elliot olha para
mim esperançoso e um grande sorriso surge em seus lábios.
— Será que me preocupar ajudaria a salvá-los? — ele cita
em resposta.
— Não... — Hesito com a resposta, também em citação,
porém as próximas palavras que saem da minha boca me
pertencem. — Mas no momento em que esse erro ameace afundá-
las ainda mais, tudo será acabado.
— Então esses são seus termos para namorar de mentirinha
comigo? — brinca.
— Você não pensava que eu iria redigir um contrato à la
Christian Grey, pensava? — Arqueio a sobrancelha.
— Para falar a verdade... — Ele se agacha e tira de dentro da
sua bolsa de academia um papel e me entrega.
No mesmo tem escrito nossos nomes, na primeira cláusula
ele deixa claro que esse é um relacionamento de fachada e na
segunda ele diz que nada sexual irá acontecer entre ambas as
partes.
— Você fez um contrato que não envolve sexo, sério?! —
Confusão só cresce em minha cara.
— Por mais que eu esteja animado por namorar pela primeira
vez em minha vida, é necessário que eu continuei com meu celibato
intacto... — ele hesita por um segundo e a cor vermelha adorna seu
rosto. — E também para que você não pense que eu escolhi você
apenas pelo que aconteceu na sexta.
Engulo em seco e olho novamente para o papel.
— Você me escolheu porque você me viu e pensou “por que
não?”, eu sei. De toda forma, não precisamos assinar qualquer
contrato para isso, Elliot. — Entrego o papel de volta a ele.
— Qual a graça de viver um fake dating sem assinar um
contrato?
— Como você sabe tanto sobre livros e tropes literárias,
Elliot?!
— Eu sou estudante de Literatura, Sadie.
Eu devo estar com cara de boba agora, pois solto um longo
“ah” e finalmente raciocino o motivo de ele ter citado Sherlock
perfeitamente e também Colleen Hoover, mais cedo. Ele ri da minha
cara de idiota e eu reviro os olhos.
— Tudo bem, nós vamos assinar esse contrato. — Aponto
para ele. — No entanto, terão alguns termos que você terá de
cumprir, afinal, eu não estou ganhando nada com isso, apenas você.
Portanto, eu quero reservar alguns direitos.
— Sempre foi assim que eu imaginei viver um romance
literário — ele diz alegremente num sorriso.
E pela primeira vez, desde que meu dia começou, eu me
permito sorrir. Talvez eu esteja sorrindo a mais tempo do que eu
tenha conhecimento, pois eu só notei que minha boca estava aberta
dessa forma ao sentir minhas bochechas arderem.
A felicidade genuína se tornou algo tão escasso para mim
que nem mesmo consigo mais reconhecer esses momentos
ímpares da minha vida.
Pense no que você acredita agora
Eu sou alguém que você não consegue viver sem?
Porque eu sei que não quero viver sem você, sim
Vamos lá, vamos virar esse jogo
CALL YOU MINE | THE CHAINSMOKERS FT BEBE REXHA

Impulsivo, é o que eu sou.


E no fundo, principalmente depois de hoje, eu acredito que eu
nasci com a bunda virada para lua. Superestimado, eu sei. Mas eu
nunca imaginei que eu iria estar com um sorriso estampado no
rosto, como estou agora, quando decidi vir ao encontro de Sadie e
implorar, mais uma vez, para ela embarcar nessa grande cilada
comigo.
Juro que até dois minutos atrás eu realmente cheguei a
acreditar que sua resposta era um grande não, afinal, ela estava
certa ao dizer que eu não tinha nenhuma moeda de troca para
oferecer a ela. Contudo, o fato é que ela topou.
Mais cedo ela me disse para dizer a verdade à minha mãe,
eu até tentei fazer isso, só que revelar a verdade à mulher que me
deu a vida iria ser pior do que um “não” da Sadie e também, assim
que retornei ao estacionamento, ela já havia ido embora. Eu tinha
um contrato de duas cláusulas, uma cara de cachorro que caiu do
caminhão de mudanças e um sonho, e se não fosse por isso ela
talvez não teria topado entrar nessa comigo.
Se sua resposta fosse contrária a que me deu, eu poderia, ao
menos, pedir um tempo para dizer à minha mãe que havíamos
terminado, embora soubesse que no segundo seguinte ela iria
empurrar a Amber de volta para mim. Certo que não conheço a
garota, porém conhecendo minha mãe durante toda minha vida, a
certeza que eu tenho de que ela não estaria apresentando a loira
para mim apenas por pura coincidência do destino, falou bem mais
alto.
Beijar Sadie também não foi o melhor plano de todos, mas
naquele momento foi a única oportunidade que enxerguei em minha
frente para poder me livrar do problema que é a minha mãe.
O que realmente importa é que, por mais que tenha sido
imprudente durante toda a manhã, deu tudo certo no final. Por isso,
nesse momento, Sadie e eu estamos remontando o nosso contrato
do namoro de mentirinha.
Se eu fosse um pouco mais inteligente eu não teria o
mostrado a ela quando a mesma disse que não precisava de um.
No entanto, agora é tarde demais para voltar atrás.
— Vamos revisar as cláusulas para ter certeza de que não
faltou nada — diz ela, sentada no chão do seu quarto.
Depois que decidimos que iríamos mesmo fazer esse
contrato, viemos para o seu quarto. Ela digitou todo o documento no
computador e imprimiu duas cópias, entregando uma delas a mim.
— Cláusula um — cito enquanto leio o papel. — Esse é um
relacionamento completamente fictício, todo e qualquer contato que
se faça necessário para parecer ser real, deverá ter um aviso prévio
para que a outra parte (Sadie) não seja pega de surpresa, uma vez
que só existe um beneficiário nesse acordo. Ei! — Olho para ela,
ofendido. — Você também estará sendo beneficiada nesse
relacionamento.
— Falar por aí que estou namorando um celibatário do time
de futebol não é nenhum benefício — defende.
— Fale por si.
Sadie revira os olhos.
— Cláusula dois: é vedado acontecer qualquer ato sexual
durante a relação e também, relembrar qualquer ato já acontecido
entre as partes anteriormente à assinatura do contrato.
Sadie fez questão de adicionar essa parte e não me passou
despercebido que enquanto ela digitava, seu rosto queimava e um
leve tremor tomou conta de seus dedos, mas eu não comentei nada.
Por mais que essa cena não tenha saído da minha cabeça nos
últimos dois dias, é melhor para nós dois esquecermos que um dia
ela aconteceu.
Após citarmos mais quatro cláusulas que envolvem: nada de
contar às outras pessoas — inclusive aos nossos amigos, com o
nome de Grey em maiúsculo — , que isso tudo não passa de uma
mentira; que em alguns domingos teremos de ir à igreja e almoçar
com meus pais, o que foi um pouco difícil de convencer Sadie, já
que ela é judia, entretanto chegamos a um comum acordo e a
última, eu não poderei me impor quanto a sua relação com Trevor.
Não me passou despercebido que sempre que seu irmão é
tema de nossas conversas, Sadie entra no modo defensivo
automaticamente, elevando uma grande parede em torno de si.
Nem mesmo quando falei de Drew mais cedo ela pareceu se sentir
assim, era como se ao falar o nome dele ela sentisse algo parecido
com raiva e medo, nem mesmo tristeza chegou a demonstrar.
— Sexta e última cláusula — continuo. — Caso o
relacionamento passe a afetar a vida pessoal de uma das partes e
uma delas ache necessário o término do contrato antes do tempo
estipulado de um ano, terá de haver uma conversa entre ambas as
partes para entrarem em comum acordo sobre como o término será
anunciado. Porque obviamente corre o risco de você se apaixonar
por mim no meio do caminho — brinco.
— Eu não sabia que era preciso passar uma hora a sós com
você para conhecer esse seu lado esnobe.
— Existe uma linha bastante tênue entre o esnobismo e a
verdade, minha cara Watson.
— Gostei dessa brincadeira de Watson — comenta pensativa
ao avaliar a folha à sua frente. — Poderia entrar no contrato como
algo nosso, para que entendam que existe uma certa intimidade
entre nós. O que você acha? — pergunta ao levantar os olhos para
mim.
Eu me levanto, indo até sua escrivaninha pegando uma
caneta e rubricando minha assinatura. Em seguida, faço o mesmo
com o papel que está em sua mão e a entrego a caneta.
— Não é necessária uma cláusula para eu te chamar de
Watson, Watson.
Sadie me olha com certa curiosidade ao espremer seus olhos
e entortar seu pescoço para o lado, ela mordisca o lábio inferior, que
não está tão vermelho como na noite de sexta, entretanto está
rosado. Sua boca carnuda entreaberta me faz ter a breve lembrança
de ela encostada em minha escrivaninha e por uma obra do destino,
agora eu estou encostado na dela.
Como eu fui ter a ideia estúpida de começar um
relacionamento falso com a última pessoa que viu meu pau?
Só de pensar no meu amigo Jack, porque sim, ele tem um
nome em homenagem ao whisky Jack Daniel’s. Não me pergunte o
porquê, nem me julgue. Um dia, eu apenas olhei para ele, duro feito
uma pedra, enquanto minhas bolas estavam extremamente roxas, e
pensei em batizá-lo, na procura de um nome eu vi uma garra da
bebida no chão e disse: “é isso, agora o seu nome é Jack”.
De toda forma, Jack decidiu acordar com a vaga lembrança
de uma garota gozando, porque vamos e convenhamos, aquilo
aconteceu de verdade, não foi apenas um pornô que eu costumo
assistir apenas para fazer meu grande amigo funcionar, foi real, tão
real que eu tenho que sonhar com aquele momento todas as vezes
em que fecho os olhos e ainda lembrar no instante em que olho para
a boca de Sadie.
Em total constrangimento e orando mentalmente para que ela
não note nada além do meu pescoço para cima, pergunto:
— Você vai assinar ou o que? — Engulo em seco.
— Estava pensando em outras coisas que podemos fazer
para que essa mentira dê certo.
— Basta você olhar para mim e dizer que está apaixonada —
brinco. — Não é tão difícil assim fingir que ama alguém.
Agora é a vez de Sadie engolir em seco, ela começa a
balançar a perna, indicando que algo está incomodando-a. Então
ela se levanta apressadamente, me entregando as duas cópias do
contrato, seu rosto começa a ficar vermelho ao passo que eu não
entendo nada do que está acontecendo.
— Quer saber? Isso é uma péssima ideia — ela diz ao se
virar e começa a prender os cabelos ruivos em um coque.
— O que aconteceu? Olha se é porque eu fiquei, você sabe...
— hesito — excitado. — Coço a garganta. — É algo supernormal,
qualquer coisa excita um quase...
— Você está duro? — Ela se vira de repente ao me
interromper.
— Você quer desistir de tudo porque eu de repente fiquei... —
Coço a garganta outra vez. — Você sabe...
Jogo os papéis em sua cama de solteiro, começo a sacodir
as mãos e pigarreio, não conseguindo falar que eu estou duro e
ficando ainda mais.
— Eu não queria te ofender, Sadie, eu juro!
— Meu problema não é o seu problema. — Ela gesticula para
o meu quadril, levando os olhos até ele. Ele... — Uau! Nossa... uau!
Sadie tenta subir seu olhar novamente para me encarar, mas
volta a olhar para meu quadril, seus olhos estão arregalados.
— Como você simplesmente estava normal e do nada ficou
assim? — Ela aponta novamente e eu tento responder. — Que seja!
O problema não é o seu pau, o problema é que nós dois entrarmos
nesse relacionamento é errado.
— Se o problema não é isso, o que é então?
Ela morde o lábio inferior de novo, só que agora ela não está
pensativa como antes, na realidade, parece que ela está prestes a
me contar um grande segredo.
Uma pequena gota de suor começa a descer por sua
têmpora, mostrando que ela realmente está nervosa com algo, eu
não me atrevo a perguntar pois já basta tudo o que eu venho
fazendo com ela nas últimas horas. Porém, sou ousado o bastante
para enxugar, com a ponta do polegar, a pequena gota e em
seguida descansar minha mão na sua bochecha.
Com o mesmo dedo que enxuguei seu suor, retiro
delicadamente o lábio preso entre seus dentes e olhando em seus
olhos quase dourados, pergunto novamente:
— Qual o problema, Sadie?
Ela solta um leve suspiro antes de responder.
— A mentira — sussurra. — Nós estaremos mentindo para
todo mundo e enganando a todos à custa de quê?
— Para mim é sobre controlar a minha própria vida, para
você é ajudar um amigo de anos que precisa de você.
— E se eu conhecer alguém e me apaixonar durante esse
processo? Ou melhor, se você conhecer alguém e se apaixonar?
— Por isso criamos a sexta cláusula, nosso relacionamento
irá acabar no momento em que ele começar a afetar nossa vida
pessoal.
— Você tem certeza disso? — pergunta apreensiva.
— Qual é, parece até que você está falando com um
psicopata que irá apontar uma arma na sua cabeça na hora que
você quiser terminar e lhe ameaçar.
— Essa não seria a primeira vez que isso iria acontecer. —
Sua resposta me surpreende, fazendo com que eu retire minha mão
do seu rosto imediatamente e dê um passo para trás.
— O que? — indago atônito.
Sadie faz o mesmo movimento, dando um passo para trás e
criando uma barreira entre nós, além do espaço. Ela também fecha
a cara de repente, mudando sua expressão de preocupada para
nervosa. No entanto, ela é salva quando uma terceira pessoa se
anuncia no local.
— Ei, casal! — a voz de Lynnox saúda.
Eu demoro alguns segundos, que na minha mente parecem
horas, para conectar a voz à pessoa e olhar para ela, pois a
resposta de supetão de Sadie me pegou de surpresa o suficiente
para gerar confusão e curiosidade em mim.
— Ei, Lyn — cumprimento.
— Se vocês forem transar, por favor, fechem a porta do
quarto. A visão de uma bunda peluda não é nada legal — a colega
de quarto de Sadie brinca.
— Ninguém aqui vai transar, Lynnox — Sadie responde.
— E mesmo se fôssemos, tenha certeza de que minha bunda
não tem pelo.
— Certeza que não? — desafia Lynnox ao arquear a
sobrancelha.
— Atrevida. Por isso que você e o Kane não se dão bem.
Lynnox solta uma lufada de ar pesada e audível.
— Você acabou de estragar todo o meu bom humor, Elliot,
obrigada por isso.
— Elliot — Sadie me repreende com o olhar.
— Desculpa, o Kane que é um babaca — digo ao balançar a
cabeça em negativa, o que arranca um riso de Lynnox, que continua
na soleira da porta, nos encarando.
— Eu sei que é — concorda. — Bom, vim apenas avisar que
havia chegado do teste das cheers e por favor, se forem transar,
porta fe-cha-da — finaliza pausadamente enquanto olha para a
Sadie e faz sinal com a mão de que quer conversar com ela.
Eu faço sinal positivo com as duas mãos e Sadie vai ao
encontro de sua colega de quarto. Assim que ela se aproxima
Lynnox diz, em um sussurro que mais parece um grito, que quer
saber de todos os detalhes depois, a minha quase namorada de
mentirinha ri e responde à amiga em um sussurro de verdade. As
duas riem e então a porta é fechada por Sadie.
Permaneço em silêncio enquanto ela caminha até a sua
cama, pegando os papéis do nosso contrato que eu joguei lá. Com a
caneta, que também está em sua cama, Sadie rubrica os dois
papéis e me entrega uma das cópias.
— Certo. Nós vamos fazer isso, mas no primeiro sinal de que
algo está dando errado, seja comigo ou com você, nós daremos um
fim imediatamente. Entendido?
Um grande sorriso estampa o meu rosto, então eu abraço a
ruiva tão apertado que quase a esmago.
— Eu poderia te beijar agora — anuncio.
— Vai com calma, campeão. Nós só vamos fazer isso em
caso de necessidade e se estivermos na frente da sua mãe —
avisa.
— E foi dessa forma que a bolsa da Hérmes aprendeu a dar
uma voadora.
Minha resposta faz nós dois rirmos, porque conhecendo
Margaret, ainda mais depois da sua reação hoje pela manhã, na
próxima vez em que ela vir algo parecido, eu não duvido que sua
bolsa crie vida própria e me ataque. Por esse motivo é que foi tão
engraçado.
Tão engraçado que eu paro de rir apenas para escutar a
risada de Sadie. Eu a conheço há anos, entretanto nunca cheguei a
prestar atenção em como sua voz é doce e sua risada histérica,
tanto que quando lhe falta ar, ela respira igual um porco.
Aos poucos o sorriso em meu rosto vai se desfazendo à
medida que eu admiro a mulher à minha frente. A pele alva de seu
rosto realça as sardas marrons ao redor do nariz e no topo dele, os
cabelos em tom de cobre imitam as folhas das árvores que caem
durante o outono, ela é simplesmente... adorável.
E sinceramente, eu não vejo a hora de poder dizer com
orgulho que essa é a minha namorada.
Mesmo que isso não passe de uma mentira.
Dizemos que somos amigos, mas eu estou te olhando do outro lado da sala
Não faz sentido, porque estamos brigando por causa do que fazemos
E não tem como eu acabar ficando com você
THAT WAY | TATE McRAE

A semana passou muito rápido. Em um instante era segunda-


feira, com um primeiro dia de aula normal, até Elliot gritar aos quatro
ventos que estávamos juntos, e em outro já é domingo.
Mais precisamente um domingo de manhã, onde eu fui
obrigada a acordar às seis para ir à igreja e receber todos os
olhares de julgamento da mamãe Tanner e seus olhos de corça
durante o almoço após o culto.
O decorrer da semana em si foi calmo, Elliot e eu assinamos
o contrato, que agora vendo por outro ângulo eu acho que foi
estúpido, embora ainda bom o suficiente para que possamos
estabelecer regras na nossa “relação”. Ainda no mesmo dia, à noite,
me juntei com as meninas para contar como tudo aconteceu tão
repentinamente e informei a ele por mensagem.
Eu: A Lynnox me perguntou como tudo aconteceu entre nós,
então eu me toquei que não chegamos a um acordo de como
começou nosso “relacionamento”.
Não bastando isso, ela chamou a Heaven e a Allie para
participarem da conversa logo que você saiu.
Então estou te avisando: ficamos escondido desde o
casamento da mãe do Axel e não tínhamos dito nada a ninguém
para não criar muitas expectativas.
Foi o bastante para convencer elas.
Boa sorte com os garotos.
Sua resposta foi imediata.
Elliot: Eu amei essa mentira, vc é a melhor!
Eu quis chorar, mas eu ri, o que foi bom. Desde então temos
trocado mensagens todas as noites, nos reunimos com nossos
amigos no refeitório durante o almoço e saímos de lá de mãos
dadas, o que não gera dúvidas em ninguém sobre o quão falsos
estamos sendo. E na sexta fui para a minha segunda sessão de
terapia, que foi revigorante para mim, tirando o fato de que eu
escondi da Rayna sobre minha relação com o Elliot.
Preferi conversar com ela sobre todas as mentiras que o
Drew me fez contar no ano passado, a única resposta para todas as
declarações que lhe dei foi apenas um:
— Você não pode lutar pelo perdão de ninguém enquanto
não conseguir fazer isso sozinha, consigo mesma.
Minha reação foi engolir em seco e secar minhas lágrimas,
depois disso venho repetindo o seu conselho.
Ontem à noite teve uma festa no armazém logo após as
lutas, só que eu não fui, pois só tenho lembranças ruins daquele
lugar e ainda não estou pronta para enfrentá-las outra vez. A minha
desculpa para não ir era que teria que acordar cedo hoje, para estar
na igreja com Elliot, entretanto eu não pretendia acordar às quatro
da manhã com uma gritaria do lado de fora do meu quarto.
Após ver a hora, me levanto para saber o que está
acontecendo, enquanto abro a porta reconheço a voz de Kane.
— Você vai me dizer de uma vez por todas o que você tomou
ou eu vou ter que enfiar o dedo na sua garganta? — Sua voz grave
está enfurecida.
— Eu quero que você vá para o inferno, Miller — Lynnox o
empurra, porém ela não tem força o suficiente, o que acaba fazendo
com que ela cambaleie para trás e acabe caindo nos meus pés.
Kane se aproxima, mas eu já estão me abaixando para
ajudá-la a se levantar.
— Deixa comigo — peço.
No momento em que pego Lynnox e consigo levantá-la, ela
encaixa a sua cabeça no vão entre meu ombro e pescoço, e
resmunga algo sobre eu estar cheirosa.
— O que aconteceu? — sussurro, perguntando a Kane.
— Não faço a mínima ideia, em um minuto ela estava
dançando e no outro começou a tremer, então eu decidi trazê-la.
— Fez bem — agarrando Lynnox pela cintura, a levo até o
banheiro. — Vamos lá, garota, hora de vomitar.
— Mas eu não quero — resmunga.
— Uma pena que quem manda em você sou eu — respondo
quando ficamos de joelhos.
Passo seus longos cabelos pretos para trás, amarrando-os
em um coque baixo, abro a tampa do vaso e faço aquilo que Kane
ameaçava fazer, segundos atrás. Coloco dois dedos em sua boca e
assim que chego fundo o suficiente, retiro-os, isso a faz colocar tudo
o que estava em estômago, ou a caminho dele, para fora.
Após ela vomitar mais duas vezes, vejo que Kane trouxe
água, então ofereço um copo à minha colega de quarto, que depois
de tomar todo o líquido, declara:
— Eu não sei o que seria de mim sem você, Sadie. — E em
seguida, um arroto sai da sua boca.
— Apenas um “muito obrigada” bastava — digo, me
levantando e ela acompanha meu movimento. — Agora vem,
levanta — peço.
No entanto, ela o faz porque eu pedi e sim, porque viu quem
está próximo de nós.
— O que esse filho do demo está fazendo aqui? — ela
pergunta, agora lúcida o suficiente.
— Ele te ajudou, Lyn — defendo Kane.
— O que eu vou receber por te deixar sóbria, docinho? —
provoca com um sorriso convencido no rosto.
— Um chute no meio das bolas. — E assim ela faz, não
cambaleando dessa vez ao atingi-lo.
Um grito de dor escapa da boca de Kane e Lynnox caminha
até seu quarto em passos duros, batendo a porta com força.
— Ela é péssima — sibila enquanto segura suas partes
íntimas.
— Você também não ajuda. Precisava mesmo provocar? —
pergunto.
— Ela quem começou.
— Aham — ignoro. — Vocês dois me acordaram antes da
hora, então faz o favor de quando sair fechar a porta.
Me afasto, volto para o meu quarto e fecho a porta, sem
nenhuma batida extrema, ao contrário da minha colega. Vou direto
para a minha cama, pego meu celular para verificar a hora e vejo
que, além de serem quase cinco da manhã, também há uma
mensagem não lida do Elliot.
Elliot: Acordada?
Chegou há vinte minutos.
Eu: Sim.
A Lynnox chegou bêbada e adivinha quem estava a
ajudando?
O Kane!
Elliot: Muitos gritos?
Eu: E um belo chute no saco.
Elliot: Ui!
Doeu aqui
Rio com a sua resposta, pois é uma coisa real quando se fala
em machucar testículos, todos os homens se compadecem e
choram de dor.
Elliot: Os caras chegaram gritando e me acordaram
O Grey está com a cara ferrada.
Eu: De novo?
Quando ele vai desistir de lutar?
Elliot: Provavelmente quando alguém colocar ele em uma
cadeira de rodas
Mas você não sabe o melhor
Ele não está com a cara ferrada pq lutou
O Colin bateu nele.
Sua última mensagem faz com que eu, ao invés de digitar
uma resposta, aperte o botão do telefone e ligue para ele. No
momento em que ouço sua respiração, indago:
— Como assim o Colin bateu nele? Por quê?
— Você quer mesmo saber?! — provoca do outro lado da
linha.
— É claro que sim!
— Você tem certeza disso, Watson?
Sim, embora não tenhamos colocado a brincadeira como
uma das cláusulas do contrato, continuamos nos chamando pelos
apelidos, o que eu tenho achado extremamente divertido e acredito
que ele também, além de que nenhum dos nossos amigos
endentem quando usamos os codinomes.
— Fala logo.
— Está bem, só que é algo muito forte.
Sim, o Elliot é fofoqueiro, porém ele não é um fofoqueiro
qualquer, ele é um fofoqueiro que faz suspense com a fofoca,
criando um frio na barriga de qualquer pessoa curiosa.
— Anda logo, Elliot — esbravejo.
— A Allison e o Colin ficaram, então o Grey simplesmente
decidiu que seria uma boa chegar dando um soco no capitão.
— Sem chance — digo perplexa.
— Essa também foi a minha reação.
— Eu não acredito!
— E tem mais...
— O quê?! — Agora eu me levanto, ficando sentada na cama
para ouvir atentamente o que ele vai dizer.
— Quem estragou o rosto do Grey foi a Allie.
Solto uma lufada de ar.
— Agora você está mentindo.
— Não estou. Ela o acertou no nariz, por isso ele está cheio
de sangue e com o olho roxo, vou te mandar uma foto. — Fico em
silêncio enquanto escuto Elliot se levantar e provavelmente
caminhar pela casa. — Sorri para mim, princesa — um resmungo
corta a ligação. — Isso, neném da mamãe.
Meu celular vibra e afasto-o do ouvido, abrindo a caixa de
mensagens com o Elliot, a última é uma foto do Grey, que está
realmente com a cara coberta de sangue e o olho roxo, quase azul.
Mesmo assim ainda não acredito que Allie tenha feito todo esse
estrago.
— Então, agora você acredita em mim?
— Isso não prova nada, Sherlock.
— Como não?!
— É só uma foto do rosto do Grey todo fodido, não há nada
que indique que a Allison, baixinha, fofinha, fã de Friends agrediu o
irmão.
— Irmão por quem ela é apaixonada.
Em uma das nossas conversas nos últimos dias, falamos
sobre todos que andam ao nosso redor e isso inclui a relação dos
supostos irmãos que se amam, até mesmo comparamos eles ao
Will e Layken do livro Métrica, da Colleen Hoover, a diferença é que
eles moram embaixo do mesmo teto e não são professor e aluna, ao
contrário dos personagens do livro.
— Ainda assim isso não prova nada.
— Nesse caso, teremos que esperar até eles acordarem para
você acreditar em mim.
— Acredito que sim...
Logo um silêncio se estende entre nós dois e um repentino
frio na barriga toma conta do meu abdômen, como se houvesse
várias borboletas sobrevoando por ele. Eu tenho sentido essa
mesma sensação todas as vezes em que estamos em uma
conversa e o silêncio se alastra sobre nós, a primeira vez que
aconteceu foi na segunda, assim que assinamos o contrato, após eu
ter ficado em dúvida, no mínimo cem vezes, se fazer aquilo era
correto ou não.
A certeza veio no instante em que Lynnox entrou no quarto, o
porquê de eu sentir tanta certeza, naquele momento, em fazer
aquilo, eu não faço a mínima ideia. No entanto, seguidamente Elliot
brincou sobre as reações icônicas de sua mãe, nos fazendo rir
durante minutos e naquele único, singelo e singular momento eu me
senti bem como nunca me senti em muitos anos.
Algo tão simples e ao mesmo tempo tão complexo, me fez
sentir estranhamente feliz.
Pena que na ocasião em que cessamos nosso riso, Elliot me
olhava paralisado. Foi ali que eu comecei a passar mal, porque seus
olhos verdes se concentravam em mim de uma maneira tão
intimidante que fazia com que me sentisse especial para ele, de
certa forma.
Não era como se tivéssemos acabado de começar uma
mentira, era como se há tempos fôssemos exatamente aquilo.
Únicos. Singelos. Singulares.
— Então... — Elliot começa.
— Eu só queria dormir mais cinco horas — resmungo.
— Mas temos que ir à igreja.
— Não, você tem — revido. — Eu posso muito bem me cobrir
e voltar a dormir como sempre faço todos os domingos.
— Você está dando um fora no seu namorado?
— De mentira.
— Namorado do mesmo jeito.
Dou de ombros ao revirar os olhos, só que lembro que ele
não está vendo.
— Parece que sim, nele e nos pais pastores dele.
— E no nosso bom e farto almoço de domingo.
Ao mencionar a palavra almoço minha barriga ronca, alto o
suficiente para que Elliot escute do outro lado da linha.
— Acho que alguém está com fome — brinca.
— Acho que alguém não conseguiu se alimentar na noite
passada para poder terminar de ler A Culpa é das Estrelas, quando
na realidade, está claro que a culpa é do Elliot Tanner — reclamo.
— Não jogue essa responsabilidade para cima de mim, você
que se considera uma grande bookaholic e nunca sequer leu
qualquer livro do John Green. Nem mesmo sabe o significado de
“Okay, okay”. Você é uma farsa, Sadie. Mas me conta, você chorou?
— Não, porém me chocou bastante ele morrer e não ela.
Quer dizer... estávamos prontos para ver ela morrer, não ele.
— Foi assim que eu conheci o plot twist.
— Eu conheci o plot twist em Amanhecer, na cena da luta.
— Verdade! — Elliot grita e eu afasto o celular do meu
ouvido. — O maior de todos os tempos, sem dúvidas.
— Não precisa me deixar surda.
— Desculpa — ele volta a falar baixinho. — Ei, são cinco e
meia, precisamos estar na igreja apenas às nove e meia, então dá
tempo de dormir mais duas horas.
— Sua mãe mandou você estar lá meia hora antes, lembra?
— Ela não vai fazer nada na frente do meu pai.
— Como você tem tanta certeza?
— Você não quer saber.
Uma careta se forma em meu rosto ao imaginar o que Elliot
quer dizer com isso.
— Não, realmente não quero. Então, até daqui duas horas e
meia.
— Até daqui duas horas e meia.
E assim eu finalizo a ligação e volto a me deitar, mesmo que
voltar a dormir seja quase impossível após essa grande dose de
serotonina, eu dou o meu máximo.

Quão idiota eu sou por pensar que não iria conseguir dormir?
Ah, essa eu respondo. Muito, muito idiota mesmo. Não só peguei no
sono, como acordei atrasada, deve ser por isso que eu quase
escorreguei no chão ao sair correndo do quarto para atender a porta
do dormitório, onde alguém — que suponho ser meu querido
namorado de mentira —, está batendo feito um louco.
— Estamos atrasados — é a primeira coisa que Elliot fala ao
entrar.
Ele veste uma calça social azul escura e uma camisa de
botões em cor creme, extremamente bem passada, além de sapatos
sociais nos pés. Seus cabelos finos e extremamente lisos estão
penteados para trás, acredito que com uma boa camada de gel os
cobrindo, uma vez que quase não se movimentam, como de
costume.
— Sim, eu sei — respondo ao tentar tocar o topo da sua
cabeça para ter certeza de que ele passou algo ali.
— Você ainda não está vestida? — pergunta, entrando no
meu quarto e deixando meu braço suspenso no ar.
— Sorte sua que eu consegui me acordar há oito minutos
atrás — respondo ao acompanhá-lo. — A gente pode terminar
agora, por favor?
— Não, não podemos. O que falta para você ficar pronta? —
muda de assunto e eu respiro aliviada por isso.
— O vestido e a maquiagem, mas posso fazer isso no
caminho.
— Você já está vestida — diz ele ao apontar para o vestido
verde esmeralda que uso, o tecido é leve, indo até a altura dos
joelhos, com uma gola fechada e mangas soltinhas estilo borboleta.
— Sim, eu sei — digo ao passar por ele e ir para a frente do
espelho, levo minhas mãos até o fecho nas costas, só que é quase
impossível fechá-lo. — Porém, eu não consigo...
Antes que eu consiga terminar de falar, sinto a presença de
Elliot atrás de mim, seus dedos quentes tocam a pele das minhas
costas delicadamente, contudo isso não impede que eu dê um
pequeno pulo, devido a surpresa da sua presença repentina.
— Eu te ajudo — anuncia quando começa a subir o zíper.
O caminho do centro da minha coluna até o pescoço dura
cerca de três segundos, mas eles se tornam uma eternidade quando
o seu toque delicado faz com que toda a extensão da minha pele
sinta o quão potente ele é sobre mim. Além da sua respiração
pesada e entrecortada ser o único som de vida entre nós.
O ar quente que sai dele e atinge a minha pele também ajuda
na minha sensibilidade, entretanto o contato é tão caloroso e ao
mesmo tempo intimidante, que eu consigo sentir meus pulmões
retesarem, sem ar algum. Por um breve segundo, eu estou com
Elliot no quarto, minhas bochechas estão pegando fogo, meu corpo
inteiro reagindo à sua presença. E eu me encontro...
Viva, talvez?!
Não viva do tipo existindo. Viva do tipo que tem o coração
batendo feito um martelo dentro do peito e grata por estar
acontecendo isso, pois é uma sensação boa.
Tanto quanto olhar em seus olhos verdes, agora tão escuros,
devido ao círculo da sua pupila dilatada, que me olham através do
espelho enquanto eu faço o mesmo. Não deveríamos nos olhar
dessa forma tão vívida quando não existe nada entre nós.
Deveríamos? Eu não deveria sentir o meu centro palpitar devido à
sua sublime presença tão perto de mim, mesmo que tenhamos
compartilhado um momento íntimo há uma semana e concordado
com essa farsa, não significa que algo a mais esteja acontecendo
entre nós dois.
O momento torna-se desconfortável assim que Elliot pega
meu cabelo, que está parcialmente controlado, levando-o para trás e
então ele cobre toda a extensão da minha coluna.
Ele coça a garganta ao finalizar e pergunta:
— Pronta?!
— Sim — murmuro em resposta. —, preciso apenas pegar
meu nécessaire com a maquiagem e a bolsa.
Elliot concorda e eu começo a juntar as coisas. Calço os
saltos scarpin creme e visto por cima do vestido um casaco de
mangas longas no mesmo tom dos sapatos. Quando finalmente
estou pronta, vou até o quarto da Lynnox, verifico se ela ainda está
respirando e dou um beijo na sua testa enquanto ela sibila algo com
raiva.
Após isso saímos do dormitório e seguimos para fora do
prédio, como Elliot não tem carro, decidimos que iríamos à Stone
Bay no meu, entretanto, como eu ainda não estou pronta e preciso
me maquiar durante o caminho, estendo as chaves para ele, que me
encara assustado.
— Você vai dirigir — informo.
— Que... por... que? — gagueja em resposta.
— Eu preciso terminar de me arrumar, não dá para eu dirigir
ao mesmo tempo que me maquio — explico. — Pega as chaves. —
Volto a tentar lhe entregar as chaves, mas Elliot sussurra algo
completamente inaudível. — O que?!
— Eu não posso dirigir — consigo escutar seu sussurro.
— Por que não?
— Eu apenas não posso — diz secamente.
— Agora estamos em um impasse. — Levanto meus braços
para o alto. — Você tem habilitação, por que você não pode dirigir?
Elliot coça a garganta ao abrir o primeiro botão da sua
camisa, ele parece estar nervoso e precisando de um pouco de ar,
portanto eu decido me render, destravando o carro e entrando no
banco do motorista. Ao ligá-lo e dar a partida, buzino para que ele
entre, uma vez que ele ainda está parado em frente ao carro,
respirando fundo.
— Se a sua mãe me criticar por eu estar feia, eu juro que
acabo tudo — aviso ao sair com o carro.
Elliot apenas concorda com um murmúrio, porém não fala
nada. E continua assim por todo o restante do caminho, que dura
cerca de quarenta minutos. Em alguns momentos eu arrisquei olhar
para ele, só que ele estava centrado na janela e nas árvores. Pela
primeira vez eu vi e presenciei Elliot Tanner ficar em silêncio por
incontáveis minutos, sem falar qualquer piada ou ironia, ele apenas
permaneceu pensativo, como se algo estivesse incomodando-o.
Eu quero perguntar a ele o motivo de ter mudado tão
repentinamente, contudo algo bem lá no fundo me avisa que eu não
devo me meter nisso, pois para mim pode ter sido de repente,
enquanto para ele pode ser algo mais estressante, a ponto de deixá-
lo dessa forma, tão quieto.
Conheço bem essa sensação, já presenciei minha mãe agir
igualmente todas as vezes em que meu avô era mencionado após a
sua morte, ela ficava em silêncio, apenas divagando. Por isso decidi
que o silêncio seria o melhor companheiro para nós dois durante a
curta viagem.
Ao chegarmos em Stone Bay, estaciono o carro ao lado do
meio fio, na rua da igreja. Dou uma olhada no espelho retrovisor e
decido passar ao menos um corretivo ao redor dos olhos e no centro
do rosto, que é onde tem mais sardas. Assim que finalizo o
esfumado e pego um gloss para passar nos lábios, finalmente ouço
a voz de Elliot ecoar no carro.
— Você não precisa de maquiagem para cobrir suas sardas,
elas são lindas. — Me atrevo a olhar para ele, com o pincel do gloss
ainda meus lábios. — Você é linda, suas sardas são perfeitas e sua
boca não precisa de batom algum para chamar atenção.
Sinto meu rosto ferver em pura vergonha.
Até agora eu achava que tudo não passava de uma loucura
da minha cabeça, essas sensações que Elliot me causa, entretanto
agora me fez sentir algo que nunca senti antes.
Vergonha por ser elogiada.
Você parece sempre me ajudar a recuperar o fôlego
Mas então eu o perco de novo quando olho para você, é o fim
E por que fico tão nervoso quando olho em seus olhos?
As borboletas não podem me impedir de me apaixonar por você
I GUESS I’M IN LOVE | CLINTON KANE

Gatilhos.
Acredito que seja algo que todo ser humano, que viveu
suficientemente para ter noção de quem ele é no mundo, já passou
por algum e por mais que eu seja um que tenha vivido pouco e
curtido o máximo que pôde, nos meus poucos dezenove anos, eu
também tenho um trauma.
O meu gatilho é ligado ao meu medo da direção, não tenho
absolutamente nada contra carros, contudo não suporto a ideia de
pegar em um volante. Por isso que eu travei quando a Sadie insistiu
para que eu dirigisse, não foi justo com ela, porém ela não sabe o
motivo por trás de eu ter negado esse simples favor. Na realidade
ninguém sabe, apenas meus pais e tudo isso já é vergonhoso o
bastante.
Eu poderia ter me aberto com ela durante todo o caminho
que fizemos de Beaufort a Stone Bay, porém eu preferi me calar e
fazer todo o percurso olhando para a janela, mesmo que em alguns
momentos eu a olhava e via que ela fazia a mesma coisa,
rapidamente eu desviava para que ela não percebesse que eu
estava a olhando.
Sadie insistiu que precisava passar maquiagem e por esse
motivo começou a fazer algo assim que estacionou o carro, só que
agora que estamos parados em frente à igreja e estou olhando no
fundo dos seus olhos cor de mel e para as sardas que os circulam
até suas maçãs do rosto, neste instante enrubescidas, eu preciso
afirmar novamente que ela não precisa de nada para realçar sua
beleza.
— Até mesmo no rosto, você jamais precisaria de qualquer
blush para destacar e dar um “ar de saúde”, é assim que vocês
falam, certo?!
Sadie arregala os olhos, ainda me encarando.
— Você calado é muito estranho, Elliot, porém falando sobre
maquiagem se torna ainda mais.
— Eu não sou estranho de forma alguma, estranha é você
que acha que cobrir seu rosto perfeito com maquiagem vai te deixar
mais bonita.
— Você está começando a me deixar constrangida com isso
— avisa ao fechar a embalagem do batom brilhoso que acabou de
passar na boca.
— Sou verdadeiro minha, cara Watson e enquanto eu for
assim, vou insistir no quão bonita você é.
Sadie abaixa a cabeça ao passo que organiza suas coisas
em uma bolsa e noto que suas bochechas voltam a ficar vermelhas.
As histórias de Sadie acompanharam ela durante todo o
nosso tempo da escola, então ela ter ficado com vários caras
durante aquele período não é segredo para ninguém. Embora ela
tenha se relacionado com muitos durante a sua vida, é fácil
perceber que ela jamais foi elogiada por qualquer um antes, pois é
notória a forma como ela sempre se sente constrangida quando eu
a olho demais ou apenas fico em silêncio, escutando suas
respirações através das nossas inúmeras ligações, e até mesmo
com tudo o que ela passou no ano passado com o Drew. Eu odeio
ter que sempre trazê-lo de volta para a história, no entanto,
infelizmente, ele fez parte da nossa, e continua sendo perceptível
que jamais a tratou bem.
Durante esses dias em que temos convivido juntos eu tenho
sentido a vontade de lhe perguntar o que afinal aconteceu entre eles
dois, e o porquê de ela ter mudado depois da sua morte, ter criado
outra postura, não a mesma de quando estava com ele. Eu só
queria saber o que ela viu de tão especial nele, mesmo depois de
tudo o que ele fez com a Heaven, para mergulhar de cabeça
naquela relação.
Assim que Sadie finalmente levanta a cabeça, com um
sorriso bobo em seu rosto, ela me olha com um ar de esperança e
eu devolvo o mesmo a ela, pois eu sinto que tudo o que estamos
vivendo, um dia nos trará uma grande benção ou uma gigantesca
lição.
De toda forma, eu não tenho nada a ver com esse assunto ou
com qualquer outro que a envolva.
Eu tenho que entender que nem mesmo quando estávamos
na fase amigos/ colegas, não éramos próximos o suficiente para que
eu pudesse interferir em assuntos como esses, então como
namorado de mentira, eu tenho muito menos direito sobre isso.
Talvez se um dia nosso relacionamento mudasse de falso
para verdadeiro, talvez eu poderia conhecer a real história por trás
de tudo o que ela viveu nas mãos dele. Contudo, não estamos em
um livro de romance.
Estamos em frente à igreja, onde meus pais já se encontram
na porta, recebendo os fiéis.
— Vamos? — pergunto.
A resposta que eu recebo é assentir com a cabeça. Tão logo
descemos do carro, encontro Sadie ao lado da porta do motorista,
meu sorriso cresce ao acenar com a mão para meu pai, que faz o
mesmo, enquanto o sorriso singelo que havia na boca de Sadie
some completamente.
— Você tem certeza de que eu estou apresentável? — ela
sussurra no momento em que seguro sua mão, como combinamos
por mensagem na sexta.
— Você está perfeita, acredite em mim — respondo sem
desfazer meu sorriso.
— Sua mãe vai me odiar — resmunga. — Eu nunca fui
apresentada a nenhuma mãe.
— Relaxa, minha mãe já te conhece. Falando assim parece
que você está prestes a conhecer sua futura sogra — brinco ao
olhar para ela e piscar um olho.
Sadie quase para quando começamos a subir a escada da
entrada da igreja, me encarando com os olhos arregalados.
— Eu sei que não é de verdade, mas mesmo...
— Meu bebê! — a voz estridente da minha mãe faz com que
a próxima palavra saia da boca de Sadie em sussurro quase
inaudível.
— Assim — Sadie completa.
No segundo seguinte minha mãe me abraça, fazendo com
que minha mão solte a de Sadie, que em resposta dá um passo
para trás. Porém, para a nossa surpresa, ela é acolhida pelo meu
pai, que rapidamente pega a sua mão em um cumprimento,
enquanto a minha mãe me agarra e arranca todo o ar do meu peito.
— Devo assumir que foi uma surpresa e tanto saber do
relacionamento de vocês. — Escuto as palavras saírem da boca do
meu pai quando o oxigênio decide voltar para o meu cérebro.
— Espero que tenha sido uma surpresa boa — Sadie
responde.
— Com certeza foi — ele completa. — Vocês dois se
conhecem desde sempre, não haveria um par melhor para meu filho
que não fosse você, tenho certeza disso.
O vermelho rapidamente volta para o rosto de Sadie, que
agradece.
— Fico feliz em saber disso, pastor Tanner — responde
envergonhada.
— Me chame de Robert, por favor — o homem, que tem a
aparência exata de Henry Cavill, responde ao sorrir e mostrar todos
os seus dentes brancos perfeitos. Minha mãe se posta ao seu lado e
ele lhe dá um beijo no topo da cabeça. — Você não vai
cumprimentar a Sadie, querida?
— Ah sim, claro. Quase tinha esquecido dela — minha mãe
diz irônica.
A seguir ela abraça Sadie, que dá três batidinhas leves nas
suas costas. No segundo em que ela desfaz o abraço, noto que
minha mãe começa a olhar para ela a partir de um único fio de
cabelo que está em pé e passa o raio x de seus olhos por todo o
restante do corpo de Sadie.
Eu, como um bom namorado, decido pegar a sua mão e
interromper o momento em que minha mãe está prestes a jogar
alguma farpa contra a garota.
— Vamos nos sentar — aviso aos meus pais ao puxar Sadie
pela mão e caminhar até o primeiro banco da igreja.
Não dou oportunidade de resposta à minha mãe, apenas
caminho com Sadie em meu encalço, quando finalmente nos
sentamos, ela diz:
— Ela estava prestes a fazer algum comentário sobre mim.
— Sim — respondo com um sorriso enquanto olho para trás e
aceno para com cumprimentar Magnus e Reese, pais da Heaven,
que estão sentados três bancos atrás. — Estava.
Sadie acompanha meu movimento e também os
cumprimenta, da mesma forma que eu fiz, ela recebe um beijo no ar
de Reese, que está esplêndida carregando um melão na barriga.
Quer dizer... o segundo filho deles. Que deve nascer no final do ano.
— Eu sabia que eu não estava apresentável — insiste Sadie.
— Agora você sabe o porquê eu nunca namorei, Watson.
— E agora você sabe o porquê eu nunca fui apresentada a
nenhuma mãe, Sherlock.
— Touché! — Pisco para ela, que ri.
À medida que a igreja se enche cristãos, aos quais fazem
questão de falar comigo, assim como com meus pais, que se portam
na entrada, o clima entre nós começa a ficar cada vez mais
estranho.
A verdade é que ao longo de toda essa semana, o máximo
de tempo que passamos juntos foi durante o almoço e em todos
eles, estivemos com nossos amigos. Embora tenhamos trocado
inúmeras mensagens, que resultaram em ligações, isso não anula o
fato de que é totalmente estranho estar à sós com ela, já que a
última vez em que ficamos assim foi quando assinamos o contrato e
eu parecia um total idiota admirando a maneira como ela ria
descontroladamente. Acredito que nesse momento eu deva estar do
mesmo jeito, uma vez que eu não consigo tirar os olhos dela
enquanto toda a igreja fica de pé para cantar o hino de abertura.
O movimento que Sadie faz ao se levantar é sútil, em pé, ela
alisa o casaco que ainda veste e passa seus longos cabelos ruivos
ondulados para o lado, eu apenas continuo olhando para ela,
mesmo no momento em que me levanto. As vozes ao fundo
finalizam a música e voltamos a nos sentar, meus olhos abandonam
Sadie minimamente, apenas para que eu possa segurar a sua mão
logo que a pregação começa, ela dá um leve pulo com o meu toque,
mas então sorri para mim.
E durante todo o restante do tempo em que passamos na
igreja, eu oscilo os meus olhares entre o seu rosto, que está
definitivamente prestando atenção a tudo o que se passa à nossa
frente, e as nossas mãos. É quase como se eu estivesse
hipnotizado por sua presença, até o instante em que ela se vira para
mim e se curva minimamente, as palavras que saem da sua boca
em um sussurro arrepiam todos os pelos do meu corpo, assim como
aconteceu na hora em que eu a ajudava a fechar o seu vestido mais
cedo.
— O que você está fazendo, seus pais estão olhando para a
gente.
— Hã... — murmuro ao me virar para eles, fazendo com que
nossas cabeças se trombem. — Desculpa! — grito e dessa vez,
sinto todos os olhares em nós dois, não só os dos meus pais.
Minha mãe fecha a cara e meu pai solta um leve riso no
microfone.
No entanto, minha atenção volta rapidamente para a Sadie
assim que ela leva sua mão até o topo da cabeça, onde sofreu a
batida da minha. Eu retiro seus dedos de lá delicadamente e passo
meu polegar no local que está vermelho, peço desculpas outra vez
quando ela olha para mim e levo uma parte da sua franja até a sua
orelha.
— Não foi nada — responde.
Olho novamente ao redor e agora ninguém presta atenção
em nós, nem mesmo meus pais, ainda assim eu sinto a
necessidade de fazer o que faço em seguida. Por um segundo eu
sinto que eu errei quando noto seus olhos arregalados, contudo,
logo que suas bochechas se tornam encarnadas eu sei que eu
estou fazendo o certo ao beijar o topo da sua cabeça.
Ao final da cerimônia faço questão de pegar a mão dela para
irmos embora, da mesma forma que fiz ao chegarmos. Como de
costume, Sadie se assusta no início, só que sem demora se
acostuma.
Seus sustos são pequenos, por isso que talvez quem esteja
ao nosso redor não consiga notar, porém, para mim, têm sido
bastante perceptíveis.
É assim que me vem uma grande dúvida, ela realmente
nunca foi tratada bem ou esse seu comportamento tem algo a ver
com a sua última relação? Sadie carrega vários segredos e eu faço
questão de descobrir um a um.
Fugir da igreja sem ao menos me despedir dos meus pais foi
um plano arquitetado há dois dias, pois eu sabia que se viesse para
casa junto com eles eu não teria a oportunidade de mostrar à minha
namorada de mentirinha o meu maior tesouro pessoal.
— Eu realmente não te conheço direito, Elliot Tanner — diz
ela ao pegar um exemplar de Orgulho e Preconceito na segunda
prateleira. — Jamais imaginaria que você é do tipo que lê romances.
— Do tipo que lê?! — questiono ao arquear uma sobrancelha.
— Você sabe, a maioria dos garotos preferem carros,
esportes e jogos ao invés de pegarem qualquer livro que não seja
complementar para alguma aula. A maioria deles costuma parar de
ler após o ensino médio.
— Aí você que está errada, senhorita Langster — pontuo. —
Eu gosto de esporte, tanto que jogo futebol e também gosto de
jogos, só não gosto de jogar com Grey.
— Por quê? Ele é ruim? — inquere ao guardar o livro de volta
no lugar.
— Pelo contrário, a única coisa em que o Grey é bom nessa
vida é no Playstation ou Xbox. — Faço cara de nojo. — E também
em ser meu melhor amigo. — Dou de ombros.
— Deve ser legal ter alguém para chamar de “melhor amigo”.
— Ela faz aspas com as mãos.
— Qual é, vai me dizer que você não tem melhores amigos?
— indago curioso.
Ela dá de ombros em resposta.
— Você está falando sério?
— Sim — confirma.
— Mas nós sempre fomos do mesmo grupo de amigos —
observo.
— Fomos — Assente ao concordar. —, porém sempre foi
você e o Grey, e Heaven, Allison e Wes. Depois veio o Kane e o
Axel. Eu sempre fiz parte do grupo, entretanto nunca fui a melhor
amiga de ninguém, mesmo antes de todos os acontecimentos do
ano passado.
Mesmo que ela fale isso de forma natural, eu sinto pena dela,
porque observando bem, é verdade. Desde os nossos treze anos
sempre fomos o Grey e eu, claro que em alguns momentos também
existiu o Drew, só que a minha ligação com o Grey sempre foi mais
forte, já do outro lado existiam Sadie, Heaven, Allison e Wes,
contudo, mesmo sendo extremamente próximos, o grupo era mais
unido quando a ruiva estava fora.
— Bom, o que eu vou te mostrar agora nem mesmo o Grey
viu. — Tento animar o clima de enterro que se estendeu entre nós.
— Então isso significa que talvez você seja mais especial do que
ele.
— E o que seria isso? — questiona curiosa tão logo eu subo
em um banquinho para que consiga pegar a mala que está em cima
da estante.
— É algo que minha mãe não pode nem sonhar que eu
comprei — faço suspense no momento em que pego o box.
— Eu não quero ver revistas ou mangás pornôs, Elli... — Ela
retesa no segundo em que eu estendo para ela o box especial de
colecionador do Harry Potter.
— Acredite, isso é bem melhor do que qualquer revista da
Playboy — afirmo.
Sadie toma a mala de madeira, revestida em couro sintético,
das minhas mãos, leva-a até a minha cama e com um cuidado
imenso, mais do que eu mesmo tive no dia em que a recebi, a abre.
Revelando os sete livros da saga do bruxinho, todos em capa dura.
— Eles são perfeitos — afirma ao passar os dedos
delicadamente sobre as lombadas dos livros, completamente
encantada. — Como você conseguiu escondê-los por tanto tempo
sem que a sua mãe soubesse? — Me encara com seus olhos
castanhos tão âmbares quanto o líquido de uma garrafa de Jack
Daniels.
Sorrio, pronto para lhe responder com a mesma fascinação
que ela carrega. Porém, o momento é quebrado no instante em que
minha mãe decide entrar no quarto.
— O que é que eu não sei? — questiona nos encarando.
Eu olho para Sadie, Sadie me olha e nós dois olhamos para a
minha mãe, que continua a nos olhar, assim nos encaramos outra
vez e voltamos os olhos para minha mãe.
— O que é isso? — minha mãe pergunta.
Eu começo a coçar a minha nuca, tentando procurar uma
desculpa para respondê-la. Não que ela vá achar ruim eu ter
comprado o box, no entanto, eu deixei de almoçar por vários dias
durante o segundo ano para poder comprá-lo, e ela vai perguntar
como eu o adquiri, depois vai me dar um sermão por não ter
almoçado por três semanas, então ela vai começar a querer chorar
e tudo vai virar uma grande confusão... Entretanto, eu sou
surpreendido por Sadie, que decide me acobertar logo que vê o
pânico crescer em meus olhos.
— Isso aqui?! — ela inquere. — É um presente que eu
comprei para o Elliot. — Ela sorri docemente.
— Presente? — minha mãe questiona, desconfiada. —
Quanto tempo vocês namoram mesmo?
— Uma semana — respondemos em uníssono.
— Hum — murmura, fazendo com que minhas mãos
comecem a suar. — Não acham muito cedo para começarem a
presentear um ao outro?!
— Cedo por quê? — Dessa vez é o meu pai que entra no
quarto, pousando as mãos nos ombros da minha mãe, que
imediatamente muda a sua postura tensa para relaxada com a
presença dele. — Que eu me lembre bem, dois dias depois que te
pedi em namoro eu lhe presenteei com uma bolsa.
— Na nossa época era diferente — ela tenta desdobrar meu
pai.
— Mas você amou tanto ela, que três meses depois a jogou
em mim pensando que eu a estava traindo com a minha irmã. — Ele
aperta seus ombros.
— Boatos que também foi com ela que eu levei a minha
primeira bronca.
— Esses boatos estão bastante corretos — meu pai
concorda, o que faz a minha mãe fechar a cara.
— Ela ainda está vivíssima e em um ótimo estado, então se
vocês dois não querem levar uma surra dela, acho bom calarem a
boca.
— A minha baixinha é brava — meu pai faz uma voz fofa,
como se estivesse falando com uma criança e aproveita a situação
para apertar as bochechas da minha mãe, que dá um tapa no dorso
da sua mão.
— Cansei da conversa — ela diz irritadiça. — Estou indo
esquentar o almoço, quero todos lá embaixo em quinze minutos, se
não todas as Hérmes e Pradas irão voar por essa casa — avisa, já
saindo do quarto. — E Elliot James Tanner nada de porta trancada
— grita, acredito que já nas escadas.
— Viu só? Brava! — Meu pai aponta por cima do ombro. —
De toda forma, é um prazer imenso te receber em nossa casa,
Sadie, espero que você se sinta bem-vinda.
— Muito obrigada, pastor Tanner. — Meu pai faz uma careta
de reprovação para ela.
— Já te disse que pode me chamar de Robert.
— Tudo bem. — Ela levanta as mãos ao ar em rendição. —
Muito obrigada, Robert.
— Nos vemos em quinze minutos. — Meu pai começa a
fechar a porta do quarto enquanto sai.
— Pai — chamo. — Deixa aberta — lembro-o.
— Se ela falar qualquer coisa, a culpa é minha.
E então ele fecha a porta, deixando Sadie e eu a sós. Noto
que durante todo esse tempo, Sadie estava com um sorriso em seu
rosto e observava toda a interação dos meus pais.
— Sua mãe é definitivamente outra pessoa quando está com
o seu pai — constata.
— Sim, ela é. Completamente mais relaxada.
— Demais — concorda.
— Minha mãe pode não ser a pessoa mais calma do mundo,
muito pelo contrário, ela é surtada, eu sei — assumo. — Porém, a
minha meta é amar alguém tanto quanto ela ama meu pai e vice-
versa. Por mais opostos que eles sejam, eles se completam.
— Eles são lindos juntos.
— Nós também somos. — Bato meu ombro no seu. — Dois
mentirosos lindos. — Sorrio brincando.
— Dois belos mentirosos — completa. — Agora toma aqui o
seu presente de uma semana de namoro.
Diz ao fechar a caixa e me entregar.
— Você é a melhor namorada do mundo, muito obrigado,
querida. — Pisco.
— Me chame de Watson, por favor.
— Só se você me chamar de Sherlock.
— Sempre.
— Sempre.
Nossas mãos se tocam quando pegamos o box juntos, eu
jamais pensei que eu fosse tão vulnerável dessa forma, durante
todo o ano passado eu beijei inúmeras garotas, muitas quiseram me
levar para a cama e eu sempre tive a consciência de dizer não,
todavia eu juro, que apenas um toque da Sadie faz com que eu
queira despi-la rapidamente.
Eu não faço a mínima ideia do que isso signifique, talvez
tenha algo a ver com o que aconteceu na festa fim de semana
passado ou apenas tenha alguma ligação com a pessoa, mas a
melhor hipótese de todas é que eu sou um jovem prestes a
completar vinte anos com os hormônios à flor da pele.
Contudo, se fossem os meus hormônios, porque eu ainda
tenho que me tocar pensando na forma como Valerie entrava nela e
na abertura que ela deixou em seus lábios ao expelir seu gozo?
Isso tem totalmente a ver com a Sadie, eu sei disso, eu só
não sei o porquê de isso estar acontecendo comigo. Quer dizer, eu
sei que tudo entre nós tem acontecido muito rápido, em um dia
compartilhamos um momento íntimo a três, na mesma noite eu
assisto sua fraqueza diante do seu irmão, dois dias depois eu a
peço em namoro e assinamos um contrato, e todos os dias
seguintes trocamos inúmeras mensagens e trocadilhos que apenas
nós dois conseguimos entender.
Entretanto, é isso que acontece, ela tem um efeito sobre mim
que eu não faço a mínima ideia de como lidar. Apenas sei que eu
devo fazer com que esse momento constrangedor chegue ao fim.
— Ler A Culpa é das Estrelas teve um efeito em você, em?
— brinco.
Ela sorri ao se afastar e alisar a saia do seu vestido verde.
— Sim — concorda. — Me debulhar em lágrimas, porque não
basta ser depressiva na vida real, tenho que ser na vida literária
também.
— Isso foi... — Engulo.
— Pesado, eu sei.
Impressão minha ou ela está mais descontraída hoje?!
Enquanto eu penso em tirar a sua roupa e toda e qualquer palavra
que sai da sua boca, ela apenas solta migalhas dos seus
sentimentos.
Afinal, não é novidade para nenhum de nós a sua tentativa de
tirar a vida no primeiro dia desse ano, mas esse, assim como o
Drew ou o tempo em que a Heaven passou no hospital, são
assuntos delicados para todos nós, por isso eles nunca entram na
roda. Porém, vê-la falar sobre isso de uma forma tão simples e ao
mesmo tempo bruta, me faz questionar tudo o que ela viveu até
hoje.
— Pesado mesmo.
— Desculpa — ela diz imediatamente.
— Pelo quê?!
— É que eu estou fazendo terapia e a minha terapeuta me
aconselhou a ser mais verdadeira com meus sentimentos, apenas
despejá-los quando eu sentisse que fosse necessário, então as
coisas estão apenas saindo da minha boca e eu nem mesmo
percebo.
— Isso é bom... eu acho — digo ao realocar o box em um
espaço vazio na estante.
— Para mim pode ser, só que para as pessoas ao redor
talvez não. Nem todos estão prontos para ouvirem que uma pessoa
tem ansiedade, depressão ou qualquer doença mental, quem dirá
falar sobre suicídio — reflete. E eu apenas deixo que ela continue.
— Mas a realidade é que a grande parte das pessoas que não
aceitam ouvir sobre isso, sofrem da mesma coisa e deixam que o
seu grito interior as cale, isso aconteceu comigo durante muito
tempo. Quer dizer, ainda acontece. Eu apenas estou tentando
descobrir uma forma de colocar tudo para fora.
— E o que seria esse tudo? — questiono.
Quando ela abre a boca para responder, somos
interrompidos pelo grito da minha mãe, que ecoa pela casa,
informando que o almoço está pronto.
— Acho melhor nós descermos — ela diz e eu concordo,
mesmo que esteja me corroendo de curiosidade para saber o que
ela iria falar.
Ao sairmos do quarto descemos as escadas juntos,
chegando no andar de baixo, levo Sadie até a sala de jantar, onde
meu pai está sentado na cadeira da ponta. Puxo uma cadeira para
ela, que me agradece em um sussurro e aguardamos minha mãe
voltar com uma travesse para a mesa e sentar-se.
Como eu sei que Sadie é judia e que muito provavelmente ela
deve seguir alguns costumes judaicos, como a dieta kosher[1],
portanto, eu pedi à minha mãe, na sexta, que não fizesse nada que
tivesse carne suína ou crustáceos. Ela se absteve por alguns
segundos, perguntando o porquê não poderia fazer esse tipo de
comida, eu não lhe falei sobre a religião de Sadie, apenas pedi para
que não fosse nada do tipo.
Então sim, eu planejei todo um dia para passar com minha
falsa namorada e foda-se se alguém acha isso ruim ou não, o que
importa é que eu estou animado com isso e estou gostando do meu
dia até agora, mesmo que ainda tenhamos toda uma tarde com a
minha família.
Todavia, tudo cai por terra no momento em que minha mãe
decide destampar a travessa que ela trazia antes de se sentar.
— Camarão à provençal — meu pai e eu falamos ao mesmo
tempo, porém meu pai tem um grande sorriso no rosto, enquanto o
meu sumiu por completo.
— O preferido do seu pai — minha mãe fala animadamente.
— Espero que você goste, querida.
Eu olho para Sadie e ela está encarando a assadeira assim
como eu, ela engole em seco ao encarar minha mãe com um sorriso
amarelo. Eu sei que no fundo ela está querendo ser educada, no
entanto, ela está prestes a surtar e dizer que isso foi uma má ideia e
que deveríamos contar a verdade à minha mãe, por esse motivo,
agora quem começa a se desesperar sou eu.
Quase nunca entrei em desespero na minha vida, só que
nesse segundo, eu realmente necessito fazer alguma coisa para
acalmá-la. À medida que minhas mãos suam e eu penso em algo
que possa fazer, Sadie me olha, com a mesma agonia que estou
sentindo, e nega com a cabeça.
— O que foi? — minha mãe pergunta. — Você é alérgica a
camarão, Sadie? — Sinto a provocação da minha mãe em suas
palavras afiadas.
— Não — Sadie responde de forma quase inaudível.
— Não, querida, ela não é alérgica — quem responde é meu
pai. Que estava pronto para se servir, mas abaixa os talheres,
largando-os na mesa novamente. — A Sadie é judia, o camarão não
faz parte da alimentação dela.
Meu pai se levanta rapidamente, arrastando a cadeira no
chão e entra na cozinha apressadamente, todos nós ficamos em
silêncio e minha mãe pede desculpas com os lábios, olhando para a
Sadie. Então ela se vira para sair da sala de jantar e acompanhar
meu pai, que provavelmente está com raiva. Contudo, no momento
em que ela está prestes a atravessar a porta, meu pai cruza por ela,
tentando equilibrar em um braço três caixas de cereais e quatro
tigelas redondas e no outro, um litro de leite e colheres.
— Bom, Sadie, minha outra comida favorita, após o camarão
à provençal, com certeza é um bom cereal com leite. Qual você
prefere? Cheerios, Nescau ou Lucky Charms? — ele pergunta
animado.
— Isso... é... bom... — ela gagueja sem conseguir responder
direito.
— Incrível — tomo a vez. — Eu fico com o Cheerios, pai.
Digo já retirando a caixa e duas tigelas dos seus braços,
ficando com uma e entregando a outra à Sadie, que me olha ainda
sem entender nada. Para falar a verdade, nem eu estou, porém
quero que ela se sinta confortável na minha casa e com a minha
família.
Que porra está acontecendo comigo? Eu nunca apresentei
nenhuma garota aos meus pais e quando isso acontece, mesmo
sendo de mentira, eu quero que tudo seja perfeito. Alguém escaneia
meu cérebro, por favor.
— Gente, isso é incrível e muito... educado da parte de vocês
— ela fala ao coçar a garganta. — Mas vocês não precisam mudar a
refeição apenas por mim ou minha religião.
— Concordo — minha mãe exclama, já se preparando para
se servir do camarão. — Não precisamos mudar nada por conta da
reli...
— Mãe! — repreendo-a.
— Olha a boca, Elliot — ela tenta me advertir, só que não
surge efeito.
— Eu havia te pedido para não fazer nenhum crustáceo e
você fez mesmo assim, então o mínimo que você pode fazer agora
é comer cereal com a gente.
Certo, eu realmente estou estranho, porque eu jamais
desafiei a minha mãe dessa forma, entretanto não me importo e
com isso, refaço a pergunta do meu pai à Sadie.
— Qual você prefere? Cheerios, Nescau ou Lucky Charms?
— Ela me olha com uma sobrancelha levantada e os lábios
fechados em linha reta, eu diria que em choque também, pela forma
como eu falei com minha mãe. — Qual?
— Lucky Charms — responde.
— É todo seu. — Meu pai a entrega a caixa com o cereal e
põe o leite no meio da mesa, afastando a assadeira com o camarão.
— Eu fico com o Nescau, meu preferido.
Realmente é o preferido dele, tanto que ele come como pré-
treino todos os dias antes de ir para a academia. Qual o benefício
que ele acha nisso, eu não sei, mas o cara é fortão.
— Eu como o Cheerios. — Minha mãe faz careta após ver
que eu me servi e pega a caixa das minhas mãos.
Ao final do nosso almoço/café da manhã, onde meu pai fez
questão de manter uma conversa saudável enquanto comíamos e
minha mãe permaneceu com uma cara de quem comeu e não
gostou durante todo o tempo, fazendo careta ao encarar a travessa
do almoço que ela preparou e depois engolir uma colher de cereal,
eu e Sadie nos oferecemos para retirar a mesa. Minha mãe é contra
no começo, porém meu pai a manda relaxar e ela logo o faz, mesmo
que contra a sua vontade, aparentemente.
Eu retiro toda a louça e talheres, Sadie pega as caixas de
cereais e o leite, ela é a primeira a atravessar a porta que divide os
dois cômodos e assim que eu a sigo escuto a conversa sussurrada
dos meus pais.
— Eu realmente me esqueci sobre a questão do camarão. —
Minha mãe parece verdadeira em suas palavras. — Mas eu não vou
perdoá-lo por falar assim comigo por conta dela.
— Ele está apaixonado, meu amor — meu pai a responde. —
Não se esqueça que quando nós dois começamos a namorar você
também desafiava os seus pais, então ele tem a quem puxar.
O que me surpreende não é o meu pai dizer que minha mãe
era capaz de desafiar seus pais e sim, o fato de ele dizer que eu
estou apaixonado.
Eu sei que eu estou completamente estranho na última
semana, só que eu não estaria apaixonado, estaria?! Quer dizer,
tem apenas uma semana que estamos nos aproximando, eu não
sou tão emocionado assim.
Ao menos eu penso que não sou.
Eu tenho pensamentos sujos sobre você
Eles pioram quando estou sem você
Isso significa que vou para o inferno
Ou você está pensando neles também, oh
DIRTY THOUGHTS | CHLOE ADAMS

Eu sou um emocionado ou talvez apenas um lunático.


A questão é que faz somente um mês desde que eu decidi
que seria uma boa ideia começar um namoro falso, eu só não
contava com o fato de que eu iria começar a sentir falta dela todas
as vezes em que ela está longe, nem que iria querer ver ela rindo e
sorrindo. Muito menos imaginaria que os momentos que me trariam
mais felicidade seriam aqueles em que eu a observo ler qualquer
livro e de repente começar a imitar as expressões faciais dos
personagens.
Muito menos pensaria que eu poderia ser capaz de burlar as
regras do time e sair de casa na madrugada mesmo sabendo que
teria treino às cinco da manhã, mas bastou Sadie me enviar uma
mensagem dizendo que estava indo até a arena de corridas há duas
semanas atrás. Grey foi meu grande cúmplice por me levar até lá,
embora isso não tenha evitado a minha raiva quando eu assisti
Trevor praticamente prostituir a sua irmã mais nova, e a troco de
quê?!
Ganhar uma corrida estúpida.
Eu quis me meter. Nossa, quis muito! E assim que vi que um
dos idiotas estava prestes a passar a mão nela, como se ela fosse
apenas um pedaço de carne, decidi me aproximar. Não falei nada,
apenas passei o braço por cima do seu ombro.
“— Elliot — Sadie me chama surpresa. — Eu não sabia que
você viria — murmura entredentes.
— Então é com o pastorzinho Tanner que você decidiu
começar a namorar? — Trevor se aproxima de nós dois,
debochando.
Faço questão de erguer o queixo e encarar seu irmão mais
velho, devolvendo o mesmo ar sarcástico que ele emana enquanto
me encara.
— Por quê? — desafio. — Você tem algo contra o nosso
relacionamento?
— Elliot — Sadie chama a minha atenção. Porém eu não a
olho, continuo travado no contato com Trevor, que dá de ombros
antes de responder.
— Para mim tanto faz — desdenha. — Desde que você não
se meta nos nossos negócios, você pode trepar com ela à vontade.
— O que seriam esses negócios?
— Elliot — Sadie chama outra vez.
Ao invés de lhe responder e lhe dar atenção, decido agir
como um macho alfa e retiro o braço do seu ombro, desfazendo o
nosso contato, seu irmão dá um passo em minha direção e eu faço
o mesmo, ficando frente a frente com ele.
— Se fosse do seu interesse, você saberia. Apenas faça o
favor de não se envolver e tudo fica certo entre nós.
— Isso é uma ameaça? — sugestiono.
— Ninguém aqui está ameaçando ninguém, apenas
avisando. Agora vê se leva minha irmãzinha de volta para o
dormitório em segurança, pastor Tanner.
Ele se afasta de nós e vira as costas enquanto eu o fuzilo
com o olhar. Ele some no meio da multidão que se juntou na pista
após Trevor vencer a última corrida da noite.
— Elliot — Sadie chama outra vez e finalmente eu decido
respondê-la.
— Sim, Watson? — A olho, só que me arrependo no mesmo
instante, pois ela parece bastante chateada.
— O que foi isso? — brada.
— O que foi o quê?! Eu apenas tentei te proteger.
— Eu não preciso de proteção, Elliot.
— Então você simplesmente gosta que seu irmão
praticamente lhe prostitua? — provoco.
Fechei os olhos no segundo em que calei a minha boca, eu
não deveria ter falado isso, pois minhas palavras não são nem um
pouco melhores do que as ações promíscuas de Trevor. Estou super
acostumado a levar bolsadas quando dou uma de criança
malcriada, então aceito se Sadie der um grande tapa na minha cara
agora ou opte por uma joelhada no meio das minhas pernas.
Contudo, nada disso acontece. Logo que abro meus olhos
novamente, ela não está mais na minha frente, olho ao redor,
entretanto não a encontro em canto nenhum. Tento enviar
mensagens e até mesmo ligar, mesmo assim não consigo ter
sucesso em nenhuma das vezes.
Dou total razão a ela por ficar chateada com as minhas
palavras, foram impulsivas e impensadas, eu deveria ter me calado
e apenas escutado, porém ela tem mexido com minha cabeça, com
meu corpo, com tudo o que eu sou.”
Não preciso nem mesmo dizer que ela ficou puta comigo
durante dias, pois os momentos que antecederam a nossa
discussão nós passamos fazendo trocas de livros, indicações,
discussões, além de virar noites e noites em trocas de mensagens e
ligações. Onde em uma delas eu lhe confessei que que queria ser
escritor.
“— Eu jamais escreveria algo em terceira pessoa, acho.
— Por que não? — Sadie pergunta do outro lado da linha.
— Além de não gostar de ler em terceira pessoa, eu não
acredito que os sentimentos repassados por uma voz do além sejam
tão intensos como da primeira pessoa. Sabe?! Quando você lê uma
narrativa em primeira pessoa, você se sente como se fosse o
personagem, você enxerga o que ele enxerga, você pensa o que ele
pensa, mas principalmente você sente tudo o que ele sente —
explico. — E escrever é do mesmo jeito, só que um pouco mais
complexo, por mais a terceira pessoa nos faça de enxergar várias
coisas ao mesmo tempo, a primeira nos faz sentir mais vivos.
Acredito que ler é um ato de amor, mas escrever é doação, pois
quando você escreve, você está doando todos os seus sentimentos
naquela folha de papel.
Quando finalizo a ligação fica em silêncio por alguns
segundos, até eu ouvir uma risadinha de Sadie vinda do outro lado
da linha.
— A forma como você fala sobre envolve tanto amor, que eu
acho que eu seria uma leitora fanática sua.
— É mesmo? — provoco.
— Aham — Sadie murmura —, daquelas que compra os
livros na pré-venda e fica ansiosa aguardando a entrega deles.
Um sorriso brota em meu rosto ao ouvir a animação no seu
tom de voz, pois as únicas pessoas que sabem que eu tenho o
sonho em me profissionalizar como escritor são meus pais, e saber
que alguém, além deles, se sente feliz e não me julga por minha
futura profissão me deixa feliz.
— Mesmo se eu escrevesse sobre autoajuda?
Sei que Sadie odeia livros desse gênero, e mesmo não
estando de frente para ela a vejo fazendo uma careta.
— Você não teria coragem de escrever uma autoajuda, você
tem jeito de que escreveria um romance facilmente.
— Verdade — concordo —, eu poderia muito bem escrever
sobre o dia em que um idiota ficou com medo da mãe e fingiu estar
namorando com uma antiga colega de classe apenas para se livrar
da mãe, mas a garota não concordou de prontidão porque aquela
ideia era no mínimo estúpida.
— Essa com certeza seria uma boa comédia romântica, até
já sinto uma simpatia pela garota.
— Ah, mas ela é também uma megera, inclusive tem uma
grande verruga na ponta do nariz.
— Não tem nada — se contrapõe rapidamente.
— Certo, talvez não uma verruga, mas belas sardas
avermelhadas talvez.
— Idiota — Sadie diz emburrada do outro lado da linha, mas
eu sei que ela está sorrindo assim como eu.”
Mesmo tudo tendo começado apenas com uma mentira, nós
dois nos aproximamos bastante, não havia um momento do dia que
eu não torcia para que ela me mandasse uma mensagem, ou eu
pensava eu mandar uma para ela. Também, todos os dias Sadie e
eu caminhávamos após as aulas até o prédio do dormitório, e nosso
assunto não era apenas sobre livros, as vezes uma fofoca sobre
nossos amigos ou as loucuras da minha mãe.
O fato é que após essa noite ela quase não mantinha contato
comigo, e foram as pequenas coisas da nossa rotina que me fez
sentir falta dela, e do seu cheiro — que é algo extraordinário, todas
as vezes em que estávamos juntos eu dava um jeito de colocá-la
em uma posição em que o vento estivesse favorável apenas para
sentir o seu cheiro doce —. Então me afastar dela por esse tempo,
me fez enxergar o quanto eu sentia a sua falta.
Quando nossos amigos nos perguntavam o que havia
acontecido, ao não nos verem juntos, eu colocava a culpa nos
treinos enquanto ela, dizia que precisava estudar.
Foi preciso eu aparecer na porta do seu alojamento, quase
dez dias depois, com uma cara de gatinho triste que acaba de
rasgar o sofá do dono, carregando em uma mão um copo de café
puro e na outra uma cópia de Trono de Vidro com a nova capa para
que ela enfim olhasse na minha cara e falasse comigo. Dei a
desculpa que minha mãe insistia para que fôssemos à igreja no
domingo e para a minha surpresa total, ela não só concordou como
não decidiu que seria a hora certa de acabar tudo entre nós.
O que confesso, me deixou aliviado.
No entanto, tudo isso me fez perceber que tenho estado
confuso com todos esses novos sentimentos que tenho sentido.
Antes eu tinha ereção apenas por pensar em sua boca, olhar
para ela então, fazia com que eu chegasse ao meu limite. Mas hoje,
eu tenho sentido cada vez mais vontade de saber como que seria se
nós dois nos beijássemos de verdade, porque eu não conto aquela
vez, que a peguei de surpresa no primeiro dia de aula, com um
beijo. E não apenas uma questão de uma ereção, como se eu
tivesse treze anos com os hormônios a flor da pele, é a sensação
que eu tenho todas as vezes em que estamos juntos. É forma como
nos olhamos, e, nos conectamos. Eu jamais imaginaria que iria ficar
tão à mercê dela quando cogitei beijá-la para desviar das intenções
que minha mãe tinha para o meu futuro.
Eu tenho pensado em como seria meu nome saindo dos seus
lábios durante o tempo em que nossas línguas estão cansadas de
tanto se movimentarem uma contra a outra e confesso, mais uma
vez, que a Sadie tem acabado comigo.
Bastou uma mensagem para me desesperar, bastou um
homem querer ter controle sobre ela para me descontrolar e alguns
dias sem nos falarmos para que eu sentisse a sua falta de uma
forma desesperadora, pegando em meu celular de dez em dez
segundos apenas para ter a certeza de que não havia nenhuma
mensagem nova dela.
Depois que saímos da casa dos meus pais, ela disse que
queria pegar algumas coisas em sua casa, por isso eu decidi vir até
a casa dos pais do Axel, que fica em frente à casa da Sadie —
sabendo que ele passou esse fim de semana em Stone Bay para
descobrir que os pais da Heaven estão esperando um menino que
se chamará Zyan —, para pegar alguns conselhos amorosos. Já
que ele é o único cara que eu conheço que namora e está
completamente apaixonado.
Quando toco a campainha sou atendido por uma pequena
humana loirinha, que abre a porta.
— Oi, Elliot — Anya saúda. — O que você está fazendo aqui?
— Ele veio me ver — Axel responde logo atrás da garotinha.
— Isso se chama injustiça, Axel, ele já passa a semana toda
com você. — Ela faz um biquinho triste e volta para dentro de casa.
— Como ela sabe o que significa injustiça? — pergunto assim
que Axel fecha a porta, acompanhando-o até a cozinha.
— Ela é uma criança, não é o Grey, Elliot — responde ao me
entregar uma cerveja. — Agora me fala o que você precisa de tão
urgente que não pôde esperar até amanhã?
Tomo um pouco de ar antes de respondê-lo, porque eu vou
ter que revelar sobre a mentira que Sadie e eu estamos contando no
último mês, porém quando estou pronto para lhe falar a verdade, o
celular de Axel começa a tocar, vejo que na tela há uma foto da
Heaven, o que o faz atender rapidamente.
— Você pode olhar a Anya apenas enquanto resolvo isso
aqui? — pede e eu assinto. — O Elliot está aqui — explica para a
namorada, que está do outro lado da linha e some.
Com isso eu vou até a sala, onde sua irmã mais nova está
sentada no chão, brincando de boneca.
— Merda! — exclamo ao derramar cerveja na minha
camiseta.
— Merda! — Escuto a voz doce da menininha que está na
sala, próxima a mim.
— Você não pode falar palavrão, Anya — repreendo-a.
— Você não pode falar palavrão, Anya — ela cita minhas
mesmas palavras.
— Anya, se o Axel ouvir você falar palavrão ele vai brigar
comigo — tento convencê-la.
— Anya, se o Axel ouvir você falar palavrão ele vai brigar
comigo — a garota de quase cinco anos implica.
— Inferno — murmuro baixinho ao soltar uma lufada de ar,
mas isso não impede Anya de me imitar outra vez.
— Inferno.
— Que porra, Anya, você não pode falar isso — digo
entredentes, olhando seriamente para a criança.
Ela suspende sua boneca no ar, me dando um sorriso, eu
diria que debochado, ao me encarar com uma sobrancelha
levantada.
— Axel, o Elliot está falando palavras feias.
É claro que não tinha momento melhor para ele retornar à
sala de estar se não esse, eu apenas fecho os olhos com força logo
que sinto um grande tapa na lateral da minha cabeça.
— Isso é para você aprender a nunca mais falar palavras
feias na frente de uma criança.
— Não foi por maldade — me defendo e aponto para Anya.
— Eu pedi para ela não me imitar e mesmo assim ela continuou.
Isso dá liberdade para Axel me dar um peteleco na orelha.
— Crianças são como papagaios, Elliot, ela vai seguir tudo o
que vê um adulto fazendo e nesse caso aqui, você é o adulto.
Levanto minhas mãos para cima em rendição, para concordar
com ele, só que não adianta de muita coisa quando cai mais cerveja
em mim.
— Cacete! — xingo novamente.
No instante em que me toco que fiz novamente é tarde
demais, porque meu amigo tem a brilhante ideia de sentar-se ao
meu lado e dar um grande tapa na minha perna. Já vi que se eu
continuar nessa casa por mais tempo, eu vou acabar no hospital
com vários sangramentos internos, porque embora Axel tenha
parado de lutar no armazém, não significa que ele tenha parado de
treinar e nem que tenha ficado fraco, pelo contrário. Sendo assim,
apenas a mão pesada dele, com força em cima da minha perna, já
dói o suficiente.
Enquanto eu faço uma careta de dor, olho para a frente e vejo
que Anya realmente estava debochando de mim esse tempo todo
assim que ela me mostra a língua.
— Ela você não repreende por fazer isso, não é? — Aponto
para ela, encarando Axel.
— Você não quer se comparar com uma criança de quatro
anos, quer? — inquere ao franzir o cenho.
— Tanto faz. — Dou de ombros e finalmente consigo tomar
um gole da cerveja sem derramar nada.
— Agora me fala de uma vez o que está acontecendo — ele
pede, eu coço a garganta e aponto com o queixo para Anya. Eu
estava pensando em ter essa conversa com ele à sós, esse foi outro
motivo pelo qual preferi fazer isso hoje em Stone Bay, do que no
campus, pois sempre estamos rodeados de outras pessoas. —
Relaxa, a Anya sabe guardar segredos.
Olho novamente para a garotinha que parece estar entretida
com suas bonecas, ela veste uma roupa branca e na cabeça tem
uma tiara com um chifre de unicórnio, na saia ultra volumosa que
veste tem um rabo colorido, então decido confiar no Axel.
Afinal, ela tem apenas quatro anos. E por mais que ela seja
mais inteligente do que o Grey e saiba o que significa injustiça, eu
decido confiar que ela jamais contaria a alguém o que eu estou
prestes a falar para o Axel.
— Eu e a Sadie não estamos juntos de verdade — revelo.
— O que?! — Ele praticamente cospe o gole de cerveja em
mim.
Assim, eu o conto tudo sobre o episódio em que minha mãe
me pegou com duas meninas e minha promessa sobre o celibato,
até porque todo mundo sabe que eu não transo e desde quando eu
não o faço. No entanto, eu não sou de ficar contando por aí que eu
tenho medo de Jesus me castigar se por acaso eu fizer sexo antes
do casamento outra vez. Eu cresci dentro da igreja, toda a minha
família tem crenças, desde que me entendo por gente eu entendo
que o sexo é algo sagrado, pois através dele que nasce a família.
Mesmo não acreditando que esse seja o maior pecado do mundo,
eu tenho medo de errar não diante dos meus pais, que me criaram
para ser um exemplo — principalmente a minha mãe —, mas
também tenho receio de estar dessagrando à Deus e tudo aquilo
que eu aprendi ao longo da minha infância e adolescência.
Conto para ele também sobre a Amber e que enxerguei as
intenções da minha mãe de longe, o que faz com que Axel concorde
comigo, porque ele a conhece e sabe, assim como eu, que jamais,
em hipótese alguma, ela seria capaz de me apresentar uma garota
se não houvesse segundas intenções ali. Falo para ele como
convenci a Sadie a assinar o contrato, mas principalmente sobre
todas as minhas dúvidas quanto aos meus sentimentos.
— Então — continuo —, eu queria saber como é se sentir
apaixonado. Sei lá, eu já li bastante sobre isso, só que nunca me
senti assim. Eu sinto falta dela sempre que ela está longe, olho meu
celular inúmeras vezes para ter a certeza de que não tem nenhuma
mensagem não lida dela. Eu tenho feito de tudo para vê-la sorrir
porque eu simplesmente fico hipnotizado todas as vezes em que ela
o faz. E o pior de tudo, eu tentei enfrentar o irmão dela. Eu —
aponto para meu peito —, Elliot, o cara mais de boa de todos,
simplesmente quase arranjou uma briga por conta de uma mulher.
— Primeiramente — Axel finalmente responde. —, esse
negócio de não fazer sexo com medo de que Jesus vá lhe punir é
besteira, se fosse por isso 98% do mundo estaria no inferno.
— Acredite no que você quiser. — Dou de ombros e tomo
outro gole da cerveja.
— De toda forma, eu nunca parei para pensar quando eu me
apaixonei pela Heaven ou como eu sabia disso, porque eu apenas
sabia e por isso eu sou capaz de fazer tudo o que for possível para
ver ela feliz. E se for assim que você se sente, talvez você também
esteja nutrindo algum sentimento real pela Sadie ou pode ser que
sua cabeça maluca esteja confundindo o que é de mentira e o que é
de verdade.
— Pode ser também — digo pensativo.
— Mas diante de tudo o que você me contou, eu quero que
você tenha ciência de que nós somos uma família, a Sadie é da
nossa família também, então o único conselho que tenho a te dar é
que tome cuidado com o que você está fazendo. Por tudo o que
você me contou, eu nem mesmo sabia dessa relação que ela tem
com o irmão, ela já passou e passa por muito, sem contar toda a
carga emocional que ela traz do ano passado e do relacionamento
nunca comentado que ela teve com o Drew, portanto vai com calma,
Elliot, por favor.
Absorvo todas as palavras do Axel e realmente ele tem
razão, a Sadie já passa por muita pressão. Quando se fala do irmão
dela, é notório a forma como ela age na defensiva sempre que ele é
o assunto, ou o Drew e por mais que eu morra de curiosidade para
saber tudo o que aconteceu entre eles, ainda assim, nessas últimas
semanas, eu tenho controlado meu instinto o suficiente para saber
que nada disso é da minha conta.
Porém, tudo o que sei e tudo o que Axel me disse, não
inibem o fato de que eu continuo confuso quanto aos meus
sentimentos.
— Entendeu, Elliot? — reforça.
— Sim, entendi — assinto engolindo em seco, pensando no
que farei e como farei para ser o menos emocionado possível tão
logo estiver ao lado dela de novo.
E falando nela, recebo uma mensagem dizendo que ela já
está pronta para ir embora para o campus. Me despeço de Axel, que
reforça que eu tenho que tomar cuidado com minhas próximas
atitudes, e diz que qualquer coisa eu posso chamá-lo, por mais
ocupado que ele esteja.
Não preciso atravessar a rua para me encontrar com Sadie,
uma vez que ela já parou o carro em frente à casa do Axel, no
momento em que eu entro ela sorri para mim e dá partida. Não
apenas o seu sorriso me quebra e sim, ela por inteiro.
— Acho que finalmente a sua mãe está gostando de mim.
“E eu de você”, penso.
Droga. Eu estou realmente apaixonado, e como eu sei? Eu
simplesmente sei.
Dessa vez
Não preciso de outra mentira perfeita
Não me preocupo se os críticos aparecem de uma só vez
Eu abrirei mão de todos os meus segredos
SECRETS | ONE REPUBLIC

— Ei, o que vamos fazer na sexta? — Grey pergunta ao se


sentar ao meu lado na mesa do refeitório.
Olho para os lados para saber com quem ele falou, porém
vejo que, na realidade, ele está falando comigo, uma vez que me
olha com expectativa e todos os outros estão ocupados. Heaven e
Axel estão estudando enquanto almoçam, Kane está brigando com
Lynnox, Valerie está tendo a sua maquiagem retocada por Wes e eu
estava lendo até o Grey chegar.
— O que tem na sexta? — devolvo, sem saber do que ele
está falando.
— Sexta é o aniversário do Elliot — Colin, o capitão do time,
quem responde ao se aproximar.
— Ah, claro! — Engulo em seco. — O aniversário do Elliot.
Imediatamente busco meu celular na bolsa, para lhe mandar
uma mensagem e perguntar se isso é sério, porque eu sequer sabia
que seu aniversário aconteceria em dois dias, só que paro de
escrever a mensagem no instante em que Grey decide explanar
seus pensamentos em voz alta.
— Por que você não faz uma festa surpresa para ele? — ele
dirige a palavra a mim, animado.
— Festa surpresa para quem? — a pergunta vem de Allie,
que está acompanhada de Colin, os dois se sentam de frente para
mim e Grey, que rapidamente fecha a cara com a presença deles.
Allison está ficando com o capitão e quarterback do time de
futebol há cerca de um mês, desde que houve a confusão no
armazém, a qual eu não presenciei, mas que segundo todos que
estavam presentes e também às marcas, que permaneceram no
rosto do Grey por dias, foi bem intensa. Isso fez com que o clima
entre os irmãos postiços e também entre Grey e Colin se tornasse
completamente hostil. Se antes era um inferno estar no meio das
brigas e discussões de Kane e Lynnox, pior ainda é presenciar a
guerra fria que ocorre entre Grey e Allie.
— Para o Elliot — Wes responde quando termina de passar o
iluminador no rosto de Valerie.
— Eu compro as bebidas — Colin se oferece e de repente,
uma confusão sobre quem leva o que começa.
— Não, eu pago as bebidas — Grey implica.
— Eu levo o lança — Valerie diz.
— Você não vai levar drogas — Kane se mete.
— Quem você pensa que é para dizer o que ela vai fazer ou
não? — Lynnox desafia ele e dessa forma eles iniciam uma
discussão entre eles, novamente.
— O Axel pode fazer o bolo — é a vez de Heaven.
— Eu não sei fazer bolo, linda, apenas lasanha — Axel
responde por si.
— Eu posso fazer brownie e colocar chantilly em cima — Allie
se solidariza.
Mais sugestões surgem em um arco de um minuto, até o
momento em que Wes decide levantar a voz.
— Quem afinal está organizando esse aniversário?
— A Sadie — todos, menos eu, respondem em uníssono.
— Eu? — pergunto assustada.
— Claro, você é a namorada dele — Grey explica.
— Mas quem deu a ideia foi você — retruco.
— Eu disse que você deveria dar uma festa para ele — ele se
esquiva —, e você concordou.
— Eu nem mesmo tive a oportunidade de responder — me
defendo.
— Afinal, vai ter festa ou não?! — Valerie pergunta.
Olho para todos os meus amigos, que me fitam com
expectativa. Como eu vou simplesmente organizar um aniversário
para o meu namorado de mentirinha em dois dias? Várias
interrogações surgem na minha cabeça, que está a ponto de
explodir a qualquer momento. De todos os olhares, o que contém
mais esperança é o de Grey, que fixa seus olhos amendoados em
mim como se eu fosse o seu ursinho de pelúcia favorito.
— Está bem, vai ter festa — todos se animam. — Mas,
apenas para os íntimos. Entendeu, Grey? — ele assente. — Pode
ser na fraternidade? — pergunto a Colin e ele imediatamente
concorda. — Ótimo! Sendo assim, você e o Grey ficarão
responsáveis pelas bebidas. — Grey faz careta, porém eu não me
importo. — Juntos. — Wes fica com a decoração, Valerie nada de
drogas, por favor, o bolo fica por conta do casal. — Aponto para
Axel e Heaven. — O Elliot não gosta muito de bolo de chocolate,
então tirando isso vocês podem encomendar ou fazer qualquer
coisa.
O que é verdade, descobri isso no domingo passado quando
a mãe dele preparou dois bolos diferentes no último almoço que
tivemos com seus pais, um com muito chocolate e outro simples
com calda de açúcar e aquilo simplesmente o satisfez. Em
contrapartida, no almoço não precisamos nos alimentar novamente
de cereal, confesso que na primeira vez, assim que seu pai abriu
mão de um dos seus pratos favoritos, me fez sentir notada como
nunca antes.
Até mesmo Margaret, que eu jurei que iria me odiar ao
extremo e que aprontou aquilo tudo na primeira vez, não cometeu o
mesmo erro dessa última vez, ela pediu para que seu marido me
ligasse perguntando qual era meu doce preferido. Mesmo que a
pergunta não tenha partido diretamente da mamãe Tanner, eu senti
que no fundo ela realmente está se esforçando para me conhecer
melhor.
O que me deixou chateada por nada disso ser verdade,
porque mesmo com todas as suas peculiaridades, a mãe de Elliot
consegue ser uma mulher extremamente intensa e interessante.
Quer dizer, não somente a questão da sua mãe estar parecendo me
aceitar, como também o fato de que o seu pai me fez sentir
confortável em uma situação totalmente incômoda.
Era como se, naquele momento, eu fosse parte de algo,
como se eu fosse respeitada apenas por ser eu mesma. Não que eu
siga todas as normas da minha religião à risca, mas isso não mudou
a intenção por trás do ato de Robert e sempre que eu lembro da sua
compaixão, imediatamente fico triste por nada disso ser verdade,
até mesmo me passa pela cabeça se ele ficará chateado se um dia
chegar a descobrir que tudo não passou de uma encenação.
Contudo, mesmo que nada seja real, em alguns momentos
me pareceu que o Elliot queria ou sentiu que fosse. Prova disso foi a
forma como ele reagiu quando ficou frente a frente com meu irmão,
devo admitir que, momentaneamente, fiquei com raiva dele e
consegui fazer com que Trevor me deixasse no alojamento naquela
noite. Entretanto, após deitar minha cabeça no travesseiro, me
arrependi da forma como o deixei sozinho sendo na realidade ele só
queria me ajudar.
Eu sei que suas intenções foram completamente
impensadas, mas além disso, elas também foram benevolentes e
por conta da minha reação quanto a elas, eu passei dias sem
coragem de olhá-lo e pedir desculpas por ter me afastado dele ou
não ter sequer dito um simples “oi” em todas as oportunidades que
nos surgiram. No entanto, Elliot soube como contornar a situação e
agora estamos bem.
É como se nada do que aconteceu naquela noite tenha
realmente tido importância, e mesmo que o nosso relacionamento
seja inteiramente falso, acredito que a nossa amizade não seja.
Ainda que eu sinta um frio na barriga todas as vezes em que meu
celular vibra, indicando uma nova mensagem dele ou que minha
pele formigue todas as vezes em que nós nos tocamos
minimamente, não altera o fato de que talvez, hoje, Elliot Tanner
seja aquilo que eu posso chamar de melhor amigo. Embora eu
acredite que eu tenha nutrido alguns sentimentos a mais por ele
além da amizade, eu não quero ser precipitada, e mesmo se houver
qualquer faísca entre nós, eu jamais poderia levar adiante qualquer
coisa entre nós.
Portanto, eu não estou organizando apenas uma festa para o
meu namorado de mentirinha, estou organizando também uma festa
para a pessoa que tem dado atenção não só a mim, mas a todos os
meus gostos e quereres, que compartilha do mesmo amor e vício
pela literatura e que mesmo quando estamos juntos e nos falta
assunto e alguma tensão sexual acontece dentro do meu corpo,
continua sendo confortável para mim. Mais confortável do que com
qualquer outra pessoa que eu já tive o prazer de compartilhar um
mesmo cômodo.
Após indicar como cada um deverá ajudar na festa, Wes me
fita com desdém e pergunta:
— E você, o que vai fazer?
— Eu sou a namorada, eu vou distrair.
— Isso aqui é a elite. — Grey põe as mãos nos meus
ombros, me sacudindo. — Bate aqui! — Ele levanta uma mão no
alto e eu bato, fazendo um highfive, mesmo sem entender o que
diabos ele quis dizer com isso.
— Então vocês dois estão... — Heaven sugere.
— O que?! — pergunto atônita.
— Eu pensava que o Elliot ainda estava respeitando o
celibato — Allie denota.
— E ele está — digo. — Nós não... — Hesito por um
momento. — Não estamos fazendo nada.
— O que é novidade para você né, querida, você sempre
gostou de sentar em todo tipo de homem — Wes ataca novamente
e eu reviro os olhos. — Altos, baixos, atletas, nerds, loiros, morenos,
solteiros, comprometidos...
— Chega! — Aponto para ele, rosnando.
Eu sei que o Wes me odeia desde o que houve com o Drew e
embora eu tenha abaixado demais minha cabeça para o que
aconteceu, em uma coisa a terapia está sendo boa para mim, está
me ajudando a não deixar pisarem em mim novamente. Seja um
Drew da vida, querendo me ameaçar ou um Wes, que usa toda e
qualquer oportunidade para me julgar.
— Bom, se ela senta ou não senta no Elliot eu não sei, só
que quem está perdendo é ela, afinal, até mesmo eu gostaria de
sentar nele — Valerie diz ao verificar suas unhas.
— Espera só até a Amber saber disso — Lynnox diz.
Ah, fofoca novíssima, Valerie está ficando com a mesma
garota que a mãe do Elliot tentou apresentar a ele no primeiro dia,
porém tudo escondido, para que ninguém da família dela saiba. Por
isso quando eu soube, na realidade peguei as duas se agarrando na
sala do meu dormitório — porque sim, a Valerie tem uma chave
dele mesmo não morando comigo e a Lynnox —, a Amber me fez
prometer que não contaria nada ao Elliot para que assim não
chegasse nos ouvidos da mãe dele e automaticamente a informação
fosse parar nas mãos do pastor Kennedy.
De toda forma, Valerie zomba de Lynnox e manda um
tchauzinho para Amber, que está do outro lado do refeitório
juntamente das outras líderes de torcida da faculdade, onde era
para elas duas estarem, já que agora ambas fazem parte das
cheers, entretanto assim como os meninos, que jogam futebol e não
se sentam na mesa com todos os outros atletas, elas preferem
sentar conosco em todos os almoços.
Enfim, tem rolado muita coisa por aqui ultimamente, o que só
tem instigado cada vez mais o Elliot nas fofocas sobre as pessoas
ao nosso redor.
E por falar nele, todos nós ficamos em silêncio no momento
em que ele finalmente chega na mesa, porém ele não se senta.
Apenas me fita e diz:
— Nós podemos conversar lá fora? — Grey se levanta antes
de mim. — Sozinhos... — Elliot deixa subentendido para o amigo ao
me olhar e ele rapidamente volta a sentar.
— Ah, é... claro! — respondo ao recolher minhas coisas e
colocar tudo dentro da bolsa.
Lynnox se oferece para colocar o restante do meu almoço no
lixo e eu agradeço. Assim que estou pronta, me despeço do restante
do pessoal e todos, assim como eu, não fazem nenhum comentário
sobre a festa de aniversário que acabamos de planejar, diante da
aparição repentina de Elliot.
Então eu o sigo até o lado de fora do refeitório onde alguns
alunos entram e saem do prédio. Vejo que Elliot parece nervoso,
passando as mãos pelos fios de seus cabelos várias vezes e
imediatamente decido perguntar.
— O que aconteceu? — Ele fixa seu olhar no meu,
apreensivo.
Eu não obtenho uma resposta imediata de Elliot, ele apenas
me encara, como se ele estivesse me pedindo um enorme favor
apenas com os olhos. Sei disso porque é exatamente a mesma
forma com que Trevor sempre me olha quando ele está
desesperado por adrenalina, sei que está longe de Elliot ser o meu
irmão ou agir igual a ele, no entanto é notória a dor que tem em
seus olhos, a apreensão, o nervosismo.
Posso não conhecer ele a fundo, mas sei que algo está o
perturbando no momento em que ele morde seu lábio inferior com
força e começa a negar com a cabeça.
Minha próxima ação é completamente impensada, eu apenas
faço aquilo que eu gostaria que fizessem comigo caso eu estivesse
tão desesperada quanto ele, eu o abraço.
Demoram alguns segundos para que ele retribua meu ato,
pois ele fica estático no lugar enquanto eu mantenho o abraço e
nossos corpos juntos. Contudo, tão logo ele o faz, ele me aperta
como se eu fosse a única coisa sólida no mundo, como se tudo ao
seu redor não passasse de uma ilusão e eu fosse tudo o que o
mantém são. Seu corpo tremula contra o meu e eu acaricio a sua
nuca, como uma forma de conforto, pois acredito que é tudo o que
ele precisa agora.
Dessa vez eu não sei disso por conta do meu irmão, eu sei
disso por mim, porque eu nunca tive a quem me agarrar assim, por
isso me afundei nos livros. Eu transformei os papéis amarelados em
extratores de dor, todas as vezes em que eu precisei chorar, eu li
um romance triste para poder colocar a culpa das lágrimas nele,
quando precisei gritar também, e nas muitas vezes em que precisei
ser feliz e me apaixonar, eu o fiz com todos os personagens
literários.
No segundo em que o corpo de Elliot para de tremer e eu
consigo sentir que ele está ficando estável outra vez, eu não
desfaço o nosso enlace instantaneamente, apenas o pergunto:
— Você quer sair daqui?
De novo ele não responde, entretanto se afasta de mim
apenas para pegar minha mão, então juntos e de mãos dadas,
caminhamos por cerca de vinte minutos, até estarmos fora do polo
universitário.
Quando chegamos em um outlet, um centro comercial com
várias lojas, o que é o mais próximo de um shopping que temos
perto do campus, nos sentamos em frente a uma fonte de água que
tem ali. Semelhante ao primeiro domingo em que viajamos a Stone
Bay, para irmos à igreja, Elliot está calado e reflexivo, e eu não
quero pressioná-lo, assim como não quis da última vez.
Ele tira uma moeda do bolso e joga na fonte, assim que
finalmente as primeiras palavras saem da sua boca:
— Meu primo sofreu um acidente de carro.
Em um primeiro momento franzo o cenho, sem conseguir
entender suas palavras, mas tão logo elas se tornam
compreensíveis para mim, arregalo os olhos.
— Meu Deus! — exclamo. — Ele está bem?
— Ele perdeu os movimentos das pernas — informa, o que
me deixa ainda mais consternada.
— Ele está podendo receber visitas? — inquiro preocupada,
já disposta a levá-lo até lá.
— Foi há quatro anos— ele responde ao entrelaçar suas
mãos e me olhar. — Eu estava no volante — explica. — Foi apenas
dois dias após eu ter tirado minha carteira de motorista, era o
aniversário de vinte anos de casamento dos pais dele, como ainda
faltava um ano para ele fazer dezesseis anos e poder dirigir, eu quis
me vangloriar porque eu já podia e ele não.
Ele pausa por um momento assim que a primeira lágrima
desce pelo meu rosto ao ouvir o seu relato e finalmente me dou
conta de que eu estava certa quando o pedi para dirigir naquela
manhã e ele rapidamente se negou, ficando nervoso.
— Ele me desafiou a acelerar mais — continua ao tomar um
pouco de ar. — E eu fiz, ele disse que eu não tinha coragem de
competir com o carro que estava ao nosso lado enquanto o sinal
estava vermelho, mas eu ri, porque naquele instante achei aquilo
ridículo. — Sorriu triste, ao recordar. — Então eu buzinei e um
homem de cerca de trinta anos desceu a janela, quando ele o fez eu
acelerei, ainda com o carro em neutro, imediatamente ele entendeu
e fez o mesmo. Assim que o sinal ficou verde eu acelerei e o
homem também. Nós percorremos cerca de quatro milhas,
estávamos praticamente lado a lado, até que em um sinal amarelo,
eu quis frear, só que o Jason disse que eu não podia perder e
naquele segundo, eu realmente não podia, era uma questão de
orgulho... para nós dois.
“Mesmo sabendo que o sinal ficaria vermelho em milésimos,
eu acelerei. O motor roncou, ele não vai aguentar, pensei. No
entanto, não foi o motor que me fez parar, mas sim o outro carro, de
alguma forma ele perdeu o controle quando estava um pouco mais à
frente, começou a girar pela rodovia, o Jason gritava para eu frear,
contudo eu me confundi, meus pés me engaram, eu tentei pisar no
freio e ao invés disso meu pé afundou no acelerador, minhas mãos
suavam, minha cabeça rodava, eu não sabia o que fazer, eu não
sabia como agir, entretanto meus pés continuavam firmes no pedal,
até o momento em que a lateral do carro bateu contra um poste. Eu
estava usando o cinto, então o máximo que senti foi o impacto do
airbag contra meu peito, quase me asfixiando, quando finalmente
consegui retomar o ar e o airbag esvaziou, o Jason não estava mais
sentado no banco do carona, seu corpo havia ultrapassado o para-
brisas e ele estava de bruços no capô do carro, sangue
extremamente vermelho manchava toda a lataria branca do carro.
Naquele momento, eu só conseguia pensar que eu havia matado o
meu primo, todavia o pior mesmo foi descobrir, vinte e quatro horas
depois, que eu o havia condenado a uma vida miserável.”
— Elliot — o chamo, desolada.
Ele me encara, porém tão logo as suas íris verdes escuras se
põem em direção a mim eu não sei o que lhe dizer, eu não sei como
agir, sequer sei o que pensar.
Em questão de minutos, toda a maneira como eu via Elliot
mudou. Eu não estou o culpando pelo que aconteceu, muito pelo
contrário, eu estou sentida por ele, que ao longo dos anos carregou
consigo um fardo que nem de longe foi sua culpa e mesmo assim,
todos os dias, tem um sorriso brilhante no rosto.
Mesmo diante de uma infelicidade como essa, ele consegue
ser luz, ele consegue brilhar por onde passa, pois não há um lugar
no mundo que seja escuro quando Elliot Tanner se faz presente. Eu
não sei se eu conseguiria suportar se algo assim acontecesse
comigo, há dias em que nem mesmo consigo sair de baixo das
cobertas pelo tanto que sei, passei e menti. Imagina o Elliot...
— Muito fodido, não é? — indaga triste.
— Não — nego rapidamente. —, você não é fodido. E
absolutamente nada do que aconteceu com você ou com o seu
primo é sua culpa. O que aconteceu com o outro motorista?
— Ele fugiu...
— A culpa não é sua, Elliot — repito, dessa vez com mais
convicção.
— Muito obrigado por me dizer isso, mas não é verdade. Eu
me sinto sujo, porque mesmo que eu não tenha o matado, minhas
mãos estarão para sempre manchadas com o sangue dele.
— Como ele está hoje?
— Ele está bem... — Hesita. — Eu acho. Aquela foi a última
vez que o vi pessoalmente, eu nunca tive coragem de entrar no
quarto dele no hospital, não fui forte o suficiente para ver o estrago
que havia feito em sua vida, na dos seus pais. Aquele foi o último
aniversário de casamento deles, poucos meses depois eles se
separaram, minha mãe disse que a relação deles havia esfriado, só
que no fundo eu sempre soube que foi culpa minha também. Eu
destruí uma família inteira.
— Você não fez isso, Elliot — afirmo outra vez. — Há muitas
coisas na nossa vida que não têm explicação, elas apenas
acontecem, seja por amor ou por dor, elas acontecem por uma única
razão, talvez não entendamos de imediato o que há por trás de
tantas coisas que acontecem na nossa vida, porém uma coisa é
certa, tudo o que vem só nos deixa uma lição. Nada é em vão, se
não é benção, é lição.
— Engraçado. — Ele ri. — Meu pai sempre costuma dizer
isso.
Esbarro em seu ombro e sorrio.
— E tenho certeza, que assim como eu, ele também sabe
que você não é o culpado.
— Isso mesmo, mas ele é meu pai, quem mais me defenderia
senão ele? — questiona ao arquear a sobrancelha.
— Sei lá... sua mãe — arrisco. — O Grey?
— Ele não sabe disso — revela, me deixando surpresa. —
Fora a minha família, você é a primeira a saber de tudo o que
aconteceu.
— Por quê? — inquiro, pois se o Grey, aquele que ele está
sempre colado e até mesmo dorme junto quando viajam para jogos
fora, não sabe, porque logo eu teria que saber disso e ele não?
— Minha tia está vindo para a cidade...
— Hum — murmuro.
— Com o Jason — prossegue.
— Essa vai ser a primeira vez que você o verá desde o
acidente, certo?!
Elliot concorda ao assentir.
— E por acaso minha mãe mencionou sobre o nosso
relacionamento, e agora quer nós dois em um jantar que ela vai
fazer na sexta.
— Na sexta? — pergunto, me lembrando do aniversário que
estava sendo planejado até sua chegada no refeitório.
— Meu aniversário — explica.
Solto um suspiro seguida de um “ah”, eu deveria encontrar
uma desculpa para mantê-lo ocupado na sexta, entretanto eu não
imaginava que seria com algo tão... doloroso dessa forma.
— Tudo bem — respondo.
— Você não precisa ir — responde rapidamente. — Eu posso
dizer que você está com enxaqueca ou sei lá... menstruada?! — diz
confuso.
— Embora sua mãe vá adorar saber que eu não estou
grávida, ela vai odiar saber que você conhece meu ciclo menstrual.
Ademais, eu acredito que você não iria me contar tudo isso se não
quisesse minha presença lá, iria?
— Não — responde.
— Eu vou estar lá com você. Eu quero estar lá com você,
Elliot.
— Muito obrigado, Watson — agradece ao colocar sua mão
sobre a palma da minha, que está encostada na minha coxa.
— É para isso que as namoradas de mentira servem,
Sherlock — respondo ao apertar nossas mãos.
Eu sorrio e Elliot sorri, iluminando tudo ao seu redor.
Porque às vezes eu olho nos olhos dela
E é aí que eu encontro um vislumbre de nós
E eu tento me apaixonar pelo toque dela
GLIMPSE OF US | JOJI

Eu nunca havia compartilhado a minha dor com alguém


antes, Sadie foi a primeira a escutar o motivo pelo qual eu estou
sempre de carona e nunca no controle. Às vezes eles pensam que é
apenas porque eu bebo muito, o que seria prudente da minha parte,
só que a realidade é mais pesada do que uma garrafa de vodka.
A forma como ela me abraçou, não só fisicamente, mas
compreendendo o que eu sentia, conseguiu aliviar um porcento da
minha dor.
Os outros noventa e nove porcento está sentado à mesa de
frente para mim.
Confesso que vir à minha casa hoje foi, pela primeira vez,
sufocante. Eu não sabia como agir, o que falar ou o que fazer
quando visse o Jason, porém eu não precisei fazer nada, pois ele o
fez. No momento em que eu desci do carro, com Sadie abrindo a
porta para mim e segurando a minha mão, a porta foi aberta por ele.
O garoto loiro e de olhos castanhos estava ali, feliz. Assim
como ele estava na manhã do acidente que esmagou sua coluna,
com o mesmo sorriso que ele exibia enquanto tirava fotos com os
pais, comemorando o casamento deles, que hoje não existe mais.
Por um instante eu paralisei, entretanto, seu sorriso era genuíno e
forma como ele acenava para mim era animada.
“— Vai lá! — Sadie me incentivou, soltando minha mão.
— Eu acho melhor a gente ir embora — sussurrei para que
apenas ela escutasse.
— Parece que não vai adiantar de muita coisa. — Ela aponta.
Quando eu olho na direção em que o dedo da ruiva está
estendido, noto que Jason está a menos de um metro de nós dois.
— Você não está pensando em fugir, está? — brinca.
— Claro que não — nego imediatamente tão logo ele se
aproxima ainda mais e me puxa.
— Então senta no colo do papai.”
E dessa forma, um tanto quanto anormal para algumas
pessoas, mas completamente normal para nós dois, ao menos
como éramos quando adolescentes, as coisas se tornaram o que
eram. Jason realmente me pôs em seu colo e nos abraçamos. Não
preciso nem comentar o grito de espanto que minha mãe deu assim
que viu a cena, o que fez Sadie rir baixinho e ela escutar do Jason
um:
— Não é nada que ele não esteja acostumado.
O que a deixou ainda mais horrorizada, mandando a Sadie
dar um jeito em mim ou ela mesma faria isso. A Sadie
imediatamente entrou na brincadeira, dizendo:
— Infelizmente eu não possuo nenhuma bolsa da Hérmes,
senhora Tanner. — Deu de ombros.
— Gostei dela — Jason sussurrou no meu ouvido quando
desci do seu colo e fomos rumo à entrada da minha casa.
Agora estamos sentados à mesa de jantar. Dessa vez minha
mãe não foi a responsável pela comida e sim meu pai, que fez
questão de preparar hamburguers com vários tipos de molhos, visto
que é a minha comida favorita. Ele também tentou fazer um bolo, o
que não deu muito certo, por isso minha mãe encomendou um na
padaria da mãe do Wes, bolo de baunilha com recheio de frutas
vermelhas.
Então minha mãe anuncia:
— Hora dos presentes! — diz ela, já tirando uma caixa
debaixo da mesa, como faz todos os anos.
— Como assim presentes? — meu pai pergunta, pois como
de costume, todos os anos ele esquece de comprar algo, em função
disso minha mãe tira debaixo da mesa outra caixa um pouco menor.
— Abre primeiro o maior — minha mãe pede, animada.
— Você comprou os dois, mãe — implico.
— Mas o maior é meu — insiste.
Assim eu o faço. Ao rasgar o embrulho azul escuro encontro
um box com os livros de Game Of Thrones, todos em capa de
couro, dentro de uma caixa de madeira. Admirado, retiro A Fúria dos
Reis, passando a mão sobre a capa.
— Isso é perfeito, mãe, muito obrigado — digo, sem ao
menos olhar para ela, ainda admirando o exemplar em minhas
mãos.
— Agora abre o do seu pai, você também vai amar — pede,
um pouco menos animada, porém o suficiente para que eu consiga
guardar com cuidado o outro presente.
— E você ganhou um... — meu pai diz animado, tentando
entender o que minha mãe comprou enquanto eu rasgo o papel. —
Uma máquina fotográfica, é isso aí!
Ao retirá-la da caixa, a ligo e aponto na direção da minha
mãe, com o flash ligado tiro uma foto dela, que saí com uma careta,
mostro a foto ao meu pai e em seguida à Sadie e Jason, que riem,
pois um olho dela ficou aberto e o outro fechado e a boca aberta
pelo seu grito.
— Obrigado, pai. — Damos um soco na mão um do outro
com a mão fechada. — Mãe — sussurro e ela volta a sorrir.
Após minha tia me presentear com um escapulário, é a vez
da Sadie falar:
— Eu também tenho algo, mas... — Ela olha para o meu pai
com expectativa. — É muito pesado para mim.
— Entendi.
Os dois se levantam da mesa e vão até lá fora, eu faço o
gesto de me levantar para acompanhá-los, só que minha mãe
aponta o dedo para mim, mandando eu voltar a sentar e eu o faço,
ela apoia o queixo com as mãos e sorri, satisfeita.
Quando meu pai retorna com Sadie, eles não vão para a sala
de jantar e sim me chamam lá na sala, “embrulhado” com um laço
verde escuro, que se parece bastante com a cor dos meus olhos, eu
encontro uma máquina de escrever manual Olivetti Linea 98. Nesse
momento eu não me importo com os costumes, regras, educação ou
bolsadas que minha mãe queira me dar, eu apenas corro em
direção a ela, pois se eu pensava que os presentes de antes eram
bons, esse é perfeito.
Insinuo que estou escrevendo algo na mesma, o toque é
macio ao passo o clique é duro. Passando as mãos pela
extremidade da máquina, olho para Sadie, que está com um sorriso
estampado no rosto, um o qual eu nunca havia visto antes, ela está
esplêndida.
— Um dia você me disse por ligação que ler é um ato de
amor...
— E escrever é doação — completo ao me levantar e abraçá-
la.
— Você já ama o mundo inteiro, Elliot Tanner, está na hora de
se doar a ele — diz à medida que nos desfazemos do abraço.
Não quero apenas dizer um simples “obrigado”, como fiz com
todos os outros presentes que recebi, quero beijá-la, sentir o seu
gosto, tê-la para mim e lhe confessar que ela tem me deixado
maluco, só que eu prometi não fazer nada disso, pois por mais que
eu sinta essa necessidade extrema de estar com ela e confessar
essa paixão que vem me arrebatando, penso também em minha
conversa com o Axel e ele estava certo em me dizer para ir com
calma, eu não posso chegar para uma garota, que está mentindo
por mim, e declarar que estou me apaixonando por ela, quando ela
me enxerga apenas como um amigo.
Mesmo que eu queira que não seja assim, é. E eu não posso
ir contra os sentimentos dela para que os meus se sobressaiam.
— Hmhum... — Alguém coça a garganta e eu me desfaço do
abraço com Sadie, que agora está com as maçãs do rosto
vermelhas, acredito que por vergonha da minha família. — Desculpa
atrapalhar o momento casal, porém agora chegou a minha vez —
Jason anuncia. — Você pode me acompanhar até a garagem,
priminho? — pergunta e eu assinto. — Apenas você.
Olho para meus pais, minha tia e Sadie e todos concordam
de prontidão, eu não faço a mínima ideia do que o Jason quer
comigo na garagem, eu apenas faço o que me pede, ele lidera o
caminho na cadeira de rodas e eu o sigo.
Ao chegarmos na garagem, ele pede para que eu ligue a luz
e eu o faço. Antes que ele possa falar qualquer coisa eu digo
imediatamente:
— Não!
— Você pode me escutar pelo menos? — reclama e ainda
assim eu nego. — Elliot, não me faça chamar sua mãe para te dar
uma bolsada — ameaça.
— Eu não posso fazer isso, eu já sei o que você quer e não
vai ter.
— Sabe mesmo? — desafia.
— Sei, você quer que eu dirija o Camaro do vovô — falo,
apontando para o carro que está na garagem dos meus pais há
anos.
— Você é tão idiota — debocha. — Quando foi a última vez
que esse carro ganhou vida, Elliot?
— Sei lá — Dou de ombros. —, uns quinze anos? — arrisco.
— Mesmo assim minha resposta é não, eu não vou dirigir ele. Nem
vem.
— Pelo visto você não vai dirigir ele, nem nenhum outro carro
— comenta infeliz. — Cara, você tem que parar de se culpar por
isso ou você acha que eu sou estúpido? A última vez que nos
virmos foi no dia do acidente, durante o acidente. Eu sei que você
carrega uma culpa com você por algo que não foi sua culpa.
— Foi sim — digo firme. — Olha o que eu fiz com você.
— O que?! Eu me tornar paraplégico? — Ri. — Eu já estaria
fadado a isso de toda forma, Elliot, Deus nunca faz algo na nossa
vida que seja em vão.
— Se não é benção, é lição — dizemos juntos.
— Seu pai sempre diz isso e é verdade. — Ele se aproxima
do carro, passando a mão pela lataria. — Antes do vovô falecer, ele
sempre dizia que esse carro seria nosso e que dividiríamos ele,
como tudo que dividimos ao longo dos anos, só que então ele parou
de funcionar, o vovô até tentou arrumar, porém logo foi descoberto o
tumor no cérebro dele e ficou por isso mesmo. No entanto, nós dois
prometemos consertar o carro, encher ele de garotas durante a
faculdade e sair apostando corridas por aí.
Eu também me aproximo do Camaro 69 preto e noto o sorriso
nostálgico no rosto do meu primo.
— Eu até poderia dirigi-lo, adaptar e tudo mais, mas isso iria
estragar toda a beleza interior dele. Entretanto, eu pude consertá-lo.
— Suas palavras fazem com que eu o encare e quando o faço,
Jason me estende as chaves. — Eu consertei e você vai dirigir.
— Eu não posso — me nego outra vez.
— Você pode não fazer agora, tudo bem, eu entendo.
Contudo, ele é seu e um dia eu quero que você vá até a minha
casa, leve a ruivinha e se ela tiver um irmão eu estou disposto a
pegar ele. — Sorri.
— Irmão? — indago surpreso.
— Muitas coisas podem mudar em quatro anos, Elliot e
digamos que eu descobri que eu sempre fui assim. — Dá de
ombros. — Você vai pegar essas malditas chaves ou não?
Um sorriso se expande em meu rosto, porém eu não pego as
chaves de imediato e sim abraço o meu primo, um abraço bem
apertado, acredito que o mais apertado que eu já dei em toda minha
vida, é bom estar com ele novamente.
— Você é feliz? — pergunto ao me desfazer do abraço.
— Eu sou feliz e espero que você também seja. — Estende a
chave de novo e eu a encaro com os olhos brilhando, a admiração
me domina, não apenas por ter a chave do carro dos meus sonhos
em minhas mãos, mas também por saber que meu primo é feliz e
ver isso em seu rosto, apesar de tudo.
Hoje eu cheguei na casa dos meus pais pensando que seria
uma noite horrível, que não conseguiria olhar na cara do Jason,
pensei que o ver sentado em uma cadeira de rodas iria me destruir,
no entanto não foi isso o que aconteceu. Eu me culpei por muito
tempo, eu ainda me culpo, mesmo que ele e todos insistam que
nada daquilo é realmente minha culpa e sim do outro motorista, que
provocou o acidente e depois fugiu, todavia eu estava no controle da
direção, eu deveria ter negado quando o Jason me desafiou, eu
deveria ter parado assim que vi que o sinal ficaria vermelho.
E mesmo assim eu fui teimoso, eu fui lá e acelerei aquele
carro. Eu fodi a vida dele e mesmo que me falem um milhão de
vezes que eu não tenho culpa, eu ainda vou me culpar e eu ainda
não me sinto pronto para pegar na direção de um carro, ao menos
não por hora.
— Você sabe que eu não vou conseguir fazer isso agora,
certo?!
— O que importa é você fazer — Jason responde. — Agora
pega a ruivinha e dá o fora daqui, bundão.
Jason sai da garagem, me deixando sozinho com o carro.
Menos de dois minutos depois Sadie entra, tomando o lugar dele ao
meu lado.
— Uau! — Aprecia o carro. — É um carro e tanto...
Bem que eu posso levar em consideração o conselho do meu
primo e dar o fora daqui nele, não é mesmo?!
— Por que não voltamos para a minha festa surpresa nele?
— sugiro ao franzir o cenho.
— Grey?! — Sadie revira os olhos.
— Quem mais poderia ser? De qualquer forma eu vou fingir
surpresa, mas você — aponto para ela, jogando a chave e ela a
pega — dirige.

Após nos despedirmos da minha família e eu falar que a


Sadie iria trazer o carro de volta e obviamente minha mãe não ter
gostado muito da ideia, meu pai concordou e mandou ela relaxar,
dizendo que pela manhã mandaria alguém deixar o carro dela no
campus.
— Qual o conceito de vocês de “só para os íntimos”? —
pergunto ao fazer aspas com as mãos enquanto Sadie tenta
encontrar uma vaga para estacionar em frente à fraternidade.
Eu nunca a vi assim, mas ao que parece, ela está com raiva,
já que a veia da sua têmpora pulsa com força.
— O meu conceito de íntimos é: apenas aqueles que
almoçam com a gente todos os dias, porém acho que “íntimos” para
o Grey significa todas as universidades da América — diz
entredentes quando finalmente encontra uma vaga em frente à
garagem.
Ao que parece, a vaga na qual Sadie deixa o Camaro, foi
deixada ali estrategicamente para nós, uma vez que Grey e Colin
saem da garagem segurando uma faixa de dois metros escrita
“Parabéns, Lionel”, o que me faz rir, porque esse não é o meu
nome, e o que faz Sadie murmurar com raiva:
— Eu nunca mais peço ao Grey para fazer nada. — Isso me
deixa ainda mais feliz, me fazendo gargalhar. — Qual a graça? —
pergunta ao descermos do carro, emburrada.
— Você fica uma gracinha com raiva, Watson — explico ao
fechar a porta do carro.
No segundo seguinte sou atingido por vários papéis confete,
que são jogados por bombas que Axel, Heaven, Kane, Lynnox, Wes
e Valerie seguram, enquanto Allie carrega em seu colo um bolo
maior do que ela. Literalmente maior do que ela, porque a garota
tem um metro e meio e o bolo deve ter dois, visto que quase não
vejo sua cabeça.
— Surpresa! — todos gritam juntos.
— Eu não acredito que vocês fizeram isso. — Coloco a mão
no coração, tentando ao máximo parecer surpreso.
— Grey! — eles gritam indignados, porque com certeza eu
não me saí bem nisso.
— Não o culpem — tento defender meu amigo. — Esse tanto
de carro na rua e a uma faixa escrita “Lionel” deixou bem claro que
haveria uma festa aqui.
— E você acha que foi quem que trouxe esse tanto de gente
para cá? — pergunta Wes, com raiva também.
— E a faixa com o nome errado? — Heaven continua.
— Não falem assim do meu bebê — defendo ele novamente,
que larga a faixa fazendo beicinho e corre para os meus braços.
Assim que o corpo do Grey tromba com o meu, eu quase caio
para trás, mas me mantenho firme no chão. Ele fala no meu ouvido
que me ama inúmeras vezes enquanto rodopiamos abraçados, ele
só me solta quando percebe o que está ao meu lado.
— Ei, esse não é o carro que vive na sua garagem, é? —
pergunta incrédulo ao segurar meus ombros. — Isso é demais. —
Me solta e entra no carro imediatamente.
Todos os meus amigos se aproximam de mim, me abraçando
e fazendo suas felicitações, já Sadie começa a discutir com Wes
sobre o que aconteceu. Pelo pouco que escuto e entendo, ele
deveria ter ficado no posto da decoração e com isso, a faixa seria de
sua responsabilidade, porém ele entregou nas mãos do Grey de
última hora e por não encontrarem ninguém que pudesse fazer uma,
apenas pegaram uma que acharam no shopping e trouxeram.
— Ei, está tudo bem? — pergunto, me postando ao lado de
Sadie.
— Eles me convenceram a te dar uma festa surpresa, só que
olha o que isso se tornou. — Ela gesticula com as mãos, pronta
para continuar a falar, mas eu a interrompo.
— Watson — chamo.
— Sim? — Ela me olha.
— Está tudo perfeito. — Ela me olha consternada e eu solto
um meio sorriso para ela, querendo dizer que ela também está
perfeita. Porque antes de virmos para fraternidade ela quis passar
no dormitório e trocar de roupa.
Substituiu o vestido branco, que usava durante o jantar com
meus pais, por uma calça preta colada, que encaixa perfeitamente
em sua bunda, eu nunca fui de notar bundas, contudo a dela está
incrível nessa calça. Também veste um top vermelho por baixo de
uma blusa preta rendada, além de uma bota de salto fino. Os
cabelos, que mais cedo estavam presos, agora estão soltos em
cachos e a boca rosa, agora está vermelha.
O vermelho mais lindo que já vi na minha vida.
Nossos olhares fixados acabam mais rápido do que de
costume, pois somos interrompidos quando Allie grita:
— Alguém pode por favor me ajudar com esse bolo, ele está
pesado.
No instante seguinte Colin corre para ajudá-la, porém ele não
foi o único, Grey também vai em sua direção e um quase acidente
acontece. Allie cambaleia com o impacto dos dois homens, por sorte
Kane a segura por trás e Axel consegue tomar o bolo de sua mão.
Antes que uma confusão generalizada comece, sugiro:
— Que tal entrarmos, bebermos algo e depois cantarmos
parabéns para partirmos o bolo? Alguém comprou as bebidas,
certo? — me certifico quando todos me olham.
— Eu comprei a cerveja — Colin informa.
— Eu comprei o Jack Daniel’s — Grey provoca.
— Eu trouxe a vodka. — Heaven mostra a garrafa na sua
mão e eu faço questão de tomá-la para mim.
Não só porque eu quero beber, mas por quê...
— Não se mistura você — aponto para ela —, bebida — ergo
a garrafa — e um carro juntos. — Aponto para o Camaro.
— Vai à merda. — Heaven me mostra o dedo do meio e logo
é repreendida pelo seu namorado.
Dessa forma, eu abro a garrafa e tomo um grande gole da
bebida transparente, que desce ardendo na minha garganta, e uma
felicidade genuína toma conta de mim, o que já é normal. No
entanto, ela aumenta quando encaro a minha namorada me
admirando.
— Vai um gole? — ofereço.
— Por que não? — Dá de ombros e abre a boca, eu entorno
o gargalo da garrafa em sua boca, assim que ela toma seu gole e
retorna o olhar para mim, um sorriso estampa seus lábios
vermelhos. — Agora eu sei o porquê você ama tanto beber direto da
garrafa.
— O sabor é bem melhor, não é?
— Com certeza.
Ela sorri outra vez e faz o meu coração disparar, eu pego a
sua mão e no momento em que olho para frente vejo que Axel está
nos observando, então ele olha para nossas mãos entrelaçadas e
em seguida olha de mim para Sadie, soltando um quase sorriso,
logo Heaven o agarra pelo braço e eles dois entram na casa.
Sigo os passos dos meus amigos e faço o mesmo, com
Sadie em meu encalço.
Ao entrar em casa sou atingido por várias pessoas me
parabenizando, algumas me chamam para tirar uma foto e eu faço,
permanecendo de mãos dadas com Sadie e a puxando em todas as
fotos. Pensando que algo pode estar sendo estranho para ela,
sussurro em seu ouvido que tudo vai para o Instagram e vão me
marcar, e que minha mãe também tem uma conta. Porém, sou
surpreendido quando ela me responde que não há problema algum
nisso.
Depois de inúmeras fotos com outras pessoas, as quais
algumas, além de um feliz aniversário pediram para trazermos o
nacional de volta para Stout esse ano, visto que no ano passado,
durante o jogo final, ficamos desfalcados pela saída do Axel e
também porque todo o time estava completamente abalado pelos
últimos acontecimentos, como a morte do Drew, então perdermos o
jogo de lavada. Contudo, essa temporada será diferente, mesmo
que o Axel nos faça uma falta imensa, ainda acredito que
poderemos ganhar esse ano.
Algumas meninas também me puxam, duas até quase me
beijam, mas ao virar o rosto para elas, o máximo que conseguiram
foi um selinho no canto da boca. Com a primeira, notei que Sadie
revirou os olhos ao ver a situação, enquanto com a segunda, ela fez
uma cara de nojo, franzindo o nariz, o que me gerou uma boa
risada, seguida de um beijo na ponta do seu nariz.
O que não só a surpreendeu, como também me surpreendeu,
uma vez que eu agi como se nós dois realmente estivéssemos
juntos. Para descontrair a emoção do momento, eu a peguei pela
mão e a girei, insinuando que deveríamos dançar e assim fizemos.
Durante aqueles minutos de uma dança sensual ao som de
The Weeknd e mais alguns goles de vodka, eu vi algo que há muito
tempo não via na Sadie. Na realidade, eu nunca havia notado o
quão espontânea ela era nas danças durante as festas que
aconteciam em nossa época da escola, até não vê-la dançando por
mais de um ano e assisti-la se soltar novamente. Depois de tanto
tempo, é algo que me consome por completo a ponto de eu colocar
as mãos em seus quadris e deixá-la liderar os movimentos,
acompanhando-a.
Minha cabeça, em algum momento, se encaixa no vão do seu
pescoço e eu sinto seu cheiro doce de baunilha e morango invadir
minhas vias aéreas e em um puro instinto, eu beijo o seu pescoço,
logo abaixo da sua orelha. Não sei se ela foi capaz de sentir todos
os pelos do meu corpo se eriçarem, mas espero que isso também
tenha acontecido com ela, no instante seguinte, ela se vira para
mim, pondo as suas mãos ao redor do meu pescoço.
Ela ri docemente e eu a acompanho, me curvo minimamente
para ficarmos no mesmo patamar de altura e então nossas testas se
encostam.
Sinto a necessidade de fazer algo que tenho sentido vontade
desde a noite em que peguei Valerie a beijando no meu quarto, que
é tomar a sua boca para mim. Sei que já nos beijamos uma vez,
contudo não quero que seja algo de surpresa, sem emoção alguma
além do desconforto, como foi da primeira vez e também não quero
que seja como se eu estivesse beijando uma garota qualquer
apenas por beijar, como fiz no ano passado inteiro.
Quero que ela me sinta ali com ela, quero que sejamos um
só, quero que ela seja tão minha como eu sou dela.
Com nossas testas coladas, o mundo inteiro parece parar ao
nosso redor, nem ao menos sei qual a música que está tocando no
instante em que meus olhos encaram a luxúria dos seus, por isso o
próximo passo é encostar os nossos narizes, seguidos dos olhos
que se fecham e quando finalmente nossos lábios se encostam,
todo o momento mágico se vai, pois um grande coro começa a
cantar parabéns.
Abro os olhos e encaro Sadie, que está com o rosto quase
todo enrubescido, ela não me olha, seus olhos fitam primeiro o chão
e logo que desfazemos nosso enlace, ela começa a bater palmas e
cantar, assim como todas as outras pessoas ao nosso redor. Ela
leva seus olhos até Grey e Colin, que trazem o mesmo bolo que lá
fora era carregado por Allie, eles colocam o bolo em uma mesa na
minha frente, quando o canto termina.
Com as velas ainda acessas, todos ficam em silêncio e eu
faço menção de assoprá-las.
Contudo, a chance se vai tão logo alguém, ao fundo, começa
a bater palmas grosseiramente, então, assim como as demais
pessoas ao meu redor, procuro de onde as palmas veem, até que
no meio da multidão, a cabeça ruiva de Trevor aparece.
— Feliz aniversário, cunhadinho. — Ele sorri sádico para
mim.
— Trevor — Sadie diz, confusa.
— O que você está fazendo aqui? — essa pergunta surge de
mim.
Há dias eu não o via, para falar a verdade a última vez foi na
arena, onde ele supostamente me ameaçou, o que eu não levei
muito a sério, porque se tivesse, eu não estaria me aproximando
dele nesse momento e por sorte, eu não estou sozinho, uma vez
que meus amigos me acompanham.
— Nada que seja da sua conta, cunhado — debocha em
resposta.
— O que você está fazendo aqui, Trevor? — a pergunta
agora vem de Sadie e dessa vez tem uma resposta.
— Aqui está ela — admira sua irmã. — Era com você mesmo
que eu queria falar — diz ele. — Estou precisando de um favor.
— Ela não vai — me meto, entrando no meio dos dois.
— E quem é você para dizer que ela não vai? — ele desafia.
— Sou o namorado dela — digo firmemente.
— E desde quando você manda nela? — sugere ao arquear
a sobrancelha.
Então eu olho para Sadie, que alterna o olhar entre Trevor e
eu.
— Por favor, não vai — digo entre os lábios quando ela dirige
o olhar a mim.
— Vamos logo, Sady — a chama carinhosamente e ela o
olha em pura consternação.
— Watson... — a chamo e ela entorta a cabeça para mim,
triste.
Assim que ela se põe ao lado de Trevor, eu a puxo pelo braço
delicadamente.
— Por favor — peço sussurrando.
— Olha só, pastorzinho — Trevor esbraveja. — Eu estou
perdendo tempo com você, então ou você a larga de uma vez por
todas ou você compete comigo.
Eu fixo meu olhar no Trevor, confuso, por que eu iria competir
com ele? Ele está louco, só pode!
No entanto, percebo que quem está louco mesmo é o Grey,
que responde ao fundo:
— Ele compete com você.
E todos ao redor aplaudem, animados com a ideia. Quando
Grey se posta ao meu lado, eu o puxo pela gola da camisa.
— Você está louco? — pergunto, quase ao ponto de colocar
as mãos em torno do pescoço do meu amigo.
— Você vai deixá-lo continuar prostituindo a sua garota? —
Grey me desafia.
Ele fala baixo, apenas para que eu posso ouvi-lo. Ao nosso
redor as pessoas começam a fazer planos sobre a corrida e com
Grey não é diferente.
— E então, pastor? — Trevor chama, mas eu não o olho,
continuo encarando Grey.
— Você tem uma máquina lá fora, agora, nesse momento,
esperando por você para ganhar essa corrida e se você ganhar,
pode dizer a ele que jamais a Sadie pisará lá outra vez, se é para
agirmos como homens das cavernas, que o façamos.
— Pastor Tanner — Trevor me chama, cantando.
— Eu não posso, Grey — digo para ele, completamente
assustado.
Eu não pego em um volante há anos, talvez nem mesmo
reconheça em qual marcha o carro está. Sem contar todo o pânico
que toma conta de mim só de pensar em colocar meus pés em um
acelerador outra vez, por mais que meu primo tenha consertado o
carro, me dado as chaves e ter insistido que a culpa não é minha,
não será em duas horas que eu simplesmente vou fingir que nada
aconteceu, que os últimos anos não existiram e que a culpa não
tomou e nem toma conta de mim até hoje.
Claro que o Grey não entende o pânico que eu estou
sentindo no momento enquanto minhas mãos suam segurando a
sua camisa, ele nem mesmo desconfia sobre o acidente e os
resultados dele. Ele apenas pensa que o mundo é colorido e esse
tempo todo eu não dirigi por não ter um carro, quando na realidade
eu o tive, porém me faltava a coragem de me sentar atrás do
volante e pilotá-lo.
— Qual é, cara. Passamos o verão inteiro assistindo a essas
corridas, você sabe exatamente o que fazer — ele tem razão —,
mas se você acha que não, não faça isso por você — Grey continua
—, faça por ela. — Aponta com o queixo para Sadie, que agora está
ao nosso lado.
— Eu não posso — repito novamente.
O pânico toma, cada vez mais, conta de mim. Sei que há
poucos minutos disse internamente o quão apaixonado eu estou por
ela, o quanto eu quero demonstrar isso e desejo que ela sinta
também. Entretanto, algumas coisas sempre serão mais fortes do
que eu.
E é isso que Sadie faz quando surpreende não só a mim,
como a todos ao nosso redor, até mesmo o seu irmão.
— Mas eu posso — diz ela. — Eu corro por você.
Insano, por dentro, o perigo me deixa louco
Não consigo evitar, tenho segredos que não posso dizer
Eu amo o cheiro da gasolina
PLAY WITH FIRE | SAM TINNESZ

Dizer que eu sei o que estou fazendo é um eufemismo, prova


disso é meu irmão aumentar o tom de voz, após ter me ouvido dizer
que eu correrei no lugar do Elliot.
— Você não vai fazer porra nenhuma, Sadie! Quem vai correr
é ele! — Trevor aponta para Elliot, se aproximando.
Separando os corpos de Elliot e Grey, eu dou um passo para
frente, erguendo o queixo como muitas vezes fiz ao desafiar Trevor
e esperando fielmente que eu consiga manter essa carcaça dura,
afirmo:
— O Elliot não vai correr, quem vai sou eu.
— Nem fodendo — Trevor se nega outra vez.
— Por quê? Você tem medo de perder? — pergunto ao
cruzar os braços por cima do peito.
— Para você? — desdenha. — Medo de perder para você?
— Ri cínico.
— Tem? — desafio.
— Eu não gosto quando você fica afrontosa, Sadie —
declara, rangendo os dentes.
— Você tem medo de perder para mim, Trevor? — pergunto
outra vez, não me intimidando com a sua raiva aparente.
— Não — murmura, fazendo uma careta.
— Eu não ouvi bem — debocho, apenas para que ele fale
mais alto e assim ele o faz.
— Não, eu não tenho.
— Ótimo! Então a última corrida da noite será feita por nós
dois, irmãozinho.
Eu não sei de onde surgiu essa minha coragem súbita, pode
ter sido causada pela bebida, pela dança com Elliot ou até mesmo
pelo nosso recente quase beijo, porém eu até que estou gostando e
prefiro que ela permaneça comigo na próxima hora, pois eu não
estou a fim de perder para o meu irmão. Não depois de ele ter me
usado por tanto tempo e ainda ter quisto me humilhar em um
momento em que eu estava me sentindo plena, feliz e completa.
Com certeza Trevor não tinha esse direito.
Ele também não tem o direito de chegar aqui e simplesmente
desafiar o Elliot e o medo dele nessa corrida, certo que meu irmão
não faz ideia dos traumas e da culpa que ele carrega, mas eu
jamais deixaria Elliot entrar em um carro e competir em um racha de
carros depois de tudo o que aconteceu com ele.
— Nos vemos na arena então — Trevor diz em um sorriso
sádico ao dar as costas.
Contudo, eu seria louca se deixasse isso acontecer e mais
louca ainda se eu não impusesse nenhuma condição nessa
competição.
— Se você vencer — falo um pouco mais alto, ganhando a
sua atenção e fazendo-o estacionar o passo. — Eu vou com você
para todas as suas corridas sem dizer um ai.
— Sadie, não — Elliot pede, olho de relance para ele e me
volto para Trevor outra vez.
— Mas se eu vencer — digo para os dois. —, você nunca
mais vai aparecer e me obrigar a ir para aquela arena, entendeu? —
pergunto ao franzir o cenho.
Trevor me avalia por alguns segundos, em seguida ele olha
para Elliot, que está ao meu lado e nega com a cabeça duas vezes,
fazendo com que eu me torne apreensiva de novo e começo a
morder minha bochecha, só que não por muito tempo, pois ele
responde:
— Combinado.
— Você está falando sério? — pergunto surpresa, porque é
obvio que eu esperava que ele fosse contra mim no instante em que
eu calasse minha boca.
— Claro. — Dá de ombros. — Eu sei que você não vai
ganhar.
— É isso que vamos ver — a resposta surge atrás de mim,
vinda de Lynnox.
— Ela vai amassar você — Allie continua.
— E depois queimar seu carro — agora é a vez da Heaven.
Todas se põem ao meu lado, seguidas também de Wes, que
finaliza:
— A vadia vai ganhar a corrida, porque ela é minha vadia.
E seguindo a minha postura, todos eles cruzam os braços.
Trevor olha para cima, rindo e antes de sair, diz:
— Nos vemos em uma hora então.
— Em uma... — Coço a garganta. — Em uma hora. — Dessa
vez minha voz sai firme e ele se vai.
Quando ele já está fora de vista e todos os presentes na festa
começam a esvaziar a fraternidade, provavelmente para irem à
corrida, Kane pergunta, se postando à minha frente.
— Você consegue fazer isso, não é?
— Claro que ela consegue — Wes me defende. — Ela é rata
de corrida.
— Eu não sabia que eu precisava enfrentar o meu irmão para
você ficar do meu lado. — Faço uma careta para ele.
— Você continua sendo uma grande vaca — retruca, porém,
sinto o humor em sua voz.
— É, eu sei. — Rio.
Após minha resposta, sinto a presença de Elliot ao meu lado,
que faz um gesto com a cabeça e nos afastamos dos nossos
amigos.
— Você sabe que você não precisa fazer isso, certo?! —
Assinto. — E por que vai?
— Porque eu conheço Trevor o suficiente para saber que ele
não sairia daqui sem um adversário — sou sincera — e eu nunca
iria deixar você ser o saco de pancadas dele sendo que eu já fui por
muito tempo.
— Sadie...
— Eu sei o que estou fazendo, Elliot — garanto a ele antes
de pigarrear. — No entanto, eu preciso de um favor seu.
— É todo seu — diz, estendendo a chave do seu carro.
No caminho que fizemos da sua casa de volta ao campus,
conversamos sobre o motor do carro e eu acabei lhe dizendo que
entendia um pouco disso, afinal, sempre que eu estava perto de
Trevor, eu o escutava falar sobre carros, sobre corridas, motores,
potências, embora eu sempre estivesse lendo algum livro ou com a
cara no celular, eu conseguia escutá-lo bem.
Durante a minha conversa com Elliot, ele também disse que
quando mais novo sonhava em correr, então ele e o primo sempre
disseram que aquele seria o carro ideal e já era deles.
Uma parte que ficou fora do assunto é que por muitas vezes
eu fiquei ao lado do meu irmão ou dos seus adversários durante as
corridas, então de certa forma, eu conhecia bem a pista, além de
saber teoricamente como correr nela.
— Você acha que eu consigo? — pergunto, curvando a
cabeça e analisando as chaves quando as pego.
— Ei! — Elliot levanta meu queixo, fixando nossos olhares. —
Você sabe o que está fazendo — repete minhas palavras de
segundos atrás. — Eu perguntei se você tinha certeza justamente
por isso, no pouco tempo em que estamos “teoricamente” juntos eu
tenho percebido sua confusão, uma hora você tem certeza de algo,
na outra muda completamente de ideia. Você tem que aprender a
confiar mais em você, Watson. — Um meio sorriso se abre ao me
chamar pelo apelido. — Porque eu confio em você de todas as
formas.
— Confia mesmo? — pergunto apreensiva.
— Eu preciso fazer o quê para que você acredite em mim?
Me diz. Eu faço!
Um sorriso se espalha no meu rosto, porque, definitivamente,
Elliot Tanner não precisa fazer absolutamente nada para que eu
acredite nele e ele sabe bem disso. Contudo, antes que eu possa
responder e dizer que eu confio em sua palavra, somos
interrompidos por um Grey animado, que nos abraça
repentinamente.
— Desculpa atrapalhar o momento casal, mas nós temos
uma corrida para fazer.
— Então... — Elliot me fita com expectativa.
— É hora de correr — digo ao agitar as chaves nas minhas
mãos.
Após sairmos da fraternidade, levou cerca de meia hora para
que chegássemos à arena.
Diferentemente das tantas outras vezes em que vim até aqui,
eu não fiquei para trás em um local estratégico, eu entrei
diretamente na pista, com Elliot no carona e Grey no banco de trás,
acompanhado de Lynnox e Wes.
Confesso que em partes Tanner tem razão em dizer como
minhas opiniões oscilam. A verdade é que muitas das vezes a
ansiedade toma conta de mim, mesmo eu sabendo que o que estou
fazendo é certo, minha mente consegue me levar a inúmeras
possibilidades para que aquilo dê errado e vice-versa.
Eu vivo me autossabotando e isso acontece há tanto tempo,
que eu nem mesmo me lembro ao certo quando começou. Todos
sempre enxergaram a Sadie que ficava com vários garotos, a que
nunca abaixava a cabeça, só que jamais tiveram a oportunidade de
conhecer a outra Sadie, a que vive em minha cabeça dizendo a todo
momento “isso não vai dar certo”, “isso está errado”, “você não é o
suficiente”, “desiste, jamais você será capaz de conseguir isso”. E
tantos outros pensamentos e questionamentos.
Todos os meus amigos se animaram hoje, porque eles
sempre encararam a Sadie que enfrenta o irmão mais velho que
sempre a usou. Eles conhecem apenas a Sadie que está sempre de
queixo erguido, jamais conheceram a Sadie que vive com vários
demônios na sua cabeça.
É como se eu vivesse com uma dupla identidade, como se
existissem duas de mim que outras pessoas nunca viram ou
ouviram. Até o Elliot chegar...
— Você não vai desistir — garante ele assim que me vê
encarando o meu irmão.
Trevor me lança seu sorriso mais convencido e seu olhar
mais ardiloso, fazendo com que um suor fino desça no centro das
minhas costas.
— Não, não vou — garanto sem tirar os olhos do meu irmão.
— Watson... — Elliot me chama, tirando a minha atenção de
Trevor.
— Sim?
— Você vai ganhar essa corrida, não por você e muito menos
por mim.
— O quê?! — pergunto atônita.
— Você vai ganhar pelo seu irmão.
— Ok, agora você está me deixando ainda mais confusa.
Elliot ri.
— É isso mesmo que você ouviu, você vai ganhar pelo seu
irmão. Para que assim ele possa lhe respeitar como a mulher foda
que você é e pare de lhe usar, para que ele enxergue que você
merece algo melhor do que ser só um objeto para que ele consiga
ganhar as coisas. — Elliot levanta uma mão, quando me vê abrindo
a boca, me impedindo de falar. — Eu não sei como é essa
comunidade irmãos, afinal, eu sou filho único, também não faço a
mínima ideia do que você passou ou passa com seu irmão. No
entanto, eu sei o suficiente para saber que você não precisa
proteger ou acobertar ele, Trevor já é grande o bastante e se ele for
bom de verdade no que ele diz que é, ele não precisa de um plano
B, C ou Z. Agora pode falar.
— Eu só ia dizer que você tinha razão — digo.
— Ata.
— Ata — debocho, lhe imitando.
Ao invés de responder qualquer coisa, Elliot sorri para mim,
me olhando da mesma forma que fez durante a nossa dança e
também quando me ajudou a fechar o vestido na primeira vez em
que fomos à igreja e almoçar com seus pais.
É normal que apenas um olhar e um sorriso provoquem
batidas completamente erráticas no meu coração? Quer dizer, eu
nunca me senti assim antes com qualquer outro que já tenha ficado
em anos, pois até então, todos os meus parceiros sexuais foram
apenas por uma questão de controle. Eu pensava que indo para a
cama com quem eu quisesse, quando quisesse, eu estaria no
controle de algo. E agora, estando frente a frente com Elliot, eu não
tenho controle de nada.
Às vezes, pela forma como ele age, sinto que ele também
não tem controle.
Principalmente nos momentos em que sua respiração fica
entrecortada, como agora. Sempre que passamos muito tempo
calados ou então, nos olhando por muito tempo, a nossa respiração
começa a falhar.
Contudo, ela retorna rapidamente tão logo Mark se põe ao
nosso lado.
— E aí, ruiva. Vai dar a largada hoje? — pergunta ele, já
estendendo o pano vermelho para mim e passando o braço por
cima do meu ombro.
— Não — Elliot responde por mim. — Eu que vou. — E
simples assim, ele toma o tecido das mãos do Mark e em seguida
me agarra pela cintura, me colocando ao seu lado.
Meus olhos se arregalam pela sua ação ao invés de eu dar
um pulo de susto, como normalmente acontece, quando ele junta
nossos corpos. Embora o que me surpreenda mais é que eu acabei
gostando da forma como ele agiu.
— Espero que isso seja brincadeira. — Mark ri ao fazer uma
careta.
— Não é. — Nego com a cabeça.
— Seu irmão não vai gostar nada disso — Mark tenta avisar.
— Ele não te disse que hoje a adversária dele sou eu? —
indago surpresa, pois eu sei que Trevor já deveria ter comunicado a
todos sobre nossa aposta, uma vez que ele acha que está vencido.
Eu também acho, mas isso não vem ao caso agora.
— Isso quer dizer que... teremos um Lansgter versus
Langster, hoje? — Mark aponta para mim e para Trevor, que se
encontra mais à frente com um sorriso sádico.
— É isso mesmo — confirmo.
— Pode balançar essa bandeira com gosto. — Mark aponta
para Elliot. — Hoje eu vou fazer muito dinheiro. — Ele sai saltitando,
animado.
Com o carro já estacionado no grid de largada, Elliot pega a
minha mão com a sua, que está desocupada, e juntos caminhamos
até onde Mark está, em seu pequeno palanque ele segura vários
papéis e inúmeras notas de cem dólares. Observo várias pessoas
fazerem suas apostas, inclusive nossos amigos.
— Eu nunca fiz apostas antes — confessa Lynnox animada,
segurando seu comprovante.
— Mentira sua — acusa Kane. — Em Hastings, todas as
vezes em que eu lutava no hangar, você apostava no meu
adversário.
— E eu sempre perdia meu dinheiro — ela concorda, rindo.
— Mas dessa vez eu vou ganhar.
— Eu também apostei — Heaven anuncia, gritando. — Você
tem que colocar fogo nessa pista. — Ela aponta para mim.
— Pode deixar — respondo.
— Ninguém vai colocar fogo em nada aqui — Axel avisa,
depois percebo seus olhos estreitarem ao ver que estou com a mão
entrelaçada na de Elliot.
Impressão minha ou ele desconfia de algo?
Decido que preciso conversar sobre isso com Elliot mais
tarde, porque agora, Mark pega seu megafone para anunciar a
última corrida da noite.
— Senhoras e senhores, vamos agora a tão aguardada
competição pela qual vocês esperaram a noite inteira. — Ele faz o
uso do seu texto tradicional de todas as últimas corridas. — Em seu
Dodge Charge 70, Trevor Langster. — Ao contrário da maioria das
vezes, Trevor é pouco ovacionado. — Ele irá competir contra nada
mais, nada menos que a nossa bandeirinha favorita e também sua
irmã, Sadie Langster, que pilota um Camaro 69. — Com isso, o
público, que hoje é formado pela maioria das pessoas que estavam
na festa de Elliot, grita e aplaude, fazendo com que meu rosto
esquente.
— Acho que chegou a minha hora — sussurro para que
somente Elliot possa ouvir.
— A nossa hora — emenda ele.
E assim nos despedimos dos nossos amigos, que se
posicionam ao lado da pista na arquibancada improvisada.
Ao chegarmos no ponto em que eu preciso soltar a mão de
Elliot, e ele sabendo disso, aperta a minha com ainda mais força,
nos olhamos por breves dois segundos e vejo a confiança em seu
olhar. Mesmo que no momento em que a gente se separe eu sinta
minha mão suar de nervoso e rapidamente eu a entrelace com a
outra que estava livre, eu caminho rumo ao seu carro.
Claramente eu não ando com a mesma confiança de Trevor,
porém, destemida o bastante para que no instante em que ele
chegue em seu carro, ele fixe seu olhar em mim uma última vez
antes de balançar sua cabeça em negativa.
Decido por não revidar nem falar nada, apenas entro no
carro.
Me posicionando no banco do motorista, primeiramente eu
passo o cinto e depois giro a chave na ignição, enquanto do outro
lado da pista escuto o motor do Dodge do meu irmão ganhar vida à
medida que ele acelera.
Com meu pé esquerdo tremendo, faço o mesmo.
Minha mente estagna por alguns segundos, a claridade
invade minha vista e eu tento ao máximo me lembrar o que eu devo
fazer a seguir, tomando consciência de que enfrentar o meu irmão
ou qualquer outra pessoa, é um plano terrível.
Em uma escala de zero a dez, quão covarde eu seria se
fingisse um desmaio agora?
Acredito que menos um.
Meus olhos focam no centro da pista a poucos metros de
distância, vejo Elliot fazer sinal de positivo com as duas mãos para
mim, então lembro das suas palavras há pouco, quando ele me
disse que enxergava a minha confusão, porque eu sou exatamente
isso, uma confusão, um embaralhado de pensamentos e ações, que
talvez ninguém nunca consiga alinhar da forma correta.
Entretanto, Elliot confia em mim e meus amigos, que
apostaram em mim, também.
E em um primeiro momento, logo que eu disse que seria
capaz de fazer parte dessa corrida, eu também confiei. É isso que
eu preciso fazer, confiar que eu sou capaz, não só de enfrentar meu
irmão, como também sou capaz de vencê-lo.
Ao ligar o som do carro Play With Fire começa a tocar.
Eu disse que sabia o que eu estava fazendo e eu sei.
Por isso que, no segundo seguinte, meus pés e minhas mãos
ganham vida própria, como se fizessem isso há bastante tempo, e
não apenas fizessem parte da plateia.
Enquanto piso no acelerador, também faço jogo de luz. À
frente, Elliot ergue sua mão e começa a fazer a contagem de cinco
segundos, que eu sou tão acostumada a fazer, descendo um dedo
de cada vez até que fique só um.
— Cinco... quatro... três... dois... — Ele hesita por poucos
segundos e eu piso na embreagem, passando a marcha. — Um. —
Juntamente com o último dedo abaixado, a bandeira vermelha, que
ele segurava, também vai ao chão e com isso, meu pé esquerdo
solta a embreagem ao passo que o direito pisa no acelerador.
Em questão de milésimos, já estou com os pés na
embreagem novamente, apenas passando as marchas e
acelerando, eu não sei ao certo quão na frente estou de Trevor, se
ele está do meu lado ou colado em mim, pois meus olhos
concentram-se apenas no que veem à minha frente. Por isso, que
na primeira curva eu desacelero e piso no freio para fazê-la, em um
declive mais à frente faço o mesmo, enquanto na terceira curva, que
é mais aberta, eu sigo na mesma velocidade. Vendo que durante os
próximos segundos estarei em uma linha reta, opto por acelerar
ainda mais.
O motor recém-consertado por Jason ruge sob meus pés no
instante em que eu completo a primeira volta, permitindo-me pela
primeira vez, olhar no retrovisor. Consigo ver que o Dodge se
encontra na minha cola, com isso, realizando o mesmo percurso da
primeira volta, opto por fazer a mesma estratégia de acelerações e
passamentos de marchas, para que eu possa me acostumar à pista
e poder arriscar melhor na terceira volta.
Contudo, meu plano não se torna bem-sucedido quando, ao
terminar a segunda volta, vejo Trevor me ultrapassar. Dessa vez
estando atrás do meu irmão, o sigo durante toda a terceira volta.
Na quarta ele continua mais à frente, no entanto, eu decido
arriscar e passar para o outro lado da pista, o que me dá uma
abertura maior na primeira curva, me economizando tempo e assim
não preciso desacelerar tanto quanto nas últimas voltas. Repito o
processo nas próximas curvas e acelero ao encontrar o aclive que
fica após a segunda curva.
Ao passarmos pela linha de chegada, Trevor e eu estamos
lado a lado.
É estranho, porém eu sinto que seus olhos estão em mim
nesse momento, entretanto eu não me atrevo a olhar para ele, a
música do carro toca freneticamente e a areia da pista sobe quando,
ainda lado a lado, Trevor e eu aceleramos. Nós continuamos
empatados até a terceira curva, quando no momento em que reduzo
a marcha para terceira, eu acelero, ganhando força no motor e
passando as próximas marchas cada vez mais rápido, em questão
de segundos eu fico na frente de Trevor outra vez.
Olhando no retrovisor, consigo enxergar que ele me segue na
última curva, mas ao reduzir a marcha para a quarta, imediatamente
quando faço a curva, eu decido pular da quinta para a sexta marcha.
Mesmo sabendo que isso pode esquentar o motor, eu decido
arriscar, pois a adrenalina está tomando conta de todo o meu corpo.
O Camaro de Elliot ganha ainda mais força na sexta marcha
e meu pé piso fundo no acelerador assim que eu o vejo a cerca de
duzentos metros de distância, balançando a bandeira quadriculada.
Quanto mais perto eu vou chegando, mais nítido o seu sorriso se
torna, seus cabelos balançam com o vento tão logo eu passo ao seu
lado e pisando na embreagem juntamente do freio, eu estaciono o
carro e puxo o freio de mão.
Apoiando ambas as mãos no volante do carro, inspiro
fortemente, tentando raciocinar o que acaba de acontecer. Será que
tudo isso foi tudo verdade ou eu estou apenas enlouquecendo? Eu
realmente acabei de fazer parte de uma corrida e não só isso, eu
acabei de ganhar ela?
Eu ganhei do meu irmão? Aquele que sempre ganha todas as
corridas, aquele que me usa para ganhar a maior parte delas, que
desde os meus doze anos me usa para pensarem que ele é o
melhor em tudo o que ele faz, é sério isso? Ou eu estou ficando
maluca?
Quem sabe seja apenas um sonho.
Noto que não é um sonho no instante em que a porta do
motorista é aberta por Elliot, que ainda segura a bandeirinha em sua
mão, porém ele me oferece a outra no momento em que, com um
sorriso no rosto, eu pergunto:
— Eu ganhei?
— Você ganhou! — afirma.
O sorriso no meu rosto se torna ainda mais amplo e
consequentemente, eu pego a mão estendida de Elliot, primeiro
coloco um pé para fora e quando coloco o outro, rapidamente me
ponho de pé, soltando a mão de Elliot e colocando ambas em seu
peito. O sorriso em seu rosto é tão amplo quanto o meu, mostrando
que ele não está apenas feliz, mas também orgulhoso.
Eu nunca havia visto alguém direcionar esse olhar para mim,
sinto um braço de Elliot contornar minha cintura ao passo que uma
mão vai até minha nuca, segurando-a.
Se eu disser que nunca pensei em beijar Elliot antes, eu
estarei mentindo, pois esse pensamento rodeou a minha cabeça na
noite em que eu o vi gozando enquanto Valerie tinha seus dedos
dentro de mim, a forma como ele suspirava me fazia estremecer. Só
que naquela noite eu queria beijá-lo apenas por prazer, luxúria... já
agora, eu preciso beijá-lo simplesmente por estar olhando demais
para a sua boca, de uma forma que faz com que todos os meus
pensamentos resetem e eu só pense em sua boca.
Talvez seja precipitado, talvez ele não queira isso tanto
quanto eu quero. Embora a forma como ele me olha, me diga
totalmente ao contrário.
Tanto é que ele não precisa de incentivo algum assim que eu
tiro os olhos da sua boca e os direciono aos seus olhos verdes,
porque no mesmo instante ele me avisa apenas com o olhar que ele
irá fazer isso e eu não me oponho.
Com isso, ele me beija.
Em um primeiro segundo, diferentemente da primeira vez, eu
não sou pega de surpresa, por isso que quando ele mordisca meu
lábio inferior, eu arfo um pequeno gemido. Esquecendo que nesse
momento estamos em público, meus olhos se fecham e nossas
línguas se entrelaçam.
O hálito de Elliot é uma mistura doce de canela e menta, seus
dedos adentram meus cabelos e ele aperta ainda mais minha
cintura contra seu corpo. Me impressiono com o quanto Elliot beija
bem, até mesmo passa pela minha cabeça se ele realmente é
celibatário, pois não é possível que alguém praticamente sem
nenhuma experiência sexual consiga ser tão sexy dessa forma em
um beijo.
Mesmo diante de uma multidão, o mundo inteiro se cala à
medida que um gemido abandona seus lábios assim que o beijo se
torna ainda mais intenso, urgente, eu diria. Uma das minhas mãos,
que estava em sua nuca, adentra também em seus cabelos, meu
corpo inteiro reage a Elliot, tanto que meu centro palpita, pedindo
atenção. Isso jamais tinha acontecido apenas com um beijo. Sua
mão, que estava em minha cintura, encontra meu quadril, me
empurrando contra o carro, meus dedos cravam em sua pele
quando sinto o metal gélido contra a minha pele quente.
Eu definitivamente esqueci onde estamos quando, dessa vez,
o gemido escapa da minha boca e eu sinto um sorriso sair da de
Elliot enquanto continuamos o beijo. Arrastando os dentes pelo seu
lábio inferior, finalizo nosso beijo, deixando uma mordida nele.
Demoram alguns segundos para que eu volte ao mundo real
e finalmente abra os olhos, minha pele continua quente, meus lábios
agora estão completamente inchados e o batom vermelho, que
estava em minha boca, agora está por todo o rosto de Elliot, que
tem seus fios de cabelos bagunçados.
Sua respiração oscila, assim como a minha, pois está sendo
totalmente difícil conseguir puxar o ar depois da nossa performance,
a boca dele está entreaberta, igual a minha, e algo me pede para
que eu as junte novamente.
Contudo, uma voz real faz com que eu pare de pensar nisso.
— Eu pensei que vocês dois iriam se comer aqui mesmo —
Allie brinca.
Eu não quero olhar para mais nada agora que te vi
Eu não quero pensar em mais nada agora que pensei em você
Eu tenho dormido há tanto tempo numa noite escura de vinte anos
E agora, vejo a luz do dia
DAYLIGHT | TAYLOR SWIFT

Que eu estou apaixonado não é novidade para ninguém, mas


depois da madrugada de sábado, as coisas ficaram mais intensas.
Bastou um único beijo para que eu me rendesse por completo e
simples assim, eu estou caidinho pela Sadie.
Sim, infelizmente foi um único beijo, porque eu não tive
coragem o suficiente para beijá-la outra vez no final da noite quando
ela parou o carro em frente ao dormitório e Grey assumiu o volante
no seu lugar. Me senti como uma criança de dez anos que é
apaixonada pela babá, eu já beijei inúmeras garotas antes, porém
nunca fiquei sem ar e tão quente enquanto mantinha minha boca
colada nas delas.
Para falar a verdade, eu quase ejaculei nas calças durante
aqueles minutos em que estivemos juntos e não preciso nem dizer o
que aconteceu assim que voltei para casa, porque eu fui direto para
o banheiro fazer aquilo que faço todas as noites. Embora dessa vez
meus pensamentos tenham mudado, após eu sentir um por cento
do gosto da Sadie.
Antes minha mente viajava para o instante em que eu abria a
porta do quarto e me deparava com ela e Valerie se beijando, agora,
quem beijava ela era eu e não só isso, eram meus dedos que
percorriam todo o seu corpo durante o tempo em que nossas bocas
estavam coladas.
No sábado tivemos um jogo play-off fora de casa e por isso
eu não a vi o restante do final de semana, entretanto trocamos
inúmeras mensagens ao longo desse tempo e ontem, quando
retornamos de viagem, ficamos uma hora em ligação, discutindo
sobre a leitura de Vergonha, da Brittainy C. Cherry. Eu já havia lido o
livro e em algumas partes me identifiquei com a história da Grace,
principalmente na questão de fazer tudo o que a mãe dela espera.
Além de falarmos sobre isso, eu me despedi de Sadie citando uma
das minhas falas preferidas do livro.
— “Era tão intrigante olhar com atenção para alguém que eu
acreditava ser tão diferente de mim e enxergar partes que
combinavam perfeitamente com alguns cantos da minha alma.” Boa
noite, Sadie.
— Boa noite, Elliot. — Senti sua voz vacilar, como se ela
estivesse engolindo em seco, ao finalizar a ligação.
Pela manhã de hoje não tive tempo de me comunicar, na
realidade nem mesmo tive a chance, uma vez que acordei às cinco
da manhã para o treino.
Me posicionando atrás de Colin, ele me entrega bola e eu
corro, desviando do nosso time de defensores, alguns puxam minha
camiseta, contudo eu consigo me desvencilhar dos puxões. Em
questão de segundos, quando eu estou próximo à linha da end
zone, um brutamontes pula em mim, me arrastando pelo campo,
porém ele não esperava que ao fazer isso, eu acabasse marcando o
ponto final do treino.
O treinador Willians apita, sinalizando o fim do treino e vejo
que ele acena para Axel, que está no banco, observando.
— Decidiu voltar para o time Davenport? — Willians inquere.
— Apenas observando, senhor — Axel responde.
— Quem perde é você — Kane grita para o colega de quarto,
que lhe mostra o dedo do meio.
— Modos, rapazes — o treinador pede e depois faz o uso do
seu apito outra vez. — Todos aqui, por favor.
O nosso treinador é um dos homens mais cultos que eu
conheci, raramente ele faz o uso de palavrões no campo, muito
menos é duro. Apesar de que no ano passado ele tenha me posto
no banco em alguns jogos por eu ter bebido demais durante a
semana, ele nunca foi duro comigo, o máximo que fez foi dar três
tapinhas nas minhas costas e me mandar tomar jeito, o que
arrancava de mim um riso involuntário.
No entanto, até agora, não levei nenhum tapinha nas costas,
até porque a maior parte das minhas noites eu tenho passado no
celular ao invés de estar bebendo, o que tem se tornado uma
mudança e tanto para mim.
— Primeiro eu gostaria de parabenizar vocês pelo jogo do fim
de semana, mesmo que alguns de vocês tenham bebido todas na
noite anterior. — Ele olha para mim e agora eu esqueço da parte em
que não levei nenhum sermão. — Ainda assim, conseguiram ir bem
no jogo. Agora é válido lembrar que nossos jogos oficiais do
campeonato nacional se iniciam nesse fim de semana e como é de
conhecimento de vocês, é proibido o uso de bebidas durante os dias
em que antecedem nossos jogos. — Ele me olha novamente e eu
abaixo a cabeça quando recebo um tapão nas costas de Kane.
— Precisava mesmo? — reclamo.
— Só para você lembrar que esse ano precisamos trazer o
título para casa. — Ele me dá outro tapa.
— Eu não sou saco de pancadas, porra. — Dou um murro no
seu estômago, revidando e ele se curva.
— Rapazes! — o técnico chama nossa atenção e eu me
aquieto. — Continuando... nada de bebidas, drogas, lutas ou
corridas clandestinas.
— Pode sexo? — Colin pergunta.
— O pênis é seu, você enfia onde quiser, desde que não seja
um saco de... — o treinador começa a responder, mas Colin é
atingido no queixo por um murro de Grey. — Vocês só podem estar
de brincadeira com a minha cara — ele grita enquanto vamos
separar Colin e Grey, que estão se pegando de soco no chão.
De um lado, Kane puxa Colin e eu consigo puxar Grey.
— Me solta. — Ele tenta se soltar do meu aperto.
— Para com isso, Greyson — repreendo.
— Ele disse que vai fazer sexo com a Allie — ele grita,
tentando se soltar outra vez do meu agarre.
— Eu perguntei se podia fazer sexo, seu idiota — Colin se
defende.
— E o que isso significa? — Grey pergunta. — Que você vai
comer a minha irmã.
— Não — quem responde sou eu. — Isso significa que você
é um burro, Grey e você sabe muito bem disso.
Finalmente largo ele, o empurrando, fazendo com que ele
caia de joelhos no gramado.
— Já chega! — Willians grita. — Sábado é o nosso primeiro
jogo contra Berkeley, Dawson, você vai para o banco — avisa a
Grey. — E Miles, você vai jogar na posição de quarterback — avisa
ao Kane.
— Mas treinador — Kane tenta intervir.
— Eu disse que já chega — o técnico explode. — Ou vocês
começam a agir como homens, ou vocês não jogam — dito isso, o
treinador sai de campo e eu consigo ver a fumaça saindo das suas
orelhas.
Aos poucos alguns dos colegas de time vão se dispersando
do campo, enquanto eu ofereço a minha mão para Grey, que ainda
está no chão, ele aceita e eu o levanto.
— Eu vou te dizer isso somente uma vez, Grey — aviso. — A
Allison não é a sua irmã e você a defender como se fosse é tão
ridículo quanto você ficar com garotas loiras apenas para esquecê-
la. Então, ou você começa a correr atrás do tempo perdido ou para
de ser um idiota.
— Valeu, cara, só que eu acho que é tarde demais. — Ele
coça a nuca, olhando para a porta dos vestiários, onde Allie está
conversando com Colin, que também olham em nossa direção.
— Só será tarde demais se você quer que seja tarde demais
— respondo.
Faço um aceno de cabeça para Axel, que continua no banco,
e caminho em direção ao vestiário, chegando no ponto onde Colin e
Allie se encontram, eu dou um beijo na testa de Allie, aproveito e
olho para Grey novamente, que agora me fuzila com os olhos, e
mostro o dedo do meio para ele.
Eu nunca fui de me meter na relação que ele tem com a
Allison, mas algumas coisas com o tempo acabam cansando a
gente.
De toda forma, opto por enviar uma mensagem para a minha
garota assim que chego no armário e retiro meu celular de lá de
dentro.
Minha garota, quem me vê falando assim nem imagina que
tudo não passa de um relacionamento falso, talvez nem eu consigo
mais imaginar isso depois do nosso beijo.
Que droga.
Eu: Bom dia, Watson.
Como já passam das sete da manhã, eu espero a sua
resposta com a tela de mensagens aberta, porém nada dos três
pontinhos piscarem na tela, então decido encaminhar mais uma:
Eu: O que eu perdi enquanto você dormia?
Faço questão de citar uma frase de um de seus livros
favoritos, para que eu possa chamar a sua atenção, embora eu
continue sem resposta. Após dois minutos encarando a tela do
celular, me convenço de que talvez ela ainda esteja dormindo.

Definitivamente a Sadie não continua dormindo, já está na


hora do almoço e eu a procurei por todo o campus após ter recebido
uma encomenda que fiz para presenteá-la. Passei a manhã inteira
em sua busca, no prédio de Artes, Engenharia e na biblioteca,
cheguei até mesmo a colocar a mão nos olhos de uma garota que
tinha os cabelos no mesmo tom dos dela, porém tudo não passou
de um grande constrangimento quando me toquei de que não era a
ruiva certa.
Agora, depois de todas as aulas da manhã terem finalizado,
estou do lado de fora do refeitório para o almoço, esperando ver
seus cabelos bagunçados pela ventania que está fazendo. Uma dor
pontuda no meu estômago diz que algo errado está acontecendo,
porque era para nos encontrarmos, certo que não combinamos, só
que era para isso ter acontecido.
Ou será que ela se arrependeu da corrida?
Pior... e se ela tiver se arrependido do nosso beijo? Enquanto
eu viajei, pensei que estava tudo bem, ela deu todos os sinais de
que estava tudo bem, ela não vacilou em momento algum, como
normalmente faz.
E se ela tiver desistido do nosso acordo?
O que será de mim?
Acredito que a Sadie não faria nada disso sem antes me
avisar, pelo menos foi isso que conversamos durante todo esse
tempo e ela insistiu tanto sobre esse assunto. Não seria ela que iria
dar para trás agora, ainda mais depois de termos nos aproximado
tanto. Seria?
Agora quem está agindo e pensando de forma confusa sou
eu.
Decido arriscar olhar para dentro refeitório através das
janelas de vidro. Encontro todos os meus amigos sentados à
mesma mesa de sempre, porém não a vejo. Mesmo assim decido
entrar e procurar por ela lá dentro, já que faz mais de quinze
minutos que estou parado aqui do lado de fora e nada dela.
— Ei, algum de vocês viu a Sadie? — pergunto ao me sentar
à mesa.
— Ela é sua namorada — enfatiza Kane, que ainda não
acredita no nosso relacionamento, mesmo depois de tanto tempo.
— Você quem deveria saber onde ela está.
— Onde quem está? — Valerie pergunta quando se senta ao
lado do meu amigo.
— A Sadie — Allison responde. — Eu também não vi ela
hoje, deveríamos ter uma aula juntas.
— Junta com quem? — Grey pergunta, atônito.
— Com a Sadie — Wes responde.
— Ela e o Elliot estão namorando, pensava que vocês
sabiam já — Grey responde. — E tem mais de um mês.
— Todo mundo aqui sabe — Allie responde a ele, secamente.
— Se você tirasse os olhos desse maldito celular e prestasse
atenção na nossa conversa, saberia que estamos nos perguntando
onde a Sadie está.
— Ele não saiu de perto dessa merda depois do treino de
hoje — Kane diz irritadiço ao jogar uma batata em Axel, que está
com a cara enfiada em um livro de quase duas mil páginas de
anatomia.
— Vai se foder — Axel responde ao lhe mostrar o dedo do
meio.
— Axel — Heaven repreende.
— Desculpa, linda.
— Afinal, onde está a Sadie? — Heaven pergunta ao tirar os
olhos do tablet onde estava escrevendo algo.
— É o que eu quero saber — respondo.
— O quê? — Lynnox inquere ao se aproximar da mesa e
sentar-se ao lado de Valerie.
— Onde a Sadie está — respondo. — Você por acaso sabe?
— Ah — diz pensativa. — Hoje a Sadie acordou sad, quando
saí do dormitório ela ainda estava debaixo das cobertas.
Axel se levanta, apoiando as mãos na mesa, entretanto eu
olho para ele, imediatamente pedindo para deixar comigo.
Abro a porta do refeitório ferozmente, sentido o ar gelado
atingir minha pele e corro apressadamente rumo ao dormitório
feminino da Stout.
Sei que seu pensamento, instantaneamente, foi o
afogamento de Sadie no ano passado, do qual ele a salvou. Mesmo
após o envolvimento de Sadie com Drew, há um ano, esse triste
episódio resultou em seu retorno ao nosso grupo e desde então,
sempre que ela esteve triste ou deu algum sinal de que poderia
fazer algo consigo mesma, todos estivemos ao seu lado.
Assim como estávamos ao lado da Heaven quando ela
descobriu a traição do Drew ou quando ela foi hospitalizada, porque
não abandonamos uns aos outros. Mesmo que eu não tivesse
entrado nessa mentir junto dela, eu nunca a deixaria para trás e
mesmo nunca tendo tanta proximidade antes, também fiz o
suficiente para tentar mantê-la sã, como todos os outros.
No entanto, agora, sabendo que ela está triste ainda na
cama, me pergunto: será que fizemos mesmo o suficiente para
ajudá-la?!
Ela não deu nenhum sinal de que estaria tendo qualquer
recaída desde que retornamos das férias e desde que assinamos o
contrato, inclusive durante os dias em que Sadie teve raiva de mim,
ainda assim, ela não deu sinal algum que havia tido qualquer
recaída. Contudo, o fato de ela ter acordado mal torna-se
preocupante. Eu não culpo a Lynnox por não ter ficado com ela
durante a manhã ou por não ter avisado a alguém sobre o que quer
que estivesse acontecendo, ainda estamos na fase de nos
conhecermos. Portanto, acredito que ela ainda não conhece nem a
metade do que vivemos durante o último ano.
Chegando no dormitório, subo as escadas apressadamente,
estando de frente para a porta do alojamento de Sadie, eu tento
abri-la, sem sucesso, uma vez que a mesma está trancada, então
decido bater, não só que surte muito efeito, pois não recebo
resposta alguma do outro lado.
Decido discar o número de Lynnox, assim que ela atende,
pergunto rapidamente:
— Existe alguma possibilidade de vocês terem alguma chave
reserva do quarto? — pergunto.
— Não sei... por quê? O que está acontecendo? — responde
do outro lado da linha, preocupada.
— Tem ou não tem? — insisto.
— Ter... tem! — Respiro aliviado, contudo minha respiração
logo retesa com as palavras que vêm a seguir. — Mas ela está com
a Val.
“Ela só pode estar brincando comigo”, penso.
— Olha, eu preciso entrar nesse alojamento agora, você
pode vir deixar a chave?
— Está bem, chego em cinco minutos.
Com isso, a ligação é encerrada e eu continuo batendo na
porta e chamando por Sadie, pensando em várias coisas horríveis
que ela pode ter feito consigo mesma. Será que se afogar não foi o
suficiente para ela no ano passado?
Melhor...
Será que a minha presença em sua vida não tem sido o
bastante?
Eu notei por várias vezes quão sozinha ela é, o tanto que ela
estranha quando recebe um elogio ou qualquer carinho, como o seu
corpo reage e sua pele fica vermelha. É notório que mesmo que ela
tenha sido muito popular entre os homens no passado, ainda hoje,
ela não sabe reagir perto de mim. Logo de mim, que quase não
tenho experiência alguma.
Eu me deito no chão, tentando enxergar algo dentro,
tentando ver algum movimento sequer de vida que venha do interior
do seu quarto pela fresta da porta, mas é totalmente em vão.
Ao ficar de pé, dou três socos na porta, a chamando.
— Vamos lá, Watson. Abre essa porta, por favor — imploro.
E como já esperado, não obtenho nenhuma resposta.
Alguns minutos se passam e Lynnox chega e para a minha
não surpresa, ela não está sozinha, os nossos amigos, que estavam
na mesa do refeitório há pouco, a acompanham. Assim que chega
ela tira as chaves do bolso de trás da calça, com as mãos tremendo,
e começa a pedir desculpas.
— Eu juro que não sabia o que havia acontecido com ela —
diz com a voz fraca. — Eu juro, eu pensei que ela só havia acordado
com algum mal-estar. — Suas mãos continuam tremendo e ela não
consegue acertar o buraco da porta. — Se algo tiver acontecido, a
culpa será minha. — Com isso ela cai no choro.
Ao pegar as chaves da sua mão, ainda trêmula, consigo
finalmente destrancar a porta. Correndo para o lado de dentro, vou
direto para o quarto de Sadie, porém não encontro nada além de
uma cama perfeitamente arrumada com o exemplar de Vergonha
em cima do travesseiro.
Eu preciso de alguém para curar, alguém para conhecer
Alguém para ter, alguém para segurar
É fácil dizer, mas nunca é o mesmo
Acho que eu meio que gostava
Do jeito que você entorpecia toda a dor
SOMEONE YOU LOVED | LEWIS CAPALDI

Definitivamente me sinto feliz.


Tanto que tenho vontade de gritar isso para o mundo, mas ao
invés de abrir a janela do meu quarto e gritar “EU ESTOU FELIZ”,
decidi que seria melhor ir à terapia.
Assim que meu despertador tocou pela manhã, eu apenas o
desliguei e continuei embaixo das cobertas, aproveitando o pouco
de sono que eu ainda teria pela frente, ao menos até a Lynnox bater
na minha porta e perguntar se eu não ia à aula, a única coisa que
respondi foi:
— Hoje não — e voltei a me cobrir.
Cerca de dois minutos depois ouvi a porta da sala se fechar.
Me levantei, fiz minha higiene matinal, tomei banho, sequei
os cabelos e depois fiz uma skin care, até mesmo tive tempo de
ondular meus cabelos, o que raramente faço. Vesti uma roupa
confortável e dirigi até Stone Bay, para uma sessão de terapia extra.
Mesmo que a minha última tenha acontecido na sexta passada pela
manhã, eu senti a necessidade de retornar.
— Como você está se sentindo hoje? — Rayna pergunta.
— Bem — sou sincera. — Muito bem para falar a verdade.
— Então esse seria o motivo para você voltar hoje? —
Assinto com a cabeça. — Isso é um progresso muito bom desde
sexta para cá, eu diria. O que aconteceu de tão especial nesse final
de semana?
— Bom, primeiramente, eu me livrei do meu irmão.
Rayna levanta uma sobrancelha, já chegamos ao ponto da
terapia em que eu consigo entender as suas expressões faciais e
vice-versa, com isso, eu sei que ela está me pedindo uma
explicação.
— Basicamente, tudo começou quando eu estava dançando
com o Elliot.
— O amigo que você tem se aproximado bastante e
conversado sobre livros?
É... eu ainda não contei a ela sobre o relacionamento falso,
talvez eu faça isso hoje.
— Ele mesmo — confirmo. — Nós estávamos dançando e
quase nos beijamos. Eu sabia que ele queria aquilo, eu também
queria, para falar a verdade, eu queria aquilo há muito tempo.
— E vocês se beijaram?
— Sim, nos beijamos, mas calma que tem muita história
ainda. — Rayna levanta as mãos e volta a me escutar. — Era
aniversário dele, fomos interrompidos no momento em que
estávamos prestes a nos beijarmos e então houve os parabéns,
entretanto logo que acabou adivinha quem chega lá? O Trevor! Eu
quase me caguei nas calças quando vi meu irmão ali.
— Você voltou a ter medo dele?
Nas sessões anteriores eu acabei cedendo e contando à
Rayna, que talvez eu não sentisse dependência do Trevor e sim
medo, pelos acontecimentos anteriores em nossa vida.
— Durante aquele momento em que ele chegou na festa, sim
— confesso. — Porém, ele praticamente me humilhou na frente de
todos e não só isso, quis fazer o mesmo com o Elliot, o que para
mim foi o ápice. — Ela franze o cenho novamente e eu continuo. —
Elliot tem alguns traumas relacionados a carro, eu não me sinto
confortável para falar sobre isso.
— Tudo bem — assente em resposta.
— Quando ele quis desafiar o Elliot em uma corrida, por um
impulso, eu intervi. Eu disse que correria no lugar dele.
— E você correu?
Assinto.
— Não só isso, além de correr, eu também ganhei do meu
irmão. No entanto, toda a confiança que eu senti não partiu de mim,
o que é mais estranho, eu precisei que alguém confiasse em mim
para não hesitar, para enfrentar o meu irmão.
— O Elliot é uma boa influência para você, Sadie, você sabia
disso?
— Ele definitivamente é — digo em um sorriso.
— O motivo da sua felicidade hoje, seria por ter ganhado do
seu irmão em uma corrida ou seria o Elliot?
— Ganhar do meu irmão me fez sentir livre, livre porque eu
não aguentava mais estar perto dele da forma como ele queria que
eu estivesse. E eu digo isso há anos, mas ele nunca me escuta.
Talvez isso tenha sido necessário para ele finalmente parar de me
usar. E quanto à minha felicidade hoje, eu não tenho uma certeza
absoluta, eu só sei que eu me sinto leve com o Elliot, eu não sinto o
peso que eu sinto estando com o Trevor ou todo o ódio que eu
sentia quando estava com o Drew, muito menos a sensação de
estar no controle ao ir para a cama com qualquer garoto. Com o
Elliot eu apenas me sinto...
— Confortável? — arrisca Rayna.
— Confortável — concordo.
— Você gosta dele?
— Eu não sei se eu mereço gostar de alguém.
— Por que você diz isso?
Então eu conto para ela um dos dias mais trágicos da minha
vida.
“Ele vem todos os dias para o meu alojamento, entra no meu
quarto e se espalha na minha cama, sentindo-se o dono do local. No
mesmo horário também, Drew se levanta e olha pela janela. Eu não
sabia ao certo o que ele tanto olhava, todos os dias no mesmo
horário, mas hoje, por incrível que pareça, ele se levantou um pouco
mais tarde. Por isso, decidi ir até a janela e ver o motivo pelo qual
ele passa um minuto inteiro observando o que há lá embaixo. Tão
vidrado que sequer pisca.
Nessa hora, eu vejo... A Heaven está saindo do prédio do
dormitório, completamente sozinha e ignorante sobre quem a está
observando. Vendo que ela caminha rumo ao campus
desacompanhada, Drew se afasta da janela e ao passar por mim,
esbarra no meu ombro.
— Aonde você vai? — pergunto, porém não obtenho resposta
quando ele começa pega o seu casaco e o vestir. — Drew — o
chamo.
Ele não me escuta, apenas termina de vestir o casaco e noto
que ele começa a procurar algo em seus bolsos. Quando ele não
encontra, me dou conta de que ele, na realidade, está em busca das
suas chaves, me fazendo lembrar que assim que ele chegou aqui,
as deixou em cima da minha escrivaninha.
Nós dois encontramos as suas chaves ao mesmo tempo,
aproveitando que eu estou mais perto delas do que ele, apenas me
estico, as alcançando. Tão logo ele nota que eu as seguro, seu
olhar torna-se furioso ao encontrar o meu.
— Me dá minhas chaves — diz secamente.
— Aonde você vai? — pergunto outra vez.
— Eu preciso conversar com a Heaven, aproveitar que ela
está sozinha.
Nego com a cabeça.
— Você não tem o que conversar com ela.
— Quem decide isso sou eu e eu decidi que eu preciso
encontrar minha namorada.
— Ela não é sua namorada. Ela está com o Axel.
— Você não vê?! — diz ele ao se aproximar de mim. — Ela
só está com ele para me provar que ela também consegue seguir
em frente, assim como eu segui. A Heaven quer apenas chamar a
minha atenção.
— Não. — Dou um passo para trás, colando as chaves nas
minhas costas. — A Heaven nem pensa mais em você, Drew.
— Claro que ela pensa. — Sorri nostálgico. — Você tem
noção do quão feliz nós dois éramos? Eu era a vida dela e ela a
minha, é impossível ela não pensar mais em mim, porque ela me
ama.
— Você acha que manipular alguém, enganar e trair é
sinônimo de felicidade? Em que mundo você vive? — pergunto
incrédula.
— O que você sabe sobre amor ou felicidade, Sadie? Você é
uma frígida. — Ele dá outro passo em minha direção.
Ao invés de caminhar para trás outra vez, eu faço com que o
espaço entre nós dois diminua.
— E você é um covarde — digo, levantando o queixo.
— Tanto faz — desdenha. — Agora me dá a porcaria das
minhas chaves para que eu possa conversar com minha namorada.
— Ela não é sua namorada — grito.
— Me dá as chaves, Sadie. — Ele aperta meu braço e esse
se torna o estopim para mim.
— Aqui suas chaves — anuncio, no instante em que minha
mão, que as escondia em minhas costas, de repente atinge seu
rosto em um tapa, arranhando a sua bochecha com a ponta da
chave do carro.
Colocando a mão sobre sua bochecha, Drew deixa seus
lábios entreabertos, observo que no momento em que ele sente o
sangue em seu rosto, seus olhos tornam-se pretos, totalmente
tomados por suas pupilas.
— O que você fez? — esbraveja.
Eu não enxergo mais nada, a não ser o vulto do seu punho
invadindo a minha boca, em seguida o ar retesa em meus pulmões
quando suas mãos pressionam minha garganta e minhas costas
batem na parede atrás de mim. Eu tento me desvencilhar do seu
agarre, seus olhos estão arregalados e minha respiração está fraca.
Tento outra vez tirar seus dedos da volta do meu pescoço,
contudo é ele mesmo quem tira as mãos de mim. Cuspindo no meu
rosto, ele diz:
— Você é uma vadia vendida, Sadie. E você jamais
conseguirá fazer com que alguém goste de você ou você acha que
é digna do amor? Deixe-me te dizer uma coisa, você não é, porque
você é tão puta que nem ao menos enxerga que eu estou pouco me
fodendo para você.
Ele se agacha e pega as chaves que haviam caído ao meu
lado, assim que ele agarrou meu pescoço.
— Se eu a perder de vista hoje, eu prometo que eu volto aqui
e termino o serviço — avisa, apontando para mim e depois me dá as
costas, saindo do meu quarto.
Segundos depois ouço a porta principal bater e levo as mãos
até meu pescoço, tentando raciocinar o que aconteceu aqui. Mas
principalmente o porquê de ter acontecido.
O Drew é louco e isso definitivamente não é novidade alguma
para mim, uma vez que ele já me contou sobre seu transtorno de
personalidade, por isso eu tento sempre tomar cuidado quando
estou perto dele, porque ele é impulsivo. Claro que a sua ameaça
também é o suficiente para que eu esteja ligada em todos os
passos, no entanto a sua psicopatia faz com que eu me mantenha
alerta.
Por esse motivo que eu peguei as suas chaves antes, tão
logo notei o que ele estava prestes a fazer, só que infelizmente eu
me descontrolei e ele acabou me atacando.
Pensando justamente em seu ataque, em como ele agiu
comigo há pouco, eu tomo a consciência de que ele não vai se
recuperar da sua raiva tão cedo, sendo assim, eu nem mesmo me
dou o trabalho de limpar o sangue que sinto escorrer na minha boca
ou sequer olhar no espelho o estrago que ele deixou em meu
pescoço.
Saindo apressadamente do meu apartamento do dormitório,
eu corro rumo às escadas, descendo-as e chegando no andar em
que Heaven divide o alojamento com Allie, porém não é para o seu
quarto que quero ir e sim, em busca da segurança do campus, em
busca de algo que possa protegê-la.
Não sei se isso é uma obra do destino ou qualquer coisa
parecida, mas meus passos estagnam quando a vejo, juntamente
do Axel, em frente à porta do seu alojamento.
— Sadie?! — ela me chama.
— Heaven... — Hesito. — Nós precisamos conversar —
despejo, decidida que preciso lhe contar o que acabou de acontecer
e todo o resto.
— Certo.
— O que aconteceu? — Axel interfere.
No instante em que Axel fala comigo, eu enxergo que logo
atrás dele, cerca de uns dez metros, está ele. Meus olhos se
arregalam assim que vejo Drew no final do corredor, levando suas
mãos até o seu pescoço.
— Isso foi um erro, deixa para lá — digo ao me afastar,
dando passos para trás.
— Sadie — ela chama. —, entra!
— Deixa para lá, é be-besteira minha — gaguejo ao vê-lo ao
longe, mostrando nove dedos uma vez e um dedo duas vezes.
Ele está querendo dizer que ligará para a polícia caso eu fale
alguma coisa, ele não precisa falar mais nada para que eu continue
me afastando. Contudo, Heaven insiste para que eu volte e
converse com ela.
Minha mente viaja a mil por hora, na minha frente estão
Heaven e Axel, claramente preocupados comigo e sem fazerem a
mínima ideia do que aconteceu e a metros de distância, está o
Drew, fazendo insinuações e ameaças. Eu balanço a cabeça em
negativa, tanto para Heaven quanto para Drew, que põe um sorriso
sádico em seu rosto.
Heaven continua insistindo para que eu converse com ela,
até pede que o Axel se afaste e quando ele o faz, Drew some do
corredor. Eu observo Heaven novamente, com cautela, e de repente
seu corpo envolve o meu em um abraço. Um nó se instala em minha
garganta, porque o Drew tem razão, eu sou uma vadia vendida.
Enquanto a minha amiga de anos tenta me ajudar, mesmo
depois de eu supostamente tê-la traído, ela me leva para dentro, me
põe sentada em seu sofá e me entrega uma garrafa de água. Com
as mãos tremendo eu tento pegá-la, porém é um trabalho
impossível abrir a tampa. Ela me pergunta o que o Drew fez, porque
é óbvio que ele fez algo. Contudo, a sua pergunta ainda me assusta.
— O quê?! Por que você acha que ele fez algo? — respondo
defensiva.
— Você está atormentada, Sadie — responde calmamente.
— Seus olhos estão oscilando, suas mãos tremendo, mesmo depois
de beber água sua boca provavelmente continua seca, seus
pensamentos também devem estar divagando e a todo momento,
você tenta ligar os pontos sobre o que está acontecendo ou quando
começou a acontecer. Você não precisa me explicar nada, mas no
fundo eu sei que é algo relacionado a ele, sem contar que você teve
medo do Axel, ou seja, você não quer chegar perto de nenhum
homem agora porque você não confia nas ações de um.
No momento em que Heaven se cala, eu caio no choro.
A Heaven é uma pessoa boa, ela nunca mereceu ter passado
o que passou com o Drew, ela sequer mereceu ter tido toda a
decepção que teve comigo, por mais falsa que tenha sido, ela não
sabe disso, eu sei. É por isso que enquanto ela me abraça, eu choro
feito uma criança nos braços da mãe.
O que eu fiz com ela? Com o Axel?
Comigo?
Tudo isso aconteceu por quê?
A culpa é realmente minha ou do Drew? Talvez ela seja do
Trevor, pois se ele não tivesse acertado aquele ferro na cabeça do
nosso avô quando eu tinha apenas doze anos, nós não estaríamos
passando por isso hoje. Quem sabe, a culpa seja do meu pai, que
acobertou o meu irmão e me disse para tomar conta dele, e nunca
contar nada à minha mãe sobre o que aconteceu.
Eu realmente nunca contei à minha mãe ou a ninguém.
Entretanto, o Drew teve que escutar o que eu disse, justamente
durante uma briga minha com o Trevor, e usar isso para me
ameaçar. Me tirando toda a sanidade que eu jurava ter. Drew fez
com que eu mentisse, enganasse e traísse duas pessoas, apenas
para ter suas próprias conquistas, o que no final, não adiantou de
muita coisa já que o seu tiro saiu totalmente pela culatra.
Enquanto eu choro nos braços de Heaven, ela pensa que
tudo é porque eu amo o seu ex-namorado, quando na realidade eu
o odeio.
Eu me odeio. E talvez eu nunca seja capaz de gostar de
alguém, talvez eu seja para sempre uma frígida, porque eu me
odeio por fazer tudo o que tenho feito com pessoas que não
merecem todo esse sofrimento.”
Também conto à Rayna o que a Heaven me disse naquele
dia, sobre como eu descobri um pouco mais sobre o quanto ela
sofreu nas mãos do Drew. A partir daquele dia, eu decidi que não
iria mais cair no papo dele, contudo, eu não poderia arriscar falar
tudo o que eu sabia.
— Eu a agradeci por tudo o que ela fez por mim naquele dia
e disse que ela não merecia ter alguém egoísta como eu ao seu
lado, sabe o que ela me disse? Que não é egoísmo querer ser
amada.
— Ela tem razão. Querer ser amada não é uma questão de
egoísmo, mas você não estava sendo egoísta por isso, você estava
querendo proteger o seu irmão, e querendo ou não,
inconscientemente, você tentou poupar a sua amiga de mais
sofrimento.
— Sim, eu sei. Hoje eu enxergo aquele episódio de forma
diferente. No entanto, na realidade, o Drew tinha razão, eu nunca
terei alguém que goste de mim de verdade.
— Novamente, por que você acha que o Drew tinha razão
nesse ponto?
— Porque eu sou uma vadia vendida, como ele me disse. E
por mais que talvez esteja rolando alguma coisa entre o Elliot e eu,
nada passa de uma farsa. — De novo o cenho de Rayna franze. —
Eu não te contei antes... — hesito — mas Elliot e eu estamos em um
relacionamento falso.
— O quê? — Ela quase cospe o café que estava prestes a
tomar.
Então eu conto a ela tudo sobre o meu namoro com Elliot,
desde o momento da proposta, até o nosso beijo na sexta.
— Por mais que seja evidente que esteja rolando algo entre
nós, tudo não passa de uma mentira.
— Por mais que seja evidente e você não consiga enxergar,
você é sim capaz de gostar de alguém, garota. Agora eu faço o uso
das palavras da sua amiga, e utilizando ela da forma mais presente
possível, te digo, Sadie: não é egoísmo querer ser amada, e você é
sim capaz de gostar de alguém. Da mesma forma que é capaz de
odiar o Drew por tudo o que ele te fez passar no ano passado, você
também é capaz de gostar do Elliot por toda a ressignificação que
ele tem trazido para a sua vida. Você tem evoluído, cada vez mais,
de forma positiva, porque ele entrou na sua vida. E por mais que o
relacionamento de vocês seja uma “mentira”, isso não significa que
em algum momento ele não possa se tornar real. O passado já
passou, o futuro é uma surpresa e o presente é uma dádiva, por
isso se chama presente, Sadie. Viva o presente e pare de pensar
que você é incapaz de algo só porque alguém lhe disse isso. Viva,
garota, apenas viva.
Finalizando a sessão, tendo em vista que eu não chorei, eu
saio do consultório revigorada. Melhor dizendo: ressignificada.
Rayna tem razão, ela é minha terapeuta, ela sempre tem
razão. Eu preciso viver o presente e parar de pensar no passado,
principalmente em todas as coisas ruins que o Drew me disse no
passado. Talvez um dia eu conte à Heaven tudo o que aconteceu
naquele dia, porém eu ainda estou trabalhando no auto perdão, para
que eu possa finalmente pedir o dela e de todos ao nosso redor.
Ao entrar no carro, voltando para o campus, noto que meu
celular está descarregado. Talvez ele já tenha amanhecido assim,
pois eu não me lembro de ter pegado nele o dia inteiro, para falar a
verdade, eu acordei tão bem e tão decidida do que iria fazer, que
nem mesmo me importei em pegá-lo.
Eu ia enviar uma mensagem para o Elliot, entretanto deixo
para fazer isso ao chegar no dormitório. No momento em que eu
chego em frente ao meu apartamento, noto que a porta está
entreaberta e a abrindo por completo, cuidadosamente, sou
surpreendida por todos os meus amigos ali, espalhados pelo
cômodo compartilhado, alguns com o celular na mão e outros em
ligação.
O primeiro a notar minha presença é o Axel.
— Sadie — ele chama, noto o alívio em sua voz.
— Oi — respondo, acenando. — O que está acontecendo...
— Sou interrompida por um furacão chamado Elliot, que me abraça
repentinamente.
— Onde você estava? — ele pergunta ao se afastar.
— Sadie, me desculpa, eu não sabia de nada do que tinha
acontecido, se soubesse eu jamais teria deixado você sozinha — diz
Lynnox.
— O que você quer dizer? — pergunto a ela atônita ao notar
seus olhos vermelhos e seu nariz escorrendo, me dizendo que ela
chorou.
— Você não tentou se afogar de novo, não é? — essa
pergunta vem de Grey.
— O quê? — pergunto horrorizada. — Claro que não!
Então Grey recebe um tapa de Kane.
— Seja mais sensível, caralho.
— Nós estávamos preocupados — diz Axel.
— Onde você estava e porque não atendia o celular? —
Elliot, que ainda está ao meu lado, pergunta desesperado.
— Meu celular está descarregado. — Mostro a ele. — E eu
fui à terapia, gente — explico.
— Terapia? — Elliot pergunta.
— Sim, eu tenho feito terapia desde o início das aulas —
respondo tranquilamente ao dar de ombros.
— Você não sabia que sua namorada estava fazendo
terapia? — interroga Kane.
— Em defesa do Elliot, eu não havia o avisado que iria hoje.
— Aaaah — um grande coro é cantado por todos e eu rio da
situação.
— Sério que vocês estavam todos aqui pensando que eu saí
para ir ali me matar? — pergunto rindo.
— Isso não é engraçado — Wes responde com a cara
fechada.
— Ah, é sim! — Eu rio mais e eles me olham como se
estivessem olhando para um alienígena e aos poucos, todos eles
riem, se juntando a mim.
É, eu realmente estou feliz e não é apenas culpa do Elliot,
mas sim por todos que têm feito parte da minha vida, me fazendo
sentir importante. Porque é isso que eu sou, importante, não apenas
para eles, mas também para mim.
Porque eu quero te tocar, amor
E quero te sentir também
Eu quero ver o Sol nascer
Sobre seus pecados, só eu e você
DUSK TILL DAWN | ZAYN FT. SIA

O grande susto que Sadie causou em todos —


principalmente em mim —, há três dias, acabou em risadas, pizza e
conversas. Por mais que eu tenha ficado aliviado em saber que ela
estava bem e não só isso, que também está indo à terapia, não
muda o fato de que meu coração estava prestes a sair pela boca
com o seu sumiço.
Isso me fez passar na lojinha do campus mais tarde, e lhe
comprar um carregador portátil, para que quando seu celular
descarregasse, ela pudesse entrar em contato de onde estivesse.
Foram poucos minutos, porém aterrorizantes o bastante, acredito
que não apenas para mim, como também para todos ao nosso
redor.
A coitada da Lynnox é prova disso, pois teve que dormir ao
lado da Sadie naquela noite. Segundo ela, quase não dormiu direito,
já que a sua colega de quarto verificava sua pulsação e respiração a
cada dez minutos.
Agora, estamos completamente a sós, quer dizer... apenas
em seu quarto.
Enquanto eu estou deitado no chão, ela está sentada na
cama, cada um com um exemplar de um livro da série Amores
Improváveis, da Elle Kennedy. Confesso que nunca tinha lido os
livros por conta do hóquei, sim, a rixa entre os patinadores do gelo e
os caras do futebol é real nas universidades. No entanto, a Sadie
me convenceu dizendo que era besteira minha não ler um livro só
por conta do esporte que há nele e que tinha sim a
representatividade do futebol.
— Uma anotação — anuncio ao ficar de joelhos e fechar o
exemplar de O Acordo. — Você já notou que muito provavelmente
Hanna e Garrett se casaram, tiveram um filho e deram o nome a ele
de Graham Wells?
— O Graham de Todas as Suas Imperfeições? — questiona
Sadie e eu assinto. — Faz sentido, afinal, Colleen lançou ele três
anos depois da Elle — diz pensativa.
— Como você sabe as datas de lançamento?
— Sabendo — ela dá de ombros. Largando completamente o
exemplar de O Erro, Sadie muda sua posição na cama e deixa seus
pés pendurados ao meu lado. — Está ansioso para o jogo de
amanhã?
— Falando nisso... — digo ao me levantar.
Caminho até o outro lado do seu quarto, onde eu deixei
minha bolsa, pego o que preciso dentro dela e volto à cama,
sentando-me ao seu lado.
— Para você. — Entrego a camiseta que estava comigo
desde a segunda e ainda não tinha lhe dado.
Ao pegar a camiseta, ela desdobra e a estende entre nós. A
mesma é azul, com a logo azul do Jaguars próxima ao final da gola
em V e logo abaixo o número 19, na frente e também atrás, junto
com meu sobrenome.
— Uma camiseta do time? — inquere, abaixando a peça.
— Com meu número e meu nome — completo.
— Isso eu vi.
Será que ela não gostou?
— Eu pensei que como é o primeiro jogo oficial e é em casa,
com certeza meus pais estarão lá e pensei por...
— Elliot — ela me interrompe, calando a minha boca com sua
mão.
— O que? — Minha voz sai abafada.
— Eu usaria essa camiseta com o seu nome e seu número
mesmo que seus pais não estivessem lá — declara ao retirar a mão.
— Sério?! — Minha voz se enche de esperança.
— Claro que sim, besta. — Ela ri. — Eu só preciso ter a
certeza de que ela realmente cabe em mim. Espera um pouco.
Ela se levanta, saindo do quarto. Acredito que ela foi até o
banheiro ou talvez para o quarto da Lynnox provar a peça. Enquanto
ela não retorna, eu me levanto e vou até a janela do seu quarto, já
está quase de noite e algumas alunas do lado de fora, entram e
saem do prédio. Como estamos no meio do outono, o vento em
Beaufort é forte, rio quando noto uma garota quase tropeçar em
várias folhas secas.
— E então, o que acha? — A voz de Sadie faz eu tirar a
minha atenção das pessoas lá embaixo.
No instante em que eu me viro para vê-la, meu coração perde
todas as batidas e meus pulmões todo o ar, sinto minha cabeça
apertar, com tamanha pressão, e todo o sangue do meu corpo
descer diretamente para o meu pau. Minha boca se escancara,
porque eu sinto o exato momento em que uma mosca a invade.
Posso dizer que estou disposto a ir contra o celibato nesse
segundo e até mesmo a todas as crenças, as quais eu fui ensinado
ao longo da vida. Por mais que possa parecer alguma asneira para
alguns, eu já beijei várias garotas, já tive desejo por algumas, mas
eu consegui me controlar acerca das tentações que me rodeavam,
me esquivei delas por inúmeras vezes. Entretanto, quando eu falo
de Sadie, eu não falo apenas de desejos ou de excitação.
É também uma questão de sentimento, não é apenas uma
atração o que sinto por ela, é também a forma como meu coração
dispara, a minha boca seca e meu estômago embrulha. É a
sensação de estar no lugar certo e com a pessoa certa, e por essa
única pessoa vale a pena arriscar qualquer voto de castidade que
eu tenha feito ou o medo que eu tenho da decepção, diante da
minha crença.
Não sabia que eu ficaria de pau duro vendo uma garota vestir
uma camiseta com meu nome estampado nela, até esse momento.
— Não vai me dizer o que achou?
Eu acho que Sadie falou alguma coisa, eu não tenho certeza
sobre isso, pois eu escutei algo, mas não vi a sua boca se
movimentar, apenas o número 19, estampado em seu abdômen, se
aproximar mais a cada segundo.
— Watson... — As palavras quase não saem da minha boca.
— Sim — ela responde, tão próxima que eu realmente não
vejo mais o número, apenas o símbolo do time acima dos seus
seios. — Pode dizer. O que você achou?
— Perfeita — falo completamente atônito, finalmente
encontrando o rosto de Sadie, hoje ela está sem maquiagem
alguma, assim como na primeira vez em que fomos à casa dos
meus pais.
Seus lábios estão rosados naturalmente e seus olhos brilham
assim que ela me pergunta novamente:
— O que você achou? Acha que ficou grande demais?
— Perfeita — repito ao engolir em seco. — A camiseta está
perfeita — pigarreio —, você está perfeita.
— Você está passando mal? — Sadie questiona ao enrugar a
testa.
— Não. — Engulo em seco.
— Tem certeza disso? — insiste, preocupada.
— Não.
— Do que você precisa?
Sabe aquele momento em que você já se sente muito
humilhado e sabe que não há mais nada para lhe deixar ainda mais
constrangido? Então, é isso o que está acontecendo comigo agora.
— De um beijo seu — digo, sem ao menos pensar.
— Está falando sério? — Sua boca se curva em um sorriso.
Ela sorriu, isso é um bom sinal, a não ser que ela esteja
tirando sarro da minha cara.
— Eu sei que pode parecer bobo, só que eu não paro de
pensar no nosso beijo desde que ele aconteceu, em todo e qualquer
momento que eu estou ao seu lado, eu penso nisso. Em te beijar.
— Então beija — responde.
— O quê?! — respondo confuso.
— Então me beija, Elliot, porque eu também não paro de
pensar na sua boca um segundo sequer.
— Watson... — digo ao passar a mão pelo pescoço até a
nuca.
— Sherlock... — Ela não precisa dizer mais nada, no
segundo seguinte eu a puxo, aproximando nossos corpos e nossas
bocas.
Os lábios de Sadie são macios, seu hálito é doce e a
chupada que ela dá na minha língua é totalmente erótica. Tanto que
minha ereção — que já estava viva —, agora está querendo pular
para fora das minhas calças. O que é totalmente torturante.
Passando o outro braço pela cintura curvilínea de Sadie,
nossos corpos definitivamente se colam e eu consigo sentir os seus
mamilos duros através do tecido fino da camiseta que ela usa,
torcendo para que no jogo de amanhã ela opte por usar um sutiã.
Meio escroto da minha parte, mas não digo pelos outros homens e
sim, pela minha sanidade mesmo.
Um gemido escapa da sua boca tão logo eu mordisco seu
lábio inferior. Arriscando abrir um pouco os olhos, noto que seu rosto
alvo está vermelho, as pontas dos meus dedos passeiam pela
extensão da pele do seu pescoço, indo de encontro à sua garganta,
chegando ali, separo as nossas bocas, o que faz com que Sadie
puxe meus cabelos. No entanto, isso não me impede de mordiscar o
seu queixo e seguir o caminho até o meio da sua garganta,
deixando um beijo molhado ali.
— Elliot... — ela geme meu nome.
Poucas garotas gemeram meu nome antes e todas foram
durante um beijo qualquer no meio de uma festa, o que já me
atiçava, só que agora meu pau treme com sua menção ao meu
nome.
— Porra, Watson — murmuro ao deixar outro beijo na lateral
do seu pescoço. O que acaba por finalizar comigo, pois seu cheiro
tão doce e ao mesmo tempo cítrico, rouba totalmente a minha
respiração, minha lógica e todas as crenças em que eu acreditei até
hoje. — Por favor, me faz parar... — peço.
— Eu não quero que você pare — confessa ao beijar o lóbulo
da minha orelha, causando um arrepio súbito em todos os meus
pelos.
— Eu também não — concluo ao dar um chupão abaixo da
sua sobrancelha e tomar sua boca novamente com a minha.
Puxando seu cabelo delicadamente, eu inclino sua cabeça
enquanto nossas línguas se enrolam uma na outra. Tento lutar
contra a submissão da sua boca, porém é um trabalho árduo e
totalmente difícil, quando ela é tão...
— Gostosa — digo, tomando um pouco de fôlego.
Sei que pode parecer piegas quando lemos algo assim em
livros, mas no meu caso, no nosso caso, apenas faz com que o fogo
entre nós aumente, tanto, ao ponto de Sadie levar suas mãos até a
barra da minha camiseta e subi-la, encontrando meu abdômen. Seja
lá o que for que ela esteja prestes a fazer, eu deixo, pois eu estou
adorando.
Pela primeira vez em minha vida eu sinto que o que estou ao
ponto de fazer é totalmente certo, por isso que no instante em que
ela sobe a minha camiseta, eu a ajudo, puxando-a com uma mão só
sobre a cabeça e afastando nossas bocas milimetricamente. Sadie
passeia com as pontas dos seus dedos por meu abdômen e eu
afundo meus dentes em seu lábio inferior à medida que ela passeia
por toda a extensão da minha pele despida. Levando seus dedos
até o cós da minha calça, ela desabotoa o botão e desce o zíper.
Sinto o momento em que ela afasta o elástico da cueca do meu
quadril e a desce, juntamente com minha calça, fazendo com que
meu pau pule para fora.
— O que estamos fazendo, Sadie? — indago, quase sem
respirar.
— Eu penso em te chupar desde aquele dia em que te vi com
a mão assim... — ela agarra meu pau. — Sobre ele.
Se antes ele estava vivo, agora ele não está só vivo, ele está
pulando de alegria.
Antes de se ajoelhar, Sadie chupa minha língua novamente e
eu fico completamente perdido logo que ela contorna o meu pau
com sua boca. Eu arfo seu nome outra vez assim que ela passa a
língua delicadamente sobre a minha glande, bombeando meu pênis
com a mão.
— Caralho.
— Você já foi chupado antes, certo? — Assinto.
O que não é mentira, certo que já faz alguns anos e que eu
não senti com a garota em questão, metade do que eu estou
sentindo nesse momento. Talvez seja por isso que sinto minhas
bolas comprimirem enquanto Sadie faz um espetáculo de sucção no
meu pau, ela é habilidosa e sabe o que está fazendo. Pouco me
interessa com quantos ela já fez ou como fez, eu só quero ter o
poder de ser o único daqui para frente e espero que ela também
queira isso, porque essa mulher está fazendo com que eu perca
todo o sentido da vida apenas por ter meu pau em sua boca.
E sabendo que ela também merece um pouco de atenção, eu
abro um pouco minhas pernas, para que eu consiga alcançá-la
melhor e puxo a camiseta pela sua cabeça quando ela afasta sua
boca da minha ereção, contudo continua a bombeando com a mão.
Assim que finalmente nos livramos da peça que vestia, seus seios
médios são revelados, duros e empinados na minha direção, os
mamilos rosados e totalmente duros choram por atenção, então
decido dá-los.
Por mais que eu não tenha uma vasta experiência, não sou
um idiota para ser bruto com ela, pelo contrário, trato-a com a maior
delicadeza possível, roçando meus polegares em suas pontas. Sei
que estou fazendo um bom trabalho quando massageio seus peitos
e ela geme, abocanhando o meu pau.
Ao passo que Sadie trabalha na massagem em minhas bolas
e chupa toda a extensão do meu membro, eu continuo com a minha
atenção totalmente ligada em seus seios sensíveis.
Ela afasta a boca da glande, voltando a bombear meu pau e
pede chorosa:
— Goza na minha boca — eu sabia que já estava próximo
quando senti meus testículos retraírem, no entanto, o seu pedido faz
com que meu pau pulse em sua mão e em questão de segundos, o
líquido branco é jorrado para fora do meu corpo, no mesmo instante
Sadie abocanha a cabeça do meu pênis outra vez, lambendo todo o
sêmen.
Eu começo a ver estrelas, literalmente, quando aos poucos
ela vai ficando de pé, beijando do meu abdômen até a clavícula,
onde deixa uma lambida e eu não sei como, mas meu pau ameaça
ganhar vida novamente. A puxando outra vez pela cintura, assim
como foi quando nos beijamos, a pego pelos cabelos e a beijo outra
vez com a minha visão ainda turva, que aos poucos vai voltando ao
normal para a luz fluorescente do quarto.
Os bicos dos seus seios são pressionados contra o meu peito
e volto a afastar nossas bocas, deixando um rastro de beijos até a
margem dos seus peitos. Chegando ali, eles se empinam ainda
mais e eu sinto a liberdade de passar a ponta da minha língua pelo
seu mamilo e depois chupá-lo.
— Você não precisa fazer nada, Elliot — ela tenta me parar,
só que é tarde demais.
— Você não é a única que tem desejos desde aquela noite,
Watson — constato, passando a língua por sua barriga despida.
Da mesma forma que Sadie fez quando começou o boquete,
eu desço o short jeans que ela usa, deixando apenas a calcinha fina
rosa cobrir as suas partes, colocando a minha mão por dentro do
tecido, levo meus dedos até as suas dobras e dou uma rápida
massageada no seu sexo, que está totalmente encharcado e retiro
minha mão dali. A ruiva presta atenção em todos os meus
movimentos com seus olhos vidrados em total luxúria, assim que eu
chupo os dois dedos que acabaram de encontrar a sua boceta.
— Desde aquela vez que eu quero descobrir o seu sabor,
então devo admitir que ele é tudo o que eu imaginava, Watson —
digo ao me deitar na sua cama de solteiro. — Agora faz um favor,
tira essa calcinha e senta na minha cara.
Eu devo estar parecendo um retardado, deitado em sua
cama, completamente nu e com uma ereção amostra, contudo ela
me olha como se perguntasse se eu tenho certeza e eu repito:
— Senta na minha cara, Sadie.
No segundo seguinte, ela se livra da sua última peça de
roupa, revelando sua boceta totalmente depilada, como se estivesse
pronta para esse momento que vem a seguir. Delicadamente, Sadie
sobe na cama e passando uma perna por cima do meu corpo, ela
faz aquilo que eu pedi duas vezes, sua boceta encharcada vem de
encontro ao meu rosto.
Antes de cair de boca, eu dou um selinho em suas dobras e
de forma totalmente instintiva minha língua encontra o centro,
contornando-o.
— Eu também quero que você goze na minha boca —
confesso com a voz abafada.
Escuto a risada doce de Sadie em meio a um gemido.
— Você é uma delícia, Sadie — falo enquanto uso meus
lábios para beijá-la uma outra vez, preparando dois dos meus dedos
para lhe penetrar.
Dou uma leve mordiscada em seu clitóris inchado, fazendo
com que seu corpo se retraia e eu vejo o exato momento em que
todo seu corpo se arrepia, juntamente de um gemido de súplica.
Então é disso que ela gosta, portanto eu decido continuar a fazê-lo,
à medida que entro e saio com meus dedos da sua entrada, lambo
toda a extensão da sua pele rosada em movimentos de vai e vem,
dando-lhe algumas mordidas no meio do caminho.
Sadie apoia suas mãos na parede em sua frente, pois quase
perde o equilíbrio quando eu decido arriscar colocar um terceiro
dedo em sua boceta. Logo que eu chupo o seu ponto sensível,
poucos segundos depois sinto as pernas de Sadie tremerem nas
extremidades do meu rosto e meus dedos ficam molhados, com isso
os tiro de dentro e sugo todo o líquido que escorre em sua boceta.
Ela é doce, assim como eu imaginei todas as vezes em que
eu me masturbei, lembrando de Valerie dentro dela e agora, todas
as minhas simulações viraram realidade e da melhor forma possível.
Sadie apoia a cabeça em suas mãos, que ainda se
encontram na parede, e delicadamente a pego pelo braço, deitando
seu corpo completamente cansado e arrasado sobre o meu. Aliso a
pele molhada de suor das suas costas enquanto distribuo alguns
selinhos por seu rosto, eu não sei exatamente o que acabou de
acontecer aqui, eu não sei se vou ser castigado por isso. Mas caso
eu seja, eu aceito toda e qualquer punição, porque durante o tempo
em que nossos corpos despidos estão juntos em cima dessa cama
minúscula, eu me sinto como se estivesse no céu, finalmente.

Berkeley está ganhando o jogo por apenas um ponto e essa


é a jogada final, com Grey e Colin no banco, justo no nosso primeiro
jogo, as coisas tornaram-se ainda mais complicadas.
Não que o Jaguars seja o melhor time da liga, só que com
certeza a gente amassaria o time da Berkeley se a nossa linha de
ataque não estivesse tão desfalcada. Kane não tem o costume de
jogar como quarterback e para piorar a situação dele, Lynnox, que
está estreando hoje como líder de torcida, decidiu que seria uma
boa desejar má sorte para ele mais cedo, e ele colocou na cabeça
que ela fez alguma bruxaria para que ele não conseguisse acertar
nenhum touchdown.
— Se você se sentir muito pressionado só me passa a bola
— peço, quando nos posicionamos em campo para a última jogada.
— Eu não posso fazer isso, esse ponto tem que ser meu —
diz ele, convencido.
— Então você prefere perder o jogo por conta do seu
orgulho? — pergunto, me colocando atrás dele.
— Sim, prefiro.
Eu nego com a cabeça após ouvir a sua afirmação, pois ele
só pode ser louco, Kane leva o esporte a sério demais para arriscar
perder qualquer jogo por picuinha que arranjou com a Lynnox.
Flexiono os joelhos, esperando o início do tempo.
Assim que o juiz apita, o nosso long snapper lança a bola, por
debaixo das pernas, para Kane. Enquanto eu corro para trás, vejo
ele que ele está perdido, sem saber o que fazer ou para onde ir.
— Kane — chamo gritando, desesperado. — Passa a bola,
porra — peço novamente.
Ele nega com a cabeça, porém quando o time adversário
ameaça atacá-lo, ele finalmente cede e faz o lance. Pegando a bola,
eu consigo correr trinta jardas sem ninguém da defesa para me
atrapalhar, pois todos foram para cima do meu amigo. Contudo, nas
últimas vinte jardas sou pego desprevenido no momento em que um
linnerback seguido do free safety, tentam me pegar, mas eu me jogo
para frente, vendo que estou próximo da endzone. Quando menos
imagino minhas mãos, juntamente da bola estão dentro da endzone
e o locutor grita:
— Touchdown!
Enquanto os dois brutamontes ainda estão em cima de mim,
retesando a minha respiração. No instante em que o juiz finalmente
apita, apontando o final do jogo e definindo a vitória do Jarguars,
todos os jogadores do time em campo e aqueles que estão no
banco, correm até o centro do campo, acompanhados do técnico
Willians e comemoramos.
São nesses pequenos momentos que eu sinto que vale a
pena toda a carga que eu carrego durante a semana, entre treinos
de futebol e academia, além de toda a dieta maluca e restrições
impostas pelo nosso treinador, valem a pena todas as vezes que um
jogo está ganho.
Após tirarmos uma foto como time vitorioso, ao longe eu vejo
a ruiva mais linda de todo o universo, vestindo a mesma camiseta
que eu a despi ontem à tarde, antes de compartilharmos de um
momento único e pegarmos no sono após eu sentir a sua libertação
contra minha boca.
Ver Sadie vestida novamente com essa camiseta, faz com
que meu pau ganhe vida outra vez, por sorte uso um protetor genital
durante os jogos, se não nesse momento, todos — inclusive os
meus pais —, saberiam que ele está necessitando dela de novo.
Que por sinal, assim que eu chego na arquibancada, faz com que
meu coração se derreta completamente ao pular nos meus braços e
me abraçar.
— Essa jogada final foi incrível — ela comenta quando eu a
agarro. — Você foi incrível.
— É porque você ainda não viu o meu pau — brinco em um
sussurro, logo que ela me solta
— Elliot James Tanner — esse grito estridente vem da minha
mãe.
Como ela ouviu isso, eu não faço a mínima ideia, só tenho
certeza de que ela ouviu porque a sua bolsa da Hérmes quase me
derruba na hora em que ela cala a boca.
— Olha a forma que você fala com a garota, eu não te criei
assim — repreende minha mãe.
— Realmente, você o criou à base de bolsadas. — Meu pai a
segue e ela olha para ele furiosa. — Belo jogo, garotão — meu pai
elogia.
— Poderia ter sido melhor se o time não estivesse tão
desfalcado — comento ao observar que minha mãe está acariciando
os fios ruivos de Sadie.
Apesar do desastre que foi o nosso primeiro almoço em
família, eu diria que finalmente Margaret Tanner começou a se
acostumar com a Sadie em nossas vidas, em minha vida, caso
contrário ela não estaria sendo tão cuidadosa com sua nora nesse
instante.
— Se ele falar qualquer coisa obscena, por favor me informe,
não importa a hora, que eu capo ele imediatamente.
— Mãe... — chamo. — Quem vai acabar traumatizando a
minha namorada é você. Deixe eu e o Jack em paz, por favor —
imploro.
— Jack? — meu pai pergunta.
— É o nome do pau dele — Grey é quem responde.
E esse é motivo pelo qual, até hoje, eu não contei nada sobre
o meu contrato com Sadie a ele, porque ele simplesmente conta.
— Grey Dawson — minha mãe o chama. — Não me faça
usar minha bolsa da Hérmes — ameaça, o que faz com que Grey
feche a boca rapidamente. — Parabéns, você traumatizou a Sadie
— finaliza ao se colocar ao lado do meu pai.
— Eu estava bem para falar a verdade — comenta Sadie. —,
até saber que as partes íntimas de alguém tem um apelido e que
outro alguém sabe. — Ela enruga o nariz.
— Viu aí?! Traumatizada. Sorte de vocês que eu trouxe uma
água benta para esse jogo hoje. — Então minha mãe tira uma
garrafa de água de dentro da sua bolsa preta e começa a jogar em
mim e no Grey.
— Para com isso, mãe.
— Só quando vocês estiverem benzidos o bastante para
pararem de falar besteira.
— Está bom, querida... — meu pai intervém. — Eles já
entenderam. Não entenderam, meninos?
— Sim — Grey e eu respondemos em uníssono.
Noto que ao meu lado, Sadie observa a cena inteira rindo.
Pois é, que venham os castigos, porque eu já estou no céu.
Não tenho muita certeza de como me sentir quanto a isso
Algo no modo como você se mexe
Me faz sentir como se não pudesse viver sem você
Isso me leva do começo ao fim
Eu quero que você fique
STAY | RIHANNA FT. MIKKY EKKO

Após o término do jogo, nos despedimos dos seus pais e


devo admitir que Margaret Tanner está me amando ou está sendo
completamente falsa, porém durante o tempo em que Elliot
conversava com o pai após o jogo, ela me disse que tem notado
uma mudança boa no filho e acha que é graças a mim, devo admitir
que eu jamais esperaria por algo parecido.
No entanto, aqui estamos nós, ela não só parece gostar de
mim como também perguntou quando é meu aniversário, pois já tem
em mente a bolsa que me dará de presente e eu ri. Ela também me
obrigou, a Elliot, Grey e todos os nossos amigos a ajudá-la amanhã
na organização de um evento da igreja para o dia das crianças.
Agora, Elliot e eu estamos de mãos dadas caminhando pelo
campus. Eu subo no meio fio da calçada do prédio do dormitório,
tentando me equilibrar na linha reta de tinta branca enquanto Elliot
segura meus dedos e pergunto:
— Está bem, mas se você pudesse escrever qualquer coisa
que não fosse um romance, o que você escreveria?
Eu havia aguardado por Elliot do lado de fora do vestiário,
pois ele disse que queria me acompanhar até o dormitório e eu não
me opus. Desde que saímos, estamos conversando sobre as coisas
que Elliot pretende escrever.
— Não sei. — Ele dá de ombros quando eu pulo ao seu lado.
— Talvez sobre você — ele diz ao passar uma mecha do meu
cabelo para trás.
— Sobre mim?
Ele dá um meio sorriso antes de responder.
— Sim, seria uma fantasia e você uma fada que salvaria um
jovem celibatário das garras do pecado.
— Uma fantasia erótica? — sugestiono.
— Olha, talvez sim hein, porque do jeito que as coisas estão
indo meu celibato irá para o ralo em breve.
— Se depender de mim você continuará com ele intacto —
respondo ao morder o lábio inferior, pois apenas a lembrança do
que aconteceu ontem entre nós faz com que meu centro desperte e
palpite entre as minhas pernas.
Mesmo que tenha sentido certa insegurança de Elliot durante
alguns movimentos à medida que ele trabalhava com sua língua e
dedos em busca do meu prazer, eu posso dizer que ele é bastante
instintivo no que faz. E também vale ressaltar que eu nunca me
entreguei ao prazer da forma como o fiz ontem. Era como se nós
dois nos completássemos enquanto nos dávamos prazer, eu falei
sério quando disse que ele não precisava retribuir, pois eu já estava
satisfeita com o seu prazer.
Contudo, vê-lo agir igual um homem das cavernas mandando
eu sentar na sua cara, fez com que todos os meus instintos
primitivos despertassem, o que de fato está prestes a acontecer
agora, outra vez.
— Você está dando um fora em mim e no Jack, Sadie
Langster? — pergunta, parecendo perplexo.
Eu rio.
— Quem apelida o próprio pau de Jack? — pergunto em
meio a risada, meneando a cabeça para trás.
Elliot não me responde, entretanto assim que retorno ao
patamar do seu rosto, ele beija a ponta do meu nariz, passando a
sua mão pelos fios soltos do meu cabelo e então ele reivindica
minha boca em um beijo, e obviamente eu cedo.
Dando alguns passos para trás, as costas de Elliot encontram
a parede do prédio o qual estamos em frente, ele passa a mão da
minha cintura até a bunda, apalpando-a. Nesse momento eu sinto a
sua ereção sobre meu ventre.
— Elliot — chamo, tomando um pouco de ar durante o beijo.
— Eu sei, Watson, eu sei — diz ao morder meu lábio inferior
e encostar a testa na minha. — Eu sei que eu preciso me controlar,
mas é impossível, porque você é... incrível.
— Você também é — elogio ao lembrar da sua performance.
— Acredite, por mim não tem problema algum você querer se
controlar.
— O fato é que eu não quero me controlar — me dá um
selinho —, não com você.
Quando Elliot põe sua boca sobre a minha uma outra vez,
nos afastamos subitamente ao escutar o toque estridente do meu
celular, que chama a minha atenção. Pegando o aparelho na bolsa,
vejo o número do Trevor piscar na tela.
Hesito em atender, pois hoje é uma sexta e eu não quero
acreditar que Trevor vai querer voltar a me usar, mesmo depois de
eu tê-lo vencido na corrida semana passada.
— É o seu irmão? — Elliot pergunta logo que a tela se apaga
e eu assinto. — Ele não está querendo arrumar problema, está?
Engulo em seco antes de responder, pois o celular começa a
tocar novamente na minha mão, eu dou de ombros em resposta a
Elliot e deslizo o dedo na tela, com medo do que me aguarda do
outro lado da linha.
— Sady... — Trevor me chama. — Eu não consigo... eu não...
Meu corpo estremece no segundo em que eu escuto a sua
voz falhar e eu sei exatamente o que significa, pegando as chaves
do carro na minha bolsa, eu respondo enquanto corro em busca do
meu carro.
— Onde você está?
— Ca... ca... casa — ele demora a concluir.
— Eu chego em vinte minutos.
Finalizo a ligação e continuo correndo até o carro. Quando
chego em frente a ele, não sei como farei uma viagem de uma hora
em vinte minutos, mas eu sei que preciso fazer isso. Destravo a
porta e assim que a abro, percebo que Elliot me seguiu.
Merda, eu tinha esquecido que estava com ele.
— O que aconteceu? — ele pergunta, apreensivo.
— O Trevor precisa de mim — digo, entrando no carro.
Para a minha surpresa, mesmo que eu não tenha dito nada,
Elliot me acompanha e entra no carro pelo banco do carona.
— Como assim ele precisa de você? — pergunta tão logo eu
dou partida no carro.
— Não é o que você está pensando — informo ao dar a ré e
manobrar a direção, acelerando o mais rápido que posso.
— Eu só estou preocupado com você, você está
atormentada.
— Olha, Elliot, eu sei que meu irmão é um grande idiota. —
Rio infeliz. — Mas ele também tem os problemas dele, assim como
eu tenho os meus e você os seus. E nesse momento, o dele decidiu
fazer uma visita.
— Você quer que vá com você? — Noto a hesitação em sua
voz. — Se não, eu posso ficar na próxima esquina.
Para falar a verdade, seria ótimo ele vir comigo, eu não quero
estar sozinha com o Trevor agora, sei que meus pais viajaram cedo
para Los Angeles e se ele está em casa, muito provavelmente está
sozinho. Por isso que ao passar a marcha do carro, aproveito para
encostar uma mão na perna de Elliot.
— Eu quero você comigo — informo com a voz vacilante ao
engolir em seco, sinto o momento em que Elliot apenas aperta a
minha mão.
Me compreendendo.
Ele me informa que se formos pela pista de cascalho,
passamos direto por Montgomery, o que faz reduzir o tempo da
viagem. Após Elliot me ajudar com as coordenadas, que eu sigo
exatamente como ele manda, eu peço para ele desbloquear meu
celular e ligar para o meu pai, colocando no viva-voz.
— Oi, linda — meu pai saúda, parecendo animado. —
Aconteceu algo?
— Sim, o Trevor.
— Crise?
— Sim.
— Eu chego em uma hora.
— Pai — chamo. — E se ele...
— Ele não vai fazer nada, Sadie.
— Certo — respondo a contragosto. — Te vejo em casa —
me despeço.
O caminho que faço de Beaufort a Stone Bay pela pista de
cascalhos realmente é bem mais rápido do que se eu estivesse indo
pelo caminho tradicional. Meus pés pisam no acelerador com
brusquidão. Ao mesmo tempo em que eu quero chegar rápido em
casa, eu também quero ir devagar.
Desde que tudo mudou na nossa vida, Trevor teve alguns
episódios de pânico, nesses momentos eu não o julgo, faço de tudo
para ajudá-lo. Apenas meu pai e eu sabemos o motivo real de
Trevor entrar nessas crises de pânico, embora minha mãe seja a
única que consiga acalmá-lo, ela não sabe todos os fantasmas que
existem dentro da cabeça do seu filho.
Ao longo dos anos e principalmente durante a faculdade, ele
sofreu por inúmeras vezes. Esse também é um dos motivos pelos
quais eu me rendo aos seus quereres, eu acredito que a única coisa
que meu irmão quer ter em sua vida é um pouco de controle quando
toda a luz é roubada e ele só encontra a escuridão dentro de si.
Porque eu costumo agir assim, eu também fazia isso,
principalmente nas noites em que dormia com qualquer um, porque
eu precisava de um pouco de controle.
Isso é algo que não tenho sentido falta desde o instante em
que Elliot decidiu me beijar subitamente no meio do campus. Ele
tem ressignificado tudo o que eu era, sou e quero ser.
Para falar a verdade, eu nem mesmo sabia ao certo o que eu
queria ser, contudo eu tenho aprendido ao lado do Elliot que eu
quero ser isso que eu sou hoje. Eu quero falar sobre livros,
desenhar casas, quero sorrir e sentir vergonha ao mesmo tempo,
quero rir das suas piadas sem graça e quero compartilhar alguma
fofoca. Quero vestir uma camiseta boba do time de futebol, porém
também quero me despir dela. Quero passar horas no celular
falando sobre qualquer coisa e quero ainda ficar em silêncio, apenas
ouvindo sua respiração do outro lado da linha. Eu quero me sentir
importante e ter alguém importante para mim na mesma medida.
Alguém que mesmo diante de algo que ele repudie, assim
como ele repudia o meu irmão e a forma como me trata, ainda
pegue na minha mão quando Trevor precisar de mim e me passe a
confiança de que está tudo bem, mesmo eu sabendo que não está.
Estacionando em frente à minha casa, desligo o motor do
carro e passo alguns segundos encarando a porta de entrada. A luz
amarelada da varanda está acessa, no entanto, todas as cortinas da
casa parecem estar fechadas. O carro de Trevor está parado em
frente à garagem e um som alto vindo de dentro dele, tira toda a
calmaria da rua tranquila.
— O que vamos encontrar lá dentro? — Elliot pergunta, me
tirando dos meus devaneios.
— Eu não sei — sou sincera.
Pois realmente não sei como Trevor deve estar nesse
momento e eu tenho medo do que eu vá encontrar lá dentro. Às
vezes ele apenas chora, outras ele quebra tudo e ocasionalmente,
já ocorreu de ele bater em si próprio..., apenas uma vez, ele fez os
três de uma só vez.
É triste e cru, só que é a realidade e eu tenho que encarar
ela.
Descendo do carro, observo que do outro lado da rua, Marlon
— o tio de Heaven e marido da mãe do Axel —, estaciona o seu.
Quando Elliot me segue, ele acena para nós e eu retribuo em um
sorriso fraco, enquanto ele parabeniza Tanner pelo jogo de mais
cedo, Íris retira uma Anya dorminhoca de dentro do carro e em
seguida eles entram em casa.
Assim que meus vizinhos estão fora de vista, eu vou até o
Dodge de Trevor, abro a porta e desligo o som, vendo que as
chaves ainda estão na ignição, as retiro de lá e guardo no meu
bolso após trancar o carro. Elliot me acompanha durante todo o
processo, inclusive aperta a minha mão logo que eu fico de frente
para os três degraus que antecedem o pórtico da minha casa.
— Você quer que eu entre com você?
— Eu não sei — repito a mesma resposta que lhe dei há
pouco.
— Watson — ele me chama.
— Sim? — Meneio a cabeça para encará-lo, seus olhos
verdes agora estão opacos, mas ainda com vida o suficiente.
Elliot passa as mãos pelas extremidades do meu rosto e beija
a ponta do meu nariz em um gesto de carinho.
— Eu vou estar colado na porta, se eu ouvir qualquer coisa
eu entro correndo. Eu não sei o que está rolando lá dentro e
também não sei o que acontece com sua família, talvez um dia eu
seja digno de entender tudo o que se passa aqui — ele aponta para
o meu coração. — No entanto, por agora, eu quero apenas que
saiba que eu vou estar aqui, pronto para te ajudar, no momento em
que você precisar de mim.
Não respondo Elliot, porque uma lágrima decide cair de meu
rosto, contudo logo ela é aparada por seu polegar, então eu tomo a
liberdade de ficar nas pontas dos pés e dar um selinho em seus
lábios.
— Obrigada — sussurro quando me afasto.
Elliot sobe os três degraus comigo e para na porta, me
deixando entrar sozinha e cumprindo a sua palavra.
Ao girar a maçaneta devagar, eu tomo um pouco de ar, me
preparando para o que eu vou encontrar lá dentro. No momento em
que eu abro a porta, vejo que a sala está escura, me inclinando para
o lado, aciono as luzes pelo interruptor, não há nada fora do lugar
nesse cômodo. Todavia, enquanto eu sigo em direção à cozinha,
noto que todas as portas dos armários estão abertas e há cacos de
vidro espalhados pelo chão.
Parando em frente à ilha da cozinha, no mesmo local em que
eu tive a conversa com Drew, onde ele me ameaçara pela primeira
vez, eu olho através da janela e encontro a imagem do meu irmão
sentado na borda da piscina, que está aparentemente com o
aquecedor ligado, devido à fumaça que sai da água.
Trevor está abraçando suas próprias pernas, enquanto se
balança para frente e para trás.
Utilizando a porta de vidro, eu saio da cozinha e atravesso o
deck dos fundos, indo em direção ao meu irmão, que ao contrário do
que eu temia, não está agressivo e sim, atônito a tudo ao seu redor.
A cada passo que eu dou, eu percebo quão atordoado Trevor está,
tanto que nem mesmo mexeu cabeça enquanto eu caminhei até
aqui.
Me agachando atrás dele, vejo que ele encara o seu reflexo
na água, assim como eu fizera há alguns meses. Seus olhos
castanhos estão tomados pela tristeza e inchados, seu rosto está
completamente vermelho, como se ele tivesse chorado por horas
seguidas e eu acho que foi isso mesmo que aconteceu, então
coloco a mão sobre seu ombro, chamando-o.
— Trevor... — minha voz sai calma e paciente.
Aos pouquinhos ele vira seu rosto para trás e assim que me
vê, sou tomada pela surpresa do seu abraço.
Quando nossos corpos se chocam, ele começa a tremer e
soluçar durante um choro incessante. Eu o abraço, como se a sua
vida dependesse daquilo, como se a minha dependesse daquilo.
Um grande nó se instala na minha garganta enquanto eu acalento
meu irmão, que depois de alguns minutos, começa a se desculpar
por tudo o que fez.
— Eu sei que tudo é culpa minha, eu queria que as coisas
tivessem sido diferentes — diz ele, gaguejando devido ao seu choro.
— Eu sou seu irmão, eu deveria te proteger..., eu tentei fazer isso.
Suas palavras são confusas durante seu ataque de pânico.
Encostando a sua cabeça em meu peito, eu tento afagar seus
cabelos ao passo que as lágrimas continuam a descer por seu rosto.
Poucos minutos se passam até que a porta dos fundos seja
aberta, dessa vez por meus pais, que correm em nossa direção. Ao
ver minha mãe, Trevor me larga e a abraça, também falando
inúmeras palavras sem sentido e se desculpando. Ela, por sua vez,
pede que ele suba com ela, que irá o ajudar e Trevor cede ao
pedido da nossa mãe.
Meu pai passa o braço sobre meu ombro e me abraça de
lado, depositando um beijo na minha testa e em seguida nós dois
caminhamos para dentro de casa, seguindo minha mãe e meu
irmão.
Ao entrarmos na cozinha, me deparo com os cacos de vidro e
agilizo para limpar. Após jogá-los no lixo, sou tomada pela atenção
do meu pai.
— O filho dos pastores está lá fora — ele informa e eu
assinto.
— Ele estava comigo quando o Trevor ligou.
— Mas ele não sabe de nada igual aquele outro, sabe? —
questiona, se referindo a Drew.
— Não — respondo imediatamente.
— Bom... — meu pai pondera. — Você sabe que no passado
eu te pedi para cuidar do seu irmão, só que você não tinha que se
meter em problemas por conta disso. Então se algo, que nem o que
aconteceu no ano passado voltar a acontecer, você sabe que deve
me dizer, certo?!
Assinto.
— Sim, eu sei.
Eu demorei um tempo para informar ao meu pai o que estava
acontecendo entre mim e Drew, para falar a verdade ele só tomou
conhecimento quando eu fui internada no hospital. No Natal, ou
melhor, durante a celebração do Hanukkah da minha família, Drew
apareceu transtornado e me fez dirigir por dois dias seguidos, eu
passei dias sem dar notícias aos meus pais. Contudo, o que mais
preocupou eles, foi a notícia de que eu estava no hospital após o
ano novo, então eu tive que contar ao meu pai tudo o que havia
acontecido.
Asher Langster, já está na casa dos cinquenta anos. Ele é
gerente geral de uma empresa de Logística, o que lhe trouxe alguns
fios grisalhos na cabeça, além de todo o estresse que é ter um filho
como Trevor. Ele também tem uma barriguinha de cerveja,
entretanto é um pouco alto e faz o uso de óculos de grau, que nesse
instante, reposiciona no dorso do seu nariz assim que vê Elliot
parado na porta da frente e acena para que ele entre.
— E eu acredito em você, o Tanner tem jeito de ser gente boa
igual o pai dele — meu pai murmura enquanto Elliot faz o percurso
da sala até a cozinha, que é em planta aberta, e eu apenas sorrio
em resposta.
— Está tudo bem? — Elliot pergunta a mim ao franzir o
cenho.
— Sim — respondo. — Está tudo quase bem — respondo.
Mesmo que meu pai já tenho o visto do lado de fora, decido
por apresentá-los.
— Pai, esse é o Elliot — Aponto para Elliot. — Elliot, esse é o
meu pai, Asher. — Os dois se cumprimentam com um aperto de
mãos, o qual, por incrível que pareça, Elliot não hesita.
— Um prazer te conhecer — meu pai anuncia, antes de fazer
a pergunta que esquenta todo o meu rosto. — Vocês são amigos,
estão se conhecendo ou o que?
— Ami... — a palavra morre na minha boca quando Elliot
toma a vez e responde.
— Para falar a verdade estamos namorando.
— Namorando, hum? — Meu pai me olha, desconfiado.
Estou tão a fim de você
Que eu mal posso respirar
E tudo que eu quero fazer
É me jogar com tudo
Mas perto não é perto o suficiente
Até que cruzemos a linha
INTO YOU | ARIANA GRANDE

Sadie arregala os olhos ao passo que alterna seu olhar entre


seu pai e eu. Asher coça a garganta e eu vejo que ela não sabe o
que responder, por isso tento contornar a situação.
— Para falar a verdade faz pouco tempo, senhor. Quer dizer,
senhor, nos conhecemos desde crianças, senhor. Mas se é que o
senhor entende, faz o quê? — Levanto as mãos — Um mês?!
Pouco tempo, o senhor sabe como as coisas são hoje em dia, não
é? Mas se o senhor não aceitar o senhor tem toda a razão, senhor.
Sadie pigarreia alto, meneando a cabeça para o lado.
— Eu acho que ele já entendeu, Elliot.
— Sim, entendi — Asher responde, rindo. — De toda forma,
nós conversamos amanhã pela manhã — informa e depois se vira
para a filha, dando um beijo no topo da sua cabeça. — Eu vou ver
como sua mãe e seu irmão estão. E vocês dois, vão dormir, já está
tarde.
Ao colocar as mãos no bolso da sua calça social, o homem
passa por mim e acena com a cabeça, eu faço o mesmo. Quando
ele desaparece pela escada, eu me inclino para frente, na direção
de Sadie, que está com um braço por cima do peito enquanto
segura o outro.
— Ele quis dizer que eu posso dormir aqui, foi isso mesmo?
— insinuo.
— Você quer dormir aqui? — ela pergunta, como se não
fosse nada demais.
— Você quer que eu durma aqui?
— Eu não vou fazer esse jogo. — Aponta para o meu peito.
— Vem logo.
Sadie começa a sair da cozinha, indo em direção à escada, a
qual seu pai acabara de subir e eu a sigo, após estalar a língua na
boca. Enquanto subimos ao primeiro andar, noto que a parede ao
lado da escada é lotada de fotos da família, que mostram que Asher
Langster um dia já teve os cabelos tão ruivos quanto os dos filhos.
Paro em frente a uma foto em que Sadie está abraçada com Trevor,
acredito que eles poderiam ter algo entre seis e dez anos,
respectivamente.
Assim como no andar de baixo, o interior da casa mantém
uma decoração mais rústica, revestida em madeira escura e tijolos
vermelhos. Passamos por duas portas, que imagino serem de algum
quarto e banheiro, uma vez que a porta do final do corredor parece
ser o quarto principal, e entramos na terceira.
Tão logo a porta se abre, eu dou de cara com um quarto,
também revestido em madeira, contudo uma madeira mais clara,
marfim, a cama é estilo princesa, com cortinado branco e a parede
de cabeceira é praticamente uma biblioteca, com inúmeros livros.
— Eu imaginava você ter uma estante no seu quarto, não um
arsenal de livros — digo, me dirigindo até à parede em questão e
ouço a risada leve de Sadie.
— Não me diga que a minha pequena estante está
intimidando a sua — desafia.
— Nunca! — Aponto com o dedo para ela, ao pegar um
exemplar de Hideaway. — Penelope Douglas? Sério? — inquiro ao
franzir as sobrancelhas.
— Eu sei que é problemático — se defende ao tomar o livro
das minhas mãos. — Mas é muito bom.
— Bom ou bomba? — provoco.
— Vai à merda. — Ela me mostra o dedo do meio antes de
guardar o livro de volta na parede.
— Admita, esses livros são péssimos.
— Você já leu? — interroga com um semblante convencido
em seu rosto.
— Não — admito.
— Então não julgue. — Me empurra com as pontas dos
dedos.
— Não está mais aqui quem falou mal de Devil’s Night. —
Levanto as mãos para cima em redenção.
— Eles são ruins mesmo — Sadie ri ao se jogar na cama, de
costas.
— São mesmo? — pergunto ao acompanhá-la, porém fico
por cima dela, colocando o peso do meu corpo na perna e braço
diretos enquanto com o outro, contorno sua nuca.
Erguendo seu olhar para encontrar o meu e passando as
pontas dos dedos delicadamente por meu tronco, ela conclui:
— Sim, mas os hots são de qualidade. — Morde o lábio
inferior.
— São é? — provoco em um sorriso ao beijar o canto da sua
boca, ela murmura um sim e eu a beijo novamente. — Me conte
mais — peço.
— Não conto nada. — Sadie me empurra, fazendo com que
eu caia de lado na cama. — Você anda muito esperto ultimamente,
Elliot Tanner.
Eu rio.
— A culpa não é minha se você me provoca.
— Sua mãe está finalmente começando a gostar de mim e se
acostumar com a ideia de eu estar na sua vida — ela declara,
pensativa. — Se ela sonhar o que está acontecendo, ela te capa.
Enrugo o nariz ao fazer uma careta, pois em partes ela tem
razão. Minha mãe está gostando dela, só que acredito que jamais
me caparia pois o sonho dela é ser avó.
— Você sabe a história do meu celibato? — pergunto e Sadie
nega com a cabeça.
Então eu lhe conto sobre as líderes de torcida, como a minha
mãe me viu e também sobre a minha promessa de não fazer mais
sexo por medo de Jesus me castigar, o que a faz rir intensamente
no final.
Ela ri tanto, que ronca, igual um porco e até mesmo algumas
lágrimas ousam descer por seu rosto. Eu também rio, no entanto
não por conta da história e sim porque a sua risada é tão genuína
que me deixa alegre, feliz.
— Você sabe que Jesus não iria lhe castigar por fazer sexo,
né? — ela consegue falar quando enfim sua risada cessa.
— Minha mãe parou no hospital — respondo, porém Sadie
me olha sugestivamente. — Eu sei, ela é um pouco dramática. —
Seu olhar intensifica assim que ela levanta as sobrancelhas. — Está
bem, muito dramática. — Reviro os olhos. — De toda forma, eu
acabei meio que traumatizado.
— Nesse caso, quer dizer que se eu tirar sua roupa agora,
você vai continuar com esse trauma? — sugere.
— Por que você não experimenta para ver? — Sorrio de
canto.
Sadie se vira para mim e em seguida eu sou atingido por um
travesseiro felpudo cor de rosa, bem na cara. Alguns pelos colam na
minha língua, devido ao fato de eu estar com a boca aberta e tento
tirá-los, antes de jogá-lo nela de volta. E assim ficamos nos
próximos minutos, em uma guerra de travesseiros ridícula e ao
mesmo tempo divertida. Porque tudo o que essa garota faz,
simplesmente me encanta.
Fazer o que se eu sou um bobo apaixonado?
— Você vai dormir no chão — declara com a voz falhada ao
jogar o último travesseiro em mim.
Aproveitando que tenho cinco travesseiros e ela nenhum,
junto todos em minhas duas mãos, jogando-os em sua direção,
contudo Sadie foge da cama no instante em que eu arremesso.
— Chão. — Ela aponta.
— Você não está falando sério — digo ao tomar um pouco de
ar.
— Está bem — ela cede, deitando-se na cama novamente. —
Nada de chão hoje, mas nada de tocar em mim também. — Com os
mesmo cinco travesseiros que eu havia jogado nela, Sadie faz uma
divisa na cama.
— Por que você está fazendo isso?
— Apenas uma forma de evitar que Jesus te castigue —
zomba, curvando a boca em um sorriso.
— Idiota. — Pego o último travesseiro que ela colocou na
barreira e jogo nela, pela última vez. — Ei, Watson.
— Sim. — Ela ergue a cabeça, me encarando.
Eu não sei se é certo eu pressioná-la quanto a isso, ainda
mais num momento em que estamos completamente alheios ao
mundo lá fora, entretanto desde que seu pai perguntou o que
éramos um para o outro, isso vem meio que me incomodando, ainda
mais quando ele ficou surpresa ao me ouvir afirmar que estávamos
namorando.
— Por que seu irmão sabe sobre nós e seu pai não?
— O Trevor só sabe porque alguém do campus disse a ele e
quanto ao meu pai, eu nunca apresentei nenhum namorado a ele
antes. — Ela dá de ombros, como se fosse a coisa mais normal do
mundo. — E eu não sei se estava pronta para apresentar um
namorado falso — conclui.
E sua conclusão faz todo o meu brilho sumir, porque ela tem
razão. Eu não passo de um namorado falso, por mais que as coisas
entre nós tenham evoluído bastante, e sem contar o fato de que a
única pessoa beneficiada nesse acordo sou eu, faz sentido ela não
ter dito nada aos pais.
— Por que a pergunta? — indaga ao notar que eu fiquei
pensativo.
— Nada — respondo sério. — Só curiosidade mesmo.
— Hum — murmura em resposta.
Em seguida ela se levanta e diz que eu posso ficar à vontade,
só que ela precisa tomar um banho antes de se deitar, porque está
se sentindo suja depois da noite de hoje. Minha resposta é um
sorriso, que se alarga ainda mais assim que ela dá a volta na cama
e deixa um selinho na minha boca.
Depois que Sadie some no banheiro, eu fico encarando o teto
do seu quarto e pensando em tudo que aconteceu entre nós. Não
apenas nas últimas semanas, como também nos últimos anos. Na
festa de treze anos do Grey, em uma brincadeira de sete minutos no
céu, quando Sadie virou a garrafa, ela quase parou em mim,
contudo acabou indo no Wes.
Lembro que naquela época meu coração só faltou sair da
boca e só agora eu me dou conta que aos treze anos de idade,
talvez eu já fosse a fim dela. Recordo também do momento em que
Grey me contou que havia dormido com a Sadie e Allie a pegou
saindo do quarto dele. Ele estava extremamente preocupado com o
que a filha do seu padrasto estava pensando sobre ele, mas na
minha cabeça só vinha à tona as palavras de que ele havia dormido
com a Sadie enquanto eu tinha acabado de entrar em celibato.
A noite em que Heaven colocou fogo no carro de Drew,
pouco mais de um ano atrás, também me vem à mente. Sadie
parecia desesperada ao sair do carro, vestindo apenas um sutiã e
saia, e não me entra na cabeça o motivo de ela ter ficado com ele,
talvez isso nunca tenha entrado porque lembro vividamente que
quando a Heaven foi parar no hospital por culpa dele. Eu fiquei
nervoso, pois na minha cabeça só vinha ela, eu só pensava que a
Sadie poderia ser a próxima vítima dele.
Mesmo sabendo que eu descobri há pouco tempo que eu
estou completamente rendido por ela, a realidade é que talvez isso
tenha acontecido ao longo de todos esses anos, existindo em meu
subconsciente, mas eu precisei lhe oferecer um acordo e me
aproximar o bastante dela para que o sentimento tomasse também
o meu consciente e eu tivesse a certeza do que eu sinto.
A grande questão é que eu sei tudo o que eu sinto, todavia
eu não faço a mínima ideia do que Sadie sente e talvez seja melhor
assim. Pois como um grande filósofo totalmente desconhecido um
dia disse: o não eu já tenho, correr atrás da humilhação é que eu
não vou.
Não sei exatamente em que momento eu adormeci, porém
sei que foi antes de Sadie vir para a cama, pois ao abrir meus olhos,
noto que estou de conchinha com ela, que seus cabelos longos e
macios acariciam o meu rosto e vejo que ela veste um conjunto de
moletom cinza.
Respiro fundo, sentindo o cheiro de cereja que sai dos seus
cabelos e finalmente concluo que o doce, ao mesmo tempo cítrico,
que ela carrega por onde anda, vem dos seus cabelos. Nada mais
justo.
— Bom dia — Sadie anuncia com a voz dengosa, se
espreguiçando contra meu corpo.
— Bom dia. — Pego uma mecha do seu cabelo, trazendo-a
até meu nariz e a cheiro, em seguida dou um beijo na pontinha da
sua orelha.
Ao se virar de frente para mim, Sadie sorri e pergunta:
— O que eu perdi enquanto você dormia?
— Hum... — Finjo pensar, já sabendo a resposta, pois meus
sonhos não mudam, toda noite a mesma coisa.
Eu, Sadie, sexo. Sexo, Sadie, eu. Sadie, sexo, eu. Um ciclo
vicioso.
— Sonhei que eu fazia sexo com uma ruiva gostosa — sou
sincero, mas isso rouba uma risada de Sadie.
— Você sonhou com essa mesma coisa ontem — enuncia
com a voz cantante.
— Eu sonho isso todas as noites — me defendo. — E quanto
a você, o que eu perdi?
— Sonhei que eu fazia sexo com um filho de pastores que
teve uma meia transa em toda sua vida e eu acabava sendo
castigada.
Faço uma careta.
— Pesado. Quem era para ser castigado era ele.
— Tem razão — ela responde e eu me aproximo para beijá-
la. No entanto, Sadie fecha a boca em uma linha reta. — Escovar os
dentes — avisa, pulando da cama, da mesma forma como fizera
ontem pela manhã.
Eu sei que essa é a segunda noite – consecutiva – que
dormimos juntos, ainda assim eu afirmo que eu poderia fazer isso
pelo resto da minha vida e jamais iria me cansar de acordar com ela
ao meu lado e ainda ser obrigado a escovar os dentes como
primeira tarefa pela manhã após fazer a citação de um dos seus
romances favoritos.
Também pulo da cama e me junto à Sadie no banheiro do
seu quarto. Chegando lá, Sadie me entrega uma escova de dentes
e eu faço minha higiene bucal junto a ela, que a todo instante me
olha pelo reflexo do espelho, rindo. E é impossível não a
acompanhar.
É algo tão brega e clichê escovar os dentes juntos, que é
engraçado.
Quando nós dois finalizamos e voltamos para o quarto,
somos surpreendidos por Trevor, que abre uma fresta da porta. Ele
tem uma maçã na mão, veste apenas uma calça de moletom e o
peito despido, logo ele me cumprimenta.
— E aí, pastor. — Sinto uma quase simpatia em sua voz ao
me olhar. — A mãe mandou avisar que o café está pronto e que
quer conhecer seu namorado — avisa, saindo do quarto.
— Certo — Sadie diz, calmamente. — Meu pai, como deu
para perceber ontem, é tranquilo, mas por favor, não chama mais
ele de senhor. — Enruga o nariz. — Já minha mãe, ela é um pouco
complicada, ela é mais conservadora, assim como a sua mãe, então
aja como se você estivesse conversando com a sua própria mãe.
Tudo bem?
— Tudo bem. — Dou de ombros para parecer relaxado,
mesmo que minhas mãos estejam tremendo dentro do bolso. — Ela
não usa nenhuma bolsa da Hérmes, não é?
— Não, apenas Louis Vuitton. E ela não irá jogá-las em você,
em mim ou até mesmo no Trevor quando ele arrotar no final da
refeição.
— Certo. — Assinto com a cabeça.
— Certo. — Sadie sorri.
— Mas e se eu fugir pela janela? — Aponto.
— Você não vai fugir — nega rapidamente.
— Impressão minha ou você está nervosa por apresentar seu
namorado falso à sua mãe? — sugiro.
— Cala a boca que as paredes têm ouvido — avisa ao me
empurrar para fora do quarto.
Chegando no andar de baixo, acompanho Sadie até a
cozinha, onde em uma mesa pequena e redonda, seu pai Asher,
está sentado lendo o jornal e seu Trevor, está ao lado da bancada,
ainda sem camisa e agora come uma banana. Ao lado do fogão,
mexendo os ovos, está Anne Langster.
Eu já conheço a mulher. Para falar a verdade, toda a cidade e
eu diria que a Costa Oeste também conhece, ela é uma das
engenheiras mais requisitadas há anos, por isso viaja tanto. E, na
maioria das viagens, seu marido a acompanha, ela é alta, loira e
magra. Seus olhos, assim como os de Sadie e Trevor são um
castanho cor de mel, que quando bate a luz do sol se tornam
dourados.
Os irmãos Langster têm uma genética mista entre os seus
genitores, isso é fato. Os cabelos ruivos vêm do pai e os olhos da
mãe. Enquanto Sadie tem uma boca mais carnuda igual à da mãe, a
de Trevor é mais fina, igual ao pai. Já Sadie tem o nariz arrebitado
de Asher e Trevor com a ponta mais longa, igual à Anne, que é a
primeira a notar a nossa presença.
Ela larga os ovos em um prato branco e vem até onde
estamos, primeiramente ela abraça a filha, dizendo que estava com
saudades dela e se desculpa por não ter falado com ela na noite de
ontem. Depois ela pula direto para mim.
— Elliot Tanner — cumprimenta em um sorriso. — Confesso
que foi uma surpresa saber que minha filha estava com um
namorado em casa.
— Me desculpa, não era minha intenção desrespeitar a
senhora — digo nervoso.
— Eu sei que não — responde. — Mesmo assim eu gostaria
de lhe conhecer melhor, se possível.
— Claro! — Sorrio em resposta.
— Então sente-se e se sinta em casa — ela diz ao puxar uma
cadeira da mesa. — Ao contrário da maioria das famílias
americanas não comemos bacon no café da manhã, porém temos
de tudo um pouco.
— Entendo e respeito.
Ao me sentar à mesa, Sadie me acompanha, sentando-se ao
meu lado. Logo depois, Anne também se põe à mesa seguida por
Trevor, que por mais estranho que seja, não parece ser o mesmo
babaca com quem eu me acostumei a encontrar nas outras vezes.
Não sei se por conta da presença dos pais ou devido à sua crise de
ontem, contudo ele me trata bem e até mesmo entra na conversa
quando falamos sobre futebol americano.
— Se eu tivesse passado só mais um ano na UCLA, eu iria
mostrar a vocês o que é um touchdown de respeito — ele diz, e aí
está o Trevor que eu conheço.
O que se acha superior a tudo e a todos. Porém, de toda
forma, ele está simpático, por isso decido por não agir
desconfiadamente ao seu redor. Os pais de Sadie me perguntam
sobre a minha formação e assim que falo que é Literatura ambos se
interessam e acabo de notar que a filha herdou deles a paixão por
livros. Eles acabam contando que se conheceram na biblioteca da
faculdade e desde então estão juntos. Anne diz ser agraciada por
ter conhecido o marido e por todo o respeito que ele lhe deu em sua
vida a dois. Ela também chega a comentar que se caso um dia, eu
for escrever meu primeiro livro e pense em ilustrar meus
personagens, ela estará à disposição.
Mas Sadie a interrompe, dizendo que esse trabalho já
pertence a ela. Ao final do café da manhã me despeço dos seus
pais e até mesmo do seu irmão, que faz um toque de mão comigo,
como eu disse, estranho. E ao me despedir da ruiva, ela informa
que me encontra mais tarde, na organização do evento de caridade.

Se existe uma pessoa nesse mundo capaz de me estressar e


me humilhar na mesma medida, essa com certeza é minha mãe.
— Meu filho, eu sei que você é um rapaz delicado, portanto
esse serviço não é para você — diz minha mãe, tomando das
minhas mãos uma parafusadeira que eu iria usar para parafusar o
balanço. — Axel, você é forte, monta isso — ela ordena, entregando
a máquina ao meu amigo, que pega atônito.
Amanhã haverá o evento de Dia das Crianças da igreja dos
meus pais, por esse motivo, minha mãe fez todos os meus amigos
— e não só eles, como também os pais deles —, ajudarem na
organização. Assim que ela vê que a mãe do Wes, que é dona de
uma padaria, chegar com algumas comidas, corre até ela e as duas
começam a brigar.
Decidindo ignorar a minha mãe, tomo a parafusadeira das
mãos do Axel.
— Ei — ele reclama. — Você é delicado, esse serviço não é
para você.
— Ei — respondo. — Você já experimentou enfiar um metro
de pau no seu rabo?
Noto que Magnus, pai da Heaven e Marlon, riem da minha
resposta, o irmão mais novo e padrasto de Axel, me oferece uma
cerveja, contudo eu nego, não quero beber na frente da minha mãe.
— Olha, não é querendo me meter na sua vida — Marlon diz.
—, mas esse estresse todo me parece falta de sexo.
— E é mesmo — Magnus responde. — Esse moleque só
transou com a mão dele.
Largando a parafusadeira no chão, finalmente pego a cerveja
da mão de Marlon, antes de ele tomar um gole, e a viro na boca,
aproveitando que minha mãe está longe. Quando finalizo, Grey e
Kane se juntam a nós.
— Alguém aqui já foi castigado por fazer sexo? — pergunto
ao tomar um gole da cerveja.
— Uma vez eu quase quebrei meu pau — Grey diz e todos
fazemos uma careta para ele. — Na realidade, ela ficou com raiva
por eu ter dito o nome de outra garota e se contorceu em cima de
mim com raiva — ele lamenta ao olhar na direção das garotas.
— Eu já brochei — admite Kane ao dar de ombros.
— Eu já fiquei tão chapado que adormeci antes de gozar —
Magnus reflete e brinda com o irmão.
— Eu definitivamente não vou falar das minhas experiências
sexuais na frente do meu sogro — Axel se nega.
— Você deveria ensinar a gente como rasgar calcinha, isso
sim — Grey diz.
— Rasgar calcinha? — pergunto.
— Cala a boca — Axel joga cerveja em Grey antes que ele
comece a falar.
Antes que eles entrem em uma confusão, eu chamo Axel
para me ajudar no balanço. Com a ajuda do meu amigo e dos seus
parentes tagarelas, eu termino de montar o balanço, que logo
também se transformou em um escorregador. Aproveito todas as
chances que eu tenho, durante o tempo que minha mãe discute com
outras pessoas, para tomar mais cerveja escondido dela e me sento
no gramado para descansar.
— Eu estou definitivamente morto de fome, a tia acha que eu
não tenho sentimentos — divaga Grey ao se sentar no chão. —
Sabe o que ela me disse? Que se eu continuar do jeito que eu
estou, vou morrer solteiro, porque até o filho dela conseguiu uma
namorada e eu não. Agora ela está lá, falando mal de mim para as
meninas — diz com um tom melancólico em sua voz.
Ele olha na direção de Allie e seu semblante transparece a
sua chateação, e todo mundo sabe o motivo, uma vez que Allison
chega próxima a nós e se senta no balanço, com Colin a
empurrando.
— Você sabe qual a minha opinião sobre isso e eu acho que
não preciso repetir.
— Por mais que seja difícil, eu tenho que concordar com o
Elliot — Kane diz e eu lhe mostro o dedo do meio.
— Se você não disser o que você sente, você vai morrer
sozinho mesmo — conclui Axel, deixando Grey ainda mais
consternado. E eu volto a olhar para Colin e Allie.
Mesmo achando eles fofos, eu ainda sinto pena do meu
amigo, pois quem era para estar de casalzinho fresco nesse
momento com ela, era ele. E falando em casal, a pessoa que
completa o meu está a alguns metros de distância rindo e
conversando com Wes, Heaven e Lynnox. Noto a forma como ela
sorri ao me ver olhar para ela e coloca os cabelos cor de cobre para
trás, em uma tentativa falha de controlar os fios com o vento que
faz.
Ao passo que meus amigos começam a conversar sobre
sentimentos, eu permaneço olhando para Sadie. Depois que eu
deixei a sua casa mais cedo, fui caminhando até a minha e admito
que ela rodeou todos os meus pensamentos durante a minha
pequena caminhada. Algumas horas depois ela apareceu para me
buscar, usando um vestido vermelho, que dá um grande destaque
aos seus seios e à cintura fina. A saia não é curta, nem longa,
porém realça suas pernas longas suficientemente, enquanto as
costas nuas são cobertas pelos cabelos soltos.
Um sorriso largo toma conta da minha feição durante o tempo
em que eu a observo, eu nem mesmo chego a notar que a conversa
ao meu redor cessou, isso só acontece quando a minha mãe invade
meu campo de visão.
— Você está surdo, garoto?
— Oi. O que foi? — Balanço a cabeça, aturdido.
— Eu estou te dizendo que separei alguns brinquedos
antigos seus para doação e que estão na sua casa da árvore para
você ir pegar, em que mundo você está habitando nesse momento,
Elliot James? — pergunta séria.
— Desculpa, não tinha ouvido.
— Anda logo, que a Sadie está te esperando no carro.
— A Sadie... — minha voz sai fraca, portanto, coço a
garganta. — A Sadie vai comigo?
Minha mãe balança novamente a cabeça em desaprovação e
me olha séria.
— Anda logo.
— Está bem! — Me levanto e rapidamente me afasto dela.
Sei que ela não está com nenhuma bolsa no ombro ou
próxima a ela, contudo não duvido que simplesmente surja uma do
além e ela atire em mim, por isso, corro até onde Sadie deixou o
carro estacionado e ela já está dentro dele. Assim que eu entro, ela
dá a partida e pergunta:
— Então você tem uma casa na árvore?
— Casa na árvore? — pergunto retórico ao passar o cinto. —
Eu tenho uma mansão na árvore.
Sadie ri e eu apenas admiro sua boca, em questão de
minutos chegamos à minha casa, Sadie estaciona nos fundos e
seguimos para o quintal, onde encontramos a minha singela casa na
árvore.
— Eu não sabia que você estava falando sério — constata
Sadie ao observar a construção de madeira que fica entre duas
raízes grandes.
A casa é erguida por alguns troncos de árvores e a escada
para subi-la é como se fosse de uma casa normal mesmo, com
degraus de madeira contornando uma das estruturas.
— As damas primeiro — faço a sugestão para que Sadie
suba e ela aceita.
Cerca de um metro e meio acima do chão, chegamos à casa
que mede cinco metros quadrados, no canto estão os brinquedos
que minha mãe havia falado, no entanto o centro da casa também
dispõe de uma mesa de pebolim, tapetes acolchoados e até mesmo
um vídeo game, antes tinha até um frigobar.
— É uma casa e tanto — elogia.
— Foi aqui que eu virei meu primeiro litro de Jack — revelo à
Sadie, que repara toda a estrutura, admirada.
— Ah, não. — Ela estreita os olhos, me encarando num
sorriso.
— O quê? — indago, sem entender sua surpresa repentina.
— Você não deu o nome do seu pau em homenagem à
bebida, deu?! — pergunta divertida e logo que eu assinto com a
cabeça, ela ri mais ainda. — Que ridículo — zomba.
E ao invés de rir, eu fixo meus olhos nela, completamente
atordoado por sua simpatia, eu nem mesmo consigo pensar direito
quando eu me aproximo de Sadie e a puxo em um beijo quente e
cheio de necessidade, cortando a sua risada no meio.
— Elliot — Sadie respira fundo ao separar nossas bocas. —,
o que é isso?
Então, eu ajo como um total idiota, ao ficar de joelhos e
declarar:
— Sei que eu não sou o padre Kai, mas eu fico de joelhos
para você.
Você, você ama o jeito que eu te mexo
Você ama o jeito que eu te toco
Meu amado, no fim das contas
Você acreditará que Deus é uma mulher
GOD IS A WOMAN | ARIANA GRANDE

Eu sorrio sem jeito ao ouvir o que acaba de sair da boca de


Elliot, pegando em seus ombros, peço:
— Levanta daí.
— Eu estou falando sério. — Ele pega uma das minhas
pernas e a ergue, beijando meu calcanhar completamente. — Eu
fico de joelhos para você, Sadie, porque eu estou louco por você.
Não apenas o meu rosto esquenta com a sua declaração,
como o meu corpo inteiro se acende, entendendo o que Elliot quer
dizer com cada beijo molhado que ele distribui pela extensão da
minha pele.
— Sei que eu posso parecer um pouco sem jeito — rosna
com a voz rouca ao arranhar minha pele com os dentes. — Mas se
você me indicar exatamente o que fazer, eu prometo que faço valer
a pena.
Umedeço os lábios, passando a língua por eles, sem
realmente saber o que responder, uma vez que estou sendo
instigada pelo meu desejo. Quando Elliot põe as mãos em minhas
coxas por debaixo da saia do vestido, eu olho para baixo,
encontrando seus olhos verdes, que estão tomados pela luxúria do
momento.
— E o seu celibato? — questiono. — Você tem certeza
disso?
— Tenho — constata. — Meu pau vive tão duro por você que
chega a doer — declara, o que faz meu rosto esquentar. — E você,
tem certeza disso?
Mordendo o lábio inferior assim que Elliot passa a mão por
minha bunda, sinto minha boceta latejar, tanto que chegar a doer.
— Mais do que qualquer coisa na minha vida — respondo
finalmente.
Não é preciso mais nenhuma palavra para que no instante
seguinte Elliot encontre a bainha da minha calcinha e a desça por
minhas pernas. Chegando aos meus pés, eu levanto um de cada
vez, mordendo os lábios para evitar que um sorriso malicioso se
espalhe em minha boca. Atentamente eu observo Elliot cheirar e
passar a língua pelo tecido que estava colado em minha boceta há
pouco.
— Tão doce... — ele murmura contra o tecido. — Seu cheiro
é perfeito, Watson.
Elliot me chamar pelo apelido faz o meu corpo estremecer e
em questão de segundos eu me agacho no chão, ao anunciar:
— Acredite em mim, Elliot Tanner, não é apenas o seu pau
que está doendo de excitação.
Um gemido sai dos meus lábios quando nossas bocas
colidem, a sua língua é perspicaz, inteligente, dura e leve. Com
apenas um toque, Elliot consegue despertar todo o meu corpo e
com um beijo, ele consegue me tomar para si, então sim, eu tenho
certeza de que estou pronta para me entregar para ele. Não apenas
com um beijo ou um oral, eu que quero o sentir dentro de mim,
quero que ele me toque, me sinta.
Me domine.
O empurro, até que Elliot se deite de costas no tapete
acolchoado, e me sento por cima da sua virilha, levando as mãos
até a bainha da sua camiseta preta, e enquanto tiro-a por sua
cabeça, eu roço por cima da sua ereção, totalmente dura dentro das
calças. Mordo o lábio quando levo a língua até a sua entrada em V,
lambendo seu abdômen, sinto o gosto salgado de suor, contudo não
me incomoda o gosto no momento em que beijo a sua pele, assim
como ele fizera em minha perna.
— Eu preciso ver seus peitos — ele pede em um sussurro.
Minha boceta palpita com o seu pedido e meus mamilos
ficam duros contra o tecido fino do vestido.
— Então tira minha roupa — digo.
Elliot passa as mãos delicadamente por dentro do tecido, no
encontro entre minhas coxas e quadril e levanta o vestido, revelando
cada pedaço do meu corpo ao passar a vestimenta por cima da
minha cabeça. Ele solta uma lufada de ar, admirando meus seios,
que estão empinados em sua direção, e os mamilos rosados se
envergam no instante em que ele os acaricia, com a mesma
atenção em ambos.
Ao passo que Tanner acaricia meus peitos, eu permaneço
roçando meu clitóris contra a sua ereção, que sinto estremecer sob
mim, levo meus lábios até o seu pescoço, depositando ali uma
chupada. Elliot belisca um dos meus seios e puxa meus cabelos,
fazendo com que eu erga minha cabeça e encontre seu rosto
totalmente ardiloso.
— Você é perfeita, Sadie — declara e eu fecho os olhos,
gemendo e sentindo a fricção dos nossos sexos enquanto o meu
permanece nu e o seu vestido pelo tecido grosso do jeans, que
ajuda a realçar o meu desejo. — Você não precisa fechar os olhos,
eu quero assistir ao espetáculo que é você gozar e sentir prazer —
declara.
Eu aperto ainda mais meu clitóris palpitante em sua ereção.
Contudo, sou surpreendida assim que Elliot me empurra e
dessa vez, quem vai parar no chão sou eu. Abrindo os olhos,
surpresa, ele repete:
— Você não precisa fechar os olhos.
Sua mão encontra minha boceta, dando um tapa nela antes
de abri-la com os dedos e começar a massagear meu clitóris, meu
corpo se curva em um primeiro momento ao sentir os dedos frios
contra o fogo da minha vulva.
— Se eu fizer qualquer coisa errada, me avisa — ele pede e
eu luto contra a vontade de fechar os olhos, pois sinto minha visão
oscilar, então eu assinto.
Mesmo que eu enxergue uma silhueta preta ao seu redor, eu
consigo ver o sorriso malicioso de Elliot se curvar em seu rosto.
Em um primeiro instante, ele é totalmente delicado em seu
toque, porém tão logo sente que eu começo a me esfregar contra
ele com mais força, ele me aperta em movimentos circulares com
mais firmeza. Meus olhos não se concentram no rosto de Elliot, mas
sim na sua mão, que se move cada vez mais esperta contra meu
sexo.
Um grito escapa dos meus lábios quando ele decide usar o
seu polegar para entrar em mim, encontrando meu ponto G.
— Você está indo muito... — começo a elogiar, só que pauso
para soltar um gemido. — be... be... bem.
— Está bom para você? — Sua voz sai rouca e eu assinto ao
lhe encarar.
O verde dos seus olhos fora substituído pelo preto das
pupilas, que assim como os meus, não estão em meu rosto e sim,
na minha boceta.
Assim como na primeira vez em que vi Elliot despido, com
uma mão só ele desabotoa a calça e a desce até o meio das suas
coxas, juntamente com a cueca preta, colocando para fora sua
ereção, Elliot leva a sua mão esquerda até o seu pau enquanto a
mão direita está tomada por minha boceta. Ele começa a bombear
sua ereção e eu até penso em ajudá-lo com isso.
Contudo, eu me deixo agir pelo egoísmo, pois tenho medo de
me mover e acabar quebrando esse momento mágico, com isso eu
levo minhas mãos até meus seios, necessitados de atenção, e
passo a massageá-los.
Esfregando e beliscando as pontas dos bicos entumecidos,
sinto que a cada segundo estou mais próxima do meu auge à
medida que Elliot esfrega meu clitóris e massageia meu ponto G.
O estopim para mim, chega no instante em que vejo o líquido
branco começar a escapar da sua glande enquanto ele bombeia seu
pau desde a base até a cabeça. Mordo a bochecha, para impedir
que um grito escape da minha garganta, entretanto é em vão, assim
que o líquido quente do gozo de Elliot encontra os meus seios, eu
também gozo em sua mão.
Em uma respiração fraca e entrecortada, Elliot cai em cima
de mim e abocanha um dos seios, chupando-o. Usando minhas
pernas trêmulas, engancho-as em sua cintura, e peço exasperada:
— Eu preciso que você me foda, Elliot Tanner.
Elliot ergue a cabeça e um sorriso adorna sua boca antes de
ele me beijar, nós dois ainda estamos ofegando ao passo que as
nossas línguas úmidas brigam pelo controle. Eu chupo a sua língua,
ele morde meu lábio, eu o mordo, ele me chupa e assim
continuamos até que a nossa respiração volte quase ao normal,
Tanner murmura entre o beijo:
— Eu preciso que você me ensine a te foder. — Eu gemo
com o seu pedido.
Ao passar a ponta do dedo por sua mandíbula, constato:
— Apenas entre em mim, que o resto a gente resolve aos
poucos.
Ele ri ao morder meu lábio inferior pela última vez, antes de
retirar a sua calça, e eu pergunto:
— Você tem camisinha?
Ele assente ao retirar a embalagem laminada de um de seus
bolsos.
— Eu tenho andado preparado desde que trombei com duas
ruivas se pegando no meu quarto. — Eu rio com sua declaração.
Elliot leva a embalagem até a boca e a rasga, com as unhas
eu arranho o seu tronco de leve enquanto ele veste a sua ereção.
— Você está pronta? — Assinto, mordendo o lábio.
Então, segurando o pau pela base, Elliot o ajusta em minha
vagina e um choque invade o meu corpo quando eu o sinto passar a
cabeça duas vezes em um vai e vem gostoso pela extensão do meu
órgão. Seus olhos estão vidrados em meu núcleo rosado e aos
pouquinhos vou sentindo a sua cabeça me preencher, seguida por
sua largura, eu arfo em um gemido logo que metade do seu pau me
adentra.
— Está tudo bem? — ele pergunta.
— Gostoso — é o máximo que eu consigo responder antes
da minha vista escurecer completamente.
A última vez que eu fizera sexo foi há mais de um ano e foi
totalmente desproporcional, foi algo rápido, em menos de dez
minutos, portanto sentir toda a grossura e comprimento de Elliot me
invadir é delicioso.
Sei que ele me preenche no segundo em que sinto suas
bolas baterem contra minhas nádegas. Em uma pretensão de ajudá-
lo, abro os olhos e ergo uma das minhas pernas, encontrando o seu
ombro e ele a agarra.
— Agora entra e sai, fique à vontade — peço. — A casa é
sua.
— Minha. — Ele geme assim que se afasta e entra em mim
outra vez.
Um sorriso estampa os meus lábios com suas próximas
palavras.
— Totalmente minha — murmura.
E assim, Elliot começa a entrar e sair de mim e devagarinho e
vai acelerando, em algum momento eu desço a minha perna e
arreganho-a, juntamente com a outra. Agora Elliot se apoia em
meus joelhos e juntos, nós dois nos movimentos um contra o outro,
a casa da árvore é tomada por nossos gemidos todas as vezes em
que os nossos corpos batem um contra o outro.
A todo o instante nós dois nos olhamos, mudando apenas
quando juntos, fixamos em nossos sexos, que se encontram
repetidas vezes.
— Está bom para você? — ele pergunta ao se curvar sobre
meu corpo e eu engancho sua cintura com minhas pernas.
Sua voz é sexy, gentil e exasperada. Tudo na medida certa.
Elliot ajusta os nossos corpos e entra em mim outra vez, eu levanto
a bunda e meus seios também se empinam.
— Você é gostoso demais — informo ao cravar minhas unhas
em suas costas.
Se movimentando por cima de mim, Elliot volta a brincar com
meus seios. Consigo acompanhar suas investidas enquanto ele me
dá longos beijos nos peitos, colo e pescoço.
Um gemido intenso deixa a minha garganta assim que Elliot
dá um chupão na lateral da mesma e sinto seus lábios sorrirem com
a sua performance.
Me entregando ainda mais a ele, decido tomar a sua boca
novamente, antes de declarar:
— Eu vou gozar.
— Repete — ele pede.
— Eu vou gozar.
— Só mais uma vez — pede novamente, me socando mais
rápido, o suor grudando em nossos corpos.
— Eu vou gozar — repito, uma, duas, três vezes.
Na sexta, as palavras vêm em forma de um grito, seguido de
um gemido quando Elliot Tanner, o celibatário, filho de pastores, que
não faz sexo por medo de que Jesus o castigue, entra mim com
tanta vontade, que toma todo o meu corpo, o meu ser, minha alma e
me faz perder todo o controle que eu achava que tinha sobre mim,
fazendo o líquido escorrer da minha boceta até o meu ânus e me
deixando encharcada pelo meu gozo.
Com Elliot ainda dentro de mim, eu apoio minha testa em seu
ombro e constato:
— Que Jesus me castigue, porque eu quero viver
eternamente com você dentro de mim, Elliot Tanner.
Elliot ri, puxando meus cabelos e me beijando ao passo que a
minha boceta pulsa, desejando que ele volta a me estocar o mais
rápido possível.
Você não precisa dizer que me ama
Você não precisa dizer nada
Você não precisa dizer que é minha
Amor
Eu andaria no fogo por você
Apenas me deixe te adorar
ADORE YOU | HARRY STYLES

— Por favor, me deixa te comer em cima da escrivaninha —


peço pela décima vez, fazendo biquinho triste.
— Se você não ficar quieto, eu vou te queimar, Elliot. —
Sadie me fuzila com os olhos através do espelho do meu quarto,
segurando um modelador de cachos e insistindo em cachear meu
cabelo pela segunda vez, já que na primeira tentativa, logo que ela
finalizou a última mecha, todo o restante do cabelo voltou a ficar
liso.
— É que você está irresistível nessa roupa — continuo.
Ela está vestindo, por enquanto, apenas um corset que realça
a sua cintura curvilínea e faz com que seus peitos saltem para fora.
Ela inclusive colocou a culpa em mim pelos cachos, que está
fazendo nos meus cabelos, não terem dado certo, porque quando
ela foi fazer a franja na primeira vez, eu não resisti e puxei seus
peitos para fora e totalmente sem querer, eles acabaram na minha
boca.
— Não vai me comer na porra da escrivaninha — ela diz pela
décima primeira vez.
— Também não faço questão de te comer mais de forma
nenhuma — digo aborrecido ao cruzar os braços.
— Deixa de ser birrento, nós dois sabemos que daqui a cinco
minutos você pede novamente — responde, completamente
concentrada na mecha na lateral da minha cabeça.
— Touché — respondo num sorriso malicioso e Sadie ri.
Ela é má, ela é muito má.
E eu não falo isso da boca para fora, desde que transamos
pela primeira, há duas semanas, eu deixei claro que queria colocar
em dia os meus vinte anos sem sexo. Certo, talvez eu esteja sendo
um pouco equivocado ou muito, uma vez que eu tive meu vigésimo
aniversário há poucos dias. De toda forma, ela sabe que eu quero
aproveitar o tempo perdido.
Por isso, todos os dias após o primeiro treino do time do dia,
que acaba às sete da manhã, eu faço questão de passar no seu
alojamento para darmos uma rapidinha. Ontem, por exemplo, Sadie
se recusou a transar porque havia acabado de lavar o cabelo e se
ela suasse iria sujar. Mas quem que lava o cabelo às sete da manhã
em uma quinta? Eu chamo de pessoas más.
Nós dois também temos transado bastante durante a tarde,
após as aulas, algumas vezes já ocorreu de fazermos durante o
almoço. Embora eu tenha tido treino mais tarde e minha barriga
tenha roncado nesse dia, eu não me arrependi de não ter me
alimentado em troca de vinte minutos de um sexo intenso dentro do
carro.
E claro, não é querendo me gabar, porém a minha
performance, nos últimos quinze dias, evoluiu o suficiente para que
nós dois consigamos chegar aos finalmentes em pouco tempo. Eu
poderia estar me achando por isso, certo?! Então eu estou me
achando.
Nossa rotina, além de muito sexo, de manhã, tarde e noite,
também inclui muitos livros, cafés e irmos à igreja aos domingos,
almoço com meus pais e jantar com os dela e a companhia do
Trevor, que voltou a ser desagradável. Além dos meus jogos com o
time, onde até agora estamos indo bem e não perdermos nenhum
jogo, contudo empatamos contra a UCLA no momento em que Grey
foi para o banco por derrubar Colin assim que ele pegou a bola.
Meu amigo tem sofrido cada vez mais a cada dia que passa e
tudo se intensificou depois de um jantar em família onde o Colin foi
apresentado ao pai da Allison. O Grey nem mesmo ficou para a
sobremesa e olha que essa é a parte favorita dele. Se eu pudesse o
ajudaria nessa situação, mas ele teve o quê? Mais de seis anos e
nunca fez nada, pelo contrário, desdenhou da garota mesmo
sabendo que era louco por ela.
Ao finalizar todos os cachos no meu cabelo, Sadie faz uma
careta e enruga o nariz, me encarando.
— Acho que você vai ficar melhor com ele bagunçado, estilo
o Sherlock do Robert Downey Jr. — Ela meneia a cabeça para o
lado. — Ao invés desse estilo Benedict Cumberbatch — diz, fazendo
gestos com a mão ao apontar para mim.
Estamos nos arrumando para a festa de Halloween que
acontece hoje na fraternidade e decidimos nos vestir a caráter. Eu
de Sherlock Holmes e Sadie de Doutora Watson, entretanto uma
Watson gostosa.
Levando em consideração o que Sadie acaba de propor
sobre o meu visual, me levanto da cadeira, vou até o espelho e
balanço a cabeça a fim de bagunçar os cachos que ela fez.
— Acho melhor eu usar a boina mesmo — constato ao
verificar meu visual no espelho.
— Concordo. — Sadie bufa, vendo que meus cabelos
voltaram ao liso extremo. — Esse seu cabelo não tem jeito.
— Sabe o que não tem jeito? — pergunto ao me virar para
ela e agarrá-la pela cintura. — O meu pau que continua duro por
você.
— Nós não vamos transar, Elliot — ela diz em um sorriso, me
beijando logo em seguida.
Aperto a sua bunda na intenção de fazer com que ela sinta a
minha ereção contra o seu quadril, para que assim ela finalmente
ceda ao meu pedido, só que de nada adianta pois ela morde meu
lábio inferior e coloca as mãos em meu peito, me empurrando.
— Não vamos transar — repete.
— Má — digo inconformado.
— Você ainda não viu nada. — Ela pisca para mim. — Agora
vamos logo, estamos atrasados, todos já estão lá embaixo.
Essa garota ainda vai me matar, eu tenho certeza disso.
Considerando que todos os nossos amigos realmente já
estão lá embaixo, eu começo a me vestir juntamente com Sadie.
Usando uma camisa branca e um conjunto de terno de 3
peças, com calça, colete e blazer em tom terroso, passo pelo
pescoço um cachecol azul escuro e visto um sobretudo de seis
botões, que vai até o meio das minhas pernas, no mesmo tom do
cachecol. Finalizo a minha fantasia de Sherlock com um sapato
social e uma boina do mesmo tom do terno.
Sadie se veste no mesmo estilo, no entanto toda a sua roupa
é em tons terrosos. Como eu havia dito, ela é uma Watson gostosa,
portanto ela veste uma saia curta de linho e um blazer, ela não faz o
uso de uma camisa branca, quer dizer, nenhuma camisa. Por isso
que o corset que ela usa ajuda a realçar e empinar seus seios
perfeitamente perfeitos.
Sei que parece que eu a exalto demais, mas todo o muito
ainda é pouco para o que essa mulher merece.
A ruiva finaliza sua fantasia com um sobretudo da Burberry,
em uma mistura de bege, preto, branco e vermelho, um lenço
vermelho é amarrado em seu pescoço para insinuar uma gravata e
ela calça botas da mesma cor da saia e blazer.
Ou seja...
— Gostosa! — declaro no instante em que ela fica pronta.
— Não está muito vulgar? — ela pergunta ao olhar suas
pernas quase despidas por completo.
— Se com vulgar você quer dizer gostosa para cacete, então
sim, extremamente vulgar.
— Obrigada — ela agradece quando suas bochechas ficam
avermelhadas.
Por mais que estejamos nesse caminho há mais de dois
meses, Sadie ainda não deixa de sentir vergonha todas as vezes
em que é elogiada e algumas delas, ainda estremece assim que a
toco com carinho. O que só me faz ter a certeza de que ela
realmente nunca foi tratada da maneira que merece, até mesmo por
Drew, no tempo em que esteve com ele.
Então, de certa forma, eu o agradeço mentalmente, por me
deixar ser o primeiro a poder valorizá-la como ela merece. E do jeito
que me sinto e como as coisas estão caminhando entre nós, eu
espero ser o único.
— Vamos? — ela pergunta ao se aproximar da porta.
— Só um segundo — peço ao levantar o indicador. Correndo
até o meu estoque de bebidas, que fica embaixo da minha
escrivaninha, eu pego um litro de Jack Daniel’s, abro o lacre e dou o
primeiro gole. — Agora sim, podemos ir — anuncio.
— Devo me preocupar com você bêbado essa noite? —
Sadie questiona ao franzir o cenho.
— Se você quer saber se eu vou ficar duro, pode ter certeza
de que eu vou — brinco.
— Para de pensar em sexo. — Ela bate no meu braço logo
que passamos pela porta e eu pego a chave. — Por que você vai
trancar?
— Da última vez em que deixei aberta, tinham duas ruivas se
comendo aqui dentro.
— Justo.
Após trancar a porta e deixar meu quarto a salvo, com uma
mão seguro a mão de Sadie e na outra carrego meu Jack já aberto,
ao descer as escadas até a sala, eu tomo mais um gole.
O andar de baixo já está lotado de universitários fantasiados,
todos os jogadores do time, juntamente com as líderes de torcida,
organizaram e decoraram a festa. Luzes roxas e laranjas oscilam
por todo o andar, na parede ao lado da escada está escrito com
uma tinta vermelha: você é o próximo. E no chão há um desenho da
silhueta de um corpo, insinuando que houve um assassinato ali. O
restante da decoração é composto por teias e aranhas voadoras,
morcegos, fitas amarelas, cartazes de procurados, e tudo o que uma
festa no tema de Halloween pode oferecer.
Indo para a mesa de bebidas, Sadie se serve de gin com
água tônica em um copo vermelho enquanto eu continuo com a
minha garrafa de whisky na mão, porque mesmo que minha mãe
nunca tenha me dito antes, eu não aceito bebidas de estranhos, por
isso tenho sempre a minha em mãos.
— Agora fala na minha cara que eu não arrasei na decoração
— Grey grita por cima da música da Ariana Grande que toca nas
caixas de som, ele veste uma fantasia de coelho rosa de pelúcia e
segura uma cenoura na mão.
— Que roupa é essa? — Sadie pergunta ao cuspir a bebida
da boca, sem conseguir evitar a risada.
— Estou vestido de coelho, não está vendo?! — ele pergunta
retórico.
— Acho que isso está um pouco óbvio — respondo. — Mas
por que cara, por quê?
— Que porra é essa? — Axel indaga ao se aproximar e
estreitar os olhos para Grey. De primeira eu não consigo identificar
sua fantasia, uma vez que ele está sem camisa, contudo a calça
bufante de cetim, os arranhões falsos em seu abdômen e a máscara
peluda no topo da cabeça, revelam que ele está vestido de Fera e
Heaven, ao seu lado, usando um vestido amarelo curto e uma coroa
na cabeça, de Bela.
— Um coelho! — Grey responde revoltado.
— Por que um coelho? — Sadie pergunta, sem conseguir
controlar a risada.
— Porque sim! — responde ao morder a cenoura, que
descobrimos, no final das contas, que é de verdade.
Allison, que está vestida de mulher gato em uma roupa de
couro colada, se aproxima de nós ao lado de Colin, que usa uma
camisa de botões cinza e um suéter marrom por cima, finalmente
revelando a fantasia de Grey:
— Ele está vestido igual ao Chandler no Halloween da oitava
temporada de Friends. — Ela revira os olhos ao passo que um coro
de “ah” é dado por todos nós.
— E do que você está vestido? — Grey pergunta, apontando
para Colin.
— De Chandler em todas as outras temporadas. — Colin
sorri simpático.
Mas ele não recebe a mesma simpatia de Grey, pelo
contrário, ele dá um sorriso debochado ao anunciar:
— Então eu ganhei, porque a Allie está vestida como a
Mônica, eu de Chandler e você de Joey no mesmo episódio.
— Desde quando você sabe tanto sobre Friends? — Allison
pergunta surpresa e a resposta que ela obtém de Grey, é um dar de
ombros.
Ele definitivamente está se achando mais do que nunca
agora.
Os meus amigos se servem de bebidas e depois nós
invadimos a pista de dança. Eu continuo entornando a garrafa de
bebida na minha boca e em algum momento, Axel reclama com
Heaven, que toma o whisky da minha mão e toma um grande gole.
Algumas músicas depois Wes surge, vestindo uma fralda de bebê,
juntamente de Lynnox, que usa uma roupa da Capitã Marvel e Kane
aparece usando uma peruca loira, uma camiseta branca assinada
com vários nomes e uma calça de moletom azul quadriculada.
Uma placa com a escrita “You Belong With Me”, mais os
óculos de grau pretos, revelam que ele está vestido de Taylor Swift.
Tomando mais três goles de Jack, eu pego a mão de Sadie e
a giro quando Adore You do Harry Styles começa a reverberar nas
caixas de som. Ela move a sua cintura contra a minha mão, que
desce pelo contorno do seu corpo até a sua bunda, e no pé do seu
ouvido eu canto a música sussurrada:
— Eu andaria no fogo por você, apenas me deixe te adorar.
Como se fosse a única coisa que eu faria na vida.
Durante algumas batidas da música aproveito para morder o
lóbulo da sua orelha. E ela contorce o seu corpo contra o meu
durante a música, que assim que finaliza, é substituída por uma
batida intensa de algum remix do Marshmello.
— Vamos jogar beer pong — Lynnox sugere.
— Só se for para tirar a roupa — Wes continua.
— Gosto! — Heaven se anima.
— Eu não — Allie diz, um pouco tonta pela bebida que
tomou.
— Nem eu — Grey a acompanha, segurando-a.
— Que tal? — pergunto à Sadie.
— Vamos lá! — responde animada. — Eu sou boa de mira e
estou louca para tirar a roupa do Wes.
— Haha, vadia, você jura, não é?
— Está com medo? — Sadie o desafia.
— Se você acertar apenas um, eu fico nu.
— Vou repetir. Está com medo? — insiste ela.
— Você esqueceu que eu aprendi a ser bom de mira com
você, querida? — diz Wes ao pegar a bola de plástico das mãos de
Sadie.
Em questão de segundos, estamos na cozinha. Dez copos
são postos em ambas as extremidades da mesa, jogando par ou
ímpar, para decidir quem vai primeiro, Sadie ganha, contudo ela tem
uma condição.
— Não vamos jogar dessa forma, eu tenho muitas peças de
roupa, então seria desproporcional...
— Acho que alguém está com medo de mim, afinal de contas
— Wes interrompe-a.
— Me deixa terminar — pede e eu, juntamente de Grey e
Kane, vaiamos, o que me rende um dedo do meio da minha suposta
namorada. — Quem perder pula na piscina apenas de roupas
íntimas. — Ela sorri com malícia para seu amigo de infância.
— Mas está fazendo dez graus lá fora — Wes reclama.
— Você não vai arregar agora, vai? — provoca Kane.
— Claro que não — Wes nega.
Quando ambos concordam com o termo do jogo, eles
começam a jogar. Sadie acerta o primeiro copo e Wes vira a cerveja
que há nele, em contrapartida ele também acerta um e a ruiva imita-
o na hora de virar o copo na boca. Sadie acerta mais três copos,
deixando Wes tonto, porém em uma reviravolta intrigante, Wes
acerta cinco copos seguidos após Sadie errar um.
Restando apenas um copo, para ambos, a jogada agora é de
Sadie, e eu grito:
— Vai lá, amor, você consegue!
Ela me olha assustada ao escutar minhas palavras e
rapidamente eu fecho a boca, eu e Sadie não fomos os únicos que
percebemos a minha gafe, logo Axel contorna a parte de trás do
meu pescoço com a sua mão forte e calejada e pergunta:
— Você acabou de chamá-la de amor? — Eu apenas assinto.
— E você já disse que está apaixonado por ela? — Nego. — Você
está fodido.
E eu concordo.
Assim que Sadie acerta o último copo de Wes, eu viro o
restante do líquido âmbar na boca e corro em direção à mesa de
bebidas, me servindo de duas doses de tequila. Eu perco o
momento em que todos vão para o jardim para verem Wes
mergulhar na água fria, no entanto eu presencio todos retornarem
para dentro da casa.
Sem desculpa alguma, eu permaneço o resto da noite
misturando todos os tipos de bebidas possíveis, vodka, tequila, gin,
cerveja, licor e até mesmo uma dose mínima de absinto, o teor
alcoólico de mais de oitenta porcento me deixa totalmente aéreo,
pensando na simples palavra que saiu da minha boca em voz alta
na frente de todos os nossos amigos, mas principalmente na dela e
para ela.
O fato é que foi um erro chamá-la assim, por mais que
estejamos mais próximos e íntimos do que nunca, eu ainda não
cheguei a conversar com Sadie sobre os meus sentimentos por ela,
nem sobre o quão intensos eles têm se tornado todos os dias, todas
as horas. A verdade é que eu faria tudo por nós.
Decido, por fim, que eu preciso declarar todo o meu amor por
ela quando ela me ajuda a subir a escada, porque pela primeira vez
na vida, eu acho que estou bêbado. Não sei se pelo absinto ou por
todas as outras bebidas que ingeri durante as últimas horas. O único
pensamento que permanece em minha mente enquanto ela tira
minhas roupas e me ajuda a deitar na cama, é que eu a amo e eu
preciso deixar isso claro para ela.
— Ei, Watson — chamo.
— Sim? — Eu acho que ela responde.
Nos segundos seguintes eu sinto minha boca se mover de
forma embolada, a minha voz chega até os meus ouvidos à medida
que eu tento me declarar para ela.
— Eu posso até ter problema do coração — começo.
— Você tem problema do coração? — ela pergunta, acho que
assustada.
— Não — respondo longo e arrastado. — Mas alguém da
minha família teve.
— Ah — murmura em resposta e eu sinto a maciez e o
conforto do colchão me abraçarem.
Puxando-a para cima de mim, coloco as mãos nas
extremidades do seu rosto e meus olhos oscilantes focam nos seus
cor de Jack Daniel’s, poxa, minhas duas coisas favoritas. Sadie e
Jack.
Jack e Sadie.
Até que eles rimam.
Ou não?
Será que eu estou falando alto agora?
Não, não estou, porque não estou ouvindo minha voz.
Por isso continuo.
— Preste atenção — peço ao arrotar.
— Estou te escutando. — Sua voz perfeita invade meus
tímpanos.
— A gente, meu amor, está junto...
— Hum.
— Podem passar mil anos, você pode achar ruim, mas eu
vou ficar com você mil anos.
— E você vai viver mil anos? — A pergunta chega aos meus
ouvidos em forma de melodia.
— Preste atenção — peço. — Eu vou ficar com você durante
as coisas boas e também nas ruins, eu vou estar com você em
qualquer momento.
— Estou entendendo.
— Você vai ficar comigo também? — pergunto.
— Vou sim. — Quando a sua confirmação chega para mim,
eu permito que minha boca sorria e fecho os olhos.
— Ei — chamo.
— Oi.
— Você é real?
— Não, eu sou um sonho — sua voz me diz e eu rio, junto
com ela.
Virando de lado, eu sei que ela não é um sonho, porém eu
passo a noite inteira sonhando com ela.
Você é lindo, mas a verdade é feia
Eu nunca tive suas más intenções
Eu só meio que não mencionei
Que eu quero você, porque eu sei que você nunca vai me amar
Então eu menti quando disse que não me importo
WE LIED TO EACH OTHER | OLIVIA O’BRIEN

Ele está deitado ao meu lado, mais precisamente, sua


cabeça descansa em minha barriga enquanto seus braços abraçam
o meu quadril e eu faço cafuné nos seus cabelos, que se espalham
por minha pele, à medida que passo as páginas no Kindle.
Elliot está dormindo desde que chegou, ontem ele teve um
jogo fora de casa e assim que retornou ao campus veio direto para o
meu alojamento, já passavam das sete da noite de sábado quando
ele bateu na porta, seu corpo estava tão cansado que ele foi direto
para a cama, então eu o ajudei a tirar os sapatos e depois me deitei
ao seu lado, lendo um romance escrito por uma autora brasileira
através da tela do e-reader.
A cada dia que passa temos ficado cada vez mais próximos,
o que começou com um contrato e uma amizade, inúmeras fofocas
e conversas sobre livros, se transformou em sexo e um sexo muito
bom para ser sincera. Contudo, mesmo que pareçamos dois
coelhos às vezes, não é apenas a transa que tem aumentado essa
ligação entre nós.
São as horas que passamos juntos e digamos que, são todas
as possíveis. Nós temos dormido juntos todas as noites desde o
Halloween, duas semanas atrás. Se eu não durmo com ele na
fraternidade, ele dorme comigo no alojamento, pela manhã ele
acorda cedo para os treinos em campo, alternados pela academia,
as rapidinhas que ele faz questão de fazer, ainda acontecem, claro!
Porque o homem não descansa nunca.
Ele também tem feito questão de me deixar na primeira aula
e me buscar na última. Também estudamos juntos na biblioteca,
uma vez que estamos em época de provas, ao passo que ele tem
que fazer vários artigos de opinião sobre livros e autores
mundialmente conhecidos, eu trabalho em desenhos de paisagens e
meio ambiente.
Na mesinha ao lado da minha cama, a tela do meu celular
acende. Deixando o Kindle de lado, eu o pego e visualizo as
mensagens de Lynnox.
Lynnox: Ei, está em casa?
Abre a porta para mim, por favor.
Nossa.
Esqueci que o ônibus dos meninos chegou antes.
Se estiver transando, esquece.
Eu me deito aqui.
Nesse chão frio.
Ela manda várias mensagens, uma atrás da outra, então eu
tiro o braço de Elliot delicadamente da volta do meu quadril e ajusto
o travesseiro em sua cabeça, para substituir o meu abdômen,
fazendo de tudo para não acordá-lo, entretanto meu celular não
para de vibrar com as mensagens de Lynnox.
Lynnox: Estou tão cansada.
Eu só queria minha cama.
Mas eu me contento com o carpete nojento do corredor.
Vc é uma boa amiga, Sasa.
Eu também sou.
Por isso não vou mais atrapalhar a sua transa.
Goza por mim, garota.
Nossa!
Isso soou péssimo.
Eu não quero seu homem.
Só para deixar claro.
Mas quando gozar
Por favorzinho, abre a porta?
— Acredite, se eu estivesse transando, com certeza o Elliot
teria brochado com o tanto de mensagens que você está enviando
— digo ao abrir a porta, tendo a visão da minha amiga totalmente
descabelada, com o celular nas mãos, digitando mais uma
mensagem, que ela interrompe no momento em que me vê.
— Eu não atrapalhei o sexo, atrapalhei? — ela pergunta,
genuinamente preocupada ao entrar no nosso apartamento.
— Não, o Elliot também chegou cansado — explico.
— Eu já estava me sentindo mal, caso tivesse feito — ela diz
ao me abraçar. — Mas essa viagem foi realmente cansativa.
O jogo aconteceu em Phoenix, no Arizona, a viagem dura em
média dez horas de ônibus, o que explica o cansaço da minha
colega, que faz parte do time da torcida, por isso ela também viajou.
— No entanto, eu tenho três reclamações para fazer — digo
quando a vejo largar a sua bolsa de viagem no sofá.
— Reclamação não. — Geme ao sentar-se ao lado da sua
mala.
— Reclamação sim — insisto, sentando-me no braço do sofá.
— Primeiro, não acho justo a Valerie morar em um flat e usar
a nossa sala para transar — digo ao fazer careta.
— Eu já pedi a chave reserva a ela. — Lynnox revira os
olhos.
— Segundo, por que mandar várias mensagens se você pode
mandar apenas uma?
— E qual graça teria? A emoção é justamente digitar e enviar
— resmunga ao gesticular.
— E terceiro, havia mesmo necessidade de sumir com os
protetores genitais do Kane?
— Havia sim, ele esbarrou em mim de propósito e derrubou
todo o glitter azul nas minhas pernas — choraminga.
Ela já havia me contado essa história ontem, antes do jogo,
quando me mandou a foto dos protetores do Kane, eu respondi que
em casa conversávamos pois eu coloquei para fora toda a comida
que estava na minha boca ao ver o tamanho do negócio, durante o
jantar com Allie, Heaven, Wes e Axel.
“— Ele tem um pau grande — explicou Axel logo que eu
mostrei a foto ao grupo, o que gerou curiosidade em todos nós
enquanto riamos da situação.”
— Você sabe que o protetor do Kane é feito exclusivamente
para ele e por conta disso, ontem ele teve que escolher entre jogar
ou ter filhos futuramente.
— Ainda bem que ele escolheu jogar — responde divertida.
— Já imaginou vários pirralhos iguais ao Kane no mundo? — Seu
rosto estremece ao pensar na possibilidade. — Eu abençoei o
mundo não deixando isso acontecer.
— Falando assim, você deveria se benzer para não ser a
mãe desses pirralhos — zombo dela ao me levantar.
— Eu pensava que você era minha amiga, Sadie, não minha
inimiga — ela responde quando eu começo a voltar para o meu
quarto.
— Boa noite, Lynnox. Sonhe com o Kane e seus pirralhinhos
— digo pela fresta da porta, no instante em que a vejo pegar uma
almofada e jogar na minha direção, fecho a porta, rindo tão logo a
almofada a atinge.
— Sua idiota — ela grita da sala.
Voltando para o quarto escuro, noto que Elliot nem mesmo se
mexeu desde que o deixei na cama sozinho. Ele realmente está
cansado, me deito novamente ao seu lado e volto a pegar o Kindle,
destravando a tela, retomo a leitura do livro que me fez sair de uma
ressaca enorme.
O livro traz uma atriz e um jogador de hóquei que se
envolvem em um namoro falso para a mídia e foi traduzido
recentemente. Basicamente ela o odeia por ser jogador, enquanto
ele ama provocá-la a chamando de esquentadinha, o que é super
divertido. Ou seja, tirando a parte do ódio, lembra a mim e o Elliot,
uma vez que vivemos um relacionamento falso e ainda temos
apelidos. E agora, por ele ter inventado de brigar em pleno jogo,
eles tiveram que viajar para as Maldivas e desviar a atenção da
mídia, não contando com isso, ele ainda reservou um quarto de
hotel com apenas uma cama. É hilário o momento em que a
personagem principal, Avery, descobre o feito de Caden e eu acabo
soltando um gritinho junto de uma risada assim que leio a cena em
questão.
Sinto Elliot se mexer ao meu lado e abaixando o Kindle junto
ao meu peito, vejo que ele continua dormindo, portanto, continuo
lendo.
Me sinto, a cada minuto que passa, mais e mais encantada
com o casal, pois na próxima cena eles estão jantando e a Avery,
cabeça dura do jeito que é, tenta esconder um sorriso, e eu sorrio
junto no momento em que o Caden tira uma foto dela e solta: “Você
deveria sorrir mais. Fica linda quando sorri.” Meus olhos brilham
com isso.
Contudo, sou pega de surpresa quando a ficção se torna
realidade e uma luz branca quase me cega, tão logo minha visão
começa a se acostumar novamente com a escuridão, percebo que
Elliot não está apenas acordado, como está com o celular em mãos,
observando a tela.
— Não sei se já te disse isso antes, Watson, mas você lendo
é a visão do paraíso — ele diz, me mostrando a foto que acabara de
tirar.
Na imagem eu seguro o aparelho branco em mãos, meus
olhos brilham enquanto leem as palavras nele e meus lábios estão
abertos em um grande sorriso.
— Eu me assustei — respondo. — Por que você não avisou
que havia acordado? — pergunto no instante em que ele se curva
sobre mim e liga o abajur na mesa de canto.
— Você parecia tão plena e feliz lendo, que preferi registrar o
momento antes — explica, como se fosse a coisa mais natural do
mundo acordar e ligar um flash na cara da outra pessoa.
— É porque esse livro é muito bom — informo ao estalar a
língua no céu da boca.
— É mesmo? — indaga interessado. Eu respondo assentindo
com a cabeça, seus olhos brilhantes me investigam e ele passa a
mão no meu cabelo, que está solto. — E como se chama? —
pergunta, agora olhando para minha boca.
Meu rosto esquenta antes de eu responder, porque quando
ele olha para minha boca, meu centro também palpita, querendo a
sua atenção.
— Me Ame ou Me Odeie — respondo com a voz vacilante.
O próximo passo de Elliot seria me beijar, entretanto, ao
alisar a maçã do meu rosto com o seu polegar e trazer seus olhos
verdes escuros de encontro aos meus, meu coração congela, minha
respiração retesa e minha boca seca instantaneamente quando o
escuto responder.
São apenas três palavras, sete letras, quatro sílabas.
— Eu te amo.
Eu te amo.
Quando lidas, são poucas, só que quando ditas ou ouvidas,
carregam o peso do universo inteiro diante da voz do ser humano.
Nunca foi tão difícil escutar algo antes, nos livros parece ser
algo tão fácil, tão feliz, tão pacífico. Mas pessoalmente? É
assustador.
Eu deveria me derreter com o que acaba de ser dito por ele,
porém não é isso que acontece, eu me apavoro. O sorriso que havia
em meu rosto desaparece, sei disso pois sinto meus lábios
paralisados em uma linha reta e meu rosto, que há instantes estava
tão quente, esfriou. As batidas do meu coração, que estavam
ansiosas e descompassadas, pararam. O ar ofegante que eu
tomava, se tornou tóxico.
Meu desespero é tão evidente que Elliot rapidamente
percebe isso.
— Ei — Elliot me chama e eu ouço, mas eu me nego a isso.
— Ei, Watson. — Sua voz é melódica, como se estivesse me
fazendo um carinho. — Você não precisa dizer de volta.
Péssima hora para eu decidir abrir a minha maldita boca,
entretanto ela age por vontade própria.
— Eu sei que não — respondo seca.
Atingindo a mim, pois meu estômago embrulha assim que
fecho a boca, mas principalmente a Elliot, que pisca várias vezes,
surpreso pelas minhas palavras e meu tom de voz.
— Nossa — ele murmura ao soltar um assobio.
Sei que isso tudo parece chocante, porque é chocante. No
momento em que alguém fala que te ama, você responde de volta, é
algo natural, pelo menos para pessoas normais, pessoas intensas.
E eu não sou assim.
Eu não mereço o amor, por mais que eu já tenha ouvido de
outras pessoas totalmente o contrário, eu me conheço mais do que
qualquer outro e eu sei que eu não mereço o amor. Talvez apenas o
amor familiar, de mãe e pai, até mesmo do meu irmão, por mais
odioso que ele seja.
Mas amor, amor?
Não.
Eu com certeza não sou uma pessoa merecedora disso,
talvez eu fosse até os meus doze anos, talvez eu fosse enquanto
ainda tinha as chances de ser uma pessoa normal, porém bastou
uma barra de ferro para acabar com toda e qualquer chance de eu
ser digna do amor um dia. Por conta daquele ferro, começou a
minha primeira mentira, que perpetua até hoje.
Essa mentira também me levou até o Drew, que me
ameaçou, me manipulou e me disse palavras duras, que eu sei que
são verdade. Eu não sou digna do amor, não porque ele me disse
isso e sim, porque uma pessoa tão infeliz como eu, que causou
danos na vida de várias pessoas, jamais mereceria algo tão puro e
tão lindo como esse sentimento.
Como eu fui capaz de deixar Elliot chegar nesse ponto,
mesmo sabendo que isso não poderia acontecer entre nós? Porque
não, ninguém pode me amar. Principalmente ele.
— Você não pode me amar, Elliot — declaro, como se aquilo
fosse um aviso, como se eu estivesse mandando nele ou sei lá o
que.
— O quê? — ele inquere assustado. — Por que eu não posso
te amar, Sadie?
— O que está acontecendo entre nós, Elliot? — respondo
com outra pergunta.
Ele solta uma lufada de ar e fecha os olhos, os abre, olha
para o teto e depois para mim, então responde.
— Não sei. Me diz você, o que está acontecendo entre nós?
Ótimo, agora virou uma mesa de ping pong, onde a bola vai e
volta e ninguém responde nada. Com isso, eu decido me levantar,
largando o Kindle em cima da cama, e caminhar até a escrivaninha,
abro a gaveta e tirando de lá o papel, leio em voz alta:
— Sexta cláusula — começo, com a voz embargada e
sentindo as lágrimas se acomodarem em meus olhos, só que eu me
recuso que elas desçam. — Caso o relacionamento passe a afetar a
vida pessoal de uma das partes e uma delas ache necessário o
término do contrato antes do tempo estipulado de um ano, terá de
haver uma conversa entre ambas as partes para entrarem em
comum acordo sobre como o término será anunciado. — Abaixando
o contrato, olho para Elliot.
Elliot olha para mim chocado enquanto nega com a cabeça.
— Eu não sei o que está acontecendo entre nós, só sei que
está afetando a nossa vida pessoal — completo.
— Não acredito que você vai envolver o contrato nisso.
— Claro que vou. — Solto a folha em cima da escrivaninha.
— A gente não pode negar que essa mentira começou a afetar
nossa vida pessoal, tanto que... — Minha voz embarga novamente.
— Tanto que...
— Tanto que eu te amo — esbraveja. — É isso aí, Sadie, eu
te amo. E por mais que você não precise responder, eu jamais
imaginaria que você iria envolver o contrato nisso.
— Nós criamos todas as cláusulas para nos protegermos. —
A primeira lágrima desce em meu rosto e eu a limpo rapidamente.
— Você quer falar sobre as cláusulas? Tudo bem, vamos
envolver o contrato.
Se levantando e passando por mim, ele pega o papel que eu
havia abandonado.
— Cláusula um, esse relacionamento é completamente
fictício, mas adivinha só?! — fala retoricamente ao olhar para mim.
— Ele deixou de ser fictício no instante em que nós quebramos a
cláusula dois e fizemos sexo, centenas de vezes.
Outra lágrima desce e eu também a limpo.
— Não vamos esquecer da terceira cláusula, que inclui não
contar a ninguém, porém eu contei ao Axel no momento em que
soube que estava apaixonado por você — completa.
Como assim ele contou ao Axel?
— Você o quê?
— Estou apaixonado por você, há horas, dias, semanas...
Meses, eu estou apaixonado por você, Sadie.
— Quando você contou ao Axel?
— Sei lá. — Ele dá de ombros, se aproximando de mim. Elliot
põe as mãos na minha cintura e pela primeira vez eu não queria que
ele me tocasse, porque eu não mereço que ele me toque. — Eu
estou apaixonado por você, Sadie e eu amo você — ele repete com
a voz suave.
Agora, não apenas uma lágrima desde por meu rosto e sim,
inúmeras delas, tornando a visão do rosto de Elliot imperfeita e
turva, eu queria poder dizer que eu o amo de volta. No entanto, eu
não sei o que é o amor, eu não o conheço, porque eu não o mereço.
Eu não te mereço, Elliot, tento falar, entretanto as palavras
que saem da minha boca são outras.
— Mas eu não te amo — respondo com a voz embargada.
— Eu não estou pedindo para dizer isso de volta, Sadie. Eu
só quero que você saiba que eu, Elliot James Tanner, te amo.
— Você não deve, Elliot — nego novamente.
— Por que não, Sadie?
Tento limpar as lágrimas do meu rosto, contudo é impossível,
pois elas continuam a descer descontroladamente.
— Porque eu jamais serei capaz de retribuir — respondo,
tentando tomar um pouco de ar.
Elliot fica em silêncio, o meu coração martelando contra meu
peito indica que eu estou não estou surda, pois apenas as batidas
dele preenchem o som do ambiente. Até o momento em que ele tira
as mãos de mim, afastando-se e pergunta:
— É por conta do Drew?
Eu não sei se sua pergunta é para mim ou para ele. Se for
para mim, a resposta é um “não”, porque por mais que eu tenha
ferrado a minha vida e de outras pessoas por conta do Drew, eu
acabo de estragar mais uma. Uma que diz que me ama e que está
apaixonada por mim e por eu ter consciência o suficiente, eu não
posso deixá-lo fazer isso consigo mesmo.
Jamais poderia me perdoar por todas as mentiras que contei,
porque eu sei que jamais ninguém irá me perdoar, por isso eu
decido mentir mais uma vez.
Pela última vez, minhas paredes são erguidas e eu faço
aquilo que eu estou acostumada a fazer há tanto tempo.
— Sim — eu minto.
Estou dando tudo o que posso
Mas tudo o que você faz é estragar as coisas
Sim, estou bem aqui
Estou tentando deixar claro
Que ter metade de você simplesmente não é o suficiente
NAKED | JAMES ARTHUR

Sua resposta me atinge como um soco no estômago, sinto o


gosto amargo da bile em minha língua. Ela só pode estar mentindo,
não é possível que o que Sadie acaba de falar seja verdade.
— Você ainda o ama, é isso? — pergunto, quase enojado.
— Sim — responde.
E todos os momentos que passamos juntos? Todas as
conversas que compartilhamos, o carinho mútuo, as risadas,
piadas? Como ela pode dizer que ainda é apaixonada por ele,
depois de tanto tempo, depois de tudo o que eles viveram, depois
tudo o que nós vivemos.
Como ela pode simplesmente atear fogo em mim e depois
jogar um balde de água na minha cabeça?
— Você está mentindo. — Eu me nego a acreditar.
O rosto de Sadie está vermelho, assim como seus olhos, que
não param de chorar, sua mão está trêmula e sua voz sussurrando.
Eu sei que ela está mentindo.
— Não — é a única palavra que ela deixa escapar da sua
boca.
O nervosismo toma conta de mim, eu me aproximo dela,
enxugando seu rosto encharcado pelas lágrimas que não param de
descer e abraçando-a, trago sua cabeça para junto do meu coração.
— Eu sei que você está mentindo, Sadie — insisto. — Você
não pode dizer que eu não posso te amar quando as batidas
frenéticas do meu coração pertencem a você. Eu te amo, Sadie.
— Não — repete.
Mesmo se agarrando a mim, como se eu fosse tudo aquilo
que ela mais deseja, ela ainda se nega.
— É mentira — repito, dessa vez deixando que as lágrimas
cheguem aos meus olhos e desçam.
— Não.
— É mentira — digo mais uma vez, segurando sua cabeça
firmemente contra meu peito.
— Não — ela sussurra, também chorando.
Sadie segura a minha cintura firmemente, sem conseguir
soltá-la e eu continuo prendendo-a contra mim, mesmo não
desejando que isso seja uma despedida entre nós, eu a seguro
como se fosse a última vez que eu vá fazer isso na vida.
A seguro para não a deixar ir, faço isso por minutos, até que
em algum momento nós dois paramos de chorar e por mais difícil
que seja, aos poucos vamos nos afastando, ela funga, limpando o
nariz e eu passo a mão no rosto.
Olhando para o teto branco do seu quarto, respiro fundo ao
colocar as mãos na cintura e crio coragem para perguntar.
— Então é isso? Cláusula seis?
Torço para que ela volte atrás e responda que não, que tudo
não passou de um equívoco da sua parte, que ela está confusa,
como sempre está, que ela precisa dizer não para depois dar um
sim. No entanto, não é isso que ela faz, ela só acaba com todas as
minhas esperanças, cada vez mais.
— Sim.
— Para de me dar respostas monossilábicas — peço. — Por
favor, me responde. Do fundo do seu coração, é isso que você
quer? Você quer acionar a cláusula seis?
— Sim, Elliot — ela responde quase sem força. — Eu quero
acionar a cláusula seis, é o melhor para nós dois.
— Não, não é — respondo. — Assim como eu, você sabe
que não é o melhor para nós dois, você pode negar o quanto você
quiser, mas jamais diga que o que vivemos durante esse tempo não
foi especial para você, que não foi diferente de tudo o que você já
viveu e sentiu. Não minta para mim dizendo que isso é o melhor
para nós, quando você sabe que é mentira — acuso. — O melhor
para nós, somos nós.
Ela nega com a cabeça e noto que ela morde o interior da
bochecha, tentando se concentrar para não voltar a chorar, porém
não serve de muita coisa.
— Acredite em mim quando eu digo que você está totalmente
errado sobre isso — sua voz sai vacilante, eu sinto a farsa em todas
as suas palavras, só que isso não impede que ela continue. —
Realmente, tudo o que vivemos foi ótimo, nós nos entendemos, isso
é fato — continua com a voz trêmula à medida que as lágrimas
voltam a descer em seu rosto. — Mas é melhor destruir uma parede
enquanto ela tem apenas areia e cimento, do que esperar ela ficar
pronta com o concreto para finalmente colocá-la ao chão. Eu fui feita
para magoar e enganar, Elliot, eu prefiro te magoar hoje, do que te
enganar amanhã.
— Você está me enganando nesse exato momento e me
magoando duas vezes mais — respondo sincero.
Pegando em sua mão, a levo até a cama e me sento na
ponta junto dela.
Eu sei que eu não vou ganhar essa discussão, por mais que
seja o meu maior desejo que ela volte atrás, eu não posso obrigá-la
a esquecer o que viveu com o Drew e se abrir para quem está na
frente dela agora. Então eu me despeço com as palavras mais
sinceras que eu consigo raciocinar nessa situação.
— Eu queria ser aquele em quem você confia, que você pega
na mão e pensa que nunca irá encontrar algo parecido na sua vida
novamente. Eu queria ser aquele com quem você sente borboletas
voarem em sua barriga enquanto você aguarda ansiosamente a
chegada. Eu queria ser aquele que, após um dia cheio, você pede
uma massagem e ele te dá. Eu queria ser aquele que faz piada da
sua voz todas as vezes em que você desafina durante a música. Eu
queria ser aquele que você ama tanto, que você tem medo de
perdê-lo. Porque você é isso para mim, Sadie. Mas eu não posso te
obrigar a me deixar ser isso para você.
Ela volta a limpar as lágrimas do rosto, eu sinto a sua tristeza,
porque eu também estou triste. Eu estou acabado, se eu pudesse
voltar uma hora atrás, talvez eu não tivesse dito que a amava.
Porém, esse sentimento mora em mim a tanto tempo que estava me
sufocando, eu não conseguiria viver mais um dia sem dizer a ela a
verdade, é uma pena que ela não queira se abrir para isso.
Beijando a ponta do seu nariz, finalizo:
— Você é a minha pessoa favorita, Sadie e eu não quero que
ninguém tome o seu lugar na minha vida.
Me levanto da cama aos poucos, ainda segurando sua mão,
eu só queria sentir um movimento, mínimo que seja, dela me
puxando de volta, só que isso não acontece. Mesmo no momento
em que o que resta do nosso toque é apenas o enlace dos nossos
dedos mindinhos, eu ainda quero que ela me puxe, mas ela não faz.
E então, de repente, não há mais toques, não há mais
palavras.
Não há mais Elliot e Sadie.
Não há mais Watson e Sherlock.
Após um último toque, tudo acabou...
Me forço a não olhar para ela enquanto pego minha bolsa,
que está ao lado da porta do seu quarto.
Contudo, assim que abro a porta, o canto do meu olho a
encontra, Sadie continua sentada na ponta da cama, entretanto
agora ela abraça suas pernas, as lágrimas estagnaram e os olhos
continuam vermelhos, assim como o restante do seu rosto
normalmente alvo.
Ela apenas me observa ir embora, sem se mover, sem falar
nada. Nem ao menos seus olhos piscam...
Antes de passar pela porta, informo:
— Vou esperar uma mensagem sua dizendo como vamos
informar isso a todos.
Ela não me responde, a consternação em seus olhos é o
suficiente para que eu ouça um “sim” vindo do fundo da sua alma.
Viro as costas para ela e finalmente saio do seu quarto.
Deixando não só ela, como também inúmeras memórias que
construímos juntos em pouco tempo, as quais estarão para sempre
presentes em minha mente.
Passando pela sala, vejo que Lynnox está encostada na
porta do seu quarto com os braços cruzados por cima do peito, ela
nega com a cabeça e me fuzila com os olhos.
— Se você tiver feito merda, eu te caço pelo resto da sua
vida, Elliot Tanner.
— Se eu tivesse cagado tudo, teria sido melhor do que o que
acabou de acontecer — respondo, mais para mim do que para
Lynnox. — Até mais — me despeço.
Saindo do apartamento delas, eu fecho a porta com um
pouco mais de força do que o normal, pois por mais que não pareça,
eu estou puto. Eu não queria me sentir assim, no entanto é
impossível não sentir quando você abre seu coração e como
recompensa alguém quebra ele em vários fragmentos
pequenininhos.
A raiva que cresce em mim é uma mistura de perda e
desilusão. Não é nada fácil quando um sentimento floresce em
você. Eu jamais vivi algo parecido, porque nunca fui o tipo de cara
de namorar, acho que por isso minha mãe havia insistido que estava
na hora de eu começar a ter algum relacionamento.
Assim que estou próximo à escada, escuto a porta do
alojamento de Sadie se abrir, no mesmo instante me viro, na
esperança de que seja ela saindo por aquela porta e voltando atrás,
contudo a desilusão me ataca quando vejo que não se trata da sua
porta e sim, da vizinha.
Eu perdi algo, o qual eu vinha acreditando que era real, não
apenas para mim, para Sadie também, o que não torna nada fácil
aceitar essa decisão quando eu sinto, mais do que isso, quando sei
que nós estávamos na mesma sintonia. Por mais que ela ainda
tenha qualquer sentimento pelo Drew, é difícil de engolir que ela
ainda esteja tão conectada a um relacionamento que só a fez sofrer
e não consiga se libertar dele por algo que tem feito bem a ela.
A nós.
Descendo as escadas eu vou embora, não porque eu estou
desistindo dela, eu jamais desistiria dela.
Mesmo que eu queira ficar, eu vou embora, porque a gente
não desiste do amor, a gente desiste do que dói e ainda que eu
saiba, que diante dessa agonia eu ainda a quero, eu sei que hoje
não é o dia em que eu vou convencê-la que somos certos um para o
outro.

Ao entrar na fraternidade, olho meu celular pela décima vez


desde que deixei o prédio do alojamento onde Sadie vive, a
caminhada até aqui dura cerca de vinte minutos, entretanto hoje eu
a fiz em quase meia hora, pois eu sentia meu celular vibrar e
rapidamente pensava que poderia ser uma mensagem dela.
Mas não era...
Para falar a verdade, meu celular não vibrou nenhuma vez,
por mais que eu tenha sentido, não aconteceu. Assim como nós
dois.
Ainda são dez da noite de um sábado, passando pela sala
vejo alguns dos colegas de time, que moram na casa, espalhados
por lá, tomando cerveja e jogando sinuca, Colin, que acena para
mim, é um deles, eu apenas ergo a mão e lhe dou um meio sorriso
ao subir as escadas.
Chegando no segundo andar, vou direto para o meu quarto,
ao entrar nele e ligar a luz, a primeira coisa que enxergo na minha
cama é um exemplar de Uma Segunda Chance, da Colleen, ele
pertence à Sadie, ela estava lendo ele antes de eu viajar com o time
para o jogo em Phoenix.
— Ela não teve culpa de nada — dizia ela enquanto se
agarrava a mim e eu passava as mãos em seus cabelos. — Ela
estava com medo, ela só estava com medo. Por que o mundo tem
que ser tão injusto, Elliot, por quê? — questionava tão logo
conseguia retomar um pouco da sua respiração.
— Eu não sei, Watson — respondi.
Fiquei abraçado com ela por quase uma hora naquela noite
enquanto ela chorava pela vida injusta de uma personagem fictícia.
Ela chorava desesperadamente e eu a afagava, se ela me
permitisse, eu faria aquilo pelo resto da minha vida, eu ficaria com
ela hoje, assim como fiquei na quarta.
No entanto, hoje eu tenho resposta para o seu
questionamento. O mundo não é injusto, as pessoas e seus
sentimentos são.
Sento-me na cama e pego o livro, eu havia prometido a ela
que o leria quando chegasse em casa, por isso ela o deixou aqui.
Contudo ao folhear as páginas, vejo todas as marcações que ela
fez, que por sinal não foram poucas, além das manchas de lágrimas
nas folhas, onde eu passo as pontas dos dedos. Embora estejam
secas, elas continuam ali, como uma cicatriz, mostrando que toda
dor é visível, independentemente de onde ela venha.
Meus pensamentos dissipam no momento em que Grey
passa pela porta do meu quarto, dançando.
— Sábado à noite! A grande noite! A noite dos encontros —
canta todas as palavras e finaliza pausadamente as próximas. —
Sábado à noite.
— Sem nada para fazer, hein?! — arrisco ao erguer o olhar
para ele.
— Nadinha de nada — responde ao se esparramar na minha
cama.
— Nem mesmo brigar com o Colin pela Allie? — zombo.
— Verdade, né?! — ironiza. — Cala a boca — esbraveja.
Ficando de lado na cama e apoiando o peso do seu corpo no
braço, ele faz a pergunta que comprime meu coração por inteiro.
— Você não deveria estar na Sadie?
Coço a garganta e mordo o interior da bochecha assim que
sinto a ardência em meus olhos. Erguendo a cabeça, pisco com
força algumas vezes, então volto a olhar para meu amigo e
respondo:
— Nós terminamos. — Minha voz sai fraca, mas grossa.
Grey me olha consternado enquanto abre e fecha a boca
algumas vezes, sem ter certeza do que falar. Pela primeira vez na
vida, ele não solta algo totalmente desnecessário em um momento
inoportuno, ele apenas me observa sem conseguir mensurar suas
palavras.
— Está tudo bem — minto. — Não precisa falar nada.
Me avaliando por alguns segundos, ele estreita os olhos e tão
logo não demonstro emoção alguma, ele dá de ombros.
— Você sabe que se quiser se abrir, eu estou aqui. —
Concordo com um aceno. — Porém, se também quiser ficar calado
assistindo alguma merda na TV ao passo que viramos um litro de
vodka e comemos alguns Doritos, eu também estou aqui.
— Fico com a segunda opção — respondo em um meio
sorriso.
— Ótimo. — Ele se levanta, quase animado. — Porque eu
também estou precisando ficar calado e bêbado.
Indo até meu estoque de bebidas embaixo da escrivaninha,
Grey tira de lá um litro de Absolut lacrado, ele o abre e toma um
grande gole, depois retorna para a cama e me entrega a garrafa.
Faço o mesmo, contudo tomo três goles seguidos, pois quando a
ardência entra em contato com a minha garganta, eu lembro da
última vez que bebi.
Eu havia a chamado de amor e quase me declarei para ela
naquela noite. Por mais bêbado que eu estivesse, Sadie já deveria
saber que eu pertencia a ela e mesmo assim, ela precisou ouvir que
eu a amava para decidir, em meio as lágrimas, acabar com tudo.
A água começa a se acumular no meu rosto logo que Grey
senta-se ao meu lado e pega o controle da TV. Ele escolhe o novo
filme do Ryan Gosling, que cá entre nós é muito bom, só que tão
mentiroso que apenas estando totalmente bêbado para acreditar
que tudo aquilo aconteceria na vida real.
Agradeço mentalmente por Grey ter escolhido um filme de
ação que não tem nada de romance, nem mesmo um beijo, pois
apenas isso me fará esquecer toda a desilusão que sofri hoje.
Assim que o filme chega ao fim, já tínhamos terminado a
garrafa de bebida e os sacos de Doritos estão espalhados pelo chão
do quarto. Grey está dormindo de bruços em um lado cama e
quando eu me deito do outro, decido pegar meu celular.
Não tinha encostado nele desde que o filme havia começado,
ao desbloquear a tela vejo que há uma mensagem não lida.
No instante em que abro o aplicativo meu coração para,
minha boca seca e meu estômago se revira. É uma mensagem dela.
Demoro cerca de cinco minutos, criando coragem para abrir o
aplicativo, na esperança de que tudo não passe de um pesadelo,
porém eu caio da cama, não literalmente, ao ler as palavras na tela.
Sadie: Não precisamos criar uma história, apenas dizemos
que não deu certo e é isso. Pelo menos a Lynnox acreditou e a
Valerie também, quando chegou aqui pouco tempo depois
acompanhada de uma garota. Não sei nem pq estou te dizendo
isso, mas de toda forma não precisamos inventar história alguma.
Acho que é isso, boa noite, Elliot.
Havia passado mais de uma hora desde que a mensagem
chegou, digito minha resposta.
Eu: Boa noite, Watson.
Antes de voltar a bloquear a tela, noto que a mensagem é
lida e os três pontinhos piscam na tela, contudo logo eles param.
Passo mais alguns minutos com os olhos fixos no celular e quando
nenhuma resposta é dada, soltando um grande suspiro, jogo o
aparelho no chão.
Grey se move com o barulho e eu decido fazer o mesmo que
ele. Fecho os olhos e sonho, porque pelo menos nos meus sonhos
ela ainda está comigo.
Ela está sempre comigo.
Eu quero você
E sempre vou querer
Eu queria valer a pena
Mas eu sei o que você merece
OCEANS | SEAFRET

— Isso é realmente chato — divaga Heaven ao se retirar da


mesa do refeitório, ela está, assim como o restante, triste pelo
“término” entre Elliot e eu.
Já se passaram dez dias desde que ele foi embora porque eu
pedi, porque eu invoquei a sexta cláusula. E como eu sei a
quantidade de dias que se passaram? É simples.
É devido ao fato de que eu sinto falta dele a todo momento,
até mesmo quando eu respiro, parece que o ar longe de Elliot é
tóxico, intolerável e me deixa doente. E com ele parece que é ao
contrário, pois ele não suporta ficar perto de mim, talvez seja por
isso que ele tem almoçado todos os dias na mesa em que os outros
jogadores do time ficam e Grey tem o acompanhado.
Ou seja, o grupo está literalmente desfalcado e é tudo culpa
minha, porque pessoas confusas perdem pessoas incríveis.
A única culpada disso tudo sou eu, fui eu quem comecei uma
mentira sem ao menos saber que ela afetaria a vida de tantos e a
minha, e por essa mentira, minha última vítima não foi apenas o
Elliot e sim, todos que o rodeiam. Eu até cogitei não ficar na mesa
durante o almoço, para que ele pudesse se fazer presente, mas logo
Wes, por incrível que pareça, foi o primeiro a dizer que não era
necessário.
— Ninguém precisa se afastar de ninguém, somos todos
adultos e vocês têm que aprenderem a conviver um com outro no
mesmo ambiente — disse ele na terça passada logo que eu disse
que ia me levantar para que Elliot pudesse se aproximar.
Todos concordaram com ele.
— Ei — Axel me chama, assim que ficamos apenas nós dois
na mesa. — Como você está?
— Bem — é tudo o que eu me permito responder e recebo
um cenho franzido em resposta.
— Ainda tem ido à terapia?
— Sim — minto.
Tem duas semanas que não me encontro com Rayna, ela até
tenta marcar, porém eu sempre recuso as ligações e não leio as
mensagens ou e-mails.
— Você está mentindo — desafia.
— Talvez. — Dou de ombros em resposta. — Mas eu estou
bem e você, como está? — Tento parecer casual, só que não
funciona muito bem com ele.
— Preocupado com você. — Eu abro a boca para responder,
entretanto ele pede para continuar. — Eu sei que o relacionamento
de vocês era mentira.
— Ele me disse.
— Disse?! — indaga ao arquear a sobrancelha.
— Me disse que te contou quando soube que estava... —
Hesito por um momento, pigarreando. — Apaixonado. — Minha voz
sai como um frangalho.
Axel concorda.
— Você sabe quando ele percebeu que estava apaixonado
por você? — Nego com um gesto de cabeça. — No dia em que
vocês almoçaram cereal na casa dos pais dele. — Eu tenho a
memória vívida o suficiente em minha cabeça para que eu olhe na
direção de onde ele está sentado. Uma mesa no final do refeitório
com mais de dez jogadores e algumas líderes de torcida.
Ele está tão animado falando sobre algo, que faz vários
gestos com as mãos e todos ao seu redor prestam atenção em tudo
o que ele fala, tão logo ele termina um grande sorriso se espalha em
seu rosto, assim como no almoço na casa dos seus pais assim que
eu me servi cereal.
— Eu lembro desse dia — digo, voltando a encarar Axel, ele
também estava olhando na mesma direção que eu.
— O Elliot passou um mês guardando esse sentimento para
si e mais uma caralhada, por semanas porque eu pedi a ele para
não te falar nada, por tudo o que você já tinha passado no ano
anterior com o Drew e toda a sua carga emocional. Eu pedi ao Elliot
para ir com calma.
— E ele foi — defendo-o.
— Não estou aqui para julgar. — Axel dá de ombros. — Estou
aqui para entender o que realmente aconteceu entre vocês, mas se
você não quiser me dizer, tudo bem também. Saiba que sempre terá
o meu apoio, Sadie.
Sorrio de canto para ele, porque é incrível como uma pessoa,
que foi tão afetada por tantas coisas na vida, continue tão bondosa
quanto o Axel. Se você o olha em um primeiro momento, jura que é
um cara mal-humorado, que odeia todos ao seu redor, porém na
realidade não é assim. Ele até pode ser grosso às vezes, mas só se
você afetar uma pessoa que ele ama, assim como eu afetei a
Heaven no ano passado e ele acabou se virando contra mim, só que
quando eu precisei dele naquele mesmo dia, ele me ajudou.
Ele me salvou.
— Quanto ao Elliot e eu apenas não deu certo — é tudo o
que eu respondo, porque foi isso que nós dois combinamos.
Quer dizer, não exatamente, todavia foi o máximo que deu
para pensar no momento em que Lynnox entrou no meu quarto e
me pegou chorando logo após ele ter ido embora.
— Certeza? — pergunta, desconfiado.
— Sim — respondo. — No entanto, tem algo que eu quero te
devolver há um tempo.
Abrindo minha bolsa, tiro lá de dentro o escapulário que
pertencia a Drew na infância, Axel me deu logo após a sua morte no
ano passado. Segundo ele, o objeto deveria ficar com alguém que
realmente o amava, naquela altura do campeonato eu já estava tão
acostumada com a ideia que o Drew havia colocado na minha
cabeça, que não tinha como eu negar ao Axel no instante em que
ele me entregou o cordão.
Em um primeiro momento ele não entende o porquê eu
estendo o escapulário, o devolvendo, então eu explico.
— Me desculpa pelo que vou falar agora, porém quando seu
irmão morreu, eu não chorei por amor, foi por alívio — coloco para a
fora as palavras que formavam um nó em minha garganta há
meses. — Assim que você me ofereceu o cordão, eu não sabia
como dizer não — continuo. — Quanto a me sentir culpada pela
morte dele, é real, eu ainda sinto essa culpa me consumir. O Drew
não era uma pessoa que merecia a morte, ele merecia pagar por
tudo o que fez, além de um tratamento adequado.
Eu abaixo a cabeça, arrancando a pelezinha do meu dedo.
— Eu menti sobre algumas coisas no ano passado, Axel e
amar seu irmão foi uma delas. — Minha voz sai em um sussurro.
Axel semicerra os olhos e franze o cenho ao me encarar,
ainda confuso e surpreso com as minhas declarações.
— Mas... — Ele hesita, alterando seu olhar entre o cordão e
eu, enquanto sua boca abre e fecha. — Mas... Sadie... Não estou
entendendo — confessa por fim.
— O Drew sempre foi complicado, todas as relações dele
também e comigo não foi diferente — digo ao pôr a mão por cima da
sua.
Axel continua confuso quando finalmente seus olhos se
voltam para mim.
— Então... nada do que aconteceu... — Ele para por um
segundo, tentando raciocinar. — Nada entre vocês foi... real?
Eu sorrio triste.
— Muitas coisas entre nós foram reais, entretanto amar o
Drew foi a maior mentira que já contei em toda a minha vida.
— Por quê? — inquere ao observar o cordão que pertencia
ao irmão.
— Porque a vida é complicada para cacete, Axel e por ela ser
o que ela é, eu vou te pedir para essa conversa ficar apenas entre
nós.
Ele assente com a cabeça, concordando. Mesmo que não
esteja entendendo nada, Axel concorda em manter essa conversa
apenas para ele.
— Ei, cara — algum colega da turma de Medicina o chama.
— Você não vem? Hoje o Harris vai mostrar o que é mito ou
verdade em Grey’s Anatomy.
— Pode ir, já me encontro com vocês lá — Axel responde o
colega e quando ele se ele vai, ele olha para mim. — Espero que
um dia você possa se abrir comigo sobre tudo o que aconteceu com
você e Drew.
— Eu também espero — respondo.
Desse modo, Axel se levanta e vai embora. Juntando as
minhas coisas, eu também começo a me levantar, logo que fico de
pé e olho para a frente, eu o vejo.
Nossos olhares se cruzam por segundos, Elliot não acena,
não sorri, não faz nada. Apenas permanece estático, assim como
eu. Contudo, alguém o tira do nosso transe na hora que o empurra e
eles começam a andar, saindo do refeitório.
Há dez dias essa tem sido a nossa única forma de contato,
olhares no meio do refeitório por alguns segundos, nada mais do
que isso.
E assim temos seguido nossas vidas.
Ao menos eu espero que ele esteja seguindo, porque eu
prefiro me afogar na minha própria miséria e sofrimento, os quais eu
impus a nós dois quando pedi para acabar tudo.

Após a minha conversa com Axel na quarta passada, eu


assisti mais uma aula e depois fui à biblioteca. Fiquei agradecida por
ele me entender, ele realmente cumpriu sua palavra como sempre e
a conversa ficou entre nós. Ele me informou que deu o escapulário à
Claire, mãe adotiva do Drew, que se emocionou e agradeceu.
Agora estou esparramada no sofá do ambiente compartilhado
do alojamento, lendo O Iluminado do Stephen King. Ele foi um
presente do Elliot diretamente da sua estante em Stone Bay, ele não
gosta muito de suspenses, prefere os romances e fantasias, por isso
me entregou a cópia.
Confesso que quando comecei a ler ontem, até tive vontade
de lhe enviar uma mensagem, como uma tentativa de voltarmos a
ser o que fomos um dia, porém preferi ficar quieta. Se eu decidi me
afastar dele, eu devo continuar assim.
— Você não cansa de ficar com a cara enfiada nesses livros?
— Lynnox diz, se jogando por cima de mim.
— Você não cansa de assistir Guerra Infinita? — retruco.
Pelo menos uma vez na semana ela assiste o mesmo filme e
todas as vezes as suas reações são iguais, eu até já decorei
algumas falas, mesmo que nunca tenha parado para assistir ao
filme completo. Eu sei de cor a parte em que o Chris Pratt aponta
uma arma na cabeça do Tom Holland e o Doutor Estranho pergunta
a qual mestre o Peter Quill serve.
— Em minha defesa, o Chris Evans está um gostoso naquele
filme — responde, sentando-se no sofá.
— E em qual filme aquele homem não está gostoso?
— Tem razão — devolve pensativa.
Assim que eu volto a enfiar a cara no livro, rapidamente ele é
arrancado das minhas mãos.
— De toda forma — diz ela com a voz melódica enquanto eu
tento reaver o livro. — Pensei que poderíamos sair para tomar
alguns drinks.
— Dispenso — respondo, me curvando por cima dela.
Lynnox se contorce, conseguindo me contornar. Merda, às
vezes eu esqueço que essa maluca é ginasta.
— Hoje é segunda — choraminga. — Dia da tequila no
Jenkins.
— Não gosto de tequila — respondo.
— Se bem me lembro os dedos da Val foram parar na sua
vagina após uma dose de tequila — menciona o acontecimento,
sugestiva.
— Hoje é segunda — continuo, me negando a ir. —
Deveríamos pedir algo para jantar e depois dormir.
— Deixa para dormir quando estiver morta, por favor, vamos.
— Ela junta as duas mãos e faz biquinho triste.
— Não.
— Por favor.
— Não.
— Por favor.
— Eu já te disse que não — respondo, me levantando do
sofá e indo em direção ao meu quarto, pois já desisti de pegar meu
livro de volta.
— Nem estou fazendo isso por mim e sim por você, que está
na fossa desde que terminou com o Elliot. — Lynnox me segue.
— Eu não estou na fossa — me defendo.
— Ah, não?! Então quando foi a última vez que lavou o
cabelo?
— Sei lá. — Dou de ombros. — Na quinta, talvez?!
— Foi na terça passada. — Lynnox faz uma careta. — Quase
uma semana inteira sem lavar esses cabelos e se eu bem entendo
do sexo feminino, passar muitos dias sem lavar o cabelo, mesmo
que você levante da cama todos os dias, significa estar na fossa ou
ser uma pessoa bastante suja.
— Eu não sou suja. — Dessa vez quem faz careta sou eu.
— Então você está na fossa — conclui.
— Ok, eu estou na fossa — digo, caindo de costas na cama e
minha colega me acompanha.
— E aí... o que me diz? Tomar banho, lavar o cabelo, vestir
uma roupa bem sexy e ir tomar algumas doses de tequila? —
sugere, franzindo o cenho duas vezes.
— Não tenho identidade falsa — lembro.
— Você é ruiva — responde.
— E desde quando ser ruiva é sinônimo de maioridade? —
pergunto confusa.
— Desde que a Valerie também é ruiva e tem inúmeras
identidades falsas espalhadas em todo canto do mundo.
Verdade, ela tem mesmo.
— Por sinal, ela nunca mais apareceu aqui — pontuo.
— Eu roubei todas as chaves dela, até mesmo a do carro, ou
seja, não tem mais como ela entrar aqui sem permissão — explica.
— O que me diz, vamos ou vamos?
— Vamos — respondo em um gemido ao cobrir meu rosto
com o travesseiro.

Após exatamente duas horas nos arrumando, finalmente


Lynnox e eu passamos pelas portas de vidro do Jenkins, bar que
fica próximo ao campus e onde a maioria dos estudantes vem na
semana para desopilar da vida acadêmica.
Demoramos porque, primeiro, eu tive que lavar meu cabelo
— ele estava realmente um nojo —, depois secar e finalizar ele. Em
seguida, Lynnox e eu entramos em uma discussão sobre qual roupa
eu deveria vestir.
Eu insisti em vir de calça, com alguma blusa ou suéter, e ela
insistiu que eu deveria vestir um vestido vermelho tubinho, por mais
que eu tenha dito “não” inúmeras vezes, ela acabou ganhando a
discussão, e também ganhou quando me fez usar um salto de
quase dez centímetros. Ela até mesmo quis que eu não usasse um
casaco por cima, contudo com a chegada do inverno se
aproximando, eu a convenci que deveria, pelo menos, usar uma
jaqueta por cima e logo minha colega de quarto concordou.
Ela está usando um conjunto branco de saia e blusa, além do
sapato scarpin na mesma cor. Seus cabelos cacheados estão soltos
e armados, por cima da roupa ela veste um sobretudo azul, que
retira no momento em que entramos no bar. Acompanhando seus
movimentos, eu também retiro minha jaqueta e caminhamos até às
mesas.
No momento em que me livro da jaqueta e a coloco sobre o
braço, noto que Lynnox está pálida e seus olhos estão arregalados,
eu tento chamar a sua atenção, estalando os dedos à sua frente e
logo ela pisca os olhos, saindo do transe.
— Juro que eu não sabia ele estaria aqui — ela fala na
defensiva, em um primeiro instante eu não entendo muito bem o que
ela quer dizer.
Vendo a confusão espalhada em meu rosto, ela aponta
minimamente com o dedo, então eu decido olhar na direção em que
ela está com os olhos fixados.
— Elliot — murmuro.
— Olha — Lynnox entra na minha frente. —, eu realmente
não fazia ideia de que ele estaria aqui.
— É noite da tequila, Lynnox, o Elliot ama tequila. — Não
tanto quanto Jack Daniel’s ou vodka, penso, porém ele realmente
ama.
— Se você quiser nós vamos embora — ela sussurra, ficando
ao meu lado.
Juntas observamos Elliot, ele está de costas para nós e vira
uma dose da bebida quente, na mesma mesa em que ele está
sentado, estão Grey e Colin, há também mais alguns garotos, que
moram na casa com eles, nenhum deles percebe nossa presença,
então opto por dar de ombros e seguir em frente.
— Você me fez lavar os cabelos para vir — digo. — Já
estamos aqui e vamos continuar — completo, com um quase sorriso
no rosto.
— É isso aí, garota. — Lynnox sorri animadamente para mim.
— Mas nós vamos nos sentar na mesa dos fundos para que
eles não nos vejam. — Aponto para o canto escuro do bar.
— Você quem manda. — Ela sorri.
Caminhamos pelo canto do bar, desviando do centro, que é
onde Elliot e os companheiros de time estão sentados. Chegando
na cabine, a qual havia apontado para Lynnox, nos sentamos e ela
pega o celular.
— Apenas enviando uma mensagem para o Wes e a Val
dizendo onde estamos para que eles não passem por lá.
Assim que, enfim, decidimos vir ao bar, enviamos mensagem
no nosso grupo íntimo, onde os meninos não estão, só que Heaven
e Axel estão se preparando para uma prova amanhã, Allison disse
que estava de mau humor, sobrando apenas Wes e Valerie.
— Certo. — Sorrio de canto, ainda olhando na direção de
Elliot.
Ele agora vira uma dose seguida da outra, poucos segundos
depois, a garçonete chega na mesa e lhe entrega um copo com um
líquido âmbar, acredito eu que seja whisky, ele rapidamente toma a
bebida e pede outra para a moça, que já se afasta. Elliot está
completamente alheio à minha presença no local, ele também
parece estar deslocado da conversa do grupo, uma vez que está
calado, apenas bebendo e olhando seu celular.
— Para de olhar para ele — Lynnox pede ao empurrar para
mim uma dose da tequila que a garçonete acaba de colocar na
mesma.
— Eu não estou olhando para ele — minto e logo recebo um
olhar semicerrado da minha colega de quarto. — Talvez eu esteja
olhando para ele. — Dou de ombros. — É que nós não nos falamos
desde que terminamos.
— Desde que você terminou — pontua ao virar sua dose na
boca.
— Porque nós dois não damos certo. — Viro minha dose.
— Porque você é insegura com relacionamentos e tem
problemas com o irmão, que é pior do que ter problemas com o pai.
— Ela vira outra dose.
— Eu nunca mais conto nada da minha vida pessoal a você.
— Levanto outra dose no ar, bebendo em seguida e pego um limão
para suavizar a ardência do álcool, nesse ponto até mesmo
esquecemos do sal.
No último final de semana, eu acabei me abrindo com a
minha colega de quarto e lhe dizendo que eu que havia pedido o
término do namoro, sem dizer sobre o contrato, farsa ou qualquer
mentira que Elliot e eu tenhamos contado no meio do caminho. E
ela disse que era tudo culpa do Trevor, eu não concordei com ela,
nem mesmo discordei, entretanto, grande parte tem a ver, não só
com meu irmão, como também com o seu pecado que consumiu a
minha vida.
Lynnox chama a garçonete com o dedo, pedindo mais doses.
— De toda forma... — continuo. — Nós não nos falamos
desde que terminamos e essa é a primeira vez que eu o vejo fora do
refeitório, e ele está bebendo. — Olho em sua direção novamente,
vendo que ele vira mais uma dose da tequila enquanto na outra
mão, está com um copo de whisky puro.
— Muito — Lynnox concorda, também olhando para ele. —
Mas o Elliot sempre bebeu muito — tenta ponderar a situação.
— Quando estávamos juntos, a única vez que ele bebeu
demais foi no Halloween — informo.
— Já parou para pensar que ele poder estar afogando as
mágoas? — Lynnox pergunta.
— Quem está afogando as mágoas? — Wes pergunta,
sentando-se ao meu lado.
— Com certeza o Elliot. — Valerie também chega na mesa e
senta-se ao lado de Lynnox, ela olha na direção da mesa onde
estão os jogadores de futebol. — Ou talvez o Grey possa estar
sofrendo também, ele não aceita o relacionamento da irmã com o
capitão — fala, se referindo à Colin.
— Eles não são irmãos — Wes e eu dizemos ao mesmo
tempo.
A garçonete chega e coloca várias doses na mesa, eu viro
uma, dessa vez me lembrando de colocar o sal na boca antes de
tomar a bebida e depois chupo uma rodela de limão. Wes e Lynnox
fazem o mesmo enquanto Valerie dá em cima da garçonete,
perguntando quando é o dia do gin no Jenkins, contudo a moça
mostra o dedo anelar, que possui uma aliança, e nós três rimos do
fora que a ruiva acaba de tomar.
Nós quatro começamos a beber e a conversar sobre tudo um
pouco. Wes, que mora no mesmo prédio de Valerie, reclama que ela
pegou as suas chaves e leva garotas para lá a todo momento, o que
gera um questionamento meu e dele do porquê ela nunca ficar com
ninguém no seu próprio canto, já que mora sozinha.
— Elas pensam que eu sou álbum de figurinhas, mas
esquecem que figurinha repetida não completa álbum — é a sua
resposta ao receber as reclamações.
O clima começa a ficar calmo entre nós em meio à tequila,
risadas e a música do Harry Styles que reverbera nas caixas de som
do bar, que por sinal começa a ficar lotado, em algum momento eu
até esqueço da presença do meu ex-namorado de mentira e do
quão bêbado ele possa estar nesse momento e tudo isso por culpa
minha, porque eu tive que dar um fora nele por ser uma idiota que
acha que não merece o amor.
Quer dizer, acha não. Eu, Sadie Ann Langster,
definitivamente não mereço o amor, porque a única coisa que eu
consigo fazer é magoar as pessoas, porque eu jamais serei uma
pessoa completa, não depois de viver tudo o que eu vivi, porque
pessoas que vivem o que eu vivi irão viver para o resto da vida com
os resquícios de tudo o que já viveram e o porquê disso é que eu
sou completamente fodida.
Tão fodida que estou repetindo por inúmeros vezes “porque”
e “vida” e “viver” e “vivi”.
Que merda.
Minha bexiga começa a apertar e eu peço licença a Wes para
ir ao banheiro.
— Quer que eu vá com você? — Lynnox oferece.
— Ou eu? — Valerie pergunta, sorrindo por cima da sua taça
de gin.
— Estou bem — informo, já me retirando em direção ao
banheiro.
O Jenkins já está bem mais cheio do que quando chegamos
aqui, então para chegar ao banheiro eu preciso me espremer entre
algumas pessoas, o que acaba me gerando um calor absurdo e
ocasionalmente me dá um enjoo súbito.
Talvez pessoas, calor e várias doses de tequila não devam se
misturar em um lugar pequeno ou talvez eu deva beber pouco, já
que eu não estou nem um pouco acostumada a ingerir tanto álcool
assim.
Meu estômago se contorce no momento em que eu chego no
corredor do banheiro, mas não acredito que seja por conta do calor
do local, das inúmeras pessoas no meio do bar ou das oito, ou mais,
doses de tequila que tomei.
Tento voltar para a minha mesa, pois a cena que eu acabo de
assistir é a de um ex-celibatário beijando uma garota qualquer no
corredor do banheiro de um bar universitário, vale ressaltar que
esse mesmo, é o homem que eu não permito estar na minha vida.
Por mais que as vezes a vida te dê pessoas especiais e as vezes
pessoas especiais te dão a vida, pessoas quebradas e
traumatizadas jamais serão capazes de normalizar o afeto em suas
vidas medíocres e acabam criando distância em tudo o que de bom
a vida lhes dá.
No entanto, o gosto amargo de vômito chega à minha boca e
eu rapidamente a cubro, sem saber o que fazer para que eles não
percebam a minha presença, embora eu saiba que, ou eu solto uma
golfada nos pés deles ou separo o beijo deles e Elliot vê o quão mal
eu posso ficar por ver ele com outra.
Esse é um dilema e tanto.
Eu tenho bebido
Eu tenho feito coisas que eu não deveria fazer
Pensado demais
Eu não sei quem sou eu sem você
Eu sou um mentiroso e uma fraude
EMPTY SPACE | JAMES ARTHUR

Perdi as contas de quantas doses eu já tomei hoje à noite,


perdi as contas também de quantas garrafas entornei nas últimas
duas semanas desde que Sadie e eu terminamos.
Se eu disser que está sendo um processo fácil, obviamente
eu estarei mentindo. Eu tenho me mantido longe dela também,
porque olhar para ela me faz querer pedir para voltar, porque eu
sinto falta dela a todo fodido momento. É como se não existisse um
Elliot pós Sadie, apenas um vulto dele.
Minhas notas caíram, meu rendimento em campo também, a
única coisa que aumentou em minha vida foi a quantidade de álcool
ingerida e mesmo sabendo que o técnico Willians está prestes a me
colocar no banco por chegar todos os dias atrasado no treino, eu
não estou nem aí.
Um dos meus maiores passatempos tem sido olhar a nossa
caixa de mensagens, lendo e relendo todas as antigas, já que a
última mensagem que eu recebi dela foi sobre como deveríamos
anunciar o término, eu havia lhe dado boa noite e até hoje não
obtive resposta alguma. Eu não almoço mais perto dela, mas eu sei
que todos os dias ela me olha no refeitório, porque eu também olho
para ela. Por mais que eu esteja tentando seguir a minha vida sem
ela, eu só tenho me afundado mais e mais.
Prova disso é que quando o Jenkins começou a ficar lotado,
há quase uma hora, eu talvez tenha a visto em uma mesa no fundo
do bar, porém quando pisquei os olhos, ela não estava mais lá, ou
seja, tudo minha imaginação. Eu não paro de ver ela, eu não paro
de pensar nela e não paro de sonhar com Sadie, e com todas as
vezes que lhe chamei pelo apelido e ela respondeu.
E eu a vejo novamente no momento em que eu saio do
banheiro, eu estreito os olhos para ter certeza de que é ela.
Meneando a cabeça para o lado e com a visão turva, depois de
inúmeras doses de tequila e copos e mais copos de Jack Daniel’s,
eu consigo enxergar o suficiente para ver que não é ela.
— Licença — peço à garota que tem os cabelos ruivos, só
que eles parecem ser tingidos, foi assim que eu reconheci que não
era Sadie, o cabelo dela é um cobre natural, com algumas mechas
grossas escuras e outras finas e claras, além de ser longo, ondulado
e macio, com cheiro de baunilha e morango.
A garota à minha frente tem cheiro de qualquer coisa, cigarro
talvez, mas nada de baunilha ou morango.
— Você não lembra de mim? — Ouço a pergunta e viro a
cabeça em sua direção, para ter certeza de que escutei bem.
— Oi?! Você falou alguma coisa? — indago para a moça dos
cabelos ruivos opacos.
— Nós ficamos em uma festa no ano passado — explica. —
Você não lembra de mim?
— Não — sou sincero. — Preciso voltar para minha mesa,
licença — peço outra vez.
Contudo, a garota que diz que eu fiquei com ela no ano
passado, a qual eu não lembro — pois no ano passado eu quase
peguei herpes na boca por conta das tantas bocas que beijei —,
agarra a camisa polo preta que eu estou usando com suas garras
enormes e me empurra contra a parede. Fixo meu olhar na mão
dela e em seguida levanto o olhar para o seu rosto.
— O que está fazendo? — pergunto atônito.
— Te fazendo lembrar de mim — ela diz quando choca a sua
boca contra a minha.
Demoro alguns segundos para ter noção que ela está me
beijando, primeiro porque ela me surpreendeu, segundo porque a
mente de um bêbado trabalha em uma velocidade diferente e eu
estou bêbado para caralho. Tanto que acabo fechando os olhos
assim que ela chupa minha língua.
Tentando pegar a sua mão, que agarra a minha roupa, para
me desvencilhar dela, porém ela decide passar a sua outra mão em
minha nuca.
— Que porra! — Arfo contra sua boca, procurando me livrar
do seu contato sem machucá-la, pois, embora ela esteja se
aproveitando de mim, de certa forma, eu não a machucaria, mas
continuo sem muito sucesso.
Ao abrir os olhos, puto da vida, tento pedir para ela parar, só
que ela morde meu lábio inferior com força.
Com o canto dos olhos percebo que nós dois não estamos
sozinhos no corredor do banheiro.
Vendo quem está com a mão cobrindo a boca, observando
toda a situação desesperadora pela qual estou passando, eu
percebo que ela pode estar entendendo tudo errado, porque está
tudo completamente errado e fodido.
Eu disse que não queria machucar a garota, mas agora eu
preciso fazer isso, por isso eu a empurro e ela acaba batendo as
costas contra a outra parede.
Assim que nossos corpos estão finalmente separados, a
outra passa por nós em direção ao banheiro feminino.
— Sadie — chamo.
No entanto, ela entra no banheiro ao lado
desesperadamente, porém acredite, eu estou bem mais do que ela
e por esse motivo a sigo, entrando no banheiro, trato de me explicar
rapidamente.
— Sadie, não é isso que você está pensando...
Eu escuto um gemido vindo da cabine onde ficam os vasos
sanitários e vou até lá, Sadie está debruçada contra a porcelana,
expelindo um líquido transparente. Eu corro até ela e pego seus
cabelos para que ela não os suje, me sentindo totalmente sóbrio
agora.
Vendo que ela está prestes a se sentar no chão, eu me sento
antes e ela acaba no meu colo, e então volta a vomitar enquanto
passo a mão em suas costas, tentando aliviar a possível pressão
que ela esteja sentindo.
Amarro seu cabelo longo em nó no topo da sua cabeça e
acabo me aproveitando do cheiro que emana dos fios. Por mais que
o banheiro cheire à cerveja, urina e agora vômito, o que se
sobressai com a nossa proximidade evidente, é a fragrância doce
que hoje está mais realçada do que nunca.
É como nos dias em que ela lavava os cabelos e eu só queria
ficar com o nariz enfiado entre os fios molhados.
— Acho que bebi demais — é a primeira coisa que ela fala ao
limpar a boca com as costas das mãos.
Sadie tenta se levantar, entretanto ela acaba cambaleando,
por isso me levanto, a ajudando. Quando estamos de pé, dou
descarga no vaso e fecho a tampa, ajudando-a a se sentar, ela
agradece em um murmúrio. Eu corro até a pia do banheiro, pegando
um papel toalha, umedeço ele e levo até ela, para limpar a sua boca
e as mãos.
— Aqui. — Mostro ao começar a ajudá-la. — Quanto você
bebeu, Watson?
Ela dá de ombros.
— Você está aqui sozinha?
Ela nega com a cabeça.
— Você está bem?
Dá de ombros.
— Você vai me responder algo? — inquiro ao franzir o cenho.
— Não posso — ela diz.
— Por que não?
— Porque se eu começar a falar com você, eu vou querer te
beijar. — Um sorriso se estampa em meu rosto, mas logo ele
desaparece com suas próximas palavras. — E se eu te beijar, eu
vou colocar tudo a perder.
— Tudo o que? — pergunto.
— Todos os motivos do porquê eu terminei com você. — Ela
abaixa a cabeça.
— O motivo pelo qual você terminou comigo está morto —
respondo amargo, lembrando da nossa conversa.
— Você está falando do Drew? — ela pergunta em um sorriso
quase sádico.
— De quem mais eu estaria falando?! — pergunto retórico. —
Você terminou comigo por conta dele, ou não?
Sadie estala a língua enquanto olha para cima, parecendo
acabar de lembrar de algo, então ela bate com as mãos nas coxas
despidas algumas vezes.
Eu não havia prestado atenção de início, ela usa um vestido
vermelho que é totalmente colado em seu corpo e delineia todas as
suas curvas, ou seja, ela está linda, como sempre esteve.
— Às vezes eu acho que o Drew está vivo — ela fala,
pensativa.
— Mas ele está morto — digo com a raiva sendo expulsa
pelos meus poros.
— Tem certeza? — ela pergunta ao levantar a sobrancelha e
eu assinto com a cabeça. — Hum... — murmura. — As ameaças
dele ainda são tão vívidas na minha memória que, às vezes, eu
tenho certeza de que ele está vivo, apenas rindo e debochando de
mim, de todos os passos que eu dou e dizendo “olha lá a vadia,
jamais será amada”. — Ela faz aspas com as mãos e engrossa a
voz.
— Que ameaças, Sadie? — pergunto preocupado.
Eu sempre estive interessado em como o relacionamento
deles dois funcionava, entretanto jamais imaginei que havia
ameaças nele, por isso essa parte da sua declaração me deixa
completamente em alerta, querendo saber mais sobre o que
aconteceu entre eles.
Todavia, eu não recebo a resposta, pois Sadie arregala os
olhos e o preto da sua pupila começa a tomar o lugar da cor de mel
das suas íris.
— Você estava beijando uma garota — ela pontua.
— Ela que me beijou, na realidade — conto.
— Eu não sei se fiquei enjoada por te ver beijando-a ou por
conta do calor que está aqui dentro — ela divaga. — Na verdade, eu
nem queria vir para cá, eu estava lendo aquele livro que você me
deu, do Stephen. — Estala a língua outra vez. — Ele é bem...
assustador.
— Sim — concordo. — Eu não tive estômago para terminá-lo.
— Assim como eu não tive estômago para ver você beijando
aquela garota.
— Me desculpa, Sadie — peço.
— Você não precisa pedir desculpas.
Ela tenta se levantar, só que não consegue ter muito
sucesso. Me agachando à sua frente, digo:
— Preciso sim. Eu não sabia que você estava aqui.
— Eu me escondi de você — ela conta ao soltar um risinho e
um ronco de porco sair, me fazendo rir junto.
— Se escondeu, foi?!
Ela concorda com a cabeça, sorrindo. Eu sorrio junto.
A forma como estamos nos comunicando é nova, porém me
dá um toque de nostalgia, pois estamos conseguindo falar um com o
outro, eu queria conseguir registrar tudo em um áudio ou talvez em
mensagens, porque tenho a leve sensação de que essa leveza, com
a qual estamos seguindo, está prestes a acabar.
E eu não quero que acabe.
Nunca.
No entanto, Sadie decide fragmentar meu coração ainda mais
com suas próximas palavras.
— Essa não é a primeira vez que eu me escondo de você —
ela revela. — Eu também me escondi de você quando deixei você
entender que eu amava o Drew.
— O que você está querendo dizer, Sadie? — pergunto
curioso.
Ela dá de ombros, tentando se levantar novamente, sem
sucesso outra vez.
— Eu estou cansada, Elliot — Sadie diz ao pender sua
cabeça para trás e encostá-la na parede.
— Ei, Watson — chamo e ela volta a olhar para mim. — Por
que você não tenta falar algo que eu consiga entender? — sugiro e
ela faz uma careta engraçada, enrugando o nariz.
— Sinto sua falta — ela confessa.
Meu coração aperta ao ouvir sua voz tão fraca dizer essas
três simples palavras. Só que eu não posso me apegar apenas à
emoção de ouvi-la dizer que sente minha falta, sem dizer o porquê
de ter acabado tudo.
— Se você não me mandou embora por conta do Drew. —
Lembro do que ela falou há pouco. — Por que você insistiu para que
eu fosse e não me procurou?
— É complicado — começa.
— Não existe nada complicado, Watson, somos nós que
dificultamos as coisas. Nesse momento, por exemplo, você só está
dificultando a minha vontade de estar com você.
Ela me olha consternada e eu vejo seus olhos cor de mel
brilharem, mas não em admiração ou sequer luxúria, é tristeza que
estampa o âmbar das suas íris, são lágrimas que brotam nos
cantinhos da sua vista.
— Eu não mereço alguém como você e você merece alguém
muito melhor do que eu — ela confessa quando uma lágrima
solitária desce por seu rosto.
Imediatamente eu levo minha mão até seu rosto, limpando-a.
Pior do que chorar e me sentir triste, é ver que ela também se sente
assim. Vê-la chorar por uma história triste que ela lê em um livro, é
saber que seu sofrimento é passageiro, entretanto vê-la chorar
porque ela insiste em quebrar os nossos corações é esmagador, é
um sentimento que me deixa sem ar, sem reação.
— E o que eu faço sendo que a única pessoa que eu quero é
apenas você? — pergunto, no mesmo nível de tristeza.
— Não tenho uma resposta para isso, Sherlock — ela
responde.
Os minutos passam conosco em total silêncio, em um
banheiro sujo de um bar, a música pop lá fora ressoa aqui dentro,
algumas pessoas gritam, mas o que é realmente ensurdecedor é o
nosso silêncio, o que me cega é a forma como nos olhamos
enquanto eu peço para tê-la de volta e ela se afasta, mais e mais.
Outra lágrima desce em seu rosto, só que ela mesma a apara, eu
sinto meu rosto molhar também, porém não faço questão de
enxugá-lo.
Quero deixar claro para ela que ela está acabando conosco,
com o que um dia fomos e poderíamos ser, porque nós éramos
felizes e agora somos dois miseráveis.
Eu nego com a cabeça.
Ela assente.
Eu peço sim.
Ela diz não.
Ela tenta desviar seu olhar.
Eu não deixo que ela o faça.
Eu imploro para ficar.
Ela diz que eu não posso.
— Watson... — Minha voz sai vacilante, em um sussurro, ao
passar a mão pela extremidade do seu rosto, indo em direção ao
seu pescoço.
— Sim — ela concorda.
Ficando de pé, ajudo-a a se estabilizar a segurando pela
cintura com o outro braço. Solto o seu longo cabelo, deixando que o
seu cheiro invada meu olfato à medida que passo os dedos entre
seus fios macios e sedosos.
Sadie faz o mesmo, penteando a ponta dos meus cabelos
com as pontas dos dedos, quando chega próxima à nuca, ela faz
um carinho ali e meus pelos se eriçam, todavia não é como antes.
Não é um toque como se estivéssemos prestes a tirar nossas
roupas.
É triste, é doloroso, torturante, angustiante, lamentoso.
Porque nós dois lamentamos a falta que fazemos um ao
outro.
Eu faço carinho na pele do seu braço, sentindo-a arrepiar
também, olhando em seus olhos, acaricio seu rosto e ela faz o
mesmo comigo. Peço permissão para trazê-la mais para perto e ela
assente. Seu peito descansa em meu peito, não como na noite em
que terminamos, não estamos em prantos, estamos apenas tristes.
Uma tristeza que toma conta do nosso peito. Pode parecer
blasé, mas eu sei que ela está sentindo o mesmo que eu, pois se
fosse ao contrário, nossos olhos e corpos não se comunicariam tão
bem como estão fazendo agora.
Sadie me abraça pela cintura de forma delicada, abraçando
meu corpo com os dois braços. Eu faço o mesmo, contudo apenas
com um, pois o outro continua a afagar seus cabelos.
Os segundos se transformam em minutos e eu apenas deixo
o tempo passar. Eu sei que em algum momento algumas garotas
entraram no banheiro e até mesmo perguntaram o que nós
estávamos fazendo, por isso eu fiz questão de fechar a cabine onde
estamos e apenas continuamos assim..., abraçados.
— Sadie — a voz conhecida de Lynnox reverbera no
banheiro.
Sadie, que está em meus braços, pula assustada. Afastando-
se minimamente de mim, eu beijo a pontinha do seu nariz quando
Lynnox a chama outra vez.
— Sadie, você está aqui?
Ao afastar meus lábios do seu nariz, declaro em um sussurro,
para que apenas ela possa ouvir:
— Eu te amo.
Ela assente e responde:
— Eu não posso te amar.
Engulo em seco antes de retrucar.
— Isso não significa que não ame. — Não deixo que ela
responda mais nada, tirando meus braços da volta do seu corpo, eu
me afasto e abro a porta do cubículo. — Estamos aqui — anuncio
para Lynnox.
— O que aconteceu? — Ela dispara em nossa direção, quer
dizer, na direção de Sadie, que volta a cambalear, porém eu consigo
a segurar a tempo. — Você estava demorando demais para voltar —
explica sua colega de quarto.
— Ela vomitou — informo. — Se eu fosse vocês, iria para
casa e tomava no mínimo dois litros de água antes de ir para a
cama.
Lynnox estreita os olhos em minha direção e ajuda Sadie a se
equilibrar assim que eu me afasto.
— Vocês não estavam fazendo nada, estavam? — pergunta
desconfiada.
— Apenas conversamos.
— Pediu para voltar? — me pergunta e eu dou de ombros. —
Ela um dia vai enxergar a besteira que fez — Lynnox tenta me
consolar.
— Espero que sim — falo a verdade.
— Ei — Sadie reclama. — É feio falar mal de uma pessoa na
frente dela.
Nós dois rimos do seu estado, porque ela bêbada é muito
fofa.
— Vai para casa com ela, Lyn e dê água a ela, por favor —
peço.
— Pode deixar.
Antes de sair, eu dou outro beijo na ponta do nariz de Sadie e
me despeço.
— Até qualquer dia, Watson.
— Até — responde triste.
Desculpe-me por não conseguir acreditar
Que alguém, um dia, realmente
Começasse a se apaixonar por mim
Desculpe-me, meu amante desconhecido
Desculpe-me por ter sido tão cega
Eu não pretendia abandonar você
E tudo aquilo que tínhamos
SORRY | HALSEY

Eu nunca gostei de aniversários, pelo menos não quando a


aniversariante em questão sou eu.
Pois todos os meus aniversários acontecem logo após o
feriado de Ação de Graças, ou seja, tudo o que todos tinham para
festejar, já foi feito. Além do mais, tem toda uma questão de signo
também.
Segundo os astros eu sou de sagitário, mas depressiva do
jeito que eu sou, eu deveria ser de câncer.
Eu não lembro exatamente o que falei ao Elliot enquanto
estávamos no banheiro, mas lembro do seu toque, da forma como
ele cuidou de mim e disse que me amava, outra vez.
Faz uma semana desde o meu definitivo/último contato com
Elliot. Desde o episódio do bar, nós dois não nos vimos mais, uma
vez que, ao que tudo indica, todos ficaram atolados de provas e
entregas de trabalhos, antes do feriado, que aconteceu na quinta
passada. Eu deveria ter passado um tempo com a família do Elliot e
depois com a minha, contudo não foi isso que aconteceu, após o
jantar com minha família, eu me tranquei no quarto e apenas dormi.
O Axel apareceu na minha casa no fim de semana, me
chamando para ir para a praia com ele e Heaven, só que eu disse
que estava com dor de cabeça. Wes me mandou mensagens na
sexta, me intimando a aparecer na padaria da sua mãe, e eu disse
que estava ajudando minha mãe a organizar seu escritório. Allie
disse que estava fazendo maratona de Friends no domingo, eu
disse que estava com cólica. Até mesmo Lynnox, que viajou para
Hastings, sua cidade natal em Washington, me ligou em vídeo,
detalhe: descobri que lá, ela é vizinha do Kane e estava em um
jantar com a família dele. Porém eu enrolei, disse que minha mãe
estava me chamando quando ela começou a puxar conversa.
Tudo mentira.
A verdade é que eu entrei em um limbo durante todo o final
de semana. O sentimento de vazio se apoderando cada vez mais e
mais de mim, eu só queria ter coragem o suficiente para ser feliz,
para amar, para acreditar que eu sou capaz de amar e deixar que
alguém faça isso por mim. No entanto, eu não consigo.
Eu não posso.
É segunda, mais especificamente, quase sete da manhã e
batidas insistentes soam na porta do alojamento. Vendo que Lynnox
sequer deu sinal de vida com o barulho, eu me levanto da cama
gemendo e ainda com o cobertor me abraçando, saio do quarto e
vou em direção à porta da frente.
— Feliz aniversário! — esse é o grito estridente que a minha
ex-sogra de mentirinha dá no instante em que eu abro a porta.
Espremendo os olhos e me adequando à luz da manhã, dou
um meio sorriso para ela.
— Senhora Tanner — cumprimento.
— Me chame de Margaret — pede ao entrar no alojamento.
— Fique à vontade — ironizo ao fechar a porta.
A mãe de Elliot passa o olho por todo o ambiente
compartilhado, desde o frigobar no canto da parede até à televisão
em frente ao sofá de dois lugares. Chegando no mesmo ela se
senta, colocando a sua preciosa bolsa preta da Hérmes no chão —
o que me choca em um primeiro momento — e depois uma
embalagem de presente em seu colo.
— Gostaria de tomar alguma coisa? — indago, ainda
sonolenta. — Água, café, suco?
— Não — responde em um sorriso. — Apenas que você
sente aqui para conversarmos — ela diz ao bater no canto vago ao
seu lado, me chamando.
Obedecendo, me sento ao seu lado, ainda estranhando a sua
visita e seu comportamento. Contudo, me livro do cobertor e o
dobro, colocando-o no braço do sofá, ficando apenas com o pijama
de flanela na companhia de Margaret Tanner.
Ela sorri para mim de uma forma estranha e eu faço o
mesmo. Totalmente desconfortável.
— Então... — começo.
— Isso aqui é seu — ela diz ao me entregar uma caixa
quadrada com cerca de sessenta centímetros quadrados.
— Obrigada — agradeço ao começar a abrir. Logo sou
interrompida por Margaret, quando ela põe a mão na tampa da
caixa.
— Antes de você abrir, eu queria conversar com você e
explicar o contexto do presente no final — ela pede.
— Tudo bem.
— Você tem medo de algo, Sadie? — pergunta de repente.
— Não... — Hesito ao franzir o cenho. — Não entendi.
— Não me leve a mal — continua. — Mesmo que eu pareça
uma louca às vezes, porque eu sei que é isso que dá a entender em
algumas situações, eu ainda consigo enxergar bem as pessoas e eu
te enxerguei naquele primeiro almoço na nossa casa. Você estava
disposta a ir contra algo que você acredita para me agradar, mesmo
que o namoro de vocês fosse uma mentira.
Eu pulo em surpresa com suas últimas palavras e
arregalando os olhos, pergunto:
— Como a senhora sabe?
— O Elliot não é a pessoa mais esperta do mundo. — Ela ri
sozinha. — Um dia depois de vocês assinarem aquele “contrato” —
Faz aspas com as mãos. —, eu peguei a folha na bolsa dele —
explica. — Assumo que gostei da cláusula dois.
Ela confessa e meu rosto incendeia em vergonha.
— Eu poderia ter dito a ele que sabia desde o início, poderia
ter jogado minha bolsa nele — brinca, me arrancando um quase
sorriso, pois ainda estou em choque pelo fato de que ela sempre
soube. — Eu poderia ter feito qualquer coisa, mas preferi ver até
onde vocês iriam com a farsa e cá entre nós, não foi um caminho
muito longo, logo os sentimentos de vocês estavam expostos em
todo tipo de ação dos dois.
— Então a senhora apenas deixou rolar?
Margaret assente, concordando.
— Vocês estavam felizes — explica. — Eu queria que o Elliot
se aquietasse, apenas isso. Eu sei das bebidas dele, inclusive do
esconderijo que ele tem embaixo da escrivaninha. Durante as férias
ele saía muito e eu pensei em apresentar uma garota a ele e de
repente, ele aparece com você. E por mais que eu torcesse para o
plano de vocês dar errado, eu vi como ele te olhava, desde aquele
domingo onde comemos cereais, e como você sorria de forma
genuína todas as vezes que ele falava. Ou seja, vocês se
completam.
A recordação me faz sorrir e a mãe de Elliot põe a mão sobre
a minha.
— Do que você tem medo, Sadie? — repete.
Engulo em seco, sem saber como respondê-la.
Nós duas nunca estivemos a sós antes, quanto mais em uma
conversa assim, frente a frente, e sobre sentimentos, onde uma
revela alguns segredos e pressiona a outra para fazer também.
— Não tenho medo de nada — tento agir na defensiva,
porém não funciona muito bem com ela.
— É da felicidade ou do amor?
Nego com a cabeça.
— Certeza? — Assinto. — Eu acho você tem medo dos dois,
então mesmo que você não leve em consideração o que eu vou te
dizer agora, quero que você leve para a vida. Não tenha medo,
Sadie, não se esconda. Talvez a sua maior fraqueza hoje, possa ser
a sua melhor qualidade e você nem sabe, o amor é algo genuíno e
bondoso, a felicidade, igualmente. No fundo você pode achar que é
uma pessoa ruim, má quem sabe... por tudo o que aconteceu no
seu passado, mas você é boa demais para esse mundo e sequer
tem noção disso. O passado pode doer, entretanto cabe a você fugir
dele ou aprender com ele.
Ela se levanta e fazendo carinho na minha cabeça, ela alinha
alguns fios do meu cabelo.
— Esse é um presente que eu vejo você usando no futuro e
um dia eu quero estar lá para assistir. — Dito isso, ela dá dois
tapinhas na tampa da caixa, pega a sua bolsa no chão e me dá as
costas.
— Senhora Tanner — chamo quando ela chega à porta.
— Feliz aniversário, Sadie — é sua resposta assim que abre
a porta, pisca o olho para mim e vai embora.
Permaneço parada no lugar, sem ao menos entender o que
acaba de acontecer. Que gente louca faz um sermão enorme e
depois simplesmente vai embora?
Abrindo a caixa de presente, a primeira coisa que vejo é um
bilhete escrito à mão:
“Não deixe o seu passado te dominar, faça dele um
aprendizado para o seu futuro. Você pode não ter tido um começo
feliz, mas não é isso que define quem você é e sim, o restante da
sua jornada. Quem você escolhe ser, quem você escolhe amar.
Com amor, mamãe (e sua sempre sogra) Tanner.”
Um sorriso brota em meu rosto ao ler sua mensagem, todavia
uma risada escapa de mim tão logo eu tiro o papel de seda de
dentro da caixa e encontro ali uma bolsa da Hérmes, igual a que ela
sempre usa quando precisa “controlar” o filho.
— Eu não acredito que ela fez isso — digo ao pegar a bolsa e
passar os dedos pelo couro da mesma.

Essa é, exatamente, a vigésima quarta vez que eu verifico o


meu celular em busca de uma nova mensagem.
Já falei com meus pais, meu irmão, tios, primas e até mesmo
colegas da época da escola, que não estudam na Stout, no entanto
a única pessoa com quem eu desejo contato é ele. No sábado
houve um jogo fora de casa, contra o Nittany Lions, time da UPenn,
na Pensilvânia, portanto o time ainda não voltou para casa.
Durante o percurso que faço entre o meu carro, entrada no
prédio do dormitório, escadas e meu alojamento, eu olho o celular
mais duas vezes... e nada. Quando li em um livro de mindset que a
era tecnológica aumentava a nossa ansiedade, eu ri e disse que
aquilo era besteira, agora olha eu aqui, desejando que a minha
internet esteja fora do ar ou que o Elliot tenha perdido o celular e por
isso não me escreveu, nem ligou.
Contudo, a realidade é que é tudo culpa minha, uma vez que
fui eu que, nas inúmeras vezes em que ele implorou para estarmos
juntos, me neguei. No momento em que a mãe dele me perguntou,
mais cedo, se eu tinha medo, eu tive medo também de responder,
porque está escrito na minha cara que eu sou uma covarde e nem
mesmo a melhor pessoa que eu poderia ter em minha vida, foi
capaz de mudar isso em mim.
— Ai, meu Deus! — um grito sai da minha garganta no
instante em que eu abro a porta do apartamento minúsculo e
confetes voam em mim.
— Feliz aniversário — várias vozes me felicitam.
— Eu não acredito que vocês fizeram isso — digo, quase
chorosa, ao pegar alguns confetes com as mãos e largar minha
bolsa no chão.
— Até as vadias merecem um aniversário decente — Wes diz
ao me abraçar primeiro. Eu aceito de bom grado, o agarrando e por
incrível que pareça, ele não reclama.
Logo após Wes, Lynnox, Heaven, Allison, Valerie e Axel
também me abraçam, o último carrega um bolo alto coberto de
chantilly, onde em cima tem um flork segurando um livro escrito “só
mais um capítulo”, eu rio com a referência e apago as velas
abraçada à Heaven e Lynnox, que sussurram em meu ouvido:
— Faz um pedido — diz a Heaven de um lado.
— É — concorda Lynnox. — Pede um gogoboy gostoso.
Rimos com sua insinuação e em seguida apago as velas,
porém o meu pedido não é um gogoboy e sim, coragem.
Para o que exatamente? Não sei.
Mas sinto que preciso que as coisas voltem a dar certo para
mim, preciso contar a verdade a inúmeras pessoas e preciso,
principalmente, pedir desculpas a pessoa que eu mais magoei por
conta de todas as mentiras que eu contei todo esse tempo.
— Como o dia é totalmente seu, hoje vamos apenas ler —
Allison anuncia.
Nas próximas horas, as meninas, Wes e Axel leem e
discutem sobre os livros que estão lendo. Nosso almoço — quase
janta —, é uma lasanha que foi preparada pelo Axel e no final
comemos bolo. Enquanto todos liam, eu ficava o tempo inteiro
olhando o meu celular, bem como o perfil de todos os jogadores,
para saber onde ele estava e através de um story postado pelo
Grey, descobri que o Elliot não apenas tinha acesso ao celular como
à internet.
No final das contas, foi uma tarde divertida para uma pessoa
que odeia aniversário como eu. Após todos irem embora, ficamos
apenas eu, Lynnox e Valerie, que pede para dormir na sala, quando
Lyn me pergunta o que eu acho sobre isso, ajo com indiferença.
— Ei, você está bem? — pergunta Lynnox assim que eu dou
de ombros para a sua pergunta sobre a Val.
— Só estou com dor de cabeça — minto.
— Certeza?! — inquere desconfiada.
Balanço a cabeça em afirmativa, entretanto não tem muita
eficiência quando ela insiste.
— Você já estava triste desde o seu término com o Elliot,
depois do episódio no Jenkins ficou ainda pior, ele não falou com
você hoje, não foi? — ela pergunta, acertando tudo.
— Não — confesso —, só que ele está certo em não fazer
isso, eu magoei ele.
— Foda-se isso — reclama. — Ele não é nenhuma criança
para agir assim. Vocês tiveram uma história, pequena, mas tiveram,
e ele ignorar o fato de que hoje é seu aniversário é de uma pau no
cuzisse enorme.
Faço uma careta, enrugando o nariz.
— Tenho quase certeza de que o que você acaba de falar
está errado.
— O que está errado?
— Pau no cuzisse — repito.
Lynnox dá de ombros.
— A questão é que você terminou com ele porque você é
toda cheia de traumas, entretanto você precisa parar de se
martirizar pelas merdas que aconteceram na sua vida. Merdas
acontecem com todo mundo a todo momento e você pode passar o
papel higiênico no seu rabo inúmeras vezes, mesmo assim nada vai
deixá-lo cheiroso de verdade, se você não tomar a iniciativa e
passar uma boa água com sabão.
Minha careta só aumenta com sua metáfora, esperando, de
coração, que ela chegue em algum lugar com isso.
— Então se você quer deixar a cu da sua vida toda cagada,
cheirosa, limpa essa merda de uma vez com água e sabão para
poder cagar novamente. Porque enquanto você continuar passando
só o papel, nunca vai chegar a lugar nenhum, a não ser em mais
merda.
— Você está querendo dizer que eu tenho que deixar para lá
tudo de ruim que aconteceu no passado e começar a dar valor ao
presente, é isso? — arrisco entender o seu sermão.
— Exatamente — ela sorri, vitoriosa.
Ótimo, é a segunda pessoa que me diz isso hoje. Primeiro, a
mãe do Elliot e agora, a Lynnox. E como eu fico com isso? Mais
confusa do que eu já sou normalmente.
— Prometo que vou pensar — minto, já sabendo que não há
o que pensar, a não ser continuar andando para trás. — Agora vou
me deitar, porque realmente estou com dor de cabeça.
— Mentirosa — Lynnox acusa e eu sorrio em troca.
— Muito obrigada pelo dia de hoje — agradeço ao abraçá-la.
Após me soltar dos seus braços, ela me diz que qualquer
coisa eu posso chamar por ela e eu sei que é verdade, mesmo
diante de tantas coisas, eu devo admitir que a Lynnox tem sido um
presente em minha vida. Ainda que não sejamos as melhores
amigas do mundo e não tenhamos quase nada em comum, nos
damos muito bem e ela sempre se faz presente quando eu preciso
de qualquer coisa.
Me despeço dela outra vez e entro em meu quarto, após
fechar a porta, eu caio de costas na cama e volto a encarar o
celular, esperando qualquer sinal de que ele lembrou da data de
hoje. E é impossível ele não ter lembrado, já que mesmo que eu não
tenha publicado nada, todas as pessoas que estiveram comigo hoje,
o fizeram.
Então sim, ele viu.
Mas como eu disse à Lynnox, eu não o culpo por não entrar
em contato, eu que pedi para ele ficar fora da minha vida, enquanto
ele insistia para estar comigo, eu chorei negando. Portanto eu
mereço toda a sua ignorância quanto à minha pessoa.
Olhando para a escrivaninha, vejo que o presente da sua
mãe ainda está ali e fecho olhos, me deparando com uma cena
imaginada em que eu bato nele, assim como Margaret fizera
durante todos esses anos.
Assim, me vem o questionamento: como uma pessoa pode
ter um feliz e infeliz aniversário ao mesmo tempo?
Essa eu respondo: perdendo a única coisa boa, que uma vida
rodeada de mentiras, ameaças e lembranças ruins, te deu.
Uma lágrima escorre do meu rosto ao pensar na
possibilidade de jamais encontrar algo parecido com o fiapo de
felicidade que tive durante o tempo em que vivi nos braços de Elliot,
pois em uma coisa ele tem razão: ele era aquele em quem eu
confiava, era com quem eu sentia borboletas voarem na barriga.
Aquele que, após um dia cheio, me dava colo e que ria de mim
quando eu desafinava em alguma nota musical.
Ele é aquele que eu amo tanto, mas não tenho medo de
perdê-lo, porque eu já o perdi no instante em que acionei aquela
cláusula. Ele é tudo o que eu era para ele, Elliot jamais precisou me
obrigar a sentir qualquer coisa por ele.
Eu apenas o amei.
É triste saber que talvez seja tarde demais para poder dizer
isso em voz alta.
Assim que uma segunda lágrima ameaça descer por meu
rosto, eu sou retirada dos meus pensamentos com um grito de
Lynnox.
— Garota, tem uma entrega para você. — Ela está na porta
do meu quarto.
— O quê? — pergunto atônita, me levantando.
Tão logo saio do quarto, vejo um representante do correio na
nossa porta. Eu vou até ele, que confirma meu nome, me manda
assinar um papel em sua prancheta e me entrega uma caixa
pesada.
Após voltar para dentro, eu coloco a caixa em cima da
mesinha em frente ao sofá e estranho o recebimento dela.
— Você não vai abrir? — pergunta Valerie, sentada em uma
ponta do sofá.
— Estou me perguntando de quem seria isso — digo. — Eu
não pedi nada e meus pais já me presentearam durante à Ação de
Graças.
— Se você não abrir, eu abro — diz Lynnox.
— E se for uma bomba? — pergunta Val.
— Não é uma bomba. — Faço uma careta para ela.
— Eu vou abrir — diz Lynnox, já com as mãos na caixa de
papelão, a rasgando, sem ao menos fazer o uso de alguma tesoura
ou estilete. — Livros — diz em uma falsa animação ao revelar o que
há lá dentro, mas não são apenas livros, é a coleção especial de
Trono de Vidro em um buquê.
Isso mesmo, um buquê, não se rosas, de livros, meus livros
favoritos...
— Tem um bilhete. — Aponta Valerie.
— Será que é dele? — Lynnox me pergunta, ansiosa.
Meu estômago se revira, pensando na possibilidade.
— Acho que não — digo. — Ele sequer me deu parabéns,
como iria mandar um buquê de livros?!
— Não seja por isso, vamos saber agora — diz minha colega
de quarto, desdobrando o papel.
Seus olhos passam rapidamente pelas palavras escritas e
brilham à medida que as lê, o que me deixa ainda mais curiosa e
ansiosa para saber se realmente se trata de um presente do Elliot.
Quer dizer, é meio óbvio que talvez tenha sido dele, uma vez
que se trata de livros, mas também pode ser dos meus pais ou até
mesmo do Trevor. E quem sabe até um segundo presente da mãe
maluca do Elliot, contudo o gesto é romântico demais para ser de
qualquer um deles.
— Acho melhor você ler — diz Lynnox, me entregando o
bilhete.
— Certeza?! — pergunto receosa e ela balança a cabeça três
vezes, em afirmativa.
— Certo... — digo com as mãos trêmulas, quando começo a
ler o que está escrito ali, um sorriso estampa meu rosto
automaticamente.
“Você achou mesmo que logo eu seria capaz de esquecer
seu aniversário, Watson?
Fala sério, eu sou o melhor ex-namorado do mundo e você
pode assumir isso, inclusive para a Lynnox, pois te conhecendo
bem, você está com medo de se decepcionar com o remetente
desse presente e ela quem decidiu abrir a caixa.
Então acabando com o mistério, acho que você já sabe que
se trata de mim, não é mesmo?!
O seu sorriso é um arco-íris após a tempestade.
A sua pele é como um travesseiro após um dia cheio.
O seu cheiro é mais doce e sensível do que qualquer
sobremesa, assim como seu coração, que por mais que você insista
que não me pertence, eu sei que ele é todo meu (piscadela aqui).
E quero deixar claro para você que, mesmo quando este
mundo for um sussurro de terra esquecido em meio às estrelas,
amarei você. Porque você ainda é aquela com quem eu sonho todas
as noites e agora, todos os dias, e será assim até meu último
suspiro, pois eu sei que você é minha, assim como eu sou, para
sempre seu.
Com todo o amor existente em meu coração, Elliot.
Feliz aniversário, Watson.”
É... talvez não seja tarde demais para que eu possa dizer que
o amo em voz alta, afinal de contas.
Eu não sei se você significa tudo pra mim
E eu me pergunto se posso te dar tudo que você precisa
Não quero descobrir que perdi tudo
Com medo demais de não ter ninguém a quem chamar
Então podemos apenas fingir
Que nós não estamos caindo até o fundo do poço
DEEP END | BIRDY

Eu não sei se estou sã, mas sei que estou bem.


Bem o suficiente para saber que meu único objetivo hoje é
encontrar o Elliot. Por isso a primeira coisa que fiz ao me levantar
essa manhã, foi me arrumar e correr para o campo de futebol.
Contudo, quando cheguei, me deparei com um campo vazio.
— Você é mais uma fã, hein? — perguntou um dos guardas.
— Hoje os Jaguars não tiveram treino, volte amanhã, quem sabe
você se dá bem.
Não sou a pessoa mais atrevida do mundo, acho que isso já
ficou claro para o mundo inteirinho, embora eu tenha sorrido em um
agradecimento, em minha cabeça eu juro que mostrei o dedo do
meio ao guarda.
Caminho para o prédio de Literatura saltitando, isso mesmo,
saltitando — nas pontinhas dos pés —, o sorriso nunca
abandonando o meu rosto. Ainda há poucos alunos andando pelo
campus, uma vez que faltam alguns minutos para a primeira aula do
dia começar, por isso que eu vim para cá. Pois se Elliot não teve
treino, a sua primeira aula hoje é de escrita criativa e mesmo se não
fosse essa, todas as suas cadeiras são nesse prédio.
Afinal, qual o motivo de eu seguir os seus passos? Simples!
Eu preciso dizer que o amo.
Eu ensaiei o que vou dizer? Não!
Eu sei o que vou dizer? Não!
Eu tenho alguma ideia de como será a reação dele?
Absolutamente não!
Mas eu tenho o meu coração palpitando tão rápido e forte
dentro do meu peito e as borboletas voando por minha barriga,
desde que recebi seu presente ontem à noite, que eu simplesmente
me nego a passar mais um dia sequer sem que ele saiba o que eu
sinto.
Elliot precisa ter a ciência que nada do que aconteceu entre
nós foi unilateral, que eu estive com ele a todo momento, que ele
era eu e eu era ele. E nós ainda somos nós. Porém, tudo vai
depender da forma como ele vai aceitar todos os meus pecados.
Porque sim, pela primeira vez eu estou disposta a contar tudo
o que vivi antes dele. Tudo o que aconteceu na minha vida desde
que ela virou de cabeça para baixo, estou disposta a dizer a ele o
real motivo pelo qual fingi estar com o Drew, pois eu tenho certeza
de que Elliot jamais faria algo parecido, como me ameaçar.
Eles são diferentes em quase todos os aspectos. Por mais
que o Drew tenha tido inúmeras ideias diante da sua impulsividade e
o Elliot também tenha sugerido o nosso relacionamento em um
impulso, os dois continuam destintos um do outro.
O Drew se centrava no que poderia ser bom para ele, já Elliot
pensa em como as suas ações afetam a vida do outro, prova disso
foi toda a sua preocupação com seu primo, diante do acidente, ou
quando ele esteve comigo no momento em que Trevor precisou,
mesmo não sendo tão apegado ao meu irmão.
De fato, é arriscado eu deixar que ele saiba tudo, mas isso
não significa que ele irá me julgar ou, diferente disso, passar a mão
na minha cabeça e dizer que está tudo bem. O Elliot por quem eu
me apaixonei, vai dizer que me apoiará, seja qual for a situação.
Conhecendo-o bem, sei que ele irá passar a mão na nuca em
um primeiro momento, depois ele vai me fitar com seus olhos
verdes, que eu sinto tanta falta, e irá me apoiar.
Porque o Elliot é bom e mesmo que eu não seja vinte por
cento do que ele é, eu pretendo ser o suficiente para que ele possa
ter orgulho de mim.
O meu sorriso começa a sumir aos poucos quando o tempo
vai passando e todos os possíveis alunos chegam, menos ele. Eu
olho o horário no celular e vejo que já passa das oito e meia, então
o sorriso que havia estampado em minha boca, agora se tornou
uma linha reta.
Decido por fim abrir o seu contato, vendo que a última
mensagem da nossa conversa é o seu “boa noite” de semanas
atrás. Confesso que naquela noite eu digitei, ao menos dez vezes,
que eu também o amava, só que todas as vezes eu apaguei e não
enviei a mensagem, e foi ali que a nossa conversa morreu.
Respiro fundo antes de digitar duas simples letras e
pressiono o aviãozinho.
Eu: Ei.
Passam dez segundos e noto os três pontinhos se moverem
na tela, contudo a resposta demora cerca de dois minutos para
chegar. Imediatamente imagino que ele esteja escrevendo um
textão, entretanto me surpreendo ao ver que não se trata disso.
Elliot: Ei.
Faz tempo que eu não faço isso, então eu não sei o que
responder.
Eu: Tudo bem?
— Tudo bem, Sadie, sério? Poderia soar menos estranha do
que isso? — reclamo comigo mesma em voz alta.
Elliot: Foto anexada.
Abro a imagem e uma risada genuína toma conta de mim.
Eu: O que aconteceu com sua bunda?
Elliot: O fato é que essa bunda não é minha.
É do Grey.
Poxa, Watson. Pensei que você me conhecia...
Mas é só para mostrar minha indignação por você passar
semanas sem falar comigo e do nada me soltar um “tudo bem?”,
então eu fiz uma cara de bunda.
Eu: Acredite, eu também achei ridículo eu falar “tudo bem”.
Elliot: De toda forma, respondendo à sua pergunta, sim, eu
estou bem.
E você, vem sempre aqui, gata?
Por um momento eu esqueci o quão bom é estar na presença
de Elliot, mesmo que não estejamos frente a frente, ainda é
reconfortante conversar com ele mesmo que seja por mensagem.
Eu: Eu costumava vir aqui com mais frequência antes, sabe?
Mas acabei dando um pé na bunda de um cara que se acha,
então dei uma sumida.
Entro na sua brincadeira, sem saber se ele irá se sentir mal
ou ofendido com isso, no entanto espero que tenha um efeito
contrário ao que eu temo.
Elliot: Interessante...
Ele pelo menos era bonito?
Eu: Não era essas coisas todas.
Mas dava para o gasto.
Em cerca de dois segundos o meu celular toca e rapidamente
eu atendo, escutando a voz de Elliot do outra lado da linha.
— Como assim você está dizendo que eu dava para o gasto?
— pergunta. — Logo eu, o desejo de todas as garotas.
— Que garotas? — pergunto ao me sentar em um banco em
frente ao prédio de Literatura.
— Algumas garotas... — ele deixa no ar.
— Hum — murmuro em resposta.
— Ciúmes? — pergunta e eu escuto uma porta se fechar do
outro lado da linha.
— Talvez...
— Você está falando sério?
Juro que consigo ver seu sorriso convencido nesse instante,
o que faz com que eu sorria junto.
— Não sei — respondo. — O que você acha que significaria
se eu estivesse com ciúmes de supostas garotas?
— Significaria que você está caidinha por mim.
— Então eu acho que estou com ciúmes... — Sinto minhas
mãos suarem no momento em que a resposta é dada.
Um silêncio estranho se estende entre nós e eu mordo o lábio
inferior, apreensiva com o que Elliot pode estar pensando agora,
mas solto-o rapidamente quando ele fala:
— Você vai acabar machucando sua boca desse jeito,
mesmo que eu esteja disposto a beijar todas as suas feridas, eu
ainda não virei vampiro para chupar sangue.
— Que nojo. — Faço uma careta ao imaginá-lo chupando
meu sangue.
Outro silêncio se estende entre nós, porém sou eu que o
quebro dessa vez.
— Elliot — o chamo.
— Sim, Watson.
— Sinto sua falta. — Minha voz sai sussurrada, ainda assim
sei que ele escuta, pois imediatamente ouço a sua resposta do outro
lado.
— Você não imagina o quanto eu quis ouvir isso nos últimos
dias, Watson.
Solto um suspiro aliviada, mesmo sem saber o que estou
fazendo, sei que é o certo. E sei também quão errada eu fui por ter
me mantido afastada dele por tanto tempo, só que isso não vai
acontecer novamente, eu me nego a ficar mais um dia sequer longe
de Elliot e negar o quanto o amo, por isso não desperdiço meu
tempo com qualquer clichê e decido ir logo para o que importa.
— Onde você está? — pergunto. — Queria te falar uma
coisa, só que só funciona pessoalmente.
Eu posso ter sido estúpida ao ter negado o que sinto por ele,
mas jamais iria me declarar através de uma ligação.
— Na casa do pai do Grey em Montgomery, só volto para o
campus à noite — explica e solto um murmúrio em resposta. —
Você sabe que eu sou curioso, então pode falar por aqui.
— Não, você não é curioso, você é fofoqueiro — acuso e ele
ri. — O que eu tenho para dizer só funciona pessoalmente — repito.
— Que tal você me dar uma dica?
— Não.
— Droga! — Ele solta uma lufada de ar audível. — Ao menos
me diz se é bom ou ruim...
— Também não.
— Você não sabe brincar, Watson.
— Que tal eu me encontrar com você na fraternidade às oito?
— sugiro.
— Vou morrer de ansiedade até lá.
— Em minha defesa, eu passei a manhã inteira te
procurando, portanto, você terá que me esperar até à noite.
— Me procurou, foi? — Sinto a malícia em sua voz.
— Até à noite, Elliot.
— Estarei te esperando, Watson.
Nós nos despedimos e eu aperto o celular contra meu peito,
mordendo o lábio inferior de novo, contudo não há perigo de feri-lo,
pois dessa vez eu estou feliz. Não vejo a hora de ver o rosto do
Elliot quando eu finalmente lhe disser aquelas três palavras, que
tanto me assustaram há três semanas.

Passei o dia inteiro ansiosa sobre o meu encontro com o


Elliot, tanto que quase não consegui me alimentar e sequer
consegui assistir qualquer aula. Sendo assim, na hora do almoço,
decidi que seria um dia perdido, por isso voltei para o alojamento.
No dormitório, fiz todo um dia de SPA para mim, me depilei,
esfoliei e hidratei todo o meu corpo, lavei meus cabelos e hidratei
com os produtos que o Elliot gosta, mesmo que ele nunca tenha me
dito, eu notei todas as vezes em que ele se afogou nos meus
cabelos quando eu os usava, desse modo faço o uso deles para
agradá-lo.
Depois de ter finalizado meus cabelos em cachos soltos,
optei por usar uma calça e um suéter, uma vez que o inverno está
chegando e o clima está mais frio. Faço o uso também de uma bota
de cano alto. Embora eu saiba que todas essas peças serão
arremessadas no chão no instante em que começarmos a nos
pegar, eu preferi me vestir de uma forma que não desse a entender
que estou indo atrás de sexo, mesmo que seja uma consequência
para tudo o que vai acontecer hoje.
Descendo as escadas do prédio saltitando, assim como pela
manhã, eu saio e sinto meu celular vibrar na bolsa, mas prefiro
pegá-lo apenas quando estiver dentro do carro, por isso ignoro.
Giro as chaves na mão e ao sair do alojamento desejo “um
boa noite” muito animado para o porteiro, todavia meu sorriso morre
no momento que eu vejo Trevor abandonar o seu Dodge em frente
ao prédio.
— Por que você não atende a droga do seu celular? —
esbraveja assim que me vê estacionar meus passos.
— O que você está fazendo aqui? — questiono ao ver que
começa dar a volta no carro, indo em direção à porta do carona.
— Entra no carro — manda ao abrir a porta.
— Não — me nego imediatamente. — Eu estou de saída.
— E eu não estou nem aí, entra no carro.
— Nós fizemos uma aposta e eu ganhei, você não pode mais
chegar aqui dizendo o que eu devo ou não fazer.
— Foda-se a merda da aposta — Trevor grita.
Ele tenta se aproximar de mim em passos duros, mas somos
interrompidos pelo segurança, que interfere na situação.
— Está acontecendo alguma coisa aqui? — ele pergunta.
— Nós somos irmãos — Trevor se apressa em explicar.
O segurança estreita os olhos para mim logo que vê que dou
um passo para trás, me esquivando de Trevor, ainda assim eu
confirmo o que ele acaba de dizer. Acenando com a cabeça, ele
aponta para a portaria, como se estivesse dizendo que está ali e eu
agradeço em um meio sorriso.
— Eu preciso de você — ele diz, baixando o tom de voz.
— E eu tenho um compromisso.
— Por favor, Sadie — ele pede.
— Olha só, Trevor, o Elliot está me esperando e eu preciso ir,
não estou a fim de servir de puta para você hoje.
— Sady...
— Não, caralho — esbravejo. — Você precisa entender que
“não” é “não”, e eu não vou. Você não está feliz com todas as
merdas que aconteceram comigo no ano passado? Ou então em
toda a minha vida, porra? Por sua culpa eu fui sexualizada com
apenas catorze anos, aos quinze perdi minha virgindade com uma
pessoa qualquer apenas porque eu senti que eu era a merda de
uma prostituta, porque o meu irmão me tratava dessa forma. Me
vendia para seus adversários.
Me aproximo dele, o fuzilando com os olhos.
— E mesmo não bastando tudo isso, você deixou que o Drew
nos ameaçasse. Graças a você, perdi todos os meus amigos, perdi
a minha vida, perdi o significado de estar viva. Graças a você, eu
tenho medo de você. Mesmo que o nosso pai insista que você
jamais faria qualquer coisa comigo, é impossível acreditar quando
eu vi com meus olhos o assassino que mora no seu interior.
— Sadie — Trevor grita e me pegando pelo braço, ele me
põe dentro do carro, sem deixar que eu finalize.
Em seguida, ele corre e entra no carro também, dando
partida imediatamente. Eu tento sair, porém se torna impossível no
momento em que ele acelera o carro pelas ruas do polo
universitário.
— Para essa droga de carro que eu quero descer — grito.
— Você está louca de falar uma coisa dessas em público? —
ele devolve no mesmo tom enquanto acelera o carro.
— O quê? Que você é um assassino? Ou você vai debochar
de mim e tentar me convencer do contrário? — digo irônica.
— Você não sabe do que está falando, Sadie.
— Eu sei e você sabe tanto que eu sei, que usou a maior
merda que você fez na sua vida de uma forma que fizesse eu sentir
pena de você, quando na realidade eu deveria ter pena de mim
mesma por ter um irmão assassino.
— Eu não sou assassino. — Ele nega com a cabeça, pisando
no acelerador ainda mais.
— Não? Então uma pessoa que pega uma barra de metal e
bate com ela na cabeça do avô, espalhando o sangue por toda a
garagem é o que então? — desafio. — Você é um assassino,
Trevor. Você matou o nosso avô a sangue frio.
— Eu fiz aquilo para te proteger, sua estúpida — ele freia
bruscamente assim que entra na pista de cascalho.
— A única pessoa que fez algo para proteger alguém aqui, fui
eu e eu estou cansada de levar esse fardo comigo.
Trevor sai do carro batendo a porta e eu o acompanho, mas
não paro de falar.
— Tudo o que aconteceu comigo foi culpa sua, Trevor. Eu fui
prostituída, ameaçada e o pior de tudo, eu quase morri por sua
culpa — grito em meio ao nada. Ele puxa seus cabelos com raiva e
depois tenta colocar as mãos sobre os ouvidos, se negando a
escutar. — Eu quis me matar, por sua culpa — grito novamente. —
Eu me afoguei por sua culpa.
— E eu quis apenas te proteger — ele grita de volta, batendo
com força no capô do carro e eu pulo em um susto.
— Não — nego. — Você fez o que fez porque é um psicopata
igual o Drew.
— Eu te protegi — ele repete em um grito, apontando o dedo
na minha cara.
— Do que você me protegeu? Você iria matar quem em vez
do nosso avô? A mim?! É isso que você quer dizer?
— Não — grita, com os olhos arregalados. — Ou eu o
matava ou ele iria matar você, só que primeiro ele iria lhe usar, iria
te mandar calar a boca e dizer que se você fosse uma boa garota e
não dissesse nada aos nossos pais, ele iria te recompensar. Então,
todas as vezes em que ele te encontrasse na garagem, ele iria
possuir cada vez mais a sua alma e pouco a pouco iria te matar.
Solto uma risada amarga.
— O vovô, o pai da nossa mãe, me matar?
— Sim, assim como ele fez comigo — Trevor diz cabisbaixo.
Ele está ficando louco? Ele só pode estar louco, o vovô
sempre foi um amor de pessoa.
— Você está louco? — pergunto. — Ou a culpa lhe fez
enlouquecer?
— Não — Trevor diz ao se sentar no meio da pista,
abraçando suas pernas. — O nosso avô, aquele homem tão bom,
ele me destruiu e naquela noite, ele estava prestes a destruir você
também.
— Eu vou chamar a polícia — digo, pegando meu celular na
bolsa. — Você está ficando insano dessa vez, Trevor.
Desbloqueando o celular, eu aciono o número da
emergência, mas desligo no instante em que escuto suas próximas
palavras.
— A primeira vez que ele me estuprou eu tinha dez anos...
Um gole seco desce na minha garganta, meus lábios se
tornam uma linha fina e minha cabeça fica a milhão no segundo em
que eu começo a ouvir todo o seu relato sobre o que ele passou, por
anos seguidos, nas mãos do nosso avô.
O CAPÍTULO A SEGUIR CONTÉM GATILHO SOBRE
PEDOFILIA E HOMICÍDIO. NÃO É RECOMENDADA A LEITURA
EM CASO DE GATILHOS, NESSE CASO VOCÊ PODE PULAR
PARA O PRÓXIMO CAPÍTULO. E LEMBRE-SE, SE VOCÊ PASSA,
PASSOU OU CONHECE ALGUÉM QUE PASSA POR ALGO
PARECIDO, LIGUE PARA A POLÍCIA NO 190 OU 100 PARA
DENUNCIAR QUALQUER CASO DE VIOLÊNCIA SEXUAL
INFANTIL.

NÃO SE CALE!
Eu não consigo escapar desse inferno
Tantas vezes eu tentei
Mas eu continuo preso por dentro
Alguém poderia me tirar desse pesadelo?
Eu não consigo me controlar
ANIMAL I HAVE BECOME | THREE DAYS GRACE

Seis anos atrás...

Eu tinha oito anos quando senti suas mãos tocarem as


minhas partes íntimas pela primeira vez, metade da idade que eu
tenho hoje. Eu sabia que era errado, mas ele me dizia que se eu me
mantivesse calado tudo seria divertido.
Nunca foi.
Aos nove, ele me confessou que seu desejo por mim era
intenso e que tudo era diversão para nós dois.
— Você é um bom garoto, Trevor, sempre foi, desde que
nasceu. E você vai obedecer ao vovô, não vai?
Eu mordi minha língua, querendo lhe dizer não, porém não
obtive muito sucesso no momento em que minha cabeça concordou
com ele.
No entanto, eu só concordei porque eu tinha medo do que ele
poderia fazer comigo em seguida, pois até então, ele só passava as
mãos em meu pênis e bunda. Entretanto, era o suficiente para que
eu vomitasse sempre que ele ia embora.
Antes do meu aniversário, ele me perguntou:
— Se você pudesse ter qualquer carro daqui a seis anos,
qual você escolheria?
Nós estávamos na mesa com meu pai, minha mãe — que
não fazia ideia do animal que era o seu próprio pai e que sorria, me
incentivando a responder — e Sadie, que tem apenas seis anos de
idade.
— Eu teria um igual ao do nosso vizinho da frente — minha
irmãzinha responde quando eu me mantenho calado.
— Mas e você, Trevor, qual teria? — meu avô insistiu.
— Um Dodge igual ao do vizinho da frente seria legal —
respondi cabisbaixo, dando de ombros.
Eu não sei se meu avô sorriu, nem se meus pais também,
contudo eu, só tive nojo.
Um dia após eu fazer dez anos, eu estava na garagem de
casa — minha mãe havia saído para visitar um cliente e meu pai
estava em seu escritório —, quando um Dodge Charge foi
estacionado na minha frente. A verdade é que eu nunca gostei
daquele modelo de carro e passei a odiar assim que vi o pai da
minha mãe, Bruce, descer dele naquela tarde.
— Você ainda não tem idade suficiente, eu sei — ele diz ao
me ver encarando a ele e o carro. — Mas que tal experimentar o
seu futuro carro?
— Não quero, estou bem aqui, brincando — digo.
— Vamos lá, Trevor, seja um bom garoto e entre no carro
com o vovô — ele pede.
— Eu não quero, vovô — repito ao dar dois passos para trás.
— Trevor Langster — ele grita, me fazendo pular em um
susto. — Entra agora nesse carro — aponta ele.
Sinto meu coração se apertar em meu peito e vômito se
instalar na minha garganta, meus olhos se enchem de lágrimas e eu
concordo com a cabeça, caminhando lentamente até o veículo.
Assim que passo por ele, ele dá um tapa na minha bunda e aquilo
me faz correr para dentro do carro.
— Como eu disse, Trevor, se você for um bom garoto, tudo
será divertido — ele diz ao me pedir para abaixar as calças.
Enquanto dirige com uma mão, meu avô faz movimentos de
sobe e desce no meu pênis, eu o sinto duro por baixo dos seus
dedos, mas eu não queria que ele ficasse daquela forma, porque ele
desistia todas as vezes em que ele ficava flácido.
“Por que você não fica flácido?” Eu me pergunto à medida
que as lágrimas descem pelo meu rosto.
— Não tem motivos para chorar, garoto. Eu já disse que você
vai gostar do nosso passeio — ele diz logo que estaciona o carro
em frente a um lago, a alguns minutos de distância da minha casa.
Eu tento abrir a porta do carro para sair, porém ele havia
travado.
Vejo que ele começa a se acomodar no banco do motorista,
deitando-o e então ele desce as calças, juntamente com sua cueca,
pondo o seu pênis para fora.
— Eu conheço garotos que amam colocar a boca aqui — diz
ele ao massagear a parte de cima do seu órgão. — Por que você
não experimenta? — sugeriu.
— Eu acho que eu não vou gostar. — Nego com a cabeça.
— Vai sim, vem cá — ele responde, agarrando a parte de trás
do meu pescoço e puxando minha cabeça.
No primeiro instante em que minha língua encontra o seu
pênis eu tenho repulsa, só que isso não o incomoda. Parece que na
verdade, o deixa ainda mais satisfeito, diante disso, ele exige que eu
abra mais minha boca e coloque todo o seu membro dentro dela. Eu
choro sem parar, contudo, isso não o incomoda em momento algum
e em pouco tempo, ele me faz engolir todo o líquido salgado que ele
jorra em minha garganta.
Quando eu finalmente posso respirar um pouco, eu quase
vomito no carpete do carro, mas ele cobre a minha boca e em
seguida, manda eu me sentar em seu colo, sem roupa, sem nada.
A ardência toma conta de mim no segundo em que ele me
penetra a primeira vez. Eu calo o grito reprimido em minha garganta,
eu queria pedir socorro, porém não tinha a quem. Isso dói demais
em mim, no entanto ele gosta disso, pois ele elogia, me dizendo o
quão gostoso isso é para ele.
Na hora em que finaliza, ele diz:
— Esse é um segredo apenas nosso, tudo bem? — ele fala,
eu não respondo. — Você e eu vamos nos divertir muito daqui para
frente e, enquanto você se mantiver calado, você terá tudo o que
quiser.
Eu concordei, mesmo com o choro entalado em minha
garganta, eu concordei.
Os próximos seis anos da minha vida foram assombrados
pelo meu avô e suas visitas na casa dos meus pais, ele sempre
vinha com a desculpa de que deveríamos ajeitar o carro, que seria
meu quando eu fizesse dezesseis anos. Entretanto, em todas as
vezes que ficávamos a sós, ele roubava um pedaço da minha alma.
Uma vez, quando eu tinha treze anos e Sadie nove, ela
entrou na garagem de supetão. Eu a levei até o seu quarto,
arrastando-a pelo braço e ela pedia para que eu a soltasse, no meio
caminho. Assim que a joguei em cima da sua cama, ordenei:
— Você nunca, jamais, em hipótese alguma irá naquela
garagem quando o vovô estiver aqui.
— Mas eu quero brincar com você — ela chora, fazendo uma
cara emburrada ao passo que abraça o seu corpo pequeno.
Sento-me ao seu lado na cama e a puxo para perto mim,
passando as pontas dos dedos em seus cabelos macios, sussurro
em seu ouvido:
— Eu também quero brincar com você, maninha, mas nunca
quando o vovô estiver aqui, está bem?
— O vovô não gosta de mim? — ela pergunta, genuinamente
preocupada.
Sadie sempre teve essa desconfiança de que ninguém
realmente gostava dela, porém eu sempre fiz questão de ressaltar o
quanto ela é uma criança incrível.
— O vovô gosta de você — respondo infeliz, apenas para
fazê-la feliz, desejando que ele realmente não goste dela, pois se
ele gostar, ele pode acabar fazendo da vida dela um verdadeiro
inferno, assim como faz com a minha. — Todo mundo gosta de
você.
— Verdade?
— Claro que sim, Sady. Você é uma garotinha muito especial,
só nunca deixe o vovô brincar com você, está bem?
Ela concorda com a cabeça, franzindo a testa e mordendo
seu lábio inferior.
— Está bem, mas só porque você está pedindo, Trevor.
— Te amo, maninha — digo ao bagunçar seu cabelo.
— Eu também te amo muito, Trevor.
Naquele dia, quando meu avô chegou dez minutos depois de
eu abandonar o quarto de Sadie e me comeu por trás, eu prometi a
mim mesmo que jamais deixaria ele encostar em fio de cabelo dela.
Porque ela jamais iria passar por algo parecido com o que eu passo.
Hoje é meu aniversário de dezesseis anos, então
oficialmente, o Dodge Charge é meu, apesar disso eu continuo
odiando esse carro, mais do que tudo no mundo, assim como eu o
odeio. Hoje ele está bêbado e totalmente descontrolado, ele coloca
a mão no meu pescoço, dizendo que eu jamais vou me desfazer
dele. Minha única vontade é de cuspir na sua cara, de nojo que eu
estou sentindo, contudo, somos interrompidos por uma garotinha
ruiva de doze anos adentrando a garagem, no momento em que ele
finaliza o seu ato covarde, que segundo Bruce, é como ele
consegue demonstrar quão macho ele é. Na minha opinião ele não
passa de um nojento.
— Trevor? — Sadie me chama. — Você está aqui?
— Ele está ocupado agora — Bruce responde, indo em sua
direção.
A sua voz forte e grossa me deixa em alerta, além da forma
como ele caminha na direção de Sadie, rapidamente eu subo
minhas calças e dou a volta no carro.
— Ah, eu queria perguntar a ele se ele queria assistir a algum
filme — ela diz, totalmente alheia à situação que acabou de
acontecer aqui.
— Filme?! — ele indaga e noto Sadie concordar, com um
sorriso feliz em seu rosto.
— Sim, o senhor gostaria de assistir um filme comigo
enquanto o Trevor não desocupa de sei lá o que? — ela sugere.
Meu avô pende a cabeça para o lado e caminha
vagarosamente em sua direção, eu estou logo atrás dele.
— Filme não — ele hesita ao responder —, mas eu sei uma
forma de nos divertirmos se você for uma boa garota.
No instante em que escuto essas palavras saltarem da sua
boca, eu não penso duas vezes ao pegar uma barra de ferro, que
está encostada na parede da garagem e arremessá-la em seu
cabeça. Eu não deixo que ele chegue perto de Sadie, no entanto
aquela fora a última vez em que eu vi um sorriso no rosto da minha
irmã.
Toda a felicidade e ingenuidade que Sadie carregava consigo
foi tomada por pavor. Porém, pavor pior quem sentiu fui eu, quando
eu escutei as palavras que me machucaram por tanto tempo saírem
da boca daquele velho nojento.
As lágrimas escorrem em meu rosto e um grito profundo
abandona a minha garganta à medida que eu golpeio a sua cabeça
com força, repetidas vezes. Na minha cabeça só tem lembranças
dos seis anos em que passei sob seu controle, todas as vezes em
que ele se enterrou em mim e me matou aos poucos.
Todas as suas investidas que destruíram ao longo do tempo e
me transformaram no animal que eu acabo de me tornar hoje.
Em nenhum momento, enquanto eu o golpeio, eu penso no
que eu estou fazendo ou se no futuro eu vou me arrepender. A única
coisa que vem à minha cabeça é destruir aquele que me destruiu,
porque ele estava prestes a fazer o mesmo com ela.
Minha irmãzinha. Aquela que eu prometi proteger.

Atualmente

— Eu não me arrependo — digo à Sadie. — Eu jamais me


arrependerei de ter o matado. Eu sei que eu roubei a luz da sua
vida, mas acredite em mim, Sadie, se ele tivesse feito com você
tudo o que fez comigo, ele teria te destruído muito mais. Sabe
quantas vezes, durante essas corridas eu penso em jogar o carro
contra algum dos obstáculos ou não fazer uma daquelas curvas
fechadas? — pergunto retórico.
O rosto de Sadie, totalmente vermelho e tomado pelas
lágrimas, nega.
— Todas as vezes. Eu não entro nessas corridas para
ganhar, eu entro nelas para morrer e por incrível que pareça, no final
eu sempre consigo sair de lá ileso. A vitória é apenas uma
consequência e a comemoração é apenas mais uma oportunidade
de tentar me matar. Porque eu não tenho mais forças para viver,
desde os meus dez anos. Eu sei que destruí a sua vida e roubei a
sua luz no momento em que deixei você me assistir matá-lo. Só que
eu faria tudo de novo mil vezes, se isso significasse que ele jamais
encostaria em você. Porque você é minha irmã e eu sempre,
sempre vou te proteger. Ou ao menos fazer o máximo para isso.
— Por que você nunca me disse a verdade, Trevor? — Sadie
pergunta com a voz embargada.
— Você acha realmente que eu nunca quis dizer o que ele
fazia comigo? — pergunto em resposta, porém logo que não
obtenho qualquer retorno seu, em meio ao nosso choro, eu
continuo. — Sim, eu quis falar, eu quis dizer à nossa mãe todos os
dias quando ela me perguntava como havia sido o dia com vovô, eu
até chegava a imaginar se ele algum dia encostou nela, mas eu
soube que não, pois ela não sentia nojo por ele como eu. E na
época em que o vovô sumiu das nossas vidas “misteriosamente” e
eu tive a minha primeira crise. Eu tentei contar a ela, no entanto ela
pensava que eu sentia falta dele e eu não tive coragem de arruinar a
imagem boa que ela tinha do próprio pai. Então ela me abraçou e
disse que ia ficar tudo bem, até hoje ela pensa que todas as minhas
crises são baseadas na saudade. O nosso pai deu um jeito no corpo
e disse para nunca falarmos sobre o assunto com a nossa mãe,
mesmo que eu quisesse lhe dizer, por todos esses anos, que eu me
livrei daquele que roubou a minha vida, eu não fiz. Eu obedeci ao
nosso pai e em troca, ele se livrou do pesadelo que era o Bruce.
— Eu não consigo acreditar que você tenha passado por
isso, tudo isso é muito absurdo.
— Quando a gente vive em uma bolha, a gente nunca
consegue enxergar o que há na bolha do outro, Sadie, é por isso
que você nunca soube.
— Eu sinto muito, Trevor, muito mesmo — ela me fala ao se
abraçar comigo.
— Eu também. Eu nunca quis destruir a sua vida, Sady, eu só
quis te proteger.
— Eu sei — ela diz enquanto nos abraçamos.
— Eu só quis te proteger — repito.
— Você o fez.
— Não — eu nego em meio às lágrimas. — Eu arruinei você
também, eu usei você, eu fiz você se sentir uma puta, eu estraguei a
sua vida em troca do meu silêncio, eu escolhi a minha dor e esqueci
de te proteger depois que tudo havia acabado.
— Você me protegeu — me garante.
Ao ouvir as palavras, eu aperto o seu corpo magro contra o
meu e me permito chorar, mas dessa vez o grito não fica entalado
na minha garganta, eu me agarro à minha irmã, como se ela fosse
minha salvação, porque ela sempre foi a minha salvação. Desde o
dia em que nasceu, ela foi minha força e eu nunca, jamais me
arrependeria de nada do que eu fiz para protegê-la.
— Você me protegeu, Trevor, você me protegeu — diz
enquanto agarra a minha cabeça e nós dois choramos, abraçados.
A luta está terminada e ninguém venceu
Então agora estamos apenas aqui, deitados com armas vazias fumegantes
Eu deveria ter dito uma palavra
Porque você está errado no que estava pensando
Não, não era isso que eu estava pensando
Garota, eu só estou pensando em você
HALF HEARTED | WE THREE

Sei que já me olhei no espelho mais de cinco vezes desde


que terminei de arrumar o meu quarto, contudo, não consigo deixar
de ver o meu reflexo uma outra vez. Arrumo o meu cabelo,
penteando-o para trás, porque na minha cabeça, Sadie gosta dele
assim, se bem que da última vez que eu verifiquei minha imagem
através do espelho, eu tinha quase certeza de que ela o preferia
partido ao meio.
Quando Sadie me enviou mensagens mais cedo e logo após
ela disse que sentia minha falta, um sorriso brotou em meu rosto ao
mesmo tempo que meu coração começou a acelerar de forma
descompassada, como nunca antes. Pois se ela estava, finalmente,
admitindo que sentia minha falta e logo depois pediu para me
encontrar, isso só podia significar uma coisa: que nós vamos voltar.
Menti para ela que iria chegar no campus apenas à noite,
entretanto de tarde já estava em casa, só que eu precisava arrumar
o meu quarto, que estava uma real zona. Inúmeras garrafas de
bebidas jogadas pelo chão, caixas de pizzas, roupas sujas. O
verdadeiro caos. A verdade é que eu queria vir correndo de volta
para o campus, porém quem estava dirigindo era o Grey e ele me
pediu para ir com ele até a casa do seu pai, em Montgomery, cidade
vizinha, para ajudá-lo com a mudança.
Eu consegui esperar dias para que Sadie enfim se tocasse e
eu esperaria meses, acredito que até mesmo anos, para poder ficar
com ela.
No entanto, começo a ficar preocupado ao ver que já passa
das oito e vinte e ela ainda não apareceu. Normalmente, Sadie
sempre chega no horário, para toda e qualquer coisa que ela vá
fazer, ela gosta de ser pontual.
Portanto, eu me dou o direito de começar a me preocupar
quando olho no relógio e vejo que faltam apenas dez minutos para
às nove.
“Será que ela desistiu de se encontrar comigo?” penso,
mesmo querendo acreditar e torcendo para que não. Mas a Sadie
que eu conheço, aquela que gosta de ser pontual, ela também ama
ser confusa, em um momento ela diz “sim”, para que no segundo
seguinte um “não” saia de sua boca. Então resolvo enviar uma
mensagem.
Eu: Aconteceu algo?
Passam-se vários minutos e não obtenho qualquer resposta
de Sadie.
Eu: Você prefere que eu vá até aí?
Envio outra. Impaciente, começo a andar de um lado para o
outro no quarto e continuo sem qualquer resposta de Sadie. Não tiro
meus olhos da tela do celular em momento algum, esperando os
três pontinhos aparecerem na tela e ela me responder.
Isso não acontece.
Eu: Watson??????
Novamente não recebo resposta alguma de Sadie. Meu
coração dispara e meu estômago embrulha. A ansiedade me pega
de jeito quando uma sinto uma pequena cólica na ponta da barriga,
que se torna ainda maior no instante em que sinto o celular vibrar
em minha mão.
Pego-o e um sorriso se abre em meus lábios assim que vejo
que se trata de uma mensagem de Sadie, porém ele desaparece e a
dor pontuda volta ao ver o conteúdo da mesma.
Sadie: Desculpa ter te dado qualquer esperança, não era a
minha intenção.
Queria te pedir para seguir a sua vida, Elliot, então faz isso,
por favor.
Ela não estaria falando sério, não é mesmo? Sadie não
poderia voltar atrás assim dessa vez, não depois de tudo o que
aconteceu durante todos esses dias, ela não teria coragem de se
esquivar dos seus sentimentos dessa forma. Eu sei que ela é
indecisa, sei também que ela tem inúmeros traumas e um passado
turbulento, cujo qual nunca chegamos a conversar sobre, no
entanto, Sadie não precisa se abster de tudo o que somos por isso.
Eu sei que disse que a esperaria, contudo, um desespero
súbito toma conta de mim após ler a sua mensagem e decido ir em
sua busca, por mais atormentado que eu esteja no momento, eu
não posso aceitar outro não assim.
Saindo do meu quarto, eu desço os dois lances de escada
feito um furacão. Chegando no andar de baixo encontro Colin, que
começa a subi-las.
— Que pressa é essa, cara? — pergunta quando eu tento
desviar dele. — O que tá pegando fogo além do seu pau
necessitado de sexo?
— Agora não, Colin — vocifero logo que, finalmente, consigo
passar por ele.
Ele murmura uma outra piada, porém eu não o escuto, pois já
estou passando pela porta da casa. Em frente à garagem encontro o
Camaro preto, que ganhei de Jason no dia do meu aniversário,
estacionado. Eu ainda não tive coragem de dirigi-lo, talvez um dia
eu crie, mas hoje não é esse dia, por isso também passo direto por
ele e começo a correr em direção ao campus, onde ficam os prédios
dos dormitórios.
Após cerca de doze minutos de corrida, estou em frente ao
prédio. Mesmo que eu esteja com a respiração entrecortada, devido
ao exercício físico feito, eu solto uma lufada de ar, aliviado por ver o
carro de Sadie parado no estacionamento, pois isso significa que ela
deve estar em seu quarto nesse momento, se questionando sobre o
que fazer.
Passando pelo segurança, dou “boa noite” e sigo até as
escadas. Após subir três lances rapidamente, entro no corredor dos
quartos e bato na porta do seu apartamento várias vezes, até ser
atendido por uma Lynnox Grace de cabelos arrepiados.
— Água — peço sem ar e sem pedir licença, entro no
alojamento.
Lynnox me segue e em seguida me oferece uma garrafa de
água, a qual eu tomo rapidamente.
— Você sabe que hoje é uma terça-feira, quase dez da noite
e você está batendo na porta de terceiros, parecendo um louco, e
importunando a vizinhança?
Limpo a boca com as costas das mãos e a respondo
retoricamente.
— Você sabe que você parece um leão quando acorda? —
digo ao me referir aos seus cabelos armados. Lynnox tenta ajeitá-
los, mas não obtém muito êxito, por isso me mostra o dedo do meio.
— Se fode, Elliot.
Sorrio para Lynnox ao passar por ela, caminhando em
direção ao quarto de Sadie, que está com a porta entreaberta. Eu
preciso abraçá-la da mesma forma como fiz da última vez em que
estive aqui ou como fiz no banheiro do bar, só que dessa vez eu não
vou apenas aceitar o seu não e ir embora, eu vou permanecer e vou
dizer que tudo bem ela não me querer, porque isso não significa que
eu vá desistir dela.
No entanto, meus planos se tornam apenas planos assim que
sou interceptado por sua colega de quarto.
— Ela não está aqui — avisa, quando vou me aproximando
do quarto.
— Não pode ser — eu digo sem acreditar.
Conferindo se a informação que Lynnox acaba de me passar
realmente está correta, abro a porta e ligo a luz, realmente eu não
encontro Sadie ali, apenas algumas roupas em cima da cama. No
instante em que me volto para Lynnox com a sobrancelha arqueada,
ela continua a explicar.
— Ela saiu há mais de duas horas, disse que ia te encontrar
e por sinal, ela estava saltitando e muito feliz.
— A Sadie nunca apareceu — informo atônito. — Você tem
certeza de que ela saiu daqui feliz?
Isso não condiz com o tempo em que fiquei sem resposta
dela, nem mesmo com a mensagem que ela me enviou e com
certeza nem com o seu carro, que continua estacionado lá fora.
— Como eu disse, ela estava saltitando, assim... — Lynnox
dá três pulinhos. — E pelo pouco que eu conheço de Sadie, as
únicas vezes em que eu a vi feliz daquela forma foram nas que você
estava presente e ela está assim, desde que recebeu sua caixa
ontem à noite.
— Isso tudo está muito estranho — reflito. — O carro dela
está lá embaixo e ela não chegou a ir para a fraternidade. Onde
mais ela poderia estar? — pergunto, colocando as mãos nos
quadris.
— Espera — pede, ao levantar um dedo no ar.
Ela pega o celular e disca algum número, pergunta se Sadie
está lá e eu volto a ficar impaciente, assim como estava enquanto
esperava por sua chegada.
— Allie disse que ela não está lá — Lynnox responde quando
se afasta do celular.
Eu começo a andar de um lado para o outro, realmente
preocupado com qualquer coisa que possa ter acontecido com ela.
— Também não responde as mensagens — digo ao ver
Lynnox digitar algo no celular. — Eu mandei inúmeras mensagens e
a resposta que recebi dela, depois de minutos, foi um pedido de
desculpas e um pedido para seguir a vida — desabafo. — Pensei
que ela poderia estar tendo uma crise de dúvidas, sei lá. — Levanto
as mãos para o ar e depois abraço a minha nuca com os dedos.
— Você não acha que ela iria fazer qualquer besteira, acha?
— me pergunta, preocupada.
Nego com a cabeça, pois se ela estava feliz desde ontem,
como Lynnox acabara de informar, não acredito que ela seria capaz
de fazer qualquer “besteira”. Sadie também parecia, além de feliz,
aliviada na hora em que nos falamos, de manhã, portanto eu me
recuso a acreditar que ela tenha feito qualquer coisa. Por esse
motivo, todo esse seu comportamento dos últimos minutos me
parece totalmente suspeito.
— O segurança deve saber de algo — Lynnox sugere.
Com isso, eu saio apressadamente do alojamento e sigo para
o corredor, descendo as escadas até chegar no térreo. A colega de
quarto de Sadie me acompanha, mesmo estando totalmente
descabelada e com roupa de dormir, Lynnox não se intimida.
Ao avistar o segurança do prédio, que normalmente fica na
portaria, eu dou todas as informações sobre Sadie, como aparência
e o horário da sua provável saída, enquanto Lynnox diz a roupa que
ela estava usando.
— Sim, ela realmente saiu — diz o segurança. —, mas ela
não estava sozinha. Tinha um carro preto, daqueles bem bonitos e
antigos, sabe?!
Esse cara não está me ajudando em nada.
— Com quem ela estava? — indago impaciente.
Ele tira o boné e começa a coçar os cabelos ralos da cabeça
ao passo que eu, coloco as mãos na cintura, soltando uma lufada de
ar ao olhar para cima.
— Era homem, mulher, velho, nova, bonito, feio. Responde,
homem — esbraveja Lynnox, também sem paciência.
— Homem — Meu coração dispara. — Vinte e poucos anos,
ruivo e com certeza era bonito, eu acho — diz ele ao fazer uma
careta.
É de Trevor que ele está falando, claro que foi ele que
apareceu, como sempre faz.
— Qual direção eles pegaram? — decido perguntar, um
pouco mais aliviado e ainda preocupado com o rumo que eles
possam ter tomado.
— O rapaz estava com raiva, eles discutiram feio, ele a pôs
dentro do carro e saiu acelerando, como se estivesse na fórmula
um.
— Era o irmão dela? — Lynnox pergunta confusa e eu
assinto. — Será que ele a levou para a arena?
O primeiro pensamento que me veio à cabeça foi esse,
entretanto lembro da vez em que fomos até a sua casa porque
Trevor estava em crise, então eu não entendo a situação como se
ele estivesse voltando a usá-la e sim, como se estivesse precisando
de Sadie.
— Acho que não — digo ao enrugar o nariz, porque eu
realmente quero acreditar que não.
Prefiro mil vezes a opção de Trevor estar tendo qualquer tipo
de crise de pânico ou ansiedade, do que ele estar prostituindo Sadie
outra vez. Eu não quero imaginar que ela esteja se esquivando de
nós por conta de que seu irmão voltou a usá-la.
— Certeza disso? — confere Lynnox.
— Sim, Sadie não faria nada disso de novo — afirmo. — De
toda forma, eu vou voltar para a fraternidade e esperar qualquer
notícia dela.
Lynnox concorda e diz que irá subir e voltar a dormir.
Chutando uma pedra na calçada, faço o caminho de volta à
fraternidade, mas agora eu faço o trajeto em uma caminhada ao
invés da corrida, pela qual ainda estou com a respiração
entrecortada.
Ou não.
Talvez o motivo de eu estar assim esteja mais ligado ao fato
de que eu me preocupei tanto com ela, sem saber o que poderia ter
acontecido e imaginei inúmeras situações para que ela desistisse de
nós.
Quando na realidade, ela pode estar passando por uma
situação em que ela precisa de ajuda e de alguém que dê suporte a
ela. Não estou dizendo que essa pessoa tem de ser eu, só que eu
gostaria que ela soubesse que eu estaria lá por ela,
independentemente do que esteja acontecendo.
Eu: O Trevor está bem?
Decido enviar a mensagem no meio do caminho.
Eu: Desculpe me meter dessa forma na sua relação com seu
irmão.
Outra vez.
Na próxima mensagem, me explico sobre a anterior.
Eu: Eu fiquei preocupado com a forma como você me
respondeu, pois isso contradiz tudo o que havíamos conversado
mais cedo e decidi te procurar no alojamento, lá o segurança disse
que o Trevor apareceu, então presumi que ele possa ter passado
por outra crise.
Podemos conversar quando estiver tudo bem?
Qualquer coisa me liga.
Sei que estou parecendo um desesperado enquanto
encaminhei toda a explicação, e mesmo assim não parei, porque é
isso. Eu estou desesperado e angustiado.
Por mais que eu tente parecer normal em relação a essa
situação, tudo está uma confusão. Uma catástrofe para ser mais
específico, antes as coisas já estavam ruins e confusas o suficiente,
era como se tivesse feito sol por dias seguidos enquanto estivemos
juntos, durante àqueles meses, contudo bastou eu dizer que a
amava e veio a chuva, tudo se tornou uma neblina no episódio do
bar e hoje pela manhã surgiu um arco-íris. No entanto, as batidas
erráticas do meu coração e vontade intensa de vomitar tudo o que
eu comi hoje, me dão a impressão de que esse arco-íris é só uma
previsão da tempestade que vem pela frente.
Chegando na fraternidade, balanço a cabeça, a fim de
dissipar esses pensamentos que estão me fazendo me
autossabotar.
— Conseguiu gozar? — inquere Colin no momento em que
eu passo pela sala, em direção à cozinha.
— Eu realmente não quero fazer nenhuma piada sobre mãe
ou irmã, então cala a porra da boca — respondo ao passar por ele.
— Acho que a resposta então é não. — Escuto ele murmurar
quando chego na cozinha e tiro uma cerveja da geladeira.
O celular vibra no meu bolso antes de eu conseguir abrir a
cerveja, ao pegá-lo vejo que se trata de uma mensagem da Sadie e
a tristeza me assola por completo com o conteúdo descrito nela.
Sadie: O Trevor está bem, obrigada por perguntar. Só por
favor, para de me procurar.
Sou tomado pela impulsividade ao respondê-la.
Eu: Por que eu pararia de te procurar se tudo o que existe
em mim é você?
Sadie: Eu não posso passar por isso agora, Elliot.
Tchau.
Não aceito sua resposta com a maior facilidade do mundo, eu
conheço Sadie e sinto que algo grande está acontecendo agora.
Discando seu número, ligo para ela, porém a ligação não é
atendida. Tento mais uma vez e outra, e mais uma enquanto faço o
percurso da cozinha até o meu quarto.
Na sexta chamada, assim que está prestes a parar de tocar,
finalmente consigo ouvir a sua respiração do outro lado da linha. Eu
não a espero falar qualquer coisa, vou logo direto ao assunto.
— Você não pode ou você não quer? — indago.
Não obtenho nenhuma resposta dela, a não ser o total
silêncio e o som da sua respiração, que parece estar pesada, por
isso eu continuo.
— Você realmente acha que eu não mereço nada mais do
que um simples “não”, do que um simples “não posso”? Você nunca
me dá uma explicação do porquê você não pode e eu apenas acato,
só que a gente não pode seguir assim, Sadie. Eu sei que você me
ama e sei que você respeita o nosso amor e todos os momentos em
que estivemos juntos. Por isso, dessa vez, eu preciso escutar de
você uma explicação concreta ao invés de apenas palavras vazias,
eu não estou dizendo que você precisa de mim ou que vou salvar
você do que quer que esteja acontecendo, mas se você precisa, por
favor me diz, porque eu quero te ajudar.
Paro de falar por um instante ao escutar ela fungar, notando
que o peso da sua respiração e o seu silêncio se tratam de um
choro silencioso.
— Você não precisa me dizer o que aconteceu, eu sei que
aconteceu algo, sei que você não está bem, mas estou aqui por
você — tento convencê-la, porém mais um silêncio angustiante é
formado por ela. — Eu mereço uma resposta sua, Sadie — insisto.
Do outro lado da linha, Sadie permanece em silêncio, sem
me responder nada, ouço apenas as vezes em que ela arqueja. Em
algum momento parece em que ela vai falar algo, contudo eu não
recebo qualquer sinal de uma resposta sua.
— Watson... — chamo, novamente sem receber qualquer
retorno seu. — Por favor — suplico.
Já esperando o seu silêncio outra vez, me surpreendo
quando ela responde.
— Definitivamente está tudo acabado, Elliot.
Antes que eu tenha a oportunidade de responder, a ligação é
encerrada. Angustiado, tento retornar a chamada, no entanto agora,
nem chega a chamar. Volto para as mensagens, mas sou impedido
de enviar ao ver que fui bloqueado há poucos segundos.
— Que merda está acontecendo, Sadie? — penso em voz
alta ao tentar acessar o seu perfil nas redes sociais, porém vejo que
estou bloqueado em todas elas, já que não encontro a sua conta.
Segurando o aparelho com força em minha mão, arremesso-
o contra a parede assim que um grito feroz abandona a minha
garganta.
Raiva e frustração tomam conta de mim, eu penso em ir até
onde ela está, mesmo sem ter a mínima ideia de onde ela possa
estar. Eu poderia atrás dela, entretanto eu estou cansado de querer
ela ao meu lado e ela sempre me afastar mais e mais. Por isso, meu
próximo passo é fazer aquilo que eu faço de melhor, ainda mais nas
horas em que preciso abafar meus sentimentos e desejos, eu bebo.
No terceiro gole decido que isso acaba por aqui.
Eu vou continuar esperando por ela, só que não vai ser mais
eu que vou atrás dela. Eu já deixei claro que estou do lado dela, que
estou aqui por ela ou onde quer que ela queira que eu esteja, ainda
assim, isso precisa partir dela e não mais de mim. Por mais doloroso
que seja e mesmo que continue partindo meu coração saber que eu
não posso estar presente em uma situação em que eu sinto que ela
precisa de alguém para lhe dar conforto, eu aceito que, até a
segunda ordem, estamos oficialmente acabados.
Não é adorável, estar completamente sozinha?
Coração feito de vidro e a mente feita de pedra
Rasgue-me em pedaços, da pele ao osso
LOVELY | BILLIE EILISH FT. KHALID

Ele me protegeu.
O Trevor me protegeu.
Durante anos, eu jamais entendi o que havia acontecido com
ele, como o meu irmão, que sempre esteve presente por mim e para
todos ao seu redor, de repente havia se tornado um monstro e sido
consumido por ele. Nunca entendi como Trevor havia sido capaz de
golpear o nosso avô daquela forma e também era incompreensível
para mim, a forma como meu pai me disse para cuidar dele, depois
do que ele havia feito.
“— Sadie, querida — meu pai me chama. Eu estou agarrando
as minhas pernas, as lágrimas descem por meu rosto e eu não
consigo piscar, pois a cena dos respingos do sangue do meu avô
ainda está vívida na minha cabeça. — Eu preciso que você faça o
que o papai vai te pedir, por favor, filha.
Ergo a cabeça, finalmente encontrando os olhos piedosos do
meu pai, que está sentado no chão do meu quarto, de frente para
mim.
— O seu irmão precisa de você, Sadie. — Nego com a
cabeça.
— Não, pai, ele vai me matar também — digo com a voz
falhada, balançando a cabeça em negativa.
Meu pai me puxa para um abraço e beija o topo da minha
cabeça, quando ele volta a falar, eu sinto a tristeza em sua voz.
— Você é muito nova para entender as motivações do Trevor,
mas um dia você vai entender tudo com clareza. Seu irmão também
está mal e ele precisa de forças, você é a única capaz de fazer isso
por ele no momento, porque eu preciso resolver essa situação.
— E a mamãe? — pergunto ao lembrar que a mamãe não faz
a mínima ideia de que seu pai, agora está morto.
— A mamãe não precisa saber de nada por enquanto. Você
precisa cuidar do seu irmão.
— Pai — suplico assim que novas lágrimas passam a
transbordar por meus olhos.
— Ele não vai te fazer nenhum mal — meu pai garante.”
Montar todo o quebra-cabeças da minha família hoje, é bem
mais fácil do que ontem, quando eu ainda acreditava que meu irmão
era um monstro. Minha mãe nunca soube o que o homem que a
criou foi capaz de fazer e meu pai só queria protegê-lo ao se livrar
do corpo do meu avô.
Todos nós sempre estivemos às margens, prontos para
entrarmos na água e nos afogarmos. Nunca resolvemos os nossos
problemas com uma conversa, cada um se esquivou no seu canto e
viveu com seus próprios pesadelos. Minha mãe permaneceu alheia,
meu pai a acompanhou, o Trevor foi atrás da adrenalina das
corridas e eu me entreguei aos seus adversários por incontáveis
vezes.
Deixei de viver a minha triste realidade para encenar a vida
de vários personagens impressos em maços de papéis. A leitura me
livrou da dor de viver dentro da minha pele, me desviou de todas as
pedras que eram jogadas sobre o meu teto de vidro, amoleceu o
meu coração, que por muitas vezes pareceu sólido como uma
pedra.
Além dos livros, também teve o Elliot, que me ajudou a
enxergar as cores em um mundo preto e branco e ontem, no
momento em que nem o branco funcionava mais diante da minha
vista, quando apenas o preto tomava conta de mim, eu precisei
escutar a sua voz.
Eu deveria tê-lo encontrado na verdade, mas saber o que o
Trevor passou, me fez enxergar que a minha dor jamais será
metade da que ele sente. Além de abraçar meu irmão, eu também
precisei do consolo de Elliot, porém ao ver suas mensagens à minha
espera, eu precisei usar todo o meu altruísmo para não o chamar e
desabar em seu colo, porque se antes eu pensava que eu não
poderia amar ou ser merecedora do amor, agora eu acredito que
ninguém merece ter consigo, todas as minhas camadas e dores. Por
isso eu enviei uma mensagem, um pedido de desculpas e lhe disse
para seguir em frente, entretanto aquilo não o fez desistir e eu sabia
que ele não iria.
Não fui forte o suficiente para recusar a sua ligação quando,
após pedir para ele parar de me procurar, com lágrimas no rosto e
uma respiração sufocada, o atendi e me afundei ainda mais
enquanto escutava a sua voz. Eu o amo, isso é um fato e por amá-
lo, disse que tudo estava acabado.
O que, juntando tudo no final, não me fez ter a mínima
vontade de levantar.
Precisei de uma semana para sair da cama da minha casa e
me mudar para a cama do meu quarto no alojamento.
Eu assisti o dia virar noite e a noite virar dia por incontáveis
horas, às vezes eu me levantava e assistia alguma aula, em outras
me sentia obrigada a comer alguma coisa, todavia nunca estive
disposta a ter qualquer contato humano.
As palavras de Trevor voltavam a rodear a minha mente, que
me colocava no seu lugar, onde eu passava a imaginar o que teria
acontecido comigo se ele não tivesse intervindo. Na maioria das
vezes, minha mente se calou, sem qualquer pensamento, além do
vazio.
— Você não vai mesmo me falar o que está acontecendo,
Sadie? — Lynnox insistiu pelo terceiro dia seguido, após o meu
retorno ao campus, se sentando na minha cama.
Sabia que ela estava falando comigo, sabia que ela pedia
uma resposta minha e sabia também que eu não queria responder,
eu preferia me manter calada.
No sexto dia eu consegui me levantar, tomar um banho,
comer bem, ir à aula e ainda assistir ao Homem de Ferro com
Lynnox, o que a fez sorrir e eu também sorri. No entanto, assim que
aquele dia acabou e eu tive que deitar a minha cabeça no
travesseiro outra vez, tudo se apagou e eu voltei às margens da
praia onde um dia eu quase me afoguei. No dia seguinte, após a
sessão de cinema com Lynnox, eu senti que ela iria entrar no meu
quarto, portanto me cobri inteira, para que ela não pudesse ver meu
rosto, e fingir estar dormindo. Quando ela finalmente saiu, sem falar
nada, eu me permiti pensar em tudo o que aconteceu com Trevor de
novo e chorei, assim como na noite em que ele me contou tudo.
Durante o recesso de final de ano, eu tive que voltar para
casa e encarar a minha família, por mais doloroso que aquilo fosse.
— Por que vocês não chamaram a polícia? Não fizeram um
corpo de delito no Trevor? Por que não chamaram um advogado?
Depois de tudo pelo que Trevor passou nas mãos do Bruce, o que
ele fez teria sido por legítima defesa e de terceiro — confrontei meu
pai assim que cheguei em casa para o Natal.
— Do que você está falando, Sadie? — meu pai perguntou,
não precisei lhe responder para que ele entendesse o que eu estava
querendo dizer. — Ele te contou? — Assenti. — Por que ele contou?
— Acho que porque ele estava cansado de ser sempre o
culpado quando eu digo que vivo uma vida de merda graças a ele,
quando na realidade, ele só quis me proteger.
— O caso do seu irmão seria complicado, Sadie — meu pai
respondeu a minha pergunta. — Ele não tinha qualquer marca em
seu corpo que indicasse um abuso, nós estaríamos incriminando
alguém da nossa própria família e ir para a justiça em um caso tão
grave como esse, só abriria várias feridas que já estavam
cicatrizadas.
— Você quer dizer a mamãe? Ele fez algo com a mamãe
também?
— Não — meu pai negou e notei o seu pomo-de-adão descer
e subir. — Quando me casei com a Anne, eu não fazia ideia do
monstro que era o seu avô e só fui ter qualquer ideia na hora em
que o Trevor me contou tudo, na noite em que ele morreu. Se eu
soubesse que havia encostado um dedo no seu irmão, eu mesmo o
teria matado, porém eu tive que controlar meus instintos e cuidar
das necessidades do meu filho naquele momento. Eu perguntei o
que ele queria fazer e ele me disse que queria enterrar tudo o que
seu avô significava. Então foi isso que eu fiz, eu errei, sei que errei
com você, com seu irmão e com sua mãe, por deixá-la ainda ter
uma imagem boa do pai. Eu deveria ter protegido todos vocês, só
que não consegui enxergar nada do que acontecia. — A primeira
lágrima desceu pelo rosto do meu pai e ele tirou os óculos para
limpá-la. — Sei que deveria ter feito mais por vocês, mas eu fiz o
que estava em meu alcance para que as dores de vocês parassem.
Ambos eram apenas crianças e enfrentaram coisas que eu como
um adulto, até hoje não sei como suportar.
Assim que meu pai começou a chorar eu me aproximei dele e
o abracei, declarando:
— O problema é que ainda dói, em todos nós.
Durante a semana que passei em casa, eu não consegui
mais olhar para o Trevor sem pensar em tudo o que ele havia
passado, não consegui mais conversar com meu pai, pois eu sabia
que ele tinha sofrido calado por muito tempo e ainda sofria.
No ano novo, houve uma festa de virada de ano na casa da
Heaven, uma vez que seu irmão deveria nascer a qualquer
momento, contudo eu apareci por apenas alguns minutos, pois
assim que vi Elliot entrando pela porta da frente, rapidamente saí
pela porta dos fundos. Eu não estava pronta para estar no mesmo
ambiente que ele, prova disso foi quando cheguei em casa e subi
correndo para o meu quarto, notando que meus pais estranharam a
minha volta repentina.
— Sadie — meu pai chamou, no entanto eu não respondi,
apenas continuei a subir.
Ao entrar no meu quarto, não tive forças para ir até cama,
acabei desabando ali mesmo no chão, com várias perguntas
rodeando a minha cabeça e sem a resposta de inúmeras delas.
Pouco tempo depois minha mãe passou os braços em volta do meu
corpo e depois de minutos enxugando minhas lágrimas, eu disse:
— Eu sinto muito, mãe.
Assim que os fogos de ano novo começaram, minha mãe que
começou a limpar as lágrimas do meu rosto.
— Você não tem pelo que sentir, Sadie — diz ela alheia, sem
imaginar o que eu sei.
— Mãe, o vovô morreu, mãe — digo em meio ao choro e
então uma das minhas perguntas é respondida por ela.
— Eu sei — revela, me deixando confusa. — Seu pai
conversou comigo, ele me disse tudo. Para mim ainda dói saber que
o homem que me criou e me educou foi tão horrível, é difícil
acreditar em tudo o que aconteceu, mas é fácil conseguir ligar todos
os pontos, o Trevor fez o que era necessário e agora ele, assim
como você, precisa do nosso apoio. Você sempre se culpou por
esconder isso de mim e antes eu me culpava por não perceber os
sinais, hoje eu me culpo por não ter protegido nenhum de vocês,
mas eu prometo que ninguém nunca mais irá encostar um dedo em
qualquer um dos meus filhos.
Saber que estou livre de uma mentira não me deixa mais
leve, pelo contrário.
— Eu queria ser forte, mãe, só que eu odeio tudo isso. Eu o
odeio pelo que fez com o Trevor, eu odeio ter escondido essas
coisas de você por anos seguidos, eu odeio a forma como as
nossas vidas são completamente fodidas, eu odeio que meu pai
teve que encobrir tudo, eu odeio ter sido chantageada por algo que
eu nem ao menos sabia de verdade o que tinha acontecido, eu
odeio ter que ter mentido por isso quando eu nem sabia o quão
grave tudo era. Eu queria ser forte, mas eu não me sinto bem.
Durante todas as minhas palavras emboladas, minha mãe
permaneceu abraçada comigo e por mais que ela quisesse chorar,
ela me segurou com força e me deixou ficar em seu colo enquanto
me consolava pela dor que eu sentia por tudo o que nós passamos
e iríamos passar, pela dor das mentiras que eu contei para proteger
a minha família de algo tão grave, pelas vezes em que eu enganei
meus amigos e pela forma como eu magoei a pessoa que eu mais
amo à medida que me nego a estar com ele, porque ele jamais
entenderia tudo o que eu vivi, tudo o que nós vivemos.
Fronteiras não mantém as pessoas fora, elas servem para
cercar você lá dentro e eu tomei a decisão de deixar toda a
confusão que é a minha vida, dentro da minha cerca. Com as
minhas mentiras e manipulações.
“Assisto os pingos de chuva caírem através da janela da sala
e do outro lado da rua vejo Axel abandonar a sua casa sem camisa,
correndo em direção ao carro. Em seguida, quando ele dá a partida
e sai acelerando pelas ruas, a única coisa que me vem à cabeça é
que uma merda muito grande deve ter acontecido, no mínimo.
Sei disso porque tive uma briga com o Trevor durante o dia
por conta das ameaças do Drew, ele queria ter certeza de que eu
estava conseguindo controlá-lo e meu pai interviu, dizendo que iria
dar dinheiro a ele para que me deixasse em paz. Porém, todos nós
sabíamos que o Drew queria tudo, menos dinheiro.
Tudo o que ele queria era controle.
Me espanto assim que, cerca de dois minutos depois, o carro
preto do próprio estaciona em frente à minha casa e ele sai pelo
lado do motorista, nervoso. Antes mesmo que ele tenha a chance de
bater à porta, eu abro-a, dando espaço para que ele entre.
— O que aconteceu? — pergunto receosa, pois a última vez
em que vi meu irmão, ele saiu de casa dizendo que iria resolver
essa situação. E agora o Drew aparece na minha porta, encharcado,
mas não é chuva, é sangue. — O que você fez com o Trevor?
— Eu preciso de uma roupa e de um carro — anuncia sem ao
menos me responder, já subindo as escadas da minha casa.
— Para onde você pensa que está indo? — tento interferir, o
seguindo, só que Drew é mais rápido do que eu. — Onde está o
meu irmão, Drew? — insisto, nervosa.
Ele entra no corredor dos quartos, no primeiro andar, e
começa a abrir todas as portas.
— Drew! — grito, chamando a sua atenção.
— Eu não sei onde a porra do seu irmão está — finalmente
responde abrindo a quarta porta e adentrando no quarto do Trevor.
— Mas eu sei que preciso de uma roupa daquele merdinha.
No segundo seguinte, Drew tira toda a sua roupa
ensanguentada e joga pelo chão do quarto, ficando apenas de
cueca, ele segue para o banheiro.
— De quem é esse sangue, Drew? — questiono.
— Não te interessa — responde ao abrir a torneira da pia e
limpar sua pele. — Mas se você continuar sendo uma chata do
caralho, ele vai se misturar com o seu — solta a ameaça ao passar
por mim.
Permaneço estática no lugar, com vários pensamentos e
possibilidades rodeando a minha cabeça enquanto o ouço bagunçar
o closet do meu irmão em busca de peças de roupa e de repente,
tudo fica claro para mim.
A perseguição de Drew à Heaven nos últimos meses.
O Axel saindo de casa eufórico e acelerando feito um louco
pela rua.
Dois minutos depois, o Drew chegando na minha casa,
coberto de sangue e em busca de roupas limpas.
Minha mente gira, pois é difícil conseguir raciocinar tudo ao
mesmo tempo, minha visão fica turva à medida que eu tento lembrar
onde deixei meu celular, até recordar que ele está na minha mão.
Sem olhar na direção de Drew eu desbloqueio a tela e disco o
número da polícia, contudo eu deveria ter me planejado melhor, pois
logo que o primeiro toque soa no meu ouvido, o aparelho é tomado
da minha mão e o baque dele contra a parede do banheiro, me faz
saltar em surpresa.
— Se você ousar falar qualquer coisa para polícia, vamos
todos para atrás das grades — ele grunhe em meu ouvido.
Todos os pelos do meu corpo se arrepiam, entretanto não é
um arrepio bom, é medo, meu estômago se revira e o gosto da bile
invade a minha boca em um enjoo.
— Você entendeu que você não vai falar nada a ninguém? —
ele continua a falar no meu ouvido.
No segundo em que uma lágrima ardente desce pelo meu
rosto, eu assinto e quando o faço, Drew me pega pelo braço,
fazendo com que eu fique de frente para ele.
— Ótimo, agora pega a porra das suas coisas e vamos dar o
fora daqui.”
Após a minha conversa com minha mãe, durante a
madrugada, se tornou sufocante continuar em casa, por isso eu fiz
de tudo para retornar ao campus o mais rápido possível e mesmo
sendo o primeiro dia do ano eu retornei para o dormitório. O único
pensamento que me vem à cabeça enquanto eu ligo o chuveiro e,
ainda de roupa, entro debaixo dele, é que eu queria que a água que
me molha agora fosse a mesma que um dia quase me levou. Eu
entrei naquele mar pronta para abandonar o mundo, porque eu
sabia, após tudo o que eu escondi de todos, fosse o segredo da
minha família, a suposta traição que fiz à Heaven, o fato de eu não
ter denunciado ele todas as vezes em que eu tive chance e a época
em que o Drew me arrasou e me calou por dias seguidos, que o
maldito mundo seria bem melhor sem mim.
Porque eu sinto que não vale a pena viver em um mundo
onde não há justiça em nada do que eu tenha vivido até hoje, eu
não posso ter sido a causadora de todos esses conflitos, mas eu fiz
parte deles.
Eu me sinto suja, imunda, nojenta.
A água escorre pelo meu corpo sentado no chão do banheiro
há minutos, eu não sei ao certo quanto tempo faz, no entanto é o
suficiente para que eu escute as batidas e gritos desesperados de
Lynnox do lado de fora, nem mesmo isso me faz ter a coragem de
me levantar e reverter essa situação.
— Sadie, abre essa porta, fala alguma coisa, por favor —
minha colega grita em meio às batidas, eu escuto, sei que sim,
porém eu não entendo.
Se eu deitasse aqui
Se eu apenas me deitasse aqui
Você deitaria comigo e simplesmente esqueceria o mundo?
CHASING CARS | SNOW PATROL

— Elliot não está disponível no momento, deixe seu recado


após o sinal — digo ao atender a chamada de Lynnox. Meu pai
estava fazendo seu testemunho no púlpito e meu celular não parava
de vibrar, o que me rendeu um olhar incisivo da minha mãe, por isso
pedi licença e saí da igreja.
— Finalmente — ela diz desesperada. — Onde você está? —
Noto a urgência no seu tom de voz, o que me deixa em alerta.
— Aconteceu algo? — indago preocupado.
— Sim, não... eu não sei — ela grita. — Onde você está?
— Na igreja, o que houve Lynnox?
— A Sadie...
— O que tem ela? — interrompo-a assim que ouço o nome
de Sadie juntamente à sua voz hesitante.
Faz mais de um mês que eu não tenho qualquer contato com
Sadie. Desde que ela me bloqueou em todos os lugares possíveis,
eu parei de tentar entrar em contato. Eu fiz a promessa de que se
fosse para nós dois ficarmos juntos, ela que teria que vir atrás de
mim, mas tudo muda em questão de segundos quando tudo me diz
que algo está acontecendo com ela.
— Ela está estranha desde aquele dia que você apareceu
aqui e ela sumiu com o Trevor, houve dias em que ela foi para a
aula, outros que não, ela passou a maior parte dos dias trancada no
quarto, apenas deitada. — A consternação de Lynnox é evidente,
assim como a minha no momento em que meu coração começa a
disparar.
— Me fala o que aconteceu de uma vez por todas, Lynnox —
suplico.
— Durante a virada de ano eu mandei uma mensagem a
chamando para a festa de ano novo, ela não quis vir. Porém, hoje
pela manhã logo que acordei notei que as coisas dela estavam no
quarto, mas a porta do banheiro está trancada e o chuveiro ligado...
— Onde ela está? — pergunto apressado.
— No banheiro. — Agora Lynnox está chorando. — E eu não
consigo fazer com que ela abra a porta, ela não me responde... eu
estou preocupada, Elliot.
— Estou indo — digo, sem ao menos me despedir.
Dessa vez eu sei que eu não posso correr de Stone Bay até
Beaufort, se de carro a viagem dura uma hora, no mínimo, correndo
duraria cerca de quatro e eu preciso encontrá-la em quatro minutos.
Por isso, respirando fundo, abro as portas da igreja, passando pelo
corredor e pouco me importando com as vozes dos fiéis, que
provavelmente me julgam pelo alvoroço que eu acabo causando.
Ficando de frente para o meu pai, que segura o microfone
suspenso no ar, peço:
— Me dá as chaves do carro.
Meu pai me lança um olhar atônito e sem entender o meu
pedido, ele abre e fecha a boca algumas vezes.
— As chaves, pai! — peço de novo, agora com o desespero
me corroendo por dentro.
Ele larga o microfone, começa a verificar seus bolsos e sem
falar nada, me entrega as chaves do seu carro. Quando eu me viro,
pronto para sair da igreja, sou impedido pela minha mãe, que me
barra, colocando as mãos em meu peito.
— Agora não, mãe. — Tento desviar dela, todavia é em vão.
— Você não dirige há anos — ela comenta e eu sei, ela tem
razão.
Eu não pego em um volante há anos, desde que deixei meu
primo paraplégico. Sei que prometi a ele que um dia iria voltar a
dirigir, contudo fui um covarde, o carro que ele consertou para mim
continua estacionado em frente à casa onde eu vivo no campus, eu
nunca tive coragem de pegá-lo. No entanto, a situação agora é
totalmente diferente de todas outras as vezes.
— Eu sei, mãe, mas agora eu preciso ir. — Tento,
novamente, desviar dela.
— Onde você vai, Elliot? — ela pergunta assim que eu coloco
as mãos em seus ombros e conduzo seu corpo para sair da minha
frente.
— A Sadie precisa de mim, mãe — ao declarar isso, eu corro
para fora da igreja, deixando dezenas de pessoas totalmente
confusas com o meu ato e, provavelmente, meus pais preocupados.
Destravando o carro com a chave, eu entro do lado do
motorista e a giro na ignição, dando vida ao motor. Solto um longo
suspiro ao contornar a direção com meus dedos, tiro a marcha do
neutro e respirando fundo a levo até o drive, como se trata de um
carro automático, ao contrário do Camaro, não há a necessidade de
ficar passando as marchas.
Entretanto, isso não significa que eu não fique nervoso com
tal situação, um pingo de suor gelado desce por minha têmpora
quando eu finalmente manuseio a direção e saio do local onde meu
pai o deixou estacionado, meus pés indecisos ganham vida assim
que eu piso no acelerador. No começo eu sinto vontade de desistir,
porém lembro que ela precisa, nesse momento, mais de mim do que
eu preciso me prender a um medo, que não irá acrescentar em nada
na minha vida.
Entrando na estrada de cascalho, que sei que irá me
economizar tempo, acelero o carro e a cada vez que preciso
acelerar ou frear, tomo mais confiança nas minhas manobras.
Nenhum pensamento paira na minha cabeça, a não ser que
eu preciso descobrir o que aconteceu com ela, Lynnox parecia
desesperada e eu sei que nada disso seria atoa ou teatro da sua
parte. Ela poderia ter ligado para qualquer outra pessoa para ajudar
Sadie, só que ela me ligou, então isso deve significar algo.
Quando chego em frente ao prédio dos dormitórios,
abandono o carro, estacionando-o de qualquer jeito, e adentro a
propriedade. O segurança tenta me barrar, mas eu sou ligeiro o
suficiente para desviar dele e subir as escadas em uma corrida. No
instante em que chego em frente ao apartamento que Sadie divide
com Lynnox vejo que a porta está aberta e Lynnox está em frente a
porta banheiro, batendo contra a madeira.
— Há quanto tempo ela está aí? — é a primeira coisa que eu
pergunto ao me aproximar dela.
— Mais de duas horas — Lynnox responde e eu noto os seus
olhos vermelhos, ela estava realmente chorando.
Porra, duas horas trancada dentro de um banheiro com o
chuveiro derramando água? Eu tenho certeza de que não vou
encontrar nada de bom lá dentro.
— Ela falou alguma coisa? — A minha pergunta recebe um
movimento de cabeça negativo de Lynnox. — Sadie — chamo,
batendo na porta. — Abre essa porta, por favor. — Nada além da
água derramando é ouvido do outro lado da porta. — Eu vou
arrombar — declaro.
Lynnox afasta para o lado assim que eu posiciono meu ombro
contra a porta, preciso ir contra ela apenas duas vezes para
conseguir abri-la.
Eu sabia que não iria encontrar nada bonito do lado de dentro
do banheiro no momento em que o adentrasse, embora o alívio
tome conta de mim quando percebo que ela está sentada no chão e
a água molha o seu corpo. Sadie está vestida com uma camiseta
branca, que eu tenho certeza de que me pertencia, e abraça as
suas pernas, mantendo a cabeça sobre elas, é uma cena triste de
ver.
Se torna ainda mais triste no segundo em que lembro que dia
é hoje.
Há exatamente um ano Sadie tentara se afogar, por um fim à
sua vida. Se não fosse pela desconfiança de Axel de que ela iria,
supostamente, encontrar o Drew, que estava foragido naquela
época, talvez hoje ela não estaria entre nós e eu jamais teria me
apaixonado por ela da forma como me apaixonei.
Arregaçando as mangas da minha camisa caminho até o box
do banheiro, sinto a água gelada disparar contra a minha pele logo
que me agacho à sua frente, nem mesmo o aquecedor ela ligou
para esse suposto banho. Seus olhos cor de mel encontram os
meus no instante em que eu retiro suas mãos de volta das suas
pernas e é justamente nesse momento que eu enxergo o pedido de
socorro nunca deixo seus lábios, no entanto explícito em seus olhos
encharcados pelas lágrimas.
Sento-me no chão, assim como ela, contudo a trago para o
meu colo. Encostando a sua cabeça no meu peito, passo a mão nos
fios dos seus cabelos ensopados e beijo o topo da sua cabeça
inúmeras vezes enquanto ela chora em meu colo. Em algum
momento consigo desligar o chuveiro, mas não abandono o nosso
abraço em minuto algum.
Faço o mesmo gesto que fiz quando ela quis acabar tudo e
na cabine do banheiro do Jenkins, porém dessa vez eu não estou
disposto a soltá-la e eu tenho certeza disso assim que a sua voz
falhada murmura em total agonia:
— Quando isso vai parar? Quando essa dor vai embora?
Eu não sei lhe responder, porque talvez não haja resposta
para essa indagação, talvez a dor nunca vá parar, talvez ela
permaneça ali com ela para sempre. A diferença é que um dia ela
poderá aprender a conviver com ela e viver feliz independentemente
do que cause esse padecimento.
A única coisa que eu tenho certeza é que ela pode me dizer
não, pode me empurrar, me xingar, me colocar para fora, entretanto
nada disso vai ser capaz de me tirar do seu lado.
— Vem — chamo ao nos levantar. — Vamos tirar essa roupa
molhada.
Preciso praticamente carregar Sadie no colo, a levando do
banheiro até o quarto e nós dois deixamos alguns pingos de água
no pequeno caminho que fazemos. Passando por Lynnox, ela
pergunta entre lábios se está tudo bem e eu assinto, querendo dizer
que eu tomo conta dessa situação.
Ao fechar a porta, busco alguma toalha para secá-la e
quando me viro, vejo que ela está abraçando o seu próprio corpo
por causa do frio. Pedindo licença, dispo o seu corpo da camiseta,
em seguida tiro os shorts que ela usa, juntamente com sua calcinha.
O corpo de Sadie está totalmente nu, mas isso pouco importa para
mim agora, sequer me dá qualquer anseio por ele, por mais que eu
sinta falta dos nossos momentos juntos, eu sinto ainda mais dela e
sei que nesse instante ela encontra-se perdida e atordoada.
Após enxugá-la por completo, eu encontro um conjunto de
roupas íntimas em seu closet e também uma calça e moletom
quentes. Para ajudá-la a se esquentar, também me dispo, ficando
apenas de cueca e enrolo a toalha em meu quadril. A levo até a
cama e com outra toalha enxugo seus cabelos, em seguida
pegando a escova para penteá-los, finalizo-os com uma trança.
Puxo-a novamente para um abraço logo que nos deitamos na cama.
Sadie não chora mais como antes, contudo isso não a
impede de se agarrar ao meu corpo.
— Eu estou aqui, Watson, eu vou sempre estar aqui —
prometo.
Ela assente contra o meu peito enquanto eu faço cafuné na
sua cabeça.
— Vai ficar tudo bem com você. Amanhã eu vou te levar à
terapia e depois de amanhã também e depois de depois de amanhã
também, vai ser um processo longo e dolorido, porém seja lá o que
você esteja passando, você vai superar e eu vou estar com você
durante toda essa caminhada. Eu não vou te abandonar nunca
mais, Sadie. Nunca mais.
Você já se perguntou o que ele está fazendo?
Como tudo virou mentiras? (...)
Onde há uma chama alguém está sujeito a se queimar
Mas só porque queima não significa que você vai morrer
Você tem que se levantar e tentar
TRY | P!NK

— Você quem vai dirigir? — pergunto, sem entender Elliot


abrindo a porta do passageiro para mim.
Ontem, após ele me tirar do banheiro e ficar comigo durante
todo o restante do dia, ele conseguiu marcar um horário com Rayna,
ele também conseguiu fazer com que eu comesse pela primeira vez
em três dias, foi pouco, mas suficiente. Eu não queria que ele me
visse daquela forma, porém quando ele disse que não iria sair do
meu lado, eu não pude negar a sua ajuda, mesmo que mal
tenhamos conversado a não ser nos momentos em que ele me
pediu meu celular, para conseguir o contato da minha terapeuta, e
insistiu que eu deveria comer.
Ele conseguiu uma muda de roupa também, seus pais vieram
deixar e embora eu não tenha saído do quarto, eu os escutei
chegarem, ouvi a sua mãe insistindo para me ver e ele dizendo que
não era a hora certa. Durante a noite, eu fingi dormir e foi então que
eu escutei seu choro silencioso enquanto me abraçava forte.
Todo o tempo em que passei acordada, ele não ousou
demonstrar qualquer fraqueza ao meu lado, ele abandonou a sua
própria dor para se centrar apenas na minha, me dando total
atenção e por mais que eu esteja ainda completamente alheia a
tudo ao meu redor, eu não posso fechar meus olhos e fingir que eu
não o escutei ou senti a sua agonia enquanto tinha seus braços à
minha volta. Talvez tenha sido por isso que, pela manhã, eu acordei
disposta a fazer o que eu preciso fazer após a consulta.
— Digamos que eu meio que perdi meu medo de dirigir
ontem. — Ele dá de ombros ao responder quando eu entro no carro.
Não posso evitar que a minha boca se curve em um sorriso
pequeno, entretanto orgulhoso, de toda forma.
— Mas por agora eu vou ficar com o carro do meu pai —
explica, entrando no carro. — Acho que ainda não estou pronto para
controlar tantas marchas em um carro.
— Isso é bom — respondo ao observar o brilho em seus
olhos e o sorriso que se forma em seus lábios com minhas palavras.
— Muito bom — concorda.
Antes de dar partida no carro, Elliot liga o som e noto que a
playlist que ele seleciona é chamada Playlist da Kenna Rowan.
Meus olhos arregalam ao perceber que há, realmente, todas as
músicas descritas no livro e a primeira a tocar é Party In The USA,
da Miley. Depois disso, ele dá a partida no carro.
— Eu li aquele livro que você me recomendou, o mundo é
realmente injusto, Watson e as pessoas também são, só que essa
playlist é muito boa para pertencer apenas à Kenna — ele diz e
começa a cantar. — Too much pressure and I'm nervous, that's
when the taxi man turned on the radio... Canta comigo, Watson! —
ele grita.
E eu o faço, um pouco desanimada no início, no entanto logo
começo a acompanhar o ritmo de Elliot, que canta animado.
— So I put my hands up, they're playin' my song, the
butterflies fly away — canto.
— I'm noddin' my head like, yeah. Movin' my hips like, yeah.
— Nós dois nos juntamos em um coro até o final da música.
Eram desses pequenos momentos que eu sentia falta na
minha vida, esses segundos de felicidade, que antes, quando
criança eu sentia ao assistir um filme com Trevor. Depois de mais
velha, me sentia assim todas as vezes em que ele me erguia para
cima ao ganhar uma corrida e também quando Elliot entrou na
minha vida.
Não posso dizer que eu estou sempre triste, porque isso é
mentira, houve momentos em que eu fui feliz, como agora, que eu
estou genuinamente bem, feliz e leve. Mesmo que minha cabeça
esteja a milhão a todo instante, eu consigo estar alegre, porque a
depressão e a ansiedade não são apenas choro, são também os
momentos bons, eles que nos fazem questionar se realmente vale a
pena viver alheia ao mundo.
Ao longo dos anos eu entendi que a depressão é uma
metamorfose. Um dia ela é pequena, como um grão de feijão na
palma de um urso e no dia seguinte, ela é o próprio urso, são
nesses dias que eu finjo estar morta, até o urso me abandonar, me
deixar em paz.
Os dias ruins, são dias sombrios e mesmo que eu tente
acender uma vela, ela não é o suficiente para iluminar aquele dia.
Às vezes, para mim, aquela fagulha de luz é como se fosse uma luz
no fim do túnel e eu a sigo, a fim de sair do limbo onde eu me
prendo. Todavia, há outras vezes em que eu espero a luz apagar,
porque eu não tenho medo do escuro, o escuro costuma me
abraçar, ele entende a minha dor, a minha ânsia e talvez isso, seja
parte do problema.
O problema não é só não querer sair da cama, eu não
consigo, realmente. Porque a ansiedade me faz ser prisioneira
dentro da minha própria cabeça, mas de onde vem essa ansiedade?
A ansiedade é como um primo que vem de outra cidade e a
depressão se sente obrigada a levá-la à uma festa, e eu sou a festa.
Só que eu sou uma festa onde eu não quero estar, porque não é
nada fácil se divertir quando você não quer se divertir e quando eu o
faço, a diversão me traz felicidade, então eu me lembro que a
felicidade é um oceano onde eu não mereço ser batizada. Mesmo
que todos me digam que a felicidade é uma questão de escolha, ela
é algo que deve pertencer a quem tem medo de morrer e eu não
tenho medo morte, eu tenho medo da vida e de tudo o que ela traz
consigo.
E há momentos como esse, que acabo de viver, dentro de um
carro, a caminho da terapia e cantando alto Justin Timberlake, que
me fazem enxergar que vale a pena enfrentar o medo da vida.
— Vamos lá? — Elliot chama ao estacionar o carro em frente
à clínica.
— Preciso de um minuto — digo ao fechar os olhos e respirar
fundo, ele fica em total silêncio ao meu lado enquanto me preparo
para sessão, porque essa, definitivamente, será um divisor de
águas, pois a partir de hoje, eu estou disposta a viver. — Estou
pronta! — anuncio ao me desfazer do cinto e abrir a porta do carro.
Após abandonar o lado do motorista, Elliot faz a volta no
carro e segura minha mão, que está trêmula e suada, e ao perceber
a minha apreensão, ele a leva até seus lábios e deixa um beijo no
dorso.
— Ei, Watson — Elliot me chama e eu ergo a cabeça,
olhando-o.
— Sim.
— Vai ficar tudo bem, você vai ver — diz confiante.
Sorrio para ele com os lábios fechados e concordo com a
cabeça.
Juntos, nós dois entramos na clínica. Eu sei que vai ficar tudo
bem, eu já conheço a Rayna e sei como ela trabalha, porém o
problema não é esse e sim, o que eu quero dizer a ela e também lhe
pedir, algo que eu sinto que ela não irá aceitar, contudo não custa
nada tentar.
Não preciso me sentar, uma vez que Rayna se encontra na
porta do seu consultório, à minha espera. Ela sorri e me convida
para entrar.
— Senti sua falta, Sadie — cumprimenta e eu faço uma
careta. — Acho que você não tem esse mesmo sentimento quanto a
mim — brinca e eu dou de ombros.
Ela sorri para Elliot, como uma forma de saudação e eu solto
a sua mão, assim como na vez em que ele foi embora do meu
quarto, quando eu o pedi para ir. Seus olhos brilham em total
confiança, me dizendo que vai ficar tudo bem e eu sei vai, porque eu
estou disposta para que isso aconteça, só que para isso, eu tenho
que ser sincera com Rayna sobre um assunto cujo qual nunca
conversamos antes.
— Eu já tentei suicídio antes — digo, antes mesmo de sentar-
me no seu divã.
— Certo... — Rayna responde hesitante, sentando-se na sua
poltrona. — Eu ia perguntar como está se sentimento primeiro, mas
acho que finalmente você está pronta para falar sobre aquele dia.
— Sim — concordo.
— Vai em frente.
Minhas pernas ganham vida assim que eu me sento e
começo a sacudi-las, nervosismo tomando conta de mim, pois eu
nunca falei sobre isso com ninguém, especialmente comigo mesma,
então tudo é confuso demais.
— Aconteceu há exatamente um ano e um dia. Mas tudo
começou oito anos atrás, quando eu vi meu irmão matar o meu avô
da forma mais violenta possível, eu não fazia a mínima ideia da sua
motivação e por anos eu acreditei que tudo aquilo havia acontecido
porque o meu irmão era um monstro, só que na realidade o real
monstro sempre foi o meu avô.
Conto à Rayna tudo o que Trevor me disse há cerca de um
mês. Em alguns momentos eu preciso parar, pois me sinto enojada,
em outros tenho que respirar fundo e voltar a me concentrar, no
entanto em todos eles as lágrimas rolam por meu rosto e meu
coração bate forte, porque é difícil falar sobre. Rayna ouve
atentamente tudo o que eu lhe digo, sei que ela é profissional e
tenta manter uma face de gelo, contudo eu noto as caretas que ela
faz. Histórias como essa, não são fáceis de serem contadas, muito
menos de serem ouvidas.
— Então, quando o Drew lhe ameaçou, você não viu outra
opção a não ser proteger o seu irmão? — Ela liga os pontos das
nossas outras conversas.
— Sim e mesmo que eu não soubesse, na época, tudo o que
o Trevor passou, eu sabia que tinha que protegê-lo, o problema é
que essa proteção teve várias consequências. Ao mesmo tempo
que eu sabia que eu deveria acatar a tudo o que Drew me pedia, eu
tinha medo do que ele poderia fazer às outras pessoas e meu medo
se tornou realidade no dia em que fez a Heaven ir parar no hospital.
— Eu paro, respirando fundo e limpando minhas lágrimas antes de
continuar. — Na noite em que ele apareceu coberto de sangue na
minha casa, eu liguei os pontos porque eu vi o Axel correr e sair de
casa desesperado, minutos antes da sua chegada. Eu tentei ligar
para a polícia, mas ele não deixou, ele me encurralou, como ele fez
durante muito tempo e por dias eu não soube a gravidade de tudo o
que havia acontecido, porque Drew me fez usar o cartão de crédito
do meu pai e escondê-lo em hotel na beira da estrada. Eu não tinha
como me comunicar com ninguém pois ele me fazia ficar presa
dentro do quarto com ele, até mesmo me fez pintar o cabelo para
que eu não fosse reconhecida e ligada a ele.
“Até que, na noite do ano novo, eu acordei de madrugada e
ele havia ido embora, tinha um bilhete do seu lado da cama onde
dizia que eu era uma inútil e que ele tinha conseguido coisa melhor.
Por um instante eu pensei que tinha sido uma pegadinha dele, que
ele poderia estar do lado de fora do quarto, me esperando, mas não
era, ele havia ido embora e levado meu carro com ele. A próxima
coisa que eu fiz foi comprar um celular pré-pago e ligar para o meu
irmão, que me disse que tudo estava fodido demais e que a polícia
estava atrás dele porque a Heaven estava hospitalizada. Eu não
acreditei no que o Trevor havia me dito, então eu peguei um táxi e
fui direto para o hospital, foi quando confirmei que eu havia
arruinado uma vida por conta do Drew. Ela passou dias em coma,
após uma cirurgia na cabeça, enquanto eu estava escondendo-o, eu
poderia ter ligado para a polícia, eu não fiz e no momento em que o
Axel me confrontou, a única coisa que eu pensava era que o maldito
do Drew estava por perto, escutando tudo e eu mentia, mentia e
mentia. Eu não conseguia parar de mentir, Rayna, eu não
conseguia..."
Eu paro de falar, porque o choro toma conta de mim tão
fortemente, que eu sinto a necessidade de gritar. Sei que Rayna
saiu de sua poltrona assim que sinto suas mãos afagarem minhas
costas e tão logo eu consigo me acalmar, ela me oferece um copo
de água, de início é difícil tomá-lo, uma vez que minha garganta
está fechada.
— Nós podemos continuar em uma outra sessão, Sadie —
Rayna informa e eu nego com a cabeça.
— Não, eu preciso falar sobre isso hoje — insisto.
Rayna continua ao meu lado dessa vez, eu solto uma lufada
de ar e limpo o meu rosto, antes de continuar:
— Eu não sabia para onde ir quando saí do hospital, eu não
podia voltar para o hotel e não queria enfrentar meus pais, após
sumir por dias, ou encarar Trevor, que estava desesperado sobre
Drew ser preso e acabar falando tudo o que sabia, então eu decidi ir
para a praia, para acalmar minha cabeça. Naquele dia o mar estava
calmo e enquanto eu olhava para ele, por incansáveis minutos,
minha cabeça estava a milhão, e eu só queria desliga-la, eu queria
que ela fosse calma assim como as águas, eu não queria aquela
turbulência que sempre tomava conta de mim, as indecisões, os “e
se”, a culpa por ter hospitalizado minha amiga, o medo por ter
escondido o que Trevor havia feito, a raiva por aceitar as ameaças
do Drew, os anos que perdi da minha vida por não confiar em
ninguém, aos tantos homens que eu me entreguei, apenas para me
sentir no controle de algo, a forma como meu irmão me usava para
vencer as corridas. E mesmo que eu soubesse que havia duas
pessoas, que iriam se martirizar até o fim das suas vidas pela minha
escolha, eu não me importava.
“Eu queria ser forte, mas eu odiava viver, eu só queria me
sentir em paz, por uma única e definitiva vez, então fui dando
passos cada vez mais largos, até o momento em que a água me
engoliu. No início foi bom, eu me senti finalmente livre, mas quando
a água foi engolindo os meus pulmões, fazendo com que cada
nervo do meu corpo se contraísse, eu me senti presa. E mesmo
com toda aquela dor, ainda assim valia a pena fazer o que eu estava
fazendo, pois havia apenas um pensamento na minha cabeça à
medida que o mar se tornava turbulento e ele me dizia que
enquanto eu estivesse viva, eu só iria machucar ainda mais as
pessoas ao meu redor. Então, enquanto eu parava de respirar, eu
escolhia salvar outras pessoas a me salvar. Contudo, houve uma
pessoa que não pensou duas vezes em me salvar e foi por isso que,
mesmo ainda mentindo para ele, eu decidi que eu deveria lhe dizer
a verdade que tanto o assombrava.”
Fechando os olhos com força, ergo minha cabeça, pois sinto
que o nó que estava preso dentro de mim, finalmente foi solto. Eu
respiro fundo, tentando controlar as minhas emoções e conto de um
a dez, três vezes. O consultório está em silêncio, pois Rayna espera
eu me acalmar e assim que o faço, ela põe uma mão no meu joelho
e me lança um olhar solidário.
— Você é forte, Sadie. Diante de tudo o que você passou,
você é forte e eu entendo isso, mas a gente precisa que você
também entenda e compreenda que o mundo é sim melhor com
você nele, que você vale a pena. Você alega, durante todo esse
tempo, que magoou outras pessoas, contudo enquanto você pensa
assim, na realidade só existe uma pessoa que você maltrata cada
vez mais, e essa pessoa é você. Você tem medo de viver, mas deixa
eu te contar uma coisa, eu também tenho, porque viver é a coisa
mais complicada que nós podemos fazer, eu sei disso, você sabe
disso. Viver dói e é justamente essa dor que nos faz perceber que
estamos vivos, no dia em que ela passar, não seremos nada além
de pó e lembranças, para algumas pessoas. Mas também, viver não
é somente doloroso, viver é igualmente bom. Eu estou aqui para
entender o lado ruim da sua vida e lhe ajudar a manobrá-lo, para
que você possa se centrar no lado bom dela, porque a vida também
é boa, Sadie. A vida é maravilhosa e um dia você vai enxergar, que
mesmo com as dores, ela vale a pena.
Concordo com a cabeça e nos instantes seguintes, Rayna me
pergunta se com o aniversário do acontecimento eu tive alguma
recaída. Eu conto a ela sobre como me senti nas últimas semanas,
minhas oscilações de humor e o episódio do banheiro, ao final ela
pede para que eu continue a ser assídua nos nossos encontros,
contudo, antes de me despedir, eu tenho um pedido a fazer.
— As nossas sessões são gravadas, certo? — pergunto, eu
já sabia dessa questão desde que comecei as sessões.
— Sim, desde que você autorizou. Eu comecei a gravá-las
para lhe passar um diagnóstico, caso necessário, mas elas não são
mostradas a ninguém...
— Eu posso tê-las? — interrompo-a.
— Uma cópia, você quer dizer? — inquere ao arquear a
sobrancelha.
— Pode ser.
— As gravações são como um prontuário, então sim, você
pode ter uma cópia delas. Mas para o que você precisaria delas em
si?
— Eu quero parar de mentir e para isso, eu preciso que
entendam tudo o que eu passei para chegar até onde cheguei.
Rayna sorri para mim, concordando e pede um minuto, com
isso ela vai até sua mesa e poucos minutos depois retorna com um
pen drive, que me entrega.
— Todos os nossos encontros estão aqui, só que como sua
terapeuta, eu não lhe aconselho entregar esse material a qualquer
pessoa.
— Eles não são qualquer pessoa — digo ao me levantar. —
Obrigada por isso, Rayna.
— Te vejo na semana que vem? — ela pergunta ao me levar
até a porta.
— Espero que sim.
— Eu também.
No instante em que saio do consultório, Elliot, que estava na
sala de espera com a cabeça baixa entre as pernas, se levanta
apressadamente e me abraça.
— Como foi? — indaga.
— Tudo bem — respondo ao retribuir o abraço.
Assim que nos afastamos, ele segura minha mão novamente
e eu aceito, então nós dois saímos da clínica.
Fazendo o caminho de volta para o campus, Elliot retoma a
playlist de quando viemos, porém dessa vez, o som está baixo e
não há qualquer conversa entre a gente durante o percurso. E
mesmo assim, o silêncio é reconfortante. Eu falei demais nas
últimas horas e acho que ele entende isso, já que não puxa
qualquer assunto, portanto eu permaneço quieta, apenas
observando-o enquanto dirige.
Jamais imaginaria vê-lo assim, não depois de saber e
entender sobre o seu medo e é por essa razão que eu quero ser
justa com ele, eu quero que ele saiba tudo o que aconteceu comigo.
Eu queria dizer tudo olhando em seus olhos, no entanto eu sei que
eu não terei coragem o suficiente para isso e também não quero
que ele se sinta pressionado à medida que eu lhe conto tudo, então
eu prefiro que ele me ouça, me entenda e tenha um tempo para
pensar.
Logo que ele estaciona o carro em frente ao prédio do
dormitório, eu falo antes que ele possa abrir a porta do carro.
— Não quero que você suba — digo.
Elliot me olha atônito, sem entender, só que mesmo assim ele
revida.
— Uma pena que essa decisão não é mais você quem toma.
— Estou falando sério, Elliot — insisto. No momento em que
ele me olha, eu faço questão de manter o nosso contato visual ativo.
— Eu penso muito sobre as coisas, me preocupo demais, eu tenho
medo demais e eu penso no pior, sempre. Eu sempre espero que o
pior aconteça e não é porque eu não me importo, é justamente ao
contrário. Eu me importo demais, mas eu não confio nos meus
pensamentos, eu sou confusa e já experimentei do pior de mim,
então parte de mim espera que você possa trazer o melhor, contudo
eu também quero trazer o melhor para você. Mas eu ainda tenho
medo de que o pior possa acontecer.
— Watson... — ele tenta falar, entretanto eu impeço.
— Eu te amo, Elliot. Eu não sei quando ou como eu comecei
a te amar, mas algo me diz que eu sempre te amei. — Seus olhos
brilham e um sorriso se abre em seus lábios ao ouvir minhas
palavras. — E sei que você me ama também, porém eu preciso que
você me ame além do que você conhece, eu preciso que você me
ame apesar de todas as minhas camadas, sejam elas tristes ou
felizes. Eu preciso que você me ame além da mentira, porque eu te
amo dessa forma.
Pego o pen drive que Rayna me deu e entrego a Elliot assim
que junto as nossas mãos.
— Aqui estão todas as minhas sessões de terapia, nelas
você vai encontrar o pior de mim, mas também o melhor mim, eu
quero que as escute, as entenda e só então decida se vale a pena
estar comigo. Leve o tempo que for necessário para ouvir e digerir
tudo, eu vou estar à sua espera, você me esperou, agora é a minha
vez.
Ele observa o pen drive em sua mão, eu acaricio o seu rosto
e antes de sair do carro, dou um beijo em sua bochecha no segundo
em que a primeira lágrima desce por meu rosto. Ao abrir a porta
para sair, escuto ele dizer:
— Eu vou voltar por você, Watson.
— Eu espero que sim, Sherlock. — Sorrio em resposta e
finalmente o deixo, com toda a minha história em suas mãos.
Mais que palavras
É tudo que eu sempre precisei que você demonstrasse
Então você não teria que dizer
Que você me ama
Porque eu já saberia
MORE THAN WORDS | EXTREME

O primeiro enjoo veio na primeira frase que ela fala “eu já


tentei suicídio”, naquele instante eu pensei que aquelas duras
palavras seriam o que mais iria doer em mim, eu estava enganado.
Já na primeira gravação eu conheci a real face do seu
relacionamento com Drew, durante muito tempo eu me questionei
sobre como as coisas aconteceram entre eles e saber que tudo foi
uma mentira, não sei se me deixou com raiva ou apenas confuso.
Contudo, confesso que o egoísmo tomou conta de mim ao saber
que não houve nenhum sentimento bom de Sadie em relação a ele,
porém não muda o fato de que ele a amedrontou e a ameaçou por
meses.
As peças se encaixam aos poucos, de acordo com cada
sessão que eu vou escutando. Cada mentira contada por Sadie no
ano passado vai se desdobrando e eu vou entendendo-a cada vez
mais, seus sentimentos quanto ao seu irmão, a forma como ela se
sentira usada por ele e também toda a dor que ela sente por ter
machucado outras pessoas no meio do caminho.
É inevitável não sorrir quando a ouço falar sobre nós, ela
demonstra alegria a todo momento, no entanto me deixa triste saber
que ela pensa que não merece o amor por conta do que aconteceu
entre ela e o Drew e das coisas que ele lhe dissera, o que me faz
entender também o motivo de ela ter acionado a sexta cláusula logo
que eu disse que a amava.
No momento em que Sadie me entregou o pen drive, que
contém todas as suas sessões na terapia, eu pensei que até à noite
eu iria ter ouvido tudo e estaria pronto para enfrentar tudo por ela.
Eu me enganei, pois ao dizer que tinha camadas, ela não mentiu e
processar tudo o que eu ouvi foi, de fato, um trabalho e tanto.
No entanto, nada me preparou para a última gravação, essa
que aconteceu na semana passada.
Ouvir o seu relato sobre tudo o que aconteceu com Trevor,
ouvir o seu choro desesperado, seu grito em meio à sessão e a
forma como ela contou sobre o seu afogamento, me fizeram querer
correr em sua direção e lhe abraçar imediatamente, porém eu ainda
precisava digerir tudo o que eu tinha ouvido. Eu deveria saber como
tratá-la, como olha-la nos olhos mesmo sabendo que não está nada
bem.
— O que você faria se não soubesse o que dizer a uma
pessoa, mesmo sabendo que precisa estar com ela? — pergunto ao
Grey, que está no café, sentado à minha frente.
— Estamos falando de mim e da Allie, ou de você e da
Sadie?
— De mim e da Sadie, óbvio, nada acontece entre você e
Allison, além de nada.
Grey me mostra o dedo do meio.
— Você sabe que eu não sou muito bom com palavras. —
Concordo com a cabeça e ele começa a encarar seu copo de café
enquanto reflete. — Mas, se estivéssemos falando sobre Allison e
eu, eu abriria meu coração e diria tudo o que eu sinto a ela, como: o
quão linda ela é pela manhã, vestindo um moletom tamanho M que
fica em seus joelhos e com os cabelos despenteados, eu diria
também como acho atraente a forma como ela se suja de chocolate
todas as vezes em que faz o melhor brownie do mundo, que amo a
risada dela quando ela assiste a inúmeros e incansáveis episódios
de Friends repetidas vezes..., eu diria que, apesar da sua
insegurança, ela é perfeita apenas por ser ela.
— Uau! — Solto um assobio. — Por que você nunca disse
isso mesmo a ela?
— Porque ela está com o Colin. — Grey dá de ombros. — E
você, o que diria à Sadie? — Grey pergunta, finalmente olhando
para mim.
— A Sadie definitivamente não é perfeita — digo. Antes eu
achava isso, porém na realidade, ela é totalmente ao contrário da
perfeição e é isso que a torna tão apaixonante. — Ela até tenta, só
que quando falha, falha miseravelmente e sente pena de si mesma.
Ela é confusa, mas também é gentil. Ela está destruída e o que mais
admiro nela é que ela sabe disso. Ela já tentou desistir, mas ela
ainda acredita em um final feliz, mesmo que o mundo e as pessoas
injustas lhe digam que não existe final feliz. E é isso que eu quero
mostrar a ela, que é possível ter um final feliz, mesmo que no meio
da história haja alguma eventual infelicidade.
— E você está esperando o que para dizer isso a ela? —
Grey responde retórico ao franzir o cenho.
— Como assim?
— A Sadie está, nesse instante, no refeitório, é uma
caminhada de dois minutos até lá. Você está esperando o que para
levantar a sua maldita bunda desse banco e ir até lá mostrar a ela
que existem, sim, finais felizes? As coisas, para mim, podem estar
completamente fodidas, mas não vou deixar que isso aconteça com
você — diz Grey, ficando pé. — Anda, fica de pé e vai dizer àquela
garota o quanto você a ama.
Grey e eu saímos do café, em uma caminhada, que é
praticamente uma corrida, de tão rápido que andamos. Ao entrar
pelas portas de vidro à minha frente, Grey sai como um furacão em
direção à mesa onde normalmente costumávamos nos sentar com
nossos amigos, entretanto isso havia mudado desde o dia em que
terminei com Sadie e Allison começou a namorar com Colin
oficialmente, então nós ficávamos sempre com o restante do time ou
no café, como agora.
Ao passo que eu ando atrás de Grey, ele sobe na mesa e
solta um grande assobio, fazendo com que todo o refeitório e
centenas de universitários fiquem em silêncio.
— Meu amigo tem uma coisa para falar — ele avisa e depois
me olha. — Sobe aqui e fala.
— Eu não vou subir. — Nego com a cabeça.
— Anda logo — Grey dá um ultimato e eu faço.
Ao subir na mesa, o primeiro a estreitar os olhos para mim é
Kane, Axel pergunta o que está acontecendo e Heaven sorri,
mesmo sem entender nada. Encontro os olhos de Sadie, que estão
arregalados em surpresa, uma vez que não entramos em contato
um com o outro desde que ela me deu as gravações. No entanto, eu
não parei de receber notícias suas, pois a todo momento estava em
contato com Lynnox, que está ao seu lado, mordendo o lábio
inferior.
“O que está acontecendo?”, noto os lábios de Sadie se
moverem e então eu começo a falar tudo o que me vem à mente
quando eu penso nela.
— Eu queria começar esclarecendo que eu não sou nenhum
Atlas, mas é assim que começa uma grande história de amor,
confessando que amo todas as suas imperfeições, assim como o
Graham amou as de Quinn. Estou longe de ser um Grey, porém
estou disposto a ler todos os seus livros favoritos para ter assunto
quando você se cansar de mim. Talvez eu chegue um pouco perto
de ser um Garrett Graham, pois jamais ficarei entediado com você,
nem se o nosso passatempo for assistir as paredes secarem. — Um
sorriso se abre em seus lábios e eu continuo. — Mesmo que eu te
ame, com espinhos e tudo, você poderá partir o meu coração mil
vezes se desejar, e mesmo assim eu amarei você até meu último
suspiro, pois cada batida do meu coração é sua. Porque eu estou
apaixonado por você e sei que o amor é um grito no vácuo, e que o
esquecimento é inevitável, contudo, mesmo que sua resposta seja
um não, por agora, eu estou disposto a esperar por você. E se no
futuro, por algum milagre, você achar que é capaz de se apaixonar
de novo, se apaixone por mim, pois eu poderia esperar mil anos por
você e se esse for todo o tempo que nos for permitido, a espera
valerá a pena.
Descendo da mesa, ando até onde Sadie está, nem preciso
pedir licença à Lynnox para que ela me dê espaço, e me sento ao
lado dela. Olhando no fundo dos seus olhos cor de mel, finalizo:
— Então eu te peço, volte para casa e grite comigo, volte
para casa e parta meu coração se for preciso, apenas volte para
casa. Volte para mim. Pois você sempre será a minha pessoa
favorita, Sadie — sussurro as últimas palavras.
— Você é e sempre será a minha pessoa favorita, Elliot — a
sua resposta vem seguida de um beijo.
Assim como no nosso primeiro beijo, estamos rodeados de
pessoas, entretanto eu não me importo com isso, pois tudo o que
me interessa nesse momento é que finalmente eu a tenho em meus
braços e dessa vez é para sempre. Não importa se ela vai querer
me afastar no meio do caminho, eu não vou deixá-la, eu estou
cansado de deixa-la e a partir de hoje, a sua única opção é ficar
comigo, segurar a minha mão e enfrentar todas as injustiças do
mundo ao meu lado.
— Eu sei você não está bem — digo ao desfazer o beijo. —
Mas eu não vou sair do seu lado. Eu vou ficar com você durante as
coisas boas e também nas ruins, eu vou estar com você em
qualquer momento — declaro o mesmo que lhe disse durante o
Halloween, quando estava bêbado. Eu poderia estar fora de mim
naquela noite, no entanto eu jamais esqueceria a primeira vez em
que me declarei para ela.
Encostando a sua testa na minha, os olhos de Sadie brilham
logo que ela diz:
— Eu te amo, Elliot. Eu te amo muito. Você jamais saberá a
dimensão do quanto, mas eu vou passar o resto da minha vida te
provando que a vida vale a pena e ela vale a pena porque tem você.
Não consigo evitar o sorriso que aparece em meus lábios,
pois durante dias eu me martirizei a fim de escutar essas três
palavras saírem da sua boca e no instante em que elas finalmente
são ditas, é como um sonho para mim.
— Vocês são tão bregas — a voz de Kane nos tira do transe
em que estávamos vivendo em nosso mundo.
— Fofos — Lynnox corrige.
— Eu não entendi nada do que você disse, Elliot — Heaven
confessa. — Mas que foi lindo, isso é um fato.
— Se um dia você me ensinar a me declarar assim, eu te
ensino como rasgar calcinhas — Axel declara, orgulhoso.
Todos nós caímos na risada. Noto a troca de olhares que
existe entre Grey e Allie e sorrio para o meu amigo, pois eu acredito,
de coração, que em breve as coisas darão certo para ele também,
eu tenho essa fé estranha de que todos nós somos a found family
que existe nos livros e que no final, todos seremos casais. Mesmo
que eu torça para felicidade do Colin também, eu sei que Allison e
Greyson foram feitos um para o outro.
Sei que para mim, não foi fácil chegar até aqui hoje. Ao longo
do caminho, antes de enfim conseguir um sim da Sadie, houve
insistência e as inúmeras vezes em que eu me debatia, pensando
que talvez eu estaria esperando por ela atoa ou as inúmeras
ocasiões em que eu a enxerguei de longe e quis abraçá-la,
reafirmando que estaria ali por ela quando ela precisasse.
E no final das contas, eu não precisei dizer nada para ela,
nem insistir. Porque, no momento em que eu compreendi que Sadie
precisava de mim, eu estive presente e então ela soube que eu
estaria ali por ela e com ela.
A separação e todas as angústias pelas quais passei por
semanas, serviram para aprender que ela, apesar de tantas
situações difíceis, tem o seu próprio tempo para se adaptar, e que
eu precisei amadurecer para que pudesse apoiá-la. E assim, nós
dois, juntos, somos a base do que iremos construir de hoje em
diante.

O time passou para as finais do campeonato nacional, o que


nós já esperávamos que acontecesse, por isso o técnico está nos
matando de treinar. Desde a minha declaração no refeitório, durante
o almoço, Sadie não saiu do meu lado e confesso que eu também
não queria sair do lado dela. Portanto, durante todo o treino, ela
esteve na arquibancada, assistindo.
Ao final dele, eu tomei o banho mais rápido da história,
apenas para tirar o suor e ficar cheiroso o suficiente para minha,
agora oficialmente, garota. Porque a partir hoje, nada entre nós é
mentira, então eu posso gritar para o mundo que ela é:
— Minha garota — grito, literalmente, ao sair do vestiário e
encontrá-la próxima a ele com um livro na mão.
Um sorriso aparece em seus lábios assim que ela me vê e eu
não perco tempo, coloco as mãos em seu rosto e a puxo para um
beijo. Não é um beijo urgente, mas também não é nada delicado, é
feroz. Eu senti a sua falta por muito tempo para não aproveitar todas
as oportunidades que me surgirem para beijá-la.
Uma tontura toma conta de mim no segundo em que sua
língua acaricia a minha em uma chupada sútil e em seguida, ela
mordisca meu lábio inferior. Inclino minha boca para um lado e ela
para o outro, eu tento me desfazer do nosso enlace, porém é difícil
quando meu pau ganha uma ereção e ainda por cima, a boca de
Sadie arfa meu nome enquanto nossas bocas ainda estão juntas,
fazendo com que ele estremeça dentro das minhas calças.
— Elliot... — Sua voz é suplicante.
— Me fala sobre o que você estava lendo — peço ao passar
as mãos por dentro dos seus cabelos e a língua no seu lábio
superior.
— Não me lembro — confessa ao soltar um suspiro.
— Você precisa fazer isso — peço novamente ao beijar o seu
rosto e descer meus lábios por seu pescoço, mordiscando o lóbulo
da sua orelha. — Eu preciso que você lembre, porque eu não quero
resolver os nossos problemas com sexo.
— Nossos problemas já estão resolvidos, Elliot — ela diz ao
afastar sua cabeça e olhar para mim, com um sorriso malicioso em
seus lábios inchados. — Nós estamos juntos e eu estou na terapia.
— Hum — murmuro hesitante.
— Então para de ser um pau mole e me come de uma vez
por todas — implora.
— Eu vou te mostrar o pau mole — digo ao erguê-la sobre o
meu corpo e ela solta um gritinho.
Vendo que não há ninguém por perto, eu entro na próxima
porta que encontro, contudo nos deparamos com uma salinha
escura. Mantendo Sadie no meu colo, tento encontrar algum
interruptor, mas não consigo.
— Seremos iluminados pelas frestas da porta — declaro e ela
ri quando jogamos nossas bolsas no chão.
Com a pouco iluminação, eu encontro uma mesa e a ponho
sentada nela. Não demoro para desabotoar sua calça e descê-la por
suas pernas, juntamente com a calcinha, eu não consigo ver seus
olhos agora, no entanto tenho certeza de que eles brilham em
luxúria.
Após me livrar das suas calças, levo meus dedos até seu
clitóris, acariciando-o e Sadie geme com o nosso contato. Sua
boceta está quente e úmida, por isso eu faço questão de trazer
meus dedos até o rosto e cheirá-los, me deliciando com seu aroma,
logo depois os chupo e declaro:
— Você não tem noção da saudade que eu estava do seu
cheiro.
— E nem você do tanto que senti da sua língua me
chupando.
Ela não precisa pedir duas vezes, pois rapidamente abro
suas pernas no segundo em que me ponho de joelhos no chão e as
apoio em meu ombro. A minha primeira lambida vai desde o seu cu,
passando por sua entrada, até o clitóris e assim que minha língua
encosta nele, dou uma leve chupada, que a faz se contorcer em
cima da mesa, gemendo.
Sadie lateja contra a minha língua e apimento o beijo em
suas dobras, chupando todo o comprimento do seu sexo e depois
novamente e outra vez, alternando entre lambidas e chupadas, até
senti-la inchada e pulsante. As pernas de Sadie vacilam quando dou
uma leve mordiscada em seu ponto sensível, fazendo com que ela
grite meu nome, porém estamos em uma sala onde alguém pode
entrar a qualquer momento.
— Calada, Watson, senão eu paro agora. — Ela respira
fundo, contudo, não volta a gritar logo que eu recomeço a investir
minha língua em sua boceta encharcada.
Nesse instante, preciso de poucas investidas para que seus
músculos comecem a tremer e sua respiração tornar-se oscilante à
medida que sua boceta jorra o seu gozo, que aparo com minha
língua, engolindo todo o seu gosto.
Não tenho tempo de esperar Sadie recuperar a respiração,
por isso começo a distribuir beijos em suas dobras, seguindo o
caminho até seu quadril e passando as mãos por dentro da sua
blusa, a subo, a fim de encontrar seus seios inchados e aposto que,
doloridos. Afasto o bojo do sutiã e tomo um dos seus mamilos com a
boca, mordiscando-o ao mesmo tempo que encontro uma camisinha
no bolso da minha calça e me livro dela.
Quando meu pau se liberta, a ereção encontra o seu sexo.
Com ele pulsando e cheio de sangue, visto-o com o preservativo,
pronto para colocar em Sadie, só que ela se levanta e seu próximo
pedido faz com que todos os pelos do meu corpo se ericem.
— Me come de quatro. — E assim ela se inclina sobre a
mesa.
— O que sua boceta não pede chorando, que eu não faço
sorrindo.
Dito isso, a cabeça do meu pau não demora muito para
encontrar a sua entrada, seu núcleo se aperta ao receber todo o
meu comprimento e eu aperto sua bunda, começando a estocá-la
lentamente, entretanto questão de segundos, minha mão segura
seu cabelo em punho enquanto a outra repousa no seu glúteo e
minhas bolas batem violentamente contra a sua boceta.
Eu tento não fazer barulho e ela também, afinal, eu prometi
que iria parar em caso de sons audíveis, porém sempre que os
nossos sexos se chocam, é um barulho ensurdecedor que toma
conta da sala, é por isso que, puxando seus cabelos, trago seu rosto
até o meu e passo a beijar a sua boca à medida em que a estoco.
— Sua boceta é minha — declaro em um sussurro ao separar
nossas línguas.
— Somente sua. — Ela arfa assim que meu pau entra por
inteiro nela. — Toda sua — repete e eu tiro meu pau lá de dentro,
logo a preenchendo outra vez. — E a única que tem direito de
engolir o seu pau — anuncia em meio à respiração oscilante e eu
sorrio, mordendo seu lábio inferior.
— Acredite, Watson, não há qualquer outra boceta no mundo
que eu queira meu pau dentro, além da sua.
Após minha declaração, eu volto a estocá-la rápido e
violentamente, e em cerca de segundos, estamos os dois tendo
nossos gritos abafados por nossas bocas ao passo que meu gozo é
liberado e sua boca palpita em meu pau, também se libertando.
Demoram alguns minutos para que minha visão turva, volte a
se centrar na pouca iluminação da sala e meus pulmões voltem a
receber o ar de forma devida e racional.
— Ei, Elliot — Sadie chama assim que eu saio dela.
— Sim, Watson.
— Nós acabamos de foder em cima da mesa do técnico —
informa, me entregando a placa onde eu consigo ler o nome do
Willians com dificuldade.
— Ele me expulsa do time se souber disso. — Caio na risada
e Sadie também.
Se eu estivesse morrendo de joelhos
Você seria aquele que me salvaria
E se você estivesse afogado no mar
Eu te daria meus pulmões, para que você pudesse respirar
Eu estou com você, irmão
BROTHER | KODALINE

Os Jaguars precisam de apenas um ponto para conseguirem


ganhar o jogo e se tornarem os vencedores da NCAA. O público
está tenso, assim como eu, minha mão não para de suar e minhas
pernas de balançarem, percebendo isso, meu pai, que veio junto da
minha mãe prestigiarem a final, segura a minha mão de um lado e
Margaret Tanner de outro, e quando seguro as mãos dos dois, noto
que estão tão molhadas quanto as minhas.
O juiz apita, o center passa a bola para o fullback, que
entrega a Colin, que sem opção de correr, uma vez que toda a
defesa do time adversário está em sua cola, joga a bola para o
Kane, contudo ele também nota que há dois defensores em sua
cola, então correndo para trás, ele faz uma jogada onde a bola
percorre oito jardas, chegando às mãos de Elliot, que está quase
praticamente com o pé na endzone quando pega a bola. As duas
mãos apertam as minhas e logo as soltam assim que respiramos
aliviados e começamos a gritar a vitória no momento em que o
número 19 faz o touchdown.
Todos que estão nas arquibancadas são tomados por alegria
e nos abraçamos, felizes pela vitória.
— Você viu?! — pergunta a mãe de Elliot, orgulhosa, ao meu
pai. — Meu bebê que fez a jogada vencedora.
— Ele não é mais um bebê, querida — Robert interfere e ela
pega a alça da bolsa.
— É agora que ela bate nele com a bolsa? — meu pai
pergunta em meu ouvido e eu começo a rir.
Um dia após Elliot e eu voltarmos e acabarmos transando na
sala do técnico do time, ele fez questão de que nossas duas famílias
jantassem juntas no dia seguinte e nisso, a Margaret acabou
contando que as vezes se descontrola e para não falar palavras
feias, dá algumas bolsadas nos seus “meninos”, o que fez minha
mãe se lembrar da bolsa da Hérmes em meu closet e eu disse que
jamais iria usar ela com violência.
— Louca, essa mulher é louca — minha mãe sussurra.
E sim, as duas não se deram muito bem, na realidade quase
ninguém se dá bem com minha oficialmente sogra, então eu me
considero uma pessoa sortuda por ela gostar de mim. De toda
forma, o jantar também serviu para que depois eu pudesse
conversar com meus pais, e juntos ao Trevor iremos começar uma
terapia em família, para que possamos resolver todos os nossos
problemas, que são muitos. Meu irmão também irá começar a fazer
seu próprio tratamento, uma vez que ele foi tão danificado ao ponto
de conseguir quebrar o que havia ao seu redor e eu fui uma delas.
— Sua sorte é que eu não gosto de violência feminina, Anne.
— É claro que ela iria ouvir a declaração da minha mãe.
— Senhoras, por favor! — pede Trevor ao apontar para os
jogadores, que param de comemorar em campo e correm para a
arquibancada.
Quando Elliot pula a mureta, eu abro meus braços e nós dois
nos abraçamos.
— Você conseguiu! — parabenizo. — Você ganhou.
— Eu ganhei — ele responde com um sorriso no rosto antes
de colocar seus dedos entre meus cabelos e me beijar.
Contudo, logo somos interrompidos pela reclamação da sua
mãe.
— Olha a pouca vergonha, Elliot James Tanner.
— Mãe... — Elliot grunhe ao reclamar.
— Eles fazem isso sempre pelo campus, pastora Tanner —
informa Wes, que recebe uma careta minha. — Pelo menos são só
beijos, imagina se os dois transassem. — Wes pisca para Margaret,
que se engasga.
— Wes — reclamo entredentes.
Elliot e eu estamos oficialmente juntos, nossas famílias estão
convivendo juntas, eu estou na terapia e não pretendo abandonar
nem meu namorado, nem as sessões. Porém, a mãe dele ainda não
faz a mínima ideia das nossas relações sexuais e por mais que ele
diga que quer informá-la sobre isso, essa seria a única mentira que
eu faria questão de manter na minha vida.
— Você é uma vadia, mas eu te amo, sua puta, sempre vou
te amar — Wes diz em meu ouvido ao me abraçar.
— Seu amor é mais tóxico do que Chernobyl — comento e
ele ri.
— Nem fodendo — Elliot exclama ao nosso lado antes que
Wes possa me dar alguma resposta venenosa.
Totalmente atônitos com a cara de choque de Elliot, que está
com a boca escancarada, eu também abro a minha em choque.
— Gente, o que foi? — Heaven, que também está próxima,
pergunta.
Então, Elliot, Wes e eu apontamos na direção do que nos
deixa chocados.
— Não acredito — Axel diz, também perplexo.
— Finalmente — eu digo.
— Eles arranjaram um problemão do caralho agora. —
Valerie também está chocada com a cena.
— Chupem meu pau! — Lynnox grita.
— Você não tem pau — repreende Kane.
— Como você pode ter tanta certeza? — E assim os dois
começam a discutir.
Mas eu não dou a mínima atenção, assim como a maioria ao
nosso redor, pois nada é mais chocante do que assistir, depois de
anos, Grey e Allie se beijando, na frente de todo mundo. Isso
mesmo, depois de longos sete anos de paixão escondida, de ambos
os lados, eles finalmente agiram e fizeram alguma coisa.
No que isso vai dar? Eu não faço a mínima ideia, porém
quero estar lá para assistir o desenrolar dessa história, assim como
Elliot, que bate palmas ao meu lado. Eu aproveito a oportunidade,
que está todo mundo feliz, e pergunto em seu ouvido:
— Você acha mesmo que eu devo fazer isso?
— Claro que sim — ele diz ainda com um sorriso no rosto. —
Eles também fazem parte dessa história e merecem saber tudo,
além de que você também merece parar de se culpar por algo que
você não tem culpa, Watson.
Respiro fundo, ainda receosa com a decisão, que para falar a
verdade, partiu inteiramente de mim. Elliot me apoiou quando eu lhe
disse o que queria fazer, mesmo assim, o enjoo e a ansiedade
permanecem em mim.
Eu amo a forma como ele confia em mim e acredita que eu
realmente posso ser uma boa pessoa, mesmo que eu não acredite
muito nisso. No entanto, o Elliot é aquele pingo de fé que tenho
plantado em mim, no momento é apenas uma semente, todavia sei
que um dia será um grande jardim e que eu vou conseguir isso,
tanto sozinha, como com sua ajuda. Um dia, eu vou ter confiança
suficiente em mim.
Provavelmente deve haver uma festa mais tarde na
fraternidade, contudo Axel e Heaven não irão, já que Reese está de
sobreaviso, porque o bebê pode vir ao mundo a qualquer momento,
por isso eles vieram apenas para o jogo e já vão retornar a Stone
Bay. Então, logo que todos começam a se dispersar, eu os chamo.
Ambos parecem preocupado quando veem o nervosismo em
meu rosto.
— Aconteceu alguma coisa? — Heaven é a primeira a
perguntar.
— Você está bem, Sadie? — Axel indaga, preocupado.
Logo eu assinto com a cabeça, para tranquilizá-los.
— Eu tenho uma coisa para entregar a vocês — anuncio ao
pegar o mesmo pen drive que havia dado a Elliot na semana
passada. — Desde que o ano começou, eu tenho feito terapia, como
vocês sabem — começo —, e tem sido um processo para mim, pois
um dos assuntos mais abordados nas sessões são as mentiras em
que eu me envolvi no passado.
Eu paro, engolindo em seco, ainda com receio.
— Você está indo bem — sussurra Elliot.
— E vocês, de alguma forma, fizeram parte dessa mentira.
Ao admitir isso, os dois me olham hesitantes, sem
entenderem o que estou dizendo.
— Eu levaria o mês inteiro para explicar tudo a vocês, então
aqui... — digo ao levantar o pen drive. — São todas as minhas
confissões, todas as minhas mentiras e todas as minhas sessões,
eu queria que vocês escutassem e se por acaso, ao final disso,
vocês quiserem tomar suas próprias decisões sobre o que irão fazer
com as declarações contidas aqui, eu vou entender vocês.
— Não entendi — diz Heaven, confusa.
— Você está nos entregando todas as suas sessões de
terapia? — Axel estreita os olhos ao pegar o objeto das minhas
mãos e eu assinto em resposta. — Isso não seria contra a lei?!
— Há muitas coisas contra a lei que todos nós já fizemos —
digo em uma risada triste. — Mas eu tenho direito a uma cópia e
estou entregando a vocês.
— Tem certeza disso, Sadie? — Heaven pergunta e eu
assinto novamente.
— Você não vai dizer aqui que o Drew sobreviveu, vai? —
Axel inquere, preocupado.
— Fala sério, cara, nem o Grey é idiota assim — Elliot
intervém.
— Sei lá, só conferindo. — Axel dá de ombros. — Nesse
caso devemos lhe chamar após escutarmos, é isso?
— Apenas se vocês quiserem.
— Nós vamos querer — afirma Heaven.

Heaven: imagem anexada.


Me diz se não é a coisa mais linda que você já viu nessa
vida.
É uma foto do seu irmão mais novo. Reese estava em
trabalho de parto e ele nasceu no sábado à noite, assim que
Heaven e Axel chegaram em casa. Desde então nenhum dos dois
voltou ao campus e também não tive qualquer retorno deles quanto
às gravações, o que é compreensível, uma vez que toda a família
está curtindo a chegada de Zyan.
Eu: Sim, ele é definitivamente a coisa mais linda que eu já
vida na minha vida todinha.
Concordo, ele foi o primeiro bebê que vi que não nasceu com
cara de joelho e o melhor, já nasceu sorrindo. Não duvido que
futuramente tenha o mesmo humor do pai.
Heaven: Ótimo, porque ele está louco para te conhecer.
Portanto, venha aqui em casa hoje à noite, bjos.
Meu coração até erra a batida com o seu convite quase que
inesperado, pois à minha mente só vêm duas coisas no momento:
A) Eles escutaram tudo e vão mandar eu sair da vida deles;
B) É apenas um convite para eu conhecer o Zyan.
Decido confiar apenas na segunda opção e é com ela que eu
faço uma viagem do campus até Stone Bay e estaciono o carro em
frente à casa dos pais de Heaven. Eu avisei ao Elliot que estaria
vindo, contudo, disse que precisava resolver isso sozinha,
independentemente de qual fosse a decisão deles ou o motivo do
convite.
Quase não preciso tocar a campainha, pois assim que meus
pés pisam no pórtico da casa, a porta é aberta por Anya.
— Você veio ver meu priminho? — ela pergunta.
— Sim, eu vim — digo ao entrar e dar um beijo na sua
cabeça loira.
— Ele é muito lindo e eu já estou pronta para quando ele
crescer e poder brincar de chá da tarde comigo — ela diz ao fechar
a porta.
— Anya, nós já conversamos e só quem abre a porta para
visitas, seja em casa ou na casa dos titios, são apenas os adultos —
Marlon, seu paidrasto, repreende.
— Desculpa, papai — diz a garotinha ao fazer biquinho.
— Está desculpada. — Assisto a cena fofa deles dois com
um sorriso no rosto, vendo que tudo deu certo para essa família, no
final. — A Heaven e o Axel estão lá em cima, te esperando — ele
avisa.
— Obrigada, Marlon — respondo.
Subindo as escadas e chegando ao primeiro andar, encontro
os dois encostados na soleira de um quarto, Axel está com os
braços cruzados e Heaven com o queixo encostado em seu ombro.
Ao me aproximar, noto que os dois estão admirando os pais de
Heaven colocarem Kalew para dormir.
— Eu estou tão apaixonada por ele — Heaven diz ao olhar
para mim com um sorriso.
— Imagina só quando for o nosso — Axel completa ao beijar
a sua testa.
— Ninguém aqui vai engravidar ninguém. — Magnus aponta
de dentro do quarto.
Nós três rimos da sua reação, pois ele tenta fazer cara de
mau, só que todo mundo sabe que no momento em que ele se
tornar vovô, ele só vai faltar dar o mundo à criança, assim como faz
com os dois filhos.
— Vem cá — Heaven me chama, pegando na minha mão e
juntas vamos até seu quarto, com Axel acompanhando logo atrás.
— Devo assumir que vocês ouviram as gravações?! —
pergunto retoricamente.
Eles não respondem que sim, nem que não. Entretanto, sei
que a resposta é afirmativa assim que Heaven me envolve em um
abraço, chorando e eu também acabo em lágrimas enquanto a
seguro. Um nó enorme entalado na minha garganta é solto quando
digo:
— Eu sinto muito, muito mesmo por tudo. Me desculpa,
Heaven.
— Ei — ela diz ao se desfazer do abraço e me lançar um
sorriso. — Você não tem culpa de nada. Eu, no seu lugar, faria o
mesmo, eu protegeria meu irmão de qualquer ameaça desse mundo
a ferro e fogo.
Tento sorrir, mas sou impedida assim que mais lágrimas
começam a rolar por meus olhos.
— Vem cá, ruiva — diz Axel, me tomando dos braços da sua
namorada e me abraçando. — Você não foi uma vítima apenas do
Drew, você foi uma vítima do mundo, Sadie, e eu jamais poderia
sentir raiva de você sabendo tudo o que você guardou, não foram
mentiras, foram segredos que a fizeram sobreviver. Quando você
me entregou aquele escapulário eu comecei a entender que havia
algo por trás daquilo, mas jamais imaginaria que era algo tão
doloroso, portanto, jamais peça desculpas por você ser uma vítima,
você tentou nos avisar por diversas vezes, você omitiu e se prendeu
numa mentira, mas mesmo se você tivesse nos dito ou nunca se
envolvido com o Drew, o resultado ainda seria o mesmo. Pois ele
ainda iria cometer os mesmos erros e seu final seria igual ou pior do
que foi.
Ao me desfazer do abraço de Axel, olho para ambos após
limpar as minhas lágrimas.
— Eu ainda me sinto um monstro por todas as minhas
mentiras e principalmente por sentir alívio com a morte dele.
— Ele não era uma pessoa boa, Sadie — Heaven diz. — Eu
vivi com ele dois anos e eu já sabia que ele não era uma pessoa
boa, as circunstâncias da vida que ele teve, o transformaram nisso.
— O único culpado por tudo que o Drew se tornou, está atrás
das grades — garante Axel. — E o culpado por transformar a sua
vida em um limbo está morto. A justiça as vezes tarde, mas jamais
falha.
Nego com a cabeça.
— A culpa por ter te levado ao hospital ainda vai ficar comigo
pelo resto da minha vida — digo, lembrando do dia em que a vi no
hospital e acabei na praia.
— Não vai não — garante Heaven ao pegar na minha mão e
erguer meu queixo, para que eu a olhe. — Porque você vai superar
isso e eu vou estar com você, você também é minha irmã, Sadie,
você é minha família.
— E família é amor, estaremos sempre juntos — Axel
completa.
— Então é isso? — pergunto. — Vocês me perdoam além da
verdade? — Mais lágrimas descem por meu rosto.
— É claro que sim, sua boba. — Heaven me abraça de novo.
— Sua história pode não ter tido um começo muito feliz, só que não
é isso que define quem você é, é o restante da sua história.
— Quem você escolhe ser — Axel completa. — Rei Leão —
informa de onde vem a fala e eu rio.
Pela primeira vez, desde o dia em que as ameaças de Drew
começaram, eu finalmente respiro.
Em paz!
E dessa vez eu não precisei parar no fundo do mar para
conseguir me livrar da culpa, apenas um abraço foi capaz de fazer
isso por mim.
Eu decidi dar um restart na minha história, mesmo sabendo
que tinha medo de magoar outras pessoas e eu ainda tenho, a
diferença é que agora eu sei que os meus erros não devem ser
escondidos, sei também que a mágoa é inevitável e que a verdade
pode ser excruciante, entretanto necessária.
Consigo respirar porque eu enfim me sinto livre para me
redescobrir, para amar e me deixar ser amada. É uma liberdade que
me deixa mais leve, antes o medo me fazia companhia diariamente
quando eu pensava em um dia contar a minha verdade. Eu também
consegui me perdoar por todos os danos que causei e todas as
mentiras que contei, que acabaram me ensinando que apenas a
verdade seria capaz de me libertar dos meus demônios interiores e
por conta dela, eu finalmente me sinto digna de algo tão sagrado
quanto o amor.
E a oportunidade de amar está na minha frente, sendo assim
eu vou agarrá-la com todas as minhas forças e não a deixarei ir
embora por nada.
Não há mais nada que eu queira
Eu quero você, sim, eu quero você, sim
E você é a única coisa que eu quero
É você, é sempre você
IT’S YOU | ALI GATIE

Seis anos depois

A casa está uma bagunça, minha vida está uma bagunça,


meu escritório é uma zona. Mas eu estou feliz e é isso que importa.
Desde que descobri que estava gravida há quase três anos,
logo após a nossa formatura. Foi um baque para mim, já para o
Elliot nem tanto.
“— Eu não acredito que você ainda não está pronta — Elliot
diz indignado ao entrar no meu quarto.
— Falou o cara que está vestindo um moletom da Grifinória e
um calção — reclamo.
— O que?! — Ele olha para sua roupa, antes de se acomodar
na cama ao meu lado. — Essa é a minha roupa confortável para
usar durante o verão e a mudança para a nossa casa.
Sim, nós vamos morar juntos, como isso vai funcionar? Não
faço a mínima ideia, porém estou animada para o nosso futuro
juntos.
— Um verão no qual você devia estar trabalhando no seu
lançamento. — Arqueio a sobrancelha, confrontando-o.
A nossa formatura, que ocorreu cerca de um mês atrás, foi
contemplada com a notícia de que uma editora aceitou fechar o
contrato para a publicação do primeiro livro do Elliot e o lançamento
acontece nesse fim de semana, em um evento em Los Angeles.
— Você já leu o livro? Ele se vende só, eu nem preciso fazer
clickbait do sexo no tiktok para ter leitores. — Ele dá de ombros.
— Certeza?! — pergunto desconfiada e ele assente,
convencido como sempre. — Eu achei um defeito no livro — digo ao
pegar o meu exemplar em cima da cama.
— Mentirosa — acusa ele.
— Se não acredita, veja por si só — digo, entregando-o o
meu exemplar.
Elliot estreita os olhos, desconfiado. Com um sorriso que
brota em meus lábios, eu olho para o livro.
— Abre logo — digo, ansiosa.
Ele dá de ombros e finalmente abre o livro. Eu estou sorrindo
feito uma idiota, enquanto ele parece não acreditar no que vê.
— Watson... — diz, sem olhar para mim, ainda encarando o
buraco que eu fiz no livro. — Eu vou ser pai?
— Sim. — Aceno com a cabeça quando a primeira lágrima
desce por meu rosto.
A realidade é que faz anos que eu não choro, pelo menos por
algo triste, normalmente as lágrimas vêm durante uma leitura,
entretanto nesse momento, elas não são nada além da mais pura e
genuína felicidade.
— Caralho! — Ele tira o palito com os dois risquinhos de
dentro do livro e um sorriso brota em seu rosto. — Eu vou ser pai?
— grita.
— Você vai ser pai! — confirmo.
É nesse instante que Elliot olha, não para mim e sim, para a
roupa que eu visto, é a sua camiseta do time, contudo ele a sobe e
passa a mão na minha barriga.
— Nós vamos ter um bebê! — Seus olhos brilham ao me
olhar e eu assinto outra vez. — E eu pensando que íamos ser
somente nós dois daqui para frente, mas isso é muito melhor. Agora
nós somos uma família, Watson.
— Agora nós somos uma família, Elliot. — Mais lágrimas
descem pelo rosto e ele rapidamente as apara antes de me beijar.
— Eu te amo, eu te amo tanto — declara, durante o beijo.
Se alguém um dia dissesse à Sadie de dezenove anos que
um dia ela seria tão feliz e confiante de si mesma, ela riria da
pessoa. No entanto, aqui está, a Sadie de vinte e três anos, grávida,
prestes a ir morar com um escritor de romances clichês e o grande
amor da vida dela, e ainda, rodeada de pessoas de confiança.
— Devo dizer à minha mãe agora, por ligação ou arrisco levar
uma bolsada dela? — indaga preocupado.
— Se eu pular na sua frente, com certeza ela não bateria em
uma mulher grávida.
— Prefiro não arriscar — diz ele de prontidão ao pegar o
celular e discar o número da mãe. — Ei, mãe, tudo bem? Então,
adivinha só, você vai ser vovó.
— Elliot James...
Ele não deixa Margaret finalizar o seu grito, pois
imediatamente ele desliga o celular e respira.
— Dou três minutos para ela aparecer aqui — digo.
— É por isso que vamos nos mudar nesse instante! —
declara ele ao me pegar no colo e sair do meu, agora, antigo
quarto.”
Na realidade, acabou que eu não estava apenas com um
bebê na barriga e sim, dois. Por isso, a bagunça na casa, hoje é o
segundo aniversário deles e eu tento juntar os brinquedos do chão,
porém não adianta de muita coisa quando Aelin pega um
macaquinho e joga no irmão.
— Aelin! — reclamo. — Você não pode fazer isso com o
Atlas, a mamãe já disse isso a você. — Faço cara de brava, que
logo se desfaz assim que ela faz beicinho.
Pois é, ela puxou o gene da avó paterna e quão mais rápido
eu tirar esse costume dela de jogar bichos de pelúcia nos outros,
melhor.
— Para de falar assim como a neném da vovó — diz
Margaret ao pegar Aelin no colo.
— A Sadie apenas não quer que a Aelin se torne uma
Margaret louca das bolsas dois ponto zero — defende minha mãe
ao pegar o Atlas.
— Em minha defesa, desde que os gêmeos nasceram, eu
nunca mais peguei em uma bolsa da Hérmes.
— Verdade — meu pai concorda. — Apenas bolsas de
maternidade.
Isso gera uma risada genuína em Robert e todos eles
começam a falar sobre o comportamento da minha sogra. Logo a
campainha toca e eu corro até ela para atender, no momento em
que abro dou de cara com meu irmão, sua mulher e o seu filho de
três meses, Lucas, que puxou a mim e ao Trevor com os fios
vermelhos e olhos cor de mel. Já Atlas e Aelin têm apenas minha
boca rosada enquanto os olhos são verdes escuros e os cabelos
sedosos e castanhos, iguais aos do pai.
Trevor passou mais de um ano recluso, após algumas
sessões da terapia em família, em um tipo de reabilitação para
pessoas com TEPT e quando saiu ainda continuou na terapia. Hoje,
assim como eu, ele é outra pessoa. Nossas famílias estão sempre
juntas e é muito bom saber que nossos filhos irão crescer juntos
também.
Depois que ele e sua família entram, a campainha não para
de tocar, pois logo o restante dos convidados vai chegando e todos
eles querem um tempo com os aniversariantes, o que torna tudo
ainda mais bagunçado.
— Respira fundo, Watson, porque essa bagunça é para o
resto das nossas vidas — declara Elliot ao massagear meus
ombros. — Eu li vocês em inúmeros epílogos ao longo da vida, e o
melhor com certeza é esse que estamos vivendo.
Sinceramente, eu não sei o que fiz para merecer esse
homem, porque mesmo diante do maior caos, ele sempre está do
meu lado para me tranquilizar.
Me viro para ele e damos um selinho.
— O Grey não vem? — pergunto preocupada.
— Ele está tentando resolver as coisas ainda — diz Elliot,
pesaroso.
— Complicado — digo ao sorrir de canto.
— Nós vamos cantar esses parabéns ou o quê? — pergunta
Jason, manobrando a cadeira de rodas para ficar de frente para os
gêmeos.
— Eu quero o primeiro pedaço de bolo — diz Lynnox ao
colocar Aelin no chão.
— Concordo, as madrinhas merecem o primeiro pedaço —
Heaven declara, colocando Atlas ao lado da irmã.
Com isso, Elliot e eu não precisamos de incentivo extra.
Acendendo as velas dos dois bolos, nós começamos a cantar os
parabéns, que logo se torna um coro entre todos, e os colocamos no
chão, de frente as crianças, para que elas possam apagar as velas.
No entanto, tudo se torna uma meleca no momento em que Aelin
coloca a mão no seu bolo e arremessa chantilly em Atlas.
— Aelin — reclamo, contudo seu irmão decide se vingar.
— Atlas! — Elliot repreende.
E aqui estou eu, depois de viver um relacionamento de
mentira com um celibatário, repreendendo os nossos filhos, com
nomes dos nossos personagens literários favoritos, por jogarem
bolo um no outro e transformarem a nossa sala em uma cena de
guerra de comida.
No final das contas, todas as mentiras que eu contei, me
trouxeram ao meu final feliz.
Dessa vez eu juro que não sei por onde começar ou por
quem começar a agradecer, socorro!
Então eu acho que vou começar por ela, pela Sadie, que
desde a primeira vez que ela veio na minha mente eu já tinha uma
noção de que sua história traria inúmeras feridas, e todas estariam
abertas, o problema era como eu iria fechá-las e cicatriza-las. A
minha ruivinha sagitariana eu trouxe um pouco de mim, um pouco
da síndrome de perseguição que eu sinto, e foi através dela eu
consegui me tranquilizar durante várias noites, pois logo após o
lançamento do primeiro livro eu me perguntava se eu tinha feito
certo em expor a história de Heaven e Axel para o mundo, e foi a
Sadie que me mostrou que aquilo que eu estava fazendo era certo.
Muito obrigada Watson por ressignificar a minha vida em um
momento de inúmeras incertezas, aprendi com você que a verdade
por mais que faça doer, ela nos liberta.
Elliot, como diria o Ed Sheeran “eu achei um amor para mim
(...) eu conheci um anjo em pessoa”, e essa pessoa é você meu
celibatário favorito! Ninguém nunca imaginaria na vida que você
também teria alguma cicatriz em sua jornada, mas você teve, e a
superou, você trouxe leveza para a vida da Sadie e também para a
minha, confesso, eu acho que sem você nada disso seria tão
perfeito como foi.
Me desculpa se lá na época do wattpad você não tinha
importância alguma, mas eu precisei te enxergar para ver que você
seria essencial na minha vida e nessa série, você me conquistou
desde quando sua mãe, lá na plataforma laranja estava dando um
sermão sobre casamentos e celibato (nada de indireta para você,
tá?!).
Por mais estranho que possa ser eu também quero
agradecer ao Trevor, por trazer uma história tão real e tão marcada
que acontece diante dos nossos olhos em todo o mundo, e muitas
vezes nem desconfiamos. Eu quero um dia ainda ter a oportunidade
de mostrar como você conseguiu superar tudo também.
Agora, não menos importante, eu gostaria de agradecer a
Deus, eu já o agradeço diariamente por Ele ser tão presente em
minha vida, mas eu gostaria de reforçar isso, eu o conheci desde
pequena, mas eu o encontrei diante o desespero e Ele nunca mais
me desamparou. Sou grata por todas as benções que o Senhor tem
dado na minha vida. Por me dar pais maravilhosos que me apoiam
nessa jornada maluca que é vida da escrita, por ter ressignificado
meu trauma através do maior amor do mundo. E também por me
dar a oportunidade de conhecer pessoas incríveis nesse meio.
Uma delas é a Bel, eu tive a oportunidade de conhecer um
pouco melhor essa menina incrível após o lançamento de ADQV e
durante o lançamento de MAOMO (que não posso negar que sou
cadela de todos os personagens dessa duologia, mas também da
própria autora). Muito obrigada por tudo o que você se tornou na
minha vida em tão pouco tempo, por estar comigo todos os dias,
principalmente naqueles em que eu duvido do meu próprio potencial
e você está ali para me reerguer. Nós estamos alcançando coisas
incríveis com o nosso trabalho e eu te amo demais, sou grata por
fazer parte da sua vida, pois eu não sei o que seria da minha se
você não estivesse nela.
Quero agradecer também a Maria Eduarda, que foi apenas
“mais uma parceira” de ADQV, contudo, eu me apaixonei por você e
pela amizade que estamos criando, apesar dos inúmeros
quilômetros de distância conseguimos nos fazer presentes na vida
uma da outra todos os dias, sejam bons ou ruins. Te amo dudinha.
Minha leitora sensível, Mariana, que por mais que não esteja
no meio literário e com a vida conturbada entre atendimentos e
aulas, tirou um tempinho para me ajudar novamente em todas as
questões psicológicas, você é essencial em tudo o que eu faço e
escrevo.
Quero agradecer também a Ana, por embarcar comigo em
mais um trabalho, em conseguir entender tudo o que eu queria
passar com a história da Sadie e do Elliot e por me ajudar em todos
os pontos que eu pensei que já estavam bons, foi através de você
que eles se tornaram perfeitos.
As minhas revisoras, Ste e Camille.
Com Ste é meu segundo trabalho e eu já te disse que não te
largo por nada, obrigada por puxar minha orelha e fazer eu me
atentar em algumas questões específicas e por ser uma pessoa
incrível, além de profissional.
Já a Camille, a Chernobyl em forma de gente, e também a
maior defensora da Sadie que eu conheço (e não é porque ela é
ruiva e de sagitário também), obrigada por toda a sua toxidade e
fazer um trabalho perfeito, que eu acabo de conhecer e não desejo
abandonar e por sempre estar ali quando a nossa Watson precisou
de um paninho vermelho com glitter.
Quero aproveitar também e agradecer ao restante das
minhas betas, a Carol, Isa e Kamila por toda a ajuda e dicas durante
o percurso da história, e claro, alguns surtos bem básicos.
A Pri, se prepara amiga, porque primeiro, estou chegando em
SP e segundo, Grey e Allie vem muito aí! Seu momento chegou,
você que surte.
Claro que eu tenho que agradecer a Nana, por ter me
ajudado em várias questões editoriais e também com as parcerias,
você é a melhor assessora que existe nesse meio, e não é porque é
a minha não, é porque é a verdade. Te amo Nana.
As minhas parceiras por terem topada estar nesse
lançamento e também ao meu grupo de leitoras, as vezes somos
igreja, mas na maioria delas somos cabaré, eu com certeza não
estaria aqui se não fosse por todas vocês que estão comigo e
tornam a minha vida mais leve 24/7. Amo vocês demais!
E a minha maior gratidão vai a você, leitor, por me dar a
oportunidade de continuar contando a história daqueles que vivem
na minha mente, e gritam suas vidas. Eu não imaginava que eu iria
criar um vínculo tão forte com todos vocês que leem o que eu
escrevo, sem vocês nada disso seria possível. Então muito obrigada
por estar aqui comigo, me apoiando mais uma vez e fazendo com
que eu me apaixone cada vez mais por você!
Com todo o amor existente no meu coração, Vitória <3
Ei, não esquece de deixar a sua avaliação, isso me ajuda muito.
Obrigada por se apaixonar por Sadie e Elliot tanto quanto eu.
Agora nos vemos em março, com Grey e Allie, até mais <3
[1]
A alimentação Kosher, também conhecida como Kasher, é a alimentação que segue as
regras descritas no Torá - o livro sagrado dos judeus - e que é adotada pela comunidade
judaica ainda hoje. A palavra, traduzida para o português, significa "adequado" ou "bom",
ou seja, tudo aquilo que é adequado para o consumo por judeus.

Você também pode gostar