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COPYRIGHT © 2023 BY WANESSA WILLERS

Texto revisado segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

TÍTULO: Como Não se Apaixonar pelo seu Melhor Amigo

CAPA & DIAGRAMAÇÃO:


Graziele Fontes Gomes
IMAGEM DA CAPA E ILUSTRAÇÃO:
Gabriela Gois Santos
REVISÃO:
Alice Martins

Todos os direitos reservados a autora. É proibida a reprodução de parte ou totalidade da


obra sem a autorização prévia da autora, sejam quais forem os meios empregados. Todos
os personagens desta obra são fictícios e qualquer semelhança com pessoas vivas ou
mortas terá sido mera coincidência.

Willers, Wanessa
Como não se apaixonar pelo seu melhor amigo / Wanessa Willers — 1ª ed. — São
Paulo, 2023.
Título original: Como não se apaixonar pelo seu melhor amigo
ISBN: 978-65-00-63996-4
1. Literatura Brasileira. 2. Romance. 3. Chicklit. I. Título
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA
SINOPSE
QUINZE ANOS ANTES
PRÓLOGO
ABRIL
16 de abril
17 de abril
24 de abril
MAIO
19 de maio
20 de maio
21 de maio
22 de maio
25 de maio
27 de maio
28 de maio
29 de maio
JUNHO
04 de junho
07 de junho
10 de junho
11 de junho
12 de junho
13 de junho
15 de junho
16 de junho
17 de junho
18 de junho
19 de junho
20 de junho
22 de junho
25 de junho
26 de junho
JULHO
01 de julho
09 de julho
AGOSTO
27 de agosto
29 de agosto
SETEMBRO
01 de setembro
02 de setembro
03 de setembro
04 de setembro
05 de setembro
06 de setembro
02 de setembro
06 de setembro
10 de setembro
NOVEMBRO
12 de novembro
EPÍLOGO
AGRADECIMENTOS
Para meu melhor amigo, Patrick, por ter sido perfeito nessa
função, servindo como inspiração para as cenas recatadas deste livro.

Para todos que em algum momento se apaixonaram por um


amigo, sendo correspondido ou não.
De uma amizade verdadeira e pura pode surgir algo a mais?
Gabriel e Isadora prontamente responderiam que não. E se
adicionarmos a essa equação algumas doses de tequila, uma bebida
batizada, uma aposta inesperada e muita sedução?
Gabriel sempre se orgulhou por ter tudo perfeitamente ordenado
e planejado, porém, Isadora, sua melhor amiga, desestruturou seu
mundo perfeito. Uma noite inconsequente e louca pode estragar uma
amizade?
Como Não Se Apaixonar Pelo Seu Melhor Amigo é um romance
New Adult divertido, envolvente e apaixonante!

CONTEÚDO ADULTO

Série Tequila e Amigas


O céu estava num tom azul intenso, livre de nuvens, e o sol
estalava sobre suas cabeças. Dois casais estavam deitados
em espreguiçadeiras brancas, observando as crianças
brincarem na piscina. A ruiva, Diana, que trajava um maiô listrado
preto e branco, abaixou os óculos escuros e estreitou os olhos verdes.

— Eles são tão bonitinhos juntos — comentou num sussurro,


apontando com a cabeça em direção aos pequenos.

Nessa hora, o menino de dez anos magricelo, de cabelos pretos,


gritou:

— Mãe! Mãe! A gente vai apostar corrida, olha quem chega


primeiro! — Ele subiu na beirada da piscina rapidamente e deu uma
mão para a menina de cabelo cobre molhado. Ela subiu também.
Correram até uma extremidade e posicionaram-se. — Mãe, quando a
senhora gritar.
— Já! — Laura, a loira usando um maiô azul, gritou, e as duas
crianças pularam e começaram a nadar. — Semana passada, Gabriel
Vitor chegou com um olho roxo. Eu perguntei o que aconteceu e ele
disse que um menino puxou o cabelo da Isadora no parquinho da
escola, que eu tinha que ter visto como ficou o outro menino, que
estava muito pior. Estava todo orgulhoso. Lógico que briguei com ele
e disse para nunca mais bater nos coleguinhas, mas achei tão fofinho
ele querer defender a amiguinha — confidenciou com um sorriso.

— Será que vamos virar parentes? — Miguel perguntou,


sorrindo também, e na sequência tomou um gole da sua cerveja. Ele
possuía um sorriso doce, cabelos castanhos compridos e olhos cor de
mel.

— Não se você interferir — Diana o cortou. — Não podemos


fazer nada, além de torcer em silêncio.

— Por quê? — questionou Raul, o mais alto, que tinha cabelos


negros e olhos azuis.

— Você não lembra quando era jovem? Contrariar os pais


sempre é mais prazeroso. Se demonstrarmos nossa aprovação, eles
nunca vão se interessar um pelo outro — a ruiva explicou e todos
concordaram com um movimento de cabeça. — Podem deixar
comigo. Não façam nada, vou colocar a sementinha do proibido na
mente deles. — Esboçou um sorriso malicioso. — Até os dezesseis
anos já estarão namorando.

— Você está bastante confiante! — Raul constatou. — Quer


apostar?
A ruiva alargou o sorriso e estendeu a mão, inclinando-se, e ele
deu um aperto forte.

— Quanto você vai ter que me pagar?

— Quinhentos reais, se eles namorarem até os dezesseis.

— Ei, eu também quero participar! — Laura interrompeu.

— Mãe! Eu ganhei! — Gabriel gritou, vibrando quando tocou


na borda da piscina.

— Não valeu! — Isadora ofegou, chegando logo depois. —


Você saiu na minha frente, vamos de novo! — O menino virou os
olhos e saiu da piscina, ajudando sua amiga em seguida.
Posicionaram-se.

— Já! — Laura gritou novamente. A menina ruivinha pulou e


começou a nadar, Gabriel aguardou alguns segundos e pulou
também.

— Ele deu vantagem para ela — Raul comentou, orgulhoso.

— Eu aposto que vão namorar aos dezessete — Laura disse,


satisfeita.

— Eu acho que vai ser aos dezoito e espero realmente que não
seja antes, ou vou ter que dar uma lição em Gabriel — Miguel
resmungou, azedo, e os outros riram.

— Então só me resta apostar que irão namorar antes dos


dezesseis. — Miguel fuzilou Raul quando o mesmo disse isso.

— É bom você torcer para perder essa aposta, Raul — ameaçou.


O ônibus estava lotado e o sistema de refrigeração com
defeito. Para piorar, um bebê não parava de chorar no
banco da frente, mas nada disso tirava o bom humor de
Isadora Rafelly Ribeiro. Ela estava voltando para São Paulo,
voltando para seu amado noivo. Resolveu antecipar em quatro dias o
seu retorno. Tinha passado uma semana na casa de seus pais, em São
José do Rio Preto, estava há muito tempo longe do seu amor e iria
fazer uma surpresa, por isso não avisou de sua chegada.

Olhou para a aliança de brilhantes no dedo e sorriu. Seria muito


feliz com Paulo. Casariam dali a três meses, comprariam uma casa
em algum condomínio seguro, um cachorro e teriam um bebê loiro e
com carinha de nerd igual ao pai, ou ruivo e cheio de sardas igual à
mãe.

Ficou olhando pela janela os postes e as casas passando


rapidamente, como borrões. Era quase dez horas da noite quando o
ônibus chegou na estação de São Paulo. Pediu um carro pelo
aplicativo e seguiu para o apartamento que dividia com o noivo.
Assim que chegaram em frente ao prédio, colocou a bolsa debaixo do
braço, desceu do automóvel, pegou sua mala no porta-malas e se
despediu do motorista. Abriu o portão e deparou-se com um porteiro
diferente, não era Júlio, o senhor de meia-idade e simpático do turno
da noite.

— Boa noite!

— Boa noite, sou a Isadora do 706 — apresentou-se.

— Eu sou o José, o novo porteiro. É um prazer conhecê-la. —


Gostava tanto do porteiro anterior, esperava que esse estivesse à
altura.

— Prazer, José, bom trabalho para o senhor! — Entrou no


elevador e selecionou o sétimo andar.

Isadora saiu do elevador, abriu a porta de madeira, trancou-a,


pegou a mala e encostou na parede. Varreu os olhos pela sala de
estar, seguindo pela cozinha anexa, mas estavam vazias. Seguiu
direto para o quarto, rindo, daria um susto tremendo em Paulo. Antes
que alcançasse a maçaneta, ouviu um gemido entrecortado. Na
mesma hora sentiu um frio na barriga e paralisou.
Não pode ser o que estou imaginando. Provavelmente é a
televisão.

Respirou fundo e escancarou a porta de uma vez. Ficou atônita


enquanto via seu noivo só de cueca entre as pernas de uma morena
completamente nua, que estava com os dois braços amarrados por
uma algema prateada sobre a cabeça e uma venda cobrindo os olhos.
Percebeu um chicotinho na mão direita de Paulo. Seus olhos verdes
encontraram com os olhos castanhos dele, que se arregalaram pela
surpresa.

— Que porra é essa?! — gritou, sentindo lágrimas


inconscientes deslizarem por suas bochechas.

— Não é nada disso que você está pensando... — Ele estava


muito vermelho, e o cabelo loiro e liso grudado na testa pelo suor.

— Não estou pensando, estou vendo! — vociferou.

Após o choque inicial, o sangue começou a correr por todo o


seu corpo e sentiu um calor, uma queimação tão intensa dentro de si.
Parecia que ardia cada célula sua, e a partir desse momento sua
capacidade de raciocinar esvaiu-se. A sensação era que outra pessoa
tomou conta de seus pensamentos e ações. Começou a bater nele com
a bolsa, sem parar de gritar “DESGRAÇADO”, intercalando com
“TRAIDOR”. Lágrimas de ódio escorriam por seu rosto. Sabia que
ele estava falando alguma coisa, mas se recusava a ouvir. Seu noivo
conseguiu desvencilhar-se dos golpes e levantar.

— Eu te amo! Preciso explicar o que está acontecendo, você


pode me escutar? — Só o som daquela voz lhe produzia ânsia.
— Não se atreva a dizer que me ama. Melhor, não fale mais
comigo! — Viu a morena baixar a venda com as duas mãos ainda
unidas, olhando assustada para ela. — O que eu vi aqui... — Apontou
para a cama e depois para ele, enojada. — Não precisa de explicação.

— São cinco anos juntos. Você não pode jogar tudo isso no lixo
— argumentou, desesperado.

— Eu joguei no lixo? — gritou, indignada. — Seu idiota! Você


que estragou tudo! — Quase cuspiu as palavras. — Eu nunca mais
quero te ver!

Saiu batendo a porta atrás de si. Ainda conseguiu ouvir ele


gritando que precisavam conversar.

Sobre o quê? Será que ele não entendeu que o que vi não
precisava de explicação ou conversa?

Nem sabia como chegou na rua, sua raiva era tanta que só
queria se afastar o máximo que podia. Ficou na frente do prédio,
aguardando um táxi passar. Sua mente estava a mil, tentando
processar tudo que aconteceu. Parou um táxi, entrou e desabou no
choro. Passado algum tempo, percebeu que o motorista falava com
ela.

— Para onde, senhora? — O taxista estava impaciente.

— Qualquer lugar — respondeu entre soluços. — Só quero sair


daqui. Por favor! — suplicou e sentiu o carro movimentar-se. Então
se permitiu chorar.

Como ele pôde? Será que tudo foi uma farsa? Conheceu ela
enquanto eu estava viajando? Será que é um caso antigo? Já me
traiu com outras?

A verdade era que tudo isso não importava, ela nunca


esqueceria aquela cena e jamais seria capaz de perdoá-lo. Não sabia
se algum dia voltaria a confiar nos homens, nenhum deles prestava,
com exceção de seu pai. Ah, e também sempre podia contar com
Gabriel.

Gabriel! É isso!

Iria ligar para ele. Pegou o celular dentro da bolsa e discou.


Não demorou muito e ouviu aquela voz familiar e reconfortante.

— Olá, Isa. Como foi a surpresa? — Não conseguiu responder,


começou a chorar novamente. — Ei, o que aconteceu?

— F-o-i hor-rí-vel — disse entre soluços. — Ele es-tá me...


traindo. — E desabou em choro novamente.

— Ei, ei, calma. Respira fundo, Isa. Tá me ouvindo? Você


precisa se acalmar... — Ela respirou fundo. — Isso, agora solta o ar
lentamente. — E ela fez como orientado. — Eu preciso que me fale
onde você está.

— Num táxi. — Sua voz saiu fraca, mas surpreendeu-se ao


perceber que parara de chorar.

— Ótimo, peça ao motorista para parar o carro e passe o


telefone para ele. — Ela fez o que ele disse, já se sentia um pouco
melhor.

O homem falou com Gabriel e em seguida devolveu seu celular,


dizendo:
— Ele quer falar com você, senhora. — Isadora percebeu que
sua mão tremia.

O carro começou a se movimentar novamente.

— Fala, Gaby.

— Dei o endereço do bar que eu estou, vou ficar te esperando


na frente dele.

Isadora lembrou que estava chorando há pelo menos meia hora


e devia estar com a maquiagem borrada e os olhos vermelhos.

— Não quero aparecer no bar assim — externou, desanimada.

— Não vamos ficar no bar, vou te levar para casa — explicou.

Seu amigo ficou o trajeto inteiro conversando com ela e a


reconfortando pelo telefone. Assim que o táxi parou, Gabriel abriu a
porta e ajudou-a a descer, abraçando-a forte em seguida. Ela se
sentiu como um bebê sendo embalado, segura e quentinha. Percebeu
que estava muito melhor, como se um peso enorme fosse arrancado
de seus ombros. Seu amigo pagou o motorista e seguiram até o carro
dele. Gabriel a apoiava com uma mão no seu ombro e a outra no
braço. Destravou o Porsche preto e abriu a porta para a ruiva. Assim
que ela entrou, ele rodeou o carro, sentou e colocou o cinto nela e
depois nele. Deu partida no automóvel e seguiu pela avenida
movimentada.

— Ainda não acredito nisso! — seu amigo esbravejou. — Ele


vai se arrepender muito, já deve estar arrependido. Se não estiver,
vai ficar quando eu quebrar a cara dele.
— Não me importo se ele está arrependido. Quero que se
exploda. — Gabriel pegou a mão dela e deu um aperto solidário.

— Bom que você descobriu antes do casamento, poderia ser


bem pior — ponderou.

— Ai, Gaby, será que ele não me achava o suficiente? —


perguntou, franzindo a testa.

— Não tem nada a ver com isso — discordou. — Quando tem


amor, essas coisas não acontecem... — finalizou. — Ele só é o cara
errado.

— Estou desiludida, nunca mais vou confiar em nenhum


homem.

Ele suspirou.

— Isso vai passar, você vai se recuperar e logo estará me


enchendo com suas histórias de amor melosas e sem graça. — Ela
bateu no ombro dele.

— Você adora que eu conte minhas histórias. — Ele balançou a


cabeça, concordando com exagero.

— Principalmente quando você conta com muito detalhe e


beeem lentamente. — Começou a fazer uma voz feminina e aguda.
— O vento batia no cabelo dele, a sensação da pele na minha, aí ele
tocou meus lábios, mas com uma leve pressão.

— Para! Eu não falo assim — reclamou e deu um empurrão de


leve no seu braço. — Você está sendo irônico e exagerado, nunca
mais vou te contar minhas aventuras — resmungou.
— Como se você pudesse se controlar.

Ela sorriu ao lembrar das suas eventuais paqueras da faculdade,


que apesar de raras, foram todas compartilhadas nos mínimos
detalhes com o amigo.

— Você está certo. Sou viciada em te contar tudo.

— Eu sou mesmo viciante.

A ruiva revirou os olhos.

— Convencido! — Os dois riram.

Conheceu Gabriel Vitor Rabello aos seis anos de idade. Ele era
o vizinho do lado, pouco mais que quatro meses mais velho que ela.
Os pais deles viraram grandes amigos e matricularam os dois na
mesma escola. Ele possuía a casa mais bonita da quadra, enorme,
com piscina, mesa de bilhar, sala de cinema, Playstation e uma
quadra de vôlei. Isso o fez bastante popular, todas as crianças
amavam brincar lá, e Isadora não era exceção. Sempre estudaram na
mesma sala, e quando completaram dez anos começaram a ir e voltar
juntos da escola todos os dias. Não demorou muito e tornaram-se
melhores amigos.

Ele era um garoto magricelo, implicante e engraçado. Viviam


grudados, era seu confidente e cúmplice de traquinagens. Ficou
nítido para ela quando ele se apaixonou pela primeira e única vez,
aconteceu aos quatorze anos, quando uma menina chamada Clara
fora transferida para a escola deles. Seu amigo ficava tenso e
nervoso toda vez que ela se aproximava, e ela entendia o motivo. A
aluna nova era loira e carismática, além de muito bonita.
Isadora e Clara fizeram alguns trabalhos juntas, e
eventualmente iam na casa uma da outra, a jovem era bastante
divertida. Ao longo dos anos, Clara sempre namorava os caras mais
gatos do colégio, no plural mesmo, como ela gostava de dizer.

— Eu não termino, só troco de namorado.

Os anos foram passando, mas Clara nunca se interessou por


Gabriel. Ela curtia os caras fortões, ao contrário de Isadora, que
sempre preferiu o estilo nerd e magrinho. Seu amigo era da equipe de
natação, e apesar de ter desenvolvido um corpo legal, ser alto e ter
ombros largos, não fazia o tipo de sua colega. No final do segundo e
penúltimo ano do ensino médio, ele decidiu entrar na academia, e
claramente não queria fazer isso sozinho, então acabou convencendo
Isadora a ir com ele. Não foi uma tarefa fácil, sempre detestou
exercícios físicos. A frustração bateu em cheio quando no meio do
terceiro ano, Gabriel estava sarado e fortinho, enquanto ela
continuava na mesma. Por que sempre era mais fácil para os
homens? Percebeu que seu corpo estava mais rígido, mas as pernas
ou a sua bunda não cresceram nada.

Isadora não foi a única a perceber a evolução dele, Clara ficou


louquinha por ele. Gabriel sempre teve um rosto muito bonito,
cabelos negros, os olhos azuis, e o corpo definido foi a cereja do
bolo para a loira. Logo os dois começaram a namorar e seu amigo
finalmente perdeu a virgindade. Ele não contou isso, mas estava na
cara. Não conseguia desgrudar da namorada, pareciam dois coelhos.
Ficou levemente chateada, sentia que tinha perdido um pouco do seu
amigo, eles quase não ficavam mais a sós.
Para fugir do casal meloso e não ficar entediada, Isadora passou
a frequentar a lan house da esquina. Lá conheceu Bruno, um garoto
dois anos mais velho, que morava no mesmo bairro que eles e
sempre estava jogando jogos de computador. Ela começou a
frequentar o lugar todos os dias só para encontrar com ele, e
timidamente iniciaram uma amizade baseada em conversas sobre
jogos, mas desconfiava que o rapaz sequer notara que ela era do sexo
feminino. Acabou não namorando ninguém nessa fase.

A vida de Isadora e Gabriel mudou completamente aos dezoito


anos, quando conseguiram realizar um sonho de infância. Sempre
planejaram mudar para São Paulo. Ela passou na USP, no curso de
Arquitetura e Urbanismo, e Gabriel em Engenharia Civil na mesma
universidade. Resolveram dividir apartamento e a amizade deles se
fortaleceu. Clara ficou em São José do Rio Preto e estavam
mantendo um namoro à distância, mas, na prática, quase não se viam
ou se falavam, e Gabriel focou nos estudos e na academia como
nunca.

Isadora continuou acompanhando-o, e conseguia ver seu corpo


mudando, mas nada comparado ao amigo, que cresceu bastante.
Onde eles iam, a mulherada virava o rosto, comendo-o com os olhos,
mas ele parecia imune a qualquer investida, mantinha-se fiel e
apaixonado. Fizeram amigos novos na faculdade e sempre saíam
juntos. A maioria das pessoas achava que os dois eram um casal e
isso atrapalhava as suas paqueras, afastava grande parte dos homens.
Ela não se importava, na verdade, já era acostumada com esse tipo
de equívoco, e não era como se estivesse procurando um namorado.
Dava uns amassos eventuais, mas ninguém parecia ser
suficientemente interessante para algo mais sério. Imagina seu
choque quando Bruno, seu amor platônico da juventude, assumiu
namoro com outro rapaz nas redes sociais? Isso mostrou para ela que
seu ideal de homem perfeito, na verdade, não gostava de mulheres.

No quarto semestre da faculdade, quando voltou para casa de


uma tarde no shopping com suas amigas de sala, Ana, Júlia e
Marcela, percebeu que Gabriel estava estranho, ele andava irritado
há uns dias.

— Está tudo bem? — perguntou com cautela. Ele continuou


sentado, sem olhar para ela, mudando de canal a todo momento.

— Estou ótimo — respondeu, elevando a voz na última palavra.


Ele definitivamente não estava bem, conhecia-o há muito tempo para
saber disso.

Sentou ao seu lado e aguardou. Ele precisava de um tempo, não


era muito fácil para ele se abrir em momentos de raiva, mas sabia
que logo faria isso. Era sempre a mesma coisa quando discutia com
Clara, ficava alguns minutos em silêncio, mudando de canal a cada
três segundos, até que contava tudo e pedia sua opinião.

Quando finalmente resolveu falar, ela se surpreendeu com a


pergunta.

— O que você acha do Paulo?

Pensou por um tempo. Era um rapaz bonito e bastante educado,


cursava Engenharia com Gabriel e já tinham se esbarrado algumas
vezes pela faculdade, bares e festas.

— Acho que ele parece legal.


Seu amigo suspirou.

— Ele está a fim de você, me pediu autorização para te


convidar para sair.

— Autorização? — Arregalou os olhos. — Quando foi isso?

Gabriel passou a mão nervosamente pelos cabelos.

— Há uns três dias. Ele resolveu falar comigo primeiro, queria


ter certeza que realmente não estávamos envolvidos.

— Por que demorou tanto para me contar? — Bufou, incrédula.

Ele deu de ombros.

— Está ou não interessada?

Isadora ia descartar a ideia, mas perguntou-se: por que não?


Estava sozinha a vida toda, envolvida em uma paixão totalmente
irreal e se fechando para o mundo. Será que não era a hora de
tentar algo novo? Paulo tinha uma boa aparência. Além disso, tivera
uma conversa rápida com ele em um bar quando Gabriel saiu para
atender uma chamada de Clara, e lembrava de tê-lo achado bastante
divertido. Por isso, confirmou.

— Acho que eu deveria sair com um cara para variar.

Ele a olhou irritado.

— Eu sou um cara.

— Um que seja solteiro e de quebra não o meu melhor amigo —


Isadora corrigiu.
Ele argumentou que não seria uma boa ideia. Paulo e Gabriel
eram amigos, e caso não desse certo o envolvimento com Isadora,
poderia ficar estranho entre eles. Mas a garota resolveu arriscar, e
quando Paulo a convidou para sair no sábado, ela aceitou. Seu
amigo não ficou com o melhor humor e comprou uma passagem para
visitar a namorada, deixando o apartamento livre para ela durante o
final de semana. Isadora aproveitou ao máximo e acabou perdendo a
virgindade com Paulo.

Quando seu amigo retornou no domingo à tarde, nem teve


tempo de contar a novidade, nunca viu tanto ódio e mágoa nos olhos
de Gabriel. Ele contou que pegou Clara com outro e que desfizeram
o namoro.

Desde então, Isadora não tivera mais notícias da loira, e Gabriel


se permitiu sair com muitas mulheres, praticamente todo dia uma
diferente. Ele tinha aversão em ficar com a mesma mais de uma vez.
Isadora, por sua vez, começou a namorar Paulo.

No último ano de faculdade, ela foi morar com seu namorado e


Gabriel ficou sozinho no apartamento. Paulo pediu-a em casamento
logo após a formatura, em um jantar romântico. Depois de formada,
Isadora não estava conseguindo emprego, já Gabriel conseguira ser
efetivado na empresa de construção que estagiara. Assim que o
amigo soube que abrira uma vaga para arquitetos, indicou Isadora.
Foi assim que começaram a trabalhar juntos.

Seu amigo era muito profissional e começou a se destacar


rapidamente na empresa. Mudou para um apartamento menor e mais
luxuoso, um típico apartamento de solteiro. Era um lindo imóvel e
muito bem localizado, ela ajudou-o a escolher na época. Apesar que
sua opinião não foi ouvida. Para ela, dois quartos era mais necessário
que varanda gourmet, mas ele priorizava festas e reuniões com os
amigos, e o apartamento de um quarto era bem mais espaçoso,
exatamente como queria.

Chegaram no prédio e entraram no estacionamento subterrâneo.


Gabriel abriu a porta e Isadora adentrou, seguindo pelo corredor até
a sala. Era muito bem decorado e isso ele poderia agradecer
inteiramente a ela. Cada móvel e decoração que comprou foi
escolhido pela ruiva. Retirou rapidamente o sapato, abandonando-o
num canto próximo à parede, e sentou no sofá.

— Quer água ou cerveja? — Gabriel perguntou da cozinha.

O apartamento tinha o conceito aberto, integrando sala de estar,


cozinha e sala de jantar.

— Uma água, não acho que beber agora vá ajudar.

Gabriel pegou um copo no escorredor, encheu-o com água do


bebedouro e entregou para ela.

— Acredito que não. Onde ficou a sua mala?

Na pressa de sair de perto de Paulo, deixou tudo no


apartamento. Não conseguiu responder, ao invés disso começou a
chorar. Seu amigo sentou ao seu lado e a abraçou por um tempo, até
suas lágrimas cessarem.

— No apartamento dele — conseguiu dizer num sussurro.


Gabriel suspirou.
— Hoje eu vou arrumar uma roupa para você dormir, amanhã
vou buscar suas coisas.

Ela desvencilhou-se do abraço.

— Preciso arrumar um lugar para ficar, posso ficar num hotel


até achar um lugar bacana para alugar.

— De jeito nenhum vou deixar você sozinha, pode dormir aqui.


Minha cama é enorme, podemos nos ajeitar.

— Esse sofá novo é muito confortável — disse, deitando e


colocando as pernas no colo dele. — Eu posso dormir aqui —
sugeriu, já que não queria tirar o conforto do amigo.

— Então vou dormir com você nele, já disse que essa noite não
vou te deixar sozinha. — Gabriel a conhecia tão bem, que sabia que
tudo que ela não queria hoje era ficar só.

Já tinham dormido na mesma cama outras vezes, isso não seria


um problema, ainda mais que a cama dele era King Size e certamente
seria mais confortável que dormir no sofá.

— Não vai te atrapalhar se eu dormir aqui? — perguntou,


receosa, afinal, não sabia com quem seu amigo estava no bar, e a
última coisa que queria era incomodá-lo.

— Claro que não, Fiona — respondeu, utilizando o apelido que


inventou quando ainda eram crianças. Na época, ela ficara muito
irritada, porque essa princesa era uma ogra. Quanto mais se irritava,
mais ele perturbava, então aprendeu a ignorar. Empurrou as pernas
dela. — Você precisa de um banho. — Levantou e entrou no quarto,
ela o seguiu e aguardou enquanto ele pegava uma toalha e uma blusa
no closet. Entregou tudo para ela. — Tem escova de dente nova e
sabonete no armário embaixo da pia. Pode pegar para você.

Isadora agradeceu e entrou no banheiro, fechando a porta em


seguida. Pendurou a toalha e a camiseta no suporte de inox e tirou
sua roupa. Dentro do boxe, ficou um tempo embaixo do chuveiro,
deixando a água quente escorrer por seu corpo, e se permitiu chorar.

Gabriel podia ouvir o seu choro abafado pelo barulho da água,


enquanto trocava os lençóis da cama. Naquele momento, tudo o que
mais queria era esmurrar Paulo. Como pôde magoá-la desse jeito? Se
sentia muito culpado, já que quando o babaca resolveu chamá-la para
sair, pediu sua autorização. Devia ter negado, mas como poderia
imaginar? O cara sempre fora aparentemente certinho e respeitoso
com as mulheres, além de ser muito educado e atencioso.

No início chegou a sentir ciúmes, imaginando que perderia sua


melhor amiga, mas logo percebeu que isso não seria um problema. O
fato do namorado e posterior noivo dela nunca ter implicado com a
amizade deles, inclusive não reclamando das diversas vezes que ele e
Isadora viajaram sozinhos, o fazia a escolha ideal. Agora que sabia
do jogo sujo do amigo, imaginava que sua boa vontade se devia ao
fato dele querer liberdade para transar com outras mulheres.
Não precisava ser nenhum gênio para ver que Isadora era fiel e
apaixonada, e assim ficava fácil confiar. Esperava que sua amiga não
ficasse amarga depois de tudo, ele sabia muito bem o que uma
traição podia fazer com um coração.

Ela saiu do banheiro, estava com os olhos inchados, o cabelo


ruivo solto e usando a camiseta masculina, que apesar de grande,
ficou bem indecente.

— Quer um short?

Ela sacudiu negativamente a cabeça.

— Não gosto de nada me apertando quando durmo —


respondeu.

Ele pegou uma roupa limpa no closet.

— Acho melhor dormirmos na cama. O sofá, apesar de grande,


é pequeno para dois. Já troquei os lençóis, vou tomar um banho
rápido — avisou, entrando no banheiro.

Isadora estava tão triste, que ele não conseguia nem implicar ou
brincar com ela, como habitualmente fazia.

Depois de pronto, vestiu a camiseta e o short. Tinha o costume


de dormir sem roupas, mas não podia fazer isso quando sua amiga
dormiria ali. Após escovar os dentes, saiu do banheiro. Isadora já
estava deitada na cama. Apagou a luz e deitou ao seu lado,
colocando os dois braços atrás da cabeça.

— Como você está se sentindo? — questionou num sussurro, na


escuridão não podia ver o seu rosto. Passados alguns minutos, ouviu
um choro abafado.

Algo se partia dentro dele toda vez que Isadora chorava, por
isso detestava quando alguém a magoava. A vontade que tinha era de
criar uma bolha ao seu redor, impedindo qualquer um de se
aproximar. Puxou ela para perto de si e a abraçou apertado. Sua
camisa ficou encharcada pelas lágrimas e ficaram assim um tempo.
Quando finalmente os soluços cessaram, Gabriel respirou fundo. Os
próximos dias seriam difíceis.

Assim que teve certeza que ela tinha dormido, fechou os olhos.
A cordou muito cedo, talvez pela posição ruim que
adormecera, com a barriga para cima e Isadora sobre o seu
peito; gostava de dormir de lado. Com muito cuidado
afastou sua amiga e levantou. Tomou um banho e vestiu um jeans
azul, uma camiseta e um tênis branco. Pegou as chaves do carro e as
chaves do apartamento de Isadora na sua bolsa e saiu.

O trânsito estava tranquilo e rapidamente chegou ao seu


destino. Estacionou em frente ao prédio e seguiu para o portão. O
porteiro pediu seu documento, interfonou para o apartamento e
liberou sua entrada. Seguiu até o elevador, já estivera ali várias vezes
antes e conhecia o caminho. Destrancou a fechadura e a adrenalina
começou a circular por seu corpo. Queria muito encontrar com Paulo
e dar pelo menos um soco bem dado nele. Ficaria feliz se quebrasse
um dente ou o nariz do amigo.

Ao abrir a porta rapidamente, avistou a mala rosê de Isadora


encostada na parede, mas ignorou-a, fazendo uma busca com os
olhos por seu alvo, que estava sentado na cadeira alta em frente à
bancada, com um café em uma mão e um jornal na outra. Paulo
olhou para ele com surpresa.

— Gabriel? — questionou e elevou uma sobrancelha, dando um


sorriso em seguida. — Veio sozinho? Pensei que Isadora estava com
você... Cara, eu preciso que me ajude com ela.

O descarado tem coragem de pedir a minha ajuda?

Lembrou dos olhos inchados e do som do choro de Isadora na


escuridão do quarto, e o ódio se apoderou dele. Certamente Paulo
percebeu, já que levantou imediatamente, largando o café e o jornal
na bancada.

— Gabriel, seja racional — desesperou-se, mas antes que


tivesse chance de se mover, Gabriel rapidamente o alcançou,
segurou-o pela gola da camisa com um braço e deu um golpe certeiro
no seu maxilar com o punho. O prazer o inundou quando viu sangue
escorrer pelo canto da sua boca. — Achei que fôssemos amigos —
reclamou, massageando o local com a mão assim que foi largado.

— Nós éramos, até você magoar Isadora. E não ouse se


aproximar dela novamente, senão não serei tão pacífico — cuspiu as
palavras, virando-se.
— Espera, cara. Em nome dos velhos tempos, me escuta. —
Gabriel respirou fundo. Paulo estava entre seus amigos mais
queridos, e só por isso não descarregou toda a sua ira nele. Nada que
ele dissesse mudaria sua opinião, mas em nome da amizade o
escutaria.

— Você tem dez minutos — disse e recostou-se na bancada.

Paulo sentou novamente, estava bastante tenso, provavelmente


com medo de levar outro soco.

— Primeiro, eu quero que saiba que eu amo a Isadora. —


Gabriel elevou as sobrancelhas, descrente, mas não disse nada. — Eu
estava muito ansioso com nosso casamento e tudo. O que aconteceu
não significou nada. — Respirou fundo e o encarou. — Sou viciado
em BDSM [1] , sou dominador, e a garota que Isadora viu é minha
submissa há muitos anos. Iniciamos nossa relação no meu primeiro
ano da faculdade, mas nunca envolveu sentimentos. É somente uma
prática para satisfazer uma necessidade do corpo. Eu queria muito
contar para Isadora, mas nunca tive coragem de falar sobre isso.
Como você sabe, ela é muito certinha, e também não é algo fácil de
falar.

Paulo parecia sincero, mas era difícil para Gabriel entender isso
tudo. Nunca chegou a experimentar esse tipo de brincadeira sexual,
conhecia o básico, mas sabia de uma coisa, envolvendo ou não
sentimento, tocar uma terceira pessoa era traição.

— Você planejava continuar com isso mesmo depois de casado?


— perguntou somente por curiosidade.
— Sim. Eu já te disse, isso não significa nada. — Gabriel
estava começando a ficar irritado novamente. — Preciso que você
me ajude, cara. Quero explicar tudo isso para Isadora.

— E você acha que ela vai aceitar? — questionou, descrente. ­—


Se acha, realmente não a conhece muito bem. — Bateu no braço dele
amigavelmente. — Se me permite um conselho, procure uma
submissa para casar ou entre em um relacionamento aberto. Agora,
me faça um favor e não procure Isadora, ela não precisa ouvir essa
merda toda. Isso irá magoá-la ainda mais. Isadora merece muito
mais, você sabe disso.

Não aguardou resposta, pegou a mala de sua amiga e saiu. O


resto dos objetos pegaria depois, com mais calma.

Isadora acordou com o cheiro de café, se espreguiçou e abriu os


olhos. Assim que seu cérebro registrou as cortinas azuis, a parede
branca e o forro de gesso, lembrou onde estava e o motivo de estar
ali. Sentiu um vazio corroer seu estômago, e não era fome, era uma
dor que a sufocava. Se encolheu e segurou as pernas contra o
abdômen, ficando em posição fetal, e não conseguiu segurar as
lágrimas. Não queria que Gabriel a visse chorar mais uma vez, então
se obrigou a levantar e tomar um banho. Quando terminou, vestiu a
mesma roupa da noite anterior.

Saiu do quarto e encontrou Gabriel na cozinha, arrumando as


xícaras para o café da manhã.

— Precisa de ajuda? — ela perguntou, aproximando-se do


amigo.

— Não, pode sentar. Já passei o café e comprei umas coisinhas


na padaria. — Ele abriu a sacola e colocou as embalagens em cima
da mesa.

— Bolo de Ninho com Nutella! — Isadora exclamou, com os


olhos brilhando ao ler o sabor na embalagem.

Não tinha nada que fosse melhor para ela do que bolo com café,
e Gabriel sabia disso. Quando moravam juntos, ele sempre comprava
quando estava triste ou de TPM. Ele retirou a tampa de plástico e
entregou uma faca para a amiga.

— Já disse que eu te amo, Gaby? — perguntou, alegre.

— Já disse algumas vezes. O que eu posso fazer, se eu causo


isso nas mulheres? — brincou e a ruiva se concentrou em cortar uma
fatia generosa do bolo.

Ela começou a comer com as mãos. Gabriel serviu café e


colocou na frente dela, depois se serviu também. Pegou uma fatia de
bolo, pôs no prato e apanhou uma colher.

— Você ainda não aprendeu que bolo e pizza a gente come com
a mão? — o repreendeu.
— Não gosto de ficar com as mãos sujas, eu não sou um ogro
— provocou, e Isadora virou os olhos com a sua resposta.

— A gente resolve isso facilmente. — Após engolir o último


pedaço de bolo da mão, começou a chupar toda a cobertura dos
dedos, e, por fim, mostrou as mãos, vitoriosa. — Viu? Limpinho.

— Babado, você quer dizer — zombou, rindo.

— É muito mais saboroso, devia experimentar.

Porém, ele continuou comendo com a colher. Ela sorveu um


pouco do café, estava exatamente como gostava: doce e forte. Essa
pequena interação lembrou à Isadora o quanto era fácil a convivência
com seu amigo. Provavelmente, se não tivesse namorado Paulo,
estariam morando juntos até hoje, mas muita coisa mudou em dois
anos. Apesar de Gabriel não comentar sobre nenhuma namorada,
temia estar atrapalhando sua rotina.

— Eu trouxe sua mala — ele disse de repente, apontando para o


canto da sala. Ela olhou e viu sua bagagem encostada na parede.

— Você foi lá essa manhã? — Seu amigo assentiu. — Viu ele?


— questionou num sussurro.

— Vi, mas não fiquei muito tempo — suspirou. Ele estava


ocultando alguma coisa, mas preferiu não questionar, sabia que
certamente a magoaria ainda mais.

O resto do domingo transcorreu tranquilamente, iniciaram The


Good Place, uma série engraçada da Netflix, que nenhum dos dois
tinha assistido ainda, e comeram pipoca. Quando terminou o quarto
episódio, ela resolveu ligar o celular. Tinha várias mensagens e
chamadas perdidas de seu ex-noivo.

— Paulo ligou e mandou mensagem. O que eu faço? —


perguntou para seu amigo, sentindo um frio na barriga.

— Você quer voltar para ele?

— É claro que não — respondeu com o máximo de segurança


que conseguiu. A verdade era que ela sabia que nunca mais devia
olhar na cara dele, mas não era tão fácil assim.

— Tem certeza, Fiona? — indagou, franzindo a testa. Ela soube


na mesma hora que não o convenceu.

— Ai, não sei! Na verdade... — Mordeu o lábio inferior. — Eu


não ouvi o lado dele.

— Isa, acredita em mim, ele nunca te respeitou, só está


arrependido de ter sido descoberto. Falei com ele hoje e,
sinceramente, a explicação dele foi absurda.

— Eu acredito em você. O que eu devo fazer, então?

— Só bloquear o contato dele.

— Bloquear? — indagou, arregalando os olhos. — Precisa


mesmo disso?

— É a única forma. Ele não vai desistir. Se você se sentir


segura depois, aí é só desbloquear.

Ela assentiu, respirou fundo, pegou o celular e sem abrir


nenhuma mensagem, apagou toda a conversa e o bloqueou. Depois
respondeu sucintamente sua mãe e sua amiga Júlia, mas ainda não
queria falar com ninguém sobre o término.

Gabriel fez a famosa macarronada de bacon com molho branco


que sabia que ela amava. Comeu um pouco e tomou um gole do
vinho branco, era uma combinação espetacular.

— Só vai comer isso? — seu amigo perguntou, apontando para


o seu prato praticamente intacto.

— Não estou com fome.

— Está tão ruim assim? — Elevou uma sobrancelha.

— Você sabe que está gostoso como sempre. Eu só estou


preocupada, não consigo comer muito quando estou assim — disse e
girou a taça, olhando o movimento do líquido dentro dela.

— Quer falar sobre isso? — Ela suspirou e tomou mais um


gole.

— Vou ter que ir atrás de um apartamento, não estava contando


com essa despesa extra. Estávamos mobiliando a casa. Paulo cuidava
dos gastos fixos e usei todo o crédito dos meus cartões.

— Eu posso te ajudar.

— Não estou falando isso para você me ajudar. Vou ter que
vender os móveis, mas será difícil alguém pagar o valor pelo que
compramos.

— Será que o Paulo não compra de você?


— Não sei, para isso teria que falar com ele, e ainda não me
sinto preparada. Vou ter que dar um jeito de me manter até resolver
tudo — suspirou. — Mas o que me preocupa mesmo são as parcelas
dos cartões.

— Com o salário você consegue pagar as parcelas?

— Sim, mas tem o aluguel, comida... — Ela apertou a têmpora


com a mão. — Não quero ter que pedir dinheiro para os meus pais,
vai ser muita humilhação. — Mordeu o lábio inferior. — Posso tentar
parcelar as faturas.

— Não faça isso, vai virar uma bola de neve. Os juros do


parcelamento são muito altos.

— Eu sei — suspirou. — Mas acho que não vou ter opção.

— Isa, você pode morar aqui comigo. Onde vive um, vivem
dois. Trabalhamos na mesma empresa, nem com transporte você
precisa se preocupar — ponderou.

— Não posso aceitar, não quero atrapalhar sua rotina.

Ele bufou.

— Que rotina? Você estará me fazendo companhia. Estava


sentindo falta de morar com você, foram os melhores anos da minha
vida, Ogrinha. — Sua fala foi convicta e sincera.

— Eu também amava morar com você, Gaby. Melhor


companheiro de apartamento não há. Mas agora só tem um quarto,
tenho medo de ser muito invasiva.

— Você nunca vai ser invasiva.


— Sua namorada pode achar ruim.

— Namorada? — perguntou, incrédulo. — Você sabe que eu


não tenho namorada.

— A mulher que você está pegando. Provavelmente a que


estava com você no bar ontem à noite.

— Se estivesse em um relacionamento sério já teria falado.


Relaxa. — Deu um sorriso de lado, mostrando a covinha na bochecha
direita. — Que tipo de ser eu seria se não pudesse oferecer um teto
para minha melhor amiga?

Não resistiu em sorrir para ele.

— Está bem, mas vai ser temporário, até eu quitar as minhas


dívidas.

— Fique o tempo que precisar. Vou arrumar um espaço no


closet para você.

Isadora pegou sua mão por cima da mesa.

— Obrigada, Gaby, prometo que não vou fazer muita bagunça.

— Se eu não te conhecesse bem, poderia até ter esperanças. —


Os dois riram.

Isadora sempre teve dificuldade de manter a casa organizada.


Quando moravam juntos, ela até tentava conter sua bagunça dentro
do quarto, mas acabava, eventualmente, deixando uma toalha
molhada em cima do sofá, ou um sapato no meio da sala. Gabriel
sempre reclamava, já que era extremamente organizado.
— Você só precisa manter os sapatos guardados, a toalha no
banheiro e as louças limpas — informou.

Gabriel rapidamente arrumou um espaço no closet dele, que


tinha um tamanho muito bom, e a ajudou a desfazer a mala e a
organizar tudo. Por volta das dezessete horas, o interfone tocou. Era
Paulo, e seu amigo desceu para falar com ele. Isadora aguardou
ansiosa, e quando ele retornou, não resistiu em perguntar:

— O que ele queria? — Estava apreensiva.

— Falar com você. Ele acredita que ainda tem volta, disse que
você não apagou as fotos do Instagram.

Ela deu um gritinho, assustada.

— Tinha esquecido completamente disso.

— Não se preocupe, eu disse para ele que isso não tinha a


mínima importância, que se você quiser conversar com ele, vai entrar
em contato.

— Ele tem razão, preciso apagar tudo isso.

Ela foi até a mesinha de centro e pegou o celular.

— Pedi para ele não voltar mais aqui e mandei separar todas as
suas coisas. Ele vai ligar para confirmar o dia que poderemos pegar
tudo. — Gabriel sentou no sofá.

A mão de Isadora começou a tremer quando abriu a rede social,


sua foto de perfil era do casal. Tinha muitas mensagens não lidas,
eram quase todas de Paulo. Isso ia ser muito doloroso.
— Você vai precisar de ajuda? — Parecia que seu amigo lia sua
mente, sempre foi assim entre eles. Ela entregou o aparelho para
Gabriel e sentou ao seu lado.

— Eu não sei se eu vou conseguir sozinha. — Uma lágrima


grossa desceu por sua bochecha.

— Quer que eu apague todas as fotos e bloqueie ele?

— Sim. Eu também quero que você apague a conversa e troque


a minha foto de perfil — orientou.

Ele ligou a TV e colocou a série. Enquanto assistiam, fez a


limpa na rede social dela.

— E as fotos que estão no celular, Isa?

— Pode apagar tudo. — Ela levantou e pegou o notebook e o


cabo do smartphone. — Mas, antes, passa para uma pasta.

— Já está fraquejando, Fiona?

— Claro que não. Depois, com mais calma, eu apago. — Seu


amigo riu, mas não disse mais nada.

Após alguns minutos, entregou o celular para ela.

— Pronto.

Ela abriu o Instagram, e de foto de perfil estava uma foto que


Gabriel tirou dela uns três anos atrás. Na imagem estava com os
cabelos desgrenhados por causa do vento e com um sorriso grande.
Estavam comendo um cachorro quente e ele veio com a câmera, fez
uma dancinha ridícula, e na hora que ela deu uma gargalhada, ele
tirou a foto.

— Que horror, Gaby, essa foto é péssima! — Fez uma careta.

— Eu não acho, amo essa foto. Você está espontânea.

— Ninguém precisa estar espontânea no perfil do Instagram —


reclamou, procurando outra foto e mudando rapidamente.

— Eu estou espontâneo na minha — apontou.

— Porque você não se importa com o que os outros pensam.


Olha só o teu perfil. — Ela abriu e mostrou para ele. — Foto de
paisagem, algumas fotos desfocadas e as únicas fotos suas são em
rodas de amigos. Até parece que você é feio e está se escondendo. —
Ele deu de ombros. — Ela continuou olhando e encontrou uma foto
dos dois. — A gente está parecendo um casal nessa foto e você ainda
coloca esse coraçãozinho, assim você vai espantar as gatas.

— Não preciso do Instagram para conseguir gatas, Fiona.

— Onde você consegue, então?

— Nos bares, nas festas, na academia... por aí.

— Na academia? — perguntou, desconfiada. — Como eu nunca


vi?

— Você nunca me viu carregando peso para alguma gostosa? —


Sorriu malicioso.

— Não acredito! — Ela deu um sorriso descrente. — E isso


funciona?
— Claro! Geralmente, elas pedem o número do meu telefone.

— Como eu nunca percebi isso antes?

— Você é muito desligada, Fiona — disse, pausando a série e


puxando-a para perto. — Vamos tirar uma selfie, faz tempo que eu
não posto nada.

— Mas eu estou horrorosa! — desesperou-se, passando as mãos


no cabelo. Ele ligou a câmera.

— Melhor você sorrir, porque eu vou postar de qualquer jeito.

— Põe pelo menos um filtro — pediu, sorrindo rapidamente.

— Nossa, que sorriso falso! — reclamou e abaixou a câmera.

— Claro! O que você espera de mim? Olha tudo o que acabou


de acontecer comigo.

— Eu sei como resolver isso.

Ela estreitou os olhos, desconfiada, mas antes que pudesse se


preparar, ele começou a fazer cócegas nela. Nem precisou de muito
para ela estar dando gargalhada. Ele conhecia muito bem seus pontos
sensíveis: atrás do joelho, nas costelas e embaixo do braço. Fazia
isso com ela desde crianças, quando estava chateada ou triste.

— Para, Gaby! — Ela revidou o ataque e ele riu, mas não parou
com a brincadeira. — Estou falando sério. Para agora! — gritou com
gravidade e ele acatou dessa vez. Os dois estavam com a respiração
acelerada e rindo. — Nós não somos mais crianças — relembrou,
ainda sorrindo.
Ele pegou a câmera e tirou uma selfie.

— Do jeito que eu gosto — vibrou. Marcou ela e postou.

— Não vou repostar. Se tivesse tirado uma foto decente, eu


pensava no teu caso.

Gabriel deu de ombros.

O celular de Isadora começou a vibrar, era uma mensagem no


WhatsApp, do seu grupo “Friends 4 Ever”. Era um grupo composto
por suas amigas da faculdade: Ana, Marcela e Júlia.

Marcela enviou dois prints, um do seu novo perfil limpo e outro


do story de Gabriel.

Marcela: O que aconteceu? Você e Paulo romperam?

Júlia: Mas faltam só três meses para o casamento!!!


Ana: Não deve ser nada sério. O que aconteceu,
Isadora? Não deixa a gente no suspense.

Marcela: Na hora que eu vi o story do Gabriel, eu


desconfiei que algo estava errado, fazia séculos que
Isa não fazia um programa só com ele. Aí entrei no
perfil dela e nenhuma foto do noivo.

Ela começou a digitar e todas as outras pararam as


especulações.

Isadora: Sim, eu rompi com o Paulo. Foi muito sério,


peguei ele na cama com outra.

Júlia: PQP! Não acredito!

Marcela: Que desgraçado, vamos cortar o pinto dele!

Ana: Como você está, amiga?

Isadora: Estou bem agora, Gabriel está cuidando de


mim como sempre.
Marcela: Cuidado! Eu sei bem como ele cuida das
mulheres.

Gabriel estava lendo as mensagens junto com ela e arqueou uma


sobrancelha.

— Essa Marcela é muito sem-noção — comentou, irritado.

— Eu sei, justamente por isso você não tem que ligar. Aliás,
acho que ela tem uma quedinha por você.

— Eu passo. — Levantou e foi para a cozinha.

Ana: Se você precisar, estamos aqui, amiga.

Júlia: Que bom, amiga. Não queria que você ficasse


sozinha depois desse baque. Manda um beijo na bunda
do Gabriel.

Isadora: Tem que ser na bunda?

Júlia: É que a bunda dele é muito gostosa.


Ana: Te controla, Júlia!

Marcela: A Júlia só falou a verdade.

Isadora: Vou assistir uma série, meninas, falo com


vocês depois.

Ela deixou o celular na mesinha de centro e foi até a cozinha.


Gabriel estava cortando legumes.

— O que você vai fazer?

— Nossa janta. — Ele entregou a tábua, a faca e três batatas. —


Descasca elas para mim.

Enquanto cortava as batatas, Isadora sentiu uma felicidade


encher seu peito. Era incrível como se sentia em casa perto de seu
amigo. Quando ficavam calados, era um silêncio confortável. Eles
nunca brigavam, qualquer assunto sério sempre terminava em risadas
e gozação. Ele a entendia como ninguém e ela tinha a sensação que
conseguia ler a sua mente. Mesmo que as outras pessoas não
conseguissem compreender a sua relação com Gabriel, ela sabia que
não havia nenhum tipo de conotação sexual. Era uma amizade pura e
estava muito feliz por tê-lo ao seu lado.

Após o jantar, Isadora resolveu tomar logo o seu banho. Só


havia chuveiro na suíte, na sala tinha um lavabo pequeno para as
visitas. Demorou um pouco mais do que o habitual. Na sua mala
estavam seus produtos de higiene pessoal, cremes e óleos, e tratou de
cuidar da pele. Saiu enrolada numa toalha e Gabriel não estava ali.
Foi até a porta e avistou-o sentado no sofá.

— O banheiro está liberado — avisou antes de se dirigir ao


closet. Colocou sua camisola velhinha, um vestido de algodão com
estampa de bolinha rosa, decote quadrado e a cintura em fita da
mesma cor. Era velho demais para ser bonito, mas muito confortável.

Geralmente dormia sem calcinha, era uma recomendação de sua


ginecologista, para ventilar a região que já ficava abafada o dia todo
no trabalho, mas como iria dividir a cama com seu amigo e sua
camisola era curta, achou prudente colocar uma.

Deitou na cama e olhou as mensagens. Suas amigas ainda


estavam falando dos atributos de Gabriel. Marcela disse que a amiga
dela saiu com ele um tempo atrás e que seu pênis era gigante.

Eca, eu preferia não ter recebido essa informação!

Seu amigo saiu do banheiro e estava com o cabelo molhado


formando cachinhos soltos próximo à orelha. A barba por fazer fazia
uma leve sombra na sua pele, e algumas gotas de água apareciam no
peitoral descoberto.

Ele estava com uma toalha branca amarrada na cintura, e, sem


querer, o olhar de Isadora recaiu justamente ali, no volume da parte
da frente, e ela sentiu seu rosto ficar vermelho.

Maldita Marcela!

— As meninas continuam falando mal de mim? — ele


perguntou, franzindo a testa, e Isadora conseguiu desviar o olhar e
encarar a tela do celular. Devia ter feito uma cara estranha, por sorte
ele não percebeu o que estava olhando.

— Você não tem que ligar para essas coisas — ela conseguiu
dizer e resolveu apagar aquela parte da conversa, para o caso dele
olhar e somar dois mais dois. Ele entrou no closet e saiu depois com
uma calça de algodão azul-marinho.

— Se você não se importar, eu prefiro dormir sem camisa —


disse, deitando ao seu lado.

— Nunca me importei antes. Boa noite, Gabriel, e obrigada!

— Boa noite, Fiona! Você faria o mesmo por mim.

Certamente ela faria. Eles tinham sorte da amizade que


construíram. Muitas pessoas viviam uma vida inteira sem uma
amizade verdadeira. Esse pensamento fez seu coração aquecer. Ela
fechou os olhos e na mesma hora enxergou Paulo em cima da
morena, e aquele vazio voltou a lhe sufocar. Não conseguiu conter o
choro, e rapidamente Gabriel a envolveu com seus braços. Logo ela
adormeceu.
N a primeira semana que se seguiu ao término, Isadora não
conseguia evitar chorar, principalmente quando pessoas
desavisadas perguntavam sobre os preparativos do seu
futuro casamento, quando assistia alguma cena romântica e todas as
noites antes de dormir. Por sorte, seu amigo estava ali para consolá-
la, e sempre dormia abraçada nele.

Gabriel e Paulo acordaram que os móveis ficariam no antigo


apartamento até serem vendidos e que o dinheiro iria para Isadora.
Ele sairia do apartamento no domingo de manhã e os dois iriam até
lá para pegar os objetos pessoais dela. Infelizmente, o seu ex-noivo
não era uma pessoa confiável, e ficou aguardando-os dentro do
antigo quarto do casal. Quando o viu, uma mágoa se apoderou
novamente de Isadora.

— Você prometeu que sairia do apartamento — Gabriel disse,


irritado. — Não se preocupa, Isa, eu tiro ele daqui.

— Não, Gaby! — Ela colocou um braço em frente ao seu corpo,


impedindo-o de avançar. — Pode aguardar na sala, eu quero falar
com ele.

— Tem certeza? — perguntou, preocupado, e ela assentiu com a


cabeça.

— Qualquer problema eu grito, pode fechar a porta. — A


contragosto, seu amigo saiu do quarto, e assim que a porta fechou,
Paulo começou a aproximar-se. — Fique onde está, não quero que
você chegue perto de mim.

— Estou com tanta saudade, meu amor.

— Eu não sou teu amor, eu só quero que você me responda duas


coisas. Por quê? E há quanto tempo? — questionou com firmeza. —
E não minta para mim, ou nunca mais falarei com você.

Ele pareceu ponderar por uns instantes e respirou fundo.

— Isso tudo começou antes mesmo da gente namorar. Eu


conheci essa mulher no primeiro ano da faculdade. — Pigarreou alto.
— Era só sexo e ela tinha um gosto peculiar... — Fez uma pausa.
Isadora percebeu que não era fácil para ele falar. — Ela queria que
eu batesse nela. — Isadora arregalou os olhos, chocada, não esperava
algo assim. — No começo, eu não queria, mas como ela pedia muito,
acabei fazendo. Só não esperava que fosse gostar tanto — ele falou
rapidamente. — Era novidade para nós dois, começamos a pesquisar
e tudo começou a ficar mais intenso. Nunca envolveu sentimento,
mas quando me interessei por você, já estava muito viciado nesse
tipo de relação. Logo percebi que com você seria diferente, você
sempre foi muito delicada e carinhosa. Fiquei com medo de te
assustar.

— Então você achou melhor me trair? — perguntou, magoada.

— Não, fiquei uns seis meses sem tocar aquela mulher. Eu


nunca te traí, o que aconteceu entre mim e minha submissa não está
relacionado a amor. Eu entendi que poderia separar as coisas, nem a
beijava, para você ter noção.

— Você só pode estar brincando! — disse, enojada.

— Eu juro, Isadora, eu não amo aquela mulher. Só amei você. É


a mulher com quem quero casar e ter filhos. — Começou a se
aproximar novamente.

— Pode parar aí. Se der mais um passo, eu grito — ameaçou.


Sem poder conter, lágrimas começaram a descer por seu rosto.
Depois de cinco anos juntos, achou que conhecia o noivo, mas
simplesmente se apaixonou por uma ilusão. — Gabriel! — chamou.

— Espera, Isa, eu ainda não terminei — falou desesperado,


aproximando-se.

— Você deveria ter me contado e não me traído. — Percebeu


que estava apertando os dentes de tanta raiva. — Eu não quero mais
falar, nada disso me interessa. — Gabriel entrou e olhou de um para
o outro, avaliando a situação. — Saia da minha frente.
— Mas...

— Sai! — Ela virou para a parede, finalizando o contato visual


e a conversa. Conseguiu perceber seu movimento saindo do quarto.

Assim que a porta fechou novamente, cobriu o rosto com as


mãos e desabou no choro. Gabriel a abraçou apertado. Em seguida
desvencilhou-se do abraço e se recompôs.

— Vamos terminar logo com isso. — Arrumaram suas coisas


em silêncio e saíram o mais rápido possível dali.

A conversa, apesar de chocante, teve um lado positivo.


Descobriu que o homem por quem se apaixonara não existia. Se não
existia, não tinha para quem voltar. Assim que assimilou tudo isso,
aos poucos seu coração começou a aceitar.

A parte mais complicada foi contar aos seus pais por chamada
de vídeo sobre o rompimento. Sua mãe se ofereceu para avisar aos
amigos e familiares, além de resolver a parte burocrática do
cancelamento da festa. Estava muito grata pela sua oferta, seria
realmente muito doloroso lidar com essa situação.

Ficou triste, já que seus pais não poderiam visitá-la. Os dois


trabalhavam e só teriam férias em dezembro, e ela já tinha ido
recentemente a São José do Rio Preto para resolver algumas
pendências do casamento, não poderia se ausentar novamente do
trabalho. Corria o risco de perder o emprego.
T rês semanas passaram rapidamente. Eles estabeleceram
uma rotina confortável. Gabriel levantava primeiro e
tomava banho. Antes de ir para o closet, acordava Isadora.
Depois de vestido, ia para a cozinha fazer o café, quando finalizava,
ela já estava pronta. Eles tomavam café da manhã e seguiam juntos
para o trabalho. Na hora do almoço comiam em algum restaurante
próximo e ao final do expediente iam para a academia e voltavam
para casa. Pediam alguma comida pelo aplicativo, assistiam um
episódio da série e depois do banho iam para a cama. Ela chorava
contidamente e Gabriel a abraçava.

Isadora começava a se sentir mais animada e a pensar cada vez


menos no seu noivado. A convivência com Gabriel era ótima, mesmo
após dois anos morando em casas separadas, continuavam com a
mesma sintonia. Na verdade, se sentia mais à vontade morando com
ele do que com Paulo. Não via o amigo sair para festas ou bares e
nem falar de nenhuma mulher. Internamente ficava feliz de tê-lo
todas as noites ao seu lado, era o momento em que ficava mais
fragilizada, mas se sentia um pouco culpada.

O setor que Isadora trabalhava era constituído inteiramente de


mulheres. A sala possuía divisórias de MDF que separavam quatro
mesas. Todas conseguiam se ver parcialmente, devido ao vidro da
parte superior.

Ela se dava bem com todas as colegas, mas não era amiga
realmente de nenhuma. Isadora sempre teve mais facilidade em fazer
amizade com homens, com exceção da faculdade, já que sua turma
era formada somente por mulheres e suas atuais amigas perceberam
sua dificuldade e praticamente a adotaram. No ambiente de trabalho,
a que se dava melhor com ela era Pietra, uma jovem estagiária muito
animada e levemente avoada. Já Amanda era muito fechada,
raramente dava abertura para conversas. E como Maria, uma senhora
de cinquenta anos, adorava um mexerico, evitava se aproximar dela.
Era quinta-feira de manhã e Isadora encontrava-se envolvida
em um projeto novo, a construção de uma clínica odontológica em
um prédio antigo. Estava tendo algumas dificuldades com os desejos
do cliente e o espaço disponível. Para deixar a entrada de luz natural
em um dos consultórios, teria que diminuir o tamanho da recepção.
Enviou um e-mail explicando e foi até a copa pegar um cafezinho. Se
surpreendeu quando encontrou Gabriel prensando uma loira contra a
parede e a beijando avidamente. Era Pietra. Pigarreou alto, fazendo
os dois se sobressaltarem, e riu da cara de ódio do seu amigo. A
jovem saiu correndo, muito vermelha, e sumiu de vista.

— Gaby, você está doido? — indagou com seriedade. — Essa


menina é muito nova, além disso, ela não parece ser do tipo de uma
noite só.

— Relaxa, Isa, somos todos adultos aqui — defendeu-se,


servindo-se de café.

— E se alguém visse vocês se pegando? — criticou, balançando


a cabeça e servindo-se também.

— Vai me dizer que você nunca deu uns amassos na copa? —


perguntou malicioso.

— Eu não! — Virou os olhos. — Não sou uma tarada que não


pode esperar um quarto.

— Meu Deus! Você é daquelas que só transa no quarto? —


perguntou com fingida seriedade. — Só papai e mamãe também,
Fiona? — Fez uma cara de sofrimento e a ruiva bateu no seu braço.
— Para de palhaçada, Gaby, estou falando sério! Não vá
magoar essa menina, eu gosto dela.

Terminou seu café e voltou para sua sala. Ao final do


expediente, Pietra veio até sua mesa, estava sem graça.

— Isadora, espero que você não esteja chateada. Gabriel jurou


que vocês são apenas amigos. — A mais jovem olhou-a com um
misto de expectativa e dúvida.

— Somos somente amigos! — confirmou. A outra vibrou.

— Que alívio, eu estava me sentindo bastante culpada — abriu


um sorriso —, sabe? Ele pegou meu número, vamos sair esse final de
semana. — A loira estava exultante e Isadora ficou imediatamente
apreensiva.

— Se eu fosse você ia com calma, Gabriel não é do tipo que se


envolve.

— Ah, mas comigo é diferente, ele está sendo um fofo. — Teve


dificuldade de retribuir o seu sorriso, teria que conversar novamente
com o amigo depois, ou ele acabaria magoando a sua colega.

O considerava confiável como amigo, mas sabia muito bem da


fama de mulherengo dele e como facilmente partia o coração das
mulheres.

À noite, após o jantar, enquanto organizavam e limpavam a


cozinha, Isadora voltou ao assunto que tanto a preocupava.

— Gaby, a Pietra veio falar comigo. Ela parece bastante


encantada por você. Quais são teus sentimentos em relação a ela?
— Sentimentos? — perguntou, rindo. — Estamos apenas
curtindo um ao outro — disse, dando de ombros.

— Mas você deixou isso claro para ela?

— E precisa?

— Precisa, parece que ela pensa que é especial.

Gabriel suspirou.

— Quem não sabe brincar, não desce pro play. — Deu de


ombros e saiu em direção à sala, encerrando o assunto.

Às vezes esquecia como seu amigo era tão insensível em


relação às mulheres. Achou melhor não insistir mais no assunto.

A sexta-feira estava chegando e suas amigas não paravam de


botar corda para saírem. Isadora estava começando a se empolgar,
era livre e desimpedida. E como disse Marcela: “um amor a gente
cura com outro amor”. Isadora resolveu contar seus planos enquanto
assistiam mais um episódio de sua série favorita, The Good Place, e
Gabriel fazia uma massagem gostosa em seu pé dolorido.

— Gaby, acho que eu quero sair amanhã.


Ele desviou o olhar da tela e a olhou rapidamente, antes de
voltar a se concentrar na série.

— Que ótimo, você precisa mesmo sair. Onde vamos?

Agora era a parte difícil.

— As meninas acham que devem ir somente as mulheres. —


Ele interrompeu a massagem e olhou nos seus olhos.

— E o que você acha?

— Eu não sei. Marcela e Júlia já me largaram sozinha em festas


várias vezes no passado, basta encontrarem um parceiro para transar.
A Ana vai, ela é legal, mas sempre vai embora muito cedo.

— Se você preferir, me diz onde vai ser a festa, e eu fico por


algum bar próximo.

— Você faria isso? — perguntou mais animada.

— Claro, não vejo problema nenhum. — Ele pegou o outro pé


dela e retornou a massagem.

Isadora sorriu, não existia amigo melhor.

— Você é um fofo, Gaby! — Ela estava deitada no sofá, com a


perna no colo dele, então sentou-se e se inclinou para dar um beijo
na sua bochecha. — Sabia que eu te amo?

— É, você já disse — respondeu com a voz entediada, mas ela


o viu abrir um meio sorriso antes de voltar a atenção para a
televisão.
G abriel estava preocupado, Isadora ia sair pela primeira vez
após o término. Temia o quanto isso poderia abalá-la
psicologicamente. Além disso, não confiava muito nas
suas amigas, costumavam ficar muito loucas nas festas e poderiam
não dar o suporte que ela precisava. Entendia que a ruiva precisava
se divertir, mas com cautela. Passou o mês todo chorando nos seus
braços até cair no sono, a conhecia melhor que ninguém e sabia que
ainda estava lidando com seus sentimentos.

Isadora precisava de um tempo para si e para colocar a cabeça


no lugar, processar tudo o que aconteceu. Por isso, estava sentado
sozinho num bar qualquer em plena sexta-feira, simplesmente porque
o tal bar ficava na esquina da casa noturna que a ruiva estava com as
amigas. Tinha ficado de ligar para Pietra, mas podia ligar no sábado
ou domingo. A verdade é que precisava fazer sexo, já que não teve
coragem de largar Isadora sozinha nenhuma vez desde que a amiga
rompera o noivado.

Quando terminou sua caneca de chope, observou uma mesa no


canto com três mulheres muito bonitas. A loira alta, com um vestido
listrado e decote profundo, era muito gostosa.

Chamou o garçom.

— O que aquelas mulheres estão bebendo? — perguntou,


apontando com a cabeça em direção a elas.

— Piña colada.

— Leve três para elas e coloque na minha conta, mas, primeiro,


traga mais um chope para mim. — O jovem anotou o pedido e saiu
em direção ao bar.

Gabriel observou quando as bebidas chegaram na mesa delas. A


morena de cabelos cacheados falou algo e o garçom apontou em sua
direção. Retribuiu o sorriso das três, levantando a caneca em um
brinde solitário. Seu olhar estava centrado diretamente na loira, que
fez sinal para ele se aproximar.

Pegou sua caneca, levantou e foi até a mesa delas.

— Boa noite, garotas! Gostaria de saber se conhecem alguma


festa boa para hoje... — mentiu para todas, mas demorou o olhar em
seu alvo.
— Boa noite! Estávamos justamente conversando sobre isso —
a loira informou. — Essa é Joana. — Apontou para a morena de
cabelos cacheados. — Essa é Maria. — Mostrou a outra morena de
cabelos bem lisos. — E eu sou Nádia.

— É sempre um prazer conhecer mulheres tão bonitas. Eu me


chamo Gabriel — se apresentou, simpático.

— O prazer é nosso, Gabriel — Maria disse. — Por que você


não senta com a gente?

— Obrigado! — Ele sentou na cadeira vazia entre Nádia e


Joana. — Pra onde vocês vão depois daqui?

— Eu vou para onde você for — a loira provocou, sugestiva,


direta como ele gostava. Ele deu um sorrisinho malicioso.

— E para onde vamos, linda?

— Isso vai depender de como você se comportar. — Ele elevou


uma sobrancelha, curioso. — Vou ao toalete. — Deu uma piscadinha
marota para ele e levantou. Gabriel percebeu que ela queria que a
seguisse, deu um gole em sua bebida para ganhar tempo e levantou
também.

— Eu já volto — disse, sorrindo, e captou a troca de olhares


entre Maria e Joana.

Seguiu as placas e entrou no corredor que levava até os


banheiros masculino e feminino. Encontrou Nádia escorada na
parede entre as duas portas. Ela sorriu e foi de encontro a ele.
Colocou uma mão no seu tórax e a outra na sua nuca. Eles se
beijaram e Gabriel circulou sua cintura com os braços. Quando se
separaram, ela deu um sorriso safado e pegou sua mão. Guiou-o para
dentro do banheiro feminino e trancou a porta.

Eles voltaram a se beijar e Gabriel a ergueu, colocando-a


sentada em cima do mármore da pia. Interrompeu o beijo e seguiu
direto para o seu decote, beijando os dois vales expostos.

— Você é muito gostosa, Nádia! — Puxou a alça do vestido


dela, o suficiente para expor os dois seios redondos e fartos. Segurou
um com a mão e percebeu que tinham silicone. — Interessante —
murmurou antes de chupar um com vontade, arrancando um gemido
da loira.

Seu celular tocou. Se fosse seu toque normal, ele ignoraria, mas
era All Star, de Smash Mouth, a música tema de Shrek, o toque que
ele colocou para Fiona. Se afastou dos seios voluptuosos e pegou o
smartphone no bolso.

— Só um momento — pediu para Nádia, que bufou desgostosa


com a interrupção. — Alô! — atendeu.

— Gabriel? Você está ocupado? — Estava difícil ouvir sua voz


com o barulho alto da festa.

— Não, Isa. Está tudo bem?

— Quero ir pra casa — respondeu desanimada.

— Aguarda dez minutos e sai. Estou passando aí de carro. —


Ele percebeu o olhar irritado da sua companheira.

— Tá. — Isadora desligou.


— Nádia, me desculpe. Minha melhor amiga não está bem, vou
precisar ir embora.

Ela suspirou.

— Tudo bem. — Deu de ombros.

— Você me dá o seu número? Gostaria muito de te ver


novamente.

Mordiscou seu pescoço, puxando e colocando seu vestido


novamente no lugar. Ela sorriu e passou seu número. Ele prometeu
ligar no dia seguinte.

Gabriel saiu correndo do banheiro e foi até o garçom. Entregou


o dinheiro para ele e partiu sem aguardar o troco. Pegou o carro e
deu a volta no quarteirão, parando em frente à porta da boate. Logo
avistou Isadora, mas ela estava com uma roupa diferente. Tinha saído
de casa com uma saia longa verde e uma blusa branca de manga
comprida, e agora usava um vestido azul-marinho curto, colado ao
corpo, revelando suas curvas, e um salto alto laranja.

Deixou-a mais cedo na casa de Marcela e podia jurar que o


vestido pertencia à loira. Isadora estava muito linda, mas tinha uma
ruga profunda entre as sobrancelhas, indicando que sua amiga não
estava muito bem. Abaixou o vidro e fez sinal, então ela veio até o
carro, abriu a porta e entrou.

— Você foi rápido. — Sua voz era de alívio.

— Coloca o cinto. Eu te disse que ia ficar por perto. — Engatou


o câmbio automático e olhou rapidamente para o seu rosto, antes de
voltar a atenção para a rua. — Está tudo bem?
Ela respirou fundo.

— Sim.

— Então por que você está com essa carinha assustada?

— Não consigo esconder nada de você. — Ela riu sem humor.

— Não mesmo.

— Tinha um cara gato que a Marcela me apresentou, ele estava


interessado em mim, me chamou para dançar. — Ela parou de falar.

— E? — Gabriel incentivou.

— Eu dancei com ele, mas ele começou a passar a mão em


mim, tentou me beijar. — Ela começou a chorar.

Ele ligou o pisca-alerta e parou o carro no acostamento. Soltou


os cintos e puxou ela para si, num abraço protetor, acariciando seus
cabelos. Odiava vê-la assim. Imaginou que ela ainda não estivesse
pronta. Quando ela se acalmou, voltou a falar, contra o peito dele:

— Eu percebi que não ia conseguir, então disse que ia no


banheiro e liguei para você.

— Você fez bem. Não precisa forçar esse tipo de situação.


Quando for a hora certa, você vai saber.

Ela levantou a cabeça e olhou dentro dos seus olhos.

— Por que eu não consegui? Quando você terminou com a


Clara, começou a sair com várias mulheres.
— Cada um é cada um. Não dá para fazer esse tipo de
comparação. Você é uma garota sensível. Eu acho que você devia
sair sim, mas sem pretensão. Se rolar, ótimo!

— Você tem razão, mas hoje não. Podemos só ir para casa e


assistir nossa série? — ela questionou, colocando o cinto.

— Com pipoca de chocolate? — perguntou esperançoso.

— Sim! — exclamou, animada.

Ele sorriu, colocou o cinto e deu partida no carro. Fizeram o


restante do trajeto em silêncio. Gabriel lembrou de Nádia e se
resignou, não seria amanhã que ele ligaria para ela, mas isso não o
chateava.
D urante o desjejum, Gabriel percebeu que Isadora estava
desanimada.

— O que foi? — perguntou depois de finalizar o seu café.

Ela levantou os olhos do celular, distraída, e deu um sorriso


sem graça.

— Não é nada, só estou sem apetite — respondeu, tomando um


gole do café.

— Você esquece que eu te conheço muito bem, fala logo —


insistiu.
— É besteira. — Ela estava tentando encerrar o assunto, mas
Gabriel não ia facilitar. Ergueu uma sobrancelha inquisitiva e olhou
dentro dos seus olhos fixamente. Agora Isadora sabia que não
adiantava fugir, ele insistiria até ela falar. A ruiva virou os olhos. —
Está bem! — suspirou. — A Marcela falou que minhas roupas são de
velha — explicou. — Fiquei com vergonha, só isso.

— Ela é sua única amiga que eu não gosto — decretou.

— É que você não a conhece muito bem, ela é ótima. Só é


muito sincera, e isso nem é defeito. Mandou eu seguir essa blogueira.
— Pegou o celular e mostrou o perfil da tal mulher no Instagram. —
Disse que o estilo dela combina com a minha personalidade e meus
acessórios coloridos.

Gabriel pegou o celular e olhou algumas fotos.

— Essa Lelê [2] gosta mesmo de cor. Vamos ao shopping essa


tarde, eu vou comprar um vestido colorido pra você.

— Não, Gaby, eu não estava pedindo nada — falou, corando


violentamente.

— Eu não lembro de ter te dado presente de aniversário ano


passado — disse.

Sua amiga ficou com o olhar perdido e os cantos dos lábios


caíram levemente.

— É... Eu... — Isadora respirou fundo. — Eu e Paulo viajamos,


foi por isso.
Seus olhos ficaram marejados, ia começar a chorar. Gabriel
precisava intervir imediatamente.

— Vamos, levanta! — falou, levantando-se também e a puxando


pelos braços. — Você precisa trocar de roupa.

— Não quero, Gaby — reclamou.

— Nós vamos, eu já decidi — exclamou, conduzindo-a ao


quarto. — Não adianta dizer não, eu vou comprar com ou sem sua
ajuda.

Uma hora depois estavam no shopping, buscando vestimentas


mais joviais. A ruiva experimentou várias roupas e ficou em dúvida
entre três.

— Qual você gostou mais? — Isadora estava muito indecisa.


Ele pegou um vestido preto e entregou para ela.

— Experimenta esse novamente. — Assim que ela foi para o


provador, chamou a vendedora. — Pode embrulhar os dois, vou levar
eles e o que ela está experimentando também. — Queria ver sua
amiga mais animada e, principalmente, que Marcela não pudesse
mais falar nada que a magoasse.
Pagou e aguardou. Isadora retornou, sorrindo.

— Acho que é esse. — Ela franziu a testa. — Acha que Marcela


vai me achar velha?

O vestido possuía um decote reto, alças de strass e era um


modelo de embrulhar, que ficava colado ao corpo, marcando as
curvas voluptuosas com uma barra assimétrica na frente.

— Uma vovozinha — disse, rindo. — Claro que não. Esse ficou


bom, mesmo não sendo colorido. — Ela voltou para o provador mais
animada.

Essa noite a levaria para um barzinho muito divertido. Gostava


dele porque sempre após a meia-noite, as pessoas costumavam
dançar e acabava se transformando em uma verdadeira festa. Assim
que Isadora saiu do provador, passou o vestido para a vendedora, que
retornou poucos minutos depois para acompanhá-los até a porta e
entregou duas sacolas de papel para Gabriel.

— Comprou alguma coisa para você? — indagou, curiosa.

— Comprei as roupas que você gostou — explicou.

— Você disse que era só um presente — acusou, estreitando os


olhos.

— São os juros, seu aniversário foi ano passado. Um vestido é


o presente e os outros são os juros — defendeu-se, rindo.

— Gaby, presente é no singular, não pode ser vários — disse


com seriedade. — Devolve os outros.

Gabriel virou para a vendedora.


— Vocês têm uma sacola maior? Pode colocar todos juntos? —
A jovem anuiu. Ele entregou as sacolas para a funcionária e olhou
para Isadora, rindo. — Agora vai ser uma embalagem, um presente.

— Você é impossível, Gaby. — Estreitou os olhos verdes e


encarou o amigo, que sorria travesso.

— Não adianta me olhar assim, se você devolver, eu volto


depois e compro — disse, dando de ombros.

— Essa foi a última vez — falou com firmeza. — Caso


contrário, não trago mais você comigo — ameaçou. Ele suspirou,
fingindo alívio.

— Não me deixe tentado, Fiona. — Ela deu um empurrão nele.


— Estou brincando, você sabe que eu amo rodar o shopping inteiro
atrás de roupas para você — ironizou.

— Só estou te treinando, um dia sua futura esposa vai me


agradecer. — Ele fez uma careta.

— Vocês podiam se unir e fazer compras juntas, assim eu


ficaria livre desse encargo.

Deu um abraço apertado nele.

— Obrigada! Mas não precisava ter comprado todos — reiterou


antes de se separarem, ignorando seu comentário.

A vendedora retornou e entregou a sacola grande.

— Obrigado e desculpa o incômodo — Gabriel disse para a


funcionária, pegou a sacola e eles saíram da loja.
Chegaram em casa e Isadora estava decidindo qual roupa nova
usaria hoje. Já tinha experimentado na loja e apontava para as três
esparramadas em cima da cama, tomando quase todo o espaço.

— Qual delas você gostou mais, Gaby?

— Não lembro. — Franziu a testa. — Usa essa — disse


rapidamente e apontou para qualquer uma, porque estava cansado e
sabia que se não escolhesse uma, ela ficaria ainda mais indecisa.
Afastou os travesseiros, sentou no canto da cama, apoiando as costas
na cabeceira, e pegou o celular. Seu amigo Henrique estava
perguntando qual era a boa para hoje.

— Vou experimentar novamente — Isadora falou, suspirando.

— Uhum — Gabriel confirmou, enquanto digitava um convite


para Henrique.

— O que você achou? — Ele desviou os olhos do celular. Era


um conjunto de cropped e calça rosa-claro.

— Está bom! — elogiou, cansado, e voltou a atenção para o


smartphone.
Henrique respondeu que iria encontrá-lo no bar. Gabriel
colocou o celular no bolso e olhou novamente para Isadora. Ficou
atônito com o que viu. Ela estava retirando o cropped por cima da
cabeça, quase de frente para ele, e usando somente uma calcinha
branca de renda. Seus seios redondos e empinados, com aréolas
rosadas, estavam completamente livres. Sua boca ficou seca.

Ela jogou a peça na cama e o encarou com os olhos verdes


arregalados, pegou o vestido laranja e passou pela cabeça e pelos
braços rapidamente. Ele desviou o olhar para a parede, constrangido.

— O que você está fazendo, Isadora?

— Experimentando roupa. — Ela terminou de descer o vestido


pelo corpo. — Pronto. — Gabriel a encarou, irritado.

— Eu sei que você está experimentando a porra das roupas


novamente. Quero saber porque você está fazendo isso na minha
frente!

— O que você acha desse? — perguntou, girando. — Eu gosto


que ele tem essa manga bufante.

— Você ainda não respondeu, quero saber porque você estava


pelada na minha frente.

— Deixa de drama, Gabriel, eu não estava pelada, estava de


calcinha. Você estava ocupado com o celular, achei que nem ia ver.
Gostou mais desse?

Ele levantou e saiu do quarto, batendo a porta. Ficou puto com


a situação, não gostou da reação do próprio corpo à nudez dela.
Estava irritado, chocado e nervoso. Essa resposta se devia à escassez
de sexo, com certeza, e sua raiva ao fato de não ter sido um acidente.
Ela deliberadamente tirou a roupa na sua frente. Pegou um copo e
encheu com água do bebedouro. Bebeu dois goles e Isadora
apareceu, agora com o último vestido, o preto.

— Desculpa, Gaby, eu não vou mais trocar de roupa na sua


frente — ela falou entediada, como se realmente achasse isso
besteira. — Agora você pode olhar esse vestido e dar sua opinião
sincera? — perguntou esperançosa. Ele respirou fundo e tomou toda
a água antes de responder.

— O conjunto combina mais com o ambiente. — Ela concordou


com a cabeça.

— Eu tenho uma bolsa perfeita para usar com ele. — Isadora


foi tomar banho e Gabriel ligou a televisão no canal de esportes.
Precisava de algo para ocupar a mente. Pouco tempo depois nem
lembrava mais da visão perturbadora.

Incrível, Isadora começou a se arrumar uma hora antes e ele já


estava pronto, e ela não.

— Isa, nós podemos perder a mesa. Só seguram a reserva até as


dez horas.
— Eu estou quase pronta. — Ela estava passando o rímel.

— Não pode levar a maquiagem na bolsa e passar lá?

— Calma aí. — Fechou a embalagem e deu algumas


piscadinhas. — Pronto. Como estou? — perguntou, girando.

Ele observou o cropped curto e marcado no corpo, com a calça


de caimento perfeito nos quadris voluptuosos. Como ela conseguia
ficar tão sexy com uma roupa tão casual? Sua amiga não era muito
alta, com o tênis branco batia no seu ombro. Isadora fez uma
maquiagem em tons de marrom, branco e rosa, estava com os lábios
rosados e os cabelos ruivos ondulados soltos, que chegavam até os
quadris.

— Está parecendo a professora Charmosa — mentiu, rindo da


cara de desespero dela.

— Sério? — Começou a se analisar criticamente em frente ao


espelho, franzindo a testa.

Esse era o apelido de uma senhorinha que dera aula para eles no
ensino médio. A professora Valentina amava a cor rosa e sempre
tinha uma ou mais peças nessa cor, além da maquiagem carregada,
brilhosa e muitas vezes borrada. Ela andava em um fusca velho e
cor-de-rosa. O apelido era uma alusão à personagem Penélope
Charmosa. Antes que Isadora surtasse, pegou a bolsa rosa e a sua
mão, puxando-a para fora.

— Espera, eu preciso consertar a maquiagem — resmungou,


tentando desvencilhar-se dele.
— Estamos atrasados. No escuro ninguém vai perceber, e não
está tão ruim — cedeu e apertou o botão do elevador.

No caminho todo dentro do carro, observou de esguelha Isadora


olhando seu reflexo no espelho do tapa-sol.

— Eu estava implicando com você — explicou, divertido, e ela


deu um empurrão no seu braço, resmungando alguma coisa sobre ser
um imbecil e não perguntar mais a opinião dele.

Chegaram quinze minutos atrasados no bar, por sorte a mesa


reservada ainda estava desocupada. Sentaram e pediram as bebidas.

— É bem animado aqui — Isadora comentou, olhando em volta.


Gabriel seguiu seu olhar pelo salão cheio de mesas quadradas e
pessoas alegres. Próximo ao palco se deparou com uma mesa cheia
de mulheres, e uma loira de vestido amarelo e trança raiz chamou sua
atenção.

— Vai ficar mais animado quando a banda começar a tocar —


ele comentou, distraído.

O garçom colocou as canecas na mesa, ele agradeceu e pegou a


sua.

— Espera, vamos brindar. — Ela pegou a própria caneca. —


Sabe como é, beber sem brindar, um ano sem transar. — Ele riu.

— Tinha esquecido dessas suas bobagens.

Eles brindaram e viraram a bebida.

— Melhor não arriscar. — Deu uma piscadinha maliciosa.


— Se fosse mesmo assim, eu estaria ferrado. — Quando Gabriel
terminou de beber seu chope, avistou Henrique e fez sinal para ele.
Seu amigo chegou e deu um tapinha nas costas dele.

— Isadora! — Ele deu um beijo no seu rosto e sentou de frente


para a ruiva. — Não achei que você viesse também. O Paulo não quis
vir?

— Eles terminaram — Gabriel informou, observando o rosto de


Isadora. Ela deu um sorriso sem graça e todo o brilho do seu olhar
havia sumido. Aparentemente, Henrique não percebeu.

— Sério? — Ele lançou um olhar interessado, examinando


Isadora mais atentamente. — Enquanto me aproximava da mesa
fiquei imaginando quem era a ruiva gata sentada com meu amigo, aí
percebi que era você.

— Menos, Rique! — Gabriel o repreendeu.

Seu amigo era muito mulherengo, não era quem ele


recomendaria para Isadora nesse momento, mas não estava realmente
preocupado. Afinal, Henrique não fazia o tipo de Isadora, seu ex-
noivo era magro demais e totalmente diferente do amigo. Ele era
musculoso, tinha cabelos castanho-claros com vários reflexos loiros
e uma pele bronzeada demais, devido ao excesso de exposição ao sol.

Fez um sinal para o garçom e pediu três canecas. A banda


iniciou o show com uma música animada e algumas pessoas
começaram a dançar.

— Dança comigo? — Henrique convidou e ela aceitou


prontamente. Os dois levantaram e Gabriel aproveitou para olhar a
loira. Ela sorriu para ele, que retribuiu, e em seguida a jovem seguiu
em direção à sua mesa, sentando na cadeira vazia ao seu lado.

— Oi, eu sou a Raíssa.

— Prazer, Raíssa, Gabriel. — Ele pegou sua mão e beijou o


dorso.

— Estou me sentindo em um filme de época — disse, rindo


timidamente. — Você tá a fim de dançar?

— Estou muito a fim. — Eles levantaram e dançaram duas


músicas.

O perfume dela era forte e adocicado, meio enjoativo, mas a


conversa era leve e descontraída. Levou a jovem até a sua mesa e
beijou seu rosto. Depois de cumprimentar suas amigas, voltou para
perto dos próprios amigos. Henrique e Isadora estavam num debate
animado sobre signos. Aparentemente, a bebida fez sua amiga
relaxar.

— Meu sonho é casar com um ariano — Isadora falou com os


olhos brilhando.

— Por quê? Não é um signo muito impulsivo?

— Librianos também são, Henrique. Gosto de áries porque eles


costumam ter bom humor. Tem tudo para ser perfeito.

— Nós, sagitarianos, somos muito engraçados. Tenho certeza


que daria muito certo com libra.

— Isso é a maior bobagem, não é um signo que vai determinar


se um relacionamento vai funcionar ou não — Gabriel cortou.
— Lógico que ter signos compatíveis não é garantia de que o
relacionamento vá dar certo, mas eu dificilmente apostaria minhas
fichas em um signo incompatível. Eu evitaria ter algo mais sério com
um escorpiano, por exemplo. — Sabia que ela estava falando isso
para provocá-lo, já que seu signo era escorpião.

— Preconceituosa — disse, rindo, e bebeu seu chope. — Eu


acho que a gente se dá muito bem, eu não acharia um problema me
casar com uma libriana.

— É que nós, librianas, somos muito sedutoras — contou,


orgulhosa. — De qualquer forma, amizade é diferente de amor.
Realmente nossos signos são perfeitos na amizade, mas são muitas
diferenças para equilibrar num relacionamento amoroso. Não sei se
eu encararia esse desafio.

— E sagitariano? Como seria o amor entre um sagitariano e


libriana? — Gabriel virou os olhos para a pergunta do amigo.

— Sério, Rique? Você não tem uma cantada melhor? — Gabriel


resmungou, mas os dois o ignoram.

— Para ser sincera, eu nunca pesquisei sobre eles, deixa eu


perguntar para o Google. — Pegou o celular. — Aqui. — Começou a
ler: — “Libra se dá bem com Sagitário em praticamente todas as
áreas da vida. Juntos, eles nunca irão se entediar. O arqueiro é
altamente inteligente, inquisitivo, brilhante e ansioso, procurando
todas as respostas que Libra tem para oferecer – que na maioria das
vezes são extremamente sábias. Eles sempre terão muito sobre o que
conversar. Outra coisa abençoada dessa combinação de signos é que
eles serão muito bons amigos e amantes. O que os une logo de cara
são os objetivos semelhantes, os ideais em comum e a necessidade de
mudança e entusiasmo. A amizade entre eles sempre adiciona um
rico laço emocional e esse casal nunca deixa de aprofundar sua
experiência sexual juntos”. [3]

— Uau, gostei! Já quero aprofundar nossa experiência sexual —


Henrique falou, animado.

— Eu conheço muito bem os dois, e certamente não combinam.


Eu disse que isso aí era besteira — Gabriel argumentou, não estava
gostando do rumo dessa conversa.

— Isso tudo é ciúmes, Gabriel? Só porque o meu signo é


compatível e o teu não?

— Até parece... — Virou a caneca e notou, irritado, que seu


chope estava quente.

Buscou visualmente por um garçom, e nesse momento, Raíssa


passou próxima à mesa deles, observando atentamente Isadora.
Gabriel conhecia muito bem esse olhar avaliativo. Era comum as
mulheres se sentirem ameaçadas por sua amiga. Seus olhares se
encontraram e a loira sorriu sem graça para ele, que retribuiu com
um sorriso tranquilizador. Não queria que ela se sentisse intimidada,
ou pensasse que havia realmente algo entre ele e Isadora. A jovem
saiu em direção ao bar.

— Quem é a loira gata, Gabriel? — Henrique perguntou.

— Acabei de conhecer — respondeu evasivo.

— Onde fica o banheiro? — Gabriel apontou para a direita e


seu amigo saiu da mesa.
— Você não pode estar pensando em ficar com o Henrique —
afirmou, descrente, para Isadora.

— Por que não? — Ela franziu a testa.

— Ele não é o cara certo para você, é muito irresponsável e


galinha. Além disso, não está procurando relacionamento sério.

— Eu também não estou — declarou em tom desafiador.

— Você fala isso agora, mas você é muito sensível, Fiona.

— Gaby, você precisa parar de ser superprotetor — reclamou.

— Preciso te lembrar que ontem você nem conseguiu beijar um


cara?

— Porque ele era um estranho. Já conheço Henrique há muito


tempo.

— Você não conhece ele realmente. — Viu que o amigo


retornava. — Faça o que achar melhor.

Levantou e foi até Raíssa. Conversaram um pouco, e quando


olhou novamente para sua mesa, estava vazia. Percorreu o local com
os olhos, mas não encontrou nenhum dos amigos. Pegou o celular e
enviou uma mensagem para Isadora.

Gabriel: Está tudo bem?


A mensagem não foi visualizada, percebeu que ela não olhava o
WhatsApp há quase uma hora. Enviou uma mensagem para
Henrique.

Gabriel: Onde vocês estão?

Henrique: Estamos aqui fora, fumando.

Respondeu quase imediatamente, seguido de um emoji


revirando os olhos.

Desde quando Isadora fumava? Sabia que o amigo fumava


eventualmente quando bebia. Achou melhor não perguntar, Henrique
não era doido de fazer mal para ela, sabia que o arrebentaria se
fizesse isso. Respirou mais tranquilo e convidou Raíssa para dançar.
Talvez estivesse realmente sendo superprotetor, afinal, ela era adulta,
não precisava de uma babá. No meio da segunda dança sentiu o
celular vibrar, soltou a cintura da parceira para pegar o aparelho e
olhou por cima do ombro dela.

Isadora: Estou bem, mas acho que vou pra casa. Pode
ficar, eu vou pedir um Uber.

Pediu licença para Raíssa, parando a dança, e respondeu:


Gabriel: Também quero voltar para casa, me espera.

Ele pegou o telefone da loira e prometeu ligar no dia seguinte.


Pagou a conta e saiu. Encontrou Isadora sozinha na calçada em
frente ao bar.

— Cadê o Rique? — indagou, olhando ao redor.

— Disse que ia para uma festa, um amigo chamou ele. —


Percebeu que algo acontecera, mas ela não estava querendo falar.

— Aquele puto nem se despediu! — reclamou, pegando a mão


dela e indo para o estacionamento.

Quando chegaram ao apartamento já passava de uma hora da


manhã. Isadora tirou o tênis, colocou no corredor e deitou no sofá.

— Isadora, você precisa colocar o tênis na sapateira — avisou


em tom sério e colocou o próprio sapato no local correto,
demonstrando. Ela resmungou e fez o solicitado, depois se jogou
novamente no sofá.
— Estou sem sono. — Ouviu sua amiga murmurar enquanto
seguia para o quarto.

— Quer assistir algum filme?

— Vamos assistir nossa série? — Fez carinha de pidona.

— Você parece uma cachorrinha sem dono quando faz essa


cara. — Ela sorriu. — Viciou mesmo na série.

— Você não?

— A série é boa — concordou. — Só vou tomar um banho


rápido.

Quando voltou, Isadora estava dormindo no sofá. Pegou uma


mecha ruiva que estava solta na frente dos seus olhos, colocou atrás
da orelha e sacudiu suavemente seu ombro.

— Ei, dorminhoca, você precisa tomar banho e escovar os


dentes. — Ela abriu somente um olho e se espreguiçou. — Depois
diz que não estava com sono.

— Eu não estava, mas você demorou muito. — Sua voz estava


rouca pelo sono.

— Eu não demorei. Vai se arrumar para dormir, não vou deixar


você deitar na cama assim. — Ela sentou, esfregando os dois olhos.

— Não vamos mais assistir The Good Place?

— Você está dormindo acordada.

— Estou bem acordada — disse, levantando. — Faz uma pipoca


pra gente, que eu já volto.
Quando retornou, Gabriel estava sentado, comendo pipoca e
assistindo um canal de comédia.

— Eu adoro o Thiago Ventura — comentou, rindo.

— Você quer assistir stand-up?

— Não, eu já assisti esse. — Pegou o controle e colocou a série.

Eles comeram toda a pipoca, depois Isadora deitou de lado, com


a cabeça na sua perna. Gabriel fez cafuné nela. Adorava esses
programas caseiros com sua amiga, sentia falta dessa tranquilidade.
Depois que ela mudou para a casa de Paulo, sempre saia de casa para
não ficar sozinho. Achava muito deprimente não ter com quem
assistir TV. Ele sabia que poderia resolver isso arrumando uma
namorada, porém nunca encontrou uma mulher com quem tivesse
vontade de sair mais do que duas vezes. Ao final do episódio,
percebeu que Isadora começou a chorar silenciosamente, molhando
sua perna com as lágrimas. Essas últimas semanas estavam sendo
uma tortura, faria qualquer coisa para vê-la feliz ou evitar que
sofresse.

— Está tudo bem, Isa? — perguntou com delicadeza.

— Sim — disse, secando as lágrimas com as costas da mão e


virando o rosto para ele. — Não consegui beijar o Henrique.

Iniciou o próximo episódio e Gabriel pausou a série, olhando


dentro dos seus olhos verdes marejados.

— Você sabe porque não conseguiu? — Ela respirou fundo e


mordeu o lábio inferior, como sempre fazia quando estava pensando.
— Não sei, na verdade... — ela suspirou. —Lembrei do Paulo e
pensei que ele poderia fazer o mesmo comigo. Eu sei que é besteira,
mas na hora foi real. Eu fiquei com medo. Será que isso é algum tipo
de boqueio?

— Claro que não, acho que apenas está muito recente.

— Pensa bem, é a segunda vez que acontece, e os dois caras


eram gatos.

— Você acha Rique um gato? — perguntou e elevou uma


sobrancelha em dúvida, fazendo-a rir.

Seu amigo não era de todo ruim, sabia que fazia sucesso com as
mulheres, o seu choque foi somente por não achar que esse fosse o
tipo de Isadora. Estava confuso. De nerds magrelos, Isadora passou a
se interessar por pseudo-surfistas sarados?

— Você sabe que ele é. — Virou os olhos. — Isso é sério,


Gaby! Eu preciso seguir em frente, transar com outro.

Gabriel ficou de boca aberta pelo choque.

— Você não está esperando que eu me torne uma freira, está?

— Freira não, mas antes do Paulo você era quietinha, quase não
ficava com ninguém, e que eu saiba, Paulo foi o seu único.

— Eu era uma boba, antes eu acreditava em príncipe encantado,


agora só quero esquecer o Paulo e curtir um pouco a vida.

— Você está certa. Eu só me surpreendi, mas não sou contra,


ok? — Gabriel esclareceu, apaziguador.
— Ótimo. Eu só preciso arrumar um cara que me faça tremer de
paixão, alguém que eu não consiga resistir.

— Precisa disso tudo para um sexo casual? Estou entendendo


porque você está com dificuldade. Fora que se você não quer nem
beijar os “gatos” — disse, fazendo aspas com as mãos —, como vai
saber se vai tremer de paixão nos braços deles?

— Você tem razão, preciso beijar todos para descobrir.

A imagem dela beijando vários caras deixou Gabriel


exasperado.

— Eu não disse que você tem que beijar todos. — Passou uma
mão nervosamente pelo cabelo. — Acho que o problema está na
escolha do parceiro, você tem o dedo podre, Fiona. Sempre teve,
olha o Paulo.

Gabriel nunca gostou de ver ou imaginar Isadora ficando com


alguém. Não chegava a ser ciúmes, era só uma irritação. Sentira o
mesmo quando ela começou a ficar com Paulo. Sempre achou esse
sentimento semelhante ao que um irmão mais velho sentiria pela
irmãzinha, o que fazia todo sentido em sua mente, já que conhecia
ela desde criança.

— Ei, você deu autorização para o Paulo me convidar para sair!


— protestou.

— Eu dei porque você quis. — Deu de ombros. — Isso não


importa agora, eu vou te ajudar na busca de um cara bacana.

— Não precisa ser bacana se é só para transar.


— Precisa sim! Com você nunca vai ser só uma transa, eu te
conheço. — Ela virou os olhos. — Não vire os olhos para mim,
mocinha — ameaçou. Ela fez uma careta e ele a atacou fazendo
cócegas, mas como ela estava por baixo, ficou com a vantagem,
então ele desistiu rapidamente. — Já chega! — gritou, rendido, sem
conseguir parar de rir.

— Foco, Gaby! — ralhou. — Eu preciso de um gato para um


sexo gostoso, um companheiro para foda, só isso.

— Um companheiro de foda? Isso vai ser fácil! A gente começa


a procurar amanhã mesmo.

— Você quer começar amanhã? Achei que fosse sair com a


Pietra.

— Agora temos uma missão, vamos sair todos os dias até você
conseguir o teu companheiro de foda. — Marcaria de tarde com a
garota e de noite ajudaria sua amiga.

— Para de falar esse nome, soa vulgar.

— Já me acostumei com esse. Agora já era.


G abriel acordou cedo no domingo, levantou e foi direto para
a cozinha. A louça do dia anterior ainda estava toda na
pia, era o dia de Isadora limpar. Balançou a cabeça
desgostoso. Era incrível como sua amiga, mesmo depois de tantos
anos, ainda tinha dificuldades de manter as coisas organizadas. Teria
que ter uma conversa séria com a ruiva, mas não conseguiria
aguardá-la acordar, para ele era difícil utilizar a cozinha estando
bagunçada.

Removeu os restos alimentares dos pratos, organizou todas as


louças sujas na lava-louças, ligou o eletrodoméstico, limpou a mesa,
a bancada e a pia. Passou o café e seu celular vibrou. Olhou a tela e
era Pietra convidando-o para assistir um filme no cinema. Não estava
muito interessado nesse tipo de programa com ela. Seu objetivo era
outro.

Gabriel: Eu prefiro um programa mais íntimo, só nós


dois.

Pietra: Você pode vir aqui em casa, assistimos um


filme da Netflix.

Gabriel: Parece ótimo.

Pietra: Que horas?

Ele lembrou que sairia com Isadora à noite, já que combinaram


de encontrar um companheiro de foda para sua amiga.

Gabriel: 15h?

Pietra: Combinado, vou enviar a localização.


Depois do almoço, Gabriel tomou um banho caprichado,
arrumou-se e saiu para a sala. Encontrou sua amiga esparramada no
sofá, assistindo um filme.

— Já está na hora de cortar o cabelo, Gaby — Isadora disse


assim que o viu. Sua amiga não gostava de homens com o cabelo
grande. Teve uma fase que ele queria deixar crescer e ela quase
surtou.

— Estou pensando em deixar crescer, fazer umas trancinhas,


rabo de cavalo... vai ficar estiloso.

— Nem pensar! Já vai começar com isso de novo?

Ele sorriu, adorava perturbá-la. Aproximou-se, e como de


costume, a jovem deu espaço para ele sentar e depois deitou a cabeça
nas suas pernas.

— Está cheiroso, vai sair? — especulou, curiosa.

— Tenho um encontro — respondeu evasivamente.

— Com a Pietra? — perguntou, fazendo uma careta.

— Está com ciúmes, Fiona?

— Claro que não! — Ela virou os olhos. — Só não gosto que


você brinque com os sentimentos das mulheres, isso não é legal.

— Relaxa, Isa, ela é só minha companheira de foda — brincou


e começou a rir quando sua amiga lançou um olhar raivoso em sua
direção.

— Não fala assim, isso é desrespeitoso.


— Ah, quer dizer que você pode intitular assim e eu não? —
Fingiu estar ofendido.

— Tenho pena das mulheres inocentes que cruzam teu caminho.

— Posso garantir que de inocente elas não têm nada. — Olhou


para o relógio no pulso. — Está na minha hora. — Isadora sentou
para liberar sua saída. Ele levantou e se inclinou, dando um beijo na
sua testa. — Só não vai assistir a série sem mim, viciada.

— Não posso prometer nada — disse travessa.

Desceu o elevador rindo. Sua amiga era muito abusada, mas


sabia muito bem como castigá-la caso soubesse que assistiu algum
episódio sem ele, ia enchê-la de cócegas até ela suplicar perdão.
Chegou à garagem, entrou no carro e ligou o GPS no endereço que
Pietra enviou. No horário marcado, estava no apartamento dela.

Era um imóvel simples. A jovem contou que dividia com uma


colega da época da faculdade, que estava na casa do namorado. A
sala era bastante neutra. Tinha um sofá de camurça cinza, uma
televisão e uma estante de madeira com muitos livros. Já o quarto de
Pietra era decorado com papel de parede rosa e diversos porta-
retratos dela com amigos e provavelmente familiares, que deixavam
o ambiente com a sua cara. No canto direito tinha um nicho com
vários ursinhos de pelúcia. Parecia um típico quarto de adolescente.

Ela parecia nervosa, mas pediu que deitasse na cama e ligou a


televisão.

— Tem algum filme que você quer assistir? — perguntou


timidamente. Gabriel não queria assistir nada realmente.
— Você pode escolher.

— Você já assistiu Combinação Perfeita?

— Ainda não.

— Que ótimo! Estou doida para assistir esse.

Ela iniciou o filme.

— Vem aqui — ele chamou. Pietra sentou na beirada da cama,


estava rígida. — Você parece nervosa — comentou, beijando o
ombro dela.

— É impressão sua.

— Qual sua idade? — O nervosismo dela e o quarto jovial


deixou-o levemente preocupado.

— Vinte anos. Achou que eu fosse menor de idade? —


perguntou, rindo, pelo menos o nervosismo foi embora.

— Só queria ter certeza. — Gabriel a puxou para perto e ela


encostou a cabeça no seu peito. Pareceu mais relaxada.

O filme começou, mas não estava prendendo a atenção dele. Ele


se aproximou do pescoço delicado dela e chupou-o, deixando-a
arrepiada. Segurou seu queixo e a beijou. Pressionou o seio farto por
cima da blusa e sentiu o braço dela o envolver. Rapidamente
posicionou-se sobre ela e o filme foi esquecido.

Gabriel não gostava de envolvimento sentimental na hora do


sexo, mas em todas as suas relações sexuais prezava pelo prazer de
suas parceiras. Com bastante paciência e cuidado, conseguiam gozar,
algumas por penetração, outras nas preliminares. Assim que sentiu
que a loira alcançou o clímax, buscou o próprio prazer. Rolou para o
lado e aguardou a respiração voltar à normalidade. Retirou o
preservativo, amarrou-o, observou se possuía algum furo e depois
descartou na lixeira perto da escrivaninha.

Pegou as próprias roupas, vestindo-as em seguida.

— Acho que eu vou voltar o filme, perdemos mais da metade da


história — Pietra disse e deu um meio sorriso, enquanto pegava o
celular.

Gabriel não aguentaria assistir mais um minuto sequer. Pegou o


seu smartphone e olhou o WhatsApp, nenhuma mensagem relevante.

— Pietra, recebi uma mensagem da minha mãe, ela quer que eu


passe na casa dela. Preciso ir.

— Pensei que sua mãe morasse em São José do Rio Preto.

Caralho!

Tinha esquecido que ela era próxima de Isadora. Provavelmente


sua amiga devia ter comentado algo sobre a família dele.

— Ela tem uma casa aqui — inventou no improviso, mas não


soou muito convincente.

Se despediram e saiu sem graça. Odiava quando ficava esse


clima estranho. Talvez fosse melhor não se envolver mais com
colegas do trabalho.
Gabriel passou a tarde fora com Pietra, mas, de noite, ele e
Isadora saíram para o happy hour na Paulista. O primeiro dia de
buscas foi frustrante para a ruiva, todos os homens bonitos que ela
mostrava eram rechaçados por seu amigo, ele sempre encontrava
algum defeito.

“Cara de safado.”

“Não gostei como ele te olhou.”

“Parece um psicopata.”

“É sério?”

“Muito novo.”

“Muito velho.”

“Parece um tarado.”

“Só faltou babar em cima de você.”

Isadora estava voltando do banheiro e avistou Gabriel no bar, se


inclinando sobre uma loira e falando perto de sua orelha. A mulher,
que deveria ter pouco menos de vinte anos, ruborizou, concordando
com a cabeça. Ele entregou o celular e ela digitou algo,
provavelmente o próprio número na agenda dele. Seu amigo era
realmente um galinha. Hoje mesmo tinha saído com Pietra e já estava
paquerando outra.

Ela voltou para a mesa e sentou, aguardando-o retornar. Fez


sinal para o garçom, mas um moreno achou que fosse para ele e
acenou de volta, então resolveu sorrir para ele. Afinal, era bonito,
além de alto e magro, do jeito que ela gostava. Observou o homem
pedir algo para o barman. Logo ele entregou duas cervejas da mesma
que tinha em cima da sua mesa. Pegou as duas e seguiu até ela.

— Boa noite! Trouxe para você. — Entregou uma das bebidas


para a ruiva.

— Obrigada. — Pegou a bebida. — Eu sou Isadora.

— Fred. É um prazer, Isadora — disse, se inclinando e beijando


sua bochecha. — Esse nome é tão bonito quanto a dona.

— Assim você me deixa sem jeito — falou meigamente. —


Quer sentar?

— Na verdade, estou com uns amigos, preciso voltar, senão vou


ser obrigado a pagar a conta toda sozinho. É uma regra nossa —
explicou. — Quem abandona o grupo por um rabo de saia tem que
pagar a conta, se bem que por você valeria a pena.

Isadora riu junto com ele.

— Será que você pode me dar o seu número? — perguntou


esperançoso.
— Claro. — Isadora passou o número e na mesma hora ele
enviou uma mensagem para ela registrar o seu e ele ter certeza que
não passou o número errado. Saiu e a deixou sozinha e sorridente.

— Gostou? — seu amigo questionou, aproximando-se.

— Ele é bacana. Acho que é um forte candidato, mas me conta


logo, qual o defeito desse? — debochou.

— Ele está acompanhado. Enquanto a companheira foi ao


banheiro, veio aqui. E vi ele colocar a aliança de volta no dedo assim
que virou de costas.

— Não acredito! — exclamou, horrorizada.

Isadora não achou mais nenhum homem interessante e


trabalhariam cedo na manhã seguinte, então resolveram encerrar a
noite.
D urante as duas noites seguintes, Isadora e Gabriel saíram
para bares diferentes. Ainda não tivera sorte em sua
empreitada, mas a esperança continuava presente. Quando
foi para o trabalho na quarta-feira, Isadora percebeu Pietra retraída,
mas quando tentava puxar assunto, a jovem fugia, inventava alguma
coisa para fazer, e não conseguiu descobrir o que se passava com ela.

Paulo entrou em contato com Gabriel, tinha conseguido vender


os móveis e enviou o dinheiro para a conta de Isadora. Ela solicitou a
antecipação de parcelas e pagou quase todas, as quatro restantes
ficaram para dali a seis meses. Seu amigo fez um cálculo, e se ela
poupasse 20% do salário conseguiria quitar a dívida quando as
parcelas chegassem. Teria que poupar, mas daria para comprar
algumas roupas eventualmente, já que Gabriel se recusou a dividir o
aluguel. Alegou que sempre pagou o aluguel sozinho, e sua vinda
não alterou em nada seu conforto.
N o dia anterior, Pietra faltou no trabalho, e na sexta-feira
Isadora descobriu que a sua colega tinha pedido demissão.
Ninguém soube explicar o motivo, mas a ruiva tinha uma
grande desconfiança. Resolveu pressionar seu amigo, e encontrou-o
na copa, tomando café.

— Ah, é você, Fiona! — Franziu a sobrancelha, desconfiada,


Gabriel parecia tenso.

— Estava com medo de encontrar com a Pietra?

— Medo não, só prefiro evitar. — Isadora serviu-se de café.

— O que você fez pra ela, Gaby?


— Eu? Eu não fiz nada — respondeu defensivamente. Ela
tomou um gole do café, observando-o atentamente.

— Você sabia que ela pediu demissão?

— Sério? — Ele não conseguiu disfarçar o alívio.

— Porra, Gaby, me fala logo o que você fez para a menina! —


explodiu. — Eu não sou idiota.

— Eu já disse que não fiz nada. — Isadora lançou seu olhar


mais raivoso. — Ela entendeu tudo errado, eu nunca prometi nada,
você sabe que eu não quero namorar nem nada disso.

— Então... — incentivou-o a continuar.

— Ela não parava de mandar mensagens melosas e de saudade,


queria marcar outro encontro. Eu comecei a ignorar as mensagens e
ligações, mas ela não desistia.

— Eu te disse que isso podia acontecer. — Ele revirou os olhos.

— Eu nunca prometi nada.

— Não precisava prometer, ela estava cheia de expectativas.


Vocês conversaram?

— Ah, sim! Ignorar não estava funcionando, eu enviei uma


mensagem.

— Mensagem? Você terminou com a menina por mensagem? —


exclamou, horrorizada.

— Terminei? — Gabriel riu. — Nós não estávamos namorando,


Fiona, não surta.
— Eu te disse que ela achava que era especial. Foi muito
insensível da sua parte.

— Insensível? Só foi uma transa, Fiona, não pedi ninguém em


casamento.

— Deixa eu ver a mensagem — pediu, deixando a xícara na pia


e se aproximando do amigo. Gabriel suspirou resignado, pegou o
celular e abriu o WhatsApp. Isadora leu as mensagens.

Gabriel: Pietra, você é linda e inteligente, mas não


estou aberto para um relacionamento agora. Tenho
certeza que você encontrará o cara certo em breve, e é
realmente uma pena que eu não seja esse cara. Espero
que possamos ser amigos e bons colegas de trabalho.

Em cima tinha várias mensagens dela que não foram


respondidas.

— Você é mesmo um babaca — concluiu, devolvendo o celular.

Gostava muito de Gabriel, mas, às vezes, tinha vontade de


sacudi-lo até aprender a respeitar as mulheres.

— É tudo uma questão de perspectiva — disse, dando de


ombros.
Q
uando chegou o sábado, Isadora estava animada. Não tinha
chorado na noite anterior, antes de dormir, e acreditava que
tinha superado o término do noivado. Mas tinha uma coisa
chateando-a. Descobriu que estava cansada de procurar um
companheiro de foda. Gabriel continuou rechaçando seus possíveis
pretendentes dia após dia, deixando-a frustrada. Ele parecia o dragão
protegendo a torre da princesa, não deixando nenhum cavalheiro se
aproximar.

O que fazia ele ser mais maleável?

Lembrou que quando ele bebia em excesso, ficava bonzinho


demais, parecia um Papai Noel magro, pagava bebidas para todos, o
que acabava sendo um verdadeiro rombo para suas finanças. Era
isso, iria dar um empurrãozinho para seu amigo aprovar algum
companheiro de foda, então resolveu que precisava embebedá-lo.

Decidida, escolheu uma lingerie provocante e o vestido preto


com alça de strass que Gabriel comprou. Tinha um decote reto,
evidenciava sua cintura fina e o quadril voluptuoso. Sentia-se sexy
com ele e era o que precisava, já que hoje ela iria transar. Sorriu para
o espelho do quarto, aprovando sua imagem.

Gabriel saiu do closet com uma camisa azul-marinho, com a


manga dobrada no braço, calça jeans azul-claro e um sapato branco
nos pés. Estava bonito, principalmente pelo corte de cabelo novo.

— Olha só que gato, adorei o cabelo. O que seria de você sem


mim?

— Um homem cabeludo? — brincou.

Isadora sentou na beirada da cama e colocou a sandália alta de


strass nos pés.

— Pronta? — Gabriel perguntou assim que levantou. Ela se


considerava baixa, mas graças ao salto alto chegava quase na altura
do seu queixo.

— Só falta o perfume. — Correu até o banheiro e aplicou atrás


da orelha, pescoço, pulso, cotovelos e na parte interna das coxas.

— Precisa de tanto perfume assim? — perguntou da porta,


franzindo a testa.
— São lugares estratégicos, meu caro, estou bastante confiante
hoje.

— Ui! — ele brincou e ela sorriu. — Já te disse que gosto


muito desse teu perfume?

— Isso faz sentido... — Ela mostrou o frasco. — Já que você


me deu ele no último Natal.

— Eu tenho bom gosto — disse, convencido, fazendo-a virar os


olhos.

— E é bastante modesto também — ironizou, guardou o


perfume e saíram. Já estava acostumada a dividir o apartamento, o
banheiro e a cama com seu amigo, às vezes até esquecia que era uma
situação provisória e tinha que arrumar um apartamento para morar.

Marcela e Júlia estavam dançando quando chegaram na casa


noturna. Ela seguiu em direção às amigas, mas parou quando ouviu
seu amigo.

— Vou pegar uma bebida pra gente, Fiona.

— Traz uma garrafa de tequila — Isadora pediu.

Ele franziu a testa com o pedido inesperado.


— Uma garrafa de tequila? Está querendo se embebedar?

— Acho que estamos precisando de um pouco de diversão aqui


— a ruiva disse, piscou e seguiu em direção às meninas.

Marcela deu um gritinho quando a viu.

— Que bom que você veio! Adorei o vestido! — elogiou.


Isadora ficou mais confiante com a aprovação da amiga.

As três se cumprimentaram com um beijo no rosto e começaram


a dançar.

Gabriel chegou acompanhado de um garçom, que trouxe uma


garrafa de José Cuervo Gold, quatro copos de shot de vidro, um pote
de porcelana branco com sal e limões fatiados no prato pequeno. O
homem colocou tudo sobre a pequena mesa redonda e saiu.

— Tequila! — Marcela gritou, animada, com os olhos


brilhando. — Desde quando você se tornou um cara tão legal,
Gabriel?

— Eu sempre fui legal — disse, servindo as quatro doses.

— Eu nunca tomei tequila — Júlia proferiu com expectativa.

Gabriel pegou um pouco de sal.

— Você espalha um pouco de sal na parte da pele, entre o


polegar e o indicador — ele falou, mostrando para ela em sua própria
mão. Júlia tentou imitar, mas o sal caiu. — Pode ser nas costas da
mão. — Ela seguiu a sugestão e as outras repetiram o gesto. — Na
mesma mão, você segura uma fatia de limão com o dedão e o
indicador. — Todas imitaram.
— Agora o brinde! — Isadora gritou.

— Sim, depois do brinde, você vai lamber o sal, beber a dose de


tequila de uma vez e morder o limão, na sequência. Prontas?

Todas confirmaram com um movimento de cabeça e eles


brindaram, chuparam o sal, tomaram a bebida e morderam o limão
juntos.

— Isso desce queimando — Júlia gemeu.

— Mais uma dose! — Marcela gritou, batendo o copo na mesa.

Gabriel encheu todos os copos e eles repetiram o ritual.

— Agora sim! Animei! — exclamou Marcela, colocando as


duas mãos no ombro de Gabriel.

Ela começou uma dança sensual, rebolando até o chão enquanto


descia a mão por todo o tórax dele. Marcela estava muito sexy num
vestido colado vermelho e bastante decotado. Pensando bem, ela
fazia o tipo de seu amigo: loira, magra e peituda. Quando chegou até
o chão, subiu insinuante, esfregando os seios nele. Marcela estava
ousada, e Gabriel lançou um olhar desesperado para Isadora, um
clássico “Socorro! Me tira daqui!”. Dando de ombros, ela virou para
Júlia.

— Vamos dar uma volta? — Ia aproveitar que seu amigo estava


ocupado e sondar o terreno, dar uma analisada no catálogo de gatos
da noite.

Segurou a mão delicada de Júlia e saíram. De canto de olho viu


o olhar fulminante que seu amigo lhe lançava, e lhe deu um sorriso
discreto. As duas faziam muito sucesso enquanto andavam no meio
da multidão, muitos olhares eram direcionados para elas. Sabia que
não era feia, e sua amiga Júlia era uma negra de tirar o fôlego, com
olhos cor de mel e quadris largos. Das três, era a que tinha o corpo
mais bonito, evidenciado por um vestido amarelo tubinho.

Dois homens as abordaram e as convidaram para dançar, mas


não sentiu atração por nenhum. Disseram que estavam procurando o
banheiro e seguiram com a excursão. Foi quando viu um loiro lindo
de morrer, magro, alto e com um sorriso de artista de cinema.

— Vamos parar aqui um pouco?

— Se interessou por alguém? — Júlia perguntou, fazendo uma


varredura nada discreta com os olhos. — É o loirinho? — Sorriu
maliciosa. — Um bom espécime de homem. — A ruiva concordou
com a cabeça e as duas começaram a dançar.

— Para de olhar! — Isadora deu uma cutucada na amiga. —


Assim ele pode perceber.

— Relaxa. — Sua amiga riu, mas começou a se concentrar na


dança. Rapidamente, ele as notou e passou a observá-las
discretamente.

— Ai, meu Deus, ele está olhando para cá! — disse, ficando
vermelha. Tinha dificuldades de sustentar encaradas diretas, nunca
foi boa na arte da paquera.

— Para de olhar pro chão, amiga, desse jeito ele vai achar que
você não está interessada. — Sabia que sua amiga tinha razão, mas
era bastante difícil para ela. — Olha dentro dos olhos dele e dá um
sorrisinho, isso deve bastar — orientou.

Respirando fundo, Isadora fez o que ela disse, e ele retribuiu


com um sorriso largo, mostrando todos os dentes brancos e
perfeitamente alinhados.

— Ele sorriu também.

— Ótimo, agora dança sensualmente, depois dá mais uma


encarada.

— Eu não vou conseguir!

— Vai sim! Me acompanha. — Júlia dançou, mexendo os


quadris no ritmo da música, e ela imitou os movimentos, rindo do
olhar sensual que a amiga lançou para ela.

— Assim eu vou me apaixonar por você.

— Faz esse olhar pro loirinho, duvido se ele não vai correr até
aqui. — Para Júlia era fácil. Isadora passou anos namorando,
esquecera completamente como era paquerar. — Se preferir,
podemos ir diretamente até ele — ameaçou.

— Não! — Ela dançou mais um pouco, criando coragem, e


tentou imitar o olhar sensual da amiga.

— Isso! Agora olha diretamente para o gato. — Mais confiante,


Isadora olhou para o loiro sem parar de dançar. Ele deu um sorriso
malicioso e veio na direção das duas, seu coração acelerou.

— Ele está vindo para cá! — gritou com um misto de


nervosismo e animação.
— Eu sabia, esse olhar não falha — declarou, convencida.

Ele chegou e se aproximou dela, falando no seu ouvido.

— Posso saber o nome da ruiva que está fazendo meu coração


parar? — Ela sorriu. Se ele não fosse tão lindo e cheiroso, ela teria
achado a cantada boba.

— Sou Isadora, e você?

— Eduardo. Você vem sempre aqui? — Teve que se segurar


para não fazer uma careta, ele era pior que ela na sedução.

— É minha primeira vez aqui, vamos dançar? — Ele segurou


sua cintura e começaram a dançar juntos.

Observou um homem de pele bronzeada, cabelos castanhos,


rosto bonito, mas musculoso demais para os seus padrões, abordar
sua amiga, e pelo sorriso percebeu que ela gostou dele. A noite
parecia promissora.

— Eu realmente quero saber mais sobre você, mas a música


está muito alta. Vamos para um lugar mais tranquilo? — Alarmes
soaram na sua mente.

— Você quer sair da festa?

— Se você quiser, tudo bem. Eu estava pensando em te levar


para o segundo piso, tenho um camarote, a música não é tão alta lá.
— Ela respirou mais aliviada.

— E minha amiga? — Apontou para Júlia, que dançava


alegremente com o seu par.
— Ela e o parceiro podem subir com a gente.

Isadora falou com a amiga e todos concordaram em acompanhar


o loiro. Eduardo pegou na sua mão e seguiram em direção a uma
escada lateral. O segurança permitiu a passagem de todos, e no andar
de cima percorreram um corredor com várias portas. Ele abriu a
última e segurou para entrarem. Ela já estivera em diversos
camarotes em sua vida, mas esse era completamente diferente. As
paredes voltadas para a festa eram todas de vidro, a música estava
mais baixa, num tom animado o suficiente, sem que as pessoas
precisassem gritar para serem ouvidas. Havia vários sofás com
alguns casais de pegação e diversas pessoas dançando. Parecia uma
festa privativa dentro da outra festa. Num canto tinha um aparador
com gelo e muitas bebidas variadas.

— O que vocês querem beber? — Eduardo perguntou.

— Uísque — o homem musculoso, que sua amiga apresentou


como Ângelo, pediu.

— Champanhe! — exclamou sua amiga, animada.

— E você, princesa? — Ele se voltou para ela.

— O mesmo que Júlia. — Ele assentiu e foi buscar as bebidas.

Voltou com duas taças de espumante em uma mão e o uísque na


outra. Entregou para os convidados e abraçou Isadora. Eles dançaram
um pouco e Eduardo começou uma conversa entediante sobre os seus
três carros importados, a mansão em Búzios e a cobertura duplex que
morava em São Paulo. Ela tomou rapidamente sua bebida, pensando
que tinha que sair dali rapidinho. O cara era gato e rico, mas
extremamente chato e superficial.

— Eu agradeço as bebidas, mas temos que ir — avisou.

— Fica mais um pouco, gatinha, agora que vai ficar bom! —


falou, apertando sua cintura, e isso fez um arrepio percorrer o seu
corpo. Mas não era de excitação, e sim uma sensação ruim, que não
sabia explicar. A ruiva tentou se desvencilhar dos seus braços, mas
ele a segurou firme pelo antebraço. — Você não vai!

Uma revolta começou a se apoderar de Isadora. Quem era ele


para dizer o que ia ou não fazer? Instintivamente enrijeceu os
ombros.

— Não é você quem decide o que eu vou fazer. — Tentou


libertar o braço, mas o loiro era mais forte que ela.

— Hoje você é minha, gata — disse, puxando-a para mais perto


e beijando seu pescoço.

Isadora ficou enojada pelo contato. Sentiu uma mão


empurrando seu abdômen e percebeu que era Ângelo, que se colocou
entre os dois.

— O que está acontecendo aqui? — Sua voz estava firme e alta.

— Não é da sua conta — Eduardo disse, revoltado, mas o outro


era mais alto e forte, além de não estar com uma cara amigável,
então ele deu um passo para trás, recuando.

— Eu só quero ir embora — ela explicou para Ângelo,


segurando seu braço, não queria confusão. — Vamos?
Júlia segurou sua mão livre.

— Vamos, amiga, Gabriel e Marcela devem estar preocupados.

Os três saíram e Isadora nem olhou para trás. Por sorte, Gabriel
não estava ali. Conhecia o gênio dele, e não seria tão pacífico como
Ângelo. Voltaram para a mesa onde deixaram seus amigos e se
surpreendeu com a cena, já que os dois estavam se beijando
intensamente.

— Gabriel e Marcela juntos? — Júlia falou no seu ouvido. —


Eu estou chocada! — Ela apontou para a mesa. — Eles compraram
outra garrafa de tequila.

— Sempre achei que Marcela tinha uma quedinha por ele. —


Deu de ombros. — Vamos tomar uma dose antes que acabe — disse,
seguindo até a mesa e servindo as bebidas. A segunda garrafa estava
quase no fim e rendeu somente três doses. — Quer? — ofereceu para
Ângelo.

— Não, estou de boa. Não gosto de misturar.

— Eu aceito! — Marcela gritou, pegando uma dose, mas


Gabriel tomou da sua mão.

— Você já bebeu demais.

— Você bebeu mais do que eu! — acusou, apontando o dedo


trêmulo para o seu tórax.

— Eu aguento mais que você.

Isadora entregou a outra dose para Júlia e ficou com uma.


Brindaram e beberam, seguindo o ritual de Gabriel, e todos
começaram a dançar na sequência. Estava se divertindo muito,
sentindo a cabeça leve, e uma euforia inexplicável, que nunca tinha
vivenciado antes, a dominava. Ao seu lado, Marcela agarrou seu
amigo novamente, e aquele beijo parecia gostoso e irresistível. Uma
excitação enorme começou a crescer dentro de si.

Olhou ao redor e viu um homem negro, alto e magro à sua


direita, que chamou sua atenção. Ele estava encostado na própria
mesa, tomando uma cerveja e observando o lugar. Queria um beijo
arrebatador. Foi até ele decidida, parou na sua frente, pôs uma mão
no seu peito e subiu lentamente até a nuca. Ele fez uma expressão de
surpresa, e sem falar nada, Isadora puxou seu pescoço, até os lábios
deles se tocarem. Ele retribuiu o seu beijo, mas em seguida ela sentiu
uma grande decepção e frustação, não foi excitante como previra.
Largou o homem desapontada.

— Não gostei — resmungou e voltou para a roda de amigos.


Sua amiga continuava atracada em Gabriel, como se o mundo fosse
acabar, e ficou chateada. Queria ter a mesma experiência.

Olhou para Marcela, ela estava realmente sexy de vermelho. Se


aproximou dos dois e puxou o braço da loira. O casal olhou confuso
para ela, e sem pensar muito, Isadora beijou a loira. Na mesma hora,
ela ouviu vários gritos de incentivo ao seu redor. A carícia foi boa,
mas novamente não foi como idealizou em sua mente. Nunca tinha
beijado uma mulher antes e nem sabia explicar o motivo de ter feito
naquele momento.

Quando finalmente se desgrudaram, Gabriel decretou que a


festa tinha acabado. Júlia e Ângelo tinham sumido. Ele pediu um
carro por aplicativo, ninguém estava em condições de dirigir, e antes
de voltarem para o apartamento deixaram Marcela em casa.

Isadora entrou, correu em direção ao sofá e se jogou nele,


deitando com as sandálias suspensas para fora, agitando-as no ar.

— Ei, mocinha, assim você vai estragar meu sofá novo! —


repreendeu Gabriel, retirando o tênis e as meias, guardando na
sapateira.

— Esse sofá é tão bom — disse, se espreguiçando. — Essa


noite não serviu pra nada — reclamou, fazendo bico. — Eu só queria
um homem! — choramingou. — Unzinho! É pedir muito? —
dramatizou.

Gabriel riu. Chegou perto do sofá, e sem precisar dizer nada,


Isadora se ergueu em um braço, dando espaço para ele sentar. Ela
encostou a cabeça no seu colo.

— A meu ver, o sexo da pessoa não fazia muita diferença —


constatou.

— Para beijo não, mas sexo é diferente. Teve um carinha lá,


mas ele era muito babaca, e o outro era sem graça. Estou tão
frustrada, que agora serviria qualquer um. — Bufou.

— Vamos assistir um filme? — Ela franziu a testa e mordeu o


lábio inferior.

Não queria saber de filme, queria desesperadamente transar.


Passara a semana inteira procurando alguém adequado, e nada,
porém essa noite saiu decidida a conseguir. Estava excitada ao
extremo. Se ao menos tivesse um delivery de homem gostoso, com
entrega 24h, pensou, divertida. Existiam aplicativos de namoro, mas
tinha medo de perfis falsos. Podia tentar ligar para alguém
conhecido, mas, infelizmente, ela não tinha uma lista pronta de
contatinhos, como sua amiga Marcela sempre se gabava.

Ficou vários anos namorando e sempre foi fiel, que idiota!


Precisava virar a página e ficar com outro. Gabriel tirou uma mecha
que estava próxima ao seu olho e a afastou. Seu pulso tão perto de
sua face fez com que sentisse a fragrância de seu perfume. Como
adorava esse cheiro. Era o perfume que tinha dado de aniversário
para ele, o 212 VIP Men, por Carolina Herrera. Amava esse perfume
masculino.

— Ei! Você é homem?! — disse, meio confusa.

— Isso é uma afirmação ou uma pergunta? Assim você ofende


minha masculinidade — brincou, mas Isadora não estava brincando.

De repente, tudo fez sentido. Por que perdeu tanto tempo


procurando? Não sabia dizer se era a recente decepção, frustação,
excitação ou o alto nível de álcool, mas tinha certeza de uma coisa:
estava decidida e nada lhe faria mudar de ideia.

— É isso! Nós podemos transar — disse, sentando animada.


Gabriel fez uma expressão assustada quando entendeu sua proposta.

— De jeito nenhum, seria como ficar com uma irmã. — Ele fez
careta.

— Ah, diz que sim! — Se aproximou e encostou a cabeça no


seu ombro, fazendo carinha de pidona.
Gabriel nunca resistia ao seu charme. Sempre que ela queria
roubar o último biscoito do pacote, era só fazer isso e ele lhe dava
prontamente.

— Sua louca. Essa carinha não vai adiantar. Isso é impossível!

— Por quê? Eu não sou bonita o suficiente para você? — Ficou


imediatamente irritada e insegura. Lembrou que seu amigo nunca
dissera que ela era bonita. Além disso, só ficava com mulheres
lindíssimas.

— Você sabe que é atraente!

— Então? Qual o problema? — questionou, impaciente.

Ele hesitou um pouco e respondeu:

— É que você é você. — E sexo é sexo, pensou, virando os


olhos. Qual era o problema de Gabriel? Não era como se ele fosse
um santo ou tivesse se guardando para o casamento. Na verdade,
sabia que ele tinha uma vida sexual bastante ativa. — E outra,
duvido que ele sequer subiria.

Ele não subiria?, repetiu mentalmente, enquanto absorvia o


significado dessa frase. Uma raiva foi se apoderando dela e sentiu-se
realmente ofendida e desafiada. Tinha que ser esperta. O que fazia
sempre que queria convencê-lo a fazer suas vontades?

— Já sei, vamos apostar!

— Apostar o quê? — perguntou desconfiado. Na verdade, sem a


mínima intenção, ele tinha desafiado ela primeiro, e agora ela iria só
retribuir na mesma moeda.
— Se eu conseguir fazer ele subir, você transa comigo! — Ah, e
ela ia conseguir, era questão de honra, faria tudo que fosse possível.

— Nem pensar! — afirmou com convicção.

— Por quê? — Hoje ele estava determinado a ferir seu orgulho.

— Porque eu sou homem! — Isso não é justamente o que


acabei de afirmar?, pensou, ficando ainda mais confusa.

Será que ele está querendo dizer que não vai conseguir
resistir?

— Mas você disse que ele não ia subir — acusou. Já estava


ficando cansada dessa discussão, parecia que davam voltas e
chegavam sempre no mesmo lugar. Estavam perdendo um tempo
precioso ali. Sabia que estava sendo irritante, mas não ia desistir.

— Qualquer homem fica excitado se for estimulado, todo


mundo sabe disso! — Nesse ponto, ela tinha que concordar, teria que
lhe dar algum tipo de vantagem.

— Então vamos fazer assim: se você ficar excitado sem eu te


tocar, aí você transa comigo! — Como exatamente ela faria isso,
pensaria depois.

— Não é uma boa ideia de qualquer forma. — Estava prestes a


atacar Gabriel, e não seria para sexo. Queria pular nele e sacudi-lo,
mas isso não ia resolver, então ela começou outra abordagem.

— Está com medo, Gaby? — perguntou desafiadora. Teve que


morder o lábio inferior para não sorrir, essa tática sempre
funcionava.
— Claro que não, Fiona. Você deve estar muito bêbada para
sugerir algo assim.

— Não estou, não! Estou ótima. — Confirmar que estava tonta


e que seu rosto estava dormente, não ajudaria a convencê-lo. — Só
tomei três doses. — Mostrou três dedos. — E outra, antes de beber
eu já estava decidida a transar, você sabe muito bem disso. Vamos,
vai ser só uma brincadeira! Se você não se excitar, a gente rir disso
depois. — Ele suspirou.

— E se eu não me excitar, o que eu ganho? — Teria que ser


algo realmente tentador, e ela sabia uma oferta irrecusável.

— Eu limpo o banheiro por um mês! — Viu Gabriel ponderar.


Podia enxergar dentro de sua mente as engrenagens trabalhando, e
soube que tinha conseguido antes mesmo dele responder.

— Fechado! Mas não vale nenhum tipo de toque ou beijo. Nem


toque através de objetos.

Ela pensou um pouco, ia ser difícil, mas daria um jeito. Seu


amigo tinha certeza que venceria a aposta, e Isadora adorava um
desafio.

— Aceito! — Só essa conversa já a deixara extremamente


excitada, era difícil de acreditar que ele não sentia o mesmo.

— Vou ganhar fácil — ele disse, rindo. — Você está ferrada!

— Isso é o que veremos, não cante vitória antes do tempo.

— Qualquer coisa que você faça, por mais sexy que seja, eu
vou achar engraçado! Simplesmente porque é você. — Ele podia
estar certo, teria que tentar contornar essa fragilidade.

Como poderia fazer ele enxergá-la com puro desejo? Precisava


fazê-lo esquecer que a sua sedutora era também sua melhor amiga.

— Você me deu uma ótima ideia! Onde você guarda a lanterna?

— Fica na terceira gaveta. — Ele franziu a sobrancelha,


intrigado, e apontou para um móvel.

Ela encontrou duas lanternas, testou-as e optou pela menor.

— Achei! Vamos para o quarto — ordenou, pegando uma


cadeira da cozinha.

Gabriel a seguiu e ficou observando-a posicionar a cadeira em


frente à cama e se voltar para ele.

— Tira a calça e deita na cama!

— Não tem necessidade disso, a regra é que não vale toques —


protestou, indignado.

— Não é para te tocar, eu só quero ver facilmente se ele subir


— disse entediada.

— Tá bem! — A contragosto, ele tirou a calça, ficando de


cueca e camiseta. Se jogou na cama, arrumando os travesseiros atrás
de si. — Como você ficou mandona — reclamou, mas ela ignorou o
comentário.

Isadora procurou no celular a música que tinha usado para fazer


um strip-tease no seu aniversário de namoro do ano passado. You
Can Leave Your Hat On, de Joe Cocker. Já tinha uma coreografia
pronta, a única dificuldade seria ter que segurar a lanterna com uma
mão e fazer a coreografia somente com a mão livre. Colocou a
lanterna e o celular na escrivaninha. Em seguida, fechou a porta e
desligou a luz. O quarto ficou imerso em completa escuridão, então
tirou rapidamente o vestido. Ela pegou o celular e espelhou a música
escolhida para o aparelho de som, deixando-o na escrivaninha e
pegando novamente a lanterna.

— You Can Leave Your Hat On? Sério, Fiona? — Ouviu Gabriel
rindo. — Você sabe que não vai funcionar! Você já dançou essa
música para mim, eu quase morri de tanto rir.

Antes de Isadora dançar para o namorado, fez uma apresentação


para o amigo avaliar se estava sexy e provocante. Na época, Gabriel
não parou de rir, e ela desistiu no meio da demonstração. Teria que
ser criativa para isso funcionar.

O quarto estava imerso na escuridão, não conseguia enxergar


nada. Malditas cortinas com blecaute! Gabriel estava ficando
preocupado, não devia ter aceitado essa aposta absurda. A luz da tela
do smartphone acendeu, e suspirou aliviado quando ouviu a música,
ia ser fácil ganhar essa aposta.
— Nova regra, você precisa ficar calado! — Ele revirou os
olhos, mas ela não viu, devido ao completo breu.

— Mas pode rir? — perguntou, já rindo de antecipação.

— Shhh... Agora você vai ter que reiniciar a música — disse,


jogando uma coisa dura nele. Ele pegou, era o celular. — Quando eu
falar três, você inicia. 1, 2, 3... — Gabriel reiniciou a música e se
acomodou melhor nos travesseiros, isso ia ser divertido.

O quarto continuava completamente escuro. Ela acendeu a


lanterna e focou a luz em direção aos dedos da mão que se mexiam
lentamente, no ritmo da música. Pela altura, ele supôs que estavam
acima de sua cabeça. Estranho, não era assim que iniciou a
coreografia da última vez. Na época, ela tinha iniciado se esfregando
na parede e jogando os cabelos para a frente. Foi realmente
engraçado. Se fosse outra mulher, provavelmente ele teria achado
sexy.

Bem lentamente a luz começou a descer pelo braço, até alcançar


o ombro, e ele viu a alça vermelha do sutiã. Lingerie vermelha, por
essa ele não esperava. A luz seguiu mostrando a curva do pescoço
até alcançar o outro ombro. Tudo ficou escuro e Gabriel percebeu
que estava prendendo a respiração em expectativa, e ainda nem tinha
visto os seios dela.

A luz reapareceu, e para sua surpresa agora estava no pé dela,


posicionado em cima da cadeira. Ela usava a sandália alta de strass, e
agora se movia no ritmo da música. Sinceramente, Gabriel nunca viu
muita graça nos pés, sabia que existiam pessoas que eram fissuradas
neles, mas não era o caso dele. Porém, aquela simples visão estava
inebriante.

A luz começou a subir lentamente e ele pôde observar o


contorno da panturrilha torneada, os joelhos, a coxa grossa, e a luz
sumiu. Percebeu que ela estava provocando. Até o momento não
tinha mostrado nada realmente, e ele já sentia a adrenalina
circulando por seu corpo. Isso ia ser mais problemático do que
imaginou a princípio.

A luz apareceu agora no abdômen reto, e seguiu tortuosa até a


lateral do corpo e desceu. A tira da calcinha era larga e de renda
vermelha. Ela colocou uma mão por dentro da tira, fazendo-a
desencostar do corpo. A forma como aquela mão passava pelo
quadril voluptuoso era muito sensual. A luz apagou. Acendeu dessa
vez no ombro, desceu bem lentamente em direção ao centro, e ele
vislumbrou a alça fina do sutiã novamente, seguindo, e dessa vez viu
a renda vermelha e o volume do seio redondo, saltando do decote
conforme respirava. Gabriel se mexeu desconfortável na cama. Por
mais que quisesse negar, estava ficando assustadoramente excitado.
Nesta hora ele soube que tinha uma grande probabilidade de perder a
aposta. Respirou fundo e tentou pensar em algo para distrair sua
atenção da provocação à frente.

Melhor lembrar de alguma coisa bem entediante e sem graça.


Tentou evocar algo, mas tudo lhe fugia da mente. A verdade é que
não conseguia desgrudar os olhos dela. Naquele momento, ela
passava a mão livre por cima do sutiã, se tocando, e isso estava
muito sexy. Ele começou a se imaginar tocando-a. FOCO!, se
repreendeu mentalmente.
Já que não conseguia mesmo pensar, melhor fechar os olhos.
Isso, ia fechar os olhos. Fez isso com mais relutância que imaginou
ser possível. Mesmo sem vê-la, sentia um formigamento por todo o
corpo, que ele sabia exatamente o que era. Tensão sexual. Ele estava
extremamente alerta e não olhar serviu como um combustível, como
se fizesse parte do jogo, fazendo o seu desejo aumentar.

Abriu os olhos e imediatamente ficou com a boca seca. Ela


estava focando a lanterna na bunda, de costas para ele, e aquela visão
da renda delicada, do fio dental e do bumbum redondo o deixou
profundamente excitado. Sua amiga dançava no ritmo da música e a
lanterna começou a subir. Ele visualizou a cintura fina, o sutiã e ela
parou ali, não dançava mais.

A mão livre foi em direção ao feche e com dificuldade ela


tentava soltá-lo. Percebeu que estava torcendo para que conseguisse
logo, normalmente riria dela, tentando tirar o sutiã, desengonçada,
com uma mão só, mas agora, essa dificuldade se tornou sensual,
como se fosse uma provocação ou fingimento, uma encenação
somente para deixá-lo com mais expectativa para o que viria.

Por fim, ela conseguiu e a lanterna tornou a desligar. Já estava


extremamente duro e resolveu interromper o showzinho antes que
fosse tarde demais. Independentemente de ela ter conseguido fazer
ele subir, essa aposta era completamente infundada. Só aceitou
porque jurava que ela não ia conseguir.

Nunca subestime o poder de uma mulher.

O fato é que não podia transar com a sua melhor amiga, isso era
algo indiscutível. Ia dar a vitória para ela e convencê-la que isso
tudo era loucura e certamente uma péssima ideia. No momento em
que ia manifestar sua resolução, a lanterna voltou a acender,
novamente no ombro, mas dessa vez a alça do sutiã estava frouxa.
Ela ia mostrar os seios.

— Isadora, o desafio acabou.

— Subiu? — perguntou com expectativa. Isso ia ser bem difícil


de admitir.

— Você sabe que sim. Agora se veste e senta aqui, precisamos


conversar.

Ela focou a luz na mesa de cabeceira ao lado da cama, seguiu


até lá, ligou o abajur e desligou a lanterna, deixando-a ali. Uma fraca
luz iluminou o quarto e ele pôde vê-la completamente. Estava
realmente linda e gostosa.

Gostosa?! Desde quando Isadora é gostosa? Deve ser efeito da


bebida, será que batizaram com alguma droga?

Ela segurava o sutiã ainda solto com as mãos delicadas.

— Eu não quero conversar. Quero o meu prêmio. — A música


ainda estava tocando e ela começou a se mover sensualmente,
baixando uma alça do sutiã com o movimento do ombro, depois a
outra alça, e virou de costas para ele. Tirou a peça de lingerie e
jogou para trás, caindo em cima da cama.

Gabriel procurou o celular entre a colcha, e assim que o


encontrou, parou a música. Tinha que cortar o clima urgentemente.
Ela grunhiu, frustrada, e se virou em seguida. Segurava os dois seios,
cada um com uma mão, escondendo-os. Ela sorriu travessa, olhando
para o volume evidente na cueca dele. Ele puxou rapidamente um
travesseiro para esconder.

— Por que você tirou a música? — perguntou, manhosa. — Não


preciso de música.

Começou a imitar a batida da música, mexendo novamente os


quadris.

Caramba! Isso é ainda mais sexy.

Ela desceu uma mão, revelando o seio perfeito e a aréola


rosada. A mão continuava a descer sensualmente até alcançar a
calcinha, e para surpresa dele, ela não parou. Seguiu até o meio das
pernas e gemeu, enquanto se tocava intimamente. Se algum dia ele
teve alguma visão mais erótica, desconhecia. Levantou rapidamente
da cama, largando o travesseiro e ignorando a ereção. Pegou a colcha
da cama, foi até ela e a cobriu, enrolando o tecido no seu corpo. Ela
parou de se tocar e se desvencilhou da colcha, que caiu no chão.

— Essa brincadeira foi longe demais — advertiu, surpreso de


como sua voz saiu falhada.

— Estou muito molhadinha, Gabriel — sussurrou com a voz


rouca pelo desejo, se aproximando dele e tocando no tórax por cima
da camisa.

Essa fala, a voz e o toque fizeram um calor percorrer todo o seu


corpo, indo parar na virilha. Uma mão subiu até sua nuca, enquanto a
outra desceu rapidamente, e antes que ele pudesse protestar, ela
rodeou seu membro ainda por cima da cueca boxer.
— E não é que subiu?! — Ela passou a mão por todo o volume,
fazendo-o gemer. — É enorme — afirmou, mordendo o lábio
inferior.

Ouvi-la dizer isso o encheu de prazer.

— Você não está facilitando — suspirou e pegou o pulso dela,


fazendo-a soltá-lo. Segurou ela pelos dois ombros, guiando-a até a
cama. — Senta. — Ela obedeceu relutante e ele pegou a colcha do
chão e jogou em cima dela. — Nós não vamos fazer sexo. Bebemos
muito, você passou por muita coisa esse mês e não tenho dúvida que
vamos nos arrepender amanhã. Vai dormir! — Saiu do quarto sem
aguardar uma resposta, fechando a porta atrás de si.

Até conversar com ela nesse momento era perigoso. A verdade


era que nunca desejou tanto alguém e estava extremamente confuso
com isso. Nada disso sequer passou por sua cabeça algum dia, e isso
estava deixando-o atordoado.

Que merda!

Deixou a calça dentro do quarto e não tomou banho, mas era


melhor não voltar. Reclinou o sofá, desligou a luz e deitou. Por sorte,
tinha comprado um sofá grande e confortável. Pegou uma almofada
como travesseiro e fechou os olhos. Não conseguia dormir, seu corpo
estava todo alerta, a imagem dela se tocando não saia de sua cabeça.
Quando fechava os olhos, parecia que um filme se passava em sua
mente. E isso não ajudava nada a diminuir sua dolorosa ereção.
Poderia resolver o problema com as mãos, mas se negava a fazer isso
pensando na sua melhor amiga. Ele ouviu um barulho, era baixo
demais para conseguir identificar.
— Ai! — Ouviu uma voz bem perto e em seguida um corpo
caiu sobre o dele. — Bati meu pé no sofá — choramingou.

— Isadora, eu disse para você dormir! — reclamou. Segurou a


respiração quando sentiu as mãos dela tocando todo o seu tórax e
subindo até sua boca. — O que você está fazendo? — Mas logo ele
soube. Ela se arrastou mais, subindo até ficar na altura dele. Estava
muito escuro e ela estava tentando identificar onde estava sua boca.

— Estou muito excitada para dormir. — Estava tão próxima que


ele podia sentir sua respiração batendo contra sua pele, e logo seus
lábios se tocaram.

Ela segurou seu rosto com as duas mãos enquanto pressionava a


boca contra a sua. Gabriel se tornou ciente dos seios contra o seu
tórax e das duas pernas que ela abriu, uma de cada lado de seu
quadril, pressionando a virilha de encontro a sua. Ele soltou um
gemido com essa pressão e toda sua força de vontade se esvaiu.
Afastou-a levemente, para poder falar.

— Tem certeza que não está bêbada?

— Claro que não. — Ela beijou-o novamente, e dessa vez ele


não ofereceu resistência.

Gabriel aprofundou o beijo, invadindo sua boca com a língua, e


subiu uma mão para o seio e outra para as nádegas redondas. Sentiu
a renda e o fio dental sobre os dedos e soltou mais um gemido. Ele se
sentia como um adolescente descobrindo o sexo, estava afoito,
necessitado e desesperado para senti-la. Isadora afastou os lábios
dele e sussurrou:
— Quero sentir você! Agora!

Pareceu que ela tinha lido sua mente.

— Espera aqui, eu vou buscar uma camisinha — suspirou,


frustrado. — Deixei a minha calça no quarto. — Segurou-a pela
cintura, para afastá-la.

— Não! Não precisa disso — ela disse, beijando-o novamente.

Gabriel nunca fazia sexo desprotegido, mas era Isadora. Se


tinha alguém que ele conhecia bem era ela. Sabia, inclusive, que seu
único parceiro fora Paulo. As chances de doença eram menores, e
foda-se, ele queria senti-la completamente. Ela estava há anos num
relacionamento sério, e lembrava de tê-la visto tomar contraceptivo
algumas vezes. Decidido, deslizou a mão entre eles, descendo até
alcançar a calcinha de renda. Colocou a mão dentro dela e sentiu a
pele macia e lisa. Ela estava completamente depilada, depois ele
faria questão de ver. Alcançou seu clitóris e estimulou-o, fazendo-a
gemer. Colocou um dedo dentro dela, sentindo-a muito molhadinha.

— Por favor, Gabriel! — suplicou contra sua boca.

Esse metade gemido e metade grito, expressava toda a sua


necessidade também. Baixou a cueca, só o necessário, e afastou a
calcinha dela para o lado, sentindo-a livremente. Antes que ele
pudesse agir, Isadora sentou com força, e ele sentiu-a o envolvendo
completamente. Gemeu devido à surpresa e prazer, estava tão afoita
quanto ele. Ela abandonou o beijo. Subia e descia, ele estava ficando
louco com aquela fricção, tão quentinha, molhadinha e apertadinha.
O fato de nunca ter feito sem camisinha fez a experiência ser
indescritível. Podia senti-la inteiramente, pele com pele. Queria ligar
a luz e vê-la, mas morreria antes de sair dali para chegar até o
interruptor, e como ela rebolava em cima dele, estava perdendo o
controle completamente.

Começou a gemer e tentou se controlar trincando os dentes.


Queria que ela chegasse junto, e estimulou seu clitóris com
movimentos circulares, mas não aguentou. E foi assim, muito rápido,
que ele atingiu o clímax. Se odiou, porque queria fazê-la sentir o
mesmo prazer.

Porra!

E nesse momento soube que estava realmente muito bêbado.


Isso só acontecera uma vez, aos dezesseis anos, quando ficou
extremamente embriagado e transou com uma amiga da sua mãe.
Isadora aparentemente não percebeu que ele havia gozado, já que
continuou rebolando em cima dele. Praguejando, Gabriel sentou,
beijando-a, e num movimento rápido ele inverteu as posições,
colocando-a abaixo de si. Ela emitiu um grunhido de surpresa. Ele
começou a beijar seu queixo, seu pescoço, e ficou ali, chupando-o.
Sentiu que toda a pele dela arrepiava e ela soltou um suspiro de
prazer. Fez um trajeto até os seios, enquanto uma mão tocava e
acariciava um, com a língua ele envolveu o outro, depois o
abocanhou, chupando-o.

Agora, Isadora não parava de gemer, e isso fazia ele sentir um


prazer enorme. Ela começou a movimentar o quadril, fazendo-o
perceber que estava excitado novamente. Abandonou o seio e
começou a dar estocadas fortes. O barulho dos corpos se unindo, o
cheiro dela misturado com o cheiro de sexo, a sensação de sentir
entrando e saindo dela, estava deixando-o doido, mas dessa vez ele
não ia perder o controle.

Começou a estimular seu clitóris novamente, sem parar de


penetrá-la. Rapidamente, ele sentiu-a estremecer. Isadora emitiu um
grito ininteligível e alto. Ele podia sentir as contrações o
envolvendo. O prazer foi tão grande de saber que ela tinha alcançado
o êxtase, que ele gozou novamente, desabando sobre ela, agora
totalmente satisfeito.

— Nossa! — Isadora exclamou, lânguida. — Esse foi o melhor


sexo da minha vida!

— O meu também! — ele disse, beijando o pescoço dela e se


erguendo em um braço.

Gabriel levantou, rindo, quando ela protestou pelo abandono, e


ligou a luz, precisava ver o rosto dela. Deitou ao seu lado e ficou
admirando a sua beleza. Parecia satisfeita e feliz. Afastou uma
mecha de cabelo que estava quase em seu olho. Ela bocejou.

— Vamos tomar um banho antes de dormir — avisou.

— Ah, não! — reclamou, se espreguiçando.

Ele sentou, puxou a calcinha dela e deu um beijo em seguida na


pele lisinha e recém-descoberta. Levantou e tirou a cueca e a camisa.
Ajudou ela a se levantar.

— Vamos! — Arrastou-a até o banheiro do quarto, rindo da


resistência dela.

— Quero água quente — pediu, manhosa.


— Seu desejo é uma ordem — gracejou.

Ele entrou com ela no boxe e ligou a água quente. Ela ficou
embaixo do chuveiro e deu um suspiro satisfeito. A água escorrendo
pelo corpo voluptuoso era muito estimulante. Gabriel a ajudou a
lavar o cabelo e se ensaboar, adorando essa parte. Quando ela estava
pronta, foi a vez dele, e embaixo do chuveiro lavou os próprios
cabelos.

— Vou te ajudar — Isadora disse, entusiasmada, pegando a


esponja ensaboada e passando pelo tórax e abdômen dele. Largou a
esponja, que caiu no chão, e tocou-o. Ele reagiu muito rápido àquele
toque safado.

— Você ainda não cansou? — perguntou, rindo, mas já puxando


ela para um beijo.

Ele a virou de frente para o azulejo e começou a beijar sua nuca


e pescoço. Uma mão foi para o seio e a outra entre suas pernas.
Estimulou-a, fazendo-a gemer. Colocou um dedo nela e gemeu ao
constatar que estava pronta para ele. Posicionou-a e abriu mais suas
pernas, e ela empinou o bumbum para facilitar o seu acesso. Ele
começou a penetrá-la, posicionado atrás dela, sem parar de tocá-la.
Dessa vez, ela gozou muito rápido, se contraindo e encharcando-o.

— Que gostosa! — ele gemeu, gozando logo em seguida. A


abraçou e beijou o topo da sua cabeça.

Gabriel ajudou-a a se limpar e saíram do boxe. A secou com a


toalha, se secou e foram para a cama. Isadora deitou, e ele desligou a
luz antes de se juntar a ela e puxá-la para ficarem de conchinha.
Beijou três vezes o pescoço dela.
— Boa noite, Fiona! — disse, mas ela não respondeu, fazendo-
o perceber que já tinha adormecido. Achou que não conseguiria
dormir depois dessa noite insana, mas estava tão cansado e satisfeito,
que dormiu rapidamente.
I sadora acordou com muita sede. Abriu os olhos e percebeu
que estava tudo escuro. Sua cabeça latejava muito e sentiu um
embrulho no estômago. Tentou levantar, porém algo a
segurava, era um braço. Tirou-o de cima de si e sentou. Percebeu que
estava nua, completamente nua. Tentou lembrar o que aconteceu na
noite anterior, o pânico a dominando. A última coisa que lembrava
era que estava na festa e beijara um homem. Será que era ele ali? Ela
não sabia seu nome, quem era ou o que fazia da vida. Não gostava
dessa sensação, o que estava pensando, afinal?

Sentiu um movimento ao seu lado e um frio na barriga pela


tensão.
— Acordou, linda? — A voz extremamente familiar penetrou
seus ouvidos, trazendo uma descarga de alívio seguida de pavor, mas
logo ela relaxou.

Tinha uma explicação certamente plausível para estar ali,


pelada, com o Gabriel, afinal, era o Gabriel.

— Acordei! Estou com muita sede e dor de cabeça também —


falou, deitando novamente na cama. — Pode me explicar porque
estou pelada e descoberta? Vou confessar que fiquei meio apavorada
quando acordei, por um segundo pensei que a gente... você sabe! —
disse, rindo. — Como se isso fosse possível.

Silêncio.

— Gaby? Você dormiu?

— Não, estou acordado. — Ela o ouviu suspirar. Ele lhe


entregou uma coberta. — Toma, se cobre.

Isadora sentiu um movimento na cama e soube que ele tinha


levantado. Aguardou, imaginando que ele ligaria a luz, mas Gabriel
foi direto para o banheiro. Assim que abriu a porta, uma luz iluminou
Gabriel e uma parte do quarto. Ela estreitou os olhos devido à
claridade repentina, mas antes que ele fechasse a porta, ela o viu. Ele
também estava completamente pelado.

Ela tentou se convencer que tinha uma explicação lógica para


isso, tinha que haver.

Não é porque duas pessoas adultas acordam nuas na cama,


após uma noite de bebedeira, que quer dizer que fizeram sexo! É
lógico que não! Existe nu artístico, praia de nudismo, naturalismo, e
sabe-se lá as infinitas outras possibilidades que não sei.

Tentou se imaginar beijando Gabriel. ECA! Riu de si mesma,


eles nem faziam o tipo um do outro, estava fazendo tempestade em
copo d’água. Ia aguardar a explicação dele. Seu amigo saiu do
banheiro e ligou a luz do quarto. Estava com uma toalha enrolada no
quadril, o cabelo molhado e muito sério.

— Vou pegar água para você. — Andou um pouco e se abaixou,


pegando algo e jogando na cama. — Pode se vestir. — Foi até o
closet, retornando com uma roupa no braço.

Ele saiu do quarto e fechou a porta. Isadora pegou o vestido e


levantou rapidamente para se vestir, mas tudo girou e sentiu uma
ânsia muito grande. Saiu correndo para o banheiro, por sorte a tampa
do vaso estava levantada. Vomitou muito. Percebeu que na pressa
jogou o vestido no chão, então abaixou-se com cautela para pegá-lo,
com receio de enjoar novamente, e o pendurou no suporte de toalha.

Fechou a porta do banheiro, lavou o rosto e escovou os dentes.


Olhou seu reflexo no espelho, estava detonada. A maquiagem estava
borrada e o cabelo volumoso e desgrenhado de uma maneira épica.
Passou as mãos por ele e sentiu vários nós. Resolveu fazer um coque
alto, prendendo com o próprio cabelo. Enquanto terminava, observou
uma mancha no pescoço. Virou levemente o rosto para observar
melhor. Era um chupão. Arregalou os olhos.

Começou a se analisar criticamente. Tocou os lábios, estavam


inchados e ressecados, como se tivesse beijado muito na noite
anterior. Se mexeu, inquieta, e percebeu um incômodo entre as
pernas. Seu coração começou a bater muito forte, as mãos suaram,
sua boca ficou seca. E a verdade estava ali, não dava mais para
negar.

Colocou o vestido rapidamente e saiu do banheiro. Gabriel


estava sentado na cama, com os braços apoiados nos joelhos e
segurando um copo de água. Estava usando somente uma bermuda
branca. Já era acostumada a vê-lo sem camisa e até mesmo de sunga,
mas agora que tinha visto ele pelado, isso a perturbou de alguma
forma. Não conseguiu desviar o olhar.

Ele levantou e entregou o copo para ela, junto com um


comprimido branco.

— Vai ajudar com a dor de cabeça. — Ela agradeceu e percebeu


que sua mão tremia enquanto aceitava o copo. Ele foi até o closet e
voltou com uma camisa cinza e a vestiu, deixando-a aliviada.
Engoliu o comprimido e bebeu toda a água.

— Gaby, o que aconteceu ontem?

— Você realmente não lembra? — perguntou, franzindo a testa,


ele parecia muito angustiado.

— Nós... transamos? — Sua voz era só um sussurro. Ele


confirmou com a cabeça, mas ela não precisava de confirmação, já
sabia a resposta.

Andou de um lado para o outro pelo quarto. Estava chocada.


Como algo assim pôde acontecer entre eles? Não! Não era possível,
Gabriel estava pregando uma peça nela. Ele era sempre tão
implicante. Virou os olhos.
— Se isso for uma brincadeira, eu te mato! — ameaçou.

Esperou alguma reação, uma gargalhada ou um comentário


irônico, mas ele continuou parado, fitando o chão.

— Meu Deus! A gente realmente fez isso?

— É o que estou te falando.

— Que merda! — Então era de fato verdade. — Que loucura!


— Riu nervosamente. Graças a Deus não lembrava de nada.

Se eu não lembro, não fiz!

A frase favorita de Marcela veio em sua mente e ela começou a


rir. Gabriel olhou preocupado para ela, estava tendo um acesso de
riso. Quando sua crise passou, respirou fundo e conseguiu pensar
melhor.

Foda-se! Eu não lembro mesmo.

— Meu Deus, essa noite foi insana! — Após o choque inicial,


tinha recobrado o bom humor.

— Até que parte você se lembra? — perguntou com cuidado.

— Lembro do carinha que eu beijei.

— Cara? — disse, confuso. — Não vi você beijar nenhum cara.


— Agora quem estava confusa era ela. Ele pareceu perceber e
explicou: — Você beijou a Marcela ontem.

— Não pode ser, você está de sacanagem comigo — exasperou-


se, mas pela sua expressão, não era brincadeira.
— É verdade, nunca imaginei que Fiona tivesse tendências
bissexuais. — Ele deu de ombros.

— Seu palhaço. — Empurrou seu ombro. — Que porra! Eu


estava muito louca mesmo.

— Você só lembra da festa, então? — Ela anuiu com a cabeça.


Ele passou as duas mãos nervosamente pelo cabelo e andou de um
lado para o outro dentro do quarto. Parou de repente e socou a parede
próxima. — Que droga! Eu me aproveitei de você bêbada. Esse
tempo todo eu fiquei protegendo você de caras babacas, sendo que eu
era o mais babaca de todos.

— Senta na cama, Gabriel. — Ele respirou fundo e sentou.

A ruiva colocou o copo vazio na mesa de cabeceira, sentou-se


ao seu lado e pegou as duas mãos de seu amigo. Não lembrava de
nada, mas se tinha uma coisa que Isadora tinha certeza é que seu
amigo nunca seria babaca com ela ou faria algo contra sua vontade.

— Olha para mim. — Com relutância, olhou para ela, e pôde


ver dor nos olhos azuis. — Tenho certeza que você não se aproveitou
de mim. Se aconteceu algo, foi porque tinha que acontecer.

Ele suspirou.

— Isa, o que aconteceu ontem foi surreal... Eu preciso que você


saiba que eu não planejei isso, na verdade, eu nem imaginava que
isso pudesse acontecer entre a gente.

Se tinha uma coisa que Isadora tinha certeza é que transar com
ela não estava nos planos do seu amigo. Ele teve inúmeras
possibilidades para se aproveitar dela bêbada, ao longo da amizade
deles. Aos dezessete anos, os pais de Gabriel viajaram, e eles
fizeram uma festinha somente com convidados mais íntimos,
surrupiaram um uísque do escritório do pai dele e tomaram um porre
daqueles.

Depois que os seus amigos foram embora, ele colocou-a em um


quarto de hóspedes e entregou uma toalha para seu banho. Enquanto
Gabriel organizava a bagunça da casa, Isadora saiu à sua procura.
Assim que o encontrou, largou a toalha, deixando-a cair no chão, e
ficou completamente nua à sua frente. Porque ela fez isso não sabia
dizer, parecia que tinha outra personalidade bêbada, sempre fazia
coisas imprevisíveis e que certamente não faria sóbria. Na ocasião,
seu amigo a cobriu, levou-a novamente até o quarto e mandou-a
dormir. E essa foi só uma dentre várias situações que já ocorreram, e
ele nunca demonstrou o mínimo interesse.

Além disso, Isadora não fazia o tipo dele. Gabriel tinha uma
preferência por loiras, magras e peitudas. A descrição perfeita de
Clara, seu grande amor do passado. Desconfiava que seu amigo
nutria uma paixão mal curada pela loira e buscava em outras algo
que só encontraria nela. Diferente de todas essas mulheres, Isadora
era ruiva, cheia de sardas e magra, mas seu quadril era grande
demais para o padrão modelo/Barbie que ele era acostumado, e seus
seios eram medianos e sem graça.

— Pode parar de se justificar, é óbvio que você não planejou.


— Ele soltou as mãos dela e pressionou a têmpora.

— Estou com uma dor de cabeça muito forte. — Ele franziu a


sobrancelha. — Eu não entendo como você não consegue se lembrar,
fizemos sexo mais de uma vez, até tomamos banho juntos.

Ela ainda estava assimilando toda a história e a palavra surreal


dita anteriormente por seu amigo fora bem acertada. Explicava muito
bem os seus sentimentos. Se não fosse a seriedade dele ou os
indícios de uma noite de sexo intenso, ela acharia muita graça de
tudo isso e teria certeza que era somente brincadeira de Gabriel.

— Como isso aconteceu?

— Depois que voltamos para casa, você chegou à conclusão que


eu era um homem. — Ele deu um sorriso sem graça. — Então tentou
me convencer e fez uma aposta.

— Que aposta?

— Eu disse que mesmo sendo homem, eu não levantaria para


você. Então você apostou que conseguiria, sem usar toques. Caso
você perdesse, lavaria o banheiro por um mês; caso eu perdesse,
teríamos que fazer sexo.

— Então eu consegui! — ela afirmou, assimilando tudo. Isso


certamente era algo que faria bêbada. — Confesso que eu estava com
um plano de te embebedar.

— Por quê? — indagou, franzindo a testa.

— Eu queria que você aprovasse um companheiro de foda, mas


você estava descartando todos — reclamou. — Então achei que só ia
conseguir sua aprovação te embebedando.

— Isa, eu estava dando minha opinião, lógico que quem iria


decidir era você — disse, indignado. — Se eu não tivesse bebido
tanta tequila, eu teria conseguido resistir. — Estava consternado.

— Para de drama, Gabriel! — Virou os olhos para o amigo.

— No fim, eu acabei sendo teu companheiro de foda. — Deu


um sorriso sem graça.

— E como eu fiz para ganhar a aposta? — perguntou, curiosa.

— Você fez uma performance de You Can Leave Your Hat On.
— Ela sorriu, erguendo uma sobrancelha, descrente.

— Não! — gritou, divertida. — Mas você riu tanto da última


vez, não acredito que foi isso que te seduziu!

— Ah, mas você não fez aquela coreografia ridícula. — Ela


bateu em seu ombro.

— Para! — Os dois riram.

Estava mais tranquila, era muito fácil conversar com Gabriel.


Eles passariam por esse obstáculo na amizade sem grandes danos.

— Fico muito feliz por saber que isso não vai afetar nossa
amizade. Confesso que o fato de não lembrar ajuda bastante. — Ele
desviou o olhar, cabisbaixo.

— Eu não tenho esse benefício — suspirou resignado.

— Está tudo bem para você? Se precisar de espaço, eu posso ir


para a casa de uma das meninas.

— Claro que não, você pode ficar o quanto precisar.

— Não vai ficar estranho?


Ele levantou e esfregou a mão no topo da cabeça dela, fazendo
o coque se desfazer.

— De jeito nenhum, Fiona. — Fez o mesmo cumprimento de


quando eram crianças.

— Ai, Gaby, não precisava fazer isso, você sabe que eu não
gosto! — Começou a refazer o penteado.

— Agora vou passar um café, pois estou faminto. — Ele saiu do


quarto e deixou-a sozinha.

Como assim ela não lembra?

Tivera o melhor sexo da sua vida e ela simplesmente não


lembrava. Inicialmente acreditara ser algum mecanismo de defesa,
vergonha ou que ela queria sondar o terreno. Porém, conforme
conversavam, se convenceu que ela estava sendo sincera. Gabriel a
conhecia muito bem, o suficiente para reconhecer em suas
expressões ou comportamentos se estava incomodada, nervosa, triste,
mentindo ou brincando. Essa percepção era muito natural para ele,
talvez porque cresceram juntos ou por Isadora o ter escolhido como
confidente.
Acordou com um misto de emoções: alegria, confusão, desejo,
nervosismo. Tudo foi tão inacreditável, que ainda pensava que seu
cérebro lhe pregara uma peça. Talvez tudo não passou de efeito do
álcool, mas já fizera sexo bêbado diversas vezes antes e nunca sentiu
nada igual. Acordou com muito desejo, queria saber se
completamente sóbrio sentiria o mesmo e isso era algo que ele nunca
descobriria.

Se eu jogar o carro no poste terei amnésia?

De repente, esse pensamento pareceu extremamente tentador, e


para piorar estava com uma ressaca desgraçada e se sentindo
culpado. Não importava o que Isadora pensava, que espécie de amigo
ele era? Independentemente da grande quantidade de álcool que
ingeriu, tinha obrigação de se comportar, exigia que todos os homens
fossem respeitosos com ela, e o que ele fora? Um tremendo
cafajeste! Terminou de passar o café e dispôs tudo na mesa,
colocando as xícaras, os pires, talheres, pães e queijo. Sentou e ficou
esperando, ela estava demorando mais que o normal.

O pior de tudo era a culpa que sentiu quando percebeu que ela
não se lembrava de nada. Ela era sua melhor amiga, deveria ter
resistido à mulher sedutora que se transformou. Não suportava
homens que se aproveitavam de mulheres bêbadas, e a ressaca mais
dolorida era justamente a moral. Passados alguns minutos, Isadora
saiu do quarto, estava com o cabelo molhado e usando outro vestido.
O cabelo solto e úmido fez reviver na sua mente o sexo no chuveiro.
Se mexeu desconfortável na cadeira, quase teve uma ereção só de
olhar um cabelo molhado.
Mas que porra é essa?

Desviou o olhar, se concentrando na térmica de café. Percebeu


que sua mão estava tremendo, precisava se acalmar ou ia acabar
derramando o líquido na mesa.

— Desculpa a demora. Precisei tomar banho, meu cabelo estava


indomável — disse, rindo. Ele lavara seus cabelos na noite anterior,
provavelmente era muito ruim nesse trabalho. Optou por mudar de
assunto.

— Tudo bem! O que você está planejando fazer hoje? —


perguntou enquanto montava seu sanduíche.

— Não sei, estava pensando que a gente podia terminar aquela


série. Você tem alguma outra ideia? — indagou, servindo seu café. A
série poderia distraí-lo e fazer essa tensão sexual que sentia sumir.

— Não tenho, pode ser.

— Ainda tem aquele bolo de chocolate?

— Tem, está na geladeira. — Isadora levantou animada e saiu


na sua busca.

— Achei — comemorou antes de retornar. Depois sentou,


pegou um pedaço com as mãos e comeu, saboreando. — Nossa, é
muito gostoso! — Chupou os dedos que sujaram com o chocolate da
cobertura, antes de tomar um gole de café.

Ela sempre fazia isso, mas essa imagem jogou uma descarga de
energia no seu corpo. Gabriel pegou um pires e uma colher e colocou
na frente dela.
— Pega, para você comer o bolo — explicou.

— Você sabe que eu prefiro comer com a mão, tem muito mais
sabor. — Ela empurrou a louça para o lado.

— É necessário — disse, meio irritado.

— Por quê?

Porque me excita te ver chupando os dedos!

Certamente essa resposta não era uma opção.

— Porque... — Pensou por um segundo. — Você pode acabar


sujando a toalha.

Ela assentiu com a cabeça, pegando novamente o pires.

— Você tem razão. Agora que estamos morando juntos, eu


preciso ser cuidadosa. Uma mancha de chocolate eventualmente é
diferente de uma todo dia — disse com um sorriso sem graça.

IDIOTA!

Desse jeito ela ia pensar que ele era um cretino. Não estava
conseguindo agir naturalmente, normalmente ele implicava com
organização e limpeza, mas agora tudo parecia errado ou impróprio.

— Esquece, você pode comer como sentir vontade.

Teria que se afastar, só hoje. Somente até sua mente e seu corpo
voltarem à normalidade. Mas não podia deixar Isadora sozinha, era o
segundo dia que não chorava e não queria que ela tivesse nenhuma
recaída.
— Isa, será que a Ana não pode ficar com você hoje? Lembrei
que eu tenho que buscar o carro, voltamos de Uber ontem, e depois
eu tenho um compromisso.

— Posso ver com ela, mas eu queria tanto terminar a nossa


série. Você vai demorar muito?

— O dia todo.

— Sério? O que você vai fazer?

O que eu vou fazer?

— Eu prefiro não falar, se você não se importar.

— Claro, tudo bem.

Mas não estava tudo bem, Gabriel percebeu que ela ficou
nervosa e o clima ficou muito estranho. Estava sendo ridículo, mas
precisava de um tempo a sós. Depois eles se entenderiam e tudo
voltaria a ser como antes.

Júlia e Marcela não responderam suas mensagens e nem


atenderam sua ligação. Ana estava em Ubatuba com sua família,
então mentiu para Gabriel que sua amiga estava a caminho e ficou
sozinha em casa. Tentou assistir uma comédia romântica, mas não
conseguia prestar atenção na história. Escolheu um livro no Kindle e
começou a sua leitura, mas passados alguns minutos desistiu de ler.
A história não conseguia lhe prender, a verdade é que queria seu
melhor amigo ali, do seu lado.

Não era boba, e percebeu que Gabriel estava muito estranho.


Falar que preferia não lhe dizer o que ia fazer? Conhecia-o muito
bem e podia afirmar que normalmente ele lhe contaria qualquer coisa
sem o mínimo pudor. Entre eles não existia julgamentos ou
represálias, somente aceitação e compreensão, sempre foi assim. Se
ele fosse assaltar um banco, certamente lhe contaria.

A amizade deles estava comprometida, precisava fazer alguma


coisa urgente. Provavelmente era tudo devido ao sexo. Sabia que seu
amigo tinha pavor de ficar com uma mulher mais de uma vez, será
que seria tão difícil assim ficar perto dela? Será que a amizade deles
não era forte o suficiente para passar por cima dessa situação? Ou
será que Gabriel temia que ela fosse se apaixonar e ficar no pé dele
como tantas outras?

Lamentava amargamente ter bebido tanto, ia perder seu melhor


amigo e a culpa era toda sua. Se não tivesse sugerido que bebessem
tequila, nada disso teria acontecido. Por que Gabriel estava
demorando tanto? Por que suas amigas não falavam com ela? Sentia
um aperto no peito, uma vontade de chorar.

Será que Marcela ficou brava comigo? Será que fiz alguma
coisa ruim para Júlia também? Até Gabriel não quer mais saber de
mim.
Se ao menos lembrasse de tudo, seria mais fácil lidar com essa
situação. Passava das cinco horas da tarde quando Júlia ligou para
ela.

— Que merda, amiga, você sumiu, eu já estava ficando


preocupada! — reclamou.

— Isa, você não vai acreditar, tenho quase certeza que


colocaram droga nas nossas bebidas.

— Por que você acha isso? — perguntou, confusa.

— Amiga, eu fiquei muito ruim. Ângelo disse que eu parecia


estar na bad, e você estava eufórica demais. Como você está se
sentindo?

— Ah, Júlia, eu vomitei três vezes, não consegui comer nada,


estou muito ansiosa e também com uma ressaca moral horrível.
Estou com vergonha do que eu fiz ontem e me sentindo muito
culpada. Eu juro, nunca mais vou beber!

— Aham, sei — duvidou, rindo.

— Isadora, aqui é o Ângelo. Como você se sentiu ontem?


Quando a gente desceu do camarote?

— Você ainda está com a Júlia? — perguntou, chocada, afinal


os dois se conheceram noite passada e aparentemente tinham passado
o dia todo juntos.

— Ele ficou cuidando de mim, amiga. Aliás, está no viva-voz,


tá?
— Essas coisas você precisa avisar com antecedência, e se eu
falasse algo constrangedor?

— Relaxa, amiga, o Ângelo é confiável e é médico —


esclareceu, como se isso explicasse tudo.

Confiável? Será que teria que lembrar sua amiga que ela o
conheceu há menos de vinte e quatro horas? Até onde Isadora sabia,
ele podia muito bem ser um psicopata. Depois, em particular, teria
uma conversa séria com ela.

— Agora, Isa, responde o que ele te perguntou.

Como me senti ontem? Tomamos a última dose de tequila e me


senti muito leve, como se minha mente flutuasse, além de uma
animação enorme. Até que vi Marcela e Gabriel se beijando e fiquei
muito excitada. Meu Deus! Fiquei excitada com meus amigos? Não
foi à toa que Gabriel disse que beijei uma e transei com o outro.
Concentração... Depois agarrei um homem. É isso que lembro, mas
não darei todos os detalhes, pelo menos não com Ângelo ouvindo.

Então...

— Me senti leve, parecia que estava flutuando, depois veio uma


euforia muito grande e também fiquei muito excitada. Júlia, eu fiz
coisas que nunca me imaginei fazendo, e pior, não lembro dessa
parte constrangedora.

— É, meninas, acho que colocaram ecstasy na bebida de vocês.


Ele não colocou nada no meu uísque. — Ela ouviu o suspiro dele do
outro lado. — Acho que Eduardo só queria desinibir vocês, tornar a
conquista mais fácil, não sei.
— Que desgraçado! — Isadora esbravejou, lembrando da
sensação ruim que teve quando ele a tocou. — Sorte que o papo dele
era tão ruim que não consegui ficar nem dez minutos com ele.

— Fiquei curiosa, Isa, o que você fez de constrangedor que


nunca sequer imaginou? — sua amiga perguntou com malícia na
voz.

Ainda não sabia se queria contar para suas amigas sobre ela e
Gabriel.

— Beijei a Marcela, você não viu?

— O quê? — gritou. — Não acredito! Que loucura. — Ela riu


com vontade. — Ah, amiga, eu não estava vendo nada, estava
ocupada fazendo coisas constrangedoras também.

— Eu vi — Ângelo disse. — Foi um beijo intenso, bastante


sexy, para falar a verdade.

— Ângelo! — Júlia chamou sua atenção. — Vai deixar a


menina pior do que já está.

— Relaxem, meninas, vocês não precisam ficar com vergonha.


Misturaram tequila, champanhe e ecstasy. Sinceramente, acho que
vocês até reagiram bem, podia ter sido bem pior. — Imediatamente
sua voz ficou séria. — O que planejam fazer quanto a isso? Querem
denunciar o Eduardo?

Isadora começou a pensar sobre isso. O certo seria denunciar.


Lembrou da reação de Gabriel. Por perceber que estava tão bêbada
que esquecera tudo, já se sentiu extremamente culpado, imagina se
soubesse que estava drogada? Iria se culpar ainda mais. Se fosse
denunciar, ele acabaria sabendo. Não iria denunciar, decidiu, por
fim, mas antes que pudesse explicitar sua resolução, a amiga falou:

— Eu quero denunciar.

— Ai... eu não sei. — Respirou fundo. Isadora se sentia mal,


será que estava agindo bem? — Eu posso pensar um pouco mais?

— Claro, amiga, enquanto isso vou consultar um advogado.

— Eu vou com você! — Ângelo se ofereceu. — Isadora, saiba


que estaremos ao seu lado caso mude de ideia.

— Obrigada! — Isadora falou e ouviu um barulho de beijo.


Imaginou que sua amiga agradecera de outra forma. Levemente
constrangida, fingiu não ter escutado. — Ah, Júlia, você falou com a
Marcela hoje? — perguntou, afinal, precisava saber se sua amiga a
estava evitando propositalmente.

— Não, ia ligar para ela depois de falar com você.

— Se ela falar com você, me avisa?

— Claro. Bom, então vou desligar, amiga. Beijos.

— Beijos e obrigada pela orientação, Ângelo.

— Que isso, precisando é só chamar.

Depois que desligou se sentiu um pouco melhor. Agora tudo


começou a fazer sentido e não tinha como se culpar pelo que
aconteceu. Tentou comer um pão, mas nada assentava em seu
estômago, então acabou vomitando novamente. Quando era quase
seis da tarde, Marcela enviou uma mensagem no grupo “Friends 4
Ever”.

Marcela: Foi mal, meninas, não atendi ninguém. Eu


estava numa ressaca medonha, nunca mais quero ver
tequila na minha frente.

P.S.: Isa, eu adorei o beijo desentupidor de pia,


qualquer dia desses vou te convidar para jantar.

Isadora começou a rir, que bom que sua amiga levou na


esportiva.

Ana: O quêêê? Pelo visto perdi muita coisa.

Júlia: Perdeu, amiga. Rum, fiquei com ciúmes. Por


que ela escolheu você e não eu?

Marcela: Você não faz o tipo dela, ela curte loiras.

Isadora: É que a Marcela estava muito sexy naquele


vestido vermelho.
Marcela: Você que me ama, amiga Kkkk Gabriel falou
de mim?

Isadora: Amiga, ele passou o dia fora, ainda nem


conversamos.

Marcela: Acho que estou apaixonada. Meu Deus! Que


gato, que gostoso, que beijo, que pegada!!!

Júlia: Vocês todos conseguiram me chocar ontem,


nunca pensei que Gabriel fosse ficar com você. Ele
sempre pareceu te odiar.

Isadora: Confesso que eu fiquei surpresa também.

Marcela: Solteirões são assim, quanto mais gostam,


menos demonstram. Isa, você vai ter que me ajudar a
fisgar esse pra mim.

Isadora: Claro, amiga.


Elas se despediram. Era melhor não falar nada sobre a noite
anterior com suas amigas, não ia voltar a acontecer e podia acabar
magoando Marcela. Tomou um banho, e depois, com muita
insistência, conseguiu comer um mingau de aveia.

Gabriel pegou seu carro estacionado na rua em frente à casa


noturna e ligou para Henrique. Foi para a casa dele, jogaram pôquer,
e depois foram para um bar jogar sinuca. Evitou falar ou pensar em
Isadora e já estava acreditando que tudo poderia voltar à
normalidade, mas ainda não se sentia plenamente seguro. Evitou-a
durante toda a tarde e ainda não desejava conversar a sós com ela.
No início da noite enviou uma mensagem.

Gabriel: A Ana ainda está com você?

Isadora: Não, ela já foi para casa.

Gabriel: O que acha de irmos ao cinema?


Isadora: Vamos! Tem algum filme em mente?

Gabriel: Escolhe algum da sessão das 21h30.

Complementou:

Gabriel: Só não escolhe nenhum de terror.

Isadora: Olha! Isso é novidade!

Realmente. Ele amava filme de terror, mas Isadora tinha muito


medo e geralmente se agarrava nele e quase quebrava sua mão de
tanto apertá-la. Nunca se importou, mas nesse momento manter a
distância física era prioridade. Depois de alguns minutos, seu celular
vibrou.

Isadora: Top Gun Maverick estreou essa semana.

Gabriel: Ótimo, vou tentar reservar.


Conseguiu comprar os ingressos, jogou mais uma partida e
voltou para casa, já que precisava de um banho. Quando chegou,
Isadora estava vestida com um roupão, escolhendo uma roupa no
closet.

— Oi. Vou tomar um banho rápido. — Evitou olhá-la, juntou


suas coisas e entrou no banheiro.

A partir de agora, sempre se trocaria no banheiro. Assim que


ficou pronto, se dirigiu para a sala, ligou a TV e aguardou. Ela foi
para a sala logo depois, usando um macacão verde e um tênis branco,
e sentou ao seu lado. Isadora pegou o controle e acionou o mudo.

— Precisamos conversar.

Ele continuou olhando para frente.

— Você não vai se maquiar?

— Não, eu vou assim. Nossa conversa é mais importante. —


Resolveu voltar para casa mais cedo, ela sempre demorava muito
para se arrumar, e ingenuamente acreditou que conseguiria evitar
essa conversa. — É óbvio que o que aconteceu ontem te abalou
muito. Você precisa ser sincero comigo, Gabriel, me diz o que está
passando pela sua cabeça.

Ele suspirou.

— Não estou abalado, só estou assimilando tudo isso, logo tudo


vai voltar a ser o que era.

— Eu não acredito em você. — Ela pegou uma mão dele com as


suas mãos. — Gaby, você sabe que pode me contar qualquer coisa.
— Não tem nada para falar.

— Bom, então eu terei que arrumar outro lugar para ficar. —


Ele olhou dentro de seus olhos, estava perdendo sua amiga, não
podia permitir isso. Não importava o que tinha acontecido, ele teria
que superar agora.

— Não precisa fazer isso.

— Então você vai me falar o que está acontecendo? — Respirou


fundo e resolveu contar parte do problema.

— Estou me sentindo culpado. Não importa que você não me


culpe, eu esperava mais de mim. Fui um péssimo amigo.

— Gaby, como sempre muito dramático. — Ela riu. — Você


tem noção que foi o melhor amigo do mundo por dezenove anos? E
que um erro bêbado não vai apagar isso? Eu realmente não acho que
você tem culpa, eu lembro que fiquei excitada com o beijo que você
deu na Marcela e foi por isso que beijei aquele cara do nada. Gabriel,
eu nem perguntei, e se ele tivesse namorada? Esposa? Eu me
conheço bêbada, sou muito geniosa, quando quero algo eu não
desisto até conseguir. Além disso, você também estava bêbado,
então, por que a culpa é só sua? Por que você é homem? Eu esperava
mais de você, Gabriel!

— Eu sempre cuidei de você.

— Eu não sou mais criança, tenho vinte e cinco anos e não


preciso que ninguém cuide de mim.

— Você tem razão.


— Então pare com isso — disse, sorrindo. — Apesar de que é
bem fofinho.

Ele virou os olhos.

— Não sou fofo, minha masculinidade frágil não vai aceitar


esse tipo de afronta — brincou e ela caiu na gargalhada.

— Estamos bem?

— Claro que estamos — ele confirmou. Isadora sorriu e o


abraçou. — Vamos? Não quero perder o início do filme — disse,
desvencilhando-se dos seus braços.

Eles foram ao cinema e se divertiram bastante. A conversa


anterior ajudou muito, apesar de ter sentido ciúmes quando Isadora
exclamou: “Meu Deus! Quanto homem gostoso, não acha?” na cena
da praia, e ainda ter desconforto quando ela o tocava. Mas sentiu que
tudo isso era tolerável. Conseguiu até brincar: “Acho! Até molhei a
calcinha aqui!”, fazendo-a rir escandalosamente na sala de cinema,
atraindo olhares irritados das pessoas ao redor. Acreditou, inclusive,
que conseguiria fingir que tudo estava normal, pelo menos até as
sensações perturbadoras cessarem e não precisar mais dissimular.
sadora decidiu não contar para suas amigas sobre o que

I aconteceu entre ela e Gabriel. As semanas transcorreram


normalmente, tinha momentos que até esquecia da crise que
eles tiveram. No final da segunda semana, ficaram assistindo série
até as três da madrugada e não conseguiram acordar cedo no sábado.
Às onze horas da manhã, Gabriel a convidou para tomar café na
padaria. Nunca tinha entrado no estabelecimento e foi surpreendida
por um caixa extremamente lindo, alto e magro. Ficou encantada
pelos olhos âmbar, que se destacavam em contraste com a pele oliva,
os cabelos castanho-escuros e lábios rosados.

Gabriel foi em busca de algum salgado e ela correu para a


vitrine de bolos. Apesar de nunca ter ido até lá, conhecia quase
todos, já que seu amigo sempre levava para casa. Estava em dúvida
ente Ninho com Nutella e chocolate. O caixa veio até ela.

— Precisa de alguma ajuda? — perguntou.

— Estou com muita dúvida, qual você acha que é mais gostoso?

— Depende do gosto, os que mais saem são Ninho com Nutella,


chocolate com morango e ameixa com doce de leite.

— Ameixa com doce de leite? Quem gosta disso? — perguntou,


rindo.

— Muitos clientes, na verdade. Acho que é porque nossa massa


é fofinha e molhada na calda da ameixa. — Isadora sempre detestou
ameixa e doce de leite separados, imagina os dois juntos? Mas
quando imaginou, sentiu a boca salivar e ficou com muita vontade de
provar. Bem que sua mãe sempre dizia que o paladar mudava
conforme envelhecíamos.

— Vou querer ameixa com doce de leite.

— Interessante — disse, sorrindo, e pegou um prato e serviu. —


Vai querer algo para beber?

— Café com leite.

— Pode sentar que eu levo na mesa. — Isadora sentou ao lado


do seu amigo, que já estava comendo uma empada. Não demorou
muito e o caixa/atendente/garçom trouxe sua bandeja.

— Bom dia, Gabriel — cumprimentou.

— Bom dia! Já conhece a Isadora?


— É sua namorada? — questionou, interessado.

— Não, minha amiga. Isa, esse é o Guilherme.

Eles se cumprimentaram com um aperto de mão.

— É um prazer conhecê-la. — Ele sorriu simpático e ela


retribuiu sem graça, não conseguiu dizer nada.

Droga! Odiava como ficava tímida na frente de homens


interessantes.

— Vou deixar vocês comerem à vontade. — Assim que ele se


virou, Isadora viu partes de uma tatuagem aparecendo por baixo da
manga do braço direito. Ficou curiosa, o que seria?

— Guilherme está a fim de você — Gabriel disse assim que ele


voltou para trás do caixa.

— Você acha? — perguntou, esperançosa.

— Tenho certeza. Pensando bem, seria uma união perfeita,


assim eu iria economizar bastante com bolo. Falando nisso, por que
você pegou o bolo de ameixa?

— Sei lá, tive vontade. — Pegou uma colherada, colocou na


boca e gemeu em apreciação. — E está surpreendentemente bom,
mas ficaria muito melhor sem essa colher.

— Come com a mão, então — Gabriel disse e deu de ombros.

— Eu tenho vergonha, isso a gente faz em casa.

Isadora passou a acordar bem cedo todos os dias para ir à


padaria comprar pão no lugar de Gabriel.
N a terça-feira, Guilherme convidou ela para jantar e pediu o
número do seu celular. Ela voltou exultante para casa e
sentou na cadeira, rindo à toa. Seu amigo estava
terminando de passar o café.

— O caixa da padaria me convidou para jantar, acha que eu fiz


mal em aceitar?

— Guilherme? — Ela anuiu. — Você fez bem, ele é um cara


legal. Mas não é o caixa, é o dono da padaria.

— Sério? Não sabia. Estou tão ansiosa. — Ele colocou a


térmica na mesa e sentou à sua frente. — Não sei o porquê, mas ele
me deixa nervosa.
— Como assim?

— Fico com medo de fazer algo errado. Fiquei muitos anos só


com o Paulo, não tinha mais paquera, conquista. Acho que eu perdi o
jeito, você entende?

— Relaxa, Fiona, ele está muito a fim. É só ser você mesma.


N a sexta-feira, Isadora estava muito cansada, mas a
empolgação era tão grande que ignorou e fez uma super
produção. Queria que o primeiro encontro deles fosse
perfeito. Quando ficou pronta, deu uma voltinha na frente de
Gabriel, que aprovou seu look, dizendo que para uma ogra até que
não estava mal. Vindo dele era um bom elogio.

Seu amigo andava estranhamente quieto a semana toda, falando


somente o indispensável. Após a aposta demorou alguns dias para
Gabriel relaxar e voltar a ser o mesmo de antes. Agora que estavam
bem não queria que algo estragasse o clima de camaradagem que
tinham recuperado. Chegou a perguntar se estava com algum
problema, mas ele negou e fugiu de qualquer tentativa de conversa.
Ele realmente não parecia interessado em falar, e ela não insistiu.
Quando ele quisesse compartilhar, estaria ali.

Guilherme a levou em um restaurante italiano muito


aconchegante, pediu um espaguete à carbonara e cerveja Tripel. A
refeição estava realmente saborosa e a conversa divertida.

— Como veio a ideia de montar uma padaria? — perguntou.

— Meus pais têm uma padaria em Sorocaba, então cresci nesse


meio, acordava cedo para ajudar meu pai. Eles reformaram a padaria
e me deram os fornos antigos, comecei pequeno e as coisas foram
acontecendo.

— Que incrível! Sempre tive vontade de montar um escritório


de Arquitetura ou uma construtora junto com Gabriel, mas nunca me
empenhei realmente para isso acontecer. Desejar e realizar são coisas
diferentes.

— E por que não começa a realizar agora? O que te impede,


Isadora? — Resolveu não falar que terminara um noivado há dois
meses, alguns assuntos deviam ser evitados no primeiro encontro.

— Estou numa fase complicada, algumas dívidas, mas vou


começar a me organizar.

— Um brinde a isso! — disse e eles brindaram.

Após terminarem de comer a sobremesa, um tiramisù delicioso,


Guilherme pediu a conta. Fez questão de pagar, e ela internamente
ficou feliz, ser cavalheiro no primeiro encontro geralmente era um
bom sinal, mostrava que estava interessado na conquista.
No trajeto do carro até o apartamento entraram em uma
conversa animada sobre viagens que já fizeram e quais ainda
gostariam de fazer. Quando chegou em frente ao prédio, ele colocou
o carro em ponto morto e puxou o freio de mão, deixando o ar-
condicionado ligado. Continuaram conversando por um tempo e o
assunto esgotou. Ela percebeu que estava nervosa, torcia as mãos no
colo.

— Posso te fazer uma pergunta, Isadora?

— Claro.

— Eu posso te dar um beijo? — Normalmente ela não gostava


quando faziam essa pergunta. Preferia que entrassem no clima e o
beijo rolasse naturalmente, mas estava muito a fim de Guilherme
para impor qualquer dificuldade.

Preferiu não responder com palavras. Tirou o cinto e sentou


mais próxima. Ele percebeu sua intenção e fez o mesmo. Foi um
beijo tranquilo, de reconhecimento, e foi muito bom. Assim que os
lábios se afastaram, ele perguntou:

— Você já tem compromisso para amanhã?

— Ainda não, por quê? — Sabia que ele faria outro convite, e
isso era um ótimo sinal.

— Gostaria de andar de bicicleta no parque Ibirapuera comigo?

— Que horas?

— Quatro da tarde está bom para você? — Ela concordou com


um balançar de cabeça. — Passo para te pegar, então.
Se despediram com um selinho. Ela desceu do carro, que era
um furgão compacto branco com a logo e telefone da padaria, e
subiu. Entrou e tirou as sandálias. Gabriel não estava em casa.
Tomou um banho, colocou um pijama, deitou no sofá, ligou a TV e
escolheu uma comédia romântica para assistir.

As luzes multicoloridas piscavam e giravam, conferindo ao


ambiente escuro a luminosidade ideal para a paquera. As paredes e o
teto eram completamente pretos, no centro do salão havia um palco
redondo e giratório, com uma luz azul direcionada ao DJ, que
transmitia a música Say It Right, levando o público à loucura. Num
canto próximo ao banheiro, Gabriel dançava com uma loira. Ela
estava de frente para ele e o encarava, mexendo os quadris
sensualmente conforme o ritmo do som.

— Fiquei muito surpresa com sua ligação, depois de semanas já


tinha perdido as esperanças — ela falou no seu ouvido.

— Desculpe ter demorado tanto, estava ocupado com alguns


projetos — justificou, mas ambos sabiam que não era a verdade.

— Você trabalha com o quê?

— Sou Engenheiro Civil e trabalho em uma construtora.


— Olha, que legal, eu sou publicitária e também coaching de
marketing pessoal.

— Muito interessante.

Ela envolveu seu pescoço com as mãos, se pendurando nele.

— Tem algo ainda mais interessante que eu gostaria de fazer


com você — falou sugestiva. Se aproximou, reduzindo a distância
entre seus corpos.

Gabriel colocou uma mão em sua nuca e a beijou. O beijo era


bom, mas para ele não tinha graça ou excitação. Simplesmente não
sentia mais vontade de sair, beber ou ficar com nenhuma mulher. Se
obrigou a sair com alguém ou ficaria louco em casa sozinho, sabendo
que Isadora estava com outro homem. Não conseguia mais disfarçar
os ciúmes que sentia, estava sendo uma verdadeira provação. Então,
ligou para Nádia, a mulher que conheceu no bar. Ela disse que estava
indo para uma nova casa noturna e que podiam se encontrar lá, e ali
estavam.

Nádia era uma mulher inteligente, divertida, linda e muito sexy.


Em outros tempos, terminariam a noite em uma cama grande, regada
a vinho e muito sexo. Não essa noite, estava sem clima.

— Tenho um compromisso com minha família amanhã cedo —


mentiu para a loira.

— Poxa, que pena! Estava com expectativas maiores para essa


noite — sussurrou, sugestiva, no seu ouvido.

— Podemos marcar algo depois.


— Tudo bem. — Estava bastante contrariada, mas pareceu
entender. — Agora que tenho o seu número, vou ligar amanhã, não
tenho paciência de aguardar mais algumas semanas. — Ele riu.

— Vou aguardar ansioso.

Ele a beijou novamente e partiu. Gabriel provavelmente sairia


novamente com ela. Apesar de seu beijo não ter lhe despertado
nenhum sentimento ou desejo, não poderia continuar sozinho. E o
desejo acabava vindo com a convivência. As outras opções não eram
muito animadoras, poderia ficar com Marcela, mas era algo que ele
não faria, já que não tinham afinidade nenhuma. Chegaram,
inclusive, a conversar algumas vezes por telefone, mas a loira
percebeu sua falta de interesse e nunca mais ligou. Também poderia
sair à procura de outras mulheres, mas não estava com paciência para
isso.

Chegou ao apartamento tarde, passava das duas horas da


madrugada. Entrou, tirou os tênis e seguiu pelo corredor, pegando as
sandálias de sua amiga e colocando todos na sapateira. A escuridão
não era completa dentro da sala pela luz vinda da televisão e do
corredor. Apertou o interruptor da lâmpada e todo o ambiente ficou
claro.

Isadora estava deitava no sofá, dormindo de lado, tão linda e


serena com um pijama do Mickey. Desligou a televisão e se
aproximou, observando-a por um tempo. Tentava não pensar muito
nas reações do próprio corpo quando chegava perto de sua amiga.
Seu peito apertava só de vê-la dormir serenamente. Quando isso ia
passar? Pegou sua amiga no colo com delicadeza, para não a acordar.
Colocou-a na cama e a cobriu. Era uma tortura dividir a cama com
ela, tão perto e tão longe ao mesmo tempo.
O passeio no parque foi mais interessante que imaginou a
princípio. Após pedalarem, Guilherme a levou para ver o
pôr do sol. Ele trouxera na mochila uma toalha e muitos
quitutes da padaria. Montaram um piquenique e Isadora pôde se
deliciar com os bolos que tanto amava.

— Desse jeito vou acabar me apaixonando — brincou.

— Então tenho que me empenhar ainda mais na próxima vez,


porque o objetivo é justamente esse — respondeu galanteador.

Quando parou em frente ao prédio para deixá-la, a convidou


para almoçar no seu apartamento no domingo. Explicou que a
padaria fechava às onze da manhã e que passaria para pegá-la.
Isadora entrou no saguão de entrada e pegou o elevador exultante.
Finalmente estava conhecendo alguém interessante.

Abriu a porta do apartamento, entrou e encontrou Gabriel


sentado, tomando cerveja e assistindo stand-up.

— Oi! — cumprimentou.

— Oi, Fiona.

Seu celular vibrou, era Júlia falando no grupo “Friends 4 Ever”.

Júlia: O Ângelo está de plantão, estou tão entediada


aqui. Vamos sair, meninas?

Marcela: Eu topo. Pra onde?

Isadora sentou ao lado de Gabriel em silêncio, digitando


rapidamente.

Isadora: Pode ser naquele último bar que fomos, o que


tinha aqueles palitinhos de tapioca.

Júlia: Kia Ora. Boa ideia, amiga. Acho que hoje tem
música ao vivo lá.
Marcela: Chama o Gaby e pede pra ele levar alguns
amigos gostosos. Ana??? Cadê você?

Ana: Estou finalizando meu projeto de pesquisa aqui,


vou tentar ir.

Júlia: PQP, ANA! Você não pode ficar estudando no


sábado à noite!

Isadora: Amiga, eu sei que você quer muito entrar no


doutorado, mas sair uma noite com suas amigas não
vai fazer você fracassar.

Marcela: Vai logo se arrumar, Ana, ou vamos levar a


festa pra tua casa. Acho que você não vai gostar da
bagunça. Até daqui a pouco, meninas.

Ana: Tá bem, eu vou.

Isadora: Vou me arrumar, vejo vocês às 20h?


Júlia: Combinado!

Isadora olhou para Gabriel, que estava tomando a cerveja e com


o olhar fixo na tela.

— Gaby, as meninas querem ir no Kia Ora Bar. Vamos?

— Quem vai? — perguntou, ainda sem tirar os olhos da


televisão.

— Júlia, Marcela, Ana e eu.

— Eu vou ser o único homem? — perguntou, olhando pela


primeira vez para Isadora.

— Pode chamar alguns amigos. — Não ia falar “gostosos”,


como sua amiga pedira, isso não era um encontro em grupo.
Levantou do sofá. — Você vai?

— Vou — respondeu, voltando a atenção para a televisão.

— Ótimo! Vou tomar banho, se apressa. Combinamos às oito.


— Saiu da sala em seguida.

No caminho para o bar, Gabriel continuava calado.


— Então, você e a Marcela? Em que pé andam? — perguntou,
quebrando o silêncio.

— Eu e Marcela? — exclamou, surpreso.

— Sim, vocês não se falaram mais desde a última vez? — A


última vez tinha sido na fatídica festa, a festa do erro, e parecia uma
eternidade. Sua amiga pedira o número de Gabriel, mas não chegou a
comentar nada.

— Não falamos nada significativo — comentou e deu de


ombros.

— Que resposta evasiva... — reclamou, mas ele não disse mais


nada, e assim o assunto encerrou. — Convidou alguém? — tentou
novamente.

— Rique e Marcos.

— Marcos? — Isadora gemeu.

Não que ele seja chato nem nada, mas é o coordenador de


obras e dono da empresa onde trabalhamos. Quem, em sã
consciência, quer encontrar um superior fora do ambiente de
trabalho?

— Ele é meu amigo.

É claro que Isadora sabia disso, os dois sempre saiam juntos


para pegar mulheres, mas Marcos não era amigo dela. Teria que se
conformar, agora não dava para desfazer o convite, e mesmo que
desse, Gabriel não faria isso.

— E por que você não convidou Guilherme, Fiona?


— Já nos vimos essa tarde e vamos almoçar juntos amanhã. —
Ele não disse mais nada e ficou um silêncio incômodo no carro.

Desde quando existiam silêncios incômodos entre eles? E a


resposta estava bem ali, na sua cara, desde a aposta, a partir daquele
dia algo se rompeu. Eles continuavam amigos, claro, mas não era
igual. E Isadora sabia exatamente porque isso estava acontecendo.
Seu amigo tinha aversão a relacionamento, e às vezes ela tinha a
impressão que Gabriel estava só esperando o momento que ela iria
saltar na sua frente e declarar amor eterno pateticamente. Certamente
ele surtaria e pularia pela janela, cometendo suicídio.

Isadora torceu as mãos nervosamente e continuou se


justificando:

— Está muito recente, não quero apressar as coisas. Já acho que


está acontecendo tudo muito rápido.

— Entendi.

— Gaby, que bicho te mordeu? — explodiu. Não aguentava


mais essa economia de palavras.

— Não sei do que você está falado — respondeu e deu de


ombros, tamborilando no volante com a mão esquerda, os olhos fixos
na estrada.

— Sabe sim. Você não está falando direito comigo. Está quieto
demais. Você não é assim...

Ele suspirou.

— Só estou cansado.
Como se ela pudesse acreditar nisso. Não conhecia ninguém
mais enérgico que seu amigo. Bufou e ficou quieta. Discussões não
levavam a nada, ainda mais quando a outra pessoa se fazia de surdo,
cego e mudo. Até a discussão parecia unilateral e irritantemente sem
sentido.

Passados alguns minutos silenciosos, chegaram, e Gabriel


estacionou a duas quadras do bar. Desceram do carro e Isadora
pendurou a bolsa azul no braço. Seu amigo estava muito bonito com
uma camiseta cinza, uma jaqueta de couro preta aberta, a calça azul-
escuro, que se ajustava perfeitamente às pernas musculosas, e uma
bota marrom. Andaram um do lado do outro. Isadora sentiu as mãos
formigarem de vontade de se pendurar em seu braço ou mesmo
segurar sua mão. Além de fazê-lo carregar sua bolsa, é claro. Era
assim que andavam antes do erro, era algo natural para eles, e
provavelmente o motivo de todos deduzirem erroneamente que eram
um casal.

A noite estava fria e Isadora começou a tremer. Usava um


vestido tubinho de botão preto, curto, de manga longa, que se
ajustava perfeitamente ao corpo, uma meia-calça preta e um coturno
da mesma cor. Achou que seria o suficiente para lhe aquecer e
dispensou o casaco, mas a meia-calça agora parecia fina demais.

Ainda faltava uma quadra e Isadora lembrou o que sua amiga


Marcela sempre dizia quando ela reclamava de frio: “para com teu
show, que piriguete não sente frio!”. Começou a rir sozinha,
tremendo ainda mais. Gabriel parou e tirou a jaqueta que usava e
colocou nos seus ombros.
— Você está parecendo uma louca rindo sozinha no meio da
rua, Fiona — falou, o canto direito da sua boca se elevando em um
meio sorriso. — Apressa, que agora eu que estou ficando com frio.
— Ele pegou sua mão e a puxou, apressando o passo. Esse toque
jogou uma descarga de energia pelo corpo de Isadora, e ela se sentiu
imediatamente aquecida por dentro.

O bar ficava na esquina, pintado de vermelho e preto, e subiram


a pequena escada e entraram. Estava lotado de pessoas e saíram à
procura de uma mesa vazia, encontrando somente no segundo piso. O
ambiente era rústico, todo de madeira, mas bastante aconchegante.
Isadora sempre tinha a sensação que estava em um chalé no meio da
floresta quando entrava ali.

A ruiva começou a sentir calor. Liberou-se da mão do amigo,


percebendo que estava bastante suada. Gabriel raramente suava a
mão, acontecia geralmente quando estava nervoso, não era novidade
para ela, mas supôs que dessa vez fora por causa do calor. Retirou a
jaqueta e entregou para ele, que a vestiu novamente. O clima dentro
estava ideal para a roupa que escolhera, ficou satisfeita em notar.

Gabriel foi atrás de bebidas para eles e Isadora sentou na


cadeira próxima à grade de proteção, tendo uma visão privilegiada de
toda a festa no andar de baixo e da banda no palco. Estavam tocando
uma música de Elle King, Ex's & Oh's. O volume do som estava do
jeito que gostava, alto o suficiente para animar, mas sem impedir as
pessoas de conversarem. Pegou o smartphone e enviou uma
mensagem no grupo das amigas.
Isadora: Cadêêê vocês? Quando chegarem, olhem para
cima.

Júlia: Eu e Marcela estamos a caminho. Ah, ela está


aqui do lado perguntando se os amigos gostosos do
Gabriel vão.

Isadora: Amiga, Gaby chamou o Marcos e o Henrique.

Ana: Isa, não consegui terminar todo o projeto, fica


para a próxima.

Isadora: Ai, Ana, até quando vai ficar fugindo do


Henrique?

Sua amiga não respondeu e seu instinto dizia que não


responderia mais. Ana não gostava de Henrique, o amigo de Gabriel,
e sempre evitava sair quando havia o risco de se encontrar com ele.

Gabriel retornou com duas canecas de cerveja e Marcos a


tiracolo. Era um pouco mais velho que eles e da mesma altura que
seu amigo. Possuía olhos verdes e cabelos castanhos até os ombros,
que tendiam a encaracolar quando soltos. No momento estavam
presos em um rabo de cavalo curto. O cara tinha estilo, ela tinha que
admitir. Estava todo de preto, com uma jaqueta de couro com
detalhes pontiagudos prateados, um coturno, uma argola pequena na
orelha direita e óculos escuros.

— Isadora! — exclamou enquanto se aproximava dela e se


inclinava, dando um beijo em sua bochecha.

— Oi, Marcos! — cumprimentou com um sorriso sem graça.

Gabriel colocou uma caneca na mesa em frente a ela e sentou


ao seu lado. Marcos sentou na ponta da mesa, próximo ao amigo.

— Então, Isadora, já que você está aqui hoje, posso supor que
já concluiu a planta do projeto do restaurante? — Marcos perguntou
com ar profissional, fazendo-a tomar um susto. Ela gelou na hora,
ficando tensa demais para responder.

O projeto não estava pronto. Ela deveria ter ficado em casa


fazendo, como era irresponsável! Marcos caiu na gargalhada e até
Gabriel estava rindo.

— Ele está implicando com você, Fiona — seu amigo


esclareceu.

— Você tinha que ter visto a tua cara, foi hilário — Marcos
disse, animado.

— Mas você tem razão, Marcos, eu devia estar em casa,


finalizando o projeto.

— Você só pode estar de brincadeira. — Ele a encarou,


descrente. — Porra! Quem trabalha no final de semana? — enfatizou,
divertido, dando um sorrisinho de leve e tomando um gole do seu
chope.

— Relaxa, Fiona — Gabriel disse e pegou a mão dela, que


estava descansando na sua perna, debaixo da mesa. A descarga de
calor voltou, passando por todo seu corpo e indo parar na sua
barriga.

— Sua mão está quente — comentou.

— Você acha? — Gabriel perguntou, franzindo a sobrancelha.

Isadora assentiu.

— Eu quase não acreditei quando você me chamou, Gabriel.


Achei que não queria mais saber da nossa amizade — Marcos disse,
aparentando estar magoado.

— Não sabia que você era tão sensível, senão já teria te pedido
em casamento — Gabriel brincou e começou a fazer carinho no pulso
de Isadora com o polegar, enquanto continuava falando com Marcos.

Ela sentiu todos os pelos se arrepiarem, e um tremor passou


por seu corpo, atraindo a atenção dos dois para ela. Isadora puxou
sua mão e colocou sobre a mesa. Na mesma hora, seu olhar cruzou
com o de Marcos, que a observava com um sorrisinho. Ela sentiu o
rosto pegar fogo e pegou o celular rapidamente, abrindo um
aplicativo qualquer, o primeiro que viu, o Google Maps.

— Hum... Agora entendi o motivo do teu sumiço — Marcos


insinuou, alargando o sorriso.
Isadora fingiu não ouvir e se concentrou em pesquisar um
endereço aleatório. Se forçou a pensar em um nome de rua para
continuar digitando.

— Está com ciúmes? — Gabriel perguntou, divertido, ao amigo,


e em seguida virou para Isadora, que continuava olhando fixamente
para a tela do celular. — Você está com frio? Quer a minha... — Ela
só queria sair dali e ficar longe dos dois. Para não precisar olhar nos
olhos de nenhum deles, selecionou um ícone destacado no mapa,
para saber mais detalhes. Gabriel acompanhou o movimento do seu
dedo. — Por que você está pesquisando um hospital psiquiátrico,
Fiona? — ele questionou, chocado, e só então ela percebeu que o
ícone vermelho era do Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental.

Ela não sabia como tinha selecionado esse endereço, estava


constrangida e agora cogitava se realmente não precisava passar por
uma avaliação psicológica. Já passara por diversas insinuações sobre
o seu relacionamento com Gabriel antes e nunca tinha ficado
minimamente sem graça.

Será que esse constrangimento era por causa da aposta? Mesmo


que ela nunca pensasse sobre esse dia, talvez o seu inconsciente
ainda lembrasse. E por que estava tendo essas sensações perto do
amigo? Seria pelo mesmo motivo? Seu corpo reconhecia seu toque
mesmo que sua mente não? Ou seria um estranhamento pela distância
dos dois nessas semanas? Provavelmente era isso... Por sorte, ou
intervenção divina, Marcela apareceu em uma entrada triunfal.

— Um dia a gente até pode tomar juízo, mas hoje eu só quero


vodca! — gritou, e todos, inclusive os vizinhos de mesa, olharam-na.
Ela se abaixou e cumprimentou Gabriel com um beijo, e Isadora
levantou para cumprimentar a amiga. Se abraçaram apertado e
Marcela sussurrou em seu ouvido:

— Quem é esse gato na mesa? Me apresenta logo.

Isadora deu um sorriso discreto e virou-se para Júlia, que estava


logo atrás dela.

— Oi, amiga! — Se abraçaram apertado também. Então ela


virou para Marcos e fez as apresentações. Ele levantou para
cumprimentar cada uma com um beijo.

Júlia sentou em frente à cadeira de Isadora e Marcela ao seu


lado, de frente para Gabriel e próxima a Marcos.

— Vamos precisar de mais uma cadeira — Isadora disse. Em


seguida virou-se para o casal da mesa ao lado e perguntou se a
cadeira vazia estava ocupada. A jovem disse que não e permitiu que
ela pegasse. Agradeceu e colocou entre Gabriel e Marcos. — Vou ao
banheiro — avisou e virou. Gabriel alcançou-a antes de chegar na
escada e segurou seu pulso.

— Espera, Fiona! — Tirou a jaqueta e colocou nos ombros dela.


— Quer que eu te acompanhe até o banheiro?

— Não precisa, eu estou bem. — Abraçar suas amigas fez o


clima mudar e já nem entendia mais o motivo de ter ficado
constrangida. — Estava pesquisando um hospital psiquiátrico para
Marcos, ele não parece muito normal — disse, brincalhona, e seu
amigo sorriu. — Já volto. — Ele a soltou e ela desceu as escadas,
levando sua jaqueta. Estava com o perfume dele e ainda quente pelo
contato com o seu corpo.

Quando Isadora retornou, Henrique já estava sentado entre


Marcos e Gabriel. Ela o cumprimentou e voltou para seu lugar. O
resto da noite foi tranquila e com muitas risadas, além de uma troca
de olhares nada discreta entre Marcela e Henrique.
N o domingo, Isadora conheceu Logan, o gato persa laranja
de Guilherme. Ele gostou imediatamente dela, ronronava
enquanto se esfregava em suas pernas.

— Ele parece com o Garfield, é muito lindo.

— E dado também — disse com carinho, acariciando o felino.


— Pode ficar à vontade, vou só colocar a lasanha no forno.

— Precisa de ajuda? — ofereceu, solícita.

— Não, já deixei tudo pronto. Pode sentar. Quer uma água?


Refrigerante?

— Não, obrigada. — Ela sentou no sofá de couro preto.


O apartamento era simples e bonito, decorado em tons de
branco, bege e marrom. Descobriu que Guilherme morava sozinho
com seu gato. O bichano veio e sentou sobre seus pés. O dono do
animal retornou e sentou ao seu lado. Enquanto aguardavam o tempo
de cozimento da massa, se beijaram no sofá. Era Dia dos Namorados
e estava feliz por não passar em casa sozinha, seria deprimente
depois de anos estando com Paulo. Ele levantou para ver se a lasanha
estava assada.

— Está pronto, vamos comer? — perguntou. Quando Isadora


entrou na cozinha, Guilherme estava colocando a luva térmica.
Preparou a mesa, dispondo os pratos, copos, talheres e refrigerante
sobre ela.

— O cheiro está muito bom. — Ele sorriu com o comentário.


Foi até o fogão, retirou a travessa de vidro e colocou sobre o
descanso de panela. — Essa lasanha está pedindo um vinho tinto.
Você tem?

— Não, minha princesa — disse entristecido. — Eu não


costumo tomar vinho, mas posso comprar. No pátio do prédio tem
um mercado de autoatendimento — explicou.

— Não precisa, vamos comer. Eu gosto de refrigerante também.


— Estava muito nervosa e queria o vinho para criar coragem, achava
que hoje iriam transar pela primeira vez.

Para ela, era como se fosse o primeiro homem com quem faria
sexo após o noivo. Sabia que tinha transado com Gabriel, mas como
não lembrava, era como se não tivesse acontecido. Guilherme
prometeu que a próxima vez que viesse para sua casa teria um bom
vinho para ela tomar. Ele era atencioso e muito querido, sempre
falava no futuro, como se fossem se ver muitas vezes ainda.

A lasanha estava realmente deliciosa, elogiou e comeu mais


uma fatia. Depois que terminaram de comer, ele colocou toda louça
suja na pia e sentaram no sofá para assistir um filme. Como
imaginava, a comédia romântica não estava nem na metade quando
começaram a se beijar e o clima foi esquentando. Eles foram para o
quarto e deitaram na cama, Guilherme sobre ela, a beijando sem
pressa.

Isadora lembrou de como seu ex-noivo, Paulo, era sempre


afoito e apressado demais, bem diferente do seu novo companheiro,
que parecia querer curtir e prolongar ao máximo aquele momento. O
moreno interrompeu o beijo e a olhou dentro dos olhos.

— Quer que eu apague a luz? — perguntou num sussurro.

Apagar a luz? Quem faz sexo de luz apagada?

— Não precisa — respondeu, esforçando-se para não rir. Ele


pareceu aliviado.

Guilherme tirou a camisa e ela aproveitou para olhar


atentamente a tatuagem que a deixou tão curiosa quando o conheceu.
Era uma fênix preta.

— Nossa, é linda! — Passou a mão pela ave. — Tem algum


significado especial?

— Renascimento e superação — explicou, mas antes que ela


pudesse perguntar qual tinha sido a sua superação, ele voltou a beijá-
la.
Isadora estava ficando com sono, parecia que o beijo não tinha
fim, então resolveu agilizar um pouquinho as coisas e puxou o
próprio vestido, passando-o sobre a cabeça. Viu a cara de surpresa de
Guilherme, mas isso não a intimidou, e começou a abrir a calça dele.

— Você é apressadinha — comentou, rindo.

— Isso te incomoda?

— De jeito nenhum. — Ele fez carinho no rosto dela. — Só


queria que fosse perfeito.

Ela adorou ouvir isso. Eles voltaram a se beijar, dessa vez não
tão lentamente, e sentiu Guilherme tocando-a sobre a calcinha.
Ansiosa, abaixou a peça de roupa sozinha, não ia aguardar ele tomar
a iniciativa. Agora sim, ele a tocou como ela gostaria, e ela fez o
mesmo, enfiando a mão dentro da cueca boxer. Interessante, era
maior e mais grosso que o do ex-noivo. Ele gemeu, já estava bastante
duro, e ela molhadinha.

Guilherme tirou a cueca e abriu o preservativo, estava com


dificuldade de colocar. Isadora ia se oferecer para ajudar, mas ele
finalmente conseguiu. Deitou novamente sobre ela, que rodeou seu
quadril com as pernas como incentivo.

— Pronta? — perguntou atenciosamente.

Existe pergunta mais broxante?

— Estou molhadinha para você. — Tentou deixar o clima mais


excitante.
Ele finalmente a penetrou, e logo ela ficou mais animada.
Percebeu que o tamanho fazia sim diferença, era muito mais
prazeroso a cada estocada. Ficaram um tempo na posição de papai e
mamãe, e Guilherme gemeu.

— Vou gozar! — Ela ainda não queria que acabasse. — Você


também? — ele perguntou. Só conseguia chegar ao clímax sozinha,
sempre teve essa dificuldade.

— Aham! — mentiu. Isadora não conseguiu gozar, mas isso não


a chateava, desconfiava que sofria algum tipo de disfunção.

Guilherme desabou sobre ela e ficou um tempo assim, até os


batimentos do seu coração normalizarem. Ele apoiou o peso no
cotovelo direito e a encarou sorridente.

— Uau, isso foi incrível! — Beijou sua bochecha. — O que


você achou?

— Sim, foi incrível! — Sorriu sem graça.

Ele entrou no banheiro e Isadora colocou sua roupa


rapidamente. Assim que ele retornou, pediu que a deixasse em casa.

Chegou em casa às quatro horas da tarde. Gabriel estava


tomando cerveja e petiscando uma tábua de frios, enquanto assistia
uma partida de futebol entre São Paulo e América de Minas Gerais.
Ele sempre torceu para o São Paulo. Ela desabou no sofá, ao seu
lado, estava exausta.

— Voltou cedo, Fiona — comentou, sem tirar os olhos da


televisão.
— Por que está sozinho e em casa? — Estranhou, geralmente
ele assistia os jogos com seu amigo.

— Rique tinha compromisso hoje, e você sabe que hoje é um


dia perigoso para sair a dois.

— Que previsível, um típico solteiro convicto que teme o Dia


dos Namorados! — Riu do próprio comentário e ele revirou os olhos.

— Se quiser, tem cerveja na geladeira. — Ela surrupiou um


salame, levantou e foi buscar uma cerveja.

O petisco estava delicioso, com um toque de limão que ele


devia ter espremido por cima. Abriu a porta da geladeira, pegou uma
latinha e seus olhos recaíram no pote de Nutella. Sentiu uma vontade
de comer o creme de avelã com cacau e imaginou seu gosto
misturado ao salame, sua boca salivou. Pegou o pote, uma colher e
voltou para o sofá. Passou uma generosa quantidade da Nutella no
salame e provou. Indescritível o sabor, a mistura do defumado, do
limão e do doce. Depois tomou um gole da cerveja gelada.
Simplesmente a perfeição. Retirou outro salame da bandeja e repetiu
o processo, mas dessa vez Gabriel observou o que fazia e arregalou
os olhos.

— Salame com Nutella? — perguntou, enojado.

— O que tem? Eu gosto — disse, colocando na boca de forma


desafiadora.

— Eca! — Ela virou os olhos e tomou mais um gole da cerveja.

— Hummm... — gemeu em apreciação. — Perfeito. Quer que


eu faça um pra você?
— Eu passo — disse, rindo. — Ah, Isa, o contrato de aluguel
desse apartamento está chegando ao fim, estou pensando em alugar
um de dois quartos. A corretora de imóveis vai mostrar um na
segunda-feira, após o trabalho. É mais afastado, mas tem o mesmo
preço desse, e não é tão longe assim. Você vai comigo fazer a visita?

— Posso ir. — Ela mordeu o lábio inferior. — Isso vai ser um


problema para você? E as festas que você gostava de fazer aqui?

— Eu nunca mais fiz nenhuma festa, é muito cansativo a


bagunça depois.

— Se é assim... Vou achar bom ter um quarto só meu. — Ela


sorriu, animada.

— Imaginei que Guilherme não ficará muito feliz quando


souber que dividimos o mesmo quarto.

— Você tem razão, ainda não contei para ele.

— Não conte, logo estaremos em outro apartamento, pra que


arrumar problema?

— Preciso te contar uma coisa. — Estava nervosa. — Nós...


fizemos sexo hoje. — Torceu as mãos. Sempre falou sobre esses
assuntos com seu amigo, mas dessa vez foi mais difícil.

— Fico feliz por você. — Voltou os olhos para a televisão, ela


suspirou.

— Acha que foi muito rápido? — Ele suspirou também e


respondeu sem desviar o olhar da tela:
— Não tem esse negócio de rápido. O tempo vai ser conforme a
pessoa e o sentimento.

Ela sorriu aliviada.

— Por isso eu gosto de falar com você, eu estava muito


apreensiva.

— Você precisa relaxar mais.


N a segunda-feira, Guilherme e Isadora trocaram mensagens
o dia todo, e, à noite, ela e Gabriel foram conhecer o
apartamento de dois quartos. Ambos gostaram muito da
vizinhança.

— É muito espaçoso e tem uma ótima ventilação — seu amigo


falou.

— Gostei que tem varanda. — Ela olhou lá de cima. Embora


fosse pequena, era anexa à sala, dando a impressão que o
apartamento era maior.

— Essa cozinha, apesar de menor que a nossa, é bem dividida e


cheia de armários, já consigo me imaginar cozinhando nela — ele
falou, empolgado.

— Que bom que gostaram! — A corretora era uma mulher de


meia-idade, de cabelos brancos e bastante simpática. — Eu amo
esses apartamentos com cozinha americana, principalmente para
jovens casais como vocês. Enquanto Gabriel estiver cozinhando,
pode conversar com você na sala, além da sensação de amplitude que
ele dá.

— Nós não somos um casal — Isadora corrigiu. — Apenas


dividimos apartamento, somos amigos — esclareceu, sorrindo, sem
se importar com a confusão, mas a mulher ficou constrangida.

— Desculpem, eu não sabia.

— Relaxa — Gabriel disse. — Eu gosto dessa bancada de


mármore dividindo o ambiente, mas precisaremos comprar umas
cadeiras altas.

— Vocês encontram umas bem baratas, conheço um fabricante,


posso passar o contato para vocês.

— Pra mim, a única desvantagem é que teremos que dividir o


banheiro, Gaby.

— Não é tão grave assim, já estou acostumado com a tua


bagunça e cabelos no ralo — alfinetou e ela virou os olhos. — O fato
de sermos os primeiros moradores me anima bastante, e achei o
acabamento impecável, isso compensa o tamanho.

— O apartamento ser pequeno tem muitas vantagens, pelo


menos vou sofrer menos quando Gaby começar com os surtos de
limpeza e organização — devolveu a ofensa. — Ele é meio surtado
— confidenciou para a corretora, mas Gabriel deu de ombros.

— Vamos ficar com ele — seu amigo sinalizou para a corretora.

Já estava tudo planejado. Assinariam o contrato em dois dias e


iriam mudar no sábado de manhã. Teriam tempo de instalar a internet
e TV a cabo antes da mudança. Como Guilherme estaria trabalhando
o dia todo, não poderia ajudar.

Contrataram uma empresa de mudanças e transporte para


desmontar, montar os móveis e transportar tudo, mas não quiseram
que embalassem seus pertences. Não gostavam de estranhos mexendo
em suas coisas, então teriam que embalar sozinhos.
O s dois dias passaram rapidamente. Assinaram o contrato de
aluguel no horário de almoço e Gabriel pegou a chave do
imóvel. O resto da quarta-feira foi tranquila. Isadora
chegou cansada da academia, e enquanto tomou banho, Gabriel
preparou o jantar, que era batata recheada com carne. Saiu do banho,
colocou um vestido amarelo confortável e comeram. Ela arrumou a
louça na lava-louças para seu amigo não ter um ataque cardíaco e
Gabriel foi tomar banho. Assim que organizou tudo, foi para o sofá
escolher um filme. Ele retornou com uma bermuda caqui, blusa
verde, chinelo e cabelo molhado.

— Achou algum filme bom? — Sentou ao seu lado, e como


sempre ela recostou a cabeça no seu colo.
— Ana disse que esse aqui é muito... — Sentiu o cheiro de
perfume masculino familiar, e na mesma hora seu estômago se
revoltou. Levou uma mão para a boca e uma ânsia forte a fez
levantar rapidamente e correr para o lavabo.

— O que foi? — Gabriel perguntou, preocupado, e correu até o


lavabo aberto. Ele ajudou a segurar seu cabelo. Despejou todo o
jantar no vaso, mas o cheiro do perfume dele fazia a ânsia aumentar.

— Sai daqui — conseguiu dizer, e ele saiu a contragosto.


Quando seu estômago se acalmou, levantou e lavou o rosto e a boca
na pia.

— Está tudo bem? — seu amigo perguntou, se aproximando, e


as ânsias voltaram.

Ela fechou a porta e respirou fundo. Dessa vez não vomitou.


Ficou um tempo encostada na parede, até que sentiu que estava fora
de perigo e abriu parcialmente a porta.

— Por que você passou perfume para dormir? — questionou de


longe. — Não se aproxima. — Levantou a mão. — Esse teu perfume
está me fazendo mal.

— Mas eu sempre usei ele.

Ela foi até a cozinha e serviu um copo de água. Seu amigo a


olhava sério, provavelmente preocupado.

— Já estou bem.

— Acho melhor eu tomar banho novamente — disse, entrando


na suíte.
Após esse episódio, eles conseguiram assistir ao filme
tranquilamente.
N a quinta-feira, saíram em casal para comemorar o
apartamento novo em um restaurante japonês. Ela foi com
Guilherme e Gabriel levou Nádia, uma loira extremamente
bonita e animada. Como sempre, parecia uma supermodelo, o padrão
que agradava seu amigo. Elas não se deram muito bem. Era a
primeira vez que Gabriel levava uma mulher para jantar com ela
desde Clara, e achou um pouco estranho.

— Então, como se conheceram? — perguntou para a loira. Ela


sorriu, passando a mão pelos braços fortes do seu amigo.

— Ele pagou uma bebida para mim num bar, um cavalheiro de


armadura e cavalo branco — brincou e beijou o rosto dele.
Ela precisa ficar tocando e beijando ele o tempo todo?

— Estamos falando do mesmo Gabriel? — alfinetou seu amigo,


mas ele não pareceu ligar.

— Sei ser sedutor quando eu quero — disse e deu de ombros,


bebendo sua bebida.

— Sempre, você quer dizer — sua companheira falou, melosa, e


eles se beijaram na frente de todos.

Que grosseria!

Assim que os lábios se afastaram, ela voltou sua atenção para a


ruiva.

— E vocês? Como se conheceram?

— Eu que apresentei — Gabriel falou rapidamente, antes que


ela pudesse formular uma resposta. — Vou pedir mais uma rodada de
cerveja, vocês querem?

— Eu quero uma também! — Guilherme pediu.

— Você assistiu algum jogo do Brasileirão ontem? — seu


amigo perguntou.

— Só assisti o Flamengo ganhar do Cuiabá, não assisto jogos


de outros times — Guilherme respondeu, mas isso não a
surpreendeu, ela já sabia que era flamenguista, em seu apartamento
tinha várias canecas do seu time.

Assim o assunto mudou, mas sempre que podia, Nádia


demonstrava muita intimidade com seu amigo, e ela achava estranho,
já que nem sabia de sua existência até então. Isso a deixou levemente
irritada. Os homens pagaram a conta e os casais se despediram em
frente ao restaurante. Gabriel e Nádia entraram no carro, enquanto
Isadora seguiu Guilherme até o furgão.

— Você quer ir para o meu apartamento? — Guilherme


perguntou após entrarem e colocarem o cinto de segurança.

— Se você não se importar, gostaria de ir para casa, estou muito


cansada. Amanhã tenho trabalho cedo e precisamos empacotar as
coisas da mudança.

— Claro, eu entendo!

Isadora não queria admitir nem para si mesma, mas queria saber
se Gabriel demoraria para chegar em casa. Ao invés de dormir, ficou
assistindo televisão até cair no sono.
A arrumação para a mudança começou na sexta-feira à noite.
Faltaram na academia e foram direto para casa depois do
trabalho. Começaram a embrulhar toda a louça e objetos
da cozinha com jornais. Deixaram em cima da mesa um pacote de
copos descartáveis, dois pratos, uma colher, dois garfos e duas facas
para usarem, e todo o restante colocaram em caixas de papelão que
Gabriel tinha arrumado. Quando finalmente terminaram de organizar
a cozinha, Isadora estava exausta.

— Estou com fome — reclamou.

— Podemos pedir algo, o que você quer comer? — seu amigo


perguntou, enquanto empilhava as caixas no canto.
Ele tinha colocado legendas, descrevendo o conteúdo das caixas
e o cômodo a que pertenciam, e agora as organizava em ordem
alfabética. Um exagero, na opinião dela. Na sua última mudança
enfiou tudo em sacos de lixo preto, foi bem rápido, prático e
eficiente. Ela pensou por um momento na pergunta dele.

— Escargots — disse, salivando.

— Escargots, Fiona? Hoje? — perguntou, descrente e


levemente divertido.

— Sim. Lembra daquela viagem para Búzios? Estava tão


gostoso.

— Eu lembro, mas agora está complicado, tem muita coisa para


organizar e encaixotar.

— Podemos pedir para entregar — pediu esperançosa.

— Não temos aquele talher próprio.

— Você tem razão, eu queria tanto... — suspirou.

— Escolhe outra coisa hoje, outro dia nós comemos, eu


prometo. — Ela esboçou um sorriso desanimado.

— Está bem.

Escolheu pizza de quatro queijos e calabresa com Catupiry.


Continuaram a arrumação até uma da madrugada, parando somente
para comer.
G
abriel a acordou cedo no sábado.

— Vamos, dorminhoca. Vem comer — disse, puxando a


coberta para ela parar de se esconder. — Sabia que teu
namorado fez questão de dar o café da manhã como presente de
mudança?!

— Ele não é meu namorado — protestou, tateando na cama em


busca da colcha.

— Levanta logo, não vou deixar você dormir.

Suspirando resignada, levantou, foi para o banheiro, lavou o


rosto e se trocou. Encontrou Gabriel na mesa, servindo o café preto.
— Tão atencioso, ele preparou essa térmica para você. — Seu
amigo parecia irritado.

— Está com... — Quando o cheiro de café penetrou suas


narinas sentiu uma forte ânsia.

Correu para o lavabo, mas mal teve tempo de abrir a tampa do


vaso e vomitou.

— Você está bem? — Gabriel perguntou da porta. Ela levantou


e lavou o rosto.

— Pode pegar um copo de água?

— Claro. — Correu e voltou com um copo descartável com


água. Ela respirou fundo e bebeu, a ânsia estava passando.

— Obrigada, acho que a pizza de ontem estava muito forte. —


Ele estava olhando-a com uma expressão de preocupação. — Já estou
melhor. — Sorriu. — Vamos comer?

Na verdade, perdeu toda a vontade de comer, mas não queria


que seu amigo se preocupasse. Comeu pão e tomou água, só de
pensar em café seu estômago embrulhava.

— Isa, você já... menstruou esse mês? — Gabriel perguntou


com a voz bem baixa.

— Para, Gaby. Isso não foi nada, não é só porque a mulher


vomita que quer dizer que está grávida. — Virou os olhos. — E se
estivesse mesmo grávida, está muito cedo para enjoos. Não faz nem
uma semana que Guilherme e eu começamos a ficar.
— Estou pensando em nós dois. Você menstruou? — reiterou a
pergunta, agora com a voz firme.

Nós dois?

A mente de Isadora sempre se recusava a lembrar do que


aconteceu entre eles.

— Não sei. — Mordeu o lábio inferior. — Tanta coisa


aconteceu, minha vida mudou tanto, não pensei nisso.

— Quando costuma... — O interfone tocou, interrompendo sua


fala. Levantou e atendeu. — Certo, pode mandar subir. — Assim que
desligou, olhou novamente para ela. — A equipe de mudança
chegou, conversamos depois.

Gabriel estava muito sério e isso a deixou em alerta, mas algo


assim não poderia acontecer. Não era possível, ou era? A ignorância
da fatídica noite nunca foi tão perturbadora quanto agora. Levantou e
começou a guardar os itens do café, pensaria nisso depois.

Os profissionais desmontaram os móveis muito rápido, e logo


depois carregaram tudo para o caminhão. Gabriel confirmou o
endereço com o motorista, antes de entrar no carro junto com
Isadora. Abriu o portão da garagem e seguiram pela rua em silêncio.
Não sabia como estava o ânimo de seu amigo, ou se a conversa
poderia atrapalhar sua direção, mas uma pergunta martelava sua
mente e precisou externá-la.

— Você acha que tem alguma possibilidade? — questionou,


receosa. — A camisinha estourou ou alguma outra coisa assim?
— Nós não usamos camisinha — respondeu. Ela arregalou os
olhos pelo choque.

— Por quê? — Percebeu que gritava.

— Porque você disse que não precisava.

— Mas por que eu diria algo assim? — Ele deu de ombros.

— Não sei, mas achei que fosse por tomar anticoncepcional.


Você parou? — indagou, nervoso, olhando seu rosto quando pararam
no sinal.

— Eu não tomo anticoncepcional — exclamou. Não queria


acreditar que isso pudesse estar acontecendo.

— Como não? Eu já vi você tomar antes — disse, descrente.

— Eu tomava porque meu fluxo estava irregular, tem uns quatro


anos que parei — explicou.

— Estamos ferrados! — ele esbravejou.

— Não necessariamente. Eu posso não estar grávida. Tem


muitas mulheres que demoram anos para engravidar, não é tão fácil
assim. — Respirou fundo. — E só foi enjoo, não é como se somente
grávidas tivessem enjoos — ponderou.

— Você passou mal com o cheiro do meu perfume — lembrou.

— Mas só foi uma vez.

— Depois disso eu não usei mais perfume — confidenciou. —


Quando os homens terminarem de montar os móveis, vou à farmácia
comprar um teste. Não vou aguentar ficar com essa dúvida.
Chegaram e abriram a porta para a equipe descarregar os
móveis e as caixas. Mostraram onde cada móvel iria ficar. Isadora
tentou não pensar numa possível gravidez. Almoçaram marmita e
lancharam biscoito. A equipe concluiu a montagem às cinco horas da
tarde. Gabriel efetuou o pagamento e os levou até a porta.

— Estou indo à farmácia. Você quer que eu traga alguma coisa?


— perguntou para ela.

— Traz chocolate e água gelada. Será que já podemos ligar o


bebedouro?

— Sim, vou fazer isso. — Ele ligou e depois saiu.

Isadora abriu algumas caixas e pegou a que tinha os utensílios


da cozinha. Estava terminando de organizar a primeira gaveta,
quando ele retornou.

— Trouxe dois testes diferentes.

— Por que dois? — perguntou.

— Um diz de quantas semanas é a gravidez e o outro é para


confirmação, tem 99,9% de precisão.

— Tá, trouxe o chocolate?

Ele entregou a sacola.

— Está tudo aí. — Isadora abriu e pegou o doce. — Será que


você pode comer o chocolate depois? Estou quase surtando aqui —
falou, passando uma mão pelo cabelo, como fazia sempre que estava
nervoso, mas dessa vez o gesto a irritou bastante.
— Eu preciso dele para me acalmar. — Entregou as duas caixas
para ele. — Enquanto isso, você pode ler a bula.

Ele pegou os testes, abriu e leu em voz alta. Os dois eram


diferentes. Um com fita e coletor de urina, e o outro digital. Somente
o tempo era igual, necessitavam de cinco minutos para precisar o
resultado.

Após comer quase metade da barra de chocolate e tomar água,


Isadora entrou no banheiro, e ele ficou aguardando na porta,
enquanto ela coletava a urina. Abriu-a, chamando-o para dentro
quando terminou.

— Agora precisamos esperar. — Os dois ficaram em frente à


pia, olhando os testes por alguns minutos. O primeiro a registrar foi
o de fita.

— Apareceu dois riscos. — Ele apontou.

— Mas um risco é bem fraco, deve ser assim mesmo. Só vale o


risco forte. — Ele revirou os olhos.

— Dois riscos é gravidez.

— Vamos aguardar o outro. Esse está com defeito —


sentenciou, nervosa.

— O da fita tem a precisão de 99,9%. É o mais preciso.

Ela parou de discutir, porque na tela do outro teste apareceu


“Grávida”. Depois de alguns minutos atônita, se pronunciou:

— Esse também está com defeito, não diz as semanas.


Queria de todas as formas negar, mas, no fundo, sabia que não
adiantava, a verdade estava bem ali, com sete letras e um acento
agudo.

— Meus pais vão me matar — Gabriel disparou. —


Principalmente porque é você. Acho que os teus pais também vão me
matar. A minha sorte é que eu só posso ser morto uma vez —
brincou, sem humor.

— Nós somos adultos, ninguém vai matar ninguém.

— Como eu vou contar para eles? — Apareceu “3-4 semanas”


embaixo de “Grávida” na tela do aparelho. — Olha! Agora você
acredita? — Apontou, chamando sua atenção para o teste.

— Meu Deus, Gabriel! — gritou, batendo no braço dele. — Por


que você não usou camisinha?

— Quem disse para não usar foi você! — se defendeu.

— Eu estava drogada, bêbada, tudo junto — vociferou, irritada.

— Que história é essa?

Isadora saiu do banheiro, entrou no quarto dele e sentou na


cama sem lençol. Ele a seguiu e parou em frente a ela.

— Ângelo e Júlia acreditam que colocaram ecstasy nas nossas


bebidas.

Não tinha dito nada para Gabriel, já que na época ele disse que
se sentia culpado, então ficou com medo de contar e ele acabar se
afastando dela. Mas agora estava com raiva. Sabia que estava sendo
injusta de jogar a culpa somente nele, provavelmente já eram os
hormônios da gravidez. Ela, grávida? Nem conseguia pagar as
próprias contas e uma casa para morar.

— Quem fez isso? Que merda, Isa, por que não me contou?

Ela suspirou.

— Isso não importa. Eu não quero falar nada agora, estou


cansada e preciso de um tempo sozinha.

— Vou arrumar a sala.

Saiu, aparentando estar abalado, e ela deitou na cama,


colocando uma mão sobre a barriga ainda plana. Ela ia ser mãe.
Sonhou tanto em casar e ter uma família feliz, e agora seria mãe
solteira. Seu relacionamento com Guilherme estava evoluindo para
um namoro, como ele ficaria ao saber que estava grávida de outro?
Que confusão! Ouviu uma batida na porta.

— Entra. — Seu amigo abriu a porta, ele estava muito tenso.

— Trouxe lençol, travesseiro, água e o resto do chocolate. —


Ela levantou e pegou o doce prontamente. Gabriel colocou a água na
mesa de cabeceira, arrumou o lençol no colchão e colocou o
travesseiro em cima da cama. — Agora descansa — disse e saiu do
quarto.

Isadora deitou novamente, recostando-se no travesseiro, e


suspirou.

Como isso foi acontecer logo agora, quando estou mais


desestabilizada?
Como ficaria sua carreira profissional? Conseguiria conciliar
trabalho com a maternidade? Estava num péssimo momento
financeiro, mal conseguia suprir os próprios gastos, como cuidaria de
uma criança? E seus planos de montar o próprio negócio?

Como seria a estrutura familiar desse bebê? Cresceu em um lar


tradicional, dava muito valor para a criação que recebeu. Imaginou a
criança indo passar o final de semana na casa do pai e Gabriel
fazendo um desfile de entra e sai de mulheres loiras e peitudas.

Era possível ainda que seu amigo se casasse e a esposa tivesse


ciúmes dela, e por causa disso ele acabasse se afastando deles.
Várias colegas suas passaram por isso no colégio, com o divórcio
dos pais. Apesar de conhecer Gabriel e achar isso improvável,
algumas mulheres conseguiam virar a mente dos homens.

Sentiu uma forte vontade de chorar, e lágrimas começaram a


descer por seu rosto. Imaginou um bebê ruivinho, lembrou do tanto
que desejou ser mãe e uma alegria se apoderou dela. Como poderia
ter sentimentos tão contraditórios? E sua mente continuou um
turbilhão de sensações, como ansiedade, insegurança, descrença,
euforia, tristeza, medo e felicidade, até que finalmente sua pálpebra
pesou, fechou os olhos e dormiu profundamente.
Gabriel estava em choque, não sabia o que pensar ou sentir. Sua
cabeça parecia que ia dar um nó. Em momentos assim, sempre
ajudava arrumar ou limpar alguma coisa, se sentia mais calmo.
Pegou uma flanela e abriu todas as caixas. Organizou, colocando
cada caixa em seu cômodo, e começou a retirar os objetos um a um,
limpando e colocando no respectivo lugar. Quando tudo estava
organizado impecavelmente, respirou fundo.

Meu Deus! Vou ser pai!

Como pôde ser tão imprudente? Se orgulhava por nunca ter


cometido um único deslize antes, mas Isadora veio e o desestruturou.
Bagunçou seu mundo perfeitamente ordenado e planejado. E não foi
como se tivesse apontado uma arma para a sua cabeça. Várias
mulheres antes já tinham pedido para transarem sem camisinha,
dizendo aquelas frases de sempre.

“Não costumo fazer sem com outros, mas confio em você.”

“Camisinha corta o clima.”

“Eu tomo anticoncepcional.”

“É mais gostoso sem.”

“Quero te sentir de verdade.”

Enfim, aquela conversa de sempre. Porém, Gabriel sempre


achou isso muito arriscado e desnecessário. Precisava de resultados
previsíveis, e a camisinha ele poderia controlar. O problema é que
Isadora não era qualquer mulher para ele, com ela era diferente,
simplesmente por ser ela.
Ele gostava de planejar tudo. Desde que recebeu seu primeiro
salário, cortou a dependência financeira dos pais, começou a
economizar e investir na bolsa de valores. Chegou a perder um bom
dinheiro no início, e isso serviu de aprendizagem, pois logo passou a
lucrar bastante. O que o incomodava era esse tipo de investimento
ser extremamente arriscado, temia que não fosse estável o suficiente
para a paternidade. Em seus planos só teria filhos quando tivesse
montado seu próprio negócio e adquirisse no mínimo um imóvel
residencial. De seu só tinha um Porsche, que ganhou de seus pais
como presente de formatura. Poderia vender o carro e comprar um
automóvel mais econômico.

Outra coisa que o preocupava era se seria um bom pai. Como


educaria essa criança? Será que ela iria gostar dele? Iria conseguir
manter um relacionamento saudável com seu filho ou sua filha? Não
teria nem tempo para aprimorar suas habilidades como pai. Como
seria sua vida de agora em diante? Teria muitas mudanças?

Todas essas questões martelavam sua cabeça. Se imaginou


carregando um bebê e seu coração se aqueceu. Seria um serzinho que
dependeria dele. Independentemente do sexo, levaria a criança para
assistir partidas de futebol no estádio. Ensinaria a pedalar, a nadar e
a andar de skate. Será que ainda era bom nisso? Riu, nostálgico,
lembrando do dia que tentou ensinar Isadora pela primeira vez, mas
ela caiu de bunda no asfalto e ele não conseguiu segurar a
gargalhada. Ela o encarou furiosa e deu a língua para ele.

Gostava tanto de sua amiga geniosa. Imagina se tivesse uma


filha com cabelo vermelho, cheia de sardas e nariz arrebitado como o
dela? Não importava a aparência que a criança tivesse, uma coisa
tinha certeza: a amaria incondicionalmente. Simplesmente porque
seria uma parte dele e outra dela.
I sadora acordou com o toque do seu celular, era Guilherme.
Não atendeu, não sabia se conseguiria falar com ele agora.
Enviou uma mensagem se desculpando, dizendo que estava
ocupada. Eram quase nove horas da manhã, dormiu muito tempo.
Levantou, estava com fome. Assim que abriu a porta, sentiu um
cheiro maravilhoso. Percebeu que a sala estava organizada e tinha
muitas caixas vazias no canto, foi até a cozinha.

— Estou fazendo pão de queijo — Gabriel disse quando a viu


entrar. — Senta, que está quase pronto.

Ela sentou, estava tudo aparentemente organizado.

— Terminou de guardar a mudança? — perguntou, descrente.


— Praticamente, só falta organizar o quarto, mas não vamos
conseguir até comprar nossos guarda-roupas, você também precisa
de uma cama. — Colocou uma luva térmica, abriu o forno e retirou a
assadeira antiaderente. — Vamos no shopping amanhã e compramos
tudo. — Colocou os pães de queijo sobre a mesa.

Comeram em silêncio. Quando terminou, fitou o copo de suco


por um tempo.

— O que vamos fazer? — perguntou num fio de voz, ainda não


conseguia acreditar no que aconteceu com eles. — Gaby... — Isadora
chamou. Sem aguardar resposta, pediu: — Eu preciso de um abraço.

Ele levantou e a puxou, abraçou-a forte por um bom tempo. Ela


chorou por alguns minutos. Por que as coisas aconteceram dessa
maneira distorcida e louca? Só precisava sentir que tinha apoio, e o
cheiro familiar dele, misturado ao sabonete, a acalmou. Gabriel
beijou o topo de sua cabeça e afagou suas costas.

— Tudo vai ficar bem! Eu prometo.

Ela se desvencilhou do abraço.

— Como você sabe? — perguntou, franzindo a sobrancelha.

— Eu vou fazer dar certo. — Afastou um cabelo ruivo do seu


rosto e secou uma lágrima com o polegar. — Você não confia em
mim, Fiona?

— Você parece estar de boa com tudo isso... Digo... com a


gravidez — explicou.
— Na hora eu fiquei muito chocado, depois preocupado, mas
agora que o susto passou, estou muito feliz. — Abriu um sorriso
suave.

— Eu ainda estou na fase do chocada e preocupada — ela


confidenciou.

— O que me preocupa é contar para nossos pais — ele disse,


fazendo uma careta.

— Isso também. — Isadora foi para a sala e sentou no sofá.


Ergueu as pernas e as apoiou na mesa de centro. Gabriel a seguiu e
sentou ao seu lado. — O mais louco de tudo é que todo mundo vai
pensar que estou grávida do Paulo, isso vai ser uma confusão —
suspirou. — Você tem alguma dúvida quanto a isso?

— Não — respondeu. Ela também tinha certeza quanto à


paternidade.

Se estivesse grávida de Paulo estaria com doze semanas, e se


fosse de Guilherme estaria com uma semana, além disso sempre
usaram camisinha.

— Essas explicações todas vão ser a parte mais chata. —


Isadora se imaginou explicando para seus pais e sentiu uma angústia.
— Imagina contar para nossos pais que transamos bêbados, e por
isso não usamos proteção?!

— É claro que não vamos falar isso para eles — discordou,


horrorizado.

— Vamos falar o quê, então? — ela questionou.


— Podemos falar que a camisinha estourou. — Para ela essa
conversa seria igualmente ruim.

— Você fala, não quero falar sobre nada disso com eles.

Tinha vinte e cinco anos, mas isso não queria dizer que se
sentia tranquila em conversar certos assuntos com seus pais.

— O que mais complica é que eles não estão nem esperando por
isso. Se você engravidasse do Paulo seria um choque menor, afinal,
sabiam que vocês transavam.

Isadora mordeu o lábio inferior, e surgiu uma ideia em sua


mente.

— E se ligássemos contando que estamos namorando? Depois


quando contarmos da gravidez, eles só terão um susto para gerenciar.
Eles moram longe, não têm contato com ninguém daqui. Depois
podemos simular um término, isso é tão comum hoje em dia.

— E quando você planeja contar da gravidez?

— Quando a barriga começar a aparecer, deixa eu pesquisar


quando isso acontece. — Ela pegou o celular, entrou no Google e
digitou: “com quantos meses aparece a barriga de gravidez”, e leu:
— “Não existe um padrão para se começar a observar o crescimento
da barriga durante a gestação. No entanto, em geral, costuma-se
perceber a saliência da barriga da gestante entre a 16º e a 20º
semana, ou seja, entre o quarto e o quinto mês da gestação.” [4]
Perfeito, isso dá bastante tempo para eles se acostumarem.

— Você planeja contar na metade da gravidez? — Elevou uma


sobrancelha.
— Podemos contar com uns três meses, sei lá. O que você
acha?

— Acho que preparar o terreno é uma boa ideia, depois vemos a


melhor hora para contar — concordou.

Isadora fez uma careta. Sua mãe sempre falou para ela que
qualquer envolvimento amoroso entre eles poderia resultar no fim da
amizade, que gostava de Gabriel como filho e não queria que isso
acabasse por um capricho deles. Além disso, Gabriel contou que,
quando tinha dezesseis anos, a mãe dela deu uma pressão nele e o fez
prometer que nunca ia ter segundas intenções com a sua filha.

— Então podemos contar que estamos namorando. — Imaginou


a cena mentalmente. — Nossos pais podem não nos matar, mas
certamente vão brigar muito, se prepara para o ralho — disse, rindo.

— Você acha isso engraçado? — Gabriel perguntou, elevando


uma sobrancelha.

— Acho. Vamos deixá-los de queixo caído, os velhos acreditam


que não existe mais nada que podemos fazer para chocá-los.

— Realmente, eles acham que essa fase já passou. Você vai


contar para o Guilherme?

— Sobre a gravidez, sim. Como você acha que ele vai reagir?
— perguntou, apreensiva.

— Não sei, vamos ter que descobrir.

Depois do desjejum, se arrumaram para fazer as chamadas de


vídeos com seus pais. Primeiro ligaram para os pais de Isadora.
Assim que sua mãe atendeu, sorriu.

— Filha, que saudade! Gabriel, você está aí! — exclamou,


surpresa. — Como sempre, bonitão. — Virou a cabeça e gritou: —
Querido! A Isa ligou!

— Olá, Diana, a senhora está cada dia mais jovial.

A ruiva do outro lado da tela sorriu encabulada.

— Como vocês estão, mãe? — perguntou, preocupada, já que


seu pai tinha sido diagnosticado com hipertensão arterial
recentemente.

— Estamos bem. Miguel está fazendo as caminhadas que o


médico recomendou, mas preciso ficar no pé dele com a comida.

— Já está falando mal de mim, mulher! — seu pai brincou,


aparecendo ao lado da esposa. — Oi, linda. É o Gabriel que está aí
com você? — perguntou, se afastando da tela para enxergar melhor,
devido à sua dificuldade de focalizar objetos.

— Como vai, Miguel? — seu amigo perguntou, fazendo o mais


velho sorrir ao reconhecer a voz do outro lado da tela.

— Estou bem, sempre na mesma. Como estão as coisas por aí,


já mudaram?

— Sim, pai. Já está quase tudo pronto. — Respirou fundo. —


Eu e Gabriel precisamos contar uma coisa.

— Na verdade, eu quero pedir algo — seu amigo disse e pegou


sua mão. — Quero pedir autorização para namorar Isadora.
— Eu ganhei! — sua mãe gritou, vibrando. — Você me deve
cem reais — disse, apontando para o pai de Isadora, animada.

— Droga! — Miguel exclamou. — Vocês não podiam esperar


até o ano que vem?

— O que é isso? — Isadora perguntou, confusa.

— Eu apostei com seu pai que vocês namorariam dentro de um


ano, ele disse que seria em dois.

— Vocês andam apostando sobre a vida amorosa da própria


filha? — Estava indignada.

— Ah, filha, essa nem é a primeira aposta — seu pai disse. —


Tínhamos apostado mil reais quando vocês foram morar juntos pela
primeira vez, mas quando você noivou com aquele Paulo, nossas
esperanças acabaram.

— Demos vitória para o teu pai, Gabriel, ele foi o único que
apostou que vocês não ficariam juntos — Diana explicou.

— Falando nisso, vou fazer esse desgraçado devolver meu


dinheiro — Miguel disse, vitorioso.

— Então vocês aprovam? — perguntou, confusa, para os pais.

— Claro, minha filha, estávamos torcendo por vocês — sua mãe


falou com carinho. — Mas vou confessar, vocês são muito tapados,
demoraram muito tempo para perceber o que todo mundo já sabia.

Aquilo não fazia o menor sentido.


— E aquele papo todo de “cuidado para não confundir o carinho
da amizade com amor?”.

— É psicologia reversa, minha filha. Se demonstrássemos nossa


aprovação, vocês nunca ficariam juntos. Os filhos sempre querem
desafiar os pais. — Ela deu um sorriso sincero. Isadora ainda estava
perplexa.

Existem pais mais loucos que os meus?

— Esquece isso, minha filha, o importante é que vocês foram


feitos um para o outro — Diana concluiu.

— Sim, e estamos muito felizes por ter você na família, Gabriel


— Miguel acrescentou.

Após essa conversa estranha, se despediram e desligaram a


chamada. Isadora olhou para o amigo, estava perplexa.

— Eu achei que íamos chocar eles, mas foram eles que me


chocaram — disse, exaltada.

— Confesso que eu também fiquei chocado. Eles ocultaram


muito bem o que realmente pensavam.

— Gabriel, acho que fizemos mal em mentir, pois quando


“terminarmos” — fez aspas com as duas mãos —, ficarão
desapontados.

— Agora é tarde demais para voltar atrás — suspirou. — Vamos


ligar logo para meus pais e acabar com isso.

— Pelo menos os seus pais são mais sensatos.


Laura, a mãe de Gabriel, atendeu a chamada de vídeo sorrindo.
O pai dele estava logo atrás, sacudindo um champanhe. Abriu a
tampa, fazendo um barulho, e a rolha voou, causando uma chuva da
bebida. Os dois gritaram, enquanto enchiam as taças.

— Um brinde ao casal! — Laura gritou e eles brindaram. —


Vitor, estou tão feliz por vocês, sempre soube que foram feitos um
para o outro. — Os pais dele chamavam-no pelo segundo nome.

— Eu também não podia estar mais feliz — o pai dele, Raul,


disse.

Pelo jeito, seus pais ligaram ou enviaram uma mensagem para


os de Gabriel, contando tudo.

— Como assim, pai? Miguel disse que você foi o único que
apostou que não ficaríamos juntos.

— Meu filho, o dinheiro seria um prêmio de consolação. Caso


não ficassem juntos, pelo menos ficaria três mil reais mais rico, mas
nunca desejei tanto perder uma aposta.

Passaram novamente pela enxurrada de aprovações e bênçãos.


Quando finalmente desligaram, resolveram almoçar em um
restaurante no shopping. As lojas só abririam às catorze horas, então
demoraram um pouco para sair.
Compraram toda a mobília, e o prazo de entrega era de até
quinze dias, mas o vendedor disse que poderia chegar antes.

— Quinze dias sem guarda-roupa? — Isadora gemeu. As


empresas deveriam priorizar as necessidades femininas.

— Nós daremos um jeito. — Seu amigo riu da sua cara de


exasperação.

Seguiram em direção ao elevador e passaram em frente a uma


loja de bebês. Gabriel parou, olhou alguns segundos e entrou.

— O que você vai fazer aí? — Ela arregalou os olhos, olhando


para os dois lados, para ver se tinha alguém conhecido, apesar de
extremamente improvável, e entrou também. — Vamos embora,
Gaby. Ainda está muito cedo para isso.

Ele ignorou, estava olhando os berços.

— Acho que esse deve dar no seu quarto. Acha melhor


alugarmos um apartamento de três quartos? Ter um quarto só para o
bebê? — perguntou, pensativo.

— Isso é sério? Acabamos de descobrir, vamos com calma. Não


sei nem se vamos continuar morando juntos.
— Como assim? — Ele franziu a testa.

— Não sei, Gabriel, é muita coisa para minha cabeça. Ainda


não pensei em como vai ser, mas não posso morar eternamente com
você. — Ainda nem tinha assimilado a situação e ele já queria
planejar o futuro?

— Por que não? Eu vou ajudar com o bebê, com as contas. —


Estava transtornado. — É melhor para a criança ficar perto do pai.

Ela olhou ao redor, tinha duas mulheres olhando para eles.

— Aqui não é o lugar para conversarmos sobre isso.

Ele suspirou e foi até uma arara de roupinhas. Comprou um


body para bebê recém-nascido, unissex, escrito “Gostou? Papai quem
fez”.

— Não acredito que você comprou esse body — reclamou,


rindo enquanto saíam da loja.

— Por quê?

— O bebê não vai usar isso. Papai quem fez — debochou. —


Eu também fiz.

— Vai sim! E vou comprar roupinhas do nosso time para ele


também — disse, animado.

— Nosso time? É o seu time. — Virou os olhos.

— Você e o bebê precisam torcer para o São Paulo, imagina que


lindo nós três vestidos com a camisa tricolor. — Os olhos dele
brilharam.
— Vai sonhando — disse, rindo.

Na verdade, Isadora não torcia para nenhum time, mas, para


implicar com ele, fingia torcer para o Corinthians.
A cordaram cedo na segunda-feira. Gabriel fez um chá de
erva-doce para eles, disse que leu que era liberado para
gestante, além de ter efeito calmante para a mamãe e o
bebê. Comprou bolo de laranja, iogurte e cortou um abacaxi, que era
bom para os enjoos.

— Assim eu vou ficar mal-acostumada — ela disse, sorrindo.


Seu amigo era um fofo.

— Fiquei preocupado, agora você precisa ficar nutrida. —


Serviu o chá para eles.

Finalizaram o desjejum e seguiram para o trabalho.


Tudo estava normal. Cumprimentou seus colegas e sentou em
sua mesa branca. Estava imersa no projeto de um novo shopping, e
às nove e quarenta foi até a copa pegar um copo de água. Assim que
o cheiro de café chegou até suas narinas, correu para o banheiro e
colocou para fora o que restou do café da manhã. Por sorte, ninguém
percebeu. Depois, às onze horas, Gabriel foi até sua mesa e sentou na
cadeira em frente.

— Já marcou a ginecologista? Quero ir com você.

Isadora olhou rapidamente ao redor e viu Maria, que estava


digitando na mesa oposta ao painel de MDF, virar a cabeça em
direção a eles, interessada. Fulminou seu amigo com o olhar, tudo
que não queria agora era fofoca no ambiente de trabalho.

— Como sempre brincalhão. — Abriu um sorriso fingido. —


Você não tem trabalho para fazer?

Ele percebeu a sua indiscrição e levantou.

— Digo isso porque você anda com uma TPM desgraçada, ia


falar para ela te dar algum remédio — mentiu, nervoso.

Não sabia se Maria engoliu a brincadeira bizarra, mas ela logo


pareceu entretida em seus afazeres, o que a fez respirar fundo,
aliviada.

— Sai logo daqui, Gabriel, antes que eu te mostre o que é uma


TPM desgraçada de verdade.

Assim que ele saiu, enviou uma mensagem.


Isadora: Você ficou doido? Que vontade de te dar um
murro! Às vezes parece que você tem doze anos.

Gabriel: Relaxa, ninguém desconfiou. Vou ter mais


cuidado, eu prometo. Então? Marcou?

Isadora: Sim, tem vaga para quarta-feira, às dez


horas. Acha que nós dois conseguimos sair cedo sem
levantar suspeitas?

Gabriel: Vou pensar em um jeito.

Evitou Guilherme todo o final de semana, mas prometeu que


jantaria com ele naquela noite. Estava nervosa, sabia que não seria
fácil contar sobre a gravidez, porém não era algo que pudesse
esconder. Conforme o tempo passasse, mais séria a relação ficaria, e
ele precisava decidir se a gravidez seria um impedimento ou não.
Quando chegou da academia, tomou um banho demorado, com a
água morna relaxando sua musculatura. Nunca contaram para ela
como ficar grávida era cansativo, poderia dormir o dia inteiro, e
ainda estava no primeiro mês.

Colocou o vestido azul-claro, que evidenciava suas curvas, e


ficou meia hora fazendo uma maquiagem, para parecer naturalmente
bela. Calçou um salto alto rosa e fez um rabo de cavalo. Hoje queria
estar impecável. Olhou no espelho, aprovando a imagem refletida, e
passou perfume. Saiu do quarto e sentou ao lado de Gabriel no sofá,
ele estava assistindo um show de stand-up.

— Você vai sair com o Guilherme? — Ela assentiu. — Vai


contar para ele?

— Vou. E você, quando vai contar para Nádia?

— Não sei se quero contar. — Deu de ombros. — É provável


que nem veja mais ela. — Abriu um sorriso safado, que poderia
derreter o coração das desavisadas.

— Achei que o lance de vocês fosse especial, você levou ela no


jantar aquele dia.

— Ela é legal, mas não sei se eu quero algo sério agora.

— Gabriel sendo Gabriel — disse, virando os olhos. — Um dia,


uma mulher vai virar sua cabeça e você vai cair de quatro. — Jogou
a praga. — Então ela vai te esnobar e eu vou assistir isso de
camarote. Inclusive, vou amar — sentenciou, divertida, mas ficou
confusa ao ver dor no olhar do amigo. — Você sabe que estou
brincando. — Cutucou o ombro dele com o seu amistosamente.

O telefone vibrou, era Guilherme.


“Estou chegando, pode descer.”

— Estou bem? — perguntou, levantando e dando um giro.

— Dá pro gasto. Boa sorte, Fiona!

Sentiu um frio no estômago ao pensar em sua missão. Sorte era


pouco, precisaria de um milagre. Quando entrou no carro, Guilherme
a cumprimentou com um selinho e disse que iam numa churrascaria.

Assim que chegaram, pediu uma picanha para dois e um vinho


tinto Cabernet, provando que tinha pesquisado sobre o assunto. Ela
achou muito fofo, mas pediu para tomarem suco, dizendo que
durante a semana não gostaria de beber. O jantar estava delicioso e a
conversa agradável. Quando terminaram a sobremesa, concluiu que
tinha chegado a fatídica hora da revelação.

— Precisamos conversar — anunciou, temerosa.

— Eu sabia — ele gemeu. — Quando você não quis ajuda com


a mudança e sumiu no final de semana, eu já adivinhei.

— Certamente não estamos falando sobre a mesma coisa. — Ele


a encarou, confuso. — Eu descobri que estou grávida de quatro
semanas. — Foi direta.

Ele arregalou os olhos e depois franziu a testa.

— Você engravidou um pouco antes de me conhecer? —


perguntou o óbvio, e ela assentiu. — E quem é o pai? Algum ex-
namorado? — Tinha chegado o momento difícil. Achou melhor
contar toda a história, e pelo começo.

Contou sobre o noivado, a traição, o apoio que Gabriel lhe deu,


a festa, a droga que colocaram em sua bebida e o que acabou
acontecendo depois. Ele pareceu ainda mais chocado.

— Então você está grávida do Gabriel, seu colega de


apartamento, e quer que eu acredite que não há nenhum
envolvimento entre vocês?

E se ele soubesse que dividiam o quarto também? Ficou


aliviada por nunca ter contado.

— Essa é a verdade.

Ele deu uma risada desprovida de humor.

— Realmente, vocês não estão envolvidos, só transam quando


bebem — disse, irônico. — O que você espera de mim, Isadora? —
questionou com um misto de impaciência e raiva.

— Que acredite em mim — respondeu, sincera.

— Desculpa, mas está difícil! — Ele pressionou as mãos nas


têmporas. — Meu Deus! O que eu fiz para merecer isso? Vocês
transaram enquanto estávamos juntos? — cuspiu as palavras, como
se estivesse com nojo.

— Você está me ofendendo! — se exaltou, levantando da mesa.


— Vou de Uber. — Abriu a bolsa, pegou dinheiro na carteira e jogou
na mesa.
Saiu do restaurante bufando, odiava quando as pessoas
duvidavam do que falava. Não precisava ficar ouvindo que era
mentirosa e traidora. Solicitou um carro e aguardou. Sentia um nó na
garganta. Quanto julgamento ainda teria que passar? Como se
Guilherme nunca tivesse cometido um único erro. Difícil de
acreditar, todo mundo erra, a diferença é que ela teria uma prova
palpável de seu erro, com prováveis bochechas rosadas e mãozinhas
gordinhas. Suspirou e colocou uma mão na barriga. Como um ser tão
pequeno mudava toda a vida de uma pessoa?
P assou os últimos dois dias muito irritada e nervosa,
provavelmente pela situação em si, que era bastante
complicada, e o término desgastante.

Por sorte, Gabriel a conhecia bem e se mantinha distante. Ele


agia como se estivesse tudo bem, sempre educado, prestativo e
carinhoso, e isso a deixava desconsertada. Parecia que para ele tudo
era mais fácil. Claro, não era ele que carregaria um bebê por nove
meses, nem suas peguetes se afastariam por causa disso. Não falou
como foi sua conversa com Guilherme e ele não insistiu, mas por seu
humor deve ter percebido que não foi muito boa.
Na primeira consulta, a doutora Fátima fez várias perguntas,
passou muitos exames de sangue e vitaminas. O primeiro ultrassom
foi agendado para a sexta-feira da próxima semana.

Enquanto voltavam para o escritório, um acidente de trânsito


tornou o tráfego bastante lento.

— Estava pensando que hoje devíamos fazer alguma coisa


diferente — ele disse. — O que acha de irmos ao boliche? Poderia
chamar tuas amigas.

— Acho difícil elas irem, também não estou no clima.

— Podemos jogar algum jogo de tabuleiro, então.

— De dois não tem graça.

— Você quer iniciar uma série?

— Gaby, acho que você precisa de uma namorada. Por que não
dá uma chance para a Nádia? — Mudou de assunto de repente.

— Por que você diz isso? — indagou, franzindo a testa.

— Guilherme desconfiou que rola algo entre nós, foi bastante


chato, mas como posso culpá-lo? Você nunca namora ninguém, e isso
acabou me atrapalhando.

Ele suspirou.

— Entendi.

O resto do caminho permaneceram em silêncio.


Ao final do expediente, foram para a academia e depois para
casa. Isadora tomou um banho, colocou uma roupa velhinha e foi
para a cozinha preparar uma macarronada. Quando ficou pronta,
arrumou a mesa para dois.

— Gaby, vem comer — gritou. Ele apareceu trajando uma calça


jeans skinny, camisa branca de botão, blazer preto e tênis branco.

Lindo demais! Isadora percebeu e sentiu um frio estranho no


estômago.

— Você me chamou, Fiona?

— Onde você vai assim?

— Vou jantar com a Nádia.

— Resolveu me ouvir, então. — Ele assentiu. — Bom jantar.

Ele se despediu e saiu. Imediatamente, Isadora se sentiu


solitária. Comeu e assistiu um filme sozinha, depois foi dormir.
D epois desse dia, Gabriel passou a sair toda noite com
Nádia. No sábado, após o almoço, Isadora e Gabriel
concordaram em avisar seus pais que o relacionamento
não tinha dado certo. Quando resolveram mentir, não imaginaram
que seus pais dariam aprovação, e quanto mais rápido essa farsa
acabasse, melhor seria para encerrar as expectativas deles.

Não fizeram o anúncio juntos. Os pais de Isadora não se


preocuparam muito com a informação, disseram que era só uma
crise, que logo se entenderiam. Já Gabriel contou que sua mãe
chorou e que seu pai lhe deu uma bronca.
— Pelo menos agora quando souberem da gravidez, não ficarão
tão chocados — seu amigo disse.

— Um problema resolvido. Quando você acha que devemos


contar sobre a gravidez? — indagou.

— Você pode escolher o melhor momento, quando se sentir


preparada.

Isadora achava que nunca estaria preparada.

— O que vamos fazer essa tarde?

— Nádia me chamou para ir numa chácara de uns amigos, vai


rolar um churrasco e piscina. Vamos às quatro horas, você quer ir?

Sair com o pai do seu filho, sua peguete e companhia? Só se ela


fosse suicida.

— Você já contou para ela que vai ser papai?

— Contei, ela está de boa com isso.

— Falou que eu sou a mãe? — sondou.

— Sim, expliquei tudo, e ela entendeu.

O quê? Duvido muito disso.

— Ela é bastante compreensiva, então. — Ele concordou com


um movimento de cabeça.

Isadora não iria com eles, apesar de Gabriel dizer que estava
tudo bem. Conhecia bem demais as mulheres, podia ser somente um
joguinho de conquista. Por ora, era melhor se manter distante. Iria
ficar em casa arrumando suas coisas no guarda-roupa, já que a loja
tinha entregado na quarta-feira os móveis e o montador estava
finalizando as montagens. Finalmente teria um quarto e uma cama só
para ela.

Convidou suas amigas para almoçarem juntas no domingo,


precisava contar sobre sua condição e esperava que lhe dessem
apoio. Seu único receio era Marcela, sua amiga ficou muito
interessada por Gabriel e tentou se aproximar dele após a festa,
porém ele foi bastante esquivo, e ela temia que a loira a achasse uma
traidora.
I sadora foi a primeira a chegar no apartamento de Júlia. Levou
um pote de sorvete e estava ajudando-a lavando a salada. O
cheiro estava ótimo, sua amiga era excelente cozinheira e
preparava um filé de salmão assado com molho branco. Logo depois,
Marcela e Ana chegaram juntas, trazendo vodca, limões e
refrigerante.

— Encontro de amigas pede uma caipirinha caprichada —


Marcela disse, pegando uma tábua, faca e coqueteleira. Ela iniciou o
preparo.

— Hoje não vou poder beber — falou baixinho, seu coração


batendo forte no peito. — Estou tomando um remédio. — Não era de
todo mentira, afinal, estava tomando vitaminas pré-natais.

Talvez, devido à consciência pesada, teve certeza que todas


perceberiam que estava mentindo.

— Que pena, amiga! — Ana se solidarizou.

— Relaxa, eu bebo a tua parte — Júlia disse, rindo. Respirou


aliviada, queria preparar o terreno antes de contar.

Enquanto comiam, a dona do apartamento contou sobre a


conversa que ela e Ângelo tiveram com o advogado criminalista.

— Ele disse que não adianta denunciar.

— Por que, amiga? — Ana indagou.

— Ao que parece, colocar droga na bebida de alguém não é


crime no Brasil — respondeu, indignada.

— Como assim? — Isadora exclamou, horrorizada. — Isso não


faz sentido.

— É complicado, tem a ver com a intenção por trás do ato, algo


assim. — Júlia parecia desolada. — Como não teve nenhuma
consequência, fica difícil provar o que ele queria dopando a gente.
Além disso, não tem como provar que foi ele quem botou a droga na
bebida. Ninguém viu e não tinha câmera no camarote.

— Que absurdo isso! — Marcela esbravejou. — O depoimento


de vocês e um exame de sangue deviam bastar...

— Eu também acho — Ana concordou.


— Ângelo disse o mesmo, mas o advogado disse que
poderíamos ter nos drogado propositalmente. Então seria nossa
palavra contra a dele.

— Que triste, amiga! — Isadora disse, pegando em sua mão.

— Da justiça divina ninguém foge... — Júlia deu de ombros.

— Eu também quero falar algo — Isadora disse, estava muito


nervosa.

— Guilherme te pediu em namoro? — Marcela perguntou.

— Não podia estar mais frio. — Respirou fundo para criar


coragem. — Tem uma coisa que não contei para vocês, que
aconteceu no dia da festa que beijei a Marcela.

— Se apaixonou por mim, amiga? — Todas riram da


brincadeira.

— Eu sempre fui apaixonada por você — respondeu, mandando


um beijo para a amiga, que retribuiu. — Na verdade, não contei que
depois da festa, eu e Gabriel transamos.

A cara de choque das três foi muito cômica. Ela sentiu como se
tivesse contado que era uma alienígena vinda do espaço. Se não
estivesse tão tensa, teria rido.

— Você está brincando, é claro — Júlia comentou, rindo, mas


ela não retribuiu o sorriso, e logo a amiga ficou séria também.

— Puta que pariu, é verdade! — Marcela esbravejou. — Por


que você não contou pra gente?
— Eu estava muito bêbada e não foi importante — explicou,
olhando nos olhos dela. — Também fiquei com medo de você ficar
chateada, por ter beijado ele aquele dia.

Ana se mantinha calada até então, mas sua expressão era


pensativa.

— Amiga, por que você resolveu contar isso agora? Depois de


tanto tempo? — Como sempre, ela era muito perspicaz.

— Descobri que estou grávida dele.

Seguiram várias exclamações de “caramba!”, “puta merda!” e


“meu Deus!”.

— Não sabem o que é camisinha? — Júlia criticou, revirando os


olhos.

— Ei, gente, nossa amiga está precisando de apoio aqui. — Ana


levantou e correu para lhe dar um abraço. — Pode contar com a
gente sempre.

Depois as outras imitaram o gesto.

— Eu realmente acreditava em vocês quando diziam que eram


somente amigos — reclamou Júlia. Optou por não rebater que eram
somente amigos, pois ia ser desgastante e elas iam iniciar uma
conversa cheia de embates. — Mas claro que pode contar com meu
apoio.

— Vem aqui, amiga. — Marcela a abraçou forte. — Vai ter


briga para saber quem vai ser a madrinha dessa criança. Te amo
muito, pode sempre me contar qualquer coisa. Como estão as coisas
entre vocês? Ele quer essa criança?

— Claro, na verdade, ele está bem empolgado. Eu que estou


com um pouco de dificuldade com tudo isso.

Contou como foi a conversa com Guilherme e que andava


irritada com tudo, além de que aconselhou Gabriel a namorar e que
agora se sentia sozinha.

— Acho que essa irritação é normal — Ana disse. — Mas


acredito que você não devia interferir na vida amorosa do Gabriel.

— Gabriel é bem grandinho pra saber o que fazer da vida dele


— Marcela retrucou. — Não vai fazer algo só porque Isadora
sugeriu.

— Acho que você devia fazer ioga, amiga — Júlia aconselhou.


— O que você está passando é barra pesada.

Ela prometeu pesquisar sobre isso e mudaram de assunto,


fazendo a conversa fluir mais leve e animada. Após o almoço, e o
sorvete de sobremesa, desceram para a área de lazer. Mesmo com o
sol forte, estava frio, então todas colocaram seus casacos.

Júlia tinha reservado a quadra de beach tennis para elas.


Iniciaram o jogo. Isadora e Ana contra Marcela e Júlia. Foi um jogo
acirrado, mas suas rivais venceram duas partidas e elas uma. Apesar
de derrotada, a ruiva se divertiu como nunca.

Devido ao frio, esqueceram de usar protetor solar, e Isadora foi


a que ficou com o rosto mais queimado. Sua pele branca demais
sempre foi muito sensível ao sol, então devia ter sido mais
precavida, já que isso não era uma novidade para ela.

Às dezoito horas se despediu das amigas e pediu um carro por


aplicativo. Chegou em casa meia hora depois, e para sua surpresa,
Gabriel estava na sala, assistindo um filme.

— Meu Deus! Você devia tomar cuidado com o sol — comentou


assim que a viu.

— Olá para você também — resmungou e ele riu.

— Fiquei assustado quando te vi. Oi! — se redimiu. — Pelo


visto, a reunião foi animada.

— Foi sim, meio tensa, mas legal. — Sentou ao seu lado e


colocou a mochila na mesa de centro, erguendo os pés e colocando
em cima dela. — Júlia acha que eu devo fazer ioga.

— Concordo com ela, você anda muito nervosa, pode fazer


bem.

— Está me chamando de estressada? — perguntou, brincalhona,


estreitando os olhos de forma acusadora.

— Jamais — respondeu, irônico. — Nunca vi pessoa mais


relaxada. — Ela revirou os olhos.

— Cadê a Nádia?

— Você não espera que a gente fique grudado 24h ou que eu me


mude para a casa dela, né?
— Não disse isso, mas vocês andam tão unidos ultimamente...
— falou e deu de ombros.

— Que alívio, já pensei que ia ter que me mudar — brincou,


dramaticamente.

— Você faria isso se eu pedisse? — questionou, elevando uma


sobrancelha.

— Depende — ele ponderou — Se fosse te deixar mais


tranquila e o bebê saudável, acho que sim — afirmou.

— Está namorando a Nádia somente porque eu sugeri? —


perguntou, franzindo a testa, talvez Ana tivesse razão.

— Claro que não. Eu não quero ficar só e não estou com


paciência para procurar outra pessoa.

— Um relacionamento tem que ser mais profundo que isso. Não


acha sacanagem com os sentimentos dela?

— Não, eu expliquei que não sentia nada, mas que precisava de


alguém do meu lado, e ela concordou — explicou, dando de ombros.
— Ela também não quer se envolver, então estamos fazendo
companhia um para o outro.

— Nossa, que romântico! — ironizou.

Pesquisou sobre ioga para gestantes e viu que tinha diversos


benefícios, mas que teria que pedir autorização para sua médica.

A semana foi bem tranquila. Evitando café, ela não tinha


enjoos, mas os desejos por comidas estranhas continuavam. Gabriel
sempre ria dela e a zoava, mas comprava tudo que pedia.
N a sexta-feira sentia-se ansiosa, seria seu primeiro
ultrassom. Eles chegaram vinte minutos antes. Gabriel não
parava de balançar o pé direito.

— Pelo visto, não sou só eu que estou nervosa — ela disse,


colocando a mão no joelho dele e paralisando o movimento. Gabriel
riu e colocou a mão sobre a dela.

— Não é sempre que vemos nosso bebê pela primeira vez. —


Ela virou a mão, entrelaçando os dedos nos dele.

— Isadora Rafelly Ribeiro? — a enfermeira chamou. Os dois


levantaram, sem soltar as mãos. Isadora sentia um frio na barriga de
antecipação. — Por aqui. — Seguiram-na pelo corredor branco com
várias portas de madeira. Pararam no consultório três. — Você pode
tirar a roupa naquele banheiro, e coloque esse avental. — Ela
entregou uma sacolinha transparente com uma peça de roupa azul
dobrada dentro. — Não há necessidade de tirar a blusa. — Virou-se
para o seu amigo. — E você pode aguardar nessa cadeira.

Isadora soltou a mão do amigo e entrou no banheiro. Retirou a


calça e a calcinha e colocou o avental fino. Quando voltou para o
consultório, a doutora já estava sentada em frente ao computador,
com sua ficha em mãos.

— Bom dia, Isadora. — Ela sorriu. — Deite na maca. Ansiosa?

— Bom dia, dra. Fátima. Ansiosa é pouco. — Isadora contornou


a maca e subiu o primeiro degrau. Gabriel foi até o seu lado. Com
uma mão segurou seu braço e com a outra suas costas, ajudando-a a
subir.

— Dobre as pernas e coloque os pés no apoio. — Isadora fez o


que ela solicitou, grata por Gabriel não estar mais sentado, afinal,
sua posição era muito constrangedora. — Isso mesmo. — A senhora
colocou um pano sobre ela, depois pegou um preservativo e colocou
no aparelho comprido, que se assemelhava a um vibrador.

Isadora sentiu o rosto arder, talvez não tivesse sido uma boa
ideia Gabriel estar ali. A médica colocou um gel lubrificante e
introduziu em sua vagina. Percebeu, aliviada, que seu amigo estava
olhando fixamente para a parede.

— Muito bem, pais, esse aqui é o bebê. — Os dois olharam para


a tela. A doutora estava medindo um volume que estava fixo a um
arco, como se fosse um anel de diamantes.
— Esse anelzinho é o meu bebê? — perguntou, chocada, achava
que já ia ver um bebê formadinho.

— Sim. — A doutora riu. — O embrião está com três


milímetros, seis semanas de gestação. Ainda muito pequeno para se
observar detalhes.

— Ele está se mexendo. — Gabriel apontou com a voz


embargada de emoção.

— São os batimentos cardíacos, querem ouvir?

Os dois concordaram com a cabeça, e logo estavam ouvindo


batimentos muito rápidos. Gabriel segurou a mão de Isadora.

— Isso é normal, doutora? Parece tão rápido. — questionou,


preocupada.

— Os batimentos dos embriões são mais rápidos realmente. Ele


está com 150 batimentos por minuto, muito normal para a idade
gestacional.

Ao final do exame, a doutora entregou uma foto do seu anel de


diamantes/bebê. Ela e Gabriel ficaram muito emocionados. A partir
desse momento, sua ficha caiu: ia ser mãe!

Foram informados que estava tudo bem com o bebê. Teria que
retornar mensalmente e continuar tomando as vitaminas, além de ter
uma alimentação saudável e se exercitar. A ioga estava liberada. A
doutora Fátima entregou o cartão de uma clínica que trabalhava com
ioga para gestantes, disse que poderia ser interessante ela fazer,
ajudaria a melhorar a saúde emocional nesta etapa com tantas
mudanças. Gabriel pegou o cartão e agradeceu. Saíram mais leves
dessa consulta. Ligaram para a clínica e pegaram valores e horários.
T rês aulas de ioga depois, Isadora estava se sentindo outra
mulher. Não era somente o nervoso que foi embora, parecia
que conseguia pensar mais racionalmente. Uma constatação
que teve é que amava muito seu melhor amigo e não queria perder
sua amizade. Então parou de ser implicante e relaxou, logo eles
voltaram ao clima de camaradagem.

Finalmente a ideia de ser mãe não lhe dava nervoso ou


insegurança. Começou a sentir uma felicidade muito grande toda vez
que pensava no bebê. Queria que fosse menina, ruiva igual a mãe e
com os olhos do pai. Seria a criança mais linda do mundo.
Os enjoos aumentaram e tomava o remédio que a obstetra
passou, mas dificilmente ficava um dia sem vomitar. Gabriel era
sempre muito solícito, corria para pegar água e guardanapo para ela.
No trabalho, sempre levava o lanche na sua mesa, para que ela
evitasse de ir até a copa.

Parecia que nenhum de seus colegas desconfiavam de nada,


sempre foram muito próximos. A verdade é que a maioria já pensava
que eram um casal, e logo que Isadora iniciou na empresa, o
burburinho começou. Saiam juntos do trabalho, além disso tinham
proximidade e intimidade excessiva, algo que só uma amizade
profunda e de longa data poderia proporcionar. Nunca mais teve
notícias de Guilherme, esperava que fosse ligar para se desculpar,
mas não podia estar mais errada.

Quando chegou o sábado, Gabriel a convidou para irem em uma


boate nova que Nádia tinha levado ele. Chamou suas amigas e
começou a se arrumar cedo, queria ficar linda. Estava na sétima
semana de gravidez e sua barriga não estava mais negativa,
apresentava uma leve inclinação para frente, ainda não perceptível
nas roupas.
Colocou um vestido que seu amigo lhe deu, era o laranja de
ombro bufante. Ficou surpresa quando vestiu. Seus seios estavam
maiores, parecia que iam saltar para fora do decote. Foi até a sala,
Gabriel estava assistindo algum filme da Netflix.

— Gaby, o que você acha desse vestido? — perguntou e ficou


de olho em sua reação, queria saber se estava muito imoral.

Como ela imaginava, o olhar dele se fixou no decote e ele


entreabriu a boca levemente, antes de desviar os olhos, ruborizando.

— Não tem outro? — perguntou, sem desviar a atenção da tela.

— Eu sei — suspirou. — Esse está muito feio no busto.

— A palavra certa não é feio — corrigiu.

— Você acha que dá para usar?

— Acho melhor não. — Ele pareceu nervoso. — Se tiver outro,


é melhor — concluiu.

Ela voltou para o quarto desanimada e ficou meia hora


experimentando roupas. A maioria estava pequena nos seios, só um
ainda servia perfeitamente. O vestido preto com alça de strass que
usou no dia que ela e Gabriel transaram. Não estava muito a fim de
usar ele, mas não teve escolha.

Depois de uma maquiagem caprichada, passou perfume e foi ao


encontro de seu amigo. Ele estava com uma calça jeans, tênis azul
com detalhes cinza, uma camiseta social preta, com os primeiros
botões desabotoados e a manga dobrada no antebraço. Era
estruturada e caia muito bem nele, evidenciando os músculos do seu
tórax e braços. Realmente muito lindo. Como não percebia isso
antes?

— Gostou? — perguntou, convencido, ao observar sua


inspeção.

— Só porque tem olho azul acha que é bonito? — brincou,


sempre falava isso quando ele começava a se achar.

— Esses olhos fazem bastante sucesso — rebateu, rindo.

Desceram para o estacionamento e pegaram o carro. Quando


saíram para a rua, ele avisou:

— Vamos passar para pegar a Nádia.

— Por que você não disse? Eu podia ter sentado no banco de


trás.

— Não precisa disso.

Cinco quadras depois, ele parou o carro e enviou uma


mensagem para ela, avisando que chegaram. Isadora abriu a porta e
seu amigo pegou seu braço.

— Nem pense nisso.

Ela suspirou, resignada, desse jeito a namorada do amigo nunca


ia gostar dela. Nádia logo percebeu que o banco da frente estava
ocupado e foi direto para a porta traseira. Entrou e fechou a porta,
sentou no meio e se inclinou para frente, beijando a bochecha de
Gabriel.

— Boa noite, mozão! — a loira cumprimentou.


Mozão? Mas já?

Não parecia sem envolvimento, como seu amigo informou


anteriormente.

— Boa noite, mozinho! — Olhou boquiaberta para Gabriel, que


correspondeu ao olhar com um sorriso amarelo no rosto.

Por que ele mentiu? Sentiu uma dor no peito, que atribuiu ao
fato de seu amigo mentir.

— Boa noite, Isadora — disse para Isadora, por quem não


passou despercebido o desânimo na voz.

— Boa noite! — Virou para ela e deu um sorriso que esperava


parecer verdadeiro, mas que duvidava bastante.

A dor no peito piorou quando chegaram na festa e Nádia se


agarrou ao pescoço de Gabriel. Só faltou o engolir num beijo voraz.
Virou de costas para o casal que só faltava fazer sexo explícito no
meio do salão.

Suas amigas vieram e estavam muito animadas. Ficou chocada


por Marcela não se importar com a demonstração de intimidade
excessiva entre seu amigo e sua acompanhante, afinal, não era ela
que estava a fim dele até pouco tempo atrás?

— Você não se importa nem um pouquinho? — perguntou pela


milésima vez.

— Não, amiga, já desencanei, juro! Não precisa se preocupar —


falou, sorrindo.
Isadora era a única que não podia beber, então Gabriel
perguntou se podia dirigir seu carro, e ela virou a motorista da
rodada. Enquanto todos já estavam alegrinhos, ela estava bocejando.
Tentou se animar, dançando com as amigas, mas estava muito
cansada. Viu Nádia se desenroscando de seu amigo e saindo em
direção ao banheiro, e ele se aproximou.

— Você não parece muito animada — comentou.

— Estou só um pouco cansada — disse, sem conseguir segurar


um bocejo.

— Então vamos embora.

— Não, eu não quero estragar a festa de vocês. — Ele virou os


olhos.

— Você nunca estraga, Fiona. — Ela sorriu e ele retribuiu com


um sorriso grande e sincero, aparecendo uma covinha em sua
bochecha, que fez o seu coração aquecer.

Nádia voltou e se pendurou novamente no seu amigo, e a dor no


peito voltou. Descobriu que não gostava da menina, que não sabia
manter uma conversa sem se agarrar em Gabriel. Ele se desvencilhou
do beijo e falou alguma coisa no ouvido dela, em seguida a jovem
fez uma careta e falou algo no ouvido dele. Pareciam estar
discutindo. Isadora virou de costas para o casal, fingindo mexer no
celular, não queria ser indiscreta. Depois de alguns minutos, seu
amigo se aproximou e falou em seu ouvido:

— Vamos.
Segurou a mão dela e a puxou. Não teve tempo de protestar ou
se despedir de suas amigas. Fez uma varredura rápida com os olhos
no local e viu elas dançando. Era Henrique falando no ouvido de
Marcela? Nem sabia que ele estava ali. Estavam todos tão entretidos,
que nem viram eles saírem.

Entraram no automóvel e Isadora gelou. Sorte que o carro era


automático, não poderia ser tão difícil. Dirigiu com cautela, não era
acostumada com o trânsito de São Paulo.

— Está tudo bem entre você e Nádia? — perguntou com


suavidade, e ele suspirou.

— Está tudo bem.

— As coisas entre vocês parecem intensas. — Não resistiu em


alfinetar. — Bem diferente do que você tinha comentado.

Ele deu de ombros.

— Esse é o jeito dela. — Permaneceram um tempo em silêncio.


Passados alguns minutos, ele voltou a falar: — Já disse que você até
que está bonitinha hoje, Fiona?

— Não, você estava mais preocupado em receber elogios.

Ele sorriu.

— Estava só implicando com você.


S ete semanas passaram rapidamente. Uma pequena barriga já
despontava e Isadora decidiu que era hora de contar para
sua família. Já tinha se acostumado com a ideia e andava
mais tranquila, a ioga era excelente e ajudava muito. Estava com
quatro meses de gravidez e usava roupas largas no trabalho, mas não
conseguiria esconder por muito mais tempo. No sábado de manhã,
sentaram no sofá e fizeram a fatídica chamada de vídeo.

— Temos uma novidade — anunciou após os cumprimentos.

— Voltaram? — sua mãe perguntou com expectativa. Gabriel


segurou sua mão, para lhe dar força.
— Quer que eu conte? — questionou, baixinho, e ela negou.
Respirou fundo e percebeu que sua mãe estava ansiosa.

— Não voltamos, mãe. — Seus pais ficaram confusos. — Na


verdade, estamos grávidos. — Isadora sempre achava a abordagem
direta a mais certa.

Os dois ficaram calados, mas o espanto era visível em seus


rostos.

— Vocês podem ficar tranquilos, que assumirei toda a


responsabilidade — Gabriel explicou. — Serei o melhor pai para
essa criança.

— Então vou ser avô? — Seu pai deu um sorriso nervoso.

— Sim, e quero que vocês prometam que não vão falar nada
para os pais do Gabriel, nós queremos dar a notícia.

— Tudo bem, filha, confesso que fui pega de surpresa, mas


estou feliz. — Sua mãe sorriu levemente. — Sempre quisemos um
netinho.

— Vocês têm certeza que não tem volta? — seu pai perguntou.
— Digo, agora que tem um bebê, deveriam pelo menos tentar.

— Não, pai. — Isadora respirou fundo. — É de comum acordo


que não combinamos, e um filho não deve ser o único motivo para
um casal ficar junto.

— Tudo bem, filha, vocês são adultos e não vamos interferir.

Achou a conversa bem tranquila, mostrando que seus pais


sempre sabiam surpreender. Porém, a conversa com os pais de
Gabriel não foi nada fácil.

— Você precisa ser responsável, filho, como vou olhar na cara


de Miguel depois disso?

— Não estou negando minha responsabilidade, pai — seu


amigo explicou. — Vou cuidar de Isadora e desse bebê, vou fazer o
que estiver ao meu alcance.

— Um neto meu nascendo com pais separados, pelo visto não te


criei bem, Vitor — Laura reclamou, com voz de choro.

— Vocês precisam entender que é uma decisão conjunta —


Isadora interveio. — Não foi Gabriel que decidiu sozinho, nós não
demos certo.

— Se não deram certo, a culpa é de Vitor — Raul sentenciou.

— Pai, vamos desligar, vocês precisam de um tempo. — Sem


esperar resposta, ele desligou a chamada.

Sempre ficava admirada com a paciência de seu amigo com os


pais. Se fosse os seus agindo assim, ela explodiria.

— A vantagem nisso tudo é que estão tão preocupados com


nosso rompimento, que a gravidez em si não pareceu afetá-los —
disse, passando a mão no pescoço e tentando desfazer a tensão ali.
Gabriel percebeu seu movimento.

— Você parece tensa, vem aqui que eu te faço uma massagem.


— Era tudo que estava precisando naquele momento.

Se aproximou e sentou de costas para ele. Relaxou conforme as


mãos hábeis trabalhavam na sua nuca. Gemeu quando pressionaram
uma região dolorida.

— Cuidado, Gaby! — reclamou, e ele parou na hora.

— Desculpa, acho que seria melhor com creme ou óleo.

— Eu tenho um creme hidratante no meu quarto — disse,


levantando e indo buscar. Assim que encontrou, se virou e viu
Gabriel escorado na porta do seu quarto.

— Por que você não tira a blusa e deita? — A voz grave e baixa
dizendo essas palavras fizeram um calafrio percorrer seu corpo. —
Vai ficar mais fácil fazer a massagem. — Na mesma hora percebeu
que estava sendo ridícula e riu.

— Vira de costas, então. — Seu amigo virou, obediente, e ela


tirou a camiseta, ficando com o conjunto de lingerie de renda branco
e sua saia rosa. Deitou de bruços. — Pronto — avisou e logo sentiu o
colchão ceder ao seu lado.

Ele pegou o pote de suas mãos e ela tremeu ao toque do creme


gelado contra sua pele.

— Qualquer desconforto, você me avisa.

Sentiu uma pressão contra a lateral de suas nádegas. Olhou para


baixo e observou que seu amigo tinha se apoiado com um joelho de
cada lado dela, mas sem colocar o peso sobre o seu corpo. Os toques
começaram e suspirou de prazer, fechando os olhos. Ele realmente
tinha ótimas mãos, e deslizava por suas costas com a pressão certa.
Gabriel abriu o feche do seu sutiã e passou a fazer movimentos de
vai e vem ao longo da sua coluna, depois repetiu o trajeto, mas agora
com pequenos círculos até a lombar.
— Nossa! Isso é muito bom! — elogiou.

Não queria que acabasse e os toques estavam deixando-a muito


relaxada. Ele inverteu o movimento, deslizou as mãos da base da
coluna até sua nuca.

— Você ficou toda arrepiada — sussurrou e ela pôde sentir seu


hálito contra a sua pele. Uma descarga elétrica passou por seu corpo,
indo parar entre suas pernas, e ela pressionou as duas naquele ponto,
tentando conter aquela sensação. — Onde você quer que eu te toque
agora? — perguntou, sugestivo.

Sugestivo? Não, certamente é minha mente fértil. Malditos


hormônios!

— Tenho sentido dor nas pernas. — Se surpreendeu de como


sua voz saiu rouca.

Sentiu o peso do seu corpo se deslocando, percebendo que


estava entre suas pernas agora. Ele deslizou as duas mãos por toda a
coxa direita, até alcançar o joelho, e depois voltou fazendo o
caminho inverso, parando a poucos centímetros de sua calcinha.
Isadora se viu desejando que seus dedos subissem mais um
pouquinho, e percebeu que estava ficando molhada, mas ele não
pareceu perceber e mudou para a outra perna, repetindo o
movimento. Nunca a parte interna da sua coxa tinha despertado tanto
tesão nela. Ele desceu mais, trabalhando agora na sua panturrilha, e
ela respirou fundo, percebendo que segurava a respiração até então.

— Melhorou? — Tomou um susto com a voz do amigo, como se


tivesse sido pega no flagra fazendo algo errado. Não confiou na
própria voz para falar, então sacudiu a cabeça afirmativamente. —
Sempre que quiser uma massagem, é só pedir — disse solícito,
pegando agora um pé dela e pressionando deliciosamente de cima
para baixo todo ele, e depois cada dedo. Repetiu o processo no outro.

Sentiu o colchão voltando ao normal e virou. Gabriel já estava


de costas para ela, seguindo em direção à porta.

— Vou sair para você se vestir — explicou, sumindo de sua


vista rapidamente.

Estava confusa com todas essas sensações. O que estava


acontecendo com ela? Devia ser a mistura dos hormônios com a falta
de sexo. Levantou com as pernas trêmulas e fechou a porta,
trancando-a. Voltou para a cama e se tocou intimamente. Tamanha
era sua excitação, que chegou ao êxtase muito rápido. Fechou os
olhos e dormiu.
N a segunda-feira tinham uma consulta agendada para às dez
horas da manhã. Decidiram que era a hora de avisar à
empresa sobre a gestação. Chegaram e foram direto para a
sala do proprietário, Marcos. No escritório, ele aparentava ser outra
pessoa, sempre com terno preto. Até a argola na orelha fora
substituída por um brinco mais discreto e pequeno. Ele os recebeu
com um sorriso.

— Bom dia, Isadora! Gabriel, você anda sumido — reclamou,


mas seu tom era de brincadeira.

— Muitas coisas acontecendo, e é por isso que estamos aqui —


disse, puxando a cadeira para ela e sentando em seguida ao seu lado.
— Certo, como posso ajudá-los?

— Isadora está grávida. Além de avisar à empresa, gostaríamos


de pedir para sairmos mais cedo hoje, ela tem consulta às dez horas.
— O homem pareceu surpreso. — Eu sou o pai — esclareceu.

— Meus parabéns para os futuros papais! — Um sorriso sincero


brotou em sua face e cumprimentou cada um com um aperto de mão.
— Sabe, mesmo você negando tanto, sempre achei que rolava
química entre os dois — disse para seu amigo.

— Nós não estamos juntos — Isadora se pronunciou


rapidamente, fazendo Marcos elevar uma sobrancelha, surpreso. —
Longa história — emendou com um sorriso amarelo.

— Entendo. — Anuiu, confuso. — Bom, estão liberados sempre


que tiver consultas. Só preciso que me avisem com antecedência. É
direito do pai acompanhar duas consultas durante a gestação, mas
quem está contando, não é mesmo? — disse, piscando maroto para
Gabriel.

Após o término da conversa, cada um foi para sua sala. Até as


nove horas, a história de sua gravidez se espalhou pela empresa feito
pólvora. Logo começaram as felicitações e perguntas.

“Quantos meses?”

“Quem é o pai?”

“Já sabe se é menino ou menina?”

No caminho para a clínica, Gabriel contou que também foi


abordado por vários curiosos e que daria uma bronca no amigo assim
que tivesse uma oportunidade. Isadora o convenceu que era melhor
que todos descobrissem de uma vez, logo começariam as
especulações pelo tamanho de sua barriga.

Chegaram no horário previsto e entraram na sala da doutora


Fátima, que analisava atentamente alguns papéis atrás da mesa.
Sentaram de frente para ela e aguardaram.

— Como vai nossa gravidinha? — questionou assim que


finalizou.

— Estou bem, os enjoos diminuíram bastante — respondeu.

Tinha uma pergunta para fazer, mas estava em dúvida se faria


na frente de seu amigo. Já relatara coisas mais íntimas para ele no
passado, porém, agora parecia estranho falar na sua presença.

— Ótimo, isso é normal. Você está com treze semanas e dois


dias — disse, olhando sua ficha. — Como já está no início do quarto
mês, a tendência é que os enjoos parem — concluiu.

— Doutora, eu tenho uma pergunta — Gabriel falou. —


Grávidas podem receber massagem?

— Como Isadora está com uma gestação normal e saudável, não


vejo problema. Mas não deve pressionar a barriga, vocês podem usar
alguns travesseiros ou massagem de lado. — Ele anuiu, sorrindo, e
ela se encheu de coragem.

— Também tenho uma pergunta. — Respirou fundo e fixou o


olhar na cortina atrás da médica. — A gravidez faz as mulheres
ficarem mais excitadas? — perguntou em voz baixa.
Sentiu Gabriel se mexer na cadeira ao lado. As suas bochechas
pegaram fogo, devia estar muito vermelha. Não tinha como ele saber
que ficou excitada com sua massagem, se convenceu.

— Sim, a libido costuma aumentar no segundo trimestre, em


razão da maior irrigação sanguínea na região pélvica. — Ela
assentiu, agora tudo fazia sentido, eram somente os hormônios.

— E grávidas podem fazer sexo? — Arregalou os olhos. Por


que seu amigo estava perguntando isso?

— Não só podem, como devem — afirmou a médica. —


Quando a gravidez não é de risco, fazer sexo traz muitos benefícios.
— Começou a enumerar: — Controla a ansiedade, aumenta a
produção de anticorpos na gestante, melhora o humor e fortalece a
musculatura da vagina. — A médica concluiu: — Vocês podem ter
relações sexuais do primeiro ao último trimestre.

O uso da palavra “vocês” fez Isadora sentir um frio na barriga.


Lógico que Gabriel não estava se referindo aos dois. Certamente
estava pensando na saúde do bebê, caso ela quisesse ficar com algum
cara, conclusão óbvia, depois de praticamente ter afirmado sentir
mais tesão. Se tivesse um buraco no chão, ela certamente se
enterraria nele. Optou por não corrigir a doutora, essa conversa já
tinha sido mais do que constrangedora.

Isadora foi orientada a deitar na maca, levantar a blusa e abrir o


zíper da calça. A médica colocou lencinhos de papel, protegendo os
tecidos, e um gel muito gelado na sua barriga.

— Vocês querem saber o sexo do bebê? — perguntou, e o


coração de Isadora deu um salto no peito.
— Já dá para saber, doutora? — Gabriel perguntou, exultante, e
ela confirmou com um movimento de cabeça.

— Doutora, eu prefiro que escreva o sexo em um papel e


coloque dentro de um envelope, queremos fazer um chá revelação —
disse, mas lágrimas bobas rolavam por suas bochechas, e seu amigo
se aproximou, segurando sua mão e beijando sua testa.

Ela conseguia ver na tela um bebê formadinho, até os pezinhos


apareciam.

— O bebê é lindo — o futuro papai disse, com a voz falhada.

— Está tudo bem com ele? — perguntou, preocupada.

— Está tudo perfeitamente bem — a médica acalmou. — Vou


só pegar as medidas e depois darei uma foto para vocês.

Saíram da consulta em silêncio. Isadora estava muito feliz por


ter visto seu bebê, mas também estava muito envergonhada pelas
perguntas que fizeram para a médica. A doutora entregou um
envelope com o sexo do bebê, que ela entregaria para Ana. Ligou
para a amiga e marcaram o chá revelação para sábado, 10 de
setembro.

De noite, Gabriel fez uma pipoca, iriam começar uma série,


Pretendente Surpresa, que sua amiga Júlia tinha sugerido. Deitou de
lado, apoiando a cabeça na perna do amigo. A série era realmente
muito boa, estavam rindo bastante quando ela sentiu um chute na
barriga.

— Acho que o bebê mexeu — disse, assustada.


— Sério? — Gabriel parou a série, colocando a mão na barriga
dela. — Onde?

Ela guiou sua mão até o local. Ficaram um tempo assim e o


bebê chutou novamente.

— Eu senti — ele comemorou. — Oi, bebezinho. — Usou uma


voz calma e baixa.

— Você é doido, Gaby? — perguntou, rindo. — Não sabe se ele


pode te escutar. — Mas ele ignorou.

— Aqui é o papai, estou muito feliz que você está vindo —


disse com carinho e o bebê mexeu novamente.

— Foi coincidência — afirmou, divertida.

— Agora sua barriga é propriedade pública pra mim —


anunciou.

— Como assim? — Franziu a testa.

— Tenho acesso livre a ela sempre que eu quiser.

— Se eu permitir.

— Você vai permitir — disse, fazendo carinho na sua pele com


o polegar. — Não vou mais conseguir ficar longe dela.

Eles voltaram a assistir a série e Gabriel não tirou a mão de sua


barriga, por baixo da blusa. Aquele toque inocente e quente deixou
Isadora um pouco desconsertada, mas não fez nada para afastá-lo.

A semana seguiu e eles continuaram assistindo a série todas as


noites.
N a quinta-feira, Gabriel colocou dois travesseiros e deitou
de lado atrás dela, dessa forma ele ficava confortável para
tocar sua barriga. Mas o calor do seu corpo contra suas
costas deixava Isadora muito alerta. Ela sentia uma tensão sexual
muito grande, certamente devido aos hormônios. Às vezes, ele ria ou
falava, e seu hálito tocava sua nuca, deixando-a arrepiada.

— O bebê mexeu — Gabriel disse com bom humor.

— Ele sempre mexe mais à noite.

— Acho que é porque o papai está perto.

— Convencido — murmurou, rindo.


— Você devia usar uma camisa, eu queria sentir a barriga
direito — reclamou.

Isadora usava um vestido, e ele estava com a mão sobre ele. Ela
pegou a mão dele com a sua e puxou para baixo da barra do vestido,
subindo pelas suas pernas, até alcançar a pele de sua barriga. Dessa
forma, o vestido subiu junto com o braço dele, fazendo a lateral de
sua calcinha cor-de-rosa aparecer.

— Resolvido — disse, soltando sua mão. Sentiu Gabriel engolir


em seco e acariciar sua barriga com o polegar.

A série passava na tela, mas ela não conseguia prestar atenção.


Todas as suas terminações nervosas estavam naquele polegar fazendo
círculos contra sua pele. Sentiu uma protuberância dura atrás de suas
nádegas. Seu amigo estava excitado? Não podia ser. A curiosidade
era muito grande, então ela pressionou seus quadris contra aquele
volume e ouviu Gabriel gemer. Ele estava excitado. Seu coração
acelerou. Seu amigo ficou imóvel, ela só conseguia sentir a sua
respiração.

Isadora sabia que isso tudo era muito errado, ele era seu melhor
amigo e também comprometido com Nádia. Lembrou que nunca mais
tinha ouvido Gabriel falar ou sair com a loira.

— Como está a Nádia? — perguntou, baixinho. Ele suspirou.

— Não sei, não falo com ela desde a festa. — Sua voz saiu
bastante rouca.

— Vocês brigaram aquele dia?

— Sim.
— Por quê?

— Ela estava com ciúmes de você. — Isadora sentiu um frio na


barriga.

Colocou a mão por cima da dele e ficaram alguns minutos


assim, sem dizer ou fazer nada. Então Gabriel beijou o seu pescoço e
ela sentiu um arrepio gostoso. Ficou ansiosa por mais. Pegou a mão
dele e conduziu até sua calcinha. Ele não precisou de mais incentivo,
a tocou por cima do tecido e ela arfou. Sem parar de chupar seu
pescoço, puxou a renda para o lado e tocou seu clitóris. Gemeu alto
com o toque e ele começou a fazer movimentos circulares com o
dedo. Ela já estava muito excitada e o volume da calça dele estava
maior. Sem conseguir resistir, ela se esfregou contra sua ereção e ele
soltou um grunhido.

Tirou a mão da sua calcinha, fazendo-a ficar desapontada.


Virou-a de barriga para cima e deitou sobre ela, prendendo-a com
seu corpo. Eles estavam agora de frente um para o outro, e ela pôde
olhar dentro dos olhos azuis, percebendo as pupilas dilatadas.

— Você tem certeza? — A voz rouca jogou uma descarga


sexual por todo o seu corpo.

Ela não queria parar para pensar agora ou fazer qualquer coisa
que fizesse com que o desejo deles se aplacasse. Colocou uma mão
no seu pescoço e o puxou para um beijo. Os dois fecharam os olhos e
os lábios se tocaram, e aquilo pareceu tão certo. Os lábios dele se
moviam sobre os dela, explorando, sentindo. Ele mordiscou seu lábio
inferior e ela entreabriu a boca.
Naquele momento, Gabriel aprofundou o beijo, explorando sua
boca com a língua. Ela suspirou de prazer e começou a própria
exploração. Depois de alguns minutos, Gabriel abandonou a sua
boca, fazendo uma trilha de beijos e mordiscadas pela sua
mandíbula, até alcançar o pescoço, e desceu até o vale dos seus
seios.

— Você está com muita roupa — reclamou, puxando o vestido


dela pela barra. Ela ajudou e logo o tecido passou por sua cabeça.
Estava sem sutiã e viu ele prender o fôlego. Ficou envergonhada e
excitada na mesma proporção, ao ver o olhar de cobiça dele. — Eles
estão bem maiores — comentou, animado, tocando um com a mão.

Ele passou o polegar pela aréola rosada e ela segurou um


gemido, enquanto uma onda de prazer percorreu seu corpo, saindo
daquele ponto e indo até o meio de suas pernas. Gabriel percebeu sua
inquietação e deu um sorriso safado, ficando ainda mais sexy. Se
aproximou, contornando a aréola com a língua, e depois chupou com
vontade. Naquele momento, ela não conseguiu mais se segurar e
gemeu com fervor.

— Que gemido gostoso! — falou contra sua pele, enquanto


chupava um seio e estimulava o outro com a mão.

Com a mão livre, ele tentava abaixar sua calcinha. Assim que
conseguiu, tocou novamente seu ponto mais sensível, e ela achou que
fosse morrer de tanto prazer. Gabriel abandonou seus seios e desceu
beijando seu umbigo, em seguida continuou descendo.

— O que você está fazendo? — perguntou, nervosa.


— Você já vai ver. — Ele não vai fazer o que imagino que ele
vai fazer, pensou, nervosa. Quando ele ficou entre suas pernas,
Isadora achou que morreria de vergonha.

Gabriel começou lambendo seu clitóris. Fechou os olhos,


nunca tinham feito isso nela e estava envergonhada, mas também
muito excitada para protestar. Sentir a língua naquele ponto sensível
foi arrebatador, teve que se segurar para não gozar.

— Caramba! Isso é muito bom! — Tanto que não queria que


acabasse tão cedo. Ele a penetrou com um dedo.

— Tão molhadinha — Gabriel gemeu e voltou a estimular o


clitóris com a língua. Dessa vez, ela não conseguiu se segurar, e
sentiu o ápice como uma explosão dentro de si, atingindo o êxtase e
ficando lânguida e satisfeita em seguida. — Estava doido para sentir
seu gosto — disse, levantando com um sorriso no rosto. — Não
tínhamos feito isso na primeira vez — explicou, enquanto tirava a
própria roupa.

Ela ficou com a boca seca diante da sua nudez. Na primeira vez
que o vira nu, não registrara muitos detalhes, a pouca luminosidade e
o choque atrapalharam. Claro que já tinha visto os ombros largos e o
peitoral musculoso diversas vezes, mas a visão do conjunto completo
era demais. As pernas grossas, o quadril estreito e os ombros
largos... Era uma surpresa para ela sentir essa atração por Gabriel.
Nunca sentiu isso por nenhum homem musculoso. Mesmo quando
tentou ficar com Henrique, não foi por se sentir atraída fisicamente
por ele, ela só queria ficar com alguém, mas agora estava muito
excitada com a imagem de sua nudez.
Além disso, Marcela tinha razão, era enorme e grosso. Nunca
tinha visto um tão grande. Ela podia ver uma gotinha de lubrificação
na ponta, e umedeceu os lábios, com vontade de sentir o seu gosto
também.

— Não faz essa cara safada para mim — gemeu, se


aproximando. — Eu quero te foder todinha — falou, e um arrepio
percorreu seu corpo com a promessa. Ele mostrava um lado sacana
que ela não conhecia, mas estava adorando.

— Eu também quero sentir o seu gosto — disse com a voz


rouca.

— Você vai sentir, Fiona — falou, subindo novamente sobre


ela. — Mas agora eu preciso estar dentro de você.

Como ela também queria muito isso, não colocou objeção.


Sentiu o peso do corpo dele sobre o dela e se beijaram. Era um beijo
desesperado e urgente. Ela subiu as pernas, rodeando seu quadril, e
podia sentir sua ereção tocando-a onde mais queria. Arfou contra sua
boca quando ele começou a penetrá-la. Sentiu um leve desconforto,
mas não reclamou.

— Tão apertadinha, Isa — Gabriel gemeu, largando seus lábios.


Ele foi avançando lentamente, até estar completamente dentro dela.
— Está tudo bem?

— Me fode logo, Gabriel! — reclamou, impaciente, fazendo-o


rir.

Ela estava sentindo dor, mas sabia que não era nada relacionado
à gravidez. Somente não estava acostumada ao seu tamanho. Estava
fazendo de tudo para não transparecer seu desconforto, conhecia
muito bem seu amigo, e caso percebesse, pararia na hora.

— Que boca suja, Fiona! — Recuou, saindo quase que


completamente, e voltou a preenchê-la em seguida. Os dois arfaram
com a sensação. — Que gostosa, Isa! — Agora o ritmo era intenso.

Isadora não conseguia parar de gemer, conforme ele entrava e


saia de dentro dela, com qualquer desconforto esquecido. A cada
estocada, seu clitóris era estimulado, fazendo ondas de prazer
percorrerem o seu corpo.

— Não para! — gritou. Parecia que estava próxima de um


orgasmo, mas isso era impossível. Não conseguia gozar com
penetração. Esqueceu o pensamento, conforme o prazer ia se
intensificando. — Mais forte, Gabriel! — Ele acatou seu comando e
intensificou ainda mais o ritmo. — Puta merda! Isso está muito
gostoso! — gritou entre gemidos.

— Eu quero que você goze pra mim — ele pediu, e ela queria
tanto. Sentiu a mão de Gabriel entre eles, chegando até o seu clitóris,
e gemeu alto quando ele começou a estimular aquele volume sensível
sem parar de penetrá-la. — Você é muito gostosa!

— Gaby — murmurou e se agarrou aos braços fortes dele,


fincando instintivamente as unhas na sua pele, e logo sentiu a
explosão e espasmos por todo o corpo.

Assim que seu corpo relaxou, sentiu-o latejando dentro de si, e


Gabriel caiu sobre seu corpo, gemendo. Notou seu coração acelerado
e sua pele toda suada contra a sua.
Conforme seus batimentos cardíacos e respiração voltavam ao
normal, um desespero começou a se apoderar dela. O que eles
fizeram? Para ela, Gabriel era muito mais que seu melhor amigo.
Toda vez que estava em apuros, triste, nervosa ou brava, ali estava
ele. Com exceção de seus pais, era a única pessoa em quem confiava.

Existem amigos que te escutam, te confortam e te aconselham.


Esses são bons amigos. Porém, existe "aquele" amigo, que não
somente te apoia, ele é capaz de te resgatar do fundo do precipício,
consegue enxergar tuas inseguranças, traumas e tristezas e te trazer
de volta à luz. Gabriel é assim para mim, meu porto seguro, e não
posso perder isso!

— Gabriel... — chamou timidamente, mais nervosa do que


gostaria. Ele levantou o rosto, olhando dentro de seus olhos.

— O que foi? Você está bem? — perguntou, preocupado,


apoiando o peso no braço.

— Estou bem, mas precisamos conversar. — Ele suspirou,


aliviado.

— Vou pegar água pra gente.

Gabriel levantou com cuidado e saiu pelado em direção à


cozinha.

Que bunda maravilhosa!

Seria melhor se não estivessem nus. Pegou seu vestido, sua


calcinha e vestiu rapidamente. Assim que ele retornou com a água,
entregou o copo cheio para ela. Isadora evitou olhar sua nudez,
apesar de sentir muita vontade de dar mais uma espiada.
— Acho melhor você se vestir — pediu, sentindo suas
bochechas ruborizarem. Ele fez o que ela disse e sentou ao seu lado.

— Então, o que você quer falar? — perguntou, cauteloso. Ela


respirou fundo e colocou o copo na mesinha de centro.

O coração de Gabriel batia forte no seu peito, e não era pelo


esforço físico que fizera no melhor sexo da sua vida. Estava ansioso
pelo que vinha a seguir. Isadora estava séria e ele temia pelo que
fosse dizer.

— Eu quero que você entenda, Gabriel, que eu agi assim por


causa dos hormônios. Eu me sinto diferente desde que engravidei, é
muito confuso, não consigo explicar. — Ela torceu as mãos, nervosa.
— Nada disso devia ter acontecido, você também está envolvido só
porque estou carregando um bebê seu. É normal isso tudo mexer com
as pessoas, mas não quero que nossa amizade seja prejudicada.

Hormônios? Respirou fundo. É lógico que ele estava envolvido,


mas não era somente pela gravidez. Se envolveu na noite que teve
ela em seus braços pela primeira vez. Desde aquela noite, sua vida
simplesmente mudou, Isadora estragou todas as outras mulheres para
ele. Não conseguiu sentir desejo por nenhuma outra. Se manteve
afastado porque era isso que ela queria, mas estava secretamente
sofrendo muito.

Percebeu seu recente interesse pelo seu corpo, Isadora era


muito transparente e conseguia ver desejo em seus olhos. Foi nítido
para ele que ficou enciumada com Nádia. O mais difícil foi ver como
reagia a cada toque seu. Quando fez uma massagem nela, teve que
usar todo o seu autocontrole para não a tomar nos braços. A tensão
sexual era palpável, não entendia como ela não sentia.

— É lógico que isso não vai atrapalhar nossa amizade —


tranquilizou-a. — Se o que aconteceu entre a gente é fruto dos seus
hormônios e o meu envolvimento com o bebê, você não acha que vai
acontecer novamente? Nem seus hormônios e nem o meu
envolvimento vão diminuir — ponderou.

— Você tem razão. — Ela mordeu o lábio inferior. — Acho que


não tem problema acontecer de novo. — Ruborizou, ficando ainda
mais linda. — Se não nos envolvermos de verdade. Precisamos só ter
cuidado para não atrapalhar nossa amizade e ter em mente que isso é
temporário. O que você acha?

— Está dizendo que devemos fazer sexo sempre que sentirmos


vontade e depois vamos fingir que nada aconteceu? — Tentou
entender.

— Isso mesmo. — Ela sorriu e seu coração palpitou.

Meu Deus! Ela não estava brincando quando disse que uma
mulher ia virar minha cabeça e depois me esnobar.
Se ele tivesse amor-próprio, fugiria correndo dali, mas tudo o
que mais queria era ficar perto dela, mesmo que isso machucasse.

— E como você acha que vamos fazer para não nos


envolvermos de verdade? Duas pessoas que vivem juntas,
transando... É possível não ter envolvimento?

— Eu achei que você entendesse mais disso do que eu. Você


sempre fica com várias garotas sem se envolver — apontou.

— Fico por uma noite, não moro com elas.

— Temos que estabelecer algumas regras, então.

Ele suspirou, sua cabeça estava latejando.

— Vou deixar as regras para você, preciso dormir. — Levantou.


Queria beijá-la, mas não seria possível depois do balde de água fria
que jogou nele. — Boa noite!

Isadora demorou a dormir, estava empolgada com a


possibilidade de poder fazer sexo sempre que tivesse vontade. Desde
que descobriu que estava grávida, não se envolveu com ninguém.
Sua maior empolgação foi pelo sexo em si, que foi simplesmente
espetacular. Os hormônios da gravidez deviam ser engarrafados e
comercializados, ela seria a primeira a comprar.

Antes, o ato sexual para ela era agradável, algumas vezes


chegou até a ser levemente prazeroso, mas estava mais relacionado a
algo que gostava de fazer, parecia trazer mais proximidade com seu
parceiro. Nunca esteve associado ao prazer intenso que sentiu, muito
menos ao orgasmo. Por causa dos hormônios, teve o melhor sexo da
sua vida, e estava doida para repetir a dose. Ele não tinha culpa que
os hormônios estavam deixando-a insaciável, mas poderiam
aproveitar a situação juntos.

Teria que ser cautelosa, ou acabaria estragando sua amizade


com Gabriel. Não poderia se apaixonar por ele. Seu melhor amigo
nunca iria amar alguém igual ele amou Clara. Ela conhecia muito
bem os padrões de relacionamento dele, eram ficadas eventuais, um
típico pega e não se apega. E se não protegesse seu coração, acabaria
muito machucada. Nunca esqueceria o que fez com Pietra, sua ex-
colega de trabalho. De todas as mulheres nesse mundo, Isadora se
considerava a maior conhecedora do coração frio e insensível dele, e
nada justificava se apaixonar por alguém assim.

Pensou bastante, deitada na cama, e achou certo estipular uma


lista de regras, então enumerou no bloco de notas do celular.
Satisfeita, adormeceu.
A cordou com a batida de seu amigo na porta. Uma vergonha
se apoderou dela, como o encararia depois do que
fizeram? Agora entendia porque Gabriel ficou estranho
após o primeiro sexo deles. Respirou fundo e levantou.

Abriu a porta. Ele não se encontrava na sala ou na cozinha,


correu para o banheiro. Após um banho, colocou sua roupa, um
vestido longo e soltinho, e foi até a cozinha. Gabriel estava com os
cabelos molhados, uma camisa social azul-claro e uma calça jeans,
sentado na mesa com uma xícara de chá. Assim que a viu, sorriu, e
seu coração acelerou. Desviou os olhos, ruborizando.

— Bom dia! — seu amigo cumprimentou. — Dormiu bem?


— Bom dia! Sim, e você? — respondeu, sentando.

— Estava com bastante dor de cabeça ontem, mas amanheci


melhor. Comprei bolo para você — disse, pegando uma embalagem
em cima da mesa. Isadora sorriu, nada melhor do que começar o dia
com bolo.

— Chocolate! — exclamou, extasiada. — Sabia que eu te amo?


— perguntou espontaneamente, pegando o pacote, mas ruborizou em
seguida. Sentiu um desconforto, tinha que parar com esses
comentários.

— Sim, eu sei. — Sua resposta não veio acompanhada do


costumeiro bom humor. A situação estava estranha.

Terminaram de comer em silêncio. No trajeto para o trabalho,


dentro do carro, Isadora resolveu falar da lista que elaborou noite
passada e que poderia acabar com esse clima estranho.

— Eu elaborei seis regras, você quer ouvir? — perguntou


timidamente.

— Pode falar. — Ela abriu o bloco de notas.

— A primeira regra é que o sexo tem que ser no escuro. — Para


Isadora era a regra mais chata, mas a nudez de Gabriel mexeu muito
com ela, e isso era justamente o que não devia acontecer. Ele
respirou fundo.

— Pode uma vela?

— Não, a ideia é que não devemos ver o outro pelado.

— Tirou 50% da graça. — Sorriu malicioso.


— A segunda regra é que não pode beijos ou carícias fora da
cama. — Ele não fez nenhum comentário, então ela continuou: —
Terceira regra é que não devemos falar sobre o que aconteceu depois.
— Seu amigo franziu a testa, mas continuou calado. — Quarta regra
é nunca dormir juntos.

— Já dormimos juntos várias vezes antes — lembrou.

— Mas agora pode ser confuso — explicou. — Quinta regra é


usarmos nomes falsos.

— Nomes falsos? — perguntou, elevando uma sobrancelha.

— Sim, acho essa uma regra importante. No escuro, usando


outros nomes, pode ajudar a não rolar envolvimento.

— Tipo Christian Grey e Anastasia? — Ele caiu na gargalhada.

— Estava pensando mais em Jack e Rose — brincou, rindo


também.

— Nossa, que brega! Prefiro o Christian. — O ataque de riso


cessou.

— A última regra é que devemos ficar com outras pessoas. —


Gabriel respirou fundo, parou o carro no estacionamento da empresa,
tirou o cinto e virou para olhar dentro de seus olhos.

— Tem certeza?

— Sim. — Sua boca ficou repentinamente seca com a


intensidade do seu olhar. — Marcela sempre diz que o segredo para
não se apegar é ficar com vários — explicou, nervosa.
— Ela tem razão — disse num sussurro. Se aproximou e
colocou uma mecha de cabelo atrás de sua orelha. — Mas você não
tem se envolvido com ninguém — falou suavemente, deixando as
pontas dos dedos descerem pelo seu pescoço. Um arrepio percorreu
sua espinha. — Não acha isso meio injusto? — Sua pulsação
acelerou quando ele se aproximou ainda mais. Ela olhou para seus
lábios e uma enorme vontade de beijá-lo se apoderou dela. — Além
disso, você acha que vai ficar tranquila sabendo que estou tocando
outras mulheres? — Com o polegar, acariciou o contorno da sua
mandíbula, subindo e tocando seu lábio inferior.

— Vou ter que aprender a conviver com isso — murmurou com


a voz rouca.

Em seguida, soltou o cinto e desceu do carro. Se surpreendeu


em como suas pernas estavam um pouco bambas. Fechou a porta do
carro, respirou fundo e seguiu para o elevador. Ficou aliviada quando
percebeu que Gabriel permaneceu dentro do carro.

O dia de trabalho transcorreu normalmente, mas estava ansiosa


pela noite e o que a aguardava. Certamente, ela e seu amigo iriam ter
uma noite intensa. Quando chegaram em casa, Isadora correu para o
banheiro, tomou um banho caprichado, não queria ficar jogada como
normalmente ficava, então procurou um pijama preto de renda que
tinha comprado há muito tempo, encontrou e vestiu.

Saiu do quarto e surpreendeu-se ao constatar que Gabriel não


estava na cozinha. Foi para seu quarto e também estava vazio. Pegou
o celular e enviou uma mensagem.
Isadora: Oi, onde você está?

Ele começou a digitar, parou e depois voltou a digitar


novamente.

Gabriel: Saí para jantar com uma pessoa.

Uma pessoa ou uma mulher?

Teve uma enorme vontade de perguntar, porém segurou o


impulso. A regra dela não dizia que deveriam sair com outras
pessoas? E era sexta-feira, afinal.
U m barulho insuportável interrompeu um sonho tão gostoso.
Bufando, Isadora se virou na cama, esticou-se e pegou o
smartphone na mesa de cabeceira. Era Marcela, sua amiga.
Atendeu ainda lânguida.

— Oi. — Sua voz era sonolenta e não conseguiu conter um


bocejo.

— Ainda está dormindo? — Bufou, incrédula. — Amiga,


estamos todos prontos. Você esqueceu?

Esqueceu? Do que sua amiga falava? Ah! Parque da Aventura.


Sentou rapidamente.
— Que horas são?

— Nove horas, corre! Lá abre às dez, mas não queremos pegar


trânsito.

— Tá, tá. Vou desligar. — Com tudo que aconteceu nos últimos
dois dias, acabou esquecendo do programa.

Correu para a cozinha, precisava engolir alguma coisa, de


estômago vazio passaria mal. Encontrou Gabriel em frente à
geladeira.

— Me passa um iogurte. Estou com pressa, acredita que esqueci


que era hoje o passeio com as meninas?

— Você não está pensando realmente em ir, né?! — Entregou o


iogurte, fazendo uma careta. Ela pegou o iogurte, uma colher na
gaveta e sentou.

— É claro que eu vou, estamos programando isso há um


tempão, e já está reservado.

— Mas você está grávida.

— Grávida, não inválida.

— É perigoso para o neném — ponderou, suspirando. — Eu não


posso deixar você ir.

— Como é que é? — gritou. — Você acha que manda em mim?


Deve estar doido.

— Seja razoável. O que você vai fazer lá? Eu andei


pesquisando, as atividades são intensas e não recomendadas para
grávidas. Você só pode tomar banho na cachoeira.

— Vou ser cuidadosa.

— Eu vou junto.

— Você não foi convidado — retrucou.

— Fui sim!

— Retiro o convite. — Ele sorriu.

— Eu vou sozinho, então. — Ela virou os olhos, terminou o


iogurte e saiu.

Tomou um banho rápido e vestiu um biquíni verde-escuro,


tomara que caia na parte de cima e cintura baixa, para não apertar a
barriga. Colocou um conjuntinho de short e camisa de folhas verdes
com fundo branco. Deixou a peça aberta, aparecendo o tomara que
caia e deixando o look mais despojado.

Organizou sua mochila, acrescentou protetor solar, saída


branca, escova de cabelo, toalha de banho e uma muda de roupa
extra. Pegou os óculos escuros, uma sandália e o celular. Enviou uma
mensagem para Marcela, andando em direção à sala.

Isadora: Amiga, estou pronta.

Marcela: Ótimo, estamos passando para pegar vocês.


Vocês? Gabriel apareceu usando uma bermuda preta, camiseta
branca, tênis azul e uma mochila nas costas. Ela estreitou os olhos.

— Marcela disse que tem vaga no carro. — Riu, dando de


ombros.

— Acho bom você não pensar que vai conseguir me impedir —


disse, cruzando os braços.

— Coloca um tênis, lá deve ser trilha, deixa a sandália na


mochila.

— É mesmo! — Voltou correndo para o quarto e fez o que ele


sugeriu.

Gabriel abriu a porta.

— Você está levando a jaqueta impermeável?

— Esqueci, vou pegar.

O trajeto até o parque foi animado. Foram no carro de Ângelo.


Júlia sentou no banco da frente e Isadora ficou entre Marcela e
Gabriel. As meninas explicaram as atrações e como planejaram a
tarde. Almoçaram em um restaurante na estrada, depois resolveram
parar para comprar alguns lanches, chocolates e snacks em uma
conveniência. Chegaram um pouco depois do meio-dia.

O lugar era lindo e limpo, com muitas árvores e cheiro de mato.


Seguiram por uma trilha de chão, cheia de pedrinhas, para a primeira
aventura, o rafting. Estava ansiosa, nunca tinha praticado esse
esporte. Depois de alguns minutos conseguiram ouvir o barulho de
água. Andaram mais um pouco e chegaram na cabana. O guia
entregou os capacetes, colete, remos e chamou a atenção deles.

— Pessoal, atenção para as orientações. Uma dúvida muito


frequente: que pessoas não devem fazer rafting? Caso você tenha
problemas cardiovasculares, respiratórios ou de coração. Se tiver
lesões recentes ou osteoporose. Pessoas que não sabem nadar ou
possuem medo de água. Mulheres grávidas, bebês e crianças
pequenas. Dicas! Só usem óculos se tiverem cordão para amarrar.
Não é recomendado utilizar relógios, joias ou celulares. Temos
armários que podem ser utilizados para armazenar esses objetos.
Usem protetor solar. É obrigatório o uso de capacete e colete. Se
organizem, que irei passar a próxima instrução.

— Eu avisei, Fiona — Gabriel comentou no seu ouvido.

— Ele disse que não devem, não que não podem — cochichou
de volta.

Marcela e Júlia se aproximaram deles.

— Que pena, amiga, não sabia da gravidez quando planejei


nossa aventura — Marcela disse com tristeza.
— Relaxa, amiga, eu vou mesmo assim. Eu e o bebê estamos
bem, e não sou sedentária.

— Isa, não acho uma boa ideia, não vamos nos perdoar se algo
acontecer com o bebê — Júlia falou com carinho.

— Finalmente, pessoas sensatas! — Gabriel exclamou,


suspirando aliviado, e Isadora deu uma cotovelada no seu estômago.
— Ai! — reclamou, se afastando dela e do alcance de seu cotovelo.

— Tudo bem. Vocês podem ir, eu aguardo aqui. — Bufou igual


uma criança.

— Eu vou ficar com ela — seu amigo disse. — Tem uma


cachoeira para banho aqui do lado, vamos esperar vocês lá.

Se despediram e Gabriel a puxou pelo braço. Seguiram na


direção que a placa indicava, por uma trilha no meio de uma mata
fechada. Assim que chegaram, Isadora sorriu. A vista era linda, a
cachoeira não era muito alta. Tinha uma queda de uns cinco metros e
represava a água, formando uma piscina natural. Nesse lado, a água
era calma, mas seguia seu curso tortuoso e agitado para a direita,
formando uma nova queda d’água.

Havia um grupo de amigos tomando banho e suas coisas


estavam amontoadas logo na entrada. Seu amigo seguiu até o final da
clareira e colocou a mochila em uma pedra grande, afastado do grupo
e perto da água.

— Eu trouxe água, você quer? — Ela confirmou com um


movimento de cabeça. Gabriel pegou a garrafa isotérmica na
mochila. — Esqueci o copo, mas pode tomar no bico.
Ela colocou a mochila ao lado da dele e aceitou a garrafa,
estava com muita sede. Isadora não lembrou de trazer nada, sorte que
seu amigo veio junto. Agradeceu e entregou a garrafa para ele.

— Vamos tomar banho? — perguntou, animada.

Preferia ter feito rafting, mas ainda assim ia tentar se divertir


como pudesse. Eles tiraram as roupas e ela colocou em cima da
mochila, retirando em seguida os tênis. Ficou observando Gabriel só
de sunga preta. Era uma visão inebriante. Sentiu um calor estranho,
desviou o olhar e se atentou ao que ele fazia. Estava terminando de
dobrar as próprias roupas e organizava metodicamente dentro da
mochila. Terminou e pegou as roupas dela, repetindo o mesmo
processo.

— Tenha dó, Gaby. Não acredito que você está perdendo tempo
fazendo isso — disse, rindo.

— Se você tivesse organizado, Fiona, eu não teria que me


preocupar — alfinetou, e ela revirou os olhos.

— Meu nome é Isadora, parece que você esquece. — Bufou.

— Tá mudando de assunto.

Ela correu e entrou na água cristalina, até atingir metade das


coxas.

— Ai! Que gelada! — gemeu e se abraçou, tentando se aquecer.


Todos os seus pelos se arrepiaram.

— Viu?! Bem feito. — Ele riu dela. Isadora franziu a


sobrancelha.
— Bem feito, é? — Pegou uma quantidade de água com as
mãos e jogou na direção dele, em seguida deu dois chutes,
espalhando bastante água.

Não conseguiu molhá-lo como gostaria, mas foi o suficiente


para se sentir desafiado. Gabriel correu, chegando bem próximo, e
jogou muita água, deixando-a completamente molhada.

— Seu idiota! — gritou, e ele caiu na gargalhada.

Ela não tinha mais nada a perder, mais molhada não dava para
ficar, então revidou o ataque. Assim que cansou, parou, sua
respiração estava ofegante pelo esforço, mas ficou satisfeita ao
constatar que fez um bom trabalho. Ele estava encharcado e foi a vez
de ela rir. Seu amigo se aproximou, colocou uma mão na sua cintura
e puxo-a, ao mesmo tempo a outra foi parar na sua nuca, guiando seu
rosto até o seu.

Isadora arregalou os olhos, surpresa, e olhou para a entrada da


trilha. Seus amigos poderiam chegar a qualquer momento, o que ele
estava pensando? Antes de seus lábios se tocarem, olhou novamente
para ele e conseguiu dizer:

— Gaby, as regras!

Mas ele continuou se aproximando, sem tirar os olhos dos seus


lábios, e a beijou. Estava com muito frio e teve que confessar para si
mesma que o corpo quente e musculoso contra o seu foi muito
gostoso, além do beijo em si. Gabriel sabia beijar muito bem, parecia
que sua língua se movia em perfeita sincronia com a dela. Como não
tinha percebido antes que um beijo poderia ser tão prazeroso?
Ele sentou na areia e puxou-a junto, sentando-a em seu colo. A
água agora batia no seu ombro e ela protestou pelo frio, o
empurrando, mas ele não soltou sua cintura.

— Babaca! — Bateu no ombro dele. — Ai, que frio!

— Relaxa, já vai passar. — Ele passou uma mão pelo seu braço.
— Amo quando você fica arrepiada, mesmo quando não sou eu o
responsável.

— Ah, mas certamente é você o responsável! Você que me


jogou na água gelada — reclamou.

— Meu Deus! Coitadinha da Fiona, vem aqui que eu te


esquento — disse, malicioso, envolvendo-a num abraço.

Isadora bufou, mas se deixou envolver, estava mesmo com frio.


Encostou a cabeça no seu ombro, era tão gostoso ali. Seu corpo já
começava a se acostumar com o frio e adorava ser abraçada por
Gabriel. Ele era grandão e a fazia se sentir pequena em seus braços.

— Meu frio já passou, e o seu? — ele perguntou depois de


alguns minutos.

— Passou, mas você não está perdoado.

— Posso sobreviver com isso.

A ruiva virou os olhos.

— Não gosto quando você vira os olhos para mim. — Ela virou
de novo. — Acho que você está merecendo uma lição.
— O que você vai fazer? — perguntou, preocupada. — Gaby,
eu estou grávida! — suplicou. Não sabia o que era, mas nunca era
coisa boa.

— Ah, tu apela, é? — Encostou a testa na sua. — Estava


pensando em outro tipo de lição, não uma que eu faria antigamente.
— Ela se arrepiou pela voz rouca e pela expectativa do que seria.

Não devia perguntar, para não incentivá-lo, sabia muito bem o


rumo dessa conversa, mas não resistiu.

— Qual?

Ele sorriu levemente.

— Eu vou te mostrar — disse e passou um braço por baixo de


seus joelhos, e outro nas suas costas, erguendo-a e levando-a para
mais fundo, atrás de uma rocha.

— Seja lá o que for, não é uma boa ideia. As pessoas podem ver
— o repreendeu.

— Eles não conseguem enxergar aqui. — Mordiscou o pescoço


delicado dela. — Isa, esse biquíni me deixou doidinho.

— Eu já usei ele outras vezes — lembrou.

— Eu sei.

A soltou. A água estava na altura do seu umbigo. Ele segurou o


tomara que caia com as duas mãos e puxou rapidamente para baixo,
liberando os seios.
— Gabriel! — reclamou, abraçando o próprio corpo, tapando os
seios, e o fuzilou com o olhar.

— Antes eu não tinha vontade de fazer isso. — Sua pupila


estava dilatada.

— Você surtou? Alguém pode me ver.

— Você está de costas para eles e atrás de uma pedra. Só eu


posso te ver.

— E não devia ver, lembra da nossa regra? — protestou.

— Esquece essas regras, só hoje — disse, se aproximando e


beijando sua testa. Depois beijou uma bochecha e a outra, a ponta do
nariz e terminou nos seus lábios. — Deixa eu te ver — pediu com a
voz rouca. — Só hoje.

Ela respirou fundo e soltou os braços.

— Só hoje — reforçou. E Gabriel abriu um sorriso. — Para de


fazer essa cara de tarado — reclamou. — Ou eu mudo de ideia. —
Ele suspirou, se aproximando.

— É impossível não ficar tarado com essa visão. — Envolveu


um seio com a mão. — Eu quero tanto chupá-los.

— Nem pensar — alertou. Ele deu um meio sorriso e um


selinho nela.

— Eu sei, Fiona, também não quero que ninguém perceba.


Estou de olho naquelas pessoas para garantir isso. — Estimulou a
aréola com o polegar e se aproximou, sussurrando no seu ouvido: —
Imagina que é a minha língua, eu poderia te deitar na areia e te levar
à loucura com ela.

Isadora imaginou o que ele disse e ficou muito excitada. Queria


que ele fizesse isso e muito mais, logicamente não poderiam. Ele
puxou seu biquíni, colocando-o de volta no lugar.

— Vamos escondê-los, antes que eu faça uma loucura. — Ele


respirou fundo. — Você precisa comer. Vai lá e pega alguma coisa na
minha mochila.

— Você não vem? — Ele pegou a mão dela e colocou sobre sua
sunga. Ela arregalou os olhos, sentindo sua ereção, e ruborizou.

— Olha só! Shrekzinho está animado. — Gabriel ficou


boquiaberto com sua fala.

— Puta que pariu! Você deu um apelido pro meu pau! E tinha
que ser zinho? — Sorriu, descrente.

— A vingança tarda, mas não falha! — disse, rindo.

— Depois vou te mostrar quem é zinho, Fiona — ameaçou.

— Mal posso esperar! — Saiu mordendo o lábio e contendo um


sorriso.

Isadora pegou um salgadinho na bolsa e sentou na areia para


comer. Estava quase terminando quando seus amigos apareceram,
conversando animadamente. Comeram, tomaram banho de cachoeira
e tiraram muitas fotos. Depois foram fazer stand up paddle, que
apesar de ter restrições para grávidas, ela já tinha praticado outras
vezes, e Gabriel não colocou nenhuma objeção. Conheceram outras
cachoeiras e voltaram para o carro. Quando retornaram, a ruiva
estava exausta.

Chegaram em São Paulo às sete horas da noite e foram comer


pizza. Já passava das nove horas quando Ângelo os deixou em frente
ao apartamento. Se despediu dos amigos e subiu, estava tão cansada
que Gabriel carregou sua mochila. Ansiava por sua cama e duvidava
que conseguiria sequer tomar banho. Quando seu amigo a viu
seguindo direto para o quarto, deve ter desconfiado de seus planos.

— Você não está pensando em dormir sem tomar banho, certo?


— Ela suspirou.

Por que ele tinha que ser tão chato às vezes?

— Eu nem vou dormir na tua cama, por que está se


incomodando?

— Porque é nojento. Você estava suando numa trilha, esqueceu?

Sem responder nada, foi batendo pé em direção ao banheiro.


Ele tinha razão, mas não ia admitir. Até que tomar banho não foi
ruim, pareceu que a água quente tirou um pouco do cansaço.
Escovou os dentes, se enrolou na toalha e foi para o quarto.

Colocou uma camisola que parecia uma camiseta comprida e


desabou na cama. Ficou lembrando da lição que Gabriel deu nela na
cachoeira e riu. Se fosse um tempo atrás, ele ia jogar água nela,
afundá-la ou fazer cosquinhas. Tinha que obrigá-lo a cumprir as
regras, ou poderiam ter problemas. Lembrou das palavras que
sussurrou em seu ouvido e sentiu um frio na barriga. Ouviu uma
batida na porta.
— Entra. — Seu amigo sorriu, arteiro, da porta. — O que você
quer, Gaby?

Ele entrou e fechou a porta. Estava com os cabelos molhados e


de bermuda.

— Só quero ficar um pouquinho aqui com você.

— Sei... — falou desconfiada.

Seu amigo desligou a luz e deitou ao seu lado, abraçando-a de


conchinha, e tocou sua barriga.

— Vou me comportar, juro!

— Não podemos continuar quebrando as regras.

— Não vamos mais quebrar.

— Então você não pode dormir aqui.

— Não vou dormir, só vou ficar um pouquinho.

— Tá bem. — Ficaram em silêncio. Isadora sentiu suas


pálpebras pesadas e fechou os olhos.
I sadora acordou cedo, o quarto estava escuro. Sentiu um peso
no seu quadril, que identificou como sendo o braço de
Gabriel, além de sentir uma respiração compassada e suave
na sua nuca. Seu amigo era muito mentiroso. Não se mexeu, para não
o acordar, e também porque não estava com vontade de levantar
ainda. Soltou um bocejo.

— Bom dia!

Ouviu uma voz sonolenta em sua nuca.

— Gaby, você disse que não ia dormir aqui! — acusou. Ele


bocejou também antes de responder.
— Dormi sem querer, mas eu me comportei — defendeu-se.

— Ainda está escuro.

— Está.

— Se ficássemos não seria contra as regras — sussurrou,


fazendo Gabriel rir.

— É mesmo? — Sua mão desceu pela coxa dela, puxando a


camisola para cima enquanto deu um beijo estalado no seu pescoço.
— Fiona está sendo uma menina malvada.

— Falando nisso, temos que usar nomes diferentes.

Ele passou completamente o vestido sobre sua cabeça.

— Tudo bem, Anastasia — concordou, fazendo-a rir.

— Não esse.

— Por que não? Eu sou gostoso igual o Christian.

— Você acha ele gostoso, é? — perguntou zombeteira.

— Muito! A Anastasia que é meio sem graça. — Chupou seu


pescoço, deixando-a arrepiada. — Vou poder te amarrar?

— Vai querer usar um chicote também? — perguntou, rouca.


Com a mão, ele apertou seu seio.

— Só se você implorar. — Beliscou a aréola, fazendo-a gemer.

— De jeito nenhum.

Ele mordiscou sua orelha e chupou o lóbulo.


— Ah, que pena! — Deslizou a mão livre pela sua barriga,
descendo mais. — Dormiu sem calcinha? — Gemeu. — Não sabia
que você era tão safadinha, Fiona.

— Gabriel! Tem que me chamar de Anastasia! — reclamou.

Ele pressionou entre suas pernas e deslizou um dedo entre suas


dobras delicadas, alcançando o clitóris e estimulando-o em
movimentos circulares.

— Isa, eu fico tão excitado quando você chama o meu nome.


Chama de novo — pediu, voltando a beijar seu pescoço.

Ela gemeu, abrindo mais as pernas.

— Não posso.

— Isa, Isa, como você é malvada! — Virou ela de frente. —


Acho que você é tão dominadora como o Christian, por isso estou tão
obcecado.

Ela riu da comparação.

— Então você é a Anastasia e eu sou o Christian — Isadora


concluiu, divertida.

— Me diz o que você quer que eu faça, Christian? — ele pediu.

Ela estava muito excitada com essa brincadeira, realmente


adorava mandar.

— Lambe o meu pé, Anastasia! — ordenou, chutando no escuro


até encostar em algo duro, que imaginou ser seu abdômen.
— Você realmente tem um gosto peculiar. — Deu uma risada
gostosa e pegou o seu pé.

Chupou seu dedão e depois lambeu todo o dorso, até chegar no


calcanhar, mordiscando-o. Isadora sentiu um calafrio. Era só uma
brincadeira, mas acabou sendo bem erótico.

— E agora, Christian?

— Agora sobe. — Sua voz estava rouca de desejo.

Gabriel fez como ela ordenou, chupando, lambendo e


mordiscando durante todo o trajeto sua panturrilha e seu joelho.
Subiu pela coxa e ela ficou muito molhadinha. Aquela região era
muito sensível. Quando ele chegou entre suas pernas, ela segurou o
ar em expectativa.

— Pede, Isa. O que você quer que eu faça agora? — Ela sentia
sua respiração bem perto do local que mais queria que ele estivesse.

— Me chupa — sussurrou timidamente.

— Onde?

— Quem está sendo malvado agora? — perguntou, contrariada.


— Você sabe!

— Não sei, estou aguardando suas ordens.

— Sobe mais! — ordenou. E ele beijou logo abaixo do umbigo


e subiu, lambendo e rindo.

— Gabriel! — reclamou.

— O que foi, Isa? — Fingiu inocência.


— Você sabe o que quero que faça.

— É só pedir, Fiona. — Ela suspirou. — Ou suplica falando o


meu nome que eu faço. — Isadora ia ficar louca se ele não fizesse
logo o que queria. Ela respirou fundo.

— Por favor, Gabriel! — Ele beijou sua barriga.

— Seu desejo é uma ordem. — Refez o trajeto, mas dessa vez


parou entre suas pernas e lambeu toda a sua extensão, os dois
gemeram. — Eu amo seu gosto.

Ele afastou seus lábios e chupou seu clitóris. Nesse momento,


Isadora segurou com força o lençol, rodeando seu pescoço com as
pernas. Temia chegar muito rápido ao êxtase, devido a toda sua
excitação. Começou a gemer descontrolada.

— Ai, Gaby, isso está muito bom! — gritou entre os gemidos.

Ele manteve o ritmo do estímulo e logo depois ela sentiu como


se seu corpo explodisse, podia jurar que viu estrelas. Relaxou as
pernas, desvencilhando de seu pescoço.

— Esses gemidos me deixam doido — disse, subindo e


beijando-a, fazendo-a provar seu gosto na boca dele.

Posicionou-se entre suas pernas e sentiu sua ereção. Penetrou-a


completamente, fazendo-a soltar um gritinho contra seus lábios. Ela
ainda estava sensível devido ao orgasmo. Era uma sensação de dor e
prazer na mesma medida. Logo o prazer se intensificou, conforme
Gabriel dava estocadas rápidas e profundas. Abraçou-o, cravando as
unhas nas suas costas.
— Ai! — ele gemeu de dor, mas não a afastou.

Começou a estimular seu clitóris com o dedo, sem deixar de


penetrá-la, e Isadora gozou pela segunda vez, fincando as unhas mais
profundamente na sua pele e gemendo.

— Gabriel! — gritou.

Ele deu uma última investida, gozando em seguida.

— Meu Deus, Isadora, cada vez fica melhor! — disse, saindo de


cima dela.

Puxou-a e ela se encaixou no seu braço, encostando a cabeça no


seu peito. Colocou a mão no seu coração, que batia acelerado pelo
esforço que acabou de fazer.

— É normal, a intimidade melhora tudo.

— Minhas costas estão ardendo, você é muito malvada. —


Sorriu. — Minha Christian.

— Gaby — chamou-o com seriedade. — Não estamos


conseguindo manter as regras. — Mordeu o lábio inferior, nervosa.
— Será que é melhor pararmos com tudo isso?

— A partir de agora a gente vai seguir as regras. Eu prometo.

Ela suspirou.

— Como amante, você é um ótimo amigo, antes não mentia


para mim — reclamou.

— Vou parar com isso, tá? — Beijou o topo da sua cabeça.


O resto do domingo, Gabriel se comportou como seu amigo de
antes, não tentou nada e nem fez brincadeiras maliciosas. Tiveram
um típico domingo, cozinharam juntos, assistiram série, comeram
pipoca, conversaram e riram. No início da noite, Gabriel se arrumou
e saiu. Ela preferiu não perguntar para onde ou com quem. Ele só
estava cumprindo com a sua regra, disse para si mesma.
N a segunda-feira, Isadora chegou cedo na empresa e
aproveitou a manhã para finalizar a planta baixa de um
prédio comercial. Estava quase terminando, quando
Gabriel apareceu com seu lanche. Assustada, percebeu que era nove
e meia. Desde que seus enjoos começaram, ele adquiriu esse hábito.
Deixou tudo na mesa dela.

— Hoje tem bolo de cenoura — avisou.

— Obrigada. — Sorriu, acanhada.

— De nada. — Retribuiu o sorriso e foi até o outro lado da sala,


conversar com uma loira, Amanda, a modeladora 3D.
A mesa dela ficava ao extremo oposto da de Isadora. Sua linha
de visão passava pelo meio das divisórias de MDF, e por isso tinha
um acesso visual a tudo que acontecia em sua mesa. Observou ele
falando algo no seu ouvido, e a mulher sorriu com vontade, dando
uma batidinha no braço musculoso. Gabriel deu uma piscadinha e
saiu.

Isadora ficou muito irritada. Tudo bem que tinham combinado


que poderiam flertar com outras pessoas, mas tinha que ser a
Amanda? Logo a colega de trabalho que ficava no mesmo
departamento que ela? Será que o jantar da noite anterior foi com
ela? Iria acabar com isso agora. Pegou o celular.

Isadora: Obrigada pelo lanche, mas não precisa mais


se preocupar. Eu não estou mais enjoando e posso
pegar meu próprio lanche.

Gabriel: Ok. De nada.

Respirou fundo, perdeu o apetite. O resto da manhã seguiu


normalmente. Na hora do almoço, seu amigo estava aguardando-a em
frente ao elevador. Assim que a viu, abriu um sorriso que a fez sentir
um calor estranho. Ela retribuiu o sorriso sem muito entusiasmo,
ainda estava chateada por ele ter flertado na frente dela.

— Onde vamos almoçar hoje?


Ele apertou o botão do elevador e mais três pessoas se juntaram
a eles, aguardando o equipamento chegar ao sexto andar. Gabriel se
aproximou dela.

— Hoje vamos fazer algo diferente — sussurrou em seu ouvido.

O que será que estava planejando? Sua mente fértil imaginou


várias possibilidades e sua boca ficou seca imediatamente. Seguiu
ele em silêncio até o carro. Estranhou, pois, geralmente iam a pé e
almoçavam em algum restaurante próximo. Assim que sentaram, ele
questionou:

— O que aconteceu? Você está estranha.

— Impressão sua — respondeu séria e colocou o cinto. — Onde


vamos?

— É surpresa.

Ela estreitou os olhos, desconfiada.

— O que você está tramando, hein?

— Você é muito desconfiada. — Deu de ombros.

Ele pegou um caminho desconhecido e em poucos minutos


pararam em frente a um restaurante todo de vidro. Ela nunca tinha
almoçado lá. Gabriel desceu e entregou a chave para o manobrista.

— Esse restaurante parece muito caro — reclamou no ouvido


dele.

— Relaxa, hoje eu pago. — Isadora revirou os olhos.

— Não é essa a questão. Por que me trouxe aqui?


— Eu estava a fim de comer aqui hoje, e almoçar sozinho é
muito chato.

— É só isso?

— Claro, o que você pensou que fosse? — perguntou, rindo.

Ela estava pensando que ele queria impressioná-la, e isso ia ser


um problema, implicaria em sentimentos e iria contra as regras, mas
talvez estivesse sendo exagerada, afinal, naquela manhã ele estava
dando em cima de outra na sua frente. Certamente, não estava
envolvido, então relaxou.

Pararam em frente à recepcionista.

— Sejam bem-vindos! Possuem reserva? — perguntou,


educada. Estava muito bem-vestida em um terninho preto.

De repente, Isadora se arrependeu de ter deixado o blazer rosa


no escritório. A empresa que trabalhavam era flexível quanto às
vestimentas, com exceção das quintas, que ocorriam as reuniões
gerais e tinham que usar terno. Como hoje não tinham visitações às
obras e suas roupas estavam apertadas, optou por um vestido longo
azul, soltinho, confortável e bem simples.

— Sim, Gabriel Vitor Rabello. — Abriu um sorriso largo, todo


animado. Isadora reparou melhor na mulher à sua frente, que mesmo
com o terninho sério, era muito bonita e loira. Seu amigo era
incorrigível.

A recepcionista os guiou até a mesa, o local estava


praticamente vazio. Um garçom trouxe a entrada e serviu um suco de
laranja.
— Como só temos uma hora de almoço, eu fiz o pedido na hora
da reserva e pedi que preparassem tudo com antecedência —
explicou. — São canapés de salmão, prova — disse, pegando um. Ela
provou e estavam realmente deliciosos. — Eu pedi risoto com queijo
brie de prato principal, e para sobremesa um doce de morango, mas
não lembro o nome.

— Certamente eu vou gostar. — Terminaram a entrada e ela


tomou o suco. — Gaby, estou com vontade de fazer xixi. Onde fica o
banheiro? — Desde que ficou grávida, essas vontades eram
recorrentes. Seu amigo apontou para um corredor no centro do salão
e ela levantou. — Eu já volto.

Seguiu pelo corredor, e a primeira porta era o banheiro


feminino, que era muito cheiroso e luxuoso, por sinal. Nunca tinha
estado em um restaurante tão chique. Gabriel era doido. O que estava
pensando? Assim que terminou, lavou as mãos e secou nas toalhas
felpudas. Destrancou a porta, abriu-a e deu de cara com seu amigo.
Quase gritou, e colocou a mão no peito, assustada.

— Meu Deus, Gabriel, quase me matou de susto! — Ele estava


sério e olhou para os lados.

— Desculpa, a intenção não foi essa — disse, empurrando-a de


volta para dentro do banheiro.

— O que você está fazendo?

Seu amigo trancou a porta e se aproximou.

— Escolhi esse restaurante por causa desse banheiro, bastante


privativo, não acha? — Seu tom era muito sugestivo.
— Você não deve estar pensando... — Mas as palavras
morreram em sua boca. Ele estava muito perto e enlaçou sua cintura,
aproximando-a de si. — Gabriel! Isso vai contra as regras —
protestou, mas se arrepiou quando ele chupou seu pescoço.

— Esquece as regras só hoje. Você também não está com


vontade? — sussurrou contra sua pele.

A excitação de estarem num lugar público, o medo de serem


pegos, a adrenalina de fazer algo tão ousado e o contato com seu
corpo, foram o suficiente para deixá-la excitada. Levou uma mão à
sua nuca, trazendo-o para mais perto. Quando ele a prensou contra a
parede e tomou seus lábios num beijo faminto, todos os seus
pensamentos foram para o espaço. Seus toques eram urgentes e
desesperados. Uma mão apertava um seio por cima do vestido,
enquanto a outra se enveredou por baixo, encontrando sua calcinha.
A afastou para o lado e estimulou seu clitóris. Ela gemeu e ele
penetrou-a com um dedo, gemendo também. Abandonou o beijo e
olhou dentro de seus olhos, a pupila dilatada pelo desejo.

— Você gosta do perigo, Fiona! Já está prontinha para mim. —


Ela estava com a respiração acelerada. Gabriel abriu a calça, abaixou
a cueca e ela olhou a sua ereção.

— Você também gosta — constatou, mordendo o lábio inferior.

— Eu gosto muito — disse, dando um sorriso sacana e


erguendo-a contra a parede.

Isadora enlaçou sua cintura com as pernas. Ele voltou a beijá-la


e a penetrou profundamente. Uma mão foi para sua bunda e a outra
segurava sua cintura, enquanto ele investia furiosamente, entrando e
saindo dela. A adrenalina era tanta, que se não estivesse beijando
Gabriel, teria gritado quando o êxtase a atingiu. Ele deu mais duas
investidas e gozou também. As bocas se separaram, ambos com a
respiração rápida.

— Foi melhor do que na minha imaginação — confidenciou.

Ele a afastou, arrumando rapidamente sua roupa, e saiu. Isadora


foi até a pia e se examinou no espelho. Seu cabelo estava só um
pouco desarrumado. Passou a mão pelos fios cobres e ficaram
alinhados novamente. Nem parecia que tinha acontecido nada. Além
do seu rosto, que estava levemente afogueado, sentia as pernas
bambas e seu coração acelerado, mas isso ninguém além dela
perceberia. Saiu perplexa do banheiro, nunca tinha tido um orgasmo
tão rápido, sem quase nenhuma preliminar e com penetração. Chegou
na mesa e Gabriel a aguardava sentado, os pratos de risoto na mesa.

— Você demorou, a comida está esfriando.

Que descarado!

Agia como se nada tivesse acontecido. Sentou e tomou um gole


do suco, com sua mão tremendo. Estava com muita fome e comeu o
risoto rapidamente. Seu amigo conversava normalmente sobre a
construção do shopping que já estava na fase final. A sobremesa era
muito gostosa, o garçom disse que era trifle de morango.

Terminaram o almoço e saíram. O carro os aguardava na porta


do restaurante e o manobrista entregou a chave.

Entraram e colocaram o cinto. No caminho de volta, dentro do


carro, resolveu contar para Gabriel a loucura que os hormônios
estavam fazendo na sua libido.

— Gaby — chamou.

— Oi.

— Sabe hoje lá no banheiro... — Ele olhou-a de esguelha e


confirmou, incentivando que continuasse. — Você percebeu que eu
gozei muito rápido? — Ficou vermelha. Engraçado, antes não tinha
vergonha de falar sobre isso com ele.

— Percebi.

— Pois é, essas coisas não aconteciam comigo antes da


gravidez. — Mordeu o lábio inferior. — Os hormônios são realmente
muito loucos.

— Como assim isso não acontecia? — perguntou, confuso.

— Você sabe, gozar. Antes de engravidar, eu nunca gozava


durante o sexo. — Ele franziu a testa. — Os hormônios da gravidez
me fizeram chegar ao orgasmo.

— Você gozou na primeira vez que transamos, e não estava


grávida. — Ela o olhou, incrédula.

— Tem certeza?

— Sim. E foi mais de uma vez. — Isadora o observou em


silêncio. Talvez fosse o ego masculino que fez ele acreditar que
tivesse gozado.

A tarde passou rapidamente e ela ficou com fome, já era hora


do lanche. Foi até a copa e encontrou Maria. A mulher disse que sua
barriga estava começando a aparecer nas roupas, o que a fez sorrir.
Pegou um suco e uma bolacha Pit Stop. Voltou para sua mesa e
estancou com uma risada familiar. Olhou ao redor e viu Gabriel com
o quadril encostado na mesa de Amanda, de costas para ela.

Uma raiva se apoderou de Isadora. Teria que conversar com seu


amigo, será que não percebia que ali era o seu território? Era muito
descarado, ainda mais depois do sexo intenso que tiveram no horário
de almoço. Como ele ainda conseguia dar em cima dessa loira sem
graça? Sentou e não tirava os olhos dos dois, que conversavam
animadamente.

Assim que a conversa acabou, Gabriel se despediu, dando um


beijo na bochecha de Amanda, e virou em direção à sua mesa. Deu
uma piscadinha marota para ela e saiu da sala. Isadora teve vontade
de esganá-lo.

Chegou o fim do expediente e seguiram para a academia em


silêncio. Da esteira, observou seu amigo ajudando uma loira a
carregar alguns pesos até a máquina leg press 45º. Como nunca
percebeu isso antes? Bufou, irritada. Pelo menos o exercício físico
ajudou a extravasar um pouco da raiva.

No trajeto para casa, não se aguentou.

— Gabriel, não quero mais que você dê em cima da Amanda na


minha frente.

Ele deu um sorriso divertido.

— Está com ciúmes?

Isadora virou os olhos.


— É claro que não, afinal, eu que estipulei as regras. Você pode
ficar com outras mulheres, só não precisa ser na minha frente. —
Bufou.

— Eu posso pedir o telefone dela e combinar algo depois do


expediente — disse, dando de ombros. — Você se incomoda?

— Sinceramente, ela é do meu departamento. Não tem outras


para você ficar?

— Você fica tão bonitinha com ciúmes.

— Eu não estou com ciúmes! — vociferou. Às vezes, ele era


muito irritante.

— Não precisa ficar brabinha, eu não vou mais dar em cima da


Amanda. Está felizinha agora, Fiona?

— Você é um idiota.

O sorriso dele se alargou mais.

Quando chegaram ao apartamento, Isadora entrou no banho


primeiro, e Gabriel fez uma macarronada. Vestiu um pijama de blusa
e short, foi para a cozinha e a comida já estava pronta. Comeram, e
seu amigo foi tomar banho. Ela ligou a televisão em um
documentário, estava matando tempo até ele voltar, para continuarem
a assistir a série. Demorou mais que o normal. Foi até a geladeira,
pegou alguns morangos e deitou no sofá com a bandejinha ao lado.

Ele retornou, a surpreendendo. Estava usando uma camisa rosa-


claro de botão, uma calça bege, sapato e cinto marrom. Estava muito
lindo e certamente arrumado demais para um filminho em casa.
— Vai para algum lugar? — questionou.

— Sim, eu tenho um encontro — comentou, distraído,


terminando de fechar o relógio.

— Numa segunda-feira? — Elevou uma sobrancelha


inquisitiva, não conseguiu segurar a inquietação.

— Existe dia da semana para isso? — Ele se aproximou do sofá


e ela sentiu o cheiro dele, fazendo-a mudar de assunto.

— Está usando perfume.

— Os enjoos pararam — disse, dando de ombros. — E esse é


novo. Ganhei da Nádia. — Isadora virou os olhos ao ouvir o nome da
ex-peguete dele, fazendo-o rir.

— Ela tem mau gosto — resmungou, azeda.

— Pelo menos não te faz enjoar. — Abaixou o tronco em frente


à Isa, beijou a sua barriga no vão entre a blusa e o short, depois
colocou uma mão no sofá, ao lado do seu rosto, pegando-a de
surpresa, e beijou seus lábios. — Até mais, Fiona.

— Gabriel! — protestou, irritada.

Ele se endireitou, fazendo uma cara confusa.

— O que foi? — Ela fuzilou-o com os olhos. — Ah, não pode


beijar. Tinha esquecido da regra. — Sorriu com cara de safado e ela
desconfiou que ele não tinha esquecido.

— Agora trate de lembrar.


I sadora estava muito preocupada. Apesar de não querer
admitir, estava com um pouco de ciúmes. Está bem, estava
com muito ciúme! Desde que Gabriel saiu para seu encontro,
ela tinha surtado. Fez um esforço enorme para não ligar ou mandar
uma mensagem.

O que está acontecendo comigo?

Tudo culpa do seu amigo, é claro. Fez eles quebrarem todas as


regras. Isadora virou no sofá, ficando de barriga para cima. Passava
da meia-noite e ela não estava conseguindo dormir. A porta abriu e o
motivo do seu abalo entrou. Assim que a percebeu, sorriu, fazendo
seu coração acelerar. Logo depois, ele franziu a testa.
— Você devia estar dormindo, vamos acordar cedo amanhã.

— Estou com insônia.

— Vou tomar um banho e durmo com você.

— Não! Não podemos quebrar mais regras — protestou,


nervosa, teria que pôr limites.

— A saúde do bebê é mais importante que qualquer regra


estúpida — disse, saindo do seu campo de visão.

Ele retornou de cabelos molhados, uma calça de algodão e sem


camisa. Isadora ficou com a boca seca com essa visão.

— Vem, eu prometo que vou me comportar. — O problema era


justamente esse, Isadora não sabia se queria que ele se comportasse.

Ela o seguiu até o seu quarto e deitou na sua cama. Seu amigo
desligou a luz e se acomodou ao seu lado, puxando-a e trazendo-a
para seu peitoral. Ela sentiu um frio na barriga de expectativa,
imaginando que eles fossem transar, mas, surpreendendo-a, Gabriel
começou a fazer cafuné em sua cabeça.

— Boa noite, Fiona! — falou com carinho.

Isadora ficou frustrada. Ele realmente tinha estado com outra e


foi tão bom que nem queria saber mais dela? Será que era a
gravidez? Estava ficando gorda? Sabia que não fazia o tipo de
Gabriel, ele gostava de mulheres magérrimas. Começou a sentir uma
insegurança muito grande, queria se sentir desejada e bonita, não
uma grávida fofa. Talvez a culpa fosse dela, nunca se esforçou para
atraí-lo ou seduzi-lo. Também nunca precisou, ele sempre estava
disposto e disponível. O que poderia fazer para mudar essa situação?

Tinha algo que queria fazer há um tempo. Se aproximou e


chupou o seu pescoço. Ele parou imediatamente com o carinho que
fazia nela. Sentiu os pelos do braço dele se arrepiarem. Mordiscou a
pele dele e subiu até sua orelha. Chupou o lóbulo e desceu traçando
uma trilha de beijos até sua aréola reta. Sugou-a, arrancando um
gemido de seu amigo. Sentindo-se mais confiante, continuou
descendo até o seu umbigo e circulou-o com a língua, ele começou a
gargalhar.

— Para, por favor! Eu tenho muitas cócegas aí.

— Que interessante saber disso. — Deu uma lambida, fazendo-


o se contorcer.

— Que merda! Descobriu meu ponto fraco — disse, rindo.

— Quer que eu pare, então? — indagou, desanimada, era pior


do que imaginava.

— De jeito nenhum, só quero te ver. — Se esticou e acendeu o


abajur. Uma luz fraca iluminou o quarto. — Agora sim! — Sorriu
malicioso, e ela sentiu um frio no estômago. No escuro estava fácil,
mas, e agora? — O que foi, Fiona? — perguntou, tocando levemente
seu rosto numa carícia. — Está com uma carinha preocupada.

Isadora baixou o rosto, escondendo-o na sua barriga.

— Fiquei com vergonha — admitiu.


— Vem cá — disse, ajudando-a a subir, até ficarem cara a cara.
— Olha pra mim. — Estava muito ruborizada. Relutante, olhou
dentro de seus olhos e viu desejo ali. Ele passou o polegar pelo seu
lábio inferior. — Não existe vergonha entre nós. — Puxou-a para um
beijo e ela se sentiu mais encorajada. Queria seduzi-lo, e agora que
estava conseguindo, não podia desistir.

Decidida, interrompeu o beijo e voltou para sua trilha, mas


dessa vez contornando seu umbigo. Não queria que nada estragasse o
clima de sedução. Começou a puxar sua calça, e Gabriel prontamente
a ajudou, tirando junto a cueca. Resolveu ignorar propositalmente o
shrekzinho e foi direto para um testículo. Lambeu-o com delicadeza,
arrancando suspiros de prazer de Gabriel.

Observou seu rosto e se sentiu poderosa. Ele a olhava com uma


cara safada e estava muito ereto, e isso a fez ficar ousada. Olhou
dentro dos seus olhos e tocou a ponta da cabeça com a língua, logo
após contornou-a, e ele gemeu alto.

— Puta que pariu! Não me olha mais assim que eu posso gozar!
— Ela mordeu o lábio inferior, provocando-o. — Como você é
malvada.

Isadora deu um meio sorriso, satisfeita. Segurou a base com


uma mão, e ao mesmo tempo passou a língua em volta de toda a sua
extensão. Gabriel grunhiu algo ininteligível. Colocou-o na boca até o
máximo que conseguiu, realizando movimentos de sucção e
acompanhando o movimento com a mão.

— Caralho! Isso tá muito bom! — gemeu. Ela aumentou a


pressão, mas manteve o mesmo ritmo. Ele não parava de gemer. —
Vou gozar — avisou.

Isadora não parou até ele atingir o êxtase e se liberar em sua


boca. Engoliu tudinho, lambendo os lábios em seguida.

— Difícil acreditar que você estava com vergonha — Gabriel


disse com a respiração ofegante.

— Eu estava, mas depois passou — respondeu, dando de


ombros.

Ele a puxou para um beijo. Isadora estranhou, já que Paulo


nunca a beijava depois que fazia oral nele, mas tudo com seu amigo
era diferente. Assim que o beijo terminou, ela bocejou.

— Soninho? Quero chupar você todinha — sussurrou em seu


ouvido e depois lambeu o lóbulo da sua orelha, fazendo-a arrepiar.

Isadora não parava de bocejar, dormiu muito pouco na


madrugada anterior. Ela e Gabriel estavam entretidos demais
transando e perderam a noção do tempo. Depois que ele adormeceu,
ela ainda ficou acordada, pensando. Analisou suas ações e reações a
tudo que acontecia entre os dois. Estava se envolvendo demais.
Como assim sentir ciúmes do seu melhor amigo? Ele sempre se
envolveu com mulheres, e isso nunca foi um problema para ela.

Esse sexo casual estava ficando perigoso. Poderia acabar se


apaixonando por ele, e isso não era uma opção. Não fazia o tipo de
Gabriel e percebia que ele estava transando com outras. Desde o
começo sabia que não podia rolar sentimento, o que poderia fazer
para evitar essa situação? Teria que ficar com outras pessoas ou parar
de transar com seu amigo?

Estava muito confusa, cansada e sem paciência para trabalhar.


Abriu seus e-mails, respondeu alguns e bocejou mais uma vez.
Resolveu levantar e tomar uma água, não conseguia ser produtiva no
seu trabalho. Encontrou Gabriel pegando um café, e ele sorriu assim
que a viu.

— Vim pegar um cafezinho, ver se espanta o sono. — Sorriu


malicioso. — Uma ogrinha não me deixou dormir noite passada —
sussurrou.

Um sorriso malicioso e uma voz sussurrada foi o suficiente para


jogar uma descarga de energia no seu corpo. Olhou para sua boca e
teve uma vontade enorme de beijá-lo. Mordeu o lábio inferior,
atraindo a atenção dele com o movimento. A tensão sexual era
palpável. Puxou-o pela mão e arrastou-o até a geladeira, se
escondendo entre o vão do eletrodoméstico e o armário. Gabriel a
olhava curioso e divertido. Colocou seu cafezinho em cima do
armário e aguardou, não gostava quando ele não tomava a iniciativa.

Não sente a mesma vontade de beijar que eu?


Ignorando esse pensamento, enlaçou seu pescoço com as duas
mãos e o aproximou. Assim que os lábios se encontraram, sentiu um
frio na barriga. Suas línguas se tocaram e provou o gosto de café na
sua boca. Pressionou o corpo contra o seu e ouviu seu amigo gemer.
Ele aprofundou o beijo, que agora era intenso e urgente. Que
loucura, ali era o trabalho deles, e lógico que não poderia passar de
um beijo, e mesmo assim carregado de risco. Ouviram um barulho e
se afastaram abruptamente, saindo do esconderijo precário. Amanda
entrou na copa. Sua excitação, que estava a mil, esvaiu-se assim que
viu o sorriso da loira para Gabriel. Saiu dali rapidamente.

O que deu nela? Não pode ver seu amigo e já quer beijá-lo?
Tinha que conseguir se controlar. O pior de tudo foi que acabou
ficando sem água e irritada, porque saiu da copa e deixou os dois
sozinhos. Será que Gabriel ia beijar ela também? Seu celular vibrou.

Guilherme: Bom dia! Estou com saudade.

Ficou surpresa. Depois de todo esse tempo, não pensou que


Guilherme ainda fosse mandar mensagem.

Isadora: Você me ofendeu.

Guilherme: Desculpa, não paro de pensar em você.


Isadora olhou para a mesa de Amanda, que ainda estava vazia.
Será que ela estava com Gabriel? Sentiu uma dor no peito e um nó na
garganta.

Não posso me apaixonar! Não posso me apaixonar! Não posso


me apaixonar!

Só uma louca se apaixonaria por um solteiro convicto, que


usava as mulheres para sexo intenso casual, cada noite com uma
diferente, insensível e sem coração. Completamente inalcançável
para ela. Será que deveria dar uma chance para Guilherme?

Guilherme: Posso ver você hoje?

Guilherme: Deixa eu te mostrar que estou


arrependido!

Será que saindo com ele, poderia proteger seu coração? Marcela
diria que sim, e Gabriel ficava com várias e parecia imune aos seus
encantos. Não entendia como seu amigo conseguia ter um sexo
incrível com ela e logo depois já dar em cima de outras mulheres
como se fosse a coisa mais natural do mundo. Sabia que foi ela
mesma que impôs essa regra, mas Gabriel precisava ficar com uma
diferente todo dia? Isadora tinha que ser como ele, por isso as coisas
estavam ficando confusas. Não se esforçou o mínimo para cumprir
com a sexta regra. Poderia sair com Guilherme hoje.
Guilherme: Por favor, Isadora! Eu fui um
idiota!

Ela respirou fundo. Era para o seu próprio bem.

Isadora: Ok. Eu aceito jantar com você


hoje.

O dia se estendeu como uma tortura. Não conseguiu se


concentrar em nada e seus olhos iam a todo momento para a mesa de
Amanda. Será que eles estavam ficando, mesmo depois de ter pedido
para Gabriel se afastar dela? Na hora do almoço, fingiu estar
ocupada e seu amigo trouxe uma marmita para ela. Não queria
encará-lo, ainda estava com vergonha de tê-lo beijado e com ciúmes
da sua colega de trabalho.

O expediente finalmente encerrou e saiu em silêncio. No


caminho de volta para casa, ficou tensa, mas Gabriel não pareceu
perceber. Na verdade, ele parecia animado com alguma coisa,
cantarolava uma música baixinha, enquanto batia os dedos no
volante, acompanhando o próprio ritmo. Quando terminou a música,
olhou para ela, sorrindo.

— O que acha de sairmos para jantar hoje?


— Eu tenho um encontro.

Ele franziu a testa.

— Com quem?

— Guilherme.

— Ah, não, você não vai sair com esse cara! — Bufou, irritado.

— Por que não? Você sai com várias. — Por essa não esperava.
O idiota achava que só ele podia sair com outras pessoas?!

— Saia com outros, mas não com ele.

— Qual o problema com o Guilherme?

— Vocês tinham um envolvimento, e pelo que entendi, ele caiu


fora. É um babaca. — Tirou uma mão do volante e passou
nervosamente pelos cabelos.

— Está arrependido, e vou justamente para saber qual é a dele.

— Se você sair com esse cara, nosso acordo já era — ameaçou.

— Você não pode estar falando sério. Quer dizer, você pode, e
eu não? Está com ciúmes?

— Estou. Se quiser, eu paro de sair com outras, é só pedir.

Gabriel era impossível. Só porque estava com ciúmes queria


fazê-la acreditar que não se envolveria mais com outras. Como se ela
não o conhecesse. Como amigo, ele era muito confiável, mas como
amante só sabia mentir, ela não podia acreditar nele. Além disso, ele
devia estar blefando. Sairia com Guilherme, blindaria seu coração e
as coisas voltariam aos eixos.

Chegou em casa e se arrumou como nunca. Seu orgulho dizia


que deveria estar linda. Colocou um vestido rosa curtinho e de
cintura alta, que comprou na semana passada. Deixou os cabelos
soltos, fez uma maquiagem clean e colocou uma sandália de salto
alto azul. Passou pela sala antes de sair. Gabriel estava assistindo
televisão, olhou-a rapidamente e fechou a cara.

— Estou indo, como estou? — Ele voltou a atenção ao


programa e não respondeu.

Isadora saiu chateada. Gabriel estava agindo como uma criança


mimada. Não fazia sentido ele sair com outras pessoas e ela não.
Sabia que estava certa, mas sentiu um aperto no peito.

Quando entrou no carro, Guilherme sorria para ela, bonito como


sempre, com uma camisa de botão preta e calça jeans.

— Você está linda grávida! — elogiou, empolgado. — Mais


linda ainda, se é que isso é possível.

— Obrigada! Onde vamos?

— Um restaurante italiano novo. — Hesitou. — Isadora, eu agi


como um completo idiota, fiquei com muito ciúme. Pensei muito
depois e percebi que estava exagerando. Você não saiu da minha
cabeça. Saí com outras pessoas, mas nenhuma delas era você. Preciso
saber se você me perdoa.

— Fiquei muito magoada, Guilherme.


— Eu sei, não me perdoo pelo que te disse. Eu vou me redimir,
prometo!

— Eu não sei, preciso pensar — respondeu evasiva.

O restaurante possuía um ar romântico, com toalhas de mesa


xadrez vermelhas, paredes rústicas de tijolinhos e uma iluminação
fraca que deixava o ambiente acolhedor. Sentaram próximo à
entrada, de frente um para o outro. Guilherme pediu risoto de
salmão, uma jarra de suco de laranja e panna cotta de sobremesa.

— Vou ser sincero com você, Isadora. Fiquei com muito ciúme
e com muita raiva. No começo, eu achei que estava certo, mas
conforme o tempo passou, a saudade bateu. Tive bastante tempo para
pensar... e não acho que você tinha motivos para mentir para mim.
Acredito em você. Que você não me traiu... que não está envolvida
com Gabriel. — Isadora desviou os olhos, constrangida. Na época,
realmente não estavam envolvidos. Se ele soubesse do tipo de
relacionamento que desenvolveram, iria surtar. Guilherme pegou sua
mão. — Eu quero que você me dê uma chance. Não consigo viver
sem você. Quero você, quero esse bebê.

Meu Deus! O que não daria para ter ouvido essas palavras
meses atrás? Mas, agora, tudo isso soou tão distante, tão errado... até
mesmo indigesto. Ela puxou as mãos e abaixou os olhos. O assunto
morreu e se instaurou um silêncio constrangedor.

O que será que Gabriel está fazendo? Por que não paro de
pensar em meu amigo? Preciso tirá-lo urgentemente da cabeça, não
é justamente esse o motivo de estar aqui?

— Isadora? — Ouviu seu nome ser chamado com irritação.


— Desculpe, me distraí. O que você dizia mesmo?

— O parto? Para quando é?

— Dezoito de fevereiro.

— Passa bem rápido. — Ele segurou a mão dela sobre a mesa.


— Espero ficar ao seu lado nesse momento.

A ruiva puxou a mão, constrangida. Por que isso parecia tão


errado?

O garçom chegou com a comida, deixando-a aliviada. Comeram


em silêncio. Quando terminaram de comer, os pratos foram retirados
e trouxeram a sobremesa.

— A panna cotta daqui é o melhor que eu já comi. —


Guilherme apontou para o doce. — Prove.

— Nunca experimentei. — Ela provou. — É damasco?

— Sim, gostou?

Nunca gostou muito de damasco, mas sabia que Gabriel amaria


o doce. Olhou para a sobremesa e suspirou. Por que não parava de
pensar no seu amigo? Não deveria estar se apegando, o combinado
era justamente esse, ficar e não se apegar. Seu amigo não era do tipo
de relacionamento sério, nessa equação sempre sairia machucada.
Tudo isso foi uma péssima ideia desde o começo, como cogitaram
que isso funcionaria? Poderia dar certo para Gabriel, afinal, ele já
era acostumado com esse tipo de envolvimento, mas ela ficou tão
empolgada com o sexo intenso e prazeroso, que quis arriscar. Era
obrigada a admitir que ele tentou avisar, isso tudo era culpa dela.
Guilherme pagou a conta e a levou até o carro, abrindo a porta
galantemente para ela. Sentou no banco do motorista e pegou sua
mão gentilmente.

— Eu estava com tanta saudade.

Tocou seu rosto com a mão livre, acariciando sua bochecha com
o polegar, e beijou seus lábios. O beijo foi estranho e desajustado.
Isadora ficou contando os segundos para acabar. A diferença entre o
beijo de Guilherme e Gabriel era gritante. Seu amigo sabia beijar
como ninguém. Não era à toa que ele tinha muita experiência com o
sexo oposto. Esse pensamento fez seu peito doer e sentiu uma falta
de ar. Então interrompeu o beijo e abaixou os olhos.

Meu Deus! O que está acontecendo comigo?

— O que você acha de irmos para o meu apartamento? Podemos


assistir um filme.

Ela respirou fundo, precisava ficar com outras pessoas e fechar


seu coração, como Gabriel fazia. Porém, estava claro para ela que
não conseguiria. Melhor inventar alguma desculpa e acabar logo com
esse encontro que claramente foi um erro.

— Acho que devemos ir com calma. Eu ainda estou assimilando


tudo isso. — Respirou fundo novamente e o encarou. — Entenda,
depois do nosso rompimento eu pensei que nunca mais sairíamos
juntos.

— Eu entendo, vou ter paciência. — Ele colocou o cinto. —


Vou deixar você em casa.
Isadora colocou o cinto e o carro começou a se movimentar em
direção ao seu apartamento. Enquanto voltava para casa, sua mente
estava a mil. O que foi tudo isso? Por que Gabriel não saia de sua
mente? Provavelmente, devido à sua falta de química com
Guilherme, e se ficasse com outra pessoa? Alguém tão experiente
quanto seu amigo...

A ideia de ficar com outra pessoa lhe causou repulsa,


semelhante ao que sentiu com Guilherme. Não conseguia imaginar
outra pessoa a tocando novamente, tinha que ser Gabriel. Seria seu
amigo o responsável por todas essas sensações, simplesmente porque
era ele? Quem ela queria enganar?

Meu Deus! Estou apaixonada por meu melhor amigo!

E os indícios estavam todos ali. Sua mente começou a fluir,


como se fosse um filme, e foi lembrando da sensação ruim que sentia
toda vez que o via com alguma mulher. Mesmo bem jovens, quando
ele começou a namorar Clara, ficou irritada, mas na época achou que
era normal, ciúmes de amiga.

Como pude ser tão cega?

Provavelmente foi o início dos seus sentimentos, que acabou


suprimindo. Agora ela estava em uma sinuca de bico. Seu amigo não
se atraía por mulheres como ela, seu perfil eram supermodelos
peitudas e oxigenadas, como ele se apaixonaria por ela?

O que farei? Esconderei meus sentimentos?

Independentemente de tudo isso, Isadora precisava expor o que


sentia. Era Gabriel que sempre a ouvia e ficaria muito mal
escondendo dele. Inclusive, duvidava que conseguiria esconder algo
de seu amigo, era sempre muito transparente e ele a lia como
ninguém. Iria falar tudo que sentia para Gabriel e depois lidaria com
a rejeição. Só o que não podia, era não falar.

Precisaria ser honesta consigo mesma, não criando ilusões ou


falsas expectativas. Não era idiota de acreditar que Gabriel largaria
as mulheres de manequim 36 para ficar com ela, para isso teria que
existir amor, e estava claro para Isadora quem era a mulher por quem
seu amigo nutria esse sentimento. Infelizmente, não era uma ruiva
sem graça e cheia de sardas, e sim uma loira sedutora que atendia
pelo nome de Clara.

Quando Guilherme parou o carro em frente ao seu prédio,


soltou o cinto e saiu rapidamente, sem se despedir. Ele baixou o
vidro e gritou: “Está tudo bem?”, mas ela não respondeu, não podia
perder mais tempo.

Chegou em casa. Gabriel não estava na sala, então foi até o


quarto dele, mas se assustou. Todas as portas do guarda-roupa
estavam escancaradas e vazias. Ele tinha saído de casa? Pegou o
celular, tremendo.

Isadora: O que está acontecendo?

Gabriel: Vou ficar na casa do Rique.


Isadora: Para de drama, volta logo para casa.

Ele não respondeu.

UMA HORA ANTES

Gabriel chegou bufando de raiva no apartamento de Henrique.


Quando seu amigo abriu a porta, arregalou os olhos, espantado ao
vê-lo com duas malas e a cara amarrada.

— O que aconteceu?

— O que aconteceu? Aconteceu você! Graças ao teu conselho


idiota, deu tudo errado.

— Como assim, cara?

— Isadora saiu com Guilherme. Eu vou perdê-la, e é tudo culpa


sua. Aliás, a culpa é minha por te ouvir.

— Não acredito! Entra.


QUATRO DIAS ANTES

I sadora entrou no banheiro. Gabriel sentou no sofá, olhando


fixamente a porta que ela tinha acabado de fechar. Sentia um
aperto enorme no peito. Ela queria usá-lo para sexo sem
envolvimento.

Caramba! O que fiz para merecer isso?

Consternado, saiu do apartamento e foi até a casa de Henrique,


precisava desabafar com alguém. Por sorte, ele estava e abriu a porta
para Gabriel.
— Cara, por pouco você não me pega em casa. Vou sair com a
Mar... — Olhou bem para seu rosto, franzindo a testa. — O que
aconteceu? Entra logo e me conta tudo. — Ele afastou para o lado,
permitindo sua entrada e fechando a porta em seguida.

Gabriel desabafou e seu amigo escutou todo seu sofrimento em


silêncio.

— Você é mesmo um idiota! — disse por fim. Esse não era o


tipo de consolo que estava esperando. — Está fazendo tudo errado,
cara. Preciso de uma cerveja, você quer?

— Acho que eu preciso também.

Henrique foi até a geladeira e pegou duas latinhas, entregando


uma para seu amigo, sentou no sofá e apontou para ele sentar.

— Escuta o que você precisa fazer. Faça ela se apaixonar


também, é simples! — Abriu sua bebida e tomou um longo gole.

— E como eu vou fazer isso? — questionou, abrindo a própria


bebida.

— Fazendo exatamente o contrário do que você fez até hoje.


Você sempre foi muito bonzinho e cuidadoso, e isso te levou onde?
Ela nunca nem te notou, cara. Você precisa dar um choque de
realidade nela. Ela não tem que pensar em você como o amiguinho
compreensivo, você tem que ser o homem dela.

— Não sei se eu consigo.

Henrique respirou fundo.


— Estou decepcionado, você era melhor que isso. O que essa
mulher fez? Fritou teus neurônios? — Gabriel virou os olhos,
bebendo um gole de sua cerveja. — É claro que você consegue.
Primeiro, essas regras aí, isso é um absurdo. Começa fazendo ela
quebrar todas as regras.

— Como?

— Você vai descobrir.

Nesse momento, seu celular vibrou.

Isadora: Oi, onde você está?

— É a Isa, ela quer saber onde eu estou — explicou.

Começou a digitar: “Estou na casa do Henr...”, porém Henrique


tomou o celular da mão dele.

— Ei!

Apagou tudo, começou a digitar e enviou:

Gabriel: Saí para jantar com uma pessoa.

— Você precisa fazer ela ter muito ciúme, ela precisa sentir que
pode te perder. Precisa sentir vontade de mudar essa regra sobre ficar
com outras pessoas.

— Não consigo imaginar ela ficando com outro, eu vou surtar!


— Gabriel pressionou a latinha gelada contra a têmpora, estava com
muita dor de cabeça.

— Então faça o que estou te dizendo, dê em cima de todas as


mulheres que aparecerem na frente de vocês, seja bem galinha.

— Mas eu não quero ficar com nenhuma outra mulher —


explicou, cansado.

— Não precisa ficar, basta que ela pense que você está ficando.
Igual fizemos hoje. Você disse que ia jantar com uma pessoa, ela vai
pensar que é mulher. A semente do ciúme já está plantada.

— E se isso não der certo? E se ela desistir e nem quiser mais


ficar comigo?

— Pelo menos você tentou — disse, dando de ombros. — Pior


do que está não pode ficar.
ATUALIDADE

H enrique errou feio, estava muito pior do que antes. Cada


momento juntos fizeram Gabriel se apaixonar ainda mais.
Com ela era diferente de tudo que já viveu, não era só
sexo, o que tinha que confessar que era perfeito. Porém, era muito
mais que isso. Se divertiam juntos, gostava de conversar com ela, ou
só ficar perto. A simples presença de Isadora no mesmo ambiente já
era o suficiente para lhe trazer paz de espírito. Estava odiando ficar
longe dela.

Ele fitava o teto da sala, deitado no sofá preto, mas sua atenção
não estava no forro de gesso ou na lâmpada quadrada. Sentia ânsia só
de imaginar Isadora e Guilherme juntos. Nada disso fazia sentido.
Naquela manhã, quando ela o beijou no trabalho, sentiu uma alegria
enorme, acreditou que estava começando a gostar dele. Não podia
estar mais enganado. Se virou de lado no sofá desconfortável, já
estava com dor nas costas. O interfone tocou, levantou e atendeu.

— Henrique, tem uma senhorita aqui que disse que precisa


falar com o senhor — o porteiro disse.

— Qual o nome dela? — perguntou, preocupado.

Seu amigo estava no quarto com Marcela. Ficou chocado


quando ela apareceu meia hora atrás. Pelo que entendeu, estavam se
conhecendo melhor, e se fosse outra mulher? Iria avisar Henrique por
mensagem de texto.

— Isadora Rafelly Ribeiro. — Sentiu o coração bater fora do


compasso. — Posso mandar subir?

— Sim — falou tão baixo que ficou na dúvida se o porteiro


tinha escutado, mas ouviu-o falar: “Pode subir”.

Gabriel andava de um lado para o outro na sala, não sabia o que


esperar, nunca conheceu alguém tão imprevisível quanto a ruiva. Se
recusou a imaginar o motivo da sua vinda, não queria criar falsas
esperanças, seu coração não aguentaria mais um baque. Ela tocou a
campainha e ele abriu rapidamente a porta. Isadora usava um vestido
marrom rodado, uma sandália bege e os cabelos estavam molhados e
soltos.

— Oi — cumprimentou, tímida.
— Oi, pode entrar. — Deu um passo para o lado, dando
passagem.

Ouviu um barulho de porta e Henrique apareceu.

— Ah... oi, Isadora, vou deixar vocês a sós — disse, dando uma
piscadinha para Gabriel e voltando para o quarto. Anotou
mentalmente que esganaria o amigo depois.

Eles se entreolharam. O silêncio e uma tensão os envolvia. Ela


torcia as mãos nervosamente.

— Quer água? — ele perguntou.

— Sim.

Ele pegou um copo no armário de louças, abriu a geladeira,


pegou a garrafa e a serviu. Pegou uma cerveja, estava precisando.

— Obrigada — Isadora agradeceu, esticando as mãos para


pegar o copo. Seus dedos roçaram no ato, e ele sentiu que sua pele
queimava. Era sempre assim, seu corpo reagia imediatamente ao
dela.

Seus olhos se encontraram e eles permaneceram assim por um


momento que pareceu durar uma eternidade. Ela quebrou o contato
das mãos e desviou o olhar para o chão. Ela respirou fundo e ele
abriu a latinha.

— O que vou falar não é nada fácil... — Deu um sorriso,


constrangida, e bebeu toda a água em um longo gole. — Mas eu
preciso falar mesmo assim. Gaby... eu... Bom, eu sei muito bem o
que combinamos. — Olhou fixamente para as próprias mãos. — Quer
dizer, eu não penso que você vá mudar de... ideia, nem nada disso. —
Fez uma pausa. Ele percebeu que ela retorcia as duas mãos. Respirou
fundo novamente e falou de uma vez: — Descobri que eu amo você.
— Ele entreabriu os lábios, surpreso. — Não precisa falar nada. —
Ela levantou a mão. — Não vim aqui exigir nada. Eu sei que você
não sente o mesmo, não quero que se sinta obrigado só porque vamos
ter um bebê. — Gabriel sorriu, deixou a cerveja intacta na mesinha
de centro e se aproximou. — Isso estava me sufocando e precisava
falar. Também vim porque você precisa voltar para...

Gabriel encostou a testa na dela e ela se calou. Ele olhou dentro


dos seus olhos.

— Fala de novo — pediu num sussurro.

— O quê?

— Que você me ama.

— Eu te amo — ela confirmou num fio de voz.

Ele sorriu e a puxou para um beijo. Estava muito feliz e com


saudades dela. Somente algumas horas pareceram uma eternidade,
mas precisavam conversar, então a afastou relutante.

— Por que disse que eu não sinto o mesmo? — questionou,


passando o polegar pela sua mandíbula.

— Eu sei que eu não faço o seu tipo — suspirou, desanimada.

— Tipo, Fiona? — Ele riu.

— Sim, loira, magra e peituda. Como a Clara ou a Nádia.


— Meu tipo é uma ogrinha insaciável e bagunceira — falou
com carinho e a puxou, sentando e colocando-a em seu colo.

— Então, você gosta de mim? — perguntou, confusa.

— Se eu gosto? Eu te amo, tolinha! — Certamente estava com


um sorriso bobo no rosto.

— Então por que você ficava com todas aquelas mulheres? —


questionou, desconfiada, estreitando os olhos.

— Não fiquei com nenhuma, só estava tentando te deixar com


ciúmes.

— Nunca mais faz isso! — pediu, chorosa. — E você


conseguiu, eu estava com muito ciúme — suspirou.

— Nunca mais vou fazer isso — prometeu, rindo.

— Você está mentindo para mim? Odeio quando você mente! —


Fez um bico lindo e ele não resistiu e roubou um selinho dela antes
de lhe responder.

— Eu nunca mais vou mentir para você, Fiona. — Resolveu


explicar o plano que Henrique arquitetou. — Eu não estava saindo
com nenhuma mulher, foi tudo um plano do Rique para fazer ciúmes
em você.

— Mentira! E a Amanda? — Fechou a cara imediatamente,


fazendo-o rir.

— Eu só conversava com ela no trabalho e quando você estava


vendo. Nunca saí com ela.
— Você jura? — perguntou, manhosa.

— Juro, Fiona. Podemos perguntar para ela, se você preferir.

— Não, eu vou confiar na tua palavra. — Eles riram um para o


outro e se beijaram. Isadora o empurrou abruptamente. — Meu Deus!
Vocês são muito malvados. — Deu uma batidinha no seu ombro. —
Eu não conseguia dormir pensando em você nos braços de outra
mulher.

— Nós somos malvados? Olha o que você fez comigo, partiu


meu coração. — Tocou a barriga dela. — Se não fosse esse bebê, eu
teria saído dessa cidade.

— Eu sinto muito por ter jantado com o Guilherme — disse


pesarosa. — Logo eu percebi que tinha sido uma péssima ideia.

— Eu quase surtei imaginando vocês juntos, mas eu entendo


que eu não estava demonstrando ser muito confiável esses dias. Só
espero que você acredite que foi algo encenado e confie em mim a
partir de agora.

— Eu confio. Vamos para casa?


Q
uatro dias depois, era o dia do chá revelação. Isadora estava
ansiosa, queria muito saber o sexo do bebê. Às dezoito
horas chegaram na casa de Ana, que organizou a festa em
seu quintal. A decoração era toda rosa e azul.

— Está tudo perfeito! — disse para sua amiga e seu olhar


vagueou pelo painel de balões nas mesmas cores, escrito “Menino ou
Menina?”.

Metade da mesa tinha docinhos rosa e a outra metade azul, e no


centro o bolo também era partido ao meio com a mesma coloração,
de um lado escrito “Prince?” e do outro “Princess?”, com duas
coroas enfeitando. Estava tudo muito lindo.
Recebeu os convidados, que eram seus amigos da faculdade e
do trabalho. Marcela estava atrasada, então estavam todos
aguardando sua chegada. Assim que a campainha tocou, Ana foi
abrir a porta. Isadora tomou um susto quando ela retornou com os
convidados. Não era sua amiga, mas sim seus pais e os pais de
Gabriel. Ela saiu correndo e abraçou Miguel.

— Pai! Não acredito que vocês vieram! — gritou entre


lágrimas.

— E você acha que nós iríamos perder esse momento tão


importante? Não aguentava mais ver minha filha por uma tela — ele
resmungou, soltando-a do abraço, e ela correu para abraçar sua mãe.

— Eu estava com tanta saudade de vocês! — Sua voz estava


embargada. Observou Gabriel abraçando a própria mãe.

— Por que não avisaram? Eu buscava vocês no aeroporto — ele


reclamou.

— A graça é fazer surpresa — Laura respondeu, rindo, e em


seguida virou-se para ela. — Como você está linda grávida. — As
duas se abraçaram, e logo após Raul a abraçou também.

Após finalizados os cumprimentos, Gabriel levou-os para uma


mesa. Não demorou muito e Marcela chegou. Isadora estranhou
quando viu que estava acompanhada de Henrique, o amigo de
Gabriel. Será que estava rolando algo entre eles?

Na hora da revelação, todos fizeram uma roda em volta do


painel e Gabriel ficou ao seu lado. No centro tinha uma caixa
decorada em azul e rosa, com uma interrogação no meio.
— Preparada? — ele perguntou.

— Sim! No três.

Todos contaram juntos. 1, 2, 3. Abriram a caixa e balões azuis


subiram.

— Não acredito! — Isadora exclamou.

— Menino! — Gabriel gritou.

— Ganhamos, Diana! — Miguel gritou quase ao mesmo tempo.


— Está me devendo mil reais, Raul.

— Pai! — Isadora o repreendeu. Ia iniciar o discurso de “parem


de apostar sobre a vida dos filhos”, mas Gabriel foi mais rápido.
Correu e abraçou-a, segurando seu rosto com as duas mãos.

— Eu amo vocês! — Quando eles se beijaram, houve um coro


de aprovação e surpresa. Os dois estavam emocionados e exultantes.

— Ainda tem a data do pedido de casamento, estou confiante


que esse eu vou ganhar — provocou o pai de Gabriel, gritando acima
dos murmurinhos de felicitações para Miguel.

Comeram bolo e docinhos. Isadora aproveitou para matar a


saudade de seus pais. Vieram de avião somente para o chá revelação
e teriam que viajar às onze horas da noite. Não conseguiram
autorização no trabalho para ficarem mais. Sua mãe prometeu que
estaria com ela no dia do parto, seria em fevereiro e ela não tiraria
férias em dezembro para estar presente na data.

Foi tudo muito especial. Após despedirem-se dos convidados,


dos seus sogros e de seus pais, Gabriel levou-os até o aeroporto e ela
ficou conversando com suas amigas e contando todos os detalhes do
seu relacionamento com seu melhor amigo e atual namorado.

Quando Gabriel retornou, ela despediu-se das amigas e entrou


no carro. Enquanto seguiam em direção ao seu apartamento,
conversaram animadamente sobre os possíveis nomes do bebê.

— O que você acha de Christian? — perguntou, malicioso.

— Nem pensar! — respondeu, rindo.

— Jack, então.

— Para! — Deu uma cotovelada nele. — Estou falando sério,


temos que pensar em um nome. — Não queria associar o filho às
brincadeiras que faziam entre quatro paredes.

Isadora estava cansada. Assim que subiram, Gabriel abriu a


porta e a deixou entrar na frente.

Estancou, olhando atônita ao redor. Pendiam do teto várias


fotos de um casal de crianças magrelas, uma ruiva de olhos verdes e
um jovenzinho de cabelos pretos e olhos azuis. Eram os dois quando
criança. Foto deles na escola, no parquinho, na piscina, na roda-
gigante, intercaladas por frases em plaquinhas. No chão tinha uma
trilha de pétalas de rosas. Ela seguiu a trilha, lendo cada plaquinha.

“Quando eu te vi pela primeira vez, pensei: essa ruivinha deve ser


muito chata.”

“Você era geniosa e competitiva.”

“Mas um dia vi você chorando depois que ninguém quis brincar com
você.”
“Eu quis cuidar de você, porque ver o teu choro partiu meu coração.”

“Logo descobri que você era muito legal.”

“Comecei a me divertir de verdade.”

“Mal esperava a hora de brincarmos juntos.”

“Odiava quando alguém te magoava.”

Isadora sentiu um aperto no coração e lágrimas começaram a


descer por seu rosto. Continuou andando e olhando as fotos e
plaquinhas. A cada metro, eles iam crescendo. Fotos adolescentes na
primeira festa, no shopping, na sorveteria, na formatura e na festa da
faculdade.

“Uma certeza eu sempre tive: queria ver você feliz.”

“Só não sabia que só seria feliz com você.”

“Hoje eu sei.”

“Não consigo mais viver sem você, Fiona.”

“Minha Christian.”

“Eu amo você.”

As fotos, frases e pétalas paravam na frente da porta do quarto


de Gabriel. Tinha lágrimas nos olhos. Abriu a porta, curiosa e cheia
de expectativa. O teto da cama estava cheio de balões de coração, de
onde desciam fitas vermelhas. Em cima do colchão tinha muitas
pétalas de rosa espalhadas, e escrito de vermelho dentro de um
coração estava: “Quer casar comigo?”.
Começou a chorar. Se virou e Gabriel estava de joelhos,
segurando uma caixinha aberta com um anel de esmeralda.

— Isadora Rafelly Ribeiro, você quer casar comigo? — Sentiu


o coração acelerado e secou as lágrimas que teimavam em descer por
seu rosto.

— Sim! Sim! Mil vezes sim! — gritou, e Gabriel levantou e a


abraçou, carregando-a e girando com ela.

Se beijaram e ele secou as suas lágrimas. Pegou o anel e


colocou no dedo anelar da sua mão direita. Ela olhou por um tempo
para a aliança de noivado.

— É lindo!

— É da cor dos seus olhos. Quando vi, soube que era esse. —
Pegou sua mão e beijou em cima do anel.

— Como você fez tudo isso? — perguntou, olhando ao redor.

— Rique e Marcela — respondeu, colocando uma mecha ruiva


atrás da orelha.

— Aqueles traíras! Por isso se atrasaram para o chá revelação


— resmungou e depois fez uma cara de pavor. — Você contou sobre
Christian e Anastasia?

— Não, mas eles estão muito curiosos — disse, rindo. — Vão


perturbar até a gente contar.

— Menos mal, a gente enrola eles — Isadora disse, encostando


a testa na sua. — Eu te amo tanto!
— Eu também te amo, Fiona!
G abriel pegou Dylan, vestiu-o com uma blusa azul-marinho,
uma calça jeans e colocou o tênis azul-claro. Passou
perfume atrás das orelhinhas e beijou o cabelo ruivo. Era a
criança mais linda que já viu. Gordinho, branquinho de bochechas
rosadas e olhos azuis. Pegou-o no colo e foi para o quarto do casal.
Isadora tinha acabado de sair do banheiro e estava com uma toalha
no corpo, secando os cabelos com o secador.

— Amor, vou deixar o Dylan aqui, preciso tomar banho —


avisou, colocando o menino na cama, ao seu lado, e se inclinou,
beijando seus lábios. Isadora colocou um desenho no celular e
entregou para a criança.
Gabriel tomou um banho caprichado. Hoje era seu aniversário e
iriam para a casa de Ana, a amiga de Isadora, que era a única que
morava em uma casa, e aproveitariam o quintal grande para fazer um
churrasco para seus amigos. Assim que saiu do banho não encontrou
Isadora ou Dylan. Colocou uma calça jeans, uma blusa preta e um
tênis branco. Saiu à procura deles e os encontrou na sala. Os dois
estavam usando a camisa do seu time, São Paulo.

Seu sorriso alargou-se. Ficou emocionado com essa visão mais


linda. Seu filho segurava uma caixa retangular branca, com um laço
azul.

— Surpresa! — Isadora exclamou.

Gabriel pegou Dylan no colo e abraçou os dois, beijando sua


esposa nos lábios.

— Estou muito feliz, amor! Muito obrigado por realizar o meu


sonho. — Acariciou o rosto dela com carinho. Sempre sonhou em ver
a sua família usando a camisa do seu time e jurava que nunca
aconteceria.

— Não vai abrir?

Ela pegou a criança dos seus braços e ele pegou a caixa das
mãos pequenas do seu filho. Já sabia o que seria, uma camiseta do
seu time. Já possuía várias, mas é claro que iria amar de qualquer
jeito. Isadora colocou Dylan no chão e segurou sua mãozinha.
Gabriel retirou o laço e levantou a tampa. Olhou atônito o pequeno
body. “Sou tricolor igual o papai” e embaixo das letras um símbolo
do São Paulo. Ficou emocionado e olhou Isadora com carinho.
— Estamos grávidos! — Ela sorriu e ele retribuiu o sorriso.

— Esse sim é o melhor presente! — disse, enlaçando sua


cintura e a beijando apaixonadamente.

Não podia estar mais feliz.


O céu estava num tom azul intenso, livre de nuvens, e o sol
estalava sobre suas cabeças. Dois casais de meia-idade
estavam deitados em espreguiçadeiras brancas,
observando a criança brincando na piscina com os pais. A ruiva,
Diana, que trajava um maiô completamente preto, abaixou os óculos
escuros e estreitou os olhos verdes.

— Eles formam uma família linda, eu não podia estar mais


feliz! — suspirou, emocionada.

— Diga por você, não gostei nada de não poder mais apostar —
Miguel murmurou, rabugento. Ele usava somente uma bermuda
cinza, e assim como os outros segurava uma latinha de cerveja.

Os cabelos, antes castanhos, agora eram brancos e ralos. Os


olhos cor de mel continuavam calorosos, contrastando com as
palavras e as rugas de irritação.
— A culpa é sua, Miguel. Se você e Raul não fossem tão
escandalosos — Diana acusou.

— Ei, podíamos apostar em segredo. — Raul abaixou a voz,


ficando quase inaudível. Ele vestia uma bermuda jeans branca e uma
camiseta verde. Os cabelos estavam acinzentados. Os olhos azuis
estreitaram-se ao concluir: — Eles nunca saberiam.

— Para dar certo, não podemos falar nada na frente de Isadora e


Gabriel. Você consegue manter o bico calado, Miguel? — a ruiva
perguntou, encarando o marido.

— Claro, mulher! — Virou os olhos. — Desse jeito, nossos


amigos vão pensar que não tenho capacidade de manter um segredo.

— Isso é arriscado, vocês dois não conseguem segurar a língua


— Laura decretou com um aceno de mão. Ela trajava um maiô
tomara que caia vermelho. Os cabelos loiros e brilhantes só estavam
um pouco finos, pelo uso constante de tintura. — Meu neto é tão
lindo, eu fiquei muito feliz de acertar a cor dos cabelos. Não só pelo
dinheiro, eu sempre quis um netinho ruivo, acho um charme.

— Mas o dinheiro faz tudo ter mais graça — Miguel suspirou.


— Podemos fazer dar certo! — exclamou, animado, abaixando a voz
logo em seguida, com o olhar faiscante de Diana. — E temos que
agir rapidamente, antes do chá revelação.

— Não faz nem um mês que ela descobriu que está grávida,
ainda tem tempo — a ruiva cochichou, conspiratória.

— É que eu não me perdoo por não termos apostado na data da


próxima gravidez — Miguel falou, desolado. — Eu teria ganhado.
Meu palpite era de que seria no segundo ano de casados. Você
lembra, Diana? Eu disse pra você.

— Eu sei, mas Isadora nos fez prometer — ela suspirou.

— Até agora não entendi porque ela nos fez prometer acabar
com as apostas. — Foi a vez de Raul reclamar, antes de tomar um
gole grande de sua cerveja.

— Ela não acha que isso é um bom exemplo para os nossos


netos. Disse que temos que amadurecer — a loira interveio.

— Que bobagem! — Miguel murmurou, mal-humorado.

Gabriel saiu da piscina e foi até eles. As gotas de água


escorriam pelo corpo musculoso. Pegou uma toalha branca na mesa e
começou a secar os cabelos encharcados.

— O que vocês estão conspirando aí?

— Nada! — responderam em coro, com fingida inocência.

— Sei... — Gabriel estreitou os olhos. — Se for alguma aposta,


só não deixem Isadora descobrir.

— Vamos ser cuidadosos — Miguel sussurrou, dando uma


piscadinha.

— Miguel! — Diana repreendeu. — Você nunca aprende?

E todos caíram na gargalhada.

Fim
Primeiramente ao meu pai, que acreditou em mim e tornou isso
possível.

Minha mãe, por sempre estar ao meu lado e me ouvir.

Minha filha, por entender que a mamãe precisa de silêncio em


momentos de inspiração.

À Juliana, minha sobrinha, por me ajudar nos momentos de


indecisão.

À primeira a ler meu livro, Sabrina.

À Hellem e Iasmin, que me ajudaram em todas as etapas e se


tornaram amigas queridas durante o processo.

[1]
O BDSM pode ser descrito como uma espécie de jogo na hora do sexo. A sigla, que vem de
palavras em inglês, é um acrónimo para a expressão Bondage, Disciplina, Dominação, Submissão,
Sadismo e Masoquismo. Ou seja, pode rolar algum tipo de agressão, como tapas, e isso dar prazer
sexual aos envolvidos.
[2]
Alexandra Burnier, conhecida como Lelê Burnier, é uma influencer famosa no TikTok
e Instagram, que conquistou milhares de corações com seus looks coloridos.
[3]
Trecho retirado do site Astro Centro.
[4]
Trecho retirado do site Fetal Med.

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