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SINOPSE
PRÓLOGO
UM
DOIS
TRÊS
QUATRO
CINCO
SEIS
SETE
OITO
NOVE
DEZ
ONZE
DOZE
TREZE
GABRIELA BURNIER
ALEXANDRE FRAGOSO
CATORZE
QUINZE
DEZESSEIS
DEZESSETE
DEZOITO
DEZENOVE
VINTE
VINTE E UM
VINTE E DOIS
VINTE E TRÊS
VINTE E QUATRO
VINTE E CINCO
VINTE E SEIS
VINTE E SETE
VINTE E OITO
VINTE E NOVE
TRINTA
TRINTA E UM
TRINTA E DOIS
TRINTA E TRÊS
TRINTA E QUATRO
TRINTA E CINCO
TRINTA E SEIS
TRINTA E SETE
TRINTA E OITO
TRINTA E NOVE
QUARENTA
QUARENTA E UM
QUARENTA E DOIS
QUARENTA E TRÊS
QUARENTA E QUATRO
EPÍLOGO
NOTAS DAS AUTORAS
Agradecimentos
SINOPSE:
Alê sempre foi um solteiro convicto. Suas saídas chegavam, no máximo,
a três encontros. Por isso achou muito conveniente conhecer uma mulher que
compartilhava das mesmas ideias. Antes mesmo que conseguisse deixar claro
que não queria envolvimento, Gabi colocou as cartas na mesa e poupou seus
esforços. Filho único e herdeiro de uma rede imobiliária que rende milhões,
nunca escondeu sua aversão ao casamento. Por consequência, seus pais
decidiram dar um empurrãozinho: condicionar a herança a um neto, fruto do
matrimônio. Alexandre precisa casar. Quem seria a mulher ideal para ajudá-lo a
sair dessa?
Como diria Chorão (CBJr.), Gabriela Burnier "é daquelas que tu gosta na
primeira, se apaixona na segunda e perde a linha na terceira", de tal modo, ela
percebeu que quando extrapola esse limite as coisas saem dos trilhos. Não que
ela tenha problemas em sair da linha, Gabi é personificação da liberdade, não
gosta de âncoras ou pesos que a impeçam de voar... Linda, rica e bem resolvida,
por que aceitaria uma proposta de casamento?
Observação: Esse livro, incialmente, é um Spin-Off da série “Os
Albuquerques”, mas pode ser lido de maneira independente. Quem leu a série,
reverá alguns personagens amados (e outros nem tanto). Para aqueles que nunca
leram, há o risco de spoiller, mas não é necessário ler os outros para entender o
que acontece aqui.
Estava há exatos quinze minutos olhando para o teto, sabia disso porque
a mulher nua ao meu lado fazia questão de, irritantemente, me informar cada um
dos segundos em que estou calado. Como se eu não tivesse notado.
Quando meus pais me ligaram segunda-feira pela manhã, soube que tinha
algo errado. Talvez fosse o fato de o meu próprio pai ter ligado para informar
que a minha mãe havia marcado um jantar. Minha mãe não era de mandar
recados. Era objetiva e franca, nisso éramos muito parecidos. Por isso o meu
estranhamento. Preocupado, procurei-a antes do dia do jantar. Eu precisava
descartar da minha mente todas as projeções drásticas que insisti em criar.
Acabei por encontrar minha mãe na biblioteca da casa com o seu clube
do chá. Um grupo de mulheres que se reuniam uma vez por mês para traçar
eventos beneficentes e, claro, falar dos filhos e maridos. Fui expulso do local,
pois os encontros eram de mulheres e ali não cabiam homens, mas não saí sem
antes assegurar que estava tudo bem com a sua saúde e a do meu pai.
Mesmo assim sensação de que algo ruim estava por vir permaneceu.
Hoje era o dia do tal jantar. Ansioso, encerrei as minhas atividades na
empresa mais cedo e levei ao motel minha mais nova amiga. Afinal, eu
precisava relaxar e o sexo era o melhor ansiolítico que eu conhecia.
— Acho que uma massagem pode te ajudar — a voz feminina sussurrou
em meu ouvido, na medida em que suas mãos traçavam um caminho vagaroso
pelos músculos da minha barriga até chegar na minha ereção. Ela era hábil com
as mãos. Fechei os olhos pronto para me entregar a mais uma rodada de prazer,
quando meu celular tocou.
— Deixa tocar, amor... — quando ela concluiu a frase, eu já havia
esticado o braço e alcançado o celular. Era a minha secretária.
— O senhor pediu que eu lhe informasse qualquer atitude suspeita — ela
disse assim que atendi.
— Sim...
— Desliga o celular... — a mulher pediu antes da sua boca tocar a minha
glande. Meu corpo reagiu no automático, mas a minha mente estava
completamente concentrada no meu diálogo por telefone.
— O advogado da família vai estar no jantar, depois que o senhor saiu da
empresa o mesmo se reuniu com o seu pai no escritório, ficaram por muito
tempo lá dentro. E quando o senhor Barros saiu eles se despediram com "até
daqui a pouco".
— Que merda! — esbravejei — Mais alguma coisa?
— Acho que o senhor deveria estar preparado para tudo.
— Estarei — encerrei a ligação.
Que Deus me ajude!
— Sou toda sua! — A mulher anuncia rolando para o lado de pernas
abertas.
Fiz o que ela esperava que eu fizesse e fodi forte e rápido. Nada tinha a
ver com a minha pressa em enfrentar o tal jantar.
— Meu amor, achei que não viria mais — minha mãe levantou-se para
me cumprimentar com um beijo e um abraço apertado.
— Fiquei preso no trânsito — respondi, beijando-a de volta.
Depois do motel, dirigi até a minha casa para tomar banho e me aprontar
para o jantar. Saí de lá trinta minutos antes do horário combinado, mas acabei
ficando preso no trânsito caótico no horário do rush.
— Tudo bem, filho? — foi a vez do meu pai me cumprimentar com um
tapinha nas costas. Assenti e abracei o velho.
— A que devo a honra da sua companhia, senhor Barros? Da última vez
que o advogado da família jantou conosco, meu pai me tornou sócio minoritário
da imobiliária. Na época seu pai era o advogado, estou realmente curioso —
sorri antes de apertar a mão do Rafael. O pai dele era advogado e amigo do meu
pai, mas se aposentou e passou os clientes para o filho.
— Não perderia a oportunidade de sair na coluna social ao lado do
Alexandre Fragoso — exibe um sorriso desdenhoso.
Eu e o Rafael discordávamos de muitas coisas, uma delas era o seu
incômodo em eu aparecer frequentemente em blogs e colunas de celebridades
por conta da minha vida agitada à noite. Ele argumentava que eu era uma
péssima vitrine para a imobiliária, argumento que eu rebati quando mostrei que
ele era advogado e não gerenciador de imagem, além disso a empresa vinha
crescendo desde que eu assumi a administração geral.
— Bebem alguma coisa? — meu pai indagou.
— Whisky! — pedi.
— Água com gás — Rafael tentou se mostrar profissional.
— Querido, para mim algo doce, mas com álcool — minha mãe pediu.
Fizemos o pedido do jantar enquanto tomávamos nossas bebidas.
Observei o exato momento em que a mão do meu pai enlaçou a da minha mãe
sobre a mesa e eles trocaram um olhar cúmplice, o mesmo olhar que via
enquanto crescia. Eles sempre foram amigos, companheiros, cúmplices. Era
bonito ver que a relação deles continuava a mesma com o passar dos anos.
— Alexandre, meu filho, chamamos você aqui para falarmos do nosso
testamento...
Anos atrás, logo após a morte da mãe do Marcos, minha mãe decidiu
fazer um testamento e convenceu meu pai dessa ideia. De um tempo para cá, ela
vinha comentado sobre deixar uma parte de tudo que tinha para a caridade, por
isso, certo alívio me percorreu ao ouvir esse anúncio. Como eles garantiram mais
cedo que estavam bem de saúde, esse jantar só podia significar o anúncio oficial
dessa mudança e talvez informar quais os locais exatos para aplicar o dinheiro
futuramente. Ou ainda, vincular a minha participação nas ações das instituições.
O que eu faria de bom grado.
Ajudar os outros alivia a nossa dor. Não gostava de pensar sobre perder
alguém que eu amava novamente, mas sabia que era um passo importante para a
aceitação.
Ouvi exatamente o que esperava e sorri aliviado. Passei dias sofrendo por
antecipação para isso? Minha mente já projetava formas de comemorar a falta de
notícia ruim quando pedimos a sobremesa. Foi então que as palavras
"casamento" e "filho" fizeram meu estômago revirar. Devo ter ouvido errado...
Tentei prestar atenção no que era proferido.
— É isso Alexandre, você é nosso único filho e sua mãe se preocupa
muito com você. Nós nos preocupamos, na verdade.
— Eu sei, pai. Mas acho que não entendi direito.
— Você não estava prestando atenção? Nós nos preocupamos com você
— minha mãe repetiu.
— Essa parte eu entendi, não precisam se preocupar. Faz tempo que sou
maior de idade — ergui as sobrancelhas.
— É isso que as mães fazem: se preocupam mesmo quando os seus
meninos crescem e se tornam homens e você precisa de uma mulher — minha
mãe disse, fitando-me com carinho e por mais que eu tenha todos os motivos
para querer brigar, sou incapaz de atacá-la.
— Uma mulher não me protegeria do mundo, nem se fosse a própria
mulher maravilha — rebati.
— Uma mulher não, mas a sua esposa sim. Veja o Marcos, como ele se
tornou um homem ainda melhor depois que encontrou a Fernanda...
Marcos Castro era o meu parceiro de noitada, amigo de longa data e um
advogado muito competente. Acontece que ele se apaixonou loucamente por sua
chefe, abandonou o time dos solteiros e entrou, com um enorme sorriso de
satisfação, no mundo dos casados. Não era algo que eu desejava para mim no
momento, talvez nunca desejasse.
— Isso foi um golpe de sorte. Posso citar inúmeros amigos que a vida se
tornou um inferno depois do casamento.
— E eu posso citar, além do caso do seu melhor amigo, mais outros dez
de pessoas próximas a nós que são muito felizes.
— Pai, o senhor precisa ouvir o meu lado — apelei para a sua
racionalidade masculina.
— A nossa decisão está tomada e já registrada — meu pai informou e eu
encarei o Rafael. Os olhos do advogado brilhavam, ele estava se divertindo com
a situação.
— Então é isso, eu terei que casar para ser herdeiro de vocês?
— Não somente casar, Alexandre — o advogado respondeu com um
sorriso imbecil no rosto — Seus pais condicionaram o cargo que ocupa na
empresa, bem como toda a herança a um casamento cujo fruto seja um herdeiro
legítimo.
Caralho!
Puta que pariu!
Porra!
Um a um os xingamentos apareceram em minha mente, eu estava
arquitetando uma maneira de sair daquela situação, um casamento por
conveniência não seria tão difícil de conseguir, mas um filho...
— Aqui está a sua cópia — meu pai estendeu o documento e peguei-o
apressadamente da sua mão. Deve ter uma brecha que me salve dessa
enrascada. Ali mesmo, sentado em frente aos meus pais, folheei até chegar ao
ponto principal.
"A partir da assinatura deste, fica estabelecido o prazo máximo de dois
anos para que o beneficiário Alexandre Fragoso Maia cumpra as cláusulas
acima, o não cumprimento do prazo supracitado acarretará a execução das
restrições".
— Dois anos? — indaguei — Só pode ser brincadeira. Encontrar a tal
mulher dos sonhos e ter um filho em dois anos?
— Se não estabelecêssemos um prazo você poderia protelar por anos a
fio... — o advogado justificou.
— Rafael, obrigado. A reunião acabou, agora teremos uma conversa em
família — meu pai dispensou o advogado que se despediu e nos deixou a sós no
restaurante.
Permaneci com o olhar atento ao documento... Deve existir uma forma de
contestar isso... Preciso pedir ajuda ao Marcos.
— Filho, fizemos isso para seu bem.
— Mãe, não quero discutir, mas para o meu bem isso não tem nada. Não
estou falando só pela herança, mas também pelo meu trabalho. Vocês estão me
obrigando a abrir mão da única coisa que aprendi a fazer.
— Você não precisa abrir mão de nada, é só se casar — meu pai via o
caso como fácil.
— Isso é um absurdo!
— Fizemos isso porque você precisa ser feliz.
— Eu sou feliz, merda! — falei alto chamando a atenção dos presentes.
— Você sabe que precisa virar a página. Já se passaram muitos anos
desde... — minha mãe interrompeu a fala do meu pai com um toque em sua mão.
Havia muitos anos que aquele olhar não era dirigido a mim. Aquela
expressão que fez parte dos meus dias quando tudo aconteceu. Eu odiava o que
aquele olhar significava: pena.
— Com licença — levantei da mesa, deixando os dois para trás.
Assim como eu havia deixado o meu passado.
O mundo está tentando me dizer que estou velha. E que preciso mudar de
vida. Sinto isso, ele está mandando recados insistentes. Desvio de cada um deles,
por mais difícil que seja.
Tudo começou quando Fernanda Albuquerque uma das melhores amigas,
senão a melhor, engravidou e em seguida decidiu constituir família... Foi um
golpe fatal nas minhas farras e planos de viagens loucas, como sempre fazíamos.
Tudo bem, ela está feliz, muito mais do que já foi um dia, diga-se de passagem.
Quase ao mesmo tempo a Soraia casou com o gato manso, ex-noivo da
Thalita, cunhada da Fernanda... Confuso né? Enfim, Soraia casou (rapidamente e
sem festa nem nada) com João Pedro. Duas amigas casadas oficialmente.
Embarcando nessa onda me vem a Lú e atende aos apelos da família: vai casar
na igreja. Mesmo já convivendo com Emerson há algum tempo, fará a cerimônia
religiosa. E todas nós seremos madrinhas.
E eu as ouviria bradar: Só falta você, Gabriela Burnier! Vai rimar, eu sei.
Meu discurso pode parecer feminista, foda-se, mas eu realmente não via sentido
nisso tudo. Por que a missão de vida da mulher era casar e constituir família?
Sempre me perguntei isso, nunca achei a resposta.
Pensei nisso tudo, enquanto me olhava no espelho, observando como o
vestido azul marinho abraçava meu corpo. Estava tentando não exagerar já que a
família da Lú era tradicional, mas não pude evitar o lasco que se estendia e
revelava minha perna.
— Sabia que você não conseguiria ficar sem mostrar um pouquinho
desse corpo fenomenal! — Fernanda Albuquerque perturbou ao meu lado.
— Estou sendo discreta... E você? Como consegue já estar gostosa assim
depois de ter um filho? — ela usava um vestido longo, rosa claro, justo no
tronco.
— Minha filha já tem quase dois anos Gabi, achou mesmo que eu não
voltaria para o meu corpo?
— Voltaria, nem que para isso precisasse fazer cirurgia plástica! —
rimos.
— Eis a vantagem de ter uma conta bancária recheada — Sol disse, se
aproximando.
— Graças a mim, né? Se dependesse da administração do meu
irmãozinho mais novo, minha filha não conheceria a Disney nunca. Por falar em
irmãozinho... — voltou-se para mim com um sorriso diabólico nos lábios —
Você nunca deixou claro o que houve entre vocês, sua vadia.
— Opa, histórias sexuais da Gabi? Também quero saber! — Sol largou
os três vestidos que segurava.
— Achei que estivéssemos aqui para escolher os vestidos que usaremos
no casamento da Lú... — desviei do assunto.
— Qual é, você nunca deixou de fora nenhum detalhe sujo das suas
aventuras... — Fernanda insistiu.
— Nenhuma delas envolvia o irmão de uma das minhas amigas! —
soltei.
— Ah então é sério? Você pegou o Felipe? — Soraia perguntou perplexa
e Fernanda sorriu ao estilo "te peguei".
Ergui as mãos.
— Vocês venceram, vamos escolher os vestidos e encontrar álcool, aí eu
falo tudo o que quiserem.
Experimentei mais uns dois vestidos, mas acabei optando pelo azul
mesmo, a Fernanda decidiu-se por um vinho e a Sol ficou com um amarelo
suave, pagamos tudo e saímos de uma das mais exclusivas lojas do shopping do
Rio de Janeiro. Enquanto seguíamos no carrinho básico da Fernanda — que eu
imaginei que fosse ser trocado por um menos potente e mais “família” — eu me
distraí olhando as redes sociais. Evitei ir ao lado da Fernanda e me joguei no
banco traseiro do carro, precisava beber alguma coisa antes de começar a
lembrar do sexo quente que fiz com o irmão mais novo dela.
— Não vamos para nenhum bar! — a rainha decretou.
— Oi? Nanda eu disse que quero beber!
— Sol, co-pilota, ligue para o meu amado marido e diga que não
chegarei em casa tão cedo, diga que ele e Dita cuidem da Mari porque vou ter
um dia de meninas. Depois, ligue para a Lú e informe que estou passando para
pegá-la, sem opções para ela dizer não.
— Sim, senhora... Posso ligar para o meu marido também ou você não
deixa? — As duas riram.
— Pelo menos eu não preciso ligar para ninguém! — comemorei.
A Soraia e a Lú estavam no Rio por motivos diferentes. Sol, a trabalho
para variar, mas com o marido a tiracolo e Lú para provar o vestido de noiva que
estava sendo feito por um estilista da cidade maravilhosa.
— Gabi, tá no hotel né? Preciso de um lugar em que possamos ficar à
vontade, beber e rir alto. Sinto falta disso — Fernanda suspirou.
— Estou em hotel sim, mas não no de sempre. Dessa vez pedi a
cobertura e tenho piscina por lá. Bora?
— Poderíamos ligar para o Alexandre também, ele emprestaria um lugar
reservado, mas aí ele informaria ao Marcos que daria um jeito de ficar me
enchendo... Melhor não. Por falar nisso, anda pegando o Alê ainda? — arqueou a
sobrancelha definida.
— Já vi que o foco hoje é com quem eu fodo, vocês casaram e a vidinha
deve estar enfadonha mesmo — elas me olharam com a cara feia ao mesmo
tempo em que o celular tocou em minha mão.
Fernanda invocou e o cara me liga?
— Oi Alexandre — atendi baixo, mas a Fernanda virou para me encarar
ao parar no sinal fechado.
— Gabriela... — hesitou — Te mandei uma mensagem há um tempo e
você não respondeu.
— Juro que mentalmente eu respondi, mas acabei esquecendo. Algum
problema?
— Podemos nos ver? — estranhei. Nosso acordo havia sido claro: Sexo e
nada mais. E já atingimos a quantidade de vezes combinada.
— Hum... Você lembra o que combinamos?
— Sim, não se preocupe. Por mais que eu saiba que assim que te ver meu
pau vibrará, esse não é um convite para sexo. Onde você tá?
— Agora eu não posso.
— E a noite?
— Estarei trabalhando.
— Eu vou encontrar você hoje, não importa a hora.
— O assunto deve ser sério mesmo...
— Você não faz ideia — sua voz estava fria.
— Apareça na Carpe então, aproveito e faço merchandising da boate
com a sua ilustre presença.
— Até mais tarde — desligou.
O que será que aconteceu?
Precisei adiar minha ida à Vegas por causa do casamento da Lú. Mas já
estava tudo certo, quando minha amiga embarcar para a lua de mel, eu seguirei
rumo a cidade do pecado. Por enquanto estava trabalhando. Eu, que passei anos
da minha vida apenas usufruindo e gastando, achei algo com que gostava de
trabalhar: festas! Quando aceitei a sociedade proposta pelo Felipe, tinha em
mente apenas entrar com o capital, tentar ajudar no início e vender minha parte
assim que ele estivesse financeiramente capaz de gerir tudo sozinho. Não
pretendia criar raízes no Rio de Janeiro. Não sou fã de âncoras, gosto de flutuar
livremente para onde a minha alma desejar ir.
Desde que a boate inaugurou me vejo envolvida nos eventos até o último
fio de cabelo platinado, vou para meu apartamento em São Paulo em raras
oportunidades, por isso gasto rios de dinheiro num hotel de luxo que já virou
quase a minha casa. Enquanto a sensação de liberdade prevalecer, continuarei
aqui. Um dia de cada vez. Se eu me sentir presa ao trabalho, a um espaço ou a
um ser humano: rompo as correntes e corro. Ou voo. Como teria feito depois do
sexo excitante que rolou entre mim e o casalzinho Feline, Felipe e Aline.
preparei tudo para voar para Las Vegas, mas precisei adiar por causa da Lú. Ela
casará no próximo sábado, e eu embarcarei no dia seguinte.
O que não fazemos por nossos amigos?
Casar! Meu inconsciente responde em um grito histérico. Mas eu
silenciei a lembrança e levantei para falar com o meu sócio, em sua sala.
Precisava de distração. Bati à sua porta e ele gritou um "entre" que me autorizou
a seguir em frente.
— Ora, ora... Veio vestida para matar! — ele observou cada curva do
meu corpo. Estava usando um macacão preto de tecido que possui mangas
longas, assim como as pernas. O detalhe está no decote que se estende até
próximo ao umbigo. Dei uma volta e quando o encarei ele sorri — Porra, Gabi!
— Achei que, a essa altura, você soubesse que para matar eu me dispo —
ele gargalhou e eu me sentei — Estou passando aqui para confirmar a minha
viagem, embarco domingo.
— Achei que tivesse desistido.
— Preciso me libertar dessa vidinha de proletária e gastar alguns milhões
para voltar a me sentir Gabriela Burnier.
— Sei como é — ele sabia mesmo. Se tem uma pessoa que entenda meu
modo de viver e sentir, essa pessoa era Felipe Albuquerque — Por falar em se
sentir foda, acho que não te agradeci ainda pelo presente de aniversário.
O ménage. Uma pontada atingiu novamente meu coração e eu ainda não
conseguia identificar o motivo, depois que saí daquela suíte me senti estranha.
Quando a Aline me convidou para ser parte do presente de aniversário do Felipe,
eu prontamente aceitei. E não me arrependi, foi quente e excitante o suficiente
para que eu quisesse repetir. Mas, algo mudou desde que eu vi que depois do
sexo, eles fizeram amor...
— O prazer foi literalmente meu — sorri com todo o meu sarcasmo —
Ela gostou?
— Adorou. Espero que ela me dê mais vezes esse presente — Felipe
gargalhou e eu acompanhei.
— Vou sugerir que ela tente com dois homens — ergui uma sobrancelha
e esperei a reação ciumenta. Ele pareceu ponderar.
— Acho justo... Mas não serei eu a sugerir — piscou — Carpe Vita,
Gabi!
— Carpe Vita! — concordei e lembrei de um detalhe — Onde você fez
sua tatuagem, Felipe?
— Com um brother que tem um estúdio em Sampa. Tá pensando em
fazer uma igual? — ele tinha tatuado no corpo “Carpe Vita”, seu lema de vida e
nome da nossa boate — Seria ótimo para o marketing da boate... Já imagino
fotos suas usando apenas a tatuagem!
— Aí seria tatuagem de casal e não somos um — dei de ombros —
Quero fazer essa aqui — mostrei, no visor do celular, uma expressão também em
latim.
— Vai ficar foda! Acho que era exatamente isso que faltava nesse seu
corpo maravilhoso. Já sabe onde vai fazer?
— estou pensando na costela, mais em cima, perto do peito.
— Preciso ver isso — gargalhei — Vou pedir pro Jhon a indicação de
algum estúdio aqui no Rio.
— Você me acompanha? — perguntei.
— Tá com medinho? — ele provocou e eu revirei os olhos.
— Já suportei picadas maiores — Felipe riu alto enquanto ligava para o
amigo tatuador.
Nunca mais eu vou beber na minha vida! Juro por tudo que é mais
sagrado. Ok, já jurei isso antes, mas dessa vez é sério. Vou até me ajoelhar
quando eu consegui abrir os olhos.
A ressaca era uma das coisas com as quais eu nunca me acostumaria, por
mais que fosse uma velha conhecida. A dor de cabeça que sentia naquele
momento era a junção de todas as outras que já tive na vida. A intensidade da
dor só perdia para a que sentia quando estava com cólica, esta já me levou ao
hospital. Abri os olhos apenas para fechá-los novamente, os sinos da catedral
pareciam soar nas minhas têmporas. Tentei me mover, mas não conseguia. Voltei
a abrir os olhos assustada. Não consigo me mover? Ai meu Deus!
Com muito esforço movi o pescoço e notei que estava imobilizada por
um corpo masculino. Menos mal, minha mente já estava pensando em paralisia.
Não fazia ideia de quem era o homem ao meu lado. Um braço forte estava
passado sobre o meu tronco, amassando meus peitos. Uma perna completava o
serviço de me prender à cama.
Estava enjoada e zonza. Confiava na minha capacidade de discernir para
ter usado preservativo na noite anterior. Será que foi apenas uma rapidinha? Se
bem que eu ainda estava vestida no mesmo vestido, sentia o incômodo de ter
dormido com uma calcinha fio dental... Mais tranquila, tentei mover o
braço de cima de mim, para que eu pudesse me virar e ver o rosto do meu
acompanhante da noite.
— Bom dia.
Não, essa voz não!
— Podemos tomar café aqui no quarto? Minha cabeça está doendo — ele
não se moveu.
— Você... Eu... — afastei o braço dele e consegui me sentar na cama —
Alexandre, nós transamos de novo? — Apontei para nós.
— Você não lembra? Assim você me magoa, Gabi.
— Não fode! Diz logo o que aconteceu.
Ele levou as duas mãos ao rosto e esfregou os olhos e o que eu vi ali fez
meu coração disparar. Por favor, não. Para confirmar as minhas suspeitas olhei
para a minha mão esquerda e perdi a capacidade de fala. Não é possível...
— O que significa isso? — Apontei o aro dourado extremamente grosso
no meu dedo da mão esquerda.
— Que você é oficialmente a senhora Fragoso.
Meu estômago se revirou e eu precisei correr para não vomitar ali mesmo
na cama. Ajoelhada no banheiro esvaziei todo o líquido amargo do meu
estômago e quase expeli meus órgãos internos também. Definitivamente essa era
a pior ressaca da minha vida. Até alucinações estava tendo.
O problema era que a minha alucinação entrou no banheiro e estendeu
um copo de água e um comprimido para mim. Levantei o mais dignamente
possível e lavei as mãos e a boca, para aceitar o copo e tomar o remédio.
— Tá de sacanagem comigo né? Cadê a Tiffany?
— Provavelmente tentando sair do banheiro em que você a trancou —
disse simplesmente.
— Eu o quê? — gritei e imediatamente baixei o tom — minha cabeça tá
estourando. Você me drogou?
— Que adorável o humor da minha esposa pela manhã — ele sorriu, eu
fechei a cara — não lembra mesmo? Quando saímos da boate eu e Tiff decidimos
casar imediatamente. Você se ofereceu para ser a nossa madrinha. Na capela do
Elvis, você foi ajudar a noiva a pôr o vestido temático. Só que quem voltou de
branco foi você. Com um convincente discurso para que eu não me casasse com
ela por ela ser uma "vadia aproveitadora que quase me chifrou".
Ai caralho!
— Isso não pode ter valor legal. Eu nem me lembro disso, anular vai ser
muito fácil. Nem consumamos, né? — ele ergueu uma sobrancelha sugestiva —
ok, então peço o divórcio. Ligo para o meu advogado e resolvo.
— Eu não vou aceitar o divórcio.
— Não vai o quê?
— Não vou assinar o divórcio — ele respondeu calmamente — Esse
casamento é importante para mim.
Quase senti pena do olhar do Alexandre. Ele estava totalmente
desesperado para casar, ia inclusive casar com uma clara golpista, mas não dava
para continuar com isso. Eu nem lembrava de ter cometido o maior erro da
minha vida, porra!
— Desculpa, mas eu não posso levar isso adiante. Não se preocupe, a
gente vai atrás da sua noiva e resolve.
— Acha mesmo que ela vai querer casar comigo depois do que
aconteceu? Eu troquei de noiva, Gabriela. E agora eu já tenho uma esposa.
— Não, não e não! — Repeti saindo do banheiro e andando de um lado
para o outro no quarto — Cadê o meu celular? Preciso de orientação
profissional.
— Gabriela por favor, me escuta! — continuei procurando o maldito
aparelho — Só me escuta — Alexandre impediu que eu continuasse andando, se
posicionando na minha frente — Gabi... — ele se ajoelhou — por favor me
ouve. Quando eu acabar de falar você liga para o seu advogado.
Porra. Eu fiquei paralisada novamente. Quando um homem se ajoelha
aos seus pés ou ele irá te dar um orgasmo ou está completamente desesperado.
Está claro que nesse caso é a segunda opção. Fodeu muito.
— Tudo bem, eu vou te ouvir e em seguida vou ligar para o advogado.
Nada vai me fazer mudar de opinião — afirmei e estendi a mão para ele levantar.
Espero estar certa. Que Deus me ajude.
O Chorão, vocalista do Charlie Brown Jr., tinha razão quando cantava
"para quem tem pensamento forte o impossível é só questão de opinião". Eu
tinha conseguido o impossível. Gabriela Burnier era a minha esposa. Pelo menos
por enquanto. A mulher estava surtando e louca para transformar esse feito
histórico em um mero incidente passível de anulação imediata.
— Gabriela eu precisava casar... — tentei introduzir, mas ela me
interrompeu.
— Já tivemos essa conversa.
— Mas éramos solteiros, agora somos casados — ela bufou e levou a
mão à cabeça — vou pedir o café da manhã para que a conversa seja menos
dolorida — sorri.
— Não sei se tenho estômago para essa conversa, Alexandre.
Fingi não ouvir e liguei para a recepção, solicitando um café completo.
Comida costumava me acalmar, espero que a ela também.
— Quer tomar um banho enquanto enviam o pedido?
Apenas nesse momento ela realmente me olhou. Os límpidos olhos azuis
percorreram meu corpo, de baixo para cima, parando no meu pau que até então
estava tranquilamente relaxado. Ela esteve tão furiosa que não tinha notado que
eu estava sem roupa ao seu lado o tempo inteiro, que decepção para o meu ego.
— Mantenha nosso amigo dentro de uma cueca — ela apontou para a
ereção que começava a surgir — por mais gostoso que você seja, estou
concentrada no nosso problema. Vou tomar banho — sorri para ela — sozinha.
E assim o fez. Gabriela só saiu do banheiro quando entregaram o café.
Nesse meio tempo eu vesti apenas uma cueca, obedecendo suas ordens como um
bom marido, mas ainda deixando meu corpo exposto. Todas as armas e
distrações seriam bem-vindas na batalha.
Ela saiu do banho usando o roupão do hotel. Os cabelos já estavam
completamente secos, o rosto ainda demonstrava contrariedade. Eu a aguardava
na mesa e contava com todas as frutas, iogurte, pães, café, ovos e bacon para me
ajudar. Ela sentou de frente para mim e se serviu de iogurte. A aliança reluzindo
na sua mão esquerda chamou minha atenção mais uma vez. Quem diria que eu
pensaria novamente em ver esse anel no dedo de uma mulher?
Mas não foi por escolha, lembro a mim mesmo. As circunstâncias me
levaram até ali. Essa seria apenas mais uma transação comercial, eu só precisava
mostrar as vantagens que fariam com que ela concordasse em passar um tempo
comigo.
Comemos em silêncio. E eu tentei ao máximo não observar enquanto ela
comia. Quando as mãos dela pousaram os talheres sobre o prato, seus olhos se
fixaram nos meus e as sobrancelhas se ergueram em questionamento.
Sempre direta, Gabriela Burnier.
— As circunstâncias mudaram, Gabriela. Você aceitou casar comigo, não
posso aceitar que volte atrás quando o que mais preciso é que sigamos em frente.
Juntos.
— Que discurso romântico — ela bocejou — Eu não me lembro de ter
aceitado casar com você. Eu estava bêbada, geralmente fazemos merda sobre o
efeito do álcool.
— E sempre precisamos lidar com as consequências no dia seguinte —
pontuei.
— Eu lidarei, é só ligar para o advogado e saber como proceder.
— Gabriela, por cinco segundos se coloque no meu lugar. Você me deu
de bom grado o que eu mais estava precisando. Imagine uma pessoa com fome,
ela não come nada há uma semana, está desesperada por qualquer migalha e lhe
oferecem um banquete. Quando essa criatura está prestes a levar o primeiro
bocado à boca, querem afastá-lo da mesa. O que essa pessoa faz?
Ela engole em seco. Está ponderando sobre a analogia.
— Eu te prometi que seria um acordo de fachada, lembra? Que você
continuaria com a liberdade que tanto preza. Nós podemos morar onde você
escolher. Carro, motorista, um batalhão de empregados à disposição... O que
você quiser, quando quiser, como desejar, Gabriela.
Os olhos dela estavam fixos em um ponto distante. Perdidos em alguma
lembrança, ou talvez considerando as minhas palavras.
— Eu posso ser um bom marido — assim que as palavras saíram eu me
arrependi. Se pudesse sugá-las de volta para a minha boca, eu o teria feito.
Primeiro porque eu não seria um marido de verdade, não queria ser, era um
acordo. Em segundo lugar era a pior coisa para se dizer para a Gabi.
Ela focou meu rosto e sorriu. Eu deveria ter saído correndo, nada de bom
poderia vir por aí.
— Tudo bem — meu cérebro demorou para decodificar o significado
dessas duas palavras.
— O que disse?
— Você precisa ver a sua cara agora — a risada dela foi sonora —
Alexandre você estava desesperado, um homem desesperado é capaz de fazer
loucuras. Inclusive casar com uma mulher com uma placa luminosa escrita
"golpista", como a Tiffany. Não estou feliz e nem satisfeita com essa situação,
errei ontem quando casei com você. Mas posso tentar prolongar esse erro por
mais um tempo, desde que deixemos as coisas claras.
Soltei todo o ar que estava preso nos meus pulmões.
— Eu tinha um contrato pré-nupcial pronto, para Tiff ontem... Mas agora
não é mais viável. Podemos estabelecer nossas regras aqui e agora.
— Não preciso do seu dinheiro e não acho justo que você tenha qualquer
direito sobre o meu. Nós casamos com qual regime de bens?
— Acha que eu te daria o golpe do baú? — perguntei surpreso.
— Nunca se sabe. Por que só as mulheres são taxadas de golpistas nesse
caso? Você pode perder tudo, só quero estar prevenida para não lhe fazer um
favor maior do que o que estou disposta.
Mulher sincera do caralho.
— Casamos com comunhão parcial de bens — informei.
— Ótimo. Apesar de também não fazer questão de nada do que possa ter
a partir de ontem — ela sorriu — podemos morar separados?
— Não seria o ideal. Precisa ficar claro para você que ninguém jamais
poderá saber que nosso casamento é um acordo. Meus pais estão de olho. O filho
da puta do advogado estava me investigando e seguindo meus passos, inclusive.
— Ok. Mesma casa. Empregados é importante, não serei dona de casa.
— Perfeito. Teremos que estabelecer um tempo mínimo de casamento.
Não posso me divorciar de repente. Um ano, no mínimo.
Ela estremeceu.
— Trezentos e sessenta e cinco dias de prisão. Nunca mais vou beber...
Foi, de longe, a minha maior burrada.
Não contive a gargalhada.
— Você acaba com a autoestima de qualquer homem, Gabi.
— Não é nada pessoal — deu de ombros — tem só mais uma coisa
essencial para que esse acordo dê certo, Alê.
— Sou todo ouvidos.
— Sem sexo.
Oi? Ela é a última pessoa no planeta de quem eu achava ser capaz de
ouvir isso.
— Você não pode estar falando sério, Gabriela — levantei e foi a minha
vez de andar de um lado para o outro.
— Estou falando sério. Precisamos deixar claro para nossa mente e para
os nossos corpos, por mais deliciosos que sejam, que isso é um acordo. Uma
transação — ergui as sobrancelhas — Esqueça essa última palavra. Estou
fazendo um favor para você, aceitando essa loucura. Não vou foder contigo.
Essa é a condição.
Graças a Deus eu não tinha contado sobre eu precisar de um herdeiro. Ela
pularia pela janela do vigésimo andar. Sem sexo... Como eu faria para ter um
filho? Inseminação artificial? Não importa, eu precisava dizer sim. Depois eu a
convenceria do contrário. Gabriela é puramente sexual, não seria mais difícil do
que fazê-la casar.
— Que fique claro que estou sendo obrigado a concordar com isso — eu
disse, por fim.
— Bem como estou sendo obrigada a permanecer casada.
Fim de jogo.
Meu pescoço doía. Senti ao tentar mexê-lo. E meu quarto estava claro e
quente demais, podia notar sem abrir os olhos. Será que esqueci de ligar o ar-
condicionado? Abri os olhos para perceber que o ar estava ligado sim, mas não
resfriava porque o sol estava batendo no meu rosto, passando pelo vidro do para-
brisa. A chave estava na ignição.
Caralho... Dormi no carro? Por isso a dor no pescoço e, notei agora ao
me mexer, nas costas. Pelo menos estou no banco do passageiro, o que significa
que não dirigi embriagado. No banco do motorista encontrei meu celular e um
bilhete.
Se eu fosse uma golpista essa hora você estaria sem carro, sem celular e
sem dignidade alguma. Me ligue para agradecer. Quero convite pra festinha.
B. Penetra - 98803-0069
— Pelo menos não precisarei me masturbar no banho feito adolescente...
— resmunguei enquanto fechava o botão da calça que ainda estava aberto e saí
do carro com a roupa tão amarrotada quanto meu rosto.
Eram cinco da manhã quando entrei e casa, tudo estava silencioso. Passei
pela ampla sala e caminhei em direção a cozinha, minha boca estava seca,
precisava de água. Antes de chegar até lá, vi a mesa de jantar posta para duas
pessoas. Nada muito romântico, mas muito mais elaborado do que a Carmem
costuma fazer para mim sozinho. Flores na mesa, souplast e louças especiais.
Será que a Gabi ia jantar comigo?
Bebo meia garrafa de água antes de subir, passei no quarto de hóspedes,
mas a porta estava trancada. Andei até o meu próprio quarto tentando fazer o
mínimo de barulho possível. Deixei os objetos no criado-mudo e fui direto para a
minha suíte. Dessa vez é a Jacuzzi que vou usar. Uma hidromassagem é tudo que
preciso para que meus músculos doloridos relaxarem.
E é isso que faço por cerca de meia hora. Quando decido que minha
cama é o melhor lugar do mundo.
Não acredito que quarenta e oito horas com uma aliança na mão
esquerda, um aniversário e uma pseudosogra carinhosa foram suficientes para
me fazer de otária. Como não sabia como lidar com meu novo estado civil diante
dos outros, optei por passar o dia na casa do Alexandre. Com o celular
desligado, só por precaução. Assim, conhecendo e me familiarizando, andei
pelos arredores da mansão para notar que, ao contrário do que pensei, ela não
fazia parte de um condomínio fechado. Era como a casa dos pais da Fernanda
em São Paulo, imensa e com muros como um condomínio, mas só havia uma
única casa. Sem vizinhos para espiar sua vida. Além da piscina, havia um espaço
com gramado para jogar futebol society e uma sauna. Bastante espaço de lazer
para apenas uma pessoa. A casa era grande e espaçosa, o quarto do Alexandre
era o maior dos três e o único que possuía um closet. Acho que eu deveria exigir
ficar nele, sem o dono do quarto, para o bem da minha saúde mental e das
minhas novas convicções.
Passei boa parte do tempo na piscina, mas fui interrompida pela Carmem
que me serviu almoço lá mesmo. Ela insinuou, discretamente, que poderia
preparar um jantar especial para o aniversário do patrão. Não vi problemas nisso
e até me animei sugerindo o cardápio, afinal eu também ia desfrutar do jantar.
Tomei banho e me arrumei, como sempre, não era porque ia jantar em casa que
me apresentaria de qualquer forma. Pensei até num presentinho para o Alê.
Desde que eu determinasse que seria apenas dessa vez, poderíamos finalmente
ter a nossa noite de núpcias. Na verdade, eu não aguentava mais e precisava dar
para alguém. Essa tensão toda desde Vegas somada ao fato de ver aquele homem
nu mexia com meus hormônios e eu nunca fui de negar-me nada.
A cada hora que se passava, mais raiva eu sentia. Quando a Carmem
perguntou se eu queria que ela o localizasse, eu fui para o meu quarto. Sem
comer. A mulher estava sentindo pena de mim?! Só porque aceitei a sua sugestão
imbecil de jantar no aniversário do filho da puta que não deu as caras durante
todo esse tempo? Não. Ela não me conhecia. Não sabia que eu não nutria a
menor esperança de que ele fosse aparecer ou que eu entrei nessa sem querer.
Não fazia ideia de que tudo que eu mais queria era voltar no tempo e deixá-lo
casar com a golpista da Tiff. Ela achava que eu estava trancada no quarto, talvez
chorando, porque o Alexandre tinha aceitado as minhas condições.
Ela estava errada, claro. E a lágrima que escorreu pelo meu rosto era
fruto da TPM maldita que me acompanha todo mês, da raiva de ter me metido
nessa merda e feito o primeiro papel de otária na pele de esposa. Mas esse seria
o primeiro e o último papel de trouxa.
Dizem que para cada ação existe uma reação. E Gabriela conhecia
exatamente essa lei da física e sabia, como poucas mulheres, aplicá-la. Assim,
no dia seguinte quando eu acordei e desci para jantar encontrei ela e o seu
personal tomando café sorridentes e cheios de papos paralelos. Minha presença
fora completamente ignorada. O mesmo comportamento ocorreu pelos próximos
dois dias, eu descia para tomar café e a encontrava sorridente e cheia de
conversa com o tal Dan. Minha cara feia não foi o suficiente para que eles
permanecessem mudos enquanto tomavam café, pelo contrário, a maldita
insinuava-se ainda mais para o moreno a sua frente.
A gota d'água foi quando numa determinada manhã minha sala fora
transformada em academia. Gabriela estava posicionada de quatro e o seu
maldito personal estava atrás dela auxiliando o exercício.
— Chega! — Bufei irritado.
— Nada disso, ainda falta uma série — Gabriela informou, ofegante.
— Fora da minha casa! — gritei para o personal que nesse momento
estava do outro lado da sala.
— Escuta, aqui! — Gabriela levantou-se e se aproximou de onde eu
estava com o dedo em riste — A casa é tão minha quanto sua!
— Não lembro de dividir a despesa da casa com você! — Só quando as
palavras saíram da minha boca eu me arrependi.
— Nunca mais jogue na minha cara que a porra da casa é sua — rosnou.
— Desculpa...
— Cale a boca que eu não acabei — Ordenou furiosa — na próxima vez
que você pensar em expulsar alguém dessa casa, sou eu quem sairá por aquela
porta para nunca mais voltar!
— Me perdoa — passei as mãos pelos cabelos desorientado.
— Você é um filho da puta de um esnobe — continuou furiosa — estou
nessa merda por você.
— Você faz questão de me lembrar disso a cada dia!
— Por que é a mais pura verdade! Você acha mesmo que eu abriria mão
da minha vida se não fosse por pena de você?
— Eu já te agradeci...
— E poderá fazer isso a vida inteira e ainda assim não será suficiente.
— O que droga você quer que eu faça?
— Que pare de bancar o marido ciumento.
— Eu queria que fosse fingimento... — confessei.
— Não, Alexandre! — Continuou andando de um lado para o outro, só
agora notei a ausência do personal, deveria ter fugido. — Eu falei que isso não
daria certo.
— Não acabei de confessar que te amo para você agir assim — encontrei
os seus olhos arregalados — Eu apenas me sinto atraído por você e não gosto de
ver aquele homem ao seu lado.
— Pois terá que se acostumar por que se você proibir o Daniel eu
encontrarei um personal ainda mais gostoso amanhã! — Desafiou-me.
— Então tudo isso é para me irritar?
— Tudo isso é para você entender que mesmo que eu seja a droga da sua
esposa de mentirinha eu continuo livre para fazer o que eu quiser, onde e quando
quiser. Não consegue lidar com isso? Liga para o meu advogado e acerta os
detalhes do divórcio. Até lá você terá que controlar esse seu ímpeto se quiser
manter a sua farsa! — Gabriela me lançou um olhar gélido, daqueles que não
permitem contra-argumentos e afastou-se pisando firme em direção a escada,
quando estava no topo parou e informou — Você tem até o próximo fim de
semana para encontrar outra casa para morarmos, não quero ficar mais na sua
casa!
— Merda! — esbravejei arrependido por toda a situação que eu criei.
Passei o resto da manhã irritado e descontando em todos a minha frente a
minha fúria. Era óbvio que todas aquelas manhãs que a Gabriela fez questão de
esfregar na minha cara tinha sido para me irritar. E eu relevei cada dia, mas vê-la
de quatro ali parada no meio da sala com a sua bunda empinada para outro
homem que não fosse eu, despertou em mim um desejo de arrebentar a cara
daquele maldito personal.
Aquele filho da puta a tocava como se ela fosse dele. E o pior na minha
casa! A simples lembrança dessa cena fazia meu maxilar retesar...
Maldição.
Uma enxaqueca chata me atingiu desde que abri os olhos. Inicialmente,
era só aquele incomodo leve, que não fazia você querer tomar um comprimido,
mas também não te deixava em paz. Por isso, levantei para tomar café da manhã
mesmo assim. Era quinta-feira e eu não tinha aula com o personal hoje, graças a
Deus. Não que eu não quisesse vê-lo, depois de ter certeza que o Alexandre
havia se incomodado tanto quanto eu gostaria, gostei ainda mais do Dan. Mas a
luta entre meu cérebro e meu corpo me deixaria mais exausta do que quinhentos
abdominais.
— Bom dia, querida — Alexandre já começava a me provocar quando
me aproximei da mesa.
— Bom dia.
— O quê? Sem nenhuma réplica engraçadinha? — sentei na cadeira,
ficando de frente para ele — Você não está bem, o que foi?
— Dor de cabeça — limitei-me a responder.
— Por isso desceu de robe? Não que eu esteja reclamando — deu de
ombros — Precisa de alguma coisa? Já tomou remédio?
— Ela estava menor antes de olhar para você. Me deixe comer e voltar
para a cama.
— Comer e cama, duas palavras que costumam me deixar feliz vindo da
minha esposa.
Não respondi. Ele não insistiu, voltando a atenção para o seu prato. A
mesa estava repleta de frutas, pães, sucos e café. Eu adoraria ser daquelas
pessoas que com uma xícara de café fazem a dor de cabeça ir embora. Mas eu já
imaginava o que estava por vir... Além disso, não via graça no líquido preto e
quente. Servi-me de salada de frutas e concentrei meus movimentos em levar a
colher a boca e mastigar.
Notei quando ele olhou para o relógio de pulso enquanto tomava um gole
de café. O Alexandre estava usando blazer preto e camisa branca. Sem gravata.
O botão do colarinho aberto, deixando-o um pouco mais informal. Ele me
encarou enquanto eu o analisava, mas as batidas na minha cabeça começavam a
indicar que eu teria que tomar um analgésico. Não estava com fome, acabei
deixando metade da salada de frutas quando levantei. Não me despedi, falar ia se
tornar dolorido em breve. Passei na cozinha, peguei um copo com água e subi
para o meu quarto. Larguei o robe no chão, tomei um analgésico e deitei,
cobrindo minha cabeça com o travesseiro.
Não consegui dormir, tinha acordado há pouco tempo... Mantive-me
imóvel pelo máximo de tempo que pude, contando sapatos, já que carneirinhos
não eram os meus animais favoritos. Nada. A dor de cabeça não aumentou, mas
também não diminuiu e eu estava ficando com dor nas costas de ficar imóvel.
Desci para a sala de TV e me aninhei no super sofá fofo que abraçava
meu corpo. Liguei a tela enorme e passei todas as séries em alta da Netflix até
achar uma com mentiras, vida falsa, homens gostosos e pouca roupa, tipo a
minha vida.
Não sei em que momento ele chegou exatamente, mas a sua voz me
atingiu em cheio, fazendo meu coração disparar. Foi apenas de susto.
— Estudos comprovam que ver homens, que não sejam o seu marido,
quase sem roupa aumentam a dor de cabeça.
— Juro que eu riria se minha cabeça não parecesse prestes a explodir...
Ele se aproximou de onde eu estava e se abaixou para me entregar uma
xícara.
— Beba! — ordenou.
Senti o cheiro de erva-cidreira e sorri, ao me sentar no sofá.
— Os chás de flores de lavanda, erva-cidreira ou camomila podem ser
bebidos ao longo do dia, 2 a 3 xícaras, para facilitar o relaxamento e assim
diminuir a possibilidade de dores de cabeça.
Ele falava tão sério quanto um médico indicando a posologia da
medicação.
— Leu no Wikipédia? — Perguntei dando um gole no líquido morno.
— Você descobriu meu segredo — ele sorriu — fui até o escritório, mas
só pensava em você — arqueei uma das minhas sobrancelhas — eu me
preocupo, sou um bom marido.
Bufei.
— Beba o chá todo, a tarde você tomará outra xícara. Você sente dores de
cabeça com frequência ou tomou um porre?
— Papai, isso não é da sua conta — terminei o conteúdo e deitei.
O Alexandre pegou o controle remoto e sentou na extremidade do sofá,
colocando meus pés no seu colo. Ele optou por The Blacklist e eu reclamei
porque ele estava vendo a terceira temporada e eu não tinha assistido nenhuma.
A massagem que ele começou em um dos meus pés foi o suborno que eu
precisava para achar aquela a melhor série de todas.
Ele tinha mãos incríveis.
A embaixada brasileira no uso das suas atribuições outorga o efeito
de casamento civil com validade em todo o território nacional a Alexandre
Fragoso e Gabriela Burnier.
Era oficial!
A notificação de mensagem do meu advogado agora pela manhã indicava
que eu era oficialmente a senhora Fragoso. Desde que retornarmos para o Brasil
eu joguei essa informação para a última gaveta do meu cérebro, aquela que uso
para esconder as cagadas da vida, e nesse mesmo compartimento está
obviamente a maior cagada de todas: casar com o Alexandre! Sim, casar é a
maior merda que já fiz. De todos os potenciais parceiros, Alexandre era o último
na lista para marido. Talvez como amante funcionássemos juntos, afinal o sexo
entre nós era perfeito. Mas só!
Uma sensação de mal-estar dominou todo o meu corpo, uma ânsia de
vômito atingiu em cheio meu estômago e todo o meu lanche pós-treino juntou-se
a água da privada quando acabei de ler as seguintes palavras:
A pedido da requerente autoriza-se o acréscimo do sobrenome Fragoso
ao seu nome, que agora deverá ser registrado como Gabriela Fragoso Burnier.
Filho da puta!
Alexandre fez a solicitação sem me informar. Mais uma de suas
artimanhas para se manter como macho alfa, acrescentar o seu sobrenome à
esposa, pior antes do meu próprio sobrenome. Por que o inverso não foi
solicitado? Por que somente eu terei que ser a porra da senhora Fragoso?
Ainda no chão, ao lado da privada, disco para o advogado que atende ao
primeiro toque.
— Solicita retificação! — informei antes mesmo dele dizer alguma coisa.
— Bom dia, Gabriela — cumprimentou calmamente — há algum erro no
registro?
— Sim! — minha voz atinge decibéis altos — eu não solicitei a alteração
do meu nome.
— O requerimento consta a sua assinatura — respondeu no mesmo tom
sereno.
— Filho da puta! — rosnei agora de pé andando de um lado para o outro
do banheiro. Na ânsia de resolver o problema joguei para o meu advogado todas
as atribuições desse maldito casamento e não me dei ao trabalho de ler os
documentos antes de assinar. — O que mais esse casamento me custou? —
indaguei.
— Você receberá até o fim do dia uma cópia da certidão de casamento.
Todas as solicitações foram atendidas: casamento com comunhão parcial de
bens; acréscimo do sobrenome a requerente...— Alfredo hesitou e essa hesitação
nos advogados indicava que a notícia a seguir não era o que o cliente esperava
ouvir.
— Tem mais!? Não me diz que terei que andar com uma tornozeleira
eletrônica também?
— Não — sorriu — presumo serem boas notícias.
— O pedido do meu divórcio chegou em suas mãos?
— Longe disso, faço votos de que perdure por muitos anos. Mas, se isso
acontecer a senhora receberá uma indenização num montante de quinhentos mil
reais, referente a cada ano.
— Eu o quê? — gritei.
— Além da comunhão parcial de bens, o senhor Fragoso realizará o
pagamento desse valor no caso de divórcio solicitado por uma das partes; bem
como o pagamento de uma pensão que deverá ser creditada todos os meses
durante o período de casamento.
— Você deveria ter conversando comigo antes de autorizar todas essas
merdas. Afinal é para isso que eu te pago.
— Exatamente, Gabriela. Como você bem disse, você me paga para
resolver toda a parte burocrática e recusou-se a falar qualquer detalhe sobre o
casamento. Apenas cumpri as suas ordens e realizei o solicitado.
— Desculpa, Alfredo — lamentei.
— Posso ligar para o seu esposo e tentar reverter o acordo pré-nupcial.
— Não precisa... Eu mesma farei isso.
— Fico no seu aguardo. Tenha um bom dia.
— Igualmente — encerrei a ligação
Olho a minha imagem refletida naquele espelho e vejo meus olhos
vermelhos por conter as lágrimas de raiva que querem vazão. Eu não sou uma
mulher que chora! Enxugo a lágrima solitária que escapou e antes que as outras
juntem-se a ela derrubo todos os itens da bancada do banheiro, o som dos
objetos caindo representa o caos que se tornou a minha vida. Eu vivo uma
mentira. Sou fake e ainda receberei como uma prostituta de luxo!
Levantei a cabeça e o espelho me encara num desafio mudo. Arremesso
o celular contra ele e deixo que os cacos de vidro me atinjam.
— Gabriela o que houve? — Carmem surge na porta do banheiro.
— Nada! — Os poucos cacos de vidro que tocam o meu corpo não são
insuficientes para provocar qualquer ferimento na minha pele.
— A senhora poderia ter se machucado — ela segura as minhas mãos e
me retira dali — Vou ligar para o Alexandre — diz após conferir
minuciosamente que nenhuma parte do meu corpo foi ferida. Exceto o meu
orgulho.
— Não! — ordeno e ela parou onde estava, seus olhos claros me
encarando — Eu quero que solicite um táxi.
— O motorista está a sua disposição — informou.
— Claro! Vou entrar no carro e logo em seguida ele saberá para onde eu
fui — ironizei.
— De forma alguma, Gabriela — falou serenamente — Antes mesmo da
senhora, quer dizer, você — corrigiu-se após meu olhar mortal — entrar nessa
casa recebi ordens expressas para lhe atender e isso inclui atender as suas
decisões sem contestar e se você deseja que o Alexandre não saiba para onde irá,
ele não saberá. Tem a minha palavra.
— Obrigada — assinto grata — Diga ao motorista que desço em cinco
minutos.
— Caso queira usar o banheiro enquanto o seu está interditado, o último
quarto do corredor é o de hóspedes. Com licença — retirou-se e eu segui para o
banheiro indicado.
Quando retornei para o meu quarto encontrei os restos mortais do meu
celular em cima da cama, passei direto e segui para o closet. Não estava com
paciência para escolher roupa e passei pela cabeça um vestido floral longo e
desci ao encontro do motorista sentindo o peso do mundo nas minhas costas.
O senhor Assis, motorista, permaneceu todo o trajeto até a Albuquerque's
em silêncio. Eu estava furiosa e me sentindo vulnerável e nessas horas conversar
com a sua melhor amiga era o que eu mais precisava, Fernanda com seu jeito
racional me ajudaria a enxergar melhor as coisas e na pior das hipóteses, beberia
comigo enquanto falávamos mal do Alexandre.
Quando o carro adentrou a rua que levava a empresa da minha amiga
uma inquietação fez com que eu mudasse de ideia. Não era conversar que eu
queria, era brigar! Extravasar toda essa raiva que se acumulava dentro de mim, e
não havia melhor pessoa para isso que o causador dessa raiva.
— Mudança de planos, Assis — informei ao motorista — Leve-me ao
escritório do meu marido.
Gabriela não me atendeu naquela noite e nem no dia seguinte. Já era fim
de tarde e a porra do seu telefone só dava caixa postal e ninguém sabia onde ela
estava. Tentei descobrir por intermédio do Marcos, afinal ela e Fernanda são
inseparáveis. Mas nada... Segundo meu amigo a Fernanda não só não sabia onde
Gabi estava como também estranhou o fato de não termos comparecido ao jantar
na sua casa. Eu havia esquecido completamente do jantar e pelo visto eu não fui
o único, já que Gabriela sequer ligou para a amiga para informar que não iria.
Contei ao Marcos que tivemos um pequeno desentendimento e que ela havia
saído de casa. Meu amigo sorriu e disse que sexo de reconciliação "é o que há!",
mal sabe ele que nem sexo comum temos. Pedi que me mantivesse informado
sobre qualquer aparição de Gabi e desliguei a ligação antes de discar mais uma
vez para Gabriela:
Oi, aqui é a Gabi! Deixe seu recado e decidirei se ligo ou não de volta
para você! Beijo
Eu já tinha escutado essa mensagem por tantas vezes que poderia jurar
que ela era uma (in) direta para mim.
— Dá pelo menos para ligar a porra do telefone? — Iniciei o meu
diálogo com a secretária eletrônica — Preciso saber se ao menos está viva!
Retorna essa ligação!
Encerrei a chamada e segui em passos firmes em direção ao hotel que
Gabriela ficou hospedada antes de se mudar para minha casa. A recepcionista
recusou-se a me dar qualquer informação sobre hóspedes do hotel e claro que eu
perdi a minha paciência exigindo que chamasse o gerente, afinal sou marido dela
e não qualquer um.
— O senhor deseja falar comigo? — o homem calvo indagou com uma
voz serena.
— Sim. A minha esposa está hospedada aqui e gostaria de vê-la.
— Tudo bem, senhor...
— Alexandre Fragoso — estiquei a mão e ele a apertou firmemente.
— É um prazer ter o senhor no meu hotel — os olhos do homem
brilharam, eu já havia visto aquele olhar milhares de vezes. Era só pronunciar
que era o herdeiro de uma família tradicional carioca que as pessoas me olhavam
com total atenção — Qual o nome da sua esposa? — indagou prestativo já do
outro lado do balcão. Com os dedos no teclado prontos a me dar a informação
que eu tanto necessitava.
— Gabriela Fragoso Burnier — informei e seus dedos bateram agilmente
no teclado.
— Lamento senhor Fragoso, mas a sua esposa não está aqui —
lamentou-se.
— Tente Gabriela Burnier. Às vezes ela assina como solteira...
— Força do hábito — o homem sorriu abertamente e devolvi um meio
sorriso.
— A senhora Burnier já esteve hospedada aqui, mas a sua conta foi
encerrada e não houve nenhum registro depois disso.
— O senhor tem certeza que ela não esteve aqui? Será que ela não fez
check-in com um nome falso?
— Duvido muito senhor Alexandre. Solicitamos documento com foto na
nossa recepção.
— É essa mulher aqui — insisti mostrando uma foto de Gabriela de
perfil para o gerente. Era a foto que aparecia quando ela raramente me ligava. O
homem encarou a foto por alguns segundos antes de responder sorrindo:
— Sua esposa não está aqui senhor Fragoso, posso te garantir que é
impossível ela ter passado por aqui e eu não ter notado.
— Talvez no seu horário de almoço? — insisti — Você pode perguntar
aos seus funcionários? Tivemos um desentendimento de casal e estou
arrependido, preciso me desculpar — fitei seus olhos — Por favor, me ajuda! —
supliquei.
— Tem razão... Vamos eliminar todas as possibilidades. Que horas o
senhor acha que ela deu entrada aqui? — Perguntou solícito.
— Entre a noite e madruga do dia de hoje — respondi. O gerente ergueu
a mão e um homem alto e forte aproximou-se de onde estávamos.
— Senhor Fragoso, esse é o Taylor nosso chefe de segurança — falou
para mim antes de voltar a sua atenção ao homem — Taylor, observe com
atenção a imagem e quero que informe se a mulher dessa foto deu entrada aqui
como hóspede ou acompanhante. Se preciso for, pode consultar as câmeras de
segurança. — Ampliei a imagem e estiquei o celular na direção do Taylor que
balançou a cabeça em negativa.
— Essa mulher não deu entrada aqui, senhor — disse num tom firme que
não deixava margens para dúvida.
— Tem certeza? — indaguei — Veja bem a foto novamente — insisti.
— Com todo respeito, senhor — seus olhos escuros me fitaram — Se ela
tivesse entrado aqui nos últimos dias eu saberia. A senhora Fragoso é daquelas
mulheres que deixam seu rastro por onde passa. — Encarou-me e vi verdade na
sua fala, em especial na última frase.
— Obrigado, Taylor — agradeci.
— Lamento mais uma vez não poder ajudar. — O gerente lamentou-se
mais uma vez.
— Eu que agradeço pela sua disposição.
— Estou ao seu dispor, senhor Fragoso.
Saí do hotel e disquei mais uma vez para Gabriela:
Oi, aqui é a Gabi! Deixe seu recado e decidirei se ligo ou não de volta
para você! Beijo
Caralho! Esbravejei desligando o celular e caminhando em direção ao
carro. Eu encontraria Gabriela nem que tivesse que passar a vida procurando. O
cerco estava fechando:
✔Casa da Fernanda
Já tinha ligado para o Marcos, ainda assim apareci sem avisar hoje pela
manhã e não havia nenhum sinal da Gabriela por ali. Mari era uma boa fonte de
informação.
PS: Lembrar de enviar uma boneca para ela.
✔Carpe Vita
Estive ontem à noite e nenhum sinal dela. Felipe Albuquerque mostrou-
se preocupado com o sumiço da amiga e os seguranças confirmaram que ela não
apareceu por lá.
✔Apartamento em São Paulo
Consegui arrancar do Marcos o endereço do condomínio que Gabriela
morava e disquei para lá. O porteiro transferiu a ligação para o apartamento e
uma funcionária garantiu que a senhora Gabriela não esteve ali pelos últimos
dias e acrescentou que a mesma não aparecia há meses.
Onde porra você se escondeu, Gabriela?
Pensei enquanto colocava o carro em movimento, uma notificação
indicando a chegada de uma mensagem me fez parar no primeiro acostamento a
frente. Desbloqueie a tela e segui em direção a mensagem.
Um vídeo de cinquenta segundos, cinquenta míseros segundos
responsáveis por desencadear em mim uma fúria crescente e privação de
sentidos. Eu não conseguia raciocinar apenas a emoção falava alto, a raiva
crescente e o desejo mórbido de bater em alguém para aliviar a minha fúria. Não
é bater em qualquer um, é bater no maldito advogado!
Apertei o celular firme em minha mão enquanto o vídeo recomeçava
numa frequência automática, pressionei os meus dedos contra o aparelho até a
minha mão ficar vermelha e meus dedos começarem a doer.
Mais uma vez o vídeo recomeçou e a imagem passou pelas minhas
retinas, fixaram na minha memória e repercutiram numa frequência cadenciada:
Gabriela e Rafael juntos.
Gabriela e Rafael se beijando.
O filho da puta do advogadozinho tomando como sua a Gabriela.
Gabriela e o cara que eu vou quebrar cada osso do maldito rosto, para
que ele nunca esqueça que não deve tocar no que não lhe pertence.
Gabriela...
Antes mesmo que a minha fúria tivesse dissipado, eu fretei o primeiro
jatinho que partiria para São Paulo nos próximos trinta minutos. Dirigi feito um
alucinado até o aeroporto, passei em sinais vermelhos, realizei ultrapassagens
indevidas e parei o carro na porta mais próxima ao portão de embarque. Antes
mesmo que eu saísse do carro um agente de trânsito abordou-me:
— Senhor, o carro não pode ficar aqui — apontou para a placa que
indicava: proibido estacionar e parar — Por favor, queira retirar o veículo ou ele
será guinchado.
— Cumpra o seu papel! — informei saltando do carro com pressa. O
homem demorou alguns segundos até entender que eu não iria tirar o carro dali.
Uma infração de trânsito era o menor dos meus problemas, afastei-me
apressado entre as pessoas chocando-me contra os transeuntes. Antes da
aeronave decolar tento mais uma vez falar com a Gabriela e adivinha o que eu
escuto? Isso mesmo, a sua voz na caixa postal.
Se você tem mais de dezoito anos já deve ter assistido Papa-Léguas. O
desenho comum da década de oitenta, onde o galo corredor é caçado
constantemente pelo Coiote, um lobo selvagem; por mais que o Coiote se
esforce para capturar o Papa-Léguas ele nunca consegue alcança-lo. É um jogo
de caça e caçador, onde a caça é mais sagaz e nunca é capturada. Exatamente o
mesmo acontece entre Gabriela e eu. Quando eu acredito estar um passo à sua
frente ela vira o jogo.
Bati no endereço que o Kauan me enviou onde aconteceu a sua despedida
de casada e tudo que eu encontrei foi um homem moreno vestindo apenas um
samba canção ao abrir a porta. Apresentei-me como marido da Gabriela e ouvi
uma sonora gargalhada, precisei usar todo o meu autocontrole para não quebrar a
cara do sujeito.
— Chama a Gabriela agora! — rosnei.
— Perdeu a viagem, brother. A festa aconteceu ontem à noite — o
homem sorriu abertamente.
— Eu preciso falar com ela... — tentei apelar para o homem, mas ele
sorriu mais uma vez e eu decidi mudar a tática — Gabriela, eu não vou embora
sem falar com você! — gritei.
— Dá para não gritar? — levou a mão a cabeça — Estou com uma puta
ressaca... Mas, a festa valeu a pena — abriu um enorme sorriso.
Foi o que eu precisava para forçar a passagem entre o homem e invadir a
sua casa.
— Eu sempre soube que os cariocas eram folgados, mas você se supera!
— sorriu mais uma vez exibindo todos os seus dentes.
— Onde ela está? — indaguei furioso.
— Não faço ideia — deu de ombros — E mesmo que eu soubesse não
diria — sorriu mais uma vez. Marchei em direção ao sujeito pronto para quebrar
todos aqueles dentes que insistiam em aparecer — Calma, eu fui com a sua cara
— sorriu — Pode procurar — jogou-se no sofá — Eu aconselho começar pelo
quarto, foi o último lugar que lembro dela estar ontem à noite.
— Seu filho da puta! — disparei e uma mulher apareceu magicamente
entre nós.
— Alice, queira acompanhar o ex-marido da Gabi na sua caça a ex-
esposa — gargalhou.
— Por aqui, senhor — a mulher indicou o caminho do corredor e eu a
segui. Queria o quanto antes achar a Gabriela e sair dali antes que eu infringisse
a lei mais uma vez. Dessa vez, não seria apenas multa e pontos na carteira, eu
temia ficar detido por lesão corporal grave, pois quando eu desse o primeiro soco
nesse homem não conseguiria parar.
A funcionária guiou-me por todos os aposentos e eu observei cada canto
feito um cão farejador, nenhum sinal dela na varanda, cozinha, banheiros, quarto
de hóspedes e muito menos na suíte principal. Eu não sabia se eu deveria
comemorar por encontrar uma mulher morena dormindo sob os lençóis brancos
ou se eu ficava ainda mais puto por não ter encontrado a Gabi. Frustrado
acompanhei Alice de volta a sala.
— Nada dela, né? — o homem indagou sorrindo. Dei as costas e segui
em direção a porta ignorando o imbecil — Brother, tô com pena de você. Por
isso, vou te ajudar — completou e eu parei com metade do corpo para fora do
seu apartamento. Qualquer ajuda era bem-vinda!
— Se eu fosse você, tentava na casa de um cara com jeito de bom moço e
sorriso fácil. Acho que era Ronaldo, Reinaldo... — tentou buscar o nome na
memória — Rafael, isso Rafael. Se eu não me engano ele é carioca, talvez você
já tenha trombado com ele por aí.
Perdi meu tempo ouvindo a dica do imbecil. Afinal, essa pista eu já tinha.
Antes de embarcar solicitei a Odete que fosse pessoalmente até a casa do
Rafael com a desculpa de que precisava de uma orientação num contrato, uma
desculpa qualquer, apenas para conferir se Gabriela estava lá. Assim que pousei
aqui, eu já tinha um relatório completo: Rafael não estava em casa, mas a sua
funcionária abriu as portas para receber Odete e enquanto ela preparava um café
para a visita, minha secretária vasculhou o apartamento do Rafael e nenhum
sinal de mulher, muito menos da Gabriela por ali. Odete seguiu para o seu
escritório e o encontrou lá trabalhando. O que só significava que eles não
estavam juntos.
— Vai a merda, seu babaca! — rebati.
— Prazer te conhecer Alexandre, querendo voltar, é só aparecer —
gargalhou.
Merda!
Para onde eu vou? Pensa Alexandre! Pensa!
Saí da casa do Felipe, sim existem dois Felipes na vida da Gabriela, uma
piada de extremo mau gosto, e segui até o seu endereço fixo. Um condomínio de
luxo na capital paulista. Mas não consegui passar da portaria, o segurança não
liberou a minha entrada mesmo após eu praticamente esfregar na cara do sujeito
a minha certidão de casamento. A nossa conversa, leia-se a minha insistência em
entrar no condomínio, dificultava a entrada dos carros na portaria, o carro que
me transportava estava parado na entrada, para livrar-se de mim o quanto antes o
segurança interfonou para o apartamento da Gabriela e a sua funcionária, a
mesma que me atendeu da outra vez, repetiu que a sua patroa não havia
aparecido ali nos últimos meses.
— Para onde vamos agora, senhor? — o motorista contratado indagou.
— Continue rodando — informei e voltei a minha atenção para a minha
lista caça a Gabi:
✔ Endereço da despedida
✔ Apartamento
✔ Família (Mãe/Pai)
✔ Amigas São Paulo
Eu me preparava para ditar o endereço da casa da sua mãe, quando o meu
telefone tocou de um número desconhecido, mas com DDD do Rio de Janeiro.
— Alô! — atendi prontamente.
— Alô, senhor Fragoso. Aqui é o gerente do hotel que o senhor esteve
hoje mais cedo em busca da sua esposa — o homem silenciou e o meu coração
acelerou. Que sejam boas notícias. — A Gabriela acabou de dar entrada no
nosso hotel, achei que o senhor gostaria de saber.
— Toca para o aeroporto — falei para o motorista.
— O senhor me ouviu? Senhor Fragoso?
— Desculpa, estava falando com o motorista. Vim até São Paulo para
encontrá-la... Enfim, eu nem sei como te agradecer — sorri pela primeira vez
desde que Gabriela sumiu da minha vida.
— Reconquistando a sua esposa seria uma ótima forma — o homem
sorriu do outro lado da linha — Vi o desespero nos seus olhos hoje mais cedo e
ficaria feliz se pudesse ajudá-lo.
— O senhor é casado? — perguntei. Pois, somente um homem que já
esteve na mesma posição que a minha compreenderia o meu desespero.
— Há mais de vinte anos e ao contrário do que as pessoas dizem
continuo um romântico incurável. E sei reconhecer quando encontro um a minha
frente.
— Eu? — indaguei incrédulo.
— Sim, o senhor. A sua devoção para se reconciliar com a sua esposa é
algo louvável. Muitos casais brigam e ficam por isso mesmo, por que ninguém
que dar o braço a torcer... Desculpa, estou te incomodando com meus devaneios
de um homem de meia idade — sorriu — Ah! Não se preocupe eu não informei
que o senhor esteve aqui a sua procura e as portas do meu hotel estão abertas
para te ajudar.
— Obrigado — encerrei a ligação e disquei para o número que me
ajudaria a salvar o meu relacionamento.
Quando entrei na Carpe Vita, meu corpo relaxou depois da tensão do dia.
A boate ainda não estava lotada, estava bem cedo para a night começar, por isso
segui para a minha sala no terceiro andar, mas antes mesmo de entrar, dei a volta
até o outro lado e abri a porta do meu sócio.
— Um dólar pelos seus pensamentos — disse assim que o vi olhando
para o teto.
— Porra, Gabi! Senti sua falta — verbalizou o que eu também sentia. Ele
aproximou-se de braços abertos e deixei meu corpo encaixar-se no seu, suas
mãos ao redor da minha cintura enquanto as minhas enlaçaram o seu pescoço,
inspirei profundamente e senti seu cheiro tão familiar. — Veio curtir a night? —
indagou soltando-me e eu contive o suspiro preso na garganta.
— Sim! — sorri — Estou liberada para ter o meu dia de rainha ou tenho
a noite de trabalho escravo?
— E o seu marido? Ou seria ex? — arqueou a sobrancelha — Você ainda
não me contou sobre seu casamento relâmpago, tampouco sobre uma tal
despedida de casada.
— Preciso de uma bebida — anunciei e encarei o meu sócio que me
indicava o sofá, enquanto ia até o frigobar e me trazia uma cerveja.
O moleque era naturalmente sexy, vestia uma calça jeans escura e uma
camisa polo branca e ainda assim conseguia chamar a atenção... Aline era
definitivamente uma mulher de sorte.
— Nós terminamos — disse antes de virar a bebida toda de uma vez. O
líquido gelado escorria em ondas para dentro do meu corpo.
— Gabi, eu já cometi muitas merdas na minha vida. Por isso eu sei que
no momento da raiva não queremos ver o outro por um bom tempo... Entendo
perfeitamente se vocês se reconciliarem.
— Você não entende, ninguém entenderia... Eu não entendo!
— Gabriela Burnier está apaixonada?
Quando eu levantei os olhos, ele me encarava e aquele azul quase verde
varreu a minha alma pelo avesso, decodificando os meus pensamentos antes que
eu mesma pudesse entendê-los.
— Não precisa me dizer nada. Sabe, Gabi, eu soube que estava
apaixonado pela Aline por acaso. Eu estava aqui na boate cantando uma música
e de repente parecia que a letra fazia sentido, que descrevia coisas que eu não
sabia que era possível sentir. Eu nunca tinha passado por situação semelhante,
logo não sabia dar nomes aos meus sentimentos.
— Outra cerveja — pedi e ele sorriu, parecendo-me mais maduro que o
irmãozinho caçula da minha melhor amiga.
— Você pode contar comigo se precisar conversar, até sobre a sua vida
sexual, sabe que aquele cara é velho demais, né? Ele não tem a minha disposição
— e com isso ele me fez gargalhar. — Podemos inclusive marcar outro ménage,
a Aline tem uma quedinha por você.
— Todos tem, desculpa aí, nasci assim — ele gargalhou também —
Talvez eu precise conversar depois. Obrigada, realmente você é a pessoa mais
parecida comigo que eu conheço, pode me auxiliar qualquer dia.
— Carpe Vita, Gabi.
— Sempre, Felipe.
Conversamos banalidades até que o Vinícius, nosso sócio minoritário,
veio chamá-lo, se surpreendendo por me ver ali. O Felipe desceu com ele para
ver algumas coisas referente ao bar, já eu peguei mais uma cerveja do frigobar
antes de descer para me movimentar entre as pessoas.
Música alta + gente bonita + álcool = Gabriela feliz.
Essa equação não dá erro nunca. Sorrir, dançar e beber está embutido no
meu DNA, é inato ao meu ser. Para me tirar do sério, tem que ter disposição, eu
geralmente ligo o foda-se e me afasto. Mas essa pessoa conseguia trazer nuvens
negras para o meu céu ensolarado.
Eu estava saindo do banheiro quando dei de cara com a criatura, desde
que a administração da boate tinha passado para as competentes mãos do
Vinícius, Bruna Moura não havia pisado na boate, mas algo tinha levado a
infeliz até ali e dessa vez, eu sabia, não era Felipe Albuquerque.
Bruna é sócia da Carpe Vita, trata-se de uma ex-foda do Felipe que se
apaixonou e quis bancar o sonho do ex-moleque, atual CEO fodão. Acontece que
ele estava apaixonado pela mãe da garota e quando tudo isso veio à tona, as duas
se afastaram de tudo e deixaram a boate nas mãos de um administrador
contratado, o Vinicius. Acontece que meu ex-atual-esposo escolheu justamente
aquela maldita boceta para comer! Tanta mulher por aí e o desgraçado escolhe
uma da qual eu não tenho a menor simpatia, nem para me ajudar no ménage o
Alexandre serve, puta que pariu!
— Oi, tenho um recado para o Alê, será que posso mandar por você? —
ela jogou quando passei por ela. Ignorei. — Gabriela, a idade tá deixando você
surda? — ela tentou mais uma vez chamar minha atenção.
O corredor dos banheiros nunca pareceu tão longo...
— Eu estou falando com você, vadia! — Bruna puxou meu braço me
fazendo virar.
Encarei-a, olhando nos olhos.
— Não sentiu falta do seu marido esses dias? Digamos que ele passou o
dia todo ocupado, no trabalho. — Ela sorriu maliciosamente.
Respira, Gabi. Não vale a pena nem gastar seu latim...
— Sabia que ele me ajudou a escolher a minha nova casa, Gabriela? —
arqueou a sobrancelha — Verdade seja dita, nós batizamos todos os cômodos do
meu novo lar. Ando pela casa e sinto como se o Alê ainda estivesse ali. Sinto o
cheiro dele...
— Cai fora, Bruna, não tô com muita paciência hoje — avisei dando as
costas mais uma vez.
— Você deve se sentir péssima né? — engoli em seco enquanto andava,
ela me seguindo de perto — Primeiro perdeu o Felipe para uma secretariazinha
qualquer, depois não consegue manter o pau do marido dentro das próprias
calças. Por que será que ninguém te quer, Gabi?
O meu silêncio parecia encorajá-la ainda mais.
— Eu sou mais jovem que você e isso deve doer aí dentro. Enquanto
você estava retocando o loiro para esconder os fios brancos, eu fodia com seu
marido no escritório dele, encarando a foto de vocês enquanto eu cavalgava.
A imagem se formou na minha mente e por mais que eu desejasse o
contrário, algo doeu em mim. Nunca fui ciumenta ou possessiva, mas da forma
como ela colocava as coisas, eu não sabia se sentia ódio, nojo ou tristeza.
— Ele gozou chamando o meu nome... Você sabe o quanto é difícil fazê-
lo gritar, né? Acho que eu consigo na próxima. Pede para trocar os lençóis da
cama amanhã, não quero foder no lugar onde você deitou.
Eu já estava prestes a me enfiar no meio das pessoas quando ela me
puxou novamente, dessa vez segurando nos meus cabelos.
Era muita afronta!
Quando eu me virei, usei o impulso do gesto para espalmar a cara dela.
Meus dedos arderam quando bateram ali com força, Bruna gritou, levando a
outra mão para puxar meus fios curtos. Enquanto ela se ocupava em saber se
meu cabelo era aplique, movimentei minhas pernas fazendo com que ela
desequilibrasse e caísse.
— Sua vadia de merda! — Sentei sobre a barriga dela que se debatia e
me arranhava os braços — sempre achei que não vale a pena brigar por homem e
isso não mudou — desferi outro tapa na cara dela — isso não é por ele, é por
ousar me agredir! — bati do outro lado — esse é por ser tão burra e baixa! —
bati novamente — Esse é só pro meu prazer!
— Eu vou prestar queixa contra você, sua puta! — Bruna gritou.
— Gabriela, solta ela! — O Felipe segurou no meu braço quando eu
estava prestes a bater novamente. — Não vale a pena, Gabi.
— As suas unhas de piranha vão ficar aqui nos meus braços. Vou
processar você e essa boate de quinta! Vou transformar a vida de vocês dois num
inferno, malditos!
— Tire ela daqui! — O chefe da segurança aproximou-se quando Felipe
indicou.
— Vamos Gabi, você precisa se acalmar.
— Eu estou calma, pode ter certeza disso. — Encarei-o.
— Tão calma que está mostrando esses maravilhosos seios sem notar? —
só então olhei para o meu estado, a vadia tinha conseguido quebrar as correntes
que ligavam o cropped ao meu pescoço.
— Pelo menos eles são bonitos — dei de ombros.
— Ah são sim, mas vamos evitar expô-los mais — Felipe tirou o blazer e
me passou.
— Isso ainda não acabou, Gabriela — Bruna gritou.
— Senhora, por favor — o segurança chamou mais uma vez a louca. —
Vou precisar contê-la?
— Não precisa, já estou de saída.
— Vou avisar que a entrada dela está proibida e vou conversar com a
Thalita para saber quais os trâmites para que eu possa me livrar, de uma vez por
todas, da família Moura Lunardelli. — Felipe anunciou.
Ele não solicitou o motorista e estranhei. Mas, pensando bem... Não sabia
como estava a vida dele. Seguíamos em silêncio ao encontro da sua mãe
enquanto eu me perguntava onde estavam seus empregados e se ele teria vendido
ou alugado sua mansão... Com um "isso não é problema meu" desviei a atenção
para o meu celular. No grupo da quadrilha, as fotos da noite anterior estavam
bombando, salvei algumas e postei somente a que tinha nós quatro, sob a
legenda "Se ela sozinha já é um perigo, imagina com as amigas... ". Meu sorriso
estava enorme e verdadeiro nesse registro.
O aparelho bipou, anunciando a chegada de uma nova mensagem. Era o
Rafael:
Gabriela, podemos jantar hoje?
Tudo que eu não queria era estar entre dois caras numa guerra de xixi,
mas eu precisava dar um jeito nas coisas. Odiava ter que mentir, mas não tinha
como falar a verdade quando nem eu mesma sabia qual era. Por isso, enviei:
Sim, precisamos conversar...
Ele enviou no minuto seguinte:
Restaurante ou minha casa?
No meu apartamento, vou te mandar a localização. Nos vemos a
noite.
Eu queria o quanto antes resolver mais esse dilema que eu havia me
envolvido.
Até mais tarde, um beijo.
Outro.
Guardei o aparelho no mesmo instante em que Alexandre reduziu a
velocidade até parar na guarita de um condomínio de luxo. Eu não esperava
menos de alguém com uma corretora que rende milhões. A nossa entrada foi
liberada e ele estacionou em frente a uma casa com uma cerca viva, verde e alta,
mas que não escondia a mansão que se engrandecia em apenas um andar. O
muro de plantas dava um ar de "sinta-se em casa" em meio a todas aquelas
mansões deslumbrantes.
A mãe dele estava à nossa espera e se aproximou assim que nos viu parar
o carro. Mesmo assim, senti-me na obrigação de sair do carro para recebê-la.
— Essa cerca viva é linda! — digo ao abrir a porta, mas antes que eu
pudesse continuar elogiando, ela me envolveu em um abraço carinhoso.
— Você não sabe o quanto estou feliz em vê-la novamente... — disse ao
se afastar, olhando em meus olhos.
Eu não conseguia entender como uma mãe amorosa obriga seu filho a
casar e procriar.
— Ela não iria a lugar algum, mãe — Alexandre se aproximou dando o
rosto para ela beijar. — Podemos ir? — Ela assentiu e entramos no carro.
— Eu tentei ligar para você, filha, mas não consegui.
— Hum, é... Eu precisei trocar de número, anote o novo — ditei
enquanto ela digitava no seu aparelho — pode me ligar quando precisar.
— Não é uma questão de precisar, é de querer. Você me deve umas
compras!
Esse era um território que eu dominava.
— Quando a senhora quiser.
— Eu envelheço trinta anos quando você me chama de senhora.
— Desculpe, Vilma. Quando você quiser.
— Ela faz esse drama com todo mundo, é só dizer que ela não parece ser
minha mãe que tudo fica bem! — Ele fez a mãe sorrir.
— Achei que estivesse na empresa hoje, a culpa é sua por seu pai me
deixar sozinha para almoçar?
— Deve ser da Odete — ele acusou sorrindo — não sinta ciúmes, mãe!
— Não sinto, sou uma mulher segura e sei todas as senhas do seu pai —
eu gargalhei alto — Aprenda Gabriela, manter um Fragoso na linha no começo é
difícil, mas vale a pena.
Ignorei a pontada no meu coração, ela não fazia ideia das dificuldades.
O meu calendário informou que hoje fazia três meses que Gabriela e eu
firmamos o nosso acordo. Eu controlava o tempo no calendário. A cada mês que
passava significava que eu estava mais perto de chegar ao fim da farsa, mas
também me deixava com menos tempo de cumprir todas as cláusulas do maldito
documento. O herdeiro, fruto do casamento, rondava constantemente a minha
cabeça. Desde que ela descobriu o testamento não voltamos a tocar nesse
assunto. Em outro momento precisaríamos conversar sobre isso. Em outro
momento. Agora eu apenas queria celebrar essa data ao seu lado.
Mais de cinquenta minutos depois eu ainda a aguardava dentro do carro,
no estacionamento. Ela me expulsou do apartamento quando voltei, exatos trinta
minutos depois de deixá-la e a encontrei ainda enrolada no roupão. Gabriela
alegou que não sabia o que vestir, já que eu não disse para onde iríamos. Quando
eu respondi que qualquer roupa estava boa, ela me acusou de agir como um
marido babaca e fechou a porta na minha cara. Engoli o "finalmente" quando ela
sentou no banco ao meu lado.
— Não me olha com essa cara! — Acusou por trás dos óculos escuros.
— Que cara?
— A cara do marido impaciente que esperou a esposa por horas para sair.
— É a quarta vez hoje que me chama de marido. Olha que eu posso me
acostumar com isso — sorri.
— Vamos antes que eu me arrependa. — Mudou de assunto.
— Sim, esposa! — respondi e ela bufou.
Gabriela voltou a atenção ao seu celular durante todo o trajeto e eu dirigi
perdido em pensamentos. Ao final desse acordo talvez eu sentisse falta da
companhia dela. Da sua risada alta e até do seu temperamento difícil. O que me
consolava era que, quando o tempo passasse, sem acordo pairando entre nós, o
sexo poderia acontecer repetidas vezes, sem neuras ou empecilhos. Nossos
corpos se buscavam e se encaixavam perfeitamente, não havia por que não
atender a esse desejo.
O toque do meu celular me retirou desses pensamentos.
Automaticamente, atendi o aparelho já sincronizado ao painel do carro. Esqueci
completamente da Gabriela ao meu lado, antes de atender sem verificar o
número.
— Alê? — uma voz feminina soou baixa em meio a um grande barulho,
fazendo Gabriela levantar os olhos do celular, atenta a conversa que iniciava.
— Ele. Quem fala? — respondi já tenso.
— Não lembra de mim?
— Ajude-me a recobrar a memória... — sorri e a Gabriela soltou o ar
com força.
— Carnaval... Angra... Carla... Marcos...
Putz! O último carnaval do Marcos solteiro foi épico. E por mais que
meu cérebro catalogasse pelo menos doze mulheres para esse evento, não ia
arriscar nenhum nome.
— Isso não te ajudou, né? — gargalhou do outro lado — Talvez uma
amiga te ajude a lembrar.
— Achei que o casamento deixaria você mais tranquilo, mas você
continua safado como sempre — agora a voz da minha prima Carla fez-se ser
ouvida.
— Que belo comentário para se fazer na frente da esposa! — sorri.
— Caralho! Foi mal, não sabia que estava com ela... E nunca imaginei
que atenderia no viva-voz ao lado da esposa.
Gabriela ficou tensa no banco ao lado.
— Relaxe! — sorri — O que você quer de mim? — Indaguei para
torturar a mulher ao meu lado, Gabriela prestava atenção a tudo com ciúmes?!
Sim, com certeza era ciúmes.
— Você, seu carro, seu dinheiro e sua casa em Angra. Não
necessariamente nessa ordem.
— Escuta aqui... — Gabriela rosnou — Eu não queria atrapalhar a
conversa dos amantes, mas eu não estou mesmo a fim de ouvir esse papo. Se
você puder retornar em uns quinze minutos, garanto que meu marido irá atendê-
la reservadamente, como deve estar acostumada! — Soltou o ar com força.
— Escuta aqui... — minha prima devolveu no mesmo tom — Você sabe
quem eu sou?
— Estou pouco me fodendo para quem você é! — Rebateu irritada.
Minha prima soltou uma gargalhada alta e eu acompanhei. O rosto de
Gabriela foi atingindo tons de vermelho e ela ergueu os óculos para me fuzilar.
— Prazer, eu sou Carla Fragoso, prima desse mala aí do seu lado —
minha prima sorria enquanto falava — E posso dizer: Já quero ser sua amiga!
Amei você!
Gabriela levou as mãos ao rosto constrangida.
— Desculpa... — pediu visivelmente envergonhada — É que eu conheço
bem demais a fama do seu primo.
— Não precisa se desculpar — sorriu do outro lado da linha — eu tenho
certeza que você está mantendo o cabresto apertado — foi a vez de Gabriela
sorrir — Vamos marcar um jantar e aí eu te conto todos os pontos fracos dele.
— Eu aceito! — Gabriela respondeu imediatamente.
— Eu ainda estou aqui — falei sorrindo.
— Então faz algo de bom e passe meu telefone para a sua esposa. Tenho
uma festa para convidá-la. — disse Carla.
— Adoro! — Gabi respondeu.
— Quando? — Perguntei ao mesmo tempo.
— Quando o quê?
— Quando será a festa, Carla.
— Você não será convidado.
— Você pede a minha casa, o meu carro, o meu dinheiro e eu não serei
convidado? Pelo que eu lembre, você disse que precisava de mim também.
— Isso foi antes de saber de que tipo era a sua mulher.
— Anota meu número — Gabriela informou o seu telefone e a ligação
assumiu um rumo de conversa que me deixava completamente de fora.
As duas pareciam amigas de longa data, quando o assunto seguiu o
caminho de festas, Carla que morava em Miami, estava animada para conhecer a
Carpe Vita e Gabriela para apresentá-la a boate. Antes da ligação ser encerrada
dei o meu xeque-mate.
— Carla, quem era a amiga do início da ligação? — Indaguei curioso.
— Ritinha — respondeu sorrindo.
A ruivinha de bunda grande. Meu cérebro ligou o nome ao corpo.
— Manda um beijo para ela! — falei antes de encerrar a ligação e fui
atingido por um soco forte no braço — O que eu fiz? — sorri abertamente para
Gabriela que me encarava com cara de poucos amigos.
— Manda um beijo para ela? — fitou-me impaciente.
— Eu mando beijo para as minhas amigas. Isso é ciúme? — Arqueei a
sobrancelha.
— Não! — devolveu os óculos ao rosto — Isso é raiva por não ter me
apresentado a sua prima antes.
— Teremos tempo de você conhecer o resto da minha família, está bem?
— toquei a sua mão e ela afastou para me mostrar o dedo do meio.
— Sempre doce — gargalhei — Chegamos! — apontei para o píer a
nossa frente.
— Aqui? — indagou olhando ao nosso redor.
— Sim. Você não fica enjoada em andar de barco, fica? — perguntei
pensando nessa possibilidade somente agora.
— Não — balançou a cabeça — vamos andar de barco?
— Vamos almoçar no meu iate — pontuei e desci do carro para abrir a
porta do passageiro.
No iate ancorado, já estava tudo pronto para nos receber, solicitei um
almoço leve, frutas, bebidas, sobremesas e tudo que pudesse agradá-la.
— Senhor Fragoso Burnier, Senhora Burnier Fragoso muito bem-vindos!
— O piloto cumprimentou-nos quando subimos no barco.
— Já gostei de você! — Gabriela apertou a mão dele sorrindo.
Eu havia informado a equipe que nos chamasse pelos nossos sobrenomes
de casado. Eu sabia que a deixaria feliz.
— Sua cota comigo está subindo a cada dia! — Voltou-se para mim com
um enorme sorriso nos lábios.
— Ao fim de tudo meu saldo será positivo — sorri de volta.
— Douglas — chamei o piloto que comandaria o iate — Mudei de ideia,
eu mesmo irei pilotar a embarcação.
— Claro, senhor — sorriu — Então está tudo pronto para a sua saída.
— Pronta? — Voltei para Gabriela.
— Prontíssima! — Sorriu mais uma vez naquele dia e naquele momento
eu soube que tudo estava muito bem.
O iate continha quarto, cozinha e banheiro com uma pequena banheira de
hidromassagem. Já em alto-mar, enquanto eu pilotava, Gabriela curtia o sol na
proa, mais um ponto positivo ao meu favor: eu mandei providenciar peças de
banho no seu número: biquíni, canga, saída de praia eu tudo o que ela por
ventura precisasse.
Já longe da Marina da Glória e tendo apenas o mar como nossa
companhia, parei para almoçarmos. Vestindo um top preto e uma calça de praia
estampada, ela não parecia em nada com a mulher que sofreu de dor ontem. Que
bom! Almoçaríamos ali mesmo na proa, a comida leve era salmão defumado e
uma salada de folhas, bebida havia sucos e um Chandon gelado.
— O que estamos comemorando aqui? — indagou antes de levar o
champanhe aos lábios.
— Nosso casamento! — respondi e ela cuspiu o líquido.
— Porra! — limpou o líquido que escorria pelos lábios — Quanto tempo
já passou? E desde quando comemoramos algo desse tipo? — As perguntas
saíam em disparada da sua boca.
— Três meses — respondi a primeira pergunta — na verdade
completamos ontem, mas você estava mal.
— Não precisava ter vindo até aqui para isso...
— Então vai julgar que é desnecessário ter comprado presente? —
Estudei sua reação.
— Você não fez isso... — seus olhos azuis fitaram-me em expectativa e
havia algo diferente neles, estavam marejados.
— Fiz e espero que você goste — abri uma caixa de veludo preta, nela
havia uma corrente prata da linha Life Secrets da Vivara.
O conceito dessa joia era uma cápsula onde você guardaria seus
segredos, escolhi uma corrente de ouro fina, a moldura da capsula é um disco
com as palavras Love e dentro os pingentes, que representariam o que ela carrega
com ela, escolhi o pingente de sapatinho, um batom, o símbolo do infinito e uma
chave. O resultado final era um colar com os pingentes emoldurados num
círculo.
— Eu nem sei o que dizer! — falou emocionada com os olhos fixos na
joia.
— Diga apenas que acertei ao tentar captar a sua essência.
— Você acertou em cheio — confessou animada — O sapato, o batom...
Vi a quadrilha ali exposta. Amei o infinito, só não entendi a chave...
— A chave representa o controle que tem pelos seus sentimentos. Assim
como eu, você sabe como manter seu coração protegido — sorri, mas ela não.
— Obrigada pelo presente — abaixou os olhos voltando-os para a
comida.
— Deixe eu colocar em você! — Levantei com a peça em mãos para
colocar em seu pescoço.
Abri o fecho e quando meus dedos tocaram a sua pele, um arrepio
percorreu meu corpo, uma sensação estranha... Levantei seu queixo e depositei
um beijo casto nos seus lábios, mas o toque esquentou todo o meu corpo. Com
isso eu sabia lidar. Saliva, calor, beijo... Ela suspirou quando me afastei.
— Já podemos ir para casa, a minha cólica está voltando — pediu.
— Certo — caminhei em direção a cabine.
Minha cabeça era um turbilhão de pensamentos, desejos e sentimentos
que ficariam todos aqui, apenas na minha cabeça.
Duas semanas depois
Sabe quando uma pessoa faz uma sucessão de merdas para, em seguida,
passar o resto da vida tentando consertar tais cagadas? Esse era o Alexandre
desde que descobri o testamento. Não sei exatamente o que o levou a mudar, mas
desde que deixei a aliança sobre a mesa do seu escritório ele vem se esforçando
para não ser o completo imbecil de outrora.
Primeiro, ele rompeu todos os contatos com a Bruna. Pelo menos até
onde eu sabia. Depois, ele mobiliou o apartamento deixando-o com a minha
cara. Minha personalidade estava presente naqueles metros quadrados e eu
confesso que achei bacana o fato dele tentar reproduzir o meu apartamento em
São Paulo. Ainda teve o convite às minhas amigas, o fato de conseguir reunir
toda a quadrilha no novo apartamento foi o auge da sua saga para mostrar que
não é um completo imbecil. Convidar o Felipe então, acrescentou mais dez
pontos extras na sua cartela de "Nova Chance com a Gabi".
Isso sem mencionar o cuidado que teve comigo enquanto eu estive
morrendo de cólica e o almoço em comemoração ao nosso casamento. Eu nem
sequer lembrava do fatídico dia, mas foi fofo da parte dele recordar. Desde
então, estamos vivendo um dia de cada vez.
Saímos para jantar quase sempre e eu sigo para a Carpe Vita todas as
noites, para não ceder à tentação de bater na porta do meu vizinho de andar, feito
uma gata no cio. Era ainda mais difícil resistir ao som da sua risada e aos olhos
sempre convidativos. E cada vez que nossos corpos se encaixavam, eu repetia
para mim mesma que era apenas sexo, sexo de excelente qualidade. E
imediatamente lembrava das suas palavras: vamos tentar fazer as coisas serem
simples e aproveitar a viagem, sem pensar na chegada. Hic et nunc! Repetia para
mim mesma antes de adormecer em seus braços.
Dessa vez, quando acordei ele não estava do outro lado da cama. Mas
havia deixado uma mensagem no meu celular:
Passarei o dia no escritório, tenho reunião agendada até as cinco da
tarde. O que acha de irmos até um bar encontrar uns amigos após o meu
expediente?
Eu aceitaria se não tivéssemos outro compromisso para essa noite.
Alexandre ainda não sabia, mas uma das ONGs que a sua mãe era voluntária
prestaria uma homenagem a ele essa noite, ela não entrou em detalhes, pois ficou
com receio que eu contasse a ele e estregasse a surpresa. Mas durante o evento
beneficente Alexandre seria homenageado como o grande benfeitor da noite.
Vilma estava orgulhosa do filho e contou-me que ele contribui com diversas
instituições de caridade. Mais um ponto para o senhor Fragoso.
Não poderemos ir, temos um compromisso inadiável!
Enviei.
Temos?
Sua resposta chegou imediatamente.
Claro que temos! Eu comentei com você essa semana que iríamos no
evento beneficente que a sua mãe organizou.
Não tô muito a fim de ir... Trocar chope gelado por um evento repleto
de velhos não é o meu programa favorito.
Não pude deixar de sorrir, eu concordava com ele, mas eu havia
prometido a sua mãe que iríamos e não mudaria de ideia.
Deixa só a sua mãe saber disso! kkkkkkkk Podemos estender a noite
depois que sairmos de lá ;)
Perfeito!
Ah! Esqueci de dizer que o traje é Black Tie.
Mais horas enfiado em roupa social, quando tudo o que eu quero é
estar nu... Me diga algo bom dessa noite? Não vi nenhuma vantagem ainda.
A minha presença!
Mas eu poderia desfrutar da sua presença numa banheira de
hidromassagem junto ao meu corpo, minhas mãos espalhando espumas nos
seus braços, enquanto meus lábios tocam o seu pescoço...
Você sabe como animar uma noite!
Enviei já imaginando nossos corpos juntos mais uma vez.
Sabemos! Nós sabemos como animar qualquer espaço.
Anexou a mensagem uma foto do seu colo com uma ereção marcando a
calça de tecido.
O que eu tinha que fazer mesmo? Ah, lembrei... Almoçar com a Vilma e
depois passar a tarde no salão de beleza. Ela teria que perdoar o meu atraso,
porque uma chamada de vídeo do Alexandre se iniciou. Ele estava no banheiro
do escritório e um sorriso imenso nos lábios. O sorriso que indicava que iria me
levar ao orgasmo, dessa vez a distância.
O humor do Alexandre melhorou consideravelmente depois do sexo por
vídeo que fizemos. Ele não reclamou mais de ter que comparecer ao evento, pelo
contrário estava animado demais para ir e livrar-se logo desse compromisso.
Tinha planos para essa noite e os planos incluíam nossos corpos numa banheira
de um motel cinco estrelas.
Passei a tarde com a Vilma fazendo compras e no salão de beleza. A mãe
do Alexandre era uma mulher cheia de vida e carinhosa, ela me contou histórias
do filho quando criança, das viagens em família e mais uma vez externou o
quanto era feliz em ter-me como nora, do quanto ela gostava da minha presença.
Um nó se formou em minha garganta e eu não pude deixar de confessar que eu
também gostava muito dela.
Eu passei tarde me produzindo, maquiagem, cabelo e procurando um
vestido perfeito. Ainda estava de roupão, quando Alexandre chegou no meu
apartamento lindíssimo usando um terno feito sob medida para o seu corpo. O
tecido encaixava-se perfeitamente ao seu corpo definido, a calça contornava a
sua bunda e marcava as coxas grossas. Um sorriso nos seus lábios completava o
quadro de perfeição.
— Aprovado? — Deu uma voltinha exibindo-se.
— Até que o terno deixou você mais bonitinho — perturbei sorrindo.
— Mais bonitinho? — enlaçou a minha cintura e puxou-me para ele.
— O que você queria ouvir? — Perguntei fitando a sua boca.
Deus do céu! Eu tinha experiência com homens gostosos, mas esse batia
todos os recordes.
— A verdade — seus lábios tocaram o meu pescoço e um arrepio
percorreu o meu corpo — Que o seu coração perdeu o compasso quando me viu
— sussurrou ao meu ouvido e o filho da puta estava certo, meus batimentos
aceleraram — Você também pode dizer que não consegue deixar de pensar na
minha boca... — completou antes dos seus lábios tocarem os meus e sua língua
invadir a minha boca.
Ele esqueceu de dizer que eu ansiava pelo toque dos seus lábios
diariamente e ficava enlouquecida a cada vez que ele me beijava. Que o seu
beijo era tão bom quanto o seu sexo. Mas, tudo que eu consegui dizer depois que
ele afastou nossos lábios foi:
— Eu preciso acabar de me arrumar! — Suas mãos soltaram a minha
cintura e meu corpo sentiu falta do seu toque. Apressada, eu saí em direção ao
quarto e fechei a porta atrás de mim soltando um suspiro alto. Porra, Gabi!
Levei as mãos a boca para conter o suspiro.
Retornei muito tempo depois, com os meus sentimentos controlados.
Alexandre me esperava sentando ao sofá com um copo de Whisky em mãos.
Quando ele notou a minha presença um brilho de desejo ficou evidente em seu
olhar, que percorreu meu corpo repetidas vezes, fazendo-o abrir levemente a
boca.
Eu usava um elegante vestido tomara que caia, laranja, mas como a
própria vendedora disse e Vilma e eu concordamos, era injusto resumir a peça a
isso. O tecido fino grudado no busto ia ganhando volume a partir da cintura e
uma grande fenda revelava as minhas coxas à medida que eu vagarosamente me
movia em sua direção. Na orelha eu usava um par de brincos de diamantes
discretos, em formato de bolinha e no pescoço a corrente que ganhei dele. Eu de
fato amei a joia e ela era quase como a minha segunda pele.
Ciente do efeito perturbador da peça que eu usava, um sorriso de
satisfação surgiu nos meus lábios, por isso não perdi a oportunidade de provocá-
lo:
— Perguntar se precisa de um babador é desnecessário, né? — indaguei e
seus olhos não desgrudaram nenhum minuto do meu corpo.
— Você está deslumbrante! — foi o que falou alguns segundos depois e
completou fitando os meus olhos — claro que eu poderia acrescentar que a
minha vontade é de possuí-la aqui mesmo na sala, tocar cada ponto do seu corpo
que o vestido esconde, que o meu desejo é substituir o tecido grudado a sua pele,
pela minha nua e sedenta do seu sabor.
Caralho, Alexandre!
Ele havia me deixado ainda mais... Encantada com o seu elogio.
— Obrigada. Há muito tempo eu não era elogiada pelo que vestia! —
Confessei sorrindo.
— Eis uma das vantagens da maturidade, apreciar o todo. Uma mulher
completamente vestida é tão sedutora e desejável quanto uma mulher nua. O
tecido valorizando o corpo feminino não deve ser uma mera embalagem a ser
descartada, pelo contrário ele deve ser apreciado. Nenhuma mulher se produz
toda somente para que homem veja apenas o corpo sexy.
— Caralho! — verbalizei em choque pelas suas palavras e como seu
elogio esquentou algo dentro de mim — Você quer parar de me elogiar assim?
— falei desconcertada. Eu não era tímida, mas os seus elogios tinham me
deixado sem palavras.
— Eu seria um tolo caso não elogiasse você essa noite — abandonou o
copo e caminhou lentamente ao meu encontro — o tecido é tão macio quanto a
sua pele — falou a passar o braço pela minha cintura e de forma espontânea
nossos corpos se procuraram, tocando-se. — Seu cheiro é delicioso — seu nariz
tocou meu colo nu — Seus lábios vermelhos imploram pelo meu toque — disse
quando eu suspirei colada a seu corpo. Abri os lábios para recebê-lo, mas a
campainha o fez me soltar sorrindo e seguir em direção a porta. Soltei um
lamento pela interrupção.
— Senhor Alexandre, o carro já está a sua espera — Assis informou.
— Obrigado — Agradeceu e voltou-se em minha direção, eu bebia o
resto do Whisky deixado no copo. — Vamos? — Indagou oferecendo o braço.
— Sim! — repousei o copo e segurei o braço que ele oferecia. Seguimos
de braços dados até o estacionamento — Por que vamos de motorista? —
perguntei já dentro do carro.
— Embora não pareça — sorriu — é um evento com música, repleto de
bebidas e gente bonita. Vamos aproveitar a noite! — piscou em minha direção.
— Sua mãe não aprovaria essa sua definição de evento beneficente —
rebati sorrindo.
— Minha mãe não aprova muitas coisas ao meu respeito — sorriu de
volta.
— Seu casamento comigo, por exemplo? — indaguei curiosa.
Embora Vilma tivesse dito que gostava muito de mim, ela deixou escapar
que lamentava não ter comparecido ao casamento do filho, queria ter visto o seu
menino no altar...
— Não — negou com a cabeça sorrindo — se tem algo que ela aprova é
esse casamento. Ela gosta de você como se fosse realmente da família! —
Respondeu encarando-me. Desviei o olhar para não me perder ainda mais
naqueles olhos azuis e voltei-me para a janela acompanhando o trajeto em
silêncio.
Somente quando o carro estacionou em frente ao Copacabana Palace,
local onde ocorreria o evento, foi que me voltei para ele. No calor do momento
acabei esquecendo de comentar que a gravata dele não estava na cor certa do
convite.
— Falta a cor que simbolize a causa defendida, presumi que não havia
prestado atenção ao detalhe! — retirei uma gravata borboleta laranja da bolsa de
mão, que eu havia comprado naquela tarde.
— Não vou usar uma gravata borboleta vermelha — negou — Já basta
parecer um belo exemplar de pinguim.
— Não é vermelho — corrigi calmamente — é um tom de laranja.
— Isso não é laranja, Gabriela — discordou — eu conheço as cores.
— Qual a cor do meu vestido, então? — Perguntei sorrindo.
— Vermelho! Óbvio — respondeu.
— Errado — sorri triunfante — é um tom de laranja.
— Assis, qual a cor do vestido da Gabriela? — indagou contrariado ao
motorista que concordou com ele, dizendo que era vermelho — Viu só, dois
contra um. — Voltou-se para mim confiante.
— Aconteceu algo, senhores? — uma voz feminina aproximou do nosso
carro, provavelmente para pedir que descêssemos logo e parasse de atrapalhar a
chegada dos outros convidados.
— Sim — respondi — estamos com uma dúvida referente a cor do meu
vestido, a senhora poderia responder qual a cor dele, por favor?
— Claro! — a mulher sorriu diante da pergunta óbvia — é um tom de
laranja que valoriza muito a sua pele, por sinal.
— Obrigada — aquiesci para a mulher e sorri para o Alexandre — eu
sempre estou certa!
— Mesmo que esse vestido seja laranja, o que não é — revirei os olhos
diante a sua teimosia em admitir que estava errado — Eu não irei usar a gravata
dessa cor — pontuou e desceu do carro caminhando para abrir a porta para que
eu descesse também.
Havia fotógrafos posicionados na porta do hotel e fomos guiados por
uma funcionária a retirar algumas fotos para o site do evento. Pousamos juntos
para algumas fotos e entramos de braços dado no hall do Copacabana.
Uma mulher morena de cabelos cacheados, promoter do evento, nos
guiou até a enorme sala onde aconteceria o jantar beneficente. Assim que
adentramos no ambiente, bastante cheio, a mulher nos posicionou na mesa
reservada para a família Fragoso. Somente seu pai estava ali, que logo levantou
para nos cumprimentar.
— Você está muito bonita, Gabriela — o senhor Fragoso me
cumprimentou com um abraço apertado.
— O senhor também está muito elegante — disse sorrindo — Veja,
Alexandre, a gravata do seu pai é laranja! — eu não ia perder a oportunidade de
provocá-lo.
— Exatamente como deveria ser! — A sua mãe se aproximou e lançou
um olhar reprovador para o filho. Vilma usava um vestido muito elegante num
tom suave de laranja, os cabelos presos num coque elegante, evidenciavam os
brincos de rubi.
— Você está belíssima! — elogiei antes de beijar a sua face.
— A mulher mais linda dessa sala — Alexandre elogiou.
— Não tente me enrolar com seus elogios — repreendeu sem conter o
sorriso — Aqui! Essa fita deve resolver — prendeu uma fita de cetim laranja na
lapela do smoking do Alexandre.
— Agora sim! — sorri.
— Senhoras e senhores, muito boa noite — o cerimonialista anunciou e
todos nos sentamos — dentro de meia hora daremos início ao nosso evento
beneficente, agradecemos desde já a senhora Vilma Fragoso e Margarida Duarte
pela iniciativa e organização do evento — seus pais trocaram um olhar de
admiração e Alexandre os fitou com carinho.
Nossas bebidas foram servidas, enquanto uma banda tocava blues,
comemos e conversamos animadamente. Vilma e eu logo tratamos de conversar
sobre as roupas das outras mulheres, elegemos os nossos vestidos preferidos e
não podemos deixar de comentar a escolha equivocada de alguns modelos, papo
de mulherzinha.
Marta Duarte, uma das organizadoras do evento em conjunto com a
Vilma, era uma amiga de longa data da minha sogra, e logo juntou-se a nós na
mesa e completou o clube das mulheres. Animada e viúva, ela revelou que que
sairia daquela noite realizada pelo evento e com o contato de um viúvo em mãos.
Sorri diante do comentário. A mulher logo tratou de me convidar para ser
promoter do Natal Solidário, após eu contar que trabalhava na Carpe. Eu
prontamente aceitei, já com mil ideias para angariar fundos para o orfanato.
Enquanto Alexandre e o pai conversavam entre eles, nós três ríamos e bebíamos
como amigas de longa data.
— Boa noite, senhoras e senhores sejam muito bem-vindos! Daremos
início ao evento, com vocês a modelo internacional Ana Matarazzo — surgiu ao
palco sob aplausos fortes, a modelo brasileira ruiva que estampava os catálogos
de uma famosa grife de bolsas.
— Gata, né? — comentei com o Alexandre que se aproximou para
sussurrar em meu ouvido.
— Você é muito mais — sorri — Tive uma ideia: o que acha de
escaparmos dessa sala e passarmos a noite numa suíte do Copacabana?
— Tentador... — Confessei sorrindo.
— Hic et nunc, Gabi!
— Silêncio, meninos! — sua mãe nos repreendeu sorrindo e ele afastou-
se com uma piscadela em minha direção.
— Boa noite a todos — a mulher disse ao microfone — Quando o
convite foi feito, não hesitei em aceitar. É com enorme prazer que estou aqui
como mestre de cerimônia e abraçando essa causa tão importante que é a ELA.
Não sei o que ocorreu, mas naquele exato momento toda a cor sumiu da
face do Alexandre. O homem que, até um segundo atrás, sorria agora estava
estático e com uma expressão de medo estampada no rosto, suas mãos
apertavam com força o copo que segurava.
— Alexandre... — me aproximei para que apenas ele me ouvisse. Seus
olhos estavam fixos no palco — Você está bem? — Toquei sua mão que estava
gelada. Olhei para os seus pais que estavam atentos ao palco e não notaram que
algo estranho estava acontecendo com o filho.
Um calafrio fez meu corpo estremecer, o prelúdio de que algo ruim
estava para acontecer.
ELA
ELA
ELA
ELA
ELA
ELA
ELA
ELA
A palavra ecoava em minha mente e reverberava por todo o meu corpo. A
simples menção dessas três letras foram o suficiente para que a minha mente
vagasse para o passado. ELA. Significava tanta coisa para mim. ELA: a mulher
de sorriso fácil. ELA: a maldita doença.
Escuto a voz da Gabriela, mas não compreendo nenhuma palavra que ela
fala. Sinto as suas mãos tocando as minhas, mas não reajo. Apenas sinto. Sinto
todas as lembranças me atingirem em cheio feito um soco no estômago. Sinto
meu coração bater acelerado e minhas mãos tremerem. Sinto todo o sangue
sumir do meu corpo e ondas de frio percorrerem-no. Sinto minha garganta
fechar, como se uma mão estivesse me sufocando, me impedindo de respirar.
Sinto lágrimas surgirem nos meus olhos. E tudo o que eu faço é apenas sentir.
Sentir uma dor dilacerante esmagar meus sentidos e levar a minha racionalidade
com ela.
ELA
ELA
ELA
ELA
Meu corpo pedia fuga, implorava para que eu levantasse daquela cadeira
e saísse dali o mais rápido possível, entretanto as minhas pernas não
correspondiam ao comando do meu cérebro, por isso eu mantinha os olhos fixos
na mulher que falava ao microfone, numa voz mecânica e sem emoção.
Enquanto eu era um poço de sentimentos distintos.
— A Esclerose Lateral Amiotrófica, ou simplesmente ELA, é uma doença
degenerativa avassaladora caracterizada pela paralisia. Uma paralisia que atinge
não somente o paciente, mas todos ao seu redor.
—Tá tudo bem, amor! — envolvi-a num abraço forte, após ela deixar
cair das suas mãos uma taça de cristal da minha mãe e sair correndo da sala de
jantar.
— Eu não sei o que aconteceu — disse entre lágrimas — Eu perdi a força
nas mãos! De repente a taça ficou pesada demais. Estraguei o jantar! —
soluçou contra o meu peito.
— Shhh! — Afastei nossos corpos para tocar os seus lábios com os dedos
— Não vai ser uma taça quebrada que irá estragar com a nossa noite. Na
verdade, esse é mais um motivo para eu colar em você: alguém precisa
consertar tudo que você bagunça e eu farei esse esforço... — sorri e ela me
acompanhou.
— Eu te amo a cada dia mais! — Admitiu sorrindo.
— Eu que te amo, minha desastrada favorita! — Sorri e beijei seus
lábios para selar mais uma vez a nossa promessa de nos amarmos a cada dia
mais que o anterior.
Em determinado momento, a voz do mestre de cerimônia cessou e um
vídeo passou a ser exibido no grande telão ao lado do palco. Paralisado. Era o
meu estado naquele exato momento, minha boca estava seca, meu coração
acelerado, minha respiração ofegante... No meu cérebro uma onda de pânico foi
instaurada, era como se placas indicando perigo estivessem ali expostas e eu
devesse levantar e correr daquele lugar, mas meu corpo não se movia, nenhum
maldito músculo obedecia aos meus comandos.
No telão, o vídeo iniciou e por mais que eu quisesse fechar os olhos e não
ver, não era o meu cérebro que estava em ação, era o meu coração que
comandava, que arrancava todos os Band-Aid’s das feridas e expunha todas as
cicatrizes que eu guardei à sete chaves.
Na sequência do vídeo, surgiu uma criança de cabelos castanhos escuros
dando seus primeiros passinhos, incentivada pela mãe:
— Yasmin meu amor, vem até a mamãe, vem! — a mulher sorria de
braços abertos. Passo a passo, a criança sorridente chegou até sua mãe.
Houve um corte temporal e em seguida vimos surgir uma linda garota em
cena, usando um vestido elegante azul, quando a sua voz ecoou pela caixa de
som, eu perdi o chão. Senti que um buraco negro havia se formado sob os meus
pés e estava me sugando para dentro dele.
A essa altura meu coração batia ainda mais descompassadamente, meus
lábios tremiam e minha visão estava turva... A menina, agora mulher, dançava
uma música romântica de corpo colado com seu par e sorria para ele, enquanto a
câmera surgia à sua frente registrando o momento.
— O que os pombinhos têm a dizer sobre o fim do Ensino Médio? — o
homem atrás da câmera perguntou.
— Que sobrevivemos! — ela respondeu sorrindo — Alexandre, olha
para o vídeo! — pediu com uma voz doce seguida de um sorriso. O garoto
tímido olhou rapidamente para a filmagem e voltou a olhá-la apaixonadamente
— Quero deixar registrado esse momento. O momento que me sinto a pessoa
mais amada do mundo, quero deixar registrado para todos que mesmo que eu
morresse amanhã, a minha vida já valeu a pena por ter você ao meu lado!
— Nem vem com esse papo! — o garoto repreendeu sorrindo — Você
prometeu que ficaríamos velhinhos juntos! Não quero envelhecer sem você ao
meu lado...
— Esqueceremos nossos nomes, mas estaremos sempre juntos! — ela
completou e o beijou delicadamente.
A imagem focou o beijo dos dois, um beijo entre dois jovens cheios de
sonhos e amor. O vídeo encerrou e uma lágrima teimosa escapou dos meus
olhos, quando reconheci as duas pessoas em cima do palco.
— A ELA levou a minha filha precocemente — Márcia, mãe da Yasmin,
falou ao microfone sendo reconfortada pelo marido, Plínio. Ambos seguravam
camisas com a foto da filha sorrindo. Eu quero que você se lembre de mim,
sorrindo! — Yasmin, não viveu o suficiente para ser veterinária, seus pés não
pisaram nos países que ela queria tanto visitar, seus braços não puderam nos dar
o último abraço — a voz da mulher estava embargada, o marido a apoiava
visivelmente emocionado, segurando sua mão — sua boca não atendeu a súplica
do seu olhar no momento da despedida, mas aqui dentro — apontou para o
próprio coração — continuamos ouvindo a sua voz sorridente, a sua gargalhada
doce e as suas constantes declarações de amor.
O casal chorou, um choro cortante, porém sem alarde, de quem já
vivenciou essa mesma situação várias vezes. De quem sentia, mesmo tantos anos
depois, a falta da filha. O choro de quem perdeu alguém que amava tão
precocemente.
As lágrimas já escorriam pelo meu rosto e, com muito esforço, consegui
mover a mão até os olhos para secá-las. Uma mão tocou a minha, mas evitei
olhá-la, pois assim como os pais no palco que já vivenciaram a situação, eu sabia
o que aquela mão significava: pena. Que talvez depois pudesse virar compaixão
e cuidado.
Meu corpo todo tremeu e eu respirava com dificuldade. Preciso sair
daqui! Preciso sair daqui! Não sei como consegui ficar de pé, trôpego me afastei
da mesa e escutei Gabriela chamar o meu nome. Saí esbarrando em mesas e
pessoas e pedi desculpas inaudíveis, me movi o mais rápido que as minhas
pernas permitiram. A voz da mulher voltou a ecoar nas caixas de som do salão.
— E é em nome dela que estamos aqui, para que possamos dar
oportunidade de vida as Yasmins espelhadas pelo Brasil — disse com a voz
emocionada — obrigada a família Fragoso pela iniciativa do evento, em especial
ao Alexandre Fragoso pela doação responsável pela criação do Instituto Yasmin
Cavalcante...
Escutei o meu nome e o mundo pareceu desabar sobre minha cabeça.
Aplausos fortes ecoaram no ambiente enquanto a sua canção favorita tocava.
Desnorteado, cruzei o restante do caminho que me libertava daquelas
lembranças. Não enxergava um palmo à minha frente, mas ouvi passos
apressados atrás de mim, não sabia para onde estava indo, apenas precisava
fugir. O elevador se abriu para uma funcionária carregando um carrinho de
limpeza sair, entrei nele esbarrando na mulher que disse algo que eu não
compreendi.
— Alexandre, espera! — Gabriela gritou e pude ver preocupação em seu
olhar. Mas era tarde... As portas do elevador se fecharam antes que ela me
alcançasse.
Segurei-me contra as paredes do elevador e acionei o botão que me
levaria até o terraço do hotel. Respirei com dificuldade e arranquei a gravata,
mas ainda era insuficiente para aplacar a sensação de falta de ar que sentia, por
isso livrei-me do terno, desabotoando os primeiros botões da camisa, numa
tentativa inútil de levar o ar aos meus pulmões.
Quando o elevador parou, indicando que cheguei ao lugar isolado, saí
cambaleando e inspirando com força o ar fresco. Gritei alto quando a dor se
tornou insuportável. Eu achei que tivesse superado. Achei que guardar à sete
chaves tudo o que vivi com Yasmin fosse o melhor a ser feito. Não lidar com os
sentimentos era o que eu fazia de melhor. Desabei no chão sem conseguir conter
a vazão de sentimentos, lágrimas feias e grossas escapavam dos meus olhos, a
sua voz ecoava no meu pensamento.
Eu quero que você se lembre de mim, sorrindo!
De olhos abertos consigo lembrar exatamente a última vez que nos
falamos e do seu sorriso. Também lembro do inferno que vivi naquela semana...
Eu lembrava do seu sorriso contagiante, mas ele não me fazia rir de volta, não
mais.
Alexandre, espera! Gabriela gritara antes de eu fugir, com os olhos
assustados, segurando o vestido erguido. Esperar para quê? Para que você zombe
da minha cara de paspalho por chorar por uma lembrança que aconteceu há mais
dezoito anos?
— O senhor não tem autorização para estar aqui! — Um homem que
presumi ser funcionário do hotel se aproximou e moveu a lanterna em minha
direção, iluminando o meu rosto. Estou sentando, no chão do terraço escondido
sob a luz do luar, chorando feito uma criança imbecil que caiu e machucou o
joelho — O senhor precisa de ajuda? — perguntou alguns segundos depois.
— Eu já estou de saída. — Respondi com dificuldade.
— Ok, mas o senhor não pode demorar aqui... — disse mais uma vez
antes de se afastar. Deixando-me na completa escuridão.
A figura da Yasmin surgiu mais uma vez à minha frente, não aquela que
os vídeos mostraram, mas a Yasmin que só eu conhecia, a que sorria das minhas
piadas bobas, a que matava aula para nos encontrarmos escondidos. Mas logo
cheguei até a Yasmin que utilizava apenas o olhar para se comunicar...
Caralho Alexandre! Me repreendi quando notei o desespero se
aproximando, o soluço preso na garganta escapou e ecoou alto na escuridão,
abracei as minhas pernas enquanto todo o meu corpo tremia. Meu pensamento
estava repleto de imagens nossas. Puxei meus cabelos com força, queria
substituir a dor emocional pela física. É isso, vou sair e beber, arranjar confusão
com alguém e socá-lo até que eu não sinta as minhas mãos.
— Alexandre... — Gabriela encontrou-me — Eu sei que você está aqui!
— Vai embora! — Gritei de volta.
— Seus pais estão preocupados! — Ela usou o celular para iluminar o
ambiente — Eu estou preocupada...
— Não preciso da preocupação de vocês — enxuguei as lágrimas — O
Assis, está lá embaixo vá para casa, eu chego depois — menti.
Seguindo a minha voz, ela me achou jogado no chão, notei seu semblante
vacilar, a pena se instaurando ali.
— Eu não vou embora sem saber se está bem — sua voz estava serena.
— Eu não estou nos meus melhores dias, mas está tudo sob controle —
menti mais uma vez. Eu era muito bom em esconder meus sentimentos.
— Eu posso ajudar com alguma coisa? — Abaixou-se até ficar a minha
altura, para olhar diretamente nos meus olhos.
— Sim, indo embora! — Informei e abaixei a cabeça para que não
percebesse as lágrimas que rolavam sem autorização.
— Eu não vou embora te deixando assim... — Sua mão tentou enxugar as
minhas lágrimas, mas eu afastei de forma rude.
— Eu não preciso da sua pena! — Gritei furioso.
— Não estou aqui por pena. Estou porque me preocupo com você! Eu...
— Vá embora, Gabriela! — Ordenei.
— Você é um imbecil! — Rebateu, ficando de pé — Eu estou aqui
querendo te ajudar, dizendo que me preocupo com você e tudo que você faz é
gritar comigo! Descontar em mim as suas frustrações... — Seus olhos
marejaram.
— Apenas vá embora! — pedi mais calmo — É o melhor para nós dois
nesse momento.
— É? — A sua voz vacilou — Seus pais disseram o mesmo. Pediram
que eu te desse um tempo. O que está acontecendo, porra? — Gritou e uma
lágrima escapou dos seus olhos — Eu me sinto no meio de um segredinho sujo
de família...
— Ela não é a porra de um segredinho sujo! — Levantei e dei dois
passos até alcançá-la — Nunca mais ouse chamá-la dessa forma... — Segurei
seu braço com força — Ouviu? — Rosnei furioso.
— Você vai me machucar, seu babaca! — Chutou as minhas pernas, mas
minha mão permaneceu apertando o seu braço.
— Repete que ouviu, porra! — Gritei e ela estremeceu de raiva, enquanto
continuava se debatendo para se soltar.
— Solte-a, agora! — Alguém acendeu uma lâmpada e o ambiente se
iluminou. Olhei para trás e vi um funcionário da segurança segurando uma arma
em punho.
— Não! — Gabriela gritou quando o homem apontou a arma em nossa
direção — Ele é meu marido, está tudo bem — voltou-se para o homem e depois
para mim — Alexandre, me solta por favor! — pediu com lágrimas nos olhos.
Soltei seu braço, mas ela não se afastou, o homem continuava com a arma
voltada em minha direção, se aproximando lentamente.
— Senhora, por favor afaste-se dele! — Ele pediu com os olhos fixos em
mim.
— Abaixe essa arma! — Ela implorou aflita — Estávamos numa
discussão acalorada, mas já passou...
— O que está acontecendo aqui?
Mais dois homens surgiram, usando o mesmo uniforme da empresa de
segurança.
— O homem aí estava agredindo a mulher — o segurança armado
informa.
— Ele não estava me agredindo... — Gabriela falou aflita e os dois
homens me encararam com fúria.
— Gabriela, afaste-se de mim. — Pedi e esperei que apenas dessa vez ela
me obedecesse sem contestar.
Estava com medo de o segurança com a arma em punho fazer alguma
merda, como puxar o gatilho, e a bala destinada a mim acabasse atingindo-a, não
precisava de mais lembranças ruins.
— Eu não vou me afastar de você quando uma arma está apontada em
sua direção. — Ela fitou-me em total desespero.
— Ele não fará nada! — Fitei seus olhos azuis e esperei que ela
acreditasse nas minhas palavras — Apenas caminhe lentamente para longe. Vai
ficar tudo bem...
O meu diálogo com Gabriela me distraiu e não percebi quando um dos
homens se afastou e conseguiu me surpreender aplicando uma gravata em meu
pescoço. Ela afastou-se assustada e eu reagi contra o homem que me apertava,
usando os cotovelos para atingir o seu estômago. Ele me soltou urrando de dor.
Aproveitei a sua dor e parti para cima, puxando-o pela camisa. Eu havia
encontrado uma oportunidade para descontar a minha raiva.
— Reage! — Instiguei o homem caído.
— Alexandre! — Gabriela gritou e tentou se aproximar, mas foi contida
pelo homem que segurava a arma. O outro segurança, alto e com cara de poucos
amigos, tentou me deter, mas eu resisti e acabei atingindo o nariz do mais
baixinho, levei um murro na barriga em resposta. Estava me sentindo num
ringue, o que me faltava em desvantagem numérica, sobrava em raiva
acumulada.
— Para Alexandre! — Gabriela gritou mais uma vez e eu continuei
batendo e apanhando feito um moleque numa briga de rua.
O segurança alto puxou da cintura uma arma de choque e ameaçou
utilizá-la caso eu não aquietasse. Não seria nada mal levar um choque e apagar
em seguida. Inconsciente não sentiria mais nada.
— Mais uma gracinha e você só vai acordar no hospital! — O homem
ameaçou novamente. Eu dou mais um passo em sua direção e sou repreendido
por Gabriela que conseguiu se soltar dos braços do segurança com uma mordida
em seu braço.
— Sai da minha frente! — Exigi quando ela parou a minha frente.
— Que merda aconteceu com você? — Sua voz saiu trêmula — Pense
nos seus pais lá embaixo... Pense em mim, eu estou assustada! — Implorou e vi
o pavor instaurado no seu olhar.
— Eles já me viram em situação pior... Agora vai embora, você não
precisa passar por isso.
— Não! — Protestou e em seguida senti uma pancada forte atingindo a
minha cabeça, poucos segundos depois, cambaleei e cair aos seus pés.
A última coisa que vi antes de apagar foram os seus olhos azuis fitando-
me em desespero.
Em um minuto estava tentando trazer racionalidade a um Alexandre
descontrolado e no instante seguinte estou com ele aos meus pés, desmaiado.
Ainda que eu vivesse cem anos, jamais esquecerei a noite de hoje.
— Que porra vocês fizeram? — Gritei para os três patetas parados.
— Ele ficará bem... — Começou a explicar o homem mais alto — foi
apenas uma coronhada.
Enquanto eu tentava convencer Alexandre a ficar calmo, o imbecil
atingiu a sua cabeça com o cabo da arma. Toquei a cabeça do Alexandre e não
encontrei sangue, mas também não enxergava com clareza nessa luz fraca, meus
dedos não estavam sujos, então deveria ser mais um sinal que não havia sangue.
Na parte de trás da sua cabeça existia apenas um galo começando a surgir.
— Façam alguma coisa! — Esbravejei para os três seguranças que
continuavam inertes — Me ajudem a levá-lo para um quarto.
Com dificuldade eles carregaram o Alexandre como se fosse um saco de
batata, seria demais que eles tivessem cuidado com homem que até pouco tempo
estava brigando com eles feito um leão enjaulado.
— A senhora não pagou pelo quarto... — o mais baixinho deles
informou, ignorei sua fala enquanto voltava a tatear a cabeça dura do Alexandre:
nenhum sinal aparente de ferimento ocasionado pela queda ou pancada. Ainda
assim, vou chamar um médico para vê-lo!
— É o procedimento padrão, senhora... — o homem pigarreou.
— Procedimento padrão? — indaguei furiosa e o homem encolheu-se —
É procedimento padrão espancar as pessoas nesse hotel?
— Não espancamos ninguém — o homem mais alto, que devia ser o
chefe de segurança, tomou a frente dos outros — ele estava agredindo a senhora
quando chegamos... Além do fato de ter atacado um dos nossos funcionários.
Qualquer advogado dirá que foi legítima defesa! Temos testemunhas — indicou
com a cabeça para o segurança de olho inchado.
— Ótimo que vocês tenham advogados, pois precisarão deles! — Não
me intimidei com a sua ameaça — Ele não estava me atacando e nada disso teria
acontecido se vocês não tivessem agido de forma deliberada. Já prevejo
estampado nos jornais que a segurança do hotel mais famoso do Rio de Janeiro
agrediu o homenageado do evento beneficente.
— Ele é o Alexandre Fragoso? — indagou com os olhos arregalados,
consciente da burrada que havia feito — Chame o médico do hotel, agora! —
Ordenou para os seus subordinados.
— Lamento mais uma vez pelo ocorrido... — iniciou as desculpas — Eu
não quis agredir o seu marido.
— Mas agrediu! — rebati — Agora faça algo certo pelo menos uma vez
nessa noite e encontre Vilma e Alex Fragoso e comunique-os que o filho deles
está bem.
— Mais alguma coisa, senhora? — Indagou solícito.
— Whisky, quero uma garrafa de Whisky!
— Claro, senhora Fragoso e desculpe mais uma vez pelo seu marido.
O homem afastou-se e me deixou a sós com Alexandre completamente
inconsciente. Não consigo conter as lágrimas o vendo esparramado na cama, seu
rosto apresentava ferimentos em diversos pontos: os olhos estavam inchados, a
boca apresentava um corte no lábio inferior e do nariz escorria um filete de
sangue. Com dificuldade ergui a sua cabeça e coloquei dois travesseiros embaixo
dela.
Retirei seus sapatos, abri sua camisa social em busca de algum outro
ferimento escondido pelas peças de roupa, quando vou fazer o mesmo com a sua
calça um homem carregando uma maleta irrompe pela porta.
— Sou o doutor Cardoso — apresentou-se e seguiu para o outro lado da
cama com o estetoscópio em mãos — os sinais vitais dele estão ok — revelou
um tempo depois de aferir a sua pressão e checar olhos e o galo da cabeça, soltei
o ar com força. Não me dei conta que tinha prendido o ar enquanto ele o
examinava.
— A senhora sabe dizer se ele ingeriu álcool ou fez uso de
entorpecentes?
— Ele bebeu Whisky.
— Ok — respondeu com os olhos voltados para o celular —
Ambulância, quarto 248.
Meu corpo gelou quando escutei a palavra ambulância. Não estava tudo
bem? Antes que eu conseguisse verbalizar uma pergunta ele voltou-se para mim:
— Seu marido está bem — tranquilizou-me — Iremos até o hospital para
realizarmos uma ressonância e descartar qualquer lesão, não houve corte na
cabeça o que é um bom sinal... — Assinto e duas lágrimas escorrem do meu
rosto. — Está tudo bem! — O médico tentava me acalmar.
Os enfermeiros chegaram e colocaram Alexandre na maca. Ele
continuava inconsciente, mas o médico disse que estava tudo bem, então... Está
tudo bem! Repito para mim mesma enquanto sigo-os para a ambulância. No hall
do hotel, encontrei Vilma sendo amparada pelo marido quando reconheceu o
filho desacordado na maca.
— O que eu houve com ele? — Perguntou apavorada.
— Está tudo bem! — Repeti a frase do médico, mas não sei se consigo
tranquiliza-la, pois minha voz estava embargada pelo choro que lutava para
conter. Ela soltou-se dos braços do marido e foi até a maca.
— Meu amor, me perdoa — Suplicou enquanto segurava as mãos do
filho — Eu não fazia ideia de que ele reagiria assim, eu não fiz por mal —
Voltou-se para mim chorando descontroladamente.
— Não se culpe — Juntei a minha mão a sua — Ele vai ficar bem.
— Eu não imaginei que ele ficaria assim. Não tanto tempo depois...—
Beijou a mão do filho antes dos enfermeiros guiar a maca até a ambulância.
Um pequeno grupo de pessoas curiosas já se formavam para ver o que
estava acontecendo, muitas com o celular em mãos para registrar a desgraça
alheia, os seguranças afastaram todos impedindo o registro.
— Qual de vocês irá acompanha-lo? — O médico perguntou.
— Eu! — Respondi de imediato e voltei os olhos para Vilma para saber
se ela concordava.
— Tem certeza minha filha? — Fitou-me com carinho.
— Tenho! — enxuguei as lágrimas — Nos encontramos no hospital.
— Certo, iremos logo atrás de vocês — Alex tocou o braço da esposa
que assentiu. Antes de se afastar ela abraçou-me, um abraço apertado e
aconchegante, a gota d'água para que as lágrimas molhassem o meu rosto.
— Vamos? — o médico chamou mais uma vez. Afastei-me de Vilma e
entrei na ambulância que seguiu apressadamente para o hospital particular mais
próximo.
Estava no bar mais uma vez, em busca de uma caipirinha, quando fui
abordada por ele.
— Não acha que já chega de álcool? — Felipe indagou.
— Por um segundo, achei que tivesse viajado no tempo e fosse meu pai
reclamando.
— A sócia da boate não pode dar perda total na frente de todo mundo,
lembra?
— Não fode, Felipe! — a palavra e a lembrança de como era com ele fez
meu corpo esquentar — Aliás, fode sim. Com força!
— Porra, Gabi!
— Uma das melhores frases que eu adoro arrancar de você — me
aproximei — Mas prefiro arrancar a sua roupa... Com a boca. — Sussurrei já
colada ao seu corpo
— Gabi, vamos subir! — A sua resposta foi música aos meus ouvidos.
Como nos velhos tempos...
Seguimos em silêncio e finalmente havia alguma coisa que ocupava a
minha mente: sexo! Imagens diversas (e meio borradas) de todas as vezes em
que eu e o novinho Albuquerque fodemos. Se tinha alguém que me faria
esquecer meu nome em meio a um orgasmo, esse alguém era o meu sócio.
Quando chegamos à sala dele, Felipe trancou a porta e eu me joguei em
seus braços, agarrando seu pescoço e envolvendo sua cintura com as minhas
pernas. Mas ele não me beijou, na verdade virou o rosto quando minha boca foi
em direção a sua. Felipe sentou no sofá, ainda comigo em seu colo e fechou os
olhos.
— Porra, Gabi! — soltou o ar com força — Eu ainda tenho pau.
— Exatamente por isso eu o quero dentro de mim — rebolei ali, tentando
fazer seu membro ganhar vida. E consegui — Parece que você também quer.
— Quero, mas não posso!
— Quando você estava puto porque pegou a Olga na cama com outro,
me fodeu bem aqui, dizendo que precisava de mim. É a minha vez, Felipe. Eu
preciso de você.
Ele me abraçou e eu achei que cederia, mas seu abraço foi forte e
contínuo, do tipo que é feito para acalentar. Com meu rosto apoiado em seus
ombros, suspirei e me deixei chorar.
— Qual é o problema, Gabi?
— Eu me perdi e quero me achar! — disse entre soluços — E você não
quer me ajudar...
— Gabi, você sabe que não seria nenhum sacrifício foder você, mas essa
não é a solução. Converse comigo, o que houve? Problemas com o seu marido?
— Tudo isso não passa de uma mentira deslavada! — funguei — Ele não
é meu marido. Quer dizer, é, mas não de verdade.
Ele me desencostou e segurou o meu rosto.
— Comece pelo começo.
— O Alexandre me pediu para casar com ele apenas para não perder a
fortuna, eu casei sem querer, bêbada em Las Vegas.
— O filho da puta te forçou a casar?
— É, mais ou menos, foi armação... No fim das constas eu permaneci
porque sou burra.
— Você passa longe da burrice, Gabi.
— Ele pegou a sua Bruna.
— Minha Bruna? Só tenho uma mulher e o nome dela não é esse.
— Hahaha — forcei uma risada — Que engraçado!
— Está com raiva por isso? — Sondou — Mas não era só um acordo?
— O problema não é essa safada, até foi... Mas tem coisa pior: a Yasmin.
— Porra, depois diziam que eu era o mulherengo que não prestava —
resmungou.
— A Yasmin é o amor da vida dele, mas morreu há muitos anos e eu não
posso competir com uma defunta!
Ele me olhou surpreso e demorou alguns segundos até falar.
— Você está apaixonada...
— E me odeio por isso — esbravejei — e odeio ainda mais o Alexandre
por não retribuir... E o pior é que não posso odiar minha rival porque ela está
morta!
— Caralho! Fodeu muito... Não sou uma das meninas da quadrilha e não
sei o que te dizer agora... Mas pelo pouco que vivi do amor, aprendi que ele é
complicado. Porém, vale a pena. Minha história com a Aline era meio torta, mas
hoje é o maior motivo da minha felicidade.
— Isso não está me ajudando! — As lágrimas insistiam em molhar meu
rosto.
— O que eu quero dizer é que você deveria conversar com ele
francamente. Confessar como se sente.
— Vocês homens são burros demais! Eu já tentei Felipe... Mas acima de
tudo eu me amo e não posso, depois de descobrir o que é estar apaixonada,
permanecer ao lado de um homem que ama outra mulher. É injusto comigo. Eu
nunca me perdoaria...
Saí do seu colo e sentei no sofá, deixando todas as lágrimas que eu
suspendi o dia todo virem à tona. Xinguei Deus e o mundo, usando cada
palavrão do meu vasto repertório e falei até me exaurir.
— Os últimos meses têm sido intensos para você, por que não tira férias
de tudo? — Sugeriu.
— Quero ir para casa, estou começando a ficar enjoada...
— Eu levo você.
— Amo você, moleque! — Beijei seu rosto com carinho.
— Também amo você, Gabi. E da próxima vez que me pedir para foder
você, me dá tempo para incluir a Aline que tá tudo certo! — Piscou.
— Combinado! — Sorri.
Parecia que esse dia tinha durado quarenta e oito horas, eu estava
exausta. Dirigindo o meu carro, Felipe me conduziu até o apartamento que o
imbecil decorou para mim. Estar ali me fez lembrar que esse nunca seria o meu
lar... Por enquanto teria que servir. Me arrastei até o quarto e assim que encostei
na cama, apaguei.
No fim das contas, por causa de um problema para pousar em São Paulo,
só consegui chegar na madrugada. Eu aguardava no seu quarto, sentado na
poltrona ao lado da cama. Gabriela dormia serena. Seus traços perfeitos e
delicados compunham o retrato de uma bela mulher, mas era quando estava
acordada que ela hipnotizava.
Não somente pelo corpo escultural, que já cansei de dizer que o quanto é
fantástico, a mulher tinha um par de seios e uma generosa bunda. Bunda capaz
de fazer você assinar um papel em branco só quando ela andava rebolando a sua
frente. A mesma que me fez brochar apenas com a lembrança de que não era ela
ali, se esfregando em mim.
Além disso, a Gabi exalava energia viva. Ela emanava força,
determinação, desejo, ardor. E era isso que eu admirava nela.
Como eu não enxerguei essas coisas todas antes?
— Sempre foi você! — O som da minha voz preencheu o quarto e
Gabriela gritou ao acordar assustada.
— Mas que porra! — soltou um tempo depois, ao constatar a minha
presença ali. — Você não deveria acordar as pessoas assim.
— Eu precisava falar com você.
— E não poderia fazer isso quando eu estivesse acordada? — Arqueou a
sobrancelha — de preferência tocando a campainha para anunciar a sua
presença?
— Tem razão — cocei a cabeça — mas eu trouxe café da manhã —
apontei para a bandeja
— Até São Paulo? — indagou desconfiada — Não estou com fome...
Não vou nem perguntar como você conseguiu entrar aqui...
— Então podemos pular para a conversa que me trouxe até aqui.
— Alexandre, eu não quero ouvir... — Sua voz falhou.
— Mas eu preciso falar!
— Procure um terapeuta! — Rebateu ficando de pé, estava usando uma
camisa enorme branca, que chegava até as coxas. — Ele é a pessoa indicada para
ouvir você.
Saiu pisando firme em direção ao banheiro. Alguns passos depois a
alcancei e invadi o banheiro, ela fazia xixi, recostado na pia, completei:
— Eu não preciso da droga de um terapeuta para confessar que estou
apaixonado por você! — Disse irritado. Os olhos de Gabriela se arregalaram em
clara surpresa.
Eles pareciam dois faróis apontando a direção que eu deveria seguir. Sua
boca abriu e fechou por diversas vezes, parecia que ela havia perdido a
capacidade de falar. No que pareceu uma eternidade depois, ela pareceu acordar
do estado de torpor e se mexeu. Livrou-se das peças de roupa e entrou no boxe.
— Ok, eu vou esperar você acordar!
— Eu falava sério quando disse que precisava de um tempo, não precisa
dizer o que acha que eu quero ouvir — disse quando a água escorreu pelos fios
loiros.
— Eu também falava sério quando disse que sempre foi você! De um
jeito que eu não sei explicar, quando me vi diante do testamento foi o seu nome
que eu pensei no primeiro momento. E alguns meses depois, estou constatando
que estou apaixonado por você. E você também está apaixonada por mim... E eu
não aceito o seu pedido de tempo. Não quando tudo parece estar finalmente se
organizando.
— Se organizando para quem? — Sorriu tristemente, me encarando
através do vidro molhado.
— Para nós!
— Alexandre, eu não posso mais ser o objeto que você desfruta de bons
momentos e evita nos minutos seguintes... — Fiz menção de falar, mas ela me
impediu com o olhar — Hoje você acordou e decidiu que está apaixonado por
mim. Amanhã você está andando na rua, encontra a Bruna e transam. E foda-se a
Gabriela!
— Não vai haver Bruna! — invadi o boxe e toquei seu rosto
delicadamente — Nem Yasmin se é o que você está pensando... A Yasmin foi a
primeira mulher que amei na minha vida e eu achei que não sentiria mais nada
dessa forma até te conhecer...
— Eu não nasci para ser prêmio de consolação.
— Quem disse que é isso que você é para mim?
— Suas ações, Alexandre. — Encarei-a sem entender — Você acha que
gosta de mim porque fui a única a embarcar na loucura que foi esse casamento
de mentira. Mas eu estou caindo fora! Eu não posso pedir que me ame, mas
posso impedir que me magoe.
— O que eu preciso dizer para você entender de uma vez por todas que
você é importante para mim?
— Mais ações que palavras é um começo.
— Isso significa que...
— Conte a verdade ao seus pais e peça a anulação do casamento.
— Isso é ilógico, Gabriela.
— Eu perdi a minha capacidade lógica quando me apaixonei por você e
olhe onde estou.
Tomei a sua boca num beijo urgente e lascivo. A água, mais uma vez,
banhava um momento decisivo. Livrei-me da camisa que, ensopada, grudava na
minha pele. Sem desgrudar da minha boca, ela fez com que o resto das roupas
caíssem num baque surdo no chão molhado.
Meu corpo reagiu a ela de imediato, se arrepiando a cada toque úmido.
Beijei seu pescoço afastando-a dos jatos mornos, ela correspondeu colocando
uma das pernas ao redor da minha cintura. Ergui seu corpo, apoiando-o contra a
parede e invadi sua boceta que estava tão molhada quanto toda aquela situação.
— Não se afaste de mim — pedi enquanto tomava o que sempre me
pertenceu — sou incapaz de viver sem você — ela me calou com um beijo
quente, puxando meu cabelo, como se me punisse pelo pedido.
Quando afastei nossas bocas, enxerguei através dos seus olhos todo o
desejo que ela sentia, mas também havia temor.
— Vamos fazer do seu jeito — arremeti mais uma vez — vai dar tudo
certo! — prometi, indo fundo dentro dela.
Quando ela gozou, gritou tão alto que impulsionou o meu próprio gozo,
antes que eu pudesse controlar. Quando encostamos nossas testas úmidas, eu me
senti muito bem, como não me sentia há anos.
Era impossível manter a coerência quando Alexandre estava próximo.
Era ainda mais impossível manter-me indiferente quando ele tocava a minha pele
com as suas mãos firmes e grandes. Sempre fui movida ao toque, mas o dele em
especial, me causava um frenesi a mais. Era quase inebriante quando a sua boca
tomava a minha com a fome e o desejo, que meu corpo desejava. Era cada vez
mais delirante quando nossos corpos se encaixavam.
Tudo isso pode explicar o motivo para o meu coração errar o compasso
quando ele falou que estava apaixonado. E eu acreditei. Embora não viesse a
confessar, acreditei por tantos motivos, mas o principal deles era simples: eu
queria acreditar que era verdade. Queria realmente acreditar que ele correspondia
aos meus sentimentos.
Merda! Sei que estou parecendo uma imbecil apaixonada e isso me
deixava puta da vida. Saio do boxe apressada, deixando-o para trás, depois da
nossa foda molhada.
— O que eu fiz de errado dessa vez? — A voz grave do Alexandre
preencheu o quarto e eu o ignorei fingindo estar concentrada em busca de uma
roupa no closet. Escutei seus passos aproximando-se de onde estou e meu
coração acelerou com a sua proximidade — No que você está pensando,
Gabriela? Divide comigo... — pediu num tom que assemelhava a uma súplica. E
meu corpo me traiu ao não conseguir ignorá-lo por mais tempo.
— Nas minhas amigas... — Digo, enquanto passo uma camiseta branca
pela cabeça, para depois vestir um short jeans rasgado, e não deixa de ser
verdade.
A quadrilha de salto alto e gloss foi meu bálsamo quando cheguei em
São Paulo completamente desnorteada. Em meio a risadas e lágrimas, sol,
piscina e um almoço delicioso na mansão dos Albuquerques, elas chamaram a
minha atenção para alguns detalhes.
Segundo elas, o que eu sentia não era apenas raiva ou frustração por não
estar sendo correspondida pelo Alexandre, mas algo bem mais profundo. Eu
admiti a minha paixão, mas elas diagnosticaram amor. Me assustei inicialmente,
mas contra fatos não havia argumentos. Sim, era amor! O tal sentimento intenso
do qual eu jurava estar imune. Nunca sonhei em casar, ter filhos ou constituir
família, pelo contrário, sempre fui contrária a esses ideais impostos pela
sociedade.
Todavia, algo mudou dentro de mim. Ainda continuava acreditando que
para ser feliz você precisa primeiro se amar e que a felicidade não estava
atrelada a outrem. Mas ter uma amostra grátis, ainda que confusa, disso me fez
querer mais.
Eu nunca quis dar meu coração de bandeja para ninguém e odiava essa
sensação de vulnerabilidade e impotência que o amor trazia. Juro que tentei não
deixar que isso acontecesse, mas em um dia qualquer que não sei precisar, deixei
de compartilhar apenas meu corpo e acabei entregando meu coração a um
homem que não sabia como retribuir.
— Humm... — hesitou — Suas amigas devem me odiar.
— Com toda a certeza do mundo! — Concordei, sorrindo.
— Fernanda já deixou isso claro... — coçou a cabeça.
— Não estou surpresa... — Era bem típico da Fernanda assumir nossas
dores e partir para o combate. Foi assim quando o noivo da Sol rompeu o
relacionamento, o que resultou em um nariz quebrado. — Mas, se ela te
procurou, você deveria ao menos ter um hematoma visível. — Arqueei a
sobrancelha sorrindo.
— Eu estava usando armadura. — Sorriu.
— Foi por causa dela que você veio?
— Se eu disser que as palavras dela não ajudaram a entender o que sinto
por você, estaria mentindo — Alexandre aproximou-se lentamente de onde
estava e eu recuei dois passos até minhas costas tocarem o armário atrás de
mim.
Ele parou, como se entendesse que eu precisava daquele pequeno espaço
físico. Meu ex-atual-pseudo-marido usava apenas uma toalha preta enrolada na
cintura e gotas de água escorriam por seu cabelo curto, seguindo uma trilha até
seu abdômen definido.
— Mas a grande verdade é que estou aqui porque eu quero você! —
completou um tempo depois e acrescentou — Eu não sei o que fazer para que
você acredite em mim, mas estou disposto a rastejar se assim você desejar —
fitou-me longamente.
Permaneci em silêncio por alguns segundos, enquanto meu corpo, se
acostumava com a sensação provocada por suas palavras.
— Vamos tomar café — disse passando por ele apressada em direção a
cozinha, escutei seus passos vindo atrás de mim, parei e quase nos chocamos —
Você precisa vestir uma roupa! — percorri seu peito nu e quase me perdi mais
uma vez naquele belo corpo.
— Algum problema com o meu corpo? — Ergueu a sobrancelha
sorrindo.
— Todos! — rebati — Não consigo pensar direito com você assim —
Admiti frustrada.
— Talvez pensar não seja a melhor solução para nós — tocou meu rosto
delicadamente — só por hoje, poderíamos apenas viver sem pensar em nada —
seus lábios tocaram o meu pescoço e eu arfei com o toque — Apenas eu e você...
Eu estava quase me deixando envolver pelas suas palavras e seu toque
carinhoso quando o toque do interfone soou alto e insistente. De início,
ignoramos e permanecemos colados, sua boca provocando meus lábios num
toque deliberadamente lento, minhas mãos enlaçadas em seu pescoço.
— Alê... — arfei quando ele mordiscou meu lábio inferior...
— Eu e você... — sussurrou.
Eu estava inebriada com todas as emoções, não importava se o interfone
continuasse chamando insistentemente, nem se a esse barulho incomodo agora,
fosse somado a campainha estridente do meu apartamento. Era fácil esquecer a
vida lá fora quando Alexandre me beijava, ele sabia usar a língua como poucos,
mas os toques insistentes da campainha e interfone me incomodaram. Eu estava
pouco me fodendo para quem estivesse do outro lado, mas bateram com tanta
força contra a porta que era impossível continuar ignorando a insistência.
— Acho melhor ver a porta... — gemi de frustração. — Mas, que porra!
— As batidas aliadas ao toque da campainha estavam soavam cada vez mais
alta.
— Você está esperando visita? — indagou.
— Não! — neguei — E mesmo que eu estivesse, nenhum desconhecido
pode subir sem a minha autorização. Se bem que você invadiu meu apartamento
— balancei a cabeça — Enfim, vou ver quem é! — Seja lá quem fosse do outro
lado, eu dispensaria imediatamente.
— Pai? — Indaguei num tom agudo quando o vi parado do outro lado
seguido da sua ninfeta.
— Desde quando eu preciso de autorização para visitar minha filha? —
bufou irritado e quando seus olhos notaram o Alexandre parado de toalha na
minha sala, eu tive certeza de que se meu pai tivesse uma arma naquele
momento, atiraria.
— Eu não sei do que você está falando...
— O seu marido ordenou que ninguém entrasse sem a prévia autorização
dele! — rosnou — Esse é o tal ex-marido? — apontou para o Alexandre.
— Você fez isso? — arregalei os olhos — Você invade meu apartamento
e ainda por cima sai dando ordens? — indaguei irritada.
— Calma — disse num tom sereno — Eu meio que deixei claro que não
deveríamos ser incomodados... Não contava que seu pai fosse aparecer aqui.
— Ele invadiu o seu apartamento? — meu pai indagou alto — Vamos
ligar para a polícia! — disse com o celular em mãos pronto para discar.
— Não! — discordei pegando o celular dele — está tudo bem, pai. —
Busquei tranquilizá-lo e ele me olhou descrente — E você — apontei para o
Alexandre — Depois falaremos sobre esse seu comportamento.
— Essa cena parece com as do meu núcleo da novela, uma família
tipicamente brasileira repleta de discussões acaloradas! — A atual esposa do
meu pai sorriu abertamente um sorriso digno de comercial de creme dental —
Prazer, sou a Dafne Figueiredo, atriz e madrasta da Gabriela! — estendeu a mão
para Alexandre.
— Alexandre Fragoso, empresário e companheiro da Gabi — aceitou a
mão estendida e com o movimento a sua toalha quase caiu.
— Será que não dá para você vestir uma roupa ou você costuma andar de
toalha por aí? — Meu pai indagou, irritado.
— Na minha casa, costumo andar nu! — rebateu sorrindo.
— Eu também, né amor? — Dafne indagou trocando um olhar com o
meu pai e eu não contive o revirar de olhos — É libertador andar como viemos
ao mundo...
— Agora que todos já puderam contemplar o belo exemplar de homem
que você é, será que você poderia vestir uma roupa? — Bufei irritada.
— Pedindo assim com jeitinho... — sorriu — Se vocês me dão licença,
vou me vestir.
— Vá e volte logo, temos muito o que conversar — meu pai avisou antes
de o Alexandre se afastar. Dito isso sentou-se no sofá acompanhado da mulher e
eu permaneci de pé.
— O que vocês fazem aqui? — fui direta ao assunto, pois queria o
quanto antes terminar esse drama familiar.
— Querida, você estava deprimida e seu pai preocupado, então...
— Eu não estava deprimida! — rebati.
— Claro que estava — meu pai discordou — ninguém permanece imune
ao fim de um relacionamento, nem mesmo um Burnier.
— Quem te contou? — Eu ainda não havia dito ao meu pai o motivo que
me fizera retornar a São Paulo. O olhar que me lançou significava que a minha
mãe já havia passado o relatório — Era óbvio que minha mãe ligaria!
— Ela não fez por mal. Estava preocupada com você...
— Por isso estamos aqui, querida — Dafne tocou a minha mão — para
dizer que nos sensibilizamos com a sua dor.
— E, óbvio, garantir que um bom advogado auxilie nesse processo de
divórcio. — Meu pai, assim como eu, era objetivo.
— Amor... — Dafne repreendeu — Agora não é hora de falarmos sobre
divórcio, você não vê que eles estão se acertando?
— Estão? — Ele arqueou a sobrancelha
— Estamos tentando... — dei de ombros.
— Eu sabia! — Dafne bateu palmas animada — Eu sabia que uma hora o
seu final feliz ia chegar!
— Eu sou o seu final feliz, amor? — Alexandre perguntou, passando o
braço ao redor do meu corpo e puxando-me para si.
— Ele é, Gabi? — Meu pai nos fitou longamente.
— Eu nunca gostei de contos de fadas! — Dei de ombros novamente.
— Te faltava um príncipe encantado — Alexandre, nada modesto,
pontuou.
— Você é, o meu príncipe? Porque está mais para sapo! — Afastei seu
braço.
— O sapo sempre vira príncipe no fim da história. — Rebateu sorrindo.
— Não fode, Alexandre! — rebati e ele gargalhou alto — Qual a graça?
— A sua escolha de palavras, querida! — Sorriu maliciosamente.
— Imbecil!
— Típico casal de novela das sete! — Dafne citou com as suas
referências televisivas.
— Que inferno de dia! — joguei-me no sofá levando as mãos ao rosto.
Queria poder me teletransportar para um lugar longe de madrastas e maridos
imbecis.
— Amor, acho que a Gabi e o seu marido querem ficar sozinhos!
— Até que enfim, você falou algo concreto — soltei.
— Já estamos de saída, mas antes... — sempre tinha um “mas” — Você
ama a minha filha? — meu pai foi direto ao ponto e permaneci com a mão no
rosto para evitar ainda mais constrangimento.
O silêncio imperou na sala por alguns segundos, como em cena de novela
na qual a verdade será revelada e todos permanecem emudecidos até alguém
romper o silêncio. E esse alguém fui eu.
— Não é da conta de ninguém! — Levantei do sofá e marchei em direção
a porta — Já passei da idade para o senhor se preocupar com quem eu me
relaciono, agora pelo amor que o senhor jura ter por mim pai, vai embora! —
supliquei.
— Não sem antes eu responder à pergunta do seu pai — Alexandre
finalmente abriu a boca.
— Alexandre, por favor...
— Quando vi a Gabriela pela primeira vez, ela estava acompanhada da
Fernanda, foi numa boate... A primeira vez que nossos olhos se encontraram eu
soube que Gabriela era daquelas mulheres que você jamais consegue esquecer
— eu precisei me recostar na porta, pois minhas pernas fraquejaram. Mas, que
porra, Gabi! — ela é uma energia pulsante daquelas que chegam e irradiam
qualquer lugar, por mais sombrio que seja. Ela trouxe alegria aos meus dias,
sorrisos a minha vida e uma sensação que eu acreditava nunca mais sentir. Se
isso é amor... — coçou a cabeça sorrindo, seus olhos estavam marejados ou
seriam os meus? — Eu não sei dizer. Só sei que eu quero estar do lado da sua
filha, compartilhar da sua risada e da sua presença pelo tempo que ela permitir.
— Acredite nesse homem experiente — meu pai sorri contente — isso é
amor! Faça a minha filha a mulher mais feliz desse mundo. Ela não merece
menos que isso. — Tocou o ombro do Alexandre.
— Será a minha missão de vida — Alexandre respondeu encarando-me.
— Gostei dele — meu pai me abraçou apertado e sussurrou ao meu
ouvido — faça ele rastejar aos seus pés, honre o sobrenome da família.
— Te amo! — Beijei seu rosto.
— Seu marido seria um perfeito mocinho de novela! — Dafne abraçou-
me.
— Eu sei... — concordei sorrindo.
Quando fechei a porta atrás de mim, suspirei. Eu havia sobrevivido.
— Vamos comer na rua! — Alexandre anunciou sorrindo.
E meu coração bateu em disparada. Será um longo dia...
Passava das dez da noite quando chegamos à Spicy. Esse era o nome que
estava gravado no cartão que a misteriosa mulher tinha me entregado na
academia, desde que li o nome que significava “picante”, “apimentado” escrito
em letras cursivas no cartão preto, era como se realmente eu sentisse algo arder.
Em aço inoxidável, também em letras cursivas, a palavra estava fria e imóvel
sobre as portas duplas, de madeira pesada, que impedia a nossa entrada. Antes
que eu pudesse bater ou tocar a campainha disponível, as portas se abriram
devagar, em uma declaração óbvia de que éramos bem-vindos. Alexandre
apertou a minha mão enquanto dávamos os primeiros passos para a recepção do
lugar.
A cada passo que eu dava, a excitação aumentava. Apresentei o convite
na recepção e prontamente fomos conduzidos para o primeiro ambiente. A
atmosfera mudou completamente quando adentramos ao que parecia ser um bar
comum, mas as luzes baixas, os garçons apenas de cueca e gravata, bem como as
garçonetes de lingerie e saltos, indicavam que não era um simples bar. Havia
vários postes de pole dance espalhados pelo ambiente, com a clara intenção de
que qualquer pessoa poderia ser protagonista.
Alexandre me conduziu até um sofá preto de couro, no canto. Havia uma
mesa redonda e vermelha em frente a ele, para apoiar bebidas. Ou uma mulher
de pernas abertas, já que o pé era feito de aço e fixado no chão. Sentei-me já
empolgada, olhando ao redor. Quando os nossos olhares se cruzaram, notei que
ele precisaria de um incentivo para relaxar.
Toquei o seu rosto, passando os dedos da minha mão direita por sua
barba rala. Deixei a minha língua sair da minha boca e lambi seus lábios
fechados.
— Relaxa... — suguei seu lábio superior.
Ele segurou minha cabeça e aprofundou o beijo, sua língua indo fundo
em minha boca, ditando o ritmo. Querendo mostrar quem estava no controle...
Ah, homens. Facilmente manipuláveis. Minha mão desceu até o seu colo e
constatou sua ereção que já dava sinal de vida, cheguei até o botão da sua calça,
mas ele segurou meu pulso quando ouviu um gemido que não pertencia a mim.
Bem ao nosso lado, uma mulher nua estava ajoelhada entre as pernas de
um homem, pagando boquete. Era dele que vinham os gemidos.
— Estava prestes a fazer o mesmo, mas você me impediu... — dei de
ombros fazendo-o olhar para mim.
— Não é como se eu nunca estivesse estado em um lugar com pessoas
transando... Só que não com a minha mulher!
— Se os maridos e esposas escutassem seus próprios desejos e os dos
seus companheiros, mais casamentos durariam, ou pelo menos, o número de
fiéis.
— Tanto faz... Já cumpri a minha promessa. Podemos ir transar em casa
agora?
— Ah, não. Eu nem comecei e eu bem sei que você está de pau duro —
sussurrei e lambi a orelha dele.
— Tudo bem, preciso de um Whisky. Ah, eu estou com a habilitação
suspensa.
— Droga, serei a babá de várias rodadas. Pelo menos ficarei com seus
carros — sorri, fazendo sinal para que o garçom super gostoso viesse nos
atender.
— Prefiro a garçonete! — Ouvi-o reclamar.
— Um Whisky puro e um coquetel de frutas sem álcool, por favor —
pedi para o garçom que sorriu antes de se afastar. — Prefere a garçonete, é? Por
que ela está com menos roupa que eu? — perguntei ficando de pé e apontando
para o meu vestido curto preto de bandagem.
— Não ouse...
— Oi? Não ouvi o que disse — fui me afastando dele e me aproximando
do pole dance mais próximo de nós.
Ele me encarou, estreitando os olhos, quando eu segurei na barra de ferro
fria com as duas mãos. Movimentei as mãos para cima e para baixo, como se
masturbasse um pau gigante e abri a boca, para provocá-lo. Segurando no
mastro, desci até o chão, abrindo as pernas. O vestido colado subiu e ele não via
minha calcinha porque o poste estava entre as minhas pernas. Eu havia
participado de uma aula experimental de pole dance, portanto seria suficiente
para provocar.
Girei algumas vezes, de maneira provocante e, em seguida, prendi uma
perna e me inclinei para trás, esticando os braços e me mantendo firme por
alguns segundos. Meu showzinho havia atraído a atenção de alguns clientes,
homens e mulheres. Uns olhavam discretamente, outros claramente pretendiam
me convidar para alguma festinha particular. Eu já estava quente, excitada e
louca para sentir mãos sobre mim... Fiquei de pé, abri as pernas e desci até a
base do poste, fazendo minha bunda ficar para cima, já sem o vestido, que havia
subido de vez. O ar-condicionado frio arrepiou minha pele suada, mas logo um
tapa ali esquentou tudo.
Até que demorou.
Estava para nascer alguém que conseguisse extrair os meus extremos tão
bem quanto ela. Em segundos ela me levava do êxtase ao chão. Da irritação ao
prazer e, principalmente, o contrário disso.
Gabriela Burnier, por sorte Fragoso, me tirou do sério com frequência ao
longo da nossa conturbada relação. Mais do que qualquer outra mulher, ela
invocava meu lado mais possessivo e irracional. O que só fazia despertar o seu
lado mais liberal, além de trazer à tona sua feminista interior. E quando ela saia
para a batalha, era difícil domar o meu homem das cavernas.
Foi querendo evitar mais uma dessas batalhas, que me obriguei a
acompanhá-la em uma casa de sexo. Imagino que vários homens gostariam de
ter uma mulher tão liberal quanto a minha, mas a coisa muda de figura quando
você imagina que será real. Que outras mãos tocarão seu corpo com o meu
consentimento, outra boca sugará os bicos rosados e duros dos seus seios, outro
pau se enfiará entre as suas pernas... Não, não suportaria ver isso. Agora dava
para entender o motivo pelo qual o Marcos se irritava tanto quando eu
mencionava um ménage com a Fernanda, lembraria de nunca mais torturar o
meu amigo dessa maneira.
Mantive-me tenso durante o trajeto até o sofá de couro preto, sem me ater
aos detalhes do ambiente. Estava nítido apenas que a pouca iluminação dava a
sensação de sexo iminente e se eu estivesse sozinho, com certeza apreciaria
muito receber um boquete de uma desconhecida imediatamente. Mas esse
pensamento só me levou a crer que a Gabriela poderia fazer isso com qualquer
um ali, o que elevou minha raiva em alguns graus.
Ela deve ter sentido a mudança na minha postura ou a minha cara não
estava das melhores, porque veio toda mansa me dar um beijo que quase me fez
esquecer de tudo. Quase, porque um gemido masculino me trouxe de volta a
realidade. Ao nosso lado, uma morena de lingerie estava entre as pernas de um
careca barrigudo.
Para tentar me relaxar ela chamou um garçom, imbecil e previsível, que
usava apenas cueca preta e gravata borboleta, pensei alto que preferia a
garçonete, mas parece que meu pensamento foi alto demais, pois ela ouviu e
decidiu dar o troco.
Em um maldito poste de pole dance.
Puta sacanagem. Meu pau respondeu quase instantaneamente, ficando tão
duro quando o mastro que ela usava para me provocar. Me olhando nos olhos,
subindo, descendo e rebolando, ela me torturava e me deixava louco. Fiquei
vidrado assistindo a cena, analisando cada detalhe daquele corpo perfeito que se
remexia e me provocava ondas de calor e excitação, até que em sua última
abaixada o vestido subiu de vez revelando uma calcinha fio dental preta e muitos
outros espectadores atentos e loucos pela minha mulher.
Minha!
Fui de encontro a ela, vendo de perto sua vulnerabilidade com a bunda
arrebitada. Sem pensar, ergui a mão e bati com força, transmitindo no gesto todo
o misto do desejo e frustração que eu sentia. Inclinei-me sobre ela, até chegar em
seu cabelo, encostando meu pau em sua bunda. Segurando os fios loiros, fiz com
que ficasse de pé, colada a mim. Ela se esfregou, safada, deixando claro que
havia calculado cada passo. Mordi sua nuca e lambi em seguida, aliviando a
pressão dos meus dentes.
Eu poderia fodê-la ali, de pé, encostada no poste. Seria rápido e firme,
minhas bolas bateriam em seu corpo, porque eu iria bem fundo. Era exatamente
o que ela queria, mais ainda, estava nítido que ela gostaria que mais alguém,
qualquer um daqueles que assistiam, participasse. Mas a minha raiva e a certeza
da manipulação ainda me deixavam com resquícios de lucidez, por isso tiraria o
holofote daquele corpo gostoso.
Com uma mão segurando firme em seu cabelo, usei a outra para tapar
totalmente sua boceta quente. Sobre a calcinha, usei minha mão grande como um
tapa sexo, mas dei o que ela queria deslizando meu dedo médio para dentro.
Escorregadia, ela me recebeu abrindo as pernas. Sem soltá-la, trouxe seu corpo
de volta para as luzes amenas, inclinando-a sobre a mesinha onde estavam
nossas intocadas bebidas. Livre-me rapidamente de todas as minhas roupas,
atraindo o olhar feminino e provocando o desinteresse masculino, afastei a sua
calcinha e invadi sua boceta por trás.
Firme.
Sem dó.
Até o fundo.
Fazendo-a se inclinar e gritar, surpresa.
Gabriela segurou firme na borda da mesinha redonda e eu segurei ainda
mais firme nos seus peitos, por cima do vestido. Apertei e fodi, fodi e apertei.
Pelo máximo de tempo que eu pude, buscando dentro dela vários ângulos,
rebolando e buscando o ponto que a faria estremecer. Ela aguentou firme,
retardando o orgasmo ao máximo, os dedos das mãos estavam brancos de tanto
apertar a mesa quando finalmente senti sua boceta me apertar, permitindo que eu
me soltasse, mordendo seu ombro, algumas estocadas depois.
Saí de dentro dela, ainda semiereto. Gabriela se virou e ao me ver
completamente nu, estreitou os olhos.
— O que foi? Só fiz o que você queria.
— Quase... Faltou incluir pessoas.
— Podemos resolver isso logo, logo. Já viu quantas mulheres estão
olhando para cá nesse momento?
Ela olhou em volta e me encarou.
— Boa jogada, tio.
— Vamos continuar? — perguntei tocando meu pau devagar. Gabriela
pensou um pouco, me olhando.
— Vou deixar passar hoje. Mas, tenho uma sugestão de um casal para
uma brincadeirinha interessante. Vista-se, vamos para casa!
— Tem certeza? Aquela ruiva ali já acenou duas vezes...
— Vista-se antes que eu decida achar um homem gostoso para você me
dividir! — Bufei e juntei as minhas roupas.
— Sobre esse tal casal que ronda sua mente impura, vamos conversar
calmamente sobre isso...
Ela gargalhou e flertou com o garçom enquanto pedia a conta.
Assim que chegamos em casa, subimos para o nosso quarto. Aquele com
o closet, que já foi meu, já foi dela e em acordo mudo firmado agora com o
olhar, seria nosso. Notei que ela estava desconfortável, mas não sabia
exatamente com o quê.
Acho que dividir espaço estava sendo mais difícil para ela do que para
mim, afinal. Quando entramos no quarto, depositei carteira e celular no criado
mudo e me joguei na cama, observando-a. Gabriela largou a bolsa na poltrona e
fugiu para o closet, saindo de lá com o que provavelmente seria a camisola que
me mataria do coração em três segundos.
— Onde vai? — Perguntei quando ela passou pela frente da cama sem
me olhar.
— Tomar banho.
— Gabi... — ela parou. — Vem cá.
— Vai ser um banho rápido... — dei um salto da cama e parei na frente
dela.
— Me beija — pedi chegando perto.
— Você está pedindo? — ela riu.
— Estou precisando ser mais persuasivo...
Conquistei sua boca devagar, usando a língua para acariciar os lábios que
se abriram rapidamente. A calmaria que tentei transmitir lembrou-me da primeira
vez em que a pedi em casamento. Ali, eu acreditava que manipular sua emoção
faria com que ela cedesse.
Aqui e agora eu pretendia apenas fazê-la sentir-se confortável em estar
comigo além da foda firme. Eu desejava mostrar, ao invés de falar, o quanto os
meus sentimentos e desejos para com ela tinham evoluído. Queria mostrar que
adoro ser o homem que transa de pé no box do banheiro, mas que poderia
proporcionar-lhe também orgasmos intensos com um papai e mamãe na cama.
Ela retribuiu o beijo, abrindo a boca. Sugando, explorando e tentando
drenar a minha calma. Toquei seu corpo de maneira firme, porém lenta, passando
as mãos pela sua bunda, fazendo-a empinar o corpo, impondo os seios contra
mim. Fiz pressão e levantei o seu corpo, ela passou as pernas ao meu redor,
facilitando minha caminhada até a cama. As roupas que ela segurava ficaram
pelo chão.
Deitei-a com gentileza e me livrei da minha camisa polo. Os olhos dela
brilhavam, encarando os meus e eu senti vontade de sorrir. Ela segurou a barra
do vestido curto, pronta para tirá-lo, mas eu faria questão de desembrulhar o meu
presente loiro.
— Deixa que eu faço isso — empurrei o vestido colado pelo seu corpo,
retirando pela cabeça.
Ela estava sem sutiã, os bicos já duros pedindo atenção. Lambi devagar,
usando a ponta da língua para arrodear a aréola e percorrer a distância entre os
dois. Repeti o gesto lento e Gabriela segurou minha cabeça, empurrando o peito
na minha boca. Suguei ritmicamente, intercalando com o passar de dentes para
atender sua vontade.
— Mais forte! — Ordenou.
— Calma... — Pedi.
Percorri o vale entre os seios e desci a língua até o umbigo, beijando ali,
propositadamente devagar. Gabriela abriu as pernas e elevou o quadril, mas usei
o braço para impedir os seus movimentos.
A calcinha preta que ela usava era mínima, com tiras finas que pediam
para serem destruídas com os dentes, mas tirei-a devagar. Sempre fui fã de
bocetas. Era impossível contar quantas vezes eu as chupei ao longo da minha
vida, são incontáveis, ainda mais se considerarmos o meu sistema de fodas.
Todas me agradavam, independente de depilação ou cor, eu sempre amei o gosto
que ficava na minha língua depois de uma boa chupada. Com a Gabriela não era
diferente, sua boceta me agradava tanto que me enchia a boca d'água apenas com
o cheiro. Totalmente depilada e quase sempre molhada para mim.
Abri espaço ali com os dedos e lambi com a ponta da língua. Ela respirou
fundo. Com o meu dedo indicador espalhei seu líquido por toda boceta, até a
entrada do seu cuzinho. Ela estava impaciente, mas eu não tinha a menor pressa.
Aproveitaria cada segundo de adoração. Suguei seu gosto quando enfiei minha
língua dentro dela e posso dizer que me apaixonei um pouco mais quando ela
gemeu meu nome.
Eu a queria tanto que as palavras ficavam sufocadas em minha garganta,
formando um nó que me impedia de respirar. Respirei fundo quando me afastei,
usando os dedos para preencher o vazio entre suas pernas. Ela pingava.
Abri a minha calça, abaixei a cueca e senti o meu pau mais duro do que
mais cedo na boate. Substituí meus dedos por ele, entrando devagar. Centímetro
por centímetro. A consciência de que estava fazendo amor pela primeira vez com
a minha esposa acelerou meu coração. Quando entrei inteiro, parei de me mover,
sentindo os sentimentos aflorarem. Era uma delícia tê-la quente embaixo de
mim, mas a sensação de sufocamento persistia. Meu coração estava disparado e
eu precisei beijá-la em busca do seu ar. Ela me beijou devagar, como se oxigênio
demais pudesse me matar ali mesmo.
Aos poucos, eu me mexi, saindo e entrando... Explorando uma nova
maneira de tê-la. Gabriela ficou quieta, de pernas abertas, recebendo os meus
gestos com pequenos gemidos em minha boca. Quando minhas mãos buscaram
seus seios e a minha boca, o seu pescoço, senti uma lágrima tocar minha
bochecha. Os olhos dela que sempre foram de um azul incrível, eram mais que
uma piscina, eram a representação do próprio oceano e se derramava lentamente.
Enxuguei as lágrimas com beijos e aumentei a intensidade das estocadas, o que
fez com que ela erguesse o quadril para me encontrar diversas vezes. O barulho
da nossa respiração preenchia o quarto e logo os gemidos passaram a fazer parte
da sinfonia.
A Gabriela me beijou mais firmemente, segurando minha nuca e eu levei
minha mão direita até o seu clitóris, estimulando devagar enquanto fazíamos
amor. Demoramos muito mais do que em qualquer outra vez, mas ela não tentou
acelerar o meu ritmo, nem mudar de posição. Nos beijamos, nos tocamos e nos
conectamos de uma maneira intensa e extremamente sensual. Quando ela atingiu
o orgasmo foi avassalador, mas não houve sons. Ela estremeceu e me apertou,
sem alarde e eu ainda pude amá-la por mais tempo antes de me liberar dentro
dela.
Não consegui dormir de fato e nem rolar para lá e para cá, como faria se
estivesse com insônia. Cada vez que o sono tentava me embalar, a dor no
abdômen me trazia de volta para a realidade. Não comi nada do que a Carmem
me trouxe, mas ela me obrigou a tomar um suco mais cedo.
Quando não conseguia mais fingir que estava sem sede, abri os olhos e
tentei alcançar o copo do criado-mudo. Mas ele foi colocado em minhas mãos de
imediato, a Carmem continuava no quarto.
— Obrigada — agradeci e voltei a deitar, encolhendo-me de dor. Mas o
movimento me fez sentir o sangue entre as minhas coxas, ultrapassando as
barreiras dos absorventes. Talvez o Alexandre tivesse razão: eu precisava de um
médico. Eu deveria ter marcado consulta com o ginecologista logo depois que
passei mal no mês anterior.
Afastei os lençóis sujos novamente, a Carmem se aproximou para me
ajudar, eu estava prestes a me trocar de novo, mas assim que os meus pés
tocaram o tapete, uma nova onda de dor me atingiu em cheio. Senti o mundo
girar enquanto meu interior era esmagado, ouvi meu nome, mas não deu tempo
de responder. Desabei no chão.
— Por isso esse temporal hoje pela manhã — minha mãe disse assim que
me viu e caminhou em minha direção, para me abraçar. Saí da reunião direto
para a casa dos meus pais — Meu filho vir me visitar espontaneamente é um
verdadeiro milagre.
— A senhora anda muito carente... — sorri e beijei seu rosto. — Pai! —
aceno para ele sentado no sofá lendo a coluna de esportes. Havia tirado o dia de
folga, principalmente quando soube que a reunião do dia era sobre planejamento
estratégico.
— Você não deveria estar numa reunião? — Meu pai franziu o cenho.
— Deveria...
— Mas, não está! — minha mãe olhou feio para meu pai — Nosso filho
está aqui seja lá qual for o motivo. Não quero ouvir nem mais uma palavra sobre
trabalho — assentimos sorrindo — Vou pedir para preparar nhoque que eu sei
que você gosta... — disse animada — Liga para a Gabriela e pede que venha
almoçar conosco.
— Mãe... — toquei seu braço
— Eu conheço esse tom — sua postura enrijeceu — Aconteceu algo com
a Gabriela? O resultado dos exames...
— Calma — pedi e ela respirou fundo — Gabriela já iniciou o
tratamento da endometriose e está tudo bem.
— Ela não vai poder ter filhos, não é? — Meu pai foi direto ao assunto.
— Não se preocupe — minha mãe disse com seu jeito doce — Há
inúmeras crianças aguardando por uma família que as ame.
Ela e meu pai trocaram olhares cúmplices e com essa simples troca de
olhares compreenderam a situação: o herdeiro exigido no testamento.
— Ainda não sabemos — informei e os dois me olharam em expectativa
— Eu não lembro os termos técnicos, mas pelo pouco que entendi não houve
comprometimento do ovário — expliquei — O que indica que ela pode
engravidar. Mas somente uma consulta com o especialista em reprodução irá
garantir. A consulta está agendada para daqui a quinze dias.
— Vai dá tudo certo, meu amor — minha mãe acariciou a minha mão.
— Eu sei — sorrio — É por isso que estou aqui. No caminho do
escritório até aqui, pensei em várias maneiras de contar a verdade.
— Que verdade? — meu pai perguntou.
— Vamos sentar? — apontei o sofá e minha mãe sentou ao lado do meu
pai. — Meu casamento com a Gabriela não seguiu o procedimento normal... —
eles me olharam sem compreender — Não nos casamos porque nos amávamos,
casamos por que era conveniente para mim ter uma esposa — vi a compreensão
surgir no olhar deles e continuei para pôr fim de uma só vez nessa história — eu
havia ensaiado começar com as desculpas, mas eu não aguentava mais esconder
isso de vocês, eu sinto muito! — Completei e esperei a reação dos meus pais,
que não reagem, apenas me olham em expectativa.
— Você a ama? — minha mãe rompeu o silêncio.
— Mais do que eu pensei que fosse possível — confessei.
— Eu fico muito feliz em ouvir isso — ela sorriu — Gabriela é uma
mulher incrível!
— Você não vai dizer nada, pai? O quanto está decepcionado...
— Por que você resolveu contar toda a verdade agora? — perguntou.
— Porque o que eu construí com a Gabriela é mais importante que o
testamento. E ainda que não possamos ter um filho, seremos uma família, pois
ela é a mulher que eu amo e desde que esteja ao meu lado nada importa.
— Está abrindo mão da herança? — meu pai indagou.
— Se esse for o preço para viver com a Gabriela, sim! — respondi
convicto da minha escolha.
— Você conta ou eu conto? — Minha mãe voltou-se para o meu pai.
— Pedimos anulação do documento quando você embarcou para Las
Vegas — a informação me pegou de surpresa.
— O Rafael continuou te investigando e...
— Aquele filho da puta! — rosnei.
— ... E foi por meio dele que soubemos que você embarcou para Las
Vegas acompanhado de um tipo escandaloso — A Tiffany, a mulher que
contratei. — Não podíamos permitir que você casasse com aquela moça.
— Por isso naquele mesmo fim de semana solicitamos a anulação do
testamento. Quando você retornou acompanhado da Gabriela o testamento não
tinha mais nenhum efeito... — meu pai completou sorrindo.
— Por que não me contaram antes?
— Quando aparecemos no dia do seu aniversário estávamos dispostos a
contar, mas assim que vimos a Gabriela e a troca de olhares entre vocês
percebemos que havia mais que uma farsa ali. Havia um sentimento que nenhum
do dois ainda havia se dado conta.
— E por isso sua mãe resolveu que deveríamos permanecer em silêncio.
Ela não parava de dizer que a intuição de mãe dizia que Gabriela era a mulher
que conseguiria ter acesso ao seu coração.
— E eu estava certa — disse confiante — Gabriela conseguiu com seu
sorriso fácil e toda a sua audácia trazer luz para a sua vida.
— Eu... Eu não sei o que dizer.
— Diga que nos perdoa por ter imposto o testamento! — minha mãe
falou com os olhos marejados.
— Eu jamais pensei que poderia dizer isso, mas obrigado! O testamento
foi o que eu precisava para sair da minha zona de conforto, foi graças a ele que
Gabriela entrou definitivamente na minha vida e não sei se sem ele e toda a
pressão eu teria conseguido casar com ela. — Sorri.
— Ela definitivamente é uma mulher incrível — minha mãe sorriu —
Sabe como colocar um Fragoso na linha!
— Amo vocês! — falei fitando-me meus pais.
— Nós que amamos você! — minha mãe falou antes de me abraçar e
logo meu corpo foi envolto por outro braço. Meu pai juntou-se a nós e formamos
um só abraço. O abraço de reconciliação e amor.
Horas mais tarde, na nossa cama, após eu ter mostrado mais uma vez
quem era a dona e proprietária do meu corpo, Gabriela contou-me sobre o
cachorro misterioso. Ela estava indo para a academia quando o viu embaixo de
um ponto de ônibus, tentando se proteger da forte chuva que caía. Na mesma
hora, ela confessou, teve vontade de parar o carro e tirar o cachorro dali, mas o
sinal abriu e ela seguiu para a academia com a imagem do cachorro em sua
mente. Prometera a si mesma que se em seu retorno ele ainda estivesse ali, o
resgataria.
— Quando eu retornei ele estava lá no mesmo lugar como se estivesse
esperando por mim — sorriu — eu só abri a porta do carona e assobiei e ele veio
correndo.
— Eu também não perderia a oportunidade de entrar no carro de uma
loira gostosa — sorri.
— Eu sempre soube que você era um cachorro — perturbou.
— E o que vamos fazer com ele?
— Com o Floquinho? — ponderou.
— Floquinho? — arqueei a sobrancelha sorrindo.
— Alê, quando ele entrou no carro estava todo sujo de lama. Imagina a
surpresa quando o vi saí da sala do pet shop todo branquinho. Daí o nome será
floquinho! A veterinária disse que ele precisa retornar lá para um check-up, mas
eu precisava vim correndo te mostrar. Você gostou dele? — perguntou animada
de uma maneira que eu nunca tinha presenciado.
— Desconfio que o seu amor pelo Floquinho aumentou depois da cena
de outrora... — sorri.
— Floquinho é o meu novo amor — sorriu abertamente — você terá que
dormi no sofá pois ele agora será o dono do lado esquerdo da cama.
— Estou perdendo para um cachorro?
— Ok — soltou o ar — Eu posso amar dois cachorros ao mesmo tempo
— sorriu antes de enroscar-se nos meus braços.
— O que você está aprontando? — Perguntei enquanto acariciava seus
cabelos. Gabriela olhava fixamente para o teto como se sua mente estivesse
longe.
— Na hora certa você saberá — sorriu e depositou um selinho nos meus
lábios — enquanto isso tiozinho, faça valer a sua rara folga do trabalho!
Ela não precisou pedir duas vezes e lá estava eu, duro e pronto para
aproveitar todo o momento ao seu lado.
Hic et Nunc!
Observei, mais uma vez, os traços que compõem a minha tatuagem no
espelho gigante do quarto enquanto aplicava creme hidratante pelo meu corpo, a
fragrância das notas cítricas me fazia pensar em tudo que me aconteceu nos
últimos meses. Passei por mais altos e baixos do que ao longo de toda a minha
vida. E eu não me referia exatamente ao fato improvável de eu estar casada e
planejando ter filhos, mas sim de toda a carga emocional que eu vivenciei em
decorrência desse fato.
Era engraçado pensar que, ao contrário dos casamentos "normais", que
iniciam no céu e acabam, na maior parte dos casos, no inferno o meu seguiu um
script próprio. Digno de novela, como diria minha jovem madrasta. Eu fui do
inferno ao céu: brigas, traições, confissões, lágrimas, sexo, gargalhadas, jantares
inesquecíveis, declarações de amor e uma calmaria que me faz temer por uma
tempestade inesperada.
Essa tempestade nunca chegou ou talvez ela tenha chegado e não causou
tanto estrago, pois estávamos juntos. Cafona para caralho, eu sei, mas era real.
Estar com Alexandre me trouxe a calmaria que eu temia sentir. Acreditava
veementemente que a vida só era verdadeiramente vivida com altas doses de
risco e luxúria. E estou aprendendo ao lado do meu marido experiente que não
há mal em curtir a noite jantando em casa, dormir de conchinha, assistir séries
durante o final de semana e enviar mensagens apaixonadas ao longo do dia.
Alexandre estava me provando que o casamento era mais do que um
contrato entre duas pessoas, era uma escolha voluntária que as pessoas fazem em
prol da felicidade mútua. E isso não tinha nada a ver com o lance de se tornar um
só ou de monogamia, mas se tratava de companheirismo e lealdade, da vontade
de compartilhar cada minuto do seu dia, tanto as alegrias quanto as dúvidas e
tristezas.
Receber o diagnóstico de endometriose tinha me feito pensar muito no
que eu realmente queria da minha vida. Enquanto os exames e consultas
ocorriam, eu pensava em como me sentiria se não pudesse ser mãe. Durante esse
tempo, o Alexandre me apoiou de maneira incondicional e nunca me cobrou
nada. Quando descobrimos quais eram as chances reais de engravidar, decidimos
que deixaríamos as coisas fluírem. O que no nosso caso era bem fácil: foder
sempre que pudéssemos, mas sem nenhuma pressão. Sempre fomos fogo.
— Eu deveria ter me juntado a você no banho — a sua voz grave fez meu
coração disparar. Continuei onde estava, de costas para ele, e espalhei mais
creme pelas minhas pernas. Seu olhar capturou atentamente cada gesto meu e
percorreu o caminho das minhas mãos.
— Pena que perdeu a chance — levei a mão aos seus lábios para fechar a
sua boca aberta. Alexandre foi rápido e segurou-a, sugando meus dedos — Porra
Alê! — repreendi sorrindo.
— O que foi? — Respondeu envolvendo a minha cintura nua.
— Eu te chamei diversas vezes para se juntar a mim no banho, mas você
preferiu ficar de conversinha com o Dan.
Sim, o Dan, tornou-se personal trainner do casal. Meu sagaz marido
entendeu, de uma vez por todas, que eu não deixaria de ter um personal gato, só
por causa dos ciúmes dele e preferiu juntar-se ao “inimigo”.
— Estava sendo um bom aluno — sorriu — Preciso estar à altura da
minha deliciosa esposa — sua mão apertou firme a minha bunda.
— Como se você precisasse disso... — levei as mãos até a barra da sua
camisa suada e deslizei os dedos pelo seu abdômen definido.
— Gabriela... — ele sussurrou quando minhas unhas percorreram o
caminho até o cós da sua calça.
— O que foi? — segurei a camisa para puxá-la para cima, mas as suas
mãos seguram as minhas — deixe-me conferir o quanto as aulas do Dan surtiram
efeito — sorri maliciosamente e tentei erguer a camisa, mas as suas mãos me
impediram mais uma vez — qual é o problema? — ergui a sobrancelha sem
entender o motivo pelo qual ele não me deixava despi-lo.
— Você está nua e eu não aguento esperar mais — sua boca esmagou a
minha em mais um dos seus beijos urgentes e molhados.
Quando a sua língua duelou com a minha, gemi contra a sua boca.
Rogava a Nossa Senhora Padroeira dos Casamentos para que nosso desejo nunca
fosse satisfeito e que continuássemos nos querendo até estarmos velhinhos.
— Eu poderia passar a vida inteira venerando você e ainda não seria o
suficiente. Por mais que eu tente, não consigo traduzir o quanto você é deliciosa,
amor — ele diz isso com a voz sussurrada bem ao pé do meu ouvido e... adeus,
controle!
Minha boca suga a dele e disputamos entre saliva e mãos, quem comanda
o beijo. Se toda esposa tivesse como marido um expert em usar a língua o
aumento de orgasmos femininos causaria um terremoto em escala global, disso
eu não poderia reclamar. A boca dele me deixava completamente entregue desde
a primeira vez em que esteve na minha boceta. Como se adivinhasse meus
pensamentos, ele guiou-me sem interromper o nosso beijo, em direção a parede
do quarto. Agachou-se ficando entre as minhas pernas:
— Pronta para receber uma lição oral? — seu sorriso é sacana.
— Manda ver, tiozinho! — Senti o seu sorriso contra a minha pele
quente, e ele realmente mandou ver — Alê... — gemi quando ele sugou meu
clitóris com maestria.
Olhei para baixo e encontrei seus olhos atentos aos meus, havia um
brilho intenso naquele olhar que me dominava e sabia que faltava bem pouco
para me fazer estremecer. Segurei firme em seus ombros para não cair quando
ele alternou entre chupar, lamber e me foder com a língua. Estremeci e gritei alto
quando gozei contra a sua boca.
Enquanto meu corpo ainda tremia, Alexandre me pegou no colou e me
deitou delicadamente na nossa cama. Seus lábios tocaram os meus, dessa vez em
um beijo delicado e calmo, fazendo-me sentir meu gosto na sua boca, o que não
ajudava a aquietar o calor latente dentro de mim. Todavia, eu não era a única
quente ali, o pau duro aprisionado no short de malhar pressionava a minha
barriga, me deixando louca de vontade de tê-lo em minha boca. Mais uma vez,
tentei livrá-lo da roupa, mas rápido feito uma flecha ele abaixou a bermuda e se
posicionou entre as minhas pernas.
— Eu te amo tanto! — ele sentenciou mordendo a minha orelha, quando
tocou lá no fundo.
— Eu que te amo... — Enlacei nossas mãos quando ele se afastou para
entrar novamente. Ele acelerou o ritmo das estocadas e pouco tempo depois
chamávamos o nome um do outro, em busca do prazer que se aproximava de
maneira feroz. Meu corpo inteiro vibrou, fazendo-o se derramar em mim.
O Alexandre rolou para o lado, levando meu corpo junto ao seu.
Permanecemos abraçados. Nossos corações batendo descompassados, nossas
respirações ofegantes e nossas mãos entrelaçadas.
Na cama nos tornávamos um só ser, fundidos e conscientes do prazer que
éramos capazes de compartilhar. No que dependesse de mim, seria assim para
sempre.