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JULIENE
A maioria das pessoas costuma dizer que “não há melhor lugar no mundo do
que o nosso lar”, mas, no meu caso, era totalmente o contrário. Eu sempre odiei
com todas as minhas forças e pensamentos negativos cada pedacinho do lugar
onde morava: a famosa mansão dos Evaristo. Para ficar igual ao inferno só
faltavam as labaredas de fogo fumegantes pelos cômodos, porque a rainha dos
demônios já reinava infernizando a vida de todo mundo, principalmente a minha.
Vivo de favor na casa dos meus tios desde sempre, minha mãe morreu quando eu
era pequena e meu pai ninguém sabe quem é. Cresci sendo tratada como
empregada por todos ao meu redor, se desobedecesse a alguma ordem apanhava.
— Não vai levar nada para você, Juli? Talvez um vestido, porque juro que não
aguento mais te ver usando esse jeans surrado — tagarelou minha prima
Veronica, tirando-me dos meus devaneios, parada diante de mim segurando uma
pilha de roupas para experimentar. Algumas quase escorregando de suas mãos,
tinha pegado, praticamente, quase metade da loja.
Ela é filha única dos meus tios e puxou toda a beleza da nossa família, minha
tia investia todo seu tempo em prepará-la para casar com algum bilionário e
arrancar até o último centavo do pobre coitado. Minha prima, assim como a mãe,
não pensa em outra coisa a não ser comprar roupas caras e maquiagem que
valem os olhos da cara. Como se precisasse disso, bonita como é, fica bem com
qualquer coisa. Veronica tem um metro e setenta e cinco de altura, os cabelos
loiros longos e ondulados nas pontas. Olhos azuis como duas pedras de safiras
valiosas, os lábios carnudos rosados bem volumosos. Tão irritantemente bonita
que chegava a doer.
— Não quero, prima, obrigada! Estou satisfeita com o meu guarda-roupa no
momento — respondi azeda, sem nem me dar ao trabalho de desviar o olhar do
meu livro para olhar para ela. Eu estava sentada em um pufe que ficava ao lado
do provador, macio e confortável.
Esqueci-me de dizer que eu era a dama de companhia da minha prima
também, quando saia para fazer compras eu tinha que ir junto para carregar as
sacolas.
— Você que sabe, Juliene. Depois não reclame que os meninos não te chamam
para sair, podia pelo menos passar um pouco de maquiagem ou usar algo que
não fosse preto ou cinza. — Começou ela com a mesma ladainha de sempre,
nem dei bola, estava entretida demais lendo meu livro. Ainda mais que a história
tinha chegado ao ápice da tensão, onde o personagem principal — que todos
pensavam ter morrido — apareceu e fez sua entrada triunfal no casamento que o
pai da mocinha arranjou em troca de grana. Se eu interrompesse a minha leitura
naquele momento para dar atenção às futilidades de Veronica, quando retomasse
de onde parei, a emoção não seria a mesma. Eu era estranha até para ler. Livros
sempre foram a minha maior paixão, cheguei a pensar em fazer Letras uma vez,
mas, no final, a fisioterapia falou mais alto e quando terminei o ensino médio,
passei com louvor no vestibular.
— Eu não gosto das suas roupas também, Veronica. Mas nem por isso fico
falando, para você não se sentir mal, sou madura o suficiente para entender que
cada um tem o seu estilo, não preciso gostar, apenas respeitar. Respeito é a base
de tudo. — Fui o mais rude que pude, esperançosa que ela parasse de me chatear
e fosse experimentar aquelas roupas logo para irmos embora, não que eu tivesse
algo de bom para fazer em casa, mas, pelo menos, poderia me trancar no quarto
e mergulhar no meu mundo gótico.
— É assim que você trata sua prima depois de me ausentar por duas semanas
trabalhando arduamente? Ir nessas viagens de negócio fora do país com o papai
não é fácil, sabia? Uma pena você não se adequar ao “padrão” da nossa empresa.
— Alta, magra e bonita, pensei comigo. — Senão mandaria ele te levar qualquer
hora dessas para acompanhá-lo nas reuniões de negócios. Mas vestida
maltrapilha assim, pode esquecer. Não vai rolar nunca. — Girou o nariz no ar
com total desdém para a minha blusa preta do “Rock in Rio” que eu tanto amava,
confesso que fiquei ofendida de verdade com o comentário maldoso dela.
— Não sabia que viajar com o meu tio para ficar comprando tudo o que vê
pela frente quer dizer trabalhar arduamente, Veronica. Apenas para gastar a
fortuna dele, como está fazendo nesse exato momento. — Apontei para a pilha
de roupa que ela estava segurando, que no final sabia que acabaria comprando
todas para mofar no fundo do seu guarda-roupa. — Além do mais, eu não iria
com ele, nem se quisesse me levar. — Dei de ombros com descaso, fuzilando-a
com o olhar, frio e hostil.
Pronto! Ela havia conseguido tirar minha concentração da leitura, ergui a
cabeça fitando seu rosto bonito, prestes a gritar com ela para que sumisse de
perto de mim imediatamente, antes que eu fizesse alguma loucura qualquer. Já
não bastava me arrastar até ali, tinha que me encher o saco também. Mas ela não
se intimidou com o meu olhar fuzilante. Continuou falando, falando e falando
sem parar como um disco arranhado.
— Fala a verdade, Juliene. Sei que morre de inveja porque eu tenho mãe e
você não, tenho beleza de sobra e um pai que me dá tudo o que eu quero e leva
para viajar para os lugares mais lindos do mundo. — Destilou seu veneno, perdi
a vontade de ler, de verdade.
E eu odiei minha prima por conta disso: tirar de mim, naquele momento, a
única coisa que me dava prazer no mundo. Então fechei o livro emburrada e
joguei dentro da minha mochila verde-escura, toda remendada, mas muito amada
por mim.
— Você é a pessoa mais egocêntrica que eu conheço, Veronica, metida e
esnobe. É melhor ter uma mãe morta do que uma viva que não vale nada, que só
pensa em adquirir bens e mais bens. — Soltei aos gritos, pondo para fora anos de
humilhações e raiva engasgados na minha garganta.
Ouvi a respiração da metida da minha prima ficar profunda. Começaria a
chorar a qualquer momento, tinha certeza! Revirei os olhos, sem paciência. Ela
era a rainha do drama. Esse foi o resultado de vinte e dois anos sendo mimada
pelos seus pais, em especial, a mãe. Já eu, depois de dezessete anos sendo saco
de pancada, tive que aprender na marra a ser forte para me defender sozinha da
maldade do mundo.
— Não quer viajar com o meu pai da mesma forma que não se importa que os
garotos não se interessem por você? Acha que não te ouvi chorando a noite toda
porque o dia do baile de final de ano da escola havia chegado e ninguém te
convidou para ir? Nasceu feia, mas podia pelo menos se cuidar mais. Andar
vestida com farrapos só vai piorar as coisas, sabia que os meus amigos te
apelidaram de patinho feio? — Destilou seu veneno mais uma vez caprichando
na dose, e eu fiquei fitando-a por um bom tempo tentando entender o que ela
ganhava sendo tão cruel comigo. Acho que fazia bem para o seu ego.
E não sentiu nenhum remorso por conta disso, pelo contrário, deslizou os
dedos pelos fios loiros sedosos jogando-os para o lado, piscando os cílios longos
lentamente com aqueles lindos olhos azuis, se exibindo para dois rapazes que
tinham acabado de entrar. Esfregando na minha cara que ela era linda, perfeita e
chamava a atenção do sexo oposto com uma simples mexida no cabelo.
— Isso aconteceu quando eu estava na quinta série, Veronica. Já me recuperei
disso, não se preocupe tanto com a minha vida pessoal. — Coloquei-me de pé a
encarando, estava com tanta raiva que podia sentir o meu peito subindo e
descendo com tanta força que parecia que o meu coração ia explodir a qualquer
momento. Eu amava a minha prima. Mesmo ela sendo uma cabeça de vento, às
vezes, deixava soltar alguns atos de simpatia, no fundo, sabia que era uma garota
legal.
Bem no fundo.
— Pelo que eu sei, você já tem dezessete anos e nunca beijou ninguém até
hoje. Estou mentindo? Mas não desista, prima, sempre tem um doido por aí —
debochou acabando de cravar o punhal no meu peito, fazendo o meu sangue
ferver dentro das veias.
— Se nem as pessoas que têm o mesmo sangue que eu, me amam, é pedir
demais que terceiros façam isso, você não acha? — Falei mais alto do que
queria, na verdade, berrei mesmo. Chamando atenção de todos os presentes,
totalmente transtornada.
Sem condições de permanecer naquele lugar, peguei a minha mochila no chão
e saí correndo feito uma louca, atravessando a rua com o sinal verde. Só que eu
não esperava que a minha prima tivesse tido um colapso de humanidade, jogado
aquela montoeira de roupas no chão e vindo atrás de mim para se desculpar,
dando-se conta do estrago que suas palavras fizeram em mim.
— Juliene! — Parei no mesmo instante que ouvi o grito de Veronica, tudo
aconteceu muito rápido. Só me lembro de uma picape azul vindo para cima de
mim com tudo, e minha prima entrando na frente do veículo para me salvar,
empurrando-me para longe.
Veronica foi atingida em cheio sendo jogada a vários metros de distância, não
me lembro de mais nada, quando acordei estava no hospital. Escutei o médico
conversando com a enfermeira dizendo que quem estava dirigindo o carro era
um rapaz de vinte e poucos anos que morreu na hora. Ele e a minha prima
morreram por minha causa, sou uma assassina, não devia ter saído correndo para
o meio da rua com o sinal verde. Chorei muito, rezando para que meus tios
pudessem me perdoar algum dia.
Fiquei um bom tempo sentada na recepção do hospital esperando os meus tios
chegarem para me buscar, imaginando o choque que levariam quando soubessem
que minha prima tinha morrido, e por minha causa. Chorei tanto, mais tanto, que
dava para encher uma piscina de mil litros apenas com as minhas lágrimas. No
fundo, estava esperançosa que a qualquer momento eu iria acordar e perceber
que tudo não passou de um pesadelo terrível, e a minha prima apareceria no meu
quarto de manhã criticando tudo o que eu faço. Como sempre fazia, todos os
dias.
A primeira a apontar no corredor foi a minha tia Margô, passou por mim
desesperada fingindo que não me viu, mesmo a minha roupa estando coberta de
sangue, não se preocupou de eu estar ferida ou abalada demais com o ocorrido.
Conversou por um tempo com a moça simpática da recepção, que apontou para
mim, e veio imediatamente. Levantei para receber o abraço que pensei que me
daria dizendo que tudo ficaria bem e que a culpa do que aconteceu não tinha sido
minha, porque sabia que jamais faria nenhum mal a Veronica por querer, mas, ao
invés disso, me deu um tapa no rosto com tanta força que eu caí no chão com
tudo. Só não me chutou porque meu tio Tadeu, a puxou antes que seu pé
alcançasse meu corpo, sua vontade era me matar com suas próprias mãos ali
mesmo.
— Quem deveria ter morrido era você, sua garota inútil. Que nunca faria falta
para ninguém, não passa de uma idiota problemática. Ainda bem que em breve
irá se formar na faculdade e vai embora para bem longe. Para mim, você morreu
junto com a Veronica. Ela era linda e arrumaria um ótimo casamento com algum
príncipe bilionário, que iria amá-la e tratar minha filha e a mim como rainhas.
Quanto a você, não passa de um patinho feio, nunca será amada por ninguém. —
Cuspiu em cima de mim e foi embora, desde então, minha vida virou um inferno
maior do que já era.
“Eu aprendi a amar a dor, porque foi através dela que te conheci”
CAPÍTULO 1
Dias atuais…
JULIENE
JULIENE
Eu sairia dali desempregada, mas não sem xingar esse tal de Romeu de todos
os palavrões existentes na face da terra. Se tinha uma coisa que odiava era
quando as pessoas me olhavam como se eu fosse burra, cresci debaixo desse
olhar por parte dos meus tios. E não seria um magnata metido a besta que faria
com que eu me sentisse inferior novamente, podia ser podre de rico e
absurdamente lindo. Mas não era nenhum Deus, e ainda não era, de fato, meu
chefe para dever respeito a ele. Que vá para o raio que o parta e leve a sua
arrogância junto. Se é que no inferno teria lugar para os dois, pelo tamanho do
seu ego, duvido muito.
— Olha aqui, baixinha, quem você pensa que é para vir na minha casa e falar
comigo assim nesse tom? Eu poderia mandar te prender por invasão de
privacidade, sua insolente.
Foi isso mesmo que eu ouvi, ele me chamou de baixinha?
E ainda ousou apontar o dedo bem no meio da minha cara, como se fosse o
dono do mundo. Meu dono. Devido à grande diferença de altura entre nós, ele
teve que se inclinar dobrando o corpo como um anzol para me encarar nos olhos,
eu olhei para cima me sentindo o Davi diante do gigante Golias. Porém, um
Golias abusadamente sexy, o homem mais lindo que já vi na vida. Tinha duas
lindas leves covinhas quando falava, fiquei imaginando como deveriam ser
perfeitas quando sorria espontaneamente.
— Em primeiro lugar, eu não invadi a sua casa. E não sou só uma garota, mas,
sim, uma fisioterapeuta formada. Fui convidada a estar aqui, confesso que se
soubesse que estaria presente nem teria vindo. Odeio pessoas arrogantes, mal-
educadas que se acham as donas do mundo. Se quiser ligar para a polícia, te
empresto meu celular, não tenho nada a temer — disse tranquilamente, com total
descaso pegando o meu celular no bolso e oferecendo para ele ligar para a
polícia ou o diabo a quatro.
Foi muito petulante da minha parte, mas quando o sangue sobe para a cabeça,
só Deus na causa. Perco totalmente a noção do perigo, falo o que vem à mente.
— Fisioterapeuta? Para mim, está mais para uma garotinha indo para uma
festa de Halloween. Tem o quê? No máximo 17 anos, aposto! E o que tem nessa
maleta aí, mocinha, doces ou travessuras? — Debochou da minha roupa preta, o
cretino.
— Seja o quer for, não é da sua conta — respondi grossa, e ele fechou a cara
no mesmo momento.
— E você acha que eu não tenho coragem mesmo para ligar para a polícia,
garota? Talvez eles ensinem você a respeitar os outros, já que pelo visto, a sua
mãe não obteve muito sucesso. — O cara mandou assim à queima-roupa,
friamente.
Mesmo percebendo em meu semblante que havia me magoado
profundamente, não vi nenhum vestígio de arrependimento em seu rosto, falar da
minha mãe sempre me feria muito. Muitos reclamam que as suas mães ficam
vinte e quatro horas em seus pés querendo saber onde estão, ligando a cada cinco
minutos, sendo que eu daria a minha vida para estar com a minha mãe,
Valentina. Pelo menos um minuto seria mais que o suficiente para me fazer
extremamente feliz. Tudo o que tenho dela é uma foto quando estava grávida de
mim. Pela forma que estava sorrindo, sabia que me amava antes mesmo de eu
nascer. Alisava a barriga grandona, os cabelos longos e negros voando
lindamente. Sonhava em poder dizer o quanto sentia a sua falta, a amava.
— A minha mãe não teve a oportunidade de me ensinar nada, senhor. Ela
morreu quando me deu à luz. Não tenho ninguém nesse mundo além de mim, o
que aprendi até hoje foi a vida que me ensinou — disse sem pensar, no susto.
Sempre faço isso quando estou nervosa.
Tive que me segurar para não chorar na sua frente, não daria a ele o gostinho
de me ver por baixo. Nunca! Jamais! Preferia morrer mil vezes.
— Meus pêsames, sinto muito. — Deu um passo para trás cambaleando,
fechou os olhos pesadamente, arrependido de ter falado da minha mãe. Como se
soubesse bem o que é perder alguém que se ama, e que nada nem ninguém
jamais ocuparia o seu lugar.
— Não precisa ter pena de mim, senhor, pois não sou nenhuma pobre coitada,
não preciso da compaixão de ninguém, muito menos da sua. — Elevei o olhar,
me segurando para não voar no pescoço dele.
Mesmo querendo muito, jamais iria agredir uma pessoa que precisava de uma
bengala para permanecer de pé. Mas se me provocasse mais um pouco, bateria
nele com ela.
— Olha, nem sei por que ainda estou falando com você, sua atrevida. Saia da
minha casa agora ou vou mandar prendê-la de verdade, e não ouse voltar aqui
nunca mais. — Levantou a bengala para apontar na direção da porta, mas não
conseguindo sustentar sozinho o peso do próprio corpo, acabou se
desequilibrando e caindo no chão com tudo.
— Ai, meu Deus! O senhor se machucou? — Fiquei de joelhos ao seu lado, na
intenção de ajudá-lo. Queria ter certeza que não tinha fraturado algum osso, já
que segurava a perna manca com uma expressão de muita dor.
— Não me toque! — Rosnou, empurrando-me com força para longe dele.
Como se o meu toque o ferisse ainda mais.
— Cala a boca e me deixa fazer o meu trabalho. — Rapidamente, peguei a
minha maleta e me aproximei dele novamente, tirei de dentro dela um gel de
massagem especial para relaxar os músculos quando estão muito contraídos,
acredito que isso seja o motivo de tanta dor. Dobrei sua calça para cima, ficando
chocada ao me deparar com um emaranhado de cicatrizes grandes.
Pelo visto, tínhamos pelo menos uma coisa comum: cicatrizes dolorosas do
passado.
Espalhei um pouco do produto na palma da mão e comecei uma massagem
lenta. Assim que o toquei, senti uma corrente elétrica passando por todo o meu
corpo. E pela forma que o senhor Romeu se arrepiou todo, também havia
sentido. Aos poucos, uma expressão de alívio foi tomando conta do seu rosto,
como se a dor tivesse indo embora aos poucos.
Era uma técnica antiga para acabar com a dor instantaneamente que aprendi
com um velho índio curandeiro, que uma professora riponga da faculdade levou
para nos ensinar essa técnica milagrosa de cura da sua tribo; entre todos os
alunos da minha sala, eu, observadora como sou, fui a única que aprendi com
perfeição. As minhas mãos tinham o toque naturalmente leve, e modéstia à parte,
na minha profissão isso era como ganhar na loteria. Acho que foi por isso que
meu professor me indicou para o trabalho, porque para trabalhar para um capeta
desse tinha que ser bom no que faz mesmo.
— Até que você é boa nisso, baixinha. — Trocamos olhares em silêncio por
um tempo, dessa vez não era com raiva.
Ele gemeu de olhos fechados mordendo o lábio inferior enquanto sentia as
minhas mãos deslizando por sua perna, e eu corei por ter tido a leve impressão
que foi de prazer.
No entanto, confesso que aquela cena me deixou com um calor infernal. Era
virgem, não por opção ou essa baboseira de “encontrar a pessoa certa”, mas,
sim, porque nunca senti atração por ninguém para chegar até esse ponto, e, além
do mais, tudo o que ouvi sobre perder a virgindade não passava de muito
constrangimento por falta de experiência, dor e sangramento. Então não tinha
pressa, aconteceria quando fosse para acontecer e pronto. Vida que segue, tanto
faz quem seria o cara. Seria ruim de qualquer forma, e provavelmente no outro
dia ele pediria o meu número e depois nunca me ligaria. Se tem uma coisa que
nunca fui é iludida, tenho os pés no chão.
— Como aconteceu isso com o seu joelho, foi há muito tempo? — Perguntei
sem parar os movimentos circulares, leves e delicados num ritmo contínuo.
Contudo, os meus olhos estavam grudados nos dele à espera de uma resposta.
Havia uma sintonia entre nós inexplicável. Agora não sabia se sentia raiva ou
atração por esse cretino.
Acho que os dois.
— Não é da sua conta, garota intrometida. — E o cavalo agiu novamente,
dando coice em tudo o que via pela frente.
— Tem razão, nada que tenha a ver com o senhor me interessa, adeus! —
Levantei bruscamente, peguei a minha maleta no chão e girei o corpo para ir
embora sem olhar para trás.
— Está contratada, senhorita Sullivan. E quero exclusividade — disse ele
assim que alcancei a porta em um tom mandão, me pegando totalmente de
surpresa.
Parei de andar e olhei para ele sentado no chão. Por um momento, pensei que
estava me comprando e não os meus serviços como fisioterapeuta. Senti uma
vontade incontrolável de voltar lá e chutar o meio das suas pernas com toda
força que tenho.
— Agora quem não quer mais trabalhar para o senhor sou eu, obrigada. —
Joguei o cabelo para o lado, sempre quis fazer uma saída triunfal como aquela.
Não queria colocar os meus olhos naquele homem nunca mais, odeio gente
com mania de grandeza.
— Eu pago o dobro, baixinha — proferiu as palavrinhas mágicas e eu voltei
na hora, pobre não pode ficar fazendo muito drama quando o assunto é trabalho,
principalmente em tempo de vacas magras.
Eu era orgulhosa, mas não idiota.
Romeu tentou levantar sozinho, mas não conseguiu. Com um pouco de
dificuldade, arrastou-se até o sofá encostando as costas nele, sem desviar o olhar
de mim um segundo.
— Estarei aqui amanhã no mesmo horário, e baixinha é a put… — Parei de
falar quando vi o doutor Leonardo escondido atrás da porta rindo da nossa
conversa, acho que já gostou de saber que não pretendo abaixar a cabeça para as
frescuras do seu — nosso — paciente.
“Você me fez querer ficar mesmo sabendo que eu deveria ter ido embora
para sempre”
CAPÍTULO 4
J ULIENE
Saí da casa daquele cretino com o nariz empinado. Trabalharia para ele, sim,
mas não seria sua escrava, e esperava que me tratasse com muito respeito.
Porque se por acaso fosse grosso comigo, eu o deixaria aleijado das duas pernas.
Emprego a gente arranja outro. Mas amor-próprio depois que perde não tem
volta, e eu pretendia manter o meu intacto de agora em diante.
Quando pisei do lado de fora do portão, tive a ligeira impressão de estar sendo
observada, andei alguns passos pela calçada de cabeça baixa contando os poucos
buracos que tinham nela, sentindo a sensação de ter a minha privacidade sendo
invadida por algum curioso aumentar mais a cada segundo. Olhei para os lados e
não vi ninguém, apenas o muro enorme que rodeava a mansão do diabo. No
entanto, o que me chamou a atenção foi a câmera no topo dele com a lente
focada bem no meu rosto com uma pequena luz vermelha brilhando. Não sabia
se era apenas paranoia da minha cabeça, mas se não fosse, o enxerido agora
sabia exatamente qual o tamanho da minha língua e a coloração avermelhada
dela.
Balancei a cabeça rindo da minha travessura e continuei o meu caminho
sentindo o calor infernal do Rio de Janeiro me consumir por completo. Fiz uma
parada para fazer as compras do mês e comprar um saquinho de ração para o
meu gatinho, levei em uma sacola mesmo. Pedi o moço para levar o restante
depois, quero muito preparar uma refeição decente para inaugurar minha cozinha
nova. Como na casa dos meus tios eu era obrigada a comer na cozinha com os
empregados — coisa que eu amava fazer, pois sempre foram muito amorosos
comigo —, aprendi a cozinhar maravilhas com a Lurdes, empregada deles há
mais de vinte anos.
Também passei em uma loja do povão e comprei vários looks baratinhos e
alguns pares de sapatos bem simples, mas que montados do jeito certo ficaram
uma graça. Tinha que aparecer vestida de forma correta no meu trabalho, para
evitar, ao máximo, dar motivo para o meu chefe implicar comigo.
— Bom dia, menina, como vai? — Cumprimentou um senhor negro simpático
passando por mim puxando um carrinho cheio de papelão quando entrei na
minha rua, os olhos esverdeados e fundos. Cabelo rastafári muito estiloso e a
barba farta. Suas vestes eram simples, rasgadas, na verdade, os chinelos de dedo
tão gastos que a parte de trás do pé ficava praticamente toda no chão. Confesso
que essa cena me tocou muito, ele era tão magrinho, tadinho.
A minha família esbanjava dinheiro com tanta porcaria e vivia de cara azeda,
esse moço simples, sem me conhecer, ofereceu-me o seu melhor sorriso.
— Bom dia, senhor, pode me chamar de Juli. — Sorri, não sei por que, mas
gostei dele de graça. Sabe essas pessoas que quase dá para ver a luz da aura em
volta dela? Então, ele era uma dessas.
— Prazer, Juli, todos me chamam de senhor Marley. — Sorriu estendendo a
mão para mim com certo receio de eu não querer apertá-la devido ao monte de
calos, senti que ficou constrangido quando me pegou olhando para ela parada no
ar.
Quando pensou em recolhê-la, levou o maior susto sendo pego por um abraço
meu. Quando alguém é gentil com a gente sem motivo algum, devemos devolver
em dobro.
— Que isso, minha filha, esse velho está todo sujo. — Afastou-se de mim
totalmente sem graça, acho que fazia muito tempo que não recebia um ato de
carinho.
Então eu fui até ele e o abracei novamente com mais carinho, senti que ficou
emocionado e dessa vez não se afastou. Eu fico boba em como as pessoas
descartam aqueles que nasceram em uma posição menos favorável. Para mim,
todo mundo sempre foi igual, minha seleção é através do caráter e não pelo que
os meus olhos podem ver.
— Eu acabei de me mudar para aquele prédio, quando quiser pode ficar à
vontade para passar lá para me visitar e tomar um café. Daqui a pouco as
compras que fiz devem estar chegando, mas agora não tenho nada em casa para
te oferecer. — Olhei para meu prédio cor de abóbora caindo aos pedaços,
tentando não perder o ânimo, no começo tudo é mais difícil mesmo.
— Você está sem comida em casa, filha? Eu divido a minha marmita com
você, dei sorte hoje e consegui vender quase todo papelão que achei no lixo de
manhã e comprei o meu almoço. Estou tão feliz, faz dias que não comia direito.
Está limpinha, nem encostei nela. — Senti um aperto no peito quando ele pegou
uma marmita de alumínio dentro de uma sacola de plástico branca que estava
dentro do seu carrinho e me ofereceu de coração aberto, fiquei com vontade de
chorar.
Esse homem tinha tão pouco e, mesmo assim, queria dividir. Então me
lembrei das inúmeras vezes que a minha tia brigou comigo por comer algo da
geladeira sendo que estava lotada de comida, dizia que era para economizar.
Além do mais, as coisas boas eram apenas da Veronica, para mim os restos já
estava ótimo. Naquele momento, minha vontade foi colocar senhor Marley em
um potinho e guardá-lo para sempre, mas não tinha nem para me alimentar
direito, que dirá para duas pessoas. Mas vou trabalhar duro para um dia poder
ajudar não somente ele, mas muitas outras pessoas que se encontram na mesma
situação.
Meu sonho é montar um abrigo de grande porte que acolhesse muitos que não
têm onde morar. Mas, por hora, assim que recebesse o meu primeiro salário, iria,
pelo menos, começar a fazer sopa para doar aos moradores de rua uma vez por
semana. Em homenagem à bondade do meu novo amigo que acabei de conhecer.
— Não precisa se preocupar, senhor Marley. Sabia que esse ato foi o mais
gentil que alguém já fez por mim? — Segurei sua mão, com os olhos inundados
por lágrimas. Eu havia adquirido sentimentos por aquele homem, em menos de
dez minutos, que não consegui nutrir pela minha própria família desde que nasci.
— Eu tomei um café da manhã bem reforçado hoje no caminho para o trabalho.
Agora preciso ir, foi um prazer conhecê-lo. Espero vê-lo novamente em breve,
fique com Deus — menti sobre o café da manhã, estava nervosa demais com o
meu primeiro dia de trabalho que não consegui comer nada no meio do caminho
nem na volta, estava em jejum.
— Vá com Deus, minha filha, que ele abençoe seus passos onde quer que vá.
Que lhe dê paciência com os dias ruins, e sabedoria para aproveitar os bons. E
para os tristes, que nosso Pai Todo Poderoso lhe traga alguém capaz de fazê-la
sorrir — desejou afagando os meus cabelos, depois foi embora puxando o seu
carrinho cantarolando uma música que eu não conhecia. Tinha uma voz bonita e
uma postura marcante, agora entendo por que todos o chamam de senhor Marley.
Direcionei-me até meu apartamento, assim que abri a porta o Romeuzinho
veio todo manhoso esfregando o pelo em mim, mas quando sentiu o cheirinho do
seu “jantar” dentro da sacola começou a miar desesperadamente, ficando de pé
mexendo as patinhas de um jeito muito fofo. Eu tinha um enorme problema em
me apegar fácil por qualquer ser com vida, em especial, os animais. Fico
pensando em como vai ser quando for mãe, o meu filho será o ser mais amado
do mundo, recebendo o amor que eu nunca tive.
— O bebezinho da mamãe está com fome? — Perguntei acariciando os seus
pelos negros brilhantes, era fofo demais. Parou de miar olhando-me irônico, tipo:
“O que você acha, depois de ficar a manhã toda sem comer? ”
— Não seja malcriado, pequeno — Pedi, mas não adiantou.
Ele não sossegou enquanto não coloquei um pouco da ração sobre um jornal
velho em um cantinho da cozinha, tinha que comprar um recipiente próprio para
dar comida ao bichano. Deixei-o comendo e fui tomar um banho bem demorado
e gostoso para tirar a tensão do dia, coloquei o meu pijama confortável branco de
bolinhas vermelhas. Ao acabar de me vestir, bateram à porta, corri para atender
rezando para ser o entregador do mercado, pois estava morta de fome.
— Boa tarde, é aqui que mora a senhora Juliene Sullivan? — Disse um rapaz
moreno alto esbanjando charme assim que abri a porta, ele deveria ser um
modelo de cueca da Calvin Klein, ou qualquer coisa do tipo. E não um simples
entregador de mercado, pensei comigo.
Santo Deus. Que homem!
— Es…tá falando com ela — respondi gaguejando feito uma idiota, escorada
na porta, praticamente babando em cima dele, Senhor! Parecia um príncipe
encantado dos contos de fadas, quando deslizou os dedos pelo cabelo, na altura
do queixo, exibindo um sorriso charmoso no rosto, fui ao paraíso e voltei.
Ele era ridiculamente lindo e sabia muito bem disso.
— Gostei do pijama, Juliene. — Olhou para a metade das minhas pernas de
fora, me fazendo ter certeza que não estava, de fato, referindo-se ao meu pijama.
Que safado!
— Obrigada. Entre, por favor. — Assentiu. Entrou puxando o botijão de gás
na maior facilidade e com a minha caixa de compras no ombro, deixando-a sobre
o balcão da minha minúscula cozinha que ele, grande como era, mal cabia
dentro.
Usava uma calça jeans justa que só Deus na causa, valorizava seus glúteos.
Pela camisa do uniforme casando bem no seu peito másculo, obviamente, vivia
na academia.
— Você está bem, moça? — Tocou meu ombro preocupado com a minha cara
de louca o admirando enquanto colocava o botijão no lugar — que não fazia
parte do seu trabalho —, não bastava ser lindo, tinha que ser prestativo também.
— Sim — respondi envergonhada.
— Uma pena, porque se não estivesse eu poderia te ajudar a ficar. — Jogou
assim, naturalmente, me deixando de cara no chão, apenas o encarei tentando
formular alguma coisa inteligente para dizer.
— Quer dizer, então, que além de entregador é médico? — Tentei jogar o
cabelo para o lado fazendo charme, mas acabei desequilibrando e quase fui ao
chão se ele não tivesse me segurado com seus braços fortes.
— Posso ser médico, bombeiro, policial, até Papai Noel. Vai depender da sua
imaginação, gata. — Minha calcinha molhou nessa hora e minhas bochechas
coraram, com certeza.
Cruzei os braços para disfarçar a vergonha, sempre fazia isso em situações
tensas.
— Você sempre se comporta assim com todas as suas clientes quando faz
entrega? — perguntei desviando o olhar, era isso ou pular em cima dele a
qualquer momento.
— Não, morena, só quando é linda e delicada como uma flor. — Engoli seco,
ele era direto, curto e grosso.
— Muito obrigada por tudo, pode ir embora agora. — Fechei a cara, virando
de costas. Com certeza percebeu que eu morava sozinha e estava se engraçando
para o meu lado, mas iria cortar a asinhas dele logo.
— Calma, gata só estou brincando, não precisa ter medo, eu sou um anjo. —
Ergueu as mãos em sinal de rendição, deixando transparecer um pedacinho da
tatuagem escondida na manga da camisa com o slogan do mercado que
trabalhava.
— O diabo também era um anjo e olha no que deu. — O meu apartamento foi
tomado pelo som da gargalhada dele, tão contagiante que me fez rir também.
— Gostei de você de verdade, gata. A sua beleza doce me encantou,
principalmente a língua afiada, quero te ver novamente. — Ele tirou uma caneta
do bolso, segurou a minha mão e escreveu algo na palma, depois beijou o meu
rosto de leve e foi embora. Quando olhei o que havia escrito, abri um sorriso
enorme, acompanhado de um longo suspiro de total encantamento.
“Quando precisar de alguém para jogar conversa fora, me liga. Vou
adorar ouvir a sua voz doce novamente, assim como o seu cheiro de
flores.”
(21) 99916-4182 | Ass.: Seu Marcelo.
Depois da partida do entregador gato, fiz meu jantar digno de uma rainha e me
esbaldei nele, arrumei a cozinha antes de dormir, esperançosa de sonhar com ele.
Infelizmente não tive muita sorte, já que os meus sonhos naquela noite foram
todos dominados por um tal de Romeu. O que tinha de bonito, tinha o dobro em
grosseria.
“Meus sonhos apenas refletiam o que já estava impregnado no meu
coração.”
CAPÍTULO 5
ROMEU
Eu não conseguia acreditar que depois que a baixinha abusada fez a massagem
em mim com aquelas mãos de anjo, passei o resto do dia sem sentir dor, tenho
que admitir que é muito boa no que faz. Nenhum outro fisioterapeuta conseguiu
essa proeza em anos de tratamento no meu joelho, não teve um segundo que eu
tenha ficado sem sentir dor depois daquele maldito dia em que aconteceu aquela
tragédia comigo, transformando-me em um aleijado. Fecho os olhos
pesadamente lembrando de cada detalhe, nem se vivesse mil anos conseguiria
esquecer.
É impossível.
Só contratei essa garota porque apesar de jovem, é competente. O problema é
que além de língua afiada é mal-educada também, parecia um filhote de pinscher
raivoso. Pequena e abusada, pronta para me morder caso se sentisse acuada.
Agora, as minhas manhãs teriam que ser dedicadas às sessões de fisioterapia, era
isso ou parar de trabalhar na minha empresa. Sou dono de uma marca de carros
importados. Cheguei a um ponto que não consigo ficar de pé por muito tempo,
nenhum médico sabe explicar o motivo dessa dor infernal no meu joelho. Isso
acaba me deixando muito frustrado e desconto toda a minha raiva nas pessoas à
minha volta, o último fisioterapeuta pediu para sair em menos de duas semanas.
Doutor Leonardo disse que Juliene é sua última tentativa de ajudar na minha
recuperação.
— Bom dia, senhor, trouxe o seu café. — Constância aponta na porta do
escritório e sorri com seu jeito doce de sempre. Além de governanta, é como
uma mãe para mim, trabalha comigo há muitos anos.
Era o tipo de pessoa organizada que sabe o que eu quero antes mesmo de
pedir, conhece todos os meus gostos e manias. Sempre tem algo reconfortante
para dizer na hora certa, seja sermão ou uma palavra amiga. Usa suas habituais
roupas sérias, mas seu humor estava longe de ser sério ou frio. Sua
personalidade é quente como sol no verão, que aquece todos os corações por
onde passa. Inclusive o meu, apesar de todos me apelidarem na empresa como
“coração de gelo”.
— Obrigado, Constância, pode deixar em cima da mesa, por favor. — Ela
assentiu e veio em minha direção ainda sorrindo. Deixou a xícara sobre a mesa e
foi embora, mas antes que saísse, não resisti e fiz uma pergunta:
— A senhorita Juliene chegou? — Senti-me meio ridículo perguntando isso,
afinal ainda faltavam alguns minutos para o horário combinado das consultas,
mas eu não conseguia segurar a ansiedade para começar logo.
— Não, senhor, mas acredito que ela não deve demorar a aparecer. — Deu um
sorrisinho malicioso.
Não entendi.
— Está bem, Constância, obrigado — respondi sério, e o sorriso dela morreu
na mesma hora. Nem vi quando saiu do escritório.
Voltei a revisar alguns relatórios, tenho trabalhado mais em casa. Mas não
conseguia focar no que estava fazendo, lia, mas não entendia nada. Isso nunca
aconteceu comigo, acho que o problema no meu joelho está afetando meu
cérebro também. Parei para tomar meu café, depois continuei lendo de onde
parei.
•
— Está cinco minutos atrasada, senhorita Sullivan. Cada segundo será
descontado do seu salário em dobro, não tolero atrasos. — Foi à primeira coisa
que eu disse para a baixinha atrevida assim que chegou ao seu, oficialmente,
primeiro dia de trabalho, já que no outro veio em minha casa apenas para me
afrontar.
— Como sabia que era eu se entrei sem fazer nenhum barulho? — Perguntou
confusa com aquela maldita voz doce que me irritava profundamente, na
verdade, até calada ela me irritava.
Eu a senti chegar assim que pisou no meu escritório, seu perfume instigante
chegou antes, me dopando em questão de segundos.
— Tenho um radar especial para sentir certo tipo de “presença” indesejada
próximo a mim, não erra nunca — disse sem pensar, ela franziu o cenho, com
certeza pensando em algo malcriado para responder.
— Funciona só para os outros, não é mesmo? Porque senão viveria apitando
quando estivesse sozinho. — Não disse? Ela era irritante, sim, não era
implicância minha.
— O que você disse, garota? — Levantei bruscamente quase me
desequilibrando, para que isso não acontecesse, usei as bordas da mesa como
apoio. Minha vontade era mandá-la sumir da minha frente para sempre, menina
insolente.
— Nada! — Revirou os olhos de um jeito muito abusado.
Ela é abusada.
— Siga-me, por favor — proferi friamente, não gostava dela, mas precisava
de suas mãos de anjo em mim.
Por causa da dor no meu joelho, é claro.
Concordou e veio atrás de mim a passos cautelosos em total silêncio,
milagrosamente ficando calada por alguns segundos. Graças a Deus. Fiquei
constrangido pelo barulho irritante que a minha bengala fazia em atrito com o
chão, estava com tanta dor que parecia que a minha perna estava sendo
arrancada fora. A conduzi até a sala que construí especialmente para as minhas
sessões de fisioterapia para não precisar ter que ir a clínicas, não tenho tempo
para isso. Possuía os aparelhos mais modernos existentes no mercado. Também
contava com uma área de relaxamento, com banheira de hidromassagem, sauna e
uma suíte com uma ducha bem grande, ótimo para banhar até duas pessoas ao
mesmo tempo.
— Estou no paraíso, obrigada, Deus! — Gritou a louquinha de pedra assim
que entrou na sala, como uma criança no seu primeiro passeio no parque de
diversões.
Ela era estranha demais, da cabeça aos pés.
— Qual o motivo de tanta alegria, senhoria Sullivan? —Indaguei.
— Meu sonho é ter um consultório com, pelo menos, a metade dessa
aparelhagem. Para um fisioterapeuta entrar em um lugar como esse é a mesma
coisa que entrar no paraíso. — Seus olhos brilhavam, fiquei impressionado, é
muito difícil ver uma jovem na idade dela se interessar tanto com coisas
relacionadas a trabalho. A maioria só pensa em orgias e gastar dinheiro dos pais,
quando não está nas ruas usando drogas e infernizando a vida de pessoas
honestas.
— Entendo. Agora vou me trocar e já volto, com licença. — Cortei o assunto
rapidamente, não tenho por que saber nada da vida dela e ela da minha.
Fui até o meu quarto e coloquei uma bermuda folgada e camiseta azul-escuro
de tecido confortável. Quando voltei, a “doutora” Juliene já estava ao lado da
cama de fisioterapia com tudo preparado me esperando. Estava tirando tudo o
que iria precisar de dentro da sua maleta e colocando sobre a mesinha ao seu
lado de forma muito bem organizada, acho que estava tão ansiosa quanto eu para
começar logo a sessão de exercícios.
Juliene tinha uma aparência de “menininha do papai”, nem de longe parecia
ser uma fisioterapeuta, na verdade, estava mais para uma aluna do colegial. Faz
o tipo nerd assumida, os cabelos negros em um corte reto acima do ombro e
óculos de grau com as lentes grandes arredondadas. Pelo menos estava vestida
adequadamente dessa vez, calça jeans clara e camisa branca de mangas
cumpridas. Nos pés, sapatilhas salmão, que davam a impressão de ser mais baixa
do que já era.
— Deite-se aqui, por favor, senhor Romeu. — Apontou para a cama de
massagem com as bochechas coradas, ficou envergonhada com a forma que eu
reparava os traços delicados do seu rosto.
Prendeu o cabelo para o alto em um nó malfeito, como era bem curto, a
maioria dos fios ficou solta de forma avulsa. Selvagem. A blusa extremamente
branca que trajava realçava ainda mais a cor pálida da sua pele, os cílios longos
espanavam como um leque toda vez que piscava. Não era uma mulher
deslumbrante, mas havia algo de especial nela.
Sei lá, não sei explicar.
— Como quiser, doutora — disse em tom de deboche, ela riu. E eu acabei
sorrindo também. Que estranho! Não costumo sorrir facilmente, principalmente
para pessoas que não gosto.
Deitei de barriga para cima e, mesmo com ela constrangida, continuei a
admirando, tinha os olhos de uma cor prateada estranha. A íris com manchas
acinzentadas dançando dentro delas, nunca tinha visto algo tão bonito antes.
Parecia um céu anunciando uma tempestade forte, tinha um mistério nela. Os
lábios eram finos e delicados, deveriam ficar vermelhos e inchados com
facilidade quando beijados de forma mais ardente.
Mas por que eu estava pensando isso?
Porra! Ela tem idade para ser minha filha.
Não é atraente, muito menos faz o meu tipo.
— Dói aqui, senhor? — Nem respondi, as palavras definitivamente me
faltaram quando sua mão tocou minha pele, delicadamente, na área bem perto do
joelho. De um jeito até sensual, quase imoral, para ser sincero.
— Não! Está ótimo assim, por favor, não pare. — Praticamente gemi, e ela
desviou o olhar mudando a intimidade dos seus atos para movimentos frios e
calculados.
Nesse momento, foi a minha vez de ficar corado, mas não conseguia evitar. Os
pelos do meu corpo estavam todos ouriçados, parecia coisa de doido. Fechei os
olhos para aproveitar melhor o momento, dobrava a minha perna bem devagar e
depois esticava lentamente. O efeito dela em mim era praticamente um milagre,
talvez a única chance da minha perna voltar a se movimentar normalmente. Mas
como depois do que houve comigo, deixei de acreditar em Deus, duvido muito
que milagres aconteçam.
— Eu sinto muito, senhor Romeu. — Sua voz era baixa, quase um sussurro.
— Pelo quê, senhorita Sullivan? — Meu tom foi rude de uma maneira que não
lembrava de ter usado antes com ninguém, não gostava do seu jeito petulante.
— Pelo que aconteceu para deixar esse monte de cicatrizes na sua perna, deve
ter sido doloroso o processo de cicatrização dos ferimentos, parecem ter sido
bem profundos. — Não sabendo ela que as feridas que quase fizeram os médicos
tomarem a decisão de amputar minha perna não eram nada comparadas ao
estado que meu coração ficou, em pedaços. De um jeito que nunca teria cura. —
Se quiser desabafar sobre o assunto, eu estou aqui, senhor Romeu, além de sua
fisioterapeuta, posso ser sua amiga. — Sorriu docemente, desenhava o contorno
das minhas cicatrizes na perna com a ponta do dedo indicador, com muito
carinho.
Como se tivesse medo de me ferir da menor forma que fosse, seus olhos
transbordavam pena de mim. Isso me encheu de ódio, ela era paga para fazer o
trabalho dela e não ficar perguntando sobre a minha vida.
— A sessão de hoje acaba por aqui! E nunca mais ouse tocar em nenhuma
parte do meu corpo de forma íntima assim, faça apenas o seu trabalho e
mantenha a porra da sua boca fechada, sua enxerida. Contratei uma
fisioterapeuta, não uma psicóloga. — Levantei grosseiramente quase a
derrubando no chão e fui embora, pelos seus lábios trêmulos segurando o choro,
acho que dessa vez ela entendeu bem o meu recado e vai parar de se intrometer
em assunto que não lhe diz respeito.
“Eu tive medo das emoções que você causou em mim com um simples
toque”
CAPÍTULO 6
JULIENE
JULIENE
ROMEU
Se alguém me dissesse que eu entraria com o meu carro, modelo novo que
minha empresa acabou de lançar, em Guadalupe, bairro operário do subúrbio
carioca, nunca acreditaria e ainda mandaria prender a pessoa por difamação
alheia ao associar o meu nome com o de Juliene Sullivan, a baixinha mais
metida que conheço. Esse lugar é cercado por favelas e bem distante do centro,
nunca passei nem perto dessa área antes. Pensei que morava em um lugar mais
conceituado do Rio de Janeiro, mesmo com aquele estilo estranho, dava para
notar pela sua postura que veio de uma família tradicional. Não que eu me
importasse com a sua segurança, porém, podia ser muito perigoso para uma
garota tão delicada transitar por um bairro rodeado por favelas tão perigosas
como o morro do Alemão.
A não ser que ela tivesse muitos irmãos e um pai que cuidasse da sua
segurança, ou alguma pessoa mais próxima como um namorado da sua idade que
a amasse e era dono de todos os seus sorrisos e pensamentos, do coração. Porra!
O que está dando em mim para ficar pensando nessa garota petulante agora?
Tanto faz se tem um namorado ou não, a vida pessoal dela não me importava.
Não acreditei quando o doutor Leonardo disse que aquela insolente teve a
ousadia de dizer que só aceitaria voltar a ser minha fisioterapeuta se eu fosse
pessoalmente à casa dela pedir desculpas, que ódio! Quem ela pensa que é para
me afrontar desse jeito?
A única que podia me dar o que eu preciso no momento, e ela sabia disso.
Inferno! Odiava me sentir acuado dessa forma.
Estava com muita raiva de Juliene por me fazer vir neste lugar, não perdia a
oportunidade de me afrontar assumindo uma postura confiante demais para
alguém que não tinha nem um metro e meio de altura direito, mas tinha mãos de
um anjo. Isso eu não podia negar, e o rosto também, porém, a língua afiada era
de uma diabinha dos infernos. Mesmo assim, é muito boa no que faz. Em anos
sentindo uma dor infernal no joelho, todas as vezes que ela me tocou, passei o
dia todo andando praticamente normal, até esqueci que era um aleijado manco.
Nem tinha mais pesadelos daquele dia terrível, sendo sincero, nunca me senti tão
bem.
Na verdade, ultimamente tenho apenas sonhado com Juliene, vou dormir e
acordo com a imagem do seu rosto angelical em minha mente. Não estava
gostando nada disso, ela é uma criança e tem idade para ser minha filha. E,
definitivamente, não fazia o meu tipo, além de baixinha, era abusada e atrevida.
Nunca cedi em nada na minha vida tanto profissional quanto emocional, estou
acostumado a ter todos correndo atrás de mim, não o contrário. Nunca precisei
me esforçar para ter nada do que eu queria, não até essa garota aparecer na
minha vida, e olha que isso não tinha nem um mês.
— Tem certeza que o endereço é esse mesmo, senhor Alcântara? — Meu
motorista tinha os olhos arregalados olhando para mim pelo retrovisor, com
certeza morrendo de medo de sermos assaltados a qualquer momento. Carros
caros como aquele por ali devia ser novidade, chamava atenção a quilômetros de
distância.
— Tenho sim, Ramón, não se preocupe porque não pretendo demorar muito
por aqui. — O tranquilizei.
Depois de subir um morro pavoroso quase arranhando o fundo do carro,
estacionamos a alguns metros do prédio que apontava no GPS com o endereço
que Juliene passou para o doutor Leonardo. Falando na baixinha abusada, ela foi
a primeira pessoa que reconheci quando abaixei o vidro escuro do lado do
carona onde eu estava sentado. Ela estava ao lado de outras pessoas servindo
algum tipo de alimento para uma pequena multidão de mendigos sujos e roupa
toda rasgada, pareciam famintos.
Ela sorria lindamente, e que sorriso era aquele? Espontâneo e sincero, único.
Parecia uma bonequinha de porcelana toda delicada dentro de um vestido da
cor do final do verão, branco com flores amarelas e a saia rodada quase na altura
do joelho que balançava lindamente conforme mexia o corpo miúdo, uma fita
azul separando a franja do restante do cabelo combinando com a cor dos seus
olhos.
Eram de um azul profundo, que me atraíam de um jeito absurdo.
O que mais chamava atenção nela era o fato de não usar maquiagem, tornando
o seu sorriso ainda mais sincero, honesto. Quando dei por mim, sorria também
só de olhar para ela, mas o meu sorriso morreu imediatamente quando vi o meu
motorista olhando para mim pelo retrovisor como quem dizia:
“Te peguei. ”
— Vou sair por um instante, Ramón, volto em cinco minutos. — Acenou com
a cabeça segurando a ponta do quepe e permanecendo sentando no banco do
motorista, sabia que eu não aceitava ajuda para sair do carro — nem para nada
—, principalmente nesses últimos dias que mal conseguia andar com o auxílio
da bengala, sou orgulhoso demais. Sempre fui, não sei ceder em nada, tenho que
estar sempre no controle. Estar ali estava sendo algo humilhante, em tão pouco
tempo Juliene já me conhecia o suficiente para saber que essa era a forma
perfeita de me punir por ter sido rude com ela.
Diaba!
Levei, pelo menos, uns cinco minutos para conseguir sair do carro, quando,
enfim, consegui, pisei em falso numa pedra solta da calçada. Por pouco não dei
de cara no chão, fui amparado por um senhor que passava próximo a mim no
exato momento.
— Obrigado — agradeci.
Ele era negro, trajava roupas muitos simples e tranças cumpridas no cabelo.
Não me soltou até ter certeza que eu não correria o risco de cair, sorrindo
gentilmente o tempo todo para mim na intenção de eu não me sentir
constrangido por ser incapaz de dominar minhas próprias pernas.
— Não precisa agradecer, doutor. — Afastei-me assustado quando o vi
abaixar apressado diante dos meus pés, pensei que fosse me dar uma rasteira e
roubar até o último centavo que eu tinha dentro dos bolsos. — Licença, vou
amarrar o cadarço do senhor para que não corra o risco de tropeçar novamente.
— Confesso que me senti envergonhado nesse momento, conhecia pessoas
milionárias que não tinham nem a metade da educação daquele homem e eu
pensando que ele iria me furtar.
— Algum problema aí, patrão? — Eu não fui o único a pensar que seria
roubado por aquele homem, o meu motorista chegou às pressas para saber o que
estava acontecendo.
— Está tudo bem, Ramón. Pisei em falso ao sair do carro e esse senhor me
amparou antes que eu fosse ao chão. Vou dar um dinheiro a ele como
agradecimento, foi muito útil. — Saiu mais rude do que eu queria, mas a verdade
é que quando alguém está em uma posição privilegiada como a minha em
relação à maioria das pessoas, qualquer coisa que sai da sua boca soará como
prepotente ou arrogante querendo exibir a sua fortuna.
Mas eu não era esse tipo. Dinheiro é muito bom, porém não definia quem eu
era, muito menos o meu caráter. Os meus pais vieram de famílias bem-sucedidas
e tiveram a oportunidade de pagar para mim e meus irmãos as melhores escolas
que alguém possa estudar neste país, nossa casa era a maior do bairro nobre em
que morávamos.
— Dinheiro em troca de uma gentileza? Essas coisas a gente não deve cobrar,
a minha recompensa virá do cara lá de cima mais tarde. — Apontou o dedo
indicador para cima, acompanhei com o olhar deparando-me com um céu
extremamente estrelado e com uma lua cheia linda bem no meio dele.
— Se o “cara” lá de cima existisse de fato, essas pessoas não precisariam estar
aqui nesse momento recebendo comida na rua, teriam uma casa com uma mesa
farta todos os dias e uma cama quentinha para dormir. — Fiquei irritado, não
acreditava mais em Deus e não suportava quando alguém falava bem dele na
minha frente.
Ajeitei a postura, sentindo a minha perna pulsar de dor. Só queria realizar logo
o que fui fazer ali e ir embora daquele lugar o mais rápido possível.
— Se Deus não existisse não teria por aí anjos em forma de pessoas como a
menina Juliene, que está na terra para se preocupar com gente como nós, que é
invisível para o restante do mundo. Diferente do senhor, não tivemos a mesma
sorte de nascer em um berço de ouro. Ela acabou de ser demitida do trabalho,
tirou do pouco que recebeu para dividir conosco e passou o dia todo cozinhando
para pessoas que nem conhece. Por mera gentileza, amor ao próximo. A melhor
forma que encontrei para agradecer foi seguindo o seu exemplo na primeira
oportunidade que apareceu no meu caminho. No caso, ajudando o senhor,
impedindo que fosse de cara no chão, siga a corrente do bem e passe o ato
adiante. — Sorriu na direção de Juliene que havia acabado de notar a minha
presença.
Ela estremeceu quando os seus olhos encontraram os meus, surpresa. Minha
respiração falhou quando sorriu, feliz em me ver? Tudo parou à nossa volta, não
existia ninguém além de nós.
Éramos só eu e ela.
— Bem que a minha vó sempre diz que gentileza gera gentileza, ato bonito
dessa jovem distribuindo sopa para os moradores de rua. Vemos aos montes
pessoas por aí dizendo ter pena, mas não fazem nada para ajudar. — E eu era
uma dessas pessoas, pensei comigo vendo o meu motorista fazendo amizade
com o senhor que me ajudou.
Por isso contratei Ramón, sempre gentil e simpático com todo mundo,
independentemente da cor ou classe social.
— Já que não quer aceitar o dinheiro, obrigado pela ajuda. Sou Romeu
Alcântara, se precisar de mim algum dia é só me procurar que terei o maior
prazer em ouvi-lo. — Estendi a mão para cumprimentá-lo, mas sem tirar os
olhos de uma certa baixinha que também não tirava os olhos de mim.
— Prazer, senhor, pode me chamar de Marley. — Sorriu surpreso, não
esperava que eu o cumprimentasse dignamente. Deve ter pensado que um
“engomadinho” como eu, jamais deixaria um morador de rua tocar em mim.
Besteira! Para mim, era uma pessoa como qualquer outra, porém mais educada
que a maioria.
— O prazer foi todo meu, senhor Marley. Se me der licença, preciso falar com
uma pessoa.
Caminhei na direção de Juliene como se estivesse sobre algum efeito
hipnótico, não conseguia parar de olhar para ela. A dor no meu joelho havia
abrandado milagrosamente, na verdade, eu nem sentia mais minhas pernas, era
como se flutuasse e não andasse em meio às pessoas. A cada vez ia chegando
mais gente para se alimentar da sopa feita por Juliene, até eu fiquei curioso para
provar. Tinha que admitir que o cheiro estava divino, não havia jantando ainda e
o meu estômago roncou em protesto devido à fome.
Conforme ia me aproximando, ela ficava ainda mais sem jeito com a minha
presença, como uma adolescente perto do garoto que estava a fim, passando a
mão pelo cabelo várias vezes tentando se concentrar em servir a sopa, mas não
conseguia ficar nem cinco segundos sem olhar na minha direção. Foi me desafiar
achando que eu não viria aqui e agora não sabia como agir na minha frente. Se
não aguenta o calor do inferno, não provoque o diabo.
Ponto para mim, baixinha!
— Oi — cumprimentei.
Cortei a fila para falar com ela e quase apanhei por conta disso, causando um
alvoroço devido às pessoas famintas que estavam atrás de mim, algumas, pela
magreza, talvez estivessem há dias sem comer. Fiquei com pena ao ver mulheres
grávidas na fila, crianças de todas as idades e pessoas idosas. Agora entendo por
que minha mãe brigava comigo quando deixava comida no prato. Eu tinha tanto
e ainda não tinha montado nenhum projeto social na minha empresa para ajudar
os necessitados, a vergonha me acertou como a força de um raio.
— Oi, qual motivo ilustre trouxe o senhor aqui no meu humilde bairro?
Debochou, a diabinha.
— Você, baixinha, sabe muito bem disso — respondi direto, e ela estremeceu
engolindo a seco devido ao meu tom firme.
Mas não deixou transparecer por muito tempo, conseguiu disfarçar direitinho
o impacto que a minha presença causava nela e deu a volta por cima rapidinho
elevando o queixo, lançando um olhar de indiferença na minha direção.
Eu adorava isso nela, a coragem de me enfrentar de igual para igual era
excitante.
— No momento, estou ocupada. Se quiser falar comigo, vá para o final da fila
e aguarde a sua vez. — Olhei para ela pasmo! Só podia estar brincando, mas
sabia que não estava.
Ela me faria esperar naquela maldita fila enorme mesmo sabendo que a minha
perna estava doendo há dias, queria me fazer ficar quase uma hora ou mais de pé
em uma fila sendo que o que tínhamos para resolver não levaria um minuto. Seu
objetivo era medir minha força de vontade, ver até onde iria para tê-la de volta
em minha vida. Era exatamente por isso que Juliene mexia tanto comigo, não
tinha pena de mim ou me tratava como um inválido como a maioria das outras
pessoas. Fazia eu me sentir vivo, vencer os meus próprios limites.
— É obvio que ele não está aqui por causa da sopa, filha. Parece ansioso para
falar com você, pode ir que eu, seu padrinho e Melissa damos conta de servir o
pessoal até você voltar. — Uma mulher alta muito bonita de cabelos cumpridos
pôs a mão em seu ombro, deslizando o olhar pelo meu terno italiano cinza
caríssimo e parou na minha bengala.
— Não me importo o motivo que o trouxe aqui, madrinha. Não é melhor do
que ninguém para passar na frente dos outros. Aqui é a minha área e eu não
pretendo facilitar as coisas para ele, nem agora nem nunca! Além do mais,
senhor Romeu, só estou retribuindo a forma que fui tratada na primeira vez que
estive na sua casa, lembra? Esperei quase uma hora para que me atendessem.
Agora já sabe que comigo o buraco é mais embaixo, olho por olho e dente por
dente. — Juro por Deus que a minha vontade era pegar aquela garota, colocar no
meu colo e dar umas boas palmadas na sua bunda para largar de ser atrevida,
abusada e irritante.
E linda demais, como não percebi isso antes?
Puta que pariu, como eu não havia reparado antes em como Juliene era
atraente? Nervosa daquele jeito com as bochechas coradas era mais sexy ainda.
Os pequenos lábios rosados dominavam toda a minha atenção naquele momento,
tão atraentes. Olhar penetrante, misterioso. Tão pequenina minha menina, não
sabia de onde vinha tanta coragem para ser atrevida daquele jeito, eu poderia
destruí-la com apenas um sopro.
— Você esqueceu de falar para sua madrinha que quando foi à minha casa
ficou esperando ser atendida em uma sala de luxo com a minha governanta ao
seu dispor, não em uma fila enorme com a perna explodindo de dor — disse de
uma vez só aos gritos, roxo de raiva e fui embora mancando, furioso.
Para o final da fila.
Depois de quarenta minutos na fila permanecendo de pé, não por condições
físicas, mas por opinião mesmo, pensei que Juliene ficaria com pena de mim e
viesse falar comigo, mas não veio. Fingiu que eu não estava ali, agiu
normalmente conversando e rindo animadamente com um “coleguinha” dela que
chegou atrasado para ajudar a servir a sopa. Não perdia a oportunidade de tocá-la
todo cheio de intimidade, devia ser o seu namorado ou alguma paquera. Coitado,
devia sofrer na mão daquela diabinha. Só faltavam os chifres e o rabo, um garfo
bem grande e afiado para torturar os outros.
De santa só tinha a cara.
Depois de muito sofrimento e estresse, faltavam apenas quatro pessoas para
chegar a minha vez para falar com ela e eu já estava no meu limite! Ela e o
namoradinho estavam me tirando do sério, a baixinha flertava com ele na minha
frente só para me provocar. E estava conseguindo.
Estava farto daquela situação, um empresário do meu gabarito não merecia
passar por aquilo. Não mesmo.
— Mamãe, eu estou com frio, quando vamos poder ir para a casa? — Fiquei
tão entretido com a minha raiva que nem percebi que a mulher atrás de mim
segurava uma criança tristinha no colo, tirei a atenção do “casalzinho romântico”
e virei para trás para escutar melhor a conversa das duas, a menininha tinha a
voz chorosa.
— Nós não temos mais casa, filha. As roupas que tínhamos vendi ontem para
comprar o almoço, se não fosse o senhor Marley avisar que distribuiriam sopa
aqui teríamos que dormir com fome hoje de novo. — Pelo jeito, o senhor Marley
era mestre em ajudar as pessoas, assim como Juliene.
Havia tanto sofrimento no rosto daquela mulher, dor. Os cabelos loiros
bagunçados, magra ao extremo. A filha não tinha a expressão alegre natural que
uma criança deveria ter, toda encolhida usando apenas um vestidinho fino. A
noite havia esfriado um pouco, a mãe alisava os seus braços na tentativa inútil de
mantê-la aquecida.
Não pensei duas vezes em tirar o meu paletó e colocar em volta da menina,
sempre sonhei em ser pai, ver uma criança sofrendo, de fato, partia o meu
coração.
— Melhorou agora, querida? — A pequena assentiu no colo da mãe dando um
sorrisinho triste, mas, pelo menos, estava sorrindo agora.
— Obrigada, senhor, não estou mais com frio. — A voz da pequena era doce,
um anjinho de cachinhos dourados e olhos castanho-claros.
— Não podemos aceitar, moço, esse paletó deve ter custado uma fortuna, não
precisa se incomodar conosco. — Tentou tirar o paletó da filha, mas não deixei.
— Hoje alguém foi gentil comigo, só estou passando o ato para frente. Tenho
um monte igual a este no meu closet, não se preocupe com isso, senhora.
Desculpe pela indelicadeza, mas onde está dormindo com a sua filha? — Não
queria me envolver com os problemas delas, mas por que não as ajudar se eu
podia? Então, fiz.
— Em um abrigo perto daqui, senhor. Meu marido morreu há seis meses com
câncer, gastamos tudo o que tínhamos para pagar o seu tratamento, como
havíamos vendido a nossa casa e eu tinha largado o meu emprego para cuidar
dele, quando dei por mim estava viúva e morando na rua da amargura com a
minha filha de cinco anos nos braços. — A menina limpou as lágrimas que
desciam pelo rosto da mãe, de pura dor.
— No bolso do meu casaco tem um cartão com o endereço da minha empresa,
apareça lá amanhã que vou deixar conversado com o meu assistente para te
arrumar um emprego. Temos creches para os filhos dos nossos funcionários, um
ótimo plano de saúde e cartão-alimentação bem gordo.
— Obrigada, senhor, não sei como agradecer. — Abraçou-me com a filha no
colo e tudo, radiante de tanta felicidade. Esperança transbordava dos seus olhos,
pura alegria.
E eu era o responsável por isso, me senti incrível. Ajudar os outros no final
acaba fazendo bem para nós mesmos. Não pretendia ficar só naquilo, iria montar
vários projetos em prol dos moradores de rua. Construir abrigos e empregá-los
até estabilizarem a vida e comprar a sua casa própria, criaria projetos para
financiamento de imóveis também. Estava animado com a ideia, colocaria tudo
em prática o mais rápido possível. Centenas de pessoas sairiam das ruas e
voltariam a viver dignamente.
Graças a ela: Juliene.
Minha inspiração.
— Não precisa agradecer, pegue esse dinheiro para pagar um lugar decente
para morar com a sua filha e comprar algumas roupas para ela até estabilizar a
vida de vocês. — Tirei várias notas de cem reais da carteira e entreguei a ela,
pensei que a mulher fosse derreter em lágrimas de tanto chorar.
— Que Deus abençoe o senhor, prometo fazer por merecer a oportunidade que
está me dando. — Ia dizer que não acredito em Deus, mas preferi guardar só
para mim para não estragar a sua felicidade.
— Eu aceito voltar a ser sua fisioterapeuta, senhor Romeu. Estarei na sua casa
amanhã no mesmo horário. — Levei um susto ao ouvir a voz doce de Juliene
vindo de trás de mim, a expressão azeda em seu rosto havia ido embora
deixando no lugar um sorriso estonteante. Puxou-me pelo braço para não
atrapalhar mais o andamento da fila.
— Desculpa por ter sido rude com você, Juliene. Não vai mais se repetir, eu
prometo. — Ela sorriu novamente, tirando-me do sério de vez.
— Podemos dar uma trégua, o que acha? Eu preciso do emprego, e o senhor
das minhas mãos.
E de todo o resto.
— Para mim está ótimo, baixinha. — Fez cara feia jogando o cabelo curto
para o lado, dando de ombros.
— Eu não sou baixinha, senhor. — Bateu o pé no chão, como uma criança
birrenta.
— Não é baixinha, é anã mesmo. — Gargalhei como há muito tempo não
fazia.
Nem assim, nem de qualquer outra forma, pensava que não sabia como se
fazia isso. Sorrir. Caminhamos até o meu carro, Ramón virou de costas fingindo
não notar nossa presença.
— Bobo. — Ela riu também, mas havia uma enorme tristeza em seus olhos
bem parecida com a minha.
A da perda.
— É muito lindo o que faz para essas pessoas, Juliene. Parabéns pela
iniciativa, ganhou meu respeito depois do que vi aqui hoje.
— E você o meu, depois do que te vi fazendo por aquela mulher na fila e sua
filha, confesso que não esperava esse tipo de atitude do senhor — alfinetou, mas
depois da forma que me comportei com ela, eu merecia.
— Não sou o monstro que todos pintam, Juliene. Se me der licença, preciso ir
embora, já fiz estripulias demais por hoje e mal estou aguentando ficar de pé. —
Abri a porta do carro, mas depois lembrei de uma cláusula nova que pretendia
acrescentar ao contrato. — E antes que eu esqueça, devido a distância que você
precisa percorrer todos os dias para ir ao trabalho, pedirei Constância para
arrumar o quarto de hóspedes para você usar pelo menos durante a semana e não
precisar ficar andando por aí sozinha todos os dias. É muito perigoso. Tenha uma
boa noite e até amanhã, senhorita Sullivan — conclui e fui embora antes que ela
quisesse protestar, eu não sei bem o que estava acontecendo ali, mas precisava
dela o mais perto de mim possível.
“Tudo o que eu queria era ficar longe de problemas, então conheci você e a
minha vida virou de cabeça para baixo”
CAPÍTULO 9
JULIENE
Fiquei totalmente desnorteada depois que Romeu foi embora, jamais imaginei
que ele realmente viria até o meu bairro pedir que eu voltasse a trabalhar para ele
e ainda ofereceu seu quarto de hóspedes para ficar quando eu quisesse. Ele
estava tão estranho, gentil. Falante. E o que fez por aquela mulher e sua filha foi
lindo demais, me deixou extremamente emocionada. Deu seu casaco para a
menininha, não somente dinheiro como oportunidade de trabalho. Sabia que
debaixo daquele monte de camada de gelo batia um coração enorme, que se
preocupa com o bem-estar de alguém além dele mesmo.
Passei a noite em claro pensando nisso, acabei perdendo a hora no outro dia
de manhã. Depois que acabamos de servir a sopa, ficamos até tarde arrumando a
bagunça que ficou na cozinha, não sobrou nem uma gota de sopa, deu para
alimentar várias pessoas. Graças a Deus. Eu me arrumei na velocidade da luz, o
pessoal ficou dormindo quando saí, pedi à minha madrinha para deixar a chave
debaixo do tapete e dar ração para o Romeuzinho, o suficiente até a minha volta.
Fui para o trabalho com uma animação que não me pertencia. Fiz o trajeto até a
casa do meu paciente, ansiosa para vê-lo logo.
Quando cheguei, fui recebida com um abraço simpático da dona Constância.
Ela me acompanhou até o corredor, Romeu já me esperava na porta da sala de
exercícios andando de um lado para o outro, arrastando a perna pelo chão,
inquieto. Não deixei que notasse minha presença de imediato, fiquei me
deliciando na imagem daquele homem magnífico de bermuda coladinha que
valorizava e muito suas pernas longas. Eu não achava suas cicatrizes feias, mas,
sim, lindas, afinal elas representavam sua força.
“Os guerreiros mais fortes são repletos de marcas, a maioria delas onde
ninguém consegue ver: na alma.”
— Bom dia, senhor Alcântara! — cumprimentei.
— O que acha de só Romeu e Juliene? Já somos íntimos o suficiente para essa
formalidade, não acha? — Do jeito que ele sorriu, eu faria qualquer coisa que ele
pedisse.
— Para mim está ótimo, Romeu. — Era meio estranho chamá-lo assim, mas
com o tempo me acostumaria.
— Podemos começar a sessão então, Juliene? — O meu nome saindo da sua
boca foi algo delirante, me deu um calor infernal.
— Sim, é claro. — Ele deu um passo para trás fazendo sinal para eu ir na
frente, mostrando um lado cavalheiro seu que eu não conhecia.
Esperei que deitasse na cama e ficasse em uma posição confortável, tudo no
seu tempo. Enquanto isso, aproveitei para prender o cabelo em um rabo de
cavalo, depois coloquei minhas mãos naquele homem lindo. Conversamos
durante toda a sessão, ele até estava tentando fazer piadas. Mas ouve um
momento que o clima na sala ficou tenso, olhava para qualquer lugar menos em
seus olhos.
Só o cheiro dele era inebriante, impedindo que qualquer raciocínio lógico se
formasse em minha mente.
— Você vai passar a noite aqui, hoje? — perguntou no finalzinho da sessão da
série de exercícios. Comecei com algo mais leve, aos poucos vou aumentando o
ritmo, não quero sobrecarregar seu joelho.
— Não posso, tenho algumas coisas para resolver hoje antes de ir para casa.
— Na sexta-feira viajo bem cedo para Nova York a trabalho, Juliene. — Meu
coração chegou a parar de bater, essa notícia me deixou triste.
— Quando vai voltar? Quer dizer… para saber quando vai voltar com as
sessões de fisioterapia, ainda bem que começamos há pouco tempo, assim, se
demorar a voltar não tem tanto problema caso seja preciso começar do zero —
expliquei enquanto dobrava sua perna bem devagar, para não forçar muito os
músculos.
— Do que está falando, Juliene? Vou ficar uma semana lá e você vai comigo,
não posso ficar mais nem um dia sem suas mãos em mim. Pode começar a
arrumar suas malas, não aceito não como resposta. — Fiquei em êxtase! Como
assim Nova York? Nunca pensei que fosse sair do Rio de Janeiro, que dirá outro
país.
— Como você quiser, Romeu — disse tentando parecer profissionalmente
séria, mas por dentro estava pulando e gritando de alegria.
•
Passei os dias contando cada segundo até chegar sexta-feira. Apesar de
Romeu continuar um pouco rabugento, aos poucos, estamos montando uma certa
“amizade”, ele me conta um pouco da sua vida e eu da minha. Escondo as partes
mais pesadas e acho que não sou a única. Quando eu o tocava era a mesma coisa
que estar no paraíso, havia uma energia boa entre nós. Algo inexplicável.
Quando a quinta-feira chegou, Romeu praticamente me obrigou a ir ao meu
apartamento com seu motorista apenas para arrumar minha mala e voltar para
sua casa mais tarde; alegou que seria mais fácil para viajarmos bem cedo no
outro dia, como cavalo dado não se olha os dentes então tive que aceitar sem
questionar muito. Pensei até em desistir de acompanhá-lo, mas aí lembrei de
como o Central Park é lindo em qualquer época do ano, em especial, no outono
com as árvores de folhas alaranjadas. Então, mudei de ideia rapidinho, mas
voltei a ficar em dúvida depois que Constância me apresentou o quarto onde eu
passaria a noite e logo após foi embora para sua casa.
Fiquei sozinha naquela casa enorme, depois de tomar meu banho no banheiro
mais chique que entrei na vida, vesti meu blusão branco de dormir e sentei-me
na cama King Size, enorme e macia, e permaneci imóvel. Tudo era tão chique
que eu me sentia como uma peça de um quebra-cabeças perdida na caixa de um
outro ao qual eu não pertenço, aquele luxo todo jamais combinaria comigo. Com
as mãos cruzadas sobre o peito, fitei o quarto por um bom tempo.
Romeu, ainda estava na empresa trabalhando e só chegaria mais tarde.
Agradeci a Deus por isso. Permaneceria ali quietinha até o dia amanhecer, eu
ando pensando demais nesse homem, mais do que devia. Ele é meu paciente,
além de rico, lindo de morrer e muito mais velho do que eu. Experiente. Mesmo
se visse algo em mim, nossos mundos diferentes jamais se fundiriam.
Traduzindo: Romeu Alcântara é um homem proibido para mim.
Pensando nisso, virei para o lado triste, fechando os olhos pesadamente para
que o sono viesse logo. Estava com saudades do meu gatinho, deixei ele na casa
dos meus padrinhos com o coração partido. O que eu estava fazendo ali, meu
Deus? Ali não era o meu lugar, nunca me senti tão perdida. Não sou nada para o
Romeu, nem deve lembrar que estou na sua casa. Talvez tenha me convidado
para ir com ele para Nova York apenas por pena e nada mais. Está escrito na
minha testa que nunca viajei nem para outro estado, nem outra cidade, para ser
sincera.
— Ainda está acordada, Juliene? — Congelei ao ouvir batidas na porta, só o
simples fato de ouvir a voz do Romeu fez minhas pernas ficarem bambas.
Não sabia se respondia ou fingia que estava dormindo, indecisão me definia
nesse momento.
— Estou sim, Romeu. — Acabei não resistindo, se for para me arrepender que
seja de algo que eu fiz, não que deixei de fazer.
— Eu pedi o nosso jantar, acabei de chegar da empresa, agora só vou tomar
um banho rápido e já desço. Pedi comida japonesa, espero que goste. — Cheguei
a lamber os lábios, parece até que adivinhou que eu amo sushi.
— Eu amo comida japonesa, se pudesse comia todo dia.
— Ótimo! É a sua cara mesmo gostar desse tipo de coisa: de dias frios e um
lugar quente e confortável para ler um livro. — Pude sentir seu sorrisinho atrás
da porta, ele havia aprendido a me ler tão rápido que me assustava.
— Poderia dizer que acertou em tudo, mas não quero que fique mais metido
do que já é. — Ele riu alto, eu amava vê-lo sorrindo.
— Está bem, Juliene, até daqui a pouco. — Romeu já havia ido tomar seu
banho, mas o meu coração ainda batia forte.
Troquei de roupa na velocidade da luz, coloquei uma calça jeans e uma
blusinha marrom de mangas finas. Soltei o cabelo e fiquei um tempão na frente
do espelho jogando a franja de um lado para o outro, mas estava curta demais
para dar um efeito dégradé, então deixei normal mesmo. Calcei minhas
sapatilhas correndo quando ouvi a campainha tocar, era o nosso jantar. Como já
estava tudo pago, peguei as sacolas com o entregador e fui ajeitar tudo sobre a
mesa de jantar.
— Uau! Que mesa linda, o aroma está delicioso! — Romeu chegou
sorrateiramente, lindo e cheiroso usando apenas a calça do seu pijama e camisa
preta de mangas curtas.
— Que isso, não fiz nada demais, só ajeitei as coisas nas travessas de
porcelana que achei no armário.
Como pode isso? Até com roupa simples, esse homem é divino.
— Vamos jantar, então, porque estou morto de fome. — Sorri tímida,
enquanto o fitava pegar gelo na geladeira se virando apenas com uma mão, a
outra segurava firme uma garrafa de vinho. Colocou sobre a mesa com mais
duas taças que pegou no armário. Fiquei surpresa. Ele sabia onde estava tudo
que precisava, sinal que apesar de ter muitos empregados conseguia muito bem
se virar sozinho.
Nos sentamos de frente para o outro, de cabeça baixa peguei de tudo um
pouco e coloquei no meu prato. Não tinha coragem de olhar para ele, meu rosto
queimava feito fogo, devia estar muito vermelho, e o homem nem chegou a abrir
a boca. Comemos em total silêncio por um bom tempo, até ele cortar o clima
tenso puxando assunto.
— Hoje não senti dor no meu joelho em nenhum momento, trabalhei o dia
todo andando de um lado para o outro resolvendo problemas sem sequer lembrar
que sou um aleijado. — Eu me remexi incomodada na cadeira enquanto levava
um sushi à boca, não gostava quando falava assim de si mesmo.
Havia algo no seu tom… que sempre me deixava mal.
— Não fale assim de você mesmo, Romeu. É um homem incrível, inteligente
e lin… — Dominei minha língua antes que ela falasse demais, disfarcei com um
pigarro um pouco alto e enfiei outro sushi na boca.
Em boca fechada não entra mosquito, essa frase também é do meu padrinho
Chicão.
— Você também é uma garota incrível, Juliene, talentosa e muito competente,
capaz de curar dores antigas — elogiou olhando no fundo dos meus olhos, fiquei
mais vermelha ainda. — E muito linda também, porém uma beleza discreta. Sem
máscaras ou quilos e mais quilos de maquiagem, não tem vergonha de mostrar
para o mundo quem é de verdade. É autêntica, engraçada sem ser cruel. Forte. —
Soltei um soluço, acostumei tanto a ouvir críticas que, agora, quando alguém me
faz um elogio fico emotiva.
— Obrigada, Romeu. Mas não sou nem a metade disso tudo, apenas uma
garota tentando seguir sua vida da melhor forma possível. — Dei de ombros,
virando a metade da taça de vinho em um gole só.
O que foi uma loucura, já que nunca tinha bebido uma gota de álcool antes.
— Ah, eu esqueci de dizer, você é modesta também. — Ele fez piada, todo
charmoso com um sorriso lindo de canto.
Soltei uma risada extravagante, acho que era o vinho querendo fazer efeito.
— Fala sério, senhor Alcântara. Olhe bem para mim e diga se vê pelo menos a
metade do que disse. Nós dois sabemos que não. — O sorriso sumiu do meu
rosto, a verdade dói.
Mas não se compara com a dor da ilusão, porque o tombo depois pode ser
mortal.
— Eu estou olhando, Juliene, e vendo muito mais qualidades do que eu disse.
— Sorveu um gole do seu vinho sem tirar os olhos de mim, havia tanto fogo
dentro deles que me queimou por completo.
Como o fogo do inferno.
— Acho que já bebi demais por hoje, nunca havia colocado uma gota de
álcool na boca antes. — Levantei meio tonta tentando pegar o prato para lavar,
mas cambaleei antes de chegar na pia.
— Deixa isso, Juliene. Depois a empregada limpa tudo, melhor ir dormir um
pouco porque amanhã a viagem vai ser longa. — Tomou o prato da minha mão,
depois me amparou segurando pelo braço até chegar na porta do meu quarto.
— Boa noite, Romeu.
— Boa noite, baixinha. — Pegando-me completamente desprevenida, beijou
meu rosto e me deixou paralisada feito uma boba.
Depois de voltar da outra dimensão, me arrastei até o banheiro e escovei os
dentes. Caí na cama e não me lembro de mais nada, feliz por ter tomado o
primeiro porre da minha vida e olha que mal tomei duas taças de vinho, mas já
me deixaram bêbada, sentindo-me no paraíso.
“Nossa aproximação foi crescendo sem que nenhum de nós dois
percebêssemos. Simplesmente aconteceu”
CAPÍTULO 10
J ULIENE
Quando Romeu disse que viajaríamos para Nova York, pensei que seria, no
máximo, na primeira classe, não no seu jatinho particular, aquilo deve ter
custado uma fortuna — como tudo que ele tinha —, não economizava para
proporcionar seu conforto. A cor predominante na decoração era branca, o
dourado sendo utilizado em algumas partes estratégicas para dar um efeito de
glamour no ambiente. Um belo carpete indiano cobrindo toda a extensão do piso,
minibar e uma televisão de plasma passando um filme romântico dos anos
oitenta.
Cruzei as pernas pousando as mãos sobre o colo, inquieta, fingindo admirar a
paisagem através da janela, um céu azul profundo. Romeu estava sentado na
poltrona de frente para a minha com apenas uma pequena mesa de madeira entre
nós, não precisava erguer o olhar para saber que ele estava me encarado desde
que o jatinho decolou da pista de voo, me tratando o tempo todo de um jeito
estranho, carinhoso.
Atencioso.
Eu sabia lidar com o Romeu rude, não com aquele gentil dos últimos dias.
Perguntando a cada dez minutos se estava confortável, fora a mania curiosa de
falar olhando no fundo dos meus olhos como se pudesse ler a minha alma.
Talvez pudesse.
— Gostaria de beber alguma coisa, senhorita Sullivan? — Uma voz feminina
tomou conta do recinto, me puxando de volta para o planeta terra.
Desviei a atenção da janela passando direto por Romeu, ignorando-o, e ergui a
cabeça para olhar para a bela mulher ruiva vestida com uniforme azul e um lenço
vermelho arrumado de forma elegante em seu pescoço, combinando com a cor
do seu batom. Era alta e tinha os olhos castanhos expressivos, fora o sorriso
simpático muito bem ensaiado.
— Não, obrigada. Parei de beber. — Sorri educadamente, da mesma forma
ensaiada que ela, perguntando-me se ela babava em cima do Romeu de propósito
ou simplesmente não conseguia evitar.
— Mas já, Juliene? Começou ontem — zombou Romeu, achando a maior
graça.
— Não devia nem ter começado, percebi que sou fraca para essas coisas.
— Traga para ela uma soda com limão, gim e vodca. — A voz grossa e sexy
de Romeu conseguiu atrair a minha atenção para o seu rosto, como eu
imaginava, os seus olhos escuros estavam cravados em mim.
Estremeci toda, se estivéssemos em terra firme teria saído correndo no mesmo
instante. A intensidade do seu olhar me intimidava, parecia um predador faminto
vigiando a presa, esperando o momento certo para encurralá-la em um canto
escuro e devorá-la ferozmente.
— Obrigada mesmo, Romeu. Mas eu não bebo mais, acho que mais uma taça
de vinho ontem e eu criaria coragem para fazer qualquer loucura. — Brinquei
coçando a nuca toda sem jeito, incomodada com aquela situação.
E a aeromoça também, o sorriso educado bem ensaiado havia sumido dando
lugar a um olhar semicerrado repleto de inveja por conta do patrão
estranhamente me tornar o foco de toda sua atenção.
— Vou me lembrar disso mais tarde. — Ele pensou alto, sorvendo um gole do
copo de uísque que nem percebi estar em suas mãos. Medindo pelo calor que
irradiava do meu rosto, eu devia estar da cor de um tomate maduro.
É isso mesmo, produção, ele está flertando comigo?
Impossível.
— Pode trazer a bebida, troque pela mais forte que tiver — pedi para a
invejosa da aeromoça que assentiu com desdém e foi buscar.
Romeu quase engasgou com o uísque rindo de mim, ele estava fazendo aquilo
para me provocar. Tenho certeza! Não demorou muito para a aeromoça voltar
com a minha bebida na mão, rebolando pelo corredor em cima de um salto fino
preto como se estivesse em uma passarela, a metida. Virei o líquido azul,
dançando dentro da taça de cristal, em um gole só. Desceu queimando pela
minha garganta, mas o gosto foi menos ruim do que pensei.
— Você tem olhos bonitos, Juliene. Acinzentados e intensos, como uma
nuvem tempestuosa. — A forma sensual que seus lábios mexiam me hipnotizou,
pisquei pelo menos umas três vezes tentando não parecer tão idiota fascinada
com sua beleza.
— Como está o seu joelho, Romeu? — Mudei de assunto rapidinho, foi a
melhor saída que encontrei no momento.
Ele fechou a cara, emburrando em uma fração de segundos, unindo as
sobrancelhas grossas ao se dar conta do que eu estava fazendo, me esquivando
de suas investidas sempre que podia. Não queria entrar em um jogo no qual não
tinha chance alguma de ganhar, os anos de experiência dele lhe davam uma boa
vantagem.
Sem coragem de encará-lo, fingi tirar alguns pelos invisíveis do meu casaco
cor de abóbora chamativo, não era nenhuma peça de grife ou a mais bonita do
mundo, mas só o fato de ter sido presente de aniversário adiantado do meu
padrinho Chicão, para eu poder levar para Nova York — com todo carinho
existente nesse mundo, preocupado comigo sentindo frio em outro país —, fazia
eu me sentir a mulher mais linda do mundo dentro dele.
— Um pouco dormente, mas nem um pouco de dor —respondeu seco,
ajeitando as costas na poltrona, sabia que estava começando a sentir dor, mas era
orgulhoso demais para assumir.
Pessoas na condição dele que sofrem há tantos anos com uma dor constante,
sabem exatamente como pode ser dolorosa e prejudicial à sua qualidade de vida
e disposição. No caso do Romeu é algo que requer muita atenção, pode ser
devido ao desgaste da articulação ou até mesmo algum acidente, talvez, ou
tantos outros motivos. Na maioria dos casos, as dores não são graves e podem
ser tratadas com diversos tipos de tratamentos supertranquilos.
Queria saber mais sobre as cicatrizes na perna dele, ver os laudos médicos
para saber melhor com o que estou lidando. E poder entender por que nenhum
dos outros fisioterapeutas — aposto que os mais caros e melhores do mundo —
tiveram sucesso tratando o seu problema no joelho, porém, eu, uma recém-
formada na profissão e sem nenhuma experiência, consegui fazer com que a sua
dor fosse embora com uma simples sequência de exercícios diários. No fundo,
suspeitava que o problema dele fosse psicológico, devido a algum trauma do
passado ao qual se culpa.
Acho que eu nunca saberia, a não ser que ele confiasse em mim ao ponto de
dizer por vontade própria.
— Dormente? Isso não é bom sinal, deixe-me dar uma olhada nisso. — Dei a
volta na pequena mesa e antes de pensar em abaixar para erguer o tecido da calça
do seu terno e avaliar o estado do seu joelho, fui impedida por ele.
Romeu segurou a minha mão de um jeito tão íntimo que o ar faltou nos meus
pulmões, a ponta do polegar deslizando pela minha pele delicadamente que era
quase imperceptível. O meu coração parecia querer sair pela boca a qualquer
momento, um calor infernal tomando conta de mim, nunca senti nada parecido
por nenhum outro homem. Por que só ele tem o poder de me deixar assim,
totalmente desnorteada? Pegando fogo por dentro.
Excitada!
Pare, Juliene! Recomponha-se.
— Por que não continuamos isso no quarto? — Perguntou ele naturalmente,
destilando erotismo em cada palavra.
— Co… como? — Gaguejei ainda em estado de choque.
— Já que vai olhar meu joelho, melhor que seja em um lugar mais confortável
do que sentado em uma cadeira de couro, não acha? — Disse como se fosse
óbvio, foi a mesma coisa que tirar o doce da boca de uma criança.
Quase morri de vergonha por conta dos pensamentos pecaminosos que
brotaram na minha mente de forma desenfreada igual água corrente na fonte.
Mas por que ele ainda estava segurando a minha mão? Tenho para mim que, às
vezes, ele se faz de bobo. Homem gostoso dos infernos! Se o erotismo pudesse
se materializar, obviamente, seria Romeu Alcântara.
— Por mim está ótimo, pode ser onde o senhor se sentir mais à vontade.
— Cuidado, Juliene, sou bastante criativo. — Corei na mesma hora, ele tinha
o prazer de me fazer ficar vermelha.
— Onde fica o tal quarto, senhor Romeu?
— Por aqui. — Pôs-se de pé com um pouco de dificuldade tendo que se apoiar
em mim, só então deu-se conta que ainda segurava minha mão. — Desculpe. —
Afastou-se imediatamente, pegando a bengala atrás da poltrona.
— Tudo bem. — Sorri.
— O seu “namoradinho” não vai gostar muito de saber que você segurou a
mão de outro homem, você não acha? — Ironizou maldoso.
— Em primeiro lugar, eu não tenho “namoradinho” nenhum. Segundo, se
tivesse não seria da sua conta, nem de ninguém. E terceiro, quem segurou a
minha mão foi o senhor, não o contrário. — Girei o nariz no ar e saí andando
para o fundo do jatinho onde tinha uma porta de madeira que suspeitei ser o
quarto, ouvi quando ele resmungou alguma coisa e depois o som da sua bengala
batendo no chão vindo atrás de mim.
Como eu imaginei o quarto era ali mesmo, pequeno, porém muito confortável.
As paredes com forro de madeira, outra televisão igual à da sala fixada na
parede, de frente para a cama. Ele devia viajar para lugares bem longe sempre,
aquele jatinho parecia uma casa ambulante.
— Sente-se e relaxe — pedi, e ele obedeceu, como um bom menino.
Tirou o paletó e a gravata jogando sobre a cama ao seu lado, abriu os três
primeiros botões da camisa branca dobrando as mangas até a metade do braço,
levando ao pé da letra quando disse que era para relaxar.
— Estou pronto, o meu corpo é todo seu. — Engasguei com a própria saliva,
ou eu estava com a minha mente muito suja ou ele estava falando coisas de
duplo sentido só para me provocar. Inclinou o corpo para trás apoiando as mãos
sobre a cama, virando a cabeça para trás, uma cena mais erótica que qualquer
filme pornô. Não que eu assista esse tipo de coisa, é claro…
Tirei o meu casaco também, respirando fundo, sentia um calor fora do
comum. E nem estava tão quente assim, pelo menos não o ambiente, mas o meu
corpo pegava fogo por dentro. Fiquei apenas de calça preta colada e blusa
branca, o problema foi que na pressa acabei esquecendo de colocar sutiã. Meus
seios não eram o que poderiam chamar de grandes e atraentes, mas eram do
tamanho suficiente para balançar livremente debaixo da blusa com os bicos
rígidos. Abaixei depressa em meio às pernas dele decidida a fazer o meu
trabalho o mais breve possível e sair daquela situação constrangedora correndo.
— Dói aqui? — Apertei bem em cima do joelho, ele respondeu que não,
balançando a cabeça de olhos fechados.
Ergui sua calça deixando as cicatrizes à mostra, meu coração apertava todas as
vezes que olhava para elas. Deslizei a mão pela sua pele de forma suave sentindo
seus pelos ouriçarem, de onde estava podia sentir a sua respiração cada vez mais
ofegante.
— Isso, está muito bom. Continue — gemeu.
Obedeci ao seu comando, continuei a massagem e fui me empolgando mais e
mais, subindo até a área mais acima do joelho. Em vez dos músculos relaxarem,
eles se contraíam velozmente.
— Basta, Juliene! Eu não aguento mais, saia daqui agora. — Empurrou-me
para longe bruscamente, fazendo-me cair de bunda no chão e eu prendi o fôlego
de tanto susto, sem saber o que fazer.
A única coisa que vi, de relance, antes de levantar e sair correndo para fora do
quarto, foi ele puxando o paletó para cima do colo rapidamente para tapar
alguma coisa que não queria que eu visse. Seja o que for, nada justificaria o fato
dele ter sido grosso comigo novamente, não mesmo.
“Você fez o meu coração de gelo derreter em chamas”
CAPÍTULO 11
R OMEU
J ULIENE
Não trocamos mais nenhuma palavra depois que saímos da limusine. Romeu
praticamente pulou do veículo depois do “quase beijo”, teve a cara de pau de
fingir que nada tinha acontecido ignorando-me por completo. Não olhou mais
para mim em nenhum momento. Fiquei constrangida quando o grosso quase
voou no pescoço do gerente só por causa da falta de vagas nos outros andares,
não conseguiu mudar o seu quarto para bem longe do meu. Sua intenção era se
distanciar de mim o máximo possível.
Como se já não fosse ruim, uma mulher esperava, ansiosamente, por Romeu
na recepção do hotel, sentada no sofá vermelho contorcendo as mãos sobre o
colo. E que hotel era aquele, meu Deus? Parecia aqueles lugares chiques que
aparecem nos filmes americanos, tinha até medo de tocar em alguma coisa e
quebrar, tendo que, depois, passar o resto da minha vida pagando. Pelo que
entendi, a mocreia loira trabalhava na filial da empresa dele aqui em Nova York,
e era responsável por deixar tudo organizado para a chegada do chefe sempre
que vinha ao país.
Seu nome era Paula, um loirão desses de parar o trânsito, com os cabelos cor
de ouro abaixo da cintura. Olhos verdes e uma boca carnuda que qualquer
homem pensaria em levá-la para a cama. E que corpo escultural era aquele, meu
pai? Curvas definidas e alta pra cacete parecendo uma modelo da Victoria’s
Secret. Mesmo dentro de um terninho social cinza, a maldita parecia
extremamente atraente e sexy. E veio andando na direção dele, cheia de
sorrisinhos para o lado do meu Romeu, vaca!
— Olá, senhor Alcântara. Seja bem-vindo a Nova York, estava ansiosa com a
sua chegada. — Fez biquinho, flertando com ele descaradamente.
Oferecida!
— Obrigado, Paulinha. Já preparou tudo? — Como assim, Paulinha? Que
intimidade era aquela dele com a sua assistente? Cheguei mais perto, mas ambos
ignoraram a minha presença completamente.
Romeu não fez questão de me apresentar, e a Paulavaca não fez questão
alguma de perguntar quem eu era…
— Mais tarde vou buscar o seu smoking para a festa de gala de amanhã à
noite para premiação dos melhores empresários do ano, o senhor está entre os
favoritos para ganhar o prêmio. Será no Luxury Space, pode levar uma
acompanhante se quiser. Eu estarei livre, pode me ligar a qualquer hora que levo
apenas dez minutos para me arrumar. — Entregou os dois convites da festa de
premiação, esperançosa que ele a chamasse para acompanhá-lo.
No evento e a noite toda, e pelo resto da vida se o Romeu quisesse.
Cruzei os braços, emburrada. Paulavaca, eu te odeio!
— Eu sempre vou sozinho aos eventos, Paula. Está cansada de saber disso,
uma coisa muito importante que aprendi recentemente é que “antes só do que
mal acompanhado”. — Foi a mesma coisa que levar um tapa, minhas bochechas
chegaram a formigar, virei o rosto para o lado tentando sobreviver ao impacto.
Romeu amassou um dos convites do evento e jogou no lixo, com a expressão
mais azeda do que nunca. Foi então que os olhos de Paula deslizaram sobre mim.
Ela também notou o tom de ironia na voz do chefe, era óbvio que tinha um
assunto mal resolvido entre nós. O clima pesado era quase palpável, não tinha
explicação, qualquer um que ficasse mais de um minuto perto de nós
logicamente notaria.
— Penso o mesmo, senhor. — A Paulavaca concordou, com aquela voz de
taquara rachada dela, podia ser bonita, mas quando abria a boca dava até vontade
de sair correndo.
— Vou para o meu quarto descansar um pouco, qualquer coisa pode me ligar
— disse Romeu, no seu melhor tom de empresário do ano.
— Sim, senhor. Como quiser, estou aqui para servi-lo — respondeu submissa
de cabeça baixa, meu Deus! Eu jamais seria submissa a alguém, muito menos a
um homem que estou a fim e o sentimento, obviamente, não era recíproco.
Assim espero.
Sem se despedir da Paulavaca, ele saiu andando em direção ao elevador e eu
fui correndo atrás dele como uma idiota. Não acredito até agora que contei ao
Romeu que havia me empolgado de propósito durante a massagem no jatinho,
quando vi já tinha falado. Perto dele, eu me sentia à vontade para dizer qualquer
coisa, como se nunca fosse existir segredo entre nós. A expressão que ele fez
enquanto as minhas mãos o tocavam durante a massagem foi excitante, e,
sinceramente, a única coisa da qual me arrependo foi de não ter aproveitado mais
aquele momento e subido com os movimentos um pouco mais para cima. O fato
de eu ser virgem não fazia de mim uma santa, na verdade, acho que depois que
eu provasse da fruta proibida não ia querer parar mais.
Ainda mais se fosse com quem eu queria que acontecesse…
No entanto, olhando para o lado ético, as coisas entre nós estavam tomando
um rumo diferente do que devia ser entre paciente e fisioterapeuta. E ele sabia
disso. Ele sabia! Se não soubesse, não fugiria de mim daquela forma, mas desde
quando fugir do problema resolve a situação? Só adia um confronto inevitável,
quanto mais empurrar com a barriga maior será o estrago quando a bomba
estourar. Em vez de me encarar, ficou ali igual a uma estátua olhando para a
porta de aço do elevador para não precisar me olhar. Não tinha ninguém quando
entramos, não aguentei e, assim que as portas se fecharam, acabei explodindo.
— Então é assim que vai ser? Fingir que não aconteceu nada? Que eu não
existo? — Levei as mãos à cintura, virada no cão como diz Melissa.
— Não sei do que você está falando, senhorita Sullivan. Pelo que me lembro,
realmente não aconteceu nada. — Mentiu com aquela cara de cínico que só ele
sabia fazer, que me deixava furiosa.
Contei 1… 2… 3… na tentativa de me acalmar, mas se ele achava que me
faria passar por louca estava muito enganado. Ô, se estava!
— Exatamente, não aconteceu nada! Então por que está agindo como um
completo babaca? Parecendo um adolescente inseguro, nem parece que tem
idade para ser o meu pai — impliquei novamente, mas não fazia ideia de quantos
anos tinha ao certo.
Com homens controladores iguais ao Romeu, essa é a melhor forma de
conseguir chamar sua atenção: fazendo-o sair do sério, mostrar sua verdadeira
face. Porque comigo é assim, se a máscara da pessoa não cai sozinha, eu mesma
arranco.
— Essa é a segunda vez hoje que insinua que tenho idade para ser o seu pai,
Juliene. — Lançou os olhos sobre mim como uma flecha, irado. — Pois fique
sabendo que tenho muito mais disposição que muito jovem da sua idade, um
fôlego de dar inveja a qualquer atleta — esbravejou, todo pretensioso.
— Lembrarei disso mais tarde. — Pensei alto repetindo as mesmas palavras
que ele disse mais cedo, todo cheio de malícia.
Romeu deu um passo para o lado, tomando uma distância segura de mim e
afrouxando o nó da gravata, na tentativa de disfarçar a expressão de agonia em
seu rosto que suava frio.
— Se acha que vai conseguir me fazer perder o controle novamente, está
muito enganada, baixinha. Não tente jogar comigo, muitas mulheres, bem mais
experientes e manipuladoras que você, tentaram e desistiram logo na primeira
tentativa. — Tentou me subestimar, semicerrando os olhos ameaçadoramente
como se conseguisse colocar algum tipo de medo em mim.
Coitado, não sabe de nada, inocente!
— Eu posso não ter a mesma idade das mulheres que costuma sair, Romeu.
Mas tenho mais cérebro do que todas juntas. Além do mais, não costumo desistir
fácil quando quero uma coisa, como bom soldado luto até a morte. — Minhas
pernas tremiam devida a raiva que vi em seus olhos, estávamos começando uma
guerra. Romeu havia me desafiado, e eu odeio ser desafiada, independentemente
das chances de ganhar, vou até o fim.
Por sorte, as portas do elevador abriram no nosso andar, dando-me a chance
de sair de perto dele o mais rápido possível bancando a ofendida. Praticamente
corri pelo corredor até encontrar a numeração correspondente à chave do meu
quarto. Apressei-me em abrir a porta quando ouvi o som da sua bengala batendo
no chão cada vez mais próximo de mim. Ao conseguir me alcançar, até tentou
falar alguma coisa, mas fechei a porta na sua cara antes que pudesse dizer algo e
virei a chave. Depois de segura, coloquei a mão sobre o peito tentando veemente
controlar a respiração.
— Estou a salvo, pelo menos por enquanto! — Pensei alto, tomada por um
alívio confortante.
Sentei-me na cama enorme que tinha no meio do quarto, era macia e
confortável. Contudo, o quarto tinha uma decoração meio apagada, as paredes
pintadas de bege combinando com a cor das cortinas, porém em um tom mais
forte, móveis modernos, mas discretos. Depois de um tempo, parti para o
banheiro deixando o rastro de roupa que fui tirando pelo caminho, dez minutos
depois estava como uma rainha dentro de uma banheira enorme cheia de
espumas, sais de banho e pétalas de rosas vermelhas. Uma taça de champanhe ao
meu lado e morangos com chantili. O meu mp3 tocando “Mirrors” de Justin
Timberlake. Adorava essa música.
Mas por dentro me sentia horrível, as coisas que Romeu falou me deixaram
para baixo. Sou “baixinha” como ele vive me chamado, não sou bonita, mas
também não sou nenhuma “Betty, a feia”, tenho lá o meu charme. Eu acho. Ter
mais um pouco de seio e bunda não seria nada mau, pelo menos mais 10
centímetros de altura, então, seria ótimo. Lábios grossos e… chega, Juliene!
Senão vou ficar a noite inteira dentro dessa banheira achando defeito em mim.
Foi então que fechei os olhos e pensei em algo que me fez sorrir.
Juliene Sullivan, apaixonada? Conta outra.
Parece até que escutei a minha prima Veronica falando e gargalhando na
minha cara. Obrigando-me a entrar no primeiro salão de beleza que
encontrássemos e em todas as lojas de roupas caras existentes em Nova York.
Ela acreditava fielmente que podia resolver tudo com um banho de loja, uma boa
maquiagem e um salto alto de grife.
— Como não pensei nisso antes? — gritei, sabe aquele momento que você
tem uma ideia tão boa que só falta aparecer uma lâmpada no topo da sua cabeça?
Então, foi mais ou menos isso que aconteceu comigo.
Saí da banheira correndo e vesti a primeira coisa que vi na minha frente e em
tempo recorde, coloquei o meu casaco cor de abóbora que o tio Chicão me deu e
fui às compras. Tudo por causa do Romeu. Antes de decolarmos no Brasil, ele
me obrigou a ficar com um dos seus cartões de crédito sem limite para alguma
emergência, e aquela era uma das grandes. No entanto, antes de sair às compras
passei na recepção do hotel e revirei a cesta de lixo ao lado da bancada, onde
meu paciente querido havia amassado e jogado o seu convide de acompanhante
para o evento em um ato extremamente grosseiro.
Eu ia precisar daquele convite essa noite, mas antes tinha que dar uma boa
repaginada no visual, porque amanhã a noite promete, a surpresa seria das
grandes. Ah, Romeu, me aguarde!
“Ele aflorou em mim o meu lado mais ousado”
CAPÍTULO 13
ROMEU
Não acredito que aquela baixinha abusada fechou a porta na minha cara! Eu
estava puto de raiva, irado. Fui para o meu quarto cuspindo fogo pelas ventas,
precisava beber algo bem forte para me acalmar um pouco. Tirei o meu paletó e
joguei junto com a minha maleta sobre a cama e fui em direção ao minibar
preparar uma boa dose de uísque francês. Sentei-me em uma poltrona que tinha
de frente para a janela panorâmica com a bela vista da cidade de Nova York.
Tinha um clima totalmente diferente do Brasil, a maioria das coisas era de um
tom frio de cinza. As pessoas que viviam ali não eram diferentes umas das
outras, todas sérias com a expressão fechada, como uma nuvem negra.
Diferente de Juliene Sullivan. Brasileira de personalidade forte, quente. Que
iluminava tudo por onde passava.
Gosto desse país, mas ele consegue me deixar mais triste do que naturalmente
sou. O que não era pouca coisa, porém nas últimas semanas o meu coração tem
permanecido em paz. Não tenho tido mais pesadelos, nem nenhum pensamento
suicida que me rondava com frequência. Já cheguei a tentar me matar várias
vezes, prefiro morrer do que continuar vivendo com esse vazio enorme dentro de
mim. De uns tempos para cá não tem doído tanto, curiosamente, depois que
Juliene chegou à minha vida.
Apenas coincidência, nada demais.
Relaxei o corpo encostando melhor as costas na poltrona e afrouxei mais o nó
da gravata. E assim que fecho os olhos, a primeira imagem que vem à minha
mente é do rosto da baixinha, porra! Por que diabos isso está acontecendo
comigo? Mais alguns anos de diferença e ela poderia ser minha filha, é muito
mais nova que o meu irmão caçula. Por mais atraído que eu estivesse, nunca
seria cafajeste ao ponto de seduzi-la, desrespeitando a sua honra.
Juliene podia até ser forte e independente, mas estava escrito bem grande na
sua testa: “SOU VIRGEM”. Admito que sentia algo muito forte quando estava
ao seu lado, mas nunca me aproveitaria da inocência de uma jovem que ainda
mal se formou na faculdade e não sabe o que quer da vida. Isso é coisa de
moleque e eu sou um homem. Garota ingênua, deveria até ter vergonha de ficar
nua na frente de um homem. Mas era incontrolável, a imagem dela se
materializava na minha frente com as bochechas coradas tentando tapar os seios
miúdos com uma mão e a outra sobre a parte íntima toda molhadinha pedindo
para ser explorada pela minha língua sugando cada gota da sua excitação.
Por Deus, Romeu. Pare com isso, homem!
Não teve outro jeito. Tinha que me aliviar ou explodiria, mas ela nunca
saberia que aquilo aconteceu. Seria um segredo meu e do “amiguinho” lá de
baixo. Falando nele, estava explodindo debaixo do tecido da calça, implorando
para ser libertado. Então me apressei em abrir o botão da calça e a abaixei junto
com a cueca boxer, meu membro rígido pulou para fora como se tivesse vida
própria.
— Porra, isso vai ser mais complicado do que pensei! — gemi ao segurar meu
membro tão duro que estava sensível ao toque mesmo que bem de leve, era uma
sensação dolorosa, porém deliciosa.
Quando fechei os olhos e comecei a me masturbar, Juliene veio com força
total em minha mente. Mesmo me sentindo culpado, não conseguia pensar em
nada mais a não ser nela só de calcinha apertando os seios enquanto mordia os
lábios fazendo cara de safada. Caralho! Essa menina estava me deixando
completamente louco. Conforme aumentava a velocidade dos movimentos, o
meu pau ficava cada vez mais duro, então, para suavizar a pressão, imaginei
minha baixinha ajoelhando na minha frente caindo de boca em mim com tudo o
que tinha.
Juliene é ousada nos movimentos, passando a língua em cada pedacinho da
minha excitação. Fui ao paraíso quando ela o colocou por completo dentro da
sua boca, dividindo os movimentos com chupões e lambidas. Olhando para mim
de baixo para cima fazendo aquela carinha de santa que me enlouquecia, logo
gozei muito em um jato longo e grosso.
Depois da sessão de masturbação mais intensa e deliciosa da minha vida, fui
procurar um banho. Ao terminar, enrolei uma toalha na cintura e fui direto ao
minibar fazer a única coisa que me restava: beber até apagar. Enchi a cara
bonito, bebi uma garrafa de uísque entre outras bebidas que nem sabia o que
eram. Mais tarde, desmaiei na cama totalmente bêbado, tanto que sentia o meu
corpo todo dormente.
•
Acordei somente no outro dia à tarde, nu em meio a uma bagunça de lenções,
eu estava um verdadeiro bagaço. O cabelo todo bagunçado e uma dor de cabeça
infernal. Liguei para a recepção e pedi um café bem forte. Tomei alguns
analgésicos que trago na minha mala, fiz minha higiene matinal permanecendo
pelo menos meia hora debaixo do chuveiro esperançoso que a água levasse junto
meus pensamentos impuros — com uma certa baixinha abusada — ralo abaixo.
Não obtive sucesso. Fiquei o resto da manhã no quarto, abri a porta apenas para
atender minha assistente, Paula, que veio entregar meu smoking para o evento à
noite.
Meus olhos traidores foram direto para a porta da suíte de Juliene, nem ouvi
uma palavra do que minha assistente tagarelava o tempo todo. Pensei no que ela
deveria estar fazendo naquele momento? Pensando em mim, talvez? Duvido
muito. Deve ter saído, fazendo coisas que os jovens gostam de fazer: se divertir.
Já passei dessa idade há muito tempo.
— Obrigado por tudo, Paula, agora se me der licença, vou descansar mais um
pouco, o evento à noite vai ser longo. — Ameacei fechar a porta, mas ela
impediu com o bico fino do seu sapato branco.
— Tem certeza que não precisa de mais nada? Estou aqui para cumprir
ordens, te satisfazer… — Estufou o peito deixando o decote mais à mostra, não
entendi qual era a sua com essa frase de duplo sentido.
Paula é uma mulher linda, mas um pouco oferecida. Muito, na verdade. Acho
que por isso não sinto nenhum tipo de atração por ela, gosto de desafios. Quanto
mais difícil, melhor. Vitória sem grandes batalhas, não tem graça.
— Infelizmente, o que eu preciso nesse momento, Paula, você não pode me
dar. — Bati a porta na sua cara, talvez assim saiba se dar ao respeito.
Aproveitei o resto do dia de folga para ler um livro, fazia um tempão que não
parava para relaxar assim. Comecei a me arrumar para o evento logo que
começou a escurecer, queria chegar cedo no hotel Luxury Space, mas acho que
todo mundo teve a mesma ideia que eu, pois o evento já estava lotado quando
cheguei. Da entrada dava para ter uma vista privilegiada da festa. Esse local
sempre foi muito requisitado para eventos de grande porte como aquele, onde
somente o pessoal de renome é convidado a comparecer. Os dez melhores
empresários da atualidade concorrerão ao troféu de melhor do ano, estava
orgulhoso em ser o primeiro brasileiro a fazer parte da lista dos finalistas. Mas
no fundo, o meu desânimo era tanto que, por mim, estaria em casa, no Brasil, em
frente à minha lareira curtindo uma boa música e bebendo um bom vinho.
No entanto, já que eu vim para esse evento tão elegante, vou tentar aproveitar
ao máximo e não vou embora sem levar comigo o prêmio de empresário do ano.
Pensando assim, adentrei o salão de cabeça erguida dentro do meu smoking
preto com abotoaduras de ouro, uma das minhas maiores qualidades sempre foi
me vestir bem. Já fazia um tempo que usar a minha bengala em público me
deixava extremamente envergonhado. Hoje, não vou dizer que me acostumei
com os olhares curiosos e os cochichos por onde passo, mas não me deixo abalar
com esse tipo de coisa, a maioria dessas pessoas que conheço não tem nem a
metade do que eu tenho em uma das minhas várias contas bancárias.
O meu poder está no meu cérebro, não nas minhas pernas.
— Boa noite, senhor. Precisa de ajuda para descer as escadas? — Um rapaz
loiro de olhos verdes usando um terno azul horroroso, que passava por mim, me
ofereceu ajuda, como se eu fosse algum inválido que não conseguisse nem
descer alguns degraus sozinho.
— Não, obrigado — respondi seco.
— Tem certeza, tio? Pessoas na sua “condição” têm que estar sempre
acompanhadas de um ajudante. Pode cair e se machucar feio. — Seu olhar
desceu para a minha bengala.
Tio? Agora, além de inválido, me chamou de velho e ainda está se achando o
“bom samaritano” do dia, que ajudou o velhinho aleijado.
— Sim, eu tenho certeza. E eu não sou seu tio, graças a Deus. Você também
precisa de ajuda para vestir-se melhor, e um bom cabeleireiro para fazer um
corte decente nesse seu cabelo estilo “menininho da mamãe”, mas nem por isso
eu fiz nenhum comentário para te constranger na frente das outras pessoas.
Disse e saí sentindo-me vingado.
Quando terminei de descer aquela escada enorme, sozinho, estava exausto e
com a boca seca, procurei com os olhos onde estava o bar e fui direto para lá
pedir algo para beber. Embriagar-me tem sido minha única saída desde que
conheci Juliene. Apoiei a minha bengala no balcão e debrucei o corpo sobre a
pedra escura de mármore, assim que o barman me viu, veio me atender
imediatamente, sendo que tinha um monte de pessoas na minha frente.
— O que vai querer beber hoje, senhor? — Sorriu para mim, não correspondi.
Mal havia chegado e era a segunda pessoa que me tratava como um aleijado,
só por conta de uma bendita bengala. Tenho fé que algum dia possa conseguir
me livrar desse troço, voltar a ter uma vida o mais normal possível.
— Ele vai beber uma vodca com limão, por favor. — Olhei para o lado e vi a
única pessoa que não queria encontrar naquela noite: Otavio Rilton. Eu o odiava,
o sentimento da parte dele por mim era recíproco.
Ele também era dono de uma marca de carros importados, vivia competindo
comigo em tudo.
— Olá, Otavio, como vai? Espero que bem mal, pode deixar que a minha
bebida eu mesmo pago — alfinetei, retornando a minha atenção para o barman
enquanto preparava a minha bebida com uma técnica invejável, fazendo um
pequeno show com manobras difíceis, jogando frasco para tudo que é lado, deve
viver praticando em casa.
— Enfim conseguiu entrar para a lista de melhores empresários do ano, esta é
a sexta vez que sou indicado. — Lancei o meu olhar sobre ele novamente, tinha
descendência japonesa e a estatura baixa, mas com um ego enorme, do tamanho
do mundo.
Muito bem-vestido dentro de um terno cinza italiano, ostentando seu relógio
cravado de diamantes, cordão e pulseira de ouro branco. Tinha os olhos
puxadinhos que nem dava para ver direito qual era a cor, cabelos espetados para
cima. Um bom porte físico, admito, devia viver dia e noite na academia.
— Mas nunca levou o prêmio para a casa não é mesmo, Otavio?
Ataquei direto no coração.
— E a perninha manca, como vai? — Ele fez o mesmo.
— Boa o suficiente para chutar a sua bunda, caso seja preciso. — Ele nem
ouviu, estava entretido demais olhando na direção do topo da escada. Tanto que
até esqueceu da nossa briga, que bom, talvez eu consiga sair de perto dele de
fininho.
— Cara, quem é aquela gostosa que acabou de chegar? Nunca a vi por aqui
antes, com essa carinha de santinha me lembraria com certeza. Deve ser alguma
empresária rica ou socialite, sei lá. Só sei que é uma delicinha. — Revirei os
olhos, sabia que para chamar tanto a sua atenção assim tinha que ter mulher no
meio.
Otavio, depois que ficou solteiro, gasta metade da sua fortuna com mulheres.
Não podia ver um rabo de saia que não sossegava até levá-la para a sua cama e
depois descartava a coitada como se não fosse nada. É um cafajeste de marca
maior. Nem fiz questão de virar para ver quem era a tal mulher, devia ser alguma
dessas loiras peitudas que costumam sair ao seu lado estampado nas colunas de
fofocas.
— Cuidado com as “com cara de santa”, essas são as piores. — O alertei. E a
imagem do rosto delicado de Juliene veio à minha mente novamente com tudo.
Minha diabinha com cara de anjo, devia estar quietinha no seu quarto agora,
dormindo.
— Mas com aquela baixinha ali vale a pena correr o risco, um espetáculo de
mulher. — O tom dele era de pura luxúria, desejo. Um caçador de olho na sua
próxima presa, coitada dessa pobre moça, tenho até pena dela.
Espera aí, ele disse baixinha?
Quando virei para olhar quem era a tal mulher no topo da escada, o meu
coração perdeu uma batida. Puta que pariu! Era Juliene. A minha Juliene. Eu não
podia acreditar que ela teve coragem de fazer isso, meu Deus, aparecer no
evento linda desse jeito só para me provocar. Havia mudado o visual por
completo. E dentro daquele vestido vermelho tão justo, com alças finas, que
revelou curvas em seu corpo pequeno e delicado então, estava simplesmente
irresistível.
Fiquei de queixo caído diante de tanta beleza!
Delicada e, ao mesmo tempo, sexy.
Assim que os seus olhos encontraram os meus, ela começou a descer os
degraus lentamente com olhar penetrante em mim, poderoso. Havia uma
abertura generosa na lateral esquerda do vestido — bem generosa mesmo — que
quando andava deixava à mostra uma boa parte da coxa, em especial, a pinta que
vi perfeitamente com os meus olhos de gavião, que mulher atraente! O cabelo
estava diferente, na altura do queixo, mais curto atrás e maior na frente. As
pontas haviam sido clareadas um pouco, mas não muito, só para dar um charme
no novo corte.
A franja reta havia sido jogada de lado, tirando um pouco da sua aparência de
menina. A maquiagem foi muito bem-feita, tudo escolhido na medida certa para
me fazer perder a razão de vez. Principalmente o batom vermelho combinando
com a cor do seu vestido, dando um belo contraste com a cor branquinha de sua
pele. Para completar, sapatos pretos de salto finíssimo. Eu sempre fui louco por
mulheres de salto alto, a imaginei usando apenas eles.
Juliene não estava atraindo apenas a minha atenção e a de Otavio, mas, sim, a
de todo mundo. Simplesmente belíssima em todos os sentidos, uma mistura
arrasadora de menina com mulher. O seu sex appeal naquele momento era só
vendo para crer, ou melhor, sentir. Irradiando energia erótica por toda parte, me
acertando com impacto profundo.
— Agora, sim eu estou perdido de vez! — Pensei alto e me arrependi
amargamente depois. Otavio estava ao meu lado, e pelo sorrisinho no seu rosto,
acho que acabei de dar a ele a arma que precisava para me atacar.
“Acima da beleza, eu vi a sua força em lutar por mim”
CAPÍTULO 14
J ULIENE
R OMEU
JULIENE
De todas as maneiras que imaginei de como seria o meu primeiro beijo, não
passou nem perto do que eu estava vivendo ao ter a virgindade dos meus lábios
sendo devorada por Romeu. A princípio suas mãos cravaram na minha cintura,
sugando a minha língua com um desejo avassalador, cheio de paixão e luxúria.
Contudo, apesar da iniciativa de agarrá-lo partir de mim, ele fora extremamente
gentil e generoso ao perceber que não tenho muita experiência no assunto e
diminuiu o ritmo. Achei isso muito fofo da sua parte, me fez sorrir sem separar
nossas bocas.
Mas os convidados destruíram o nosso momento de paixão, ao montarem um
coral desafinado e meloso dizendo em unânime:
“Ahh…”
Senti os músculos faciais de Romeu tencionarem na hora, ele interrompeu o
beijo no mesmo momento em um rompante, pegou-me pela mão e saiu me
arrastando para fora no local do evento, furioso! Bufando feito um toro, podia
ouvir seu coração batendo como um tambor. Ao passarmos pelas mesas, as
pessoas se despediram de nós com uma salva de palmas, discretamente passei os
olhos nos tios dele e percebi que sorriam escancaradamente de felicidade pela
cena que acabaram de assistir, de camarote, do nosso primeiro beijo. Os olhos
cheios de lágrimas como se abençoassem o nosso “relacionamento”, o problema
é que não existia nenhum.
E depois de agora, nunca que teria mesmo. Se eu sair dessa história viva,
estaria no lucro.
Foi então que a minha ficha caiu. Deus, o que eu fiz? Amanhã as fotos do que
aconteceu aqui estarão estampadas em todas as capas de revistas e jornais, fora
os programas de fofocas. Por isso, Romeu estava tão nervoso comigo, devia
estar me arrastando para a morte. Passamos por uma direção diferente da que
entrei, acredito que seja os fundos do prédio. Droga! Como pude ter sido tão
idiota estragando tudo, expondo o meu chefe dessa forma, não devia ter feito
isso.
Ele sendo tão gentil comigo doando o prêmio milionário do concurso para
realizar o meu sonho e criar um projeto social para moradores de rua do Rio de
janeiro, e eu o ferrei na primeira oportunidade que apareceu. Que maravilha,
Juliene Sullivan!
Eu precisava me desculpar pela burrada que fiz, dizer para Romeu que não
consegui segurar a paixão ardente dentro de mim e acabei roubando um beijo na
frente de todos. A verdade é que estava completamente apaixonada, deslumbrada
e totalmente fascinada por esse homem rabugento que está prestes a me matar,
mas sou louca de amor por ele mesmo assim. Pensando bem, dizer isso só
pioraria as coisas.
— Para onde você está me levando, Romeu? Vamos conversar sobre a burrada
que eu fiz, faço o que for preciso para consertar. — Ele não respondeu nada,
continuou me puxando pela mão até chegarmos em um beco apertado e escuro e
me empurrou sem nenhuma delicadeza para dentro dele.
Veio para cima como um leão faminto, e eu era a sua presa, os seus olhos
estavam mais escuros do que o habitual e os cabelos todos bagunçados por mim
durante o nosso primeiro beijo. Estava certa que tinha me levado ali para me
matar, ninguém nem ficaria sabendo.
— Pensa direito, Romeu, violência nunca resolveu nada e… — Ele me calou
com um beijo, pegando-me totalmente de surpresa com o seu gesto.
Meu coração parecia que ia explodir a qualquer momento, de paixão. Ele não
me arrastou para aquele lugar para me punir, mas, sim, poder me beijar do jeito
que queria, sem que fôssemos incomodados por olhares curiosos e darmos mais
assunto, amanhã, para os tabloides e programas de fofocas.
Não podia acreditar que Romeu Alcântara havia gostado do meu beijo a ponto
de querer repetir de forma tão possessiva. Ah, mas eu ia fazer gostar mais ainda,
ao ponto de ficar gamadinho! Não tenho muita experiência no assunto, mas
aprendo rápido e vou provar isso agora. Esse homem já é meu, e eu suprirei
todos os seus desejos mais profundos para que nunca mais queira tocar em outra
mulher que não seja eu.
Assim que Romeu abriu a boca, enfiei a minha língua dentro dela de forma
sensual, explorando o máximo de espaço possível marcando meu território.
Minhas mãos tremiam, não sei se estava fazendo a coisa certa, mas pelo gemido
que escapou da boca dele colada na minha, acho que sim. Senti-me segura para
ousar mais um pouco, envolvendo os braços em volta do seu pescoço, atraindo-o
para mais perto de mim, nossos corpos ficaram tão colados que pareciam um só.
Estremeci ao sentir algo duro esfregando na minha barriga, ele parecia fazer de
propósito para me provocar.
Safado.
Eu estava amando todo esse jogo de sedução.
Ele também.
— Estava louco para fazer isso desde que te vi chegar no evento, baixinha —
sussurrou com a voz aveludada de desejo, quase enfartei.
Agarrou-me bem forte erguendo o meu corpo do chão, obrigando-me a
envolver minhas pernas em volta da sua cintura, me esmagando contra a parede,
beijando a minha boca, sugando e mordendo meus lábios escandalosamente.
Gemi feito um animal no cio quando apertou a minha bunda por debaixo do
vestido e elevou os quadris para esfregar aquele troço duro e quente em mim
novamente.
Gemi… e gemi em seus lábios.
Senti o meu rosto queimar de vergonha. Ele sorriu lindamente achando graça
de me fazer perder o controle dessa forma. E eu? Bom, corei como no meu
primeiro dia de aula no ensino médio.
— O que você está fazendo comigo, menina? — Encostou a testa na minha e
colocou uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha, olhando no fundo dos
meus olhos.
— Não sei, me diz você? — Sorri dando de ombros, beijando-o brevemente.
— Você me deixa completamente louco, Juliene. Faz muito tempo que não me
sinto assim, tão vivo. Tive que te arrastar para esse lugar mais discreto ou faria
uma insanidade contigo na frente de todo mundo.
— Eu não me importaria se tivesse feito, também estou louca por você.
— Juliene… — exclamou de forma arrastada, deixando-me em sinal de alerta.
Entendi o recado perfeitamente.
— Desculpa por te expor na frente de tantas pessoas, ficar te cercando desde
que chegamos em Nova York, vasculhado o lixo para pegar o convite de
acompanhante que jogou fora e aparecer aqui de surpresa, na cara dura mesmo.
— Baixei a cabeça, morta de vergonha, mas tinha que contar tudo. — E
principalmente por gastar o dinheiro do cartão de crédito que me deu para uma
emergência com roupas novas e salão de beleza, tenho até vergonha de falar
quanto custou esses sapatos. Sei que tudo o que fiz foi errado, e pode descontar
tudo do meu salário — falei tudo logo de uma vez. Queria o máximo que
pudesse de sinceridade entre nós, de um jeito ou de outro, ele acabaria
descobrindo mesmo.
— Não precisa devolver nada, baixinha. Valeu muito a pena o investimento,
vou “desfrutar” bastante dele mais tarde. — Mordeu o meu ombro cheio de
segundas intenções, me arrepiei toda pensando no que ele queria dizer com
“desfrutar do investimento mais tarde”.
Que homem gostoso!
— É sério, Romeu. Não devia ter te beijado na frente de todo mundo, agi
como uma adolescente idiota. Na verdade, tenho agido assim desde que descobri
que estou apaixonada por você. Nunca gostei assim de ninguém antes, dei o meu
primeiro beijo agora há pouco. Nunca outro homem me tocou de forma tão
intima e… — Parei de tagarelar ao perceber a forma hipnotizante com que
Romeu me encarava. Cheio de admiração, como se eu fosse um diamante raro
em suas mãos, os olhos brilhando como uma estrela, tão lindo que poderia olhar
para ele pelo resto da minha vida.
— Venha, meu anjo, vamos voltar para o hotel agora mesmo. — Colocou-me
no chão com todo cuidado do mundo, ajudou a ajeitar a saia do meu vestido que
quase foi parar na minha cabeça, beijou a minha testa e saiu me puxando pela
mão como se fosse uma criança de cinco anos, e ele o meu pai. Mas por que não
me beijou na boca?
E que história era aquela de meu anjo?
Mudou o tratamento comigo de uma hora para outra depois que contei que
aquele foi o meu primeiro beijo e que nunca ninguém havia tocado o meu corpo
antes. Não entendi nada, onde estava o homem cheio de desejo que me agarrou
há pouco? Agora só falta querer me tratar como uma santa só por causa disso,
mas de jeito nenhum.
Deixei-o terminar uma ligação rápida que fez, pedindo que o motorista viesse
nos buscar imediatamente, e já fui logo esclarecendo qualquer mal-entendido
que minhas revelações causaram.
— Olha aqui, Romeu, não vou admitir de forma nenhuma que me olhe com
outros olhos depois do que eu disse. E não venha me tratar como uma santa
puritana, porque apesar de ter os meus princípios, estou longe de ser uma. —
Parei de andar, emburrada, soltando a sua mão no mesmo momento, cruzando os
braços e fitando-o inquieta.
Ele apenas riu balançando a cabeça, dobrando a minha raiva.
— Ah, Juliene… Pode ter certeza que o “tratamento” que vou dar a você no
hotel não é de nenhuma santa puritana, pode ficar tranquila quanto a isso. Eu
quero ser o primeiro em tudo contigo. Hoje vou te deixar marcada como minha,
para sempre. Já que estou na chuva, quero me afogar nela. — Sua voz saiu
aveludada, cheia de luxúria. Desenhou o contorno dos meus lábios inchados com
as pontas dos dedos.
Deu uma boa conferida no meu corpo, começando pelas pernas até encontrar
os meus olhos, mordeu os lábios e jogou uma piscadela charmosa para o meu
lado que quase desmaiei. Eu o desejava tanto que chegava a doer, ficava tão
lindo e gostoso dentro daquele smoking caro. Esfreguei uma perna na outra
sentindo a minha calcinha encharcada, quando vi já tinha pulado em cima dele
atacando a sua boca novamente.
— Eu sinto o meu corpo pegando fogo… um fogo que me queima por
completo… preciso te beijar ou sinto que vou morrer em chamas. — Eu disse
ofegante entre os beijos, não estava conseguindo raciocinar direito.
— O nome disso é tesão, baixinha. Por isso, a temperatura da sua pele está tão
elevada, eu sei como resolver isso, mas só quando chegarmos ao hotel, então,
não me provoque mais, pequena, porque estou por um fio de perder o controle
com você aqui mesmo e aí, sim, será um prato cheio para os jornais amanhã —
explicou segurando o meu rosto entre suas mãos, vi chamas ardentes dançando
dentro dos seus olhos e a temperatura da sua pele estava igual ou mais elevada
que a minha.
Mas é experiente, sabe controlar os seus desejos.
— E se você perder o controle, o que aconteceria comigo, senhor Romeu? —
Provoquei.
— Você é terrível, menina. — Balançou a cabeça.
E um sorriso maroto dançou em seus lábios, cafajeste e tentador.
— Beije-me! — Não pedi, mandei.
— Por Deus, Juliene! Já chega de provocação, eu consigo sentir o cheiro da
sua excitação daqui. Não quero perder o controle e agir como um adolescente
inexperiente possuindo você encostado em alguma parede dessas, é sua primeira
vez e tem que ser especial. —Senti vontade de chorar, percebendo isso ele me
abraçou bem forte em um gesto de carinho. Companheirismo.
Como não ficar ainda mais louca por esse homem?
— Eu não ligo para onde aconteça. Só de ser com você, Romeu, já faz desse
momento mais que especial.
— Mas eu ligo, meu anjo.
— Por que está sendo tão cuidadoso comigo como se eu fosse um bebê?
Indaguei curiosa.
— Porque, de agora em diante, vou cuidar de você como se fosse o meu
bebezinho, com muita atenção e carinho. Não estou nem aí para mais nada, só
quero viver isso que sinto toda vez que estou contigo. — Fiquei emocionada
com suas palavras, ninguém nunca cuidou de mim antes, sempre tive que me
virar sozinha.
Senti-me totalmente segura quando Romeu me abraçou puxando meu corpo
para si, depositando um beijo no topo da minha cabeça, parecia tão feliz,
tranquilo. Totalmente diferente do homem arrogante que conheci, enfim deixou a
máscara de homem frio que criou para o mundo e me mostrou sua verdadeira
face. Um vento gélido passou, me fazendo encolher em seus braços, cavalheiro
como ele é, tirou o casaco e colocou sobre os meus ombros. Ficamos abraçados
em total silêncio enquanto esperávamos a limusine, ele fez mais algumas
ligações, mas falou baixo de forma que eu não escutasse.
Então permanecemos ali, apenas desfrutando da presença um do outro. Aos
olhos de muitos, nós dois juntos ia parecer tão errado, mas para nós, nada nunca
pareceu tão certo. Dois mundos completamente diferentes que se completavam
de uma maneira intensa. Curiosa.
Quando a limusine, enfim, chegou para nos buscar, Romeu abriu a porta para
que eu entrasse. Ele deu a volta e sentou do meu lado, dessa vez o motorista se
tocou e levantou o vidro escuro assim que o veículo começou a se movimentar.
Nos primeiros quinze minutos, nós dois permanecemos calados olhando para
baixo. Era como se estivéssemos nos conhecendo de verdade naquele momento,
dois estranhos tímidos no primeiro encontro.
— Está animada com a construção do abrigo para moradores de rua, baixinha?
— perguntou meio que impaciente, com a voz rouca.
— Estou muito, parece até um sonho. — Não pude terminar a frase, todo meu
fôlego foi roubado por Romeu, através de um beijo que aconteceu assim de
repente.
— Não consigo mais tirar minhas mãos de você, acho que estou enfeitiçado
— murmurou com nossos lábios ainda unidos, depois senti sua língua se apossar
da minha boca novamente. Sedenta.
Fizemos o trajeto de volta para o hotel entre beijos e carícias no banco de trás
da limusine, fora extremamente respeitador e gentil comigo. O tempo todo
dizendo o quanto sou linda, forte e determinada. Prometeu cuidar de mim de
agora em diante, disse que nunca mais estarei sozinha. Tudo estava acontecendo
tão rápido, isso me assustava um pouco, mas eu não me importava, estávamos
felizes.
— Dirija o mais rápido que puder, por favor. — Romeu abaixou o vidro opaco
que separava nós dois do motorista, olhando para ele pelo retrovisor de um jeito
que o fez dobrar a velocidade indo em direção contrária ao nosso hotel.
— Para onde estamos indo, Romeu? — Perguntei curiosa virando o seu rosto
para olhar para mim, estava sentada em seu colo com seus braços em volta da
minha cintura de forma possessiva.
— Não seja curiosa, baixinha. Logo saberá.
— Pensei que não teríamos segredos entre nós, acho que me enganei. — Fiz
biquinho, vai que colava.
Não colou.
— Não banque a esperta comigo, mocinha. Surpresa é diferente de segredo,
tente controlar sua ansiedade só por mais 30 minutinhos. — Assenti, curvando
os cantos da boca em um sorriso travesso já com um plano em mente.
— Sabe o que sempre me ajuda quando estou ansiosa? — Iniciei, um pouco
tímida.
— Não faço ideia, baixinha. — Arqueou a sobrancelha com um ar de riso nos
lábios, sabia exatamente onde eu queria chegar.
Suas pupilas se dilataram, excitado, antes mesmo de ouvir a minha resposta.
— Uma boa distração. Acha que pode me ajudar com isso? — Esfreguei-me
desavergonhadamente em seu colo, meus braços rodearam o seu pescoço
aproximando nossos corpos, toda cheia de malícia.
Como eu nunca fui o tipo que banca a santa puritana, amei o fato dele ter
entrado no jogo bem rápido. Safado!
— Acho que consigo pensar em algo, sua danadinha. — Deu um tapa de leve
na minha bunda, e eu soltei um gritinho agudo de alegria, nunca o vi tão à
vontade antes. Tirou o paletó ficando apenas de colete por cima da camisa
branca, diga-se de passagem, uma bela cena erótica para se admirar.
Com uma expressão mal-intencionada, apertou um botão na lateral do banco e
imediatamente o vidro opaco subiu novamente devolvendo nossa privacidade.
— Estava contando com isso, Romeu. — Ansiedade era a palavra que me
definia naquele momento, louca para obter mais informações sobre o seu plano
para me “distrair” até chegarmos onde quer que seja que estava me levando.
— Abra as pernas, mocinha. — Paralisei suando frio, mas obedeci, morta de
vergonha.
Tenho quase certeza que a cor da minha pele pareava com o tom vermelho do
meu vestido, nunca me senti tão exposta antes. E o pior era que eu estava
amando toda essa sensação excitante de proibido, se abríssemos as janelas
estávamos a menos de um metro de distância dos outros carros passando por nós.
Queria conhecer mais desse mundo de prazer, aprender mais sobre o meu corpo.
Caramba! Sinto calafrio só de pensar que será nas mãos do Romeu.
— Ora essa, a senhorita quer que eu arrume um jeito de distraí-la e fica
vermelha só porque pedi para abrir as pernas? — disse sério, mas os dentes
trincados morrendo de vontade de rir do meu constrangimento.
— Desculpa — disse envergonhada, e ele gemeu alguma coisa baixinho.
As mãos, que estavam na minha cintura, deslizaram para os meus quadris
ajeitando o meu corpo em seu colo até ficar na posição que ele queria, meio de
lado com total acesso ao meio das minhas pernas. Minha cabeça repousou sobre
o seu peito, mesmo em cima do tecido da camisa pude sentir como a temperatura
do seu corpo estava elevada. Ele também estava excitado. Assim como eu.
— O que eu faço com você, hein, menina? Não faz ideia de como me deixa
louco toda vez que cora assim, sinto-me um pervertido por te desejar tanto. É
quase uma adolescente, ainda dá tempo de desistir se quiser e levarei você de
volta para o hotel e cada um vai para seu quarto fingindo que nada aconteceu. —
Entrei em pânico.
Ele estava mesmo dando para trás no finalzinho do segundo tempo do jogo?
Não mesmo, agora que provei do seu beijo não o deixarei escapar nem morta.
— A única coisa que quero é que me distraia como prometeu, senhor Romeu
Alcântara. — Beijei os seus lábios provocantemente. E literalmente escancarei
as pernas para ele, de forma que o meu vestido subiu, propositalmente, até a
altura da cintura deixando à mostra a minha meia de cinta liga preta e a calcinha
de renda da mesma cor.
Agradeci mentalmente a vendedora da boutique que me fez comprar o
conjunto de lingerie que eu estava usando debaixo do vestido, ela disse que uma
mulher solteira deve sempre estar com um trunfo desses debaixo da roupa
quando sai para algum evento importante. Bom, tinha acabado de usar a última
arma que tinha. Realmente não estava disposta a perder esse homem, mas tenho
ciência da experiência de Romeu, em um caminho que estou conhecendo agora.
— Meu Deus, Juliene. Assim você vai acabar me matando. — Sua voz saiu
abafada, quase trôpega.
Senti as pontas dos seus dedos deslizando pela parte de dentro da minha coxa
enquanto devorava a minha boca, faminto. Sua mão foi subindo cada vez mais
até chegar na tira da cinta liga. Puxou o elástico e soltou, acertando minha pele
em cheio, gemi de dor e prazer ao mesmo tempo. Mordi o seu lábio quando
deslizou a minha calcinha para o lado e alisou a minha intimidade, fazendo-me
arfar o corpo de prazer. Tomada por emoções desconhecidas, as quais não
conseguia controlar, tentei a todo custo fechar as pernas na tentativa de aliviar a
pressão no meio delas.
Romeu usou o seu joelho para me impedir, prendendo firmemente. Fui ao
delírio quando começou a massagear meu clitóris em movimentos circulares.
Minha temperatura subiu tanto quase em estado febril, para completar a minha
tortura com a mão desocupada invadiu o decote do meu vestido agarrando o meu
seio sem nenhum pudor, apertando com vontade, quase o arrancando fora.
— Ahhhhh Romeu, isso é tão… bom. — Perdi o fôlego quando enfiou o dedo
em mim, saiu lentamente e voltou com dois, introduzindo com jeito e na
profundidade certa.
Uma pressão muito forte dominou o meu ser, tive a impressão que explodiria a
qualquer momento. Romeu arqueou o pescoço, pressionando o encosto do
assento com a cabeça enquanto violava o meu corpo da forma mais deliciosa
possível.
— Você é tão apertadinha, Juliene. — Suor brotava da sua pele. Conforme
remexia no seu colo, senti algo ficando cada vez mais duro esfregando na minha
bunda, uma verdadeira loucura.
Ele contorceu a boca de maneira impaciente, lutando para não perder o
controle. Seus olhos encontraram os meus, a promessa de todo tipo de prazer
dentro deles me excitou ainda mais.
— Nunca senti nada tão bom antes, deliciosamente quente — gemi
enlouquecida sentindo seus dedos entrando e saindo de mim em um ritmo
contínuo, eloquente.
— Goze para mim, pequena. — Bastou ouvir o seu tom autoritário para que o
meu corpo obedecesse ao seu comando, totalmente submisso aos desejos
daquele homem divino.
Comecei a tremer em uma sequência de leves espasmos e senti um choque
forte como se um raio tivesse me acertado; segundos depois, toda a energia do
meu corpo pareceu acabar e um líquido viscoso escorreu da minha intimidade.
Apoiei a cabeça no peito de Romeu, exausta. Tentando controlar a minha
respiração, sentindo um calor infernal.
— Você está bem, querida? — perguntou preocupado, afagando o meu cabelo
com carinho.
— Nunca me senti tão bem, obrigada. — Ele riu, satisfeito com a minha
resposta.
Romeu agarrou a minha cintura, puxou um lenço do bolso e o passou
gentilmente no meio das minhas pernas, em um gesto extremamente íntimo e
protetor.
— Você fica linda durante o orgasmo, baixinha. Quero admirar essa cena
várias vezes, pelo resto da minha vida, entende isso? Sinto-me seu dono agora,
não pode se livrar de mim nem se quiser. — Ele me apertou forte em seus braços
que mal consegui respirar, prendendo-me possessivamente. — No pé em que
chegamos com essa loucura, não tem mais como voltar atrás. Não admito que
outro homem tenha o prazer de ver o que acabei de presenciar, apenas eu e
ninguém mais. — Sorri, já conhecia Romeu o suficiente para conhecer aquele
tom.
Ele estava falando muito sério.
Sorte a minha.
— Eu só não serei mais sua, Romeu, quando essa for a sua vontade —
afirmei, sentindo os músculos do seu corpo relaxarem. E sabe de uma coisa?
Fiquei muito feliz por isso, porque não pretendia ser de nenhum outro além dele.
Não é só a dor no joelho do Romeu que passa quando está comigo, a que
tenho no meu coração, deixa de existir quando estou ao seu lado. Esqueço de
tudo de ruim que a minha tia fez comigo, e a enorme culpa da morte da minha
prima que me corroía a cada segundo desde aquele maldito acidente até agora,
simplesmente se dissipa como um castelo de areia ao vento.
— Você tem idade para ser minha filha, Juliene. Futuramente, é óbvio, que
quando conhecer um bom rapaz vai querer me deixar e… — Foi a minha vez de
calar o meu rabugento com um beijo, o clima entre nós abrandava e esquentava
na mesma intensidade.
— Desculpe incomodar, senhor, mas já chegamos. — A voz do motorista
ecoou pela caixa de som, dei um pulo de susto ajeitando minha saia.
— Agora não tem mais volta, Juliene. — Sorriu desavergonhadamente, e eu
correspondi, tímida, colocando o cabelo atrás da orelha.
O lugar para onde ele me levou era uma casa, não tão grande como a dele no
Brasil, mas no mesmo grau de luxo, localizada em um bairro caro mais afastado
do centro da cidade. Pelo lado de fora, logo passa uma impressão extremamente
aconchegante, aquele tipo de lugar que dá vontade de morar pelo resto da vida.
Sua estrutura era toda de madeira, a frente enfeitada por um belo jardim de flores
exóticas. Fiquei encantada com o caminho de pedras que ia até a porta da frente,
parecia um quadro de mosaico. Tudo muito lindo e bem construído.
Fizemos todo o trajeto de mãos dadas, como um casal apaixonado, sentindo o
vento gélido tocar nossos rostos. A noite estava fria e romântica, perfeita para
namorar. Romeu tirou uma chave única debaixo do tapete e abriu a ampla porta,
quase desmaiei ao ver o que nos esperava do lado de dentro. A decoração era
rústica, com móveis de madeira escura. Uma mistura de antigo com moderno, o
que mais gostei foi da lareira na sala. Levei um susto quando fui pega no colo —
com um pouco de dificuldade por conta do seu joelho —, mas se manteve firme,
me levando não fazia ideia para onde.
— E o seu joelho, Romeu, ficou louco? — Tentei descer do seu colo, podia
muito bem ir andando, estava fazendo mais esforço do que podia, mas ele não
deixou.
— Não se preocupe comigo, querida, hoje é um dia muito especial para você e
merece ser tratada como uma rainha. A minha rainha. — Eu me derreti toda,
confesso, apaixonando-me ainda mais por aquele homem.
Tem se mostrado um verdadeiro cavalheiro.
— Todo rei merece a sua rainha, Romeu. — Sua risada saiu alta e divertida,
mas concordou com minha constatação.
— Agora você disse tudo, Juliene — confirmou. Caminhava com um
pouquinho de dificuldade, mas não chegava a ser preocupante.
Ao chegar em frente a uma porta, eu o ajudei a girar a maçaneta para abrir.
— Meu Deus! — Soltei um grito ao ver o chão do quarto coberto por um
tapete de flores de todas as cores, o teto cheio de balões de gás vermelhos em
formato de coração, a coisa mais linda que já vi na vida.
Havia uma janela panorâmica que ia do chão ao teto fazendo com que a luz
natural da lua refletisse sobre a cama King Size, bem ao meio dela, escrito com
pétalas de rosas vermelhas:
“Fico feliz em ser o primeiro, espero ser o último.”
Meu queixo literalmente caiu! Como preparou aquilo tudo em tão pouco
tempo? Era quase impossível.
— Primeiro e único, para todo sempre. — Pulei nos seus braços enchendo-o
de beijos, completamente apaixonada com o seu gesto de carinho e atenção
comigo, agora entendo os motivos de tantas ligações secretas antes da limusine
chegar para nos buscar.
— Pelo visto, acho que você gostou da surpresa, bebê.
— Gostei, não, eu amei — gritei para o mundo inteiro ouvir. — Mas como
preparou isso tudo em tão pouco tempo? — questiono girando o dedo ao redor
do quarto, tinha até champanhe dentro do balde de gelo e duas taças de cristal no
criado-mudo ao lado da cama.
— As pessoas dizem que dinheiro não é tudo, mas devo admitir que ajuda
bastante. — Jogou uma piscadela para o meu lado, sexy pra caramba.
— Bobo! — Dei um tapa no seu ombro, ele me pegou pela cintura e colou
nossos corpos.
— Obrigada, Juliene — disse fitando-me de forma ilegível.
— Pelo quê? — perguntei confusa.
— Por ter aparecido na minha vida, dando-me um motivo para acreditar que
poderia ser feliz mais uma vez. Você chegou, e o meu coração encheu-se de
esperanças novamente. — A emoção dos seus olhos dominou os meus também,
não consegui segurar as lágrimas, que deslizaram pelo meu rosto.
Se eu era a sua esperança de ser feliz, ele era a minha.
— Eu sinto o mesmo em relação a você, Romeu. — Nos beijamos cheios de
paixão, como se um fosse o colete salva-vidas do outro, perdidos no escuro, em
alto-mar. Nos completávamos de uma forma surreal, não tinha explicação.
Apenas tinha que ser vivido da forma mais bonita possível, com todo ardor que o
fogo da paixão nos permite.
“Sabíamos que seria eterno quando, enfim, percebemos que um completava
o outro”
CAPÍTULO 17
JULIENE
R OMEU
O dia havia clareado em Nova York, podia se ouvir o som distante dos
pássaros cantando alegremente e as buzinas dos carros tocando como uma
sinfonia na loucura que é o trânsito dessa cidade de manhã. Eu não consegui
pregar o olho nem por um segundo naquela noite, não com Juliene adormecida
em meus braços. O rosto delicado apoiado sobre meu peito, havia uma mecha de
cabelo caída sobre seus lábios ainda inchados e vermelhos, obra de arte feita por
mim algumas horas atrás. Nossos corpos tão próximos faziam o dela parecer
ainda menor, era como se eu estivesse abraçado com uma menininha indefesa.
Era a verdadeira imagem de um ser celestial, o qual tirei a pureza na noite
passada. E eu me sentia um pervertido por conta disso. Por Deus! Como vou
explicar isso para minha família? Ela é mais nova do que meu irmão mais novo,
tenho idade para ser seu pai. Mesmo assim, não me arrependo nem um pouco do
maravilhoso sonho que vivemos, foi incrível. O problema seria quando eu fosse
apresentá-la à minha mãe, ela era um pouco preconceituosa em relação a isso,
pensa que todas as mulheres que se aproximam de mim estão interessadas no
meu dinheiro. Na verdade, a maioria está mesmo, mas Juliene não é assim.
Ela era diferente de todas as outras que conhecia.
No entanto, mesmo com todos os problemas que estavam por vir, que seriam
muitos, não estava nem um pouco disposto a abrir mão de Juliene, essa hipótese
estava completamente fora de questão. Sem chance de negociação ou acordo, ela
é minha e ponto final. Não me sinto vivo assim há muito tempo, essa garota
chegou com seu um metro e meio de altura e nariz empinado me tirando
totalmente do sério com sua língua afiada. Foi me encantando com seu jeito
doce, mas, acima de tudo, a ferocidade em me defender que fez com que me
apaixonasse rapidamente por ela.
— No que você está pensando, Romeu? — A voz doce da minha menina
tirou-me dos meus devaneios, não havia percebido que tinha acordado e fitava-
me com seus olhos lindos em um tom de azul mais peculiar do que de costume.
Eles me enfeitiçavam facilmente.
— Em você, baixinha. — Desenhei as curvas dos seus lábios com o dedo,
depois os beijei. Eles eram rosados e doces como mel.
— Fico feliz em saber disso. — Bocejou.
— Você está bem, Juliene?
— Estou ótima, não se preocupe. Foi a melhor noite da minha vida, obrigada
pelo cuidado que teve comigo, Romeu. — Senti meu membro criando vida
debaixo do lençol, mas não me mexi, tenho certeza que ela não admitiu estar
com dor só para não me preocupar.
Eu sou muito grande, e ela pequena e apertada pra cacete, quase me esmagou
ontem quando entrei nela pela primeira vez.
— Não precisa agradecer, foi perfeito para mim também. Da próxima vez vai
ser melhor ainda, aos poucos vai se acostumando com meu tamanho. — Ela deu
um sorrisinho malicioso, era uma safadinha na cama.
— A prática leva a perfeição, sabia? — Disse rindo. Não disse que a minha
menina é uma safadinha? Assim não sei se consigo me controlar e esperar até
que se recupere da noite quente que tivemos.
Porra! Como eu quero estar dentro dela novamente, uma, duas, três, várias
vezes. Mal provei e já estou viciado. Deus! Logo eu, um empresário respeitado,
da minha idade, apaixonado por uma ninfeta.
Eu estou perdido.
Juliene é o tipo de garota — agora, uma mulher — que sabe o que quer. Fico
tão feliz que tenha passado por essa transformação em meus braços, só de pensar
que poderia ter sido com um filho da puta qualquer que não seria delicado com
ela, meu sangue ferve de raiva.
— Eu estou louco para fazer amor com você novamente, baixinha, mas não
quero te machucar. Não quer assumir, mas sei que está dolorida, sim. — Ela fez
um biquinho lindo, não aguentei e roubei um selinho.
As pontas dos meus dedos alisavam suas costas bem de leve, sua pele estava
toda arrepiada só com esse simples toque, o corpo de Juliene também reagia ao
meu involuntariamente.
— Muito bonito, coloca o doce na minha boca e depois tira. — Fingiu estar
zangada franzindo o cenho, por um momento quase acreditei que estava de
verdade.
— Eu vou colocar na sua boca, sim, mas um tipo de doce “especial”, baixinha.
Quero ver o recheio dele escorrendo nas bordas dessa boquinha rosada, enquanto
olho dentro desses seus olhos prateados cheio de tesão. — Puta merda! A cara de
safada que Juliene fez me deixou louco, umedecendo os lábios com a língua
enquanto esfregava as pernas uma na outra.
— Eu quero provar esse “doce” agora, por favor, Romeu. — Suplicou com a
voz sensual, já enfiando a cabeça debaixo do lençol indo atrás do que queria.
Porra! Eu esperava vê-la corando muito, escondendo o olhar de mim, não uma
resposta dessa tão direta. Juliene não ficava fazendo charminho e partia com
tudo para cima do que ela queria, amava isso nela.
Para minha sorte, nesse momento, ela queria a mim.
— Eu quero muito fazer isso com você agora, Juliene. Mas ainda é muito
cedo, não tem experiência para isso ainda. — Puxei-a de volta para cima pelos
cabelos e encarei seu olhar de pura frustração.
— Nossa, você é muito sem graça, não se parece em nada com o Romeu do
sonho que tive hoje de manhã, estávamos tomando um banho delicioso de
banheira, eu podia sentir a água morninha cheia de sais de banho. — Bocejou
sonolenta como se fosse voltar a dormir, se agarrando mais em mim.
— Que tal realizamos seu sonho agora, baixinha?
— Nada me deixaria mais feliz. — Seu sono foi embora na mesma hora, os
olhos brilhavam. — Pode ir na frente, estou indo logo atrás de você. — Tapou os
olhos, com vergonha de me ver pelado.
Gargalhei com vontade.
— Por que você não vai na frente? Vou logo atrás de você, meu anjo. —
Coloquei as mãos atrás da cabeça observando-a, suas bochechas avermelhadas.
— Está bem. — Levantou, com cuidado, enrolada no lençol, até parece que eu
deixaria que esse pedaço de pano atrapalhasse meu campo privilegiado de visão.
— O que eu disse sobre me privar da imagem magnífica do seu lindo corpo
nu, Juliene? — Já de costas para mim, ela me olhou por cima dos ombros, com a
sobrancelha arqueada.
— É o preço que você vai pagar por não ter me dado o “doce” que eu queria,
amorzinho — disse e saiu correndo rindo igual criança, e eu parti atrás dela
totalmente nu, com o mesmo humor que o dela, em direção ao banheiro.
Nem lembro quando foi a última vez que fiquei tão feliz assim, talvez nunca.
Juliene transmite algo especial em mim, forte.
— Te peguei! Pensou mesmo que conseguiria fugir de mim, mocinha? —
Agarrei sua cintura por trás, enchendo a curva do seu pescoço de beijos
molhados.
— Até que para um homem da sua idade, está bem em forma — zombou
rindo muito, sentindo cócegas enquanto tentava a todo custo puxar seu lençol,
ela puxando para um lado e eu para o outro.
Nossas risadas tomaram conta do banheiro, chegando a lacrimejar no canto
dos olhos. Era a primeira vez que a vi sorrir como uma garota da sua idade, feliz
e descontraída. Cheia de paixão, esperança.
— Vou te mostrar o que o velho aqui sabe fazer, sua atrevida. — Coloquei
minha pequena sobre a pia me aproximando dela, que imediatamente cruzou as
pernas em volta da minha cintura, e lhe tasquei um beijaço de tirar o fôlego.
— Faz amor comigo, Romeu, aqui e agora. — Cravou as unhas nas minhas
costas, arranhando de cima a baixo, esfregando sua entrada no meu pau duro,
estava me saindo uma bela provocadora.
— Tá bom, sua teimosa, eu também estou que não me aguento de vontade de
estar dentro de você novamente. — A malandrinha deu um sorriu radiante, como
consegui resistir a ela por tanto tempo? Não fazia ideia.
— Então vem aqui, vem… — Veio com as mãos gulosas em cima de mim,
acho que criei um monstro.
— Vamos fazer amor dentro da banheira, vai ser mais confortável para você.
— Dei um beijo rápido em seus lábios e fui colocar a banheira para encher.
Ao abaixar para abrir a torneira, senti os músculos da minha dolorosa ereção
contraindo ainda mais. Voltei para Juliene e ficamos no maior amasso até que a
banheira enchesse, entrei primeiro sentando na borda e, sem eu mandar, ela veio
e sentou no meu colo de frente para mim. Era pequenina, leve igual pena.
A expressão devassa em seus olhos acionou um botão dentro de mim, era a
imagem de um anjo agindo como uma capetinha. Ela sabia que estava no
comando e adorava isso. Ergueu o quadril bem devagar, sem eu precisar ensiná-
la, tomou a iniciativa sozinha. Olhou para baixo e viu que eu estava segurando a
base do meu pau, abraçou meu pescoço e começou a montar em mim bem
devagar.
— Vai com calma aí, baixinha, não quero que sinta dor. — Mordeu o lábio
inferior quando a pontinha começou a entrar, esfreguei a ponta do meu pau de
um lado para o outro na sua fenda olhando no fundo dos seus olhos.
— Nossa, que delicia, isso é muito bom — gemeu.
Desceu as mãos para meu ombro, apertando com força usando como base de
apoio.
— Porra, Juliene! Você está me deixando louco, garota —grunhi.
Quando menos esperei, ela sentou em um golpe só, soltei um gemido alto e
agudo. Ela não soltou um ruído, fechou os olhos enquanto sentia ser
completamente preenchida por mim.
— PUTA QUE PARIU! — Rosnei alto, acho que Nova York inteira ouviu.
Fiquei com medo dela ter se machucado nessa sua ousadia, mas antes que eu
pudesse dizer alguma coisa, enfiou a língua na minha boca devorando-a cheia de
tesão enquanto cavalgava em mim. Agora gemendo cada vez mais, conforme
aumentava a velocidade levantando o quadril e afundando em mim, mesmo com
pouca experiência nisso, ela estava mandando ver e acabando comigo de prazer.
Fiquei doido.
Peguei as rédeas da situação, segurando firme em sua cintura, a erguendo e
abaixando rápido e com força, entrando até no talo. Espalhando água para todo
lado, seu sexo apertado espremia meu membro pra lá de rígido.
— Ahhh, eu acho que vou… — gemeu rebolando em cima de mim.
— Goza para mim, baixinha. — Aumentei o ritmo. A observei virar a cabeça
para trás fechando os olhos, em êxtase.
A cena mais erótica do mundo.
— Romeu…
— Juliene… — E assim, chegamos ao orgasmo juntos, exaustos, com a
respiração ofegante. Porém, saciados, um clamando pelo nome do outro.
Tudo estava tão perfeito, tinha até medo do que enfrentaríamos quando
colocássemos os pés para fora da porta, em breve. O mundo virá para cima de
nós com tudo, espero que o que sentimos um pelo outro seja mais forte do que o
que está por vir. As pessoas costumam ser cruéis quando duas pessoas diferentes
se apaixonam, dão mais valor à aparência do que ao sentimento. A mídia vai ser
a primeira a cair matando, as pessoas do meu meio social e, a pior parte de todas,
minha família.
Depois de um banho bem gostoso, voltamos para a cama sem roupas e
dormimos por mais algumas horas abraçados de conchinha. Fiquei triste por ter
que levantar para me arrumar para ir trabalhar, tinha uma reunião importante, a
qual não podia faltar. Por mim, passava o dia na cama mimando a minha menina,
dando-lhe tudo o que quisesse.
— Você tem mesmo que ir trabalhar hoje, Romeu? — A voz doce de Juliene
saiu em um ruído baixo, atraente como o canto de uma sereia me atraindo de
volta para a cama.
Nosso ninho de amor.
— Eu daria tudo para poder continuar na cama contigo, meu anjo. Mas eu
realmente não posso, tenho uma reunião muito importante daqui a quarenta
minutos. — Meu olhar deslizou pelo seu pequeno corpo delicado coberto com
lençol apenas até a cintura, quando dei por mim, tinha dado dois nós a mais na
minha gravata.
Essa menina ainda vai acabar comigo. Antes de conhecê-la, era fanático por
trabalho, agora, por mim, passaria o resto dos meus dias ao seu lado, mal chegou
na minha vida e já virou minha prioridade. Estou ferrado! Mas às vezes sabe ser
irritante como ninguém, cínica e hostil. Acho que é isso o que mais me atrai em
Juliene: é muito transparente. Fala o que pensa, direta como flecha, doa a quem
doer, luta pelo que quer, sem fazer joguinhos de menininha puritana. É fogosa na
cama, aprende rápido. Também é forte e valente, e, ao mesmo tempo, doce,
tímida e solidária.
Uma mistura perigosa para um coração ferido como o meu.
— Precisa de ajuda com a gravata, tigrão? — Ergueu o tronco apoiando o
cotovelo na cama para usar a mão como apoio para a cabeça, fitando-me cheia
de segundas intenções.
Seus seios estavam com o bico rígido, sedentos.
— É melhor não, Juliene, pare de me tentar, mocinha! Eu realmente preciso ir
para o trabalho, mas assim que der, volto para você correndo. — Caminhei até a
cama e a cobri com o lençol branco até o pescoço, meu membro já estava pronto
para o combate dentro da calça.
— E a assistente que recepcionou sua chegada no hotel vai participar? Como é
mesmo o nome dela? Ah, lembrei, é Paula, a loira bonitona que falta pouco
lamber o chão que você pisa. — Revirou os olhos, seu tom carregado de
sarcasmo me incomodou.
— Sim. Paula é minha assistente e me acompanha em todos os meus
compromissos de trabalho aqui em Nova York. — Fui sincero, porém mais rude
do que deveria. Já estou velho demais para “ciuminho” bobo, já passei dessa fase
há muito tempo.
Depois da noite e manhã maravilhosas que tivemos, pensei que tinha deixado
bem claro que é ela quem eu desejo loucamente, as outras simplesmente não
existem mais para mim.
— Ok. Te vejo mais tarde, então. Bom trabalho, Romeu. — Virou para o outro
lado, oferecendo-me as costas, pirracenta!
— Obrigado, Juliene. — Peguei minha maleta e saí usando da mesma ironia
que ela, mas não antes de puxar o lençol e depositar um beijo nas suas costas nua
fazendo-a arrepiar todinha.
A maciez e o aroma delicioso da sua pele quase me fizeram desistir de ir para
essa bendita reunião e fazer um delicioso sexo de reconciliação, mas eu não
podia deixar a cabeça de baixo pegar as rédeas da situação ou não trabalharia
nunca mais e iria à falência. Por isso, fui para o trabalho, mas durante o caminho
todo pensando na minha menina ciumenta.
Não nego que o ciúme dela faz eu me sentir vaidoso, mas não é esse tipo de
relação que quero construir ao seu lado. Há um dia eu nem tinha uma relação,
pensei que nunca mais teria, passando o resto da minha vida sozinho. Mas
depois de conhecer Juliene, a quero comigo sempre. Porém, a confiança deve
prevalecer entre nós. Quando eu voltar para seus braços mais tarde, vou ter uma
longa conversa com ela. Mas, por hora, vou tentar focar no trabalho.
Cheguei na filial da minha empresa em Nova York em cima da hora da
reunião, quando entrei na sala o silêncio foi tão grande que por um momento
pensei que havia algo de muito errado com meu rosto. Doze pares de olhos
voltaram-se para mim com uma certa curiosidade como se eu fosse alguma
atração bizarra de circo.
— Bom dia, senhoras e senhores! — cumprimentei em inglês, com as
sobrancelhas erguidas. Meu tio Joaquim foi o primeiro a responder, coçando a
nuca.
— Bom dia, filho, você está bem? — Ele levantou e veio me dar um abraço
carinhoso, aproveitou o breve momento de proximidade para sussurrar no meu
ouvido: — Você por acaso leu o jornal hoje, Romeu? Eu e a sua tia tentamos te
ligar mil vezes hoje bem cedo. O que estava fazendo de tão importante que não
atendeu? Seu rosto e da sua fisioterapeuta estão estampados em todos os jornais,
revistas e sites de fofocas do mundo te nomeando como “papa anjo do
momento” — disse discretamente num tom brando, mas a preocupação era
gritante em cada palavra.
— Tudo bem, tio, eu já esperava por isso. — Toquei em seu ombro
tensionado, e ele assentiu relaxando um pouco.
— Eu estou ao seu lado, não me importo com o que os outros falem, o que
importa é a sua felicidade. Porque é meu sobrinho e amo você como se fosse
meu filho. — Deu um sorriso discreto, eu também o amava tanto quanto ao meu
pai.
— Obrigado, tio, mas não se preocupe, eu nunca estive tão feliz nos últimos
anos como estou agora.
— Eu sei, filho, a propósito gostei muito de Juliene. Principalmente a maneira
como o defende. Tem que ver a cara de bobo que você faz perto dela, a garota te
pegou de jeito. — Meneou a cabeça satisfeito, depois voltou para o seu lugar, e
eu logo retomei a postura de tirano.
— Vamos começar a reunião, mas antes quero deixar bem claro que minha
vida pessoal só diz respeito ao meu tio, porque ele se preocupa com a minha
felicidade, não com fofoquinhas que rolam por aí nos tabloides e sites de fofocas
que ganham dinheiro falando da vida dos outros. Não sei quem é mais hipócrita:
quem vende esse tipo de coisa ou quem compra. — Os homens engoliram a
seco, e as mulheres tiveram as bochechas tomadas por um rubor vermelho
acentuado.
Depois disso, os olhares questionadores sobre mim acabaram, e eu conduzi a
reunião normalmente. Durou mais que o previsto, se arrastando até o horário do
almoço, ainda bem que no caminho parei em uma cafeteria conceituada do
bairro, aqui próximo, e tomei um café da manhã reforçado, deixei pago o da
minha menina e pedi que entregassem em casa junto com uma caixa de
chocolates e um bilhete desejando bom dia. Eu já estava louco de saudades dela,
não conseguia pensar em outra coisa a não ser poder beijá-la novamente o mais
breve possível.
No entanto, ainda tinha de visitar os dois departamentos novos que eu estava
construindo na empresa e não tinha como adiar, o arquiteto queria o meu parecer
para finalizar a obra o quanto antes. Resolvi ligar para Juliene assim que saí da
sala, avisando que chegaria bem tarde, mas para minha surpresa, havia mais de
vinte chamadas perdidas dela no meu celular, não ouvi por estar no silencioso
durante a reunião.
Retornei imediatamente, ela atendeu no primeiro toque, como se tivesse
ansiosa para falar comigo.
— Alô, Romeu, estou tentando falar com você há horas. — Ela falava
tropeçando nas palavras, quase não consegui entender direito, parecia estar
andando em um lugar com o fluxo grande de pessoas, quando pensei em abrir a
bocar, minha assistente chegou me apressando para o nosso almoço.
— Vamos logo, Romeu, ou perderemos a reserva que fiz naquele restaurante
que sempre vamos aqui em Nova York e você ama a comida de lá.
— Pode me esperar no carro que estou indo logo atrás de você. Obrigado,
Paula. — A moça assentiu, depois saiu prendendo os cabelos loiros compridos
em um coque no topo da cabeça com uma caneta azul.
— Você vai almoçar com a Paula? — Juliene perguntou em um fio de voz,
quase em um sussurro.
— Sério que você me ligou mais de vinte vezes para me vigiar com a Paula?
Pensei que fosse mais madura do que isso, estou decepcionado com você.
Quando eu chegar em casa, vamos ter uma conversa muito séria, mas agora, se
me der licença, não quero perder minha reserva para o almoço com minha
assistente de trabalho. — A linha ficou muda por um tempo, pensei que tinha
desligado, mas, então, ouvi sua respiração trôpega.
— Mas, Romeu, não foi por isso que eu li… — A interrompi.
— Tchau, Juliene, por que não sai um pouco para fazer compras na Wall
Street? “Gente da sua idade” adora esse tipo de programa. Mais tarde nos
falamos, tenho muito trabalho e não sei a que horas chego. — Encerrei a ligação
não lhe dando oportunidade de dizer mais nada, não estava a fim de iniciar uma
briga agora.
Acabei cancelando o almoço, havia perdido a fome. Corri para resolver todos
os problemas logo e ir embora, esse desentendimento meu com Juliene estava
me deixando louco. Fiquei feliz pelo pessoal responsável pela obra fazer um
ótimo trabalho, os ajustes a se fazer seriam poucos, em menos de um mês a nova
ala da empresa poderia ser inaugurada. Já era tarde da noite quando consegui
resolver tudo, voltei correndo para casa para ver a minha baixinha.
Juliene não me ligou mais depois da nossa última conversa, em compensação,
choveu ligações dos meus pais e irmãos, com certeza querendo falar sobre a
jovem misteriosa que me beijou em público virando notícia nos quatro cantos do
mundo. O grupo da família no WhatsApp, então, fervia de mensagem, mais de
duas mil, não li nenhuma, o dia já havia sido estressante demais.
Chegando em casa, destranquei a porta apressado, jogando a mala em
qualquer canto assim que entrei. O casaco e a gravata tiveram o mesmo destino,
subi as escadas em direção ao quarto pulando dois degraus por vez. Chegar em
casa nunca foi tão excitante, o sangue corria fervendo pelas minhas veias, quente
e grosso. Confesso que a ideia de ter uma conversa séria com ela foi por água
abaixo, talvez mais tarde, porque agora eu não conseguia pensar em outra coisa a
não ser amá-la loucamente.
— Juliene, cheguei! — Abri a porta do quarto já desabotoando a camisa, todo
animado, a mente cheia de planos obscenos.
Mas não obtive resposta, apenas o eco da minha própria voz no quarto vazio.
Procurei no banheiro e em todos os outros cômodos da casa e nada, Juliene havia
desaparecido. Onde ela poderia ter ido a essa hora da noite em Nova York?
Fiquei furioso.
Liguei várias vezes para ela, mas só caía na caixa postal. Devia ter deixado
um segurança na sua cola, teria evitado todo esse desespero que me encontro
agora sem notícias do seu paradeiro. Tentei me acalmar para pensar direto, mas
quando o assunto se tratava de Juliene, perdia a cabeça com facilidade. Foi então
que o meu celular tocou, mas não era a baixinha.
— O que foi, doutor Leonardo? Não estou em um bom momento agora, seja
rápido. — Eu sempre atendia quando ele me ligava, porque só fazia isso em caso
de extrema urgência.
— É sobre Juliene, ela está aqui comigo no hospital. — Meu coração parou de
bater, cambaleei até o sofá e desabei sobre ele. —Você precisa voltar para o
Brasil agora, a coitada da garota mal chegou no país e a imprensa está atrás dela
como abutres em cima da carniça, querendo falar com a jovem que conquistou o
coração de gelo do grande empresário “Romeu Alcântara”. — Nesse momento,
minha alma saiu do corpo, como assim ela havia voltado para o Brasil sem falar
comigo? Sem mim. Se estava chateada, por que não ficou e me enfrentou
olhando nos meus olhos, essa é a atitude da Juliene que eu conheço.
— E por que o senhor está me ligando para dizer isso, doutor? Se ela foi
embora sem mim, é porque sabe se virar sozinha, não precisa da minha ajuda. —
Cuspi entre os dentes, me sentindo traído, abandonado.
— Porque eu estava ao lado de Juliene quando seu amigo, senhor Marley,
morreu segurando sua mão. Ele era um morador de rua que deu entrada no
hospital hoje de manhã, após ter sido queimado vivo por um grupo de jovens.
Jogaram gasolina no pobre homem e tacaram fogo enquanto dormia debaixo de
uma ponte. — Fez uma pausa respirando bem fundo, estava emocionado ao
contar o fato. — Acharam o telefone dela na mochila da vítima, por isso ligaram
para avisar do ocorrido e ela veio na mesma hora, em um voo direto que
conseguiu para o Brasil, disse que tentou te avisar ligando para você várias
vezes, mas não obteve sucesso, então deixou um bilhete colado na porta
avisando do seu retorno repentino. — Meus olhos correram para a porta de
madeira e lá estava uma folha inteira colada nela, escrito bem grande em letras
maiúsculas:
“Um amigo precisa de mim, estou voltando para casa”.
Caramba! Eu estava tão ansioso quando cheguei, que não prestei atenção em
nada, só queria vê-la e agora nem sei quando isso vai acontecer. Eu lembrava
bem desse pobre homem que foi queimado vivo, era uma boa pessoa. Conheci o
senhor Marley na primeira vez que estive no bairro onde Juliene mora. Foi
extremamente gentil comigo, impedindo que eu caísse quando tropecei ao sair
do carro e não aceitou o dinheiro que ofereci como forma de agradecimento pela
ajuda. Uma pena o que aconteceu com ele, e não pode ficar impune de forma
nenhuma.
Eu não deixaria que ficasse.
Meu Deus! Minha menina precisava de mim naquele momento e estamos há
milhas de distância, por isso ligou tantas vezes, era para pedir socorro para o
homem que prometeu protegê-la de todo mal do mundo e acabou virando as
costas para ela na primeira vez que precisou dele. Eu sou um filho da mãe
egocêntrico! E eu achando que estava com ciúme da minha assistente, quanta
presunção de minha parte. Sendo que só queria contar sobre o que aconteceu
com seu amigo. Saiu correndo para dar apoio a alguém que é importante para
ela, um morador de rua que não deve ter mais ninguém na vida.
Que orgulho da minha baixinha!
Se não estava apaixonado por ela, agora corro grande risco de ficar.
Saí do jeito que eu estava em direção ao aeroporto, enquanto pedia ao doutor
Leonardo que fizesse algumas coisas para mim até que eu chegasse, depois
liguei para meu piloto mandando me esperar com meu jatinho ligado para irmos
embora para o Brasil imediatamente e que se foda o resto.
“Eu percebi que estava ferrado de vez quando ela se tornou minha
prioridade”
CAPÍTULO 19
J ULIENE
ROMEU
J ULIENE
Já havia se passado uns cinco minutos e eu ainda não conseguia dizer nada,
permaneci em total estado de choque com esse pedido de namoro repentino do
Romeu. Sinceramente? Não sabia o que responder, queria muito dizer sim, mas
estava com medo. Sou um ímã para coisas ruins, a maioria das pessoas que amo
morrem de forma trágica. A felicidade é algo que não foi feito para mim, já tive
inúmeras provas da vida em relação a isso. E se ele só estiver fazendo isso no
calor do momento? Por ciúmes do Marcelo, ou porque eu disse que o amava, sei
lá, não quero de forma nenhuma que se sinta obrigado a ter algum compromisso
comigo só porque me declarei para ele.
— Se estiver fazendo isso só porque eu disse que te amo, Romeu. Não
precisa. Sou bem resolvida em relação aos meus sentimentos e ao meu corpo, só
por que me entreguei a você não quer dizer que tem que assumir compromisso
comigo. — Bebi o resto do meu vinho tremendo de cima a baixo, cada gesto
meu era analisado, minuciosamente, pelos seus olhos atraentes, cheios de luxúria
e desejo.
— Pera aí, deixa eu ver se entendi direito, Juliene. Você usou e abusou desse
corpinho aqui e agora na hora de assumir compromisso, está saindo fora? — Se
fez de ofendido, a expressão era séria, mas apenas como máscara para encobrir
— muito mal, por sinal — o riso.
Ele fez essa graça tentando me fazer relaxar um pouco, meus ombros nunca
estiveram tão tensos como naquele momento.
— Não é isso, seu bobo, eu só quero que faça o pedido por vontade própria,
não para me agradar. — Dei de ombros erguendo os braços sobre a cabeça em
um bocejo longo, ainda estava com um pouco de sono.
Eu realmente não fazia o tipo que precisava de uma aliança no dedo ou um
papel assinado para me sentir amada por alguém. O que vale para mim é como a
pessoa me trata no dia a dia, são os pequenos gestos que me encantam. Os
detalhes inesperados que me emocionam, tocam a alma, como os simples
torpedos carinhosos que são capazes de me fazer ganhar o dia. Poucas
palavras…, mas com grandes impactos.
Pequenas atitudes que me conquistam.
Isso é um fato.
— Pode apostar que eu nunca quis tanto nada na vida, toda vez que olho para
você vejo uma nova chance de ser feliz. — Desviou o olhar todo sem jeito, mas
eu segurei seu rosto obrigando-o a me olhar nos olhos. — Passei os últimos anos
da minha vida odiando a Deus por um dia ter me tirado tudo o que eu amava,
mas agora Ele me deu você, então acho que eu e Ele estamos quites agora. —
Uma lágrima silenciosa deslizou pelo seu rosto, e eu a enxuguei, depois o
abracei bem forte.
Lembrei-me de a tia do Romeu comentar no evento de premiação que nunca
mais viu o sobrinho com nenhuma outra mulher depois da morte da sua esposa,
que acredito ser a tal Vanessa que o japa falou. Agora estava explicado por que
não achei nenhuma foto dele acompanhado na internet. Era sempre sozinho e
com o olhar triste, devia amá-la muito. Nem em mil anos poderia imaginar que
ele era viúvo, com certeza sofreu muito com a perda da mulher que amava.
Como será que ela morreu? Gostaria de saber mais sobre essa fase da sua vida,
mas jamais perguntaria nada, deixaria que contasse quando estivesse pronto.
— Eu aceito namorar com você, Romeu. E prometo te amar todos os dias da
minha vida, não só com palavras, mas também com ações. — Nos beijamos
fazendo com que nossas lágrimas se misturassem, era incrível com a dor, de fato,
sempre nos aproximava ainda mais.
Sem separar nossos lábios, comecei a erguer sua camisa, ele logo entendeu
minha intenção e levantou os braços. Fez o mesmo processo comigo me
deixando apenas de calcinha, mas logo se livrou dela também, me deitando
carinhosamente de costas no colchão, o tempo todo me olhando nos olhos e
passando toda confiança do mundo. Tirou o resto da sua roupa, depois,
calmamente, deitou sobre mim.
Então fizemos amor, de forma tão intima que me fez chorar o tempo todo. Ele
também chorou, suas lágrimas gotejaram sobre meu rosto enquanto entrava em
mim uma… duas… três, infinitas vezes.
— Você fechou as feridas do meu coração, Juliene — sussurrou ao pé do meu
ouvido com a voz macia e doce.
— E você curou as do meu, Romeu — sussurrei de volta, enquanto era
possuída pelo homem que eu amava.
— Eu quero que você venha morar comigo, namorada. Quando a confirmação
do nosso relacionamento sair na mídia, esses abrutes não te darão sossego. —
Saiu completamente e entrou em um golpe só fazendo-me gemer alto, em
resposta cravei minhas unhas nos seus braços.
— Não, obrigada! Eu gosto do meu apartamento, namorado. — Mais gemi do
que falei, engolindo uma lufada de ar a cada palavra.
— Só por um tempo, até o fervor da mídia baixar com o estouro que vai ser a
confirmação do nosso namoro.
— Não se preocupe, eu sei me esconder bem quando quero. — Arfei com uma
estocada profunda, acho que minha resposta não o agradou, então me puniu.
— Se não for, eu virei morar aqui com você. — Parou de se movimentar
intencionado a me persuadir, sabia que eu estava prestes a chegar ao clímax.
— Você só pode estar brincando, não é? — Ergui a sobrancelha, e ele negou
veemente com a cabeça.
— Vou pedir para meu motorista trazer minhas malas hoje, seu rosto é a
primeira coisa que quero ver antes de dormir e ao acordar. —Depois dessa eu
tinha que admitir que o cara sabia jogar para ganhar, para acabar comigo de vez
sorriu de canto, de um jeito charmoso que só ele sabia fazer.
— Da próxima vez que você usar esse sorriso canalha para conseguir mais
alguma coisa de mim, não vou deixar um dente nessa sua boca sexy para contar
história. — Ele achou graça, estava tão feliz que dava gosto de ver.
Apressou-se em sentar no colchão e me puxou para seu colo deslizando para
dentro de mim, caprichando na performance, entrando e saindo freneticamente,
sugando meu seio ao mesmo tempo.
— Você é deliciosa, baixinha — grunhiu.
— Mais forte, Romeu. Por favor. — Quase implorei.
E ele obedeceu.
Logo chegamos ao orgasmo juntos, Romeu gozou tanto que escorreu pela
parte de dentro das minhas coxas.
— Meu Deus, Romeu! É a segunda vez que não usamos camisinha, quando
fizemos sexo na banheira do hotel em Nova York e agora. — Alarmei
preocupada, eu não fazia uso de anticoncepcional.
— Tudo bem, baixinha, eu não posso ter filhos. Estou com meus exames em
dia, e pelo que vi na sua ficha de contratação, os seus também estão. — Meu
coração perdeu uma batida, como assim não podia ter filhos? Isso é horrível,
saber que sua linhagem morrerá com você.
Achei melhor mudar o foco do assunto logo, não queria que se sentisse
incapaz ou menos homem por conta disso.
— Sabia que me pedir em namoro e morar na sua casa não é tão simples
assim? Precisa pedir minha mão para o meu padrinho Chicão. Ele é como um pai
para mim, só com a benção dele poderei ir morar na sua casa. — Ele pensou por
alguns segundos, depois perguntou desconfiado:
— E como é esse seu padrinho Chicão?
— Um negão enorme com cara de mau, o namorado da filha mais velha dele,
a Melissa, apareceu morto um dia depois de ir pedir a mão dela em namoro. —
Chegou a engolir a seco, e eu ri da sua cara de apavorado.
— Porra, Juliene, não pode brincar com essas coisas, menina, quase morri do
coração agora. — Levou a mão no peito fazendo o maior drama, mal sabendo ele
a figura que é o meu padrinho.
— Tinha que ver a sua cara agora, amor. — Parei de rir na mesma hora,
envergonhada por tê-lo chamado de amor.
Romeu deslizou os dedos pelo cabelo todo vaidoso, seu olhar esbanjava
paixão ardente.
— Você está muito engraçadinha hoje, baixinha. — Veio para cima de mim
com uma chuva de cócegas, eu que pensei que não conseguiria rir tão cedo
depois do que houve com meu amigo, mas, na verdade, acabei gargalhando
muito.
A dor pela perda do meu amigo ainda era imensa, mas sei que ele ficaria feliz
em me ver sorrindo. Lembro-me que toda vez que se despedia de mim, ele
sempre dizer a mesma coisa:
“Vá com Deus, minha filha, que ele abençoe os seus passos onde quer que vá.
Que lhe dê paciência para os dias ruins e sabedoria para aproveitar os bons. E
para os tristes, bom, que nosso Pai poderoso lhe traga alguém capaz de fazê-la
sorrir.”
Suas preces foram, de fato, ouvidas, porque depois de tanto sofrimento que
passei na vida, Deus havia me trazido Romeu. Eu não me importava com o fato
dele não poder ter filhos, ser mãe não é bem um sonho meu. Amo crianças, mas
não sei se seria seguro deixar um ser inocente aos meus cuidados durante vinte e
quatro horas por dia.
— Que tal um banho quentinho, namorado?
— Só se for agora, namorada. — Ele me pegou no colo e levou até o banheiro
sem mancar, era como se nunca tivesse sentido dor na perna um dia, agora tinha
mais que certeza que o seu problema era psicológico. Devia ser alguma coisa
relacionada ao seu passado, tenho certeza.
Fizemos amor novamente debaixo do chuveiro, e, depois, no colchão na sala,
para, então, desabarmos completamente exaustos. Acordei apenas na manhã do
outro dia com Romeu dormindo agarrado em mim, como se eu fosse seu bote
salva-vidas em meio ao mar à deriva. Contornei cada traço do seu rosto com as
pontas dos dedos, ao passar sobre seus lábios, ele segurou minha mão ainda com
os olhos fechados e beijou.
— Bom dia, meu amor. — Eu disse um pouco tímida, ele foi abrindo os olhos
preguiçosamente, abrindo um sorriso.
— Bom dia, baixinha — disse bocejando ao mesmo tempo, me puxou pela
nuca e deu um beijo.
Romeuzinho havia dormido nos pés da cama, todo encolhidinho como uma
bolinha de pelo mesmo.
— Não tem que trabalhar hoje?
— Sou todinho seu pelo resto do dia, pensei em jantarmos na casa do seu
padrinho hoje à noite e eu peço sua mão a ele logo de uma vez. Levarei uma
caixa de charutos cubanos e uma de Uísque 1958, será que ele vai gostar? —
Mordi a parte de dentro dos lábios achando graça da sua ansiedade toda, ele não
parava de falar um minuto preocupado dos meus padrinhos não apoiarem nosso
namoro por conta da enorme diferença de idade entre nós.
— Calma, Romeu, você vai amar meus padrinhos e os filhos deles. — O
tranquilizei.
Liguei para minha madrinha e combinei tudo para o jantar, além de eufórica,
ficou muito curiosa também. Como eles vivem num estilo meio “paz e amor”, a
casa deles tem flores para todo lado e não usam internet, e televisão só em canais
educativos. Melissa às vezes mexia nas redes sociais escondido no seu celular, a
danada. São pessoas simples e de coração enorme. O que é ótimo, não estão
vendo esse alvoroço na mídia sobre o meu envolvimento com Romeu.
Depois que encerrei a ligação com minha tia, arrumei minhas coisas na
mochila, enquanto Romeu tomava banho, o motorista dele veio nos buscar e
trouxe roupas limpas para o patrão. Quando terminei de ajeitar tudo — não tinha
muito o que levar —, fiz companhia para ele debaixo do chuveiro, acabou que o
banho demorou mais que o previsto. Almoçamos no meio do caminho até sua
casa, ao chegarmos fomos recebidos pela sua governanta Constância, a mulher
não parava de chorar, dizia que era muito bom ver gente nova na casa depois de
tanto tempo vendo o patrão vivendo ali sozinho.
Constância ficou encantada com Romeuzinho — meu namorado também, só
não admitia —, ele até mandou comprar uma caminha muito fofa para o bichano
e colocou no canto da sala, o danadinho pulou do meu colo e foi estreá-la.
— Arrumou tudo como eu pedi, Constância? — Romeu inclinou para beijar a
testa da governanta, achei bonito o carinho e respeito dele por ela.
— Já, sim, senhor, desocupei o espaço que pediu para as coisas da moça, só
falta colocar suas roupas no cabide, mas vou resolver isso agora mesmo. —
Tentou tirar a mochila das minhas costas, mas não deixei, eu mesma poderia
fazer isso mais tarde.
— Não precisa, Dona Constância, eu mesma arrumo, não precisa se preocupar
comigo, não quero dar trabalho, é só me dizer onde será meu quarto que eu me
viro. — Ela ameaçou dizer alguma coisa, mas Romeu a impediu com o olhar.
— Deixa que eu mesmo mostro, Constância. — Ela assentiu de forma suspeita
torcendo a boca, depois de uma risadinha. — Tire o resto do dia de folga para
descansar, e os outros empregados da casa também. — Deu a ordem, pegou
minha mão e saiu puxando escada acima, fiquei abobalhada quando chegados ao
terceiro andar da casa, onde ficava apenas uma suíte gigantesca.
Durante o caminho, reparei tudo à minha volta, os corredores com as paredes
pintadas de um salmão bem suave enfeitadas com belos quadros originais de
pinturas famosas, antigas e sofisticadas. Quando Romeu abriu a porta, quase caí
para trás, meus tios eram bem de vida mais nada sequer comparado àquilo. Uma
cama enorme bem no centro, cortinas vinho grossas, abertas no momento, dando
vista para a piscina gigantesca. Havia uma escrivaninha no canto com um
notebook prateado sobre ela, entre outros móveis elegantes.
— Não tem nenhum outro quarto menor, Romeu? Eu me viro bem em
qualquer canto, é completamente desnecessário um quarto tão grande só para eu
ficar por tão pouco tempo. Em breve, voltarei para o meu apartamento. —
Encolhi os ombros, não queria bancar a chata, apertei a minha mochila tão forte
contra o peito que quase entrou na minha carne.
— Quem disse que esse quarto é só para você, Juliene? Eu sou um cara
bastante espaçoso, por isso, quando construí essa casa fiz questão que esse
cômodo fosse desse tamanho. — Meu queixo caiu literalmente, fiquei de boca
aberta na frente dele.
— Seu quarto? Estamos indo rápido demais, você não acha? — Meu professor
de português sempre dizia que a pressa é inimiga da perfeição, e eu concordava
plenamente.
— Agora que conhece o nosso quarto, vou lhe mostrar o restante da casa. —
Fingiu que nem me ouviu.
O teimoso tirou a mochila das minhas costas entrando em uma espécie de
closet contendo uma infinidade de ternos, camisas e calças sociais separadas por
cores. E deixou na parte separada para mim, que deveria caber uma loja inteira,
no mínimo. Foi nesse momento que percebi que como eu estava na sua área,
quem dava as ordens era ele. E se o grande Romeu me queria todas as noites ao
seu lado na cama, ninguém iria impedi-lo. Muito menos eu.
“Percebi que era sério quando minha presença se tornou indispensável.”
CAPÍTULO 22
R OMEU
J ULIENE
Acordei com uma chuva de beijos trilhando um caminho pelas minhas costas,
fazendo com que todos os pelos do meu corpo se arrepiassem, se tem uma coisa
que aquele homem sabia era me deixar excitada. Quando chegamos em casa de
madrugada, Romeu já foi me agarrando escada acima, beijando-me enquanto
tirava minhas roupas ao mesmo tempo. Jogou-me sobre a cama sem nenhuma
cerimônia e fez maravilhas com a boca por todo o meu corpo dando uma atenção
especial para minha área mais sensível, para depois me amar intensamente por
várias horas, conforme o sol nascia.
Eu amei o nosso jantar com meus padrinhos, porém, no começo, os achei um
pouco tensos. Não costumam ser assim tão desconfiados com ninguém como
ficaram com Romeu, talvez, seja apenas excesso de cuidado comigo. Eles me
amavam tanto quanto aos filhos, querem o melhor para mim. Mas no final,
acabaram caindo no encanto do meu namorado e a noite terminou mais que bem.
O padrinho Chicão fazendo graça, os gêmeos sendo fofos, a Melissa sendo
tagarela e a madrinha Ester, amorosa como sempre. Tenho muita sorte em tê-los
como minha família, é a melhor que eu poderia ter.
A parte que mais amei da noite passada foi quando meu amor me levou a um
lugar lindo, de longe dava para ver o Cristo Redentor todo iluminado pela luz da
lua, a coisa mais linda que já vi na vida. Inspiradora. Eu me emocionei quando
Romeu disse que aquele ponto sempre foi muito especial para ele, por isso, me
levou ali, meu coração faltou pouco explodir de amor. Na verdade, é a primeira
vez que me sinto assim, tão amada. Completa. Como se não bastasse, escolheu
um terreno imenso próximo àquele lugar incrível, para ser construído o nosso
abrigo para os moradores de rua.
Minha felicidade era não grande que parecia nunca ter fim. Havia um sorriso
enorme no meu rosto que não saía mais, estava tudo tão perfeito que tinha até
medo que algo ruim acontecesse e estragasse tudo.
— Bom dia, baixinha. — Ele ficou sobre mim atacando a curva do meu
pescoço com mordidas perigosas, seu membro rígido esfregava na minha
barriga.
— Você não cansa nunca, Romeu? — Sorri exausta, mal dormi naquela noite.
E ele também não, e, mesmo assim, acordou com esse fogo todo já em ponto
de bala.
— De você, Juliene? Nunca. — Beijou-me com vigor, e eu logo me entreguei
ao seu desejo ardente.
Romeu deslizou a mão para baixo acariciando a parte de dentro da minha
coxa, chegando a calcinha de renda que eu estava usando para o lado e enfiou
dois dedos em mim, sua boca devorava meu pescoço.
— Romeu, meu amor, você está em casa, filho? — Eu e o meu namorado
congelamos na hora, havia uma mulher gritando sem parar no andar de baixo.
— Mas que inferno! É a minha mãe, anda, se veste logo antes que ela venha
aqui e coloque essa porta abaixo. — Ele resmungou mal-humorado.
Praticamente pulou para fora da cama e começou a vestir o que achou pela
frente no closet, seu membro estava tão ereto que foi difícil ajeitá-lo dentro da
calça jeans clara. Quase babei em cima dele enquanto vestia uma camisa preta
apertadinha, tinha um peito definido cheio de gominhos durinhos.
— Eu não posso te esperar aqui, Romeu? Ainda estou com sono, prometo não
fazer barulho e sua mãe nem vai saber que estou aqui. — Fingi um bocejo
virando de costas para ele, puxando o lençol até o pescoço, não queria conhecer
a mãe dele assim no susto, tinha que me preparar psicologicamente.
E não assim, com o cabelo todo desmaranhado, a boca vermelha e inchada,
fora o meu pescoço com várias manchas de chupões que o próprio filho dela fez.
Não preciso olhar no espelho para saber que estou um horror, se Romeu estava
com receio dos meus padrinhos não aprovarem nosso relacionamento por conta
de ele ser mais velho, no meu caso, com a sua, era o contrário, tenho medo da
família dele não gostar de mim por eu ser muito mais nova. Pior, pelo fato de
estarmos morando juntos tão cedo, podem pensar que sou uma interesseira, que
só quero seu dinheiro.
— Você vai se vestir sozinha, ou eu terei que fazer isso por você, Juliene? —
Puxou meu lençol bruscamente e ficou me puxando pelo pé, homem teimoso!
— Olha o estado que você me deixou, Romeu. — Apontei para o meu reflexo
no espelho, havia levantado e ficado nua atrás dele enquanto terminava de se
arrumar. — E eu nem tenho o que vestir direito, por isso, não insista, porque
nada vai me fazer descer para conhecer minha sogra com essa cara de bem
fodida pelo meu namorado tarado. — Sua resposta foi um beijo selvagem me
imprensando na parede e apertando meu seio, deixando-me totalmente sem ar.
— Você está linda, Juliene. E com essa cara de muito bem fodida por mim
então, nossa! É a coisa mais sexy do mundo, irresistível. — Ele me olhou
daquele jeito safado que só ele sabe, contorcendo os lábios para o lado em um
sorriso presunçoso.
— Você está aí dentro, filho? Onde arrumou aquele gatinho, pensei que odiava
animais, principalmente felinos. Vivia atirando pedra neles quando pequeno e
morria de rir depois. — A mãe dele batia à porta do quarto insistentemente, a
impressão que tive era que colocaria mesmo abaixo a qualquer momento.
Dei um tapa no braço de Romeu, encarando-o de cenho franzido, ele sorriu
todo sem graça por não ter me dito que não gostava de gatos.
— Só um minuto, mãe, já estou indo. — Ele revirou os olhos, e eu dei outro
tapa no braço dele.
— Não revire os olhos para mim, Romeu Alcântara. Não preciso estar perto
de você para saber que está sendo malcriado, então dá um jeito de descer logo,
porque não tenho o dia todo. — Cobri a boca rindo da mãe dele chamar sua
atenção como se fosse um menino, e ele começou a me fazer cócegas, acabei
rindo alto.
— Quem está aí com você, filho? — Eu coloquei as mãos sobre a boca com
os olhos saltando para fora, agora ela sabia da minha presença.
— Minha namorada, mãe. Não se preocupe, vai conhecê-la daqui a pouco, não
foi por isso que a senhora veio aqui?
— Espero vocês lá embaixo, meu amor. Mal posso esperar para conhecer
minha nora, pelo jeito as fofocas do jornal procedem. — Ela soltou um gritinho,
animada.
Esperei ela descer, e depois enchi o meu namorado de tapas, onde que estava
com a cabeça para contar para mãe que era eu que estava ali com ele.
— O que sua mãe vai pensar de mim, Romeu? Ai que vergonha, agora ela
sabe que passamos a noite fazendo sexo. — Cobri o rosto com as mãos morta de
vergonha, não queria nem imaginar o que estava passando na cabeça da minha
sogra agora, com certeza que estou comprando o seu filho com sexo.
— Pare de bobeira, Juliene, já conheci as pessoas que você ama. Agora é a sua
vez, se a minha mãe não gostar de você, problema é dela. Não muda nossa
relação em nada, porque eu continuarei te amando do mesmo jeito e nem ela
nem ninguém pode fazer nada em relação a isso. — Era por isso que eu amava
esse homem, ele sabia o que dizer na hora certa para me deixar confiante o
bastante para fazer qualquer coisa.
— Como consegue ser tão cretino e apaixonante ao mesmo tempo, hein?
— Depois que a minha mãe for embora, eu te mostro, baixinha. — Apertou
minha bunda, depois nos beijamos.
Optei por colocar um vestido simples, na cor lilás claro, nem curto nem
cumprido. No tamanho certo. Usei minhas sapatilhas pretas e prendi o cabelo
para trás partido ao meio.
— Você está linda, podemos descer agora, namorada?
— Sim, namorado. — Sorri nervosa, não sabia o que me esperava lá embaixo.
Ao apontarmos de mãos dadas no topo da escada, a mãe dele que estava sentada
no sofá, logo pôs-se de pé para nos receber.
Tratava-se de uma senhora na faixa dos seus cinquenta e cinco anos, mas
muito conservada para sua idade. Elegância deveria ser seu nome do meio,
porque o conjunto social bege de três peças que usava era de marca importada,
com certeza. A saia vestia muito bem em seu corpo, a mulher estava com tudo
em cima, belas pernas sustentando saltos altos finos. Cabelos loiros na altura do
ombro, bem-arrumados em cachos largos, e a maquiagem muito bem-feita.
— Olá, meu filho, que saudades eu estava de você. — Romeu soltou a minha
mão para abraçar a mãe, beijando-lhe o rosto dos dois lados. Quando os braços
dela envolveram a cintura dele, observei a pulseira cravejada de diamantes
combinando com a gargantilha e brinco.
— Oi, mamãe, que bom te ver. Como a senhora está?
— Agora que estou te vendo, ótima! — Ela falava com o filho, mas não tirava
os olhos de mim. Comecei a suar frio, as mãos tremiam.
— Essa é a Juliene, minha namorada. — Meu amor sorriu amplamente
olhando dentro dos meus olhos, depois me pegou pela cintura, puxando para
perto de si.
Ergui minha mão para cumprimentá-la, mas não apertou, em vez disso, me
puxou para um abraço bem forte. Foi então que relaxei um pouco, ela só tinha
cara de perua metida. Mas não agiu como uma, agradeci a Deus por isso.
— Meu nome é Brenda e é um prazer enorme conhecê-la, querida.
— O prazer é todo meu, senhora. — Sorri para ela envergonhada, quase nem
mostrando os dentes, Romeu cruzou os braços observando nós duas.
— Quero que saiba, Juliene, que não me importo nem um pouco com as
fofocas da mídia em relação a diferença de idade de vocês. Você trouxe a alegria
do meu filho de volta, é isso que importa. — Ela limpou as lágrimas e segurou
minhas duas mãos. — Eu nem me lembrava mais da última vez que o vi
sorrindo, agora ele sorri o tempo todo, os olhos brilham toda vez que olha para
você. — Fiquei emocionada, porque eu também voltei a sorrir por causa de
Romeu. E era tão bom saber que também fazia bem a ele, era como se nos
completássemos.
— Eu gosto muito do seu filho. Ele, com certeza, foi a melhor coisa que
aconteceu na minha vida. — Minha sogra sorriu, era evidente nos meus olhos
que eu estava sendo sincera.
— Com certeza foi, afinal, o sonho de toda “novinha” é encontrar um coroão
para bancá-la. Deve estar sendo um sonho morar aqui, não é mesmo, Juliene? —
A sala foi tomada por uma voz grave, fria e maldosa. Olhei para o lado e vi um
senhor muito parecido com Romeu, mas já bem de idade, os cabelos totalmente
brancos eram a prova disso.
Ele estava com as mãos enfiadas no bolso da calça do seu terno de corte fino,
fitando-me com seus olhos negros acusadores. Não sou de sentir medo, mas esse
homem me assustou bastante. Tomada pelo medo, me escondi atrás do Romeu,
encolhendo os ombros.
— Bom dia para o senhor também, pai. — Romeu estufou o peito, como um
touro bravo pronto para atacar, caso fosse preciso.
— Vamos para o seu escritório, meu filho, temos muito o que conversar. —
Meu sogro disse entre os dentes, fitando-me com raiva escorrendo pelos olhos.
— Seja lá o que tenha que dizer, pai, pode ser na frente da minha namorada.
— Enlaçou os dedos aos meus, e eu mal conseguia respirar de tanto que minha
boca estava seca, o corpo tremendo de cima a baixo.
— Por mim tanto faz, filho, você que sabe. — Elevou a voz, sua esposa fez
sinal para que ele parasse com tanta grosseria desnecessária, mas o homem
desandou a falar asneiras. — Primeiramente, quero saber o porquê de o
advogado da sua empresa denunciar a filha de um grande amigo meu por tacar
fogo em um mendigo? Valquirio me ligou agora há pouco dizendo que a coitada
foi levada pela polícia, vê se pode uma coisa dessas acontecer com uma moça de
sobrenome nobre. Requintada. Não pode passar uma noite atrás das grades, por
isso, exijo que você dê um jeito nisso agora mesmo, meu filho. Tudo não passou
de uma brincadeira boba, só isso — disse naturalmente, fazendo meu sangue
ferver de raiva, quando dei por mim, eu já estava falando.
Ou melhor, gritando mesmo.
— Só isso? — Sorri irônica chegando mais para a frente, ele havia acabado de
mexer em um ninho de vespa. — Essa moça, de sobrenome “nobre” e
requintada, participou do assassinato de um homem inocente que não fazia mal a
ninguém, pelo contrário, sempre tinha uma palavra amiga para dizer. Era
bondoso e gentil, jamais levantaria o dedo para uma mosca. O meu grande
amigo que eu tanto amava. Depois de conhecê-lo, aprendi que um cavalheiro
nem sempre está dentro de um terno caro como o do senhor. Mas no que uma
pessoa traz por dentro, no caráter. E a compaixão ao próximo — disse direta, doa
a quem doer, quem o fitava com total desdém agora era eu. Tenho nojo de gente
assim, prepotente.
Depois de tudo, que ouvi não estava mais me lixando se o pai de Romeu
gostaria de mim ou não. E nem morta fingiria ser quem não sou para agradar
esse velho esnobe, não tenho estômago para isso. Se está pensando que o senhor
Marley estava sozinho no mundo, está muito engado! Com ou sem a ajuda do
Romeu, iria até o inferno para fazer esse grupo de assassinos pagar pela
crueldade que fizeram com meu amigo.
“Mexa comigo, mas não com um amigo meu, ou a coisa ficará feia para o
seu lado”
CAPÍTULO 24
R OMEU
Minha mãe, assim como eu, estava de queixo caído ao observar Juliene
enfrentar meu pai daquela maneira tão afrontosa, nem ela em quase quarenta
anos de casados teve essa coragem, sempre baixou a cabeça diante das grosserias
do marido. Meu pai não era um homem ruim, mas rude ao extremo. Todos têm
que viver do seu jeito, seguindo suas ordens. Eu e os meus irmãos nunca
elevamos a voz para ele, pois se um aprontasse, os três apanhavam. Então, por
amor, andávamos na linha, pois pior do que levar uma surra de cinto, era ver
alguém que você ama levando uma sem ter culpa nenhuma.
Porém, hoje, o senhor Moacir Alcântara encontrou alguém para colocá-lo no
seu devido lugar.
— Então você era amiga do mendigo, mocinha? Ah! Isso explica muita coisa
— ironizou, me reparando de cima a baixo com as sobrancelhas arqueadas em
sinal de reprovação, agora ele sabia por que me empenhei tanto no caso do
senhor Marley: por ela.
E faria tudo de novo, e muito mais inclusive, até mesmo enfrentar minha
família.
— Se o senhor veio dentro da minha casa para destratar a minha namorada,
poder sair pela mesma porta que entrou. Não sou mais um menino para que diga
o que devo ou não fazer da minha vida. — Prendi Juliene contra meu corpo, ela
tremia de nervoso devido à situação embaraçosa.
Se eu soubesse que meu pai também havia vindo, não teria deixado ela descer
de jeito nenhum. Queria conversar com meu pai antes de apresentar minha
namorada, mas o conhecendo bem como conheço, ele a destrataria do mesmo
jeito.
— Namorada, Romeu? Essa menina tem idade para ser sua filha, seu irmão
caçula é bem mais velho do que ela, devia ter vergonha de si mesmo. Sei que é
homem e precisa de sexo, mas podia muito bem, pelo menos, manter seu
“casinho” às escuras e não trazer para dentro da sua casa. — Eu olhei tão feio
para meu pai que ele encolheu os ombros, envergonhado, sabia que tinha
passado de todos os limites, e eu não pegaria leve com ele nem com ninguém
que colocasse em risco meu relacionamento com Juliene.
— Eu acho que a visita de vocês já terminou e não precisam voltar tão cedo,
pai. Se não respeita a minha mulher, não é bem-vindo aqui. — Fui taxativo, e
apesar de a sua expressão deixar claro que ficou extremamente magoado com o
que eu disse, continuou de nariz em pé.
Como sempre.
— A sua mulher de verdade morreu naquele maldito acidente com o seu filho
na barriga, onde você quase perdeu a sua perna se o doutor Leonardo não tivesse
te operado às pressas. — Juliene parou de respirar, totalmente pálida, virando o
pescoço na minha direção, afastando-se de mim bruscamente com horror nos
olhos.
Mas que inferno! Não era assim que eu queria que ela soubesse do meu
passado, tinha que ser em um momento íntimo entre quatro paredes, longe de
tudo e todos que possam ameaçar nossa relação.
— Já chega, Moacir! Você sabe que o nosso filho não gosta de falar do dia em
que ele perdeu tudo que amava. — Ouvi Juliene soltar um soluço cobrindo o
rosto coberto por lágrimas, e o meu coração apertou. Ela estava chorando por
minha causa, como se a minha dor refletisse nela.
Inferno! Não queria que ela descobrisse tudo dessa forma, vai pensar que
menti que não posso ter filho. Mas não é bem assim, eu tive que fazer muitos
tratamentos para que minha esposa conseguisse engravidar. Nosso médico havia
nos dado poucas esperanças, quando nos deu a notícia da gravidez, até ele ficou
surpreso. Mas deixou claro que demos muita sorte, e que, provavelmente, não se
repetiria facilmente.
— Com licença, preciso tomar um pouco de ar. — Juliene saiu sem olhar para
mim, tentei segurar seu braço, mas ela puxou de volta rancorosamente e passou
pela saída que dava ao jardim feito um tiro.
— Você não havia contado para ela sobre o acidente, não é mesmo, querido?
— Minha mãe tocou meu rosto preocupada com o desespero estampado no meu
rosto, só em cogitar a possibilidade de Juliene me deixar por causa da falta de
tato do meu pai em expor seu ponto de vista.
— Espero ter chegado a tempo de impedir uma catástrofe, Romeu. Vim o
mais rápido que pude, me desculpe. — Meu irmão do meio, Pedro, apareceu
praticamente correndo, segurando sua maleta de couro preta com uma mão e a
outra afrouxando o nó da gravata.
Ele era advogado, um dos melhores que existe nesse país. Muito inteligente e
dedicado, responsável por todos os casos grandes envolvendo minha empresa.
Pedro é muito parecido comigo fisicamente, apesar de ser cinco anos mais novo
que eu.
— Pensei que tinha uma reunião importante hoje, filho, o que está fazendo
aqui? — Minha mãe abraçou meu irmão, mas ele não tirava os olhos de mim,
existia uma ligação forte entre nós.
Sabia que eu não estava bem.
— Eu tenho, mãe, mas assim que soube que viriam na casa do meu irmão,
sabia que o pai ia fazer alguma merda para estragar a felicidade dele. — Senhor
Moacir fez cara de paisagem desviando o olhar, me irritando ainda mais.
— Ele já fez merda, Pedro, e das grandes — resmunguei cruzando os braços,
só queria que eles fossem embora logo para que eu pudesse fazer as pazes com a
minha baixinha.
— Que droga, irmão, eu vim assim que o Junior me ligou preocupado,
contando sobre a visita repentina dos nossos pais. — Ele veio até mim, beijou
meu rosto e me abraçou, nunca tivemos vergonha de demonstrar o amor que
sentimos um pelo outro.
Sempre foi assim.
O mais mimado dos três era o caçula da família, Junior, já era homem-feito,
com vinte e cinco anos e ainda o tratávamos como se tivesse quatro.
— Obrigado por se preocupar comigo, mano, te amo!
— Eu também te amo, cara, e não vou deixar nada nem ninguém estragar sua
felicidade, nem que para isso tenha que lutar contra o mundo. — Nosso pai
pigarreou deixando claro que havia entendido o recado, mas obviamente entrou
em um ouvido e saiu pelo outro.
— Mas o que é isso, Pedro? Em vez de aconselhar seu irmão mais velho a
largar essa pirralha, fica apoiando essa sandice. Sempre foi o mais sensato dos
três, estou decepcionado com você, meu filho.
— Quem está decepcionado aqui com o senhor sou eu, pai. Depois de todo
sofrimento que o seu primogênito passou perdendo a esposa grávida do filho que
tanto amavam antes mesmo de nascer, seu neto, teve a coragem de vir aqui
intencionado a estragar a alegria dele? Em vez de julgar Juliene, devia agradecê-
la de joelhos por trazer Romeu de volta das trevas na qual que viveu todos esses
anos. — Os olhos do meu irmão encheram-se de lágrimas, ele foi o único que
não saiu do meu lado, nem um segundo, nos primeiros meses após a morte da
minha esposa.
Chorou comigo, me acompanhando em todas as sessões de fisioterapia até eu
conseguir voltar a andar com o auxílio de uma bengala. Não desistiu de mim,
sempre disse que seu maior sonho era me ver refazendo minha vida novamente
com alguém especial.
Esse alguém é Juliene.
— Você por acaso já conheceu a pirralha para estar defendendo-a com tanto
vigor, Pedro? — Soltou destilando seu veneno, uma mistura de ironia com
desgosto. — Tenho certeza que não, mas quando conhecer, vai me dar razão —
completou em um resmungo rabugento, estava prestes a gritar com ele quando
minha mãe segurou minha mão, olhando-me com os olhos piedosos pedindo
calma.
— Eu sinceramente não estou nem aí para a fofoca da mídia, muito menos
para a idade da namorada do Romeu. Nunca vou esquecer a sensação que tive
quando fui ler um jornal outro dia e vi a foto do meu irmão na capa de uma
revista de mãos dadas com a garota do olhar mais doce do mundo, acredito que
especial também, porque ele sorria de um jeito que nunca vi antes. Eu chorei
feito um menino de alegria, por isso não importa as circunstâncias, se meu irmão
está feliz, eu também estou e que se foda o resto. — Pedro desabou deixando as
lágrimas, que tanto segurava, caírem e eu fui atrás, minha mãe também.
Meu pai virou as costas, mas eu sabia que estava chorando também. Não
mostrava suas reações na frente dos outros. Mas eu o conhecia, melhor que a
palma da minha mão.
— O meu filho, um dos homens mais ricos do mundo, namorando uma moça
que é amiga de um morador de rua, parece até uma piada de muito mau gosto. —
Ele balançou a cabeça, decepcionado.
— O nome dele era senhor Marley, pai. Homem bom que eu estou tendo a
honra de vingar sua morte trabalhando no seu caso contra os assassinos, não só
porque Romeu me pediu, mas, sim, porque é o certo, e pode ter certeza que eu
vou ferrar a filhinha problemática do seu amigo o máximo que eu puder. —
Pedro socou o aparador ao seu lado, o barulho assustou meu pai fazendo-o dar
um pequeno sobressalto.
Eu já disse o quanto eu amo meu irmão? Ele era o cara, por isso que pedi para
trabalhar nesse caso para mim, nunca perdeu um.
— Eu ouvi mesmo você falar uma palavra feia, Pedro? Eu devia lavar sua
boca com sabão agora mesmo, não foi assim que mamãe ensinou vocês. — Ela
dramatizou.
— Ferrar nem é um palavrão tão feio assim, mamãe, me poupe. — Nossa mãe
olhou feio para ele levando as mãos à cintura, conhecia bem aquele olhar “está
muito encrencado, mocinho”. — Desculpa, mãe, falei sem querer. — Pedro
revirou os olhos, voltando atrás rapidinho.
— Está na cara que ela só quer o seu dinheiro, filho, se eu, seu próprio pai, for
a favor disso, estarei indo contra todos os meus princípios. — Seu tom foi
apaziguador, mas não me acalmou em nada.
— Ela não precisa querer meu dinheiro, porque ele já é dela. Assim que eu a
trouxe para morar nesta casa, tudo dentro dela passou a ser seu, inclusive eu. Se
Juliene quiser ir embora e levar tudo que tenho, não me importo, porque não
viverei mais se não puder ser ao lado dessa mulher. Entendeu bem agora? Acho
que deixei bem claro. — Meu pai assentiu, a contragosto. — Ótimo. Não me
obrigue a escolher entre vocês e ela, porque já sabem a resposta — concluí,
sendo o mais firme que pude.
— Meu Deus! A situação é pior do que pensei, meu filho, espero que não se
arrependa por se doar tanto para esse relacionamento. —Meu pai deu o veredito
final, porém mais compreensivo do que pensei.
— Foi muito boa a visita de vocês, família, mas eu preciso ir atrás da minha
namorada para ver como ela está. Se é que eu ainda tenho uma. Depois dos
absurdos que ouviu, duvido muito. Obrigado, pai, por estragar minha felicidade
antes mesmo dela começar — rosnei, eu amava meus pais mais que minha
própria vida, mas às vezes conseguiam me tirar do sério.
Despedi-me da minha mãe e irmão com um abraço e saí em direção ao jardim
à procura de Juliene, meu pai ganhou apenas um aceno de cabeça.
Não encontrei Juliene em parte alguma, logo entrei em desespero. Voltei para
casa voando para pegar as chaves do carro e procurá-la por todo Rio de Janeiro
se fosse preciso, mas não voltaria para casa sem minha namorada de jeito
nenhum.
— Quase quarenta anos e ainda não aprendeu que quando uma mulher está
nervosa, dentro da sua razão, o melhor é dar um tempo a ela para esfriar a
cabeça? Vai por mim, conversar com sua namorada do jeito que a vi saindo
daqui quando cheguei é burrice. — Pelo visto, nem todo mundo havia ido
embora, meu irmão estava sentado no sofá da sala segurando dois copos de
vodca servidos com uma dose bem caprichada.
— Trinta e oito anos, está muito longe de quarenta — resmunguei sem
paciência. — Se sabia que Juliene havia saído, por que me deixou ir procurar por
ela, Pedro? — Perguntei mais rude do que o normal, procurando as malditas
chaves do meu carro para ir atrás da minha namorada, mas não encontrava em
lugar nenhum, porra!
— Eu escondi as chaves do seu carro dentro da minha cueca, se quiser pode
pegar, ou então senta aí e tenta relaxar um pouco. — Ergueu o copo de vodca na
minha direção e eu peguei, sentando ao seu lado completamente contrariado.
Sorvi todo o líquido em um gole só e me servi mais uma dose da garrafa à minha
frente sobre a mesinha de centro. — Juliene pediu para avisar que ia sair, mas
não voltaria tarde, também pediu para que você cuidasse do Romeuzinho para
ela. — Meu irmão dava o recado segurando o riso, ele, melhor que ninguém,
sabe o meu pavor por felinos.
Falando na bola de pelos, o pequenino dormia tranquilamente na sua caminha.
Eu estava começando a me acostumar com ele miando dia e noite atrás de mim
pela casa.
— Virou garoto de recados agora, irmão? — zombei, e ele riu balançando os
ombros largos.
— Ela é encantadora, Romeu. Parabéns! Bastou sessenta segundos falando
com a sua namorada para perceber por que se apaixonou por ela. Não estou
falando somente da sua beleza delicada. Mas, sim, da energia positiva que
transmite, sei lá, ela tem um charme especial que é só dela. — Encarei os olhos
escuros do meu irmão tagarelando sem parar, tecendo elogios em relação à
minha mulher, era assim que Juliene deixava os homens que a conheciam,
simplesmente babando em cima dela.
O fato dela ser diferente de todas as outras garotas, fazia dela apaixonante.
— Ela é incrível, sim, mas é minha. Então já chega de elogios para minha
namorada. — Dei uma cotovelada nele rindo, enfim começando a relaxar, acho
que o álcool começava a fazer efeito no meu sangue.
— Não acredito que vivi para ver Romeu Alcântara com ciúmes, essa menina
te pegou de jeito mesmo!
— Oh, se pegou! Ela me deixa louco, principalmente de amor e na cama. —
Fiquei sem graça depois que falei, virei outra dose da minha bebida para encarar
meu irmão, os olhos dele já estavam começando a ficar vidrados e a voz
arrastada, Pedro sempre foi fraco para bebidas. — Você realmente não se
importa com a idade da minha namorada? E não partilha nem um pouquinho da
opinião do nosso pai, que acredita que Juliene é mais uma dessas jovens
aproveitadoras que seduz coroas ricos para sugar todo seu dinheiro? —
questionei sério, a verdade é que quem olhava nossa relação de fora era difícil
pensar de outro jeito.
Eu não me importava com a opinião alheia, mas com a dos meus irmãos e da
minha mãe, sim. Diferente do meu pai, eles, sim, se importavam com minha
felicidade independentemente se isso colocasse a fama do sobrenome nobre em
risco.
— Você acha mesmo que eu apoiaria seu namoro com uma golpista? Ah, vai
se ferrar, Romeu. — Ele ficou nervoso, e com razão. — Para ter a resposta da
sua pergunta me coloque no seu lugar, o que faria se fosse eu apaixonado por
uma garota bem mais nova? — Ergueu as sobrancelhas esperando uma resposta
convincente da minha parte, às vezes esqueço que não dá para argumentar com
meu irmão em nada, afinal, ele é um advogado esplêndido.
— Eu dava um tiro no meio da testa da desgraçada antes mesmo dela pensar
em tirar um centavo seu, mas se eu percebesse que ela era uma boa moça, eu
defenderia o amor de vocês com unhas e dentes.
— Também te amo, meu irmão, quando eu matar alguém já sei quem chamar
para me ajudar a esconder o corpo. — Pedro gargalhou escandalosamente
dominando toda a sala, e eu fui junto, a ponto de cairmos do sofá levando a mão
à barriga.
A essa altura, a garrafa de vodca estava vazia.
— Mas que porra, meu! Vocês ficaram bêbados antes de eu chegar? — Junior
apareceu rosnando na sala, fingindo estar bravo, e eu e Pedro rimos mais ainda.
Apesar de ter os traços do rosto parecido com o nosso, Junior puxou os
cabelos e olhos claros da nossa mãe. Ele falava como ela, sorria como ela e o
coração grande não ficava muito atrás. É um rapaz bondoso. Enchi-me de
orgulho quando escolheu fazer medicina, sempre foi muito estudioso.
— Trouxe mais munição como eu pedi, Juninho? — Pedro perguntou em
meio aos risos, nosso irmão caçula não respondeu nada, apenas colocou o
engradado de cerveja no chão.
— Eu sempre ando bem armado e ainda trouxe aperitivos. Depois do plantão
tenso que tive, só quero beber e comer como se o mundo estivesse acabando,
vida de residente em hospital público não é fácil, meus brothers. — Ele se
esparramou no sofá conosco ainda com a roupa do hospital, todo vestido de
branco, com uma cara de exausto.
— Não vai dar um abraço no seu irmão mais velho, pirralho? — Eu me
zanguei com ele, que abaixou a cabeça envergonhado como se fosse um menino
de cinco anos.
— Desculpa, irmão, você sabe que eu te amo. — Abraçou-me bem forte,
afaguei seus cabelos loiros como faço desde sempre.
— E eu não vou ganhar abraço do meu irmãozinho, também? — Pedro fez
beicinho, ninguém aguentava ele quando ficava bêbado, era a carência em
pessoa.
— Eu já te abracei hoje antes de ir para o trabalho, Pedro. Não começa com
drama, quem está com dor de cotovelo aqui é o papa anjo… Ops, quer dizer,
Romeu. — Junior fez piada, mas como eu não ri, o silêncio pairou no lugar.
— Se eu fosse você, maninho, torcia para minha namorada me perdoar
quando voltar para casa. Porque pelo que pode ver, faço um sucesso danado com
as novinhas, como é o nome mesmo daquela garota que você gosta? — Meus
dois irmãos pararam a garrafa de cerveja no ar, literalmente de queixo caído,
aquela era a primeira vez que me viam fazendo uma piada.
— Não deixa essa garota escapar, cara, ela é especial. — Junior tocou meu
ombro, por um minuto trocamos um olhar de companheirismo. — Até porque
não quero perder minha peguete para meu irmão mais velho, com esse seu
charme nem eu e o Pedro juntos temos a menor chance. A mulherada cai
matando mesmo, Juliene que se cuide. — Rimos muito os três, fazia muito
tempo que não tirávamos um momento só nosso.
Passamos o resto do dia enchendo a cara, e nem sinal de Juliene aparecer.
Liguei um milhão de vezes, ela não atendeu nenhuma, apenas mandou uma
mensagem para que eu não ficasse preocupado, porque havia apenas saído com
alguns amigos para espairecer. Imediatamente o ciúme me dominou, com certeza
ela estava com o “Superboy”. Fiquei furioso.
Depois disso, enchemos a cara mais ainda, a ponto dos meus irmãos irem
embora arrastados para casa com a ajuda do meu motorista. E eu apaguei no
tapete da sala que ficava em frente à lareira, perdendo total sentido de tudo à
minha volta, em uma escuridão sem fim.
“Meu maior medo sempre foi perdê-la para alguém que a merecesse mais
do que eu”
CAPÍTULO 25
R OMEU
Acordei com uma dor de cabeça insuportável, tive dificuldade para abrir os
olhos direito devido à excessiva claridade ao meu redor. Eu estava vestido
apenas com a calça do meu pijama, deitado na cama com todas as janelas do
meu quarto abertas, trazendo raios de sol para dentro do extenso cômodo, era
uma agradável manhã daquelas que prometiam um dia de céu azul e pássaros
cantando com todo seu esplendor. Só Deus sabe como fui parar ali, não me
lembro de nada depois que Pedro me entregou a última garrafa de cerveja que
sobrou do engradado que o Junior trouxe. Nunca bebi tanto na vida e acho que
os meus irmãos também não, devem ter levado uma bronca e tanto dos nossos
pais.
Girei o pescoço para o lado e vi sobre o criado-mudo uma cartela de remédios
ao lado de um copo de água com um bilhete com letras delicadas apoiado nele,
que dizia:
“Para ajudar com a ressaca”.
Tomei o comprido rapidamente, fiz minha higiene pessoal e saí desesperado
atrás de Juliene. Ao chegar no andar de baixo, ouvi uma voz angelical
cantarolando vindo da direção da cozinha, logo chegando na porta sorri ao ver
Juliene vestida com uma camisola simples branca, de tecido fino, mostrando a
metade da bunda, e descalça. Uma cena muito sexy, por sinal. Ela estava de
costas para mim, terminando de arrumar uma mesa linda de café da manhã,
reparei que não havia empregados na casa, apenas nós dois. Será que seu plano
era me matar sem nenhuma testemunha presente? Pensei comigo apavorado.
— Bom dia, baixinha — cumprimentei totalmente sem jeito, apoiando as
costas no vão da porta de braços cruzados, apreensivo.
— Bom dia, amor, e a ressaca como está? — Ela franziu o cenho contorcendo
a boca, repreendendo-me como se eu fosse um adolescente depois de uma noite
de farra.
Não gostei disso, mas não estou em condições de reclamar de nada.
— Está melhor, obrigado pelo comprimido. — Assentiu sorrindo, voltando
sua atenção para a bela mesa de café da manhã.
— Eu dispensei os empregados, assim teremos mais privacidade para
conversar. — Fiquei tenso, não sabia onde ela queria chegar com aquilo. —
Agora venha tomar seu café antes que esfrie, acabei de preparar a mesa. — Eu
não conseguia tirar os olhos dela, queria beijá-la e amá-la em toda parte daquela
cozinha, mas tinha medo de tocá-la e ser rejeitado.
— Não está brava comigo por ter escondido coisas tão sérias de você, bebê?
— Eu brava com você? Nunca! — Foi sincera.
Como assim, não? Fiquei em sinal de alerta.
— Mas, então, por que saiu ontem sei falar comigo? Fiquei com tanto medo,
pensei que nunca mais voltaria para mim e… — Não consegui terminar a frase,
Juliene veio correndo e me acolheu dentro de um abraço bem apertado.
Eu estava tão feliz, mal podia acreditar que a minha baixinha estava ali
comigo de verdade. Ela poderia fazer uma cena, gritar ou fazer drama. Mas não.
Esse não faz o estilo da minha garota, não mesmo!
— Eu saí para respirar um pouco não porque estava com raiva pelo que
descobri, mas, sim, pelo impacto de saber que perdeu sua mulher e filho num
acidente terrível de carro. Meu coração doeu me deixando com muita vontade de
chorar, mas não queria fazer isso na sua frente — explicou, fazendo meu peito
transbordar de amor. — Pretendia dar apenas uma volta no quarteirão, mas
quando estava retornando para casa, seus pais estavam indo embora e pediram
para que eu entrasse no carro com eles porque queriam ter uma conversa
importante comigo. Fiquei com receio, mas achei melhor resolver isso de uma
vez, deixando bem claro que nada nem ninguém me separaria de você. — Um
alívio enorme ultrapassou meu corpo, fazendo todos os meus músculos
relaxarem no mesmo instante, se dependesse de mim nada nem ninguém ia nos
separar.
— Meus pais foram gentis com você, Juliene? — Indaguei, erguendo seu
queixo com as pontas dos dedos para que olhasse para mim.
— Foram, sim, principalmente sua mãe. Seu pai desistiu de ser grosso comigo
depois que percebeu que eu era o dobro com ele quando me provocava, depois
de um almoço longo em um restaurante chique no centro da cidade, todos
chegamos à conclusão que o que realmente importa para ambos os lados é a sua
felicidade. — Ela desviou o olhar pigarreando e acrescentou. — Eles me
contaram por alto sobre o acidente que tirou tudo o que você amava, Romeu.
Sinto muito por ter passado por um momento tão terrível, eu melhor do que
ninguém sei bem o que é perder alguém que se ama de forma tão trágica. — Tive
a leve impressão que Juliene não estava falando só da perda de seu amigo
Marley, fiquei preocupado, porém não perguntei nada.
— Foi o pior dia da minha vida, não tinha mais motivos para viver e ainda
herdei várias cicatrizes na perna e uma dor pavorosa no joelho que por pouco
não me tirou a possibilidade de andar. — Juliene deixou uma lágrima cair
enquanto alisava meu rosto, fechei os olhos deliciando-me com aquela sensação
maravilhosa.
Era como se a minha dor também fosse a sua.
— Eu te amo, não vou deixar que sofra nunca mais — sussurrou no meu
ouvido.
— Eu te amo mais, baixinha, ainda mais agora com você tendo todos os
motivos para estar chateada comigo e não está — sussurrei de volta, então senti
seu corpo ficando um pouco tenso.
— Eu só tenho uma dúvida que fiquei com vergonha de perguntar para seus
pais, queria ouvir diretamente de você, por que disse para mim outro dia que não
podia ter filhos?
— Eu não menti para você, Juliene, se é o que está pensando. — Sentei em
uma das cadeiras da mesa e a puxei para o meu colo, o cheiro do bolo com
cobertura de chantili e morangos à minha frente estava com um aroma delicioso.
— Como o sonho da minha esposa era ser mãe, tive que me submeter a vários
tratamentos demorados e rígidos. Sem sucesso por anos, ela só conseguiu
engravidar, com muita dificuldade, depois da quinta tentativa de fertilização in
vitro. Porque, naturalmente, meu médico disse que a chance era de 0,1111 %. Ou
seja, quase impossível. — Observei Juliene atentamente enquanto prestava
atenção em tudo o que eu falava e ao mesmo tempo preparava um prato farto
esticando o braço sobre a mesa, colocando de tudo um pouco, gostava do jeito
atencioso que ela cuidava de mim.
— Não precisa explicar mais nada, já entendi. — Cortou o assunto, sabia que
falar disso me deixava triste. Mas eu ainda precisava perguntar algo a ela muito
importante.
— Você entendeu bem que eu não posso ter filhos, Juliene? —Arqueei a
sobrancelha.
— E? — Ela franziu o cenho.
— E que se ficar comigo a chance de ser mãe é praticamente zero?
— 0, 1111 % não é zero, Romeu. Se não acontecer é porque Deus não quer,
se, sim, será um grande milagre, muito bem-vindo. — Deu de ombros, e eu sorri
feito um bobo apaixonado.
— Sim, senhora, baixinha. — Inclinei para mordiscar a ponta do seu mamilo
rígido aparecendo debaixo da camisola fina, implorando pelo meu toque.
— Agora tome o seu café, aposto que deve ter ingerido, ontem, só coisas que
contêm álcool. — Assenti, e levei um tapa no ombro. — Se eu comer tudo, o que
eu ganho, senhorita?
— Algo bem especial, tenho certeza que vai amar. — Rebolou no meu colo e
o meu membro logo deu sinal de vida; percebendo isso, rebolou ainda mais.
— Se continuar rebolando assim, baixinha, o meu café da manhã será você.
— Não, senhor, pode tratar de se alimentar direito. — Ela acabou me fazendo
comer o prato todo e mais uma salada de frutas, terminei meu café da manhã
degustando minha namorada lambuzada de chantili e morangos sobre o balcão
da cozinha.
A chupei todinha e depois fizemos amor loucamente em cada canto daquela
casa, Juliene era inteligente e — para minha sorte — estava aprendendo rápido
como me agradar sexualmente. Sabia onde e como me tocar para me fazer perder
a cabeça, a ponto de gozar dentro dela várias vezes feito um louco naquela
manhã.
Desfrutamos do privilégio de estarmos sozinhos, andando nus pelos cômodos
livremente. Tomamos banho juntos e dormimos de conchinha pelo resto da tarde,
relaxados e saciados. Eu acabei acordando primeiro e aproveitei para ligar para o
Pedro, precisava saber se ele e o Junior haviam sobrevivido à bronca dos nossos
pais por chegarem bêbados em casa.
— Já curou a ressaca, irmão? — Foi a primeira coisa que Pedro perguntou
assim que atendeu, levantei com cuidado e fui conversar com ele na varanda
embutida no quarto, para não acordar minha namorada.
— Já, sim. E você, Pedro? Não devíamos ter deixado nosso irmão caçula
beber tanto, se o pai e a mãe brigarem conosco, será merecido.
— Eles brigaram o de sempre, nem lembro direito o que disseram, estava
tonto demais. Tomei um banho gelado e passei a noite no meu antigo quarto,
hoje de manhã, na hora do café, adivinha qual foi o assunto principal? — Não
precisando ser muito inteligente para descobrir, respondi:
— Juliene — digo com certeza.
— Sim, senhor, Romeu. Que lavagem cerebral sua namorada fez na cabeça
dos nossos pais? — Sorri, sabia que meus pais cedo ou tarde cairiam no charme
da minha baixinha. — Minha mãe tece elogios a ela o tempo todo, dizendo o
quanto achou Juliene forte e, ao mesmo tempo, delicada. Já o nosso pai ouvia
tudo e não dizia nada, o que é um grande milagre vindo do senhor Moacir
Alcântara. Sinal que já aceitou o relacionamento de vocês, só não quer dar o
braço a torcer. No fundo, ele, assim como nós, só quer a sua felicidade. — Eu
sabia disso, apesar de tudo, eu sempre amei muito meu pai e ele os filhos.
— Ótimo! Pelo menos assim, nós poderemos viver nosso amor em paz agora.
— Não é tão fácil assim, irmão, ainda têm a mídia para enfrentarem, não vai
demorar para que comecem a comparar Juliene com sua antiga esposa. Fora que
ficarão atrás de vocês como abelhas atrás do mel, é sempre assim quando
pessoas de mundos diferentes se juntam. — Respirou pesadamente do outro lado
da linha, ele estava coberto de razão.
— Desde que estejamos juntos, tenho força para enfrentar qualquer coisa, não
se preocupe. Custei muito para reencontrar a felicidade, e nada nem ninguém irá
tirá-la de mim.
— Assim que se diz, mano, aproveita bem a sua “novinha” aí porque eu vou
embora para meu apartamento, um dia na casa dos nossos pais e já estou
enlouquecendo. — Afastei o celular do ouvido para abafar o som da sua
gargalhada, Pedro é a pessoa mais irritantemente feliz que conheço, vê esperança
em tudo e todos.
— Eu não sei por que Junior ainda mora com eles, dei um apartamento para
ele no seu aniversário de dezoito anos à toa, só usa o lugar como “matadouro”,
toda semana é uma mulher diferente. —Revirei os olhos, meu irmãozinho caçula
é um cafajeste de marca maior.
— Nem me fale, Romeu. Agora vou nessa mesmo, irmão, te amo!
— Também te amo, cara, fica com Deus!
— Como assim? Pensei que não acreditava mais nele depois do acidente.
— Mas voltei a acreditar depois que ele colocou Juliene em minha vida. — Eu
o ouvi respirar pesadamente, depois se despediu rápido com a voz embargada e
desligou.
— Mas é um chorão mesmo! — Pensei alto rindo.
— Quem, amor? — Perguntou Juliene, me abraçando por trás enrolada em um
lençol, depois beijou minhas costas nua.
— Seu cunhado, Pedro. — Virei de frente para ela me enfiando dentro do seu
lençol, a temperatura do seu corpo logo se elevou.
— Eu gostei muito dele, parece ser um rapaz bacana.
— Ele é, sim. Precisa conhecer o mais novo, Junior, é uma figura! E em breve
será um grande médico, se forma ano que vem — disse orgulhoso.
— É mesmo, irmão babão? — Riu da minha cara, abusada!
— Sou mesmo! Meus irmãos são meu orgulho, apesar de nascerem em berço
de ouro, não são esnobes e têm o coração bondoso.
— Assim como o irmão mais velho deles, porém você, devo acrescentar à
lista: muito gostoso. — Seu tom era de pura malícia. Por Deus! Como não amar
essa mulher? Em tão pouco tempo havia se tornado tudo para mim.
Minha vida.
Meu tudo.
Acabamos fazendo amor novamente na varanda mesmo, sobre a luz das
estrelas, em um ato totalmente romântico e íntimo. Depois de uma ducha longa,
fomos preparar o nosso jantar. Eu não sei cozinhar quase nada, mas minha
namorada foi me ensinando pacientemente. Ríamos de tudo, comemos uma bela
salada com peixe grelhado e depois arrumamos tudo no seu devido lugar.
Voltamos para o quarto, namoramos mais um pouco e depois dormimos de
conchinha, agarradinhos.
Não fui trabalhar naquele dia, nem nos próximos. Dediquei-me apenas a
cuidar da minha namorada, ela tem passado por muitos momentos difíceis. Em
um clima totalmente romântico, o final de semana chegou rápido, havíamos
passado momentos incríveis juntos. No sábado, meus pais nos convidaram para
almoçar com eles e os meus irmãos, confesso que aceitei com um certo pesar.
Mas Juliene, com seu sorriso confiante, me fez acreditar que tudo sairia bem. E
de fato saiu, vez ou outra, meu pai torcia o nariz para o lado da minha namorada,
mas não a maltratou verbalmente em momento nenhum, graças a Deus!
No domingo à noite, eu e Juliene iniciamos uma briga feia porque não
autorizei de forma nenhuma que trabalhasse como caixa no supermercado do
“Superboy”, isso só aconteceria por cima do meu cadáver.
— Você não tem o direito de mandar na minha vida, Romeu. —Ela rosnou
irritada batendo a mão sobre a mesa do meu escritório de casa, furiosa.
Fitando-me com os olhos azuis marcantes faiscando de raiva, eu nem me
abalei, ela podia gritar e espernear que não ia me desobedecer dessa vez.
— Por que não vem trabalhar comigo na minha empresa, Juliene?
— Não entendo nada de carros, faria o que lá? Só quer me levar para lá para
ficar me vigiando dia e noite.
— Também — confirmei calmo.
Foi a mesma coisa que jogar gasolina na fogueira.
— Você não tem vergonha de dizer uma coisa dessas, Romeu? Se acha que vai
tentar me controlar, está muito enganado, nunca serei sua submissa. — Aí que a
coisa ficou feia mesmo, que mulher difícil. Deu a volta na mesa e me puxou pela
gola da camisa com as duas mãos, descontrolada. — Nunca serei sua submissa,
nem agora nem nunca, entendeu bem? — Empurrou-me para trás com a mão
aberta sobre o meu peito e girou o corpo para ir embora, mas não deixei.
— Mas que namorada brava que eu fui arrumar, hein? — A obriguei a sentar
em meu colo, de frente para mim, com uma perna de cada lado do meu corpo, a
bermudinha jeans que estava usando subiu aparecendo mais do que devia. — Eu
não estou querendo que vá trabalhar comigo na empresa para te controlar, mas,
sim, para supervisionar de perto o andamento da construção da sede do projeto
social que você aceitou ser responsável. Como eu não poderei participar muito,
pelo menos, de perto, poderei te orientar no que eu puder. — Sua expressão se
suavizou, a raiva foi embora dando lugar a um sorriso enorme. E o olhar
desviado do meu rosto, agora estava no fundo dos meus olhos.
— A minha sala vai ser pertinho da sua? — Sorriu sapeca, mordendo a parte
de dentro dos lábios, essa mulher me enlouquece.
— Colada na minha, bebê. — Cheguei sua calcinha para o lado deslizando
meu membro rígido para dentro dela, minha vida sexual nunca foi tão ativa.
“Ela conseguia me enlouquecer em uma fração de segundos”
CAPÍTULO 26
J ULIENE
Quando conheci o pai do Romeu, pensei que ele seria um grande impedimento
para o nosso amor. Mas depois, de um jeito ou de outro teve que me engolir ou
perderia o filho, e ele o ama demais para pagar um preço tão alto por mero
preconceito em relação à minha idade e estrutura social. O senhor Moacir ainda
não conversa comigo direto, durante o almoço na sua casa quase não dirigiu a
palavra a mim, apenas respondia o que eu dizia em palavras monossilábicas.
Mas não desisti, esse velho ranzinza ainda vai virar um grande amigo meu. Ah,
se vai!
Já a mãe do meu namorado e os irmãos são uns amores, atenciosos e
extremamente educados. Pedro é gentil e ama demais o irmão mais velho, assim
como o caçula. Junior é uma graça, muito maduro e focado na profissão que
escolheu para sua vida, a medicina. Meu namorado se orgulha muito dos dois, os
olhos brilham quando olha para eles. É obvio que seria um ótimo pai, uma pena
que ele tenha problemas com esterilidade.
Mas, para Deus, nada é impossível.
— Você está pronta, amor? Ramón já está nos esperando para levar para a
empresa, meu motorista sabe melhor do que ninguém que não tolero atrasos. —
Deixou seu recado “discretamente”, enquanto me observava pelo reflexo do
espelho, me vendo travando uma briga com meu cabelo para fazer um coque
alto. Estava curto demais e a maioria dos fios ficaram soltos, mas até que ficou
legal.
Pedi ao Romeu para, a princípio, não me apresentar na empresa como sua
namorada, a maioria das pessoas já desconfiava por causa da mídia, mas sair
diretamente da boca dele eram outros quinhentos. Eu queria conquistar a
confiança das pessoas que trabalhariam comigo e não começar como “a
namorada do chefe”. Coloquei o mesmo vestido preto simples que usei no jantar
na casa dos meus padrinhos e sapatos de salto médio, passei uma maquiagem
discreta, mas notável. Não curto muito isso de ficar me preocupando com visual,
mas queria impressionar no meu primeiro dia de trabalho.
— Tudo bem, chefe, já entendi o recado. — Passei rebolando por ele com a
minha bolsa debaixo do braço e o nariz mais empinado do que de costume, ele
ficou parado com cara de idiota esperando um beijo ardente e ficou chupando
dedo. Bem feito! — Vai ficar o dia todo parado aí, senhor Romeu Alcântara? —
gritei antes de sumir pelo corredor adentro, ele logo veio correndo atrás de mim,
segurando sua maleta.
— O que é isso agora de “chefe” e “senhor Romeu Alcântara”, hein,
baixinha? — indagou assim que colocamos o pé do lado de fora de casa, e eu
tentei segurar o riso.
— Entre as oito da manhã e as dezesseis horas, eu serei para você apenas
senhorita Sullivan. Nada de palavras sacanas ao pé do meu ouvido, olhares
devassos, amassos pelos cantos, tirar a roupa e, principalmente, mantenha essas
suas mãos longe da minha bunda. — Ele paralisou chocado, olhos arregalados e
a coloração do rosto avermelhada.
— Então para que valeu todo meu esforço para te convencer a trabalhar
comigo se não vou tirar proveito disso? — disse, naturalmente, o cínico. Minha
mão chegou a formigar de vontade de dar na cara dele.
Em vez disso, caminhei em direção ao carro para não dar um fim no meu
chefe antes mesmo de começar a trabalhar para ele.
— Bom dia, Ramón. Como vai? — cumprimentei o motorista ao abrir a porta
do carro, ele era um bom rapaz. Alto e de olhos azuis, no auge dos seus trinta e
poucos anos.
Estava sempre impecável dentro do seu terno preto, gravata e o quepe bem
alinhados, o cabelo castanho-claro aparado em um corte preciso e a barba feita.
E um sorriso no rosto, lindo e sincero.
— Bom dia, senhorita Juliene. Está muito linda hoje. — Foi gentil.
— Obrigada, Ramón. Mas já falei que só Juliene está ótimo, não precisa usar
essa formalidade comigo. — Toquei em seu ombro.
— Podemos ir agora, por favor? E que fique claro que não tolero conversinhas
paralelas entre meus funcionários durante o horário de serviço, depois das
dezesseis horas podem colocar o papo em dia — alfinetou Romeu, e entrou no
carro, no banco de trás, batendo a porta com tudo, eu sorri amarelo para o
motorista, morta de vergonha, e sentei-me ao lado do meu namorado rabugento.
Não me dirigiu mais a palavra durante o caminho, mantendo a pose de chefe
durão. Ótimo. Mas confesso que senti falta de ouvir sua voz dizendo coisas
românticas ao pé do meu ouvido como sempre faz. Devassas. O toque carinhoso
de suas mãos e sua boca passando por todo meu corpo.
Que isso, Juliene? Sossegue!
Era muito difícil manter a compostura ao lado de um homem como Romeu.
Ele era lindo. Alto, forte e muito charmoso. Tinha mãos ágeis e uma língua
poderosa, conseguia arrancar vários orgasmos de mim um atrás do outro apenas
com ela, tem um fôlego invejável, melhor que muitos rapazes de vinte anos, só
me deixava dormir todas as noites quando o dia começava a clarear. Adora sexo
matinal, lento e bem gostoso. Romântico. Traduzindo: meu namorado é o sonho
de toda mulher. Tive certeza disso quando pisamos no elevador da empresa e
algumas oferecidas faltaram pouco babar em cima do meu homem, mas ele
estava mais sério do que nunca, chegava a ser ridículo.
Bufei irritada, ainda bem que dentro do elevador ele permaneceu de cara
fechada o tempo todo com o olhar fixo na parede de aço à sua frente.
— Bom dia, senhor Romeu. Quanto tempo, seja bem-vindo ao trabalho. Essa
empresa não é a mesma sem você por aqui. — Cheguei a trincar os dentes de
raiva ao sermos recebidos pela “Paula” logo de cara na recepção, essa diaba não
trabalha na filial da empresa em Nova York? O que está fazendo aqui, então?
Paulavaca dos infernos! Só essa que me faltava agora.
— Obrigado, Paula. Mostre a nova sala da senhorita Sullivan, por favor, e a
auxilie no que precisar no projeto social patrocinado pela “nossa” empresa que
beneficiará centenas de moradores de rua. — Olhei feio para Romeu, mas ele
manteve a expressão distante e cruel.
Totalmente indiferente a mim, como se eu não tivesse nenhuma importância
para ele, fosse uma estranha, pior, um cão sarnento que queria passar a
responsabilidade da minha presença para outro logo. Quando eu disse que
deveríamos manter a formalidade no local de trabalho, não imaginei que levaria
tão ao pé da letra. E agora ainda tenho que lidar com a presença dessa tal de
Paula, alta, loira, linda e magérrima dentro de um vestido azul sensual e saltos
finos.
Por que não me contou que ela veio trabalhar com ele no Brasil?
Isso me deixou extremamente chateada.
— Pensei que você fosse me auxiliar no que eu precisasse, Romeu. — Cruzei
os braços e o encarei.
— Eu sou o chefe dessa empresa, senhorita Sullivan. Tenho muitas coisas
importantes para fazer, não posso passar o dia todo passeando com você por aí.
Paula fará isso por mim, e ponto final! — E voilà, o Romeu grosso deu as caras
novamente.
— Não precisa se incomodar me emprestando a sua assistente, visivelmente
tão eficiente, senhor Alcântara. Vocês dois têm muito “trabalho” para fazer
juntos, é só me mostrar onde será minha sala que eu me viro sozinha. —
Duelamos com o olhar, se ele me irritasse mais um pouquinho, eu daria meia-
volta e iria para a vaga de emprego no supermercado do Marcelo.
Pelo menos lá, tenho certeza que serei tratada com atenção e carinho pelo meu
chefe.
— Que bom que você é tão compreensiva, Juliene. Já que o presidente tirou
uma semana de folga, acumulou muito trabalho por aqui e vai levar vários dias
para colocarmos as pendências em dia, só hoje marquei cinco reuniões onde eu
precisarei auxiliá-lo e não terei tempo para te recepcionar. — Latiu sua assistente
perfeita, Paula, jogando os cabelos longos para o lado. Confesso que me senti
culpada pelo meu namorado ter acumulado tanto trabalho só para passar um
tempo comigo. — Mas eu sei quem pode te passar tudo sobre o projeto, aquele
que acabou de chegar ali é o Miguel, ele é um dos novos arquitetos recém-
contratados da empresa, eu mesma o entrevistei e o escalei para esse trabalho.
Apesar de ser jovem e estar há pouco tempo no mercado, é um ótimo
profissional e está a par de tudo sobre o projeto social — explicou ela mostrando
eficiência, apontando para um cara sorridente que havia acabado de sair do
elevador. De estatura mediana e cabelos castanhos cacheados, era novinho e
cheio de energia para trabalhar. Que ótimo!
Através dos seus óculos de grau, pude ver seu olhar quente cravado em mim
mais tempo do que deveria. E eu não era a única a reparar nisso, meu chefe
bufava de raiva com o maxilar rígido. Nem me importei, continuei analisando o
Miguel, ele fazia o tipo nerd gato. Sua camisa azul tinha os botões fechados até o
pescoço, calça jeans e tênis. Uma mistura peculiar, mas interessante. Equilibrava
uma pilha de papéis, carregando sua maleta ao mesmo tempo.
— Obrigada, Paula. Você é muito gentil, se me derem licença, vou me
apresentar ao meu novo companheiro de trabalho, Miguel. — Olhei dentro dos
olhos escuros tempestuosos do Romeu, depois saí disposta a dar o meu melhor
nesse trabalho.
Em conversa com meu companheiro de trabalho, descobri que Miguel era um
amor de pessoa, paciente e gentil. Tenho certeza que se eu já não estivesse
completamente apaixonada pelo babaca do Romeu, tinha grandes chances de me
apaixonar por esse cara. Explicou-me todo o projeto da construção
detalhadamente, e, juntos, tivemos várias ideias. No total, o abrigo comunitário
terá capacidade de acolher quinhentas pessoas. Terá vários dormitórios e uma
área gigantesca de refeição. Optei em ter salas de alfabetização, oficina de cursos
profissionalizantes, parquinho para as crianças, reuniões de autoajuda para os
viciados e uma bela horta comunitária, além de gerar alimento para o abrigo
seria um processo interessante. Cabeça vazia é oficina para o diabo. Se deixasse
por minha conta, não parava mais de fazer aquele projeto crescer em benefício
dos necessitados.
Era tudo tão incrível que quando Miguel me mostrou a maquete digital que ele
montou da obra, só para eu ter uma ideia de como ficaria depois de pronto, eu
chorei de emoção, como um bebezinho, de tanta alegria de estar fazendo parte de
algo tão incrível e tudo graças ao Romeu, que está por trás disso.
— Você está mesmo animada com o projeto, não é? — Miguel me entregou
um lenço branco que tirou do bolso e puxou a cadeira sentando de frente para
mim.
Nossos joelhos se tocaram, íntimos até demais.
— Muito, sempre sonhei em poder participar de um projeto social como este.
Distribuí sopa para moradores de rua uma vez, foi a coisa mais incrível que já
fiz, se pudesse faria todos os dias. — Funguei o nariz, chorosa. — Para mim, é
muito triste saber que nesse exato momento há várias pessoas com fome, frio e
sede vivendo sozinhas ao relento, e muito delas, crianças e idosos. E como se
não bastasse tanto sofrimento, ainda aparece um grupo de jovens, filhinhos de
papai, que tem tudo e ateia fogo em outro ser humano, como se fosse um saco de
lixo. — Eu lembrei do meu amigo, senhor Marley, então comecei a chorar mais
ainda. Por que tinha que acontecer isso com ele logo agora? Ele poderia fazer
parte do projeto social, começando uma vida nova fora das ruas.
— Eu vi passar no jornal, fiquei horrorizado com tanta maldade. — Balançou
a cabeça chateado.
— Ele era meu amigo, uma das melhores pessoas que conheci na vida.
— Nossa, Juliene, eu sinto muito. — Ele me abraçou gentilmente até que meu
choro cessasse, depois continuamos trabalhando no projeto normalmente, mas
não deu para fazer muito porque estava quase no horário do almoço.
— Tem planos para o almoço, Ju? — Arqueei uma sobrancelha enquanto
pegava minha bolsa, não lembro de ter lhe dado intimidade para me chamar
assim, afinal acabamos de nos conhecer.
— Tenho, sim, obrigada. — Sorri amarelo, ele assentiu jogando uma piscadela
charmosa para o meu lado. Apressei o passo procurando pela sala do meu
namorado, iria chamá-lo para almoçarmos juntos.
Chegando ao final do corredor, parei em frente a uma parede de espelho para
ajeitar meu cabelo e retocar o batom nude. Mas ao virar para trás, percebi que
estava parada de frente para a porta da sala de Romeu. Estava entreaberta, deu
para vê-lo sentado na sua mesa como um rei no seu trono. Postura firme e
imponente, parecia um Deus grego.
E a vadia da Paula debruçada sobre ele, praticamente esfregando os seios no
seu rosto com um decote enorme, enquanto fingia estar mostrando alguma coisa
em uma folha sobre a mesa, filha da mãe! Meu sangue ferveu, cheguei a dar um
passo para frente para fazer um escândalo e dar na cara dessa loira metida.
Mas me contive. Afinal, fui eu mesma que pedi a ele profissionalismo no
trabalho, então dei meia-volta e saí furiosa.
— Ainda por aqui, moça? Pensei que já tinha ido almoçar. — Encontrei com
Miguel esperando o elevador, fingi um sorriso para disfarçar meu estado de
humor tempestuoso.
— O convite ainda está de pé? — indaguei.
— Claro, Ju, conheço um ótimo restaurante aqui perto que a maioria do
pessoal da empresa almoça.
— Ótimo. — Era até bom, assim poderíamos continuar falando sobre o
projeto e eu esqueceria da cena horrível que acabei de ver.
Seria ótimo mesmo, se meia hora após chegarmos ao restaurante, Romeu não
aparecesse com sua assistente a tiracolo. Tentei me esconder atrás do cardápio,
mas o cínico teve a cara de pau de vir até a nossa mesa.
— Será que poderíamos sentar com vocês? — perguntou na cara dura, sem
nem ao menos cumprimentar ninguém antes. Quando estava com a armadura de
poderoso chefão, se sentia o rei do mundo.
— Cla… claro que pode, senhor, será uma honra. — Miguel falou
gaguejando, maravilhado por ter a oportunidade de almoçar com o chefe.
Trinquei os dentes de raiva, para não falar merda.
— Tudo bem para você também, senhorita Sullivan? Não quero atrapalhar
nada. — Romeu me alfinetou mais uma vez, eu apenas dei de ombros, sem
encará-lo.
— Ótimo, porque eu estou morta de fome! — Paula arrastou uma cadeira e
sentou ao meu lado, Romeu de frente para mim.
— Boa tarde! Qual será o pedido de hoje? — O garçom veio anotar nossos
pedidos, o clima estava tão tenso na nossa mesa que até ele sentiu, mudando o
sorriso simpático para uma expressão de constrangimento.
— Para mim, nada! Eu perdi a fome, mais tarde faço um lanche. Se me derem
licença, bom almoço para vocês. — Nem morta ficaria na mesma mesa que os
dois juntos, se eu ouvir a voz dessa mocreia mais uma vez furo os dois olhos
dela.
Levantei com o resto de dignidade que me restava e saí de lá praticamente
correndo, com o estômago roncando e os olhos cheios de lágrimas, mas não
deixaria nenhuma cair, não daria esse gostinho para a Paula. Sou mais forte do
que isso. Porém, infelizmente, mal cheguei na calçada e fui puxada bruscamente
pelo braço.
— O que você pensa que está fazendo, Romeu?
— Apossando-me do que é meu. — Ele me beijou daquele jeito de tirar o
fôlego, quente e cheio de paixão.
— Você ficou louco? — Tentei empurrá-lo, mas ele me beijou de novo, com
tanta avidez que meus lábios ardiam.
— Se deixar outro homem te abraçar novamente, Juliene, juro por Deus que
eu o mato. — Ameaçou com o maxilar trincado, estava fora de si.
Mas eu também estava.
Só um minuto, como ele sabia que o Miguel tinha me abraçado?
— E se eu vir a sua assistente esfregando os seios na sua cara novamente,
quem vai morrer aqui é você. — O afastei para longe e saí falando uma meia
dúzia de palavrões, ele me pegou pelo braço e arrastou até o seu carro, me
jogando dentro dele, sem nenhum pingo de gentileza.
Romeu estava tão nervoso que não abri mais a minha boca, voltamos para a
empresa mudos, só se ouvia sua respiração pesada enquanto seu motorista
mantinha o olhar fixo na estrada. A comida, do restaurante em que estávamos,
chegou quase junto conosco ao escritório, ele havia pedido antes de ir atrás de
mim e fazer aquela cena toda no meio da rua. Pensei em ir para minha sala, mas
ele trancou a porta e abaixou todas as persianas.
Eu me encolhi toda apertando minha bolsa debaixo do braço como um escudo,
ele dava voltas ao meu redor com as mãos pousadas atrás do corpo, fitando-me
minuciosamente. Minhas pernas ficaram bambas, sempre ficava assim na sua
presença.
— Em menos de uma hora, as fotos de nós dois nos beijando no meio da rua
vão sair em toda a mídia, então, nosso namoro não é mais segredo para ninguém.
Estará mais que confirmado. Sendo assim, as palavras sacanas e olhares
devassos, amassos, tirar sua roupa — nos intervalos do trabalho — e,
principalmente, apertar sua bunda quando eu quiser está liberado. —
Praticamente gritou, inchando sobre mim como um toro bravo.
Não me afastei um centímetro, o encarando de queixo erguido.
— Você fez tudo de caso pensado, não é mesmo, Romeu?
— Fiz, sim, não estamos fazendo nada de errado para manter nosso namoro
escondido — disse o cínico, naturalmente, tirando o paletó, queria ficar mais à
vontade.
— Você é um filho da mãe da maior espécie, cínico e calculista — esbravejei.
— Você só descobriu isso agora? Pelo menos, já sabe com quem está lidando,
então pense duas vezes antes de brincar comigo — disse aos berros.
— Ou vai fazer o quê? Vai me bater? — provoquei jogando minha bolsa sobre
a mesa.
— Até que não seria má ideia, pelo visto os tapas que dou na sua bunda
enquanto te fodo não estão sendo suficientes. — Eu não aguentei e tive um
ataque de riso, eu amava aquele homem na mesma proporção que odiava seu
cinismo às vezes.
Romeu não aguentou e começou a rir também, não conseguíamos ficar
brigados por muito tempo. Sempre acabava em risos, beijos ou na cama.
Ou os três…
— Eu não sei por que a Paulavaca veio trabalhar contigo no Brasil, mas eu
quero que a mande de volta para onde veio hoje mesmo. — Aproximei-me dele
abraçando seu pescoço, seus braços envolveram minha cintura, colando nossos
corpos.
— Paulavaca? — A princípio achou graça do apelido que dei à sua assistente,
mas depois ficou sério e continuou. — Ela me pediu para ser transferida para a
sede da empresa aqui porque a mãe dela está muito doente e quer ficar ao seu
lado durante o tratamento, mas, assim que melhorar, voltará para o lugar de onde
veio. Não se preocupe, amor — explicou em meio aos beijos que distribuía pela
curva do meu pescoço, instigando-me.
— Tudo bem, eu confio em você. Mas não nela, então a mantenha longe o
máximo possível. — Afastei-me para encará-lo nos olhos, em seus lábios
dançava um sorriso de pura luxúria.
Metido!
— Digo o mesmo com o tal de Miguel, são apenas companheiros de trabalho
e nada mais. — Franziu o cenho, tive que controlar a louca vontade de beijá-lo,
para não interromper seu discurso ciumento. — Então sem abraços, nada de “Ju”
e conversas de coisas que não sejam sobre o projeto social. — Assenti, adorava
ver meu namorado com ciúmes de mim.
— Está ficando tudo lindo, amor, mal posso esperar para ver funcionando e
ajudando várias pessoas. — Deitei minha cabeça em seu peito, sentindo o calor
do seu corpo.
— Seja paciente, baixinha, num piscar de olhos inauguraremos o abrigo para
ajudar os moradores de rua “Senhor Marley”. — O chão sumiu debaixo dos
meus pés, mal conseguia respirar.
Ele ia dar o nome do meu amigo para seu o projeto social? Isso é surreal. E
quando penso que não posso amar ainda mais esse homem, ele vem e me
surpreende.
“Ele sabia melhor do que ninguém como me fazer feliz”
Algum tempo depois…
CAPÍTULO 27
ROMEU
J ULIENE
JULIENE
— Tia? — Eu disse com a voz embargada, quase não a reconheci devido a sua
aparência debilitada. Mas a maldade evidente em seu rosto continuava a mesma.
A amargura.
Ela veio se aproximando pelo corredor como uma cobra peçonhenta, pronta
para destilar seu veneno. Trajava um dos seus diversos vestidos pretos, pelo
visto, continuava de luto pela morte da filha. Fazia tanto tempo, mas ela fazia
questão de não deixar ninguém esquecer do que houve nem um segundo. O que
achei estranho era que seus cabelos estavam escondidos debaixo de uma espécie
de turbante, pelo que sei nunca foi adepta a esse tipo de apetrechos. Meu Deus!
O que aquela louca estava fazendo ali? Por que aparecer logo agora para me
humilhar? E por que em um momento tão especial da minha vida? Minha tia não
podia fazer isso comigo, não podia!
— Eu mesma, sobrinha querida, quando vi a matéria no jornal sobre a
inauguração desse lugar, logo vi que era a oportunidade perfeita para te
desmascarar na frente de todos. Eles precisam saber a assassina que você é,
matou a própria prima, agora está dando uma de boa moça. — Meu olhar foi
direto para a mesa do Romeu, ele me olhou de um jeito muito estranho que me
fez entrar em total desespero.
Agora estava tudo perdido, como explicaria essa história trágica que
aconteceu comigo? Nunca vai me perdoar, principalmente por eu estar fazendo
com que ele passasse esse constrangimento tão grande na frente dos amigos e
sócios.
— Cale essa maldita boca, sua cobra! Sei muito bem o que veio fazer aqui,
mas eu não vou permitir que estrague a vida de Juliene novamente, como fez
durante todos esses anos. — Meu padrinho Chicão veio em minha defesa,
madrinha Ester aproveitou a deixa, correu até mim e me tirou lá da frente de
todos, pedindo desculpas aos convidados pelo ocorrido.
Mas minha tia não desistiria tão fácil assim de me destruir, nos seguiu até um
dos quartos onde madrinha Ester me colocou sentada na cama. Eu estava tão
nervosa que rezava para aquilo tudo não passar de um terrível pesadelo como o
da noite passada. O qual eu acordaria a qualquer momento e meu coração ainda
estaria inteiro, não em mil pedaços.
— Você não pode se esconder de mim, Juliene. Vai ter que assumir na frente
de todo mundo tudo o que fez, de como tirou a vida da minha filha tão linda. —
Cobri o rosto, meu estômago embrulhava só de olhar na direção da minha tia.
— Por favor, Margô, vá embora. Deixe minha afilhada em paz, suma da vida
dela de uma vez por todas — implora madrinha Ester.
— Pelo amor de Deus, Juliene! Quem é essa mulher? E por que ela está te
acusando de ser uma assassina? — Romeu apareceu com a voz alterada, tão
nervoso quanto eu, deslizando as mãos pelo rosto confuso.
— Perdoe-me, meu amor, não queria que você passasse por essa vergonha —
digo, rezando para que acredite em mim.
Ao levantar a cabeça, percebi que a família toda dele estava no quarto
também, se antes era difícil contar a verdade só para o meu namorado, imagina
para todos juntos? Sabia que a felicidade não havia sido feita para mim, e que
cedo ou tarde esse sonho viraria um pesadelo. Só não imaginava que seria da
pior forma possível, com meu passado vindo à tona com tudo para me
assombrar.
— Será que podemos conversar a sós, Romeu? Por favor, eu imploro, deixa eu
contar minha história e depois aceitarei qualquer decisão que você tomar. —
Fiquei de joelhos aos seus pés me humilhando, mas antes mesmo de saber de
tudo, sua expressão estava tão dura que me tirou todas as esperanças.
— Mas acontece, Juliene, que existe uma parte da história que você não sabe e
esse pobre homem ao seu lado precisa saber, a verdade sobre o acidente que
matou sua esposa grávida e quase o deixou paralítico. — Eu me pus de pé na
mesma hora, como minha tia sabia da morte da esposa do Romeu e do problema
na sua perna? Será que andou pesquisando sobre a vida dele? Ou passou esse
tempo todo me vigiando, e eu pensando que estava livre desse demônio quando
saí de casa.
— Eu já falei para calar essa boca, criatura, você vai embora agora nem que
eu te arraste pelo pescoço. — Meu padrinho tentava arrastar minha tia para fora,
mas ele era gentil demais para ser grosso com uma mulher, então ela se debatia e
conseguia se soltar facilmente.
Na confusão, o turbante dela acabou caindo, revelando sua cabeça lisa sem
nenhum fio de cabelo, percebi que ela também não tinha mais sobrancelhas e
cílios.
— A senhora está com câncer, tia. — Por incrível que pareça, eu senti pena
dela.
Se o seu coração era amargurado antes, imagina agora sendo vítima dessa
doença horrível. Minha tia podia me odiar, mas o sentimento não era recíproco,
queria que encontrasse a paz algum dia.
— Sim, eu estou! E não posso morrer deixando esse coitado viver sendo
enganado, apaixonado por uma garota idiota, assassina! Estou cansada de ser
obrigada a ficar calada pelo meu marido e por você, Chicão. Tudo porque a
menininha problemática não podia sofrer mais, então deixaram você, Juliene,
acreditar que naquele dia que correu para o meio da rua com o sinal verde,
fazendo birra sem olhar para os lados, causando aquele bendito acidente, tirou
somente a vida da minha filha e do infeliz rapaz que dirigia a caminhonete. Mas
houve outra vítima: uma mulher grávida de oito meses. — Fiquei totalmente
tonta, meu coração batia tão rápido que era audível. Eu não podia acreditar
naquele absurdo. — E hoje está se deitando com o marido da falecida, matou a
coitada embuchada e depois roubou o homem dela. Parece até que fez tudo de
caso pensado, sobrinha querida. — Suas palavras me deram ânsia de vômito,
aquilo não podia ser verdade.
Não, não e não!
Choro descontroladamente, eu não podia ser a culpada pela morte da esposa
do Romeu, grávida de um filho que eles sonharam tanto em ter. Meu Deus! Por
que tanto sofrimento? Isso não pode ser verdade, me recuso a acreditar nesse
absurdo.
“Eu poderia suportar tudo, menos conviver com ele sabendo que destruí
tudo o que mais amava”
CAPÍTULO 30
ROMEU
12/06/2013
A vida nunca me pareceu tão bela como naquele momento, eu tinha tudo que
um homem poderia sonhar em ter para ser feliz. Muito bem-sucedido no
trabalho, dono de uma marca de carros importados com filiais por todo o Brasil e
fora do país também. No entanto, isso era o de menos, meu maior tesouro era a
minha amorosa esposa e o meu herdeiro que não demoraria muito para vir ao
mundo. Faltava pouco menos de um mês para poder ter meu primogênito, Pedro
Henrique Alcântara, nos braços. Fazia anos que eu e Vanessa estávamos
tentando realizar o sonho de sermos pais, mas devido a um problema que tenho,
o médico disse que seria muito difícil conseguirmos. Mesmo sendo através de
inseminação artificial, a chance era quase que escassa. Por isso, muito tempo
depois, quando recebemos a notícia que estávamos grávidos, quase não
acreditamos, passamos o resto do dia comemorando.
Sempre saímos para comemorar datas especiais, naquele dia, por exemplo, era
dia dos namorados e eu convidei Vanessa para um jantar romântico. Havia
reservado um restaurante inteiro para nos servir os pratos especialmente
escolhidos por mim, mandei decorar com centenas de flores e contratei uma
orquestra para tocar para nós durante o jantar, e o melhor chefe de cozinha do
Rio de Janeiro. Trabalhei duro nos mínimos detalhes para que tudo corresse
perfeito, o meu grande amor merecia tudo do bom e melhor. Sempre fiz o
impossível para satisfazer todas as suas vontades, vivia para fazê-la feliz.
Contudo, minha esposa tinha passado a manhã toda indisposta e não queria
sair de forma nenhuma, mas eu, teimoso, insisti tanto até convencê-la a ir. Fiquei
sentado na cama observando-a acabar de se arrumar, Vanessa era uma mulher
linda e sedutora. Tinha certeza que quando visse a surpresa que preparei, daria
pulos de felicidade e tiraria fotos de tudo para mostrar depois para as amigas do
grupo de socialites que participa todos os sábados à noite.
— Amor, você acha que eu engordei muito? — pergunta, ela estava em frente
ao espelho que tinha fixado na parede do nosso quarto, virando a barriga farta,
de um lado para o outro.
— Você está linda, querida. A mais bela de todas e única mulher da minha
vida — declarei cheio de amor, apoiando o cotovelo na perna, levando a mão no
queixo que estava prestes a cair a qualquer momento diante de tanta beleza.
Vanessa era linda de morrer, vinha de família nobre. Muito alta e magra,
durante a gravidez só havia ganhado barriga. Tinha a pele naturalmente
bronzeada e os cabelos lisos castanho-claros quase loiros, compridos na altura da
cintura, soltos do jeito que eu gostava, seus olhos cor de pistache me
hipnotizavam. Vestia um dos seus vestidos de grife, a maquiagem leve, porém
muito bem-feita. Traduzindo: estava linda de morrer. Em qualquer lugar onde
íamos, os homens babavam em cima dela, descaradamente, na minha frente. Mas
nunca senti ciúmes, afinal confiava no meu taco. Além de ser podre de rico,
digamos, que os meus pais capricharam quando me “fizeram”.
— Você é muito mentiroso, amor, eu posso até vestir um saco de lixo preto
todo furado que vai dizer que estou linda. — Cruzou os braços fazendo um
biquinho lindo, andava muito sensível por conta da gravidez do filho que já
amávamos com todas as forças.
— Não sou mentiroso, Vanessa, apenas te amo muito e não consigo ver nada
em você além de beleza. — Levantei e fui andando até ela fazendo charme,
beijei os seus lábios, depois a barriga.
— Vamos antes que eu desista de vez de ir nesse bendito jantar, por mim
passávamos o dia dos namorados na cama agarradinhos. — Pegou na minha
gravata de seda preta com riscos e saiu me arrastando, rindo maliciosamente.
E era sempre com aquele sorriso que ela me ganhava, por completo.
Ela era a minha razão de viver…
No meio do caminho, Vanessa sentiu um pouco de enjoo, parei um pouco no
acostamento para ela se recuperar. Seguimos caminho depois de meia hora, ela
afirmou que o mal-estar havia passado. Como estávamos atrasados, não queria
que o jantar feito especialmente para nós esfriasse. Resolvi aumentar a
velocidade já que não tinha muito trânsito. Como se fosse coisa do destino,
desviei o olhar da estrada por um minuto para ligar o rádio e estava tocando a
nossa música. A mesma que a chamei para dançar juntinho em uma boate de
luxo quando nos conhecemos, seis meses depois estávamos nos casando.
(É isso aí…)
Como a gente achou que ia ser
A vida tão simples é boa, quase sempre.
É isso aí… Os passos vão pelas ruas
Ninguém reparou na lua
A vida sempre continua…
Eu não sei parar de te olhar
Eu não sei parar de te olhar
Não vou parar de te olhar
Eu não me canso de olhar
Não sei parar
De te olhar…
(Ana Carolina & Seu Jorge)
Nunca imaginei que a minha vida viraria de cabeça para baixo de um segundo
para o outro, a gente pensa que nunca vai acontecer com a gente até estar
vivendo um pesadelo. Parei no sinal e quando virei o rosto para olhar para o meu
amor, feliz pela nossa música estar tocando na rádio, Vanessa sorriu para mim
lindamente, alisando a barriga. Como dizia no refrão, simplesmente não
conseguia parar de olhar para ela.
— Eu te amo. — Ela sussurrou, ainda sorrindo.
Antes mesmo que eu pudesse responder sua declaração de amor a altura, do
nada apareceu um veículo desgovernado com tudo do lado da minha esposa,
destruindo tudo que eu amava num piscar de olhos. Como se estivesse em
câmera lenta, a minha Ferrari capotou várias vezes, arremessando a minha
mulher para fora, ela havia esquecido de colocar o cinto de volta quando
paramos no meio do caminho. Quando, enfim, o veículo parou de capotar, saí
todo machucado, me arrastando para fora dele até onde ela estava. A minha
perna estava num estado lastimável, em carne viva. Se não tivesse de ser
amputada, com certeza ficaria aleijado para sempre.
Por Deus!
Havia tanto sangue em volta do corpo da minha esposa que eu amava tanto, os
seus lindos olhos verdes abertos e vidrados fixos no nada. Coloquei a mão sobre
a sua barriga, mas o bebê não mexia. Não havia mais vida ali, eles haviam
partido e me deixado sozinho.
Eu estava desesperado. Perdido…
Destruído!
A minha mulher e o meu filho haviam morrido e eu era o único culpado por
tudo. Vanessa não queria sair de casa, não devia tê-la obrigado a vir comigo.
Jamais me perdoaria por isso e nunca amaria outra mulher como a amei. Daquele
momento em diante minha vida se resumiria a dor e trevas. Debrucei sobre o
corpo dela, alisando a sua face cheia de sangue e chorei, até a última lágrima que
existia em mim. Passaria o resto da minha vida desejando a morte, não havia
mais alegria no mundo. Perdi a fé em Deus. Tudo perdeu a cor ao meu redor, a
beleza. A minha alma estava perdida, em um caminho sem volta.
“Eu perdi tudo o que amava bem diante dos meus olhos”
CAPÍTULO 31
JULIENE
— Isso é mentira, tia Margô! Diga para ela, padrinho, que tudo isso não passa
de uma ilusão da sua cabeça, eu não posso ser culpada por mais duas mortes.
Não da mulher do Romeu, grávida do filhinho deles. — Corri até o padrinho
Chicão pedindo socorro, o balançando pelo braço sem parar, ele chorava tanto
quanto eu. — Ela está mentindo, padrinho, não está? — Disse quase suplicando,
com a voz embargada por conta do choro.
— Sinto muito, filha. Eu só queria te proteger de mais sofrimento, já bastava a
culpa que carregava da morte da sua prima e do rapaz que dirigia a caminhonete.
Como desmaiou depois do acidente, não viu que a tragédia foi bem maior do que
pensava e teve mais duas vítimas na via à direita. — Pude sentir minha alma
saindo do corpo, minhas mãos tremiam sem parar. Olhei na direção do Romeu,
meu coração quebrou em milhares de pedaços ao ver seu rosto coberto por
lágrimas.
Seus olhos estavam abertos, mas sem vida.
— Não fique com raiva de nós, filha. Eu te imploro, só queríamos o seu bem.
— A voz da minha madrinha saiu entristecida, quase em um sussurro. — Nós te
amamos muito. Em conversa com seu tio Rubens, decidimos manter isso em
segredo e juntos obrigamos sua tia a manter a boca fechada. Ela topou, mas em
troca ficaria à frente do velório da filha e de todos os trâmites legais envolvendo
o acidente. Aceitamos sua condição, afinal, na época não vimos mal algum
nisso. — Senti a garganta ficar áspera, havia um gosto amargo se espalhando na
minha boca. Minha cabeça rodava, por um momento pensei que fosse desmaiar,
minha vista estava turva.
— Eu pensei que vocês me amavam de verdade, mas quem ama não mente —
gritei tomada por uma fúria imensa.
— Ninguém nunca te amou, sua idiota, uma imprestável feito você devia ter
nascido morta. Pelo menos, assim, não teria estragado a vida de ninguém. — As
palavras da tia Margô foram cruéis. Mas era a mais pura verdade, minha vinda
ao mundo só trouxe destruição e dor.
— Cala a boca, Margô! Eu e o Chicão sempre amamos Juliene como nossa
filha de verdade. Tentamos pegar a guarda da menina várias vezes, mas você
nunca autorizou, mesmo não gostando dela — Madrinha Ester extravasou sua
raiva, era a primeira vez que a via gritando com alguém. — Quando colocamos
os olhos no Romeu, no jantar que teve lá em casa, logo o reconhecemos, das
fotos que saíram no jornal na época do acidente, como uma das vítimas
gravemente feridas e que perdeu a esposa grávida, próximo a dar à luz. — Ela
abranda o tom, tentando se aproximar de mim, mas não deixei, dando um passo
para trás.
Lágrimas encheram os seus olhos.
Meu Deus! Eu havia sido traída pelos meus padrinhos, agora entendia por que
aquele clima pesado durante o jantar na casa deles, isso doeu mais do que todas
as maldades que minha tia já fez comigo desde que nasci. Ela nunca me amou, já
eles sempre diziam que me tinham como uma filha mais velha.
Bem que dizem por aí que a maior decepção vem daqueles que amamos.
— Como vocês puderam fazer isso comigo? Pensei que me amavam. Eu
merecia saber a verdade, principalmente o Romeu. Que a mulher que estava ao
seu lado era a pessoa que causou a morte da sua esposa e o filho que eles tanto
esperavam, destruindo todos os seus sonhos e a alegria de viver — disse com
sangue nos olhos, arranhando meu próprio rosto com as unhas de tanto nervoso.
Sem mais condições de permanecer ali, saí correndo o mais rápido que pude,
disposta a terminar com aquele sofrimento de vez, só havia um jeito… Contudo,
antes de conseguir sair do local, bati de frente com a metida da Paula, como ela
era bem mais alta que eu e o corpo mais forte, eu caí sentada de bunda no chão,
sendo mais humilhada em público.
— Para que tanta pressa, senhorita Sullivan? — Ela relinchou levando as
mãos à cintura, fitando-me com seu olhar superior. — Eu sabia que acabaria
aprontando cedo ou tarde, ou Romeu se cansaria de brincar com a ninfetinha sem
graça. Mas daí descobrir que matou a mulher e o filho do cara, caramba! Foi
melhor do que pensei, agora, sim, me livrei de você de vez, e ele será só meu,
obrigada por limpar o caminho para mim. Ouvi toda a conversa atrás da porta, de
fato, essa foi a melhor notícia que recebi nos últimos tempos — concluiu
vitoriosa, rindo da minha desgraçada.
Depois de tanto lutar como uma guerreira valente, enfim, desisti, entregando
os pontos de vez. Tirei os saltos, joguei longe e saí correndo. Corri e corri, cada
vez mais e mais. Lágrimas de dor deslizavam pelo meu rosto, como uma faca
atravessando minha carne. Meu coração estava em pedaços, nunca senti tanta
dor antes, tão forte que cortava a alma, eu havia feito o homem que amava sofrer
muito. Destruí toda a sua alegria, planos de um futuro perfeito ao lado da mulher
e filho que lutou tanto para ter. Ele deve estar me odiando nesse momento. Eu
estou me odiando. Se pudesse, voltaria ao passado e não cederia à insistência da
minha prima para acompanhá-la naquela maldita loja. Ou não cairia na sua
provocação, já havia sido humilhada por ela tantas outras vezes e aguentei
calada, por que logo aquele dia fui resolver revidar?
Se eu tivesse ficado no meu lugar, hoje, Romeu estaria vivendo feliz ao lado
da esposa e filho.
Depois de andar não faço ideia por quanto tempo, eu me vi vagando sem
rumo, descalça e chorando muito. Quando dei por mim, estava chegando ao
ponto alto da cidade onde Romeu me levou, não ficava tão longe do local onde a
sede do nosso projeto social tinha sido construída. Acho que por isso ele havia
escolhido aquele lugar para construir, e agora eu arruinei isso também. Não
adianta, minha sina é estragar tudo por onde passo. Mas isso tem que acabar, já
chega, não aguento mais! Não podia mais prejudicar a vida de ninguém. Tenho
muitas contas para acertar com Deus e eu pagarei cada uma delas.
Certa do que fazer, me aproximei da beira do penhasco, luzes alaranjadas
cortavam o céu dando indícios que o dia estava prestes a clarear. Olhei mais uns
minutos para aquela vista linda do Cristo Redentor e pedi perdão a Deus pela
decisão que eu havia tomado, de dar um fim ao meu sofrimento. Por alguns
segundos, fechei os olhos lembrando dos momentos românticos que eu e o meu
amor passamos ali. A dor era grande demais e eu precisava fazê-la sumir, para
sempre.
Virei-me de costas com os olhos fechados e abri os braços lentamente, enfim
meu sofrimento chegaria ao fim. Eu estava tão cansada, parecia que meu coração
havia sido arrancado e ficou um buraco enorme no lugar. De toda forma, já
estava morta mesmo, só faltava consumar o ato.
— Espero que um dia possa me perdoar por isso, Romeu. Eu te amo!
Obrigada por me proporcionar os melhores dias da minha vida, conhecer você e
o Romeuzinho foram as únicas coisas que fizeram minha vida valer a pena.
Cuide bem do meu bichano, ele é um bom gato. — Forcei o corpo para trás, e
conforme ele foi inclinando na direção do abismo, senti a liberdade se apoderar
de mim, rezei para Deus me perdoar por eu estar fugindo pelo caminho mais
fácil.
O da morte.
“Eu preferia morrer do que viver sem você.”
CAPÍTULO 32
R OMEU
J ULIENE
Acordei sentindo um carinho gostoso no meu cabelo, era tão bom que dava
vontade de permanecer com os olhos fechados, mesmo já estando acordada.
Acho que é Deus, depois de me ver sofrendo tanto, veio me receber
pessoalmente no céu. Eu ainda estava meio confusa devido aos últimos
acontecimentos após minha chegada ao penhasco, devo ter me jogado e morrido.
É mais fácil do que parece, nem senti dor. Foi tão rápido que nem me lembro da
queda, porque tive uma alucinação linda com Romeu, onde ele não me odiava.
Até disse que me amava e que me perdoava por tudo que fiz. Pena que não era
realidade, uma hora dessas devia estar feliz com a minha morte.
— Como você se sente hoje, baixinha? — Abri os olhos imediatamente ao
ouvir a voz do Romeu, ele tinha os olhos inchados como se tivesse chorado. A
aparência cansada, acho que havia passado muito tempo acordado.
— Por favor, pode ir embora? Não quero te ver nunca mais. Não sou digna da
sua presença. — Virei o rosto para o lado, não queria vê-lo indo embora, mas era
preciso.
— Amor… — Ele disse quase em súplica.
— Estou implorando, eu quero ficar sozinha. — Na verdade, não queria isso,
mas, sim, que me abraçasse e não soltasse nunca mais.
— Eu não vou a lugar nenhum, meu anjo. Precisa de mim, agora mais do que
nunca. Vou cuidar de você, vai ficar tudo bem. — Ele deu a volta pela cama e
agachou do lado onde meu rosto estava virado, em vez de uma expressão
zangada, Romeu sorria lindamente para mim, passando toda confiança do
mundo.
Ao invés de curar a ferida do meu coração com essa sua atitude, ela se abriu
ainda mais, pensei em quanto tempo por minha culpa meu amor ficou sem dar
esse sorriso lindo, porque estava triste demais pela perda da esposa e do filho.
— Se você não for, eu vou, Romeu. — Em um ato de desespero, sentei-me na
cama e comecei a arrancar os fios anexados ao meu corpo, mas ele logo me
envolveu em um abraço de urso, me imobilizando facilmente.
Quando me tocou foi como ácido queimando minha carne, lento e
dolorosamente. Só a possibilidade de o magoar novamente me deixava
apavorada, por isso tinha que manter o máximo de distância possível do Romeu.
Não entendia por que esse homem não me deixou morrer, pior, por que está
sendo tão carinhoso comigo? Outro, no seu lugar, teria me matado com as
próprias mãos, afinal, tirei dele tudo o que mais amava.
— Se você quer que eu vá embora, baixinha, eu vou. Mas não vou voltar, não
precisará colocar os olhos em mim nunca mais. — Sua voz era firme, eu
comecei a chorar apoiando minha cabeça em seu peito, minhas lágrimas
molhavam sua camisa. Não tem coisa mais triste do que saber que nunca mais
verá a pessoa que se ama. — Mas não pode me afastar do meu filho, tenho meus
direitos. Teremos que entrar em um acordo em relação a ele, porque não vou
admitir que cresça longe de mim, quero ensiná-lo a falar, andar e tudo mais. —
Agradeci por eu estar sentada em uma cama ou teria ido ao chão durinha, do que
aquele homem estava falando? Acho que havia ficado louco de vez, só pode!
— Mas de que filho você está falando, Romeu?
— Do milagre que Deus mandou para nós através de 0,1111 % de chances.
Descobri através do exame de sangue que fez assim que chegou ao hospital,
passei as últimas horas chorando de alegria. O doutor Leonardo me deu a notícia
hoje de manhã, o único resultado diferente foi positivo para gravidez, esse foi o
motivo do desmaio, sua pressão baixou demais. — Perdi a voz para dizer
qualquer coisa que fosse, como assim grávida? Meu Deus, ele só pode estar
brincando comigo. Era aquele momento que você não sabia se ria de alegria ou
chorava com medo de ser uma pegadinha, acabei fazendo os dois ao mesmo
tempo.
Havia uma vida crescendo dentro de mim, isso era surreal!
— Eu vou mesmo ter um bebê, Romeu? — Eu estava tão emocionada, agora
mais do que nunca tinha um motivo para viver.
E se não fosse pelo Romeu, eu teria matado nosso filho também.
— Nós vamos ter, sim, e criaremos nosso milagre juntos! —Inclinou para
beijar minha barriga, depois se aproximou da minha boca como se fosse me
beijar. Contudo, o impedi cobrindo seus lábios com os meus dedos.
— Eu jamais te afastaria do nosso filho. Mas não temos mais condições de
continuarmos juntos como um casal, não depois do que descobri hoje. Mesmo te
amando mais do que minha própria vida, desculpa, mas não consigo esquecer
tudo o que houve no nosso passado.
— Juliene, eu… — Tentou falar, mas o impedi novamente.
— Não adianta, Romeu, já tomei minha decisão. Quando nosso filho nascer,
eu vou entregá-lo a você e vou sumir no mundo, antes que destrua a vida dele
também, como fiz com a do seu pai. — Pronto! Comecei a chorar de novo,
simplesmente não conseguia evitar, eram muitas emoções diferentes vagando
dentro de mim.
— Precisamos conversar sobre o dia do acidente, você disse o que queria,
agora é a sua vez de ouvir tudo, o que preciso é de cinco minutos. — Assenti,
nada mais justo.
Mas para conversar comigo, ele não precisava deitar ao meu lado na cama,
envolvendo meu corpo em seus braços, inevitavelmente minha cabeça descansou
sobre seu coração. Sendo sincera, eu amei que tenha feito. Sempre amei ouvir as
batidas do seu coração, sentir seu cheiro gostoso. Romeu não usava mais as
roupas de ontem à noite, estava de jeans e suéter vinho cheirando a limpo,
parecia ter acabado de sair do banho.
— Nós não íamos conversar, Romeu? — perguntei depois de termos passado
uns dez minutos em silêncio. Acho que queria ficar abraçado comigo em
silêncio, apenas aproveitando o nosso momento íntimo, apenas eu, ele e o nosso
filho.
Como podemos amar tanto um ser tão pequeno que acabamos de descobrir
sobre a sua existência?
— Por acaso você tem a mania de confundir cores primárias, Juliene? —
indaguei.
— Como você adivinhou? Desde pequena que confundo os tons mais fortes,
meu tio quis me levar ao oftalmologista uma vez por causa disso. Mas minha tia
disse que não precisava gastar dinheiro comigo por uma bobagem dessas, porque
eles já gastavam demais comigo tendo que criar uma bastarda. — Ele resmungou
alguma coisa baixinho, acho que foi um palavrão.
Depois me contou toda a verdade sobre o dia do acidente, me deixando em
total estado de choque, o sinal estava mesmo vermelho quando passei correndo
na faixa de pedestres. Ou seja, eu não fui culpada pelo acidente. Romeu acha que
devido ao problema — que acredita — que eu tenha nos olhos, daltonismo, na
hora do nervosismo acabei confundindo as cores e carreguei essa culpa por
muitos anos. Mas por que meus tios sabiam de toda verdade e nunca me
contaram, sabendo de todo meu remorso? Minha tia até entendo fazer essa
crueldade comigo, mas, meu tio não entendo. Não era uma pessoa boa, mas
também não era má, não ao ponto de compactuar com algo tão horrendo.
— Sinto muito por todos esses anos que passou se culpando por algo que não
foi sua culpa, mas não se preocupe. Eu buscarei por justiça — prometeu.
— Eu não consigo entender, Romeu. Por que fizeram essa maldade comigo?
Guardando essa mentira por tanto tempo.
— Acredito que seu tio nunca revelou nada por dinheiro, Juliene. A esposa
deve ter ameaçado denunciá-lo por extorsão, porque tudo que eles têm é seu! Em
uma breve investigação sobre sua família hoje, Pedro conseguiu descobrir que
seus tios se apossaram da herança que sua mãe deixou para você, ela e sua tia
eram filhas de pais diferentes. Seu avô era um grande empresário e o da Margô,
pedreiro. — Minha respiração aumentou o ritmo, eu sou a dona de todo o
dinheiro deles? Lembrei de quantas vezes passei fome, porque minha tia me
proibia de mexer na geladeira. — Quando sua mãe morreu ao te dar à luz, e seu
avô um ano depois, seus tios conseguiram direito para controlar sua herança,
como eram seus tutores legais foi fácil dar o golpe. Viveram uma vida de luxo
por todos esses anos às suas custas, por isso a mantiveram perto deles por tanto
tempo — concluiu, me deixando extremamente arrasada. Além da minha
dignidade, roubaram minha infância e juventude, me escravizando sem poder
usufruir do meu próprio dinheiro.
Tiraram-me tudo!
— Eu não posso acreditar que meus tios possam ter feito tanta crueldade
comigo, tudo por causa de dinheiro, é algo vergonhoso demais. Recuso-me a
acreditar que possa existir gente tão má nesse mundo.
— Sabia que se negaria a acreditar em uma maldade desse tamanho, por isso,
trouxe provas. — Ele me entregou vários relatórios que comprovavam tudo o
que havia dito, minha vontade era vomitar em cima daquilo tudo.
Isso não ia ficar assim, eles teriam que devolver cada centavo que me
roubaram. Mas antes, precisava esclarecer uma última dúvida muito importante.
— Os meus padrinhos tinham conhecimento sobre minha herança?
— Não! Eles nunca souberam o quanto o pai da sua mãe era rico, tentaram
várias vezes pegar sua guarda por amor, mas seus tios jamais abririam mão da
“mina de ouro deles”. — Senti um alívio enorme depois disso, eu amava muito
meus padrinhos.
— Mas como conseguiram controlar meu dinheiro depois que fiz dezoito
anos?
— Tudo indica que falsificaram a documentação, dando total poder a eles, se
denunciá-los, podem ir presos por roubo. — Senti um aperto no peito, queria que
fossem punidos pelo que fizeram, mas não colocar minha tia doente atrás das
grades, isso não se faz com uma pessoa no seu estado.
— Sinceramente? Não quero pensar nisso agora, apenas no meu bebê e no pai
dele. — Meu amor sorriu lindamente. Enfim, a esperança voltou a brotar em
meu coração partido pela vida.
— Casa comigo? — Romeu se ajoelhou do lado da cama, tirando uma
caixinha aveludada preta de dentro do bolso da frente do seu jeans, sentei-me
colocando as mãos sobre a boca encantada.
Depois de tanto sofrimento, não dava para acreditar que aquele sonho estava
acontecendo de verdade.
— É claro que eu aceito, meu amor, somos uma família agora. — Sorri
radiante, o coração leve, assim como meu estado de espírito.
E, pela primeira vez, senti que seria feliz de verdade, e o responsável por isso
estava bem à minha frente. Era bom demais saber que havia um pedacinho dele
crescendo dentro do meu ventre a cada segundo, o nosso pequeno milagre.
Depois de fazermos vários planos para o futuro e infinitas juras de amor,
rimos sobre várias coisas, as mais lindas e românticas possíveis. Eu me sentia
leve, feliz. Acabei adormecendo nos braços do meu noivo, quando acordei mais
tarde, o quarto estava repleto de flores, balões de gás colados no teto e ursinhos.
Como se estivesse comemorando o nosso noivado, sua grande felicidade era
notória. Romeu sabia como demonstrar seu amor por uma mulher, fazê-la se
sentir amada de todas as formas possíveis.
“Quando é da vontade de Deus, de um jeito ou de outro simplesmente
acontece”
CAPÍTULO 34
J ULIENE
J ULIENE
Romeu mal abriu a porta de casa, e Romeuzinho veio correndo nos receber.
Eu estava morrendo de saudades do meu bichano, parecia ter crescido tanto no
curto período que passamos separados. Seus belos pelos negros estavam mais
brilhantes do que nunca, em seu pescoço balançava o pingente dourado com seu
nome gravado pendurado na coleira vermelha. Tinha certeza que aquilo havia
sido coisa do meu namorado, deve ter pedido para Constância arrumá-lo para me
recepcionar.
— Miauuuu. — Ele miou animado assim que o peguei no colo, esfregou a
cabeça na minha blusa, todo manhoso.
— A mamãe tem novidades, meu amor, em breve você vai ganhar uma
irmãzinha. — Meu tom foi de pura euforia, estava ansiosa para meu bebê
começar a mexer na minha barriga.
— Sua mãe quis dizer que você vai ganhar um irmãozinho, bola de pelos. —
Romeu o tomou do meu colo e começou a bajulá-lo jogando o pequeno para o
alto. Não admitia, mas adorava nosso gatinho como um filho de verdade.
— Vai sonhando, amor. — Gargalhei bem alto subindo as escadas, nunca
pensei que um dia poderia me sentir tão livre e feliz.
E Romeu dividia da mesma alegria, saber que eu sou responsável por aquilo
era de fato muito gratificante.
— Que tal um banho quente, meu anjo? Vai esfriar muito à noite. Vou pedir à
Constância para fazer um chocolate quente bem gostoso, depois vamos dormir
de conchinha. Você precisa descansar, o dia hoje foi tenso, a partir de amanhã
vamos viver uma vida nova. Nossa vida, juntos e mais apaixonados que nunca.
— Abraçando-me por trás, Romeu, deslizou os lábios quentes pela curva do meu
pescoço perigosamente.
— Eu não estava pensando bem em dormir, amor, mas em outra coisa bem
diferente. — Virei de frente para ele e comecei a desabotoar os botões da sua
camisa marrom, mas Romeu me impediu assim que cheguei ao terceiro.
— Nem pensar, baixinha, tem que fazer repouso, acabou de ganhar alta do
hospital e… — O interrompi, sabia exatamente onde queria chegar.
— Se você acha que vou ficar em abstinência sexual durante o período da
minha gestação, está muito enganado, Romeu Alcântara. Uma vez vi um
documentário na TV falando que o desejo da mulher pelo seu parceiro dobra, os
orgasmos são mais intensos, principalmente o sexo. — Deixou escapar um
sorriso cafajeste iluminado como o nascer do sol, ele assim como eu, devia estar
subindo pelas paredes.
Não estranhava nem um pouco o Romeu ter me engravidado, afinal, nos
últimos meses, fazíamos amor o tempo todo. E eram várias vezes durante o dia,
escondidos nos intervalos de trabalho, e em toda parte da casa, até mesmo no
carro. Enfim, simplesmente não conseguíamos tirar as mãos um do outro quando
estávamos sozinhos.
— Não me tente, menina. — Deu um tapa na minha bunda e saiu me
empurrando em direção ao banheiro, depois fechou a porta ficando do lado de
fora para não cair em tentação.
Aposto que vai ser um daqueles pais lunáticos que deixam a mulher louca
durante a gravidez toda, fazendo-a sobreviver a base de verduras saudáveis e
vitaminas malucas, meu estômago embrulhava só de imaginar. Mas, na verdade,
viver isso ao lado de Romeu seria de fato incrível. Nunca fui o centro da atenção
de ninguém, vou amar ser mimada pelo meu futuro marido.
Sorrindo feito uma boba, tomei um banho demorado, queria tirar o cheiro de
hospital do meu corpo. Ao terminar, saí do banheiro enrolada em uma toalha,
caminhei até o guarda-roupa e escolhi uma das camisolas sexy que Romeu
comprou para mim no dia que me levou em uma boutique para comprar um
vestido para a inauguração da sede do nosso projeto social e acabou comprando
a loja toda. Queria ficar atraente para ele.
Graças ao bondoso Deus, meu noivo garantiu que o show da minha tia não
atrapalhasse em nada o sucesso do evento. Sua família havia segurado as pontas
durante o resto da festa, pediram desculpa pelo imprevisto e tudo ficou bem.
— Esse chocolate quente está com uma cara ótima, amor — disse com a voz
sexy assim que cheguei à sala, enfiando o dedo no chocolate quente e levando à
boca sensualmente — talvez não tanto quanto eu queria —, não sou boa nisso de
“sedução”.
Meu noivo estava sentado no tapete macio bege que tinha em frente à lareira,
que se encontrava acesa naquele momento, com labaredas vigorosas, trazendo
uma luz amarela ao redor do seu rosto, deixando-o mais lindo do que já era, o
homem mais atraente e charmoso da face da terra. Ao seu lado havia uma
bandeja com duas canecas de chocolate quente soltando fumaça e o cheiro estava
esplêndido.
— Sim. Delicioso! — Ele diz passando a língua pelos lábios, me secando de
cima a baixo por cima do ombro.
— Você tem que provar primeiro para saber se está realmente delicioso, não
acha? — Ousei jogando o cabelo para o lado, deslizando as mãos pela minha
cintura, Romeu logo percebeu meu jogo e soltou uma gargalhada.
Filho da mãe!
— Você está tentando me seduzir, baixinha?
— Eu já te seduzi há muito tempo, querido. — O observei levantar e vir até
mim com aquela cara de “quero te foder agora”.
E eu estava louca que ele fizesse isso.
— Desde o dia que te vi pela primeira vez, Juliene. — Beijou meus lábios
docemente como se eu fosse uma rosa, todo cheio de amor e cuidado. — Não faz
ideia do quanto queria fazer amor com você nesse momento, mas hoje quero
apenas cuidar da mãe do meu filho, alimentá-la e depois ficar abraçadinho com
ela em frente à lareira, fazendo carinho no seu cabelo até que pegue no sono. —
Puxou-me pela mão e me colocou sentada em seu colo, os fios grossos do tapete
fizeram cócegas nos meus pés, ele era grande e macio.
Depois de espalhar beijos na minha nuca, ele me entregou a caneca de
chocolate quente.
— Não podemos fazer amor primeiro, depois fazer isso tudo que você falou?
— Joguei verde para colher maduro, vai que colava.
— Nada de sexo antes do casamento, fiz essa promessa antes de pedir a sua
mão. Como a sua resposta foi sim, tenho que cumprir à risca.
— Você só pode estar de brincadeira, Romeu! — Praticamente gritei,
horrorizada.
— Estou falando muito sério, então durante as duas próximas semanas
mantenha essas suas mãos assanhadas longe do meu corpinho. — Deitou de lado
usando a mão como apoio para a cabeça, totalmente à vontade.
— Duas semanas? — indago em um fio de voz, horrorizada.
Pela forma que meu noivo me olhou, eles deviam estar brilhando forte como
dois faróis das estrelas, ele falava sério mesmo.
— Exatamente! Faltam quatorze dias para realizarmos nossos votos na frente
do juiz de paz, já pode ir escolhendo suas madrinhas e o vestido de noiva.
— Mas por que casar assim tão rápido? — indaguei feliz, mas muito curiosa.
— Não está sendo rápido coisa nenhuma, amor, já faz mais de um mês que
estou mexendo com a papelada em segredo. — Deu de ombros, eu comecei a
gritar feito uma louca e pulei em cima dele.
Romeu planejava me pedir em casamento há muito tempo, meu coração
parecia que ia explodir de alegria a qualquer momento.
— Prometo te fazer o homem mais feliz desse mundo, você e o nosso filho
são meu mundo agora — jurei através do olhar, Romeu sabia que eu viveria para
cumprir meu juramento.
— Eu já sou o homem mais feliz desse mundo só de estar ao seu lado, Juliene.
— Eu me derreti toda, confesso.
— Eu te amo, meu amor, obrigada por ser tão perfeito para mim.
— Eu também te amo, baixinha — declarou, era quase possível ver amor
jorrando dos seus olhos.
“O amor só é valido quando é recíproco.”
CAPÍTULO 36
R OMEU
R OMEU
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente, quero agradecer a Deus por me proporcionar sentir a emoção
de concluir este livro. Foi incrível escrevê-lo, não tenho palavras para descrever
o quanto. Ele veio em um momento difícil da minha vida, salvando-me da
depressão.
A todos os meus amigos e familiares que acreditaram em mim desde sempre, e
a minha segunda família, as minhas amoras do grupo Romance da Mari. Amo
todas vocês, obrigada por fazer meus dias mais felizes.
Aos profissionais que trabalharam neste livro para deixá-lo lindão para vocês,
a revisora Jéssica Nascimento, a diagramadora Saj Capas e a capista Mônica
Kaster.
A todos os meus leitores do Wattpad, por todo carinho e apoio que tiveram
comigo e com Romeu e Juliene, ou como os dois foram apelidados: o casal mais
fofo dos últimos tempos.
Você leu um romance da autora Mari Sillva, como Megan Scott.
Table of Contents
QUERIDO LEITOR, COMO VAI?
SUMÁRIO
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
EPÍLOGO
AGRADECIMENTOS