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Quando chego em casa, conto até
três para tomar forças e abrir a porta.
Sei o que vou encontrar, um cenário
simples como de qualquer família
normal: pais assistindo TV na sala.
Como se enganasse alguém...
Ao girar a chave, já fico tensa.
Abrindo a porta, isso só aumenta. Mas
não os vejo no sofá, mas ouço um
assobio aparentemente alegre.
Entro devagar, deixo minhas
sapatilhas onde ficam os sapatos, ao
lado da porta, e me viro para trancá-la.
O assobio vem da varanda, onde,
esticando o pescoço, consigo ver meu
pai em sua espreguiçadeira, assobiando
enquanto lê um jornal.
Fico mais aliviada em não ter que
dar boa noite a ele, então vou à procura
da minha mãe, para ela saber que estou
bem e só dormi fora de casa.
Eu não encontro-a na cozinha, então
subo os degraus da escada, indo
procurar em seu quarto. Bato antes de
abrir a porta, mas também ela não está
lá. Vou ao meu próprio quarto, mas não a
encontro. Meu coração acelera.
Desço de novo, indo ao único
banheiro da casa, a porta estando
destrancada e o cômodo vazio. Estou
querendo me desesperar, mas não vou
fazer isso. Puxo minha bolsa para pegar
o celular e ligar para ela, mas o toque
do seu vem da sala. Ela não está com
ele.
Eu sigo para a varanda a passos
largos, a garganta seca.
— Onde está a minha mãe? —
pergunto, segurando na porta tanto pelas
mãos trêmulas, como pelas pernas
fracas.
O meu pai não tem sequer a
decência de me olhar, continuando a
assobiar, aparentemente despreocupado.
Várias possibilidades começam a
passar pela minha cabeça. Ela sozinha
com ele. Meu pai sabendo estar sozinho
com ela pela madrugada.
Engulo em seco.
— Pai… — tento ser suave, não
querendo irritá-lo. Ainda isso, tem que
falar manso porque qualquer coisa ele
joga algo no chão e berra, se irritando e
querendo quebrar algo ou alguém,
especificamente a minha mãe. — Onde a
mamãe está?
— Ela saiu — ele responde, muito
calmo.
— Para… onde?
— Não sei, ela não me disse — a
folha do jornal é passada para o lado e
ele me olha com um sorriso. — A sua
mãe é uma mulher livre, filha.
Minha respiração já está
desequilibrada quando me viro para
voltar e calçar minhas sapatilhas, saindo
de volta à rua, dessa vez para procurar a
minha mãe.
Capítulo 14
***
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— O que aconteceu? — É a
primeira pergunta que faço ao abrir os
olhos e me deparar com o teto branco.
Pelos bips, estou em um hospital e odeio
muito isso. William filho de uma puta e
arrombado do caralho.
— A Bela Adormecida resolveu
dar o ar da graça — Logan preenche
meu campo de visão, esticando o
pescoço para que meus olhos possam
vê-lo sem que eu precise mover a
cabeça – que está desorientada. —
Nossa mãe achou que você ia morrer,
mas eu falei pra ela ficar tranquila que
vaso ruim não quebra cedo.
— Sei, claro. Experiência própria
— bufo, me mexendo para sentar na
cama. Estou incomodado por estar
deitado.
— Vai com calma. Seu corpo está
recebendo soro. Você ficou sem comer
por quase cinco dias, está muito fraco.
— Eu não me sinto fraco — digo,
Logan vindo ajeitar os travesseiros atrás
das minhas costas para me dar apoio. —
Por que estou em um hospital? Só fiquei
sem comer.
— E foi espancado. Admirável que
ainda enxergue do olho direito, disse o
médico que te atendeu — meu irmão
parece ficar tenso. — Tenta não levar
isso muito no desdém, porque nossa mãe
está preocupada. Ela ainda nem se
recuperou do aconteceu com a Lili, e aí
rola isso com você.
Respiro fundo, trazendo a mão à
cabeça, que percebo o pulso estar
enfaixado.
— O que é isso? — fico olhando a
atadura.
— Quiseram quebrar sua mão
porque você tentou lutar contra o
William — Logan ergue as
sobrancelhas. — Se eu fosse você,
entrava em umas aulas de autodefesa,
porque tá precisando.
— Ah, claro — as lembranças vêm
aos poucos e, quando isso acontece,
olho para as poltronas da sala
destinadas as visitas. Mas estão vazias e
só Logan está comigo. Volto a olhá-lo.
— Celeste está bem?
Meu irmão abre um sorriso imenso,
digno de fazer seus olhos brilharem.
— Está. Pelo menos, pareceu. Ela
voltou para a Itália. Nós viemos para o
hospital e ela foi para o aeroporto.
As palavras e o saber não fazem
sentido para mim. Por que ela não está
aqui?
— Por que ela foi para a Itália de
novo? — É mais certo perguntar.
— Ela prometeu para a mãe que
voltaria no dia seguinte. Mas, na real,
percebi que ela estava desconfortável
depois que chegamos na sua casa e tudo
o mais. Quando me explicou o que tinha
acontecido, tinha muita apreensão nos
olhos dela. Acho que ela estava com
medo de ser culpada por não ter avisado
nada.
Balanço a cabeça.
— É impossível que ela ache que
tem culpa de alguma coisa que não por
eu estar vivo.
— Ela chamou a polícia e ficou
escondida no banheiro de empregada —
Logan fica pensativo. — Por que você
ligou para ela e não para a Elisha?
— Porque confio nela — a
confissão parece surpreender meu
irmão, mas não mais que eu, que
experimento dizer a realidade em voz
alta pela primeira vez. — Confiei, pelo
menos.
— Sei… — ele estreita os olhos.
— Com certeza confia. Fazer a mina vir
lá do caralho para te salvar, é uma
confiança foda mesmo. Espero que
ninguém confie em mim ao ponto,
porque não tenho muito essa de me
deslocar dos lugares pra salvar alguém.
— Você também estava na Itália —
corto a sua graça de sujeito inabalável,
o que faz rir. — Achei que ela estaria
junto, aqui, para eu poder agradecer a
sua solicitude.
Tenho frustração em minha voz, por
causa do que fiquei sabendo. Mas claro,
Celeste tem a sua mãe que precisa dela;
e eu já fui muito ousado e ridículo em
pedir que as duas se separassem por
causa das minhas consequências.
— O que houve com o William? —
volto os olhos para Logan depois de
fitar por um bom tempo os assentos de
visitas vazios.
— Está preso. Os caras que o
ajudavam eram foragidos. Agora, você
pensa só, cheio da grana e o cara de
presta ao papel de vingança porque se
sentiu injustiçado, feriu o egozinho dele
— Logan ri. — Ele tinha a intenção de
te matar, caso você não saiba.
— Sei disso desde que acordei
naquela casa velha — expiro, fazendo
uma careta. Ao menos vou ter uma outra
lembrança ruim para pensar além das do
monstro que chamo de pai. — Por que
você está aqui sozinho?
— Todos estavam aqui, mas foram
para casa onze horas, porque eu disse
que passaria a noite com você. Deve ser
duas da madruga — meu irmão senta na
borda da cama e fica me encarando.
— O que foi? — quero saber,
começando a sentir algum incômodo no
olho direito, como um peso doloroso.
— Não sei, estou aqui pensando
uma coisa…
— Que coisa?
— Você e a Celeste já…
tiveram algo?
Faço uma careta imediata.
— Algo? Que algo?
— Sei lá — ele sorri. — Não entra
na minha cabeça essa confiança mera.
Além do mais, eu vi ela deitada na sua
cama naquela câmera e você ficou, tipo,
nem aí, usando desculpas para justificar
que aquilo não era um erro. E eu te
conheço, você é meu irmão,
normalmente você teria ligado — ele faz
um gesto de ligação com a mão na
orelha — para a sua casa e demitido ela
na hora. Mas você relevou.
Continuo olhando-o, sem dizer
nada.
— Certo que você a demitiu de
qualquer jeito, mas não foi na hora,
como seria o seu normal — Logan
continua. — E teve aquilo de você me
pedir para levar ela e a mãe para a
Itália. Você queria se desculpar pela
demissão? E, então agora, quando você
confiou nela. Confiou sua vida a ela.
Por quê? — agora ele parece estranhar a
falta de sentido em tudo que despejou.
— Só posso supor que você ganhou um
chá, e não foi de plantas.
Desvio o olhar e solto a respiração
que não notei estar prendendo. Tem
algum incômodo nos músculos do meu
corpo, mas nada que me tire dores como
as que senti no rosto ao levar socos.
— Não — nego. — Não tivemos
nada. — Eu só a beijei, e foi de longe o
melhor beijo da minha vida. — Ela é
uma boa mulher, só isso. — Ela é
maravilhosa e prestativa. — Confiei
nela porque sei que tem um bom
coração. — Muito bom, que a faz
merecedora de todas as glórias do
mundo. — Eu sabia que ela me ajudaria,
porque faz parte dela querer fazer o
bem. — Ela é a pessoa mais bondosa
que já conheci. — Celeste é alguém se
pode contar, só isso.
Não é só isso, minha mente me
lembra. Não, não é só. É além. Eu quero
agradecê-la, com ela de novo em meus
braços, moldando os lábios nos meus e
soltando aqueles gemidos baixinhos e
que me deixaram louco. Quero-a falando
como uma matraca e me dando respostas
a altura de minhas perguntas
inconvenientes. Desejo tê-la me
explicando como funciona o mundo em
contrapartida com as minhas emoções
decisivas. Daria qualquer coisa para vê-
la aqui agora, tentando me ensinar sobre
qualquer coisa que fosse. Até sobre o
perdão.
Só queria ter aberto os olhos
depois de tudo e a visto. Eu tinha certeza
que ela estaria por perto depois que eu
fosse encontrado.
Eu estava certo que seria
encontrado, pois o código que dei para
que ela abrisse a caixa de dinheiro,
ativava o alerta de emergência
diretamente para o meu contador, que
chamaria a polícia. Mas ele não fez
isso. E isso só me fez enxergar mais
alguém que fingia estar do meu lado.
Celeste pode estar sendo motivo de
muitas coisas em minha vida, mas acho
que, principalmente, de me mostrar que
nem sempre estou certo. E isso é duro de
saber.
Por isso, e por muito mais, preciso
vê-la. Para agradecer. Porque, do meu
lado, eu preciso entender: mesmo que
tenha sido um ótimo beijo e os meus
lábios anelem pelos seus mais uma vez,
não vai passar disso.
Ela é boa demais para ter alguém
como eu, que sou um homem rancoroso e
cheio de ódio que nunca vai se esvair.
— Fechou, então — Logan se
levanta. — Vou atrás do médico pra
avisar que você voltou da terra dos
ossos.
Capítulo 29
— Santiago?
A voz dela é como o acalmar da
tempestade, o que me tira do meu
escuro, que costumava ser bem-vindo
quando eu fechava os olhos. Mas não
parece que vai ser mais.
— Sim? — respondo, difícil.
Mesmo que eu já tenha me
levantado para ir ao banheiro e
aproveitado para lavar o rosto, e me
situar diante de tudo que aconteceu,
ainda estou fora de mim. Foi incrível.
— William era mesmo seu amigo?
— ela se mexe para sair de meus braços
e se virar, o que me tira um gemido de
frustração. Estava gostoso ficar
abraçando-a junto ao meu corpo.
— Não, era um funcionário
revoltado.
— Você falou que tinham uma
amizade — Celeste parece confusa. Ela
está toda descabelada e com os lábios
inchados, os olhos em um brilho de
fogo. Perfeitamente linda.
— Tentei investir no lado
emocional dele ao falar aquilo, mas
acho que ele não tinha.
Ela dá uma risadinha, então desvia
o olhar, pensando ao longe.
— Ele ficou revoltado pelo quê?
— quer saber.
— Eu o demiti. Ele era um
incompetente.
— Acho que poucas pessoas são
competentes ao seu ver, Santiago — seu
olhar volta a me focar. — Você é um
homem muito exigente.
— Seus olhos têm cor de safira.
Seu rosto suaviza de imediato, e
seu suspiro é o som mais lindo que já
pude escutar. Ela é magnífica, e não só
como pessoa, também na cama.
— Você quer mudar de assunto —
ela me acusa, desconfiada. — Vamos
fingir estar no jogo das confissões?
Sorrio.
— O que significa?
— Que faremos confissões — ela
pisca para mim, se ajeitando para ficar
de bruços antes de contar: — Eu vi você
pelado no dia em que ficou trabalhando
em casa. Você estava na sala de
ginástica e com uma toalha no pescoço.
Foi muito sexy, eu fiquei bobinha.
— Estava me espionando? — Não
estou incomodado por saber, muito pelo
contrário, me enche de prazer. — Que
feio, Celeste…
— Eu não pude evitar. Foi sem
querer — ela tampa a boca, escondendo
um sorriso. — Estava indo buscar meu
avental e você me seduziu como um
verdadeiro boto.
Dou risada, levando a mão para
suas costas e traçando uma linha com os
dedos desde o seu pescoço até a coluna.
Ela suspira profundamente, deitando a
cabeça no travesseiro.
— Sua vez — diz baixinho.
— Não tenho nada para confessar.
— Nossa, nada? — volta a
levantar a cabeça, parecendo
decepcionada. — Você ficava me
olhando maior estranho, era por quê?
— Eu achava você esquisita,
porque não era muito aberta sobre si.
Não te olhava estranho, olhava curioso
— esclareço.
— Ah, tá! — ela ri. — Eu era
esquisita? Nunca fiz nada demais!
— Cheguei em casa no seu
primeiro dia e você estava ouvindo
Andrea Bocelli no último volume —
ergo as sobrancelhas. — Também mentiu
na minha cara.
— Eu não queria ser demitida —
se justifica. — E é melhor arrumar as
coisas ouvindo música. O que você
queria? A Alexa estava naquela mesinha
do corredor, me chamando!
— Está perdoada — continuo a
carícia em sua pele macia e quente, me
perdendo no contato e me achando em
seus olhos que me encaram sem desviar.
— Por isso você estava me encarando
na cozinha aquele dia? Porque tinha me
visto sem roupa?
— Ma-jestoso! — ela se empolga
com a lembrança, se inclinando para nos
aproximar mais. Gosto especialmente
disso, gostaria de sempre ter isso. Meu
braço a rodeia pelas costas, enquanto
bebo da sua imagem. — Sim, era por
isso. Você tem uma câmera no seu
quarto?
— Na casa toda. Não gosto da
possibilidade de ser roubado — olho
para o lado, me sentindo um idiota. —
Mas acabei sendo, de todo jeito.
— William não conseguiu levar seu
dinheiro…
— Mas conseguiu pôr as mãos no
que estava, aparentemente, intocável —
volto a olhá-la. — Isso foi uma derrota
para mim.
Celeste morde o lábio, maneando a
cabeça.
— Sei bem… Você está bem? Seu
olho está um pouquinho roxo — sua mão
vem ao meu rosto, acariciando perto de
onde deve ter um hematoma.
— Está melhor. — Não dou muita
confiança para as consequências, só
pelo que houve. — Mais alguma
confissão sua?
Um sorriso abre seus lábios
imediatamente, e isso parece ser a
estampa da felicidade. Creio que sim.
Ela parece estar feliz. Depois do que
tivemos, depois do nosso momento, eu
também estou. Parece que nos fizemos
felizes. No entanto, algo ainda remexe
dentro de mim contra esse sentimento. A
verdade.
Ela é bondosa demais. Carinhosa
demais. Incrível demais para mim. Não
sou digno de merecer o que aconteceu e
não sou digno dela. Me censuro por
pensar que podemos repetir isso mais
vezes. Não devemos, seria insano.
— Sabe quando conversamos na
cozinha? — ela questiona, não me
esperando confirmar: — Eu coloquei a
mão na sua, que inclusive foi nosso
primeiro contato, e depois fiquei com o
seu cheiro. Dormi com a mão no nariz,
sentindo o seu perfume.
— Foi tão bom assim? — dou um
riso curto. — Eu fiquei puto com você.
— Ahá! — ela aponta para mim. —
Isso é uma confissão.
— Tem razão — levanto a cabeça
para aproximar o rosto do seu, com
saudade dos seus lábios, então dou um
beijinho neles e nossas respirações se
misturam. — Mas depois eu fiquei
pensando em como seria passar um
tempo com você na minha cama.
— Sério?
— Sério — passo a língua em seu
lábio inferior, pedindo passagem para a
minha língua, mas Celeste dá uma
risadinha, que parece desanimada. Eu
me afasto para olhá-la. — Algum
problema?
— Não — ela nega, ainda sorrindo.
Mas tem algo diferente. Que a fez mudar
de postura repentinamente. O sorriso
não é mais de felicidade, parece
apenas… uma distração.
— É uma outra confissão minha,
não é? Eu tinha algumas, só não percebi.
— Sim, é — ela concorda, se
afastando para sentar, então suas mãos
se apressam em puxar o edredom e
cobrir os seus seios.
O que é, claro, um pecado, então
me sento também. Olho para suas mãos
segurando o edredom, então de novo
para seus olhos. Estão cheios de
preocupação e apagados do brilho
anterior. Isso é doloroso de perceber. E
eu nem sei o porquê.
— O que houve? — pergunto, com
cuidado. — Está arrependida? — a
palavra rasga minha garganta.
— Não — sua voz sai tão falhada
que ela precisa limpar a garganta. — Eu
só vou ali ao banheiro. Já volto.
Sem fala, a observo se levantar,
substituindo, nervosamente, o edredom
pela toalha que estava embolada nos
lençóis da cama, então sair, me deixando
com uma interrogação na cabeça.
Capítulo 32
***
Série Os Mackenzies:
Amor em Atração
Amor em Redenção
Amor em Obsessão
Amor em Opção
Amor em Omissão
Amor em Negação
Amor em Ilusão
Amor em Impulsão
Amor em Possessão
Amor em Intenção
Amor em Pretensão
Amor em Obstinação
Amor em Depressão
Amor em Presunção
Amor em Ambição
Amor em Solidão
Amor em Exceção
Amor em Emoção
Série Armstronger:
Submissão sob Amor
Coração sob Amor
Rendição sob Amor
Perseguição sob Amor
Livro único:
Falhas de Amor
Série Os Irreverentes:
À Prova do Amor
À Sombra do Amor
À Espera do Amor