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4 ANOS ATRÁS
SÁBADO, 26 DE DEZEMBRO DE 2020, ÀS 16H.
01 SEMANA DEPOIS.
SÁBADO, 10 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 09H05MIN.
CONTRATO
Entre as partes
SR. ASHTON BAKER (CONTRATANTE – NOIVO)
SRTA. GRAVITY MONAGHAN (CONTRATADA – NOIVA)
AS PARTES CONCORDAM COM OS TERMOS ABAIXO
1 – Os termos a seguir são parte de um contrato vinculante
entre Ashton Baker e Gravity Monaghan;
TERMOS FUNDAMENTAIS
2 – O propósito fundamental é de um relacionamento
previamente acordado entre as partes; namoro, noivado e
casamento devidamente legal;
3 – Concordam e firmam amplamente uma união conjugal;
estão cientes de seus deveres e da confidencialidade do presente
contrato;
4 – Ambos concordam que após a união estável, deverá de ter:
respeito e pacificidade;
5 – Qualquer descumprimento vigente no presente contrato
levará imediatamente à punição satisfatória; a devolução do valor
pago à NOIVA ou multa paga pelo NOIVO, e será desfeito qualquer
negócio entre as partes;
6 – O casamento só será estabilizado e considerado oficial
após a cerimônia, entretanto, o namoro deve ser iniciado
imediatamente a partir da assinatura deste documento;
7 – As partes se comprometem a morarem juntas a partir da
assinatura deste documento para credibilidade dos fatos;
8 – A NOIVA se torna oficialmente estilista da The Reckless
pelo período de vigência do contrato e, durante este tempo, poderá
se beneficiar da imagem da banda para autopromoção do seu
negócio;
9 – Tudo no presente contrato deve ser lido e interpretado à luz
do propósito fundamental e dos termos fundamentais estabelecidos
nas cláusulas;
VIGÊNCIA
23 – O NOIVO e a NOIVA celebram o presente contrato no ato
de sua assinatura, plenamente cientes de sua natureza, e se
comprometem a cumprir totalmente suas condições;
24 – A NOIVA receberá a quantia de 50 mil dólares mensais
pela sua contribuição com a recuperação da imagem do NOIVO e
serviços prestados como ESTILISTA da The Reckless; receberá
também 20 mil dólares por cada imagem sua exposta por jornalistas
e paparrazzi;
25 – O presente contrato vigorará pelo período de 8 meses,
sendo três meses de namoro e noivado, e cinco meses de
casamento;
26 – O presente contrato poderá ser rescindido a qualquer
momento se uma das cláusulas for quebrada;
27 – Se uma das partes demonstrar interesse na rescisão do
presente contrato, o mesmo poderá ser desfeito mediante a punição
legal da multa de 500 mil dólares. E se o desejo partir da NOIVA, o
valor já pago pelo NOIVO deverá ser devolvido em íntegra;
CONCLUSÃO
28 – Nós, abaixo assinados, lemos e entendemos plenamente
as disposições do presente contrato e, por estarmos assim justos e
contratados, assinamos o presente instrumento.
O NOIVO: Ashton Baker
Data: 10/08/2024
A NOIVA: Gravity Monaghan
Data: 10/08/2024
Camille termina de ler o contrato. Minha atenção está voltada
para Gravity, embora esteja se esforçando pra caralho para agir
como se eu não estivesse aqui.
Pensando bem, o contrato só é vantajoso para uma das
partes, e não sou eu.
Aperto a caneta com tanta força que acredito ser capaz de
parti-la ao meio se dobrar e concentrar o polegar no ponto certo do
tubo.
Sanguessuga.
Aproveitadora.
Como é que minha boca já esteve na sua?
Como é que cheguei a pensar que poderia estar apaixonado
por você?
Continuo tendo dedo podre para mulheres. Cedendo
principalmente para as parasitas interesseiras.
Ouço o ranger dos meus dentes. Um minuto sozinho com ela e
tenho certeza de que Gravity mudaria de ideia. Antes, achava que
ela tinha mudado, agora, penso que sempre foi assim, só estava
cego demais para enxergar. Todas as mulheres são como Nicola.
E ainda sou acusado de ser desrespeitoso? De só usá-las para
sexo? Porra!
Elas extraem o que você tem de melhor e te cospem fora
quando não precisam mais. É exatamente o que Gravity está
fazendo comigo.
— Semana que vem, Bandit dará uma festa de aniversário em
Miami. A The Reckless foi convidada. É uma excelente oportunidade
para vocês aparecerem juntos pela primeira vez. — Jared passa as
instruções. Queria dizer que estou animado com a ideia, mas não.
Não vou poder nem sair com Harper para aliviar a tensão. Gravity foi
tão auspiciosa nos detalhes. — Mas é, acho que é uma boa.
Avalon?
— Sim, vou telefonar para o agente do Bandit e informar que
Ashton levará companhia. Alguma dúvida?
— Tenho. — Levanto a mão, como se estivesse na pré-escola.
— O que foi?
— Esse contrato parece vantajoso só para a sanguessuga ali.
— Agito a cabeça, indicando Gravity do outro lado da mesa. Sua
atenção, enfim, paira sobre mim. — Onde estão as minhas
vantagens?
— Você terá sua imagem restabelecida, sem mencionar o fato
de que vão tirar o foco das suas polêmicas e mirar no seu
relacionamento amoroso, com uma história crível e linda por trás. —
Ava soa com raiva. Mas ela tem estado o tempo todo com raiva de
mim. — Deveria estar feliz que Gravity concordou!
Posso jurar que vejo a boca de Gravity curvar em um sorriso
vitorioso.
— Mas…
— Sinceramente, Ashton, qual é o seu problema? — Avalon
sobe o tom. — Porque, sério, não podemos ser os únicos
enxergando quão no fundo do poço você chegou. Caramba, em
menos de um ano, você adquiriu uma lista extensa de pessoas que
dariam qualquer coisa para socar o seu nariz pelo menos uma vez
antes de morrer! — A mão sobre a mesa se fecha em um soco, que
tenho certeza de que, se pudesse, estaria direcionado a mim. —
Sem contar a história com agressões, impulsividade, sua falta de
responsabilidade afetiva, de autocontrole e raiva… Estivemos
dispostos a qualquer ideia que tivesse, mas você não teve. Quer se
afastar da banda? — Arqueia uma sobrancelha, cruzando os
braços.
— Você sabe que sem eles, não sou nada — murmuro,
desviando para outro lado.
— Se não está fazendo por si mesmo, faça por eles, então. —
Avalon começa a reunir seus pertences, assim como Cami e Jared.
— Vamos nos reunir periodicamente para discutirmos os
cronogramas. As reuniões para a volta da turnê começam em breve,
Gravity. Avalon te manterá informada de tudo. — O sorriso amigável
do meu empresário para ela me deixa enjoado. Ele costumava sorrir
assim para mim.
Fico esperando que todos saiam para finalmente me levantar.
Wade já deve estar me esperando para me levar de volta, mas,
sinceramente, estou me sentindo sufocar pouco a pouco com a ideia
de estar em um casamento por contrato. Vai começar simples e
ficará complicado.
E aí, depois, Gravity pede o divórcio alegando o quê? Estava
tentando ser positivo quanto a tudo isso, mas quando penso em
como as coisas vão ficar e como ela está me magoando por fazer a
única coisa que não suporto, quero apenas ter a chance de puni-la
por isso.
Permaneço em silêncio com meus próprios pensamentos,
tentando estabelecer algum controle entre a raiva e a impulsividade,
contudo, sei que sou uma bomba e posso explodir a qualquer
instante. A caneta que usei para assinar o contrato gira entre meus
dedos esbranquiçados pela força que envio para o conduto.
— Não estou feliz também.
A voz de Gravity me desperta. Subo os olhos até que minha
visão a capte. O cabelo abaixo dos ombros, ondulados e
semipresos por uma faixa vermelha. A franja cai ao redor do rosto, o
emoldurando. Seus olhos castanho-escuros me miram, estudando
se pode falar ou se vou deixar a raiva me dominar.
— Mas preciso trabalhar. Minha oportunidade com Magdalene
foi por água abaixo por sua causa — enfatiza a minha culpa. — A
The Reckless é minha última oportunidade como estilista. Pensar
em namorar você e depois me casar… — Suspira, afastando a
franja para trás. — Entendo a sensação. Detesto essa ideia tanto
quanto você, mas vamos conseguir o que queremos. A gente não se
suporta, mas podemos aprender. Já fomos amigos, já transamos,
podemos lidar com a situação.
— Quero ver quão determinada você está para ir atrás dos
seus sonhos.
Jogo a caneta sobre a mesa, ela repica e cai no colo de
Gravity. Empurro a cadeira com mais força que o necessário, e ela
gira até estar do outro lado da sala, atrás de mim.
— Vou fazer da sua vida um inferno, Gravity. Guarde as
minhas palavras.
Gravity suspira, seu quadril inclina-se sobre a mesa, e ela usa
as mãos para sustentar o peso. O canto de sua boca estica até
formar um sorriso diabólico.
— Eu sou o seu inferno, Ashton.
“Aproveite sua vida ao máximo
Enquanto ela é abundante”
FOURTH OF JULY – SUFJAN STEVENS
7 ANOS ATRÁS
TERÇA-FEIRA, 04 DE JULHO DE 2017, ÀS 20H34MIN.
DIAS ATUAIS
01 SEMANA DEPOIS.
SEXTA-FEIRA, 16 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 19H26MIN.
MIAMI, FL.
MILÃO, IT.
3 ANOS ATRÁS
TERÇA-FEIRA, 17 DE AGOSTO DE 2021, ÀS 23H43MIN.
DIAS ATUAIS
Que delícia de beijo, porra! Por que tive que ir com tanto
ímpeto e paixão? Poderia ter moderado, sem nada de especial. Mas
não. Brinquei e saboreei. De um jeito que gostei e estou ansioso
para o próximo.
Porque, claro, se estou determinado a usá-la como Gravity se
empenha para fazer comigo, não posso economizar em minhas
habilidades. Irei com tudo e preciso manter a cabeça no lugar.
Preciso ter foco. Tanto quanto sei que está voltada para seu objetivo
com nosso contrato, também tenho que estar para os meus.
Recuperar minha reputação é um deles, mas não terá nada
mais prazeroso que ter o controle de Gravity Monaghan em minhas
mãos. Como se segurasse sua existência entre os dedos. É o que
eu quero.
Sempre que penso que estou sendo usado novamente como
um atalho, a raiva me aquece por dentro. Fico cego. Perco todos os
sentidos. E preciso de algo para retaliar.
A contração da mandíbula faz doer minha arcada dentária.
Debruço sobre o balcão do bar. Dessa vez, peço uma dose dupla de
uísque e, quando o bartender me entrega a bebida, atravesso a sala
em busca de algo para me divertir.
Aproximo-me da roda onde Finnick, Bryan e Aidan estão.
Bandit está cantando uma de suas rimas.
Enquanto bebo um gole de uísque, ele me nota. Ainda existe
um clima estranho entre nós por causa de Ebony, mas, porra, não
tenho culpa se ele se casou com uma mulher deslumbrante e não
soube dar valor.
O divórcio aconteceu há uns seis meses e foi quando saí com
ela. Em uma noite, Eb me contou por que estava se divorciando;
Leo Bandit é um traidor fodido e descarado, e não foi apenas uma,
como várias traições durante seu tempo fora, em turnês, premiações
e shows. Ebony é coreógrafa, portanto, também viaja bastante, mas
era fiel ao casamento. Ele, por outro lado, não estava nem aí. Isso
Ravennah não espalha, não é mesmo? É por isso que acredito que
tem um maluco vendendo informações minhas para o TNC.
Entro no meio de Bryan e Aidan, escondo uma mão no bolso
da calça e bebo tranquilamente durante o tempo em que Bandit
canta.
Admiro meus amigos. Pra caralho. Eles são fiéis às suas
garotas. Oportunidade para infidelidade não falta. Em festas como
esta, simplesmente precisamos insinuar o que queremos e, em uma
fração de segundo, nós temos.
Por exemplo, a modelo que estava comigo antes de me dirigir
à Gravity, por estar hiperconsciente de sua atenção voltada para
mim, estava insinuando que poderia levá-la para o hotel. Se
quisesse.
É o que pretendo fazer porque aquele contrato não irá me
impedir. Deixei tudo pronto quando saímos mais cedo. Arranjei um
quarto e dei uma gorjeta generosa para o concierge manter a
discrição quando voltar acompanhado. Não é traição quando o que
você tem com alguém não é real.
— Em quantos problemas você vai nos meter hoje? — Bryan
ironiza ao cruzar os braços, sem desviar os olhos de Bandit.
Rio contra o copo.
— Em nenhum, caralho. Vocês não confiam em mim?
— Nem um pouco. — Aidan completa antes que Bryan possa
responder.
— Não está tramando sair daqui acompanhado com outra
pessoa que não seja Gravity, não é?
— Não me force a mentir para vocês, Bryan.
— É quebra de contrato. — Aidan franze o cenho.
— É uma cláusula absurdamente ridícula e vocês sabem.
— Ela está tentando te proteger. — Finnick rosna ao lado de
Aidan. — Inconscientemente, mas está.
— Olha só quem decidiu voltar a falar — caçoo para trocar o
assunto, e sou repreendido pelo olhar assassino de Finn. — Sua
namorada está por aí, já falou com ela?
— Não estamos namorando. — Finnick só tem bebido vodka
pura, e o copo com um líquido transparente definitivamente não é
água. — Foi passageiro.
— Passageiro? Penni te fez uma declaração pública! — Aidan
retruca.
— E daí? — Ele nem tenta camuflar o desdém.
Não me contenho, começo a rir. Esse cara é impossível.
— E daí que você não pode esperar que alguém não se
magoe quando você manda uma mensagem dizendo “eu não sabia
que estávamos namorando”.
— Mas eu não sabia. Nunca pedi ela em namoro. — Ele
arqueia uma sobrancelha, inocentemente acreditando que não fez
nada de errado.
Céus, depois eu que sou o fodido insensível.
— Você saiu com ela por semanas, cara. Certos
relacionamentos não precisam de um rótulo para saber o que são.
Finnick parece ficar ainda mais confuso quando Aidan tenta
explicar.
— Sério, Finnick, você precisa ser estudado! — zombo, rindo
sem conseguir parar.
— Você sai com a Harper, certo? — Finn começa a elaborar
seu argumento, e, sinceramente, não gosto do rumo que escolhe
para rebater. — E vocês dois fazem isso há quanto tempo? Um
ano?
— Mais ou menos. — Cerro as sobrancelhas.
— Vocês namoram?
— Não — respondo sem ânimo porque esse desgraçado tem
um ponto forte a seu favor.
— Viram? Não fui eu que entendi errado.
— Para ser honesto, nós vamos desistir de você e Ashton. São
dois cuzões! — Bryan exala seu primeiro sinal de derrota. — Será
que já podemos ir embora? Estou cansado pra caralho. E sentindo
que vou levar um pé na bunda se não voltar para Humperville nas
próximas semanas. Conseguiu suas fotos? Alguém viu você e
Gravity? — Rapidamente define outro assunto para não ter que
entrar em detalhes sobre o dele com Mackenzie.
Eles estão namorando há quanto tempo? Quatro? Cinco anos?
Não deve estar sendo fácil, considerando que estavam
acostumados a estar sempre juntos.
— Consegui — falo com uma entoação de orgulho.
— Então, nós podemos ir, certo? — Aidan confere.
— Querem saber? Até que estou curtindo. — Vagueio meus
olhos pela festa, atrás da modelo que não tive tempo de descobrir o
nome. — Vão na frente. Falo com vocês amanhã.
— Também vou ficar.
Bryan e Aidan franzem a testa para Finnick, mas não discutem.
— Vamos procurar por Chase e Tess. — Aidan diz, dando um
tapa em meu ombro como consolo. — Por favor, não se meta em
problemas. Vocês dois sozinhos… — suspira, balançando a cabeça
como se lamentasse algo que não aconteceu ainda — não é boa
coisa.
— Nossa, cara, valeu pelo voto de confiança! — desdenho,
forçando decepção na voz.
Nem os vejo desaparecer. Finnick e eu continuamos ao lado
um do outro e em silêncio porque se você não for o lado que
conversa, ele será muito menos.
— Evite as drogas. — Beberico do meu copo e, pelo canto do
olho, o vejo fazer o mesmo.
— Evite as mulheres — rebate, e preciso me controlar para
não suspirar.
— Estou falando sério, Finnick. Evite a porra das drogas.
Sinto-me virar o quadril para estar de frente para ele.
— Admito que ser mulherengo pode acabar com minha
reputação, mas, se ficar viciado nessa merda, ela vai acabar com
você. Eu te amo, cara. Se algo acontecer, juro, seu fodido egoísta,
te mato com minhas próprias mãos!
Finnick cerra a mandíbula. A contração faz o queixo tremelicar,
mas, como se minha exasperação não significasse nada, volta a
beber a vodka devagar e sem nenhuma preocupação sombreando
suas feições.
— Sabe qual foi a parte mais difícil em toda a minha vida? —
Permaneço em silêncio, aguardando que prossiga. — Lutar para
continuar vivendo. Se alguma coisa acontecesse comigo por causa
das drogas ou se você decidisse me matar, estaria me fazendo um
favor.
Sempre achei que os problemas com drogas da senhora Taylor
evitariam que Finn se metesse com isso, mas é o contrário. Parece
que, por saber o que as drogas fazem com alguém, é aí que ele
gosta. Finnick é altamente destrutivo. Para ele mesmo e para as
outras pessoas.
— Effy está namorando — confidencia. — Você sabia?
— Eu? — Arregalo os olhos, arqueando as sobrancelhas. —
Por que eu saberia? Ela não mencionou nada.
Finnick pressiona os lábios, rindo feito um lunático. Quando o
encaro de perto, procurando entender o motivo, noto as pupilas
dilatadas.
Que porra.
— Minha mãe que me contou. Parece que a maldita adora me
ver sofrer. Ela falou em um tom tão sarcástico, como se estivesse
feliz ao me dizer que Effy encontrou alguém e que esse alguém é
mil vezes melhor do que eu.
— Quem é o cara?
— Um médico. — Ele sacode os ombros, crispando os lábios.
— Pesquisei. Bom partido, rico, boa família. Ela se deu bem.
— Você também é, Finn.
Arrisco apertar seu ombro, dando apoio.
Exceto pelo fato de que destrói tudo que toca.
— Não fode. — Ele ri, encaixando o copo entre os lábios para
terminar de beber. — Estou longe de ser um bom partido. Ela
merece ser feliz.
— Você disse que pesquisou…
— Ah. — Ele cambaleia, rindo alto o suficiente para atrair
atenção para nós. — Liguei em cada maldito hospital até descobrir
em qual ele trabalhava. Beckham Malik. Ele é cardiologista, sabia?
Consegui algumas informações quando pedi para marcar uma
consulta.
— Deus do céu, Finnick! — esbravejo, porque sei como Effylin
irá reagir se souber. — Você não pode fazer uma porra dessas. É a
vida dela. Está parecendo um ex-namorado ciumento e stalker. Se
gosta dela, só precisa dizer. Pensando bem, se gosta dela, só
esquece. Porque se Effy está seguindo em frente, é melhor assim.
Você precisa fazer o mesmo.
— Tem razão. — Ele assente, e sinto alívio ao ouvi-lo
concordar. O semblante de resigno me convence de que posso
confiar nele. — Preciso de mais uma bebida, você vem? —
Gesticula com o queixo para dentro da casa.
O espaço externo onde estamos tem uma bela vista para o
mar. Se descermos as escadas do pórtico, estaremos com os pés
soterrados na areia.
Meu desejo é que, no futuro, me mude para uma mansão em
Beverly Hills ou acabe me mudando para cá, Miami. Gosto de
climas tropicais. É um plano para uma futura aposentadoria.
Ao atravessar o primeiro ambiente, meus olhos instintivamente
aterrissam no sofá onde deixei Gravity. Dobras de pele se formam
em minha testa quando capto o lugar onde estava vazio.
Rapidamente rastreio a sala, atrás da minha futura esposa que
adora arranjar encrenca, mas faz com o único propósito de me
provocar.
— Ei, você viu a Gravity? — murmuro para Finnick, e ele faz o
reconhecimento da área como eu.
— Não. Vocês não estavam juntos agora há pouco?
— Quero outro duplo. — Ergo o copo para mostrar a ele e o
coloco em sua mão. — Vou procurar pela encrenqueira.
Enquanto me afasto, faço outra varredura minuciosa. São
tantas pessoas aglomeradas no mesmo lugar que fica difícil
reconhecê-la.
Procuro pelo meu celular no bolso da calça e o retiro, vou até o
número dela em minha lista de contatos. Claro, não atende na
primeira tentativa, mas insisto. Sua voz soa pelo interior da linha, e
não entendo o porquê do meu coração disparado e minha mente
tecendo o pior dos cenários.
Já estive em milhares de festas como essa e sei que muitas
coisas não são realmente expostas porque estamos falando de
dinheiro, influência e manipulação. Convivi com a pessoa mais
tirana que conheço — meu pai —, que move e faz coisas com o
intuito de ter seus desejos e perspectivas atendidas, portanto, sabia
antes mesmo de me tornar famoso o que acontece em lugares
frequentados por pessoas como essas. Não são todas de todo o
ruim, mas sexo e muita droga são, muitas das vezes, a atração
principal.
Gravity é durona e não mede esforços para ostentar esse seu
lado. Mas me preocupa que essa personalidade seja exatamente o
motivo de levá-la a ser um alvo para os predadores cheios de si.
— Para onde você foi? — indago, sem esconder o tom de
advertência.
— Por que seria da sua conta?
— Por que não seria da minha conta?
Exala uma aspiração demorada.
— É impossível ter qualquer conversa com você. Sua
arrogância, prepotência e ego me dão náuseas.
— Agora te dou náuseas? Pensei que tivesse feito de tudo
para conseguir que estivesse dentro de você! — Esboço um sorriso
vil, como se ela pudesse vê-lo e sentir a pungência do atrevimento.
— Como é hipócrita.
Um grunhido arranha sua garganta.
— Se soubesse do quanto me arrependo, não estaria se
vangloriando.
Meu sorriso se desfaz tão rápido quanto chegou à curva da
minha boca. A contração do maxilar atinge minhas têmporas e
narinas dilatadas refletem a raiva que essa malcriada consegue
aguçar em mim.
A parte ruim que me esforço para manter sob controle se
desprende facilmente de seu confinamento quando Gravity tenta um
embate. O lado perverso que mantenho enjaulado e que por muito
tempo consegui manter assim está por um fio de se libertar.
Tenho muitos arrependimentos e com certeza estou com raiva
dela por tudo que está fazendo, mas nunca me arrependi de nós.
Ouvi-la reconhecer que se arrepende de ter ficado comigo me deixa
furioso para um caralho.
— Ora, ora, consegui te fazer perder a fala?
Ela não faz ideia do quanto está estimulando meu lado
catastrófico.
Cerro o mandíbula, dentes trincados com a força que estou
disparando para essa região da boca.
— Se arrepende porra nenhuma.
Analiso ao meu redor, esperando que Finnick esteja em algum
lugar com a minha bebida, mas não o vejo. Caminho para o mais
longe que consigo da música alta e irritante. Direciono-me para o
corredor empanturrado, testando cada maçaneta até encontrar uma
porta que abra. Quando acho, estou dentro de um quarto de
hóspedes, presumo, e me certifico de trancá-la para não ser
interrompido.
Só quando sento-me na cama e não tenho o volume da música
interceptando os sons através da chamada que ouço o chuveiro. Ela
deve estar se aprontando para o banho, então volto à minha
normalidade e paz domina o meu cerne por saber que está segura
no hotel.
— Já que estamos falando disso, não tem um dia em que eu
olhe para você e não pense no quanto errei em te deixar me tocar!
Superei o que aconteceu entre nós, mas não significa que não
deseje apagar aquele maldito fim de semana da minha vida. Acha
que eu me afastei por quê? Ficar do seu lado é insuportável. Porque
te conhecer de verdade, com todas as coisas que você faz todos os
dias, a forma como trata as mulheres... Céus. — Uma risada
desesperada soa dela. — Começo a me perguntar como eu pude
ser tão idiota! — esbraveja a última frase. — Você é repugnante!
— Se sou tão repugnante, por que concordou com esse
maldito contrato? Estar presa a mim por oito meses? Não é o tipo de
coisa que alguém que me acha desprezível faria!
— Você não entende, não é?!
Quando Gravity muda o modo de falar outra vez, sei que o que
vai dizer irá me destruir de um jeito que só ela pode.
— É o que você tem para oferecer que prende as pessoas a
você! Não é sua personalidade, não é porque você é incrível, não é
porque elas te amam! Estou aqui porque você tem dinheiro,
influência e um jeito de eu conseguir me estabilizar na carreira.
Então, se o seu plano é me deixar perdidamente apaixonada para
depois me chutar, não perca seu tempo. Não tem nada em você que
me atraia, além do que vai fazer por mim quando essa merda de
casamento por contrato acabar!
É um golpe atrás do outro. Uma palavra dela tem o peso de
duas fraturas e dez socos no estômago. Não esperava ser açoitado
por Gravity dessa maneira.
O nó na garganta cerca o soluço, mas minhas lágrimas são
silenciosas, como a maioria das que já deixei cair ao longo dos
anos.
Primeiro, quando meu pai me batia. Ele era violento, mas
quando eu chorava, tendia a ser pior.
Segundo, quando Aidan saiu da banda porque nós o banimos
e depois por escolha dele. E naquele momento, parei de conter
minha raiva.
E por último, minha amizade com Delilah. Perder minha melhor
amiga me destruiu de maneiras que, mesmo se procurasse pelas
palavras certas, nosso dicionário seria incapaz de descrever.
Ninguém sabe o que você faz quando está sozinho, no seu
quarto, prisioneiro dos seus demônios, dos tormentos que cercam
sua mente e coração. Ninguém vê as feridas que tentam cicatrizar,
mas que repetidamente tem alguém as cutucando, impedindo que
esse processo de cura se concretize.
Ser quem eu sou é o meu protesto. É o meu jeito hostil de
dizer que sou refém de uma história que não tem e nunca terá um
fim porque as expectativas que estou tentando alcançar sequer
existem.
— Você estava desesperado para me ouvir admitir que estou
sendo como Nicola, então tudo bem, Ashton, se quer me ouvir dizer,
vou dizer: estou agindo exatamente como sua ex-namorada e te
usando para conquistar meu sonho! Feliz agora?!
Meus dedos cercam o celular, sinto a dormência dos nódulos e
imagino que estejam esbranquiçados. Boquiaberto, extasiado com o
discurso dela, fico inábil para qualquer resposta à altura.
Pisco, limpando a visão, esperando que as últimas lágrimas
reprimidas dentro dos orbes escorram, e eu possa engolir a parte
melancólica e dar evasão para a fúria e o rancor.
— Ashton? — Gravity está com a voz mais suave que
instantes atrás. Posso imaginar a testa franzida de curiosidade. —
Ainda está aí?
— Como eu te disse — pigarreio e me esforço para manter a
voz firme —, em oito, Gravity. Estará apaixonada por mim em oito
meses.
Encerro a ligação. Se antes tinha determinação para retaliar,
ela conseguiu me fornecer um combustível ainda mais potente.
Devolvo o telefone para o bolso da calça. Utilizando as
mangas do blazer, seco o rosto sem deixar nenhum vestígio.
Endireito a postura, reordenando meus pensamentos e camuflando
meus verdadeiros sentimentos. Poderia sentar aqui e chorar como
uma criança, mas não tenho mais sete anos. Posso revidar à altura.
Encaminho-me para o banheiro do quarto, lavo o rosto, as
mãos e encaro ao meu reflexo no espelho; olhos e bochechas
relativamente afogueados. Seco-me e volto para o quarto, indo em
direção à porta.
No minuto em que a destravo, a modelo com quem passei
flertando o começo da festa está recostada do outro lado do
corredor, como se estivesse esperando por mim todo esse tempo.
Os cantos da minha boca se curvam em um sorriso atencioso,
e a garota retribui.
— Qual é o seu nome? — Encosto a lateral do corpo no
caixilho, estudando os dois lados do corredor. Ninguém familiar.
Ótimo.
— Sadie.
— Quer entrar e passar um tempo conversando comigo,
Sadie?
Fisgando o lábio inferior, Sadie estreita o sorriso até que esteja
rachando suas bochechas com as covinhas fundas. Empurra o
cabelo por cima do ombro, caminhando em minha direção. Com as
mãos espalmadas em meu peito, compele meu corpo a voltar para o
quarto.
Vou fodê-la deliciosamente bem esta noite e Sadie nunca mais
esquecerá meu nome.
“Pare de fingir que você é uma santa
Porque você não é digna de adoração”
NOTHING HOLY – JAYMES YOUNG
7 ANOS ATRÁS
TERÇA-FEIRA, 04 DE JULHO DE 2017, ÀS 22H00MIN.
Não sei quantas cocas batizadas bebi nesta noite, o que sei é
que estão fazendo o efeito esperado.
Minha pulsação aloja-se na garganta e fico em efeito gangorra
nos pés, indo e voltando para os calcanhares. Gostaria de poder
esconder a presunção em meu sorriso, mas o álcool fez uma aliança
com minha mágoa e tudo o que quero nesta noite é que meu pai se
sinta tão diminuído e incapaz como sempre me fez sentir.
Minha vida é uma merda por causa dele.
Perdi minha namorada.
Perdi meu herói, e ele está zombando da minha dor na minha
cara porque sabe que meu avô era importante.
As agressões acabaram quando revidei pela primeira vez e,
naquele momento, o limiar que nós dois encontramos era uma linha
frágil a qual não pudemos ultrapassar.
Ele reconheceu que eu não era mais uma criança indefesa, e
entendi que não precisava apanhar calado. Podia fazer algo por
mim. Algo do qual minha mãe se escondia de ver ou ouvir. Então,
quando ele me ameaçava, eu o ameaçava de volta. E não
passamos mais disso.
Enquanto bebo outra dose de coca com uísque, estudo o
sorriso despretensioso do meu pai. Falso. Tenho até calafrios na
espinha vendo-o sorrir de maneira tão hipócrita e agir como se
estivesse criando aqui, sob este teto, a família perfeita.
Nem preciso falar sobre minha mãe, que naturalmente ao
longo dos anos se esforçou para ser a esposa perfeita, receber a
aceitação e a aprovação, repassando a mesma educação para
minhas irmãs porque quando fossem mais velhas, se casariam com
homens tão ricos e poderosos quanto Conrad Baker.
Isso me enfurece de tantas maneiras, mas a principal delas é
que essas mentiras se findam em suas mentes e se estabilizam
como se esse fosse o único futuro possível para elas.
Odeio essa família. Odeio esse lugar. Continuo aqui por causa
de Maddie e Halle. Quero ser um obstáculo entre a lavagem
cerebral dos meus pais e a educação das minhas irmãs. E se eu
puder anular a visão de que são pais perfeitos, com certeza irei.
Estou bêbado, com raiva ou em luto? Talvez os três porque
estar aqui, na presença do meu pai e com essa família ridícula, está
me deixando enjoado.
Relanceio o olhar para os convidados de honra de Conrad.
Meu sangue aquecido pela fúria flui por entre minhas veias. Meu
avô faleceu e ele não está nem dando a chance de seu corpo esfriar
sob a terra antes de dar uma festa. Porra, é o pai dele. E o que ele
faz? Dá uma grande festa para seus malditos acionistas?
A gargalhada dele do outro lado do cômodo se amplia e, em
conjunto, sinto-me enraivecer mais por dentro.
Esvazio meu copo em um único gole, cruzando a sala até a
roda onde meu pai está com um grupo de seus acionistas da
Baker’s. Adorno meu rosto com o mesmo sorriso arrogante que está
instalado no de Conrad. Deixo meu copo vazio em uma das mesas
durante meu percurso até eles.
No momento em que me nota, flagrando-me de soslaio, sua
máscara feliz desmantela.
— Boa noite, senhores. — Ignoro a olhadela recriminatória do
meu pai, avolumando o sorriso sagaz. — Sabiam que o ex-
presidente da joalheria Baker’s faleceu? — Os homens engomados
em seus ternos sob medida esbugalham os olhos para a
informação. — Isso mesmo. Rain Baker. O fundador da porra da
joalheria. Morreu. Dois dias atrás.
— Eles sabem desse infeliz acontecimento, filho. — Meu pai
tenta conter o tom de censura, mas é inútil. A cabeça dos três
homens se volta para ele. — Esse é meu filho, Ashton. Ele será o
próximo a assumir a cadeira da presidência. — Um sorriso forçado
se desenha, e quero vomitar, sinceramente. A porra de uma mentira.
— Será meu sucessor, oficialmente.
Engasgo com a risada, e os homens derivam sua atenção para
mim outra vez. Nesse momento, meu pai se desfaz do semblante
orgulhoso para assumir a verdadeira carranca de aversão a mim.
— Sério? Ainda não contou para seus acionistas que não tem
um sucessor?
É claro que não. Admitir para o conselho que não tem para
quem passar a cadeira da presidência da Baker’s é um tiro no pé,
uma preocupação antecipada que quer evitar para não ter que
entregar para alguém que não seja da família.
A sucessão seria algo fácil de resolver se meu pai não tivesse
o patriarcado enraizado nas veias. Minhas irmãs são ótimas opções,
mas, claro, para ele, elas sequer foram cogitadas como possíveis
sucessoras.
Para Maddie, está sonhando com medicina e quem sabe
construir uma rede de hospitais que carregue o nome da família, e
Halle terá o mesmo destino definido na carreira de saúde.
— Mas tenho um sucessor, Ashton. Você. — Conrad eleva as
sobrancelhas esculpidas e pregas de pele surgem em sua testa. —
Não é uma noite apropriada para tratarmos de sucessão, muito
menos nos lembrar de uma tragédia como a perda do meu pai.
Desato em uma gargalhada alarmante. Olhos curiosos miram
em nós.
— Fala sério, você é um puto mentiroso, Conrad! — Limpo o
cantinho dos olhos, lágrimas se acumulam de tanto que rio. — Você
não está triste porque perdeu seu pai. Essa festa, na verdade, é
uma comemoração! — Abro meu sorriso diabólico, aquele que
venho guardando para ele, esperando o momento oportuno para
usá-lo.
— Ashton, está me envergonhando — brada, cerrando os
dentes. Sua voz é quase inaudível quando fala. — O que bebeu?
Acho melhor subir para seu quarto. Imediatamente. — O tom de
autoritarismo familiar está lá, impregnado como se tivesse nascido
com ele. — Lido com você mais tarde.
— Lida comigo mais tarde? — Sobressalto, arregalando os
olhos para meu pai. — Vocês ouviram, senhores? Ele disse que lida
comigo mais tarde! — exclamo, bato palmas e esparramo os braços
para os lados, os abrindo como asas. Tombo a cabeça para trás,
inchando meu peito com ar, e mais uma onda de gargalhada
explode de mim. — Quer que eu conte para eles como você lida
comigo? Como sempre lidou comigo durante quinze anos?
— Ashton, esse é meu último aviso. Você está bêbado e
descontrolado. É melhor subir para seu quarto, e nos falamos mais
tarde, quando estivermos sozinhos, e você, sóbrio.
— Estou consciente, Conrad. Tão consciente como nunca —
murmuro de volta, o ranger de meus dentes pulsando em minhas
têmporas. — E, finalmente, posso te dizer com todas as letras o
quanto eu te detesto e estou ansioso para todas essas pessoas
descobrirem o verdadeiro filho da puta que você é! — rosno cada
palavra com a mandíbula contraída. Narinas expandidas com a raiva
em crescente espiral dentro de mim. Até as batidas do meu coração
se tornaram ferozes nos últimos segundos.
— Lamento pelo comportamento de meu filho.
É a única forma que encontra de tentar amenizar, já que não
pode dar outra justificativa. Meu pai jamais tentaria me fazer parecer
um monstro para os acionistas. Preciso do voto deles na sucessão e
manchar minha “reputação” com eles não contribuiria positivamente
para a Baker’s.
— Ashton, o que está fazendo? — Minha mãe cochicha, e sorri
ao mesmo tempo, ofegando ao meu lado.
— Querida, que bom, Ashton precisa ir pra cama. Pode levá-
lo?
— Não fode, Conrad! Essa festa você armou para cuspir na
minha cara que não dá a mínima para a minha perda! — grito em
seu rosto, respingos de saliva caindo nele. — Você sabe o quanto
ele era importante para mim?! Sabe que ele foi o pai que você
jamais conseguirá ser?!
Minha mãe envolve seu braço na curva de meu cotovelo, me
arrastando para longe, mas não desisto, continuo gritando.
— Diga para seus acionistas o que costumava fazer comigo!
Como gostava de impor sua autoridade me espancando até que eu
não tivesse forças para aguentar! E que incentivava a disputa entre
mim e Alex, sempre me dizendo coisas que me faziam acreditar que
eu não sou bom o bastante! Que não passo de um garoto fraco e
mimado!
Lanço palavra por palavra, as pessoas reunidas na sala fitando
a cena que estou fazendo com espanto e indignação. Ouço os
burburinhos, os questionamentos, e sei que atingi meu objetivo
nessa noite.
Meu pai, por outro lado, não permite que a raiva — que sei que
está sentindo — chegue ao seu semblante. Sua expressão é
imperturbável, a insensibilidade que cruza seus olhos me diz que
dará um jeito de contornar a situação a seu favor.
Ele vai me culpar e me penalizar por esta noite.
“Eu soube desde o primeiro passo
Que você é uma coisa perigosa”
A DANGEROUS THING – AURORA
DIAS ATUAIS
De: avalon@thereckless.com
Para: gravitymonaghan@mail.com
Assunto: Cronograma – Miami
Olá, Gravity.
Já deve saber que as fotos de vocês na festa de aniversário de
Leo Bandit estão circulando na internet desde esta madrugada.
Nós duas sabíamos que poderia acontecer. Ashton tem seu
próprio modo de decidir como e quando as coisas vão acontecer —
me imagine suspirando e revirando os olhos neste momento.
Aproveitaremos que estão em Miami para fortalecer as
especulações do relacionamento. Preparei um cronograma simples
para vocês serem vistos em público hoje. Espero encontrá-los
amanhã em Nova York, com certeza. Mas aproveitem a estadia
também.
Cronograma:
Café da manhã no hotel (certifiquem-se de que sejam vistos de
mãos dadas ou com demonstrações de afeto).
Dia na praia (Hollywood Beach, vocês só precisarão atravessar
a rua. Caso não tenha levado roupas de banho, Ashton poderá
acompanhá-la para comprar algumas. Ele tem um cartão black o
qual pode utilizar, mas já providenciei um para você.).
Jantar e passeio à noite em Little Havana (bairro cubano
famoso em Miami, acredito que serão fotografados).
Lembrem-se de serem especialmente naturais enquanto
estiverem juntos em público. Ajam como se realmente estivessem
apaixonados, afinal, não queremos piorar a reputação de Ashton se,
por acaso, a história de ser um relacionamento falso vier à tona.
Acima de tudo, divirtam-se.
Ergo o rosto em direção ao Ashton, terminando de se vestir
para descermos para o café. Aidan já enviou milhares de
mensagens dizendo que estão esperando por nós no restaurante.
Estamos em uma suíte presidencial, poderíamos, sem nenhum
problema, tomar café no quarto, mas o cronograma diz
especificamente que esperam que sejamos vistos juntos. De mãos
dadas.
Suspiro, captando as palavras de Avalon no corpo do e-mail e,
mais uma vez, enviando minhas advertências internas para um lado
da minha mente que meu consciente não possa alcançar. Se
continuar me penalizando por todas as escolhas erradas que faço,
definitivamente Ashton conseguirá fazer da minha vida um inferno.
Não preciso de mais pressão afundando meus ombros.
Não tenho nenhum biquíni, óbvio. Não estava esperando
passar mais um dia em Miami, quem dirá passeio em Hollywood
Beach e jantar em um dos bairros mais famosos.
Envio uma mensagem para Wade — trocamos nossos
números de telefone ontem, antes da festa de Bandit —, pedindo
que me encontre dentro de uma hora no saguão do hotel. Poderia
sozinha ir para o shopping mais próximo, contudo, dei uma espiada
pela sacada do quarto. Ainda que a entrada do hotel não esteja
obstruída por fãs, tem pessoas cercando-a o suficiente para gerar
uma confusão desnecessária.
Conduzo minha atenção para Ashton. Ele borrifa perfume nas
laterais do pescoço e no pomo de Adão quando pende a cabeça
para trás.
Confesso que estou esperando os comentários
desnecessários sobre o que aconteceu de madrugada, mas ele me
surpreende guardando-os só para si. Entretanto, não confio em
Ashton quando não está tentando ser um completo babaca
egocêntrico. Definitivamente está tramando alguma coisa, e meu
estado de alerta contínuo é a forma que encontrei de me defender
quando partir para outro ataque.
— Estou pronta há meia hora… — Suspiro, examinando-o
caminhar de um ponto ao outro do quarto.
— Estou me arrumando.
— Está se arrumando? — escarneço, e estrangulo uma risada
sarcástica. — É só a praia.
— Não. É Hollywood Beach. Não quero estar mal arrumado se
encontrar alguém interessante.
Supervisiona a regata branca e o short de poliéster branco
estampado com coqueiros cinza. Ele recupera os óculos escuros de
aviador de dentro do closet e faz outra verificação no espelho.
— Você nem tem vergonha, não é?
— Por que eu teria vergonha de ser bonito? — Ele sorri para
seu reflexo no espelho.
Engulo a gargalhada, mas quase não consigo quando ronco
com o nariz.
— Estou dizendo que não tem vergonha de ser um grande
imbecil. Você estará acompanhado!
— Só porque tenho um relacionamento de mentirinha com
você, diga-se de passagem, não quer dizer que preciso me tornar o
santo padre. Quando a gente se divorciar, estarei de volta à pista. —
Ajusta o arco no nariz. — E como você disse — ele se aproxima,
estendendo uma mão para mim —, está sendo bem paga para me
suportar.
Exalo com fúria e me empurro da cama, ignorando sua ajuda.
Marcho em direção à porta, agindo como se suas passadas atrás de
mim também não fossem um grande fator a ser levado em
consideração para a raiva que estou sentindo dele nesse momento.
Ashton não é só irritante, como faz de tudo para me lembrar de
que não vai me respeitar como sua namorada, muito menos esposa.
Nem que eu coloque em letras destacadas no contrato. Ele não fez
isso antes, quando supostamente gostava de mim, por que estou
esperando que faça agora?
Estou usando um vestido vermelho curto, esvoaçante na saia e
com uma alça que amarra no pescoço. Como prendi o cabelo no
alto, em um coque, Ashton não tem nenhum problema em me
segurar pelo cordão sobrando e pendendo em minhas costas. Ele
fecha o punho no amarrilho, forçando-me a deter as passadas
longas para conseguir o máximo de distância dele possível.
— Se entrar assim no elevador, as pessoas vão especular que
já tivemos uma primeira briga.
— Ah, mas nós tivemos não uma, como várias brigas —
murmuro, tentando expressar minha exaustão na voz.
— Que cheiro bom. Que perfume está usando? — indaga,
escolhendo esquecer a conversa anterior. Ele passa o braço por
meus ombros e me acolhe sob seu bíceps. Cruzo os meus, as
narinas retesando com rancor. — Te fiz uma pergunta — cantarola
quando não vê nenhuma indicação de que vou conversar com ele.
— Não te interessa — respondo com os dentes cerrados.
— Parece verbena.
É verbena, esclareço mentalmente.
— A propósito, gostou de gozar comigo te estimulando? —
Tem uma risada contida sob a voz fraca.
Adentro o elevador, grata pelas portas terem aberto no
momento certo. Contudo, meu rosto contorce a musculatura ao ver
que não tem ninguém dentro dele. E Ashton me segue, não faz
nenhum esforço para acompanhar meus passos e mantém o braço
em cima de mim, me contornando de forma protetora.
O abraço dele me arremete a muitas lembranças. Em Paris,
não se esforçava para ser um completo idiota como tem feito. Pelo
contrário, ele queria ser galante e conquistador, falava coisas para
me entreter e impressionar. Agora, estou constantemente
imaginando como seria bater nele com qualquer objeto que tivesse
em mãos.
— Quer fazer hoje de novo?
Inclina-se sobre meu ombro, o queixo resvalando
inocentemente minha pele. A barba rala e por fazer escorregando e
gerando formigamento através das minhas coxas. Entre os lábios,
uma limitada corrente de ar esquivando-se até o lóbulo da minha
orelha.
Maldito provocador.
— Dessa vez, posso entrar na brincadeira com você. Quem
sabe entrar em você... — salienta a provocação.
Endireitando a coluna, esfrego o ombro com o queixo para
afastar a voz rouca do meu ouvido, assim como o calor lascivo
tocando minha pele.
— Você não quer, encrenca? Repetir o que já fizemos? Sabe
que não foi suficiente, não é? — Mais uma ação provocadora —
Não fiz nem um por cento das coisas que gostaria. Não toquei em
metade dos lugares que imaginei. Ainda fica com a boceta molhada
só de me ouvir falar essas coisas? Vai negar só para que eu tenha
que descobrir sozinho? Porque eu posso.
Ele espalma minha barriga e percorre os dedos em direção à
virilha, circulando e brincando por cima do vestido. Ingiro uma lufada
de ar, fecho os olhos e ouço o zumbido externo do elevador se
movendo, mas confinada demais nas memórias para me distrair.
Minha cabeça cai para trás quando inala contra minha pele e a beija
depois, uma corrente de energia galgando dentro de mim quando
baforo.
Ordeno meu corpo a brigar por controle. Ceder outra vez, em
menos de vinte e quatro horas, é uma humilhação ainda maior.
Entretanto, esqueço que estou lidando com uma pessoa que odeia
ser contrariada tanto quando odiei receber um fora dele no passado
e fiz de tudo para tê-lo. E, no momento em que tento me
desvencilhar, Ashton firma o braço, me emboscando, e sou atingida
por outra carga de eletricidade quando belisca meu mamilo túrgido
sobre o vestido como castigo.
Correndo a mão da minha barriga para a barra do vestido,
embola-o até onde minhas coxas começam. Seus dedos dedilham
minha pele assim como faz quando está dominando seu
contrabaixo.
Infelizmente, não alcança seu objetivo porque o elevador emite
uma sonorização que se assemelha a uma campainha e
imediatamente Ashton solta minha roupa, deixando-a cair
suavemente em minhas pernas. O tecido leve que acaricia minha
pele é suave, mas estou afogueada por dentro e o inofensivo toque
arremete a uma combustão.
— Você é um canalha — grunho, quando ele entrelaça os
dedos em minha mão, liderando-nos para fora do elevador.
— Sou um canalha por querer satisfazer minha futura esposa?
— Ri com o canto da boca.
— Nosso relacionamento só significa alguma coisa quando é
você quem está ganhando.
— Mas, me diz, você não está? — Ele me encara através das
lentes escuras dos seus óculos. — Você está ganhando dinheiro,
fama e gozando ao mesmo tempo. Não vejo nenhuma desvantagem
para você.
Solto nossas mãos com brutalidade. Ashton para, virando-se
para mim com uma sentença incutida acentuando sua expressão.
— Ainda que seja um relacionamento falso, mereço que aja
comigo com consideração! Não pode sair e transar com outra
pessoa, não pode agir como se eu não tivesse nenhum sentimento,
Ashton! — berro, alto o bastante para causar nele alguma emoção
sincera.
Ele afasta os óculos escuros e os guarda no bolso do short.
Em seguida, fecha a mão em torno do meu pulso, nos conduzindo
para trás do elevador. Distancia-nos de possíveis olhos curiosos.
— Sabia que não tinha nada a ver com o contrato! Ainda está
com raiva de mim por causa de Paris!
Amplia os braços, gesticulando-os para os lados.
Seguro seus olhos nos meus, e agora que posso vê-los sem a
barreira dos óculos, acho que prefiro quando está com eles. Ele está
com raiva de mim. A explosão iminente chegando às suas pupilas
levemente dilatadas.
— Não tem nada a ver com o fato de você ter me deixado
sozinha em Paris para ficar com sua ex-namorada! Tem a ver
comigo! Com o que você está me obrigando a passar! Não gosto de
nada disso, não gosto de como as coisas aconteceram antes e
gosto muito menos de como estão acontecendo agora! Mas eu
preciso desse maldito emprego e não custa nada admitir que
precisa de mim para limpar a sua barra! — pontuo, firmando o
indicador contra seu peito.
— Eu não ligo — sussurra, com a respiração ofegante. — Não
ligo para o quanto você está magoada. Escolheu me deixar para
trás quando foi para Milão. Não tente colocar a culpa em mim.
— Você não se arrependeu do que fez!
— Não, porra! Não me arrependi e não me arrependo!
Retraio os ombros, talvez porque já faz quatro anos da nossa
conversa sobre Nicola e pensei que durante esse tempo, Ashton já
tivesse reconsiderado seu posicionamento quanto ao que
aconteceu, mas, olhando para ele, para a sinceridade circundando
seus olhos, tenho ainda mais certeza de que ele nunca irá se
desculpar. Isso me magoa e fragiliza profundamente porque, antes
de termos tido sentimentos um pelo outro, éramos amigos e achei
que poderia haver consideração por esse lado.
— Se você entender e aceitar que eu sou assim e não vou
mudar por você nem por ninguém, talvez consiga seguir em frente.
— Diminui o tom. Acho que nunca senti tanta transparência em
Ashton quanto nesse momento. — Não me arrependo de ter te
deixado para trás para ajudar uma pessoa que é importante para
mim.
— Você está fazendo da minha vida um inferno porque não
consegue aceitar que assinei esse contrato, mas consegue largar
tudo por ela? Consegue perdoá-la por ter te traído? — Franzo o
cenho, confusa. — Por quê? Por que é tão fácil para você me odiar,
e não odiar ela?
— Porque ela tem uma parte de mim que você nunca terá! —
Ele aponta para mim com o indicador, como se fosse me fazer
entender. — Porque eu a amei de um jeito que nunca amei você ou
qualquer outra pessoa. Porque Nicola carrega com ela todas as
minhas dores e, por mais difícil que seja encarar que ela foi egoísta,
não posso ficar com raiva dela.
Minhas lágrimas, meu choro, minha vontade de socá-lo, tudo
desfalece em um segundo. Ele é difícil de entender, difícil de amar,
difícil até mesmo de gostar. Mas estive cercada por pessoas
problemáticas. Sei que elas são o que são baseadas naquilo que
têm como vivência. Se Ashton só teve o amor de uma única pessoa
e essa, acredito que seja Nicola, jamais vai demonstrar ingratidão.
Ele a ama como uma forma de compensação. Porém não significa
que eu não esteja arrasada da mesma maneira, com o sentimento
de rejeição.
Fungo, ainda que tenha conseguido contornar o choro.
— Quero te ajudar a recuperar sua reputação e quero que me
ajude a me estabelecer na minha carreira. Portanto, vamos fazer
dessa forma. E, Ashton, não me toque mais.
Passo por ele, apertando os olhos para atenuar a visão.
— Nunca toquei em ninguém que não quisesse ser tocada. —
Detenho os passos, firmando-os no chão dentro das minhas
sandálias. — Você só precisa dizer não. E você não diz.
Giro na ponta dos pés, voltando-me para ele.
— Talvez eu dependa do seu toque — arrisco a sinceridade,
olhando para dentro de mim. — Assim como você depende do que
sente por Nicola. Não sei o que ela sabe sobre você nem qual a
parte feia que ela amou e que acha que deve compensá-la por isso.
Mas qualquer dependência só leva a um único destino: a perda de si
mesmo. E eu não pretendo me perder de mim por sua causa. —
Respiro fundo. — Quer que eu desista do contrato? — Sustento seu
olhar, esperando por uma resposta. Ele, por outro lado, não
responde. — Que bom que se decidiu.
Volto a andar pelo hotel, então estagno outra vez quando o
ouço dizer:
— Não é uma trégua. — Ele trança os dedos nos meus,
apertando com mais força que seria necessário. — Você ainda me
dá nos nervos — uiva, a voz pesando de raiva.
— Me odeie com tudo que tem, Ashton. Porque vou fazer o
mesmo.
“Porque eu nunca me trataria como uma merda
Você me fez odiar essa cidade”
HAPPIER THAN EVER – BILLIE EILISH
MILÃO, IT.
3 ANOS ATRÁS
QUARTA-FEIRA, 18 DE AGOSTO DE 2021, ÀS 08H13MIN.
MIAMI, FL.
DIAS ATUAIS
7 ANOS ATRÁS
QUARTA-FEIRA, 05 DE JULHO DE 2017, ÀS 00H23MIN.
Gravity:
Quando chegar aqui, prometo te explicar tudo.
Essa foi a resposta que dei à Mackenzie quando a informei
que havia me mudado para o Brooklyn Heights e convidei a ela e às
outras para virem hoje à noite. Mack enviou um polegar confirmando
que tinha entendido e passei a localização junto da mensagem,
embora tenha certeza de que Bryan sabe exatamente para onde
Ashton e eu nos mudamos.
Deixei meus rastros no quarto de Ashton. Não acho que
minhas amigas vasculhariam atrás de provas de que o que estamos
dizendo é verdade, contudo, também não quero abrir chances para
ser questionada.
Existe uma pequena probabilidade de acreditarem na mentira,
mas não vou me apegar a ela. Sendo sincera, não estou totalmente
de acordo em esconder esse casamento de fachada delas. Mas
também quero fugir do dramalhão que vão criar em cima disso se
souberem. Consigo ouvir o discurso ensandecido de Mackenzie, a
bronca de Delilah e, para ser honesta, acredito que Effy me apoiaria,
entretanto, otimismo sempre é o que mais me irrita nas pessoas.
Quando a situação está ruim, devemos encarar o fato como
realmente é. E a minha com Ashton é péssima. A gente se odeia.
Briga na maior parte do tempo e não posso mentir que as bolsas
roxas cercando ao redor dos meus olhos não têm influência daquele
imbecil insensível. Meu vocabulário está cada vez mais maçante
porque não tenho outros nomes para descrever o sentimento
crescendo na base da minha espinha e explodindo em dores de
cabeça.
O céu começa a se colorir de um laranja acentuando,
ampliando-se no horizonte, e entranha a janela, realçando a
madeira do piso do quarto principal.
Como trouxemos minhas roupas e produtos pra cá, precisei
me arrumar aqui. Um rubor quente desenvolvendo do alto das
minhas bochechas cresce e as cobre por inteiro porque acabei de
sair do banho.
Escovo as mãos pelo vestido preto, descobrindo como o tecido
evidencia meu quadril largo, abraçando meu corpo. Já faz um tempo
que não desenho nada pessoal, é um modelito antigo, inclusive, um
dos que fiz em Milão. Ele é mais curto que os outros dentro do
armário, seu comprimento termina onde minhas coxas começam e
há uma abertura de uns cinco centímetros na lateral esquerda.
O brilho do vestido ressalta de acordo com a exposição à luz.
As alças são duas tiras finas do pano e ele tem um vasto decote nas
costas. A ponta do V do corte surge na base da lombar e se alarga
até as escápulas, descortinando a pele bronzeada de sol no meu
torso. Solto os cabelos dos grampos, ondas fluindo por sobre os
ombros. Minha franja faz uma curva dos dois lados e fixo as pontas
com presilhas.
O som do chuveiro cessa, indicando que Ashton acabou seu
banho.
Termino de calçar as sandálias de salto e prendo as tiras ao
redor das panturrilhas, mas acabo me enrolando na hora de colocar
os brincos.
Prestes a sair, a porta do banheiro abre, e Ashton aparece no
corredor que conecta ao closet. Pingos de água embalam sua pele
pálida dos ombros, descendo para o peito e abdômen. Pigarreio,
fugindo com os olhos para outra direção, me recordando da última
vez que o vi seminu. Nada mudou, exceto pelo fato de que o acho
um ser desprezível, porém gostoso demais.
— Já estava de saída — alerto-o, começando a me
encaminhar para fora do cubículo.
— Tenho que te entregar uma coisa. — Ele me para, a voz
rouca retinindo dentro da minha cabeça.
Ouço o bramido de uma gaveta abrir e fechar. Em seguida, o
calor do seu corpo se aproxima do meu.
— Se começar com suas gracinhas, juro por Deus, Ashton…
— Você não cansa de me ameaçar em vão?
Sua risada irônica vibra em minha coluna quando se aproxima
mais. Resisto à vontade de me virar e brigar com ele. Sinceramente,
a ineficácia da discussão se provou ser mais forte do que minha
vontade de fazê-lo engolir tudo que diz.
— Não concordo com o comprimento do seu vestido, mas está
muito bonita, encrenca.
Outro sorriso cáustico replica dentro do cômodo apertado.
Reviro os olhos tão forte que por trás deles dói, e começo a
acreditar que podem saltar para fora se eu passar mais tempo com
Ashton, ouvindo seus comentários absurdos.
Meu corpo entra em defensiva quando estamos por perto. Meu
consciente já entendeu que minha necessidade física é um
problema e a razão sempre perde para a vontade de ser tocada.
Especialmente quando o homem em questão sabe onde pode me
desestabilizar.
Prendo a respiração, os pulmões reclamando quando não
conseguem exalar. A pele se arrepia onde a ponta dos dedos
acaricia meu pescoço. O toque é gentil e inocente, porém, uno as
coxas com força, prendendo minha excitação para não ser a
responsável por minha estupidez outra vez.
— Você não tem que concordar com porra nenhuma —
censuro, minha voz áspera ecoando entre nós dois.
— Eu sou ciumento.
— Esse problema não é meu.
— A partir de agora, é.
Espalmando minha barriga, ele crava os dedos por sobre o
umbigo e encaixa o nariz em minha jugular, aspirando minha pele
como se fosse um viciado. O tecido se embola entre os dedos
afincados, e a proximidade do seu corpo e a essência do pós-barba
vinculado ao xampu embaralham meus sentidos com tanta
facilidade, que mentalmente estou amaldiçoando a porra do mundo
inteiro. Ainda anestesiada pelo toque, Ashton concentra sua força
no braço ancorado ao redor de mim e com um movimento violento,
me desloca para junto do seu tórax.
— O que foi que você disse sobre eu nunca mais te tocar? —
O desgraçado ri contra minha pele, o calor do seu hálito
corroborando para me aquiescer. — Assim perde a graça, Gravity...
Gostava mais quando você fingia ser difícil. — Suspira com
decepção e, em seguida, está afastando meu corpo do seu.
Raiva se avoluma dentro de mim, ondulando conforme sua
mão volta a escorregar para o meu pescoço. Ele o aperta antes que
um material gélido se choque com o calor da minha pele.
Desço os olhos para acompanhar o que está acontecendo e
um pingente transcorre em meu colo. É um coração partido. Ashton
sobe com o objeto e ele fica como uma gargantilha. Viro-me quando
termina de colocá-lo em mim, flagrando-o pôr outro em si mesmo.
— É um presente — conta, e eu atravesso por ele, indo
verificar no espelho. É metade de um coração de prata pura e nele
está gravado “Ash”.
Franzo a testa, me voltando para ele.
— É uma coleira — acuso, e olho para o pingente igual ao meu
pendendo em seu pescoço. A outra metade do coração está
gravado com “Vity”.
— Faria sentido porque você é mesmo uma cadela.
Minha mão voa antes mesmo de a consciência me impedir de
fazê-lo. A palma arde com a bofetada, mas uma parte ampla de mim
está feliz por ter reagido. Tenho escutado e aguentado todas as
porcarias saindo da boca dele porque ainda tenho esperança na
pessoa que pensei ter conhecido, mas existe um limite e ele já
ultrapassou o meu há muito tempo.
A vermelhidão na lateral de seu rosto cresce, formando um
vergão. As narinas estendidas manifestando a raiva que deve estar
sentindo de mim. Imponho meu corpo, meu busto subindo e
descendo em uma respiração desnivelada.
— Quer me odiar? Odeie. Mas odeie em silêncio. Odeie dentro
do seu mundinho perverso, só não me afunde com você. Estou
tentando me restabelecer, encontrar meu caminho e sinto muito que
eu seja a responsável por trazer de volta seus fantasmas, mas estou
cansada de ser humilhada! Não estou esperando um pedido de
desculpas porque você não reconhece nenhum dos seus erros, mas
pelo menos me deixe fazer o que está me pagando para fazer sem
desejar te matar a cada segundo do meu dia! — esbravejo,
gotículas de saliva respingando em seu rosto enquanto grito.
— Me bata de novo — tomando meu pulso, ele me arrasta, e
espalmo seu peitoral para impedir a colisão — e eu vou comer essa
boceta tão fundo, que você não vai conseguir andar.
— Você está se ouvindo?
— Muito claro e em bom som, Gravity. Estou preso a você por
malditos oito meses. Sabe como eu lido com meus problemas?
Fodendo. Tenho feito isso há anos e por sua causa, não tenho meu
consolo.
— Então, esse é o problema? Não ter sexo?
— Não só esse, como não consigo superar você ser uma
maldita sanguessuga.
Entreabro os lábios, a voz desaparecendo por sobre o som do
telefone da recepção tocando. Aperto os olhos com força, um
suspiro carregado fluindo da minha boca.
— Quer saber o meu ponto de vista dessa situação? — Ashton
não responde, mas as íris escuras se concentram em mim. — Você
odeia não conseguir esconder que me quer. Você não suporta que
não consegue me odiar inteiramente, que uma parte, de algum jeito,
consegue controlar todo o resto, e não é de ódio que estamos
falando. E o que te enfurece ainda mais é saber que não estou nem
um pouco interessada em você, nos seus joguinhos ou na porcaria
do seu drama! — guincho, minha boca flutuando por cima da sua,
nossos olhos faiscando em puro sangue e raiva. — Você estava
empenhado em me fazer ficar apaixonada por você, mas tudo que
conseguiu até agora foi meu desprezo genuíno.
— Eu sei que te deixo molhada! — Raiva ferve em seus olhos
e faz seu corpo tremer.
— Me deixa molhada? — Inclino a cabeça para trás, a
gargalhada repercutindo no closet. — Você pode me excitar, mas
não pode ter meu coração, e homens como você não querem só
excitar, querem que estejamos entregues de corpo, alma e paixão.
Me diz, como é saber que eu sou a única a cruzar o seu caminho
que não está se rastejando pela sua atenção? — Ranjo os dentes,
retorcendo meu pulso até que esteja livre do seu agarre. — Só está
agindo feito um babaca porque sabe que estamos presos pelo
contrato, mas não espere que eu continue na sua vida quando ele
acabar. Eu espero nunca mais ter que olhar para você, Ashton. Você
vai morrer para mim.
Pego meu celular que deixei em um dos vácuos do closet, o
contorno e ando apressada para fora do quarto. O telefone parou de
tocar, mas confiro minhas mensagens e tem uma de Mackenzie
dizendo que estão no saguão esperando autorização para subir.
Ligo para a recepção e permito a entrada.
Nos breves segundos esperando recebê-los aproveito para
respirar, a ardência se acumulando no fundo dos meus olhos
enquanto seguro meu quadril com as mãos. Empurro a cabeça para
trás como se fosse impedir as lágrimas. Continuo insistindo na
tentativa esquisita porque se manchar o rímel, será um prato cheio
para Mackenzie me impelir a uma confissão.
Encaminho-me para o hall quando ouço o apito do elevador.
Pressiono com a ponta dos dedos a linha d’água dos meus olhos e
desenho um sorriso no rosto no momento em que as portas se
abrem. Eles estão quase empilhados, mas meu coração pulsa em
euforia ao vê-las. Effy, Mackenzie e Delilah saem primeiro, as três
correndo em minha direção para me cercar com um abraço
aconchegante. Merda, estou tão feliz em vê-las.
Soluço, o grave do meu choro replicando na entrada do
apartamento.
— Ei, por que esse choro? — Delilah ri, afastando-se do
abraço para me estudar. A testa franze para mim. — Você está
mesmo emocionada de nos ver? — Semicerra os olhos com um ar
de suspeita, mas sei que está só sendo insuportavelmente
provocadora.
— Pobrezinha, eles deram muito trabalho? — Mackenzie espia
por sobre o ombro, lançando um olhar enviesado para Bryan. — Ou
você já se arrependeu de ter aceitado namorar com o Ashton? —
sussurra, voltando para me analisar com apreensão.
Caio na risada, engolindo o choro, e puxo para abraçá-la outra
vez. Um ano. Faz um ano que não as vejo pessoalmente. E,
sinceramente, depois de Milão, passei a apreciar os momentos com
as pessoas que me amam de verdade. Estive cercada por falsidade,
brigas e disputas, é bom estar no meio de quem não tenta te
machucar, para variar.
Um suspiro de alívio por estar outra vez com minhas melhores
amigas exala de mim e, dessa vez, ele é sonoro. Puxo Effy e Delilah
para junto, nós quatro emboladas em um monte humano no centro
do saguão enquanto os outros começam a entrar. Desisto de não
borrar a maquiagem e quando paro de abraçá-las, pressiono com os
dedos nas trilhas que as lágrimas fizeram no rosto.
— Mas o que é essa coisa? — Delilah cochicha, espremendo
as pestanas enquanto estuda a metade do coração pendendo do
meu pescoço. — Você está usando um colar com o nome dele?
Sério? Você? — Espanta-se, a boca se abrindo em um O perfeito.
Tess me cumprimenta com um aceno e segue Chase para o
fundo do apartamento. Estou pronta para receber o interrogatório
das minhas amigas ali mesmo.
— Pode apostar que ela está! — Effy gargalha, apanhando o
pingente entre os dedos. — Olha só, parece ser prata mesmo.
Aposto que ele te forçou a usar.
— Gravity, pisque duas vezes se for um pedido de socorro —
caçoa Mackenzie, cruzando os braços. — Porque você não pode
estar esperando que nós acreditemos nesse showzinho!
— Não é um showzinho — enfatizo, girando e rumando para o
sentido que os meninos seguiram.
Effy ancora o braço no meu cotovelo, seus lábios firmados em
um sorriso gentil. Amo tanto essa garota que dói.
— Estamos em um relacionamento. — Tento ser convincente,
mas ela me encara com os olhos cerrados, então não tenho certeza
se estou sendo expressiva demais e minhas feições acabam por me
entregar. — E estamos felizes — prossigo, fixando minha atenção
nela.
— Ainda parece que estamos num universo paralelo. —
Delilah me inspeciona, as íris azuladas estreitadas sobre mim. —
Tipo, você Gravity Monaghan, superou o que ele fez em Paris e, em
menos de duas semanas, o relacionamento de vocês avançou de
uma segunda chance para isso? — Repara ao nosso redor, se
referindo a estarmos morando juntos.
Solto uma risada consternada porque Delilah tem razão.
Caramba, não quero mentir para elas. De jeito nenhum. E está me
aborrecendo fazer por causa dele.
— Não foi em duas semanas — contra-argumento, sem
desviar do destino, que é a sala onde os meninos já escolheram
seus lugares e estão se acomodando. — Ashton me procurou logo
que me mudei para Nova York. Foram muitos nãos antes que eu
dissesse sim.
— E por que você nunca nos disse nada? — Effy apura, as
duas bolas amendoadas que fundem seus olhos pairando sobre
mim com um ar curioso. — Ashton me explicou que não atendeu às
minhas ligações em Paris porque surgiu uma emergência pessoal.
Mas quando você finalmente nos contou o motivo, sério, não achei
que fosse conseguir perdoá-lo. Você é muito seleta nos
relacionamentos e sempre brigou comigo por causa do Finnick.
Minha decisão de abrir o jogo com elas sobre Ashton veio logo
antes de me mudar para Milão. Foi uma longa conversa no dia em
que peguei o voo para a Itália, que acarretou nelas chocadas e
também magoadas com ele por causa da mentira e por nunca ter se
desculpado pelo que aconteceu.
Delilah tem raiva de Ashton pelo que falou dela, mas também
tem um leve ressentimento por minha causa. Ele contou a versão
dele dos fatos e, quando contei a minha, somada à mágoa que ela
já estava sentindo, imagino que foi como uma bola de neve
crescendo.
— E com a gente por causa do Bryan e do Aidan. — Delilah
acrescenta, apontando de Mackenzie para ela, as suspeitas se
ampliando a cada pretexto. — Vocês estão juntos por outro motivo
— declara, com a testa franzida. — Conheço o Ashton. Ele é
orgulhoso pra caramba. Ele não se desculpou com você. O que está
acontecendo? — Estanca no lugar, forçando-me a parar também. —
Viemos até aqui porque estamos preocupadas com você.
— Não tem nada com o que se preocupar — asseguro,
forçando uma risadinha na qual elas não confiam. — É sério, nós
realmente estamos juntos. — Dou ênfase à palavra, minha
respiração despencando a cada pressão.
— Você não mentiria pra gente, certo? Se estivesse com ele
por outros motivos, contaria? — Mackenzie me examina, como se
fosse capaz de pescar alguma coisa de mim se estiver apreensiva,
entretanto, já escondi coisas piores dela e não estou esperando que
um dia descubra. — Então, vamos supor que vocês estejam juntos
porque estão apaixonados, por que rápido desse jeito? — Cruza os
braços, e a cada segundo, sinto-me mais encurralada.
— Deus do céu, não foi repentino. Ele me procurou e eu o
rejeitei. Por isso ele estava transando com qualquer pessoa.
— Ashton transa com qualquer pessoa, independentemente do
motivo. — Delilah avança um passo, revistando meu semblante
apático.
— Ele estava descontando a raiva, Delilah. Você não o
conhece tão bem. Vocês sequer eram amigos de verdade porque,
sinceramente, não estão se falando até hoje! — Minha explosão
repentina é um atalho para escapar do interrogatório. Embora
estivesse preparada, não esperava que fosse tão súbito. — Se
vocês ficassem com raiva de mim e me ignorassem por quase três
anos, estaria surtando! Ele é bem de boa quanto ao rompimento de
vocês.
Delilah recua, e, nesse momento, vejo que a atingi em um
ponto sensível, o que, honestamente, não estava esperando. Ela
sempre se mostrou determinada quanto a continuar distante dele,
como se quisesse ensiná-lo uma lição valiosa, mas ao conectar
meus olhos aos dela, vejo a profundidade do quão magoada está.
Talvez não tenha mais nada a ver com o que Ashton disse, e sim ele
nunca tê-la procurado de verdade para tentar consertar as coisas. A
amizade deles era importante para ela. Agora estou começando a
achar que mais do que era para ele.
— Você sabe se cuidar muito bem.
— Delilah, me desculpa, só estou dizendo que é exagero
vocês desconfiarem de mim. Estamos juntos. Estou feliz e quero
poder contar tudo para vocês sem sentir que estou cometendo um
erro enorme dando uma chance a ele.
— A gente faz você se sentir assim? — Effy tenta entender.
— Às vezes, sim. Vocês estão desconfiando da veracidade do
meu relacionamento e isso me chateia — digo com sinceridade. —
Amo vocês e como minhas melhores amigas, quero o seu apoio.
— Só quero que você veja do nosso ponto de vista. Foi, sim,
repentino. Nunca disse que Ashton estava por aí atrás de você e
muito menos que estava considerando tentar um relacionamento
com ele. Então…
— Amor.
Sobressalto com a voz rouca imperando às minhas costas.
Viro-me devagar rumo ao som gutural, Lilah, Mack e Effy
acompanhando a direção da minha atenção. Ashton está de calça
jeans e camiseta básica branca, os bíceps e o peitoral quase
rompendo a malha fina com os músculos proeminentes.
Trago o nó de chumbo fechando a garganta quando o vejo se
aproximar. Por alguns minutos, esqueci da nossa discussão e do
tapa que dei nele, ainda que minha palma esteja ardendo e o rastro
vermelho siga intacto em sua bochecha, tamanha a força com que o
golpeei.
Amor.
Que apelido mais ridículo e nada original.
Noto a sobrancelha de Delilah arcar para ele.
— Amor? Sério? — Mack cochicha para uma delas, e me
esforço para sorrir.
— Oi — cumprimento ao sentir a fragrância do seu perfume
amadeirado encher minhas narinas quando cobre meus ombros
com o braço. — Já estava indo te encontrar.
— Oi para vocês. Sentiram tanta saudade que precisaram vir à
Nova York? — brinca, sorrindo, e a covinha marca o canto esquerdo
de sua bochecha.
— Na verdade, vim verificar se você não tinha sequestrado a
minha amiga e estava mantendo ela em cativeiro! — Delilah replica,
juntando os cílios grossos para fitá-lo.
— Você pensa tão mal de mim. — Ele estala a língua no céu
da boca, a gargalhada ondulando seu peito.
— Já me deu todos os motivos para pensar pior. —
Contornando-o, marcha para onde os outros estão reunidos,
conversando e já com cervejas nas mãos.
Fazemos um minuto de silêncio, Ashton a acompanhando por
cima do ombro com um vinco separando sua testa.
— Oi! — Effy exclama, dando saltinhos em direção a ele.
Ashton me solta para abraçá-la, os dois se aconchegando um
no outro e balançando para os lados. Ele pousa um beijo no topo da
cabeça dela, inspirando o perfume familiar de melancia do protetor
labial que Effy usa há uns bons anos. A forma como Ashton trata
Effy é diferente. Ele lida com ela com tanto carinho e cuidado.
Um desconforto se manifesta no âmago do meu estômago, um
laço envolvendo minhas entranhas. O jeito como Ashton me trata é
totalmente o oposto da maneira como a está tratando e uma coisa
me ocorre: já cheguei a pensar que ela era apaixonada por ele e ele
por ela. Mais de uma vez essa dúvida se levantou, mas Effy sempre
negou. Partindo dela, tenho certeza que não, mas e dele?
Presenciando como Ashton cuida de Effy, a suspeita se
amplia. Ele é sempre educado e paciente se tratando dela. Não usa
palavras feias nem tenta magoá-la de propósito.
Cruzo os braços na frente da barriga, como se isso fosse
travar a inquietação. Abaixo a cabeça, esperando os dois
terminarem. Mackenzie também o cumprimenta com um abraço,
mas não é nada tão prolongado como com Effy. Ambas começam a
se afastar, Mack nos observando por sobre o ombro.
Minha boca se curva, desenhando o sorriso para consolá-la.
— Amor? — murmuro baixinho por entre os dentes cerrados.
— Seja mais original. E você fica cafona.
— Todo imbecil apaixonado é cafona — troveja, com a
mandíbula contraída. — De nada por te resgatar.
— Estava indo muito bem, então não preciso te agradecer.
— Você me deixou falando sozinho de novo.
— Já tínhamos terminado.
Estamos chiando um com o outro, falando baixo para não
sermos notados, mas ora ou outra, Mackenzie relanceia suas vistas
para nós, consequentemente me deixando perturbada.
— A palavra final tem que ser a sua?
— Você se incomoda por não ter sido a sua — retalio,
endireitando o corpo. — Encontre um jeito de se sentir confortável
com como a conversa acabou porque não vamos mais brigar.
Cansei de você.
Meus pés se movem primeiro, corrigindo o destino para junto
deles, mas meus passos são detidos pelos dedos de Ashton
rodeando o cotovelo. Meu corpo retrocede poucos passos para
atrás e, girando-me para que seus olhos estejam sobre mim,
murmura, a boca ameaçando me devorar:
— Qual é o seu objetivo, hum? Me enlouquecer?
— Nada do que eu faço tem a ver com você, mas o seu ego
quer que seja o contrário — retruco, a mesma ira que nubla suas íris
encharcando as minhas.
Ainda que esteja com raiva, noto que a dele é diferente.
Ashton não deixa rachaduras. Nada que possa ser usado contra ele
porque quer estar por cima na maior parte do tempo. Mas a
hostilidade do nosso relacionamento mexe com ele. Deixa-o
indefeso, e consigo enxergar, mesmo que com muita dificuldade,
que nossas discussões são suas partes favoritas. Ele fica com
tesão. É o jeito que encontrou de chamar a minha atenção porque
desde que decidi não estar mais em sua vida, estive indiferente a
tudo que fosse relacionado a Ashton Baker. Fiz meu papel com
primor. Durante os quatro anos, foi como se nunca nada tivesse
acontecido entre nós e na sua presença eu sequer fazia questão de
reparar.
— Me irritar é o seu jeito de conseguir minha atenção? Se quer
que eu te veja, aja como um adulto, para variar. Estou cansada de
lidar com um moleque mimado e mesquinho.
Solto o braço, tornando a marchar para perto dos outros.
Não olho para trás para conferir se Ashton se move, mas sua falta
de palavras diz que não estou totalmente errada.
“Começou com uma faísca depois virou um incêndio!
Me queimando, me consumindo”
RESENTMENT – A DAY TO REMEMBER
Sabia que tinha algo errado comigo quando era mais novo,
mas nunca entendi o que nem o porquê. Eu não tinha amigos.
Nenhum. Não confiava nas pessoas. Não acreditava que elas
poderiam nutrir nada real por mim.
Então, por que perder meu tempo criando laços, sendo que, no
fim, eles se romperiam? Evitar a dor é a minha fuga. Evitar o
problema é poupar meu cérebro da exaustão ao tentar compreender
aquilo que não consigo controlar. Meus próprios sentimentos são
bagunçados. Mal consigo me entender, quem dirá gastar minha
energia para entender os outros.
Mas quando conheci os caras, me vi criando raízes. Foi
intenso pra caralho recebê-los na minha vida. Chase pode ter
crescido sem conhecer os pais biológicos, mas encontrou um lugar
onde era amado.
Meu pai achava que estava me criando para ser dono do seu
império e minha mãe vivia em sua luta diária para agradá-lo. Dentro
da minha casa, sentia como se tivesse nascido por um único
propósito e era ser o herdeiro da Baker’s.
Demorei para entender que as poucas coisas com as quais me
sinto seguro, são aquelas onde deposito o meu esforço.
Nicola. A primeira garota que amei de verdade e também
minha primeira melhor amiga. É difícil para mim até hoje, depois de
anos de término, ficar com raiva dela. Ela me fez entender que eu
podia encontrar pessoas em quem me apoiar e confiar.
Porém minha cabeça já estava fodida, tentando assimilar o
que eu havia me tornado e aceitar quem eu era quando descobri
sobre sua traição. Algo dentro de mim quebrou de tal maneira que
não consegui reconstruir.
Podia revidar os socos do meu pai, mas não sabia como
retaliar com Nicola. Não quando ela tinha estado comigo por quase
quatro anos e, sinceramente, não acredito que tenha sido uma
mentira completa.
Começamos como amigos, depois ficamos juntos, e meu pai
ofereceu a ela uma oportunidade. Em troca, Nicola tinha que me
deixar.
Segundo meu pai, ela era a responsável por eu não estar
levando a sério minhas obrigações como herdeiro do império
Baker’s, portanto, precisava se livrar dela, e Nicola nem hesitou ao
aceitar ser o rosto de uma coleção limitada de joias. O que implicava
a uma única conclusão: ela não me amava o bastante para lutar por
mim.
Foi dessa forma que descobri que não importa como ou
quando, se o seu coração está em outro lugar que não seja focado
em si mesmo, você se torna um alvo fácil.
A The Reckless me magoou, mas eles sempre lutaram por
mim, e luto por eles com a mesma determinação. Eu retribuo o que
recebo. Aprendi que minhas ações dependem das ações dos outros,
é como consigo me defender daquilo que me fere. É a minha
película protetora revidar.
Ouço os passos acima da minha cabeça, portas abrindo e
fechando. Minha mente retorna para o tempo atual. Minha boca se
curva, um sorriso de divertimento sendo moldado a cada movimento
de Gravity no primeiro piso.
Minha maldita futura esposa, que consegue ser o caos quando
quer. Se soubesse que a raiva é a única resposta que encontrei
para encarar as outras sensações que desperta em mim,
estaríamos caminhando para outra direção.
Gravity é o meu gatilho. A responsável por eu estar procurando
por algo desesperadamente e não encontrar. A idealização de que
tenho o direito de ser amado como todo o resto.
Finnick é um fodido. Talvez até mais do que eu, e Effy o ama.
Ela nunca parou de amá-lo. Por que eu tenho que viver em uma
realidade onde as pessoas me menosprezam? Ou só ficam comigo
quando precisam de dinheiro ou sucesso?
Bebo o máximo que consigo da cerveja, conferindo que já se
passaram dez minutos e ela ainda não encontrou um bom lugar
para se esconder.
Como disse, reajo de acordo com as ações dos outros comigo.
Gravity me provocou. Enviou aquela última mensagem como um
teste, e eu passei. Estou aqui, pronto para tê-la, assim como ela
está louca para ser possuída.
Vou lidar como o “homem” que meu pai supostamente me
criou para ser e pegar o que eu quero. Está bem esclarecido que
Gravity e eu temos uma obsessão um pelo outro. Ela vem
florescendo muito antes de Paris e o que tivemos na França foi uma
pequena dose de tudo o que poderíamos conseguir juntos. Ela e eu
vamos colidir e explodir a porra do mundo.
Ela é minha, fim de papo.
Não porque quero provar que posso tê-la sob meu domínio —
ok, talvez isso também —, mas principalmente porque Gravity é o
ponto colorido na minha história sombria.
Gravity não me traiu. Não mentiu para mim. A culpa não é dela
que Nicola fodeu com a minha mente e me tirou a chance de ter um
relacionamento de verdade. É claro que esse contrato é motivo mais
do que suficiente para odiá-la, contudo, não significa que não posso
tirar proveito disso.
Não vou ficar satisfeito enquanto Gravity não estiver
completamente rendida por mim.
Mexo na tela do meu relógio, quinze minutos. Ela teve
bastante tempo para se esconder. Finalizo a cerveja, devolvendo a
garrafa para a superfície de mármore da ilha. Salto da banqueta,
assobiando enquanto acomodo as mãos dentro dos bolsos da calça
jeans.
Subo lentamente pelas escadas, seguindo o rastro do seu
perfume de verbena. Ela não economizou, não é? Queria estar
cheirosa para o Liam. Entorto a boca, reprovando sua tentativa de
ficar atraente para outro homem.
— Não gostei, Gravity. Para que tanto perfume para ele? —
Inalo o ar, aspirando com força.
Estagno no mezanino, observando as portas brancas com
maçanetas douradas fechadas. Encaro cada uma delas.
Garotinha esperta. Ela abriu e fechou várias delas para tentar
confundir minha intuição. Só que não tão esperta assim.
A fragrância de verbena me lidera até o último cômodo no
corredor e, sem conseguir conter a expressão maliciosa, empurro a
maçaneta para baixo e abro a porta do meu quarto, o trancando em
seguida. A chave faz um clique audível e a guardo dentro do bolso.
Enquanto percorro o quarto, começo a retirar minha jaqueta de
couro, lançando-a sobre a cama. Em seguida, estou usando a ponta
do pé direito no calcanhar esquerdo para me livrar dos sapatos.
Repito a ação com cautela, eu mesmo me espantando com a
paciência com que estou agindo.
Minha vontade era de tê-la jogado sobre os ombros, a trazido
pra cá, a comido na minha cama e permitido que Liam escutasse
tudo só para constrangê-lo, contudo, estou dando uma chance à
Gravity de admitir que me quer. Só para sugerir que tem algum
controle quando sou o assunto.
Eu a conheço bem o bastante para saber que a mensagem
que me mandou, respondendo à foto que postei com Harper, foi só
mais um indício de que está tentando se conter, sem nenhum
sucesso.
— Gostou de ter as mãos dele em você? — cantarolo com
uma risada atrás da voz. — Você sabe que sou ciumento com o que
me pertence, encrenca.
Abro a porta invisível do closet, me infiltrando pelo corredor.
Tateio a parede, atrás do interruptor, e logo ele está iluminado.
Minhas coisas estão no lugar, nada foi movido, mas o bálsamo de
seu perfume faz trilha no vestíbulo.
Viro para o corredor estreito que faz conexão com o banheiro
e, antes de chegar até ele, passos apressados vibram o chão do
quarto. Não engulo a gargalhada, sequer me esforço por isso.
Redireciono meu objetivo de volta ao quarto, a mesma
serenidade que tenho nos olhos expandindo-se para minhas
feições. Enfio as mãos outra vez na calça, atravessando o caixilho
do closet, e a vejo lutando contra a maçaneta para sair.
Tinha certeza de que iria apostar no meu quarto por acreditar
que esse seria o último lugar em que a procuraria. Na verdade, a
princípio, até pensei que ela poderia se esconder na sala de jogos
ou no ateliê, mas do meu ponto de vista, Gravity nem se esforçou.
— Se escondeu no baú da cama? — Encaro a tampa aberta,
estalando a língua no céu da boca. — Que decepção, estava
esperando mais empenho de você.
— Vai se foder, Ashton! Abre logo essa porta! — ordena, o
autoritarismo já me deixando excitado.
Não vou condená-la por me querer. Também estou louco para
beijá-la sem que seja uma obrigação contratual. Mais ainda para ter
minhas mãos passeando pelos seus peitos. Mais gostoso se Gravity
estiver com raiva por seu corpo responder a mim com tanta
resignação.
— Você perdeu.
— Perdi? — Sua gargalhada com asco incendeia o quarto. —
Você trapaceou, como eu disse que faria. Trancou a porta! —
exclama, balançando a maçaneta com violência. — Você não me
encontrou!
Desafivelo o cinto, enrolando-o na extensão do meu punho.
Aproximo-me dela, e Gravity empurra as costas contra a porta, a
respiração frenética forçando seu peito a se mover mais rápido que
o normal. Eu a encurralo com meu corpo, seus olhos serpenteando
por meu torso, a boca entreaberta liberando ondulações de ar
morno.
— Você me quer — sussurro, inclinando o tronco sobre ela.
Minha boca flutua sobre a sua, a provocando. Gravity umedece os
lábios, calor subindo e aquecendo suas bochechas. — Venha
buscar.
Apoio os cotovelos na porta sobre seus ombros, o cinto
farfalhando contra a madeira em suas costas. Forço meu joelho
contra sua virilha, as pernas se separando ao atender meu pedido
silencioso. Um sorriso rasga meu rosto.
— Publiquei aquela foto de propósito.
— Claro que sim — desdenha.
— É antiga. Não estava com a Harper. Passei o tempo todo no
saguão do prédio, esperando o Liam chegar.
Seus olhos crescem à medida que sua consciência capta a
explicação.
— Idiota! — rosna, os dentes cerrando para mim, e meu
sorriso amplia. — Você é patético.
— Sim, sim… Sou terrível. Sabia que você veria a foto e tinha
um palpite de que iria reagir. — Deito a cabeça para o lado, meus
olhos acompanhando a resposta quase imediata do seu corpo. —
Não pretendo sair com mais ninguém se você estiver na minha
cama todos os dias.
Ela procura por mim, seus olhos se prendendo aos meus,
intrigada.
— E espera que eu acredite? Ashton, não sou burra. Você diz
o que as mulheres querem ouvir e quando tem o que precisa, as
descarta — relata com orgulho, arqueando o queixo.
Impulsiono meu joelho até o limiar de sua boceta, o jeans
absorvendo a umidade. Desvio minha atenção para baixo, para ela
praticamente montada sobre ele e sua lubrificação marcando o
material áspero.
Crispo os lábios, exasperação assumindo o controle da minha
lucidez.
— Ficou sem calcinha para ele? — Aperto os dentes com tanta
força que os sinto cortar a gengiva.
— Ele tirou assim que chegou aqui. Ele a cheirou, lambeu e
sussurrou no meu ouvido o que pretendia fazer comigo enquanto
guardava minha calcinha como um prêmio.
— Quer testar meu nível de possessividade com você? — Meu
tom soa ameaçador, meus dedos cercando e fechando a curva de
sua cintura.
Gravity bafora em meu rosto, o hálito adocicado e tíbio.
— Já te disse para fazer o seu melhor — retruca, a incitação
compelida na provocação.
Afasto meu peito por poucos centímetros, o suficiente para
conseguir desenrolar o cinto do meu pulso. Gravity segue minha
mão se mover, curiosidade infiltrando através de seus olhos.
Enlaço a fivela em seu pescoço, tão depressa e com
habilidade que não deixo lacuna para ser questionado. Ela separa
os lábios, sinto as palavras verterem para fora de sua boca, mas
pressiono a minha própria e balanço a cabeça em negativa para
mandá-la ficar em silêncio.
Fecho o cinto, trazendo seu cabelo para frente e a fivela com o
fecho na nuca. O espaço entre o couro e sua pele é exíguo, regular
para o ar percorrer livremente.
— Que porra…?! — grunhe, uma mão voa para a cinta
enlaçando seu pescoço.
— Agora, sim, você está com uma coleira — escarneço,
distancio os olhos para não perder nenhum minuto de sua
fisionomia mudar. — E, nossa, você fica linda pra cacete assim,
encrenqueira.
— Solta isso, Ashton! Agora! — exige, a mão correndo para a
nuca.
— Se não parar quieta, vou amarrar suas mãos também —
sopro contra seu rosto, firmando o couro que sobrou em meu punho.
— Você gosta do meu lado obscuro — asseguro, as costas da
minha mão escorregam por sua bochecha. — Se não gostasse, por
que mentiria para mim, hum? Por que testaria o quanto posso ir por
você, se não estivesse ciente de como eu reagiria?
Imponho meu joelho outra vez entre suas coxas, forçando-a a
se abrir mais para mim. Minha mão afundada em sua cintura
delineia o caminho até a entrada de seu vestido. Quando roço os
dedos na pele, Gravity prensa uma perna na outra, retendo a
excitação para si.
Sorrio enquanto embrenho meus dedos por debaixo da saia,
sem afastar meu foco de seus olhos. Eles nublam ao passo que me
aproximo de sua carne quente e molhada. Espalmo o interior de
uma coxa, enterro meus dedos em sua pele, e Gravity objeta com
um gemido coibido.
— Quer ser uma vagabunda na cama? Então, você será a
minha vagabunda.
Mergulho meus dedos nos lábios carnudos, afastando e
friccionando enquanto sua umidade encobre minha mão.
— Gostou de como ele estava te tocando? Mas na sua mente,
quem dominava seus pensamentos era eu. Diga a verdade —
repreendo, beliscando o clitóris quando reprime o gemido ao morder
o lábio inferior e marcá-lo com os dentes. — Não precisa se conter
comigo porque você só tem que pegar o que já é seu. Só precisa
aceitar que quer ser a única a estar na minha cama.
Ela tenta se afastar me empurrando pelos ombros, mas não
movo meio centímetro da minha posição porque ela quer tanto
distância de mim quanto deseja que eu a coma.
Empunho o cinto com força, promovendo a privação de ar.
Gravity engasga, ruídos dela se debatendo rasgando nossa bolha.
Deixo-a respirar ao soltar o cinto e lágrimas escorrem do canto de
seus olhos.
— Ninguém precisa saber que quando fechamos essa porta,
você me deixa fazer o que eu quiser.
Volto a enterrar meu dedo, rompendo sua entrada. Suas mãos
se fecham em meus ombros, as unhas longas ultrapassando o
tecido frágil da camiseta para cavar minha carne.
— Cala a maldita boca! Quanto mais você fala, mais eu te
odeio!
— Me odeie pra caralho enquanto como sua boceta…
Solto o cinto, ajoelhando-me diante dela. Ergo suas pernas,
pondo seus joelhos dobrados sobre meus ombros. Forço a saia do
vestido para cima, embolando o material pequeno em seu quadril.
Minha boca cobre os lábios roliços de sua boceta, engolindo-a
em uma abocanhada esfomeada. Ela muda o foco de suas mãos
para enterrá-las em minha cabeça, enredando os fios nos dedos e
arfando alto com os ganidos que arranham sua garganta.
Os sons altos e agudos vibrando através das paredes
enquanto a como como se fosse a minha última refeição. Levo
minhas mãos para sua bunda, apalpando-a com vontade, a polpa
encaixando perfeitamente em minha palma.
— Céus... Puta que pariu, Ashton…! — vocifera, as mãos
puxando meu cabelo à medida que persigo seu orgasmo. — Assim,
uh, ah… — A rouquidão de sua voz é a coisa mais sexy que já ouvi,
puta merda.
Vagueio pelo centro, a aspereza da superfície da língua
estimulando os ruídos que ecoam dela. Comprimindo as pernas em
minha cabeça, sei que está perto de gozar. Não vou deixar. Não
ainda.
Afasto-me depressa, minha boca molhada de seu néctar.
Lambo tudo, assistindo à sua expressão catabolizar em revolta.
Coloco Gravity no chão e seguro novamente o cinto, usando a
outra mão para abrir o botão e o zíper da minha calça. Desço-a
habilmente com a cueca, meu pau duro galgando para fora. Os
olhos de Gravity pousam nele, nas veias sobressalientes sob a pele
fina e a ponta brilhando com o pré-sêmen.
— Pode vir, encrenca. É tudo seu.
Obrigo seu corpo a se mover com a coleira improvisada
circundando sua garganta com uma puxada. Gravity cai de joelhos,
respirando contra a glande vermelha do meu pau.
— Me engole inteiro, como uma boa garota.
— Não sou uma boa garota — murmura, respirando
arduamente.
— Nada que um bom adestramento não resolva — insinuo,
espremendo a risada na garganta.
“Eu sei que você me quer
Está em todo o seu rosto”
RIDE FOR ME – DANIEL DI ANGELO
Dirijo minha moto por Nova York, primeiro, sem saber o destino
e depois, estou costurando até o Village.
As luzes da casa estão acesas. Sei que meus amigos estão lá.
Só preciso de algumas horas com eles e algumas cervejas, para
relaxar e afastar minha raiva.
Se continuasse discutindo com Gravity, nossa briga não teria
fim. Nós dois temos personalidades que tentamos superar e não
gostamos de ser amedrontados ou desafiados. Gostamos do
controle. Embora esteja ciente de que quando o assunto é foder,
Gravity ama ser submissa. E descobri que gosto de domá-la. Ela só
precisa entender que temos isso em comum. Não precisamos ter
respeito um pelo outro ou estarmos apaixonados para trepar.
Dou duas voltas na rua antes de estacionar. É claro que um
jornalista ou outro pode estar à espreita. Não acessei as redes
sociais para conferir, mas a imprensa não perde nada quando o
assunto é alimentar os acessos nas mídias enquanto querem cuidar
da vida das celebridades.
O tempo dirigindo me forçou a entender por que estou com
tanta raiva. Queria que ela tivesse gostado mais de ter transado
comigo, mas o que ela fez? Ficou lá emburrada, reclamando. E com
razão, porque fui cuzão.
Estaciono a moto perpendicular ao passeio, descendo o pé e
acionando o alarme. Confiro aos meus arredores antes de galopar
escada acima, pegando a chave no fundo do bolso da calça.
Abro a porta, o cheiro de macarrão com queijo incinerando
meus sentidos. Fecho-a atrás de mim, retirando a jaqueta pesada
que costumo usar quando vou pilotar, e a penduro no cabideiro da
entrada, conversa fluindo da cozinha.
— Aquela pizza estava horrível! — Alguém reclama, só
reconheço a risada de Harper.
Esgueiro pelo corredor, a caminho da cozinha. Estão todos lá,
Harper, Tess e Delilah sentadas à mesa, uma garrafa de vinho
aberta e as taças cheias. Mackenzie, Bryan e Aidan na cozinha — e
só posso esperar pelo desastre com esses três assumindo o fogão
—, Chase e Finnick sentados nas banquetas, braços esticados e o
tronco inclinado sobre o balcão de mármore enquanto conversam
com os três do outro lado.
— Oi! — Tess estreita os olhos quando me vê. — Cadê a Vity?
— Estica o pescoço para tentar enxergar atrás de mim.
— Em casa — respondo, conciso, ponho o capacete e as luvas
de couro no chão, encostados na parede ao lado da porta. — Vocês
não tinham saído para comer?
— Pois é, a pizza estava uma droga. Ficamos com fome. —
Tess ri, alternando entre olhar para Delilah e Harper.
— Por que você a deixou em casa sozinha? — Mackenzie grita
por sobre o crepitar de algo fritando na panela diante dela. — Lilah,
liga pra ela — ordena para a loira com os olhos contidos em mim. —
Estamos todos aqui. É estranho ela ficar de fora.
— Ela não vai querer vir — falo para poupa-lá do esforço.
Puxo uma cadeira para me sentar.
— E por que não? — Aidan rebate, a testa marcada com uma
película fina de suor.
— Nós brigamos — cuspo sem constrangimento.
Harper me lança um sorriso amigável, como se me dissesse
que não há ressentimentos por eu ter começado a namorar e não a
ter comunicado.
Era para ser você.
— Vocês brigaram por quê? — Delilah redargui com um quê
de surpresa.
— Só queria umas cervejas com meus amigos.
Fujo da pergunta dela, em parte porque não quero me explicar
e em outra porque ainda estou com raiva por Delilah estar irritada
comigo. Isso é ridículo pra caralho. Ela costumava ser minha melhor
amiga.
— Vou pegar uma pra você. — Chase salta do banco para ir
até a geladeira. Ele a entrega à Tess, que faz seu truque de retirar a
tampa com os dentes, e posso vê-lo se apaixonar de novo. — Tá na
mão. — Estende a Budweiser, e degluto metade da garrafa, olhos
centrados em mim.
— A briga foi feia, hein? — Bryan zomba, me mirando por cima
do ombro.
— Não enche — murmuro, colocando a cerveja na mesa.
— Você está bem? — A voz aguda e preocupada de Harper
atingindo meus sentidos.
Minha parte vingativa quer puxá-la para perto e beijá-la. Jogar
na cara de Gravity que, se não está satisfeita comigo, posso
encontrar alguém que fique. Eu tenho tanta raiva, a maior parte do
tempo tentando contê-la e de alguma forma compreender o porquê.
Você cresce em um lar violento. Nos filmes, os pais violentos
são bêbados ou viciados, mas o meu? É bilionário, com uma
reputação, desfilando de terno e gravata. Ele é controlador. Quer
controlar sua carreira, sua esposa e quantos filhos precisa ter e
explicando por que a maioria deles precisa ser homem. Minha
cabeça sibila, confusa e atormentada.
Às vezes, me pergunto se em alguma das surras, acabei
batendo com ela em alguma quina e deformando uma parte
importante, que faria de mim uma pessoa decente.
— Ash? Tudo bem? — Harper repete.
Mas tudo o que eu quero é brigar. É ferir ou ofender. Meu
mecanismo mórbido de defesa é bater antes de apanhar.
— Sim, tudo.
Bebo de novo, sentindo a pressão sob a pele. O sangue
borbulha e efervesce, queimando como brasa. Não consigo
entender por que tenho pensado tanto nele ou em Nicola. Nem
sempre é assim. Talvez seja porque tenho estado irritado ou
magoado. Ou com medo.
Medo de quê?
— Irmão, tem certeza? Você parece pálido. — Chase observa,
fitando-me por entre os olhos cerrados. — A briga foi tão séria
assim? — sussurra, como se os outros não pudessem ouvir.
Então, empurro a cadeira com ímpeto, segurando a garrafa
pelo gargalo. Marcho para fora da cozinha, rumando para a escada,
e subo a passos apressados.
A porta do meu quarto está fechada, mas me dirijo para ele,
querendo ficar por um minuto em silêncio. Entro num impulso
intenso, caminhando para dentro do cômodo escuro; ainda com o
cheiro de perfume amadeirado, menta e couro salientes no ar. Ando
de um lado para o outro, inquieto, a cabeça fermentando meus
sentidos.
— Ash?
Ouço atrás de mim, minha respiração assumindo uma
inquietação disforme. Pisco para afastar as bordas escuras
crescendo em minhas vistas. Paro no meio do quarto, deixo a
cerveja no chão e levo as mãos para a cabeça. Atormentado. Tenho
me sentido assim. Com raiva de tudo e de todos. Com raiva de
Isabella Wren. Com raiva de Delilah. Com raiva de Gravity. Com
raiva do meu pai. Estou com raiva do mundo a ponto em que
poderia explodi-lo sem imaginar salvar ninguém.
— Ashton?
Sinto mãos pequenas apertarem meus bíceps e me puxarem
para baixo, para me sentar. Não vejo nada, só sinto a aspiração
afiada descascar minha garganta e em um ato de desespero. Abro a
boca, sugando com mais força ainda o ar. Um chiado agudo
retinindo do meu tórax.
— É possível que você possa estar tendo um ataque de
pânico. Por favor, tenta respirar mais devagar. Se concentra na
minha voz e na minha respiração, está bem?
Faço que sim, embora não tenha ideia de quem seja a pessoa
tentando — sem sucesso — encaixar meus músculos grandes
dentro dos seus braços finos, e sigo seu comando.
Fecho os olhos, suor aspergindo da minha testa e as laterais
da cabeça. A voz afetuosa serpenteando para dentro da minha
mente, alojando-se na minha consciência. Acompanho o ritmo
brando de sua respiração, tentando imitá-la, mas os tremores
crescem exponencialmente, varando meu corpo. Tilintar dos dentes
cerrados rompendo a minha bolha.
— Você está indo bem, calma.
Deixo o corpo cair para trás, cedendo ao cansaço e aos
espasmos musculares. Inalo profundamente, sentindo dor quando o
ar enche meus pulmões, porém, minha cabeça começar a querer
relaxar e a revolta interna parece estar estabilizando.
— Obrigado. — Mantenho os olhos apertados, minha nuca
sendo amparada pela borda do colchão.
Tomo meu tempo para reabrir os olhos e recobrar minha
postura.
Delilah está com os dedos entrelaçados aos meus, o que me
assusta pra caralho e me faz alarmar com o calor da sua mão na
palma da minha.
— O que está fazendo?! — inquiro, a voz apossando um tom
hostil.
— Oferecendo uma mão amiga? — Ela levanta nossas mãos
presas, arcando uma sobrancelha. — Está melhor?
— Sim. — Desfaço o enlace dos seus dedos dos meus,
cravando-os na cabeça e coçando o couro.
— Certo. — Exala, trazendo as pernas para junto do peito. —
Um de nós dois terá que dar o braço a torcer e estou vendo que não
será você. — Miro-a de soslaio, as duas íris azuladas fixas em um
ponto lúgubre do quarto. — Minha amizade foi importante para
você? Ou só servi para compensar a falta da Effy naquela época?
Porque ela estava focada no Finnick e se esqueceu de você.
Travo a mandíbula. Embora Delilah não esteja deixando
transparecer, mágoa obscurece o tom delicado de sua voz.
Mordo com firmeza, a arcada doendo à medida que os dentes
se firmam mais. Não admito meus sentimentos. A raiva causa terror
e, consequentemente, as pessoas começam a te respeitar por
medo, mas o amor? O carinho? Porra, é como convidar um estranho
para causar um estrago. Sei o porquê Delilah está magoada. Não
dei a importância que ela acreditava ter para mim.
Nunca pensei nela como uma compensação, mas existem
coisas que faço e não entendo por que estou fazendo, como estar
tão furioso com Gravity. Meu inconsciente numa tentativa de me
proteger pode estar vendo problema em tudo e me obrigando a agir
assim.
Se Delilah fosse como uma substituta para Effy, não me
sentiria tão mal por estar distante por causa do Finn. Faria sentido,
mas não fiz de propósito. Não dessa vez.
— Senti a sua falta — digo, simplesmente, não encontrando
nada melhor para responder à sua pergunta.
— Mas você continua se recusando a se desculpar. — Suspira
audivelmente, minha cabeça girando para encontrá-la olhando para
mim. — Eu vou te desculpar porque, no fundo, sei que você não
estava tentando me magoar, e sim expressar como se sentia sobre
a decisão de Aidan sair da banda para ficar comigo.
— Obrigado — rumorejo, umedecendo a boca. — Por isso e
por antes.
— Você, pelo menos, sabe agradecer. — Ela sorri, mas não de
felicidade. Não era exatamente como pretendia que essa conversa
começasse ou terminasse, sei lá. — O iPod do meu irmão ainda
está com você?
Franzo o cenho diante da sua pergunta. Ele está guardado no
armário, dentro de uma caixa. Tenho lembrança de tê-lo mantido ali.
Delilah queria queimá-lo e não ter de volta aquelas lembranças. No
momento, a única coisa que pensei foi que no futuro ela poderia se
arrepender e decidi deixá-lo guardado para quando o quisesse de
volta.
— Sim, está ali. — Gesticulo com a cabeça, apontando o
armário.
— Eu o quero de volta, se não tiver problema.
— Não tem.
Impulsiono o corpo para cima, indo em direção às portas
fechadas. Assim que o abro, exploro a parede à direita atrás do
interruptor. Não levei todas as coisas para o apartamento, mas não
sei mais se deveria ter decidido encaixotar tudo. Aidan e Delilah vão
morar juntos, presumo. Será só uma questão de tempo até Mack e
Bryan optarem por isso também. E Chase e Tess já estão falando
sobre futuro, casamento e filhos.
Essa porra é muita loucura e minha cabeça não consegue
acompanhar. Eles são meus melhores amigos. Minha família. A
única que me ama pelo que sou. Vê-los mudando suas prioridades,
como casamento e filhos, me deixa deslocado e confuso.
Almejei uma vez essas coisas, com Nicola e, quando
terminamos, só pensava em transar com metade da população
feminina do planeta. Nunca me vi em uma posição onde seria pai,
até porque meu maior medo em um relacionamento tão sério é me
tornar um fodido da cabeça como Conrad.
Encontro o iPod dentro de uma caixa de sapatos, junto de
outras lembranças. Guardei a primeira paleta que o Finnick usou, no
nosso primeiro show no Anarchy. As primeiras cordas que troquei do
meu contrabaixo. O ingresso do Farewell Show. Os pôsteres do
Purple Ride divulgando quando a The Reckless estaria tocando.
Sempre sonhei em conquistar sucesso e fama, mas nunca percebi o
que isso me custaria.
Agarro o aparelho, devolvendo a caixa para a prateleira do
armário. Estendo-o para Delilah, que já está de pé, ao lado da porta.
— Não sei o que aconteceu entre vocês — diz, acertando a
quina do aparelho na palma da mão —, mas acho que te conheço
um pouco. Você gostava muito dela.
— Mas ela me traiu e mentiu para mim.
— Não estou falando da Nicola, Ashton. Estou me referindo à
Vity. Tudo o que queria naquela época era uma segunda chance
para consertar a merda que fez. Você ganhou sua chance e não
está sabendo aproveitar.
Ela me encara, como se esperasse por uma resposta, mas não
consigo elaborar nenhuma.
— Nós estávamos na sua casa, sentados no sofá, e eu te ouvi
falar dela e da Nicola por horas. Você gostava da Nicola. Ela foi a
primeira pessoa a te amar mesmo com suas feridas, mas estava
apaixonado pela Gravity. Não sei do que está com medo, mas uma
coisa posso te dizer: Vity é leal. Pode mostrar quem você é. Ela não
vai te dar as costas se você não for tão bonito por dentro como é por
fora.
Termina com um sorriso, dessa vez a tristeza dissipa. Meu
coração pulsa ao enxergá-la. Não como a garota que conheci e
disse que era “minha melhor amiga no mundo inteiro”, mas como a
mulher que se propôs a conhecer meu lado sombrio, feio e, mesmo
eu estando errado, decidiu que precisava dela mais uma vez.
Engulo o choro travado na garganta e, mesmo sabendo que a
voz sairá embargada, antes de a porta fechar, fecho meus dedos
nela e abro outra vez.
— Aidan disse que vai se mudar.
— Pois é. — Estagna, parada no topo da escada. — Vou ter
mais chances de encontrar uma editora por aqui. Me mudo no Natal.
Limpo a garganta, escavando coragem no fundo meu peito.
— Podemos montar a árvore juntos? Como na primeira vez?
Ela apoia a mão no corrimão.
— Você vai voltar a me infernizar, não vai? Que saco... —
murmura a última frase, mas um sorriso escorregando do fundo da
voz. — Estava feliz de não receber suas mensagens dramáticas de
madrugada.
— Duvido muito, estava era morrendo de saudade.
Sua gargalhada estrondeia. Puta merda. Estou feliz demais
pelos últimos cinco minutos.
— Só mais uma coisa. — Delilah vira o quadril, o corpo ereto
voltando-se de frente para mim. — Bryan disse que a psicóloga vem
atender vocês pelo menos uma vez na semana, mas que você e
Finn faltam a quase todas as sessões. Os ataques de pânico vão
melhorar se você — faz uma pausa, franzindo o lábio para a direita
—, sabe, conversar mais profundamente com alguém especializado
no assunto. Para entender quais são os gatilhos e essas coisas…
— Como sabe de tudo isso?
— Fiz algumas pesquisas para o meu livro, mas acho que
principalmente porque continuo fazendo terapia para me curar do
meu pai tóxico.
— Valeu, Delilah.
— De nada. — Volta a descer, gritando por cima do ombro: —
Vem comer!
Sei que precisamos de outra conversa. Nossa amizade não vai
voltar ao que era assim, da noite para o dia. Coisas aconteceram.
Ela me magoou e eu a magoei. No entanto, o que acabou de
acontecer mostra que ainda temos uma chance.
“Não precisamos estar apaixonados, não
Eu não preciso ser a escolhida, não”
ONE OF THE GIRLS – THE WEEKND, JENNIE & LILY-ROSE
DEEP