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Copyright © 2023 Amanda Maia

SEGREDO PERFEITO – ATO 1


SÉRIE THE RECKLESS 4
1ª Edição

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra poderá ser


reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meios eletrônicos ou
mecânico sem consentimento e autorização por escrito do
autor/editor.

Capa: Thais Alves


Revisão: Rafaela Horn
Leitura Crítica: Duda Rodrigues
Leitura Sensível: Psicóloga Bruna de Oliveira CRP 08/39405,
Psicóloga Amanda Sampaio CRP 06/151044 e Estudante de
Psicologia Hellen Amanda
Betagem: Bianca Nolasco, Hellen Amanda, Leinara Gama e Milena
Botelho
Ilustração: Tácyla Priscilla

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação do autor(a).
Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.

TEXTO REVISADO SEGUNDO O ACORDO ORTOGRÁFICO


DA LÍNGUA PORTUGUESA.
Sumário
Aviso
Nota 1
Nota 2
Epígrafe
Prólogo
Parte 1
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Parte 2
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Parte 3
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Agradecimentos
Esta leitura é recomendada para maiores de dezoito anos;
contém cenas de sexo explícito, sexo consensual sem camisinha,
palavras de baixo calão e linguajar impróprio.
Este livro está recheado de tópicos sensíveis, temas que
geram discussão e afetam princípios, porém não é minha intenção
ofender ninguém. Esta é uma obra de ficção, com o único intuito
de entreter o leitor. Falas, ações e pensamentos de alguns
personagens não condizem com os da autora. Os
acontecimentos neste livro são fictícios e qualquer semelhança com
a realidade é coincidência.
Atente-se aos gatilhos:
Transtorno de estresse pós-traumático e ataques de pânico
(cenas gráficas descritas).
Luto, sintomas de depressão, sintomas de TEI (transtorno
explosivo intermitente), abandono parental, negligência familiar,
dependência emocional e física, violência verbal e física (cenas
gráficas descritas), abuso de drogas lícitas e ilícitas (cenas gráficas
descritas), alcoolismo, bullying (cenas gráficas descritas), violência
doméstica (cenas gráficas descritas), tentativa de afogamento
(cenas gráficas descritas) e menção a bulimia.
Práticas de bondage, dominação e submissão (BDSM),
privação de respiração durante o ato sexual e negação ao orgasmo
(todos os atos sexuais são de concessão mútua entre o casal).
O anti-herói deste livro é possessivo, obcecado pela
protagonista, apresenta caráter e moral duvidosa, falas
machistas, personalidade agressiva considerada inadequada e
problemática.
Alguns leitores podem se sentir sensíveis diante de
determinadas cenas. Se em algum momento da leitura se deparar
com qualquer situação que te cause incômodo emocional, feche o
livro e dê o seu tempo com a história por encerrado.
Tive uma profissional acompanhando a escrita deste livro.
Houve leitura sensível e a mentoria de uma psicóloga. Além de
muita conversa, também fiz pesquisas sobre os assuntos
abordados.
Busque sempre informações sobre educação sexual e temas
sensíveis.
Você foi inteirado de todo o conteúdo inserido aqui, continuar
ou não é de sua escolha, mas lembre-se de que é essencial
priorizar sua saúde e bem-estar.
Este livro pertence a uma autora nacional independente que
se dedica em tempo integral à escrita, ou seja, além de arcar com
todos os custos da publicação, essa também é sua única fonte de
renda.
Se por acaso estiver lendo por meios ilegais (PDF), peço
gentilmente que repense sua ação. Ele tem um preço acessível na
Amazon e está disponível gratuitamente no Kindle Unlimited para
assinantes.
Não incentive a pirataria de livros. Não prejudique meu
trabalho, assim como você não gostaria de ter o seu desvalorizado
dessa maneira.
Respeitar o trabalho de outra pessoa é também uma forma de
apoio e incentivo.
Sei que estão ansiosos para conhecer a história de Ashton e
Gravity, afinal, foram quase 6 anos desde a primeira versão de
Sintonia Perfeita publicado no Wattpad — caramba, passou um
tempão —, e AshVity continua sendo um casal querido por vocês.
Porém, antes de seguirem para a leitura, gostaria que ficassem
comigo nesta nota. Ela, de certo modo, faz parte da história porque
abro aqui meu coração com vocês.
A série The Reckless é uma narrativa contínua, portanto, nem
tudo será esclarecido neste livro sobre os outros personagens.
Se tratando de Gravity e Ashton, protagonistas neste livro, se
não realizou a leitura dos anteriores, pode ser que se sinta confuso
diante a determinados momentos. É necessário, ao menos, a leitura
de Mentira Perfeita para compreender em íntegra o relacionamento
dos dois.
Segredo Perfeito: Ato I é um cliffhanger, ou seja, o livro
acabará com uma narrativa que provoque a curiosidade de vocês,
logo, nem todos os questionamentos sobre Ashton e Gravity serão
respondidos neste ato. Aguardem o ato II para terem todas as
respostas, mas está valendo teorizar. E muito.
Comecei a pensar no que escrever nessas notas no mesmo
dia em que iniciei a escrita de SGP; ainda não sabia que o livro seria
dividido em dois atos. De fato, não estava em meus planos estender
a história deles para mais de um livro, sobretudo porque é cansativo
permanecer tanto tempo com o mesmo casal. Mas aqui estou, mais
uma vez, sendo dominada por esses personagens.
Não é segredo — isso não é — que Ashton e Gravity são
geniosos, muita coisa aconteceu durante os últimos 3 livros da série
publicados, ou seja, passaram por mudanças notáveis, diante de
tudo que aconteceu na vida deles nesse tempo e até mesmo seus
passados influenciaram em suas personalidades.
Existe uma razão para AshVity e Effin serem os últimos livros e
quero esclarecer quanto a isso: apesar de não serem romances
darks, pesei um pouco mais a mão na história, ou seja, pode ter um
clima mais sombrio que os anteriores. Por isso, é de extrema
importância que estejam cientes do conteúdo que irão encontrar
aqui (tudo colocado nos avisos).
Neste ato I, mergulhei tão profundamente na raiva, falta de
confiança e sentimentos reprimidos que guardam um do outro — e
seus passados — que, por muitos capítulos, experimentava uma
sensação de sufocamento. Não que os outros não tenham me
provocado emoções tão carregadas, mas, sei lá, é algo inexplicável
ter tantas sensações brigando dentro de você. É torturante e
estranhamente gostoso.
Vocês lerão sobre pessoas traumatizadas. E não, não é uma
desculpa para suas ações, mas o que você vive, seja na sua
infância ou adolescência, molda seu caráter. Suas reações na vida
adulta, para as adversidades ou os ataques que sofre, são um
reflexo de como aprendeu a lidar com o mundo.
Você não pode oferecer aquilo que não te deram. Não
consegue pedir perdão quando nunca te pediram. Não consegue ser
gentil se não foram com você. Gostando ou não, as pessoas que te
cercam influenciam quem você se torna quando decide caminhar
com as próprias pernas.
Tudo bem reagir de forma errada às vezes, mas não normalize
essas ações e procure estar bem, procure ajuda de um profissional
para lidar com suas dores e entender o motivo de elas existirem. Só
consegui compreender mais sobre mim mesma e respeitar quem eu
sou quando decidi olhar para dentro.
Pode ser que alguém te feriu profundamente um dia e o que
tirou daquilo foi que para não doer tanto, precisava se defender e o
único jeito que encontrou é retaliar à mesma altura. Não sinta que
não merece uma segunda chance por causa disso. Ninguém é
perfeito, portanto, minha promessa é nunca te presentear com
personagens assim.
Quanto mais o tempo passa, mais quero escrever sobre
pessoas feridas. Elas me atraem. Me fazem sentir mais como eu
mesma e menos como alguém criado para agir, pensar e falar como
outros impõem como deve ser — ou, no meu caso, o que devo
escrever.
Com amor,
Amanda.
Para minhas apocalípticas.
Se este livro saiu tão rápido, foi porque
vocês estavam lá me incentivando.
Eles são como ódio e rancor.
Eles são como fachadas e segredos.
Eles são como turbulência e caos.
Eles são como obsessão e loucura.
Eles não vieram para a paz, mas para a inquietação.
“Bastou duas semanas para você sair com ela
Acho que você não traiu, mas mesmo assim é um traidor”
TRAITOR – OLIVIA RODRIGO

4 ANOS ATRÁS
SÁBADO, 26 DE DEZEMBRO DE 2020, ÀS 16H.

Meu coração me trai. Como o perfeito estúpido que é, galopa


erroneamente enquanto Ashton me segura pelo pulso, guiando-nos
para seu quarto ao fim do corredor da cabana.
Evito olhar para trás, para nossos amigos reunidos na sala
espantados com a explosão dele ao descobrir que aceitei uma bolsa
para estudar em Milão.
Antes de Ashton e eu estarmos envolvidos nessa bolha de
mentiras, sabia que só estava em Humperville para fugir do meu
passado. Embora reconheça que alguns quilômetros de distância
não fazem diferença para aqueles que já têm uma opinião
estabelecida sobre você.
Torço o punho até que Ashton não possa mais pressioná-lo
entre os dedos e consigo me desvencilhar dele. Eu o ultrapasso na
caminhada, marchando em direção à porta. Ao empurrá-la para trás,
imagino que é a cabeça dele e estou prestes a esmagá-la contra a
parede.
Isso me dá uma satisfação enorme.
Tem meses do que aconteceu em Paris. Meses que deixei a
mágoa de lado e a substituí por algo totalmente novo: raiva.
Nunca pensei que seria traída um dia. A única pessoa que me
amou, amou até seu último minuto e me deixou para trás
absorvendo uma culpa tão assustadora quanto a própria morte... E
foi Ashton que fez com que eu me sentisse traída pela primeira vez.
Passei os últimos anos me protegendo do passado, das feridas
profundas que romperam minha alma. Ninguém acreditaria se eu
contasse. Nem mesmo as minhas melhores amigas conseguiriam
ver através das feridas se eu as deixasse se aproximar.
Sou só um corpo em decomposição, carregando uma dor que
não para de doer, um passado que nunca deixa de voltar e
aguardando a visita de uma história que me assombra à noite.
Não sei se o odeio mais por causa de Paris ou pelo efeito que
causa em mim quando está por perto.
Quero que ele saiba. Ainda que eu não consiga dizer em voz
alta, espero que Ashton Baker saiba o quanto suas mentiras
vendaram meu coração outra vez.
Ele bate a porta quando entramos. As paredes vibram ao
nosso redor e a sensação esmagadora retorna, dessa vez mais
precisa.
Estar sozinha com Ashton e apenas a minha consciência me
forçando a não fraquejar é estar sem nenhuma saída. Sinto o aroma
dele invadir minhas narinas. A pulsação sob a minha pele me
perturba.
Seus olhos escuros como carvão analisam minha postura.
Imagino que esteja estudando a possibilidade de se aproximar e,
quando ameaça fazer o que acho que vai, recuo um passo para
trás. A popa da minha bunda chega à sua escrivaninha e me
preparo para o embate.
Ashton e eu somos como fogo e gasolina. Não importa o que
aconteça, qualquer palavra é uma faísca que pode começar um
incêndio.
Esfregando os cabelos pretos, ele avança em minha direção.
Reparo o brilho diferente possuindo o contorno das íris e engasgo
com o ar. Minha respiração pode estar contida, mas a pressão do
meu coração dentro do peito nem tanto.
É uma das coisas que não gosto em Ashton: ele pode não me
conhecer, mas conhece o meu corpo. Ele sabe como lidar com as
minhas reações. Sabe como torná-las suas aliadas.
— Agora você vai me ouvir! — Ele me cerca. A poucos passos
de distância, se impõe como um bloqueio me impedindo de fugir. —
Vai ouvir, Gravity — repete, como se eu precisasse de confirmação
para entender que estou sem saída.
— Estou esperando — encorajo, gesticulando o queixo em
sinal de confronto. — Estou louca para ouvir a história sobre como
você desapareceu em Paris e depois eu te encontrei com sua ex-
namorada. A forma como vocês agiram quando te encontrei,
Ashton, só pode me dizer uma coisa…
— Foi um beijo — confessa, e não sei, aquele pedaço de mim
acreditava que não tinha acontecido nada.
Cruzo os braços.
— Mas não fui para a cama dela.
— Quando?
Ashton coça a nuca, inspirando fundo. Sinto a tensão saindo
pelos poros dele.
— No último dia. Juro. Quando Nicola me beijou, tirei minhas
malas do apartamento e…
— Você ia fugir para não ter que me contar? — acuso,
semicerrando as pestanas para ele. — Por quê? E o que você faria
depois, quando estivesse em Humperville?
— Gravity, Nicola tem transtorno alimentar. — Travo, minha
mandíbula endurece e não sei se consigo acreditar nele. — Ela está
melhorando, cada dia melhor, mas tem recaídas e, quando precisa,
me liga e estou lá por ela. Naquele fim de semana,
coincidentemente, estava em Paris para um trabalho e acabou
tendo alguns gatilhos. Aquele dia em que nem você ou Effy
conseguiram falar comigo, estava no hospital com ela. Sou a única
pessoa para quem ela pode ligar e contar essas coisas. E,
sinceramente, como poderia te explicar tudo isso, sendo que você já
sabia da minha situação com ela?
— Então, está me dizendo que, não importa o que aconteça,
se ela te ligar agora, você vai?
— Não, porra! — grita, recuando, e solto os braços para apoiar
as mãos na escrivaninha. — Estou te dizendo que sou incapaz de
negar ajuda a alguém que eu gosto. Nicola não precisa da minha
proteção, só do meu apoio, e quero dar a ela, se puder.
— Já considerou ela estar usando a doença para te prender?
Em seu semblante, vejo mágoa pela minha acusação e, pela
primeira vez, ele consegue me fazer sentir pequena.
— Você tem ideia do quanto a carreira de modelo acaba com
ela? Tem ideia do quanto ela se esforça para ser perfeita, Gravity?
Você é estilista. Me diz, os estilistas estão sempre em busca do
corpo perfeito para apresentar suas roupas, não é? Essa pressão
com dietas restritivas e a relação tóxica com a comida, você não
tem ideia de como é!
Ele está tão furioso comigo, que começo a me sentir culpada
por uma história com a qual não tenho nada a ver.
Sim, eu conheço esse mundo.
Sim, eu sei como é a vida e a rotina de uma modelo.
E sim, eu sei que transtornos alimentares nesse meio são
comuns. Isso me destrói e quero, no futuro, poder ser alguém que
faça diferente. Quero mulheres orgulhosas dos seus corpos usando
roupas que as valorizem, que não sejam obrigadas a mudar para
caberem nelas. É o que eu quero. Que não se sintam pressionadas
e obrigadas a seguir um padrão para se encaixar.
— Eu não sabia de nada disso até aquele dia em Paris, e
caralho… — Ele suspira, caminhando pelo quarto com certo
desespero. — No último dia em que nos encontramos, a tratei tão
mal ao telefone e fiquei com medo de algo acontecer de novo. Você
pode tentar me entender? Por favor?
— Você nem se desculpou… — Minha testa vinca, e ele para
de andar. — Em Paris, você não se desculpou pelo que fez. Só me
pediu milhares de vezes para se explicar, mas você nunca se
desculpou. — Respiro fundo, tento esconder o nervosismo, e acho
que sou bem sucedida, porque ele nem desvia os olhos dos meus.
— Você nunca se arrependeu. — Entendo, finalmente.
— Não. — Aceita minha acusação.
— Você faria tudo de novo.
— Faria porque não vou dar as costas para ela, Gravity. Já
aceitei que uma parte de mim sempre vai se importar.
— E o que você quer de mim?
— Quero que saiba que não te magoei de propósito.
Rio com escárnio.
— E que você é importante para mim, eu…
— Para — interrompo, me desencostando do móvel. — Não
posso te dizer que não te entendo. Sei como é quando alguém deixa
uma marca profunda, mas não posso te deixar mentir para mim de
novo.
— Gravity, não é mentira. Gosto de você, porra, você não tem
ideia. — Franze as sobrancelhas e me detém quando tento ir para a
porta.
— Tem razão, eu não tenho. Nós dois pensamos diferente
sobre o que é gostar de alguém. Mesmo que tivesse todos os
motivos para ir atrás dela, ainda escolheu mentir para mim. Mesmo
que o beijo que deu nela não tenha significado nada, ainda tomou a
decisão de fugir. Você não gosta de mim, Ashton — despejo tudo de
uma vez, antes de perder a coragem. — Talvez tenha perdido a
noção do que é esse sentimento. Talvez ainda esteja tão envolvido
com Nicola que não perceba o que ele significa. Talvez só esteja
arranjando uma desculpa para não admitir que ainda ama sua ex.
Você disse que se sentiu traído quando ela te usou como
passaporte para ser modelo da joalheria do seu pai, não me faça
sentir traída porque não consegue resolver os sentimentos que tem
por ela.
Passo por ele e, por uma fração de segundo, me sinto aliviada
por estar me distanciando, mas Ashton me para. Firmemente seus
dedos estão envolvendo meu cotovelo e ele me puxa para a posição
anterior. Fico presa entre sua parede de músculos e a escrivaninha.
Minha respiração rasga o ar, mas me esforço para manter as
feições intactas, como se tudo que foi dito até agora não tivesse
sido jogado dentro de um liquidificador e estivesse batendo tanto,
que minha cabeça dói.
— Me deixa ir — peço, mantenho a voz calma e contida.
— Não. Não posso.
— Ashton, me escuta. — Viro a cabeça para ele, nossos olhos
se sustentam. — O que você tem com a Nicola é algo no qual não
quero estar envolvida. Você é emocionalmente dependente dela e
ela, de você. Vocês dois se conhecem há anos e isso torna a
intimidade um fio ligando um ao outro. Eu entendo, é difícil de cortá-
lo, mas arrastar outras pessoas para isso é egoísmo. Além do mais,
quando a banda estourar, o que acontece? Você vai embora e eu
fico? Imaginando que está passando suas noites com ela? Qualquer
chance que nós tínhamos de ficar juntos acabou. Você sabe que
sim, mas é orgulhoso demais para admitir. Então, estou te dizendo
por nós dois para me deixar em paz.
— Não fode, Gravity. Você não quer isso.
Tombo a cabeça para trás, um suspiro rompe da minha
garganta. Fecho os olhos, sentindo o aperto em meu braço suavizar
até que esteja liberta.
— Você sabe que não faço joguinhos. Se quero estar com
alguém, simplesmente estou. E se não quero, vou embora. É assim
que funciona.
— E como a gente fica?
— Como sempre foi. Somos amigos.
— Você quer mesmo me foder, não é? — Sua testa vinca. —
Sabe muito bem que nós nunca seremos amigos.
— Se te conforta, não estou nem um pouco feliz de conviver
com você. Para ser sincera, eu te odeio nesse momento para
pensar em ter qualquer relação amigável. Mas Delilah acabou de
acordar do coma e ela é uma das minhas melhores amigas. Não
vou ferrar o tempo que me resta com ela tentando entender o que
você acha que sente por mim.
JULHO 2023

THE NEW CELEBRETIES

THE RECKLESS CURTE EM “AFTER” O ÚLTIMO SHOW


DA
TURNÊ DE CAÓTICOS EM VANCOUVER

Por Ravennah Hollow, em julho de 2023.

O último show da banda aconteceu na noite de ontem, em


Vancouver. O grupo de músicos foi flagrado em um clube da
cidade e parecia estar se divertindo muito.
Nos últimos meses, Jared McAvoy foi considerado um dos
melhores “caça talentos” da indústria americana, graças à
descoberta dos cinco garotos imprudentes que saíram de
uma pacata cidade chamada Humperville.
Há pouco mais de um ano, o tecladista da The Reckless
assumiu estar em um relacionamento amoroso com a filha
do empresário. Não se sabe há quanto tempo nem se têm o
consentimento de Jared, mas, aparentemente, eles são um
casal feliz publicando declarações em suas redes sociais.
Sabemos que a The Reckless explodiu rapidamente no meio
musical, o que atraiu bastante atenção para o grupo. Já
admitiram publicamente que não estão acostumados a
serem bombardeados o tempo todo por tantas emissoras,
revistas, jornais e sites de notícias. Entretanto, dar atenção
aos fãs, pelo visto, não é nenhum problema. Espalhou-se
que no último show, além de pararem para conversar,
fotografar e autografar para os recklovers, a banda também
exigiu que servissem pizzas para aqueles que estavam
aguardando do lado de fora. Com essa atitude, ganharam
ainda mais o carinho e a admiração dos fãs.
Depois de um show espetacular no Teatro Orpheum, o
grupo se dirigiu para uma pequena comemoração com a
equipe em um clube.
Fãs alegam ter visto o baixista, Ashton Baker, sair
acompanhado. E, claro, isso explodiu na internet.
THE NEW CELEBRETIES

BAIXISTA DA THE RECKLESS COMEMORA


SEU ANIVERSÁRIO COM AMIGOS EM RESTAURANTE
NA CIDADE DE NOVA YORK E É FLAGRADO
COM MULHER MISTERIOSA
Por Ravennah Hollow, em julho de 2023.

Na noite de ontem, Ashton Baker foi fotografado por


paparazzi em um jantar com Bryan, Aidan, Chase, Finnick e
outros amigos no Per Se.
Flagrado aos beijos com uma loira misteriosa, Ashton se
recusou a dar qualquer declaração a respeito do seu
relacionamento com a garota. Tudo que se sabe, no entanto,
é que ela é uma amiga próxima do grupo.
Entre eles, também estavam reunidas as namoradas dos
outros integrantes, Mackenzie, Delilah e Theresa.
As redes sociais do novo astro do rock explodiram com
comentários — alguns não tão educados assim — e pode-se
perceber que as fãs não aprovam o recente relacionamento.
O baixista, porém, se mostra ser um cara bem
descomplicado. Em entrevistas, disse que não está
interessado em relacionamentos sérios porque pretende
curtir muito mais essa fase que está vivendo com os amigos.
Esperamos que curta, Ashton, mas com moderação!
Em meio a isso, podemos perceber que a banda vem
trabalhando arduamente na divulgação do álbum Caóticos.
Isso, incluindo a turnê que teve duração de quase quatro
meses.
Antes de embarcarem de volta para a cidade onde a banda
nasceu, eles pararam no aeroporto e conversaram com
milhares de fãs que estavam esperando no portão de
embarque e desembarque.
Tanto na ida quanto na chegada, os astros do rock
souberam dar grande atenção para os recklovers. Várias
das publicações do Instagram onde foram marcados vieram
acompanhadas com legendas extensas de agradecimento
ao grupo por ser a melhor banda de todos os tempos. Além
de bons no que fazem, são educados e carismáticos.
Não é novidade para ninguém: a The Reckless vem
conquistando um espaço gigantesco nos corações dos fãs
com suas músicas e personalidades com um magnetismo
surpreendente.
Queremos, acima de tudo, conhecer suas verdadeiras
histórias e o que carregam por detrás de tantos sorrisos.
AGOSTO 2023

THE NEW CELEBRETIES

ASHTON É HERDEIRO DO BILIONÁRIO CONRAD


BAKER, DA JOALHERIA “BAKER”
Por Ravennah Hollow, em agosto de 2023.

O integrante da The Reckless nunca falou abertamente


sobre a família, mas resolvemos ir mais a fundo para
conhecermos melhor cada um deles e, em uma conversa
com a irmã do meio de Ashton, ela confidenciou que seu
irmão já não morava com a família há muitos anos e que
sempre desejou se desvincular da responsabilidade de ser o
responsável pelo negócio da família. Muito menos almeja
receber qualquer dinheiro que esteja relacionado à joalheria.
Tive o imenso de prazer de ter uma conversa sincera com
Ashton depois da minha ligação com Maddie —
carinhosamente apelidada pelo baixista —, e ele reafirmou
mais de uma vez que não existe nenhum drama familiar
acontecendo. Só que ele e seus irmãos amadureceram
muito rápido e, dessa forma, cada um seguiu o caminho que
achou que deveria.
Ashton é o segundo mais velho da família Baker e, pelo
modo como descreve seus pais e irmãos, existe muito
carinho envolvido entre eles.
Esperamos que essa admiração entre a família se perpetue
e que a distância entre eles, devido às agendas lotadas, não
venha a ser um problema no futuro.
THE NEW CELEBRETIES

THE RECKLESS PUBLICA FOTO EM


ESTÚDIO E CRIA TEORIA ENTRE FÃS
Por Ravennah Hollow, em agosto de 2023.

Depois de meses afastados do estúdio de gravações da


Reeves, o grupo divulgou em suas redes sociais nessa
madrugada que está trabalhando em alguma coisa.
A rainha do pop, Penni Lancaster, curtiu e comentou na
publicação, o que levou os fãs a especularem uma possível
contribuição entre eles.
No ano passado, Penni disse que gostaria de colaborar com
a The Reckless porque admirava o trabalho dos garotos e,
aparentemente, essa música finalmente irá sair.
Estamos empolgados para o que está por vir!
THE NEW CELEBRETIES

BAIXISTA DA THE RECKLESS PUBLICA EM SEU


INSTAGRAM E ESPECULA-SE RELACIONAMENTO
Por Ravennah Hollow, em agosto de 2023.

Mais uma noite na qual Penni e o grupo passaram em claro


no estúdio da Reeves Records, mas dessa vez, Ashton
ousou em provocar a curiosidade dos fãs e publicou um
vídeo onde aparece beijando a garota loira com quem jantou
em seu aniversário no mês passado.
Internautas apontam a loira misteriosa sendo Harper
Reeves, filha de Sydney Reeves, proprietária da Reeves
Records e também a melhor amiga de Theresa McAvoy.
O romance, ao que parece, já vem acontecendo há algum
tempo, mas nenhum dos dois confirmou se existe algo sério
rolando entre eles.
O assédio dos fãs do baixista obrigou Harper a privar suas
redes sociais, entretanto, ela também não fez nenhuma
declaração e se recusou a falar sobre seu relacionamento
com Ashton com a nossa equipe.
Esperamos que, em breve, se sintam confortáveis para nos
contar o que anda acontecendo entre eles!
SETEMBRO 2023

THE NEW CELEBRETIES

THE RECKLESS DIVULGA QUE ESTÃO TRABALHANDO


EM
ÁLBUM NOVO E DEVERÁ SER LANÇADO AINDA NESTE
ANO

Por Ravennah Hollow, setembro de 2023.

Desde o lançamento de Caóticos, a banda vem sendo


questionada sobre o próximo álbum.
Os fãs estavam se sentindo um pouco “órfãos” de
novidades, mas o suspense acabou ontem, quando o
vocalista, Bryan, divulgou em seu story do Instagram a
página de um caderno onde exibiu uma música chamada
Infamous e legendou da seguinte maneira:
“Essa jornada tem sido insana, preciso admitir. Nossas vidas
têm dado saltos inimagináveis nos últimos tempos. É tão
fervoroso, que não estamos conseguindo acompanhar, mas
seguimos compondo. Porque é sobre música. Tudo é sobre
música. E nosso novo álbum chega ainda neste ano.
Obrigado por todo apoio, recklovers. Vocês são melhores do
que merecemos.”
Infamous ficou nos trending topics do Twitter depois da
publicação de Bryan.
Só podemos aguardar ansiosamente por esse lançamento!
THE NEW CELEBRETIES

FOTOGRAFADOS EM MANSÃO COM PENNI


NA CIDADE DE BEVERLY HILLS, UM DOS
INTEGRANTES
DA THE RECKLESS PODE SER AFFAIR DA MUSA DO
POP
Por Ravennah Hollow, setembro de 2023.

Os cliques aconteceram há dois dias na mansão que a


cantora alugou para comemorar seu aniversário em Beverly
Hills e rapidamente trouxemos atualizações: Finnick Taylor
pode ser o novo affair de Penni.
Os dois foram clicados em vários momentos em que
pareciam íntimos e, com demonstrações de afeto, não
restam dúvidas de que, sim, estão saindo.
Nossa musa do pop é discreta, mas não podemos negar que
sua festa de aniversário foi um grande evento. Convidados
importantes da indústria da música e de Hollywood
compareceram, assim como familiares e amigos íntimos.
Fãs disseram que o começo deste romance aconteceu na
primeira aparição da cantora com o guitarrista da The
Reckless, alguns anos atrás, quando a banda recebeu a
proposta de abrir a turnê de Penni.
Apesar de seus esforços para manter a discrição —
principalmente porque Finn também é reservado quanto à
sua vida pessoal —, duas noites atrás deixaram de esconder
o provável envolvimento.
Mesmo utilizando um boné de beisebol para cobrir o
momento em que Penni se inclina para Finnick, fãs
alegaram que rolou, sim, um beijinho ali.
Nenhum dos dois, no entanto, veio à público para confirmar
ou negar as especulações.
OUTUBRO 2023

THE NEW CELEBRETIES

EM SITE OFICIAL, THE RECKLESS ANUNCIA


PROCURA POR ESTILISTAS
Por Ravennah Hollow, em outubro de 2023.

Através do site oficial da banda ontem à noite, divulgaram


vagas destinadas à estilistas para compor a equipe da The
Reckless.
Eles procuram por uma pessoa que possa produzir as peças
dos shows e que consiga captar a essência dos meninos.
Ela também será responsável por vesti-los em seus
compromissos profissionais e eventos importantes.
Se você tem um portfólio e deseja trabalhar junto desse
grupo, chegou a hora de se inscrever!
THE NEW CELEBRETIES

THE RECKLESS GRAVA CLIPE EM HUMPERVILLE,


CIDADE ONDE NASCEU
Por Ravennah Hollow, em outubro de 2023.

Apesar de a banda ter estourado nos últimos tempos,


sabemos que a produção de um clipe não era algo que
ocupava o topo de sua lista de prioridades.
A divulgação de um concurso online para os fãs nos levou a
acreditar que tivemos uma mudança nos planos, já que o
objetivo da competição era selecionar cinco garotas para
protagonizar Declínio com os nossos meninos.
Houve milhares de inscrições, esclarecendo mais uma vez
que a banda é um sucesso estrondoso. As sortudas
escolhidas tiveram tudo pago, desde o hotel até a viagem
para Humperville, e o clipe foi gravado nas terras em que
Ashton, o baixista, herdou dos avós.
Eles até fizeram um breve tour no Instagram pelo porão
onde costumavam ensaiar para os shows da banda quando
começaram. Os fãs curtiram tanto que pediram que fizessem
o mesmo pelos lugares onde tocaram e, pela primeira vez,
os garotos gravaram as melhores amigas — e namoradas
—–, que deram relatos de quando eles começaram.
Ah…
Ashton Baker decidiu roubar a cena para si mais uma vez:
uma das fãs escolhidas, Kristy DiLaurentis, acabou sendo
seu affair do dia e, como percebemos, o baixista não hesita
em exibir quando está com alguém. Eles foram fotografados
em um jantar e depois partiram para uma noite agitada no
famoso pub da cidade: o Purple Ride. Foram vistos e
clicados em vários momentos se beijando e curtindo a noite
juntos.
Acho que já podemos excluir a possibilidade de ele estar em
um relacionamento sério com Harper Reeves.
NOVEMBRO 2023

THE NEW CELEBRETIES

ASHTON BAKER, BAIXISTA DA BANDA DO MOMENTO,


É PRESO EM LOS ANGELES
Por Ravennah Hollow, em novembro de 2023.

Já faz algum tempo que Ashton vem se mostrando ser o


“bad boy” do grupo.
Em uma viagem para Los Angeles no fim de semana,
Ashton foi preso por desacato enquanto dirigia embriagado,
ao sair de uma festa na qual era convidado.
O delegado veio à público quando a notícia se espalhou,
alegando que o baixista estava alterado e só foi detido
porque se recusou a mostrar sua habilitação, entrando em
uma discussão infeliz com o policial.
Ashton foi “grosseiro e desrespeitoso”, disse o policial que
estava patrulhando naquela noite.
Entramos em contato com Jared, o atual agente e
empresário da banda, e ele contou que tudo não passou de
mal-entendido. Ashton está bem e em sua casa em Nova
York. Os fãs não demonstraram desapontamento nas redes
sociais, pelo contrário, apoiaram o ídolo justificando que o
grande culpado pelas alterações de humor do astro é o
constrangimento que vem sofrendo com tanta exposição na
imprensa.
“A pressão da fama tem me sufocado”, disse o músico.
Ashton mais de uma vez apareceu em seu Instagram, onde
desabafou que gostaria de poder não ser bombardeado com
tantas coisas ao mesmo tempo, todos os dias. Ele fez um
tweet também se desculpando com os fãs pelo ocorrido e
admitiu que pode ser explosivo e grosseiro algumas vezes,
mas que não faz de propósito.
O músico aproveitou a oportunidade de estar sendo tão
sincero com os fãs e revelou sua intenção de voltar a
frequentar a terapia para tentar lidar melhor com todas as
mudanças que vem acontecendo em sua vida nos últimos
dois anos.
DEZEMBRO 2023

THE NEW CELEBRETIES

THE RECKLESS LANÇA NOVO ÁLBUM E FICA EM


PRIMEIRO
LUGAR NAS PLATAFORMAS DE STREAMING
Por Ravennah Hollow, em dezembro de 2023.
Foi um lançamento silencioso em comparação ao primeiro,
entretanto, é um dos maiores sucessos da banda.
Intitulado como The Journey, o novo trabalho da The
Reckless é um dos mais ouvidos através das plataformas
digitais e, uma semana após o lançamento, o agente da
banda, Jared McAvoy, agendou uma coletiva de imprensa,
onde anunciou a The Journey World Tour, que começa em
março de 2024.
Segundo ele, a banda vem se preparando para a turnê
mundial há algum tempo. Eles estavam em negociação para
uma turnê pela Europa com o álbum de Caóticos, mas, ao
que parece, os planos mudaram quando começaram a
trabalhar no novo sucesso.
O novo álbum dos astros do rock contém dez faixas inéditas,
sendo duas delas em colaboração com Penni Lancaster.
Hoje, o perfil oficial da banda conta com quase dois milhões
de seguidores. Seus perfis pessoais variam entre
novecentos mil e um milhão.
A explosão do grupo de cinco amigos causou um alvoroço e
toda a expectativa criada sobre eles foi alcançada.
No texto, disseram que sempre buscaram conexão com as
pessoas com quem suas músicas conversam e que todo o
sucesso do álbum se deve a isso. Todas as pessoas estão
sofrendo por algum motivo. Somos feitos de micropartículas
de emoções e todos os dias lidamos com um sentimento
diferente. Unir-se a esses sentimentos é o que motiva a The
Reckless na hora de compor suas músicas.
Cada um deles publicou um texto de agradecimento aos fãs
e prometeram que será uma turnê inesquecível.
Nós não duvidamos disso!
JANEIRO DE 2024

THE NEW CELEBRETIES

THE JOURNEY WORLD TOUR TEM VENDA


LIBERADA NOS ESTADOS UNIDOS E ESGOTA
EM MENOS DE DUAS HORAS
Por Ravennah Hollow, em janeiro de 2023.

Foram divulgadas 33 cidades dos Estados Unidos por onde


a banda passará em sua turnê mundial. O primeiro show
acontecerá na cidade de Las Vegas, no famoso estádio do
Mandalay Bay.
Em menos de duas horas após a liberação das vendas, os
ingressos esgotaram rapidamente com uma fila de espera
que beirava o impossível a garantia de um ingresso para o
tão aguardado momento. Fãs publicaram em suas redes
sociais, marcando a banda, quando conseguiam, enfim, um
lugar para assisti-los.
A banda falou com os fãs através de uma live feita por um
dos maiores perfis, The Reckless Diary, no Tik Tok, e
disseram que estão animados para colocar “o pé na
estrada”. Também revelaram que, infelizmente, não havia
previsão de liberação de outras datas.
O Meet foi um dos mais vendidos na história da música.
Nem a banda ou a equipe esperavam que os shows fossem
esgotar tão rápido.
MARÇO DE 2024

THE NEW CELEBRETIES

THE RECKLESS INICIA HOJE SUA


TURNÊ MUNDIAL

Por Ravennah Hollow, em março de 2024.

O primeiro show acontecerá hoje na arena do Mandalay


Bay, em Las Vegas.
Ashton publicou em seu story mais cedo, quando estavam
pegando o voo particular, o que cada um estava sentindo, já
que um ano atrás, eles saíam em uma turnê menor, porém
tão importante quanto essa.
Seus números cresceram de maneira desproporcional e os
shows na América do Norte lotaram em menos de duas
horas depois de terem suas datas divulgadas.
O grupo se emocionou ao abrir o coração para os fãs e
expor o quanto se sente grato e amado por cada pessoa que
o acompanha. Eles também disseram que estão ansiosos
para conhecer cada um deles em breve!
Desejamos sorte e sucesso para nossos garotos nessa nova
— e longa — jornada!
ABRIL DE 2024

THE NEW CELEBRETIES

PENNI LANCASTER ASSUME RELACIONAMENTO


COM GUITARRISTA DA THE RECKLESS
Por Ravennah Hollow, em abril de 2024.

Finnick é o membro menos carismático da The Reckless e


talvez essa seja a razão para os corações pulsarem mais
rápido pelo guitarrista — afinal, todo mundo curte uma aura
misteriosa. O guitarrista realmente consegue atrair a
atenção sem ter intenção.
Penni fez uma declaração pública em seu Instagram para o
astro em uma foto publicada no feed quando os rumores de
um possível relacionamento se tornaram mais fortes depois
que a rainha compareceu ao show da banda em Fresno.
“Você. É sempre você”, disse ela na legenda.
Famoso por sua antipatia, fãs da cantora podem não estar
felizes com o possível romance.
Finnick não se pronunciou, mas curtiu a foto com ela.
MAIO 2024

THE NEW CELEBRETIES

POLÊMICA: RELACIONAMENTO COM ASHTON FOI O


MOTIVO DA ESTILISTA ISABELLA WREN SER DEMITIDA
Por Ravennah Hollow, em maio de 2024.

Isabella tem um currículo impecável. Desde muito nova, se


dedicou para alcançar a posição em que está hoje e
trabalhar com uma equipe grandiosa como a da The
Reckless a levou a acreditar que poderia acrescentar mais
experiência ao seu trabalho.
Porém fomos informados que Isabella foi demitida três dias
atrás, depois de a assessoria da The Reckless descobrir que
Ashton e ela estavam tendo um caso.
A estilista foi até suas redes sociais recentemente e disse
que é verdade, que os dois tiveram relações íntimas várias
vezes ao longo dos meses em que estavam trabalhando
juntos, se preparando para a turnê, e que quando o caso
terminou, Ashton teria “instigado” a demissão dela para sua
assessoria, alegando ser desconfortável que continuassem
trabalhando juntos depois de terem tido um relacionamento.
A equipe da banda, contudo, não se pronunciou e, apesar
dos questionamentos dos fãs no perfil do baixista, Ashton
permanece sem aparecer em suas redes sociais há dias.
A primeira etapa de shows da turnê termina no mês que vem
e ainda não temos informações se a banda procurará por
um substituto para cuidar do figurino da The Journey World
Tour.
JUNHO DE 2024

THE NEW CELEBRETIES

ISABELLA WREN PROMETE PROCESSAR THE


RECKLESS
POR DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA
Por Ravennah Hollow, em junho de 2024.

Não tem duas semanas que o baixista da The Reckless


compareceu às suas redes sociais furioso por sua vida
íntima ter sido insensivelmente exposta pelas páginas com
foco nas celebridades, incluindo o TNC.
Nós sempre apoiamos a banda e seus integrantes. Desde o
começo, admiramos a garra com que esses garotos
buscaram realizar seus sonhos, mas Ashton tem se
mostrado instável e grosseiro.
Os relatos de Isabella a respeito do breve relacionamento
com o astro do rock deixaram grande parte dos fãs da The
Reckless decepcionados. Falas da estilista Isabella Wren
fizeram com que os recklovers questionassem se tudo o que
os garotos mostram é verdadeiro ou se estão escondidos
sob máscaras.
De novo, Ashton apareceu em seu Instagram e, dessa vez,
parecia realmente arrependido em um vídeo. Ele disse que
sim, esteve com Isabella durante os meses que
antecederam a turnê e que continuaram se relacionando
durante a turnê, mas que nunca foi sério. Ambos estavam
cientes de que era algo casual e também de consenso
mútuo.
A estilista respondeu e disse que sim, estava ciente dos
termos de se envolver com um dos maiores nomes da
música do rock atualmente, mas que não esperava que isso
fosse prejudicá-la no trabalho.
Isabella também afirmou que está processando a banda por
assédio moral e pedirá, com certeza, indenização pela
demissão sem justa causa.
Ashton, por outro lado, parece ter superado a polêmica com
Isabella Wren. Ele apareceu recentemente caminhando de
mãos dadas com Harper Reeves por Seattle depois do seu
último show pelos Estados Unidos.
Segundo paparazzi que flagraram os dois no momento,
Ashton parecia sorrir o tempo todo e foi educado com eles
quando estavam voltando para a SUV que os levou para
jantar. A informação que temos é que Ashton fechou um dos
melhores restaurantes da cidade, tarde da noite, para um
jantar íntimo e privado com a estudante de medicina.
Harper continua sendo alvo dos fãs de Ashton, mas, pela
forma como estava sorrindo nas fotos, não se importa nem
um pouco com os ataques que vem sofrendo.
Apesar disso, algumas pessoas dizem que Harper consegue
despertar o melhor de Ashton.
THE NEW CELEBRETIES

INTEGRANTE DA THE RECKLESS ENTRA EM BRIGA


EM CLUBE NA CIDADE DE CAMBRIDGE
Por Ravennah Hollow, em junho de 2024.

Fontes contaram que o baixista estava de passagem pela


cidade para visitar Harper Reeves, que é aluna da Escola de
Medicina em Harvard.
O casal foi visto junto e fotografado por fãs e paparazzi na
noite de sábado, mas quatro horas depois de estarem dentro
do clube, fãs filmaram o momento em que Ashton discutiu e
brigou com outro estudante, acusando-o de ter atacado
Harper.
A discussão não durou cinco segundos, o integrante da The
Reckless partiu agressivamente para cima do veterano de
medicina, o que gerou grande comoção no estabelecimento
e fez com que os dois fossem expulsos.
O dono do estabelecimento falou com a gente e contou que
várias vezes Ashton usava de sua fama, demonstrando
prepotência e superioridade ao tentar se justificar.
Mais uma vez, Ashton apresenta um comportamento
imaturo, instável e de grande preocupação para o seu futuro
com a banda.
Contudo, ele escreveu um texto para os fãs se desculpando
novamente e narrou o que de fato aconteceu: o estudante
em questão ofendeu Harper por sua orientação sexual — a
atual namorada de Ashton é bissexual — e ele explodiu na
hora, só pensando em defendê-la.
Pela primeira vez, Harper se expôs no Instagram de Ashton
e confirmou a versão dele. Segundo a caloura, a
perseguição do estudante já vinha acontecendo desde
quando ele descobriu que ela havia saído com a ex-
namorada dele no ano passado.
JULHO DE 2024

THE NEW CELEBRETIES

ASHTON BAKER E FINNICK TAYLOR SÃO VISTOS EM


CASA DE SWING EM LAS VEGAS
Por Ravennah Hollow, em julho de 2024.

A The Reckless encontra-se em pausa dos shows da turnê


até novembro. E enquanto alguns dos integrantes visitam
seus familiares e namoradas, Ashton e Finnick viajaram para
Las Vegas e foram vistos em uma casa de Swing.
Recentemente, Ashton e Harper estiveram juntos, mas
depois de vários questionamentos a respeito da estudante
de medicina, o baixista disse que os dois não passavam de
“bons amigos”, mas nós conseguimos imaginar os
benefícios que devem rolar nessa amizade. Por qual outro
motivo ele a levaria em um jantar romântico?
O termo “mulherengo” seria mais apropriado para descrevê-
lo, no entanto. Porque, estando correndo risco de voltarem
ou não, Ashton sempre usa seu tempo sozinho na
companhia de outras mulheres.
Finnick e Penni também tiveram um breve relacionamento,
ela até chegou a se declarar publicamente para o astro,
dando vários indícios de que as coisas entre eles estavam
fluindo bem. Porém, depois que Finnick foi visto em Las
Vegas, a foto que Penni publicou dois meses atrás foi
deletada. A cantora não se pronunciou sobre o fim do
relacionamento, mas aparentemente o romance durou
pouco.
Voltando ao garoto problema do grupo, Ashton Baker, ao
que parece, combina com um espírito livre e desapegado.
Junto da fama, trouxe consigo o peso de estar envolvido em
mais polêmicas do que conseguimos divulgar.
É melhor Ashton se cuidar porque pode levar o nome da The
Reckless junto dele para a lama.
“Todos sabem o meu nome agora
Mas algo sobre isso ainda me traz um sentimento estranho”
LONELY – JUSTIN BIEBER & BENNY BLANCO

LAS VEGAS, NV.


DIAS ATUAIS
DOMINGO, 28 DE JULHO DE 2024, ÀS 21H54MIN.

O retumbar da música reina em minha mente. A anastomose


da batida com o álcool no meu organismo são os causadores da
perda de sentido.
É a porra do meu aniversário e, pela primeira vez, sinto que
estou distante de ter uma comemoração de verdade. Levei tanto
esporro de Jared nas últimas semanas que sinto que minha cabeça
foi violentada repetidamente por horas.
Fretar um voo de Nova York para Las Vegas está longe de ser
um problema como costumava ser quase dois anos atrás. Bastou
uma ligação para Kimberly, nossa assistente pessoal — também
conhecida como minha maior apoiadora e defensora —, e ela
conseguiu rapidinho um jatinho particular para me trazer à melhor
cidade que já conheci.
A melhor parte é que eu nem precisei me esforçar para Kim
me amar, ela simplesmente me acha incrível — embora tenha
certeza de que não preciso listar aqui os motivos disso, é bem
óbvio.
A imprensa, por outro lado, não me ama como a Kim. Não,
eles me odeiam. Cada passo que dou pareço estar sob o olhar
vigilante dos jornalistas, paparazzi e toda a doente indústria musical.
Nós nem começamos direito e já sou visto como o “garoto que
levará a The Reckless a sua ruptura”. Fodam-se todos eles. Esses
merdas escrotos. Não tem ninguém nesse grupo que ame mais, que
se dedique mais, que faça mais do que eu faço pela The Reckless.
Estou literalmente na berlinda por querer curtir a minha vida
como fazia antes. A grande diferença é que agora tudo que faço vira
matéria, polêmica ou alguma revoltada jogando um processo
estrondoso nas nossas costas, como Isabella Wren — porque ela
não quer só nos processar por danos morais, quer ferrar com a
nossa reputação. Mais especificamente a minha reputação. Levar os
caras comigo é só um brinde.
Ravennah Hollow tem uma relação incrível de amor e ódio
comigo.
Olho para cima, para os dois brutamontes sobre mim como se
fossem minha sombra. Wade, nosso chefe de segurança, só me
permitiria subir no jato que me trouxe à Las Vegas, se eu
concordasse que dois dos seus melhores homens viessem comigo.
Max e Lucca. Porque me recuso a sair no meu aniversário na
companhia de dois grandalhões e não saber o nome de nenhum
deles. Estou esperando o momento em que se cansarão e voltarão
para o hotel, me deixando sozinho para conseguir comemorar da
maneira que mereço.
Tanto estresse, conversas com advogados para lidar com o
processo, agendamento de reuniões e todas essas merdas… Bella
não só está com raiva pela sua demissão, mas está querendo
vingança pelo pé na bunda que não aceitou. Se é que foi mesmo um
pé na bunda. Nunca tentei enganá-la com promessas de um
relacionamento.
Minha fama ruim vem desde as minhas raízes. Não prometi
flores e chocolates no Dia dos Namorados. Não prometi um anel de
noivado no próximo Natal. Não fiz nada que desse a entender que
nós teríamos um futuro juntos.
É por isso que eu amo a Harper. Ela não está preocupada se
vou telefonar, se o que fazemos é sério. Para ser sincero, às vezes
me sinto muito usado porque a lindinha não se importa se vai ferir
os meus sentimentos ou com como me sinto quando conversa
comigo sobre seus outros relacionamentos-não-relacionamentos.
Sim, porque, de alguma forma, ela acha que temos essa
intimidade.
Harper sai mais com outras mulheres do que homens.
Segundo ela, sou o primeiro em muito tempo. Ela até consegue me
iludir um pouco quando fala isso. Sinto-me ridículo quando fico com
ciúmes dela porque claramente não estou querendo um
relacionamento, mas perceber que Harper se diverte pra caralho na
minha ausência me enlouquece ainda mais.
Minha primeira garrafa de uísque passa da metade e, quando
me inclino para servir um pouco mais, ofereço para Max e Lucca.
Ambos rapidamente balançam a cabeça, sem emitir nenhum som.
Tento conter a frustração por estar sem companhia nesta noite,
não conseguindo controlar um revirar de olhos, o que atrai mais a
atenção dos meus seguranças para mim.
Por minha causa, a área do camarote está vazia. Kimberly
telefonou antes para o dono do clube, explicou quem estava vindo
para curtir a noite, e o proprietário garantiu — depois de um
depósito generoso, claro — que teria esse espaço apenas para
mim. Mas não sei onde foi parar a diversão, se tenho que fazê-la
sozinho.
Bryan e Aidan voltaram para Humperville e ficarão lá até
quarta-feira, quando teremos uma reunião com a nova equipe de
estilistas. Chase, rendido como é, deve estar em casa com Theresa
— não entediado, porque esses dois sabem como se divertir e são
barulhentos sem medo —, e Finnick é um cuzão egoísta. Ele prefere
ficar em casa com um cigarro de maconha a sair comigo.
Segundo Finn, por minha causa, naquele dia na casa de
Swing, ele entrou no radar de Ravennah e quer estar comigo o
mínimo que conseguir — em público — porque, aparentemente, sou
um ímã de problemas.
— Vocês não têm que ficar parados aqui. Não preciso de babá
— ironizo, engolindo a dose de uísque quente, que arde ao entrar
em contato com a garganta. — Podem me esperar no hotel.
— Claramente você precisa de babá. — Max ridiculariza, seus
olhos castanho-escuros firmados sobre mim. — As últimas notícias
são a prova disso.
— Ei, eu sou seu chefe. Posso te demitir por isso.
A mandíbula de Max contrai com a ameaça, mas ele não
debate. Imagino que a contração dos músculos em seu rosto é um
esforço para não me dar uma boa resposta — que eu mereço por
ter sido um cuzão cheio de ego.
— Foi mal, eu não te demitiria — tento corrigir, mas Max não
parece querer mais bater papo e mantém os olhos erguidos e fixos
em um ponto distante. — Será que eu posso, pelo menos, descer?
— Indico com o queixo para a pista de dança, onde corpos suados
estão saboreando uns aos outros.
— Com certeza não. — Lucca define. — Melhor tomar sua
bebida e irmos embora o quanto antes. Sabe que temos que estar
em Nova York pela manhã. — Minha babá verifica seu relógio de
pulso.
Cruzo os braços, fazendo bico como uma criança quando
recebe “não” da mãe.
Tenho tudo que sempre quis com a banda: dinheiro, adoração
dos fãs e, de novo, dinheiro. Porém a sensação é de que não
cheguei ao fim da linha. Ao contrário, quanto mais sucesso a The
Reckless faz, mais distante a linha de chegada fica.
Não me sinto tão solitário porque tenho os caras, mas, ainda
assim, a impressão de estar sendo engolido por tudo o que nós
temos não sai de mim. Ela insistentemente me obriga a correr mais
do que minhas pernas e meu fôlego aguentam. As garotas são
distrações temporárias, confesso que gosto de ser louvado quando
estou com alguém que me admira.
Passei a vida sendo rejeitado pelo meu pai, tentando
impressioná-lo, e meus esforços nunca foram validados. Em
algumas das minhas sessões de terapia com Erin — à qual Jared
me obriga a frequentar —, sinto que estar com várias mulheres é
uma forma de encobrir esse trauma infantil.
Quando estou com elas, sei que sou bom em algo: sexo. Sexo
selvagem, com carinho, a três… Sou bom em modo geral. Mas
quando o assunto é me envolver emocionalmente, porra, eu travo.
Meu passado com Nicola é um grande fator, sei disso. Aquela
mulher me fodeu para qualquer outra que vier. Ela me usou para se
tornar o rosto da joalheria do meu pai e, mesmo que isso tenha sido
uma traição dolorosa demais, não consigo ficar com raiva dela.
Por outro lado, agora, mais do que nunca, me sinto inseguro
para qualquer outro relacionamento. Principalmente porque não sou
mais só um herdeiro.
Sou Ashton Baker, baixista da The Reckless.
Nunca sei se as mulheres estão comigo por quem eu sou ou
pelo que eu tenho a oferecer.
Traumas, traumas e traumas.
Não peguei meu celular nenhuma vez nesta noite, mas quando
a tela acende com uma notificação de mensagem, o recupero da
mesa para descobrir de quem é.
É de Gravity. Não é inusitado e, sendo sincero, não estou nem
um pouco surpreso. Apesar de ter certeza de que ela me odeia com
toda a força do seu ser, não teve um aniversário em que Gravity não
me desejou parabéns.
Quando desbloqueio a tela e abro sua aba de conversa, lá
está:
Gravity:
Feliz aniversário!
E só. Seca, insensível como em todas as outras que já me
mandou. Faz-me até pensar que só escolheu me felicitar porque
Theresa a convenceu.
Bloqueio a tela outra vez e devolvo o aparelho para a mesa.
O pior de todos os aniversários. Nem estou sendo dramático
dessa vez. Confesso que ainda espero que minha ex-melhor amiga
no mundo inteiro deixe o orgulho de lado e resolva se desculpar
comigo. Porque a culpa é dela, com certeza.
Não disse nada para ofendê-la. Se Delilah se sentiu
minimamente incomodada com algo, que ela tenha a decência de
me procurar para resolvermos essa situação. Caso contrário, ficarei
feliz em continuar sendo o cuzão que me acusa de ser.
Com tanta porrada que a vida te dá, ser um filho da puta é um
dos menores dos problemas. Essa noite entediante precisa
melhorar.
Pego de volta meu celular. Já decorei o número dela e,
enquanto não ouço sua voz manhosa do outro lado da linha, não
desisto.
Cai na caixa de mensagens, mas insisto e nesta, quando Effy
atende, sua voz de sono é quase música para meus ouvidos.
— Ainda é meu aniversário! — Não tento conter a empolgação.
— Eba, feliz aniversário — murmura com uma animação
forjada, o bocejo preenchendo a linha. — Ashton, o que você está
fazendo? — Como se fosse despertada pelas retumbadas de
Rumors tocando, a voz de sono é preenchida por preocupação.
— Estou enchendo a cara em Las Vegas. — Recupero o copo
de uísque da mesa, bebendo em goles curtos. — Por que você não
se arruma e desço em Humperville com meu jatinho?
— Você gosta é de se exibir. — Ouço o roçar dos lençóis
quando Effy, provavelmente, se levanta da cama. — Por que está
me ligando? Sabe que preciso estar no trabalho amanhã cedo.
— Me diz por que nós nunca ficamos? Nem uma vezinha?
— Você deve estar totalmente bêbado para me fazer uma
pergunta estúpida dessas.
— Nós costumávamos ser melhores amigos e, confesse, você
sempre me achou gostoso.
— Tenho olhos, então, sim, já te achei um gostoso, mas não é
necessariamente por isso que vou cair no seu papo. Toda semana
seu nome está nos sites e revistas de fofoca, não é? Até Angel sabe
que uma publicação sobre você tem mais engajamento que
qualquer outro assunto.
Um suspiro de desânimo rasga minha garganta.
— Meus amigos são todos uns fodidos traidores. É meu
aniversário. Eles deveriam estar comigo.
— Sério que sou a sua única opção para ligar tarde da noite e
encher o saco?
— Sério que você prefere dormir em vez de falar comigo? No
meu aniversário?
— O que você quer? — Deixa uma risada nasal fugir. — Que
eu me arrume e voe para Las Vegas?
— Você faria isso por mim?
— Claro. — Faz uma pausa dramática. — Que não! É domingo
e eu trabalho amanhã! — Quase grita para me lembrar que Effy,
assim como as outras, tem uma vida que não condiz em nada com a
minha.
Em seguida, é como se uma mão se fechasse em torno da
minha garganta e, porra, a ardência se acumula em meus olhos
mais rápido do que consigo refrear. Abro a boca para responder,
mas desisto no instante em que sinto a traqueia tremer. Se falar
qualquer coisa, vou denunciar a voz empossada de choro.
Na realidade, a fama é uma vertente de nossas vidas pouco
compreendida. Não tanto pelas pessoas à nossa volta porque elas
sabem a proporção do que alcançamos, mas por nós mesmos.
Principalmente eu.
Sei que não posso viver mais como antes. Sei tão bem disso
que é pavoroso pensar que nunca mais poderei sair com alguém
sem que isso se transforme em notícia nos tabloides, assunto para o
Twitter fofocar ou para as pessoas me etiquetarem como
“mulherengo”. Não que estejam errados, porque sei que não estão e
que faço merda. Sou explosivo na maior parte das vezes e não
tenho nenhuma paciência para as pessoas que ficam em cima de
mim como urubus, tentando se apropriar de qualquer pedaço meu.
Mas é extremamente assustador assistir ao impacto que você pode
causar nos meios de comunicação.
O que podem falar sobre você sem conhecer 1% de quem
realmente é. Tudo que aparece em sites e revistas é só um pouco,
quase nada, na verdade, do que somos.
Para muitos, não passamos de um meio para um fim. Hoje,
tudo onde o nome da The Reckless está, irrompe e em pouco
tempo, está em todos os lugares. É enlouquecedor. Surreal.
Contudo e principalmente, assustador.
— Ei, você está aí? Ashton? — Effy me traz de volta, e eu
endireito os ombros, pondo minha dignidade de volta ao seu lugar.
— Escuta, eu sei que é complicado. Você estava acostumado a uma
vida totalmente diferente, mas essa é a realidade pela qual sempre
lutaram. Nem tudo é como esperamos. Alguns acontecimentos
bons, vêm acompanhados de outros ruins. Eles andam em conjunto.
Você não pode ter apenas a melhor parte das coisas, precisa das
ruins para crescer e amadurecer. — Suspira e, mesmo a
quilômetros de distância, eu quase posso sentir sua mão tocar a
minha, em um sinal de acolhimento. — Eu te amo e não é com todo
o meu coração, é com toda a minha alma. Eu te amo porque você é
o Ash, e não o Ashton Baker, baixista da The Reckless. Você é um
moleque irritado e impulsivo. Eu te amo porque você seca as
minhas lágrimas todas as vezes. Eu te amo porque, apesar de
turrão, você tem um coração gigante. Nada pode mudar o que sinto
por você. Nenhuma notícia estúpida. Queria poder comemorar seu
aniversário com você, mas vocês estavam em turnê até duas
semanas atrás.
— Eu sei… — rumorejo. Tento esconder o embargo, mas Effy
ri baixinho, me dando a entender que não fui nada eficiente.
— Você vai ficar bem, certo?
— Sabe que sim. Eles precisam de muito mais para me
derrubar, Effylin.
Conhecendo como a conheço, sei que ela está sorrindo, dessa
vez nem se incomodando que eu a chame assim, embora o apelido
esteja atrelado a lembranças ruins.
— Por que não vem para cá em vez de voltar para Nova York?
— Eu quero, mas não posso. Não estou no meu melhor
momento com Jared, pelos motivos óbvios…
— Então, a gente se vê em algum momento deste ano?
— Faremos uma pausa da turnê em dezembro, então é um
talvez. — Termino de beber o uísque e, embora Effy esteja sendo
compreensiva, dá para notar no seu tom de voz como fica infeliz
com a resposta.
— A gente prometeu se encontrar ao menos uma vez no ano,
mas a última vez que te vi foi no seu aniversário do ano passado.
— É uma loucura tudo o que aconteceu nos últimos anos. —
Esfrego a cabeça, ciente de que as coisas não voltarão a ser como
eram em Humperville. — A gente ainda vai se ver neste ano, Effylin,
prometo. Mas bem que você podia vir até aqui agora…
— Nem se eu pudesse me teletransportar.
— Desculpa te acordar, fiquei meio melancólico de repente.
Effy faz uma pausa, e posso apostar no que possivelmente
está arquitetando em sua mente.
— A convivência com a Gravity tem sido difícil?
Travo a mandíbula e uma bola de areia sufoca minha traqueia.
Gravity. Meu tópico sensível.
Gravity se mudou no ano passado para o apartamento de Tess
duas semanas depois que finalizamos a turnê de Caóticos. Nossa
relação é passivo-agressiva. Eu sei que ela me odeia e eu a odeio
de volta, meu orgulho é a última coisa que tenho e não pretendo
perdê-lo porque tivemos uma relação que não deu certo.
Salvo pelas visitas no apartamento de Theresa — na maioria
das vezes, por causa de Harper quando está em Nova York —,
quase não a vejo. Sei que trabalha com Magdalene Saylor, uma
estilista de renome, e que ela e Tess se aproximaram bastante no
último ano, mas com certeza Vity se esforça pra caralho para evitar
me encontrar. E claro, com a produção do nosso novo álbum,
nossos encontros foram esporádicos pela falta de tempo minha e
dos caras.
— Não. A gente quase não se vê — resumo. E apesar de ter
muito mais o que falar, decido que não preciso. Effy deve saber
muito por Vity. — Mas você já sabia.
— Na verdade, não. Gravity não fala sobre você.
Tento fingir que isso não fere meu ego, mas o amargo se
expandindo dentro da minha boca prova o contrário.
— Nunca?
— Gravity é muito reservada quando o assunto são os
sentimentos dela. Acho que prefere guardar para si mesma. A única
coisa que sei é que as coisas no trabalho estão difíceis. Yael a
enviou para Nova York para trabalhar com Magdalene para que
Gravity tivesse a chance de criar os próprios modelos, mas ela
reclama que a mulher a trata mais como uma assistente pessoal do
que como aprendiz. Enfim, as coisas estão duras para ela.
— Por que está me contando isso? — especulo, uma
sobrancelha arqueada esperando a resposta com curiosidade.
— Estou só te relatando que Gravity não tem tempo a perder,
mesmo que seja para te odiar. — Effy ri. — Já passou da meia noite.
Não é mais seu aniversário.
— Cretina…
— Passei os últimos minutos do seu aniversário ao telefone
com você e tenho certeza de que consegui te impedir de fazer
alguma burrice que te coloque em destaque no TNC amanhã.
Impediu-me por enquanto.
Depois que me despeço de Effy e confiro o que ela disse,
tenho certeza de que esse foi o pior aniversário de todos. Estou puto
com meus melhores amigos por preferirem ficar com as
namoradas? Estou, mas eles também estão enlouquecendo comigo
por tudo que aconteceu com Isabella. Entretanto, não significa que
tenho que ter uma noite de merda.
Olho para Max e Lucca, intercalando com a garrafa de uísque
quase vazia. Minha tolerância para o álcool aumentou
exponencialmente no último ano e ingerindo com água, torna a
embriaguez a coisa mais estúpida do universo. Mal sinto o efeito e
quando vem, passa tão rápido, que preciso beber um pouco mais
para tentar amenizar a angústia provocada pela tão almejada,
porém estereotipada, fama.
— Preciso de mais. — Mostro a garrafa praticamente vazia
para um dos seguranças. — Eu mesmo iria buscar, mas sabem
como é... Tenho babás.
Max não resiste rolar os olhos dentro dos orbes e, assentindo
para Lucca, dispensa o segundo segurança. Lidar com um deles é
fácil.
— Preciso mijar enquanto ele não volta com meu uísque.
Ajeito a camisa branca social, dobrando-a até os cotovelos.
Max não objeta, mas seu olhar carregado e felino me acompanha
até o banheiro. Se o lugar estivesse cheio, seria muito fácil me livrar
dele como em tantas outras vezes.
Quando volto, vejo que Max está distraído mexendo no celular.
Todos eles trabalham da mesma maneira: atualizando Wade de
como estão indo as coisas, assim, nosso chefe de segurança
atualiza nosso empresário, que nesse momento adoraria me
devolver para o buraco de onde me tirou.
Calmamente passo pelas costas de Max, os ombros largos do
brutamontes são sua própria desvantagem porque servem como um
bloqueador de visão para mim. Pé ante pé, corro em direção à
escada e acelero quando estou na metade dela, me infiltrando entre
os corpos suados.
Assim que estou cercado pelo calor humano, o odor de suor e
maconha penetram minhas narinas, me deixando zonzo. No cerne
de todo o tumulto, sinto-me liberto.
Now, de Chase Atlantic, toca, e danço ao ritmo da música.
Avisto uma garota rebolando em minha direção. Minhas mãos
pousam em seu quadril, sua bunda empinada resvalando minha
virilha e me deixando com tesão. Minhas bolas se apertam no
material da cueca quando ela gira o quadril em mim.
Minha última trepada foi há muito tempo porque estou tentando
me manter longe de problemas — que as garotas com as quais
durmo não têm nada a ver. Reconheço que o único problema sou eu
e a minha inabilidade de manter o pau dentro da calça, a raiva
constante sob controle e a minha impulsividade sempre falando
mais alto.
Acredito no amor. Sim, acredito que posso encontrá-lo. Mas
duvido que consiga mantê-lo. Sou incapaz de deter alguma coisa
sem apodrecê-la no processo.
Existe uma parte de mim que acredita que ser rejeitado pelo
meu próprio pai e ter lidado com o julgamento a vida inteira é uma
forma de o destino dizer que não existe nada para mim no fim da
linha. Eu só preciso curtir o máximo que conseguir. Como se fosse
morrer amanhã.
Nunca acreditei mesmo que teria uma vida longa.
“E eu sei que não vai, mas ainda estou aqui
Esperando que isso fique melhor agora”
2 CIGARETTES – JACK & JACK

NOVA YORK, NY.


QUARTA-FEIRA, 31 DE JULHO DE 2024, ÀS 08H33MIN.

THE NEW CELEBRETIES

ASHTON BAKER É VISTO COM FILHA DE BILIONÁRIO


EM
CLUBE AGITADO NA CIDADE DE LAS VEGAS
Por Ravennah Hollow, publicado há 1 dia.
Baixista da The Reckless comemorou seus 26 anos em uma
boate conceituada na cidade de Las Vegas no último
domingo.
Ele foi visto aos beijos com a modelo Ayla Knylee, e eles
saíram juntos ao fim da noite. O pai da jovem é dono de uma
grande porcentagem de cassinos na cidade e não faltou
comentários a respeito do encontro inusitado entre o astro
do rock e a modelo da Victoria’s Secret.
Ayla publicou em seu Twitter que ela e Ashton se
conheceram na boate e que, apesar de terem se dado bem,
não passou de um caso de uma noite.
Tudo que envolve os integrantes da The Reckless acaba se
tornando assunto e foi em respeito aos fãs da banda que a
modelo decidiu se pronunciar sobre a relação com o astro.
Havia especulações de que ela estava em um
relacionamento sério com o jogador de basquete americano,
Sawyer Blake, mas o mesmo não expressou sua opinião
sobre os burburinhos que aconteceram entre domingo e
hoje.
A história se repete: Ashton está sempre envolvido em
polêmicas amorosas e conturbadas. Embora Harper e ele
apareçam juntos com frequência e ela dizer que não
acontece nada seriamente entre eles, muito se fala nas
redes sociais que o baixista da The Reckless, além de
mulherengo, não exerce nenhuma consciência sobre seus
envolvimentos. Sobretudo porque, apesar de não haver
seriedade em suas relações, é imprescindível que exista
responsabilidade sobre seus atos.
Gostaríamos de lembrar que seu caso com Isabella Wren
ainda é um grande problema para o grupo, e Ashton não
demonstra nenhum arrependimento — mesmo que tenha
falado à público que sente muito. Segundo nossas fontes,
um homem como ele só está interessado em usufruir do que
a fama lhe provê, sem nenhuma sensatez do que seria certo
ou errado.
É nítido que a fama atingiu a banda precocemente e que
nenhum deles esperava tamanho sucesso em tão pouco
tempo, mas essa não é uma desculpa para que o baixista
saia por aí agindo e tratando mulheres como seus
brinquedos sexuais, com o objetivo de aplacar qualquer
insegurança que carregue dentro de si.
Pessoas se machucam e se sentem usadas quando são
tratadas dessa maneira. Raramente, como editora do TNC,
exponho minha opinião pessoal sobre qualquer celebridade
que venha a publicar aqui, mas me sinto na
responsabilidade de dar um pequeno conselho para Ashton:
aprenda a valorizar os diamantes que você tem. Mulheres
não devem ser tratadas como seu depósito emocional.
— Que porcaria é essa?! — brado, empurrando o iPad para
Kimberly. Pela contração no músculo facial de Ava, estou ferrado.
Tipo, muito. — O que ela disse não tem nada a ver, porra!
Responsabilidade? Depósito emocional? Que caralho, nunca me
envolvi com ninguém que não estivesse totalmente ciente dos meus
interesses!
— Não importa. Esse tipo de crítica mancha a sua imagem. —
Jared cerra o punho embaixo do queixo, me encarando de soslaio.
— Com todo o respeito com as pessoas aqui, mas você não
consegue manter o pau dentro da calça? — Arqueia uma
sobrancelha, ela quase tocando o topo de sua cabeça. — Pode não
parecer ruim o bastante para você, Ashton, mas nós temos um
grande problema com a Isabella e você continuar na sua vida de
libertinagem só atrai mais a impressão de que é completamente
irresponsável.
— Com todo o respeito também, mas por que a porra da minha
vida sexual é da conta de alguém? — Bufo, revirando tanto os olhos
que as costas da minha cabeça doem. — É sexo. Todo mundo gosta
de sexo.
— O problema não está em gostar de sexo — Avalon interfere,
pressionando o osso do nariz com os dedos —, está no fato de que
uma integrante da equipe foi demitida porque você decidiu que
queria isso.
— Porque era impossível continuar trabalhando com a Bella!
Ela estava fazendo da minha vida um inferno!
— Então, não trepe com a nossa equipe. — Finnick ironiza,
suas sobrancelhas loiras arqueiam. — É muito simples. Mantenha
seu pau, suas mãos e sua boca longe das mulheres que trabalham
com a gente.
— Estão dizendo que a demitiu porque Bella não quis
continuar dormindo com você. Ela pode te acusar de assédio. —
Camille, nossa advogada, elucida, torcendo os lábios. — Minha
sugestão é oferecermos um acordo. É mais seguro. Pagamos uma
quantia generosa e você faz uma nota de esclarecimento,
assumindo a responsabilidade.
— Cami… — Faço que não, sacudindo rapidamente a cabeça.
— Eu não assediei ela!
— Sim, você assediou. — Jared me observa, a decepção
tornando o castanho dos seus olhos mais intenso. — Ela pode ter
concordado em dormir com você, mas quem foi que deu o primeiro
passo? Você. Regras existem para serem cumpridas. — Desvia
brevemente a atenção para Chase e, apesar da tensão, sinto
vontade de rir. Acho que nosso empresário nunca vai superar que
um de nós trepa com a filha dele. — Faremos o acordo. Daremos a
quantia que ela quiser, Camille.
— Pode deixar. Vou agendar uma reunião.
Jared suspira, esfregando o cavanhaque.
— Não vou admitir coisa nenhuma, porra. Ela quis sair comigo!
— Confere: você a seduziu. — Chase me provoca, mas exala
em seguida, mantendo os olhos presos em mim. — Não importa que
ela quis, irmão. Na sua situação e com as críticas vindo de todos os
lados, você se defender ou querer manter seu orgulho só vai piorar
as coisas. Melhor fazer o que a Camille disse.
— Isso é ridículo! — Desfiro um soco na porta da van,
avocando a atenção das oito pessoas aqui para mim. — Inferno! —
Outro soco repercute no veículo, e minha arcada dentária começa a
doer com a contração da mandíbula. — Não é nem um pouco justo.
Por que tenho que pagar por algo que não fiz?
— Mas você fez. — Aidan me encara, a argola prateada em
sua orelha e os anéis enfeitando os dedos refletem com a luz do sol
pelas janelas. — Você dormiu com ela, a dispensou e ainda a
demitiu. Você nem deveria ter tido um envolvimento com ela, para
começo de conversa.
— Concordo que tenho um problema sério com
relacionamentos, mas isso não significa que tudo que faço não seja
de forma consensual. Isabella quis cair de boca no meu pau.
Aponto para o meu membro, e Camille precisa virar o rosto
para outra direção, para que eu não testemunhe seu desdém. Mas
conheço nossa advogada. Nesse momento, ela gostaria de me
atirar pela janela.
— E por que tenho que admitir assédio, se nós dois
claramente estávamos nos divertindo? Pago a quantia que ela
quiser, mas nem fodendo que vou fazer uma admissão dessas.
Mexe com a minha índole. Posso ser um filho da puta mulherengo?
Posso, sim, mas não sou desrespeitoso. É o que a imprensa quer
que eu admita, que sou um abusador, e não vai acontecer. Nem por
cima do meu cadáver!
— Ashton pode ter razão. — Kimberly reflete, entrando em
minha defesa. — Se ele assumir algo assim, a reputação que já é
ruim, ficará pior, e não estamos falando de prejudicar somente a ele,
como todos nós. Pelo que consta, Isabella só está processando por
demissão sem justa causa e o acusando de abuso de poder. Apesar
de ter sugerido um processo por assédio, ela admitiu publicamente
que foi consensual. Estamos nos precipitando sem nenhuma
necessidade. Agora, o que precisamos mesmo é dar um jeito de
limpar a sua barra com a imprensa. — Passa os dedos pela testa,
parecendo irritada com a situação. — Ravennah não está com jeito
de que vai te perdoar facilmente e, se tem uma coisa que ela odeia,
são homens que acham que dinheiro é poder e, por isso, podem
tratar as mulheres como descartáveis. Ela vai passar a manchar
ainda mais sua reputação como uma forma de rebelião. Ravennah
controla o maior site de notícias de celebridades do país e tem
poder para destruir vocês. Vamos dedicar nosso tempo em
encontrar uma solução rápida para esse assunto.
— Só se o Ashton se casar. — Bryan caçoa, rindo sozinho de
como “casar” e “Ashton” soa na mesma frase. Quando para de rir,
limpa o canto dos olhos. — Sério, você teria que colocar um cinto de
castidade nele, Kim. Desde que o conheço, ele é assim. —
Direciona-me o olhar, sustentando a minha encarada mortal. — E
você não vai mudar. Nem pela The Reckless.
— Acha que não consigo? — Eu o desafio.
— Você está me perguntando se acho que você não consegue
ficar sem sexo? Você não consegue. Está na cara que essa é uma
coisa que te consome.
— Não tenho dependência no sexo — replico, assistindo-o
aprumar a postura e se curvar em minha direção. — Posso manter
meu pau longe de problemas, se quiser.
— Ótimo. Por que não começa hoje? — Avalon me encara,
cruzando os braços. — A sua assessoria de imprensa está cheia de
problemas para resolver porque você e o seu amiguinho não
conseguem se controlar.
— Tudo bem. Mas esse problema com Ayla poderia ter sido
evitado se os meus melhores amigos estivessem comigo no meu
aniversário! — berro, olhando para os quatro traidores.
— Tínhamos outro assunto para resolver. — Bryan me
responde com indiferença. — Nosso mundo não gira a favor do seu.
— Prefiro não falar com vocês até voltarmos à turnê. — Viro o
rosto para o lado oposto ao deles, afugentando minha carranca de
decepção.
— Ele sabe que moramos juntos? — Aidan finge estar
tentando me excluir da conversa, mas fala alto o suficiente para a
van inteira escutar.
— Ele só está fazendo o charme de sempre porque detesta ser
deixado de lado. — Chase ri.
A van para, cortando minha fala no meio do caminho. Quando
olho pela janela, vejo que a entrada da Reeves Records está
cercada por paparazzi com suas câmeras a postos.
Não faço ideia de quanto vale uma foto boa da The Reckless,
mas, para recebermos tanta atenção assim, imagino que muito.
Esperamos até que Wade salte do banco da frente e os outros
quatro seguranças desçam do carro que veio à frente para, então,
sairmos.
A porta de metal range ao abrir. Flashes disparam e ofuscam
minha visão. Sinto uma mão, provavelmente de Max, pesar sobre
meu ombro ao me empurrar em direção à porta giratória do prédio
da gravadora.
— Ashton, você dormiu mesmo com Ayla? Sabia que ela
estava em um relacionamento com Sawyer?
Ouço a pergunta de algum dos fotógrafos, mas sempre somos
instruídos por Avalon a não responder, e deixo Max me guiar para
fora da confusão. Entretanto, antes mesmo de alcançarmos o prédio
que é nosso objetivo, uma robustez corpórea me arremessa para
trás e a dor se expande em meu queixo, assim como o gosto de
cobre se avoluma na minha língua.
Leva pouco mais de alguns segundos para minha mente
atordoada processar que porra está acontecendo, mas, antes de
pensar em reagir, a força centrípeta de outro soco atuando em meu
corpo faz com que eu gire e cambaleie. Não sinto mais a mão de
Max no meu ombro, apenas um peso gigantesco me mantendo
imprensado no chão e um punho fechado e encorpado descendo
com grande potência em meu rosto.
Tento usar os braços para bloquear os ataques, mas é inútil e,
por mais que queira devolver cada soco que o desgraçado está
disparando, não existe brecha para revidar, então só tento aceitar as
investidas até que um dos fodidos dos seguranças me livrem disso.
O peso dos socos que a pessoa lança em mim é quase de
uma tonelada e minha lombar fica cada vez mais inserida no
concreto sólido onde fui derrubado.
A adrenalina me impede de sentir dor, mas sei que tem sangue
escorrendo de mim porque o cheiro é forte e o líquido descendo por
meu nariz, espesso.
Demora menos de um minuto para Max e Lucca afastarem o
responsável por essa merda, mas, para mim, que fui atacado
desprevenidamente e preso ao chão, foi como se esse pouco tempo
tivesse durado uma eternidade.
Estou cego pela vertigem e a pulsação agressiva do meu
coração dentro do peito pode ser sentida no alto da minha garganta,
mas minha primeira ação é tentar partir para cima do filho da puta
que me socou até arrancar sangue. Porém, antes que consiga
concluir meu plano, os braços atléticos de Wade se engancham aos
meus, me puxando para trás.
Pisco descontroladamente, tentando atenuar a tontura
causada pelos socos que recebi na lateral da cabeça. Minha voz se
perde, sendo esmagada pela passagem da garganta que se aperta
com a necessidade de sugar mais ar.
Sacudo os ombros, tentando me livrar das amarras humanas,
mas Wade luta bravamente contra mim e preciso confessar que,
apesar do meu tempo dedicado na academia, meus braços em
comparação aos dele não são nada.
— Quem você pensa que é, seu desgraçado?! Vou te matar!
— berro, chutando o ar. — Filho da puta de merda! — grito tão alto,
que minha garganta dói e meus ouvidos estão fechados para todos
os comentários ao redor. — Me solta, Wade! A gente te paga para
quê, hein?! Deixou esse imbecil chegar perto de mim e me atacar!
— Você se acha muito bom, não é?! — O outro refuta, gritando
tão alto quanto eu.
Meus olhos finalmente se abrem e o cara diante de mim tem
quase dois metros de altura e cabelos cortados rente à raiz. Sua
camiseta branca está manchada de sangue, mas muito
provavelmente é o meu, porque ele continua intacto.
Não sei de onde ele veio para ter conseguido chegar tão perto.
Imagino que estava esperando por mim dentro da gravadora, caso
contrário, não teria conseguido se aproximar de maneira tão
assertiva.
— Você dormiu com a minha namorada, porra!
— Sua… o quê?! — Franzo o cenho, sentindo desconforto no
supercílio.
— Ayla. Vai me dizer que já se esqueceu do nome dela?
— Ayla Knylee? — reflito. A lembrança da noite de domingo, a
garota que dançou para mim e voltou comigo para o hotel. A garota
que Ravennah Hollow disse que era filha de um bilionário e modelo.
Engulo em seco, a ardência causada na garganta pelos gritos
incomoda. — Eu nem sabia que ela tinha namorado. Detalhe que
ela esqueceu de mencionar.
— Quieto! — Wade murmura atrás de mim.
Só então minha consciência bate. Estamos na entrada da
gravadora, cercados de testemunhas e mais paparazzi prontos para
cavar minha cova e jogar terra por cima do meu corpo frio.
Analiso minha situação com cuidado e faço o que Wade
manda. Pressiono um lábio no outro, embora esteja muito ansioso
para socar o desgraçado e devolver alguns dos hematomas que
ficarão em mim.
— Solta ele — ordeno para Max e Lucca.
Eles hesitam, mas quando Sawyer sacode os braços, se vê
finalmente liberto.
Encarando-me, sustenta meu olhar com uma vontade
desenfreada de terminar de me bater até que o ar não esteja mais
atravessando meus pulmões.
Wade, enfim, me solta, e respiro fundo, usando as costas da
mão para limpar o sangue escorrendo do nariz.
Quero olhar à minha volta, ver quantas pessoas
testemunharam essa cena ou como meus amigos estão me olhando
nesse momento, mas confesso que, pela primeira vez, me
envergonho por uma escolha que fiz.
Em um modo geral, me sinto orgulhoso por ser tão bom de
cama e por poder ser livre para dormir com quantas mulheres
quiser. Nunca tive problema em admitir que as pessoas têm razão
quando me acusam de ser um escroto do caralho ou mulherengo,
tanto faz.
As mulheres me querem e eu as quero tanto quanto.
Entretanto, enquanto olho para Sawyer, realmente me sinto mal. O
jogador bruto de basquete tenta disfarçar a mágoa e muito
provavelmente usou da sua ira irremediável para reverter o choro.
Sinto pena dele.
Ayla não disse que estava comprometida e não me pareceu
alguém que trairia o namorado, então que porra ele está fazendo
aqui é um grande mistério, que não tenho certeza se quero
descobrir.
— Não pense que acabei com você! — Ele avisa, antes de dar
as costas e sair por entre a multidão que se aglomerou ao nosso
redor.
Wade pondera segui-lo após a ameaça, mas o impeço ao
agarrar seu pulso. Eu mesmo estou com vontade de socar Sawyer
pelas costas e a única coisa que me impede é o olhar furioso de
Jared.
Vasculho à minha volta, sentindo a pressão da minha
respiração me sufocar. Empurro os fios de cabelo para trás e puxo a
bainha da camiseta contra o rosto para limpar o sangue, deixando
um pedaço da pele do meu abdômen para fora.
Caminho com pressa para dentro do prédio, nossos
seguranças erguendo uma muralha ao meu redor, mas as
indagações explodem atrás de mim e mais flashes das câmeras se
descarregam na minha direção. A vertigem acentua com a
luminosidade e firmo os pés, tentando ser ainda mais rápido.
Impulsiono-me para a porta giratória, me sinto ser engolido
para o outro lado quando a atravesso. Passos altos repercutem
atrás de mim, a equipe inteira se instala em silêncio profundo, mas
minha mente é constantemente atropelada pelos pensamentos.
Que merda. Se as coisas para mim estavam ruins, acabaram
de piorar. A filha do bilionário e modelo também era comprometida.
Paro de repente quando meu celular vibra no bolso e, ao puxá-
lo para fora, vejo o nome de Ayla na tela. Nem me lembro de termos
trocado nossos números de telefone. Estava bêbado demais.
Ayla:
Sinto muito, muito mesmo.
Sawyer é controlador. Nós estávamos dando um tempo,
não estava com ele. Juro que vou tentar remediar as
coisas de cá. Espero que você não tenha mais
problemas.
Bloqueio a tela novamente. O peso em minha cabeça é tanto,
que a deixo cair para trás, cedendo ao cansaço. Para Ayla ter me
enviado mensagem, significa que as coisas já devem estar
bombando nas redes sociais, no Twitter e no Instagram
principalmente.
Levanto a cabeça, determinado a seguir em frente. Temos uma
reunião com a nova equipe de estilistas para, então, definir o retorno
da turnê e divulgar as datas, porém, detenho meus passos, sentindo
aquela mão ao redor da minha garganta, prendendo meu ar até que
a oxigenação esteja baixa quando a vejo.
Seu cabelo escuro cai em ondas encorpadas por cima do
ombro até a altura do seio. Poucas são as pessoas que conseguem
me fazer sentir como ela faz.
Pois é. Minha antiga paixão de Humperville. A mulher que eu
humilhei em Paris quase quatro anos atrás e que continua sendo
meu vórtice sistêmico.
Sempre que uma matéria nova sai, me pergunto que diabos
deve pensar de mim, se a sua raiva cresceu com o passar dos anos
ou se simplesmente a deixou para trás e superou o fato de eu ter
saído com minha ex-namorada enquanto estava com ela em Paris.
Sou mesmo um filho da puta egoísta.
Contudo, quando seu olhar cruza com o meu, não me sinto
nem um pouco confortável com o que vejo exalando dele.
Odeio tanto o jeito dela de me olhar quanto ela odeia a mim.
“Você tem estado no topo
É hora de te derrubar”
GONE – JESSICA BAIO

Costumo acusar o destino das merdas que acontecem comigo,


mas, desta vez, pressiono a língua no céu da boca e impeço a
contestação de vir à tona porque quando o transformo no maior
causador das minhas desgraças, elas sempre tendem a piorar.
No momento em que Ashton passa por mim, seguido por seus
seguranças, ele age como se eu não estivesse em seu caminho e
presenciado o que aconteceu do lado de fora.
O homem em questão, Sawyer, chegou aqui antes de mim,
mas as notícias estavam em toda a internet. Explodiu como uma
bomba o que aconteceu entre Ayla e Ashton.
Nos últimos anos, entendi o que Ashton é e, mesmo de longe,
tenho observado como leva sua vida, e não é nada monótona. Ele
gosta do caos. Tem uma atração forte por problemas. É impulsivo,
muitas vezes violento e, quando está com raiva, fica cego. Essa sua
personalidade se apurou depois que a The Reckless se tornou o
centro das atenções na imprensa.
Foi também nesses últimos anos que entendi o quanto Ashton
e eu somos diferentes. Tais diferenças que nos trouxeram até esse
ponto em que sentimos mais raiva um do outro do que qualquer
coisa.
Detestamos nossas personalidades. Não temos identificação
um no outro em absolutamente nada. Mantemos a nossa relação de
“coleguismo” porque não podemos nos evitar sempre, mas tento me
manter distante dele o máximo que consigo.
Quanto mais distante, menores são as chances de atrair
problemas para mim.
— Oi, o que está fazendo aqui? — Aidan franze a testa ao
perguntar.
— Adivinha só quem é a possível estilista da The Reckless? —
devolvo sem rodeios, até porque, estou ciente de que o suspense
que Magdalene criou durante esse tempo foi uma forma de
impressionar sua equipe. Mas quando soube que trabalharia com os
meninos, não houve nenhuma comoção, apenas certo desdém e
uma vontade imensa de explicar para ela o motivo de que isso
nunca funcionaria.
— Tá brincando? — Arregala os olhos, surpresa chega às íris
verdes presas em mim. — Por que não me contou?
— Não sabia. Magdalene fez suspense. E eu nem conseguia
imaginar. Quando é que estilistas renomados trabalham como
figurinistas? Raramente acontece. Quanto ofereceram?
— Sinceramente, não faço ideia. Jared e Avalon que cuidaram
de todos esses detalhes. — As sobrancelhas platinadas arcam, e
prendo o suspiro na garganta ao ver a porta do elevador fechar e
Ashton com os seguranças subirem primeiro. — A gente quase não
te vê e você está morando aqui há um ano! Onde é que você se
esconde?
Levo minha atenção de volta a ele.
Bryan, Chase e Finnick entram em seguida, falando baixo
sobre o ataque que Ashton sofreu antes, e acabo perdendo a linha
de raciocínio para responder à pergunta de Aidan.
Assim que os três me veem, a musculatura de seus rostos
suaviza e vejo sorrisos se desenharem. Bryan se apressa ao me dar
um abraço, Chase me cumprimenta em seguida da mesma forma
atenciosa, mas Finnick se contenta com um meio sorriso e um
aceno.
— Ouvi direito? Você vai trabalhar com a gente? — Bryan
especula, a mesma expressão de surpresa predominando em seu
rosto.
— Magdalene contou hoje de manhã que tínhamos uma
reunião com a The Reckless.
— Porra, isso é demais! — O vocalista comemora, exibindo a
arcada dentária perfeita ao sorrir.
Não costumo levar a minha vida considerando o que as
pessoas pensam ou deixam de pensar de mim, mas tenho
trabalhado duro durante muito tempo.
Dediquei-me aos estudos como ninguém, trabalhei em todo
tipo de lugar para conseguir dinheiro e me sustentar na França e na
Itália — embora Darnell tenha me ajudado várias vezes durante
esses anos, não quero ter que depender do meu cunhado para tudo
—, e a essa altura, esperava estar realmente criando, ao menos
ganhando um pouco de espaço no ateliê de Magdalene. Mas tudo o
que recebi desde que comecei a trabalhar em Nova York foi uma
lista imensa de afazeres que não estão relacionados com o que
realmente pretendo aqui.
Mesmo com tudo estando prestes a desmoronar, me esforço
para ninguém perceber. Effy é a única pessoa que sabe, até então,
como as coisas estão difíceis.
Não quero pensar que toda a minha dedicação dos últimos
anos não valeu de nada e, querendo ou não, a The Reckless é um
dos nomes mais importantes na indústria da música. Embora não
seja a área na qual quero atuar, estar envolvida em um projeto com
eles significa visibilidade e, quem sabe, uma chance de finalmente
poder criar algo meu.
— Você vai trabalhar com seus amigos, mas não parece
empolgada. — Aidan semicerra os olhos para mim.
— Como é que eu estaria? Vocês são todos dramáticos e dão
muito mais trabalho que uma sala inteira de crianças. — Reviro os
olhos e entro no elevador que acabou de chegar, sendo seguida
pelos outros. — Mas não se ofendam, só não vim para Nova York
para trabalhar como figurinista. Meu objetivo é outro. — Cruzo os
braços, encolhida no canto.
— E qual é o seu objetivo? — Chase pergunta inocentemente.
— Porque trabalhar com a gente é uma boa. Estamos em quase
todas as revistas, sites e canais de TV.
— É impressão minha ou todos vocês ficaram convencidos?
Se vangloriando de tudo que conquistaram — observo, com uma
sobrancelha levantada para eles.
— Qual é! Sabe que nenhum de nós se vangloriaria disso, só
estamos apontando os fatos e os fatos são que somos a banda mais
famosa atualmente. — Bryan se explica com um sorriso convencido.
— E estamos te dando autorização para tirar proveito. Além do
mais, podemos passar mais tempo juntos. Precisávamos mesmo de
alguém familiar nessa turnê. Não tem uma vaga disponível para
assistente de figurinista? Talvez você possa convencer Mackenzie a
vir trabalhar com você! — exclama. O plano, embora seja ruim, vejo
uma fagulha de esperança sincera no tom azulado de seus olhos.
Acabo rindo e não sou a única, Chase e Aidan também
gargalham alto.
— E Ashton não será um problema — Aidan continua o
monólogo de Bryan, chamando a atenção para o fato de que nós
dois não nos suportamos — porque ele passa muito tempo ocupado
tentando ser um grande “gostosão” — faz aspas com os dedos das
mãos para acentuar — para as mulheres com as quais ele sai.
Não sei quando foi que Ashton e eu chegamos a esse abismo
de raiva e estranheza. Defini meus sentimentos e minhas
prioridades em nossa última vez juntos e tive mais uma confirmação
do que éramos um para o outro naquele dia em sua cabana, quando
finalmente entendi o que tinha acontecido com Nicola. Mas jurei, em
prol do meu relacionamento com nossos amigos, que faria tudo que
estivesse ao meu alcance para manter nossa interação amigável.
Por um tempo, consegui.
Foi tão fácil que pareceu que o que tinha acontecido não nos
afetaria em mais nada. Na inauguração do The Icarus, por exemplo,
foi quase como se tivéssemos voltado há quando nós sequer
imaginávamos ter qualquer envolvimento amoroso.
Até o famigerado dia em que Jared McAvoy surgiu na vida
deles e me vi presa em um looping inexplicável de rancor.
No começo, achei que estava com raiva. Ashton não vale
nada, estou ciente disso e descobri uma dura realidade: estava tão
ressentida com ele que desejei que não fosse feliz, que não tivesse
sucesso, que vivesse uma vida infeliz e solitária. Foi assim que
descobri meu ódio por ele. Quando torci pelo seu sofrimento.
Dessa maneira, também descobri que ele não quebrou as
barreiras do meu coração como achei que fosse capaz de fazer. Só
vi um bote no meio do mar acenando para mim e me agarrei a ele
como se minha vida dependesse disso. Mas quando a realidade me
puxou de volta, entendi que Ashton era só mais um passatempo. Ele
é como todos os outros que estiveram na minha cama e não
passaram de sexo.
A fissura onde fica o meu coração continua aberta e eu
continuo procurando alguém que seja capaz de fechá-la. Porque é
desesperador sentir que os dias de dor são intermináveis enquanto
os felizes têm sempre um prazo para acabar.
Mesmo que tenha lembranças boas guardadas, são as ruins
que ditam como levo a minha vida e como me sinto em relação a
tudo e a todos.
Assim que a porta do elevador abre, sigo os meninos pela
direita e depois, à esquerda, então, enfim, estamos diante de uma
sala grande a qual consigo espiar pela porta entreaberta. A mesa de
reuniões está quase toda ocupada pela equipe da The Reckless e
de Magdalene — inclusive a própria já está acomodada —,
esperando os outros membros da banda para começar.
Caminho em sentido à Magda e, no instante em que seus
olhos pousam em mim, provavelmente analisando minhas botas de
couro que vão até os joelhos, o vestido preto justo no meio das
coxas e o blazer branco, sua feição vira reprovação. Trabalho com
ela há tempo suficiente para saber quando está me julgando, mas
não dou a mínima.
Puxo uma cadeira para me sentar ao lado dela.
— Com licença. — Magda pigarreia, falando mais alto, e
chama a atenção de todos para mim. — Pode sair. Você não
participará da reunião. — Estuda-me dos pés à cabeça e,
envergonhada, olho à minha volta.
Como uma zombaria do destino, Ashton está com seus olhos
pretos colados em mim. Os hematomas da briga estão em todos os
pontos de seu rosto; boca, nariz, queixo e sobrancelhas. Porém o
sangue sumiu e tem alguns curativos borboleta nos cortes.
— Por quê? — murmuro a pergunta, evitando uma cena.
Magda retira os óculos e suspira, girando na cadeira.
— Você está atrasada. Sabe que detesto atrasos.
— Cheguei na hora. Só estava conversando com…
— Não importa com quem esteve. Se não consegue levar
nossos compromissos à sério, você sequer merece estar aqui.
Conhece nossa política e a prioridade é sempre os clientes.
Minha mandíbula trava. Sinto a dor nela e uma vontade súbita
de chorar faz a ardência por trás dos olhos ser pavorosa. Estou com
uma resposta pronta na ponta da língua, mas preciso me agarrar a
esse emprego com todas as forças da minha alma e tentar, ao
menos, tirar proveito de algo disso. Não posso respondê-la como
gostaria.
Magdalene Saylor é uma das estilistas mais influentes. Estar
no meu currículo que trabalhei para ela abrirá inúmeras portas para
mim.
Repito como um mantra que é temporário, até que as lágrimas
sucumbam à determinação de fazer esse emprego dar certo. Alinho
a postura, me recompondo e a encaro com um sorriso que disfarça
o desconforto em minhas feições.
— Tem razão — sussurro e, mesmo que tente deter a direção
para qual meus olhos vão, eles pousam em Ashton, que me estuda
com a testa franzida. — Sinto muito, Magda. Vou esperar lá fora.
— Volte para o ateliê e confirme nossas outras reuniões. Se
você se sair bem, pode ser que te deixe participar de uma delas.
— Farei isso.
Volto a cadeira para o lugar e começo a me distanciar,
torcendo para que não notem como estou envergonhada ou como
sinto uma esponja na garganta me sufocando ao passo que me
aproximo da porta.
— Ela é sua aprendiz?
Ouço a voz rouca por cima do ombro e, antes de atingir a
porta, viro no salto das botas, encarando o dono da mesma com
raiva.
— Como é? — Magda diz em um tom risonho.
— Aqui diz que ela é sua aprendiz. — Ashton folheia alguns
papéis sobre a mesa, mantendo a atenção fixa em Magdalene. —
Por que está tratando ela como alguém que é descartável na sua
equipe? — Ondulações marcam a pele de sua testa ao confrontá-la.
Cala a boca! Cala a boca!
É o que quero gritar para ele, mas a impulsividade desse
garoto é insuportável em níveis catastróficos e penso que, se tentar
impedi-lo, só vou conseguir instigá-lo mais a enfrentá-la.
Ashton detesta ser contrariado, mas principalmente ser
desafiado.
— Ela não se atrasou, chegou com os outros membros da The
Reckless. Então, por que caralho você está mandando-a embora?
— Ashton. — Jared, o empresário, censura à cabeceira da
mesa ao ouvir o palavreado.
— Só estou perguntando — justifica, sucinto, sem desviar os
olhos de Magdalene.
Cada músculo que forma seu rosto parece tenso e, ainda que
esteja pronta para sair, não consigo dar mais nem um passo. Ele vai
destruir o resto da minha semana se irritá-la.
— Isso não importa. Só cabe a mim decidir como lidar com a
minha equipe, e não a você — desafia. E, pelo pouco que conheço
dos dois, a minha chance de ter qualquer visibilidade trabalhando
com a The Reckless está indo por água abaixo. — Por quê? Ela
dormiu com você também?
Nesse momento, meu estômago embrulha, e Ashton lança seu
olhar tempestuoso em minha direção.
— Não me espantaria, considerando sua reputação e a dela.
— Magda relaxa, jogando a coluna contra o encosto. — Gravity é
talentosa, mas tem um péssimo hábito. Só neste mês, tive que
demitir dois dos meus melhores colaboradores porque ela não
conseguiu manter as pernas fechadas.
O rubor sobe e me sinto aquecer da base do pescoço até a
cabeça, onde uma dor lancinante se espalha rapidamente e a
vergonha me toma. Os olhos dele ainda pesam sobre mim.
— E se tiver?
— Te diria que não poderemos trabalhar juntos. Não misturo
trabalho com relacionamentos.
— Então, acho que acabamos por aqui.
Empurrando a cadeira, Ashton se levanta, marchando em
minha direção com o peito estufado e o olhar minando a ira.
Saio do caminho quando percebo que ele não está pensando
em se desviar ou parar porque estou bloqueando a passagem. Sem
olhar para mim, cruza a porta com uma máscara impenetrável em
seu rosto.
Os outros que estão sentados à mesa também se levantam, e
ouço Jared, assim como Avalon, expelir pedidos de desculpas para
Magdalene, dizendo que precisam de um tempo para conversar com
a equipe e que voltarão a entrar em contato.
Já estive em algumas outras reuniões com Magda, e todos nós
sabemos que não importa quem esteja sentado do outro lado da
mesa, se não fecham o negócio no mesmo dia, significa que a
primeira chance acabou e é provável que não exista uma segunda.
Fico estagnada no lugar, assistindo a todos saírem e passarem
por mim.
Na vez de Magdalene, meus pensamentos estão lentos e
definitivamente tento encontrar uma desculpa para dar a ela, mas
não sei qual seria a mais aceitável.
O que Ashton fez não tem nada a ver com me defender ou se
opor a uma atitude abusiva, mas sim de descontar a raiva que está
sentindo do que aconteceu instantes antes dessa reunião. Está
pondo em mim sua frustração pelo ataque de Sawyer.
Os efeitos colaterais de Ashton afetam sempre as pessoas que
estão mais próximas e hoje, para o meu azar, sou eu.
Magda assume uma postura ereta e rígida ao se pôr diante de
mim.
— Magda, sinto muito. Nós nos conhecemos, e talvez ele
tenha…
— Está demitida.
— O quê?! — A incredulidade muda meu tom de voz para
baixo e consternado.
— Passe no ateliê para acertarmos os detalhes em dois dias,
não antes disso. Prefiro não ter que olhar para você por mais tempo
hoje.
— Você não pode me demitir!
— Não posso te demitir? — Entreabre os olhos, focando sua
atenção em mim. — Escreverei um e-mail para Yael expondo minha
opinião sincera sobre você. Acho que de todas as aprendizes que
recebi, você é a mais irresponsável, descontrolada e,
definitivamente, sem talento algum! — esgoela-se, e seu corpo vibra
à medida que suas palavras se tornam mais cruéis. — Pensa que
não te dei nenhuma oportunidade porque sou mesquinha? Não. Não
te dei porque você ainda não atingiu o que é preciso para trabalhar
nesta área. Você é determinada, admito, mas não tolero petulância.
Milhares de respostas se formam em minha mente, mas
nenhuma delas está à altura da humilhação que acabei de passar.
E, por mais que seja um desejo inerte, não consigo expor todas as
coisas que gostaria de dizer para Magda.
Durante um ano trabalhando com ela, não aprendi nada além
de como gosta de seu latte descafeinado, seus horários no salão e
na massagista. Passei um ano aprendendo sobre sua vida pessoal,
lidando com uma personalidade prepotente e soberba, ouvindo
coisas que realmente preferiria morrer a escutar outra vez.
Sim, acabei dormindo com dois dos colaboradores da equipe
de Magda, mas não, não houve falta de profissionalismo em
nenhuma das partes porque dentro do ateliê, agimos com discrição.
E, mesmo assim, quando ela descobriu, fez questão de demiti-los
na minha frente, me culpando por estarem sem emprego agora.
Apenas o resquício do perfume de Magdalene fica. Levo uma
mão à testa como se fosse capaz de reduzir a pungência da dor de
cabeça que estou sentindo.
Mais uma vez, a raiva que sinto de Ashton cresce em um
espiral que faz meu corpo trepidar em resposta e o autocontrole que
Magda me acusou de não ter está prestes a se romper como um
véu frágil.
Saio da sala, pisando duro e olhando para os lados, tentando
definir qual direção tomar para encontrá-lo.
Jared ainda está no meio do corredor. Dessa vez, demoro para
reconhecer a figura feminina discutindo com ele. Suponho que seja
Sydney, a proprietária da gravadora. E embora tenha respeito por
ambos, minha raiva é quem está no controle das minhas ações e
não me detenho da minha intenção.
Passo por eles, ouço meu nome saindo da boca de Jared, mas
não soa importante o bastante para conseguir me parar. Como
previsto, vejo Ashton escorado à parede do outro corredor, cercado
por Bryan, Aidan, Chase e Finn. Eles conversam e estão imersos no
assunto, portanto, não percebem minha chegada.
Meu punho se fecha. Faço exatamente como Theresa me
ensinou no kickboxing para o qual me arrasta aos sábados e, sem
pensar em nenhuma consequência do que estou prestes a fazer,
desfiro um soco na mandíbula de Ashton. Ele não vê o que o atinge
quando se desequilibra, mas uma parte de mim sente-se tão
satisfeita por ter explodido que não consigo me arrepender.
Meu soco não foi forte o suficiente para derrubá-lo, Tess
estaria decepcionada comigo por eu não ter levado nossas aulas de
defesa pessoal tão a sério como ela leva.
Sacudo a mão, a dor nas juntas dos meus dedos se espalha e
escondo meu semblante contorcido atrás de uma expressão plena.
— Porra, Gravity! — pragueja, massageando o local onde o
acertei. — Por que você fez isso?! — indaga com a ira elevando seu
tom. E, em vez de me afugentar, dou um passo à frente, o que o
obriga a dar um para trás.
— Por quê?! Porque me fez ser demitida!
— Então, te fiz um favor! — rebate, ainda acariciando a região
avermelhada do seu rosto. — Por qual motivo você estava deixando
ela falar daquele jeito? Se submetendo a essas merdas…
— Porque no mundo real, para conseguir alguma coisa, você
precisa ficar quieto em determinadas situações! Não sei em que
mundinho tem vivido, mas acredite em mim, isso é mais comum do
que você imagina.
— Quer que eu consiga seu emprego de volta? Se quiser,
posso ligar para Magdalene e resolver o problema. — Ergue as
mãos, proferindo sua rendição. — Mas para de fazer um escândalo!
Desde quando faz esse tipo de coisa?
— As coisas mudaram e, se acha que pode se intrometer e
ainda pensar que está sendo um herói, preciso te mostrar onde é o
seu lugar. Se você se meter na minha vida outra vez, vou infernizar
a sua na mesma proporção!
Começo a me afastar quando ouço-o gritar:
— Estava tentando ajudar!
— Babaca arrogante!
Não me despeço dos outros, mas sei que mais tarde vou
receber mensagens e ligações deles, tentando amenizar minha
situação com Ashton como toda maldita vez.
Ainda assim, só estou bolando um plano para conseguir
recuperar meu emprego. Yael é uma grande estilista e foi aluna de
Magdalene. Ela colocou toda a sua reputação à prova por minha
causa. Não posso decepcioná-la.
“Queria que você estivesse lá para me levar para casa
Então eu não teria que me sentir sozinha”
HEART – THE PRETTY RECKLESS

SEXTA-FEIRA, 02 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 18H25MIN.

THE NEW CELEBRETIES

ASHTON BAKER PODE SER ACUSADO DE ASSÉDIO


EM GRAVADORA, REVELA FONTE
Ravennah Hollow, publicado há 2 horas.
Fontes próximas revelaram que a equipe jurídica da The
Reckless pode estar se preparando para um novo caso
judicial de Ashton Baker.
Fotos comprovam que dois dias atrás, após uma reunião
com Magdalene Saylor, uma ex-aprendiz da estilista
respondeu às investidas do astro com um soco na
mandíbula. Também nos foi confidenciado que Ashton foi o
motivo da demissão da garota que aparece nas fotos.
Uma lista extensa de envolvimentos amorosos segue o
músico, mas, acima de tudo, todas estão acompanhadas de
polêmicas preocupantes.
Não é de hoje que Ashton Baker se prova ser uma má
influência para os jovens fãs que o acompanham, e na
internet, surgiu a preocupação sincera de que forma as
atitudes do baixista estão impactando aqueles que o veem
como inspiração.
Nossa fonte nos informou que Magdalene, assim como sua
equipe, estavam cotados para trabalhar como os novos
responsáveis pelo figurino da banda para retomarem sua
turnê.
Para manter o anonimato da garota das fotos que estão
sendo divulgadas, não iremos expor seu nome ou redes
sociais, mas gostaríamos de salientar nossa real indignação
com a insistência nas atitudes de Baker.
Tem menos de setenta e duas horas que o mesmo foi visto
ameaçando de morte o jogador de basquete Sawyer Blake.
Várias testemunhas disseram que ele parecia irreconhecível
enquanto ofendia o jogador.
A impulsividade e a agressividade do astro podem indicar
um transtorno explosivo não identificado.
Está em todo lugar. Fotos minhas de todos os ângulos
possíveis do momento em que dei um soco em Ashton. Contudo, foi
tirado de contexto e aplicado para de certa forma manchar a
imagem dele, que já está à beira da morte.
Leio a matéria publicada pelo TNC enquanto Tess e eu
dividimos uma garrafa de vinho. Em sextas-feiras como essa, Chase
aparece, mas devido à última publicação do site, foram
sentenciados a uma reunião com a assessoria de imprensa e
consequentemente estão incomunicáveis desde então.
Reli ao menos três vezes, tendo ciência de que Ravennah
publicou como uma forma de desafio. Tem vários pontos onde vejo
um furo ou outro, que a levaria a um processo gigantesco se a The
Reckless decidisse assim fazer. Mas acho que Jared sabe que a
intenção de Ravennah é abrir ainda mais esse buraco e tentar sugar
tudo o que puder deles.
Toda a história contada na matéria, para quem está lendo de
fora, pode ser coerente. Ashton está com uma reputação de merda,
principalmente depois do caso de Isabella.
Os comentários são de dar náuseas. São mais de pessoas o
atacando do que apoiando e, por um mísero segundo, me
arrependo do que fiz. Se não o tivesse atacado, essas fotos não
estariam agora espalhadas pela internet e um texto completamente
absurdo “justificando” as fotos vazadas não teria sido escrito.
Não sei o que a redatora do TNC está querendo, mas a cada
publicação atingindo Ashton, instiga uma guerra entre ela e a
reputação da The Reckless. E no meu ponto de vista, os meninos
estão perdendo.
Nossa melhor fonte para acompanhar a banda é o Twitter.
Existe uma conta nova além da “The Reckless Diary” da Tess, a
Central de fãs da The Reckless. Eles estão literalmente por dentro
de tudo, como se andassem lado a lado com os integrantes.
Assim que entro no perfil, vejo fotos que foram publicadas há
menos de quinze minutos, onde eles são guiados por sua equipe de
segurança para dentro da van que estão acostumados a usar para
se locomover.
Atualizo a página e outra foto é publicada. Dessa vez, é dos
meninos chegando a uma pizzaria na Times Square.
Um suspiro sôfrego escorrega por entre meus lábios e fecho a
capa do iPad. Tenho preferido usá-lo para desenhar minhas roupas
e estou montando um portfólio para tentar convencer Magda a me
readmitir.
Yael me ligou no mesmo dia. Não estava brava, mas
decepcionada, e depois de conversarmos por quase uma hora ao
telefone, disse que faria o possível para amenizar o desastre com
Magda.
Trabalhar com Magdalene é uma oportunidade que poucos
estilistas que estão começando têm e simplesmente joguei a minha
fora.
— Então, você deu um soco nele. — Tess ri por cima da boca
larga da taça, erguendo um joelho dobrado na frente do tórax. — Foi
bonito, viu?
— Não tem graça. — Bufo, bebendo o gole mais longo da noite
e quase esvaziando minha taça. — Ele literalmente entrou em um
problema ainda maior que o anterior por minha causa.
— Não importa qual seja a página, Vity, eles vão sempre
buscar por acessos. TNC quem divulgou meu relacionamento com
Chase e eles não se importaram com como meus pais reagiriam.
Não vão se importar com a reação dos fãs da banda também. Não
esquenta, meu pai vai encontrar uma solução para esse problema.
Uma das coisas que adoro em Theresa é sua maneira de lidar
com as coisas. Desde que a vi no ano passado, enterrando seu ex-
namorado abusivo junto da história deles, vi algo que ainda não
tinha visto em mais ninguém: ela é uma fortaleza.
Se estiver ao seu lado, é difícil que coisas ruins cheguem até
você porque Tess tem uma habilidade extraordinária de proteção e,
não importa quão difícil seja o problema, ela vai lutar com tudo o
que tem para te manter segura. É uma fortaleza estabelecida,
murando qualquer mal que tente penetrar.
Esse foi um dos motivos que me convenceram a me mudar
para cá. A princípio, pensei que seria uma péssima ideia.
Ashton e eu ainda temos nossos problemas, e eles, em sua
maioria, parecem que vão respingar nas pessoas que amamos.
E tem a Harper. Ela não me odeia. Está resolvida demais
sobre si mesma e seu relacionamento com Ashton para deixar
interferir nas suas outras relações, mas sempre que estamos no
mesmo cômodo, fica um clima estranho. Então, estou apenas
suportando esse processo até ter grana o suficiente para alugar
outro lugar. Vou sentir falta de Tess, mas não é como se não
pudéssemos nos ver com a mesma frequência.
— Você está bem? — pergunta, o brilho castanho-escuro dos
seus olhos me prende.
— Estou... É que foi bizarro.
— Eles são bizarros. Toda essa história com a The Reckless, a
fama crescendo mais rápido do que eles conseguem se acostumar...
Meu Deus, é coisa demais para lidar.
— Chase está bem com tudo isso?
Apesar de estar em Nova York, minha vida com eles não é
mais a mesma. Estamos em fases diferentes. Eu me sinto diferente
desde que fui para Milão e tive que enfrentar todo o tipo de situação
com as outras estudantes.
Desde que me mudei para Humperville, sou vista como
talentosa e descolada, mas em Milão, essa minha reputação não
significava nada. Lá, as outras futuras estilistas matavam por um
simples elogio de Yael sem se importar com quem tivessem que
derrubar no caminho.
Foi a fase mais difícil de toda a minha carreira. Estar em Milão
me fez abrir os olhos para a profissão que escolhi e, apesar de
sempre tê-la visto como algo fantástico, experimentei um lado
obscuro. Sempre que tinham oportunidade, as garotas de lá
costumavam me lembrar de que eu não era boa o suficiente e tudo
o que Magdalene me disse ontem só provou que estavam certas.
— Para ele, a fama não é um peso, eu acho. — Tess franze o
cenho, como se minha pergunta fosse uma novidade também para
ela. — Nós falamos sobre os shows, sobre como Ava pega no pé
deles e como meu pai ainda está ressentido pelo nosso
relacionamento, mas ele nunca se sentiu pressionado pela fama.
Chase evita ler o que as pessoas mandam para ele, tanto através
de mensagens quanto nos comentários, e isso o ajuda a não se
preocupar tanto com o que estão pensando dele por aí. Mas eu
acho que Ashton nunca se adaptou bem a essa loucura. Ele
adorava a vida que levava e nunca pensou que quando tivesse uma
reputação a zelar, precisaria se comportar melhor. Ele é um
crianção! — Ri ao terminar, bebendo o resto do vinho do fundo da
taça.
— Sabe o que é engraçado? Eu os conheço há muito mais
tempo, mas você parece que os entende melhor.
— Fui a primeira que eles conheceram quando chegaram a
Nova York. — Sacode os ombros com desdém.
— Até o Finn se abre com você. — Arqueio uma sobrancelha
para Tess, que ri abertamente.
— Talvez eles me vejam como a mais madura. — Ela tenta,
semicerrando os olhos. — Não sei, mas me irrito com eles, para ser
sincera. Jesus, arranjei um bando de crianças para cuidar — finaliza
com um sorriso maroto. — Sobre o Finn, acho que rolou
identificação, apesar de estar brava com ele a maior parte do tempo.
Há um momento de silêncio que se estende porque não estou
nem um pouco a fim de interrompê-lo. Vejo-a mordiscar o lábio
inferior, lutando para refrear a vontade de me interrogar.
Tess nunca foi invasiva, do tipo que faz muitas perguntas, e
desde que me mudei, nosso relacionamento é cordial. Nós duas
somos pessoas reservadas e nossa convivência tem sido boa pelo
fato de que estamos imersas demais em nossas próprias vidas para
nos importar de verdade em nos conhecermos. Até agora, quando
noto o desconforto chegar até os membros tensos do seu corpo e a
curiosidade munir seus olhos.
Minhas amizades são sempre mais sobre os outros do que
sobre mim mesma. Detesto falar sobre mim ou ter que me colocar à
prova para permitir que as pessoas atravessem um limite
claramente demarcado.
Mas Theresa é uma observadora. Mackenzie me contou que
ela percebeu tudo sobre Finnick sem ninguém precisar dizer com
detalhes. E, enquanto me encara, sinto que está desvendando todos
os meus segredos e, pela primeira vez em muito tempo, sinto-me
despida das minhas máscaras.
Encolho sob o olhar analítico e me inclino sobre meu próprio
tronco para alcançar a garrafa de vinho. Sirvo a nós duas ainda em
silêncio, até ele implodir com a voz suave de Tess.
— Não precisa se preocupar em conseguir seu emprego de
volta. Dava para ver o quanto estava infeliz com ele.
— Não posso cruzar os braços e esperar que outra
oportunidade como a que tinha com Magda apareça.
Um fluxo de ar separa meus lábios.
— Effy me disse que quando Mackenzie estava
desempregada, você fazia turnos extras no seu trabalho para pagar
a parte dela nas despesas de casa. Só estou dizendo para não se
apressar. Pode ficar aqui quanto tempo quiser e não se preocupe
com o dinheiro, porque Harper não cobra aluguel. — Ri como se
fosse uma piada, mas sinto o desconforto crescer no estômago. —
Parece que está acostumada a cuidar de todo mundo, mas não tem
ninguém para cuidar de você. Me deixa lidar com isso por enquanto
e você tem tempo para decidir o que quer fazer.
Ardência se acomoda atrás dos meus olhos ouvindo-a ser tão
gentil e calorosa.
Quando você cresce em um lar onde seus pais te protegem de
tudo e usam dessa desculpa para te manipular, descobre um vazio
intenso. Tenta encontrar uma justificativa para o que fazem, mas se
depara com mais perguntas.
Meus pais, principalmente a minha mãe, gostavam de como
me submetia às suas crenças e regras. Se ela me visse hoje, com
todos os homens com quem já saí, com tudo que já experimentei,
estaria me amaldiçoando pelo resto da vida, assim como a minha
própria geração, e não importaria que tivessem seu sangue porque
para Alyssa Monaghan, tudo o que tem de mais precioso é o
controle sobre suas filhas.
— Obrigada, Tess.
— De nada. Por mais que o papo esteja bom, preciso estudar.
Tem um caso que está me dando dor de cabeça na Baylor. — Seu
suspiro de desânimo corta o ar. — Se precisar de mim, é só me
chamar.
Ela acena com a mão esquerda enquanto leva na direita sua
taça de vinho. Aceno de volta e ponho os pés para cima da cadeira,
encarando meu celular com mensagens não respondidas de
Dannya e milhares de ligações de Mackenzie, Effy e Delilah.
A essa altura, já devem saber que estou em diversas páginas
de fofoca como a “mulher misteriosa que socou Ashton Baker”.
Decido retornar para Mackenzie primeiro. Conhecendo a
personalidade dela, se ignorá-la por mais tempo, é provável que
grave uma mensagem de voz terminando sua amizade comigo.
— Por que você não me atendeu?! — Sua voz impetuosa
dispara antes mesmo do segundo toque completar. — Fiquei
preocupada!
— Me desculpa. — Rio, apoiando o celular no ombro.
Desço da cadeira e caminho com a taça e a garrafa até o sofá.
Sentando-me nele com uma perna dobrada debaixo do corpo, deixo
a garrafa na mesa de cento e volto a segurar o aparelho com a mão
enquanto dou uma nova bicada na bebida.
— Você bateu mesmo nele? Isso foi há dois dias? Por que não
me contou nada?
— Porque não foi grande coisa. Estão fazendo tanto barulho
por nada.
— Não foi grande coisa? Você deu um soco na cara do
Ashton, Vity! É grande coisa, sim. O que foi que ele fez?
Minha derrota é evidente nessa discussão. Mackenzie é
teimosa e não só quando o assunto é se recusar a casar com Bryan.
Em todo quesito, essa garota consegue fazer minha cabeça ruir
quando define alguma coisa.
— Para variar, o babaca se intrometeu em um assunto que não
era dele, falou umas coisas durante a reunião da The Reckless para
Magdalene. Ela não gostou e me demitiu. — Descanso no encosto
do sofá, brincando com um fio invisível na barra do short do baby
doll. — Pensei que Bryan teria te contado. — Franzo o cenho, de
repente me dando conta de que é um assunto sobre o qual com
certeza eles teriam falado.
Mackenzie e Bryan conversam quase sempre por mensagens
— quando ele não está imerso demais produzindo músicas —,
então é meio difícil não ter mencionado minha briga com Ashton
quando ele e os outros estavam por perto, como testemunhas.
— A gente tem brigado.
— De novo? — exaspero, enviando o estresse para o fundo da
garganta e engolindo a resposta verdadeira que gostaria de dar a
ela. — Por que você só não se muda pra cá?
— Não posso só me mudar, Gravity. Você sempre diz que
devemos seguir nossos sonhos e ninguém tem que estar acima
deles.
— Sim, mas não tenho um relacionamento no meio do meu
sonho. Admita que você só está agindo como sempre age, sendo
orgulhosa e esperando que ele implore!
— Não vou me mudar e ponto-final — define. A linha fica
muda, mas ouço sua respiração acirrada. — Não quero brigar com
você também. Só liguei para ter certeza de que está bem.
— Estou bem. — Engulo todo o vinho da taça e a deixo na
mesa de centro. — Não precisa se preocupar comigo. Me conta por
que brigou com ele dessa vez.
Mackenzie não insiste em esconder os motivos e começa a
tagarelar. Quando não preciso falar de mim, é um tremendo alívio,
portanto, nem me importo que as pessoas prefiram que eu seja sua
ouvinte em vez do contrário. Mas tem dias em que simplesmente
quero não ter que lidar com nada ou ninguém. Não quero saber dos
meus problemas e muito menos os dos outros.
— Você é a pessoa mais importante da minha vida, Gravity.
Tem noção disso?
Sua testa vinca, encarando-me apreensivo entre as pestanas
densas.
— Você também é para mim.
— Contagem regressiva?
Ele sorri, notando que o relógio mudou para 23:59.
— Dez…
Eu te amo.
— Nove…
Você é tão importante para mim.
— Oito…
Quero que seja feliz.
— Sete…
Se houvesse algum jeito de te mostrar como meu coração fica
quando estou com você...
— Seis…
Sem você, meus dias são frios.
— Cinco…
Sem você, tudo fica cinza.
— Quatro…
Sem você, eu sinto que vou desmoronar.
— Três…
Sem você, não consigo me imaginar em nenhum outro lugar.
— Dois…
Você é a minha casa.
— Um…
Você é o meu lar.
Ele sorri. Um sorriso largo que quase atinge a ponta de suas
orelhas.
Neil escorrega o polegar pela cobertura da minha boca,
aparentemente desenhando seu contorno e, a cada pedaço de mim
que tenta gravar, maior o brilho em seus olhos.
Então, de repente, a visão perfeita que tenho se distorce e me
transporto para outro cenário.
Sinto o asfalto áspero enquanto corro. Ainda que esteja
usando tênis, é como se penetrasse a camada do solado e atingisse
a planta dos meus pés.
Continuo correndo. Reconheço a rua e ela é extensa e escura,
mas, por mais que deseje parar e olhar para trás, meu corpo me
obriga a manter os olhos no meu objetivo: minha casa.
Tropeço em meus próprios pés e uma voz desdenhosa caçoa
do quanto sou covarde. Ponho-me a correr outra vez. Quero gritar.
Sinto a voz embaraçar no cume da garganta e luto, me debato por
dentro, desesperada por gritar “socorro”, mas ela não vem. Está
aprisionada e é desesperador.
Ouço o disparo e a voz de Neil ecoando através de mim em
um grito letal. Sinto a umidade na palma das mãos, olho para baixo,
a fim de entender o que é que está causando a sensação, e vejo
sangue. Há tanto sangue em minhas mãos que é impossível
encontrar qualquer pedaço de pele que não esteja maculada com
ele.
Caio de novo. Dessa vez, tento impedir a queda pondo as
mãos à frente, mas meu corpo colide com uma região macia, porém
gelada, e quando entendo, estou caída sobre o corpo sem vida do
meu namorado.
— Gravity?
Arregalo os olhos e ergo o corpo para frente, sentindo a
respiração assolar meus pulmões. Suor pesa em minhas têmporas,
escorrendo até fazer o contorno da mandíbula.
Esfrego as pálpebras com os punhos até que minha visão
esteja em foco de novo e a imagem de Theresa com uma caneca
fumegante de café na mão se acentue diante de mim.
As dobras de pele que marcam sua testa me dizem que
aconteceu o que eu mais temia.
— Acho que estava tendo um pesadelo. Você está bem?
Olho aos meus arredores, percebendo que cai no sono no
sofá.
— Merda. — Empurro os fios de cabelo para trás, a umidade
neles se mescla com o suor em minha mão. — Sim, estou bem.
Acordei você?
Tess dá uma risadinha constrangida, e só então a olho com
mais atenção. Está usando suas roupas de ginástica para o
kickboxing.
— Não, você estava gemendo e não sei como acordar alguém
quando está tendo um pesadelo. Te chamei umas quatro vezes
antes de você despertar.
Ela me estende a caneca de café, e eu aceito, dando o
primeiro gole como se fosse água.
— É frequente? — Estuda minha expressão, tentando saber se
vou mentir ou dizer a verdade.
— Não, quase nunca tenho.
E é verdade. Quase nunca tenho, mas quando eles
acontecem, me destroem.
Já acordei em noites enjoada e não pude segurar o vômito por
muito tempo. Esses são os piores, aqueles nos quais o tormento
deixa de ser mental e passa a ser físico. É visceral porque o sonho
entra em conflito com a realidade e sou brutalmente atingida por um
passado do qual tenho me esforçado para convencer a mim e a
todos que nunca existiu.
Disparo minha atenção para Tess, esforçando meus lábios até
que construam um sorriso. Ela, entretanto, leva um tempo para me
retribuir, ainda se decidindo se o que estou dizendo é verdade ou
não.
Criei uma nova vida para mim quando me mudei para
Humperville. Estou apegada a ela, mesmo que os pesadelos
venham vez ou outra para me lembrar de onde saí. Estou disposta a
manter minhas máscaras, tudo o que fiz e me esforcei para ser,
assim como um camaleão, para me adaptar, proteger e,
principalmente, esconder as minhas marcas.
Forço minhas feições até se acentuarem em tranquilidade e
vejo que as de Tess começam a suavizar. Consegui.
— Você vem hoje?
Retorna para cozinha, suponho que para se servir de novo.
Meu pijama é um baby doll de short curto e cropped de alcinha. É
inteiro lilás com bolinhas brancas. No espaço entre os seios, o suor
marcou a parte de cima.
— Sim! — respondo empolgada, já me empurrando para fora
do sofá.
Por sorte, as noites estão quentes e não senti falta de algo
para me cobrir. Minhas manhãs com Tess no sábado são a única
coisa que realmente me mantêm estável. Ao menos, eram, antes de
Magda me demitir. Aquela vaca folgada fazia de tudo para a minha
semana ser horrível.
— Enquanto se troca, vou ligar para o Chase. Não tive notícia
dele desde ontem à noite, quero saber se está tudo bem por lá.
Encaminho-me para o quarto, mas concentro minha atenção
no outro lado do corredor, por detrás da porta. Consigo ouvir poucas
palavras como “agora?” e também “por quê?”.
Termino de vestir meu top, e Tess bate à porta do quarto.
Harper tem uma grande obsessão por cores e confesso que, às
vezes, meus olhos doem com as colchas de cama verdes ou rosa-
fluorescentes. Acho que é a única coisa realmente difícil de me
adaptar aqui.
Quero comprar minhas próprias roupas de cama, mas com o
meu salário de merda trabalhando com a Magda, tudo acabava nas
despesas. Nova York com certeza tem um custo de vida maior, mas
também existe o fato de que não estou mais deixando Darnell pagar
minhas contas. Isso porque Andie é a prioridade deles agora.
Precisa ser. E não quero que Dannya se abdique de mais nada por
mim.
— Então, é meio engraçado. — Tess começa, e viro o tronco
para encará-la por sobre o ombro. Ela está recostada no caixilho da
porta, me estudando passar a regata por cima da cabeça. — Meu
pai solicitou uma reunião com você.
— Comigo? — Assim como existe uma ruga separando suas
sobrancelhas, também cresce uma em mim. — Por quê?
— Ele não disse. Mas estão te esperando na gravadora.
Meus olhos se estreitam, carregados de curiosidade.
— Agora?
— É, agora. Perguntei se podia participar, mas ele disse que
precisa falar com você em particular. Acho que é sobre o que
aconteceu. — Tess bate a quina do celular na palma da mão, seus
olhos se perdem de onde devem ficar focados. — Você vai?
— Tenho escolha?
— Tirando o fato de que a sua foto agredindo um dos caras
mais famosos desse momento está se espalhando mais rápido que
uma pandemia, sim, você pode optar por ignorar. Mas, Vity... — Tess
adentra, se aproximando. — Li alguns comentários e, em alguns
deles, moradores de Humperville divulgaram seu nome. Então, é só
uma questão de tempo, senão algumas horas, até você estar mais
envolvida nisso do que qualquer um de nós.
— Passei um maldito ano inteirinho me escondendo disso… —
murmuro para mim mesma, pondo uma madeixa do cabelo atrás da
orelha. — Quem foi o desgraçado que tirou essas fotos?
— Alguém que estava desesperado por dinheiro. Uma foto dos
meninos vale muito, mas uma foto deles daquele jeito vale ainda
mais. Sei que você odeia essa atenção, céus... — Arfa, olhando
para cima e piscando pesado. — Posso entender melhor que
qualquer um o quanto odeio estar exposta desse jeito, mas tem
certas coisas que não podemos evitar, e o seu passado com o
Ashton é uma delas. Alguém vai querer vender informações sobre
vocês em Paris e vão pagar muito bem por isso. Não é melhor que
os fãs descubram por vocês?
Se Theresa soubesse que o problema não é meu passado
com o Ashton que me assusta tanto, não estaríamos tendo essa
conversa. As pessoas falam pelas minhas costas desde sempre,
não é algo que temo. Tenho sonhado com uma vida tranquila há
muito tempo e um pequeno momento de impulsividade está me
colocando no olho do furacão.
De qualquer forma, Tess tem toda razão e se as pessoas já
estão sabendo o meu nome, estamos mais perto de eu ser exposta
do que nunca.
“Mas não posso esperar dar a você
O que não posso dar a mim mesmo”
DYWTYLM – SLEEP TOKEN

Recebendo ligação de Pai.


Ignoro mais uma das milhares que foram realizadas nas
últimas vinte e quatro horas. Se tem uma coisa que Conrad Baker
odeia, é ser rejeitado.
Minha caixa de mensagens de voz está cheia e não pretendo
esvaziá-la com a intenção de deixá-lo ainda mais puto. Posso estar
sendo infantil? Sim, é verdade. Mas nada me diverte mais do que
deixar meu pai puto de raiva.
Viro a tela do celular para baixo, brincando na cadeira giratória.
Finn não tira seus olhos de águia de cima de mim, como se
esperasse que fosse tomar outra atitude que me colocará de novo
em maus lençóis.
Nas últimas vinte e quatro horas, fui ainda mais atacado depois
de Isabella Wren expor sua opinião sobre como sou um escroto do
caralho. Não tem nada mais cansativo do que uma garota que não
superou um término.
Eu a entendo, juro que sim, porque no lugar dela, também
estaria decepcionado por ter terminado comigo. Contudo, não dá a
ela o direito de aproveitar o palco a cada polêmica que surge com
meu nome.
Ravennah Hollow me odeia. Sim, não tenho nenhuma dúvida
quanto a esse sentimento. Tudo que ela tem publicado sobre mim
nos últimos meses é o seu jeito de mostrar o quanto. E não estou
tentando argumentar que sou o mocinho.
Posso ser muitas coisas, mas não fujo da responsabilidade.
Sou merecedor de toda a raiva direcionada a mim. Mas não estou
dizendo que Ravennah tem o direito de expor outras pessoas. Acho
que estou começando a entender — e aceitar — que essa é a
minha vida.
Não foi assim que imaginei nosso sucesso, mas, depois de
uma reunião de quase quatro horas, que mais parecia um sermão
de Sydney, Avalon e Jared, chegamos à conclusão de que
precisamos resolver esse assunto o quanto antes.
Minha reputação ruim está apodrecendo as outras maçãs
nesse cesto e a última coisa que quero é ver a banda sendo
prejudicada por minha causa.
Porra. Nós brigamos, paramos de nos falar e passamos por
tantas merdas juntos nos últimos anos, que não é justo que tudo
seja em vão por minha causa. Culpado e envergonhado soaria
como um eufemismo para o meu estado nesse momento.
No auge dessa situação, concordaria com qualquer coisa para
o controle de danos funcionar. Se descobrisse quem foi o filho de
uma puta que tirou fotos minhas e de Gravity brigando e vendeu
para o TNC, acho que seria capaz de enterrá-lo vivo. As pessoas
não entendem. Mesmo que eu e os caras sejamos figuras públicas,
ainda necessitamos de espaço e privacidade.
Outra coisa que Jared disse, com bastante ênfase, é que não
importa o quanto eu repita que ninguém tem nada a ver com a
minha vida, a partir do momento em que lançamos o primeiro álbum,
assinamos nossa sentença. Para coisas boas e as ruins, não
importa o quanto seja errado a invasão, ainda foi uma escolha
minha. Não posso querer só o dinheiro, preciso aprender a lidar com
a fama e o caos que a acompanha.
Querer usufruir do meu dinheiro, seja com sexo, drogas ou
festas, não é da conta de ninguém, mas não sou mais um estranho
para as pessoas que andam na rua. Eu sou famoso. À medida que
as coisas vão acontecendo, estou entendendo a proporção do
quanto e que, cada escolha estúpida minha, me leva à outra
armadilha de merda. Todo mundo está pronto para usar do meu erro
para me atingir. É disso que eles vivem, querendo ou não.
Para ser sincero, a pior parte não foram as publicações da
TNC e outros sites de fofoca, foi ver como os fãs estão lutando para
nos defender e que, a cada passo em falso que dou, seus
argumentos estão diminuindo.
Tenho medo de um dia acordar e não estarem mais lá. Saber
que existem é uma das coisas que me faz mais feliz hoje, senão a
única. Por esse motivo, concordei com essa reunião e, apenas por
isso, estou pendendo para o plano de Jared.
Preciso me casar.
E precisa parecer uma decisão consciente e sincera.
Não posso deixar nenhuma brecha para que esse segredo se
volte contra nós no futuro. Porque a partir do momento em que a
notícia se espalhar, não terá volta e não serei mais o único alvo; eu,
meus amigos, nossa equipe... Porra, literalmente todo mundo que
mais amo será responsabilizado. E não quero que aconteça.
Posso arranjar problemas que nos levam a outros maiores,
mas não quero que minhas decisões recaiam sobre a minha família.
Eu amo os caras. Amo mesmo. Amo pra cacete. Tanto que pensar
em perdê-los de novo me deixa doente. Faço qualquer coisa para
manter a gente junto até o fim.
Inclusive ceder ao plano maluco de Jared de me casar com
Gravity.
De mentirinha, é claro, mas eu nunca tinha rido tanto.
Sabendo que as chances de ela concordar são mínimas, meu
plano B é recorrer à Harper. Porque nem fodendo que vou me casar
com alguém que não conheço. Mesmo que de mentira, nós
arquitetamos ontem que, para a história ser verossímil, precisa
haver algo por trás.
Harper era a minha primeira opção, mas Sydney foi
irremediável. A filha dela não será prejudicada nos estudos por
minha causa. E, bom, já ferrei com o trabalho de Gravity. Ela não
tem nada a perder.
No instante em que a vejo atravessando a sala em saltos
quadrados e barulhentos, usando um jeans claro skinny da Calvin
Klein e uma camiseta branca com um nó ao lado esquerdo, percebo
que as chances de ela concordar são ainda menores do que três
dias atrás.
O combinado é que eu não abra a boca. Nessa reunião, só
falam Jared, Avalon e Sydney.
Segundo nossa produtora, esses relacionamentos por contrato
são mais comuns do que nós imaginamos. Mas que, com certeza,
para dar certo, a história precisa fazer sentido para quem irá ouvi-la.
E eu não quero, de jeito nenhum, decepcionar as pessoas que nos
apoiam.
Contanto que meus fãs não se sintam mal, vou fazer qualquer
coisa para que a The Reckless saia desse buraco de mau agouro
que a coloquei.
— Obrigada por ter vindo, Gravity. Lamentamos muitíssimo
que você tenha sido exposta nesses últimos dias. Nós vimos que já
descobriram quem é você e sua rede social ficou uma loucura, não
é?
Gravity nem direciona seu olhar para mim, atira-o para Avalon,
mantendo a atenção intacta em nossa assessora.
— Está cheio de paparazzi lá fora — pontua, cruzando os
braços e relaxando no encosto da cadeira. — Por isso mandaram
um segurança me buscar?
Wade.
Sim, porque há grandes chances de você agir como dias atrás
e socar um paparazzo.
É o que quero responder, mas aperto os lábios, mantendo a
resposta em cárcere.
Avalon sorri de forma gentil, e me pergunto por que é que ela
nunca sorri desse jeito para mim.
— Por que eu estou aqui? — Gravity intercala os olhos entre
mim e os caras porque, apesar de me odiar, ainda sou alguém
familiar.
Milão a deixou diferente. Gravity costumava ser impulsiva, não
levava nenhum desaforo consigo, mas a forma como agiu com
Magdalene, permitindo que a tratasse daquela maneira, foi
insuportável de assistir e não fazer nada. Fiquei me perguntando por
que caralhos uma garota como ela, que sempre foi obstinada, se
acuou diante daquela situação. Queria que me deixasse chegar
perto para descobrir o que mudou nesses últimos anos.
Paris foi um divisor de águas, claro, mas além disso, o que
mais?
— Temos uma proposta. — Jared se inclina, empurrando por
cima da mesa o documento.
Os caras e eu passamos a noite toda lendo. Se Gravity
continua a mesma, se existe ao menos um pontinho do que
costumava ser, vai recusar na hora.
— Contrato de casamento? — Seus olhos sobem de volta para
Jared, ambas as sobrancelhas alçando e quase atingindo o limite da
raiz do cabelo. — Que merda é essa? — Nem se dá ao trabalho de
ler a primeira linha.
— Ashton não se encontra em uma das melhores situações. —
Sydney tenta, mas antes mesmo de conseguir terminar sua frase,
Gravity ri. O amargor da sua risada atinge meu estômago em cheio.
— Está falando sério? — Dessa vez, sua atenção está
direcionada a mim. — Você tem coragem de pensar em mim para
um relacionamento falso? Sei que você é impulsivo e não conhece a
palavra limite, mas sabe o quanto soa ridículo?
É, ela continua como ela mesma. Ao menos um pouco.
— Vocês todos sabem o que significa? — Ela estuda a mim e
aos caras, e o que vejo em seus olhos me faz encolher. — Sabia
que tinham mudado, mas é demais. É demais mesmo.
— Gravity… — Aidan fala baixinho, testando até onde pode ir
com ela nesse primeiro momento.
— Não. — Ela o para, estendendo a mão para ser o mais
expressiva possível. — O que vocês estão sugerindo é loucura. Isso
só acontece nos filmes.
— Na verdade, no mundo deles é muito comum. — Avalon
interfere, forçando um sorriso amigável. — Músicos, atrizes,
atores… Relacionamentos de fachada são uma ótima saída para
qualquer problema, seja de marketing ou, nesse caso, para
recuperar a dignidade de alguém quando está à beira de destruir a
carreira de todos ao redor. — Relanceia-me um olhar tão irado, que
me encolho. — Você é a opção perfeita, Gravity.
— Por que eu? Ele saiu com tantas mulheres no último ano,
qualquer uma pode assumir esse papel.
— Porque a história seria absolutamente crível. — Jared
justifica. — Você e Ashton têm um passado. — Ela se volta para
mim, e prendo seu olhar no meu. — Vocês dois tiveram um
relacionamento antes.
— Ele disse isso?
— Não, mas se você o odeia, não precisamos de muito mais
para saber que é verdade. — Ele continua. — É um contrato de oito
meses. Namoro, noivado, casamento. Namoro e noivado, três
meses, casamento, os outros cinco. Você pode aproveitar esse
tempo para conseguir visibilidade. Te contratamos como estilista da
The Reckless para finalizarmos a turnê e você adiciona esse
trabalho ao seu currículo. Ganhará mais dinheiro em um ano do que
ganharia em dez. Apenas algumas pessoas saberiam a verdade e,
para o mundo lá fora, vocês dois estariam vivendo um amor intenso
e que já vem se maturando desde quando moravam em
Humperville. — Posso ver em seus olhos que esse é o momento em
que começará a apelar. — Está desempregada, Gravity, e sabe que
Magdalene pode manchar sua carreira se ela quiser. Por mais que
esteja planejando se rastejar para aquele ateliê, você não quer
voltar a trabalhar com ela.
A respiração de Gravity oscila. Tento manter sua atenção
presa em mim, mas, conforme Jared fala, ela muda o foco para
nosso empresário, o que forma um vinco em minha testa e ele se
aprofunda a cada minuto em que a presencio ceder à proposta mais
idiota que já ouvi.
Tudo por dinheiro. Isso não faz dela diferente das outras com
quem estive. Não faz dela diferente de Nicola.
Minha mandíbula trinca e meus dentes rangem com a força
que imponho. Concordei, mas uma das coisas que sempre admirei
em Gravity era que não comprava qualquer ideia facilmente. Ela
está ignorando a raiva que sente porque vai usar da minha fama
para conseguir a dela. Isso me enoja. Talvez tenha sido resoluto
porque tinha certeza de que recusaria.
— Se eu aceitar, como vamos convencer as pessoas de que é
verdadeiro?
— Faremos um planejamento juntos. Vocês e eu. — Avalon
esclarece. — Primeiro, arquitetaremos os encontros e faremos como
se vocês estivessem tentando esconder no começo. Uma pequena
porcentagem das pessoas acusará vocês de estar tendo um
relacionamento falso, mas isso, até o pedido de casamento. Porém
tanto você quanto a The Reckless estarão entre os assuntos mais
falados e tirarão o foco de mulherengo para homem apaixonado. A
velha história de que ele encontrou a pessoa certa e mudou de vida.
As pessoas amam isso.
— Parece errado — objeto. — Vamos enganar milhares de
pessoas. Não me sinto confortável com isso.
— Você estava se sentindo confortável ontem e disposto a
fazer qualquer coisa para limparmos a sujeira que causou. —
Avalon me contrapõe, cerrando as pestanas. — Tem uma ideia
melhor? Estamos aqui, dispostos a escutar.
— Por que não posso ter um relacionamento com Harper?
Gosto dela. Eu facilmente me casaria com ela e não precisaria ser
de mentira.
Harper não me aceitaria nem que eu a enchesse de milhares
de diamantes ou ameaçasse me jogar do Empire State.
— Quer tentar? — Sydney me desafia. — Se Harper concordar
em realmente namorar você, nós acabamos por aqui com Gravity.
Mas todo mundo nessa sala sabe que Harper jamais concordaria.
Entremeio os dedos no cabelo, a irritação subindo em um
espiral espesso que me deixa zonzo.
— Então, não fui a primeira opção? — Gravity procura saber,
sua atenção voltada para mim.
— Claro que não, você foi a última — digo, consciente de que
estou irritado demais e que meu propósito é magoá-la. — Acha que
estou feliz em fingir estar apaixonado por você? Não, Gravity. Fico
com nojo só de pensar.
— Jesus Cristo... — Bryan murmura do meu lado, esfregando
a testa e inspirando com força. — Você precisa calar a boca.
— A gente se odeia. — Ela se vira, falando com Jared. — Você
merecia outro soco agora mesmo por insinuar que tem nojo de mim.
Até parece que nunca esteve na minha cama.
— Preciso te lembrar que você correu atrás de mim feito uma
lunática desesperada?
— Vai se foder, Ashton!
Ela empurra a cadeira, jogando o contrato na minha cara. O
papel fere a ponta do meu nariz, um corte superficial, mas dolorido.
Encaro-a entre uma fresta pequena dos cílios, esperando que saiba
que conseguiu me deixar com raiva.
Brinco com a língua dentro da boca, empurrando o interior da
bochecha. A respiração queima minhas vias nasais e meu pulmão
parece estar perto de implodir com as sugadas agitadas de ar.
— Tudo bem, ninguém está feliz com isso. — Jared brada,
cortando nossa discussão para chamar a atenção de volta para si.
— Mas precisamos que funcione e rápido. Isabella está nos
processando. A mídia não para de atacar o Ashton e
consequentemente está acabando com a reputação que
conseguimos estabelecer para a banda no último ano. O sucesso de
vocês é um castelo de areia. Se a água atingir à orla, acabou.
Entendeu? Conseguir chegar aonde chegaram é difícil, leva tempo,
mas para destruir, basta uma palavra errada, uma decisão ruim, e
todos esquecem o quanto são bons. Então, temos duas opções
aqui: desistimos de tudo ou vocês dois entram em consenso.
— Ela não pode ser a única opção — desdenho, evitando
encará-la.
— Não é, mas é a que faria mais sentido. Vocês dois têm uma
história juntos e seria convincente. Ravennah escreve sobre
celebridades há uma vida. Não é fácil esconder nada dela, mas
você e Gravity podem ter uma chance. — Sydney clarifica, pondo
fim de vez à briga.
Gravity volta a se sentar, Chase se inclina para pegar o
contrato do chão e volta a deslizá-lo para ela.
— Se eu concordar, quero o dobro — impõe, evitando se
direcionar para mim.
— O quê? Já estamos pagando mais do que
convenientemente seria. — Jared ri, como se a garota diante de nós
estivesse blefando.
— Então, arranjem outra que tolere esse imbecil. E se formos
mesmo fazer o que estamos prestes a fazer, quero que ande na
linha. Você não vai sair por aí trepando com tudo que tiver vontade.
— Gravity me mira.
— Nós sabemos. Ele está disposto. — Ava garante. Mas
nunca prometi fidelidade à minha noiva de mentira. — Temos um
acordo?
— Não. Quero ler o contrato com calma.
— Vai mesmo aceitar? Por dinheiro?
A sala cai em repleto silêncio quando percebem que a
pergunta veio de mim. Gravity não tem medo de olhar feio e muito
menos corre de uma briga — exceto quando o outro lado é
Magdalene, pelo visto —, e não sinto que tenho qualquer chance de
ganhar em uma discussão com ela.
Nós dois estamos com raiva. Nós dois estamos magoados um
com o outro e, sinceramente, ainda estou tentando entender o
porquê.
Quatro anos se passaram desde Paris. E a meu ver, as coisas
se resolveram muito antes de saber que viria para Nova York.
Gravity e eu nos odiamos por outra razão.
E nesse momento, a odeio por ser tão mesquinha.
— Não é por isso que as pessoas estão lutando todos os dias?
Por dinheiro? — Franze o cenho. — Não é por isso que você faz o
que faz, por dinheiro? Nem todo mundo nasceu em um berço de
ouro, Ashton. E eu não pertenço à pequena porcentagem que vem
de uma família rica.
— Não parecia um problema para você quando se aproveitava
do dinheiro do Darnell.
Quando a acuso, a raiva que Gravity está sentindo de mim se
perpetua no olhar agressivo que me relanceia.
— Darnell era bom para mim porque queria. Nunca pedi por
nada. Ele sempre se ofereceu para cuidar de mim e de Dannya. E
não, não recusei, e não, não vou me desculpar. Mas tudo bem, você
tem razão, só que agora estou querendo ficar por conta própria, e se
esse é um jeito de fazer, eu vou. Te arremete lembranças da sua ex-
namorada? — Ela incita mais minha repulsa. — É melhor se
acostumar com a ideia, Ashton. Porque nós vamos nos casar, e
serei muito bem paga para te suportar.
“Como nós chegamos aqui
Se eu costumava te conhecer tão bem?”
DECODE – PARAMORE

01 SEMANA DEPOIS.
SÁBADO, 10 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 09H05MIN.

O corpo de Harper é imprensado pelo meu no colchão, meto


fundo em sua boceta quente e apertada. Não paro nem quando seu
esguicho tenta me expulsar porque ainda não cheguei lá e preciso
gozar.
Meu quadril bombeia forte, estocando meu pau dentro dela
abruptamente. Tento sugar seus gemidos ao beijá-la, mas, com os
guinchos que a cama faz com os movimentos violentos enquanto a
estoco, evitar seu ganido é o menor dos meus problemas.
Não dou a mínima. Que meus amigos saibam que estou
fodendo gostoso desde às quatro da manhã, que foi quando Harper
chegou de Massachussets.
Entre um golpe lento e outro violento, sinto suas paredes
internas me apertarem mais e, com as bolas inchadas, louco para
gozar, é que intensifico meus impulsos até que meu pau se contraia
e o clímax espirala, varando meu corpo em um rugido rouco.
Meu sêmen jorra dentro da camisinha e, por mais que tente
imaginar a sensação de ter minha porra dentro dela, não é suficiente
para atender minhas expectativas.
Retiro o látex com cuidado e me inclino para o lado, para
alcançar a lata de lixo perto da mesa de cabeceira.
Caio ao seu lado, pondo o antebraço na testa enquanto tento
reencontrar o ritmo da respiração. Um sorriso curva minha boca, e
Harper gira em seu próprio eixo, amparando o queixo em meu
abdômen. Suor marca entre suas sobrancelhas esculpidas e os
cabelos loiros que estou familiarizado com o aroma de baunilh,
úmidos na raiz.
Deslizo a mão pelos fios, afastando aqueles que se
desprenderam do rabo de cavalo.
Harper se move do meu lado. O aroma do seu corpo — suor e
sexo — funda minhas narinas. Giro a cabeça para encontrá-la com
os olhos verdes semi-abertos para mim. O lençol que a cobre
desloca-se alguns centímetros ao mexer os braços, expondo o
mamilo duro e rosado, do qual me deliciei nessas últimas horas.
Lambo minha própria boca ao sentir o bico entumecido na
ponta da língua com a lembrança.
Essa mulher é uma benção, mas preciso me cuidar. De alguma
forma, parece que as mulheres com potencial de ferrar com a minha
cabeça são o meu ponto fraco.
Harper é uma versão melhor de mim. Estamos transando há
um bom tempo, mas ela nunca deu a entender que quer um
relacionamento nem nunca questionou minhas escapadas entre um
after e outro depois dos shows com a banda. Ou seja, ela não dá a
mínima importância. Contanto que estejamos nos protegendo e eu
esteja com meus exames em dia, Harper não se importa de “me
dividir”, por assim dizer.
Admito que a ideia de ela sair com outros homens ou mulheres
me ferra mentalmente, mas ignoro porque é meu lado possessivo
dando as caras.
Estou vivendo minha melhor fase com a The Reckless, então
por que complicar o descomplicado? Também não sei dizer se gosto
dela ou do sexo. Tenho sérios problemas de me confundir quando
decido pôr sentimentos na jogada. Por outro lado, Harper não é nem
um pouco confusa.
Mas a cada vez que estou com ela, o pedido de casamento
fica na ponta da língua. A esperança é a última que morre. Para ser
sincero, não preciso de amor — já disse que tenho certeza de que
não foi feito para mim —, só preciso de sexo gostoso e uma mulher
mais gostosa ainda para acordar ao meu lado.
Harper me encara. Parece o momento oportuno para contar
para ela que nossa equipe está tentando me arranjar alguém e esse
alguém é Gravity Monaghan.
Toda vez que minha mente pende para a lembrança de nós
naquela sala, com um contrato de distância de nos fazer um casal,
meu estômago se transforma em gelo puro.
— Preciso ir. Prometi à Tess que tomaríamos café juntas.
— Porra. Por que você não pode me colocar na sua lista de
prioridades quando está em Nova York?
As sobrancelhas bem feitas de Harper se levantam.
— Porque minha prioridade é e sempre será a Theresa,
lindinho. Não importa quão gostoso você consiga me comer.
Dando palmadas em meu peito nu, Harper se empurra para
fora da cama. O lençol vermelho de cetim cai até seu quadril. Minha
garganta seca com a visão da sua cintura bem acentuada.
— Você se casaria comigo? — Viro o tronco, ficando de lado.
Ponho a mão debaixo da cabeça, assistindo-a resgatar suas
roupas espalhadas pelo quarto.
— Essa pergunta é séria?
Harper não detém o que está fazendo para me dar atenção.
— Claro que é. Não brinca comigo, estou te propondo um
casamento.
— Não viaja, Ashton. — Gargalha, passando os braços para
dentro das mangas da sua camisa de botões rosa-pink. — Não
quero namorar você, quem dirá me casar. Que papo esquisito é
esse? A gente transa porque existe um limite entre nós. — Utiliza as
mãos ocupadas com suas botas brancas para ilustrar. — Não me
diga que você está apaixonado por mim? — O desdém em seu rosto
quase chega a me magoar, admito. — Tem alguma coisa a ver com
o soco que Gravity deu em você na semana passada?
Pego o travesseiro ao lado e o aperto contra o rosto, abafando
um grito frustrado.
— Pode falar comigo. O que está rolando?
Enquanto veste a calcinha e seu short-saia branco —
combinando com as botas —, devolvo o travesseiro para o lugar de
antes e encaro o teto do quarto.
— Nada.
“É extremamente fundamental que ninguém saiba desse
contrato.” A voz de Jared replica em minha mente como um chato.
“Precisa ser segredo absoluto, Ashton. Ninguém além da equipe e
seus amigos pode saber.” Filho da puta!
— Não acredito! Está guardando segredos de mim?
— Casa comigo e eu não guardo segredo de mais nada.
Ignoro todas as sentenças de Sydney descartando a filha de
ser minha esposa.
— Você ficou maluco se acha que vou me casar com você.
Não vai acontecer nem hoje nem nunca. É melhor parar de sonhar
acordado, está te fazendo mal.
Pela maneira como Harper me fita, consigo saber que está
perdendo a paciência e não pretendo irritá-la por algo tão estúpido.
Só deixo um suspiro de derrota sair.
— Só vou aceitar seu não porque você é gostosa e pretendo te
comer casualmente pelo resto da vida.
Harper não resiste revirar os olhos para o meu comentário.
— A gente acaba no minuto em que eu encontrar alguém que
goste de verdade.
— Quando eu encontrar alguém não conta? — enfatizo,
fingindo estar chateado.
— Sejamos honestos, quando é que você gostou de alguém
além de si mesmo? Só tem uma pessoa por quem você é
apaixonado, e essa pessoa é você. — Harper joga a bolsa por cima
do ombro, rindo. — E depois de você, são os quatro homens
dormindo nos quartos dessa casa. Então, não estou nem um pouco
preocupada que possa acontecer.
— Lindinha, já te disseram o quanto você é irritante?
— Já. Ouço o tempo todo. — Ela se curva sobre a cama para
me beijar. — Talvez eu apareça mais tarde, mas não conte
totalmente com isso. — Lança uma piscadela enquanto se afasta.
— Você está me usando! — grito no instante em que fecha a
porta ao sair.
Foi uma semana de pura angústia. Saí daquela reunião com
Gravity pior do que como entrei. Contudo, a raiva não tão recém-
descoberta encontrou um lugar confortável dentro de mim e não
vem à tona desde aquele dia. Isso porque, tenho certeza, não a
encontrei outra vez. Caso contrário, teria achado uma forma peculiar
e do meu jeito de reacendê-la.
Gravity sempre foi ousada para me desafiar; quando me
arrastou para Paris e depois, ao decidir me tirar da sua vida. Agora,
mais uma vez, estou esperando que ela determine como será nosso
futuro.
Harper errou sobre eu ser apaixonado por mim mesmo. Já
estive apaixonado antes, primeiro por Nicola e claro que deu errado.
E cheguei a pensar que tinha sentimentos por Gravity.
Forço-me a sair da cama. Minha primeira ação é pegar o
celular, mas tenho evitado as redes sociais nos últimos tempos. Ler
a enxurrada de críticas sobre mim é morte de saúde mental na
certa, porém, entendo que não vou conseguir ignorar a minha
família por muito mais tempo como faço com os haters.
Deparo-me com cinco ligações de Conrad e sete de Jolie, fora
as mensagens de Maddie e Halle. Alex deve estar ocupado demais
provando que é o filho perfeito para se preocupar em me mandar
mensagem. Deve voltar para casa em meados de outubro, e não
estou nem um pouco ansioso para o nosso reencontro.
Achei que com o sucesso da banda, Conrad Baker
reconheceria que posso seguir meu próprio caminho, como Alex, e
alcançar tantas coisas quanto meu irmão mais velho. Porém meu
pai e eu temos visões divergentes do que é ter sucesso.
Volto a bloquear a tela do telefone. Não me preocupo em
colocar uma roupa. Faço dos meus dias morando com os caras uma
missão: torturar Finnick por ter pegado a suíte, então abro a porta e
caminho até o banheiro com a toalha sobre o ombro, sem me
importar em cobrir minhas partes.
A casa encontra-se silenciosa, imagino que ainda não
acordaram. Estamos todos cansados e estressados, ainda que seja
o meu nome no título de todas as polêmicas, a The Reckless está
carregando esse fardo tanto quanto eu.
Suspiro quando o alívio momentâneo do sexo evapora e, sob a
água quente do chuveiro, tento aliviar a tensão que enrijece meus
ombros. Inclino a cabeça para trás, vapor cumprindo com seu
objetivo de me fazer relaxar um pouco. Embora seja bem-vindo,
minha mente continua em turbilhão.
Gravity não deu resposta, continua “analisando” o contrato
como se tivesse muito o que ver sobre ele. Passamos a noite em
claro desenhando todas as cláusulas com Camille.
Uma parte de mim sabe que todas as pessoas nesse mundo
são como Nicola: todas estão em busca de dinheiro e fama. Com
Gravity, ainda mais atuando onde ela quer, ter reconhecimento é
uma exigência e estar em um relacionamento comigo é ganhar mais
do que isso; é a vitrine que te exibe para o mundo inteiro.
Ela nunca teria sido minha primeira opção, mas Jared, Avalon
e Sydney têm razão: as pessoas acreditariam em nossa história
com muito mais facilidade e qualquer um que fosse questionado em
Humperville saberia que Gravity pertence à minha vida desde antes
do sucesso com a banda. Ninguém desconfiaria que nosso
relacionamento está embasado em cláusulas, regras e cronogramas
de encontros para cumprir.
Desligo o registro do chuveiro, envolvo o corpo na toalha e
saio. Para o meu completo choque, Finnick está recostado do outro
lado do corredor. O cabelo loiro desgrenhado, os braços pálidos
com muitas tatuagens e o peito quase não tem mais espaço para
nenhuma nova.
A cada ano, Finn se parece menos com ele mesmo. É como se
o lado sombrio de sua mente estivesse no controle. O monstro que
o distância do ser humano que o vimos se esforçar para ser quando
conheceu Effy parece estar dominando-o, e nós não temos a
mínima ideia de como afastá-lo.
— Oi, cara. — Arqueio uma sobrancelha para o zumbi de
braços cruzados parado diante de mim.
Seu nariz está vermelho. Muito vermelho.
Franzo a testa, me questionando se está resfriado.
Finnick passa por mim, empurrando-me para voltar para seu
próprio quarto, e uma nuvem escura se forma em minha mente.
Passo em frente ao de Chase. Espio através da semi-abertura
e o vejo digitando no celular.
— Bom dia, neném.
— Ah. Bom dia, e aí? — Chase bloqueia o celular e o esconde
debaixo da bunda quando me vê.
Suspeito.
— Já cedo trocando mensagens sacanas com a Tess? Me
deixa ver!
Invado o quarto, rindo tanto que chega a doer as bochechas.
Chase recupera o celular antes de correr para longe de mim.
— Sai fora, Ashton!
Ele aponta o indicador, me ameaçando, mas para o azar dele,
não me importo. Vale o risco se tiver munição para implicar com o
neném do grupo.
— Porra, você é insuportável! Me deixa em paz, cacete!
Pulando sobre a cama, tenta fugir de mim, mas salto atrás
dele, e Chase corre para fora do quarto. Continuo em minha
perseguição disparando pela escada.
— Por que está se esforçando tanto para esconder as
mensagens? — grito, atrás dele.
— E por que você está se esforçando tanto para ler algo
particular?!
Ao nos direcionarmos para a cozinha, deparamos com Aidan e
Bryan sentados à mesa, tomando café da manhã. Eles nos encaram
com desdém, aquele ar de superioridade enraizado em ambos,
ignorando por completo minha caçada ao Chase.
— Me deixa ver, você sabe que adoro uma fofoca! — implico,
gargalhando alto, e o fôlego me escapa. — Não adianta correr. Sabe
que se eu quiser, posso hackear seu telefone.
— Você não pode! É invasão de privacidade!
— Na verdade, eu posso.
Paramos no meio da sala, cercados pelos ruídos de nossas
respirações ofegantes. Minha toalha começando a escorregar do
quadril, e uso uma mão para mantê-la no lugar.
— Chase está escondendo alguma coisa! — Semicerro as
pestanas, agora acreditando que não tem nada a ver com a Tess. —
Sobre o que é?
— Alguém já te falou que você é um intrometido, Ashton?
— Mais um dia normal na nossa vida. — Bryan arqueja atrás
de mim. — Aidan, você é o pai. Dá um jeito, cara.
— Sou o pai? Por que eu sou o pai?
— Porque você é o mais velho? — argumenta, e não consigo
ver a expressão de Bryan, mas aposto que está de braços cruzados,
se divertindo por mais um dia comigo e Chase implicando um com o
outro.
— Essa desculpa é a mais ridícula que já ouvi! — Aidan refuta.
Mas as risadas cessam no instante em que ouvimos um
bramido vindo do segundo andar, como se Finnick estivesse
expelindo de si a própria alma.
O tinido que rompe de sua garganta faz com que Chase
dispare primeiro, e logo o estou seguindo. Corro sobre as escadas
com tanta pressa que o pulmão chega a arder. Sei que Bryan e
Aidan estão atrás porque ouço o piso de madeira ranger com o peso
de seus corpos sobre as passadas.
— Finnick!
Chase empurra a porta com força, a maçaneta se choca com a
parede e o estrépito quase encobre as golfadas.
Não esperamos que ele esteja de acordo com a invasão, então
abruptamente nos arremessamos para o banheiro do quarto. A
visão dele abraçado à privada e com vômito no cabelo é a pior que
já vi. Aquela vermelhidão na ponta do nariz parece ainda pior.
— A gente liga para alguém? — Chase sussurra, nós quatro
parados em volta de Finn enquanto ele não consegue cessar o
vômito e muito menos explicar o que o causou.
Aidan sacode a cabeça, expressando a resposta.
— Podemos lidar com isso. Finn, tudo bem, cara? — pergunta
ao nosso amigo, e só então percebo que suas costelas estão mais à
mostra do que costumavam ser. Ele emagreceu bastante. — Vamos
te dar um banho.
Ele gesticula, passando a instrução para eu ligar o chuveiro.
Aidan conduz tudo o que temos que fazer. Não é como se
soubesse o que aconteceu com Finn, mas a forma como nos
entreolhamos enquanto colocamos nosso guitarrista dentro da
banheira é claramente uma resposta.
Nós sabemos o que ele tem, só não falamos em voz alta
porque para ele é vergonhoso e para nós, desesperador. Nunca
sabemos como podemos ajudá-lo ou se existe um jeito de aliviar as
dores que carrega.
Antigamente, cada um procurava resolver seus próprios
problemas, mas hoje, contamos uns com os outros; seja para dar
banho depois de um porre ou para acobertar um relacionamento de
mentira. Encontramos em nós um lugar muito melhor do que casa, é
abrigo. Para onde você corre quando precisa se sentir seguro.
Finnick nem reluta quando nos recusamos a deixá-lo sozinho
durante o banho. Ele sabe que precisa de nós, mesmo que não diga
nada, mesmo que não saiba por onde começar.
A nossa presença é suficiente para confortá-lo.
“Puta que pariu!
Como ainda estamos nos falando?”
FUCK YOU – SILENT CHILD

Deixo os outros com Finnick para me trocar. Assim que entro


em meu quarto, ouço o celular vibrando na mesa de cabeceira.
Além de Harper, só nossa equipe me liga e, nos últimos dias, minha
família, mas já os ignorei suficientemente para desistirem de tentar
falar comigo.
Franzo a testa para o nome de Jared na tela. Não esperava
que fosse entrar em contato comigo tão cedo. Não quando está
tentando ser um pai irado com a rebeldia do filho.
— Oi? — atendo com um quê de suspeita.
— Está pronto?
Olho para baixo, sondando a toalha em volta do meu tronco.
— Pronto para o quê?
— Gravity se decidiu.
Silêncio paira entre nós.
Encaro meus pés descalços, são várias as vezes em que sinto
a pulsação do meu coração maltratar as paredes de carne e osso
que o cercam antes de Jared tentar quebrar a inquietação e
racionalizar a informação. Dizer que fiquei surpreso por ela
considerar assinar seria uma tentativa de abrandar minha reação.
— Alguém está prestes a ficar rica.
— Precisamos dela. Você precisa.
Encaminho-me para o closet, abrindo as portas. Escolho uma
camiseta básica e um jeans preto.
— Sabe do que eu preciso? Ir à academia. Tenho certeza de
que meus bíceps estão murchando.
Jared não evita o suspiro do outro lado da linha, e eu o ponho
no viva-voz, para conseguir me vestir. Apoio o celular na cama.
— Ela aceitou.
— Claro que aceitou. Você ofereceu vinte e cinco mil por mês
e ela pediu o dobro.
— Gravity quer mais vinte para cada encontro que tiverem e a
imagem dela for exposta.
A gola da camiseta cerca minha garganta e não consigo
terminar de vesti-la posterior à consciência dessa informação.
Franzo a testa, olhando para o telefone, ainda sem conseguir
acreditar. Pensei que Nicola fosse ser a última mulher que me usaria
como uma conexão para o próprio sucesso, mas como o destino
gosta de rir da minha cara e provar que não está para brincadeira,
me colocou frente a frente com uma das minhas dores mais
intensas.
O que mais me deixa estupidamente enraivecido é que
acreditei na versão de Gravity que criei na minha cabeça.
Entretanto, ela é igual a todas as outras que conheci.
Não controlo mais a raiva, não tento encarcerá-la dentro de
mim. Se Gravity vai entrar nessa, vai aturar a pior versão que
consigo ser.
— Se contratássemos uma prostituta, ela cobraria mais barato,
e eu não precisaria do voto de castidade. Ainda não assinei, você
tem uma chance de reconsiderar.
— Wade vai passar para te buscar. Esteja pronto. — Jared
ignora minhas falas. — E, por favor, tente não estragar tudo. Sei que
você odeia estar nessa situação, sei que quer continuar tendo a
liberdade de antes, com os benefícios que o dinheiro e a fama
proporcionam. Detesto ter que te colocar em um vínculo com
alguém que não se dá bem, mas, para funcionar, para salvar a sua
reputação e impedir que a banda afunde junto dela, precisamos da
Gravity. Ela não deixará brechas para desconfiarem. Você está
sendo visto como desrespeitoso com as mulheres e, cá entre nós,
você realmente não se importa com quem vai magoar com as suas
escolhas ou com o que diz. Precisa aprender a controlar essa
impulsividade, Ashton.
Mordo minha própria língua, impedindo outra resposta da qual
Jared irá me repreender. Não é muito da minha persona controlar o
que penso, falo ou como ajo, mas reconheço o que Jared significa
para mim e para os meus amigos, sei que tudo o que fez até agora
foi pensando no que seria melhor para nós.
Estou fodido com todas essas polêmicas abraçando minha
reputação. Não que eu me importe, nunca liguei para o que as
pessoas estão pensando ou falando. Mas, porra, tem muita gente
que eu amo envolvida e sendo prejudicada por minha causa.
— Tudo bem, estarei pronto quando Wade chegar.
— Ótimo. Porque ele já está esperando por você.
Jared desliga sem sequer me dar uma oportunidade de
responder.
Fecho o zíper da calça, ponho os tênis da Nike, procuro os
óculos escuros de aviador na primeira gaveta da mesa e os coloco.
Quando saio do meu quarto, deparo-me com Aidan e Bryan
saindo do de Finnick. De dentro do bolso da calça, retiro o chiclete
de um tablete e o coloco dentro da boca. Os caras me estudam ao
cruzar os próprios braços na frente do tórax.
— Aonde você vai?
— Parece que Gravity e eu vamos namorar — respondo, sem
ânimo.
— Ela aceitou? — Aidan surpreende-se, me seguindo através
das escadas com Bryan atrás. — Não acredito. Podia jurar que ela
ia segurar o máximo possível e depois te recusar. É a cara dela agir
assim.
— Independente de qualquer princípio, Gravity ainda é um ser
humano pensante. É muito dinheiro e uma garantia de sucesso no
trabalho dela. É claro que ela aceitaria. Todo mundo tem um preço
— falo, enquanto pesco a jaqueta de couro do cabideiro no hall.
Deslizo os braços para dentro das mangas porque, embora
esteja quente, o prédio da gravadora vive com o ar-condicionado
ligado e congelo sempre que estou em uma das salas de reunião.
— Não a Gravity. — Bryan a defende e, com um suspiro, viro
nos calcanhares para encará-lo.
— Já se passaram anos desde que a gente se conheceu. E
fala sério, o que sabemos dela? — Uma onda de silêncio cresce
entre nós três. — Exatamente, nada. Então, porra, não quero saber
de vocês defendendo ela. O seu princípio sempre foi dinheiro e se
tornar uma estilista reconhecida. Você sabe muito bem o quanto ela
se aproveitava do Darnell. — Gesticulo o queixo para Aidan, seus
olhos perdem o foco e ele parece perdido na própria mente
enquanto me escuta.
— Jared não disse se tínhamos que ir junto? — Bryan se
adianta, me seguindo até a porta.
Assim que abro uma fresta, Wade salta do assento do
passageiro para abrir a traseira da van.
— Não, ele só me disse para estar pronto. Volto pra cá assim
que terminar lá. Esperem por mim e cuidem do Finn.
Bryan e Aidan sorriem para mim enquanto desço as escadas,
mas, antes de entrar na van, olho para os lados, consciente de que
tem um paparazzo em algum canto por aqui, aproveitando meu
descuido para me fotografar.
Estou usando os óculos escuros, não só porque acho que fico
incrível com eles, mas porque o maldito Sawyer me bateu com tanta
força que os hematomas parecem fazer parte da minha cara agora.
— Bom dia, Ashton. — Wade usa seu corpo protuberante para
bloquear a visão da esquerda, e pulo para dentro da van. Kimberly e
Camille estão acomodadas.
— Obrigado, Wade — agradeço depois de estar sentado
diante delas. — O que estão fazendo aqui?
— Jared ligou. Gravity quer repassar algumas cláusulas do
contrato. — Camille esclarece e, quando olho para Kim, sei que está
aqui para me dar apoio moral. Não posso evitar sorrir para ela em
forma de agradecimento. — Você está bem? — Empurra os fios
ruivos do seu cabelo para trás da orelha, inclinando-se sobre o
tronco para me analisar.
Desço a armação dos óculos até o osso do nariz, revelando o
arroxeado no olho.
— Jesus, deveríamos processar aquele babaca! — Kim franze
a testa para as escoriações. — Não podemos processá-lo?
— Podemos. — Cami ri, sacudindo a cabeça. — Mas não
vamos. Só chamaria mais atenção para ele, e não queremos. Além
do mais, não seria bem visto. Estamos tentando ganhar a simpatia
da imprensa, não o contrário. Sawyer Blake é o queridinho da NBA.
— Alguém já conseguiu ganhar a simpatia dela? — ironizo,
voltando os óculos para o lugar. — Porque é muito bom no começo,
até te transformarem no anti-herói.
— Eles não transformam ninguém em anti-herói. Suas
péssimas escolhas fazem isso. — Minha advogada usa um tom
repreensivo, mas não fico irritado, por incrível que pareça. Preciso
poupar minha energia para lidar com a minha futura esposa. —
Enfim. Gravity nos enviou por escrito algumas exigências, quer
conferir?
— Não. Jared me adiantou que ela quer mais dinheiro.
— Vinte mil por cada imagem dela que for publicada pela
imprensa, sim.
— Previsível. Tem mais alguma coisa?
— Ela exigiu uma cláusula também que te impede de dormir
com outras pessoas enquanto estiverem juntos.
Um vinco marca minha testa.
— Segundo ela, o problema é seu, então não existe motivo
para ela parar a própria vida por sua causa. — Cami continua
explicando.
— Espera, quer dizer que tudo bem se ela dormir com outras
pessoas, mas eu não posso?
— Sim, acho que é exatamente o que ela disse.
— Isso é um absurdo! — enraiveço, chutando o ar. Cami
desvia os olhos do iPad para mim. — O que ela está tentando
fazer?
— Te evitando de mais uma polêmica? — Wade brinca do
banco da frente. — Imagina a notícia que Ravennah publicaria:
baixista da The Reckless trai esposa. Todo mundo te conhece. Na
primeira oportunidade, você estraga tudo. A garota está sendo
prudente em colocar essa cláusula no contrato, basicamente te
impedindo de cometer o único erro óbvio.
— Sério? Por que vocês falam assim comigo? Eu sou o chefe
de vocês!
— Tudo bem, chefe. — Wade caçoa. — A gente só te conhece
demais e queremos que fique bem porque, apesar de estúpido, nós
te amamos.
Bufo, compreendendo que todos só estão sofrendo
consequências de escolhas que eu fiz. São poucas as publicações
do TNC, de alguma forma, positivas quando se trata de mim. Jared
e Avalon estão se dividindo em mil para controlar tudo. E ainda tem
o processo de Isabella caindo sobre a equipe.
Com um suspiro, aceito que não tenho outra opção.
Odeio que Gravity seja a pessoa do outro lado? Odeio. Odeio
que ela se mostrou interesseira e sanguessuga? Demais. Mas é por
oito meses. Só preciso suportá-la por oito meses.

CONTRATO
Entre as partes
SR. ASHTON BAKER (CONTRATANTE – NOIVO)
SRTA. GRAVITY MONAGHAN (CONTRATADA – NOIVA)
AS PARTES CONCORDAM COM OS TERMOS ABAIXO
1 – Os termos a seguir são parte de um contrato vinculante
entre Ashton Baker e Gravity Monaghan;

TERMOS FUNDAMENTAIS
2 – O propósito fundamental é de um relacionamento
previamente acordado entre as partes; namoro, noivado e
casamento devidamente legal;
3 – Concordam e firmam amplamente uma união conjugal;
estão cientes de seus deveres e da confidencialidade do presente
contrato;
4 – Ambos concordam que após a união estável, deverá de ter:
respeito e pacificidade;
5 – Qualquer descumprimento vigente no presente contrato
levará imediatamente à punição satisfatória; a devolução do valor
pago à NOIVA ou multa paga pelo NOIVO, e será desfeito qualquer
negócio entre as partes;
6 – O casamento só será estabilizado e considerado oficial
após a cerimônia, entretanto, o namoro deve ser iniciado
imediatamente a partir da assinatura deste documento;
7 – As partes se comprometem a morarem juntas a partir da
assinatura deste documento para credibilidade dos fatos;
8 – A NOIVA se torna oficialmente estilista da The Reckless
pelo período de vigência do contrato e, durante este tempo, poderá
se beneficiar da imagem da banda para autopromoção do seu
negócio;
9 – Tudo no presente contrato deve ser lido e interpretado à luz
do propósito fundamental e dos termos fundamentais estabelecidos
nas cláusulas;

OBRIGAÇÕES E NÃO OBRIGAÇÕES


10 – O NOIVO é responsável pelo bem estar e felicidade total
de sua parceira pelo tempo em que este contrato estiver em
vigência;
11 – O NOIVO será responsável por todas as despesas
financeiras pelo tempo em que este contrato estiver em vigência;
12 – A NOIVA deve estar presente em todos os momentos
públicos na vida do NOIVO, incluindo reuniões, marketing,
premiações, festas e eventos beneficentes;
13 – A NOIVA e o NOIVO devem cumprir o cronograma de
encontros previamente estabelecidos pela equipe em conjunto com
os envolvidos para a fiabilidade do relacionamento;
14 – A NOIVA e o NOIVO devem cumprir o cronograma de
postagens em suas redes sociais pessoais, publicando fotos e
declarações amorosas que estabeleça a fiabilidade do
relacionamento;
15 – A NOIVA e o NOIVO devem sempre ser carinhosos e
demonstrar afeto em público, incluindo beijos, abraços e toques
para a fiabilidade do relacionamento;
16 – O apartamento onde a NOIVA viverá após a data vigente
deverá ter um quarto à parte para seu próprio conforto e satisfação;
17 – O NOIVO tem o poder de intervir em qualquer situação
desastrosa ou conflitante que a NOIVA venha a vivenciar e evitar a
exposição que possa manchar a imagem de ambos;
18 – A NOIVA terá um motorista particular e um segurança
para sua proteção; a qualquer momento ou situação presente;
19 – O NOIVO deverá arcar com as necessidades básicas da
NOIVA, sempre prezando pelo seu bem-estar. Não é de obrigação
que a NOIVA aceite seu auxílio amigável;
20 – Não é de obrigação que a NOIVA tenha relações sexuais;
a não ser que ela o faça por sua plena consciência;
21 – A NOIVA não tem obrigação de ser fiel ao NOIVO,
contudo, é indispensável a discrição para que não haja exposição
de ambas as partes;
22 – O NOIVO se compromete a evitar traições, ou seja, ter
relações íntimas com qualquer outra pessoa para que não haja
exposição de ambas as partes;

VIGÊNCIA
23 – O NOIVO e a NOIVA celebram o presente contrato no ato
de sua assinatura, plenamente cientes de sua natureza, e se
comprometem a cumprir totalmente suas condições;
24 – A NOIVA receberá a quantia de 50 mil dólares mensais
pela sua contribuição com a recuperação da imagem do NOIVO e
serviços prestados como ESTILISTA da The Reckless; receberá
também 20 mil dólares por cada imagem sua exposta por jornalistas
e paparrazzi;
25 – O presente contrato vigorará pelo período de 8 meses,
sendo três meses de namoro e noivado, e cinco meses de
casamento;
26 – O presente contrato poderá ser rescindido a qualquer
momento se uma das cláusulas for quebrada;
27 – Se uma das partes demonstrar interesse na rescisão do
presente contrato, o mesmo poderá ser desfeito mediante a punição
legal da multa de 500 mil dólares. E se o desejo partir da NOIVA, o
valor já pago pelo NOIVO deverá ser devolvido em íntegra;

CONCLUSÃO
28 – Nós, abaixo assinados, lemos e entendemos plenamente
as disposições do presente contrato e, por estarmos assim justos e
contratados, assinamos o presente instrumento.
O NOIVO: Ashton Baker
Data: 10/08/2024
A NOIVA: Gravity Monaghan
Data: 10/08/2024
Camille termina de ler o contrato. Minha atenção está voltada
para Gravity, embora esteja se esforçando pra caralho para agir
como se eu não estivesse aqui.
Pensando bem, o contrato só é vantajoso para uma das
partes, e não sou eu.
Aperto a caneta com tanta força que acredito ser capaz de
parti-la ao meio se dobrar e concentrar o polegar no ponto certo do
tubo.
Sanguessuga.
Aproveitadora.
Como é que minha boca já esteve na sua?
Como é que cheguei a pensar que poderia estar apaixonado
por você?
Continuo tendo dedo podre para mulheres. Cedendo
principalmente para as parasitas interesseiras.
Ouço o ranger dos meus dentes. Um minuto sozinho com ela e
tenho certeza de que Gravity mudaria de ideia. Antes, achava que
ela tinha mudado, agora, penso que sempre foi assim, só estava
cego demais para enxergar. Todas as mulheres são como Nicola.
E ainda sou acusado de ser desrespeitoso? De só usá-las para
sexo? Porra!
Elas extraem o que você tem de melhor e te cospem fora
quando não precisam mais. É exatamente o que Gravity está
fazendo comigo.
— Semana que vem, Bandit dará uma festa de aniversário em
Miami. A The Reckless foi convidada. É uma excelente oportunidade
para vocês aparecerem juntos pela primeira vez. — Jared passa as
instruções. Queria dizer que estou animado com a ideia, mas não.
Não vou poder nem sair com Harper para aliviar a tensão. Gravity foi
tão auspiciosa nos detalhes. — Mas é, acho que é uma boa.
Avalon?
— Sim, vou telefonar para o agente do Bandit e informar que
Ashton levará companhia. Alguma dúvida?
— Tenho. — Levanto a mão, como se estivesse na pré-escola.
— O que foi?
— Esse contrato parece vantajoso só para a sanguessuga ali.
— Agito a cabeça, indicando Gravity do outro lado da mesa. Sua
atenção, enfim, paira sobre mim. — Onde estão as minhas
vantagens?
— Você terá sua imagem restabelecida, sem mencionar o fato
de que vão tirar o foco das suas polêmicas e mirar no seu
relacionamento amoroso, com uma história crível e linda por trás. —
Ava soa com raiva. Mas ela tem estado o tempo todo com raiva de
mim. — Deveria estar feliz que Gravity concordou!
Posso jurar que vejo a boca de Gravity curvar em um sorriso
vitorioso.
— Mas…
— Sinceramente, Ashton, qual é o seu problema? — Avalon
sobe o tom. — Porque, sério, não podemos ser os únicos
enxergando quão no fundo do poço você chegou. Caramba, em
menos de um ano, você adquiriu uma lista extensa de pessoas que
dariam qualquer coisa para socar o seu nariz pelo menos uma vez
antes de morrer! — A mão sobre a mesa se fecha em um soco, que
tenho certeza de que, se pudesse, estaria direcionado a mim. —
Sem contar a história com agressões, impulsividade, sua falta de
responsabilidade afetiva, de autocontrole e raiva… Estivemos
dispostos a qualquer ideia que tivesse, mas você não teve. Quer se
afastar da banda? — Arqueia uma sobrancelha, cruzando os
braços.
— Você sabe que sem eles, não sou nada — murmuro,
desviando para outro lado.
— Se não está fazendo por si mesmo, faça por eles, então. —
Avalon começa a reunir seus pertences, assim como Cami e Jared.
— Vamos nos reunir periodicamente para discutirmos os
cronogramas. As reuniões para a volta da turnê começam em breve,
Gravity. Avalon te manterá informada de tudo. — O sorriso amigável
do meu empresário para ela me deixa enjoado. Ele costumava sorrir
assim para mim.
Fico esperando que todos saiam para finalmente me levantar.
Wade já deve estar me esperando para me levar de volta, mas,
sinceramente, estou me sentindo sufocar pouco a pouco com a ideia
de estar em um casamento por contrato. Vai começar simples e
ficará complicado.
E aí, depois, Gravity pede o divórcio alegando o quê? Estava
tentando ser positivo quanto a tudo isso, mas quando penso em
como as coisas vão ficar e como ela está me magoando por fazer a
única coisa que não suporto, quero apenas ter a chance de puni-la
por isso.
Permaneço em silêncio com meus próprios pensamentos,
tentando estabelecer algum controle entre a raiva e a impulsividade,
contudo, sei que sou uma bomba e posso explodir a qualquer
instante. A caneta que usei para assinar o contrato gira entre meus
dedos esbranquiçados pela força que envio para o conduto.
— Não estou feliz também.
A voz de Gravity me desperta. Subo os olhos até que minha
visão a capte. O cabelo abaixo dos ombros, ondulados e
semipresos por uma faixa vermelha. A franja cai ao redor do rosto, o
emoldurando. Seus olhos castanho-escuros me miram, estudando
se pode falar ou se vou deixar a raiva me dominar.
— Mas preciso trabalhar. Minha oportunidade com Magdalene
foi por água abaixo por sua causa — enfatiza a minha culpa. — A
The Reckless é minha última oportunidade como estilista. Pensar
em namorar você e depois me casar… — Suspira, afastando a
franja para trás. — Entendo a sensação. Detesto essa ideia tanto
quanto você, mas vamos conseguir o que queremos. A gente não se
suporta, mas podemos aprender. Já fomos amigos, já transamos,
podemos lidar com a situação.
— Quero ver quão determinada você está para ir atrás dos
seus sonhos.
Jogo a caneta sobre a mesa, ela repica e cai no colo de
Gravity. Empurro a cadeira com mais força que o necessário, e ela
gira até estar do outro lado da sala, atrás de mim.
— Vou fazer da sua vida um inferno, Gravity. Guarde as
minhas palavras.
Gravity suspira, seu quadril inclina-se sobre a mesa, e ela usa
as mãos para sustentar o peso. O canto de sua boca estica até
formar um sorriso diabólico.
— Eu sou o seu inferno, Ashton.
“Aproveite sua vida ao máximo
Enquanto ela é abundante”
FOURTH OF JULY – SUFJAN STEVENS

7 ANOS ATRÁS
TERÇA-FEIRA, 04 DE JULHO DE 2017, ÀS 20H34MIN.

Entendo mais dos negócios da família do que gostaria. Sei que


preciso engolir a dor que estou sentindo se quiser lidar com essas
pessoas como um homem. É questão de sobrevivência e aprendi
muito com o velho Rain Baker.
Meu avô estaria do meu lado, me fazendo rir com suas piadas
ruins e tentando dissipar a tensão dos meus músculos. Foi difícil
quando vovó Pamella se foi, mas sem o vovô, não sei o que será de
mim.
Algumas pessoas transformam a sua vida. A minha era ruim,
mas por causa dos meus avós, descobri que podia encontrar um
lugar aconchegante para fugir do caos que é estar nessa casa,
cercado pelas falácias do meu pai, sua exigência e seu jeito
controlador de tomar conta das coisas.
Sendo sincero, meu pai acredita que seus filhos e sua esposa
são como a empresa que administra e por causa disso, nos trata
como uma corporação que precisa ser fiscalizada se quiser ter
sucesso no futuro.
A raiz da arcada dentária formiga, me alertando que se eu
contrair a mandíbula um pouco mais forte, é provável que quebre
todos os dentes, então tento relaxar.
Mantenho a respiração controlada, mas meus olhos estão
ardendo, assumindo uma coloração avermelhada que me fará
parecer um perdedor na frente de Conrad Baker.
O pai dele morreu. Foi encontrado morto após um infarto há
dois dias. Não houve um enterro digno nem uma cerimônia de
despedida. Mas a vida para a família Baker seguiu como se a
pessoa mais importante deste mundo fodido não tivesse me deixado
aqui, para ser consumido por uma vida que quero
desesperadamente deixar para trás.
Um jantar. Meu pai deu a porra de um jantar para os sócios da
joalheria Baker’s. Ele não deu a mínima para a leitura do
testamento. Acho que já sabia que meus avós deixariam tudo o que
era deles para mim porque tinham conhecimento da minha relação
conturbada com meu pai.
Retiro um recipiente de uísque de dentro do bolso do paletó e
dou as costas para a rodinha de conversa acontecendo a poucos
metros de mim. Despejo o líquido âmbar no meu copo de
refrigerante e, quando me volto para frente, trombo com meu irmão.
— Quer arranjar encrenca, Ashton? — Alex bebe do seu
próprio copo, uma taça de vinho branco, e afunda uma mão no
bolso da calça social, rindo amigavelmente para nosso pai do outro
lado da sala de estar. — Você tem idade para beber?
— Se estiver cometendo um crime, pode me prender.
Dou o primeiro gole na coca com uísque e a língua estala no
céu da boca.
— Ah, sim. Você não é da polícia, então por que não cala a
boca e me deixa em paz?
— Só estou te dando um alerta. Papai não vai gostar se fizer
uma cena na frente de todas essas pessoas.
— Você bem que iria curtir, não é? Adora me ver sendo
humilhado.
Noto a contração na mandíbula de Alex.
— Se quer uma vida diferente, saia de casa.
— Acredite em mim, Alexander, não tem nada nessa vida
fodida que eu gostaria mais de fazer do que cair fora.
— Faça, Ashton. Você sabe tão bem quanto eu que esta casa,
esta família, este lugar não pertencem a você.
Poderia acreditar que sou filho fora deste casamento se
tivesse traços distintos dos meus pais, mas acontece que tenho o
nariz, os cabelos e o queixo do meu pai, e a boca e as sobrancelhas
naturalmente arqueadas da minha mãe. Sou com certeza filho
deles, mas, por alguma razão, nunca me senti verdadeiramente
desejado na família.
Minhas irmãs nunca foram punidas de maneira física, mas meu
pai as proíbe de utilizar o celular, no caso de Maddie, e televisão, no
caso de Halle. Alex é sete anos mais velho, portanto, não faço ideia
de como foi sua vida antes de mim, Maddie e Halle, mas como o
único homem ainda vivendo nesta casa, sou o responsável pelos
erros das minhas irmãs e, quando mais novo, Alex decidiu entrar
para a Marinha, e meu pai o enviou para um colégio militar para
terminar o ensino médio.
Conrad se enche de orgulho para falar de Alex. Enquanto a
mim, não passo de um viciado em sexo e álcool, o que,
sinceramente, é um elogio. Formei-me no ano passado e tenho
certeza de que a diretora Claire da Boulevard Academy orou
ajoelhada em agradecimento por ter, enfim, se livrado de mim.
Dormi com três professoras no último ano, depois que Nicola e
eu terminamos, e saí com metade das alunas da primeira e segunda
série. Nunca me esforcei para me esconder das câmeras de
segurança.
Desafiar meu pai se tornou um hobby e dormir com todas
essas mulheres foi o jeito que encontrei de me vingar de Nicola.
Meu estômago embrulha, vendo-o rir com tanta honestidade
com seus sócios e percebendo o quanto se esforça para ser um
escroto comigo. Nada do que eu faço é suficiente para deixá-lo
orgulhoso. Minhas escolhas, para ele, são sempre ruins e sua
necessidade de me lembrar disso é o que me deixa sempre
inseguro.
O canto dos meus olhos volta a arder. Alex está quieto e não
pode ser um bom sinal. Quando devolvo a atenção ao meu irmão,
vejo que a sua está fixa em mim.
A vontade que tenho de esmurrar a cara dele é grande.
Impulsivo.
Explosivo.
São só alguns dos adjetivos que a diretora usava para me
descrever para meu pai quando tínhamos um problema na escola.
“Talvez ele sofra de ansiedade ou esteja acontecendo algo em
casa que o deixe estressado.”
A sobrecarga emocional aqui é grande. Meu pai diz que tudo o
que faz é para nos ensinar a sermos fortes porque, se quisermos
assumir a presidência da Baker’s, precisamos aprender a ser como
rochas. Ter malícia, mas principalmente aprender a tomar decisões
difíceis. Não teremos orgulho de como as outras pessoas se
sentirão sobre elas mesmas, mas é preciso se impor e fazer o que
for preciso para manter o império de pé, independentemente de
quem tenhamos que destruir.
Para meu pai, não estou nem perto de ser apto para assumir a
empresa. O que ele não sabe é que não estou interessado em me
sentar em sua cadeira. Não almejo essa posição, principalmente
depois de descobrir que Nicola Fox, minha agora ex-namorada, só
se aproximou de mim porque pretendia se tornar modelo na Baker’s.
Descobrir suas intenções definitivamente me quebrou.
Como alguém que diz te amar, tem coragem de te apunhalar
tão forte assim pelas costas? A raiva, entretanto, não durou quase
nada, e começo a acreditar naquela diretora; de que existe em mim
uma bandeira vermelha e que preciso de ajuda porque, mesmo que
tenha motivos para me afastar de Nic, mesmo que não mereça
minha atenção — e grande parte das garotas com as quais saí
depois dela tenha sido com intenção de machucá-la —, continuo
indo até ela quando me chama.
— Que foi? — Bebo mais um gole da minha bebida, agora
mais quente depois de ter adicionado o uísque.
— Estou pensando em como você deve ser por dentro.
— Sou normal. — Balanço os ombros com indiferença,
entretanto, minha pequena mentira parece não colar com Alex.
Ele ri.
O maldito ri.
— Você é um Baker. Normalidade não combina com nossa
personalidade.
— Do que está falando? Até onde sei, você é o filho perfeito.
— Uma vez, papai me levou para a empresa, antes de decidir
ir para a Escola Militar. Ele explicou como as coisas funcionavam
por lá e contou que, um dia, eu me sentaria à mesa da presidência
da Baker’s. Mas além de muita parceria suja para que a joalheria se
tornasse o que é hoje, nosso pai queria uma cópia escrachada dele.
Não poderia seguir seus passos, mas decidi me tornar como
Conrad. Essa escolha garantiu que estivesse na Marinha hoje. —
Levanta a mão ao acenar para algum conhecido atrás de mim,
continuando: — Pode não gostar, mas nós dois sabemos que para
ter o que ele tem, é preciso ser o que ele é.
“Amor, a-amor, a-amor
Como você ama me odiar”
LOVE TO HATE ME – BLACKPINK

DIAS ATUAIS
01 SEMANA DEPOIS.
SEXTA-FEIRA, 16 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 19H26MIN.

— Existe alguma coisa sobre você que preciso saber? —


Avalon volta, me oferecendo uma lata de refrigerante.
Estou aqui porque ela solicitou uma reunião particular e me
recebeu no aconchego do seu apartamento. Não é muito grande,
mas tem uma vista incrível da cidade.
Estou abafando o suspiro desde que cheguei porque o
alaranjado colorindo o céu é de tirar o fôlego. Se parece tanto com
uma tela de pintura através da ampla janela.
Quero me concentrar na conversa com Ava, mas
sinceramente? Um minuto de silêncio seria pedir muito para apreciar
um dos cenários mais lindos que já presenciei? Ainda que os
arranha-céus sobressaiam na cidade, nada se compara ao pôr do
sol.
— É incrível, não é? Preciso admitir que, apesar de passar
meu tempo estressada com eles por estar trabalhando com uma das
maiores bandas atualmente, tenho o privilégio de pagar por um
apartamento em um dos prédios mais altos de Nova York e ser
engolida por essa beleza. — O sorriso ao fim da frase provoca
minha atenção de volta a ela. — Não está feliz com o contrato, mas,
prometo, você será recompensada.
Avalon recupera seu iPad. Os lábios se esticam em um sorriso
ainda maior, como se estivesse tentando me convencer a ver o lado
bom dessa decisão.
Estou me esforçando desde a proposta para medir os prós e
os contras de ter aceitado. A princípio, minha resposta era não, mas
a raiva que senti de Ashton no dia em que me apresentaram o
contrato me fez querer contrariá-lo e por isso deixei indícios de que
aceitaria. Depois, quando estava sozinha relendo o contrato, sabia
que poderia estar escolhendo um caminho definitivo.
Ser estilista é uma aspiração antiga. As únicas vezes que
pensei em desistir estava em meus piores momentos; Winstow e
Milão. As duas vezes em que sonhar pareceu uma perda de tempo
e energia, onde me perguntei pelo quê e por quê estava lutando por
uma carreira que estava destinada a ser minha ruína.
Quando Magdalene me demitiu, naquele ínfimo momento, vi
meu sonho, tudo aquilo pelo qual dediquei meus últimos anos se
transformar em uma nuvem de fumaça e evaporar.
Estar desesperada não é só um sinal de fraqueza, te leva a
tomar decisões estúpidas e das quais possivelmente irá se
arrepender, mas de uma coisa tenho certeza: não posso perder
mais nada. Durante toda a minha vida, tenho perdido e abdicado de
coisas, sendo movida por medo e incerteza.
Desse contrato, só vejo vantagens: vou trabalhar com uma das
maiores bandas — como Avalon mencionou —, ganhar visibilidade
por estar envolvida na turnê, conhecer lugares novos, ganhar
experiência, tempo e dinheiro para investir no meu próprio ateliê.
Claro que ter solicitado uma cláusula que rouba de Ashton sua
liberdade de sexo casual foi uma pequena vingança pelo passado,
mas, no fundo, é também uma forma de impedir que ele acabe com
a minha oportunidade de chegar ao topo. Suportá-lo no processo é
o único contra e também abro mão de me casar com alguém de
quem realmente goste.
— Então, alguma notícia sobre você que possa vir a ser
exposta? Algum passado? — Avalon me chama de volta para a
primeira pergunta.
Mordo o interno das bochechas, ponderando.
Meu passado está há sete anos de distância. Em alguns
momentos, até parece que a vida voltou ao eixo, mas aí algo me
lembra que enterramos corpos, e não fantasmas.
— Não.
— Ótimo. — Desliza o dedo pela tela o iPad, a concentração
segue intacta. — Preparei um dossiê sobre o Leo Bandit — continua
falando, sem voltar seus olhos para mim. — É aniversário dele
amanhã, deve saber que é um dos rappers mais famosos. Ele
enviou o convite para a The Reckless dois meses atrás e a banda
aceitou, mais por questão social. — Um suspiro ecoa de Ava. —
Detalhe importante que talvez você deva saber: Ashton dormiu com
a ex-esposa do Bandit.
— Me conta uma novidade.
Abro a lata de refrigerante finalmente, bebendo um gole
porque acho que vou precisar para conseguir engolir a bola de areia
engasgada na garganta.
Avalon dá uma risadinha nasalada.
— Quando comecei a trabalhar com eles, era mais positiva e
via o lado bom de tudo, mas quando se trata de Ashton, tem o lado
bom? — Franze a testa, e o questionamento é sincero. — Porque,
com tudo que está acontecendo, tenho estado mais estressada do
que normalmente fico com o trabalho. Amo o que faço, mas a
quantidade de problema para resolver sempre me faz pensar se não
devo pedir demissão.
— E deixá-los por conta própria?
— Durariam quanto tempo?
— Menos do que você imagina. — Rimos em conjunto. — Eu
os conheço há anos e eles sempre foram assim, mas são uma
família, e é o que mais amo neles.
— Eles me fazem alimentar os fãs em todo show. Posso ficar
brava, mas é o que me faz continuar com eles. Porque não são
como os outros com quem já trabalhei. Apesar de serem famosos,
não deixaram que atrapalhasse o bom coração que eles têm. — Um
suspiro de deleite flui de Ava. — Ashton tem esse grande problema,
de se envolver em polêmicas, e juro que às vezes quero esganá-lo
por me dar tanto trabalho. — Ela ilustra, enforcando o ar. — Mas o
coração dele é gigante.
Não vejo Ashton dessa maneira há muito tempo e é
interessante poder ouvir alguém falar sobre ele com tanto carinho.
Nem sei se ele sabe que Avalon tem esse tipo de consideração,
mas senão, uma hora irá perceber.
— Enfim, já estou falando demais! — Ela ri, endireitando a
postura. — Quero repassar com você alguns detalhes de como deve
agir diante dos amigos de vocês porque as dúvidas serão muitas e
mentir para eles não será fácil. Mas é importante manter a discrição,
está bem? Um segredo deixa de ser um segredo quando quem não
deveria saber fica sabendo. A propósito, tudo bem se eu reservar o
mesmo quarto para você e Ashton no hotel em Miami? Porque,
quero dizer, se vocês dormirem em quartos separados…
Uma respiração densa eflui da minha boca enquanto mexo o
quadril, travando-o para refrear o desconforto.
— Teremos que dividir o quarto nesse fim de semana?
— Se dormirem em quartos separados, vai ficar estranho.
Ashton não sai com nenhuma mulher e deixa que ela durma em
outro quarto.
Elevo uma sobrancelha esculpida, estudando o rosto magro e
preocupado de Avalon. Desajeitada, empurra uma madeixa
castanha para trás da orelha.
— Já estou arrependida desse contrato, Avalon.
— Pense pelo lado positivo: quando tudo acabar, você terá o
que sempre quis.

SÁBADO, 17 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 13H30MIN.

Estou pensando seriamente em como Ashton fez a minha vida


virar de cabeça para baixo em menos de três semanas. Porque,
honestamente, meu distanciamento me preservou de problemas
mentais e sentimentais, mas, agora, estou prestes a andar de mãos
dadas e fingir que estou apaixonada por ele.
Só a imaginação consegue fazer meu estômago retorcer e um
vesperal começa sua tormenta em minha cabeça, enquanto luto
para me convencer de que tomei a melhor decisão. Na minha
situação, era a mais lógica, certo?
Milionária. Sucesso na carreira. Namoro. Noivado. Casamento.
Que porra!
Essas palavras galgam em looping dentro da minha mente,
deixando-me zonza.
Encaro minha mala de mão aberta sobre a cama de Harper,
fisgando peles mortas do interior das bochechas.
Dentro de alguns dias, farei minhas malas para morar com
uma pessoa que não suporto. Passarei longos oito meses tentando
deter meus nervos. É pra lá de cansativo pensar e me organizar
para não ter os piores dias da minha vida porque se passarmos a
maior parte brigando, nos aliando ao passado, com certeza vou
enlouquecer.
Na verdade, conheço Ashton muito bem. Sua promessa de
fazer da minha vida um inferno não é uma palavra que ele usou
despretensiosamente. Se disse que vai me importunar, é porque vai.
Não é que eu não entenda, pelo contrário, sei que aceitar a
proposta de Jared é o estopim para Ashton. Traz lembranças
dolorosas do seu passado. Não importa quanto tempo passe,
alguém que ele amou o usou e, mesmo que tenha perdoado,
superar é uma outra história.
Tenho certeza de que a traição ficou enraizada em seu
coração, criando ramificações, e conseguir levá-la só no sexo é
como provar a si mesmo que pode controlar o que sente. É como se
dissesse que apesar de ter sido usado, ele venceu. Mas não posso
deixá-lo me vencer. Por causa dele fui demitida e perdi o único fio
que me conectava com uma carreira promissora. Posso aguentar
um pouco de rancor se estiver sendo recompensada.
Li o dossiê de Leo Bandit. O cara é famoso pelas festas que
dá, e Ava quis me preparar. Chequei a lista de convidados, só tem
celebridades entre eles. Desde Penni Lancaster até o jogador de
basquete que espancou Ashton outro dia, Sawyer alguma coisa. A
ex-esposa também está entre os convidados, Ebony Bandit.
A festa vai acontecer em uma casa à beira da praia em Miami.
Desde cedo, páginas de fãs no Twitter estão fazendo uma cobertura
dos artistas que estão pousando na Flórida.
Pelo que vi, todo ano, o aniversário dele se transforma em um
evento. Rola muita coisa, mas inclusive e principalmente drogas.
Disso, eu não tinha nenhuma dúvida. Só espero não ter que bancar
a irmã mais velha e responsável, e andar atrás dos meninos
impedindo que façam merda.
Jogo dentro da mala o vestido que escolhi para usar hoje,
assim como meus pertences de higiene pessoal e maquiagem. Meu
celular toca por debaixo das pilhas de roupa em cima da cama.
Empurro as peças, vasculhando por entre uma e outra, seguindo o
som do toque até encontrá-lo pressionado por alguns vestidos de
festa.
Apanho o aparelho e leio o nome de Mackenzie.
— Oi?
— Oi? Por acaso, somos melhores amigas, não somos?
— Hm, sim, nós somos. — Rio, andando pelo quarto e
colocando de volta no closet as roupas que não vou levar comigo.
— Que tom esquisito é esse?
— Bryan me contou que Ashton te convidou para uma festa
hoje.
Filho da mãe linguarudo.
— Bom, sim. O que é que tem?
— E por que você não me disse nada?! — Pelo estrídulo
ecoando na linha, a chateação é sincera.
Existe um ponto entre mim e Mackenzie; estarei sempre lá
para ela. Não importa qual seja o problema, se ela precisar de ajuda
para cavar um buraco e esconder um corpo, serei a pessoa que leva
a pá e todo o componente químico para acelerar a decomposição.
Mas não sou aquela que dá todos os detalhes da vida pessoal. Isso
porque gosto de manter minhas escolhas só para mim, sem ter
alguém julgando ou protestando sobre cada decisão.
Durante minha adolescência, meus pais agiram comigo de
forma controladora e estoica. Cresci tão insegura sobre mim mesma
e minha personalidade, que me vi envolvida por garras humanas,
afundadas tão profundamente em minha carne que não me
imaginava ter a liberdade que tenho hoje. Aproveito dela e detesto
quando alguém julga minhas decisões como se estivesse na minha
pele.
— Porque não é nada demais! — respondo exatamente como
Avalon me instruiu. — É só uma festa.
Queremos dar passos lentos. Não vamos expor que estamos
em um relacionamento para imprensa logo, embora tenha certeza
de que Ashton não está nem um pouco preocupado em seguir as
orientações que a equipe passa. Certamente vai agir como acha
que deve e se decidir que hoje será o dia em que vamos contar ao
mundo inteiro que estamos “namorando”, ele fará sem nenhum
problema.
Arrogante e impulsivo, como sempre, mas não vou analisar
cada passo que quiser dar. Afinal, é ele quem está com a reputação
uma merda completa.
— Você não fala com ele direito há muito tempo, Gravity. Não
me vem com essa conversinha.
Arfo, colocando todos os vestidos em cabides e os
organizando dentro do closet.
— E se eu te disser que pode ser… — Mordo o canto do lábio
inferior, inalando o aroma de amaciante das peças. — Mas só pode
ser que a gente tenha se entendido?
Não gosto de guardar segredos dela, mas não seria a primeira
vez e provavelmente não será a última.
— Você sabia que ele e Delilah estão brigados há anos? E que
ele nunca admitiu estar errado?
Sim, eu jamais voltaria a ficar com Ashton e ele jamais se
desculparia pelo que aconteceu porque, para ele, não tem nada de
errado no que fez. Então, Mackenzie tem um argumento forte a seu
favor.
— Mas existe uma diferença entre mim e Delilah.
Mackenzie ri.
— Qual?
— Ele pode dormir comigo.
— Nossa. Então, você e ele estão mesmo transando de novo?
Você conseguiu perdoá-lo por Paris?
— Paris foi há quatro anos. Já superei.
E é verdade.
Sinceramente? Por que eu teria rancor? Nós dois não
estávamos namorando. É claro que, na época, aquilo me magoou
profundamente e por um tempo, tive tanta raiva que não achei que
conseguiria. Mas aqui estamos.
Confundir sexo com amor é o pior erro de qualquer pessoa e
foi o que aconteceu comigo e Ashton. Nenhum de nós está
realmente pronto para um relacionamento de novo. Estamos
emaranhados ao passado.
— Uau, Gravity, eu te admiro.
— Você superou Bryan ter mentido sobre Delilah. Por que é
estranho que eu tenha superado Paris e Nicola?
— Porque, primeiro, Ashton ficou com ela. E segundo, ele
desapareceu e não se sentiu na obrigação de se explicar ou se
desculpar. Bryan não beijou Delilah e ele se desculpou. — Minha
amiga suspira. É consternado, como se não quisesse aceitar. —
Gosta dele?
Quase engasgo com a minha própria língua ouvindo a
pergunta. Que piada.
— Para você ter perdoado assim, deve gostar. Sempre me
perguntei do seu passado, já fiz suposições de que namorou algum
dos meninos ou, sei lá, está fugindo de alguma coisa. Um dia você
me conta se estou certa?
— Não tem nada para contar. — Meu sorriso é uma máscara,
então agradeço por Mackenzie não poder vê-lo. — Quero dizer, é
claro que já namorei antes, mas não tem nada para contar.
— É que você sempre falou de mim e Bryan como se tivesse a
mesma experiência.
— Meus conselhos são baseados em fatos, e o fato é que
você e Bryan poderiam ter resolvido tudo se não fossem tão
orgulhosos! E eu só não queria ver você se magoando de novo e de
novo por causa dele.
Dessa vez, é Mackenzie quem ri.
— É, você e Ashton também são orgulhosos. Enfim, só liguei
para ter certeza. Delilah e eu ficamos um tempão debatendo os
motivos de, de repente, terem se aproximado. Acredita que Delilah
disse que Ashton te convenceu a forjar um relacionamento para
limpar a imagem podre dele na imprensa? — Sua risada alcança
uma altura que me faz afastar o telefone e encarar a tela com a
testa franzida. Agora entendi por que Delilah costumava ser melhor
amiga dele. — Só que eu disse que você jamais aceitaria! Imagina
só? Te conheço há muito tempo, tenho certeza de que se fosse o
caso, você me contaria.
Minha garganta aperta. Uma ardência desconfortável e
totalmente nova cresce no fundo dos meus olhos. Pressiono-os com
os dedos até limpar a visão e termino de arrumar a bagunça, assim
como a mala, com o celular preso entre a bochecha e o ombro.
— Bryan não te convidou para a festa?
— Convidou todas nós.
— Mas?
Porque sempre tem um “mas”.
— Delilah está em reta final do livro dela e não quer sair de
casa. Effy tem um encontro…
— Effy tem um encontro?! — Arregalo os olhos para o meu
reflexo do espelho, apoiando as mãos na cintura. — Por que não
fiquei sabendo disso?
— Ela não quer espalhar. Mas o cara é um gato! — exclama,
soltando risadinhas empolgadas. — Ele é médico, trabalha no San
Rosé. Doutor Beckham Malik.
— Como? Onde? Mas, principalmente, por quê?
Sento-me na cama, boquiaberta, e dobro as pernas sob a
bunda para escutar. Feliz pelo foco ter mudado.
— Angel é amiga da família dele. Na primeira vez que o Beck
apareceu no prédio da Font News, não tirou os olhos da Effy. Tudo
bem que ele é doze anos mais velho, mas parece gostar dela de
verdade.
— Finnick sabe disso?
— É justamente por causa dele que Effy não quer contar.
— Porque ele vai tentar estragar tudo como fez com Reed.
— Bingo! — Mackenzie estala a língua. — Acha que ele gosta
dela ou só não suporta vê-la com outro?
— Acho que um pouco dos dois. Ele não tem coragem para
admitir que gosta dela e, por isso, não suporta vê-la com outro.
— Será que um dia a história dos dois terá um final feliz?
— Um final? Com certeza. Feliz? Para ser sincera, acho que
não.
Arquejando, decido mudar de assunto.
— E você? Por que não vai?
— Não sei…
— Ainda dá tempo.
— Não me coloca em dúvida!
— Seria legal. Espiei a lista de convidados, só tem pessoas
famosas.
— Esse é um mundo totalmente novo, ao qual eu não
pertenço. É estranho pensar que três anos atrás eles estavam
tocando no Purple Ride e no Anarchy e, agora, estão cantando em
shows lotados e os ingressos esgotam em menos de duas horas.
— Você precisa aceitar que eles chegaram onde sempre
quiseram e ficar feliz por eles.
— Eu estou, é só que é difícil. Bryan é uma parte tão
importante e significativa da minha vida, mas sinto que quanto mais
sucesso ele faz, mais distantes nós ficamos. — Ela parece
realmente triste. Meu cenho franze para o seu desabafo.
— Quer meu conselho?
— Por favor.
— Se mude para Nova York. — Desço a tampa da mala e
fecho o zíper. — Solicite uma vaga em um dos jornais daqui, peça
ajuda à Angel e se mude para cá. Você só está em dúvida porque
ainda não se decidiu, mas quando tiver feito a sua escolha, se
sentirá melhor.
— Odeio que seus conselhos façam sentido.
— E eu odeio que fique assim, sendo que as coisas podem ser
resolvidas de forma bem prática. — Sorrio, tentando amenizar a
tensão da conversa. — Seria bom ter você por perto. — Apelo para
seu lado emotivo. — Pensando bem, estou completamente sozinha
aqui.
Tess surge na porta, escorando o ombro no caixilho e unindo
as sobrancelhas para mim. Sacudo as mãos, mostrando que só
estou tentando convencer Mackenzie a se mudar. Minha colega de
apartamento acende a tela do próprio celular, justificando sua
presença.
Estou atrasada. Merda.
— Estou atrasada. Eles fretaram um voo para Miami que sai às
duas e meia.
Salto da cama e corro para me vestir. Minhas roupas
escolhidas estão na cadeira da escrivaninha; short jeans, coturnos,
cinto preto, body canelado e a camisa branca jogo por cima para
compor o look.
— Te ligo mais tarde? — sugiro, colocando-a no viva-voz para
conseguir fazer um coque no cabelo.
— Claro, até mais tarde. Quero mais detalhes quando voltar.
— Você não precisaria se deixasse de ser tão orgulhosa e
fosse para Miami! — brado, começando a ficar impaciente.
— Tchau, Gravity!
Ela se despede sem deixar mais brechas para continuar a
discussão.
Tess me deixa sozinha, e consigo terminar de me arrumar —
em tempo recorde.
Arrasto minha bagagem de mão até a sala, onde ela está
sentada, encarando as cutículas bem-feitas e o esmalte branco nas
unhas. Estudo seus cachos densos e volumosos caindo sobre os
ombros. A faixa de cabelo mantém o rosto bem exposto e a
maquiagem leve, porém luminosa, a deixa ainda mais bonita.
— Então, não sou uma boa companhia? — brinca,
mencionando o fim da conversa que ouviu com Mackenzie.
— Só disse isso para tentar convencê-la.
Procuro por meus óculos escuros e os encontro na mesa de
centro. Ajusto o aro no rosto e lanço um beijo no ar para Theresa.
Por sorte, ela aceitou ir para a festa do Bandit como acompanhante
de Chase, o que não me torna a única “namorada” no meio deles.
— Pronta? — Tess segura sua mala pela alça e se levanta.
Aceno, fazendo que sim, e a sigo para fora do apartamento. —
Achei interessante.
— O quê?
— Você ter aceitado.
— Aceitado? — Testo para ter certeza de que estamos na
mesma linha de raciocínio.
— Sou filha dele, Vity. — Tess ri com todo o orgulho que tem
dentro de si. — Conheço as decisões do meu pai. Até as
improváveis.
— Sinceramente, não sei do que você está falando. —
Agradeço que os óculos escuros me ajudem a compor uma feição
despretensiosa.
— Quanto ele ofereceu para você namorar o Ashton? —
arrisca num sussurro, pressionando o botão para chamar o
elevador.
Engulo a seco, sentindo as farpas afiadas pinicarem a
passagem da garganta.
— Relacionamentos falsos na indústria da música são comuns.
— Sua risadinha nasal me conforta, porém, assinei um contrato que
me cobra confidencialidade. Por mais que queira dizer a ela, não
posso. — Já vi várias vezes, mas sabe o que é mais comum entre
eles? — Tess vira o rosto em minha direção, então consigo ter uma
dimensão mais ampla de seu semblante, e ela parece estar se
divertindo com o assunto. — Até o fim do contrato, deixa de ser de
mentira.

Wade passa as instruções para mim e Theresa. Estamos no


banco de trás da SUV. Somente a equipe de segurança vai nos
acompanhar nessa viagem e, como a presença da The Reckless na
festa de aniversário de Bandit não é nenhum segredo, ele nos
prepara para o que vamos encontrar nos aeroportos.
Como essa é minha primeira aparição com eles em público,
não sinto que estou pronta para tanta exposição. A pulsação
pressiona minhas têmporas e tento não deixar transparecer que o
nervosismo está impedindo minha respiração de fluir regularmente.
Os meninos estão mais adiante na van. O motorista, que
também faz parte da equipe de segurança, utiliza uma entrada
especial do aeroporto para voos não comerciais e, ainda assim,
quando passamos pela entrada principal, vejo fotógrafos, assim
como fãs, se amontoando no portão de embarque.
Encolho os ombros. Embora já tenha conhecimento da
balbúrdia que causam com suas presenças, estar aqui, diante de
toda comoção, é inteiramente novo.
Espio pela janela, ciente de que posso ver tudo lá fora, mas
não podem me enxergar aqui dentro — único motivo pelo qual estou
me permitindo olhar —, e arrepios esquivam em espiral pela minha
coluna. O retumbar oco do meu coração agita tão forte que os
ouvidos obstruem.
A SUV diminui a velocidade até parar.
— Por que estamos parando? — Tess questiona, olhando no
retrovisor para Wade e o motorista.
— O que está acontecendo aí? — Wade fala para o microfone
preso à lapela do seu paletó, e pressiona em seguida o ponto em
seu ouvido. — Nós dissemos direto para o jato! — briga,
resmungando ferozmente enquanto as narinas dilatam. — Diga a
eles que estamos atrasados! — insiste. Noto uma camada de suor
se formar em sua cabeça calva, e ele profere um palavrão baixo. —
Por que eles fazem essa merda toda maldita vez? Fiquem no carro,
por favor — direciona sua ordem para mim e Tess.
Wade abre a porta para sair, e inclino o corpo para espreitar
com os olhos para a van estacionada a poucos metros de distância
de onde estamos. Então, os cinco integrantes da The Reckless
saltam dela.
Bryan ajeita a camisa que está vestindo, puxando as mangas
brancas até os cotovelos. Aidan alinha a gola da camisa jeans e
sorri, acenando para o círculo recentemente formado à entrada do
aeroporto. Chase está vestindo uma camiseta branca básica e não
economiza nos sorrisos. Finnick não parece tão simpático como os
outros nem está feliz em seguir a ideia de parar para dar autógrafos,
mas, ainda assim, o faz quando um fã se joga contra ele, lhe dando
um abraço desajeitado.
Pressiono os lábios para reprimir a gargalhada.
O último a sair da van é Ashton. Ele caminha como se
soubesse que é o favorito. Seu ego inflando o peitoral e quase
rasgando a camiseta com os músculos.
Já sabia da tatuagem de libélula que tem na nuca, mas não a
tinha visto pessoalmente porque nas vezes em que nos
encontramos, estava usando jaqueta de couro. Mas os fãs sempre
falam da tatuagem como se fosse a coisa mais sexy nele. Tenho
que admitir, contrariada, que realmente é. Até o brinco de argola
prateado que, segundo Tess, se recusou a colocar no começo, faz
dele ainda mais bonito.
Quero sentenciar meus pensamentos por tomarem essa
direção, mas ele ser um babaca não anula o quanto é gostoso.
Um suspiro condescendente ovaciona de mim.
Uma fã se agarra ao antebraço de Ashton, estudando seu
relógio preto de fivela no pulso. Ele cochicha algo que a faz sorrir e,
em seguida, o vejo retirar o relógio e entregar para ela.
A garota dá um grito agudo e pula no pescoço dele, lhe dando
o abraço mais sufocante que já presenciei. Entretanto, a fisionomia
de Ashton muda. Antes, ele estava satisfeito por falar com os fãs,
mas no instante em que a garota o aperta dentro dos braços, é
como se ele tivesse ganhado o mundo.
Seu sorriso é de fazer os olhos marejarem e a boca tremer. Ele
realmente ama cada fã, mesmo sem conhecer ou estar presente
todos os dias. Posso ver seus olhos assumirem um brilho
estonteante, capaz de suavizar o semblante aborrecido. É uma
relação que nunca tinha presenciado antes.
O tremor em meus lábios indica um sorriso teimoso sendo
pouco a pouco desenhado. Acho que consigo entender por que
mesmo odiando tanto a ideia de se “vender” para restabelecer sua
reputação, aceitou ter um relacionamento falso comigo.
Ele não quer decepcionar os fãs. Ele pode perder tudo, menos
o amor deles.
Ficam por ali, conversando, tirando fotos, concedendo
autógrafos por mais de vinte minutos, e os paparazzi não perdem
tempo ao fotografá-los. Conforme flashes luminosos disparam, o
aspecto tranquilo de Ashton desmancha. Ele marcha, indo em
direção aos paparazzi, contornando o grupo. Mas Wade apoia uma
mão em seu peito, o impedindo de concluir o objetivo.
Sussurrando algo para Wade, volta a dar atenção aos fãs, e o
chefe de segurança se aproxima do grupo de fotógrafos ansiosos,
gesticulando com as mãos. Minha leitura labial é péssima, mas pela
forma como recuam, acho que pediu para se afastarem um pouco.
Abro uma fresta da janela. Minha visão fica mais límpida sem a
taciturnidade do insulfilme. Embora apenas as sobrancelhas e os
olhos fiquem à vista, leva menos de um minuto para o grupo de
paparazzi me descobrir.
Quando um dos membros levanta a câmera e a aponta para
mim, o flash que dispara ofusca a visibilidade. Pisco inúmeras
vezes, tentando aliviar o efeito do clarão da câmera, mas o
panorama esbranquiçado das coisas e pessoas não muda em nada.
Então, me dou conta de que os outros também me descobriram e
estão fazendo o mesmo que seu colega: me fotografando.
Tento ser rápida e subo a janela do carro, jogo o peso do corpo
no encosto e aperto as pálpebras até que meus olhos parem de
arder.
— Tudo bem? — Tess apoia a mão no meu antebraço.
— Acho que me fotografaram.
— Se fotografaram, não pegaram seu rosto inteiro. Será inútil,
não se preocupe. — Sorri, tentando abrandar a eficácia das fotos.
Esperamos por mais alguns instantes até Wade retornar para o
carro. A The Reckless se despede dos fãs e se encaminha
novamente para a van.
Os três automóveis param próximo ao jato particular, e Tess
sai primeiro. Eu a sigo em seguida, e os outros derivam de seus
carros, se reunindo perto das escadas de acesso ao jato.
Wade nos ajuda com a bagagem, retirando as malas, e a
arrasta até o homem uniformizado ao lado de uma aeromoça.
Entregando nossos pertences para o comissário de bordo, ele sorri
e se afasta com eles.
O chefe da equipe de segurança se distancia para conversar
com o piloto e copiloto, e, enquanto tudo acontece, Tess já se uniu
ao Chase em uma roda de conversa com os meninos.
Encolho os ombros, sentindo aquele frio na barriga. Não há
nada que se possa fazer quando você, de repente, não faz mais
parte do mundo de alguém. É assim que me sinto quando estou
perto da The Reckless. Embora os ame com todo o meu coração e,
quanto ao sentimento sei que nada mudou, ainda entendo o que
Mackenzie quer dizer sobre não pertencer ao meio onde se
encontram.
Fãs esperando por eles, paparazzi, shows lotados, voos
particulares, entre outras coisas que nunca imaginei que acabaria
presenciando, estão me cercando como uma muralha.
Quero dizer, eles estiveram destinados ao sucesso desde
sempre, mas nunca pensei que eu acabaria no centro dele e, de um
jeito muito estranho e distorcido, usando essa influência a meu
favor.
O comissário de bordo volta para dizer que estão prontos para
decolar. Como é um jato que comporta catorze pessoas, apenas
dois seguranças da equipe vão conosco, mas Wade diz que nos
encontrará no hotel em Miami.
Nós subimos. Sou a última a entrar e, mesmo que me sinta
deslocada, pretendo aproveitar a situação para me beneficiar.
As poltronas ficam de frente uma para outra, com um espaço
ínfimo entre elas, e uma mesa pequena as divide. Um sofá estofado
acomoda quatro pessoas sentadas.
O interior é luxuoso, parece ter sido inspirado em um vagão de
trem de primeira classe; os tons opacos trazem essa suntuosidade,
os assentos em tom de creme com detalhes em marrom escuro e as
costuras em dourado. Todas as mesas com o tampo de vidro
marrom e fissuras que encaixam perfeitamente um copo ou uma lata
de refrigerante com as bordas em dourado. Tudo tão chique.
Inspiro o ar do ambiente, couro se mesclando ao aroma de
limpeza. Cada um se acomoda em um assento, como se estivessem
acostumados, e sou a única tentando assimilar minha realidade a
deles.
Será que já se esqueceram que, um tempo atrás, sequer
imaginavam viajar em um jato desses? Porque, para mim, é tudo
uma grande novidade.
— Senhorita, pode se sentar, por favor? — O comissário de
bordo — leio Ben Tucker na placa de bronze em seu uniforme —
fala, e sobressalto, indecisa sobre onde vou me sentar.
Ashton está sozinho em uma poltrona no fundo. Com o suspiro
preso na garganta, caminho na direção dele. Avalon me disse para
ser “paciente” e mesmo que fique com raiva, tente estar em conexão
com ele.
Quando tudo estiver na mídia, não poderemos deixar nenhuma
fissura à vista ou negligenciar aqueles que estarão nos vigiando em
troca de uma boa matéria. Tenho que ficar me lembrando do motivo
de estar fazendo isso.
Todo o meu esforço dos últimos anos dependia de Magdalene.
Não importa quão dedicado você seja ou quão incrível seus
modelos são, sem uma boa ponte como influência, se tornar uma
estilista é um sonho que ficaria dentro de uma caixa, e o que quero
é sair dela.
Ashton é a minha passagem. É a única pessoa que conheço
capaz de ser essa conexão. Detesto precisar dele tanto quanto
detesta precisar de mim, mas não sofri por nada. Não passei por
tudo que passei para deixar que acabe com uma estilista arrogante
me dizendo que não sou talentosa. Estou aqui, apesar de tudo,
porque decidi não desistir por nada nem ninguém.
A ânsia de vômito sobe no instante em que Ashton estreita os
olhos para mim. Deixo minha bolsa cair na mesinha separando os
assentos.
— Cai fora — diz simplesmente, agitando a mão para me
dispensar.
Ignoro e me jogo na poltrona diante dele. Seu olhar ferino e
imperdoável viaja até mim.
— Qual parte do cai fora você não entendeu?
— Precisamos conversar.
— Não, obrigado.
Sua atenção volta para a janela.
— Como pretende fazer isso me ignorando? Será que você
sabe que sou eu quem deveria estar com raiva? Você me fez ser
demitida. Você me irrita. Você é o meu maior problema, Ashton.
Lentamente, como se cada palavra minha fosse absorvida por
sua mente, ele se vira de novo. Pendendo o corpo sobre o próprio
tronco, apoia os cotovelos nas coxas e firma os olhos escuros em
mim.
— Vou te dizer como pretendo fazer, Vity — sussurra,
debochado, e, ainda com os olhos vidrados, sinto o fogo faiscando
dentro deles me prender, hipnotizar e até mesmo ferir. — Eu vou
para cima de você com tudo que tenho, com força total, e vou te
destruir.
Retraio os ombros, sentindo a ameaça me atingir nos ossos.
Minha expressão não muda, entretanto.
Aprendi a conviver com máscaras e sou feita de segredos.
Ashton acha que me assusta, mas tenho o diabo debaixo da cama,
à espreita.
— Não estou fazendo com você o que Nicola fez. Nós dois
precisamos de ajuda.
Mantenho a postura, agindo como se suas narinas expandidas
de raiva não me deixassem aterrorizada.
Ele ri sem tentar ser moderado. Os caninos afiados ficam à
mostra e exibem uma versão dele que ainda não conhecia.
— Não, está fazendo pior. Está mostrando que estive errado
sobre quem você é. Está me fazendo questionar por que um dia
cheguei a pensar que estava me apaixonando por você.
“Algo sobre você
Me faz sentir como uma mulher perigosa”
DANGEROUS WOMAN – ARIANA GRANDE

MIAMI, FL.

Ashton e Tess trocaram de lugar. Era para nós duas ficarmos


juntas no carro alugado, mas, como se Wade tivesse presumido
minha briga com Ashton, está nos forçando a passar um tempo
juntos.
O motorista liga o som do carro, os alto-falantes ribombam
uma música e não é alta o bastante para me impedir de conversar
com Ashton, mas, enquanto escorrega os polegares na tela de seu
telefone, sei que é uma mensagem subliminar de que não pretende
abrir a boca.
Não estou esperando que facilite para mim. Recebi tantas
ameaças que estou esperando, nada mais nada menos, que o pior
dele. Conheço uma pequena prestação de quem ele é. Além da
personalidade explosiva e uma certa predisposição para causar uma
bagunça imensurável, Ashton Baker é quase uma incógnita.
Anos de amizade não foram o suficiente para conhecê-lo, Paris
nem se fale porque, quando penso naquela viagem, é como se tudo
nela não tivesse passado de uma mentira muito bem arquitetada.
Tanto da parte dele quanto da minha. Não nos conhecemos de
verdade nem deixamos transparecer o que carregamos dentro de
nós. Foi superficial, uma maneira de renegar nossas raízes cruéis.
Entreabro os lábios para falar, mas antes que consiga formular
a frase, sou interceptada.
— Não fale. Nem pense em falar comigo — murmura com a
voz irritadiça. — Só vou interagir com você quando for para cumprir
com nosso contrato.
Retraio os ombros, sentindo a fisgada em meu peito. Ele está
precisando de outro soco na boca, se quer saber.
— Preciso que me dê sua mão.
Ponho a minha sobre o banco, a palma virada para cima.
— Por quê? — Ashton franze a testa, uma compreensível
confusão.
— Avalon disse que preciso publicar algumas fotos nossas.
Sem mostrar seu rosto, por enquanto — elucido. Torço para que
seja o suficiente para convencê-lo, mas Ashton continua encarando
minha palma. — Só segura a minha…
Com um farfalhar impaciente, entrelaça os dedos nos meus. O
calor da sua mão esquenta a minha e sou amplamente dominada
por uma sensação familiar de toque. Por uma fração de segundo,
sua atenção fica aprisionada em mim.
Deslizo pelo banco até que meu joelho resvale no dele. Viro
nossas mãos, deixando a minha por cima, e as posiciono sobre a
coxa, evidenciando os anéis dourados adornando meus dedos, mas,
sobretudo, nossas mãos circundadas.
Ignoro o roçar leve do dorso da sua em minha coxa e
especialmente o aroma de couro e perfume masculino surtindo dele
como um elixir poderoso que transtorna meus sentidos.
Abro o aplicativo do Instagram com a mão livre, aponto a
câmera para nossos dedos trançados e tiro a foto. Publico em
seguida no story e instantaneamente, depois de confirmar que atingi
o objetivo com o contato físico, Ashton desvencilha a mão de forma
abrupta.
Pela carranca e as dobras de pele marcando o centro da testa,
começo a compreender que este será um fim de semana longo e
extremamente cansativo.
— Você está agindo como uma criança. — Arrasto-me de volta
para o outro canto, abrindo o distanciamento entre nós.
— Estou agindo como criança? — Ele liberta uma risada
debochada. — Você prestou atenção nas cláusulas do contrato?
Quer dormir com outros homens, enquanto eu tenho que colocar um
cinto de castidade e ser fiel? A você? Qual é a porra do seu
problema?
— Espera, não sei se entendi. — Meus lábios se desprendem
em um sorriso inocente. — Está com raiva de quê? Eu dormir com
outras pessoas ou a parte em que coloquei uma cláusula que te
impede de acabar com sua reputação já fodida?
Encrespo a testa, aguardando por sua resposta.
— Você está tentando ser o meu pior pesadelo — sussurra,
bufando.
— Você poderia ter recusado. — Sacudo os ombros, exibindo
meu desdém para seu argumento fajuto. — Por que não recusou?
— E que outra escolha eu tinha?
— Você tinha muitas, mas, segundo a sua equipe, nenhuma
delas teria uma narrativa convincente.
— Você colocou aquela cláusula porque ainda está ressentida.
— Ah, por favor, Ashton! Quantos anos nós temos? — Giro o
tronco e dobro uma perna sob o corpo. — Paris foi há quatro anos.
Quatro! Se não superou ainda, esse problema não é meu. Só exigi
essa cláusula como uma maneira de proteger o pouquinho da
dignidade que te resta… — Faço uma pinça com os dedos para
ilustrar. — Porque você não se importa com a discrição e se fosse
pego me traindo, qual seria sua explicação?
— Olha só, sua maldita… — Ele rosna, os olhos injetados com
uma repulsa recém-adquirida. — Se eu saísse com outra mulher,
não estaria te traindo porque o que nós temos não é real!
— Suas ofensas não surtem efeito em mim. Sabe disso, não
é?
Arqueio uma sobrancelha. De certo modo, me divirto bastante
com a raiva que Ashton está sentindo. Gosto de ser a responsável
pelos gatilhos que estou causando nele? Não. Mas ele nunca
ponderou se responsabilizar pelo que já fez comigo também.
— Por mim, tudo bem se quiser agir dessa maneira, não sou
eu que estou por um fio de ser expulso da The Reckless.
Quando falo da banda, recupero sua atenção, e os olhos
inoculados de cólera, ensandecidos pelo desprezo, me fitam.
— Se continuar prejudicando a reputação deles, a próxima
alternativa é você fora. Apesar de tudo, não estou a fim de ver
acontecer. Então, pode se portar como um ser humano desprezível
e me ofender de quantas formas tiver vontade, mas você me fez
perder uma oportunidade única. Trabalhei duro para conseguir a
vaga com a Magda. Você não tem ideia do inferno que enfrentei! Só
preciso de um empurrãozinho para chegar lá e é você quem vai me
dar. Não estou tentando mentir para conseguir sua confiança. Nós
dois precisamos disso, então que tiremos o melhor proveito
possível, hum?
— Se você acha que vou ceder, pode esquecer.
Um suspiro de derrota evapora da minha boca. Que homem
difícil e teimoso.
— Sabe como funciona uma guerra. Se você emite o primeiro
bombardeio, precisa estar preparado para o contra-ataque. —
Ashton reflete, olhando através da janela. — Você sabia que me
sentiria usado se assinasse o contrato e o fez mesmo assim. Não
espere que eu seja compreensivo com você agora.
— Não sei o que acha que tem contra mim, mas não vai
funcionar.
Desvio os olhos para o outro lado, certa de que serão os oito
meses mais dolorosos da minha vida. Só torço para que,
profissionalmente falando, valha a pena.
— Em oito meses, você estará apaixonada por mim e terei o
prazer de quebrar seu coração.
É um alerta ou uma ameaça. O que quer que seja, não gosto
de como meu coração reage a isso.

Roo o gelo do meu drinque, então o estrépito chama a atenção


de Theresa. Tento fingir que esse é só mais um encontro
convencional, mas essa desculpa é como testar a inteligência da
minha colega advogada.
Cerrando a testa enquanto me encara, estou com a explicação
arquitetada. Para a imprensa, meu relacionamento com Ashton
pode ser coeso, mas para nossos amigos, não. Eles sabem que
minha história com o baixista é repleta de altos e baixos — mais
baixos que altos, claro — e meu namorado de mentirinha não está
facilitando nosso relacionamento.
Ele não está medindo esforços para deixar claro seu ódio por
mim. Primeiro porque está distante desde a hora que chegamos à
festa e, durante todo o percurso do hotel até aqui, fez questão de
agir como se não estivéssemos emaranhados nesse contrato.
Tudo bem, Ashton está com raiva. Para ele, eu o estou usando
e, sinceramente, faz sentido que minhas ações acabem o levando
de volta a um relacionamento traumático, mas, porra, preciso desse
emprego. Não passei pelo inferno nos últimos três anos para morrer
na praia.
— Seu encontro está indo por água abaixo. — Tess declara ao
meu lado. Estamos passando um bom tempo juntas enquanto
Chase se afastou para pegar aperitivos e ainda não conseguiu voltar
sem ser contido por uma conversa e outra. — Ficará mais fácil se
você me deixar te ajudar.
— Me ajudar no quê?
Arrasto meus olhos até a garota.
Sua pele marrom-clara está com uma fina camada de suor. O
vestido rosa-choque tem um bonito decote em V, a fenda deixa o
colo ligeiramente exposto. A gargantilha é de prata, assim como os
brincos cravejados de zircônia que descem de seus lóbulos como
dois pendentes.
Tess não precisa de muitos acessórios para ficar incrível e a
pinta acima do lábio superior é um charme delicado.
— A fazer com que o relacionamento de mentirinha de vocês
dê certo, bobona. — Ela ri, piscando suavemente. — Posso
conhecê-lo há pouco tempo, mas Ashton precisa de pulso firme.
Você já deve saber disso. Se não assumir as rédeas, ele não vai se
esforçar, e o contrato de vocês já era — fala com tanta
tranquilidade, que chego a pensar que eu claramente deveria deixá-
la me ajudar. E, sim, sei que Ashton pode agir como uma criança, às
vezes, e se deixá-lo comandar tudo, o que você terá no fim é uma
catástrofe irremediável. — Posso ajudar.
— Não acho que precise de ajuda. Ele literalmente disse que
está disposto a me deixar apaixonada até o fim do contrato.
Pressiono os lábios. Noto tarde demais que contei sobre nosso
segredo sem a intenção, mas a ameaça de Ashton fica me
rondando segundo após segundo.
Tenho certeza de que ele não poupará energia tentando me
deixar apaixonada por ele. Posso não conhecê-lo profundamente,
mas o pouco é suficiente para saber que quando determina um
objetivo, é difícil voltar atrás.
Mas não estou preocupada que vá acontecer. Meu foco está
voltado para o prêmio, e se Ashton quer me forçar a gostar dele
para me dispensar depois e provar que pode me usar tanto quanto
acha que estou fazendo com ele, admito que estou curiosa para
saber quais serão suas táticas.
Seguro a cereja presa à taça do meu Cosmopolitan pelo cabo
e a levo à boca, mastigando a fruta em seguida.
— E ele disse isso de um jeito bom? — Vincos entalham a pele
de sua testa.
Viro em direção à voz de Tess, rindo.
— O que você acha?
— Meu Deus. Ele quer quebrar seu coração. — Tess bebe de
seu próprio drinque, como se precisasse de ajuda para engolir a
repulsa. — Como vingança?
— Coisas que Ashton Baker faria para provar um ponto. — Um
suspiro ecoa de mim.
Meus olhos varrem o ambiente, fazendo o reconhecimento que
não tive a oportunidade quando cheguei.
Assim que nossos nomes foram confirmados pelos seguranças
na entrada, Ashton se desvencilhou para se aproximar dos seus
“colegas famosos” e o restante dos meninos se dispersou quando
viu o bar, mas principalmente porque Bandit logo os chamou para
uma batalha de rap perto da piscina. É claro, estão só assistindo,
mas gosto mais da playlist que está tocando aqui dentro.
A casa deve ter pelo menos dois andares acima do térreo, mas
a quantidade de pessoas perambulando é sufocante, então opto por
me manter confortável nesse sofá, cercada por celebridades. Tantas
que nem sei se conheço todas elas.
Minutos atrás, reparei em Penni Lancaster. Ravennah publica
tanto sobre a cantora que seria difícil não reconhecê-la. Sobretudo
porque quando chegou, aconteceu um escarcéu. Todo mundo, sem
nenhuma exceção, a adora. Ela tem longos e ondulados cabelos
dourados, um corpo esculpido pela musculação ou qualquer que
seja o exercício que pratique para se manter em forma, e
sobrancelhas com um design perfeito.
Penni é linda. Tem uma pele bronzeada com marquinhas de
biquíni, o que significa que passa bastante tempo tomando sol.
Por um segundo me questionei o motivo de ela e Finnick não
terem dado certo, mas considerando que também estivemos juntos,
sei que não é fácil levar um relacionamento com ele.
Com Finn, as coisas funcionam no raso. Ele curte o sexo, mas
odeia beijos tanto quanto detesta falar de sentimentos. Para ele, a
parte íntima que faz de as pessoas serem um casal é irrelevante. Se
posso suspeitar o motivo de o relacionamento não ter durado nem
dois meses, é que ninguém suporta a insensibilidade de Finnick
para lidar com a necessidade de afeto do outro.
O jogador de basquete que estava na lista não apareceu. Acho
que Ayla, a modelo, deve ter voltado com ele, porque li alguma
coisa sobre o assunto durante essa semana.
Meus olhos só param o curso quando aterrissam em Ashton,
sorrindo feito um estúpido em uma roda de atrizes e músicos.
Tombo a cabeça para trás, ingerindo o restante da minha bebida.
Envergo o corpo e deixo a taça na mesa centralizada no círculo
onde o grande sofá está.
Mesmo que não queira deixar óbvio, minha atenção retorna
para o idiota que disse com todas as palavras que se esforçará para
partir meu coração só porque tem um ego enorme e um orgulho
maior ainda. Ele prefere continuar sendo atacado pela imprensa a
aceitar que está preso a mim.
Sinto a caixa torácica comprimir com a emboscada na qual me
enfiei ao aceitar essa loucura.
Ashton está vestido inteiramente de preto e retirou o brinco de
argola. Terno. Camisa. O preto lhe cai bem, o deixa misterioso e
sexy, e o pior é que ele sabe e não se importa de abusar da cor
como sua aliada. A gola da camisa está desalinhada, mas não o
deixa menos elegante, e estou para morrer por ser sabotada pelos
meus pensamentos de novo.
A bola de chumbo em minha garganta parece impossível de
engolir quando, internamente, admito que ele é uma perdição. Meus
sentidos ficam conturbados por conhecer o que ele tem debaixo de
todas essas roupas e da carranca de arrogante vingativo.
Morro com a calcinha encharcada, mas não vou ceder ao
charme inato que ele exibe como um superpoder.
Como se soubesse que estou olhando, Ashton ri, inclinando a
cabeça para o lado, e cortesmente toca o ombro da modelo
acinturada, cochichando através da cortina de cabelo castanho-
chocolate.
Fecho as mãos em punhos, a ponta afiada de minhas unhas
perfura minha palma.
Lembro-me da lista de coisas que temos que fazer nesta festa
para tornar nossa história coerente quando finalmente publicarem
sobre nós, porém, acredito que meu parceiro não está interessado
em seguir as cláusulas do contrato. Ao contrário, acho que vai me
importunar com tudo o que tem, somente pelo prazer de me
enlouquecer ou para me convencer a ser a parte que implora para
sair. Seja me provocando ou tentando me deixar perdidamente
apaixonada.
Ashton relanceia seu olhar em minha direção. Retraio minha
vontade de desviar a atenção. Não fujo mais de um embate. Há
muito tempo deixei a versão fraca de Gravity para trás e decidi me
tornar poderosa. E algo em Ashton me faz desejar que ele me
provoque para que eu mostre o quanto posso ser perigosa.
Empino o nariz, arqueando o queixo, e mantenho a cabeça
erguida, obstinada a vencer nossa guerra óptica.
Ele me surpreende quando volta a dobrar a coluna em direção
ao ouvido da modelo, mussitando algo que jamais saberei o que é.
Ela concorda com a cabeça e sorri, e ele se encaminha para o bar
no canto do cômodo.
Luzes amareladas e opacas não me fazem perdê-lo de vista,
entretanto. Debruçando sobre o balcão, pede uma bebida para o
bartender e aguarda. Instantes depois, o vejo cercar com a mão
uma taça com o Cosmopolitan.
— Oh-ou — murmura Tess do meu lado. — Ele está vindo. Por
que ele está vindo? E está rindo como alguém que está planejando
algo perverso — continua, mas não consigo me distrair do andar
confiante e autoritário de Ashton. — Acho que vou dar privacidade
para vocês e procurar o Chase.
Theresa não me dá tempo para contrariá-la. Ela só me toca
gentilmente antes de se levantar, lança um sorriso para Ashton
quando vê que está perto o bastante para notá-la e mergulha entre
a multidão anárquica de convidados de Bandit.
É uma péssima ideia nos deixar sozinhos agora.
— Para você. — Ele sorri de forma diabólica.
Arrepios governam minha espinha.
— Tem veneno aí? — Gesticulo com o maxilar inferior para a
taça.
— Por que eu tentaria envenenar minha futura esposa?
Sobe uma sobrancelha, soando tão inocente que quase
acredito. Contudo não aceito a bebida. Não acredito mesmo que a
tenha envenenado — óbvio —, mas ele está com um sorriso ladino
que me deixa desconfiada.
Inflo o tórax com ar, elevando meus olhos para o semblante
divertido esculpindo seus músculos faciais.
Ele deixa a taça na mesa.
— Futura esposa? Algumas horas atrás, eu era uma maldita.
Dentre outros nomes que deve ter me chamado enquanto eu não
estava por perto.
— O que os ouvidos não escutam, o coração não sente.
Ele abre o botão de seu blazer e pula minhas pernas para
assumir o lugar onde Theresa estava.
— Cansou de agir como um babaca?
— Eu sou incrível, Gravity — fala com seriedade. E, embora
esteja esperando que ria em seguida, ele não o faz.
— Você realmente acredita que é incrível. — Fito-o.
— Não, eu realmente sou — enfatiza. Quase vejo o ego
inflando seu peito e não resisto em revirar os olhos. — Você tem
esse péssimo hábito — comenta, desviando para outro ponto.
— Que péssimo hábito? – sobressalto, detectando o escárnio.
— Ficar revirando os olhos para mim.
— É que sai muita merda da sua boca.
— É assim que vai falar comigo?
— Se você agisse como um ser humano decente, poderia te
tratar como um.
Ashton volta a me encarar com olhos injetados de
exasperação.
— Ficar sem se sentar por uma semana resolveria o
problema.
— Está me ameaçando?
— Algumas boas palmadas te deixariam molhada e
disciplinada.
Sua seriedade se dissolve em um sorriso malicioso.
Suprimo a risada.
— Você nunca mais vai me tocar — sussurro, provocativa.
— Quer apostar? — desafia.
Só percebo o que está acontecendo quando Ashton me agarra
pela cintura e, sem nenhuma dificuldade, me coloca sentada de lado
em seu colo. Ele desliza a mão pelo decote trançado do vestido nas
costas, calor se ampliando sobre minha pele com o carinho
afetuoso. Como se de fato estivesse tentando ser gentil.
Para qualquer um que cruzar a nossa frente e nos vir, pode
parecer inofensivo, mas a reprimenda interior do meu ser diz que
não. Que ele só está colocando em prática o que disse que faria.
Isso é tortura, de um jeito diferente, mas funciona.
Segurando meus pulsos, os escolta até que meus braços
estejam enroscando seu pescoço. Retenho uma generosa
quantidade de ar para conseguir sobreviver a esses minutos
intermináveis.
— Viu? Estou te tocando — sussurra ao encaixar a boca na
curva do meu pescoço e, antes que considere me distanciar, Ashton
envolve meu quadril com outro braço, me cercando e imobilizando.
— Fácil, fácil, Gravity. — A voz rouca vibra contra minha pele.
— Acha que não sei o que está fazendo… — sibilo, trincando
os dentes até a mandíbula contrair.
— Estou dando início ao nosso segredo. Não foi você que
disse que tínhamos que fazer isso?
Ele ignora minha pele arrepiada só com a calidez do seu hálito
tocando a lateral do meu pescoço e, se provando ser irritantemente
determinado quando o assunto é me provocar, aproxima os lábios,
pousando um beijo úmido e quente na minha pele. As vértebras da
minha coluna enrijecem com o toque e meu estômago se revira de
um lado para o outro.
Quando não achei que pudesse piorar, Ashton acaricia minha
coxa por cima do vestido, mas, ainda assim, cada centímetro de
pele está abalado com o toque repentino.
Engulo o fôlego, apertando as pernas para conter a resposta
involuntária do meu interior. Seu polegar chega à fenda do meu
vestido, aflorando um insignificante pedaço de pele, e pode parecer
inocente, mas meu corpo incinera. Especialmente quando rompe a
barreira de tecido por completo e apalpa minha coxa, fechando a
mão e adicionando pressão.
— Não sei o que está planejando, mas é melhor parar.
— Parar com o quê? Estamos encenando. — A rouquidão de
sua voz sussurrada acaricia meu pescoço docemente. Ele estende a
mão para afastar uma madeixa que se desprende do coque. — As
pessoas estão olhando para nós e, amanhã, quando publicarem
nossas fotos, todos saberão que você é minha.
Engasgo com a gargalhada.
— Sua?
— Você será minha esposa e o contrato pode te permitir sair
com outras pessoas, mas eu não.
Ele olha para o lado, como se conferisse se ainda estão
prestando atenção em nós, e, no momento em que atesta que sim,
sem nenhum prenúncio, me reivindica.
Sua língua afiada e macia, com sabor agradável de suco de
frutas, separa minha boca para adentrar. Quando briga por
dominação, sinto o gosto do rum vindo presumivelmente do drinque
que tomou. Ele se esforça para ganhar território, impulsionando até
que eu fique obsequie e permita que conduza o beijo como desejar.
Abro a boca, cedendo mais espaço para explorá-la. Seu beijo,
o toque, seu agarre está mais firme e possessivo do que me lembro,
e ele se divide entre acariciar minha coxa e fechar a mão livre em
minha garganta, para deter qualquer reação adversa. Paralisada e
completamente entregue, nem me ocorre afastá-lo.
Chegamos até aqui, de qualquer forma. É o mesmo que estar
em alto mar e considerar voltar para o porto de onde saímos.
Você só tem uma alternativa em situações assim: seguir em
frente.
Durante toda a minha vida, esse foi o meu mantra. Seguir em
frente. Olhar para trás, voltar para o ponto de partida não é e nunca
será uma opção.
Ele intensifica o beijo, se deliciando de mim. Mergulho de
cabeça nesse mar furioso, sem protelar ou medir as consequências.
Calor sobe para minhas bochechas e sigo pressionando as pernas
para conter a excitação, mas até minhas coxas proferem sua revolta
quando tremem sem nenhum juízo.
Ashton, por outro lado, encontra um ritmo que tenho
dificuldade de acompanhar, entre impaciente e faminto, conduz meu
corpo a um ciclo de necessidade que não será atendido.
O pulsar pungente entre minhas pernas arrasta para fora de
mim um gemido que rasga o ar. Seus dedos ao redor de minha
garganta fazem pressão, se empenhando para impedir o som
afônico de fugir, mas se seu objetivo é me beijar dessa maneira e
não me autorizar reagir à altura do que sua boca está fazendo
comigo, temos um grande problema.
Então, suas palavras de minutos atrás serpenteiam minha
mente, agudas e intrusivas, me forçando a pensar como seria se ele
acabasse cumprindo suas ameaças. Eu tenho qualquer chance
contra ele? Tenho, sim. Tanto tenho quanto vou lutar contra ele, se
for necessário. É definitivamente uma guerra para se lutar lado a
lado, mas se Ashton quiser me ver como oponente, não irei me
amedrontar.
Ele lambe meu lábio superior antes de prensar os dentes no
inferior e, se desmanchando em um suspiro denso, me devolve para
o lugar no sofá. Sem afastar os olhos de mim, puxa o colarinho da
camisa e limpa a boca, ocasionando uma turbulência estrondosa no
meu âmago.
Ele está com nojo de mim?
Sem nenhuma cerimônia, se levanta, voltando a prender o
botão do blazer. Diferente de mim, Ashton não demonstra ter sido
afetado pelo beijo.
— Acabamos por hoje. Ao menos agora você tem memórias
para se masturbar mais tarde.
Os cantos de sua boca projetam um sorriso, e é ainda mais
impiedoso.
“Não é uma guerra, não é o êxtase
Sou só uma pessoa, mas você não aguenta”
IGNORANCE – PARAMORE

MILÃO, IT.
3 ANOS ATRÁS
TERÇA-FEIRA, 17 DE AGOSTO DE 2021, ÀS 23H43MIN.

Você é o meu lar.


Ele sorri. Um sorriso largo que quase atinge a ponta de suas
orelhas.
Neil escorrega o polegar pela cobertura da minha boca,
desenhando seu contorno e, a cada pedaço de mim que tenta
gravar, mais brilho vejo em seus olhos.
— Por que você não me deixa viver?
O sorriso desaparece.
— Por que você não se importa o suficiente?
— Eu me importo, Neil. Juro que me importo, eu…
Não consigo terminar de elaborar minha frase, um disparo a
corta ao meio, atingindo meus tímpanos. O zumbido alto perfura e
maltrata minha audição.
O corpo de Neil enternece entre meus braços, o líquido
vermelho e concentrado escorre como uma cachoeira atravessando
seu queixo e goteja em meu colo.
— Neil! — O grito rouco e alto ecoa da minha garganta, sinto
ardência se ampliar em minha carne. — Neil! — chamo-o outra vez.
O desespero se acumula em meu peito de tal forma que não
consigo respirar.
Lágrimas escorrem por meu rosto, embaçam minha visão.
Tumulto se forma dentro de mim, as pancadas lépidas do meu
coração vedam minhas saídas respiratórias e inalar o ar com o odor
de cobre me deixa enjoada.
— Por favor, por favor, por favor…!
Ajoelho-me na calçada com seu corpo flácido em meus braços.
— Não morre!
Desperto com um solavanco. Lençóis embrenham entre
minhas pernas. Empurro os fios de cabelo úmidos de suor para trás
e a respiração entrecortada tenta encontrar o ritmo constante.
Abraço meus joelhos, trazendo-os para o peito. Escondo o rosto
entre eles e mordo o lábio inferior para impedir o choro de
atravessar as paredes do quarto.
Seja forte, meu consciente me ordena. Mas, em alguns dias,
eu só gostaria de desmoronar sem me sentir culpada por isso, sem
me forçar a ser a Gravity que não precisa de nada nem ninguém.
Às vezes, só gostaria de me encolher como uma bola e me
permitir sofrer de verdade, sem medo de me considerarem fraca,
volátil e vulnerável.
Minha cabeça gira em direção a um som novo no ambiente.
Risadas ribombam do corredor do apartamento. Ainda que minhas
pernas estejam fracas e presumivelmente eu vá cair em minha
primeira tentativa, acabo me arriscando.
Afasto os lençóis para o lado, liberando meu quadril, e puxo o
ar para recuperar o fôlego antes de pôr os pés no chão. Acendo o
abajur, notando que a porta do meu quarto está entreaberta e um
feixe de luz do corredor a atravessa.
Franzo o cenho e, então, volto minha atenção para a
escrivaninha. Estou criando uma coleção para Yael apresentar à
Magdalene Saylor. É minha passagem para Nova York. Uma chance
de trabalhar com uma estilista de verdade, aprender e, quem sabe,
minha primeira chance para começar minha própria marca.
“Você é muito boa, Gravity. Faça algo para mim, um dia.”
Balanço a cabeça quando a voz de Neil invade meus
pensamentos. O sorriso dele. A voz rouca e preguiçosa, porém
sempre empolgada quando se tratava de mim, dos meus sonhos.
O nó de choro volta a engasgar em minha garganta, mas trato
de engoli-lo.
Caminho até minha mesa ao perceber que minhas coisas
estão fora do lugar. Meus lápis, assim como meu caderno de
desenhos, desapareceram.
Arregalo os olhos para as risadas que voltam a atrair minha
atenção e, sem racionalizar, ignorando o rosto vermelho e os olhos
inchados de lágrimas, disparo porta afora, encontrando um corredor
iluminado. Caminho em sentido à cozinha, as vozes cochichadas e
risadas irônicas me causando vertigem.
— Até que ela é boa. — Iris comenta. Observo meu caderno
passar de uma mão à outra; a capa surrada do material reciclado
com constelações desenhadas são características inconfundíveis.
— Por isso Yael gosta tanto dela.
— Amber. — Chamo a garota de cabelos pretos longos, e ela
ergue o rosto em minha direção quando o caderno chega nela. — O
que está fazendo?
Meu peito sobe e desce, a respiração descontinuada expõe
meu nervosismo.
— Só verificando. — Ela brinca com a capa, mas não é nem
um pouco cuidadosa ao puxar, e começa a se soltar do arame.
Dou um passo adiante, porém, minha colega ergue um
isqueiro e o acende.
— Yael te trouxe pra cá. Queria saber por que todas nós
tivemos que lutar por uma vaga, enquanto você a recebeu sem
mérito nenhum. — Brinca com o fogo próximo das páginas, e
ameaço andar, mas acabo parando outra vez quando Amber
aproxima a chama faiscante da capa.
Tem inúmeros desenhos ali. Não é meu único caderno, mas a
coleção que Yael me pediu está nele.
— Você acha justo? Yael te indicará para Magdalene e,
sinceramente, Gravity — solta uma risada amarga —, acredita
mesmo que merece?
— Temos oportunidades iguais, Amber.
— Você não acredita mesmo nisso, não é? — Ela levanta o
caderno sobre a chama do isqueiro. — Você nem é tão talentosa
assim. — Balançando meu material, noto a fumaça quando o fogo
atinge a ponta da capa. Travo a mandíbula. — Yael tem pena de
você porque é uma ninguém. Quero dizer, você é quase um
fantasma, não? Ninguém sabe nada sobre você, sua vida ou seu
passado. — Faz uma pausa dramática antes de continuar: — Com o
que estava sonhando?
A última pergunta sai sussurrada e, se antes estava com os
joelhos tremendo, agora estou quase para desmoronar. Tento
controlar meus pesadelos nessa época com remédios para dormir,
eles me apagam e me impedem de ficar tensa, mas têm sido de
uma inutilidade sem tamanho. Especialmente neste mês, não tem
nada que possa controlá-los.
— Você tem tido bastantes pesadelos nos últimos dias. Nós
quase não conseguimos dormir. — O sorriso de Amber é intricado. A
tensão em meus ombros se espalha. — Talvez você precise relaxar
um pouco…
E, quando diz isso, a chama do isqueiro sobe e o fogo começa
a consumir as páginas. Amber ri alto e as outras, minhas colegas de
classe, riem tanto quanto.
Fico imobilizada pelo choque. Apesar de querer me mover,
brigar com ela, não o faço. A base dos meus pés se enraizou no
chão e a ardência por trás dos meus olhos é inevitável.
Amber segura o caderno pela ponta do arame e, em seguida,
caminha com ele em chamas pelo apartamento. Ela passa por mim,
sorrindo e me desafiando a pará-la.
Talvez eu devesse, mas a família de Amber é uma das que
doam dinheiro para a universidade na qual tenho bolsa, com foco no
curso de Moda. Não é possível lidar com famílias influentes, muito
menos competir com elas. Você se resigna até que esqueçam da
sua existência e torce para que continue sendo insignificante para
eles. Amber tem tudo e não vejo o porquê eu seria uma ameaça
para ela. É talentosa, rica e um futuro garantido a aguarda quando
terminar a faculdade. Perto dela, sou mesmo uma ninguém.
Quando Amber se vira na direção do banheiro, sua risada fica
mais estridente, como se estivesse tentando chamar minha atenção.
Como se ela ainda precisasse fazer qualquer coisa para tê-la.
Então, quando as outras garotas começam a se mover para ir atrás
dela, entendo que é exatamente o que querem que eu faça.
Sigo-as até o banheiro. Amber está parada diante da banheira.
Assim que me dou conta do que está acontecendo, é tarde demais
para mudar.
A banheira está com água até a metade e, a passos lentos,
encaro o caderno que pegou fogo queimado pela metade submerso
na água. Boiando junto dele, meus outros cadernos fazem
companhia. Todos eles têm constelações em suas capas e,
enquanto flutuam, um filme passa em minha cabeça.
Cada caderno daquele representa uma etapa da minha vida.
Nem todas são bonitas como os modelos que desenhei neles, mas,
de alguma forma, saber que estavam lá deixa a dor insuportável,
razoável. Quanto mais dura a vida se tornava, mais me agarrava ao
que estava ao meu controle de fazer: me tornar uma estilista.
Não posso mudar meu passado ou apagar o que esses
pesadelos significam, mas tenho em minhas mãos o meu futuro.
Posso escolher o que gostaria de viver e ser. Criar roupas é a única
parte antiga de mim mesma que restou, que não foi consumida pela
calamidade. É a única coisa do meu passado que ainda amo e que
me conecta com alguém que, um dia, significou o mundo inteiro
para mim.
Não vou deixar que tirem isso de mim também.
Olho de soslaio para Amber, seu sorriso se alargando à
medida que percebe que conseguiu me afetar. O trabalho de uma
vida inteira perdido, imerso na água.
Fecho as mãos em punhos, ignorando a prudência que Yael
me disse para ter no tempo em que vou ficar em Milão.
Violência.
Foi o que me fez ser expulsa de casa.
Perda de controle.
Foi o que forçou minha mãe a me pôr para fora.
Raiva.
Foi o que me fez descobrir algo sobre mim que não conhecia.
Injustiça.
Foi o que me fez perder a cabeça.
Não penso em muito mais. Amber pode me odiar. Não ligo
para o que as pessoas estão pensando, não me importo com o tipo
de sentimento que desperto em quem está ao meu redor. Tenho
ciência de que não estou tentando magoar ninguém, entretanto,
Amber acabou de solicitar acesso a uma parte de mim que guardo
em segredo.
E eu explodo.
O ataque a ela não diz respeito só ao que fez comigo, mas
também àquele maldito pesadelo que está me assombrando.
“Às vezes você me deixa louco
Às vezes, eu juro, acho que você me odeia”
WHO – LAUV & BTS

DIAS ATUAIS

Que delícia de beijo, porra! Por que tive que ir com tanto
ímpeto e paixão? Poderia ter moderado, sem nada de especial. Mas
não. Brinquei e saboreei. De um jeito que gostei e estou ansioso
para o próximo.
Porque, claro, se estou determinado a usá-la como Gravity se
empenha para fazer comigo, não posso economizar em minhas
habilidades. Irei com tudo e preciso manter a cabeça no lugar.
Preciso ter foco. Tanto quanto sei que está voltada para seu objetivo
com nosso contrato, também tenho que estar para os meus.
Recuperar minha reputação é um deles, mas não terá nada
mais prazeroso que ter o controle de Gravity Monaghan em minhas
mãos. Como se segurasse sua existência entre os dedos. É o que
eu quero.
Sempre que penso que estou sendo usado novamente como
um atalho, a raiva me aquece por dentro. Fico cego. Perco todos os
sentidos. E preciso de algo para retaliar.
A contração da mandíbula faz doer minha arcada dentária.
Debruço sobre o balcão do bar. Dessa vez, peço uma dose dupla de
uísque e, quando o bartender me entrega a bebida, atravesso a sala
em busca de algo para me divertir.
Aproximo-me da roda onde Finnick, Bryan e Aidan estão.
Bandit está cantando uma de suas rimas.
Enquanto bebo um gole de uísque, ele me nota. Ainda existe
um clima estranho entre nós por causa de Ebony, mas, porra, não
tenho culpa se ele se casou com uma mulher deslumbrante e não
soube dar valor.
O divórcio aconteceu há uns seis meses e foi quando saí com
ela. Em uma noite, Eb me contou por que estava se divorciando;
Leo Bandit é um traidor fodido e descarado, e não foi apenas uma,
como várias traições durante seu tempo fora, em turnês, premiações
e shows. Ebony é coreógrafa, portanto, também viaja bastante, mas
era fiel ao casamento. Ele, por outro lado, não estava nem aí. Isso
Ravennah não espalha, não é mesmo? É por isso que acredito que
tem um maluco vendendo informações minhas para o TNC.
Entro no meio de Bryan e Aidan, escondo uma mão no bolso
da calça e bebo tranquilamente durante o tempo em que Bandit
canta.
Admiro meus amigos. Pra caralho. Eles são fiéis às suas
garotas. Oportunidade para infidelidade não falta. Em festas como
esta, simplesmente precisamos insinuar o que queremos e, em uma
fração de segundo, nós temos.
Por exemplo, a modelo que estava comigo antes de me dirigir
à Gravity, por estar hiperconsciente de sua atenção voltada para
mim, estava insinuando que poderia levá-la para o hotel. Se
quisesse.
É o que pretendo fazer porque aquele contrato não irá me
impedir. Deixei tudo pronto quando saímos mais cedo. Arranjei um
quarto e dei uma gorjeta generosa para o concierge manter a
discrição quando voltar acompanhado. Não é traição quando o que
você tem com alguém não é real.
— Em quantos problemas você vai nos meter hoje? — Bryan
ironiza ao cruzar os braços, sem desviar os olhos de Bandit.
Rio contra o copo.
— Em nenhum, caralho. Vocês não confiam em mim?
— Nem um pouco. — Aidan completa antes que Bryan possa
responder.
— Não está tramando sair daqui acompanhado com outra
pessoa que não seja Gravity, não é?
— Não me force a mentir para vocês, Bryan.
— É quebra de contrato. — Aidan franze o cenho.
— É uma cláusula absurdamente ridícula e vocês sabem.
— Ela está tentando te proteger. — Finnick rosna ao lado de
Aidan. — Inconscientemente, mas está.
— Olha só quem decidiu voltar a falar — caçoo para trocar o
assunto, e sou repreendido pelo olhar assassino de Finn. — Sua
namorada está por aí, já falou com ela?
— Não estamos namorando. — Finnick só tem bebido vodka
pura, e o copo com um líquido transparente definitivamente não é
água. — Foi passageiro.
— Passageiro? Penni te fez uma declaração pública! — Aidan
retruca.
— E daí? — Ele nem tenta camuflar o desdém.
Não me contenho, começo a rir. Esse cara é impossível.
— E daí que você não pode esperar que alguém não se
magoe quando você manda uma mensagem dizendo “eu não sabia
que estávamos namorando”.
— Mas eu não sabia. Nunca pedi ela em namoro. — Ele
arqueia uma sobrancelha, inocentemente acreditando que não fez
nada de errado.
Céus, depois eu que sou o fodido insensível.
— Você saiu com ela por semanas, cara. Certos
relacionamentos não precisam de um rótulo para saber o que são.
Finnick parece ficar ainda mais confuso quando Aidan tenta
explicar.
— Sério, Finnick, você precisa ser estudado! — zombo, rindo
sem conseguir parar.
— Você sai com a Harper, certo? — Finn começa a elaborar
seu argumento, e, sinceramente, não gosto do rumo que escolhe
para rebater. — E vocês dois fazem isso há quanto tempo? Um
ano?
— Mais ou menos. — Cerro as sobrancelhas.
— Vocês namoram?
— Não — respondo sem ânimo porque esse desgraçado tem
um ponto forte a seu favor.
— Viram? Não fui eu que entendi errado.
— Para ser honesto, nós vamos desistir de você e Ashton. São
dois cuzões! — Bryan exala seu primeiro sinal de derrota. — Será
que já podemos ir embora? Estou cansado pra caralho. E sentindo
que vou levar um pé na bunda se não voltar para Humperville nas
próximas semanas. Conseguiu suas fotos? Alguém viu você e
Gravity? — Rapidamente define outro assunto para não ter que
entrar em detalhes sobre o dele com Mackenzie.
Eles estão namorando há quanto tempo? Quatro? Cinco anos?
Não deve estar sendo fácil, considerando que estavam
acostumados a estar sempre juntos.
— Consegui — falo com uma entoação de orgulho.
— Então, nós podemos ir, certo? — Aidan confere.
— Querem saber? Até que estou curtindo. — Vagueio meus
olhos pela festa, atrás da modelo que não tive tempo de descobrir o
nome. — Vão na frente. Falo com vocês amanhã.
— Também vou ficar.
Bryan e Aidan franzem a testa para Finnick, mas não discutem.
— Vamos procurar por Chase e Tess. — Aidan diz, dando um
tapa em meu ombro como consolo. — Por favor, não se meta em
problemas. Vocês dois sozinhos… — suspira, balançando a cabeça
como se lamentasse algo que não aconteceu ainda — não é boa
coisa.
— Nossa, cara, valeu pelo voto de confiança! — desdenho,
forçando decepção na voz.
Nem os vejo desaparecer. Finnick e eu continuamos ao lado
um do outro e em silêncio porque se você não for o lado que
conversa, ele será muito menos.
— Evite as drogas. — Beberico do meu copo e, pelo canto do
olho, o vejo fazer o mesmo.
— Evite as mulheres — rebate, e preciso me controlar para
não suspirar.
— Estou falando sério, Finnick. Evite a porra das drogas.
Sinto-me virar o quadril para estar de frente para ele.
— Admito que ser mulherengo pode acabar com minha
reputação, mas, se ficar viciado nessa merda, ela vai acabar com
você. Eu te amo, cara. Se algo acontecer, juro, seu fodido egoísta,
te mato com minhas próprias mãos!
Finnick cerra a mandíbula. A contração faz o queixo tremelicar,
mas, como se minha exasperação não significasse nada, volta a
beber a vodka devagar e sem nenhuma preocupação sombreando
suas feições.
— Sabe qual foi a parte mais difícil em toda a minha vida? —
Permaneço em silêncio, aguardando que prossiga. — Lutar para
continuar vivendo. Se alguma coisa acontecesse comigo por causa
das drogas ou se você decidisse me matar, estaria me fazendo um
favor.
Sempre achei que os problemas com drogas da senhora Taylor
evitariam que Finn se metesse com isso, mas é o contrário. Parece
que, por saber o que as drogas fazem com alguém, é aí que ele
gosta. Finnick é altamente destrutivo. Para ele mesmo e para as
outras pessoas.
— Effy está namorando — confidencia. — Você sabia?
— Eu? — Arregalo os olhos, arqueando as sobrancelhas. —
Por que eu saberia? Ela não mencionou nada.
Finnick pressiona os lábios, rindo feito um lunático. Quando o
encaro de perto, procurando entender o motivo, noto as pupilas
dilatadas.
Que porra.
— Minha mãe que me contou. Parece que a maldita adora me
ver sofrer. Ela falou em um tom tão sarcástico, como se estivesse
feliz ao me dizer que Effy encontrou alguém e que esse alguém é
mil vezes melhor do que eu.
— Quem é o cara?
— Um médico. — Ele sacode os ombros, crispando os lábios.
— Pesquisei. Bom partido, rico, boa família. Ela se deu bem.
— Você também é, Finn.
Arrisco apertar seu ombro, dando apoio.
Exceto pelo fato de que destrói tudo que toca.
— Não fode. — Ele ri, encaixando o copo entre os lábios para
terminar de beber. — Estou longe de ser um bom partido. Ela
merece ser feliz.
— Você disse que pesquisou…
— Ah. — Ele cambaleia, rindo alto o suficiente para atrair
atenção para nós. — Liguei em cada maldito hospital até descobrir
em qual ele trabalhava. Beckham Malik. Ele é cardiologista, sabia?
Consegui algumas informações quando pedi para marcar uma
consulta.
— Deus do céu, Finnick! — esbravejo, porque sei como Effylin
irá reagir se souber. — Você não pode fazer uma porra dessas. É a
vida dela. Está parecendo um ex-namorado ciumento e stalker. Se
gosta dela, só precisa dizer. Pensando bem, se gosta dela, só
esquece. Porque se Effy está seguindo em frente, é melhor assim.
Você precisa fazer o mesmo.
— Tem razão. — Ele assente, e sinto alívio ao ouvi-lo
concordar. O semblante de resigno me convence de que posso
confiar nele. — Preciso de mais uma bebida, você vem? —
Gesticula com o queixo para dentro da casa.
O espaço externo onde estamos tem uma bela vista para o
mar. Se descermos as escadas do pórtico, estaremos com os pés
soterrados na areia.
Meu desejo é que, no futuro, me mude para uma mansão em
Beverly Hills ou acabe me mudando para cá, Miami. Gosto de
climas tropicais. É um plano para uma futura aposentadoria.
Ao atravessar o primeiro ambiente, meus olhos instintivamente
aterrissam no sofá onde deixei Gravity. Dobras de pele se formam
em minha testa quando capto o lugar onde estava vazio.
Rapidamente rastreio a sala, atrás da minha futura esposa que
adora arranjar encrenca, mas faz com o único propósito de me
provocar.
— Ei, você viu a Gravity? — murmuro para Finnick, e ele faz o
reconhecimento da área como eu.
— Não. Vocês não estavam juntos agora há pouco?
— Quero outro duplo. — Ergo o copo para mostrar a ele e o
coloco em sua mão. — Vou procurar pela encrenqueira.
Enquanto me afasto, faço outra varredura minuciosa. São
tantas pessoas aglomeradas no mesmo lugar que fica difícil
reconhecê-la.
Procuro pelo meu celular no bolso da calça e o retiro, vou até o
número dela em minha lista de contatos. Claro, não atende na
primeira tentativa, mas insisto. Sua voz soa pelo interior da linha, e
não entendo o porquê do meu coração disparado e minha mente
tecendo o pior dos cenários.
Já estive em milhares de festas como essa e sei que muitas
coisas não são realmente expostas porque estamos falando de
dinheiro, influência e manipulação. Convivi com a pessoa mais
tirana que conheço — meu pai —, que move e faz coisas com o
intuito de ter seus desejos e perspectivas atendidas, portanto, sabia
antes mesmo de me tornar famoso o que acontece em lugares
frequentados por pessoas como essas. Não são todas de todo o
ruim, mas sexo e muita droga são, muitas das vezes, a atração
principal.
Gravity é durona e não mede esforços para ostentar esse seu
lado. Mas me preocupa que essa personalidade seja exatamente o
motivo de levá-la a ser um alvo para os predadores cheios de si.
— Para onde você foi? — indago, sem esconder o tom de
advertência.
— Por que seria da sua conta?
— Por que não seria da minha conta?
Exala uma aspiração demorada.
— É impossível ter qualquer conversa com você. Sua
arrogância, prepotência e ego me dão náuseas.
— Agora te dou náuseas? Pensei que tivesse feito de tudo
para conseguir que estivesse dentro de você! — Esboço um sorriso
vil, como se ela pudesse vê-lo e sentir a pungência do atrevimento.
— Como é hipócrita.
Um grunhido arranha sua garganta.
— Se soubesse do quanto me arrependo, não estaria se
vangloriando.
Meu sorriso se desfaz tão rápido quanto chegou à curva da
minha boca. A contração do maxilar atinge minhas têmporas e
narinas dilatadas refletem a raiva que essa malcriada consegue
aguçar em mim.
A parte ruim que me esforço para manter sob controle se
desprende facilmente de seu confinamento quando Gravity tenta um
embate. O lado perverso que mantenho enjaulado e que por muito
tempo consegui manter assim está por um fio de se libertar.
Tenho muitos arrependimentos e com certeza estou com raiva
dela por tudo que está fazendo, mas nunca me arrependi de nós.
Ouvi-la reconhecer que se arrepende de ter ficado comigo me deixa
furioso para um caralho.
— Ora, ora, consegui te fazer perder a fala?
Ela não faz ideia do quanto está estimulando meu lado
catastrófico.
Cerro o mandíbula, dentes trincados com a força que estou
disparando para essa região da boca.
— Se arrepende porra nenhuma.
Analiso ao meu redor, esperando que Finnick esteja em algum
lugar com a minha bebida, mas não o vejo. Caminho para o mais
longe que consigo da música alta e irritante. Direciono-me para o
corredor empanturrado, testando cada maçaneta até encontrar uma
porta que abra. Quando acho, estou dentro de um quarto de
hóspedes, presumo, e me certifico de trancá-la para não ser
interrompido.
Só quando sento-me na cama e não tenho o volume da música
interceptando os sons através da chamada que ouço o chuveiro. Ela
deve estar se aprontando para o banho, então volto à minha
normalidade e paz domina o meu cerne por saber que está segura
no hotel.
— Já que estamos falando disso, não tem um dia em que eu
olhe para você e não pense no quanto errei em te deixar me tocar!
Superei o que aconteceu entre nós, mas não significa que não
deseje apagar aquele maldito fim de semana da minha vida. Acha
que eu me afastei por quê? Ficar do seu lado é insuportável. Porque
te conhecer de verdade, com todas as coisas que você faz todos os
dias, a forma como trata as mulheres... Céus. — Uma risada
desesperada soa dela. — Começo a me perguntar como eu pude
ser tão idiota! — esbraveja a última frase. — Você é repugnante!
— Se sou tão repugnante, por que concordou com esse
maldito contrato? Estar presa a mim por oito meses? Não é o tipo de
coisa que alguém que me acha desprezível faria!
— Você não entende, não é?!
Quando Gravity muda o modo de falar outra vez, sei que o que
vai dizer irá me destruir de um jeito que só ela pode.
— É o que você tem para oferecer que prende as pessoas a
você! Não é sua personalidade, não é porque você é incrível, não é
porque elas te amam! Estou aqui porque você tem dinheiro,
influência e um jeito de eu conseguir me estabilizar na carreira.
Então, se o seu plano é me deixar perdidamente apaixonada para
depois me chutar, não perca seu tempo. Não tem nada em você que
me atraia, além do que vai fazer por mim quando essa merda de
casamento por contrato acabar!
É um golpe atrás do outro. Uma palavra dela tem o peso de
duas fraturas e dez socos no estômago. Não esperava ser açoitado
por Gravity dessa maneira.
O nó na garganta cerca o soluço, mas minhas lágrimas são
silenciosas, como a maioria das que já deixei cair ao longo dos
anos.
Primeiro, quando meu pai me batia. Ele era violento, mas
quando eu chorava, tendia a ser pior.
Segundo, quando Aidan saiu da banda porque nós o banimos
e depois por escolha dele. E naquele momento, parei de conter
minha raiva.
E por último, minha amizade com Delilah. Perder minha melhor
amiga me destruiu de maneiras que, mesmo se procurasse pelas
palavras certas, nosso dicionário seria incapaz de descrever.
Ninguém sabe o que você faz quando está sozinho, no seu
quarto, prisioneiro dos seus demônios, dos tormentos que cercam
sua mente e coração. Ninguém vê as feridas que tentam cicatrizar,
mas que repetidamente tem alguém as cutucando, impedindo que
esse processo de cura se concretize.
Ser quem eu sou é o meu protesto. É o meu jeito hostil de
dizer que sou refém de uma história que não tem e nunca terá um
fim porque as expectativas que estou tentando alcançar sequer
existem.
— Você estava desesperado para me ouvir admitir que estou
sendo como Nicola, então tudo bem, Ashton, se quer me ouvir dizer,
vou dizer: estou agindo exatamente como sua ex-namorada e te
usando para conquistar meu sonho! Feliz agora?!
Meus dedos cercam o celular, sinto a dormência dos nódulos e
imagino que estejam esbranquiçados. Boquiaberto, extasiado com o
discurso dela, fico inábil para qualquer resposta à altura.
Pisco, limpando a visão, esperando que as últimas lágrimas
reprimidas dentro dos orbes escorram, e eu possa engolir a parte
melancólica e dar evasão para a fúria e o rancor.
— Ashton? — Gravity está com a voz mais suave que
instantes atrás. Posso imaginar a testa franzida de curiosidade. —
Ainda está aí?
— Como eu te disse — pigarreio e me esforço para manter a
voz firme —, em oito, Gravity. Estará apaixonada por mim em oito
meses.
Encerro a ligação. Se antes tinha determinação para retaliar,
ela conseguiu me fornecer um combustível ainda mais potente.
Devolvo o telefone para o bolso da calça. Utilizando as
mangas do blazer, seco o rosto sem deixar nenhum vestígio.
Endireito a postura, reordenando meus pensamentos e camuflando
meus verdadeiros sentimentos. Poderia sentar aqui e chorar como
uma criança, mas não tenho mais sete anos. Posso revidar à altura.
Encaminho-me para o banheiro do quarto, lavo o rosto, as
mãos e encaro ao meu reflexo no espelho; olhos e bochechas
relativamente afogueados. Seco-me e volto para o quarto, indo em
direção à porta.
No minuto em que a destravo, a modelo com quem passei
flertando o começo da festa está recostada do outro lado do
corredor, como se estivesse esperando por mim todo esse tempo.
Os cantos da minha boca se curvam em um sorriso atencioso,
e a garota retribui.
— Qual é o seu nome? — Encosto a lateral do corpo no
caixilho, estudando os dois lados do corredor. Ninguém familiar.
Ótimo.
— Sadie.
— Quer entrar e passar um tempo conversando comigo,
Sadie?
Fisgando o lábio inferior, Sadie estreita o sorriso até que esteja
rachando suas bochechas com as covinhas fundas. Empurra o
cabelo por cima do ombro, caminhando em minha direção. Com as
mãos espalmadas em meu peito, compele meu corpo a voltar para o
quarto.
Vou fodê-la deliciosamente bem esta noite e Sadie nunca mais
esquecerá meu nome.
“Pare de fingir que você é uma santa
Porque você não é digna de adoração”
NOTHING HOLY – JAYMES YOUNG

Estou deslumbrado por Sadie. De verdade. Ela sabe o que faz.


Sabe como mover o quadril e beija tão bem que quase — quase
mesmo — me fez esquecer do beijo de Gravity essa noite. Foi por
pouco. E é esse fio de esperança que me leva a convencê-la a
voltar para o hotel comigo.
É preciso muita habilidade para conseguir driblar um
paparazzo após sair de uma festa. Sei que estão à espreita do lado
de fora da casa, prontos para conseguir uma foto.
O manobrista traz o Ford Mustang alugado prata, e peço para
Sadie sentar no banco de trás. Ela sorri para mim quando concorda
e, mesmo analisando minuciosamente à minha volta, ainda sinto
como se estivessem com os olhos atentos sobre mim.
Assumo o volante e deixo uma gorjeta generosa para Elijah, o
nome na placa presa ao uniforme. De maneira subliminar, o dinheiro
que coloco em seu bolso é um pedido para que ele não conte a
ninguém que saí acompanhado da festa de Leo Bandit.
Acelero o carro, atravessando o jardim frontal da mansão até
estar diante do portão de ferro cravejado. Eu o espero ser aberto e
piso fundo no acelerador, flashes luminosos disparam em minha
direção, deixando-me cego por um segundo, mas pisco, lutando
para recobrar a visão.
Sadie ri alto no banco de trás, se divertindo com a adrenalina
causada por estarmos cercados de paparazzi. Camuflo o meu mau
humor. Não quero espantá-la, afinal, a culpa não é dela por eu estar
com raiva de um certo alguém.
Enquanto estou concentrado em dirigir, ela tenta passar para o
banco da frente e, depois de muito esforço, consegue se acomodar
ao meu lado.
— É melhor você ficar no banco de trás — alerto, esperando
ter a mesma recepção calorosa de fluorescência quando chegar ao
hotel. — Eles não desistem tão fácil. Aposto que o hotel está
cercado de…
— Tem certeza? — Sua mão pequena e macia cobre meu
membro por sobre a calça, o despertando. Estremeço sob o toque,
arrepio percorre minha nuca. — Prometo que eles não vão me ver.
Estarei ocupada…
Sadie brinca com o zíper, e fecho os olhos no momento em
que sua respiração cálida toca a carne sensível quando dobra o
corpo sobre meu colo.
Afasto brevemente o quadril da poltrona, o suficiente para que
Sadie consiga escorregar alguns centímetros da minha roupa para
baixo, e meu pau, com uma camada de pré-semên na glande, salta
para fora da cueca, rígido de atenção.
— Cacete… — murmuro, afundando os dentes em meu lábio
inferior.
Projeto o tronco para frente, querendo que ela me chupe de
uma vez.
Sadie faz sons de engasgo quando impulsiono meu quadril,
mas não dou atenção. Afasto uma mão do volante para apoiar atrás
de sua cabeça e conduzo o movimento.
Seus lábios são macios, envolvendo-me por inteiro, e tenho
que me esforçar para manter o carro em linha reta. Sua língua
habilidosa aflora meus sentidos e meus batimentos cardíacos
galopam em um ritmo desconcertante dentro do peito.
— Sabe que estou dirigindo? — vocifero. Entretanto, ela me
suga com tanta vontade que perco a linha de pensamento,
esquecendo a advertência que pretendia dar nela. — Porra!
Ergue os olhos verde-oliva, procurando pelo meu semblante.
Ar escapa por entre meus dentes e forço os dedos em volta do
volante. Mantenho uma velocidade equilibrada, não vou muito
rápido, mas estou ponderando estacionar no acostamento e me
enterrar nela bem fundo antes de continuar o percurso.
Ela me segura pela base, sua mão acompanha o ritmo
impaciente da boca, e por um breve segundo, pisco mais
lentamente.
Aumentando a cadência, permitindo-me definir a rapidez com
que me recebe, sinto-me inchar, as veias circundando meu pau são
proeminentes. Minhas bolas estão doloridas pra cacete.
— Isso, caralho… — rosno, me deliciando do som da sua boca
sorvendo meu pau. — Me chupa inteiro. Não deixa nada faltando,
Gravity.
Arregalo os olhos no instante em que Gravity escapa por entre
meus lábios. Pressiono a boca, sentindo esse nome filho da puta
retorcer meu estômago.
Sadie levanta a cabeça imediatamente, repúdio modelando
suas feições, e se afasta, deixando-me desolado.
Por que porra o nome de Gravity saiu da minha boca assim?
Do nada?
— Quem é Gravity? — Sadie cruza os braços, fazendo bico. —
É a garota com quem você estava na festa mais cedo? Quer dizer
que tudo o que falam sobre você nas reportagens é verdade? — De
esguelha, vejo-a preguear a testa, decepção murcha a felicidade
anterior em seu rosto.
Merda!
— Sadie, vamos lá, nem tudo é verdade. Você é uma
supermodelo. Está em tantas notícias quanto eu. Sabe que
exageram. — Tento contornar a situação, mas com pouco sucesso.
— Você gostou de mim? — replica.
Pelo canto do olho, tento definir o que dizer: posso ser sincero
ou posso mentir para tentar apaziguar.
Contraio a mandíbula, sentindo cada osso do meu rosto
rachar. Gravity é a porra de uma pedra no meu sapato. Mulher
desgraçada.
— Claro, gostei. — Suspiro, sacudindo a cabeça, e uso uma
mão para subir a calça, consciente de que minha noite com ela
acabou. — Mas não pode esperar nada de mim, Sadie. — Desvio
da estrada por um curto momento para olhá-la. — Gosto de como a
minha vida está, entende?
É a vez dela de contrair a musculatura do rosto.
— Eu gosto de você.
Franzo a testa, começando a ficar realmente perdido.
— A gente acabou de se conhecer. — Rio, tento não parecer
irônico, mas, com minha observação, é exatamente como soa. No
entanto, vejo algumas lágrimas pulando dos olhos de Sadie e minha
confusão se amplia. — Porra. Não é a primeira vez que a gente
fica?
— Não. Pensei que, quando perguntou meu nome, estivesse
tentando criar um clima de suspense. — Ela tenta afugentar a
mágoa, limpando o rosto. — Ou, sei lá, querendo soar misterioso,
mas você realmente não se lembra de mim! — O tom acusatório
que usa me faz encolher.
— Sadie…
Como pude cometer esse erro estúpido? Geralmente deixo
claro minhas intenções. Sadie parece ser mais nova, talvez vinte e
dois anos. Estou acostumado a estar no meio de celebridades mais
novas, mas a garota aparenta estar tão magoada que me sinto
verdadeiramente mal por não me lembrar dela.
São tantas com quem dormi nos últimos tempos, como eu
poderia, caralho?
— Eu pensei que as reportagens fossem só um ataque. Não
achei que fosse tão imbecil! — explode, me mirando com raiva
infiltrada sob a camada verde de seus olhos. — Pare o carro, quero
sair!
— Não posso te deixar sozinha aqui, no meio da nada!
— Mas eu quero! Se não parar a droga desse carro agora, eu
vou pular! — ameaça, pondo a mão na maçaneta, e verifico se as
portas estão travadas.
— Tudo bem, tudo bem! — exclamo alto, chamando a atenção
dela. — Me dá um minuto, ok? Não fazia ideia de que já tínhamos
ficado. Foi mancada ter dito o nome de outra, admito! Mas posso te
recompensar? — Dirijo o rosto de volta para ela, avaliando sua
expressão. — Por favor?
Sadie assente e resfolega, termina de enxugar o rosto e se
encolhe no canto do carro.
Deveria ter escutado meus amigos. Deveria ter voltado para o
hotel e ficado longe de um motim.
Se Sadie ficar com raiva e explanar o que aconteceu hoje,
estou morto. Serei realmente expulso da minha própria banda e
minha futura esposa vai encontrar uma brecha para terminar de me
ferrar.
— Nós vamos para o hotel primeiro. Lá a gente liga para o seu
agente? — sugiro, em tom amável.
Ela faz que sim, sem emitir nenhum som.
Estou muito fodido.

— Sabia que você ia arranjar problema! — Aidan esbraveja,


andando de um lado para o outro no quarto, depois de ter ligado
para o agente de Sadie.
Através dele, soubemos que Sadie está tendo problemas com
drogas. Estava tão obcecado pela raiva de Gravity, querendo de
alguma forma me poupar daquele sentimento maluco que provoca
em mim, que não percebi que Sadie estava drogada quando
estávamos no quarto mais cedo.
Porra. Caralho.
Inclinado sobre o tronco, não tenho coragem de olhar para
eles. Gravity e Tess estão do outro lado do quarto, acomodadas no
sofá, encarando-me com o mesmo aspecto de chateação que os
outros.
Finnick chegou pouco depois de mim ao hotel, tão bêbado e
chapado que desmaiou em seu quarto e nem atendeu ao telefone
quando liguei.
— O que nós fazemos? — Chase está sentado ao meu lado,
tentando elaborar um plano.
Podemos fingir que não aconteceu. Que não transei com uma
mulher que estava drogada e depois admiti que não tinha nenhuma
intenção de continuar saindo com ela. E pior, que quebrei uma das
cláusulas do contrato com Gravity. Porra. Estou muito fodido.
— Não tem o que fazer. Temos que ligar para o meu pai e
contar tudo. — Tess pega o celular e, nesse momento, flagro Gravity
me encarando.
Pela maneira como me olha, tenho certeza de que está
atravessando uma estaca em minha barriga e arrancando minhas
vísceras com um único golpe certeiro.
Ela não disse nada quando chegamos ao quarto, sentou-se
naquele canto e cruzou os braços, como se uma fita estivesse sobre
a sua boca a impedindo de brigar. Nem vou mencionar o detalhe de
que está usando um pijama minúsculo e não se importou nem em
vestir um robe decente para ficar em nossa frente. Consigo ver a
popa da bunda dela nesse pijama preto de short curtinho.
— Ele vai te matar. — Tess acrescenta quando o celular
chama, e ela o coloca no viva-voz.
— Tess? O que foi? — Jared atende com voz de sono, não
espera nem tocar o bastante para eu conseguir me preparar.
— Oi, pai. Desculpa te acordar. Temos um problema. — Ergue
os olhos para mim, gesticulando.
— Que tipo de problema?
Ele desperta com o anúncio de um problema.
— Do meu tipo — confesso, sem nenhuma expectativa de
compreensão.
— É brincadeira, não é? — Jared gargalha, exasperado
demais para deter o sarcasmo. — Por favor, Ashton, diz para mim
que você não se meteu em mais problemas e que só está tentando
me causar um ataque cardíaco!
— Transei com uma garota. Ela estava drogada.
— Puta que pariu! — berra do outro lado, e fecho os olhos, a
cabeça caindo entre as pernas. — Onde é que você está com a
cabeça? Sua futura noiva está aí! Do seu lado! — continua gritando
e, nesse momento, conduzo meus olhos para Gravity. Dizer que ela
está com raiva é um eufemismo. — E você… Céus, Deus, Jesus
Cristo… Ela estava drogada? E onde ela está agora?
— Eu não sabia que ela estava chapada, tá legal? Era uma
festa! Todo mundo bebe, usa drogas e transa! Não tem nenhum
problema com isso!
— Se você não vê um problema, então, definitivamente, você é
que é o problema! — alarma, e balanço a cabeça, lutando contra a
náusea tratorando meu estômago. — O que eu faço com você?
Estou ficando sem opções aqui! Me diz, por favor, o que posso dizer
para te fazer entender que precisa parar? Precisa parar, Ashton!
A cada grito dele no telefone, me encolho mais sob minha
própria vergonha. Por que sempre faço isso? Por que acabo me
metendo nessas enrascadas? Por que deixo a raiva e meu lado
vingativo serem superiores?
— Você não vê o tamanho do problema porque está focado
demais em suas próprias necessidades! Tudo bem, vamos lá.
Mordo o lábio inferior, torcendo para que ele não conte para os
meus amigos sobre meu pai, as agressões e tudo o mais. Eu me
sinto envergonhado e fraco quando alguém descobre. Jared sabe
porque esse foi o acordo: ele precisava conhecer nossas famílias
para concordar em nos trazer para Nova York de novo e, quando
conheceu meu pai, soube imediatamente que estava lidando com
uma pessoa violenta e controladora.
— Qual é o nome dela?
— Sadie. Sadie Olsen.
— A modelo. — Aidan ajuda a clarificar para nosso
empresário.
— Conheço a mãe dela. — Jared suspira. — Vou telefonar
para o agente e tentar entender o que está acontecendo na cabeça
de Sadie nesse momento. Usaram camisinha, espero?
— Claro — assinto para meus amigos também. — Jamais teria
dormido com ela se soubesse que estava bêbada ou drogada. —
Tento me defender, mas sei que qualquer justificativa é inútil.
— Melhor descansarem. Falarei com Avalon e vamos torcer
para que ninguém tenha visto vocês.
— Obrigado — agradeço baixo, porém, com toda sinceridade.
— Ashton… — Meu nome soa firme e impiedoso na voz de
Jared. — Quero que pense seriamente se quer continuar fazendo
parte da The Reckless. O passado de vocês vive em conflito com a
nova realidade e, sim, sei que é difícil lidar com o julgamento de
pessoas que não sabem pelo que passaram, os demônios e os
traumas continuam serpenteando a vida de vocês. Tudo o que
precisam lidar de uma única vez é muito, eu entendo. Mas está
estragando a vida dos outros também se importando somente com o
que você carrega. Pense nos seus irmãos.
Olho para os caras. Não vejo raiva nem julgamento em seus
olhares, apenas compreensão e apoio, e fico com mais raiva de mim
mesmo.
Se fosse o contrário, se fosse um deles que estivesse sentado
aqui admitindo seus erros, seria eu o primeiro a condená-los. Mas
estamos em papéis invertidos e o que estou recebendo é totalmente
o oposto do que eu daria. Isso me quebra.
— É a última vez que tento limpar sua barra. Na próxima, vou
permitir que as consequências te atinjam e não vou me importar que
irá respingar nos outros. Eles decidiram que você fica nesse barco e
optaram por afundar com você, se for o caso, então saiba que é o
responsável pelo sucesso ou pela ruína desse grupo a partir de
agora.
O peso das palavras dele deixa meus ombros doloridos.
— Se Gravity quiser reincidir o contrato, ficarei feliz de
compensá-la pelo tempo perdido pagando a multa. Deixarei que
você se desculpe com ela. — Divago meus olhos para a garota
irritadiça no sofá. Ela continua estática. — E resolva essa situação.
Só me informe qual decisão tomaram.
— Tudo bem. Até mais, pai. — Tess encerra a chamada, e um
coro de suspiros corta o ar do quarto. — Vamos tentar dormir um
pouco.
Tess é aquela que tem mantido as coisas em ordem. Quando
não estamos com nossa equipe, ela é quem determina tudo, como
se precisássemos de alguém para nos direcionar no que fazer.
Vendo minha situação atual, preciso concordar com ela a respeito
disso.
Os caras se despedem de mim, enviando olhares
complacentes antes de saírem. Sei que voltaremos a falar disso
mais tarde, mas, nesse momento, com minha cabeça atropelando
um pensamento após outro, minha única vontade é dormir por horas
ininterruptas.
Gravity e eu ficamos sozinhos. Estou esperando receber uma
bronca ou que ela diga um milhão de coisas que vão me fazer odiá-
la ainda mais. Porém se levanta em silêncio, cruza o quarto e se
deita na cama bagunçada, onde provavelmente estava minutos
antes de Aidan acordá-la porque eu estava com problemas.
Mantenho-me preso no lugar, sentado à beira da cama, as
mãos entrelaçadas e o corpo encurvado.
— Não vai dizer nada? — Arfo, determinado a resolver essa
porra com ela agora.
— Preciso dizer alguma coisa? Jared disse tudo. Tem que se
decidir no que quer fazer.
Volto o tronco para a direção dela. Está meio sentada meio
deitada, braços para fora do edredom branco e macio, a alça do
pijama escorregando por seu ombro desnudo, e tento contornar
meus pensamentos para não irem pelo caminho que acredito que
irão.
— Mesmo depois de eu ter transado com alguém, quando
colocou no contrato como uma cláusula que me proibia disso, ainda
vai continuar? — Arqueio as sobrancelhas, choque e raiva se
mesclam dentro de mim. — Você vai se humilhar desse jeito?
— Quem é que está se humilhando? É você quem está por um
fio com a The Reckless. Minhas motivações para continuar não são
da sua conta. Você não precisa saber nem entender o que me leva
a tomar minhas decisões. Se você não quiser, é outra história.
Eu não quero, porra. Não quero de jeito nenhum. Mas o que
Jared disse foi minha sentença final. Se não me empenhar para
limpar minha reputação, deixar meu orgulho de lado e aceitar a
ajuda de Gravity — por mais que a odeie por estar me usando —,
preciso colocar de verdade minhas prioridades em seu lugar.
Quero continuar com a The Reckless. Esses caras são minha
vida. Essa banda é a única coisa boa das marcas que meu passado
me deixou. Desistir dela é abrir mão de mim mesmo.
Com um suspiro de derrota, retiro os sapatos, o blazer e
começo a desabotoar a camisa, contornando a cama e parando ao
lado esquerdo, onde está vazio.
— E você, está fazendo o que agora?
As mangas da camisa escorregam por meus braços. Tenho
uma tatuagem na costela “Infamous”, que é o nome do nosso single
e fala muito sobre mim. Nas costas do meu bíceps tem o diamante
rachado da The Reckless que compõe a capa do nosso primeiro
álbum. E minha terceira e última tatuagem — por enquanto — é
uma libélula na nuca.
Estava esperando certo repúdio de Gravity, como ela disse que
sente, mas, conforme tiro minhas roupas, o que vejo é um olhar
ambicioso.
— Me aprontando para dormir com a minha namorada.
— Você traiu sua namorada e ela deseja que você durma no
sofá.
Abro o zíper da calça e a desço, ficando só de cueca boxer.
Seu olhar minucioso divaga para meu ventre e controlo a vontade
de sorrir. Não quero levar outro gancho na mandíbula.
— Não é real, portanto, não teve traição.
Gravity bufa, chutando o edredom para se desvencilhar. Ela
pega seu travesseiro e um novo cobertor no closet ao lado.
— Aonde você vai?
Franzo a testa, vendo-a ir em direção ao sofá pequeno do
outro lado.
— Dormir no sofá.
— Não seja teimosa.
— Prefiro dormir no chão congelando a dividir a cama com
você! — grunhe, ajeitando de maneira bruta o travesseiro e o
cobertor para deixá-los mais fofos.
Entrelaço os dedos debaixo da cabeça, assistindo-a brigar com
o edredom para se acomodar no sofá, mas especialmente tentando
encontrar uma posição confortável para dormir.
Aperto os lábios, coibindo a risada.
— Cala a boca! — profere quando não consigo mais me
conter.
— Que foi?
— Você acabou de ter um momento tenso e está dando risada
de mim?!
Desmancho o sorriso e respiro fundo, sendo sugado pelo
tormento de ser um fardo bem pesado para as pessoas que me
amam. Mulher irritante.
— Volta pra cama.
— Como eu disse, prefiro dormir no chão congelando.
— Não me faça ir aí te buscar, Gravity. Você já estragou a
minha noite o bastante.
— Não me culpe por não conseguir conter seus impulsos
sexuais!
— Impulsos sexuais? — brado, empurrando o edredom para
longe, rindo de quão absurdo isso soa.
Marcho na direção dela, estufando o peito de forma autoritária.
Gravity arqueia as sobrancelhas, quase atingindo a raiz do cabelo.
— Tudo estava indo bem até você me infernizar!
Ela se senta, enfrentando-me quando estou de pé na frente
dela.
— Eu te infernizar? Me poupe! Te deixei na festa acreditando
que teria alguma responsabilidade sobre o nosso acordo. Então, me
diz por que a culpa é minha?!
— Porque você consegue me enlouquecer!
— Você é maluco por si só! — grita de volta. — Para de gritar
comigo, volta pra cama e dorme!
— Caralho! — chuto o pé do sofá, entremeando os dedos nos
fios do cabelo. — A culpa foi sua!
Gravity se levanta, inflando o peito com a raiva se ampliando.
— Me diz por quê?! Por que a culpa é minha?
— Porque…
Paro, inspirando e expirando o ar com aspereza. Minha
traqueia está prestes a sufocar com a proximidade dela, com a
raiva, o descontrole e a vulnerabilidade que só sinto quando ela está
por perto.
— Por quê, Ashton?!
— Porque você beija como ninguém, porra!
Gravity se espanta, arregalando os olhos, e recua o corpo com
minha admissão.
— E se não quiser que eu te beije de novo, é melhor se
afastar.
Meu peito sobe e desce em uma cadência descompassada.
Os batimentos entorpecem meus sentidos e dou meia volta,
apanhando minhas roupas no caminho. Visto depressa, sugando o
ar em espiraladas desordenadas.
Saio do quarto enquanto ainda estou abotoando a camisa
porque se voltar lá para dentro, só vou sair quando tiver matado
minha vontade dela.
“Vivendo em uma casa sem alma
Desde que você foi embora”
WORLD SO COLD – THREE DAYS GRACE

7 ANOS ATRÁS
TERÇA-FEIRA, 04 DE JULHO DE 2017, ÀS 22H00MIN.

Não sei quantas cocas batizadas bebi nesta noite, o que sei é
que estão fazendo o efeito esperado.
Minha pulsação aloja-se na garganta e fico em efeito gangorra
nos pés, indo e voltando para os calcanhares. Gostaria de poder
esconder a presunção em meu sorriso, mas o álcool fez uma aliança
com minha mágoa e tudo o que quero nesta noite é que meu pai se
sinta tão diminuído e incapaz como sempre me fez sentir.
Minha vida é uma merda por causa dele.
Perdi minha namorada.
Perdi meu herói, e ele está zombando da minha dor na minha
cara porque sabe que meu avô era importante.
As agressões acabaram quando revidei pela primeira vez e,
naquele momento, o limiar que nós dois encontramos era uma linha
frágil a qual não pudemos ultrapassar.
Ele reconheceu que eu não era mais uma criança indefesa, e
entendi que não precisava apanhar calado. Podia fazer algo por
mim. Algo do qual minha mãe se escondia de ver ou ouvir. Então,
quando ele me ameaçava, eu o ameaçava de volta. E não
passamos mais disso.
Enquanto bebo outra dose de coca com uísque, estudo o
sorriso despretensioso do meu pai. Falso. Tenho até calafrios na
espinha vendo-o sorrir de maneira tão hipócrita e agir como se
estivesse criando aqui, sob este teto, a família perfeita.
Nem preciso falar sobre minha mãe, que naturalmente ao
longo dos anos se esforçou para ser a esposa perfeita, receber a
aceitação e a aprovação, repassando a mesma educação para
minhas irmãs porque quando fossem mais velhas, se casariam com
homens tão ricos e poderosos quanto Conrad Baker.
Isso me enfurece de tantas maneiras, mas a principal delas é
que essas mentiras se findam em suas mentes e se estabilizam
como se esse fosse o único futuro possível para elas.
Odeio essa família. Odeio esse lugar. Continuo aqui por causa
de Maddie e Halle. Quero ser um obstáculo entre a lavagem
cerebral dos meus pais e a educação das minhas irmãs. E se eu
puder anular a visão de que são pais perfeitos, com certeza irei.
Estou bêbado, com raiva ou em luto? Talvez os três porque
estar aqui, na presença do meu pai e com essa família ridícula, está
me deixando enjoado.
Relanceio o olhar para os convidados de honra de Conrad.
Meu sangue aquecido pela fúria flui por entre minhas veias. Meu
avô faleceu e ele não está nem dando a chance de seu corpo esfriar
sob a terra antes de dar uma festa. Porra, é o pai dele. E o que ele
faz? Dá uma grande festa para seus malditos acionistas?
A gargalhada dele do outro lado do cômodo se amplia e, em
conjunto, sinto-me enraivecer mais por dentro.
Esvazio meu copo em um único gole, cruzando a sala até a
roda onde meu pai está com um grupo de seus acionistas da
Baker’s. Adorno meu rosto com o mesmo sorriso arrogante que está
instalado no de Conrad. Deixo meu copo vazio em uma das mesas
durante meu percurso até eles.
No momento em que me nota, flagrando-me de soslaio, sua
máscara feliz desmantela.
— Boa noite, senhores. — Ignoro a olhadela recriminatória do
meu pai, avolumando o sorriso sagaz. — Sabiam que o ex-
presidente da joalheria Baker’s faleceu? — Os homens engomados
em seus ternos sob medida esbugalham os olhos para a
informação. — Isso mesmo. Rain Baker. O fundador da porra da
joalheria. Morreu. Dois dias atrás.
— Eles sabem desse infeliz acontecimento, filho. — Meu pai
tenta conter o tom de censura, mas é inútil. A cabeça dos três
homens se volta para ele. — Esse é meu filho, Ashton. Ele será o
próximo a assumir a cadeira da presidência. — Um sorriso forçado
se desenha, e quero vomitar, sinceramente. A porra de uma mentira.
— Será meu sucessor, oficialmente.
Engasgo com a risada, e os homens derivam sua atenção para
mim outra vez. Nesse momento, meu pai se desfaz do semblante
orgulhoso para assumir a verdadeira carranca de aversão a mim.
— Sério? Ainda não contou para seus acionistas que não tem
um sucessor?
É claro que não. Admitir para o conselho que não tem para
quem passar a cadeira da presidência da Baker’s é um tiro no pé,
uma preocupação antecipada que quer evitar para não ter que
entregar para alguém que não seja da família.
A sucessão seria algo fácil de resolver se meu pai não tivesse
o patriarcado enraizado nas veias. Minhas irmãs são ótimas opções,
mas, claro, para ele, elas sequer foram cogitadas como possíveis
sucessoras.
Para Maddie, está sonhando com medicina e quem sabe
construir uma rede de hospitais que carregue o nome da família, e
Halle terá o mesmo destino definido na carreira de saúde.
— Mas tenho um sucessor, Ashton. Você. — Conrad eleva as
sobrancelhas esculpidas e pregas de pele surgem em sua testa. —
Não é uma noite apropriada para tratarmos de sucessão, muito
menos nos lembrar de uma tragédia como a perda do meu pai.
Desato em uma gargalhada alarmante. Olhos curiosos miram
em nós.
— Fala sério, você é um puto mentiroso, Conrad! — Limpo o
cantinho dos olhos, lágrimas se acumulam de tanto que rio. — Você
não está triste porque perdeu seu pai. Essa festa, na verdade, é
uma comemoração! — Abro meu sorriso diabólico, aquele que
venho guardando para ele, esperando o momento oportuno para
usá-lo.
— Ashton, está me envergonhando — brada, cerrando os
dentes. Sua voz é quase inaudível quando fala. — O que bebeu?
Acho melhor subir para seu quarto. Imediatamente. — O tom de
autoritarismo familiar está lá, impregnado como se tivesse nascido
com ele. — Lido com você mais tarde.
— Lida comigo mais tarde? — Sobressalto, arregalando os
olhos para meu pai. — Vocês ouviram, senhores? Ele disse que lida
comigo mais tarde! — exclamo, bato palmas e esparramo os braços
para os lados, os abrindo como asas. Tombo a cabeça para trás,
inchando meu peito com ar, e mais uma onda de gargalhada
explode de mim. — Quer que eu conte para eles como você lida
comigo? Como sempre lidou comigo durante quinze anos?
— Ashton, esse é meu último aviso. Você está bêbado e
descontrolado. É melhor subir para seu quarto, e nos falamos mais
tarde, quando estivermos sozinhos, e você, sóbrio.
— Estou consciente, Conrad. Tão consciente como nunca —
murmuro de volta, o ranger de meus dentes pulsando em minhas
têmporas. — E, finalmente, posso te dizer com todas as letras o
quanto eu te detesto e estou ansioso para todas essas pessoas
descobrirem o verdadeiro filho da puta que você é! — rosno cada
palavra com a mandíbula contraída. Narinas expandidas com a raiva
em crescente espiral dentro de mim. Até as batidas do meu coração
se tornaram ferozes nos últimos segundos.
— Lamento pelo comportamento de meu filho.
É a única forma que encontra de tentar amenizar, já que não
pode dar outra justificativa. Meu pai jamais tentaria me fazer parecer
um monstro para os acionistas. Preciso do voto deles na sucessão e
manchar minha “reputação” com eles não contribuiria positivamente
para a Baker’s.
— Ashton, o que está fazendo? — Minha mãe cochicha, e sorri
ao mesmo tempo, ofegando ao meu lado.
— Querida, que bom, Ashton precisa ir pra cama. Pode levá-
lo?
— Não fode, Conrad! Essa festa você armou para cuspir na
minha cara que não dá a mínima para a minha perda! — grito em
seu rosto, respingos de saliva caindo nele. — Você sabe o quanto
ele era importante para mim?! Sabe que ele foi o pai que você
jamais conseguirá ser?!
Minha mãe envolve seu braço na curva de meu cotovelo, me
arrastando para longe, mas não desisto, continuo gritando.
— Diga para seus acionistas o que costumava fazer comigo!
Como gostava de impor sua autoridade me espancando até que eu
não tivesse forças para aguentar! E que incentivava a disputa entre
mim e Alex, sempre me dizendo coisas que me faziam acreditar que
eu não sou bom o bastante! Que não passo de um garoto fraco e
mimado!
Lanço palavra por palavra, as pessoas reunidas na sala fitando
a cena que estou fazendo com espanto e indignação. Ouço os
burburinhos, os questionamentos, e sei que atingi meu objetivo
nessa noite.
Meu pai, por outro lado, não permite que a raiva — que sei que
está sentindo — chegue ao seu semblante. Sua expressão é
imperturbável, a insensibilidade que cruza seus olhos me diz que
dará um jeito de contornar a situação a seu favor.
Ele vai me culpar e me penalizar por esta noite.
“Eu soube desde o primeiro passo
Que você é uma coisa perigosa”
A DANGEROUS THING – AURORA

DIAS ATUAIS

A contagem regressiva acontece ao passo que as declarações


são pensadas por mim. Do dez ao um, a sensação é como se já
tivesse vivido essa cena tantas vezes que consigo ter uma ideia de
como será quando chegar ao fim. E, por mais sádico que possa
parecer, aproveito cada segundo, pois, apesar de dolorosos, são os
últimos em que consigo respirar. Que estou em casa.
Sem você, tudo fica cinza.
Sem você, sinto que vou desmoronar.
Ele beija minha testa. É suave, terno, macio, como o amor que
sinto por ele.
Cerco-o com meus braços, acomodo minha cabeça em seu
peito e, sem nenhum prenúncio, lágrimas cedem de meus olhos.
Elas traçam um caminho por minhas bochechas até o queixo. A dor
imperando em meu ser transforma cada membro do meu corpo em
pedra.
Não consigo me mover.
Não consigo pensar.
Não consigo respirar.
Porque eu sei como essa história termina.
Porque eu sei o que acontece quando volto a procurar pelos
seus olhos divertidos e sua boca larga em um sorriso.
E eu só desejo, com toda a vida que existe dentro de mim, que
o fim nunca chegue.
Que essa noite nunca acabe.
Que eu nunca mais o perca.
O gemido expelido por entre meus dentes me força a abrir os
olhos. O reconhecimento é a primeira parte para voltar à minha
consciência.
Levo os dedos para a umidade em meus cílios. Seco os olhos
quando percebo que realmente estive chorando durante o sono.
Olho à minha volta, atrás do meu celular. Quando o encontro
sob o travesseiro pressiono a tecla de bloqueio, ela acende e
descubro que são três e meia da manhã. Só dormi por uma hora
desde que Ashton saiu.
Emaranho os dedos no cabelo, ciente de que voltar a dormir
não é uma opção. Esses últimos dias, os pesadelos têm vindo com
frequência e não quero fingir que não sei o motivo; é a data de
aniversário de morte de Neil.
Todos os anos, no mesmo mês, mas principalmente no dia
dezessete de agosto, sou arrastada contra minha vontade para
aquela noite. Posso lutar contra o cansaço e o sono, mas é difícil
quando, mesmo acordada, você os tem. Estar hiperconsciente do
passado, ainda que ele tenha acontecido muitos anos atrás, é estar
em queda livre em um abismo e sinto que o fim nunca chega.
Soprando o ar, forço-me a sair do sofá. Tateio com os pés,
buscando por minhas pantufas, e as calço. Acendo as luzes para
rastrear o quarto e encontrar qualquer sinal de Ashton.
Um suspiro rompe, separando minha boca com a rajada de ar.
Ashton é um enigma quando se trata dos seus sentimentos e,
por muitas vezes, não vou concordar com a maneira como pensa e
age. Não posso me deixar enganar pelo que ele diz porque nem
tudo é real.
Aprendi sobre ele por causa de suas reações aos
acontecimentos, do trágico ao cotidiano. É impulsivo, confuso e faz
qualquer coisa para remediar uma situação conflituosa, onde ele é
quem está perdendo.
Ele está conseguindo me enlouquecer com essa história de
contrato, namoro e casamento falso. As coisas seriam muito mais
fáceis se apenas entendesse que, se houvesse outra opção, essa
seria minha última escolha. Se entendesse que acabamos
enroscados nisso e só decidisse colaborar, se esforçando para
passar por esses oito meses da maneira mais agradável possível.
Ando em sentido ao closet, onde guardei minha mala. É uma
suíte de luxo, então tem muito espaço. Encontro uma calça de
moletom e a visto por cima do short do baby doll de seda. Apanho o
cartão de acesso do quarto e saio à procura dele.
Por mais irritada que esteja, não quero que entre em outra
enrascada. Preciso que meu trabalho como estilista da The
Reckless seja feito, ainda que tenha que engolir meu orgulho e
mostrar ter mais maturidade quando o assunto são nossos infinitos
desentendimentos.
Desço até o saguão do hotel e atravesso-o, viro à direita
porque, quando chegamos, vi um bar de coquetéis — que duvido
que esteja aberto a essa hora — e, antes de chegar nele, confirmo
ao encontrá-lo fechado. Continuo andando e, no fim, faço a curva
para a esquerda.
O chão é de um piso frio de mármore bege e brilha como se
tivesse acabado de ser encerado. A decoração é composta por
preto e dourado, colunas esféricas paramentadas com o mesmo
material do soalho.
Cruzo os braços para me proteger de uma corrente de ar,
percorrendo por uma janela entreaberta. O vestíbulo pelo qual
transito está vazio e silencioso, exceto pelo estrépito das pantufas
contra o piso.
Estou prestes a reorientar meu percurso ao saguão principal
quando minha visão alcança vários lounges montados a cada
quadro de imensas janelas, que dão visibilidade para o jardim.
Em uma das poltronas escuras, vejo-o sentado com as pernas
esticadas para frente e a lombar afastada do encosto. Os braços
enroscados sobre o peitoral e usa o blazer para se proteger da leve
aragem até o pescoço.
Direciono-me para lá. Está de olhos fechados e, antes de
pensar em acordá-lo, fito o peito em diminuição do ritmo cardíaco, a
respiração lenta e regular, realçando que está tendo um sono bem
tranquilo, diferentemente do que estava acontecendo comigo.
Contendo o suspiro, chuto seu pé de forma brusca. Ele abre os
olhos, os espremendo contra a luminosidade do lustre e, em um
sobressaltado, corrige a postura.
O blazer escorrega até parar sobre seu tronco. Rugas
profundas unem a pele de sua testa, e ele pisca, sua mente se
esforçando para compreender o presente. Só quando estreito a
atenção poucos centímetros para o lado, é que noto a garrafa de
Blue Label pela metade, na mesa de apoio. Ele deve ter comprado
antes de o bar fechar.
Sento-me na poltrona enviesada à dele. Entrelaço os braços e
conecto meus olhos aos seus. As pálpebras pesadas de sono
pestanejam, e Ashton boceja.
— Preciso me preocupar que você acabe apaixonado por
mim? — sondo, minhas sobrancelhas encurvando junto das
palavras saltando da minha boca.
Ashton verga a cabeça para trás, sua gargalhada áspera de
quem acabou de acordar ribomba dentro do meu peito.
— Você é mesmo uma encrenca sem tamanho, Gravity.
— Estou falando sério. Não tem a menor chance de eu me
apaixonar por você, então espero que você não se apaixone por
mim.
Minhas palavras são rigorosas. Não estou tentando ser gentil
ou compreensiva. Ele se esforçou para me humilhar. Todas as suas
tentativas, entretanto, são uma perda de tempo. Lidei com bullying
em Milão. Ofensas verbais e até meus confrontos físicos com Amber
me transformaram. Descobri-me sob tantas camadas que ele se
surpreenderia com o que posso aguentar. Ashton é uma maldita
pedra no caminho. Só tenho que contorná-lo.
— Já cheguei a pensar que gostava de você, mas quer saber?
— Ele curva o tronco, apoiando os braços nas coxas. — Foi
bobagem. Isso nunca aconteceu.
— Ótimo. Então, podemos colocar um ponto-final e seguir em
frente?
— Não é sobre Paris, Gravity. É sobre eu estar decepcionado
por acreditar que você era diferente. Que jamais me usaria dessa
forma. Porra, pensei que… — Suspira, como se fisgasse uma parte
sua sendo finalmente polida. — Só achei que fosse outra pessoa.
— Pessoas mudam. Você mudou. Eu mudei. São ciclos,
Ashton. Eles acabam para que outros possam começar. E o nosso
acabou, entendeu? — Faço uma pausa, esperando que me
responda, mas quando não acontece, insisto: — Tudo bem, posso
ter adicionado aquela cláusula como vingança, mas também foi para
nos proteger. O que não adiantou nada.
Ashton esfrega os olhos, cansaço pesando neles.
— Vou esquecer Paris.
Um suspiro ecoa dele.
— Trégua? — Estendo a mão, oferecendo-lhe uma
oportunidade para que nossos meses juntos não sejam
completamente insuportáveis.
Ele me encara, aborrecimento contorce em suas linhas de
expressão, e desabo a mão para junto do corpo. Um nó grosso se
aloja em minha garganta e, por mais que tente empurrá-lo, não
consigo engolir.
Ashton é a pessoa mais orgulhosa que já conheci.
— Eu me recuso a fingir que não sei o que está acontecendo.
Você, se aproveitando de um momento de vulnerabilidade da minha
carreira para fazer a sua. — A mandíbula contraída em desprezo me
faz retrair o corpo. — Nunca vou perdoar essa porra, Gravity.
Silêncio impera entre nós antes de decidir confrontá-lo.
— E o que você quis dizer sobre meu beijo?
— Posso te odiar e gostar do seu beijo. — Ele sorri, intricado.
Às vezes, sua parte sombria me assusta.
Desde que a fama chegou à vida de Ashton, esse seu lado tem
se salientado mais em suas atitudes. Ele sempre foi explosivo,
problemático, com uma inclinação para fazer coisas estúpidas.
Todavia, está deixando a raiva que sente do mundo se apropriar de
seu bom senso.
— Posso te odiar e ainda ser o melhor namorado do mundo.
— Pensei que estivesse determinado a fazer da minha vida um
inferno — escarneço, recordando-me de sua primeira ameaça.
Ah, tem sido tantas desde então...
— Mudança de planos, encrenca. Já que me desafiou, estou
ainda mais empenhado em conseguir você.
Seu sorriso débil retorce meu estômago porque uma versão
dele empenhado é pior que a sua vingativa.

Voltamos ao quarto. Estou esperando que ele coloque seu


plano em prática, começando pela cama, entretanto, vai direto para
o banho sem brigar por espaço nela comigo.
Eu luto contra o sono porque se dormir, voltarei para o
pesadelo que quero esquecer. Entro debaixo do edredom depois de
tirar a calça. Digito uma mensagem para Dannya. Está tarde e não
quero preocupá-la ou atrapalhar sua rotina com Andie, mas preciso
conversar com alguém. Preciso falar com quem não preciso
esconder nada nem reforçar minhas barreiras.
Gravity:
Desculpa o horário. Tive um pesadelo.
Espero até a mensagem ser entregue.
Gravity:
Eles voltaram há algumas semanas.
Quando puder, me liga?
Antes de conferir se a mensagem foi entregue, o nome de
Danny acende na tela. Com um suspiro pesado e uma dor frustrante
rasgando meu peito, atendo.
— Quando começaram? Posso viajar para Nova York agora
mesmo.
Seria maravilhoso se Dannya estivesse comigo enquanto tento
passar por todas essas merdas, mas minha sobrinha vem à minha
mente e decido que já roubei demais da minha irmã.
— E deixar Andie com Darnell? Nem pensar. — Rio. Não que
ela vá se tranquilizar, mas tento mesmo assim.
— Ele pode dar conta da nossa filha por dois ou três dias.
Pondero, mordendo o lábio inferior enquanto inspiro uma
dosagem maior de ar. Preciso dela. Acho que preciso dela mais do
que qualquer pessoa nesse momento.
— Andie precisa ser sua prioridade.
— Ela é, mas se você também precisa de mim, não vou te
deixar na mão.
Um laço estreito se amplia em minha garganta, lágrimas
brotam em meus olhos e a gravidade me puxa para baixo.
Encolho os ombros, assim como minha cabeça pende até a
testa estar apoiada nos joelhos. Reprimo o soluço, mas a força que
faço para empurrá-lo acaba me engasgando e ele se liberta. Ainda
meio contido, mas está lá.
— O que aconteceu? Tudo bem, o aniversário de morte dele,
mas o que aconteceu? — enfatiza.
— Acho que…
— Não precisa se conter comigo. Me diz o que está havendo.
— É o Ashton.
Silêncio se estabelece entre nós.
Preciso dizer que Dannya não é a maior apoiadora das minhas
interações com ele?
— Você não quis falar sobre o soco que deu nele e saiu em
todos os sites importantes. Só me diz o que aconteceu, e eu vou
matá-lo por você.
Sorrio. É o meu primeiro sorriso sincero em dias.
— Ele tem me feito sentir… — engulo, limpando o rosto
quando ouço o registro do chuveiro desligar — culpada.
Sim. Preciso ser honesta. Com Dannya, posso me livrar de
todos os segredos obscuros e encarar a podridão dentro de mim,
adoecendo minha alma vagarosamente. Não preciso fingir que,
mesmo há sete anos de distância do passado, ainda está lá, criando
raízes cada vez mais sólidas.
— Como assim?
Se contar à Dannya que estou presa a ele por um contrato,
minha irmã é capaz de voar até Nova York e me arrastar de volta
para Humperville. Não posso dizer totalmente a verdade, afinal de
contas.
— Nós… — pigarreio, atenta à porta para a qualquer momento
ele sair de lá — estamos saindo de novo.
— O quê?! — vozeia de forma estrídula.
— E, em alguns momentos, me sinto culpada por Ashton se
sentir… — Suspiro. — Consumido, entende? Pendendo para o lado
assombroso dele. Se Ashton se transformar em uma pessoa ruim
por minha causa…
— Quero que pare imediatamente com esses pensamentos.
Você não tem culpa de nada! E se ele é um escroto, apenas
termine! — Arqueja, reprimindo o que gostaria de dizer de verdade,
mas não faz porque Dannya sabe. Ela sabe que Ashton chegou
muito perto de ser alguém importante para mim. Ela foi a única a me
ver chorar por causa dele quando voltei de Paris. — Por favor,
Gravity. Me escuta. Você não tem culpa de nada. Não teve antes
com Neil e não tem agora com Ashton. Termine com ele e…
A porta do banheiro abre e Ashton sai, esfregando os fios
molhados para retirar o excesso de água.
— Sim, eu entendo. Posso te ligar depois? Estou ocupada
agora.
— Você está com ele?! Está falando sério?!
— Tudo bem. Eu te amo, até logo.
Encerro a chamada às pressas, observando-o desfilar pelo
quarto com a toalha no quadril como se não tivesse notado que
ainda estou acordada. Pressiono os joelhos um no outro e deixo o
celular sobre a mesa de cabeceira, seguindo-o com as pupilas
atentas enquanto caminha pelo quarto.
Seco os olhos, embora já tenha feito antes, mas confiro se não
deixei resquícios de que estava chorando e visto minha máscara da
impassibilidade.
Ele anda de um ponto ao outro, como se minha presença aqui,
assistindo-o percorrer o quarto só de toalha, não o afetasse em
nada. No entanto, minha mente movida pela exaustão permite que
eu me satisfaça desses poucos minutos, assistindo a um homem
muito gostoso andar seminu diante de mim.
Miro os músculos que há escondido debaixo das roupas.
Ashton tem se dedicado à academia, sem sombra de dúvida.
Sei que ele e os meninos mantêm uma alimentação regrada
porque Jared não quer que corram o risco de ficarem com a
imunidade baixa. Mais de uma vez ouvi Tess e Chase conversando
sobre as dietas que a nutricionista monta. Porém a alimentação
saudável, assim como uma rotina árdua de exercícios físicos,
beneficia especialmente Ashton.
A caracterização de suas escápulas fica intacta com qualquer
movimento. O descomplicado ato de andar marca a estrutura inferior
das costas. Bíceps e tríceps também estão definidos e o abdômen,
entalhado com gomos.
Noto mais uma vez as tatuagens, especialmente a de libélula
em sua nuca, no comecinho da vértebra cervical; as asas e o corpo
longo se movendo em sintonia com ele.
Com a mão em volta da toalha, mantendo-a no lugar, Ashton
faz um movimento sutil e ela cai ao chão, revelando sua bunda firme
e empinada.
Ele cantarola, se divertindo, e o choque dificulta meu
raciocínio.
— Ashton! — grunho, cobrindo os olhos com as mãos.
— Não tem nada aqui que você já não tenha visto, encrenca.
Ótimo. Ele me arranjou um novo apelido.
— Está tímida? Mas estava me secando um minuto atrás! —
diz, com divertimento em sua voz. — Só estou facilitando para você.
Pode dar uma boa olhada. Será tudo seu mesmo quando me disser
sim no altar.
Ele fala de um jeito tão descontraído, que não resisto à risada
e acabo me esquecendo dos minutos de tensão que tivemos no
lounge. Como ele pode ser irritante e ao mesmo tempo engraçado?
Quero brigar com ele por me fazer rir.
— Você ainda sabe rir.
— E você está tramando alguma coisa.
Espio por entre as frestas dos dedos e descubro que já está
vestido com apenas a calça de moletom. O V marcando seu quadril
parece ainda mais fundo com o tecido cingindo seu corpo.
Afasto as mãos, visualizando-o por inteiro.
— Não posso confiar em você.
— Relaxa, só quero dormir.
Reduz a distância, indo para o lado vago da cama. Suspiro,
pronta para sair e me deitar no sofá, quando seu punho se fecha no
meu cotovelo, me puxando de volta.
— E você vai ficar bem quietinha aqui.
Rio outra vez, contorcendo o braço até fugir de seu toque.
— Não vou dormir com você. Nem sonhando.
— Gravity. — Ele suspira, derrota sombreando as linhas finas
de seu rosto. — Vamos somente dormir. Eu prometo.
— Você estava com raiva de mim antes de entrar no banho…
— Semicerro as pestanas, tentando capturar qualquer indício de
suas intenções.
— Ainda estou com raiva de você! — expele, com os
supercílios arcados. — Cacete, estarei sempre com raiva por causa
desse contrato. Mas não precisa dormir no sofá — braceja,
apontando para o móvel. — E eu não vou dormir lá porque estou
pagando por tudo isso — pontua, os lábios se moldam em um meio
sorriso.
— Se me tocar, te dou outro soco! — esclareço em tom de
alerta.
Ashton suspende as mãos e contorce a boca, formando um
bico.
Não pretendo dormir. Não quero correr o risco de ter um
pesadelo com ele do lado. Estou desperta e sem sono. Então, se
tentar me tocar, vou revidar.
— Vamos fazer uma barreira — decido, e ouço o sopro de
irritação fluindo dele.
Chuto o edredom, cambaleando para fora da cama rumo ao
closet. Consigo dois travesseiros extras. Quando volto, construo a
barricada.
Ashton retém a atenção em mim, uma mão apoia sua cabeça e
o cotovelo afunda no colchão. Ignoro o sorriso desprendendo do
canto de sua boca e me deito ao finalizar o trabalho, sentindo-me
mais à vontade.
— Terminou? — interpela, a fenda de sua boca rompendo em
um sorriso cômico.
— Sim. — Afofo o edredom em torno de mim.
Estendendo a mão para alcançar o abajur, Ashton o desliga.
Nem um feixe de luz permitindo que encontre a silhueta de seu
rosto. Minutos de silêncio permeiam o quarto. Sua respiração
arrastada quase me convence de que já pegou no sono.
— Você não dorme mais pelada?
Pisco para a penumbra, atenta à pergunta. Tento encontrar
qualquer luminosidade em meio à escuridão plena do quarto.
A expiração ritmada separa meus lábios.
— Ashton, dorme.
— Que foi? Estou curioso. Uma vez me disse que dormia
pelada.
— Não vou dormir sem roupas com você aqui!
Ruídos afloram ao meu lado, o roçar demorado do edredom
em sua pele.
— Tiro as minhas se você tirar as suas.
A pulsação cadenciada do meu coração se aloja no topo da
garganta. Reviro entre o edredom e o lençol. Minha pele
ascendendo com a carícia macia do tecido.
— Você prometeu que íamos só dormir.
— Estou sem sono.
Ele se move novamente. Tento desvendar o que está fazendo
do outro lado da barricada de travesseiros, como se os sons que as
roupas de cama fazem contra sua pele pudessem me contar
qualquer coisa.
Engulo a bola de saliva hospedada em minha garganta.
— Não precisa ser totalmente insuportável… — declara, a voz
rouca faz cócegas em meus ouvidos. — Podemos fazer ficar
divertido.
— Você não vai me tocar.
— Quem disse que preciso te tocar? Faça você mesma,
encrenca.
— Eu te odeio.
Mas a dor pungente em meu ventre me trai.
O modo como estou pressionando a virilha entre as coxas
desde que ele saiu do banho, ostentando seu torso delineado, e
procuro proporcionar alívio só com a voz rouca imperando através
de mim é vergonhoso.
A risada gutural sonorizando arranha sua garganta.
— Você está com tesão. Morrendo de vontade de mergulhar
esses dedinhos nessa boceta molhada, não é? Você está
imaginando como seria se eu realmente te dobrasse em meu colo e
te desse algumas palmadas.
Ele arfa fatigante, e aperto as pálpebras, enviando ordens para
o meu centro não me trair mais do que já fez.
— Pode ficar com raiva de mim, mas por que está se punindo?
Faça. Não ligue para mim.
Sua voz parece estar dentro da minha cabeça, áspera, e faz
cócegas no meu ponto latejando.
— Se toca, encrenca. Você sabe que quer.
Ofego, a necessidade esperneia como uma criança birrenta.
Não posso ignorar como meu corpo tensiona, esforçando-se para
aplacar a vontade.
Honestamente, estou com esse tesão cruciante desde que me
tocou na festa de Bandit. Ele sabe que conseguiu me provocar com
aquele beijo. Lutei contra a vontade de me masturbar durante o
banho, mas não posso vencer com ele ao meu lado, incitando meu
desejo.
Eu o odeio. Odeio por sempre conseguir o que quer. Ele nem
precisa se esforçar tanto. Com o incentivo certo, Ashton tem o
mundo na palma da mão.
— Desgraçado.
Agarro o short pelo elástico nas laterais, afoita, e escorrego o
tecido de seda para baixo, me livrando dele. Quero sentir minha
própria pele e a umidade escorrer no interior das coxas sem nada
para absorver a ardência.
Sorvo pequenas porções de ar quando espalmo sobre minha
carne, esfregando a mão, circundando o botão distendido, e depois
de acariciá-lo sem nenhuma moralidade, cubro-me por inteira.
Imerjo dois dedos na piscina se formando entre as pernas,
meu corpo reage com o toque luxurioso e lamurio com os dentes
afundando em meu lábio inferior.
— Gosta de como meus dedos afundam em você? — sussurra
sobre o chiado da minha respiração descontinuada.
— Uhum… — murmuro. Ainda que queira amaldiçoá-lo até o
fim dos tempos, preciso atender à minha vontade de gozar.
Deslizo sobre minha carne inchada e contenho outro gemido
porque quero guardar um pouco da minha dignidade para mais
tarde, quando for me repreender por me render à sua persuasão.
— Como não posso sentir eu mesmo, quero que me diga o
quanto está molhada. Sem nenhuma objeção, encrenca.
Seu tom ditador explora uma partícula do meu interior nunca
visitada. A que diz que gosto de ser domada. Ou quando tenho um
homem primitivo me dizendo o que fazer.
— Estou encharcada... Meus dedos estão besuntados com
meu gosto, meu cheiro… — Minha voz morna ressoa em um sopro
sôfrego e meu ruído enche o quarto.
Já que ele pode me provocar e me instigar a ir para um lado
que me fará odiar a mim mesma depois, quero causar o mesmo
efeito nele.
— Boa tentativa, mas hoje só você vai gozar — rosna como
uma fera selvagem perto da sua presa, o suficiente para deixá-lo
zonzo de fome. — E da próxima vez que for malcriada, vou te punir.
E sabe o que é pior? Você vai gostar porque tem prazer em me
contrariar.
Aprofundo os dedos em minha fenda, a abertura se alarga
para me receber. Arremeto de uma vez, minha mente registrando o
som molhado da minha boceta em atrito com meus dedos.
Bombeio mais forte e levo a outra mão para o clitóris, o ponto
pulsante e inchado avultando ondas de eletricidade por meu corpo.
Afastando em seguida, dirijo minha atenção para meu seio, minha
mão se enche com ele e faço pressão com os dedos em pinça no
mamilo, aprisionando-o e esmagando com vontade por cima da
blusa do baby doll.
Arfo e logo o gemido que contive explode em um grito
alucinante.
— Você quer tanto que eu te faça gozar... E estou aqui. Vamos
lá, encrenqueira, goza. Depois, quero lamber seus dedos e provar
você.
Elevo o quadril, empurrando-o contra meus dedos com força.
Alterno entre estocadas lentas e vigorosas, proporcionando-me
prazer e euforia, e, com a outra mão, belisco o mamilo túrgido até
provocar dor, imaginando que essa é a punição que Ashton
ameaçou infligir a mim por eu ser malcriada.
Sem interrupção, corro atrás do meu orgasmo, a sensação se
assemelha a um ciclone e trabalho com as mãos com mais
persistência.
O grito se agarra às paredes da minha garganta quando os
membros do meu corpo começam a tremer. Meus músculos se
contraem, avançando para o clímax. Atiro a cabeça para trás, a
onda gigantesca vindo para cima de mim, e estou pronta para
recebê-la.
Desço com a mão para meu clitóris novamente, estimulando-o
em círculos curtos e precisos. Minha abertura me puxa cada vez
mais, escorregadia, absorvendo meus dedos.
Idealizo como seria estar sendo coberta por beijos no colo e
nos seios. Deixo minha mente me transportar e calor começa a se
concentrar entre minhas pernas. Com os olhos fechados, eu o vejo.
Seu olhar lascivo se conecta ao meu enquanto a língua passeia em
minha pele, subindo pelo interior das coxas. Ardor seguindo por
onde me toca.
Mordo o interior das bochechas, pressionando os dedos em
minha carne dilatada. Guinchos de prazer irrompem de dentro de
mim, atravessando meus poros. Espasmos me inundam e amarro o
lençol debaixo do meu corpo nos nódulos dos dedos dos pés
enquanto me deleito do esguicho quente e violento que transpassa
meu meio.
Encaro o teto escuro, ouço minha respiração e sinto as
vibrações em meu peito atingirem as têmporas.
Pouso a mão lambuzada sobre a barriga. Não tenho tempo
para começar com os confrontos internos, pois dedos brutos se
fecham em meu pulso e o calor úmido os cercam no momento em
que a língua aveludada de Ashton chupa cada gota de mim.
Ele suspira. A voz consternada me paralisando.
— Você é tão gostosa quanto me lembro.
“Você e eu
Poderíamos escrever um péssimo romance”
BAD ROMANCE – HALESTORM VERSION

As três horas de sono não abrandaram o carmesim no cume


de minhas bochechas, muito menos foram suficientes para diminuir
as bolsas de cansaço contornando os olhos.
Expiro com força extra, aterrando as unhas no mármore
brilhante da bancada do banheiro. Da torneira escorre água, e tento
encerrar o sermão consciente acontecendo dentro da minha cabeça.
Tive sorte de ter conseguido dormir depois do que aconteceu,
mas não posso dizer que não estava esperando o arrependimento
me enfurecer logo que acordasse.
Só de imaginar o rosto de Ashton se iluminando com a vitória,
sinto vontade de afogá-lo nessa pia. Entretanto, não posso deixá-lo
levar a culpa sozinho. Quis fazer. Teria me tocado de qualquer jeito.
No banho ou quando estivesse em casa, acabaria me divertindo
comigo mesma com ou sem a intervenção dele.
Preferia que tivesse acontecido com privacidade? Sim, com
certeza. Seria poupada das piadinhas e provocações que sem
dúvidas está preparando para mim. Porém, ainda que sem a
intenção, Ashton conseguiu mudar o que teria sido a madrugada
para mim. O dia dezessete de agosto é sempre o mais difícil de
sobreviver.
Ter ligado para minha irmã foi minha bandeira vermelha para o
que teria sido se Ashton não tivesse sido meu escape. Já resisti a
muitos dezessete de agosto, mas ter tido uma distração como essa
evitou que mergulhasse no meu passado contra minha vontade.
Agora, contudo, preciso lidar com a vergonha. E também com um
homem que está disposto a me destruir só para me provar que pode
ter controle sobre qualquer coisa, inclusive os meus sentimentos.
Outro suspiro me escapa. Desligo a torneira e enrolo a toalha
no cabelo. Visto o roupão atoalhado com o brasão de uma coroa
dourada bordado no lado esquerdo do peito, com o nome do hotel.
Sobressalto com o estrondo da porta ao ser empurrada para
trás, a maçaneta se chocando com o azulejo da parede.
— Jesus Cristo, Ashton! — guincho, levando as mãos para o
peito, as pancadas do coração acertando a caixa torácica com
violência. — Você conhece a palavra privacidade?! — esbravejo,
recostando o quadril na lateral da bancada. Sustento meu corpo,
apoiando as mãos para trás.
— Não existe privacidade no casamento, querida. — Ri,
colocando pasta de dente em sua escova. — É melhor ir se
acostumando.
— Não é um casamento de verdade! — Arregalo os olhos. —
Precisa, sim, respeitar os limites. Não somos um casal!
Ashton para com a escova a meio centímetro da boca, fitando-
me no reflexo do espelho imenso, cobrindo toda a parede.
— Para a mídia, nós somos. Já deu uma olhadinha nas suas
redes sociais hoje?
Confusão nubla meu semblante sereno.
— Do que está falando?
— Parece que todo mundo sabe quem é você.
Ele começa a escovar os dentes. Seus olhos escuros
conectados aos meus enquanto faz uma tarefa tão simples.
Suspiro, alcanço o celular no apoiador perto do secador de
cabelo e viajo com os dedos para o ícone do Instagram no display.
Dirijo por um breve segundo meu olhar para o dele, ciente de
que não afastou os seus de mim, então acesso meu perfil. Ganhei
ao menos vinte mil seguidores desde a última vez que tinha
conferido. Na foto que publiquei no story com Ashton no sábado à
tarde, pouco depois de termos pousado em Miami, tem mais de dez
mil respostas. São questionamentos dos fãs, querendo saber se
estamos namorando.
Minha respiração afiada corta o silêncio.
— Se atualizar sua página em dois minutos, terá ganhado mais
vinte mil. — Devolvo minha atenção a ele quando lava a pasta da
boca. — E até o fim desta semana, já terá atingido mais do que
qualquer um de nós. Só precisa continuar me usando. — Seca o
rosto com a toalha, jogando-a no cesto ao lado. Ele se aproxima,
lânguido, os olhos sendo sustentados pelos meus. — Dormiu bem,
encrenca? — sussurra, agindo como o verdadeiro cretino que é.
Ashton me cerca com sua muralha de músculos. Um sorriso
impiedoso escancara os dentes retos. Pressiono a boca, assim
como aprisiono o ar nos pulmões.
Meus orbes saltam, inquietos e apavorados com a maneira
com que fixa a atenção em mim. Com uma mão em cada lado da
minha cintura, empurra a virilha contra a minha. Ele dobra o joelho,
impondo-o entre minhas pernas até que eu desista de pressioná-las
e libere uma brecha para que encaixe a rótula. E a desliza para
frente, subindo a barra do meu roupão enquanto roça o interior das
minhas coxas.
— Você me odeia, mas seu corpo me quer. — Para de mover o
joelho, centímetros antes de atingir minha parte sensível. — Deve
ser difícil para você saber que sou um caso perdido e, ainda assim,
ter vontade de dar pra mim. Se te conheço bem, não quer perder
sua dignidade nem sua moral.
Uma exalação trêmula desliza por minha boca quando ele
empunha meu cabelo, agarrando-o na raiz pela nuca e forçando
minha cabeça para trás.
Ele me olha de cima, a boca com uma fissura deixando
emanar o aroma mentolado da pasta de dente.
— Mas não se preocupa, encrenca. Comigo, você não precisa
ter nenhuma dessas coisas.
Ashton quer me provocar. Quer tornar nosso tempo juntos
sufocante e insuportável para que eu não consiga sobreviver a ele.
Empurro seu joelho para baixo com um tapa e, em seguida,
desço os braços torneados de músculos que estão me cercando.
— Não pense que vou cair no seu jogo. Sei o que está
fazendo.
— Sabe, é? — Ri com asco, curvando uma sobrancelha bem
desenhada. — O que é que estou tentando fazer?
— Não se faça de sonso, Ashton. Passou o fim de semana me
ameaçando. Quer que eu sofra! — rosno, cerrando os dentes com
força.
— Tem razão. Vou te deixar sofrendo de amor e tesão. — Ele
brinca com uma madeixa do meu cabelo fugindo da toalha,
enrolando-a no indicador, e sua simpatia fingida retorce meu
estômago. — Teremos meses intensos — segreda com os lábios
pairando sobre os meus, soprando o hálito quente —, esposinha.
— Ainda não nos casamos. — Afasto a mão dele do meu
cabelo, luto por um distanciamento seguro. — E, só neste fim de
semana, já quebrou várias cláusulas do contrato. Incluindo me tocar
sem que eu permita que faça.
— Vá em frente e desista. — Ele cruza os braços na frente do
peito, seus músculos ficando mais proeminentes sob a compressão.
Evito olhá-los, principalmente porque não tem nenhuma barreira me
impedindo de encará-lo. — Ligue para Camille, Gravity.
— Eu poderia, se não soubesse que tudo que está fazendo é
para me condicionar a desistir. Só que eu não vou — sussurro a
última parte.
Ele cerra a mandíbula.
— Você ouviu o que Jared disse ontem. É melhor se esforçar
se não quiser ser expulso — relembro, me deliciando de suas
feições se descosturando em raiva.
Gosto muito de como consigo fazê-lo oscilar sobre suas
decisões. Ashton pode tentar fazer dos meus dias ao seu lado
detestáveis, mas não significa que preciso ficar quieta.
— Você está tornando nossa briga cada vez mais interessante
— diz ele, comprimido o maxilar. — Gosto quando está me odiando.
— Não se preocupa, você não precisa se esforçar tanto para
conseguir que eu te odeie. Faço isso de graça.
Aproximo-me, meu nariz rente ao seu queixo. Inclino
parcialmente a cabeça para unir meus olhos aos dele.
Ashton avança um passo, quase me empurrando novamente
contra a bancada de mármore. Minha respiração vacila com a
proximidade repentina, porém, consigo me recuperar a tempo de ele
não notar.
— Se quer jogar com provocações, Gravity, trate de não recuar
quando estiver assustada.
— Alguma vez na vida fugi de uma briga?
— Que bom saber, encrenqueira, porque nosso tempo em
Miami ainda não acabou.
— O quê?! — ofego em sussurro.
— Verifique sua caixa de e-mail. Avalon enviou nosso primeiro
cronograma de tarefas como casal.
Gira nos calcanhares, rumo à saída do banheiro.

De: avalon@thereckless.com
Para: gravitymonaghan@mail.com
Assunto: Cronograma – Miami
Olá, Gravity.
Já deve saber que as fotos de vocês na festa de aniversário de
Leo Bandit estão circulando na internet desde esta madrugada.
Nós duas sabíamos que poderia acontecer. Ashton tem seu
próprio modo de decidir como e quando as coisas vão acontecer —
me imagine suspirando e revirando os olhos neste momento.
Aproveitaremos que estão em Miami para fortalecer as
especulações do relacionamento. Preparei um cronograma simples
para vocês serem vistos em público hoje. Espero encontrá-los
amanhã em Nova York, com certeza. Mas aproveitem a estadia
também.
Cronograma:
Café da manhã no hotel (certifiquem-se de que sejam vistos de
mãos dadas ou com demonstrações de afeto).
Dia na praia (Hollywood Beach, vocês só precisarão atravessar
a rua. Caso não tenha levado roupas de banho, Ashton poderá
acompanhá-la para comprar algumas. Ele tem um cartão black o
qual pode utilizar, mas já providenciei um para você.).
Jantar e passeio à noite em Little Havana (bairro cubano
famoso em Miami, acredito que serão fotografados).
Lembrem-se de serem especialmente naturais enquanto
estiverem juntos em público. Ajam como se realmente estivessem
apaixonados, afinal, não queremos piorar a reputação de Ashton se,
por acaso, a história de ser um relacionamento falso vier à tona.
Acima de tudo, divirtam-se.
Ergo o rosto em direção ao Ashton, terminando de se vestir
para descermos para o café. Aidan já enviou milhares de
mensagens dizendo que estão esperando por nós no restaurante.
Estamos em uma suíte presidencial, poderíamos, sem nenhum
problema, tomar café no quarto, mas o cronograma diz
especificamente que esperam que sejamos vistos juntos. De mãos
dadas.
Suspiro, captando as palavras de Avalon no corpo do e-mail e,
mais uma vez, enviando minhas advertências internas para um lado
da minha mente que meu consciente não possa alcançar. Se
continuar me penalizando por todas as escolhas erradas que faço,
definitivamente Ashton conseguirá fazer da minha vida um inferno.
Não preciso de mais pressão afundando meus ombros.
Não tenho nenhum biquíni, óbvio. Não estava esperando
passar mais um dia em Miami, quem dirá passeio em Hollywood
Beach e jantar em um dos bairros mais famosos.
Envio uma mensagem para Wade — trocamos nossos
números de telefone ontem, antes da festa de Bandit —, pedindo
que me encontre dentro de uma hora no saguão do hotel. Poderia
sozinha ir para o shopping mais próximo, contudo, dei uma espiada
pela sacada do quarto. Ainda que a entrada do hotel não esteja
obstruída por fãs, tem pessoas cercando-a o suficiente para gerar
uma confusão desnecessária.
Conduzo minha atenção para Ashton. Ele borrifa perfume nas
laterais do pescoço e no pomo de Adão quando pende a cabeça
para trás.
Confesso que estou esperando os comentários
desnecessários sobre o que aconteceu de madrugada, mas ele me
surpreende guardando-os só para si. Entretanto, não confio em
Ashton quando não está tentando ser um completo babaca
egocêntrico. Definitivamente está tramando alguma coisa, e meu
estado de alerta contínuo é a forma que encontrei de me defender
quando partir para outro ataque.
— Estou pronta há meia hora… — Suspiro, examinando-o
caminhar de um ponto ao outro do quarto.
— Estou me arrumando.
— Está se arrumando? — escarneço, e estrangulo uma risada
sarcástica. — É só a praia.
— Não. É Hollywood Beach. Não quero estar mal arrumado se
encontrar alguém interessante.
Supervisiona a regata branca e o short de poliéster branco
estampado com coqueiros cinza. Ele recupera os óculos escuros de
aviador de dentro do closet e faz outra verificação no espelho.
— Você nem tem vergonha, não é?
— Por que eu teria vergonha de ser bonito? — Ele sorri para
seu reflexo no espelho.
Engulo a gargalhada, mas quase não consigo quando ronco
com o nariz.
— Estou dizendo que não tem vergonha de ser um grande
imbecil. Você estará acompanhado!
— Só porque tenho um relacionamento de mentirinha com
você, diga-se de passagem, não quer dizer que preciso me tornar o
santo padre. Quando a gente se divorciar, estarei de volta à pista. —
Ajusta o arco no nariz. — E como você disse — ele se aproxima,
estendendo uma mão para mim —, está sendo bem paga para me
suportar.
Exalo com fúria e me empurro da cama, ignorando sua ajuda.
Marcho em direção à porta, agindo como se suas passadas atrás de
mim também não fossem um grande fator a ser levado em
consideração para a raiva que estou sentindo dele nesse momento.
Ashton não é só irritante, como faz de tudo para me lembrar de
que não vai me respeitar como sua namorada, muito menos esposa.
Nem que eu coloque em letras destacadas no contrato. Ele não fez
isso antes, quando supostamente gostava de mim, por que estou
esperando que faça agora?
Estou usando um vestido vermelho curto, esvoaçante na saia e
com uma alça que amarra no pescoço. Como prendi o cabelo no
alto, em um coque, Ashton não tem nenhum problema em me
segurar pelo cordão sobrando e pendendo em minhas costas. Ele
fecha o punho no amarrilho, forçando-me a deter as passadas
longas para conseguir o máximo de distância dele possível.
— Se entrar assim no elevador, as pessoas vão especular que
já tivemos uma primeira briga.
— Ah, mas nós tivemos não uma, como várias brigas —
murmuro, tentando expressar minha exaustão na voz.
— Que cheiro bom. Que perfume está usando? — indaga,
escolhendo esquecer a conversa anterior. Ele passa o braço por
meus ombros e me acolhe sob seu bíceps. Cruzo os meus, as
narinas retesando com rancor. — Te fiz uma pergunta — cantarola
quando não vê nenhuma indicação de que vou conversar com ele.
— Não te interessa — respondo com os dentes cerrados.
— Parece verbena.
É verbena, esclareço mentalmente.
— A propósito, gostou de gozar comigo te estimulando? —
Tem uma risada contida sob a voz fraca.
Adentro o elevador, grata pelas portas terem aberto no
momento certo. Contudo, meu rosto contorce a musculatura ao ver
que não tem ninguém dentro dele. E Ashton me segue, não faz
nenhum esforço para acompanhar meus passos e mantém o braço
em cima de mim, me contornando de forma protetora.
O abraço dele me arremete a muitas lembranças. Em Paris,
não se esforçava para ser um completo idiota como tem feito. Pelo
contrário, ele queria ser galante e conquistador, falava coisas para
me entreter e impressionar. Agora, estou constantemente
imaginando como seria bater nele com qualquer objeto que tivesse
em mãos.
— Quer fazer hoje de novo?
Inclina-se sobre meu ombro, o queixo resvalando
inocentemente minha pele. A barba rala e por fazer escorregando e
gerando formigamento através das minhas coxas. Entre os lábios,
uma limitada corrente de ar esquivando-se até o lóbulo da minha
orelha.
Maldito provocador.
— Dessa vez, posso entrar na brincadeira com você. Quem
sabe entrar em você... — salienta a provocação.
Endireitando a coluna, esfrego o ombro com o queixo para
afastar a voz rouca do meu ouvido, assim como o calor lascivo
tocando minha pele.
— Você não quer, encrenca? Repetir o que já fizemos? Sabe
que não foi suficiente, não é? — Mais uma ação provocadora —
Não fiz nem um por cento das coisas que gostaria. Não toquei em
metade dos lugares que imaginei. Ainda fica com a boceta molhada
só de me ouvir falar essas coisas? Vai negar só para que eu tenha
que descobrir sozinho? Porque eu posso.
Ele espalma minha barriga e percorre os dedos em direção à
virilha, circulando e brincando por cima do vestido. Ingiro uma lufada
de ar, fecho os olhos e ouço o zumbido externo do elevador se
movendo, mas confinada demais nas memórias para me distrair.
Minha cabeça cai para trás quando inala contra minha pele e a beija
depois, uma corrente de energia galgando dentro de mim quando
baforo.
Ordeno meu corpo a brigar por controle. Ceder outra vez, em
menos de vinte e quatro horas, é uma humilhação ainda maior.
Entretanto, esqueço que estou lidando com uma pessoa que odeia
ser contrariada tanto quando odiei receber um fora dele no passado
e fiz de tudo para tê-lo. E, no momento em que tento me
desvencilhar, Ashton firma o braço, me emboscando, e sou atingida
por outra carga de eletricidade quando belisca meu mamilo túrgido
sobre o vestido como castigo.
Correndo a mão da minha barriga para a barra do vestido,
embola-o até onde minhas coxas começam. Seus dedos dedilham
minha pele assim como faz quando está dominando seu
contrabaixo.
Infelizmente, não alcança seu objetivo porque o elevador emite
uma sonorização que se assemelha a uma campainha e
imediatamente Ashton solta minha roupa, deixando-a cair
suavemente em minhas pernas. O tecido leve que acaricia minha
pele é suave, mas estou afogueada por dentro e o inofensivo toque
arremete a uma combustão.
— Você é um canalha — grunho, quando ele entrelaça os
dedos em minha mão, liderando-nos para fora do elevador.
— Sou um canalha por querer satisfazer minha futura esposa?
— Ri com o canto da boca.
— Nosso relacionamento só significa alguma coisa quando é
você quem está ganhando.
— Mas, me diz, você não está? — Ele me encara através das
lentes escuras dos seus óculos. — Você está ganhando dinheiro,
fama e gozando ao mesmo tempo. Não vejo nenhuma desvantagem
para você.
Solto nossas mãos com brutalidade. Ashton para, virando-se
para mim com uma sentença incutida acentuando sua expressão.
— Ainda que seja um relacionamento falso, mereço que aja
comigo com consideração! Não pode sair e transar com outra
pessoa, não pode agir como se eu não tivesse nenhum sentimento,
Ashton! — berro, alto o bastante para causar nele alguma emoção
sincera.
Ele afasta os óculos escuros e os guarda no bolso do short.
Em seguida, fecha a mão em torno do meu pulso, nos conduzindo
para trás do elevador. Distancia-nos de possíveis olhos curiosos.
— Sabia que não tinha nada a ver com o contrato! Ainda está
com raiva de mim por causa de Paris!
Amplia os braços, gesticulando-os para os lados.
Seguro seus olhos nos meus, e agora que posso vê-los sem a
barreira dos óculos, acho que prefiro quando está com eles. Ele está
com raiva de mim. A explosão iminente chegando às suas pupilas
levemente dilatadas.
— Não tem nada a ver com o fato de você ter me deixado
sozinha em Paris para ficar com sua ex-namorada! Tem a ver
comigo! Com o que você está me obrigando a passar! Não gosto de
nada disso, não gosto de como as coisas aconteceram antes e
gosto muito menos de como estão acontecendo agora! Mas eu
preciso desse maldito emprego e não custa nada admitir que
precisa de mim para limpar a sua barra! — pontuo, firmando o
indicador contra seu peito.
— Eu não ligo — sussurra, com a respiração ofegante. — Não
ligo para o quanto você está magoada. Escolheu me deixar para
trás quando foi para Milão. Não tente colocar a culpa em mim.
— Você não se arrependeu do que fez!
— Não, porra! Não me arrependi e não me arrependo!
Retraio os ombros, talvez porque já faz quatro anos da nossa
conversa sobre Nicola e pensei que durante esse tempo, Ashton já
tivesse reconsiderado seu posicionamento quanto ao que
aconteceu, mas, olhando para ele, para a sinceridade circundando
seus olhos, tenho ainda mais certeza de que ele nunca irá se
desculpar. Isso me magoa e fragiliza profundamente porque, antes
de termos tido sentimentos um pelo outro, éramos amigos e achei
que poderia haver consideração por esse lado.
— Se você entender e aceitar que eu sou assim e não vou
mudar por você nem por ninguém, talvez consiga seguir em frente.
— Diminui o tom. Acho que nunca senti tanta transparência em
Ashton quanto nesse momento. — Não me arrependo de ter te
deixado para trás para ajudar uma pessoa que é importante para
mim.
— Você está fazendo da minha vida um inferno porque não
consegue aceitar que assinei esse contrato, mas consegue largar
tudo por ela? Consegue perdoá-la por ter te traído? — Franzo o
cenho, confusa. — Por quê? Por que é tão fácil para você me odiar,
e não odiar ela?
— Porque ela tem uma parte de mim que você nunca terá! —
Ele aponta para mim com o indicador, como se fosse me fazer
entender. — Porque eu a amei de um jeito que nunca amei você ou
qualquer outra pessoa. Porque Nicola carrega com ela todas as
minhas dores e, por mais difícil que seja encarar que ela foi egoísta,
não posso ficar com raiva dela.
Minhas lágrimas, meu choro, minha vontade de socá-lo, tudo
desfalece em um segundo. Ele é difícil de entender, difícil de amar,
difícil até mesmo de gostar. Mas estive cercada por pessoas
problemáticas. Sei que elas são o que são baseadas naquilo que
têm como vivência. Se Ashton só teve o amor de uma única pessoa
e essa, acredito que seja Nicola, jamais vai demonstrar ingratidão.
Ele a ama como uma forma de compensação. Porém não significa
que eu não esteja arrasada da mesma maneira, com o sentimento
de rejeição.
Fungo, ainda que tenha conseguido contornar o choro.
— Quero te ajudar a recuperar sua reputação e quero que me
ajude a me estabelecer na minha carreira. Portanto, vamos fazer
dessa forma. E, Ashton, não me toque mais.
Passo por ele, apertando os olhos para atenuar a visão.
— Nunca toquei em ninguém que não quisesse ser tocada. —
Detenho os passos, firmando-os no chão dentro das minhas
sandálias. — Você só precisa dizer não. E você não diz.
Giro na ponta dos pés, voltando-me para ele.
— Talvez eu dependa do seu toque — arrisco a sinceridade,
olhando para dentro de mim. — Assim como você depende do que
sente por Nicola. Não sei o que ela sabe sobre você nem qual a
parte feia que ela amou e que acha que deve compensá-la por isso.
Mas qualquer dependência só leva a um único destino: a perda de si
mesmo. E eu não pretendo me perder de mim por sua causa. —
Respiro fundo. — Quer que eu desista do contrato? — Sustento seu
olhar, esperando por uma resposta. Ele, por outro lado, não
responde. — Que bom que se decidiu.
Volto a andar pelo hotel, então estagno outra vez quando o
ouço dizer:
— Não é uma trégua. — Ele trança os dedos nos meus,
apertando com mais força que seria necessário. — Você ainda me
dá nos nervos — uiva, a voz pesando de raiva.
— Me odeie com tudo que tem, Ashton. Porque vou fazer o
mesmo.
“Porque eu nunca me trataria como uma merda
Você me fez odiar essa cidade”
HAPPIER THAN EVER – BILLIE EILISH

MILÃO, IT.
3 ANOS ATRÁS
QUARTA-FEIRA, 18 DE AGOSTO DE 2021, ÀS 08H13MIN.

Concentro meus olhos na ponta desgastada da mesa de Yael.


A respiração descontinuada faz arder meus pulmões.
Desvio por um breve segundo para a garota de cabelos pretos
ondulados assumindo uma posição de espanto. Amber não estava
tão tímida quando estragou o trabalho de uma vida nem pensou em
como me sentiria por essa perseguição ilógica estar acontecendo.
Qual é o problema dela? Não tem nada em mim que possa
sugerir uma ameaça para ela ou sua carreira. O pai de Amber é
dono de uma indústria têxtil conceituada no Norte da Itália. Ele tem
tanto dinheiro que poderia comprar a faculdade em que nós
estudamos e oferecer à família como trunfo. Mas ela prefere
estabelecer uma guerra entre nós duas, na qual tenho chances
minúsculas de vencer.
— Estou decepcionada com vocês duas. — Os saltos de Yael
refletem no piso de madeira de sua sala. Massageio as têmporas
para aliviar a dor cruciante macetando o interior da minha cabeça.
— Sinceramente, o que há com vocês? Sabem que posso expulsar
as duas por agressão?
Olho para meus dedos. Debaixo das unhas tem sangue da
pele de Amber, que arranhei quando a ataquei. De soslaio, posso
ver as linhas se salientando das esfoladuras, começando em sua
testa e terminando nas bochechas. Suspiro, ansiosa para esse
martírio acabar.
No geral, consigo controlar as provocações e não cedo à
agressão física, mas Amber tocou em um lugar sensível. Perdi a
cabeça e o total controle das minhas ações.
Ela também não me deixou ilesa. Na raiz do meu cabelo, na
nuca, a dor lateja onde se empenhou para puxar um montante de
fios.
Lembro que, quando Trycia chegou em casa, foi a única que
interveio para nos separar. Se ela não tivesse aparecido, Amber e
eu teríamos matado uma à outra. Sem nenhum exagero. A raiva de
ambas estava no pico, e eu muito menos estava agindo por conta
própria. Fui dominada pela sensação de justiça, sabendo que por
toda a influência da família de Amber nessa universidade, ela sairia
sem culpa de nada, e eu acabaria frustrada e enfurecida por não ter
brigado por mim.
— Amber, telefonei para o seu pai.
— O quê?! — A voz aguda dela sobressalta, e direciono minha
atenção para ela. — Por quê? Nós poderíamos ter resolvido tudo
sem precisar da intervenção dele, Yael!
— Não acho que seja o caso. Gravity disse que foi você quem
começou. Estragou todo o trabalho dela.
— Foi um acidente! — grita, exasperada, e capto um leve
tremor no olho direito. — Não joguei aquele lixo na banheira de
propósito!
— E eles com certeza foram parar lá sozinhos! — ridicularizo
seu argumento, revirando os olhos.
— Você os deixou próximos à banheira, e caíram quando
estava me preparando para o banho! — acusa.
— Você é dissimulada! — Arregalo os olhos para ela, em
choque com o pretexto patético que tenta criar. — Aqueles cadernos
estavam guardados e em segurança no meu armário! — O bramido
faz minha garganta coçar.
Sei que aumentar a voz não tornará minha versão convincente,
mas, pelo modo como Yael observa a nós duas, tenho certeza de
que está ponderando para o lado de Amber. E isso me deixa furiosa.
— Eu? Quem é que grita durante a noite? — murmura,
limitando sua atenção apenas a mim. — As outras alunas também
estão cansadas. Você está aqui por nenhum mérito. Só para cumprir
tabela dos bolsistas.
Sinto o sangue aquecer sob a pele. Ele borbulha a cada
palavra de Amber. Trinco os dedos em punhos, policiando minha
irritação e seus níveis.
Já lidei com pessoas como Amber. Os pais de Neil são
exatamente como ela. Têm dinheiro e poder, portanto, acham que
retêm direito sobre os outros. Um dia, terei tanto quanto essas
pessoas e poderei brigar com eles de igual para igual, sem medo de
perder o pouco que ainda tenho.
— Tudo bem, vocês duas, podem parar! — A voz aguda de
Yael interfere minha defesa, e prenso os lábios para me impedir de
continuar. — Dessa vez, vou dar apenas uma detenção. Estamos
nos preparando para um desfile dos alunos do primeiro ano e quero
vocês duas como mentoras deles no ateliê. Todos os dias às treze
horas.
— Mas nós temos a nossa própria coleção para trabalhar! —
Amber refuta, torcendo o tronco até estar ereta e de frente para
Yael.
— Já que arranjaram tempo para brigar, podem arranjar para
trabalhar nos próprios projetos, certo? — Debruça sobre os braços,
entrelaçando os dedos enquanto um sorriso mélico serpenteia seu
rosto. — Já que estamos todas de acordo, podem se retirar. — Yael
pesca uma caneta do porta-lápis à beira da mesa e folheia alguns
papéis que estão à sua frente, assinalando um por um.
Mantenho-me em meu lugar, aguardando que me peça para
ficar. Amber, por outro lado, bate a porta da sala com força
extracorpórea ao sair.
— Já pode ir, Gravity — ralha, sem deslocar a atenção de sua
tarefa.
— O que eu disse é verdade.
Ela exala, a cabeça se inclinando para trás quando dirige os
olhos verdes para mim. A pele dourada do bronzeamento artificial
destoando do vestido branco e fluído abraçando suas curvas.
— Não importa. Podemos sentar aqui e apontar os verdadeiros
culpados, mas o pai de Amber é melhor amigo do reitor dessa
universidade e um dos maiores investidores do curso de Moda da Di
Santis. Travar uma guerra com a família Sommers é uma perda de
tempo. Aceite a detenção. Se levar essa briga para Tommaso, você
será expulsa.
Rio, sacudindo a cabeça.
— Mas não fiz nada de errado.
— Pode não ter feito, Gravity, mas imagine que está em uma
escalada, está bem? Durante essa escalada, poderá encontrar
empecilhos, alguns mais difíceis de contornar do que outros, apesar
disso, sabe que pode chegar ao topo e o que encontrará quando
estiver lá em cima. O que precisa fazer é encontrar um jeito de usar
esse contratempo a seu favor. Cá entre nós, já estive no seu lugar,
sempre haverá alguém que terá mais habilidades, assim como mais
influência para te ultrapassar. Independentemente disso, não
significa que não tenha potencial para ocupar o mesmo lugar que
ela.
Crispo a testa para o monólogo de Yael, entretanto, acho que
consigo entender ao menos um pouco o que ela está querendo que
eu veja através das entrelinhas. Amber é só o primeiro
aborrecimento entre muitos que vou encontrar, mas se realmente
quero continuar nesse caminho, preciso aprender a enfrentar essas
situações.
Nunca pensei que atingir meus objetivos fosse ser fácil, ao
contrário, como nunca tive as coisas de maneira fácil, estou
acostumada a lidar com as adversidades, mas me deparar com uma
no estilo de Amber é novidade.
— Te ajudo em mais alguma coisa?
Balanço a cabeça, fazendo que não.
— Ótimo. Te vejo às treze, então.
Arrasto-me para fora do escritório, deparando-me com um
corredor extenso que está silencioso devido à falta de alunos neste
patamar, porém, assim que saio da sala, sou encurralada por um
braço fino esmagando-me contra a parede do lado. A pressão sobre
minha garganta empurra o ar de volta, e resfolego entre arfadas
curtas, a compressão do braço de Amber pulverizando minha
respiração.
Enterro as unhas das duas mãos em seu antebraço fino,
procurando por uma saída rápida para recuperar o oxigênio. Pisco
lentamente, sentindo o gás necessário para me manter ciente dos
acontecimentos escapando de mim pouco a pouco.
— Vou te alertar só uma vez! Se encostar a mão em mim de
novo, eu te mato. Se Yael ousar colocar meu pai no meio dos
nossos assuntos, eu te mato. E se tiver a coragem de ficar no meu
caminho mais uma vez… — ri de maneira demoníaca, o que faz
minhas vértebras congelarem —, eu te mato. É bom acreditar em
mim quando digo que seu tempo na Di Santis será exatamente
como estar no inferno ou, talvez, seja tão pior que você desejará
mesmo estar morta.
“Ela é tudo que ele sempre precisou
A alma dele é dela para mantê-la”
GOING TO HELL – BRYCE SAVAGE

MIAMI, FL.
DIAS ATUAIS

THE NEW CELEBRETIES


ASTRO DA THE RECKLESS APARECE EM FESTA NO
FIM DE SEMANA ACOMPANHADO
Publicado por Ravennah Hollow, há 3 horas.

Parece que o astro do rock, Ashton Baker, superou as


polêmicas anteriores a seu respeito.
Fontes afirmam que ele chegou acompanhado à festa de
aniversário de Leo Bandit e, um tempo depois, estavam aos
amassos sem tentar esconder na sala do local onde foi
comemorado os trinta anos do rapper.
Minha fonte também confirmou que a garota em questão
não é nenhuma estranha. Conhecida como “Vity” pelos mais
próximos, existem rumores de que Gravity Monaghan é o
mais novo relacionamento de Ashton. Ao que parece, os
dois já se envolveram no passado, antes de a The Reckless
se tornar mundialmente conhecida.
O recente reencontro veio através de um trabalho que eles
farão juntos. Aparentemente, Gravity será a nova
responsável pelo figurino da banda no retorno da The
Journey World Tour. Embora tudo não passe de
especulações, publicações na rede social da estilista
apontam que sim, o relacionamento é verdadeiro.
Será que ele não aprendeu nada sobre a experiência com a
estilista anterior?
Gostaríamos de saber por eles se o que estão dizendo é
verdade e se sim, como foi que isso aconteceu, afinal?
Bryan relê em voz alta a matéria publicada por volta das sete
horas da manhã por Ravennah. A mulher não perde tempo. Aposto
que contratou um detetive particular para bisbilhotar minha vida
pessoal e meus relacionamentos, contudo, não sei por que não fui
pego saindo da festa com Sadie. Tudo bem, fui mais diligente
tentando não ser pego desta vez. Meus cuidados podem ter surtido
efeito e não prejudicado nossos planos. Quero dizer, os planos de
Jared para mim. Porque tudo que está acontecendo é culpa dele.
Esse relacionamento falso, essa merda toda, se estourar na mídia,
estaremos fodidos.
Encaro de esguelha minha futura esposa. Seu semblante
impassível pode não significar nada para os outros, mas a
discussão de minutos atrás ainda está aflorada na minha pele.
A raiva que sinto dela, por tudo, é asfixiante. Se para ela está
complicado, para mim é dez vezes mais. Admito que uso o sexo
para me distrair. Estar com raiva dela não interfere no meu tesão,
muito pelo contrário, quanto mais fico com raiva, mais quero beijá-la.
É irritante pra cacete estar nesse limbo.
Aidan alterna suas olhadelas injetadas de curiosidade entre
mim e Gravity. Certamente já desconfiou que tivemos algum
desentendimento no caminho.
Relanceio um olhar condenatório para Gravity, que ignora sem
nenhum discernimento. Volta a comer suas panquecas com mel e
mastiga devagar, como se estivesse se regozijando da minha
situação.
Só estou fazendo isso pelos caras. Só estou preso a ela
porque desejo continuar fazendo parte da The Reckless. Sei que
mesmo que Jared decida colocar outro no meu lugar pelas minhas
mancadas, os caras jamais me abandonariam, portanto, estou
tentando não ser expulso. Por eles.
— O que era para ser discreto, não é mais. — Chase ri,
brincando com o cereal dentro de sua tigela. Arremesso meu olhar
de desprezo para ele. — Que foi, cara? Tess desconfiou no
momento em que Gravity disse que viria com a gente.
— Então, você sabe? — Divago minha atenção para ela. — E
concorda?
— Sei. Não concordo. — Levanta uma sobrancelha, como se
dissesse que deveria estar óbvio seu posicionamento. — Mas meu
pai está procurando por caminhos mais fáceis para acelerar sua
retomada de imagem, e, no seu lugar, aproveitaria o esforço que
Gravity está fazendo para te suportar.
No final, Tess oferece uma risadinha confortável, o que me diz
que só está tentando criar um clima agradável para a tensão
planando sobre nossa mesa.
Geralmente conseguimos comer ao meio das outras pessoas
no hotel, mas o edifício está cercado de paparazzi e fãs desde cedo,
quando Ravennah publicou a matéria. Segundo o concierge, não
havia tantos no começo, mas que em menos de duas horas atrás, o
saguão parecia um retiro espiritual. Precisaram acionar a segurança
para esvaziar a área, mas permitiram que os fãs ficassem
aguardando do lado de fora.
Finnick pediu que servissem café e comida porque
conhecemos nossos fãs. Eles só sairão depois que nos virem. Se
Avalon estivesse aqui, me diria para sair pelos fundos e não olhar
para trás. Não é que ela odeie a atenção que recebemos, mas sabe
que qualquer coisa pode gerar uma algazarra na mídia.
O hotel deixou o restaurante livre. Então, somos nós sete,
sentados em três mesas agrupadas no centro do lugar, e Gravity
parece estourar meus miolos com as olhadas afiadas. Arrepio do
começo da cervical até a lombar.
— Nosso voo é ao meio-dia. — Bryan relembra. — Espero que
não tenha nenhum problema vocês ficarem sozinhos… — sonda,
dividindo sua atenção entre mim e Gravity. — Avalon disse que
preparou um cronograma e tudo mais. — Beberica do seu café,
mantendo os olhos azul-oceano presos em nós.
Gravity bufa ao meu lado, devolvendo sua xícara de café para
o pires.
— Vocês podem, por favor, não agir assim? — roga, o
atrevimento dela assustando aos outros. — Sei que passamos
quase quatro anos separados e que escolhi ficar mais distante, mas,
caramba, somos amigos desde Humperville. Parece que estou
pisando em ovos com vocês e vocês comigo!
Aidan abre um sorriso sorrateiro.
— Tenho medo de falar demais e você me bater. Aconteceu na
última vez! — exclama, com uma ruga florescendo entre as
sobrancelhas.
— Aquilo foi diferente. Darnell estava no hospital, e você
estava acusando a minha irmã de estar envolvida no que havia
acontecido com ele. — Gravity devolve o sorriso genuíno e, não sei
o motivo, mas algo dentro do meu cerne se movimenta em rodopios
que dão ânsia de vômito. — Ou seja, você mereceu.
— Sério? Você bateu nele? — Theresa escancara os olhos
para a nova informação.
— E também já me beijou. — Aidan recorda do nosso jogo de
sete minutos no paraíso, cinco anos atrás.
— Nós já passamos por muita coisa. — Bryan salienta,
movendo a xícara pela alça até a boca. — Queria que ficássemos
todos juntos de novo, como antigamente, mas é meio complicado,
não é? São caminhos diferentes.
— É complicado, mas não impossível. — Tess fala,
esperançosa. — Logo vocês estarão juntos de novo e teremos essa
mesma conversa.
Então, Aidan muda de assunto, perguntando para Finnick o
que ficou fazendo durante a festa, no tempo em que eu o deixei
sozinho para procurar por Gravity. Ele, entretanto, só enrola. Uma
parte de mim acredita que ele ficou com Penni, a outra diz que não
seria tão cuzão assim.
Estendo minha atenção para Gravity, comendo e rindo da
implicância de Chase com Finnick. Nunca mais tive um café da
manhã calmo e silencioso. A partir do momento em que entraram na
minha vida, uma montanha russa de acontecimentos desastrosos e
dramáticos veio, mas não escolheria estar com mais ninguém.
Se fosse para passar por todas as merdas de novo, escolheria
esse exército para estar comigo. Eu os amo. De todo o meu coração
fodido. Com todo o egocentrismo que carrego. Com a minha parte
bonita e feia. Não tem mais ninguém nesse mundo de merda que
ame mais do que amo esses caras. É por eles que estou revivendo
meus maiores traumas.
Inalo a fragrância de verbena exalando do corpo ao meu lado.
Retenho minha atenção no espaço, mantendo Gravity a uma
distância de quase dois palmos de mim. Exalo uma respiração
estremecida, encaixo a mão na parte inferior do assento dela e puxo
sua cadeira rumo à minha. As falas cessam com o ruído dos pés de
madeira em atrito com o linóleo do chão.
Ignoro os olhares apreensivos, assim como a dúvida flutuando
no castanho-escuro das íris de Gravity. Volto a comer em silêncio,
agora seu cotovelo quase tocando o meu sobre a mesa. Do outro
lado, Bryan e Aidan explodem em gargalhadas, mas tento não
pensar que tem a ver com a minha atitude sobre ela.
Eles terminam de comer e, aos poucos, a mesa recai em
silêncio. Chase e Tess são os últimos a sair do restaurante,
sobrando apenas Gravity e eu. Não quero discutir com ela de novo
sobre o mesmo assunto, principalmente porque nada mudou para
mim na última hora.
— Pensei que não quisesse uma trégua — examina nossos
braços a menos de meio centímetro um do outro sobre a mesa.
Giro em minha cadeira, observando-a por entre as pestanas.
— Não é uma trégua, encrenqueira. Só quero que eles saibam
que estou fazendo tudo que está ao meu alcance para esse
relacionamento dar certo.
— Está fazendo tudo que está ao seu alcance? — Uma risada
irônica flutua sobre nossas cabeças. — Você não tem vergonha.
— Não estamos perto o bastante? — Inclino-me sobre o corpo,
aproximando-me mais.
— Já terminou? — Afasta a cadeira, abrindo distância entre
nós. — Porque se sim, nós deveríamos ir. Temos um cronograma
apertado e, segundo Avalon, você precisa me levar às compras.
— Além de me fazer passar raiva, quer me falir?
— Só estou cumprindo ordens… — murmura, encarando-me
com desprezo.
Confesso que uma parte de mim adora quando está com raiva.
Só me dá um tesão desgraçado saber que provoco tantas emoções
nela, assim como faz comigo.
Odiá-la e querer transar com ela faz qualquer sentido nessa
porra de mundo? Não, não faz. Exceto pelo fato de que Gravity é
como uma droga. Você não se contenta em ter apenas uma vez.
Você prova, fica viciado, tenta se restabelecer e até consegue,
contanto que exista uma distância impondo um limite entre você e
ela. Estar tão perto é um problema. Ser tão fácil ganhá-la é outro.
Um suspiro ovaciona de mim quando me levanto para segui-la.
Antes, retiro da carteira algumas notas para deixar de gorjeta para
os funcionários do restaurante. É sempre muito estressante quando
a The Reckless está comendo ou se hospedando em qualquer lugar.
Eles perdem clientela e até deixamos os outros hóspedes
desconfortáveis por acabarmos atraindo o máximo de atenção e
cuidado para nós mesmos.
Aguardo no saguão por Lucca e Max. As babás que estou
acostumado a ter andando por aí comigo, na minha cola. Pela
expressão retorcida de Gravity, não estou esperando que seja
maleável hoje.
Os dois marcham ao nosso encontro, ambos ajustando os
pontos nos ouvidos. Observo através das portas do hotel nossa van
estacionar.
— Isso vai ser divertido — cochicho para mim mesmo, mas
Gravity me mira.
— O que vai ser divertido?
Entrelaço os dedos nos de Gravity, liderando o caminho com
Lucca e Max à nossa retaguarda. As portas se abrem com o sensor
de presença e, no instante em que estamos do lado de fora, gritos
rompem através dos meus ouvidos. O tinido agudo das fãs
serpenteia dentro da minha mente.
Mantenho Gravity atrás de mim, meu corpo estabelece uma
barreira entre ela, os fãs e os paparazzi. Visto os óculos escuros de
aviador, sorrindo e acenando para o grupo que literalmente
monopolizou a entrada do hotel.
Guio Gravity para a van, sustento a base de seu quadril e a
empurro para dentro. Quando vejo que está se acomodando no
assento, fecho a porta lateral e me direciono para a multidão
berrando perto ao canteiro de rosas de frente para a entrada
luxuosa.
— O que está fazendo?! — Lucca me segue, rumorejando
para o microfone preso à lapela do seu paletó. — Ashton, entra na
van. É muita gente. Max e eu não podemos lidar com tantas
pessoas, nós…
Mas o ignoro. Só ouço o palavrão atravessar a garganta de
Lucca e atingir meus ouvidos. Atravesso o pavimento em direção a
elas. No momento em que estou perto, acabo sendo cercado por um
muro de corpos. Entretanto, não me sinto sufocado, pelo contrário, é
como estar no paraíso.
— É sua namorada? — Ouço a pergunta de alguma delas, do
grupo, mas não tenho tempo para identificar de quem.
— Ela é boa para você?
Assinalo um pôster antigo, de quando gravamos Caóticos.
Estou tão acostumado com esse tipo de coisa que sempre
ando com uma caneta no bolso.
— Como foi que vocês se conheceram?
— É verdade que já foram namorados?
As perguntas explodem diante de mim, quase sempre são as
mesmas, mas não sei se devo responder a todas. Avalon disse que
a matéria já é bastante esclarecedora, e eu, sinceramente, não
acho. Não é a primeira vez que apareço com uma mulher em uma
festa e Ravennah me acusa de estar em um relacionamento.
Contudo, sei que minha história com Gravity está longe de acabar.
Pelo contrário, estamos só começando.
Abro meu melhor sorriso quando uma fã descansa a cabeça
em meu ombro e pede para tirar uma selfie.
— Então, vocês estão mesmo namorando?
— Ainda não pedi… — confidencio, rindo, e assinalando a
capa do nosso álbum com uma caneta branca que me foi ofertada.
— Mas sim, acho que sim. — Sorrio, entregando a capa para ela.
— Nunca acreditei na versão insensível sua que Ravennah
tenta colocar.
Direciono minha atenção para a pessoa que disse isso, mas
são tantas, que não consigo encontrá-la em meio às outras.
— Não sou nada do que dizem. Posso garantir.
Flashes disparam em minha direção. Sei que estão vindo dos
paparazzi perto da van.
— Tenho que ir. — Devolvo outro pôster.
— Quando a The Journey World Tour volta?
— Em breve, prometo que os caras e eu daremos notícias.
Obrigado por nos apoiarem, significa muito mesmo! — exclamo,
sorrindo. Tento sair do meio da roda e, depois de muito esforço,
finalmente consigo estender um braço, por onde Lucca me puxa.
Aceno para elas, sorrindo, e corro para a van. Max está na
porta, a postos para abrir, e, antes de entrar, mais flashes
estrondeiam em minha direção. Abro uma fresta da janela, coloco
uma mão para fora e dou tchau para o grupo.
Max assume o volante, e Lucca entra na porta ao lado, no
passageiro.
— Sempre soube que você seria o que mais iria curtir essa
parte de ser idolatrado.
Meu sorriso desaparece quando a ouço falar. Coloco a mão de
volta para dentro.
— Só quero retribuir o carinho que sentem por mim.
— Você é convencido à beça. Só quer ter pessoas inflando seu
ego.
Cruza os braços na frente dos seios, pressionando-os até
estarem cheios no decote do vestido. Por sorte, estou com os
óculos escuros e não sou flagrado admirando aquela região.
— Está com ciúme, encrenca?
— Bem que você gostaria de ter essa importância para mim,
não é?
Então, o celular de Gravity apita. Desço meus olhos para o
som da mensagem. O aparelho está em seu colo, a tela para cima,
e, de relance, leio o nome que acendeu o display. Liam.
Esse otário ainda fala com ela?
Meu sorriso se desmancha por causa dela pela segunda vez.
Liam é o cara com quem Gravity dormiu em Paris antes de mim.
Naquela época, pensei que ele fosse só um romance de verão, mas
acho que estava enganado. Se depois de todo esse tempo eles
ainda mantêm contado, significa que alguma coisa deixei passar.
— Você ainda fala com aquele babaca? — Procuro saber, a
curiosidade fica exposta e me deixa irritado.
— Sim. E ele não é babaca. — Gravity alcança o celular no
colo e abre a mensagem. Não vejo o que está escrito, mas ela sorri.
— O que ele quer?
Expira uma lufada de ar carregada.
— Não que seja da sua conta, mas ele está se mudando para
Nova York e gostaria de me ver.
Minha mandíbula trava.
— E você disse não, com certeza.
— Por que eu diria não? — Gravity move o pescoço
lentamente em minha direção. Pregas de pele formam rugas em sua
testa.
— Por que nós vamos nos casar? — conjecturo, arrastando os
óculos até tirá-los do rosto. — Ele não viu o que Ravennah
publicou?
— Liam não é muito ligado nesse mundo musical, mas ele viu
minhas postagens. Disse a ele que estávamos saindo de novo.
Meus ombros relaxam.
— Então, obviamente, disse não para o convite dele.
Acomodo-me no assento, descanso a coluna no encosto e
respiro tranquilo outra vez.
— Não, eu disse que podemos sair qualquer dia e que você
não faz o tipo ciumento porque nosso relacionamento é aberto.
— Como é que é?! Desde quando? E por que caralhos eu teria
um relacionamento aberto com alguém, Gravity?! — sobressalto,
encaminho minha atenção para ela novamente. — Você não vai sair
com o otário do Liam.
Ambas as sobrancelhas se arqueiam. Gravity está me
encarando com a fisionomia aturdida.
— Não estou quebrando nenhuma regra.
— Não interessa. Você não sai com ele. Se alguém te
fotografar…
— Você só se preocupa com o próprio ego? — desafia,
fazendo uma pinça com o indicador e polegar, e prensa o osso da
ponte do nariz. — As regras só se limitam às pessoas que quer
controlar, você mesmo não respeita nenhuma delas. Quanto mais
conheço esse seu lado, menos consigo gostar de você! Se o seu
incrível plano de vingança for mesmo me deixar apaixonada por
você, continue agindo assim. Tenho certeza de que terá tanto
sucesso quanto teve antes — ironiza, a risada nasal permeando a
parte de trás da van. — Talvez você tenha esquecido o ultimato de
Jared, mas eu não. Se quer minha ajuda, vai seguir o que eu disser
para fazer.
Seu olhar fatal se conecta ao meu e, por um breve segundo,
acho que até considero seguir tudo o que me disser.
— E se decidir sair com Liam, eu vou. Se quiser sair com
qualquer outro cara nesse meio tempo em que estamos fingindo que
nos suportamos, eu vou. Então, é melhor engolir seu orgulho, enfiar
seu rabo de homem das cavernas entre as pernas e não me
aborrecer.
— Ah, interessante, você finalmente está reagindo. Pensei que
estivesse tão desesperada por dinheiro que iria aceitar qualquer
coisa vindo de mim! — Desenho meu melhor sorriso cômico.
Covinhas se afunilando em meu rosto.
— Só acho uma perda de tempo discutir com você. — Gravity
finge admirar a paisagem através da janela.
Sinceramente, estou cansado de brigar com ela. De todas as
coisas que fizemos neste fim de semana, discutir está no topo da
lista. Por mais que já tenha entendido o que estamos fazendo,
existe uma parte de mim que não quer acreditar que estou
revivendo esse trauma com ela. Justamente Gravity.
Não preciso nem dizer que, depois de Nicola, Vity foi a
primeira garota a me transmitir confiança novamente. E me sentir
usado, porra, ainda mais por ela, está me enlouquecendo a níveis
inimagináveis.
Realmente tenho vontade de gritar com ela, humilhá-la e puni-
la por me fazer sentir indefeso como quando estava sob a sombra
do meu pai. Ela conseguiu reunir todos os meus medos em um
único lugar. E me calar para essa situação é como aceitar outra vez
que alguém me espanque e roube minha dignidade.
Não posso me permitir ser aterrorizado por outra pessoa. Vivi
anos da minha vida lutando contra as marcas deixadas pelo abuso
que sofri quando criança. Não assinei um contrato, assinei minha
sentença. Estou revivendo meus demônios ao lado de Gravity.
Se tiver que usar seu corpo e sentimentos contra ela para
manter os meus demônios sob meu domínio, eu vou. Gravity pode
nunca entender como é estar na minha pele e viver as coisas pelas
quais já passei, mas já quis ser qualquer coisa, menos Ashton
Baker.
“Do jeito que está olhando, eu vou precisar de você, amor
Então, por que você não coloca seu corpo em mim?”
ROUND AND ROUND – ANGELICCA

Levamos um tempo até Max encontrar um bom lugar para


estacionar. Analiso a Lincoln Road antes de estender a mão para
Gravity e ajudá-la a sair da van.
Serpenteamos pelo shopping ao ar livre, com os dois
seguranças em meu encalço. Olho por sobre o ombro, para as
sombras musculosas me seguindo como se precisássemos mesmo
de toda essa atenção.
Gravity tenta desvencilhar nossas mãos, mas a detenho. Não
sei como os paparazzi conseguem, mas em cada canto, acabo
encontrando um e o TNC ganha mais uma matéria estúpida para
publicar sobre mim.
— Quem você acha que vamos encontrar? — bufa, tropeçando
para acompanhar meus passos mil vezes mais largos que os seus.
— Pode me soltar! — Seu tom furioso vem acompanhado de uma
ordem, mas a ignoro.
Forço seus passos, caminhando com pressa para chegar à
Victoria’s Secret. Tudo que quero é que esse fim de semana termine
e que eu possa me livrar dela, finalmente.
Uma respiração afiada evapora por entre seus dentes
cerrados. Gravity vacila no esforço com seus pés, e paro
subitamente quando seu rosto colide com minhas costas. Max e
Lucca detêm suas passadas simultaneamente.
— Vocês podem esperar aqui fora. Não vamos demorar —
anuncio aos seguranças, que dão somente mais dois passos, para
cercar a única entrada da loja.
Inspiro a aragem quente, o sol formando partículas de suor em
minha testa. Empurro os óculos através do arco do nariz e lidero
Gravity pelo detector de metais na entrada.
Uma vez cruzado o hall, estaciono a atenção nos manequins
com lingeries e viajo com os olhos às várias araras com peças
sensuais da marca. Enrubesço, assimilando que sou o único homem
acompanhando a “namorada” dentro da loja.
— Te falei para esperar na van! — vocifera baixinho, e, enfim,
permito que solte a mão da minha.
— Te esperar na van enquanto você faz a festa com o meu
cartão? Nem pensar — objeto, escoltando-a até uma guia de araras
com biquínis.
Uma colaboradora finalmente chega para nos atender. Ela fala
e gesticula para Gravity quando a encrenqueira explica o que está
procurando. A jovem ruiva nos pede para segui-la depois de
apanhar alguns modelos presos na arara. Subimos três degraus e,
no meio do caminho, sinto que sou reconhecido por um grupo
pequeno de cinco amigas que estão vendo as lingeries no canto
esquerdo.
Pigarreio, marchando atrás de Gravity até os provadores. A
mulher indica um para ela e sorri como se dissesse que podemos
ficar à vontade. Sondo por sobre o ombros, o grupo ainda
cochichando e mirando na direção do cubículo que entramos.
Menos de quinze segundos depois, ouço o guincho de Gravity
e um suspiro longo carregado de irritação.
Firmo os pés no chão, mal deu tempo de esquentar a bunda
no assento. Dirijo-me para o provador, pairando com o punho sobre
a porta, ponderando. Porém ela a abre, e recuo alguns passos para
examiná-la.
O cume de suas bochechas assume uma tonalidade de
carmesim devido ao calor. Ela fez um coque, supostamente para
impedir que os fios se mesclem ao suor aspergindo de seu pescoço.
Recaio com os olhos para os seios medianos, suas mãos agarrando
a parte de cima do biquíni enquanto as tiras de amarração pendem.
O vestido vermelho que estava usando antes, emaranhado no
quadril.
— Preciso de ajuda — solicita, girando no próprio eixo e
voltando poucos passos para dentro do provador. — Nada de
gracinhas — adverte para o reflexo do espelho, onde nós dois
estamos refletidos através dele.
Empurro a porta para nos fechar, e Gravity mantém as mãos
firmes por cima dos mamilos, sustentando o biquíni no lugar. Puxo
as tiras do pescoço primeiro, meus dedos escorregam sutilmente na
superfície de sua pele aquecida, e faço um laço.
— Está frouxo — reclama, sentença anuviando o castanho-
escuro de seus olhos.
Desfaço meu trabalho e refaço o laço, deixando-o ainda mais
folgado.
— Se vai ficar de gracinha, chame a Charlotte.
Sua expressão azeda, e dou um meio sorriso endiabrado.
Afasto uma mecha de cabelo que se desprende do coque, sua pele
arrepia com a carícia inofensiva, jogando-a por cima do ombro.
Deslizo a mão de volta para as tiras do biquíni preto, recomeçando o
nó.
— Assim está bom? — Elevo meus olhos para seu reflexo
corado no espelho, nossos olhares se conectando por uma fração
de segundo.
— Sim.
Arfa quando atravesso as mãos por suas costelas, surfando
com os dedos sobre sua pele até alcançar as outras pontas do
tecido para uni-las nas costas.
— Quer ajuda com a parte debaixo? — questiono ao finalizar a
amarração. A curva da minha boca alçando em um sorriso mordaz.
— Eu te odeio muito nesse momento e você, melhor do que
ninguém, entende o porquê — ofego, segurando sua atenção em
mim —, mas continua linda e sabe que não sou burro para não
notar. Vou me casar com uma mulher gostosa pra caralho e não
posso me deliciar porque estamos em guerra. — Inclino o tronco
para frente, minha boca encaixando em seu lóbulo. — Me avise se
mudar de ideia sobre eu te tocar. Foder com raiva é ainda mais
gostoso. Posso te mostrar o quanto.
Gravity recua um passo, e eu conserto a postura, afundando
as mãos nos bolsos da bermuda.
Não consigo evitar sorrir. Seu peito se eleva e afunda, a
respiração intervalada expondo como reage a mim.
Confesso que sou bem ardiloso quando quero. Quebrá-la será
como um prêmio de consolação por toda essa merda que está me
fazendo passar.
Ela pode dizer o quanto quiser que não irá se apaixonar por
mim, mas seu corpo, sua pulsação, a maneira como facilmente
consigo despertá-la, se opõem às suas convicções.
Caminho para fora do provador, a porta estrondeando às
minhas costas. Minha boca se afina com o sorriso.
Volto para o meu lugar, e ela demora muito mais para provar
os próximos. Dessa vez, sem pedir ajuda. Nem mesmo a de
Charlotte que, vez ou outra, aparece para saber se precisamos de
alguma coisa. Nesse meio tempo, até aceito a garrafa d’água que
insiste em me trazer. Tenho certeza de que já sabe quem eu sou,
mas não quis fazer alarde. Isso determinantemente se dá ao fato de
que está no seu local de trabalho e, querendo ou não, sou um
cliente.
Quando ouço a tranca da porta, empertigo. Gravity já está com
o biquíni escolhido; um preto cortininha, uma pequena placa de
bronze separando as partes que seguram os seios e nela está
escrito “love”. Ao girar para pegar suas roupas, a parte de trás —
vejo pela saída de praia branca praticamente transparente — tem
um coração na ponta das tiras e a calcinha é quase indecente,
soterrada dentro da bunda.
Remexo-me no sofá ao presenciá-la jogando o quadril para
trás para colocar seus pertences dentro de uma bolsa de praia —
não a havia notado, deve tê-la pegado antes de entrar no provador
— e empina-se, quase como se fizesse de propósito para me
provocar. E se tratando dela, não estou eliminando essa hipótese.
Meus olhos vagam pela musselina translúcida cobrindo seu corpo
delgado. Afunilo as pestanas, examinando minuciosamente sua
escolha de biquíni somado à saída.
É, sim, uma provocação, defino. No momento em que se vira
para mim, posso ver por trás do tecido fluído a parte de cima do
biquíni. Ele é bem menor do que o que provou antes, cobrindo um
pouco os mamilos.
— Você sabe que não é a porra de uma praia de nudismo?
Isso não é um biquíni, é um pedaço de tecido costurado para
parecer um — rosno, a pele de minha testa começando a doer
devido aos vincos.
— Ele ficou ótimo em mim. — Gravity argumenta, alçando os
braços ao lado do corpo, girando na minha frente para se exibir.
Minha mandíbula trinca.
— Escolhe outro. O primeiro estava ótimo e não era tão
indecente.
— Já escolhi e é esse. — Ela me encara com as duas esferas
marrons vitrificadas.
— Você gosta de me arranjar problemas — murmuro atrás
dela, marchando.
— Te arranjar problemas? — Engasga com uma risada
comovida. — É você quem está agindo como um lunático
possessivo. Nós temos um contrato, não é um casamento de
verdade! — irrita-se, e rapidamente cubro sua boca com minha mão,
empurrando as palavras de volta quando vejo o grupo anterior nos
rondando. — Que porra! — grita, afastando minha mão com a força
do seu bramido. — Não estamos no século dezoito. Você não pode
me reivindicar ou dizer como me vestir, entendeu?! — reitera, as
narinas dilatando de acordo com a irritação atingindo seu ápice.
— Se algum engraçadinho mexer com você, teremos
problemas — advirto, assistindo por cima dos seus ombros, através
das vitrines, alguns homens e mulheres com suas câmeras a
postos.
Um chiado escapa por entre meus dentes quando percebo que
fomos cercados por paparazzi.
— Merda. — Suspiro, meus orbes se revirando para o circo
sendo montado lá fora.
— Que foi? — Gravity vira o pescoço na direção onde minha
atenção se concentra. Ela se volta para mim, compreensão
atingindo sua fisionomia. — Podemos despistá-los?
— Eles só querem provas visuais de que estamos juntos —
elucido, dividindo a visão entre ela e o aglomerado de fotógrafos se
amontoando.
Faço uma varredura ao nosso redor e me aproximo de uma
baia de chapéus de praia. Gravity anda atrás de mim, como se
tivesse compreendido meu plano sem que dissesse nada.
— Aja naturalmente — articulo com a boca, expressando tão
baixo que suspeito de ela não me escutar. Contudo, quando anui
com a cabeça, sei que entendeu.
Coloco um chapéu sobre sua cabeça e desenho um sorriso
supostamente feliz quando alinho as abas. Gravity devolve a
simpatia, a boca se abrindo e revelando os dentes retos. Minha mão
desliza pela coluna de sua garganta, e ela pisca com apreensão. Os
olhos obtusos explorando minhas feições para determinar qual o
próximo passo.
O meu é avançar, minha virilha roçando a sua com a
proximidade. Ela exala uma respiração trêmula no instante em que
dobro a base do corpo, a tomando com minha boca e sorvendo o
gemido surpreso que meu ato inesperado provoca nela.
Forço a língua em sua linha suavemente contraída pelo susto
e determino o ritmo do beijo até que Gravity enfraqueça em meus
braços. Certo de que o chapéu bloqueia grande parte de seu rosto,
trago seu corpo para junto do meu bruscamente. Minha língua
domina a sua, uma agitação sensual e asfixiante, sobretudo,
eventualmente me deixando de pau duro. Meu coração se parece
com uma rocha descendo um desfiladeiro e não existe nenhum jeito
de pará-lo.
Lidero o beijo, mas ela retribui tão avidamente que aposto
como está gostando tanto quanto eu. Suas mãos unidas cercam
minha nuca, e fecho a minha em seu pescoço, inundando-me nela
como a porra de um barril de afrodisíaco. Tento camuflar meus
pensamentos, mantê-los sob controle, mas minha vontade é afundar
meus dedos no calor úmido que se concentra entre suas pernas
nesse momento e moldá-la à minha vontade.
É ela quem me afasta. Não de maneira abrupta, mas
carinhosa. A aba do chapéu de praia fazendo sombra em seu rosto
me impede de ler sua expressão. Gravity contorna a boca com a
língua, bebendo de nossa saliva.
Meu peito infla, denunciando a respiração inquietante que
escurece minhas ideias.
Levo uma mão para seu rosto, o polegar desenhando sua
mandíbula. Minha língua traça meu lábio inferior, os dentes
cravando e puxando a carne com a força do tesão que estou
sentindo agora.
Seu corpo desestabiliza sob o passeio dos meus dedos em
sua pele. Mas não ligo para o quanto ela se torna fraca quando eu
sou o assunto. Sei o que faço com ela. Sei o que meu toque é capaz
de causar porque os anos podem ter passado, mas uma marca
como a nossa não desaparece. Ela pode me odiar pelo que fiz.
Pode detestar que seu corpo responda tão desesperadamente
quando a provoco. Porém não pode negar. E isso deve enraivecê-la.
Deve mexer com ela pra cacete.
Abro um sorriso genuíno. Gravity aceitou esse contrato pelo
dinheiro, pelo seu sonho, mas também para provar a si mesma que
não serei seu último. Só que estou muito empenhado em deixar
uma marca extremamente profunda em sua vida. Saber o que faço
com ela, mesmo que contrariada, me fornece o impulso necessário
para continuar com meus planos.
— Deve estar sendo difícil para você me beijar desse jeito e
continuar negando ao seu corpo que me quer.
— Você é ridículo — rumoreja, a carranca desfazendo o rubor
que se concentra em suas bochechas.
— Não, encrenca. Eu sou gostoso — provoco, entrelaçando
sua cintura com um braço e forçando-a de volta contra meu corpo.
— E você me quer — enfatizo-a na frase.
Embora queira me afastar, ela não pode. Os paparazzi ainda
estão do lado de fora fotografando sem parar. Admito que estou
ansioso para saber o que Ravennah publicará a respeito disso.
— Você só tem esses momentos comigo porque estamos
presos nesse contrato! — explode baixinho com a mandíbula
enrijecida de raiva, respingos de saliva salpicam minha bochecha.
— Se não fosse por ele, você nunca mais encostaria em mim,
Ashton. Não cansa de me ouvir dizer que não tem nada em você
que me atraia?
— Só o meu pau. — Rio, mantendo-a imóvel entre os braços.
— Já tive maiores.
Ondas enrugam minha testa. Sei que é uma provocação
infantil, mas falar do tamanho do meu pênis é mexer demais com o
meu ego.
— Gravity, Gravity… — cantarolo com um suspiro. — Você
anda querendo mesmo aquelas palmadas, não é, encrenqueira?
— Eu te desafio a tentar. — Estende o queixo, tenaz como sei
que é.
— Desafio aceito.
“Tudo o que eu quero fazer
É ser mais eu mesmo, e ser menos como você”
NUMB – LINKN PARK

7 ANOS ATRÁS
QUARTA-FEIRA, 05 DE JULHO DE 2017, ÀS 00H23MIN.

Passa da meia noite quando a orquestra que tocava no som


cessa e não ouço mais as vozes. Tem milhares de lápis partidos
sobre minha escrivaninha, meu quarto ainda tão infantil quanto
quando tinha cinco anos e acreditava em Papai Noel.
Conrad nunca quis que eu crescesse de fato. Acho que ele
temia que me tornar um homem me faria ver que meu pai não passa
de um covarde abusador.
Desde criança fui educado dessa forma. Levando uma surra
após outra. Se não obedecesse. Se tivesse pesadelos e fizesse
birra para dormir com minha mãe. Se quisesse algo de Natal e não
conseguisse compreender o porquê de não poder ter também
apanhava.
Admito que nunca fui uma criança tranquila. Sempre gostei de
fazer arte. Alex e eu vivíamos nos atracando, desde moleques, e
meu pai incentivava nossa competição.
Quem fosse melhor na escola, ganhava o que quisesse. Fosse
um presente ou uma boa quantia em dinheiro. Aquele que se
destacasse em qualquer área, era sempre premiado. Eu nunca fui
bom, entretanto. E cresci consciente de que nunca seria em nada.
Segundo meu pai, se tivesse sucesso em algo, seria por sorte.
Não duvido em nada dele. São poucas as coisas que realmente me
empenho para fazer dar certo. E para ser honesto, foram as coisas
que meu avô costumava me ensinar que ganhavam minha devoção.
Sem Rain, estou perdido.
Não sei por que ainda o temo como uma criança. Mesmo
depois de todo esse tempo sem me tocar, ainda tenho a mesma
sensação de minhas entranhas estarem retorcendo a ponto de o nó
ser irreversível.
A bile sobe à garganta no instante em que ouço a escada
ranger com o peso de seu corpo. O que me leva de volta à última
surra, e, por um ato de rebeldia, peguei seu carro e dirigi para a
escola. Tirei onda com a porra da Lamborghini que seria presente
para Alex. No fim das contas, acabei sendo pego pela polícia e,
além disso, estava embriagado e com algumas gramas de maconha
no porta-luvas.
Tudo bem, talvez eu não tenha desandado por completo só
depois de Nicola. Era um fracasso mesmo antes dela. Ter ficado
comigo por interesse só provou quão inútil sou para as pessoas. O
quanto meus sentimentos são inválidos e o que é importante para
mim, não tem importância para mais ninguém.
A porta se abre e fico de pé por instinto. Meu pai está com os
olhos arregalados, a fúria o sucumbindo. Veias protuberantes
saltando da coluna da garganta.
Minha respiração desenfreada entorpece minha consciência.
Sinto-me extasiado e letárgico quando, sem esperar, recebo o
primeiro tapa no ouvido. O zunido se estende por longos segundos,
meu corpo cede à força que ele impôs no impacto e caio sentado de
volta na cadeira.
— Você por acaso é imbecil?! — grita, tirando o Rolex do
pulso. Depois de deixá-lo na cômoda, avança sobre mim, me pondo
de pé diante de sua cólera. — Ainda se considera meu filho?! —
vocifera, sem conter a voz rouca se arrastando na garganta com
raiva.
Ele me segura, mantendo-me de pé, e levo outro tapa no
mesmo ouvido. O chiado dentro da cabeça me desnorteia e, por
mais que queira revidar, sinto que o único jeito de fazer meu luto se
abrandar é deixar que a raiva do meu pai me consuma.
— Seu maldito! — Uma chuva de saliva cai sobre meu rosto e
vem acompanhada de tapas e mais tapas na lateral da minha
cabeça. — Não importa o quanto tente te educar, você sempre me
decepciona! Tem prazer de me envergonhar na frente dos meus
sócios! — exclama, grita e estapeia.
Não sinto nada, no entanto. As lágrimas não caem. Vejo o
rosto do meu avô em todos os lugares e me sinto envolto em uma
mortalha. A dor que meu pai quer me infligir nem se compara a que
está arrebatando minha alma. Perdi minha esperança. Meu lar.
Conrad pode me espancar até perder a consciência e, ainda
assim, não seria doloroso o suficiente para romper a bolha na qual
estou preso desde a notícia de que meu avô se foi.
— Você não merece estar nessa família! — berra, fechando o
punho, e o desfere em minha mandíbula.
Meu corpo cai sobre a cama quando me arremessa. Estou
amortecido demais para reagir. Ouço-o desafivelar o cinto e o couro
trincar quando o dobra ao meio.
— Vou te dar uma lição que você jamais esquecerá e
aprenderá a nunca mais, em toda a sua maldita existência, me
envergonhar daquele jeito!
Meu pai tem dois metros de altura. Sou pequeno perto dele,
herdando a estatura da minha mãe, e nunca tive vontade de fazer
exercícios físicos para aumentar os músculos.
Com sua força e porte elevado, Conrad facilmente consegue
me virar na cama, deitando-me de bruços.
Escancaro os olhos, eles quase saltando dos orbes quando,
sem nenhuma antecipação do que virá a seguir, desce minha calça
e minha cueca até meus tornozelos. Congelo e, pela primeira vez,
luto para sair da armadilha. Contudo, ele dobra o joelho em minha
lombar, usando o peso de seu corpo para me imobilizar.
A primeira chibatada vem e o guincho é potente o suficiente
para sentir as paredes da minha garganta se desprenderem. O
cobre se espalha pela minha língua. Grito alto o bastante para
acordar a casa inteira, mas ninguém aparece para me ajudar.
São todos uns fodidos medrosos!
A segunda quase arranca minha pele, deixando-me em carne
viva. A aflição me dominando. Brigo entre um açoite e outro, suor
descendo por minha espinha, e o algodão da camisa o absorve. O
som afônico dos meus pedidos de ajuda sendo engolidos pelo ruído
dos golpes do seu cinto contra a minha pele. Jamais esquecerei
esse tinido sinistro da minha pele sendo repetidamente flagelada.
Mergulho o rosto contra a cama, transigente de que não
haverá intervenção divina, nem minha mãe interferirá na minha
punição. Recebo tudo, mastigando a dor, sorvendo os rangidos dos
meus dentes trincados e torcendo para que a próxima seja a última.
Prendo os lençóis da cama entre os dedos, clamando e sufocando
os sons do meu desespero no colchão.
Quando o martírio acaba e não sinto a próxima cintada pelo
intervalo de um minuto, descolo o rosto da cama, virando-o por um
milissegundo para flagrá-lo dobrando as mangas da camisa. A
transpiração manchando sua peça cara e a película cobre seu rosto.
Nossos olhares se conectam por um instante.
— Você nunca mais me desrespeitará nessa casa outra vez.
Sou seu pai e mereço o devido respeito. Se não posso conquistá-lo
pelo bem, farei pelo mal.
Contraio a mandíbula com tanta força que acho que sou capaz
de estourar meus dentes.
Ele apanha seu relógio sobre a cômoda e cruza a porta do
quarto, a batendo em suas costas. Não sei por quanto tempo fico
deitado daquela maneira, sentindo-me diminuído por ter apanhado
daquele jeito. Meu pai não esfolou só meu corpo, como também
meu coração e minha alma foram corrompidos e amaldiçoados pelo
resto da vida.
Apoio as mãos contra a cama, forçando meu corpo a se
reerguer. Desabotoo a camisa e dirijo-me para o banheiro do quarto.
Evito o espelho, ciente de que as marcas, embora estejam
queimando e doloridas, não ficarão na minha pele pela eternidade.
Abro o chuveiro e me livro da última peça de roupa. Deixo a
água gelada cair para esfriar o calor se acumulando em minha
bunda e pernas.
Ainda meio trôpego, passo um pé e depois o outro para dentro
da banheira. A ardência se acumula especialmente onde a
esfolação está em carne viva.
Odeio chorar. Odeio principalmente quando choro por causa
de dor física. Odeio, sobretudo, ter sido causada pelo meu pai.
Esfrego o corpo, espalhando a água com sabão, sentindo
como se estivesse arrancando pedaços de pele, e tenho vontade de
gritar quando a dor pungente se alastra para o meu interior. Tudo
está doendo. Meu corpo. Meu coração. Minha alma.
Minha coluna prostrada, assim como minha mente em um
turbilhão, e começo a questionar a pessoa que quero ser no futuro.
Com certeza, nunca mais vou permitir que outro filho da puta me
açoite. Homem ou mulher. Não vou aceitar ser humilhado outra vez
em toda a minha vida. Preciso ser forte. Corajoso. Engolir cada
maldita lágrima, a cada vez que tentarem me ferir. Não vou
demonstrar fraqueza e não vou permitir que minha vida continue
sendo para provar o meu valor a alguém que não está prestando
atenção.
Serei tão amargo quanto a vida que estou deixando para
trás.
“Obcecado, você me olha atentamente, mas eu gosto disso
Possessivo, você não é meu, mas insinua isso”
HEARTBEAT – ISABEL LAROSA

NOVA YORK, NY.


DIAS ATUAIS
SEGUNDA-FEIRA, 19 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 18H43MIN.

THE NEW CELEBRETIES


FIM DE SEMANA AGITADO EM MIAMI PARA O
BAIXISTA DA THE RECKLESS
Por Ravennah Hollow, publicado há 5h.
Ashton está em um novo relacionamento amoroso e teve um
fim de semana bastante agitado na Flórida ao lado de
Gravity.
Os pombinhos foram fotografados diversas vezes fazendo
compras na Lincoln Road, tomando sol em Hollywood Beach
e, para finalizar a noite de domingo, saíram para comer e
dançar. Ashton e Gravity foram vistos conversando, sorrindo
e trocando carinhos no The Ball and Chain, no famoso bairro
Little Havana.
A internet está em polvorosa com o possível primeiro
relacionamento sério do astro. Sobretudo porque seus
últimos envolvimentos não tiveram duração de mais de
quarenta e oito horas. E os que duraram, não passavam de
diversão.
Nem Gravity nem a equipe da The Reckless esclareceram
os rumores de a moça ser a nova estilista do grupo,
entretanto, muito nos chama a atenção. Ao que parece, o
baixista de uma das maiores bandas de rock da atualidade
não se contenta com relacionamentos fáceis.
A trajetória de Gravity e Ashton começou anos atrás, quando
a banda tocava em cidades vizinhas de Humperville e bares
locais. Fontes próximas aos dois afirmaram que o fim do
relacionamento de Gravity e Ashton se deu devido a uma
traição do bad boy em uma viagem que realizaram para
Paris em meados de 2020. Recebemos fotos dos dois juntos
na época e até mesmo uma confidência de que o pivô da
separação tenha sido sua ex-namorada e modelo, Nicola
Fox. Todas essas informações nos foram trazidas
espontaneamente.
Lembrando que não estamos aqui para condenar ou ofender
ninguém. O TNC tem como objetivo apenas informar e
manter o mundo das celebridades em constante atualização
para vocês, fãs.
Tentamos contato com a equipe de assessoria de imprensa
do grupo para agendarmos uma entrevista com o casal que
tem dado o que falar nas redes sociais, porém, a resposta
foi de que eles preferem manter o relacionamento mais
privado, por enquanto. O que deu a entender que as
especulações são reais.
Ashton Baker não é mais um solteirão cobiçado, e pode ser
que Gravity tenha encontrado uma maneira de perdoá-lo
pelo passado e recomeçar sua história de amor.
Só podemos desejar a eles felicidades!
Desabo na cama, sentindo os membros do meu corpo
quebrarem aos poucos. Theresa cantarola atrás de mim, recitando a
maldita reportagem publicada por Ravennah Hollow. Soube da
matéria no minuto em que Ashton e eu estávamos no jatinho, mas
me recusei a ler até estar no conforto de casa. Foi um dia
extremamente cansativo e me perguntei como eles dão conta de
manter as feições intactas, mesmo que o corpo esteja exigindo
descanso.
Durante nossa passagem por Hollywood Beach, encontramos
mais fãs. Ashton parou e tirou fotos com todo mundo, e também
autografou braços, costas e colo. Pagou até uma água de coco para
eles e a história se repetiu quando estávamos em Little Havana.
Minhas bochechas estavam comichando, doloridas de tanto me
esforçar para sorrir a todo momento. A melhor parte foi não termos
tempo nenhum para brigar porque estávamos sendo cercados e
seguidos por fãs e paparazzi.
Quando chegamos ao hotel, deitamos na cama e não houve
nada além de um suspiro longo exalando de nós dois até finalmente
nos entregarmos ao cansaço.
Foi a mesma coisa para embarcarmos em Miami e ao
chegarmos ao aeroporto de Nova York. Entradas abarrotadas de fãs
fazendo fila, esperando pelo momento em que teriam a chance de
tirar uma foto com ele. E Ashton não foi embora enquanto não
atendeu a todas aquelas pessoas. Mal estava conseguindo parar de
pé nos meus saltos e a maquiagem já completamente deteriorada
por causa do calor não me animou a fazer parte daquilo.
Fiquei dentro da van, uma parte de mim se convencendo de
que estava cansada enquanto a outra dizia que nunca havia
imaginado estar em meio a tudo aquilo e preferiria continuar sendo
anônima. Mesmo que para crescer no meu nicho precise ficar um
pouco mais conhecida, preferiria que não estivesse a um nível tão
elevado quanto a The Reckless.
Nossas fotos pipocam na internet. E foi preciso reunir toda a
coragem do mundo no percurso do aeroporto até em casa para
conferir minhas redes sociais. Estou com quase cem mil seguidores
no Instagram e duzentos no Twitter. Em cada foto que publiquei em
meus stories na noite passada, por insistência de Avalon, milhares
de respostas diferentes surgiram na minha caixa de mensagens.
Algumas pessoas são simpáticas e demonstram apoio, outras
dizem que só estou tentando ganhar meus cinco minutos de fama.
Embora devesse ficar chateada, não consigo porque, no fundo, elas
estão certas. Estou usando dessa oportunidade para conseguir
avançar os degraus que foram roubados de mim. E não, não
consigo me sentir culpada por isso.
Algumas pessoas, como eu, levam anos para conseguir uma
chance, e outras acabam nem conseguindo e desistem no caminho.
Você só sabe como é viver de um sonho quando lutou demais
por ele e não viu nada de diferente acontecer. Fiz os melhores
cursos, com as pessoas mais importantes do ramo, mas perdi minha
identidade quando fui para Milão e me deparei com a dose mais
sombria do mundo no qual tentava ingressar. A competição pode
enlouquecer. Tentar ser o melhor o tempo todo pode mexer a níveis
irreparáveis com sua sanidade.
— Ele se comportou?
Theresa senta-se à beira da cama. Elevo brevemente o rosto
do colchão para fitá-la por trás da cortina de cabelos.
— Quando é que ele se comporta? Parece que estou lidando
com um quintanista do ensino fundamental. — Bufo, e volto a
mergulhar o rosto no edredom com cheirinho de amaciante.
Ouço sua risada rouca.
— Tão ruim assim?
— Ele dá em cima de mim a cada cinco segundos em que
estamos juntos.
— Ashton quase nunca entende a palavra “não”. Precisa ser
mais dura com ele — aconselha, e dirijo minha atenção para ela.
Uma risada constipada me escapa.
— Tenho sentido que sou fraca em comparação a ele. Ashton
tem as maiores artimanhas para usar contra mim…
Minha mente viaja para nós dois no provador, quando, por um
minúsculo momento, quis que a raiva entre nós dois fosse uma
conexão, e não um empecilho. Porque o ódio é a única certeza que
carrego.
A mágoa e o rancor são ímpares, o que nos move e nos
mantêm nessa briga.
Ele tem seus motivos, e eu os meus, e nenhum de nós está
sendo “exagerado”. Entendo o porquê de ele estar com raiva e
tenho certeza de que Ashton também entende a minha, e nós
apenas abraçamos essa catástrofe como tem que ser.
— Por exemplo…? — Endireita a postura, demonstrando
interesse.
Levanto-me, ignorando o cansaço e o latejamento na sola dos
pés.
— O toque — confesso, com uma carranca formando rugas
em minha testa.
Nivelo meus olhos a altura dos dela, sinceramente exausta de
não ter alguém com quem me abrir de verdade. Estou em Nova York
há um ano, lutando contra mim mesma para provar que sou forte e
não preciso de companhia. Mas estou presa a alguém que eu odeio
e que, por pura ironia, consegue despertar meu corpo, e preciso
falar sobre isso.
— Quando ele me toca, tem o meu ponto fraco nas mãos. E,
então…, fico com raiva dele por me provocar e de mim, por ceder.
Ele é obcecado, possessivo, traidor, mulherengo — enumero com
os dedos —, e muito provavelmente está tramando para sair por
cima. Porque é o tipo de coisa que o Ashton faz. Ele é assim. Ele é
totalmente errado e não posso confiar nele!
A cada palavra, Tess arregala mais os olhos. Apesar disso, a
expressão inabalável em seu rosto não muda. Até quero arriscar
que está entediada me escutando, mas ignoro essa parte para
minha mente não me sabotar.
— Acho que você ainda tem sentimentos por ele que não
foram resolvidos — depõe, empurrando uma madeixa de cachos
para trás. — Você gostou dele naquela época?
— Não. Quero dizer, não sei, acho que um pouco… Talvez. —
Atropelo as palavras, me sentindo presa novamente contra a
parede, e todos os sentimentos que Tess disse que não tenho
resolvidos tornam-se cada vez mais aparentes.
— Não sabe ou talvez?
— Não sei!
— Tudo bem. O primeiro passo é entender o que você sentiu
por ele antes e o que está sentindo agora, mas, na minha opinião,
pelo que conheço de Ashton, ele não liga. Ele preferiria mil vezes te
magoar a admitir que gosta de você e está te tratando dessa
maneira para provar o contrário. Não acredito que ele tenha
problemas para admitir a si mesmo os verdadeiros sentimentos. Ele
sabe o que sente, só não quer que você saiba que o afeta.
— Uau... — Suspiro, encarando-a com os olhos se
arregalando pela sua análise. — Você sabe ler as pessoas. Quando
Effy me contou, achei que estava exagerando.
Um sorriso pretensioso afina seus lábios.
— Sou bastante observadora. É o que eu aprendi a fazer pelo
tempo em que namorei Zach. Ele era difícil de entender, e eu
passava muito tempo o analisando antes de tomar qualquer
decisão. Se tornou uma bela de uma habilidade. Mas, no meu ponto
de vista, Ashton precisa resolver milhares de questões sobre ele
mesmo antes de decidir se envolver com qualquer pessoa —
argumenta, e eu não poderia concordar mais. — Ele não machuca
ninguém de propósito, mas não quer dizer que isso não seja ruim.
Falo por mim. Por causa de tudo que passei no meu antigo
relacionamento, acabei magoando o Chase diversas vezes. Para
conseguir admitir que estava pronta para seguir em frente, precisei
revisitar o passado e enfrentá-lo, mas também deixá-lo ir.
— Não acho que tenha gostado dele o suficiente para que isso
durasse tanto tempo. Foi ele ter mentido para mim que doeu —
reflito, relembrando do dia em que o peguei com Nicola naquele bar
em Paris. — E ele nunca se desculpou porque nunca se
arrependeu.
— Quer meu conselho?
Aceno positivamente.
— Se você quer seguir adiante com o contrato, precisa perdoá-
lo, mesmo que ele não tenha demonstrado interesse em conseguir
esse perdão. Porque você precisa. Está presa a esse sentimento e
o deixando te confundir! E sobre o toque… — Tess abre um sorriso
genuíno. — Merda, você não é de pedra, entende? É claro que se
ele souber onde te tocar, você vai ficar com tesão e se confundir.
Quando Chase e eu começamos a sair, foi exclusivamente por
atração física, não por sentimento.
— E o seu conselho é… — Semicerro os olhos, esperando.
— Imponha um limite. — Sacode os ombros, um desdém
evidenciado. — Você pode colocar um se realmente só estiver
ficando confusa por estar magoada com ele. Primeiro, o perdoe e
depois, defina até onde ele pode ir com você. Ashton pode ser um
babaca, mas não vai te forçar a fazer nada que não queira. Se ele
está investindo tanto tempo em você, é porque acredita que pode
conseguir alguma coisa, e se não quer que esse relacionamento
ultrapasse o profissionalismo do contrato, basta esclarecer.
Ver a minha situação através de Theresa torna as coisas muito
mais simplórias para mim. É quase como se eu realmente estivesse
colocando mais importância nisso do que merece ter.
Abro um sorriso de gratidão. Não sou boa nesse lance de
amizade. Faço muitos amigos, mas com a maioria, escolho contar
certas coisas e outras não. Aprendi a guardar segredos, me adaptar
a situações e pessoas como uma camaleoa. Não estou acostumada
a ser honesta e pedir conselhos. Mas Tess transmite confiança e
tem uma inteligência emocional que me espanta.
Mackenzie é minha melhor amiga, sempre será, mas não faço
ideia de como reagiria se contasse a verdade para ela. Talvez esse
seja o ponto. Acho que é mais fácil me abrir com Tess porque não
me importo com o que ela pensa de mim, mas se Mack ou Effy me
vissem de maneira diferente, aí sim, me quebraria.
— Obrigada, Tess.
— Por nada. Pretende ficar em casa hoje? — Começa a se
arrastar para fora da cama.
— Sim, e você? Aliás, por que não está no escritório?
— Muitas horas extras! — Ri, se direcionando para a porta. —
Preciso estudar um pouco antes, mas podemos pedir comida, beber
e jogar conversa fora. O que acha?
— Acho perfeito, obrigada.
— Está bem, você escolhe o filme. — Envia uma piscadela
antes de cruzar a saída.
Quando não vejo mais nenhum sinal dela e ouço a porta bater,
estendo a mão para pegar meu telefone na mesa de cabeceira. Meu
dedo zapeia pela lista de contatos atrás do número de Ashton.
Troquei seu nome na lista para “Traidor”; na época, pareceu
ótimo. Uma forma de convencer ao meu cérebro o quanto ele não
merecia meu perdão, mas Tess tem razão. Preciso me libertar dessa
mágoa. Ela está me sentenciando.
Pressiono sobre “Traidor” e levo o celular até o ouvido. Ouço o
primeiro toque, o segundo e o terceiro…
— Que foi, encrenqueira?
— Eu te perdoo — expresso, movimentando a cabeça
positivamente, ainda que não esteja por perto para ver. — Por ter
mentido e me traído em Paris.
Sua gargalhada ressoa na linha, e meu coração espreme
dentro do peito.
— Participou de algum retiro espiritual online ou algo assim?
— Não. Só decidi que para dar certo, preciso te perdoar. Ainda
que você não tenha se esforçado para receber meu perdão, quero
ser superior e fazê-lo assim mesmo.
— Hum, entendi. Ser superior.
— É isso. Então, tchau.
— O que te faz pensar que me perdoar irá mudar alguma
coisa?
— Não estou buscando sua aprovação, Ashton. Só quero ficar
bem comigo mesma.
— Na minha sincera opinião, você está ótima. Até aceitou esse
contrato para conseguir fama e dinheiro. Por que alguém que se
sente mal por minha causa faria uma coisa dessas?
— Esse assunto de novo? — Bufo, minha voz se erguendo
gradativamente. — Você precisa aceitar, porra.
— Só fiz uma observação. Fica calma, encrenca.
Inalo uma respiração pesada, piscando suavemente para
minha mente não implodir. É impossível conseguir chegar a
qualquer lugar com Ashton. Ele é rancoroso e principalmente
cabeça dura demais para tentar ser qualquer coisa melhor do que
um homem desprezível.
— Vamos sair para jantar? — sugere, e noto um farfalhar do
outro lado da linha, como se estivesse retirando as roupas. —
Comemorar sua superioridade, que tal?
— Já tenho planos.
— Espero que esses planos não comecem com a letra L.
Ouço-o ranger os dentes e, confesso, uma parte amarga de
mim gosta de provocá-lo.
— Se forem, não é da sua conta, certo? Teremos um
casamento por conveniência, nada mais do que isso.
— Perante o juiz de paz e o mundo, você será minha. Cancele
os planos. Você vai sair comigo.
Uma risada sarcástica sai de mim.
— Já disse que tenho planos para hoje. Só preciso sair com
você para cumprir nosso cronograma de encontros e não recebi
nada de Avalon.
— Você me conhece há anos e ainda não entendeu nada? —
Suspira, estalando a língua no céu da boca. — Quem dita as regras
sou eu. Portanto, eu te pego às oito. Esteja pronta e se não estiver,
por mim tudo bem te levar para sair de pijama. E se não cancelar
com ele, vou te encontrar onde quer que vocês estejam.
Ashton encerra a ligação, deixando-me transtornada. Encaro a
tela do celular, o tempo de dez minutos marcando o quanto nos
falando.
Exalo, trêmula, me decidindo se vou ceder a ele mais uma vez
ou simplesmente mandá-lo ir se foder.
Meus planos com Tess, pelo jeito, foram por água abaixo.
“Você diz me odiar
Mas me diz coisas que ninguém sabe”
EYES DON’T LIE – ISABEL LAROSA

Vertigem se acumula na base do meu estômago. Cogito voltar


para o apartamento ao conferir o horário e perceber que levei um
bolo horroroso. Não que estivesse animada para sair com Ashton,
na verdade, fiquei mais intrigada do que qualquer outra coisa.
Se tudo que sente a meu respeito é ódio, elaborar um jantar
comigo é a última tarefa que colocaria em sua lista para hoje. Deve
ser por essa característica que Ashton sempre me atraiu. Seu modo
descomplicado de fazer as coisas. Não que esteja sendo simples
ultimamente, mas lembro que uma das particularidades que me
fisgava era como gostava de deixar seus relacionamentos
esclarecidos. Não me sentir confusa a respeito de nós, a única coisa
clara determinada em minha vida, sempre me instigava a querer
estar com ele.
Encaro os tênis Air Force brancos, a barra da calça de
moletom cinza se agarra aos tornozelos e minha camiseta alongada
pink com uma margarida bordada ocupando o canto superior
esquerdo.
Estou inimiga da moda, especialmente porque meu objetivo
não é ficar bonita. Não quero que Ashton pense que me arrumaria
para encontrá-lo e no minuto em que me vir, saberá que esse era o
meu último plano para esta noite. Embora tenha me esforçado tanto
para ficar mal arrumada, esse encontro, felizmente, não irá
acontecer.
Averiguo a rua novamente, não só para ter certeza de que ele
não está se aproximando, mas para garantir que nenhum paparazzo
está escondido nas moitas em torno do prédio.
Quando Wade me deixou horas atrás, fui fotografada enquanto
arrastava minha mala pelo saguão e o segurança do condomínio
disse que passaram quase o dia todo rondando o edifício. É
assustador e ao mesmo tempo me pergunto como a mídia irá reagir
quando a notícia do nosso noivado chegar.
Prestes a subir as escadas e voltar para dentro, ouço distante
o ronco de uma moto. Reconheceria o estrondo de uma Ducati em
qualquer lugar. Neil era apaixonado por motos e aprendi quase tudo
sobre elas quando começamos a namorar. Ele me ensinou,
inclusive, a pilotar e foi uma experiência incrível, mesmo que nunca
tivesse tido vontade de tirar carteira.
Detenho os passos quando o modelo Streetfighter V4 S preto
com detalhes em cobre estaciona perpendicular ao paralelepípedo.
A moto saindo alguns centímetros do chão com a freada brusca.
Friso a testa, esforçando-me para decifrar o rosto por trás do
capacete também preto, combinando com a pintura da Ducati. No
momento em que o piloto abaixa os braços do guidão, estudo a
jaqueta grossa preta com o nome “Ashton” bordado em branco. Ele
retira as luvas e depois o capacete. Os cabelos como carvão
bagunçando com o atrito.
Cruzo os braços, não estou nem espantada que tenha decidido
ser barulhento em sua chegada. Ashton ama atrair atenção para si.
Chega a ser irritante o quanto se empenha para ser adorado.
Meus olhos rolam de tal maneira que quase afundam em
minha cabeça. Dou passos crédulos em sua direção, ainda com um
braço enganchado no outro. Desdém embalando minha face.
— Está atrasado.
— Você também está. — Seus olhos viajam pelo meu corpo,
dissecando minha aparência desleixada.
— Você disse que não se importaria de me arrastar para um
jantar de pijama. Já que é assim, pensei em ir de boa vontade desse
jeito.
Solto os braços para os lados, ostentando as roupas que eu
jamais usaria em um encontro.
— Não importa o quanto se esforce para ficar feia para mim,
encrenca. Você continua deslumbrante.
Corrijo a postura, baque me atingindo em cheio. Ele está
insuportavelmente sendo generoso. O que, vindo dele e
considerando os discursos de ódio que me desferiu no fim de
semana, só consegue levantar suspeitas.
Aproveito os instantes de silêncio para explorá-lo. Além da
jaqueta grossa, que geralmente pilotos de corrida usam, Ashton
traja uma calça do mesmo material. O perfume viril faz um
amálgama com a olência de couro e menta, meus pulmões se
fechando para a fragrância, não porque é ruim, e sim porque eu
adoro e me atordoa ter que suportar.
Ashton estende a mão para me alcançar, entretanto, esquivo
do agarre. Seus olhos gravitam até mim, censura escurecendo as
íris foscas. Poupo ar, sondando suas intenções ao avançar meio
centímetro de distância. No momento em que está perto o suficiente
para não conseguir evitá-lo, seus dedos cercam meu pulso. Minha
pele queima com o toque como fogo alastrando por minha carne.
Ele me move em direção ao seu corpo, o solavanco quase nos
colidindo violentamente. Usa um pé para se manter sobre a moto
enquanto encaixa o outro joelho entre minhas pernas.
— Ainda bem que não exagerou no penteado. Ia estragar tudo.
Gargalha, austero, encaixando o capacete que estava em sua
cabeça na minha. Ele aperta a ponta do meu nariz com o indicador,
afundando-o dentro, e fecha a viseira com um estrépito.
Não fiz nada de especial no cabelo. Apenas o enrolei no alto
da cabeça e usei os próprios fios para amarrá-lo em um coque.
Alguns filetes caindo ao redor do rosto e o emoldurando.
— Sobe aí, quero te levar num lugar.
Não tinha notado o outro capacete na dobra de seu cotovelo.
Vejo tudo sob uma borda escura, devido ao insulfilme preto na
viseira.
Ele posiciona o capacete na cabeça, o ajustando, e assume o
guidão, ligando o motor.
Avalio por uma fração de segundo minha última chance de
mandá-lo à merda, voltar para dentro e só me encontrar com ele
quando for uma obrigação contratual. Porém atravesso a perna no
assento, atrás dele, e agarro as alças atrás.
Nem ferrando que vou abraçá-lo.
No entanto, Ashton só se importa com o que ele acha que
deve acontecer. Suas mãos voam para trás e aterrissam em minha
cintura e, com o impulso delas na base, arrasta-me pelo assento até
que minha virilha esteja colada em sua lombar. Ele tateia meus
braços e encontra meus dedos enterrados nas alças de metal. Não
tento medir forças com ele quando entrelaça meu pulso direito e
divaga até que minha mão esteja espalmada sobre seu abdômen.
Um suspiro rompe a dureza em meu peito, a respiração
afunilada extraindo em curtas golfadas de ar. Ainda que o capacete
impeça o seu cheiro de alcançar minha consciência, é como se o
tivesse gravado, e estremeço sob a memória. Perfume masculino
amadeirado, menta e couro.
Ashton acelera, a aragem fria açoitando minha pele. Sinto-a
formigar sob os cortes fundos do vento sendo rompido pela
velocidade. Não sei a quantos quilômetros por hora estamos, mas
imagino que o suficiente para o ar ficar ameno e ter dificuldade para
inalá-lo.
Sou forçada a soltar a outra mão da alça, unindo-a a que está
na barriga dele, e o agarro com tanta força que meus músculos
doem. Só então percebo que acelerou de propósito, para me impelir
a me prender a ele como se minha vida dependesse disso. Ele
reduz a velocidade quando nos deparamos com o engarrafamento.
Acelerando outra vez, trinchamos alguns carros pelo caminho,
buzinando para alertar suas manobras de risco nessa coisa.
Alcançamos o primeiro sinal vermelho, e ele desce um pé para
sustentar a moto. Sinto os tremores involuntários envolvendo meus
músculos.
Adrenalina bombeia uma nova sensação, se espalhando por
meu corpo. Minha vida ficou monótona nos últimos anos, quase
como se tivesse estagnado. Mas desde que Ashton voltou para ela,
apenas há algumas semanas, tenho a estranha sensação de estar
vivendo outra vez. Brigando o tempo todo, lutando por um propósito,
mas ao menos tenho tido algumas emoções, coisa que parece que
morreu em Milão junto da minha autoconfiança.
Calor cobre minhas mãos quando Ashton pousa a sua por
cima, áspera por causa da luva de motoqueiro. Ele acaricia por
entre meus dedos com a ponta dos seus. Estoco ar nos pulmões, o
peito inflando à medida que sua mão percorre meu antebraço e
entremeia os dedos nos meus.
Ainda que esteja com uma camada grossa de material que me
impede de ter contato físico com ele, meu coração se torna uma
bola demolidora de sentidos. A frequência cardíaca se eleva e
atinge o pico, tão profundamente que sinto na entrada da garganta.
A aflição me consome e tento separar nossos dedos, mas, então, o
sinal fica verde, e Ashton arranca com a moto, pneu cantando e
fumaça crescendo atrás de nós.
Escovo a lateral do rosto com o capacete em suas escápulas.
Não sei qual é nosso destino, mas a alta velocidade está me
enervando. Pressiono as pernas, as rótulas dos meus joelhos
afundando nas laterais das suas coxas. Agarro-o com mais força,
suprimindo as sentenças da minha mente porque estou ofertando a
ele exatamente o que quer.
Ashton dirige por mais um tempo. Estou esperando parar em
um restaurante, mas quando crio coragem para erguer o queixo e
assistir por sobre seu ombro, vejo a ponte do Brooklyn se aproximar.
Ele faz uma curva fechada, entretanto, mudando o trajeto.
Adentramos uma rua com prédios, movimento nelas por bares
e lanchonetes. Não conheço o lugar, Nova York é grande demais e
passei o último ano sendo cativa de Magdalene, presa naquele
ateliê como sua assistente pessoal, então não sei exatamente o que
encontrarei nesse lugar.
Ele faz outro desvio, o pneu ruindo com o bronco, e descemos
a rampa de um edifício. O portão da frente se abre para nós e
arregalo os olhos para o estacionamento no subsolo, guardando
vários carros de luxo em suas vagas.
Os pneus tiritam contra o chão de linóleo, e Ashton cruza as
pilastras como se estivesse em uma competição automobilística
dinâmica. Ele freia de súbito, parando em uma das vagas, mais uma
vez a traseira da moto zarpando alguns centímetros do chão antes
de aterrissar de volta com um estampido.
Salto da garupa, arrancando o capacete com raiva.
— Você dirige feito um maluco! — brigo, empurrando o
capacete contra seu peito.
Ashton desce, retirando o seu próprio e segurando o meu nos
braços. Há um sorriso trincando seu rosto e quero muito bater nele
por estar achando graça em colocar nossas vidas em risco.
— Aposto que só está se justificando.
— Me justificando?
Paro, as sobrancelhas franzindo com sua acusação.
— Por ter estado agarrada em mim o tempo todo. Pode admitir
que estava se aproveitando.
Ele ilustra, abraçando o próprio tronco. Minha respiração
afiada enche o ar.
Deus, eu estou pagando por todos os meus pecados com ele.
É tão irritante que o rubor aquecendo minhas bochechas sou eu
atingindo o extremo da minha paciência.
Rolo os olhos para o comentário, andando em direção à placa
que indica um elevador.
— Aonde você vai?
— Sair daqui. E só falar com você quando for uma exigência.
Não sei por que concordei.
— Quero te mostrar uma coisa. — Ouço os passos apressados
atrás de mim. O soalho dos coturnos em seus pés permeando pelo
estacionamento.
— O que quer que seja, não estou interessada.
— É importante.
— Ah, sério? — Rio com ironia. Avisto as portas de metal e
marcho no sentido delas. — Não acredito em você — rujo.
Aperto o botão para chamar o elevador e cruzo os braços
enquanto espero.
— Nós vamos morar aqui.
Ashton fisga minha atenção, e viro o rosto em direção a ele.
Estudo a expressão para encontrar qualquer vestígio de que esteja
mentindo, mas está sério.
— Nós?
— Está no contrato.
— Sim, mas...
— Já escolhi o lugar.
— Você escolheu? — interpelo, boquiaberta, as portas se
abrindo para nós no mesmo instante em que uma ruga atravessa o
centro de minha testa.
— Sim. Já que vou pagar por ele, nada mais justo do que eu
decidir.
— Tanto faz. Se você é quem decide, por que tenho que estar
aqui?
— Tem razão. — Ele balança os ombros, desinteresse
recaindo sobre eles. — Mas você me ligou e pensei: por que não?
— Nós dois sabemos que você não se importa com o que vou
achar do apartamento.
— De novo, você está certa — debocha, atravessando as
portas e inserindo um cartão dourado em uma fissura do painel. —
Mas, se não percebeu, o tempo está passando.
Sigo-o para dentro do elevador, e ele pressiona um botão para
liberar o andar. Presumo que Ashton encontrou um lugar tão
luxuoso quanto a casa que vive hoje com os outros.
— Já que não consigo me livrar de você, preciso levar essa
porra a sério.
Ele, enfim, consegue fisgar minha atenção de verdade. Seu
rosto esculpido em ondulações de insatisfação.
Ashton continua se negando ao fato de que precisa que esse
relacionamento funcione. A reputação dele, assim como a garantia
de ter o seu lugar protegido dentro da banda, depende do sucesso
ou fracasso da sua imagem pessoal. Gostando ou não, a banda não
está vendendo apenas música e entretenimento, os fãs estão
emocionalmente ligados a eles, e, pelo que vi neste fim de semana,
são as únicas pessoas pelas quais Ashton está tentando ser uma
pessoa diferente. Se ele for mudar sua atitude em algum momento,
não terá nada a ver comigo ou por consideração a mim.
— Precisamos elaborar uma história — continua o discurso,
retirando as luvas e as guardando no bolso da jaqueta. — Quando
fornecermos entrevistas ou alguém importante perguntar como foi
que isso aconteceu — enfatiza, apontando dele para mim e de mim
para ele —, precisamos de algo crível.
— Essa é fácil.
Ashton arqueia uma sobrancelha para mim, interesse
moldando suas feições.
— Você sempre foi apaixonado por mim e, quando nos
reencontramos, eu não quis ter nada com você, portanto, estava
suportando a dor da rejeição dormindo com todas as mulheres que
conhecia. Até que, quando Magdalene me demitiu e a The Reckless
decidiu me contratar como estilista por me conhecer e confiar no
meu trabalho, me deu uma chance, e nós nos aproximamos
enquanto trabalhávamos juntos — falo sem parar, nem mesmo lhe
dando a chance de contestar. — Passamos a conviver mais porque,
mesmo sendo próxima de Tess, evitava você. E, embora nosso
noivado seja repentino, é o seu jeito desesperado de provar o
quanto é louco por mim! Antes de aceitar me casar, você pediu
várias vezes, até que tomei a decisão porque eu também me
apaixonei de verdade — encerro minha narrativa, mas Ashton
explode em gargalhadas.
Espero que a erupção de risos termine, mas minha fisionomia
não atenua para ele. Estou tentando encontrar qual é o problema
em minha história. Para mim, ela é lógica.
— Sempre fui apaixonado por você? — pergunta, com a risada
ainda influenciando no tom. — Ninguém vai acreditar nessa porra.
Um homem apaixonado não trepa feito um maluco por aí como eu
estava fazendo. Vão sacar na hora. Esse romance só acontece nos
filmes!
— Ao menos você sabe — sussurro, encarando-o com
perplexidade. — Tem outra ideia? Estou ouvindo.
As portas abrem, revelando um hall profundo. E as luzes
brancas acendem no minuto em que Ashton dá o primeiro passo
para fora do elevador.
As paredes do vestíbulo estão revestidas com artes em óleo
sobre tela. Arandelas pregadas entre elas e o lindo piso de mármore
branco refletindo meu espanto diante do lugar. Quanto mais fundo
mergulho no apartamento, mais acredito que nunca poderia pagar
pelo aluguel de um lugar assim.
A sala imperiosa com imensas janelas por toda a extensão
frontal, a vista da Estátua da Liberdade e da ponte do Brooklyn e
suas luzes assim como a lua, refletidas sobre a água. É quase como
se estivesse à orla, de tão perto que ficamos da região.
Um suspiro irrompe de mim, fluindo afetado por entre meus
lábios. São necessárias três luminárias pendentes no pé direito
duplo da sala para iluminar o ambiente. Adjacente a ele, está a
cozinha, com eletrodomésticos de aço escovado modernos,
armários brancos com arabescos ornamentando as portas e
puxadores em dourado. Ele já está mobiliado, com uma mesa de
oito lugares de tampo de vidro e cadeiras estofadas de um cinza
chumbo.
Meus olhos viajam entre a torneira dourada da pia para o meio
da sala, onde Ashton está jogado sobre o sofá branco, as pernas
desleixadas esticadas para frente e as mãos entrelaçadas nas
costas da cabeça. Confino outro suspiro porque não quero que ele
saiba que conseguiu me impressionar com a escolha.
Atravesso a sala em direção ao próximo cômodo. Nenhuma
parede fazendo divisão no primeiro piso do apartamento. Do outro
lado, presumo que seja a sala de descanso, um piano de calda
longo ocupa metade do compartimento, instrumentos como guitarra,
baixo e violão presos à parede. Uma minibiblioteca com livros de
fantasia e romance de época pregada sob a escada caracol de
mármore com guarda-corpo de vidro. Minha cabeça cai para trás,
pretendendo enxergar o mezanino, embora saiba que para uma
percepção completa, precisaria subir.
— Lá em cima temos uma sala de jogos e seis quartos, todos
com suíte e closet. Um para mim, outro para você, um ateliê e um
estúdio pequeno para eu trabalhar quando estiver em casa. Os dois
quartos que sobraram pensei em deixar como de visitas. — Sua voz
está próxima da concha do meu ouvido, então giro repentinamente,
deparando-me com o peitoral robusto. — Tem academia, piscina
aquecida e sauna no prédio. Tudo para o conforto da minha
esposinha.
— Até parece… — escarneço, revirando os olhos.
Recupero o fôlego diante da sua proximidade e viro nos
calcanhares de volta à sala principal.
— Quando a notícia do nosso noivado se espalhar, você não
vai conseguir sair daqui sem ser interceptada por jornalistas e
paparazzi.
— E você quer que eu acredite que pensou em um lugar
confortável para mim porque está preocupado com meu bem-estar?
— Arco uma sobrancelha, meu corpo cedendo ao sofá que parece
confortável, e me lanço contra ele.
— Você pensa tão mal de mim — aponta, os cílios grossos me
fitando por uma fenda.
— Por que eu pensaria mal de você? Tem sido tão gentil
comigo. — Pestanejo inocentemente. — Enfim, estou com fome.
Vamos pedir comida ou continuar discutindo sobre qual é o melhor
jeito de convencer a imprensa de que somos um casal
verdadeiramente apaixonado?
— Não quer conhecer os quartos? Você pode querer dormir na
minha cama um dia desses. — Seu olhar ferino enclausura minha
resposta.
Ashton deixa suas luvas sobre a mesinha de centro e dá
passos arrastados, porém diligentes, em minha direção. Corrijo a
postura, me apressando para ficar de pé.
É difícil prever o humor dele, se teremos um embate ou se vai
tentar usar meu corpo contra mim para provar que está no controle.
A presença de Ashton sempre deixa o ar encorpado, minhas
expirações estremecem e a base do meu estômago congela como
se ele fosse o maldito do inverno, contudo, quando me toca, um
incêndio é instaurado e fico responsável por lidar com os destroços
quando o fogo apaga.
— Você me deixa confusa. — Sinto o ar fugindo e corro atrás
dele, mas minha inspiração tremula. — Primeiro em Paris, e agora
você gosta de brincar com a minha cabeça. Ora me odeia, ora quer
ser gentil, ora quer me reivindicar e ora gosta de fazer coisas para
mostrar o quanto me despreza.
As costas de seus dedos deslizam pela base de minha
bochecha, uma onda intensa de eletricidade viajando pelos
membros do meu corpo.
— Se te importa tanto como me sinto em relação a você,
significa alguma coisa.
Ele gravita com a mão pela coluna do meu pescoço e,
imprevisivelmente, os dedos se enterram em minha garganta.
Empurrando-me de volta no sofá, Ashton monta sobre mim, suas
coxas me aprisionando contra o encosto.
— Não quero te deixar confusa, então permita-me esclarecer:
estou aceitando minha condição porque não tenho nenhuma
escolha — segreda, o hálito quente escovando a lateral do meu
rosto e o aroma mentolado rodeando meus sentidos.
Seu aperto empedra, meu coração tropeçando nas próprias
batidas descontroladas enquanto um calor úmido sentencia meu
caráter por gostar tanto de como ele fica gostoso tentando me
dominar.
Seus dedos envolvendo minha carne afrouxam, não muito,
mas o suficiente para minha respiração soluçar.
— Quero brigar com você, te humilhar e fazer tudo o que
estiver ao meu alcance para expressar o quanto te odeio, mas,
inesperadamente, também quero que você goste de mim. Me diz,
tem qualquer porra de sentido nisso? — A boca fina paira sobre a
minha, sua virilha pressionando minha barriga. Posso sentir sua
excitação crescendo à medida que fala o quanto me despreza. —
Todos os dias tenho que ficar lembrando o motivo de eu estar tão
magoado e é o seu rosto que fica vindo à minha mente. Como devo
lidar com isso? Você tem sido meu maior estresse.
— E olha só… — Forço as palavras a salpicarem da minha
boca. — Nem estou me esforçando. Seja sincero, Ashton. O que te
irrita mais? Eu ser a porra de um gatilho ou você saber que precisa
me odiar, mas não consegue? — Seus olhos escurecem sob uma
nuvem de irritação, os lábios afinando com a linha rígida de tensão.
— Não sou eu o problema aqui.
Ele condensa minha cabeça contra o encosto, as narinas
avolumando com minhas palavras.
Enterro os dedos nas laterais de seu quadril, tentando tocar
sua pele. O tecido grosso da jaqueta formando um impedimento do
meu objetivo. Ele está com tanta raiva. Ashton sempre teve um
temperamento explosivo e ultimamente essa raiva vem assumindo o
controle da maioria de suas escolhas. Razão que o levou a cometer
tantos erros.
Impulsiono meu corpo, separando sua mão de mim, entretanto,
o furor volta depressa para as linhas do seu rosto, consumindo
como fogo as íris pretas.
Ashton não me oprime, não é de forma violenta que ele age,
por isso não me assusto.
Ele suga inspirações curtas e interpoladas, esforço contraindo
seu rosto em puro ódio. Arremesso o tronco para frente,
desobstruindo o espaço. Afundo os dedos em sua nuca, forçando
seu corpo a sucumbir sobre o meu.
Engulo sua expiração acentuada quando colido com a sua
boca. Instantaneamente, o ar sendo liberado de seus pulmões, a
raiva consentindo o alívio momentâneo da minha língua abatendo a
sua.
O beijo é voraz, cheio de exasperação, mas com um traço de
luxúria dominando cada partícula do meu ser. Odiar é exaustivo. É
contagioso. E Ashton e eu estamos há dias com armamento
pesado, indo com tudo que temos para nos ferir. Só quero um
minuto de paz na presença dele e o único jeito de conseguir é deixar
que a parte que mais gostamos um do outro venha à tona: o desejo.
Ashton vaga com a mão por cima da minha blusa, fechando-a
em volta do meu seio. O pico duro do mamilo alçando entre os
dedos, esfregando a ponta inchada.
Erguendo-me do sofá, as mãos amparando minha bunda,
muda nossas posições, eu por cima, e ele por baixo. A calça de
moletom é uma barreira frívola e, com ele estimulando, rebolo em
seu pau, me esfregando nele. A calcinha já ensopada de
lubrificação deixando a sensação molhada entre minhas coxas.
Ele passeia com a mão entre nossos corpos, manobrando em
direção ao meu ponto sensível. Agarrando o elástico do moletom
preso em meu quadril, soterra a mão entre minhas pernas. Calor de
encontro com o frio dos seus dedos, circulando meu clitóris por cima
da renda encharcada.
Monto em sua mão, meu tronco lidera movimentos encíclicos.
Um gemido atravessa minha garganta e o ronco do seu peito ao
rugir preenche o ar.
— Posso dizer que estava com saudade da sua boceta
melando meus dedos? Porque eu estava, Gravity. Porra. Se você
tivesse me aceitado, se tivesse me escutado naquela época, nunca
na minha vida fodida te deixaria ir embora. — As confissões se
perdem no som molhado da minha boceta em fricção com seu dedo
quando imerge entre os lábios carnudos.
Com a outra mão, Ashton agarra minha nuca, rente à raiz do
cabelo, e impele minha cabeça para trás. Um grunhido deslizando
para fora por entre meus lábios.
— Mas você será minha, goste dessa situação ou não.
Atordoo, meus dedos trépidos buscando reconhecimento de
seu corpo percorrendo sobre o tecido duro do casaco de piloto.
A voz de Ashton vara minha mente com a promessa. Você vai
se apaixonar por mim.
E o que ele ganha? Meu sofrimento. Minha dor. Muitas
pessoas já se alimentaram da minha humilhação para continuarem
saboreando de seu próprio ego. Para provarem sua superioridade
diante de mim, me fizeram quebrar. Os pais de Neil. Amber.
Magdalene. Todas essas pessoas tiveram minha dedicação e
usaram dos meus sentimentos para terem controle sobre mim.
Gerar sofrimento no outro, de alguma forma, é o jeito que pessoas
como Ashton encontraram de lidar com o próprio desprezo por si
mesmas.
Não posso ser outra vítima. Tenho trabalhado para ser forte,
embora grande parte da minha força seja uma máscara, um segredo
perfeito para me proteger.
Acumulo força nos braços e, com um impulso, distancio meu
corpo do dele. O afastamento precoce partindo de mim, a
responsável por termos chegado a esse beijo, o perturba. Posso ver
a penumbra crescendo em um tormento descontrolado em seus
olhos. O ciclone expandindo em suas íris se desprende em conjunto
com a raiva que consegui conter quando o beijei.
Abaixo a bainha da camiseta. Milhões de desculpas sendo
desenhadas em minha mente, mas não sinto vontade de fornecer
nenhuma a ele. A culpa não é minha se Ashton plantou essa
incerteza em mim.
Ele disse, várias vezes e em situações diferentes, que faria
com que eu gostasse dele para usar como arma contra mim, e de
pessoas que usam dos meus sentimentos a favor delas mesmas, já
deu. Estive cercada de pessoas assim por quase uma década e não
preciso de outro nome na lista de quem preferiria mil vezes me
humilhar a entender minhas motivações.
Aprumo o tronco, minhas costas ficam imediatamente eretas.
Alinho os fios de cabelo que se desprenderam do coque quando os
agarrou, empurrando para trás da orelha meadas de tufo.
Manuseio a respiração, esculpindo um sorriso tímido, e
esforço-me para agir com naturalidade. Se deixá-lo saber que o
beijo me afetou, não serei perdoada.
Uma carquilha profunda cobre sua testa. O silêncio sendo
preenchido por suas lufadas de ar cerradas. Raiva e confusão
compõem seu semblante, anteriormente marcado por apetite. Ele
estava morrendo de fome. Desejando se enterrar fundo dentro de
mim. E por um momento, também quis que esse fosse o resultado,
mas a troco de quê?
— Não precisa me levar de volta.
— Que porra foi essa?! Você quem me beijou e agora quer me
deixar na mão?
— Por que você não liga para uma das várias mulheres com
quem já saiu?
— Quê?! — sussurra, descrença contraindo sua mandíbula.
— Nosso contrato não te impediu de fazer antes e estou te
dando o aval para transar com quem quiser.
— Quero transar com você! — responde, seu tom chia com a
voz erguendo.
Giro em meu próprio eixo, iniciando minha caminhada para a
saída. Seus coturnos rompem atrás de mim, e aperto os olhos com
constrangimento. Porra.
— Você não quer transar comigo! — enfureço, ainda
caminhando sem olhar para trás porque seus passos irados são o
suficiente para eu saber que está me seguindo. — Só quer que eu
goste de você o bastante para me humilhar depois.
— Isso nem passou pela minha cabeça!
— Você deixou claro seu objetivo com as provocações!
— Ei! — exclama, quando voo para dentro do elevador,
entretanto, antes de conseguir alcançar meu objetivo, seu braço
está cercando a minha cintura e me puxando de volta. — Porra,
quer me escutar?! Por que você nunca me escuta?! — esganiça,
pondo-me de volta no chão quando chuto o ar. — É verdade que eu
disse que faria você se apaixonar por mim para te magoar depois,
mas não pensei nisso nem por um segundo enquanto te beijava!
Nem me lembrava dessa merda!
— Esse é o seu problema! — grito, afundando o indicador em
seu peito e o empurrando para trás, embora não enfraqueça a
postura. — Você não liga para as consequências do que faz ou fala,
nem consegue reconhecer quando está errado ou se desculpar!
— O que houve com você? — Expele o ar com o rosto
franzido, como se apertar os olhos o fizesse enxergar através de
mim. — Você está fraca. Vulnerável. Qualquer coisa te machuca!
— Dizer tudo o que disse para mim é qualquer coisa? —
Petrifico, minha voz perdendo força. — Só porque não significa nada
para você, não quer dizer que para os outros também seja
insignificante. Quer um exemplo? Delilah. Você a humilhou, a
resumiu a nada e até hoje não conseguiu admitir qual foi o
problema. E se não consegue reconhecer o erro, como pode se
desculpar? — Ardência chega aos meus olhos, estendendo para
uma dor aguda no crânio. — Você não me conhece, Ashton. Só
porque passou um fim de semana comigo, não quer dizer que sabe
tudo que carrego.
Preparo-me para sair, mas ele me cerca. Seu corpo austero
fabricando uma barreira entre mim e a saída. Ar escorre por uma
brecha entre meus lábios, meus olhos rolando dentro das orbes
para a insistência dele.
— Foi o que quis dizer? Que mente para se proteger?
Assusto-me por ele se lembrar exatamente das palavras que
usei em nossa última conversa em Paris. Você mente para magoar.
Eu minto para me proteger.
— O que está tentando esconder? Qual é o seu segredo?
— Nada. — Camuflo minha verdadeira expressão; medo,
choque e tormento, para uma calmaria insensata. — Só que não
pretendo ultrapassar nenhum limite com você. Nós temos um
contrato e trabalhamos juntos. Vamos manter nosso relacionamento
dentro do profissional. Não tente me tocar. Não tente me fazer
gostar de você. Se existe qualquer consideração por mim, mantenha
distância, Ashton. É a única coisa que estou te pedindo.
Seu olhar me acompanha até o elevador, e quando me viro,
conecto-me a ele.
Poderia dizer que a raiva se estabeleceu de uma vez pela
forma como o maxilar está contraindo, mas aquele brilho ligeiro da
ira se acendendo está apagado, não existe nem rastros dela.
Porém identifico outra coisa nele. É sombrio e tempestuoso,
carrega um peso ainda maior que a raiva. Ele sustenta meus olhos
nos seus e é como se fosse sugada para essa desgraça, embora
esteja remando para a direção oposta.
Ashton é obcecado. Se ele cair do precipício, pretende me
levar junto.
“Você me enganou e fez isso direitinho
Pensei que fosse outra pessoa”
SOMEBODY ELSE – BAD OMENS

Não sei como eles conseguem, mas sempre me encontram, ou


melhor, nos encontram. Embora eu seja a maçã podre do grupo, os
caras também são constantemente perseguidos por paparazzi
quando estão nas ruas. Não sei se Gravity os viu quando saiu,
receio que nossa permanência juntos não tenha durado tempo o
suficiente para ser cercada por eles.
Eu, por um lado, preciso tomar cuidado quando arranco com
minha Ducati do estacionamento para não atropelar nenhum deles.
Por outro, não tive nenhuma cautela para guardar a raiva para mim.
Aquela desgraçada vai foder com minha cabeça a níveis
estratosféricos. Já consigo prever o título da reportagem do TNC
amanhã de manhã: Ashton Baker tem sua primeira briga com a
namorada nova. Caralho, amo ser famoso. Amo tudo que o
reconhecimento da minha música me trouxe, mas não ter o mínimo
de privacidade é de ensandecer qualquer um.
Meu pau está torando dentro da calça quando chego em casa,
ainda querendo se aliviar. Imagens da sua boca cobrindo a minha e
o quadril se esfregando em mim dão espaço para a imaginação.
Será que a raiva é capaz de superar o tesão? Porque estou
irritado pra caralho, mas não consigo pensar em outra coisa que não
seja estar me enterrando fundo em uma certa pessoa.
Eis a única explicação que consigo arquitetar: devo estar em
abstinência. Como ela conseguiu esse autocontrole? Como
simplesmente parou no meio do caminho e me deixou na vontade?
É o mesmo que oferecer um copo d’água a um sedento e afastá-lo
quando estava prestes a acabar com a sede. Filha de uma puta
traiçoeira. Não consigo deixar de pensar que foi planejado. Estava
esperando o momento em que eu baixasse a guarda para se vingar
do fim de semana.
Escalo a escada, meus passos sonolentos. Retiro minha
jaqueta — estava ansioso para finalmente pilotar minha moto nova.
Eu a comprei pouco antes de sairmos em turnê, mas, com todos os
acontecimentos, a pobrezinha tinha sido deixada de lado na
garagem até então.
Preciso aproveitar os poucos dias que me restam antes de
cairmos na estrada e pularmos de estado em estado outra vez.
Seremos consumidos pelo auge da nossa popularidade em breve e
confesso, os únicos momentos nos quais sinto que minha sanidade
é plena, são aqueles em que estou no palco com meus melhores
amigos.
A nuvem de breu recai no corredor dos quartos. Inspiro o odor
amargo replicando do cômodo para o restante da casa, vincos
profusos enrugando meu nariz para o fedor. Espio pelo vão das
portas, examinando se algum deles está acordado e de onde o
cheiro vem.
Preciso de uma distração rápida ou farei merda de novo.
Transar com Sadie foi um vacilo gigante e não pretendo cair na
tentação outra vez.
Mexo no meio das pernas, querendo encontrar uma posição
confortável para meu membro retesado, se forçando contra a calça
para sair.
Encaminho-me para o meu quarto. Deixo a chave da moto na
cômoda e a jaqueta no encosto da cadeira. Procuro pelo meu
celular no bolso, abro a lista de contatos e o polegar plana no nome
“Encrenca”.
Pressiono sobre a tela, carregando o aparelho até o ouvido. Só
estou checando. Tess disse uma vez que Gravity parecia ter medo
de Nova York porque raramente saía. Aconteceu alguma coisa, a
garota que conheci em Humperville não é mais a mesma. Ainda que
a irrite constantemente, esperando uma resposta à altura, Gravity só
aceita, e não sei o que me irrita mais: admitir que não está sendo
como sempre foi ou estar começando a me preocupar com essa
mudança de personalidade.
Ela não atende, óbvio. Então, escrevo uma mensagem.
Ashton:
Atende o celular. Quero falar com você.
E, de novo, ela não responde. Tenho certeza de que nem
pretende. Bufo, arremessando o aparelho por cima do ombro, e ele
— por sorte — cai na cama. Arranco as botas e meu Apple Watch,
coloco-o sobre a cômoda ao lado da chave e me conduzo para fora
do quarto.
Espreito o corredor, analisando as portas fechadas, mas o
fedor de maconha só pode estar vindo de um cômodo: Finnick.
Oriento-me para lá, passos monótonos enquanto me acostumo
com o cheiro. Minha cabeça rodopia; já faz um tempo desde a
última vez que fumei maconha, mas não seria nada mal dormir sob
a eficácia da erva.
Temos uma reunião às oito da manhã para discutirmos os
detalhes do retorno da turnê e, se conheço nossa assessora de
imprensa, Avalon deve estar planejando meu casamento, para que
ele aconteça nos próximos três meses ou antes.
Ravennah fez uma adição errada sobre meu relacionamento
com Gravity e é claro que todo mundo tem uma opinião sobre nosso
“romance” na internet agora que ele deixou de ser algo que deveria
acontecer a prestações.
Não solicito minha entrada, apenas giro a maçaneta e empurro
meu corpo para dentro do quarto. Finnick abaixa o rosto, seu queixo
se alinhando com minha presença. Fumaça encobre o cômodo, mas
ainda consigo flagrar a massa loira de cabelos se movendo.
Uma música baixa toca na Alexa sobre a cômoda e um Finn
extremamente chapado agita a cabeça no ritmo. Posicionando uma
mão sobre o abdômen, dedilha a pele nua em cordas imaginárias de
guitarra.
Fecho a porta atrás de mim, os cantos da minha boca traçando
um sorriso. Divertimento esculpe meu rosto, mas, assim que a
música chega ao refrão, uma ondulação percorre meu peito.
Somebody Else de Bad Omens me transporta para Gravity.
Sobre como eu tinha uma idealização de quem ela era e acabou se
transformando em uma nova ferida para mim. Como ela foi de
alguém que eu jurei gostar para essa estranha?
O quarto de Finnick é o maior da casa. Ele tem uma cama king
size com lençóis pretos de cetim, mas que sempre está
desarrumada. Um conjunto de sofás de dois lugares na
extremidade, uma mesa de apoio no centro e um frigobar debaixo
da escrivaninha. Ele tem mais de três guitarras, cada uma com tons
de madeira diferentes; embora passemos mais tempo no estúdio ou
na estrada do que realmente aqui, gosta de tê-las ao alcance
quando quiser tocar.
É inútil pigarrear para provocar sua atenção, então continuo
me infiltrando até que não seja mais possível me ignorar. E ao ter
consciência da minha presença perambulando seu espaço pessoal,
Finn recupera o celular da mesa e abaixa o volume. A música se
transforma em um ruído distante.
— Estava alto? — especula, uma sobrancelha loira arqueando
enquanto suor escorre profusamente de suas costeletas.
— Não, irmão.
Endireito a postura, indiferente ao impacto que a letra da
música causou em meu peito.
Dirijo-me ao frigobar, convicto de que Finnick tem um estoque
de cervejas, já que algumas long necks estão apoiadas na
escrivaninha.
Agarro duas garrafas da portinha, uso o abridor pendurado na
parede para abri-las e entrego uma para ele.
Descanso em um dos sofás, enquanto Finnick verga a cabeça
para trás, virando um grande gole da cevada. A língua estala ao céu
da boca, provando o gosto. Ele se conforta no outro sofá, seus olhos
caçando os meus em manifesto de sua curiosidade.
É verdade que nos aproximamos pra caralho no último ano.
Nós cinco nunca estivemos tão unidos quanto agora. Não tem nada
sobre mim — exceto a parte onde era espancado pelo meu pai —
que não contaria para eles e não tem nada nesse mundo fodido que
não faria para protegê-los de suas dores.
Finnick sabe que tem alguma coisa errada, e ainda que sua
mente esteja sob influência da erva, interesse engessa sua
expressão.
— Voltou cedo — atesta, examinando os sulcos em minha
testa.
— Voltei. A gente meio que brigou — confidencio, ingerindo a
cerveja.
— Vocês só brigam.
— Não é verdade! — objeto, mas seu semblante indiferente
retorce até que exiba diversão.
— Corrigindo, então. Desde que Gravity aceitou ser sua
esposa de mentira para limpar sua barra, vocês só brigam — grunhe
para enfatizar. — Quer fumar?
Reflito antes de aceitar. Vim primeiramente por causa disso.
Finnick é o único nessa casa que tem drogas. Não falamos em voz
alta porque é difícil admitir que a única pessoa que deveria temer se
envolver com elas também é o único que as carrega por aí como se
fosse um órgão vital.
Fumo cigarro quando estou no ápice do meu estresse. Porém
sei que maconha e cigarro não são as únicas coisas que tem
guardado no cofre atrás da estante de livros.
— Quero.
Um sorriso vitorioso se instala em seu rosto.
— A maconha acabou, mas tenho cristal.
Ele retira alguns livros da estante, revelando um cofre
entalhado na parede. Finnick digita a senha, e tento espiar por cima
de seu ombro para descobrir qual, mas é uma perda de energia
porque ele pressiona os botões tão rápido que meus olhos, sob a
fumaça ainda nublando o quarto, não conseguem acompanhar.
— Cristal?
— Metanfetamina.
— Porra, Finn — sibilo, espanto formando uma carranca em
meu rosto. — Quando começou a mexer com essa merda?
— Vai querer ou não? — irrita-se, cortando meu sermão.
— Tanto faz — murmuro, rolando os olhos para suas
escápulas.
Ele puxa de dentro da abertura da parede o pipe de vidro e um
saquinho com estilhaços de cristal. Antes de se sentar, organiza o
produto no recipiente. Fecha a porta do cofre, voltando a se
acomodar no sofá diante de mim. De dentro do bolso da calça jeans,
pesca um isqueiro preto-fosco, a estrutura ornamentada com emojis;
um irritado e o outro corado com corações ao redor. É antigo e já o
vi com ele antes.
Finnick acende o cachimbo com seu isqueiro, tragando em
espaços curtos.
— Isso vai te matar — alarmo, estudando-o sorver essa porra
e se deliciar dela como se fosse a melhor coisa que sua mente já
provou. — Finnick.
— Que foi? — Ele se inclina sobre o quadril, estendendo o
pipe para mim.
Analiso a situação como um todo. Adoraria poder nublar minha
mente com drogas, entrar em êxtase, aumentar meus níveis de
serotonina e dopamina com essa porcaria, mas preciso controlar
meus impulsos por Finnick. Agora já estou sentindo o peso sobre
meu peito, acreditando que o influenciei a usar.
— Acho que vou passar. O que mais você tem naquele cofre?
— Empurro a cabeça em direção à estrutura de aço e chumbo.
— Tenho de tudo — desembucha, ingerindo o cristal
profundamente. — Cristal, maconha, quer dizer, tinha maconha. E
coca. Mas tenho preferido isso aqui… — Mostra o cachimbo diluindo
a metanfetamina.
Minha garganta fecha para a realidade cruel se materializando
diante de mim. Finnick está pior do que eu suspeitava. Não sei se
posso ajudá-lo, não sou nenhum médico nem sei o que acontece
dentro de sua mente atormentada.
Nesse momento, a impotência me esfola em carne viva. Dizer
que aquela coisa irá matá-lo não dará nenhum resultado
significativo. Para Finnick, não faz diferença se está vivo ou morto.
Mas eu me importo. Eu me importo pra caralho com ele.
— É por causa da Effy? — indago, curiosidade se instalando
em minha mente.
Nunca me intrometi nos relacionamentos dos meus amigos.
Não diretamente, pelo menos. E Effy sempre foi uma pessoa
admirável. Ela tem o melhor coração que já conheci e não a vejo
movendo meio centímetro para tentar machucar alguém de
propósito ou guardando rancor.
Ela é humana, portanto, se irrita como qualquer um e, às
vezes, jura que não irá perdoar, só para instantes depois mudar de
ideia. Então, nunca entendi por que Finnick não correspondeu aos
sentimentos dela.
— Precisa ser mais claro. No momento, estou chapado. — Ele
ri da própria fala, encarando com louvor o pipe e o girando na mão
pelo comprimento delgado.
— Você está se drogando por causa dela?
— E se eu estiver?
— Então, terei a confirmação de que é um imbecil. Porque se
gosta dela, você está atrasado em uns seis anos, por aí.
Finnick deriva os olhos verdes abalados — não sei se pela
metanfetamina ou pelo que acabei de dizer.
— Nossa! — Os lábios se unem, um assobio impressionado
pairando o ambiente. — Ela gostou de mim por anos, né? Admiro a
coragem da Effy. Ou ela é só burrinha mesmo.
Enrijeço o tronco, pronto para defendê-la. Se ele falar mal dela
para mim, não vou me incomodar em quebrar seu nariz. Ainda bem
que não estou chapado e faria consciente de tudo. A honra da
minha amiga me importa mais que qualquer coisa nessa porra de
mundo.
— Quando ficou com a Gravity, sabia que Effy estava
apaixonada por você? — investigo, minhas mãos já fechando em
punhos sobre as coxas.
Reconheço que nunca gostei de saber que Finnick dormiu com
Gravity no passado. Sou um cara bem ciumento e a ideia de saber
que um dos meus melhores amigos já a teve na cama rouba meu
sono à noite. Tenho vontade de quebrar a cara dele só de imaginar
que pode ainda fantasiar com ela.
Tem grandes chances de Finnick recuar sob a pergunta, mas
estando chapado, abre espaço para decidir responder.
— Sabia.
Meu peito tremula em uma respiração consternada.
— E fez mesmo sabendo que eram amigas?
— O que te faz pensar que Gravity também não sabia? — Ele
lança a provocação e abre uma brecha no meu autocontrole. Gosto
de pensar que Gravity não seria tão fingida, mas considerando
nossa situação, é uma possibilidade.
— Ela sabia? — pergunto mesmo assim.
— Pergunte a ela.
Ela disse que não quando revelei que Finnick havia me
contado sobre os dois. Entretanto, uma nuvem de desconfiança em
relação à Gravity vem planando sobre minha cabeça. Finnick está
conseguindo sugar meu último fio de confiança nela, plantando essa
dúvida na minha mente.
Se ela sabia e mesmo assim escolheu trair a melhor amiga,
juro, não sei se consigo perdoá-la por essa porra. Já é difícil para
mim estar sob controle agora, sabendo que Finn escolheu sair com
ela mesmo ciente de seus sentimentos.
— Você gosta de magoá-la — insinuo, a respeito de Effy. Finn
me fita, aspirando outra dose da droga. — Você é meu melhor
amigo e eu te amo pra caralho, mas não vou te deixar magoá-la
mais, entendeu? — O tom cortante deixa bem claro a seriedade da
minha fala. — Deixa ela ser feliz!
Ainda não tive a oportunidade de falar com Effy sobre o novo
namorado. Ela está sendo discreta e estou esperando que escolha
me contar sobre Beckham. Sem falar que acho que não confia
totalmente em mim para revelar essas coisas. Ela sabe que, na
primeira oportunidade, abriria a boca. Porém essa é uma situação
diferente. Não a trairia dessa maneira.
Ele sorri como se o próprio Diabo o tivesse desenhado.
— Eu deixo. Ela quem não consegue seguir em frente.
Tombo a cabeça, expelindo o ar sob a vibração em meu peito.
Nem vejo a raiva chegando.
— Você já amou alguém na sua vida? Brianna?
— Não faço a menor ideia de como seja amar alguém, Ashton.
Quando estava com a Bree, podia jurar que tinha descoberto como,
mas eu a superei tão rápido… — Ele fica reflexivo, sulcos de pele
estendendo em sua testa. — Hoje, acho que confundi tesão com
amor. Porque ela era gostosa, certo? E eu estava enlouquecendo
com os sentimentos que a Effy dizia ter por mim. Ter começado meu
relacionamento com a Bree naquela época foi o caminho mais fácil
que encontrei de erguer uma muralha emocional entre mim e Effy.
Não sei como é estar na mente de Finnick, mas de uma coisa
tenho certeza: deve ser exaustivo pra caralho. A maneira como ele
lida com as coisas, como sua cabeça trabalha para enfrentar os
próprios sentimentos, é realmente insano.
— Por que de repente estamos falando de mim? Foi você que
brigou com a namorada, porra.
— Ela não é minha namorada.
— Para o resto do mundo, ela é. E, em breve, será sua noiva.
Minha cerveja deve ter esquentado, mas bebo mesmo assim e
confirmo as suspeitas. Está quente demais e é quase insuportável
para engolir. Finnick, entretanto, continua se divertindo com seu
cachimbo de cristal, tomando a droga como um remédio para as
lacunas que ele tem.
— E você gosta dela — diz, um sorriso serpenteando o rosto
besuntado de suor.
— Não viaja, Finn.
— Você gosta. Está perguntando sobre mim e ela porque está
preocupado que eu ainda pense nela dessa maneira. O que quer
saber?
Meu coração bate de forma irregular, os ossos da boca doendo
com a contração da mandíbula.
— Nada.
Levanto-me, rumando para o frigobar e pegando outra cerveja.
— Não exagera nessa merda aí. Já ouvi falar que o efeito da
metanfetamina dura por mais de 24 horas — alerto-o, antes de
começar minha caminhada para a porta. — E precisamos de você
amanhã na reunião.
— Vocês nem começaram e já está mais responsável —
zomba, fumando mais uma porção da droga. — Fica tranquilo, vou
estar consciente amanhã cedo.
Bato a porta atrás de mim, a música subindo o volume quando
estou voltando para o quarto.
Empunho a maçaneta do quarto de Chase, ainda precisando
de alguém para conversar. Estou chapado só com a porra da
fumaça. Giro-a e adentro o quarto, meu amigo está deitado na cama
com uma bacia de pipoca sobre a barriga enquanto assiste a um
filme na Netflix.
— E aí, cara. — Arrasto-me com a cerveja em punho, e Chase
chega para o lado, liberando espaço para me deitar.
— Quão chapado ele está? — Chase escrutina, a testa
franzida. Podemos ouvir a música varando a parede e invadindo o
quarto.
— Ele fumou toda a maconha que tinha e agora está no cristal.
Meio que estou me sentindo culpado, estava puto pra caralho
quando cheguei e queria fumar.
Mergulho uma mão na bacia, pegando um punhado dos grãos
estourados e o levando à boca. Estou morto de fome porque minha
namorada preferiu fugir a comer comigo.
— Estava puto por quê?
Uma luz acende em minha cabeça. Se ligasse para a baixinha,
e Gravity contou da nossa discussão, Tess não me deixaria falar
com ela. Mas se Chase ligasse, seria outra história.
— Problemas no paraíso. — Rio, bebendo a cerveja para
terminar de descer a pipoca. — Escuta, pode ligar para a Tess?
Chase vira a cabeça em minha direção, a pele da testa
dobrando.
— Por quê? Ela está estudando, não quero incomodar.
— Preciso falar com a Gravity.
— Relaxa. — Chase divaga sua atenção de volta para a TV,
uma explosão acontece na tela, fogo e fumaça se espalhando. —
Gravity chegou em casa bem.
É minha vez de franzir a testa.
— Falei com a Tess meia hora atrás. As duas tinham planos de
comer juntas, mas parece que estragou quando impôs que Gravity
saísse com você.
— Queria mostrar o apartamento. — Pisco com inocência,
Chase entortando a boca em advertência.
Avalon o mostrou primeiro quando cheguei de Miami. A ideia
era que eu levasse Gravity junto nesta semana para visitá-los, mas
assim que coloquei meus pés naquele, já tinha me decidido.
Afinal, Gravity não tinha planos com Liam. Um sorriso de
vitória desponta dos cantos da minha boca ao descobrir e relaxo,
gozando do sentimento recém descoberto: eu a odeio pra caralho,
mas é insuportável imaginá-la com outra pessoa. E gosto muito de
como essa sensação tange em meu peito.
— Você não está pensando em dormir aqui, está? — Chase
suspeita, os olhos estreitando até pousarem no meu corpo relaxado.
Agito o tronco e cubro as pernas com a colcha. Cruzo as mãos
nas costas da cabeça depois de deixar a cerveja na mesa de
cabeceira. Minha respiração morosa responde por mim.
Chase revira os olhos, mas eventualmente aceita minha
companhia. Ainda que consiga me concentrar no filme, mastigar os
grãos de pipoca estouradas e bebericar a cerveja, não posso ignorar
que Finnick está no outro cômodo, descobrindo maneiras de ferrar
com a própria vida sem precisar de muito esforço.
“Eles querem o melhor de mim agora
O melhor de mim agora”
BEST OF ME – NEFFEX

Finnick, seu fodido do caralho.


É a primeira coisa que me vem à mente para dizer. E pretendo,
depois que enfiá-lo debaixo do chuveiro e fazê-lo entender que
precisamos dele estável.
Nosso amigo está esparramado em sua cama, vestindo
apenas uma calça jeans justa. A massa loira de cabelos se
perdendo entre a porra dos lençóis. Tem tantas garrafas de cerveja
espalhadas, assim como o pipe que estava usando ontem jogado
sobre a mesa. Carreiras de cocaína pintam o tampo preto, deixando
rastros de partícula de pó branco.
— Inferno… — Bryan pragueja, a voz sai abafada por estar
apertando a boca.
— O que a gente faz, porra?! — resmungo, me embrenhando
para dentro do quarto.
— A gente deveria verificar o pulso dele — sugere Chase, já
se encaminhando para o corpo imobilizado de Finnick.
Estaria mais assustado se não estivesse vendo as costas se
elevarem com a respiração arrastada. Enquanto Chase tenta virá-lo
na cama e afere o pulso, pressionando a jugular com o indicador e
médio, Aidan despacha para o banheiro. Ouço o registro girar e a
banheira encher. Bryan e eu tomamos nosso tempo limpando o
quarto, escondendo resquícios de que Finnick passou a noite se
drogando.
— Isso é loucura! — rumorejo, juntando todo o pó e o jogando
dentro da lixeira que encontro ao lado do frigobar. — Por que
caralhos ele anda se drogando desse jeito?
— Não sei, Ash... — Bryan suspira, alinhando os livros para
esconder o cofre. — Mas se Jared descobre, estamos fodidos,
então vamos lidar com esse problema nós mesmos, tá legal?
— Ele está fora de controle! — objeto, parando com as mãos
no quadril para encará-lo. — Precisamos de ajuda.
— Você está exagerando.
Encara-me através de uma janela entre os cílios longos.
— Exagerando?! — vozeio, choque e indignação assumindo o
controle. — Porra, está vendo toda essa merda aqui? — Mostro as
três fileiras de pó que não foram cheiradas, porém, existe a sombra
de outras três trilhas e que tenho certeza de que estão no
organismo do meu melhor amigo nesse momento, fodendo com ele
de dentro para fora. — Ele está viciado, Bryan. Vamos encarar a
realidade, Finnick está por um fio! Não podemos só lidar com o
problema, ele precisa de ajuda!
— Não podemos contar para ninguém! Você já pensou em
como a imprensa acabaria com a gente se soubesse? — Bryan
argumenta, e retraio os ombros, o abalo arranha minha pele e a
garganta fecha, uma bala de chumbo se alojando lá. — Se
concentra primeiro em limpar a sua barra com eles — salienta, com
o indicador apontado para mim. — Depois a gente pensa em como
ajudar o Finnick sem que isso detone com a nossa carreira!
— Ela é tão importante assim para você? A carreira? —
retruco, o ar entrando denso em meus pulmões e os alargando.
— Claro que é, porra! — brada, dando passos em minha
direção. — Deixei tudo para trás por vocês. Estou quase perdendo a
mulher da minha vida para sustentar a nossa banda. Então, sim, é
importante que continue dando certo porque se der errado, o que vai
sobrar? Me importo com o Finnick tanto quanto você, mas nós
sabemos que o que ele precisa, ninguém pode dar.
— E o que ele precisa? — Chase corta nossa discussão, Aidan
já o está ajudando a arrastar Finn para o banheiro.
— Amor. — Bryan responde, sucinto.
— E se a gente ligasse para a Effy? Ele pode escutá-la. —
Aidan propõe, contudo, dúvida nubla o mar azulado de suas íris.
Aposto que, nesse segundo, está reconsiderando porque Delilah lhe
daria uma bronca. — Tudo bem, péssima ideia — corrige a si
mesmo, entortando os lábios.
Eles o levam para o banheiro, enquanto Bryan e eu
continuamos a limpar o quarto. Desço para buscar produtos de
limpeza, afinal, ainda que tenhamos uma pessoa que vem duas
vezes na semana para organizar a casa, deixar evidências de que
Finnick anda se drogando é a última coisa que queremos. Por mais
simpática e sensível que Lillie seja, foi contratada por Jared, e não
tenho nenhuma dúvida a quem sua lealdade pertence.
Troco as roupas de cama, sinto o fedor de cerveja impregnado
no cetim. Jogo as garrafas no lixo e borrifo um aromatizador de
ambiente de lavanda.
Encontro uma caixa de camisinhas na mesa de cabeceira, já
está praticamente vazia, e evito pensar com quem ele as usa.
Finnick não costuma sair com pessoas que conhece em uma
noite. Ele tem para quem ligar quando quer sexo e um detalhe é que
elas nunca vêm até ele, ele quem vai até elas.
Mais de um ano vivendo sob o mesmo teto que Finn e nunca o
vi dormir com ninguém. Talvez sejam os terrores noturnos. Nunca
contamos efetivamente que sabemos deles, mas se está ciente que
os tem, é claro que desconfia que nós já o ouvimos gritar à noite.
Finalizo borrifando mais um pouco de aromatizador nos
travesseiros. Finn sai andando do banheiro, mas Aidan e Chase
estão logo atrás, como sua sombra e observando-o para ter certeza
de que o porre não irá derrubá-lo. Ele sequer olha para mim e Bryan
quando se joga na cama, sem se importar em tirar a toalha que
abraça seu quadril.
Bufo, levando uma mão à testa para afastar uma mecha de
cabelo caindo. Jogo o lençol por cima do tronco dele.
— O que vamos dizer para o Jared quando perguntar onde é
que nosso guitarrista se meteu? — questiono, olhando para os
outros que estão se juntando ao meu lado, todos cruzando os
braços para assistir à Cachinhos Dourados dormir. — Como é que
vamos resolver esse problema? — continuo, notando a respiração
inflar lentamente seu peito coberto de tatuagens distintas.
— Vamos focar em um problema por vez. — Aidan acentua, as
sobrancelhas grossas e tingidas empenando. — Você se casa
primeiro e volta para as graças da imprensa, e depois a gente lida
com o Finnick.

Quando começamos nossa carreira, era Jared quem bancava


a maioria das nossas despesas, incluindo os novos colaboradores
da equipe.
Os números cresceram de maneira disforme, e os caras e eu
nos assustamos com a dimensão do sucesso quando subimos no
palco no primeiro dia de nossa turnê. Estádio lotado, ingressos
esgotados e nossas músicas explodindo em primeiro lugar em todos
os streamings. Fomos de uma banda recém-descoberta para o topo
da Billboard, com três músicas ao mesmo tempo.
Em um ano, conquistamos tudo aquilo que outras bandas
levam de dez a quinze anos para conseguir; isso, quando chegam
lá. É claro que o sucesso súbito bateu na bunda da mídia e eles
escavaram nossas vidas para entender o porquê nós merecíamos
estar onde estamos e o porquê chegamos aqui tão rápido, quando,
segundo alguns especialistas, não somos tão bons assim.
Acredito em trabalho duro, mas também aposto na sorte.
Fomos sortudos pra caralho em conhecer Jared McAvoy. Ele nos
trouxe para Nova York, nos acolheu dentro de seus braços e nos
tornou uma família de verdade.
Os caras e eu sempre fomos loucos uns pelos outros.
Realmente apaixonados. Tanto pela música quanto por nossas
histórias. Porém nós ainda não sabíamos direito o que família
significava. O quanto essa minúscula palavra traz responsabilidade
e quão profusos são os sentimentos ao redor dela. Nós aprendemos
o real sentido de estarmos juntos quando desabamos. Eles são
minha maior felicidade, meu encontro imprudente com o caos e
como me sinto protegido nele.
Agora estou sendo forçado a me casar porque minha felicidade
depende do sucesso do meu relacionamento com alguém que eu
odeio. Gravity me coloca diante dos meus traumas, e só eu sei
como me sinto quando usurpam as partes boas de mim.
Giro a caneta entre os dedos, observando-a por uma greta
entre os cílios. Avalon nos apresenta aos novos colaboradores da
equipe e que permanecerão conosco por oito meses, tempo total do
meu contrato com Gravity.
— Este é o Roman — diz ela casualmente, gesticulando para o
homem de pele bronzeada de sol e barba baixa sentado ao lado de
Gravity. — Ele será o “paparazzo” pessoal de vocês. Roman será
responsável por fotografá-los em todos os encontros e também
faremos com que ele os ache em momentos que mais ninguém
estaria, por exemplo, faremos algumas fotos aqui no estúdio.
Roman irá vender para Ravennah como se os tivesse flagrado em
um momento íntimo, quando veio fazer uma visita à Sidney, que é
muito amiga dele.
Seu sorriso é irritante e está me dando nos nervos. Quando foi
que a reunião de retorno da turnê se transformou em uma reunião
para falar do meu relacionamento por conveniência com Gravity?
Desenho um diamante no bloco de notas, demonstrando
desinteresse pelo assunto, ainda que meus ouvidos estejam
atentos.
— Aquele é Silas, o segurança pessoal de Gravity.
Subo meus olhos para conferir o novo membro da equipe de
segurança. Queria que Wade estivesse aqui para ver que porra
Avalon está fazendo.
— Precisa mesmo disso? — Gravity pergunta, porém, seu tom
é de contestação. — Não sei se é mesmo necessário eu andar por
aí com um segurança no meu encalço.
— Por enquanto, o relacionamento de vocês para a imprensa é
algo casual, como os anteriores que Ashton teve, mas quando
anunciarem o noivado, paparazzi e jornalistas cercarão você por
onde quer que vá. Precisamos prever antes que aconteça. Apesar
de tudo, vai odiar a parte do assédio.
— Ainda assim, por que nosso relacionamento seria tão
interessante para eles? — Ri com indiferença.
— As pessoas consomem histórias. — Kim intervém, girando
em sua cadeira. — Elas querem vidas divertidas para distrai-las de
sua monotonia. As pessoas acordam e a primeira coisa que fazem é
acessar o perfil de suas celebridades favoritas para ver o que estão
fazendo e se algo novo aconteceu enquanto dormiam. Sites de
fofoca são os mais visitados. Programas de TV, onde têm acesso
exclusivo e direto à vida das pessoas, são os mais consumidos. É o
que você e Ashton irão fazer nos próximos meses, oferecer
entretenimento em troca de varrer as polêmicas da vida pessoal de
Ashton para longe.
Gravity conecta seus olhos aos de Kim, uma conversa
acontece entre elas em sessenta segundos de repleto silêncio.
— Tudo bem. — Gravity soa indiferente, girando até que seu
tronco esteja por completo voltado para Avalon, à direita da mesa,
ao lado de Jared. — Quando vou começar a trabalhar de verdade?
Porque só aceitei esse contrato para poder criar minhas roupas e
eles as vestirem.
— Já chegaremos aí… — Jared diz com um sorriso polido.
— Aquele é Theo, ele será seu motorista particular. — Ava
indica outro homem sentado à mesa; nossa reunião nunca esteve
tão cheia como agora. — Ele vai te levar para os lugares quando
não estiver com a The Reckless.
Gravity ameaça contrapor, mas desiste em seguida, anuindo
em concordância.
— Muito bem. Antes de chegarmos ao tópico que todos estão
ansiosos, precisamos rever a questão do noivado de Ashton e
Gravity. — Nossa assessora curva-se sobre a mesa, resvalando o
dedo sobre a tela do iPad e muito provável se encontrando no meio
de tudo que gostaria de falar. — Jared e eu definimos a data de
retorno da The Journey World Tour e, infelizmente, Ashton,
precisamos priorizar estabilizar sua imagem com a imprensa,
portanto, queremos que se casem antes do início da turnê.
— O quê?! — sopro, minha voz fluindo com um ar quente
passando entre meus lábios.
— É assim que vai ser. — Jared decreta. — Sem discussão,
Ashton.
Cruzo os braços sobre o peito, minha respiração irregular
assobiando com a irritação percorrendo minhas veias, e não posso
discutir porque não importa o que eu diga, estou errado.
— Vocês já podem definir a data em que vão começar a morar
juntos. Na minha opinião, se mudem essa semana mesmo. Estou
pensando em aceitar uma entrevista com Ravennah para vocês. E,
ainda que eu possa planejar tudo, gostaria que definissem o noivado
e data de casamento, que deve acontecer em outubro. E precisa
pedir a mão dela de um jeito que todos saibam que você está
apaixonado!
— Como é? — Corrijo a postura, arregalando os olhos para
Avalon. Tremor esticando os cantos de sua boca em divertimento.
Dá para sentir que Avalon está curtindo muito me humilhar
nesse momento.
— Precisa ser tão… — Gravity interrompe, a testa marcada
por rugas de vincos — extravagante? Não pode acontecer de um
jeito discreto, entre nós dois?
— É o Ashton. Todo mundo sabe que ele é impulsivo e adora
atrair atenção. Ele nunca faria um pedido de casamento do jeito
convencional. — Jared chama minha atenção quando responde por
Avalon.
— Quando já tiverem tudo decidido e se Ravennah concordar
com a entrevista para antes da turnê, ela será uma das principais
convidadas do casamento. É importante que pessoas como ela
estejam presentes e testemunhem a veracidade do relacionamento
de vocês.
— Podemos falar sobre a turnê agora? — Massageio as
têmporas, sentindo-as pulsar com tanta informação.
— Claro. Reabriremos as vendas dos ingressos no começo de
setembro. Seguiremos a agenda inicial, alterando só o fim da turnê.
Ah, Gravity — Avalon eleva os olhos para ela —, preciso que me
envie uma proposta de figurino, tudo bem? — Sorri, amistosa.
— Claro, tudo certo.
— Tudo bem, vamos alinhar agora alguns detalhes da The
Journey World Tour.

Amo o estúdio. É o meu lugar favorito da nossa gravadora. Ele


me brinda com lembranças muito divertidas de um ano atrás,
quando ainda estávamos gravando nosso primeiro álbum e minha
vida não era uma vitrine para as pessoas observarem.
O que Kimberly disse à Gravity é uma pequena porção de
como realmente me sinto em relação a tudo. Reconheço que a fama
me trouxe o que mais aprecio na vida hoje, mas a parte obscura
meio que faz de mim um anti-herói.
— E se a gente arranjasse um bichinho de estimação? —
Bryan reflete alto, a mão fechada em punho apoia o queixo e a
perna direita está dobrada sobre a esquerda, formando um
triângulo.
— Ficou maluco? — Aidan refuta antes mesmo de a sugestão
ser absorvida por minha mente. — A gente adotar um animalzinho
para ele passar a maior parte do tempo sozinho em casa? Você não
tem coração?
— É uma sugestão válida, porra. Talvez faça bem ao Finnick.
Tem estudos que comprovam que a presença de um animalzinho
em casa alivia a tensão. E ajuda com a depressão e a ansiedade.
Considero, pensando no assunto. Bryan tem razão, assim
como Aidan.
— Voto para termos um gatinho. — Levanto a mão, rindo ao
fundo da voz quando Aidan me sentencia com seu olhar de pai
raivoso. — Qual é, pode ser legal ter um gato de estimação. Finn
pode curtir também. E o nome dele pode ser… Eros. Porque Bryan
disse que Finnick precisa de amor — caçoo, minha boca se
estendendo em um sorriso empolgado.
— O que faremos com ele quando estivermos na turnê? —
Chase implica, revirando os olhos para a ideia.
— Tess pode cuidar dele. — Bryan sacode os ombros,
expressando indiferença ao problema. — Tenho certeza de que ela
não iria se importar.
— Você está supondo que minha namorada gosta de animais,
mas ela mesma não tem nenhum, então Eros pode não ter lugar
para ficar quando estivermos fora e sou totalmente contra deixá-lo
em creche por tanto tempo.
— Own, que fofo, já estamos usando o nome dele! —
Gargalho, minha cabeça tombando para trás com a força. — Bom,
meus dias com Eros estão contados porque vou me mudar. Se
vamos ter mesmo um gatinho, quero guarda compartilhada.
— Falando em se mudar… — Chase fisga o lábio inferior, seus
olhos apreensivos alternando a concentração. — Tess e eu
andamos conversando, e quando Vity sair, vou me mudar pra lá. É
temporário — acrescenta às pressas quando vê a prega em minha
testa se aprofundar. — Só até Gravity voltar.
— Já estou vendo tudo. — Inalo o ar com mais força que o
necessário, meu peito se ampliando com a brutalidade com que o
sugo. — Quando Delilah e Mackenzie decidirem se mudar para
Nova York, Finnick e eu ficaremos com aquela casa gigante só para
nós dois.
— Delilah se muda no Natal. — Aidan libera a novidade, as
sobrancelhas alçando junto dos olhos azuis e saltam de mim para
Bryan. — Nós conversamos e ela quer tentar publicar com alguma
editora aqui de Nova York. As chances são maiores. Ia contar para
vocês, mas…
— Quando? — Ondulo o nariz, carranca esculpe minha feição.
— Porra. Não fica chateado, Ashton. Sempre falamos de nos
casar e ter filhos em algum momento. O sucesso da banda não será
um empecilho.
— Parece que a minha garota é a única que se recusa a me
seguir até Nova York... — Um suspiro de cansaço flui de Bryan, e o
observo. É por isso que não pretendia me envolver emocionalmente
com ninguém por causa da banda. As coisas tendem a desandar
quando está com a cabeça no amor. — Então, está definido? Delilah
vai se mudar?
— Uhum. Estou feliz pra caralho. Vocês podem ficar por mim?
— Nós estamos felizes, cara. — Chase aperta o ombro de
Aidan, sorridente. — Tess e eu moramos na mesma cidade e nem
por isso passo menos tempo com vocês. Elas estarão aqui para
agregar, e não atrapalhar.
— Como fomos de ter um gatinho para Aidan contando que
Delilah se muda em dezembro? — Espremo os olhos para eles. —
Pobre Eros, nem chegou e já perdeu metade da família.
— Estou falando de presentearmos o Finnick. — Bryan
recapitula, ignorando a novidade de Delilah estar se mudando.
Conhecendo-o como conheço, vai ligar para Mackenzie e
tentar convencê-la a vir junto e levará outro sermão sobre como é
insuportável quando o assunto é casamento.
— Aidan, Chase, Ashton e, em breve, eu, não estaremos mais
vivendo com ele. Já pararam para pensar nisso? E Ashton tem
razão, ele está perdendo o controle. Quando não estamos por perto,
que merda ele pode fazer?
Silêncio pesa sobre a sala, sendo rasgado somente por nossas
inspirações intensas enquanto refletimos sobre como Finnick poderá
ficar sem nós por perto. Nunca foi uma preocupação. Ele sabia se
virar bem sozinho com a mãe, mas estamos falando de um Finnick
viciado em drogas. E agora parece que sei como ele se sentia em
relação à senhora Taylor. A única diferença é que Finn tem dinheiro
para sustentar a porra do vício.
Dissemos ao Jared que Finnick pegou uma virose. Ele quis
marcar uma consulta, mas garantimos que já tínhamos telefonado
para nosso médico particular e ele, receitado alguns remédios.
Engoliu a história porque não acredita que Bryan e Aidan mentiriam.
Chase e eu, por outro lado, estamos na lista de desconfiança do
nosso empresário.
— Então, vamos adotar um gatinho e torcer para que o
pobrezinho cuide do nosso amigo viciado por nós? — Aidan debate,
objeção injetada no timbre de sua voz. — Cacete, não faz o menor
sentido.
— Ele não cuidaria do Finnick, só o incentivaria a ficar bem,
cara — argumenta Bryan.
— A sugestão mais lógica é interná-lo. — Chase cogita, as
pestanas apertando enquanto encara a ponta dos tênis. — Mas
Finnick precisa aceitar a ajuda.
— Quem precisa de ajuda?
Sobressaltamos com a voz afiada perfurando nossa bolha.
Dirijo meus olhos para a porta, Gravity se infiltrando por um
estreitamento. A curiosidade refletindo em seu semblante sinuoso.
— Ashton! — exclama Bryan, viajando em direção a mim para
que eu reforce sua mentira. — Ele precisa de ajuda. Para lidar com
tudo que está acontecendo. Que bom que você está aqui, Gravity.
— Sorri como um idiota, e arqueio uma sobrancelha, sem nenhuma
vontade de apoiá-lo na desculpa esfarrapada.
— Entendi — sopra, desconfiada, os olhos divagando pelos
outros a fim de descobrir. — Cadê o Finn? — Cruza os braços, o
quadril largo caindo para o lado e o caixilho sustenta a lateral de seu
corpo. — Era uma reunião importante, por que ele não veio?
— Está doente, Gravity. — Aidan se levanta primeiro, e os
outros o seguem. — Vocês vão fazer algumas fotos espontâneas,
né? Vamos deixá-los sozinhos. Ashton, a gente te ajuda a
empacotar suas coisas! — Lança uma piscadela a mim quando
passa ao meu lado, um sorriso despretensioso despregando do
canto de sua boca. Babaca.
Eles saem rapidinho, enfileirados, me deixando sozinho com a
encrenqueira. Precisei de um banho gelado hoje de manhã para
aliviar a pressão do meu pau na calça. Minha mente me sabota e
me leva direto para os momentos em que eu a provoco.
Era para ela passar as noites pensando em mim, não o
contrário.
Era para ela estar sofrendo por não ter o meu toque, não eu.
Fodida do caralho. Ela não quer arrancar só meu dinheiro e
minha liberdade, quer dominar minha sanidade também.
— Roman está no corredor. Ele vai fotografar a gente. —
Gravity empurra a porta da sala, o baque oco recolhendo minha
atenção novamente para ela. — Avalon disse para sermos íntimos
porque ele vai dizer à Ravennah que nos pegou desprevenidos.
Colabore.
Abro a boca para reclamar porque já se tornou um hábito, mas
a fecho antes que minha mente termine de elaborar a resposta.
Ela abre as pernas e monta em mim. Seus joelhos abraçam
meu quadril, e sustenta o peso das mãos na extensão dos meus
ombros.
Engulo um xingamento quando manipula seu quadril contra a
minha pélvis. Estilhaços de excitação explodem e se concentram no
meu cerne. Exploro sua barriga blindada pela camisa preta de
botões e desço com determinação até que minhas mãos estejam
estacionadas em sua bunda, a puxando para mais perto, seus seios
são esmagados em minha parede de músculos.
— Aposto que está se divertindo, sua desgraçada — grunho,
meus dedos cavando sua bunda gostosa.
— Você tem uma boca suja. Deveria arrancar sua língua com
meus dentes.
— Por favor, faça isso. — Rio, levantando o queixo para minha
língua contornar sua boca. — Arranque a minha língua com seus
dentes. Vou gostar e implorar por mais.
— Como passou de ontem? — Sua voz vibra em meu peito.
Está baixa e controlada, um brilho determinado alastrando seus
olhos.
— Não tão bem como gostaria. Por que não atendeu ao
telefone?
— Por que eu atenderia? Não preciso estar ou falar com você
fora dos nossos compromissos contratuais.
— Não importa. Se eu ligar, você atende. Como uma boa
garota.
— Ah, Ashton... — Suspira, o hálito quente e adocicado
invadindo meu espaço pessoal e transtornando meus pensamentos.
— Eu não sou uma boa garota.
Ela aumenta a distância entre sua boceta e o meu pau, e por
mais que estejamos cobertos e o breve afastamento seja pequeno,
sinto falta da fricção como se estivesse debaixo da água e
precisasse desesperadamente de oxigênio. Então, ela senta com
tudo, tirando de mim um uivo de aflição potente que replica no
estúdio.
Meus dedos voam para sua nuca, fechando-os nos fios de
cabelo, e a trago para perto. Sua boca paira a menos de dez
centímetros da minha, consigo sentir a frequência cardíaca se
elevar sob a força com que a empunho na mão, e a respiração
afetada intercala entre inspirações curtas e expirações longas.
Aproximo-me mais dos seus lábios entreabertos, recebendo
nos meus o hálito doce. Puta merda. Quero possuí-la com tanta
força que poderia rasgá-la ao meio.
— Quando te ligar, você vai me atender imediatamente.
— Ou o quê?
A instigação cresce em seus olhos. Gravity adora me provocar.
Está ansiosa para o que posso fazer com ela caso eu decida puni-la
por ser tão indisciplinada. Mas tudo no seu tempo.
— Não quero Roman de testemunha, Gravity. Me desafie de
novo quando estivermos sozinhos.
A linha de seus lábios afina com um sorriso malicioso.
— Acho que ele já tem todas as fotos que precisa.
Gravity sai de cima de mim, a expressão mudando
drasticamente. Podia jurar que tinha desejo moldando seu rosto,
entretanto, nesse momento, ela parece séria e distante.
Dobras de pele se formam em minha testa enquanto estudo a
encrenqueira.
— Ontem não devo ter sido clara com você.
Ela corrige a postura ao cruzar os braços sobre os seios, e
meu peito gangorra em uma respiração afunilada. Entre minhas
pernas, meu pênis briga para romper a barreira da calça jeans e
entrar nela com tanta força que seus olhos saltariam dos orbes.
— Não estou interessada em foder com você. Só te beijei
porque você estava com raiva e queria te distrair dela. Não vai
acontecer nada entre nós, Ashton.
Girando no próprio eixo, se encaminha para a saída.
Gravity não entende que quanto mais rebelde é, mais me
incentiva a possuí-la. Nosso contrato se torna mais interessante
para mim quando sou desafiado.
“Você me segura apenas para alimentar seu ego”
HELP – ISABEL LAROSA

QUINTA-FEIRA, 22 DE AGOSTO DE 2024, ÀS 09H45MIN.

Carrego a última caixa com meus pertences para o quarto.


Subir e descer essas escadas esmagaram meu fôlego, mas preciso
admitir que Ashton não economizou na escolha do apartamento.
Meu quarto é quase do tamanho do apartamento de Tess. O
closet é imenso, com repartições para meus vestidos e prateleiras
para bolsas e sapatos. Claro que tudo que tenho, fui eu mesma que
fiz e não costumo acumular roupas, portanto, não vou demorar mais
que uma hora para arrumá-las nele.
Adentro o closet, um espelho de corpo inteiro no fundo que
tem luzes que acendem com um toque. A porta à direita leva ao
cômodo adjacente: um banheiro com duas pias e uma bancada de
granito preta e cubas brancas, uma banheira de hidromassagem e
mais armários para organizar os produtos de higiene pessoal.
Sinceramente, não sei por que precisaria de tanto espaço, mas
dizem que as pessoas compram de acordo com suas contas
bancárias, e esse apartamento é uma representação minúscula de
como eles cresceram financeiramente também.
Tem uma mochila no meu ombro, deixo-a escorregar para o
chão e a carrego pela alça, colocando-a sobre a bancada do
banheiro. Não pretendo organizar todas as minhas coisas agora.
Estou atarefada demais; depois que Avalon me deu um prazo e
comecei a estudar o estilo da The Reckless, não parei de trabalhar e
está sendo a melhor experiência.
Minhas últimas criações foram para mim mesma e já estava
começando a ter bloqueio criativo graças ao estresse trabalhando
com Magdalene. Passei a madrugada de terça para quarta e o dia
todo de ontem assistindo aos vídeos da turnê anterior da banda,
estudando como cada um gosta de se vestir. É claro que já
conhecê-los ajuda bastante, mas anos se passaram e não posso
esperar que nada tenha mudado.
Ainda quando penso nisso, em como tudo mudou de repente,
como nossos mundos se transformaram, não consigo acreditar que
é real.
Esses garotos tinham um sonho fantasioso. Tocavam no porão
mofado da cabana de Ashton. Publicavam vídeos apostando que
conseguiriam algum resultado com eles. Ensaiavam todos os
sábados. Tocavam em bares da cidade. Conheceram pessoas e as
deixaram para trás, marcaram algumas vidas e outras nem fizeram
tanta diferença assim.
Faith e Bailey retornaram para sua cidade natal. Maeve está
estudando teatro porque seu sonho ainda é se tornar uma grande
atriz. Trycia não quis voltar para Humperville, continua em Milão.
Willa assumiu os clubes de Darnell. Nate se mudou para fazer
faculdade.
É aterrorizante olhar para trás e ver que as pessoas que
faziam parte da sua vida encontraram um caminho diferente do seu
e, apesar de estarem presentes no seu pensamento, está ciente de
que elas nunca mais terão a importância que costumavam ter.
Empurro a mochila para o lado e encaminho-me para o quarto,
duas malas grandes abertas sobre a cama. As roupas de cama são
novas, sei porque estão engomadas, mas a fragrância de amaciante
não nega que foram lavadas antes de estarem ali.
Meu celular assovia no bolso de trás do meu jeans e um
suspiro escova minha garganta. Não preciso pegá-lo para saber
quem é. Desde que o TNC publicou sobre mim e Ashton na
segunda-feira, quando eles lançaram a suspeita de que estávamos
visitando um apartamento no Brooklyn, Mackenzie não parou de me
irritar com esse assunto. Depois, Roman, o paparazzo que a equipe
da The Reckless contratou para nos fotografar, vendeu suas fotos
para não só o TNC, mas replicou para todos os sites importantes
que ganham a vida publicando sobre celebridades.
Minhas fotos com Ashton no estúdio estouraram na internet.
Meu perfil está com quase duzentos mil seguidores agora. Muitos
comentários são fofos, outros me fazem querer arrancar os olhos.
Alguns fãs são absurdamente sensíveis quando o assunto são seus
ídolos em um relacionamento, ainda mais um que indica que está
caminhando para um possível casamento.
Ravennah pontuou que podemos estar indo rápido demais,
mas outro site disse que não existe tempo para o amor verdadeiro e
uma discussão interminável começou no Twitter. AshVity está até
hoje nos assuntos mais comentados e não paro de pensar no
quanto isso é insano.
Por que se empolgam ou se enfurecem por causa de um
relacionamento de pessoas que elas nem conhecem? Não consigo
entender.
As fotos publicadas no estúdio não deixaram nenhuma dúvida
de que estamos juntos e Ashton não tentou negar, mas não foi às
redes sociais confirmar. Continuamos criando suspense, publicando
fotos quando estamos juntos sem mostrar nossos rostos.
No entanto, minhas amigas estão a ponto de aparecer em
Nova York, me raptar e me manter em cativeiro até que eu tenha
uma explicação melhor do que: estou dando a ele uma segunda
chance. Merda, odeio que elas não confiem em mim porque fica
difícil sustentar a mentira quando conseguem argumentar contra
todas as minhas justificativas.
Com um suspiro, deslizo a mão para trás, pescando o celular.
Aperto o botão de bloqueio só para confirmar minhas suspeitas,
entretanto, o aparelho escorrega da minha mão e a quina quica no
chão, causando um estrondo. Meu coração dispara, cada músculo
do meu corpo congelando com a informação da mensagem.
— Que barulho foi esse? — A voz de Ashton invade o quarto.
Eu o estou evitando, só me encontrando com ele quando
necessário, mas combinamos de nos mudar hoje, então não tinha
mais como fugir.
— Meu celular.
Inclino o quadril para recuperá-lo, o girando na mão para
conferir se ainda está funcionando.
Ele poderia estar quebrado, seria ótimo.
— Qual é o problema? — Ashton deve reparar nos sulcos
estremecendo a pele de minha testa.
— Mackenzie.
— Aconteceu alguma coisa? — Minha respiração atropela as
palavras. Não consigo responder. — Porra, Gravity, está me
assustando. O que tem a Mackenzie?
— Ela, Effy e Delilah estão em Nova York.
— O quê?! — Ele brada, a entoação avolumando no quarto. —
Por quê?!
— Desde que o TNC publicou sobre nós, parei de responder.
— Parou de responder sua melhor amiga?
— E queria que eu fizesse o quê? Ela não parava de
perguntar! Posso até ser uma boa mentirosa, mas não encaro bem
a pressão, e Mackenzie é do tipo que pressiona! Ela não acredita
em mim!
— Bom, Effy pareceu convencida quando me perguntou e
contei que estávamos juntos! — Um suspiro esgotado ondula seu
peito. — Não pode contar para elas.
— Os outros sabem, por que não elas? — contesto, uma
máscara de raiva crescendo em meu rosto.
— Porque, porra, essa é a questão do segredo. Para ele ser
perfeito, ninguém pode saber. Os caras sabem porque estão tão
envolvidos nisso quanto você e eu. Eles também estão pagando por
seus serviços, encrenqueira.
Quando fala assim, sinto que vendi minha alma para o Diabo.
De fato, pode ter acontecido depois de todas as vezes que o deixei
me tocar quando não tinha nada a ver com o contrato ou como me
masturbei com ele deitado ao meu lado, imaginando que eram seus
dedos em vez de os meus.
Sinto o rubor aquecer minhas bochechas. Embora as
lembranças estejam limpas na minha mente, estou disposta a deixá-
lo o mais longe que for possível de mim.
— Mackenzie quer me ver. Nem contei para ela que íamos
morar juntos. Que desculpa vou arranjar? E não se esqueça de um
incrível detalhe: não estou apaixonada por você! Como vamos fingir
na frente delas?
— Como temos fingido o tempo todo desde que assinamos o
contrato, tá legal? Não sei por que está surtando desse jeito, porra.
— Céus, você não consegue dizer uma frase inteira sem
terminá-la com um xingamento? — Bufo, retirando minhas roupas
da mala com pressa.
— Onde elas estão? — Ashton vem para me ajudar, e quase o
expulso, se não fosse pela situação de que preciso terminar de
ajeitar as minhas coisas o mais rápido que puder e correr para
encontrá-las.
— Com os meninos. — Inflo o peito com ar, dobrando as
roupas no antebraço e correndo para o closet, para alinhá-las. —
Merda. Isso está errado.
— O que está errado? — Ashton me segue, mais roupas em
seus braços.
— Elas vão querer conhecer nosso apartamento.
— Não vai fazer sentido você dormir num quarto separado —
arremata, comprimindo os cílios enquanto formula uma solução. —
A gente organiza as coisas no meu quarto.
— Por que no seu quarto?
— Porque — ele arranca as roupas da minha mão com mais
força que o necessário, narinas dilatando de raiva — meu quarto é
maior e não faria nenhum sentido escolhermos o quarto de
hóspedes para nós.
— Você me colocou num quarto de hóspedes?!
— Por que eu te colocaria na suíte principal?
— Sério, você é... Argh!
Fecho as mãos em punhos, meus dentes cerrando e o
grunhido saindo de mim com aspereza. Pego todas as roupas que já
havia colocado no closet, embalando-as em meus braços, e marcho
para devolvê-las para a mala. Apresso-me para o banheiro,
alcançando a mochila na bancada, e a ajeito no ombro.
Examino o ambiente para conferir se não deixei nada para trás
antes de fechar a mala, e Ashton a retira de cima da cama. Ele
lidera o caminho através do corredor, seu quarto é na última porta, e
no minuto em que o abre, a luz natural do interior se espalha no
corredor.
O sol da manhã lambe meu rosto e escalda minha pele. A
visão do Rio East pela lateral e o amarelo pincelando a tela azul do
céu é de tirar o fôlego. Sorvo o ar, a mochila escorrendo do meu
ombro para o chão. O quarto principal tem janelas imensas por onde
consigo visualizar o flanco da ponte do Brooklyn.
A cama extensa fica no centro do quarto, uma parede de tijolos
expostos na cabeceira. Os aparadores ao lado da cama são pretos
e pendentes de ferro com luzes amarelas descem de uma prateleira.
Sobre ela, plantas com ramos que caem como cachoeira dos vasos
de barro. Inalo o ar puro e limpo do quarto, o perfume amadeirado
de Ashton embalando meu corpo como se eu fosse um bebê.
De frente para a cama, tem uma TV grande presa à parede
branca com textura ripada, embaixo dela, outra prateleira com mais
plantas. Na outra extremidade do quarto, dois contrabaixos estão
apoiados em um suporte de metal.
Um tapete preto de pelos amplo cobre metade do piso
castanho de madeira, e quase tropeço nele quando sigo o comando
de Ashton para o closet. É um daqueles cômodos “invisíveis”. Não o
teria descoberto. Parecia uma parede extensa, onde a TV está, mas
Ashton a aperta e depois de um clique, a porta abre e a impulsiona
para dentro. Ele arrasta minhas malas, uma em cada mão, e avalio
as várias prateleiras vagas.
— Coloque onde quiser. — Agita a mão em direção aos
espaços vazios. — Vou ajeitar suas coisas no banheiro.
— Não precisa colocar tudo. Aposto que irão embora amanhã
mesmo — aviso, vendo-o sumir para o anexo à esquerda,
desaparecendo pelo corredor estreito, onde imagino ser a entrada
para o banheiro.
Minha curiosidade não abafa nos minutos seguintes. Quero ver
como é o cômodo. Deixo minhas malas abertas no meio do
vestíbulo e vagueio para a esquerda. Ashton está retirando as
coisas da minha mochila e as organizando na bancada — é muito
parecida com a do outro quarto, exceto que essa tem quatro pias,
não duas — e a banheira de hidromassagem acomoda por volta de
cinco pessoas. Ao lado dela, cercada por um boxe com esquadrilhas
pretas que terminam no teto, uma ducha enorme. As paredes do
banheiro são feitas de vidro, tenho toda a visibilidade do exterior.
Confesso que sempre achei esse conceito excêntrico, mas elegante.
— Ninguém que está de fora pode ver aqui dentro — explica
Ashton, presumo que esteja me aliviando a respeito da visibilidade
externa.
— Claro, eu sabia disso. — Pigarreio, andando para perto
dele.
Meu corpo escorrega para o lado, o braço apoiado no caixilho
enquanto o analiso colocar minha escova de dentes ao lado da sua.
— Não estou confortável enganando elas assim — conto,
mordiscando o lábio inferior.
Preciso falar com alguém sobre o quanto toda essa história
tem me abalado. Durmo de consciência pesada porque casamento
é coisa séria. E meu desejo de encontrar alguém e firmar laços está
comigo desde que era criança e não mudou, nem depois que Neil se
foi.
Sinto que estou brincando com a união entre as pessoas.
Zombando daqueles que acreditam na felicidade do casamento.
Ashton é o único com quem poderia falar sobre todas essas
coisas, mas quando estamos juntos, é como se estivéssemos no
campo de batalha e armados, prontos para o nocaute.
Eu o odeio por ser como é? Odeio que seja um cafajeste e que
não se importe com os sentimentos dos outros? Odeio que tenha se
esforçado pra cacete para me machucar? Sim, todas essas coisas
fazem sentido, e eu juro de todo o meu coração que o ódio
enraizado não suaviza nem quando sua língua está na minha boca,
entretanto, quero uma trégua para conversar com ele como pessoas
civilizadas.
— Também não estou feliz de mentir para elas — diz, a
expressão mantendo-se neutra. — Mas se contarmos, serão mais
três pessoas que amamos envolvidas nas nossas merdas. Não acha
que já tem gente demais nisso? Já é foda pra caralho ter forçado
meus melhores amigos a concordarem com limpar minha barra. Não
quero Effy, Delilah ou Mackenzie carregando nosso segredo por aí.
A gente pode segurar a onda por elas por oito meses.
— Precisamos mesmo formular uma história, Ashton. Avalon
quer marcar uma entrevista com o TNC e não quero deixar brechas
para elas duvidarem de mim.
— A sua história é boa — admite, virando o corpo para
encostar a lombar na bancada. Ele cruza os braços, os bíceps
crescendo com a pressão debaixo da camiseta branca básica. —
Vamos usá-la.
— Tem certeza? — Arqueio uma sobrancelha, entortando os
lábios para a conformidade dele.
— Tenho. Faz sentido e as meninas vão acreditar, já que tenho
certeza de que disse para Delilah que estava apaixonado por você.
A confissão dele embaralha minha mente em um nível
exagerado. Minha pulsação vertiginosa replicando em minhas
têmporas, e, por um segundo, fico zonza. Tenho medo de falar e
minha voz entregar que fiquei abalada.
— Quatro anos atrás, lógico. — Ele ri em seguida, como se
percebesse minha falta de palavras. — Nem se você gozasse mel,
me apaixonaria por você hoje, encrenca.
E voltamos ao Ashton babaca.
— E por que não? — rebato, arrebitando o queixo para
provocá-lo.
Ashton inclina a cabeça para frente, o sorriso perspicaz
curvando a linha rígida de sua boca quando endireita o pescoço e
olha para mim.
— Você não faz meu tipo. Nunca fez.
— Nunca fiz? — devolvo, escondendo o ressentimento.
— Não. Preciso te lembrar que foi você quem fez tudo que
podia para tentar ficar comigo? Desde me comprar passagens para
Paris até me fazer ciúmes com Liam quando estávamos juntos lá?
Você é astuciosa, Gravity. Sempre te admirei por ser determinada,
que não se importa com os meios, contanto que consiga o que quer
no final.
— Claro. — Sorrio, sem confiar nas palavras que está dizendo
porque ontem mesmo, Ashton estava tentando conseguir minha
atenção.
— Não confunda meu desejo com sentimento. Você é gostosa
e eu te foderia como ninguém. Mas nunca me casaria com você.
Meu corpo retesa.
— Você é muito egocêntrico. Age como se eu fosse te
escolher. Por favor, Ashton, nem todas as mulheres estão
desesperadas pela sua atenção.
— Não estamos falando de todas as mulheres, estamos?
— Não, mas é difícil manter uma conversa com você quando
tudo que sai da sua boca é merda.
Desencosto do caixilho, corrigindo a postura. Ele é rápido,
reconheço. Ashton tem um superpoder escondido debaixo desses
olhos de carvão, que é basicamente destruir tudo o que toca. E tudo
o que faz para responder a minha ínfima explosão de raiva é sorrir
como o inabalável que aparenta ser. De todas as coisas que já disse
para tentar estar ao seu nível, Ashton só demonstrou frieza para os
meus ataques. Brigar com ele é como desferir murros em
fragmentos de vidro.
As consequências sempre voltam para mim, enquanto do outro
lado, Ashton não passa de um homem desinteressado. Ele nunca
saiu com todas aquelas garotas inconscientemente. Sempre soube
o que tiraria delas e o que elas poderiam oferecer: sexo sem
nenhum envolvimento emocional.
Acredito que tenha sido claro quanto às suas intenções, mas a
maioria fantasia sendo sua alma gêmea e acredita que será a
responsável por tirá-lo de seus dias gloriosos de farra.
Eu, por outro lado, não acredito que sou capaz de salvar
ninguém. Ainda estou lutando para salvar a mim mesma e, às
vezes, parece que meu tempo está acabando. Evito olhar para a
massa obscura corroendo minha alma brilhante, ajo com indiferença
com o meu passado para não ter que enfrentá-lo.
Por que eu arregaçaria as mangas e tentaria pular atrás de
alguém que não consegue nem decidir por si mesmo? Ashton é o
que é devido à bagagem que carrega, e eu sou o que sou por tudo
que precisei passar para me reerguer. Então, cada um de nós está
apegado àquilo que nos mantêm amparados. E é confortável
demais por aqui para sair querendo algo diferente do que nós
encontramos.
— Apenas finja que está apaixonado — digo, por fim, quando
ele não demonstra interesse em me responder. — Se você agir
como um otário, não terei como arranjar uma desculpa para elas.
— Quando é que eu ajo assim? — caçoa, um sorriso irritante
brincando com os meus sentidos.
Preciso sair de perto dele antes que lhe acerte outro soco.
— Basicamente em todas as vezes que tento ter uma conversa
com você.
“Você acha que é um presente de Deus
Bem, você está errado”
BETTER THAN THIS – HEATHER JAYNE

Gravity:
Quando chegar aqui, prometo te explicar tudo.
Essa foi a resposta que dei à Mackenzie quando a informei
que havia me mudado para o Brooklyn Heights e convidei a ela e às
outras para virem hoje à noite. Mack enviou um polegar confirmando
que tinha entendido e passei a localização junto da mensagem,
embora tenha certeza de que Bryan sabe exatamente para onde
Ashton e eu nos mudamos.
Deixei meus rastros no quarto de Ashton. Não acho que
minhas amigas vasculhariam atrás de provas de que o que estamos
dizendo é verdade, contudo, também não quero abrir chances para
ser questionada.
Existe uma pequena probabilidade de acreditarem na mentira,
mas não vou me apegar a ela. Sendo sincera, não estou totalmente
de acordo em esconder esse casamento de fachada delas. Mas
também quero fugir do dramalhão que vão criar em cima disso se
souberem. Consigo ouvir o discurso ensandecido de Mackenzie, a
bronca de Delilah e, para ser honesta, acredito que Effy me apoiaria,
entretanto, otimismo sempre é o que mais me irrita nas pessoas.
Quando a situação está ruim, devemos encarar o fato como
realmente é. E a minha com Ashton é péssima. A gente se odeia.
Briga na maior parte do tempo e não posso mentir que as bolsas
roxas cercando ao redor dos meus olhos não têm influência daquele
imbecil insensível. Meu vocabulário está cada vez mais maçante
porque não tenho outros nomes para descrever o sentimento
crescendo na base da minha espinha e explodindo em dores de
cabeça.
O céu começa a se colorir de um laranja acentuando,
ampliando-se no horizonte, e entranha a janela, realçando a
madeira do piso do quarto principal.
Como trouxemos minhas roupas e produtos pra cá, precisei
me arrumar aqui. Um rubor quente desenvolvendo do alto das
minhas bochechas cresce e as cobre por inteiro porque acabei de
sair do banho.
Escovo as mãos pelo vestido preto, descobrindo como o tecido
evidencia meu quadril largo, abraçando meu corpo. Já faz um tempo
que não desenho nada pessoal, é um modelito antigo, inclusive, um
dos que fiz em Milão. Ele é mais curto que os outros dentro do
armário, seu comprimento termina onde minhas coxas começam e
há uma abertura de uns cinco centímetros na lateral esquerda.
O brilho do vestido ressalta de acordo com a exposição à luz.
As alças são duas tiras finas do pano e ele tem um vasto decote nas
costas. A ponta do V do corte surge na base da lombar e se alarga
até as escápulas, descortinando a pele bronzeada de sol no meu
torso. Solto os cabelos dos grampos, ondas fluindo por sobre os
ombros. Minha franja faz uma curva dos dois lados e fixo as pontas
com presilhas.
O som do chuveiro cessa, indicando que Ashton acabou seu
banho.
Termino de calçar as sandálias de salto e prendo as tiras ao
redor das panturrilhas, mas acabo me enrolando na hora de colocar
os brincos.
Prestes a sair, a porta do banheiro abre, e Ashton aparece no
corredor que conecta ao closet. Pingos de água embalam sua pele
pálida dos ombros, descendo para o peito e abdômen. Pigarreio,
fugindo com os olhos para outra direção, me recordando da última
vez que o vi seminu. Nada mudou, exceto pelo fato de que o acho
um ser desprezível, porém gostoso demais.
— Já estava de saída — alerto-o, começando a me
encaminhar para fora do cubículo.
— Tenho que te entregar uma coisa. — Ele me para, a voz
rouca retinindo dentro da minha cabeça.
Ouço o bramido de uma gaveta abrir e fechar. Em seguida, o
calor do seu corpo se aproxima do meu.
— Se começar com suas gracinhas, juro por Deus, Ashton…
— Você não cansa de me ameaçar em vão?
Sua risada irônica vibra em minha coluna quando se aproxima
mais. Resisto à vontade de me virar e brigar com ele. Sinceramente,
a ineficácia da discussão se provou ser mais forte do que minha
vontade de fazê-lo engolir tudo que diz.
— Não concordo com o comprimento do seu vestido, mas está
muito bonita, encrenca.
Outro sorriso cáustico replica dentro do cômodo apertado.
Reviro os olhos tão forte que por trás deles dói, e começo a
acreditar que podem saltar para fora se eu passar mais tempo com
Ashton, ouvindo seus comentários absurdos.
Meu corpo entra em defensiva quando estamos por perto. Meu
consciente já entendeu que minha necessidade física é um
problema e a razão sempre perde para a vontade de ser tocada.
Especialmente quando o homem em questão sabe onde pode me
desestabilizar.
Prendo a respiração, os pulmões reclamando quando não
conseguem exalar. A pele se arrepia onde a ponta dos dedos
acaricia meu pescoço. O toque é gentil e inocente, porém, uno as
coxas com força, prendendo minha excitação para não ser a
responsável por minha estupidez outra vez.
— Você não tem que concordar com porra nenhuma —
censuro, minha voz áspera ecoando entre nós dois.
— Eu sou ciumento.
— Esse problema não é meu.
— A partir de agora, é.
Espalmando minha barriga, ele crava os dedos por sobre o
umbigo e encaixa o nariz em minha jugular, aspirando minha pele
como se fosse um viciado. O tecido se embola entre os dedos
afincados, e a proximidade do seu corpo e a essência do pós-barba
vinculado ao xampu embaralham meus sentidos com tanta
facilidade, que mentalmente estou amaldiçoando a porra do mundo
inteiro. Ainda anestesiada pelo toque, Ashton concentra sua força
no braço ancorado ao redor de mim e com um movimento violento,
me desloca para junto do seu tórax.
— O que foi que você disse sobre eu nunca mais te tocar? —
O desgraçado ri contra minha pele, o calor do seu hálito
corroborando para me aquiescer. — Assim perde a graça, Gravity...
Gostava mais quando você fingia ser difícil. — Suspira com
decepção e, em seguida, está afastando meu corpo do seu.
Raiva se avoluma dentro de mim, ondulando conforme sua
mão volta a escorregar para o meu pescoço. Ele o aperta antes que
um material gélido se choque com o calor da minha pele.
Desço os olhos para acompanhar o que está acontecendo e
um pingente transcorre em meu colo. É um coração partido. Ashton
sobe com o objeto e ele fica como uma gargantilha. Viro-me quando
termina de colocá-lo em mim, flagrando-o pôr outro em si mesmo.
— É um presente — conta, e eu atravesso por ele, indo
verificar no espelho. É metade de um coração de prata pura e nele
está gravado “Ash”.
Franzo a testa, me voltando para ele.
— É uma coleira — acuso, e olho para o pingente igual ao meu
pendendo em seu pescoço. A outra metade do coração está
gravado com “Vity”.
— Faria sentido porque você é mesmo uma cadela.
Minha mão voa antes mesmo de a consciência me impedir de
fazê-lo. A palma arde com a bofetada, mas uma parte ampla de mim
está feliz por ter reagido. Tenho escutado e aguentado todas as
porcarias saindo da boca dele porque ainda tenho esperança na
pessoa que pensei ter conhecido, mas existe um limite e ele já
ultrapassou o meu há muito tempo.
A vermelhidão na lateral de seu rosto cresce, formando um
vergão. As narinas estendidas manifestando a raiva que deve estar
sentindo de mim. Imponho meu corpo, meu busto subindo e
descendo em uma respiração desnivelada.
— Quer me odiar? Odeie. Mas odeie em silêncio. Odeie dentro
do seu mundinho perverso, só não me afunde com você. Estou
tentando me restabelecer, encontrar meu caminho e sinto muito que
eu seja a responsável por trazer de volta seus fantasmas, mas estou
cansada de ser humilhada! Não estou esperando um pedido de
desculpas porque você não reconhece nenhum dos seus erros, mas
pelo menos me deixe fazer o que está me pagando para fazer sem
desejar te matar a cada segundo do meu dia! — esbravejo,
gotículas de saliva respingando em seu rosto enquanto grito.
— Me bata de novo — tomando meu pulso, ele me arrasta, e
espalmo seu peitoral para impedir a colisão — e eu vou comer essa
boceta tão fundo, que você não vai conseguir andar.
— Você está se ouvindo?
— Muito claro e em bom som, Gravity. Estou preso a você por
malditos oito meses. Sabe como eu lido com meus problemas?
Fodendo. Tenho feito isso há anos e por sua causa, não tenho meu
consolo.
— Então, esse é o problema? Não ter sexo?
— Não só esse, como não consigo superar você ser uma
maldita sanguessuga.
Entreabro os lábios, a voz desaparecendo por sobre o som do
telefone da recepção tocando. Aperto os olhos com força, um
suspiro carregado fluindo da minha boca.
— Quer saber o meu ponto de vista dessa situação? — Ashton
não responde, mas as íris escuras se concentram em mim. — Você
odeia não conseguir esconder que me quer. Você não suporta que
não consegue me odiar inteiramente, que uma parte, de algum jeito,
consegue controlar todo o resto, e não é de ódio que estamos
falando. E o que te enfurece ainda mais é saber que não estou nem
um pouco interessada em você, nos seus joguinhos ou na porcaria
do seu drama! — guincho, minha boca flutuando por cima da sua,
nossos olhos faiscando em puro sangue e raiva. — Você estava
empenhado em me fazer ficar apaixonada por você, mas tudo que
conseguiu até agora foi meu desprezo genuíno.
— Eu sei que te deixo molhada! — Raiva ferve em seus olhos
e faz seu corpo tremer.
— Me deixa molhada? — Inclino a cabeça para trás, a
gargalhada repercutindo no closet. — Você pode me excitar, mas
não pode ter meu coração, e homens como você não querem só
excitar, querem que estejamos entregues de corpo, alma e paixão.
Me diz, como é saber que eu sou a única a cruzar o seu caminho
que não está se rastejando pela sua atenção? — Ranjo os dentes,
retorcendo meu pulso até que esteja livre do seu agarre. — Só está
agindo feito um babaca porque sabe que estamos presos pelo
contrato, mas não espere que eu continue na sua vida quando ele
acabar. Eu espero nunca mais ter que olhar para você, Ashton. Você
vai morrer para mim.
Pego meu celular que deixei em um dos vácuos do closet, o
contorno e ando apressada para fora do quarto. O telefone parou de
tocar, mas confiro minhas mensagens e tem uma de Mackenzie
dizendo que estão no saguão esperando autorização para subir.
Ligo para a recepção e permito a entrada.
Nos breves segundos esperando recebê-los aproveito para
respirar, a ardência se acumulando no fundo dos meus olhos
enquanto seguro meu quadril com as mãos. Empurro a cabeça para
trás como se fosse impedir as lágrimas. Continuo insistindo na
tentativa esquisita porque se manchar o rímel, será um prato cheio
para Mackenzie me impelir a uma confissão.
Encaminho-me para o hall quando ouço o apito do elevador.
Pressiono com a ponta dos dedos a linha d’água dos meus olhos e
desenho um sorriso no rosto no momento em que as portas se
abrem. Eles estão quase empilhados, mas meu coração pulsa em
euforia ao vê-las. Effy, Mackenzie e Delilah saem primeiro, as três
correndo em minha direção para me cercar com um abraço
aconchegante. Merda, estou tão feliz em vê-las.
Soluço, o grave do meu choro replicando na entrada do
apartamento.
— Ei, por que esse choro? — Delilah ri, afastando-se do
abraço para me estudar. A testa franze para mim. — Você está
mesmo emocionada de nos ver? — Semicerra os olhos com um ar
de suspeita, mas sei que está só sendo insuportavelmente
provocadora.
— Pobrezinha, eles deram muito trabalho? — Mackenzie espia
por sobre o ombro, lançando um olhar enviesado para Bryan. — Ou
você já se arrependeu de ter aceitado namorar com o Ashton? —
sussurra, voltando para me analisar com apreensão.
Caio na risada, engolindo o choro, e puxo para abraçá-la outra
vez. Um ano. Faz um ano que não as vejo pessoalmente. E,
sinceramente, depois de Milão, passei a apreciar os momentos com
as pessoas que me amam de verdade. Estive cercada por falsidade,
brigas e disputas, é bom estar no meio de quem não tenta te
machucar, para variar.
Um suspiro de alívio por estar outra vez com minhas melhores
amigas exala de mim e, dessa vez, ele é sonoro. Puxo Effy e Delilah
para junto, nós quatro emboladas em um monte humano no centro
do saguão enquanto os outros começam a entrar. Desisto de não
borrar a maquiagem e quando paro de abraçá-las, pressiono com os
dedos nas trilhas que as lágrimas fizeram no rosto.
— Mas o que é essa coisa? — Delilah cochicha, espremendo
as pestanas enquanto estuda a metade do coração pendendo do
meu pescoço. — Você está usando um colar com o nome dele?
Sério? Você? — Espanta-se, a boca se abrindo em um O perfeito.
Tess me cumprimenta com um aceno e segue Chase para o
fundo do apartamento. Estou pronta para receber o interrogatório
das minhas amigas ali mesmo.
— Pode apostar que ela está! — Effy gargalha, apanhando o
pingente entre os dedos. — Olha só, parece ser prata mesmo.
Aposto que ele te forçou a usar.
— Gravity, pisque duas vezes se for um pedido de socorro —
caçoa Mackenzie, cruzando os braços. — Porque você não pode
estar esperando que nós acreditemos nesse showzinho!
— Não é um showzinho — enfatizo, girando e rumando para o
sentido que os meninos seguiram.
Effy ancora o braço no meu cotovelo, seus lábios firmados em
um sorriso gentil. Amo tanto essa garota que dói.
— Estamos em um relacionamento. — Tento ser convincente,
mas ela me encara com os olhos cerrados, então não tenho certeza
se estou sendo expressiva demais e minhas feições acabam por me
entregar. — E estamos felizes — prossigo, fixando minha atenção
nela.
— Ainda parece que estamos num universo paralelo. —
Delilah me inspeciona, as íris azuladas estreitadas sobre mim. —
Tipo, você Gravity Monaghan, superou o que ele fez em Paris e, em
menos de duas semanas, o relacionamento de vocês avançou de
uma segunda chance para isso? — Repara ao nosso redor, se
referindo a estarmos morando juntos.
Solto uma risada consternada porque Delilah tem razão.
Caramba, não quero mentir para elas. De jeito nenhum. E está me
aborrecendo fazer por causa dele.
— Não foi em duas semanas — contra-argumento, sem
desviar do destino, que é a sala onde os meninos já escolheram
seus lugares e estão se acomodando. — Ashton me procurou logo
que me mudei para Nova York. Foram muitos nãos antes que eu
dissesse sim.
— E por que você nunca nos disse nada? — Effy apura, as
duas bolas amendoadas que fundem seus olhos pairando sobre
mim com um ar curioso. — Ashton me explicou que não atendeu às
minhas ligações em Paris porque surgiu uma emergência pessoal.
Mas quando você finalmente nos contou o motivo, sério, não achei
que fosse conseguir perdoá-lo. Você é muito seleta nos
relacionamentos e sempre brigou comigo por causa do Finnick.
Minha decisão de abrir o jogo com elas sobre Ashton veio logo
antes de me mudar para Milão. Foi uma longa conversa no dia em
que peguei o voo para a Itália, que acarretou nelas chocadas e
também magoadas com ele por causa da mentira e por nunca ter se
desculpado pelo que aconteceu.
Delilah tem raiva de Ashton pelo que falou dela, mas também
tem um leve ressentimento por minha causa. Ele contou a versão
dele dos fatos e, quando contei a minha, somada à mágoa que ela
já estava sentindo, imagino que foi como uma bola de neve
crescendo.
— E com a gente por causa do Bryan e do Aidan. — Delilah
acrescenta, apontando de Mackenzie para ela, as suspeitas se
ampliando a cada pretexto. — Vocês estão juntos por outro motivo
— declara, com a testa franzida. — Conheço o Ashton. Ele é
orgulhoso pra caramba. Ele não se desculpou com você. O que está
acontecendo? — Estanca no lugar, forçando-me a parar também. —
Viemos até aqui porque estamos preocupadas com você.
— Não tem nada com o que se preocupar — asseguro,
forçando uma risadinha na qual elas não confiam. — É sério, nós
realmente estamos juntos. — Dou ênfase à palavra, minha
respiração despencando a cada pressão.
— Você não mentiria pra gente, certo? Se estivesse com ele
por outros motivos, contaria? — Mackenzie me examina, como se
fosse capaz de pescar alguma coisa de mim se estiver apreensiva,
entretanto, já escondi coisas piores dela e não estou esperando que
um dia descubra. — Então, vamos supor que vocês estejam juntos
porque estão apaixonados, por que rápido desse jeito? — Cruza os
braços, e a cada segundo, sinto-me mais encurralada.
— Deus do céu, não foi repentino. Ele me procurou e eu o
rejeitei. Por isso ele estava transando com qualquer pessoa.
— Ashton transa com qualquer pessoa, independentemente do
motivo. — Delilah avança um passo, revistando meu semblante
apático.
— Ele estava descontando a raiva, Delilah. Você não o
conhece tão bem. Vocês sequer eram amigos de verdade porque,
sinceramente, não estão se falando até hoje! — Minha explosão
repentina é um atalho para escapar do interrogatório. Embora
estivesse preparada, não esperava que fosse tão súbito. — Se
vocês ficassem com raiva de mim e me ignorassem por quase três
anos, estaria surtando! Ele é bem de boa quanto ao rompimento de
vocês.
Delilah recua, e, nesse momento, vejo que a atingi em um
ponto sensível, o que, honestamente, não estava esperando. Ela
sempre se mostrou determinada quanto a continuar distante dele,
como se quisesse ensiná-lo uma lição valiosa, mas ao conectar
meus olhos aos dela, vejo a profundidade do quão magoada está.
Talvez não tenha mais nada a ver com o que Ashton disse, e sim ele
nunca tê-la procurado de verdade para tentar consertar as coisas. A
amizade deles era importante para ela. Agora estou começando a
achar que mais do que era para ele.
— Você sabe se cuidar muito bem.
— Delilah, me desculpa, só estou dizendo que é exagero
vocês desconfiarem de mim. Estamos juntos. Estou feliz e quero
poder contar tudo para vocês sem sentir que estou cometendo um
erro enorme dando uma chance a ele.
— A gente faz você se sentir assim? — Effy tenta entender.
— Às vezes, sim. Vocês estão desconfiando da veracidade do
meu relacionamento e isso me chateia — digo com sinceridade. —
Amo vocês e como minhas melhores amigas, quero o seu apoio.
— Só quero que você veja do nosso ponto de vista. Foi, sim,
repentino. Nunca disse que Ashton estava por aí atrás de você e
muito menos que estava considerando tentar um relacionamento
com ele. Então…
— Amor.
Sobressalto com a voz rouca imperando às minhas costas.
Viro-me devagar rumo ao som gutural, Lilah, Mack e Effy
acompanhando a direção da minha atenção. Ashton está de calça
jeans e camiseta básica branca, os bíceps e o peitoral quase
rompendo a malha fina com os músculos proeminentes.
Trago o nó de chumbo fechando a garganta quando o vejo se
aproximar. Por alguns minutos, esqueci da nossa discussão e do
tapa que dei nele, ainda que minha palma esteja ardendo e o rastro
vermelho siga intacto em sua bochecha, tamanha a força com que o
golpeei.
Amor.
Que apelido mais ridículo e nada original.
Noto a sobrancelha de Delilah arcar para ele.
— Amor? Sério? — Mack cochicha para uma delas, e me
esforço para sorrir.
— Oi — cumprimento ao sentir a fragrância do seu perfume
amadeirado encher minhas narinas quando cobre meus ombros
com o braço. — Já estava indo te encontrar.
— Oi para vocês. Sentiram tanta saudade que precisaram vir à
Nova York? — brinca, sorrindo, e a covinha marca o canto esquerdo
de sua bochecha.
— Na verdade, vim verificar se você não tinha sequestrado a
minha amiga e estava mantendo ela em cativeiro! — Delilah replica,
juntando os cílios grossos para fitá-lo.
— Você pensa tão mal de mim. — Ele estala a língua no céu
da boca, a gargalhada ondulando seu peito.
— Já me deu todos os motivos para pensar pior. —
Contornando-o, marcha para onde os outros estão reunidos,
conversando e já com cervejas nas mãos.
Fazemos um minuto de silêncio, Ashton a acompanhando por
cima do ombro com um vinco separando sua testa.
— Oi! — Effy exclama, dando saltinhos em direção a ele.
Ashton me solta para abraçá-la, os dois se aconchegando um
no outro e balançando para os lados. Ele pousa um beijo no topo da
cabeça dela, inspirando o perfume familiar de melancia do protetor
labial que Effy usa há uns bons anos. A forma como Ashton trata
Effy é diferente. Ele lida com ela com tanto carinho e cuidado.
Um desconforto se manifesta no âmago do meu estômago, um
laço envolvendo minhas entranhas. O jeito como Ashton me trata é
totalmente o oposto da maneira como a está tratando e uma coisa
me ocorre: já cheguei a pensar que ela era apaixonada por ele e ele
por ela. Mais de uma vez essa dúvida se levantou, mas Effy sempre
negou. Partindo dela, tenho certeza que não, mas e dele?
Presenciando como Ashton cuida de Effy, a suspeita se
amplia. Ele é sempre educado e paciente se tratando dela. Não usa
palavras feias nem tenta magoá-la de propósito.
Cruzo os braços na frente da barriga, como se isso fosse
travar a inquietação. Abaixo a cabeça, esperando os dois
terminarem. Mackenzie também o cumprimenta com um abraço,
mas não é nada tão prolongado como com Effy. Ambas começam a
se afastar, Mack nos observando por sobre o ombro.
Minha boca se curva, desenhando o sorriso para consolá-la.
— Amor? — murmuro baixinho por entre os dentes cerrados.
— Seja mais original. E você fica cafona.
— Todo imbecil apaixonado é cafona — troveja, com a
mandíbula contraída. — De nada por te resgatar.
— Estava indo muito bem, então não preciso te agradecer.
— Você me deixou falando sozinho de novo.
— Já tínhamos terminado.
Estamos chiando um com o outro, falando baixo para não
sermos notados, mas ora ou outra, Mackenzie relanceia suas vistas
para nós, consequentemente me deixando perturbada.
— A palavra final tem que ser a sua?
— Você se incomoda por não ter sido a sua — retalio,
endireitando o corpo. — Encontre um jeito de se sentir confortável
com como a conversa acabou porque não vamos mais brigar.
Cansei de você.
Meus pés se movem primeiro, corrigindo o destino para junto
deles, mas meus passos são detidos pelos dedos de Ashton
rodeando o cotovelo. Meu corpo retrocede poucos passos para
atrás e, girando-me para que seus olhos estejam sobre mim,
murmura, a boca ameaçando me devorar:
— Qual é o seu objetivo, hum? Me enlouquecer?
— Nada do que eu faço tem a ver com você, mas o seu ego
quer que seja o contrário — retruco, a mesma ira que nubla suas íris
encharcando as minhas.
Ainda que esteja com raiva, noto que a dele é diferente.
Ashton não deixa rachaduras. Nada que possa ser usado contra ele
porque quer estar por cima na maior parte do tempo. Mas a
hostilidade do nosso relacionamento mexe com ele. Deixa-o
indefeso, e consigo enxergar, mesmo que com muita dificuldade,
que nossas discussões são suas partes favoritas. Ele fica com
tesão. É o jeito que encontrou de chamar a minha atenção porque
desde que decidi não estar mais em sua vida, estive indiferente a
tudo que fosse relacionado a Ashton Baker. Fiz meu papel com
primor. Durante os quatro anos, foi como se nunca nada tivesse
acontecido entre nós e na sua presença eu sequer fazia questão de
reparar.
— Me irritar é o seu jeito de conseguir minha atenção? Se quer
que eu te veja, aja como um adulto, para variar. Estou cansada de
lidar com um moleque mimado e mesquinho.
Solto o braço, tornando a marchar para perto dos outros.
Não olho para trás para conferir se Ashton se move, mas sua falta
de palavras diz que não estou totalmente errada.
“Começou com uma faísca depois virou um incêndio!
Me queimando, me consumindo”
RESENTMENT – A DAY TO REMEMBER

Meu pai nunca se desculpou por suas falhas comigo. Cresci


sem entender quão valioso é a frase “sinto muito”. E a incrível
semelhança é que, assim como meu pai, nunca me senti
arrependido de nenhuma das minhas escolhas. Por mais horrendas
que sejam, as fiz consciente das consequências.
Nunca é minha intenção magoar ninguém, mas também é
subjetivo. O que um pode levar como uma ofensa, para o outro não
significa nada. E sim, tenho a péssima prática, desde a minha
adolescência, de ser imprudente para ganhar a atenção das
pessoas ou pelo menos reparar na minha dor ocasionando dor ao
outro.
Quando soube que Nicola estava me usando, a primeira coisa
que fiz, em uma atitude impensada, foi trepar com a professora
novata de Literatura.
Caralho, gostei tanto daquilo. Da adrenalina de ser pego. Das
pessoas comentando sobre o que tinha acontecido. De estar sendo
endeusado pelos outros alunos e desejado pelas líderes de torcida.
Do olhar assombrado de Nicola perseguindo-me nos corredores
enquanto eu desfilava com um ar de superioridade, como se a
tivesse vencido no jogo. Foi do caralho ter essa experiência.
Depois disso, encontrei meu método. Um jeito de enfrentar
uma parte adoecida da minha mente que me fazia crer que eu era
fraco.
As surras do meu pai formaram meu caráter. A traição de
Nicola me ensinou a fazer o que estiver ao meu alcance para não
ser usado por mais ninguém. A humilhação que Alex fazia comigo,
como meu irmão mais velho, reencarnando a podridão do meu pai,
moldou parte do que sou hoje.
Não estou justificando, mas entendo que minhas raízes são o
grande motivo de eu ser um cuzão. Esse é quem sou. Não vou
mudar para me encaixar nas expectativas dos outros. Fiz isso por
tempo o bastante para entender que nunca é o suficiente. Para
nenhum dos lados. Não vou ficar feliz agindo totalmente ao contrário
do que acredito e não vou deixar ninguém satisfeito me moldando a
uma personalidade que não é minha.
É a segunda ligação de Harper nesta semana. Ela não
costuma agir como desesperada, esse é um dos motivos pelo qual a
gente se dá tão bem.
Gravity está sentada ao meu lado e não tenho certeza se nota
o nome tinir a tela do meu telefone quando o viro para baixo, o visor
contra braço do sofá. O que ela disse, quase uma hora atrás, ainda
me importunando como uma pedra na ponta do sapato.
Pedimos comida tailandesa. Existe uma gama enorme de
culinária em Nova York, culturas diferentes para conhecermos.
Mastigo meu Pad Thai em silêncio, parte da minha concentração
voltada para a conversa rolando na roda e outra, centrada em tudo
que aconteceu hoje.
O rastro do tapa de Gravity finou, mas a raiva não. A última
vez que alguém me tocou, foi a porra do jogador de basquete. E
mantive minha paciência no auge, provando que posso ter controle
da minha agressividade se quiser.
Porém é a segunda vez que Gravity explode comigo. Não vou
mentir. Quando ela está brava daquele jeito, só penso que fodê-la
no pico da raiva seria delicioso. Não paro de criar expectativas, de
como poderia reparar sua impetuosidade com sexo. Não o que
tivemos em Paris, mas um selvagem e depravado.
O celular rasga minha linha de pensamento tocando outra vez.
Agarro-o, colocando a tela para cima, e o nome de Harper está lá de
novo. Merda.
— Não vai atender? — A voz de Gravity ressoa.
— Não.
Ignoro a ligação, voltando a me atentar à conversa, dessa vez
um pouco mais focado neles. Estou com saudade de Effy,
Mackenzie e Delilah, mas meu orgulho não me permite admitir.
Às vezes, espio Finnick, tentando identificar evidências de que
andou se drogando. Não posso me enganar, é claro que sim. Ele
está viciado. A pessoa não simplesmente decide parar com elas.
Quando se está viciado, a droga é quem está no controle, não você.
A senhora Taylor foi a maior prova de que não é possível se afundar
mais em algo na vida do que nesses entorpecentes.
A minha parte favorita dos meus dias, sem sombra de dúvida,
vinha desses momentos nos quais estávamos todos juntos, mas
Gravity e eu estamos em frequente tensão e a parte divertida do
meu dia é perturbá-la. Meu passatempo preferido recém adquirido.
Gosto ainda mais quando revida. Mostra que, embora esteja
diferente de quando nos conhecemos, tem um resto de dignidade
nela.
Quero que me bata outra vez. Dessa vez, vou cuidar de ser
recompensado.
— Ashton, seu telefone está tocando de novo. — Delilah
recupera minha atenção para ela. — Se não vai atender, desliga.
— É a Harper. — Tess diz, centelhas de tumulto toldando suas
vistas, focando no próprio celular. — Oi, Harper! — atende, saindo
da sala para o outro cômodo.
— Harper? — Mackenzie profere, posso ouvir as engrenagens
do seu cérebro trabalhando enquanto liga o nome à pessoa. — É a
melhor amiga da Tess e a garota que você estava saindo antes da
Vity?
Mackenzie é insuportável quando seu objetivo é me infernizar.
— Saímos algumas vezes, nada demais. — Sacolejo os
ombros, não dando tanta importância para o comentário com esgar.
— Ela lidou bem com o relacionamento de vocês? — Ela
sonda, as duas olivas que compõem suas íris me alvejando.
— Harper? — Bryan agarra a namorada pela cintura, pondo-a
sentada em seu colo. — Ashton até queria que as coisas entre os
dois evoluíssem, mas ele encontrou sua versão feminina e muito
pior. — Gargalha alto, e, na mesma hora, meu semblante assume
um aspecto de ódio.
Bocudo do caralho. E a fama de fofoqueiro, sou eu que
carrego. Ele limpa a garganta, piscando com um ar de inocente. Já
está difícil convencê-las e os comentários de Bryan não estão
facilitando nem um pouco. Dá para ver como fica agitado por estar
escondendo as coisas de Mackenzie, mas dessa vez todos nós
estamos envolvidos.
— Péssimas notícias… — Tess volta, expressando com um
suspiro audível e eliminando a discussão previsível entre mim e
Mackenzie. — Harper está na cidade. Desculpa, Effy, será que você
pode ficar por aqui? Com Ashton e Gravity?
— Ah — pondera, abre e fecha a boca, esperando por nossa
aprovação.
— Claro. — Gravity sorri cordialmente, e faço o mesmo, como
se não houvesse nenhum problema.
Porém temos vários, começando pelo fato de que não somos
um casal e Effy pode acreditar no relacionamento, mas não vou
testar o faro afiado dela para descobrir.
Tentei flagrar qualquer interação entre ela e Finnick, entretanto,
até agora, os dois não trocaram nem uma palavra. Effy sequer olha
para ele. E Finn passou metade da noite no celular ou bebendo até
que começasse a pestanejar de sono. Estou a cada dia mais
preocupado com ele e quase mandando Bryan ir se foder com esse
assunto de imprensa e polêmica.
Finnick é mais importante para mim — mesmo com todos os
motivos para eu socá-lo — do que qualquer outra coisa, e isso inclui
a banda.
— Então, está decidido.
Tess volta a se sentar ao lado de Chase, ele a cobre com o
braço.
— Vocês vão passar dois meses na estrada? — Effy pergunta,
curiosidade minando de seus olhos. — E você é oficialmente a
estilista da The Reckless?
— A decisão de vocês de morar juntos foi estranha —
interrompe Delilah, pregueando a testa profundamente.
— Estranha? Como assim? — Gravity ri, inquietação
timbrando sua voz.
— Precipitada. Vocês estão namorando não tem um mês,
como podem, de repente, morar juntos? — Mackenzie apoia Delilah.
Esfrego o rosto, contendo a irritação. Como são intrometidas,
puta merda.
— Não quero ser grosso, mas por que seria da conta de
vocês? — disparo, virando-me em direção à Delilah. — Somos
adultos e decidimos que seria bom morarmos juntos. Não estou
vendo nenhum problema aqui, a não ser, é claro, vocês duas sendo
chatas pra cacete. — Minha fala é para pôr fim à discussão, mas
Mackenzie infla o peito, assinalando que está pronta para rebater.
— Linda, ele tem razão. — Bryan tenta atenuar, e o rosto de
Mackenzie apropria-se de uma revolva inigualável. Quase engasgo
com a risada. Se ferrou, amigo. — Só estou tentando dizer —
apressa-se para corrigir a fala impensada — que Ashton e Gravity
podem decidir morar juntos.
— Não confio nele — aponta, com a cabeça indicando para
mim. — Não confio nadinha nele.
— Linda, estou aqui! — exclamo, utilizando o apelido de Bryan
para promover um pouco mais de estresse. — Me diz, por que não
confia em mim?
— Preciso dizer? Você é mentiroso, traidor, insensível,
fofoqueiro... — A cada dedo que Mackenzie levanta, adiciona um
adjetivo para mim. — E já magoou muito ela antes. Sinto muito se
não consigo ter um pingo de simpatia por você, Ashton! Sem contar
que, se formos considerar tudo que já escutamos, todos eles
estariam solteiros se dependesse de você!
— Uau, parece que sou o vilão! Ela não é perfeita também,
Mackenzie — bracejo, apontando para a minha quase-noiva ao
lado. — Só está bravinha porque seu namorado não pode te comer
direito, não que ele não queira, mas você é teimosa demais para
aceitar se mudar.
— Olha a porra da boca, Ashton! — Bryan me repreende, a
voz munida de exacerbação. — Caralho, vamos manter a calma?
— Jesus Cristo, você sexualiza toda e qualquer situação! —
ruge, estreitando os olhos e se levantando.
— Dá para vocês se acalmarem, porra? — Aidan grunhe de
algum canto, mas a raiva ofusca minha racionalidade e me ergo
também, endireitando os ombros.
Sou muitos centímetros mais alto que Mackenzie. Ela é quase
um gnomo perto de mim.
— Gravity pode não ser perfeita, mas ela é muito melhor do
que você!
— Tem certeza absoluta disso? — Semicerro os olhos,
baforando o hálito morno com brusquidão. — Colocaria sua mão no
fogo por ela?
— Sim, eu colocaria! Gravity é leal e sincera, o completo
oposto de você!
— Ashton...! — Ouço sua lamentação atrás de mim, mas
pouco me importo.
Só quero vencer essa discussão.
E eu vou.
— Pelo menos não finjo ser alguém que não sou. Um santo. —
Mackenzie corrige a postura, tentando compreender o que estou
dizendo. — Gravity trepou com o Finnick — revelo por entre os
dentes cerrados.
— O quê? — Effy ofega e, rapidamente, estou me voltando
para ela. Seu olhar pela primeira vez se dirigindo ao Finnick.
Merda. Porra.
— Effy… — cochicho, inalando o ar com força.
— Cala a boca. — Ela me ordena, erguendo o indicador em
riste para mim, fitando Finnick, que se mantém imóvel, estabilizado
e nem um pouco afetado por eu ter contado a ela assim, de súbito.
— É verdade?
Finnick retira a carteira de cigarros do bolso de trás da calça, o
isqueiro vindo junto. Ele pega um e prende a guimba entre os lábios,
acendendo a ponta. Toda a sua ação é equilibrada, e começo a
repensar minha explosão. Ele dá uma tragada sonolenta, baforando
a fumaça no momento em que o pescoço gira para seus olhos
encontrarem-na.
— Prometi nunca mentir para você — expressa, soprando
mais uma névoa contra o rosto dela. — Mas a verdade sempre te
machuca. Você não sabe como encará-la e sou eu que sempre saio
perdendo, só por querer cumprir a promessa que te fiz.
Não consigo ver o rosto de Effy por inteiro, mas avanço em
direção a ela.
Eu planejava contar a verdade. Estava pouco me ferrando para
Finnick ou Gravity. Esse assunto me atormenta há muito tempo, e
Effy é uma das poucas pessoas que consigo olhar nos olhos e dizer
o quanto a amo e me importo com ela.
Se ela sofre, eu sofro o dobro. Se ela sangra, eu sangro com
ela. Se ela precisasse de uma vida, eu daria a minha sem hesitar. É
dessa forma que eu me sinto em relação à Effy Cohen.
Só estava pensando em infligir dor à Gravity porque estou na
maior parte do tempo com raiva e ressentido, e, sei lá, uma parte de
mim quer sempre esmagar o rosto de Finnick por ter ciência de que
ele já dormiu com ela, mesmo sabendo como Effylin se sentia em
relação a ele.
Estou só descartando o detalhe de que sempre tive ciúme pra
caralho de Finn. Ele não teve nada que eu pudesse invejar, até
descobrir que Effy era apaixonada por ele.
Não, nunca gostei dela dessa forma, mas eu tinha ciúme pra
caralho de como gostava dele. Ele não tem ideia da sorte que tem
por receber um amor tão genuíno quanto o dessa mulher. Ela
sempre o amou sem esperar que fosse retribuída e foi até ele, ainda
que não merecesse, ainda que a tivesse desprezado ou ficado com
outra mulher na frente dela, Effy estava lá.
Para a maioria, diriam que é falta de amor-próprio, eu, por
outro lado, vejo como alguém que entendeu o verdadeiro significado
do amor. Ela entendeu pra cacete o que é e tem sido leal ao
sentimento. Eu o invejo por isso. Invejo por ter encontrado alguém
como ela. Todo ser humano precisa de uma Effy ao lado para se
lembrar de que, por pior que você seja, existe uma chance e você
pode mudar, se quiser.
— Você dormiu com ele? — Effy se volta para Gravity,
rasgando o véu do silêncio que impera na sala. Minha cabeça se
move na direção contrária, onde minha namorada está sentada.
— Effy, eu sinto muito… — Levanta-se, e Effy faz o mesmo,
ambas parando uma de frente para a outra, a respiração das duas
entrando em choque. — Por favor…
— Eu te perdoo — diz, a curva de sua boca erguendo e
rompendo a seriedade em seu rosto.
Finnick inclina o corpo, encarando-a com a testa franzida.
Confusão dominando as linhas que formam suas feições.
— Você queria que ela ficasse com raiva — acuso, admirando
a expressão de Finnick mudar de impassível para indignado. É a
primeira vez que testemunho-o se alterando assim.
— Você é burra ou o quê?! — Finnick esbraveja, apagando o
cigarro no cinzeiro no braço da poltrona.
Ele eleva-se, inclinando sobre o corpo dela.
— Do que me chamou? — O sorriso de Effy murcha.
— De burra. Pra caralho, porra! — Seu peito vibra com o
estrondo alto de sua voz replicando na sala e enchendo o ar com
tensão. — Eu transei com a Gravity sabendo que você gostava de
mim, e adivinha? Nem gostava tanto dela assim. Só fiz porque sabia
que estavam próximas e eu queria tanto, tanto te ver sofrer, Effy.
Eu vou encher esse filho da puta de porrada.
Mas antes de dar o primeiro passo, sou detido quando um
estalo ecoa na sala. Tão alto e ardente que estou arregalando os
olhos, vendo que Finnick não se move nem um centímetro, apesar
de os dedos de Effy se impregnarem em sua pele pálida e o
carmesim veemente espalhando-se por toda a região da lateral de
seu rosto.
— Gravity é uma boa pessoa — murmura, a voz escoando por
uma fresta ínfima onde os dentes deixam atravessar o ar. — Pode
descontar a porra da sua raiva em mim o quanto quiser, mas não
vou permitir que a use para me atingir.
— Finalmente você está se expressando como um ser humano
normal. — Finnick toca a mandíbula, movendo-a para aliviar a dor.
— Grite comigo se estiver magoada. Me bata se estiver com raiva.
Mas não aja como se não te afetasse.
Não ouço nada além dos ofegos tensos estalando dos corpos
à nossa volta. Cada membro do meu corpo petrifica com o que
acabou de acontecer. Estou próximo de Effy o bastante para fechar
o punho em volta do seu pulso, afastando-a dele aos poucos.
Finnick vagueia por ela, procurando o que a está distanciando,
e, ao me notar, abre um meio sorriso como se estivesse me
agradecendo por ter contado a ela.
— Vou na frente. Cuidado com os paparazzi e os jornalistas,
estão cercando o prédio — acautela, contornando para se dirigir à
saída.
Lidero Effy até que ela esteja acomodada ao meu lado
esquerdo e fico no meio, entre ela e Gravity. Abraço-a por cima dos
ombros, acariciando a pele desnuda pelo vestido listrado, branco e
azul longo, de alças finas. Quando o elevador apita, indicando que
Finnick já desceu, tremores espalham-se por seu corpo, e
incremento pressão, a fim de aquecê-la.
— Ele é a única pessoa capaz de me enlouquecer.
— Eu entendo bem sobre ter pessoas que enlouquecem a
gente — digo, mas não em um sussurro, falo alto o suficiente para a
mulher sentada ao meu lado direito ouvir.
Quando confiro, Gravity está focada em mim. Não sei dizer se
está com raiva ou aliviada por seu segredo ter sido revelado, mas
entendo que essa briga não acabou por aqui.
“E eu sei que você me quer, amor
Você sabe que eu te quero”
DRIVE YOU INSANE – DANIEL DI ANGELO

Gravity arremessa uma taça com tanta força dentro da pia,


com as outras louças sujas, que o cristal se despedaça e os
fragmentos se espalham na cuba.
Distraio-me de guardar os talheres nas gavetas, estudando
seus ombros prostrados enquanto empunha a beirada do mármore.
Ela não falou nada para mim. Estava esperando uma reação
diferente. Achei que fosse gritar, me ofender, perder a cabeça como
estou acostumado a presenciar, mas admito que estou surpreso
com seu tratamento de silêncio.
Consigo ouvir a água fluindo do encanamento acima de
nossas cabeças, sugerindo que Effy seguiu meu conselho e foi
tomar um banho depois que todos foram embora. Não sobrou clima
para a conversa animada continuar e decidiram sair. Se Delilah
estava com raiva antes, agora sou a última pessoa que quer ver.
— Merda! — resmunga baixinho, então me volto para ela,
vendo o sangue empossar na ponta de seu indicador.
— Se está com raiva, não precisa descontar na louça suja —
implico, pegando uma folha de papel do suporte preso à parede
perto da pia e o envolvo em seu dedo, fecho seu pulso com meus e
a tiro do lugar alguns passos, trazendo-a para mais perto.
— Estou bem.
Ela luta para me afastar, contorcendo o braço, mas, às vezes,
Gravity se esquece de quem e como sou. Não aceito não como
resposta e não me arrependo das minhas escolhas. Mantenho o
aperto estável, pressionando o papel que absorve o sangue até
transpassar do outro lado.
— Vou fingir que acredito em você para não te constranger.
Um suspiro combalido dilata suas narinas.
— Por que fez aquilo?
— Porque sim. — Imponho um pouco mais de força, e ela chia
por causa da dor. — Porque estava com raiva — prossigo. —
Porque não gosto de mentir para Effy.
— E tudo bem me humilhar se for para protegê-la? — Gravity
revira o pulso, escapando do meu agarre, e usa a própria mão para
comprimir o ferimento. — Você se importa com o sentimento dela,
mas não dá a mínima para como eu vou me sentir. Foi assim com
Nicola, agora com Effy — murmura por entre os dentes, piscando
ligeiramente para afastar algo que não quer que eu descubra.
Capto rugas ameaçando se formar no centro de sua testa,
criando um vácuo na pele. Prendo o indicador em seu vestido, na
região onde seus peitos estão acomodados, e seguro o material,
guiando seu corpo para frente e quase a chocando com meu tórax.
— Está com ciúme porque penso nos sentimentos dela e
quero protegê-la — comprovo, um sorriso afinando minha boca
quando volta a me encarar com aborrecimento. — Acha que gosto
mais dela do que gosto de você.
— Eu sei que você me odeia. Só estou fazendo uma
observação.
— Ah, eu te odeio pra caralho.
Ela tenta fugir outra vez, mas firmo a âncora no decote do seu
vestido. Um tranco potente a faz escorregar nos próprios pés, e a
amparo em meu peito, o papel voando para algum lugar que não
consigo ver.
Comprimo os lábios para suprimir o sorriso. Suas bochechas já
estão coradas de vergonha. Adoraria causar mais constrangimento
fazendo um comentário, mas estou curtindo como não está
revidando. Às vezes, também sei ser paciente.
— Mas sabe o que odeio mais? — Umedeço a boca, planando
a língua sobre a dela. — Ficar imaginando você gemendo o nome
dele. Não gosto nem um pouco.
— Clareie a minha mente. De quem estamos falando? — O
prazer esculpindo as linhas de expressão do seu rosto me contam
que sabe exatamente de quem estou falando, mas só está jogando
comigo.
Vou entrar no jogo dela só porque sei quem vai vencer. E não
será ela.
— Finnick.
— Então, é você quem está com ciúme. — Retesa o peito,
uma coragem tão estúpida aprumando sua postura que me faz rir.
— Você disse que te coloquei uma coleira…
Percorro o colo, o osso proeminente de suas clavículas
expandindo-se no ritmo de sua respiração lépida. Alcanço a
extremidade do colar, roçando os dedos na serrilha onde a metade
do coração se conecta ao meu. O deleite da reação agitada de seu
corpo debaixo do meu toque faz a curva da minha boca se alastrar
num sorriso travesso.
— Mas bem que eu poderia colocar uma de verdade.
Transito pela coluna de seu pescoço, meu polegar se
encaixando perfeitamente no alto da garganta e os outros dedos a
agarrando firmemente. Sinto sua respiração enérgica estremecê-la,
o hálito morno entranhando a pele do meu rosto.
— Você iria gostar pra caralho, não é mesmo? — indago com
a voz divertida.
— Você tem a errada impressão de que sabe tudo o que eu
gosto.
— Está me dizendo que quando ajo assim, não fica com
tesão? E depois, internamente, se julga por adorar?
— Gosto de ser respeitada. — Inutilmente, tenta esgueirar-se
do meu toque, mas não acredito que esteja realmente inclinada a
fugir.
Estalo a língua em resposta a ela.
— Hum... Me deixa pensar por um segundo. — Vergo sobre
seu corpo, ela não recua. — Você é poderosa. Sabe que não
precisa de mim para se sentir dessa maneira. É por isso que aceita
ser domada porque, no fim de tudo, é o outro que acaba sendo
dominado.
— Está facilmente admitindo que tenho poder sobre você? —
Encara-me por entre os olhos cerrados.
— Não. Estou dizendo que poderia ter, se decidisse por si
mesma.
Ela devasta os poucos centímetros existentes de distância
entre nós. Minha mão escorrega com o movimento de seu corpo, e
detenho-a na curva de sua cintura. O eflúvio de verbena emanando
dela intercepta todo o maldito raciocínio que me resta.
— Não vai rolar — decide-se por fim, estabelecendo distância,
e meu pau, que por pouco não rompeu a barreira da calça, perde a
esperança de sair da seca. — Você não é confiável, querido —
cochicha, o aroma doce emanando por entre os lábios.
— Não quer nem ouvir o que estou considerando te propor? —
Engulo a bola de acidez no limiar da garganta.
Subo os dedos, pescando a madeixa de sua franja entre eles,
e a ajeito atrás da orelha. Aproveitando do momento para arrastar
livremente o dorso da mão contra a bochecha dela.
— Vindo de você, Ashton, aposto como vou me arrepender.
Ela termina de se afastar. Não quero admitir, mas estou
sentindo falta do calor do seu corpo tão próximo.
Suspiro, desolado, descendo a cabeça para esconder o
sorriso. Ela é terrivelmente traiçoeira. Se faz de desentendida, mas
está começando a perceber o efeito que tem em mim e, caralho,
deixei que acontecesse no minuto em que confessei ter ciúme de
uma coisa que aconteceu, sei lá, uns seis anos atrás, no mínimo.
— Me deixa te explicar como funciona. — Gravity sopra o ar
por entre os lábios rosados e naturais, ela mesma colocando de
volta a franja para trás da orelha. Busca o amparo da bancada da
pia, sentando-se sobre ela com um impulso da ponta dos pés. —
Não vamos transar. Não teremos um acordo onde me tem a hora
que quer, e não, você não vai me convencer a confiar em você
como se tudo que fez até agora não tivesse me magoado.
Ela leva o dedo machucado para dentro da boca, chupando o
resquício de sangue.
— Amanhã Liam vem me visitar. E vou transar com ele
naquele sofá. — Gesticula com os olhos para a sala. — Você vai
estar lá em cima, fazendo silêncio para conseguir nos ouvir. E
depois vai brigar comigo porque seu lado machista acredita que o
nosso casamento de mentira faz de mim sua posse. Vou mostrar
que você não é a porra do meu dono.
É natural que a petulância dela me irrite, contudo, o que faço é
sorrir com esgar. Ainda que esteja sentindo a raiz dos ossos da
boca doerem por ranger os dentes, trato de ignorar minha
possessividade para me concentrar nela. Gravity está começando a
reagir às minhas investidas, melhor ainda, está revidando. Não
gosto quando estou lidando com uma mosca-morta. Estava sentindo
falta desse lado atrevido dela.
— É o que vamos ver — ameaço, certo de que pode sair com
quem quiser, não vai ser fácil para ela como está pensando.
Vou deixá-la pensar que tem o controle só para provar que a
única coisa que Gravity tem a seu favor é sua coragem.

Estou considerando acender um cigarro quando Effy cruza a


sala de estar, as bochechas esbraseadas da chuveirada quente.
— Gravity já foi dormir? — Encara a escada por sobre o
ombro, cruzando os braços enquanto aguarda uma resposta minha.
— Sim — respondo, estudando se posso falar com ela sobre o
que aconteceu.
Não sei quão profundo cavei em Effy. Minha última intenção
era magoá-la. Estou me sentindo responsabilizado por estragar
essa noite para ela por sempre querer ganhar uma briga. Parece
que essa é uma das características que herdei do meu pai também.
Ele tem o controle de tudo e quando não o tem, usa as pessoas
como peões e suas fraquezas como um tabuleiro de xadrez. Vencer
é a única resposta aceitável.
Seus cabelos ruivos estão bem mais longos agora. Effy
costumava mantê-los curtinhos, mas muito tempo passou desde o
acampamento. As ondas encorpadas e avermelhadas pendem por
sobre seus ombros. Uma parte do cabelo esticado para traz,
amarrado por uma presilha de cabelo.
Effy une os lábios, encaminhando-se na minha direção.
Endireito os ombros quando se senta ao meu lado e reparo em seu
baby doll. É um rosa-chiclete com vários abacates estampados.
Cada detalhe dela é único.
Desde que a vi pela primeira vez, sua delicadeza, a forma
gentil com que sempre tratou a mim e aos caras, mesmo sendo uns
fodidos do caralho, e como não ficou assustada. Ela nos acolheu
como se fôssemos parte da família dela.
Esse tipo de tratamento, vindo de uma estranha,
principalmente comigo, que estava acostumado a lidar com tanta
pressão em casa, foi como se tivessem inserido oxigênio em meus
pulmões para me ajudar a respirar.
— Fui um idiota hoje. Pode me dar sermão, eu mereço —
acato, dobrando sobre o tronco para alcançar a haste da long neck
da minha cerveja.
— Ele está se drogando, não está? — Effy dispara,
desconsiderando totalmente o que acabei de dizer.
Minha cabeça gira lentamente de encontro a ela. O polegar
direito cutucando a cutícula do esquerdo evidencia ao nervosismo.
— Você não deu a mínima para o que contei — atesto, a pele
lisa da minha testa enrugando.
— É claro que eu fiquei chocada — revela, coçando mais
fundo sua carne. — E, céus... — a cabeça curva para trás,
esbaforindo o ar —, gostaria que não tivesse acontecido. Fui a
primeira amiga da Gravity quando chegou a Humperville. Lembro
até hoje, nós duas sentadas na cozinha, tomando refrigerante e
comendo pizza enquanto amaldiçoava o Bryan por não querer me
ver. Ele tinha acabado de conhecer vocês, sabia? — A boca
espreme e, em seguida, se transforma em um sorriso contido. —
Tinha sido a primeira terapia em grupo de vocês. Só consegui vê-lo
depois que Vivian chegou em casa e me deixou entrar.
— Nunca soube como vocês se conheceram — reconheço,
uma sobrancelha grossa alçando e quase atingindo a raiz do meu
cabelo quando percebo que nunca tivemos essa conversa.
— Bem, foi assim. Gravity estava meio… — Posso ouvir as
rodas de seu cérebro trabalhando, procurando pela palavra certa
para explicar. — Não sei se cabisbaixa a descreveria, mas ela
estava triste. Nunca me contou o porquê, só que tinha sido expulsa
de casa, mas com explicações vagas. Só aceitei o que queria me
contar e deixei que o resto ficasse para o tempo. Aos poucos, a vi
se tornar a mulher que conhecemos hoje. Vity tem um lado frágil, é
difícil acessá-lo, mas sei que está lá. — Effy se esforça para esculpir
seus lábios em um sorriso. As sardinhas vermelhas ondulando na
pele quando o rosto torce. — Não conseguiria guardar rancor dela.
— Você é boa demais para ele. — Bebo minha cerveja antes
que esquente demais. — Por que gosta tanto dele, afinal? —
questiono. Embora saiba do médico, não acredito que Effy esteja
totalmente apaixonada.
— Porque somos opostos, acho — considera, franzindo o
cenho ao mesmo tempo em que entrecerra as pálpebras. — Fui a
filha, a aluna, a amiga perfeita… Finnick é a única coisa imperfeita
da minha vida, e eu gosto de poder escolher errado, para variar. —
Dá uma risadinha, mas a maneira como sua boca treme não é de
felicidade. — Ele é meu oposto perfeito.
— Vou ter que te dizer que aquele filho de uma puta tem razão.
— Termino minha cerveja, ingerindo tudo de uma vez. — Você está
sendo muito idiota.
— Ashton.
— É sério, porra. Ele não liga se fere os seus sentimentos e
quer saber por quê? Finnick já entendeu que não importa como aja,
você nunca desiste dele. Acorda, Effy, pelo amor de Deus. Sofro de
te ver sofrendo também — brado, e gesticulo ao mesmo tempo,
devolvendo a garrafa vazia para a mesa de centro.
— Não vou discutir com você.
— Que bom porque, com certeza, você perderia.
— Estou feliz com o Beckham, Ashton.
— Interessante você falar dele porque Finnick descobriu.
— O quê? — Empertiga o corpo com assombro na voz.
— A mãe dele viu você e o médico juntos. Ligou para debochar
dele. Não sei por que essa mulher gosta tanto de infernizá-lo.
— Ai, merda... — Ela se dobra sobre o quadril, estacando a
cabeça contra a palma da mão. — Como ele reagiu?
— Como um maluco. Ele descobriu absolutamente tudo do
cara. E nem precisou dos meus dotes como hacker. — Crispo a
boca para o lado. — Enfim, se fosse você, se casaria logo com o
doutor.
— Por que eu me casaria? — Gargalha, se levantando.
— Ele não é quase treze anos mais velho que você? Pode ser
que perca algumas habilidades, se é que me entende.
— Doze e não seja ridículo. Sinceramente, tenho preferido
homens mais velhos. Eles são menos inseguros. Reed quase
acabou com a minha sanidade com aquele ciúme! — Revirando os
olhos, ajusta seu caminho de volta para o primeiro piso.
— Você está bem mesmo? — grito para checar. — Não quer
me punir?
— Todo mundo quer te punir por alguma coisa, Ashton! —
exclama, acenando por cima do ombro. — Vai dormir e tenta não
arranjar confusão até o amanhecer.
“Porque você é só um homem
É isso o que você faz”
NORMAN FUCKING ROCKWELL – LANA DEL REY

Passo a noite quase em claro, concentrada no trabalho. Há


muito tempo não me empolgava com meus modelos. Estou
acostumada a criar especialmente para mulheres, detalhes
femininos e elaborados, então acredito que foi uma boa voltar a
trabalhar com a moda começando com o básico.
Bryan se move bastante durante os shows — estudei a noite
toda sobre o que poderia costurar para eles —, portanto, não posso
produzir modelitos muito agarrados porque pode deixá-lo
desconfortável.
No começo da turnê de Caóticos, ele apostava nas calças de
couro, o que o limitava muito na hora de se deslocar pelo palco.
Repriso um vídeo do YouTube enquanto engulo uma boa dose de
cafeína para aumentar minha concentração. Piscando com
dificuldade, luto para afastar o sono. Preciso apresentar alguma
coisa para a equipe que vai me ajudar e gastei tempo demais nas
confusões que Ashton arruma, deixando de lado o principal motivo
para ter começado isso tudo.
Ser estilista é um sonho antigo e depois de ter estudado em
Milão, passei a questionar se estava apegada a ele pelos motivos
errados. Neil me incentivava a estudar moda. Ele foi o principal
motivo de eu ter escolhido essa profissão, para começo de
conversa. Sempre que desenho, crio ou costuro, me sinto conectada
a ele. Minha razão, às vezes, precisa me lembrar de que Neil não
está mais aqui. Apesar de todos esses anos, ele é a maior influência
na minha vida. E nunca, sequer uma vez, consegui amar outra
pessoa como eu o amava.
Talvez o motivo de ele estar morto seja o maior fator para eu
não me permitir me apaixonar outra vez. A única pessoa capaz de
me fazer sentir alguma coisa real depois de todos esses anos
também não pode ficar comigo porque feriria totalmente minha
dignidade.
Ashton não me deixa esquecer de que não posso ser feliz.
Alguém morreu por minha causa e toda vez que tento seguir em
frente, uma desgraça maior acontece, como um lembrete vivo de
que preciso pagar, de um jeito ou de outro, pelo que aconteceu.
Ter me sentido cruelmente traída em Paris me fez entender
que uma força maior me penalizou por quase ter me apaixonado.
Ter Ashton tentando brincar com os meus sentimentos sempre que
tem uma oportunidade para fazer, é Neil de algum lugar me
lembrando que não tenho o direito de deixar outra pessoa me amar,
já que sou responsável pelo que aconteceu com ele.
Fecho os olhos, o palato amargo do café crescendo dentro da
minha boca quando estalo a língua. A exaustão, aos poucos,
enfraquecendo minha habilidade de pensar.
A folha do meu caderno está quase por inteira com desenhos.
Fiz um conjunto de sarja para Bryan. Primeiro rascunhei um com
chino, mas definitivamente a sarja é mais confortável, além de trazer
um aspecto de elegância e maturidade para ele.
Eles preferem o casual, cada um tem um estilo diferente, mas
único.
Aidan, por exemplo, sempre combina jeans básico e jaqueta
de couro com camisa social. Enquanto Finnick prefere usar coisas
versáteis, como coletes, e aposta pra caramba nos de couro preto e
quase nunca usa uma peça por baixo para conjugar. Ashton, para
variar, está me dando trabalho porque literalmente não usa nada
além da jaqueta de couro e uma calça jeans de lavagem escura,
com os joelhos rasgados. Chase é o tipo: quanto mais básico,
melhor. Ele sobe aos palcos com jeans, às vezes calça social, e
camiseta branca lisa.
Por que diabos eles precisam de uma estilista para elaborar o
figurino se literalmente usam as roupas que têm no closet em casa?
Pressiono o centro da tela do iPad, pausando o vídeo. Retiro
os fones do ouvido e debruço sobre a mesa de madeira crua. O sol
atravessando a vidraçaria do ateliê.
Preciso admitir que Ashton soube “organizar” meu espaço.
Onde estou agora é a minha mesa de corte, ela deve ter uns dois
metros de comprimento e o cheiro amadeirado por estar crua exala
no ambiente. As máquinas de costura ficam recostadas nas
vidraças, equipamento de modelagem e prateleiras com a mesma
madeira da mesa com amostras de tecidos. Dei uma olhada durante
à noite, tem uma diversidade imensa de cores e texturas para eu me
arriscar na hora de projetar as roupas.
Em um dos nichos tem todo o material que preciso, como lápis,
papel de desenho, régua, tesouras — de variados tamanhos —,
tudo para criar meus esboços. Também encontrei alguns catálogos
dentro da gaveta de uma mesa de escritório, para coletar
referências visuais.
No canto direito, uma parede de tijolos brancos tem um sofá de
dois lugares roxo, a única coisa no ambiente se destoando do chão
clarinho e das paredes brancas. Esse é o maior cômodo do
apartamento, sem sombra de dúvidas.
Ao lado da prateleira tem uma porta de correr que dá acesso à
uma sala de prova e os nichos vagos estão com plaquinhas escrito
“estoque”, onde posso guardar as roupas que projetar.
A raiva que estava sentindo dele quase se dissipou quando
entrei aqui ontem à noite. É o “mundinho de Gravity” e gostaria
muito de me sentir especial só com esse gesto, mas se me permito
pensar bem dele só por um segundo que seja, Ashton faz um
comentário estúpido que me obriga repensar que tipo de pessoa ele
é. Pessoas odiosas estão ali para odiar e estou começando a achar
que Ashton existe na minha vida para esse propósito.
O que ele fez ontem, cuspindo toda aquela merda na frente de
todo mundo, não foi humilhante só para mim, mas para Effy. Nunca
cogitei esconder dela para sempre, uma hora ou outra acabaria
contando, mas não queria que fosse daquele jeito. A verdade é que
Mackenzie conseguiu acessá-lo e brincar com a impulsividade dele,
ocasionando a explosão que estragou a noite de todo mundo.
Dou outro gole no café, desintegrando o nó apertado da
garganta. Confiro o celular, são quase seis e meia da manhã. Não
dormi nem por três horas, entre um cochilo e outro no meu quarto —
porque nem se fosse de extrema necessidade dividiria a porra da
cama com aquele imbecil —, vinha para o ateliê pensar no que
posso levar para a reunião.
Ainda tenho aquele encontro com Liam. Ele queria me levar
para jantar fora, mas não foi difícil convencê-lo de ficarmos em casa
quando falei que os jornalistas andam me perseguindo por causa de
Ashton. Não estruturei nenhuma história para contar a ele sobre
meu recente namoro com o astro da The Reckless, mas não estou
esperando que Liam deixe pra lá.
— Toc, toc…
Desencurvo os ombros, mirando a porta entreaberta. Os
cabelos ruivos de Effy pendendo para dentro do ateliê. Queria falar
com ela, mas não sabia como. Estava pensando em convidá-la para
almoçar comigo depois que saísse da Reeves.
— Oi. — Cubro a boca para esconder o bocejo.
— Passou a noite toda acordada? Te procurei ontem, mas
Ashton disse que estava dormindo.
Entra, fechando a porta em seguida.
Effy está vestindo uma calça jeans de lavagem média,
camiseta branca básica para dentro do cós, cinto preto e escarpins
de salto. Está mais… elegante. Ela sempre teve um jeito de
menininha, desde o estilo até a maneira como fala, mas está
diferente.
— Eu tentei dormir, mas com tudo que aconteceu, decidi
trabalhar.
Empurro o caderno para o lado e puxo um pufe roxo,
gesticulando com os olhos para se sentar ao meu lado.
— Estou voltando para Humperville. Consegui trocar minha
passagem para hoje.
— Me desculpa, Effy... — arfo, acompanhando-a contornar a
mesa para se sentar. — Eu juro, não sabia o que sentia por Finnick
quando fiquei com ele. Só soube muito tempo depois. Quero dizer,
você nunca disse que gostava dele até Delilah te confrontar.
Comecei a desconfiar antes, quando passava muito tempo com ele,
mas não fazia ideia de que estava apaixonada. Eu nunca, em toda a
minha vida, trairia uma amiga assim.
— Ei, ei… — Effy cobre minha mão com a sua, a boca
dobrando até que desenhe um sorriso. — Beckham me enviou uma
mensagem ontem à noite. A avó dele faleceu e quero estar lá para
ele. Eles eram apegados. Não estou indo embora por sua causa,
ok?
Como ela consegue? Como ela é assim?
— Você não é humana. Deve ser mística, uma fada ou coisa
assim. — Eu a encaro por entre os olhos cerrados, meus lábios se
separando para fluir o ar. — Porque, no seu lugar, estaria
profundamente magoada. Foi uma merda grande o que aconteceu
ontem, Effy.
— Eu conheço eles há anos. — Suspira, afastando o toque e
reclinando o corpo para trás, olhando para cima. — Não estou
tentando justificar as falas problemáticas, o jeito imprudente... Você
sabe, eles são o que são. Antes me machucava mais. Me importava
mais. Talvez esse seja o primeiro sinal de que, finalmente, estou
superando meus sentimentos pelo Finn.
— Você está? — sopro com um quê de incredulidade
empossando minha voz.
— Sim, estou. — Ri, o tom animado. Se está encobrindo a
mágoa, está fazendo muito bem. — Acho que Beckham é a pessoa
certa para mim, Vity. Eu me sinto bem, feliz e, nossa, ele faz parecer
que sou a única mulher existente no universo! Ainda me preocupo
com o Finn, ele não é como é por nada. No dia em que o conheci,
aqueles olhos desconfiados esbanjavam uma soberba ridícula, mas
por trás, conseguia enxergar o quanto era vulnerável e precisava de
alguém para dar força a ele. Alguém que não fosse fugir no primeiro
problema ou quando mostrasse a monstruosidade que carrega. —
Effy respira, o par de íris amendoadas se perdendo na lembrança.
— Mas nós seguimos para caminhos diferentes. E quer saber?
Quando desisti, eu estava quase vencendo! — Aponta o dedo em
riste para mim, se levantando e afastando para a porta. — Mais um
pouquinho e ele teria sido meu.
Effy para, escorando a mão na maçaneta.
— Fica de olho nele. Tenho certeza de que Finnick está se
drogando.
— O quê?! — tremulo, erguendo-me brevemente do pufe.
— Sei quem ele é. Eu o amei de todo o meu coração, mas
Finn nunca conseguiu amar a si mesmo. Ele é covarde demais para
atentar contra a própria vida, mas vai usar meios indiretos.
Rapidamente, me vem à mente que Finnick não compareceu à
última reunião que tivemos. Os outros deram uma desculpa
convincente e não considerei ser nada fora do que contaram ao
Jared.
— Estou indo para o aeroporto. Você se despede do Ash e dos
outros por mim?
— Claro.
Eu me levanto, encaminhando-me para perto dela. Effy abre os
braços para corresponder ao meu abraço, e ficamos grudadas por
um tempo. Seu aroma adocicado e aconchegante me embalando
também.
É bom vê-la feliz. É um alívio poder olhar para ela e dizer que
consigo ver paz em seu semblante.
Effy exala brilho. Uma luz magistral e contagiante. Você sabe
que está perto de uma alma pura quando não sente nada além de
conforto na presença dela.
Ela e Finn são opostos colidindo; ele vive nas sombras, e ela,
na luz. Ela brilha e ele ofusca qualquer faísca que possa existir. Não
sei o que acontece quando dois mundos assim se fundem, mas
imagino que um lado se destaca mais que o outro.
— Obrigada por ter aceitado dividir aquela pizza comigo.
— Obrigada você, por ter me convidado para fazer parte da
sua vida.
Seus braços afrouxam o aperto, escorregando aos poucos
para se distanciar. Prendo meus dedos aos dela, já sentindo falta da
sua companhia. Estava em Paris com Willa e em Milão com Trycia,
sempre com um pedacinho de casa do meu lado, mas nada se
compara a estar com Effy e Mackenzie.
— A propósito... — Effy se separa de mim, girando a
maçaneta. Estreita os olhos para sua visão me alcançar. — Nunca
acreditei que seu ex-namorado te largou na sarjeta.
“Pois é, o homem que você queria te largou na sarjeta e, se
não fosse por sua irmã, você estaria se afundando na própria lama.”
A voz de Trycia impera no meu consciente. A lembrança desse
momento, nós jogando verdade ou desafio, quando precisei contar a
verdade sobre ter beijado ou não Aidan no jogo de sete minutos no
paraíso. Trycia era apaixonada por ele e explanou para elas que tive
um relacionamento ruim porque estava magoada.
Quando me mudei para Humperville, pude mascarar tudo que
não conseguia enfrentar. Criei a minha versão dos fatos. Nunca
precisei contar sobre meu relacionamento, mas todo mundo tem um
passado, e precisava manter o meu em segredo. E como uma
desconhecida naquele lugar, vi inúmeras possibilidades de recriar a
Gravity Monaghan.
Poderia ser a mulher que estava fugindo do ex-namorado
abusivo. Ou abandonada quando contei que estava grávida, sofri
um aborto e tentei recomeçar. Ou simplesmente Neil cedeu às
ameaças do pai e decidiu me deixar. E meus pais, que eram contra
o relacionamento, me expulsaram de casa.
Enfim, posso pertencer a cada um desses passados e não
faria nenhuma diferença, para nenhum deles, porque, no fim, sou a
única que precisa lidar com essas marcas. Então, por que não criar
minha própria versão da dor, se eu tenho a possibilidade de fazê-la?
Acho que estou fazendo de novo, entretanto. Estou recriando
uma nova versão de mim, como faço quando tenho medo de
encarar aquilo que não posso controlar.
Você é covarde, isso sim.

— Liguei para vocês milhares de vezes, porra. Não me amam


mais?
Ashton rompe a porta da sala de reuniões resmungando como
um bebê chorão — o que combina com ele —, fixando as faíscas
iradas de seus olhos nos outros quatro integrantes da The Reckless.
Ele está um pouquinho atrasado — por volta de trinta minutos.
Poderia admitir que fiz de propósito, mas quando me perguntaram,
pisquei os olhos inocentemente e disse que tentei acordá-lo.
Bobagem. Ainda estou com raiva porque ele espantou Effy de
volta para Humperville. Não chamá-lo foi de propósito. Que ele se
foda. Precisa ter alguma responsabilidade, se quer saber. Às oito
em ponto eu estava com Theo no carro e Silas no meu encalço,
garantindo que os jornalistas que estavam se hospedando na porta
da gravadora não me assediassem.
Remexo na quina do iPad sobre a mesa quando sinto que sua
atenção se volta para mim. Minhas bochechas pesando com o
esforço que faço para não rir do seu desmantelo. Os fios pretos de
seu cabelo em um repleto caos, a camiseta vestida do avesso, o
zíper da calça jeans aberto e o rosto ainda carimbado com os
gomos da fronha do travesseiro.
Fecho a mão em punho, colocando-a contra a boca para
engolir a risada.
— A gente deveria te dar uma lição pelo que fez ontem. —
Finn murmura, sem pupilas dilatadas e com um olhar bem lúcido e
vidrado em Ashton. — Não precisava infernizá-la daquele jeito.
— Ah, sim, agora você se importa com os sentimentos dela?
— grunhe, puxando a cadeira entre Finn e Chase para se sentar. —
Não me faça rir. Você é tão miserável quanto eu.
— Pelo menos, você admite — comento com acidez,
desbloqueando a tela do iPad para abrir o portfólio que preparei
para a reunião.
— Admito o quê? — A rouquidão de sua voz espelha toda a
fúria incutida nele. Eu, por outro lado, estou muito a fim de deixá-lo
no auge do seu estresse hoje.
— Que você não presta — respondo, ríspida, sem mudar o
foco do arquivo.
— Cala a boca, Gravity. Não tenho dúvida que entrou no meu
quarto e desligou o despertador só para eu me atrasar.
— Não tenho tempo para essas implicâncias de criança. —
Escorrego o indicador no visor, fingindo estar centrada no trabalho,
mas, na realidade, só quero parecer relaxada enquanto acarreto um
furacão nessa sala. — Você se atrasou porque é irresponsável. Não
precisaria nem me esforçar para provar meu ponto.
— Todo mundo sabe que a banda é a única coisa que levo a
sério, nunca me atraso para os compromissos com ela.
— Vocês vão brigar de novo? Logo cedo? — Chase suspira, e
desvio para ele, vendo a exaustão cobrindo seu semblante. Não só
o dele, como dos outros também. — Sério, nós vamos passar muito
tempo juntos. De hotel em hotel. De cidade em cidade. Precisam dar
uma trégua.
— Um descanso das brigas de vocês ajudaria bastante —
emenda Bryan, girando uma caneta esferográfica entre o indicador e
polegar. — Já basta minhas infinitas discussões com a Mackenzie.
— Bom dia, pessoal! — Avalon surge na sala, empurrando a
porta, e Kimberly em seu encalço. Seu tablet apoiado no braço
dobrado. — Hoje vou conduzir a reunião, Jared está em Los
Angeles com a esposa. — Firma um sorriso no rosto, assumindo a
cadeira na cabeceira da mesa. — Seremos breves porque,
enquanto vocês curtem pra caramba essas férias, Kim, Sidney e eu
estamos lidando com milhares de assuntos. Bryan, Chase e Ashton,
vocês faltaram à aula de canto ontem. Por favor, pessoal,
precisamos voltar ao ritmo. — Ela gesticula com as mãos,
suspirando para o desinteresse deles com a volta da turnê. — Se
não forem fazer por mim, façam pelos fãs. Eles querem vocês de
volta aos palcos, mas só podemos voltar se estiverem prontos.
— Paramos só por um mês e meio. — Aidan relembra, girando
a aliança de compromisso no dedo. — Relaxa, Ava.
— Estou relaxada, querido. Agora, tenho consultas marcadas
para vocês na semana que vem. Faremos um check-up de rotina,
conferir se estão saudáveis, e quero que voltem a se exercitar. —
Avalon apanha de dentro de sua bolsa um bloco de anotações e
uma caneta. Não sei por que utiliza papel quando pode escrever
tudo no iPad. — Ashton e Gravity. As vendas dos ingressos abrem
em duas semanas, e queremos aproveitar a centelha do
relacionamento para engajar as vendas. Portanto, agendei a
entrevista de vocês com o TNC na quinta-feira. Vocês farão as fotos
que estarão no site e na revista deles na terça. Falei pessoalmente
com a equipe da Ravennah. Eles acham que seria legal se tudo
acontecesse no apartamento de vocês. Passa um nível de
intimidade maior.
— Terça-feira? — Arquejo, esticando os olhos para Ashton.
— Sim, algum problema? — Ava devolve.
— Não. Quero dizer, pensei que eu teria uma reunião com a
equipe que vai trabalhar comigo no figurino.
— Ah, sim, reagendei a reunião para… — Avalon desbloqueia
a tela do tablet, movendo os dedos habilmente enquanto retorce os
lábios de concentração — segunda às 10.
— Está bem.
— Ótimo. Seguindo, a equipe de redação do TNC vai me
encaminhar a listagem de perguntas. Vocês podem escolher quais
querem ou não responder, mas é indispensável que sejam
carinhosos perto deles. Ravennah é quem vai entrevistar e é
importante que ela acredite no relacionamento de vocês. — Ava
franze os lábios para a direita, virando a folha do bloco de notas. —
Contem que estão pensando em se casar. Espero que já tenham
estruturado uma boa história de como chegaram a esse ponto.
— Hm, sim. Gravity é criativa pra caralho. — Ashton diz em
tom de deboche. — Segundo ela, me arrastei e lambi o chão que ela
pisou durante quase um ano.
— Sério? — Bryan engasga com a risada. — Isso é fantástico,
Ash!
— Fantástico? Você bebeu? — replica.
— Não, só que já prevejo as reportagens quando essa
entrevista sair.
Ashton revira os olhos, mas desiste de brigar.
— Muito bem, vamos seguir com a reunião…
Avalon dá fim à discussão sobre entrevista e casamento, meu
cérebro se embolando e atando em um nó rígido enquanto continuo
a processar. O contrato vai acabar e ainda não vou acreditar na teia
em que cai.
“Então, eu estou armando minhas defesas
Porque eu não quero me apaixonar”
HEART ATTACK – DEMI LOVATO

Liam e eu nunca paramos de nos falar. Houve uma distância


física entre nós nos últimos anos, mas ele estava presente. Fosse
por mensagem ou através de chamadas de vídeo, tomando vinho e
rindo como se Paris tivesse acontecido há apenas alguns dias.
Sempre soube que haveria uma lacuna entre nós porque minha
passagem por Paris foi como um daqueles acampamentos de verão.
E, bem, o que acontece em Paris, fica em Paris.
Liam fazia aulas de francês comigo e Willa. Foi assim que nos
conhecemos e ficamos tão próximos. Bons amigos que ficavam de
vez em quando.
Quando Ashton chegou a Paris, Liam demonstrou ciúme,
incerteza e insegurança, e precisei lembrar a ele que, em algum
momento, teríamos que nos despedir. Minha passagem pela França
foi apenas um desvio do meu objetivo principal, e ele estava no
caminho.
Por alguma razão, o destino o colocou em minha vida outra
vez. Quando contei ao Liam que estava me mudando para Nova
York no ano passado, ele disse que se instalaria aqui também no
segundo semestre, quando tivesse concluído a faculdade de Direito.
A coisa toda explodiu na minha cabeça. Não acredito em
coincidências. Sou crente de que tudo acontece por uma razão, e
você precisa estar atento aos sinais para pescá-los. Tudo que me
passou pela cabeça quando soube que Liam e eu acabaríamos
entrelaçados outra vez foi: é ele.
Então, toda a merda com Ashton aconteceu. E aqui estamos.
Não posso contar ao Liam a verdade sobre meu relacionamento,
seria quebra de contrato, mas pretendo deixar claro que Ashton não
é um empecilho, se quiser ficar comigo, e que eu estou muito a fim
de relaxar. Preciso de uma pausa do meu relacionamento falso com
Ashton. Preciso respirar e não me sentir sufocada o tempo inteiro
quando estou dividindo o mesmo espaço que ele.
Voltei para o meu quarto e acomodei todas as minhas coisas
depois da reunião. Ashton saiu com os outros e ainda não voltou, o
que acho ótimo porque não duvido ele tornar essa noite um inferno
para mim.
Precisei mentir de novo para Mackenzie e Delilah. Não posso
contar a elas sobre Liam, mas também não tinha nenhuma desculpa
boa o bastante para não sair com eles.
Por sorte, Avalon agendou minha reunião para segunda. Foi o
motivo perfeito para dizer a elas que precisava trabalhar. Mack nem
me questionou. Ela sabe como o trabalho é importante para mim e
que ser diligente é uma das minhas qualidades. Por isso nem
retrucou quando disse que Ashton iria sem mim.
Por essa razão, passei minha noite em claro, para não ter que
me preocupar com nada essa noite, a não ser em estar com um
homem de verdade.
Ashton gosta de mulheres que inflem seu ego. Meu maior erro
foi tê-lo convencido de que era importante, naquela época, ter uma
noite com ele. Estou pagando por esse maldito equívoco até hoje,
sendo obrigada a escutar merdas como “você é mesmo uma
cadela”. Idiota.
Libero o fecho do colar com o nome dele abreviado,
adicionando tanta raiva no ato que acabo ferindo a nuca quando
minhas unhas cravam na pele. Imbecil arrogante.
Arremesso a joia no recipiente de porcelana, o tilintar me
forçando a encarar o maldito coração pela metade. Às vezes, me
questiono se é possível odiar tanto alguém quanto consigo odiá-lo.
Uma veia cresce no centro da minha testa, o rubor se
ampliando no pico das minhas bochechas.
Agarro a beirada da penteadeira, visando meu reflexo no
espelho. Acabei de sair do banho, as laterais do meu cabelo estão
úmidas e gotas de água cobrem meus ombros desnudos. A toalha
preta enlaça meu corpo, fazendo contraste com minha palidez.
Rodeio em meu próprio eixo, caminhando lentamente no
centro do corredor do closet. Contemplo os vestidos pendurados no
apoio, tentando me decidir por qual deles. Meu consciente
ordenando-me para o mais indecente entre todos. Não para
impressionar Liam, mas porque tem muito tempo que não uso um
vestido para provocar.
Não sou uma orgulhosa ignorante nem vou fingir que não
quero causar impacto em Ashton, mesmo que seja uma mulher
revestida de poder, gosto de ser notada. Mas principalmente
desejada. Ele pode retribuir toda a antipatia, mas nós dois temos
noção de como nossos corpos reagem um ao outro quando estamos
perto. Posso não querer me render, mas não significa que não
pretendo tirar o maior proveito das divergências.
Fisgo o lábio inferior, enterrando os dentes na carne. Fixo
meus olhos no modelo de mangas bufantes em duas camadas com
bordas onduladas, o corpo e a saia em corte reto, porém, ele deixa
uma fenda do colo até o umbigo, tanto na frente quanto nas costas.
A parte do tecido da manga acompanha o corte para cobrir os seios.
Kendall Jenner usou um modelo similar em 2018, na festa do Oscar.
Usar calcinha com um material que é tão colado ao corpo?
Pondero e solto o nó da toalha, decidindo por não colocar nenhuma
roupa íntima.
Visto a peça, mas não consigo fechar o zíper totalmente. Liam
deve chegar em trinta minutos pois, segundo ele, quer cozinhar para
mim, então posso pedir ajuda.
Faço a maquiagem, não fica tão boa quanto as de Effy, mas
consigo camuflar as bolsas circundando meus olhos com corretivo.
Aplico uma camada generosa de batom vermelho. Avolumo os cílios
com a máscara e desenho um delineado grosso estirado, o que
causa a impressão de que meus olhos são mais finos e alongados.
Calço as sandálias pretas, a tira fechando nos calcanhares. Borrifo
meu perfume, a fragrância com notas florais de verbena se
avultando no armário.
Trilho de volta para o quarto e procuro pelo meu celular no
edredom embolado no meio da cama. Eu o encontro preso na teia e
desbloqueio o visor, rumando para fora do aposento. Confiro a
última mensagem de Liam. Ele confirmando que estaria aqui por
volta das 17h30.
Seguro no corrimão para descer as escadas e acesso meu
Instagram. Publiquei uma foto no feed do desenho que estava
fazendo da jaqueta de Ashton. Pensei em colocar vários strass de
stiletto nos ombros e consegui a aprovação de milhares de pessoas.
Para ser sincera, não sei se consigo me habituar com essa atenção.
Quando publico algo, rapidamente tenho milhares de curtidas e
comentários, e, quando Ashton está envolvido, ultrapassa qualquer
métrica.
Passeio com os olhos por alguns comentários do desenho,
vários fãs da The Reckless dizendo que tenho talento. Meu coração
pula uma batida lendo tantos comentários positivos. Há pelo menos
três anos que não sinto que meu trabalho é reconhecido. Não me
sinto orgulhosa do que faço. Perdi a esperança e não posso culpar
ninguém além de mim por ter deixado as outras pessoas me
definirem.
O canto da minha boca se curva em um sorriso. De repente,
estou oferecendo corações na maioria dos comentários; todos que
consigo ler. Solto uma mão do corrimão para ser mais ágil. São mais
de vinte mil, não acho que um dia vou conseguir ler todos, mas pude
conferir alguns.
Começo a ver alguns stories, faz tempo que não fico nas redes
sociais por não conseguir acompanhar tantos novos seguidores,
mensagens e comentários.
O primeiro a aparecer para mim é de Effy. Ela escreveu uma
mensagem dando apoio ao Beckham, mas tem um emoji de coração
no lugar onde deveria estar o rosto dele — é a primeira vez que
publica sobre ele em seu perfil.
O próximo é de Bryan, tirou uma foto de Mackenzie distraída.
Posso ver uma mecha de cabelo de Delilah ao lado dela. Atravesso
outros stories, de Alana, Willa, Faith, Nate… Então, chego ao dele.
Ashton Baker. O desgraçado que adora provar que veio ao mundo
para ser meu inferno pessoal.
Meus dedos enrijecem nas costas do celular, cravando tão
fundo que os nós emitem formigamento. Fecho os lábios em uma
linha fina, apertando com tanta força que sinto os dentes
machucarem a boca. É uma foto dele com Harper. Ela está com a
língua para fora, encostando na bochecha dele.
Arfo com o súbito choque. O braço de Ashton por cima dos
ombros dela, o sorriso dele cavando covinhas em suas maçãs.
Quase não tenho tempo para acompanhar o que acontece a
seguir, a ponta do meu sapato esquerdo se atando no calcanhar
direito. O grito agudo fura o nó em minha garganta, rasgando as
paredes do meu pescoço.
Meu corpo é impelido para frente com o peso da gravidade,
meu celular escorregando para longe, e uso as mãos e os joelhos
para reparar a queda, ainda assim, a dor cavalga em minhas
rótulas, e urro de raiva e desespero. Estar enciumada me colocou
na porra do chão, de quatro.
Você é mesmo uma cadela. Idiota. Imbecil. Cala a porra da
boca, escroto de merda.
Olho por sobre o ombro, a ponta dos meus sapatos no último
degrau da escada. Espiralo com a força da revolta. Bambeio as
pernas quando tento me reerguer, a dor concentrada nos joelhos me
forçando a voltar para o chão.
Engatinho para perto dos instrumentos musicais, meu celular
patinou no mármore e parou debaixo do piano. Estico o braço para
alcançá-lo, sentando-me no chão por um minuto, estabilizando a
respiração, e espero a latência no osso diminuir. Confiro a tela para
ver se não rachou e averiguo os vértices da estrutura de metal.
Num ímpeto de raiva e infantilidade, estou abrindo a foto
novamente e meus dedos agem por conta própria enquanto digitam
uma mensagem, respondendo à foto publicada no story há dez
minutos.
@gravitymonaghan: parece que está se divertindo, babaca.
Bloqueio a tela do celular, forçando os joelhos a colaborarem.
Impulsiono os pés, projetando o corpo para cima.
Ando meio mancando para a sala de estar e observo meu
estado no reflexo da vidraça, meu cabelo cacheado com o baby liss
da metade até as pontas desalinhou um pouco por causa da queda,
mas uso as mãos para assentá-lo no lugar. Minhas feições
esculpindo uma careta sôfrega que dou um jeito de suavizar. Noto
um círculo vermelho no joelho esquerdo, pequenas faixas de
sangue marcando onde a pele foi esfolada. Devo tê-lo atingido na
borda do mármore da escada.
Meu dedo paira no ícone do aplicativo e reflito se devo ou não
conferir se tive uma resposta.
Ele me desestabiliza. Ele mexe com a minha cabeça. Ele me
faz quebrar minhas próprias regras. Ele me faz agir como Demi
Lovato na música Heart Attack.
Ele me faz ver um mundo em roxo e preto – a libertação dos
medos e o incentivo do meu poder.
Estou fazendo com ele o que fiz com todos, ignorando até que
uma hora desapareça, mas preciso ser honesta e aceitar que
Ashton Baker é o único capaz de me fazer ir contra o que eu
acredito. Ele é furacão em forma de homem. Não importa como eu
decida agir, ele não vai me deixar esquecer como sempre me faz
sentir: viva e ardendo em chamas.
Abro o aplicativo, e ele respondeu menos de um minuto depois
de eu ter enviado a mensagem.
@ashtonbakeroficial: não me diga, encrenca, tá com ciúme?
@gravitymonaghan: pra te lembrar que você tem namorada.
@ashtonbakeroficial: egoísmo da sua parte me dizer isso
quando é você quem está em um encontro com um fodido. dê oi ao
Liam por mim.
Não sei do que estou com mais raiva: de ter entregado como
estou me sentindo ou por ele não estar se importando com Liam.
@gravitymonaghan: não vai dar, minha boca está ocupada
com a dele.
Ele visualiza, mas não responde. Controlo a parte de mim que
gosta de brigar. É o que mais fazemos, mas, pelo menos, estamos
tendo algum tipo de conexão — mesmo que seja para discutir.
Minha respiração assume um ritmo ofegante e bloqueio a tela,
o interfone tocando em seguida e uma onda de alívio vara meu
corpo.
Autorizo a subida de Liam e cambaleio para a cozinha,
fincadas anelando a rótula do meu joelho no percurso. Limpo o
resquício de sangue com o papel toalha e enterro os pés dentro dos
sapatos como se as solas estivessem criando raízes no chão,
nervosismo se evidenciando quando começo a bater com a quina do
celular na palma de minha mão, me dirigindo para a entrada.
Camuflo a agitação com um sorriso quando as portas de metal
se abrem.
Liam tem 1,80 de altura, cabelo loiro escuro e agora uma
barba com a mesma coloração cobre metade de seu rosto. Ele
adentra o saguão, girando na ponta dos pés e rastreando o lugar.
Uma das mãos estocada em sua calça social, o blazer dobrado em
seu braço oposto e a camisa social com dois dos botões do topo
soltos.
— Oi! — Aceno para ele antes que trombe comigo na curta
caminhada através do saguão.
— Gravity! — Ele exibe os dentes brancos e alinhados com um
sorriso, terminando a distância com uma corrida ao meu encontro.
Liam enlaça minha cintura, os braços mais largos do que me
lembro circundando meu corpo e me levantando do chão. Ele gira
comigo pelo hall, minha risada preenchendo o ar, e por um minuto,
consigo me esquecer de Harper e Ashton. Meus pés aterrissam no
chão, e Liam estabiliza as mãos em meu quadril, olhando para baixo
para me estudar.
— Uau, você continua… — Ele suspira, as duas piscinas que
colorem suas íris focalizadas em mim. — Deslumbrante. De
verdade, Gravity.
Seu olhar trajeto por meu corpo, parando em minha cintura fina
e articulada. Liam sempre teve uma persona de possessivo e
ameaçador, mas nunca de um jeito que me fizesse sentir intimidada.
Sabia como lidar com ele.
Com esses pensamentos, acho que entendo por que passei a
me atrair por homens que são o oposto de Neil.
Homens como Ashton e Liam enfrentariam o mundo por suas
mulheres. Não que Neil não tivesse feito de tudo para estar comigo,
mas ele odiava estar em conflito com a própria família por minha
causa. Odiava que eu não era aceita por eles e não lutava para
mudar a situação. Ele queria que nos mudássemos e fugíssemos
daquele círculo, e, no fundo, eu queria que enfrentasse tudo por
mim. Que colocasse fogo em Winstow se fosse necessário, mas ele
se acovardava, ministrando os conflitos para que eles não
chegassem até mim, mas nunca de uma maneira resoluta porque
sempre voltavam. E no fim ele morreu por você, sua egoísta.
— Obrigada — agradeço o elogio, procurando suas mãos
atracadas em minha cintura.
Entrelaço nossos dedos, guiando-o para dentro do
apartamento. Seus olhos miram tudo, desde a decoração até os
móveis requintados.
— Ashton não está? — Ele foca em nossas mãos interligadas.
— Não. Nós temos um relacionamento diferente. —
Desvencilho-me dele, andando para a cozinha, e Liam me segue. —
Ele está com a Harper.
— A garota das reportagens?
— É — respondo, sucinta, abrindo o armário para apanhar
uma garrafa de vinho e as taças.
— Gravity.
— Sim?
— Seu vestido… — Pigarreia, indicando minhas costas com o
queixo.
Eu o estudo por sobre o ombro, coloco as taças e a garrafa na
ilha da cozinha. Estampo um sorriso inofensivo no rosto. Faço o
contorno da ilha, indo até ele.
— Fecha pra mim? — peço com uma doçura forjada.
Viro de costas, puxando o cabelo por cima do ombro. Uma
corrente morna de ar vertendo por entre seus lábios.
Dou passos para trás, recuando de encontro ao seu peito.
Liam deixa o blazer no encosto de uma das banquetas na ilha,
encostando a virilha em minha bunda e o peito em minhas
omoplatas.
A ponta cálida do indicador deslocando-se sobre a pele nua
das costas dos meus ombros, resvalando inocentemente por toda
extensão e projetando um leve ronco da minha garganta. Deixo a
cabeça cair para o lado, dando espaço para seus dedos se
fecharem em minha espádua e massageá-la.
— Quer pular para a sobremesa? — A voz cavernosa sopra
contra minha orelha.
Não é como se nossas conversas não tivessem deixado em
aberto o que aconteceria quando nos encontrássemos. Eu o
provocava, ele me provocava de volta e, claro, acabaríamos
transando. Ele é gostoso e tenho saudade das noites que passamos
juntos.
Meu zíper está na metade das costas e não impede suas
unhas de arranharem o caminho percorrido. Ele encaixa a boca em
meu pescoço, minha cabeça caindo para o lado e criando uma
possibilidade. Liam cobre minha pele com sua língua, o hálito cheira
à pastilha de hortelã. Transita com as mãos por meu corpo,
divagando para minha barriga delgada e derivando para a barra reta
do vestido.
Aperto uma coxa na outra, sentindo a umidade encharcando
entre minhas pernas. Reclino a cabeça para trás, suas mãos
cercando minha garganta e distribuindo beijos por ela. Sua outra
mão se dedica em subir meu vestido para ter acesso ao meio das
minhas pernas.
— Você é a sobremesa — cochicha, beijando minha bochecha
—, caso eu não tenha sido transparente.
— Sim, entendi. — Minha respiração oscila quando sua mão
espalma minha boceta e corro atrás de ar, sugando em pequenas
prestações. — Quero participar dela antes do prato principal. Estava
com saudade, Liam — admito como uma cretina porque, enquanto
Liam fala e sua mão delineia meu corpo, o rosto, o cheiro, a voz…
Não é ele se infiltrando em minha mente e dominando meus
sentidos.
Liam me gira em suas mãos, meus seios se esmagando contra
seu peitoral. Sua boca paira sobre a minha, centímetros me
separando de fisgá-lo.
— Se você beijar a minha namorada, vai sair daqui sem os
dentes.
A rouquidão da voz me faz afastar de súbito. Um solavanco me
arrastando para longe de Liam. As mãos se firmam em meu quadril
e, girando meu corpo com facilidade, Ashton fecha o zíper do meu
vestido com mais força que o necessário, meu corpo chacoalhando
com a brutalidade com que desce a saia para o lugar.
— Vim jantar com vocês — explica, um ruído ecoando dele
quando range os dentes, mas sem desviar o foco de mim. — Cadê o
seu colar? — Ele encara meu colo vazio e, rapidamente, desvio
para o seu peito e o dele também não está lá.
— Cadê o seu colar? — replico, projetando uma sobrancelha
para cima.
— Oi, Ashton. — Liam finge cordialidade, mas sei que ele
gosta tanto do Ashton quanto Ashton gosta dele. — Até onde sei, o
relacionamento de vocês é aberto.
— Aberto porra nenhuma! — responde, ainda me mirando. —
Não tenho relacionamentos abertos. — enfatiza, o pescoço se
deslocando brevemente para encará-lo — E ela não vai ser a
sobremesa. Pelo menos, não a sua.
— Você não deveria estar aqui! — esbravejo por entre os
dentes obstruídos. A raiva causando explosões e escurecendo
minhas vistas.
— Onde eu deveria estar, hum? Com a Harper? — devolve,
pegando-me de surpresa. — Sem gracinhas, Gravity. Nós dois
sabemos que você não me quer perto dela. Ou de qualquer outra
mulher além de você.
— Talvez eu… — Liam começa a pescar seu blazer do
encosto da banqueta, indicando com o polegar a saída. — Posso te
ligar depois e conversamos, Gravity. Não quero estar metido nisso.
Pensei que você estivesse disponível — completa ao começar a se
afastar, com vincos na testa e tristeza amortecendo a expressão
lasciva de antes. Ele está bravo e triste, e eu estou decepcionada.
— Não! Espera, Liam!
Ameaço ir atrás dele, mas Ashton fecha os dedos em meu
pulso.
Minha visão turva, a ira encontrando um lugar dentro de mim
para crescer e adquirir força o suficiente para explodir esse prédio.
— Você destruiu minha noite! — brigo, torcendo o pulso até
fugir de seu agarre quando o elevador apita ao fim do corredor,
assinalando que Liam se foi. — Você é estúpido pra caralho!
— Estúpido? Quem foi que ficou enciumada com a Harper?
Teria ficado longe se você não tivesse me perturbado, porra!
— Te perturbado? — replico, espremendo a risada na
garganta.
— Vai me dizer que suas mensagens não eram para testar
meu nível de importância com você e Liam? — Ele avança para
cima de mim, sua boca flutuando sobre a minha. — Deixou ele te
tocar dentro da nossa casa! — exclama, a irritação flamejando e
escurecendo suas íris.
— Nossa casa? Não estamos brincando de casinha, Ashton. É
a porra de um contrato!
— Você está me tirando do sério, caralho!
— E vai fazer o quê? — Dilato as narinas, inflando o peito e
exibindo autoridade. — Ameaças vazias sobre me deixar
apaixonada? Quebrar as coisas para extrair a raiva? Você é um
covarde de merda. Se escondendo atrás de um relacionamento
fracassado, sustentando uma dependência emocional ridícula que
não te leva a lugar algum! Trepando com todas as mulheres que te
cercam para suprir uma necessidade que nem mesmo você
conhece! Você é a fonte dos problemas. Você, Ashton, é o meu
pesadelo. E Liam estava aqui para me aliviar de você!
— Mentirosa do caralho… — esbraveja, as mãos soterrando
em meus cabelos e firmando na raiz. — Mas como sou bonzinho…
— o calor do seu hálito plana por sobre minha boca —, vou te dar
uma vantagem de fugir de mim.
— Quê?! — sopro com incredulidade.
— Vamos jogar. Você adora joguinhos, por mais que diga o
contrário. — Com um safanão, guia minha cabeça para mais perto
da sua. — Pique, esconde e pega. Vou me sentar na ilha, abrir uma
garrafa de cerveja e saborear lentamente, te dando um tempo para
se esconder. É um apartamento grande, tem vários cômodos. Não
vou te limitar. Se esconda, e se eu te encontrar, você é minha.
— Você enlouqueceu… — respondo, aérea, encarando-o com
descrença. — E se você não me encontrar?
— Você liga pro Liam, ele volta, e eu saio. Te deixo ter a noite
que tanto quer.
— Você vai trapacear — uivo em deboche.
— Gosto de jogos e não sou trapaceiro, encrenca.
— Você não sabe perder, Ashton.
— Eu sei perder quando a luta é justa, mas você não fez com
que o contrato fosse justo, não é? Você pode sair por aí e trepar
com quem quiser, enquanto eu tenho que me calar e te ver dormir
com outros otários. Acorda, Gravity! Se você está comigo, não vai
acontecer.
— Você dormiu com aquela modelo! — acuso, sacolejando o
corpo para escapar do seu aperto em meu cabelo. — Contrato
nenhum te impediu, seu babaca egoísta!
Ele suspira, como se estivesse cansado de me ouvir.
— Vamos brincar ou não?
— Tenho escolha?
— Tem. A gente pode só transar e acabar com essa tensão.
Facilitaria pra caralho, não acha?
Aperto os lábios, a raiva que tinha se acumulado dissolvendo
em adrenalina. Gosto da ideia de vê-lo perder, para variar. E vou
amar trazer Liam de volta e transar com ele no meu quarto da
maneira mais violenta que conseguir. Deixar rastros de como ele me
possuiu só para que Ashton seja criativo para imaginar.
— Não. Vamos jogar.
Ele, enfim, me solta, caminhando para o cubículo da cozinha.
— Pode ir. Te vejo em breve, amor.
Sorri com sarcasmo, abrindo a geladeira e pegando uma
cerveja.
— Você não vai me encontrar — garanto, andando de costas
em direção às escadas.
— Eu sempre consigo o que quero.
“Eu vou te dar tudo que eu tenho
Se você vier buscar”
TONIGHT – DXVN & DANIEL DI ANGELO

Esfrego as mãos com mais força para limpá-las, como se


precisasse arrancar a pele para me livrar de todo esse sangue.
Minha pulsação faz as têmporas distenderem e lágrimas de
dor deslizam copiosamente por meu rosto. O vermelho do sangue
se aderindo à água, a mistura girando até encontrar o ralo na pia.
Gotas de carmesim marcam a bancada, mas tudo que quero é
me livrar dos resíduos aderidos em minha pele. É como se fizessem
parte dela. E a cada minuto, a sensação não diminui. Estou me
tornando violento e reativo como meu pai, respondendo aos seus
ataques com a mesma brutalidade.
Borrões em preto cercam minhas vistas, talvez tenha sido a
força com que minha cabeça colidiu com o mármore da ilha da
cozinha. Pela dor, os tremores e a visão embaçada, posso estar
perto de desmaiar. De fome, dor ou raiva, seja o que for, estou
fodido pra caralho.
Meu pai não vai me perdoar por ter revidado. Quando chegar
em casa depois da escola, vou levar uma surra para aprender quem
é o homem da casa.
Eu o desrespeitei na frente da minha mãe e de Madison. Fiz
exatamente o contrário das regras.
Ele está tentando me ensinar a me tornar forte, um homem de
verdade, alguém que poderá lutar suas próprias batalhas sem
parecer um fracassado. No processo, as surras são uma
consequência das minhas escolhas erradas. Ou das respostas
exaustas por não suportar o comportamento odioso do meu pai com
minha mãe.
Tudo bem se quiser me bater, às vezes faço por merecer, mas
mamãe? Ela faz de tudo para ser a mãe e a esposa perfeita. Não
fala mais alto do que deve. Segue as regras. Entende a hierarquia
da casa. Mantém os empregados seguindo os horários que meu pai
quer que sigam. Nossas notas estão boas.
Porra. Ele não podia relevar que ela está doente e precisava
ficar na cama por mais uma hora ou duas? Não. Não para Conrad
Baker. Ele não tolera fracotes sob seu teto. Ele nos lidera como
lidera a joalheria. Tudo que precisamos fazer é nos fortalecer para,
no futuro, eu assumir meu lugar na presidência. Assumir a minha
responsabilidade de homem grande.
Minhas costelas doem quando estico o braço para alcançar as
folhas de papel. Enxugo as mãos, pontos em vermelho sendo
absorvidos. Acabei manchando minha camisa do uniforme com
sangue e não sei se vou suportar o calor que está fazendo lá fora
com o blazer.
Faço o nó na gravata, meu rosto retorcendo em uma feição
disforme por causa da luxação dos nós dos meus dedos. É a
primeira vez que parto para cima do meu pai. A primeira vez que lhe
dou um soco. Não sei o que deu em mim, apenas não consegui me
sentar e ouvi-lo ofendê-la. Quando dei por mim, meu punho estava
voando na direção dele, e seu sangue manando das narinas
estendidas e o osso do nariz provavelmente estava quebrado. Ele
me bateu de volta. O soco parecendo o menor dos meus problemas
quando me acertou nas costelas.
Amasso o papel úmido com água e sangue, fazendo uma bola,
e a arremesso para dentro da lata de lixo. Confiro o horário no meu
relógio de pulso, ciente de que já estou atrasado demais para a
primeira aula.
Prefiro tirar um 0 em biologia a encarar a professora
Cassandra. Ela vai perguntar sobre o inchaço das minhas mãos, do
rubor na mandíbula no lado esquerdo e sobre as manchas de
sangue na minha camisa. Já fui envergonhado o suficiente por um
dia, não preciso de outra nota de sermão, como a que minha mãe
me deu ao praticamente me chutar para fora de casa depois de tê-la
defendido daquele escroto.
Jogo a alça da mochila sobre um ombro, a musculatura do
meu rosto contorcendo a cada passo que dou para fora do banheiro
da Boulevard Academy. Meu corpo inteiro sentindo o resultado de
outra surra. Minhas costelas estão todas fodidas.
Meu pai nunca mediu sua força. Nem quando era moleque. Ele
apenas achava que eu podia aguentar e qualquer coisa se tornava
motivo para me bater.
Nada do que era importante para mim chegava perto de ser
para ele. Cresci consciente de que tinha um genitor, mas não um
pai. Tinha alguém que me sustentava — e sempre jogava isso na
minha cara —, mas não tinha alguém com quem contar quando
precisasse. Ele não me protegeria se gritasse por socorro porque
Conrad está me educando para viver por conta própria.
Empurro a porta com força por estar no pico da minha ira, mas
ouço um grito em conjunto com as molas rangendo ao voltarem a se
fechar.
Arregalo os olhos para a garota caída no chão, uma bola rúbea
começando a crescer na lateral de sua testa. Já a vi antes. Ela é
nova por aqui, mas nunca conversamos.
— Puta merda, você está bem? — Corro até ela, evitando
torcer a boca por causa da dor pungente na lateral do meu torso.
— Parece que estou bem? — A garota embravece,
empurrando os cabelos longos com as pontas enroladas por cima
do ombro. — Você acertou a minha cabeça! — revolta, e ignora
minha mão erguida, levantando-se sozinha. — Qual é o seu
problema? Seu maluco…
Ela está ajeitando a saia pregueada do uniforme, o xadrez
verde e preto combinando perfeitamente com os orbes verde-claros.
Hipnotizado, é assim que fico. Não sei por quanto tempo permaneço
em silêncio, mas é o suficiente para ela me achar um otário.
— Ei, você está me ouvindo? — Estala os dedos na frente do
meu rosto, e pisco repetidas vezes, focando nela.
O uniforme a envolve como se tivesse sido desenhado
especialmente para seu corpo. A gravata com um nó desleixado e
as mangas da camisa social dobradas até os cotovelos. Ela bate a
ponta do pé algumas vezes, esperando que eu diga alguma coisa.
Ouço o toc-toc-toc da sola, mas sigo sendo absorto pelas íris
profundas, meu reflexo brilhando no verde delas.
— Eu te conheço? — pergunto de repente, cerrando as
pestanas.
— Não. Definitivamente me lembraria de você. — Ela me
estuda e, quando nota a gota de sangue em minha camisa, dá um
passo adiante. — Você está bem? — Dobras de pele criam vincos
em sua testa. Ela fisga minha roupa entre os dedos, sondando para
descobrir se é o que acha que é. — É sangue na sua roupa?
— É.
— O que aconteceu?
— Matei meu pai. — Minha piada é para dissipar a tensão,
mas consigo é assustá-la. Pigarreio para tentar consertar a merda.
— É uma história que não vale a pena te contar. Qual é seu nome?
— Nicola. E o seu…
— Ashton.
— Ashton Baker? — Sinto seus olhos me investigarem. —
Você é o filho do Conrad Baker, da joalheria?
Claro que ela conhece meu pai. Todo mundo conhece o
empresário Conrad Baker. Mas ninguém sabe quem ele é de
verdade.
— Infelizmente, sim. — Suspiro, jogando a mochila para cima
quando a alça começa a escorregar do meu ombro.
— Por que infelizmente? Seu pai parece ser um cara
interessante. Ele assumiu o lugar do seu avô e, quando aconteceu,
várias filiais abriram. — Nicola gesticula o queixo para frente, me
convidando para ir para algum lugar com ela. E eu aceito.
— Essa é outra história que não vale a pena te contar.
— Você é culpado por esse galo na minha testa, Ashton. O
mínimo que deveria fazer seria me entreter enquanto vou à
enfermaria conseguir uma bolsa de gelo para isso aqui. — Indica a
minimontanha nascendo em sua testa.
Comprimo os lábios para não rir.
— Em minha defesa, não vi você.
— Continua sendo o responsável por eu ter uma bola de
beisebol na testa.
— Tudo bem, tudo bem… — Suspiro, aceitando a derrota. —
Posso pagar o seu almoço e ficamos quites, que tal?
— Você não tem nenhum amigo para incomodar na hora do
almoço?
— Por incrível que pareça, não sou popular. Você é minha
primeira amiga.
— Não, não! Não somos amigos! Você é o cara cujo
arremessou a porta na minha cara!
Caio na gargalhada, por um minuto esquecendo a merda que
aconteceu em casa.
— Foi sem querer, caramba.
— Estou começando a achar que, como um cara solitário,
armou para arranjar um motivo para me convidar para sair.
— Você não é tão interessante assim.
— Não sou? Então, por que está me seguindo até a
enfermaria?
— Bom, meio que fui responsável pelo novo integrante do seu
rosto, então preciso ir com você para garantir que não desmaie
antes de chegar lá. — Soterro as mãos nos bolsos da calça.
— Ainda quero ouvir a história desse sangue. Se vou te deixar
pagar meu almoço, pelo menos preciso saber por que estava com
raiva daquela porta.

Sabia que tinha algo errado comigo quando era mais novo,
mas nunca entendi o que nem o porquê. Eu não tinha amigos.
Nenhum. Não confiava nas pessoas. Não acreditava que elas
poderiam nutrir nada real por mim.
Então, por que perder meu tempo criando laços, sendo que, no
fim, eles se romperiam? Evitar a dor é a minha fuga. Evitar o
problema é poupar meu cérebro da exaustão ao tentar compreender
aquilo que não consigo controlar. Meus próprios sentimentos são
bagunçados. Mal consigo me entender, quem dirá gastar minha
energia para entender os outros.
Mas quando conheci os caras, me vi criando raízes. Foi
intenso pra caralho recebê-los na minha vida. Chase pode ter
crescido sem conhecer os pais biológicos, mas encontrou um lugar
onde era amado.
Meu pai achava que estava me criando para ser dono do seu
império e minha mãe vivia em sua luta diária para agradá-lo. Dentro
da minha casa, sentia como se tivesse nascido por um único
propósito e era ser o herdeiro da Baker’s.
Demorei para entender que as poucas coisas com as quais me
sinto seguro, são aquelas onde deposito o meu esforço.
Nicola. A primeira garota que amei de verdade e também
minha primeira melhor amiga. É difícil para mim até hoje, depois de
anos de término, ficar com raiva dela. Ela me fez entender que eu
podia encontrar pessoas em quem me apoiar e confiar.
Porém minha cabeça já estava fodida, tentando assimilar o
que eu havia me tornado e aceitar quem eu era quando descobri
sobre sua traição. Algo dentro de mim quebrou de tal maneira que
não consegui reconstruir.
Podia revidar os socos do meu pai, mas não sabia como
retaliar com Nicola. Não quando ela tinha estado comigo por quase
quatro anos e, sinceramente, não acredito que tenha sido uma
mentira completa.
Começamos como amigos, depois ficamos juntos, e meu pai
ofereceu a ela uma oportunidade. Em troca, Nicola tinha que me
deixar.
Segundo meu pai, ela era a responsável por eu não estar
levando a sério minhas obrigações como herdeiro do império
Baker’s, portanto, precisava se livrar dela, e Nicola nem hesitou ao
aceitar ser o rosto de uma coleção limitada de joias. O que implicava
a uma única conclusão: ela não me amava o bastante para lutar por
mim.
Foi dessa forma que descobri que não importa como ou
quando, se o seu coração está em outro lugar que não seja focado
em si mesmo, você se torna um alvo fácil.
A The Reckless me magoou, mas eles sempre lutaram por
mim, e luto por eles com a mesma determinação. Eu retribuo o que
recebo. Aprendi que minhas ações dependem das ações dos outros,
é como consigo me defender daquilo que me fere. É a minha
película protetora revidar.
Ouço os passos acima da minha cabeça, portas abrindo e
fechando. Minha mente retorna para o tempo atual. Minha boca se
curva, um sorriso de divertimento sendo moldado a cada movimento
de Gravity no primeiro piso.
Minha maldita futura esposa, que consegue ser o caos quando
quer. Se soubesse que a raiva é a única resposta que encontrei
para encarar as outras sensações que desperta em mim,
estaríamos caminhando para outra direção.
Gravity é o meu gatilho. A responsável por eu estar procurando
por algo desesperadamente e não encontrar. A idealização de que
tenho o direito de ser amado como todo o resto.
Finnick é um fodido. Talvez até mais do que eu, e Effy o ama.
Ela nunca parou de amá-lo. Por que eu tenho que viver em uma
realidade onde as pessoas me menosprezam? Ou só ficam comigo
quando precisam de dinheiro ou sucesso?
Bebo o máximo que consigo da cerveja, conferindo que já se
passaram dez minutos e ela ainda não encontrou um bom lugar
para se esconder.
Como disse, reajo de acordo com as ações dos outros comigo.
Gravity me provocou. Enviou aquela última mensagem como um
teste, e eu passei. Estou aqui, pronto para tê-la, assim como ela
está louca para ser possuída.
Vou lidar como o “homem” que meu pai supostamente me
criou para ser e pegar o que eu quero. Está bem esclarecido que
Gravity e eu temos uma obsessão um pelo outro. Ela vem
florescendo muito antes de Paris e o que tivemos na França foi uma
pequena dose de tudo o que poderíamos conseguir juntos. Ela e eu
vamos colidir e explodir a porra do mundo.
Ela é minha, fim de papo.
Não porque quero provar que posso tê-la sob meu domínio —
ok, talvez isso também —, mas principalmente porque Gravity é o
ponto colorido na minha história sombria.
Gravity não me traiu. Não mentiu para mim. A culpa não é dela
que Nicola fodeu com a minha mente e me tirou a chance de ter um
relacionamento de verdade. É claro que esse contrato é motivo mais
do que suficiente para odiá-la, contudo, não significa que não posso
tirar proveito disso.
Não vou ficar satisfeito enquanto Gravity não estiver
completamente rendida por mim.
Mexo na tela do meu relógio, quinze minutos. Ela teve
bastante tempo para se esconder. Finalizo a cerveja, devolvendo a
garrafa para a superfície de mármore da ilha. Salto da banqueta,
assobiando enquanto acomodo as mãos dentro dos bolsos da calça
jeans.
Subo lentamente pelas escadas, seguindo o rastro do seu
perfume de verbena. Ela não economizou, não é? Queria estar
cheirosa para o Liam. Entorto a boca, reprovando sua tentativa de
ficar atraente para outro homem.
— Não gostei, Gravity. Para que tanto perfume para ele? —
Inalo o ar, aspirando com força.
Estagno no mezanino, observando as portas brancas com
maçanetas douradas fechadas. Encaro cada uma delas.
Garotinha esperta. Ela abriu e fechou várias delas para tentar
confundir minha intuição. Só que não tão esperta assim.
A fragrância de verbena me lidera até o último cômodo no
corredor e, sem conseguir conter a expressão maliciosa, empurro a
maçaneta para baixo e abro a porta do meu quarto, o trancando em
seguida. A chave faz um clique audível e a guardo dentro do bolso.
Enquanto percorro o quarto, começo a retirar minha jaqueta de
couro, lançando-a sobre a cama. Em seguida, estou usando a ponta
do pé direito no calcanhar esquerdo para me livrar dos sapatos.
Repito a ação com cautela, eu mesmo me espantando com a
paciência com que estou agindo.
Minha vontade era de tê-la jogado sobre os ombros, a trazido
pra cá, a comido na minha cama e permitido que Liam escutasse
tudo só para constrangê-lo, contudo, estou dando uma chance à
Gravity de admitir que me quer. Só para sugerir que tem algum
controle quando sou o assunto.
Eu a conheço bem o bastante para saber que a mensagem
que me mandou, respondendo à foto que postei com Harper, foi só
mais um indício de que está tentando se conter, sem nenhum
sucesso.
— Gostou de ter as mãos dele em você? — cantarolo com
uma risada atrás da voz. — Você sabe que sou ciumento com o que
me pertence, encrenca.
Abro a porta invisível do closet, me infiltrando pelo corredor.
Tateio a parede, atrás do interruptor, e logo ele está iluminado.
Minhas coisas estão no lugar, nada foi movido, mas o bálsamo de
seu perfume faz trilha no vestíbulo.
Viro para o corredor estreito que faz conexão com o banheiro
e, antes de chegar até ele, passos apressados vibram o chão do
quarto. Não engulo a gargalhada, sequer me esforço por isso.
Redireciono meu objetivo de volta ao quarto, a mesma
serenidade que tenho nos olhos expandindo-se para minhas
feições. Enfio as mãos outra vez na calça, atravessando o caixilho
do closet, e a vejo lutando contra a maçaneta para sair.
Tinha certeza de que iria apostar no meu quarto por acreditar
que esse seria o último lugar em que a procuraria. Na verdade, a
princípio, até pensei que ela poderia se esconder na sala de jogos
ou no ateliê, mas do meu ponto de vista, Gravity nem se esforçou.
— Se escondeu no baú da cama? — Encaro a tampa aberta,
estalando a língua no céu da boca. — Que decepção, estava
esperando mais empenho de você.
— Vai se foder, Ashton! Abre logo essa porta! — ordena, o
autoritarismo já me deixando excitado.
Não vou condená-la por me querer. Também estou louco para
beijá-la sem que seja uma obrigação contratual. Mais ainda para ter
minhas mãos passeando pelos seus peitos. Mais gostoso se Gravity
estiver com raiva por seu corpo responder a mim com tanta
resignação.
— Você perdeu.
— Perdi? — Sua gargalhada com asco incendeia o quarto. —
Você trapaceou, como eu disse que faria. Trancou a porta! —
exclama, balançando a maçaneta com violência. — Você não me
encontrou!
Desafivelo o cinto, enrolando-o na extensão do meu punho.
Aproximo-me dela, e Gravity empurra as costas contra a porta, a
respiração frenética forçando seu peito a se mover mais rápido que
o normal. Eu a encurralo com meu corpo, seus olhos serpenteando
por meu torso, a boca entreaberta liberando ondulações de ar
morno.
— Você me quer — sussurro, inclinando o tronco sobre ela.
Minha boca flutua sobre a sua, a provocando. Gravity umedece os
lábios, calor subindo e aquecendo suas bochechas. — Venha
buscar.
Apoio os cotovelos na porta sobre seus ombros, o cinto
farfalhando contra a madeira em suas costas. Forço meu joelho
contra sua virilha, as pernas se separando ao atender meu pedido
silencioso. Um sorriso rasga meu rosto.
— Publiquei aquela foto de propósito.
— Claro que sim — desdenha.
— É antiga. Não estava com a Harper. Passei o tempo todo no
saguão do prédio, esperando o Liam chegar.
Seus olhos crescem à medida que sua consciência capta a
explicação.
— Idiota! — rosna, os dentes cerrando para mim, e meu
sorriso amplia. — Você é patético.
— Sim, sim… Sou terrível. Sabia que você veria a foto e tinha
um palpite de que iria reagir. — Deito a cabeça para o lado, meus
olhos acompanhando a resposta quase imediata do seu corpo. —
Não pretendo sair com mais ninguém se você estiver na minha
cama todos os dias.
Ela procura por mim, seus olhos se prendendo aos meus,
intrigada.
— E espera que eu acredite? Ashton, não sou burra. Você diz
o que as mulheres querem ouvir e quando tem o que precisa, as
descarta — relata com orgulho, arqueando o queixo.
Impulsiono meu joelho até o limiar de sua boceta, o jeans
absorvendo a umidade. Desvio minha atenção para baixo, para ela
praticamente montada sobre ele e sua lubrificação marcando o
material áspero.
Crispo os lábios, exasperação assumindo o controle da minha
lucidez.
— Ficou sem calcinha para ele? — Aperto os dentes com tanta
força que os sinto cortar a gengiva.
— Ele tirou assim que chegou aqui. Ele a cheirou, lambeu e
sussurrou no meu ouvido o que pretendia fazer comigo enquanto
guardava minha calcinha como um prêmio.
— Quer testar meu nível de possessividade com você? — Meu
tom soa ameaçador, meus dedos cercando e fechando a curva de
sua cintura.
Gravity bafora em meu rosto, o hálito adocicado e tíbio.
— Já te disse para fazer o seu melhor — retruca, a incitação
compelida na provocação.
Afasto meu peito por poucos centímetros, o suficiente para
conseguir desenrolar o cinto do meu pulso. Gravity segue minha
mão se mover, curiosidade infiltrando através de seus olhos.
Enlaço a fivela em seu pescoço, tão depressa e com
habilidade que não deixo lacuna para ser questionado. Ela separa
os lábios, sinto as palavras verterem para fora de sua boca, mas
pressiono a minha própria e balanço a cabeça em negativa para
mandá-la ficar em silêncio.
Fecho o cinto, trazendo seu cabelo para frente e a fivela com o
fecho na nuca. O espaço entre o couro e sua pele é exíguo, regular
para o ar percorrer livremente.
— Que porra…?! — grunhe, uma mão voa para a cinta
enlaçando seu pescoço.
— Agora, sim, você está com uma coleira — escarneço,
distancio os olhos para não perder nenhum minuto de sua
fisionomia mudar. — E, nossa, você fica linda pra cacete assim,
encrenqueira.
— Solta isso, Ashton! Agora! — exige, a mão correndo para a
nuca.
— Se não parar quieta, vou amarrar suas mãos também —
sopro contra seu rosto, firmando o couro que sobrou em meu punho.
— Você gosta do meu lado obscuro — asseguro, as costas da
minha mão escorregam por sua bochecha. — Se não gostasse, por
que mentiria para mim, hum? Por que testaria o quanto posso ir por
você, se não estivesse ciente de como eu reagiria?
Imponho meu joelho outra vez entre suas coxas, forçando-a a
se abrir mais para mim. Minha mão afundada em sua cintura
delineia o caminho até a entrada de seu vestido. Quando roço os
dedos na pele, Gravity prensa uma perna na outra, retendo a
excitação para si.
Sorrio enquanto embrenho meus dedos por debaixo da saia,
sem afastar meu foco de seus olhos. Eles nublam ao passo que me
aproximo de sua carne quente e molhada. Espalmo o interior de
uma coxa, enterro meus dedos em sua pele, e Gravity objeta com
um gemido coibido.
— Quer ser uma vagabunda na cama? Então, você será a
minha vagabunda.
Mergulho meus dedos nos lábios carnudos, afastando e
friccionando enquanto sua umidade encobre minha mão.
— Gostou de como ele estava te tocando? Mas na sua mente,
quem dominava seus pensamentos era eu. Diga a verdade —
repreendo, beliscando o clitóris quando reprime o gemido ao morder
o lábio inferior e marcá-lo com os dentes. — Não precisa se conter
comigo porque você só tem que pegar o que já é seu. Só precisa
aceitar que quer ser a única a estar na minha cama.
Ela tenta se afastar me empurrando pelos ombros, mas não
movo meio centímetro da minha posição porque ela quer tanto
distância de mim quanto deseja que eu a coma.
Empunho o cinto com força, promovendo a privação de ar.
Gravity engasga, ruídos dela se debatendo rasgando nossa bolha.
Deixo-a respirar ao soltar o cinto e lágrimas escorrem do canto de
seus olhos.
— Ninguém precisa saber que quando fechamos essa porta,
você me deixa fazer o que eu quiser.
Volto a enterrar meu dedo, rompendo sua entrada. Suas mãos
se fecham em meus ombros, as unhas longas ultrapassando o
tecido frágil da camiseta para cavar minha carne.
— Cala a maldita boca! Quanto mais você fala, mais eu te
odeio!
— Me odeie pra caralho enquanto como sua boceta…
Solto o cinto, ajoelhando-me diante dela. Ergo suas pernas,
pondo seus joelhos dobrados sobre meus ombros. Forço a saia do
vestido para cima, embolando o material pequeno em seu quadril.
Minha boca cobre os lábios roliços de sua boceta, engolindo-a
em uma abocanhada esfomeada. Ela muda o foco de suas mãos
para enterrá-las em minha cabeça, enredando os fios nos dedos e
arfando alto com os ganidos que arranham sua garganta.
Os sons altos e agudos vibrando através das paredes
enquanto a como como se fosse a minha última refeição. Levo
minhas mãos para sua bunda, apalpando-a com vontade, a polpa
encaixando perfeitamente em minha palma.
— Céus... Puta que pariu, Ashton…! — vocifera, as mãos
puxando meu cabelo à medida que persigo seu orgasmo. — Assim,
uh, ah… — A rouquidão de sua voz é a coisa mais sexy que já ouvi,
puta merda.
Vagueio pelo centro, a aspereza da superfície da língua
estimulando os ruídos que ecoam dela. Comprimindo as pernas em
minha cabeça, sei que está perto de gozar. Não vou deixar. Não
ainda.
Afasto-me depressa, minha boca molhada de seu néctar.
Lambo tudo, assistindo à sua expressão catabolizar em revolta.
Coloco Gravity no chão e seguro novamente o cinto, usando a
outra mão para abrir o botão e o zíper da minha calça. Desço-a
habilmente com a cueca, meu pau duro galgando para fora. Os
olhos de Gravity pousam nele, nas veias sobressalientes sob a pele
fina e a ponta brilhando com o pré-sêmen.
— Pode vir, encrenca. É tudo seu.
Obrigo seu corpo a se mover com a coleira improvisada
circundando sua garganta com uma puxada. Gravity cai de joelhos,
respirando contra a glande vermelha do meu pau.
— Me engole inteiro, como uma boa garota.
— Não sou uma boa garota — murmura, respirando
arduamente.
— Nada que um bom adestramento não resolva — insinuo,
espremendo a risada na garganta.
“Eu sei que você me quer
Está em todo o seu rosto”
RIDE FOR ME – DANIEL DI ANGELO

Ela deve estar querendo me matar.


Quanto mais incutir ódio, melhor.
— Você sabe que quer — repito a frase que disse a ela em
Miami, deleitando da lembrança; o momento em que ouvi o farfalhar
dos lençóis debaixo de seu corpo roçando contra sua pele e o som
molhado de seus dedos melados varrendo o silêncio daquele
quarto, enquanto ela se masturbava comigo do lado.
Brindo-a com outro safanão em sua cabeça, estimulando-a, e
não preciso insistir mais para ela envolver meu comprimento com a
boca, cobrindo-o por inteiro em uma única tragada lenta. A língua
aveludada saboreando ao me sugar, as paredes de sua bochecha
fechando-se ao redor, aprisionando-me como se estivesse dentro
dela.
— Porra, você é meu o paraíso e o meu inferno — grunho,
meu corpo caindo para frente.
Apoio as mãos na porta, forçando o ar para dentro dos
pulmões e chiando no processo ao me sentir sufocar com o calor da
sua boca chupando meu pau como se eu fosse a porra de uma
bengala doce de Natal.
Gravity ameaça enterrar os dentes, mas desço a mão e agarro
com força bruta a cinta, manipulando como quero que me sorva.
Seus lábios vermelhos por uma camada generosa de batom
marcam a pele, mas não me importo, contanto que ela me coloque o
mais fundo que conseguir.
A cabeça do meu membro atinge o limiar de sua garganta, e
examino seu rosto, suor escorrendo pelas laterais e umedecendo
seus cabelos escuros.
Uno meus olhos aos seus, impulsionando meu quadril, e sua
boca abre mais para acompanhar as investidas. Nesse momento,
sinto uma conexão com ela que há muito tempo não tínhamos. Eu a
adoraria como uma deusa se me pedisse. Faria qualquer coisa para
me prender ao agora.
Violência incendeia seu rosto, presumo que esteja planejando
maneiras de se vingar pela “coleira”, mas não pelo sexo gostoso
que pretendo proporcionar a ela pelos próximos meses. Sim, porque
não tem a menor chance de eu deixá-la se livrar de mim.
A ardência em seus orbes faz as lágrimas se acumularem
enquanto continuo a encher sua boca com minha densidade. Aliso
as maçãs de seu rosto, meu polegar contornando a pele, e espalho
as gotas esparsas de suor.
— Tudo que eu disse é verdade — cochicho, minha voz sendo
contida pelo meu gemido. — Vou ser fiel a você enquanto o contrato
durar.
Bombeio mais forte, formando uma barreira nas costas de sua
cabeça com a mão para impedir que se distancie muito quando volto
com meu quadril, meu membro dilatando o âmago de suas
bochechas.
Estou perto de gozar, mas coíbo, puxando-a para longe.
Distancio-me dela, liberando meus tornozelos da calça e da cueca.
— Fica de costas para mim — oriento, indo para a mesa de
cabeceira e pescando um preservativo da gaveta.
Rasgo o pacote laminado com os dentes, cobrindo meu pau
com a película de látex. Meu peito cobre suas costas, sua
respiração encontrando o ritmo da minha. Paro, uma das mãos
espalmada no topo de sua cabeça contra a porta, meu corpo vibra
com a respiração condensada. Esboço um sorriso contido para não
denunciar o anseio de fodê-la nos próximos minutos.
Deslizo minha mão pela fenda de trás, meu dedo perpassando
a entrada de sua bunda.
— Mas o que…?
— Shhh… Não vou comer seu rabo. Pelo menos, não hoje.
Gravity tenta se virar para mim, mas entrelaço nossas mãos,
prendendo-a contra a madeira. Uso meu corpo como uma muralha
para impedi-la, e a força com que imponho ao envolver nossos
dedos é o suficiente para imobilizá-la. Encaixo a boca na curva de
seu pescoço, fios de seu cabelo entranhando pela cavidade.
— Estou duro pra cacete, Gravity. Quero foder essa boceta tão
forte, como um punho te rasgando — vozeio, a pele de suas costas
arrepiando sob a sonorização espessa. — E vai gostar tanto de me
ter te fodendo como uma puta, que na próxima vez, irá implorar de
joelhos.
— Até parece — ofega, mas pressiono meu pau na base de
sua bunda e extraio dela um silvo prolongado.
— Você estava gemendo meu nome agora mesmo e jurou que
não me deixaria te tocar nunca mais. Ainda acha que não tenho
determinação para te fazer suplicar por mim?
Beijo suas costas e agradeço mentalmente por seu vestido ter
um decote tão exagerado — embora não tivesse pensado assim
quando vi Liam com as mãos nela.
A imagem dele com as mãos sobre sua boceta se avolumam
em minha mente, crescendo a ponto de eu precisar fechar os olhos
e contrair a mandíbula para provocar outra sensação que não seja o
ciúme.
Não gostava de Harper com outras pessoas, aquilo me
incomodava, mas não sentia a necessidade de marcar território.
Com Gravity, porra, é diferente. Só de pensar em outro a
tocando, outras mãos decorando cada parte linda que compõe seu
corpo, me faz querer gritar e quebrar a primeira coisa que estiver
por perto.
— Ashton? — A voz aguda e cheia de tesão me desperta.
Desvencilho nossos dedos, cubro uma nádega, apertando com
força, e Gravity se alarma. Espaceio a mão de sua carne, sentindo
falta do seu calor. Mas logo a desço com força, estalando a palma
em sua bunda. Ela sobressalta, engolindo o gemido para esconder
que gostou.
Meu rosto se rasga em um sorriso de triunfo. Repito, lhe dando
outra palmada, comedindo a força. Minha intenção não é machucá-
la, mas deixá-la dolorida o bastante para se lembrar de que pode e
será castigada se deixar outro homem além de mim tocá-la.
— Deus… — arqueja o ar com rispidez, suas mãos se abrindo
e espalmando a porta.
— Minha intenção é te punir, mas como posso se você gosta?
— Soo por cima do estalo de outro tapa.
Seu vestido roça contra a madeira, a fricção suave se mescla
com o estrídulo de suas unhas tirando lascas de tinta da porta ao
arranhá-la.
Gravity contrai as nádegas para repelir a ardência e só paro de
esbofetear sua bunda gostosa quando o carmesim dilata sobre a
carne.
Entretanto, quando paro, não pretendo lhe dar tempo para se
recuperar do suplício, meto fundo e duro dentro dela, rompendo sua
entrada. Seu peito estrondeia em um uivo enlouquecido, a ponta
dos dedos de sua mão procurando se fixar contra a porta, mas a
desmantelo arremetendo com violência.
O baque oco de nossos corpos impactando contra a porta
tenta superar os gemidos alucinados sufocando na garganta quando
agarro a cinta, guiando sua cabeça para trás para apoiá-la em meu
ombro.
Ela separa os lábios, umectando a região ressecada com a
língua. Seus murmúrios são estímulo para mim, meus movimentos
aumentando a cadência e a precisão a cada minuto. A boceta me
recebe tão deliciosamente bem que gostaria de segurar meu
orgasmo por muito mais tempo, só para continuar sentindo-a moer
meu pau.
— Você ainda acha que Liam é melhor do que eu? — Minha
voz áspera cochicha, fisgo a carne de sua orelha entre os dentes. —
Acha que ele poderia te comer tão bem quanto eu, Gravity? Não, ele
não pode, e sabe por quê? — Aguardo, ansiando por sua voz
sufocada de tesão, mas ela não vem. — Responde! — exclamo,
dando um tranco no cinto e uma bofetada na bochecha de sua
bunda.
— Não, eu não sei! — geme, seus peitos esmagando contra a
porta.
— Ele não entende o que você gosta. Como esse cinto te
privando de respirar… — Tomo com força a faixa de couro enrolada
nos dedos. — Ou como te estapeio, marcando sua pele. Ou meu
pau te abrindo cada vez mais.
— Ai, uhm… — Ela aperta a boca, mais uma vez abstendo de
expelir como realmente gostaria. — Está tão bom…
— Eu sei que está, porque somos bons. Somos bons pra
caralho, encrenca.
Afasto seus cabelos para marcar sua carne ao cravar os
dentes em seu ombro. Gravity exala outro gemido, alto o bastante
para ensurdecer, e dedico-me com empenho, tomando meu tempo
para estocá-la devagar.
Mudo meu movimento, intercalando entre fodê-la com força e
prolongado para lento, as paredes internas se fechando à minha
volta, chupando meu cacete para mais fundo. Ela quer gozar. Os
joelhos começam a ceder, sua força drenando à medida que invisto,
me enterrando até atingir o ponto macio e sensível dentro dela.
— Preciso gozar! Me faça gozar!
— Você não vai gozar.
— Não se atreva, Ashton! — Ela leva as mãos para a base da
minha lombar, me impedindo de afastá-la.
— Se você gozar, prometo que não vai conseguir se sentar por
dias — ranjo os dentes, odiando que ela está sendo a teimosa que
costuma me desafiar.
Corro atrás do meu próprio prazer, ignorando seu choramingo.
Minhas arremetidas intensas são para eu finalmente ejacular. Bato
em sua bunda, soterrando com vontade, encontrando o limiar do
seu ventre com meu pau todo dentro dela. A esfregação molhada de
sua boceta me mamando até o talo.
Encho o preservativo com minha porra, meus braços e pernas
sendo dominados por espasmos enquanto me deleito do meu
próprio orgasmo. Minha respiração oscila, os olhos pesando e o
corpo vacila quando recuo para trás, me distanciando dela.
Descrença anuvia os olhos castanho-escuros de Gravity
quando a miro, mas dissimulo meu entendimento, ignorando-a com
desinteresse.
Ela permanece com os mamilos pressionados contra a porta
quando sigo para o banheiro, a chave do quarto ainda no bolso da
minha calça jeans, mas não pretendo informar a ela. Se quiser sair,
terá que procurá-la por conta própria.
Retiro o preservativo e faço um nó para jogá-lo no lixo. Teria
sido melhor se a tivesse tomado sem camisinha, mas pretendo fazer
exames e confirmar que estou limpo antes de arriscar.
Ligo o chuveiro, puxando a camiseta por cima da cabeça e
entro sob a água densa caindo em minhas costas. Apoio as mãos
no azulejo, limpando-me do sexo. A palma da minha mão ardendo
por causa dos tapas, mas gostei de cada segundo em que pude
castigá-la.
Permito que o tempo no chuveiro limpe minha mente das
cenas que presenciei dela com Liam quando entrei na sala.
Não me lembro de como foi que me tornei esse homem
obcecado e possessivo, talvez esteja preocupado de cometer os
mesmos erros, de reviver a mesma história. De me apaixonar e de
Gravity ser a nova Nicola para mim. De ela só ficar por perto
enquanto eu puder oferecer dinheiro e fama. Então, por que não
posso tomar alguma coisa dela, se está tomando outras de mim?
Desligo o registro, alcanço a toalha no gancho dourado ao lado
do boxe e a enrolo no quadril, rastros de água marcando por onde
caminho. Paro no closet, encontrando roupas limpas. Apanho uma
calça jeans de lavagem escura, uma camiseta preta lisa e a jaqueta
de couro. Pretendo sair para comer porque estou morto de fome.
Fiquei ao menos duas horas no saguão como um stalker.
Saio do closet para o quarto adjacente, enxugo o corpo,
estreitando os olhos por cima da cama ao encontrá-la sentada lá, as
pernas dobradas e os braços circundando os joelhos.
Seu cabelo despenteado cascateando sobre o rosto como uma
cortina. Solto a toalha para vestir a cueca e as roupas, mas
concentro-me nela, notando como sua respiração oscila. Sento-me
à lateral da cama para calçar os mesmos sapatos e quando
endireito a postura, Gravity está levantando.
— Você não me beijou — observa, e olho sobre o ombro,
encarando-a com apreensão.
— Não estava fazendo amor, estava te fodendo — lembro-a,
arqueando uma sobrancelha. — Você disse que não estava
preocupada de acabar apaixonada por mim — dobro a jaqueta no
antebraço e ajeito o cabelo molhado com os dedos —, então não
vou nem perder meu tempo me esforçando para fazer o contrário.
Vamos apenas foder como animais. — Aproximo-me dela,
encaixando seu queixo entre meus dedos. — E prometo que não
vou ver mais nenhuma mulher enquanto estivermos transando.
Serei seu, Gravity.
— Vou pensar. — Ela foge com o rosto, puxando-o
agressivamente. — Você não me deixou gozar.
— Você não merecia. — Fito-a por entre as pestanas cerradas.
— E sabe que não. Trouxe Liam aqui só para me infernizar. —
Mantém-se em silêncio, e esforço-me para desenhar um sorriso. —
Estou com fome. Vamos sair para jantar?
Gravity pisca, incredulidade afinando a linha de seus lábios
enquanto reflete sobre minha proposta — só não consigo descobrir
qual delas.
— Estou cansada. Talvez na próxima.
Estava esperando uma reação diferente. Gravity é uma versão
de mim, mas com seus próprios fantasmas para lidar, então não
posso dizer que não sou pego de surpresa por ela não retaliar como
estou acostumado. Sei lidar com uma Gravity que reluta, mas não
com uma que age com indiferença.
— Preciso da chave para sair. — Gesticula com os olhos para
a porta.
O cinto que estava em seu pescoço agora caído no chão ao
lado da cama, sua pele com um vestígio acentuado. Inclino-me
sobre o tronco, abaixando para alcançar a calça embolada no chão.
Tateio o bolso da frente atrás da chave e a encontro entrelaçada
com o colar. Metade do coração envolvido na própria corrente.
Desfaço o emaranhado, liberando a chave. Passo a cordão no
pescoço, o coração caindo e derivando pelo centro do meu peito
como um pendente. Vou até a porta para abri-la e, girando a chave,
destranco-a.
— A propósito — bloqueio sua passagem, colocando o braço
no caixilho na altura de seus olhos —, obrigado por ter sido a melhor
foda em meses.
Abro meu sorriso cínico, provocando-a porque sei que está
com raiva de mim. E eu gosto. Porra. Devo ser doente porque gosto
demais quando ela está me odiando. Estou acostumado. É o único
sentimento que conheço. Raiva. Ódio. Rancor. É o que consigo
desbravar em outra pessoa. Não importa o quanto me esforce para
ser bom, minhas tentativas são um prelúdio para o fracasso e a
decepção.
— Talvez eu queira de novo, quando voltar.
Gravity suspira com força, aspirando e engolindo o azedume
— provavelmente — que estou conseguindo desencadear nela.
— Esteja pronta para mim — acrescento com soberba.
Eu a vejo fechar as mãos em punhos, meu sorriso se
alargando em satisfação à medida que possuo todas as suas
emoções.
Desço o braço para liberar sua passagem, ela abrindo a porta
com violência para sair.
Estou esperando que ela revide. Vamos lá, encrenca, não me
decepcione. Então, estagna no meio do corredor, seu corpo
ondulando no ritmo da respiração descompassada. Cruza os
braços, virando-se para mim. Deixo o corpo cair para o lado,
escorando no batente e ofertando um sorriso orgulhoso durante os
segundos que foco nela.
— Caso você ainda não tenha escutado — ela golfa uma
risada nervosa —, você é escroto pra caralho. — Vejo os espasmos
correrem em espiral por seu corpo enquanto procura as palavras
para me ofender no nível que mereço. — Quer saber de uma coisa?
No minuto em que sair, vou ligar para o Liam e convencê-lo a
terminar o que você não fez.
Meu sorriso descostura no rosto e franzo a testa, escutando
seu “plano” estúpido.
— Não tem a menor chance de acontecer.
— Por que você só não admite que o que já sentiu por mim
ainda está aí? Em alguma porra de lugar que decidiu enterrar
porque acha que estou sendo uma aproveitadora? Ou você é
orgulhoso para reconhecer que eu sou alguém que quase te fez
superá-la?
Desço meus olhos por seu corpo, para os pés descalços e os
dedos se contorcendo contra a madeira fria. Na mesma hora, foco
no círculo vermelho no joelho com escoriações como se tivesse
caído.
— O que aconteceu com você? — investigo, apontando com o
indicador para a região ferida.
Gravity afasta o pé do chão por um breve minuto, examinando
o machucado. Ela suspira, revirando os olhos e abanando os braços
em sinal de desistência.
— Esquece, você é convencido demais para admitir. — Bufa,
girando e voltando a andar para o quarto. — Não que fosse fazer
diferença também. Não me importava naquela época, não vou
começar agora.
Pesando a mão sobre a maçaneta, Gravity empurra a porta,
seu corpo indo junto. Em seguida, ouço-a bater com força atrás de
si. Esfrego o rosto, começando a ficar frustrado.
Costumo me divertir irritando e provocando as pessoas,
deveria ser assim com ela também. É mais simples quando não
estou me importando com o que vão pensar de mim. Mas não é
nenhuma porra de segredo que me importo com Gravity. Não sou
orgulhoso para admitir, só covarde.
O que também é uma droga.
Giro nos calcanhares, indo para a mesa de cabeceira do meu
quarto. Quando você está frequentemente arrumando briga ou
socando alguma coisa para descontar a raiva, adquire o hábito de
ter primeiros socorros em casa.
Pego a caixa no fundo da gaveta, fechando-a com força, e vou
para o quarto de Gravity.
Adentro o cômodo sem bater, flagrando-a tirando o vestido. Ela
sobressalta com o rompante, uma alça da roupa escorregando do
ombro.
— Senta. — Aceno com a cabeça para a cama, meus dedos
afundando sobre a tampa.
Gravity sopra uma lufada de ar, reconhecendo que discutir
comigo é uma luta perdida, e se arrasta para a cama, esticando as
pernas para frente para me permitir limpar com antisséptico o
sangue seco.
Ajoelho-me diante dela, abrindo a caixa e dispondo dos
remédios. Ela retorce o cenho, uma expressão de dor substituindo a
irritadiça. Limpo com gaze de leve, eliminando todo o sangue e
qualquer sujeira que possa ter impregnado.
Aplico uma pomada com antisséptico também, ela sentindo
arder na mesma hora; confesso que fico sem entender se é o
ferimento no joelho ou a bunda raspando na cama. Controlo a
vontade de sorrir.
— Estou exausta de brigar.
Eu não.
Eu amo brigar com você.
Brigue comigo sempre.
— Hum — rosno.
— Ashton, estou falando sério.
Levanto minha cabeça quando noto a voz embolada. Os olhos
marejados e circundados com bolsas de insônia.
Um nó começa a se formar em minha garganta.
Porra, se ela chorar, é sacanagem.
— Estou a ponto de pegar o telefone e dizer à Camille para
rescindir o contrato.
— Eu não estou cansado.
— Não importa que você não esteja cansado. A vida não está
girando ao redor dos seus sentimentos. Como daria certo? Eu te
odeio. Você me odeia. E tudo o que fizemos nas últimas semanas
foi brigar e magoar um ao outro. Se você não se sente cansado,
sinto muito, mas eu estou!
Lambo o lábio inferior, umedecendo-o. Angústia começa a se
ampliar dentro do meu peito, uma sensação de pesar catastrófica.
— Você é gostoso e me dá tesão. Não é novidade e não estou
escondendo esse fato, mas caso não tenha notado, os
relacionamentos não sobrevivem só de sexo. — Ela suspira,
prendendo uma mecha atrás da orelha. — É necessário conversa,
compreensão, mas principalmente respeito.
— Não vou mudar por você nem por ninguém. — Fecho a
tampa da caixa de primeiros socorros, o estampido repercutindo. A
raiva me cegando e me impedindo de admitir a ela que me importo
mais do que pensa que sabe. — Se quer rescindir o contrato, fique à
vontade. Era o que eu queria desde o começo.
Levanto-me, encaminhando-me para fora do quarto, antes de
sair, entretanto, pergunto:
— Teve alguma coisa que eu fiz na última hora que você não
quis?
— Não faço nada que eu não queira — responde, erguendo o
queixo com orgulho. — E você tem razão, gostei das palmadas e da
coleira. Mas não significa que goste de te ouvir me culpando por
cada maldita coisa que dá errado para você.
— Então, ótimo, ligue para Camille e rescinda o contrato. Abro
mão da multa se for necessário — revido, contrariado, mas
arrogante demais para deixá-la decidir sozinha.
Gravity se levanta também. Estou prestes a fechar a porta
quando ela me para:
— Você só tem que dizer. — Olho por sobre o ombro, para sua
postura ereta. — Não é difícil. Sinto muito, Gravity, por tudo que
disse, por ter mentido, por ter te enganado, por ter desaparecido de
Paris na mesma hora em que admiti que queria namorar você.
— Não sei qual foi a versão de mim que criou na sua cabeça,
mas nunca disse que queria namorar você. Disse que gostaria de
continuar trepando quando voltássemos para Humperville. —
Franzo o cenho, ganhando outro olhar enviesado. — Mais nada
além disso. Eu não namoro mais. Nunca vou namorar ninguém.
Meu pai nunca se desculpou por todas as surras que levei e
por todos os membros fraturados do meu corpo.
Minha mãe nunca se desculpou por nunca intervir.
Nicola nunca se desculpou por me usar e me chutar como um
lixo descartável.
Por que eu preciso me desculpar por coisas menores? Tive
que aceitar os erros dos outros comigo, mas sou forçado a me
desculpar por nada?
— Que bela história vamos contar para Ravennah na
entrevista, hein? — Gravity aspira o ar com extenuação, os ombros
caindo elucidando sua desistência. — Tudo bem, Ash. Vamos agir
do seu jeito.

O verde de seus olhos fica mais intenso contra a luz do sol, um


arco escuro cerca as íris e pontinhos pretos fagulham ao redor
delas. Tem algo nela que me que deixa absorto. Não consigo parar
de olhá-la e quando não estamos juntos, fico com saudade. Que
merda?
— Você ouviu o que eu disse? — Nicola estala os dedos na
frente do cenho, reavendo minha atenção. — Você vai se sair mal
em trigonometria outra vez! — Suspira, os ombros despencando em
desânimo. — Seu pai vai te dar uma bronca se não subir suas
notas… — cicia, abaixando a cabeça para encarar as provas
antigas entre nós. — Ele não gosta de mim, eu acho.
— Ele não gosta de ninguém.
Empurro os cabelos longos para trás de seus ombros,
raspando propositalmente os dedos no flanco do seu pescoço.
Nicola retrai com meu toque, os pelos eriçando nos braços, e não
resisto ao sorriso. Ela responde a mim tanto quanto respondo a ela.
— Mas eu quero que ele goste de mim.
— Por quê? — Dobro o corpo sobre o dela, beijando seu
ombro desnudo. Ela remexe o quadril, o sorriso brigando para se
desenhar em sua boca. — Eu gosto de você. É suficiente.
— Sim, eu sei, mas ele é seu pai — murmura, a risada
ecoando por um filete porque ela tenta esmagá-la antes que saia
por inteiro. — E, bem, nós estamos namorando. Quero que ele
goste de mim.
Faz um ano do dia em que a acertei na testa com a porta do
banheiro masculino da escola. Daquele dia em diante, não me
afastei mais dela.
É irritante e reconfortante ao mesmo tempo. Irritante porque
não consigo tirá-la da cabeça nem quando estamos separados e
reconfortante porque pela primeira vez estou sendo feliz.
Meus sorrisos com ela são verdadeiros, fáceis. Ela não precisa
dizer coisas incríveis — embora não tenha conhecido ninguém tão
inteligente e esperto quanto ela — para me impressionar. Sem
contar que, nossa, o seu beijo é o mais doce. Não que tenha
provado muitas bocas. Nicola é minha primeira namorada. Meu
primeiro “amor” e sinto que estou flutuando, vivendo no paraíso por
causa dela. Tudo por causa dela.
A minha raiva constante parece ter diminuído um pouco. Tenho
me esforçado porque não quero ser para ela o que meu pai é para
minha mãe. Quero ser bom, gentil, amável e reconfortante, assim
como ela tem sido para mim. Quero que o que ela sente por mim
traga essa sensação de segurança, do mesmo modo que o sinto por
ela me torna melhor e feliz.
Eu a amo. Tenho certeza. Ouvi minha mãe dizendo para o meu
pai não se preocupar porque tenho apenas quinze anos e que vai
passar. Nós dois vamos optar por caminhos diferentes quando
terminarmos o colegial e vai acabar. Mas eu sei que não. Sei que
Nicola é a única pessoa nesse mundo que faz com que eu me sinta
importante. Sei que ela é a responsável por minhas noites de sono
tranquilas. Ela que me faz ter ânimo para levantar de manhã e ir
para a escola.
Nicola é a única para mim. Não importa o que minha mãe diga.
Sempre serei dela e ela sempre será minha.

Dirijo minha moto por Nova York, primeiro, sem saber o destino
e depois, estou costurando até o Village.
As luzes da casa estão acesas. Sei que meus amigos estão lá.
Só preciso de algumas horas com eles e algumas cervejas, para
relaxar e afastar minha raiva.
Se continuasse discutindo com Gravity, nossa briga não teria
fim. Nós dois temos personalidades que tentamos superar e não
gostamos de ser amedrontados ou desafiados. Gostamos do
controle. Embora esteja ciente de que quando o assunto é foder,
Gravity ama ser submissa. E descobri que gosto de domá-la. Ela só
precisa entender que temos isso em comum. Não precisamos ter
respeito um pelo outro ou estarmos apaixonados para trepar.
Dou duas voltas na rua antes de estacionar. É claro que um
jornalista ou outro pode estar à espreita. Não acessei as redes
sociais para conferir, mas a imprensa não perde nada quando o
assunto é alimentar os acessos nas mídias enquanto querem cuidar
da vida das celebridades.
O tempo dirigindo me forçou a entender por que estou com
tanta raiva. Queria que ela tivesse gostado mais de ter transado
comigo, mas o que ela fez? Ficou lá emburrada, reclamando. E com
razão, porque fui cuzão.
Estaciono a moto perpendicular ao passeio, descendo o pé e
acionando o alarme. Confiro aos meus arredores antes de galopar
escada acima, pegando a chave no fundo do bolso da calça.
Abro a porta, o cheiro de macarrão com queijo incinerando
meus sentidos. Fecho-a atrás de mim, retirando a jaqueta pesada
que costumo usar quando vou pilotar, e a penduro no cabideiro da
entrada, conversa fluindo da cozinha.
— Aquela pizza estava horrível! — Alguém reclama, só
reconheço a risada de Harper.
Esgueiro pelo corredor, a caminho da cozinha. Estão todos lá,
Harper, Tess e Delilah sentadas à mesa, uma garrafa de vinho
aberta e as taças cheias. Mackenzie, Bryan e Aidan na cozinha — e
só posso esperar pelo desastre com esses três assumindo o fogão
—, Chase e Finnick sentados nas banquetas, braços esticados e o
tronco inclinado sobre o balcão de mármore enquanto conversam
com os três do outro lado.
— Oi! — Tess estreita os olhos quando me vê. — Cadê a Vity?
— Estica o pescoço para tentar enxergar atrás de mim.
— Em casa — respondo, conciso, ponho o capacete e as luvas
de couro no chão, encostados na parede ao lado da porta. — Vocês
não tinham saído para comer?
— Pois é, a pizza estava uma droga. Ficamos com fome. —
Tess ri, alternando entre olhar para Delilah e Harper.
— Por que você a deixou em casa sozinha? — Mackenzie grita
por sobre o crepitar de algo fritando na panela diante dela. — Lilah,
liga pra ela — ordena para a loira com os olhos contidos em mim. —
Estamos todos aqui. É estranho ela ficar de fora.
— Ela não vai querer vir — falo para poupa-lá do esforço.
Puxo uma cadeira para me sentar.
— E por que não? — Aidan rebate, a testa marcada com uma
película fina de suor.
— Nós brigamos — cuspo sem constrangimento.
Harper me lança um sorriso amigável, como se me dissesse
que não há ressentimentos por eu ter começado a namorar e não a
ter comunicado.
Era para ser você.
— Vocês brigaram por quê? — Delilah redargui com um quê
de surpresa.
— Só queria umas cervejas com meus amigos.
Fujo da pergunta dela, em parte porque não quero me explicar
e em outra porque ainda estou com raiva por Delilah estar irritada
comigo. Isso é ridículo pra caralho. Ela costumava ser minha melhor
amiga.
— Vou pegar uma pra você. — Chase salta do banco para ir
até a geladeira. Ele a entrega à Tess, que faz seu truque de retirar a
tampa com os dentes, e posso vê-lo se apaixonar de novo. — Tá na
mão. — Estende a Budweiser, e degluto metade da garrafa, olhos
centrados em mim.
— A briga foi feia, hein? — Bryan zomba, me mirando por cima
do ombro.
— Não enche — murmuro, colocando a cerveja na mesa.
— Você está bem? — A voz aguda e preocupada de Harper
atingindo meus sentidos.
Minha parte vingativa quer puxá-la para perto e beijá-la. Jogar
na cara de Gravity que, se não está satisfeita comigo, posso
encontrar alguém que fique. Eu tenho tanta raiva, a maior parte do
tempo tentando contê-la e de alguma forma compreender o porquê.
Você cresce em um lar violento. Nos filmes, os pais violentos
são bêbados ou viciados, mas o meu? É bilionário, com uma
reputação, desfilando de terno e gravata. Ele é controlador. Quer
controlar sua carreira, sua esposa e quantos filhos precisa ter e
explicando por que a maioria deles precisa ser homem. Minha
cabeça sibila, confusa e atormentada.
Às vezes, me pergunto se em alguma das surras, acabei
batendo com ela em alguma quina e deformando uma parte
importante, que faria de mim uma pessoa decente.
— Ash? Tudo bem? — Harper repete.
Mas tudo o que eu quero é brigar. É ferir ou ofender. Meu
mecanismo mórbido de defesa é bater antes de apanhar.
— Sim, tudo.
Bebo de novo, sentindo a pressão sob a pele. O sangue
borbulha e efervesce, queimando como brasa. Não consigo
entender por que tenho pensado tanto nele ou em Nicola. Nem
sempre é assim. Talvez seja porque tenho estado irritado ou
magoado. Ou com medo.
Medo de quê?
— Irmão, tem certeza? Você parece pálido. — Chase observa,
fitando-me por entre os olhos cerrados. — A briga foi tão séria
assim? — sussurra, como se os outros não pudessem ouvir.
Então, empurro a cadeira com ímpeto, segurando a garrafa
pelo gargalo. Marcho para fora da cozinha, rumando para a escada,
e subo a passos apressados.
A porta do meu quarto está fechada, mas me dirijo para ele,
querendo ficar por um minuto em silêncio. Entro num impulso
intenso, caminhando para dentro do cômodo escuro; ainda com o
cheiro de perfume amadeirado, menta e couro salientes no ar. Ando
de um lado para o outro, inquieto, a cabeça fermentando meus
sentidos.
— Ash?
Ouço atrás de mim, minha respiração assumindo uma
inquietação disforme. Pisco para afastar as bordas escuras
crescendo em minhas vistas. Paro no meio do quarto, deixo a
cerveja no chão e levo as mãos para a cabeça. Atormentado. Tenho
me sentido assim. Com raiva de tudo e de todos. Com raiva de
Isabella Wren. Com raiva de Delilah. Com raiva de Gravity. Com
raiva do meu pai. Estou com raiva do mundo a ponto em que
poderia explodi-lo sem imaginar salvar ninguém.
— Ashton?
Sinto mãos pequenas apertarem meus bíceps e me puxarem
para baixo, para me sentar. Não vejo nada, só sinto a aspiração
afiada descascar minha garganta e em um ato de desespero. Abro a
boca, sugando com mais força ainda o ar. Um chiado agudo
retinindo do meu tórax.
— É possível que você possa estar tendo um ataque de
pânico. Por favor, tenta respirar mais devagar. Se concentra na
minha voz e na minha respiração, está bem?
Faço que sim, embora não tenha ideia de quem seja a pessoa
tentando — sem sucesso — encaixar meus músculos grandes
dentro dos seus braços finos, e sigo seu comando.
Fecho os olhos, suor aspergindo da minha testa e as laterais
da cabeça. A voz afetuosa serpenteando para dentro da minha
mente, alojando-se na minha consciência. Acompanho o ritmo
brando de sua respiração, tentando imitá-la, mas os tremores
crescem exponencialmente, varando meu corpo. Tilintar dos dentes
cerrados rompendo a minha bolha.
— Você está indo bem, calma.
Deixo o corpo cair para trás, cedendo ao cansaço e aos
espasmos musculares. Inalo profundamente, sentindo dor quando o
ar enche meus pulmões, porém, minha cabeça começar a querer
relaxar e a revolta interna parece estar estabilizando.
— Obrigado. — Mantenho os olhos apertados, minha nuca
sendo amparada pela borda do colchão.
Tomo meu tempo para reabrir os olhos e recobrar minha
postura.
Delilah está com os dedos entrelaçados aos meus, o que me
assusta pra caralho e me faz alarmar com o calor da sua mão na
palma da minha.
— O que está fazendo?! — inquiro, a voz apossando um tom
hostil.
— Oferecendo uma mão amiga? — Ela levanta nossas mãos
presas, arcando uma sobrancelha. — Está melhor?
— Sim. — Desfaço o enlace dos seus dedos dos meus,
cravando-os na cabeça e coçando o couro.
— Certo. — Exala, trazendo as pernas para junto do peito. —
Um de nós dois terá que dar o braço a torcer e estou vendo que não
será você. — Miro-a de soslaio, as duas íris azuladas fixas em um
ponto lúgubre do quarto. — Minha amizade foi importante para
você? Ou só servi para compensar a falta da Effy naquela época?
Porque ela estava focada no Finnick e se esqueceu de você.
Travo a mandíbula. Embora Delilah não esteja deixando
transparecer, mágoa obscurece o tom delicado de sua voz.
Mordo com firmeza, a arcada doendo à medida que os dentes
se firmam mais. Não admito meus sentimentos. A raiva causa terror
e, consequentemente, as pessoas começam a te respeitar por
medo, mas o amor? O carinho? Porra, é como convidar um estranho
para causar um estrago. Sei o porquê Delilah está magoada. Não
dei a importância que ela acreditava ter para mim.
Nunca pensei nela como uma compensação, mas existem
coisas que faço e não entendo por que estou fazendo, como estar
tão furioso com Gravity. Meu inconsciente numa tentativa de me
proteger pode estar vendo problema em tudo e me obrigando a agir
assim.
Se Delilah fosse como uma substituta para Effy, não me
sentiria tão mal por estar distante por causa do Finn. Faria sentido,
mas não fiz de propósito. Não dessa vez.
— Senti a sua falta — digo, simplesmente, não encontrando
nada melhor para responder à sua pergunta.
— Mas você continua se recusando a se desculpar. — Suspira
audivelmente, minha cabeça girando para encontrá-la olhando para
mim. — Eu vou te desculpar porque, no fundo, sei que você não
estava tentando me magoar, e sim expressar como se sentia sobre
a decisão de Aidan sair da banda para ficar comigo.
— Obrigado — rumorejo, umedecendo a boca. — Por isso e
por antes.
— Você, pelo menos, sabe agradecer. — Ela sorri, mas não de
felicidade. Não era exatamente como pretendia que essa conversa
começasse ou terminasse, sei lá. — O iPod do meu irmão ainda
está com você?
Franzo o cenho diante da sua pergunta. Ele está guardado no
armário, dentro de uma caixa. Tenho lembrança de tê-lo mantido ali.
Delilah queria queimá-lo e não ter de volta aquelas lembranças. No
momento, a única coisa que pensei foi que no futuro ela poderia se
arrepender e decidi deixá-lo guardado para quando o quisesse de
volta.
— Sim, está ali. — Gesticulo com a cabeça, apontando o
armário.
— Eu o quero de volta, se não tiver problema.
— Não tem.
Impulsiono o corpo para cima, indo em direção às portas
fechadas. Assim que o abro, exploro a parede à direita atrás do
interruptor. Não levei todas as coisas para o apartamento, mas não
sei mais se deveria ter decidido encaixotar tudo. Aidan e Delilah vão
morar juntos, presumo. Será só uma questão de tempo até Mack e
Bryan optarem por isso também. E Chase e Tess já estão falando
sobre futuro, casamento e filhos.
Essa porra é muita loucura e minha cabeça não consegue
acompanhar. Eles são meus melhores amigos. Minha família. A
única que me ama pelo que sou. Vê-los mudando suas prioridades,
como casamento e filhos, me deixa deslocado e confuso.
Almejei uma vez essas coisas, com Nicola e, quando
terminamos, só pensava em transar com metade da população
feminina do planeta. Nunca me vi em uma posição onde seria pai,
até porque meu maior medo em um relacionamento tão sério é me
tornar um fodido da cabeça como Conrad.
Encontro o iPod dentro de uma caixa de sapatos, junto de
outras lembranças. Guardei a primeira paleta que o Finnick usou, no
nosso primeiro show no Anarchy. As primeiras cordas que troquei do
meu contrabaixo. O ingresso do Farewell Show. Os pôsteres do
Purple Ride divulgando quando a The Reckless estaria tocando.
Sempre sonhei em conquistar sucesso e fama, mas nunca percebi o
que isso me custaria.
Agarro o aparelho, devolvendo a caixa para a prateleira do
armário. Estendo-o para Delilah, que já está de pé, ao lado da porta.
— Não sei o que aconteceu entre vocês — diz, acertando a
quina do aparelho na palma da mão —, mas acho que te conheço
um pouco. Você gostava muito dela.
— Mas ela me traiu e mentiu para mim.
— Não estou falando da Nicola, Ashton. Estou me referindo à
Vity. Tudo o que queria naquela época era uma segunda chance
para consertar a merda que fez. Você ganhou sua chance e não
está sabendo aproveitar.
Ela me encara, como se esperasse por uma resposta, mas não
consigo elaborar nenhuma.
— Nós estávamos na sua casa, sentados no sofá, e eu te ouvi
falar dela e da Nicola por horas. Você gostava da Nicola. Ela foi a
primeira pessoa a te amar mesmo com suas feridas, mas estava
apaixonado pela Gravity. Não sei do que está com medo, mas uma
coisa posso te dizer: Vity é leal. Pode mostrar quem você é. Ela não
vai te dar as costas se você não for tão bonito por dentro como é por
fora.
Termina com um sorriso, dessa vez a tristeza dissipa. Meu
coração pulsa ao enxergá-la. Não como a garota que conheci e
disse que era “minha melhor amiga no mundo inteiro”, mas como a
mulher que se propôs a conhecer meu lado sombrio, feio e, mesmo
eu estando errado, decidiu que precisava dela mais uma vez.
Engulo o choro travado na garganta e, mesmo sabendo que a
voz sairá embargada, antes de a porta fechar, fecho meus dedos
nela e abro outra vez.
— Aidan disse que vai se mudar.
— Pois é. — Estagna, parada no topo da escada. — Vou ter
mais chances de encontrar uma editora por aqui. Me mudo no Natal.
Limpo a garganta, escavando coragem no fundo meu peito.
— Podemos montar a árvore juntos? Como na primeira vez?
Ela apoia a mão no corrimão.
— Você vai voltar a me infernizar, não vai? Que saco... —
murmura a última frase, mas um sorriso escorregando do fundo da
voz. — Estava feliz de não receber suas mensagens dramáticas de
madrugada.
— Duvido muito, estava era morrendo de saudade.
Sua gargalhada estrondeia. Puta merda. Estou feliz demais
pelos últimos cinco minutos.
— Só mais uma coisa. — Delilah vira o quadril, o corpo ereto
voltando-se de frente para mim. — Bryan disse que a psicóloga vem
atender vocês pelo menos uma vez na semana, mas que você e
Finn faltam a quase todas as sessões. Os ataques de pânico vão
melhorar se você — faz uma pausa, franzindo o lábio para a direita
—, sabe, conversar mais profundamente com alguém especializado
no assunto. Para entender quais são os gatilhos e essas coisas…
— Como sabe de tudo isso?
— Fiz algumas pesquisas para o meu livro, mas acho que
principalmente porque continuo fazendo terapia para me curar do
meu pai tóxico.
— Valeu, Delilah.
— De nada. — Volta a descer, gritando por cima do ombro: —
Vem comer!
Sei que precisamos de outra conversa. Nossa amizade não vai
voltar ao que era assim, da noite para o dia. Coisas aconteceram.
Ela me magoou e eu a magoei. No entanto, o que acabou de
acontecer mostra que ainda temos uma chance.
“Não precisamos estar apaixonados, não
Eu não preciso ser a escolhida, não”
ONE OF THE GIRLS – THE WEEKND, JENNIE & LILY-ROSE
DEEP

— Que cheiro podre é esse? — Trycia encara o breu do


apartamento, apertando as narinas para evitar o odor. — A gente
deixou alguma coisa na geladeira que pode ter estragado?
Já faz três semanas do meu desentendimento com Amber e,
nesse meio tempo, Try e eu decidimos sair para evitá-la.
Segundo ela, me faria bem um tempo longe, como se para dar
espaço para que percebessem que o que estão fazendo não é
correto. Ajudou muito que Amber não apareceu na detenção,
nenhuma vez.
Dias atrás recebi uma notificação do prédio, a respeito da
mudança de Amber e as outras. Nossa moradia não tem nada a ver
com a universidade. Esse apartamento — que aparentemente
estava dividindo com Amber e suas amigas — foi uma indicação
inocente de Yael. As garotas precisavam de alguém para dividir o
aluguel, e Trycia e eu precisávamos de um lugar para morar, onde
não ficássemos completamente zeradas no fim do mês, e com
quanto mais pessoas você divide a casa, mais barato fica.
Amber não precisa de colegas de quarto, mas acho que uma
parte dela adora ter alguém para infernizar. Ouvi histórias pelos
corredores da universidade que ela é uma valentona e está sempre
agindo como uma filha da puta com as outras pessoas —
essencialmente novatos e sempre se salvando de ser punida por ser
filha de alguém influente.
O pai dela, entretanto, deve estar envolvido na decisão da
mudança. Acredito que está tentando evitar que Amber arranje mais
confusão. Presumi que Yael foi responsável por isso. Como se ela o
tivesse alertado sobre as ações da filha, portanto, seria bom que
encontrassem outro lugar.
Não sei para onde ela se mudou com as outras duas que
moravam aqui — as outras que estavam naquele dia entraram com
o consentimento dela —, mas pretendo evitá-la como tenho feito nas
últimas semanas. Não posso perder minha oportunidade e estou
quase me formando. Não preciso de “violência” manchando meu
currículo.
Tenho trilhado meu caminho de Winstow até Humperville com
inteligência, sendo prudente e me impondo. Estabeleci uma base
sólida para mim mesma, reconstruí a minha vida e cheguei tão
longe quanto foi possível, no estado em que estava.
Determinei minhas próprias regras, fundei meu alicerce, formei
uma história que eu mesma estou acostumada a contar e, melhor
que isso, menti por tanto tempo sobre quem eu sou, que acabei me
tornando a versão que criei para me proteger. Não posso deixar
uma qualquer chegar à minha vida e acabar com tudo que tenho
ajustado para o meu futuro, como uma pessoa com traços de
megalomania.
— Não que eu me lembre. — Fecho o nariz com a ponta dos
dedos, batendo a porta atrás de mim.
— Nossa, mas está fedendo demais!
Trycia tateia a parede atrás de mim, em busca do interruptor.
As luzes acendem e intercepto meus passos, notando rastros de
terra no chão por todo o apartamento.
— Que coisa é essa? — Trycia está apontando para gotas de
sangue no sofá e também sobre a mesa de jantar. — Jesus, alguém
morreu aqui? — murmura, escondendo-se atrás de mim.
Deixo minha bolsa na entrada, agarrando-a pela mão. Sigo as
marcas no chão. Pelo formato do solado, é uma bota e a pessoa
deve calçar de quarenta a quarenta e dois. Meu pé fica minúsculo
perto da pegada.
Acendo a luz do corredor que conecta aos quartos e banheiro,
descubro que o vestígio de lama seca acaba na entrada do meu
quarto.
Um nó se forma no vértice da garganta e nenhuma gota de
saliva passa por ela quando tento engolir. A sombra de uma mão
coberta de sangue espalmada na porta branca entreaberta, o fedor
ficando mais aguçado à medida que me aproximo do quarto.
— O apartamento com certeza foi invadido, vamos chamar a
polícia agora mesmo! — Trycia enraivece, arrancando com um
ímpeto seu celular do bolso de trás da calça e soltando minha mão.
Ignoro-a, apesar de querer impedi-la, estou concentrada
demais em chegar ao quarto para evitar a polícia aqui. Estou ciente
de que posso acusar Amber e, ainda assim, ela conseguirá
manipular a situação a seu favor. Uma maldita de uma narcisista
com um rostinho de anjo.
Empunho a maçaneta, empurrando-a. O cheiro fica mais
acentuado, meus dedos divagam na parede atrás do interruptor, a
protuberância toca a ponta deles e acendo a luz. A cena é de horror,
como se realmente alguém tivesse sido atacado e morto no meu
quarto. Tem sangue nas paredes, assim como em todas as minhas
roupas espalhadas no chão. Elas foram arremessadas por ali
propositalmente, dá para notar pelo modo como estão estiradas e
emboladas em manchas de sangue e o fedor concentrado
especialmente nelas.
Pisco lentamente, minha mente absorvendo o cenário que
mais está parecido com um filme de terror. Lágrimas se acumulam
em minha esclera enquanto um frio sobe pela espinha.
Adentro o quarto, fundindo-me à bagunça que meus pertences
se transformaram. O sangue está seco, o que indica que deve ter
acontecido há dias. Porém Amber é esperta, ela sabe que nas
últimas semanas, para evitá-la, estava hospedada em um hotel
perto do campus. E quando os vizinhos podem ter tentado me
notificar do cheiro, mas ela deve ter sido a primeira a falar com eles
e inventar a desculpa mais esfarrapada.
Aproximo-me da cama, o lençol absorveu sangue de algo que
está debaixo dele. Fecho os olhos, hiperventilando e um pouco
nauseada. Seguro a barra, onde o sangue ainda não consumiu, e o
puxo para fora, pedaços de pele de sapo vindo com ele.
Grito, desequilibrando e andando para trás, a cena grotesca
sendo incorporada cada vez mais, a cada segundo, pelo meu
consciente. Meu corpo inteiro tremula perante o massacre de sapos
na cama. Tem, pelo menos, vinte deles. Seus corpos esmagados,
vísceras cobrem minha cama e o sangue seco deles impregnou
meu colchão.
Corro para fora do quarto, o odor parece ter se entranhado no
meu próprio sangue e minha pele está infestada com ele.
Lanço-me para dentro do banheiro, me ajoelhando e
abraçando a privada, expelindo o jantar. Meu corpo convulsiona
com a expulsão forçada do estômago, e por cima do som da minha
garganta arranhando, ouço o grito de Trycia do outro lado.
— Meu Deus, Gravity! Que foi que aconteceu naquele quarto?!
— berra. — Já liguei para a polícia, eles estão vindo!
Trycia anda de um lado para o outro até finalmente vir me
ajudar. Ela prende meu cabelo com a mão, acariciando minhas
costas enquanto meu gastro trata de limpar meu estômago. Evito
inspirar fundo porque a podridão só me faz querer vomitar de novo.
— Gravity… — Try sussurra, o tronco erguendo-se
brevemente.
Giro a cabeça, acompanhando a direção que seus olhos
miram.
No espelho tem uma frase, não consigo lê-la inteira pela minha
posição, então limpo a boca com o dorso da mão, aprumando a
postura, e fixo meus olhos nele.
— Seu sangue será o próximo…
Leio em um sussurro.
Não tenho muitos medos na vida, mas, com certeza, tenho
medo de morrer. Já estive cara a cara com a morte, talvez ela esteja
voltando para me buscar.

Escuto o som das botas de Ashton afundando no piso de


madeira de seu quarto.
Ele acabou de voltar.
Sinto minha pulsação dilatar debaixo da pele à medida que
reconheço sua presença. Ele está a exatamente uma parede de
distância. Meu corpo, ainda ciente do seu calor expandindo minha
entrada, das suas mãos apertando e castigando minha bunda.
Embora esteja dolorida entre as coxas e as nádegas tenham
reclamado no chuveiro enquanto tomava banho, cada pedaço de
mim continua faminto.
Eu o detestei por não me deixar gozar. Ele estava me punindo
por ter trazido Liam para cá, mas principalmente por tê-lo deixado
me tocar. Mas, porra, provocá-lo é um desejo inevitável. Contrariá-lo
me faz sentir viva, em expectativa. Cada pedaço de mim ansiando
pela adrenalina do estrago que Ashton é capaz de causar.
Devo ter perdido minha dignidade em alguma fase da minha
vida, mas, desde Milão, tudo é extremamente monótono para mim.
Escolhi me esconder, fugir em vez de lutar, parar em vez de
brigar. Fiz escolhas pois pensei que estaria me poupando de mais
sofrimento para, no fim, descobrir que estava abrindo mão de quem
tanto lutei para me tornar.
Voltei ao começo de tudo. Voltei à Gravity medrosa que
costumava ser.
Em alguns momentos, quando Ashton e eu estamos brigando
como inimigos, é quando consigo me conectar à minha versão
inabalável. Gosto de como ele me desafia.
Às vezes, me sinto cansada e com vontade de desistir, então,
ele volta e me testa, se atrelando com meu lado obstinado e me
forçando a provar a mim mesma que eu posso fazer qualquer coisa,
mesmo quando dizem que não.
Essa noite eu percebi que é Ashton que me leva de encontro a
uma parte de mim que pensei ter perdido.
Ele me faz querer lutar por mim de novo. Ele me faz querer ter
de volta minha dignidade. Ele me força ao embate, com seu jeito
babaca e egoísta, meio distorcido e confuso, mas quando estamos
brigando, é também quando consegue despertar meu lado
tempestuoso.
Do seu jeito nada convencional, Ashton está me trazendo de
volta à vida.
Viro sob os lençóis, o material fino e macio roçando minha
pele. Imagens dele me imprensando contra a porta passam diante
dos meus olhos.
A umidade entre as pernas cresce, sinto-a encharcar a
calcinha, e giro outra vez, tentando encontrar uma posição
confortável que me faça dormir rápido. Entretanto, não teve um
minuto desde que ele saiu, que consegui me acalmar.
Um misto de raiva e tesão me deixando a cada segundo mais
desperta. Mackenzie me convidou para jantar com eles, mas sabia
que se saísse daqui, não conseguiria dividir o mesmo espaço que
Ashton sem querer esganá-lo. Como ele pôde não me deixar gozar?
Como ele consegue ser egoísta a esse ponto? E, pior, ter esse
autocontrole indestrutível?
O sono desaparece quando o som de nossos corpos se
chocando com violência contra a madeira permeia minha mente.
Meu corpo inteiro aceso, os pelos dos meus braços arrepiados com
a memória fresca. O botão no topo da minha boceta lateja e minha
respiração fica mais intensa. Afasto os lençóis, os chutando com um
movimento brusco. Arfo de irritação, o sangue borbulhando debaixo
da pele.
Levo minha mão para a garganta, minha pele do pescoço
ligeiramente sensível sob o toque dos dedos. Não sei por quanto
tempo a marca do cinto vai ficar, mas tenho estoque de momentos o
bastante para ser atormentada por muito tempo.
Como pode alguém me causar tanta raiva e, ao mesmo tempo,
desejo? Talvez nunca consiga explicar ou o mais aceitável seja que
Ashton tem sido como um tratamento para a minha mente fodida.
Nunca sofri bullying na escola, mas acabou acontecendo na
faculdade, longe da minha irmã e das minhas melhores amigas.
Obriguei Trycia a ficar quieta. Não contar nada a ninguém porque,
de algum jeito, pensei que poderia superar o que Amber fez comigo,
como superei quando Neil se foi. Porque uma parte de mim bem
ambiciosa acredita que pode lidar com todas as merdas sozinha.
Deslizo o dedo por toda a região com vergões, minha garganta
seca sentindo dificuldade para engolir.
Atravesso o pescoço pelo colo, rente à renda delicada do meu
baby doll. A palma resvalando por cima do bico intumescido do meu
seio direito. Sugo o ar, inspirando profundo, e prendo um mamilo
entre os dedos, beliscando com raiva e mordendo o lábio inferior.
As imagens de Ashton me comendo por trás, minhas unhas
enterradas na madeira e o sibilo delas interrompendo meus gemidos
crescem em meus ouvidos.
Aperto uma perna na outra para disfarçar o quanto essa cena
me deixa encharcada, mas o som molhado da minha calcinha
destrói qualquer tentativa de esconder que aquele desgraçado
conseguiu o que queria de mim.
Repito a ação, impondo mais força no bico rígido, meu quadril
involuntariamente projetando para cima. Afasto o elástico do short
que abraça minha cintura e desço-o até os tornozelos. Quero sentir
minhas coxas e o calor úmido da minha boceta.
Nem mesmo os homens com quem dormi nos últimos anos
foram capazes de aplacar o sentimento de que sou uma covarde, e,
a cada nova descoberta, comprovo mais que Ashton é como uma
cura temporária para a minha dor. Ele é o meu resgate. Sendo
imbecil ou não, é responsável por me deixar assim. E preciso de
mais. Preciso que ele me tire do fundo desse poço em que Amber
me lançou.
Escorrego entre minha carne, a calidez abraça a ponta de
meus dedos e os sinto empapuçar com minha lubrificação. Circulo o
clitóris com o polegar, massageando devagar enquanto afundo em
minha abertura. Apesar de estar dolorida por ele ter me fodido
daquela maneira, só quero ter mais dessa sensação.
Abro as pernas, permitindo mais acesso ao meu interior.
Arqueio a coluna, me proporcionando prazer intenso enquanto
minha boceta engole o comprimento dos meus dedos. Meu corpo
efervescendo e entrando em síncope.
Mordo o interior da bochecha e pressiono os lábios, contendo
o gemido agudo tentando varrer a garganta. Faço círculos precisos,
meu ponto alto de prazer inchando debaixo do meu dedo.
Grunho o gemido, mas uma rajada quente de ar flui da minha
boca e o ronco faz meu tórax vibrar. O mesmo som oco que o corpo
de Ashton fez quando colidia contra o meu, e nossos corpos unidos,
chocando na porta, o estrondo imperando e fazendo minhas pernas
perderem o equilíbrio.
Meu corpo explode em um orgasmo potente, meu tronco
arremetendo para cima, pretendendo me abrir como Ashton fez
enquanto metia fundo e duro. Inferno de homem. Inferno de desejo
pervertido.
Libero um uivo afônico, raspando a mão inundada do meu
gozo pela barriga. Minha pele sensibilizada eriçando com o toque
quente. O coração bate forte, quase rompendo minha barreira de
carne e se fundindo ao colchão em minhas costas. Respiro com
dificuldade, minha visão voltando ao normal aos poucos.
Aguço os ouvidos, procurando me situar de sua presença, mas
o silêncio é um assombro. Ainda com as pernas bambas, lanço-as
para fora da cama. Firmo os pés no chão e procuro pelas pantufas
com a ponta dos dedos. Calço-as e caminho no escuro até o
banheiro, onde encharco uma toalha com água e limpo entre as
pernas. Volto para o quarto, e visto o short.
A passos vacilantes, direciono-me para a porta, abro uma
fresta, espiando por lá. A luz amarelada do quarto de Ashton está
apagada e não ouço nenhum ruído vindo de lá, mas não posso dizer
com certeza se já dormiu.
Passo com o corpo por ela, caminhando pé ante pé para perto
do seu quarto. Colo meu ouvido nela e fecho os olhos,
concentrando-me a ouvir qualquer coisa, mas o silêncio perdura e
decido que já deve ter dormido.
Na realidade, não sei o que estou planejando. Bater na porta
dele e admitir que ainda estou morrendo de tesão? Ou confessar
que sem perceber, ele está me resgatando de uma merda pesada
que enfrentei em Milão? Não tem a menor chance de acontecer.
Nem que o céu caia sobre a minha cabeça vou reconhecer que ele
quem está me forçando a escalar esse poço.
Estou prestes a me virar e voltar para o quarto quando a
madeira ralha às minhas costas. Rodeio em um ímpeto exasperado,
meu rosto por um fio de bater contra a parede do seu peito. Aspiro o
ar, calor aquecendo minhas bochechas de vergonha.
Puta que pariu.
— Espiando por trás da porta, encrenca? — Seu sorriso
sedutor cava furinhos em suas bochechas. Tremo de raiva, mas não
mudo minha expressão antipática.
— Não. Tenho quase certeza de que deixei meu celular no seu
quarto. Só ia conferir. — Cruzo os braços, sentindo-me orgulhosa da
minha agilidade para arranjar uma desculpa.
Porém Ashton não aparenta estar convencido.
— Não deixou.
— Você não pode ter tanta certeza disso! — contesto, irritada,
não sei se por ele estar rebatendo ou por eu estar com vergonha. —
No meu quarto, ele não está — minto outra vez, porque com certeza
ele está na minha mesa de cabeceira.
— Veio por que quer ganhar mais algumas palmadas na
bunda? — Ele avança um passo, o sorriso ganhando mais força
quando descobre o nervosismo escapando da minha voz. — Não
me importo de te fornecer o que quer, se você estiver com as pernas
bem abertas para mim.
Continua dando passos em minha direção até que eu esteja
encurralada entre seu corpo e a porta.
— Algumas horas atrás, estávamos nessa mesma posição,
mas do lado de dentro… — Gesticula a cabeça, possivelmente
entendendo meu olhar lascivo quando a lembrança me invade. —
Quer repetir, não quer? — arrisca, o pescoço tombando brevemente
para o lado. — Você sabe que quer — sussurra, inclinando o corpo
sobre o meu, a frase particularmente sendo reciclada. É a terceira
vez que testa o meu limite com ela.
— Você está certo, eu quero — aceito, e, nesse momento, o
vejo se desprender de sua superioridade sobre mim. Ashton não
espera que eu seja fácil, isso o entedia. Ele gosta de ser instigado.
— O que pretende fazer a respeito?
— Hoje? Absolutamente nada — revela, com uma mão sobre o
meu ombro, me deslocando da frente do quarto para desobstruir a
passagem.
Assombro forma minha expressão.
— Você está brincando comigo? — sobressalto, arregalando
os olhos quando abre a porta para entrar. A luz amarelada
rompendo da fresta e pintando o breu do corredor.
— Não, encrenqueira. Mas gosto de te provocar para te ver
assumir que me quer. Nós vamos nos casar em breve, já pensou na
minha proposta? — Ele dobra o braço contra o batente, apoiando o
peso do corpo. — Podemos nos envolver sem nenhum
compromisso sério durante os oito meses que ficaremos presos no
contrato, só sexo. — Agita os ombros para explicar a indiferença. —
E quando o contrato acabar, nós terminamos com nosso
relacionamento casual também.
— Está admitindo que ainda me deseja, Ashton Baker?
Ele suspira, franzindo os lábios para a direita.
— Nunca disse que não te desejava, Vity. — Seus olhos
obscuros passeiam por meu corpo. — Eu sempre te desejei. Fugi de
você pra caralho, tentando não te querer. — Ele me dá um meio
sorriso convencido. — Está feliz agora? De me ver reconhecendo?
— Não exatamente. — Firmo meus olhos nele.
— Deveria. Sou orgulhoso demais para assumir algo assim.
Espremo os lábios, sentindo a fricção rachar a pele.
— Não posso confiar em você. Não quando você disse que
estava planejando me magoar.
Ele suspira, a cabeça caindo para trás enquanto formula uma
resposta.
— Vamos fazer assim. — Apoia uma mão na maçaneta,
curvando-se sobre mim. — Prometo não ter nenhuma atitude que
faça parecer que estou tentando te deixar perdidamente apaixonada
por mim. Vou apenas te foder gostoso todos os dias e te deixar feliz.
— Ainda não poss…
Ele não me deixa terminar. Sua boca captura minha fala,
fôlego e raciocínio. Ashton mergulha uma mão na nuca, prendendo
meu cabelo em seus dedos enquanto me devora e suga minha
língua, compartilhando seu característico sabor de menta. A outra
mão rodeia minha cintura, os dedos enterrando na carne quando me
puxa de encontro ao seu peito em um solavanco forte.
Ashton me afasta de repente, calmo e tranquilo. Fico
preocupada que ele possa estar ouvindo meu coração, entretanto,
mantenho a postura e a expressão impassível.
— E vou te beijar desse jeito pelos próximos meses, quantas
vezes quiser.
Ele resvala o nariz no meu, sentindo minha respiração quente
oscilar.
Como eu o odeio, céus…
— Sem contar que, se estivermos mais íntimos, vamos passar
mais confiança sobre nosso relacionamento. Não quero decepcionar
os caras nem o Jared. Preciso que minha imagem se restabeleça.
— Você é tão contraditório… — cantarolo, tentando ignorar a
mão pesada e quente ainda rodeando minha cintura. — Antes de
sair, disse que o que mais queria era que esse contrato acabasse.
— Convenhamos, digo muita merda quando estou chateado.
— Ah, sério? — escarneço, sua boca ainda flutuando a menos
de dez centímetros da minha. — Não tinha notado quão imbecil
você fica quando está com raiva. Mas sabe o que me choca? Você
estava com raiva quando a única que tinha o direito de estar era eu.
Você não me deixou gozar porque tem um senso ridículo de que
tudo que te cerca, te pertence e achou que poderia me punir.
— Estava com ciúme. — O pomo de Adão se move seco
quando ele engole.
— Você não tem direito de ficar com ciúme.
— Dentre todos os homens do mundo, sou o que tenho mais
direito de ter ciúme de você. Nem por um segundo passou pela
porra da sua cabeça como me sentiria? Você não se coloca no meu
lugar e é só por isso que vivemos brigando.
— Você também nunca se colocou no meu lugar…! — ralho,
meus olhos saltando enquanto tentam acompanhar a direção dos
seus.
— Ela precisava de mim — repete a mesma desculpa de
sempre, e me sinto exausta outra vez.
Tento me afastar de sua mão na minha cintura, mas só o faz
me cercar com o braço.
— Me responda uma coisa. Se ela precisasse de novo, se, por
acaso, tivesse que escolher entre ficar do meu lado e ir até ela, o
que escolheria? — Pisco, alinhando nossos olhos na mesma altura.
Noto a contração da mandíbula quando morde os dentes. Não
desvio dele nem ele de mim. Meu coração martela no peito,
angustiado pela resposta que não vem. Estou prestes a fugir de
dentro dos seus braços quando ele solta o ar mentolado em meu
rosto.
— Escolheria você. Posso cometer vários erros repetidamente,
mas esse é o único que não arriscaria.
— Significa que se arrependeu — compreendo, devolvendo
seu olhar sincero com confusão. — Por que é tão difícil para você se
desculpar? E por que, em Miami, gritou comigo e insistiu que nunca
escolheria ninguém além dela?
— Porque é inútil. Não vou deixar de falhar só porque
reconheci um erro. Nem quero tentar camuflar minhas merdas com
pedidos de desculpa. — Ele faz uma pausa, o braço rodeando
minha cintura me prendendo com mais força.
— Você só está dizendo todas essas coisas porque quer que
eu aceite sua proposta — concluo, não conseguindo confiar em
suas palavras, embora ele esteja falando de maneira comedida,
transmitindo honestidade.
Ele sopra o ar, abatido.
— Não. Estou dizendo tudo isso porque uma pessoa muito
especial me deu uma sacudida e estou começando a entender por
que é que ela decidiu me dar um gelo tão grande.
Delilah.
Ele falou com ela sobre mim. Ou ela falou com ele sobre mim.
Não acredito que Delilah tenha essa influência sobre Ashton, mas,
ao mesmo tempo, é possível que a considere mais do que eu ou até
que ele mesmo pensava.
A importância de uma pessoa é medida na ausência dela.
Não deveria ser dessa forma, mas é. O impacto da amizade
dos dois na vida de Ashton pode ser maior do que ele nos deixa ver.
O que, se tratando dele, não é nenhuma novidade.
— Não vou mudar, mas me sinto melhor para admitir que sim,
quero você, então aceita — incentiva em um tom autoritário.
Ele nunca vai mudar.
Mas ele está me ajudando a escalar esse poço.
Ele está me puxando de volta ao topo.
Posso aproveitar de cada parte desse contrato.
Posso me agarrar a ela.
Suspiro, agarrando seu braço ao redor da minha cintura para
me soltar.
— Só sexo. Sem nenhum sentimento. E você não vai mudar
porque se mudar, vou entender que está tentando partir meu
coração. Também não pretendo ser maleável com você, então
vamos continuar nos odiando, mas aproveitando que somos bons
transando.
— Eu vou te comer deliciosamente todos os dias, por meses,
encrenca.
— Se me punir me privando de gozar outra vez, juro que vou
me vingar.
— Por que não experimenta se vingar agora?
Ele sorri como um próprio Deus reinando no meu paraíso
infernal.
— Sabe de uma coisa? — Apoiando as mãos em seus
ombros, fico na ponta dos pés. Ashton me ajuda, curvando o quadril
para minha boca alcançar sua orelha. — Não tem nada que um
homem faça que uma mulher também não possa fazer. Isso inclui
me proporcionar prazer.
Volto os calcanhares para o chão, deliciando-me da sensação
de conseguir arrancar o sorriso presunçoso de seu rosto com minha
confissão incutida na fala. Não precisava dele para me fazer gozar
— embora admita que teria sido muito melhor se tivesse acontecido
enquanto era fodida contra a porta de seu quarto.
— Boa noite, Ashton.
Subo na ponta dos pés e dou um beijo no canto de sua boca.
Minhas mãos espalmam seu peito e ignoro quando as suas pousam
em meu quadril, aplicando um pouco mais de pulso ao fechar os
dedos no osso.
Afasto-me, o aroma de verbena do meu perfume deixa um
rastro quando volto para meu quarto. A porta bate atrás de mim, a
palpitação em meu peito soando tão alto quanto o estrondo que a
porta faz.
Minha respiração frenética faz o tórax arder. Fico com as
costas coladas à porta até ouvir a dele fechar. Sinto meu pulso outra
vez, a adrenalina, o sangue fervendo ao passar pelas veias. Trinco
os dentes no lábio inferior, as bochechas sendo consumidas pelo
ardor.
A luminosidade da tela do meu celular provoca minha atenção.
Caminho rumo à mesa de cabeceira, lendo pelo canto do olho. É
uma mensagem de Ashton. Libero a tela com o Face ID e sento-me
na cama.
Traidor:
Fiquei com tesão.
Senti falta do seu lado meio bad girl… que adora me provocar.
E espero quando vejo os três pontinhos pulando na tela.
Traidor:
Sua bunda vai ficar muito vermelha na próxima vez,
encrenqueira.
Prendo o lábio entre os dentes, sentindo o sorriso contornar
minha boca.
Gravity:
Hoje vou dormir pelada.
Minha bunda ainda está doendo.
Traidor:
Porra. Melhor se abster dos detalhes.
A não ser que você queira que eu invada seu quarto.
Gravity:
Quer saber o que eu estava fazendo antes de você chegar?
Ele não responde e meu corpo começa a formigar. Chuto as
pantufas para longe, deitando-me na cama enquanto espero pela
resposta.
Merda. Não quero ficar ansiosa para essa conversa, mas,
sério, Ashton e eu fazíamos isso com frequência quando eu estava
em Paris e ele em Humperville. Foi assim que aumentei minhas
expectativas com ele. Foi nessa troca de mensagens que alimentei
meu desejo de transar com ele. E, em um fim de semana, conseguiu
me fazer cogitar mais.
Não está sendo muito diferente agora. Quanto mais brigamos,
mais o quero. Quanto mais o provoco, mais quero ser punida. E
admitir sem nenhuma culpa afasta o medo e a insegurança de
mergulhar nessa insanidade com ele.
Ashton me odeia e não acredito que vá enxergar isso só como
sexo. Vai se esforçar para me ferrar porque é como a cabeça dele
funciona. Seu orgulho está acima de qualquer interesse físico ou
amoroso.
Traidor:
Você meio que deixou claro o que estava fazendo…
Vai dormir.
Ouço-o como se estivesse aqui no quarto comigo. O tom
autoritário e raivoso ecoando em meus ouvidos. Inflo o peito com
uma inalada profunda.
Traidor:
Agora.
Decido por não responder mais. Posso provocá-lo a noite toda,
seria divertido, mas nossos amigos estarão aqui amanhã de manhã
e quero preparar o material para a minha reunião com a equipe do
figurino para a turnê na segunda-feira.
É uma oportunidade. Embora não planeje trabalhar com a The
Reckless para sempre, quando for a hora de deixá-los, quero ir
sabendo que fiz o meu melhor. Como Gravity Monaghan faria.
“Você me alimenta com o veneno
Que tenho alimentado você”
ELON – FAOUZIA

Trycia queria que eu contasse à polícia que minhas suspeitas


eram Amber e suas “comparsas”, mas lhe lancei um olhar de
sentença, que a fez recuar no momento em que comecei a dizer aos
policiais que todo aquele massacre de sapos no meu quarto não
passava de uma brincadeira de calouros. Escondi a parte em que
Amber deixou uma ameaça no espelho do banheiro, mas sabia que
aquele seria só o começo da minha ruína perante ela.
Se Amber tinha que se mudar para outro lugar, então eu
também deveria. Essa foi a mensagem que enviou. Se ela fosse
punida, eu seria em dobro. Poderia denunciá-la e acabaria com a
minha bolsa de estudos.
— Não é ruim. — Trycia examina nosso novo lar. Na verdade,
é um hostel e nosso quarto é compartilhado.
Sondo o espaço que mais se parece uma caixa de fósforo.
Duas camas de solteiro — uma de cada lado do cubículo —, uma
mesa de estudos perto da porta de entrada e embaixo dela, um
frigobar. Os armários são feitos sob medida para otimizar o espaço
compacto, ficam pregados no alto, sobre a cabeceira da cama, um
para cada uma de nós. A cozinha, o banheiro e a lavanderia são
áreas sociais e vamos dividir com os outros hóspedes. Desde
turistas até estudantes, é a variedade de pessoas que ficam
hospedadas no centro histórico de Milão.
Mesmo que quisesse continuar naquele apartamento,
financeiramente seria impossível e também aquela imagem
sangrenta, assim como o fedor, não se apagaram da minha mente
mesmo depois de dias de tudo ter sido limpo e dedetizado. Além
disso, não quero preocupar minha irmã. Se Dannya soubesse o que
está acontecendo, iria interferir, como sempre faz, e não quero
continuar sendo um peso para ela.
Deixo a caixa de papelão com meus materiais de desenho.
Trycia me deu um caderno novo para desenhar, mas decidi
economizar para comprar um tablet, algo mais funcional e que em
longo prazo é econômico.
Transfiro o peso de uma perna para outra e continuo minha
varredura pelo quarto. Cheira a desinfetante e madeira, ainda assim,
tem um aroma bem melhor do que meu antigo quarto. Desabo sobre
a cama, Trycia deixa sua mala de roupas à cabeceira e se senta de
frente para mim.
— Consegui um emprego como ajudante de cozinha em um
restaurante aqui pertinho. — Sorri, orgulho moldando os lábios
pomposos. — Começo hoje, então não posso ficar à noite com
você, mas se precisar de alguma coisa, pode contar comigo.
— Valeu, Try. — Suspiro, puxando as pernas para cima da
cama, desamarrando e retirando os coturnos.
— Você deveria contar para as meninas o que está
acontecendo ou conversar com alguém do campus, Vity. Essa
garota está mexendo com a sua cabeça.
— Amber é só mais uma riquinha mimada com complexo de
superioridade. Se contar à Danny ou à Effy, Mack e Lilah, vai ser o
mesmo que mostrar que me importo com ela. Aposto que quando
souber que nos mudamos, vai me esquecer.
— Não sei não, Vity... Amber é uma daquelas garotas que só
decide parar quando tiver certeza de que venceu — pondera,
imprensando o lábio inferior com os dentes. — Ela está com raiva
de você.
— Ela não tem nenhum motivo para estar com raiva de mim!
— Ela não precisa ter um motivo. Para algumas pessoas,
basta se destacar em uma determinada área para elas decidirem
que você não merece ocupar esse lugar. Nem tudo tem um por quê.
Fecho os olhos. Esse é um assunto que tem sugado minhas
energias há dias.
— Não estou preocupada com o que ela está fazendo, Try, só
quero continuar trabalhando para conquistar minha vaga como
estagiária da Magdalene. Quero ser boa o suficiente para ser
escolhida e quando acontecer, vou deixar Milão e Amber para trás,
de uma vez por todas.
Trycia ainda não conseguiu aprovação da universidade de
Humperville para transferir seu curso para cá, mas a solicitação está
em análise e Yael está fazendo tudo que pode para garantir que dê
certo. Enquanto a vaga não surge, Trycia está saindo, conhecendo
lugares e pessoas novas. Seus pais só queriam que ela voltasse
para Humperville e continuasse o curso até que desse certo por
aqui, mas, convenhamos, Trycia quer uma vida agitada e
Humperville estava ficando sem graça sem Faith e Bailey.
O suspiro de Trycia corta o silêncio e ela se levanta.
— Tudo bem, então. — Caminha em sentido à porta. — Pelo
menos tenta comer alguma coisa. Você tem pulado várias refeições
no dia — observa, lançando seu olhar incisivo para mim por cima do
ombro. — E notei que está perdendo peso muito rápido.
Aceno, dizendo que entendi, mas não tenho vontade de comer
nada. Viro para o canto, subindo os lençóis até o pescoço estar
inteiro coberto. Não demoro muito a pegar no sono. Minhas noites
se transformaram em pesadelos. Os sonhos que tinha com Neil
foram pulverizados por um arsenal de sapos mortos no meio da
minha cama.

Ashton tem um sono pesado. Quase não tinha notado antes,


quero dizer, a última vez que o vi ressonar assim foi em Paris. Para
ser honesta, tenho um pouco de inveja de como ele consegue se
entregar ao cansaço dessa maneira.
Passei a noite em claro finalizando modelos que estava
costurando para Mack, Effy e Lilah. Queria ter entregado à Effy
pessoalmente, mas por causa desse idiota, não foi possível.
Assisto-o dormir enquanto mastigo lentamente o mirtilo,
escondendo o sorriso enquanto trituro a fruta com os dentes. Estou
quase o acordando, só para ver sua reação. Ele tem do que se
gabar, honestamente. Ostenta um corpo perfeito. E um pau grande.
Minha cabeça tomba para o lado, analisando o membro com
sua ereção matinal e a pontinha vermelha brilhando sob o sol.
Pego outra bolinha de dentro do bowl, moendo enquanto seu
peito nu sobe e desce. Ele facilitou muito as coisas quando me
esgueirei para dentro de seu quarto, uns quarenta minutos atrás, e o
peguei dormindo completamente pelado. Ashton tem uma barriga
tanquinho, os gomos são bem salientes, bíceps e escápulas
marcadas, e ele tem veias que saltam do dorso das mãos até os
antebraços. As tatuagens novas pelo corpo…
Céus, esse filho da puta é muito gostoso.
O mirtilo esmaga em minha boca, e Ashton revira na cama, as
pálpebras tremulam debaixo da claridade do sol atravessando as
imensas janelas com vista panorâmica da ponte do Brooklyn, assim
como a Estátua da Liberdade. Poderia chamar de vingança, ele
disse que queria, mas acho que soa mais como divertimento. Estou
cheia de expectativas para a reação dele.
Ele vai esculpir o rosto em uma carranca furiosa. As
sobrancelhas grossas e definidas vão se projetar para cima quando
ele vir o prazer desenhando um sorriso na minha boca.
Acorda logo, traidor. Preciso de um pouco da sua raiva para
me animar antes de os nossos amigos chegarem.
Como se ouvisse meu pedido, abre suavemente os olhos. Ele
pisca inúmeras vezes, como se para alinhar minha presença no
quarto às lembranças da noite passada. Uma ruga profunda marca
o centro de sua testa, onde a pele se dobra uma sobre a outra.
Estou vestindo short jeans e uma camisa social feminina, além
disso, meu cabelo está preso em um coque descuidado. Estou
sentada sobre as pernas dobradas, no baú de suede ao pé da
cama.
— O que…?
Ele tenta se mexer, mas confusão escurece as íris brilhosas
quando percebe que seus braços foram imobilizados por duas cintas
de couro — as suas cintas.
Precisei de duas camadas de base e corretivo, e bastante pó
para selar a maquiagem que fiz no pescoço para esconder as
marcas da noite passada. Apesar de ter gostado, não significa que
preciso encarar de forma relapsa.
Ashton me disse uma vez que quando se está em uma guerra,
não pode esperar que o outro lado não contra-ataque.
— Você amarrou a porra dos meus braços?! — Ele puxa os
pulsos presos nas barras de ferro dos pendentes de luz com um
tranco impetuoso. Sua testa enruga mais, assim como a respiração
fica arfante.
— Sim, o que achou? Está gostando? — Rio, exibindo meus
dentes roxos de mirtilo.
Ele considera minha pergunta.
— Não muito, mas você gostou quando te coloquei em uma
coleira.
— Já disse que sim. — Deixo a tigela de mirtilos de lado,
engatinhando na cama, entre suas pernas, seu pau ereto quase
tocando minha barriga. — Mas queria saber se você iria gostar
também.
— Não curto quando não sou eu quem está no comando.
— Own, que pena. — Franzo os lábios para o lado. — Você
terá que gostar porque também quero te punir quando merecer. E
por ontem, você merece ser punido, não concorda? — Desço a mão
entre nossos corpos, o hálito morno e doce da minha boca pesando
sobre seu rosto.
Envolvo-o com a mão, sangue se concentra ali e o faz inchar
no meio dos meus dedos, ficando cada vez mais duro. Que delícia.
— Sabe o quanto é doloroso ser privado de gozar? —
murmuro, começando a mover a mão em seu pau, sua pele
deslizando facilmente contra minha palma.
Ashton arfa, o pomo de Adão se avultando quando joga a
cabeça para trás e engole a seco.
— Você é uma maldita com um gosto que vicia. Pra cacete —
rosna, trincando os dentes ao morder.
— Você dormiu sem roupa, estava pensando em mim? —
sopro, pescando o lóbulo da sua orelha por entre os dentes, mas em
nenhum momento diminuo o movimento da mão brincando com seu
pau.
— Dormi pensando em me afundar na sua boceta apertada —
resmunga, impulsionando o tronco para frente.
O atrito de nossas peles superaquece minha mão. Remexo o
tronco, sentindo a umidade encharcando a calcinha, e o liberto do
estímulo, ouvindo-o suspirar abatido.
Começo desabotoando os botões de pérola da minha camisa,
sentando-me sobre suas coxas.
Ele me estuda, a respiração desnivelada martelando em cada
ponto de seu corpo e posso até sentir a pulsação do seu coração
embaixo de mim.
Conecto meus olhos aos dele, transformando a ação de
desatar os botões em uma cerimônia civilizada enquanto vejo seus
olhos pegarem fogo, necessitando ele mesmo fazer aquilo;
conhecendo-o, é com o objetivo de diminuir o tempo para arrancar
minhas roupas.
Deslizo os braços para fora das mangas, a metade do pingente
de coração pendendo em meu pescoço como uma gargantilha. Ele
contorce os pulsos em uma tentativa frívola de se livrar das
amarras. Eu garanto que estivessem bem presas, então, a menos
que esteja disposto a destruir a decoração, terá que esperar que eu
decida livrá-lo delas.
Ele desvia o fulgor em seus olhos para meus seios, o bico duro
marcando por baixo da renda roxa. Levo uma mão para as costas,
mas desisto de retirar o sutiã, pele roçando contra pele deixa meu
ventre com calafrios. Estou com o corpo inteiro pegando fogo e a
dor latejando entre minhas pernas, é frequente desde que me tocou
pela primeira vez.
Quando estou com Ashton, é tudo intenso. Nossas discussões,
seu toque, sua boca na minha. Consigo sentir tudo e me torno frágil
ao inofensivo resvalar de um dedo. Ele é meu maior desejo sexual,
minha fantasia depravada e errada.
Rebolo contra sua ereção, o material áspero do meu short
jeans contra a carne vermelha do seu pau. Ele puxa e empurra os
pulsos mais uma vez, fagulhas de raiva e desejo vibrando no brilho
incisivo de seus olhos. Meus lábios se desprendem em um sorriso
lascivo e, dessa vez, meu quadril desce com força, esfregando e
bombeando contra ele.
Desabotoo o short e desço o zíper, Ashton lambe a boca ao
ver a beirada roxa da renda da calcinha envolvendo meu quadril. O
tecido é fino e frágil, poderia se partir com um único movimento
brusco de seus dedos ancorando a lateral.
— Você quer me enlouquecer? — esbraveja por entre os
dentes apertados.
Volto a sorrir. Minha mão mergulha para dentro da calcinha, a
lubricidade da minha boceta embebedando os dedos quando os
afundo na fenda apertada. Cada joelho de um lado das pernas de
Ashton, sua respiração afiada e os gemidos afônicos reverberando
dele enquanto ouve o ruído úmido de eu estar me masturbando em
cima dele.
— Quero. Fique louco de tesão. Por mim — acrescento,
inclinando o tronco e a cabeça para trás, ar escorregando pela
cavidade ínfima da minha boca.
— Monta em mim, Gravity — diz como uma ordem, mas não
estou aqui para receber ou acatar ao que ele decide. — Cavalga
com essa bocetinha em mim como se essa fosse a última coisa
digna a se fazer nessa sua vida — rosna com a mandíbula trincada,
sua voz cada vez mais obstruída. — Quero ver como ela come meu
pau. Sobe aqui, gostosa — grunhe, e, quanto mais ele fala, mais
perto de gozar eu chego.
Afasto a bunda de seu colo, engatinhando até a mesa de
cabeceira de onde o vi retirar o preservativo na noite passada.
Tateio às cegas atrás do papel laminado, o sinto na ponta dos
dedos, e rapidamente o estou abrindo com os dentes e encobrindo
seu comprimento com o látex. Meus dedos embaraçando nos
passadores do jeans quando desço o short e a calcinha e os jogo no
chão ao lado da cama.
Monto nele, seu pau duro se acomodando lentamente em
minha fenda. Pendo a cabeça para trás a cada polegada dele para
dentro de mim escaldando a parede interna do meu ventre. Uma
rajada de ar perpassa minha garganta, e quando desço com tudo
contra ele, começo a mover o tronco. Cavalgando nele como me
disse para fazer. Sentindo cada centímetro seu ser tragado por
minha boceta. Meu peito vibra com um gemido rouco, estrondeia e
rasga o ar. Minha pele queima com o atrito das minhas pernas nas
laterais das suas.
Galgo em seu colo, subindo e descendo, o sorvendo quando
desço com brusquidão e o desenterrando ao separar nossos corpos
que se moldam perfeitamente um ao outro quando estamos juntos.
Não o beijo porque estou seguindo nossas regras não ditas:
não estamos fazendo amor, estamos trepando como animais, em
busca somente de prazer e depravação primitiva.
Minha boceta o suga e o inunda por cima da camisinha com
minha umidade. Fecho os olhos, sentindo-o me preencher e esgotar
em seguida com os movimentos deliberados do meu quadril. É tão
bom, porra. É insano transar com ele.
— Ai, isso é tão gostoso… — murmuro por cima de sua
respiração entrecerrada.
— Porque você sabe cavalgar em mim como uma puta —
sibila, os dentes trincados, e minha resposta é rápida e impulsiva,
sua pele estala com o tapa que disparo em seu rosto.
Arregalo os olhos, encarando o carmesim expandir por toda a
lateral de sua bochecha, contudo, recupero-me rápido, quicando
com força em seu pau. Ele me abre, minha boceta se acostumando
com a espessura rígida enquanto rebolo firme, estocando-o dentro
de mim com força.
— Não sou uma maldita prostituta, Ashton!
Arquejo, grunhindo quando ele toca o lugar macio dentro de
mim, enterrando-o até que não sobre nenhum centímetro dele de
fora.
— Se falar assim comigo outra vez, porra, eu juro…
— Você gosta. É uma vadia safada.
O demônio ri sobre o estrépito do atrito da cama contra o chão
de madeira. Giro a cintura, movendo a ponta de seu pênis em meu
cerne. Massageio meu clitóris, correndo atrás do meu orgasmo.
— Cala a boca — exijo, meu tom mais grave.
Minha cabeça inclina para trás, o peso dos meus seios
começando a me desmantelar.
— Se não quer que eu goze, encrenca, melhor se apressar,
porra! — brada, projetando o quadril para cima, arremetendo para
mais fundo, me rompendo com violência. — Porque com você
balançando esses peitos, cavalgando desse jeito, não posso
segurar, cacete!
— Você vai segurar o quanto tiver que segurar — vocifero,
acelerando sobre meu ponto de prazer e sem parar de sentar e
cavalgar. — Ai, meu Deus…!
Ele empurra o tronco para cima, encontrando uma sincronia
com meu quadril, e mete, intercalando entre forte e lento.
Empurro o quadril, os pelos subindo de sua virilha roçando o
clitóris quando vergo o corpo por cima dele, aterrando as unhas na
carne de seu peito. Ele chia um xingamento, forçando em vão as
mãos contra os nós das cintas. O calor se concentra entre minhas
coxas, e silvo um gemido enquanto esguicho, tremores assumem
meu corpo e firmo a ponta dos dedos ainda mais em sua pele, atrás
de sustentação.
— Se você gozou, não está valendo! — Olho-o com alerta.
Caio ao lado dele, resgatando o ar em inspiradas intervaladas.
— Você não sabe o quanto tive que me controlar. — Sua
respiração vacila. — Gosto quando você é reativa.
— Reativa? — Rio, erguendo a cabeça meia polegada para
capturar seu foco em mim. — O que quer dizer?
— Quer me desamarrar? Preciso muito de um banho, embora
seu cheiro impregnado em mim seja bem doce. — Ele sorri,
diabólico, covinhas marcando suas bochechas enquanto sustenta
meu olhar através de uma fenda pequena entre as pestanas.
Testo a estabilidade das pernas quando me levanto. Não quero
arriscar ficar de pé sobre duas gelatinas.
Caminho até o pendente de ferro da luz. Precisei de quatro
cintas, duas de cada lado, para emendar e alcançar a barra.
Desfaço o nó que dei na ponta do braço direito e, em seguida, o
esquerdo. As rótulas dos meus joelhos vacilam, estremecendo ao
passo que paro ao lado da cama.
Ashton massageia os pulsos, marcas vermelhas como faixas
envolvem sua pele. Prendo o lábio inferior entre os dentes, sentindo
orgulho dentro de mim por tê-lo mantido preso e sob meu domínio.
Estou me deliciando do meu feito, então só o percebo me agarrar
pela cintura e me prender no colchão quando seu corpo plana sobre
o meu, a boca a centímetros de distância de me tocar.
Respiro de forma precária, sugando o oxigênio com
dificuldade. Sua presença imponente e agressiva marcha sobre
mim.
— Reativa, Gravity. Quando você é mais como você e menos
como uma mosca-morta. Quando estou te humilhando e não está se
defendendo, sinto que estou perdendo meu precioso tempo.
— Aprendi a me ocupar só com aquilo que me importa de
verdade.
Ashton franze a testa e me encara pelas pálpebras cerradas,
em seguida, a linha dura da boca se desmancha em um sorriso
arrogante.
— Significa que agora está se importando comigo. — Fica em
silêncio, ocupado em exibir o sorriso esnobe. — Interessante.
— Desde quando vingança é o mesmo que se importar?
Vingança no meu dicionário tem um significado diferente do seu,
pelo jeito — respondo, levantando o queixo. Posso ser presunçosa
como ele.
— Pode não gostar de mim, mas gosta de como eu te fodo e
um dia, Gravity, não muito distante, aliás, vai admitir. E, bem — ele
estala a língua no céu da boca —, estarei aqui para não te deixar
esquecer.
— Melhor se sentar, querido. Não quero que fique cansado
enquanto espera — sopro, um misto de raiva e divertimento
esculpindo minhas feições.
Ele balança a cabeça de um lado para o outro.
— Gostei da cor. Roxo. Combina com você. Erotismo, mistério,
arrogância… — desfere cada adjetivo com um tom de sarcasmo
enquanto brinca com a alça fina do meu sutiã. — Tudo a ver com
você, encrenca.
— Arrogância tem mais a ver com você.
— Tem razão. Então, roxo é a nossa cor.
— Sai de cima. Nossos amigos estão chegando.
— Sabe como odeio receber ordens? — reclama, mas, mesmo
assim, faz o que estou mandando.
Ele endireita o corpo entre as minhas pernas, onde posso ver
sua ereção com o preservativo.
Tão fácil… Só temos que voltar para a cama, afinal, para
nossos amigos somos um casal que se reconciliou recentemente e
acabamos de tomar a decisão de morarmos juntos. Arranjar uma
desculpa para dispensá-los não seria problema — embora para
Bryan, Aidan, Chase e Finn as coisas não sejam assim tão às
claras.
Alcanço minha camisa na beirada da cama e a visto, já
abotoando para não correr o risco de cair no seu joguinho de
provocação.
Pego meu short jeans com a calcinha e os visto.
— Mirtilo, hein? — comenta quando passa perto do baú, ao pé
da cama. Rouba um punhado de dentro da tigela, manchando os
lábios quando mastiga devagar e um pouco da fruta escorre pelo
canto da boca. Ashton suga com a língua, e minha garganta fica
seca. — Muito bom — elogia, rindo sem exibir os dentes, mas a
arrogância continua intacta em seu tom de voz.
— Te vejo lá embaixo.
Fecho o último botão da camisa para esconder a borda do
vergão na garganta que a maquiagem não conseguiu cobrir. Dou as
costas para ele, me dirigindo para fora do quarto.
— Vamos fazer de novo e de novo... — Ashton cantarola,
como se estivesse me seguindo pelo quarto, mas quando paro e
olho por cima do ombro, o vejo escorando o antebraço na passagem
do closet, as pintinhas marrons salpicadas no ombro. — Até você
estar viciadinha em mim.
Ignoro o sorriso petulante crescendo nos cantos de sua boca
com uma indiferença que me deixa orgulhosa, porém, meus joelhos
ameaçam vacilar. Não é só o maldito sorriso. É a arrogância que
emana dele através dos poros.
A confiança de que eu tanto tenho inveja dele — uma
característica que antes também estava enraizada em mim — e o
vejo exibir com orgulho. Honestamente, não tem nada de errado em
Ashton saber que é bom em alguma coisa, mas me deixa enfurecida
que eu o odeie tanto e, ainda assim, me sinta atraída e fraca quando
age dessa maneira. Eu só quero que ele me beije como fez ontem.
Só quero seu corpo me imprensando com possessividade e loucura.
Ele é tudo o que eu não deveria desejar porque é um veneno,
e Ashton está me alimentando com ele.
— Na próxima, acabo com você.
Ele ri por cima da voz convicta. Tremores de entusiasmo
atravessam meu corpo em uma sinuosidade frenética.
Saio, me esquecendo dos mirtilos. Se voltar para buscá-los,
esse será o fim do meu controle. Decido deixá-los para trás,
encaminhando-me para meu quarto, para trocar a calcinha e tentar
varrer a memória dos últimos momentos antes de eles chegarem.
É quase como anos atrás, quando introduzimos uma tradição
de nos reunirmos todos os sábados de manhã, antes dos ensaios
da The Reckless na cabana de Ashton.
Um filme passa na minha mente enquanto os observo se
acomodar à mesa; o som das risadas sinceras, as conversas
banais, porém divertidas, o aroma das panquecas de chocolate —
porque Aidan gosta das malditas panquecas —, o odor de queimado
dos waffles que Mackenzie tentava fazer, o bolo de laranja ou o chá.
Por um mísero segundo, permito-me assisti-los, criando novas
memórias porque é difícil nos imaginar reunidos assim outra vez.
Pelos próximos meses, vou estar com eles em uma
experiência única na The Journey World Tour e já me decidi que
quero tentar me reconectar com eles, como costumava ser em
Humperville.
Effy me apresentou ao Bryan que, consequentemente, me
apresentou aos outros. Nós nos tornamos uma grande família —
não tão feliz e não tão perfeita —, mas é um lugar ao qual sei que
pertenço. Foi onde consegui me reconstruir, confiar e amar outras
pessoas além de Neil.
Solitária seria a resposta para o eu que costumava ser antes
de me mudar para Humperville. Só tinha Neil como melhor amigo e
confidente, e Dannya, claro, mas não criei laços intensos com
ninguém antes deles e o meu depois se resume à The Reckless e à
Mack, Effy, Delilah e agora Theresa.
Termino de preparar o café e os ovos mexidos. Estou com
aquela estranha sensação de estar sendo observada e nem preciso
olhar para trás para saber que Ashton não arredou sua atenção de
mim desde que desceu. Ele estava prestes a me dizer alguma coisa
quando ligaram da recepção avisando que nossos amigos tinham
chegado.
— Vocês fizeram as pazes. — Mackenzie observa, apoia os
braços na ilha, enquanto mexo na frigideira.
Theresa deu a missão aos meninos de fazer as torradas, as
panquecas e o suco, enquanto ela, Mack, Lilah, e eu cuidamos do
café, dos ovos e bacon. Eles levaram ao menos uma hora para
preparar tudo porque não conseguem fazer nada sem transformar
aquilo em um playground. A cozinha, ao menos, ficou limpa para
começarmos a preparar nossa parte do combinado.
Entretanto, ainda não confio em Mackenzie para conduzir um
fogão. Tudo que ela toca na cozinha literalmente vira carvão. Então,
Tess é quem está fritando o bacon.
— Fizemos as pazes? — devolvo, distraída.
— É, ele apareceu ontem à noite muito nervoso. — Delilah
emenda, e movo por um breve momento o tronco para flagrá-la no
meio da cozinha, fechando a garrafa térmica de café. — Ele teve um
ataque de pânico — confidencia, sussurrando a última frase. Tess,
Mack e eu nos entreolhamos, o abalo momentâneo deixando
nossos rostos pálidos. — Eu o ajudei.
— É claro que nós brigamos. — Pigarreio, me recuperando do
choque inicial. — Ele fez aquilo com a Effy.
— E, por falar nisso, quando é que pretendia nos contar que
você e Finnick tiveram um caso? — Mackenzie murmura, sem
deixar de esconder o aborrecimento.
Suprimo o suspiro, não querendo que pense que não confio
nela o bastante para contar certas coisas, mas sim porque fui uma
incentivadora para ela ficar com Finn.
Na época em que Finn e eu ficamos, foi complicado. Ele foi o
primeiro cara com quem dormi depois de Neil. Ele foi o homem com
quem decidi transar pela segunda vez porque Neil havia sido meu
primeiro em tudo. Talvez eu realmente estivesse atraída por algo
mais estimulante e sabia que Finn era um turbilhão. Quando soube
que Effy era apaixonada por ele, muito tempo depois, tive uma
mistura de sensações que até hoje são confusas.
Gostava dele — não tanto quanto Effy, é claro —, mas por ter
sido meu primeiro após uma dor dilacerante, tive um apego
emocional, o que me fez acreditar que estava apaixonada. Ou só
estava muito desesperada para conseguir sentir alguma coisa outra
vez que não fosse luto e angústia, que não pensei em nada além de
que Finnick era uma escolha plausível. Posso ter tido ciúme de Effy
com ele e jogar Mackenzie para cima de Finn, não sei, me fazia
sentir vitoriosa.
Pois é, acho que Ashton e eu não somos muito diferentes,
afinal.
O que me faz ter muita vergonha para admitir para elas sobre
meu breve relacionamento com Finnick.
— Não achei que fosse importante a esse ponto — concluo,
sacudindo os ombros com uma indiferença que Mackenzie não
engole. — Olha, aconteceu, tá legal? Foi errado, reconheço que
sim, e quando soube que Effy também gostava dele, eu…
— Também? — Tess replica, parando de virar uma fatia do
bacon. — Como assim também?
— Você gostava dele? — Delilah pressiona, soltando em um
sopro de voz. — Céus, o que esse cara tem que vocês gostam
tanto?
— Vocês? — Mackenzie ri, cruzando os braços. — Só o beijei
porque estávamos jogando e porque ele avançou.
— O que foi muito estranho — observo, desligando o fogo. —
Finn evita esse contato. Ele considera “íntimo” demais. — Levanto
os dedos no ar, fazendo aspas.
— Pode ser que entre falar e beijar, ele prefira beijar. — Tess
contra-argumenta. — Ou ele deteste os dois, mas a boca de
Mackenzie chamou a atenção… — Ela ri, alçando ambas as
sobrancelhas.
— Ou ele só estava querendo magoar a Effy. — Dessa vez,
Delilah suspira, e meus olhos flutuam até ela.
— Eu aposto nisso. Se Finnick percebe uma oportunidade,
logo quer usá-la para ferir a Effy. — Mackenzie apoia, endireitando a
postura para me ajudar a servir os ovos em um bowl. — Com
certeza ele me beijou porque sabia que eu era uma pessoa
importante para ela.
— Ele não deixa de me surpreender... — Tess confabula, mas
parece perdida dentro da própria cabeça. — Não em um bom
sentido. Sou totalmente apoiadora de Delilah e acredito que Effy
mereça alguém melhor, sem contar que… — Ela para de falar, os
olhos obtusos e concentrados mirando um ponto de mim que não
consigo descobrir qual é. — O que é isso no seu pescoço? —
Encaixa o dedo no botão da minha camisa, a gola rente à garganta
quase me sufocando.
Tess puxa com um movimento bruto, o que faz o botão soltar.
Olho para baixo e noto algumas manchas de maquiagem
maculando a camisa roxa que estou vestindo.
— Que merda é essa, Gravity?! — Mackenzie brada, o tom de
voz alto me faz prensar sua boca com a palma da mão.
— Ele te enforcou?! — Tess exclama, se contendo mais que
Mackenzie para não chamar atenção.
— Não é desse jeito… — murmuro, afasto a mão da boca de
Mack para fechar o botão e ajeito a gola.
— Não existe um jeito, Gravity. É um problema.
— Não é um problema, Tess, porque eu gostei muito.
Delilah, Mack e Tess me encaram com uma surpresa
angustiante. Quero dizer, algumas pessoas curtem, certo? Durante
o sexo? E está tudo bem porque é uma questão de fetiches e gosto
que Ashton consiga explorar esse meu lado.
— Jesus Cristo, vocês curtem BDSM? — Delilah sobressalta, o
queixo caindo.
— Que susto… — Tess espalma a testa. — Achei que ia
precisar entrar com uma ação judicial contra ele.
— Tudo bem, os meus fetiches com Ashton não deveriam ser
assunto em pauta aqui, já que eu não interfiro na vida sexual de
vocês.
A parte que mais detesto em ter amigos: eles acharem que
precisam saber de tudo, o tempo todo, sobre mim e o que eu faço
quando não estou com eles.
— Sua safada! — Mackenzie ri, os cantos da boca subindo de
maneira sugestiva. — Tem essa coisa de submissão e dominação,
não é? Vocês intercalam entre quem é o dominante e quem é o
submisso? Ou, tipo, ele é o dominante? Como funciona? Quero
saber de tudo.
— Céus… — Coloco todos os ovos mexidos dentro do bowl e
reviro os olhos para a encruzilhada que Mackenzie está criando ao
meu redor. — Não quero falar disso com vocês. É estranho.
Explanar a minha vida sexual com meu namorado é horrível.
— Você não acha que conversam entre eles? Sobre o que
fazem? — Desvio meus olhos brevemente sob a alegação de
Delilah, aguçando os ouvidos para tentar ouvir o que estão dizendo.
— Eles conversam. Te garanto que sim.
— Homens nunca amadurecem. — Tess joga o bacon em
outro bowl de alumínio. — Também acho que eles falam sobre
isso…
— Que a gente fala sobre o quê? — Bryan surge, agarrando
as laterais da pedra de mármore da ilha. — Do que estão falando?
— Encara-nos por entre as pestanas cerradas.
— Nada de mais. — Mackenzie se inclina, beijando a
bochecha dele, e entrelaçam os dedos.
Bryan disse que eles estavam tendo problemas, mas não é o
que aparenta. Preciso me lembrar de perguntar à Mackenzie o que
é que está acontecendo. Entretanto, decido que só vou fazer
quando puder me concentrar na minha amizade com ela.
Nesse momento, estou focada em seguir meu contrato com
Ashton, trabalhar como estilista da The Reckless, não pirar com o
bombardeio de mensagens que recebo dos fãs deles e com o TNC,
que sempre publica uma coisa nova sobre a banda, e agora,
adicionei um novo problema para a minha infinita lista: sexo sem
compromisso com meu quase marido de mentirinha.
“Eu estou paralisado
Onde está o verdadeiro eu?”
PARALYZED – NF

— Então, talvez você venha para o Natal? — Dannya indaga, a


voz insegura através da ligação.
— Não tenho certeza, espero que sim.
Seguro o celular entre o ombro e a orelha, a mão livre para
conseguir trancar o quarto.
Acabei dormindo demais e o centro de Milão nos fins de
semana é um pouco mais agitado. Não vou nem adicionar a dose
extra de entretenimento que a cidade proporciona, o que torna-a
ainda mais agitada.
Estou mega atrasada para a minha entrevista com Magdalene.
Bom, não diria que é uma entrevista de verdade, mas Yael
conseguiu que Magda me conhecesse antes de ver meus trabalhos.
A primeira impressão é a que fica, portanto, me esforcei bastante no
visual.
Desenhei o vestido há poucos meses, meu primeiro trabalho
depois que cheguei a Milão. Ele tem um decote em V, não muito
profundo, mangas compridas bufantes e fecha como um kimono. A
tira que prende nas costas realça a curva da cintura e tem uma
pequena abertura frontal no vestido.
É um tecido de linho fresco, portanto, se sentir calor — o que
eu duvido com o clima de Milão em outubro —, não ficarei
incomodada. Ele é sofisticado, mas não me faz parecer exagerada.
Meu cabelo está mais comprido, então fiz cachos e o prendi em um
rabo alto, a franja ondulada e também longa esculpe meu rosto de
forma delicada.
— Como estão as coisas por aí? Como vai minha sobrinha?
Andie está prevista para dezembro e é um dos motivos pelos
quais espero conseguir ir para o Natal.
— Não vejo a hora de conhecê-la. — Danny expele um suspiro
ansioso. — Não é, querida? — sussurra, o canto dos meus lábios
começando a desatar em um sorriso. — Espero que você consiga
chegar a tempo. Te quero do meu lado na sala de parto.
Engulo em seco, voando pelas escadas do hostel.
— A mamãe não pretende ir e ficar um tempo com você e
Andie?
— Já foi difícil convencê-los a vir para o meu casamento,
duvido que façam questão de conhecer a própria neta.
Tento me equilibrar nos saltos finos quando chego ao lado de
fora, verificando as placas dos carros que passam para ver se
alguma delas é do meu Uber.
Meus pais não odeiam Danny, apenas a mim. Sou eu a filha
rebelde, agressora e descontrolada. Minha irmã só está pagando
pelo que fiz. Não importa quantas vezes tente me desculpar com
minha mãe, ela, afinal, é como eu. Rancorosa pra caralho.
— Sinto muito, Danny.
— Não seja boba, eles quem estão perdendo, não nós. Olha
só para você, está prestes a se tornar uma estilista brilhante! —
exclama, eufórica. — Lembro de você, toda acuada, com medo até
mesmo de usar um batom vermelho. — Ri, a lembrança me
pegando também. Eu era medrosa, sim, ou só considerava respeitar
demais os meus pais para ir contra eles, principalmente minha mãe.
— Como você está se sentindo? Não fique muito nervosa. Seja você
mesma, ok? Magdalene vai perceber a profissional incrível com
quem vai trabalhar. Estou muito, muito orgulhosa de você, Vity.
— Obrigada, Danny.
Avisto meu carro se aproximando, aceno para que me veja e o
motorista estaciona perpendicular à calçada. Entro na parte de trás,
voltando a escutar minha irmã na ligação.
— E não fique decepcionada se ela não for tudo o que está
esperando, grandes estrelas tendem a ser bastante pretensiosas…
Tanta coisa começou a acontecer comigo depois que me
mudei para Milão, que não tive muito tempo para absorver o que
estava fora da minha bolha, como a separação da The Reckless.
Ainda não consigo acreditar, quando penso nisso, que
decidiram abrir mão do sonho deles.
Mackenzie me contou que Bryan está arrasado, mas ao
mesmo tempo feliz porque não precisará ficar longe dela. Mesmo
assim, é muito estranho imaginar que aquele grupo desistiu de tudo,
no último momento.
— Sim, claro… — respondo, alheia.
— Você não ouviu uma palavra do que eu disse, não é? —
Dannya graceja, não parece que está chateada por eu andar
distraída nas nossas ligações. — Você anda estranha. Tem alguma
coisa que queira me contar?
— Estranha como? — Tento rir.
— Você está diferente, disso tenho certeza. Parece… — Ela
corta a fala, me deixando intrigada. Abro a boca para tentar
convencê-la a terminar, mas desisto. Acho que não quero ouvi-la
dizer. — Parece quando Neil morreu e você ficou tão dentro de si
mesma, que não conseguíamos falar sobre nada. Você se fechou e
passava muito tempo triste.
Não sinto que esteja como naquela época, mas também não
acho que sou a mesma. Amber e suas atitudes me mudaram. Eu
acreditava que era invencível, que depois de Neil, nada poderia me
abalar. Acreditei na versão de mim que inventei para me proteger do
luto, das feridas, e passei a agir como se fosse imbatível. Tem sido
difícil me olhar sem todas as máscaras que costumo usar.
— Tem certeza de que está bem? Quero dizer, se quiser voltar
para casa, você pode, Gravity.
— Não, está tudo bem — asseguro, o Uber já estacionando
em frente ao restaurante de onde Yael me passou o endereço. —
Só estou um pouco ansiosa. Essa vaga com Magdalene é muito
importante. Nova York é uma oportunidade.
E eu vou sair desse lugar. Desse inferno. Deixar tudo para trás
e recomeçar. Vou trabalhar com alguém que pode direcionar minha
carreira e nunca mais precisarei rever Amber Sommers na minha
vida.

Disparo pelo saguão da gravadora, cumprimentando o máximo


de pessoas que consigo no percurso. Forço o máximo de sorrisos
que o fôlego me permite conceder e atravesso o vestíbulo rumo aos
elevadores, saudando a segurança na entrada. Silas tenta
acompanhar meus passos apressados enquanto Theo foi estacionar
o carro. A entrada da gravadora está abarrotada de jornalistas e
fotógrafos, isso porque no sábado à noite, Bryan telefonou para
Ashton e disse que tinha tido uma ideia para uma próxima música.
Não o vejo desde então. Eles literalmente dormem aqui
quando estão criando. É bizarro. Acho que nunca tinha visto
ninguém com tanto comprometimento. Claro, eles sempre foram fies
à banda, até mesmo antes de se tornarem astros cuja assinatura
pode ser leiloada na internet, mas nunca imaginei que cederiam
passar dois dias com suas namoradas para compor uma música
nova.
Agnus, o coprodutor da maioria das músicas, deve estar
enlouquecendo com eles no estúdio. Sydney, a produtora oficial dos
meninos, por outro lado, adora quando eles têm um pico de
criatividade. Já ouvi falar que muitos músicos passam até meses
presos dentro de um estúdio quando estão inspirados. Se é verdade
ou mentira, não sei.
Acabei me atrasando. Costumo ser pontual, mas fiquei até
tarde trocando mensagens com Ashton. Ele me irrita tanto e tenho
certeza de que só enviou a primeira mensagem para provar o
quanto consegue ser insuportável.
Ele já percebeu que Harper é um ponto fraco — até eu mesma
me questionava disso —, mas quando disse que ela viria jantar com
eles no estúdio, por um segundo, minha fachada foi por água abaixo
com a mensagem que enviei dizendo que ele poderia ser punido
quando voltasse para casa.
Então, Tess me contou, depois que enviei uma mensagem
perguntando, que Harper tinha voltado para Harvard.
Babaca arrogante. Ele adora testar minha paciência.
Além de acordar atrasada, tive que correr para o aeroporto,
para me despedir de Mackenzie e Delilah. Elas passaram um tempo
com eles antes de ir, mas Mack disse que estavam tão
concentrados na música que se esqueceram da presença delas.
Lilah foi compreensiva, acredito que em parte porque em três
meses estará de volta — mal ela sabe que antes disso estará aqui
para o meu casamento com Ashton —, e será definitivo. Mackenzie,
por outro lado, parecia chateada por Bryan não ter ido ao aeroporto.
Observando-a, percebi que ainda não entendeu quem ele é
agora. Acho que nenhuma de nós, de fato, compreendeu a
proporção que a presença deles toma onde quer que decidam ir.
Eles não são mais o que eram e privacidade é a última coisa que
terão, não importa que seja um restaurante ou aeroporto.
Jared nunca permitiria que fossem ao aeroporto sem os
seguranças, o que deixaria Mackenzie desconfortável. E geraria
mais brigas entre eles. Queria poder ajudá-los, mas não acho que
meus conselhos seriam úteis.
Adentro o elevador, Silas me acompanhando. Aperto no botão
do décimo segundo andar, onde ficam as salas de reuniões da
Reeves. Vejo pelo canto do olho meu segurança mexendo
desconfortável no seu blazer. Não sei quando vou me habituar a ter
uma sombra humana me acompanhando, mas ainda bem que está
aqui porque quando descemos da SUV, quase fui engolida pelos
flashes.
Meu relacionamento com Ashton ainda é um mistério para a
imprensa e para os fãs, portanto, entendo que enquanto as coisas
não estiverem esclarecidas para eles, seremos diariamente
assediados.
Sem mencionar que estão sendo pressionados para uma nova
data da volta da turnê. Ainda que já tenha sido definida, Avalon quer
que nos casemos antes de tudo. Ashton costumava estar envolvido
em polêmicas durante os shows e o nosso casamento, será o centro
de todas as atenções, desviando do fato de que ele esteve
envolvido em uma grande história com Isabella Wren. E até onde
sei, ela ainda não aceitou o acordo proposto por Camille.
O elevador abre, noto uma movimentação em quase todas as
salas. Às vezes, me esqueço que a The Reckless não é a única
banda de sucesso que Jared empresaria e que Sydney é a
produtora. Provavelmente, nem todos os paparazzi lá embaixo são
por causa deles.
Caminho apressada para a sala de reunião, meu coração
começando a se agitar. É a primeira vez que serei “chefe” de um
projeto e não qualquer um, minhas peças estarão, de fato, sendo
vistas por milhares de pessoas no mundo inteiro. Avalon disse que
vai participar como uma forma de me instruir para lidar com a
equipe, mas sou eu quem irá conduzir.
— Oi, desculpa o atraso! — cumprimento Avalon, que está na
porta.
— Bom dia, sem problema. Dei uma olhada na sua coleção, os
meninos vão adorar!
Avalon empurra a porta de vidro, deixando uma brecha para eu
entrar primeiro. Silas permanece do lado de fora, e corro para a
cadeira onde estou acostumada a me sentar em quase todas as
reuniões.
Tiro um bloco de notas, meu iPad e algumas canetas de dentro
da bolsa, organizando o material sobre a mesa. Avalon se senta à
cabeceira, e estou do seu lado direito.
Distraio-me com o arquivo onde estão os modelos que
desenhei. Enviei uma cópia para os meninos ontem, mas não acho
que eles tenham aberto para ver.
— Bom dia, pessoal. Depois de alguns meses sem nos
reunirmos, a pausa da turnê e toda essa loucura, estamos prontos
para retomar. — Avalon empurra o corpo para frente, colocando as
mãos na mesa. — Essa é Gravity Monaghan, a nova estilista e
responsável pelos modelos que a The Reckless irá vestir na
segunda fase da The Journey World Tour.
Elevo a cabeça pela primeira vez, querendo olhar para os dez
membros que compõem a equipe de figurino da The Reckless.
Meu cérebro tem somente alguns segundos para processar a
presença da mulher sentada diante de mim. Minha garganta fecha
como uma mão a enforcando e por trás dos meus olhos, estacas
afiadas são cravadas em uma tentativa de perfurá-los. Meu tórax se
move em contingência, um nítido desespero por oxigênio.
O que ela faz aqui? Ela não deveria estar aqui. Eu não deveria
vê-la outra vez nesta vida.
— Gravity? — Avalon ecoa, e balanço a cabeça, voltando a
mim.
— Sim? — sussurro, engolindo o nó seco formado pelo choro.
— Podemos começar? Quero te apresentar à equipe. — Ela
me oferece um sorriso afável, mas tudo que consegue é fazer com
que meu estômago retorça de forma nauseante.
— S-i-im — respondo, desviando dos cabelos pretos e longos
de Amber, os olhos vidrados e um sorriso doentio crescendo dos
cantos. Pisco para afugentar as lágrimas. — E-e-u…
— Gravity, Gravity…
A voz aguda cantarola em minha cabeça.
Elevo minha atenção de volta à Amber. Pelo modo como fixa
em mim, a gentileza forjada em seu rosto não passa de uma
máscara. Ela faz meu corpo estremecer.
— Essa é Amber Sommers…
Avalon me apresenta, diz os nomes para que eu os conheça,
mas não capto nada além do nome e sobrenome da minha
agressora.
Amber não para de sorrir e a cada ruído que faz, seja de sua
risada hipócrita ou ao se mover na cadeira, é como uma agulha
cavando meu tímpano. Jurava que meus anos em Milão seriam
meus únicos tendo que compartilhar com ela. Pensei que aqueles
dias infernais estivessem contados. Estava confiando que não
precisaria mais vê-la pelo resto da vida se conseguisse sobreviver
todo aquele tempo. Eu me enganei, céus, como fui inocente.
— Precisa de um minuto? — A mão álgida de Avalon me
acorda do choque de revê-la depois de quase um ano onde acreditei
ter conseguido me libertar dela. — Podemos adiar, se não estiver se
sentindo bem, que tal?
— Quanto tempo, Gravity.
Avalon para de falar comigo, movendo-se sem pressa para
Amber.
Entrelaço os dedos sobre a mesa, cutucando o fundo da
cutícula do polegar esquerdo com o indicador direito.
Não consigo encará-la. Não posso. Ela passou dois anos me
atormentando. Amber foi responsável por derrubar tudo que levei
anos para reerguer. Por causa dela, os escombros que usei para me
reconstruir foram demolidos e foi então que percebi que eles sequer
estavam sólidos.
A cada ataque físico ou verbal, a cada vez que me fazia sentir
debilitada e incompetente, foi um pedaço do meu alicerce que ela
removia. Ela explorou cada fraqueza até que eu fosse
desmascarada. Amber nunca teve compaixão. Ela não é uma vilã
incompreendida, ela é má e talvez essa palavra nem consiga
descrevê-la totalmente.
— Vocês se conhecem? — Avalon se empolga, e quero pedir
que ela não fique feliz porque não sei se posso fazer isso com
Amber por perto.
Eu sequer consigo olhar para frente quando ela está no
mesmo ambiente que eu. Amber impõe respeito para alguns, mas
para mim, é só medo, pânico e insegurança. Esqueço como é ser
poderosa quando ela está por perto. Ela me afugenta.
— Claro, Gravity e eu fomos amigas na faculdade. Em Milão. A
gente se divertia tanto. — enfatiza, e ouço o farfalhar das rodas de
sua cadeira quando ela a arrasta pelo chão.
— Isso é incrível! — anima-se Avalon, dando risada.
Céus, quero vomitar. A bile me sobe à garganta, separo as
mãos para fechá-las ao redor da mesa para tentar conter os
tremores do corpo. Essa mulher é o meu pesadelo diário, meu
lembrete de que não sou invencível. Ela roubou tudo de mim, tudo
que conquistei, e está voltando para tomar o que sobrou.
— Significa que você pode contar com a Amber para te ajudar
daqui em diante. Como vai seu pai? — Avalon pergunta, e nesse
momento, levanto o queixo, sua estatura entrando no meu campo
de visão. O pai dela.
— Ele está bem. Quando Jared disse que estavam
reestruturando a equipe de figurino da The Reckless, nossa, eu
imediatamente quis me oferecer para esse trabalho. Sou muito fã
deles! — Amber exclama, o entusiasmo não me passa
despercebido. — Ashton é incrível.
Miro meus olhos nela, dessa vez o sangue correndo por
debaixo da minha pele ferve e as bolhas quentes explodem.
— Ah, sim, ele dá um pouco de trabalho, mas é um excelente
músico. A The Reckless sem ele não funciona.
— Sim, com certeza. Cheguei mais cedo e passei algumas
horas com ele no estúdio. Estávamos conversando. Queria entender
o que ele gosta, sabe, para trabalhar melhor no figurino.
Cravo as unhas na mesa, minha pulsação lépida me deixa
zonza.
— Que dedicada! — Avalon observa. — Bom, vamos deixar a
conversa de lado, precisamos trabalhar e Gravity quer mostrar o que
preparou.
Ela me cutuca com a ponta de seu scarpin debaixo da mesa.
Assombro faz o meu corpo saltar, e Avalon gesticula com o topo da
cabeça, me instruindo a iniciar a reunião.
Cravo minha atenção em Amber, os seus orbes vibrantes
focalizados em mim. Se eu deixar para lá de novo, em uma tentativa
de evitar o confronto, ela voltará a ser minha perseguidora.
Então, pela primeira vez, decido não me deixar intimidar.
Embora esteja com as pernas tremulando e o meu corpo tenha uma
resposta defensiva para ela a cada vez que me dirige um olhar,
tento vencer minhas reações físicas para o trauma psicológico que
essa mulher deixou em mim.
Seguro o colar em meu pescoço, puxando o pingente com
metade do coração para fora do macacão jeans. Noto quando os
olhos dela derivam por meu colo, rumo ao apelido de Ashton
gravado na prata. Sim, estou marcando meu território porque seus
comentários sobre ele foram intencionais. Ela queria testar o quanto
gosto dele, o quanto me importo e o que o relacionamento significa
para mim.
Amber deve ter acompanhado tudo a respeito de nós, desde
que nos tornamos públicos. Ela vai tentar, a todo custo, usá-lo
contra mim. O que me dói é que Ashton a levaria para cama sem
pensar duas vezes. Sem nem considerar como eu me sentiria.
Ainda assim, estou dando um voto de confiança para o que me
garantiu quando concordei em transar com ele. Ashton será só meu
enquanto esse contrato durar.
Agarro o iPad como se fosse meu bote salva-vidas, empurro o
corpo para trás, afastando-me da mesa, e mexo nas configurações
para espelhar minha tela na TV da sala de reuniões.
Inicio a reunião e no começo, gaguejo tanto que quase
choramingo para Avalon, implorando para ela me poupar de tanta
humilhação, mas sua concentração em mim, a simpatia em suas
feições, me fez perceber o quanto torce por mim. Ela assente
quando necessário, sorri para encorajar, solta palavras de apoio
sem emitir nenhum som e faz comentários que me estimulam a
seguir com a reunião sem grandes problemas.
Os outros membros da equipe acompanham minha proposta
de figurino e, por um minuto, me esqueço de Amber entre eles. Foco
minhas energias no trabalho, afinal, não estamos mais no campus e
ela não pode me atingir porque aqui, vai acatar o que eu disser.
No fim, todos estão de acordo com o que propus, e Avalon
informa que vai agendar uma nova reunião com todos, incluindo a
The Reckless, para depois iniciarmos a produção das peças. Cada
show precisa de uma peça similar, mas não idêntica, para não ficar
repetitivo, então, basicamente, temos que montar em torno de trinta
figurinos para cada um deles. É muita coisa.
— Parabéns, você se saiu muito bem. — Avalon cochicha ao
passar por mim.
Sorrio em forma de agradecimento, orgulho substituindo o
sentimento de medo do começo da reunião. Fiquei feliz que Amber
não tentou me cortar durante a explicação nem abriu brechas para
criticar minha liderança nesse trabalho. Ainda assim, quando estou
juntando minhas coisas na mesa, sinto-a com a mira em minhas
costas.
Aprumo a postura, conferindo a sala; todos saíram, alguns
estão do lado de fora, conversando. Os sorrisos me tranquilizam
porque é notável que estão confiantes e positivos quanto às minhas
propostas.
Porém paro de me mover quando a vejo fechar a porta e
obstruir a passagem com seu corpo.
Amber é alguns centímetros mais alta e se veste como uma
predadora. O batom vermelho-sangue, os olhos sempre marcados
com lápis preto, os cabelos como carvão estão sempre brilhantes e
hidratados, com as ondas densas caindo por cima dos ombros. Está
usando uma saia de couro e um corselete acetinado azul-royal.
Ela caminha em minha direção, o salto de suas botas de cano
baixo emite um som oco quando choca com o chão.
— Como conseguiu esse emprego? — Amber ri pelo nariz, a
ponta vermelha das unhas raspando a mesa.
Tomba a cabeça para o lado, encarando-me através dos cílios
alongados com rímel.
— Me deixa em paz, Amber.
— Por quê? Não sentiu minha falta? A gente se divertiu tanto
naquela época. — Por dentro, Amber é amarga e fria, mas a voz é
doce e calorosa. — Sabe quantos problemas eu tive por sua causa?
— Por minha causa? — escarneço, arregalando os olhos
perante a ridícula acusação dela. — Você fez por merecer, Amber.
— Meu pai me deixou em exílio por culpa sua.
— Você não me deixou escolha — revido, meus lábios tremem
sob a voz empossada. — Você estava tentando me destruir, Amber!
— explodo, inflando o peito.
— Tentando? Achei que estávamos nos divertindo, querida.
— Não era divertido. Você precisa ter alguma noção nessa
maldita cabeça! — esbravejo, o maxilar começando a doer com a
força com que cerro os dentes. — Nunca fiz nada e você me odiou.
— Nunca fez nada? — Ela ri com ironia. — Esse é o problema
de pessoas como você. É adorada por nada. Você sequer tinha
talento e estava lá, ocupando o lugar de alguém que merecia. E só
conseguiu essa vaga porque está dormindo com um dos
integrantes, então não tente me convencer de que você é santa.
Pode enganar todo mundo, menos a mim.
— Quem? — indago simplesmente.
— Oi?
— De quem eu estava ocupando o lugar? Deve ser alguém
importante para você, por ter me perseguido daquele jeito.
Ela não responde, e começo a pensar sobre o que Trycia me
disse na época, sobre pessoas como Amber não precisarem de
motivos para atacarem.
Quando seus olhos parecem perdidos e a boca firme em uma
linha fina, começo a me questionar se ela sequer tinha razão o
suficiente para me detestar.
— Você estava com inveja porque tinha alguém à altura para
concorrer com você à vaga no estágio da Magdalene — deduzo,
minhas sobrancelhas arqueando e quase chegando ao topo do
cabelo. — Estava com medo de eu vencer e só por isso decidiu me
infernizar daquele jeito.
— Precisava muito daquela vaga — ruge, avançando um
passo. — E eu teria conseguido se você não tivesse procurado meu
pai.
— Não te disseram? A vaga está livre, fui demitida. — Pego
minha bolsa no encosto. — É a sua chance.
— Você trapaceou! Levou nossa briga para ele.
— Não trapaceei, eu te parei. Você teria ido além nas suas
“brincadeiras” — faço aspas com os dedos para enfatizar —, se eu
não tivesse contado ao Sommers o tipo de pessoa que estava
caminhando pelos corredores da universidade que ele patrocina. O
que você teria feito comigo? Me matado?
Ainda que esteja conseguindo respondê-la com confiança, por
dentro, estou me desfazendo em pequenos pedaços. As memórias
de quase dois anos sendo perseguida e assombrada por ela
voltando sempre que Amber fala comigo.
Cada parte do meu corpo se lembra dela, cada lasca da minha
alma que arrancou quando tentava me ferir, retornando com força
vital para o agora. Mesmo que não possa me atingir nesse
momento, só a sua presença é o suficiente para me sentir
ameaçada.
— Se isso fosse me garantir a vaga, teria feito. — Amber dá
um passo à frente, a voz ameaçadora me atingindo como uma
adaga na barriga. Congelo, sentindo a coação. — Você não faz ideia
de quem eu sou ou do que estou disposta a fazer.
Ela inclina a cabeça, a curva de sua boca exibindo um ar
vingativo.
— Eu voltei para a sua vida. Espero que tenha sentido
saudades, porque nós vamos continuar brincando e dessa vez, não
vou falhar. Dessa vez, enquanto você estiver de pé, vou continuar te
batendo.
“Porque, amor, eu sou seu Davi
E você é meu Golias”
I WANNA BE YOUR SLAVE – MANESKIN

Depois de quase três dias no estúdio, estou em casa.


Retiro a jaqueta e deixo o capacete da moto na entrada.
Comprei uma pizza no caminho, de moto é muito mais fácil escapar
das lentes dos paparazzi e, por sorte, Wade tem me deixado mais
“livre” para curtir.
Gostando ou não, Gravity é uma boa influência e minha equipe
confia nela para me colocar na linha.
Soube da reunião de hoje de manhã, que Gravity se saiu bem
pra caralho. Todos falaram de como a adoraram e que estão
ansiosos para trabalhar com ela nas cento e cinquenta peças que
precisam produzir.
O que me lembra que Avalon está no meu pé para acelerar a
compra do anel. Nosso casamento acontecerá em algum momento
de outubro, o que só me faz pensar que passarei o restante da The
Journey World Tour casado. É loucura, ainda que seja falso, é
loucura demais.
Deixo a caixa da pizza sobre a ilha da cozinha, notando o
apartamento vazio e silencioso, mas principalmente gelado. A
refrigeração deve estar ligada.
No mínimo é estranho. Geralmente, quando Gravity está por
aqui, nada é calmo ou silencioso.
Subo as escadas em direção ao segundo piso, as luzes do
corredor também apagadas. Tenho certeza de que nossa última
trepada foi boa demais e eu só queria chegar em casa a tempo de
repetir. Acordar com as mãos amarradas e Gravity disposta a me
montar foi de outro nível.
Porém sinto as rugas em minha testa ficarem mais profundas
quando não vejo nenhuma evidência dela no corredor. Além da luz
dos postes atravessando a janela do ateliê e cruzando a porta
entreaberta, a última alternativa é conferir se está no seu quarto.
Direciono-me para ele, apoiando a mão na maçaneta. Abro só
uma fresta, espiando lá dentro. Noto roupas ilhadas no chão e
acompanho uma trilha até a cama, onde vejo seu corpo embolado
nos lençóis.
— Gravity? — Arrisco chamá-la, para ter certeza de que está
acordada, mas ela não responde. — Está um gelo aqui dentro —
reclamo, pondo o corpo para dentro do quarto e fechando a porta
atrás de mim.
Pego o celular de dentro do bolso da calça, não são nem oito
horas, não é possível que ela já tenha pegado no sono.
Abro o aplicativo do termostato para conferir a temperatura e
vejo que o cômodo está bem frio e por escolha dela. Suspiro,
devolvendo o aparelho para o fundo da calça.
— Até onde eu sei, não fiz nenhuma merda.
Rio, observando os cabelos escuros espalhados no
travesseiro. Franzo os lábios, assistindo-a. Sua respiração está
normal, as costas inflando quando ela inspira e murchando ao
expirar. Estou esperando que me mande ir embora ou resmungue
algum xingamento, contudo, o silêncio perpetua, o que me deixa
inquieto.
Geralmente não sou insistente. Não me arrasto por alguém
que não quer falar comigo ou não demonstra interesse. Sempre
corro para a próxima. Sempre tem alguém disposto.
Contudo, passei dois dias e meio sem vê-la, cochilando no
sofá do estúdio e no chão, comendo macarrão instantâneo na
cozinha da gravadora, tudo porque Bryan acha que vamos lançar
nosso próximo ícone musical com o que nos propôs. Realmente é
muito boa. E Agnus quase enlouqueceu quando ligamos para ele no
domingo, para gravarmos a bateria. Só um teste, mas Sydney, claro,
se empenhou e fizemos o nosso melhor.
Adoro o trabalho com eles. É foda. Mas Finnick e eu ainda
estamos nos estranhando, devido ao que aconteceu com Effy, e não
conversamos desde então.
Por mais odioso que seja admitir, só queria chegar em casa e
ter uma boa — e estúpida — razão para brigar com ela. Iria puni-la
por sua impertinência e depois fodê-la sem tentar ser cuidadoso.
— Você está estragando todos os meus planos de te dar umas
palmadas. — Tiro os sapatos, deitando-me ao seu lado. Cruzo as
mãos debaixo da cabeça, mantendo o peito elevado. — Qual é o
motivo do tratamento de silêncio?
— Pode me deixar em paz? Estou com dor de cabeça.
Abro um sorriso tempestuoso.
— Parece que alguém quer mesmo umas palmadas.
Ela suspira, esticando a mão para trás e agarrando a ponta do
travesseiro onde estou deitado, arrancando-o com um tranco.
— Não estou para brincadeiras hoje. Sai daqui, Ashton. —
Envolve o travesseiro com os braços, curvando o corpo como um
feto. — Quero dormir.
Endireito a postura, fitando-a por entre as pestanas. Meu
estômago resmunga de fome porque estava planejando comer com
ela, então não belisquei nada até agora. Não costumo ceder, mas se
está com dor de cabeça, não vou forçá-la. Calço os sapatos e saio
do quarto, minha mente pipocando. Deve estar cansada da reunião.
Pego o celular no bolso e ligo para Bryan.
— Querem vir pra cá? — convido assim que ele atende.
— Mudou de ideia? — Ri com zoação.
— Cala a boca.
— Que foi? Sua não namorada te deu um fora? — provoca.
— Ela está cansada — contra-argumento, descendo as
escadas galgando.
Não contei para os caras que Gravity e eu estamos em um
acordo para transar enquanto esse contrato está em vigência, mas
eles são meus melhores amigos e me infernizaram esses dias
todos, principalmente quando passei metade da noite de domingo
trocando mensagens com ela.
Lembrando disso, olho por cima do ombro, em direção ao
mezanino. Ela parecia bem antes, enviando mensagens
provocativas e até me ameaçando caso eu estivesse com Harper.
— Já chegamos em casa. É mais fácil você vir para cá, do que
nós irmos pra aí, não acha? Somos em quatro, você em um.
— Tá bom, seus merdinhas. — Baforo, revirando os olhos. —
Chego aí daqui a pouco.
— Se demorar muito, vamos comer sem você.
— Nossa, como vocês me amam.
— Nós te amamos, mas nem por isso precisamos morrer de
fome.
— Pouco dramático, não é?
— Tchau, Ashton! — Bryan cantarola, animado.
Nada que algumas horas no estúdio compondo e gravando
não resolvam uma questão de coração angustiado. Ele e Mackenzie
passaram um fim de semana incrível pelo que contou, mas hoje,
quando não pôde sair do estúdio para acompanhá-la ao aeroporto
— por várias questões, mas principalmente porque seríamos
cercados se os jornalistas descobrissem —, Mack não aceitou muito
bem. Ela mandou uma enxurrada de mensagens “desabafando”.
Bryan olhou para cada uma, suspirou e, pela primeira vez, a
ignorou. Entretanto, as horas que passamos com ele o fizeram, aos
poucos, esquecer o desentendimento com ela e voltou a se dedicar
totalmente ao que estávamos produzindo.
Foi muito bom. Desde a gravação do The Journey não
passávamos tanto tempo juntos no estúdio e foram as horas mais
fodas que tive nos últimos meses.
Procuro por uma caneta dentro das gavetas da cozinha.
Encontro um pincel roxo de tinta permanente e escrevo na caixa:
Vê se come, encrenqueira.
Já que eu não posso te comer…
Rio da minha mensagem imaginando a reação dela ao ler.
Tampo a caneta e pego o celular de volta para digitar uma
mensagem para ela:
Ashton:
Deixei pizza pra você aqui embaixo.
Espero pela confirmação de envio, mas ela não vê a
mensagem. Desisto de esperar, ciente de que os caras estão sendo
sinceros quanto a comer sem mim se eu demorar demais.
Posso falar com ela quando voltar.

— Como está seu relacionamento com aquela garota? — Meu


avô pergunta enquanto limpo as rodas da sua Harley Davidson. —
Nitroka?
— Nicola — corrijo com um sorriso. — O nome dela é Nicola,
vovô. — Levanto-me do chão, notando uma mancha de graxa
redonda no meio do peito da minha camiseta branca dos Beatles. —
Ah, merda, a vovó vai me matar… — rumorejo, esticando o pano
pela bainha.
Ouço a gargalhada sardônica do vovô ao meu lado. Ele
devolve a chave de fenda para dentro da caixa de ferramentas antes
de vir até mim para examinar a mancha.
— Eu te disse para colocar uma camiseta velha e de
preferência que não fosse branca. — Dá um tapa sobre o meu peito,
como se estivesse tentando me confortar. — Sua avó vai ter
trabalho para limpar. Se é que vai sair.
Ele fecha a caixa de ferramentas e a coloca sob o braço.
— A tal da Nicola, por que ainda não a trouxe pra cá?
Gesticula com o olho direito, mostrando a cabana. O cheiro da
sopa de tomate da vovó incendiando o exterior.
— Já tem mais de um ano que fala da menina sem parar.
Parece que não tem outro nome na sua boca além do dela.
Acabo sorrindo perante a observação. Meu avô tem razão. Há
mais de um ano a minha vida mudou por causa dela. Tudo sobre
Nicola enche meu peito de uma alegria que, sinceramente, não
imaginei que fosse capaz de sentir algum dia.
Meu pai sempre foi duro comigo, me trata com rejeição,
diminui quem eu sou, demonstra sua infelicidade quanto a mim, me
compara à Alexander e tenta de alguma maneira me fazer sentir
incapaz. Por exemplo, minhas notas não são boas em matemática e
já até me esqueci de quantas vezes ele me insultou por causa disso.
Pior quando sou punido, levo uma surra por ser tão “burro”.
Nicola veio para suavizar a visão que tinha de mim mesmo.
Quando pego o boletim e vejo que as notas não são tão boas
quanto meu pai espera, acabo, por instinto, ficando aborrecido e eu
mesmo dizendo que sou idiota por não conseguir entender uma
matéria que, ao que parece, é tão simples para meu pai.
Ela está mudando essa mentalidade que tenho sobre mim
mesmo. E depois de tanta insistência de sua parte, o que na
verdade, agora reconheço que foi mais uma maneira de conseguir
me entender melhor, contei sobre ele e como meu pai costuma agir
comigo.
Nicola passou a me dar aulas particulares e graças a ela, as
notas subiram consideravelmente nos últimos meses. Para o meu
pai ainda não é suficiente, mas para mim, porra, vê-la sorrindo com
tanto orgulho é a melhor coisa do mundo.
Nicola está me ajudando a reencontrar minha confiança, minha
dignidade, meu amor-próprio. Ela me trouxe de volta. Não me sinto
fraco ou humilhado por ela saber sobre como Conrad age, pelo
contrário, Nicola passou a listar todas as coisas incríveis sobre mim,
e quer saber? Aquela mulher tem razão e meu pai que é um fodido
por não enxergar o filho incrível que tem.
— É porque ela é incrível, vô.
Subo os degraus do pórtico, abrindo a porta de tela e o
deixando entrar na frente. Vovó está no cubículo da cozinha,
mexendo no caldeirão com a sopa de tomate.
O cheiro de pão torrado e queijo mais saliente agora que
estamos dentro da cabana. Adoro esse lugar. Adoro passar um
tempo com eles nas férias porque é quando eu sinto que tenho uma
família de verdade.
— Se ela for um tiquinho como sua avó, você tem sorte. — Ele
inclina sobre a bancada separando a cozinha da sala e dá um beijo
na testa da vovó.
Sorrio para a cena dos dois, lançando-me no sofá, e estico a
mão para alcançar o controle da TV na mesa de centro.
— Quem for um tiquinho como eu? — A voz carinhosa soa até
mim.
Ergo um pouco o pescoço para vê-la.
— Nicola. A namorada do Ash.
A fala do vovô some quando ele desce as escadas para o
porão.
— Ah, a garota que você fala sem parar, mas não nos
apresenta nunca? — Vovó resmunga, saindo da cozinha para se
juntar a mim.
Fito os olhos marrons, os cílios espessos e a pele flácida de
seu rosto. As marcas do tempo acentuadas em sua testa e
bochechas.
— Está esperando o que para trazê-la a Humperville?
— Em breve, eu prometo. — Zapeio através dos canais, atrás
do jogo de basquete. Meu avô adora. — Ela é modelo, então, nas
férias, os pais dela viajam com ela à trabalho.
— Uau, nosso menino arranjou uma namorada importante! —
exclama, entusiasmada.
Estou tão concentrado na TV que não a vejo chegando perto, e
só percebo o que está acontecendo quando fecha as mãos em
minhas bochechas e beija a ponta do meu nariz.
— Ou foi ela que arranjou um menino especial? — murmura, o
hálito morno e a voz doce me fazendo lacrimejar.
— Ai, vó! — grunho, limpando o batom rosa-claro do nariz com
o dorso da mão. — A senhora sabe que odeio quando faz isso.
— Odeia quando demonstro meu amor? Que rapazinho
ingrato! — rosna, alinhando a coluna. — Venha até aqui me ajudar
na cozinha. — Ela estapeia meu joelho dobrado sobre o sofá. —
Não pense que vai ficar desbundado nesse sofá enquanto me mato
na cozinha! Sua mãe não te ensinou nada?
— Já estou indo. — Suspiro, cambaleando para a cozinha, e
só então vovó nota o círculo de graxa no centro da minha camisa.
Ela arregala os olhos, fagulhas de fúria começando a brilhar
em suas íris.
— Ashton Baker! — esbraveja, levantando a colher que
respinga sopa para todo lado, inclusive se junta à mancha. — Que
foi que você fez com a sua camiseta? Vai dar um trabalho danado
para limpar!
— Acho que esbarrei na corrente da moto, não sei. — Tento
consertar, mas tem uma risada no fundo da minha voz. — A culpa
foi do vovô! — Aponto para o porão, sem me dar conta de que ele
acaba de abrir a porta.
— A culpa é minha do quê? — indaga, inocência esculpindo
seu rosto enrugado. — Não fiz nada, Pam. — Ele alça as mãos,
querendo se render. — Juro, querida, não importa o que ele disse,
não tive culpa.
— Vocês dois, sinceramente… — Bufa, devolvendo a colher
para o caldeirão. — Quer saber? Deixe comigo. Rain, lave as mãos
e me ajude a cortar mais cebola. E você, já para o banho. Não
quero um porcalhão na minha mesa!
— Sim, senhora!
Bato continência e começo a andar para o corredor, rumo ao
banheiro.
— Você viu aquela mancha de graxa? — Ouço-a discutir com
vovô. — Não vai sair nunca.
— É só uma camiseta, Pam. — Ele ri.
— Mas é a camiseta favorita dele. — Ela suspira.
Minha boca afina em um sorriso.
O problema não é a graxa, afinal. Minha avó se lembrou que
essa é minha camiseta favorita. E só por ela se importar com esse
detalhe, me faz não ligar tanto assim por tê-la estragado.

Como eu amo a liberdade de costurar o trânsito de Nova York.


A brisa fresca lutando contra a velocidade da moto, a rapidez com
que o mundo à minha volta passa por mim. É como se tudo parasse
e só existisse o tempo e eu, e estamos correndo para ver quem
chega primeiro.
Toda a loucura dos últimos meses, desde a polêmica com
Isabella até meu casamento arquitetado com Gravity, a minha
redescoberta dos meus desejos sobre ela, estão em profusão.
Porra. Minha mente, às vezes, fica perturbada.
Nossas fotos com a equipe da Ravennah é amanhã. Não
pretendo voltar tarde para casa, já que preciso recuperar as
energias desse fim de semana conturbado.
Aciono o alarme da moto quando estaciono, faço uma
varredura da rua, calma e sem nenhum vestígio de jornalista. Sem
tirar o capacete, corro para a porta da frente.
Mais de uma vez, Ava e Kim tentaram nos convencer a nos
mudar para um apartamento e agora que estou vivendo em um,
acho que pode ser uma boa ideia os caras pensarem em arranjar
um também. Tenho certeza de que a corretora que nos atendeu
consegue encontrar um lugar para eles. Seria incrível se
morássemos todos no mesmo prédio.
Adentro a casa, o tumulto familiar soando da sala. As vozes de
Chase, Aidan e Bryan reverberam até o hall, e fecho a porta atrás
de mim, retirando a jaqueta e a pendurando no cabideiro na entrada.
Faço a curva à esquerda, cruzando a passagem estreita que
leva à sala gigantesca da casa. O que me fez apoiar a compra
dessa casa foi esse espaço, especificamente. Imaginei nós cinco
aqui depois de um ensaio, reunião ou de uma gravação, jogando
conversa fora e esquecendo das merdas que faço tentando me
desprender das sombras que me perseguem.
Estou tentando não ficar obcecado com a ideia de Gravity
estar com raiva de mim. Naturalmente, alguém sempre está com
raiva de alguma coisa, mas quando estou envolvido na história, é só
uma consequência.
— Chegou rápido. — Bryan diz quando me vê entrando na
sala, chegando um pouco para o lado para me sentar entre ele e
Finn. — Brigou com ela de novo? Para um casal que não é casal,
vocês discutem bastante — emenda, sem me deixar responder.
— Não enche o saco — murmuro, acomodando-me entre os
dois e evitando olhar para Finnick. Por sorte, ele parece estar lúcido.
Também, não deve ter tido tempo para se drogar ainda. — Não
brigamos, ela só não estava a fim de conversar. — Sinto-me na
vontade de respondê-lo, entretanto.
— Ou talvez ela tenha decidido que não vale a pena perder
tempo com você. — A voz rouca, porém determinada, ressoa de
Finn.
— Valeu, Finn.
— Vocês dois deveriam resolver esse problema. — Chase tira
a tampa da pizza, o aroma quente e salgado sobressaindo no
cômodo. — É por causa da Effy ou da Gravity? — pondera, sinto o
sarcasmo na tonalidade.
— Não estamos brigando. — Finn declara, mas a entoação
não me deixa convencido.
Aidan pega o seu pedaço e dá uma mordida generosa na
massa, grunhindo para o sabor. Sim, estamos morrendo de fome.
Tenho certeza de que, assim como eu, eles não pensaram em outra
coisa que não fosse comer.
— Não estamos? — sondo, no entanto, não olho para o lado
para ver a expressão de seu rosto.
— Eu não estou — destaca ao falar de si mesmo, tomando um
pedaço.
— Vocês nunca pensaram em contar pra gente? — Aidan
questiona, a voz embolada por causa da pizza na boca. — Sobre
Gravity e você. — Indica Finn com o queixo. — E por que Ashton já
sabia?
— Finn abriu a boca uma vez, quando estava bêbado — conto
finalmente, provocando a atenção nele.
— Você já gostava da Vity? — Chase perscruta meu
semblante, acho que tentando pescar alguma coisa. Ainda assim,
sigo inexpressivo.
— Quem disse que gosto dela? — menosprezo-o, balançando
a cabeça.
— Delilah diz o contrário. — Aidan contesta, as sobrancelhas
descoloridas trepidando quando franze a testa. — E se quer saber?
Confio na minha mulher. Ela te conhece.
— Não acho que as pessoas precisem conhecer o Ash para
entender o que ele sente. — Bryan implica, abafando a risada ao
morder sua fatia. — De nós, você é o mais transparente. Grita
quando está com raiva, bate quando tem vontade, fala o que pensa.
Se não gosta da Vity, no mínimo, se sente atraído, e vindo de você,
não é nenhuma surpresa.
Diminuo o ritmo da mastigação, focando em Bryan.
— O que quer dizer?
— A pessoa só precisa insinuar que está a fim, que você está
em cima. — Ele para, reparando nos músculos do meu rosto se
moldando em esgar. — Ah, qual é, cara! Você é assim. Todo mundo
sabe que não tem a menor chance de alguém te prender de
verdade. Esse casamento com a Gravity é temporário, só até a
imprensa largar do seu pé, e quando acabar, você volta ao seu
normal.
Não sei por que me sinto ofendido quando sou exatamente
como Bryan descreveu. Já entendi que relacionamentos são
complicados e que a escuridão presa à minha alma, formada pela
rejeição que sofri, me impede de ter amor por alguém e esse
alguém por mim. Contudo, vê-los aceitando não me oferece o
mesmo conforto que sinto quando sou eu quem estou conformado.
Significa que o meu normal é uma vida solitária? Eles se
casam, criam suas próprias famílias, e sigo preso ao sentimento de
que não mereço mais?
Contraio a mandíbula, colocando a fatia de pizza de volta na
caixa. Fixo meus olhos na comida, a fome dando lugar para um
vazio que faz meu estômago retorcer, e a bile sobe à garganta.
Nunca tive problemas com quem eu sou, quero dizer, sempre
estive bem com a personalidade que forjei depois de muitos anos
me sentindo rejeitado. Convencer-me de que sou bom pra caralho
me fez deixar para trás os dias quando desprezava a mim mesmo
para caber nas expectativas de Conrad. É a primeira vez que tenho
medo de não viver o que meus amigos estão vivendo porque não
faço ideia de como ser alguém que recebe amor.
Sei que as minhas irmãs gostam de mim, mas elas não se
importam se estou feliz. Diferente de como Effy lida com Finn. Ou de
como Mackenzie quer tanto estar perto de Bryan que briga por tudo
e por nada, por ainda não ter encontrado um jeito de dizer o quanto
ela o ama. Ou de como Delilah sempre toma as decisões pensando
em Aidan ou como Theresa sempre resgata Chase nos seus dias
ruins.
Quero uma pessoa assim para mim também, que ama os
meus defeitos, que enlouquece por não encontrar as palavras certas
para dizer o quanto se importa comigo, que vai escolher
considerando os meus sentimentos também e que venha para me
salvar quando eu estiver em apuros.
Caralho, estou pensando igualzinho ao Aidan.
— Ashton, relaxa, você tem a gente. — Bryan tenta me
tranquilizar, eventualmente entendendo que a frase dele
desencadeou algum tipo de perturbação em mim.
— Estou relaxado. — Recomponho-me, deixando esses
pensamentos de lado.
Não preciso de ninguém. Não preciso de nada disso.
— Não vou me desculpar por ter dito a verdade a ela — falo,
não olhando diretamente para Finnick. — Nunca vou me desculpar
por ser sincero com alguém que me importo — acrescento, e volto a
pegar meu pedaço de pizza, coloco de lado o sentimento de
assombro. — Mas você é meu melhor amigo, espero que a gente
fique bem.
Finn não responde de imediato, e, por um minuto, acredito que
ele não vai dizer nada. Por mim está tudo bem porque, por mais que
não tenha escolhido o melhor momento — e que tenha sido
impulsivo —, Effy precisava saber. E poupamos um tempão quando
contei para todos eles de uma só vez.
— Quando é que não ficamos bem? — cochicha.
Ainda que esteja sorrindo quando mastigo, eles não
conseguem ver.
“Você não me segura
Você só me vê afogar”
CHROME HEARTED – JADEN HOSSLER

Meu telefone toca quando chego ao espaço que liga o


elevador à sala do apartamento. Detenho a caminhada para deixar o
capacete no chão e pego o telefone, o nome de Ava na tela.
Pregueio a testa, tentando imaginar porque nossa assessora me
ligaria quase dez da noite.
— Não deve ser boa coisa. — Opto por soar descontraído ao
atendê-la, voltando a andar em sentido à sala, de onde reparo a luz
acesa.
— Estou ligando para repassar os seus compromissos dessa
semana. Você e Gravity precisam agilizar a escolha do anel de
noivado, a data do casamento, e, por favor, Erin disse ao Jared que
você faltou à outra sessão de terapia. — Expele um suspiro
exaurido. — Encaminhei o cronograma para você e Vity analisarem
juntos. Sugeri alguns encontros, e Roman está aguardando a
localização de vocês.
Enxugo o suor da testa, aproximando-me do primeiro cômodo
do apartamento. Aos poucos um coro de vozes começa a ficar
audível. Reconheço a voz moderada de Gravity, mas a segunda,
grave e relaxada, faz com que minhas entranhas contorçam de
insatisfação.
— Tá, falo com ela.
Depois que eu descobrir por que caralhos Liam está aqui outra
vez, quando fui muito específico três dias atrás, que trituraria todos
os seus dentes se colasse as mãos nela novamente.
— O noivado, Ashton. Precisa resolver. A turnê volta em
novembro e vocês dois precisam estar casados! A estabilidade da
sua imagem vai contar muito quando estivermos com as vendas
abertas!
Por mais que esteja forçando meu cérebro a captar as
orientações de Avalon, ele só consegue focar na ceninha ridícula
dela dividindo a pizza que trouxe para nós dois com Liam. Minha
mandíbula dói ante a força que adiciono na arcada ao trincar os
dentes.
— Você sequer está me ouvindo?
— Te ligo mais tarde.
Encerro a ligação, aumentando o espaço de uma passada a
outra, querendo chegar até eles o mais rápido que meu corpo
conseguir. No minuto em que noto que estou praticamente correndo,
é que diminuo a velocidade. Porém meu andar é enérgico e a
fisionomia não deixa dúvida do quanto estou disposto a uma briga
com ela sobre o motivo de estar fazendo o oposto do que nosso
acordo manda.
Sei que Gravity me vê quando seus olhos se estreitam, não de
surpresa, mas em afronta. Ela está descaradamente me desafiando
a mandá-lo embora outra vez. Como se eu me importasse com Liam
Windsor para não chutá-lo daqui com meus dois pés em sua bunda.
Eles estão sentados à mesa, Gravity na cabeceira, as pernas
dobradas debaixo da bunda. A cadeira onde Liam está foi afastada
de seu lugar para conseguir ficar mais perto e antes que possa notar
minha presença, vejo a mão dele voar para debaixo da mesa e
apertar a coxa de Gravity, onde o short de seu baby doll não cobre.
Paro atrás dele, a pizza que trouxe pela metade e a tampa da
caixa onde deixei a mensagem virada para cima e, então, vejo que o
que escrevi foi riscado com a mesma caneta que usei antes de sair.
Agarro a extremidade do seu encosto, arrastando-o para longe
dela com um único movimento. Não faço com a violência que
gostaria, mas também não estou tentando ser delicado.
O porquê de ele estar aqui começa a perturbar minha cabeça e
não acho que a minha encrenca pretenda clarear as coisas para
mim, a menos que arranque dela.
Gravity ao menos parece surpresa com a minha reação, Liam
não faz nada além de me oferecer um meio sorriso e puxar as
mangas da sua camisa social, arregaçando-as até os cotovelos.
No mínimo o fodido saiu do escritório do papai e veio direto
para cá. Mas não acredito que seja tão sem noção. Ele está aqui
porque ela o chamou, o que significa que Gravity nunca esteve com
dor de cabeça, só quis se livrar de mim com uma desculpa ridícula
como essa.
Ela me rejeitou.
Agora não sei se estou furioso por ter me dado o fora ou por
ter tentado se vingar me causando ciúme. Se vingar de que é a
questão
O aborrecimento em meu interior cresce de tal maneira que
procuro respirar mais devagar para a síncope não me atingir como
um dardo no meio da testa. Entremeio os dedos na massa de
cabelos desalinhados sobre a cabeça, esforçando-me para conter a
irritação se avolumando no âmago do meu estômago e o forçando
através da garganta. Engulo com dificuldade, soltando os fios, e
deixo os braços caírem ao lado do corpo.
Ela não é nada minha, porra.
Preciso controlar essa possessividade. Nem sempre fui assim,
nem sempre estive no meu limite. Com o passar dos anos, você
descobre que pode se encolher diante da dor ou pode retaliar para
se proteger. E na maioria das vezes, não consigo simplesmente
deixar para lá, eu escolho ficar e brigar. Se sei o que Gravity está
tentando fazer, é escolha minha ou não ir de acordo com as
emoções, e, dessa vez, vou entrar em seu jogo só para contrariá-la.
Só porque é o que ela não espera que eu faça.
Rodeio a mesa, passando por trás dela e puxo a cadeira ao
seu lado, Liam no sentido oposto reposicionando a sua, entretanto,
sem desviar a atenção de mim. É um frouxo mesmo. Se a quisesse,
deveria tomá-la, e não ficar testando o quanto vou deixá-lo ir por ela.
Posso não ser a melhor opção para Gravity — não sou a
melhor opção para ninguém —, mas não tenho medo de pegar o
que quero. Não me importo se tiver que destruir tudo para
conseguir. Se Gravity não tivesse sido específica anos atrás, não
teria desistido dela. Mesmo contrariado, só estava respeitando a
decisão que tomou sobre nós. Liam é covarde, não a merece, e vou
me divertir a assistindo perceber por conta própria.
— Posso me sentar aqui ou vocês preferem ficar sozinhos? —
Cruzo os braços, erguendo os pés para apoiar os calcanhares sobre
a mesa.
Gravity analisa meus movimentos com cautela, as
sobrancelhas unindo como que para tentar prever o próximo passo.
— Não me importo de sair. — Sacudo os ombros, expondo
toda a indiferença que consigo, contudo, a inspeção não para e
acho que ela fisgou a isca. — Se quer transar com ele, vá em frente
— incito, entrecerrando os dentes, mas, no fim, consigo expurgar o
desgosto em relação a essa merda. — Não vou tentar te impedir.
No entanto, minha futura esposa, razão pela qual estou
extremamente irritado e confuso nesse instante, equipara a altura
dos seus olhos castanhos com os meus. Ondulações de pele
marcam o centro de sua testa enquanto me sonda. Concentro minha
atenção no movimento intenso do seu peito ao se erguer e descer
para acompanhar a respiração exaltada. Concluo que, embora Liam
esteja aqui tarde da noite, dormir com ele não é a intenção dela,
mas não anula o fato de que esse cara se aproveita de cada ínfima
situação para tocá-la quando não estou por perto.
Tem uma diferença entre o que estamos fazendo agora e anos
atrás, quando o conheci em Paris; eu não tinha um contrato de
casamento com Gravity. Significa que enquanto houver esse fio me
ligando a ela, ninguém pode tê-la além de mim. São indiscutíveis os
termos desse acordo.
— Se não vai, ele tem que sumir — decido por fim, mirando
com advertência para Liam. — Nós dois temos que conversar sobre
você trazer alguém para a nossa casa, que claramente quer trepar
com você pelas minhas costas.
— Liam é meu advogado. — Gravity esclarece, a ruga quase
permanente em sua testa se dissolve quando dobras se formam na
minha. — A partir de agora, ele vai me acompanhar em todas as
reuniões que se dizem respeito ao nosso contrato. Eu chequei com
Jared e Camille, tenho o direito de ter um advogado nessa história
defendendo os meus interesses tanto quanto você.
Ela só pode estar de sacanagem comigo!
— E tinha que ser ele?! — vocifero, acentuando o tinha
quando adiciono mais potência na voz.
— Ele é meu amigo e confio no julgamento dele para defender
o que pode ou não ser bom para mim, Ashton.
— Não, você decidiu optar por ele, com milhares de
advogados à nossa volta, incluindo Tess, para me irritar. É o que
você faz de melhor, ser meu inferno, porra! — berro, espalmando a
mesa, e, por um breve segundo, estreito os olhos para Liam, que
está me analisando de maneira vidrada.
— Ele já te tocou alguma vez? — Liam indaga, falando
exclusivamente com Gravity.
— Eu estou bem aqui, seu cuzão! Pode falar comigo.
— Não estou interessado no que você tem a me dizer,
somente ela, porque Gravity é minha cliente — responde,
controlado, enquanto minha vontade é atravessar meu punho sobre
a mesa e acertá-lo no meio da cara. Filho da puta arrogante.
— Ele não me tocou sem o meu consentimento. — Gravity o
informa, a cabeça se move ligeiramente na direção dele. — E Tess
ainda está estudando, ela teria sido minha primeira escolha se já
tivesse passado na ordem — finaliza, voltando-se para mim.
— Você tem um temperamento explosivo que é preocupante.
— Ele observa, me vistoriando com olhos desdenhosos. Não
gostava dele em Paris, mas agora que está prestes a levantar uma
barreira ainda maior entre mim e Gravity, com certeza o detesto. —
Se tocar nela, vou encher seu rabo de processos. Esse contrato diz
especificamente que ela não tem nenhuma obrigação matrimonial,
como relações sexuais. — Afunda o indicador sobre a mesa, e
transporto minha atenção para o lugar, vendo o contrato que
assinamos na frente dele. Estava tão irritado antes que não notei. —
Então, é melhor andar na linha com a minha cliente.
Repuxo os cantos da boca, exprimindo um sorriso orgulhoso.
— Ela acabou de dizer que não a toquei sem o consentimento
dela. O que significa que Gravity quis tudo que fiz depois que foi
embora na sexta à noite. E ela gostou pra caralho. A porta do meu
quarto arranhada pode provar que sim — vanglorio-me, expandindo
o sorriso no rosto à medida que Liam desenha uma carranca de
insatisfação. — E se estiver insinuando que eu a tocaria com a
intenção de machucá-la, quem vai encher seu rabo com processos,
serei eu, por uma acusação dessas.
— Quero agendar uma reunião com a sua advogada para que
sejam definidas as condições de vocês morando juntos. Ainda que
diga que não a tocaria para machucá-la, tem um histórico de
agressões que considero preocupante para minha cliente. Talvez
devêssemos instalar câmeras nas áreas sociais. Como é um
relacionamento de fachada, a segurança dela é minha maior
preocupação.
— Não fala comigo como se eu fosse um otário, porra! —
Ranjo os dentes. — E não ouse sugerir que eu bateria em uma
mulher. Isso não vai acontecer, principalmente com ela. — Defiro a
cabeça para Gravity.
— Nós vamos agendar — decreta Gravity, afastando a cadeira
da borda da mesa para se levantar. — Nesta semana estamos
atarefados. Temos fotos amanhã para o TNC, nossa entrevista,
encontros, e Ava já me disse que gostaria que escolhêssemos o
anel de noivado e começássemos com os preparativos do
casamento. A gente se casa em outubro e ele vai garantir que não
dure mais do que foi contratado. Liam, muito obrigada por ter vindo.
De verdade.
Liam se levanta quando ela sorri em sua direção. Ignoro meus
membros rígidos devido à tensão ao vê-los se despedir. Ele se
inclina para beijar seu rosto, e Gravity passa por mim como se fosse
indiferente à minha presença, subindo as escadas. Ele junta o
contrato e coloca dentro de sua pasta, e ouço uma porta bater no
mezanino. Então, percebo os primeiros botões de sua camisa
abertos e a gravata vermelha sobre o assento da cadeira ao seu
lado, junto dos seus outros pertences.
— Você me disse em Paris que Gravity não era seu tipo, e eu
te disse que não estava levando meu relacionamento com ela a
sério — ele começa, colocando a alça da pasta sobre o ombro —
porque achei que não fosse encontrá-la de novo. Mas aqui estamos.
— Endireita a coluna, colocando ambas as mãos dentro dos bolsos.
Levanto-me e contorno a mesa para ficar de frente para ele,
meu peito expandindo na proporção em que encho o tórax de ar
para não pender para o meu lado irracional que está me gritando
para socá-lo.
— O que está tentando me dizer? Que vai roubar minha
esposa de mim? — caçoo, meu sorriso dilatando, mas não é nem
um pouco amigável, e sim intimidador.
— Ela não é sua esposa de verdade. Vocês só estão juntos
porque ela não tem escolha.
— Não tem escolha? — debocho, esfregando a ponta do nariz
com o dorso da mão. — Ela teve escolha. Dei várias oportunidades
para ela sair ilesa, ofereci, inclusive, abrir mão da multa se Gravity
decidisse abandonar a ideia desse contrato. Fiquei tão puto por
causa disso, faria qualquer coisa para me livrar dela.
— Admito que quando ela me disse o que estavam fazendo,
não acreditei que faria só pelo dinheiro. Eu a conheço muito bem,
nós mantivemos contato ao longo dos últimos anos e sei que Vity
não concordaria, sobretudo porque se tem algo que odeia mais do
que a cidade de onde saiu, é você. Enquanto ela contava tudo,
entendi, mas você pensa demais em si mesmo. A vida precisa
acontecer ao seu redor, não é mesmo? Só a sua dor é válida, só o
que você sente é importante.
— Não tem nenhum outro motivo para que tenha concordado
com essa merda além do dinheiro. Como você mesmo disse, ela me
odeia.
— Ela odeia que tenha mentido e, pior, você nunca ter se
arrependido ou considerado se desculpar. O que prova, mais uma
vez, que não a merece. — Ele avança um passo largo e, embora
Liam acredite que vou recuar, estaciono os pés com tanta força no
chão, que poderia criar raiz aqui mesmo. — Ela concordou por você.
Para te ajudar. O dinheiro é só um detalhe. Ela teria feito isso
mesmo que não fosse ganhar nada em troca porque é assim que
Gravity é. O coração dela é grande e especial, e é por essa e tantas
outras razões que sou apaixonado por ela.
Cerro a mandíbula, meus dentes rangendo com o atrito. Fecho
os punhos ao lado do corpo, sentindo o espiral gigante se formar
dentro de mim, e estou bem perto de ignorar o autocontrole. Na
verdade, deveria tê-lo chutado para fora no instante em que o vi
aqui.
— Quando menos perceber, a terei tomado de você. Vou fazê-
la tão feliz que vai se esquecer de quem você é na primeira noite em
que estiver comigo, porque vou me preocupar somente com o que
ela gosta.
— Está querendo sair daqui com a cara sangrando? — rosno,
minha voz escapando exígua. — Você não pode tomá-la de mim! —
Rio com escárnio. — Ninguém pode.
— Minha fala foi infeliz. — Ele devolve a ironia. — Gravity não
é um objeto para ser tratada assim. Porém estou determinando para
que saiba que não vou deixá-la ficar com você. Se ela quiser me
rejeitar, eu aceito, mas você nunca será uma opção.
— E é você quem vai me impedir, certo?
— Não preciso nem me esforçar para estragar as coisas entre
vocês. Você sozinho vai conseguir afastá-la de novo, e estarei lá
para confortá-la. Exatamente como da última vez — sussurra a
última parte.
O sentimento se avolumando dentro de mim estoura em um
pico enérgico de raiva e meu punho fechado é tudo que vejo no
momento em que o afundo na boca de Liam. A raiva produz um
escudo que não me deixa sentir nenhum tipo de dor, embora
enxergue a marca dos seus dentes na minha pele e sangue
escorrer.
Liam cambaleia para trás, se agarrando ao encosto da cadeira
para recuperar o equilíbrio, mas acaba a puxando com ele, e o
móvel cai ao chão. Contudo, não dou a ele tempo necessário e
arremesso outro soco, dessa vez, não tenho alvo preciso, estou
apenas querendo me esvaziar do sentimento que conseguiu
implantar em mim com as ameaças.
A pasta escorrega em seu ombro com meus golpes, atingindo
o chão com um som vazio. Ele ergue os braços, se protegendo dos
açoites do meu punho. Tenho dificuldade para respirar, sorvo o ar
com um sibilo agudo saindo pela boca.
Em nenhum momento paro com os socos, ele não tem espaço
para revidar, então segue tentando se defender de mim. Perco o
foco de certo e errado, a fúria, como sempre, predomina qualquer
senso que possa ter. Sempre foi assim, como se existisse um
defeito no meu cérebro, onde não consigo dominar minha própria
mente e corpo.
Minhas decisões são movidas pela emoção, seja raiva ou
tristeza, são elas que me influenciam. As pessoas naturalmente
sabem se controlar, eu, por outro lado, chego ao limite em questão
de segundos. Não importa que o outro lado não mereça os
respingos da minha brutalidade, ela está lá, tentando romper o meu
discernimento das coisas.
Liam tropeça no tapete da sala de estar e cai sobre a mesa de
centro, o vidro estilhaçando em micropedaços debaixo de seu corpo
contorcido. Deveria parar, mas estou com tanto ódio desse filho da
puta que no momento em que ele arranha a garganta,
resmungando, estou o agarrando pelo colarinho da camisa,
erguendo seu corpo do chão.
— Ashton, o que você está fazendo? Solta ele! — A voz
veemente penetra meus ouvidos, e meu punho erguido prestes a
descer em um murro para. — Jesus, o que você fez?! — esbravece
atrás de mim, só então me dou conta de que os dedos pequenos
estão enredados no pano da minha camiseta. — Liam, você está
bem? — Gravity pergunta, preocupação fazendo a tonalidade
tremer.
Solto os dedos do seu colarinho. Liam cai como uma panqueca
no chão. Frouxo. Está fazendo um drama do caralho para conseguir
a atenção dela.
Empenho-me para regular a respiração transtornada. Olho
para o cume da mão, vermelho-vivo espalhando-se na pele. A
adrenalina impediu que a dor irradiasse, mas conforme os segundos
passam, meus ossos começam a latejar de forma pungente.
Dou passos para trás, fugindo dos pedaços de vidro cobrindo o
chão. Gravity, por outro lado, pisa sobre eles com suas pantufas,
agarrando o bíceps de Liam.
— Meu Deus, você não está bem — repara, segurando a
mandíbula dele entre os dedos. Ele deve ter machucado por dentro
da boca com os socos, mas duvido que eu tenha feito um dano
permanente.
Distancio-me deles, sentindo cada fibra do meu corpo
borbulhar. Ainda estou com raiva. Ainda quero quebrar alguma coisa
para aliviar a sensação de sufocamento ocasionado por ela. Quero
explodir a porra do Liam Windsor com meus próprios punhos.
— Estou bem. — Ele puxa a bainha da camisa para limpar o
rosto ensanguentado, e quando olho para ele, mesmo desejando
matá-lo por sequer pensar em tirá-la de mim, entendo o que Liam
disse sobre eu ser descontrolado. Nem preciso culpar a maldita
bebida. Consigo destruir tudo em plena consciência. — Mas,
Gravity, não quero que fique aqui com ele. Por favor — suplica,
puxando-a pelos dois cotovelos.
— Você não vai tirar ela de mim, porra! — protesto,
conduzindo-me até ele outra vez, mas Gravity se impõe entre nós
dois, suas mãos voando para trás para apoiá-lo nos quadris. Ela
está protegendo-o.
Detenho as passadas autoritárias.
— Não sou sua propriedade, Ashton! Você não pode decidir
nada por mim, coloca isso na sua maldita cabeça! — grita de volta,
o lábio inferior tremendo sob tanta tensão.
Ele armou para mim.
Esse fodido armou para mim e caí como um patinho. Ele
estava tentando provar a ela que sou como um trem descarrilhado e
vai conseguir porque se Liam me provocou com essa história
ridícula sobre tomá-la de mim, significa que não tenho um pingo de
noção. Ninguém pode me tomar nada, a não ser que ela decida ir
por conta própria. Só que esse desgraçado descobriu uma coisa
que eu mesmo estava me recusando a enxergar: ela é meu
calcanhar de Aquiles.
Quando me rejeitou.
Quando aceitou o contrato, e eu acreditei que estava sendo
usado.
Quando tenta me provocar causando ciúme.
Porra. Gravity é literalmente a única pessoa capaz de me
aniquilar com um só golpe. E vou deixar.
Eu tinha medo.
Tinha medo de como seria o efeito dela em mim. Agora
entendo o porquê. Precisei ser forte durante todas as fases da
minha vida, da infância até me tornar adulto, tive que lidar com
merdas que são mentalmente irreparáveis e no meio do caminho,
acabei me deparando com a pessoa que seria responsável por me
forçar a abrir o coração novamente. Deixá-la entrar é me expor à
fraqueza. O engraçado é que essa brecha para ela existe há tantos
anos que foi imperceptível.
— Vou te levar ao hospital. — Ela corta meu devaneio, tirando
Liam de cima dos cacos de vidro.
— Você não pode — intervenho quando ela empunha a alça
da pasta.
— Boa sorte tentando me impedir — incita, pondo a correia no
próprio ombro. — Vou ser discreta para não ser vista — avisa,
arrastando-se com um braço de Liam sobre os ombros. Nem acertei
o imbecil na boca do estômago, e, ainda assim, choraminga por
todo o caminho como se tivesse sido atingido. — Espere por mim no
saguão. Vou me trocar rapidinho e te encontro lá.
Liam afasta o braço de cima dos ombros dela, assentindo
veementemente para assegurar. Apoia a mão aberta no pilar de
sustentação do hall quando Gravity lhe entrega a pasta e gira nos
calcanhares, correndo apressada para o segundo piso. Ela passa
por mim sem sequer me lançar um olhar.
— Como eu te disse… — Seu olhar obstinado cruza com o
meu. — Não preciso me esforçar. Você estraga tudo sozinho.

Meu cérebro está fritando nesse momento. Preciso de uma


pausa desses malditos cálculos. Não pretendo seguir nenhuma
carreira que exija matemática, embora admita que goste de
computadores e programação, mas é só um hobby, faço por
divertimento, e não com a intenção de me aprofundar.
Sem contar que aprender sobre tecnologia, hackear contas de
redes sociais e estudar sobre como rastrear um celular são mais
como uma forma de, no futuro, me vingar do meu pai por me forçar
a passar pelo menos quatro horas depois da escola na sede da
joalheria.
Nos intervalos das reuniões, fico preso na sala dele, estudando
cálculo. Segundo meu pai, para assumir a maldita Baker’s, preciso
ter notas impecáveis para convencer o conselho de que sou uma
boa opção como substituto quando Conrad não puder continuar.
Conrad não me deixa esquecer minhas fraquezas, não deixa
de limitar minhas visitas aos meus avós porque, segundo ele, meu
avô está fazendo minha cabeça contra suas escolhas para meu
futuro.
Meu avô poderia discursar sobre ele por muito tempo, para ser
sincero, sobre o quanto se importa comigo, mas não consigo
acreditar que me pune dessa maneira por amor. Ele faz por ego. Por
controle. Por ser obcecado pelo trabalho. Por ter prazer em me ver
sofrendo.
— Toc, toc…
Ergo a cabeça das apostilas topando com os olhos verdes e
hipnotizantes focalizados em mim. Um ar de malícia encobrindo com
uma película cristalina as íris cintilantes.
Fecho na mesma hora meu material da escola, afastando a
cadeira na qual estou sentado para ir de encontro a ela. Nicola entra
na sala — é uma das inutilizadas da Baker’s onde meu pai me
permite estudar quando estou na empresa — e, em seguida, está
devorando minha boca em um ímpeto.
Fôlego me falta, mas não consigo me afastar dela ou do seu
cheiro feminino e marcante. Sempre que estamos juntos, o perfume
de Nic fica impregnado em minhas roupas até que sejam lavadas e
adoro como posso passar mais tempo com ela, ainda que não
estejamos nos vendo muito ultimamente.
— O que está fazendo aqui? — pergunto entre o beijo,
pousando as mãos na base de sua lombar e a puxando rumo à
mesa, onde só paro quando meu quadril se choca com a beirada.
— Estava morrendo de saudade, precisava te ver só um
pouquinho. — Ela sobe os dedos para o nó da minha gravata do
uniforme, começando a desfazê-lo. — Estou tão molhada, você
precisa dar um jeito nisso.
Céus, eu a amo pra cacete. Ela é tudo que eu pedi para Deus
em minhas orações. Só passei a acreditar nele, no entanto, quando
Nicola apareceu para mim, uma resposta significativa que tem um
ser divino que ainda não me esqueceu totalmente.
Giro-a pela cintura, colocando-a sentada na mesa. Desde que
começamos a transar ano passado, passei a carregar preservativo
comigo, por precaução.
Nicola ergue a saia, embolando-a no quadril, e desce a
calcinha até os tornozelos. Abro a calça e a escorrego, vestindo
meu pau duro com a camisinha. Encaixo-me entre suas coxas,
sentindo o calor do seu interior encobrir meu volume enquanto me
enterro nela. Movo o quadril para trás, poucos centímetros, e volto
com tudo, mergulhando nela com intensidade.
Ela silva um gemido que repercute na sala. Apresso-me para
cobrir sua boca com a minha, absorvendo todos os seus ruídos com
a língua. Estoco profundamente, suas unhas enterrando em minhas
costas sobre o uniforme.
— Ai, meu Deus, você é tão gostoso... Mais forte, amor... —
exige, tensionando a bunda para frente, procurando me tragar até o
talo.
Sua cabeça pende para trás, um espaço entre sua garganta e
o colo se abrindo para mim. Chupo a pele clara, marcando
pequenos pontos vermelhos nela. A mesa se move com a
mobilidade violenta do meu corpo batendo contra o dela, do meu
pau cravado fundo em suas entranhas que parece que fomos
fundidos um no outro.
— Você é gostosa... Sinto sua falta todos os dias. Eu te amo,
Nic — grunho, fechando as mãos em volta de seu pescoço magro e
apertando. — Um dia, nós vamos nos casar e vou colocar bebês em
você. — Mordo a ponta de seu queixo, o ar atravessando o antro de
sua boca quando ela grunhe.
Sua bunda desliza sobre o tampo de madeira, o atrito da pele
contra a superfície lisa emitindo um assobio, mas que me enche de
tesão por saber que vou voltar a estudar com a memória cheia de
sexo e da pele da minha namorada linda contra a mesa.
— Ashton, preciso que você…
Paro de estocá-la, pondo o queixo sobre o ombro, e encontro
meu pai parado no meio da porta. Suas narinas inflam para a cena
que ele acaba de ver. Rapidamente, me imponho na frente dela,
detestando a ideia de que ele a veja nua.
Tiro a camisinha apressado e subo a calça. Nicola salta da
mesa, descendo a saia e recobrando a postura delicada. Ela se
esconde atrás de mim como se eu pudesse protegê-la dele. De fato,
jamais deixaria que Conrad fizesse com ela o que costuma fazer
comigo.
— O que essa vadia está fazendo aqui?! — ruge ao fechar a
porta com um baque ensurdecedor.
— Ela não é vadia. É minha namorada. — Levo as mãos para
trás, entrelaçando nossos dedos. — Você tem que respeitá-la.
— Não vou respeitá-la quando ela não se dá o respeito. Aqui é
um escritório, não um motel. — Nicola se encolhe atrás de mim. —
Saia daqui!
— Não. — Firmo o aperto em sua mão. — Ela pode vir me ver
quando quiser.
— Nicola, saia. — Ele repete e, dessa vez, Nicola torce a mão
até conseguir se soltar do meu aperto.
Trinco a mandíbula, a raiva retorce minhas vísceras. Nicola sai
apressada da sala, e vejo os joelhos trepidarem de medo quando
tenta marchar sem parecer afetada para fora. Isso me enlouquece
de tal maneira que gostaria muito de entrar em uma briga com meu
pai hoje. Queria que ele testasse minha paciência para eu ter uma
desculpa para enfrentá-lo.
— Espero que você esteja se protegendo. Garotas como
aquela só querem um filho seu para conseguir seu dinheiro. Sei
porque me casei com uma.
A raiva transcende meu controle e, como resposta, jogo a
camisinha que usei em seu rosto. Noto o instante em que a fúria o
esgota e estou esperando o confronto, mas Conrad chuta o
preservativo para o lado, ajustando a gravata, indiferente ao insulto.
— Quando meu pai me deu conselhos sobre sua mãe, também
fiquei irritado. Mas adivinha o que aconteceu pouco tempo depois
que começamos a transar? Ela ficou grávida do Alexander. Levei
anos até finalmente decidir me envolver romanticamente com
alguém, mas são as putas que acabam sendo mais atraentes para
homens como nós.
— Não sou como você — objeto, expandindo as narinas. O
peito sorve o ar de forma intensa e frenética. — Não sou nem um
pouco fodido da cabeça como você, Conrad.
— Sua mãe era uma prostituta barata. Descobri um tempo
depois que não estava saindo apenas comigo, como também com
metade de Postforn. Alexander pode até não ser meu filho, ou você,
ou qualquer uma de suas irmãs. Nunca saberemos porque prefiro
carregar essa família nas costas a me submeter a tamanha
humilhação.
Meu corpo inteiro enrijece como se tivesse se transformado em
uma rocha. Ele não pode estar falando a verdade, pode? Podemos
não ser filhos legítimos dele? Impossível. Tenho características tanto
dele quanto da minha mãe. Ele só está tentando mexer com a
minha cabeça como fez durante a minha vida inteira.
— Tome cuidado com Nicola. Ela pode te deixar por alguns
trocados.
“É como se não pudéssemos parar, somos inimigos
Mas nos damos bem quando estou dentro de você”
ANIMALS – MAROON 5

Gravity demora o suficiente para que eu tenha tempo de limpar


a bagunça que Liam causou na sala ao cair em nossa mesa de
centro e ainda me acalmar durante o banho.
Ao menos, quando voltar, posso tentar não brigar com ela,
embora mais me deixe com tesão do que realmente angustiado.
Porém não consigo esquecer o furor cinzelar sua testa em sulcos
quando a vi com ele. Ela estava irritada pra caralho comigo, o que
também me provoca uma profusão de questionamentos. Até onde
minha memória consegue alcançar, não me lembro de ter feito nada
além de passar as últimas quase setenta e duas horas preso no
estúdio com os caras.
Ainda assim, escavo tudo que aconteceu nos meus dias
ausentes. Refaço meus passos na gravadora, todas as conversas
que tive com Jared, Sydney, Avalon e Kimberly, mas não consigo
me lembrar de nada que pudesse tê-la deixado com raiva.
Honestamente, não faz o meu estilo me preocupar com o que
estão pensando de mim, muito menos se fiz algo que a deixou
chateada, então, no auge desse momento, não consigo entender
por que é no mínimo importante ou por que decidi descer para o
primeiro andar e esperar.
Não consigo dormir, mesmo que minhas pálpebras estejam
fechando involuntariamente diante da exaustão.
Direciono meu olhar fixamente para as costas da mão, a
extremidade dos dedos com cortes superficiais que devo ter
conseguido na colisão com a boca de Liam. Com a mão oposta,
esfrego a região dolorida e marcada. Apesar de ter me acalmado
após uma ducha demorada, se o encontrasse de novo, acho que
não conseguiria ignorar tudo que me disse, com tanta confiança, de
que estou destinado a estragar tudo.
Liam não mentiu, entretanto, não significa que não vou lutar
contra meu próprio ego se decidir vencer.
O elevador emite um sinal de alerta. Meus ombros prostrados
reagem e rapidamente estou saltando da banqueta para ficar no
caminho de Gravity. Embora tivesse deliberado que a deixaria em
paz por hoje, saber que está aqui me faz voltar atrás e seguir meus
impulsos.
Assim que me vê, diminui os passos e deixa a bolsa sobre a
banqueta ao seu lado, conseguindo deter minha atenção apenas
nela. Engulo a bola ácida presa na garganta. Gravity apoia a mão no
encosto do banco alto, a outra firmada na curva da cintura. Seu
ritmo respiratório se tornando cada vez mais profundo e audível.
Estou esperando que ela me bata, o frenesi fazendo os cantos
de seus olhos tremerem é um prelúdio sempre que está com
vontade de ejetar sua raiva.
— Ele não quebrou o nariz nem fraturou nada — informa-me.
— Merda, significa que não bati com tanta força quanto
deveria.
— Você poderia ter arranjado mais problemas — adverte com
os olhos esbugalhados. — E se o pai dele decidir te denunciar? Se
for para a imprensa e te expor? Você não pensa antes de agir! —
exclama, o peito se elevando com uma inspiração longa.
Não deveria bufar uma risada, mas não consigo evitar. Pensei
que ela estivesse preocupada com ele, no entanto, está preocupada
comigo.
— Quero que se desculpe com ele. — Ela usa um tom de
exigência que não gosto, e fecho a cara na mesma hora.
— Não vou me desculpar. Se você não tivesse me impedido,
teria afundado a cabeça dele no chão! — cuspo com sinceridade,
por entre os dentes cerrados. — Ele fez por merecer!
— Não interessa o que ele fez para te provocar! Ou não se
lembra de que uma agressão foi exatamente o que te trouxe até
aqui? Agredir as pessoas não vai te ajudar a resolver o problema,
pelo contrário, você só consegue piorar as coisas! — grita de volta,
aproximando de mim um passo.
— Por que ele estava aqui, porra?! Por que ele veio, afinal de
contas?! — Conduzo o corpo para frente, seu peito tocando o meu.
— Eu o contratei como meu advogado. Gostando ou não, você
tem que aceitar que não sou sua para me dar ordens ou determinar
com quem saio ou quem vai trabalhar para mim!
— Quer que eu acredite que a escolha de Liam não foi de
propósito? — Escárnio escorre na nuance da minha fala. — Você o
trouxe aqui porque sabia exatamente como eu reagiria. Não tente
mentir para mim, Gravity. Por que você está com raiva de mim? —
Inclino o corpo sobre o dela, sua fragrância de verbena perfurando
meus sentidos. — Por que quis se vingar? — sussurro a pergunta.
Ela encolhe os ombros sob a acusação, mas não tenta me
corrigir, o que significa que estou certo.
Gravity nunca consideraria Liam para ser seu advogado, a
menos que quisesse gerar alguma coisa em mim. Não que o fodido
não seja bom no que faz, reconheço que deve ser um excelente
profissional, considerando onde estudou e suas raízes, mas a
conheço e sei que não traria alguém de fora. Principalmente para
torná-lo parte disso.
— Você é muito cara de pau... — Examina-me por entre os
olhos cerrados, balançando brevemente a cabeça para expressar a
indignação. — Concordei com esse contrato porque queria te ajudar,
mas não tem um dia que eu passe do seu lado, que não me
arrependa — murmura com a arcada dentária fechada, os orbes
brandindo conforme alteram o ponto de concentração no meu rosto.
— Liguei para o Liam para me dar uma alternativa.
— Alternativa para quê? — retruco, mas minha mente articula
uma resposta que não quero ouvir.
— Para rescindir — responde, sucinta. A voz nem titubeia, o
que significa que ela teve tempo para pensar a respeito. — Não
quero me casar com você. Nem mesmo por fingimento —
acrescenta, expelindo por uma brecha entre os lábios.
Era tudo que eu queria, ouvi-la dizer que não quer fazer isso,
porque uma parte de mim deseja que Gravity seja diferente. Que
não pense somente no dinheiro ou no sucesso que trabalhar com a
The Reckless traria para ela. Isso me enfurece, essa situação tem
testado meu temperamento, o autocontrole quase inexistente por
pouco não se rompe. Contudo, pensar nela me virando as costas
outra vez é ainda pior. É de ensandecer não saber como teria sido
se tivéssemos ido até o fim.
Fecho a boca com firmeza, contraindo o maxilar ao ouvi-la
admitir com tanta convicção que não quer se casar comigo — sim,
eu sei que essa merda não é pra valer —, mas não consigo me
imaginar fazendo isso com outra pessoa. Pelo menos, não mais. É
claro que ainda sinto raiva dela, mas me assusta acabar ficando
indiferente. Não sentir nada a respeito dela.
— Você não tem nenhum respeito por mim. Não considera os
meus sentimentos nem cumpre com o seu lado do acordo. Me cobra
uma coisa que não consegue retribuir!
Inalo o ar profundamente e de maneira audível, sentindo que o
tórax será trucidado com o pulsar estremecido do coração.
Pressiono as pálpebras com os dedos, impaciência começando a se
consolidar.
— Não faço a menor ideia de que porra você está falando,
Gravity.
Ela move a mão para trás, sacando um papel embrulhado do
bolso traseiro da calça. Amassando-o entre os dedos, arremessa
com agressividade em meu rosto. A bolinha de papel bate em minha
testa e quica ao cair no chão.
— Você me acha idiota ou o quê?! — esganiça, guinchando os
ossos da mandíbula. — Deve pensar que é fácil me enganar duas
vezes. Mas não confio em você nem em nada do que diz, Ashton!
Você é a última pessoa nesse mundo em quem eu conseguiria
acreditar outra vez!
— Continuo sem entender porcaria nenhuma do que você está
falando! — badejo de volta, minha voz afônica rachando o ar. —
Que merda tem nesse papel? — Vergo o tronco para alcançar a
bola e desembrulho.
Leio nele “Amber Sommers”, o número de telefone e mais
embaixo, ela escreveu: me envia uma mensagem quando quiser
sair, vou adorar passar um tempo com você de novo.
Fecho os olhos com um suspiro extenso, a lembrança da
mulher que cruzou o estúdio hoje de manhã vindo à tona.
— Onde conseguiu isso?
Ergo o papel na altura de seus olhos para mostrá-lo.
— Caiu do seu bolso quando se deitou na minha cama mais
cedo — explica, cruzando os braços, e pela forma como me encara,
sei que está esperando que eu dê uma interpretação diferente do
que ela teve.
— O que você quer? — questiono, colocando o papel sobre a
bancada ao nosso lado.
Quando volto minha atenção para ela, está contraindo um lábio
no outro. Quero sorrir porque Gravity Monaghan está se mordendo
de ciúme.
Posso me deliciar desse momento? Porque não tem nada que
me deixe com mais tesão do que essa mulher obcecada por mim.
Adoro provocá-la, embora dessa vez não tenha sido intencional.
Nem sabia do maldito papel no meu bolso, talvez Amber tenha
colocado quando foi se apresentar como parte da equipe de figurino
da The Journey.
Conversamos um pouco, ela perguntou dos nossos gostos
pessoais em relação ao figurino. Vindo de mim, é estranho não ter
me interessado em Amber, já que ela claramente deu sinais
explícitos de interesse, mas a ignorei porque estava ocupado
pensando na encrenqueira que está parecendo uma pequena
amazona vingativa diante de mim.
— O que quer que eu diga, Gravity? — escrutino, dando um
passo à frente. — Me pediu para não mudar porque não quer
acreditar que estou tentando te deixar apaixonada, por que está
com ciúme de um número de telefone? — Tento afastar uma mecha
de seu cabelo, mas ela foge do meu toque. — E se eu quiser sair
com ela? Afinal, Amber é muito gostosa.
— Vai ser quebra de contrato. — A tonalidade embolada quase
não me deixa ouvi-la.
— Eu estaria quebrando pela segunda vez. Você não fez nada
a respeito da primeira, por que essa seria diferente?
— Já te dei oportunidades para se redimir, mas você tem
apreço por problemas. Me diz, Ashton, você faz com a intenção de
convencer as pessoas que é realmente um fracasso ou só é
estúpido demais para enxergar a própria imundice?
Ai, essa doeu.
Porém não vou rebater. Mereci por estar ultrapassando o
limite.
Divago com as mãos pela extensão de seus braços, Gravity
seguindo o movimento com os aros castanhos, sua pele arrepiando
por causa do contato calmo e suave dos meus dedos ao se
curvarem contra eles. Responde tão rápido ao meu toque que me
sinto constrangido por ela.
Tento bloquear o sorrisinho triunfante, mas é impossível
quando Gravity nem tenta me rejeitar. Se soubesse, teria tentado
tocá-la mais cedo e teríamos evitado esse estresse, contudo, tenho
certeza de que encontraria outras maneiras para perturbar meu
juízo.
Quando o assunto é me importunar, Gravity é perita. Fico,
inclusive, impressionado com sua habilidade de ser a única mulher
que consegue me tirar do sério usando apenas uma palavra. Isso
quer dizer que me importo demais com o que ela pensa ou sou um
masoquista por gostar tanto de ser desafiado.
Curvo sobre o tronco, encaixando o queixo na sinuosidade de
seu pescoço. Agarro a parte macia de sua orelha com os dentes,
lambendo e sugando. Seus joelhos oscilam mediante o calor da
minha boca em contato com sua pele, usa as mãos para impedir
seus seios de recostar no meu peito, mas escorrego as mãos para a
base de sua cintura, espetando a ponta das unhas por cima da
camiseta lisa que cobre seu corpo.
— Está com ciúme, encrenca? — ronrono em seu ouvido,
obtendo como resposta um grunhido cavernoso. Sorrio contra a pele
de sua bochecha ao afastar a boca. — Sabe o que me deixa
surpreso?
Envolvo sua cabeça com minhas mãos, meu pescoço
pendendo brevemente para trás, capturando sua atenção para mim.
— Você acreditar que eu conseguiria trepar com alguém
depois do que fizemos.
— Espero que você não esteja tentando ser romântico porque
eu odeio.
— Você pode me odiar enquanto eu te puno por ter tentado me
enlouquecer pela milésima vez desde que nos reencontramos? Sua
bundinha linda está pedindo por umas boas palmadas.
— Não pense que você pode…
Engulo o restante da frase quando confino sua boca com a
minha. Mergulho, saboreando cada centímetro dela, sugando e
lambendo, beijando sedento enquanto ela escava por entre os fios
da minha cabeça.
Sua língua impaciente duela com a minha por domínio. A
avidez com que tenta arrancar minha camiseta me faz sentir sua
aflição por um mínimo de contato com minha pele.
Estreito a mão por sua barriga plana e divago até a polpa da
bunda, onde soterro a ponta dos dedos, sentindo o músculo durinho
e esculpido. Sorrio contra a sua boca, alisando seu traseiro,
brincando com ela enquanto sua ganância tenta me comandar.
— Estava com tanta saudade assim?
— Cala a porra da boca, Ashton.
Ela se distancia para puxar minha camiseta pela bainha e
quando consegue, faz o mesmo com a sua. Tenho menos de um
minuto para assistir ao ponto duro dos mamilos balançar assim que
o tecido passa por ele. A pressa com que volta para mim, atacando
a minha boca e fincando as unhas na pele da minha nuca, arranca
de mim um suspiro profundo de dor, mas não é ruim. Porra, é bom
pra caralho sentir o desespero latente dentro dela despontar, ficar
tão exposto que, se não estivesse com tesão, estaria envergonhada.
— Você é a razão dos meus problemas. Você representa tudo
de ruim que tenho na vida. — A voz ondula sob a raiva e a
excitação, mas estou ocupado demais para me interessar.
Todo mundo em algum momento está me odiando ou com
raiva de mim. É o meu normal.
Num minuto, estou com a boca na dela, no outro, puxando-a
para cima pela volta da bunda. Seus tornozelos plantando em minha
lombar e os braços cercando meu pescoço para se sustentar.
Caminho com ela pela sala, topando com a poltrona, e a coloco
sentada nela.
Ajoelho-me diante dela, entreabrindo as pernas para encaixar
meu tronco. Desabotoo a calça e desço o zíper, quando escorrego o
jeans por suas coxas, vejo que está sem calcinha. A boceta
depilada cintilando na parte rosada no meio de suas coxas por
causa da umidade escorrendo dela.
— Me diz uma coisa. — Agarro os braços da poltrona,
encarando-a com intimidação. — Toda vez que você o encontra, não
está vestindo nenhuma maldita peça íntima. Você faz de propósito
ou…?
— Se não estou vestindo roupas íntimas, significa que quero
poupar tempo.
Irritação e apetite combinam dentro de mim com seu
argumento. Brincar de fazer ciúme nela não é tão divertido quando
ela está tentando fazer o mesmo comigo. Contorno os dedos na
carne de suas coxas, adicionando pressão na ponta. Ela estende a
coluna para frente, misto de dor e malícia esculpindo suas feições.
— Você não precisa poupar seu tempo porque não vai gastar
nem um segundo com ele.
Quando tenta provocar, uma profusão de emoções usurpa
meus sentidos. Não penso em mais nada. Perco realmente o
controle. Foi assim em Paris. Está sendo assim outra vez. Preciso
ficar me lembrando de que tudo é um jogo, o que eventualmente
não seria necessário porque estou acostumado com o simples, o
casual, nada de relacionamentos, muito menos sentimentalismo.
Mas com Gravity, é intenso e desproporcional.
Reparo na gravata vermelha de Liam no encosto da cadeira.
Ele a deixou cair no meio da nossa briga e não tenho intenção de
me encontrar com ele outra vez para devolvê-la, então planejava
jogá-la fora. Mas tenho uma ideia muito melhor.
Levanto do chão, indo em sentido à cadeira para pegar o
acessório. Dou várias voltas até que o comprimento dela esteja todo
ao redor da minha mão. O vermelho-vivo fazendo volume no dorso e
na palma. Volto para ela, o compasso respiratório mais denso a
cada segundo. Seus olhos passeiam por mim, tentando detectar
alguma coisa, e, quando param no pano envolvendo minha mão,
Gravity entrecerra os cílios espessos, ar fluindo por uma brecha
através dos lábios.
— Vire-se de costas — imponho, ilustrando quando faço um
círculo com o indicador no ar.
— O que vai fazer?
— Não importa porque, no fim — empurro o tronco para frente,
pairando sobre ela enquanto amparo o peso do corpo nas
extremidades do móvel, — você gosta.
Ela aperta um lábio no outro, a garganta se movendo a seco
quando tenta engolir. O ar morno que exala pelas narinas atingindo
meu rosto.
Gravity não discute mais, escorrega do assento, parando
quando os joelhos estão apoiados no chão, e se vira.
— Mãos nas costas — exijo, me abaixando para ficar atrás
dela. — Bem boazinha. — Fungo em sua nuca, inalando as notas
frescas do perfume. — Da última vez, você quem me amarrou. Nada
mais justo — argumento, meu hálito na lateral de seu pescoço
gerando tremor.
Obedece, os pulsos ficando cruzados na altura da lombar.
Solto a gravata da minha mão, fechando-a nas dela. Consigo dar
três voltas para amarrá-la e dou um puxão de propósito, seu corpo
vacilando quando testo se está bem presa.
Sorrio para mim mesmo, retirando as mechas marrons das
suas costas e jogando por cima do ombro.
Beijo a vértebra cervical à vista, notando que Gravity perdeu
peso depois que voltou da Itália. Já tinha desconfiado por causa das
bochechas encovadas e o rosto ter se afinado nos últimos anos,
mas nunca fiz nenhum comentário com medo de ofendê-la ou por
estar exagerando por conhecer a doença de Nicola e saber o que
fez com o corpo dela ao longo dos anos enfrentando a bulimia.
Arrasto o nariz por toda a extensão da pele de seus ombros,
beijando o ponto certo e ganhando uma resposta positiva para cada
vez que meus lábios a roçam. Passeio com as mãos por seu corpo,
conhecendo e decorando cada curva, sentindo o peito ser
esmagado pela sensação de tê-la tão perto.
Quero despertar um sentimento ainda mais forte que amor.
Julgam que esse é o mais intenso que se pode sentir por outra
pessoa, mas, na minha opinião, tem outras emoções mais
poderosas que te tornam inesquecíveis para alguém.
O amor é uma consequência. Obsessão, por outro lado, te
alucina. Mexe com a sua cabeça, seu corpo, domina sua alma, suas
decisões e brinda a sua loucura quando você menos percebe. Esse
é o tipo de sentimento que quero despertar nela. A obsessão. Quero
que fique inquieta quando pensar em mim. Serei o único tomando
ciência de cada um de seus desejos. Nenhum outro visitará seus
sonhos além de mim. Seu corpo não se curvará para o apetite
lascivo, a não ser que esteja comigo.
Percorro as mãos até sua cintura delgada, findando os dedos
em sua carne para virá-la de frente para mim. Gravity acompanha
meu comando com lentidão. No momento em que está virada de
frente, o peito discorrendo em uma respiração lépida, mechas de
cabelo grudam no suor em sua testa. Minhas mãos transitam por
seu corpo, sentindo, desejando, possuindo.
Espalmo um seio e o aperto, a forma volumosa tremula na
hora em que o solto. Gravity deixa um gemido escapar, uma
corrente densa e audível de ar ressoando entre nós.
Fecho o indicador e o polegar na ponta de um dos seus
mamilos, esfregando para frente e para trás, sentindo-o aquecer no
meio dos dedos.
— Você é tão gostosa — sussurro, abaixando o corpo para
chupar o peito túrgido, ordenhando o bico dentro da boca. — Quer
que eu pare? — Contorno a aréola rosada com a língua.
— Se você parar, eu te mato.
Rio sob a ameaça.
Viu, Liam, seu maldito? Não a toco, a menos que sua boca me
diga o contrário, não vou negar a ela nada que meu pau esteja louco
para dar.
Gravity mexe os braços, querendo se soltar das amarras. O
sorriso sendo abafado pela sua teta enchendo minha boca. Elevo os
olhos para vê-la através das pestanas, a cabeça pendendo para trás
sob a influência do tesão escalando o corpo. Sei porque está
acontecendo o mesmo comigo. Paixão e obsessão me devastando
de dentro para fora.
— Você ainda quer dar pra ele? — Troco o foco, indo para
outro peito, envolvendo-o e mordiscando.
— Não sei do que está falando.
Ela arfa, sentando-se sobre os calcanhares. Suor escorre por
sua clavícula e colo, a camada cristalina de água cobre sua pele.
— Não sabe, é?
Minha mão vaga pelo vale separando seus seios, deslizando
sobre a película de suor.
— Acho que você sabe, sim. Me diz o que quer que eu faça.
Me diz o que merece receber por tentar me trair.
— Não trai você. Não somos a porra de um casal para me
acusar de uma coisa assim! — brada, mas mordisca o lábio inferior
quando aperto os dedos ao redor de um mamilo.
Desloco os lábios, respirando o aroma quente emanando da
sua pele quando arrasto a ponta do nariz por ela. Subo rumo ao seu
colo, minha língua tecendo o caminho, e ganho a objeção do seu
corpo, vibrando sob o mormaço por onde minha boca passa.
Encaixo os lábios sobre a garganta, engolindo a bola de saliva
quando sorvo sua pele com a boca.
— Nosso relacionamento pode ser uma fachada, mas o que
estamos fazendo agora não é. Seu corpo reagindo a mim não é.
Enfio a mão entre as coxas, calor embalando meus dedos na
hora em que escorrego por ela.
— Você estar molhada para mim também não é uma mentira.
Se quer trair seu corpo dessa maneira, tente pelo menos fingir que
não está morrendo de vontade de me dar um pedaço dessa boceta.
Afasto a mão, levando os dedos embebidos com seu néctar
para seus lábios. Contorno-os com eles, impondo que ela deve
lamber.
Gravity separa a boca, e os mergulho dentro dela. Ela os
chupa devagar, suas bochechas coradas e os olhos afogueados de
volúpia me fitando à medida em que faço círculos precisos no
interior de sua boca. Puxo os dedos para fora, a beijando em
seguida, compartilhando seu gosto doce como um aperitivo.
Empunho seus cabelos rente a raiz, o solavanco a obrigando a
abrir a boca novamente e se afastar do meu beijo. Ela mordisca os
lábios, a expressão pervertida misturada ao carmesim de sua pele
me coloca fora de eixo.
Mulher desgraçada. Um maldito furacão se divertindo ao
provocar a destruição.
— Você toma anticoncepcional? — indago ao agarrar sua
mandíbula com a outra mão.
— Tomo, por quê? — Ela vinca a testa, os olhos assumindo
um brilho de expectativa que me desconcerta.
— Porque pretendo te comer sem preservativo — rosno,
sugando seus lábios, beijando e mordendo.
— Nunca transei com ninguém sem camisinha antes —
informa-me, não sei se para garantir que não tem nenhum risco de
ter uma IST, ou, sei lá, para me dizer que gostaria de fazer isso
comigo.
— Ótimo, porque eu também não.
Então, sem aviso prévio, a debruço no assento da poltrona.
Empurro sua cabeça com a mão, os fios do seu cabelo ainda
envolvendo meu punho.
— Você perturba o meu juízo — ranjo os dentes embaixo de
sua orelha, meu peito vergando sobre suas costas enquanto
amasso a lateral de sua bochecha no estofado.
Decorro a mão por uma nádega macia e lisa, a pele se
arrepiando ante o carinho que faço. No entanto, a cadência de sua
respiração atinge uma potência errática porque ela sabe o que vem
a seguir.
— Você pode me dizer o que quer ou posso descobrir sozinho
— cochicho, fios do seu cabelo entrando na minha boca. —
Aproveite enquanto ainda estou sendo atencioso. Me diga, você
quer que eu bata nessa bunda?
Belisco a carne, ela sobressalta o tronco, e rio em contato com
a bochecha avermelhada.
— Ou você prefere que eu foda esse rabo? — Imerjo o dedo
em sua abertura de trás, sentindo-a contrair quando tento penetrar o
polegar. — Hum, quem te fodeu aqui atrás? Não é tão apertado
quanto imaginei que seria.
— Me bate. Eu mereço umas palmadas — grunhe, as mãos se
movendo inquietas para se soltar da gravata.
— Fugiu da pergunta. Foi alguém especial? — Tento fugir do
meu lado possessivo, mas ele já engalfinhou suas garras em mim
quando se trata de Vity. Não consigo evitar. Preciso saber sobre
cada um que já a tocou.
— Ashton, estou pingando de tanta vontade de ser fodida,
porra, mete fundo dentro de mim!
Contudo, não dou ouvidos a ela. Meto o polegar a seco em seu
cu, ciúme e obsessão roubando minha estabilidade emocional e
mental.
— Ai, meu Deus… — bufa contra o assento, abafando a
respiração intervalada. — De novo! — ordena, ríspida, a voz
esmagando na garganta ante a agonia.
Enfio o dedo mais fundo, quase no talo da mão, seu rabo me
prendendo ali quando começo a movê-lo circularmente. Gotículas
de suor brotam em minha testa e pingam em sua lombar. Tiro o
polegar alguns centímetros e volto com violência.
— Quem foi que te fodeu aqui, hein? — repito a pergunta,
embora tenha certeza de que não vai me contar. — Um ex-
namorado? Quem, Gravity? — insisto, bombeando o dedo para
dentro de sua bunda com força e domínio.
Sua coluna arqueia em consequência das investidas secas
ficando mais grosseiras a cada minuto. Quando percebo que está
gostando mais do que deveria, paro, roubando dela a oportunidade
de ter um orgasmo assim, tão fácil. Ela gosta de ser fodida na
bunda, afinal.
Então, imponho distância entre minha mão e sua bunda, em
seguida, a palmada estala no ar, se unindo ao uivo forte varrendo o
que a impedia de gemer de sua garganta. Reinicio sua punição, seu
corpo indo para frente, e eu o puxando de volta, para seguir com os
tapas. Escorrego a mão no interior de suas pernas, sua excitação
escorrendo como uma cachoeira por entre as coxas.
— Porra, você gosta quando estou batendo nessa bundinha?
— Espalho a umidade com as mãos, o clitóris rígido e inchado.
— Gosto — ofega. — Puta que pariu, gosto muito —
resmunga, empinando mais a bunda. — Por que eu gosto tanto
quando é você quem faz?
Ela consegue me tirar da concentração. Observo seu corpo
curvado, minha mão segurando sua cabeça contra a poltrona
enquanto a outra se prepara para mais uma palmada que a deixará
vermelha e ardida, porém, é como meu coração fica trepidando
diante da sua confissão que faz a bile subir minha garganta. Dou
mais uma palmada, a queixa aguda vem seguida de um rangido
profundo de prazer.
— Mais uma…
Interrompo com outro tapa, minha palma começando a cintilar
com o flagelo. Estou duro feito um aço maciço, ansioso para entrar
nela e rompê-la. Paro quando a vejo contrair as bochechas da
bunda, a vermelhidão agora combinando com as maçãs coradas do
seu rosto.
Curvo o corpo sobre o dela, percorrendo de sua lombar até a
bunda com beijos quentes e molhados.
Agarro as laterais de suas coxas e viro o corpo, me deitando
no chão atrás dela. Seguro seus quadris, guiando-a para se sentar
em minha boca. Lambo o fluido viscoso gotejando de dentro dela
sem deixar nenhum filete de excitação de fora, bebendo tudo.
Prendo seu botão firme entre os dentes, sentindo a carne
tremer na minha língua. Invado-a esfomeado, minha boca a
cobrindo inteira enquanto a penetro fundo com a língua, bombeando
calor e o tesão se avolumando em minha virilha, minhas bolas
doloridas querendo desesperadamente ejacular.
Ergo sua bunda somente o suficiente para conseguir
desabotoar minha calça, tirar os sapatos e descer a cueca.
Contorno meu pau roliço e duro com a mão, fechando-o por inteiro
com a palma e os dedos. Faço movimentos curtos de vem e vai,
minha pele deslizando facilmente no meio da mão.
— Vem cá. Cavalga em mim, delícia.
Empunho seu quadril, transportando seu corpo para trás. Ela
abre as pernas para se encaixar sobre meu corpo, as mãos ainda
atadas para trás. Seguro-o na base, posicionando a ponta brilhante
em sua fenda. Gravity está tão lubrificada que escorrego para dentro
dela com facilidade. Seus músculos internos se esticando para se
ajustar a mim. Ela começa a balançar o quadril, minhas mãos
pousadas nela para guiá-la a fazer direito.
Olho para a sua boceta rosada ingerindo a extensão do meu
pau, nenhum centímetro ficando de fora.
— Isso é tão bom, puta que pariu... É bom demais. — Ela
tomba a cabeça para trás, as mãos presas e o tronco se movendo
para frente e para trás. — É como se você estivesse me rasgando
— bufa a admissão.
Lambo a boca fazendo o contorno, mordiscando em seguida
para conter a vontade de meter com mais força. Porém estou
curtindo muito o movimento lento de seus quadris, como ela está
saboreando os minutos da sua boceta me tomando como um torno.
Ela é minha e eu sou dela.
Levo a mão em direção ao seu rosto, espalmando suas
bochecha, e deslizo o polegar pelo lábio inferior de sua boca,
sentindo a aspereza de estar seca na carne. As paredes internas
contraindo ao redor do meu pau, apertando-me tão forte que não
resisto ao rugido alto. Ele reverbera pelo apartamento,
provavelmente rompendo através das paredes.
— Por que você pegou aquele maldito telefone? — Ela levanta
brevemente o quadril, me tirando dela.
— Não peguei, querida — murmuro, levando os dedos para
trás de sua nuca e apertando quando sua bunda desce com
violência, me engolindo de novo até o caule. — Nem sabia que
aquela porcaria estava lá.
— Não acredito em você. — Seu abdômen cria um vácuo
quando ela arrasta a bunda para trás e volta para a frente,
alternando entre se mover e quicar. Porra de mulher gostosa.
— Caralho, por que não? Estou dizendo a verdade. Não
peguei a droga do número!
Puxo seu pescoço em direção à minha boca, calando-a com
um beijo intenso. Ela morde meu lábio inferior e o gosto de cobre
cresce em minha língua com o corte superficial.
— Estou dizendo a verdade — repito, colando minha testa na
dela, nossos corpos se movendo em uma sincronia incrível para ser
interrompida por algo tão inútil. — Não seja ciumenta.
— Eu sou, sim, Ashton — assume, fisgando meu lábio entre os
dentes novamente. — Se tocá-la, ou se você sequer pensar nisso,
juro por Deus, vai se arrepender do dia em que tomou essa decisão.
Rio contra sua boca, devorando-a outra vez. Cerco sua cintura
com os braços, girando seu corpo para voltar a ficar debruçada na
poltrona.
Deito sobre ela, encaixando meu pau novamente e
arremetendo fundo e forte, ela grita, e o som ricocheteia pela sala.
Meu pau incha com os impulsos para o centro dela, mas tento me
segurar.
— Goza primeiro, minha encrenca ciumentinha — provoco,
afastando a cortina de cabelos da lateral de seu rosto para vê-la
com a boca aberta, arfando e grunhindo.
Bombeio com rigidez, a atingindo no ponto frágil, as paredes
internas da sua boceta contraindo ao redor do meu pau como um
torniquete ao gozar.
Mantenho o ritmo constante, sentindo minhas bolas ficarem
mais pesadas, o saco batendo ferozmente contra sua pélvis e o
estalo de pele contra pele quicando, repercutindo à nossa volta.
Meu pau incha como um balão, as veias proeminentes se
aquecendo perante o orgasmo vigoroso. Planto meu sêmen dentro
dela, escorrendo de sua boceta enquanto tremores possuem meu
corpo, e desabo sobre suas costas, exaustão arrebatando minha
consciência e cada fio do meu corpo.
Recupero o fôlego, levando a mão para desfazer o nó apertado
em seus pulsos. Quando a solto, saio de cima dela, sentando-me
embaixo, no tapete felpudo. Gravity desaba ao meu lado,
massageando com as mãos os pulsos levemente marcados com a
tira da gravata e o arco vermelho criando uma fissura na pele.
Puxo suas mãos para mim, o ritmo respiratório ainda tentando
encontrar estabilidade. Começo a massagear a região rúbea e
escoriada com os dedos.
— Tenho uma pomada lá em cima, se quiser…
— Tudo bem — interrompe, voltando com as mãos para seu
colo. — Não precisa. Amanhã compro uma pomada.
— Gravity, tenho uma pomada que você pode usar. — Vinco a
testa para a sua reação.
— Não seja legal comigo — decreta, colocando os olhos em
mim. O peito expandindo com a inspiração carregada. Meus olhos
recaindo nas tetas se movendo junto com o tórax. — É só sexo.
Não precisa se preocupar com o meu bem-estar.
— É só sexo, Gravity, não estou fazendo nada demais. —
Semicerro as pestanas, a ruga entre as sobrancelhas se
aprofundando mais. — Só tentando não ser um completo babaca.
— Mas você é um completo babaca. Quando age diferente, me
deixa confusa, e eu não gosto.
Ela se levanta, agarrando suas roupas pelo caminho. Ainda
quero falar sobre Amber porque pareceu que ela deu muito mais
importância para um simples número de telefone que eu sequer
pedi. Contudo, meu orgulho me mantém paralisado. Se for atrás
dela, vai parecer que me importo.
E eu não me importo, porra. Quero mais que se foda.
Então, por que meu coração parece ter diminuído de tamanho
vendo-a se distanciar?
“Olhe nos meus olhos
Quando estiver apaixonado por mim”
ROUND AND ROUND – ANGELICCA

O frescor dos sais de banho infiltra o ar e o vapor da água


quente gruda em minha pele. Minhas bochechas continuam
coradas, os pulsos e a bunda com um leve ardor por causa do
aperto da gravata e as palmadas, mas o latejar impertinente no meio
das minhas pernas e a umidade dilatada não são nem um pouco
desconfortáveis.
É como se nunca tivesse o bastante dele. Não importa o que
Ashton faça com meu corpo ou quanto tempo passe, nunca sou
inteiramente saciada. Isso está me enlouquecendo. Acho que nunca
tive tanto ódio e tesão pulsando ao mesmo tempo, enjaulados,
mudando de dócil para selvagem. Quando houver qualquer brecha
para a fuga desse apetite, vou escapar e atacá-lo.
Sinto minha mente emaranhada nos pensamentos, os sentidos
entorpecendo com a lembrança do seu toque. Perco o controle. Meu
corpo se torna manipulável quando é Ashton quem está com as
mãos nele. A intensidade com que esses sentimentos vêm sendo
explorados, estão, com certeza, me deixando desorientada.
Tenho que pensar no trabalho, no meu vestido de noiva —
ainda que seja um casamento de fachada, a equipe por trás disso
quer um evento nível Ashton Baker —, e ainda lidar com a reação
das minhas amigas quando descobrirem que vou me casar. E seus
pais, meu consciente me lembra. A última vez que os vi foi no
casamento de Dannya.
Nós nos falamos pouco, mantivemos as aparências porque é
assim que mamãe e papai estão acostumados a lidar com nossa
relação intensa. Já tem anos que sequer recebo uma ligação deles.
Não que eu me importe, com o passar do tempo, aprendi e aceitei
que mereço esse tratamento.
Existem coisas mais importantes que o meu tesão reprimido
para me preocupar, mas não consigo pensar em outra coisa que
não seja a próxima vez que vou estar com ele.
Cabeça no lugar, Gravity. A última vez que confiou nele, teve
seu coração dilacerado. Ele é um traidor. Não confiamos em
traidores.
Limpo a névoa tapando meu reflexo no espelho. O ponto alto
das bochechas querendo voltar ao tom pálido.
Estendo a mão para alcançar o celular do outro lado da pia e
envio uma mensagem para Liam. A garganta se fecha para a
decisão impulsiva de entrar em contato com ele, mas a pulsação
intensa entre as pernas se torna mais vívida. Convenhamos que ver
Ashton no estopim é o que mais me diverte e arrisco toda maldita
vez porque sei como nós terminamos.
Nossos corpos emaranhados. Minhas mãos atadas. Recebo
uma onda de prazer mordaz. A mente se recordando de como é
bom o sentimento de ser desejada e ter o poder de atormentar o
equilíbrio de outra pessoa. Ter esse tipo de controle é algo que
perdi. Conseguir viver isso de novo me traz um entusiasmo
fervoroso e aí percebo que sou recompensada.
Gravity:
Oi, chegou bem em casa?
Não deveria estar mandando mensagem às duas da manhã,
mas duvido que consiga pegar no sono, e também estou
preocupada que ele decida entrar com uma ação contra Ashton por
tê-lo agredido. E principalmente acabe falando demais sobre o
contrato. Agora que estou mais calma, não sei se contar ao Liam
sobre tudo foi realmente uma boa ideia.
Devolvo o telefone para a bancada, desfazendo o nó do
roupão. Deixo-o pendurado no gancho da parede, próximo ao boxe
de vidro da ducha, e submerjo na banheira, na altura dos mamilos,
os bicos endurecendo ao entrarem em contato com a água quente.
Respiro com dificuldade, a água arrebatando no meio das
pernas e meu clitóris inchando à medida que divago de volta para a
sala, menos de meia hora atrás.
Ganhei o melhor orgasmo da minha vida. Como posso me
orgulhar dessa merda? Como ele consegue me fazer sentir tão bem
como naquele momento em que amarra as minhas mãos e me
proporciona lembranças que sei que serão difíceis de deixar para
trás quando acabar? Isso me faz odiá-lo ainda mais.
Derrubo a cabeça para trás, alisando um mamilo, beliscando e
torcendo o bico duro como uma pinça dos dedos. Ouço o telefone
vibrar atrás de mim, sobre a bancada, mas a compreensão
escurece, e remexo a bunda na banheira, esfregando contra o
material do fundo.
A sensibilidade me deixa hiperconsciente de como pressiono
uma coxa na outra, o atrito da pele fazendo a virilha formigar.
Céus, eu acabei de gozar, mas quero de novo. Preciso disso
outra vez. Meu corpo é uma bomba atômica com uma explosão
catastrófica se aproximando.
Subo as pernas, apoiando-as na extremidade. Levanto o
quadril brevemente, planando na superfície, a água batendo de
modo suave na minha bunda, e me recordo de seu dedo me abrindo
por trás.
Sufoco o rangido, com medo de ser ouvida. Não porque tenho
vergonha, mas não quero que ele pense que domina meus sentidos
quando não estamos perto um do outro. Mesmo que seja verdade,
não quero ser a responsável por inflar seu ego mais do que já é.
Trajeto através das duas montanhas que formam meus seios,
escorregando em direção a boceta. Abraço-a com a mão,
beliscando o topo onde se concentra meu prazer, sentindo-o dilatar
na ponta dos dedos enquanto movo em círculos, a fricção aquece
minha carne e bombeia sangue ali.
Reteso o pescoço para o lado, um sopro morno expandindo-se
contra minha pele. Mergulho um dedo para dentro, os músculos
internos envolvendo e esquentando em torno dele. Ecoo um suspiro,
rompendo fundo a garganta ao sentir a pressão da traqueia se
fechar.
Mordisco o lábio inferior quando uma boca atrevida cerca o
flanco do meu pescoço. Esgueiro a mão para cima, rumo ao corpo
curvado acima de mim, o cabelo fino e liso. O hálito mentolado
chegando até meu nariz e impregnando. Estou com tanto tesão que
minha imaginação é quase realista.
— É tão gostoso… — gemo, soterrando os dentes no lábio
inferior. — Você é tão gostoso — assinalo, enrolando os fios em
meus dedos e o puxando contra minha garganta, suas presas
ferroando ao morder a carne.
— Se divertindo sem mim, encrenca? — A tonalidade profunda
ressoa em minha mente.
Meu quadril cede, a água da banheira transborda com a
resposta violenta, e giro de pressa, me afastando para a outra
borda. Seu tronco arcado para frente, em seu rosto um sorriso
maligno e um olhar cobiçoso escrutinando meu corpo recolhido.
Cubro os seios com o braço, a espuma dos sais é o suficiente para
ocultar o resto.
— O que é que você está fazendo aqui?! — berro, um misto de
vergonha e fúria deixando minha voz transtornada.
— Vim deixar a pomada — diz, a fisionomia alegre se
iluminando mais ao descobrir que estou envergonhada por ter sido
pega.
Minha bochechas estão superaquecidas agora. Fecho os
olhos, esquecendo de esconder os seios para cobrir o rosto.
— Eu bati, mas parece que estava concentrada demais para
ouvir. — Ele suspira, corrigindo a postura curvada. — Estava
pensando em mim, é? — enuncia, sem deixar de camuflar a
entonação pretensiosa. Jesus Cristo, não estou acreditando nessa
porcaria que acabou de acontecer. — Quer um segundo round,
encrenca? — Gargalha, fixando os olhos tenazes em mim. — Se
você está corada, não precisa admitir.
— Cala a boca e cai fora. Eu te falei que não precisava da
maldita pomada! — exclamo, ignorando suas últimas falas como se
isso fosse reduzir o impacto da sua presença.
Considero sair da banheira, mas para alcançar a toalha,
preciso passar por ele e duvido que consiga chegar nela com
Ashton no caminho.
— Não vim só por causa dela. — Ri abafado, começando a
soltar o botão da calça.
— Espera, o que você está fazendo? Mandei sair!
— Relaxa, não vou mover um dedo para te tocar. A não ser
que você queira — acrescenta, com malícia.
Ele retira a calça e a cueca, sua ereção ganhando liberdade
quando quica para fora. Sorvo a bola de saliva travada na garganta,
observando-o se sentar dentro da banheira, de frente para mim.
Seus pés roçam o exterior das coxas ao esticar as pernas ao
lado das minhas. Meu ritmo respiratório acentua e puxo um punhado
de espuma contra o colo, garantindo que ele não veja nada. Não
que seja um problema, ele me viu nua outras vezes, mas, de
alguma forma, me cobrir me faz sentir menos constrangida.
— O que você quer?
— Conversar — responde, limpando a espuma pairando sobre
a água.
— A gente trepa, não conversa. — Pendo a cabeça para a
esquerda, analisando suas feições contorcerem. — Ou você está se
apaixonando por mim? — Rio, porque não tem a menor chance de
acontecer, ainda assim, soa como piada e não resisto.
— Quero falar da tal Amber. — Ele me corta, a voz profunda
sumindo com a diversão que detinha anteriormente. — Quem é ela
para você?
— Não sei do que está falando. — Brinco com a espuma assim
como ele, evitando direcionar os olhos para os seus.
É engraçado como Ashton me fez sentir em pouco tempo, que
Amber não pode me atingir, mesmo que não saiba da história toda
ou de como aquela maldita acabou comigo e minha confiança
quando estava em Milão. Ela voltou para me assombrar. Voltou para
brincar com minha sanidade e vai usá-lo contra mim.
Quando encontrei aquele papel na minha cama, por um breve
momento, perdi a consciência de tudo. Dois traumas voltaram:
Ashton e Amber. As duas pessoas que mais conseguiram me
marcar e mexer comigo depois de Neil. Foi como unir o que me
envenena e beber até não sobrar nenhuma gota no frasco. Senti
como se Amber estivesse no controle de novo e Ashton, traindo
minha confiança.
— Você é ciumenta — ri, os dedos do pé acariciando a lateral
do meu quadril —, mas não me convence com essa história. Deu
muito mais importância a ela do que à Nicola ou Sadie. E eu nunca
havia visto Amber na minha vida antes de hoje de manhã. Então,
estou num impasse tentando entender por que fui punido.
— Não puni você — defendo-me, franzindo a testa para a
acusação.
— Você puniu quando o convidou.
As narinas expandem, não sei se pela raiva ou impaciência,
entretanto, não faz diferença.
— Tenho certeza de que meu fraco por você não é mais um
segredo. — Ele estende os braços, apoiando os cotovelos na
beirada da banheira. Água e sabão respingam dos cotovelos
dobrados. — Ela é uma ex-namorada ou o quê? Fiquei um tempo
pensando lá embaixo, me decidindo se vinha ou não. Acontece que
fiquei um pouco ansioso de pensar que poderia ter feito tudo isso
porque está com ciúme dela, não de mim. E não gosto de te dividir,
caso não tenha ficado esclarecido.
Embora pensar em Amber cause embaraço no estômago,
Ashton consegue me fazer rir.
— É cômico que você realmente acredite que tem qualquer
poder sobre mim.
— Quer me convencer de que é o contrário?
Seus dedos afundam na água outra vez, as pontas dedilhando
meus calcanhares e, em uma fração de segundo, estão se curvando
ao redor deles, fechando em punhos.
Com um safanão rápido, Ashton desloca meu corpo, minha
bunda rastejando na base da banheira. As ondas agressivas da
água ricocheteando e entornando como cascata pelas bordas.
Ofego um gemido na hora em que sinto seu pau esfregar
minha entrada. Amparo-me em seus ombros, empenando os dedos
para dentro de sua pele. Ele espalma uma mão no meio das minhas
costas e a outra aperta minha bunda.
O ar frio atinge meus mamilos quando saem da água ao
levantar brevemente o corpo sobre o dele. Cravo os dedos em sua
nuca, serpenteando pela raiz do cabelo. Meus lábios pairam a
centímetros da abertura de sua boca, o calor morno movendo-se
através da fissura.
Ashton escorrega a mão da lombar, firmando-a na curva do
meu joelho, onde me impulsiona para ajustar as pernas na lateral do
seu tronco.
Conecto meus olhos aos dele, a atenção exagerada cravada
em mim. Esfrego o lábio um no outro, experimentando a textura
áspera das rachaduras, e empunho sua cabeça, afastando-o
ligeiramente de mim. Ele separa a boca, um sorriso depravado
fazendo uma curva e acentuando as covinhas em seu cenho. Minha
mandíbula enrijece diante da provocação silenciosa.
— Você tem meu corpo, meus gemidos e os orgasmos, assim
como tenho os seus para mim. Mas compartilhar segredos, te dar
intimidade, é algo que jamais irá conseguir.
— Sexo é intimidade. — Ele declara, espetando a carne da
minha coxa com as unhas.
— Existe muito mais sobre mim, e você nunca terá acesso.
Liam, sim — alfineto, de repente lembrando-me do porquê nossa
briga começou, afinal.
Não importa que Ashton tenha dito que não conhece Amber,
não consigo acreditar em qualquer maldita palavra que saia da boca
dele. Ele é um mentiroso. Um traidor desgraçado. Sempre que me
recordo que quase confiei a ele meu coração, sou contemplada com
uma onda nauseante de arrependimento.
Ele é bom trepando. Nós nunca seremos mais do que duas
pessoas que adoram pra caralho transar. Estamos abafando nossos
problemas com sexo. E quando for ele quem estiver apaixonado por
mim, vou jogá-lo para escanteio. Por vingança. Porque esse é o
meu lado que floresceu quando sangrei.
— Sai daqui, cansei de você.
Espalmo as mãos em seu peito, empurrando com a raiva
fervilhando dentro de mim ao pensar nele e Amber juntos.
Consigo distância dele, mas não dura muito tempo pois Ashton
agarra um punhado do meu cabelo por trás, me mantendo em seu
agarre. Bufo um rosnado quando os dentes rangem. Sinto o ar
sufocar na garganta quando tento inalar para os pulmões.
— Cada dia que passo perto de você, tenho certeza de que a
sua existência é uma afronta à minha sanidade.
Ele arfa no momento em que se apropria da minha boca,
consumindo meus pensamentos, derrubando a resistência criada
como uma maneira de me proteger dele.
Seus braços enlaçam ao redor da minha cintura, esmagando
meus seios contra a parede de músculos. Volto a segurar os fios de
sua cabeça, próximo à raiz, puxando e soltando, mordendo e
sentindo o calor espalhar na pele ao descer o beijo para o colo,
capaz de inflamar cada terminação nervosa do meu corpo.
Envergo a cabeça para trás, espaceando mais para ele
conseguir me explorar com a língua. Suas mãos cursam meu corpo
como uma estrada magistral, os dedos apertando onde sabe que
vou reagir.
Um amálgama de luxúria e ira desponta da base do meu
ventre, e não sei refrear nenhuma das duas.
— Não consigo ficar mais um minuto longe de você, porra —
ofega um rosnado, as presas enterrando na carne do meu ombro
quando ele vira meu quadril, me empurrando contra a outra ponta
da banheira.
Uso as mãos para me sustentar na borda. Meus dedos se
fechando ao redor do material, metade do corpo saindo da água. Ele
se curva sobre mim, aplicando uma trilha de beijos afetuosos que se
intercalam com mordidas dolorosas que fazem minha coluna
arquear.
— Acho que estou dependente — choraminga, prendendo o
lóbulo da minha orelha entre os dentes e puxando até que um
resmungo seco vare minha garganta. — Você não pode me afastar,
Gravity. Não pode me pedir pra cair fora outra vez.
Não consigo entender se está falando de agora ou de anos
atrás, mas não importa porque a única coisa que minha mente
consegue detectar é seu pau grosso abrindo espaço entre minhas
nádegas.
Puxo uma golfada de ar pela boca conforme se desliza para
dentro, me estendendo de um jeito tão bom que sinto as
articulações fraquejarem.
Agarro-me firme à borda para sustentar o peso do seu corpo
sobre o meu. Ele aprofunda a si mesmo no meu rabo, sentindo o
calor e o ardor escalar minha bunda ante a estocada. Por sorte, a
água e o sabão tornam a penetração mais branda, e não é a minha
primeira vez no anal, porém, é a primeira que sinto como se fosse
ser dilacerada.
— Fala comigo — ordena.
— O que quer que eu diga?! — esbravejo, a vontade de
mandá-lo meter logo o que meu corpo tanto suplica vem à tona.
— Que se sente assim, que seu corpo está tão viciado no que
fazemos quanto o meu. Não posso ser o único se arruinando aqui,
Gravity.
— Sim, você é — ralho, cerrando os olhos por cima dos
ombros.
— Não se eu puder te levar comigo — explode, agarrando
meus quadris para se empurrar mais para dentro.
Ashton está indo devagar e ponderado, o que é de
surpreender, mas meu corpo precisa que as coisas funcionem
brutais e escassas de fragilidade. Minha mente necessita de sexo
intenso e agressivo para vencer os demônios que assombram a
alma.
É por isso que tenho gostado tanto dele porque Ashton
alcança zonas onde não consigo ir. Tenho um lado medroso,
embora muitos pensem o contrário. Não sou sempre determinada;
na verdade, sou mais insegura do que corajosa. Esse é um aspecto
que prefiro manter escondido porque o que não conhecem, não
podem usar contra mim.
Sinto o puxão no cabelo, obrigando-me a empinar mais a
bunda para recebê-lo. Ele empurra o quadril, começando a se
mover até que eu o tenha engolido ao talo. Separo os lábios,
soprando o ar de forma enérgica, resfolegando atrás de uma
respiração irregular.
— Mesmo que você já tenha dado essa bunda, posso te sentir
contraindo. O cara que te fodeu aqui atrás não devia ser muito bom
nisso.
Bombeia duro e rápido, e meus joelhos escorregam no fundo
da banheira. Ashton prende os dedos no osso do quadril, trazendo
meu tronco de volta quando sou lançada para frente com o impulso
violento, metendo em um ritmo curto e acelerado, tomando-me com
seu volume rígido.
Cerro os dentes em um composto de dor lancinante e
excitação, o lubrificante natural escorrendo do meio das minhas
coxas e trazendo uma sensação gostosa com o viço. Impulso a
bunda para trás, o impelindo a cravar mais fundo.
— Porra… — xingo quando ele atende ao meu estímulo,
rosnando e ofegando ao avultar a cadência.
— Sua bunda é uma delícia, caralho, tão apertada e faminta —
bafora, começando a ficar sem fôlego entre as investidas.
Sua voz rouca ressoa, ele se afasta para então me penetrar
outra vez. Atordoo, sentindo minha bunda o prender. Ele sustenta a
estocada e violentamente, até que seu corpo ondula com os
primeiros sinais do orgasmo, o ritmo respiratório decaindo e a
pressão do seu pau dentro de mim aumenta com os golpes
potentes.
Abro mais as pernas, a entrada de trás se alargando e
fechando quando aperto as nádegas nele. Ele sufoca o grunhido,
mas não é capaz de contê-lo a tempo de eu não perceber. Repito,
contraindo e liberando seu pau das punhaladas. Contraio o
abdômen ao senti-lo ejacular, seu sêmen preenchendo-me.
Levo uma mão para um mamilo, necessitada de sentir algum
toque no bico rosado. Ele continua metendo fundo por mais um
minuto, me colocando em uma situação enervante. Preciso
desesperadamente gozar, então tomo meu tempo no meu botão de
prazer, deslizando e percorrendo a umidade da boceta, espalhando
o calor por toda a vagina.
Mordo o lábio inferior, o sugando para dentro da boca, e
Ashton me ajuda a correr atrás do meu próprio orgasmo, comendo
meu cu e lambendo a pele que marca minhas escápulas.
— Você não gozou o suficiente por uma noite?
— Fica quieto — ordeno, esbravecida com a interrupção.
Ele bafora uma risada e continua metendo, auxiliando para o
clímax vir com mais força. Preciso me agarrar às laterais da
banheira para não desabar como uma gelatina diante dele quando
gozo.
— Com você, vou do inferno ao céu em minutos. — Sopra o ar
morno de seu hálito em minha nuca.
Viro-me na banheira, sentando-me na lateral oposta de onde
ele está. Seus olhos capturam os meus no processo de
esquadrinhar as maçãs coradas. Suor se acumulando na costeleta
de seu cabelo. Sinto dor na bunda, agora não só pelas palmadas.
Tento me sentar de lado, mas, ainda assim, parece queimar por
dentro.
Ele conseguiu me fazer esquecer que estava com raiva ou
quando disse que Neil não era bom o bastante quando
transávamos. A diferença entre Ashton e Neil é que um deles se
importava com os meus sentimentos.
Neil queria que tudo que fizéssemos fosse extraordinário para
mim. Não me lembro de ele ter sido agressivo ou ter me tratado
como uma puta suja quando fazíamos amor. Essa é a diferença.
Com Neil tinha amor e com Ashton é tudo frívolo. Vazio. Não sei se
fico chateada ou lisonjeada. Não ter nenhum vínculo emocional, é o
que me faz querer continuar trepando com ele.
Simultaneamente, parece que me distancio ainda mais de ter
um recomeço. Sofri muito ao perder Neil e levei um tempo para
entender que podia tentar de novo com outra pessoa porque
mereço. Porém quanto mais tempo passo com Ashton, menos
acredito que vou conseguir ter um relacionamento. Ele me afasta
disso porque Ash é o oposto da minha expectativa de felicidade. E
eu me sinto atraída pela bagunça dele. Ele faz com que eu me odeie
e consequentemente o odeie também. Não é saudável, caramba.
Não é nem um pouco recomendado.
— Aonde você vai? — pergunta quando me levanto, a água
cascateando de mim.
— Amanhã o TNC vem para tirar nossas fotos, lembra?
Preciso descansar. — Passo uma perna e depois a outra, me
afastando da banheira, esforçando para me manter de pé, e deixo
um rastro de água até estar com a toalha. — Obrigada pela pomada
— agradeço, lembrando-me que ele veio primeiramente por causa
dela.
Ashton sai da banheira, água também escorrendo de seu
corpo. Ele caminha até o armário sob a bancada, presumo que
esteja atrás de uma toalha e confirmo quando o vejo se cobrir do
quadril para baixo. Ele para diante de mim, aspirando morosamente
o ar que infla seu tórax.
— Você não me respondeu sobre a Amber.
Faço um nó na lateral da toalha, agindo como se o nome
expelido pela boca dele não me afetasse, contudo, é como ácido
puro fervendo sob a pele.
— Ela não é uma ex-namorada — respondo por fim,
escapando de seu olhar analítico.
Uma vez disse que nunca conseguiria mentir para ele. Apesar
de estar vivendo sob segredos a maior parte do tempo, escondendo
de todo mundo quem realmente sou e meu passado, ainda não sei
se seria capaz de olhar nos olhos dele e mentir.
Ashton sempre teve essa vantagem sobre mim, uma que não
consegui ter sobre ele. Isso também, às vezes, é de me
enlouquecer.
— Não sei por que pensaria que ela é.
— Era um palpite.
— Seu palpite está errado — informo, voltando a erguer a
cabeça e detectando seu olhar de apuração.
As sobrancelhas arqueadas de forma sútil, quase
imperceptível, e uma fenda deixando o ar fugir por entre os lábios
enquanto me examina. Tento contorná-lo para sair do banheiro, mas
Ashton se prostra diante de mim.
— Você não estava com dor de cabeça coisa nenhuma. — Usa
um tom de acusação, rugas profundas marcando em sua testa
enquanto espera eu me defender.
Aperto um lábio no outro.
— Não. Só queria me livrar de você — admito, o que o faz
dilatar as narinas.
— Por quê?
— Não é óbvio? Você estava com ela antes de vir pra cá.
— Está com ciúme mesmo... — implica, o sorriso convencido
me deixando irritada. — Quero que saiba que você não está nem
por um momento me deixando convencido.
— Que bom — digo com esmo, contornando a muralha
formada pelo seu corpo diante de mim. — Porque não preciso te
convencer de absolutamente nada. Só quero você abrindo a boca
quando for pra me beijar — exponho, atravessando o pequeno
vestíbulo do closet para o quarto. — Ou para tocar outras partes do
meu corpo. Fora isso, não precisamos ser íntimos.
Solto a toalha no meio do quarto, pegando meu conjunto de
pijama na cama e vestindo-o. Viro-me nos calcanhares, Ashton
parado na passagem do closet para o quarto. As pintinhas marrons
em torno do seu pescoço, peito e rosto são um charme impossível
de esquecer.
Não é nem um pouco estranho que Ashton tenha pensado em
Amber como uma ex-namorada. Nunca estive com ninguém pelo
gênero. Meu interesse está além disso. Se gosto de alguém, me
envolvo sem me importar se é homem ou mulher, contanto que
tenha uma conexão.
Não namorei nenhuma mulher de fato antes, mas já fiquei com
algumas, o que me fez entender um pouco mais sobre meus
interesses sexuais e românticos. Já me senti atraída por Mackenzie,
o que me levou a roubar um selinho dela, mas nada mais — ela não
demonstrou interesse — e Effy também, quando nos conhecemos.
Foi só depois de um tempo que comecei a entender e aceitar meus
desejos.
Ele me estuda passar a blusa do baby doll pela cabeça e vestir
o short. Seus olhos nunca se desviando de mim, como se estivesse
prestes a me atacar outra vez. Embora meu ventre se contraia com
a ideia, preciso mesmo descansar.
— Avalon quer que a gente se decida sobre o casamento. —
Muda de assunto, provavelmente percebendo que não vou ceder ao
assunto “Amber”. — Impressão minha ou você está postergando
isso também?
— Não estou postergando nada, Ashton.
Resgato a toalha do chão para sugar o excesso de água do
cabelo.
— Te dei todas as oportunidades do mundo para sair disso e
você não quis, agora, já que estamos em comum acordo, faremos
direito.
— O que quer dizer?
— Avalon quer um pedido público porque é uma coisa que eu
faria. — Ele tomba o corpo para o lado, escorando no batente. —
Vou fazê-lo em uma semana. Esteja preparada — alerta, virando-se
em direção à porta do quarto. — Você vai usar o anel de noivado da
minha avó.
— O quê? — Minha voz sai fraca e abatida, os sulcos criando
ondas na pele da minha testa evidenciando o choque.
— Ela era importante demais para mim. Não faria sentido eu
ficar noivo e não entregá-lo à pessoa que escolhi passar o resto da
vida. Se vamos ser convincentes, tem que ser aquele anel.
Eu sei da importância de Pamella na vida de Ashton. Embora
nunca tenha sido detalhista quanto à sua relação com a família, tudo
que constantemente lembrava a mim e aos outros era o que ele
sentia a respeito dos avós. Ele os amava muito, a ponto de que, se
fosse necessário, teria ido no lugar deles.
Engulo em seco, sentindo a responsabilidade pesar.
— Também não estou saltitando de alegria por colocá-lo em
você. Pretendia entregá-lo para Nicola — provoca, porque fiz o
mesmo sobre Liam. — Mas ela também agiu como uma vadia
interesseira e, assim como você, espero que recebam o que
merecem por me usar como escadinha para o sucesso de vocês. —
O ácido em sua fala explode em mim.
Dá para sentir a raiva pulsando em cada palavra dele. É por
causa de Amber. Não preciso estender a conversa para tentar
desvendar. Ashton é mais transparente do que parece. Ele odeia ser
contrariado, perder uma discussão, mas principalmente não estar
inserido naquilo onde quer estar.
É uma pena porque não vou lhe oferecer mais armamento
para me atingir. Se Ashton souber quem ela é, não duvido que a use
para continuar me ferindo.
“Acho que já vi esse filme antes e não gostei do final
Eu não sou mais seu problema”
EXILE – TAYLOR SWIFT & BON IVER

Voo porta adentro, os saltos me fazendo tropeçar na pressa de


chegar.
Recebi ao menos quatro mensagens de Yael. Um atraso de
vinte minutos. Para uma estilista conceituada e exigente como
Magdalene, minha demora fará parecer que não valorizo o tempo
que reservou em sua agenda apertada para me conhecer. Ela está
de passagem por Milão, veio a trabalho, o que significa que se
conseguiu um espaço para me conhecer, posso ter alguma chance
com ela em Nova York.
Estaco no centro do restaurante, examinando à minha volta
atrás de Yael. Nunca vi Magdalene pessoalmente, só ouvi coisas a
seu respeito e elogios do trabalho. Ela se formou na Di Santis com
honras, foi ganhadora de prêmios importantíssimos na moda e já
trabalhou com grandes nomes. Estar na presença dela é como
compartilhar o ar com uma celebridade.
— Gravity, aqui!
Ouço atrás de mim, a voz branda distante me alcançando por
um fio. Dirijo o corpo na direção, detectando um braço magro
estendido para conseguir minha atenção.
Começo a caminhar, mas à medida que meu campo de visão
se amplia, o sorriso sucumbe em aflição. Yael não está sozinha.
Magdalene, entretanto, também não está com ela à mesa. Só noto
os cabelos escuros, vultuosos e ondulados fluindo por sobre os
ombros.
Paraliso ao lado da mesa, Amber curvando um sorriso que faz
meu estômago contrair. Preciso inalar fundo para afastar a onda
nauseante que a presença dela provoca em mim. E só depois de um
minuto tentando não me exaltar, é que consigo expressar outra
emoção além do choque. Esforço-me para esboçar um sorriso
delicado, porém reprimido. Yael não precisa de muito para entender
meu desconforto.
— Sei que tiveram alguns desentendimentos — ela começa,
os olhos viajando ao meu encontro —, mas Magdalene quer
conhecer as duas. — Volta para Amber, que assume uma feição
indiferente. Vaca manipuladora.
Amber conseguiu escapar da detenção e eu quase não me
encontrei com ela, exceto nas aulas práticas. Apesar disso, não
acredito que tenha me livrado dela. Essa garota é como uma cobra,
sabe exatamente a hora em que pode mostrar as presas e injetar o
veneno.
O celular de Yael toca no centro da mesa. Ela o segura, lendo
o nome da tela e erguendo brevemente o quadril para sair.
— Preciso atender. Falo com vocês num minuto.
Ela sai, deixando-me a sós com Amber. Fico parada ao lado
da mesa, decidindo se quero mesmo dividir qualquer coisa com ela,
principalmente uma refeição. Não duvido que tenha trazido algo
consigo para me sabotar.
— Onde é que você anda se escondendo? — Ela cruza os
braços na frente dos seios, entrelaçando as pernas ao reclinar o
corpo para trás. — Estou sentindo a sua falta — estala a língua no
céu da boca, a ironia da declaração me obrigando a engolir o café
da manhã que voltou à garganta —, não tenho tido ninguém com
quem me divertir nas últimas semanas. Se mudou aqui para perto?
— Não te interessa — respondo, na defensiva.
Amber fita meu rosto apreensivo e provavelmente corado de
raiva.
Eu deveria acabar com isso. Já a enfrentei uma vez, posso
fazer de novo, mas Amber, às vezes, me lembra a minha mãe. Sua
necessidade de me controlar e como eu perdi meu próprio domínio
e acabei sendo expulsa de casa.
Não quero perder minha vaga na Di Santis. Seria humilhante e
patético, eu me sentiria debilitada e frágil. Amber é só um
contratempo, como Yael disse. Já lidei com contratempos piores.
Sem contar que essa é a minha última chance de conseguir algo
nessa profissão. Não vou desistir, ainda que ela tente me matar.
— Você ficou mais ultrajante, eu gosto. — Ela finge um
rosnado, enrugando o nariz ao franzir o cenho. — Essa vaga é
minha, só para te lembrar. Você continua sendo um nada e não tem
a menor chance de o reitor permitir uma coisa dessas.
— Se quer tanto o estágio, por que não pede para o
papaizinho comprar? Não é assim que vocês, milionários,
conseguem tudo?
Consigo, pela primeira vez, esmorecer o sorrisinho triunfante
de seu rosto.
— Não que seja da sua conta, mas meu pai não aprova minha
mudança para Nova York.
— Ora, ora, a princesinha está com problemas no seu reino?
Até agora, fui paciente com você, Amber.
— Você perdeu o medo — percebe, cerrando as pestanas. —
Isso não é nada bom... — Verga-se sobre a mesa, envolvendo a
garrafa de vinho pelo gargalo. — É melhor voltar a ter medo de mim,
querida.
De repente, Amber está entornando a garrafa sobre o assento
vago ao lado. Olho ao redor, mas ninguém parece estar preocupado
com o que ela está fazendo. O estofado de suede absorve o líquido
bem depressa e ela só para quando quase metade do conteúdo foi
despejado.
— Sente-se aqui. — Gesticula com a cabeça para o assento
pingando vinho.
Aperto com força o celular entre os dedos, sentindo-os ficar
doloridos nos ossos. Minha boca afina ante a força que imponho
para pressioná-la.
— Não vou me sentar aí.
— Você vai.
Quase engasgo com a risada. Puxo a cadeira onde Yael
estava instantes antes, reclinando-me sobre a mesa e ficando frente
a frente com Amber.
— Sabe por que tenho tolerado tudo o que você faz? Porque,
diferente de você, não posso contar com meu pai para limpar minha
barra. Soube que tem o hábito de perseguir pessoas que considera
uma ameaça. É um hobby? Ou você só gosta de agir como uma
escrota do caralho? — rosno a última frase, seu olhar travando uma
batalha comigo.
Porém a máscara de irritação de Amber desmancha em
divertimento, o que, num primeiro momento, me deixa incomodada.
Endireito a postura, elevando o queixo para nivelar a altura do meu
rosto com o seu.
— Qual é a graça?
— Conheço ela. — Amber lança com escárnio, os cílios longos
e espessos chocando com o topo das bochechas ao piscar
inocentemente. — Nicola Fox.
Impossível.
— Ela, Brianna… — cantarola, o ruído partindo de sua
garganta pressionando a minha. — Da última vez que nos
encontramos, Nic me contou da garota patética que conheceu em
Paris, que estava dormindo com o ex-namorado dela. Fiquei me
questionando o que um homem poderia querer com alguém como
você. Consegue me despertar curiosidade, querida.
Tento buscar um furo em sua história, porém, preciso
considerar que Nicola e eu trabalhamos no mesmo ramo. Sou
estilista em ascensão, e Nicola, modelo manequim. Ela está tão
inserida nesse meio quanto Amber e eu. Só é trágico que, por obra
do destino, as duas se conheçam e, pior, que nosso encontro deixou
uma primeira impressão errada sobre mim.
O único culpado nessa história é Ashton, e, ainda assim, me
sinto diminuída porque Amber provavelmente sabe mais do que eu
gostaria que tivesse descoberto. Contudo, forço meus ombros a
endireitarem. Não vou me permitir ser intimidada por ela outra vez.
— Porque você…?
— Lamento a demora. — A voz próxima ofega.
Ergo o rosto na direção, a mulher alta, corpo esguio, ombros
largos e cintura fina apoiando a alça da bolsa na cadeira ao lado de
Amber. Yael vindo a reboque.
Magdalene puxa a cadeira para se sentar e, no instante em
que seus músculos esculpem uma carranca, percebo que se sentou
no lugar onde Amber queria que eu me sentasse.
Merda. Vaca ardilosa.
Arregalo os olhos, Yael identificando o rosto de Magdalene
contorcer e a ira ascender em seus olhos como um vulcão.
Amber armou para mim. De novo.
— Meu Deus, Gravity! — Amber choca-se, a boca abrindo em
um perfeito O. — Sinto muito, Magdalene. Vity estava sentada aí
agora mesmo e derrubou vinho.
Magda guia sua atenção para mim, as pálpebras pesando ao
sentir o tecido afilado absorver o vinho.
— Por que não me avisou?! — ralha, levantando-se às pressas
e quase jogando a cadeira para trás. — Tenho uma reunião
importantíssima depois daqui. Olha só para o meu vestido… —
murmura, uma mancha gigantesca marcando a parte de trás do
vestido, que, por um infeliz acaso, é branco.
Saio do lugar, pegando o guardanapo sobre a mesa e
contornando para ir de encontro a ela. Ofereço ajuda, mas
Magdalene arranca o pano da minha mão com grosseria, bufando
um resmungo.
— Ai, meu Deus! Sinto muito, Magda. — Yael tenta corrigir,
mas a outra levanta a mão com a palma virada para frente, a
impedindo de continuar. — Olha só para isso… — Ela me dirige um
olhar de censura.
Que merda?!
— Tenho um vestido, pretendia te dar de presente. Está no
meu carro.
— Ah, você é um doce! Yael — Magdalene para —, podemos
esquecer esse almoço? — Relanceia uma olhadela para mim, o
rosto tomado por repulsa. — Sinceramente, prefiro receber a ficha
de minhas estagiárias no escritório. Não tem nenhuma necessidade
de conhecê-las antes de uma entrevista formal.
— Claro, Magda, como preferir. — Yael bufa, espiando para
mim por sobre o ombro.
Magdalene apruma a postura, agora relaxando a coluna ao
saber que não precisará ir a nenhuma reunião cheirando a vinho
tinto.
Por outro lado, aperto a mandíbula num escape da raiva,
vendo Amber guiar minha oportunidade para fora do restaurante.
Não vou conseguir viver em paz enquanto Amber e eu
estivermos morando em Milão, concorrendo para a mesma vaga.
Está óbvio que vai fazer o que estiver ao seu alcance para
conseguir. Ela me intimida porque não tenho formas de lutar contra
seus ataques. Não tenho a menor chance de vencer contra Amber.
— O que foi que aconteceu aqui?! — Yael exaspera, virando-
se para mim.
Por mais que queira dizer a verdade, será só mais um dia
tentando convencê-la do que não quer enxergar.
Avalon chega com Kim horas antes da equipe do TNC.
Passamos parte do tempo ouvindo e falando sobre o casamento,
que precisa acontecer até outubro, para o retorno da turnê. A venda
dos ingressos vai ser liberada simultaneamente à publicação da
nossa entrevista no site do TNC, induzindo os números de venda a
aumentarem.
— Casamento na praia. — Kimberly sugere, mordiscando a
tampa da caneta e dividindo sua atenção entre mim e Ashton,
pedindo nossa aprovação.
Ele, porém, não parece interessado nesses detalhes. Eu, muito
menos.
Como e quando o casamento vai acontecer não está no topo
da minha lista de preocupações do ano, sobretudo porque, desde
que assinei o contrato, Ashton e eu vivemos em guerra — exceto
quando estamos transando, aí conseguimos nos entender.
— Posso conseguir aprovação do estado da Flórida em tempo
recorde. Vai ficar lindo e convincente. O que acha, Avalon? — Kim
dispara os olhos para ela, minuciosa e com expectativa.
Fiz uma lista pequena de convidados bem cedinho, conforme
Kimberly solicitou em um e-mail que recebi ontem à noite, mas só fui
checar quando acordei. Meus pais, minha irmã e meu cunhado,
Andie como minha florista, minhas amigas como madrinhas e Danny
como minha dama de honra.
Céus, o que eu mais queria era não ter que envolver essas
pessoas nessa história. Principalmente porque Dannya não vai
concordar e fará o impossível para me convencer do erro que estou
cometendo, e o pior é que não posso contar a verdade sem estar
quebrando a cláusula de sigilo. Um casamento de mentira que
precisa parecer ser de verdade e por causa disso, precisamos ter
todos os pequenos detalhes alinhados.
— Para mim, está ótimo. Você disse que não quer uma festa
de noivado? — Avalon direciona a pergunta para Ashton, que
parece exausto.
Para ser sincera, também estou. Elas chegaram às sete da
manhã e estamos de pé desde às seis. Se dormimos por duas
horas, foi muito. Cada um em seu quarto, claro. Depois de Ashton
ter tentado outra briga comigo, ele praticamente marchou como um
soldadinho para fora do quarto.
— Seria ótimo se fizéssemos. Poderíamos convidar mais
pessoas e…
Ashton suspira, esfregando as pálpebras com a ponta dos
dedos. Os pés estirados para frente, a coluna cedendo ao cansaço
ao se desmontar no sofá.
— Juro, às vezes, penso em demitir você.
Avalon corrige a postura diante da voz áspera de Ashton.
Miro-o, sentindo daqui a tensão emanando dele.
Ashton está irritado comigo, mas não é nenhuma novidade
porque constantemente parece se enfurecer com os motivos mais
fúteis. Desconfio que dessa vez se trata de Amber, por eu tê-lo
cortado quando quis saber mais dela.
Contei o suficiente para ele entender que não é nada
importante, ou melhor, prefiro que continue sem saber de Amber e
nosso passado, todas as coisas que ela me fez passar em Milão
precisam ser enterradas.
Um dos motivos pelo qual não o questionei sobre ela conhecer
Nicola. Ashton aparentava ser tão próximo da ex-namorada, a ponto
de conhecer as amigas dela, não entendo por que não sabe quem
Amber é.
— Me demita, então. — Ela o desafia, bloqueando a tela do
iPad.
— Jared chutaria meu rabo. — Ele massageia as têmporas e
fecha os olhos, desfrutando de poucos minutos de silêncio. — Sobre
o anel, já defini. Gravity vai usar uma joia da família e quanto ao
noivado, vou fazer o pedido na semana que vem. Vamos fazer algo
íntimo porque, apesar de vocês acharem que gosto de coisas
espalhafatosas, certas situações prefiro que aconteçam entre duas
pessoas. Ficar noivo é uma delas.
— Se você prefere assim, não tem problema. Posso cuidar do
resto, a cerimônia e os detalhes. Fizeram a lista?
— Te enviei a minha por e-mail, Kimberly — respondo, ouvindo
o farfalhar do sofá no assento ao lado, quando ele mexe o tronco.
— Vocês não tinham uma mesa de centro? — Ava nota o lugar
vago no meio da sala de estar, a testa frisando enquanto analisa.
— Ela quebrou. — Ashton responde antes de mim.
— Quebrou como? — retruca, levantando os olhos na direção
dele.
— Foi um acidente — interrompo porque o conheço e para
abrir a boca no meio de uma explosão de raiva, não é preciso muito.
Lanço um olhar recriminatório para ele.
— Que tipo de acidente? — perscruta Ava, me examinando
por entre os olhos cerrados.
— Não foi nada demais — insisto, buscando manter a voz
relaxada.
— Jared contou que contratou um advogado. — Avalon diz
para mim, mudando o foco do assunto brevemente.
— Não por muito tempo. — Ashton ralha sob a voz baixa.
— Contratei. Consultei Camille e ela disse que não tinha
problema — respondo, mas sem desviar a atenção dele.
— Sim, é verdade. Só achei estranho você não ter solicitado
um antes da assinatura do contrato — constata, tornando a
desbloquear a tela do tablet em seu colo. — Vocês estão
conseguindo se entender, não é?
— O que está insinuando, Avalon? — Ashton estreita o olhar
colérico para ela, erguendo a cabeça da mão onde a apoiava. —
Que não posso controlar minhas explosões de raiva? Porra, por que
parece que todo mundo está esperando o pior de mim?
— É muito difícil esperar outra coisa quando tudo que você faz
prejudica a maioria das pessoas que estão do seu lado! — exclamo,
não gostando da forma grosseira com que está falando com ela.
Tudo que Avalon faz é para ajudar a ele e a banda, e o que
recebe em troca? Esse tipo de atitude?
Ashton tem seu lado não babaca, sei porque já estive na
presença dele, mas ultimamente, ante a pressão da imprensa —
presumo —, a responsabilidade e, sim, eu ter aceitado o contrato só
pelo dinheiro, e o crescimento do meu sucesso, devem ter sido
grande influência para a reação explosiva frequente dele. Está por
pouco de ruir de uma vez. O que significa que precisa urgentemente
de ajuda. Ele tem que voltar para suas sessões de terapia com Erin.
As narinas expandem quando ele respira uma dosagem maior
de ar, mas não rebate minha acusação.
— Preciso dormir um pouco antes de lidar com o TNC.
Ele se levanta, marchando para as escadas.
A entrevista está marcada para daqui dois dias, mas, ainda
assim, só de pensar estar presente em uma página de fofocas que
tem feito de tudo para detonar com a imagem dele deve estar
abalando sua mente.
— Ele não parece bem. — Kim repara, fitando-o subir para o
quarto. — Aconteceu alguma coisa?
Suspiro, arqueando as sobrancelhas e deslizando o indicador
na tela do iPad. Estou com a pasta aberta, os arquivos do projeto de
figurino da The Reckless. Minha empolgação para começar a
trabalhar nessas peças está quase explodindo meu peito. Preciso
muito dar vida a essas roupas.
Peças masculinas não são meu forte, mas com certeza vão
acrescentar no meu portfólio e estou animada para ser desafiada.
Um pouco de adrenalina na monotonia que se tornou meu trabalho
no último ano.
Balanço a cabeça, respondendo silenciosamente à Kimberly,
contudo, de Avalon é mais difícil de esconder determinados
detalhes. Ela pesca tudo só observando nossas reações e ouvindo
as conversas. Acho que depois de tanto tempo trabalhando com
eles, pode ter ficado mais fácil captar o que as pessoas tentam
esconder dela.
— Não dormimos direito — explico para Ava ficar ciente. —
Ashton chegou ontem, e Liam estava comigo, lendo o contrato.
Bem, Liam é mais do que um amigo, saímos por um tempo quando
estudávamos em Paris, e Ashton não gostou de tê-lo aqui.
— A mesa quebrada… — Avalon cerra as pestanas, sondando
onde o móvel ficava, de repente compreendendo. — Meu Deus.
Quais são as chances de ele decidir nos processar? Vou ligar para
Camille. Ainda estamos tentando entrar em acordo com a Isabella.
Ela quer uma nota de esclarecimento e Ashton se recusa a fazer. —
Empurra os fios de cabelo escapando do rabo de cavalo para trás
da orelha, piscando rapidamente, como se fosse ajudá-la a assimilar
tudo.
— Ele está passando por muita coisa. — Kim diz, sentando-se
do meu lado. — A vida dele, assim como dos outros, mudou nos
últimos dois anos. Ele passou de anônimo para alguém que tem os
detalhes da vida privada sendo jogados na mídia e pessoas que
nunca o viram comentando sobre aquilo, como se tivessem poder
para condenar ou soubessem de tudo.
— Isso não…
— Não estou tentando protegê-lo, mas também não podemos
dizer que não ferra com a mentalidade de qualquer um. Ele pode
agir como se não ligasse para o que pensam, mas já foi atacada e
perseguida? — Ela retalia ao me interromper, esperando minha
reação. — Ou julgada por um estranho que acha que te conhece
porque leu um boato sobre você em algum lugar? Porque é o que
está acontecendo com Ashton. O que ele fez com a Isabella não foi
certo. O jeito dele de agir nos seus relacionamentos com certeza
não é bom, mas não é tudo uma reação natural depois de vários
problemas sociais e a ex-namorada?
— Como você sabe dela? — sussurro, desviando para Avalon
por um breve segundo, tentando pescar algo dela também.
Ela pigarreia diante do escrutínio, mexendo distraidamente no
eletrônico em seu colo.
— Ele a vê, de vez em quando. — Kim sacode os ombros,
demonstrando sua indiferença. — Quando eles estão na mesma
cidade a trabalho.
Não sei por que acreditava que Ashton tinha se afastado dela.
Ou só estava tentando me convencer disso, para não me sentir mais
insultada e humilhada. Se ele pudesse se desculpar, talvez esse
sentimento suavizasse e eu conseguiria, sei lá, ao menos tentar
confiar um pouco nele, mas Ashton não vai mudar de ideia. Ele
detesta ser pressionado ou contrariado. Forçá-lo a fazer algo que
não quer é o mesmo que pedir para fazer o oposto.
Fisgo o lábio inferior entre os dentes, sentindo a frequência
respiratória se tornar escassa.
— Quero definir a data do casamento. — Mudo de assunto,
apanhando o celular para olhar a agenda. — O que acham de 12 de
outubro?
— 12 de outubro? — É a vez de Avalon e Kimberly conferirem
em suas agendas. — É um bom dia. Kim, você consegue organizar
tudo a tempo? Lista de convidados? Decoração? Autorização do
estado para a cerimônia acontecer na praia?
— Consigo. Temos mais de dois meses, vai dar certo. E
quanto ao seu vestido?
— Eu mesma vou desenhá-lo e costurar. Não se preocupe —
informo, ignorando a sensação pesada no meu estômago por causa
da nova informação de Ashton e Nicola.
Meu Deus. Que inferno. Pensei que tivesse superado essa
merda.
— Ah, finalmente! — Avalon sobressalta com o celular em
mãos.
— Quem é? — Kim procura saber, diante da reação aliviada.
— Jimmy e Amber — esclarece Ava.
Paro o que estou fazendo para levantar a cabeça, encarando-a
de soslaio se distanciando para atender o telefone.
Ela disse Amber?
— Amber? — sondo Kim, a testa pregueando em sulcos.
— Sim, você a conheceu, não é? O pai dela é colega da mãe
da Tess. Parece que ele já forneceu material para o figurino da série
que Kayla trabalha.
— Ela conseguiu a vaga por nepotismo, então.
— Não diria nepotismo, é mais como um: me faça esse favor e
fico te devendo. É muito comum nesse meio. Pede alguns favores,
deve outros. Aí por diante.
— Por que ela está aqui?
Sinto como se agulhas espetassem minha garganta quando
engulo e a voz de Avalon some para o hall de entrada, em direção
ao elevador.
— Ela pediu para ajudar a te vestir para as fotos. Avalon não
viu problema em deixar porque acha importante a equipe estar
entrosada na turnê. É sempre tudo muito agitado quando estamos
nos bastidores. E Jimmy veio para te maquiar. Bem-vinda ao
mundinho da The Reckless onde sempre terá pessoas dispostas a
fazer essas coisas por você. — Ela ri com diversão. — Tem algum
problema?
Levanto a cabeça outra vez, meus olhos disparando para
avistá-la, Kimberly me encarando com uma preocupação tangível.
Mas esforço-me para traçar um sorriso que afina e separa minha
boca.
— Não. Por que teria problema? — sussurro, a voz se
perdendo em meio ao tremor.
Ela não vai me deixar em paz.
Não vai desaparecer.

Jimmy finaliza minha maquiagem. Ele é divertido e durante


uma hora, quase não me lembro que Amber está esperando por
mim do lado de fora do quarto. Porém, quando o estrépito da maleta
sendo fechada estimula minha audição, sei que vou ficar a sós com
ela por pelo menos meia hora.
Preciso de quatro trocas de roupa, ainda que já tenha tomado
um tempo para escolher, tenho certeza de que Amber tem seu
discurso eloquente — ou intimidador — para não me deixar usá-las.
No momento em que Jimmy sai, a vejo fechar a porta atrás de
si, um sorriso dissimulado e cortante me paralisando.
— Seu namorado é divertido — profere, rodopiando enquanto
analisa o aposento.
É o quarto de Ashton. Como estamos tentando parecer um
casal de verdade, tive pouquíssimos minutos para conseguir trazer
para cá o máximo de coisas que consegui.
Por sorte, várias peças de roupas minhas ficaram no closet da
última vez e meus produtos de cabelo e pele não são muitos, então
bastou uma viagem para conseguir organizá-los no banheiro antes
que começassem a xeretar.
Amber se joga na cama, deitando-se e abrindo os braços,
ladeando o corpo e deslizando-os pela textura macia da seda da
colcha. Observo-a se mover e deleitar a sensação suave do tecido
na pele. Contraio a mandíbula, os dentes atritando.
— Hum, tem o cheiro dele... — geme, voltando à postura ereta,
espalmando as mãos para trás para sustentar seu peso.
Permaneço estagnada no lugar, apenas a observando, lidando
com a minha raiva do jeito que consigo. Amber não pode mais me
atingir, mas ainda me sinto amedrontada quando está perto. Perdi
minha confiança, meu jeito tempestuoso, as respostas rápidas e as
reações. Ela me deixou invalidada com sua perseguição sem
sentido.
Só me sentia dessa maneira com meus pais, incapaz de
responder à altura, até o dia em que foi a gota d'água.
— Liguei para Nicola ontem. Para contar que estava
trabalhando com ele. Sabe o que ela me disse? — provoca, com um
sorriso intricado. — Que não tem muito tempo da última vez que os
dois se viram. Foi junho ou julho? — pondera, se esforçando para
recordar. — Não tem medo de que ele te abandone pela segunda
vez?
Suspiro, andando rumo ao closet.
Tem sido mais difícil agir como se não me afetasse, como se
Ashton não tivesse se tornado especial a ponto de eu não conseguir
ignorar as burradas que faz. Amber está me cutucando em um
ponto fraco.
— Já selecionei algumas roupas. Não preciso de você para me
trocar. — Fujo do assunto, voltando com as peças no braço.
— Vocês mal começaram e ele já tem planos de te trair. Sabia
que Ashton vai acompanhá-la na semana da moda em Paris no mês
que vem? — insiste enquanto balança os pés, rindo. — Enfim, só
para o caso de estar preocupada, não tenho mais aquele vídeo.
Ergo o olhar, Amber conseguiu minha atenção, engolindo a
bola de saliva congestionando a passagem da minha garganta.
— Não sei do que você está falando — pigarreio, jogando as
roupas sobre a cama.
— Tem certeza? Aquele vídeo seu com aquele cara em Milão
— sussurra a última frase, achando graça. — Meu pai me forçou a
apagá-lo quando você o procurou.
Quero suspirar de alívio, mas ao mesmo tempo, se eu relaxar,
Amber vai me apunhalar de outra forma, como tem feito desde que
a conheço.
— Você enfiou a sororidade no rabo, Amber. Gravar um vídeo
sem autorização é…
— Já disse que apaguei — salienta, saindo da cama para
analisar as trocas de roupa. — Mas, quando meu pai me mandou de
volta para casa, passei um tempo em Winstow. Sabe o que nunca te
contei sobre mim, Gravity?
— Você é maluca — cochicho, mais para mim mesma do que
para ela, ao compreender que deve ter descoberto minha cidade
natal e ido até lá, de alguma forma para tentar me sabotar.
Como? Por quê?
— Não, só acho que o destino gosta de ser brincalhão. —
Suspira, andando vagarosamente até mim, agarrando uma mecha
do meu cabelo e a enrola no dedo. — Neil Keplinger — rosna. —
Ainda se lembra dele, sua vadia desgraçada?
Arregalo os olhos, meu corpo se afastando para trás à medida
que o dela curva-se sobre o meu. O nome de Neil se embalando na
minha mente, de maneira que consegue me fazer perder o
equilíbrio.
Com certeza, percebe meu semblante alienado, as pupilas
sumindo de foco, e tudo que quero é que ela cale a porra da boca.
— Demorei tanto para ter a chance de te encontrar de novo. —
Cerra os olhos, soprando o hálito quente contra meu rosto. — E eu
poderia ter conseguido me vingar de você antes, se não tivesse
corrido para o meu pai.
— Amber… — sussurro, piscando incessantemente, a bomba
despencando em meu colo e entorpecendo qualquer pensamento
coerente. — O que significa?
— Não sabe?
Solta meu cabelo. Tudo acontecendo tão rápido que me sinto
incapaz de acompanhar. O torpor em meu corpo ao saber que ela o
conhece me tornando inepta para me defender.
Eu fugi do que aconteceu com Neil por anos, fui para
Humperville para recomeçar e achei que tinha conseguido deixar
essa história para trás. Por que, de repente, alguém a está
desenterrando? Por que não posso seguir em frente, porra?
Amber me empurra, as duas mãos contra meus ombros, e
cambaleio para trás, errando o passo e enlaçando um calcanhar no
outro quando caio no chão.
Minha respiração vacila, a pulsação do sangue bombeando
diretamente para o coração repercutindo nas têmporas. Tento me
levantar para me defender, mas a mescla de choque, ansiedade e
raiva faz com que minha capacidade de raciocinar se assemelhe a
de uma criança de dois anos, que está apavorada com os monstros
escondidos debaixo da cama.
— Você está morando em um apartamento bacana,
namorando um cara novo… — expressa, rangendo os dentes e
mostrando as presas para mim. — Subindo na carreira,
conquistando seu espaço, se esquecendo de que ele morreu por
sua causa! Pretendia esperar um pouco mais, mas quer saber? Não
suporto te ver feliz. Como, depois de tudo, ainda quer seguir em
frente?
Amber avança, juntando um punhado do meu cabelo em sua
mão, me arrastando pelo quarto, me deixando sem tempo para
conseguir reagir. O grito violento ao safanão em minha cabeça
despedaçando diante do farfalhar do meu corpo sendo rebocado
pelo chão, o atrito gerando lacerações na pele das minhas coxas. O
apartamento é grande, a música tocando pode abafar o que está
acontecendo aqui.
— Para com isso, Amber! — grito, lutando, chutando o ar e
esperneando.
Levo as mãos de encontro à sua, a raiva dela impulsionando a
força com que me puxa para dentro do closet e a minha, se
perdendo.
— Eu estava apaixonada! — Ela urra de volta, em nenhum
momento demonstra interesse de parar, meu couro cabeludo
começando a doer ante a força com que prende os fios. — E ele
estava por mim também! Aquele dia… — Finalmente para, soltando-
me só quando chegamos ao banheiro. Bufo um choramingo,
sentindo a pele queimar. — Aquele dia seria o seu último com ele.
Eu só não esperava que fosse o meu também.
Ela anda até a banheira, tapando o ralo e girando a torneira
para começar a encher.
O que ela está fazendo, porra?
— Não faço a menor ideia do que você está falando, Amber! —
esclareço, socando o chão com a lateral do punho com tanta força
que as ferroadas espiralam até o cotovelo. — Para de brincar
comigo, porra! Seja direta! Por que me odeia tanto? Por que tem me
perseguido desse jeito?! E o que Neil tem a ver com você?
— Porque a culpa é sua! Ele morreu por sua causa! — acusa,
o indicador erguido perante meu rosto, e noto que está tremendo.
Dá para sentir a raiva a consumindo em cada palavra enquanto
respinga saliva. — Cansei de ficar em casa chorando! Quando vi
você em Milão pela primeira vez, céus, soube exatamente o que
aquilo significava! Depois de tanto tempo, finalmente tinha te
encontrado! Você não me conhecia, não sabia que estudava em
Conoway, na mesma universidade que Neil, e não sabia que ele
tinha ficado comigo por quase um ano.
As palavras dela se misturam. Não consigo me lembrar da
linha temporal dos acontecimentos daquele ano. Meu Deus, foi há
sete anos. Neil estava na faculdade, estudando contabilidade. Já
namorávamos há três malditos anos, e eu estava perdidamente
apaixonada por ele. Sempre fui apaixonada por Neil.
Nunca passou pela minha cabeça que Neil poderia ter
conhecido outra pessoa. Ou sequer ter se apaixonado por ela.
Ele me traiu.
Lágrimas descem copiosamente através do meu rosto, a água
da torneira escorrendo e enchendo a banheira abafa nossos
rangidos esfolando a garganta.
Nós duas estamos sofrendo pela mesma pessoa pelos últimos
fodidos sete anos?
— Era para você ter morrido, não ele — imputa, e, quando
ergo o rosto, noto o quanto ela também está chorando.
— Você veio atrás de mim em Nova York só para me lembrar
que não mereço estar viva? — indago, fraca e exausta, a mente
perturbada e confusa me deixando zonza.
É muita coisa. Muita informação. Não estou entendendo nada.
Amber vem até mim, agarrando meu braço, e me coloca de pé,
empurrando-me em direção à banheira. Luto na direção contrária,
mas Amber sempre foi mais alta e consideravelmente mais forte,
ainda assim, tento retaliar seu agarre.
— Meu pai me violentava. — Amber conta, sua voz embargada
por causa do choro, agarrando novamente meu cabelo. Dessa vez,
tento soltá-la, forçando os dedos a aliviarem o aperto rente à raiz. —
Neil descobriu tudo e me protegeu. Acumulou provas, ameaçou
entregar meu pai para as autoridades e, então, ele parou. Neil me
convidou para morar com ele, no começo, como amigos, e, com o
passar do tempo, nos tornamos cada vez mais próximos. Ele era
tudo para mim.
Sim, ele faria isso. Neil tinha um bom coração e não consigo
acreditar que ele me trairia, no entanto, a única pessoa capaz de
desvendar esse segredo não pode. Porque ele está morto. Amber
fez tudo aquilo em Milão porque sabia quem eu era? Ela me
perseguiu, humilhou e me ameaçou porque também me culpa pelo
que aconteceu. Estou no inferno. Estou literalmente lá.
— E eu não vou parar Gravity, até pagar pelo que fez.
A voz dela me atravessa como um machado e, empunhando
meu cabelo com mais força, ela me vence na batalha e afunda
minha cabeça dentro da banheira.
Debato-me, meus pulmões enchendo com água enquanto luto
para ter ar. A pressão em meus ouvidos cresce a cada segundo, a
dor da perda do consciente dilatando meu crânio.
Uso as mãos no fundo para impulsionar o corpo e sair do
martírio, desesperada por ar, mas Amber intensifica sua força,
tomada pela raiva, a sede de me punir, e me empurra para o fundo
outra vez.
Ela enrola os fios molhados do cabelo nas mãos e me tira da
água por uma fração de segundo. Abro a boca, tossindo, sorvendo o
ar em intervalos curtos, mas enchendo os pulmões. Eles ardem,
mas não me importo. Mais uma vez me debato, empurrando o corpo
para trás. A coluna colidindo com suas coxas, mas ela não se move
nem um centímetro.
Amber leva a outra mão para a minha nuca, travando a cabeça
para eu não me mexer.
— É tudo sobre causa e efeito. Você é a causa, e eu, o efeito,
querida.
E então, ela me mergulha de novo. Separo a boca, clamando.
As cordas vocais definham com a urgência com que degluto a água,
atrás de maneiras para respirar. A tensão se concentra no meio da
testa e as têmporas distendem com a força que luto para me livrar
de suas mãos. Exaustão aplaca meus sentidos, me obrigando a
ceder e, realmente, acho que estou perto de morrer.
Feliz aniversário, Neil…
Escrevendo esses agradecimentos com o coração leve, ou
não, depois desse final, só quero surtar. Felizmente, graças a
pessoas especiais, não aconteceu dessa vez de precisarem me
internar. Tenham pessoas certas na sua vida e você verá a mágica
acontecer.
Às primeiras leitoras deste livro: Bianca, Hellen, Leinara e
Milena, obrigada por embarcarem nesse projeto comigo. Obrigada
pelas sugestões, pelas conversas e pelo carinho. Segredo Perfeito
não teria sido tão bom sem a ajuda e os conselhos de vocês.
Bianca, descobri que você é o meu oposto perfeito. Nossas
conversas durante a escrita de Segredo Perfeito foram surreais de
boas. Obrigada mesmo por ter segurado minha mão e não ter me
permitido enlouquecer nesse processo. Graças a você, me senti
mais confiante na hora de publicar essa história e seu feedback me
confortou todas as vezes.
Hellen, minha amiga e consultora em assuntos psicológicos.
Estamos nessa há quase quatro anos. Tenho certeza absoluta de
que, se não fosse por você, algumas coisas nesse livro não teriam
atingido seu auge. Nossas conversas sempre me mantêm com a
cabeça explodindo de ideias. E ajudou que Ashton é seu
personagem favorito, me senti compreendida. Obrigada por todos
esses anos de amizade, por embarcar nas minhas ideias e ajudar
quando preciso. Você é especial em um nível que eu jamais
conseguiria por aqui em palavras (entende por que não consigo
escrever cartas?).
Duda, quando tinha dúvidas sobre o que fazer — fosse para
dividir a história ou saber se o final estava bom mesmo —, você
estava lá dando sua opinião. Muito obrigada por não se importar de
eu ficar te enchendo hahaha. Ter você trabalhando comigo nesse
livro foi especial demais. Mil vezes obrigada.
Bruna, mais conhecida como Bu Oliveira, obrigada por ter
topado fazer a leitura sensível deste livro. Mesmo em meio à
correria de casamento e mudança, você estendeu a mão para mim
e não me deixou desamparada. Você não faz ideia do quanto sou
grata. Te desejo todo o sucesso do mundo, você é uma psicóloga
incrível e ama o que faz — os olhinhos até brilham quando fala da
profissão e acho lindo isso.
Um obrigada especial à Helaine, minha assessora, que chegou
para me ajudar a administrar minha vida de escritora e o meu grupo
apocalíptico. Acabamos nos aproximando nesses últimos meses e
você fez mais por mim do que pode imaginar. Apenas obrigada por
tudo — aquelas conversas intensas onde você me dava um abraço
virtual e me lembrava que sou boa pra caramba no que faço.
Ao meu marido porque ele foi o primeiro a ouvir a história
inteirinha de Ashton e Gravity — sortudo. E, de quebra, me ajudou
com os plots. A melhor parte do meu parceiro também ser meu
melhor amigo é que consigo compartilhar absolutamente tudo e
ainda receber uma opinião sincera, com todo amor e carinho, de
como lidar com uma história tão intensa como essa. Obrigada por
nossas conversas, vida. Te amo.
Às minhas apocalípticas (vocês sabem quem são), que me
incentivaram pra caramba a escrever esse livro. O que mais me
motivou durante a escrita foi poder ler as mensagens de vocês
todos os dias. Me disseram que escrevi esse livro mais rápido que
os outros e não tenho nenhuma dúvida de que foram as
responsáveis. Recebi tanto amor, carinho e apoio durante a escrita
de Segredo Perfeito, que tudo que queria era entregar para vocês o
meu melhor. Obrigada por estarem comigo. Obrigada por abraçarem
meu universo de imprudentes. Obrigada por absolutamente tudo. Eu
amo vocês demais!
Para finalizar, obrigada a cada um que comprou, leu, pegou
emprestado no KU ou deixou sua avaliação. Vocês também fazem
parte disso comigo!
Até o próximo!
Com amor,
Amanda.

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