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O

Perfeito
Caos

JOSIANE VEIGA
O PERFEITO CAOS

1ª Edição
2020
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou
transmitida por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e
gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem autorização
escrita da autora.

Esta é uma obra de ficção. Os fatos aqui narrados são produto da imaginação.
Qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real deve ser
considerado mera coincidência.

Título:
O perfeito Caos

Romance

ISBN –
9798618589734
Texto Copyright © 2020 por Josiane Biancon da Veiga
Eu me casei com Joana. A trouxe para essa vida. Ela não tinha escolha a não ser ficar ao
meu lado...

Sou um membro da Black Rose. Nossa organização criminosa comete as maiores barbáries,
contudo, a protegerei como puder desse mundo terrível.
Ela pode confiar em mim. Tudo que faço é por ela. Nosso amor sobreviverá a tudo.
Sumário
JOSIANE VEIGA
Demais livros do universo Bianconi
Enzo
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
JOANA
ENZO
Demais livros do universo Bianconi

Ela era o paraíso, mas ele foi feito para o inferno.

Victor Bianconi era membro da máfia que tinha origem na Itália e agora dominava a Serra Gaúcha. Ele
havia sido salvo por aqueles bandidos e devia a eles mais que a vida, toda a sua lealdade.
Sem princípios morais que pudesse carregá-lo, ele sempre acreditou que cumprir seu papel de vilão
bastaria... Até ela aparecer.
Francine Stein era de uma boa família. E era, igualmente, uma boa pessoa. O tipo de gente que jamais
iria se aproximar de um bandido como Victor.
Mas, o destino provou-se ser mais forte que tudo.
Anjo e Demônio queriam coexistir.
Aquilo seria, definitivamente, o apocalipse.
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Quando eu tinha dez anos, os Bianconi me levaram... me estupraram... me escravizaram... Mas, com a
morte do chefe da máfia, eu consegui fugir.
E não havia lugar mais seguro para me esconder do que a pequena cidade de Esperança, lugar onde
Pietro Bianconi conheceu seu fim.
O que eu não esperava é que nessa cidade eu conheceria um homem que desejava uma esposa e um
filho. Um bom homem...
Como eu poderia ser isso para ele?
Fugir não é a melhor solução?
Contudo, o que fazer quando me descubro grávida?
Os Bianconi estão me caçando, e o único abrigo que consigo imaginar é nos braços fortes do único
homem por quem senti algo... O pai do meu filho.
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Ele queria transformá-la em sua cadela, sua escrava. Ela acabou por ser sua
SENHORA.

LUCAS VOLTOU...

Aos doze anos, ele foi salvo das ruas pelos Bianconi. Órfão de mãe, abandonado
pelo pai, havia se entregado a degradação das drogas quando Pierre o resgatou...
... Apenas para usá-lo.
Aos dezoito anos, já era um assassino. E essa condição custou a vida de alguém que
ele amava, seu irmão, Victor.
Depois de anos preso, ao encontrar a liberdade, soube que não conseguiria lutar
contra os Bianconi por meios justos. Ele precisava se tornar o rei de uma novo
grupo.
Com sua experiência, Black Rose, em pouco tempo, já era uma das maiores
organizações criminosas do país.
Todavia, não bastava. Sua condição exigia vingança contra àqueles que o induziram
a ser quem era.
Para fazer isso, seu caminho cruzou com o de Renata.
A garota perfeita, virgem e pronta para desposar o novo líder dos Bianconi, Bruno.
Tê-la para si se tornou um objetivo. Mas, amá-la não estava nos planos.
Sexo, fogo, paixão... Lucas não esperava que uma garota tão simples e delicada
pudesse fazê-lo repensar todos os seus objetivos.
Perdido em sua teia de desejos, tudo que ele queria era possuí-la.
E ele faria isso...

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Enzo

A vida não era uma merda completa.


Claro, também não era um mar de rosas, mas haviam bons momentos.
Recordo-me de que conhecer Lucas, o fundador da Black Rose, foi um deles.
O “pai”, como era chamado dentro da organização, havia me retirado
do fundo do poço. Um poço tão cadavérico e fétido que jamais pensei que um
homem fosse capaz de se afundar.
Tudo começou assim: Um dia meu pai biológico foi embora. Não
houve uma preparação ou alguma palavra que antevisse isso. Ele
simplesmente disse a minha mãe que a estava deixando para viver com uma
mulher mais jovem e que se ela cobrasse a pensão pelos seus sete filhos, ele a
mataria.
Lei nenhuma a protegeria, ela sabia. A vizinha havia colocado o
marido na Maria da Penha alguns meses antes, e o juiz havia dado uma
ordem de restrição ao homem. Um criminoso não respeita papeis, e numa
noite ele invadiu a casa e a esfaqueou. Minha mãe estava tão ciente quanto
meu pai que o mesmo podia ocorrer a ela.
Então, ela o deixou ir e ficamos todos nós na miséria absoluta até que
ela decidiu nos entregar ao Conselho Tutelar.
Eu tinha o quê? Sete anos? Sete anos e entregue ao abandono. Não vou
achar culpados, mas isso contribuiu muito para que eu nem sequer tentasse
ser um cara do bem.
Aos dezoito eu já havia sido preso. Roubo. Aos vinte, assassinato. Aos
vinte e três, cumprindo pena, encontrei Lucas dentro da Charqueadas.
Ele me deu algo que eu jamais pensei receber de outro homem:
paternidade.
Todos sabiam como aqueles grupos italianos funcionavam. Pierre
Bianconi, o fundador de uma das piores máfias do estado, usava jovens
abandonados em favor próprio, dando-se a si mesmo a alcunha de protetor, o
pai.
Francamente? Não me importei. Lucas me deu um pai. Lucas era meu
pai. Eu sentia seu carinho no tom da voz e na maneira como ele sempre
parecia orgulhoso de mim.
Não esperava me tornar um membro tão importante da Black Rose,
mas com o passar do tempo, ao lado de Ricardo, eu liderava a Rosa Negra
para meu pai.
Eu o servia. O protegia. E matava por ele.
— Mano... mano... é sério — um som desesperado chegou aos meus
ouvidos. —N ão fiz nada de errado. Eu juro, eu juro...
— Você estuprou aquela menina.
— Não, não... — o homem deitado sobre uma lona parecia agonizar
em suas palavras. — Não fui eu... não fui...
— A polícia fez os testes e seu sêmen estava na garota.
— Foi um erro — ele garantiu. — Um engano, com certeza!
Suas mãos estão amarradas nas costas com suas próprias meias de
algodão. Ele tenta se mexer, mas Felipe, ao meu lado, dá um chute forte no
seu estômago. O homem se contorce.
Ele não era um de nós. Nenhum dos filhos de Lucas se atreveria a
estuprar uma criança. Mas, era um dos nossos mulas. Nossa responsabilidade.
Meu pai estava viajando numa lua de mel com Renata, sua esposa e nossa
mãe. Quando a notícia atingiu os telejornais de que uma menina havia sido
violentada na nossa área de atuação, Ricardo investigou e logo pegou o
culpado.
A polícia também havia pegado o homem, mas as porcas leis o
soltaram para responder em liberdade.
A lei da Black Rose não era tão gentil.
A lona começa a ficar encharcada de urina. Eu dou um suspiro
zangado, porque a intenção de usarmos a lona era para fazermos a menor
sujeira possível. Aquele imbecil acabou com nossos planos.
Desloco a pistola para a direita, e a aponto na sua direção.
— Por favor, não me mate — ele implorou. — Eu posso conseguir
dinheiro. Muito. Eu tenho alguma reserva... O que você acha de fazermos um
acordo?
Observo Felipe dar um sorriso sacana.
— É mesmo? Quanto?
— Dez mil! — ele quase grita.
— Você acha que eu vou vender meu trabalho por essa mixaria?
— Eu posso conseguir mais — ainda tenta.
Felipe já não esconde o riso.
Outro sorriso invade meus pensamentos.
Joana...
Há dois anos eu a conheci durante uma investigação de assassinato.
Joana era repórter investigativa e parecia bem próxima de saber toda a
verdade por trás da Rosa Negra.
Eu devia matá-la. Contudo, eu me apaixonei. Aproximei-me.
Atrapalhei sua investigação, plantei pistas falsas. E, depois de tudo, me casei
com ela, com a benção de meu pai, Lucas. Contudo, mesmo não me
condenando, ele deixou claro que ela era minha carga.
Eu precisava manter Joana afastada dos nossos negócios. Um mula da
nossa organização estuprando crianças chamaria sua atenção.
Especialmente porque Joana era doce... gentil... Céus, eu a amava. Seu
olhar rasado de lágrimas quando o bosta sobre a lona foi solto da cadeia me
fez ferver.
Ninguém faz minha esposa chorar!
— Por favor, tenha piedade — a voz do homem chega a mim.
O observo.
— Não. — respondo.
E então puxo o gatilho.
CAPÍTULO UM
ENZO

Ricardo está estressado. Ele é meu irmão mais inquieto. Costuma ser
irascível, mas é muito leal, então normalmente sua personalidade é aceita
com normalidade.
Ele acena na minha direção. Caminho entre pedaços de carne moída,
partes do corpo de alguém que não podemos identificar.
— Tem alguém matando na nossa área — Ricardo reclama.
A vida podia ser tranquila e gostosa. Eu adorava terminar meu dia, ir
para casa e aproveitar o final da tarde tomando chimarrão ao lado da minha
esposa na nossa varanda com vista para a Redenção.
Joana não sabia o que eu fazia, e assim pretendia que ficasse. Ao que
tudo indicava, eu trabalhava com vendas para uma empresa de tecnologia.
Obviamente, a empresa era apenas uma laranja da Black Rose. Assim eu
seguia meu dia: um homem comum, bom marido, bom cidadão, que pagava
meus impostos e respeitava as autoridades. O tipo de homem que qualquer
mulher se congratulava por conseguir desposar.
— Merda... merda — Ricardo reclama.
Um leve toque de vômito flutua em minha direção. Ricardo odeia
pedaços de cadáveres.
O cheiro está insuportável. Dou um tapinha animador nas costas dele
antes de passar por cima de uma perna e sigo na direção de dois de meus
irmãos ajoelhados no chão.
Entre eles, há uma coleção de partes do corpo meio comidas -
principalmente dedos das mãos e dos pés.
— Bom, é óbvio que o corpo está aqui há alguns dias. Quem quer que
for, teremos que contatar nosso contato na polícia para saber se alguém está
desaparecido.
— O problema, você sabe... — Ricardo toca meu braço —, é a porra de
uma merda dessas acontecer na nossa área. O pai está voltando de Veneza. O
que Lucas dirá quando souber dessa bagunça?
— Não temos como cuidar de toda a área. Além disso, sempre há
mortes que não envolvem o tráfico. Sabem dizer se é homem ou mulher?
— Você quer que eu procure por uma piroca ou uma vagina no meio
dessa porra — Juliano reclama. Dou um suspiro cansado. Estou ficando
velho. — Ainda precisamos saber o tempo e o método da morte.
— Pela cor da pele, está assim há uns quatro dias.
— Como você sempre sabe disso?
— Eu presto atenção aos mortos. E tive muitos anos de experiência
com cadáveres — retruco.
— É assustador, irmão. Sem ofensa.
— Não me sinto ofendido. Você mandou Fernando tirar fotos? Papai
irá querer ver isso.
— Sim. — Ele rola a cabeça em volta dos ombros. Há um tom exausto
nele. Ninguém quer ver o resultado de um assassinato dias depois. Matar é
uma coisa, lidar com pedaços do que já foi gente é outra. — Está tudo
organizado num arquivo. Nada foi movido aqui, também, então se você
quiser pegar uma amostra, fique à vontade.
Observo os pedaços de carne. Os animais dos arredores daquela mata
fizeram um bom trabalho em esconder meu crime. Seria difícil determinar
com precisão que dano foi causado pelo agressor e que feridas a mãe natureza
infligiu.
— Quem fez isso é um bastardo doente — observa Juliano. — Matar é
uma coisa, estraçalhar desse jeito é covardia.
Covardia é tirar de um homem seu direito a um fim de tarde tranquilo
ao lado da esposa.
A perturbação é acentuada por alguns pássaros cantando. Os animais
não são incomodados por cadáveres. Somente os humanos.
— Isso me lembra alguma coisa. — murmura.
Finjo interesse.
— Como assim?
— Não sei. Apenas tem algo me incomodando.
Fernando seria um bom policial se a vida não o tivesse levado para o
caminho errado. Ele tem instintos de um cão de caça. Gosto dele. Aperto seu
ombro, orgulhoso.
— Se lembrar de algo, se sua intuição dizer algo, não esqueça de me
avisar. — mencionei casualmente.
— Sim, irmão.
— Enquanto isso, por favor, mandem os mais novatos avisar a polícia.
Deixamos a cargo deles a incumbência de limpar essa bagunça.
— Mataram na nossa área — Ricardo que até então estava quieto,
voltou a se manifestar. — Uma morte assim, e ficaremos quietos?
— E vamos fazer o quê se nem ao menos soubermos quem foi? Faça
um relatório e tire fotos para Lucas. Avisaremos nosso pai, e seremos
cautelosos até sabermos quem está matando na nossa área. No mais, não
precisamos fazer nada.
— Podemos fazer como os traficantes do Rio de Janeiro e tocarmos o
terror.
Eu quase gargalho diante da ideia. Ricardo era mesmo impulsivo.
— Nós temos classe, meu irmão. Só o que falta querer insinuar que
passamos a ouvir funk.
— Eu até gosto de uma batida.
— Nossa música é tradicionalista. Nossas roupas são sociais. Não
deixe nosso pai te ouvindo falando essas merdas. Não somos marginais,
somos negociantes de drogas.
Ele suspira, irritado. Dou-lhe as costas e volto para o meu carro.
No caminho, meu celular vibra.
Pressiono o botão e a voz de Joana enche meu carro.
— Virá para o jantar? — ela pergunta.
Eu me lembro que agendamos de ir a um restaurante. Nem lembro
porquê? Aniversário de namoro? Do primeiro beijo? Merda... Destroçar
aquele idiota que a estava perseguindo – um imbecil que veio de Santa
Catarina porque Joana estava fazendo uma matéria sobre o tráfico naquela
região – havia me afastado dos nossos momentos românticos.
Foi por acaso que eu soube do cara. Uma ligação anônima para a
delegacia dizia que um homem queria se vingar da repórter sensacionalista
que estava metendo o bedelho onde não era chamada. Meu contato na polícia
me contou. Eu fiz o cara em pedaços para dar um recado bem dado aos seus
companheiros do estado vizinho.
— Estou a caminho, meu amor. Você quer que eu te pegue?
— Não. Eu já estou no restaurante.
Bosta! Atrasado!
— Tudo bem, querida, vejo você em breve.
Desligo o aparelho. Eu podia ser um psicopata, mas sempre respeitava
o tempo dado a minha esposa.
CAPÍTULO DOIS
JOANA

Certa vez, na faculdade, um professor disse que eu seria uma péssima


repórter, porque eu jamais conseguia separar meu lado profissional das
emoções que me minavam a cada história de horror que ficava sabendo.
Descobri, mais tarde, que ao contrário do que aquele professor achava,
narrar situações humanas e com sentimentos atraía o público e o fazia sentir-
se parte da narrativa. Sim, vergonhosamente eu já havia chorado diante das
câmeras, e apesar de isso ser visto como antiprofissional por meus colegas, o
público me entendia e me aceitava.
Tinha um emprego fixo num telejornal diurno e em um jornal de
grande circulação. Algumas das minhas reportagens – como quando descobri
que os auxílios governamentais estavam sendo desviados dos pobres e
sacados por membros da política local – havia me dado destaque
internacional, e eu me sentia pronta para, em breve, conduzir meu próprio
programa investigativo.
Sempre fui fascinada com todos os aspectos da lei. Mas, jamais pensei
que houvesse momentos que me fariam cair profundamente em ansiedade e
depressão por causa da tristeza que algumas reportagens causavam.
Havia muita injustiça no mundo. Quando mais você se afunda em
descobrir o lado sujo da sociedade, mais arrasado fica.
É ainda pior quando sabe que uma pessoa que deveria estar atrás das
grades, mas que por poder ou influência, escapa delas. Era o que mais me
chateava. É difícil ver esses criminosos fugindo com seus crimes, sabendo
que não há nada que você possa fazer sobre isso.
Meu último caso era referente ao assassinato de uma jovem mãe. O
assassino, o marido, conseguiu um excelente advogado e saiu pela porta da
frente com um sorriso vitorioso de que o crime compensa.
Nosso Brasil era assim...
Eu mal conseguia entregar a notícia sem conter as lágrimas de raiva.
Quando fui entrevistar o advogado do réu, quase bati nele.
Edison Magalhães era um presunçoso arrogante que nunca perdia um
caso. Não tenho ideia de como ele pode viver consigo mesmo. Acho que
encontra conforto na pilha de dinheiro que recebe cada vez que consegue
fazer um desgraçado ser solto. Costumo pensar que ele é pior do que os
homens que representa no tribunal. Não deveria julgá-lo, porque é assim que
nosso sistema judicial está configurado, mas não posso evitar.
Sou observadora de pessoas por natureza. Embora possa parecer que
estou gravando apenas as palavras que estão acontecendo no dia a dia,
também estou absorvendo tudo ao meu redor. Estou observando cada
movimento e expressão facial. Especialmente de culpados e vítimas.
Eu construo histórias em cima de fatos. Nunca é apenas uma criança
que sumiu. É o filho ou filha de alguém que frequentava tal escola, que tinha
tantos amigos, que tinha sonhos... Nunca era apenas uma mulher qualquer
que era assassinada. Era a mãe de alguém, a irmã, a amiga. Era alguém que
tinha um futuro e que o perdeu.
Então, enquanto estou construindo minha narrativa, vou criando
vínculos com as vítimas, o que me leva a ter ódio dos bandidos. Você
aprende muito observando as pessoas. Costumam dizer que as pessoas são
inocentes até que se prove o contrário, mas aos meus olhos a maioria dos
homens que Edison representa são culpados, seja isso provado ou não.
Hoje foi um daqueles dias insuportáveis ​para mim. Nunca me saio bem
nos dias em que o júri devolve o veredicto. Eu sei que devo ser imparcial,
mas é difícil continuar assim. Eu poderia dizer que esse veredicto também
afetou o juiz Ferreira.
Eu podia sentir a raiva saindo quando o júri voltou com a absolvição.
Suas mãos estavam amarradas neste momento. Tive que digitar as palavras,
cada tecla pressionada no meu celular parecia um tapa na cara da vítima.
Mesmo enquanto meus dedos se moviam pelo teclado, parecia surreal.
O filho da puta matou a esposa. Eu sei disso. Também sei que ele
matou a mulher com quem era casado antes desta. Esse pequeno fato não foi
permitido ser apresentado ou considerado no tribunal porque nada havia sido
provado. Não tenho dúvidas de que ele matará a próxima desavisada também,
se não for parado.
Observo Edison caminhando feliz ao lado do desgraçado e sei que ele é
tão culpado quanto porque ajudou o homem a se safar.
É o tipo de coisa que não tem fim.
Edison para ao meu lado. Ele sabe que eu condenei seu protegido aos
olhos do povo.
— Ainda vamos conversar sobre um processo de danos morais — ele
murmura baixo, apenas para que eu escute.
Não fala sério. Eu sei bem que ele pretende me comer. Respiro fundo e
tento dar meu melhor naquela situação.
Edison parece muito satisfeito em seu terno caro. Não que eu o julgue
pela moda. Até porque minha roupa também não é das mais simplórias.
Meu esposo tem um bom emprego e costuma ser generoso com
presentes. Tenho o luxo de possuir coisas boas por causa disso.
Eu forço um sorriso.
— Como se sente com a absolvição do seu cliente?
Ele me encarou como se me devorasse. Odiava aquela sensação.
O advogado ignorou minha questão e continuou andando ao lado do
assassino. Baixei meu telefone e me recostei contra a parede do fórum. Na
área externa, tudo parecia mais calmo.
— Ei, Joana — Edison voltou, pouco depois. — Quer uma exclusiva?
Poderíamos sair...
— Não dá, já tenho compromisso.
Eu faria muita coisa pela minha carreira, mas sentar num restaurante ao
lado daquele homem sabendo que ele desejava que nosso vínculo se tornasse
mais profundo, não era uma dessas coisas.
— Compromisso? — Ele me dá aquele sorriso que funciona bem para
os jurados.
Isso só me irrita. Ele nunca saberia disso, no entanto. Eu aprendi a
manter meu rosto o mais neutro possível.
— Sim. Jantar com o maridão. — Meu sorriso se torna real. Sempre
que menciono que sou casada, o sorriso de Edison desaparece.
— Só ia perguntar se você quer lanchar.
Eu tenho um anel gigante no meu dedo. E o cara ainda insistia para
que eu entrasse no carro dele? Era muito idiota se pensava que eu era esse
tipo de pessoa.
— A gente vai continuar fingindo que isso não está acontecendo?
O que porra estava acontecendo? Porque homens com dinheiro sempre
acham que as mulheres vão cair sentando em cima de suas pirocas?
— Eu realmente tenho que ir. Disse ao meu marido que o encontraria
em alguns minutos. Se eu não estiver lá, ele se preocupará. Você o conhece,
sabe como ele é...
Sim, ele conhecia Enzo. Todos conheciam Enzo. Ele trabalhava com
alguma coisa sobre softwares de segurança. Eu realmente não entendia
direito, mas sabia que tinha orgulho dele por ser um homem tão dedicado.
Enzo costumava aparecer no meu trabalho, às vezes nos tribunais, ele até
participava de juris populares. Ele ficou conhecido pelo promotor, por
advogados, e até soube que ele havia ido tomar café com Maria, uma das
juízas. Não que isso me preocupasse, ele apenas gostava de ler sobre casos
investigativos como hobby. Jamais tentou interferir de alguma forma nos
meus afazeres. Ter a presença dele constantemente no meu local de trabalho
era apenas um privilégio.
— Ainda não acredito que você se casou com aquele cara. Ele é
estranho, você sabe... O que ele faz mesmo?
— Trabalha com vendas...
— É meio pouco para uma jornalista, não?
— Ele ganha mais do que eu. Talvez até mesmo mais que você.
Eu não sei quanto Edison ganha, nem o quanto Enzo ganha. Nunca
falamos sobre dinheiro até porque nunca me faltou nada. Ele sempre fez
questão de pagar tudo e eu aceitei, encantada demais por sua generosidade.
Afastei-me do advogado, satisfeita por ter dado a última palavra.
Entro no meu carro. Mudo meu cambio para marcha à ré e saio do
lugar.
O único conforto que terei hoje é que passarei a noite ao lado do meu
marido. Sei que não devo contar a ele algumas das coisas que faço no
trabalho, mas Enzo é meu porto seguro, onde me ancoro após um dia difícil.
O homem da minha vida é a minha fortaleza. Tem sido assim desde
que nos conhecemos há dois anos, quando ele apareceu no meu trabalho para
instalar um novo software de proteção na empresa.
Todas as mulheres do trabalho ficaram de olho nele naquela semana
que Enzo esteve lá. Mas, ele só olhou para mim.
E foi fascinante.
Era como se sempre nos conhecêssemos.
Nosso primeiro encontro foi na semana seguinte. Um mês depois ele já
me pedia em casamento. Rápido demais, mas estava tão apaixonada que não
me importei.
Agora sou sua esposa. E eu o amo completamente.
CAPÍTULO TRÊS
ENZO

Estendo minha mão e toco na de Joana. Percebo o sulco na sua testa,


mais profundo do que o habitual. Sei que algo a está incomodando.
— Dia ruim no trabalho? — Pergunto depois que pedimos nossos
pratos.
— Edison Magalhães colocou na rua um desgraçado abusador que
assassinou a esposa. Ainda não acredito que o júri não o condenou — ela
respirou fundo, parecendo buscar forças. — Eu realmente o odeio. Ele nem se
importa com culpa ou inocência, apenas se a pessoa que está defendendo
pode pagar seus honorários.
Joana busca o pão fresco em uma bonita peça artesanal sobre a mesa,
separa-o com as mãos e enfia um pedaço na boca, mastigando com raiva.
— Ele é um idiota — concordo.
Sei que os advogados de defesa desempenham um papel importante no
sistema, mas existe uma parcela que é como Edison, oportunista. Eu sei,
quando alguém se aproxima muito da Rosa Negra, precisamos de advogados.
Alguns são capazes de vender a alma por dinheiro.
Não gosto de gente que joga sua lealdade sobre moedas. Por isso,
sempre que percebo que meus irmãos ou nossa família está em perigo, eu
prefiro destruir o perigo do que enfrentar meios legais.
Mas, como disse, às vezes precisamos de advogados. Especialmente
quando cai algum questionamento sobre meus irmãos. Usamo-nos, claro. Um
lance profissional. Apenas isso. Normalmente os ignoro, mas há algo em
Edison que me irrita.
Já o investiguei. Especialmente quando Joana começou a atacar seu
último cliente. Todavia, não o peguei fazendo nada de errado além de trair
suas várias namoradas. Cretino sim, mas criminoso? Não sei dizer. Não
ficaria surpreso se ele tivesse fantasmas no porão, contudo.
— O marido fez isso — decretou minha esposa. — Eu sei que ele fez.
— Joana se inclina para frente. — Você sabe o que disse que estava fazendo
quando ela morreu?
— O quê?
— Que estava passeando com o cachorro. Ele tinha um daqueles
relógios da xiaomi, que mostra por gps seu trajeto, e mostrou como percorreu
a rota ao longo do guaíba como sempre fazia ao entardecer. Como se tal coisa
não pudesse ser facilmente manipulada.
Todos os dias ao entardecer, hum?
— Ele apresentou uma rotina certinha, do dia a dia?
Ela voltou a mastigar o pão por um momento, pensando nas evidências.
Depois começa a assentir lentamente.
— Sim. Acordava tal hora, saía para o trabalho, retornava na hora X,
caminhava com o cachorro por tal lugar. Parece um cara normal, não é? Mas
você tinha que ver seu olhar. Era assustador. Muito assustador. Não acredito
que o júri o deixou sair.
Bebo um gole do vinho.
— Parece um cara bem metódico.
Como eu. Gosto de minhas meias dobradas de uma certa maneira, uma
quantidade precisa de camisas limpas no meu armário, meus sapatos sempre
lustrados e bem organizados, na ordem certa, espaçados em quinze
centímetro de distância. Quanto isso irrita Joana?
Ela deve ter lido minha mente porque estendeu a mão para apertar meu
antebraço.
— Você também é metódico, mas não é um assassino como esse cara.
Pego os dedos dela e os entrelaço nos meus.
— Sou apenas um homem apaixonado, querida. Mas, às vezes sou
chato com minhas coisas, mesmo. Se isso a incomodar alguma vez, você
pode me dizer.
Se ela soubesse... se soubesse, minha esposa cumpridora da lei ficaria
horrorizada.
— Ah Enzo. Estou tão revoltada — ela voltou ao assunto. Tinha essa
personalidade. Precisava falar, senão explodia. — Ele matou sua primeira
esposa, mas o juiz não pôde deixar entrar essas evidências. Disse que havia
sido inocentado por falta de provas. Acho que o júri teria votado na
condenação se soubessem que essa era a segunda esposa que desaparecia de
forma estranha... E como ele acabou com duas de suas esposas, isso faz dele
um assassino em série, não acha?
— Sim. Concordo. — Coloquei seus dedos na minha boca e dou um
beijo gentil contra eles antes de ter que me afastar para a comida recém-
chegada.
— Se apenas o corpo tivesse sido encontrado... Tenho certeza que você
teria condenado aquele cara apenas com suas matérias.
— Também acho. Mas, sem corpo... tudo foi tão difícil. E a grande
mídia não se interessou muito pelo caso. A vítima era apenas uma dona de
casa sem emprego formal.
Ela cai em um silêncio frustrado e olha para o prato. Normalmente, eu
não tomo nenhuma atitude tão rápido. O cheiro do último que matei ainda
está cravado na minha mente. Mas prevejo que terei que fazer algo sobre esse
imbecil que matou a esposa.
Joana não conseguirá dormir bem até que seja resolvido. A injustiça
vai massacrá-la. E eu ficarei quieto vendo-a se corroer? Não mesmo!
É por isso que faço o que faço. Alguém tem que manter o equilíbrio.
Um crime covarde precisa ser punido ou as pessoas sofrem e, nesse caso,
minha esposa sofre e isso não é aceitável.
Não posso fazê-la feliz a todo momento do dia. Sei que isso não é
possível, mas vejo como meu dever remover o maior número possível de
obstáculos em seu caminho. É meu dever como marido.
— Não vamos mais falar sobre isso — ela anuncia, pegando o garfo.
— Como foi o seu dia?
— Nem vale a pena mencionar — murmuro, lembrando dos pedaços
moídos.
Joana torce o nariz adorável.
— Tão ruim assim?
— Não ruins, apenas chatos e iguais. Por isso gosto tanto de ouvir suas
histórias. Você tem uma matéria para amanhã, não?
— Nada sério, apenas a demora do INSS em fornecer o benefício a
uma pessoa que se acidentou de moto.
Aceno enquanto mordo um pedaço da lasanha.
— Amor, vou ter que sair da cidade por alguns dias. Não mais que
quarenta e oito horas, eu acho. Como sabe, meu chefe, Lucas, vai retornar em
breve de sua viagem e eu preciso melhorar minhas notícias. Quero vender um
novo software para uma empresa perto de Uruguaiana.
O rosto bonito e redondo de Joana ficou sério. Seu lábio inferior se
projeta de uma maneira que me faz querer me inclinar para frente e mordê-lo.
— Vai de carro?
— Provavelmente.
— Você sabe que eu me preocupo. As estradas estaduais estão
péssimas.
— Não se preocupe, eu sou bom na direção. Contudo... Talvez devesse
pedir para sua irmã lhe fazer companhia nesses dois dias.
Não gosto da ideia de que fique sozinha em casa.
— Oh, é uma boa ideia. Ela está aprendendo a tricotar, você sabia
disso? Talvez ela possa me ensinar e eu possa fazer uma touca para você no
inverno.
— Talvez ela possa nos ensinar e eu possa fazer uma para você no
inverno.
Joana começa a rir.
— Você é muito bom dono de casa, sabia?
Balanço meus dedos.
— Eu sou muito bom com minhas mãos. Você mesmo disse que tenho
dedos pecaminosamente talentosos.
Sua risada é substituída por um rubor.
— Eu não acho que as habilidades que você usa comigo são as mesmas
que você usa com tricô.
— Vou te tocar hoje à noite até você gritar e depois nós dois teremos
aulas de tricô.
Seus olhos disparam e ela murmura:
— Enzo, há outras pessoas aqui no restaurante!
— Eu sei. É uma pena. Coma, querida. Estou com fome de outra coisa
e, como você se opõe a mim fodendo-a publicamente, teremos que esperar
até chegarmos em casa para eu alimentar esse apetite em particular.
Suas bochechas ficam ainda mais rosadas e, mais importante, se
afastam do marido assassino em série que está desfrutando de sua liberdade.
Por enquanto...
CAPÍTULO QUATRO
JOANA

Joseane sempre teve um temperamento complicado. Apesar de ter um


grande coração, ela costumava ser irascível, e meus casos policiais a
deixavam ainda mais revoltada quanto eu.
Minha irmã está passando a noite comigo, já que Enzo viajou a
negócios. Odeio quando ele tem que sair nessas viagens, mas sei que isso faz
parte do seu trabalho. Meu marido é um dos melhores vendedores da empresa
e reconheço o quanto o trabalho é importante para ele.
Conheci seu chefe, Lucas, em meu casamento. Ele é um homem grande
e bonito, com olhos curiosos e escurecidos. Lembro-me de ele segurar meus
ombros e me fazer jurar amar Enzo até meu fim. Isso porque Enzo é como
“um filho” para ele. Foi uma denominação estranha, pois ambos tem quase a
mesma idade.
Quando ouviu minha resposta afirmativa, sorriu e disse que sabia que
eu era uma mulher de palavra. Os demais homens da empresa também eram
estranhos, mas Enzo me disse que eu podia confiar a vida à eles.
Então tento esconder minha decepção quando ele precisa sair. Lembro-
me que ele é um bom marido e está presente sempre que pode. Ele está
trabalhando. Colocando comida dentro de casa. Agindo como um homem
sempre deve agir.
— Você quer mesmo ficar fazendo comida ou podemos tricotar como
combinamos?
Eu não sei porque diabos Joseane aprendeu aquele hobby. Mas, ela era
um pouco obcecada com qualquer atividade inédita.
— Desculpe, estou louca para comer algo doce. Um bolo com café.
— Você sabe que tem várias padarias por aqui, que pode comprar um
bolo, não é?
— Bolos prontos não tem um ingrediente fundamental...
— Qual?
— Meu amor.
Joseane dá uma sonora gargalhada.
— Céus, que cafona.
Adoro cozinhar. Sobremesas são meu prato favorito. É uma das duas
coisas que sempre me deixa de bom humor. A outra coisa está muito longe
para usar a boca em mim.
Seguro um suspiro apaixonado. Enzo sempre me deixa com um sorriso
no rosto. Sobremesas e um marido amoroso. O que mais uma garota poderia
querer?
— Não aja como se você não amasse meus doces caseiros.
Seu sobrepeso era em parte culpa minha. Eu sempre estava enviando
doces com chocolate para o apartamento dela na Azenha.
— Eu amo seus doces mais do que devia. Mas estou tentando uma
nova dieta.
— Por que vive de dietas? Você nem é gorda.
— Eu sou e você sabe disso. O espelho sabe disso. Minha balança sabe
disso.
— Tá — admito. — E daí que você está acima do peso? Você é uma
das garotas mais bonitas dessa cidade.
— Eu tô cagando para a minha aparência. O que me preocupa é a dor
nas pernas, o cansaço no final do dia, a dor de um corpo pesado... Ah céus,
porque é tão difícil perder peso? Sabia que mesmo com dieta e exercícios eu
engordo?
Toco o ombro da minha irmã com suavidade. Eu temo que ela se
enxergue diferente do que ela é: uma pessoa maravilhosa, linda e gentil.
Temo que o simples fato de seu peso estar um pouco alto abale sua
autoestima e a faça desenvolver algum tipo de transtorno alimentar.
— Sabe, sobre o tricô — ela interrompe meus pensamentos. — Você
poderia fazer os últimos pontos para poder dizer que fez algo. — Eu torço o
nariz com a ideia. — Deixa pra lá. Imagina a Sra. Joana contando uma
mentirinha ao marido, de que fez tricô...
— Parece bobagem mentir sobre algo que você não precisa.
— Às vezes, uma mentira é para um bem maior. — Ela me encara
firme, como se estivesse tentando me ensinar uma lição.
— Eu disse que amo a cor que você pintou seu escritório? — Mudo de
assunto rapidamente. Ela postou fotos do ambiente reformado essa manhã no
Facebook. — Ficou tão chique.
Joseane sabe que estou tentando desviar a mente da sua lição. Mas,
simplesmente se aquieta enquanto continuo a bater a massa do bolo.
Todo mundo tem suas esquisitices. Eu também. Não gosto de mentiras.
Mesmo as pequenas. Mesmos as irrelevantes. Para mim tudo deve ser preto-
no-branco. Oito ou oitenta. O fato de eu lidar com fatos jornalísticos no dia a
dia me moldou assim.
De repente, o telefone toca. Olho para minhas mãos melecadas e depois
aceno em direção ao aparelho.
— Por favor, coloque no viva-voz — solicito.
Joseane faz isso. Logo um calafrio percorre minha espinha ao som do
meu nome sendo chamado, porque eu sei quem é sem precisar de
apresentação.
— Olá, Joana.
Edison tinha o disparate de me ligar? No meu aparelho particular?
Quem forneceu meu número?
— Sim? — dou outro sorriso falso para tentar não enervar minha irmã.
Se eu contasse para ela o quanto aquele homem era inconveniente,
Joseane falaria a Enzo ou ela mesma iria invadir seu escritório e mostrar que
ninguém mexe com a nossa família. Eu não queria provocar um problema.
— É Edison. Liguei porque... enfim... seu marido está fora da cidade,
não é? — Ele tem aquela voz pastosa que me dá ânsia de vômito.
Como ele sabe que Enzo está fora da cidade?
— Sim. Está. O que tem isso?
— Quero muito falar com você. Sabe, admiro seu trabalho. Tenho algo
que pode te pagar bem.
— Eu não estou procurando um novo emprego. — Minha voz está
carregada de raiva. Joseane me encara. Não são necessárias palavras para ela
compreender tudo.
— Não despreze esse trabalho sem a gente conversar. Quem sabe um
jantar?
De repente Joseane puxa o telefone da mesa. O posiciona bem perto da
boca?
— Cara, você já viu o anel no dedo dela? Tem noção de que está
ligando à noite para uma mulher casada, chamando-a para jantar? Tenha
semancol!
Silêncio por alguns segundos.
— Quem é?
— Eu sou a irmã dela. E não acho que Joana esteja preocupada com o
quanto você pode pagar. Minha irmã gosta do trabalho dela. Minha irmã é
boa no que faz.
Ela deixa sua antipatia por Edison clara em seu tom. Joseane nunca se
constrangeu em ser antipática quando quer.
— Sua irmã é adulta e pode responder por si mesma.
— Ela já disse. E você finge não entender. Talvez você queira que meu
cunhado lhe explique melhor.
O telefone fica mudo. Depois, o sinal de que a ligação foi encerrada.
Observo minha irmã, orgulhosa de sua confiança em falar com quem quer
que seja.
— Obrigada.
— Se ele continuar te enchendo o saco, me avisa. — Ela coloca o
celular na mesa. — Não gostei da voz dele. Não gostei da aura dele. —
Quase sorri, minha irmã era ligada a coisas astrológicas. — Oferecendo-lhe
um emprego? Há. Não sabia que quicar num pau era trabalho!
O telefone volta a tocar. Observo o aparelho, imaginando se não é
novamente Edison. Porém, dessa vez o visor mostra um nome muito amado.
Limpo as mãos rapidamente na pia e busco o celular, caminhando com
ele em direção a sala.
— Joana — Enzo diz antes que eu possa cumprimentá-lo. — Olá
amor.
— Oi. — Não sei como esse homem ainda pode me dar borboletas no
estômago, mas ele pode com o simples tom da sua voz.
— Eu queria ligar e dizer que cheguei bem da viagem. Estou no hotel.
Ligo novamente para você antes de ir para a cama.
— Certo. Eu te amo.
— Eu também te amo, querida.
— Não trabalhe demais. Seja qual for sua meta, você sempre vai
consegui-la.
— Não se preocupe comigo.
— Estou fazendo bolo. Guardarei um pedaço.
— Aquele de laranja que eu gosto?
— Esse mesmo.
— Você é maravilhosa. Vou cumprir a minha obrigação e retornarei o
mais breve possível.
Eu realmente tenho o marido perfeito.
CAPÍTULO CINCO
ENZO

Eu guardo meu telefone. Joana e sua irmã, Joseane, vão comer, tricotar,
assistir televisão e ir para a cama por volta das dez. Eu tenho apenas cinco
horas para concluir minha tarefa.
Evandro Garbin é muito preciso, como minha esposa disse. A grama
dele é tão uniformemente cortada que eu não ficaria surpreso se ele o fizesse
à mão. Ele provavelmente matou a esposa por não colocar o controle remoto
em seu devido lugar ou por algo igualmente mesquinho. Parece ser do tipo.
Da minha posição no final de sua propriedade, atrás do parque onde ele
escondeu o corpo de uma mulher transitória que ele matou, eu posso vê-lo se
preparando para caminhar. Um zumbido alto precede ele e seu cachorro.
Olho para cima e vejo um zangão voando no alto. O cachorro dispara para
frente, perseguindo a abelha voando baixo.
Caminho estrategicamente atrás de Evandro. Ele avança para o parque.
Naquele horário, quase noite, não há muita gente perto das árvores, mas
Evandro não tem medo de andar por aquelas bandas. Ele é o perigo ali.
Mal sabe ele que eu também sou.
Perto de uma curva, onde uma formação rochosa cria um pequeno
abrigo, eu me aproximo.
Evandro me percebe, surpreso. Ele não está acostumado a ver pessoas
em seu caminho. Seus olhos disparam em direção à parte de trás daquelas
árvores. É aí que está o corpo da esposa?
Este é o lugar perfeito para matar alguém. É por isso que eu o escolhi.
Enfio minhas mãos no meu casaco e dou um passo à frente. Ele dá um passo
desajeitado, como se não soubesse se devia avançar ou retroceder.
— Como é ser um homem livre?
Ele suspira aliviado, imaginando que sou algum repórter curioso.
— Como me sinto? Muito bem. A justiça existe no nosso país. —
Então, como se ele lembrasse que deveria estar triste, acrescenta: — Mas,
claro, quero que o desaparecimento de minha esposa seja resolvido.
Esfrego um dedo na minha barba rasa.
— Com o corpo, talvez o desfecho do seu julgamento fosse diferente.
Ele endurece e o sorriso desaparece.
— Sim, uma verdadeira tragédia.
Ele limpa a garganta e não fala até eu erguer o olhar para ele.
— Bom... vou continuar meu passeio.
Há um brilho claro em seu pescoço. Ele está começando a suar.
— Você acredita em equilíbrio, Evandro?
— Como assim?
— Minha esposa disse que você gostava de rotinas e ordem em sua
vida. Imagino que as pessoas que estragam as coisas o deixem louco.
— O que há de errado com a ordem? Se você não consegue se lembrar
de regras simples e não consegue executar tarefas simples, não oferece
realmente valor neste mundo. Existem estudos que comprovam o que estou
falando. Sabia que o simples ato de acordar de manhã e arrumar sua cama já
o coloca em uma seleta lista de pessoas com provável sucesso.
Avanço em sua direção. Ele não recua. Parece me estudar.
— Estou totalmente de acordo com você. Também não gosto dessas
pessoas. — Pego a seringa do meu bolso e o apunhalo no pescoço antes que
ele tenha tempo de responder. — Eu não gosto nada de gente que faz
serviços porcos e deixam pistas — murmuro enquanto ele cai no chão.
Arrasto seu corpo em direção à mata fechada. Eu já havia preparado
anteriormente num pequeno local a maneira com que eu faria tudo da forma
mais limpa possível.
Sem tiros. Sem barulho. Sem som. O homem estava dopado por uma
medicação forte que consegui com um farmacêutico. Eu o queria acordado
para saber onde estava o corpo da sua esposa, mas depois eu faria o que fosse
necessário para trazer paz a Joana.
O amarrei forte em uma árvore e cobri sua boca. Enquanto o breu
noturno caía naquele lugar, sentei em uma pedra e aguardei que acordasse.
Lucas não sabia o que eu andava fazendo, e eu imaginava se devia
contar ao pai da Black Rose. Ele me condenaria? Não sei dizer...
Cerca de uma hora depois, ouvi um gemido. O homem estava
acordando. Deixei que se situasse, abrisse seus olhos e compreendesse tudo
que estava acontecendo.
— Eu quero informações — antecipei. — Onde está o corpo da sua
mulher?
— O quê? — ele gaguejou.
Eu quase podia acreditar na sua inocência não fosse uma investigação
prévia me dizer que o cara gostava de espancar namoradas e que uma moça
universitária havia sido encontrada morta exatamente naquele parque, dois
meses antes.
— Não me faça repetir a pergunta.
— Acredite em mim, não sei onde...
— Olhe — o interrompi. — Você tem sua rotina, não é? Eu tenho a
minha. Após trabalhar durante o dia, eu gosto de chegar em casa, tomar um
banho, sentar na varanda da minha casa, e tomar chimarrão com a minha
esposa. Eu sei o que está pensando: é uma vida muito comum e chata. Mas,
sabe? Eu gosto da chatice. Do comum. Eu gosto de não ter muita emoção no
meu dia a dia. E alguém interrompeu isso: você. Porque agora minha esposa
está totalmente revoltada com o caso da sua esposa, e eu sei que você será o
assunto dela por semanas. Talvez para sempre, porque ela nunca se esquece
de injustiças. Então...
— Você é maluco?
— Maluco ao ponto de derrubar você e o trazer para essa mata? Sim.
Maluco ao ponto de querer minha esposa triste? Não. Facilite a minha vida e
fale logo onde ela está.
Dei-lhe alguns segundos para pensar. Eu não era violento. Mesmo
quando esquartejava alguém, só o fazia se a pessoa merecia.
— Nada? Não vai falar?
Pus as luvas. Estava tranquilo, frio. Tinha uma automática no casaco
que me protegeria caso algo saísse errado.
Peguei uma faca. Aproximei-me de Evandro. Andei em volta dele,
observando o que melhor eu poderia cortar. Decidi por um dedo.
Antes, cobri sua boca, tapando-a com um pano sujo, lacrando com uma
fita adesiva.
Então, me pus ao serviço.
Não era difícil. Se você já esquartejou uma galinha, saberia como
cortar um dedo. As juntas não eram assim tão diferentes.
Enquanto ele se contorcia contra a árvore, me lembrei que teria um
jogo novo no campeonato gaúcho. Fazia muito tempo que eu não ia ao
estádio ver o Grêmio.
O sangue se esparramou na grama verdejante. A mistura de verde e
vermelho é bonita. Lembra-me um quadro que Joseane pintou no verão
passado.
Dedo no chão. Voltei para frente e o observei.
— Onde está o corpo? — indaguei.
Quando tirei a mordaça, fez menção de gritar, então lhe dei um belo
soco na cara.
— Vai ser pior se começar a fazer escândalo. Eu odeio gritaria e
baderna. Você não foi homem para matar sua mulher? Seja homem para
enfrentar as consequências.
— Você é maluco... maluco...
— Onde ela está?
— Eu não a matei... Eu juro que não a matei.
— Você vai mesmo me fazer arrancar todos os dedos da sua mão?
Talvez cortar fora um pedaço do seu pau? Furar seus olhos? Vou lhe dar
cinco minutos para você meditar enquanto sente a dor pulsando na sua mão.
Então você irá me dizer onde o corpo está.
Voltei a sentar perto de uma árvore. Limpei minha faca, e imaginei
como cortaria ele de uma forma que mandasse uma boa mensagem a
sociedade.
Eu tinha um machado no carro. Mas, ele estava numa avenida, e
poderiam haver câmeras por perto.
Senti vontade de fumar. A maldita carteira de cigarro também estava
no carro. Respirei fundo, percebendo que devia ter planejado melhor minha
ação.
— Atrás... atrás do banheiro público do parque. Eu a enterrei lá de
madrugada — ele confessou, entre lágrimas, me fazendo erguer a face e
encará-lo. — Você vai me soltar agora, não vai? Eu já disse o que você
queria.
Que merda de lugar para se enterrar uma pessoa.
— Nunca disse que ia soltá-lo.
Eu não planejava atirar no cara, mas, de repente, estava cansado demais
daquela merda.
Puxei minha automática, mirando-a no crânio do infeliz.
Foi uma morte misericordiosa, alheia a minha personalidade. De fato,
eu devia estar ficando muito velho para essas coisas.
Enquanto volvia para a trilha, puxei meu telefone. O cachorro de
Evandro surgiu no final do terreno de terra e então me dei conta de que o
idiota deve ter colocado sua smartwatch na coleira do animal, para que ele
circulasse pelo parque enquanto matava a esposa.
Vou até meu carro. Preciso matar tempo, então sento no banco
enquanto busco o cigarro mentolado do porta-luvas.
Enquanto aspiro a fumaça, ligo para Joana.
— Como vão as coisas? — ela pergunta alegremente.
— Apenas outro dia no escritório. Eu devo estar em casa amanhã cedo.
— Sinto sua falta.
Eu abaixo minha voz mesmo que ninguém esteja por perto.
— Você está sozinha?
— Não, minha irmã vai dormir comigo essa noite. Portanto, sem sexo
por telefone. Também não me deixe excitada, caso contrário não poderei
dormir.
Isso é decepcionante.
— Ok, tenha uma boa noite de sono, porque amanhã eu precisarei
dessa energia extra.
— Eu posso sentir o caminho perigoso que essa conversa pode levar,
então estou desligando agora porque Joseane já está me olhando
estranhamente — diz ela, mas eu posso ouvir o riso e a antecipação em sua
voz.
Em seguida, disco o número de Ricardo.
***
As duas e quinze retorno para perto do banheiro público. O corpo da
esposa atraiu dois cachorros de rua e Ricardo já está lá, observando o monte
de carne podre com um olhar chocado.
— É a esposa?
— Isso mesmo.
— E o marido?
— Eu o matei.
Ricardo cobriu parte da boca, tentando se proteger do ar pungente.
— Matou? Por quê?
— Porque eu quis.
Ele me encara como se estivesse juntando peças.
— Mas que bosta, hem?
— Não me olhe assim. Maníaco é o cara que fez isso com essa moça.
Ricardo deu os ombros.
— Ok. Eu nem ligo, na verdade. Vamos avisar a polícia?
— Sim, faça isso, mas quero um favor. Peça para Juliano descobrir
tudo que puder sobre um tal de Edison Magalhães.
— O advogado?
— Esse mesmo.
— Mais sujo que pau de galinheiro — brincou. — E o corpo do cara?
Quer que eu dê um sumiço?
— Por favor, leve-o para o mar. A água salgada vai corroer qualquer
vestígio que eu possa ter deixado.
— Vou mandar os notados fazerem isso. Primeiro cadáver é sempre
emocionante.
Não digo nada, apenas puxo mais um cigarro.
A lua brilhava alto no céu. Avistei novamente o cão de Evandro.
— Acha que tem lugar para levarmos esse? Não queria deixar o animal
abandonado por aí...
— Vou mandar um dos garotos colocar no facebook que ele o
encontrou perdido. Quando ninguém aparecer, a gente fica com ele. —
Ricardo contrapôs.
Aliviado por saber que o animal não ficaria sozinho nas ruas, voltei
para o carro. Ainda tinha algumas horas para dormir antes de retornar para
minha casa.
CAPÍTULO SEIS
JOANA

— Já conseguiu aquele arquivo sobre o aumento do preço das


passagens? — indago à minha assistente Bruna quando ela abre a tampa do
recipiente de biscoitos que trouxe consigo.
Ela os cheira antes de fechar a tampa e volver em direção ao
computador.
— Sim, eu trabalhei nisso de manhã. Você acha que o aumento tem a
mão do sindicato?
— Sempre quem paga o pato é o povo — retruco. — Aumentam as
passagens, mas não melhoram o transporte público nem o salário dos
motoristas e cobradores. Então, esse dinheiro extra vai para onde? Se o
sindicato não piou, está junto na maracutaia, e eu vou provar.
— Brasil, um país de tolos — ela gemeu. — Desde que entrei nesse
emprego, só vejo corrupção e maldade. Todos os dias.
Era um fato. Não a contradisse enquanto volvia para o computador e
digitava meu próximo artigo. Um policial PM do Rio de Janeiro foi expulso
da corporação por denunciar o envolvimento de poderosos no Comando
Vermelho. Um caminhoneiro acidentado gritava por socorro enquanto sua
carga era saqueada por populares. Um pequeno agricultor teve suas duas
vacas roubadas e mortas por bandidos que resolveram fazer um churrasco
para comemorar uma boa venda em drogas.
O país apodrecia no caos.
— Vai escrever agora? Eu pensei que você estava saindo mais cedo...
— ela me lembra.
Fiquei empolgada o dia todo por causa de Enzo. Eu sei que ele ficou
apenas duas noites fora, mas odeio quando viaja. Meu consolo é que nesse
tempo sempre tenho um momento a sós com minha irmã. Antes de Enzo,
Joseane e eu éramos sozinhas, por isso, muito unidas. Eu morava com ela
antes que ele aparecesse e me arrebatasse. Enzo é um homem que sempre
sabe o que quer. Nosso namoro foi curto e nosso casamento bastante rápido.
Não que esteja reclamando. Eu aproveitei cada segundo dele me tirando o
fôlego. Ele ainda faz isso. Nosso estágio de lua de mel não parece estar
chegando ao fim tão cedo.
— Seu marido não está esperando por você? Corrupção e desgraça têm
todos os dias, mas um marido gentil esperando pela gente...
Salvo o documento recém escrito e pego minha bolsa da cadeira em
frente à mesa dela. Meu sorriso é inegável.
— Você está certa. Muitas coisas não valem a pena, mas Enzo vale.
O telefone de Bruna vibra em sua mesa. Ela atende. Seus olhos se
arregalam quando sua boca se abre.
— O quê?
Largo minha bolsa de volta.
— Eles encontraram o corpo da esposa de Evandro Garbin. Estava a
poucos metros da casa dela, perto do parque daquele bairro.
— Meu Deus — sussurro em choque.
Ela desliga o telefone.
— Claro, o marido não está em lugar nenhum. — Levo um minuto
para processar o que ela está dizendo.
— Eles não podem acusá-lo de assassinato novamente. Ele já foi
considerado inocente.
— Você não está pensando — Bruna ralhou. — Obviamente o
ministério público vai recorrer. — Suas sobrancelhas franzem e eu sei que
ela está pensando a mesma coisa que eu.
Será que encontrariam provas no corpo de que o assassinato havia sido
cometido pelo marido? Aliás, já fazia um tempo que o corpo estava
desaparecido... haveriam quaisquer provas no cadáver ou apenas um resto de
carne podre?
— Eles precisam encontrá-lo primeiro, de qualquer maneira.
Provavelmente Evandro já se se mandou. Ele tem o dinheiro. Me dá nojo
pensar nele em algum lugar aproveitando a vida.
Bruna dá os ombros.
— Francamente, não sei se ele fugiria. Aquele maldito Edison sempre
consegue convencer os juris da inocência dos seus clientes. — De repente,
ela ri. — Não seria cômico que alguém o tenha matado?
— Como?
— Lembra daquele pedófilo que você cobriu o julgamento em março?
Foi encontrado morto.
— Ele já estava solto da cadeia? — Eu sei de quem ela está falando.
Não fazia muito tempo que o homem havia sido condenado por abusar de
uma menina.
— Réu primário — Bruna justificou. — Com emprego e residência
fixa.
Suspiro, cansada. O bastardo doente havia pegado apenas alguns anos.
Um pequeno tapa em comparação a dor e o sofrimento que ele fez passar
aquela pobre criança.
— Enfim, agora ele vai ficar preso pela eternidade no inferno. — Ela
torce um meio sorriso, não sentindo uma lambida de culpa pelas palavras.
Eu também não.
— Meio que facilita o trabalho da justiça quando os doentes se matam
entre si. — Bruna aponta. — Ouvi boatos que era a Black Rose... Você
também já a investigou.
— Não deu em nada. É uma organização extremamente sigilosa e
secreta. Nem sei se existem mesmo, ou é apenas boatos.
— Se é a Black Rose, eles são heróis.
— Está brincando? Não é assim que as coisas devem funcionar —
afirmo, embora, no íntimo, acho que concordo com ela.
— Ah, esquece... Vá para casa ficar com seu marido. Pare de pensar
sobre isso agora. Amanhã a gente cobre isso.
— Não... é um furo grande...
— Eu faço o material da descoberta do corpo e coloco no site. Pode
confiar em mim, vou fazer uma boa matéria. E, para amanhã, vou reunir mais
informações e daí te repasso tudo para que você monte seu próprio artigo.
Sorrio para Bruna. Pego minha bolsa de volta e dou um adeus a ela.
— Amanhã vou atrás desse cara. Vou encontrá-lo de qualquer jeito! —
prometo.
Saio da minha sala. No corredor, vasculho minha bolsa para encontrar
as chaves. Enquanto manuseio a bolsa procurando por elas, sinto um
solavanco no ombro.
— Desculpe — digo enquanto vou tendo a percepção que bati em
alguém.
Meu olhar encontra Edison. Puta merda. Por que continuo me
encontrando com esse homem?
— Para onde você está indo, Joana? — ele pergunta.
Não sei por que me incomoda quando ele diz meu nome, mas sempre
me sinto intimidada. Estar perto dele sempre parece errado e nojento.
— Ver meu marido.
Todo o rosto de Edison muda com a menção de Enzo.
— Ouvi dizer que foi alguém da empresa dele que encontrou a senhora
Garbin. Vim aqui saber das novidades. Vocês da imprensa sempre sabem de
tudo.
— O corpo da senhora Garbin — Não posso deixar de acrescentar.
Durante o julgamento, Edison brincou com a ideia de que ela fugira.
Nenhuma mulher foge e não leva nada com ela.
— Parece que um tal Ricardo estava correndo por aquelas bandas e
percebeu o comportamento estranho de alguns cachorros. Foi lá ver o que ela.
Cavou um pouco a terra, e achou o corpo. Depois, ligou para a polícia. Você
o conhece?
— Não muito. Mas, ouvi dizer que ele é um ótimo desenvolvedor. —
Sinto meu estômago aquecer. —Parece que quem acabou fugindo depois de
tudo foi o Sr. Garbin. — Inclino minha cabeça para cima. Eu estou atirando a
isca.
— Bom, ele me pagou todos os honorários corretamente. — Edison
encolhe os ombros porque é só com isso que se importa.
Fico enojada.
— Eu te vejo por aí.
Eu tiro meu cabelo do rosto, passando por ele. Estendo a mão para tirar
meus óculos, tendo esquecido que ainda os estava usando. Minha miopia era
leve e qualquer lente daria conta, mas gosto da sensação que meus óculos me
dá. Estranhamente sinto como se tivesse um escudo. Estou começando a me
perguntar se realmente amo meu trabalho.
— Tenho certeza que sim, Joana — ele responde.
Não me viro para olhá-lo quando saio, indo direto para o meu carro. Há
apenas um lugar que eu quero estar agora. Em casa com meu marido. O único
homem em quem confio. O único homem que sempre me faz sentir segura.
CAPÍTULO SETE
ENZO

Pego o saco de pipoca e despejo o conteúdo em uma tigela. Minha


esposa bate a mão na almofada vazia no sofá, num óbvio convite.
Aquilo sim era a vida perfeita. A mulher que você ama, num
aconchegante sofá, com a televisão ligada em alguma série que nós dois
fazíamos maratona juntos, e pipoca para completar.
Nunca precisei de muito para ser feliz. Tem gente que sonha com
riquezas ou poder. Eu quero apenas Joana.
— Joseane te ensinou a tricotar?
Ela me dá aquele sorriso que responde mais que palavras.
Olho para a tela da televisão e tento lembrar os nomes dos
personagens. Depois de um minuto, desisto.
— A morena que usa batom vermelho é a Phoebe?
— Essa é a Mônica. A Phoebe é a loira.
— A que deu um tempo com o Ross?
— Eles não estavam dando um tempo! — ela ralhou. — E essa loira é
a Rachel. A Phoebe é a que canta gato fedido.
Olho para a televisão por algum momento, observando os personagens
circulando por um pequeno apartamento em Nova York. Não era uma série
daquelas que lhe fazia pensar por horas, mas era divertida e humana. Os
personagens tinham defeitos e qualidades que todos podiam se identificar.
Enfio um punhado inteiro de pipoca na boca.
Chandler beija Mônica. Os dois personagens estão namorando. São
muito diferentes, mas provavelmente dará certo, porque existe química. De
soslaio, observo Joana. Nós éramos igualmente diferentes. Sou grande; ela é
pequena. Sou mais calado; ela é espontânea e tagarela. Eu mato pessoas; ela
tenta ajudá-las.
— Como Porto Alegre anda perigosa, não? — ela comenta. A quebra
das palavras me faz encará-la. — Houve tantos assassinatos aqui
ultimamente... — finaliza.
— Eu não sei. — Eu passo a mão pelo braço dela. — Não presto muita
atenção nas notícias. Você está com medo?
— Não. Parece apenas estranho. Sempre houve mortes, mas agora elas
parecem diferentes. Sabe... quando falo com os policiais, sinto que estão
perdidos, porque são assassinatos sem pistas. Normalmente quando alguém
morre tem um monte de caminhos que você pode seguir. Mas, agora... — Ela
levanta seu doce rosto. — Você acha que devo me preocupar? Talvez um
serial killer? Como jornalista, estou sempre na mira.
— Não. — Puxo-a para o meu colo. — Nada vai acontecer com você.
— Dou-lhe um beijo firme antes de redirecionar sua atenção para a televisão.
— Eu cuidarei de você.
Ela se sente tensa e preocupada. Eu não gosto disso. Nem um pouco.
— Cuidar de mim como?
— Assim. — Deslizo minha mão sob a cintura de sua calça de ioga.
Ela está usando uma tanga, uma coisa fina feita de elástico e renda. É preciso
apenas o menor giro dos meus dedos em um ponto para que ele se encaixe.
— Enzo...
Eu separo seus lábios de boceta e empurro dois dedos dentro de sua
fenda suculenta.
— Oh! — ela geme novamente, só que desta vez sua voz está mais
rouca.
Joana tenta virar o rosto para mim, mas eu pressiono seu queixo até
que ela esteja de frente para a televisão.
— Olhos para frente, Joana. Este é o seu programa favorito, lembra?
— Sim, mas...
Eu mordo seu ombro.
— Sem desculpas, querida. Você assiste enquanto eu alivio seu
estresse.
Ela faz como é instruída. Eu não sei o quanto ela vê a série, o quanto
ela absorve da história. Minha atenção está nela e como sua doce vagina
sugando meus dedos mais profundamente para dentro. Ela encharca minha
mão e eu uso essa lubrificação para me mover mais rápido, prendendo seus
lábios carnudos e grossos entre meus dedos. Os sons de eu fodendo sua
boceta molhada são acompanhados pelas risadas do humorístico.
Enquanto sua vagina fica mais sensível, ela tenta fechar as pernas, mas
eu as afasto, cavando as pontas dos meus dedos em suas coxas macias.
Ela vem com um gemido alto e fino que emana da garganta.
— Joana, goze, meu amor. — A buceta quente da minha esposa
convulsiona ao meu redor. Seu orgasmo parece beijos minúsculos de
borboleta subindo e descendo em meus dedos. Seus tremores provocaram
meu próprio prazer. Com pressa, puxo para fora meu pau e derramo em meu
jeans. Minha visão fica embaçada quando eu martelo sua boceta macia com a
mão até que sua coluna se torne curvada.
Ela cai no meu peito. Eu lentamente a prendo com um dedo até que ela
pare de tremer e sua respiração volte ao normal.
— Cama, agora!
— Nós não terminamos esse episódio — ela murmura.
Com Joana nos meus braços, eu me levanto e vou para o quarto.
— Por isso que a gente assina Netflix — brinco. — Você pode assistir
depois. Mais tarde. Muito tarde.
Vou ter que despi-la e devastá-la. Meu pau está com muita fome para
ser ignorado. Deito-a na cama. Tiro a roupa, afasto as pernas dela e mergulho
nela sem dizer mais uma palavra. Eu a seguro assim, totalmente aberta para
mim e meu pau invasivo. Faz dois dias e é muito tempo para ficar sem sua
boceta ao redor dos meus dedos, ao redor do meu pau. O desejo me deixa
fraco e com fome. Eu quero devorá-la, consumi-la até que não reste nada de
nenhum de nós. Eu empurrei nela de novo e de novo até que sua boceta
estivesse cheia do meu esperma.
Limpo-nos com o lençol antes de cair no colchão. Jogo o lençol longe,
puxo o edredom sobre nós e fecho os olhos. Minha vida é carregada de
merdas enormes, mas naquele curto espaço de tempo eu tenho paz... ali... em
casa, com minha mulher em nossa cama.
É assim que eu quero terminar. Meu final perfeito.
Afago minha mão nas costas dela e espero que Joana adormeça. Eu
sempre espero.
O equilíbrio é importante neste mundo, mas a paz de espírito de Joana
é mais ainda. Eu nunca posso estar satisfeito a menos que ela esteja segura e
feliz.
CAPÍTULO OITO
JOANA

Olho para cima e vejo minha irmã em pé, encarando-me com o olhar
nitidamente questionador. Enfio meu desastre de tricô embaixo da mesa da
cafeteria para que ela não o veja.
— O que você está fazendo aqui? — finjo inocência.
— Eu sempre tomo meu café aqui. A questão é o que você está
fazendo aqui? — Ela cai na cadeira em frente à minha. Depois se inclina um
pouco para tentar dar uma olhada no que estou escondendo. – Não há
cafeterias perto do jornal?
Há uma cafeteria ao lado do trabalho, mas eu decidi ir naquela direção.
Joseane faz um gesto com a mão para eu lhe dar meu tricô. Pego-o debaixo
da mesa e o entrego. Ela nem tenta lutar contra uma risada.
— Eu sou péssima nisso. — Busco a xícara com meu café puro,
tomando um gole. — Ninguém me conhece aqui. – comento em seguida,
tentando justificar minha presença.
— Por que importa se as pessoas te conhecem? — Em segundos ela
desfaz a bagunça emaranhada nos fios. Suas mãos são mágicas ou algo assim.
Joseane tem o dom do artesanato, coisa que eu jamais teria.
Mesmo sendo irmãs, éramos tão diferentes.
— O motivo é um pouco vergonhoso. — Admito.
— Sou sua irmã. Entre nós não existe isso. Você pode me dizer
qualquer coisa, que jamais irei julgá-la. Eu nem estou tirando sarro de você
sobre isso. — Ela coloca minha tentativa de fazer uma touca na mesa,
sabendo que não quero que ela faça isso por mim.
— Você se lembra daquele cara que me ligou naquela noite que
estava lá em casa?
Ela levanta as sobrancelhas perfeitas. Sua cara é de repulsa.
— Senhor macho escroto?
— Sei que você não o conhece, mas existe algo nele que me dá ânsia
de vômito. Lá no trabalho muitas mulheres o bajulam porque é um advogado
famoso. Nos tribunais, ele deslumbra os jurados com seu charme falso.
Realmente não entendo como as pessoas não veem através dele. Sei que não
é feio na aparência, mas exala uma vibração estranha que sobe pela minha
espinha toda vez que eu o vejo, e me dá calafrios. Pode ser porque sei que ele
é um merda.
— Bom, o jeito que ele falava com você era assustador. Parecia quase
íntimo. Se eu não a conhecesse bem, acharia que eram amantes.
— Vê? É por isso que estou tentando evitá-lo. Ele está sempre por
perto porque seus clientes são sempre manchete no jornal. Fico imaginando o
que Enzo faria se visse a maneira como ele me olha. Sei que algumas
mulheres gostam de provocar seus parceiros com ciúmes, mas não faço o
tipo. Não quero que meu marido fique estressado porque tenho que conviver
com aquele cara.
— Na minha opinião você deveria contar a ele.
Minha boca se abre, mas nenhuma palavra sai.
— Se ele está te incomodando, você deve falar com seu marido. Ele
precisa estar ciente das coisas que ocorrem com você. Isso vai estabelecer um
canal melhor de confiança.
Eu tomo outro gole.
— E direi o quê? Que Edison é assustador? As pessoas pensam que
Enzo também é.
Não ligo quando ouço as pessoas dizerem isso sobre ele. Enzo não é
assustador. Ele é brilhante, gentil, doce. Ele é um homem bom, trabalhador,
alguém em quem posso confiar. Claro, não era perfeito, mas quem era? Às
vezes ele me incomoda um pouco com seu excesso de organização e limpeza.
É como se nunca deixasse rastro. Tem dias que acho que sequer moramos
juntos.
Mas, isso é apenas uma característica. Enzo gosta de detalhes. Por
menores que sejam, são importantes.
Talvez por ser assim, foi que me conquistou tão rapidamente. Não
havia nada que eu pudesse reclamar. Ele sempre foi atencioso e humano.
Enzo percebe cada respiração que exalo. Ele sabe até mesmo os dias
que vou menstruar, e sempre deixa um bombom no criado mudo um dia
antes.
É o homem perfeito.
Eu me mexo na minha cadeira tentando fazer minha mente vagar por
esse caminho. Enzo está tão sintonizado com o meu corpo porque presta
atenção aos sons que eu faço. Ele sabe quando eu gosto de algo, o que por
sua vez permite que me traga um grande prazer.
Certa vez ele me disse que eu era o anjo de sua vida. Foi uma confissão
inesperada, e fiquei curiosa com seu passado, mas ele nunca fala muito disso.
“Não há nada para dizer”, ele me comentou. “Eu cresci sem ninguém e
cometi erros, mas já encontrei minha família”. Ele nunca explicitou, mas eu
acreditava que essa família era eu. E, em breve, se Deus permitisse, bebês
que estava louca para ter.
Enzo me protege e me cuida. Eu acho que isso pode ser parte da razão
pela qual não disse algo sobre Edison aparecendo o tempo todo. E se eu
estiver errada? E se estivesse vendo algo a mais no seu olhar? Eu não queria
meter meu marido em confusão por alguma bobagem.
Edison é advogado. Nós temos que conviver porque sou repórter
voltada a área criminal. Não tenho certeza se Enzo é do tipo ciumento. Acho
que nunca houve uma razão para ele ser. Se eu dissesse algo, isso poderia
tornar as coisas estranhas.
— Enzo não é assustador. Ele é muito inteligente e pode ler as
pessoas. Só é assustador se você tem algo a esconder. — Joseane adora meu
marido.
Eu sorri. Quando se conheceram, Joseane estava passando por um
momento complicado. Ela tinha um ex-namorado abusivo que vivia
aparecendo no apartamento dela. Havia medidas protetivas dadas por um
juiz, mas o cara nunca as respeitava. Então Enzo disse que falaria com o dito
cujo.
Enzo deixou claro que considerava Joseane como uma irmã e cuidaria
dela. Aquilo a marcou muito. Alguns dias depois o ex-namorado ligou
pedindo perdão por tudo e nunca mais apareceu.
Isso foi no começo do nosso namoro, quando eu pensava que jamais
iria me apaixonar tanto. Todos os meus relacionamentos até então eram
decepcionantes, com homens que simplesmente não se importavam comigo.
Antes de Enzo, nunca soube o que era receber uma mensagem à noite
perguntando como havia sido meu dia, ou se eu havia chegado em segurança
em casa.
Na época estava investigando a Black Rose. Estava nervosa e
preocupada com tudo. Enzo foi um bálsamo.
— Tenho sorte por ter Enzo na minha vida. – acenei.
Não sei como outra mulher não o pegou antes de mim. O pensamento
me arrepia, porque não sei se há muitas no trabalho dele.
Ok, eu posso ser ciumenta. Não que eu tenha que me preocupar com
Enzo. Ele é tão gentil e amoroso que não consigo acreditar que me traia.
Quando nos casamos, antes de me beijar, ele repetiu murmurando os
votos contra meus lábios: “Até que a morte nos separe”. Eu lembro de ter
ficado arrepiada. E emocionada.
— Ah, sua sortuda! Você tem o melhor marido do mundo!
Sorrio para Joseane. É verdade.
— Brincadeiras à parte, se você está se sentindo constrangida sobre
Edison, acho que deveria contar a Enzo.
Estendo minha mão e seguro a dela.
— Prometo que o farei se a situação ficar insustentável.
Joseane olha para mim, não convencida pelas minhas palavras.
— Eu vou! – Tranquilizo-a. — Se ele fizer algo, vou falar com Enzo.
Até lá, espero que desapareça e realmente tudo seja coisa da minha cabeça.
CAPÍTULO NOVE
ENZO

Lucas, o pai da nossa organização, era completamente apaixonado por


sua esposa, Renata. Por isso nós não tínhamos o que se chamam de cadelas,
mulheres para servir aos homens da Black Rose.
Antes de Lucas comandar tudo, quem mandava no Sul eram os
Bianconi. Lucas era um dos Bianconi, mas, por vingança ao que fizeram a
Victor – seu irmão – matou praticamente todo mundo que pertencia àquela
máfia.
Os Bianconi tinham muitas cadelas, e muitas delas se tornaram garotas
dos homens da Black Rose. Apesar de serem proibidas de circularem pela
casa – Lucas não aceitava que prostitutas andassem no mesmo ambiente que
sua amada Renata – as garotas estavam sempre aos arredores, casas alugadas
perto da mansão, para transarem com os caras e terem algumas regalias.
Nunca ia a essas casas, mas queria falar com Ricardo, então não tive
escolha. Ele estava no quarto com uma das meninas, e outra esperava na sala,
de calcinha e sutiã, o olhar faminto na minha direção.
— Sabia que todas querem você? – ela me indagou.
Quase ri.
— Por quê?
— Todas querem o homem que é o braço direito de Lucas.
— Vocês têm Ricardo, que também é muito valoroso para o pai Lucas.
Ela desdenhou.
— Ricardo é legal, mas ele não tem uma garota só. Estou cansada de
ser trocada. Eu quero alguém que cuide de mim. Você sabe o que eu quero
dizer? Sei que é casado, mas eu jamais iria ser um estorvo.
Recuo, dando-lhe um olhar de repúdio. Joana é a única mulher que
amo. O resto apenas tolero. Magali, a governanta de Lucas, e Renata, a mãe
da Black Rose, tem meu respeito e carinho, mas amor só dedico a minha
esposa.
Lembro-me das ordens para matá-la quando ela começou a investigar a
Rosa Negra. Lembro-me de vê-la na rua, sozinha.
Indefesa... tão fácil de destruir.
E, ainda assim, impossível de machucar.
Busquei Lucas naquele dia. Disse que ela não seria um problema
porque eu iria conquistá-la e me casaria com ela.
Meu pai gargalhou.
“Você está louco?”, ele questionou.
“Sim”. Foi minha resposta.
Joana me envolveu em um laço que jamais quebraria.
“Certo, meu filho”, ele retrucou após alguns segundos me encarando.
“Então você cuida dela. A jornalista é seu fardo. Se ela abrir a boca, a culpa
será sua!”.
— Eu não sou o cara certo – digo a garota. — Mas espero que tenha
sorte na sua busca.
A garota encolhe os ombros.
— Sua esposa tem sorte. Você sabe... Juliano um dia me contou que
você a salvou da Black Rose. Ele também me disse que ela é muito bonita. É
por isso que sempre tem advogados de defesa correndo atrás dela.
Eu sei que é uma isca jogada para me causar desconforto. Mesmo
assim, não resisto.
— Que advogados?
— Bom, tem o Edison Magalhães, acho que é esse o nome.
Meus dedos se contorcem no bolso da calça.
— Dizem que ele sempre pega casos que ela está investigando para
poder ficar perto da sua mulher.
Ouço a porra dos gemidos de Ricardo no quarto. Meu estômago está
pegando fogo. Sem delongas, dou as costas à garota e saio da casa.
O escritório de Edison fica a dez minutos a pé da mansão. Eu chego em
seis minutos. Há uma mulher sentada na recepção quando abro a porta
externa. Ela sorri e começa a me receber, mas o olhar brilhante desaparece
quando eu passo por ela sem dizer uma palavra.
— Senhor. Você não pode entrar — ela chama atrás de mim,
cambaleando sobre os saltos impossivelmente altos. — Senhor. Senhor! Ele
está com um cliente.
A ignoro e bato meu punho contra a porta de madeira com o nome de
Edison escrito em dourado na frente. A abro com um estrondo, atingindo a
parede. O barulho chama a atenção de Edison. Ele e a mulher com quem
estava trepando se separam rapidamente.
— Saía — eu ordeno à prostituta.
A mulher abaixa a saia e passa por mim.
— Sinto muito, doutor. Não consegui contê-lo — adverte a
secretária.
Edison acena com a mão.
— Não se preocupe com isso. Você não pode esperar que um cara sem
instrução, um Zé ninguém, saiba se portar em sociedade. Aprenda algo, meu
caro, aqui a gente bate na porta e espera ser chamado.
Aproximo-me dele em passos rasteiros.
— Eu não ligo para suas regras, mas você deve se importar com as
minhas. Fique longe da minha esposa ou — meus olhos caem nas calças que
ainda está aberta — você não terá nada para entreter seus “clientes”.
— Isso é uma ameaça?
— Não. É uma promessa.
Ele acena para a secretária. A mulher sai.
— Eu sei tudo sobre você, Enzo...
— Sabe o quê?
— Preso aos dezoito anos. Tem ficha suja. Assassino, ladrão,
traficante...
Ele não citou a Rosa Negra, então não me senti intimidado.
— Sua esposa sabe do seu passado?
Aproximo-me mais. Estamos tão perto... eu podia contorcer seu
pescoço com minhas mãos.
— Lembre-se que uma vez assassino, sempre assassino. Ninguém
desfaz um assassinato. Não há perdão para um crime cuja vítima jamais
poderá voltar para perdoar o delito. E depois que se mata a primeira vez, é
fácil fazer isso de novo...
Logo recupero meu controle e me afasto.
— Fique longe da minha esposa e não teremos problemas.
Com isso, vou embora.
CAPÍTULO DEZ
JOANA

Viro-me para olhar para a porta dos fundos quando ouço o som do
alarme sendo desativado. Enzo aparece um momento depois. Um sorriso
surge no meu rosto. É involuntário, sempre fico feliz quando o vejo.
Ando, apaixonada, em sua direção. Ele me encontra no meio do
caminho, me levantando do chão enquanto me beija.
— Senti sua falta — digo antes de dar outro beijo.
Ele é minha casa. Eu me sinto completa quando ele está aqui.
— Também senti sua falta, Joana.
Enzo aperta minha bunda. Eu lhe dou um leve tapa enquanto me
separo, volvendo em direção a cozinha onde, momentos antes, descascava
batatas.
— Por que você está assistindo essa merda? — Ele indaga, volvendo
em direção a televisão, onde um noticiário sensacionalista comenta as
manchetes do dia.
Enzo odeia quando assisto as notícias. Ele sabe que elas sempre me
afetam de alguma maneira, mesmo quando não estou envolvida nas
investigações.
— Sua irmã ligou. — Ele vai até o balcão onde eu estava prestes a
começar a cortar as batatas.
Espero para ver onde ele está levando a conversa.
— Ela queria me perguntar se eu já assisti “O homem do Castelo
Alto”, da Amazon Prime. Fiquei curioso com a premissa – ele comenta. –
Acho que podemos fazer maratona dessa série.
Não respondo. Enzo lava as mãos na pia, e depois começa a cortar as
batatas. Suas mãos se movem rapidamente enquanto ele as corta em
segundos. Levaria três vezes mais se eu estivesse fazendo isso. Ele é tão
talentoso com as mãos e não apenas na cozinha.
— Como foi seu dia? — Ele coloca as batatas fatiadas em uma tigela.
— A entrevista que eu iria fazer com o presidente do sindicato foi
cancelada, mas você já sabe disso. — mandei uma mensagem para ele
durante a tarde, desgostosa com a situação.
— Você está preocupada sobre o aumento do preço das passagens, não
é?
Eu tento pensar em outra coisa para dizer a ele, realmente tentando
evitar a conversa.
— Estou tão decepcionada com tudo. Só queria que as pessoas fossem
honestas. Mas, ninguém parece ser.
Ele solta uma risada profunda que aquece todo o meu interior. Não sei
como ele faz isso, mas Enzo ainda me faz sentir como uma colegial
apaixonada. Borboletas dançam no meu estômago sempre que ele está por
perto.
— Sinto muito, Joana. — Ele volta para mim para dar um beijo na
ponta do meu nariz. – Mas, não sei... A gente pode criar um mundo só nosso,
completamente honesto. Faremos nossos filhos serem pessoas de valor. —
Ele se vira, indo à geladeira pegar os bifes que preparou de manhã.
Eu lambo meus lábios repentinamente secos. Já conversamos sobre
crianças antes, mas nunca dissemos quando ou quantas. São sempre
comentários aleatórios.
— Por que você não me diz o que está pensando agora? Sei que está
viajando na sua mente. — Enzo interrompe meus pensamentos sobre bebês.
— Como você faz isso? — Não sei por que pergunto.
Enzo pode me ler como um livro. Ele está sempre prestando atenção
em tudo que faço.
Ele desliga o fogão, esperando minhas palavras. Eu sei que ele está
certo. De um jeito ou de outro, eu vou falar. E o que me incomoda não é o
tema da maternidade.
— Você sabe... tem um advogado... Edison Magalhães...
Todo o comportamento de Enzo muda. Ele fica um pouco mais alto.
Seus braços se dobram sobre o peito por um momento antes que ele os
derrube rapidamente.
— E?
— Pode não ser nada — tento diminuir a importância da situação. –
Mas eu sinto que... Eu não sei explicar... Eu não gosto da maneira como ele
parece... – Droga! Não queria falar disso ao meu marido. – Às vezes eu acho
que ele está dando em cima de mim – desabo.
— O que ele fez?
— Bem, ele fica me oferecendo um emprego.
— Você não quer este emprego.
Ele não está me perguntando. Enzo sabe que estou desconfortável.
— Que emprego é?
— Nunca perguntei, não faço nem questão de saber, mas ele continua
me pressionando.
— Como se estivesse te forçando? — Enzo dá um passo em minha
direção.
— Pode ser coisa da minha cabeça, mas juro que toda vez que me viro,
ele está lá. Não apenas no trabalho. Às vezes na cafeteria, às vezes no
restaurante, no mercado. Esses dias ele ligou para meu número pessoal.
Silêncio. Sorrio, tentando aliviar o clima sombrio que caiu sobre a
cozinha. Eu sei que Enzo não está chateado comigo, mas com Edison.
— Você está com medo dele?
— Não... Eu tenho um marido que me protegeria – brinco.
— É um fato – concorda.
De repente ele está tão perto que posso sentir sua presença me
dominando. Coloco minhas mãos em seu peito, inspirando-o. Eu sei que meu
toque sempre lhe traz conforto. Ele se inclina para mim.
— Sempre estou de olho em você, querida. Isso te irrita?
Nego.
— Sabe quando nos conhecemos? Na verdade eu a estava seguindo.
Isso te assusta?
A frase me perturba um pouco, mas volto a negar.
O que eu poderia pensar? Ele me viu em algum lugar, enamorou-se e
foi atrás de mim? Era até romântico.
— Estou agradecida pelo dia em que entrou na minha vida. Mas não
sinto o mesmo por aquele advogado.
A mandíbula de Enzo se move.
— Não fique chateado. – peço.
— Não ficar chateado que alguém esteja perturbando minha esposa?
— Eu não quero causar problemas. Não sou esse tipo de mulher.
— Você nunca é um problema, Joana. — Ele se inclina para me
beijar. Envolvo meus braços em volta de seu pescoço, aprofundando o beijo.
Quando Enzo se afasta, sorrio para ele porque sua boca está um pouco
vermelha e inchada pelos nossos beijos.
— Edison não incomodará mais você.
— Mas temos que trabalhar juntos, às vezes.
— Você confia em mim?
— Não precisa me perguntar isso.
Eu confio neste homem com a minha vida. Enzo é meu tudo.
— Vou resolver isso.
Sinto-me boba por não ter contado antes. Claro que meu Enzo cuidaria
disso para mim. Ele faria qualquer coisa por mim.
CAPÍTULO ONZE
ENZO

Eu nunca tirei a vida de uma pessoa por vingança.


Como membro da Rosa Negra, eu matei sob ordens. Como marido
apaixonado, dei a pedófilos, agressores, estupradores o castigo que mereciam,
o que traria a minha esposa um pouco de paz.
As penas no Brasil são muito leves. Além dos casos serem muito
difíceis de provar, as vítimas vivem com medo do que lhes ocorrerá quando
seus algozes saírem da cadeia. Isso quando a vingança não ocorre apenas com
uma ligação por trás das grades. Celulares são comuns em presídios.
A situação nunca me agradou, então eu usei as habilidades necessárias
para corrigir as coisas. É a única maneira de eu dormir na cama de Joana,
tocar seu corpo precioso, aceitar seu amor, com a consciência tranquila de
que dei meu melhor por nosso casamento.
Edison não é um pedófilo, abusador ou estuprador. Ele é um idiota que
sonega impostos, trai clientes e parceiros. E agora ele é um idiota que fez
minha esposa se sentir insegura. Isso é suficiente para justificar sua morte?
Coloco meus binóculos no colo. Eu não deveria ter que esperar que ele
a machucasse para agir. Eu sabia que ele estava no caminho para fazer uma
besteira. Normalmente os abusos são antecedidos por ações estranhas e
desconfortáveis. Depois... é tarde demais.
O toque de Joana vibra, momentaneamente me distraindo.
— Querida?
— Espero não estar incomodado sua venda. Eu ia deixar uma
mensagem de voz.
— Não é um incômodo.
— Joseane ligou e está reclamando que não nos vê há uma semana.
Você se importa se formos jantar com ela hoje à noite? Ela está fazendo o seu
favorito: frango assado e purê de batatas com alho.
— Que horas?
— Seis horas é muito cedo?
— Perfeito. Vou parar e pegar uma garrafa do vinho que ela gosta.
— Obrigada. E não trabalhe demais hoje.
— Eu não vou.
É meio da manhã e eu não fiz nada além de seguir o sombrio Edison.
Ele é chato. Quando não está jogando paciência no computador, flertando
com a secretária que não está interessada ou aceitando um boquete de uma
prostituta (que lavou a boca com Coca-Cola após o encontro e cuspiu nos
arbustos do lado de fora do prédio), ele está dormindo.
Bato meu punho contra o volante.
Posso tirar a vida dele se ele ainda não fez nada?
Como posso ser fiel aos meus votos a Joana e permitir que ele continue
respirando? Minha esposa não quer admitir, mas ele a assusta.
E é meu papel defendê-la.
Contudo, existe algo que possa fazer antes de matá-lo? Uma simples
surra, talvez? Animo-me diante da perspectiva.
Eu poderia desfigurá-lo e toda vez que ele se olhasse no espelho,
lembraria o que acontece com quem desrespeita a esposa de um homem.
Enquanto penso sobre essa ideia, faço algumas anotações no meu bloco
de notas e guardo. Preciso voltar a mansão da Rosa Negra porque o dia da
volta de Lucas se aproxima e temos que mostrar os resultados, os balanços
das vendas das drogas nos últimos meses. Isso é mais importante que o
Edison no momento.
***
Definitivamente eu gostava de Joseane. Acho que nosso santo “batia”.
Ela era uma artesã forte, uma mulher com personalidade própria que me
causava admiração.
Joseane me cumprimentou na porta com um enorme sorriso e um
abraço.
O cheiro da carne assada e do alho enche minha cabeça.
— Você fritou o alho?
O alho que ela preparava era o único que eu comia. Ela tinha um jeito
de fritá-lo, quase torrá-lo, que o deixava simplesmente delicioso.
— Você vai comer tanto que Joana não vai querer beijá-lo pelo resto
da semana – ela brinca.
Depois, dá um tapinha nas minhas costas enquanto lhe entrego o vinho.
— Entre e sente-se. Joaquim está assistindo as notícias e precisa de
alguém para ouvi-lo discutir com as âncoras desde que Joana e eu nos
recusamos.
Joaquim era o novo namorado. Um cara legal, de vida comum. Eu o
investiguei assim que ele começou a sair com Joseane. Não encontrei nada
com que me preocupasse. Seu delito mais grave era olhar de soslaio para a
bunda de mulheres na rua. Mas, nada que parecesse assédio, tão discreto era.
Chego na sala e o encontro resmungando. Ele odeia políticos e
jornalistas (parciais, segundo ele), mas é viciado em ambos. As notícias estão
sempre presentes no quanto a criminalidade estava alta e no quanto a
imprensa odiava o novo presidente.
— Você pode acreditar nessa merda? — Joaquim diz quando entro
na sala. – A imprensa é um lixo, só dou um desconto para Joana porque sei
que ela é uma exceção. Olhe isso... Eles checam as informações que passam?
Eles sabem o que é um fato?
Eu sento no sofá ao lado dele. Mantenho um sorriso no rosto.
— Cerveja? – me oferece.
— Ainda não comi nada e não quero ficar alto. Vou esperar para
depois do jantar.
— Hum. E como foi seu dia?
— Tranquilo. E o seu?
— Normal. A academia sempre fica cheia às quartas-feiras.
Ele era professor de educação física e instrutor numa academia.
Na televisão a matéria muda para uma fotógrafa e uma modelo que
foram assaltadas e estupradas durante um ensaio fotográfico no campo, em
uma cidade no interior.
Anoto mentalmente o nome da cidade e o nome do estuprador já
capturado. Vou mandar matá-lo.
Joaquim me lê enquanto isso. Ele silencia a televisão e se inclina na
minha direção.
— Homens de verdade, sabe... Como nós... Enfim, a gente odeia essas
notícias, não é?
— Estupradores deviam morrer. Mas, no nosso país impera a
choradeira dos direitos humanos.
— Você é a favor da pena de morte?
— Para pedófilos e estupradores.
— E assassinos?
— Depende quem o cara matou.
Ele ri.
— Enzo, eu gosto disso em você. Você é firme e confiável.
Firme sim. Mas confiável? Ele sabe que eu o matarei se ele, algum dia,
magoar Joseane?
CAPÍTULO DOZE
JOANA

Havia sido uma noite maravilhosa. Quando cheguei a casa de minha


irmã, Enzo já estava lá. Jantamos conversando sobre assuntos leves, e depois
bebemos vinho assistindo um filme na Netflix.
Enzo me guiou em direção ao carro quando a noite terminou. Eu espio
meu marido. Essa noite foi como qualquer outra noite que passamos na casa
da minha irmã. Inclino-me para ele enquanto contornamos a traseira do carro.
Ele abre a porta para mim. Enzo é sempre o cavalheiro.
— Você está bem, querida? — pergunta quando eu não entro no
carro imediatamente.
Giro minha cabeça para olhar diretamente para ele. Enzo parece tão
bonito como sempre.
— Você se divertiu com Joaquim hoje à noite? — Lambo meu lábio
inferior, ainda provando o vinho que tomado antes de sairmos.
— Gosto da companhia dele. E ele é importante para Joseane, então
poderá ser parte da nossa família em breve.
Enzo é realmente o marido perfeito. Às vezes me sinto péssima porque
fico esperando que ele tenha algum tipo de falha, mas nunca acontece.
Alguém pode realmente ser tão completo? Mesmo as coisas que ele considera
falhas na própria personalidade, não concordo. Esses detalhes o tornam quem
ele é, meu Enzo.
Ele se inclina, beijando minhas bochechas quentes, que estão coradas
por uma mistura de vinho e excitação.
— Você vai entrar no carro para que eu possa levar minha esposa
embriagada para casa e tirar vantagem dela?
— Você nunca faria isso. — suspiro.
— Não — concorda.
— Você nunca se aproveita da situação. Mesmo quando eu quero que
o faça.
Vou entrando no carro, mas ele me interrompe.
— Joana.
O rosto dele está sério. Eu disse algo errado? Estou um pouco
embriagada.
— Você quer que eu me aproveite? — Ele se vira, me prendendo na
lateral do carro. Sua boca cai na minha.
Eu suspiro de surpresa. Meus braços instintivamente envolvem seu
pescoço. Minha boca se separa dele quando meu homem empurra sua língua
pelos meus lábios. Eu me agarro a ele, esquecendo onde estamos e o beijo de
volta.
Nunca tenho que duvidar que Enzo me ama ou me quer. Ele mostra
isso em tudo o que faz. Ele está determinado a me fazer feliz.
— Enzo...
Respiro seu nome quando ele puxa sua boca da minha, ao descer seus
lábios e começar a beijar meu pescoço. Largo minha cabeça para trás,
certificando-me de que ele tem todo o espaço que precisa.
— Vamos para casa.
Meus olhos se abrem. Um segundo depois, estou no banco do
passageiro com Enzo me prendendo.
— Quanta pressa! Isso me lembra um ex-namorado que...
Minhas palavras escaparam, e só me dei conta do que dizia quando era
tarde demais. Enzo não gostava de me ouvir falar sobre o passado.
— Você sabe que não precisa ter ciúmes, não é? Quando estive com
outras pessoas... Isso foi bem antes de você — digo, quando ele se senta no
banco do motorista.
As mãos de Enzo apertam o volante. O carro começa a andar, numa
velocidade média.
— Você não estava com outras pessoas — ele corrige.
— Enzo, eu tive namorados... — Por que estou cutucando ele?
— Joana...
Sua voz tem um tom mais firme. Minhas pernas se apertam. Seus olhos
piscam desfrutando de minha reação.
— Só estou bêbada — justifico.
— Percebo.
Seus olhos percorrem o meu rosto por um momento. É então que noto
que já estamos na nossa garagem.
— Você está tentando me deixar louco, Joana?
— Não fique bravo comigo. Foi só uma besteira.
Não me lembro de uma vez que ele ficou bravo. Chateado, com
certeza. Geralmente é sobre algo tão ridículo quanto eu esquecer de trancar a
porta dos fundos.
— Eu lembro de você me recusando porque não confiava nos homens.
— Ele estende a mão, apertando o botão da porta da garagem um pouco mais
do que precisa. — Dizendo que não poderíamos nos casar porque não
confiava em ninguém.
— Mas me casei com você. — O lembro, tentando fingir inocência. –
Você me levou para a cama em poucos dias...
Nunca esquecerei aquela noite. Como ele me conquistou com tanto
cuidado. Foi gentil e amoroso.
Ele entra na garagem, estacionando o carro. Ele fica lá por um
momento sem olhar para mim.
O silêncio... A cada segundo que passa, o carro fica mais carregado de
um ar estranho. Eu aperto minhas coxas mais firme; a pulsação está se
tornando quase insuportável. Por que estou ficando tão excitada ao vê-lo
ciumento?
— Foi uma das noites mais difíceis da minha vida. — Ele finalmente
olha para mim. Há um olhar sombrio em seus olhos.
— O quê?
— Aquela noite em que você se entregou a mim. Eu não devia fazer
amor com você... Eu devia tê-la... – suas palavras cessam.
— Tê-la o quê?
— Esquece...
Eu solto uma risada.
— Eu tinha tanta coisa para fazer, mas tudo que conseguia pensar era
em foder sua boceta.
Eu respiro fundo.
E ele fez isso. Enzo me deu prazer até eu gritar seu nome.
— Você quer ser fodida, Joana? Hoje à noite?
Abro a boca, mas de repente nenhuma palavra sai.
— Vou te dar o que você pedir de mim. Qualquer coisa. Você sabe
disso.
Eu sei disso.
— Diga as palavras, Joana.
Uma risada feliz escapa da minha boca.
— Eu quero que você me foda.
Meu cinto de segurança é desconectado em um segundo. Ele me puxa e
sai do carro.
Eu o beijo quando ele, de alguma forma, nos leva para dentro de casa.
Minhas costas batem na parede.
— Enzo — gemo o nome dele enquanto ele tira minhas roupas. Sua
boca está toda sobre mim até que eu esteja nua.
Ele me prende na parede. Sua boca está em todo lugar. Esfrego contra
ele, tentando encontrar o atrito que preciso. Já estou tão perto, oscilando à
beira do orgasmo. Eu nunca vi essa parte de Enzo antes. Não com essa fome.
É intoxicante e eu quero tudo.
— Joana.
Minha cabeça gira ao som do meu nome sendo gemido. Eu enfio
minhas unhas em seus ombros enquanto sua mão desliza entre nós. Ele desata
o cinto, me mantendo presa na parede.
— Não pare. – imploro.
— Mesmo que eu quisesse, não poderia.
Ele empurra dentro de mim até o fim. Eu o levo facilmente. Estou tão
molhada, excitada. Aperto em volta dele, meu corpo nunca quer que ele saia.
Suas mãos seguram minha bunda enquanto ele mergulha dentro e fora de
mim em golpes fortes e rápidos. Cada um batendo exatamente onde eu
preciso.
— Mais forte — Eu mordo seu lóbulo da orelha, insistindo.
— Isso é o que você queria, Joana? Me ver fodendo sua buceta sem
dó? Como uma putinha? Você quer ser minha putinha?
Ele está no controle do meu orgasmo nesta posição. Eu tento encontrar
seus impulsos, mas ele controla o nosso ritmo.
— Como minha puta, você só vai gozar quando eu quiser que goze.
— Suas palavras sozinhas quase me mandam para o limite.
Seus dedos continuam cavando na minha pele. Seu toque não é nem de
longe gentil e, por algum motivo, o pensamento de ter pequenos hematomas
por fazer amor apenas aumenta minha excitação.
— Enzo.
Estou assustada em como gosto da dor. Sobrecarregada para ter outras
palavras.
Uma de suas mãos sai da minha bunda, estendendo a mão para esfregar
meu clitóris.
— Agora — ele exige.
Meu corpo faz como meu marido ordena. O orgasmo toma conta de
mim. Eu venho com tanta força que minhas unhas afundam ainda mais na
pele de Enzo. Agarro-me a ele enquanto meu homem bombeia mais algumas
vezes, seu sêmen quente me enchendo.
Enterro meu rosto em seu pescoço, tentando recuperar o fôlego.
— Eu te amo — murmuro.
Todo o seu corpo relaxa.
— Eu também te amo.
Enzo me leva para nossa cama. Eu me aconchego nele, sorrindo contra
seu pescoço. Não tenho ideia do que aconteceu, mas foi maravilhoso.
CAPÍTULO TREZE
ENZO

— Que milagre é esse? Não é sempre que te vejo sorrindo.


Observo Magali e tento evitar mais perguntas.
— Oh, por favor, me conte.
— Está ensolarado lá fora — respondo, sem me preocupar em
verificar se isso é preciso, porque no meu mundo, o sol está brilhando. –
Papai está voltando, todos os relatórios estão positivos e nossas mulas estão
fazendo um bom trabalho.
Estou sentado no escritório de Lucas, fazendo ajustes nas planilhas.
Somente Ricardo e eu temos autorização para ficarmos no lugar do chefe
maior da Rosa Negra.
— Precisa de mais alguma coisa? – Magali indaga ao me oferecer uma
xícara de café.
— Não. Obrigado.
Ela se vira para sair quando a porta se abre. Juliano e Fernando
irromperam, com os braços cheios de pastas de papel pardo. Minhas
sobrancelhas colidem. Eu não gosto do que estou vendo.
— Acho que encontrei algo.
— Achamos que encontramos algo — corrige Fernando.
— Certo. Enfim — Juliano deixa sua pilha de pastas na minha mesa e
abre uma — esse é Márcio Stein. Ele foi acusado de abusar de seus filhos.
Três deles se manifestaram contra ele em uma audiência preliminar. Um
morreu antes do julgamento e os outros dois se recusaram a testemunhar no
julgamento. O caso foi arquivado e ele saiu impune.
— E?
Juliano apunhala o dedo contra o relatório da autópsia.
— O cara foi encontrado cerca de três semanas após o julgamento.
Seus genitais foram mutilados. Ele sofria de sangramento interno grave. Ele
teve socos no peito e na virilha que provavelmente foram infligidos por um
martelo.
— Bah. — Eu levanto minha cabeça. — E?
— Foi encontrado na nossa área.
— Certo. E daí?
— Quero que você olhe isso. – Abre outro relatório. — Essa é
Valéria Camargo. Ela era a mãe de um garoto que foi amarrado em casa. Ela
costumava fazer isso para sair. Ficava em bailes funks por dias, a criança
presa e sem comida. Quando a polícia foi chamada após uma denúncia,
encontraram o garoto todo cagado e mijado. Ela alegou insanidade e foi
sentenciada há seis meses em uma instituição mental, mas saiu depois de
apenas três.
— Ok... Aonde quer chegar?
— Ela morreu na mesma semana que saiu. O relatório da autópsia diz
que foi asfixiada.
— Hum... – aceno com a face.
— Na nossa área – Fernando volta a destacar.
Eu espio meus irmãos. Quando eles ligariam os pontos?
— Hoje, o corpo de Evandro Garbin apareceu na praia de Tramandaí.
Eles não sabiam que havia sido Ricardo que ordenara que os novatos se
desfizessem do corpo.
— É mesmo? Acha que tem alguma relação com esses casos e os
demais nas outras pastas?
— Possivelmente. Há uma coisa que conecta todos esses casos — diz
Juliano. Há um brilho nos olhos dele que está me deixando desconfortável.
— Médico legista ruim incapaz de encontrar o assassino? Polícia
incompetente? A lei furada? — Eu brinco.
— Todos esses casos não foram resolvidos e todos envolvem uma
pessoa que foi acusada de um crime repugnante e que recebeu uma sentença
leve ou nenhuma sentença — afirma Fernando. — Um pedófilo aqui, um
abusador ali, um estuprador lá. E todos na nossa área.
— O que você está sugerindo?
— Nós temos um serial killer atuando na nossa região. Alguém está
matando todas essas pessoas. E nem sabemos quem é.
Dou os ombros.
— E daí? Deixe que mate. Ninguém prestava mesmo.
— Na área da Rosa Negra, só quem mata é a Rosa Negra – Juliano
relembrou uma das célebres frases de Lucas.
— E o que você sugere que eu faça?
Há um longo período de silêncio antes de Fernando dizer, um pouco
envergonhado:
— Queremos que você revise os casos para ver se consegue encontrar
alguma semelhança, qualquer informação. O assassino usou uma droga para
incapacitá-los? Houve um método primário de morte, como um golpe na
cabeça?
— Essa cabeça parece perfeitamente intacta — aponto para uma foto
na minha frente.
— Eu sei que parece assim, mas talvez possamos começar a desenhar
alguns pontos em comum e elaborarmos um modelo sobre esse cara.
— Isso é papel da polícia.
— Nem a polícia age na nossa área – Juliano insistiu. – Lucas não vai
querer alguém matando sem sua autorização.
Resvalo na cadeira, pensando em meu pai. O que Lucas faria quando
soubesse de tudo isso? Porque ele perceberia na hora a maior das
semelhanças: Todos aqueles casos foram investigados por Joana.
CAPÍTULO QUATORZE
JOANA

Olho para o telefone me sentindo decepcionada com a mensagem de


Enzo. Pensei que a noite passada havia sido maravilhosa. Ele pareceu se
divertir também, mas de repente a preocupação me enche. Ainda sinto a
pequena dor no meu corpo pelos sucessivos atos que ocorreram.
Eu estava nas nuvens, feliz até Enzo me avisar que tinha que trabalhar
até tarde.
— O que te derrubou de repente? — Olho para cima e vejo Bruna
parada lá.
— Enzo tem que trabalhar até tarde.
— Oh, isso e doce. — Ela sorri para mim.
— Doce que meu marido tem que trabalhar até tarde?
— Não. É doce que você sentirá falta daquelas poucas horas em que
ele não pode estar em casa.
Ela rodeia a mesa, sentando-se. Eu estava terminando algumas coisas
antes de sair para o dia. Estivemos no tribunal o dia todo, juntas. Tem sido
um longo dia e Enzo não estaria em casa para ser meu alento.
— Sabe, é legal como você ainda está apaixonada. É fácil esquecer o
amor e as coisas boas quando estamos sempre envolvidas com desgraça.
— Bom, nós não nos casamos há tanto tempo. — Eu rio, puxando a
bolsa por cima do ombro.
Não que eu ache que isso mude qualquer coisa. Se aprendi alguma
coisa ao me casar, é que me apaixono cada vez mais por Enzo todos os dias.
Justo quando acho que não posso amá-lo mais, ele vai e me mostra o
contrário.
— Até mais — aceno para ela enquanto saio pela porta.
No corredor, pego meu telefone de volta e encontro as chaves do meu
carro. Olho para cima quando sinto uma presença. Me volto e percebo Edison
sentado em um banco. Ele me lança um olhar estranho, mas felizmente não se
aproxima. Continuo andando até chegar ao meu carro. Meus passos são um
pouco mais rápidos porque Edison me dá arrepios.
Eu não quero ir para casa. Eu quero ver o Enzo. Estou curiosa para
saber por que ele, de repente, tem que trabalhar até tarde.
Aquele lance todo de palavras sujas o deixou constrangido? Ele estava
arrependido da noite passada? Esse pensamento continua aparecendo na
minha cabeça. A insegurança começa a surgir dentro de mim. Mordo o lábio,
pensando no que devo fazer. Normalmente eu ia para casa, preparava um
jantar e esperava por ele. Mas eu sei que essa preocupação vai me consumir a
noite toda. Nada disso é fundado, mas sei que voltar para casa não é a
solução.
Ligo meu carro. Eu me sinto um pouco deslocada. Então faço o que
acho que Enzo gostaria que eu fizesse. Começo a manobrar em direção a
empresa que ele trabalha.
Paro diante dos enormes portões. Alguns seguranças me encaram por
trás das grades grossas. Meu telefone vibra. É uma mensagem.
“Você não respondeu minha mensagem”.
Sorrio.
“Estou aqui. Passei numa padaria e trouxe um lanche para você”.
Ok, eu trouxe mais do que um lanche. Meu carro estava cheio das
minhas inseguranças. Eu sabia que se visse Enzo me sentiria melhor.
Pego minhas coisas, saio do carro e vou em direção à entrada. Eu mal
chego lá e Enzo surge, inquieto.
— Tudo certo? — ele pergunta, seus olhos cheios de preocupação.
— Uma esposa não pode visitar o trabalho no marido?
— Minha esposa pode fazer o que quiser. — Ele pega minha mão,
me levando em direção à mansão.
O lugar está praticamente vazio ali dentro.
Vamos até um escritório. Algo simples. Um computador em uma mesa
de madeira. Entro e ele fecha a porta atrás de mim. Coloquei a bolsa em cima
da mesa. Enzo aparece atrás de mim, tirando meu cabelo do ombro e dando
um beijo no meu pescoço.
Eu respiro fundo quando ele belisca meu pescoço, em seguida, coloca
outro beijo lá antes de se afastar de mim. Eu lambo meus lábios, tentando não
mostrar minha decepção. Não foi para isso que vim aqui.
— Trouxe comida — digo como se ele não soubesse. Já havia dito
isso na mensagem e ele pode ver a sacola.
Ele pega minha mão, me puxando para a mesa dele. Senta-se e acho
que vai me puxar para o colo dele, mas ele muda, me colocando entre as
pernas. Minha bunda repousa na borda de sua mesa.
— Eu acho que você veio aqui para outra coisa. — Sua mão sobe
pela minha saia.
— Aqui? — Eu me mexo, já me molhando pelo roçar dos dedos na
minha coxa.
— Levante o vestido. — Seu tom muda, fazendo meus mamilos
endurecerem. Abro a mão, puxando meu vestido para revelar minha calcinha.
Seus dedos se prendem a fenda enquanto se arrastam pelas minhas pernas.
— Está doendo? — Ele se inclina, beijando uma pequena área
avermelhada no meu quadril.
Eu tinha visto essa manhã quando estava me vestindo. Eu sei que o
machucado é de um dos dedos dele cavando em mim.
— Não. — Balanço a cabeça. — Eu gosto disso. — Ele sorri,
pressionando outro beijo lá.
— Você gosta de muitas coisas sobre as quais nunca me contou.
Sua boca se move, abrindo mais minhas coxas.
— Eu não sabia que gostava — admito.
Sua respiração quente se espalha pelo meu centro enquanto seus dedos
cavam nas minhas coxas. Eu largo minha cabeça para trás, precisando de sua
língua em mim agora.
— Você quer que eu te foda aqui?
Meu gemido não me permite dizer uma única palavra. Fecho meus
olhos, mordendo meus lábios, desfrutando do momento.
— Responda-me — ele exige. Esse tom me deixa tonta de desejo.
— Sim. Por favor, Enzo — imploro.
Meu corpo inteiro está pegando fogo. Preciso dele. Preciso da boca
dele em mim. Conheço o prazer que me espera.
— Eu sempre darei o que você precisa, Joana.
Enzo me dá coisas que eu nem sabia que precisava. Hoje são dois
orgasmos alucinantes antes que ele me leve ao meu carro, me dizendo para
estar pronta para ele quando chegar em casa.
CAPÍTULO QUINZE
ENZO

Renata desceu deslumbrante pela Hilux preta.


— Mãe – a cumprimentei com o corpo levemente curvado.
— Veneza é linda! – ela disse, puxando-me para seus braços, num
abraço caloroso. – Oh, o mundo é lindo, Enzo. Preciso viajar mais. Você
também precisa viajar mais. Todos nós devíamos aproveitar nosso curto
tempo de vida.
Renata sorriu daquele jeito juvenil que nunca se perdeu. Já tinha alguns
anos que ela havia se casado com o pai Lucas, mas ainda parecia a mesma
menina doce.
Depois, ela foi até Ricardo e Magali. Eu sabia que Emanuel, seu irmão,
chegaria da faculdade naquela tarde para vê-la. Tudo parecia calmo com
aquele retorno.
Logo Lucas aproximou-se de mim.
— Meu filho favorito – ele brincou, antes de me abraçar.
Todos sabiam que o favorito era Ricardo, o filho que podia ser irascível
e desbocado, mas ainda assim era seu xodó. De qualquer forma, sorri,
aceitando o cumprimento. Lucas, desde o princípio, aceitou-me como eu era.
— Muitas mortes na nossa região, não é? – Lucas me indagou.
Volvi meus olhos para Ricardo, mas ele ergueu as mãos em defesa.
— Eu não disse nada.
— Relaxe, eu vi na internet. Sigo a página da sua esposa. – O Pai
segurou meu braço e me encaminhou para dentro da mansão. – Depois falarei
com todos, agora preciso de um momento à sós com Enzo.
Dentro do seu enorme escritório, ele sentou-se na sua poltrona favorita
e suspirou.
— Então você andou se divertindo.
Não era uma pergunta. Ele sabia.
— Pai...
— Não ouse mentir para mim, Enzo. Você sabe que tem tudo comigo,
enquanto houver verdade entre nós.
Suas mãos apontaram a cadeira a sua frente.
— O que fará comigo? – questiono.
— Você está com medo de mim?
— Não. Devo?
— Eu me sentiria ofendido se tivesse. – ele suspirou. – Enzo, nós dois
nos conhecemos há muitos anos. Eu confiaria minha vida a você. A única vez
que me desobedeceu foi quando mandei matar a jornalista, mas você se
apaixonou. Eu entendi, não entendi? Eu permiti que se casasse com ela.
Como você poderia pensar que sinto algo além de amor por você, meu filho?
Era um estranho amor. Mas, era o mais perto de amor paternal que eu
já havia recebido.
— O problema é que os crimes estão começando a se tornarem
sucessões de casos iguais. Está óbvio que estão sendo cometidos pela mesma
pessoa. Com a minha volta, se espera que a Rosa Negra se manifeste, porque
é tudo na nossa área. Quando eu me calar, ficará claro que o assassino é um
dos meus filhos.
— O que o senhor espera que eu faça?
— Eu sei que está matando por um motivo. Faria o mesmo por sua
mãe. Renata é meu tesouro mais precioso. – ele suspirou. – Enfim, saiu no
portal de notícias que o corpo daquele marido que matou a esposa foi
encontrado boiando na praia. Devo considerar que foi você.
— Sim.
— Francamente, Enzo... Se tivesse esperado mais alguns dias, eu
mesmo ordenaria que matassem o homem. Não gosto de covardes. Você sabe
que sou um homem à moda antiga. Em mulher você não bate nem com uma
rosa. Quiçá matar uma.
Assenti. Eu sempre me sentia compreendido e acolhido por Lucas.
— Se ocorrer mais casos, levarei ao seu conhecimento antes.
— Fico feliz de ouvir isso, filho. Mais alguém da Rosa Negra sabe?
— Do marido? Ricardo. Dos demais casos, ninguém.
— Ótimo. Fique entre nós. Colocarei a culpa da minha falta de
interesse nisso em Renata e na nossa excelente e romântica viagem.
Ergui-me.
— Se puder me dar licença – comentei. – Ainda tenho relatórios para
finalizar para lhe apresentar.
Lucas assentiu.
Mais tranquilo, saí de sua sala. No caminho, encontrei com Fernando e
Juliano.
— O que houve?
Fernando praticamente pulou na minha frente.
— Você lembra que eu disse que estava investigando sobre nosso
serial killer?
— Papai disse que não se importa com isso. Pode parar de investigar.
— Oh, mas estou fazendo isso por diversão – Fernando apontou.
— Enfim, achei mais uma curiosidade.
Minhas sobrancelhas se ergueram.
— Qual?
— Quase uma dúzia das vítimas foi defendida pelo doutor Edison
Magalhães. — Ele levanta as sobrancelhas e aponta o dedo para mim. —
Você não acha que isso é suspeito?
Eu acho que é bastante perfeito, na verdade. Eu tento manter o sorriso
fora do meu rosto.
— Por que Magalhães teria um motivo para matar seus próprios
clientes?
Fernando encolhe os ombros antes de inclinar a cabeça novamente.
— Eu não sei. Psicopatas tem motivos? Enfim, pensei em revisar o
restante dos arquivos hoje à noite, se estiver tudo bem com você. Escreverei
um relatório amanhã ou no dia seguinte. Se papai não pensa em puni-lo,
talvez possamos entregá-lo a polícia.
— Isso é bom. Você pode estudar os arquivos agora, se quiser.
— Você tem certeza? Ricardo me mandou verificar como estava as
vendas na...
— Isso é mais importante. Você sabe... alguém matando na nossa
área... Papai não está interessado, mas pode ser que se interesse. Você sabe
como ele é de lua. Hoje quer uma coisa, amanhã quer outra...
— Legal. Ok, deixe-me voltar para os arquivos.
Caminho até o lado de fora da mansão. Aliviado, ligo para Joana.
— Como está o seu dia? — pergunto.
— Indo... Estou esperando o presidente do sindicato há duas horas. O
cara realmente não quer falar comigo.
— Hum. Sinto muito querida. Ah, uma coisa... Aquele advogado chato
lhe procurou hoje?
— Não. Eu não o vi.
— Fique longe, se o ver. Ou me ligue se ele estiver próximo.
— Por quê? — Ela está alarmada.
— Não quero assustá-la. Apenas não gosto dele.
— Eu também não gosto dele. Ele me dá arrepios.
E eu tenho a solução perfeita para isso.
— Eu diria que você tem instintos muito bons, mas você se casou
comigo, então seu julgamento é um tanto falho — provoco.
— Por que está dizendo isso?
— Amor... não posso falar muito... Apenas, você sabe que minha
empresa vai oferecer um software de segurança a polícia? Então, um dos
nossos funcionários estava falando com um policial, e rolou uma conversa...
enfim, isso nem poderia ser falado, mas...
— Onde quer chegar, Enzo?
— Nada. Esqueça. Envie-me uma mensagem quando terminar aí que
irei buscá-la para jantarmos. Eu te amo.
— Amo você também.
Nunca me senti tão satisfeito em receber as palavras.
CAPÍTULO DEZESSEIS
JOANA

Minha mente se desloca para a noite passada e todas as coisas que


Enzo fez no meu corpo. Nos últimos dias, não conseguimos tirar as mãos um
do outro. Sempre tivemos uma vida sexual muito ativa, mas esse é um nível
totalmente novo. Meu corpo tem uma dor doce. Adoro que quando me
desloco ou me movo, ainda sinto meu marido como parte de mim.
A princípio, fiquei preocupada que Enzo não gostasse de me mostrar
seu lado mais duro, mas nos últimos dias colocamos essas preocupações na
cama.
Eu pego meu telefone e envio a Enzo uma mensagem de que estou
pronta. Ele está tão empolgado em me ver que mal pôde esperar até que nós
dois chegássemos em casa. Ele envia de volta uma mensagem avisando-me
que está a caminho.
Pela porta lateral do prédio, vou até o estacionamento, querendo pegar
meu casaco que deixei dentro do carro. Hoje fazia calor, mas o tempo mudou
rapidamente. Já existe um frio no ar e, com o vento aumentando, acho que
pode estar congelando amanhã de manhã. Faço uma pausa quando um
sentimento estranho desliza pela minha espinha.
Minha pele formiga, fazendo com que os cabelos dos meus braços se
arrepiem. Olho ao redor do estacionamento cheio. Quase todos os lugares são
ocupados por veículos, mas não há pessoas ali. Ainda assim, sinto como se
alguém estivesse me observando. Afasto a sensação, indo até o meu carro e
embolsando meu telefone enquanto encontro minha chave para destrancar a
porta.
Abrindo a porta de trás, pego meu casaco.
— Joana.
Soltei um pequeno grito quando pulei para trás, me virando para ver
Edison parado ali. Ele está tão perto que esbarro nele. Edison agarra meus
ombros, certificando-se de que eu não caia. Meu corpo endurece com o
contato de suas mãos.
O advogado tenta me puxar para ele, mas eu recuo, quase caindo de
volta no meu carro.
— Eu não quis te assustar. — Ele me dá aquele sorriso que faz minha
pele arrepiar. Ainda não entendo como ele é um homem de muitas mulheres.
— Você não deve espreitar mulheres assim. — repreendo o melhor
que posso, observando-o como um falcão.
Mesmo estando em um estacionamento aberto, não há ninguém por
perto e eu estaria mentindo se dissesse que não estava um pouco nervosa por
dentro.
Mantenho minha linguagem corporal relaxada, mas sou tudo menos
isso. Sei que foi ele que me senti observando-me.
— Existe uma razão para você estar tão nervosa? — pergunta. —
As coisas estão bem em casa?
Minha boca se abre. Eu não sou do tipo que amaldiçoo, mas esse idiota
está me dando nos nervos. O fato de ele insinuar isso me faz querer bater em
seu rosto.
— O que quer dizer?
— Ah, Joana...
Eu odeio o jeito que diz meu nome. Sempre faz parecer que tem
intimidade comigo.
— Só me preocupo com você.
— Você está preocupado comigo? – repito. Inacreditável tamanha cara
de pau!
Não consigo manter o sarcasmo fora do meu tom. Ele deveria estar
preocupado com todas as pessoas que ele tirou da cadeia ao longo dos anos.
Os criminosos que provavelmente estão no mundo fazendo coisas ruins
quando deveriam estar na prisão. Não tenho certeza se a prisão seria
suficiente para algumas das coisas que os clientes de Edison fizeram.
Eu sei que é assim que a lei funciona, mas às vezes parece realmente
muito injusto.
Tento desviar dele, mas o homem não se mexe. Ele não está me
tocando, mas está bloqueando meu caminho. Tento novamente, mas ele muda
seu corpo para me bloquear.
— Você pode me dizer qualquer coisa, Joana. Estou aqui para você.
— Esse sorriso arrogante aparece em seus lábios e a preocupação se instala
no meu estômago.
— Saía da minha frente — controlo minha voz, certificando-me de
que soe firme. Tento manter o medo fora disso.
Por alguma razão, acho que ele gosta de me assustar.
— Sabe, Joana... Você sempre me surpreende. Uma jornalista como
você, conhecida por lutar contra a injustiça...Casada com um homem
daqueles...
Ele coloca a mão em cima do meu carro, me prendendo completamente
agora.
— Você sabe com quem se casou, Joana?
— Sim. Com um homem bom.
— Você sabe os antecedentes dele?
Arqueei minhas sobrancelhas.
— Eu te disse. Estou preocupado com você.
Edison mantém aquele sorriso falso plantado em seu rosto. Eu nunca
na minha vida quis bater em alguém antes. Agora eu daria tudo para fazer
isso.
— Eu acho que deveria se preocupar consigo mesmo. Meu marido...
Soltei um grito assustado quando Edison foi bruscamente afastado de
mim. Seu corpo bate no carro ao lado do meu antes de cair no chão.
— Joana. Você está bem? — Enzo segura meu rosto. Seus olhos estão
cheios de preocupação, mas há algo mais por trás deles.
Raiva. Ele está tentando esconder, mas eu vejo.
— Estou bem. Ele só me assustou.
Enzo vira, tenho certeza que irá atrás de Edison, mas eu o agarro pelo
braço para detê-lo.
— Eu vou acabar com você! – avisa.
Edison engasga, esfregando a parte de trás da cabeça. É então que
percebo que Enzo jogou Edison em seu carro esportivo de luxo.
— Por favor, não – peço. – Não vale à pena. Esse homem não vale à
pena.
Meu marido me observa. Ele vê meu desespero. Não quero esse tipo de
confusão.
— Vamos embora, Joana. — Enzo pega minha mão, me levando até
o carro dele, que está estacionado atrás do meu, o lado do motorista ainda
aberto. Ele abre minha porta para eu entrar.
Enzo fecha minha porta, depois dá a volta no carro, entrando. Logo,
estamos cruzando uma avenida.
— Enzo — digo o nome dele suavemente.
— Você está bem? — ele me pergunta novamente.
— Estou bem — o tranquilizo.
Como posso não ficar bem quando Enzo está aqui comigo?
Ele olha para mim. Há fogo ali. Um outro homem tentou tocar no que é
dele.
— Eu preciso te foder.
Aperto minhas coxas, ficando instantaneamente excitada.
— Então dirija mais rápido.
CAPÍTULO DEZESSETE
ENZO

— Nua... fique nua para mim...


— Eu estou muito cansada. — Joana se joga na cama, jogando um
braço sobre a cabeça.
— Vai se fazer de difícil? – subo na cama, os joelhos cravados nas
laterais do quadril dela. — Eu sei que sua calcinha está molhada desde que
entramos no carro. – Então, vou fazer o seguinte. Vou ir tomar um banho e,
quando voltar, é melhor você usar apenas o seu lindo sorriso.
Começo a me despir diante dela. Seus olhos cravados no meu
abdômen. Sua boca abre levemente, como se não conseguisse respirar direito
diante da visão.
Saio da cama e vou até o banheiro. Não há sons de qualquer tipo vindo
do quarto. Acho que alguém precisa de uma mão pesada hoje à noite e isso
está me deixando ainda mais excitado, porque ver Edison respirando o
mesmo ar que Joana fez meu sangue ferver.
Quando saio do banheiro, minhas suspeitas são confirmadas. Joana não
se mexeu nem um centímetro.
Chego perto de uma cadeira e pego meu cinto. Vou colocar uma bela
faixa nessa bunda espetacular pela desobediência direta.
Dobro o couro e bato na minha mão. O som a faz recuar, mas ela não
alcança nem um dedo para tirar a roupa.
Vou até a cama e abro a gaveta. Algumas pessoas mantêm armas nas
mesas de cabeceira, mas eu sou fã de facas.
Com uma lâmina afiada, rasgo a blusa dela.
Os olhos dela se abrem.
— Você sabe quanto eu paguei por essa blusa?
Deslizo a faca por baixo da cintura da calça.
— Sei. Fui eu que a paguei, esqueceu? – ri, baixinho. — Tenha muito
cuidado e não se mexa. Eu não quero que você seja cortada pela lâmina.
Você sabe que é muito afiada.
Ela respira fundo - e eu corto o cós como se fosse manteiga.
— As calças têm um zíper — diz ela.
— E você tem dedos, mas nenhum deles funciona. — Coloco um
joelho no colchão ao lado dela e tiro as roupas arruinadas. Meu pau duro
balança ansiosamente no ar fresco da noite.
— Olhe ele está feliz em me ver - Joana murmura.
Afasto a mão dela.
— Não. Você não toca.
— Por que não? — Ela faz beicinho.
— Porque você tem sido uma garota má e precisa ser castigada.
Belisco um mamilo nu.
Ela se contorce sob o meu aperto, as pernas juntas quando um choque
de emoção viaja daquele nó duro diretamente para o seu sexo. Eu a alcanço
para colocar a lâmina de volta dentro da gaveta e sinto um par de mãos
macias agarrar meu pau. Fecho a gaveta e me afasto.
— Eu disse para você não tocar.
O lábio inferior se projeta ainda mais.
— Mas estava ali e você tem um pouco de esperma. Você não quer
que eu lamba?
Meu pau palpita em antecipação, mas ela precisa ser punida.
— Você pode me chupar, mas eu controlo seus orgasmos, o que
significa que você não pode gozar até eu mandar. Se você me desobedecer,
vou bater na sua bunda com isso. — Aponto para o cinto ao lado dela.
Ela lambe o lábio inferior. É um dilema real, porque ela é super
sensível e gosta de gozar várias vezes por noite. Se ela escolher isso como
castigo, ela sabe que eu a levarei à beira da loucura. Afasto suas pernas e
enfio meus dedos dentro de sua boceta molhada.
— Ah — ela engasga com a intrusão.
Sua boceta me aperta com força. As paredes tremulam ao meu redor
enquanto coloco minha mão contra ela. Seus olhos se fecham e seus quadris
se levantam quando ela começa a me montar. Um orgasmo já está batendo à
sua porta.
Eu arranco meus dedos dela.
Seus olhos se abrem e ela olha.
— Eu estava quase...
— Você não me disse o que decidiu. Você quer meu pau na sua
garganta ou quer que eu controle seus orgasmos?
— Eu quero os dois — ela lamenta.
Envolvo meus dedos encharcados dela em volta do meu eixo e trabalho
meu pau da base à ponta, usando seu suco de boceta como lubrificante. O
som da minha mão batendo contra o meu pau enche a sala. Os olhos dela
estão presos. Ela lambe os lábios. Um gemido escapa. Ela quer muito o meu
pau, mas não sabe se quer na boca ou na vagina. Ela também não tem certeza
de quanto tempo ela pode durar sem gozar.
Continuo me esfregando. Em alguns segundos, eu vou estar pintando
em seus peitos com a minha porra.
— Boca. Vou gozar na sua boca.
Paro a puxo para que ela fique de joelhos.
— Mãos atrás das costas — ordeno. — Como isso é um castigo,
você não pode me tocar.
— Isso não é justo — reclama, mas faz o que eu ordeno.
A quero tanto que estou tonto. Minha visão borra por um segundo
enquanto ela se ajoelha. Ela alisa a língua e abre a boca, uma suplicante
esperando sua oferta.
— Abra mais — ordeno com uma voz rouca. Aperto a base do meu
pau para afastar o orgasmo. Se eu não tiver controle, não vou durar mais que
três segundos.
Ela estica a boca aberta, mas mesmo assim é difícil passar meu eixo
grosso por seus lábios. Ela engasga e depois engasga um pouco mais quando
minha cabeça bate no fundo de sua garganta.
Joana engole e minha cabeça desce para aquele espaço apertado e
estreito. Ela não será capaz de falar muito amanhã. A garganta dela ficará
dolorida. Assim como a bunda dela e a boceta dela quando eu terminar de
fodê-la.
— Você pertence a mim, Joana. Ninguém mais toca em você.
Ninguém mais sorri para você. Ninguém mais respira perto de você. Você
entendeu?
Ela balança a cabeça levemente, o movimento fazendo meu pau
deslizar ainda mais pelo canal restrito.
— Você pertence a mim. Eu possuo você.
Começo a me mover devagar, porque ela está vulnerável. Meu pau
arranha sua garganta, enchendo-a. Coloco minha mão em volta do pescoço e
me sinto movendo dentro dela. Isso é possessão. Ela é minha. Minha.
— Quando você se comprometeu comigo, me deu o direito de destruir
qualquer coisa ou alguém que ameace nosso vínculo.
Ela se contorce um pouco.
— Vou descer pela sua garganta e depois vou foder sua buceta até que
você não possa ficar em pé. Você entendeu?
Ela assente novamente. Eu jogo minha cabeça para trás e empurro,
deixando o orgasmo sair de mim, deixando o esperma derramar em sua
garganta.
Puxo e cubro sua garganta e seios com minha semente. Agarrando-a
pelo queixo, eu a levanto até que sua boca esteja nivelada com a minha.
— Não há nada que eu não faça para mantê-la segura.
— Eu sei. — A admissão sai com uma respiração instável.
Fecho minha boca na dela, selo nossa promessa um ao outro. Eu nasci
por um motivo e isso é para proteger Joana. Eu não vou falhar nisso.
CAPÍTULO DEZOITO
JOANA

Enzo foi chamado para trabalhar naquele sábado. Não era costume do
seu empregador reivindicá-lo nos finais de semana, mas ele atendeu a ligação
e prontamente se dispôs a comparecer. Não me disse porque precisava ir, mas
eu respeitei sua saída. Apenas espero que não seja nada importante que o faça
ter que se ausentar por dias. Estamos numa fase nova – e quente – do nosso
casamento. Tudo que quero é usufrui-la o máximo que puder.
Meu corpo ainda está doendo de fazer amor.
Não sei ao certo o que mudou, mas seja o que for, espero que continue
assim. Sinto-me mais perto de Enzo, o que não achei que fosse possível.
Nosso vínculo sempre foi intenso, mas o sexo tornou-o ainda mais forte.
Eu sempre amei Enzo. Desde o momento em que o conheci, ele tem
sido meu tudo. Eu não sabia que poderia me apaixonar mais por ele, mas a
cada dia acho que sim. Ele tirou algo de dentro de mim que não sabia que
estava lá. Provou que realmente fará qualquer coisa para me fazer feliz.
“Você pertence a mim”.
Meus mamilos endurecem, pensando nas palavras que ele me disse.
Pertenço a ele, mas ouvi-lo dizer isso despertou algo profundo dentro
de mim. Vendo o olhar em seus olhos enquanto ele pronunciava essas
palavras de posse, meu mundo inteiro parecia como se tivesse tombado.
Para mim, suas palavras eram tão doces quanto quando ele me disse
que me amava pela primeira vez. Tão especiais quanto quando disse que me
seria fiel e me honraria até que a morte nos separasse. Algumas pessoas
podem não entender, mas é assim que me sinto sobre Enzo.
Me afasto da janela, indo para a cozinha para fazer café. De relance,
vejo o tricô sobre a mesinha de canto.
Nunca vou conseguir fazer essa touca se não começar a trabalhar nela.
O inverno vai acabar antes que Enzo tenha a chance de usá-la.
Bom, conhecendo meu marido, ele ainda a usaria, mesmo que
parecesse horrível. Ele sorriria, me daria um beijo e a usaria até que ela se
consumisse pelo tempo, o que tenho certeza de que não demoraria muito,
devido à minha falta de habilidade em fazer tricô.
Adicionando mais açúcar ao café, vou para a sala de estar para sentar
na poltrona de Enzo enquanto pego as agulhas. Uma batida na porta me faz
virar para olhar o relógio. É muito tarde para alguém estar me visitando.
Minha irmã teria ligado se estivesse a caminho. Meu coração salta quando
corro para a porta.
Não sou tola. Eu já mexi em muito vespeiro nas minhas investigações.
Eu sabia que o sindicato estava incomodado com a minha tentativa de
entrevistá-los sobre o aumento das passagens. Além disso, alguns meses
antes havia recebido ameaças de traficantes.
A preocupação enche meu estômago enquanto meu ritmo cardíaco
aumenta. Abro a porta e vejo Juliano e Fernando ali. São colegas de Enzo na
empresa que ele trabalha. Já os havia conhecido em festas de final de ano.
— O que aconteceu? Onde está Enzo? — Meus olhos se enchem de
lágrimas. — Ele está bem?
— Enzo está bem. — Fernando dá uma cotovelada em Juliano, que me
encara perplexo. — Ela acha que algo aconteceu com o marido. Dois
homens à sua porta tarde da noite nunca é um bom sinal.
Juliano suspira, um riso lhe escapa da boca.
— Desculpe, não quisemos preocupá-la. Enzo ficará muito bravo se
souber que a preocupamos — ele brincou.
— Oh. E o que querem? – indago.
— Estamos aqui para conversarmos com a senhora.
— Me chame de Joana – peço.
Aos poucos, vou recuperando o fôlego. Nunca pensei em perder Enzo
antes, mas vê-los ali diante de mim trouxe-me essa possibilidade. Não sei se é
algo que eu poderia lidar ou pensar naquele momento. Há tanta coisa ruim no
mundo que Enzo é a única pessoa com quem eu sempre posso contar para
colocar um sorriso no meu rosto no final de um dia de merda.
— Por favor, entrem.
Dou um passo para trás, abrindo a porta.
— Vocês podem me fazer um favor e não dizer a Enzo que eu abri a
porta sem perguntar antes quem era? — peço. – Ele é meio super protetor.
Os dois homens se encaram.
— Mentir para Enzo?
Qual a porra do problema? Que tipo estranho de colegas de trabalho.
— Omitir – murmuro.
Enfim, não me preocupo muito com isso. Se eles contassem, o máximo
que aconteceria era Enzo avermelhando minha bunda com tapas. Ele está
sempre tão preocupado com a minha segurança.
— Café? – Mudo de assunto, fazendo sinal para que eles entrem na
sala de estar. Eles vão naquela direção, fechando a porta atrás deles.
— Não, obrigado Joana. — Fernando olha em volta de nossa casa,
seus olhos examinando o local. — Lugar agradável que vocês tem aqui.
Enzo ganha muito bem. Suas comissões são sempre altíssimas. E ele
gosta de viver bem.
— Obrigada. — Sento-me na beira da poltrona.
Os dois se sentam no sofá de frente para mim.
Dobro minhas mãos no meu colo.
— Bem, é sobre o dr. Edison Magalhães — diz Fernando finalmente.
Eu me encolho com o nome do homem.
— Joana, sei que é uma pergunta estranha para dois funcionários de
uma empresa de software de segurança, mas... sabemos que trabalha perto do
advogado, e já cobriu vários casos dele... Então... o Dr. Magalhães já a fez
sentir-se desconfortável?
Eu lambo meus lábios, arqueando minhas sobrancelhas.
— Enzo me falou que a empresa de vocês estava fazendo um novo
software para a polícia. Tem algo a ver com isso?
Eles se entreolharam.
— É melhor você não saber — Juliano destacou.
— Por que então você me pergunta isso? — devolvo.
— Para ser sincero com você, estamos ajudando a polícia, mas
preferimos não falar muito sobre isso. Ocorreu que investigando o cara,
algumas pessoas nos contaram que ele tem uma queda por você. Eles notaram
algum comportamento estranho da parte dele quando se refere a você.
— Edison fez algo errado? — Eu tento não parecer muito esperançosa.
Aquele homem devia estar atrás das grades. Não apenas pelo fato de
ser tão perturbador. Nem pelo jeito que ele me encurralou no meu carro. Ele é
cúmplice de cada crime que ajudou a reverter nos tribunais.
— Nós realmente não podemos discutir isso. — Fernando encolhe os
ombros, parecendo se desculpar.
Então digo a verdade. Sobre Edison parecendo estar em todo lugar que
eu estava. Sua insistência num emprego que recusei. O jeito que ele me
encurralou no estacionamento. Conto tudo, exceto a parte sobre Enzo
jogando Edison em seu carro. Eu não digo isso a eles. Eu não minto, apenas
deixo convenientemente essa parte de lado.
— Há mais alguma coisa que você queira nos dizer? — Juliano
pergunta.
Eles não são policiais. Eu sei que devia estar falando sobre isso com
um policial. Mas, se de alguma forma eu pudesse ajudar naquela investigação
privada, devia fazer. Porém, eram colegas de Enzo e eu não queria deixar
meu marido em uma situação desconfortável no trabalho.
— Para ser sincera, eu realmente não quero falar sobre isso sem Enzo.
— Abaixo a cabeça, olhando para as minhas mãos, fingindo ser tímida e
assustada com tudo isso.
— Compreendo. — Fernando se levanta. Juliano segue o exemplo.
— Obrigado pelo seu tempo. — Juliano acena para mim.
Eu os conduzo até a porta, dizendo adeus e trancando-a atrás deles.
CAPÍTULO DEZENOVE
ENZO

Juliano e Fernando estão na sala quando eu chego. Fernando está


esparramado no sofá, e Juliano está parece ler algo em um papel.
— Aconteceu algo? — indago.
— Temos uma câmera perto de onde sua esposa trabalha — eles me
contaram, como se eu não soubesse. — E parece que você teve uma
discussão com Magalhães no outro dia. Quer nos contar sobre isso?
Eu quase ri. Dentro daquela organização, eu só respondia a Lucas.
Mesmo assim, não vi motivos para entrar em atritos com meus irmãos.
— Ele estava ciscando no meu galinheiro. — Coloco minha jaqueta
de couro no gancho e dou de ombros.
— Você bateu nele.
— E daí?
Eu olho em direção ao corredor que leva ao escritório de Lucas. A
polícia federal havia interceptado uma grande carga de cocaína vinda da
Bolívia, e o prejuízo seria imenso. Nós precisávamos verificar nossos
orçamentos.
— Não é uma boa ideia um membro da Black Rose estar atacando um
importante advogado de defesa. Isso atrai a atenção.
Fernando está parado. Ele não está literalmente torcendo as mãos, mas
sei que não gosta de estar me dando sermão.
Contudo, sua preocupação é válida. Eu não tinha pensado nisso e
admito isso.
— Sinto muito, irmão . Eu não estava pensando em nada além de
minha esposa sendo assediada.
Fernando faz uma careta.
— Enzo...
— Eu sinto muito. Posso sair do interrogatório agora? — insisto.
Sou uma pessoa calma. Não quero ficar criando atritos com eles. São
minha família. Eu morreria por qualquer um desses caras.
— O fato é que várias vítimas foram representadas por Magalhães.
Especialmente a última: Garbin.
— Sim... você já insinuou isso antes.
— E a gente quer pegar esse cara. Mas, não matando, entende? Seria
fácil matar, mas isso só chamaria mais a atenção. Queremos entregá-lo a
polícia.
Ele suspira e junta os dedos.
— Certo.
— Irmão... — Juliano parece tentar forçar as palavras. — Me diga uma
coisa: se você fosse matar alguém, nos contaria, não é?
Encaro-o firme.
— O que quer insinuar?
— Desde que entramos pra Black Rose aprendemos que cada ação tem
uma reação. Por isso não matamos sem ordem para isso. E as ordens ou
partem do pai, ou do conselho. Você não estaria agindo sem o aval da
família, não é?
O que eu devia fazer? Ignorar e seguir para Lucas? Ou responder? Se
respondesse, mentiria ou seria sincero?
A verdade é que eu matei muita gente nos últimos dois anos. Mais até
do que eles calcularam. Alguns corpos nem foram encontrados.
— Isso importa? — digo, enfim.
— Confiança importa.
Depois, eles se afastam, indo em direção a saída. No momento em que
a porta se fecha, vou na direção de Lucas.
— Juliano e Fernando me pediram um álibi para a morte de Garbin. —
contei ao pai. — Não sei o que dizer.
Fechei a porta do seu escritório. Ele repousou na sua enorme cadeira,
suspirando fundo.
— Que merda, hem? Quem se importaria com a morte daquele merda?
Como sua esposa reagiu ao saber da morte dele?
— Nós falamos pouco sobre isso, mas ela gostou porque houve justiça.
Às vezes, acho que Joana é tão sedenta de sangue quanto eu. Há uma
ferocidade nela, principalmente na cama. Ela quer que eu seja brutal, que a
submeta com força até que suas lágrimas cheguem ou que bata em sua boceta
apertada até que esteja gritando.
Todavia, apreciar um pouco de tempero no quarto não é o mesmo que
aprovar um assassinato.
Teoricamente, ela gosta da ideia de justiça chegando à porta de
Evandro. Por outro lado, ela não iria querer o marido esteja sujando as mãos.
— Juliano e Fernando se importam com a morte desse merda —
resmungo.
— Por que os direcionou para isso?
— Achei que eles fossem focar no advogado e o levariam a polícia.
Não imaginei que desconfiassem de mim.
— Sua esposa está envolvida com todos os crimes. É muito imaturo de
sua parte achar que eles seriam tão idiotas. Eles tem o mesmo treinamento
que você.
— Eu sei... eu sei...
— O que me surpreende é Joana não ter juntado as peças.
Sento-me no sofá ao lado.
— O que eu faço, pai?
— O mais simples é contar a eles. Vão ficar irritados por não saberem
de nada antes, mas ao menos...
— Ricardo ficará puto. Ele não admite ficar por fora de nada.
Lucas dá um sorriso orgulhoso.
— Você acha que a polícia pode chegar até Joana? Da mesma forma
que Juliano e Fernando?
Lucas dá outro suspiro cansado.
— Escute Enzo. Desde que voltei, alguns membros das facções estão
me cobrando explicações sobre as mortes. Querem saber porque a Black
Rose não está fazendo nada. Mais cedo ou mais tarde, nós vamos ter que lidar
com isso. Juliano e Fernando não são os únicos com suspeitas.
— Sobre mim?
— Sobre mim — ele se apontou. — Alguns acham que eu ordenei as
mortes sob sigilo. E querem saber os motivos. Está rolando muita
desconfiança. — ele riu. — Você me meteu numa enrascada, sabia? Se não
fosse um dos meus favoritos, acabaria com você.
Meu telefone toca naquele momento. Peço um momento ao meu pai, e
vou até o corredor.
— Joana?
— Joseane ligou. Parece que ela brigou com Joaquim. Quer que eu
fique com ela essa noite. Eu sei que não é nada sério, mas ela quer alguma
companhia.
— Se ela precisa de você, deve ir, amor. Mas sentirei sua falta. Não
gosto de dormir sozinho.
— Eu irei sentir sua falta também. Prometo compensá-lo amanhã. Não
fique acordado até tarde, ok?
— Estarei na cama com a mão no meu pau, esperando seu retorno.
Ela ri.
— Eu gosto desse pensamento. Te amo, Enzo.
— Eu também te amo. — Jogo o telefone no meu bolso.
Joana iria se ausentar por uma noite. Era a oportunidade perfeita para
eu cometer meu último assassinato, antes que meu pai Lucas me proibisse de
praticá-los.
Nessa noite Edison Magalhães iria morrer.
CAPÍTULO VINTE
JOANA

Minha irmã tem azar com os homens. Ela sempre brinca e diz que eu
usei toda a sorte da família quando conheci Enzo, não deixando nada para
ela. Mas, a verdade é que Joaquim enganou a nós duas.
Quando o conheci, achei que fosse um bom rapaz. Contudo, Joseane
me disse que ele estava lhe traindo com uma garota da academia.
Eu queria me sentar ao seu lado e lhe dar todo o conforto, mas minha
mente, de repente, foi tocada pela presença de Juliano e Fernando.
Quando falaram comigo, havia algo a mais nas suas indagações. Como
uma suspeita... mas, não sobre Edison... Sobre mim.
E algo a mais havia me aprofundado desde que eles foram embora.
Palavras de Edison que, na época, considerei como apenas provocações, mas
que agora me tomavam se me deixar: Você sabe com quem se casou, Joana?
Você sabe os antecedentes dele?
Que mulher, em nome de Deus, busca pelos antecedentes do
namorado? Que mulher que vai investigar o noivo? Que vai pedir uma ficha
criminal do marido?
— Eu nunca vou ser feliz, Joana — Joseane murmura, nos meus
ombros.
Dou um abraço apertado na minha irmã.
A ignorância é muitas vezes felicidade. Joseane era feliz com Joaquim
sem saber que ele a traia. Eu sou feliz com Enzo não sabendo nada sobre seu
passado.
O pouco que ele me disse, me deixou claro que era algo que não se
orgulhava.
Então...
Mas...
Havia um problema. Enzo está tramando algo. Eu posso sentir isso.
Não tenho ideia do que é, mas não posso ignorar esse sentimento. E a
constatação disso me faz ter a certeza de que ele está mentindo para mim.
Porém, eu sempre respeitei a sua privacidade. Se ele não queria falar
sobre sua família, seu passado... eu sempre respeitei isso. Contudo... Eu sabia
com quem havia me casado?
O homem com quem dividi os últimos dois anos era maravilhoso. Eu
realmente desejava saber como ele era antes de nós nos conhecermos?
— Estou tão magoada, tão infeliz. Nunca vou conhecer alguém
sincero?
— Claro que vai, Joseane. Você só precisa esperar o tempo certo. As
vezes Deus está te livrando de algo pior.
— Deus? Você ainda acredita em Deus vendo tantas desgraças?
— Por um tempo me deprimi vendo bandidos saindo impunemente da
cadeia. Mas, sabe... de repente está começando a haver justiça. Nos últimos
anos, muitos dos desgraçados que cometeram barbárie e foram soltos,
apareceram...
... Mortos.
— Apareceram o quê? — Joseane insistiu.
— Enfim, eles encontraram a justiça — desconversei.
Desde quando isso começou a acontecer? Dois anos...?
Desde Enzo...
Neguei com a face.
Você sabe com quem se casou, Joana?
Meu sangue começou a ferver.
— Encontraram a justiça? — minha irmã repetiu. — Bem feito!
— Você acha bem feito?
— Se a lei não cumpre seu papel, que alguém o faça. Claro que fazer
justiça com as próprias mãos pode trazer problemas, mas... É melhor que
nada.
Eu nunca pensei nisso assim antes.
— Eu me senti feliz quando alguns deles aparecem mortos —
confessei.
— Não tem nada de errado nisso. Se as leis fossem cumpridas, a gente
não precisaria clamar por justiça pelas próprias mãos. Então, estou feliz que
alguém esteja dando um fim nesses desgraçados, seja lá por que motivo.
Muita gente que foi tema das minhas matérias desapareceu ou acabou
morta. Nunca havia ligado os pontos até então.
Porém, nada é uma coincidência. Quantas vezes meu próprio marido
me disse isso? Quantas vezes ele teve que sair no meio da noite?
Eu balanço os pensamentos da minha cabeça. É por causa trabalho que
ele saí. Claro que ele é chamado no meio da noite. Se um sistema de
segurança dá pau... se chama... os técnicos, não o vendedor...
Como nunca me dei conta disso antes? Por que ele é chamado se não é
ele que os projeta?
Não... não... Por que ele faria isso?
Por mim.
Se eu sei alguma coisa sobre Enzo, é que ele odeia quando estou
chateada. Se algo está me incomodando, o homem tem como missão
consertar isso. Ele me ama mais que tudo. Eu nunca duvidei disso.
Algo em nosso relacionamento mudou nos últimos meses. Uma
conexão mais profunda vem crescendo. Nós dois mostramos lados que
mantivemos trancados dentro de nós.
Eu sorrio.
Estranhamente, ironicamente, horrivelmente... Eu sorrio.
Meu Deus...
Aquele homem é meu tudo. Ele pode ser totalmente inocente, mas
mesmo que fosse culpado, ainda assim que o amaria.
Eu deveria mandar uma mensagem para Enzo.
CAPÍTULO VINTE E UM
ENZO

Meu telefone vibra. Suspiro enquanto o busco no casaco.


— Salvo pelo gongo. – brinco e me levanto. – Aliás, fato interessante:
sabia que na idade média era comum enterrarem pessoas vivas, por isso
colocavam um sino sobre o túmulo, com uma corda atada no dedo do
defunto. Caso se mexesse, ele podia pedir ajuda. Por isso que usamos essa
expressão.
Afasto a corda do pescoço de Edison.
Olho para o aparelho. É uma mensagem de Joana. Sorrio, enquanto
leio:
“Você está vendo o jogo? O Grêmio está vencendo. O Inter também.
Os dois times vão se enfrentar na próxima fase. Vai ter Grenal na
Libertadores. Não é emocionante?”
Não era muito ligado a futebol, mas assenti enquanto respondia.
“Com certeza. Lucca Novaes está jogando muito!”
Eu não estava vendo o jogo, então chutei no jogador que sempre jogava
bem.
“Está! Lucca Novaes é demais. Será que ele me daria uma entrevista?
Sei que não gosta da imprensa por causa do que fizeram a sua esposa... Bom,
vou deixá-lo ver o jogo em paz. Apenas, não coma todas as batatinhas!”
“Não se preocupe. Nem toquei nelas. São todas suas ♥”
Eu nunca como enquanto estou trabalhando.
— Você realmente está mandando mensagens para alguém? —
Edison se mexe na cadeira atrás da mesa.
Estamos em seu escritório em casa. O local é muito aconchegante com
painéis escuros, uma grande mesa de madeira e uma janela em formato oval.
Há um sofá grande em frente à mesa.
— Estou.
— Que tipo de filho da puta doente você é? Você matou Garbin, não
matou?
— Eu? Está louco? Quem o matou foi você. — Bato meu dedo
enluvado no envelope que trouxe. — Você matou aproximadamente vinte
pessoas nos últimos dois anos ou mais. Você é um homem muito ocupado.
Ele me encarou como se estivesse alucinando.
— Eu nunca matei uma pessoa em toda a minha vida.
— Você matou – insisto. – Mas, o lado positivo é que muitos vão te
ver como herói quando essa lista sair. Para começar tem um traficante
perigoso. Depois você foi pra cima de pedófilo. Teve vários pedófilos, aliás.
Teve também estupradores, homicidas... Cara, eu realmente admiro você.
Porque, veja: todos te veem como um desgraçado que protege criminosos,
mas você só os queria livres para poder matá-los!
Ele conseguiu absorver cada palavra. Eu via a compreensão em seus
olhos, conforme os mesmos iam se arregalando.
— Desgraçado! – gritou. – Doente! Maldito!
— Bom... Você já me chamou de muita coisa. Enfim, você sabe que
eu não tive muitas oportunidades na vida, já fui preso, não tenho estudo...
Entretanto, eu não sou tão simplório. Eu gosto de ler, por exemplo. Oh, eis
uma coisa que você não sabe de mim – brinco. – Viu, a vida é cheia de
surpresas!
— Aonde quer chegar, seu psicopata?
— Dick, o açougueiro, personagem de Shakespeare na peça Henrique
VI, dizia que “a primeira coisa a fazer é matar todos os advogados”. E ele
está certo. Vocês deviam cumprir a lei, ajudar a estabelecê-la, mas por
dinheiro, ajudam desgraçados a ficarem livres. Então, caras como eu, os
famosos psicopatas como você chama, precisamos fazer valer a justiça.
Eu inclino minha cabeça e estudo Edison. Ele vai morrer, e como devo
explicar isso para Lucas? No fundo, não consigo me importar.
Definitivamente, eu gosto daquela sensação. Matar era delicioso.
Há suor escorrendo de seu rosto e seus olhos estão levemente
arregalados. Suas mãos balançam inutilmente ao lado do corpo. Essa é uma
das maneiras mais chatas de matar alguém e, para Edison, um homem que
assediou minha esposa e a deixou com medo, uma morte fácil demais. Eu
deveria estar socando seu rosto até que seu queixo se tornasse mole. Não
posso, porém, porque seria óbvio que ele não se matou.
O celular volta a vibrar. O Grêmio fez mais um gol.
“Oh, sim, vi o gol de relance. Na verdade, estou limpando a casa”.
“Não precisa. Amanhã eu iria passar um pano em tudo até a diarista
aparecer na próxima semana. Não trabalhe demais, querido”.
“Não vou. Eu te amo.”
“Eu te amo também”.
Coloco o telefone de volta no bolso e pego o rolo de corda no caminho
de volta para Edison.
Ele se afasta, o desespero o dominando.
— Sinto muito por tudo. Sinto muito por ter incomodado sua esposa.
Eu me agacho na frente dele. Odeio covardes.
— Para um famoso advogado de defesa, você não está sendo muito
persuasivo. Você já disse isso várias vezes hoje, e em nenhuma delas eu senti
veracidade no seu tom.
— Você é um merda doente — ele chora enquanto coloco a corda em
volta do pescoço. — Por que você está me atormentando? Apenas acabe
com isso.
Passando o nó, paro antes de apertá-lo e digo:
— Ah, sei lá, é engraçado ver você chorar e me prometer muito
dinheiro se eu deixar você ir.
— Diga-me o que você quer. Você quer uma garota com quem possa
brincar? Você tem um problema que precisa resolver? Posso encontrar
alguém. Não importa o que seja.
Eu aperto o laço com força.
Os olhos de Edison lacrimejam.
— Por favor... por favor — ele engasga.
Naquela noite eu invadi sua casa. Num corredor escuro, o embosquei.
Usei uma forte anestesia (conseguida no mercado negro), e o inutilizei. Tudo
precisava ser feito da melhor forma, sem deixar marcas ou vestígios. Afinal
de contas, tinha que parecer um suicídio.
— Sabe... Não adianta me oferecer dinheiro ou mulheres. Eu tenho
tudo o que preciso. Você nunca deveria ter falado com minha esposa. Nunca
deveria ter olhado para ela. Nunca devia tê-la tocado. Essas são as minhas
regras. Joana é apenas minha. Um homem como eu não tem muito o que se
orgulhar na vida, mas eu tenho ela. Joana é tudo para mim.
Eu levanto, arrastando seu corpo comigo. Ele é forçado a ficar de pé,
com os pés lutando para encontrar o equilíbrio, mas Edison não tem forças.
— Eu não sabia disso. Se eu soubesse...
A corda o corta. Eu o chicoteio na viga do teto dele e o puxo para
baixo. Ele faz barulho, provavelmente mais ameaças e promessas, que eu
ignoro.
Como se eu precisasse contar a alguém quais são as regras... Joana tem
um anel no dedo. Um homem de verdade respeita o matrimônio de outro.
Antes de sair, verifico tudo mais uma vez, enfio a nota de suicídio na
gaveta superior para que os bons policiais a encontrem.
Quando a porta se fecha atrás de mim, envio uma mensagem para
minha esposa.
“Estou indo para a cama. Durma bem. Eu te amo”.
Ela não responde, mas isso não importa. Tiro as luvas e as queimo a
meio caminho do meu carro, que estacionei a três quilômetros dali.
A borracha tem um cheiro ácido, mas as luvas biodegradáveis ​se
desintegram rapidamente, deixando apenas um monte de cinzas.
Demora apenas um pouco antes de eu estar na frente do prédio da irmã
de Joana. As luzes estão apagadas.
Volto a ligar meu Cruze e retorno para casa.
Joana está segura. A carta de suicídio confessa os assassinatos, com
detalhes que não estão nos arquivos.
O caso será encerrado e todos ficaram felizes.
Claro, talvez meus irmãos sempre suspeitem de mim, mas não haverá
nada que eles possam fazer.
Algumas pessoas precisam ser mortas e, portanto, estarei lá para fazer
o que a polícia e o tribunal não podem.
Só estou mantendo o equilíbrio — e minha esposa segura.
CAPÍTULO VINTE E DOIS
JOANA

— Joana.
Ele estava surpreso por me ver. Eu devia estar no apartamento de
Joseane, mas senti que precisava voltar para casa. Pedi perdão a minha irmã e
peguei um Uber.
Não fiquei surpresa ao encontrar a casa vazia. No fundo eu sabia que
ele não estaria lá. Todas as suas mensagens durante a noite foram mentiras.
Um pouco antes de ele chegar, mandei uma mensagem para Bruna:
“Faça um levantamento completo com o documento de identidade
abaixo”.
Estava limpo. Nenhuma mancha, nem mesmo uma multa de trânsito.
Naquele momento, soube que Enzo usava documentos falsos. E percebi
que eu podia enfrentar tudo em nome do meu amor por ele, mas eu precisava
saber a verdade.
Ele cruzou pela cozinha, vindo na minha direção.
— Joana... Eu precisei sair porque...
— Diga-me, Enzo: Amanhã eu verei alguém que conheço estampado
nos jornais, morto?
Ele ficou em silêncio. Aquilo fez meu coração vibrar.
— Enzo, diga-me a verdade. Desde o começo.
Então, vi seu olhar vacilar. Pela primeira vez na vida, parecia fraco.
— Não quero perder você...
— Vai me perder se não dizer tudo. Mas, se me contar... Por pior que
seja, sei que ficarei ao seu lado.
— Não vai ficar... – ele insistiu.
— Eu vou – aproximei-me de meu marido, segurando seus ombros. –
Fale, Enzo. Eu imploro...
Ele largou o celular na mesa da cozinha. Buscou uma cadeira, sentou-
se. O imitei, ficando defronte a ele.
— Você lembra da Black Rose? – indagou.
Eu esperava tudo, menos aquela pergunta.
— A organização que na verdade era apenas uma lenda?
— Não é uma lenda...
As palavras pareciam loucura. Eu passei meses no encalço daquela
organização e tudo deu em nada.
— Eu investiguei muito e descobri que era apenas um boato...
— Você investigou muito e quase chegou à verdade. Porém, antes
disso, fui incumbido de matá-la.
Perdi o fôlego. Segurei-me na madeira da mesa, tentando conter as
lágrimas.
— Você quer dizer...?
— Lucas, meu chefe, é o Pai da Black Rose. Nossa empresa de
software é apenas uma empresa laranja, para lavagem de dinheiro. Eu não sou
um vendedor, sou um dos filhos de Lucas. Ele estava irritado com você,
então ordenou sua morte. Naquele dia que falei que a estava seguindo e você
achou romântico, na verdade não o fazia por amor, e sim porque estava
buscando a melhor forma de te assassinar.
Sua mão cruzou a distância da mesa e segurou a minha.
— Mas, eu me apaixonei. Não sei como, nem porque... Mas, fiquei
louco por você. Então, contei isso a meu pai. Lucas aceitou, contanto que eu
a mantivesse sobre controle. Então, manipulei sua investigação para deixá-la
longe da Rosa Negra.
Entendia tudo até ali. Estava chocada, mas entendia.
— Quem você é? Além dessa coisa da máfia? – questionei.
— Não menti quando disse que cresci jogado de um lado pra outro,
sem família. Fui preso cedo, na verdade várias vezes. Até que numa das
vezes, conheci Lucas. Ele me mudou. Ele me tornou alguém que as pessoas
respeitam.
— E as pessoas que morreram...?
— Sim, fui eu.
— Mas... por quê?
— O que eu posso dizer, Joana? Suas lágrimas pela injustiça me
fizeram agir.
Ali estava eu, segurando meu choro, descobrindo um Enzo
completamente novo. Provavelmente deveria me assustar, mas não sentia
isso. Ele me fazia sentir protegida e amada.
Sou tão doente quanto ele?
— Eu posso te jurar uma coisa, Joana: Nunca matei alguém que não
merecesse morrer. E você sabe disso, porque todos que matei nesses dois
últimos anos foram casos que você investigou.
Silêncio. Não consigo achar palavras, então Enzo segura meu rosto,
inclinando minha cabeça para trás para me beijar profundamente. Eu suspiro
em sua boca. Com um grunhido, Enzo se afasta do nosso beijo.
O medo me enche.
— Você vai me deixar? – ele indaga.
— Não. Nunca. – admito. – Mas, o que será de nós? E quando a
polícia chegar até você?
— A polícia nunca vai chegar até mim, Joana. Eu sou muito bom no
que faço.
Meu celular toca. Estou em choque. Não deveria atendê-lo, mas estou
no modo automático.
— Sim?
— Joana... – Era Bruna. –Edison Magalhães se matou. Uma das
amantes foi vê-lo e encontrou o corpo. Está nos grupos de notícia do
WhatsApp. Você acha que devo ir até a casa dele?
Meu estômago cai.
— Se matou? — Eu repito.
— Eles estão dizendo que ele deixou um bilhete de suicídio. Na carta,
confessa alguns assassinatos. Alguns deles eram seus próprios clientes.
— Isso é... — Eu paro porque não sei como me sinto sobre o que
Bruna está me dizendo.
Meus olhos volvem para Enzo, o verdadeiro assassino.
— Parece que a polícia já estava investigando. Tinha denúncias
anônimas. Há um monte de assassinatos não resolvidos, e eles falavam de um
serial killer. Joana, isso é ouro! Um material desses vai nos dar a melhor
matéria do ano.
Minha mente foca no meu marido. O olhar em seu rosto no dia em que
contei a ele sobre Edison. A raiva que saiu dele naquele dia no
estacionamento.
Desligo o telefone na cara de Bruna.
— Foi você?
— Para te proteger, acho que faria qualquer coisa. – admite sem
rodeios.
Essa é uma coisa que tenho certeza.
CAPÍTULO VINTE E TRÊS
ENZO

Eu não vou perdê-la. Joana é minha âncora nesta vida. Quando a vi,
sabia que a razão da minha existência era amá-la e apreciá-la. As coisas que
fiz foram porque eu queria criar um mundo melhor para ela.
— Você ainda é capaz de me aceitar? Estou sendo completamente
honesto com você.
Minha mão está molhada. Nunca estive mais nervoso.
— Você já matou mulheres?
— Quase nunca. Eu só matei duas mulheres e você conhece o caso de
ambas. Uma amarrava o filho pra ir num baile funk e a outra fez um aborto
numa dessas clinicas clandestinas. Nem sequer foi presa.
Ela assente.
— Lá na sua organização tem mulheres?
— Lucas é casado e não mantêm prostitutas, se é isso que está
perguntando.
— Quero saber se você já fodeu com mulheres quando está longe de
mim.
Eu era um homem completamente novo à sua visão. Entendi que ela
queria saber tudo. E eu estava dando tudo.
— Nunca te traí.
— Tem certeza?
— Eu nunca toquei em nenhuma mulher depois de conhecê-la. A não
ser as mortas.
— E crianças? Você já matou crianças?
— Não! Eu nunca mataria uma criança.
Ela fecha os olhos. Sei que está lutando internamente.
— Eu não posso te perder.
Seu murmuro faz meu coração balançar.
— Você nunca vai me perder, Joana. Eu sempre fui cuidadoso —
asseguro. — E vou continuar a ser.
Por fim, ela faz um movimento positivo com a face. Um enorme
suspiro de alívio me escapa. A puxo para mim, passo a mão nas costas dela
enquanto Joana senta-se no meu colo.
— Como você se sente ao saber de tudo?
— Não sei dizer. Culpa, talvez?
— Culpa?
— Porque, para mim, é reconfortante saber que existe alguém por aí
que cuida das coisas. Na verdade, eu estava pensando em deixar meu
emprego porque é muito frustrante ver as pessoas saírem impunes depois de
cometerem crimes hediondos. Não é justo.
— Não. Não é. — Eu a abraço com força.
Estamos do mesmo lado.
— Eu não quero te perder – ela soluça, repetindo a frase.
Coloco um dedo nos lábios macios de minha esposa.
— Eu não estou indo a lugar nenhum. Eu sou cuidadoso. Muito
cuidadoso.
— Nem sempre haverá um Edison para levar a culpa — ela sussurra.
Solto uma gargalhada.
— Sempre há um Edison, infelizmente. Sempre há alguém que coloca
o dinheiro acima de tudo.
Seus braços sobem para envolver meu pescoço.
Pressiono meus lábios no topo da cabeça dela.
— Não se arrisque, mas torne o mundo um lugar mais seguro. – ela
pediu.
Manter-me-ei fiel às suas palavras, ao seu doce desejo. Nosso amor é
imundo. Não me importo.
Não há espaço para culpa entre Joana e eu. Jamais haverá.
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Josiane Biancon da Veiga nasceu no Rio Grande do Sul. Desde cedo, apaixonou-se por
literatura, e teve em Alexandre Dumas e Moacyr Scliar seus primeiros amores.
Aos doze anos, lançou o primeiro livro “A caminho do céu”, e até então já escreveu mais
de sessenta livros, dos quais, vários se destacaram em vendas na Amazon Brasileira.
WWW.JOSIANEVEIGA.COM.BR

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