Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Ilustração: Ilustraí
Shattered Souls
[Recurso Digital] / April Jones — 1ª Edição; 2023
1. Romance Contemporâneo 2. Literatura Brasileira 3. New
Adult 4. Ficção I. Título
NOTA DA AUTORA
Apenas viva.
A guerra acabou.
PRÓLOGO
VIVENDO OU SOBREVIVENDO?
Eu não sei o que devo fazer
Assombrado pelo seu fantasma
Me leve de volta para a noite em que nos conhecemos
The Night We Met | Lord Huron
INÍCIO DE ABRIL
Nunca tive uma perspectiva de vida.
Às vezes, um turbilhão de perguntas me rondava e eu nunca
sabia qual seria o fim delas. Tudo ficou ainda mais difícil à medida
que a maioridade veio chegando, onde diversas responsabilidades
encheram a minha cabeça quando eu ainda nem sabia qual curso
eu escolheria, depois que me formasse. Em que lugar iria morar ou
se continuaria vivendo no apartamento com meus amigos, mas na
forma drástica que o ciclo da vida das pessoas ao meu redor ia
mudando, meu instinto percebia que eu seguiria sozinho, assim que
todo meu teatro da faculdade acabasse.
As máscaras teriam que ir ao chão.
Isso se eu unisse forças suficientes para aguentar meus
demônios.
Era aterrorizante como tudo ia piorando na minha vida, a
cada ano que seguia.
E, de certa forma, eu sentia que tudo estava saindo do meu
controle e ainda não sabia ao certo como realmente viver.
O que eu poderia fazer?
Estava vivendo ou sobrevivendo?
Não lembrava o exato momento que tudo simplesmente
começou a ruir. Houve apenas o estrago surgindo, como se não
fosse algo novo. De repente estava ali, despencando cada vez mais
forte. Simples assim.
Não teve um dia sequer na minha existência, sem que eu
acordasse temendo o que poderia acontecer ao decorrer do dia. O
pesadelo percorria por longos anos, nada era bom para me arrancar
um sorriso verdadeiro. E os que vinham, eram totalmente falsos.
A verdadeira vida adulta estava por vir.
Isso me fez prender o ar entre os pulmões sem perceber,
mas logo em seguida soltei.
Não somente uma vez, foi preciso perder a conta para ter o
controle do domínio das minhas mãos novamente, enquanto prendia
a textura metálica entre os dedos.
Precisava ir até o andar de baixo para pegar comida e
alimentar Brigitte, a minha macaquinha de estimação, que se
encontrava do outro lado do meu quarto.
Dormindo de forma serena.
Sua pelagem escura preenchia cada centímetro do seu
corpo. Nada mudou desde que a adotei há mais ou menos cinco
anos.
Na época não parecia tão insano a ideia de adotar um
animal, quer dizer, nas palavras de Mônica, a minha antiga
psicóloga da universidade, que me aconselhou quando achou que
manter a mente ocupada seria uma boa ideia.
Ela dizia que acolher um animal de estimação poderia me
fazer pensar menos no meu passado, e nas escolhas impulsivas
que precisei fazer por amor. Tudo por amor. Um que sempre esteve
determinado a falhar pela minha covardia.
Às vezes, as sessões me faziam ficar irritado.
Não tinham muito efeito proveitoso sobre mim, já que tudo
que rodava na minha cabeça eram meus problemas do passado e a
possibilidade de perder a minha garotinha.
Na época, ela ainda era um bebê alegre e sem
preocupações.
De maneira alguma eu deixaria que algo acontecesse. Seria
capaz de morrer por ela antes que algo afetasse sua vida.
Então, como se fosse minha salvação, achei que a terapia
fosse minha luz brilhando no fim do túnel e que poderia me ajudar
com os meus demônios do passado. A longo prazo ajudou, o
conselho de adotar um animal se tornou o mais viável.
Brigitte foi incrivelmente bem recebida pela família.
Pareceria ser impossível pensar em construir um laço
fraternal anos atrás. E mesmo que meus genitores não estivessem
ao meu lado quando eu mais precisei, eu tive uma família de
verdade quando conheci Nathaniel Sullivan e Eric Peterson.
Por hora, não estava pronto para revelar o motivo da minha
falta de sono, dos meus sumiços nos momentos mais importantes, e
o porquê odeio tanto ser Alexander James.
A aberração de Boston.
Isso era passado.
Olhando para Brigitte novamente, a ilusão do seu corpo
maculado nos lençóis me trouxe a vontade de trocar nossos corpos.
Não queria ter as preocupações e os pesadelos que meu verdadeiro
eu carregava dentro de si.
Queria ser livre.
Tranquilo como o sono de Brigitte.
Mas era algo que mudaria em alguns instantes, pronta para
comer sua primeira refeição do dia, porém, meu corpo parecia não
querer seguir minhas ordens. Até que de repente uma força foi
descarregada nos músculos, como se tudo dependesse unicamente
da porta que me separava das pessoas que moravam na casa.
Na verdade, isso era exclusivo para uma pessoa.
Uma garota.
Hannah Jane Peterson.
A mulher que atormentava meus sonhos desde que eu tinha
dezoito anos.
O pior, ela sempre esteve ali. Por mais que mil coisas
tivessem acontecido entre nós dois, continuamos frequentando os
mesmos lugares, tínhamos os mesmos amigos, dividimos um
apartamento, mas acima de tudo, fazia anos desde que trocamos
mais de cinco palavras, ou melhor, iniciamos uma conversa de
verdade.
Sem estarmos aprisionados com as memórias que ambos
guardamos. Elas, definitivamente, nunca deixariam nossas almas,
estavam enterradas em algo mais profundo. Encravadas em nossos
corações, entretanto, eu guardava mais que uma catástrofe nos
meus pensamentos.
Havia culpa.
Um arrependimento cruel.
E uma mente quebrada.
— Vamos lá, não é a primeira vez que você tem que fazer
isso — meus sussurros foram direcionados para mim mesmo.
Era apenas um estímulo para enfrentar meus pesadelos em
carne e ossos, que além de tudo, carregava um par de olhos verdes
surreais. Um sorriso arrebatador, que definitivamente me fazia ficar
de joelhos. Todavia, eles já não eram dados com frequência.
O pequeno gesto que fez parte da minha Jane adolescente,
já não existia mais.
Ele.
O namorado de Hannah acabou com o pouco que restou de
ânimo na vida caótica dela, mas para mim, ela sempre seria Jane. O
seu segundo nome, que era pronunciado apenas por duas pessoas.
Seu pai e eu.
— Certo. Um, dois... — Um nó apertou minha garganta, foi
impossível declarar o número seguinte.
Droga, eu não conseguia sair daquele quarto, mas era
necessário, todos iriam estranhar. Sempre soube que meus amigos
me observavam e notavam que a máscara carregada por anos, era
apenas uma fachada para algo destruidor.
Preferia que todos me vissem como o Alex idiota do que
sentir pena.
Apertei os olhos, ainda mantendo os dedos na maçaneta.
Então, algo aconteceu.
No momento em que o “três” se extraiu dos meus lábios
como uma pluma, fui capaz de respirar melhor, ao mesmo tempo
que meus dedos destrancavam a porta.
Um sorriso falso esboçou cada ponta dos meus lábios.
Tudo mentira.
Sacudi os ombros, parecendo ter acabado de acordar
naquele horário à medida que deslizava os dedos até o alcance da
cabeça, e pressionava de um lado para o outro. Um estalo, mesmo
baixinho, foi ouvido logo em seguida.
Pensei que teria alguns minutos até alguém surgir por
qualquer cômodo da casa, mas tudo isso foi por água abaixo
quando ouvi o ranger da porta de Eric sendo aberta bruscamente. O
corpo do loiro, coberto por apenas uma calça jeans escura, tomou
minha atenção. Havia alguns hematomas arroxeados na
extremidade da costela, isso me fez retrair os ombros.
Sabia bem de onde vinha aquilo.
Eric lutava boxe desde adolescente, após ter sido
diagnosticado com TEI[1].
Sempre que meu amigo sentia que as coisas estavam saindo
dos trilhos, descarregava todo o estresse acumulado no saco de
boxe. A forma como ele lidava com todo o processo e os sintomas
era impressionante, porque o loiro há poucos centímetros de mim
tinha um controle indestrutível quando se tratava do seu diagnóstico,
eram poucas as vezes que realmente o vi fora de si, e quase em
todas se tratava de Stéfany.
A mesma garota agarrada no seu pescoço.
Seus cachos castanhos se detinham presos por um elástico
de cabelo, enquanto a pele negra estava coberta pelo uniforme do
time de futebol americano. Os lábios naquele horário não
compartilhavam o fiel batom vermelho nos lábios, sua marca
registrada.
Porra, não bastava a época em que tive que ver Ana e
Nathaniel praticamente transando em cada cômodo da casa, Eric e
Stéfany resolveram tomar o pódio, ficando em primeiro lugar no
ranking dos sem-vergonhas.
— Eu realmente não preciso de pornô amador pela manhã,
pessoal — falei, sem ter o menor cuidado em esconder minha
aversão com a cena diante dos meus olhos.
— Oh, me desculpe, senhor puritano. Suas preciosas pupilas
não estão preparadas para o verdadeiro show. — Stéfany
respondeu, deixando o sarcasmo dançar ardilosamente na sua
língua.
Eric olhou para mim como se tudo que a sua garota falasse,
ele assinasse embaixo. Meu amigo estava apaixonado, melhor
ainda, estava amando. Sté com seus métodos peculiares fez mágica
e até poderia perguntar como, entretanto, nada poderia ter o mesmo
efeito que causou no cara à minha frente.
— Com toda certeza desse mundo, essa cena é demais para
meus olhos virgens.
— Eu duvido muito, Alex — instigou a garota ao girar seu
corpo, a posição que ambos mostravam para mim já não era a
mesma. Stéfany estava de frente, enquanto as mãos de Eric
envolviam as laterais da sua cintura coberta pelo uniforme dos
Crows Blues Legs.
— Discordo, gatinha. — devolvi e Eric pigarreou com o
apelido que nunca deixei de chamá-la nos últimos tempos.
Era algo que eu sempre fazia. Provocava meus amigos
assim, mas os dois sabiam que não era algo para se preocupar,
mesmo que não soubessem que na minha mente e no meu coração,
garotas da universidade não tinham espaço.
Era impossível ter alguém dentro do meu peito.
— Você tem uma sorte do caralho, se não, estaria com um
olho roxo logo pela manhã, cara. — O timbre do loiro soou pelo
corredor me tirando do fundo do poço. Quase agradeci o ato, mas
seria estranho pra caralho.
— Certo, acho que já deu de conversa e você sabe que estou
morrendo de fome. — Os ombros de Stéfany encolheram no
momento que ela inclinava o rosto na direção do namorado, em um
sinal de advertência por não ter preparado algo mais cedo.
— Tudo bem, vamos. — Eric disse, por fim.
— Prepare o meu também, docinho — zombei, vendo-o se
aproximar em conjunto da namorada. As írises azuladas se
intensificaram como se estivesse me enforcando mentalmente.
Levei as mãos contra os lábios, e soltei um beijo estalado. — Se eu
te tratar com carinho durante o café eu ganho uma sobremesa?
— Talvez ganhe um gancho de direita, Alex.
— Isso aí! Nesse queixo ridículo, amor! — Sté deu um sorriso
recheado de escárnio.
Filha da mãe, quase xinguei em controversa, mas por hora
preferi entrar na sua jogada.
— O que custa dividir seu homem, Fany? — continuei
provocando e notei Eric arquear as sobrancelhas.
— Ele é só meu, cara.
— Gostava mais de você quando odiava ele. — Indiquei meu
olhar sobre Eric.
— É uma pena, Alex. — Assisti suas mãos puxando-o para o
corredor a nossa frente, seus corpos ultrapassando-me enquanto eu
já pressentia paralisar no mesmo lugar. Reaja, Alex. — Ah, estamos
indo para o ateliê da Holly em alguns minutos, se quiser ir junto eu
deixo você ficar no mesmo carro que meu homem. — Isso me fez
contrair os lábios, sabia que ela estava tirando uma com a minha
cara. Entrando na minha bizarrice, a garota já entendia tudo que
rolava comigo.
Ah, Stéfany. Obrigado por isso.
— Não perderia a oportunidade, e só por isso, deixo você ir
no banco de trás. — Forcei um sorriso de lado, não conseguia dar
outro em um curto espaço de tempo.
— Nem sonhando.
— Que merda é essa, vocês dois? — Eric grunhiu.
Quando finalmente ouvi seus passos pelos degraus da
escada soando, pude respirar melhor. Enquanto seguia a mesma
trilha que Eric e Sté fizeram, os picos de memória de uma noite
distante encheram minha mente.
A conversa que tive com ela no momento que nunca pensei
que a deixaria ver.
Estava frágil, e pior, ela poderia tirar meus segredos sem que eu
percebesse. Responderia sem perceber.
Não lembrava totalmente se fui muito longe. E ainda temia
perguntar a ela o quanto deixei escapar, entretanto, um por cento do
incômodo foi tirado das minhas costas. Lembrava que tinha bebido,
era algo que eu relutava muito a fazer. Descarregar qualquer coisa
no álcool me fazia parecer ele.
Não queria ser como ele.
Não queria nada que me vinculasse a Alexander James, o
meu genitor.
No segundo que vi Stéfany sentada na escada meses atrás,
completamente sozinha e sem armadura, me permiti deixar as
minhas caírem também pelo menos uma vez, com alguém que me
entendesse. Não que meus amigos não poderiam me entender, mas
era diferente. Porque desde o primeiro momento que troquei uma
única palavra com ela soube que parecia um pouco comigo.
Sté tinha um olhar felino, ao mesmo tempo tão inofensivo,
mas sempre na defensiva com qualquer pessoa nova, não gostava
de sair da sua zona de conforto. O primeiro detalhe que sempre
chamava a atenção eram suas tatuagens. Ela possuía várias pelo
corpo, principalmente no braço esquerdo, as quais encobriam um
passado tortuoso. Em cada uma delas cabia uma mensagem
destrutiva da cabeça de alguém tão jovem.
Stéfany podia ser considerada uma mistura de Nathaniel pela
aparência e vícios, mas uma grande porcentagem comigo na parte
que nos vinculamos com nossos passados.
Enquanto ela fumava como Nathaniel, quando chegou em
Boston, Stéfany tinha memórias fodidas dos pais como eu.
Era apenas uma garota sozinha.
Perdeu tudo que era seu por direito de um instante para o
outro, e no fim, sabia que não podia negar um lar para ela, quando
precisou na noite em que foi expulsa de casa, na Filadélfia. Essa,
definitivamente, foi a minha melhor decisão.
Algo que eu quis que alguém tivesse feito por mim.
Sempre soube que gostaria de Stéfany, em algum momento
da nossa convivência no apartamento, desde que a conheci ainda
caloura, percebia que as coisas iriam mudar a partir do momento
que um vínculo surgiu inesperadamente com um dos meus
melhores amigos.
Eric Peterson.
Filho mais velho do prefeito da cidade, irmão da garota que
sempre foi um território fora do meu alcance, desde o colegial, e
pelo visto nada mudou a partir do momento que eu não podia ser
alguém na vidinha quase perfeita de Hannah.
Eric nunca soube do nosso envolvimento, e se um dia
chegasse aos seus ouvidos... Oh, o loiro encheria minha cara de
golpes que me deixariam inconsciente por vários dias. Sabia da
potência que poderia envolver seus punhos, entretanto, não queria
ser mais um a sentir sua ira, mesmo que eu merecesse por ter feito
o que fiz com sua irmã gêmea.
Às vezes, suspeitava que ele soubesse de algo. Embora em
nenhum momento, de todos esses anos, tivesse dado pistas mais
claras do que sabia, eu senti que a nossa amizade havia mudado
após minha colisão destrutiva pela sua irmã.
Todos do nosso vínculo desde o ensino médio percebiam que
havia algo acontecendo.
Palavras que nunca foram ditas e continuam embargadas na
minha garganta.
Houve um passado feliz por pouco tempo.
Mas ainda compartilhamos um presente doloroso.
Hannah foi a única mulher que tive na minha vida e seguia
assim desde então, nunca me permiti deixar outra pessoa entrar.
Era apenas dela. Seu lugar por direito, o mesmo que sempre esteve
reservado para ela. Porque em hipótese alguma daria para alguém
reivindicar.
Por mais que eu tenha ocultado esse detalhe por anos, ainda
não pude fazer o que meu coração desejava.
Era cedo demais para colocar tudo a perder e o motivo
principal, eu me formaria em alguns meses. Precisava primeiro me
estabilizar completamente, somente assim, teria o controle da minha
vida e da única pessoa que a vida dependia de mim.
Confesso que em algum momento desejei ser livre disso
tudo; Das amarras que me aprisionam e do medo de fazer tudo
errado e ferrar com tudo.
Engoli em seco, tomando controle dos meus passos até o fim
do corredor. Não tinha certeza se estava há muito tempo parado ali,
completamente perdido nos meus pensamentos destrutivos.
Hora da realidade, o meu subconsciente sempre me
alertando.
Quando finalmente cheguei no começo da escada, meu olhar
desceu por cada degrau.
Me permiti pensar em tudo que vivi enquanto meus pés
tocavam a madeira.
De um em um, pensei em Hannah.
Dei outro pensando nos meus amigos.
Pensei na faculdade.
Pensei na oficina.
E por fim, no meu futuro.
Apertei os olhos, à medida que meu peito parecia ter sido
pisoteado, no momento que imaginei um lugar solitário sendo real
na minha vida.
Essa seria a minha nova realidade em alguns meses.
Precisava aguentar um pouco mais.
Parado na frente da cozinha, o cheiro forte de ovos mexidos fluía
nas minhas narinas. Odiava ovos. Passei tanto tempo dependendo
deles que simplesmente não aguentava mais sentir o cheiro. Eles
me lembravam dos dias que aquela era a única opção de refeição
para o dia todo, para aguentar ir à escola, trabalhar e participar dos
treinos do time de futebol.
Porém, essa era minha realidade, pelo menos tinha algo para
me alimentar e que pudesse deixar mais dinheiro sobrando para o
leite ou fraldas de Margô. Ela era mais importante, e precisava de
algo melhor.
Para a minha menina eu daria sempre o melhor.
Eu poderia passar dias vivendo à base de ovos e água. Às
vezes, nem isso.
— Você quer ovos, Alex? — Stéfany indagou me vendo
entrar na cozinha.
O gosto amargo inundou minha língua.
— Hmm... — Meu timbre repercutiu pelo cômodo
completamente rouco. Sabia que era o bolo preso que dificultava,
por isso parei e limpei a garganta.
— Alex não gosta de ovos mexidos, Sté — Eric contou por
mim.
— Ah, como nunca soube disso? — Levantou as
sobrancelhas em conjunto do fraco sorriso que surgiu nos seus
lábios.
— Porque não como pela manhã. Talvez seja por isso,
gatinha — comentei.
— Certo. — Notei seus lábios se juntando um no outro.
Compartilhei um sorriso, não foi sincero, mas não queria que
ela se sentisse mal.
Enquanto Stéfany e Eric preparavam seus respectivos pratos,
meus pensamentos me levaram para longe. Para alguém que
estava longe e ao mesmo tempo tão perto.
A todo segundo eu deveria lembrar das minhas escolhas do
passado.
Ela ainda precisa de mim.
Sempre precisou.
Era apenas por ela que temia não ser capaz de estar ao seu
lado.
Margô James.
Definitivamente, aquela garota me tinha na palma da mão.
Oh, a criança sabia tirar tudo de mim quando podia, até minha
vontade de morrer vinte e quatro horas por dia quando não a
visitava do outro lado da cidade.
Seu sorriso fazia meus dias chuvosos serem ensolarados.
Sua pureza era o pouco que eu podia ter após perder a
minha.
A garotinha não precisava de muito para me fazer entender o
motivo que escolhi ela.
Uma escolha que mudou em todos os sentidos a sua vida e a
minha para todo o sempre.
Ela era o motivo de Hannah me odiar, mesmo sem saber da
sua existência e nosso laço sanguíneo, entretanto, a Pequena
Peterson que carregava o meu coração desde os meus dezoito
anos, amava outro homem.
Estava aprisionada a um relacionamento que a destruía a
cada ano.
Dia após dia.
Mês após mês.
Tudo que eu queria era voltar no tempo em que éramos
felizes, sendo dois adolescentes sem medo.
Queria apenas voltar para quando nos conhecemos.
02
ATOS E CONSEQUÊNCIAS
Você virou as costas para o amanhã
Porque você se esqueceu de ontem
Eu investi o meu amor em você
Mas você o desperdiçou
Você não pode esperar que eu esteja bem
Payphone | (feat. Wiz Khalifa) Maroon 5
IRREPARÁVEIS
Eu preciso chorar
Mas não consigo tirar nada dos meus olhos
Ou da minha cabeça, eu morri?
Eu preciso correr
Mas eu não consigo sair da cama por ninguém
Juliet | Cavetown
PASSADO
RECUPERANDO OS SENTIDOS
Lembro quando você costumava me ligar tarde da noite
Eu te dei as minhas horas e conselhos, apenas tentando te
consertar
E todos os seus problemas com o seu pai
Mas agora nem sequer sinto mais a sua falta
Então, eu quero de volta todas as lágrimas que chorei
Fingers Crossed | Lauren Spencer-Smith
CERCADO DE MEMÓRIAS
E eu ficarei bem
Admirando de longe
Porque mesmo quando ela está perto de mim
Nós não poderíamos estar mais distantes
E ela tem gosto de bolo de aniversário, histórias e outono
Mas para ela
Eu não tenho gosto de nada
She | Dodie Clark
INCOMPATÍVEIS
Eles dizem que é melhor ter amado e perdido
Do que nunca ter amado antes
Isso pode ser um monte de merda
Mas eu só preciso contar a todos vocês
Alguns erros são cometidos
Tá tudo bem, tudo ok
Moral Of The Story | Ashe
PASSADO
Eu odiava o inverno.
Era a época do ano que mais afetava Margô, principalmente
depois de ter sido diagnosticada com asma, quando ela tinha um
ano de idade. Isso me deixava nervoso e ocasionalmente, não
conseguia me concentrar nas aulas.
Engoli em seco ao passar as mãos contra o rosto. Deveria ter
comprado os remédios dela, no entanto, não estava com o dinheiro
e os seus anti-inflamatórios e a solução para nebulização eram
caros demais para nunca deixar faltar. Para piorar tudo, a demanda
na oficina estava uma merda para mim.
Alexander seguia pegando todos os trabalhos que surgiam e
no final, a grana ficaria unicamente para ele sustentar o vício em
bebidas e drogas.
Ele continuava sendo um filho da puta.
Apertei os olhos, pegando a caneta entre os dedos. Por um
segundo, achei que todos aqueles números escritos na folha
estavam se embaralhando entre si.
— É só uma equação — sussurrei, prendendo minha atenção
no caderno.
Números eram algo simples para mim. Não havia mistério
algum. Ainda mais quando eles faziam parte do meu dia-a-dia. Judy
dizia que eu era um gênio da matemática. Ela sempre implorava
para que eu fizesse suas lições da escola, na época que ainda
frequentava.
Por mais que eu me esforçasse a focar no dever, as risadas
que vinham do outro lado do refeitório me distraíam. Em questão de
segundos, uma batida do meu coração falhou quando meu olhar
encontrou a garota de cabelos rosa, mesmo depois de um ano, ela
mantinha a cor chamativa entre os fios loiros.
Hannah nunca me percebeu.
Às vezes, eu me sentia invisível.
Como se nenhuma das pessoas daquele colégio tivessem me
enxergado, pelo menos uma vez. Todas elas viviam em seu próprio
teatro, era inegável como qualquer um deles agia como se estivesse
atuando pelos corredores, porque quando o mundo ao seu redor
não é capaz de te ver, você acaba se tornando um observador.
Era isso que eu fazia todos os dias.
Observava cada corpo fingindo ser algo que não era.
Sabia cada ponto de todos eles.
Entretanto, ninguém sabia da minha existência naquele lugar.
— Ei, Hannah-Cara-de-Aranha. — Revirei os olhos quando
ouvi a voz de Mason, um dos irmãos dela se aproximando.
Havia uma bola de futebol americano debaixo dos braços,
quando ele encostou seu corpo ao lado do corpo dela. O Peterson
caçula parecia ter a mentalidade de um girino e nunca na vida seria
sucedido por méritos próprios.
Ele era o tipo de cara que sempre viveria na barra da saia da
mãe. Mason não andava sozinho, sempre tinha dois fiéis
cachorrinhos idiotas nas suas costas, para rir de algo sem graça ou
ajudar a aterrorizar algum nerd.
Tudo que eu conseguia pensar ao encarar o moreno, era que
alguém deveria exterminar essa raça.
Mas então, um sorriso surgiu nos meus lábios quando
Hannah ergueu o dedo do meio para o irmão. Isso era algo que eu
gostava na Pequena Peterson, ela sempre foi corajosa e, ao mesmo
tempo, uma das piores alunas da St. Emery.
Como alguém poderia manter essa pose por tanto tempo?
Não lembrava quanto tempo eu estava encarando-o, mas
sabia que havia sido o suficiente para o acéfalo me notar. Pela
distância, podia calcular que não estávamos tão longe. Isso foi
apenas uma brecha para ele lançar a bola na minha direção. Em um
gesto rápido, consegui apanhar a bola antes que pudesse acertar
meu rosto.
Fazer parte do time da minha antiga escola fez meus reflexos
melhorarem, assim como ter mais firmeza com as mãos. Na cabeça
do Paterson caçula, eu era um zero à esquerda e não sabia como
lançar uma bola. Todavia, acabei me surpreendendo ao ver o lance
fraco de Mason, a Wilson estava diante de mim, quase tocando no
meu tênis.
O pirralho não colocou a precisão necessária ao jogá-la.
Patético.
— Foi quase, amigão — Sorri, zombando-o enquanto
esticava uma das mãos, no entanto não foi o suficiente. Tive que
colocar o caderno ao lado do meu corpo. Ao sentir a textura, a vaga
lembrança de quase um ano sem tocar em algo parecido atrapalhou
meus pensamentos. — Na próxima, tenta colocar mais força —
declarei, encarando Mason.
— Joga a bola de volta, mendigo. — Seus olhos estavam
cerrados na minha direção.
Mendigo? Existia tantos adjetivos para me nomear, riquinho
de merda.
Enquanto me colocava de pé, apertei a Wilson com força, na
ideia de mostrar quem era a porra do mendigo para o pateta.
— Claro, é pra já! — Sorri, mantendo minha atenção nele,
mas por um breve segundo, desviei os olhos dele para a garota ao
seu lado.
Hannah. Bem ali, diante de mim.
A inseparável câmera fotográfica estava presa entre seus
dedos na altura dos seios.
Era uma das primeiras vezes que eu a via, sem estar fazendo
algo que a colocasse em problemas. ela havia ficado na detenção
por dar um soco em um estudante, que tentou passar a mão por
debaixo da sua saia. No entanto, Hannah passou horas ao lado do
assediador.
A memória me fez ter uma ideia absurda.
Minha ideia inicial era acertar a bola de volta no rosto do seu
irmão babaca.
Entretanto, fiz um ato totalmente diferente na medida que
prendia a bola entre os dedos, por um minuto olhei com destreza
para a Pequena Peterson, claro, sem que ela desvendasse o que
estava prestes a acontecer em questão de segundos.
A bola foi lançada com um intuito certeiro.
Aquela distância, que separava Mason de mim, foi o
suficiente para chegar ao meu verdadeiro objetivo: a câmera dela.
E, de repente, aconteceu.
Todos os olhares dos estudantes de St. Emery estavam sobre
mim, e por fim, o dela. A máquina fotográfica estava no chão.
Hannah encarava o objeto caído no gramado, completamente
estática. Demorou três segundos para que seus olhos voltassem
para minha direção. Eu consegui ver a ira expandindo em conjunto
da sua respiração fora do ritmo normal.
Hannah J. Peterson estava furiosa.
— Ah, porra. Pelo visto o mendigo é ruim de mira! — Risadas
provocativas foram palco do ambiente.
Eu não liguei para isso, minha intenção era somente dela e
qual seria sua reação. O lance tinha o intuito apenas de chamar sua
atenção, e o que poderia vir logo em seguida. Eu precisava daquilo;
A sua atenção.
Hannah apanhou a câmera e examinou a gravidade do seu
aparelho preferido. Pela carranca que se formou no seu semblante,
percebi a maior burrada que tinha feito na vida. A câmera quebrou.
— Você é louco? — vociferou, enquanto andava a passos
fundos, na minha direção. Notei que a câmera estava entre os
dedos.
Quando parou na minha frente, senti meu sangue virando
gelo apenas por estar respirando o mesmo ar que ela.
Hannah era mais bonita de perto e tinha um cheiro
imensuravelmente bom – a fragrância exalou entre minhas narinas,
deixando-me embriagado cada vez mais por ela. Havia alguns sinais
pelo seu rosto, algo que nunca tinha percebido. Existia duas lado a
lado na bochecha, outra no lábio inferior, um pontinho escuro que
ficava no meio do pescoço e só. O esverdeado dos seus olhos
parecia mais claro naquele momento, mas isso não impedia de
demonstrar a raiva assombrando aquele olhar.
Então, sem que eu estivesse preparado para um ato seu,
senti sua mão fechada acertando uma das minhas bochechas com
uma força absurda. Um golpe que me fez sacudir a cabeça para
voltar a raciocinar.
— Isso é pela minha câmera quebrada, cacete!
O ambiente foi tomado pela agitação dos alunos, houve uma
gritaria que chamou a atenção dos funcionários.
— Foi mal, eu... — Senti suas mãos tentando me empurrar
para trás, no entanto, foi impossível.
— Foi mal um caramba! — Outro soco foi desferido na região
atingida segundos antes.
Ela não amenizava na medida que a gritaria se elevava a um
nível fora de controle.
— É isso ai, maninha! — Mason vibrou, sorrindo com a ação
violenta da sua irmã.
Ele queria fazer o mesmo, ou talvez pior comigo. Entretanto,
duas mãos puxaram os ombros de Hannah para longe de mim.
— Caramba, Hannah! — A imagem da versão masculina de
Hannah surgiu em meio a confusão.
Aquele era Eric Peterson, irmão gêmeo de Hannah.
Éramos quase do mesmo tamanho, porém, o loiro tinha mais
músculos e um porte mil vezes mais saudável que o meu. Ah, porra.
Aquele momento seria o meu último na Terra, apenas por uma ideia
estúpida.
— Senhor e senhorita Peterson, Senhor James, para a
diretoria! Agora! — A coordenadora exclamou, causando um silêncio
na algazarra que havia se formado.
Detenção.
Desde que comecei a estudar ali, nunca havia ficado de
detenção, como a maioria dos baderneiros costumava ficar após
algum incidente. Às vezes, eram por coisas mínimas, mas no meu
caso, ganhei algumas horas extras na biblioteca por um soco. Que
eu levei.
Fazia exatamente três horas que eu estava naquela sala com
os gêmeos Peterson, e eu sabia que as aulas não tinham terminado,
pelo horário. Ouvíamos apenas o velho e insuportável tic-tac do
relógio de ponteiros.
Ao olhar para o passado, percebi que somente fui existir
quando acabei quebrando a câmera da garota de mechas rosas.
Não estava nos meus planos quebrar a câmera.
Havia feito sem pensar nas consequências que viriam logo
em seguida.
Essa definitivamente não era a maneira que eu queria que
fosse nosso começo. Poderia ser patético, mas havia sonhado com
cada detalhe.
Porque desde o momento em que a vi, percebi que essa
seria minha missão. Tê-la unicamente para mim. Entretanto, as
chances de uma trégua estavam o mais longe possível dos
pensamentos da Pequena Peterson.
Seus olhos estavam outra vez sobre a câmera fotográfica,
quebrada em uma das mesas da biblioteca, e ela provavelmente
estava a ponto de cair em um colapso, sem o sinal de vida do
aparelho. E tudo na minha cabeça girava em torno de reverter a
situação, sabendo que uma entrada formal não seria bem-vinda
após o desastre.
Os olhos me perfuraram e, por um segundo, desejei sumir
instantaneamente, sem pretensão de algum momento voltar para
essa realidade.
— Olha...
— Não quero ouvir nada que venha de você — O brilho
acinzentado das pecinhas do seu aparelho odontológico afundou
minha atenção.
Todavia, eu fiz o que ela ordenou. Porque sempre seria
assim: ela mandaria e, sem pensar duas vezes, eu obedeceria às
suas ordens, por mais loucas e insanas que fossem.
Desviei minha atenção para a mesa, ao nosso lado onde se
encontrava Eric Peterson, encarando-me com fervor nos olhos
azulados.
— Acho bom você continuar calado, cara. — Ríspido como a
irmã em seus momentos de raiva.
Ambos eram parecidos tanto na aparência quanto nas
emoções.
Que porra insana.
Levantei as mãos em rendição e o silêncio voltou a reinar por
pelo menos cinco minutos, até que um ranger da porta soou. Duas
pessoas entraram: a bibliotecária e um garoto tatuado que nunca
tinha visto na vida. Quase como um projeto de badboy ambulante,
percebi unicamente pelo cheiro de cigarro, que exalou nele desde
que entrou, e pelas tatuagens que não havia pudor algum em
escondê-las.
— Você vai escrever “não devo fumar nas dependências
do colégio. Trezentas vezes!”. Estamos entendidos, Sr. Sullivan?
— O garoto revirou os olhos cinzentos ao ouvir as palavras.
— Como quiser, senhora — cuspiu as palavras com
desprezo, enquanto ela entregava a ele papéis e canetas, que era o
suficiente para que Sullivan pudesse terminar seu castigo na
detenção. — Ótimo, estou na época da tortura.
— É, não se preocupe, cara. Daqui alguns segundos ela bate
na sua mão com uma daquelas colheres de pau — Não acreditei
que meu humor tinha se tornado ácido por um instante, as palavras
simplesmente escorreram dos meus lábios.
O moreno tatuado ergueu as sobrancelhas.
— Alguém te perguntou algo, porra? — chiou, fechando a
cara. Após o xingamento, assisti ele tirando a mochila das costas,
jogando-a sobre a mesa.
Os únicos materiais que ele tirou de lá foram o caderno e
uma caneta. Apenas isso.
— Ah, vamos com calma, projeto de badboy — falei,
erguendo as mãos em rendição.
Após o meu comentário, ouvi um riso baixo ecoando pelo
lugar. Era Hannah. O momento foi rápido, mas consegui ver o brilho
metálico do aparelho, com ligas escuras entres os dentes. Quando
notou meu olhar sobre ela, rapidamente fechou a boca.
— O silêncio estava mais confortável — Eric resmungou,
passando as mãos entre os cabelos claros.
— Sem conversas! — A senhora que nos vigiava bateu a
mão na mesa.
— Pelo visto, não vamos sair tão cedo daqui — A loira de
mechas rosas disparou, batendo a cabeça contra a mesa. — E tudo
por culpa dele. — Apontou para mim.
— Bem, o culpado aqui recebeu um soco e ainda assim, está
feliz. — A confissão me deixou surpreso, tanto quanto ela ao erguer
as sobrancelhas na minha direção.
— É um dia feliz? Sério isso?
— Hannah, quanto menos interagir, melhor — seu irmão
aconselhou.
— Sim, hoje definitivamente foi um dia feliz, Jane — ignorei
Eric, focando meus olhos somente no esverdeado ofuscante diante
mim.
— Como sabe meu nome? — Franziu o cenho, endurecendo
a coluna.
— O certo seria: quem não sabe seu nome?
— Que merda é essa? — O seu gêmeo loiro resmungou,
fazendo uma careta.
Apenas isso foi necessário para nossa interação acabar.
Porque, no segundo seguinte, Hannah voltou sua atenção para o
caderno à sua frente e o seu irmão fez o mesmo, enquanto eu, vez
ou outra, admirava os gestos dela.
Me senti corajoso por alguns minutos, somente por trocar
mais do que meia dúzia de palavras com ela. E esse foi
definitivamente o dia mais feliz, em anos da minha vida.
Eu sorri sem que Jane precisasse se esforçar.
Eu fui feliz por um dia.
08
PRESA AO PASSADO
Se eu falhar, vou desmoronar
Talvez tudo isso seja um teste
Porque eu sinto que sou a pior
Oh No! | MARINA
PEDIDOS E MEDOS
De vez em quando penso em todas as vezes que você me
ferrou
Mas me fazia acreditar que era sempre algo que eu tinha feito
Mas eu não quero viver desse jeito
Analisando cada palavra que você diz
Somebody That I Used To Know | (feat. Kimbra) Gotye
Chuva.
Era tudo que existia no céu de Boston.
Não era época de chuvas, mas o clima tinha mudado em
questão de segundos, depois que entrei no apartamento com Ethan.
O clima tinha se tornado completamente outro após o que
aconteceu naquele estacionamento.
Ninguém estava em casa ainda, além de nós dois.
Fazia anos que não me sentia assim;
Desolada.
Tinha quase uma hora que eu estava daquela maneira.
Quieta, sem querer trocar uma única palavra com o homem que
achei que nunca me machucaria.
A última vez que fiquei tanto tempo em silêncio, eu tinha treze
anos. Passei horas sem abrir a boca, tentando entender porque
tinha que ir embora da casa em que cresci com meus irmãos e
porque estava deixando meu pai.
Meus pais brigavam tanto.
Mas nunca vi papai levantar a mão para minha mãe, isso era
tão irônico porque presenciei uma vez Lilian dar um tapa na cara de
Oliver. Eles não me viram passar pelo escritório, foi algo que
somente meus olhos viram, nem Eric ou Mason sabiam daquilo.
Eu só queria descobrir o motivo das brigas de todas as
noites. Até descobrir que minha mãe estava se encontrando com
outro homem.
Não tive informações de quem seria, ou se mamãe estava
traindo meu pai porque havia uma grande diferença nas palavras de
Oliver.
“Por que você está se encontrando com esse homem
novamente, Lilian?”
E instantes depois, começaram a discutir e acabou virando
algo pior, foi naquele segundo que vi minha mãe levantar a mão
contra meu pai, por ter insinuado que ela estava o traindo.
Eu entrei em um estado de choque.
Lilian poderia ser tudo, menos uma traidora.
E na noite em que fomos embora, passei as seguintes 72h
sem dizer absolutamente nada. Só existia silêncio. Nada mais fazia
sentido. Optei por ficar entre as sombras, porque lá, eu me senti
segura com o eco. Era melhor.
— Hannah, fale comigo — Ethan sussurrou novamente me
tirando do meu conforto.
Levantei meus olhos lacrimejados para ele. Talvez não
houvesse mais vida no meu olhar.
— O que quer que eu fale? Nada é o suficiente. — Solucei
mais uma vez.
Era tudo que eu conseguia fazer enquanto abraçava meus
pés contra o meu peito, e meus joelhos serviam de apoio para
descansar meu queixo.
— Eu perdi o controle, me desculpa.
— Não sei se consigo.
Era verdade, não tinha sido a primeira agressão, mas eu
sempre acabava perdoando-o. Ethan de alguma maneira conseguiu
mudar meus pensamentos.
Silenciosamente, assisti seus passos lentos na minha
direção. Meu namorado sentou-se sobre o colchão macio, bem
próximo de mim. Uma das mãos envolveu minhas bochechas e logo
senti meu corpo se contrair pelo frio tocando meu rosto.
— Linda, eu não queria ter feito isso. Caramba, me diz se
você está me vendo naquela mesma situação? Eu fiquei puto
quando vi vocês dois juntos.
— Eu te falei que não aconteceu e que não ia acontecer
nada, Ethan!
— Olhe para mim, por favor. Eu estava feliz antes de tudo
aquilo, tinha preparado uma surpresa para você, mas não consegui
tomar as rédeas dos meus atos, quando vi aquele merdinha
praticamente te beijando. Queria te levar para um lugar maneiro e
feito o pedido da melhor forma possível.
Uni minhas sobrancelhas.
Um alerta vermelho piscou na minha cabeça imediatamente.
— Pedido? — indaguei com cautela.
— Sim. — Ethan deslizou uma das suas mãos para o bolso
da sua calça feita sob medida.
Uma caixa vermelha aveludada entrou no meu campo de
visão. Ali estava a sua surpresa. E quando o pequeno objeto foi
aberto, vi o brilho do pequeno diamante ofuscar completamente
tudo. Aquilo valeria milhões de dólares, cacete.
— Achei que estávamos no momento certo para fazer isso.
São quase cinco anos juntos, linda.
— Ethan... — balancei a cabeça, mas no mesmo segundo,
ele levantou a mão, me fazendo encolher os ombros.
— Hannah, eu não vou te bater. Eu juro, quero que as coisas
melhorem entre nós dois. Quero ser uma pessoa melhor para você.
Passei semanas para conseguir encontrar um anel que fosse
perfeito e hoje pensei que seria o dia ideal para o pedido.
— Ethan, depois de hoje... eu não sei se quero continuar com
isso.
— Eu prometo que vai ser diferente. Vamos ser felizes de
verdade. Eu quero que você se torne a verdadeira Senhora Hinxton,
quero que depois da faculdade você venha morar comigo. Melhor,
se case comigo. Quero que você carregue todos os nossos bebês.
É uma promessa que eu faço agora para você, Hannah.
Meus pensamentos corriam para todos os lados. Eu não
sabia como reagir.
— Vai mesmo ser tudo diferente?
— Com toda certeza, Han. — Ethan me encarava
atentamente, segurando a caixinha entre os dedos.
— Não sei, Ethan. Realmente não sei. — O ocorrido de
minutos atrás, no estacionamento da universidade, ainda estava
fresco na minha memória e na dor que ainda lateja no meu
abdômen.
Minha cabeça estava barulhenta demais. Não obtive
descanso desde que entrei no quarto.
Ethan é a melhor escolha que você terá.
Ethan me deu um soco.
Ethan me ama.
Ethan mudou meu jeito de pensar.
Ethan quer casar comigo.
Um compilado de emoções brigavam entre si dentro do meu
peito, em busca da melhor solução para o embate que acontecia na
minha mente. Ouvir a razão ou a emoção doente?
Nenhuma das duas parecia ser coerente.
— Como posso ter certeza que isso não vai acontecer de
novo? — murmurei, sentindo a garganta apertava. Ethan se
aproximou mais ainda, pegando em uma das minhas mãos. Parecia
carregar ternura no olhar, no instante que acariciava com o polegar
o torço da minha mão.
— Você tem minha palavra. Serei o que quiser a partir de
hoje, linda. Eu a amo tanto, não quero te perder. — Seu rosto se
aproximava cada vez mais, até estar colado no meu. Os lábios
praticamente juntos e nossas testas encostadas uma na outra. Um
beijo suave foi depositado na minha boca. — Por favor, Hannah. Só
mais essa chance. — Me beijou novamente, seus lábios foram
tocando minha bochecha, pescoço e ombros.
A cada toque ele me pedia perdão. Que seria um novo Ethan.
— Pare, Ethan — declarei, afastando seu corpo do meu.
— Me responde, você ainda quer casar comigo? Eu prometo
que tudo vai ser diferente. — repetiu, mostrando a joia novamente, e
se minha mãe tivesse do meu lado já teria empurrado a aliança
entre meu dedo sem pensar duas vezes.
Mas não estava me importando com o valor ou o quão era
valioso aquele anel. Eu poderia me dar um igual de qualquer
maneira.
A única coisa que queria era a verdade de Ethan.
— Então? — indagou novamente. Aceite logo, sua tonta,
mamãe sussurrou no meu ouvido. — Você está me deixando louco,
Han.
Fechei meus olhos por dois segundos, e quando abri,
balancei a cabeça confirmando.
Eu aceitei o pedido de casamento.
Acabei determinando minha própria sentença aceitando
aquele pedido.
Ele sorriu, tirando o anel da caixinha de veludo e colocou no
meu dedo. Eu me senti como se estivesse entrando em uma gaiola
de ouro, porque era apenas isso que a joia significava para mim
naquele momento. E mais nada.
Noiva.
Eu realmente estava noiva.
A realidade me acertou, ela tinha um brilho doloroso e um
pequeno diamante que chamaria atenção por onde eu passasse.
Qualquer pessoa faria tudo para ter algo tão valioso, mas
tudo que eu podia ver, era uma pequena jaula em volta do meu
dedo anelar. Não era confortável, me apertava, em hipótese alguma
tinha sido feito para mim.
Porque eu não me encaixava completamente no mundo de
Ethan.
— Eu te amo tanto! — soprou, beijando meus lábios
novamente.
Somente segui seus movimentos, enquanto sua língua
envolvia a minha com suavidade e uma das suas mãos descia até
minha cintura. Pela primeira vez em anos, eu senti repulsa em beijar
meu próprio namorado. Pior que isso, eu estava me sentindo suja
na medida que o beijo crescia.
Ethan estava sob mim, apoiando os cotovelos no colchão. A
boca trabalhava com agilidade dentro da minha, entretanto, sentia
suas mãos tirando minhas roupas. Virei para o lado, sabendo
claramente onde iríamos acabar com aquele beijo, sem uma única
fagulha de tesão dentro de mim. Meu olhar estava distante ao
mesmo tempo que abria a gaveta da mesinha de cabeceira do lado
da cama.
Quando peguei o que queria, empurrei o preservativo para
Ethan.
— Aqui — declarei.
— Camisinha? Mas...
— Não rola sem e você sabe, Ethan.
Ele bufou, pegando-a.
Naquele momento sentia minha alma deixando meu corpo,
enquanto deixava meu noivo entrar dentro de mim. Foi diferente,
Ethan parecia saborear cada segundo. Todavia, eu queria que ele
fosse mais rápido e terminasse logo.
Apenas isso.
Ethan continuava dizendo que seria o melhor marido que eu
poderia ter, enquanto estocava repetidas vezes. Obrigando-me a
assistir cada uma das suas confissões olhando nos seus olhos,
fazendo a dor crescer ainda mais.
Meu coração doía.
Meu peito parecia em estilhaços.
Minha alma já tinha me deixado.
Eu definitivamente me arruinei.
Pobre, Hannah. Você ainda acredita em recomeços, mesmo
quando seu mundo é um castelo de mentiras.
10
ABOMINÁVEIS
Eu tenho essa coisa de ficar mais velha, mas nunca mais
sábia
As meias-noites se tornam as minhas tardes
Quando minha depressão resolve trabalhar no turno da noite
Todas as pessoas que eu ignorei ficam paradas no meio do
cômodo
Anti-Hero | Taylor Swift
PASSADO
Não era a primeira vez que eu ficava na detenção.
No último ano, isso acontecia com mais frequência do que eu
poderia evitar. E, o melhor disso tudo, era que minha mãe vinha com
mais frequência no colégio, aos poucos, estava conseguindo o que
queria : a atenção de Lilian Peterson.
Ser uma Peterson sempre me deu passe livre para muitas
coisas na minha vida, menos para uma.
Porque quando se é uma criança, você acaba não
entendendo como funciona isso. O desenrolar era perigoso, não
tínhamos todo o controle do poder que recai em nossas mãos.
Apenas acontece e com ele, danos abomináveis.
Eu tinha seis anos quando senti o gosto de perto.
Poderia ser bom a longo prazo, mas com isso, ganhei
inimigas. Claro, não era normal crianças do jardim da infância
tramarem um corretivo para outra, mas isso acontecia, e pior, por
debaixo dos panos, e ninguém imaginava o quão traiçoeiras elas
poderiam se tornar para pregar uma peça.
Foi então que minha classe inteira começou a me ignorar
durante um ano.
Elas fingiam que eu não existia e nos trabalhos em grupo,
nunca era chamada. Hannah Peterson se tornou um nada, e isso
gerou consequências para o meu desenvolvimento, no decorrer da
minha vida, porque já era algo que acontecia antes mesmo de ir à
escola.
Mamãe me ignorava.
Era difícil conseguir sua atenção por mais de dois segundos.
Passava muito tempo em casa com as babás, que contratava
enquanto ela estava no trabalho. Nos dias que tinha folga ou férias,
Lilian não queria contato com seus filhos. Houve uma época que ela
ficou afastada do hospital e, com isso, pensei que teríamos algum
momento de mãe e filha, depois que meu pai voltou a ficar
sobrecarregado com as campanhas eleitorais.
Contudo, isso não aconteceu, pelo contrário, acabei ganhando aulas
de balé. E eu odiava balé.
Não por conta da modalidade, mas porque não me encaixava
entre as meninas, com postura que treinavam desde que eram mais
novas. A Hannah de seis anos era apenas uma garota
desengonçada, medrosa e que só queria ficar longe de todas as
outras crianças da sua idade.
Ainda carregava o medo insuportável de receber outro
castigo do silêncio pelas garotas do balé. E conforme ia crescendo,
ficava mais claro que eu precisava escolher outros meios de ter a
atenção da minha mãe.
Notei que não valia a pena ser a princesinha perfeita, a
menina de ouro dos Peterson, porque Lilian não dava a mínima.
Todavia, tudo mudava de figura quando eu ia mal na escola e
continuava sendo uma péssima bailarina.
Os meus acertos não eram o suficiente para minha própria
mãe.
Vi no meus defeitos ultrajantes que eu só teria sua atenção
daquela maneira.
Ninguém deseja implorar o amor de uma mãe ou a presença
do pai.
Queremos apenas acordar um dia e receber tudo que
deveríamos ter por direito, sem pedir, apenas tê-lo com facilidade.
Era humilhante precisar de atenção e achar que é um peso por isso.
O incômodo afligia a vida de milhões de crianças e eu sabia
que o que passava poderia estar acontecendo na casa ao lado,
como também podia existir crianças sendo amadas há duas quadras
do meu bairro.
Simples assim.
Fazia dois dias desde a detenção, e quando minha mãe
recebeu a ligação da direção, Lilian passou uma hora inteira
brigando comigo, dizendo o quão inútil continuava sendo por não
dar valor a escola cara que ela pagava.
Por causa daquela tralha que provavelmente não irá durar até
o próximo ano?
Mamãe não sabia o quanto aquela câmera era importante
para mim, eu carregava uma vida registrada. Era minha maior
paixão. Meu pai havia me dado quando era mais nova, e foi o
primeiro presente que mais gostei de receber. No entanto, só existia
os seus estilhaços.
Tudo por culpa dele: Alexander James.
O garoto que eu não sabia da existência até dois dias atrás.
Descobri que estudávamos na mesma sala, mas nunca tinha
percebido ele. Sabia que era repetente, e que deveria ter se
formado no ano passado. Era bolsista, e pelas notas
impressionantes não perdeu sua bolsa, mas um fato curioso
impregnou minha mente.
Alexander tinha notas melhores que Eric, o meu irmão,
entretanto, de alguma maneira reprovou no último ano do colegial.
E eu iria descobrir o porquê. Não sabia como daria o primeiro
passo, mas iria.
Suspirei, apertando meus passos para os fundos do colégio.
Talvez, se eu tivesse sorte conseguiria pular o muro sem que as
câmera pudessem me ver. Era apenas questão de ângulo e esperar.
Contudo, meu plano parecia ter ido escada abaixo quando ouvi o
barulho de spray.
Ah, merda.
Alguém estava ali.
Apertei os olhos, antes de olhar para os dois lados.
Não havia nenhum inspetor.
Silenciosamente, me aproximei da parede que me separava
da pessoa que estivesse ali do outro lado. E com cuidado, tentei
descobrir quem poderia ser. Ergui as sobrancelhas quando
tatuagens grosseiras entraram no meu campo de visão e logo o
reconheci.
Nathaniel Sullivan, o novato que tinha ficado na detenção
comigo, por fumar nas dependências do colégio.
— Nossa, não imaginei que você fosse tão vingativo, projeto
de badboy — declarei, chamando sua atenção.
Cacete, eu usei o mesmo apelido que aquele babaca usou.
A lata em uma das suas mãos paralisou no ar quando ele
ouviu minha voz, entretanto, no segundo que me identificou voltou a
pichar a parede.
— Vai embora, Hello Kit. Não tem nenhum mendigo para
bater hoje?
— Isso foi pesado.
— Jura, gênio? — zombou com a voz rouca.
— Demais. — Afirmei, balançando a cabeça.
— Foi uma pergunta retórica, Hello Kit.
— Ah, dane-se. Não vai ser eu que vai para a detenção
novamente por pichar. — Li outra vez o que ele tinha escrito: Vai se
foder, Sra. Olivia.
Genérico, eu diria.
A senhora Olivia o tinha mandando escrever trezentas vezes
sobre não fumar, durante a detenção.
— Você sabe que vai acabar tendo que esfregar tudo isso,
não é? — comentei, me esquivando das câmeras de movimento.
— Eu não te mandei ir embora, filha da Barbie?
— Tudo bem, estou indo. Só se liga nessas câmeras ali, te
gravando. Em alguns minutos, algum inspetor vem te buscar.
Tchauzinho, otário! — Fiz o gesto saindo devagar para não ser
pega, se alguém já tivesse visto ele, acabaria chegando a qualquer
momento, e isso significava que meu plano de matar aula não podia
mais acontecer.
Que droga, Sullivan.
Enquanto dava meia volta, ouvi a lata sendo arremessada
para algum lugar que eu não consegui identificar. Demorou dez
segundos para Nathaniel se encontrar do meu lado com as mãos na
calça social do seu uniforme. Ele não usava o blazer, apenas a
camisa branca de botões onde as mangas estavam arregaçadas até
os cotovelos e por fim, sem a gravata.
Todos podiam ver suas tatuagens.
Enquanto meu olhar passeava por elas, percebi que
nenhuma tinha um significado ou propósito. Quando eu fizesse a
minha primeira, definitivamente significaria algo.
— Assim vão pensar que eu estava com você — xinguei,
empurrando seus ombros, sendo completamente ignorada pelo
comentário.
O garoto permaneceu do meu lado.
— Como sabia que tinha câmeras ali?
— Você deveria lembrar que estou a mais tempo aqui do que
você, cara. A propósito, são três câmeras com sensores de
movimento, mas há um ponto cego — contei, caminhando.
— E o que você ia fazer lá trás, Hello Kit? — indagou, o
moreno repleto de tatuagens.
— Não é da sua conta. — Sorri, olhando finalmente para ele.
Os olhos cinzas pareciam mais escuros naquele momento e
os cabelos tinham uma tonalidade incomum dos moradores de
Boston. Aquele cara com toda certeza não era da cidade. E mesmo
que eu carregasse parte do sangue texano do meu pai, sabia
identificar quem era forasteiro ou não.
O garoto diante dos meus olhos tinha um sotaque novo.
— Você é de Londres, garoto problema?
Ele uniu as sobrancelhas.
— Como você sabe?
— Seu sotaque é meio óbvio — contei, como se todo mundo
soubesse a diferença. — Você tem muito a aprender ainda! —
divaguei, ouvindo o som que anunciava o intervalo.
Não demorou muito para que os alunos saíssem
imediatamente das suas salas, enchendo todos os cantos do
colégio. Com isso, deixei Nathaniel para trás.
A poucos centímetros dei de cara com Stacy, a namorada do
meu irmão. Ela era o tipo de garota que todos adorariam ter como
sua ao lado. Os cabelos eram claros, um olhar hipnotizante,
inteligente e uma possível médica no futuro.
Tinha tudo para ser a rainha do baile naquele ano, algo que
todas as meninas almejavam. Eu só queria um par para
compartilhar o momento. Realmente ansiava por aquilo. Dançar com
alguém a noite inteira, sorrir com ele sem ter vergonha do aparelho
e registrar o acontecimento enquanto explodia de felicidade.
— Ei, onde você estava? — ela indagou, franzindo o cenho.
— Por aí... — murmurei, passando as mãos entre os fios
loiros com as chamativas mechas rosas.
— Eric perguntou por você — Stacy comentou, mastigando
algo. Não tinha percebido que ela estava mascando um chiclete.
— Hm, estava pensando em matar aula, no entanto, não deu
certo.
Talvez eu pudesse confiar na minha cunhada para contar
meus segredos. Ela já era quase parte da família após oficializar o
namoro com meu irmão.
— Por que? Foi pega?
— Não. Havia testemunhas.
— É, pelo visto você terá que ter uma desculpa muito boa
para a próxima aula.
— Acho que você ainda não aprendeu os benefícios que se
ganha por ser rica, Stacy. Ninguém vai dar a mínima por não ter
aparecido nas primeiras aulas.
— Mas vão falar...
— Como assim? — Procurei seus olhos.
— Você e o novato. — Inclinou o queixo para algo atrás de
mim, eu não precisava virar para saber que ela se tratava de
Sullivan. — Vão pensar que vocês estavam juntos.
E com isso, eu não consegui esconder a careta no meu rosto.
Argh!
— Pela mãe, isso não.
— Pois é, você tem dez minutos para pensar em algo.
Como esperado.
Ninguém havia sentido minha falta na aula, apenas Eric fez
algumas perguntas e no fim, me deu uma bronca por quase matar
aula. Meu irmão era o mais consciente dentre os três filhos de Lilian
e Oliver Peterson, já que eu estava na minha fase rebelde e Mason
não ligava para nada, a não ser ele mesmo.
Uma família e tanto.
— Certo, turma. Formem seus grupos da aula passada! —
Gilda, a professora de Artes declarou, fazendo-me erguer as
sobrancelhas.
A aula dela tinha acontecido no dia em que fiquei de
detenção, já que quando fui mandada para a diretoria, perdi a aula.
Ótimo.
— Senhorita e senhor Peterson, senhor James e senhor
Sullivan, como vocês não estavam presentes na aula passada, irão
fazer o trabalho juntos — Voltou a falar, enquanto folheava alguns
papéis sobre sua mesa.
Ah, droga. Obrigada, universo.
Olhei para Eric, vendo-o jogar a cabeça para trás. Isso foi o
sinal de que ele estava odiando a notícia tanto quanto eu. Já
bastava as horas que tínhamos que suportar um ao outro na
detenção, e naquele instante faríamos pelas próximas semanas.
— Isso tinha como piorar? — sussurrei, enquanto inclinava
meu rosto para o lado procurando Sullivan e James.
O Destruidor de Câmeras Alheias foi o primeiro que eu
encontrei. Ele estava no fundo da sala, sentado no canto da parede.
Um pensamento surgiu na minha mente, enquanto o encarava,
talvez fosse por isso que nunca notei na sala. Mesmo com todos os
meus problemas com a escola, sempre sentava nas primeiras
cadeiras da frente.
Já A Chaminé Ambulante se encontrava na penúltima
cadeira, também no fundo daquela classe.
— Vamos logo — resmunguei para os três.
Eu seria a única garota no meio deles. Isso chamou a
atenção dos outros alunos, enquanto Sullivan e James se
levantavam. Entretanto, minha atenção ficou somente nele.
Alexander James.
Havia algumas olheiras surgindo debaixo dos seus olhos, o
olhar exausto parecia implorar por socorro. Franzi o cenho.
O que aquele garoto estava fazendo?
Continuei observando-o e a cada passo que ele dava na
minha direção, dúvidas sobre ele sussurravam nos meus ouvidos.
Quem era ele?
Por que nunca o notei?
E por que tinha um corte, na verdade uma linha reta aberta,
em uma das suas bochechas?
A ferida naquele lugar me fez passar a aula inteira olhando
para ela. Praticamente em todas as oportunidades que eu tive, mas
nunca perguntei a ele. Foi uma curiosidade que nunca desvendei.
— Se você continuar me olhando assim, eu vou achar que
tem algo errado em mim, princesinha — sussurrou baixinho,
deixando-me desprevenida.
Eu realmente não esperava por aquilo.
— Princesinha? — Não me contive em silêncio, trazendo meu
olhar sobre ele mais uma vez.
— Não é isso que você é? A Princesa de Boston? — O
garoto parecia zombar de mim.
Foi aí que Alexander James passou a ser uma incógnita para
mim. Todavia, isso acabaria.
Eu teria respostas sobre ele.
— Se você puder não dirigir a palavra a mim, eu agradeceria
muito — jorrei a raiva que incomodava o centro da minha língua. Um
veneno hostil.
— É impossível — disse em contrapartida.
— Não, não é. Já que, passou meses à espreita, sem que
ninguém o notasse. Pode voltar para a escuridão.
— Ainda estou na escuridão — deixou escapar. — Mas de
alguma maneira, você me puxa de lá toda vez que troca alguma
palavra comigo. — Meu estômago deu um giro estranho, algo
desconhecido.
Eu parecia uma garotinha que nunca havia falado com
nenhum cara, mas estava longe de ser assim. Os dois anos fora da
cidade me fizeram fazer coisas que nunca imaginei aos treze, a
idade que fiquei com minha mãe no seu divórcio de fachada. E nada
mudou no momento em que pisei na capital de Massachusetts
novamente.
Garotas não deveriam ter que ser pressionadas a ter sua
primeira vez aos quinze anos.
— Gosto de quando você fala.
— E eu adoro quando você fica calado — chiei.
— Se não se importam, eu gostaria de fazer parte da
conversa — Eric zombou, bufando.
Droga, não sabia por quanto tempo estávamos assim.
— Não estávamos conversando nada.
— Claro, apenas flertando. — Sullivan disse, passando as
mãos entre os cabelos.
Encarei seus olhos com desdém, jogando minhas costas
contra a cadeira. Meus braços estavam cruzando quando os lábios
de Eric sussurram nos meus ouvidos.
— O que está havendo?
— Está tudo bem.
Normalmente não agia assim, não era a verdadeira Hannah
por trás da máscara de garota rebelde. Suspirei, dando uma última
olhada no garoto de cabelos castanhos escuros, seus olhos eram da
mesma tonalidade, no entanto, mais chamativos. Notei seu uniforme
surrado como se essa fosse sua única vestimenta. A gravata
vermelha estava frouxa demais no seu pescoço, percebi que ele não
dava a mínima para as normas da escola.
St. Emery College era rígida demais. Um verdadeiro colégio de elite,
onde agrupava os herdeiros de Boston. Todos com títulos
impressionantes, e qualquer pessoa daria sua vida para estudar
naquele lugar.
Contudo, os efeitos davam oportunidades para pessoas
carentes terem oportunidade de pisar no chão valioso da instituição
a partir de bolsas integrais.
— Aqui está o tema do trabalho de vocês. — Uma folha foi
despejada sobre nossa mesa, e quando meus olhos visualizaram o
título podia jurar que algo brilhou no meu olhar.
Artes Cênicas.
— Cada grupo ganhou um tema para apresentar, e vocês
terão oito semanas para trabalharem em conjunto. Escolham algo
que melhor representa o projeto em questão. Pode ser através de
uma peça de teatro, circo... o que preferirem — a professora
declarou e com isso eu soube que minha nota em artes estava
garantida.
— Peça de teatro e circo? — Nathaniel repetiu, folheando as
folhas. — Estou fora.
— Sinto muito em dizer, mas você quem escolheu Artes na
sua grade, sr. Sullivan. Então, se quer se formar terá que fazer parte
disso. Cada componente será avaliado individualmente, por isso,
caprichem! — E com isso, ela voltou à sua mesa, sentando-se.
Uau, um a zero para a senhora Gilda.
— Hoje não é seu dia, projeto de badboy — Alexander
debochou.
— Fica na sua.
— Calma, zangão. Se quiser, podemos apresentar Romeu e
Julieta. — Um sorriso surgiu nos lábios de James, enquanto ele
zombava do garoto problema. — Adoraria ser seu Romeu, como
remissão das brincadeiras.
Apertei o sorriso que queria aparecer no canto da minha
boca, sentindo o aparelho nos meus dentes roçando na carne
inferior. Sorrir com ele me deixava desconfortável, na maioria das
vezes, no começo eu achava normal, mas após alguns comentários
que Mason deixava, com o passar do tempo acabei deixando de me
sentir livre com o material.
E todas as vezes que eu sorria, acabava cobrindo a boca
com as mãos sem perceber.
Seria uma tarefa impossível me conter, enquanto
estivéssemos juntos nesse trabalho. Alexander parecia ter sempre
algum comentário sarcástico para dizer. E não fazia nem dois
minutos que a sua última jogada continuava nos meus
pensamentos. Até que, como uma lâmpada bem na minha cabeça,
vi o tema do nosso projeto.
Romeu e Julieta era perfeito.
— Sabe que a ideia não é tão ruim? — disparei, organizando
meus pensamentos.
— O quê? Os dois irão fazer um par romântico?
— Não, Eric. A peça. — Percebi que os três pareciam
confusos, na verdade, Nathaniel estava mais para entediado. —
Vamos trabalhar sobre Romeu e Julieta! Você sabe tudo sobre
Shakespeare. Eu tenho uma... — Quando lembrei da ausência da
minha câmera, meus ombros murcharam. Ainda era ridículo o
quanto eu estava mexida por não ter aquela máquina.
— O que você tem? — Sullivan indagou.
— Quer dizer, eu tinha uma câmera. Podemos usar os
celulares, de qualquer forma — falei por fim.
A menção sobre o aparelho deixou Alexander tenso, um tanto
desconfortável nos minutos seguintes. Foi tudo que eu pude notar
enquanto fazíamos pesquisas a fundo sobre Artes Cênicas e
Literatura. Outrora, haviam diversas trocas de olhares enquanto eu
fazia as anotações. Às vezes, pensava que isso era coisa da minha
cabeça, até ver que realmente estava acontecendo.
Ele não tirava os olhos de mim.
Seu olhar se intensificava ainda mais quando eu cobria a
boca, tentando não mostrar o aparelho odontológico. Temia que em
algum momento ele pudesse fazer igual o meu irmão caçula, e
tornasse esse trabalho um fiasco.
Tentei esvaziar minha mente, desviando meu olhar dele e
sem pretensão, vi Nathaniel escrevendo algo. Não era referente ao
nosso trabalho. Parecia uma carta. E ela se direcionava para uma
garota, sem sombra de dúvidas. Eu não pude ver seu nome, mas vi
outra coisa.
Abelhinha.
Nathaniel Sullivan passou até o final da aula escrevendo para
ela.
E, na medida que seus dedos colocavam sua caligrafia no
papel, ele se perdia entre seus pedidos de desculpas. Havia uma
garota na vida dele? Nathaniel não demonstrava saber como tratar
uma garota, ele era ignorante, hostil e acima de tudo, condizia ser
um cara que não queria alguém consigo.
Sullivan realmente era um projeto de badboy.
11
PLANOS
E se o mundo não acabar
Eu irei sacudi-lo
Porque, afinal, sou um jovem homem, ooh
E quando as estações mudarem
Você ficará ao meu lado?
Porque sou um jovem homem fadado a falhar, ooh
Mind Over Matter | Young The Giant
INCONSOLÁVEIS
Quando você é jovem, eles deduzem que você não sabe
nada
Sorriso brilhante, batom preto
Políticas sensuais
Quando você é jovem, eles deduzem que você não sabe
nada
Cardigan | Taylor Swift
PASSADO
Março havia chegado com duas notícias.
O baile de formatura e a temporada de inscrições para o time
de futebol americano, que havia aberto na semana passada.
Nos corredores de St. Emery não se falava de outra coisa.
As garotas já estavam à procura do seu par para o baile, os
caras loucos para a seleção, entretanto, seria uma chance para
conseguir bolsas de estudo por ser atleta em algum esporte do
colegial.
Era um dos privilégios que aqueles garotos tinham. E um belo
jeito de conseguir uma chance de se tornar jogador profissional.
Bem, se realmente levassem o esporte a sério, como se valesse
suas vidas.
— Não vai se inscrever para o time? — Perguntei para Eric,
enquanto caminhávamos em direção ao seu carro, que valia uma
fortuna.
Papai havia dado a ele de presente, no nosso aniversário de
dezessete anos. Já que meu irmão não queria uma festa de
aniversário. Todavia, acabou ficando somente para mim toda a
chuva de atenção.
Seria incrível se no final da noite, minha mãe não tivesse me
tratado como um produto para as suas amigas socialites com seus
filhos babacas. Eu era a aniversariante que não conseguia nem a
metade dos convidados que estavam presentes daquela festa.
— Não — o tom tenso me fez voltar para o estacionamento.
— E por que não? — franzi o cenho.
— Estamos quase nos formando, então, não vale a pena me
inscrever — comentou, abrindo a porta do veículo.
— Ah, isso é o de menos, Eric. Você sabe que consegue uma
bolsa, apenas por participar do time — Os ombros dele relaxaram,
parecia tenso com as inscrições. — Pode te ajudar também...
— Não.
— Mas, Eric…
— Não quero que saibam disso. — Seu tom era quase
inaudível, como se fosse um segredo que ninguém ao nosso redor
pudesse descobrir. — Vai ser pior.
— Você está falando como se fosse um problema para a
sociedade, e isso não é verdade. — Cruzei os braços, encarando-o.
Meu olhar parecia julgador demais para quem só queria abrir os
olhos do garoto diante de mim.
— Você é impossível — disparou, um pouco mais tranquilo.
Percebi seus ombros mais descontraídos nos segundos em que
permanecemos estáticos um para o outro.
Isso arrancou um sorriso maroto dos meus lábios.
O diagnóstico do TEI foi um baque para o meu irmão anos
atrás e ainda continuava sendo tortuoso, saber que ele carregaria
para sempre consigo. Tudo por conta de uma lacuna que surgiu no
meio da nossa família, quando éramos novos demais para
entendermos que ficaríamos separados de uma hora para outra. Foi
um compilado de momentos que acabou nos destruindo.
Todos fomos afetados de alguma maneira sem perceber.
Eric, Mason e eu.
Somente anos depois de todo caos ter sido manifestado no
meio dos Peterson, que consegui ver as consequências.
Meu irmão mais velho – por alguns minutos, apenas – sofria
com fúria explosiva, mas não era sempre. Naquela época, ele
conseguia ser, na maior parte do tempo, o melhor cara do mundo,
entretanto, houve tempos que nada o fazia ficar sem seus picos de
crises, alguns deles ocasionados por nosso irmão caçula.
Mason tinha o poder de acabar com a tranquilidade de Eric
em um estalar de dedos.
Comigo já era mais difícil, não parecia ser um bicho de 7
cabeças. Conseguia lidar com a personalidade irritante de Mason.
Entretanto, havia dias que nem eu tinha um escudo para bloquear
os ataques gratuitos vindo da sua parte. Nunca entendi como tudo
começou. Era como se sempre estivesse ali.
— Então, o que vai fazer? — Indaguei, voltando à tona.
— Darei uma chance a essa droga. — Bufou.
— Serei sua torcedora número um, maninho!— garanti,
encarando-o com um grande sorriso nos lábios. Meus braços
rapidamente envolveram seu pescoço na medida que tentava
alcançá-lo.
Eric era alto pra caramba.
— Quanta animação! O que estou perdendo? — A voz
aveludada era de Stacy, minha cunhada bem diante de nós dois.
— Eric vai se inscrever para o time de futebol americano! —
exclamei no meio do corredor, naquele momento alguns alunos
passavam por nós, fazendo com que minha animação fosse o
centro das atenções por poucos segundos. — Me desculpa —
sussurrei para meu irmão.
— Sério? — Stacy parecia surpresa com a notícia.
— Nada demais, amor — Eric declarou dando de ombros.
Os olhos azuis, exatamente iguais ao de nossa mãe, estavam
convencidos de que não passaria de uma inscrição. Eu conhecia
aquele loiro como a palma da minha mão e sabia que no segundo
que estivesse no campo, não conseguiria sair mais dele.
— Nada demais... — O imitei fazendo uma voz semelhante,
mas um pouco mais grossa que a sua. — Você sabe que não será
isso nos próximos dias! — contestei para meu gêmeo ranzinza,
enquanto eu o soltava.
— Está mesmo segura de si, Hannah. — Stacy deixou uma
risada extravasa no ar.
— Sempre estou certa do que falo! — Coloquei minhas mãos
na cintura assistindo os dois pombinhos se abraçarem na minha
frente.
Minutos se passaram e quando vi, já estávamos indo para
nossa próxima aula.
A aula de Artes.
Eu sabia o que me esperava nela no momento em que eu
colocasse meus pés dentro da sala.
Lá estaria Alexander James, o garoto que estava entre todos
os meus pensamentos. Não havia um segundo em que ele não
estivesse impregnado na minha mente. Seja eles desprezíveis ou
não, James tinha uma inconsolável aversão de um lado meu.
Genuíno em algumas partes, entretanto, não o suficiente para
esquecer da câmera que ele detonou semanas atrás. E pior, ter sua
companhia não fazia bem para minha consciência. Eu não era o tipo
de pessoa que guardava rancor por muito tempo, todavia, o estoque
em que aquela maldita bola acertou a única coisa que me fazia feliz
tudo mudou.
Poderia ser algo sem importância para algumas pessoas,
contudo para mim, tinha um valor sentimental. Eram anos em uma
única câmera, e pior, eu a perdi no dia em que fiquei na detenção.
Droga, deveria parar de ser tão careta e ouvir o que minha mãe
tinha dito quando soube... pela boca de Mason.
A tralha, como ela havia mencionado, realmente não duraria até a
faculdade, talvez. Além disso, meu pai não sabia do que havia
acontecido já que eu mal o via, nossos horários não se encontravam
mais. E quando estava em casa passava mais tempo no seu
escritório.
Eu sentia tanto sua falta, mesmo morando debaixo do mesmo teto.
Porque ainda que morássemos juntos, pareciamos tão distantes.
Não havia momentos em família.
Os jantares eram regados de silêncio quanto estava somente
Lilian, meu pai seguia ocupado com seus problemas da cidade, e
minha mãe com o hospital, vivendo apenas para seus plantões dia
após dia.
Sonhava com um dia que eu não precisasse implorar por
companhia e ter finalmente uma família de verdade. Sem mentiras
ou almas dilaceradas. Já não aguentava sobreviver de falsas
esperanças, que minha cabeça me forçava acreditar.
Em algum momento poderia mudar.
Ou não.
ESTRAGANDO TUDO
Se eu não disser isso agora eu certamente enlouquecerei
Como se deixasse a última coisa que quero ter
Perdoe a urgência, mas apresse-se e espere
Meu coração começou a se partir
Look After You | The Fray
INCONTESTÁVEIS
Segredos que tenho mantido em meu coração
São mais difíceis de esconder do que pensei
Talvez eu só queira ser seu
Eu quero ser seu, eu quero ser seu
I Wanna Be Yours | Arctic Monkeys
PASSADO
Uma semana desde o fiasco na casa da família Peterson,
que também contabilizava os dias em que não ia para a St. Emery.
Os últimos dias acabaram se tornando cansativos demais
quando precisei me dedicar unicamente ao trabalho da oficina.
Estava sem nenhum tostão furado nos bolsos e, fora isso, eu
precisava cumprir a promessa que fiz a mim mesmo, semanas
atrás.
Prometi que iria conseguir outra câmera fotográfica para
Hannah.
Era essa uma das minhas motivações para continuar
trabalhando e vivendo, caso contrário, não existiria mais Alex,
depois de uma semana compartilhando o mesmo espaço que o meu
pai.
Não havia paz quando se respirava o mesmo ar que ele.
Eu precisava estar com os olhos e ouvidos bem abertos,
diante de qualquer situação que o envolvesse. Margô estava em
completo perigo, a cada segundo que eu me obrigava a trabalhar
constantemente. Não era algo que eu queria. Porra, ninguém
merecia ficar em alerta a cada choro de uma criança e temer o pior
acontecendo, no lugar que ela deveria está segura.
Entretanto, aquele não era o caso.
Alexander era o diabo em pessoa.
Não havia mais sanidade correndo em seus sentidos, existia
apenas um vício irreversível pelas drogas e suas bebidas
diariamente, e por isso, precisava estar ciente nas minhas decisões.
Porque qualquer passo em falso com ele, mudaria todas as rotas
que vinha percorrendo para dar um basta nisso tudo.
Meus ombros estavam tensos quando coloquei Margô no
berço. Os cabelos cresciam a cada dia, formando alguns cachos
ainda mais ondulados. E mesmo que ela estivesse um pouco abaixo
do peso ideal para a sua idade, a garotinha carregava as bochechas
mais redondas que eu já vi na cidade de Boston.
Sua respiração estava serena.
Foi esperando por isso que a deixei no quarto, implorando
que ela tivesse algumas horas de sono, o suficiente para me deixar
trabalhar na oficina.
Enquanto me aproximava do local, ouvi um barulho indo na
direção que meus pés estavam acostumados a ir. Puta merda, o que
podia ser? Meus passos se tornaram lentos à medida que encurtava
os movimentos, somente para descobrir quem estava ali.
Parei bem no meio da porta e encontrei a figura do homem
que há meses não entrava naquela oficina por nada. Podia ver
somente suas pernas para fora ao mesmo tempo que se mantinha
por debaixo do carro.
Que merda ele estava pensando em fazer?
— Puta que pariu! — Ouvi ele rosnando, parecia irritado com
algo debaixo do carro. Quando estava prestes a dar um passo para
trás e ir embora, percebi as rodinhas do suporte rolando. — Ah, é
você. Me dê uma chave estrela, seu merdinha — ignorei a
percepção do meu estômago se revirando, no momento em que vi o
pequeno pino de droga ao lado do seu corpo. Não tinha visto antes,
se soubesse, não teria ficado tanto tempo vacilando na oficina.
Era um mau sinal.
Deslizei meus olhos sobre Alexander e vi o pó esbranquiçado
sujando todo seu nariz, com isso, eu apenas conseguia sentir nojo
do homem diante de mim. Aquele era o meu genitor, a pessoa que
eu tanto lutava para viver longe.
Talvez eu nunca tenha odiado alguém tanto quanto eu odiava
ele.
Alexander destruía tudo que tocava.
Era o pior homem que existia na Terra.
Às vezes, eu tentava aceitar que foi por isso que Magnólia foi
embora. E se realmente fosse, ela tinha se livrado do mal que
Margô e eu vivemos após sua partida. Ainda restava tudo que um
dia foi seu, guardado em caixas no sótão, poucas lembranças, na
verdade. A maioria Alexander havia jogado na frente da casa, em
um dos seus surtos, enquanto estava cego pela cocaína.
Lembrar dela me fazia ficar perdido, eu queria explicações.
Lutava por isso.
No modo automático, eu segui até a caixa de ferramentas e
peguei a chave de fenda, em seguida, entreguei a ele. Quando
pensei que estava livre, senti algo sendo lançado na minha direção.
Em um instante, a ferramenta estava nas mãos de Alexander
e, no outro, cortando a minha bochecha esquerda.
— Porra, eu falei chave estrela, filho da puta! Nem para isso
você presta? — Tensionei a maxilar enquanto deslizava meus dedos
até o corte, não conseguia ver, somente senti-lo.
Pela proporção da ardência, podia perceber que o corte tinha
sido profundo, enquanto o pouco de sangue começava a pingar no
piso sujo da oficina. Meu genitor não pensou que, ao lançar a chave
em mim, poderia causar algum ferimento. Na verdade, ele estava
pouco se fodendo para o que acontecesse comigo ou Margô.
Éramos apenas os filhos imprestáveis que acumulavam problemas
na sua vida.
E se não fosse pela minha insistência em aprender a
comandar a oficina, Margô e eu teríamos morrido de fome. Porque
para o desgraçado, tudo que importava, era seu próprio nariz.
Assisti ele deixando o ambiente, levando consigo outro pino
que não havia visto quando entrei. Era melhor assim, ansiava pelo
dia em que o vício fosse maior e ele tivesse uma morte lenta e
dolorosa. Porém, parecia que o universo estava contra isso, nada
saía da maneira que eu queria.
Os últimos dias que aconteceram foram um fiasco.
Não somente para mim, mas para Margô também. Em um
momento de deslize não a ouvi chorando, estava conversando com
um cliente, fazendo ser impossível de identificar qualquer choro que
denunciasse o bem-estar da minha menina. E quando finalmente
percebi, corri para ver o que estava acontecendo.
Vi meu pai tentando sufocar Margô com um travesseiro. Os
olhos vermelhos e a voz deixavam nítido que ele estava drogado.
Pior que das últimas vezes.
Nas palavras dele, a menina estava dando-lhe dores de
cabeça e foi seu modo de acabar com dois problemas.
Podia dizer que nunca senti tanto medo na minha vida, como
senti naquela tarde.
Como uma pessoa poderia fazer tanto mal a alguém?
Eu me odiei por não ter notado seu choro antes.
Me odiei por não ter conseguido ir embora com ela.
E me odiei por ter sido um fracasso.
Um erro na vida de todos.
Às vezes, passava pela minha cabeça abandonar a ideia de
voltar para o colégio. Deixar que Hannah conhecesse alguém que
se encaixasse com ela. Todavia, segundos depois surgia um
sentimento possessivo, onde um alerta piscava no meio dos meus
pensamentos.
Jane deveria ser apenas minha.
Mesmo que em cada palavra dela houvesse repulsa e uma
pitada de aversão, eu lutaria até conseguir uma trégua.
Respirei fundo.
Havia todos os tipos de câmeras fotográficas que eu nunca
imaginei ver na vida.
Câmeras profissionais, digitais e analógicas.
Imaginava que se Hannah estivesse aqui, pensaria que eu a
levei para o paraíso. E apenas por esse pensamento, um sorriso
brotou nos meus lábios. Inspirei, procurando o olhar de Judy que
balançava o carrinho de Margô para frente e para trás, repetidas
vezes.
— Qual você acha melhor?
— Ah, cara... por que você não compra o mesmo modelo que
ela já tinha? — Judy deu de ombros.
Fiquei pensativo, sabendo que a câmera quebrada estava
comigo, desde o dia da detenção. Hannah não tinha percebido, mas
acabou deixando o aparelho, e foi ali que vi uma oportunidade de
um possível perdão.
— Tem desse modelo? — perguntei para o atendente e os
seus olhos analisaram a câmera com cuidado.
— Infelizmente, não temos, é um modelo que já não é mais
produzido. Tenho somente peças para consertos. Porém, temos
outra que é um modelo muito parecido com a sua, se quiser ver.
Assenti.
— Por favor — assenti.
Dois minutos depois ele estava de volta com a câmera em
mãos.
— Aqui está. — Analisei com cuidado qual poderia ser a
melhor escolha, porque simplesmente não fazia ideia de como
funcionava o mundo das câmeras.
Por fim, acabei pedindo a ajuda do vendedor, imaginando que
ele entendesse mil vezes mais. Meu lance eram carros, poderia
colocar qualquer veículo na minha frente que eu saberia dizer seu
modelo completo.
— Vou levar esta — declarei e paguei. A câmera antiga de
Hannah havia ficado na loja para conserto, eu também entregaria se
tivesse salvação, mesmo estando com uma das lentes quebradas.
— Foi uma boa escolha — Judy disse, olhando para o
aparelho na caixa. — O atendente gato tem um bom gosto. — Fiz
uma careta ao ouvir seu comentário, enquanto caminhávamos para
fora do estabelecimento.
— Eu não preciso ouvir isso, cara.
— Eu só falei que ele era gato, Alex — resmungou. Naquele
momento quem guiava o carrinho de Margô era eu e, enquanto
seguíamos para a praça da cidade, Judy cortou nosso silêncio.
— Você realmente gosta dessa garota, não é?
— Acha mesmo? — Franzi o cenho pensativo.
— Desde a primeira vez que você a viu, fala nela. Ainda tem
dúvidas? — relembrou quando eu descrevi cada detalhe de Hannah
à Judy.
De como ela tinha sido a primeira garota com mechas rosas,
em um colégio de elite, que me fascinou. Ainda conseguia lembrar
tudo que senti no momento em que meus olhos viram ela.
O sentimento perpetuava descaradamente mesmo depois de
tempos.
— É... talvez, eu goste dela.
— Traduzindo: você está de quatro por ela. — ironizou,
balançando a caixa entre os dedos. — Sabe quantos caras
passariam dias empenhados em conseguir dinheiro para comprar
uma câmera dessa? Pelas minhas contas o número é bem baixo,
praticamente nulo. Ninguém se daria ao trabalho, Alex. A garota
poderia ter quantas câmeras quisesse, simples assim.
— Eu tinha que fazer isso, Judy. Eu joguei aquela bola de
propósito.
— Sim, e porque queria chamar a atenção dela. Aliás, você
deveria se inscrever para o time de futebol americano, antes que
fechem as inscrições
— Isso... Argh! — Não sabia como me defender.
— RÁ!
— Tudo bem... você está certa, Judy. Estou completamente
de quatro pela Hannah. No entanto, a vida começou a imitar a arte
depois que decidimos fazer um trabalho juntos, sobre Romeu e
Julieta, e com isso, quero dizer que a mãe dela não me quer perto
da sua doce filha.
— Uau, que lei da atração foi essa? — Ela riu da minha
desgraça.
— Menos, por favor — resmunguei, revirando os olhos.
— Se é isso que quer, oh, Romeu — imitou uma das falas de
Julieta Capuleto, enquanto gargalhava.
— Você é insuportável! — grunhi.
Judy se tornou minha melhor amiga sem que eu tivesse
chance de escolha. E quando menos esperei, ela estava ao meu
lado, trilhando um caminho que nunca sonhei atravessar. Onde
havia muitos encalços e trajetos perigosos demais para dois jovens,
ainda no começo da vida.
Tão novos e tinham que carregar em silêncio o fardo.
Eu prometi a mim mesmo que, quando fosse embora daquele
lugar, daria um jeito de levá-la junto com sua mãe, a qual a filha
tanto lutava pela recuperação. Entretanto, a cada dia que passava o
diagnóstico se agravava.
Judy não comentava, porém, era possível ver em seus olhos
o quanto estava mexida por ver sua mãe a deixando, pouco a
pouco.
Não restava nenhuma saída.
Suspirei.
Era bom estar de volta.
Tudo parecia exatamente igual, menos eu mesmo.
Tinha apenas um desejo, enquanto procurava por Hannah
pelos corredores, e ele era entregar a câmera em suas mãos. E
ainda que eu não fosse merecedor, queria ter sua simpatia.
Não tinha segundas intenções, mas receberia de bom grado
caso ela optasse em deixar seu rancor para trás.
E quando a encontrei, Hannah não me notou, enquanto
conversava com sua cunhada, até que... Um sorriso surgiu nos
meus lábios, quando vi ambas se despedindo. Stacy seguiu para o
lado oposto, contudo, a garota de mechas rosas caminhava na
minha direção, com o celular tomando sua atenção.
Esperei até que ela se aproximasse até onde eu estava.
Quando o momento chegou, puxei sua mão fazendo nós dois
entrarmos na única sala vazia daquele corredor.
— Olá, Jane.
Hannah demorou um total de dois segundos para entender o
que estava acontecendo.
— Alexander? Pela mãe, você sumiu. O que aconteceu? — O
verde dos seus olhos pareciam querer saltar para fora.
— Pode me chamar de Alex, Jane — sussurrei, sentindo-me
incomodado a cada vez que se referiam a mim por aquele nome.
Odiava que me chamasse de Alexander, fazia parecer que
éramos a mesma pessoa. Iguais.
Alexander era desprezível.
Um grande filho da puta. E eu não era assim.
— Tudo bem, Alex... acho que vou demorar para me
acostumar, mas irei me esforçar — Sorri fraco, enquanto estava
sendo tomado para o fundo dos seus olhos verdes. — Por que você
sumiu?
— Precisei resolver algumas pendências.
Ela arqueou a sobrancelha.
— Eram mais importantes do que sua educação? Você
perdeu aulas demais!
— Ah, pode crer que sim. Aliás... — Tirei a mochila das
costas e procurei a caixinha que tinha colocado dentro antes de sair
de casa. — Aqui. — Coloquei o embrulho nas suas mãos.
— O que... — indagou enquanto abria o presente. — Ai meu
Deus. Ai meu Deus! Não acredito que você fez isso! — exclamou,
sorrindo. O mais puro sorriso que eu poderia receber. — Mas por
quê?
— Era minha obrigação depois do que fiz com a sua.
— Tudo bem, eu sei que fui um pouco hostil no dia da nossa
detenção e depois também... e sobre a situação constrangedora na
minha casa, semanas atrás, queria pedir desculpas.
— Você já pediu, Jane. Aquilo não teve importância para
mim, de qualquer maneira — no fundo tinha uma parcela de
ressentimento, mas no fim, seria apenas incluída no fundo da minha
memória.
Era algo que gostaria de fazer com todas as lembranças que
me aterrorizavam.
— Certo... se o que diz é verdade, gostaria de lhe fazer um
convite. Meu aniversário de dezoito anos está chegando e eu decidi
fazer uma festa para comemorar, na minha casa.
— Jane... — Tentei interrompê-la.
— Eu sabia que você iria reagir assim, mas não se preocupe.
Meus pais não estão na cidade, então, a casa vai estar liberada —
revelou. — O que me diz?
— Prepare um lugar especial para mim, Jane-Gatinha.
Estarei lá.
Um sorriso largo se formou nos seus lábios. E merda, eu
acabaria indo sem muito esforço. Seria necessário apenas mostrar
esse sorriso mais uma vez e eu já estaria acampando na frente da
sua casa.
Hannah não sabia o poder de persuasão que tinha sobre
mim.
Eu esperei ansiosamente até o dia do seu aniversário.
Porque a cada dia o sentimento que existia dentro do meu
peito, crescia de forma assustadora. Eu passava todos os segundos
que tinha pensando nela. Adorando-a com devoção.
Sonhando com o dia em que ela seria minha, ainda que eu
temesse a rejeição cruelmente.
Eu guardaria esse segredo a sete chaves.
17. 1
FORA DO CONTROLE
Eu vou trazer a sensualidade de volta (é)
Os filhos da puta não sabem como agir (é)
Venha aqui para compensar as coisas que lhe faltam (é)
Pois você está em chamas, preciso agir rápido (é)
Sexyback | (feat. Timbaland) Justin Timberlake
Minha festa?
Levantei a cabeça.
IMBATÍVEIS
E no meu aniversário de 18 anos, nós fizemos tatuagens
iguais
Costumávamos roubar as bebidas dos seus pais e subir no
telhado
Conversar sobre nosso futuro como se soubéssemos de algo
The One That Got Away | Katy Perry
PASSADO
PRIMEIROS PASSOS
Oh, espero que algum dia eu consiga sair daqui
Mesmo que demore a noite toda ou cem anos
Preciso de um lugar para me esconder,
mas não consigo encontrar nenhum por perto
Quero me sentir viva, lá fora não consigo enfrentar meu medo
Lovely (feat. Khalid) | Billie Eilish
DIAS DEPOIS
INFELIZES
Mas eu desmorono completamente quando você chora
Parece que mais uma vez você teve que me cumprimentar com um
adeus
Eu estou sempre a ponto de estragar a surpresa
Tirar minhas mãos dos seus olhos cedo demais
505 | Arctic Monkeys
PASSADO
Ú
ÚLTIMO DIA:
Seleção para novos atletas!
Faça parte dos Boston Red Coats.
SOMOS UM ERRO
Se você fosse minha, eu nunca deixaria ninguém te
machucar
Eu quero secar aquelas lágrimas, beijar aqueles lábios
Isso é tudo que eu tenho pensando
Can I Be Him | James Arthur
Dançando (dançando)
Dançando (dançando)
Seu corpo e o meu, preenchendo o vazio
Subindo e descendo (subindo e descendo)
NOITE DE KARAOKÊ
Essa luxúria é um fardo que nós dois carregamos
Dois pecadores não podem se redimir com uma única oração
Almas unidas, entrelaçadas pelo orgulho e pela culpa
Daylight | David Kushner
Eu comecei.
INALCANÇÁVEIS
Por que você não pode me abraçar na rua?
Por que eu não posso te beijar na pista de dança?
Eu queria que pudesse ser assim
Por que não podemos ser assim?
Porque eu sou sua
Secret Love Song (feat. Jason Derulo) | Little Mix
PASSADO
AMULETO DA SORTE
Todos os seus amigos estão aqui há muito tempo
Eles devem estar esperando por você para seguir em frente
Garota, eu não gosto disso, já estou longe demais
Eu não estou pronto, estou com os olhos pesados agora
Seus sentimentos estão à mostra, como se nunca tivesse sido
amada
Você corre em círculos, agora veja o que fez
Te dou minha palavra enquanto você a pega e corre
Gostaria que você me deixasse ficar, eu estou pronto agora
Friends | Chase Atlantic
DESCOBERTAS
O AMOR É PACIENTE
E se você tiver um minuto, por que nós não vamos
Falar sobre isso num lugar que só nós conhecemos?
Isso pode ser o final de tudo
Somewhere Only We Know | Keane
Dias se passaram.
E com ele o evento que me assombrava desde a ligação para
Lilian, tinha chegado. Estávamos todos prontos para sairmos.
— Vocês precisam ver isso! — Hannah gritou, no meio da
porta, chamando nossa atenção e compartilhando um puta sorriso
nos lábios levemente rosados.
Seus olhos brilhavam enquanto falava.
Notei o vestido escuro que envolvia seu corpo até o fim dos
pés, ele continha uma pequena fenda, deixando suas pernas à
mostras. Voltei meu olhar para seu sorriso animado.
Era inegável o quanto estava feliz.
Nathaniel, Eric e eu nos entreolhamos confusos, entretanto,
não esperamos que ela dissesse mais nada porque, no minuto
seguinte, Hannah já tinha desaparecido da porta.
— Vamos ver o que está acontecendo — Nathaniel deixou
sua bebida na ilha da cozinha.
Assim como Eric e eu, o tatuado usava um smoking preto e
gravata borboleta.
— Venham logo ou vão perder o momento! — Stéfany gritou
da sala.
— Pelo visto, é uma intimação — arqueei as sobrancelhas.
A regra era clara, tínhamos que acatar as ordens delas, caso
contrário, estaríamos ferrados.
— Vamos — Eric disse por fim, tomando as rédeas e dando
os primeiros passos a frente.
O loiro foi o primeiro a encontrar as meninas na sala de estar
e quando as viu, paralisou no meio da porta, assim como Hannah
havia feito segundos antes.
Unindo as sobrancelhas, acelerei as passadas.
— O que está havendo aí? — questionei, curioso.
Era tão impactante assim?
— Venham! Rápido! — o irmão gêmeo de Hannah estava
com os olhos arregalados, olhando para Nathaniel e eu. —
Principalmente você, cara. — Inclinou seu olhar sobre Sullivan, à
medida que sorria de canto, mostrando uma felicidade incomum em
seus olhos.
— Caralho, estou ficando preocupado — zombou, mas foi
possível identificar o receio no seu tom de voz rouco.
Assim como ele, depositei mais agilidade nos pés, chegando
finalmente à sala. Quando meus olhos visualizaram Ellie e Aaron
sozinhos em pé, senti o ar aquecendo meu inteior, e porra, tudo
comecou a fazer sentido.
Os gêmeos de Ana e Nathaniel estavam finalmente dando os
seus primeiros passos.
Ambos estavam parados com a postura um pouco torta,
como se fossem cair a qualquer momento diante de sua mãe e
madrinha. Os olhos grandes do garotinho loiro pareciam hesitantes,
se iria até Ana ou sentaria no chão.
Todavia, Ellie se mostrava determinada a seguir em frente, foi
com esse impulso que a pequena deu um passo, fazendo todos ao
seu redor assistir orgulhosamente.
Por um segundo, eu me permiti desviar a atenção da
garotinha e visualizar minha Jane, gravando cada detalhe com um
grande sorriso estonteante nos lábios. Contudo, um movimento
vindo de Nathaniel, fez meus olhos voltarem para seus filhos, no
momento em que ele caminhou até sua esposa e agachou ao seu
lado.
— Vamos, minha princesa. Venha aqui... — O som cálido fez
com que a sua cópia minúscula desse um sorriso aberto, mesmo
que existisse apenas dois requisitos de dentes aparecendo.
— Da-da! Da-da! — Ellie balbuciou, sorrindo.
Foi o impulso necessário para fazê-la da outra passada na
direção dos seus pais. E para a surpresa de todos, Aaron fez o
mesmo, rindo.
Porque Ellie parecia ser a sua condução, guiando o irmão
para suas aventuras desde a barriga da mãe. Era assim que os
gêmeos funcionavam, não havia formas de descrever como era a
irmandade daqueles dois, não tinham semelhança com Hannah e
Eric.
Aaron e Ellie eram únicos da sua maneira distinta e nada
poderia provar o contrário.
— Venha, querido, Venha até a mamãe! — Ana sussurrou,
chamando seu garotinho com as mãos. O estímulo deu resultados,
fazendo com que o loirinho inclinasse mais um pé, ainda que
estivesse tomado pela dificuldade. — Isso, meu amor... — A voz não
escondia o quão feliz ela estava.
Eu sabia perfeitamente como ela estava se sentindo,
principalmente, por ter visto em primeira mão os primeiros passos
de Margô quando tinha quase a mesma idade. Quando aconteceu,
eu não esperava sentir o turbilhão de emoções que provei, ao
entender que a pessoa que eu mais amava no mundo estava
crescendo.
Era um sentimento extraordinário.
Uma das sensações é de que parece que o coração vai
explodir a qualquer momento de ansiedade. Um calor corre por cada
célula do corpo.
Puxei o ar, sentindo que, de um segundo para o outro, meu
peito estava apertado e a respiração estava presa entre meus
pulmões. Me permiti assistir aquele momento que nem em um
milhão de anos sonhei em ver com meus amigos ao lado. Eu
observava o futuro do grupo crescendo diante dos meus olhos, a
geração que marcaria a cidade de Boston ou qualquer outro lugar
do mundo.
Porque seria sempre assim, sabia que ambos nem sempre
iriam querer seguir nossos passos, entretanto, a escolha caberia
somente para os dois. O mundo estaria melhor, e não teriam que
seguir um caminho oposto que seus pais.
Seríamos para sempre sua família. Ainda que não
tivéssemos o mesmo sangue, eu os amava. Eram como meus
sobrinhos.
— Isso... com calma, crianças. — Ana dizia para os dois,
mantendo os braços abertos, enquanto Nathaniel apoiava uma das
mãos nas suas costas, incentivando igualmente seus filhos, ao lado
da esposa.
Porra, esposa.
Quando eu iria pensar que viveria para ver o projeto de
badboy do colegial sendo pai e, ainda por cima, casado?
O pensamento me fez respirar fundo e olhar para Stéfany e
Eric juntos, as mãos do loiro mantinha-se ao redor da cintura da sua
namorada, enquanto ela carregava consigo um sorriso singelo nos
lábios, talvez estivesse pensando exatamente o mesmo à medida
que via seus sobrinhos andando até sua melhor amiga.
Stéfany sabia como ninguém que Ana merecia viver tudo
aquilo. Entendia perfeitamente o quanto valia vê-la sorrindo. Aaron e
Ellie trouxeram vida para a sua Ana novamente.
Um bater de palmas soou, trazendo-me de volta para aquele
cômodo.
Vi Ellie parada ainda de pé, com os enormes olhos virados
para o irmão. Ela esperava serenamente Aaron chegar ao seu lado
e quando isso aconteceu, suas mãos se juntaram, fazendo ambos
sorrirem. Somente isso foi necessário para uma comoção surgir no
meio da sala.
Aaron e Ellie caminharam lado a lado, até encontrarem os
braços de seus pais, que logo abraçaram ambos.
— Por Deus, vocês foram incríveis! — Ana exclamou,
beijando as bochechas do filho e em seguida, fez o mesmo com a
sua filha, fazendo-a rir ainda mais.
— Droga, acho que o vídeo gravou o som do meu choro —
Hannah sorriu, limpando as lágrimas com a ponta dos dedos. Os
olhos compartilhavam uma mistura de verde com um leve vermelho,
deixando que uma risada fosse extraída de mim. — Não ouse fazer
nenhuma piadinha!— Vi seu dedo erguido na minha direção.
— Não irei, Jane. — Levantei minhas mãos em rendição.
Talvez em algum momento eu pudesse usar esse
acontecimento a favor do meu humor.
— Certo, agora preciso retocar a maquiagem e podemos ligar
para a sua mãe — Ana disse.
Todavia, não foi somente ela a fazer isso, Sté e Hannah
fizeram o mesmo e depois de meia hora, todas estavam prontas e a
mãe de Nathaniel esperando os netos em seu carro.
— Olhem como eles parecem dois anjinhos dormindo, lindos
da vovó! — Fez uma voz fina, enquanto admirava os gêmeos
dormindo.
E realmente, ambos pareciam dois anjos imaculados quando
dormiam e tínhamos apenas que se preocupar com a vida, no
momento em que faltavam derrubar a casa a baixo.
Ellie quem o diga.
Observamos Nathaniel e Ana se despedindo dos filhos. Eles iam
passar a noite com a avó, enquanto íamos ao evento anual de
Lilian.
A cada segundo o nervosismo me abatia.
Faltava tão pouco.
Tudo daria certo!
Era o que eu esperava.
30 |
O AMOR É DESTRUTIVO
URGENTE!
A princesa de Boston foi vista com outro affair no evento da
sua mãe. Ela não estava noiva? Esperamos saber até o fim da
noite.
QUEBRA-CABEÇA
Como podemos não falar sobre família
Quando a família é tudo que nós temos?
Tudo o que passei
Você estava lá, ao meu lado
See You Again | (feat. Charlie Puth) Wiz Khalifa
NATHANIEL SULLIVAN
NOSSO DECLÍNIO
Nós sempre andamos em uma linha muito frágil
Você sequer me ouviu (você sequer me ouviu)
Você nunca deu um sinal de aviso (eu dei tantos sinais)
Todo esse tempo
Eu nunca aprendi a ler sua mente (nunca aprendeu a ler
minha mente)
Eu não conseguia mudar as coisas (você nunca mudou as
coisas)
Porque você nunca deu um sinal de aviso (eu dei tantos
sinais)
Exile (feat. Bon Iver) | Taylor Swift
PASSADO
O baile de formatura havia chegado, deixando claro que
faltava poucas horas para o mundo saber sobre Jane e eu.
Eu tinha prometido a ela que todo o suspense e mentiras
acabariam naquela noite, eu poderia contar a verdade sobre Margô
e a minha vida.
Hannah finalmente saberia o motivo dos meus sumiços, eu
não queria mais esconder, estava se tornando sufocante guardar
tudo aquilo somente para mim. Às vezes, eu sentia que não sabia
prender aquela dor no meu coração. Todavia, acabava sendo
vergonhoso dizer que tinha um pai alcoólatra e viciado em drogas,
acho que ninguém quer dizer essas palavras em voz alta. Ninguém
quer sustentar um fardo por muito tempo.
Entretanto, seria por mais pouco tempo.
O pesadelo iria acabar depois que vendi o Mustang para
Nathaniel.
Eu tinha dinheiro o suficiente para ir embora daquela casa e
ficar o mais longe possível do bairro que morei, praticamente a
minha vida inteira.
Era somente questão de tempo.
Nas férias eu começaria a busca de um lugar acessível e
aconchegante, para Margô e eu. Não precisaria ser algo exagerado
ou grande demais. Seria apenas para sobreviver e abrir minha
própria oficina. Infelizmente, não iria para a faculdade. Acabou
ficando fora dos meus planos quando vi que era quase impossível
cuidar de uma criança, que estava começando a andar e falar como
nunca.
Não queria continuar dependendo de Judy, ela tinha os seus
próprios problemas para lidar. Aquela noite seria a última vez que
pediria para ficar com Margô, enquanto eu estivesse no baile do
colegial com Hannah.
Tudo mudaria no final da noite.
Respirei fundo, tentando ao máximo não parecer perdido no
meio da conversa com Eric e Nathaniel, sobre o assunto mais falado
do mês, ou melhor, desde que havia sido anunciado.
— Não vai levar ninguém para o baile de formatura mesmo?
— eu perguntei, enquanto mantinha a bola de futebol americano
entre os dedos.
Nathaniel havia revelado meses atrás que não convidaria
nenhuma garota para a festa, não tinha ao menos intenção de
marcar presença nele, quanto mais se divertir.
Nenhuma garota do St. Emery conseguiu conquistar seu
coração de pedra.
Claro, a arrogância do projeto de badboy dificultava
basicamente tudo, quando se tratava de flertar com alguma
estudante daquele colégio, não falta uma única garota que tivesse
interesse em Nathaniel. Talvez porque o gostinho do perigo
alucinava, e cada uma adoraria tê-lo na sua mão.
O típico garoto problema, com marra de badboy, carregado
de tatuagens pelo corpo e um incontestável cigarro entre os dedos.
O velho clichê que rodava pelos corredores do colégio.
E por onde passava, todas as garotas não falavam de outra
coisa a não ser nele. E não haveria uma única alma que se negaria
a ser sua parceira no baile de formatura, se ele pedisse. Entretanto,
Nathaniel não queria saber de baile ou festas.
Preferia continuar sozinho ou não ir para o baile.
— Não estou a fim de ir. Se for, irei sem par — levou o cigarro
entre os dedos para a borda dos lábios, em seguida, tirou, soprando
uma grande quantidade de fumaça. — Hannah disse que chutaria
minhas bolas se eu não fosse, vamos ver qual a probabilidade.
Podia considerar Nathaniel e os cigarros um casal quase
inseparável.
Todavia, era mais que um simples vício que ele adquiriu
quando entrou na sua fase adolescente anos atrás, cada um tinha
sua maneira de encontrar forças para o mundo lá fora. Não era fácil
viver ou melhor, se manter vivo. Caso contrário, não sobraria uma
única pessoa para contar a história.
Era deprimente a forma como ele se matava de uma maneira
lenta, mesmo sabendo perfeitamente as consequência que o cigarro
resultaria dali a uns anos.
Respirei fundo.
— Sabe, parei para pensar numa coisa — Nathaniel deixou
suas palavras se extraírem entre uma tragada e outra, chamando
nossa atenção. Eric estava quieto, apenas observava a conversa
atento, mas sem entrar de fato a fundo nela.
— O que? — indaguei, unindo as sobrancelhas.
— Você não revelou qual garota que vai levar ao baile —
Nathaniel me acusou de omitir esse detalhe.
Ele sabia bem quem era a garota, não precisava de pistas
para descobrir que eu levaria Hannah Peterson para a festa e não
podia descumprir a promessa.
— Isso, quem é ela? — Eric finalmente falou e para o meu
desespero não era algo que eu gostaria de responder.
Porra, ainda estava me preparando para esse momento,
prinpalmente porque sabia as regras sobre não pegar a irmã de um
amigo.
Poderia apanhar feio.
Então, tinha que agir como se nada estivesse acontecendo,
mas, na verdade, eu queria espalhar pelo mundo o quão louco eu
estava por Jane. Eu estava sentindo algo por uma garota e ela
sentia o mesmo por mim.
— Meus planos são de mostrá-la apenas no baile, amigão —
eu anunciei, lançando a bola na direção do Nathaniel, que sem
perder tempo a pegou no ar.
Era tudo que eu podia dizer naquele momento.
Faltava mais ou menos uma hora para o baile.
Eu ainda não estava pronto, tinha que comandar a oficina
antes de começar a me preparar. A minha sorte era que eu só
precisava terminar a troca de um carburador e aquilo não iria
demorar mais do que trinta minutos.
E só então poderia dizer adeus a este lugar.
Tudo que eu podia fazer era sonhar alto, já que não podia
dizer em voz alta que estaria me mandando daquela podridão com
minha garotinha. Daria a vida que ela realmente merecia sem temer
que a sua segurança fosse violada, por compartilhar o mesmo
ambiente que aquele filho da puta.
Por sinal, ele estava desaparecido desde o dia anterior. Bom, era
melhor ele longe do que em casa.
Só Deus sabia onde Alexander poderia estar, talvez em
algum lugar sustentando seus vícios ilícitos, mas o que me chamava
atenção era que ele tinha dinheiro, caso contrário, estaria no meu
pé, me obrigando a dar algo contra minha vontade.
A minha sorte foi que escondi toda a grana do Mustang,
restando na minha carteira apenas os trocados que surgiam na
oficina, a maioria era troca de remendo ou de óleo.
Depois de mais ou menos quinze minutos.
Quando desviei meu olhar sobre o relógio bem acima da
porta, que separava a oficina de casa, notei que estava atrasado.
Puta merda. Uma camada quente se formou ao redor do meu
estômago quando vi a hora passando em um piscar de olhos.
Estava atrasado.
Na verdade, muito atrasado.
Eu precisei correr para não perder ainda mais a hora, tinha
prometido para Hannah que não iria deixá-la na mão outra vez.
Podia sentir a testa úmida com o suor que se formava, enquanto me
dirigia até o andar de cima para ver Margô, sabia que em alguns
minutos Judy apareceria para pegá-la e levar para sua casa,
enquanto eu iria para o baile.
Lentamente, girei a maçaneta do seu quarto e fechei a porta
no segundo seguinte, encontrando-a dormindo.
Era somente assim que eu conseguia respirar melhor em
meio aos problemas da nossa vida, vê-la bem me fazia bem, e nada
mais importava. Apenas eu e ela, se o mundo desmoronasse sob
minha cabeça, sabia que Margô estaria ao meu lado até o fim.
— Tudo vai melhor depois de hoje, princesa — sussurrei,
vendo-a no seu berço.
Antes que eu pudesse pegar o dinheiro que deveria dar para
Judy, por aquela noite, fui até a porta e passei a chave pela
fechadura. Não podia deixar ela aberta em hipótese alguma, caso
contrário, seria pego. Quando vi que estava seguro, voltei para o
berço e o puxei para frente, sem acordar a bebê.
Havia um buraco lá atrás. Alexander não sabia que eu
guardava todo o meu dinheiro em uma caixa com coisas
importantes.
Ok, vamos lá...
Tirei o tijolo que cobria a parede e o coloquei ao meu lado. A
caixa estava ali.
Ufa!
Cuidadosamente, tirei ela lá de dentro, também deixando-a no chão.
Porém, quando a abri, meu coração acelerou.
— Não pode ser. Não pode ser. Não pode ser! — Eu quis
gritar quando vi que não tinha um único centavo dentro da caixa.
Nem mesmo um único dólar.
Em choque e medo, deixei a caixa cair no chão, levanto-me
rapidamente.
Meus dedos tremiam à medida que eu sentia o ar se
esvaziando do quarto.
Aqui não podia estar acontecendo.
Meu Deus, onde estava aquele dinheiro?
Não eram dez, cem ou quinhentos dólares.
Eram quase dois mil dólares que eu havia guardado por
meses.
— O que eu faço? — sussurrei para mim mesmo, perdido na
névoa que se formou naquele cômodo. — O que eu faço? — Passei
as mãos trêmulas pelo rosto na medida que eu sentia meus olhos
arderem.
Mais e mais perguntas surgiram nos meus pensamentos,
enquanto tentava descobrir o que podia ter acontecido, só entrava
naquela casa, Margô, Alexander e eu... espera.
Não consegui me mover.
Alexander.
— Filho da puta! — rosnei, no segundo em que ouvi garrafas
sendo quebradas no andar de baixo. Só podia ser isso.
Rapidamente, corri até a porta destrancando-a e fui para o cômodo
que ele poderia estar.
NÃO PODIA SER!
No segundo em que meus pés tocaram o começo da escada,
vi sua imagem sentada no sofá velho da nossa casa. Seu corpo
estava inclinado para a mesinha de centro. Eu não precisava ser
nenhum gênio para descobrir que Alexander estava cheirando
cocaína sobre.
Aquilo me deu mais raiva ainda.
Porque havia vários pinos de droga naquela mesa, mais do
que eu poderia contar no topo da escada. Com a ira me
consumindo, eu pisei fundo por cada degrau existente. Alexander
ouviu que eu estava descendo, porém, em nenhum momento, seu
olhar me procurou, apenas continuou cheirando toda aquela merda.
Naquele novo ângulo, podia ver as demais carreiras de
cocaína sobre a mesinha de centro. Foi então que ele me olhou pela
primeira vez no dia. Os olhos estavam vermelhos e eu não precisei
ficar tão próximo dele para notar suas pupilas dilatadas.
Havia uísque do mais caro que os dois mil dólares poderiam
comprar.
— Ei, garotão. Quer se juntar a mim? Tenho o suficiente para
nós dois! — Sorriu com a proposta que deslizava venenosamente
dos seus lábios, enquanto passava as mãos pelo nariz
esbranquiçado.
Eu quis vomitar com aquela cena.
Nunca havia sentido tanto nojo como estava sentindo
naquele segundo.
Filho da puta.
Eu queria matá-lo com minhas próprias mãos.
— Voce é doente, porra! Como arrumou dinheiro para tudo
isso? — rosnei, ressaltando que ele não tinha um tostão furado para
comprar ao menos um pino de droga.
— Eu encontrei, garoto. Às vezes, a sorte está do nosso lado,
e você precisa agarrar a oportunidade e fazer tudo que deseja. Cá
estou eu aqui, aproveitando tudo isso! — levantou o copo com a
bebida. — Você não deveria ter escondido toda essa grana do seu
velho aqui. — Balançou a cabeça como se estivesse decepcionado.
— Era meu! Eu trabalhei por ele!
— Não, filho da puta. A oficina é minha, então, tudo que sai
dela, consequentemente, é meu! — Me encarou de volta, mas,
naquele momento, em mim, só havia raiva.
Um aglomerado de sensações, enquanto ele passava a
língua pelos lábios e depois, abaixou a cabeça, cheirando mais do
pó branco. Quando seu rosto levantou outra vez o vi fungar,
balançando de um lado para o outro.
Por muitas vezes, eu quis entender o porquê de tudo aquilo.
Porque ele destruiu sua família.
Porque ele se rendeu tão fácil.
Mas só havia uma resposta.
Alexander James I era um filho da puta.
— O convite ainda está de pé, garoto. Acho que somente
assim você vai sentir o verdadeiro prazer da vida. Venha aqui e
aproveite com o seu velho. Siga o legado dos James, assim como o
seu pai. — Eu queria esfregar a cara dele naquela merda, até que
algo rompeu meus pensamentos.
Era isso.
Cuidadosamente me aproximei, ficando frente a frente dele.
— Não, somente você está fadado a cair nesse vício, porra.
Eu me recuso.
— Acha mesmo que sua vida vai ser diferente da minha? —
Ele riu, jogando a cabeça para trás.
Alexander tinha somente quarenta e quatro anos, mas
aparentava ser bem mais velho. As drogas e as bebidas
envelheceram meu genitor muito mal.
— Eu farei ser diferente.
Alexander gargalhou.
— Como? Você não tem nada de especial. Será a porra de
uma mecanicozinho de merda. Nunca vai conseguir ser mais que
isso. Acha que vai para faculdade no próximo semestre? Você não
vai, porra. É um inútil. A única coisa que sei, é que somos iguais,
queira você ou não acreditar. Até no péssimo gosto para mulheres.
Congelei.
— Todos sabem que a filha daquele vadiazinha sempre vem
aqui. Eu sei como é, no começo, vale a pena. Elas realmente são
gostosas, e por sinal, a garota lembra um pouco a mãe.
— Não fale dela, porra!
— Ciúmes? Não precisa disso, filhão.
— Cale a boca e me diga, cadê o resto do dinheiro? —
bradei, apertando a mandíbula.
— Está aqui bem diante de você. Olhe, é o paraíso! —
declarou, antes de cheirar outra fileira que ele havia feito.
Foi naquele segundo que o baque me preencheu.
Ele não fez isso.
Ele não torrou todo dinheiro.
— Vamos, experimente. Assim você relaxa um pouco... — A
voz carregada de álcool fez meu sangue esquentar ainda mais.
— CHEGA, PORRA! — Passei a mão pelos resquícios de
cocaína na mesinha, espalhando o restante da droga pelo ar.
Eu não queria ver mais aquele merda diante de mim,
enquanto eu sentia minha respiração acelerada pela reação rápida.
— Seu merdinha, olha o que você fez! — Se levantou, zonzo.
As drogas haviam fodido com a cabeça dele. Não restava
mais nada do Alexander de anos atrás e pior, eu não lembrava de
um único dia que ele tinha sido um bom pai. A única lembrança de
nós dois juntos, foi quando ele me ensinou a consertar meu primeiro
carro, não para ter um momento em família, mas sim, para ter
alguém que fizesse o seu trabalho.
Senti suas mãos empurrando meus ombros.
— Como sempre fazendo merda, porra! — Deu um soco no
meu rosto, quando pensei que viria outro, notei seu corpo
cambaleando para trás.
Os olhos vermelhos olharam para o chão, entretanto,
voltaram para mim. Vi o segundo em que seus joelhos cederam e
antes que eu pudesse contar, acompanhei o momento que ele caiu
no chão, convulsionando.
— Merda! — xinguei, me aproximando, todavia, parei no meio
do caminho.
Eu sabia o que estava acontecendo. Alexander estava tendo
mais uma overdose naquele ano, mas diferente das outras vezes,
eu não iria socorrê-lo.
Assisti cada segundo dele se sacudindo no chão e, em
seguida, vomitar em si mesmo. Era uma cena repugnante, que
ninguém no mundo merecia ver. As nuances escuras de Alexander
me imploraram por ajudar, entretanto, eu não fazia aquilo.
Não quando ele tinha fodido com a minha noite.
E então, eu lembrei dela. Hannah. Pelo horário, ela já estaria
me esperando no baile. Estava claro que eu havia perdido metade
do baile.
O que eu deveria fazer?
Meu peito doía enquanto meus olhos estavam sobre
Alexander, com os lábios esbranquiçados e as pupilas mais
dilatadas.
Respirei fundo, puxando as pernas dele, no momento em que
o vi vomitando no pouco que sobrou do carpete.
— Ah, porra! — rosnei, ainda puxando-o. Meus dedos
tremiam enquanto tentava colocá-lo em uma posição melhor. — Eu
te odeio tanto, seu filho da puta. — Queria ter descarregado tudo
que estava sentindo naquele momento, mas o pavor era o
sentimento que me dominava.
SEM SALVAÇÃO
Essa é para os solitários
Aqueles que sempre se perguntam para onde seus amigos
foram
O garoto que não consegue parar de chorar
A garota que desistiu de tentar
Lonely Ones | LOVA
Eu não consegui.
A realidade me acertou.
Eu não consegui acabar com tudo.
Fui impulsivo e sabia que teria consequências me esperando,
assim que a porta do quarto de hospital fosse aberta. Me forçava a
pensar que ainda éramos os mesmos de cinco anos atrás. Ela
continuava sendo a minha garota de mechas rosas e uma câmera
entre os dedos. Que ainda tínhamos momentos bons, onde ela me
abraçava como se eu fosse seu mundo.
Na minha cabeça, Jane ainda me amava e nunca me deixou
pensar o contrário.
Era tudo que eu queria acreditar.
Precisava dela.
Do seu amor.
Por que sem ela... eu estava sem salvação.
34 |
PERDENDO A SANIDADE
Mas isso não foi sua culpa, mas sim minha
Era seu coração na linha
Eu realmente fodi tudo dessa vez
Não foi, meu caro?
Little Lion Man | Mumford & Sons
— O que eu faço?
— Dê mais algum tempo para ela digerir toda essa
informação, Alex — Nathaniel suspirou, passando as mãos pelos
cabelos do filho.
Eu estava inquieto pra caramba.
Não conseguia respirar sem sentir todo meu corpo doendo,
tendo, nas próximas quarenta e oito horas, um jogo marcado. Era a
porra da final dos jogos universitários. O time tinha conseguido uma
chance para fazer acontecer o maior draft da história.
Depois da overdose que tive, precisei passar alguns dias
fora, me recuperando.
E pela ação divina, eu estava liberado para jogar na final.
Implorei para Hanks me permitir jogar. Mas para isso, foi exigido um
exame toxicológico e eu fiz. Não foram encontradas drogas no meu
sangue.
Aquilo foi uma dádiva, porque quase cogitei usar aquela
merda que guardei por cinco anos. Quando entrei naquela casa pela
primeira vez, após a morte do meu genitor, vi que tudo estava igual
como deixei. Havia pó espalhado por todos os lados, coisas
quebradas, pinos de cocaína intactos.
Desde o dia em que me mudei para o apartamento que
dividia com Eric e Nathaniel, não conseguia entrar mais lá. A todo
segundo uma memória surgia. E todas eram ruins.
Passei anos guardando a maior lembrança da minha
destruição.
A porra de um pino que eu nem sabia se era viável usar.
E a cada recaída dos meus pensamentos suicidas, eu sentia
vontade de experimentar o poder que aquela droga tinha e porque
Alexander sempre consumia, nas suas noites de farra, regada de
bebidas.
— Você acha que ela vai voltar? — sussurrei. — Ou se irá
assistir a final?
— Não, irmão. Hannah é imprevisível. Entretanto, torça para
que o seu coração duro amoleça, e ela venha ver a final.
Eu ri, girando um dos brinquedos de Aaron nas mãos.
Margô, Ellie e seu irmão brincavam juntos no canto da sala,
mesmo que a diferença de idade entre eles fosse grande, acabaram
se dando bem.
Minha irmã e Judy estavam passando os últimos dias em um
quarto de hóspedes, que não era usado no apartamento em que eu
morava. Eu podia ver Margô a todo momento agora, já que as aulas
haviam sido encerradas.
Faltava somente a final e a formatura para estar livre.
Tirando-me dos meus pensamentos, a campainha soou.
Nathaniel e eu nos entreolhamos.
— Isso?— Bufou, se levando.
Contraí o sorriso, girando o brinquedo novamente.
— Alex, é para você. — Meu coração errou uma batida.
Poderia ser ela?
Olhei para a porta, vendo duas pessoas entrando e
rapidamente, os identifiquei. Era Magnólia e seu marido, com o filho
nos braços.
Tinha chegado a hora, pensei olhando para minha irmã ainda
brincando. Ela não tinha notado a presença da mãe.
— Gô, pode vir aqui, por favor? — indaguei para a garotinha,
enquanto ela montava alguns blocos.
Os olhos castanhos inclinaram-se na minha direção e em
seguida, foram diretamente para Magnólia.
— Lili! — exclamou, não dando a mínima para mim.
Passei a mão pelo pescoço, esfregando a região, enquanto
sentia um incômodo crescendo no meu peito. Suspirei, vendo minha
irmã correndo para abraçar as pernas de Magnólia.
Ela ainda não conseguia pronunciar o nome da mãe, apenas
a chamava de Lili. Mas seria por pouco tempo, em breve, Margô
acabaria chamando Magnólia de mãe, porém, ela ainda não sabia
que aquela mulher, que a enchia de presentes, era sua verdadeira
mãe.
— Oi, princesa! — Magnólia a pegou nos braços, enquanto
Oscar sorria para ela, no momento em que seu olhar procurou o do
marido. — Tudo bem, Alex? — direcionou sua voz para mim, à
medida que eu me enfiava em um transe.
— Ah... tudo sim.
Porra, era inegável o quanto estava nervoso.
— Chegou a hora? — ela questionou.
— Chegou. — assenti. Magnólia suspirou, aliviada.
— O que chegou? — Margô perguntou, curiosa.
Respirei fundo, chamando para que eles se aproximassem.
Nathaniel havia se afastado e estava ao canto, brincando
com os bebês. Sentamos todos no sofá e deixei Margô no meio,
sentando na sua frente, na mesinha de centro.
— Você lembra quando perguntou sobre nossa mãe? —
peguei suas mãozinhas entre as minhas.
— Lembro. V-ocê, você disse que ela estava viajando —
notei sua gagueira, era normal para a sua idade.
— Sim, e sabe a boa? — decidi ir para um caminho mais
lúdico.
Margô tinha só seis anos, porra.
— O que? — seus olhos me encaravam com curiosidade e
ansiedade.
— Ela voltou! — exclamei. Os olhos grandes de Margô
ficaram ainda maiores, quando ela arregalou as íris. — Quer
conhecê-la? — instiguei, com cuidado. Ela ficou pensativa.
— Onde ela está? — perguntou baixinho, apertando seus
dedinhos em torno dos meus.
— Ali. — Inclinei o queixo na direção de Magnólia.
Margô virou o rosto lentamente para ela e então olhou para
mim novamente, com o cenho franzido.
— A Lili é minha mãe?
— Sim, querida. — Magnólia disparou nervosa, enquanto
minha irmã se mantinha sem reação, paralisada, olhando para mim.
Percebi seus olhos se encherem de água e, em um
movimento ágil, Margô se jogou em seu colo.
— Promete que não vai viajar de novo? — Margô pediu
baixinho, com os braços em volta do pescoço dela.
Porra! Aquilo era demais para mim.
— Eu prometo, meu amor. Prometo que nunca mais vou
deixar você! — Meu coração voltou a bater normalmente quando vi
que minha irmã não sofreria pela falta da mãe de novo.
Implorava para que ela nunca sentisse desejo de conhecer
seu genitor, ainda que estivesse morto.
Alexander James I não merecia amor.
Nem em vida, tampouco depois da sua morte.
36 |
JOGADA FINAL
Digo a mim mesma que eu não me importo muito
Mas eu sinto que estou morrendo até eu sentir o seu toque
Só o amor, só o amor pode machucar assim
Só o amor pode machucar assim
Deve ter sido um beijo mortal
Só o amor pode machucar assim
Only Love Can Hurt Like This | Paloma Faith
FORMATURA
E se eu estiver longe de casa?
(Oh, irmão, vou ouvir você chamar)
E se eu perder tudo?
(Oh, irmã, eu vou ajudá-la)
Oh, se o céu estivesse desmoronando, por você
Não há nada neste mundo que eu não faria
Hey Brother | Avicii
TENTATIVAS ENCERRADAS
Você ainda me deixa nervoso quando você aparece
O frio na barriga volta quando estou perto de você
O tempo todo, a única verdade
É que tudo me lembra você
E eu sei que isso é errado
Que eu não consigo seguir em frente
Mas existe algo em você
This Town | Niall Horan
Você se lembrará
Quando isso tudo acabar
E tudo se perder pelo caminho
Quando eu envelhecer
Eu estarei lá ao seu lado
Para te lembrar de como eu ainda te amo (eu ainda te amo)
— Jane...
— Oi, Alex.
— Você me perdoa pelo o que eu fiz?
Eu queria sua verdade. E fazer tudo dar certo daquela vez,
era a minha nova missão.
Queria ser feliz por completo.
Queria o seu amor.
— Eu já te perdoei, querido. Há quase dez minutos atrás, no
carro do Eric, no tempo em que ouvi sua filmagem na minha
câmera. Bem ali, eu soube que seria impossível te odiar, Alex. —
sussurrou, calma e serena. — Não tem como não perdoar você.
Eu sorri.
Porra, eu só poderia estar sonhando.
Era a Nirvana em pessoa ver o sorriso da mulher que eu
amava, sendo lançado para mim. Os seus sorrisos, beijos, risadas e
choros eram todos meus.
— Jane... — Não conseguia mais evitar o meu peito ardendo,
enquanto a encarava.
Ela continuou olhando fixamente para mim.
— Pode falar, Alex. — Soprou, baixinho.
— Eu te amo — confessei, mesmo que os sinais estivessem
claros para nós dois.
Eu precisava dizer em voz alta.
— Ei, Alex — Hannah me chamou, causando um
desequilíbrio no meu coração.
— Oi, Jane.
— Eu te amo também — Meu coração ficou acelerado com a
notícia.
PUTA MERDA!
— Mesmo? — Não acreditava que tinha ouvido o que tanto
desejei por anos.
Eu não queria duvidar da sua palavra, mas gostaria de ouvir
mais vezes. Era surreal ouvir que a garota que eu amava sentia o
mesmo por mim, mesmo depois de tantas merdas que aconteceu na
minha vida.
O momento poderia ser melhor, se o meu celular não tivesse
atrapalhado tudo. Quando deslizei uma das mãos até os bolsos da
calça social e tirei o aparelho do bolso, meus olhos leram o nome do
treinador na tela.
Eu ia ignorar, mas Hannah me disse suavemente para
atender.
— Foi mal — sussurrei, atendendo a ligação.
— Eu espero que tenha uma caneta reservada, James — Ele
não me deu tempo para me preparar.
Caneta?
— Como assim, treinador? — Compartilhei minha dúvida.
— Digamos que você vai precisar assinar um contrato. Então,
separe duas, quero você e Peterson amanhã no meu escritório! Três
dos times mais cobiçados da NFL querem vocês dois.
Pu-ta-mer-da!
Paralisei.
— Eu… Meu Deus, obrigado, treinador Hanks. Estaremos aí!
A chama que estava quase se apagando meu peito havia
voltado a fumegar. Íamos ser um dos nomes mais falados do
mundo.
— O que aconteceu? — Hannah perguntou.
— Você está olhando para o homem que te dará o mundo,
Jane-Gatinha.
— Wow, que ligação foi essa, hein? Você não estava assim
dois minutos atrás.
— Bem, é porque dois minutos atrás eu não sabia que tinha
três times profissionais que querem me contratar! Aliás, Eric e eu!
— Ai, meu Deus! — Hannah gritou, pulando nos meus
braços. — Parabéns! Parabéns! Pessoal, venham aqui! — A sua
empolgação se tornou a minha, enquanto meus amigos chegavam.
— Vocês não vão acreditar.
Todos uniram as sobrancelhas.
— Alex e Eric vão entrar em um time profissional!
Surpresa encheu os olhos de todos.
Foi naquele momento que eu soube que tinha os melhores
amigos do mundo inteiro.
Que vibravam a cada conquista.
Que, independente da situação, estavam comigo.
Éramos peças que se completavam de um quebra-
cabeças.
Após terem seus amores em jogo.
EPÍLOGO
FIM.
NOTA DA AUTORA: PARTE II
Obrigada!
MINHAS OBRAS:
FOREVER YOU - LIVRO UM (AMORES EM JOGO)
Um beijo.
Um segredo.
Um lembrete fatal.
SUBLIME DEAL - LIVRO DOIS (AMORES EM JOGO)
Marcados pelas feridas do passado, eles terão que passar por cima
de qualquer mágoa e se submeterem a um namoro falso.
INSTAGRAM
TWITTER
SUMARIO
SHATTERED SOULS
NOTA DA AUTORA
AVISO DE GATILHOS
PRÓLOGO
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15.1
15.2
16
17. 1
17. 2
18
19
20 |
PERDIDA ENTRE FRAGMENTOS
21 |
PRIMEIROS PASSOS
22 |
INFELIZES
23 |
SOMOS UM ERRO
24 |
NOITE DE KARAOKÊ
25 |
INALCANÇÁVEIS
26.1 |
PARTE I: TERRA DESABITADA
26.2 |
PARTE II: CONEXÕES
27 |
AMULETO DA SORTE
28 |
DESCOBERTAS
29 |
O AMOR É PACIENTE
30 |
O AMOR É DESTRUTIVO
31 |
QUEBRA-CABEÇA
32 |
NOSSO DECLÍNIO
33 |
SEM SALVAÇÃO
34 |
SEGUINDO MEU CAMINHO
35 |
PERDENDO A SANIDADE
36 |
JOGADA FINAL
37 |
FORMATURA
38 |
TENTATIVAS ENCERRADAS
EPÍLOGO
NOTA DA AUTORA: PARTE II
AGRADECIMENTOS
[1]
Transtorno explosivo intermitente (TEI) é uma condição psicológica que consiste em
constantes explosões de raiva e comportamentos agressivos
[2]
Tradução: Por Deus, merda!
[3]
Colégio fictício que foi criado unicamente para a construção do enredo e todo o arco da
história.
[4]
Tradução: Irresponsável de merda.
[5]
Traduzido do francês: Querida.
[6]
Filme infantil.
[7]
Protagonista do livro Entrelaços da autora April Jones.
[8]
1 Coríntios 13:4-7
[9]
Tradução do francês: Minha garotinha
[10]
Tradução do espanhol: Por Deus!