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SUMÁRIO
PLAYLIST (DISPONÍVEL NO SPOTIFY)
AVISO DE GATILHO
NOTA DA AUTORA
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
EPÍLOGO
SOBRE A AUTORA
Playlist (disponível no Spotify)
Aviso de gatilho
Este livro pode conter conteúdo sensível e/ou provocar gatilho emocional.
( Bulimia, Violência física e verbal, menção a abuso sexual)
Nota da autora
Alana
Dimitri
***
Dimitri
Mais uma vez naquele dia, acordo confusa sem saber onde estou.
Desta vez pelo menos estou em uma cama quentinha, mas
definitivamente não é meu quarto, quando me ergo, girando a cabeça pelo
lugar estranho, até minha mente clarear e lembrar que adormeci no quarto
do Dimitri.
Mas que merda!
E quando viro para o lado quase solto um grito de horror ao ver que
o próprio está deitado na mesma cama.
Ele está de bruços, as costas largas à mostra e parecendo num sono
profundo, pois está até roncando um pouco.
Que diabos Dimitri estava pensando em se deitar comigo?
Aqui é a cama dele, não? Uma voz debocha em meu íntimo.
Sim, mas aposto que essa casa enorme deve ter muitos quartos e que
não tinha a menor necessidade de se deitar ao meu lado!
Furiosa, saio da cama e, por um momento, tenho vontade de acordá-
lo e soltar os cachorros em cima dele, registrando toda a minha indignação.
Mas interrompo a onda de raiva, quando me dou conta que talvez
esteja sendo um tanto ridícula. Inferno, não sou uma mocinha do século
XIX que fica indignada por dormir na mesma cama que um homem. Eu
mesma já dormi na mesma cama que Tyler algumas vezes em nossas
viagens. Só que Tyler é gay e Dimitri não.
Como se Dimitri tivesse algum interesse neste sentido em você. De
novo a voz debochada sussurra.
Eu queria não ficar irritada com isso, mas fico.
Até quando?
Detesto Dimitri e o fato de ele não gostar nem um pouco de mim
também deve ser motivo de alívio, e não de decepção.
Ok. Preciso dar o fora daqui. Já está na cara que foi uma ideia mais
do que idiota ter vindo até esta casa. O que poderia fazer com ele? Agora o
estrago já está feito e nada do que eu faça com Dimitri vai consertar o fato
de Tyler estar machucado.
Certo. Próximo passo, dar o fora dali.
Então me recordo que não coloquei a roupa na maldita máquina.
— Ah não!
Corro para o banheiro, mas minhas roupas sujas não estão mais no
lugar que deixei.
Será que Dimitri as colocou para lavar?
Saio do quarto e desço as escadas, encontro a cozinha facilmente e,
além dela, a área de serviço. Abro a máquina e respiro aliviada ao abri-la e
pegar minhas roupas. Até meus sapatos Dimitri colocou ali, já que foram
atingidos.
Pego o vestido, minha meia e sutiã e não encontro minha calcinha.
Junto com minhas roupas estão outras roupas do Dimitri e começo a
me impacientar de não a encontrar, até que escuto um barulho da porta da
rua se abrindo e alguém chamando Dimitri, seguida de passos.
— Ah merda! — Desistindo de achar a calcinha, coloco o vestido
rápido, e estou calçando os sapatos quando uma moça ruiva aparece na
minha frente.
Ela arregala os olhos ao me ver.
— Alana?
— É... esse ainda é meu nome — resmungo para Diana,
conseguindo colocar os sapatos.
— O que está fazendo aqui?... — E sua voz vai tomando um tom
que mescla incredulidade e malícia que me irrita e ergo a cabeça, rápido.
— Não é o que está pensando, credo!
Ela solta um risinho.
— Sinceramente, é mesmo difícil de acreditar que você estaria aqui,
claramente se vestindo, na casa do Dimitri porque passaram a noite juntos.
Seria a coisa mais bizarra do ano.
— Não se preocupe, não passei a noite quicando no seu parceiro!
Nem precisa ficar com ciúme.
— Eu não ficaria, eu e Dimitri não somos amantes, como acredita.
— Então este bebê é do espírito santo?
— Não, óbvio. Mas não é do Dimitri, eu te garanto. Não que seja da
sua conta.
Certo, essa eu mereci.
— Sim, tem razão! Agora se me der licença, preciso dar o fora
daqui.
— E não vai sanar minha curiosidade e dizer o que estava fazendo
aqui na casa do Dimitri, já que não estavam transando?
— Eu poderia dizer que não é da sua conta, mas a verdade é que
vim tirar satisfação com ele, por ter machucado Tyler. E seu parceiro
nojento vomitou em mim, em resumo. Por isso me pegou me vestindo.
Dimitri deixou que eu tomasse um banho e infelizmente acabei
adormecendo.
— Isso explica isso aí... — Diana ri apontando para algo em mim,
mas não entendo do que está falando. — Dimitri às vezes parece ter cinco
anos de idade.
— Não acho. O problema do seu parceiro não é imaturidade, e sim
agressividade. Ele machucou o Tyler, que agora não vai mais poder
competir nas Olimpíadas.
— Ah não... — Ela leva a mão na boca. Parece genuinamente triste.
— Sinto muito. De verdade. Imagino que Tyler está arrasado e você
também.
— Claro que sim. Ainda nem consegui digerir direito. Estou furiosa
com Dimitri, ele não tinha o direito.
— Ele não fez de propósito! Dimitri tem muitos defeitos, mas...
— Ele machucou o Tyler!
— Não porque quis. Ele perdeu a cabeça.
— Não interessa! Ele é um monstro!
— Não é! Olha, sei que não tem como defender o Dimitri agora,
mas ele é uma boa pessoa. Só... tem problemas com agressividade.
— Então deveria estar preso ou com uma camisa de força se é
maluco...
— Não é assim.
— Tem razão, não venha defender o Dimitri. Eu nem deveria estar
aqui, quero que ele se exploda!
— Se serve de consolo, Dimitri e eu não vamos competir também.
— Não?
— Estou grávida, não estou?
— Mas...
— Não, não vou abortar.
Eu fico um tanto surpresa. Quando descobri que Diana estava
grávida, não tinha parado para pensar o que isso afetaria ela e Dimitri nas
Olimpíadas.
Por um instante, sinto um prazer maldoso em pensar que Dimitri
também se ferrou. Bem-feito. O universo tratou de tirar dele o que ele tirou
de mim.
Bem, parece que minha vingança veio rápida.
Mas ao ver a desolação nos olhos de Diana, não posso evitar sentir
certo pesar. Estamos no mesmo barco, ainda quando somos concorrentes.
Ninguém entende da glória e da maldição que é ser um atleta a não ser
outro atleta.
Estou morrendo por dentro por não poder mais competir nessas
Olimpíadas. Diana deve sentir o mesmo.
Até o babaca do Dimitri deve sentir.
Só que Diana está escolhendo este caminho e eu não.
Dimitri também não escolheu.
De repente escuto meu celular tocar na bolsa e ao pegar o aparelho
vejo que é uma ligação da Peyton.
— Oi...
— Onde diabos está?
— Na casa de uma amiga. — Coro quando Diana levanta a
sobrancelha.
— Ficou louca? Os pais do Tyler me contaram o que aconteceu com
ele, que merda você fez?
— Eu não fiz nada. Foi Dimitri Ivanov.
E como se fosse o Satanás sendo chamado, o próprio Dimitri surge
descendo as escadas.
Rolo os olhos, irritada só de me ver de novo em sua presença. Pelo
menos desta vez ele veste uma calça de moletom, embora esteja sem camisa
e com os fios de cabelos pretos se espreguiçando para todos os lados.
— Minha nossa, Alana! Não pode ser verdade que deixou uma
tragédia dessas acontecer! Venha agora para casa!
— Eu vou visitar Tyler antes.
— Não, você vem pra casa. Mamãe está furiosa, fiquei com medo
até de ela passar mal... Na pensa em como estamos nos sentindo?
— E você acha que estou me sentindo como? — grito e agora tanto
Diana quanto Dimitri estão prestando atenção em mim.
Eu me viro, dando alguns passos para longe deles, buscando alguma
privacidade enquanto abaixo a voz.
— Sou eu que me ferrei e não vou mais para as Olimpíadas. —
Tento não chorar quando o nó fecha minha garganta.
— Alana, venha pra casa. Agora, não pode ficar fugindo. Temos que
resolver isso...
— Resolver como? Está acabado. Eu vou ver o Tyler e depois eu
volto pra casa.
Eu desligo e encaro Diana e Dimitri.
— Satisfeitos? Agora minha vida virou um inferno!
— Eu entendo. A minha vida também está — Diana rebate.
— Mas você escolheu, eu não. — Encaro Dimitri com raiva.
Ele não parece muito preocupado.
Claro. Típico daquele babaca narcisista não estar nem aí.
— Não vai falar nada? — insisto numa reação, porque se Dimitri me
irrita falando, calado me irrita também.
— Ainda aqui? Achei que estivesse louca para ir embora. Ou devo
interpretar o fato de que a encontrei deitada usando só uma blusa minha, na
minha cama, como um convite? Já ouvi dizer que é uma malcomida, mas
não sabia que estava tão desesperada.
Meu rosto se tinge de vermelho com aquela insinuação ridícula, de
raiva e certa vergonha que nem deveria estar sentindo.
Óbvio que Dimitri está me provocando para me irritar.
— Jamais estarei tão desesperada a ponto de me rebaixar a sentar
num babaca como você!
— Gente, para com isso — Diana pede, apaziguando o clima.
— Provavelmente por isso que o mais perto que um pênis chegou da
sua boca seja com este desenho aí! — Dimitri ri e coloco a mão no rosto
sem entender.
— Dimitri, isso foi muito bobo — Diana o repreende.
Eu pego o celular e checo minha imagem através da câmera.
Puta merda. Dimitri desenhou um pênis com canetinha no meu
rosto.
Eu perco o ar de indignação, o que o faz rir mais ainda.
— Que merda é essa? Você tem 11 anos de idade agora? — Eu
esfrego meu rosto sem sucesso.
Diana abre a bolsa e pega o que acredito ser um lenço umedecido e
coloca na mão do Dimitri.
— Limpa o rosto dela.
— Eu não.
— Você sim. Sabe que isso é ridículo, ela não pode sair assim.
E antes que eu possa sequer dar um passo atrás, Dimitri está
segurando meu rosto com uma mão e com a outra esfregando minha
bochecha com um olhar irritado.
Estou surpresa por ele ter obedecido a Diana, talvez por isso eu não
tenha a reação que deveria ter, que é dar um tapa na sua mão e mandá-lo
limpar a própria bunda em vez do meu rosto. Mas fico ali, esperando que
limpe seu desenho bobo que mais convém a um pré-adolescente cheio de
hormônio.
Por alguns segundos, quando a raiva arrefece, me dou conta de que
ele está muito perto, invadindo meu espaço pessoal.
Tão perto que sinto seu hálito de menta em meu rosto, denunciando
que ele acabou de escovar os dentes. E os olhos concentrados em mim são
como uma piscina de águas claras, num tom que pode ser descrito como um
pouco bizarro, entre o verde e o azul dependendo da luz.
É mesmo uma merda que Dimitri seja bonito pra cacete, com aquele
rosto pálido de vampiro, os cabelos escuros e o maxilar que parece ter sido
desenhado por algum artista muito inspirado.
De repente ele abaixa o olhar e me flagra o encarando.
Fecho minha expressão numa tentativa de disfarçar meu súbito
interesse descabido.
— Acabou? — resmungo impaciente.
— Está quase saindo. Talvez se eu... — E inesperadamente, ele leva
dois dedos à língua, umedecendo-a e passado o seu cuspe no meu rosto com
força.
— Ei, para com isso! — Desta vez eu o empurro.
— Só estava tentando ajudar!
— Já chega! Não quero nenhum fluido do seu corpo no meu rosto!
— Talvez você precisasse de outro tipo de fluido para deixar de ser
uma vaca chata...
— Ei, Dimitri, já chega! — Num minuto Diana está entre nós. —
Essa briga de vocês é ridícula. Somos adultos aqui. E estamos todos
chateados por causa do que está nos sendo tirado. Acho que tanto você
quanto a Alana estão com os nervos à flor da pele.
— E a culpa é de quem mesmo? Claro que estou chateada. Meu
parceiro foi nocauteado por este babaca! E você nem sequer parece
arrependido.
De repente o olhar do Dimitri muda. Parece quase... humano.
— Então Tyler está mesmo fora?
— Sim, feliz agora?
— Pois aí que se engana. Não era minha intenção machucar o Tyler.
Isso é uma merda... — Ele passa os dedos pelos cabelos, parecendo
angustiado.
Eu não tenho a menor pena.
— Sim, Diana tem razão, estamos os quatro ferrados! E acho que já
chega pra mim. Vou embora.
— Dê um abraço em Tyler, diga que sinto muito — Diana diz.
Eu não digo nada e saio da casa.
Chamo um táxi e vou para o hospital. Sei que estou evitando minha
casa e que não poderei fazer isso para sempre.
Quando chego ao hospital me enfureço quando vejo Kiara no
corredor, desligando o celular.
— Que porra está fazendo aqui? Veio rir da nossa cara?
— Claro que não! — Ela se indigna. — Viemos ver como Tyler
está. Estou muito triste por ele não poder mais competir.
— Eu duvido. Você e a bruxa da sua mãe devem estar rindo! Mas
pelo menos o idiota do Dimitri também não vai mais, já que a Diana vai ter
o bebê, pelo que fiquei sabendo.
— Sim, fiquei sabendo também. É tudo muito triste.
— Triste para uns, felicidade para outros! — debocho e entro no
quarto do Tyler.
Christian está saindo e apenas me cumprimenta com um meneio de
cabeça, mas eu não ligo para Christian, e sim para meu amigo que está
deitado sobre os lençóis, muito abatido.
Eu desabo num choro quando me aproximo, me sentando ao seu
lado e deitando a cabeça em seu peito. Ele acaricia meu cabelo e por um
momento nem um dos dois fala nada.
— Ei, se continuar chorando assim, como vai manter sua pose de
durona? — Ele tenta fazer piada.
Eu me levanto, enxugando o rosto.
— Não sou durona. Eu sou uma idiota. Fui eu quem começou
aquela briga...
— Não foi culpa sua.
— Foi culpa do Dimitri, claro. Aquele cretino, psicótico! Ele não
deveria ter se intrometido para defender a vaca da Kiara!
— Ninguém teve culpa. Foi uma fatalidade.
— Você é muito bonzinho, Tyler. Eu só queria pegar um taco de
baseball e quebrar as duas pernas do Dimitri. Talvez o pau bonito dele
também.
— Pau bonito? — Tyler levanta a sobrancelha.
— Deixa pra lá...
— Não, agora vai contar.
E eu lhe conto o que aconteceu naquela manhã.
No fim, Tyler está rindo.
— Não tem nada de engraçado nessa história.
— É sim, eu devo dizer que concordo com você, o pau do Dimitri é
mesmo bonito pra caramba.
— Você manja o pau do Dimitri no vestiário? Seu safado...
Ele não nega.
— Chris ficaria com ciúme.
— Chris não precisa ter ciúme porque o dele é mais bonito ainda.
Eu rolo os olhos.
— Está apaixonado por ele, né?
— Acho que pelo menos estar fora das Olimpíadas vai me deixar
com tempo para arranjar um namorado.
— Boa sorte. Chris não parece querer sair do armário.
— Todo mundo tem seu tempo. E eu estarei aqui.
— Ah Tyler, o último romântico.
Eu amo Tyler. Acho que é a única pessoa que tem um coração bom e
que não me entedia.
Desde que nos conhecemos e começamos a treinar juntos, nos
entrosamos bem, embora tenha mais a ver com a paciência do Tyler do que
da minha boa vontade.
Eu não sou uma pessoa fácil, sei bem disso. Mas Tyler não saiu
correndo como os outros. Ele ficou e me aguentou. E acho que serei
eternamente grata a ele por isso.
Eu seria uma pessoa muito pior se não fosse Tyler Chon. E agora ele
foi tirado de mim, e não sei o que fazer.
Ele toca meu cabelo.
— Vá pra casa, vá descansar.
— Eu não quero. Minha irmã e meus pais devem estar furiosos.
— Ei, não foi culpa sua.
— Duvido que eles vejam assim. Mas tem razão, já fugi demais,
tenho que ir pra casa.
Eu o abraço me despedindo e finalmente chamo um táxi para casa.
— Ainda estou meio chocada por encontrar a Alana aqui na sua casa
— Diana diz quando Alana se vai.
— Então não imagina o meu choque quando cheguei e ela estava
deitada na minha varanda parecendo uma mendiga qualquer — resmungo
indo para a cozinha e ligando a cafeteira. Boris vem atrás de mim e deita
aos meus pés.
Ainda estou irritado por ter ouvido Alana me chamar de monstro.
Eu escutei boa parte da discussão das duas, antes de descer.
Alana é uma gnomo insuportável, mas nesta acusação talvez ela
esteja certa.
Eu me viro para encarar Diana.
— Também estou chocado de ver você aqui.
— Ainda está com raiva de mim.
— Não sei se um dia vai passar. — Não nego enquanto abro a
geladeira e pego alguns ovos.
Meu treinador ficaria horrorizado com este café da manhã.
Jamais podemos sair da linha. Mas quem se importa, não vou mais
aos Jogos de Inverno. Posso comer todas as gorduras saturadas até explodir.
De fato, pego meu celular em cima da bancada e mando um recado
para Landon, convidando-o para beber.
Não saio com Landon há um bom tempo, desde que começamos o
treino pesado para as Olimpíadas. Tudo o que eu fazia nos últimos meses
era acordar cedo, correr na praia, nadar. Comer alimentos que estivessem na
minha dieta restrita, treinar no ringue de patinação no mínimo seis horas por
dia. Sem contar musculação, ballet, pilates, passar o programa com a
coreógrafa e dormir cedo para estar bem disposto no dia seguinte para fazer
a mesma coisa.
Eu até mesmo não estava transando, quanto mais sair para beber e
curtir com meu melhor amigo. Eu achava que Diana também estivesse sob a
mesma pressão, mas parece que ela andou se divertindo por aí.
Só de pensar nisso já sinto a raiva me dominando de novo. Não, não
sei quando vou conseguir perdoar Diana.
Não dá.
— Acho que me precipitei vindo aqui hoje em busca de perdão, não
é?
Jogo os ovos na frigideira.
E não respondo.
A verdade é que não quero brigar com Diana.
Não quero gritar, perder o controle e Deus me livre partir para vias
de fato.
Respiro fundo e encho uma xícara de café. Pego meu celular e tem
um recado do meu pai pedindo que ligue pra ele, sinto um embrulho ruim
no estômago.
Não vai ser uma conversa fácil quando eu lhe contar o que
aconteceu.
Porém, por enquanto, ignoro a mensagem e escolho uma playlist
para ouvir. Ligo na caixa de som e os primeiros acordes de Nirvana com
Come as You Are enche a cozinha.
— Nunca vou entender como isso pode te acalmar — Diana
comenta e olha com censura para o prato de ovos que começo a devorar. —
Vai ter um ataque cardíaco comendo essas merdas gordurosas. Paul vai te
matar.
— Paul vai perder o emprego, afinal não precisamos mais dele.
Paul é nosso técnico.
Diana esboça um sorriso triste.
— Tem razão. Isso me lembra que precisamos falar com ele.
— Fale você, se vira.
— Não vai adiantar manter essa atitude.
— Foda-se.
— Já contou ao seu pai?
Eu engulo com dificuldade.
Certo, o café não está adiantando. Preciso de álcool.
Preciso de alguma coisa que me faça esquecer que minha vida virou
uma merda. Talvez o álcool seja pouco, preciso de uma boceta para
extravasar a fúria que começa a me dominar, embora eu tenha prometido
me controlar.
— Ainda não.
— Andrey vai ficar puto.
— Você acha? — Eu a encaro irritado. — Diana, sério, veio fazer o
que aqui? Por que não dá o fora e me deixa em paz?
— Eu não vim aqui só pra pedir desculpas, mais uma vez. Eu vim
ver como estava. Sabia que estaria mal.
— Sim, estou péssimo. E como se não tivesse que lidar com o fato
de que você me ferrou, ainda tem Tyler...
— Aquilo foi horrível, mas você não fez por mal.
— Acha que muda o fato de que ele está machucado?
— Não deveria ter se metido na desavença da Alana com a Kiara.
— Eu sei.
— Então por que se intrometeu?
— Alana estava falando um monte de merda para a Kiara...
— Kiara não precisa que a defenda.
— Eu estava defendendo você também. Estava com raiva das
mentiras que aquela gnomo filha da puta estava espalhando. E no fim, ela
tinha razão. Não eram mentiras. Agora estou ferrado e Alana também.
— Nem um dos dois tem culpa. Realmente não parece justo que não
compitam. Mas e se vocês formassem uma dupla?
Levanto o olhar do meu prato.
— Como é?
— Sim, por que não? Alana perdeu o parceiro e você também.
Podem formar uma nova dupla.
— Eu nem tenho por onde começar a explicar o quanto essa
sugestão é absurda.
— Não é tão absurda. Sei que tem pouquíssimo tempo para treinar e
se entrosar, mas...
— É só um dos motivos. Eu e Alana somos péssimos juntos.
— Isso foi quando tinham 13 anos. Alana é profissional agora e
você também.
— Alana me odeia.
— Ela odeia todo mundo, e daí? Só precisam treinar juntos e se
apresentarem. E mesmo que não haja tanta chance de medalha, pelo menos
estarão lá.
— Está falando um monte de bobagem! Acha que o comitê iria
permitir?
— Seu pai é Andrey Ivanov, claro que iriam dar um jeito de
permitir! Os dois foram classificados! Têm direito de estarem lá. Só que
agora juntos.
— Nunca daria certo. Alana é intragável.
— Dizem que você também.
— Mais um motivo, provavelmente nos mataríamos antes que
conseguíssemos fazer um programa completo.
— Eu acho que competir com Alana é melhor do que não competir.
Está há quatro anos se preparando pra isso. Não é justo que fique de fora. E
não é justo que Alana fique de fora também. Eu e Tyler já estamos, vocês
podem dar um jeito.
Engulo os ovos na minha boca, com a ajuda de um grande gole de
café enquanto Kurt Cobain grita com sua voz rouca nos alto-falantes. Por
um momento me recordo de estar levantando Alana, há dez anos, e a
derrubando no chão.
O olhar irritado do meu pai.
A frustação dela.
A minha própria impaciência.
E me lembro da Alana me encarando com raiva ontem na boate.
Seus punhos me agredindo e meu próprio punho se erguendo para revidar.
Não. Eu e Alana juntos é sinônimo de catástrofe.
— Está louca, isso não tem a menor chance de acontecer. —
Encerro a conversa e Diana se levanta, com uma expressão vencida.
— Certo. Eu dei minha sugestão. Agora preciso ir, vejo que não
quer minha companhia.
— Eu quero sua companhia mais que tudo. Desejei sua companhia e
foi minha pessoa preferida por todos esses anos. Não haja como se eu
tivesse ferrado com tudo quando é você que está fazendo isso.
Diana se encolhe com minhas palavras ferinas, mas ainda estou com
raiva.
— Vai embora — exijo, porque não quero mais brigar com ela.
Não vai adiantar nada.
Não muda o fato de que já tomou sua decisão e não foi a meu favor.
Ninguém nunca toma uma decisão a meu favor.
Estou sozinho de novo, como sempre.
***
Quando entro no quarto de hospital, ainda não sei o que vou dizer.
Mas desde que Diana me deixou sozinho com a bagunça que estava na
minha mente, eu me sentia cada vez mais angustiado e perdido.
Com o celular entre os dedos, hesitei durante algumas horas em
fazer o que já deveria ter feito. Comunicar Andrey de que tinha ferrado com
tudo.
Eu me sentia vazio.
Sem qualquer perspectiva.
Se me tirassem a patinação. O que sobrava?
E por um momento, me compadeci do Tyler e de muitas maneiras
senti-me pior por ele do que por mim.
Eu não escolhi aquele desfecho, mas Tyler tampouco.
Você não está machucado, ache uma parceira que substitua Diana e
entre naquele maldito ringue, nem que seja para perder. Uma voz que se
parecia muito com Diana ainda teimava em sussurrar dentro de mim.
Mas era um absurdo. Não havia tempo.
Não havia ninguém que se prestaria a isso.
A não ser Alana Percy.
A maldita gnomo encrenqueira.
Não. O inferno vai congelar antes que eu faça dupla com Alana.
No fim, Landon respondeu que também estava treinando. Landon é
jogador de hóquei e estará nas Olimpíadas com o time do Canadá, mas deve
ter percebido a urgência do meu convite em um momento como aquele,
pois prometeu vir até a minha casa no fim da noite.
Quase pedi para que ele trouxesse uma de suas amiguinhas. Landon
é um galinha que fazia jus a sua fama de galã do time, e fodia toda e
qualquer garota que aparecesse na sua frente. Mas hoje talvez apenas
desabafar com meu amigo sem ter que dar atenção a qualquer mulher
pegajosa seja a melhor pedida.
Eu terei muito tempo a partir de agora para recuperar o tempo
perdido. Pensei com amargor.
Então, decidi ir visitar Tyler. Eu devia isso a ele.
Embora, agora eu não saiba o que dizer quando me aproximo de sua
cama de hospital, sentindo a culpa apertar meu peito ao ver seu tornozelo
engessado sobre os lençóis.
— Ei, cara. Sou eu que estou quebrado, mas parece pior que eu —
Tyler comenta com um inesperado bom humor.
Eu abro um sorriso relutante.
— Em seu lugar eu teria pulado dessa cama, com tornozelo
engessado e tudo e matado o cara que me machucou.
— Fiquei sabendo que também está ferrado, não precisa que eu te
machuque. Sem contar que não faço o tipo do cara brutamonte que resolve
tudo na porrada.
— Eu também não.
Ele levanta a sobrancelha com ironia.
— Eu queria não ser. Acredita?
— Nunca achei que fosse uma má pessoa, Dimitri. Nunca brigamos,
nunca foi filho da puta comigo.
— Eu nunca quis te machucar. Eu jamais...
— Eu sei.
— Eu só queria...
— Defender a Kiara.
— E isso é ridículo, eu sei, mas a Alana... ela me tirou do sério.
— Alana não tem limites quando se trata de provocar os outros. É a
maneira que ela se defende.
— Se defender do quê? As pessoas que precisam se defender dos
ataques escrotos dela.
— Alana não é essa pessoa horrível que pinta.
— Desculpa se eu não acredito. Ela gosta de confusão. E ontem
estava caçando confusão com a Kiara.
— Disse bem, com a Kiara. Não com você.
— E eu estava puto por causa das fofocas com a Diana.
— Não eram fofocas.
— Eu não sabia... inferno, Diana ferrou com tudo. Acho que o
universo foi rápido em me punir, pelo que te causei.
— Sim, fiquei sabendo. Sinto muito. Você merecia estar nesses
jogos. Com certeza ia ser medalha.
— Você também merecia. Acho que até aquela gnomo maldita da
Alana merecia. É tudo uma merda. E eu nem sei como começar a te pedir
desculpas.
— Foi um acidente. Não estou te culpando.
— Alana está.
— Alana já não ia com a sua cara muito antes disso acontecer. Acho
que ela nunca superou que a trocou por Kiara.
— Não tive culpa. Nós éramos péssimos juntos. E agora Diana acha
que eu deveria convidar Alana a fazer uma dupla comigo, não sei de onde
ela tirou isso.
— Para agora?
— Sim, para competir nessas Olimpíadas. Não tem como dar certo.
— Mas pode ser uma boa, pensando bem... Deveriam competir
juntos.
— Mesmo que eu considerasse não temos tempo hábil. Jamais
ganharíamos qualquer coisa.
— Mas competiriam. Não ficariam de fora. Eu acho que deveria
pensar nisso.
— Alana jamais aceitaria.
Eu nem posso acreditar que estou começando a achar aquela ideia
não tão absurda.
A verdade é que eu quero estar naqueles jogos.
Quero mais que tudo.
E não quero decepcionar meu pai. Não quero que Andrey jogue na
minha cara que ferrei com tudo. Talvez pelo menos competindo com Alana,
possa não sair tão por baixo.
Mas como fazer com que duas pessoas que se odeiam confiem uma
na outra a este ponto?
— Eu sei que Alana é difícil. Mais do que ninguém, eu sei. Mas
também sei que ela é determinada. Que é dedicada e tem fogo correndo no
lugar de sangue quando se trata de competir. E ela está arrasada agora,
como você. Como eu e Diana. Mas você e Alana ainda podem ao menos
estarem nos Jogos Olímpicos. Podem superar a si mesmos, ainda que não
superem os outros competidores que tiveram mais tempo para treinar.
Quando chego em casa, ainda não sei como farei para convencer
Alana, mas sei que preciso tentar. Não me agrada ter que pedir o que quer
que seja àquela gnomo insuportável, mas agora que garanti ao meu pai que
achei a solução, não tenho escolha a não ser convencê-la que é uma boa
ideia ser minha parceira.
Eu passo uma mensagem a Diana e peço o celular da Alana. Diana
me pergunta por que e respondo que pensei em sua sugestão e que pretendo
fazer a proposta a Alana.
Diana me informa o número e pede que eu seja “educado e
humilde”.
Solto uma risada irônica.
Nem fodendo.
Subo para o quarto, hesitando em ligar, pensando em como abordá-
la. Intimidador e agressivo? Maduro e profissional?
Só sei que não estou a fim de ser humilde e educado com alguém
como Alana. Se vamos fazer isso juntos, ela precisa saber que estou no
comando.
Quando entro no banheiro, avisto um colar em cima da pia. Eu o
apanho e franzo o olhar para o pingente em forma de patins.
Só pode ser da Alana.
Certo. Tenho um motivo para entrar em contato.
Disco seu número e demora alguns toques para escutar sua voz.
— Alô? — ela atende, desconfiada. Provavelmente por não saber
quem é.
— Oi, é o Dimitri.
Ela desliga.
Simples assim, sem nem se dar ao trabalho de me ouvir.
— Inferno.
Disco de novo.
Ela atende com um “Vai se foder, Dimitri.”.
E desliga.
Eu insisto de novo.
— Se desligar na minha cara eu vou aí na sua casa agora — falo
rápido.
— Como conseguiu meu número?
— Com Diana.
— E por que está me ligando?
— Preciso conversar com você.
Ela ri.
— Conversar o quê? O que quer? Não temos nada pra falar! Aliás,
quero distância de você! Toda vez que estou perto de você alguma merda
acontece! Quebrou o tornozelo do meu parceiro, me desclassificou das
Olimpíadas, depois vomitou em mim e sem contar que ficou balançando
esse pinto fino na minha frente!
— Parece que meu pênis é um assunto que te marcou mesmo —
provoco.
— Ah vai se foder...
— Não desliga!
— Então fala logo o que quer.
— Conversar com você. Pode se encontrar comigo hoje à noite?
Ela fica em silêncio e acho que está em choque.
— Alana?
— Está pedindo para sair comigo?
— Não neste sentido. Quero conversar com você um assunto sério.
— Não tenho nenhum assunto em comum com você.
— Temos sim.
— Não. Me deixe em paz.
— Se você se recusar a se encontrar comigo, vou jogar no lixo algo
que achei aqui, que esqueceu na minha casa.
— Achou minha calcinha?
— Calcinha?
— Ah merda.
— Deixou sua maldita calcinha aqui?
— Provavelmente está na máquina de lavar, eu não achei, esquece.
— Não é sua calcinha velha. É seu colar.
— Não! Não joga meu colar fora.
— Tarde demais, estou jogando na privada...
— Por favor, esse colar é importante.
— Então temos um encontro?
— Credo, não fale nesses termos.
— Que termos?
— Não vou a um encontro com você e nem sei por que insiste em
falar comigo.
— É um assunto de seu interesse. Vou te buscar em uma hora.
— Não, nem pense em vir à minha casa.
— Certo. Vamos à pista de patinação no centro.
— Pista de patinação, sério?
— Lugar público. Achei que iria gostar. E claro, ouvi dizer que sabe
fazer algumas piruetas.
— Eu faço mais do que algumas piruetas.
— Acho que chegou a hora de provar. Daqui a uma hora. Se não for,
jogo seu lindo colar no esgoto.
Eu desligo e intrigado vou até a máquina de lavar.
Retiro minhas roupas que estão lá e, enganchado no fundo da
máquina, puxo uma peça de renda preta.
Estico entre os dedos o fio dental, um tanto chocado.
Alana Percy usa aquele tipo de calcinha? Acho que eu nunca
poderia imaginar. Não que eu perdesse meu tempo imaginando Alana Percy
de lingerie.
Embora agora não possa evitar minha mente traidora imaginando
exatamente isso.
Alana Percy usando aquela peça minúscula.
Merda.
É uma visão inesperadamente interessante que faz meu pau dar um
salto dentro da calça. O que é totalmente nojento.
Calma aí, cara. Não gostamos da Alana Percy.
— Uau, gostei.
Eu dou um pulo ao ouvir a voz atrás de mim e Landon está ali, me
encarando com um riso malicioso.
— Porra cara, quase me matou de susto.
— Estou vendo! Está usando calcinha agora, Dimi boy? Ou é de
alguma garota que anda pegando? Achei que estivesse celibatário e tudo o
mais...
— Nem um e nem outro. Sim, uma garota esqueceu aqui.
Ele levanta a sobrancelha.
— Longa história, mas não trepei com ela.
— Uma pena, uma garota que usa isso, deve ser bem quente. Se não
está pegando me apresenta.
— Não, não vai comer Alana Percy. — Faço uma careta.
— Alana Percy? Não é a patinadora?
— Sim, uma patinadora insuportável. Duvido que valha a pena
perder seu tempo com uma bruxa daquelas.
— Não tenho medo de bruxas, às vezes elas são até mais
interessantes do que as boazinhas.
— Sério, cara, você só pensa nisso?
— Não posso evitar. Agora me diz, por que me chamou aqui?
Eu olho a hora.
— Eu tenho que sair.
— Mas me chamou aqui...
— Sim, está tudo uma bagunça, mas se vier comigo, te conto no
caminho.
Quando estaciono o carro e saltamos, caminhamos em meio às
pessoas que passeiam por Downtown Vancouver, apesar do frio cortante.
Acabo de contar a Landon toda a confusão que aconteceu comigo nas
últimas 24 horas.
— Cara, como assim Diana está grávida? — Parece que foi tudo o
que ouviu.
— Antes que pergunte, não, não é meu.
— Eu nem ia perguntar...
— Acho que ia sim. Já me perguntou mil vezes por que eu não trepo
com a minha parceira. Como se eu fosse você, que transa com todo mundo.
— Mas transa com todo mundo menos com a Diana, até onde sei.
— Diana é minha parceira, nunca é uma boa ideia levar a parceria
no gelo para a cama.
— Cara... que merda! Ela contou quem é?
— O pai? Não. E no fim acho que nem faz diferença pra mim agora.
Ela ferrou com tudo engravidando. Não vai se livrar do bebê e estou sem
uma parceira.
— Mas acabou de dizer que quebrou o tornozelo do parceiro da
Alana Percy e por isso vai chamá-la para patinar contigo.
— Ainda nem sei se é uma boa ideia, mas é minha única saída no
momento. Só preciso convencê-la de que é a única solução para ela
também.
— E lá está ela.
Olho na direção que Landon aponta e Alana está se aproximando.
Assim como nós, ela veste um casaco pesado por cima das roupas, os
cabelos estão presos em um rabo de cavalo e ela se aproxima como quem
está indo para a briga.
Lá vamos nós.
Alana
Alana
Quando chego em casa à noite, para meu azar está rolando um jantar
de família com Peyton e o marido Jaxon.
Jaxon Johnson é um comentarista esportivo da TV local. Tem 38
anos e é tão arrogante quanto Peyton. Fazem o casal insuportável perfeito.
Meus pais os adoram.
— Finalmente em casa! Esqueceu que tínhamos jantar? — mamãe
reclama.
— Estava no pilates e depois tive ballet.
— Hoje? — Peyton questiona.
— Sim, agora aumentei a carga. Ordens do Paul.
— Paul? Achei que quem estava te treinando era Andrey...
— Ele chegará em duas semanas. Agora se me derem licença, vou
subir e tomar um banho, estou morta.
— Não, não. Vai tomar um banho e descer e jantar com a família —
mamãe exige.
Bufo, mas meneio a cabeça concordando.
Subo, tomo um banho e olho com pesar para minha cama.
Infelizmente, minha adorável família faz questão da minha presença
e eu nem sei por quê. Mesmo assim desço e escuto a conversa chata sobre
hóquei do meu pai com Jaxon e as perguntas intermináveis da Peyton sobre
meus treinos.
— Dimitri está sendo escroto?
Tenho vontade de dizer que sim, afinal é impossível Dimitri ser
agradável comigo, mas douro a pílula porque não quero Peyton achando
que tem que tomar minha defesa e se intrometer no meu treino como
Dimitri, só vai piorar tuto.
Tyler aguentava Peyton porque ele era um príncipe educado e gentil,
mas Dimitri não vai abaixar a cabeça para os desmandos da minha irmã, o
que só vai piorar ainda mais o que já está ruim.
— Você sabe, Dimitri sendo Dimitri. Está tudo sob controle. Só
precisamos entrar em sintonia, mas estamos trabalhando para isso.
— Ainda acho uma perda de tempo. Vai passar vergonha e...
— Ei, deixa sua irmã, querida — Jaxon a interrompe. — Ela não é
você, perfeita! De qualquer maneira, acha que ela conseguiria uma
medalha?
Engulo a vontade de cuspir em seu nariz idiota enquanto coloco
mais purê de babata em meu prato.
— Alana, está comendo demais — Peyton chama minha atenção.
Eu ignoro e engulo tudo e ponho mais.
— Para com isso!
— Alana, para de criancice! — Meu pai bate na mesa.
— Essa semana saiu a notícia que Kiara Willians é o rosto da nova
campanha da De Santi — Jaxon comenta.
A comida ganha gosto de papel na minha boca.
— Pois é. Aquela piranha — Peyton desdenha. — Aposto que está
dormindo com o Nick de Santi. Eu o conheci no centro. Tentei alertá-lo
para quem ela é, assim como a mãe dela...
— Não sabe se isso realmente aconteceu — Jaxon pondera.
— Ela envenenou a Alana sim!
Peyton está citando o último mundial quando não consegui
participar porque passei mal minutos antes de entrar no ringue.
Minha irmã cismou que foi Maude Willians, a mãe de Kiara que
envenenou minha comida.
— Agora Alana está a ponto de dar um vexame nas Olimpíadas e
Kiara vai se dar bem de novo! Isso é muito injusto! — Peyton continua.
Desde que me entendo por gente, Peyton odeia Kiara. No começo,
eu não entendia. Claro que Kiara era linda e a nova promessa da patinação,
mas não havia motivos para ter raiva dela. Eu já tinha certa inveja, mas
acho que era normal. Era mais como uma inspiração, uma vontade de ser
tão boa quanto ela. Porém, quando tomou meu lugar junto a Dimitri, o ódio
foi instalado com sucesso. E desde então, ele só aumentava, conforme Kiara
ascendia cada vez mais.
Peyton tem razão. Não é justo.
— Tudo pronto para o aniversário do Albie? — mamãe pergunta,
mudando de assunto.
— Está um horror organizar tudo! Mas vai ficar lindo.
— Por que não o trouxe hoje? — Se meu sobrinho estivesse ali, pelo
menos ele me distrairia da vontade de enfiar o garfo na minha mão.
— Ele ficou com a babá, tem natação amanhã cedo, não queria que
dormisse tarde.
— Ele é só uma criança, não está sobrecarregando ele? — indago.
— Deixar Albie ficar indisciplinado igual você até ser tarde demais?
Ele diz que quer patinar, então vai ter que se esforçar!
— Meu filho vai ser um grande jogador de hóquei — Jaxon diz.
— Achei que ele queria patinar no gelo.
— Não, ele vai ser jogador. Esporte de homem.
Rolo os olhos não respondendo.
Jaxon é um idiota machista. E Peyton é uma feminista fodona até o
marido falar merda e ela sorrir e abaixar a cabeça, como se tudo o que ele
falasse fosse incrível.
Meu Deus, se eu ficar assim por causa de um homem, por favor, me
mate.
Na manhã seguinte, chego ao ringue e Dimitri já está lá com Paul
porque eu não consegui acordar a tempo.
Coloco os patins e deslizo pelo gelo para aquecer, ignorando a
carranca do Dimitri.
— Que bom que se juntou a nós — provoca-me quando passo por
ele e levanto o dedo do meio, ainda escutando sua risada idiota.
— Muito bem. Hoje vamos para as sequências de spin — Paul
anuncia.
Respiro fundo, encobrindo meu estresse e concordo com a cabeça.
— Comecem com um camel.
No spin de duplo os dois patinadores giram ao redor de um eixo
enquanto seguram um no outro ou fazem o mesmo spin lado a lado. Os
spins de pares diferem entre si pela posição (sit, camel, upright ou suas
variações), pela direção das pernas livres dos parceiros, pela perna da
patinação e pelo jeito que um segura o outro, apenas um parceiro ou ambos
se abraçam com mãos diferentes.
Então eu e Dimitri deslizamos e levantamos as pernas enquanto nos
movimentamos e inclinamos o torço para segurar um na perna do outro,
aumentando a velocidade.
Da primeira vez, sai esquisito.
E Paul manda parar e começar de novo.
— Está no eixo errado, Alana.
Bufo e recomeço.
Repetimos o que parece milhões de vezes até passarmos para sit
spin, que são os giros sentados e revezamos várias posições. E consigo
manter minha concentração, assim como a aversão que sinto por ser Dimitri
que me segura.
E sim, eu vou chamar de aversão, porque me sinto muito mais à
vontade com isso do que a outra opção.
— Muito bem, a execução está razoável, mas claro que temos que
melhorar muito.
— Sabemos quem tem que melhorar — Dimitri debocha e eu não
respondo porque sei que é exatamente o que ele quer.
— Amanhã, levantamentos.
Saímos do ringue e desta vez sigo Dimitri para o carro dele como se
tivéssemos combinado e ele não fala nada.
Não vou reclamar das caronas, afinal, ele me deve isso.
— Animada para os levantamentos?
— Claro. Mal posso esperar para você quebrar meu pescoço quando
não conseguir me levantar direito.
— Ajudaria se não fosse tão ruim tecnicamente.
— Eu não sou ruim!
— Podia ser melhor...
— Por que não enfia sua opinião no rabo? Acha que me importo
com o que pensa de mim?
— Deveria, já que sou seu parceiro.
— Por enquanto! Se conseguirmos não nos matar até a Olimpíada,
depois quero distância de você!
— Digo o mesmo!
Desta vez ele para em frente à academia e eu salto, batendo a porta.
— Alana! — Dimitri grita e eu me viro.
— O quê?
— Vamos participar de um exhibition program em Toronto.
— Como assim... Nem pensar!
Exhibition program é uma apresentação de caráter não competitivo.
Ainda assim não acho que eu e Dimitri estamos prontos para tanto!
— Meu pai estará lá e ele já nos inscreveu. Então, a partir de
amanhã vamos começar a treinar nosso programa.
— Na creio que concordou com isso! Acha que estamos
preparados?
— Eu estou e acho bom você dar um jeito de estar também.
Ele sobe o vidro, saindo cantando pneu e me deixando ainda
chocada parada no mesmo lugar.
Capítulo 9
Dimitri
***
Em que momento eu achei que era uma boa ideia abrir minha casa
para os amigos de Landon?
Em outros tempos, quando não estivesse me preparando para uma
Olimpíada, eu poderia me permitir sair da linha.
Hoje, eu tento prestar atenção na conversa sobre hóquei entre Harry
e Mike, dois dos amigos de Landon do time de hóquei, sem querer me
levantar e ir dormir. Costumo me dar bem com os amigos de time de
Landon, muitos são meus amigos também. Eu prefiro a turma do hóquei à
da patinação. Até me pergunto por que não treinei hóquei em vez de
patinação artística. Obviamente, meu pai teve grande parcela de culpa na
minha escolha de esporte. Embora às vezes eu me questione se foi mesmo
uma escolha ou uma imposição.
Eu amo os ringues de patinação. Amo saber que sou bom. Não
consigo me imaginar fazendo outra coisa. Está no sangue Ivanov, já que
minha avó tinha patinado no gelo na Rússia no seu tempo.
Assim como meu pai, quando me aposentar dos ringues como
patinador, provavelmente serei técnico e professor.
Não que eu pare para pensar muito no futuro. Sempre achei que o
futuro é algo distante. Uma vez, Paul me indagou sobre futuro e eu não
soube muito bem o que responder, a não ser que provavelmente seguiria os
passos do meu pai, e ele riu, indagando se era só isso que eu pensava e
quando continuei sem responder, ele riu dizendo que era típico dos jovens,
achar que seríamos jovens para sempre e que teríamos todo o tempo do
mundo para escolher da maneira que queríamos viver.
E não sei qual o problema disso.
Hoje, minha vida é a patinação.
Eu quero me superar a cada prova. Superar outros competidores.
Ganhar o maior número de competições que conseguir. Forjar meu
nome no mundo da Patinação do Gelo como um dos grandes.
Talvez por eu ser atleta sobre pouco espaço na minha vida para
questões mais pessoais e íntimas.
Nada fica na frente da patinação.
Diversão, amigos, festas, sexo.
Eu gosto de tudo isso, mas todo o resto pode ficar em compasso de
espera, como agora.
Assim como eu jogo para o fundo da mente o fato de que, às vezes,
eu não reconheço a mim mesmo. Como na noite em que machuquei Kiara.
Como na noite em que machuquei Tyler.
Ignoro o fato de que, de vez em quando, olho no espelho e além dos
límpidos olhos claros dos Ivanov eu vejo o medo mais profundo de que um
dia, aquele outro lado, o lado mais sombrio, destrua tudo o que eu tenho.
E no momento, a única coisa que tenho é minha reputação na
Patinação Artística.
E não deixarei nada me tirar esta glória.
Eu preciso dela como referência de quem eu sou no mundo.
Para mostrar ao meu pai que, apesar de suas previsões, permaneço
em pé e ainda poderei ser tão bom quanto ele.
— Ei, Dimitri.
Molly se aproxima e senta ao meu lado, praticamente no meu colo,
o perfume doce que se desprende dela me enjoa.
— Ei, Molly.
Ela brinca com meus cabelos.
— Está sumido... Fiquei tão triste pelo que aconteceu com você e
Diana... Ela foi uma vaca.
Eu seguro sua mão.
— Nunca mais abra sua boca nojenta para falar da Diana.
— Nossa, calma! Mas sabe que tenho razão! Está todo mundo
comentando como foi injusto o que rolou! Assim como foi injusto o que
aconteceu com Tyler.
— Sério, por que não vai chupar o pau de algum cara do hóquei e
me deixa em paz?
Ela ri.
— Está de mau humor? Eu entendo. Também estaria se não pudesse
patinar nas Olimpíadas depois de me preparar tanto. Pelo menos a ridícula
da Alana também não vai. Mas por que não me ligou mais? Achei que a
gente se divertia...
Sim, eu já tinha saído com Molly algumas vezes, mas ela era tão
quente quanto cansativa. E quando o tesão acabou, não restou a menor
vontade de aguentar sua voz.
— Olha quem chegou! — Escuto a voz já bêbada de Landon que
está com alguns caras junto à porta e levanto a cabeça para ver Diana
entrando.
Ela faz uma careta quando Landon vai até ela e o empurra.
— Sai, está bêbado.
— Ei, antes era mais simpática.
Ela me vê e vem até mim.
— Sério que deixou esse babaca dar uma festa na sua casa?
— Era aniversário dele.
— Não parece estar se divertindo.
Ela olha para Molly e levanta a sobrancelha.
— De novo isso? Achei que tinha se cansado dela?
— Oi Diana, não está grávida demais para curtir essas festas? Não
deveria, sei lá, estar tirando leite dos seus peitos caídos?
— Pelo menos eu tenho peito.
— Vaca! — Molly se indigna.
— Tem alguma bebida que não seja alcoólica aqui? — Diana
questiona.
— Eu vou preparar algo pra você.
Eu me levanto, louco para me livrar de Molly, e vou pra cozinha.
Duas amiguinhas de Landon, Maria Patins, como eles chamavam as
meninas que seguiam os jogadores de hóquei, estão se beijando e eu as
empurro do meu caminho.
— Procurem um quarto.
— Quer vir com a gente?
— Não hoje.
Sim, acho que me sinto até um pouco tentado, mas me mantenho
concentrado em não fazer merda hoje.
Começo a preparar um drinque virgem para Diana e Landon entra
na cozinha.
— Ei, por que está com cara de bunda?
— Não estou bebendo, e você e seus amigos não são engraçados
quando eu não estou bêbado.
— Então beba.
— Tenho que viajar amanhã para Toronto. E farei uma apresentação
depois de amanhã.
— Vai ver seu velho, tinha esquecido. Outro motivo para beber.
Uma noite de liberdade! Você viu quem apareceu, sua parceira.
Eu levanto a cabeça olhando pra sala e lá está Alana.
Ela está vestida com uma calça preta de cintura baixa e um top
também escuro de mangas compridas. Os olhos maquiados se encontram
com os meus através das pessoas e ela dá de ombros como quem diz “não
fala nada”.
Um dos amigos de Landon se aproxima e coloca um cigarro
suspeito entre os dedos dela.
Praticamente voo em sua direção, mas quando chego lá Alana já
está tragando.
— Ficou louca? — Tiro o cigarro da sua mão.
— Seu idiota, me devolva.
— Não vai ficar chapada na minha casa.
— Nunca fiquei, e achei que as festas eram pra isso.
— Para você não.
— É meu pai agora?
Devolvo o cigarro para o amigo de Landon.
— Suma daqui com isso.
— Cara, a gata estava na minha. Ei gatinha, que tal um beijinho.
Ele se inclina para Alana e eu o empurro.
— Não entendeu?
— Dimitri. — A voz da Diana chega até a névoa de fúria e eu pisco.
Os dedos da Diana estão na minha blusa.
— Para, é só um cara bêbado.
— E se ele quiser dar em cima de mim, qual o problema? Cuida da
sua vida — Alana rebate.
— Deixa ela — Diana percebe meu olhar de raiva. — Não ficava
com raiva assim quando eu pegava seus amigos!
— Você sabia se cuidar.
— Sabia tanto que engravidou! — Alana refuta com um risinho de
deboche.
Diana enrubesce.
— Cadê minha bebida?
— Aqui. — Landon aparece segurando três copos.
Diana pega um.
— Trouxe um pra linda Alana. — Ele beija o rosto da Alana e lhe dá
a bebida.
— Para de ser escroto, Landon. — Diana faz cara de nojo, e uma
careta ao tomar sua bebida.
— Está batizada, seu idiota!
Ela me devolve.
— Landon, merda! — Eu tomo um gole e agora a bebida de pêssego
está cheia de vodka.
Landon ri.
Alana já tomou todo o seu copo. Porra!
— Diana está grávida, cara.
— E daí? Sou o pai agora pra tomar conta? — Ele dá de ombros e se
afasta puxando Alana junto para uma pequena pista de dança improvisada
onde umas Maria Patins estão dançando.
Mil vezes inferno.
— Esse cara é um sem noção — Diana reclama.
— Ele só está bêbado.
— E acho que ele quer pegar a Alana.
Eu olho na direção deles e quero dizer que não me importo.
Mas ver Alana rindo com Landon e parecendo se divertir,
provavelmente com a bebida que ela não está acostumada a beber já
fazendo efeito, me irrita pra cacete.
— Acho que vou embora — Diana diz.
— Não, fica. Por favor, não vou aguentar ficar aqui com este bando
de bêbados e Marias Patins sem você.
— Vou pegar uma Coca então.
Eu me sento e tento não ficar lançando olhares furiosos para Alana e
Landon que estão dançando hip hop.
Alana já está bebendo de novo e tenho vontade de ir até lá e
esmagar seu pescoço inconsequente. Amanhã vamos viajar, encontrar meu
pai e essa gnomo infeliz estará de ressaca.
Alguém passa uma cerveja e eu a pego.
Que se dane. Cansei de ser babá de gente sem noção.
Landon se joga ao meu lado rindo em determinado momento. Alana
continua dançando.
— Ela é muito gata, cara.
— Quem?
— Alana Percy. Como não tinha reparado? Olha como ele se mexe...
porra, imagina sentando em mim...
— Não vai comer a Alana.
— Por que não? — Ele ri. — Ou quer você comer ela?
— Não, não quero.
— Não reparou como ela é gata? Olha aquele cabelão e ela tem
peitos, reparou? As meninas da patinação geralmente não têm...
Sim, Alana tem mesmo um cabelo escuro e grosso que ela agora
joga para trás enquanto dança. E eu conhecia o corpo dela. Faz parte do
meu trabalho.
Mas até agora eu só tinha analisado o corpo da Alana como minha
parceira de patinação. Seu peso, a curvatura dos seus quadris, a barriga
plana, sim, seus seios que não são grandes, mas que o volume encheria
minha mão caso eu os pegasse.
Não que isso vá acontecer. Para patinar não é preciso apalpar os
seios da parceira, ou abocanhar...
Que porra estou pensando?
Já estou bêbado?
Merda, agora que Landon falou, eu não consigo desviar meu olhar.
Agora ela não é a Alana Percy, a gnomo chata.
Ou Alana Percy, minha parceira.
É Alana Percy, a garota sensual que dança toda vestida de preto no
meio da minha sala. Ela parece livre e quase feliz.
Se conseguisse capturar este momento e fazê-la usar isso na pista.
Seria incrível.
Seríamos incríveis.
— Vamos jogar! — Molly sugere pegando uma garrafa e agora
muita gente já foi embora e sobraram poucas pessoas que se juntam a ela
em uma roda no chão da sala.
Landon me puxa para o chão a contragosto.
— Que porra é essa, vocês têm 11 anos de idade? — Diana critica
sem se mover do sofá.
— Para de ser chata, mamãe — Molly brinca e Alana ri da piadinha
maldosa.
A cara dela fazer isso.
— Vem. — Eu puxo Diana para meu lado.
— Eu vou girar e em quem parar eu vou beijar! — Molly continua.
Será que ela esta tão desesperada para pegar alguém para inventar
essa brincadeira idiota?
Molly gira e a garrafa para em mim. Ela sorri com malícia e se
ajoelha, praticamente engatinhando até mim e me beija.
Olho para Alana quando Molly se afasta, e ela está rolando os olhos
com deboche.
— Minha vez — Landon levanta a mão e gira.
A garrafa para em frente à Diana.
— Nem pensar!
— Por que não, já nos beijamos antes, não?
— Não.
— Que chata!
— Gira de novo — Molly exige.
Alana está olhando para Diana e Landon de forma esquisita.
— Não vou participar de uma brincadeira de quinta série — Diana
defende sua posição se levantando.
Quero dizer que concordo com ela.
Por que não vão logo para o quarto fazer uma orgia decente como
adultos?
— Certo, vamos apimentar um pouco. O próximo vai para o armário
do Dimitri e vai ficar sete minutos lá — Molly diz animada.
— Pelo amor de Deus, sete minutos no céu? Agora em vez de 11
vocês têm 12 anos? — Diana ri.
— Sua vez, Alana. — Landon passa a garrafa para Alana.
Alana parece hesitante, mas roda e para em mim.
Vai se foder.
— Nem pensar. — Ela faz uma careta. — Vou rodar de novo.
— Não, não vale — alguém diz.
— Vale, sim, se ela não quiser beijar o Dimitri não beija, ou passa a
vez pra mim... — Molly sorri com malícia. — E não estou só falando de
beijar na boca.
— Ela não vai passar a vez — de repente eu me vejo dizendo
enquanto me levanto.
— Está de brincadeira? — Alana me encara chocada.
— Está com medo?
Por seu olhar passa várias emoções e para na fúria.
Mas ela aceita o desafio e se levanta.
Eu sigo até o armário e quando ela entra eu fecho a porta.
Está semiescuro ali e por um momento eu me pergunto que merda
estou fazendo.
— Não vai me beijar, não é? Isso é ridículo.
— Por que não? Não é o desafio?
— Porque eu não quero.
— Eu acho que quer sim.
— Só nos seus sonhos! Abre a porta.
— Não.
— Dimitri, não estou brincando.
— Nem eu.
Sua respiração vacila.
O que ela vai fazer?
Correr?
Fugir?
Eu apostaria tudo o que eu tenho – se eu tivesse algo que fosse meu.
Talvez minhas medalhas de ouro, que se ela se mover não vai ser pra
longe. Talvez eu esteja bêbado. Talvez esteja de saco cheio de fingir que
não reparei que sua boca é carnuda e perfeita para fincar meus dentes. Que
já não fantasiei aqueles mesmos lábios ao redor do meu pau que agora dá
um pulo dentro da minha calça somente com essa pequena fantasia sacana.
Que já pensei em calar seus insultos com a minha boca.
Muito lentamente, quase em câmera lenta, sem desviar o olhar, dou
um passo atrás.
Como previ, ela dá um passo na minha direção.
Porra.
Ainda assim, quero lhe dar a chance de ir. Se eu estiver entendido
errado os sinais, ou se ela simplesmente não quiser levar aquela loucura
adiante.
Estendo a mão para o lado e toco a maçaneta e a giro.
A mão dela cobre a minha.
Levanto uma sobrancelha com uma pergunta muda.
— Fecha essa maldita porta, Ivanov. — Sua voz sai rouca.
Exigente.
Malditamente sexy.
Que se foda.
Eu me inclino e beijo Alana Percy.
Capítulo 10
Alana
***
Acordo na manhã seguinte com dor de cabeça e o celular tocando.
Tiro o cabelo do rosto e o nome narcisista asqueroso brilha na tela.
— Ah droga!
Atendo bocejando e ainda perdida.
— Estou parado em frente a sua casa, por favor, diga que está
pronta. — A voz do Dimitri atravessa as várias camadas de confusão do
meu cérebro.
— Bom dia pra você também, babaca. — Eu me sento, com a
cabeça rodando.
— Alana, sério, você estava dormindo? — Sua voz está irritada
agora.
— Sim.
— Porra, mexa agora seu rabo preguiço até aqui. Tem dez minutos.
— Vinte.
E desligo.
Parece que um caminhão passou por cima de mim. E este caminhão
chama vodca, insensatez e Dimitri.
Tomo uma chuveirada rápida, escovo os dentes e me arrumo sem
pensar muito no que estou fazendo. Felizmente minha mala já estava
arrumada para a viagem. Então enfio as botas nos pés, pego minha mochila
e corro escada abaixo.
Não tem ninguém da minha casa no caminho e me recordo que hoje
é sábado e que meus pais costumam ir tomar café na casa da Peyton.
Ótimo, melhor que não tenha que me despedir e ouvir um monte de
merda. Desde que contei que iria para Toronto e que faríamos uma
apresentação não oficial, Peyton estava surtando.
— Não vai dar certo!
— Você não sabe se não vai!
— Estou te avisando, para o seu bem! Para não passar vergonha! Vai
jogar seu nome na lama, mas sinceramente lavo minhas mãos! Cansei!
Anos e anos te instruindo, dando tudo de mim, para você ser como eu, mas
parece que nunca vai rolar.
Eu queria dizer que eu não queria ser como ela. Mas era mentira.
Eu não comecei a patinar para ser como ela?
Agora eu abro a porta e está nevando.
Corro para o carro e me acomodo no banco do passageiro,
sacudindo a neve do meu cabelo, enquanto jogo minha mochila no banco de
trás.
— Está atrasada — resmunga e me entrega um copo da Starbucks.
— Que merda é essa?
— Não é isso que toma toda manhã?
Eu pego o copo, meio embasbacada. Não achei que ele prestasse
atenção.
Mas tomo um gole de café me sentindo mais humana quando o
líquido quente desliza por meu corpo como um abraço morno.
Embora minha cabeça ainda esteja latejando e eu fecho os olhos
gemendo e querendo morrer.
Dimitri está dirigindo rápido e com cara de poucos amigos.
— Está de ressaca?
— Se não tivesse dado uma festa na sua casa ontem e...
— Não tenho culpa se bebeu como uma piranha do hóquei.
— Ei! Não sou uma...
— Espero que se recomponha até chegarmos a Toronto. Está
horrível.
Eu olho minha imagem no espelho e realmente estou medonha.
Pálida e com olheiras.
Dimitri para em um engarrafamento e espia as horas.
— Se não sairmos daqui vamos nos atrasar...
Não respondo, encolhida, tomando meu café.
Porém, passa meia hora e ainda estamos seguindo para o aeroporto
em um trânsito lento.
E Dimitri está cada vez mais impaciente.
Entediada, abro minha bolsa e pego um blush e algumas maquiagens
tentando parecer minimamente apresentável e não um cadáver.
Posso sentir o olhar de desdém do Dimitri ao meu lado, mas não me
importo. Ele que enfie sua carranca mal-humorada no rabo cretino dele.
Mesmo porque não estou me arrumando porque ele me disse que
estava horrível. Pouco me importa o que pensa de mim.
— Que bom que está tão preocupada quanto eu com nosso voo —
resmunga.
Ocupada em passar lápis no olho, eu não respondo.
Dimitri arranca com o carro com velocidade, quando subitamente o
trânsito anda e eu me desequilibro, minha mão voando por meu rosto e
borrando meu traçado.
— Porra, olha o que fez, seu idiota!
Dimitri ri.
— Fez de propósito?
— Claro que não.
— Mas que droga!
Dimitri estaciona no aeroporto. Eu continuo tentando limpar meu
olho. Ele sai do carro e abre a porta pra mim, já com a minha mochila nas
costas assim como a dele.
— Vem logo.
— Não posso sair assim.
— Alana, vamos perder o voo!
Saio do carro a contragosto, agora parecendo um urso panda com
uma mancha preta embaixo do olho e sigo Dimitri pelo aeroporto. Porém,
nosso voo acabou de sair quando chegamos ao guichê da companhia.
— Satisfeita? — Dimitri reclama.
— A culpa não foi minha, foi do engarrafamento!
— Teríamos saído mais cedo se não tivesse se atrasado, inferno!
Bem, ele tem razão, mas não vou dar o braço a torcer.
Chegamos ao guichê e descobrimos que não há mais lugar para voos
para Toronto naquele dia.
— O que vamos fazer?
— Qual o próximo voo para o local mais próximo? — Dimitri
indaga à funcionária.
— Montreal.
— Certo, vamos para Montreal.
— O que vamos fazer em Montreal? — reclamo.
— Pegamos outro voo para Toronto quando chegar lá.
Ele compra passagem de Montreal para Toronto e eu não discuto,
porque Dimitri parece já ter tomado a decisão. Então apenas o sigo quando
entramos no avião e aproveito para fechar meus olhos e tentar dormir.
— Sério que vai dormir?
— Espera que eu faça o que em cinco horas de voo? E sim, estou de
ressaca. Espero que não faça nenhum desenho tosco no meu rosto — aviso
antes de fechar os olhos.
Durmo quase imediatamente e acordo com Dimitri me sacudindo.
— Vamos.
Abro os olhos, confusa e sonolenta.
Dimitri já está se levantando e tento tirar meu cinto, mas meus
movimentos estão lentos. Dimitri solta um palavrão e abre ele mesmo meu
cinto e me puxa para me levantar.
— Está bêbada ainda?
— Acho que dormi demais. — Bocejo e ele não solta minha mão
quando saímos da área de desembarque, pega nossas malas e seguimos para
fazer o check-in do próximo voo.
Eu o deixo para ir ao banheiro e quando retorno, ele não está com o
melhor dos humores.
— O que foi agora?
— Voos foram cancelados, por causa do tempo.
— Mentira? E estamos presos aqui? Eu sabia que não deveríamos
ter vindo pra cá!
— Não vamos ficar presos aqui, vamos alugar um carro e prosseguir
viagem. São cinco horas de estrada.
— Ah não, mais cinco horas.
— Ainda chegaremos a Toronto à noite.
— Certo, acho que não temos opção!
Capítulo 11
Alana
Decido não contar que por um infeliz acaso do destino vou ter que
dividir um quarto com ele.
Embora não seja a primeira vez, eu me recordo de que já dormi na
mesma cama que Dimitri na manhã da festa fatídica.
— Aqui está a chave, é no primeiro andar — a recepcionista avisa.
Eu sigo Dimitri pelas escadas.
— Já marcou um encontro com sua fã para mais tarde? Não espere
que eu fique no corredor esperando você transar!
Dimitri ri.
— Não é o que amigos fazem?
— Não sei se concordei com esses termos. Aliás, não lembro nem
de concordar em ser sua amiga.
— Tarde demais, parece que vamos passar por nosso batismo de
amizade.
— Como é?
— Acho que teremos nossa festa do pijama.
— Ah, pelo amor de Deus... você perguntou se tem duas camas
nesse quarto?
Dimitri chega em frente à porta e enfia a chave na fechadura.
E entra, acendendo a luz.
E meu olhar recai sobre a única cama do lugar.
— Que ótimo. Só tem uma cama.
Capítulo 12
Alana
— Alana?
Levanto a cabeça, quando Dimitri bate na porta.
— Está tudo bem? Está vomitando?
Droga.
Fecho o vaso e dou descarga.
— Estou bem...
— Precisa de alguma coisa?
— Não! — Eu me levanto e lavo a boca e escovo os dentes.
— Alana, está me preocupando. Deixa eu entrar.
Eu abro a porta e passo por ele.
— Credo, me deixa, vai dormir, falei que estou bem.
Mas antes que eu me deite, Dimitri me alcança e me faz encará-lo.
— Está com intoxicação? Alguma virose?
— Não tenho nada, só fiquei enjoada, já passou.
Mas ele toca minha testa como se para comprovar que estou bem e
eu rolo os olhos.
— Estou falando sério, vamos dormir!
— Precisa me falar se não estiver bem...
— Eu estou! Fique tranquilo, nada vai estragar nossa apresentação
manhã!
— Não falei por isso.
— Claro que está preocupado...
Nós nos enfiamos debaixo da coberta, de novo.
— Me acorda se não se sentir bem, ok?
Eu não respondo.
Forço minha respiração a desacelerar, até que tudo desaparece da
minha mente.
***
Chegamos a Toronto um pouco depois das nove da manhã e Dimitri
nos leva direto ao hotel onde o pai está hospedado.
Eu me sinto meio tensa com o encontro com Andrey, não tenho boas
lembranças da época em que ele me treinou com Dimitri, apesar de ter sido
por pouco tempo.
Sem contar que em poucas horas eu e Dimitri estaremos nos
apresentando como dupla pela primeira vez e eu quero só ver no que isso
vai dar.
E se Andrey me achar horrível como achou antes?
Dimitri vai acatar o que o pai mandar, quando Andrey dizer que ele
só podia estar louco em querer patinar comigo?
O bom de estar surtando por causa de Andrey e da apresentação é
que eu posso me distrair dos acontecimentos bizarros envolvendo
brincadeiras de caráter sexual trocadas com meu parceiro.
Acordei hoje de manhã, com Dimitri já arrumado e um tanto mal-
humorado, dizendo que se eu não me arrumasse em meia hora ia me deixar
para trás.
Ele saiu do quarto e por um instante eu me perguntei se tinha
imaginado a noite anterior.
Atordoada, me arrumei e desci em vinte minutos. Dimitri estava de
conversinha com a piranha da recepção que obviamente estava passando o
telefone para ele.
— Ela te convidou para fazer sexo por telefone? — Não consegui
evitar meu deboche quando entramos no carro.
— Por que quer saber?
— Não quero saber de nada não! Só estou curiosa de ter te passado
o número dela quando moram em cidades diferentes.
— Quando se está a fim de trepar a gente dá um jeito.
Fiz um careta de nojo e não toquei mais no assunto do Dimitri e sua
fã.
Dimitri não devia satisfação só porque tínhamos nos divertido de
forma sacana ontem à noite.
Agora entramos no hotel e seguimos para a sala de café, Andrey já
está lá.
Andrey é um homem grande e magro, com os mesmos olhos do
Dimitri, de uns cinquenta anos.
Ele se levanta e abraça Dimitri, mas não parece que sejam muito
amorosos.
E então seu olhar recai em mim.
— Como vai, Alana?
— Olá, estou bem. Quer dizer, estaria melhor se seu filho não
tivesse quebrado o tornozelo do meu parceiro...
Andrey gira para Dimitri.
— Do que ela está falando?
Dimitri está vermelho e me encarando como se fosse me matar.
— O quê? Não contou ao seu pai?
— O que aconteceu, Dimitri? — O tom de Andrey, que até aquele
momento estava neutro, se torna frio como o gelo.
— Alana, por que não vai se servir? — Andrey sugere.
Percebo que estou sendo dispensada e me afasto.
Melhor mesmo deixar que Dimitri preste satisfação ao pai dele.
— Por que não me contou tudo o que aprontou? — meu pai indaga
quando termino de lhe relatar a verdade sobre Tyler.
— Sabia que ia ficar puto comigo. — Dou de ombros na defensiva.
— E não tenho razão? Devia ter te levado para a Rússia comigo.
— Parecia feliz em se livrar de mim quando foi embora.
Até hoje eu não supero que meu pai tenha dado no pé na primeira
oportunidade. Mesmo eu já sendo um adulto. Ele aceitou o emprego no
comitê russo e não pensou duas vezes antes de ir para o outro lado do
mundo sem olhar para trás.
Desde então nos víamos apenas quando competimos nos mundiais e
ele estava lá com a equipe que dirigia. Saíamos para jantar eu lhe relatava
com orgulho minhas conquistas e Andrey balançava a cabeça sempre me
perguntando quando viria mais? Eu sempre poderia mais, nunca era o
suficiente.
— Essa carreira é curta, Dimitri, está no auge e precisa provar o
quanto é bom enquanto é tempo — ele dizia.
E eu vivia para isso.
Óbvio que ele estava furioso por eu ter perdido o controle e
machucado Tyler, colocando em risco minha reputação.
Reputação é algo muito importante para Andrey Ivanov.
— Tyler vai ficar bem.
— Mas você o tirou da competição por um tempo. Fez isso de
propósito?
— Claro que não! Que pergunta? O que acha que sou? Uma Tonya
Harding?
— Eu sabia que um dia esse seu jeito ia te pôr em problemas.
— Não estou com problemas por isso. Foi um acidente! — Eu me
defendo, embora esteja ciente da minha parcela de culpa.
E a mesma parcela de quando quebrei o nariz de um colega com
quem briguei em um jogo de futebol na escola com 14 anos.
Ou a parcela de quando saí na mão em um bar com um cara que deu
em cima de uma namorada com 16.
Ou quando Kiara me deixou.
E agora Tyler nocauteado.
— Sim, seu problema foi Diana Colombo.
— Já está superado. Sim, fiquei furioso e decepcionado com Diana,
mas ela tomou a decisão dela. O que eu podia fazer?
— E acha que Alana Percy é a solução? Essa menina não é boa o
suficiente para você.
— Estou vendo que estão falando de mim. — Alana escorrega na
cadeira ao meu lado.
E ouviu o que meu pai disse.
— Certamente estou questionando Dimitri se vocês são uma dupla
com algum potencial. A reputação do Dimitri está em jogo aqui.
— E a minha não? — rebate.
— Ei, ambos estamos no mesmo barco agora — eu me intrometo.
Não estou gostando do tom que meu pai está se dirigindo a Alana.
Sim, Alana tem suas limitações técnicas e eu sei disso agora mais do
que ninguém, mas se ela é minha parceira, os problemas dela são meus,
essa é a verdade.
Não vou jogá-la aos lobos.
Se ela cair. Eu caio junto.
Já está na hora de sermos uma unidade.
— É este o problema — meu pai continua.
Alana come ferozmente, parecendo furiosa.
— Nós estamos treinando e dando tudo o que podemos para fazer
dar certo.
— E acha que vai ser suficiente?
— O senhor está aqui para ajudar ou para nos colocar pra baixo? —
Eu me irrito.
Alana levanta a cabeça, prestando atenção, enquanto levanta ergue a
sobrancelha. Certamente ela nunca me viu contrariando Andrey.
— Quero ter certeza de que não estou perdendo meu tempo. E hoje
quero ver se vai valer mesmo a pena. — Ele olha pra Alana. — Deveria
estar comendo assim?
Alana para de mastigar no mesmo instante.
Eu me recordo dela vomitando na madrugada. Me deixou
preocupado que estivesse doente.
Na verdade, estou evitando pensar no que aconteceu antes de
dormirmos.
Como prometi a Alana, estou fingindo que nada aconteceu, porque
acho que é o melhor a fazer no momento. Hoje, ela é minha parceira.
Precisamos de unidade, concentração e conexão. Precisamos de um
programa minimamente decente para Andrey acreditar em nós.
Para nós mesmos acreditarmos.
E o que aconteceu ontem a noite foi inesperado, porém, inevitável.
Alana me irrita, mas também me excita e é recíproco.
Eu rompi com minha regra de não misturar parceria de gelo com
parceria sexual – embora não tivéssemos chegado ao ato propriamente dito.
Naquele momento em que iniciamos a conversa sobre sexo e Alana
me revelou que nunca teve uma transa decente e nem ao menos um
orgasmo, eu só queria lhe provar que valia a pena insistir em encontrar o
próprio prazer. Alana é puro fogo e fúria, eu não podia me conformar que
alguém como ela não gozasse da melhor sensação do mundo.
Não era pra menos que ela vivia de tão mau humor. Sexo é delicioso
e relaxante. Mesmo que seja sozinho.
E do mesmo jeito que estou me esforçando para a tornar melhor no
gelo, eu posso ajudá-la fora dele. Somos adultos. Ouso dizer que quase
somos amigos, ou estamos no caminho de o ser. Alana precisa relaxar.
Precisa gozar. Caramba, ela era minha parceira e eu poderia passar a vida
ouvindo-a gemer em êxtase se precisasse.
O único problema é que eu também queria me divertir com ela.
Também queria gozar nela.
Como fiz ontem.
E foi incrível e eu queria repetir a experiência.
Quem sabe agora, dentro dela?
Ainda não estou certo se é uma boa ideia.
Ainda não estou certo de que conseguirei impedir que aconteça,
mesmo não sendo uma boa ideia.
— Eu vou ao banheiro — Alana arrasta a cadeira e sai praticamente
correndo.
— Precisava falar assim com ela? — Eu me irrito.
— Se vou ser seu treinador, é minha obrigação. Vamos embora.
Na manhã seguinte, meu pai está puto comigo ainda enquanto nos
dirigimos para o Pacific Coliseum, por causa da confusão de ontem.
— Me desculpe pela briga. — Eu acabo rompendo o silêncio
quando chegamos.
— Acha que desculpas resolvem agora? Só prova o quanto imaturo
está ainda.
— Não foi minha intenção começar uma confusão.
— Nem deveria ter marcado aquela festa. Devia afastar-se desse
Landon, é um irresponsável, nem sei como consegue ter lugar no time de
hóquei.
— Porque ele é fenomenal. E é meu amigo, não vou me afastar dele.
Somos amigos desde criança.
Landon se mudou para a casa vizinha na época que minha mãe foi
embora e nos aproximamos porque nos identificamos. O pai do Landon era
viúvo e ele também não tinha mãe. Dois garotos perdidos.
— Não interessa. Precisa parar com essa mania de ser sentimental.
Se apega demais às pessoas. E é esse seu lado emocional exacerbado que o
faz perder o controle e depois se enfiar nessas brigas que sempre são pra
proteger alguém. Acho que já chega, não é?
— Não está sendo justo, pai.
— Sabe que tenho razão! Tem uma carreira brilhante no gelo, não
jogue fora colocando suas emoções na frente da razão.
— No gelo, eu sempre sou racional.
— Tem certeza? Alana Percy está te desestabilizando.
— Não é assim.
— Eu já percebi que estão dormindo juntos.
— Isso não está atrapalhando em nada — afirmo, mas sei que é
mentira.
Assim como meu pai sabe.
— Alana não deve te tirar do seu caminho. Termine esse casinho
antes que seja tarde.
— Acho que já chegou ao fim — rebato frustrado.
— Ótimo. Espero que isso não atrapalhe o desempenho.
— Não vai.
— Com você talvez não. Mas Alana é emocional, e qualquer coisa
lhe tira concentração. É péssimo. Nem pense em mantê-la como sua
parceira, vai te arruinar.
Antes que eu responda, ele se afasta.
Vou para o camarim que me foi designado e Alana já está lá. Ela
está vestida e se maquiando e sem nem se dar ao trabalho de olhar pra
mim, se levanta, pega seus patins e sai do camarim.
— Gnomo teimosa do caralho — grito antes de ela sair e ela se volta
e mostra o dedo do meio, antes de bater a porta.
Eu me arrumo e quando chego ao corredor, Alana está se
aquecendo.
— Oi, Alana.
— Oi, babaca filho da puta.
Já vamos nós.
— Vai agir assim agora?
— Quer que eu aja como?
Ela se levanta me encarando furiosa.
— Contou a Peyton...
— Eu tive que contar. Precisa de ajuda.
— Quem é você pra me ferrar desse jeito?
— Sou seu parceiro.
— Não por muito tempo.
— É isso que quer?
— Claro que sim! Não veja a hora de me livrar de você! Não sabe a
raiva que estou neste momento! — Ela pisca, querendo chorar e isso me
quebra.
Ela se vira, para se afastar, mas seguro seu braço.
— Eu não fiz por mal, muito pelo contrário...
— Acha que acredito? — Puxa o braço.
— Para de ser uma bruxa irracional, pelo menos um momento! —
Começo a me irritar.
— Não estou sendo irracional. Estou sendo bem racional e
acordando para o fato de que me envolver com você foi um erro.
— Tem certeza?
— Chegou a vez de vocês — meu pai nos chama.
Alana passa por mim bufando e entra na pista de gelo. Eu a sigo
com o humor tão ácido quanto o dela.
Nós nos encaramos como adversários e a música começa.
Patinamos com raiva e determinação e antes mesmo que aconteça eu
sei que vai dar merda.
E não demora para eu derrubá-la quando a levanto no throw jump.
Alana se levanta furiosa para prosseguirmos e terminamos o
programa sem mais acidentes.
Quando chegamos à mureta de proteção, Andrey está nos
aguardando.
— Precisam melhorar muito.
— Seu filho é um imbecil e me deixou cair! — Alana reclama.
— Você errou o tempo! — rebato também irritado.
— Chega vocês dois. Vamos melhorar o que tem que ser melhorado,
não vão me envergonhar... — Andrey sibila com autoridade.
— Olá, Andrey — Nádia, a treinadora da Kiara e do Chris, se
aproxima.
Eu me viro e vejo Kiara e Chris atrás dela.
Kiara parece extremamente perturbada. Qual o problema dela?
Sinto-me um tanto preocupado com sua palidez e olheiras embaixo dos
olhos claros.
Não consigo me livrar do carinho que sinto por Kiara do mesmo
jeito que não consigo me livrar do carinho por Diana.
Estarão sempre ali, acho.
E Alana também vai estar, mesmo que ela tente matar tudo o que eu
sinto com sua hostilidade.
— Vamos, Kiara, concentre-se. — Maude, a mãe de Kiara, se
aproxima, segurando o braço da filha. — Não perca o foco!
Meu pai se afasta passando por Kiara que está sentada agora tirando
as proteções dos patins para entrar na pista.
Eu sorrio e pisco pra ela.
— Boa sorte!
Alana bufa, soltando um palavrão baixo, sentando ao lado de Kiara
para colocar as proteções dos patins.
— Nem precisa de boa sorte, depois deste imbecil me deixar cair e
quase quebrar meu nariz qualquer apresentação vai ser melhor — dardeja,
me irritando por insistir em pôr toda a culpa em mim.
— Você podia deixar de ser uma vaca e parar de reclamar! Estou
cansado de você gritando comigo o tempo todo.
— Dimitri, não fale assim com ela.
Kiara me surpreende quando se intromete.
Eu e Alana nos viramos para ela, surpresos por se dar ao trabalho de
defender Alana.
— Se detestavam um ao outro nem deveriam formar uma dupla! —
Kiara continua. — Provavelmente você a deixou cair porque não tem
conexão e nunca vai ter se não se permitirem! Você sabe disso, Dimitri. Não
é culpa só da Alana! E chamar ela de vaca, embora ela seja mesmo, não vai
adiantar nada! Ela é uma vaca, mas é sua parceira. Deveria matar e morrer
por ela. E nunca a deixar cair.
E ela se levanta, passando por nós e entrando na pista seguida por
Chris.
Alana
Não sei quanto tempo se passa até que ela consiga voltar a si.
Eu a solto, quando noto que ela está respirando normal e a cor
voltou ao seu rosto.
Que merda aconteceu com ela?
Kiara se encosta na parede e fecha os olhos
Eu me movo para trancar a porta e me recosto ao seu lado.
— Eu não sabia que você tinha... esses ataques — comento curiosa.
É uma surpresa que a perfeita Kiara Willians tenha seus demônios.
Ela os manteve muito bem escondidos.
— Eu não tenho. Quer dizer, não é algo habitual.
— Não tem diagnóstico, quer dizer?
— Parece saber muito disso.
— Todos nós temos nossos esqueletos, não é? Eu devia imaginar
que a princesinha tinha os seus.
— Vai começar a brigar comigo agora?
— Acho que não devo chutar cachorro morto, não é o que dizem?
— Por que me odeia?
— Eu odeio todo mundo e boa parte do tempo também odeio a mim
mesma. Então, não se sinta especial — rebato com minha ironia habitual.
— E odeia Dimitri.
— Atualmente, mais que todo mundo. Você o odiava também, por
isso o deixou?
— Não foi por isso.
— O que aconteceu hoje?
— Eu a deixei... Eu a deixei e não sei o que fazer agora que ela está
aqui...
— Deixou quem? — Eu me sinto confusa.
De quem Kiara está falando?
— Minha filha... Há cinco anos.
Eu arregalo os olhos, em choque.
— Porra, você tem uma filha?
Minha nossa!
Antes que Kiara possa me responder, escutamos alguém mexendo
na maçaneta da porta.
— Alana, abra essa porta.
É Dimitri.
— Vai embora! — grito.
— Por que está trancada aí? Se não abrir eu vou arrombar.
— Dimitri, eu mandei você ir embora!
Então de repente a porta se abre e Dimitri está na nossa frente.
— Qual o seu problema? — Eu me levanto irritada. — A porta
estava trancada!
— E eu tenho a chave! Eu sabia que podia começar com suas
gracinhas e...
Eu entendo o que ele quer dizer.
Ele achou que estivesse vomitando.
De repente ele vira e nota Kiara.
— Kiara? Estão todos atrás de você! Me disseram que teve um
problema ou algo assim na sua apresentação... O que você tem? — Ele
parece reparar no rosto inchado de chorar da Kiara e me encara com os
olhos cheios de acusação. — Que merda fez com ela, sua bruxinha filha da
puta...
— Ei, eu não fiz nada!
— Dimitri, Alana não fez nada — Kiara indossa. — Na verdade, ela
me ajudou.
— Alana? Te ajudou? Você odeia a Kiara. — Ele me encara
incrédulo.
— Eu não odeio!
— Claro, seu problema, na verdade, é inveja.
— Ah, cale a boca!
— Cale a boca você!
E ele se abaixa em frente à Kiara.
— Kiara, está me preocupando pra cacete, o que está acontecendo?
— Alana, pode nos deixar a sós? — Kiara pede.
— O quê... — De repente algo me ocorre e eu empalideço. — Ah
meu Deus, o bebê era do Dimitri!
— Que bebê? — Dimitri olha de Kiara pra mim, confuso.
— Não, mas eu preciso falar com Dimitri, por favor? — Kiara
insiste.
E eu não sei o que está acontecendo, mas percebo a seriedade da
situação e assinto.
— Avise para o Chris que estou aqui. A mais ninguém E peça para
ele me esperar aí fora.
— Tudo bem.
Eu saio e fecho a porta atrás de mim e me recosto nela.
Ah minha nossa, o que foi isso tudo?
Kiara tem uma filha?
E o que Dimitri tem a ver com o assunto? Ela disse que o bebê não
é dele. Então, era de quem?
Dimitri
Não sei quanto tempo ficamos abraçados. Até que ela me solta e diz
que devo ver onde está Alana.
Eu volto para a sala e Alana está adormecida no sofá.
— Ah pobrezinha. Ela parece cansada.
— Ela brigou com a família.
Eu conto à minha mãe um resumo da situação de Alana.
— Podem ficar aqui, o quanto quiserem.
— Obrigado.
— Leve-a para o quarto e deixe descansar.
Eu pego Alana no colo e faço o que minha mãe pediu.
Ela deve estar mesmo exausta porque não acordou. Eu a cubro me
perguntando o que será de nós agora.
Mas de uma coisa é certa. Não vou largar a mão da Alana.
Ela é cheia de problemas, mas se ela permitir, eu vou assumir
aqueles problemas como meus.
FIM
Agradecimentos
Grande abraço.
Ju
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