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1ª.

Edição
2023
Copyright © Julia
Fernandes
Todos os direitos reservados.

Criado no Brasil.

Edição Digital: Gialui Design

Revisão: Grupo TBJ

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as


pessoas. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos
descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é
mera coincidência.

São proibidos o armazenamento e/ou a reprodução de


qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios –
tangíveis ou intangíveis – sem o consentimento escrito da
autora.

A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei


n°. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Sumário
Copyright © Julia Fernandes
Sumário
Sinopse
Prólogo
Capítulo um
Capítulo dois
Capítulo três
Capítulo quatro
Capítulo cinco
Capítulo seis
Capítulo sete
Capítulo oito
Capítulo nove
Capítulo dez
Capítulo onze
Capítulo doze
Capítulo treze
Capítulo catorze
Capítulo quinze
Capítulo dezesseis
Capítulo dezessete
Capítulo dezoito
Capítulo dezenove
Capítulo vinte
Capítulo vinte e um
Capítulo vinte e dois
Capítulo vinte e três
Capítulo vinte e quatro
Capítulo vinte e cinco
Capítulo vinte e seis
Capítulo vinte e sete
Capítulo vinte e oito
Capítulo vinte e nove
Capítulo trinta
Capítulo trinta e um
Capítulo trinta e dois
Capítulo trinta e três
Capítulo trinta e quatro
Capítulo trinta e cinco
Capítulo trinta e seis
Capítulo trinta e sete
Capítulo trinta e oito
Capítulo trinta e nove
Capítulo quarenta
Capítulo quarenta e um
Capítulo quarenta e dois
Capítulo quarenta e três
Capítulo quarenta e quatro
Epílogo
Conheça a história dos outros Angels
Playlist
Sobre a Autora
Dedicado a João Paulo,
Larah
e a todas as Marias
O amor é um jogo que tem que ser
jogado com um parceiro. Cabe a você,
escolher o melhor jogador para assumir o
player two.
Sinopse
Eles sabiam que era proibido, que não deviam se
envolver, mas com a convivência foi impossível não se
renderem à tentação.

Gustavo vivia como desejava, proprietário de uma


casa noturna de sucesso, solteiro desapegado e considerado
tão atraente quanto inalcançável, era o desejo da maioria
das frequentadoras do Clube Angels.

Lívia dava o primeiro passo para realizar um sonho:


se tornava estudante de medicina. E para iniciar os estudos
longe da cidade natal, recebeu como exigência da família,
morar com o primo Gustavo que não via há algum tempo.

A convivência os aproximou e para o ajudar, Lívia


aceitou um namoro de mentira para enganar a ex-
namorada do empresário, porém, o que era para ser apenas
um faking love despretensioso, acabou se tornando um
emaranhado de desejo reprimido, sim e não, querer e não
poder, seguir e retroceder.

Impulsivos e ciumentos, ambos metem os pés pelas


mãos e acabam lutando contra muito mais do que só o
vínculo de família que os impedem de viver o amor e juntos
terão que descobrir um jeito de arrumar a bagunça que
criaram.

Obs.: Livro publicado anteriormente como Gustavo –


o amor proibido, por Julia Fernandes.
Prólogo
Lívia com cinco anos
Estou fazendo cinco anos e toda minha família e
amigos cantam parabéns para mim.

— E pra princesa Lívia, nada? — meu pai pergunta.


Ele me chama de princesa desde quando eu estava na
barriga da mamãe e todos acabaram me chamando assim
por causa dele.

— Tudo! — os convidados respondem e continuam a


cantar.

Do outro lado da mesa consigo enxergar meu primo


Gustavo, sorrindo e batendo palmas. Ele tem dez anos e
desde que nasci é meu melhor amigo, mesmo, às vezes,
querendo me deixar de lado para brincar com os meninos
da rua e com a Aninha, aquela feia.

A canção de parabéns acabou e estão todos


esperando que eu responda à pergunta de para quem é o
primeiro pedaço do bolo. E claro, o entrego para meu primo
Gu.
Ele é filho da minha tia Vic, que é irmã do meu pai e
sempre foi melhor amiga da minha mãe, e filho do meu tio
Nic que sempre foi melhor amigo do meu pai.

Meus primeiros pedaços de bolo sempre foram para


Gu, desde o primeiro aninho e nunca vai ser diferente.

Amo papai e mamãe, mas já os expliquei que o


primeiro pedaço é sempre para o Gustavo, porque ele que
brinca comigo, me defende quando os meninos da rua
tentam me chatear, me ensina a surfar, é o Ken da minha
Barbie quando a gente brinca de casamento, mas ele pede
para não contar isso para ninguém.

Ah! E quando brincamos de médico, é sempre o


atropelado e eu sou a médica que cura os dodóis dele.

Quando estamos brincando de médico, papai sempre


faz cara feia para nós, fala para Gu que está de olho e
depois, ri quando a mamãe briga, mandando-o parar de
falar besteira, pois somos primos.

Nunca entendo o motivo dele estar de olho no Gu.

Entrego o primeiro pedaço do bolo para o meu primo,


que me deu um abraço, um sorriso e todos batem palmas
enquanto a mamãe tira uma foto.

Gu se parece muito com o tio Nic, ele tem um olhão


azul da cor do mar. Sempre quis ter o olho dele, é tão lindo!
Tem o cabelo amarelo da cor do sol, e sempre que digo isso,
ele ri e diz que tenho mania de comparar as cores de tudo.

Dizem que sou muito parecida com a mamãe, mas


tenho o cabelo cor de carvão do papai, os cílios cheios como
os dele e puxei o olho cor de mel da vó Eliza. Na verdade,
acho que pareço um pouquinho com cada um, mas fico feliz
quando dizem que pareço com a mamãe.

Ela é tão linda, quando crescer quero ser igual a ela e


ter um príncipe lindo igual ao papai.
Capítulo um
Lívia anos depois
Encontrava-me no carro com meu pai, mãe e irmão,
indo a caminho da casa do meu primo Gustavo. Relutei um
pouco a me mudar para lá, mas não tive alternativa, já que
passei no vestibular para cursar medicina e morar com ele
era a única opção.

Minha família se via cheia de orgulho, principalmente


meu pai que também era médico. Foi por influência dele,
que desde que me conhecia por gente que sonhava em ser
médica e coloquei como meta para minha vida realizar esse
sonho. Fiz diversos cursinhos até finalmente me sentir
pronta a prestar o vestibular.

Não passei na primeira tentativa e foi um balde de


água fria, mas meu pai, que fez do meu sonho o dele, não
me deixou desistir, insisti, até que por fim consegui.

Eu tinha vinte e um anos, nova, mas não era criança,


carregava a consciência que para buscar meus sonhos,
talvez tivesse que renunciar a algumas coisas que não me
agregavam... inclusive, a primeira renúncia foi meu
namorado.

Ele não era lá grandes coisas e, para ser sincera, até


me vi aliviada e pensava que Deus ouviu minhas preces
justamente na parte que pedi: “livrai-me do mal”.

Com o término descobri que Fábio não era um


exemplo de namorado.

Problema dele!

Ele quem perdeu a chance de ter para sempre a


excelente namorada que eu era.

Desde o início eu sabia que o “felizes para sempre”


não seria uma alternativa para nós, afinal, Fábio e eu já não
estávamos bem há algum tempo. Ele não aceitava que eu
saísse de Cananéia, a cidade em que morávamos, para
estudar, mas como lá não tinha universidade, eu teria de ir
e teríamos que namorar a distância, mesmo eu não me
mudando para tão longe assim.

Minha casa nova ficava a umas duas horas de carro


de Cananéia, mas como não existia mais amor entre nós, a
relação acabou de uma vez.

Repensei e cheguei à conclusão de que nunca houve


amor, estávamos juntos por comodidade e eu partir e ele
não querer assumir uma relação à distância, foi à gota
d’água para o término.

Duas horas para eu ir para Cananéia em um final de


semana era pouco, mas para ir e voltar todo dia era muito,
então por isso, quando meu primo Gustavo nos ofereceu o
apartamento dele para eu morar enquanto estudava, foi o
combinado perfeito e meus pais logo concordaram.

Eu não via meu primo há alguns Natais, quando ele


foi até Cananéia festejar com a família. Gu e eu sempre
fomos muito amigos, quando nasci ele tinha cinco anos.
Aliás, meus pais estavam brigados e tiveram uma recaída
no aniversário dele, nove meses depois eu nasci.

Na infância assumiu o papel de irmão mais velho e


sempre teve uma tendência a cuidar de mim.

Olhando para fora do carro, um sorriso feliz tomou


meus lábios quando me lembrei que ele sempre me chamou
de princesa... ou pirralha quando estava bravo comigo ou
queria me irritar.

Relembrei o momento em que a adolescência chegou


e meio que nos afastamos por culpa da diferença de idade
que tínhamos. Enquanto com quinze ele pensava nas
meninas, eu com dez, ainda queria brincar na rua, depois
com dezoito ele foi estudar na cidade grande e eu fiquei em
Cananéia e assim fomos nos distanciando aos poucos.

Ainda nos dávamos bem, claro, a ponto dele me


convidar a dividir seu apartamento, mas só nos víamos nas
festas e reuniões de família. Sendo assim, não tínhamos
tanta intimidade quanto antes dele descobrir as meninas e
eu parar de dar os primeiros pedaços do meu bolo de
aniversário para ele.

Enquanto olhava as árvores passando do lado de fora


do carro, pensei que não sabia como seria nossa
convivência, mas mesmo que não nos déssemos bem, eu
tentaria fazer o possível para aguentar firme e fazer dar
certo.
Meu pai já havia me dito que eu não podia morar em
república nem sozinha, porque isso deixaria minhas avós
muito preocupadas e ambas deixariam meus pais doidos.
Então, meu primo era a única opção.

Esperava que ele fosse fácil de lidar e fizesse minha


vida um pouco confortável.

— Lili, toda vez que você vier nos visitar em


Cananéia, você traz presente para mim? — perguntou meu
irmão Pedro Luiz, seu nome era em homenagem aos dois
avôs.

Com seus poucos sete anos, nós o chamávamos de


raspinha do tacho, já que minha mãe o teve quando eu já
estava com quatorze.

Desde que eu tinha cinco anos, ela e meu pai


tentavam ter outro filho e não conseguiam. Quando já
haviam desistido e nem esperavam mais, Pepê chegou, um
menino lindo, que eu amava mais que a mim mesma.

— Pode ser uma bala?

Ele sorriu.

— Credo, Lili, sua mão de vaca! Só uma bala?

— Pepê, vou ser uma estudante, desempregada e


morando de favor na casa do primo, tenha dó de mim. —
Baguncei o cabelo dele.

— Princesa, já disse que vou te enviar uma quantia


mensal, para você se manter e para ajudar seu primo nas
despesas — meu pai se intrometeu na conversa.
— Ah, pai, eu sei, mas quero arrumar um emprego
quando chegar lá. Quero começar minha vida como você e
a mãe começaram a de vocês, trabalhando e estudando.
Sendo independente. — Sorri para ele, que me encarava
pelo retrovisor.

— Filha, podemos te ajudar financeiramente, você


não vai precisar trabalhar — minha mãe interveio.

— Eu gostaria, mas se é para vocês ficarem mais


tranquilos eu vou adiar o trabalho o quanto puder.

Ela sorriu, virou-se para frente olhando a estrada e vi


orgulho em seu olhar. Pensei que ela via muito dela em
mim.

Seguimos o caminho rindo e brincando em família


como sempre fizemos. Pepê podia não assumir, mas eu
sabia que ele ia morrer de saudade de mim.

Não demorou até que chegamos ao prédio do meu


primo, o porteiro o avisou que estávamos ali e logo Gu
desceu para nos receber e nos levar até o seu apartamento.

— E aí, pirralha? — disse enquanto me abraçava.

— Princesa — o corrigi, como sempre na nossa


brincadeira de criança.

— E aí, tio, beleza? — cumprimentou ao meu pai o


dando um abraço.

— Tudo certo. Vim trazer minha joia preciosa pra


você cuidar para mim. — Revirei os olhos para meu pai.
Como ele era babão.
— Vou ser seus olhos aqui, tio. Ela vai andar na linha
e marmanjo nenhum vai chegar perto dela.

— Menos, Gu — resmunguei e me lembrei do quanto


ele me tirava do sério, todas as vezes que nos víamos,
depois que entrei na idade em que descobri os meninos.

— Oi, tia, continua gata, como sempre. — Minha mãe


sorriu e agradeceu.

Não tinha mais tanto contato com meu primo quanto


gostaria, mas só de vê-lo de novo, sempre voltava nossas
brincadeiras e a proximidade do passado e, com isso,
finalmente me senti mais calma e confiante que tudo ia dar
certo.

Enquanto subíamos até o andar do Gu, no elevador


meu pai e ele seguiam conversando sobre amenidades e
sobre a casa noturna que meu primo era dono.

Gustavo quando criança, assim como eu, queria


seguir os passos do pai e sonhava em ser advogado, mas
durante a faculdade para ganhar um dinheiro extra, ele e
mais três amigos começaram a organizar festas que ficaram
famosas entre os alunos do campus, arrastando a fama para
as faculdades e cursinhos vizinhos.

Os quatro começaram a alugar local para as festas, a


cobrar entrada, fizeram eventos cada vez mais elaborados,
com filas de espera para entrar e assim foram levantando
um bom dinheiro. Quando terminaram a faculdade aos vinte
e cinco anos, pegaram o diploma, o dinheiro que juntaram
em anos de curso e eventos e abriram a melhor casa
noturna da cidade, o Clube Angels.

Aos vinte e seis anos ele e os amigos Fernando,


Rodrigo e João já eram os empresários mais promissores do
ramo e a casa noturna se tornou sua única fonte de renda.

Chegamos ao apartamento e ele abriu a porta para


que entrássemos. Pepê foi logo correndo para sala, que era
toda em branco, tinha um lindo sofá também branco em “L”,
uma TV enorme na parede com um videogame
supermoderno conectado e um aparelho de som que
quando ligado, daria para dar som a uma rave com certeza.

Meninos e seus brinquedos...

Eu era alegre e adorava dançar, já me imaginei


dançando na rave, mas que de imediato me repreendi
mentalmente:

Eiii... Foco, Lívia. Você está aqui para estudar!

Gu me levou até onde seria meu quarto, que era


também todo em branco e muito confortável. Vi um vaso
com rosas amarelas em cima da cômoda, minhas
preferidas, e achei fofo ele ter tido o cuidado de colocá-las
lá para me agradar.

— Que lindas, Gu. Obrigada.

Deu de ombros.

— Lembrei que você adorava amarelo. Lembro que


falava quando éramos pequenos que amava o amarelo,
porque era da cor do sol e quando tinha sol, tinha praia e
sorvete. — Rimos. Eu ainda amava o amarelo pelos mesmos
motivos. — Seja bem-vinda!

Ele parecia tímido por tentar me agradar e eu lhe


lancei um sorriso.
Voltamos para sala, Gu nos mostrou o resto do
apartamento e vi que era confortável, mas com cara de
apartamento de homem. Com três quartos, um era o meu, o
outro o dele e o terceiro foi adaptado como quarto de jogos
e integrado a sala. Nele encontrava-se uma mesa de bilhar
e um bar.

Pelo jeito meu primo gostava de receber visitas e eu


só esperava que essas visitas não se importassem com a
minha presença.

A conversa se estendeu, Gu nos serviu café e nos


contou sobre o seu trabalho, sobre a cidade e sobre minhas
aulas que começariam em uma semana. Disse que o
campus ficava próximo, mas que fazia questão de me levar
no primeiro dia de aula.

Até que depois de conversarmos muito e minha mãe


se certificar de que tudo daria certo com minha estadia,
meus pais resolveram ir embora.

Havia chegado a hora que, por fim, eu começaria a


cortar o cordão umbilical.

Ainda no apartamento, prometi ao meu pai que iria


me cuidar e garanti que se eu precisasse dele, chamaria o
Gustavo.

Coitado do Gu!

Meu pai o fez prometer que cuidaria de mim com a


própria vida. Tive que revirar os olhos para isso.

— Filha, se cuida e se precisar de qualquer coisa, nos


ligue e viremos correndo. Ai, meu Deus, agora sei o que a
sua avó sofreu quando eu saí de casa — minha mãe disse,
chorosa.
— Tia, fica tranquila. Tá comigo, tá com Deus, eu vou
cuidar dessa pirralha. Lembra que eu sempre fui o irmão
mais velho? — Gustavo tentou descontrair.

— Sim, eu lembro. — Minha mãe o abraçou


carinhosamente.

— Lili, vou sentir saudade. — Meu irmão também me


abraçou com carinho e com olhinhos cheios de lágrimas.

— Pepê, vou tentar ir todo final de semana para


Cananéia, sei que, às vezes, vai ser difícil por conta dos
trabalhos que terei que fazer, mas a gente conversa pela
internet. Nem vai dar tempo de sentir saudades, tá?

— Tá bom, mas posso usar suas coisas que você


deixou lá? — Sorri.

— Pode, mas me pergunte antes. — Meu irmão sorriu


animado e me abraçou para se despedir.

Meu primo ficou no apartamento e eu desci para


levar meus pais até o carro, onde minha mãe me beijou e
me abraçou mais umas três vezes e ouvi meu pai me dizer
para ter cuidado mais umas quatro.

Eles se foram e voltei para o ap e encontrei Gustavo


sentado na ponta do sofá com a cabeça apoiada nas mãos.

Cogitei a ideia de ele já se sentir meio desconfortável


com minha a presença.

Quando me viu entrando, levantou a cabeça e me


encarou, enquanto eu andava para me sentar na outra
ponta do sofá.
— Lívia, espero que você se sinta em casa e se tiver
alguma coisa que precise e não tenha, você me grita.

— Tudo bem. — Sorri.

Ficamos em silêncio... um silêncio meio


constrangedor.

— Bom, então vou lá no meu... no quarto. Arrumar


minhas coisas no armário. — Fiquei com vergonha de
chamar o quarto de meu logo no primeiro dia.

— Vai lá, vou ter que sair agora, tenho uma reunião
na Angels, mas sinta-se em casa. Tem comida na geladeira,
no armário, se vira aí. Se precisar de alguma coisa me liga.

— Tudo bem — respondi rapidamente.

Gu se levantou, pegou a chave sobre a mesa de


jantar e antes que fosse de vez, o parei:

— Gustavo. — Ele me olhou. — Obrigada, mais uma


vez. — Lançou-me um sorriso sem jeito, um meneio de
cabeça e saiu.

Pensei que seria estranho minha estadia ali, mas


entendia que talvez fosse só o primeiro dia. Com o tempo
nossa convivência ia melhorar e a relação de família falaria
mais alto sobre o tempo que passamos longe um do outro.
Assim eu esperava.

Fui até meu quarto e passei a tarde arrumando


minhas roupas no armário.
Capítulo dois
Gustavo
Quando meu tio Jonas entrou em contato,
perguntando se eu poderia ver apartamentos próximos a
faculdade da minha prima para ela morar, ele parecia
preocupado, então não pensei duas vezes e ofereci meu
apartamento, dizendo que ela poderia ficar pelo tempo que
precisasse, mas quando finalmente isso aconteceu, eu me
senti meio... estranho.

Morei em uma república por cinco anos, enquanto fiz


a faculdade de direito. Sempre dividi tudo com o pessoal,
mas depois que eu e os caras montamos a balada Clube
Angels e ela se tornou sucesso, logo comprei meu ap e já
me acostumei a morar sozinho.

Quando Lívia entrou com as suas novecentas e


noventa e nove malas, tive uma sensação de que ela
invadiria meu espaço, mesmo tendo chegado na dela e
super contida. Foi inevitável não me sentir meio invadido.
Pensei ser falta de costume, logo eu me acostumaria
com a sua presença.

Quando Lívia saiu para acompanhar a família até o


carro e eu me sentei no sofá pensando como seria dali para
frente. A sensação foi estranha.

Vê-la tão mulher e tão independente, em nada me


lembrava daquela bebezinha que peguei no colo... bom,
tudo bem que eu também era um bebê, mas me lembrava
de tudo como se fosse recente.

Cresci sempre apaixonado pela princesa Lívia e


assumi o papel de irmão mais velho com louvor. Gostava de
ajudar cuidar dela, porque sempre a achei frágil e indefesa.
E olhe só! Se tornou uma linda mulher e quando eu a definia
como linda, era linda mesmo.

Tivemos pouco contato nos últimos anos, o que foi


bom, porque me conhecendo, eu era um poço de ciúme e
sabia que se eu estivesse por perto na época em que os
namoradinhos começaram a aparecer, ela não teria
namorado ninguém até hoje. Eu teria afastado os
marmanjos um a um.

Pensando nisso, lembrei que teria que dar um jeito


de manter Fernando, Rodrigo e João, todos bem longe dela.

Saí dos meus pensamentos quando Lívia voltou


abrindo a porta do ap e sentou-se na outra extremidade do
sofá.

Um silêncio constrangedor se instalou entre nós.

Inventei um compromisso inexistente e dei espaço


para ela se habituar a casa. Saí dizendo que iria até a
Angels, mas do caminho liguei para Bruna e tentei
convencê-la a sair comigo naquela noite.

Bruna era uma ex ou atual namorada, era ex para ela


e atual para mim, tínhamos um rolo desde a época da
faculdade, namoramos por uns seis meses no último ano,
mas com o tempo ela me disse que não queria nada sério.

Desde então só nos encontrávamos de vez em


quando para um sexo rápido, no qual saíamos satisfeitos,
apesar de eu querer algo mais e ela só me usar.

Meus amigos insistiam que devia partir para outra e


deixar a Bruna de vez, diziam que ela só me daria valor
quando não me tivesse mais lambendo o chão em que
pisava.

Nunca me vi dessa forma, só não tinha tempo vago


para sair procurando mulher, nem mesmo enquanto estava
na Angels. Então enquanto conseguia sexo fácil com ela, eu
ia aproveitando daqueles cabelos ruivos e olhos verdes,
sem falar dos seios fartos e do corpo escultural que me
deixava com um tesão do caralho.

E, pensava que se ela não saía com mais ninguém


além de mim, eu ainda era importante e o combinado
continuava valendo.

— Fala, Gustavo — Bruna me atendeu.

— Oi, gata, vamos nos ver hoje?

— Hummm... Hoje, só um minuto. — Me deixou


esperando uns segundos na linha e continuou: — Ok,
vamos, mas tem que ser agora e rápido, porque marquei de
sair com umas amigas.
— Opa, por mim tudo bem.

— No seu apartamento ou no meu?

Na hora me lembrei da Lívia e seria melhor evitar


levar mulheres no ap por enquanto.

— No seu.

— Ok. Te espero em cinco minutos.

— Combinado.

Podia até me sentir usado por ela, às vezes, mas


essa era a forma mais deliciosa de ser usado por alguém.
Capítulo três
Lívia
Era segunda-feira e no dia anterior eu havia ficado
até tarde arrumando o guarda-roupa e não vi o Gu voltar.
Ele provavelmente emendou a tarde com a noite e ficou
trabalhando no Clube Angels.

Até pensei em pedi-lo para me levar lá um dia


daquela semana. Gostaria de conhecer a balada que ele era
dono e precisava aproveitar para sair o quanto antes, já que
na semana seguinte começaria o meu tão sonhado curso de
medicina.

Sentia até um arrepio no corpo todo de ansiedade.

Logo que acordei me levantei, estiquei o lençol e


coloquei a colcha sobre a cama, depois peguei minhas
coisas para escovar os dentes e segui até o banheiro, que
ficava no corredor e dava de frente para o quarto do Gu.

A porta do meu quarto era a do final do corredor,


então troquei de roupa e fui pé com pé até o banheiro, sem
fazer barulho, porque não queria acordá-lo. Imaginei que
Gustavo devia ter chegado tarde e com certeza estava
cansado.

Era pouco mais de oito horas da manhã quando


terminei de me aprontar, queria acordar mais cedo e fazer
café para o meu primo, assim seria o meu jeito de dizer que
queria ajudar e não ser somente um peso em seu
apartamento. Porém, quando cheguei à porta que dava de
frente para mesa de refeições, tomei um susto, Gu já estava
de pé e tinha colocado uma mesa linda e cheia de comidas
deliciosas.

Se exibia sem camisa, descalço e usava uma calça


de moletom um pouco baixa demais.

Jesus, meu primo tinha tanquinho!

Imediatamente me adverti por olhá-lo daquela


maneira. Ele era meu primo! Por outro lado, eu não era cega
e ele sempre foi lindo desde criança.

Depois que cresceu, eu e minha amiga Vivian até


dizíamos que ele se parecia com o Chris Evans o Capitão
América, aquele lindo.

Com o cabelo em um corte moderno estava mesmo


bem parecido e era certo que Gustavo arrasava corações.

Sacudi levemente a cabeça para sair do transe que o


tanquinho dele me colocou e segui até chegar próxima à
mesa.

Gustavo sorriu para mim.

— Não sabia o que você gostava de comer, então fui


à padaria e comprei um pouco de cada coisa. Bom dia,
prima! — disse colocando a jarra da cafeteira sobre a mesa.
— Bom dia, primo, e eu que pensei que acordei cedo
para fazer o café pra você. E olha! Fui surpreendida com
essa mesa linda. — Ele lançou-me um sorriso e indicou a
cadeira para que me sentasse.

— Você faz o café nos outros dias, não tenho o hábito


de acordar cedo, fiz hoje porque queria fazer a política da
boa vizinhança e te dar boas-vindas. Coisa que devia ter
feito ontem.

Eu sorri.

— Nossa! E eu achando que iria ter vida boa e café


farto todos os dias. — Gu abriu um sorriso largo.

— Quem sabe de vez em quando isso não se repita.


Mas, Lívia, mudando de assunto, o que pensa em fazer
hoje? Segundas-feiras a Angels não abre, então estou de
folga e podemos fazer alguma coisa juntos.

— Se aqui tivesse praia podíamos ir e brincar de


fazer castelos de areia. Você se lembra como a gente se
divertia? — falei empolgada e tomando o café que ele fez,
que estava uma delícia. Sempre fui viciada em café.

— Muito. Mesmo com cinco anos de diferença a


gente brincava bastante. Na verdade, você mandava e eu
obedecia. — Ri.

— Não era bem assim, você adorava ser o meu


Ken[1].

— Shiiiuuu... — Ele pôs o dedo na boca pedindo


silêncio — Dizer que brinquei de Barbie quando pequeno,
pode acabar com a minha masculinidade.
— Não acaba não! — respondi de imediato e corei
quando percebi a tamanha convicção com que falei. Meu
primo exalava masculinidade. — Hummm... nossa que
delícia esse pão de queijo.

Gu percebeu meu desconforto e me olhou sorrindo,


corando um pouco com meu elogio velado.

— Mas então, aonde vamos hoje? Não conheço a


cidade direito, podia me apresentar — continuei o assunto.

— Pode ser. É bom que você vai se habituando. —


Bebeu um gole do café e pousou a xícara na mesa.

— Olha, eu queria mesmo era conhecer a tal balada


Clube Angels também. E essa semana de preferência,
porque semana que vem começam as aulas, aí já era vida
social.

— Podemos ir na quinta-feira, que sei que os caras


vão estar todos lá e posso te dar mais atenção.

— Urruhhh... Quinta vamos para balada! — Aplaudi.

— Não se empolga, prometi ao tio que ficaria de olho


em você.

— Tudo bem! Só quero dar uma olhada nos gatinhos.


— Ri e ele não ficou muito feliz.

— Lívia, não faça com que eu me arrependa de te


oferecer guarita — brincou.

— De jeito nenhum. Deixa comigo que serei muito


comportada, priminho. — Lancei-o uma piscada e bebi o
café.
Vi que se fechou tímido, mas sorriu em seguida,
depois se levantou.

— Lívia, fica à vontade, coma tudo que comprei que


vou me trocar e... resolver uns assuntos. Logo a gente sai.
— Assenti feliz.

Ele saiu, comi como uma esfomeada e quando


terminei, guardei tudo e fui até meu quarto onde coloquei
um vestido rosa rodado, com um tênis All Star branco,
depois segui para sala e Gustavo já se encontrava me
esperando.

Usava uma camiseta cinza e calça preta e estava


lindíssimo.

Senti-me meio apagada perto dele, principalmente


quando ele me olhou de cima a baixo e afirmou:

— Você está parecendo uma menininha, com essa


roupa.

— Pode não parecer, mas eu sou uma. — Dei uma


voltinha.

Sorriu, me olhou dos pés à cabeça, até que se deu


conta de que me dava um “confere” e foi a vez de ele ficar
sem jeito. Balançou a cabeça de um lado para o outro e
rindo, continuou:

— Anda, pirralha, vou levar você para passear.

Nosso tour começou e primeiro me levou para


conhecer uma feira de artigos hippies que ficava em uma
pracinha próxima ao prédio em que morávamos.
Andamos por todas as barracas admirando a arte
hippie e me apaixonei por várias pulseiras, brincos,
badulaques em geral, enquanto Gu ria e dizia se arrepender
de ter me levado ali, que eu encheria meu quarto de tralha.

Em um momento em que me via encantada


experimentando uma pulseira linda de pedra azul turquesa,
Gustavo sumiu por um instante e quando voltou estava com
um pacote nas mãos. Um embrulho feito em papel de pão e
me ofereceu.

— Presente de boas-vindas.

Encarei-o e juntei as sobrancelhas.

— Pão?

Ele riu.

— Para de ser gulosa, Lívia! Não é pão e nem de


comer, é um presente. Abre.

— Presente... — Sorri, mas logo semicerrei os olhos.


— Para de me mimar, primo, ou vou ficar mal-acostumada e
querer café da manhã, passeio e presente todos os dias.

— Acho que é como dizem: estou criando um


monstro. Abre logo, Lívia!

Vi a ansiedade em seu olhar e abri o embrulho. Lá de


dentro tirei um filtro dos sonhos em tons de lilás e com as
penas rosa. Era lindo!

— Gu! Sempre quis um desses... Juro.

Ele sorriu para mim, parecia estar feliz com minha


empolgação.
— Que bom que gostou, é para te fazer companhia.
Muitas noites quando você ficar em casa, eu não vou estar
lá, porque a Angels fecha muito tarde. Na verdade, fecha
cedo. E quando passamos pela barraca, me lembrei de
quando você tinha pesadelo a noite, sempre queria dormir
com alguém e acordava chorando. Todas as vezes que eu
dormia na casa do tio e da tia você corria para minha cama.

Sorri.

— Muito obrigada, Gu. — Omiti que ainda era uma


medrosa durante a noite, às vezes, e que o filtro dos sonhos
seria muito bem-vindo e útil. — Eu amei. Lembro que eu
dizia que você era o anjo que me protegia dos monstros.

— Éramos tão amigos.

— Sim.

Ficamos sem assunto.

— Vamos? — Assenti e seguimos o passeio turístico,


conversando sobre o passado, as nossas noites de
brincadeiras quando ele dormia na minha casa ou eu na
dele e tudo que vivemos.

A hora do almoço chegou e para ser bem fiel a um


passeio em cidade grande, ele me levou para almoçar no
shopping. Comemos comida italiana, nossa favorita da
infância. Após o almoço chupamos uma casquinha, me
melequei com o sorvete e ele limpou o canto da minha boca
com o guardanapo. Pouco a pouco a intimidade ia voltando.

Seguimos andando pelo shopping e descobri que


tínhamos muitas coisas em comum e outras tantas
diferentes.
Meu primo era muito gentil e me senti triste por ter
perdido a proximidade com ele depois que foi morar na
cidade. Claro que sempre que a família se reunia ele estava
lá, mas era uma conversa mais superficial, não tinha todo
carinho e afeto que sempre vivemos na infância.

Contudo, em apenas um dia morando com ele já


começava a trazer de volta a intimidade do passado e o
desconforto da noite anterior não existia mais.

— Estou adorando nossa tarde. Sempre senti falta da


sua amizade, pena que você teve que se mudar para
estudar.

— Foi bom, agora você tem onde ficar.

Sorri.

— Verdade, mas fiquei triste lá, sem meu melhor


amigo. Apesar de que, quando você veio já estávamos
distantes, né?

— Sim.

— Você terminando a escola e eu começando a


pensar nos menininhos. Você podia ter ido mais a Cananéia
depois que veio para cá. Realmente senti sua falta.

Ele me olhou como se sentisse o mesmo.

— Pois é, mas a gente se joga em um mundo novo e


esquece que têm coisas tão boas quanto baladas, bebidas e
mulheres.

— Sério que nossa conversa e tarde juntos, está te


fazendo lembrar o que é melhor que tudo isso?
— Não. — Abriu um largo sorrio, o dei um soco de
leve e ri também. — Na verdade, dei graças a Deus que não
peguei sua fase de namoros. Mesmo assim quando eu
ligava ou ia até lá, ainda implicava com você, lembra?
Imagina se eu estivesse por perto, você ainda seria virgem.
— Dei outro soco nele.

Que vergonha!

— Então ainda bem que veio para longe de mim. —


Gustavo riu e eu mudei de assunto — Gu, acho que ontem
te assustei com minha chegada, mas prometo não mudar
nada na sua vida nem na sua casa.

— Imagina, prima. Mi casa és su casa, fique à


vontade para fazer o que quiser. E sobre ontem, não sei do
que está falando eu realmente marquei um compromisso.

— Sei... — Encarei-o rindo em desconfiança e ele


sorriu de volta.

Já passava das cinco da tarde quando decidimos


voltar para casa, mas Gu me prometeu que no dia seguinte
me levaria para almoçar de novo, já que não deu tempo de
me levar ao parque dos pássaros, o mais famoso e
arborizado da cidade.

Fiquei empolgada com a ideia de saímos de novo,


assim íamos cada vez mais quebrar as barreiras que a
distância colocou na nossa amizade.

No entanto, quando jurei que não mudaria nada na


vida dele, mal sabia eu, que aqueles passeios seriam o
primeiro passo para ter minha vida mudada, reformulada e
girada em trezentos e sessenta graus.
Capítulo quatro
Gustavo
Já passava das onze da noite quando Lívia e eu
fomos nos deitar. Chegamos da nossa tarde de passeios e
resolvemos jogar Super Mário Word e aí nem vimos a hora
passar.

Ela era péssima no jogo, mas muito persistente,


tentava de todo jeito passar as fases, mas morria facinho,
facinho e eu, me acabava de rir do semblante sério que ela
exibia todas as vezes que perdia. No jogo só prestava para
descer o caminho até a fase mais fácil e pegar vida para
jogarmos a mais difícil.

Mesmo morrendo toda vez que tentava jogar a fase


difícil, aplaudia quando eu ganhava e ficava feliz de seguir
para próxima fase do jogo comigo. Uma figura!

Com isso, ficamos das seis às onze da noite jogando,


rindo, conversando, comendo bobeiras e ela brigando
comigo todas as vezes que eu ria quando ela morria... Pobre
Luigi! Sem falar do pobre do Yoshi, que ela sempre perdia
pelo caminho.
Eu, claro que era o Mário, sempre que eu jogava esse
jogo com alguém, eu sempre era o Mário. No jogo, como na
vida, eu nunca aceitei ser coadjuvante. Luigi nem pensar.

A noite passou repleta de risadas, há tempos não me


divertia tanto com um programa tão simples e todo aquele
clima estranho entre nós do primeiro momento, já não
existia mais.

Acordei já era quase dez horas de terça e ainda me


sentia com sono, mas o cheiro de café estava me chamando
a acordar.

Levantei, tomei banho e segui para sala. Quando


cheguei à mesa, foi a vez dela me receber com um café da
manhã delicioso, que há tempos eu não tinha.

— Me fala que eu não estou vendo um bolo de fubá!

— Tcharaaam! — Apontou feliz para o bolo.

— Lívia, por que você não veio antes morar aqui?


Agora sim, eu fiquei feliz que você está nessa casa.

— Vem, se senta para comer que está quentinho,


acabei de tirar do forno. Lembrei que você gostava e fiz.
Sabecomé, né? Tenho que te agradar senão eu viro uma
sem-teto. Fiz café fresquinho também.

— Meu Deus, como eu amo bolo de fubá!

Sentei-me e comi quase metade do bolo com


manteiga. Ainda bem que três horas por semana me
exercitava nas aulas de Jiu Jitsu ou já teria assumido a
pancinha do Homer Simpson de tanto que era esfomeado.
Aquele bolo estava muito bom e tinha gosto de
infância.

— E aí, está de pé a continuação do nosso passeio


turístico hoje, Gu?

— Sim, podemos sair daqui uma hora, só vou fazer


uns telefonemas e adiantar a resposta de uns e-mails e
podemos ir.

— Não quero te atrapalhar, pode ficar à vontade para


fazer suas coisas que me viro por aí.

— Imagina, estou me divertindo como guia turístico.


Fica sossegada que semana que vem começa sua loucura e
quase não teremos tempo juntos. Então me aproveite o
quanto puder.

— Tudo bem, então aproveitarei. — Ela sorriu.

Depressa terminei tudo o que eu tinha para fazer e


me aprontei para sair.

Nunca imaginei que estaria empolgado para ser guia


turístico da minha prima, mas o dia e a noite anteriores
foram tão divertidos que nem tive tempo de ligar para
Bruna. Nem sequer havia pensado nela. Nem ela me ligou.

Saímos de casa já passava do meio-dia, então


decidimos almoçar primeiro. Seguimos para um restaurante
que tinha como base a culinária caipira. Lívia reclamou
dizendo que viraria uma baleia enquanto morasse comigo,
já que em dois dias ingerimos as calorias de um mês.

— Estou muito cheia. Por que as coisas que


engordam são as mais gostosas?
— Verdade. Também queria saber, mas o importante
é ser feliz.

— Você diz isso, porque está assim, todo lindo —


disse apontando para o meu corpo e imediatamente corou.

— Estou? — Levantei uma sobrancelha, a deixando


ainda mais envergonhada.

— Sim, e não fica se achando — confirmou tímida. Eu


ia dizer que ela também era perfeita como estava, mas
achei melhor só continuar sorrindo e curtindo o desconforto
que ela sentia.

— Então... — Lívia deu um gole na Coca que tomava


e perguntou: — Você tem namorada, Gu?

— Não... e sim — respondi.

— Como assim? Ou tem ou não tem.

— Não tenho, porque ela não quer, por mim ainda


estaríamos namorando. Não tenho tempo para arrumar
outra namorada, então nos pegamos de vez em quando.
Meus amigos dizem para eu desencanar, mas sei lá, tenho
preguiça de me abrir para outro relacionamento.

— Você não a ama? — perguntou séria.

— Não sei, nunca pensei nisso. Vamos mudar de


assunto? Que tal irmos ao parque agora? A gente já faz uma
caminhada que vai ajudar na digestão.

— Vamos. — Levantou-se animada e consegui sair do


assunto que me deixava meio tenso desde que Bruna e eu
terminamos.
Falar dela me deixava... não sabia como me sentia,
talvez por ser a situação instável em que vivíamos, onde eu
não sabia se estava ou não com ela.

Saímos do restaurante e caminhamos até o parque,


levamos trinta minutos andando. Maldita hora que inventei
de fazer caminhada.

Havia acabado de chegar ao parque e já me sentia


com fome de novo, mas valeu a pena. Lívia me contou
sobre a sua vida, sobre o namoro que não deu certo, sobre a
melhor amiga que deixou em Cananéia e claro, eu já queria
conhecer a amiga que pelo modo como descreveu, devia
ser gata.

Sentamo-nos na grama, de frente para o lago e nos


lembramos de várias coisas da infância: da vez que deixei a
Lili me maquiar, de quando prendi chiclete sem querer no
cabelo dela e teve que cortar curtinho, também de quando
“sem querer” ela colou no meu e tive que raspar careca.

Nós nos lembramos de quando ela fingiu ser


cabelereira, jogou terra no meu cabelo dizendo que era
xampu e nossas mães quase nos mataram. Falamos de
todas as vezes que recebi o primeiro pedaço de bolo do seu
aniversário e de quando parei de receber.

— Foi injusto — acusei.

— Não, Gu, não foi. Você sabia que eu não gostava


da Aninha, aquela “rudicula” — Fez aspas com os dedos
enquanto falava errado a palavra ridícula e riu lembrando-
se de como chamava a Aninha quando éramos crianças. —
Mesmo assim você a levou no meu aniversário de onze anos
e depois ainda peguei você a beijando na boca. Na boca,
Gu? Nunca me conformei com isso.
— “Ridícula” — Fiz aspas com os dedos também, a
corrigindo. Nós dois ríamos. — Fiquei triste, achei que iria
receber seus primeiros pedaços eternamente. E nem vou
mencionar que não fui o príncipe na sua festa de debutante.

— Não mesmo, foi o TDBDE.

— TDBDE?

— Sim, o “Tudo de bom da escola” — falou colocando


aspas com os dedos de novo. — E Fui a garota mais popular
por ele ter sido meu príncipe. O Cara mais gato da escola foi
meu príncipe! Me orgulho disso e claro de ter dado uns
beijinhos nele no final da festa.

Bufei.

— Grande coisa. O tio soube disso? Teria sido muito


mais interessante se eu tivesse sido seu príncipe.

— Pode ser, mas fiquei com medo de você levar a


Aninha de novo — Gargalhamos.

— Esquece a Aninha.

— Não esqueço não. Ela é tipo um trauma que tenho


nos meus aniversários.

— Exagerada.

Um pipoqueiro passou e perguntei:

— Quer comer pipoca com queijo? — Levantei e


estendi as mãos para ajudá-la a levantar.

Lívia colocou sua palma sobre a minha e quando


nossas mãos se conectaram eu a puxei. Ela pegou impulso e
a hora que levantou, se desequilibrou pendendo para frente
e se jogando para cima de mim.

Em poucos segundos estávamos os dois caídos na


grama, ela sobre meu peito e os dois morrendo de rir.

— Mas você continua a mesma desastrada de


sempre, Lívia.

— Lógico que não. A culpa foi sua que me puxou para


cima com muita força e me desequilibrei.

Continuamos rindo, com ela ainda no peito, mas


alguma coisa nos seus olhos me chamou atenção, aqueles
olhos amarelados que realmente faziam jus a coloração
chamada olho mel.

Por um pequeno instante me perdi no olhar da minha


prima.

— Que foi? Meu rosto está sujo? — perguntou


levantando depressa e passando a mão no rosto e na roupa.

— Não, é que seu olho tem uma cor tão bonita, que
eu estava admirando.

— Ah, para, Gu. Você sabe que eu sempre quis ter


seus olhos. Azul da cor do mar... Sempre tive inveja deles.
— Sorriu meio sem graça e eu a acompanhei.

— Pois eu olhei seus olhos bem de perto agora e digo


que queria ter o olho mel.

— Não queria não.

— Queria sim.
— Estamos parecendo duas crianças de novo. E cadê
a pipoca?

— Vem, vamos comprar.

Com a mão dela pousada em meu braço, seguimos


andando pelo parque, juntos comemos pipoca, jogamos um
no outro e até enrolei na sua trança comprida.

Foi uma tarde muito boa.

Quando a noite já estava caindo e eu precisava ir


embora, ela insistiu para voltarmos andando até o
restaurante onde deixei o carro, mas sentia-me tão cansado
que preferi um táxi.

Pegamos o carro no estacionamento, seguimos para


casa e durante o percurso o rádio do carro tocava Geração
Coca-Cola da Legião Urbana.

— Escuto essa música e me lembro de você, Lili. Não


por causa da letra, mas por todo o amor por Coca-Cola que
você sente.

— Amor é pouco. Coca-Cola é vida. Coca com


chocolate então... Não tem nada melhor.

— Preciso te mostrar mais da vida, prima, existem


muitas coisas melhor que Coca com chocolate.

— Duvido...

— Duvida? Então acho que você anda fazendo sexo


com os caras errados.

Ela arregalou os olhos, corou e me deu um tapa,


nitidamente envergonhada.
— Gustavo, pelo amor de Deus! — exclamou rindo
ainda tímida.

— Ué, vai me dizer que não existiram caras?

— Como eu te disse existiu um cara, meu ex-


namorado e para ser sincera ele realmente não era tão bom
assim, na verdade, era um babaca. — Ela olhava para fora,
para frente, para qualquer lugar menos para mim.

— É, para deixar você partir só pode ser babaca


mesmo. — Lívia me olhou e me lançou um sorriso carinhoso.
— Você o amava? — perguntei.

— Não sei, nunca pensei nisso. Vamos mudar de


assunto? — Lançou-me um sorriso falso, após repetir as
mesmas palavras que eu havia dito quando me perguntou
se eu amava a Bruna.

— Touchê, senhorita Lívia. — Piscou um olho para


mim e eu continuei: — Mas olha, prima, desejo que você
arrume um cara que te dê o melhor sexo da sua vida,
daqueles que te tire dos eixos e te faça ver estrelas, aí você
me conta se Coca com chocolate ainda é a melhor coisa da
vida.

Lívia tampou os olhos com as mãos e jogou a cabeça


para trás, a encostando ao banco do carro, e riu.

— Meu Deus, Gustavo. Você é muito idiota. Sério!


Isso é o que dá dar intimidade às pessoas. — Gargalhei,
enquanto ela sorria com vergonha e olhava para fora do
carro.

Pensei que o cara que ela namorou realmente devia


ser um babaca, porque minha prima era uma obra prima.
Realmente linda, o tipo de mulher que qualquer homem
queria ter por perto e na cama.

Cutuquei-a na costela quando chegou o refrão da


música e cantamos alto e rindo.

Lívia se divertia com pouco e sorria muito. Minha


prima era a pessoa mais agradável que eu havia convivido
nos últimos tempos, tudo bem eu já a conhecia, mas não
era assim adulta. E o seu lado divertido me encantou.

Livia trazia de volta o meu eu infantil que eu tinha


deixado para trás nos últimos anos e os dois dias que
passamos juntos me fez perceber que nossa convivência
seria mais que satisfatória.

Eu havia curtido muito passar esse tempo com ela,


tanto, que em mais um dia eu não lembrava nem ligava
para Bruna, e o melhor... Não sentia a mínima falta dela.
Capítulo cinco
Lívia
Chegamos em casa após o segundo dia de passeio,
Gu foi tomar banho e resolver uns problemas da Angels.

Também tomei uma ducha, coloquei uma roupa


fresca e quando terminei, pedi pizza para o jantar.

Logo que terminamos de comer, não demorou até


que Gu foi se preparar para o trabalho e eu segui para o
meu quarto.

Iniciei uma chamada de vídeo com minha amiga


Vivian e ela não parava de perguntar sobre o Gustavo.
Sempre o achou um escândalo de lindo e o chamava de
capitão por causa do Capitão América do filme. Dizia que eu
era uma sortuda de morar com esse homem lindo.

Contou-me sobre Fábio e disse que já o viu com outra


moça. Não senti nada quando ouvi isso, na realidade, senti
até alívio. Contei para Vivian sobre meus dois dias de
passeios com o Gu e ela suspirava a cada comentário meu.

Acordei pela manhã e me senti meio sozinha.


Gustavo ainda encontrava-se dormindo por ter
chegado de manhã e me deixou um recado dizendo para
que eu não me preocupasse com almoço, porque
normalmente ele acordava por volta das duas da tarde.
Deixei um bilhete avisando que ia sair.

Decidi tirar a quarta-feira para mim e andar pelas


redondezas. Fui ao shopping, comprei um jeans novo para o
primeiro dia de aula, peguei um cinema e comi um lanche.
Segunda-feira eu começaria uma dieta.

Quando voltei para casa já era noite, o ap estava em


silêncio e deduzi que meu primo já tinha saído.

Tomei banho, liguei a TV da sala e fiquei zapeando


pelos canais, mas não vi nada de interessante, então peguei
um livro. Ler sempre prendia minha atenção mais que
qualquer outra coisa.

Havia levado comigo minha coleção de romance de


época, já tinha lido todos eles, mas nunca era demais reler
sobre tais irmãos Bridgertons[2].

Comecei a ler e me apaixonei de novo pelo duque de


Hastings, entretanto, não sabia se era o cansaço da
andança daquele dia mais cedo ou por estar tarde mesmo,
mas minutos depois acabei adormecendo no sofá.

Um campo verde, com mato baixo e árvores altas,


me cercava. Eu corria com o cabelo solto e voando ao
vento, usava um vestido longo com tecido esvoaçante, na
cor azul bebê. Ele cobria meu corpo até os pés e um sorriso
radiante iluminava meu rosto.
Eu olhava para trás e ele corria para me alcançar.
Minha alegria e sorriso se intensificavam a cada passada
larga que meu amor dava e chegava mais perto de mim.

Não demorou até que me alcançou e agarrou-me


pela cintura, girou-me em seu colo e estávamos
gargalhando alto e feliz.

No meio de um rodopio nos desequilibramos e


caímos no mato baixo, rindo como nunca. Sentia-me
apaixonada.

O sol da tarde, com seus raios fortes me cegavam e


eu não conseguia ver muito do rosto do meu amor, mas não
precisava, porque eu podia senti-lo.

Envolvida em um beijo, senti seus lábios nos meus e


nos conectamos. Seu toque me tirou o ar e um calor intenso
se espalhou por meu corpo, o qual eu nunca havia sentido.

Ao final do beijo, quando me separei dele, abri meus


olhos e encarei os seus lindos olhos azuis.

Pisquei para enxergar melhor entre os raios que


ainda me cegavam, tentei olhar em volta e a surpresa me
atingiu quando já não existia a mesma campina em que eu
estava antes do beijo, o que tinha ao redor era o parque dos
pássaros aonde eu fui com o Gu.

Depois olhei para as minhas roupas e nem resquício


do lindo vestido de época em que eu vestia há um minuto,
mas o pior foi quando eu ergui meu rosto e vi, parado de
frente para mim, com seu lindo sorriso e me olhando...
Gustavo.

Levantei-me em um pulo, passei as mãos nos lábios


em desespero e gritei:
— Não, Gustavo, não! O que você fez? Não podemos
nos beijar. O que você fez? Não...

—... Lívia... — a voz dele saía baixo dos seus lábios,


como se estivesse abafada. —... Lívia.

— Não... Não... O que você fez? — Tentava me


afastar.

— Lívia, acorda!

De repente abri meus olhos, me sentei em um pulo e


bati a cabeça no nariz do Gustavo que se encontrava bem
na minha frente e tentando me acordar.

— Aiiiii... — gritou quando caiu sentado no chão e


próximo ao sofá.

Pressionava o nariz e estava com os olhos


assustados e marejados pela dor que se formou depois da
batida. Meu primo me encarava como se eu fosse louca e eu
também me achava louca... Doida de pedra... maluca...

Que beijo foi aquele?

— Desculpa, Gu... você está bem? — Abaixei-me


próxima a ele, tentando ver se o nariz sangrava, mas não.

— O que aconteceu, Líli? Você estava sonhando


comigo? O que eu estava fazendo com você? — O olhar de
assustado e a dor já se esvaíam do seu rosto e sua boca
assumia um pequeno sorriso.

— É... hummm... É que eu sonhei... — Eu claramente


me embaraçava ao tentar explicar. Sentia-me confusa, sem
entender o motivo daquele sonho ridículo que eu havia
acabado de ter. Não conseguia formular a frase.
— Sim... O que você sonhou?

— Sonhei que você grudava um monte de pipoca no


meu cabelo — menti, dizendo tudo de uma vez e sem olhar
para ele.

Não contaria que sonhei que ele me dava o melhor


beijo que minha boca já recebeu.

Gustavo me encarou e me analisou, semicerrou os


olhos, até que por fim soltou uma sonora gargalhada.

— Todo esse desespero por causa de pipocas, Lívia?


Você é uma figura! E eu achando que você sonhou que eu
estava te matando sufocada. Você continua exagerada, até
para sonhar.

Mal sabia ele que eu realmente me sentia sem ar no


sonho e não por estar sendo sufocada e sim beijada.

— Tá bom, já pode parar de rir, tá? — falei brava e fui


até a cozinha beber um pouco de água, o calor do sonho
ainda aquecia meu corpo.

Mas que coisa! Que porcaria de sonho mais confuso e


doido foi esse?

Nunca sonhei com um beijo tão, tão, tão bom e


quando sonho tem que ser com meu primo? Gu apareceu
na cozinha e me olhou desconfiado.

— Está brava comigo?

— Já parou de rir? — perguntei em resposta e ele


assentiu balançando a cabeça, mas bem vi um sorrisinho
faceiro se formando em seus lábios.

— Então não estou.


— Às vezes, você parece que não cresceu, Lili, ainda
me lembra e muito a princesinha que peguei no colo.

— Você nem é tão mais velho assim, para de se


achar o tiozão. E que horas são? — Mudei de assunto.

— São cinco horas da manhã. Acabei de chegar e te


vi se debatendo no sofá, como se estivesse em pânico,
então resolvi te acordar.

— Ah, tá. Quer um café? — Senti minhas bochechas


quentes e mudei de assunto.

— A essa hora da manhã? — Olhava-me como se eu


fosse doida. — Se eu tomar café agora, não vou dormir.

— Verdade... Então vou para o quarto terminar de...


dormir. Boa noite... quero dizer, bom dia. — Sorri e ele riu
em resposta.

— Só não sonha comigo. — Escutei-o rindo atrás de


mim, mas não me virei para responder.

Cheguei ao meu quarto, fechei a porta e encostei-me


a ela.

Novamente as perguntas martelaram minha mente:

Mas que porcaria de sonho foi esse afinal?

Como assim eu sonhei que beijava o meu primo?

Meu Deus, me perdoa? Isso deve ser pecado.

Sonhar que beija o primo realmente deve ser pecado.

Eu só posso estar louca.


Aquilo só podia ser culpa do Gustavo, com toda
aquela conversa sobre sexo que tivemos no carro, a bendita
conversa só serviu para me deixar carente e assim sonhar
com ele. Mas tinha que ser com ele?

Balancei a cabeça em negativo para me livrar da


confusão, decidi tentar dormir e pensei que com certeza era
só carência, nada mais que carência.

Deitei-me na cama e relembrei o quanto o sonho


tinha sido lindo antes de eu ver quem era o príncipe que
corria atrás de mim. Sempre sonhei em viver no século
passado e protagonizar as cenas dos romances de época
que eu tanto amava.

Eu era uma romântica incurável e sonhava com meu


príncipe encantado, chegando em um cavalo branco. No
entanto, como uma boa moça do século XXI, sabia que
príncipes encantados não existiam. O único que existia era
meu pai e eu não podia me casar com ele por motivos
óbvios.

O bom foi que o sonho serviu para me dizer que,


enquanto o príncipe não surgia, eu precisava arrumar um
sapo para me divertir ou aquilo não daria certo.
Capítulo seis
Gustavo
Fui para o meu quarto ainda rindo. Minha prima era
uma louca.

Meu nariz ainda doía pela cabeçada que ela me deu,


mas a vergonha que Lívia sentiu ao acordar e admitir que
sonhou comigo, foi impagável.

Sorri.

Com minha prima morando comigo meus dias nunca


seriam monótonos.

Achei que eu estranharia tê-la ali, quando eu me via


tão acostumado a morar sozinho, mas, na verdade, eu já
encontrava-me adorando ter companhia.

Deitei-me e logo peguei no sono, porque me sentia


muito cansado. A Angels seguia bombando aquele mês. Os
rapazes e eu estávamos muito empolgados com nosso
negócio, que rendia mais do que nunca.
Nem por um minuto me arrependi de não assumir a
carreira de advogado. Meu diploma se via guardado e o que
eu queria mesmo era continuar com a vida de sócio da
Angels.

Acordei já passava das duas da tarde e o ap exibia-se


um silêncio só. Concluí que Lívia devia ter saído. No dia
anterior quando acordei, ela também não estava em casa e
imaginei que estivesse gostando de andar pela cidade.

Fui até a cozinha tomei um gole de café e quando


voltava para sala, ela entrou com algumas sacolas com
coisas de papelaria.

— Foi comprar material de escola, pirralha?

— Princesa — corrigiu-me sorrindo. — E sim, fui,


minhas aulas começam em quatro dias e ainda não tinha
nada. Agora chega de comprar, ontem e hoje extrapolei.

— E aí, pronta para conhecer a Angels, hoje?

— Opa, claro! Estou ansiosa para balançar o


esqueleto e doida para conhecer esse boteco que você
toma conta.

— Não insulte a Angels. Ela é a princesa da noite.

— Quero só ver se ela é mesmo essa Coca-Cola toda.


— Lívia riu.

— Ahhh... Ela é! É essa Coca-Cola toda e com muito


Jack Daniel´s. — Pisquei para ela.

— Hummm... Quero experimentar Coca com Jack.


Nunca bebi.
— Não exagera. Lembra que prometi ao tio que
cuidaria de você.

— Tudo bem. Prometo me comportar.

Lívia foi para o quarto dizendo que ajeitaria suas


coisas da faculdade e depois se arrumaria para noite,
segundo ela: “iria arrasar” e eu mais uma vez a lembrei de
não se empolgar.

Fui para o meu quarto enviar uns e-mails para


fornecedores e quando terminei liguei para o Fernando e o
lembrei que eu levaria minha prima à Angels e que
precisaria da ajuda dele e dos outros com os afazeres, já
que eu teria que dar atenção a ela.

— Fala, cara.

— E aí? Você se lembra de que te avisei que levaria


minha prima a Angels hoje, né?

— Ah, lembro. Hoje você vai ser babá. Ela pelo


menos é gata?

— Pode parar. Nem pense em chegar perto dela.

Ele riu.

— Tudo bem, não chegarei, até por que, se ela é da


sua família e se puxou sua beleza, deve ser mais feia que
bater na mãe — Do outro lado da linha escutei a gargalhada
dele.

— Você que pensa, ela puxou a beleza da família e é


muito gata.

— Se é assim, então você vai me apresentar a ela,


caro amigo?
— Nem fodendo! Conheço bem sua fama. No máximo
deixo você ser amigo dela e estando a pelo menos dois
metros de distância.

— Olha, ela deve ser muito gata mesmo, pra você já


estar com esse ciúme todo.

— Não é ciúme, é cuidado. Ela é minha prima.

— E daí? Conheço muita gente que namora primo.

— Mas para mim não dá, não com a Lívia, quem sabe
uma prima gostosa distante. E você sabe que estou com a
Bruna.

— Lá vem você falar dessa va...

— Olha o que vai falar, cara. Você sabe que gosto


dela.

— Gosta porra nenhuma, você pensa que gosta,


porque é tão preguiçoso que tem preguiça de arrumar
outra. Masss... Desculpa, se você diz que gosta, não vou
ofendê-la. Nos vemos a noite, beleza?

— Beleza. Até mais. — Desliguei o celular com um


pouco de raiva.

Fernando e os caras não entendiam que eu ainda era


enrolado com a Bruna e que não conseguia partir para
outra. E essa outra teria que ser muito foda para fazer com
que eu começasse algo repentino.

Naquele momento eu não me sentia com cabeça


para procurar romances por aí, estava curtindo meu modo
empresário, me jogando de cabeça no trabalho e correndo
junto com os caras atrás de levantar cada vez mais o nome
da Angels.

Era por isso que não tinha ânimo para pensar em


mulher. O que me fazia feliz era meu trabalho e mesmo eu
dizendo que gostava da Bruna, a Angels que era meu caso
de amor no momento. Só ela.

Lívia e eu tomamos café da tarde e depois ela voltou


para o quarto, dizendo mais uma vez que ia se arrumar. A
hora passou voando e quando dei por mim já era quase dez
da noite.

Bati na porta do quarto da minha prima, a


apressando, já que eu gostava de chegar à Angels antes
que a casa lotasse. De dentro ela me gritou um “tô indo” e
fui esperá-la na sala.

Peguei um copo de Coca na geladeira e caminhei e


voltei na intenção de colocar uma música enquanto
aguardava, mas quando ia ligar o som, Lívia saiu apressada
do quarto e seguiu caminhando pelo corredor.

Usava uma saia justa preta no meio da coxa, uma


blusa vermelha e sapatos de salto alto preto. O cabelo
preto, liso e comprido estava solto e batia no meio das
costas. Apresentava-se uma mulher estonteante.

— Hum... Coca? — perguntou e quando não respondi,


pegou o copo da minha mão e deu um gole — Coca. Delícia!
— E me devolveu.

Que sexy... Caralho!


Balancei a cabeça disfarçadamente e saí do transe
em que eu me encontrava.

Bem, minha prima cresceu... Minha prima... Prima!

— Onde você pensa que vai com essa saia, Lívia?

— Vamos pra balada! — Sorriu dando uma voltinha.

— Não comigo.

— Então vou sozinha.

— Tio Jonas me mata.

— Para de ser bobo, Gu. Vamos logo, estou doida


para dançar. — Lívia me puxou pela mão, pegou a bolsinha
pequena que tinha deixado sobre a mesa de jantar e foi o
tempo de eu pousar o copo e saímos rumo à Angels.

No caminho, pensei:

É hoje que eu não aproveito nada só cuidando dela.

Para que eu fui promoter ao tio Jonas que eu


cuidaria?

Que Deus me ajude!


Capítulo sete
Gustavo
Quando chegamos à Angels passamos direto na
portaria e a fila gigantesca na porta me fez abrir um sorriso
de orelha a orelha.

— É, parece que essa balada é boa mesmo — Lívia


comentou parecendo admirada.

— Sim, ela é ótima, porque eu sou o dono.

— Convencido — acusou-me em brincadeira.

Fui até o escritório deixar uma papelada que tinha


levado para avaliar em casa, Lívia foi atrás de mim e se
exibia encantada com tudo.

Era a primeira pessoa da família que via a casa


funcionando, o resto todo foi apenas no coquetel de
inauguração durante o dia e havia sido uma comemoração
intimista.

Para mim, a nossa balada Clube Angels ficava linda


de verdade daquele jeito: fervendo, com fila na porta, as
luzes piscando e o bar funcionando. Perfeita!

O escritório ficava no piso superior e tinha um vidro


panorâmico que dava para ver a boate toda, mas quem
estava embaixo não enxergava a parte de dentro.

Decidimos fazer assim para sempre estarmos de olho


em tudo que acontecia. Existia o ditado que o olho do dono
era o que engordava o gado, então... nós o levávamos a
sério e estávamos sempre presentes e de olho em tudo.

— Muito linda! — Lívia sussurrou olhando a Angels.

— Gostou? — Ela balançou a cabeça afirmando e


sorrindo. — Eu também acho. Vamos descer? — perguntei
depois que liguei o computador e deixei os papeis sobre a
mesa.

Chegamos ao térreo, encostamo-nos ao bar e logo


avistei os três patetas, Fernando, João e Rodrigo entrando,
eles também me viram e andaram até mim.

Cumprimentamo-nos e apresentei a Lívia, puxando-a


pela mão e a fazendo desencostar do bar logo atrás de nós.

— Galera, essa é minha prima, Lívia. Lívia, essa é


minha galera. — Ela sorriu e os cumprimentou com um beijo
no rosto.

Trocaram uma ou duas palavras quando os


parabenizou pela Angels e eu, enquanto isso, vi que João a
fitou de cima a baixo e a devorou com os olhos, o que não
foi muito diferente dos outros dois, mas João nem se deu o
trabalho de disfarçar.

A música Latch de Disclousure começou a tocar e


Lívia disse que amava aquela música. Sem esperar por nada
foi para pista de dança com os braços para cima dançando
e curtindo a balada.

Meus amigos e eu estávamos os quatro com o corpo


apoiado ao balcão do bar e ficamos todos a olhando se
afastar.

Fui o primeiro a desviar o olhar, virar para o lado e


encontrar os três patetas observando minha prima
dançando como se ela fosse um pedaço de picanha em uma
churrascaria.

Tão de palhaçada, né?

— Eiii! — Dei um soco de leve, mas não tão de leve,


no braço do Rodrigo que era quem estava ao meu lado.

— Que porra é essa, cara? — reclamou, chamando a


atenção dos outros ao seu lado.

— Que porra é essa? Eu que pergunto. Parem de


olhar para Lívia como se ela fosse um pedaço de carne.

Eles riram.

— Não temos culpa se sua prima é gostosa pra


caralho. — Fechei a cara para o Fernando. — Desculpa. —
Levantou as mãos em rendição e sorriu.

— Mas que ela é, ahhh... isso ela é — retrucou João


sem tirar os olhos da pista e sem perceber meu olhar
assassino.

— Olhem, vou dizer só uma vez, fiquem longe dela.


Lívia não vai ser um brinquedinho de vocês. Ela é minha
prima, pô!
Continuaram rindo e pensei que riam de mim.
Rodrigo colocou a mão no meu ombro, a outra no coração e
disse para me provocar:

— Cara, tô apaixonado, não vou brincar com ela. Se a


Lívia quiser, eu até caso. — Os outros palhaços
gargalharam, tirei a mão dele do meu ombro e bufei sem
paciência.

— Eu tô falando sério. — Olhei para eles com o


semblante fechado.

Fernando se posicionou ao meu lado e me deu um


tapinha nas costas.

— Estamos brincando, cara, pode deixar que


ajudaremos você a cuidar dela. Sua prima vai ser tipo a
nossa mascote. — Os outros riram.

— Que bom. — Enfim pude soltar o ar e respirar com


calma. Não podia permitir que minha prima virasse
brinquedo na mão dos meus amigos.

— Uma mascote muito gostosa — Rodrigo completou


e eu quis voar no pescoço dele, mas continuou: — Tenho dó
de você, que tem que dividir seu ap com esse monumento.

— Para de graça, Rodrigo, ela é minha prima.

— E daí? Já peguei várias primas minhas.

— Você também com isso? — retruquei.

— Foi o que eu disse para ele no telefone mais cedo


— comentou Fernando.

— Eu pegaria fácil se ela fosse minha prima — João


completou, ainda sem tirar os olhos dela que continuava
dançando na pista e foi acompanhado pelos outros dois que
a olhavam e só faltavam babar.

Dei um peteleco na cabeça de cada um, fazendo com


que se virassem para mim de imediato.

— Já disse ela é minha prima, não tem nada a ver. E


parem de olhar para ela, porra!

Eles balançaram a cabeça em negativa, riram e


voltaram a olhar para pista onde a gata da minha prima se
acabava de dançar.

Olhei em volta e vi que vários outros marmanjos a


observavam. Ia ser difícil.

E pensar que a faculdade de medicina dura muitos


anos... realmente ia ser difícil! Esperava não enfartar até ela
concluir esse curso.

Com a frase “se não pode com os inimigos se junte a


eles” martelando em minha mente, me juntei a eles a
olhando e admirando cada movimento dela.
Capítulo oito
Lívia
A Angels era uma balada incrível!

Chique, exibia um lustre que custava o preço de um


carro, também neons que refletiam luzes coloridas por
todos os lados e um bar gigantesco, que ia de ponta a ponta
e contava com dezenas de barmans.

Pensei que ali ninguém esperava bebida.

Desci com o Gu para balada e mal encostamos ao


balcão, uns amigos dele chegaram para cumprimentá-lo,
mas fiquei mais atrás e dei espaço. Se meu primo quisesse
me apresentar, me chamaria. E assim foi, não demorou a
me apresentar a eles, mas quando os olhei de frente,
pensei:

Uowww... Que paraíso é esse que me encontro?

Fernando tinha os olhos puxadinhos, mestiço, usava


uma camisa branca gola “V” apertada nos músculos... me
perdi nessa informação e não conseguia mais descrevê-lo
fora isso.
João... esse me pegou. Era preto, com olhos
castanhos claro, quase mel como os meus, com cílios
marcados e covinhas se formavam nas suas bochechas
quando sorria, o deixando com um ar garanhão e inocente
ao mesmo tempo. Era um gato!

E por fim Rodrigo, branco de cabelos e olhos


castanhos, um corpo definido e um deus de tirar o fôlego.

Divaguei em minha mente, cogitando que deviam


deixar a mulherada louca quando andavam juntos.

Ao olhá-los pensei que era muita beleza para um


grupo só de amigos. Admirar os quatro juntos, era como
estar em um self servisse de homem, tinha para todos os
gostos e cheguei à conclusão de que eu podia muito bem
me servir ali.

Tentei me concentrar na conversa com todos, apesar


da distração, até que após trocarmos meia dúzia de
palavras começou a tocar uma música que eu adorava e
resolvi ir para pista.

Precisava me afastar daquele bando de homem


bonito e pensar em qual deles eu podia investir, acabar com
minha carência e parar de sonhar que estava beijando meu
primo.

Nem gostava de lembrar do sonho que me dava


coisas...

Tinha loiro, moreno, negro e mestiço. Bom, o loiro era


óbvio que não dava para mim. Gu era meu primo, mas os
demais... Qualquer um deles servia de bom tamanho para
me divertir.
Olhei de relance na direção em que estavam e vi
meu primo com cara de bravo, enquanto os outros me
olhavam com desejo.

De costas para eles, sorri.

Claro que não ia demonstrar interesse por nenhum,


pensei em deixar rolar e assim ver como se comportavam,
porém, de uma coisa eu tinha certeza, o olhar assassino que
Gustavo lançava para todos, era sinal de que detestava
aquilo tudo.

Mais uma vez sorri ao constatar.

Quando a música acabou voltei novamente até eles e


meu primo me ofereceu uma bebida. Pedi Jack com Coca e
mesmo me alertando para não beber muito, foi pegar.

Reclamão.

— E aí, está gostando de morar aqui, Lívia? —


Rodrigo perguntou.

— Por enquanto sim. Gu tem sido uma ótima


companhia.

— Espera só ele ficar de TPM, aí você vai querer


voltar para o litoral — Fernando disse sorrindo.

Nessa hora Gu voltou e entrou na brincadeira.

— Eu não fico de TPM, a moça aqui é o João que é


todo sentimental, apesar de sempre ficar iludindo e
quebrando o coração das moças por aí.

— Não sou sentimental, só sou um cara romântico —


João piscou um olho para mim e Gu deu um tapa de leve na
cabeça dele, que sorriu em resposta. — E eu não as iludo,
elas que se apaixonam fácil.

— Fiquei curiosa — falei mudando de assunto — Por


que deram o nome de Clube Angels? — perguntei fazendo
um círculo com o indicador para cima e apontando o
espaço, enquanto bebericava meu Jack com Coca.

— Não é claro para você? — Gu perguntou com a


sobrancelha arqueada.

— Pra mim não. — Dei de ombros.

— Angels — disse, apontando o indicador para ele e


para os amigos.

Semicerrei os olhos tentando entender, até que abri


um sorriso quando a resposta veio.

— Ahhh... claro! Fala sério? Anjos? Vocês? — Todos


riram.

— Sim, somos. Na faculdade éramos conhecidos


como os anjos da noite, que levam as mulheres ao céu —
Fernando disse com um sorriso safado e lindo no rosto.

— Ok. Ok. Muita informação — falei sacudindo as


mãos e eles riram.

— Bom, o papo está bom, mas vou subir para


trabalhar, já que alguém tem que fazer isso. No final da
noite me junto a vocês — João informou passando por mim
e em despedida me deu um beijo no rosto, que fez meu
primo fechar a cara. — Prazer em te conhecer, Lívia.

— Rodrigo e eu vamos para o estoque ver se os


funcionários conseguiram fazer o levantamento de tudo que
precisamos para próxima semana. Logo estaremos de volta
também.

— Preciso mesmo ir, Fernando? — Rodrigo perguntou,


mas me olhando fixamente.

— Vai logo, Rodrigo! — Gu o expulsou e vi que os


rapazes estavam flertando comigo, mais para irritar o
Gustavo do que por qualquer outra coisa e então eu ri em
resposta balançando a cabeça em negativo.

Quando os outros Angels partiram, Gu e eu nos


sentamos nos bancos altos do bar e ele me contou como
realmente eram o terror da faculdade e que deixavam as
mulheres loucas. Quis completar que não conseguia
imaginar o motivo.

Será que pelos braços fortes?

Pelos rostos lindos?

Ou pelos sorrisos perfeitos, que deixam qualquer


mulher maluca?

Pensei que seria mesmo difícil resistir a qualquer um


deles, inclusive ao meu primo, que eu já havia comprovado
por mais de uma vez, tinha um abdômen perfeito. Perfeito!

Não podia reparar no abdômen do meu primo.

Balancei a cabeça para clarear as ideias e continuei


conversando com o Gu e bebendo Jack com Coca.
Realmente era uma ótima mistura.

Gustavo bebeu comigo, dançou na pista de dança e


depois ele me mostrou o resto da casa noturna. Apresentou-
me a algumas pessoas que encontrou por lá e a hora
passou voando.

Um tempo depois os amigos do Gustavo voltaram e


se juntaram a nós, dizendo que estavam liberados para
aproveitar. Gu tinha me dito que escolheram não abrir a
casa noturna de dia e deixar o trabalho todo para parte da
noite, assim eles ficariam todos os dias até fechar e não
tirariam o olho de tudo que acontecia ali.

A Angels já estava quase fechando e pouquíssimas


pessoas encontravam-se pelos cantos. O Dj disse que
tocaria a saideira e encerraria as atividades após a
contagem regressiva.

Deu-se início a contagem e ao término dela começou


a tocar La cubanita, um techno bem dos antigos.

Soube pelo Gu que a Angels era uma balada que


tocava de tudo e esse era o diferencial deles. A ideia de
uma balada eclética surgiu justamente por os quatro amigos
serem tão diferentes uns dos outros, física e
emocionalmente e ainda assim se darem tão bem.

A música acabou e os seguranças começaram a


mostrar a saída aos poucos bêbados que restavam,
enquanto observávamos de longe. Em um certo momento,
notei que Fernando tentava tirar a atenção do Gu de um
ponto específico, como se não quisesse que ele visse o que
tinha no canto com pouca luz, mas foi tarde.

Gu também notou a manobra do amigo, olhou por


cima do ombro do Fernando e perguntou alto:

— Mas que porra é essa?


Olhava para uma moça ruiva, que se agarrava com
homem em um dos lounges.

— Calma, cara! Vocês não têm mais nada. Relaxa. —


Fernando tentou acalmá- lo.

Gu olhou mais uma vez para o sofá, balançou a


cabeça em negativo e virou–se para sair de perto de todos.
Bufava com ódio, que até me abandonou, não se lembrando
de que eu o esperava para ir para casa.

Os outros Angels pediram para um dos seguranças


acompanhá-lo, mas minutos depois ele voltou para nos
avisar que Gu tinha ido embora.

Fiquei vermelha de raiva, me despedi dos rapazes e


avisei que procuraria um táxi ali por perto.

— Não, eu te levo, Lívia — João se ofereceu.

— Não quero te atrapalhar.

— Não vai e não vou te deixar ir sozinha. Esse


horário é bem perigoso.

Pensei um pouco e como não conhecia quase nada


na cidade decidi aceitar a oferta de carona.

— Tudo bem.

Olhei em direção à porta como se esperasse que


Gustavo voltasse para me buscar, mas nem sinal dele.

— Vou só resolver umas últimas pendências aqui e já


vamos. Pode me esperar?

— Claro. Leve o tempo que precisar. Não estou com


pressa. — Sorri sem jeito.
Fernando e Rodrigo nos observavam com atenção
até que João os chamou até o escritório e os três sumiram
da minha visão.

Esperei mais alguns poucos minutos no bar, até que


João voltou acompanhado dos amigos.

— Vamos? — Ofereceu seu braço, bem cavalheiro,


como se quisesse me fazer rir e eu aceitei.

— Sim.

Seguimos para saída e antes que nos afastássemos


de vez, ouvi murmúrios de Rodrigo e Fernando dizendo para
o João se lembrar do que eles haviam conversado e para
termos cuidado com o Gu. João balançou a cabeça rindo,
mostrando a covinha linda que carregava no rosto e nem
deu atenção ao que os amigos diziam.

Muito charmoso!

Entrei no carro do João e fomos o caminho todo


conversando sobre assuntos diversos. Descobri que além de
lindo era muito divertido.

Não quis invadir a privacidade do meu primo, então


não perguntei ao João quem era a ruiva que fez com que Gu
saísse bufando da Angels daquele jeito, mas acreditava que
devia ser a namorada/não namorada dele.

Alguns minutos depois, chegamos em frente ao


prédio do Gu. João parou o carro no meio fio e em seguida
tirei o cinto de segurança para descer, mas antes precisava
agradecer a carona.

— Bom, obrigada por me trazer.


Ele pegou minha mão.

— Fiquei feliz em te conhecer, Lívia.

— Eu também gostei de todos vocês. — João soltou o


ar parecendo desapontado.

— Pô, achei que você ia responder “eu também


gostei de você” e você me vem com esse plural aí.

Sorri sem jeito.

— É que eu realmente gostei de todos.

— Que seja, mas pelo menos me diz que você gostou


mais de mim?

— Tá, mas não conte aos outros. — Ele me abriu um


sorriso enorme e assentiu olhando para minha boca.

Senti o clima esquentar e parecia que João me


beijaria a qualquer momento, então decidi colocar um
espaço.

— Vou subir. João, muito obrigada pela carona.

Assentiu.

— Imagina. Sempre que precisar de mim, me grita.


Ah, e só mais uma coisa, você vai à Angels amanhã?

— Não sei, porque amanhã acho que o Gu não vai


poder me dar atenção e não quero atrapalhá-lo. Acho que
vou esperar fazer amigos na faculdade para voltar lá.

— Bom, sou seu amigo e amanhã vou estar livre, se


quiser te faço companhia.
Pensei um pouco, cogitei se o Gu gostaria que eu
fosse e cheguei à conclusão de que ele não veria problema.

— Ok. Te encontro lá então. — Sorriu em resposta.

Dei um tchau tímido e ele se inclinou para me dar


um beijo na bochecha, no entanto, deu uma leve desviada e
o beijo pegou no canto da boca.

Fiquei sem graça, dei tchau mais uma vez e segui,


sorrindo e sem olhar para trás.

Já no apartamento, quando abri a porta da frente,


logo vi o Gustavo jogado no sofá, com uma garrafa de vodca
nas mãos e com o rosto triste.

— Gu, você está bem? — Aproximei-me preocupada.

— Aquela... ela estava lá com outro cara, Lívia. Por


quanto tempo ela faz isso? E eu aqui sempre esperando por
ela. Ei, seu rosto tá esquisito, Lili, seu olho... — Semicerrou
os olhos. — Está tremido.

Sorri e a raiva que antes eu sentia dele por ter me


deixado para trás, passou. Naquele momento eu teria que
cuidar de um bêbado apaixonado.

— Não fica assim, Gu. Não a conheço, mas se ela fez


isso, não merece nem um minuto da sua tristeza e muito
menos que você beba essa garrafa de vodca inteira.

— Nossa, eu não bebi tudo isso. Bebi só um


pouquinho... Ah, danadinha, foi você que bebeu, né? — Deu
uma gargalhada bêbada que me fez rir também.

— Vem, vou cuidar de você.


— Meu Deus! — gritou e eu tomei um susto. — Eu
esqueci você lá. Como você voltou para casa? Eu sou um
idiota, me desculpa, Lili? Me dexculpa?

— Desculpo, vamos.

— Como você é mandona. Uma mandona linda. E se


não fosse minha prima eu pegava você. Pegava muito.
Vamos fingir que você não é minha prima só um pouquinho?

Ri e levei-o até o quarto com muita dificuldade, ele


era pesado e estava trançando as pernas de tão bêbado.

Sentia-me o título da música da Elis, ele o bêbado e


eu a equilibrista. Equilibrava-me para não cair com aquele
homão todo em cima de mim.

No quarto tirei o seu sapato, pensei em jogá-lo em


um banho frio, mas fiquei com dó e então só o pousei na
cama.

Com as mãos na cintura o observei por um tempo,


logo fechou os olhos e com a boca um pouco aberta dormiu.
Balancei a cabeça em negativo para irresponsabilidade dele
de beber tanto assim.

Acomodei-me na poltrona ao lado da cama e decidi


passar o resto da noite ali, eu não conseguiria dormir no
meu quarto pensando nele completamente bêbado e
dormindo sozinho. Já havia ouvido histórias de pessoas que
morreram engasgadas com o próprio vômito.

Fui até o meu quarto, troquei de roupa depressa e


voltei a me acomodar na poltrona olhando para o Gu,
enquanto ele continuava deitado na mesma posição.
Alguns minutos se passaram, a poltrona começou a
ficar desconfortável e a cama king do Gu estava muito
convidativa. Não aguentei e tive que me acomodar nela.

Deitei-me lentamente, puxei o cobertor para cima de


mim e mantive uma distância considerável.

Olhei para o Gu por alguns instantes e admirei como


meu primo era lindo.

— Eu também pegava você, Gu — falei baixo e sorri.

O sono começou a me tomar e esperava que meu


primo não ficasse bravo por eu ter dormido ali. Foi
necessário.

Não demorou até que o cansaço me venceu e não


consegui mais velar o sono do bêbado apaixonado por
muito mais tempo, adormeci.
Capítulo nove
Gustavo
Acordei com uma dor de cabeça dos infernos, meio
desnorteado e a última coisa de que me lembrava, era de
estar na sala e conversando com a Lívia.

Coloquei a mão na cabeça para ver se ela parava de


latejar e lutei contra a claridade, que atravessava a cortina
fina na janela e invadia o quarto, fazendo com que eu
semicerrasse os olhos ao olhar em volta.

Por fim, consegui manter meus olhos abertos o


suficiente para observar tudo e foi aí que o susto me
atingiu. Vi coxas bem gostosas e uma mulher deitada de
lado. Não me lembrava de ter levado nenhuma mulher para
casa.

Levantei um pouco apoiado nos cotovelos e enfim vi


o rosto dela.

Caralho! É a Lili!

Saí com um pulo da cama e esfreguei meus olhos


para ver se realmente era ela. E era.
Dei mais uma olhada e minha prima, que seguia
deitada de lado, com o braço embaixo do rosto e com o
cobertor enroscado em seu corpo, passando entre as suas
pernas e deixando as coxas grossas à mostra. A bunda mal
era escondida pelo short curto e preto, que fazia conjunto
com a regata também preta que ela usava.

Senti meu corpo pegar fogo e minha ereção matinal


me tirou do transe.

Porra! Que Deus me perdoe... Não posso estar


olhando minha prima desse jeito.

Eu não posso!

Peguei uma bermuda, uma toalha e fui para o banho.

Quando saí de lá vestido e cheirando


descentemente, não mais como um pudim de álcool, sentei-
me na poltrona de frente para cama e sorri ao ver como
minha prima dormia feito um anjo.

O que será que fiz para ela dormir ali?

Pensei que sexo com minha prima não foi, não podia
ter sido isso, seria sério demais para que eu não me
lembrasse.

Deu-me uma ânsia em pensar nessa hipótese. Não


que minha prima não fosse gostosa o suficiente para isso,
mas ela era minha prima.

Como se adivinhasse que eu a observava, ela


acordou e me lançou um sorriso tímido.

— Bom dia. Melhorou? — perguntou.

— De quê?
— Da bebedeira.

— Estou com um pouco de dor de cabeça e só. — Ela


sorriu e sentou-se na cama se espreguiçando.

Quando ergueu os braços e fechou os olhos, se


esticando, vi um pouco da sua barriga e desviei os olhos
rapidamente.

— Gu, sua cama é maravilhosa. — Sorri para ela, mas


o seu sorriso se apagou e séria continuou a falar: — Sinto
muito pela noite de ontem e... pela ruiva.

Foi aí que o entendimento tomou conta de mim e


junto vieram as lembranças da noite anterior: a Bruna com
um cara, a bebedeira e eu bravo, indo embora sem pensar.

Fechei o rosto fazendo com que o sorriso que eu


estava dando desaparecesse. Lembrei-me da Lívia me
levando para cama, me arrastando, na verdade, e depois
disso não me lembrava de mais nada.

Espera! Como ela veio embora? Me lembro de deixá-


la lá.

— Meu Deus, Lívia. Me desculpa? Nossa... Não estou


acostumado em ter que trazer alguém para casa. Fiquei tão
puto, que esqueci você lá.

Ela riu.

— Não esquenta, o João me trouxe. — Saber que eu


tinha a abandonado e que João a havia levado embora, me
deu mais raiva do que ver a Bruna beijando outro.

De repente senti como se perder a Bruna de vez, não


me irritasse tanto como imaginei na noite anterior e senti-
me um idiota.

Foi mais como se eu só estivesse perdendo o


brinquedo que eu era acostumado a brincar. Doeu-me mais,
ter deixado a Lili para trás.

Filho da puta de João!

— Quanto a Bruna, não sinta, é passado. Mas agora


me conta, o João tentou alguma coisa com você?

— Não. — Vi que deu um sorriso meio tímido.

— Não?

— Bom, não... só algumas investidas, um beijo no


rosto e me convidou para ir à Angels hoje.

— E você vai?

— Estou pensando em ir sim.

Assenti, disfarçando que me incomodou muito a


história dela com o João. Esperava que ele se comportasse
ou ia ser obrigado a quebrar a cara do meu amigo.

— Como veio parar na minha cama? — mudei de


assunto tentando perguntar da maneira mais sutil possível,
não demonstrando meu medo da resposta.

— Bom, me desculpa por isso, é que fiquei com medo


de você passar mal e decidi ficar por aqui para cuidar de
você. A princípio fiquei na poltrona, mas sua cama estava
tão convidativa que não resisti.

Sorri e respirei por não ser nada do que eu tinha


medo.
Ela mordeu o canto do lábio inferior, meio sem jeito e
mesmo com os olhos inchados por ter acabado de acordar,
era bonita.

— Obrigado, Lili. — Levantei e dei um beijo em sua


testa. — Já são quase duas da tarde e tenho Jiu Jitsu, vou me
arrumar para sair, você vai ficar bem sozinha?

— Está explicado então. — Pensou alto.

— Explicado? — perguntei com os olhos


semicerrados.

— É... Está explicado de onde vem seus músculos,


pensei mesmo que você devia... se exercitar — meio
gaguejou, pensando nas palavras.

— Sim, faço, três dias na semana, se quiser vir


comigo conhecer, pelo menos você sai de casa um pouco,
depois de cuidar do bêbado do seu primo.

— Se não for me deixar para trás, eu vou.

— Você vai usar isso contra mim eternamente, né?

— Vou. Sorte sua que não vou contar para o meu pai.

— Pirralha provocadora.

Rimos.

— Me arrumo em um minuto. — Lívia se levantou em


um pulo e pude ver que sua roupa de dormir mais mostrava
que cobria.

Cogitei que, talvez, por eu ser seu primo, ela não via
malícia e eu também não devesse ver.
— E, Lívia... — chamei-a antes que saísse do quarto.
— Mais uma vez obrigado por cuidar de mim, prometo fazer
o possível para isso nunca mais acontecer.

— Fica tranquilo, Gu. — Lançou-me um sorriso de


cumplicidade que acertou direto no meu coração.

Olhei-a passar pela porta e pensei no quanto eu


gostava daquela menina e pensei também que pelo que
pude ver pela manhã, minha prima havia crescido e de
menina não tinha nada, era um baita de um mulherão capaz
de deixar qualquer homem doido.

Qualquer homem.

Senti-me novamente culpado por olhá-la dessa


maneira.

Ela é sua prima, porra!


Capítulo dez
Lívia
Coloquei um jeans, uma baby look e um tênis, depois
saí do quarto ao encontro do meu primo que me esperava
na sala.

Seguimos até a academia em que ele treinava e me


espantei com a quantidade de mulher bonita que virava o
pescoço para olhá-lo. Ele sorria para elas e suspiros se
formavam.

Também... parecendo com o Capitão América só


podia ter esse efeito sobre as mulheres. E o sem vergonha
sabia o que sua presença causava, claro que usava isso a
seu favor, se divertindo com cada jogada de cabelo e
sorrisos insinuadores que recebia.

Vi o treino de Jiu Jitsu e fiquei passada com o quanto


meu primo era bom nisso. Na verdade, eu não entendia
muito das regras e tal, mas sabia que ele era bom, por
causa do sorriso orgulhoso que abria a cada golpe que
acertava e me olhava de longe com seu sorriso exibido.
O treino acabou, Gu foi para o vestiário e eu o
esperei sair, minutos depois ele apareceu de banho tomado
e com a mochila jogada nos ombros.

— E aí, gostou do treino? Eu sou bom, não sou?

— Olha, sob o meu olhar crítico de quem não


entende nada das regras nem dos golpes e menos de quem
está ganhando ou perdendo. Sim, você parece ótimo pra
mim.

Ele riu.

— Você sabe bem como massagear o ego de alguém,


Lili. — Gu jogou o braço em volta do meu ombro.

No mesmo momento olhamos para frente e ele parou


abruptamente quando se deu conta de que uma ruiva nos
olhava com a sobrancelha arqueada.

— Oi, Bruna — ele começou a conversa.

Essa é a Bruna, então?

Não tinha conseguido olhá-la de perto, já que na


noite anterior ela estava se agarrando com outro no escuro.

— Oi, Gustavo, você está bem? — Ela virou-se para


mim e me olhou dos pés à cabeça.

— Sim, estou — Gu respondeu apertando ainda mais


o braço a minha volta.

— Sei... — murmurou ainda me olhando e torceu a


boca.

— Deixa eu te apresentar. Já conhece minha


namorada, a Lívia?
Oi? Namorada? Como assim? Gustavo não complica
as coisas.

Tentei dizer alguma coisa, mas o aperto que ele me


dava, me fez colocar a mão na sua barriga para tentar por
um espaço entre nós e a firmeza dos gominhos que eu senti
por baixo da camisa fina, tirou minha concentração da
conversa.

Lívia, pelo amor de Deus, se situa, ele é seu primo!

Sacudi a cabeça de leve e voltei para conversa.

— Namorada? — a ruiva perguntou com espanto.

— Sim, namorada. Passamos a nos ver mais na


última semana e estou completamente apaixonado. — Ele
se abaixou e me deu um beijo no rosto.

— Por isso que você parou de me ligar?

— Pois é, estava ocupado.

— Amor... é... — Entrei na mentira, limpei a garganta


e continuei a falar: — Vou ali beber água e já volto. — Tentei
me afastar, mas Gu me segurou mais forte.

— Vamos juntos, gata, já acabei aqui. Até mais,


Bruna. — Nós nos afastamos e ela nos seguiu com o olhar
como se não estivesse acreditando no que via.

— O que foi isso? — perguntei com os dentes


cerrados, quando já estávamos longe o suficiente para que
ela não nos ouvisse.

— Isso, foi eu superando as dificuldades. — Sorriu


orgulhoso.
— Com uma mentira? Ela vai acabar descobrindo,
Gu.

— Ah, que se dane, se ela descobrir nós terminamos.


O que não quero é que ela ache que me chifrou e que eu
estou por baixo.

Balancei a cabeça em negativa e revirei os olhos


para ele.

— Hoje de manhã percebi que o meu lance com a


Bruna realmente já tinha acabado faz tempo, como os caras
viviam dizendo. Eu me dei conta de que fiquei mais bravo
por ter te esquecido na Angels do que por ter visto ela
beijando outro. — Deu de ombros.

— Fico feliz por você não estar sofrendo, mas fico


preocupada que se ela descobrir que somos primos vai
saber da mentira e que você só fez isso para irritá-la. E
falando como mulher, isso vai fazer com que ela se sinta
mais confiante e por cima da situação e mais uma coisa: se
ela frequenta a Angels, logo vai sondar e descobrir. Lembra
que você me apresentou para várias pessoas ontem?

— Não pensei nisso.

— Já que começou a mentira agora pense nas


consequências, uma mulher quando se sente trocada vira
fera e vi no olhar da tal da Bruna, que ela já virou.

— Tem razão, mas você vai ter que continuar


mentindo para me ajudar.

— Eu? Você bem que podia ter me perguntado antes,


né?
— Sim. Quer namorar comigo? Pronto perguntei. —
Abriu um sorriso divertido.

— Deixa de ser engraçadinho. Estou falando que


antes de inventar a mentira, você podia ter me perguntado
se eu aceitava participar dela.

— Tem razão, desculpa, mas agi por impulso. Vai,


prima, me ajuda, só por um tempo, uns meses, depois
terminamos. Você vai sofrer por perder esse pedaço de
homem que eu sou, mas depois voltamos a sermos só
primos.

— Meses? — Ri.

— Lívia, eu disse para ela que estava completamente


apaixonado. Um amor assim não acaba em um mês.

— E o que você entende de amor? — perguntei


sorrindo.

— Ah, vai, aceita, juro que vou ser um namorado


legal. Por favor, prima, só para eu não passar de corno para
todo mundo que conheço. Tudo bem que não estava mais
com ela, mas a maioria das pessoas sabia do nosso rolo.

— Tudo bem. Eu topo, mas vou querer presentes do


meu namorado.

— Jogo baixo isso aí. — Semicerrou os olhos para


mim e concordou: — Tá, tudo bem. Justo.

Sorri.

— Estou começando a gostar da ideia.

— Juro que logo, logo isso acaba. Ah! E tem um


problema, você não vai poder namorar mais ninguém, já
que a ideia do namoro de mentira é para que eu não leve
fama de corno.

— Ok. Fechado. Desde que você também não


namore, porque também não quero virar corna.

— Fechado. — Ele me estendeu a mão para


fecharmos nosso acordo.

— Sinto que vou me arrepender disso, mas ok,


fechado. — Peguei sua mão, ele me puxou para um abraço
e sussurrou no meu ouvido:

— Disfarça que ela está olhando. — De canto de olho


vi a ruiva nos observando e o abracei de volta, sussurrando:

— Quero chocolate e Coca na geladeira, sem miséria.

— Esse acordo vai me sair caro — falou baixinho e


passou a mão no meu cabelo.

Quem nos via de longe podia imaginar que


estávamos completamente apaixonados.

— Você que teve a ideia, agora aguenta.

Senti o trepidar do seu peito de encontro ao meu


rosto, quando sorriu.

Ia ser engraçado.

Seguimos para o carro e a música Quase sem querer


da Legião Urbana soou pelos autofalantes quando ele ligou
o rádio.

Enquanto Gu dirigia, parei para pensar no que


concordei em fazer e tive a impressão de que estava me
metendo em uma confusão enorme, porém, meu primo
seguia sendo tão legal comigo que não consegui dizer não
para ele.

Imaginando o que de pior poderia acontecer, cheguei


à conclusão que os gatinhos aparecerem e eu precisar
dispensá-los, seria a parte triste.

Na hora lembrei-me de João e eu o veria naquela


noite.

— E João? — perguntei.

— O que tem ele? — Gu perguntou em resposta.

— Vou sair com ele hoje.

— Você não vai sair com ele, só vai à Angels.

— Isso é sair, Gu. E pensando no quase beijo que ele


me deu ontem, acho que João tem segundas intensões.

Gu me encarou irritado.

— Ele te beijou? Você não me disse isso. Falei para


ele ficar longe de você.

— Não foi um beijo, beijão. Foi um selinho no canto


da boca Gu, mas ele deu a entender que queria mais.

— E você quer? — Focou apenas na estrada e não me


olhou.

— Ah, ele é muito gato, sei lá, deixa rolar.

— Você é minha namorada agora, não pode rolar


nada. — Sorriu.

— E você vai mentir para seus amigos também?


— Vou, para o sucesso da operação ninguém pode
saber que é mentira.

— Afff... Meninos... Meninos... Tudo isso para não


pensarem que você é corno, quando nem sequer estava
namorando. Que confuso!

Ele já tinha entrado com o carro na garagem do


prédio, estacionou, desligou o motor e olhou para mim.

— Tudo bem se você não quiser, prima.

Pensei um pouco.

— Gu... está tudo bem. Vamos mostrar para essa


gente o que é um casal apaixonado, ninguém precisa saber
que é mentira. — Ele me lançou um sorriso.

Descemos do carro e enquanto seguíamos para o


elevador, Gustavo pousou a mão nos meus ombros,
acariciou meu pescoço e um arrepio percorreu meu corpo.

Bom, pensei que eu poderia facilmente me


acostumar com os carinhos. Sempre fui meio carente e
carinho gratuito ia ser bom, mesmo que fosse de
mentirinha.

Olhei para meu primo, sorri e ele sorriu de volta.

Esperava que pelo menos, tirássemos umas boas


gargalhadas daquela história toda. Enganar os amigos dele
ia ser engraçado. Uma pena ia ser eu não dar uns pegas no
João, mas, talvez depois que tudo acabasse daria certo.
Capítulo onze
Gustavo
Chegamos ao ap depois da academia, comemos
alguma coisa e cada um foi para o seu quarto.

Peguei-me pensando na confusão que arrumei, mas


no final das contas acreditei que tudo seria divertido. E me
sentia doido para ver as caras dos meus amigos a hora que
eu contasse que Lívia e eu, estávamos namorando.

As horas passaram depressa e já passava das onze


da noite quando estávamos no carro e indo em direção à
Angels.

De canto de olho, disfarçadamente, olhei minha


prima mais uma vez. Ela era linda. Usava um vestido preto,
justo, que marcava bem o corpo. Pensei que graças a Deus
ela era gata, já que era para ser minha namorada de
mentira, que fosse uma mulher bonita.

No carro, conversamos amenidades e resolvemos


alguns pontos sobre as mentiras que contaríamos sobre o
namoro de mentirinha. Decidimos dizer a todos que
estávamos de rolo desde o Natal e que só na noite anterior,
depois que vi que não iria partir o coração da Bruna por ela
já estar com outro, que resolvemos enfim assumir nosso
relacionamento.

Entramos na Angels, deixei a Lili no bar por um


instante e fui até o escritório resolver pendencias.

Encontrava-se sentada em um ponto estratégico,


onde eu podia vê-la lá de cima. Não fiquei confortável em
deixá-la sozinha, ainda mais que prometi para o meu tio que
iria cuidar dela, mas se Lívia subisse, eu não conseguiria dar
baixa em todos os documentos que precisava.

Deus... Quando meu tio descobrir (se descobrir) o


rolo em que meti a mim e a Lívia, ele vai me matar.

Respirei fundo e decidi que com o meu tio eu me


entenderia depois.

Eu encontrava-me no telefone com fornecedores, que


já estavam acostumados a me atender fora do horário
comercial, quando olhei para o bar e vi que a Livia
conversava com o João. Ela seguia sentada em um banco
alto e ele estava de pé com o braço apoiado no balcão.

Não sabia o motivo, mas senti meu rosto quente de


raiva e ciúme... Não, não era ciúme era só cuidado, não
queria que a Lívia virasse casinho dos meus amigos.

Desliguei rapidamente o telefone e nem me importei


se o fornecedor tinha algo mais a falar. Desci correndo até
onde eles conversavam, cheguei perto o bastante e ouvi um
pedaço da conversa em que o João dizia que eles poderiam
ir até o lounge onde era mais sossegado e lá conversariam
melhor.
Posicionei-me por trás da Lili e coloquei minhas mãos
na sua cintura em um gesto claramente possessivo. João
olhou para minhas mãos e depois para mim franzindo a
testa como se não estivesse entendendo nada.

E lá vamos nós!

— Oi, gata — falei dando um beijo no rosto dela.

Lívia ficou meio travada percebendo que a mentira


começaria e não respondeu, só me deu um sorriso meio
sem graça.

— E aí, João? — cumprimentei.

— E aí? Éééé... Vocês estão... — Ele limpou a


garganta — Juntos?

— Sim, sabe já nos gostávamos desde criança, mas


ontem quando vi que a Bruna estava de boa quanto a mim,
decidimos assumir. — João ficou sério, meio desconfiado e
olhava da Lívia para mim e de mim para ela.

Eu sorria e Lívia fazia cara de paisagem.

— Se é assim, então por que você saiu tão


transtornado ontem, deixando a Lívia para trás?

— É que eu estava passando mal.

— Entendi — falou ainda parecendo desconfiado e


continuou: — Legal. Parabéns para vocês, então. — Pegou a
sua bebida sobre o balcão e se afastou.

— Isso foi estranho — finalmente Lívia falou.

— Eles vão se acostumar. Dou cinco minutos até


aparecer os outros patetas para confirmar a história dele.
Na verdade, acho melhor nós não esperarmos. Vamos
dançar?

— Dançar?

— Sim, enquanto estivermos dançando, eles não vão


vir contestar nossa história.

Puxei a Lívia pelas mãos e a levei até a pista de


dança onde estava tocando Exagerado do Cazuza. Sim, a
Angels tocava de tudo mesmo.

Fiz uma dramatização da música para ela e minha


prima tampava o rosto com as mãos, nitidamente
envergonhada.

...Exagerado
Jogado aos teus pés
Eu sou mesmo exagerado
Adoro um amor inventado...

No refrão encenei o que dizia a letra da música e


pensei que estávamos sim inventando tudo, mas o sorriso
largo que ela me lançava enquanto testemunhava minha
performance me enchia de alegria e compensava qualquer
possível erro que estávamos cometendo.

Amava minha prima desde que éramos crianças e


vê-la sorrir sempre me fazia feliz.

Ao final da música a puxei para junto e dei um beijo


em sua testa.

— Obrigado por topar participar dessa loucura.

— Tamu junto, primo. — Ela sorria.


Seguimos para o bar e Lívia não quis beber, não era
muito acostumada com álcool, por isso recusou o Jack
Daniel´s que ofereci e ficou só na Coca.

Conversamos mais um pouco e quando vi que meus


amigos se aproximavam, a puxei pela mão mais uma vez e
saímos rapidamente, nos esgueirando pelas pessoas e rindo
durante a nossa fuga.

Em um dos cantos mais escuros, a puxei para perto e


fiquei de frente para ela, rindo e colocando o indicador
sobre a sua boca, como se pedisse silêncio.

Parecíamos duas crianças.

Parei de rir, olhei em seus olhos risonhos que em


seguida se tornaram apreensivos.

Estávamos muito próximos um do outro, senti-me


preenchido e um arrepio estranho subiu por todo meu
corpo. O sorriso que estava em seu rosto sumiu e Lívia me
olhou tensa, como se sentisse a mesma sensação que eu.

— Você é bem louco! — Afastou-se um pouco —


Vamos fugir deles até quando, Gu?

— Até quando conseguirmos, não sou muito bom


com esse negócio de mentira.

— Eu também não. Eu não deveria ter vindo aqui


hoje.

— Devia sim, você é minha namorada. — Ela me deu


um tapa de brincadeira.

— Estou falando sério, Gu, só vim hoje, porque já


tinha combinado com o João, mas evitarei vir. Também devo
estar atrapalhando seu trabalho.

— Você nunca atrapalha — falei de imediato.

Um casal ao nosso lado tirou nossa atenção por


estarem literalmente se comendo em um beijo quase
obsceno. Nós os encaramos por um minuto e me senti meio
estranho ao olhar aquela cena perto dela.

Minha prima virou o rosto nitidamente sem graça e


decidi que era melhor encerrar a noite para evitar mais
constrangimento.

Do nosso esconderijo, liguei para o Fernando e avisei


que teria que levar a Lívia embora e só voltaria no dia
seguinte, ele riu e disse que já sabia que minha história com
ela só podia dar nisso por eu ter essa prima gostosa.

Quis socar a cara dele.

Lívia me observava, arqueou a sobrancelha quando


me viu fechar o cenho depois de mandá-lo se foder e assim
que finalizei a ligação, me perguntou:

— Quem disse que quero ir embora?

— Eu disse, seu namorado.

— Meu namorado homem das cavernas?

— Tipo isso.

— Vai me bater com um pau?

Contive o riso pelo duplo sentido que sua pergunta


continha e Lívia percebendo o que disse riu também.
— Quantos anos você tem? — Desconversou. — Por
hoje é melhor irmos e quando estivermos com a história
mais bem-arranjada, encaramos seus amigos.

— Combinado.

De mãos dadas fomos em direção à saída e quando


olhei para o bar vi meus amigos nos olhando, acenei e dois
deles riram acenando de volta, já o João carregava uma
cara de poucos amigos, deixando claro que não estava
nenhum pouco feliz.

Era como se eu estivesse tirando o novo brinquedo


dele.

Nem tô!

Na realidade, me sentia resolvendo dois problemas


de uma única vez: fazia minha prima se afastar do João, que
eu sabia que não prestava. Era meu amigo, mas o conhecia
bem para dizer que com as mulheres ele não era bom. E
segundo, dava a volta por cima no caso Bruna.

Após um tempo tudo voltaria ao normal.

Fomos o caminho para casa conversando, cantando e


sorrindo. Quando chegamos em casa a convidei para ver um
filme, mas Lívia disse que estava com sono e foi para o
quarto dormir.

Eu não era acostumado a dormir àquela hora, então


fiquei zanzando mais um pouco pela casa até decidir por fim
deitar... porém, o sono não vinha.

Peguei meus fones de ouvido e no aplicativo de


música, sem querer, acabei parando na música Latch,
cantada na versão do Boyce Avenue. Ouvi baixinho.
Era a música que vi Lívia dançar e sem motivo, me
deu vontade de ouvi-la no celular.

Escutei sem parar, enquanto a cena da minha prima


dançando feliz, com as mãos para o alto, não saía da minha
cabeça.

Coloquei a música para repetir e minutos depois


adormeci.

Sonhei com a Lili e eu, juntos... muito juntos, no


parque dos pássaros.
Capítulo doze
Lívia
Acordei com o barulho do despertador.

Enfim havia chegado a tão esperada segunda-feira.

Começaria meu curso na faculdade e por isso pulei


da cama, ansiosa e feliz como nunca.

Parti para o banho e com a água caindo sobre meu


corpo, pensei no quanto passei o final de semana inteiro um
poço de nervosismo. Fiquei ainda mais nervosa, porque não
tinha ninguém para conversar.

Decidi não ir para Cananéia no sábado, já que fazia


apenas uma semana que eu morava na cidade e precisava
provar para mim que não morreria de saudade dos meus
pais, apesar de estar sofrendo a cada minuto pela distância.
No entanto, engoli o sentimento e foquei na ideia de que eu
era uma mulher independente.

Preferi não ir à Angels e assim não precisaria mentir.


Continuaria evitando o quanto pudesse. Sempre fui a que
gaguejava na hora da mentira.
Gu teve que trabalhar e eu passei o final de semana
inteiro sozinha no apartamento.

Troquei poucas palavras com meu primo, sempre


rapidamente quando estava saindo para trabalhar e nos
momentos em que ficava em casa, se trancava no quarto
resolvendo alguma coisa sobre trabalho ou dormia para
descansar.

Só não me senti mais sozinha, porque segui com as


chamadas de vídeo que fazia com o Pepê e com a Vivian.
Minha amiga chorava dramaticamente dizendo que na
segunda-feira eu arrumaria uma nova amiga na faculdade e
iria esquecê-la.

Terminei o banho e percebi que chegaria atrasada se


não corresse, então me sequei rapidinho e quando procurei
a roupa... Cadê?

Que droga!

Eu não levei para o banheiro a muda de roupa que


separei, mas pensei que não tinha problema, já que àquela
hora Gu estava dormindo, no milésimo sono, longe do
horário dele acordar.

Analisei a situação e decidi que seria rápida na


corrida para o quarto.

Xinguei-me por ter esquecido a roupa, porque o


banheiro ficava no corredor e se Gu estivesse com visitas,
sair de toalha não seria educado, mas naquele dia não tinha
ninguém fora eu ali, então cheguei à conclusão que tudo
bem se eu corresse de toalha em direção ao meu quarto.

Enrolei-me no tecido felpudo e coloquei um pouco a


cabeça para fora da porta, olhei para um lado e para o outro
e vi que realmente não havia barulho. Aliviada, voltei para
pegar a roupa suja e sem novamente espiar, abri a porta e
saí.

Foi aí que a maior vergonha da minha vida


aconteceu.

Depois de sair depressa, virei-me para fechar a porta


e quando me voltei novamente para seguir até o quarto, me
choquei com um corpo grande e forte que fez com que eu
derrubasse o montinho de roupas sujas no chão e o impacto
fez o nó da toalha em volta do meu corpo se soltar e cair.

— Opa! — Gu disse, sorrindo e me segurando pelos


ombros.

Afastei-me dele, me abaixei para pegar o pouco de


dignidade que ainda me restava e, meio desajeitada,
coloquei de novo a toalha em volta do corpo o mais
depressa possível.

Após me cobrir olhei para ele e vi que nem tentava


disfarçar que me olhava.

Com as bochechas vermelhas de vergonha, pensei


que não sabia o quanto ele conseguiu ver, mas rezava para
que não tivesse visto nada.

— Para de me olhar, Gustavo! — exclamei quando


ele não disse nada.

— Não estou olhando. — Virou o rosto.

— Mas estava!

— Não, e se estivesse, tem nada aí, que eu ainda não


tenha visto. — Ele ria, o filho da mãe.
— Problema é seu! Sei que viu nas vad... nas
mulheres com quem você anda.

— Estou dizendo, que não tem nada aí, que eu ainda


não tenha visto quando você era bebê, Lívia. Sou cinco anos
mais velho e ajudei a te trocar, prima.

— Pelo amor de Deus, Gu! Não é a mesma coisa. —


Virei-me e fui pisando duro brava para o meu quarto, mas
antes de me afastar de vez o ouvi dizendo baixo ao fundo:
“Definitivamente não é”.

Seguia no carro para faculdade, em silêncio e


olhando janela afora.

Meu primo insistiu em me levar, disse ter prometido


ao tio que me acompanharia e fez questão de manter a
promessa.

Não conseguia olhar para o Gu sem me lembrar do


episódio de nudez pela manhã. Sentia-me envergonhada,
por isso preferi ficar em silêncio e engolir minha vergonha
quieta.

Ele, vez ou outra enquanto dirigia, me olhava


rapidamente e até tentou puxar assunto sobre o tempo,
mas apenas respondi monosilabicamente a todas as suas
tentativas de interação.

— Ei, está brava comigo? — Foi direto ao assunto


quando não aguentou mais meu silêncio.

— Não.
— E por que está falando comigo assim? Ou melhor,
por que não está falando comigo? — Riu.

— Eu estou falando com você.

— Não, não está.

Encarei-o, soltei o ar e desabafei:

— Ah, Gu, quer saber? Estou com vergonha, você me


viu pelada! — Tampei o rosto com as mãos.

— Para de ser boba, prima. Eu vi sim e posso dizer


que você não tem nada do que se envergonhar. — Puxou
minhas mãos do rosto e quando o olhei vi que ele ria.

— Para! — Dei um tapa nele de leve e sorri também.

Pronto, ele já conseguiu quebrar minha barreira.

— Verdade. Você está de parabéns.

— Gustavo! — O filho da mãe ria largamente.

— Tudo bem, vamos mudar de assunto para você não


ficar mais sem jeito. E então, nos vemos à tarde? Que horas
você volta?

— Acho que por volta de uma hora da tarde já estou


em casa.

— Tudo bem. Vou fazer o almoço para nós.

— Você cozinha? — perguntei desdenhando.

— Opa... Claro! Praticamente um chefe.

— Pois é, tenho medo desse praticamente. — Rimos.


Fomos conversando sobre comida, até que minutos
depois paramos em frente à faculdade e já não restava mais
vergonha em mim.

Despedi-me dele com um beijo no rosto e com a


proximidade, senti seu perfume que instantaneamente me
causou arrepio.

Afastei-me depressa e lhe lancei um tchau sem


graça, sem esperar resposta. No entanto, mesmo distante,
enquanto procurava minha sala, pensei:

O que foi isso?

Balancei a cabeça discretamente para afastar


pensamentos errados e sentimentos estranhos, depois
tentei seguir para o meu destino tão entusiasmada quanto
acordei.

O meu primeiro dia de aula foi de apresentações e


dinâmicas. Fiz amizade com várias pessoas da minha sala,
entre elas Igor e Samira.

Samira era linda, com cabelos encaracolados e


cumpridos e parecia ter saído de uma capa de revista, já
Igor era todo engomadinho, daquele tipo que se pudesse
usaria colete de tricô e jeans mais justo, mas não fazia para
não parecer tão ultrapassado, porém seu modelito o
mostrava claramente como um nerd. Era branco, com olhos
e cabelos castanhos.

Nos conectamos de imediato e juntos formamos o


trio perfeito.
Quando mostrei para os dois a foto do meu primo e
contei que morava com ele, descobri que Igor era gay, já
que o comentário dele para foto foi: “Que homem é esse?”.
Samira disse apenas que Gu era lindo e eu ri.

Depois que as aulas começaram as horas passaram


absurdamente rápidas, assim como a semana. Almocei
aquele dia com o Gu e assistimos algumas comédias
românticas à noite.

Estávamos nos dando muito bem. Eu via os filmes


deitada em seu peito, enquanto o braço dele me
aconchegava.

Sempre ficava toda estranha quando me sentava


para assistir filme com o Gu, na verdade, era a proximidade
dele que fazia com que eu me sentisse dessa forma. Porém,
conforme o filme ia passando, quando eu percebia, já
estava toda jogada em seu ombro ao mesmo tempo que ele
acariciava meu cabelo.

Era um carinho inocente, mas ao mesmo tempo,


ouriçava todos os pelinhos do meu corpo.

Às vezes, sentia como se estivéssemos fazendo algo


errado, afinal, éramos primos, depois confortava a mim
mesma pensando que era normal primos serem carinhosos
e estávamos apenas assistindo um filme.

Pelo menos eu esperava que isso fosse


completamente normal. Por Deus, eu esperava que fosse.

Os dias que se seguiram foram tão corridos para nós


dois que quase não o vi. O final de semana chegou e fui
para Cananéia, justamente para colocar uma distância da
correria da cidade e principalmente para evitar ter que ir a
Angels e enfrentar a mentira.
Acabei ficando com saudade do Gu e durante a noite
fazíamos chamadas de vídeo, enquanto ele me contava que
os rapazes perguntavam de mim com frequência, não
acreditavam no nosso relacionamento, principalmente o
João, que era o mais desconfiado de todos.

João...

João era um fofo, com uma covinha linda e não via a


hora da mentira com o Gu acabar. Eu precisava de um
namorado, sempre fui muito carente e pensei que era ela
que, às vezes, podia me fazer confundir as coisas,
embaralhar meus pensamentos e fazer o que não devia...
com meu primo.

Já havia completado dois meses que eu morava na


cidade, não tinha ido mais à Angels e minha vida se resumia
a estudar, estudar e estudar. Ah, e ver filmes agarrada ao
Gu todas as segundas-feiras nas folgas dele.

Eu também passava um tempo conversando por


mensagens com o João, que descobriu o número do meu
celular sem que eu soubesse como e quando lhe perguntei,
respondeu que sempre que queria algo, ninguém o
segurava.

Com isso, começamos a conversar diariamente,


sobre assuntos que variavam de sérios a descontraídos.

Meu novo amigo me perguntava sobre os estudos e


me contava como tinha sido o dia dele. João era muito
engraçado e a conversa era sempre muito divertida,
fazendo ser muito fácil gostar dele.
Como eu sabia que o Gu não gostaria de ver nossa
amizade, acabei não contando que andava conversando
com seu amigo, no entanto, um certo dia, quando
assistíamos a um filme, minha amizade com o João veio à
tona e Gustavo não gostou nada.

Aconteceu quando fui ao banheiro e deixei meu


celular sobre a mesa de centro da sala, no momento em
que voltei tentei me aconchegar de novo em Gu, mas ele
estava emburrado, distante e não me abraçou de volta
como sempre.

Não entendi o motivo do afastamento, mas dei


espaço a ele. Entretanto, após algum tempo, cansei daquele
silêncio todo e perguntei, incomodada:

— O que você tem?

— Nada.

— Mas até cinco minutos atrás você estava normal,


fui ao banheiro e voltei e você está assim... estranho.

Ele bufou, sentou-se de frente para mim e cruzou as


mãos na frente do corpo. Visivelmente irritado.

— Tá, olha, lembra que combinamos que não


teríamos outros relacionamentos? Para mentira dar certo,
não podemos ter outras pessoas. Daí, acabei de descobrir
que você está dando mole para o João?

— Dando mole? — perguntei semicerrando os olhos.

— Sim, seu celular acendeu com a chegada de uma


mensagem e sem querer vi que era do João. E sabe o que
estava escrito? “Manda nudes”. Sério, Lívia? — Ele fez cara
feia. Queria rir da mensagem do João, mas me segurei e não
ri, porque sentia-me irritada com o Gu.

— Sério sim. Somos amigos e a mensagem é uma


brincadeira, não estou mandando nudes para ninguém e
mesmo se eu estivesse, sou solteira, nosso namoro é uma
mentira e não sabia que no nosso combinado eu não
poderia ter amigos também.

— Se o amigo for o João, não pode, não — falou alto,


quase gritando e foi o que bastou para eu parar de falar, me
levantar e seguir para o meu quarto.

Gu está com ciúme de mim com o João?

Não podia acreditar.

Não devia ser ciúme, ele devia estar apenas


tentando cuidar de mim como sempre, afinal, ele me disse
que o João era um mulherengo, mas isso não o dava o
direito de gritar comigo.

Fechei a porta mais forte do que devia e me deitei na


cama pensando que a mentira já estava indo longe demais,
precisava acabar com ela o mais rápido possível.

Já havia passado dois meses, tempo suficiente para


um namoro acabar. Assim eu já podia ser amiga de quem eu
quisesse e o Gu podia seguir com quem ele desejasse.

No mesmo momento àquele pensamento, um aperto


tomou conta de mim e fez minha raiva dissipar.

Pensei que se o Gu arrumasse alguém, nossa


proximidade com certeza teria fim e ao final de tudo, eu não
queria que isso acontecesse.
A sensação estranha no meu peito me deixou
apreensiva e um nó se formou na minha garganta com a
tristeza reprimida. Não queria ficar longe do Gu, mas acabar
com a mentira seria o próximo passo.
Capítulo treze
Gustavo
Passei as mãos no rosto e pensei: o que está
acontecendo comigo?

Desde quando vi Lívia nua no corredor, que andava


tendo sonhos estranhos com ela e me sentindo
extremamente culpado por isso.

Até à igreja eu fui, na intenção de pedir perdão a


Deus por ter certos sonhos com minha prima, que com toda
certeza eu não devia ter.

Às vezes, pensava que isso não significava nada, que


era apenas a abstinência de sexo por estar todo esse tempo
sem ninguém, mesmo assim era errado e o sentimento de
raiva e posse que tomava conta de mim, seguia me
corroendo há dias.

Eu morria a cada comentário que escutava João fazer


sobre Lívia ou quando a levava à faculdade e via os olhares
dos outros homens em volta, a apreciando no momento em
que ela passava.
Olhei para o corredor e cheguei à conclusão que era
minha obrigação pedir desculpas por ter falado alto com
ela. Eu não tinha o direito. Ainda mais por estar possesso
por ciúme.

Ciúme?

Não, não era ciúme era apenas cuidado com minha


prima.

Porra! Lívia tinha que me entender, João não


prestava para ela.

Não, era ciúme sim!

Precisava de uma cerveja. Segui até a geladeira,


peguei uma lata e encostei-me ao balcão tentando entender
o sentimento doido que apertava o meu coração.

Um querer e não poder... mas querer o quê? Eu não


podia querer nada! Abri outra lata que bebi praticamente
em um único gole enquanto olhava fixamente um ponto
qualquer.

Pensei no final de semana que passei sem ver a Lívia


quando foi para Cananéia e senti o quanto a presença dela
me preenchia.

Senti tanto a sua falta, que conversar com ela por


chamada de vídeo era o ponto alto do meu dia.

Nunca vivi tanto a presença e a ausência de alguém,


mas parando para pensar, vi que, na verdade, era só o
costume de tê-la todos os dias comigo. Era só costume. Pois
mesmo quando passávamos a correria da semana eu sabia
que ela se encontrava ali e estava por perto para trocar
uma palavra ou duas comigo.
Pensei que senti sua falta como a do meu pai ou da
minha mãe quando fui para cidade estudar... Não! Nem se
compara, é diferente. A quem eu estou tentando enganar? A
mim mesmo. Isso é errado!

Virei outra lata de cerveja e vi que não estava


servindo para amortecer o sentimento de culpa misturado
com o de...

Sei lá que porra de sentimento é esse que eu estou


vivenciando.

Eu me via confuso.

Abri o armário de maneira brusca, peguei um copo e


me servi de uma dose generosa de uísque, virando-a goela
abaixo em apenas um gole que desceu queimando.

Pensei que precisava falar com a Lili e pedir


desculpas por eu ter gritado com ela e precisava acabar
com aquela história toda que nos meti, aquilo ia destruir
nossa amizade de primo e não queria perdê-la.

Decidi dar fim a mentira e quando tudo acabasse ela


poderia trocar mensagem, ficar, namorar, transar com
quem quisesse.

Imediatamente ao pensar nisso, a bendita sensação


estranha apareceu dentro de mim de novo e bebi mais um
copo de uísque para ver se passava. Não passou e virei
mais um em uma nova tentativa em vão.

Eu ainda experimentava aquela queimação no peito


que me confundia insistentemente.

Deixei a bebida e segui pelo corredor, tive que me


apoiar na parede para não cair.
Opa, acho que bebi rápido demais, mas tô legal, as
coisas estão meio girando, mas tô legal.

Pisquei para tentar focar e quando cheguei à porta


do quarto da Lívia, bati devagar e esperei para ver se ela
saía.

Apoiei a mão uma de cada lado do batente e


esperei... esperei... já ia bater de novo, ficando com ainda
mais raiva de mim, mas ela abriu.

— Fala, Gu. — Pelo tom da sua voz, seguia chateada.

— Me dexculpa por ter gritado com voxê... você?

— Você bebeu, Gustavo? — me perguntou colocando


a mão na cintura.

— Sxó um pouquinho... Maxs acho que bebi rápido,


me dexculpa? — Tentei não me enrolar tanto ao falar, mas
falhei.

Ela me analisou parecendo menos chateada.

— Tá, desculpo, não estou mais brava, mas agora vê


se vai dormir. — Ia fechar a porta, mas a impedi segurando
com a mão.

— Sabe, Lili, tô com uma coisa estranha aqui dentro.


— Coloquei a mão no peito e continuei: — E não tô
entendendo nada e isso tudo desde que vi... — Parei e a
olhei de cima a baixo, ela pareceu com vergonha. Me
contive me sentindo mal, entrei no quarto e me sentei na
sua cama, mesmo sem ser convidado. — Desde que vi uma
obra de arte, mas pela primeira vez na vida não sei o que
fazer. Você sabe o que está acontecendo? Me explica o que
está acontecendo comigo?
— Não, não sei, mas acho que o caminho agora é
pararmos com essa mentira que arrumamos e voltarmos à
vida normal, onde posso sair com quem eu quiser e você
também.

— Aí é que tá, não quero que você saia com qualquer


um por aí, quero que saia só comigo, só eu sou bom o
bastante pra você.

— Mas você é meu primo, Gu! Quero um


relacionamento de verdade, não de mentirinha.

— Aí é que tá dois. Eu também não quero mais de


mentirinha, eu quero de verdade e isso é uma bosta, porque
não podemos e é tão errado eu dizer isso em voz alta. Mas
tudo bem. — Levantei-me da cama irritado, com pressa e
me desequilibrei me apoiando nela que estava de pé perto
de mim. Lívia tentou me segurar, mas caímos um sobre o
outro e dessa vez eu quem estava por cima.

Rolei para o lado para não a esmagar e tanto eu


quanto ela começamos a rir.

— Temos que parar com isso de cair um sobre o


outro, isso está ficando esxtranho. — Tentei de novo falar
sem enrolar a língua e de novo falhei.

Maldito uísque e maldita cerveja.

— Olha, primo, você tem que parar de beber tanto


assim.

— Eu não. Beber é bom, pelo menos faz com que


essa estranheza dentro de mim se controle. — Levantei
apoiado no cotovelo, olhei fixamente para ela e tirei uma
mexa de cabelo do seu rosto, Lívia me encarou apreensiva e
meus olhos sem que eu pudesse controlar, pairaram por
todo o seu rosto, parando tempo demais na boca e aquilo
que eu sentia em todos os sonhos que tive, voltou. Isso me
deixou puto. Não queria sentir.

Levantei-me, me apoiando para dessa vez não cair e


quando finalmente fiquei em pé e firme, perguntei a ela:

— Estamos bem? Você não está mais brava comigo,


né?

— Não, não estou. Eu não consigo, mesmo que eu


queira. — O olhar que me lançou deu vontade de agarrá-la.

— Tudo bem... Lili, entendo que temos que acabar


com a mentira e terminar nosso namoro. Sei que você vai
sofrer e não vai achar alguém melhor que eu nem tão
bonito ou tão sexy... — Ela me deu um tapa de leve.

— Taaaa... Entendi, super fodão... Estamos


terminados. Agora fora do meu quarto, não tenho um bom
relacionamento com ex. Principalmente quando o ex está
bêbado.

— Só não chora a noite toda, tá?

— Sai do meu quarto, Gustavo!

Lívia me empurrou e saí do quarto com a porta


batendo nas minhas costas, encostei-me a ela e esfreguei o
rosto.

Devia me sentir diferente com o término dessa


confusão toda, mas só conseguia pensar que ela estava
livre para ficar com o João e isso me deixava ainda mais
confuso e com vontade de beber para esquecer.
Capítulo catorze
Lívia
Acordei na terça-feira, fui para faculdade e quando
voltei, assim que entrei no ap no horário habitual, vi o Gu
jogado no sofá assistindo TV.

— E aí? — cumprimentei.

— E aí.

— Bem? — perguntei

— Bem.

— Vamos conversar assim? Não quer conversar


comigo?

— Claro que quero, mas é que estou com uma dor de


cabeça do caralho. — Sentou-se no sofá

— Quer beber mais um pouco? — provoquei-o, rindo


e sentei ao seu lado.

— A culpa foi sua, mulher impossível. Bebi por sua


causa, porque prometi para o tio que iria cuidar de você e
leio uma mensagem do João te pedindo nudes. — Ele
ergueu uma sobrancelha para mim.

— Minha? Eu não tenho nada a ver com isso. Você


bebeu porque é doido e, na verdade, agora eu até posso
mandar nudes para ele se eu quiser, já que não tô mais
namorando.

Ele fechou a cara.

— Não brinca comigo, Lili. — Gargalhei da sua cara


de bravo.

— Tô solteira e na pista, primo. — Revirou os olhos.

— Olha, quanto ao namoro... Na verdade... — Ele


hesitou — Hoje recebi uma mensagem do Rodrigo dizendo
que vai comemorar o aniversário dele na Angels, na sexta e
quer te ver lá comigo. Ele disse para eu te levar, já que todo
esse tempo, falei para eles que estávamos namorando, mas
não fomos lá nem uma vez juntos. Aí, pensei... não tem
como você continuar com a nossa mentira só por mais uma
semaninha?

— Ah, Gu, não vai dar não, você sabe que sou
péssima em mentir, por isso não fui lá esse tempo todo e se
eu for, vou acabar entregando alguma coisa.

— Então... na verdade... já falei que te levaria e não


contei que terminamos.

— Pô, Gu! Isso não vai prestar. Não foi isso que
combinamos.

Parecia envergonhado.
— Vai sim, deixa comigo vai dar tudo certo. Depois
disso juro que terminamos. — Riu.

Soltei o ar, fechei os olhos um pouco e por fim


concordei:

— Tudo bem, mas depois disso acabou, tá? E nem


adianta me pedir uma terceira chance.

Ele abriu um sorriso lindo.

E que sorriso lindo!

A lá Chris Evans, que juro que se minha amiga Vivian


estivesse conosco, teria suspirado e infartado.

— Tudo bem. — Ria vitorioso como se tivesse


ganhado uma batalha.

A semana passou como um borrão. Era tanta matéria


para estudar que estava ficando louca.

No dia do aniversário, não sentia a mínima vontade


de ir à Angels, mas pensei que talvez sair para tomar
alguma coisa e espairecer um pouco, fosse bom.

Não aguentava mais estudar anatomia, fisiologia,


microbiologia e os demais "ias" que a medicina abrangia,
entretanto, se tinha uma coisa que fazia a faculdade valer a
pena, eram Samira e Igor. Eu desejava estar com eles
mesmo no final de semana, sendo assim, perguntei ao
Rodrigo se podia convidá-los para o seu aniversário e para
minha alegria o sócio do Gu concordou, me dando
permissão para convidar quem eu quisesse.
Meus amigos ficaram eufóricos.

A noite caiu e me encontrava no quarto me


maquiando, enquanto Gustavo me esperava na sala. Fiz um
esfumado preto, deixando meus olhos cor de mel ainda
mais em evidência e abusei do delineador.

Vesti uma saia lápis preta e um cropped também


preto de mangas compridas que deixava uma faixa da
minha barriga amostra e uma sandália com salto me
deixava mais alta. Para terminar, passei um batom
vermelho acompanhado de muito rímel, depois soltei os
cabelos e pronto.

Saí do quarto e fui em direção à sala onde


novamente Gu me esperava para sairmos.

— Fiu fiuuuuu... — Assobiou assim que me viu e me


pegou pela mão, fazendo-me dar uma voltinha.

Sorri, mas falei:

— Para que eu fico com vergonha.

— Tá gata pra caralho! — Não consegui conter o riso.

— Vamos?

— Vamos, mas que Deus me ajude. Percebe que


desde que você veio morar aqui o que eu mais faço é pedir
ajuda para Deus? — Ele passou a mão na testa e o empurrei
rindo.

— Não sei o motivo disso, já que sou uma boa


menina.

Encarou-me de maneira suspeita e saímos. Seguimos


para Angels e assim que descemos do carro, Gu me pegou
pela mão para mais uma vez darmos início a mentira e me
olhou sorrindo. Retribuí o sorriso, mas o calafrio que
ultimamente sempre tomava meu corpo quando estava com
ele, surgiu novamente sem que eu pudesse controlar.

O que é isso meu Deus? Devo estar pegando uma


gripe. Gripe! É a única explicação para esses arrepios, não
pode ser outra coisa. Não pode!

Assim que entramos Omi de Cheerleader tocava a


toda altura e comecei a me remexer no ritmo da música.
Amava dançar.

Gu olhou para mim, abriu um lindo sorriso e me


puxou para pista que ainda estava com pouca gente, já que
era cedo.

Começou a fazer uns passos, meio hip hop, passando


a mão pelo meu corpo e eu entrei no embalo me remexendo
também. Passei as mãos pelos cabelos e encostei meu
corpo ao dele.

A cada batida da música Gustavo me virava, me


rodeava e me apertava contra seu corpo forte. Na parte em
que a música ficava mais lenta ele apenas se balançava
devagar e me encarava diretamente nos olhos, enquanto eu
rebolava provocante e mordia o lábio inferior para conter o
sorriso.

Como se aquilo fosse uma loucura, Gu dançava, ria e


balançava a cabeça em negativo, divertido.

Toda aquela proximidade podia ser errada, mas que


ele estava curtindo muito, isso era nítido pelo sorriso largo
em seu rosto... e o meu refletia o dele.
A música acabou e Gu me puxou pela mão para
deixarmos a pista de dança. Enquanto caminhávamos pelo
local, fomos acompanhados por vários pares de olhos
curiosos, afinal, "namorávamos" a mais de dois meses e eu
ainda não tinha ido ali como a namorada. Apostava que
todos duvidavam do nosso namoro.

Por ser a festa de aniversário do Rodrigo, a balada foi


fechada e só estariam presentes os amigos e os clientes
mais assíduos que se tornaram amigos com o tempo. O que
me deixava mais nervosa em pensar que todos que
frequentariam a Angels naquela noite sabiam de nós.

Fomos até o escritório, Gu fez o de costume,


enquanto fiquei olhando a estante de livros que adornava a
sala. Passei os dedos em cada exemplar.

Livros... Sempre me fascinavam.

No entanto, no canto da estante achei um exemplar


da revista Playboy, praticamente escondido e ao pegá-la
ergui para o Gu com um olhar questionador.

— Não é minha — logo foi se justificando.

— Sei... Vou fingir que acredito. — Ele riu de cabeça


baixa olhando para o monitor.

— Mas tem umas matérias muito legais aí. — Bufei,


riu mais uma vez e continuou: — Mudando de assunto, você
dança muito bem.

— Eu tento. — Dei de ombros e coloquei a revista no


lugar. — Fiz balé e street dance por muitos anos. Ah! E, na
verdade, a esfregação durante a dança, era mais para
mostrar a todos o namoro e tal, desculpa se exagerei, mas
dei uma atuada. Era para causar então... — falei rápido e
com vergonha.

— Me use para atuar sempre que quiser. — Fechou o


cenho como se não tivesse gostado do que falei e voltou a
olhar a tela do computador.

— Aí está o casal. — Rodrigo entrou porta adentro. —


Já estou sabendo que deram um pequeno show lá embaixo
na pista. Uauuu, Lívia, você está uma gata — disse tudo de
uma vez, me olhou de cima a baixo e me deu um beijo no
rosto.

— Parabéns, Rodrigo — parabenizei e ele piscou para


mim em resposta.

— E aí, brother, parabéns — Gu disse, indo ao


encontro do amigo e os ambos se abraçaram em um breve
cumprimento de homens com tapas estalados, que doeram
em mim.

Logo começaram a conversar sobre fornecedores e


decidi deixá-los.

— Rapazes, não quero atrapalhar vocês, então vou


descer e encontro vocês lá embaixo — falei, Gu acenou para
mim, mas antes afirmou que eu não atrapalhava nunca e
que em breve me encontraria.

Soprei um beijo em sua direção para continuar com a


atuação e desci.

Ao chegar novamente no térreo, vi que a casa estava


começando a ficar cheia e concluí que pelo jeito Rodrigo era
bem-visto por todos.
Fui até o bar e do caminho avistei meus bests Samira
e Igor sentados em um canto. Feliz fui até eles.

— Olá... Uau que gatos! — falei entre beijos enquanto


os cumprimentava.

— Você que está linda, se eu gostasse de mulher


você e a Samira não me escapariam, mas gosto do que
vocês gostam. — Deu um gole em sua bebida, todo
masculinizado e sem um resquício do seu lado gay.

— Te digo o mesmo, amigo, você está lindo! Se não


gostasse do mesmo que eu, você não me escaparia.

Ele riu e Samira concordou comigo.

Igor era um belo exemplar de homem, lindo em uma


camisa social e jeans preto, enquanto Samira estava linda
em um vestido tubinho e preto.

— Amiga, cadê seu primo? Não vai me apresentar?

— Opa, nos apresentar, né, Samira? Vai que ele


curte. — Ri alto.

— Definitivamente o Gu não curte homens, Igor.

— Não mesmo, só pela foto, vi que ele exala


testosterona, sendo assim, você pode me apresentar. —
Samira sorriu empolgada.

Fiquei séria, mais uma vez me sentindo estranha, e


pensei que provavelmente era pela mentira, então decidi
dividir com eles toda história do meu namoro falso.

— Sabe, preciso ter uma conversa com vocês e


contar um segredo, mas que pelo amor de Deus, fica entre
nós.
— Tudo bem — os dois concordaram juntos, ri das
caras de curiosos e contei tudo: a mentira, o motivo da
mentira, o término da mentira, o retorno da mentira e que
ela acabaria amanhã novamente.

— Eita! Homem com o ego ferido é pior que mulher.


Toda essa confusão para não pensarem que ele é corno,
quando nem estava mais com a moça — constatou Igor.

— Pois é — confirmei.

— Miga, se quiser faço isso no seu lugar — Samira se


ofereceu, mas fiquei meio desconfortável com todo
interesse dela por Gu.

Já estava acostumada com a admiração sem fim da


minha amiga Vivian, ainda que o interesse dela fosse mais
para platônico, já o da Samira percebi que era real.

— Deixa comigo, Sá. Dou conta.

Ela semicerrou os olhos para mim como se me


avaliasse.

— Dá conta? — perguntou e eu sorri sem jeito.

— E nem vai ser difícil ficar se esfregando naquele


deus grego. — Igor me empurrou com o ombro.

— Nem um pouco, mas pena que ele é meu primo. —


Fiz questão de frisar.

Pena! O que eu estou pensando? Para já com isso,


Lívia!

— Pena nada, boba, primo com primo pode e nem


vira lobisomem... Afff detesto esse ditado "homem com
homem vira lobisomem", sou a prova viva de que homem
com homem pode sim e é mentira esse ditado, nunca virei
lobisomem — Igor me animou falando suas bobeiras e
sorriu.

Sorri de volta completamente desconsertada com


aquela conversa.

— Acho que não pode, não — afirmei triste.

— Preconceituosa!

— Nãooo, Igor. — Ri — Quis dizer que não pode primo


com primo — O desânimo apareceu na minha voz sem que
eu deixasse e os dois semicerraram os olhos juntos, como
se tomassem entendimento de algo. — Homem com homem
pode e deve — completei tentando descontrair.

— Consideramos justas todas as formas de amor, e


digo que pode sim — Samira disse sorrindo. — Tanto primo
com primo, quanto homem com homem.

— Apoiada! — Igor concordou. — E acho que tem


alguém aqui apaixonada. — Empurrou-me de novo com o
ombro.

Apaixonada? Não!

Não tive tempo de responder, porque fui tirada dos


meus pensamentos confusos quando Gu chegou e meus
amigos ficaram maravilhados com ele.

Samira enxuga a baba!

Igor se apresentou com um aperto de mão forte e


quem olhasse meu amigo de longe realmente não
desconfiaria que era gay, tanto que Gu perguntou se Samira
e Igor eram namorados e claro os dois caíram na risada
falando um sonoro não e deixando-o sem entender nada.

Gu se sentou ao meu lado e ficamos os quatro


conversando sobre banalidades. Meus amigos me lançavam
olhares furtivos todas as vezes que meu primo se encostava
em mim ou me dizia algo meloso.

Rodrigo se juntou a nós pouco depois e eu o


apresentei aos meus amigos que o parabenizaram.

Notei que ele praticamente devorou Samira com os


olhos e fez a mesma pergunta que o Gu, se Samira e Igor
eram namorados, os dois se entreolharam e riram gritando
mais uma vez um alto e sonoro não.

Vi que Rodrigo ficou feliz em saber que meus amigos


não eram namorados e mesmo sem entender o “não”
exagerado, sorriu e deu uma piscadinha para Samira que
correspondeu também sorrindo.

Minha amiga vai se dar bem!

Fernando e João também se juntaram a nós e assim


que João chegou, Gu me puxou pela cintura, me fazendo
ficar de pé entre as suas pernas. Meu primo estava sentado
no banco alto do bar o que facilitou a posição.

Fernando me cumprimentou com um beijo no rosto e


depois apertou a mão do Gu, João fez o mesmo e apresentei
meus amigos a eles.

Cumprimentos feitos, fizemos uma roda e para o


meu desespero começamos a conversar.

— Até que enfim estou vendo vocês juntos, achei que


esse namoro era fake[3] — João provocou.
— É que a Lívia anda muito cansada com a
faculdade. Temos muito tempo ainda para sair juntos. Agora
prefiro que ela se dedique aos estudos, não é, amor? —
Assenti depressa demais. — Mas posso dizer que morarmos
juntos favorece o namoro.

Gu me puxou para mais perto, eu corei e sorri


concordando mesmo estando tensa.

Disfarçadamente dei uma cotovelada nele, que em


resposta apenas passou o dedo carinhosamente na fenda
entre minha saia e o cropped, fazendo um arrepio se
espalhar por todo meu corpo e meus pelinhos se
arrepiarem.

— Está com frio? — o desgraçado perguntou


sorrindo, para que apenas eu ouvisse.

— Não — respondi um tanto irritada, saí do aperto


dele e pedi um Jack com Coca ao barman.

Não estava me reconhecendo, nunca senti isso com


o toque do Fábio, meu ex, nem de nenhum outro. Pensava
que por Gu ser meu primo e por entender que tudo era tão
errado, acabava sentindo em um nível elevado.

Precisava acabar logo com aquilo.

Samira me olhou desconfiada, sendo acompanhada


por Igor. Parecia que me viam por dentro, mas a conversa
animada de uma história que o Rodrigo contava, tirou de
mim a atenção.

Com minha bebida em mãos, voltei a sentar no


banco que eu estava antes do Gu me puxar para ele. Não
demorou até que João se acomodou ao meu lado e com
minha visão lateral vi Gustavo se incomodar.
Nem um minuto depois deu um jeito de me puxar
para junto dele de novo.

Cada um dos nossos gestos não passavam


despercebidos, pensei se seria assim se fosse qualquer
mulher que não eu, mas cheguei à conclusão que o fato de
eu ter sumido depois de assumirmos tão repentinamente
um relacionamento, quando até uns dias antes o Gu corria
atrás de outra, que era o que causava todo o interesse
coletivo.

Aparentava até que o fato de sermos primos todos


levavam numa boa.

Já a mim, o que mais me apavorava era todo nosso


contato físico e a proximidade excessiva que me deixava
estranha, com sensações e desejos que eu não entendia ou
evitava entender.

Ao meu redor a conversa animada regia a festa,


mesmo em meio a música alta. Igor e Samira se davam
muito bem com todos e formávamos um só grupo de
amigos, o que me deixava muito feliz em uni-los.

Um tempo depois fui dançar com a Samira e


deixamos os meninos conversando sobre diversos assuntos.

— Você e seu primo fazem um lindo casal — Samira


meio falou e meio gritou por causa da música.

— É, mas não somos um.

— Por enquanto.

Fiz uma careta sem jeito e neguei com a cabeça,


como se ela estivesse dizendo uma loucura, em
contrapartida minha amiga me lançou um sorriso e deu um
gole em sua bebida colorida, que eu não fazia ideia do que
era.

Após nos acabarmos de dançar, decidimos dar uma


pausa e ir ao banheiro. Na volta, quando já chegávamos
próximas aos rapazes, vi de longe uma cabeleira ruiva de
costa para mim e de frente para o Gu.

Imediatamente reconheci como a ruiva, a tal da


Bruna.

Senti meu rosto pegar fogo e parei abruptamente,


decidi que devia dar espaço ao meu primo. Desejei ser
invisível naquele momento.

— O que foi? Por que parou?

— Samira, aquela ruiva era namorada do Gu. —


Apontei discretamente para Bruna.

— E o que que tem? — perguntou impaciente.

— Tem que não vou lá.

— Ah, você vai! Pode ser de mentira, mas você é a


namorada dele agora e se ele te meteu nesse rolo todo para
não ser corno, então você que não vai ser também. Vai lá
agora e mostra para Ariel siliconada, que você que é a dona
desse mar e daquele peixão.

Mesmo em meio aquela situação, tive que rir dos


apelidos.

Samira tinha razão, eu precisava me posicionar, se


eu não podia, ele também não podia.

Olhei para os dois conversando e voltei a encarar


Samira que me pegou pelo pulso e começou a me puxar
sentido ao bar.

Conhecia minha amiga há apenas alguns meses, mas


meu carinho por ela e pelo Igor foi desde o primeiro contato,
quando se tornaram meus novos melhores amigos de
infância. Que a Vivian não me ouça.

Dei um longo suspiro e segui para o bar toda


trabalhada na autoconfiança ou não. Na realidade, toda
trabalhada na mentira.

Ao me ver, Gu se posicionou melhor no banco e ao


me aproximar ouvi quando a ruiva perguntou:

— É sério isso, Gustavo? Se é, então por que está tão


mal contado?

— Muito sério — Gu respondeu.

— Voltei, amor. — Atuei e passei o braço sobre os


ombros do Gu, que me olhou como se não esperasse o
gesto.

Logo atrás vi Samira me lançar sinal de positivo com


o polegar.

— Você demorou. — Gustavo me deu um beijo na


bochecha parecendo feliz e Bruna se afastou um pouco.

— Vou atuar tão bem que você vai dizer que mereço
o Oscar — sussurrei para que só ele me ouvisse.

— Tudo bem, vamos atuar — foi a sua vez de


sussurrar no meu ouvido e eu sorri.

— Pervertidos, parem de dizer pornografias um para


o outro — Igor nos interrompeu.
Sorrimos, olhei para Bruna e a cumprimentei
cordialmente, enquanto ela mal abriu a boca em resposta.

Passado o desconforto inicial, as conversas


continuaram, mas todos pareciam desconfortáveis com a
presença da ruiva, que nos fitava insistentemente e não
disfarçava.

Bebia um líquido vermelho que deixava seus lábios


ainda mais chamativos, mas parecia que só eu estava
prestando atenção, porque os meninos do grupo faziam o
possível para deixá-la isolada. Claramente não gostavam
dela.

— Gustavo, conte-me mais sobre como você deixou


de me amar da noite para o dia — Bruna provocou algum
tempo depois, meio bêbada.

— Não deixei, Bruna.

— Não? — Ela pareceu se inflar, enquanto eu fiquei


completamente dura e tentei me afastar dele, que me
manteve próxima ao seu corpo, me apertando com a mão
pousada na minha cintura.

— Não, porque eu nunca te amei. — Houve um


sonoro “oh” de todos, que foi sufocado pela música alta.

Bruna fechou a cara e cruzou os braços na frente do


peito.

— Tudo bem, vou fingir que acredito. Você vivia


correndo atrás de mim e da noite para o dia parou, depois
disse que estava apaixonado por essa... Lívia, sendo que eu
sei que ela é sua prima.

Ela descobriu.
— E o que tem ela ser minha prima? Primos
namoram — Gu respondeu tranquilamente.

— Eu já beijei vários primos meus — Samira se


meteu, Bruna olhou para ela como se fosse nada e isso fez
com que me sentisse quente de raiva.

Ela não pode olhar assim para minha amiga.

Ia xingá-la, mas ela continuou:

— Tenho para mim que esse seu namoro, é seu modo


de me fazer sentir ciúme, Gustavo. — Gu riu sem vontade.

— Você está se sentindo importante demais, Bruna.

— Ah, não é? Então prove. Quero que você dê um


beijo nela, mas daqueles de cinema.

— Não preciso te provar nada. — No momento todos


já prestavam atenção na conversa, até João e Fernando que
estavam mais adiante, conversando com outras pessoas, se
juntaram a nós novamente.

Gustavo ficou desconfortável, passou as mãos nos


cabelos enquanto eu me afastei um pouco.

Meu coração batia descompassadamente e quando


ele me puxou para perto de novo, vi que o dele batia
acelerado também.

Entrelaçou os dedos nos meus e senti que meu primo


estava suando frio. Pensei que por medo de ser
desmascarado se não me beijasse.

— Tudo bem, eu já desconfiava mesmo. — Ela deu


uma gargalhada alta. — Que coisa feia, Gustavo, inventando
uma mentira dessas com sua prima, para me provocar e
achando que eu tinha caído nessa.

Olhei um por um que acompanhava a conversa, com


a vergonha estampada em meu rosto e minha vontade era
apenas sumir.

Igor e Samira me olhavam passando apoio, nos olhos


de João eu via divertimento, Rodrigo e Fernando exibiam-se
incrédulos, Gustavo parecia pensar no que ia fazer e
Bruna... sentia-se a dona da porra toda.

Não aguentei a raiva misturada com vergonha, com


ciúme e com a sensação de humilhação que corria dentro
de mim. As erupções de emoções fizeram com que eu me
soltasse do Gu, me afastasse dele e só desejasse sair dali.

Não entendia o que eu sentia e só queria me afastar.


Dei um passo para o lado e vendo que eu fugiria a qualquer
momento, Gu se levantou e me segurou pela mão.

— Espera, Lívia.

Depois não ouvi ou vi mais nada, me lembro dele me


puxando pela mão e me acomodando perfeitamente em
seus braços, sua boca foi direto para minha e seus lábios
quentes se encostarem aos meus, sugando o inferior depois
o superior, como se me pedisse permissão, e por fim, os
abrindo quando não o parei.

Senti sua língua entrar em minha boca e me beijar


firme e, ao mesmo tempo, carinhosamente. Uma de suas
mãos se acomodou no meu pescoço, subindo e se
enroscando entre meus cabelos, enquanto a outra ele
pousou na minha cintura, me prendendo firme e próxima,
muito próxima ao seu corpo.
Primeiro pensei em resistir, mas me encontrava
completamente tomada pelo beijo, que fez o calor que senti
no sonho voltar, só que muito melhor e muito mais quente.
Depois não pensei em mais nada, era como se eu houvesse
sido domada e completamente arrebatada e não tivesse
controle sobre meu corpo.

Sem saber quanto tempo depois, notei que Gustavo


encerrava o beijo com vários selinhos e suas mãos estavam
na altura do meu rosto, o segurando enquanto ele
encerrava nosso beijo de forma carinhosa.

Ouvi vários gritos ao fundo, de todos que antes


acompanhavam a conversa e aí fui voltando em mim.

Escutei a voz de Rodrigo gritando "é disso que eu tô


falando" Igor gritou "essa é minha amiga" e ao fundo ouvi
um "chupa, Ariel siliconada" da Samira.

Os assobios foram cessando e eu estava paralisada e


com muita vergonha. Nunca havia sido beijada daquela
maneira na frente de tanta gente, na verdade, eu nunca
havia sido beijada daquela maneira na vida!

Encontrava-me tomada por uma sensação deliciosa,


mesmo me sentindo um pouco culpada, mas ainda assim
feliz.

Gustavo me abraçou e tentei me esconder no seu


peito.

Um sorriso bobo escapou dos meus lábios, até que


Gu se abaixou na altura do meu ouvido e sussurrou:

— Quem merece o Oscar agora? Desculpa pelo beijo,


mas espero que pelo menos tenha gostado da atuação.
Desculpa pelo beijo?

O seu comentário fez meu coração se apertar, como


se pulasse uma batida.

Era só atuação... Ele quer a Bruna?

Meu peito se apertou e senti como se fosse chorar


como uma boba. Imediatamente contive com um sorriso.

Não me reconhecia e me perguntava que sentimento


e sensação eram aqueles. O que eu queria afinal, que o
beijo e o namoro fossem verdade? Isso não podia!

Meu Deus, preciso acabar com isso, antes que isso


acabe comigo. Preciso me afastar dele.

O que era um beijo real e inigualável para mim, era


apenas um beijo cenográfico para ele, apenas e somente
para provar algo para Bruna.

Eu precisava me afastar.
Capítulo quinze
Gustavo
Bruna exigiu um beijo e eu disse que não precisava
provar nada a ela, mas no momento em que vi um lampejo
de humilhação e rejeição nos olhos da Lívia, enquanto
tentava se afastar de mim, não pensei em mais nada e
tasquei um beijo nela.

Pensei que qualquer coisa seria melhor do que vê-la


saindo dali se sentindo humilhada, mas esse beijo foi mais,
muito mais do que para provar qualquer coisa para quem
quer que fosse.

Cara! Foi o melhor beijo que dei na vida.

Meu coração estava acelerado, duzentas batidas por


minuto era pouco. Eu seguia mais que aproveitando o beijo,
mas me lembrei dos meus pais, da tia Lana e do tio Jonas
me pedindo para cuidar dela e isso definitivamente não era
cuidar.

Um banho de água fria surgiu acompanhado do olhar


deles me recriminando se descobrissem, então finalizei o
beijo que Lívia me retribuía com fervor.

Pensei que talvez só para me ajudar a manter a


mentira.

Tentei respirar e controlar minhas emoções enquanto


dava selinhos na boca da minha prima.

Controle-se, Gustavo.

Isso é só encenação e a Lívia é sua prima.

Isso não pode! E tem que acabar... isso vai acabar.

Sussurrei no ouvido dela que o beijo foi encenação,


apesar do meu coração traidor entregar nitidamente o que
meu corpo estava sentindo. Vi que o leve sorriso que exibia
nos lábios sumiu e seus olhos assumiram uma expressão
triste.

Ela se virou rapidamente para os outros que riam e


nos parabenizavam como se tivéssemos feito um gol no
final de campeonato. O único que não parecia muito feliz
era o João, mas fazer o quê?

Era melhor assim, também já acabava com as


esperanças dele de ter alguma coisa com a Lili. Ele tinha
seus problemas do passado e não era homem para ela.

Lívia se afastou para ir ao banheiro de novo, mas a


expressão de tristeza em seu rosto me deixou triste
também e preocupado.

Estranhei, porque tinha acabado de voltar de lá, mas


arrastou Samira com ela. Vi que Igor as encarava com
preocupação, mas permaneceu ali com a gente.
Ainda não tinha entendido qual era a do Igor, se ele
não estava interessado na Samira, então devia estar
interessado na Lívia. Pensar nisso fez com que eu gostasse
menos dele.

— Ei, cara. — Fui tirado dos meus pensamentos


quando ouvi Fernando. — Então era verdade esse namoro?

— Claro que era.

— Rodrigo e João, vocês me devem mil conto cada


um. Eu ganhei a aposta.

— Esperem aí... Vocês apostaram se eu estava ou


não namorando de verdade? — perguntei.

— Claro! Sua história estava meio mal contada, eu e


João apostamos que era mentira e Fernando foi o único que
apostou que era verdade — disse o Rodrigo desanimado.

— Eu preferia ter ganhado a aposta por dois motivos


e o dinheiro não era o principal deles — João murmurou.

— Parece que temos um triângulo amoroso aqui —


Igor se meteu na conversa, rindo.

— Nem pensar, mulher de amigo meu para mim é


homem. Tiro meu time de campo — João ergueu as mãos
em rendição.

Mantive-me em silêncio até que notei que Lívia


voltava do banheiro e seu rosto já não transparecia a alegria
que tinha antes do beijo, isso fez com que eu me sentisse
um idiota.

— Gu, vou embora, não estou me sentindo bem.

— Eu te levo.
— Não — negou de imediato. — Vou de táxi mesmo,
não precisa se preocupar, aproveita a festa aí.

— O que você tem? Eu te levo. — Já ia me levantar


para levá-la quando ela me interrompeu de maneira seca:

— Não. Fique e comemore com o Rodrigo, te vejo em


casa. — Desviou o olhar.

Mais adiante percebi que Samira me fuzilava com o


olhar e comentava algo com Igor, que assentia. Tentei falar
mais uma vez que levaria Lívia, mas Igor me interrompeu e
disse que também precisava ir e ele a acompanharia até em
casa.

Percebi que tentava salvá-la... de mim.

A raiva daquela proximidade me atingiu. Com Igor


ela aceitou ir sem reclamar. O problema realmente era
comigo. Entendi que havia mesmo um interesse entre eles.

Mantive-me emburrado enquanto via Lívia se afastar


e pedi mais uma bebida.

— Cara, se quiser ir atrás da Lívia por mim tudo bem,


não vou ficar bravo por não ficar no meu aniversário. Na
real, estou achando que eu mesmo vou sair para me dar
bem daqui a pouco — Rodrigo disse e indicou Samira com o
queixo.

Sem responder ao meu amigo, olhei na direção por


onde Lívia tinha ido há pouco e sem pensar no motivo pelo
qual eu não deveria ir, me despedi de Rodrigo e ignorei os
demais que riam por eu seguir atrás da minha prima.

Eu não sabia o que realmente estava sentindo, só


sabia que precisava conversar com ela.
Depressa fui para saída, na esperança de que Lívia e
Igor ainda estivessem por ali, mas nada, então fui para o
meu carro e segui para casa o caminho todo pensando no
motivo que fez Lívia voltar do banheiro com o rosto tão
triste.

Talvez estivesse tão confusa quanto eu.

Dirigi me sentindo em dúvida se devia mesmo ir para


casa ou colocar uma distância entre nós era o melhor a
fazer. Pensava e repensava no beijo, que me deixou em um
pico de felicidade.

Imaginar que Lívia queria distância de mim me


deixava triste. Cogitei voltar para Angels e encher a cara
até não aguentar mais ficar de pé, mas logo deixei a ideia
de lado, porque eu precisava conversar com ela e resolver
toda a merda que inventei. A bebida não podia mais ser
minha fuga.

Que confusão dos infernos!

No rádio do carro Ana Carolina tocava Quem de nós


dois, aumentei o volume e as batidas do violão me
atingirem. Permiti-me pensar por apenas um minuto que se
Lívia não fosse minha prima ela seria a namorada perfeita:
alegre, simpática, carinhosa, linda... Incrivelmente linda.

Sacudi a cabeça.

Não adiantaria pensar no “e se” já que sermos


primos era um empecilho do qual eu nunca conseguiria me
livrar ou desviar. Simplesmente não dava.

Mais uma vez me lembrei do beijo, dos meus pais,


dos meus tios e tudo que vivi com ela desde que éramos
pequenos... Sentia vontade de me bater.
Ela é minha prima, porra!

E aí eu já não sabia se xingava por ela ser minha


prima ou por tudo que estava acontecendo.

Desci do carro no estacionamento do prédio, rezando


para que Lívia tivesse ido para casa e não para qualquer
outro lugar com o Igor.

Subi para o meu apartamento, abri a porta e logo vi


a bolsa e as chaves dela sobre a mesa. Respirei aliviado.

Segui até o corredor e nem precisei ir até seu quarto


para saber onde ela estava, o barulho do chuveiro me
chamou atenção e sabia que se encontrava no banho.

Sentei-me no chão encostado à porta do meu quarto,


de frente para porta do banheiro, e fiquei ali enquanto a
esperava sair. Eu podia ouvir uma música vinda do
banheiro.

Imaginei se estava chorando no banho, não queria


ser o culpado por nenhuma lágrima que caía dos seus olhos,
mas era tudo culpa minha. Esfreguei o rosto, apoiei os
braços nos joelhos e deitei a cabeça sobre eles.

O que estamos fazendo?

Depois de uma eternidade a porta se abriu e me


levantei em um pulo. Ela exibia os olhos inchados, o nariz
vermelho e já usava a roupa de dormir. Graças a Deus
estava de roupa daquela vez. Tinha mesmo chorado e senti
uma pontada de raiva de mim por causar isso.

Ela me olhou com um misto de espanto e vergonha,


como se tivesse sido pega fazendo alguma coisa errada.
Aproximei-me, passei a mão em seu rosto e o toque dos
meus dedos na sua pele, foi de novo mais, muito mais.

— Por que estava chorando?

— Não sei, só me deu vontade. — Tentou se afastar


de mim e eu a segurei.

— Queria te pedir desculpas pelo...

— Está desculpado, Gu, já entendi, sei que foi tudo


um teatro. — Engoli em seco e tive certeza que ela estava
chateada.

— E por que você chorava, afinal, Lívia? Por eu ter te


beijado ou pelo fato de o beijo ter sido um teatro.

Precisava saber, se fosse pelo que falei, retiraria


naquele mesmo instante. Nunca tive um beijo tão real.

— Na verdade, eu não estava chorando. — Se virou


para ir até o quarto e entrei na frente dela a parando de
novo.

— Não? Então me explica o nariz de palhacinha —


pedi, ela esboçou um pequeno sorriso e fiquei feliz por
conseguir tirar do seu rosto a expressão de tristeza.

— É que a água estava quente. Ah, e amo as músicas


da Ana Carolina, sempre fico emotiva ouvindo. — Ergueu o
celular.

— Então não está brava comigo por que te beijei?

— Não estou. E dá pra parar de falar do bendito


beijo, por favor. — Fechou os olhos como se o assunto
doesse.
— Tudo bem, eu paro, mas só se você for assistir a
um filme comigo. — Fiz cara de cachorrinho abandonado —
É que como você sabe só consigo dormir mais tarde. — Dei
de ombros, pidão.

Vi que relutou como se não quisesse ficar perto de


mim, como se ficar ao meu lado fosse errado, mas pensou
por um tempo, me encarou mais um pouco, enquanto eu,
sorria mesmo sem vontade.

Só queria tirar aquele olhar triste e aquela cara de


choro que Lívia apresentava. Nem que para isso eu tivesse
que esconder minhas próprias dores.

Depois do que pareceu uma eternidade, respondeu:

— Tudo bem, mas nada de comédia romântica ou


qualquer romance água com açúcar.

— Você é quem manda. O que eu coloco?

— Escolhe lá, algo com muito sangue e que não seja


drama. Que de drama minha vida está cheia — disse a
segunda parte baixinho como se fosse para eu não ouvir,
depois se virou e entrou no quarto.

— Só vou tomar um banho e já volto — gritei para ela


que me respondeu um “ok” de volta.

Saí do banho e Lívia ainda não estava na sala.

Será que ia me evitar?


No mesmo instante a vi abrindo a porta do quarto e
seguindo para sala. Sentindo-me sem jeito para encará-la
de frente, liguei todos os aparelhos e escolhi o filme.

Muito sangue como Lívia pediu pensei ser muito


pesado, então decidi por um terror dos antigos, um leve
para não dar medo.

Em silêncio ela chegou na sala e se sentou no canto


oposto ao que eu estava. Vi que parecia mesmo querendo
impor uma distância entre nós.

Jogou-me uma manta e ficou com uma, ainda sem


dizer nada, apenas com sorriso sem vontade no rosto.

Agíamos com tamanha estranheza um com o outro


que até me doía.

O início do filme começou e eu me sentia vazio com


a nossa distância. Foram muitas noites de segunda-feira em
que assistíamos filmes e ela sempre se deitava no meu
peito e ficava toda agarrada em mim. No entanto, depois de
tudo que vivemos e daquele beijo, a distância era mesmo
necessária.

— Não estou reconhecendo, qual filme você colocou?

— Freddy Krueger.

— Ahhh... Esse não! — reclamou.

— Por que não? Vai me dizer que tem medo?

— Claro que não, mas esse filme é muito antigo,


pensei que seria uma coisa mais moderna.

— Sei... mas vamos de clássico. Freddy é o clássico


do terror.
— Tudo bem então, sei que vou dormir mesmo. —
Lívia puxou a manta até os ombros.

O filme prosseguiu e segurei-me para não rir, todas


as vezes que ela tampava os olhos com a manta nas partes
de mais suspense.

Passados vinte minutos de filme, ela sentou-se perto


de mim, alegando que estava com frio.

Abri um sorriso largo e o braço para que ela deitasse


no meu peito como de costume e vi em seu olhar uma
relutância que não existia antes, porém, o medo falou mais
alto e alguns minutos depois acabou aceitando minha
oferta.

Deitou-se no meu peito enquanto eu acariciava o seu


braço e nossa aproximação fez uma sensação de calmaria
tomar conta de mim, como se fôssemos um tipo de
calmante um para o outro, como se ficar próximos fosse o
correto mesmo não sendo.

Mais uma vez me peguei pensando que tudo seria


mais simples se a Lívia não fosse minha prima. Ela seria
perfeita.

Mas é minha prima!

A namorada perfeita em uma história imperfeita.

Precisava parar de pensar naquilo, o aperto no meu


peito não me fazia bem e novamente cogitei me afastar,
mas minha cabeça pensava uma coisa e meu corpo fazia
outra, com isso, a puxei para mais perto e ela se
aconchegou.
Capítulo dezesseis
Lívia
O filme acabou e me desgrudei do Gu me sentindo
sem graça. Já ele me olhou como se estivesse com medo de
dizer qualquer coisa e quebrar a barreira que construímos
para calar o que tínhamos que dizer um para o outro.

Despedi-me dele e fui rápido para o meu quarto. Até


me chamou para comer alguma coisa, mas eu disse não.

Já havia ficado muito tempo perto dele e horas antes


enquanto tomava banho, jurei para mim, entre todas as
lágrimas que caíam pelo meu rosto, que colocaria distância
entre nós e não permitiria que nunca mais nada como
aquele beijo acontecesse novamente.

Foi maravilhosamente bom e fez meu corpo


estremecer como nunca aconteceu...

E não demorou até eu começar a pensar em tudo de


novo. Precisava parar, até porque Gustavo deixou claro que
estava atuando e nada do que senti, ele sentiu, era tudo
parte do plano inicial e doía pensar, doía de verdade.
Eu era uma idiota.

Deitei-me na minha cama e fiquei pensando na


loucura que era aquilo tudo, perguntei-me em como minha
vida deu aquela reviravolta. Vivi tanto tempo em Cananéia
entre namoricos e términos e nunca senti tanto conflito de
sentimentos como vivia naquele momento.

Tentei manter trancado e escondido em algum lugar


dentro de mim o que eu sentia, porque aquilo era errado,
mas precisava aceitar que eu nutria pelo meu primo, mais
que amizade e carinho fraterno.

Admitir acabava comigo, porque eu sabia que era


loucura, para não dizer imoral e nunca daria certo, nossos
pais não aprovariam e ficariam chocados.

Pensar nos nossos pais me envergonhava, mas o


beijo foi o estopim para desencadear um turbilhão de
pensamentos e sentimentos que tinha que confessar... eu
não queria pensar, muito menos sentir, mas era inevitável.

Adormeci e acordei instantes depois, com o coração


a mil e ouvindo mentalmente o Freddy me dizendo: “Um,
dois, Freddy vai te pegar, três, quatro feche a porta do
quarto...”

Tinha sonhado com o filme e ele martelava em


minha mente.

Detestava filme de terror, se soubesse que pedir um


filme de sangue, resultaria em ter que assistir Freddy
Krueger, eu teria pedido uma comédia.
Passei meus olhos pelo quarto e ele exibia-se grande
demais, assustador demais e escuro demais. Parecia coisa
de criança, mas era mais forte que eu. Sempre fui uma
medrosa assumida.

Olhei para o filtro dos sonhos que ganhei do Gu e


pensei: Que filtro dos sonhos de araque.

De repente a poltrona do quarto ao lado parecia o


lugar mais confortável do mundo, pelo menos lá eu não
estaria sozinha.

Em silêncio segui para o quarto do Gustavo e bati de


leve na porta, esperando que ainda estivesse acordado.
Para minha alegria eu mal tinha batido e ele a abriu como
se estivesse esperando.

Gu me olhou com a sobrancelha arqueada e


perguntei sem jeito:

— Te acordei?

— Não, estava acordado. Ia beber água. — Sem


querer o olhei e percebi que usava apenas uma cueca boxer
preta e o “V” perfeito se formava em sua barriga.

Senti cede também. Tirei os olhos do seu abdômen e


voltei a olhar para todos os lugares exceto para ele.

— Está tudo bem? — perguntou.

Sacudi a cabeça me batendo mentalmente e demorei


alguns segundos para digerir a pergunta, até que por fim,
respondi:

— Humm... é que... sabe... não consigo dormir e o


filtro dos sonhos que você me deu deve estar quebrado. —
Sorri completamente sem jeito e pensando que a ideia de
ter ido até lá era ridícula. — Não consigo dormir, Gu, o
Freddy não sai dos meus pensamentos. — Ele riu.

— Entra e fique à vontade.

Imediatamente senti-me infantil e idiota.

— Olha, parece que agora o medo passou, acho que


vou conseguir dormir.

— Lívia, anda, sei que não vai conseguir. — Riu. —


Lembro perfeitamente como era quando éramos crianças. —
Deu passagem para que eu entrasse em seu quarto.

Sorri sem graça, aceitei a oferta e entrei, enquanto


ele foi até a cozinha beber água. Quando voltou, eu já
estava confortavelmente acomodada na poltrona.

— O que você está fazendo aí?

— Vou dormir aqui. Está ótimo pra mim.

— De jeito nenhum. Se dormir aí, amanhã você vai


acordar toda dolorida. Vamos para cama, é enorme e cabe
nós dois.

Olhei para cama e pensei que ela devia ter algum


imã para mulheres, porque era a segunda vez que parecia
me chamar. Por fim, não resisti e fui me deitar sem me fazer
de difícil.

Gu se deitou de costas ao meu lado, apoiou a cabeça


no braço e ficou olhando para o teto. Manteve uma
distância respeitosa e considerando o quão gostoso ele
estava com aquela cueca boxer, mesmo sem querer pensar
naquele tipo de coisa, cogitei que eu poderia simplesmente
não me controlar e atacá-lo.

Sentindo-me louca com meus pensamentos, achei


melhor virar de costas e evitar o máximo possível observar
aquele corpo escultural do meu primo... Primo.

Isso, foca nisso, Lívia. Ele é seu primo.

— Boa noite, Gu — falei baixinho.

— Boa noite, Lili.

Mesmo alguns minutos depois do boa noite, percebi


que ele continuou na mesma posição e o silêncio pairou
entre nós como se o barulho da nossa confusão não nos
deixasse dormir.

Dormir perto dele não foi uma boa ideia e tive a


certeza disso quando sem querer o seu pé encostou no meu
e o típico arrepio que me causava, passou por meu corpo.

E a distância que jurei que colocaria entre nós, caiu


por terra tão rápido quanto um raio.

— Lívia.

— Oi.

— O que está acontecendo entre a gente?

Suspirei e apertei os olhos, não queria falar.

— Nada. Não está acontecendo nada — respondi.

— Está e você sabe disso, não podemos continuar


fingindo que está tudo normal. Você sabe que nós dois, não
somos os mesmos de antes.
Virei-me de frente para ele e encarei seus lindos
olhos azuis.

— Sei. E com toda certeza eu preferia a estranheza


do primeiro dia a esse aperto que estou sentindo no meu
peito. O beijo não foi boa ideia e só fez piorar.

Olhei para os seus lábios de frente para mim.

— Não, não foi. — Vi-o engolir em seco. — Apesar de


ter sido... O melhor de todos. — Encarei-o e ele olhou para
os meus lábios.

Deus...

Imediatamente não me contive e fiz a pior burrada


da minha vida.

Puxei-o pelo pescoço joguei meu corpo sobre o dele e


o beijei em busca do calor e da sensação de que vivi na
Angels.

Gu retribuiu fervorosamente, passou as mãos pelo


meu corpo e com um movimento rápido me girou para que
eu ficasse por baixo do dele.

Acomodou-se entre minhas pernas colocou a mão em


minha coxa e a apertou com vontade, erguendo-a até seu
quadril.

Minhas mãos passeavam por todos os lugares do seu


corpo e nossa respiração estava ofegante, nos beijávamos
como se fôssemos o que mais queríamos na vida.

Naquele momento eu achava que não existia


atuação nem mentiras, aquilo era verdadeiramente o que
sentíamos. Meu corpo traidor se acendeu todo e
definitivamente nunca havia vivido nada parecido.

As suas mãos, da minha cintura subiam por minha


costela de maneira firme, enquanto sua boca ainda
devorava a minha. Seus dedos se aproximaram do meu
peito, até que a ponta do seu polegar se encostou a base
deles e eu arfei contra a sua boca, reprimindo um gemido,
que escapou no momento em que Gu ultrapassou a barreira
que nos podava e por debaixo do pijama que eu vestia,
apertou meus seios, fazendo-os caber perfeitamente em
suas mãos.

Éramos apenas um casal que se sentia em chamas,


com um querer e não poder que deixava tudo mais intenso.

Era tesão e o mais puro desejo carnal entre um


homem e uma mulher.

Podíamos viver aquilo se quiséssemos.

Gustavo soltou um gemido de encontro aos meus


lábios e eu sentia seu pênis duro de encontro ao meu corpo,
indicando que sentia desejo por mim da mesma forma que
eu me via molhada por ele.

Arranhei suas costas e o puxei para mais perto,


mordi seus lábios e passei minha língua de maneira lenta
sobre eles. Eu queria excitá-lo e consegui, porque Gu
tomado de desejo, apertou meu mamilo entre seu dedo
indicador e polegar, pressionou sua pélvis contra minha e
por cima do tecido fino do short de dormir que eu usava,
senti mais uma vez sua ereção.

Duro e pulsando.

Desejei estar nua para que me penetrasse.


No entanto, a constatação da minha burrice por ter
me jogado sobre ele, veio em seguida quando Gu com a
respiração ofegante, agiu como se eu desse choque, saiu
depressa de cima de mim, passou as mãos no rosto e se
virou para janela, ficando de costas para não me olhar.

Apoiei-me nos cotovelos e olhei para ele sem


entender, afinal, minutos antes parecia estar gostando
tanto quanto eu.

— Lívia, eu... olha... eu quero tanto... não posso fazer


isso... Desculpa.

— Gustavo... — Eu não sabia o que dizer.

Banho de água fria era fichinha, isso era todo o gelo


das calotas polares sendo jogado em cima de mim.

Era de novo atuação?

Gustavo só estava seguindo o que comecei, foi


educado demais para me afastar assim que desandei a
beijá-lo feito uma louca descontrolada.

Minha afobação e fogo no rabo era tanta que não


percebi que, na verdade, era só eu que queria.

Burra! Sentia tanto tesão que até cogitei que aquilo


podia dar certo.

Balancei a cabeça em negativo, me levantei sem


dizer nada e parecia que meu corpo pesava uma tonelada.

Juntei a manta em um montinho e meus olhos já me


traíam se enchendo de lágrimas que eu não queria que
Gustavo visse, entretanto, foi tarde demais.
Quando ele se virou da janela e encarou-me, viu que
eu estava prestes a chorar como uma boba. Notei que
arrependimento passou por seu olhar e desviei meus olhos
dos dele institivamente.

Minha vergonha não permitia que eu o encarasse.

Parecendo perdido, novamente passou as mãos nos


cabelos, em seguida andou pisando firme em minha direção
e se eu não o tivesse parado, tinha a impressão de que ele
ia me beijar de novo.

— Não! — falei alto e ergui as mãos espalmadas em


direção a ele, que parou abruptamente respirando forte.

— Lívia, eu... — Andou mais alguns passos e eu


repeti:

— Não.

— Por favor, nós dois...

— Já entendi. Eu não devia ter começado isso. Fazer


o que fiz foi errado, juro que isso não vai acontecer
novamente. Foi só... a carência. — Sorri como uma boba.

— Lívia...

— Tudo bem, Gu. Peço desculpas. Você foi educado


demais para me parar no início, já posso reconhecer suas
atuações, a culpada fui eu... que... Bom, não devia ter
começado isso.

Ele me encarava assustado.

— Gu, seguimos daqui... Primos. Somente isso e


vamos apagar tudo que vivemos como se nada tivesse
acontecido. — Sem esperar réplica, virei–me e fui para o
meu quarto, meio andando e meio correndo.

Ouvi-o me chamar, mas só parei de andar quando


atravessei a porta e a tranquei.

Meu resto de noite... na verdade, meu começo de


manhã, foi de muito choro e raiva de mim. Não acreditava
que havia me deixado tomar pelo desejo.

Se eu soubesse da confusão que ia me meter nunca


teria ficado tão próxima.

Não queria admitir, mas era mais forte que eu, nunca
senti um aperto no coração como o que experimentava
naquele momento, nunca senti os arrepios por todo corpo
como quando estava perto dele, nenhum toque fez comigo
como o dele fazia.

Eu sentia ciúmes de pensar nele com outra mulher e


por mais dor que me causasse assumir, eu precisava...
necessitava assumir para mim mesma, para que o próximo
passo fosse me curar e me livrar daquele sentimento, que
não ia me fazer bem e só ia me causar dor.

Então, deitada na minha cama e em meio ao choro,


admiti: eu estava apaixonada pelo meu primo.

Meu primo.

E como se assumir fosse como um soco que me


atingiu com força, chorei ainda mais intensamente e pedi
em oração para Deus tirar de mim aquela angústia e aquele
sentimento impossível.

Não queria que meus pais nem minha família


soubessem, não queria que meus amigos soubessem e
principalmente não queria que ele soubesse.

Era vergonhoso e imoral, na minha família não


existia nenhuma relação entre primos e tinha certeza de
que mesmo que Gu quisesse algum relacionamento comigo,
o que não era o caso, meus pais não iam aceitar facilmente
nossa relação. Me doía só de pensar.

Chorei tanto por estar vivendo aquela situação, que


caí no sono por exaustão. Acordei algumas horas depois, o
sol entrava forte pela janela e escutei leves batidas na porta
do meu quarto.

— Lívia... Fala comigo.

Era ele.

Meu coração acelerou, levantei-me em um pulo para


conferir se a porta estava trancada, porque não queria vê-
lo, e me encostei nela.

Mesmo que a porta nos separasse, conseguia senti-lo


do outro lado.

— Lívia, por favor, sei que está acordada. Precisamos


conversar.

Fechei meus olhos, me mantive em silêncio e sentia


o coração acelerado.

— Por favor... tenho compromisso e vou ter que sair,


mas preciso que fale comigo. Não podemos ficar assim,
preciso conversar com você, Lili.

Não o respondi e meus olhos se encheram de


lágrimas novamente. Precisava mesmo me afastar dele
enquanto podia.
Fiquei alguns minutos escutando os movimentos do
Gu, mesmo através da porta, até que o ouvi se afastar.

Notei que o silêncio tomou conta do ambiente e


depois de um tempo resolvi deixar o quarto. Fui até o
banheiro, escovei os dentes, tomei um banho e saí ainda
sem ouvir nem mais um barulho dele, assim constatei que
já devia ter saído ou estava dormindo.

Suspirei. Eu não queria encará-lo e não podia ficar


ali.

Rapidamente arrumei uma mochila e decidi que ia


passar o resto do sábado e do domingo em Cananéia.

Chamei Samira para ir comigo, no interesse de


arrumar uma carona, e ela topou de imediato. Levei meu
material da faculdade e instrui minha amiga a fazer o
mesmo, já que tínhamos algumas matérias para estudar.

Deixei um bilhete para o Gu dizendo apenas que ia


para Cananéia e que nos veríamos na segunda-feira. Liguei
para o meu pai e avisei que estava indo vê-los.

Desci até a portaria para esperar Samira, não


demorou nada e ela chegou.

Assim que entrei no carro liguei para o Igor e


perguntei se também queria ir, mas infelizmente ele já tinha
compromisso para o final de semana.

Seguimos, tentei embalar algum assunto com minha


amiga, mas toda história com o Gu não saía da minha
cabeça e fui em silêncio quase o caminho todo, entretanto,
Samira percebeu que eu não estava bem.
— O que aconteceu com você, Fofa? — Ela me
chamava de fofa desde que nos conhecemos.

— Aconteceu... Nada, não aconteceu nada não,


amiga. — Pensei em falar, mas fiquei com vergonha de
assumir tudo em voz alta.

— Hum... sei... E esse silêncio todo? O gato comeu


sua língua? — Riu e cogitei dizer que, na verdade, foi eu que
quase comi a língua do gato durante a madrugada, mas me
contive mais uma vez.

— Tipo isso, mas e você se deu bem ontem com o


Rodrigo? — Mudei de assunto.

— Se eu me dei bem? Meu Deus, amiga, eu me dei


ótima! Ele é o mestre supremo do sexo, você precisa provar.
— Dei uma gargalhada e pensei que com certeza ter
convidado ela para ir comigo para casa foi uma ótima ideia.

— Tá doida, Sá? — falei ainda rindo.

— Sério! Ele manja muito dos paranauê do sexo. A


noite foi intensa. Sei lá... aqueles quatro devem ser
realmente os anjos do sexo, porque aquele quarteto exala
testosterona, como disse o Igor, sensualidade e tudo mais.

— Verdade, Gu, Rodrigo, Fernando e João, são lindos.

— E o João, hein? Está de quatro por você, percebi o


desconforto dele em ver você e o Gu juntos.

— Tá nada, ele brinca, mas me quer só como amiga.

— Ha, há, há, duvido!

Começou a tocar uma das músicas preferidas da


Samira, ela aumentou o volume do rádio e Celine Dion
entrou com o hit I love You.

Todas as vezes que eu andava com ela em seu carro,


tocava as divas, até já tinha aprendido a cantar algumas
músicas e essa era uma delas.

Com o volume a toda altura cantamos o refrão alto e


sorrindo.

… I love you, please say

You love me too, these three words

They could change our lives forever…

A música era linda, fui cantando e olhando janela


afora ao mesmo tempo que pensava no refrão que dizia:

“... Eu te amo, por favor, diga que você me ama


também, estas três palavras

Poderiam mudar nossas vidas pra sempre...”

Pensei:

E se o Gu compartilhasse do mesmo sentimento que


eu, como seria?

Como faríamos isso funcionar?

E nossa família?

Tudo tem que ser tão difícil?

Em uma cidade tão grande com tantas opções, por


que fui me apaixonar justo pelo meu primo?
Também, como não me apaixonar por alguém que
era um anjo em minha vida, que cuidou de mim, me mimou,
me tratou com carinho e tinha um beijo capaz de ligar todos
os botões do meu corpo.

Argh... Isso parecia cada vez mais difícil. Parar de


pensar nele parecia impossível. Mas pôr uma distância
necessária entre nós faria com que o sentimento diminua e
por fim acabe.

— Vou tirar a música, se ela vai te fazer ficar triste


assim — Samira interrompeu meus pensamentos.

— Não é tristeza, é que a música é muito bonita.

Encarou-me rapidamente tirando os olhos da estrada


e parecendo mais desconfiada do que nunca, mas percebi
que decidiu não perguntar.

— Sabe, as divas regem minha vida, você tem que


ouvir mais e tem também que me ver fazendo os falsetes
iguais aos delas.

— Dispenso. — Rimos.

— Ah, amiga, amo cantar. No volante então... é cada


livramento que Deus me dá enquanto dirijo ouvindo as
divas. Faço a diva do volante e fecho os olhos para atingir
as notas mais agudas. — Ela riu.

— Samira, pelo amor de Deus esqueça as divas por


hora, até chegarmos a Cananéia, sãs e salvas.

Ela continuou cantando achando que era a própria


reencarnação da Whitney Houston e dei graças a Deus
quando chegamos em casa.
Assim que desci do carro, meu pai foi ao meu
encontro.

— Oi, minha princesa, aconteceu alguma coisa? Você


disse que não viria neste final de semana.

— Pois é, pai, mas bateu saudade e resolvi ficar


pertinho de vocês um pouco. Essa é minha amiga Samira.

— Como vai? — meu pai a cumprimentou com um


beijo no rosto e ela encontrava-se meio de boca aberta
olhando para ele.

Sua atenção foi tirada quando minha mãe apareceu


abraçada ao Pepê e depois de apresentações feitas, ela
convidou:

— Venham, vamos entrar, preparei um café da tarde


delicioso para nós. — Entramos em casa e logo o meu pai se
despediu dizendo que tinha plantão no hospital. Quando
minha mãe foi levá-lo até a porta, Samira sussurrou para
mim:

— Miga sua louca, por que você não avisou que seu
pai era esse deus grego? Olha se não fosse pela sua mãe eu
investia nesse coroa. Aliás, sua mãe também é muito gata.

— Para com isso, Samira! — Ri.

— Agora sei de onde saiu sua beleza. — Empurrei-a


rindo para que ela ficasse quieta.

Após o café da tarde delicioso, conversei um pouco


com meu irmão e ouvi as mil e uma novidades que ele tinha
para me contar. Depois liguei para Vivian avisando que
estava na cidade e que a noite iriamos sair.
Minha amiga ficou eufórica, confirmou que nos
veríamos e que sentia saudade. Não contei que Samira me
acompanhava, preferi deixar que elas se conhecessem sem
aviso prévio.

Conhecendo Vivian, ciumenta como era, se soubesse


que a Samira também estava era capaz que nem fosse.

A noite caiu e quando estávamos nos preparando


para sair, recebi uma mensagem do Gu.

“Lili, quando voltar se eu não estiver em casa


me liga. Precisamos conversar.”

A mensagem dele fez um arrepio atravessar meu


corpo, mas decidi não responder, pelo menos não naquele
momento.

Terminamos de nos arrumar e Samira e eu seguimos


para o Bar dos Pescadores. Era um bar tradicional e antigo
da cidade, mas ainda bem frequentado pelos jovens da
região.

Assim que chegamos, logo avistei Vivian sentada


próxima à janela que tinha vista para o mar. Ela sorriu e
acenou feliz.

Andamos até a mesa e depois de um abraço


apertado na minha amiga, a apresentei a Samira e para
minha alegria, ambas pareceram se dar bem.

— Só vou deixar uma coisa clara aqui — Vivian disse


enquanto nos sentávamos. — Eu sou a melhor amiga de
infância, tá?

— Ok. Combinado, e eu sou a melhor amiga da


faculdade.
— Tudo bem, combinado. Gostei de você — concluiu
Vivian.

— E eu de você, adoro gente sincera. — Vivian sorriu


para Samira e as duas me olharam por eu só me manter
quieta.

— Já acabaram, comadres?

— Já — responderam juntas.

— Só estávamos deixando claro alguns pontos aqui


— Vivi falou, jogando de lado o cabelo preto e pesado, típico
de orientais. Era uma linda mestiça. — Agora que já
resolvemos, me diga o que veio fazer em Cananéia sem
avisar? Está fugindo do quê?

— Vivi, estou tentando tirar dela a viagem inteira.


Posso te chamar de Vivi, né?

— Claro, Sá. Somos amigas agora.

Ri.

— Podem parar com essa intimidade toda, na


verdade, vocês podem até se amar desde que me amem
mais.

— Certo. Mais um ponto resolvido aqui — Vivian disse


apontando o indicador para mim. — Agora conta qual o
babado que te fez fugir para casa.

— Meninas, vamos beber alguma coisa? — pedi. —


Depois eu conto toda a novela.

— Isso — Samira concordou.


— Garçom, desse a cachaça e põe um modão[4] pra
tocar, que hoje tem choradeira de amor da minha amiga
aqui — Vivian disse alto e eu ri.

— Ah, eu mereço — resmunguei.

— Merece.

Ri.

— Olhem como somos ecléticas, uma japa que curte


sertanejo, uma preta que curte divas e eu que curto de
tudo. Podemos ir à Angels qualquer dia que vai dar bom.

— Topo! — Samira exclamou, animada.

— Falando em Angels, quando você vai me levar para


passar uns dias lá na cidade grande e me apresentar
oficialmente para o capitão? — Tinha esquecido essa queda
que minha amiga carregava pelo meu primo e isso me
deixou com as bochechas vermelhas... de ciúme.

— Capitão? — Samira indagou.

— O Gu — respondi.

— Não reparou como ele se parece com o Chris


Evans, o Capitão América, aquele tesão? — Vivian
perguntou sorrindo.

— A Vivi chama o Gu assim desde a vez que o viu,


mas eles nunca trocaram nem duas palavras e ela sempre
cobra, para que eu a apresente. — Revirei os olhos e tentei
esconder o ciúme que batia forte a cada comentário.

— Não é que parece mesmo — Samira concordou


pensativa.
— Mas e aí, nos conte a novela — Vivian pediu assim
que as bebidas chegaram.

— Primeiro um brinde. Um brinde a essa noite


agradável em que uni minhas duas melhores amigas e que
agora são melhores amigas também.

— Um brinde! — disseram juntas e demos um gole


em nosso vinho.

Vendo que ambas me olhavam esperando que eu


contasse algo, menti:

— Bom, meninas, na verdade, não tem novela


nenhuma, o que acontece que estou assim para baixo,
porque preciso de um amor, um amor de verdade sabe.
Daqueles arrebatadores.

Não era tão mentira assim. Realmente precisava de


um que me fizesse esquecer o Gu.

— Sei como é, somos duas. Também ando precisando


— disse Vivian.

— E já somos três — completou Samira. — Mas como


anda você e o Gu?

— Terminei ontem a mentira com ele, não dava mais


para sustentar. O beijo de ontem já provou para todos o que
ele queria e tá tudo certo.

— Ei! Espera aí, beijo? Que beijo, cara pálida? — Vivi


cruzou os braços teatralmente. — Já estou me sentindo
traída por não saber.

— Calma. — Ri. — É que ontem Gu me beijou para


provar para ex dele, aquela lá que eu já tinha te contado,
que éramos mesmo namorados. Mas foi bom, pelo menos
agora acabou. Já provou e enfim a mentira acabou. — Dei
de ombros.

Samira me fitou tentando ler em meu rosto o que


estava acontecendo de verdade, mas segurei firme a fala
desprendida para não deixar transparecer nada.

Eu queria me abrir e contar tudo que sentia, mas


lembrar da quedinha que minha amiga carregava pelo meu
primo, fez com que eu me freasse e decidi que guardaria
meus sentimentos só para mim. Nunca aconteceria nada
mesmo. E dali a algum tempo ia rir de tudo quando parasse
de doer.

— E desce mais uma e vamos beber — gritei


empolgada e rimos.

Foi uma noite muito agradável, que virou madrugada


e depois manhã. Tomamos banho de mar na água gelada do
mês de maio, sem pararmos de rir nem um só minuto.
Devia ser efeito do vinho. Amigas, álcool e risada eram os
melhores remédios para curar qualquer dor, principalmente
a de amor.

Samira e eu chegamos à casa dos meus pais já


passava das sete da manhã e minha mãe quase me matou
quando viu que estávamos molhadas.

Tomamos banho quente, café da manhã e dormimos


até a hora do almoço, o que foi relaxante.

Acordei com uma baita ressaca e me arrastando fui


para sala. Assim que me aproximei do cômodo, ouvi a voz
da tia Sarah conversando com minha mãe e sorri feliz.
Ela sempre ia almoçar na casa dos meus pais nos
finais de semana. Era apaixonada por mim e eu por ela.
Minha tia porralouca.

Desde quando eu era pequena que ela encobria tudo


de errado que eu fazia e ainda me ensinava a fazer a
maioria dos erros.

— Oi, tia. — Dei-a um beijo e um abraço apertado e


me sentei em seu colo como se ainda tivesse cinco anos.

— Vou ver o almoço. — Minha mãe saiu da sala.

— Como você está, minha princesa? — Tia Sarah


perguntou, como se eu ainda fosse uma menininha.

— Com ressaca — falei fazendo careta.

— Boa garota, assim que tem de ser. Curta a vida.


Seu pai me mata se ouvir eu te dizendo isso — falou
baixinho e eu ri.

— Mata mesmo, tia, mas relaxa ele está dormindo.


Ressaca do plantão. — Levantei-me do colo dela e sentei-
me no sofá.

— Vish... coitado.

— Pois é.

A voz de Samira conversando com minha mãe


chamou nossa atenção e quando parei de falar com minha
tia, uma foto minha com o Gu, que estava pousada na
estante me fez fechar o cenho.

O que tia Sarah pensaria?

Acho que ela me apoiaria.


— Por que estou vendo uma fagulha de tristeza no
seu olhar que devia estar feliz?

Parei de olhar para foto e sorri sem vontade para


minha tia.

— Nada não.

— Eu te conheço, Lívia. Sei que tem algo só por seu


olhar repentinamente distante.

Suspirei.

— Complicado, tia, muito complicado, complicado


nível hard, mas um dia eu te conto.

Ela semicerrou os olhos e quando ia dizer alguma


coisa, fomos interrompidas pelo Pepê que entrou correndo e
pedindo comida. Interceptei-o no caminho, o abracei
apertado e o beijei em um monte de lugares do seu rosto,
minutos depois ele saiu se limpando e brigando comigo. Ri.
Eu amava aquele moleque.

Minha mãe nos chamou para o almoço e fez Samira ir


até a sala nos apressar. Apresentei minha amiga para minha
tia e juntas decidimos ir para cozinha antes que minha mãe
nos matasse.

No entanto, meu celular vibrou com mais uma


mensagem do Gustavo e quando o peguei, li:

Pode, por favor, me responder? Estou me


sentindo péssimo.

Revirei os olhos. Ele está péssimo? Imagina eu que


estou apaixonada e fui rejeitada por meu primo.
Tia Sarah estava ao meu lado, escondi
disfarçadamente o celular para que não conseguisse ver
com quem eu trocava mensagem e então o respondi:

Conversamos depois, estou com fome, de


ressaca e não posso agora.

Deixei o celular na sala e seguimos para mesa onde


almocei a comida deliciosa da minha mãe.

Após o almoço brinquei um pouco com o Pedrinho e


aproveitei minha casa, minha família, até que já era noite
quando decidimos subir a serra de volta para cidade.

No meio do caminho, tristeza misturada com


vergonha tomou conta de mim, ao pensar que eu teria que
encontrar com meu primo de novo. Ainda não me sentia
preparada para isso, não queria vê-lo.

O desespero aumentou quando pensei que no dia


seguinte era sua folga e ele ficaria em casa. Respirei fundo.
Eu sabia que o reencontro era inevitável, mas enquanto
pudesse adiar o dia de encará-lo, eu faria.

— Sá, será que posso dormir na sua casa hoje e


amanhã?

Ela tirou o olhar da estrada por um segundo e sorriu.

— Claro, amiga. Me sinto sozinha e adoro companhia,


pode ficar o tempo que quiser.

Assenti e voltei a olhar para fora do carro.

— Lívia, me conta o que está acontecendo, amiga.


Sei que tem alguma coisa errada.

Soltei o ar.
— Ah, Sá, eu ia contar para vocês, mas sei que a Vivi
tem uma quedinha pelo Gu e achei melhor não contar e
deixá-la desanimada por algo que nunca vai acontecer,
mas... — Dei uma pausa antes de continuar e tentei buscar
coragem para dizer em voz alta, o que até então, guardava
apenas para mim. — Estou apaixonada pelo Gu e não sei o
que fazer quanto a isso. Ele é meu primo.

— Sabia! — gritou e deu um tapa no volante — Vi no


seu rosto todos esses dias, sei disso desde quando vi você
olhar para ele na sexta. — Ela sorria.

— Por que você está sorrindo? Isso é trágico, Samira!

— Trágico por quê? E daí que vocês são primos? Tem


uma vizinha da minha mãe, que é casada com primo há
anos, tem filhos e é muito feliz.

— Mas tem toda a minha família, as pessoas que nos


conhecem desde pequenos e... tudo.

— Lívia, é você quem tem que decidir a sua vida,


você que tem que saber o que te faz feliz e não pode
permitir que convenções e opiniões da sociedade sejam
responsáveis por definir seu destino ou suas decisões.

— Mas é tão difícil, tão complicado.

— Talvez por sua família sim, mas nada que com o


tempo eles não se acostumem. E quanto a Vivian, acho que
você está entendendo errado, percebi que ela brinca
quando fala do Gu, não é nada sério nem amor
desenfreado.

— Será?
— Tenho certeza. E quanto a sua família, sei lá... se
permita tentar, sem contar para ninguém por enquanto. Se
der certo vocês contam.

— Samira, mesmo que eu me permitisse, não posso


fazer nada sozinha, ele não me quer. — Dizer isso em voz
alta doeu.

— Ahhh... você que pensa, pude ver pelo beijo, pelos


olhares que ele te lança e o jeito que ele é todo cheio de
ciúmes de você. Ele te quer muito, Fofa.

— Tenho certeza de que não, mas vamos mudar de


assunto. Já decidi que vou esquecer isso, o esquecer e
seguir em frente.

No mesmo instante chegou uma nova mensagem


dele.

Já acabou com a fome e a ressaca? Estou te


esperando para conversar. Às onze eu saio para
Angels. Por favor, Lívia. Sigo te esperando.

Definitivamente não ia voltar naquele dia e,


sinceramente, o quanto eu pudesse evitá-lo, evitarei.

Pensei que quanto mais eu me mantivesse longe,


mais fácil ficaria para mim quando o visse novamente.
Tempo e distância era o que eu precisava e tinha fé que
com a mistura dos dois não sobraria mais resquícios do
sentimento que me afligia.

Em silêncio no carro, relembrei o que Samira disse e


me perguntei se estava mesmo me privando de viver por
convenções?
Podia ser que eu estivesse, mas eram convenções
importantes.

Apesar, que se Gustavo me quisesse... não haveria


convenções que me impediriam de agarrá-lo.

Samira falou sobre destino e lembrei que sempre


ouvi meus pais falarem disso. Diziam que o deles era o
mesmo: ficarem juntos para sempre.

Mas qual seria o meu destino e o que ele reservava


para mim?

Certamente não seria o Gu, porque seria muita


palhaçada, Deus escrever que meu primo era o meu
príncipe encantado.
Capítulo dezessete
Gustavo
Eu fiquei de olho no maldito celular o dia todo, na
esperança de que a Lívia me respondesse dizendo que ia ao
meu encontro para conversarmos.

Mandei várias mensagens e ela não respondeu.


Fiquei com tanta raiva que não consegui ficar em paz.

Puto por ela não responder, por ser primo dela, por
estar sentindo esse aperto na porra do meu peito desde que
fiquei mais próximo a ela e sentia-me puto pra caralho, por
ter me separado dela quando me agarrou.

Porra! Por quê?

O que eu mais queria, era me acabar no seu corpo a


noite toda, beijar sua boca até que nossos lábios formigasse
e matar o desejo que me corria sempre que a olhava.

Entretanto, a culpa prevaleceu e a voz do meu tio me


pedindo para cuidar da Lívia, não saía da minha cabeça.
Sentia-me tão culpado.
Mesmo quando eu queria beijá-la até amanhecer,
não foi isso que fiz, eu me afastei. Por que eu me afastei?
Eu não teria outra chance.

O pior foi ver seu rosto quando me virei, sentindo-se


desprezada e não era isso, eu a queria, cada pedaço do
meu corpo a desejava e eu não pretendia magoá-la.

Meu Deus, eu a queria tanto, ansiava por sentir seu


corpo em minhas mãos de novo, mesmo sendo errado era
isso que eu planejava a cada maldito segundo longe dela.

Pensei como meus pais reagiriam se eu contasse que


estava apaixonado por minha prima.

Apaixonado...

Será que eu realmente estava apaixonado ou era


mais atração física, coisa de corpo, magnetismo por algo
proibido.

Sei lá, que droga!

Aquela confusão me matava.

Olhei de novo para o celular e nada dela responder.


Precisava dizer que não me separei por não a querer e sim
por não poder.

Já se aproximava do meu horário de ir para Angels e


nada dela chegar. Além de as horas passarem e ficar cada
vez mais tarde.

Preocupado a enviei mais uma mensagem só para


me certificar:

“Lívia, está tudo bem?


Me respondeu friamente:

“Sim. Não vou dormir em casa.”

Encarei o celular em minhas mãos, lendo e relendo


aquela mensagem.

“Como assim não ia dormir em casa?”

Pensei um pouco em que lugar ela poderia dormir e


Igor logo ocupou meus pensamentos. Lívia tinha algo com
ele. Se Igor não namorava a Samira, só podia ser ela o seu
interesse. Senti meu rosto quente e digitei movido a raiva:

“Vai passar a noite com o Igor? Bem estranhei


essa amizade. Não esquece o combinado. Você não
pode sair com ninguém.”

Demorou alguns minutos e pensei que mais uma vez


ela fosse me deixar sem resposta, mas enfim meu celular
vibrou:

“Combinado, descombinado! Dessa vez é finito,


conte a todos que terminamos.”

Joguei o celular na cama com raiva e andei pelo


quarto. Não queria me sentir daquela maneira.

Ela não me respondeu sobre o Igor, o que me fez crer


que realmente era com ele que ela ia dormir.

Caralho!

Minha respiração estava acelerada e meu coração


apertado em meu peito.

Como terminar um relacionamento que nunca existiu


podia me deixar tão instável, mesmo sabendo que isso era
o melhor a fazer?

Parei no meio do quarto completamente desnorteado


e pensei que precisava saber se realmente rolava algo entre
ela e o Igor. Peguei o celular novamente e digitei:

“E quanto ao Igor, está rolando mesmo? Eu


mirava no João, mas era com o Igor que rolava. ☺ ”

Tentei dar uma descontraída, usando um emoji feliz e


assim ver se Lívia me responderia. Precisava saber.

Dessa vez ela me respondeu rápido:

“Estaria... Se ele não fosse gay.”

Soltei o ar que segurava, respirei fundo e até sorri.


Era isso. Eu me sentia ridículo e precisava esquecer. Peguei
meu casaco e segui para Angels.

Chegando lá me joguei no trabalho, na esperança de


tirar Lívia da minha cabeça e ela não saiu. Tentei me
concentrar mexendo em uma tabela que necessitava de
atenção e não consegui.

Os números não batiam e comecei a ficar ainda mais


irritado. Soquei o teclado e até a gaveta recebeu um pouco
da minha fúria quando a fechei com força, fazendo um
estrondo alto ecoar pela sala.

Apoiei os cotovelos na mesa, coloquei as mãos na


cabeça e fechei os olhos por um minuto. Respirei tentando
me acalmar. Quando voltei a abrir os olhos, Fernando estava
apoiado à porta me observando.

— Tudo bem aqui?

— Não.
— Qual o problema?

— Lívia — respondi depressa demais.

— A Lívia que te deixou assim?

— Foi. — Esfreguei os olhos.

— Está sério assim esse namoro?

— Não tem mais namoro, nós terminamos.

— Ah, então é isso. No começo, mesmo quando


apostei com os caras que era verdade, eu achava que esse
namoro era uma mentira, mas olha, nunca te vi assim por
mulher nenhuma.

— Com a Lívia é diferente — falei de imediato


voltando a olhar para tela do computador.

— Diferente como?

— Não sei dizer, só sei que é diferente. Mas não pode


ser, porque nunca vai dar certo.

— Você está apaixonado, cara. Não é só sexo dessa


vez.

Mal sabe ele que nem sexo teve ainda. Ainda? Como
assim ainda, Gustavo? Eu só posso estar ficando doido. Isso
nunca vai rolar.

— Bom, cara, desculpa, não vou conseguir ficar para


trabalhar hoje. — Levantei-me e coloquei meu casaco.

— Tudo bem, te vejo na terça. Se precisar de alguma


coisa me liga.
Assenti e fui embora, deixando meu amigo me
observando incrédulo.

Cheguei em casa e caí na cama, estava me sentindo


estranho e com uma saudade desenfreada da Lívia. Tentei
ligar para ela, mas não me atendeu, então fiquei na sala
mais um pouco e liguei o videogame na esperança de me
distrair.

Só para variar lembrei dela jogando Super Mario


comigo.

Porra, tá difícil!

Enfim dormi, na segunda me senti sozinho o dia todo,


pensei que enfim eu ia vê-la, mas já era noite e nada dela
chegar da faculdade.

Enviei uma mensagem que ela me respondeu apenas


que estava bem.

Sentei-me para ver um filme sozinho, olhando para


porta esperando que Lívia chegasse a qualquer momento,
mas nada.

Na terça ela ainda não havia voltado até a hora de eu


sair para Angels. Quando voltei na quarta já era quase de
manhã e fui devagar ao quarto dela, onde vi que enfim Lívia
tinha voltado para mim e íamos conversar e resolver aquela
bagunça toda.

Dormi até a tarde de quarta e quando acordei, Lívia


havia saído e até eu sair para Angels à noite, ela ainda não
tinha chegado.

Inferno! Seguia mesmo disposta a me evitar.


Desencontramo-nos o resto da semana o que me deu
a certeza de que ela fugia de mim e isso me deixou com um
mau humor do cão. Descontei em tudo e em todos na
Angels, os caras já não queriam nem ficar perto de mim.

Na sexta-feira tomei uma decisão: eu ia dar um jeito


de conversar com ela. Cheguei de manhã e considerei ficar
sentado na porta do seu quarto até que acordasse. Assim
não teria como Lívia fugir de mim.

Se eu não fizesse dessa maneira, eu tinha certeza,


que como era sexta, ela viajaria para Cananéia só para não
me ver o final de semana inteiro.

Sentei-me encostado à porta do seu quarto, decidido


a fazê-la me ouvir, não dava para viver assim. Já que não
podemos ser algo mais que primos, então que sejamos os
primos que éramos antes dessa confusão toda começar.

Além do mais, eu estava preocupado com ela


dormindo tantos dias fora de casa. E ao pensar em dormir,
bocejei e o sono por ter passado a noite acordado bateu
forte.

Meus olhos começaram a ficar pesados e pensei que


enquanto ela não acordava, eu podia encostar minha
cabeça e fechar só um pouquinho os olhos... E então eu
dormi.
Capítulo dezoito
Lívia
Acordei na sexta pela manhã, comecei a me aprontar
para faculdade e a arrumar uma mochila para o final de
semana.

Não vi o Gustavo por dias, fiquei na casa da Samira


domingo e segunda. Segunda foi o melhor dia, Igor também
apareceu por lá, me fez confessar para ele o que eu sentia
pelo Gu e depois começou a traçar planos. Primeiro para
que eu traçasse o boy e depois para que eu o esquecesse.
Igor era muito engraçado.

Fui direto da casa da Samira para faculdade e passei


o resto da semana saindo cedo, passando a tarde toda fora
e voltando só a noite quando eu sabia que Gustavo já tinha
saído.

Se era de espaço que eu precisava para deixar de


sentir, então era espaço que eu teria.

Em mais um dia de fuga, coloquei a mochila no


ombro e pensei que eu precisava sair o quanto antes do ap
para não ver o Gu. Meu final de semana seria na casa da
Samira, que morava sozinha e estava adorando me ter por
lá.

Ao mesmo tempo que guardava o celular na mochila,


abri a porta do quarto para sair e foi aí que tropecei em algo
macio e caí.

Assustada e sem saber o que acontecia, olhei para o


que me fez cair e lá se encontrava Gustavo, tão assustado
quanto eu e se espreguiçando.

— Meu Deus! Gustavo, o que você está fazendo aqui


na minha porta?

— Bom dia, Lívia. — Bocejou — Esse foi o jeito que eu


achei de ver você, já que está fugindo de mim desde
sábado.

Levantei do chão e ele também.

— Eu não estava fugindo, só ando muito ocupada.

— Percebi. Sei que está ocupada demais para mim,


mas podemos conversar agora? — Lançou-me uma carinha
triste que foi difícil dizer não.

— Tá.

— Passa um café pra gente enquanto eu vou ao


banheiro? — pediu, sorriu e eu sorri de volta.

— Ok.

Gu levantou-se, passou os dedos na minha bochecha


me encarando em silêncio, depois foi para o seu quarto sem
dizer nada.
E esse pequeno toque foi o que bastou para que
aquele arrepio passasse mais uma vez pelo meu corpo,
como sempre acontecia. Aí percebi que o tempo que nos
dei, não fez a mínima diferença no que eu estava sentindo.

Usei o banheiro com calma, já que não precisava


mais fugir e depois de escovar os dentes fui para cozinha
fazer o café.

Apoiei-me na pia e comecei a pensar em como eu


resolveria aquilo, já que a distância não ajudou em nada.

Fiquei uma semana sem olhar para o Gu e no


primeiro segundo que avistei aqueles lindos olhos azuis,
tudo voltou e meu coração traidor disparou.

Talvez se eu arrumasse outra pessoa... Com uma


distração seria mais fácil.

Olhei o relógio e vi que ia chegar atrasada na


faculdade, mas aquela conversa tinha mesmo que
acontecer, não adiantava mais fugir.

Fechei meus olhos e soltei um suspiro, relembrando


mesmo sem querer a sensação dos lábios dele nos meus.
Era a mais deliciosa e acolhedora que já senti, mas o gosto
amargo de ser desprezada me atingiu quando nos
separamos, foi horrível.

Abri meus olhos, ergui a cabeça e Gu estava ali, lindo


encostado à porta e me olhando.

— O café já está quase pronto. — Senti minhas


bochechas vermelhas.

— Lili — falou, enquanto se encostava ao meu lado,


depois o vi engolir em seco e continuou: —, queria te pedir
desculpas por tudo que aconteceu entre nós, por ter te
colocado nessa confusão de mentira... Pensei muito esses
dias e percebi que foi um erro, mas um erro todo meu. Já
sobre o beijo, foi muito bom, muito mesmo. — Ele engoliu
em seco mais uma vez e não me olhava, encarava apenas
suas mãos. — Mas...

— Tudo bem, Gu — o interrompi. Não ia aguentar


ouvi-lo dizer que o beijo foi um erro. — Eu entendo e acho
que nossa amizade deve voltar a ser como antes, devemos
seguir nossas vidas e esquecer o que aconteceu.

— Esquecer?

— Sim.

— Não acho que seja possível.

— Eu sei, mas devemos fazer um esforço.

Ele me encarou por um tempo e não consegui


sustentar o olhar quando os seus olhos desceram para
minha boca. Afastei-me depressa e estendi a mão.

— Primos amigos novamente?

— Sim. — Gu pegou minha mão e me puxou para um


abraço. — Só não foge mais de casa, tá? Fico preocupado e
esse apartamento já é tão seu quanto meu — sussurrou no
meu ouvido.

— Tudo bem. — Afastei-me — Agora me deixa ir,


porque já estou atrasada, nos vemos depois.

Não esperei resposta nem bebi o café para não ter


que passar mais tempo ao lado da minha tentação. Com um
nó na garganta, parti.
Capítulo dezenove
Gustavo
Um mês se passou desde que conversei com a Lívia
e deixamos claro que só a amizade restaria da mentira.

Naquele dia não consegui falar para ela tudo que eu


gostaria, não disse que eu a queria com todo o calor do meu
corpo e que só a afastei de mim por sentir culpa por sermos
primos, pela nossa família e por medo de nos machucar
mais.

Depois ficou tarde e desde a manhã em que


tínhamos conversado, tentávamos manter a maior distância
possível e estávamos conseguindo.

Ela e João se aproximaram e isso ajudou a nos


afastar.

Ainda que a cada vez que os via juntos meu coração


ficava apertado e sentia meu corpo formigando de raiva,
porém, pensava que se não podíamos ficar juntos, gostaria
que ela fosse feliz com outra pessoa. Apesar de não desejar
que essa pessoa fosse o João. Eu o conhecia bem e sabia
que ele não prestava, pelo menos não para Lívia.

Ele tinha dores do passado, de um amor que não deu


certo, que não sabia lidar, escondia de todos e descontava
em seus relacionamentos.

João, quando soube do nosso término, não demorou


a perguntar se estaria tudo bem se ele se aproximasse.
Respondi que sim, mas minha vontade era arrancar sua
cabeça e usá-la de exemplo para qualquer um do sexo
masculino que chegasse perto dela, mas claro eu não podia
fazer isso.

Desde então, ambos seguiam cada vez mais


próximos e os dois faziam quase tudo juntos.

Muitas vezes eu chegava em casa e João estava lá a


ajudando a estudar ou a esperando para ir ao cinema ou
qualquer porra que fosse que fariam juntos e isso me
deixava louco de raiva, ainda que não deixasse
transparecer.

Nunca vivenciei o que eu sentia naquele momento e


isso ferrava com meu psicológico e com meu humor.

Fernando sempre falava que eu ainda seguia


apaixonado e que precisava rever a separação, mas ele não
sabia o quanto seria difícil de contar uma coisa dessas para
nossa família.

Às vezes, me pegava pensando em conversar com os


meus pais sobre isso e ver o que eles achavam, mas logo
lembrava da vergonha, afinal, era para eu cuidar dela, não
me apaixonar por ela.

Não! Não! Não! Ela é minha prima, porraaa!


Pensei sobre paixão, não era paixão, não era amor,
era só meu corpo querendo o que não podia ter. Afinal,
minha prima era difícil de olhar e não desejar, ela era
gostosa pra caralho! E era isso, apenas desejo pelo que não
podia ter e ia acabar.

Todos os dias, Fernando e Rodrigo tentavam me


apoiar, mesmo eu dizendo que me sentia bem com tudo,
mas ambos perceberam que eu não estava.

Os dois até tentaram conversar com o João, pedindo


para que se afastasse da Lívia, mas ele alegou que já tinha
falado comigo e por mim estava tudo bem. Apesar de saber
que não. Ou eu fingia bem, para que ele não visse a
verdade.

João era um cara legal, mas do tipo que se


apaixonava fácil e desapaixonava tão fácil como se
apaixonou, sempre foi assim, desde a faculdade.

Parecia que ele só aproveitava o frenesi de conseguir


a garota e em seguida toda a empolgação da paixão
passava tão rápido como quando chegou.

Não queria isso para Lívia, sabia que João só a queria


porque não a tinha, mas não ia empatá-los, ferrava com
meu psicológico vê-los tão amigos, mas não ia atrapalhar.

Em uma das minhas folgas, perguntei para Lívia se


ela havia feito planos de sair à noite e me disse que não,
então decidi que faria com que nosso tempo juntos fosse
agradável e reviveríamos as noites de filmes que tínhamos
antes de eu começar aquela confusão toda.
Fui ao mercado e comprei vários salgados,
chocolates e claro muita Coca-Cola que eu sabia que ela
amava. Tudo só para agradá-la.

Sozinho no elevador sorri ao pensar que Lívia ia se


deitar nos meus braços e assistiria ao filme grudada em
mim, como antes. Pensei em escolher um de terror só para
vê-la tampar os olhos como se fosse uma menininha.
Contive um sorriso bobo.

Saí do elevador, abri a porta da sala e assim que


entrei, escutei a risada feliz da Lívia e quando olhei para o
sofá, o sorriso que eu carregava se tornou uma carranca.
Fechei a cara para cena que vi.

Lívia segurava o controle do videogame e sorria


largamente, enquanto o João segurava o outro e se
encontrava sentado próximo a ela.

Olhei para o monitor e vi que ele era o Mario.

O Mário... Só eu sou o Mário nessa casa e no meu


videogame. Só eu que vou conquistar a princesa aqui.
Porra!

E eu não estava falando do videogame.

Bati a porta com força, o que chamou a atenção


deles, coloquei as bolsas com as guloseimas em cima da
mesa e fui até a sala de onde eles me olhavam com caras
de espanto.

— Tudo bem, aqui? — perguntei dando o sorriso mais


falso do mundo.

— Tudo ótimo, até agora — João respondeu fechando


o cenho.
— Você sabe que esse controle é meu, né?

— Sim, mas até o momento ele estava disponível e


muito bem comigo. — O filho da mãe me provocava e
parecia falar bem mais do que apenas do controle do
videogame e eu também.

— Pode estar nesse momento, mas ele é meu. —


Encarei-o.

— Ei, o que vocês dois têm? Não vão se estranhar


por causa de um videogame, né? Senta, Gu, joga com a
gente?

— Opa, jogo sim, prima! — Joguei-me no sofá entre


os dois, me apertando para caber entre eles.

João me fuzilava com o olhar por atrapalhar o


momento que vivia com ela. Minha casa, meu videogame,
minhas regras.

Podia parecer infantil, mas era muito mais do que


isso.

— Então pega o outro controle lá, Gu, e vamos jogar


— João falou emburrado, se levantando de onde estava e
indo para outra extremidade do sofá, enquanto eu me
aproximava o máximo da Lívia.

Um a zero para mim.

— Nã, nã, nã, nã, não! Eu sempre sou o Mário aqui


nessa casa, vou conquistar a princesa e você pode ser o
Luigi, aquele que fica em segundo plano, sabe? Que nem é
tão importante assim e só está lá, enquanto o Mário está
descansando para derrubar o próximo castelo.
— Ou talvez não, talvez dessa vez na história, quem
salve a princesa seja o Luigi e ela fique com ele no
final .

— Duvido muito, o Luigi é muito fraquinho. O Mário é


que leva a princesa sempre. — João me encarava como se
quisesse me matar, mas respirou fundo e emburrado se
levantou.

— Bom, vou embora, Lív.

Liv? Que porra de apelido é esse? Ela não é Liv, é


Lívia para ele.

João pousou o controle do videogame no centro de


sala de maneira brusca e se levantou com raiva, enquanto
eu ria largamente.

— Já vai, João? — ela perguntou como se não


entendesse nada.

— É, já vai? Fica aí, cara. Vamos ver quem ganha


essa disputa?

— Essa já está ganha.

Não entendi o que ele quis dizer, mas decidi que eu


ganhei. João estava indo embora e enfim eu poderia ficar a
sós com a Lili.

Ela o levou até a porta, eles trocaram beijo no rosto e


ele disse um: “até logo, Liv”, que consegui ouvir do sofá.

Lívia fechou a porta e andou até mim, que falei


quando ela se sentou ao meu lado:

— Liv? Que apelido é esse? — Revirei os olhos.


— Ah, eu gosto, acho bonitinho. — Sorriu.

— Eu prefiro Lili. — Dei de ombros, emburrado.

— Eu também. Desde que éramos pequenos. — Sorri


para ela e passei os dedos pela sua bochecha.

— Ééé... — Ela limpou a garganta e se sentou um


pouco mais longe. — Gu tive a impressão de que você e
João falavam de outro assunto que não o videogame, está
acontecendo alguma coisa?

— Não que eu saiba, eu estava falando do Super


Mário Word. — Pisquei um olho para ela.

— Ham... sei...

— Bom, mudando de assunto, trouxe guloseimas


para nós assistirmos um filme. Topa? — Vi que ela ficou
meio relutante. — Comprei Doritos.

Encarou-me como se pensasse.

— Ah, e tem Coca e chocolate — continuei e abri um


sorriso para ela, que me encarou sorrindo também e
respondeu:

— Tá, então eu topo!

— Nossa, eu precisando comprar alguém para


assistir um filme comigo é o fundo do poço.

— Coca com chocolate, super me compra. — Riu e


andou depressa até a mesa, para ver o que tinha nas
sacolas.

Andei até ela e quando me aproximei, Lívia virou-se


rapidamente como se fosse me mostrar algo e ficou a
centímetros da minha boca.

Nossa respiração ficou ofegante e sem pensar muito


peguei em sua mão e entrelacei nossos dedos.

Lívia se afastou de mim rapidamente.

— Gu, é... Esqueci que eu tinha que ligar... Uma


chamada de vídeo na verdade, com a... Vivi, tinha marcado
mais cedo... Desculpa o filme não vai rolar.

E como se estivesse fugindo de uma das pragas do


Egito, Lívia correu para o quarto, me deixando ali sozinho,
sentindo o cheiro dela e pensando o quanto iria ser difícil
me manter afastado.

Será mesmo que precisávamos nos manter


afastados? Será que não podíamos tentar e só então contar
para todos? O que eu sabia era que estava difícil resistir.

Joguei-me no sofá e me lembrei de quando erámos


pequenos, de como mesmo com a diferença de idade não
conseguíamos ficar separados. Sempre estávamos
aprontando alguma travessura, que eu sempre assumia a
culpa toda sozinho, para que ela não ficasse de castigo.

Ri com a lembrança e vi que sempre tivemos esse


magnetismo como se estivéssemos destinados a ficar
juntos.

Na realidade, desde que eu soube que a tia Lana


estava grávida, colei ainda mais nela até ver a Lívia nascer.
Sorri mais uma vez e pensei que nossa família já era mais
que acostumada em nos ver juntos, não como homem e
mulher, claro, mas como primos que se amavam desde
sempre.
Repensei e eu queria tentar, para falar a verdade, eu
queria muito que desse certo seja lá o que fosse que
começava a se acender entre nós.

Eu queria muito aquela mulher, meu corpo todo a


queria, por mais que eu tentasse negar para mim, eu a
queria com todas as minhas forças e sempre que
estivéssemos perto um do outro ia ser isso, toda essa
intensidade ia acontecer e íamos ter que nos separar
correndo. Sendo assim, já que ficarmos separados e nunca
mais nos vermos não era uma opção por sermos parentes,
então no que dependesse de mim, ela ia ser minha.

Era isso!

E que se foda toda a culpa por sermos família e o


que mais que pudesse nos separar. Eu não sabia o que
sentia... Pensando melhor, eu sabia sim... Só não queria
admitir.

Que bosta de confusão de sentimentos.

Cheguei à conclusão que por mais que eu não


quisesse, por mais que eu lutasse contra, não ia ter jeito,
daquela vez era diferente de todas as outras. Não queria
estar com ela só por sexo, apesar da atração ser difícil de
controlar, para exibi-la ou por comodismo como era com a
Bruna, com Lívia eu queria estar, porque eu sentia algo
diferente por ela e precisava resolver aquilo.

Ou me afastava ou a agarrava de vez e como me


afastar não era uma opção, então pensei: Lívia, você vai ser
minha!
Capítulo vinte
Lívia
Eu tentava me controlar e ficar o mais longe possível
do Gu, mas estava cada vez mais difícil. Ele me agradava e
me tratava tão bem que eu só queria ficar perto.

Talvez estivesse se sentindo culpado por não querer


nada comigo como eu desejava. Nunca mais havia
acontecido nem um beijo ou um carinho mais íntimo e isso
era bom, pelo menos ficava mais fácil de me controlar.

Não fui mais à Angels e a faculdade também não me


deixava sair, o máximo que tinha de distração era um
almoço com meus amigos.

Samira e Igor também diziam não conseguir ter vida


social, o que fazia com que eu não me sentisse a única
antissocial do grupo. Apesar de que, andei vendo Samira
receber algumas mensagens do Rodrigo, mas que ela dizia
serem apenas convites para Angels.

João continuava indo muito ao ap, foi me buscar na


faculdade diversas vezes e fomos ao cinema umas duas
vezes.
Gustavo seguia não gostando da nossa amizade e
sempre que me via com o João, seu semblante mudava e
exibia-se muito irritado.

De início pensei ser ciúmes, mas depois soube que


ele havia proibido qualquer um dos meninos de se
aproximarem de mim pela promessa que fez ao meu pai.
Segundo ele, nenhum dos amigos servia. Então presumi que
era apenas zelo.

João tentou algumas vezes me beijar, mas me


esquivei de todas elas, estava sem cabeça para
relacionamentos.

O final de semana chegou e por conta de uma festa


temática na Angels, eu sairia de casa e da minha vida de
reclusão.

Era uma festa à fantasia que meus amigos ficaram


loucos para ir e se empolgaram com o processo de procurar
o que vestir.

Durante a semana, em um dos poucos momentos em


que nos encontramos no apartamento, Gu de um jeito sem
graça me convidou para ir com ele, mas eu já havia
combinado de ser companhia do João e precisei recusar.

Meu primo ficou muito incomodado e até xingou o


amigo por ser tão insistente, mas após um tempo voltou
atrás na sua irritação, pediu desculpas e perguntou com que
fantasia eu iria.

— Surpresa.

— Nem um spoilerzinho?
— Não. — Na verdade, eu não fazia ideia de que
fantasia usar, mas queria provocá-lo. — E você vai do quê?

— Se você não me conta a sua, eu também não


conto a minha.

— Que vingativo.

Sorrimos e ficamos em silêncio por poucos segundos,


até que ele disse:

— Caso o João não seja sua companhia, estou aqui.

Encarei-o tentando ver algo por trás da sua fala e


falhei.

— Tenho certeza de que vamos ficar todos juntos lá.

Assentiu.

— Vocês... é... estão juntos?

— Não — respondi como se a pergunta fosse boba.

— Nem um beijo?

— Nadinha. Somos só amigos. — Assentiu sem jeito e


acabamos mudando de assunto.

Durante a semana, conversando com o João,


decidimos ir de príncipe e princesa. Já que iriamos juntos,
apesar de brega, pensamos que seria legal combinar nossas
fantasias. Mas ainda que essa ideia fosse romântica avisei
para ele não ir com segundas intenções que éramos apenas
amigos. Ele exibiu um sorriso lindo e brincou que não teria
segundas e sim terceiras, quartas e quintas.
Em um dia que fomos juntos ver as fantasias, ele
escolheu uma roupa típica de príncipe na cor verde e
sugeriu que eu fosse de princesa Aurora, já que eu dormia
tanto quanto a Bela adormecida. Aceitei, porque não estava
errado e eu não tinha ideia de outra princesa.

A sexta-feira chegou e eu sentia-me mais que


animada para festa à fantasia. Algo me dizia que aquela
noite ia ser “A noite”.

Saí da faculdade e era o último dia de aula antes de


saírmos de férias. Combinei com o Igor e a Samira que eles
me pegariam no ap às onze para irmos juntos à Angels.

E por fim eu não ia nem com o Gu nem com o João,


porque eles foram antes para ficar de olho em tudo da
organização. A Angels ia bombar.

A noite caiu e comecei a me arrumar, meu vestido


era uma versão curta e rodada do vestido da Aurora,
coloquei uma meia-calça arrastão branca e sapatos rosa de
salto. Cacheei meu cabelo e coloquei uma coroa dourada na
cabeça.

Eu estava uma versão muito moderna e morena da


Aurora. Me amei!

Quando terminei de me arrumar fiquei na sala


esperando a ligação do Igor indicando que eu descesse.
Como fiquei no silêncio do apartamento, meus pensamentos
vagaram e sem que planejasse comecei a pensar no Gu.

Não fazia ideia de qual era a fantasia dele, tentei por


diversas vezes descobrir, mas assim como eu, ele manteve
o segredo.
Permiti-me pensar por um segundo o quão lindo ele
devia estar, mas o segundo passou e me lembrei de que o
meu par era o João e não o Gu.

Lívia, sua louca, não se confunda!

Enfim meus amigos chegaram, desci para encontrá-


los e entrei feliz no carro do Igor, que era o motorista da
vez.

Meu amigo vestia um traje de cafetão dos anos vinte


com bigode, chapéu e calça com suspensório. Enquanto
Samira estava linda de princesa Tiana. O Vestido dela era no
mesmo estilo do meu, curto e rodado e também usava uma
meia-calça arrastão. Com o cabelo em um coque e linda.

Chegamos a Angels e a fila já se arrastava até o


próximo quarteirão, vários personagens conhecidos
estavam nela, fantasias lindas. A ansiedade me consumia e
sentia-me doida para entrar.

Como prima do dono eu tinha passagem liberada e


passei pela fila junto com meus amigos.

Entramos e quando ouvi as batidas da música, senti


de novo aquele arrepio subir pelo meu corpo e confirmei o
sentimento que me tomou mais cedo, de que aquela noite
seria “a noite”.

Te acalma, coração.

Mr. Probz – Waves tocava alto e fomos entrando e


dançando. Samira e eu jogávamos os braços para cima e
Igor exibia-se entre nós duas, com as mãos nas nossas
cinturas, até parecia que era nosso cafetão.
Rindo fomos para pista de dança, seguindo a música
e muito animados.

Senti-me como se estivesse sendo observada, olhei


para o grande vidro que era o escritório dos meninos e
continuei jogando os braços para cima me remexendo e
sendo banhada pelas luzes neons e a fumaça que exalava
por entre todos.

Igor foi buscar bebidas para nós enquanto Samira e


eu caíamos na dança. Quando ele voltou segurava três
copos entre as mãos e ergueu um brinde após nos entregar.

— Um brinde as garotas mais lindas da balada.

— Um brinde ao cara mais quente da balada — falei


apontando para ele, rindo e erguendo meu copo.

— Só se for quente de calor.

— Igor se você não fosse gay, eu te pegava. —


Samira piscou para ele.

— Eu também pegava. Você é lindo, amigo.

— Parem de me tentar ou posso abrir uma exceção.

Nos olhou de um jeito sedutor, no estilo hetero top,


que quem estivesse perto juraria que ele estava flertando
conosco.

— Igor, precisamos ir qualquer dia desses a uma


balada gay, deve ser incrível. — Samira falou.

— Bom, para mim é sim, mas para vocês a não ser


que curtam uma linguada acho que não vai ser muito
produtivo.
— Ai, que horror, Igor! — Dei um tapa nele. — Isso foi
vulgar.

Ele deu de ombros.

— Sinceramente, meninas. Tenho preferido a Angels


olha aquilo ali — Ele ergueu o copo apontando
disfarçadamente em direção ao que via e foi aí que nos
viramos e vimos o Rodrigo.

Ele usava uma fantasia de sapo, uma versão bem


sexy de um sapo. Vestindo calça social preta, sapato social
preto e exibia-se sem camisa. Seu abdômen todo pintado
com tinta verde com algumas partes mais escuras, imitando
o desenho de uma pele de sapo. Em seu pescoço usava
uma gravatinha borboleta e na cabeça uma espécie de
óculos que imitava o olho do sapo.

Os gominhos da sua barriga estavam todos salientes


e Samira nem piscava enquanto o via se aproximar.

Rodrigo parou para cumprimentar alguns amigos


pelo caminho, enquanto ela disse sem tirar os olhos dele:

— Oh. My god! Me digam que isso é uma miragem,


pessoas.

— Se for eu estou vendo a mesma que você, amiga


— falei também hipnotizada.

— Gata, realmente ele é o deus do sexo que você


descreveu e não preciso provar para saber disso, esse cara
exala sexo. Preciso buscar mais bebida para não dar pinta
aqui. — Ri do meu amigo, que se afastou logo depois de
Rodrigo chegar e cumprimentá-lo pegando firmemente na
sua mão.
Rodrigo me falou um “oi” rápido, em seguida agarrou
Samira pela nuca e lhe tascou um beijo molha calcinha que
me deixou de boca aberta.

— Fiquei sabendo que você vinha de Tiana, então só


eu poderia ser o seu sapo, gata — disse ao se separar e de
imediato voltou a beijá-la com voracidade.

Bom... Não foi somente ela que curtiu o sexo que


eles tiveram.

Pelo que Samira tinha me dito, eles saíram mais


algumas vezes depois de se pegarem. E essa demonstração
toda de desejo só podia ser saudade ou vontade de mais
repetecos.

Virei-me de costas para o beijo e decidi seguir o Igor


até o bar, mas no momento em que olhei na direção que
meu amigo se dirigiu, fui fisgada por lindos olhos azuis que
me encaravam do bar, olhos que me hipnotizavam desde
criança e que naquele momento me encaravam como se
quisessem me...

Ops! Acho que o beijo da Samira me fez ver demais.

Gu exibia-se lindo de Super Mario e enfim vi a


fantasia dele. Abri um sorriso ao reconhecer. Era a cara
dele.

Sorriu de volta, se levantou e parecia andar em


minha direção. Pude admirar rapidamente a camiseta
vermelha colada aos seus músculos e o quepe vermelho do
Mário que Gu usava virado para trás, deixando-o muito
sexy.

No entanto, quando ele se aproximava, João entrou


na minha frente e tampou a visão.
— Oi, minha princesa! — cumprimentou-me.

— Opa... Oi, príncipe! — falei no susto, mas só


conseguia pensar em outra pessoa me chamando de
princesa.

Tentei olhar para o Gu, mas ele não estava mais lá.

— Você está linda. — João sorriu me mostrando as


covinhas charmosas que conquistaram minha atenção.

— Você está lindo também. — Sorri para ele.

— Não fala assim, senão eu me apaixono.

— Para, João. — Fiquei vermelha.

— Aonde você estava indo?

— Pegar uma bebida.

— Vamos lá, te acompanho. — Ofereceu-me o braço


assumindo o papel de príncipe, se mostrando
extremamente lindo.

Acho que eu pegaria o João.

Olhei para ele, que me lançou aquele sorriso lindo.

Pegaria sim.

Segui para o bar com João e Igor ainda estava lá,


notei quando me olhou, sorriu para alguém atrás de mim e
quando me virei, vi que era o Gu, que reapareceu como por
um passe de mágica.

— Que lindo! Vocês dois combinaram de vir de Super


Mário e Princesa? — Igor perguntou apontando do Gu para
mim e de mim para ele.

Ham? Igor sabia que combinei com o João de príncipe


e princesa.

— Éééé... Não. — Franzi a testa para ele e João o


fuzilou com o olhar.

— Oi, Lili. — Gu me deu um beijo na bochecha,


passou seus braços em volta do meu corpo e me puxou
para perto, o que fez arrepiar todos os pelos do meu corpo e
os cabelos da minha cabeça.

Como uma reação elétrica, separei-me rapidamente,


senti minhas bochechas corarem e os olhos dele em mim.

Gustavo parecia diferente. Mais leve.

— Você está linda, pirralha — disse sorrindo.

— Eiii! Princesa, tá! Hoje literalmente princesa —


falei segurando a ponta da saia que mal cobria minhas
pernas e fazendo uma reverência.

— Olha que legal, temos o Mário aqui e vejo que ele


já salvou a princesa do último castelo. Vocês combinaram
de vir de Mário e princesa? — Fernando também perguntou
se juntando a nós, vestido todo de branco, como se fosse
um oficial da marinha.

— Eu não sou a princesa do Mário, eu sou a Aurora,


sabe? A Bela adormecida? Aquela que dorme? Essa! — falei
de uma vez.

— Pois para mim parece a princesa do Mario, o João o


Luigi e olha aqui — Fernando virou-se e apontou para o
Rodrigo que já tinha parado de beijar Samira e ambos se
juntavam a nós. — E aqui temos o Yoshi.

Todos nós rimos.

— Eu não sou Luigi porra nenhuma, eu sou o príncipe


da princesa aqui. — João passou o braço envolta dos meus
ombros e me puxou para ele, enquanto o Gu revirou os
olhos e virou a cerveja que estava bebendo em um só gole.

— E eu não sou a porra do Yoshi — Rodrigo reclamou.

Tentei me separar do João, mas o braço dele me


prendia firme junto ao seu corpo.

Percebi o desconforto do meu primo quando nos


olhava e eu também me sentia desconfortável, como se
estivesse nos braços errados. Nos braços do Gu que eu
queria estar.

Não faz a louca, Lívia!

Ouvi Gustavo reclamar baixinho de alguma coisa e se


levantou indo em direção de uma loira que dançava. Vi
quando cochichou algo em seu ouvido, ela riu e o encarou
como se não acreditasse que o Gu, dono da balada, estava
lhe dando mole e logo topou ir para sabe-se lá onde com
ele.

Olhei a cena e raiva borbulhou dentro de mim. Pedi


uma bebida, tentei disfarçar, até que João me tirou do meu
ciúme.

— Lív, nunca te vi mais linda, hoje você está muito


gata. — E ao invés de prestar atenção no elogio, eu só
conseguia pensar no Gu reclamando do apelido que o João
me deu. Sorri com a lembrança.
— E vocês dois? É namoro ou amizade? — Igor
perguntou.

— Amizade.

— Namoro.

Respondemos juntos e sorrimos um para o outro.

— Bom, por mim seria namoro, mas ela não quer.

— Você não sabe no que quer se meter. — Dei um


gole em minha bebida.

— Eu sei sim. Me deixa te mostrar como pode ser


perfeito.

Engasguei e todos riram.

— Vai com calma, João. Você está assustando a Lívia


— Samira disse, sorrindo.

Tentando fugir daquela conversa de “Com quem


será”, chamei Samira para irmos ao banheiro, ela deu um
beijo em Rodrigo e foi comigo. Mal tínhamos nos afastado
do grupo e me assustei quando ela esfregou o seu corpo no
meu.

— O que isso, doida? — perguntei.

— O que é isso? Isso sou eu pegando um pouco do


seu mel. O que são aqueles dois homens lindos te
disputando? Chega fiquei com calor. — Se abanou
teatralmente.

— Ninguém me disputava, estavam disputando entre


si. Acho que o Gu só quer encher o saco do João, por ele ser
meu amigo.
— Tsc, Tsc, Tsc deixa de ser inocente amiga, o Gu e o
João estão doidos por você e estão te disputando. Sabe o
que o Igor me contou que o Gu disse para ele no bar,
enquanto você e o João conversavam na pista?

— Não faço ideia. O quê?

— Disse que o João pode até tentar, mas você era


dele. E quando disse isso ele ganhou o Igor, que agora é
team[5] Gu total. Ele me disse que o olhar que o Gu lançou
para você, foi o que o conquistou.

— Bem vi que o Igor estava aprontando. Ele sabia


sobre minha fantasia e quis por lenha na fogueira falando
que eu era par do Gu. Mas é um traidor.

— Ah, eu ainda não decidi para quem estou torcendo,


mas na minha opinião você podia ficar com os dois e fazer
um ménage. O que você acha?

— Samira, sua pervertida. — Eu a empurrei.

— Sério! Pensa que delícia: um loiro e um negro na


sua cama, dupla penetração, mãos por todos os lados.
Uiiii....

— Para, Samira. Biscate! Você anda muito safadinha.


— Ela riu da minha cara, mas minha imaginação foi longe e
me deu calor.

O que o Gu quis dizer quando disse que eu era dele?


Será... prima dele? Ou que eu era tipo... dele.

Sacudi a cabeça para limpar esse pensamento da


minha mente e não sonhar com algo que nunca
aconteceria. Saímos do banheiro puxei Samira direto para o
bar.
Muita intensidade na minha vida. Precisava beber.

Quando estava quase chegando lá, fui puxada para


trás de uma pilastra e prensada contra ela para que
ninguém nos visse. Era o Gu.

Samira viu e ficou distante disfarçando, como se


tomasse conta para que não nos vissem.

— Preciso falar com você. João está investindo forte,


mas não fique com ele. — A voz do Gustavo era sensual e
falava bem perto do meu ouvido para que eu conseguisse
ouvi-lo sobre a música, porém, só consegui pensar na loira
com quem ele tinha saído há alguns minutos.

Ri sem vontade.

— Nossa mentira já acabou, inclusive você é rápido.


Onde está a loira com quem você saiu há pouco?

Olhou-me segurando o riso.

— Lívia Queiros Vilar, você está com ciúme?

— Claro que não. Só acho muito feio você largar ela


lá sozinha e vir aqui me prensar em uma pilastra. —
Separei-me dele e cruzei os braços.

Ele riu largamente e continuou:

— Me promete que não vai ficar com ele?

— Por que, Gustavo? Por que não posso ficar com


ele?

Ainda sorrindo, um sorriso lindo e confiante que faria


qualquer mulher se derreter, ele disse:
— Porque você é minha!

Minha nossa senhora das primas apaixonadas, me dê


forças para resistir.

— Sim. Sou sua prima — falei irritada.

— Por enquanto — ele sussurrou próximo, muito


próximo da minha boca e senti seu hálito mentolado.

Achei que fosse me beijar, mas não fez.

— Por enquanto?

— Eu vou mudar isso e o que for preciso.

— Como vai mudar o fato de sermos primos?

Piscou um olho para mim, sexy pra cacete e com


isso, partiu, me deixando ali paralisada, até a Samira me
tirar do meu devaneio.

— O. Que. Foi. Isso? — ela perguntou pausadamente.

— Tô tentando entender, amiga. — Samira me fitou


com os olhos arregalados e gargalhamos. — Ele está
bêbado, só pode.

— Jesus me abana que eu vi tudo, ele não está


bêbado, ele está... marcando território.

— E que marcada foi essa? Ele chegou tão perto, que


pude sentir o tamanho do... da... Fita métrica. — Abanei-me
e Samira gargalhou.

— Amiga, sabe o que dizem sobre negros, né? E você


acaba de me dizer sobre o tamanho da fita métrica do Gu,
então só posso dizer que qualquer um que você escolha,
seu território estará muito bem demarcado.

Abanei as mãos para ela, gargalhando, pedindo que


parasse de falar besteira e seguimos para o bar, de onde os
dois deuses da demarcação me olhavam.

Eu precisava beber, não estava acostumada com


muito álcool, mas aquela intensidade toda só ia me descer
se eu estivesse anestesiada.

Pedi um copo de Jack com Coca e comecei a


bebericar.

— Que demora, onde vocês estavam? — perguntou o


Rodrigo. — Minha princesa precisa me beijar muito para ver
se viro príncipe. — O pessoal vaiou quando Samira deu um
beijo enfiando a língua na boca dele, mas logo se
separaram e ela respondeu:

— É que demoramos um pouquinho, porque estava


conversando com a Lívia sobre demarcações e tamanhos de
fitas métrica. — Engasguei-me com a bebida, Igor bateu
levemente nas minhas costas e sussurrou:

— Depois quero saber sobre esses tamanhos aí. —


Sorri em resposta, tentando me recuperar e já pedi outra
bebida para não dar tempo de o assunto prolongar.

Gu sorriu cúmplice e me acompanhou pedindo Jack


com Coca. Virou a bebida dele de uma vez e pediu outra me
encarando com olhar de competição. Para não ficar para
trás pedi mais uma, ele também pediu e rindo viramos mais
uma vez.

Todos nossos amigos entraram na onda quando o


Fernando sugeriu, que já que nós dois ficaríamos bêbados,
que todos ficassem também.

— Quem vai cuidar da Angels? — perguntei.

— Ela se cuida. Desce uma rodada da bebida da


Lívia, para todos — Fernando pediu para o barman e
divertidos, viramos todos juntos nossos copos de Jack com
Coca.

Pronto, aquela bebida seria a minha bebida.

Gu pediu mais uma sem tirar os olhos de mim, me


desafiando. Eu era competitiva e não queria ficar para trás,
mas como era fraca para bebida dei a desculpa que queria
dançar.

Alguns minutos depois quando eu já estava na pista,


comecei a ver umas estrelinhas na minha visão periférica.
Efeito do álcool.

Decidi suar para melhorar.

Sexy back do Justin Timberlake tocava e eu sentia a


batida da música sacudindo meu corpo. Comecei a dançar
com movimentos sexys e olhava para o balcão do bar de
onde João e Gu me olhavam.

Não sabia para qual dos dois eu me exibia.

Igor também me encarava, rindo do meu show de


seduzência e eu o chamei fazendo movimentos com o dedo
indicador. Sorrindo meu amigo andou até mim, dançando
um passo após o outro, no ritmo da música e me ajudando
na provocação.

Gu sabia sobre o Igor ser gay, mas o João não, então


vi que fechou o cenho e também se aproximou de mim,
enquanto o Gu continuou sentado no bar com cara
emburrada.

Fechei meus olhos para aproveitar a música e logo


senti as mãos do João na minha cintura, abri meus olhos
rapidamente, olhei em volta e o Igor já não estava mais.

Voltei meu olhar para o rosto do homem lindo perto


de mim e ele me lançou o sorriso sedutor, mostrando suas
covinhas, que eu amava.

Aiiiii... Assim eu não aguento.

Chegou bem próximo e me olhou fixamente, até que


sem que me desse tempo de pensar, me beijou.

Aproveitei o beijo e João beijava muito bem, senti o


gosto de Jack com Coca. Delicado, casto e lento, ele
desenvolveu nosso primeiro beijo, sua língua entrou em
minha boca e se enrolou a minha. Foi bom, mas não chegou
nem perto do calor que senti com o beijo do Gu.

Ei, por que estou comparando?

Não queria pensar no Gu, enquanto beijava um


homem muito gato, mega gostoso, com uma covinha linda
no rosto, mas era impossível, já que sentia os olhos dele em
mim, com certeza nos fitando do bar.

Separei-me do João, colocando a mão em seu peito


para colocar um espaço entre nós.

— Muito rápido — sussurrei.

— Desculpa, mas está rápido para você, para mim


está a passo de tartaruga, te quero desde que te vi e não
consegui resistir. Você é irresistível, Lívia.
— João, não quero te enganar, mas ainda me sinto
confusa em relação ao Gu e me envolver com você agora,
não vai dar. — Ele me olhou com o rosto tomado de
decepção e algum outro sentimento que eu não consegui
decifrar.

Afastei-me, o deixando na pista e fui em direção ao


bar onde o Igor bebia ao lado da Samira e do Rodrigo que se
agarravam sem parar, enquanto o Fernando dava ordens
sobre a Angels a um segurança.

Sentei-me no banco ao lado do Igor e pedi mais uma


bebida, eu já tinha bebido demais, mas uma a mais ou a
menos não faria diferença.

— Que beijo, hein? Realmente como a Sá disse, você


só pode ter mel.

— Tenho mel nada, tenho é imã para problemas.

— Falando em problemas, você tem um que só


depende de você para virar solução.

Franzi a testa.

— Não entendi.

— Hoje mais cedo, o Gu me disse que estava


disposto a enfrentar esse negócio todo de família que vocês
inventaram para se separarem. — Fez uma careta. — E ficar
com você se você quisesse. Eu fiz o amigo cupido e disse
que você queria sim.

— Você fez o quê? Igor você não...

— Shiuuuu... — Ergueu o dedo para me calar. — Mas


daí você vai e beija o cara errado da balada. Pô, amiga, a
princesa no final do jogo fica com o Mário, não com o Luigi.

— Eu não sou a princesa do Mário!

Ele riu.

— Tudo bem, que seja, mas olha. — Apontou a


escada que dava acesso ao escritório dos meninos, de onde
o Gu descia e ia em direção à saída. — O Super gostoso do
Mário está indo embora com cara de poucos amigos e se
quiser conquistar o boy, corre, porque ele não me parece
nada feliz.

— Mas somos primos, Igor, isso nunca vai dar certo.


Não inventamos isso de família para ficarmos separados,
isso existe, é real, não podemos ficar juntos.

— Gata, esquece isso só por essa noite, tá? Depois


vocês resolvem essa questão. Só por hoje se permita viver,
como se essa bagagem toda de família não existisse. Ok?

Fechei os olhos e respirei fundo.

— Ok.

— Então anda ou quer que ele pegue a primeira


disponível que encontrar pelo caminho.

Levantei-me.

— Te amo! –— Dei um beijo no rosto do Igor.

Virei em um gole o resto da minha bebida atrás de


força e segui até a porta por onde Gu tinha acabado de sair.
Capítulo vinte e um
Gustavo
Eu estava decidido a enfrentar as barreiras que me
separavam da Lívia, ainda que isso ferrasse com o meu
psicológico e mesmo que eu não conseguisse mais olhar
para o meu tio e tia, com o mesmo olhar sem culpa.

Decidi que a Lívia valia a pena, sabia que me queria


também, mesmo estando cada vez mais próxima do João,
eu entendia que ela sentia alguma coisa por mim e só se
aproximava dele para se afastar.

A eletricidade que nos envolveu nas duas vezes que


nos beijamos, não era algo que eu tivesse sentido antes e a
maneira como Lívia se entregou ao meu toque, serviu para
que eu tivesse a certeza de que me queria tanto quanto eu
a desejava.

Pensei em convidá-la para ir à festa a fantasia


comigo, mas claro, João que não dá uma chance para Lívia
respirar, e não saiu de cima desde que nosso namoro de
mentira acabou, a convidou primeiro e eu tive que ir
sozinho. Entretanto, decidi que resolveria as coisas entre
nós.

Conversei com Igor, que desde que eu soube que era


gay gostei muito mais, falei sobre meus sentimentos e pedi
ajuda.

Tática de guerra aprendida no filme Hitch -


conselheiro amoroso: se eu a queria, teria que conquistar a
confiança dos amigos dela primeiro, para que eles me
ajudassem no processo.

Na conversa, Igor confirmou que Lívia sentia o


mesmo que eu e fiquei radiante. Mostrei o meu lado para
ele e concluí que consegui a sua aprovação. Tive certeza
quando me afastei para resolver um problema no estoque e
quando voltei, ele olhou para minha fantasia de Mário e
perguntou se Lívia e eu havíamos combinado de ir de par,
quando já sabia que não.

Aliado recrutado com sucesso!

Fiquei a noite toda investindo na Lívia com olhares,


gestos e a prensei na parede deixando claro que a queria.
Sabia que ela e João ainda não tinham passado do estágio
amizade, que não havia rolado nem sequer um beijo.

Depois da pequena competição de quem bebe mais,


Lívia, já um pouco alcoolizada, dançou provocante e tive
que me concentrar para não parecer um adolescente
apaixonado e deslumbrado.

Ela era maravilhosa.

Olhei para o lado e vi que João também a admirava


com um sorriso safado no rosto. Fiquei puto.
Apesar de tudo ele era meu amigo, mas forçava
muito a amizade. Se bem que não o culpava, quem resistiria
a Lili?

Até que ele se levantou, não resistiu e a beijou.

Meu coração começou a bater acelerado no peito e a


raiva explodiu dentro de mim junto com um ciúme
desenfreado que nunca senti.

Observei o beijo dos dois e tive vontade de o agarrar


pela camisa e tirá-lo de cima dela, mas percebi que Lívia
retribuía. Engoli em seco sentindo meu peito queimar com o
ciúme e não consegui mais testemunhar aquela cena, me
levantei e quando ia sair rumo ao escritório, Igor me
segurou pelo braço.

— Achei que você fosse mais persistente. — Foi


macho pra cacete ao me falar isso e me segurei para não o
empurrar longe.

— Eu não luto em batalhas perdidas, ela está... Ela


está retribuindo. Não vou impedi-la de fazer o que quer.

— Para de ser frouxo, Gustavo, e enfrenta essa briga


de frente — Nessa hora tive realmente vontade de dar um
soco no meio da cara dele e descontar a raiva que eu
sentia.

Tirei o chapéu do Mário, coloquei de baixo do braço,


respirei fundo e esfreguei o rosto com as mãos, voltei a
olhar para os dois que ainda se beijavam e não aguentei.

— Ah, quer saber? Que se foda tudo! Sabia que isso


não daria certo mesmo. Tenho certeza que um dia vou
conseguir esquecer, mesmo que machuque pra caralho.
— Gustavo, não vai embora sem falar com ela.

— Como vou falar com a Lívia, se ela está lá com... —


Soltei o ar para não matar um e apertei a boca em linha
reta. Meu peito doía. — Tenho que ir embora daqui.

— Isso que você está sentindo é amor, Gu, não


adianta fugir. — Ele colocou a mão no meu ombro.

— É amor porra nenhuma, é só tesão e vai passar.

Saí dali sem olhar de novo para pista de dança e subi


rumo ao escritório, para pegar a chave do carro.

Não vi se eles ainda se beijavam ou se tinham saído


da pista para outro lugar.

“Isso que você está sentindo é amor, Gu”

As palavras do Igor não saíam da minha cabeça,


martelavam dentro de mim na mesma intensidade que
aquele sentimento me corroía, me dilacerava e me fazia
viver algo que nunca senti.

Será mesmo que é amor?

Se for amor, eu tinha a resposta para pergunta que a


Lívia me fez uma vez. Eu nunca amei a Bruna. Nunca senti
nada que chegasse perto ao que sentia em relação a Lívia.

Desci do escritório sem olhar de novo para onde eles


estavam, passei no bar e pedi uma garrafa de uísque e fui
em direção ao estacionamento da Angels.

Precisava esquecê-la, já que ela o escolheu que fique


com ele.
Cheguei ao meu carro, pousei os cotovelos nele e a
garrafa de uísque no teto, depois apoiei a cabeça nas mãos
e respirei fundo.

Mas que saco! Nunca amei ninguém antes e quando


amo tem que ser minha prima. Maldita hora que ofereci
meu apartamento para ela.

Droga! Não a amo coisa nenhuma, é só o álcool


embaralhando tudo dentro de mim.

Desencostei-me do carro para sumir dali.

Abri a garrafa e ia beber quando ouvi alguém gritar


meu nome e nem precisei me virar para saber quem era.

— Gu — Era ela.

Comecei a procurar a chave do carro no bolso, não


queria conversar, só queria distância.

— Gu, fala comigo. — Continuei de costas


procurando a droga da chave.

— Gustavo, por favor. — Ela colocou a mão no meu


ombro.

— O que foi, Lívia? — Estourei me virando para ela


bruscamente.

Vi medo e arrependimento em seus olhos.

— É... — Engoliu em seco, parecendo pensar. —


Desculpa... não... eu... — Respirou fundo. — Deixa pra lá.

Virou-se para ir embora, eu passei as mãos pelo rosto


arrependido por ter gritado. Ela me deixava louco.
Dei dois passos e a alcancei, pegando-a pelo braço e
a virando para mim.

— Espera. O que você quer? Por que veio atrás de


mim?

— Eu vim... para dizer... — Vi que ela se encontrava


em dúvida e, assim como eu, vivia um conflito. — Deixa
mesmo pra lá, Gu. Acho que o Igor estava enganado,
entendeu errado. — Virou-se para ir.

Bufei, dei mais dois passos e segurei-a de novo.

— Espera, o que o Igor te disse? — Olhou-me


apreensiva e parecia segurar para não chorar.

— Me diga você, o que disse a ele?

Esfreguei o rosto na esperança de que conseguisse


achar as palavras certas, enquanto o vento passava entre
nós e balançava os seus cabelos.

— Porra, Lívia! Isso é difícil e complicado pra cacete.


Você é minha prima.

Eu voltei em direção a garrafa de uísque e ela me


seguiu.

— Isso o quê? O que é difícil? Me fala tudo


claramente, Gustavo — gritou.

Pensei no meu tio e mais uma vez concluí que não


devíamos fazer o que desejávamos.

— Não consigo falar. Melhor continuar como está e


você seguir de onde parou. — Mais uma vez as palavras
ficaram travadas na minha garganta e eu não conseguia
dizer o que pensava.
Peguei a garrafa e ia beber, mas ela pegou da minha
mão e virou em sua boca em um gole generoso, como que
para buscar coragem. Era uma conversa difícil para nós
dois, ambos pensávamos demais.

Fez uma careta ao sentir a bebida queimar e me


olhou segurando o choro.

— Eu... quero você. — Seus olhos brilhavam,


enquanto eu ainda não conseguia dizer nada. — Olha... Vou
voltar lá pra dentro e depois disso, vou pôr fim em tudo.

Ainda me via em silêncio, apenas a olhando com


meu coração a mil e com tanto sendo sufocado por nossa
história.

Vi quando ela engoliu em seco e criou coragem para


colocar um fim.

— Eu não devia ter vindo atrás de você.

Pensar que ela voltaria para o João doeu meu peito,


mesmo assim virei de costas e ia entrar no carro.

Ouvi os passos dela se afastando.

Eu ia perdê-la de vez. Parei, respirei fundo e me virei


de novo a observando se afastar. Pensei no quanto me doía
vê-la indo para outro.

Que se foda tudo!

— Lívia, espera!

Andei a passos rápidos e quando me aproximei, não


dei chance a ela nem a mim de pensar em nada que podia
nos separar. Peguei-a pelo pescoço e a beijei firme e
possessivamente.
Passei a mão por sua cintura, a puxei para junto de
mim e tê-la tão perto acendeu meu corpo e eu a queria, a
queria como nunca quis ninguém.

Sua boca tinha gosto de uísque e de Coca com Jack.

O barulho de alguém batendo a porta de um carro


nos separou, ela me olhou como se estivesse com vergonha
ou se esperasse que eu dissesse algo que acabaria com
aquele momento.

Entrelacei nossas mãos e a puxei em direção ao meu


carro, abri a porta do carona para ela e a acomodei,
soltando relutantemente a sua mão.

Corri para o meu lado e entrei no carro assumindo o


volante, o segurei com força, soltei o ar e olhei para Lívia
que me encarava com ar de indecisão. Sua bochecha estava
vermelha, talvez por causa de tanto Jack com Coca ou pelo
calor que nossos corpos sentiam.

— Não vamos voltar lá pra dentro. Vem comigo?

Lívia me encarou com a respiração entrecortada.

— Gu... você está certo do que está fazendo?

Não respondi, só a beijei de novo e beijá-la era a


coisa mais certa e deliciosa. Nunca tive tanta certeza do
que queria como desejava beijá-la.

Empolguei-me e joguei meu corpo sobre o dela, a


prensando no assento do carro.

— Nunca estive tão certo — sussurrei com a boca


ainda encostada a sua e com olhos fixos. — E você, me quer
como eu te quero?
Ela sorriu, olhou para fora do carro, mordeu o lábio
inferior e soltou o ar como se fosse difícil respirar, voltou os
olhos lindos cor de mel para mim e enfim me respondeu:

— Por mais maluco e errado que isso seja, eu te


quero mais do que você me quer.

Eu a beijei mais uma vez e quando nos separamos,


liguei o carro e eu só queria chegar em casa o mais rápido
possível.

Daquela vez, nada, ninguém, nem sentimento de


culpa nenhum faria com que eu me separasse dela.
Capítulo vinte e dois
Lívia
Entramos no estacionamento do prédio e eu estava
tensa e excitada. Segui o caminho todo em silêncio
enquanto ele dirigia e segurava minha mão.

Certos momentos a levava até os lábios e a beijava,


o que fazia meu corpo se acender de prazer. Tanto ele
quanto eu, estávamos perdidos em pensamentos.

Sentia-me curiosa para saber o que ele pensava, mas


no fundo não queria saber de verdade, tinha medo de ser
algo que me deixasse triste.

Estava bravamente trancando no fundo do baú do


meu inconsciente, tudo o que me fazia lembrar o motivo
que eu não deveria estar indo para casa e pensando
loucamente no meu primo pelado.

Para ser sincera, me concentrava no pensamento


sobre vê-lo pelado, mas nem tanto ou não resistiria e
arrancaria as roupas dele no carro mesmo.

O álcool me deixava assanhada.


Gustavo estacionou o carro, deu a volta nele e foi me
pegar do outro lado, seguimos de mãos dadas até o
elevador e ele me lançou um sorriso que era daqueles
lindos que me fascinavam desde que éramos crianças e eu
retribui sem jeito.

Entramos no elevador e sem aviso prévio Gu


prensou-me contra a parede e me beijou com fervor.

Seguimos até o andar do apartamento nos beijando


sem parar e agradeci aos deuses do agarramento no
elevador por ninguém precisar usá-lo desde o
estacionamento até o andar do Gu.

Quando as portas se abriram, fomos andando, meio


nos desequilibrando por causa de tanto Jack com Coca, mas
mesmo quase caindo não nos separávamos nem por um
segundo.

Chegamos à porta do ap, que ficava a alguns passos


do elevador, Gu separou-se de mim por segundos para
procurar a chave nos bolsos do macacão do Super Mário e
eu ri.

Rapidamente abriu a porta, me pegou de novo pela


mão e me guiou para dentro.

Entramos e ele me puxou para o quarto sem hesitar.


Gu estava agindo como se estivesse muito ansioso para me
ter... “meter” ri do trocadilho besta.

Eu parecia só sorrisos, como beber deixava tudo


engraçado ou, na verdade, o motivo do meu sorriso não
fosse o álcool e sim felicidade.

— Eu sou engraçado? — perguntou divertido e me


puxando pela cintura.
— Não, você é gostoso. — Meu Deus, eu estava
chamando meu primo de gostoso. Sacudi a cabeça para não
pensar nisso.

Tentei parar de pensar que ele era meu primo,


porque gostoso Gustavo era pra cacete e não tinha como
não pensar, ainda mais o tocando em todos os lugares.

Não sabia se era o álcool, mas me via mais


desavergonhada que o normal. Não, não era o álcool, era
aquela delícia de Gu, com aquele oblíquo maravilhoso.

Seguimos para o quarto dele em uma dança de


toques e beijos por todos os lugares. Ele me encostou ao
batente da porta do quarto e me beijou com força, enquanto
sua mão erguia minha coxa para enroscar na sua cintura.

Sem desencostar sua boca da minha, desceu o zíper


do meu vestido de Bela adormecida/princesa do Mario e me
olhou de cima a baixo depois que a peça caiu no chão e
fiquei com os seios à mostra, de calcinha, meia arrastão e
saltos.

— Meu Deus, como resistir à tentação?

Espalmou suas mãos na minha bunda, enquanto me


beijava e me empurrava em direção a cama. Não demorou
até que minhas pernas tocassem o colchão.

Deitei-me e me sentia muito sexy, mesmo com os


seios à mostra eu não sentia vergonha. Só sentia tesão.

— Sexy pra caralho! — exclamou me olhando mais


uma vez.

Gu se separou de mim para tirar o macacão e a


camisa vermelha, ficando só de cueca e mais uma vez pude
ver e me deliciar com seu corpo e braços fortes.

O olhar faminto que me lançava enquanto eu me


encontrava deitada, me deixava ainda mais excitada.

Foi para cima de mim, me beijou com desejo, mas se


afastou como se estivesse com dificuldade de parar,
suspirou e disse:

— Não vamos fazer nada que você não queira. Você


tem certeza de que quer isso?

— Cala a boca, Gustavo! — Puxei-o pelo pescoço e


ele caiu rindo sobre mim.

Sentia-me diferente do que era normalmente, eu


estava muito decidida a ser dele e a partir do momento que
o puxei, não parei nenhum minuto para pensar o motivo de
que não devia ser.

Gustavo se perdia em mim e seus olhos entregavam


todo o desejo que sentia. Meu corpo reagia com intensidade
a cada toque dele e como de costume, o arrepio tão
característico das vezes em que estive ao seu lado, me
tomava e eu me sentia flutuando.

Fechei os olhos e me permiti desfrutar a sensação do


seu toque forte. Com as duas mãos uma de cada lado da
minha cintura, subiu pelas minhas costelas e beijou meu
corpo com delicadeza, me fazendo arfar de desejo e me
contorcer embaixo dele.

— Não acredito que estamos aqui. Nunca acreditei


que isso fosse acontecer. É como se fosse um sonho.

— Espero não te decepcionar. Não sou tão experiente


quanto você.
— Shiiiuuu... Você é perfeita. — Pousou o indicador
nos meus lábios e já substituindo seu dedo por sua boca.

Desceu beijando meu rosto, até chegar próximo ao


meu ouvido e sussurrar:

— Você é o que eu mais quero desde o dia que te vi


pelada bem ali. — Apontou para porta que dava para o
corredor e riu divertido.

Sorri também e fiquei tímida com a lembrança da


vergonha que passei aquele dia.

— Te garanto que você não tem nada do que se


envergonhar. — E me lançou o sorriso mais largo e sexy que
já vi, depois um selinho em meus lábios e quando se
separou deles, encostou sua testa na minha para dizer mais
uma vez:

— Você é gostosa pra caralho, Lívia! E que Deus me


perdoe se isso for pecado, mas não sou de ferro e não
consigo resistir por mais nenhum minuto.

Sua mão passeou por todos os lugares do meu corpo


me deixando louca. Gu me beijou em lugares que eu nem
sabia que poderiam ser beijados e fez com que eu
experimentasse sensações inigualáveis e que nunca
imaginei que existissem.

No começo fiquei tímida, mas seus olhos me


encaravam como se eu fosse a mulher mais maravilhosa da
terra e isso fez aos poucos minha vergonha sumir.

Afastou-se de mim, tirou a cueca que ainda vestia e


na mesma hora que o admirei nu na minha frente, pensei:
Deus, eu não mereço tanto.
E quando eu digo tanto, é TANTO!

No momento em que ia colocar o preservativo, eu o


parei e me sentindo a deusa do sexo, o puxei para cama,
fiquei por cima e me deliciei com seu pênis que se
apresentava tão duro e ereto quanto eu podia desejar.

Segurei a base com as mãos e lambi até a ponta,


depois o abocanhei sentindo a cabeça encostar na minha
garganta.

Os gemidos que Gustavo sibilava, enchiam meus


ouvidos e me faziam sentir prazer, de modo que me
animavam a dar prazer e foi o que precisei para continuar.

Lambi com vontade, chupei e o alisei lentamente,


fazendo seus gemidos se intensificarem. Passei-o nos meus
lábios ao mesmo tempo que o encarava fixamente e foi o
estopim para que Gu me segurasse pelos ombros, me
puxasse para ele e me virasse na cama.

— Preciso entrar em você agora ou vou gozar na sua


boca e não quero que seja assim. — Com os olhos em
chamas passou forte o polegar nos meus lábios e em
seguida me beijou de maneira nada delicada.

Depressa se afastou, colocou o preservativo e voltou


para me beijar com sua língua explorando cada canto da
minha boca.

Passou a mão pelo meu corpo, como se fizesse uma


adoração e enfim me penetrou, devagar e lentamente.
Fechou os olhos parecendo aproveitar profundamente a
sensação.

Centímetro a centímetro me preencheu e o peso do


seu corpo sobre o meu, era o carinho mais estimulante e
prazeroso.

Um ritmo delicioso se instaurou enquanto ele entrava


e saía, rebolava alisando meu clitóris no processo e me
excitava como ninguém nunca fez. Entre as caricias nos
encarávamos... olhos nos olhos e línguas se devorando.

— Gustavo.

— Não geme meu nome ou... — Beijou-me. —


Imaginava que você era gostosa, mas não tanto.

— Isso... é... loucura — falei pausadamente em meio


a estocadas e gemidos.

— A loucura mais deliciosa e sã que já vivi. — Beijou-


me de novo. — Se liberta, minha Lívia. Sem amarras.

Ao ouvir isso me mexi mais no seu ritmo, o apertei


de encontro ao meu corpo pedindo que fosse mais fundo e
não consegui pensar em mais nada, só senti, gemi, arfei e
aproveitei cada sensação que o toque do Gu me
proporcionava.

Senti tudo em mim se esquentar, somado toda a


tensão que vivemos por meses, todo o sim e não e o desejo
reprimido sendo transformados em tesão, então de olhos
fechados aproveitei a constatação de que estávamos juntos.

— Mais forte — pedi.

— Lívia... — Intensificou o ritmo.

— Isso... — gemi. — Gustavo... — Cravei minhas


unhas em suas costas.

Gu fechou os olhos ao me ouvir dizer seu nome,


apertou minha coxa, ergueu seu tronco e apoiou uma das
minhas panturrilhas em seu ombro, me deixando exposta,
aberta para ele e excitada.

Passou o polegar no meu clitóris, me encarando com


a respiração ofegante e meus seios balançavam conforme
ele arremetia firme para dentro de mim.

— Isso — implorei.

Estocou fundo, de modo que o som dos nossos


corpos se chocando ecoava pelo quarto.

— Desejei tanto isso. — Bateu sua pélvis com força


de encontro a minha, me fazendo gemer mais, e de novo
alisou meu clitóris.

Naquele momento o proibido deixou tudo mais


excitante.

— Gu...

Encontrava-me tão molhada que seu pau deslizava


com facilidade. Esperei tanto por aquilo, que senti o clímax
surgir, preencher meu corpo, me esquentar e não demorou
até que eu vivenciasse a sensação deliciosa tomar cada
centímetro e fizesse com que eu me libertasse.

Entreguei-me em tremores, gemidos, chupadas e


apertões nos braços fortes dele. Do meu primo.

Apartando-me em seus braços Gu também


estremeceu, gemeu com um urro atraente e juntos, nos
perdemos em prazer, respiração acelerada e suor.

Minutos depois, saciados e extasiados ele se afastou


de mim deixando um rastro de beijos por meu rosto e
terminando com um beijo na ponta do meu nariz. Deitou-se
ao meu lado e ofegante, falou:

— Lívia... Não sei o que dizer nesse momento. Pela


primeira vez, não sei o que dizer.

— Me diga que sou sua melhor conquista, que já fico


feliz. — Ele abriu um sorriso lindo e respondeu:

— Isso você é sem dúvida, Lili. Sem dúvida.

Sorri feliz me deixando enganar. Sabia que não era a


melhor, mas por aquele dia eu podia conviver com aquela
mentira deliciosa, já que para mim, Gu tinha sido o melhor
de toda minha vida.

E fazendo uma pequena e rápida comparação


percebi que Fábio era um nada na cama. Não tinha como
não pensar, já que meu ex foi o único homem na minha vida
e ele não fez com que eu sentisse nem perto do que Gu me
fez sentir.

Bom, pensando no Gu pelado, em toda a sua


abundância e o comparando ao Fábio... Meu ex realmente
era um nada.

Cobri-me com o lençol me sentindo tímida e Gustavo


me puxou de pela cintura, ficando atrás de mim.

De repente dormir de conchinha teve um novo


sentido. O melhor sentido.

Não demorou até que adormeci.


Capítulo vinte e três
Gustavo
Acordei e mais uma vez me deparei com minha
prima na minha cama, mas daquela vez era diferente, eu
me lembrava de tudo, mesmo estando muito alcoolizado na
noite anterior, não tinha como esquecer.

Foi perfeito demais para que eu esquecesse.

Um grande sorriso surgiu no meu rosto ao observá-la,


mas logo sumiu quando pensei: o que faríamos a partir
daquele ponto?

Na noite anterior, o álcool e o tesão que eu sentia


por ela, não permitiram que eu pensasse na real situação
que estávamos vivendo.

O que aconteceria se meus tios e meus pais


soubessem sobre nós? E pensar nisso tirou de vez o sorriso
do meu rosto.

Levantei-me da cama com cuidado para não a


acordar e me permiti olhar mais uma vez o quanto era linda.
Estava deitada de lado com o lençol cobrindo parcialmente
seu corpo e os cabelos jogados pelo travesseiro.

Olhar para ela, de repente me fez reviver novamente


a noite anterior e era impossível não sentir um arrepio pelo
corpo todo e o desejo de repetir.

Fechei meus olhos e suspirei.

O que está acontecendo com minha vida e meus


sentimentos?

Eu precisava de um banho.

Peguei o celular, a toalha e segui para o banheiro.


Com Bruno Mars cantando It will rain como se soubesse da
minha vida, deixei a água cair e enquanto ela escorria,
pensei no que faria depois daquela noite.

Afastar-me dela e tentar cada um viver sua vida seria


o correto, mas já tentamos e não deu, então só podia
pensar que poderíamos ser mais que primos, até acabarmos
com o tesão que sentíamos um pelo outro.

Ninguém precisava saber o que estava acontecendo.


Ninguém da nossa família, porque os amigos saberiam,
começando pelo João.

Ri.

Ele vai ficar puto! Mas nem tô, ele que aprenda a
perder. A garota é minha.

Minha... Estava decidido, ela ia continuar sendo


minha. Latch tocou a seguir e não pude deixar de dar um
sorriso ao me lembrar da Lívia dançando na Angels...
Saí do banheiro depois de pelo menos meia hora de
banho. Precisava pensar. Enxuguei-me e voltei para o
quarto enrolado na toalha e Lívia não estava mais na cama
e sem entender, juntei as sobrancelhas me perguntado para
onde ela tinha ido.

Troquei de roupa, fui para sala e não vi nem sinal


dela, procurei na cozinha, na sala de jogos e fui até o
banheiro do corredor, que indicava que ela havia acabado
de sair do banho. Pensei que devia estar trocando de roupa.

Fiz café, tomei, esperei, esperei, esperei e nada da


Lívia aparecer. Se ela estivesse se trocando, pela demora,
daria tempo suficiente para experimentar o guarda-roupa
inteiro, então decidi ir procurá-la. Seu sumiço tinha jeito de
fuga.

Bati na porta do seu quarto e ela não me respondeu.


Decidi entrar assim mesmo, abri a porta e coloquei a cabeça
para dentro do quarto.

Encontrei-a sentada na cama, com as costas de


encontro a cabeceira, os braços abraçando os joelhos e com
os olhos vermelhos.

— Lili? — perguntei devagar, não queria assustá-la,


mas ela não respondeu, então entrei e me sentei ao seu
lado.

Pensar que ela se sentia arrependida acabou comigo.

— O que estamos fazendo, Gu?

— Estamos tentando ser feliz.

— E isso está certo?


Abracei-a e ficamos em silêncio por um minuto,
pensei e não cheguei à conclusão alguma. Então por fim, fiz
a pergunta que estava com medo de ouvir a resposta.

— Você está arrependida ou não gostou do que


fizemos? — Ela se separou de mim e me encarou.

— Nem por um minuto. Amei cada segundo de


ontem. Realmente você tinha razão, é muito melhor que
Coca com chocolate. — Sorri para resposta divertida que ela
deu.

Passei o dedo de leve pela sua bochecha. Ela era tão


linda.

— Melhor que Coca com chocolate, hein? Então


realmente você gostou. — Parecia com vergonha. — E por
que está chorando?

— Porque apesar de amar te ter como primo desde


que nasci, ultimamente tenho desejado tanto não ser sua
prima e você ser um homem qualquer que conheci. —
Abaixou a cabeça envergonhada, ergui seu rosto e enxuguei
uma lágrima que escorreu.

— Lívia, estou no mesmo confronto de sentimentos


que você. E sobre ontem: foi surreal de tão bom. — Ela abriu
um sorriso.

— O que vamos fazer com isso?

— O que você quer fazer com isso? — Pareceu


pensar, mas não explanou o que passou em sua mente,
então o fiz: — Eu quero você, Lívia. Te quero como mulher.

Encarou-me sem dizer nada.


— Mas estava pensando... Acho que não deveríamos
contar para nossa família sobre nós por enquanto, vamos
dar tempo ao tempo e ver no que isso vai dar.

— Concordo. — Passou as duas mãos no rosto e


limpou as lágrimas sem dizer mais nada.

Ficamos em silêncio.

— Pensei que você acordaria arrependido.

— Nunca.

Sorriu.

— Lívia, você está com nariz de palhacinha de novo.


— Empurrou meu ombro, sorrindo mais e a segurei pelo
pulso a puxando para mim de novo.

— Você é muito sem graça, Gu — resmungou com o


rosto no meu peito.

— E você é uma graça, Lívia.

Encaramo-nos e com as duas mãos em torno do seu


rosto, a beijei. O que começou lento foi se intensificando,
quando vi, eu já estava tirando a sua roupa, empurrando-a
de encontro a cama e a beijando em todas as partes do seu
corpo.

Podia parecer clichê, mas Lívia para mim era como a


sensação que Ícaro sentiu quando voou próximo ao sol, ele
sabia que não devia, que podia se dar mal, mas a sensação
de voar alto era tão boa, que preferiu arriscar.

Eu carregava a consciência de que não devia, era um


sentimento proibido por ser minha prima, mas quando
estava com ela me esquecia do que devia ou não fazer e
acabava ouvindo só o desejo.

Esquecia-me dos perigos, disfrutava das delícias de


tê-la para mim e, sinceramente, quando me via nos braços
da Lívia, como me encontrava naquele momento, sentindo
seu corpo sob o meu, seu beijo e o desejo que sabia que ela
também sentia por mim, pensava que o que acontecesse
depois não me importava.

Enquanto estivesse perdido em seu corpo, sabia que


Lívia era meu sol e ela podia me queimar o quanto quisesse,
desde que eu a tivesse por perto, aquecendo minha vida.

Depois do sexo delicioso, ambos saciados, ficamos


abraçados e desfrutando o momento de tranquilidade.

Conversávamos, ela deitada no meu peito e eu


brincando com os dedos da sua mão.

— Gu, percebi que você também tem mania de ouvir


música no banho.

— Sim, quando quero pensar. O chuveiro e a música


me ajudam.

— O que você estava ouvindo hoje?

— Não vai rir de mim? — Afastei-me e fitei seus


olhos.

— Prometo — respondeu já rindo.

— Estava ouvindo músicas que me lembram de você.


Por exemplo, desde a primeira vez que você foi a Angels eu
tenho uma música no meu celular e a escuto sem parar.
Lembro que assim que começou tocar Latch do Disclousure,
você saiu correndo para dançar e deixou os caras babando.
— Fiquei puto com isso, mas não contei a ela.

— Aquela música é ótima.

— Sim, mas escuto uma versão mais lenta.

Olhou-me curiosa.

— Posso ouvir?

— Vou buscar o celular. — Saí da cama, fui rápido até


meu quarto e voltei para ela depressa.

— Vê se você gosta dessa versão. — Entreguei-a o


celular, ela deu play na música e enquanto tocava, a
tradução ia passando na tela do celular, evidenciando cada
palavra que a letra romântica dizia.

Você levanta o meu coração


Quando o resto de mim está pra baixo
Você, você me encanta, mesmo quando não está por perto
Se houver barreiras, vou tentar derrubá-las
Estou me prendendo a você, querida, agora sei o que
encontrei

Sinto que somos próximos o bastante


Quero me prender no seu amor
Acho que somos próximos o bastante
Poderei me prender no seu amor, querida

Agora que eu tenho você no meu espaço


Não vou te libertar
Tenho você algemada em meus braços
Estou me prendendo em você
Estou tão capturado, embrulhado em seu toque
Me sinto tão apaixonado, me abrace forte em seu aperto
Como você faz isso? Você me faz perder o fôlego
O que você me deu para fazer meu coração bater fora do
meu peito?

Sinto que somos próximos o bastante


Quero me trancar no seu amor
Acho que somos próximos o bastante
Poderei me trancar no seu amor, querida

Agora que eu tenho você no meu espaço


Não vou te libertar
Tenho você algemada em meus braços
Estou me prendendo em você

Estou me prendendo em você


(Eu estou me prendendo)

Não vou te libertar de novo


(Eu não vou libertar)

Estou me prendendo em você


(Eu não quero libertar)

Não vou te libertar de novo


(Não vou libertar, eu não vou libertar)
(Não vou libertar, eu não vou libertar)

A música acabou e um silêncio constrangedor se


instaurou entre nós. A letra falava exatamente o que eu
carregava no meu coração e não tinha dito a ela.

Vi-me vulnerável mostrando meus sentimentos e até


envergonhado.

— E aí, gostou?
— Sim, muito.

Respirei fundo.

— Bom, podemos tirar a parte melosa de amor e está


tudo certo. Você realmente levanta o meu coração quando o
resto de mim está para baixo. — Ergui o rosto dela pelo
queixo, a forçando olhar para mim e abri um sorriso. Em
contrapartida ela me lançou um riso apagado e se levantou
do meu braço, se afastando.

— Então, Gu... Você pode me dar licença agora,


preciso arrumar minhas coisas, vou para Cananéia hoje e
volto no meio de julho quando minhas férias acabarem.

Ela se levantou, se vestiu sem mais me olhar e


começou a arrumar uma mala, ao mesmo tempo que exibia
o rosto fechado, como se estivesse triste.

O que aconteceu? Por que ela mudou assim?

Não quero ficar todo esse tempo longe dela.

Como vou ficar esse tempo todo sem ela?

Abri meu coração em uma música e ela se afasta,


mostrei a letra que penso nela por muito tempo e ao invés
de gostar, Lívia me diz que vai para longe de mim.

Como entender as mulheres?


Capítulo vinte e quatro
Lívia
Sério?
Quando eu pensava que ia dar tudo certo e já estava
saltitando feito uma gazela de alegria, Gu vem com o dom
que ele tem de me dar banho de água fria.

Naquele instante só queria distância dele, do seu


bendito sorriso sedutor e dos seus olhos azuis que me
encaravam como se não me entendessem.

Minutos antes achei que estávamos bem e que ele


sentisse por mim o mesmo que eu por ele, mas aí, Gustavo
tem que deixar claro, tirando o romance da música, que não
me ama ou está apaixonado por mim.

Tudo bem, que seja. Droga!

Decidi mais uma vez me afastar para ver se naquele


momento que já havíamos nos beijado, transado e vivido a
noite mais maravilhosa da vida, eu entendesse que o que
sentia por ele era só tesão e ia passar com a distância.

— Mas você não me disse que ia.


— Pois é, acabei esquecendo, mas sabe, férias...
Tenho que ir para lá. Além do mais, estou com saudade dos
meus pais e do Pepê — falei sem olhá-lo e arrumando a
mala.

— Quer que eu te leve?

— Não, está tudo certo, vou com a Samira.

Ele se levantou colocou as duas mãos no meu rosto e


ergueu para que eu olhasse para ele.

— E como ficamos?

— Ficamos como somos. Primos. — Ficou sério.

— Primos?

— Sim, sem sentimento nem nada. Foi só sexo,


passou. Ninguém ficou sabendo e continuamos de onde
paramos. Primos.

Ele assentiu.

— Tudo bem. Se precisar de mim me chama, vou


dormir no meu quarto.

Friamente me soltou e saiu.

Encarei a porta por onde ele passou e joguei com


força na mala a blusa que eu segurava.

Que porcaria estava acontecendo? Como, em


questão de minutos, passamos de nos amarmos no meu
quarto, a ele saindo com cara de bravo?

Amarmos não, nós apenas transamos, como ele


mesmo disse, não estamos apaixonados nem nada.
Bufei.

O que você quer, Lívia, que ele declare amor eterno?

Que se dane!

Isso nunca ia dar certo mesmo.

Liguei para Samira, a convidei para passar as férias


comigo em Cananéia e a doida topou na hora. Convidamos
o Igor também, mas infelizmente por motivo de trabalho ele
não podia.

Passou uma hora mais ou menos e minha amiga me


ligou dizendo que estava na frente do prédio.

Depois de respirar fundo bati na porta do Gu para


avisar que havia chegado a hora de ir e ele saiu sério.
Talvez pensasse que íamos ficar transando como animais no
cio durante minhas férias inteira.

— Você tem mesmo que ir? — falou quando avisei


que estava de saída.

— Sim, tenho. Mas ficamos como estávamos. Afinal,


não estamos apaixonados nem nada. Foi só sexo e você
pode ficar com quem quiser e eu o mesmo.

Encarou-me com as mãos na cintura, até que por fim,


disse:

— Não quero ficar com ninguém e não quero que


você fique com ninguém, Lívia. — Virou-se, foi em direção à
sala e se jogou no sofá. — Você não entende.

— Não, não entendo, definitivamente não estou


entendendo nada.
O silêncio tomou conta do espaço.

— Nos vemos na volta, Gu. — Fui até ele para dar um


beijo em sua bochecha, mas Gustavo se virou e me deu um
beijo na boca, em seguida virou-se para frente emburrado e
não respondeu.

Sem pensar no quanto eu queria ficar, peguei minha


mala, fui em direção à porta e não olhei para trás.

Quando cheguei ao carro da Samira ela me lançou


um sorriso do tamanho do mundo. Ri ao ver sua alegria,
coloquei minha mala no porta-malas e entrei.

— Fofa, sua louca, me conta tudo. Você saiu ontem


da Angels com o Gu, e aí?

— Ai, Sá, posso economizar tempo e contar para


você e para Vivian de uma vez só?

— Claro que não. Me conta agora e quando você for


contar para ela, finjo que não sabia. — Ri.

Como eu tinha certeza de que ela não desistiria


enquanto eu não contasse, comecei a falar tudo que
aconteceu no estacionamento da Angels, a noite de sexo
incrível, passei pela minha crise de choro e terminei na
despedida. Ela ouviu tudo atentamente.

— Sabe, acho que vocês dois são doidos e que estão


fazendo uma tempestade em copo d’água. Se vocês se
gostam, fiquem logo juntos e acabem com esse mimimi
desnecessário.

— Gostaria que fosse fácil assim, mas acho que o Gu


não sente nada por mim, é mais uma coisa carnal mesmo.
— Lívia, eu vejo como ele te olha e pode ter certeza,
não é só carnal. E mesmo se for, só aproveita.

— Sei lá, pra mim é... Tenho medo de me machucar.


— Dei de ombros enquanto a diva Toni Braxton cantava sem
parar Why Won't you love me no rádio do carro.

Era para eu morrer mesmo afundada na minha


tristeza, com aquelas músicas que minha amiga gostava de
ouvir.

— Bom, amiga, e se tentássemos viver as nossas


férias sem você falar ou pensar nele e até pegar uns
gatinhos em Cananéia? Aí, se mesmo assim, depois de duas
semanas você ainda o quiser, pensamos em um plano
maquiavélico de sequestrá-lo e ele virar seu escravo sexual
pelo resto da vida. O que acha?

— Acho ótimo, principalmente a parte do escravo


sexual. Samira... ele é fodástico na cama. Meu ex não chega
nem perto do que ele me fez sentir.

— E a fita métrica?

— Tem um quilometro.

Samira riu alto.

— Sexo de zero a dez? — perguntou com a


sobrancelha arqueada.

— Cem.

— Uauuu! Então o clube Angels são realmente os


anjos da noite. E se a gente experimentasse todos? Rodrigo
posso dizer que é cem também.

— Deixa de ser doida, Samira!


— Olha, é só você estalar os dedos e pode
experimentar o João.

— Meu Deus, me esqueci de perguntar, como ele


ficou ontem?

— Ah, ficou puto por você ter ido embora com o Gu,
mas a hora que o vi, ele estava se agarrando com uma
coelhinha, ou seja, ficou puto, mas não tão puto assim.

— Entendi. Tomara que ele tenha se dado bem, iria


me sentir péssima se tivesse estragado a noite dele.

— Ele ficou bem sim.

— E aí, você e o Rodrigo? Namoro ou amizade? —


Samira fez uma careta e me respondeu meio desanimada.

— Só sexo amiga.

— Mas você queria algo a mais?

— Não sei, acho que não. Estou bem com minha


solteirice. Mas é que ele é muito gostoso para que eu o
deixe escapar.

— Então não deixe.

Ela pareceu pensativa e disse:

— Mas não quero nada sério com ele... Por enquanto.

— Por enquanto? — repeti com a sobrancelha


arqueada e caímos na gargalhada.

O caminho para Cananéia foi divertido e passou


rápido. Minha amiga conseguiu me tirar da confusão e do
desânimo.
Quando chegamos já estava de tarde, tentamos ligar
para Vivian e contá-la que estaríamos em Cananéia por
duas semanas, mas sua mãe nos informou que ela havia ido
para casa da avó e só voltaria no próximo final de semana.

Não saímos naquele dia e nem no domingo.


Passamos a semana hibernando, assistindo filmes,
colocando as séries em dia e fazendo programas de
meninas.

Compramos roupas, fomos ao cabelereiro e cortei


meu cabelo em um corte repicado. Fiz as unhas e Samira
me fez entrar em milhares de lojas de moda praia, até ela
encontrar o biquíni perfeito: que combinasse com a sua cor
de pele, com o seu cabelo, com os seus olhos e a cor do seu
útero.

Fiz uma nota mental de nunca mais inventar de


comprar biquíni com ela.

Falamos com o Igor por chamada de vídeo, ele


simulou um choro dramático por não estar conosco.
Desempenho digno de novela mexicana. E depois me fez
contar tudo sobre o sexo com o Gu e em seguida me fez
agradecê-lo pela noite, já que se não fosse por ele, não teria
acontecido.

Brinquei com o Pepê que me ensinou uns truques no


jogo do Super Mário e foi impossível não pensar no Gu
enquanto jogávamos.

Ele me mandou algumas mensagens durante a


semana, perguntando como eu estava e respondi o mais
contida possível, que me sentia bem, mas com certeza cada
mensagem que recebia dele, dava uma balançada na minha
estrutura, mais do que se um terremoto número cem na
escala Richter tivesse passado por mim.
Tentei me manter no eixo.

Samira notava meu desconforto e tentava me animar


quando não estava fazendo bagunça com o Pepê.

Minha amiga era filha única e ela se deu tão bem


com o meu irmão, que parecia ter a mesma idade que ele,
na verdade, não duvidava que tivesse a mesma idade
mental, já que muitas vezes Samira parecia uma criança.

Saímos na sexta à noite e bebemos todas.

Voltamos para casa não era muito tarde, mas


parecíamos duas adolescentes rindo e entrando quietinhas
em casa para que meus pais não notassem que estávamos
bêbadas.

No sábado acordamos cedo, mesmo de ressaca, para


irmos à praia. Estava um pouco frio e um vento cortante
assoviava, ainda que o sol brilhasse no céu, como em um
perfeito sábado de junho.

Voltamos para casa dos meus pais era perto da hora


do almoço e assim que cheguei, vi uma mensagem da
minha mãe dizendo para irmos à casa da vó Eliza, que o
almoço seria lá.

Seguimos e já na casa da minha avó,


cumprimentamos os familiares que se encontravam na sala
e apresentei minha amiga para todos.

Samira ficou com vergonha de exibir sua cara


acabada por conta da bebedeira da noite anterior, mas tia
Sarah, minha tia porralouca preferida, percebeu e disse
para irmos lá para trás, que o resto do pessoal estava lá.

Pensei: que pessoal?


Não senti falta de ninguém, meu pai, minha mãe,
meus avós, tia Sarah e seu marido, encontravam-se na sala
junto com o Daniel, filho deles, e o Pedro.

Sem entender puxei Samira pela mão e nos


encaminhamos para parte dos fundos da casa, onde ficava
a churrasqueira... Eis a surpresa.

— Gu? — Não acreditei que ele estivesse ali.

— Rodrigo? — Samira disse também surpresa,


quando percebeu Rodrigo perto da churrasqueira com um
prato na mão

— E Fernando — Fernando se fez notar, quando viu


que não o tínhamos visto sentado do outro lado da mesa.

— O que vocês fazem aqui? — Cruzei os braços na


frente do peito, parecendo um pouco irritada.

— Tiramos férias também. João vai ficar tomando


conta da Angels por essa semana e viemos curtir o litoral
com vocês — Gu explicou, sorrindo e continuou me
encarando com um olhar... que eu não sabia decifrar. —
Cortou o cabelo? Ficou bonito. — Exibiu um sorriso discreto.

Bom, plano distância seria abortado.

— Obrigada.

Gu passou a mão no meu rosto no mesmo momento


que tia Sarah passava pela porta da cozinha.

Ele disfarçou e sussurrou para mim:

— Pensou que se livraria de mim? — Só revirei os


olhos e não respondi.
— Nossa, a noite de ontem foi boa, hein, meninas?
Vocês estão péssimas — Rodrigo zombou.

— Desnecessário esse comentário — Samira


respondeu incomodada.

Observei-os e talvez Rodrigo mexesse com ela, mais


do que deixava transparecer. E percebi que a melação da
festa à fantasia já não existia e os dois estavam tensos.
Alguma coisa acontecia entre eles.

— Você sabe que estou brincando, gatinha.

Mais uma vez Samira revirou os olhos para Rodrigo.

— E aí, vamos sair hoje? Quero conhecer esse Bar


dos Pescadores, que já ouvi falar que é bom — Fernando
mudou de assunto — Estou doido para conhecer umas
caiçaras.

— Cananéia tem muita mulher bonita — falei.

— Tem mesmo, você é daqui. — Sorri para Fernando


que foi fuzilado com olhar por Gu.

Embalamos em uma conversa sobre os bares locais e


seguimos conversando, comendo e bebendo a tarde toda.

Meus avós adoravam toda aquela bagunça na casa


deles e se juntaram a nós, assim como meus pais, tia Sarah
e tio Maurício, marido dela.

Olhei para Gu diversas vezes e ele retribuía o meu


olhar, me encarando intensamente, fazendo me sentir como
se estivesse nua.

Tentei disfarçar e me manter sempre a uma distância


segura, para não dar bandeira para nossa família, mas me
pegava o admirando como se o meu primo, que interagi
minha infância toda naquela mesma casa, não fosse o
homem por quem eu me via apaixonada.

Arghhh... Isso vai ser difícil! Não era para ele ter
vindo atrás de mim.

Pensei que plano desapaixonar realmente não daria


certo e desejei ser como ele, que não sentia nada e
conseguia tocar aquela história toda sem se afetar.
Capítulo vinte e cinco
Gustavo
Não sabia o que acontecia comigo. Fiquei louco sem
a Lívia no meu apartamento, senti falta dela, de falar com
ela, do cheiro dela e da companhia dela. Foi uma semana de
merda.

Além da semana de merda que tive na Angels. João


andava me tratando rispidamente por eu ter ido embora
com a Lívia no dia da festa à fantasia.

Ainda que fosse meu amigo e sócio, andava sem


paciência para o trato com ele. João tinha que aceitar que
perdeu.

Eu o avisei que quem levava a princesa no final do


jogo era sempre o Mário. Então nada mais justo que eu sair
da festa com a princesa. Eu ria sempre que pensava nisso.

Ficar sem a Lívia e sentir o vazio na minha casa e no


meu coração, logo depois que tínhamos transado, fez tudo
mudar e percebi que o que sentia por ela não era apenas
tesão.
Nunca foi só desejo, sempre foi algo mais, muito
mais. Não tinha nada a que comparar o sentimento que
vivia quando estava com ela e sem ela. Com isso, se eu
precisasse confessar, mesmo que não fosse recíproco, eu
faria.

Todas as vezes que pensava nisso me lembrava do


Igor me dizendo que o que sentia por ela era amor.

Só podia mesmo ser amor, mas um amor proibido


que mexia comigo mais que o normal.

Lutei muito contra meus sentimentos e quando por


fim, parei de lutar, constatei algo que já era para ter
aceitado antes de deixá-la ir.

Martirizei-me pensando que Lívia sentisse o mesmo,


talvez por isso foi embora tão repentinamente quando falei
que não estava apaixonado. Ela só podia me amar também.

Decidi acabar com a incerteza, ir atrás dela, me


declarar e trazê-la de volta para mim.

Peguei uma semana de férias da Angels e chamei


Rodrigo e Fernando para irem comigo à Cananéia, ambos
toparam na hora.

Como João me evitava, pareceu dar graças a Deus de


irmos e ele ficou no comando.

Via-me perto da minha família, lutando para não


agarrar a Lívia na frente de todos, contar que estava louco
por ela e acabar de vez com aquela palhaçada de indecisão
e sentimento de culpa, mas antes, precisava dizer tudo a
ela primeiro.
E claro, que não podia fazer isso em meio a um
almoço com a família toda reunida.

— E aí, Lívia, como anda os namoradinhos na


faculdade? — Sarah perguntou e eu fechei a cara.

Que assunto besta!

— Sem namorados ainda, tia, quase não tenho


tempo para isso, o curso de medicina toma muito dos meus
dias.

— Sei como é, filha, mas a gente sempre arruma um


tempo, não é, Gu? — Tio Jonas disse batendo em minhas
costas, como se soubesse de tudo.

— Sim, tio — Bebi minha cerveja me sentindo tenso.

— Filha, espero que você não arrume tempo mesmo.


Não quero saber de marmanjos paquerando minha princesa.
— Engasguei-me com a cerveja.

— Você está bem, filho? — Tio Jonas perguntou e em


resposta eu só assenti.

Sarah nos olhava parecendo pegar algo no ar, já Lívia


estava com as bochechas vermelhas.

— Nada de namorados, pai. — Lívia sorriu sem graça.


— Bom, eu e Samira vamos indo, família, vamos nos
arrumar para sair à noite com os meninos. — Ela avisou
nitidamente fugindo da conversa e se levantou seguida por
Samira.

Logo deu um beijo em cada um e foi.

— Aí tem, hein, Gu? Só foi a gente falar de namorado


que ela saiu rapidinho. Você deve saber de algo — Sarah
sondou sorrindo.

— Na verdade, não sei de nada mesmo. — Olhei para


minhas mãos e dei um gole na cerveja.

— Gu, confio em você para cuidar dela para mim —


tio Jonas disse com um sorriso no rosto, mas foi como se
cravasse uma faca bem na minha ferida. Só consegui
assentir.

Rodrigo e Fernando me lançaram olhares tensos e


perceberam o quanto eu me via encrencado.

Depois daquela conversa inocente da minha família,


todas as minhas certezas deram uma titubeada.
Capítulo vinte e seis
Lívia
Depois da tensão de fugir do assunto na casa da
minha avó, Samira e eu fomos para casa dos meus pais,
fizemos a sessão meninices e nos arrumamos para sair à
noite.

Tentamos ligar para Vivian, mas até a hora que


saímos, ela ainda não tinha chegado. Fiquei triste, afinal,
estava com saudade da minha amiga, e assim, deixei uma
mensagem, avisando que estaríamos no Bar dos Pescadores
às oito.

Samira e eu chegamos lá antes do horário, demos


uma olhada ao redor e nos apaixonamos por um garçom
delícia, moreno, alto, bonito e sensual que nos olhou desde
que entramos no bar. Quando notou que também
olhávamos para ele, nos presenteou com um lindo sorriso.

Pegamos uma mesa e esperamos os três Angels


chegarem. Não demorou muito, Gustavo, Rodrigo e
Fernando apareceram, lindos, na porta de entrada do bar e
acenamos para que nos vissem.
— E aí? — Rodrigo disse ao se aproximar, sentando-
se ao lado da Samira, que não deu muita atenção. — Qual é
a do lugar?

— Acabamos de chegar, mas parece que hoje tem


música ao vivo — respondi.

— E um garçom bonito nos olhando. Já gostei —


Samira provocou, apontando com o queixo para o garçom,
levando do Rodrigo uma cutucada de leve na costela, que a
fez e rir alto em seguida.

— E aí, meninas? — cumprimentou Fernando, quando


ele e Gu se juntaram a nós.

— E aí — respondemos.

— Já pediram alguma coisa? — perguntou Gu.

— Não, nada.

Gu acenou para o garçom bonito, que andou até


nossa mesa, sorrindo satisfeito.

— Olá, boa noite. O que vão pedir? — cumprimentou


e olhou de mim para Samira, enquanto Gu fechava a cara
para ele.

Fizemos nossos pedidos e o garçom não parava de


olhar tanto para mim quanto para Samira. Nunca para os
rapazes.

— Se precisarem de algo, o meu nome é Otávio.

— Olha que legal, meu nome era para ser Otávio se


eu fosse menino. Bonito nome — elogiei.

— Obrigado — respondeu simpático e saiu.


— Já acabou? — Gu perguntou.

— O quê? — Fiz-me de desentendida.

— De dar em cima do garçom. — Ele estava


realmente bravo.

— Não quero o garçom.

— Então para de dar atenção para ele. — Gu cruzou


os braços, parecendo um menino mimado e evidenciou seu
braço forte.

— Olha, tem alguém com ciúme — Samira brincou e


o Gu balançou a cabeça em negativa.

— Não estou com ciúme.

— O cara é folgado mesmo. Parem de dar atenção


para ele — Rodrigo disse para amenizar o estresse, mas
também parecia com ciúme, por conta da atenção que
Samira recebeu. — Né, Fernando? — tentou chamar atenção
do amigo.

— Não consigo opinar, porque no momento acho que


estou apaixonado por aquela morena.

Olhamos em volta e vimos que uma moça na mesa


ao lado dava muita atenção ao Fernando. E quando me virei
para olhar, vi minha amiga Vivian nos procurando. Acenei
para ela.

— Vivi — gritei, ela me viu e andou em nossa direção


sorrindo.

Percebi que enquanto ela se aproximava teve a


atenção da mesa, afinal, Vivian era uma mestiça linda.
Todos babaram por ela, incluindo o Gu e isso me incomodou
um pouco.

Vivian me abraçou e depois das apresentações feitas,


ela sentou-se ao meu lado e de frente para o Gu.

— E aí, estão gostando de Cananéia? — perguntou.

— Agora estou gostando muito mais — Rodrigo falou


sorrindo e levou um cutucão da Samira, que fez todos rirem
e Vivi perceber que ele já tinha dona.

Não entendia qual era a dos dois.

— Olha, é que de olho puxado já basta eu, mas sua


amiga é uma gata, e a morena da mesa ao lado já me
conquistou — Fernando falou baixinho só para que eu, que
me encontrava sentada ao seu lado, ouvisse.

Sorri.

Pensei que se Fernando não estava interessado e


Rodrigo tinha Samira, então sobrava o Gu para Vivi e foi
quando me dei conta disso, que voltei para conversa da
mesa e notei que os dois pareciam animados.

Juntando isso ao fato de que minha amiga sempre


demonstrou ter uma queda pelo meu primo... perdi.

Na verdade, Gustavo nunca foi meu para que eu o


perdesse.

Lembre-se Lívia: ele não está apaixonado, foi só sexo


com você.

Se era só sexo comigo, poderia ser só sexo com


qualquer outra e se minha amiga estava interessada, eu
tirava meu time de campo.
— Então você é o capitão? Até que enfim te conheci
pessoalmente, porque já te conhecia por foto.

— Capitão? — Gustavo a encarou, desentendido.

— Sim, sempre achamos você a cara do lindo do


Chris Evans, o Capitão América.

— Ah, é? — Gu perguntou olhando para mim — Então


você anda mostrando fotos minhas para as suas amigas?

Sorri sem jeito, mas nem deu tempo de responder e


os dois começaram a conversar de novo e
animadamente.

— Sim, a Lili me mostrou algumas fotos suas, mas já


tinha te visto outras vezes pela cidade e como você não
sabia que eu era amiga da Lívia, não me notou.

— Entendi... Então eu sou lindo como o Capitão


América? — Gu me perguntou mais uma vez e dei de
ombros.

De repente o gato comeu a minha língua.

— Ele é gay, cara, não se anima — Rodrigo se meteu


na conversa.

— Ah, não é não. E mesmo que seja, continua um


gato — Vivian respondeu olhando para o Gu.

Fernando se levantou, foi até a mesa da morena e


em seguida os dois sumiram porta afora sem aviso.

A conversa na mesa se intensificou entre Vivian e


Gustavo, era como se eu não existisse, ele só tinha olhos
para ela, que contava algumas coisas sobre a nossa
adolescência e o quanto a gente aprontou.
Samira notou meu desconforto e quando me levantei
dizendo que ia ao banheiro, ela foi atrás de mim e Vivi ficou
lá conversando animadamente com o seu novo amigo.

— Você está com ciúmes da Vivian com o Gu? — ela


me perguntou assim que entramos no banheiro.

— Não — respondi emburrada.

— Está sim e estou vendo na sua cara.

— Não estou.

— Amiga, conta tudo para Vivian, diz que você o


ama, que ela vai entender. Ela está empolgada com o
Gustavo, mas não sabe sobre vocês dois, o que é injusto.
Sem falar que o assunto deles é só sobre você.

— Não vou contar nada. E... eu não amo mais o Gu.

— Sei... Simples assim?

— Sim. Além de que, ele parece estar gostando da


atenção que está recebendo. Que se divirtam juntos. E,
aliás, não temos nada mesmo, ele tem todo direito de sair
com quem ele quiser.

— Mas isso está te machucando, a Vivi vai te


detestar quando souber.

— Não é para contar. Deixe-os, não quero empatar


ninguém. Vai que os dois dão certo, pelo menos Gu e eu já
acabamos logo com isso.

— Mas você vai sair machucada.

— Vai sair machucada de quê? — Vivian entrou no


banheiro perguntando.
Pensei por um instante, pedindo com o olhar para
Samira não contar nada.

— Esse sutiã está me matando, amiga, acho que vou


embora.

— Não vai não! Amiga, você tem que ver como o Gu


e eu estamos nos dando bem.

— Afff... não aguento ver isso, vocês só fazem merda


— Samira falou saindo do banheiro.

Vivian observou Samira com as sobrancelhas


arqueadas e perguntou:

— O que foi isso? Vocês estão me escondendo


alguma coisa?

— Nada, ela está chata hoje. Só vou ao banheiro e já


voltamos para lá — desconversei.

No caminho para mesa, o garçom gatinho me parou


e passou o número do seu telefone anotado em um
guardanapo, sorri em resposta e voltei para mesa de onde
Gustavo me olhava com atenção.

— Sério mesmo, Lívia? — perguntou baixo quando


me sentei ao seu lado.

— O quê?

— Você e o garçom.

— Se você pode, eu também posso.

— Posso o quê? — perguntou como se não


entendesse.
— Nada.

— Essa música é ótima. Quer dançar, Gu? — Vivi


perguntou animada.

— Vamos lá. — Ele aceitou sem nem me olhar.

Gustavo pegou a mão da minha amiga e foi dançar


com ela.

— O que eu perdi dessa novela? — Rodrigo


perguntou sem entender.

— Nada, isso tudo é uma palhaçada, Rodrigo —


Samira bradou irritada e ele ergueu as mãos em rendição.
— Conta pra ela, Lívia — exigiu.

— Não, deixa minha amiga se divertir, ela merece,


sempre foi tão empolgada com Gu — falar me doía e não
queria que a Vivian estivesse dançando com o homem que
eu amava — Não vou atrapalhá-la — reafirmei.

— Para de ser ridícula, Lívia. Ela está empolgada,


porque não sabe que você é apaixonada por ele.

— Não sou apaixonada por ele. — Engoli em seco. —


Não mais.

— Tá e Papai Noel existe? Não esquece que está


falando comigo, que sei a história toda.

Não falei mais nada e tentei mudar de assunto, mas


antes que conseguisse quando olhei para o lado em que Gu
e Vivian dançavam os vi se beijando.

Encarei a cena por mais alguns segundos, engoli em


seco e olhei para Samira pedindo ajuda para não desabar.
Não queria demonstrar, mas estava difícil ver aquilo e
manter-me impassível.

Via-me possessa com o Gustavo, já que sentia algo


por mim, era ele quem devia ter parado o flerte, mas não
fez isso, continuou dando atenção e incentivando algo que
também queria.

Não vi como o beijo terminou, desviei o olhar e


encarei as ondas pela vidraça do bar e foquei nas árvores
do lado de fora, que balançavam com o vento forte.

Sabia que Samira me encarava, mas não dei atenção


e tentei respirar para não chorar.

Aquilo precisava acabar, então que acabasse de vez.


Que Gustavo ficasse com Vivian, que era uma pessoa
maravilhosa.

Uma lágrima se formou e pisquei várias vezes, me


mantendo firme.

Ambos voltaram à mesa minutos depois. Assim que


percebi que estavam se sentando, me levantei e coloquei a
bolsa no ombro.

— Bom, pessoas, nos falamos amanhã, estou com


uma dor de cabeça dos infernos e vou embora. — Lutando
para não chorar, deixei dinheiro para pagar a conta, sob
reclamações do Rodrigo.

Olhei para Vivi e ela me fuzilava com um olhar de


raiva. Pensei ser porque eu estava indo embora. Samira
parecia impaciente e Gu me encarava como se não
soubesse o que falar.

Virei-me e saí.
— Lívia, vou contar para Vivian. — Samira disse
enquanto eu andava para saída.

— Não conta, quem tinha que contar era o Gu, mas


ele estava nitidamente gostando, então que se divirtam. Aí
pelo menos já acabamos de vez com essa confusão toda.

— Deixa de ser louca, Lívia.

— Volta para dentro, Sá. — Dei um beijo na minha


amiga, deixei a chave da casa dos meus pais com ela e fui
embora.

Já não estava mais lutando para não chorar, soltei as


lágrimas e caminhei em direção à praia, ao mesmo tempo
que as perguntas de sempre se repetiam em minha mente:

Por que eu fui me meter nisso tudo? Por que fui me


apaixonar pelo meu primo? Um amor proibido e sem
sentido.

Um vento gelado de chuva, vindo do mar balançou


meus cabelos e fechei meus olhos para recebê-lo.

— Lívia — alguém me gritou, olhei para trás e vi que


o Gustavo andava rapidamente ao meu encontro.

Não queria conversar e aí andei depressa em direção


aos táxis.

— Espera, Lívia.

Não queria falar com ele, além de pensar em como a


Vivi devia estar se sentindo enquanto o Gu andava atrás de
mim. Por isso continuei andando, quase correndo, para o
mais longe dele possível.
Capítulo vinte e sete
Gustavo
Caralho!
Pensei quando a Vivian me beijou enquanto
dançávamos.

Ela não podia ter feito isso.

Imediatamente lembrei que Lívia nos via da mesa e


isso fez meu coração acelerar. O medo de perdê-la de vez
me atingiu. Eu estava beijando sua amiga. Separei-me da
Vivian e tentei não a deixar desconfortável.

— Vivian, desculpa, mas não sei se você sabe... Eu e


a Lívia, estamos vivendo um... romance, apesar de ela estar
fugindo de mim... estou muito apaixonado por ela. Não me
leve a mal.

— Vocês o quê? — ela perguntou espantada.

— Imaginei que você não soubesse. Ela não deve ter


falado nada sobre ou se sente algo por mim.
— Espera. Eu até sei da mentira do namoro falso e
tal, mas não sei nada a mais que isso. Você sabe que estou
me sentindo traída, né?

— Imagino.

— Que filha da mãe de amiga que a Lili é. E por que


ela não me contou e deixou me jogar em cima de você?

— Não faço ideia, talvez ela não sinta nada por mim.
— Pensar sobre isso me deixou triste.

— Ahhh... Era isso então, que ela e a Samira


conversavam no banheiro. — Estávamos os dois parados no
meio da pista de dança e Vivian parecia uma fera. — Ela
sente sim, Gustavo, e pode apostar que está sofrendo
agora, mas eu estou muito brava com ela, cara. — Ela
passou as mãos nos cabelos, muito irritada, depois me
encarou com carinho. — E me desculpa pelo beijo, achei
que eu fosse me dar bem pegando o capitão América e só
ferrei com os sentimentos da minha amiga.

Sorri e vi que a Vivian era uma figura.

— Mas sabe, estou com muita raiva dela, por não ter
me contado. Estou vendo que não sou mais a melhor amiga.

— Não fica assim, vamos voltar para mesa ela vai te


explicar tudo.

Vivian assentiu, seguimos para os nossos lugares,


mas assim que chegamos, Lívia se levantou, deu um tchau
rápido e foi embora. Vivian se jogou na cadeira e a Samira
já foi logo se explicando:

— Eu falei para ela te contar, Vivi. Eu juro, mas ela


cismou que você estava apaixonada pelo Gu.
— Ah, que burra! A Lívia já foi mais inteligente. —
Vivian parecia realmente brava.

— Ela está apaixonada por você, Gu, mas está


sofrendo com essa confusão toda de família, além de achar
que você não sente o mesmo que ela. Ai, meu Deus, eu não
devia estar te contando isso, ela vai me matar, mas não
aguento ver vocês fazendo tanta burrada — Samira falou
irritada.

— Claro, e você sabe de tudo isso e eu sou a


trouxiane da história. — Vivian resmungou. — Percebo que
não sou mais a melhor amiga, na verdade, não sou nada.
Ah, não, eu sou sim, agora me transformei na putiane que
beija o cara por quem a amiga está apaixonada.

Samira tentou apaziguar a situação, mas não fiquei


para ouvir, virei-me em direção à porta e corri para tentar
alcançar Lívia, com as palavras da Samira martelando na
minha cabeça me dizendo que a minha Lili estava
apaixonada por mim.

Avistei-a andando, encolhida de frio e o vento


cortante que vinha do mar anunciava a chuva que cairia a
qualquer momento.

A chamei e quando ela me notou, apertou o passo


para longe e corri para alcançá-la. Quando consegui chegar
perto, virei-a para mim, a abracei e beijei sua boca, mas ela
me empurrou com raiva estampada no olhar.

— O que está fazendo? — Estava chorando.

— Beijando quem eu realmente quero beijar.

— Você estava beijando a minha melhor amiga há


dois minutos.
Um relâmpago acompanhado de um alto trovão
tomou o céu.

— Não a beijei. Ela me beijou.

— O que é muito pior. Não vou beijar você, quando a


minha melhor amiga te quer. — Lívia exibia-se visivelmente
irritada.

— Ela não me quer, Lívia, e está muito brava com


você nesse momento, por você não contar a ela que está
apaixonada por mim.

— Eu não estou apaixonada por você — ela gritou. —


Eu. Não. Estou. — falou pausadamente. — E você estava
retribuindo, Gustavo. — Bateu com o indicador no meu
peito. — Parecia encantado com a atenção que recebia dela,
nem sequer demostrou que sentia algo por mim. Ah, é,
lembrei, você não sente, não é?

— Eu não estava retribuindo, só sendo educado. —


Esfreguei o rosto frustrado e continuei: — Eu só quero você,
Lívia, não consegue perceber? Não percebe que não consigo
ficar uma semana sem você que enlouqueço? Não percebe
que larguei a Angels, que era meu maior amor até você
aparecer, para vir até aqui? Não percebe que está sendo o
meu mundo por todo esse tempo, desde que colocou os pés
no meu apartamento?

Um trovão cortou novamente o céu e ela começou a


chorar compulsivamente. Acabei com a distância entre nós
e a abracei forte, mas Lívia se separou de mim em seguida.

— Não podemos continuar com isso, Gustavo. Por


mais que eu queira, não podemos.
— Podemos sim e eu vou ter você, sabe por quê?
Porque eu te amo! E não vou te deixar por convenções
idiotas ou por qualquer outro motivo. Eu te amo, Lívia.

E falar isso em voz alta tirou de mim o peso de todo


esse tempo de encontros, desencontros, desentendimentos
e confusões de sentimentos.

Vi que ficou em silêncio me olhando como se não


acreditasse no que eu dizia e uma chuva torrencial caiu
sobre nós, molhando os cabelos dela e os colando no rosto.

— Não fala isso, Gustavo. Por favor, não brinca


comigo assim.

Cheguei perto dela, coloquei minhas mãos em seu


rosto e o ergui para que ela olhasse para mim.

— Não estou brincando, eu amo você, demorei a


entender isso, mas eu te amo. Te amo como nunca amei
ninguém.

Beijei-a delicadamente e as lágrimas quentes que


escorriam dos seus olhos, molhavam minhas mãos
misturadas com a chuva gelada.

— Gu... — Vi que ela carregava uma indecisão no


olhar e antes que dissesse qualquer coisa, tive que implorar.

— Por favor, não me afasta, Lili. Vamos pelo menos


tentar. Eu preciso de você.

— Gu... Por mais louco que isso possa ser... — Ela


abaixou a cabeça, não me olhou e disse em voz baixa — Eu
preciso dizer que eu também te amo... Sou louca por você.
Suspirei fechando os olhos de alívio e ri de felicidade.
E aí era como se tudo se encaixasse.

Ela também me ama, porra!

Beijei-a com vontade, com minhas mãos puxando


seu rosto para mim e quando o nos separamos a peguei
pela mão, ambos ensopados e tive que fugir dali com ela,
para mostrar em cada gesto o quanto eu a amava. Eu a
amava...

Sim, enfim assumi para mim mesmo e para ela. Eu a


amava.
Capítulo vinte e oito
Lívia
Ensopados chegamos a um hotel afastado da cidade
dos meus pais, pegamos um quarto e assim que abrimos a
porta não conseguimos nos controlar.

Desejo tomava conta dos nossos corpos, sensação de


liberdade e só queríamos ficar cada vez mais perto um do
outro.

Tiramos nossas roupas ensopadas, nus e entre beijos


seguimos para cama onde Gu me pegou no colo e me
deitou, se posicionando entre minhas pernas.

Como se meu corpo fosse um templo ele o adorou,


olhando para mim com admiração e mais uma vez quando
estava com ele me senti a mulher mais linda e desejada do
mundo.

Abaixou sua boca até meus mamilos, que se


encontravam rijos e pedindo atenção. Passou a língua de
leve em um e depois no outro, fazendo meu corpo se
arrepiar e eu arfar desejando mais.
Seu toque com mãos firmes me deixava louca e eu
só queria que ele continuasse com as carícias.

Desceu beijando minha barriga, o baixo ventre e


chegou ao meu clitóris. Ansiei em pensamento e
ardentemente que me tocasse ali e sem que eu precisasse
pedir, devagar passou a língua por meu ponto mais
sensível.

Ah... que delícia.

Abri-me para ele e senti seus dedos deslizarem para


minha abertura e a seguir entrou. Primeiro um, depois dois,
ao mesmo tempo que sua boca me chupava e sua língua
deslizava insistentemente me dando prazer.

Apertei o lençol nas minhas mãos e gemi alto e sem


amarras, curvando meu corpo de encontro a sua boca e
pedindo mais.

Aberta para ele passei a mão em seus cabelos e mais


uma vez gemi livre, como incentivo para que ele
continuasse.

Meu corpo fervia e a cada lambida e entrada e saída


de seus dedos eu sentia o clímax surgir lentamente e
crescer.

— Não para — pedi e ele continuou.

Foi então que tremi apertando minhas pernas no seu


rosto e gozei livremente, me contorcendo de prazer.

— Preciso de você. — Puxei-o para mim.

Gustavo rapidamente ficou de joelhos na cama,


pegou um preservativo na carteira e o colocou, depois, com
uma mão em cada uma das minhas pernas, me pegando
para ele, lentamente me preencheu com seu pênis tão duro
quanto podia estar.

Joguei a cabeça para trás aproveitando a sensação e


logo voltei a encará-lo, já ele, como se degustasse cada
centímetro dentro de mim e admirasse cada movimento
meu, fitou-me com os olhos em chamas e cheios de desejo.

Vi-o engolir em seco, tentando se acostumar com a


sensação de estar dentro de mim e depois se mexeu para
dentro e para fora, com estocadas lentas e ritmadas.

Queria senti-lo e o puxei sobre o meu corpo. A cada


arremetida eu apreciava sua respiração em meu pescoço,
ao mesmo tempo que me beijava, eu alisava seu corpo e
chupava seu ombro, braços e boca.

Apertei minhas unhas em sua pele, na intenção de


garantir que era real e que estávamos juntos novamente.

Gustavo me amava.

— Eu te amo — falei enquanto ele arremetia e sua


boca tomou a minha.

— Não mais do que eu te amo.

Ele continuou estocando, rolamos na cama e fiquei


por cima, onde rebolei, deslizei e me dei prazer como
sempre desejava quando o via gostoso na minha frente.

Nós nos amamos de diversas formas. Aproveitamos


um ao outro completamente sem amarras e sem deixar que
tudo com que tínhamos que lidar fora daquele quarto nos
impedisse de aproveitar o momento.
Atingi o clímax mais vezes, assim como ele que me
apertou deliciosamente de encontro ao seu corpo quando
gozou com gemidos sexys e másculos que me deixavam
ainda mais apaixonada.

Mais uma vez confirmei que Gu sabia como satisfazer


uma mulher. Adormecemos cansados e satisfeitos e no dia
seguinte, acordei exausta e lembranças da noite anterior
passavam por minha memória.

Beijos, carícias e amor... Fizemos amor.

Não foi só sexo, daquela vez foi amor. Ele me


mostrou a cada toque em meu corpo o quanto me amava e
foi carinhoso ao extremo.

Lembrar-me da noite anterior e dele dizendo que me


amava, me causou um frenesi e o arrepio tão característico
reapareceu, para me mostrar o que o meu corpo sempre
sentia quando se aproximava do dele.

Espreguicei-me e admirei o boy delícia dormindo ao


meu lado. Encontrava-se deitado de bruços e parecia uma
pintura de tão lindo.

Suas costas fortes e o tanquinho que me fascinou


desde o segundo dia que cheguei no apartamento dele, me
convidavam para uma rodada de sexo de bom-dia, no
entanto, só então caí em mim que o dia já tinha nascido e
estava claro.

Estiquei-me para pegar o celular na mesa de


cabeceira e ver que horas eram, mas foi aí que perdi uma
respiração: quase meio-dia.

Desbloqueei o celular para ver o motivo dele não ter


feito nem um ruído sequer para me acordar e aí lembrei que
se encontrava no silencioso.

Droga! Droga! Droga!

Levantei-me correndo, me enrolei no lençol e


comecei a sacudir o Gu para acordá-lo.

— Gustavo... Gustavoooo...

— Hummm... Oi, linda. — Espreguiçou, esticou a mão


e me puxou. Caí na cama e ele me agarrou para junto dele.
— Bom dia — sussurrou no meu ouvido, com sua voz grossa
matinal e tive que reunir todo meu autocontrole para me
afastar.

— Gustavo, me larga, anda, precisamos ir. —


Levantei novamente enrolando o lençol no meu corpo.

— Lívia, o hotel está pegando fogo?

— Não, Gu, já são quase meio-dia. O que vamos falar


para todo mundo? Onde estávamos até agora? Levantaaa —
gritei para ele.

— Relaxa, Lívia, já estamos ferrados mesmo, vamos


aproveitar — falou virando-se de costas na cama e
colocando os braços atrás da cabeça, evidenciando os
músculos do braço e me lançando um sorriso que me fez
vacilar na minha pressa.

Peguei meu celular novamente e comecei a olhar as


notificações. Tinha milhares de mensagens da Samira, mas
uma mensagem me chamou atenção por ser enorme, de
mais ou menos meia hora antes.

Samira me xingava, dizia que éramos irresponsáveis


e que ela estava preocupada. Disse que mentiu para meus
pais por minha culpa e concluiu a mensagem dizendo que
se eu não estivesse bem ela me matava. Eu ri.

No final da mensagem adicionou duas observações:


que Rodrigo e Fernando eram amigos de infância do meu
pai e estavam lá começando um churrasco, já a segunda
era que a família toda já se encontrava reunida e não
paravam de perguntar por nós, principalmente a tia Sarah.

Rapidamente digitei avisando que estávamos bem e


perguntei o que ela havia dito a todos. No mesmo instante
Samira respondeu que contou que fomos a uma balada na
cidade vizinha, mas ela decidiu voltar porque não estava se
sentindo bem e a mensagem acabava com um: “Puta que o
pariu, Lívia, você só me mete em roubada”.

Mostrei o celular para o Gu que leu e riu.

— Viu, ela já resolveu. Vem deitar.

— Gu, é sério, levanta e vamos ou eles vão


desconfiar.

— Por mim que desconfiem e descubram, é bom que


já facilita minha vida e não vou precisar contar.

Ele se ajoelhou na cama, esticou o braço até mim e


desenrolou o lençol do meu corpo. Puxou-me para ele, deu
um beijo no meu pescoço e aí não consegui pensar em mais
nada. Foi o tempo de escrever um “chego logo” para Samira
e me entregar a minha perdição.

Dizem que o proibido é mais gostoso, reafirmo, é


delicioso.
Capítulo vinte e nove
Gustavo
Estávamos no carro seguindo para casa do tio Jonas
e um sorriso bobo tomava conta do meu rosto.

Nunca na vida imaginei me sentir desse modo, ainda


mais que a causa do meu sorriso era minha prima.

Eu apaixonado... Inacreditável, mas real.

Nem a tensão de enfrentar minha família depois de


um sumiço tirava o sentimento de alegria que eu sentia.
Encontrava-me em um êxtase de felicidade que nem toda a
confusão que envolveria contar sobre nós para todos, me
amedrontava. Ninguém me separaria da Lívia depois
daquela noite perfeita.

— Vou conversar com o tio Jonas hoje, sobre nós —


falei para Lívia.

— Não, Gu, vamos esperar mais um pouco.

— Lívia, não quero que você seja um segredo na


minha vida.
— Não serei, mas por enquanto vamos ver como as
coisas ficam entre nós.

— Como assim como as coisas ficam? — Fiquei


irritado, porque ela parecia não ter certeza de que me
queria, como se nada estivesse certo para ela.

Soltei sua mão que eu segurava enquanto dirigia.

— Só quero dar um tempo, para nós mesmos nos


acostumarmos com isso tudo. — Ela pegou a minha mão de
novo e entrelaçou nossos dedos. — Por favor?

Amoleci.

— Tudo bem — concordei, mas por mim já chegava


metendo o pé e contando tudo para todos.

Não aguentava o sentimento de culpa e de que eu


estava traindo a confiança do meu tio.

Samira havia pedido para Lívia avisá-la quando


estivéssemos chegando e assim que estacionamos ela
apareceu no portão.

Descemos do carro rápido e reprimi o desejo de


segurar a mão da minha prima e ficar de casalzinho. Eu
tinha me tornado uma porra de um romântico.

— Ei, vocês dois, espero que tenha valido a pena


esse sumiço, porque vocês quase me mataram do coração.

— Valeu cada segundo — respondi com o maior


sorriso no rosto.

— Sim, valeu. — Lívia também sorria.


— Que bom que se entenderam, agora disfarcem
esse sorriso de quem fodeu a noite e toda e vamos, que a
família toda está esperando vocês. Eu não sabia mais o que
falar.

Eu ri.

— Gu sua mãe está uma fera com você e a Vivian


com você, Lívia. Ela nem quis vir aqui hoje.

Lívia parou de sorrir sentindo-se culpada.

— Vou falar com ela mais tarde.

Entramos para nos juntarmos aos outros e assim que


chegamos à parte externa, minha mãe nos recebeu com
beijos, mas realmente parecia brava.

— Bonito, senhor Gustavo, até que enfim vocês


chegaram. Onde vocês estavam? — perguntou.

— Tia, fomos a uma balada na cidade vizinha e


bebemos demais, aí o Gu preferiu que dormíssemos em um
hotel por lá, mas perdemos a hora de voltar — Lívia se
apressou em responder a minha mãe, talvez com medo de
que eu falasse a verdade.

Fugi do assunto e fui me juntar ao Rodrigo e


Fernando que bebiam uma cerveja perto do meu tio e do
meu pai.

— E aí? — cumprimentei e eles me passaram uma


cerveja.

— A noite foi boa? — Fernando provocou, rindo e o


respondi fechando a cara.

— Ótima.
— Gu, não entendi, por que só você e a Lívia que
foram e os outros ficaram? — meu pai me perguntou.

— Ah, pai, a Samira estava se sentindo mal e os dois


patetas já tinham se arrumado por aqui. — Meu rosto
pegava fogo e com certeza quem olhasse com mais atenção
notaria minha mentira.

— Hum... E aí foi só você e a Lili? Que legal! — Sarah


disse atrás de mim, cheia de desconfiança na voz e rindo
como se soubesse de algo.

Pensei se Samira tinha contado, mas cheguei à


conclusão que não ou teria nos avisado.

— Pois é. — Dei de ombros.

A tarde seguiu, conversamos, rimos comemos e


bebemos. Fugi das perguntas sobre a noite anterior como
pude e foi uma tarde perfeita entre amigos e família.

Tentei ficar o mais longe possível da Lívia para não


dar bandeira, mas foi quando a música Sem medo de amar
da banda Onze: 20 começou a tocar e ela cantava olhando
para mim, que tive que usar todo meu alto controle para
não a agarrar ali mesmo.

“Ontem te falei, que você e tudo que eu mais quero e


o meu coração só tem lugar pra você...”.

E conforme a música seguia, me concentrar na


conversa era muito difícil, eu só conseguia pensar em beijar
aquela boca chamativa a minha frente e que sorria
cantando.

— Gu, você que é alto, pode ir até a despensa pegar


um guardanapo na última prateleira, por favor? — Tia Lana
me tirou do transe.

— Ah, claro — respondi de imediato, meio assustado.

— Vou lá te mostrar onde está, Gu. Gente, ele nunca


consegue achar nada no apartamento, sempre preciso
ajudá-lo — Lívia disse sorrindo.

O que ela planejava?

— Típico de homem — minha mãe retrucou revirando


os olhos.

Fomos até a despensa e assim que entramos no


cômodo, Lívia me pegou de surpresa, me empurrou contra
as prateleiras e me beijou fazendo com que quase
derrubássemos todos os enlatados.

Isso foi muito sexy.

— Eu estava querendo muito te beijar — disse rindo


quando nos afastamos.

— Você é louca. — Ri.

— Sim, por você. — E nos beijamos de novo.

Desceu com a mão e ousada apertou meu pau por


cima da roupa e me divertindo chamei sua atenção:

— Lívia, você, não quer contar, mas quer transar na


frente da nossa família?

— Sabe quando você come um doce muito bom, não


resiste e mesmo de dieta quer mais dele a ponto de comer
escondido? Tô te querendo, doce.
— Meu Deus, gata. — Olhei para porta da despensa
para ver se não éramos vistos e então a puxei para um beijo
quente.

Quando nos separamos, relutantes em ficar um longe


do outro, pegamos o guardanapo e viramos para sair da
despensa sorrindo da nossa travessura, mas ao olharmos
para frente, demos de cara com a Sarah de braços
cruzados, sobrancelha arqueada e um leve sorriso
maquiavélico no rosto.

Porra!
Capítulo trinta
Lívia
— Tia, não é o que a senhora está pensando —
comecei a me explicar.

— É exatamente o que você está pensando, Sarah —


Gu me interrompeu.

— Gustavo, fica quieto!

— Do que adianta prolongar? Vamos assumir logo.

— Cala a boca os dois — minha tia falou e fiquei com


medo. — Desde quando isso está acontecendo?

— De verdade desde ontem, mas estou apaixonado


por ela desde que entrou no meu apartamento — Gu
respondeu e eu sentia vontade de chorar.

Passei a mão na testa ainda tentando achar uma


explicação inocente para o beijo. Até em respiração boca a
boca e fingir que eu estava passando mal eu pensei.
— Por que eu tinha certeza de que isso ia acontecer?
— Tia Sarah perguntou para ela mesma. — Era por causa
dele que você estava triste da outra vez que esteve aqui,
não era?

— Sim — respondi sem olhar para ela.

— Consegui ler a mensagem do Gu no seu celular


aquela vez e não parei de pensar nisso. Desde então, estou
de olho em vocês, comecei a juntar os pontos ontem e
alguém com um pouco de esperteza, pode notar de longe
que vocês estão apaixonados. Como sou a única esperta
nessa família, só eu notei. Sempre tive um certo tino para
detetive. — Tive que rir, é a cara dela falar isso, mas fiquei
séria, porque vi que tia Sarah não riu. — Vocês vão contar.

— Tia, por favor, nos dê tempo, não quero contar


agora e se não der certo?

— Já deu certo, Lívia. Para de jogar água no nosso


namoro — Gu falou bravo.

— Namoro? — Eu e tia Sarah perguntamos juntas.

Tia Sarah sorriu.

— Preciso confessar que isso é muito bonitinho.

— Ei, que demora é essa? Cadê o guardanapo? —


Meu pai apareceu e eu estremeci.

— Aqui, pai. Achei! — Mostrei o guardanapo que tirei


da mão do Gu — Vamos lá para fora, aqui está quente. —
Puxei meu pai pela mão.

— Estava quente a hora que eu cheguei, Jonas, você


tinha que ver. Agora até que esfriou. — Minha tia ria da
própria piada, enquanto eu fechava a cara para ela.

— Pela demora achei que vocês tivessem derrubado


as prateleiras da dispensa. — Meu pai parou de andar e
falou sorrindo enquanto eu continuava tentando puxá-lo
para longe da tia Sarah.

— Se eu não chego para ajudar, eles teriam


derrubado mesmo, Jonas. Essas crianças... É só deixá-los
sozinhos, que estão sempre fazendo arte. Desde pequenos
são assim — falou, se divertindo e eu puxei meu pai às
pressas para fora, mas antes lancei a minha tia mais um
olhar de repreensão.

O dia passou rápido, entretanto, eu não conseguia


tirar da cabeça que tia Sarah sabia sobre nosso amor
proibido.

Talvez isso fosse uma coisa boa e facilitasse a nossa


vida na hora de contar para toda família, mas também
poderia ser um problema, já que se não desse certo alguém
da família já saberia de tudo.

Sorri ao pensar que se tinha uma coisa boa em


termos sido pegos por tia Sarah, foi ouvir o Gu falar que
estávamos namorando. Isso foi uma delícia e pensar me
dava até um frio na barriga.

Meu primo, aquele Deus grego, meu namorado. Oh.


My. God! Meu primo... Como minha vida mudou tanto?

Ao mesmo tempo em que eu não podia me conter de


alegria por ter me acertado com o Gu, também me sentia
triste, porque tentei por diversas vezes falar com a Vivian
sobre nosso desentendimento, mas ela não me atendeu e
nem respondeu minhas mensagens.
Segundo a Samira ela estava muito brava comigo e
se sentindo traída, por eu não ter contado o que acontecia
de verdade. Eu precisava tentar consertar nossa amizade,
mas ia dar um tempo a ela.

A semana passou rápido em Cananéia e minhas


férias já estavam acabando. Gu e os meninos voltaram para
cidade no meio da semana, para resolver um problema que
surgiu na Angels, já Samira e eu decidimos voltar na
segunda-feira.

Ainda me sentia triste em me afastar dos meus pais


e do Pepê, mas era um mal necessário e a dor de deixá-los
era preenchida pela alegria de estar indo para perto do Gu.

Tia Sarah insistiu em conversarmos durante a


semana e em um café com apenas nós duas, me fez
prometer que não sairia machucada dessa história toda e
que sempre usaria camisinha. Claro, morri de vergonha.
Garanti a ela que me preservaria.

E pensar que fui para Cananéia para fugir, pensando


que Gu não gostava de mim da mesma forma como gostava
dele e saí de lá com a certeza de que ele me amava e
estávamos namorando.

Muita mudança em duas semanas.

De volta à cidade, Samira me deixou no ap quando já


anoitecia. Tentei ligar para o Gu durante todo o dia, mas ele
não me atendeu e só tínhamos nos falado pela manhã,
quando me perguntou se eu ia mesmo voltar naquele dia.

Quando passei pela portaria do prédio, seu Joaquim


me cumprimentou, abriu um sorriso e antes que eu entrasse
no elevador, vi que ele foi correndo até o telefone e,
tentando disfarçar, interfonou para alguém falando baixinho
com a mão na boca. Achei estranho e sorri antes das portas
se fecharem.

No andar do apartamento, abri a porta e assim que


entrei, vi que o ambiente se encontrava à meia luz e pétalas
de rosas amarelas faziam um caminho até o quarto do Gu.

Com um sorriso curioso no rosto, segui o caminho de


pétalas, ansiosa para saber onde aquilo ia dar.

No momento em que entrei no corredor ouvi o toque


baixinho da música Latch. Abri a porta do quarto do Gu e
tampei a boca de emoção quando vi o que estava
acontecendo.

Em cima da cama tinha um boneco de pelúcia do


Super Mário, que segurava uma plaquinha com a escrita:

“Passa comigo para próxima fase, minha princesa?”

Eu já me via rindo e chorando.

Em pétalas amarelas em cima da cama estava


escrito:

“Quer namorar comigo?”

Ao lado, Gu se encontrava com as mãos nos bolsos


da calça e no rosto exibia um sorriso lindo e um olhar
ansioso. Olhou-me e deu de ombros, como se estivesse com
vergonha.

Corri para ele, pulei em seu colo, entrelacei minhas


pernas na sua cintura e comecei a beijá-lo.

Era o pedido de namoro mais lindo que já vi e Gu


tinha o dom de me surpreender e me fazer feliz.
Deitou-me na cama, sobre as pétalas, depois
separou-se de mim como se esperasse que eu dissesse
algo, mas eu apenas queria beijá-lo extasiada com a
surpresa e mostrar com meu corpo o quanto eu o amava e o
quanto ele me fazia feliz, então o puxei para outro beijo.

— Estou esperando minha resposta.

— E precisa?

Gustavo riu do meu desespero, tirou sua camisa e


notou o quanto eu sentia saudade de nós.

— Sim.

— Vou pensar. — Puxei-o para outro beijo.

— Tem poucos dias que não nos vemos. Esse


desespero é saudade?

— É amor.

Sorriu e era só ele sorrir que eu ficava excitada e o


queria cada vez mais.

Gu tirou a minha roupa e seu desejo explodiu, passou


a mão por meu corpo enquanto eu me contorcia sob seu
toque e sem demora se acomodou entre minhas pernas, me
penetrou e embrenhou seus dedos entre meus cabelos, os
puxando com delicadeza para trás e deixando livre o meu
pescoço, onde ele chupou e me excitou.

Não eram necessárias palavras, mas para completar


o momento e me deixar flutuando ainda mais, sussurrou no
meu ouvido:

— Você mexe comigo de um jeito incontrolável.


— E você comigo.

— Cadê minha resposta, Lívia?

— Estou pensando.

— Precisa de um incentivo assim? — Arremeteu forte.

— Ah... — gemi. — Sim.

Com vontade ele arremeteu de novo, entrou e saiu,


com seus olhos me encarando e admirando cada gemido
que saía da minha boca.

— E então, Lívia, você quer ser oficialmente minha?


— Arremeteu de novo forte e eu gemi sem responder, o que
o fez fechar os olhos de prazer e juntos gozamos e nos
perdemos um no outro.
Capítulo trinta e um
Gustavo
Nós dois ainda nos permanecíamos deitados, nus e
ela sobre o meu braço, enquanto brincava com as pétalas
amarelas que ainda se encontravam entre nós.

Decidi pedi-la em namoro, quando percebi que no dia


que Sarah nos pegou na dispensa, não estava tão claro para
Lívia que estávamos juntos e namorando. Com isso, busquei
meu lado romântico e a surpreendi.

— Você ainda não me respondeu — falei sorrindo.

Ela riu no meu peito e o som da sua risada era


música aos meus ouvidos.

Nunca achei que fosse amar alguém assim. Jason


Mraz e Colbie Caillat cantavam Lucky que preenchia o
quarto com o clima romântico que preparei para aquele dia.

— E você tem dúvida? Claro que a resposta é sim,


achei que tivesse deixado claro pra você.

Ri e a beijei.
— Nunca pedi ninguém em namoro, você gostou?

— Se eu gostei? Eu amei. Foi o pedido de namoro


mais lindo do mundo. Mas espera aí, nunca pediu? E a
Bruna?

— Nunca pedi, só fomos ficando. E sabe, Lili, agora


posso te responder à pergunta que me fez sobre se eu a
amava e a resposta é não. Depois de você tenho certeza, eu
nunca amei ninguém antes. — Dei um beijo no alto da sua
cabeça.

— Também nunca amei ninguém como eu te amo. —


Fitei seus olhos mel e pensei que nunca me senti tão
encantado.

— Quem diria que eu me apaixonaria pela pirralha


que cresceu me obrigando a fazer todas as suas vontades.

— Que doido isso! Ainda tenho dificuldade para


acreditar que estamos vivendo essa loucura. É meio surreal,
nunca imaginei que começar a estudar me daria o amor da
minha vida. Me daria você.

— Sempre fui seu, Lili. Desde o primeiro olhar, só que


do primeiro olhar até o primeiro beijo teve um longo
caminho.

— Gu... na verdade, eu te beijei dois dias depois que


entrei no seu apartamento.

— Como assim? — Semicerrei os olhos para ela, rindo


sem entender.

— Lembra de quando te dei aquela cabeçada,


quando você me acordou de um sonho? — Assenti — Então,
eu estava sonhando que nos beijávamos.
Ri.

— Para, Gu, não ri. Eu fiquei confusa naquele dia.


Você era meu príncipe no sonho e me beijava no Parque dos
Pássaros e parecia um anjo, de tão lindo. — Sorri
largamente para ela. — Bom, anjo você sempre foi, né? Meu
anjo, sempre me protegeu e esteve comigo e agora é meu
Angel. Meu anjo da noite que me deixa maluca e me leva ao
céu. Só meu! — falou com a sobrancelha arqueada e muito
sexy. Lembrando-se de quando contei a ela o significado do
nome da Angels.

— Só seu.

— Como eu já disse, Coca com chocolate não chega


nem perto da satisfação que você me faz sentir.

Gargalhei.

— Você me faz tão feliz. Não sei se mereço você ou


porque Deus te deu para mim, mas não quero te perder
nunca mais.

Lívia me deu um beijo e disse:

— Tudo por obra do destino. Minha mãe sempre disse


que ela e meu pai tinham o mesmo destino e acho que os
nossos foram traçados desde quando eu estava na barriga
dela.

— Quando você nasceu foi o meu melhor presente.


Me senti o mais forte, o seu protetor e você era o brinquedo
que eu mais amava.

— Brinquedo? — Ela riu.


— Sim, adorava brincar com você, mesmo sendo
bem mais velho. Aliás, você me tirava do sério muitas
vezes, Pirralha — falei, lembrando de todas as vezes que
brigamos quando éramos pequenos e sorri. — Para ser
sincero, ainda me tira. Tive que me segurar para não socar
todos os homens na Angels que olhavam para você.

— Ciumento.

— Sempre.

Um silêncio se formou e senti ela suspirando.

— Eu te amo, namorado.

— Também te amo, namorada.


Lívia
As aulas recomeçaram e minha correria também.

Samira e eu tivemos que contar em detalhes tudo


que aconteceu em Cananéia para Igor e ele ficou radiante
em saber que Gu e eu estávamos namorando.

Quando contei sobre o pedido de namoro, ambos


pareciam assistir uma novela e riam feito bobos enquanto
eu contava e mostrava as fotos de tudo. Claro que não tinha
foto do sexo quente que tivemos depois, mas essa parte
eles já sabiam.

Por conta da correria das aulas, trabalhos e


simpósios, eu quase não tinha tempo de ver meu
namorado, exceto pelas nossas segundas de filme, namoro
e sexo no sofá, na cama, no corredor e onde mais tínhamos
direito.

Por morarmos juntos, eu pensava que ter uma


pequena distância dele até que era uma boa, se não
estaríamos vivendo praticamente um casamento.

Durante as noites que Gustavo estava na Angels, eu


dormia no meu quarto e quando ele chegava de manhã
deitava comigo até a hora de eu sair para faculdade, depois
tomávamos café juntos e quando eu saía ele ia dormir.

Em alguns dias, conseguíamos organizar os horários


para nos vermos à tarde, antes dele ir para o Jiu Jitsu e
depois que voltava, antes de sair para trabalhar novamente.

Ainda me sentia triste por não conseguir falar com


Vivian, o máximo que consegui dela foi um “Ok” em
resposta a um textão que enviei, em que eu explicava tudo
e pedia desculpas por não ter contado antes. Conhecendo a
Vivi, um “Ok” já era um progresso.

Virava e mexia minha tia Sarah me ligava para


perguntar como eu estava e como andava minha história
com o Gu, sempre respondia que seguíamos bem e ela
parecia ficar feliz. No entanto, tudo que é bom dura pouco.

Em um dia que me via sozinha em casa e Gu tinha


acabado de sair para Angels e eu seguia pelo corredor, no
momento em que passei em frente ao seu quarto, ouvi o
barulho de um celular apitando com a chegada de uma
mensagem e até pensei ser o meu.

Voltei ao meu quarto, conferi e não era, então segui


pelo corredor novamente e retornei ao quarto do Gu, onde
avistei o celular dele em cima da mesa de cabeceira. Juntei
os lábios e pensei: ele esqueceu e usa tanto que podia ser
um problema.

Como o aparelho dele não tinha senha, o abri para


ligar na Angels, saber se Gu já havia chegado e avisar que o
celular estava em casa, mas antes que eu pudesse fazer
isso, meu mundo caiu.

Uma mensagem da Bruna piscava na tela:

“Estava com saudade, gostei da noite de


ontem.”

Juntei as sobrancelhas sem entender, li e reli.

Não queria acreditar no que lia.

Como assim noite de ontem? Eles estiveram juntos


ontem à noite?
Uma dor apertou meu peito. Não era possível que o
Gu tivesse feito isso comigo, eu não podia acreditar.

Reli a mensagem mais umas cinquenta vezes, até


que o entendimento veio e com as lágrimas embaralhando
as letras e escorrendo pelo meu rosto parei de ler.

Não conseguia acreditar, mas era real.


Capítulo trinta e dois
Gustavo
Assim que entrei na Angels e fui pegar meu celular
no bolso para procurar um contato e passar para o
Fernando, percebi que não estava com ele.

Pensei em continuar trabalhando e deixá-lo em casa,


mas precisávamos de um número de telefone que eu só
havia salvado no meu celular.

Decidi voltar em casa para buscar o aparelho, mas


quando me virei para sair, Bruna encontrava-se bem atrás
de mim, ouvindo a minha conversa com meu amigo e
ficamos centímetros um do outro.

— Estava com saudade de você. — Colocou a mão no


meu peito.

— Bruna, me dá licença que preciso ir até em casa e


voltar rápido. — Tirei a mão dela imediatamente.

— Ouvi que você esqueceu o celular, mas se quiser


companhia posso ir até lá com você e fazer aquilo que
fazíamos tão bem antes. — Parecia estar bêbada.
— Olha, não sei se você sabe, mas estou namorando
e minha namorada está lá no meu apartamento nesse exato
momento me esperando, então acho que ela não ficaria
muito feliz se você chegasse comigo. — Dei a volta nela,
segui para saída e Bruna continuou atrás de mim.

— Ainda com a história com a prima, Gustavo? Achei


que já tivesse enjoado dela.

— Sem chance, impossível. Ela é a mulher da minha


vida. — Dei um sorriso e voltei a andar.

— Então tá, se é aquela sem graça que você quer,


então seja feliz. Ou não. — E virou-se mexendo no celular.

Via-me sem tempo de responder as gracinhas da


Bruna e segui para o ap.

Já em casa, abri a porta e no mesmo instante


encontrei Lívia sentada no sofá, o rosto coberto de
seriedade, como se andasse chorando, e o meu celular nas
mãos.

— O que aconteceu? — perguntei enquanto andava


até ela.

— O que é isso, Gustavo? — Entregou-me o aparelho


e nele li uma mensagem da Bruna, dizendo que estava com
saudade e gostou da noite de ontem.

Noite de ontem? Como assim? Ela está louca? Nem


sequer a vi ontem.

— Não sei o que é isso, Lívia. — Sentei-me ao seu


lado.
— Não sabe? Você não sabe? — perguntou cheia de
desconfiança. Nunca a tinha visto tão brava e ressentida. —
Eu aqui te esperando voltar e você lá fazendo sei lá o que
com ela e mentindo que estava trabalhando. — Se levantou,
virou de costas para mim como se fosse difícil me olhar.

Levantei-me e fui até ela.

— Você está sofrendo à toa. Eu não fiz nada com a


Bruna e nem a vi ontem.

— E essa mensagem?

— Eu não sei o motivo dela ter enviado isso.

Encarou-me como se pensasse, mas não disse nada.

— Por favor, vamos parar de brigar, eu não quero a


Bruna, não falava com ela desde aquele dia na Angels, no
nosso primeiro beijo. — Abracei-a e Lívia se soltou de mim.

Aquilo doeu, porque eu não carregava a culpa


nenhuma e eu não tinha feito nada com a Bruna a não ser
conversado com ela naquele dia.

Logo me lembrei do tom de ameaça com que Bruna


falou comigo.

— Eu sei o que aconteceu, Lívia. Hoje a hora que eu


estava saindo para buscar o celular, ela me parou, tentou
algo e eu a esnobei dizendo que você me esperava aqui. Ela
sabia que eu tinha esquecido o celular e deve ter planejado
tudo.

— E você acha que vou acreditar nisso? Fábio


também me traiu, devo ter... sei lá, um imã para traição.
Ela tinha os olhos marejados e eu detestava vê-la
chorando, mas quer saber? Ela me acusava de algo que não
fiz.

Que se foda!

E me comparava ao imbecil do ex-namorado, que a


traiu e a tratou como nada. Sendo que eu não fiz isso. Não
fiz nada de errado. Então explodi.

— Também? Eu não te traí, Lívia e... acredite no que


quiser. Eu tenho a minha consciência tranquila. E não me
compare com o idiota do seu ex-namorado, eu sou bem
melhor que ele.

— Não grita comigo!

Eu nem percebi que estava falando alto e ela me


encarava assustada e com raiva.

— Desculpa.

Estávamos os dois exaltados, por algo que não


aconteceu.

Respirei fundo e sem paciência para mais discussão,


virei-me para sair. Peguei a chave do carro sobre a mesa, o
bendito celular que havia esquecido e fui em direção à
porta, até que a voz dela me parou:

— Espera... Aonde você vai?

— Vou trabalhar. É o que eu faço na Angels. Trabalho


e penso no quanto quero que o tempo passe rápido para
voltar pra você. Não tenho tempo para ninguém que não
seja você, Lívia, mas se prefere acreditar em uma mentira
armada pela Bruna para nos separar, eu não vou ficar aqui
tentando te provar nada. Se você não confia em mim e não
quer acreditar, não tenho mais nada a dizer.

Virei as costas e saí, ouvi quando ela me chamou


mais uma vez, mas eu estava muito puto.

Bati a porta com raiva e voltei dirigindo para Angels.

Já no trabalho eu nem sequer olhei para o lado e fui


direto para o escritório. Sentei-me à mesa, fechei ao me
recostar e me permiti respirar e me acalmar.

Não demorou até que fiquei mais tranquilo e não


acreditava que havia gritado com ela. Mas poxa, eu não a
traí. Sabia que a mensagem devia tê-la a machucado muito,
mas ela precisava confiar em mim.
Lívia
Sentei-me encolhida no sofá e chorei depois que ouvi
a porta bater e o Gu sair.

Inicialmente fiquei cega e pensei que ele não tinha o


direito de me trair, ler aquela mensagem acabou comigo,
mas desde que o olhei, uma dúvida pairava sobre mim.

Ele parecia tão sincero que me deixou realmente na


dúvida se eu estava certa ou errada.

Decidi que ficar ali chorando não ia acertar as coisas,


eu precisava tentar resolver, mesmo que isso me doesse eu
precisava saber a verdade.

Fui até meu quarto, coloquei um jeans, uma blusinha


preta e saltos pretos. Sentia-me sem vontade nenhuma de
me arrumar e apenas passei uma make leve para esconder
as olheiras e os olhos inchados de chorar. Pronta segui para
Angels.

Algo me dizia que eu teria minha resposta.

Chamei um táxi e chegando lá, como sempre, eu já


tinha passe livre e fui entrando, tentando não ser vista por
ninguém conhecido.

Dei uma olhada na pista e em toda a parte térrea da


balada para ver se o via, mas nada. Quando me dirigia para
o lado que dava para o escritório, vi a Bruna no pé da
escada.

Parei, dei um passo para trás e me mantive


escondida. O segurança conversava com ela meio sem
paciência e parecia não querer deixá-la subir, inclusive fazia
que não com a cabeça repetidas vezes e gesticulava
Depois dela insistir muito, vi que ele cedeu, pegou o
celular, como se ligasse para pedir permissão e em seguida
deixou-a passar.

Senti um aperto no meu peito ao entender que talvez


fosse Gu do outro lado da linha e ele permitiu a entrada
dela.

Não sabia por que estava me prestando àquele papel


e arrependida comecei a andar em direção a saída. Até que
parei e pensei que eu não era assim, sempre fui a que tirava
tudo a limpo, a que enfrentava e não fogia das dificuldades.

Amava o Gu e precisava ver com meus próprios olhos


o que acontecia, mesmo que isso me dilacerasse em mil
pedaços.

Eu ficaria completamente destruída se ele estivesse


com a Bruna de novo, mas precisava saber.

Voltei decidida até o início da escada e vi que o


segurança não estava mais lá, o que me facilitaria seguir
sem ser anunciada.

Subi rapidamente e quando cheguei ao corredor que


dava para porta da sala do Gu, eu já podia ouvir vozes
conversando.

Mais uma vez me acovardei e pensei em voltar e ir


embora. Doeria demais se os visse juntos, mas respirei
fundo e eu precisava ver para seguir em frente e de uma
vez por todas, decidir nossa história.

Segui mais uns passos e ouvi a voz do Gustavo, que


parecia completamente exaltado. E eu seguia no misto de
quero e não quero saber.
— Ah, Gustavo, pelo amor de Deus, não consigo
acreditar que você quer aquela sem graça. Você sempre
correu atrás de mim. — Do lado de fora ouvi Bruna dizer.

— E você me esnobava o quanto podia, quando viu


que eu estava apaixonado por outra, aí decidiu que me
queria. — Andei mais uns passos lutando contra a vontade
de sair correndo e fiquei em um ângulo em que os via e eles
não me viam.

— Esnobei, mas quero você de volta, bebê. — Ela se


aproximou e colocou a mão em seu peito.

Ouvi-la ronronando como uma gata no cio estava


fazendo meu estômago revirar.

— Mas eu não te quero. — Ele tirou a mão dela de


cima do seu peito — Estou apaixonado pela Lívia, ela é a
mulher da minha vida e aquela maldita mensagem
mentirosa que você enviou... acabou com tudo.

Meu coração batia freneticamente, parecia que sairia


pela boca a qualquer momento. Ele não tinha estado com
ela afinal.

— Que mensagem mentirosa? Era totalmente


verdadeira.

— Não era porra nenhuma. Para de ser doida. Você


sabe que não era e por tudo que é mais sagrado, para de
brincar comigo assim. — Gu parecia muito exaltado, nunca
o tinha visto tão irritado.

— Solta meu braço, Gustavo. — Ela deu um safanão


e se soltou da mão do Gu que a segurava e ele esfregou o
rosto parecendo arrependido do surto de raiva. — Você
esteve sim comigo... nos meus sonhos. — Ela riu divertida.
— Tive um sonho tão quente com você ontem, que o nosso
sexo até pareceu real.

Ah, sua piranha!

Quando ouvi isso, meu coração já não batia, ele


saltava.

Maldita mulher mentirosa dos infernos!

Gu tinha razão, ela armou tudo para me separar


dele. Meu rosto estava quente de raiva, fervendo de ódio e
minha mão coçando de vontade de dar na cara dela.

Apareci na porta da sala e os olhos do Gu me fitaram


assustados, como se tivesse sido pego em flagrante, mas eu
sabia, naquele momento eu tinha certeza de que ele era
inocente e eu me sentia completamente culpada.

— Lívia? — Gu disse engolindo em seco. — Olha...

— Ei, você — falei interrompendo o Gu e apontando


para Bruna — Sai daqui se não quiser ser escorraçada a
tapas.

— Há, há, há... E quem vai fazer isso? — ela me


perguntou rindo.

— Eu. — Andei até ela, a peguei pelo cabelo e a


arrastei porta afora, enquanto ela se debatia tentando se
soltar.

— Para com isso, Lívia — Gu tentava me parar, me


puxou pelo ombro e me afastou dela que arrumou o cabelo
quando se livrou da minha pegada.

— Eu quero matar essa mentirosa — gritei.


— Essa não é você — falou me olhando fixamente.

— Sua selvagem. — Bruna gritou.

— Não, a selvagem aqui é você que parece um mico


leão dourado com esse cabelo vermelho horrível, e só não
te mato porque sua espécie está ameaçada de extinção. Ah,
não, na verdade, não parece não, porque o bichinho é
bonito.

Vi Gu se segurar para não rir, enquanto a macaca


parecia furiosa.

— E outra coisa, faz mais uma armaçãozinha dessas


para me separar do Gu e vai ser muito pior. — Meu
namorado me segurava para eu não voar para cima dela de
novo.

Bruna bufou.

— Tudo bem, fica com ele todo para você, já usei e


abusei desse corpinho mesmo. Deixo o resto para você.

— Sai daqui, Bruna. — Gustavo gritou e ela saiu


pisando duro nos deixando a sós.

Eu tentava viver uma vida sem rivalidade feminina e


pondo em prática a tal sororidade, mas com aquele tipo de
mulher sem caráter, não dava.

Respirei fundo e me acalmei, enquanto Gu se afastou


de mim e ficou de frente para vidraça que dava para pista
de dança.

Pensei em milhares de coisas que eu poderia dizer,


mas nenhuma expressaria o que eu realmente sentia e o
quanto me sentia arrependida.
Andei até ele.

— Gu, me desculpa? — Continuou de costas e em


silêncio. — Eu ouvi tudo antes de entrar. — Encontrava-se
com as mãos nos bolsos, pensativo e não me respondeu.

Aproximei-me ainda mais dele e coloquei a mão em


seu ombro. Eu queria abraçá-lo, beijá-lo e mostrá-lo o
quanto eu estava feliz que tudo aquilo era mentira, que a
traição nunca existiu e que sentia-me aliviada. Eu o amava.

— Agora você sabe disso? Só agora? Você tinha que


ter me ouvido e acreditado em mim.

Fechei meus olhos e soltei o ar. Ele tinha razão.

— Me desculpa?

— Lívia, preciso trabalhar... depois conversamos.

Permaneci olhando para ele por mais alguns minutos


e uma lágrima escorreu pelo meu rosto.

— Tudo bem. — Engoli em seco.

Achei que ficaria tudo bem entre a gente, mas vejo


que está longe disso.

Eu o magoei por não acreditar nele e merecia o gelo


que estava recebendo.

Virei-me e fui em direção à saída, pensei que ele


fosse me chamar, correr atrás de mim e dizer que me
perdoava, mas nada aconteceu. Essa cena só acontecia em
filmes românticos.
Capítulo trinta e três
Gustavo
Eu queria tanto provar para Lívia que eu era inocente
e nada tinha acontecido entre a Bruna e eu, aí a vida me
ajudou e ela apareceu no meu escritório, ouviu por conta
própria e enfim consegui provar que era inocente.

Entendia que ela era insegura e sofria com isso, mas


contei a verdade e Lívia precisava ter acreditado em mim,
além de que, o que me deixava mais puto, era pensar que
minha namorada havia ido até a Angels ver com os próprios
olhos algo que não existia.

Quando Lívia entrou na sala pensei que não tivesse


ouvido a confissão, mas ouviu e senti-me aliviado.

Podia parecer muito baixo, mas vê-la brigando com a


Bruna por minha causa foi muito sexy. Era meio ridículo eu
ter gostado de ver aquilo, mas Lívia conseguia ser
engraçada e linda até quando estava brava.

Continuei tentando trabalhar depois que ela saiu pela


porta da minha sala, mas me concentrar foi algo muito
difícil. Mesmo me sentindo aliviado por ela saber a verdade,
a mágoa existia.

Perguntava-me que poder era aquele que Lívia tinha


sobre mim, que desde que ela chegou no meu apartamento
virou meu mundo de pernas para o ar e nem a Angels que
sempre foi o meu maior motivo, não me prendia mais como
era antes dela aparecer.

Droga!

Recostei-me na cadeira e pensei que fui duro demais


com ela, eu no seu lugar, também teria imaginado o que
não devia, afinal, pensei quando vi aquela mensagem do
João, sobre nudes no celular dela.

Por outro lado, ela me comparou com o ex, um


verdadeiro babaca e isso me deixou irado.

Decidi que não conseguiria trabalhar, já que me via


ali olhando para o computador há horas e sem fazer nada.
Mais uma vez teria que deixar a Angels por causa da minha
vida pessoal, precisava conversar com ela e resolver tudo,
mesmo me sentindo injustiçado, era a Lívia que me fazia
feliz e se não estivermos bem, nada anda e nada na minha
vida funciona.

Levantei-me peguei meu casaco e segui para casa.


Passaria por cima do meu orgulho e consertaria as coisas.
Lívia
Cheguei em casa triste e me sentindo péssima por
ter duvidado do Gustavo quando ele só me dizia a verdade
o tempo todo.

Fui uma idiota e a Bruna tinha conseguido


exatamente o que queria: Me separar do Gu.

Fui direto para o meu quarto e pensei que desde que


cheguei ali minha vida vivia uma montanha russa de
emoções, uma hora me via subindo e radiante de alegria,
esquecendo tudo e todos os motivos pelos quais não
deveríamos estar juntos, já na hora seguinte, lá estava eu
em uma descida íngreme por algo que aconteceu e nos
separou mais uma vez.

Sabia que relacionamento perfeito não existia, mas


se apaixonar por primo tem um tanto de conflito de
sentimentos que, às vezes, pensava que não daria conta.

E nesse caso, olha que nosso desentendimento nem


surgiu pelo motivo de sermos primos e sim por um motivo
mais que normal: a vaca da ex-namorada.

Depois de tanto pensar e chorar, acabei


adormecendo, mas acordei um tempo após, ouvindo
barulho do lado de fora do meu quarto. Não demorou até
que ouvi uma batida leve na porta, ela se abriu
delicadamente e mesmo sem me virar eu conseguia sentir a
presença do Gustavo.

— Lívia?

Virei-me de frente, continuei deitada de lado, mas


não disse nada.
Vi-o tirar o casaco, os sapatos e a calça jeans, ainda
em silêncio ergueu a coberta que me cobria e se enfiou
embaixo dela.

Meu coração já batia acelerado ao pensar que nos


reconciliaríamos.

Deitou-se de frente para mim e me encarou sem


dizer nada.

— Me desculpa? — Quebrei o silêncio e uma lágrima


escorreu pelo meu rosto. Ele a enxugou com o polegar e
deu um beijo casto em minha boca.

— Você sabe que desde que você era pequena não


consigo ficar bravo com você.

Sorri sem vontade e balancei a cabeça


afirmativamente.

— Aprendi com meu erro, Gu, e a partir de agora vou


confiar mais em você. Mesmo quando as condições
disserem ao contrário.

— Isso, confie em mim mesmo que me veja beijando


a mulher mais bonita do mundo. — Ele abriu um sorriso
largo.

— Também não exagera. — E aí eu já estava rindo


também.

Gu sempre teve esse efeito de me curar e ser quem


sempre me fazia sorrir.

Ele me beijou com fervor, mas tive que o parar e


perguntar:

— Preciso ouvir você dizer, você me perdoou?


— Lívia, é claro que sim, mas nunca mais me
compare com seu ex, porque ele foi um idiota e isso foi o
que mais me magoou.

— Justo! Comparação nunca mais. — Beijei-o, montei


meu corpo sobre o dele e perguntei: — Posso fazer algo
para me desculpar? — Olhei-o com um sorriso safado nos
lábios.

— O que tem em mente?

Abaixei-me e beijei seu peito nu.

— Tenho certeza de que você vai gostar.

— Então fique à vontade.

Abaixei-me novamente dando um beijo em seu peito


firme, depois me arrumei ao seu lado e passei o dedo no cós
da sua cueca, já notando que seu pênis se exibia duro e
esperando o que fosse que eu tinha em mente.

Passei sua cueca por suas coxas grossas e me livrei


dela, liberando para mim aquela delícia, dura e pulsante.

Novamente me posicionei entre suas pernas, tirei a


regata que eu vestia e fiquei apenas com a pequena
calcinha.

Abaixei meu tronco deixando minha bunda empinada


para que ele tivesse uma visão sexy de mim, enquanto com
as mãos posicionei seu pau de pé e o abocanhei indo com
ele fundo até minha garganta.

Ouvi-o gemer.

— Porra, Lívia.
Apertei a base e espalmei minhas mãos em volta, a
seguir subi com a boca até a cabeça, onde lambi
lentamente e voltei a abocanhá-lo por completo.

Seus gemidos ecoavam pelo quarto e me deixavam


molhada.

Pousei minhas mãos uma em cada lado da sua bunda


redonda, que eu amava, e continuei sugando, abocanhando
e lambendo seu pau que ia fundo na minha boca.

Eu não tinha tanta experiência, mas com ele eu me


entregava.

— Eu vou gozar na sua boca se você continuar.

Não o dei ouvidos e em um movimento ritmado de


lábios e língua o chupei ainda mais.

Abaixei meu tronco e esfreguei meu clitóris na sua


perna, me dando prazer ao roçar-me nele, sem parar de
chupá-lo.

Gustavo pegou no meu cabelo, como que para eu


parar, mas apenas o encarei por um instante e com o seu
pau na minha boca sorri, o tirei passando lentamente nos
meus lábios e voltei a abocanhá-lo, ainda que Gu segurasse
meu cabelo para me controlar.

Jogou a cabeça para trás, rendido e soltou um


gemido rouco.

Chupei-o mais e com minha mão em volta do


membro duro fiz um movimento de rotação subindo da base
para a cabeça e arrematei com uma chupada profunda, que
seu pau encostou no fundo da minha boca e foi aí que senti
seu gozo e engoli.
Continuei o movimento enquanto ele se contorcia por
minha causa e me sentia muito sexy por conseguir com que
ele se libertasse ao meu toque.

Como uma atriz, encarei-o e limpei meu lábio inferior


e o canto da minha boca, ao mesmo tempo que exibia um
riso convencido.

— Estou perdoada? — perguntei mais uma vez.

— Sim e com louvor, mas agora quem está te


devendo sou eu.

Puxou-me para ele, me abraçou forte e com seus


dedos hábeis me deu prazer alisando meu clitóris
lentamente indo e voltando.

— Você gosta assim?

Assenti e ele continuou, ao mesmo tempo que


chupava meu mamilo, deslizando a língua sobre ele no
ritmo que dedilhava meu clitóris.

Era delicioso e não demorou até que me viu gozar e


sorriu satisfeito. Ficando duro novamente e pronto para
mim. Subiu sobre o meu corpo e nos amamos com vontade.
Gustavo me levou ao céu e fez com que me sentisse a
mulher mais amada e a mais desejada da face da terra.

Terminamos com a luz do sol entrando pelo quarto e


decidi não ir para faculdade. Aquele momento merecia um
tempo a mais.

Ficar na cama agarradinha com o Gu, valia a loucura


que eu viveria para repor as matérias que ia perder.
Capítulo trinta e quatro
Gustavo
Lívia e eu estávamos ainda dormindo abraçados na
cama dela, quando ouvimos a campainha sendo tocada
insistentemente.

Ela se esticou para pegar o celular na mesa de


cabeceira, lutando para ver as horas e abrir os olhos ainda
um pouco inchados por ter chorado.

— É quase uma da tarde. Quem será? — perguntou.

— Será que não é o seu Joaquim trazendo a


correspondência? Quando tem que assinar ele é sempre
muito insistente.

— Vou lá ver e já volto.

— Gata, coloca o roupão — Apontei para o short


preto e curto e a regata que ela usava. — Não quero que Sr.
Joaquim fique excitado vendo a minha namorada. — Ela
jogou o travesseiro em mim e enrolada no roupão seguiu
para sala.
Fiquei deitado com preguiça, até que ouvi uma voz
muito familiar preenchendo o ambiente.

Espera aí conheço essa voz...

Porra, era minha mãe!

Levantei-me em um pulo e estava nervoso por mim e


mais ainda pela Lívia que, com certeza, devia estar
tremendo de nervoso.

Vesti minha calça rapidamente e pensei em seguir


para sala, mas quando eu fechava a porta do quarto da
Lívia vi minha mãe no final do corredor e gelei.

Ela me olhou sem entender o motivo de eu sair do


quarto errado e pensei em milhares de desculpas que eu
poderia dar a ela sobre isso, mas na verdade o que eu
queria era dizer a verdade.

Com a mente a mil andei até a sala também e vi meu


pai que se encontrava sentado no sofá e me encarou com
olhar curioso.

Minha mãe semicerrou os olhos para mim e disse:

— Vocês trocaram de quarto? Por que você está


saindo do quarto da Lívia, filho?

— Oi, mãe, oi pai. — Beijei minha mãe e ergui a mão


para cumprimentar meu pai. — O que vocês fazem aqui no
meio da semana? — perguntei para ganhar tempo.

Encostada à mesa, Lívia me olhava em pânico e vi


que por causa do seu medo da situação, eu teria de
inventar uma desculpa o mais rápido possível.
— Seu pai veio ver um cliente do escritório e
resolvemos passar aqui para convidar você para almoçar. —
Ela olhou para Lívia e perguntou: — E você não deveria
estar na faculdade? Por que você está com os olhos
inchados, Lívia?

— Quanta pergunta, Vic. Deixe-os acordarem — meu


pai disse sorrindo, mas notei que ele percebeu meu
desconforto e a cara de pânico da Lívia.

— Quer saber? Vou contar. Eu estava saindo do


quarto dela, porque... — Cansei daquela tensão toda e
decidi que contaria a verdade aos meus pais, mas Lívia me
interrompeu.

— Porque eu passei mal essa noite e por isso não fui


à faculdade e estou com os olhos inchados. Aí o Gu foi gentil
e me cedeu o quarto dele, porque lá tem banheiro — ela
falou tudo rápido e me lançou um olhar de repreensão.

— Ah, que bonitinho! Meu príncipe, sempre sendo o


anjo que cuida da nossa princesa. — Minha mãe andou para
perto de mim, me deu um beijo e continuou: — E você está
melhor, Lívia?

— Sim, acho que foi algo que comi. Não queria


preocupar ninguém por isso enrolamos para contar.

— Pode deixar que não conto para sua mãe, mas me


promete que se piorar, vai procurar um médico.

— Sim, prometo. Seria só preocupar minha mãe atoa.


— Lívia sorriu sem jeito e minha mãe assentiu.

— Gu, na realidade, viemos aqui pegar emprestado


uma camisa para o seu pai. Ele derrubou café na dele, terá
de ir até o fórum e com essa mancha horrível não vai dar,
né? Posso ir ao seu quarto ver se tem alguma que sirva?

Minha mãe perguntou, mas já foi se encaminhando


para o corredor e entrou no meu quarto. Foi o tempo de eu
respirar e já sentir meu coração batendo forte novamente.
Olhei para Lívia e ela me lançou de novo o olhar em pânico.

Da porta do meu quarto minha mãe me olhou e com


a testa franzida, perguntou:

— Lili, você dormiu aqui, acabou de se levantar e a


cama já está arrumada?

— Sim, tia, tenho esse costume. E, já me sinto


melhor.

— Entendi... — Minha mãe nos encarava com


curiosidade.

— Bom, vamos logo procurar essa camisa? — meu


pai interrompeu o momento tenso. — Podemos almoçar
depois?

— Eu topo, pai.

— Lívia, você está se sentindo bem para vir com a


gente? — meu pai perguntou.

— Não, tio, prefiro ficar aqui, ligar para Samira e ver


o que perdi da aula de hoje.

— É melhor você descansar, querida. — Gustavo traz


comida para você. — Minha mãe sorriu para Lívia e virou-se
para o meu pai. — Nic, é melhor trocar a camisa ou vai ficar
tarde.

— Tem razão.
Meu pai seguiu para o quarto e Lívia pediu licença
dizendo que precisava falar com a amiga. Quando fiquei a
sós com minha mãe ela me encarou e disse:

— Isso está meio mal contado, vocês não estão me


escondendo nada, não é, Gu?

— Claro que não, mãe. O que estaríamos


escondendo? Bom, vou trocar de roupa para irmos almoçar
e já volto. — Saí deixando-a me olhando fixamente.

Minha mãe era esperta e eu tinha a certeza que ela e


meu pai não engoliram essa história de que a Lili estava
passando mal.

Enquanto eu trocava de roupa, pensei que por mim


teria contado tudo para eles, mas como a Lívia não quis,
respeitei a vontade dela. Mais uma vez precisávamos
conversar sobre isso, para que possamos resolver o mais
rápido possível antes que todos saibam da pior maneira.

Não aguentava mais mentir para minha família.


Queria contar para todos que estávamos juntos e felizes,
mesmo que isso causasse um pequeno terremoto na
família.

O almoço com meus pais foi tranquilo, eles não


perguntaram mais sobre a chegada deles de manhã ao
apartamento, e dei graças a Deus ou acabaria contando a
verdade, falamos apenas sobre coisas triviais como nossos
trabalhos, sobre meus avós e os da Lívia, que estavam
aproveitando baile da terceira idade e deixando meus pais e
tios, doidos.
Segundo meus pais, eles são os pais dos pais deles
naquele momento.

— Ah, filho, lembrei... A Lívia faz aniversário semana


que vem, não é?

Pensei um pouco e me lembrei de que já estávamos


no final de julho.

— Sim, mãe, dia trinta e um.

— O pai dela, tinha comentado comigo que queria


fazer uma festa, para comemorar. Está ficando velhinha
nossa princesa — meu pai disse feliz e orgulhoso, como se a
Lívia fosse filha dele.

Sempre fomos uma grande família unida, por isso


Lívia carregava tanto receio de contar sobre nossa situação
e por isso que lutamos tanto contra o nosso sentimento.

— Sim, também fiquei sabendo pela Lana que


estavam pensando em fazer uma festinha surpresa para
Lívia em Cananéia, mas como cai em uma quarta-feira, eles
acabaram desistindo, porque sabem que ela não vai faltar
na faculdade.

Pensei um pouco e concordei com minha mãe.

— É, não daria certo, ela está bem focada nos


estudos, mas a festa pode ser feita aqui. — Sorri para meus
pais que entenderam o que eu queria.

— Então vou avisar a todos que você vai organizar.

Sorri.

— Deixa comigo, mãe.


Já me sentia ansioso para ver o sorriso que ela abriria
com a surpresa.
Lívia
Depois que a tia Vic foi embora após o pequeno
flagrante que deu em nós, fiquei pensando no que eu
estava fazendo?

Adoraria que meu primo fosse um cara qualquer que


conheci e assim apresentá-lo para todos da nossa família
como meu namorado.

Meu Deus, por que tem que ser tudo tão confuso na
minha vida amorosa?

Gustavo ficou o dia todo fora com os pais e me deu


tempo suficiente para pensar.

Eu adoraria que todos soubessem, mas só de pensar


que meus tios estavam desconfiando, meu coração esboçou
um pequeno ataque, imaginei como seria quando eu fosse
realmente contar para todos.

Pensei nos nossos avós e eles iriam ter um treco.

Tia Vic ter quase nos pegado juntos serviu para eu


entender que não podíamos contar, não naquele momento
e não tão cedo e nem sabia se realmente queria passar pelo
nervoso de encarar a todos.

Naquele dia e nos seguintes tive que correr com a


matéria de um único dia que faltei. Samira e Igor me
ajudaram e durante a semana eles foram todos os dias ao
ap.

Gustavo se juntava a nós quando acordava e


tomávamos café da tarde todos juntos. Ele e o Igor eram
superamigos e eu ficava muito satisfeita de ver que meu
namorado não tinha nenhum tipo de preconceito com o meu
amigo.

O dia do meu aniversário chegou e acordei cedo com


o celular vibrando sem parar com várias mensagens de
parabéns de Igor e Samira. Olhei ao meu lado e Gu já havia
levantado.

Sentei-me na cama puxando o cobertor para cobrir


meu corpo nu, após ter passado a noite inteira em
comemoração com o meu namorado, que me mostrou de
todas as maneiras o quanto me amava e o quanto estava
feliz de passar o meu aniversário comigo.

Sentei-me encostada na cabeceira da cama e


comecei a ler as milhares mensagens dos meus amigos nas
redes sociais. Nenhuma delas era da Vivian.

Minha mãe, meu pai e o Pepê, me ligaram a meia-


noite em ponto, para serem os primeiros a me parabenizar.
Mal sabiam eles, que no momento que meu celular
começou a tocar, eu estava agarrada ao Gu em um beijo
quente em que ele me dava os parabéns.

Minha família dizia-se triste por não conseguir ir à


cidade me ver, já que meu pai estaria de plantão, mas me
fizeram jurar que no final de semana eu iria para lá,
comemorar com eles.

Concluí que precisava mesmo ir até Cananéia


naquele final de semana e resolver minha desavença com a
Vivi.

Continuei procurando uma mensagenzinha que fosse


da minha amiga e nada. Desde as férias ela não falava
comigo e eu tentei insistentemente entrar em contato.
Nunca tinha ficado tanto tempo sem falar com a Vivi e nos
conhecíamos desde adolescência.

Falta de contato dela me matava e por ser meu


aniversário eu sofria dobrado. Desejava uma mensagem
maluca de parabéns, com áudios engraçados e caras e
bocas me mandando beijos como ela sempre fazia.

Bufei.

Deixei o celular de lado e enxuguei uma lágrima pela


falta que ela me fazia, até que o barulho da porta se abrindo
e o Gu entrando por ela, me tirou da tristeza.

Ele segurava uma bandeja, dessas típicas de café da


manhã, e ela estava abarrotada de tudo que eu gostava de
comer.

— A minha aniversariante preferida já acordou?

Dei um sorriso sem graça e ele colocou a bandeja na


cômoda que ficava próxima a cama, depois sentou-se ao
meu lado.

— O que você tem?

— Estou sentindo falta da Vivi, nunca fiquei tanto


tempo sem falar com ela e hoje é meu aniversário e ela
nem sequer me mandou uma mensagem. Estou triste.

— Não fica assim, logo, logo ela manda, vai ver que
está dormindo ainda.

— Tem razão. — Sorri. — O que você trouxe aí? Café


na cama, hein? Quero fazer aniversário todos os dias — falei
dando um beijo casto na sua boca.
Ele levantou-se, pegou a bandeja, colocou sobre o
meu colo e deu um beijo na minha testa.

— Não fique mal-acostumada e lembre–se que


sempre terá meu aniversário depois do seu.

Sorri para ele.

— Ah, tá, vou me esquecer.

Tomamos café juntos na cama e após, quando fui me


levantar para ir à faculdade, Gu viu que eu ainda estava nua
por causa da nossa festa durante a noite, então safado que
só, desenrolou o lençol do meu corpo e comemoramos mais
uma vez do jeito que mais gostávamos. Juntos, nus e
fazendo amor.

Mesmo sem vontade segui para faculdade, quando


queria ter ficado com o Gu na cama o dia todo.

Eu parecia uma tarada, mas meu primo namorado


era um deus e sentia-me privilegiada por ter meu próprio
Capitão América e precisava aproveitar. Gu conseguisse ser
ainda mais bonito.

— Acorda, gata! — Igor estalou os dedos na frente do


meu rosto e me tirou dos pensamentos.

— Ela estava sonhando acordada com o Gu, aposto


com você, Igor — Samira disse.

— Nem aposto, vou perder. Pela cara de biscate que


estava fazendo, certeza que pensava em algo muito
pervertido.
— Parem, vocês dois. Tenho certeza de que se
tivessem um namorado como o meu também sonhariam.

— Com certeza — Igor respondeu e caímos na risada.

Estávamos na sala de aula e peguei meu celular


escondido para ver a mensagem que tinha acabado de
chegar, na esperança que fosse da Vivi, mas não era e sim
uma mensagem da minha operadora de celular.

A tristeza transpareceu em meu olhar e Samira não


deixou escapar.

— O que foi, amiga?

— Ah, a Vivi não fala comigo, ainda não me responde


e não me mandou nenhuma mensagem de aniversário.
Passei todos os meus aniversários com ela desde que a
conheci. — Pisquei para não chorar.

— Mas você pisou na bola, Fofa. Eu no lugar dela


também estaria triste, porque primeiro ela se sentiu traída
por você ter me contado e para ela não, e depois, porque
você a deixou beijar o Gu na sua frente. Se sentiu uma
vaca. — Samira explicou.

— Sim, eu entendo.

— Ei, para de sofrência, gata. Hoje é seu aniversário


e tem que ser só alegria — Igor me animou.

— Tem razão. — Passei as mãos nos olhos para


dissipar as lágrimas que se formavam. — Hoje só alegria.

— Como vamos comemorar, Lívia?

— Igor, nem sei, porque hoje é quarta, amanhã tem


aula e aí já viu.
— Ah, para de ser velha. Que tal Angels hoje?

— Topo! — Samira falou sorrindo.

— Se é assim então topo também. Vou avisar o Gu. É


até bom, porque assim ele não precisa deixar de ir a Angels
para comemorar comigo mais uma vez, comemoramos
todos lá.

— Urruuuh, hoje nossa noite promete — Samira falou


alto e foi repreendida pelo professor.

Rimos e meu aniversário estava sendo lindo. Só


sentia falta da Vivi.
Capítulo trinta e cinco
Gustavo
Combinei com meus pais e eles ficaram de chamar
toda a família, para comemoração do aniversário da Lívia
que me dispus a organizar.

Tentei falar com a Vivian de todo jeito, mas ela nunca


podia me atender.

Sabia que Lívia ficaria radiante se a amiga


comparecesse e sabia o quanto ela estava triste. Por fim,
não consegui mesmo falar com Vivian e deixei uma
mensagem avisando que comemoraríamos o aniversário da
Lívia e ficaríamos muito felizes se ela fosse.

Lili foi para faculdade mesmo sem vontade e eu a


incentivei para que pudesse preparar tudo.

O bendito negócio de decoração não era minha praia,


então tia Lana chegou mais cedo e me ajudou com tudo e
com os comes e bebes.

Estava próximo do horário em que Lívia chegaria e


todos estávamos apreensivos. Eu havia combinado com
Samira e Igor, para eles darem uma enrolada nela depois
que saíssem da faculdade e assim eles fizeram.

Durante a manhã Lívia me enviou uma mensagem


dizendo que havia combinado com os amigos de ir até
Angels à noite. Bom, eu tinha outros planos, no caso o meu
plano era ficar na cama com ela a noite toda, mas sair com
os amigos também ia fazê-la feliz.

Recebi uma mensagem da Samira avisando que eles


já estavam chegando e corri avisar o pessoal.

— Atenção, família, eles estão quase aqui.

— Ai, minha garotinha vai ficar tão emocionada — Vó


Eliza, mãe da tia Lana, disse dando uma palma.

— Vai mesmo, mãe, ela ama fazer aniversário e mais


ainda comemorar cada um deles — tia Lana confirmou
sorrindo.

— Parece que foi ontem que a minha princesa


nasceu. Estou ficando velho — tio Jonas concluiu.

— Tá nada, meu amor. Ainda continua gato. — Tia


Lana deu um beijo nele.

— Meu Deus, vocês dois nunca acabam com essa


melação, né? — Minha mãe disse rindo e foi acompanhada
por Sarah que concordou.

— Verdade, desde sempre eles são assim... e quando


queriam o Pedrinho e ele não vinha... Era tanta pegação,
que nós nem podíamos ir à casa deles.

Rimos e o pai da Sarah, Sr. Pedro, a cutucou pedindo


para ter modos.
— Agora que está velho, nem sabe mais o que é
pegação. Não é, Jonas? — meu pai provocou.

— Cala a boca, Nic — tio Jonas respondeu rindo.

— Fiquem quietos todos ou a Lili vai ouvir vocês


falando lá do térreo — Vovô repreendeu.

— Verdade, Vô e tomara que a Lívia não demore,


quero bolo. — Pepê e Daniel, filho da Sarah, não tiravam os
olhos do bolo sobre a mesa.

Minha mãe e tia Lana decoraram a sala com objetos


temático sobre medicina, bexigas e um cartaz enorme que
dizia: “Para sempre nossa princesa e desde sempre nossa
médica.”

O bolo era rosa com uma coroa e um estetoscópio


em cima.

Fernando, Rodrigo e João também estavam e


jogavam bilhar na sala de jogos. Pensei em não convidar o
João, mas apesar de me irritar pela queda que ele tem pela
Lívia, os dois sempre se deram bem e eu sabia que ela
ficaria feliz em vê-lo ali.

João e eu sempre fomos amigos e nunca brigamos


por causa de mulher nenhuma, mas Lívia não era qualquer
uma, ela era o amor da minha vida e saber que João a
queria me deixava louco de raiva, sendo assim, para conter
os ânimos, eu preferia pensar que os dois sempre foram e
sempre serão apenas amigos.

Outra preocupação era para que eu conseguisse


reprimir meus sentimentos, olhares e gestos quanto a Lívia,
ia ser difícil, mas eu precisava ou todos acabariam
desconfiados.
Já tínhamos a Sarah que sabia de tudo e meus pais,
que eu levava para mim que desconfiavam de que algo
estranho estivesse acontecendo, ainda que no nosso
almoço não deixaram transparecer nada.

Mais uma mensagem da Samira chegou, avisando


que eles estavam subindo.

— Ei, galera, agora eles estão chegando — gritei.

Sentia-me curioso para saber qual a desculpa que


Samira e Igor inventaram para subir com ela até o
apartamento, já que sempre que iam deixá-la, era só até a
portaria.

Ficamos em silêncio em volta da mesa onde estava o


bolo e eu só conseguia pensar no quanto Lívia ficaria feliz
com a pequena recepção.

Meu sorriso se alargou com o pensamento e tomou


conta do meu rosto.

Sarah olhou para mim, me deu uma piscada e eu


fiquei vermelho. Senti até meu rosto quente e ela sorriu
mais uma vez.

Pensei que era uma pena a Vivian não ter ido, tinha
certeza de que Lívia ficaria radiante com a presença da
amiga, mas mesmo com a ausência dela eu faria o possível
para que Lívia ficasse feliz e não notasse.

Ouvimos as vozes abafadas no corredor e a risada


alta e alegre dela se sobressaía sobre o silêncio que
estávamos fazendo. Ouvimos o barulho da chave na porta,
ela se abrindo e o sorriso da Lívia preenchendo o ambiente.

— Igor, você não exis...


— Surpresaaa! — gritamos alto e aplaudimos fazendo
com que ela parasse de falar e levasse a mão ao rosto,
cobrindo a boca.

O sorriso que ela deu em seguida, com os olhos


marejados, foi como sempre perfeito.

O sorriso perfeito, que sempre fazia com que eu me


apaixonasse de novo.
Lívia
Igor pediu para usar o banheiro do ap e enquanto
subíamos pelo elevador, foi contando a história de um dia
em que ele fez xixi na calça em uma balada.

Como sempre o Igor era uma figura.

Abri o ap e quando falava sei lá o que com meus


amigos, virei-me para sala e lá estava todo mundo que eu
amava.

— Surpresaaa! — gritaram.

Olhei um por um nos olhos e por fim para Gu que


sorria orgulhoso e minha vontade era correr para ele.

Eu levava a certeza de que aquilo havia sido ideia do


Gu, mas por motivos óbvios eu não podia me jogar nos
braços do meu namorado e enchê-lo de beijos.

— Não acredito nisso! Vocês me esconderam tudo —


falei depois que passou o susto.

Gu andou em minha direção para me abraçar antes


de todo mundo e eu ainda estava parada na porta.

— Você está tão linda com esse sorriso no rosto, que


minha vontade é beijar sua boca na frente de todo mundo
— sussurrou no meu ouvido fazendo aquele frenesi subir
pelo meu corpo.

— Nem pense nisso.

Sorri, ele se afastou e todos os demais vieram me


felicitar, inclusive João que me abraçou e me deu um beijo
no rosto.
Ao me separar dele vi tia Sarah sorrir para mim e
estava com os polegares para cima em sinal de positivo.
Instintivamente olhei para o Gu e vi que ele a fuzilava com o
olhar.

— Parabéns, Lívia — João disse e me entregou um


presente. Abri e era uma gargantilha linda.

— É linda, obrigada, João.

— Posso colocá-la em você, Liv? — Sabia que o Gu


não ia gostar, mas seria constrangedor dizer que não, sendo
assim, só balancei a cabeça em afirmativo.

Ele se posicionou atrás de mim e colocou a


gargantilha, enquanto a minha frente eu via Gu me olhando
do sofá, com cara de quem desejava matar um.

Os outros Angels também me deram presentes, meu


pai e minha mãe me deram um vale habilitação para que
enfim perdesse o medo de dirigir e tirasse a minha carteira
e deram também um anel lindíssimo.

— Filha, com muita relutância, porque nunca quis


isso na vida, pensei em te dar um carro, mas fui
terminantemente proibido. Então me sobrou te presentear
com a habilitação para dirigir. — Meu pai deu de ombros e
minha mãe sorriu.

Não entendi por que minha mãe proibiria meu pai de


me dar um carro.

Sorri pensando que no lugar dela também teria medo


dos meus dotes motorísticos.

— Um passo de cada vez, pai. Logo eu comprarei


meu carro. — Ele apenas sorriu.
Todos os outros me presentearam, incluindo meu
Pepê que me deu um desenho de um bonequinho
segurando um escudo e no escudo estava escrito o meu
nome. Perguntei a ele quem era, ele respondeu o Capitão
América que eu amava, já que não parei de falar dele para
Samira quando estávamos em casa.

Reprimi um sorriso ao olhar para minha amiga e Gu


piscou para mim sem que ninguém visse.

Minha família e amigos conversavam animados.


Briguei carinhosamente com todos e disse que me sentia
traída.

Meu pai fez um pequeno interrogatório com o João,


achando que ele era meu namorado depois da cena da
gargantilha, o que fez tia Sarah se engasgar de rir com a
bebida e tia Vic ergueu a sobrancelha para nós, como se
não entendesse.

Gu ficou incomodado com a situação e vi no seu


olhar que a vontade que tinha, era gritar para todo mundo
naquela sala que eu era dele. Enquanto o João só sorriu em
resposta, não negou e até parecia se divertir, o que deixou
Gustavo ainda mais irritado.

— Fica longe do João — Gu disse baixo, em um


pequeno momento a sós que tivemos na cozinha, o que me
fez ver o quanto ele estava tenso.

Igor e Samira por diversas vezes tentavam tirar de


mim a atenção, para que tanto eu quanto Gu, ficássemos
mais à vontade, mas foi em vão e eu só conseguia pensar
que eu teria que consertar essa situação o mais rápido
possível e criar coragem para contar a nossa família que eu
e o Gu estávamos namorando. Teria um impacto inicial, mas
depois eles iriam entender. Teriam que entender.
E me via entre o sim e não novamente: contar ou
não contar...

A festinha se estendeu e a hora de cantar Parabéns


chegou. Posicionei-me atrás da mesa e todos cantaram para
mim. Eu sempre amei aniversários.

Do outro lado da mesa olhei para o Gu e ele mexeu


os lábios dizendo um: “te amo” e lutando para que ninguém
visse.

Sorri e fiquei vermelha.

— E para princesa Lívia, nada? — meu pai perguntou.

— Tudo! — todos responderam e continuaram


cantando.

Com todas as pessoas que amo a minha volta, só


senti falta da Vivi. A música terminou e a pergunta fatídica
foi feita por tia Vic:

— Para quem vai o primeiro pedaço do bolo, Lili?

— Bom, para fazer as pazes com o passado... O


primeiro pedaço vai para... O Guuuuu.

Todos da família que sabiam da história riram, ele


andou para perto de mim, me deu um beijo na bochecha e
tiramos a típica foto os dois abraçados.

Há anos que não vivíamos aquele momento e foi tão


familiar que me peguei pensando se nosso relacionamento
não desse certo, eu estaria estragando todas essas
lembranças.

Pensativa afastei-me da mesa e dei espaço para


minhas avós cortarem o bolo, mas Gu não deixou escapar
meu desconforto e se juntou a mim.

— No que você está pensando? — perguntou.

— Estou pensando se temos certeza de que vale


apena acabar com todas essas lembranças, se o nosso
relacionamento não der certo.

— Eu tenho certeza de que vale a pena e do que eu


quero, mas você parece ter dúvidas. — Fechou o cenho e
bebeu a cerveja que segurava.

— Não tenho dúvidas, o que quero é você, mas e


nossa família?

— O que tem a nossa família? Eles vão continuar


sendo nossa família. — Ele soprou o ar, olhou para o lado e
depois para mim de novo — Não pense nisso, pelo menos
não hoje, vamos ter que contar pra eles, mas hoje não
quero te ver triste.

Assenti e perguntei:

— E a Vivi? Alguém a convidou?

— Eu tentei diversas vezes ligar e deixei mensagem,


mas sinto muito, acho que ela não viu.

— Tudo bem. — Forcei um sorriso. — Obrigada pela


festa. Sei que isso foi ideia sua. — Ele retribuiu com o
sorriso lindo que acabava com todas as minhas incertezas.

— Tudo para te ver feliz. Mas nem começamos a


comemorar. — Sorri com segundas intenções e pensando
em algo pervertido, que talvez ele tivesse preparado para
nós.
As pessoas começaram a ir embora e Gu mais uma
vez quis matar o João, quando ele se despediu de mim com
um abraço apertado.

Samira e Igor também foram e me disseram para


ficar maravilhosa, porque a noite nos iriamos nos acabar na
Angels.

A cada despedida dos nossos familiares e amigos, Gu


e eu fomos ficando cada vez mais sozinhos, até que por fim
os últimos a saírem foram a tia Vic e tio Nic, que nos
aconselharam “juizo” entre um olhar suspeito.

— Enfim sós. — Gu fechou aporta atrás dele, andou


até mim e me beijou. — Estava ficando maluco sem poder
te beijar — disse quando nos separamos.

— Eu também.

Olhou para o meu pescoço e fez uma careta.

— Pelo amor de Deus, tira esse presente horrível do


pescoço, Lívia.

Sorri em resposta.

— Ah, eu achei bonitinho.

—Tira logo e para de me provocar. — Virou-me de


costas e desabotoou a gargantilha que o João tinha me
dado. — Eu tive vontade de levantar e quebrar a cara dele.
Tenho que admitir que o João é corajoso.

Ri mais uma vez, pensei em protestar, mas ele me


deu vários beijos no pescoço que fez com que eu
esquecesse completamente o que estava falando.
Virou-me de frente de novo e colocou o rosto na
curva do meu pescoço.

— Te amo, Lívia, e fico furioso de ver qualquer


homem que não seja eu, perto de você.

— Também te amo, meu possessivo.

Deu-me mais um beijo casto.

— Vem comigo. — Pegou-me pela mão, me levou até


o quarto dele e me entregou uma caixa de presente que
pegou no guarda-roupa. — Seu presente. Achou que eu não
iria te dar nada?

Sorri.

— Gu, o maior presente que você podia ter me dado


era reunir todos que estavam aqui hoje. — Pensei que faltou
a Vivian.

— Abra, estou louco para ver a sua reação. Só tirar


uma tampa de cada vez.

Abri a caixa e ela era dividida em níveis. O primeiro


nível tinha a foto dele com cinco anos, me pegando no colo
quando nasci, me olhava sorrindo, como se eu fosse o
brinquedo mais legal que já ganhou na vida. Em uma
etiqueta no canto da foto estava escrito: “Desde sempre
apaixonado por você”. Olhei para ele e sorri.

Continuei desvendando o presente, tirei a base que


cobria o próximo nível da caixa e lá encontrei uma pulseira,
com um pingente em formato de controle de videogame e
uma etiqueta que dizia: “Só você tem o controle da minha
vida”. Ri com a mensagem da etiqueta e ele me olhou rindo
também.
— Só eu? — perguntei.

— Sim, só você.

Dei um beijo na sua bochecha e continuei com a


minha saga.

Tirei a última base e encontrei um chaveiro com um


bonequinho do Super Mário Kart, em que o Mário dirigia um
carrinho. O chaveiro enfeitava a chave de um carro que
carregava uma etiqueta escrita: “Feliz aniversário”.

Por um momento não entendi, olhei para chave com


a sobrancelha franzida e encarei o Gu em seguida.

— Para você não precisar mais de carona e ir para


onde quiser. — Sorriu.

Ah, esse sorriso!

— Espera, me deixa ver se entendi. Isso é meu


presente? Um carro?

— Sim. — Deu de ombros.

— Um carro? Você me deu um carro?

— Sim. — Ele ria da minha euforia.

— Ai, Meu Deeeus. — Pulei em cima dele e o enchi de


beijos.

Separei-me, olhei a chave e a fechei na minha mão,


a abraçando e pulando em círculo como uma criança.

— Não! Espera. Não posso aceitar. — Estiquei meu


braço em direção a ele e ofereci a chave. Depois que passou
a animação, lembrei que um carro era um presente caro
demais.

— Por que não?

— Gu, pelo amor de Deus, é um carro!

— E o que tem? É só um presente, Lili.

— Um presente caro.

— Não foi tão caro assim.

— É um carro!

— Por favor, aceita ou ficarei extremamente ofendido


e triste.

Encarei-o, tentei me conter, mas não consegui, corri


para ele, pulei em seu colo de novo e mais uma vez o enchi
de beijos.

Era o presente mais lindo e mais elaborado que já


recebi.

— Lívia, você é difícil até para receber um presente.


— Revirou os olhos e dei mais um beijo nele.

— Vamos... Quero ver meu presente. Onde ele está?

— Na garagem. Quer vê-lo agora?

— Simmmm...

Puxei-o pela mão sentido à porta da sala e entramos


no elevador. Eu fiquei nas pontas dos pés, o beijei sorrindo e
ele retribuía meu sorriso, sorrindo também.
Chegamos à garagem do prédio e assim que as
portas do elevador se abriram, ele disse:

— Olha, gata, não é um carro zero nem um super


carrão. É um carro popular, mas está em ótimo estado. —
Ele parecia ansioso e com medo da minha reação.

— Anda logo, Gustavo. Me dá meu presente!

— Vamos.

Entrelaçou nossos dedos e andamos em direção a


vaga dele na garagem do prédio. Vi seu carro estacionado,
um preto e potente carro esportivo e ao lado notei um Onix,
vermelho, lindíssimo.

Eu queria aquele carro, cheguei a comentar com o


meu pai, que se um dia ele fosse me dar um, eu queria
aquele, mas nunca, nem nos meus mais lindos sonhos,
sonhei que aquilo se realizaria.

Não pode ser!

Tentei segurar a ansiedade.

Quanto mais andávamos, a cada passo, ele sorria e


parecia nervoso. Quando chegamos ao lado do seu carro,
Gustavo me lançou um sorriso, em seguida me mandou
apertar o botão na chave, que desativava o alarme, e então
as luzes do Onix piscaram.

— Como eu te disse, não é nenhum carrão, mass... —


Eu o agarrei e o beijei, interrompendo o que ia dizer.

Meu carro era lindo!

— Guuu, é lindo! Como você soube? Sempre vi esse


carro pelas ruas e sempre sonhava em ter um desses e a
cor também era essa. Gu, eu ameiiii. — Aplaudi e corri para
me sentar ao volante e meu namorado sorria satisfeito.

— Conversei com o tio Jonas, ele quase me bateu e


disse que ele queria te dar esse presente. Bom, na verdade,
ele queria, mas não queria — Ri — Aí, fui bem persuasivo e
consegui convencê-lo. Ele me contou que você sempre que
via esse carro, seus olhos brilhavam e não deu outra.
Procurei e procurei, até encontrar esse que achei a sua cara
e da cor que você queria.

— Eu não mereço um namorado como você, Gu. —


Saí do carro e o abracei. — Muito obrigada. Você hoje está
me fazendo muito feliz, esse aniversário está sendo
inesquecível. O melhor de todos.

— Minha linda, tudo para te ver feliz.

— Eu te amo, meu anjo.

— Eu também te amo, minha Lívia.


Capítulo trinta e seis
Gustavo
Lívia se arrumava para irmos à Angels, porque eu
teria que trabalhar, mas comemoraríamos o aniversário
dela também.

Como sempre ela se arrumava no quarto e eu ficava


a aguardando na sala, pensando como ela sairia linda de lá
e como teria que me controlar para não socar meio mundo
que a desejaria naquela balada.

Ouvi o barulho da porta abrindo e ela apareceu no


corredor, seguiu andando em minha direção e usava uma
saia branca justa, curta, com estampas em preto, uma blusa
de mangas compridas preta e saltos também preto.

Realmente vou matar um hoje, minha namorada está


muito gata.

— Lívia, sério, hoje não vou me concentrar nem no


trabalho nem em me divertir ou em nada, com você tão
gata assim. — Abracei-a, sentindo seu cheiro e colocando a
cabeça no seu pescoço. — Mulher, você me mata.
Ela riu e se afastou de mim.

— Mato nada. Você pensa que sou tudo isso, porque


me ama, mas sou super comum. — Deu de ombros.

— Te garanto que não. Se fosse comum eu não teria


me apaixonado tão rápido por você. Foi só você pisar na
minha sala que vi que minha vida seria completamente
mudada.

— Exagerado.

— Juro, me lembro perfeitamente como meus amigos


olharam para você na primeira noite que foi à Angels.

— Só queriam te irritar, Gu.

— Não, não. Você não vê que o João continua te


querendo? E falando nisso, hoje tive que aguentar ele em
cima de você, porque nossa família estava aqui, mas não
fica de conversinha com ele na Angels. Sei que ele não é do
tipo... que perde fácil.

— Gu, ele é meu amigo.

— Amigo para você, para ele é sempre algo mais. —


Fechei a cara.

— Gu, por favor, não cria caso por causa do João.


Entenda que é você que eu amo, gato. Só você que eu
quero. — Ela andou para perto de mim, me abraçou e
amoleci.

— Tudo bem, mas só não dá muita corda para ele,


tá?

— Tá bom! E Gu... Sobre nossa família e nosso


namoro, eu andei pensando...
— Hoje não, amor. Depois conversamos sobre isso.
Hoje só quero que você aproveite seu aniversário, sem
preocupações — interrompi, porque sempre tinha medo dela
dizer que não queria contar ou que nosso namoro não daria
certo e se isso acontecesse, eu sabia que ia sofrer.

Nunca sofri por mulher nenhuma, mas a Lívia tinha


esse poder sobre mim e eu sabia que se nosso namoro não
desse certo, minha vida ia ser só escuridão.
Lívia
Chegamos à Angels e Gustavo precisou se juntar aos
outros sócios, para fazer uma entrevista de emprego com
alguns candidatos a barmans.

A casa noturna era muito concorrida por barmans de


toda a região e sempre que tinha entrevista com
candidatos, os quatro donos tinham que estar em comum
acordo quanto ao profissional que ocuparia o cargo e
manteria o nível do atendimento do lugar.

— Preciso subir, mas prometo resolver tudo rápido


para voltar e comemorar com você, minha aniversariante —
falou depois de me beijar e ainda manter a boca próxima a
minha.

— Não tem pressa, logo a Samira e o Igor estão aí.

— Tem pressa sim. Apesar de a maioria das pessoas


aqui saberem que você é minha, sempre tem um ou outro
desavisado.

— Deixa de ser possessivo. — Ri.

— Minha — disse me abraçando mais uma vez.

— Sim, sua.

— Mas, meu Deus, quanto amor aqui — Igor falou


chegando atrás de nós.

— É tanto doce, que até ouriça minha diabete —


Samira também entrou na conversa.

Gu sorriu, mas se manteve me olhando.


— Bom, vou trabalhar e já volto para comemorar
com vocês.

Deu-me mais um beijo de despedida e subiu para o


escritório. Olhei para meus amigos que me observavam
sorrindo.

— O que foi?

— Nada — os dois responderam, rindo e eu ri junto.

— E aí, quais as novas? — Samira me perguntou.

— Desde a hora que vocês saíram do ap, nada. A não


ser que ganhei um carro de presente do Gu. Ah, e essa
pulseira linda. — Balancei o pulso para mostrar.

— Um carro? — Samira parecia chocada.

— Fofa, que periquita abençoada é essa?

Não me contive com o comentário do Igor e tanto eu


quanto a Samira soltamos uma sonora gargalhada.

— Gente, tentei não aceitar, mas ele foi tão


persuasivo e a elaboração do presente foi tão fofa.

— Não aceitar? Você tá doida? Se não aceitasse, eu


te batia. Estou cansado de te dar carona.

— Igor, você adora quando eu te peço carona.

— Fofa, Gustavo realmente está apaixonado por


você.

— Pois é. — Dei de ombros sorrindo largamente.


— Amiga, mudando de assunto, mas para um
assunto chato. E a Vivian deu sinal de vida? — Samira
perguntou.

— Nada ainda, estou tão triste. Ela nunca, desde que


eu a conheço, ficou sem me ver ou me parabenizar no meu
aniversário.

— Eu estava dando razão a ela, mas só de te ver


triste assim, já não estou gostando dessa Vivian, sem nem
ao menos conhecê-la.

— Ela é uma ótima pessoa, eu que fui errada, Igor.


Dá um desconto. Apesar de que mesmo me sentindo
culpada, agora estou muito brava e quem não quer mais
nenhuma mensagem dela nesse aniversário sou eu.

— Tudo bem, vamos mudar de assunto, não quero te


ver triste, nem brava. Vamos dançar?

— Boraaaa... — Samira gritou.

Pedimos umas bebidas, dançamos e após algum


tempo, percebi que as entrevistas com os candidatos a
barmans, estavam demorando bastante. Entretanto, fiquei
orgulhosa em ver meu empresário trabalhar.

Voltamos para o bar, rindo, conversando e quando,


por um instante, olhei para entrada, vi um rosto amigo me
olhando e sorri ao ver a Vivian. Ela andou até onde eu me
encontrava e parecia triste.

— Oi, Samira — cumprimentou. — Prazer, Vivian,


você deve ser o Igor, né? — falou para Igor, também o
cumprimentando.
— Precisamos conversar, Lívia — disse para mim com
um olhar triste.

— Conversar o quê? Achei que tinha esquecido de


mim.

— Não esqueci, mas ainda estou brava com você —


falou alterada.

— Brava comigo? Eu também estou brava e muito


triste com você agora — falei emburrada. — Sei que errei,
mas você me magoou hoje.

— Ah, você está brava comigo agora? Me fez passar


pela maior putiane da terra quando beijei o Gustavo, Lívia.

— Eu tentei te pedir desculpas, mas você nem


sequer respondia minhas mensagens nem atendia minhas
ligações. E tudo que eu fiz, o tempo todo, foi pensando em
você, não queria te decepcionar, só queria te ver feliz.

Estávamos as duas gritando, enquanto Igor e Samira


só nos olhavam e pareciam com medo de se meter.

— E me esconder às coisas, como se eu não fosse


sua amiga, é me ver feliz?

— Achei que você gostava dele, Vivian!

— Achava ele bonitinho, mas você o amava, pô!


Tinha que ter me contado.

Cruzei os braços brava e não sabia o que responder.


Vivian também cruzou os braços e estava visivelmente
chateada comigo. Nesse momento, Gu chegou e se juntou
ao Igor e Samira, acompanhando a novela.
— Você me deixou chateada por não ter me
mandado nem um mísero parabéns — falei baixo depois que
respirei e me acalmei. — Senti sua falta hoje o dia todo.
Vamos parar de brigar? Me desculpa?

Ela me olhou e vi que um pequeno sorriso se


formava no canto de sua boca.

— Também senti sua falta, sua vaca. Também me


desculpa? — Tanto eu quanto ela enchemos nossos olhos de
lágrimas e nos abraçamos.

Igor, Samira e Gu nos observavam como se fôssemos


duas loucas.

Ainda abraçadas ela falou, entre choro:

— Nunca mais me esconda nada. Você é minha Lili,


antes de ser a Fofa da Samira. — Ri.

— Tudo bem e você nunca mais não me responda.

— Combinado.

— Meu Deus, que cena linda, digna da Televisa.


Novela mexicana perde feio — Igor aplaudiu e eu e Vivi nos
separamos rindo também. Olhamos para Samira e ela
estava quase chorando.

— O que foi? Me emocionei — explicou-se, rindo. — E


pelo amor de Deus, vamos beber, que estou emotiva hoje.

— Vamos beber — concordei com ela e pedimos


nossas bebidas.

Samira, Vivian e Igor começaram a conversar sobre a


história toda e ríamos lembrando a confusão toda que
arrumamos.
Gustavo se posicionou atrás de mim e me abraçou
pela cintura, me deu um beijo no pescoço e perguntou:

— Felicidade completa, agora?

— Sim, completa.

Fernando, João e Rodrigo se juntaram a nós, mas


meio que estavam com a gente e trabalhando ao mesmo
tempo.

Vivian ria de tudo e ela sempre foi muito


comunicativa, sempre agradava as pessoas de cara.
Quando os Angels foram a Cananéia eles se tornaram
superamigos.

Rimos quando ela os fez pedirem para o Dj tocar


sertanejo e oferecer a ela.

Fomos para pista, onde ela fez uns passos country e


insistiu para que eu e Samira fizéssemos também. A gente
mais ria que dançava.

Da pista víamos os meninos bebendo e conversando,


mas o olhar que o João me lançava enquanto eu dançava,
era tão intenso que chegava a ser constrangedor.

Tentei não olhar em sua direção, mas meio que


parecia um imã.

Gustavo quando percebeu que João me olhava,


andou até mim, como um predador atrás da presa,
enganchou as mãos nos meus cabelos e me beijou com
fervor, sem me dar a chance de dizer qualquer coisa.
Quando o beijo terminou, ele encostou a testa a minha e
disse:
— Só para mostrar a todos aqui que eu amo a
aniversariante. — Deu-me mais um beijo, me deixou sem
fala e voltou para o bar, de onde os outros me olhavam
rindo. Menos o João, que vi virar uma dose de uma vez só
de alguma bebida que pensei ser muito forte, só pela careta
que ele fez depois que engoliu.

A noite seguiu perfeitamente, como a melhor da


minha vida. O melhor aniversário. Com presentes
maravilhosos, família, amigos e meu namorado perfeito.

Fui surpreendida mais uma vez pelo Gu, quando o Dj


anunciou:

— A música a seguir foi oferecida pelo Gustavo,


Angel, especialmente para Lívia, aniversariante e mulher da
sua vida.

A balada gritou e então Latch começou a tocar.

Na pista de dança, dancei com meu namorado, que


sensualmente passava a mão pelo meu corpo enquanto
sussurrava em meu ouvido:

— Ainda não acredito que você é minha.

— E eu não acredito que você é meu.

Vi que enquanto dançávamos muitos olhares das


mulheres ali, eram lançados a ele, mas Gu parecia alheio a
qualquer um deles.

Mesmo sendo quarta-feira, fiquei chocada como a


Angels estava cheia e muitas pessoas aproveitavam a noite.

— Gustavo?

Uma loira perguntou, atrás de nós.


— Sim? — ele respondeu também em tom de
pergunta.

— Não acredito que estou te vendo depois de tanto


tempo — falou como se não acreditasse que o Gu, era o Gu.

— Desculpa, mas quem é você?

— Natural que não se lembre de mim, faz tanto


tempo. Sou eu, a Aninha.

Ele pareceu puxar na memória.

— Aninha?

— Aninha? A Aninha da nossa infância? — perguntei


como se não acreditasse.

E só depois que falei que ela pareceu me notar, na


verdade, só me olhou, mas continuou falando com o Gu,
como se não me conhecesse.

— Aninha é você? — Ela assentiu sorrindo. — Quanto


tempo.

Gu me soltou e deu um abraço nela, que retribuiu


toda sorridente e aquilo fez meu sangue ferver.

Não acreditava que aquilo estivesse acontecendo de


novo. Lá estava ela mais uma vez, se fazendo presente em
mais uma comemoração do meu aniversário.

Isso só pode ser carma.

Comecei a rir descontroladamente, de raiva e de


nervoso.
Só podia ser brincadeira... pegadinha? Cadê as
câmeras? Aquela garota de novo no meu aniversário?

Os dois me olharam sem entender, enquanto eu ria


feito uma hiena descontrolada.

— Gu, por favor, só não me fala que isso é mais uma


surpresa que você preparou para o meu aniversário — falei
me recompondo, mas ainda sem ar.

Ele começou a rir também, entendendo e lembrando


de todo trauma que eu disse ter da Aninha nos meus
aniversários.

— Desculpa, Ana, é que nos lembramos de algo


muito engraçado — Gu falou e ela sorria, até meio sem
graça, coitada.

— Tudo bem. Gustavo, foi muito bom te ver. —


Apoiou a mão no peito dele, descaradamente se
oferecendo, e parei de rir na hora.

Ela ainda fingia não me ver.

— Você se lembra da Lívia, minha prima?

Oi? Prima? Ele me apresentou como prima?

— Ah, sim, como vai? Lembro-me dela pirralhinha.


Fui a alguns aniversários seus, né?

— Vou bem. Sim, foi. Gu insistia em te convidar. —


Ele parecia se segurar para não rir. — E olha só, hoje é meu
aniversário e você está aqui de novo, se fazendo presente.

— Parabéns. Você é de leão? Sou meio exotérica,


sabe? — Riu. — Preciso te dizer: nunca me dei bem com
pessoas do signo de leão. São sempre pessoas exibidas e eu
sou de virgem, acho que esses signos não batem. — Ela riu
colocando a mão mais uma vez no Gu e pensei: só se for
virgem com ascendente em puta.

E esses signos batem sim, continua com a mão no


meu Gu, para você ver, vadia, se eu não te bato.

Ei, ela me chamou de exibida?

Gu percebeu que meu semblante se fechou para o


toque dela e se afastou, dizendo:

— Foi bom te ver, Aninha, mas estamos com uns


amigos ali. Espero que goste da Angels.

Aninha?

— Já estou adorando — disse mais uma vez se


insinuando e quando fui me exaltar, Gu me puxou para
perto e nos afastamos.

Já longe da Ana, ele falou:

— Está tudo bem, só quero você.

— Ah, e eu sou só sua prima? Achei que eu fosse sua


namorada. — Cruzei os braços.

— Só te apresentei como prima, porque ela não


entenderia e não quero perder tempo explicando para ela.
Os minutos do meu dia, quero dedicar só a você. — Deu-me
um beijo no rosto — Gostou dessa surpresa? Foi para
relembrar os velhos tempos dos seus aniversários.

Revirei os olhos.

— Olha, não testa minha paciência, engraçadinho, e


desde que você não queira relembrar com ela os velhos
tempos também, por mim está tudo certo — falei,
emburrada e ele me puxou para perto para um beijo.

— Relaxa, ciumenta, eu só quero você.

— Sei... E o que ela quer aqui em plena quarta-feira?


Só pode ser Deus me sacaneando no meu aniversário. —
Rimos.

— E pensar que hoje é quarta me lembra de que


amanhã é quinta, tenho aula e está mais que tarde. Gu,
preciso encerrar a noite. Já estou meio cansada.

— Tudo bem, só vou ver com o Fernando sobre as


novas barwomans e já vou te levar.

— Barwomans? — perguntei com a sobrancelha


arqueada.

Ele me lançou aquele sorriso safado e lindo.

— Sim, mas não tenho nada a ver com isso, foi ideia
do Fernando, que insistiu em contratar duas. Segundo ele,
vai ser um diferencial.

— Diferencial? — perguntei ainda em desdém.

— Para com isso, gata, fizemos testes com elas e são


boas.

— Boas fisicamente ou profissionalmente?

Ele gargalhou, me puxou pela cintura e me deu um


beijo, me soltando em seguida e continuou rindo.

— Totalmente profissional, dona Lívia ciumenta. Pelo


menos para mim, quanto ao Fernando, já não sei.
— Sei... Vou ficar de olho em você.

— Pode ficar, só tenho olhos para você. Agora espera


lá no bar, que vou resolver tudo e te levo.

— Não precisa, Gu, pode ficar trabalhando, eu vou


embora com as meninas. Ah! E esqueci de te falar, a Vivian
vai dormir no ap hoje, tá?

— Tudo bem, mesmo assim eu te levo.

Fomos em direção ao bar e sentei-me nos bancos


altos, me juntando as meninas e ao Igor, enquanto o Gu foi
resolver o que precisava.

Conversei com meus amigos, que hora ou outra


cantavam alto parabéns para mim, mesmo eu dizendo que
já passava da meia-noite e sendo assim não era mais meu
aniversário. Se eu ganhasse um ano para cada parabéns
cantado para mim naquele dia, eu já seria uma múmia.

Samira, certo momento da noite, foi para os lounges


com um gato que ela trocou olhares a noite toda e percebi
que de longe, Rodrigo a fuzilava com o olhar.

Qual é a desses dois?

Eu me sentia observada o tempo todo em que me


encontrava no bar até que olhei para o lado e vi o João
sentado bem próximo a nós.

Assim que notou que eu o olhava, João ergueu o copo


para mim e virou-o de uma vez a bebida nele. Parecia
visivelmente alterado e bebido demais. Diferente do João
que sempre foi meu amigo. Naquele dia seu olhar estava
sombrio.
Mudei o olhar de direção para conversa com meus
amigos. Sabia que algo não parecia bem para ele. Vi quando
se levantou, começou a andar em minha direção e Igor falou
antes que ele chegasse:

— Fica longe.

Pensei em responder que eu não pretendia ficar


perto, mas era tarde, João já estava ao meu lado.

— Será que vocês poderiam dar licença um minuto


para eu falar com a Liv?

— Pode falar na frente deles, João. São meus amigos


e não os escondo nada — apressei-me em falar, não queria
que Gustavo visse que eu estava sozinha com o João.

— Por favor, Liv, juro que vai ser rápido.

João se encontrava muito bêbado e fiquei com pena,


porque senti que algo parecia difícil para ele.

Olhei para o Igor e para Vivi, fazendo um pequeno


meneio de cabeça e os dizendo que estava tudo bem, que
podiam se afastar um pouco. Eles se levantaram e recebi
olhares de reprovação de ambos.

— Diga, João.

— Liv, sei que você está com um lance sério com o


Gu, mas preciso te dizer o que sinto.

Levantei-me do banco e fiquei de pé perto dele.

— Por favor, João, não vamos por esse caminho,


como você disse, eu estou com o Gu e o amo.
— Lívia, só preciso te dizer que eu estou muito a fim
de você desde a primeira noite que te levei até o
apartamento do Gu. Só preciso que você saiba que ele não
é sua única opção. Sei que posso estar parecendo um fura
olho do caralho fazendo isso, mas o que sinto por você, está
acima da amizade que eu tenho pelo Gu.

— João, para, não quero mais falar sobre isso, não


quero acabar com nossa amizade, nem com a sua com o
Gu. Vamos continuar amigos. Tudo bem?

Passei por ele para seguir até mais a frente onde


meus amigos se encontravam e João segurou meu braço.
Virei-me, olhei-o e no instante seguinte, os lábios dele
estavam nos meus, sem que eu pudesse fazer nada para
impedir.

Senti o gosto mentolado da bebida que ele ingeriu e


em seguida o empurrei com força, para que se afastasse de
mim.

— Para, João — gritei — Nunca mais faz isso.

Olhou-me assustado, até arrependido e quando fui


dar a volta nele para me afastar, vi ao longe, parado no pé
da escada de onde só me via e não me ouvia, olhos azuis
que eu amava, me observando com expressão de raiva.

— Gu.
Capítulo trinta e sete
Gustavo
Que porra é essa que está acontecendo aqui?

Pensei quando desci a escada e dei de cara com o


João beijando a Lívia.

Meu corpo formigava todo e eu sentia que ia matar


alguém. Vi quando ela se afastou dele, mas eu não parava
de pensar se tinham um caso, se levavam algo escondido.

Foi só eu sair e eles começaram a se beijar...

Não, não pode ser!

Esse filho da puta, amigo fura olho do caralho, está


com a minha namorada. Porraaa! De novo estou vivendo
essa cena da Lívia beijando o João na minha frente. Eu não
aguento mais isso e quero que essa porra de
relacionamento enrolado do caralho, vá para os infernos.

A amava muito, mas não aguentava aquilo.


Marchei bufando em direção a eles, não consegui
raciocinar de tanta raiva. Vi que Igor tentou entrar na minha
frente, mas o empurrei e parti para cima do João, dando um
soco na cara dele que estava tão bêbado que caiu com o
impacto.

A balada toda nos olhava e mesmo o Dj continuando


com a música, vi que éramos o centro das atenções.

— Gu — Lívia gritou. — Por favor, para, vamos


conversar.

— Não tenho nada para conversar com você — gritei


apontando o indicador para ela.

— Para, não é nada disso.

— Lívia, te pedi para ficar longe desse imbecil. Só


pedi isso. Para se manter longe dele e foi só eu sair e voltar
e você o beijava.

— Eu não estava beijando...

— Lívia, eu só pedi para ficar longe, porque sabia que


ele...

— E fiquei longe.

— Não quero ouvir nem uma porra de uma palavra


que você tenha para me falar, entendeu? Pra mim acabou
— interrompi enquanto ela gritava descontrolada.

Fui andando em direção à saída, sentindo meu


sangue borbulhar e percebi que Lívia vinha atrás de mim.

Pensei que talvez eu estivesse errado, mas estava


cansado de sofrer tanto naquele relacionamento.
Não era acostumado com aquilo, nunca amei
ninguém assim e doía muito.

No início eu sofria, porque me sentia culpado por


amar a minha prima, naquele momento eu sofria com o
ciúme... O sentimento que nunca tive de lidar a minha vida
toda.

Que inferno! Custava ela se manter longe dele por


mim?

Continuei andando em direção a saída até que no


caminho, vi a tal Aninha, que me olhava com interesse,
então a raiva fechou meus olhos e meus atos foram
tomados por ela.

Parei na frente dela e a beijei. Beijei para machucar a


Lívia. Queria que ela visse e sentisse o mesmo que eu.

Um beijo sem graça no qual não senti nada.


Absolutamente nada além de raiva por precisar fazer aquilo
com a mulher que eu amava.

O beijo acabou e olhei para trás, na certeza de que


ela estava ali. Assim que me virei, vi os lindos olhos cor de
mel me fitando como se não acreditasse no que via.

Beijei a Ana na intenção de abrandar a raiva que eu


sentia, fazer a Lívia também sentir o gosto amargo da
traição e à única coisa que consegui, foi sentir raiva de mim
mesmo por ter feito aqueles lindos olhos se tornarem
assustados e tristes.

Gustavo que merda você fez?

Ah, mas que se foda!


Lívia
Não sabia o que fazer, minhas pernas viraram
gelatina.

Entendia que tinha sido errada em estar ao lado do


João, quando prometi não estar, mas ele estava beijando a
Ana, na minha frente. Aquilo foi muito para mim, eu não
podia aguentar.

Quando se separou dela como se o beijo não fosse


nada e me encarou, vi a raiva e o arrependimento no seu
olhar, mas aquilo não ia me comover.

Andei até ele e cheia de raiva, falei:

— Velhos hábitos nunca morrem, não é mesmo,


Gustavo? — Ri sem vontade. — De novo, no meu
aniversário. — Dei de ombros e enxuguei uma lágrima —
Viva a sua vida com essa aí ou com quem quer que deseje.
Não adianta tentar fazer dar certo, algo que nasceu para
dar errado.

Sem olhar para trás voltei para onde estava meus


amigos e eles, vendo o quanto eu parecia arrasada, se
ofereceram para me levar até em casa e aceitei.

Antes de sair, vi Fernando e Rodrigo brigando muito


com o João, que parecia arrependido, também brigavam
com Gustavo, que só os ouvia.

Saímos da Angels e segui com meus amigos para o


apartamento do Gustavo. Durante o caminho fui pensando
em como consegui fazer essa bagunça com a minha vida
amorosa.
Fechei os olhos e pensei no meu dia e na perfeição
que ele foi, em como nos divertimos e o quanto uma ação
errada de outra pessoa fez tudo mudar.

Eu me sentia culpada por ter ficado a sós com o João


quando não deveria, mas eu não o beijei, ele me beijou e eu
o empurrei, enquanto o Gu... Beijou a Ana porque quis e
pensar nisso doía, doía demais.

Vivian enxugou uma lágrima que caía do meu olho e


lancei um sorriso sem graça para ela.

Assim que o Igor estacionou no prédio do Gu, desci


do seu carro e mais uma vez dispensei a oferta de todos de
ficarem comigo. Garanti aos meus amigos que preferia ficar
sozinha, para pensar.

Ofereci o ap para Vivi, confirmei que ela poderia


passar a noite como era o plano inicial, mas minha amiga
sabia que sempre que eu estava mal preferia a solidão,
então disse que iria para casa da Samira e de lá, voltaria
direto para Cananéia.

Despedi-me dos três, subi para o apartamento e me


joguei chorando na cama. Mais uma vez tudo acabou.
Acabou o que nem devia ter começado.

Chorei tanto, até meus olhos não aguentarem e se


entregarem ao sono.

Acordei assustada algum tempo depois, ouvindo


xingamentos e barulho de coisas caindo. Forcei-me a abrir
os olhos e comecei a tentar ouvir quem entrava na casa.

Corri e encostei o ouvido à porta e foi então que


percebi que os xingamentos eram do Gu, ele devia estar
muito bêbado, pela forma enrolada como falava.
Coloquei a mão na maçaneta para abrir a porta, sair
para ajudá-lo e ver se ele estava bem, mas no mesmo
momento escutei uma risada feminina.

Meus pelos se arrepiaram.

Senti o corpo inteiro formigar e fiquei paralisada sem


realmente acreditar que ele havia levado alguém para
nossa casa.

Escutei a voz feminina pedindo para ele se equilibrar


e riu divertida. Em seguida escutei-o dizer para ela ficar
quieta, porque não era a voz dela que ele gostaria de ouvir.

— Só não fala, gata, por favor, fica calada e me ajuda


a chegar ao quarto.

Ouvi quando a porta dele bateu se fechando e senti


meu coração arrancado do peito.

Então era isso, tinha acabado.

Daquela vez realmente havia acabado, ele estava


com outra mulher e a levou para casa. Ele queria me
magoar e havia conseguido. Voltei para cama, sentei-me
encostada a cabeceira, fiquei abraçada aos meus joelhos e
chorei.

A casa era dele e eu era hóspede ali. O recado havia


sido dado e só me restava manter-me quieta.

Era certo que nossa história não funcionaria, desde o


começo já era previsto e mesmo assim eu tentei.

Tentei dar murro em ponta de faca.

Vi a noite terminar e o dia amanhecer, o celular


despertou, me lembrando de que estava na hora de me
arrumar para faculdade.

Mesmo sem vontade engoli a tristeza, me levantei,


me arrumei e saí do quarto.

Fui ao banheiro passando obrigatoriamente em


frente ao quarto do Gustavo e não ouvi nem um barulho
sequer.

Na cozinha passei um café para acordar e juntar


meus cacos e forças para enfrentar toda situação.

Pensar que ele estava com uma mulher no quarto


naquele momento, fazia formar um caroço na minha
garganta e a vontade de chorar me invadia novamente, mas
respirei fundo e um gole de café forte e sem açúcar me tirou
da realidade, me mostrando que tinha algo mais amargo
que o gosto da traição.

Segui para pegar minha mochila e sair, quando ouvi


a porta do quarto do Gustavo abrir aí olhei para o corredor e
o vi. Exibia o rosto péssimo e parecia estar com uma grande
ressaca.

Desviei o olhar do dele rapidamente e continuei meu


caminho até a porta. Eu respirava com dificuldade, com o
coração batendo a mil e lutando para não chorar.

Não queria que ele visse que eu estava derrotada.

Quando eu me via quase chegando à porta, ele me


chamou:

— Lívia.

Parei, indicando que ele podia falar, mas não me


virei. Minha respiração estava acelerada.
Pensei na mulher que o esperava na cama, balancei
a cabeça em negativo e continuei a andar, mas ele deu
alguns passos rápidos e me segurou pelo braço.

— Espera precisamos conversar.

— Não temos mais nada para conversar.

— Temos tudo para conversar.

— Você tem uma mulher te esperando no seu quarto,


Gustavo. Vai lá. Não seja bobo e não perca tempo aqui
comigo.

Ele passou as mãos no rosto e soltou o ar como se


estivesse exausto.

— Olha, não é nada disso que você acha que


aconteceu.

Ri sem vontade.

— Ouvi você chegando e sinceramente foi uma


decepção pra mim. Não achei que fosse me substituir tão
rápido.

— Te substituir? Foi você quem nem esperou eu virar


as costas para deixar o João enfiar a língua na sua boca.

Quando ele disse isso, sem que eu pudesse controlar,


a minha raiva levou a minha mão até o rosto dele e o
acertei com um tapa.

— A única coisa que fiz de errado, foi deixá-lo se


aproximar de mim e me beijar sem que eu quisesse.
Enquanto você, na primeira oportunidade beijou outra
mulher na minha frente e trouxe uma qualquer para dentro
de casa, mesmo sabendo que eu estava aqui e o quanto
isso ia me machucar — falei, chorando e com raiva por estar
chorando.

— Não é isso que você está pensando. Eu e ela...

— Não quero saber. — Coloquei a mão nos ouvidos e


apertei os olhos fechados.

— Lívia... — Encarei-o e engoli em seco.

Respirei e com a voz carregada de dor, falei:

— Lembra que ontem você gritou que para você


estava tudo acabado? É isso.

Ele me encarou com olhar triste, que eu pensei em


dizer que não, que eu o amava e aquilo tudo só aconteceu
por causa de um erro, mas só consegui completar movida
pela dor:

— Nem deveríamos ter começado. Estava na cara


que não era para acontecer, prova disso é sermos primos. E
a única coisa que vai restar dessa história toda, é o nosso
parentesco.

Ele tentou falar, mas continuei a andar e bati a porta


do apartamento, abafando qualquer mentira que ele
pudesse me dizer e o deixando inteiramente para quem
quer que fosse que estivesse dentro daquele quarto.
Capítulo trinta e oito
Gustavo
Quando eu repensava o olhar magoado e cheio de
tristeza que Lívia me lançou quando me separei do beijo
com a Ana, me sentia um lixo e a queimação que a bebida
causava ao passar por minha garganta era pouco,
comparado a tudo que eu merecia passar.

Necessitava de algo mais forte, a bebida que eu


tomava parecia água e um péssimo anestésico, não
chegava nem perto de diminuir minha dor.

Bebi tanto, que em um certo momento já não estava


mais raciocinando e vi mais de uma Ana na minha frente.

Parei para pensar como ela foi parar ali do meu lado
e não me lembrava em que momento se tornou minha
companhia.

Ana se levantou, passou o decote em mim e por um


instante de delírio imaginei ser a Lívia, mas quando ela
falou usando uma voz arrastada de gatinha manhosa, perdi
o tesão e percebi que era ela quem me abraçava e não
minha Lili.
Tentei me levantar para ir embora e mal consegui dar
um passo.

Então Ana colocou meu braço em volta do seu


pescoço, me dando apoio e se oferecendo para me levar e o
álcool não me deixou pensar o quanto estava errado em
aceitar.

Sentia-me tão bêbado que não sabia distinguir o que


era verdade e o que era fruto do delírio que o álcool
causava. Chamei a Ana de Lívia algumas vezes e ela me
corrigiu todas elas.

Expliquei, sei lá como, onde ficava meu ap e com


muito custo ela conseguiu entrar e me deitar na minha
cama.

No delírio, mais uma vez pensei ser a Lívia e quando


ela falava eu caia em tristeza novamente percebendo que
não era a linda voz da minha Lili.

Apenas dormi e não fiz absolutamente nada com a


mulher que se acomodou na minha cama. Tudo porque
amava demais a que dormia no quarto ao lado.

Acordei no dia seguinte me martirizando por pensar


que ela devia ter me visto chegar e sabia que tinha uma
mulher ali na minha cama.

Cama esta, onde passei diversas noites com ela.

Meu peito se apertou imaginando o que a Lívia


estava sentindo naquele momento. Tive vontade de me
bater.

Ouvi barulhos do lado de fora do meu quarto, engoli


minha vergonha, minha raiva de mim mesmo e me levantei
para encarar a mulher com quem eu realmente queria estar.

O olhar que Lívia me lançou quando me viu, foi como


uma espada me ferindo, ou melhor, o olhar que não me
lançou, porque nem sequer me encarou direito.

Tentei me explicar, mas ela nem quis me ouvir, gritou


que tudo estava acabado e saiu batendo a porta.

Nunca fui de chorar por nada, aprendi que homem


não chora, mas homem só não chora se não sofrer por
amor. E naquele momento eu sabia, enquanto meus olhos
se enchiam de lágrimas e a dor apertava meu peito, que a
pior coisa da vida foi ouvir que minha história com a Lívia
acabou.

Eu a amava tanto, tanto que vê-la beijando o João


me deixou cego. Cego de raiva e de ciúme. E não pensei em
nada a não ser na minha dor.

No dia anterior, assim que a confusão toda se


acalmou, Fernando e Rodrigo me contaram que a Lívia não
tinha culpa de nada, disseram que o João contou tudo a ele
e se declarou completamente culpado, disse ainda que
mereceu o soco que dei nele, mas se defendeu dizendo que
naquele dia as lembranças estavam o martirizando.

Foda-se!

Bebi feito um alcoólatra, sabia que eu precisava ter


ido embora e me arrastado aos pés dela pedindo desculpas,
mas não consegui e simplesmente decidi me punir bebendo
e apreciando minha fossa.
As semanas se passaram e assim foi: noite, após
noite, onde cada uma delas que passava, minha solidão e
arrependimento me deixavam cada vez mais triste.

Acabei me conformando com a presença da Ana, que


se sentou ao meu lado no bar da Angels, por noites
seguidas e passou a ser figurinha carimbada ali.

Via que ela sempre tinha segundas intensões, mas


não podia culpá-la, já que eu que fui o idiota que a beijou do
nada, dando-a todas as esperanças que carregava naquele
momento.

Quase não vi a Lívia e sabia que se esquivava de


mim. Tentei por diversas maneiras conversar, mas todas às
vezes ela fugiu e não quis me ouvir.

Eu mal tinha conhecimento de onde minha prima


andava e só soube que havia ido para Cananéia, quando
Sarah ligou, me detonando e eu nem me defendi, porque
ela tinha toda razão.

Soube que a Lívia brigou feio com o João no dia


seguinte a nossa briga, mas claro, ele que não se cansava
de insistir e não saía de cima dela, além de ser mais
sensato que eu, fez de tudo para que Lívia o perdoasse,
fazendo com que se tornassem amigos de novo e aquilo
acabou comigo.

Sabia que tinha feito merda e que não a merecia,


mas doía demais vê-la e não poder beijá-la ou senti-la nos
meus braços.

Fernando e Rodrigo marcaram uma reunião entre os


sócios, e deixaram claro que o desentendimento entre João
e eu não deveria de maneira alguma influenciar na
administração da Angels e claro, nós dois concordamos.
Nosso empreendimento era para mim, como para o
João, uma prioridade e com certeza passaríamos por cima
de nossas diferenças e toda a raiva que um sentia do outro,
para mantê-la no topo.

Conforme os dias foram passando, vi que Lívia me


evitava mais e aquilo acabava comigo aos poucos, nós
continuávamos mal nos encontrando apesar de morarmos
juntos e eu estava com uma saudade sem fim, morto de
vontade de vê-la e ouvir a sua voz.

Cheguei da Angels, pensei em me sentar na porta do


quarto dela e fazer como da outra vez, em que dormi ali até
ela falar comigo, mas achei melhor não a pressionar.

Fiquei pela cozinha enrolando, liguei o rádio baixinho


e até decidi fazer café da manhã para nós.

Chegou a hora em que ela teria de acordar para ir a


faculdade e quando saiu do quarto, uma eletricidade subiu
pelo meu corpo.

Ed Sheeran tocava baixinho no rádio I´m a mess


cantando exatamente o que eu sentia.

Ela se exibia linda, me encarou e desviou o olhar.

Não nos falávamos de verdade desde a manhã do


nosso rompimento e naquele momento eu não a via há dias.

Percebi que Lívia parecia mais magra e abatida,


devia estar sofrendo tanto quanto eu. E então, antes que
ela saísse, apressei-me em cumprimentá-la:

— Bom dia, fiz café pra nós. — Forcei um sorriso sem


graça.
— Bom dia, obrigada.

Ela não sorriu e me doeu.

Uma estranha sensação pairava entre nós, meu


corpo sentia a proximidade do dela, eu queria agarrá-la e
prometer que nada nos separaria nunca mais, mas a
realidade não era bem assim.

Lívia puxou a cadeira e praticamente não me olhou,


sentei-me de frente para ela e comecei a tomar meu café.

— Sinto muito por tudo — sussurrei cheio de


vergonha.

— Tudo bem.

— Não quero ficar sem falar com você. — Respirei


fundo e soltei o ar em seguida continuando a falar: — Sei
que devia ter tido essa conversa antes. Mas...

— Está tudo bem mesmo, Gustavo — interrompeu-


me.

— Não está. Ficamos tão próximos esses meses, que


cada dia sem ouvir sua voz está sendo tão...

— Vai ser difícil no começo, mas somos primos e não


devemos deixar de nos falar... Além de que, moramos juntos
também. A não ser que você não queira que eu more mais
aqui, mas caso contrário, vamos ter que conviver.

— Não quero conviver com você, Lívia. Quero viver


com você.

— Gu, já conversamos.
Levantei-me, virei a cadeira em que ela estava
sentada de frente para mim e agachei na sua frente. Parecia
assustada e me olhava sem entender.

— Nós não conversamos nada até agora. O que eu


quero que entenda, é que estou doido por você e tudo que
fiz de errado, foram atitudes impensadas que tive apenas
por te amar demais.

Ela piscou para conter as lágrimas e vi que pensava


no que falei. Mas uma lembrança passou por seu olhar.

— Gustavo, você desconfiou de mim, no mesmo dia


beijou outra e trouxe uma mulher para dormir aqui, sabendo
que eu me encontrava no quarto ao lado. Você sabia que
isso ia acabar comigo, mas não se importou.

— Não aconteceu nada. Eu juro, só dormimos. Eu


estava bêbado demais. Me perdoa, Lívia? — Eu mordia o
lábio inferior e me segurava para não chorar.

O gelo com que ela me tratava, seguia me matando.

— Você a beijou, na minha frente. — Virou a cabeça


para o lado e enxugou uma lágrima que escorreu pelo seu
rosto.

— Eu fui um imbecil. Nunca a beijaria se não


estivesse com raiva, foi o maldito impulso por ver o João te
beijando. Por favor, Lívia? Me perdoa?

Porra! Eu estava chorando, tentava me segurar, mas


a dor de estar perdendo a mulher da minha vida era mais
forte que eu. Ela parecia tão magoada a ponto de sua dor
transparecer na voz.
— Aprendi com o meu erro e com o sofrimento que a
minha atitude impensada está me causando e te causando.
Me perdoa e nunca mais vou te magoar.

Lívia pensou e uma fagulha de esperança se abriu


em meu peito, mas caiu por terra, quando o seu celular
tocou. Ela o pegou, observou quem ligava, suspirou e
fechou os olhos ao atender.

— Oi, João, só um minuto, estou descendo. — E


desligou.

— João de novo? Ele você perdoa? — perguntei


irritado.

— Gu, por favor, não começa. — Ela se virou e pegou


a mochila para sair.

— Não começa? Eu estou aqui sofrendo igual a um


idiota pelo nosso término, me culpando dia e noite por ter
trazido a Ana aqui na noite em que brigamos. Enquanto isso
eu morro por dentro ao ver você pra cima e para baixo com
o João. Vocês estão juntos?

Ela riu sem vontade e balançou a cabeça em


negativa.

— Então era a Ana que estava na sua cama? Bem


que imaginei.

— Ele arma para nos separar e você o perdoa e fica


com ele tão fácil assim?

— Não estou com ele, mas sou solteira e posso ficar


com quem eu quiser. E quanto eu perdoá-lo, ao contrário de
você ele errou, mas no dia seguinte estava na frente da
minha faculdade, me esperando para me pedir desculpas e
não continuou cometendo um erro após o outro.

— Tudo bem, Lívia. Acho que encerramos aqui. Seja


solteira e faça o que você quiser.

Ela não me respondeu, simplesmente enxugou o


rosto, colocou a mochila nas costas e saiu batendo a porta e
me deixando sozinho novamente.

Eu vou esquecê-la. Preciso esquecê-la! E a partir de


hoje para mim acabou. Como ela mesma disse: não adianta
insistir no que nasceu para dar errado.
Lívia
Fazia um mês que Gu e eu tínhamos terminado.

Depois do dia que ele me esperou no café da manhã,


não conversamos mais e vivemos como dois estranhos
morando no mesmo apartamento.

Sofri todos os dias quando sentia que Gustavo estava


ali ao meu lado, mas não podia tocá-lo nem me deitar em
seus braços para assistir um filme como fazia antes.

Não conseguia comer e já tinha emagrecido de tanto


sofrer por amor. Melhor dieta do mundo ou pior dependendo
do ponto de vista.

Eu e o João estávamos muito próximos, ele fazia tudo


por mim e, às vezes, me peguei pensando se ele não era
alternativa certa desde o começo e fui eu que escolhi a
opção errada, mesmo com tudo dizendo e a vida me
mostrando que o Gu não era uma opção por ser meu primo.

João foi errado em me beijar a força, mas ele fez por


gostar de mim e não por querer me prejudicar, por isso o
perdoei. Gustavo que não tinha que ter feito o que fez.

Eu sabia que Gu estava sofrendo, porque Samira e


Igor me contavam o que viam, mas percebi que ambos
evitavam o quanto podiam por notarem que me doía.

Conforme os dias seguiam, eu soube que ele andava


bebendo muito e saindo com várias garotas, mas nunca vi.
O que os olhos não veem o coração não sente.

Gustavo continuava seguindo com a vida dele e não


podia me acusar de fazer o mesmo quando eu dava
andamento a minha amizade com o João.
Ficar sem vê-lo me doía também, porque o que eu
mais temia aconteceu e da nossa história não tinha sobrado
nem a amizade de primos. Sempre fomos o anjo protetor
um do outro, na verdade, ele que sempre me protegeu,
mesmo quando estávamos distantes.

Eu tentava seguir a vida me jogando de cabeça nos


estudos, enquanto nos intervalos, coloquei em prática o
presente do meu pai, dando entrada na papelada para tirar
a minha habilitação.

O processo foi rápido, como eu tinha bastante tempo


livre à tarde, fiz todas as aulas práticas rapidamente, fui
aprovada e já estava começando a dirigir aos poucos.

João me ajudava com aulas de direção e explicações.


Era inevitável pensar e desejar que fosse o Gu que estivesse
vivendo aquele momento comigo.

A saudade só aumentava, porque eu amava meu


carro novo e revivia o dia lindo em que o ganhei. Tentei
devolvê-lo para o Gu na semana em que terminamos, mas
ele se sentiu tão ofendido, que desisti.

Depois do carro, era eu quem dava carona aos meus


amigos, que super me incentivavam a dirigir.

Durante as caronas, eu sempre tinha que ouvir


sermões sobre minhas escolhas. Igor não gostava de jeito
nenhum da minha proximidade com o João e Samira dizia
que eu só fazia merda, a única que me apoiava, na verdade,
ela não apoiava, mas pelo menos não me criticava, era a
Vivi quando conversávamos por chamada de vídeo.

Depois de mais um dia cansativo de aulas, saí da


faculdade e andei distraída pelo estacionamento procurando
a chave do carro na bolsa, enquanto pensava que aquela
bendita sempre me trazia tantas lembranças que eu
gostaria de esquecer.

Peguei o objeto e quando ergui a cabeça, vi perto do


meu vermelhinho, aquele homem lindo, alto, bonito e
sensual, com lindas covinhas e um sorriso faceiro.

João exibia-se encostado ao carro e com os braços


cruzados na frente do peito, o que o fazia parecer
incrivelmente forte.

Dei um pequeno sorriso e pensei: já que não posso


ficar com quem eu quero, por que não me divertir um pouco
com quem está completamente a fim de se divertir comigo?

Ver aquele deus, sorrindo e disponível me dava


ideias. Como não afogar minhas mágoas naqueles brações?

E é isso que vou fazer. Só diversão e sem


sentimento.

— Oi, João.

— Oi, Gata. Como anda minha piloto de fuga?

— Estou bem, cada dia me sinto mais confiante.

Ele sorriu.

Ai, meu Deus... As covinhas.

— Linda, me dá uma carona até à Angels?

— Não seria mais fácil você ter ido da sua casa direto
para lá, do que ter vindo até aqui me pedir uma carona? —
falei com a sobrancelha arqueada.
— A companhia vale a pernada, mas só peço que
dirija bem devagar, tá?

— Está com medo dos meus dotes motorísticos?

Ele riu.

— Não, Liv, só estou querendo aproveitar cada


minuto da sua companhia.

— Ah, mas é tão galanteador esse meu amigo, que


chego a acreditar.

— É tudo verdade.

Ele deu a volta no carro para entrar no banco do


passageiro e eu me virei sorrindo, para entrar no do
motorista, entretanto, antes de assumir o volante, meu
olhar foi capturado por olhos azuis me observando de
dentro do carro estacionado mais à frente.

Gustavo, saiu arrancando, cantando pneu e fez meu


coração saltar pela boca.

O que ele queria aqui?


Capítulo trinta e nove
Gustavo
Acordei na cama de uma morena em plena quarta-
feira.

Meus dias se resumiam a bebedeira e sexo com


desconhecidas. Tudo na esperança de esquecer aquele rosto
delicado e aqueles olhos lindos que me hipnotizavam, mas
para minha tristeza, acabava procurando a Lívia em cada
uma delas e nunca conseguia esquecê-la.

Nenhuma mulher com quem fiquei naqueles dias,


teve o poder de me fazer esquecer esse sentimento
maldito, que fazia com que me sentisse um lixo por ter
deixado a mulher da minha vida escapar.

Saí da cama da desconhecida, que nem sequer me


lembrava do nome, e comecei a me vestir rezando para que
ela não acordasse.

Detestava quando tinha que dizer que não ia rolar


troca de telefone nem que íamos repetir o que aconteceu.
Dei sorte e ela não acordou até a hora que saí. Era
quase meio-dia e, nem sabia por que, decidi ir até a
faculdade da Lívia, para apenas vê-la de longe. Sentia
saudade mesmo morando na mesma casa, já que fazíamos
o possível para evitar um ao outro.

Cheguei à faculdade e quando ia descer, avistei João


encostado ao carro dela, então para evitar socar a cara
dele, optei por ficar onde eu estava. Pensei em ir embora,
mas a vontade de vê-la falou mais alto e decidi ficar e
observar.

Pensei que adoraria vê-la brigando com o João e o


mandando embora dali, mas não foi o que aconteceu,
quando ela o viu, abriu um sorriso que revirou meu
estômago de raiva.

De longe os vi conversar, sorridentes, e ela parecia


sentir-se completamente feliz ao lado dele. Aquilo me doeu
tanto, como nunca pensei que amar pudesse doer.

Lívia me olhou quando já entrava no carro para partir


e aí vi seu sorriso congelar. Arranquei com meu carro, com
raiva e o que eu queria era sair dali o mais rápido possível.

Jurei para mim mesmo que nunca mais aconteceria,


nunca mais correria atrás dela de novo, mesmo que meu
corpo e meu coração me pedissem incansavelmente.

O destino já tinha me provado diversas vezes que ela


não era para mim. Então chega.

Sentia tanta raiva que soquei o volante repetidas


vezes e decidi parar o carro para não me matar. Peguei o
celular, olhei nos meus contatos, encontrei o nome da Bruna
e pensei: ela sempre foi tão disponível. Por que não tentar?
Olhei para tela decidindo o que fazer e a cena dos
dois juntos martelavam na minha mente insistentemente
machucando meu coração.

Eu precisava de uma fuga.

Apertei o discar e escutei o toque do celular


chamando do outro lado.

— Ah, achei que nunca mais me procuraria.

— Nunca mais é muito tempo — falei irritado — Topa


me encontrar agora?

— Que direto. Agora?

— Sim, agora. Já.

— Topo. Na sua casa ou na minha?

— Na minha e não espere nada a mais que sexo.

— Ok. É isso mesmo que quero agora. Estarei lá em


dez minutos.

Desliguei o celular, liguei o carro e parti para o ap


dirigindo feito um louco. Era para esquecer? Então eu
tentaria voltar a viver da maneira antiga. Funcionava antes
da Lívia aparecer na minha vida, então ia ter que funcionar
de novo.

Cheguei ao meu prédio e Bruna já me esperava na


recepção, a cumprimentei e entramos no elevador. Antes de
as portas se fecharem, recebi um olhar atravessado do Sr.
Joaquim, mas eu fingi não notar.

E quer saber? Que se foda! Até o porteiro do meu


prédio queria me recriminar, agora?
Subimos, mal entrei em casa e já me sentia culpado
por trazer mais uma vez uma mulher para casa.

Lívia ficaria tão triste quando soubesse.

Que se dane o que ela vai sentir, ela não se importa


com o que eu sinto e aliás ela não vai saber, saiu toda
sorrisos com o João.

Fui até o bar na sala de jogos e bebi vários copos de


uísque que desceram rasgando goela abaixo. Precisava
estar alcoolizado para conseguir transar com a Bruna tendo
a Lívia na cabeça.

Bruna não deixava escapar nada e me olhava com


um sorriso safado no rosto.

— Aposto que está...

Ela começou a falar, mas a interrompi, não queria


ouvir as merdas dela.

Beijei-a com força, não sendo nada delicado.

Empurrei-a até chegarmos ao quarto e nem me dei


ao trabalho de fechar a porta. Bom, era desse jeito que eu
vivia minha vida antes de a Lívia aparecer, então seria
desse jeito que voltaria a viver e teria que dar certo.

Eu a esqueceria por bem ou por mal.

Já que ela já fez isso.

Precisava voltar a viver sem aquela maldita dor no


meu peito.
Lívia
Deixei o João na Angels e ele insistiu para que eu
entrasse, cheio de segundas intenções, mas sorri e disse
que tinha trabalho da faculdade para fazer.

Segui para casa direto e assim que entrei no


apartamento comecei a ouvir gemidos de mulher que mais
pareciam de uma atriz fingida, de filme pornô. Os gemidos
vinham do quarto do Gu, não era difícil adivinhar o que
estava acontecendo ali.

Meu corpo todo se arrepiou. Mais uma vez... Não


pode ser.

Notei que a porta do quarto se encontrava aberta e


não tive coragem de passar em frente e ir até o meu, então
fiquei na sala ouvindo tudo, todos os gemidos e gritos da
companhia dele, que pelo visto se divertia.

Tampei os ouvidos e comecei a chorar.

Por que tinha que doer tanto?

Quando eu pensava que estava cicatrizando, ele


vinha e metia o dedo na ferida e a fazia sangrar sem dó.

Mantive-me na sala e aos poucos escutei os gemidos


se abrandarem até cessarem.

Meu coração batia tão rápido que podia senti-lo nos


ouvidos.

E a partir desse momento eu decidi que


definitivamente precisava acabar.
Por que eu ainda seguia ali? Por que me prestava
àquele papel?

Poucos minutos se passaram e eles saíram do quarto


para completar meu pesadelo, quando olhei para o rosto da
mulher, vi que o que parecia ruim, sempre podia ficar pior.
Era a Bruna que estava com ele e minha raiva aumentou.

Ele sempre escolhia as piores, como se quisesse usar


disso para me magoar ainda mais.

Gu me olhou espantado, como se não esperasse me


ver ali, enquanto a Bruna me lançou um sorriso cínico e
falou:

— Ahhh, tadinha.

Olhei-os, balancei a cabeça de um lado para o outro


e não perdi meu tempo respondendo.

Gu não me encarou, segurou a Bruna pelo braço e a


levou para porta, enquanto eu pegava minha mochila e
seguia para o quarto.

Não ouvi Gustavo dizer uma só palavra, mas antes


de me afastar de vez ouvi Bruna perguntar:

— Por que você ainda a mantém aqui, Gu? Ah, que


estorvo. Achei que já tivesse se livrado dessa chata.

Não ouvi o que ele respondeu, bati a porta do meu


quarto e chorei.

Eu não precisava daquilo, sabia que meus pais não


queriam que eu morasse em outro lugar que não fosse com
ele, mas eu não conseguia mais.

Não queria ser estorvo para ninguém.


Respirava com dificuldade entre o choro.

Será que meu sonho de ser médica valia aguentar


aquilo tudo?

Se eu soubesse que minha vida seguiria por aquele


caminho, nunca teria ido morar ali ou nunca teria me
aproximado tanto dele. Mas também, como saber que amar
podia doer tanto?

Como ele pode dizer que me ama e me fazer passar


por isso? Que porcaria de amor era esse?

Decidi que tudo tinha um limite e comecei a tirar


minhas coisas do guarda-roupa, com raiva e chorando.
Voltaria para Cananéia e seguiria meu sonho de lá.

Meu celular começou a tocar e era Samira me


ligando em um momento mais que propício, como se
soubesse que eu precisava muito da sua amizade.

Atendi chorando compulsivamente e mal conseguia


falar.

— Amiga, nada está perdido, calma, você não vai


voltar para Cananéia e desistir do seu sonho por ele. Olha,
amo o Gu, mas agora ele passou dos limites. Sempre quis
ter alguém para dividir minha casa e amei os poucos dias
que você passou aqui. Vem morar comigo.

Chorei mais ainda.

— Posso ir hoje? Não quero mais ser um empecilho


para ele.

— Vem agora. Você vem de carro?


Pensei e estava com tanta raiva que não queria mais
nada dele. Nem nada que me lembre dele.

— Não tenho mais carro, amiga. Vou devolver.

— Tem certeza?

— Absoluta.

— Então arruma as suas coisas, que estou indo aí te


buscar.

Ela desligou e arrumei minha mala depressa, não


queria ficar ali por mais nem um dia.

Quando terminei de ajeitar tudo olhei para o quarto e


pensei quantas noites de amor passamos ali, quantos
momentos felizes e chorei sentindo a perda de cada um
deles.

Peguei meu caderno e, meio que sem pensar direito


nas palavras certas, escrevi um bilhete.

Gustavo

Obrigada pelo tempo que me acolheu, mas como sua


amiga disse, estou sendo um estorvo aqui e não quero
atrapalhar a sua vida. Por isso estou indo embora.

Como você sabe, para nossa família, a condição para


eu estudar aqui na cidade, era morar com você, mas nós
sabemos que isso não é mais viável, então espero que não
conte nada a eles por enquanto.

Estou deixando a chave do carro e os presentes que


você me deu. Desculpa, mas eles só vão me fazer sofrer
mais ao me lembrarem de cada momento feliz que vivi e
não tenho mais.
Foi bom enquanto durou, mas tudo tem um fim e
esse definitivamente é o nosso, para que deixemos de nos
magoar.

Seja feliz.

Lívia

Podia escrever pelo celular, mas o bilhete não daria a


ele a chance de responder.

Posei o papel na minha cama junto com o filtro dos


sonhos, a pulseira e a chave do carro.

Peguei todas minhas malas fazendo de tudo para não


chorar e sendo vencida miseravelmente.

Saí do quarto e não o vi, cogitei que provavelmente


dormia ou havia saído com a amiga.

Apressei-me, as colocando no elevador antes que


pudesse vê-lo e então fui embora sem olhar para trás.
Gustavo
Como sempre eu agia por impulso e me arrependia
depois, com isso, eu sabia que havia perdido a Lívia de vez,
só pelo olhar que ela me lançou quando viu que era com a
Bruna que eu estava.

Fechei meus olhos, arrependido por ela ter ouvido as


merdas da Bruna e pensei no quanto eu tinha capacidade
de fazer burrada e magoá-la.

De início joguei a culpa no João aquele filho da puta


que não deixava a gente se resolver e vivia em cima dela e
aí eu acabava fazendo burrada e agindo sem pensar no
depois... Não! Cheguei à conclusão de que a culpa era toda
minha que fazia tudo errado e jogava cada vez mais ela nos
braços dele.

Nunca amei assim, não sabia como agir e fazia


burrada em cima de burrada.

Dormi assim que me livrei da Bruna e acordei horas


depois. Levantei-me ainda meio tonto de sono e um pouco
de ressaca por todo o uísque que tomei antes de fazer
aquele sexo sem graça. Foi a foda terminar e já me sentia
culpado.

Fui até a cozinha e o apartamento carregava o mais


absoluto silêncio. Ela devia ter saído para não me encarar,
como sempre fazia quando a gente brigava.

Ainda que não tivéssemos nada, sentia-me culpado,


como se a tivesse traído. Voltei para o meu quarto e
tentando esquecer a dor de amor, dormi novamente.

Acordei já era noite e completamente recuperado,


relembrei o momento em que Bruna disse que a Lívia era
um estorvo. Fechei meus olhos sentindo remorso.

Ela não sabia nada de como a Lívia alegrava minha


casa, nem o quanto alegrava minha vida. Respirei fundo e
esfreguei os olhos.

Bruna foi apenas um jeito de anestesiar a dor por


estar perdendo a Lívia para o João. Nunca gostei de perder e
nunca tive algo tão precioso, que por diversos motivos,
desde família até o cuzão de um dos meus amigos, a vida
pudesse me tirar e, com isso, eu acabava enfiando os pés
pelas mãos e fazendo tudo errado.

Sentia-me péssimo e precisava ficar em casa e


esperar a Lívia chegar para implorar o perdão que não pedi
quando a Bruna disse aquela merda. Mesmo com o
turbilhão de sentimentos e entre términos e retornos, eu
amava tê-la por perto. Ela preenchia aquela casa.

As horas passaram e realmente decidi que não iria à


Angels e assim esperaria a Lívia. O bom de ser dono do meu
próprio negócio era a autonomia nos horários.

Liguei para Rodrigo e avisei que não estava bem,


mas foi aí que fiquei sem chão, quando ele soltou uma
bomba em cima de mim.

— Imaginei, mesmo.

— Como assim imaginou?

— Ah, cara, porque a Lívia foi embora.

Sentei-me na cama.

— O quê?
— Bateu uma saudade da Samira, liguei para
perguntar se podia passar na casa dela hoje e ela me disse
que sem chance, porque a Lívia estava péssima.

— Isso eu sei, fiz outra burrada e por isso não vou


trabalhar hoje. Preciso esperar ela chegar, para
conversarmos.

— Gu, cara, sinto muito, não sei se você sabe, mas


ela não vai voltar. Samira me contou que a Lívia foi morar
com ela.

Meu coração pulou uma batida.

— O quê? Não pode ser.

— Foi o que ela me contou. — Fiquei em silêncio e


Rodrigo continuou: — Eu sei que é foda, cara, mas fica bem
aí. Dê um tempo a Lívia.

Desliguei e corri para o quarto dela. Abri com


violência as portas do guarda-roupa e não encontrei nada,
nem uma peça de roupa. Ela havia ido de vez e eu tinha
definitivamente a perdido.

Furioso soquei a parede com minha mão, que


começou a sangrar e a dor que eu sentia fisicamente, não
era nada perto da que eu sentia emocionalmente.

Sentei-me no chão, respirando com dificuldade como


se tivesse corrido quilômetros e não acreditava naquilo.

Eu colhia, enfim, os frutos da minha impulsividade.

Levantei-me depressa decidido a ligar e fazê-la


entender que aquela casa era dela e que não era um
estorvo nem nada disso.
Eu ia sair do quarto quando vi em cima da cama
todos os presentes que dei para Lívia, incluindo a chave do
carro e uma carta.

Li cada palavra, escrita de forma automática na folha


de caderno e tive a certeza de que Lívia realmente foi
embora.

Senti a dor de perdê-la, mas aquilo não podia ser, o


apartamento era mais dela que meu. Via-me na obrigação
de fazê-la voltar para casa.

Liguei e seu telefone tocou, tocou até que caiu na


caixa postal. Tentei mais uma vez e o mesmo aconteceu. Ela
não queria falar comigo. Mandei uma mensagem:

“Me atende e fala comigo, por favor. Eu não


mereço, eu sei, mas, por favor.”

Esperei alguns minutos e nem uma resposta. Inferno!


Tentei ligar mais uma vez e de novo chamou até cair na
caixa postal. Porra!

Decidi ligar no celular da Samira, tocou duas vezes e


ela atendeu.

— Oi, Gustavo.

— Samira, preciso falar com a Lívia.

— Ela não quer falar com você — Samira falou ríspida


e vi que estava muito brava comigo.

— Eu sei que errei feio Samira, mas preciso falar com


ela.

Ela não me respondeu, mas escutei-a falando


carinhosamente com a Lívia e dando o recado.
— Fala, Gustavo. — Lívia me atendeu tão fria que
meu coração gelou.

— Obrigado por me atender, sei que não mereço


isso, mas por favor, Lívia, volta para casa.

— Olha, vai ser melhor para nós dois e... — Ela parou
de falar e pude sentir toda a dor que carregava. — Eu não
estando aí, você poderá receber quem você quiser sem que
eu atrapalhe.

— Lívia, você não atrapalha. Me perdoa por tudo que


eu tenho feito de errado... tenho me sentido um lixo quando
te vejo com o João e acabo agindo por impulso. Sei que não
justifica e estou aprendendo com cada erro meu. Mas por
favor, não sai de casa, volta... Essa casa... é sua... tudo nele
é seu...

Inclusive eu.

— Não consigo, Gu. Não depois de hoje. Viva sua


vida e eu vou viver a minha. Agradeço a Deus por não
termos contado as nossas famílias ou tudo seria pior.

— Por favor, Lívia?

— Não, Gustavo. Obrigada pelo tempo que me


acolheu, mas para mim não funciona mais.

Suspirei.

— Tem certeza de que é isso que você quer?

Perguntei e senti que ela pensou na resposta, mas


me respondeu fazendo meu coração se despedaçar.

— Sim.
— Tem alguma coisa que eu possa fazer para apagar
tudo e voltarmos na noite do seu aniversário, antes do João
nos separar?

— Não, o que está feito, está feito.

Apertei meus lábios para não chorar feito um bebê.

— Ok... Lívia... — chamei quando percebi que ela ia


desligar.

— Fala.

— Eu ainda te amo, minha princesa.

Ficou em silêncio por mais um instante e desligou,


fazendo meu mundo desmoronar.
Capítulo quarenta
Lívia
Nunca me disseram que sofrer por amor era assim.
Fábio foi tão nada na minha vida que quando terminamos
não senti um por cento da tristeza que experimentava
naquele momento.

Fazia uma semana que eu morava com a Samira e


ela seguia sendo maravilhosa. Tinha um quarto extra e me
acomodou muito confortavelmente.

O pai da Samira era dono de uma das maiores


empresas de engenharia da cidade vizinha, e assim como
eu, ela não precisava trabalhar e era sustentada pelo pai
enquanto estudava.

Samira, Igor e Vivian por chamada de vídeo, foram


fundamentais na minha vida pós-Gu. Os três me apoiaram
na recuperação daquele que parecia uma droga na qual eu
estava viciada.

Eu tentava não pensar nele, mas era impossível,


vivemos tantas coisas nos meses juntos que tudo me fazia
lembrá-lo.
Não conseguia olhar para Coca com chocolate, que
me lembrava do quanto o sexo com ele era mil vezes
melhor que aquela mistura.

Gustavo tentou de todas as maneiras fazer com que


eu voltasse e quando viu que eu não voltaria atrás, tentou
ao menos que eu aceitasse o carro de volta, mas me
mantive firme e, aliás, o que eu faria com o veículo, se ia
todos os dias para faculdade com minha amiga?

Rodrigo passava bastante por ali e eu não sabia que


o relacionamento dele com a Samira estava andando e
quando perguntei sobre como eles seguiam, ela me
respondeu apenas que com o Rodrigo não tinha como ter
relacionamento e ela até preferia assim, já que também não
queria nada sério no momento, então eles continuavam em
um relacionamento aberto.

Era segunda-feira e Rodrigo buscaria Samira para


sair, com isso, ela me fez prometer que eu ficaria bem,
antes de aceitar e jurei que até preferia a solidão para
pensar.

Quando eu seguia para o quarto, escutei a


campainha tocar e Samira me gritou para atender. Abri e
dei de cara com um Rodrigo sorridente.

— E aí, Fofa, você está bem?

Ri.

— Ah, por favor, Rodrigo, você também com esse


negócio de Fofa não. Estou bem sim, ficando bem.

Ele entrou e seguimos até a sala.


— Estou andando muito com a Samira e acabei
aprendendo o apelido. — Rimos e ele mudou de assunto: —
Lívia, fui incumbido de uma missão e se eu falhar nela, serei
um homem morto.

— Então seria bom que não falhasse. Qual é essa


missão? Deixe-me ver se posso te ajudar.

Ele sorriu, tirou do bolso a chave de um carro e a


balançou para mim que logo reconheci pelo chaveiro do
Mário.

— Nem começa — apressei-me em recusar.

Ele deixou a chave e o documento do carro sobre a


mesa e falou:

— Você não tem opção, Lívia, o carro já está


estacionado lá embaixo. O Gu disse que não recebe de volta
presentes que ele deu. E te enviou isso. — Entregou-me um
envelope lacrado e guardei para abrir depois.

Samira entrou na sala.

— Estou pronta. Vamos com a gente, Lívia — me


convidou, mas eu não estava tão no fundo do poço assim
para aceitar sair de vela.

— Estou cansada e louca para dormir. Mas divirtam-


se vocês.

— Na próxima você vai.

— Sim, na próxima. — Sorri.

Se despediram e assim que saíram fui para meu


quarto.
Coloquei o envelope sobre a cômoda e tentei segurar
minha ansiedade em abri-lo. Sentia-me com medo de ver o
que havia dentro e sofrer.

Sentei e fiquei encarando o pacote de longe. Até que


decidi que já que tinha que arrancar o esparadrapo que
fosse de uma vez.

Levantei e quando ia abri-lo a campainha tocou,


fazendo com que eu deixasse o conteúdo para depois.

Segui até o portão da casa e o abri.

— João? — falei surpresa ao vê-lo parado do lado de


fora.

— Oi, posso entrar? — Ele estava lindo com as mãos


nos bolsos da calça e exibia uma carinha de cachorrinho
abandonado.

— Claro. É... A Samira saiu com o Rodrigo — falei


abrindo o portão para ele entrar e tentando entender o que
fazia ali.

— Eu sei, liguei para o Rodrigo e ele me disse, então


vim aqui te fazer companhia. — Deu de ombros, sorriu e eu
vi as benditas covinhas lindas.

Eu tinha fetiche por sorrisos.

— Legal. Bom, é... O que vamos fazer então?

Entramos na sala.

— Vamos pedir uma pizza? Ou você quer sair para


comer?
— Não, prefiro ficar aqui. Estou sem um pingo de
vontade de me arrumar.

— Tudo bem, então. Ficaremos aqui.

Pedimos uma pizza e enquanto a esperávamos


chegar conversamos e vimos um filme. A pizza chegou,
comemos e seguimos conversando sobre tudo, menos sobre
o Gu.

Sempre me dei bem com o João desde a primeira


noite, ele era muito agradável, fácil de conversar e me fazia
rir. Inclusive, até me parecia a escolha certa desde o
começo, mas eu insisti em escolher a errada.

Após a pizza, achamos uma garrafa de vinho da


Samira e decidimos dar uma animada na noite. Esvaziamos
a garrafa e tudo ficou mais engraçado, mais leve e a dor
diminuiu.

Até entendi o motivo de Gustavo beber sempre que


tinha suas dores.

Em um momento ríamos de uma história que o João


contava da época de faculdade e quando a história acabou,
um silêncio constrangedor se instaurou entre nós.

Olhos nos olhos e tive que engolir a tensão que


encheu o ambiente.

Até que de repente não sei se minha boca foi até a


dele ou a dele até a minha, apenas sei que quando dei por
mim estávamos nos beijando.

Primeiro o beijo começou devagar, quase como se


ele estivesse com medo da minha reação, depois o clima foi
esquentando e quando percebi, já estávamos como loucos.
Ele com mãos por todo o meu corpo, arrancou minha
blusa e eu a dele. Ficamos nus e fizemos sexo, sem pensar
nem no passado ou no futuro, não pensamos em ninguém e
muito menos em nós mesmos.

Quando tudo acabou, a bebedeira passou e a


consciência do que eu tinha feito chegou, percebi que foi
bom, mas definitivamente ele não era a escolha certa.
Descobri também que a bebida diminuía a dor somente no
momento, no instante em que a consciência voltava, a dor
ainda estava ali.

João foi embora com um sorriso feliz no rosto e com a


promessa de nos vermos no dia seguinte.

Voltei para o quarto e encarei o envelope que o


Gustavo me mandou, não queria intensificar minha dor,
então o deixei no mesmo lugar e consegui forças para não o
abrir.

Por medo de ler ali algo que me faria sofrer mais,


decidi só não abrir, só que os dias se passaram e por fim ele
acabou caindo no esquecimento.

Depois daquela primeira noite, passei a ver o João


todas as seguintes. Não fizemos mais sexo, pedi um tempo
para ele, que atendeu.

Gostava do João, mas meus amigos diziam que eu o


estava usando como bengala, para me apoiar e esquecer a
dor e o que eu sentia pelo Gu. E isso me deixava culpada.
Já fazia uma semana que estávamos saindo, às
vezes, pensava que parecia ir rápido demais, porque nem o
Gu, quando morávamos no mesmo apartamento eu via
todos os dias, enquanto o João ia me ver sem folga.

Como ele não estava livre todas as noites, me


pegava na faculdade e ficava um pouco comigo durante a
tarde. De vez em quando faltava a Angels para ficarmos
juntos. Soube que o Gu ainda não sabia do nosso
envolvimento.

Na segunda saímos para jantar e quando chegamos


ao restaurante ele encontrou com um amigo e me
apresentou como sua namorada. De início, me senti
estranha e achei que João estava colocando o carro na
frente dos bois, mas não o contrariei e assumi o posto de
namorada do João.

Tudo seguia rápido demais e eu me sentia tão


estranha em relação a isso. Sentia-me pressionada, mas
simplesmente não conseguia dizer não.

Certa noite João chegou com o lábio sangrando, me


contou que o Gu soube que estávamos juntos e parecia até
culpado e triste pela situação.

Naquela noite não consegui ficar com ele, me senti


péssima por ser o pivô da briga dos amigos e inventei uma
dor de cabeça. Não sabia se João havia notado a mentira,
mas também pensei que se notou, eu não podia fazer muita
coisa sobre isso.

Na manhã seguinte fui para faculdade e seguia em


direção ao meu carro, junto com meus amigos, quando olhei
para frente e Gustavo encontrava-se encostado a ele.
Meu coração pulou uma batida quando meus olhos o
viram, minha respiração ficou ofegante e senti minhas
pernas bambas, fazia dias que não o via e ele continuava
maravilhosamente lindo e tendo o mesmo efeito sobre mim.

Usava óculos de sol pretos e uma camisa polo


vermelha, que o deixava parecendo um modelo.

— Disfarça, Fofa, seu namorado agora é o João.

— Mas não é ele que ela ama, né, Sá? Só que a Lívia
tem o poder de se meter em confusão.

— Não tenho namorado e fiquem quietos os dois —


repreendi Samira e Igor que eram team Gu mesmo ele
fazendo tantas merdas. Segundo eles, eu fazia a quantidade
de merda igual.

Andei mais alguns passos e cheguei até meu carro,


lutando para não demostrar o quanto Gustavo me afetava.

— Oi — cumprimentei séria.

— Oi. — Tirou os óculos de sol e me encarou.

— Tudo bem?

— Não.

Engoli seco.

— Bom, eu aceitei o presente de vez, como você


pode ver — mudei de assunto apontando para o carro e
tentei sorrir, mas meu sorriso não atingiu os olhos. Gu não
me encarava.

— Só vim aqui para ouvir de você, Lívia. Você e o


João realmente estão namorando?
— Não é bem assim...

— Está ou não está. Sim ou não, simples assim Lívia.

— Sim — falei em um sussurro sem olhá-lo.

Senti-me péssima.

— Olha você não conhece o João, ele tem problemas


com relacionamentos. Sempre foi do tipo galinha, que pega
geral e quando encontra um brinquedinho um pouco mais
difícil de conquistar, ele briga até conseguir e aí então,
enjoa e joga fora. Estou te dizendo isso, porque com você
ele já está no estágio em que ele consegue o brinquedo o
próximo passo vai ser te trocar por outro.

Apertei os lábios para não chorar e ele continuou:

— Eu te amo... amei tanto... Só não soube lidar com


o sentimento. — Olhei para ele e vi que me deu um sorriso
sem graça. — Seja feliz, Lívia. E não se esqueça de que se
precisar, estou sempre disponível.

Passou o dedo pelo contorno do meu rosto, virou as


costas e saiu andando, me deixando ali, acabada. Igor e
Samira que estavam distantes vendo toda a cena, se
aproximaram e me abraçaram.

— Amiga, você tem certeza do que está fazendo? —


Samira perguntou.

— Não sei — respondi chorando. — Mas eu e o Gu


não nascemos para dar certo, prova disso é que nascemos
até na mesma família, nossos destinos não é ficarmos
juntos, gente.
— Ah, amiga, para com isso. O que faz o destino é
cada uma das nossas decisões.

— E o que eu faço com o João? Eu não quero magoá-


lo.

— Meu Deus, Lívia! Para de pensar nos outros e


pensa em você. Você está sempre pensando no que a sua
família vai pensar, no que a Vivi vai sentir, em como o João
vai ficar. E você, o que você quer? — Igor falou e tinha
razão.

— Quero ser feliz.

— Então seja, amiga. Seja feliz com a piroca do João,


com a do Gu ou com uma piroca desconhecida. O
importante é você estar feliz com piroca ou despirocada e
louca como nós.

Ri alto enxugando uma lágrima, enquanto


entrávamos no carro para irmos embora.

— Falando em piroca, você ainda não nos contou


como é a piroca do João. — Igor disse para me animar.

— Pelo amor de Deus, Igor! Pode parar, muito


desnecessária essa informação.

— Desnecessária? Não, senhora Lívia, é muito


necessária, já que nunca vou ver mesmo. Falando nisso, ele
já sabe que sou gay?

— Não ainda — respondi.

— Por isso que sempre me encara querendo me


matar e faço questão de me fingir de macho na frente dele.

— Por isso me abraça forte e até parece hétero. — Ri.


— Sim, gosto de fazer ciúmes para ele. Sabe, o João
é lindo pra cacete, o sonho de toda mulher e homem. — Riu.
— Mas sempre parece que ele está em busca de algo que
não encontra... não sei. Prefiro que você escolha a piroca do
Gu.

— Genteeee, por favor, vamos parar de falar de


pirocas, tá? — falei abanando as mãos.

— Tá, só mais uma coisa e paramos — Samira disse


pensativa. — Você já deu para dois Angels, eu dei para um,
se juntarmos nós duas, pegamos quase todos, falta eu
experimentar o Fernando para podermos empatar e
confirmar se realmente eles todos são bons de cama e de
pirocas.

Rimos.

— Você é muito piranha, Samira — Igor disse rindo.


— Mas eu queria poder confirmar também.

— Sossega, viado. — Samira usou o apelido como se


chamavam, gargalhando. — Mas acho que com o Fernando
não vai rolar, soube que ele está passando por uns
problemas de família e tem uma noiva que até então,
ninguém sabia que tinha.

— Noiva? — Eu e Igor perguntamos juntos.

— Sim, mas deixemos isso pra lá, eu nem podia


contar, porque o Rodrigo que me contou. Vamos esquecer o
Fernando.

— E ele é mestiço também, né? Sabe como é. — Igor


fez sinal de pequeno juntando o indicador com o polegar.

— Igorrrr... — Eu e Samira gritamos e rimos alto.


— Que idiota! — falei.

— Meninas, que tal almoçarmos juntos, antes de eu ir


para o trabalho?

— Sim! — Eu e Samira concordamos.

E aquela conversa maluca com meus bests, fez com


que eu esquecesse a confusão da minha vida amorosa por
hora. Ao menos por hora.
Gustavo
Trabalhar era impossível, não aguentava olhar para
cara do João. Brigamos feio mais uma vez por causa da
Lívia. O que também me doía, porque sempre fomos
amigos.

Fernando e Rodrigo decidiram que não nos


encontraríamos mais e preferi assim, já que todas as vezes
que olhava para ele, sentia vontade de quebrar sua cara.
Amigo fura olho do caralho.

Carregava a certeza de que ele ia fazê-la sofrer, mas


infelizmente não podia fazer nada para impedi-lo. Lívia não
me queria mais e ouvir da sua boca que estava namorando
com o João, me quebrou.

Eu tentava seguir em frente, mas todas as noites a


bebedeira me atingia e acordava péssimo no dia seguinte.

Minha mãe passou em casa de surpresa, não viu a


Lívia e fez milhões de perguntas sobre ela. Eu continuei com
a mentira de que ela ainda morava comigo e que estava
tudo bem, mas a minha mãe percebeu que eu não me
sentia nada bem.

Meu pai, que também passou no ap, quis ter uma


conversa de homem para homem, me abraçou e disse que
eu poderia contar qualquer coisa para ele, que me apoiaria.
Lutei contra a vontade de contar tudo e lutei contra as
lágrimas, o que o fez ter certeza de que algo de errado
realmente estava acontecendo.

Nada me fazia esquecê-la. Nada de porra nenhuma


me fazia esquecer o amor que me maltratava dia e noite.
Enviei uma carta com todo o meu coração e ela
simplesmente não respondeu, os dias se passaram e nada
dela falar comigo.

Tentei sair com outras mulheres, mas era tão difícil,


nenhuma se comparava a ela, nem tinha sua alegria ou seu
sorriso lindo que me iluminava e menos ainda aqueles olhos
lindos.

Enquanto dirigia para Angels, Beatles cantava alto


Don´t let me down no rádio do carro e me fazia sentir que
estava no fundo do poço quando ouvia aquelas malditas
músicas românticas, que matariam qualquer um de fossa.

Que Droga!

Dei um soco no volante e pensei que se soubesse


que amar era essa bosta, nunca tinha me apaixonado pela
Lívia, mas novamente conclui que me apaixonar por ela foi
inevitável.

Parei no semáforo na esquina da Angels, quando o


movimento de um casal na calçada me chamou atenção e
quando olhei, vi o João tocando o rosto de uma moça. Ele
sorria com olhar de caçador.

Filho da puta, ele está fazendo de novo.

O farol abriu para mim e entrei no estacionamento


da Angels. Assim que parei, encontrei com o Fernando e
perguntei:

— E aí, mano, me deixa perguntar: João e Lívia ainda


estão juntos?

— Esquece, cara, deixa pra lá — respondeu, dando


tapas nas minhas costas.
— Fernando, escreve o que eu estou falando, se o
João magoar a Lívia eu mato ele.

— Eu ajudo você a matar.

Fernando estava olhando para uns papéis e parecia


triste. Esqueci meus problemas por hora e tentei ajudar
meu amigo.

— E você, está bem?

— Problemas, cara. Minha mãe e essa mania que ela


tem de controlar a minha vida. Minha avó tenta me ajudar,
mas tá difícil.

— Ainda aquele lance do casamento? Rodrigo me


contou. — perguntei.

— Ainda e cada vez me enrolo mais. Acho que estou


apaixonado. Mas deixa isso pra lá outro dia enchemos a
cara e te conto tudo.

Sorri para ele e dei uns tapas de macho nas suas


costas.

— Se precisar desabafar, tô aqui, cara.

— Tudo bem. Obrigado.

A hora da reunião chegou e foi tensa. Não conseguia


olhar para cara do João que minha mão formigava. Tive que
me conter, respirei fundo e contei até dez diversas vezes.

Não fazia ideia sobre o que era a reunião, ouvi mais


ou menos alguma coisa sobre a nossa ideia antiga de
abrirmos uma filial da Angels no interior, mas não dava a
mínima para nada do que eles falavam.
Não estava mais aguentando ficar na mesma sala
que o João. Não sabia o motivo de Rodrigo e Fernando terem
desistido da ideia de nos manter longe, por mim não olhava
para cara dele nunca mais.

— Preciso de férias — falei alto interrompendo a


reunião e seja lá o que era que falavam.

— Como assim, cara? — Rodrigo perguntou.

— Férias, licença, afastamento ou descontem da


minha parte dos lucros esse meu distanciamento. Seja lá o
que vocês decidirem eu concordo, preciso dar um tempo
daqui. — Mantive-me de cabeça baixa e ouvi o João soltar
um grunhido de desdém. Na mesma hora olhei para ele com
raiva e Rodrigo interferiu.

— Por mim, tudo bem. Pode tirar o tempo necessário.

— Por mim, também — Fernando concordou.

— Então está tudo certo, temos a maioria. Vou para


Cananéia, hoje — falei impedindo João de dar a sua opinião
e me levantei sem esperar o final da reunião.

Fui para casa e jurei para mim mesmo que esse


tempo serviria para esquecer a Lívia e voltar a vê-la
somente como prima.

Primos. Somente primos. Ia doer, mas um dia


passaria.
Capítulo quarenta e um
Lívia
Os dias passavam depressa, voavam sem que eu os
vivesse como deveria.

Soube que Gustavo tinha ido para Cananéia e se


afastado do trabalho. Pensei ser melhor assim, toda
distância existente entre nós, seria bem-vinda, para quem
sabe daquela vez, eu conseguir esquecê-lo.

Tentava ser uma boa namorada para o João, mas


nosso namoro seguia morno. Antes ele me via todos os dias,
depois eu nem o via mais. Às vezes, me sentia culpada, mas
dava graças a Deus quando não nos víamos.

Por mais que eu tentasse me entregar ao


relacionamento, cada vez mais, sentia que estava fazendo a
coisa errada, mas era só eu relembrar tudo que Gustavo me
fez passar que acabava voltando a pensar que o João era a
escolha certa.

Meus amigos me diziam para terminar com o João e


me afastar tanto dele, quanto do Gu, que nenhum deles me
merecia, mas eu não conseguia terminar com o João, tinha
medo de fazê-lo sofrer.

Era como meus amigos diziam: eu pensava demais


nas pessoas e esquecia de pensar em mim. Até conseguia
ouvir as vozes de Igor, Samira e Vivian me dizendo isso.

Cheguei da faculdade sozinha, porque Samira foi se


encontrar com sua mãe no shopping e então aproveitei a
solidão para organizar meu quarto. Precisava ocupar minha
mente e fazer faxina era algo que me distraía.

O rádio tocava divas, alto e em bom som. Sabia que


morar com a Samira só podia dar nisso: me tornei mega fã
da Toni Braxton.

A limpeza me fazia bem e eu até sentia-me mais


leve. Atingi alguns agudos da Celine Dion, dancei erguendo
a mão espalmada estilo Mariah Carey, enquanto com a
outra mão puxei o pano que enfeitava a cômoda e no
mesmo instante vi cair no chão o envelope que o Gu me
enviou pelo Rodrigo semanas antes. Uma tristeza súbita me
atingiu.

Abaixei, peguei o envelope e fui para sala. Sentei-me


no tapete encostada ao sofá e olhei fixamente para o
envelope.

— Abrir ou não abrir? — pensei alto.

Vamos lá, Lívia. Coragem, mulher! Ok. Vou abrir.

Rasguei a aba do envelope de papel pardo e assim


que o virei para baixo consegui ver o que tinha. O filtro dos
sonhos junto com a pulseira que ele me deu no meu
aniversário caíram lá de dentro e a etiqueta com a frase “Só
você tem o controle da minha vida” também estava lá.
Tampei a boca com a mão e comecei a chorar.

Todas as emoções daquele dia voltaram e lembrei o


quanto ele foi perfeito e carinhoso, foi o príncipe que
sempre sonhei.

Retirei a carta do envelope e comecei a ler mesmo


lutando contra as lágrimas que embaçavam a minha visão.

Lívia

Sei que toda desculpa que eu te pedir, não vai


apagar sua tristeza e as cenas que estão em sua memória,
te lembrando incansavelmente de toda a dor que a fiz
passar. As que eu vi também estão na minha, me
lembrando de que não sou o único homem que é
completamente apaixonado por você.

Está difícil esquecer as mãos de outro sobre você e


sei que não justifica. O que fiz foi muito pior e só agora
consigo ver isso, mas lembre-se sempre: eu te amo.

A distância de você está me fazendo sofrer, mas


também está me fazendo uma pessoa melhor e sei que o
meu jeito impulsivo de ser, será amenizado.

Estou tentando melhorar por você, mesmo que não


me queira de volta eu sempre estarei aqui para quando
quiser.

Esses dias peguei carona com a Samira quando ela


saía da Angels e eu estava bêbado demais para dirigir. Ouvi
uma música enquanto ela me levava para casa, que me fez
lembrar de você. Sei que as músicas melosas que ela ouve,
pode não parecer muito másculo, mas se é pra ter você de
volta eu abro mão da minha masculinidade.
Olha, eu estava tão bêbado que acho que chorei... e
no ombro dela.

A música fala por mim.

Samira não me contou sobre isso. Coloquei a música


que estava escrita para tocar ao mesmo tempo que eu lia a
letra traduzida.

Música Back At One – Brian Mcknight

De Volta ao Um

É inegável que devemos ficar juntos


É inacreditável como eu dizia que jamais me apaixonaria
Você precisa saber
Se já não sabe como me sinto
Então deixe-me mostrá-la agora que eu estou falando sério
Se todas as coisas, na hora certa, o tempo revelará
Sim...

Um: você é como um sonho que se tornou realidade


Dois: só quero estar com você
Três: Garota, é evidente
Que você é a única para mim
E quatro: repita os passos de um a três
Cinco: e se apaixone por mim
Se algum dia eu achar que meu trabalho está terminado
Então voltarei para o primeiro passo
Sim...

É tão incrível como as coisas acontecem sozinhas


É tudo emocionante quando você descobre do que se trata,
ei
E é indesejável que nós fiquemos separados
Eu jamais teria ido muito longe
Porque você sabe que tem as chaves do meu coração
Porque...

Um: você é como um sonho que se tornou realidade


Dois: só quero estar com você
Três: Garota, é evidente
Que você é a única para mim
E quatro: repita os passos de um a três
Cinco: e se apaixone por mim
Se algum dia eu achar que meu trabalho está terminado
(Então voltarei para o primeiro passo)

Diga adeus a escuridão da noite


Eu vejo o sol se aproximando
Sinto-me como uma criança cuja vida está começando
Você chegou e trouxe uma vida nova dentro deste meu
coração solitário
Você me salvou
Na hora exata

Um: você é como um sonho que se tornou realidade


Dois: só quero estar com você
Três: Garota, é evidente
Que você é a única pra mim
E quatro: repita os passos de um a três
Cinco: e se apaixone por mim
Se algum dia eu achar que meu trabalho está terminado
Então voltarei para o primeiro passo

Ainda te amo, minha princesa, volta pra mim?

Seu Gu.

Desliguei a música e pensei como pude demorar


tanto para ler a carta? Ele deve ter ficado arrasado quando
não respondi.

Ele me ama e eu ainda o amo. O amo tanto...

Mas eu podia perdoar tudo o que ele me fez? E o


João?

Fechei meus olhos e tentei respirar para não agir por


impulso. Apertei replay e a música começou a tocar de
novo, de novo e de novo.

Depois da milésima vez que ela tocava sem parar,


decidi me levantar e pensei que eu precisava ver o João e
tentar controlar a vontade de correr atrás do Gustavo.

Usar o João de bengala, era muito feio, mas era a


única coisa que me segurava para não correr atrás do Gu e
perdoá-lo.

Mesmo com toda tristeza que passei e de ter me


magoado tanto, eu ainda o amava e a carta me mostrou o
quanto ele estava arrependido.

No entanto, minhas emoções seguiam em conflito,


porque tinha meu orgulho e não podia perdoá-lo tão
depressa.

Pensei que eu também o fiz sofrer me juntando ao


João em seguida ao nosso término e isso, com certeza, o
magoou.

Ahhh... Não quero mais pensar.

Olhei o relógio já passava das seis, era quase noite e


eu sabia que ultimamente o João chegava sempre muito
cedo à Angels.
Liguei para meus amigos e os dois não podiam sair
comigo naquele dia, Samira ainda demorava a chegar e Igor
já tinha compromisso, então me arrumei e rumei para
Angels sozinha.

Cheguei lá e subi direto para o escritório, precisava


ver o João e desejava que ele tirasse de mim a vontade de
ver o Gustavo, de beijá-lo e de perdoá-lo.

Não! Eu não podia perdoá-lo, ele era meu primo e


tinha que esquecê-lo.

Sentia-me tão eufórica e não conseguia tirar a


bendita música do Brian Mcknight da cabeça.

Assim que cheguei ao andar de cima abri a porta da


sala do escritório sem bater e fiquei sem fala. João estava
deitado no sofá em cima de uma mulher a beijando.

Filho da puta!
Gustavo
Fui para Cananéia e tentei curtir minha família e não
pensar na Lívia. Eu precisava superar aquele
relacionamento que não deu certo e viver como se quem
quebrou meu coração não tivesse sido minha prima.

Minha mãe e meu pai continuavam notando minha


tristeza e me perguntavam insistentemente o que estava
me deixando assim, pensei em contar, mas não contei,
porque sabia que a Lívia não ia gostar.

E ainda faço todas as vontades dela.

Encontrava-me sentado em um bar, de frente para o


mar e de óculos escuros. Pensava em como fui me meter
naquela confusão?

— Gu.

Virei-me e ao meu lado Sarah estava parada e me


olhando.

— Oi, Sarah.

— Oi, estava mesmo querendo falar com você.

— Senta aí. — Apontei a cadeira.

— Você não está bem, não é? — Ela me encarava


com carinho. — Soube pela sua mãe e logo imaginei que
fosse algo sobre a Lívia.

— Sim, tá foda e estou aqui para dar uma distância.


Não estou nem um pouco bem, mas vou ficar.
— Sei que você a ama e te ver sofrendo assim está
me deixando muito triste. Sei que quando a Lana se casou
com o Jonas e você quis me chamar de tia eu não deixei,
porque me sentia uma velha. — Ela sorriu e eu sorri junto.
— Mas te considero meu sobrinho igual à Lívia e o que
quero é que você seja feliz.

— Estou tentando, mas está tão difícil.

— Olha, quando minha irmã e o Jonas começaram a


namorar foi um rolo danado e nunca vi um namoro tão
confuso, mas no fim deu tudo certo. Pense positivo vai dar
tudo certo para vocês também. Juntos ou separados.

— Preferia que fosse juntos. — Sorri para ela.

— Eu também. No aniversário dela me diverti muito


com seu ciúme e o jeito como você a olhava.

Bufei e ri.

— Essa porra de amor devia ser proibida.

— Olha a boca, menino.

— Desculpa, tia.

— Nem pensar. Nem vem com isso de tia agora, não


deixei você me chamar de tia quando era um menino, não
vou deixar agora que é um marmanjo.

Sorri para ela.

— Tá certa — concordei.

— Mas, Gu, pensa positivo que tudo vai dar certo. —


Ela apertou minha mão com carinho e eu assenti em
resposta.
Sarah era mesmo como uma tia para mim e foi bom
conversar com ela. Era engraçada e carinhosa e nunca quis
nem que a Lívia a chamasse de tia, mas tia Lana foi tão
persistente em ensinar a Lívia, que Sarah não teve como
lutar.

Nós conversamos mais algumas coisas banais e em


nenhum momento ela quis saber o que de fato aconteceu
conosco e depois de algum tempo apenas se despediu,
desejando que tudo se resolvesse e levantou-se para ir
embora.

A noite começava a cair e eu ainda me via no mesmo


lugar, com minha água de coco e pensava que só queria
mesmo ficar bem.

Parece que estou escrevendo letra de música


sertaneja. Amar me deixou brega pra Caralho!

Só quero esquecer... Só esquecer.

Meu celular começou a tocar e na tela apareceu o


sorriso mais lindo do mundo, o da Lívia.

Encerrei a chamada e preferi não atender. Só queria


esquecê-la.

Deixei o celular tocar até cair na caixa postal. Só


precisava esquecer.
Capítulo quarenta e dois
Lívia
— João?

Ele me olhou assustado e saiu de cima da mulher,


que continuou inabalável deitada no sofá, e andou em
minha direção.

— Não é o que parece ser — teve a cara de pau de


me falar.

— É exatamente o que parece ser. Bem que o Gu


tentou me avisar que você era assim. Eu fui só mais uma
conquista, que no início era difícil e você me viu como um
desafio, assim que conseguiu o que queria, perdi a graça,
não foi?

— Não, não foi. Lívia... Foi um deslize... que eu


sempre cometo por mais que eu não queira. Gosto muito de
você... Droga! — Ele parecia arrependido, mas eu não sabia
dizer com certeza.

Sentia-me em um misto de alívio e decepção, além


de confusa.
— João, eu não perdoo traição. E sabe, estou me
perguntando se valeu a pena para você insistir tanto em
ficar comigo, me beijar sem que eu quisesse e fazer com
que eu e o Gu nos separássemos, para depois fazer isso.

Olhei para moça que parecia sem entender nada e


ainda estava no sofá. Coitada, nem sabia que ele era
comprometido.

— Não sei o que acontece comigo, Lívia. Eu sou


assim, não consigo levar um relacionamento até o fim.
Quando eu te vi a primeira vez, achei que era você, mas
nessa última semana, novamente me senti confuso e sei
que você não me ama, sei que ainda ama o Gustavo, aí isso
acabou me levando a conhecer outra pessoa.

— A culpa é minha agora? Inacreditável — falei


virando de costas e depois voltando-me para ele
novamente.

Eu chorava, mas não sabia se por João ter me traído


ou se por eu ter dado a chance de isso acontecer. Se por ele
ter estragado o meu relacionamento com o Gu ou por eu ter
o perdoado mesmo assim e ainda ter ficado com ele. Eu
devia estar cega. Eu era uma idiota e precisou que João
esfregasse a traição na minha cara para que eu visse isso.

— A culpa não é sua, me desculpa, sabe...

— Para, João — falei o interrompendo. —, parece que


com essa confusão toda fui levando a minha vida no piloto
automático e não pensei no que eu estava fazendo. Fiquei
com você, porque achei que era apaixonado por mim e
pensei que era uma boa pessoa... — Ri sem vontade. —
Você foi culpado por todo o sofrimento que eu passei. Foram
os seus atos que desencadearam vários acontecimentos
que me fizeram sofrer, mas quer saber? Vai se tratar e
cresce. Se você tem problemas com relacionamentos, eu
não quero ser mais um teste desse seu mundinho. Volta ao
passado e resolve esse problema.

— Lívia...

— E quer saber de mais uma coisa? Não te desejo


mal, desejo que você encontre o amor verdadeiro e que
assim você aprenda a amar de verdade. — Virei-me e saí da
sala o deixando embasbacado.

O sentimento de decepção ainda prevalecia, mas


também estava me sentindo como se um peso tivesse saído
das minhas costas, afinal, não precisava mais levar um
relacionamento, apenas por medo de magoá-lo. Ele me
magoou antes.

Entrei no carro, olhei para o meu celular e pensei em


ligar para o Gu.

Desisti imediatamente.

A vontade de ouvir a voz dele falou mais alto e liguei.

O telefone tocou, tocou, tocou e ele não atendeu,


então coloquei o celular no banco do carona e voltei para
casa.

Assim que entrei na sala da casa da Samira, lá


estava ela, me olhando com carinha de cachorro que caiu
do caminhão da mudança.

— Me desculpa, amiga? Eu já sabia desde ontem,


mas estava pensando em como te contar. Fiquei sabendo
sem querer pelo Rodrigo e agora foi ele que me contou que
você acabou de descobrir.
Assenti e sentei-me no sofá ao lado dela.

— Ai, amiga, fala alguma coisa — falou pegando a


minha mão. — Não fica brava comigo.

Fechei os olhos soltando o ar.

— João filho da putaaaaaaaa... — gritei.

Ela me olhou assustada, depois sorriu e eu sorri


junto, logo estávamos gargalhando.

— Você não está triste? — Samira perguntou.

— Não, na verdade, estou aliviada por me livrar


desse namoro estranho.

— Que bom.

Dei de ombros.

— Acho que estava com ele mais porque não sabia


como terminar e não queria ficar sozinha por medo de
voltar para o Gustavo. Estou triste por ter sido chifrada de
novo. O que será que tem de errado comigo? Todos os
homens me chifram. Devo ter sido uma vaca em outra vida.

Ela riu.

— Não pira, Fofa, não tem nada de errado com você,


amiga. E o Gu não te chifrou.

— Para de defender ele.

— Acho que você e o Gustavo deveriam conversar e


resolverem isso. Vocês dois estão separados por causa do
idiota do João, que te queria tanto a ponto de estragar seu
namoro, para depois te trair com outra.
— Verdade... mas o Gu me magoou tanto. — Pensei
por um instante — Não me traiu, mas na mesma noite que
terminamos, já estava dormindo com outra.

— Ah, fofa, ele só dormiu. Sei, porque ele contou


para o Rodrigo, que me contou.

— E depois ele ficou com a curupira no apartamento.

— É, nisso ele foi muito idiota, quis matar ele —


Samira falou brava. — Mas sabe, ele transou com ela depois
que vocês já tinham terminado, assim como você transou
com o João. Vocês estão empatados. — Ela sorriu

— Não acho que estamos empatados, ele foi muito


mais idiota.

— Olha, acho que vocês dois aprenderam com os


erros, por serem impulsivos e ciumentos e deveriam tentar
de novo.

— Será?

— Eu acho. — Sorriu para mim.

— Não sei... Mais uma chance? Quantas vou ter que


dar?

— Quantas seu coração desejar. Acho que o Gu


aprendeu com os erros dele e dessa vez vai dar certo.

— Tem razão. Espera aí. — Levantei-me e com ela me


olhando, fui até meu quarto, fiz uma mochila pequena para
passar a noite em Cananéia e voltei para sala.

— Aonde você vai, Fofa?


— Atrás do amor da minha vida, chega de correr da
minha felicidade, chega de lutar contra o meu destino. —
Dei um beijo nela, passei a mão na chave do carro e gritei
da porta. — Não me espere.

— Assim que se fala, garota! Boa sorte — gritou,


respondi soprando um beijo e fechei a porta atrás de mim.

Decidida a recomeçar, segui para Cananéia atrás do


meu anjo.
Gustavo
Fiquei mais um tempo no bar, me martirizando por
não ter atendido a chamada da Lívia. Pensei que eu podia
ter atendido só para ouvir a voz dela, mas aí, me lembrei de
que ela era namorada do João e ao contrário dele, eu não
ficaria com ela sendo namorada dele.

Meu celular tocou novamente, peguei-o de pressa,


mas era o Rodrigo.

— Fala, Rodrigo.

— E aí, Gustavo. Tudo bom?

— Ah, mais ou menos, vocês sabem como está sendo


difícil.

— Sei e por isso nunca vou me apaixonar, isso é para


os fracos.

— Você já está apaixonado.

— Tô nada, mano.

Ri.

— Tá, vamos dizer que não, mas quero só ver quando


acontecer com você. Ainda vou te ver chorando por mulher.

Ele riu, porém, eu sabia que algo já estava


acontecendo.

— Impossível! Desse mal não vou sofrer. Mas, Gu,


estou ligando para falar que a Lívia pegou o João com outra
mina, cara.

João imbecil. Até que demorou.


— Sabia que ele ia fazer isso. Ele sempre faz. Falei
para o Fernando que mataria o João se ele a magoasse.

— Fica calmo.

— Ela está muito triste?

— Acho que não, ela está indo aí te ver. Samira vai


arrancar meu saco se descobrir que te contei, mas acho que
você deveria saber.

Senti meu coração bater mais rápido.

— Me ver? Agora?

— Sim. Você sabe que ela te ama. Acho que estava


com ele só por comodismo mesmo.

Ri sem vontade.

— Não sei se quero isso. Mas obrigado por me avisar.

— Por nada. Vê se não faz merda, porque tô


parecendo uma Maria fofoqueira nessa sua história com ela.
Fico sempre contando as novidades de um para o outro.

— Pode deixar. Não sei o que vai acontecer, acho que


não temos mais volta, mas agradeço por me contar.

— Tamujunto, mano. Sei que ainda vou ver vocês


namorando de novo.

Ele desligou e pensei: Ela só está vindo para mim,


porque ele a traiu, só por isso.

Fiz-me diversas perguntas e a principal era se ela


teria me procurado se o namoro deles ainda estivesse às mil
maravilhas.
Eu não queria ser o consolo de ninguém, queria que
ela ficasse comigo por me amar.
Lívia
Dirigi muito rápido até Cananéia, mesmo com meu
medo de dirigir, enfrentei o trânsito que graças a Deus
estava tranquilo. Tudo para recuperar o amor do meu amor.

Parecia que ia chover e detestava dirigir na chuva.

Fui um pouco mais rápido e assim que cheguei à


Cananéia, peguei o caminho para casa do tio Nic. Parei na
esquina mais próxima e liguei no celular do Gu, que atendeu
no primeiro toque.

— Lívia?

Pude sentir o quanto ele encontrava-se apreensivo


assim que ouvi a sua voz.

— Gu, estou parada na esquina da casa dos seus


pais, você pode vir até aqui?

— Estou indo.

Provavelmente já sabia que eu estava a caminho,


Rodrigo devia ter contado.

Ansiosa o esperei e os raios começavam a brilhar no


céu escuro.

Não demorou muito e lá estava ele: lindo, andando


de cabeça baixa e com o rosto sério.

Senti meu coração bater tão forte que parecia que ia


sair pela boca. Gustavo andava de cabeça baixa, ergueu os
olhos em minha direção e me viu.
Logo parou ao lado da minha janela e eu desci o
vidro.

— Oi — cumprimentou receoso.

— Entra aqui.

Deu a volta no carro, sentou-se no banco do carona e


olhou para frente sem me encarar.

— O que você veio fazer aqui, Lívia?

— Bom, para começar eu e o João terminamos. Eu o


peguei com outra. Você tinha razão, agora estou na fase
que ele enjoou do brinquedo.

Ele riu sem vontade e balançou a cabeça de um lado


para o outro.

— Eu preferia não ter razão. Na verdade, eu preferia


que você nem estivesse com ele.

— Foi tudo tão de repente, Gu e...

— Vou te fazer uma pergunta, Lívia, e gostaria que


você me respondesse com sinceridade — interrompeu-me,
eu assenti e ele continuou olhando para o para-brisa onde
os pingos de chuva já caíam. — Se você não tivesse
flagrado o João com outra, estaria aqui comigo agora?

Fiquei em silêncio e ele tomou o meu silêncio como


resposta.

— Eu sabia — falou abriu aporta do carro e saiu.

Também saí do carro e gritei indo atrás dele:


— Gustavo, espera. Essa história toda está me
matando.

— E você acha que para mim está fácil? Você acha


que é fácil ver a mulher que eu amo namorando com outro,
que era meu amigo, logo depois de eu tê-la enviado uma
carta com todo meu coração?

— Eu vi a carta hoje, Gu. E você acha que para mim


foi fácil ver o homem que eu amo transando com a ex-
namorada e levando uma antiga para o apartamento dele,
no dia em que terminamos?

Como nossas mágoas no olhar, nos encaramos.

— Nós dois nos magoamos muito e nossa história


desde o começo não era para dar certo, Lívia. Você mesmo
disse isso. Faz assim, volta para cidade e me deixa aqui.
Acho que a distância nesse momento é o melhor para nós
dois.

— Eu não quero mais ficar distante de você e estou


aqui, vencendo meu orgulho — falei baixo, mas ele ouviu e
se virou. — Esse namoro com o João foi um erro, fiquei com
ele para tentar te esquecer, para que ele fosse o motivo
pelo qual eu não correria atrás de você na primeira
oportunidade me arrastando e pedindo para voltar.
Perdoando tudo como uma boba que ama.

— Era tudo que eu queria. Só que você deixou tudo


sério com ele.

— Ele acelerou as coisas, me apresentou como


namorada e tudo se tornou mais difícil... difícil terminar,
difícil de voltar atrás, pensei que o magoaria e virou uma
bola de neve. Nunca senti nada por ele, Gu — falei tudo de
uma vez.
Gustavo andou até mim, passou a mão no meu rosto
e eu fechei os olhos para sentir o toque que eu estava com
tanta saudade.

— Lívia, estou com medo de sofrer mais. Sonhei


todos esses dias que você voltaria para mim, mas não quero
assim. Quero que seja minha, porque escolheu e não porque
pegou o João com outra. — Ele me deu um beijo na testa e
foi embora.

— Eu te quero, Gu — falei e o observei ir em direção


à casa dos pais, sem mais olhar para trás.

A chuva começou a cair, mais uma vez


testemunhando um dos nossos momentos decisivos. Foi
assim quando ele disse que me amava e assim naquele
momento, quando me mandou embora.

Voltei para o carro, chorando, encharcada pela chuva


e com o coração mais partido do que quando saí da casa da
Samira.

Droga, droga, droga!

Xinguei, chorando e deitando a cabeça no volante.

Depois de tentar respirar e conter um pouco as


lágrimas, enfim liguei o carro e parti de volta para casa,
mesmo com medo enfrentando a serra e o temporal que
caía.

Por um momento pensei em dormir na casa dos


meus pais, mas eles perguntariam o que estava
acontecendo e já que o Gustavo não me queria de volta,
não tinha por que soltar uma bomba na família. Sendo
assim, criei coragem e segui em direção a estrada que me
levaria de volta para cidade.
Durante o caminho a chuva ficou mais forte e o
limpador do carro não dava conta de se livrar das gotas que
caíam.

Eu continuava chorando e a minha visão embaçada


tornava difícil dirigir e meu medo de direção gritava alto ao
mesmo tempo que muitas perguntas na minha cabeça.

Por que eu fui atrás dele?

Por que o Gu foi para longe de mim?

Por que terminamos?

Por que não estamos felizes?

E por que diabos fui namorar com o João?

Era para eu estar feliz e não esse caco e essa


confusão de sentimentos.

Droga de vida!

Eu me sentia péssima e o choro era impossível


controlar.

Os faróis dos carros que seguiam no sentido


contrário batiam nos meus olhos cheios de lágrimas e me
faziam perder o foco da estrada. Precisava parar um pouco
já quase não enxergando nada.

Sabia que era perigoso dirigir com chuva, ainda mais


para mim que não tinha experiência.

Tentava respirar, controlar o choro e para minha


sorte, me lembrei de que existia um restaurante a mais ou
menos um quilometro de onde eu estava.
Lembrei-me de uma vez, quando Gu e eu éramos
pequenos e meus pais pararam naquele mesmo
restaurante, em um passeio que fazíamos nós quatro e eu
cismei que queria tomar sorvete.

Ri com a lembrança de quando Gu disse que não era


para eu tomar todo o sorvete sozinha, para não ficar com
dor de garganta, mas, a realidade, era que o safado só
queria tomar o meu e o dele. No fim, o meu caiu e ele disse
aos meus pais que não precisava comprar outro, que me
daria o seu.

A lembrança me fez chorar novamente, desde


sempre Gustavo me protegia e cuidava de mim.

Fechei os olhos por um segundo para sentir a dor de


não estar mais com ele, mas um segundo foi tempo demais.
Quando os abri novamente, vi um farol alto vindo em minha
direção e um clarão me cegou.

Tentei desviar, mas ao virar o volante rapidamente as


rodas subiram na parede de pedra lateral e o carro capotou,
me fazendo bater a cabeça e apagar com a escuridão
caindo sobre meus olhos e trazendo uma calmaria e paz
para o meu coração.
v

Capítulo quarenta e três


Gustavo
Como posso ser tão idiota?

Fiquei ali chorando pela mulher que eu amava e quando ela


foi atrás de mim, eu a mandei embora, mas minha consciência e
meu coração, não aceitavam ficar em segundo lugar e ser consolo
para Lívia.

Queria ser tudo na sua vida e queria que ela largasse tudo
e enfrentasse todos, para ficar comigo.

Eu olhava pela janela da sala, a chuva que caía estava


cada vez pior e pensei: será que Lívia foi para casa dos pais dela?

De repente senti meu coração bater mais rápido e


conhecendo-a como conheço, soube que ela não ia para lá só para
não ter que enfrentá-los.

Fui até meu celular e a liguei na esperança de que me


atendesse. Já tinha dado tempo de ela chegar pelo menos na
cidade.

O celular tocou, tocou e ela não atendeu, meu estômago se


revirou e um sentimento ruim passou por mim.

Liguei para Samira desejando que Lívia já estivesse com


ela, mas Samira disse que se encontrava em casa e a amiga ainda
não havia chegado.

O medo tornava-se cada vez maior. Lívia não tinha nada de


experiência em dirigir e muito menos com chuva. Brigamos e ela
estava nervosa. Eu era um burro, como pude tê-la deixado ir
embora sabendo que ela ia dirigir?

Não deveria ligar para tia Lana, mas pensei que talvez a
Lívia tivesse ido dormir lá e estava me preocupando à toa.

Fiz uma oração antes de discar e quando comecei a


procurar o número do telefone nos meus contatos, o rosto da Lívia
apareceu na tela.

Era ela me ligando. Graças a Deus.

— Oi, Lívia, até que enfim.

— Alô, senhor, desculpe. Aqui quem fala é a médica da


equipe de resgate. — Senti meu coração parar e a pessoa do outro
lado da linha continuou: — Infelizmente estou com uma jovem
acidentada na serra de Cananéia e olhando os documentos dela vi
que se chama Lívia. A última ligação no celular dela foi para você.
Qual seu grau de parentesco?

Fiquei mudo e senti como se o sangue fosse drenado do


meu corpo.

Eu sabia, eu estava sentindo.


— Senhor?

— Como ela está? — consegui perguntar.

— O que o senhor é dela? E qual o seu nome?

— Me chamo Gustavo. Sou o namorado dela. Como ela


está?

A médica socorrista começou a me passar as informações,


disse que ligar para família não era um procedimento de praxe,
mas viu o celular da Lívia tocar e resolveu fazê-lo, depois me
informou para onde meu amor seria levada.

Não conseguia acreditar no que acontecia e no meio do


telefonema minha mãe entrou na sala e ao me olhar parou
imediatamente de andar, esperou-me terminar a ligação me
olhando espantada.

O rosto dela transparecia o que estava estampado no meu.

Assim que desliguei tentei contar a ela sobre o acidente,


mas chorava desesperado e me trocava ao mesmo tempo.

Peguei a chave do carro para seguir para ao hospital e


minha mãe tentou me deter dizendo que eu estava nervoso
demais para dirigir. Mas a deixei chorando e com a difícil missão
de contar aos meus tios o que havia acontecido.

Era tudo culpa minha.

Eu não deveria ter dado o carro para ela, não devia tê-la
mandado embora. E se ela...

Não vou pensar nisso, ela não podia me deixar. Eu não


podia viver sem ela.

Dirigi feito um doido e quando cheguei ao hospital, estava


fora de mim em um transe de preocupação e medo de que algo
muito pior do que um término de namoro tirasse a Lili de mim.

Deus, não permita que ela morra.


Tentei de todas as maneiras conseguir notícias, mas
ninguém ali me dizia nada. Fui grosso com a atendente, briguei
com o segurança, disse que eu era o namorado dela e tinha o
direito de ter notícias, mas eu só consegui um olhar piedoso da
recepcionista que se comoveu com o meu desespero.

Sentei-me nas cadeiras na recepção, apoiei minha cabeça


em minhas mãos e mais uma vez fiz uma prece para Deus não
levá-la de mim.

— Gu?

Olhei para cima e vi tia Lana me olhando e ao lado o tio


Jonas a abraçava. Levantei-me e de pressa os abracei.

— Me perdoa, tio, é tudo culpa minha, eu não estava


cuidando dela.

— Não é culpa sua, Gu. Acidentes acontecem — meu tio


disse chorando.

— Ô, meu menino, não se culpe — tia Lana também tentou


me consolar chorando e em seguida meu pai, minha mãe e Sarah
entraram na sala de espera.

Tentava engolir minha vergonha e a culpa, para não contar


a todos o verdadeiro motivo pelo qual a culpa era minha.

— Já sabe notícias, Gu? — meu pai perguntou.

— Ainda nada, pai. Tentei de todo jeito saber, mas ninguém


me fala o estado dela.

— Namorado de Lívia Queiroz Vilar?

Levantei depressa e me apresentei, aí então o médico


começou a falar:

— Ela teve um traumatismo cranioencefálico, pela pancada


na cabeça. Fizemos uma tomografia de crânio onde não foi
encontrada nenhuma lesão cirúrgica. Ela ainda está desacordada,
mas só por causa do efeito dos remédios. Terá de ficar em
observação, mas está bem.

Respirei aliviado por saber que eu não ia perdê-la e


agradeci a Deus por atender meu pedido.

Chorando, mas tentando engolir o choro, voltei a me


sentar, sendo fitado por toda família.

Recebi um olhar sério do tio Jonas antes que ele se


apresentasse como médico e fosse se certificar com o colega de
que realmente estava tudo bem e sobre o real estado de saúde da
sua filha. Tia Lana o acompanhou.

Sentei-me ao lado do meu pai que me encarava como se


enfim eu tivesse contado o que me afligia todos esses dias, mas
não tive coragem de olhá-lo.

Após terminar a conversa com o médico, tio Jonas sentou-


se de frente para mim e me encarou, enquanto eu fitava o chão.

Não conseguia encará-lo e só quando passou o desespero


do acidente, que pensei que me apresentar como namorado não
foi uma boa ideia.

Na hora do desespero me senti mais como namorado do


que como primo.

— Namorado? — tio Jonas perguntou, observando cada


gesto meu e sendo acompanhado pela família toda.

Soltei o ar e apenas assenti.

— Desde quando?

— Tem uns meses, logo depois das férias que fomos a


Cananéia — falei ainda sem olhá-lo. — Mas não estamos mais
juntos, só me apresentei assim... sei lá...

— Era só fogo de palha? Vocês são primos, Gustavo!


— Jonas, não é hora nem o local para isso, eu já sabia e
posso dizer que não é fogo de palha — Sarah nos defendeu.

— Você sabia? — tia Lana perguntou para irmã.

— Eu a amo, tio. Me desculpa eu não deveria amar, pelo


menos não desse jeito, mas eu amo. A amo como nunca amei
mulher nenhuma. — Eu lutava para conter as lágrimas, apertava a
boca para me manter firme e ainda me mantinha sem olhar para
ninguém que estava ali, na sala de espera.

— Bem que desconfiei que algo estava errado — minha


mãe disse.

— Eu já sabia, só não tinha a confirmação, mas sabia que


esses dois estavam aprontando, como sempre — meu pai disse
rindo e arrancou um breve riso do tio Jonas que pareceu uma
lufada de ar.

— E por que terminaram se você disse que a ama? Ela não


te ama, Gu? — tia Lana perguntou.

— Muito complicado, tia, mas eu gostaria de pedir perdão a


vocês, por não ter cuidado dela como deveria. Esse acidente
aconteceu por minha culpa. Ela estava em Cananéia por minha
causa e eu não a aceitei de volta, fazendo-a voltar dirigindo
sozinha na chuva. Me perdoem? — A culpa tomou conta de mim e
comecei a chorar copiosamente ao dizer tudo em voz alta.

No mesmo momento tia Lana me abraçou e me apertou


como fez a vida toda. O soluços me sacudiam pelo choro intenso e
pelo medo de o pior acontecer com Lívia.

— Você não tem culpa de nada, querido. Como Jonas disse,


acidentes acontecem. — Ela também chorava.

— Fica tranquilo, Gu. Nada do que aconteceu é culpa sua —


tio Jonas disse, apertando meu ombro.

— Familiares de Lívia? — Uma enfermeira chamou e


acenamos. — Ela já pode receber visitas, mas duas pessoas por
vez.

Tio Jonas e tia Lana entraram apressados, mas antes de


irem de vez, tia Lana me deu um beijo, o que foi reconfortante.

— Fica tranquilo, filho, vai dar tudo certo — meu pai disse
apertando meu ombro.

— Com tanta mulher no mundo, você tinha que se


apaixonar justo pela sua prima, Gustavo? — minha mãe perguntou
com os braços cruzados.

— Não tinha como não me apaixonar por ela, mãe. Ela é


perfeita demais. Acho que sou apaixonado por ela desde que ela
nasceu.

Sarah abriu um sorriso e meus pais não disseram mais


nada, mas vi minha mãe virar o rosto e deixar um pequeno sorriso
surgir nele.
Capítulo quarenta e
quatro
Lívia
Abri meus olhos e encontrava-me em um quarto de
hospital, sentia dor na cabeça e no corpo todo, como se um
caminhão tivesse passado por cima de mim.

Não me lembrava de como fui parar ali.

Forcei a memória e a última coisa que surgiu em


minha mente, era de estar dirigindo na chuva e chorando
por Gu não me querer de volta.

E lembrar-me disso doeu mais do que a dor que eu


sentia na cabeça e no resto do corpo.

Assim que uma enfermeira percebeu que eu havia


acordado, perguntou como estava me sentindo, me contou
o que tinha acontecido e disse que chamaria o doutor para
me examinar.
Após conversar com o médico e certificar de que eu
estava bem, perguntei por minha família e ele pediu para
enfermeira chamá-los, saindo em seguida e me deixando
sozinha.

Meus pais entraram no quarto, chorando e correndo


para me abraçar. Levantei a mão para abraçá-los, mas
mesmo com o tanto de remédios que me deram, eu ainda
me sentia um caco e doía tudo.

— Filha, que susto, achei que tínhamos te perdido —


minha mãe falou entre soluços e passou a mão nos meus
cabelos.

— Minha princesa... — meu pai tentou falar, mas


encontrava-se visivelmente emocionado e só me abraçou.

Conversamos sobre o acidente e me contaram que


souberam pela polícia, que um carro ultrapassou em local
proibido, seguiu em minha direção e eu desviei batendo no
barranco e capotando após a colisão.

Pensei que realmente o pior poderia ter acontecido


se eu tivesse confrontado o outro veículo ou despencado
pela ribanceira.

Um arrepio passou por meu corpo e agradeci a Deus


por minha vida.

— Filha, o Gu nos contou — minha mãe disse e eu


gelei.

— O que ele contou?

— Sobre o romance de vocês — ela respondeu e meu


pai me encarou com os braços cruzados no peito.
Desviei o olhar.

— Pai, mãe, sinto muito, mas não pude evitar, eu me


apaixonei por ele. — Engoli em seco. — Mas podem ficar
tranquilos, acabou, não estamos mais juntos, ele não quer.
— Pisquei para não chorar.

— Depois conversamos sobre isso, filha — meu pai


falou, enxugando uma lágrima. — Vamos sair para o resto
da família entrar, mas sua mãe volta para passar a noite
com você.

Concordei sem olhá-lo e me sentindo muito


envergonhada.

— Te amo, filha, e estou muito feliz por te ver


conversando comigo. Qualquer dificuldade enfrentaremos
juntos. — Assenti e tentei sorrir.

Ambos me deram beijos e em seguida saíram para os


próximos entrarem.

Fiquei de olho na porta e logo entrou tia Vic e tio


Nicolas que me deram beijos e ambos choraram me
abraçando. Sempre foram como pais para mim e sempre
me trataram com tanto amor, como se eu fosse filha deles
também.

Os dois tocaram rapidamente no assunto “Gu e eu”,


falando que não era novidade que estivéssemos
aprontando, porque a vida toda fomos assim, era só nos
deixar sozinhos por um minuto e fazíamos alguma
traquinagem. Tive que rir.

Ficaram poucos minutos e saíram, dando lugar a tia


Sarah que já entrou chorando de soluçar e com isso percebi
que realmente os assustei. Para tia Sarah chorar daquela
maneira, só podia estar muito mexida com tudo o que
aconteceu.

Meus quatro avós entraram em seguida,


desesperados com o acidente, assim como os pais do tio
Nic, avós de Gu, que eu também considerava meus avós.
Morta de vergonha pensei se eles estavam lá todo o tempo
e sabiam sobre Gu e eu. Conclui que não ou teriam puxado
minha orelha.

Cada um que entrou chorou de alegria por eu estar


bem e me senti tão amada e agradecida a Deus por não ter
morrido ou todos estariam chorando de tristeza.

Alguns minutos se passaram depois que meus avós


saíram e ninguém mais entrou.

Esperei um certo alguém, que eu tanto amava e ele


não entrou.

Senti-me triste e pensei que magoei tanto o Gustavo


que nem a ideia de eu quase ter morrido, fez com que ele
fosse me ver.

Fechei meus olhos e uma lágrima escorreu. Pensei no


romance que a gente viveu e em como nós conseguimos
acabar com tudo. Desejei recomeçar, queria tentar e tê-lo
de novo para mim.

Nunca amei ninguém como o amava, mas imaginava


que realmente havia acabado até a amizade, já que nem
comigo naquele estado, no hospital, acidentada e toda
dolorida, ele desejou me ver.

Só o queria comigo.
Eu ainda continuava de olhos fechados desejando a
presença dele, quando mais uma lágrima escorreu pelo meu
rosto e imediatamente senti um toque conhecido a
enxugando.

Abri meus olhos e lá estava meu anjo.

— Você veio?

— Não tem outro lugar no mundo que eu queira mais


estar do que aqui.

— Gu... — Chorei.

— Por que está chorando? — perguntou com os olhos


marejados.

— Porque quero você de volta.

— Você quase morreu e está chorando por que me


quer de volta?

— Nada me dói mais do que pensar em não te ter na


minha vida.

Vi que ele engoliu em seco, lutando para não chorar.

— Lívia eu...

— Está tudo bem, Gu. — Tentei acalmá-lo e impedi-lo


de falar, mas ele continuou:

— Se eu te disser que também te quero de volta,


você me perdoa? — Ele enxugou as lágrimas que agora
escorriam livres pelo seu rosto.

— E você, me perdoa? — também perguntei.


— Te perdoo — dissemos juntos.

— Nos magoamos tanto — relembrou.

— É passado e temos outra chance para recomeçar.

Gu concordou feliz, me abraçou e me beijou com


paixão, que até esqueci que meu corpo doía.

Beijou todo o meu rosto, sussurrou no meu ouvido


que me amava e que achou que tinha me perdido para
sempre.

— Lívia, preciso também te pedir perdão, porque...


esse acidente foi culpa minha. Eu não devia ter deixado
você partir naquela chuva, eu não devia ter te mandado
embora por orgulho. E agora se você estivesse... Se você
estivesse... Se esse acidente tivesse tirado você de mim
para sempre, eu nunca me perdoaria e eu nunca mais seria
feliz.

— Você não é culpado de nada, Gu. Foi um acidente.


— Passei a mão no seu rosto.

— Mas preciso que você me perdoe. Eu aprendi,


Lívia. Aprendi que o orgulho só afasta as pessoas e o meu
poderia ter nos afastado para sempre.

— Ambos erramos tanto. E é o que dissemos, vamos


apenas apagar tudo e viver com uma nova história daqui
para frente. — Gu enxugou as lágrimas e tentei dizer algo
engraçado para aliviar sua culpa: — Olha que dessa vez o
acidente nem foi culpa dos meus dotes motorísticos.

Ele riu, mas fechou a cara em seguida.


— Com o professor que você teve, não duvido que
seja.

Tive que rir.

— Vamos esquecer o João, Gu, ele já atrapalhou


demais. Agora seremos só nós dois. Lembra? Começar de
novo.

Ele riu.

— Ah! E a nossa família. Já que está todo mundo


sabendo.

— Por que você contou? Se morresse podia ter


deixado o segredo ir para o túmulo.

Ficou sério.

— Nunca mais repete isso, só de pensar, meu


coração sangra. Se você morresse eu morreria também, de
tristeza.

— Que declaração mais linda. — Passei a mão em


seu rosto e fiz uma careta quando levantei o braço.

— Lívia, fica quieta. Quer que eu chame o médico?


Está sentindo muita dor?

— Está tudo bem, Gu. Mas me conta, como eles


souberam?

— A socorrista me ligou, fui o primeiro a chegar aqui


e arrumei uma tremenda confusão dizendo que era seu
namorado e queria notícias. Quando todos já haviam
chegado também, o médico foi até a sala de espera e
perguntou pelo namorado da Lívia e eu me apresentei. —
Ele deu de ombros.
— Por que não disse que era meu primo?

— Porque seu namorado era o que eu queria ser.


Agora sou e todos sabem. Parece um sonho.

— Sim. — Sorri e o olhei intensamente depois. — Gu,


nunca deixei de te amar, nem por um minuto sequer.

Ele me deu um beijo.

— Agi tanto sem pensar, mas agora aprendi.

Olhei para o lado, pensei nos atos dele, nos gemidos


da Bruna, no beijo na vaca da Aninha e em todas as
lágrimas que derramei nos dias anteriores, mas percebi que
os sorrisos e as lágrimas de alegria que ele me tirou, foram
superiores a todo o resto.

— Nada mais parecido com o que eu fiz vai acontecer


— garantiu como se pudesse ler meus pensamentos.

— Digo o mesmo.

— Te amo, minha princesa. Volta a ser minha?

— Também te amo, meu anjo. Nunca deixei de ser


sua, meu coração é seu desde que nasci.

Ele sorriu, aquele bendito sorriso lindo, entre os


lindos olhos azuis que eu amava.

E tudo parecia voltar ao lugar.

Gustavo era a escolha certa. Por mais que o nosso


amor fosse proibido sempre foi a escolha certa.
Gustavo
Lívia ficou um dia em observação no hospital, fez
mais uma tomografia que não deu nenhuma lesão grave,
mesmo assim, tio Jonas como médico, fez questão de ficar
por dentro de todo o quadro clínico e ainda pediu uma
ressonância por precaução, que também não deu nada.

Todo o tempo em que Lívia ficou no hospital, eu


fiquei com ela o máximo que pude, na verdade, só saí de lá
para tomar banho, comer alguma coisa e mesmo assim,
depois de muita reclamação da tia Lana, que também
queria ficar com a filha.

Vivian, Igor, Samira, Rodrigo e Fernando também


apareceram para visitar a Lili. Soube que Fernando tinha até
levado a Clara, a barwoman da Angels que ele começou um
rolo, mas ela foi embora antes que a víssemos.

As meninas choraram abraçadas e os caras viram por


foto, como o carro da Lívia estragou depois do acidente.
Ficaram espantados com a gravidade do acidente e felizes
por ela estar viva.

João me ligou, parecia tão arrependido por tudo e


perguntou como a Lívia estava, confirmei que bem, mas
pedi que ele não fosse vê-la. Eu não me sentia nem um
pouco a fim de olhar para ele depois de tudo o que
aconteceu antes do acidente.

Tentei não beijá-la na frente da família e para todos


os efeitos continuávamos somente primos e isso foi uma
tortura, nos momentos que ficávamos sozinhos eu a beijava
rapidamente o que a fazia rir como se fosse uma criança
fazendo travessura.
O som do sorriso dela era música para meus ouvidos
e pensar que eu não poderia tê-lo nunca mais, fazia com
que meus olhos se enchessem de lágrimas.

A alta médica foi dada e estávamos no carro do tio


Jonas indo em direção a casa deles.

Percebi olhares furtivos entre o tio e a tia por todo o


caminho. Todas as vezes que eu ficava mais próximo da
Lívia, um toque ou um olhar que eu direcionava a ela, eles
não perdiam e se fitavam cúmplices.

Assim que chegamos à casa deles, ajudei a Lívia a se


sentar na sala, me preparei para sair e, meio em fuga, me
despedi:

— Bom, família, princesa sã e salva. Vou indo para


casa, mas podem me ligar. — Olhei para Lívia, sorri e ela me
encarou como se não quisesse que eu fosse embora.

— Mãe, pai e Gu, precisamos conversar. — Nós nos


olhamos sem entender e ela continuou: — Agora.

Sentei-me ao lado dela e meus tios a nossa frente.

— Lívia, seja o que for, pode esperar. Você acabou de


chegar do hospital — falei.

— Quanto antes deixarmos tudo às claras, melhor.


Nós dois já sofremos muito com essa carga de família,
vamos acabar logo com isso. — Ela se virou para os pais. —
Pai e mãe, eu amo o Gu, amo como homem, sei que não
deveríamos nos amar, por sermos primos, mas amo.
Tentamos lutar contra esse sentimento, mas foi doloroso e o
amor foi inevitável.

Eu estava com as mãos geladas e suava frio, mas


não podia deixar com que Lívia contasse tudo sozinha,
então quando notei que tio Jonas começaria falar, falei
antes:

— Tio e tia, não queria falar sobre esse assunto


agora, mas já que a Lili começou, prefiro que meus pais
estejam aqui também.

Meu tio assentiu.

— Tudo bem, vou ligar para sua mãe vir. — Tia Lana
se levantou e o tio Jonas ficou encarando a mim e a Lívia
com a testa franzida e um olhar sério que dava medo.

Passei a mão na testa para enxugar o suor que


começava a surgir ali e quando pousei a mão no joelho de
novo, Lívia entrelaçou nossos dedos e sorriu para o pai.

Receoso olhei para o Tio Jonas, que bufou, revirou os


olhos e encarou a TV que passava alguma notícia qualquer.

Quando ela ficou tão corajosa assim?

Tia Lana voltou para sala nos contou que meus pais
estavam a caminho e depois de um silêncio constrangedor,
chamou o marido para fazer sabe-se lá o que na cozinha.

Sentia-me sem ar.

— Lívia, você é o que eu mais quero na vida, mas


estou tendo um princípio de ataque cardíaco de ter que
explicar isso aos nossos pais.

Ela deu uma sonora gargalhada.


— Ué, não era você que queria contar antes, agora
está dando para trás? Não quer me assumir, Gu? — Ela ria e
parecia supertranquila.

— Trocamos os papéis, princesa, estou quase


enfartando de medo do seu e do meu pai. Eles vão arrancar
minhas bolas.

— Gu, lembre-se, você que desde o começo que


queria contar. — Ela riu, mas pude ver em seu olhar que
também se sentia nervosa e preferia não me deixar ainda
mais. — Ah, fica calmo, o pior já foi. Na hora do desespero
você já contou que estávamos namorando e isso já adiantou
boa parte da história, até que o acidente foi bom, serviu
para alguma coisa.

— Não fala isso nem brincando, Lili.

Ela passou a mão no meu rosto em solidariedade e


continuei:

— Mas e se eles disserem que não, se disserem que


não aceitam o nosso relacionamento? Eu vou perder você
de novo e não quero te perder nunca mais. Acho que, na
verdade, isso que está me deixando mais aflito que
qualquer outro motivo.

— Gu, você não vai me perder. Se eles não


aceitarem, nós fugimos para as montanhas. — Lançou-me
um sorriso tenso.

Conhecia o peso que nossa família tinha sobre


qualquer decisão que tomávamos, mas não sabia se era
verdade que ela ficaria comigo acima de qualquer que fosse
a opinião deles.
Meus pais chegaram e tio Jonas saiu da cozinha para
recebê-los.

Tentei me controlar para não demonstrar o quanto eu


estava nervoso, mas minhas mãos suando me
denunciavam.

Em silêncio fiz uma prece para Deus me ajudar a


resolver tudo. Não aguentaria brigar com minha família e
não aguentaria ver a tristeza da Lili diariamente se
acontecesse.

Meus pais deram um beijo nela e perguntaram sobre


seu estado.

— Me sinto pronta pra outra.

— Lívia! — foi repreendida por todos.

Nossos pais se sentaram de frente para nós e me


senti em um julgamento.

— Estamos aqui, tem certeza de que está bem, Lívia?


Precisa mesmo conversar sobre isso agora? — meu pai
perguntou.

— Sim, tio, quanto antes resolvermos, melhor.

— Então vamos lá: como chegamos a esse ponto?


Como vocês começaram essa história toda? — minha mãe
perguntou, séria e cruzando os braços na frente do peito.

— Bom, tia...

— Deixa que eu falo, Lili. — Tomei a frente da Lívia.


Se alguém tivesse que levar a culpa ou ser julgado, que
fosse eu, não ela. — Bom, como sabem, meu amor pela
Lívia começou quando ela ainda estava dentro da barriga da
tia Lana e desde que eu a vi pela primeira vez, decidi que
seria seu anjo da guarda e me apaixonei por ela desde
então.

— Sim, vocês sempre foram como irmãos — minha


mãe falou séria.

— Ficamos bastante tempo afastados e depois que


ela foi morar comigo, mesmo ainda tendo o jeito de moleca
e o sorriso fácil, me mostrou que não era mais a menininha
que peguei no colo, então foi aí que me apaixonei por ela
pela segunda vez, mas de outra maneira. Me apaixonei
como homem. — Vi tio Jonas bufar e tia Lana o repreendê-
lo.

— Filho — meu pai falou como aviso para que eu os


poupasse da parte adulta.

— Sei que talvez eu não seja o melhor para ela ou


nem a mereça, mas no tempo que moramos juntos,
tentamos lutar contra o sentimento com todas as forças,
tanto eu quanto ela, e tivemos muitos conflitos internos e
entre nós. Tentamos nos afastar, mas ficar longe doía e era
só ficar perto que todo sentimento voltava com força.

Encarei meu tio e continuei:

— Peço desculpas, tio, por não ter cumprido o que


prometi ao senhor, ainda me sinto culpado. Não cuidei dela
como devia e ainda a fiz sofrer. — Abaixei a cabeça e
lágrimas brotaram em meus olhos. — Mas só posso garantir
que ela nunca vai achar na vida alguém que a ame mais
que eu e, com todo respeito do mundo, queria pedir a
permissão a vocês, para namorá-la.

— Meu Deus! — minha mãe exclamou e eu não sabia


se de espanto ou de emoção, mas continuei a falar:
— Sei que não é tão simples assim, mas eu a amo
tanto que enfrento qualquer coisa para ficar com ela. —
Enxuguei mais uma lágrima, ergui a cabeça encarando cada
um deles e vi minha mãe e minha tia chorando. Meu pai
tinha um olhar orgulhoso e o olhar do tio Jonas eu não
conseguia decifrar. Mais uma vez Lívia segurou minha mão
e entrelaçou nossos dedos me passando segurança.

— Enfrenta a família também? — Tio Jonas


perguntou.

— Daria tudo para que não precisasse. Perderia parte


do meu coração.

Ele apertou os lábios.

— Olhem, crianças, sabemos que isso não era para


ter acontecido, pelo menos não pela lógica. Mas... para o
amor não existe lógica, certo ou errado, o amor apenas
acontece. E o de vocês realmente começou no primeiro
olhar — minha mãe disse com amor e tia Lana sorriu
concordando.

— Eu estava desconfiado de que alguma coisa


estranha acontecia, até pensei que poderia ser um
envolvimento entre vocês dois, mas relutei a acreditar —
meu pai disse e sorriu. O único que não sorria era o tio
Jonas.

Ele se levantou passou as mãos no rosto e parecia


pensar. Foi até a janela, voltou a olhar para nós e em
seguida, perguntou:

— Tem alguma chance de eu conseguir separar vocês


dois?
— Nenhuma — Lívia respondeu decidida antes que
eu pudesse pensar em responder.

— Gustavo?

— Chance nenhuma, tio.

Soltou o ar.

— Que bom, era isso que eu queria ouvir. Essa


certeza, porque já que vamos ter que enfrentar seus avós,
temos que ter certeza de que isso não é fogo de palha.

— Pode ter certeza, tio. A Lívia é o que quero para


minha vida.

Ele engoliu em seco e assentiu.

— Gu... Eu não consigo pensar em ninguém melhor


do que você, que eu amo tanto quanto amo a Lívia, para
namorar a minha princesa.

Abaixei a cabeça e as lágrimas voltaram a rolar pelo


meu rosto. Enxuguei rapidamente e me levantei para dar
um abraço no meu tio.

— Obrigado, tio, obrigado por nos apoiar.

— Já sofri por amor e sei como é isso, não seria eu a


fazer vocês sofrerem.

— Obrigado, muito obrigado, tio.

Meu tio era como um pai para mim e sabia que a


reação dele não seria diferente.

Felicidade explodia no meu peito.


Lívia
Sentia-me tão feliz.

Eu chorava abraçada a minha mãe e tia. Já havia


abraçado meu pai e tio Nic e esse foi o momento mais tenso
e mais lindo da minha vida.

Ouvir a declaração de amor que Gu fez e em seguida


o apoio dos nossos pais foi perfeito.

Meu pai abriu um vinho e brindamos a mim e ao Gu


que nunca paramos de aprontar. Eu, claro, brindei com suco
por conta dos remédios.

Minha mãe, tia Vic e eu, ficamos na sala conversando


enquanto nossos homens saíram para buscar algo para
comer.

— Sabem o que eu estou gostando mais nessa


história toda? — perguntou a tia Vic. — Estou amando te ter
como nora. Sempre pensei que eu não me daria bem com a
namorada do Gu. — Ela fez uma careta.

— Você como sogra será um tormento. Cuidado, Lívia


— minha mãe disse rindo.

— Ah, mas para Lívia serei uma sogra maravilhosa —


Ela me deu um beijo na testa.

— Filha, nos conte, já teve alguma vagaba tentando


separar vocês? Porque sempre tem, né? — Minha mãe
revirou os olhos.

— Mãe!
— Com meu filho sendo lindo como é, certeza que
devem ter várias.

Tive que rir disso. As duas juntas eram umas figuras.

— Confesso que já tive sim, mas o Gu também não


foi tão inocente assim.

— Ahhh... não fala assim do meu bebê. Ele é um anjo


— tia Vic falou como se falasse de um bebezinho.

— Filha, tenho dó de você com uma sogra dessas.

Rimos e contei a elas como me apaixonei pelo meu


primo, tirando os detalhes picantes, e elas suspiravam como
se assistissem a uma novela.

À noite ligamos para todos e reunimos a família na


casa dos meus pais para contarmos para o resto dos
integrantes sobre o nosso namoro.

Meus avós de início ficaram espantados, mas depois


até aceitaram super bem, acho que o medo por eu quase
ter morrido transformou tudo e fez com que um namoro
entre primos não fosse nada comparado a morte.

Tia Sarah também ajudou, já que enquanto a gente


contava, ela ficava fazendo graça, contando todas as artes
que fizemos quando éramos crianças e mostrando que a
última era a menor delas.

Quando estávamos todos juntos, rindo e eu de mãos


dadas com o Gu, percebi que o medo que tanto eu quanto
ele tínhamos, sobre contar para nossa família, era
desnecessário. O amor de todos por nós, nunca os
permitiriam nos julgar ou nos fazer sofrer separados, por
meras convenções.
Aprendi com eles que respeitar e a apoiar a decisão
do próximo, sem julgamentos, era o certo a fazer quando se
há amor e não se faz mal a ninguém.
Epílogo
Gustavo
Anos depois
— Lívia Queiroz Vilar.

Anunciou o mestre de cerimônia e minha princesa se


levantou, vestida com a beca e um sorriso lindo no rosto.
Pegou o canudo, levantou em direção a nossa família e
amigos e aplaudimos orgulhosos.

Já fazia mais de cinco anos que estávamos juntos, eu


nem acreditava que ela havia se formado, esperei
pacientemente por este dia.

Não via a hora dele chegar, porque depois que


contamos a todos sobre nosso namoro, nossos avós
disseram que não poderíamos morar juntos e exigiram que
Lívia voltasse para casa, mas com muito custo os
convencemos que o trajeto era longo e cansativo para
enfrentar todos os dias e que morar na cidade era mais
fácil, então vô Luiz decidiu que ela moraria com a Samira e
sem discutir concordamos.
Claro que ela ficava mais no meu ap do que na casa
da Samira, mas eles não precisavam saber disso.

Um ano após, eu já estava querendo oficializar nossa


união e queria me casar com ela, mas Lívia sempre me
dava um banho de água fria, dizendo que só se casaria
quando terminasse a faculdade. Por isso, esperei
pacientemente a colação e enfim ela chegou, enfim eu
podia colocar meu plano em prática.

Os cinco anos não foram fáceis, tivemos muitos


desentendimentos por ciúmes, mas aprendemos com os
erros do passado e crescemos juntos no relacionamento.

Aprendemos a perguntar e conversar antes de


causar uma hecatombe.

O acidente da Lívia foi uma tragédia, mas serviu para


que déssemos mais valor um ao outro, a nossa vida e aos
que seguiam a nossa volta. Nos ajudou a crescer.

Nos amávamos demais e o nosso amor era o que nos


unia e nos dava força para enfrentar as dificuldades e as
brigas.

No começo, trabalhar com o João causou muitas


delas, não aguentava olhá-lo sabendo que muito do que
sofri por não ter a Lívia, foi culpa dele e isso fazia a vontade
de socar a sua cara sempre voltar. Entretanto, o que me
segurava, era pensar nos nossos anos de amizade antes de
tudo acontecer e também que ele se sentia arrependido.

Até que o projeto que tínhamos de abrir uma filial da


Angels no interior deu certo e o João foi tomar conta do
nosso novo empreendimento, o que foi minha alegria e anos
depois nos dávamos bem de novo.
Voltando ao casamento, me sentia atrasado nessa
questão, meus amigos todos já haviam se casado, enquanto
eu continuava ali esperando a Lili, mas como havia dito,
essa espera acabaria naquele dia.

A colação de grau acabou e ela andou para junto de


nós sorrindo e seu sorriso acertava direto no meu coração.

Abracei-a parabenizando e todos fizeram o mesmo.

— Vamos comemorar então, família? — ela


perguntou sorrindo, eu a puxei pela cintura para que ficasse
próxima a mim e beijei sua bochecha.

— Bom, amor, eu vou ter que ir até em casa pegar


uns documentos e levar para Angels para aproveitar que
vamos para lá, mas encontro vocês daqui a uns minutos —
falei dando um beijo em minha princesa e dando um tchau
a todos os meus cumplices.
Lívia
Gu tinha dito que ia comigo direto para Angels depois
da colação, mas teve que ir em casa buscar documentos.

Inicialmente estranhei, porque tínhamos fechado a


Angels para comemorarmos minha colação, mas ele era tão
dedicado ao trabalho, que Gustavo resolver problemas da
casa noturna em dia de festa até que era normal.

Meus avós disseram que a badalação não era com


eles e tia Sarah, que estava com o seu marido, Pepê e o
Daniel, disse que também não ficaria, pois precisava levá-
los, junto com Tia Vic e tio Nic que também não ficariam
para comemorar.

Fiquei triste de não ter todos da família na


comemoração, mas no final de semana eu iria a Cananéia e
faríamos uma festinha.

Meus pais decidiram ficar e tê-los comigo, já me


deixava muito feliz.

Fui tirar a beca junto com Samira e Igor. Estávamos


todos vestidos de branco, toda a turma optou pela cor por
sermos médicos.

Eu e Samira fomos juntas comprar nossos modelitos,


mas o dela era mais simples, enquanto o meu, ela quase
me bateu para que eu comprasse um vestido longo, tomara
que caia, em estilo sereia e tecido esvoaçante.

Achei que era demais, mas ela insistiu tanto que


fosse aquele que acabei cedendo, porque realmente ficou
muito bonito.
Minha amiga tirou a beca e colocou um vestido
amarelo. Fiquei brava porque eu não tinha levado outra
roupa e ela me disse que iria à Angels com o mesmo vestido
da colação.

Vaca! Vou ter que ir assim mesmo.

Saímos já prontos para Angels, mas quando fui


encontrar meus pais depois que tirei a beca, Igor me disse
que eles tiveram que ir, pois meu pai foi chamado para o
hospital de última hora, com urgência, e levaram a Vivian
com eles, já que ela estava de carona.

Droga! Fiquei decepcionada. Mas bora comemorar


como sempre: eu, Igor, Samira e o Gu, na Angels

Fui no carro da Samira até lá e assim que cheguei à


portaria, vi meu pai como se me esperasse, com um sorriso
enorme no rosto.

Oi? Ele não foi embora?

Samira e Igor me deram um beijo em meio a um


sorriso e separaram-se de mim correndo para dentro da
Angels, enquanto eu ia em direção ao meu pai.

— O que está acontecendo? O senhor não tinha ido


embora, pai?

Acho que a surpresa estava estampada em meu


rosto e eu não entendia absolutamente nada.

— Vamos entrar, princesa, que você já vai entender.

Franzi a testa e deixei que meu pai me conduzisse


para dentro, mas assim que passamos pela porta e
entramos, dei de cara com um corredor cheio de flores e
quando eu digo cheio, era cheio mesmo.

Muitas rosas, flores de diversas espécies, em vários


tons de amarelo que eu amava. O lugar exibia-se todo
escuro e as luzes só iluminavam o corredor e o final dele,
onde uma luz apontava para o Gu.

Tão lindo!

Ele que estava com as mãos para trás, vestido todo


de branco e parecia um príncipe encantado. Meu príncipe
encantado. O que sempre achei que não existisse, mas que
sempre esteve ao meu lado.

Cheguei ao início do corredor e o salão todo da


Angels ficou a meia luz, foi então que vi que dos dois lados
tinham cadeiras, onde toda nossa família e amigos estavam
acomodados. Todos aqueles que eu amava e o
entendimento tomou conta de mim.

Olhei para o meu vestido branco e eu me


apresentava como uma linda noiva.

Ahhh.. Samira sua louca! Agora entendi a do vestido


branco...

Jesussss... É meu casamento!

Abri um sorriso enorme e o Gu me retribuiu lá da


frente. Parecia nervoso, mas estava tão lindo. Era o príncipe
que tanto sonhei.

— Pai... vou me casar?

— Sim, filha. — Sorriu.


Praticamente puxei meu pai até o altar. Se eu
pudesse teria corrido e pulado no colo do Gu.

Eu disse a ele que queria esperar acabar a faculdade,


mas não imaginei que faria aquela surpresa no dia da minha
colação.

Ele e suas surpresas...

Segui olhando as pessoas que se encontravam ali,


enquanto andava pelo corredor e vi todos meus amigos da
faculdade e as meninas não usavam mais o vestido branco.

Vacas!

Sorri.

Vi minha mãe, meus avós, os Angels e suas esposas,


minhas amigas, Igor, meus tios e os meninos.

Tentava firmemente não chorar, mas Latch tocou e


não tinha como não lembrar da primeira vez que entrei
naquela casa noturna e tocou aquela música. Nem de não
me lembrar de todas as vezes que ela foi a música que
embalou as tristezas e alegrias que vivi com o Gu.

Lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto e


quando voltei a olhar para o Gu ele também enxugava
discretamente uma lágrima.

Sorri e ele andou em minha direção. Cumprimentou


meu pai com um aperto de mão, um tapa estalado nas
costas e um abraço cheio de emoção. Depois meu pai me
entregou.

— Espero que agora que ela será sua oficialmente,


você continue cuidando, amando e sendo o anjo que ela
merece.

— Sempre, tio — Gu respondeu muito emocionado,


virou-se para mim, me dando um beijo na testa e encostou
a sua na minha para sussurrar:

— Te amo, princesa.

— Também te amo, anjo.

O Juiz de paz pigarreou sorrindo para nos tirar do


nosso momento e só então percebi que ele estava ali.

Eu encontrava-me em estado de êxtase, já que nem


por um minuto desde a hora que acordei até aquele
momento, imaginei que passaria por isso.

O juiz disse suas palavras e em seguida passou a


palavra ao Gu, que tirou um papel do bolso, me olhou
sorrindo, pigarreou e começou a ler:

— Minha Lili, toda palavra que sair da minha boca é


pouco, nenhuma palavra existente no mundo será suficiente
para dizer o quanto eu amo você. O quanto você alegra
minha vida desde que eu soube que crescia na barriga da
tia Lana. Nenhum sentimento no mundo se compara ao que
você me faz sentir e nada nessa vida faz meu coração se
apertar no peito de saudade, como quando ficamos longe
um do outro. Você é a princesa pela qual eu luto, enfrento
dragões, derrubo castelos e mato vilões. Por você espero de
peito aberto a próxima fase pela qual a vida vai me fazer
passar, para chegar mais próximo e sempre ficar perto de
você. Porque esse é o meu destino, você é meu destino e
nada vai fazer com que eu pare de lutar para ficar ao seu
lado e te fazer feliz. — Fez uma pausa como se me
analisasse. — Lívia, você aceita ser para sempre a minha
princesa, assumir o controle dois desse videogame
chamado vida, passar junto comigo todas as fases difíceis
que ela vier nos oferecer e ser para sempre minha, nessa e
em outras vidas?

Eu chorava, ele sorria e todos os presentes choravam


e sorriam. Era um casamento totalmente diferente de tudo
que eu já tinha visto e era perfeito.

— Simmm... — gritei e todos aplaudiram.

— Bom, Lívia, agora é a sua vez de dizer algumas


palavras e perguntar ao Gustavo se ele aceita — instruiu o
Juiz e eu fiquei com cara de espanto.

— Ai... é... eu não sabia do casamento, não preparei


nada e... — Eu sempre fui péssima em falar em público e fui
pega de surpresa. Eu estava rindo descontrolada de nervoso
e todos riam do meu pânico.

— Bom, como eu sou um excelente namorado,


preparei um discurso para você, princesa. — Gu tirou outro
papel do bolso e me entregou. Sorri para ele e peguei de
sua mão, o abrindo e começando a ler.

— Puxa! Como sou uma mulher de sorte. — Li o que


estava escrito e todos riram. Olhei para ele com a
sobrancelha arqueada e ele riu largamente.

— Vi isso em uma série e sempre quis fazer igual —


explicou e eu ri, balançando a cabeça em negativa e
continuando a ler: — Como sou uma mulher de sorte por ter
esse belo exemplar de homem na minha vida, com esse
corpo perfeito, sorriso lindo e olhos encantadores... Ah, pelo
amor de Deus, Gu. Não vou ler isso!

— Ele se acha. — Fernando gritou.


Todos riram, eu dobrei o papel e o coloquei sobre a
mesa do juiz.

— Vou falar o que está no meu coração. — Suspirei


profundamente, soltando o ar a seguir, peguei a mão dele e
logo comecei a falar: — Gu, sou uma mulher abençoada e
de sorte sim, pois Deus me deu você. Que sempre foi meu
primo, meu irmão mais velho, meu herói, meu Ken, o meu
primeiro paciente quando brincávamos de médico.
Inocentemente, tá, pai? — Meu pai, riu em resposta.

— Ela ainda brinca de médico com ele — Rodrigo


gritou, revirei os olhos e continuei:

— Depois se tornou meu companheiro com quem


dividi a casa, que me ensinou que Coca com chocolate nem
é lá essas coisas. — Ele lançou-me um sorriso safado. — Me
protegeu do Freddy Krueger, se tornou meu primeiro amor e
me mostrou que príncipes encantados existem sim e você
era o meu. O meu, desde que eu estava na barriga da
minha mãe. E agora eu te pergunto, sendo completamente
egoísta: Gu, você aceita ser para sempre meu príncipe, meu
anjo e o meu Super Gustavo, que vai estar sempre me
salvando e enfrentando todas as fases difíceis que a vida
vier nos oferecer? — Sorri, enxugando uma lágrima e ele
também estava emocionado, assim como todos os
presentes.

— É inevitável, Lili. Não consigo não dizer sim. Para


mim não existe vida sem você.

Todos aplaudiram e assobiaram e o juiz continuou:

— Então pelo poder investido a mim eu os declaro


casados. Podem dar o primeiro beijo como marido e mulher.
Gu me pegou pela cintura e deu-me um beijo de tirar
o fôlego.

Meu pai ao fundo bradou xingamentos e após o beijo


acabar, Gustavo me rodopiou sorrindo, ainda com a boca
colada na minha, enquanto todos voltavam a aplaudir de pé
e felizes, dividindo conosco a alegria que estávamos
sentindo.

O casamento foi lindo, a festa a seguir foi


maravilhosa e olhando todos que estavam ali, pensei que
valeu a pena ter passado por tudo só para viver aquele
momento.

Encontrava-me sentada ao lado do Gu e olhando


para pista de dança onde Igor, Samira, Vivi, Rodrigo,
Fernando, sua esposa e sua filhinha, dançavam fazendo
palhaçadas. Amigos que eu amava tanto. Sorri.

Entrelacei meus dedos aos de Gu que me encarou


sorrindo.

Olhei a Angels, me lembrando de tudo que passei ali


naquela casa noturna e repensei o quanto existiram pessoas
que tentaram atrapalhar nosso relacionamento.

Nunca mais ouvi falar de Bruna nem de Ana nem de


nenhuma mulher que pudesse me afastar do Gu.

Tudo que vivemos foi ensinamento para que naquele


momento eu me sentisse mais madura e pronta para viver
eternamente com meu Gustavo. Deixando de lado toda
impulsividade e infantilidade que pudesse nos afastar.

— Amor, eternamente é muito tempo? — perguntei e


Gu me olhou sem entender. — Porque eternamente é o
tempo que te quero ao meu lado, cuidando de mim e sendo
o meu anjo.

Ele sorriu.

— Então, princesa, eternamente é pouco demais


para nós.

Deu-me um beijo no pescoço e o arrepio e o


sentimento tão característico que me atingia sempre
quando me via ao seu lado, passaram pelo meu corpo e
percebi que ia ser sempre assim.

— Ah, e a Lua de mel? Sinto te informar, mas ela


também será eterna — Sorri em resposta.

— Que bom, eu não esperaria menos de você, meu


anjo da noite que me leva ao céu. — Pisquei um olho para
ele e mais uma vez Gu me puxou para um beijo.

Esperava que meus dias fossem assim, de pura


felicidade e que sempre tivessem beijos maravilhosos e o
Gu ao meu lado.

Quanto ao resto?

Lutaremos e enfrentaremos cada fase. Uma de cada


vez.

Quando ele fraquejar?

Eu estarei pronta para buscar mais vida para ele.

E quando eu fraquejar?

Ele também estará pronto para me amparar, sendo o


meu anjo e passando a fase difícil comigo.
Parceiros na vida e no jogo.

E que Deus me ajude, porque com esse homem lindo


eu terei muita vaca para abater pelo caminho, mas pensar
que o terei em uma lua de mel eterna, me dava ânimo para
enfrentar tudo.

E finalmente era a minha vez de repetir: e que Deus

me ajude! Fim...

Conheça a história dos


outros Angels
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Playlist
Latch – Disclousure
Toca me – La Cubanita
Geração Coca- Cola – Legião Urbana
Quase sem querer – Legião Urbana
Exagerado – Cazuza
Latch – Boyce Avenue
Omi – Cheerleader
Quem de nós dois – Ana Carolina
I love you – Celine Dion
Sexy Back – Justin Timberlake
Waves – Mr. Probz
It Will Rain – Bruno Mars
Why Won’t you love me – Tony Braxton
Sem medo de amar - Onze:20
Luck – Jason Mraz e Colbie Caillat
I am mess – Ed Sheeran
Don’t let me down – Beatles
Back at one – Brian Mckni

Sobre a Autora
De Biritiba Mirim-SP, Julia é casada, tem uma filha e é
escritora em tempo integral. Sempre foi encantada pelo
mundo literário e quando criança os gibs da turma da
Mônica a fascinava. Cresceu, e se tornou uma romântica
incurável que se perdia de amores pelas histórias de época
e romances em geral. No entanto, foi em agosto de 2015
que decidiu unir o amor pela leitura com o pela escrita e
criou o seu primeiro romance . A partir daí Julia não parou
mais e escreveu diversos livros, sendo dois deles infantis.
Apaixonada por seus leitores, ela não pensa em
parar e por isso se joga diariamente no mundo das histórias
que os personagens a contam, dando vida a cada um deles
e acreditando que seus leitores os mantêm vivos todas as
vezes que os leem.

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[1] Boneco namorado da boneca Barbie


[2] Nome da série de livros.
[3] falso
[4]
Musica sertaneja
[5] time

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