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Copyright © 2016 Pam Godwin


Copyright © 2022 Editora Cabana Vermelha
Título original: DARK NOTES

 
Diretora Editorial: Elaine Cardoso
Editora: Mari Vieira
Tradução: Marcela Resende
Preparação: Sara Lima
Revisão: Sara Lima
Revisão Final: Elaine Cardoso
Capa e Diagramação: Elaine Cardoso
 

Esta edição é publicada mediante acordo com Harlequin Books S.A.


Todos os direitos de edição reservados, incluindo o direito de reprodução
no todo ou em parte de qualquer forma. Nenhuma parte dessa obra pode ser
apropriada ou distribuída em qualquer forma ou meio, seja eletrônico,
fotocópia, gravação etc., sem a permissão do detentor do copyright.
Sumário
Sinopse
1
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Playlist
Sobre Pam Godwin
Sinopse
 
 
Me chamam de promíscua.
Talvez eu seja.
Às vezes faço coisas que desprezo.
Às vezes os homens tiram algo de mim sem pedir.
Mas eu tenho um dom musical, só mais um ano de ensino médio, e um
plano.
Com um obstáculo.
Emeric Marceaux não apenas tira.
Ele agarra minha força de vontade e a acerta como uma nota sombria.
Quando ele me manda tocar, quero dar tudo a ele.
Eu me ajoelho por seus castigos, estremeço com seu toque e arrisco tudo
pelos nossos momentos roubados.
Ele é minha obsessão, meu mestre, minha música.
E meu professor.
 
 
1

Ivory

Pobreza.
Costumava ser mais fácil.
Talvez porque não me lembro muito dela na minha infância. Porque eu
era feliz.
Agora tudo o que sobrou foi o luto e os gritos e as contas a pagar.
Aos 17 anos, eu não sei muito do mundo, mas descobrir que ser
indesejada e infeliz são muito mais difíceis de suportar do que não ter nada
para comer.
Os nós em meu estômago apertam. Talvez vomitar antes de sair de casa
vai acalmar meus nervos e clarear minha mente. Exceto que eu não posso
me dar ao luxo de perder calorias.
Respiro fundo para confirmar que os botões da minha melhor camisa se
mantêm firmes e o considerável decote ainda está escondido
moderadamente. A saia na altura do joelho está servindo melhor essa
manhã do que no brechó e a sapatilha… Esqueça, não tem nada que eu
possa fazer sobre as solas rachadas e os rasgos nos dedos. Esses são os
únicos sapatos que eu tenho.
Saio do banheiro e ando na ponta dos pés pela cozinha passando as mãos
trêmulas pelo cabelo. As mechas molhadas caem nas minhas costas
encharcando a camisa. Droga! O sutiã está aparecendo nesse tecido úmido?
Eu deveria ter prendido meu cabelo ou secado, mas estou sem tempo, o que
endurece ainda mais minha barriga.
Meu Deus, eu não deveria estar tão ansiosa. É só o primeiro dia de aula.
Eu fiz isso inúmeras vezes.
Porém é o meu último ano.
O ano que irá determinar o resto da minha vida.
Um erro, notas menores do que a ideal e uma violação no código de
vestimenta, a menor das infrações irá direcionar o holofote para longe do
meu talento e brilhar na pobre garota do Treme. Cada passo que dou nos
corredores preconceituosos e de mármores do Instituto Le Moyne é um
esforço para provar que eu sou mais do que aquela garota.
Le Moyne é um dos ensinos médios de belas-artes mais reconhecido,
elitista e caro do país. É intimidante. Muito assustador. Não importa se eu
seja a melhor pianista de Nova Orleans. Desde o meu primeiro ano, a
academia tem procurado um motivo para me expulsar e preencher o meu
competitivo lugar com um estudante que traga talento e recursos
financeiros.
O fedor da fumaça de cigarro me traz de volta à realidade da minha vida.
Aperto o interruptor na parede da cozinha, iluminando as pilhas de latas de
cervejas amassadas e caixas de pizzas vazias. Pratos sujos enchem a pia,
pontas de cigarros se espalham pelo chão e… Que diabos é isso? Eu me
inclino sob o balcão e semicerro os olhos para os resquícios queimados na
colher.
Filho da puta. Meu irmão usou nossos melhores utensílios para aquecer a
coca? Jogo a colher no lixo em um surto de raiva.
Shane alega que ele não tem condições para pagar as contas, mas o
maldito desempregado sempre tem dinheiro para festejar. Não só isso, a
cozinha estava impecável quando eu fui dormir, apesar do mofo exuberante
nas paredes e das lâminas descascando na bancada. Caramba, essa é a nossa
casa. A única coisa que ainda temos. Ele e minha mãe não tem ideia do que
tenho suportado para manter a gente com o atual pagamento da hipoteca.
Pelo bem deles, espero que nunca descubram.
Um pelo macio roça no meu tornozelo chamando minha atenção para o
chão. Grandes olhos dourados olham para cima em um rosto laranja
malhado e meus ombros logo relaxam.
Schubert inclina o queixo sujo e esfrega o bigode de gato na minha
perna, sua cauda balançando no ar. Ele sempre sabe quando preciso de
atenção. Às vezes, eu acho que ele é o único amor que sobrou nessa casa.
— Eu tenho que ir, garoto — sussurro, e me abaixo para coçar suas
orelhas. — Seja um bom gatinho, está bem?
Pego a última fatia do pão de banana do esconderijo, na parte de trás da
despensa, aliviada por Shane não ter encontrado. Embrulho em um papel
toalha e tento sair pela porta da frente o mais quieta possível.
Nossa casa em ruínas tem uma sala ampla e cinco ambientes compridos.
Sem corredores e com os quartos organizados um na frente do outro, todas
as portas em fileiras. Eu poderia ficar parada no final, atirar com uma
espingarda na porta da frente e não atingir nenhuma parede.
Mas eu poderia atingir Shane. De propósito. Porque ele é um maldito
fardo e um desperdício de vida. Ele também é nove anos mais velho, tem
sessenta e oito quilos a mais e é o único irmão que eu tenho.
As tábuas antigas de madeira gemem debaixo dos meus pés e eu paro de
respirar, esperando para que um Shane bêbado urre.
Silêncio. Obrigada, Senhor.
Segurando o embrulho do pão no peito, passo pelo quarto da minha mãe
primeiro. Trinta minutos atrás, andei sonolenta e tropeçando em direção ao
banheiro no escuro. Mas com a luz da cozinha brilhando no vão da porta, o
amontoado em sua cama parece bastante com uma pessoa.
Eu cambaleio de surpresa tentando lembrar a última vez que eu a vi.
Duas… três semanas atrás?
Uma palpitação se agita em meu peito. Talvez ela tenha voltado para casa
para me desejar boa sorte em meu primeiro dia?
Três passos quietos me levam até a cama. O quarto retangular é apertado
e estreito, mas o teto eleva-se em três metros ou mais. Papai costumava
dizer que o telhado inclinado e o longo layout comprido era um projeto de
ventilação para garantir que todo o seu amor pudesse fluir.
Contudo, papai se foi. E tudo que ficou circulando pela casa foi o mofo e
os crepitantes barulhos do ar-condicionado.
Eu me curvo sobre a cama, me esticando para ver os curtos cabelos da
minha mãe na sombra. Porém, encontro o indesejável fedor de cerveja e
maconha. Mas é claro. Bem, pelo menos ela está sozinha. Não tenho
nenhum interesse em conhecer o homem do mês com quem ela está
transando.
Deveria acordá-la? Meus instintos me diziam para não fazer, mas eu
anseio sentir seus braços em volta de mim, caramba.
— Mãe? — sussurro.
O amontoado se levanta e um profundo gemido ressoa dos cobertores. O
gemido de um homem que eu conheço com uma horrível intimidade.
Um calafrio percorre minha coluna enquanto ando para trás. Por que o
melhor amigo do meu irmão está na cama da minha mãe?
O braço grosso de Lorenzo balança para cima e sua mão pega minha
nuca, me puxando em sua direção.
Deixo meu pão cair em uma tentativa de me afastar, mas ele é forte,
malvado e nunca responde ao não.
— Não! — digo de qualquer forma, o medo aumentando minha voz e
minha pulsação ressoando em meus ouvidos. — Pare!
Ele luta comigo na cama, me empurrando de bruços sob seu corpo suado.
O hálito de cerveja quente me sufoca. Então seu peso, suas mãos… meu
Deus, sua ereção. Ele cutuca minha bunda com isso, levantando minha saia
e sua respiração pesada roçando minhas orelhas.
— Me solta! — Bato descontroladamente, meus dedos batendo nos
cobertores e me levando a lugar nenhum. — Eu não quero isso. Por favor,
não…
Sua mão tapa minha boca, me calando enquanto sua força limita meus
movimentos.
Meu corpo vai gelando, ficando entorpecido, desmoronando como algo
morto, me separando dos pensamentos. Eu deixo minha concentração
escapar para uma segurança que eu conheço, que eu amo, enquanto envolvo
meu ser com uma atmosfera negativa, leves batidas no teclado do piano e
um ritmo atonal. A sonata Nº 9 de Scriabin. Vejo meus dedos percorrendo
as teclas do piano. Escuto a persistente melodia e sinto cada nota tremer, me
puxando mais perto da massa negra. Para longe do quarto. Para longe do
meu corpo. Para longe de Lorenzo.
Uma mão vagueia sob meu peito, apertando meus seios e puxando a
blusa, mas estou perdida nas notas dissonantes e recriando-as com cuidado,
distraindo meus pensamentos. Ele não pode me machucar. Não aqui com a
minha música. Nunca mais.
Ele muda de local, empurrando suas mãos em minhas nádegas, dentro da
calcinha, sondando rudemente o buraco na parte de trás que ele sempre faz
sangrar.
A sonata se estilhaça em minha mente e eu tento reunir as notas. Mas
seus dedos são persistentes, me obrigando a aguentar seu toque e sua mão
que abafa meu grito. Procuro por ar e desesperada chuto as pernas próximas
da mesinha de cabeceira. Meu pé bate no abajur, mandando-o direto para o
chão.
Lorenzo congela, sua mão apertando minha boca.
Uma batida alta vibra a parede sob minha cabeça, um punho batendo do
quarto de Shane. Meu sangue congela.
— Ivory! — A voz de Shane ecoa pela parede. — Porra! Você me
acordou, sua puta inútil!
Lorenzo salta de cima de mim e vai até o feixe de luz da porta da
cozinha. Tatuagens tribais escurecem seu peito e a calça de treino folgada
pendura em seu quadril estreito. Uma pessoa despretensiosa poderia
considerar seu físico robusto e seus fortes traços latinos atraentes. Contudo,
a aparência é apenas a pele da alma e a dele é podre.
Eu rolo da cama, abaixo a saia e pego o pão embrulhado do chão. Para
chegar na porta da frente tenho que passar pelo quarto de Shane e pela sala.
Talvez ele ainda não tenha se arrastado para fora da cama.
Com o pulso trêmulo, corro para a escura caverna do quarto de Shane e
pufff! Bato em seu peitoral nu.
Esperando sua reação, desvio do caminho de seu primeiro golpe só para
expor minha bochecha ao forte tapa da sua outra mão. O impacto me manda
de volta ao quarto da nossa mãe e ele me segue. Seus olhos perdidos em
uma neblina de álcool e drogas.
E pensar que um dia ele se pareceu com o papai. Mas isso foi antes…
Todo dia, o contorno loiro do couro cabeludo de Shane recua mais, as
bochechas afundam mais no rosto pálido e a barriga cai sob aqueles
ridículos shorts de treino.
Ele não tem treinado desde que desertou dos Fuzileiros Navais, quatro
anos atrás. O ano em que nossa vida virou uma merda.
— Por que... Diabos… — diz Shane, empurrando seu rosto no meu. —
Você está acordando a maldita casa às cinco horas da manhã?
Tecnicamente são quase seis horas e eu tenho que fazer uma rápida
parada antes da viagem de quarenta e cinco minutos.
— Eu tenho escola, idiota. — Endireito a coluna, ficando mais alta,
apesar do terrível som que azedava meu estômago. — O que você deveria
estar perguntando é: por que Lorenzo estava dormindo no quarto da mamãe,
por que ele colocou as mãos em mim e por que eu estava gritando para que
ele parasse?
Eu sigo a atenção de Shane para seu amigo. Tinta desbotada rabisca as
laterais do rosto de Lorenzo, indiscernível sob a sombra escura das
costeletas. Mas a nova tatuagem no pescoço queima com tanta ousadia e tão
preta quanto seus olhos. Destruir era o que dizia e o modo como ele me
encarava era uma promessa.
— Ela deu em cima de mim de novo. — O olhar fixo de Lorenzo recai
sobre mim, sua expressão um livro aberto de malícias. — Você sabe como
ela é.
— Mentira! — Eu me viro para Shane, minha voz suplicando. — Ele não
me deixa em paz. Toda vez que você se vira, ele puxa minhas roupas e…
Shane agarra meu pescoço e me joga de cara no batente da porta. Eu
tento escapar lutando contra a força de sua ira, mas minha boca encontra o
canto pontiagudo.
Dor explode em minha boca. Quando sinto o gosto de sangue, levanto o
queixo para evitar que suje minha roupa.
Ele me solta, seus olhos opacos e pálpebras pesadas, mas seu ódio me
apunhala mais forte do que nunca.
— Se você mostrar seus peitos para os meus amigos de novo, vou cortar
essas merdas fora. Você me escutou?
Minha mão voa para os meus peitos e meu coração afunda quando minha
mão desliza no decote em V da camisa. Pelo menos dois botões se foram.
Merda! O instituto vai me reportar ou pior, me expulsar. Em desespero,
procuro pelas pequenas bolinhas na cama e no mar de roupas espalhadas no
chão. Eu nunca vou encontrá-las e se eu não sair agora, terá mais sangue e
botões perdidos.
Eu me viro e corro pelo quarto de Shane, seus gritos furiosos me
impulsionando a ir mais rápido. Na sala, eu pego a mochila do sofá que
durmo e logo depois estou do lado de fora da porta, exalando meu alívio
sob o céu cinza. O sol não irá nascer por mais uma hora e tudo está calmo
na rua vazia.
Enquanto dou um passo no gramado da frente, tento apagar os últimos
dez minutos da cabeça ao guardá-los em malas. De estilo antigo, prendo o
couro marrom com fivelinhas beges. Então, imagino a mala na varanda.
Fica lá porque eu tenho um limite para carregar.
Uma corrida curta me leva em direção a rota 91. Se eu me apressar, eu
ainda consigo dar uma olhada em Stogie antes do próximo ônibus.
Contornando os buracos que marcam as majestosas ruas arborizadas,
passo pelas fileiras de chalés e casas espingarda pintadas com cores
vibrantes e adornadas com marcas registradas do verdadeiro sul: cercas de
ferro forjado, luminárias a gás, janelas guilhotinas e frontões trabalhados
com arabescos ornamentais. Está tudo lá, se alguém conseguir olhar além
das varandas caídas, do grafite e do lixo em decomposição. Lotes vazios e
cobertos de mato marcam a paisagem urbana como se precisássemos do
lembrete do último furacão. Mas a reverberação do Treme cresce no solo
fértil, na história cultural e no sorriso degastado das pessoas que chamam de
lar a parte de trás da cidade.
Pessoas como Stogie.
Alcanço a porta altamente bloqueada de sua loja de música e encontro a
maçaneta destrancada. Apesar da escassez de clientes, ele abre a loja no
momento que acorda. Afinal, esse é o seu sustento.
O sino no alto toca quando entro na loja e minha atenção se volta como
de costume para o antigo Steinway no canto. Eu passei cada verão que
posso me lembrar batendo as teclas daquele piano até minhas costas doerem
e meus dedos perderem a sensibilidade. Por fim, essas visitas se tornaram
em um emprego. Cuido dos clientes, da contabilidade, do inventário e do
que mais ele precisa. Porém, só nos verões quando não tenho nenhuma
maneira de ganhar outra renda.
— Ivory? — O barítono rouco do Stogie gorjeia pela lojinha.
Eu ponho o pão de banana sob o balcão de vidro e grito para os fundos.
— Só estou deixando o café da manhã.
O som de mocassim sendo arrastado sinaliza sua aproximação e seu
corpo encurvado emerge do quarto nos fundos. Noventas anos e o homem
ainda consegue se movimentar rápido ao cruzar a loja com seu frágil corpo
como se não estivesse abatido pela artrite.
O olhar enevoado nos olhos escuros mostra sua visão ruim, mas ao se
aproximar, ele nota de imediato os botões faltando em minha camisa e o
machucado inchado em meu lábio. As rugas debaixo da aba do seu boné de
beisebol aumentam. Ele já viu o trabalho de Shane antes e eu fico muito
feliz que ele não pergunta ou fica com pena. Eu posso ser a única garota
branca nesse bairro e com certeza a única criança com uma educação em
uma escola particular, mas as diferenças terminam aqui. Minha bagagem é
tão comum no Treme como as contas jogadas na Bourbon Street.
Enquanto ele me observa da cabeça aos pés, coça o bigode branco que
contrasta com sua pele negra como carvão. Os tremores visíveis percorrem
seus braços e ele endireita os ombros, com certeza em uma tentativa de
disfarçar sua dor. Eu tenho visto sua saúde piorar em meses, impotente para
parar isso. Eu não sei como ajudá-lo ou apaziguar seu sofrimento e isso me
mata por dentro.
Eu vi suas finanças. Ele não pode arcar com medicamentos ou visitas aos
médicos, nem mesmo coisas básicas como comida. E com certeza ele não
pode arcar um funcionário, o que fez com que meu último pagamento no
verão passado fosse bom, mas pesado para ele. Quando eu me formar no Le
Moyne na primavera, eu vou deixar o Treme e Stogie não se sentirá mais
obrigado a cuidar de mim.
Mas quem irá cuidar dele?
Ele puxa um lenço do bolso da camisa, suas mãos tremendo ao levar em
direção ao meu lábio.
— Você parece muito inteligente esta manhã. — Seus olhos astutos
encaram os meus. — E nervosa.
Fecho os olhos enquanto ele limpa o sangue. Ele já sabe que minha
aliada mais forte no instituto renunciou ao cargo de professora chefe do
departamento de música. Minha relação com a sra. McCracken durou três
anos. Ela era a única pessoa no Le Moyne que eu podia contar para cuidar
de mim. Perder seu endosso para uma bolsa de estudos é como começar
tudo de novo.
— Só tenho um ano. — Abro os olhos, bloqueando-os do Stogie. — Um
ano para impressionar meu novo professor.
— E tudo o que você precisa é de um momento. Apenas garanta estar lá
para isso.
Vou pegar a rota 91 alguns quarteirões de distância. A viagem de ônibus
dura vinte e cinco minutos. Depois uma caminhada de dez minutos até o
campus. Verifico meu relógio. Vou estar lá com botões faltando e lábio
machucado, mas meus dedos ainda funcionando. Vou fazer com que cada
momento valha a pena.
Corro a língua no machucado e recuo na vultuosa pele partida.
— Está perceptível?
— Sim. — Ele me lança um olhar estreito. — Mas não tão perceptível
quanto seu sorriso.
Meus lábios se curvam sozinhos, o que tenho certeza que era a sua
intenção.
— Você é encantador.
— Somente quando ela vale a pena. — Ele abre a gaveta bagunçada
próxima do seu quadril e enfia uma mão trêmula nas palhetas de violão, nas
palhetas de sopro, nos pregos… O que ele está procurando?
Ah! Pego o alfinete de segurança ao lado do seu dedo e procuro por
outro.
— Você tem outro?
— Só um.
Depois de alguns ajustes estratégicos, consigo prender as frentes da
minha camisa e dou um sorriso grato a ele.
Com um leve tapinha em minha cabeça, ele faz um movimento de
expulsão.
— Anda. Saia daqui.
O que ele realmente está dizendo é: vá para aquela escola para sair
daquela casa. Sair do Treme. Sair dessa vida.
— É o que eu planejo. — Deslizo o pão pela mesa.
— Ah não, fique com ele.
— Vão me alimentar na escola.
Eu sei que ele percebe a mentira, mas ele aceita de qualquer maneira.
Enquanto me viro para partir, ele pega meu pulso com mais força do que
eu achei que fosse capaz.
— Eles têm sorte de ter você. — Seus olhos escuros piscam. — Não
deixe que aqueles malditos filhos da puta esqueçam disso.
Ele está certo. Só porque minha família não pode oferecer doações
abastadas ou conexões poderosas, isso não faz de mim um caso de caridade.
Minha mensalidade de quatro anos foi paga quando eu tinha dez anos e eu
passei nas audições exigidas quando eu tinha 14 anos, assim como meus
colegas. Durante o tempo que eu continuar superando os outros nos
trabalhos, nos recitais, nas redações e no comportamento, o instituto não
pode ser tão pressionado em me largar.
Dou um beijo na bochecha enrugada de Stogie e parto em direção a
parada de ônibus, incapaz de permitir que o medo retorne a minha barriga.
E se o novo professor de música me odiar, se recusar a ser meu mentor ou
ao me apoiar no processo de matrícula da universidade? Papai ficaria
devastado. Deus, esse é o meu maior medo. Será que o papai está me
vendo? Será que ele viu as coisas que fiz para sobreviver? As coisas que
terei que fazer de novo esta noite? Ele sente minha falta como eu sinto a
dele?
Às vezes, o terrível vazio que ele deixou para trás dói tanto que é
impossível suportar. Às vezes eu quero ceder a dor e me juntar a ele, onde
quer que ele esteja.
E é por isso que estou movendo meu maior desafio para o topo da lista de
tarefas.
Hoje, eu vou sorrir.
2

Emeric

À medida que a reunião do corpo docente termina, meus radiantes novos


colegas deixam a biblioteca em um monocromático de ternos engomados e
saltos altos. Permaneço sentado na mesa, esperando que o rebanho se
disperse enquanto observo Beverly Richards com minha visão periférica.
Ela não mudou sua postura autoritária na cabeceira da mesa e não me deu
muito mais do que uma olhada quando me apresentou no começo da
reunião. Mas ela irá, assim que o ambiente esvaziar. Sem dúvida, ela ainda
tem mais um item em sua agenda para discutir. Em particular.
— Sr. Marceaux. — Seus olhos cortam os meus e ela anda pelo chão de
mármore, surpreendentemente silenciosa em seus sapatos pretensiosos, e
fecha a porta atrás do último membro da equipe. — Uma palavra rápida
antes de você sair.
Será mais do que uma palavra, mas não uso da semântica para
desestabilizar a posição que ela acha ter sobre mim. Existem maneiras mais
criativas para por ela de joelhos.
Cruzando as mãos em meu colo, reclino na cadeira de couro, um
cotovelo na mesa e um tornozelo no joelho. Eu a encaro com toda a força
do meu olhar, porque ela é o tipo de mulher que quer algo de todo mundo,
algo poderoso com o qual ela pode manipular de acordo com sua vontade e
visão. Por enquanto, tudo o que ela está conseguindo de mim é minha
atenção.
Beverly caminha ao redor da longa mesa, seu modesto terninho com saia
feito à medida para caber em seu corpo esguio. Vinte anos mais velha do
que eu, ela carrega sua idade com uma elegância notável. Maçãs do rosto
altas e acentuadas. Traços estreitos e aristocráticos. Quase sem nenhuma
ruga na pele pálida.
Difícil dizer se seu cabelo é grisalho ou loiro onde ele se junta na nuca.
Aposto que ela nunca o usa solto, atrair atenção de homens não é sua
vaidade especial. Não, seu orgulho feroz encontra-se em seu senso de
superioridade ao dar ordens e assistir aos subordinados lutarem para bajulá-
la.
Nossa primeira e única reunião cara a cara durante o verão expôs um
pouco de sua natureza. O resto eu deduzi. Ela não virou a diretora do Le
Moyne pela bondade de seu coração ou diminuindo a concorrência.
Eu sei em primeira mão o que leva para supervisionar uma escola
preparatória como essa.
Eu também sei como é fácil perder essa posição.
À medida que ela passa por mim, seus olhos aguçados passam pelos
cantos entre as estantes de mogno, a mesa vazia do bibliotecário e os sofás
vagos na extremidade. Sim, Beverly. Estamos sozinhos.
Ela se abaixa na cadeira em frente à minha, suas pernas se cruzando no
joelho e me olha com um sorriso calculado.
— Tudo instalado na sua nova casa?
— Não vamos fingir que você se importa.
— Muito bem. — Ela passa suas unhas muito bem lixadas sob a saia. —
O advogado de Barb McCracken entrou em contato comigo. Parece que ela
decidiu não sair sem fazer alarde.
Não é problema meu. Encolho os ombros.
— Você disse que cuidaria disso.
Talvez Beverly não seja tão competente quanto imaginei.
Ela cantarola, mantendo seu sorriso, porém mais tenso agora.
— Eu cuidei disso.
— Você ofereceu mais dinheiro?
Seu sorriso desliza.
— Mais do que era necessário, a gananciosa… — Seus lábios se
estreitam ao mesmo tempo que ela recosta na cadeira e encara o outro lado
do ambiente. — De qualquer forma, está finalizado.
Relaxo minha boca em um meio sorriso, em um sinal deliberado de
diversão.
— Já está repensando nosso acordo?
Ela volta a me encarar.
— Você é um risco, sr. Marceaux. — Seus olhos se estreitam em faíscas
geladas ao girar a cadeira para me encarar. — Quantas ofertas de emprego
você teve desde o fiasco em Shreveport? Hã?
Sua provocação acorda uma corrente de raiva e traição que acelera meu
pulso. Minha garganta queima para rebater, mas tudo o que dou a ela é uma
sobrancelha arqueada.
— Certo. Bem… — Ela funga com a insolência. Ou dúvida. Possível que
seja os dois. — Le Moyne tem uma reputação inigualável na qual eu sou a
responsável por preservar. A partida de McCracken e minha vontade de
contratar você como substituto, estimulou uma desconfiança indesejada.
Ao mesmo tempo que Shreveport destruiu minha reputação profissional,
a razão da minha demissão nunca foi a público. Mesmo assim, as pessoas
falam. Suspeito que a maior parte do corpo docente e das famílias dos
estudantes escutarão os rumores. Eu prefiro expor a verdade a me submeter
aos julgamentos baseados em rumores distorcidos. Porém os termos do
trabalho oferecidos por Beverly exigem meu silêncio.
— Lembre-se de nosso acordo. — Seus cotovelos estão pressionados no
corpo e seus olhos excessivamente brilhantes, quase vítreos. — Mantenha a
boca fechada e me deixe guiar o instituto e suas conversas frívolas.
Ela diz isso como se eu devesse ficar impressionado com suas práticas
antiéticas nos negócios. Mas o que ela faz de forma inesperada é estender
sua mão. Seu medo é perceptível. Ela demitiu injustamente uma professora
titular e pagou a mulher para ficar quieta, tudo para me trazer aqui para seus
ganhos pessoais. Se tivesse mesmo o controle sob a situação, ela não teria
sentido a necessidade de começar essa conversa. Ela pode ter bastante
sangue frio para destruir a vida das pessoas, mas isso não significa que ela
está preparada para jogar esse jogo. Meu jogo.
Esfrego o polegar no meu lábio inferior, deleitando com o modo como
seus olhos relutam para seguir meu movimento.
A pele em cima do colarinho fica vermelha.
— É crucial que mantenhamos a atenção em seus resultados como um
professor. — Ela levanta o queixo. — Espero que você dê um exemplo
profissional dentro da sala de aula…
— Não me diga como fazer o meu trabalho. — Eu era um professor
muito bem respeitado antes de subir na hierarquia administrativa. Foda-se
ela e sua ousadia hipócrita.
— Como a maioria dos professores, você parece ter um problema em
aprender. Então tente prestar atenção. — Ela se inclina para a frente, seu
tom baixo e afiado. — Não aceitarei que suas perversões obscureçam os
corredores da minha escola. Se sua má conduta, como em Shreveport, se
repetir aqui, o acordo está cancelado.
O lembrete do que eu perdi acende uma chama em meu peito.
— Essa é a segunda vez que você menciona Shreveport. Por quê? Está
curiosa? — Nivelo um olhar desafiador para ela. — Vá em frente, Beverly.
Tire suas dúvidas importantes.
Ela interrompe o contato dos olhos, seu pescoço endurecendo.
— Ninguém contrata um gigolô para ouvir sobre suas façanhas.
— Ah, então agora eu sou um gigolô? Você está mudando os termos do
nosso contrato?
— Não, sr. Marceaux. Você sabe por que eu o contratei. — Sua voz
aumenta uma oitava. — Com a explícita cláusula de que não haverá
imprudências. — Ela abaixa o tom. — Eu não quero ouvir outra palavra
sobre isso.
Permiti a ela a vantagem desde que ela me contatou. É hora de ver como
ela navega com um pouco de humilhação.
Eu me inclino para a frente agarrando os braços de sua cadeira,
prendendo-a.
— Você está mentindo Beverly. Acho que você quer escutar cada detalhe
indecente da minha indiscrição. Devo descrever as posições que usamos, os
sons que ela emitiu, o tamanho do meu pau…
— Pare! — Ela aspira por ar, uma mão tremendo em seu peito antes de
cerrar o punho e prender a expressão digna que ela usa com o mundo. —
Você é nojento.
Eu rio e descanso minhas costas na cadeira.
Ela se levanta de um salto, olhando para mim.
— Fique longe do meu corpo docente, principalmente das mulheres
trabalhando para mim.
— Verifiquei as ofertas na reunião desta manhã. Você deveria mesmo
atualizar a paisagem.
Havia muitas professoras com os corpos em formas e muitos olhares
interessados em minha direção, mas não era para isso que eu estava aqui.
Eu tenho dezenas de mulheres prontas para vir ao meu chamado e meu erro
em Shreveport… Minha mandíbula enrijece. É algo que não vou cometer de
novo.
— Você por outro lado… — Deixo meu olhar percorrer sua postura
rígida. —Parece precisar de uma deliciosa transa forte.
— Você está passando dos limites. — O tom de seu aviso perde o efeito
com a agitação de seus saltos ao se afastar.
Ela se vira e foge em direção à cabeceira da mesa. Quanto mais ela se
afasta de mim, mais forte ficam seus passos. Mais alguns passos e ela dá
uma olhada sob seus ombros como se esperando me pegar vendo sua bunda.
Eu estremeço. A vadia arrogante realmente acha que tenho interesse.
Fico de pé, passo uma mão no bolso da calça e ando na direção dela.
— O sr. Rivard não está atendendo à suas exigências no quarto?
Ela chega ao final da mesa e recolhe seus papéis, recusando-se a me
encarar.
— Continue com este comportamento e eu garanto que você nunca mais
verá o interior de uma sala de aula de novo.
A ilusão dela sobre controle torna muito difícil manter minhas palavras
guardadas.
Eu entro em seu espaço, apertando-a.
— Me ameace de novo e se arrependerá do resultado.
— Se afaste.
Inclinado, deixo que meu hálito roçar sua orelha.
— Todo mundo tem segredos.
— Eu não…
— O sr. Rivard está esquentando outra cama?
É só um palpite, mas o leve tremor em sua mão me fala que eu estou
perto de algo.
Suas narinas se dilatam.
— Absurdo.
— E o seu filho perfeito? O que ele tem feito para colocá-la nessa
delicada posição?
— Ele não fez nada de errado!
Eu não estaria aqui se isso fosse verdade.
— Você está tremendo, Beverly.
— Essa conversa acabou. — Ela anda ao meu redor com os olhos na
porta e tropeça.
Seu equilíbrio balança, os papéis caem de sua mão e ela cai de joelho aos
meus pés. Perfeito.
Ela me lança um olhar assustado e ao perceber que eu não me movi para
pegá-la, seu rosto fica em um tom discreto de vermelho.
Estalando seus olhos para o chão, recolhe suas coisas com movimentos
raivosos.
— Contratar você foi um erro.
Eu piso nos papéis que ela está pegando e encaro o topo de sua cabeça.
— Então me demita.
— Eu… — Ela olha para a pele de cobra no couro em relevo do meu Dr.
Martens, sua voz sussurrada e decepcionada. — Só use suas conexões.
Para colocar seu filho ingrato na Leopold, a universidade de música mais
bem classificada do país. Esse era o acordo.
Ela me deu um trabalho na sala de aula quando mais ninguém me deu e
eu manteria minha parte do acordo. Mas eu não me curvaria ou me
acovardaria como seus subordinados. Ela não tem ideia com quem está
lidando. Mas ela vai descobrir.
Empurro o papel em direção aos seus dedos e o seguro com o sapato.
— Acho que estamos claros com os termos… — Levanto meu pé
permitindo que ela pegue —, assim como nossas posições nesse acordo.
Ela enrijece, sua cabeça pendendo baixo.
A humilhação está completa.
Eu me viro e saio da biblioteca.
3

Ivory

— Eu ouvi que ela enche o sutiã.


— Que vadia.
— Ela não usou aqueles sapatos ano passado?
Os murmúrios vagueiam pelo corredor lotado, falados por trás de
manicures bem-feitas, mas com a intenção de chegar aos meus ouvidos.
Depois de três anos, como essas garotas ainda não inventaram um material
novo?
Ao passar pelo grupo dos sussurros de marcas renomadas, última edição
de iPhones e cartões pretos American Express, fortaleço meu sorriso com o
lembrete que apesar de nossas diferenças, eu mereço estar aqui.
— Eu me pergunto de que cama ela rastejou essa manhã.
— Sério, eu posso sentir o cheiro dela daqui.
Os comentários não me incomodam. Eram apenas palavras. Palavras sem
imaginação, imaturas e vazias.
Quem estou querendo enganar? Algumas dessas alfinetadas eram
verdadeiras o suficiente e escutá-las de forma tão odiosa sugava o ar de
meus pulmões. Mas eu já tinha aprendido que reações chorosas só as
encorajavam.
— Prescott disse que teve que tomar três banhos depois de passar um
tempo com ela.
Paro no centro do corredor. O fluxo do tráfico se divide ao meu redor
quando respiro fundo e volto a andar em direção ao grupo.
Quando elas me veem chegando, várias garotas se dispersam. Ann e
Heather permanecem observando minha aproximação com a mesma
curiosidade mórbida que os turistas dão aos meus vizinhos sem-teto: sem
piscar, costas eretas e pernas de dançarinas imóveis sob saias da altura dos
joelhos.
— Ei. — Eu me apoio nos armários ao lado delas, sorrindo ao mesmo
tempo que elas trocam olhares. — Vou dizer algo para vocês, mas precisam
prometer que não vão contar.
Seus olhos se estreitam, mas tem interesse ali. Elas amam fofoca.
— A verdade é que… — Aponto para meus peitos. — Eu odeio essas
coisas. É difícil de encontrar camisas que caibam. — E muito menos
comprá-las. — E quando consigo, olhe para isto. — Cutuco o alfinete de
segurança. — Os botões estouram. — Dou uma olhada em seus peitos
chatos e mesmo que eu sinta um pouco de inveja por seus traços altos e
magros, escondo na voz sarcástica. — Deve ser legal não ter que se
preocupar com isso.
A garota alta, Ann, bufa indignada. Magra, graciosa e cheia de confiança,
ela é a melhor dançarina no Le Moyne. Ela também é bonita de modo
intimidador com seus olhos apreciados e lábios carnudos em sua pele negra
escura, aprimorada com tons frios da meia-noite.
Se Le Moyne tivesse bailes de formatura, ela seria a rainha. E por algum
motivo, ela sempre me detestou, nunca nem deu a oportunidade para ser de
outra maneira.
Então, tem sua ajudante. Tenho certeza de que foi a Heather quem fez o
comentário do sapato, mas ela é mais tímida que Ann e medrosa demais
para ser cruel comigo na minha frente.
Eu levanto o pé, torcendo-o para que elas possam ver os buracos no
plástico.
— Usei esses sapatos ano passado. E no ano anterior. E no ano anterior a
esse. Na verdade, esse foi o único sapato que vocês me viram usando.
Heather passa os dedos na longa trança castanha e olha para minha
sapatilha surrada com a sobrancelha franzida.
— Quanto você calça? Eu posso te dar…
— Eu não quero suas coisas usadas.
Eu realmente quero, mas de jeito nenhum vou admitir isso. Já é difícil o
suficiente me defender nesses corredores e de jeito nenhum farei isso em
sapatos emprestados.
Desde o primeiro dia, tenho confrontado suas farpas com franqueza e
honestidade. Isso é o que papai teria feito. Ainda assim, aqui estamos. Um
novo ano e elas já estão zombando de mim com veneno o suficiente para
queimar através da pele.
Por fim decidi usar uma tática diferente, uma mentira inofensiva para
calar a boca delas.
— Esses eram os sapatos da minha avó, a única coisa que ela possuía
quando imigrou para os Estados Unidos. Ela passou para minha mãe que
passou para mim como um símbolo de força e superação.
Eu não tenho uma avó, mas a expressão de culpa em Heather mostra que
eu finalmente explodi sua preciosa bolha dourada.
Triunfo sobe em espiral pela minha coluna.
— Da próxima vez que abrir sua boca condescendente, considere o fato
que você não sabe merda nenhuma.
Heather respira fundo como se eu tivesse a ofendido.
— Seguindo em frente. — Eu me inclino em direção a elas. — Sobre
Prescott Rivard, é o seguinte… – Olho em volta do corredor cheio, como se
eu desse a mínima para quem me escuta. — Ele tem um problema sexual.
Todos os garotos têm. Eles querem e se você não dá, eles pegam.
Entenderam?
Ann e Heather me encaram sem expressão. Ignorantes. Como elas não
sabem disso?
Ajeito a alça da mochila no ombro, minha pele coçando com algumas
verdades que estou deixando de fora.
— Alguém tem que dar um passo à frente para fazer esses garotos
felizes. Eu só estou fazendo minha parte para deixar a escola livre das
violências sexuais. Vocês deveriam me agradecer.
Eu faço isso soar muito mais caridoso do que realmente é. Faço o que
faço por sobrevivência. Foda-se o resto.
Ann olha para mim com seu nariz franzido.
— Você é uma puta.
Um rótulo que eu tenho desde o meu primeiro ano. Eu nunca
desestimulei suas suposições. Má conduta sexual exige provas. Contanto
que não aconteça na escola e eu não apareça grávida, não serei expulsa. É
claro que os rumores mancham minha reputação já asquerosa, mas também
distraem da verdadeira razão pela qual passo tanto tempo com os garotos do
Le Moyne. Essa verdade me faria ser expulsa em um piscar de olhos.
— Puta? — Diminuo minha voz para um sussurro conspiratório. — Faz
tempo que não faço sexo. Quero dizer, já passaram quarenta e oito horas. —
Eu me viro, esperando por seus arquejos antes de girar, sorrindo para Ann.
— Mas seu pai me prometeu que compensaria essa falha esta noite.
— Meu Deus. — Ann se curva, segurando sua barriga e cobrindo a boca
aberta. — Nojento!
O pai dela? Eu não saberia dizer, mas sexo em geral é nojento. Horrível.
Insuportável.
E previsível.
Eu as deixo em um silêncio chocado e passo a primeira metade do dia
sem perder o sorriso. As manhãs no Le Moyne são fáceis, compostas por
todas as aulas fáceis nos blocos A/B como inglês e história, ciências e
matemática e línguas mundiais. Logo que o meio-dia se aproxima, nos
dispersamos por uma hora para almoçar e malhar antes de nos trocarmos
para irmos para nossas aulas especializadas.
Exercícios diários e alimentação são exigidas como parte da nossa dieta
musical balanceada, mas comer era uma inconveniência considerando que
eu não tinha comida ou dinheiro.
Em pé em frente ao meu armário no Campus Central, a dor do vazio em
meu estômago acorda com um gemido. Sob as camadas de fome está um
pacote bem fechado de pavor. Ou entusiasmo.
Não, com certeza é pavor.
Encaro a impressão dos meus horários da tarde.
Teoria Musical
Seminário de Piano
Aula Magistral de Apresentação
Aulas Particulares
A metade do meu dia será no Pavilhão Meia-Lua. Sala 1A. Todos
ensinados por Marceaux.
Durante a aula de literatura inglesa, por acaso ouvi umas garotas
tagarelando sobre o quanto o sr. Marceaux é gostoso, mas não trabalhei
meus nervos para caminhar até o Pavilhão Meia-Lua.
Minhas entranhas se apertam enquanto eu falo em voz alta:
— Por que tem que ser um ele?
A porta do armário ao meu lado se fecha e Ellie gira por cima do meu
braço para ver o horário.
— Ele é realmente bonito, Ivory.
Eu giro em direção a ela.
— Você o viu?
— Um vislumbre. — Ela agita seu pequeno nariz de rato. — Por que ser
um ele importa?
Porque eu me sinto mais confortável perto de mulheres. Porque elas não
me dominam com músculos e tamanhos. Porque os homens pegam. Eles
pegam minha coragem, força e confiança. Porque só estão interessados em
uma coisa e não é a minha habilidade de tocar os últimos compassos do
Estudo Transcendental Nº 2.
Entretanto, não posso compartilhar isso tudo com Ellie, minha doce e
protegida amiga, criada em um restrito lar chinês. Eu acho que posso
chamá-la de amiga. Nunca definimos isso, mas ela sempre foi legal comigo.
Enfio o horário na mochila.
— Acho que estava torcendo para ser alguém como a sra. McCracken.
Talvez o sr. Marceaux seja diferente. Talvez ele seja gentil e confiável
como meu pai e Stogie.
Cerca de uma cabeça mais baixa do que eu, Ellie passa as mãos nos
cachos de seus cabelos pretos como tinta e faz essa coisa saltitante com os
dedos dos pés. Acho que ela está tentando aumentar sua altura, mas em
grande parte só faz com que ela pareça precisar fazer xixi. Ela é tão
pequena e adorável que eu quero puxar seu rabo de cavalo. Então eu faço.
Ela bate nas minhas mãos, afastando-as e sorrindo para mim ao cair de
volta em seus calcanhares.
— Não se preocupe com Marceaux. Vai dar tudo certo, você vai ver.
Fácil para ela falar. Ela já está com uma vaga garantida como
violoncelista no Conservatório de Boston no ano que vem. O futuro dela
não depende de Marceaux gostar dela ou não.
— Estou indo para a academia. — Ela puxa uma mochila com metade do
tamanho dela sobre seus ombros. — Você vem?
Em vez de organizar uma aula de educação física, Le Moyne oferece uma
academia de ginástica completa, instrutor particular e uma abundância de
aulas de ioga e kickboxing.
Prefiro cortar meus dedos a ficar pulando em uma sala espelhada com
garotas que não gostam de mim.
— Nah. Vou correr na pista lá fora.
Nós nos despedimos, mas minha curiosidade sobre Marceaux me faz
chamá-la.
— Ellie? O quanto bonito exatamente?
Ela se vira, andando de costas.
— Surpreendente bonito. Foi só um vislumbre, mas estou lhe dizendo, eu
senti bem aqui. — Ela dá um tapinha na barriga e arregala seus olhos
puxados. — Talvez um pouco mais para baixo.
Meu peito aperta. Os mais bonitos são os mais feios por dentro.
Mas eu sou bonita, não sou? Dizem que sou, menos por pessoas que
confio e mais por pessoas que não confio.
Talvez meu interior também seja feio.
Quando Ellie se afasta saltitando e joga seu lindo sorriso por cima do
ombro, corrijo minha generalização. Não tem nada de feio em Ellie.
No vestiário, visto um short e uma camisa regata antes de sair para a pista
que circula os oitenta mil metros quadrados do campus.
A umidade impede a maioria dos trezentos alunos de se aventurar do lado
de fora do ar-condicionado nessa época do ano, mas alguns descansam nos
bancos do parque, rindo e comendo seus almoços. Algumas dançarinas
praticam seus aquecimentos sincronizados debaixo das imponentes torres
do prédio do Campus Central.
Enquanto aqueço minhas pernas debaixo da sombra do grande carvalho,
encaro os jardins verdes e a trilha de caminhada emborrachada. As mesmas
trilhas que caminhei com o meu pai quando minha cabeça mal alcançava
seus quadris. Ainda posso sentir sua mão segurando a minha enquanto ele
me conduzia. Seu sorriso era tão cheio de vida enquanto ele apontava para a
antiga catedral de pedra do Pavilhão Meia-Lua e especulava sobre o
tamanho das salas de aulas do lado de dentro.
Le Moyne era sonho dele, um que seus pais não podiam arcar e nem por
isso ele pareceu triste. Porque ele não era alguém que pedia coisas, nem
mesmo seus sonhos. Ao contrário, ele deu seu sonho para mim.
Dobrando minha cintura, alcanço os dedos do pé e deixo que o
aquecimento aqueça meus tendões enquanto as memórias aquecem meu
sangue. Eu pareço minha mãe com os cabelos e olhos escuros, mas o sorriso
é do papai. Queria que ele pudesse me ver agora, em pé aqui no campus,
vivendo seu sonho e usando seu sorriso.
Sorrio ainda mais porque seu sonho, seu sorriso… também são meus.
— Santa mãe de Deus, senti falta dessa bunda.
Em um estalar fico reta, meu sorriso some e meu corpo fica muito rígido
para se virar em direção à voz que faz meus ombros subirem até os ouvidos.
— O que você quer, Prescott?
— Você. Pelada. Em volta do meu pau.
Meu estômago se afunda e uma gota de suor escorre pela minha têmpora.
Endireito a coluna.
— Eu tenho uma ideia melhor ainda. Que tal você enfiar seu pau entre as
suas pernas, dançar igual ao Buffalo Bill e ir se foder.
— Você é tão sórdida — Prescott fala com um sorriso em sua voz ao
andar no meu campo de visão.
Ele para em uma distância apropriada, mas não distante o suficiente. Eu
dou um passo para trás.
Seu longo cabelo comprido está na altura do queixo e as mechas loiras
descoloridas pelo sol Caribenho ou onde quer que ele tenha passado seu
verão. Se a gravata e a camisa estão sufocando-o nesse calor, ele não
demostra enquanto leva seu angustiante tempo passando seus olhos em
mim.
Eu não entendo o porquê das garotas da Le Moyne brigarem por ele. Seu
nariz é muito comprido, seu dente da frente é torto e sua língua se contorce
como uma minhoca sempre que ele a enfia na minha boca.
— Por Deus, Ivory. — Sua atenção se concentra no meu peito,
queimando minha pele debaixo do top. — Suas tetas cresceram mais um
tamanho de bojo durante o verão.
Eu luto com meus ombros, para ficarem em uma posição relaxada.
— Se você está pedindo minha ajuda esse ano, tente de novo.
Seus olhos se mantêm presos no meu peito, seus longos dedos apertando
em volta do saco do seu almoço.
— Eu quero você.
— Você me quer para fazer o seu dever de casa.
— Isso também.
A rouquidão em sua voz me faz estremecer. Cruzo os braços em volta
dos peitos, odiando como eles são perceptíveis, odiando como ele encara de
forma flagrante e odiando como dependo dele.
Seus olhos finalmente se levantam, parando na minha boca.
— O que aconteceu com a sua boca? Pegou em um anel peniano?
Encolho os ombros.
— Era um piercing… grande.
Sua expressão escurece com ciúmes e eu também odeio aquilo.
— Você deveria ter um. — Inclino a cabeça ao som forçado de sua
risada. — Por que não? Aumenta o prazer. — Eu não sei nada sobre
piercings, mas não posso deixar transparecer. — Se você tivesse um, talvez
pudesse fazer uma garota gozar.
Sua risada tensa acaba com uma tosse.
— Espera, o quê? — Seus olhos endurecem. — Eu faço você gozar.
Sexo com ele é muito parecido com remover um tampão. Um puxão
rápido que leva a uma bagunça repugnante, uma que descarto da minha
cabeça até que precise ser feito de novo. Eu não faço o esforço de falar isso
para ele. Ele pode ver no meu rosto.
— Isso é besteira. — Ele avança, cruzando a fronteira do que os
espectadores considerariam uma conversa amigável.
Quando ele alcança o meu braço, olho para o prédio do Campus Central e
acho a janela vazia do escritório da diretora. — Sua mãe está vendo.
— Você é uma puta mentirosa. — Ele não olha, mas deixa sua mão cair.
— Se quer minha ajuda, preciso de um adiantamento.
Ele solta uma risada de nojo.
— Nem pensar.
— Fique à vontade. — Saio correndo, ficando na grama ao lado da pista
e onde não queima meus pés descalços.
Só leva alguns segundos até que as longas pernas de Prescott me
alcancem.
— Espera, Ivory. — O suor se forma em seu rosto enquanto ele corre ao
meu lado em sua camisa de gola. — Você pode parar só por um instante.
Diminuo minhas passadas, ponho os pulsos no quadril e espero ele
recuperar o fôlego.
— Eu não tenho nenhum dinheiro comigo nesse exato instante. — Ele
puxa os bolsos da calça. — Mas te pagarei hoje à noite.
Hoje à noite. Meu estômago embrulha, mas sorrio mesmo assim e puxo o
saco do almoço de sua mão.
— Isso serve até lá.
O almoço é o único adiantamento que eu preciso de qualquer maneira.
Ele tem um estoque ilimitado na cafeteria, então não é como se ele fosse
morrer de fome.
Ele olha para meus pés descalços, a sacola de papel em minha mão e para
em meu lábio machucado. Para um garoto que tem dificuldade com álgebra,
ele não é idiota. Está mais para desinteressado. Desinteressado em meu
problema. Desinteressado no currículo.
Nenhum de nós está aqui para estudar equações de segundo grau ou
biologia celular. Nós viemos aqui para o programa de artes, para dançar,
para cantar, para tocar nossos instrumentos e sermos aceitos nos
conservatórios de música de nossa escolha. Prescott preferia dedicar seu
tempo fodendo e tocando violão clássico a ter que escrever um relatório de
história en Français. Sorte dele que não precisa se incomodar com
trabalhos acadêmicos. Não quando ele pode me pagar para fazer isso.
Ele não é o único idiota no Le Moyne, mas eu limito meus serviços
àqueles com as carteiras cheias e mais a perder. Todos nós sabemos os
riscos. Se um de nós cai, todos caímos. Infelizmente, meu pequeno círculo
de trapaceiros é feito em grande parte por Prescott e seus amigos.
E às vezes, eles levam mais do que pagam.
Espio dentro da sacola do lanche, salivando ao ver rosbife com pão
crocante, uvas e biscoitos de chocolate.
— Onde?
— No mesmo lugar.
O que envolve me buscar à dez quarteirões de distância da escola,
estacionar o carro dele em um estacionamento vazio e fazer mais do que
dever de casa. Mas fui eu quem definiu as regras. Nenhuma troca de
deveres de casa em propriedades da escola ou locais públicos, é muito
arriscado, especialmente com a maneira que a diretora observa seu filho.
— Te vejo na aula. — Ele se afasta, sua atenção presa na janela da
diretora e na silhueta sombreada lá dentro.
Ele jura que ela não sabe de nada, mas ela está procurando uma falha em
mim desde que entrou como Madre Superiora no meu segundo ano. Talvez
seja minha reputação como puta ou minha falta de riqueza. Ou talvez seja a
minha escolha de universidade.
O Conservatório Leopold em Nova York é a universidade mais
competitiva no país e só aceita um musicista do Le Moyne por ano. Quer
dizer, isso se aceitarem qualquer um de nós. Dezenas dos meus colegas se
inscreveram, incluindo Prescott, mas a sra. McCracken disse que eu era a
melhor, eu era a pessoa que ela recomendaria. O que faz de mim a maior
competidora de Prescott. Pelo menos, eu era. Sem a recomendação, posso
muito bem ter voltado para o ponto de partida.
Encolhida debaixo de uma árvore, devoro o almoço de Prescott e me
convenço a não me preocupar com Marceaux, ele vai gostar de mim. Ele
verá que eu mereço aquela vaga. E essa noite… Essa noite eu não entrarei
no carro de Prescott. Nós podemos repassar seus trabalhos na calçada e se
ele tiver algum problema com isso, eu vou embora. Deixo-o falhar em seus
trabalhos e sair da corrida pela Leopold. Vou encontrar outro preguiçoso
para compensar por essa perda na renda.
Enquanto corro na pista de cinco quilômetros que circula ao redor da
propriedade coberta de árvores, fortaleço minha mente e corpo com esse
plano.
Quando o sinal de aviso dos cinco minutos toca pelos prédios, já tomei
banho, troquei de roupa e vagueio pelos corredores cheios do Pavilhão
Meia-Lua, minha barriga revirando.
Tudo o que você precisa é de um momento.
A confiança de Stogie ilumina meus passos, mas é a memória do meu pai
que levanta meus lábios. Se ele estivesse no meu lugar, andando pelos
corredores que ele sonhou, estaria cantarolando com um entusiasmo
descontrolado e gratidão. Eu posso sentir, seu entusiasmo contagiante,
pulsando meu sangue e acelerando meus passos ao entrar na Sala 1A, a
mesma sala de música do ano passado.
Uma impressionante exibição de instrumentos de metal, corda e
percussão se alinham na parede oposta. Seis ou mais dos meus colegas
músicos se reúnem ao redor das mesas no centro de um grande espaço na
forma de L. Se eu andar para o lado, eu poderia ver o grande piano
Bösendorfer na alcova. Mas minha atenção se fixa no homem em frente à
sala.
Empoleirada no final da mesa com os braços cruzados no peitoral, ele
observa a reunião de estudantes com uma expressão inquietante, irritada.
Graças a Deus ele ainda não me notou porque não consigo descolar os pés
do chão ou desviar o olhar.
Ele é inesperadamente jovem, não jovem como um estudante, mas talvez
da idade do meu irmão. Seu rosto é esculpido de forma robusta. Sua
mandíbula bem barbeada, mas ainda tão escura que suspeito que a navalha
mais afiada não raspe a sombra.
Quanto mais encaro, mais percebo que não é seu rosto que parece jovem.
É o seu estilo, tão diferente dos outros professores com seus ternos
conservadores e atitudes modestas.
É a forma como seu cabelo preto está arrumado, curto nas laterais e
longo e bagunçado no topo como se seus dedos tivessem empurrados,
deixando-os cair em sua testa em um caos perfeito. Suas pernas parecem
estar envoltas no jeans escuro, mas uma análise mais detalhada confirma
que ele está usando calças que são cortadas como jeans. As mangas da
camisa xadrez estão enroladas até os cotovelos e a gravata tem um design
xadrez diferente que não combina e de alguma forma funciona muito bem.
Seu colete marrom justo é do tipo que um homem usaria debaixo de paletó.
Exceto que não tem paletó.
De modo geral, seu visual é um casual cosmopolitano, profissional com
personalidade, desafiando o código de vestimenta sem violá-lo.
— Sente-se. — Sua voz retumbante reverbera pela sala, sacudindo meu
íntimo, contudo não é direcionada a mim.
Respiro aliviada antes dele virar em minha direção. Seus olhos azuis se
mexem primeiro, seguido por seu corpo. Suas mãos agarram as bordas da
mesa assim que seu rosto fica à vista. Puta merda, palavras como
surpreendente bonito diluem o efeito da sua imagem. Sim, o primeiro
vislumbre é um choque, mas não é só o seu deslumbre. É a sua presença,
sua projeção de autoconfiança e comando que me faz ficar desorientada,
sem fôlego e com uma sensação muito estranha no fundo do meu âmago.
Ele me encara por um eterno segundo, sem expressão e suas sobrancelhas
se juntam em um V.
— Você é… — Ele olha para o corredor atrás de mim e volta para o meu
rosto. — Você não estava na reunião de equipe essa manhã.
— Reunião de equipe? — Compreensão me dá um soco no estômago.
Ele acha que sou uma professora e agora ele está olhando para mim como
os garotos fazem, seu olhar se arrastando pelo meu corpo e despertando
uma vontade de vomitar em minha barriga. O que me lembra o quanto eu
pareço diferente das outras garotas da minha idade e o quanto odeio essas
diferenças.
Puxo a mochila para frente do meu peito, escondendo as partes mais
perceptíveis.
— Eu não… — Pigarreio e forço meu pé em direção a mesa mais
próxima. — Eu sou uma estudante. Piano.
— Claro. — Ele se levanta, as mãos deslizando para dentro do bolso, a
voz rouca. — Sente.
Seus olhos duros e gelados me seguem e droga, eu não quero ser
intimidada por eles. Tento fortalecer meus passos velozes com a confiança
que eu senti ao caminhar até aqui, mas minhas pernas estão trêmulas.
Ao colocar a mochila embaixo da mesa vazia, sua impaciência troveja
alta e afiada.
— Depressa!
Eu caio na cadeira, minhas mãos tremendo e as batidas do meu coração
parecendo um martelo na cabeça. Se eu fosse mais forte, mais confiante, eu
não me importaria que seu olhar estivesse perfurando o meu e acelerando
meu pulso.
Se eu fosse mais forte, eu seria capaz de ignorar.
4

Emeric

Sou pego de surpresa. Essa é a melhor explicação para o severo tom da


minha voz e a tensão na minha expressão normalmente composta. Eu não
estava preparado para isso. Não para uma mulher alta, voluptuosa e muito
atraente entrar na minha sala. Meu primeiro pensamento? Beverly Rivard
achou a professora de música mais gostosa do país para trabalhar para mim.
Para me testar.
Acontece que ela não é uma professora.
Relaxo meus dedos na borda da mesa. Deus, aquilo teria sido um
péssimo incômodo.
Exceto que isso é pior.
Desconfiança endurece o olhar da garota, que me estuda da primeira
fileira. Sentada rigidamente na cadeira, ela puxa a bainha da saia sobre os
joelhos e mantém as pernas fechadas. Não é a reação que estou acostumado
das mulheres – ou de garotas do ensino médio, por sinal.
Eu me orgulho de ser um professor rigoroso e respeitável. Eu sei como
estudantes femininas olham para mim e estou imune à paixão borbulhante
em seus olhos. Mas ali não tem uma pitada de adoração ingênua em
profundos olhos de mogno que me encaram nesse instante. Nos meus seis
anos ensinando, nunca encontrei uma aluna que tivesse me resumido em um
olhar, considerando e desaprovado minhas intenções.
Talvez essa garota tenha ouvido sobre o erro que cometi com Joanne, a
depravação que levou a perder meu emprego para ela. Bem, foda-se aquele
emprego. Só os meus pais sabem o quanto eu perdi em Shreveport e a
natureza das minhas intenções.
Seja lá o que essa garota acha que sabe, não estou além de usar
intimidação ou demonstração de poder para exigir sua atenção na aula.
Eu mantenho seu olhar incisivo enquanto falo com a turma.
— Encontrem um lugar e guardem seus celulares.
Vários outros alunos entraram e uma rápida contagem de onze garotas e
nove garotos confirmam que todos estão presentes.
Quando o sinal toca, os atrasados vão escolhendo seus assentos.
Reconheço o filho da Beverly das fotos exibidas no escritório dela. Prescott
Rivard é mais arrogante em pessoa, usando um sorriso malicioso em vez de
um sorriso fotogênico. Ele senta do lado bela garota de olhos castanhos e se
inclina sobre sua mesa para torcer um dedo sobre o cabelo dela.
Ela se afasta.
— Pare.
O garoto hipster do outro lado dela se inclina em sua direção, o corpo
magro espremido em calças justas, uma camisa quadriculada e uma gravata
borboleta xadrez. Ele encara a boca dela através da armação preta dos
óculos e sussurra algo muito baixo para eu escutar.
Os lábios dela formam uma linha reta e a expressão sombria em seu rosto
parece vir de algum lugar muito mais profundo do que apenas uma
irritação.
Eu preciso saber o que ele está falando para ela. É uma curiosidade
estranha que pulsa no peito enquanto levanto minha visão para o garoto que
está sussurrando.
— Qual é o seu nome?
Ele reclina, petulantemente relaxado com as pernas esticadas sob a mesa.
— Sebastian Roth.
Ando em sua direção e dou um chute de advertência na ponta de seu
sapato que o impulsiona a se sentar reto.
— O que você disse a ela, sr. Roth?
Ele olha com malícia para a garota, esfregando a mão no lábio para
esconder o sorriso forçado.
— Eu só estava comentando como… Humm… — Ele olha para o peito
dela e levanta o olhar para a boca dela. — Seu lábio está grande. Como seu
lábio está grande.
Prescott explode em risos, seguido por vários garotos sentados ao redor
dele.
É quando eu percebo a segregação nas carteiras. Garotas de um lado,
garotos do outro. Com exceção da garota que parece uma mulher. Se ela
escolheu o assento por urgência ou para se sentar intencionalmente onde os
garotos durões poderiam se reunir ao seu redor, eu pretendo descobrir.
Com as pontas dos dedos nos bolsos e os polegares para fora, me mexo
para ficar diante dela.
— Qual é o seu nome?
Seu lábio inferior está mesmo machucado e inchado. Ela chupa entre os
dentes enquanto os ombros descem devagar para mostrar autoconfiança.
Então ela levanta o queixo e encontra meus olhos.
— Ivory Westbrook.
Ivory. Isso evoca a imagem de palidez com bordas duras e desgastadas
como as teclas do piano ou dentes. Não combina de jeito nenhum com ela.
Ela é um retrato escuro com curvas suaves e cabelos castanhos com uma
profunda pele dourada que parece absorver as sobras da sala que até agora
eu não havia notado.
Merda, eu com certeza vou sair e transar esta noite.
— Srta. Westbrook, encontre um assento com menos distrações. —
Aponto em direção às garotas.
Os enormes e ingênuos olhos de Ivory me encaram como se estivessem
presos no brilho das luzes do palco. Ela pisca, olha para as meninas e olha
para sua própria mesa quando as meninas abrem sorrisos poucos
convidativos. Aquilo responde minha dúvida sobre sua escolha de se sentar.
— Eu não estou aqui para ceder às suas sensibilidades. — Bato uma mão
em sua mesa, fazendo-a pular. — Mexa-se.
Com uma respiração irregular, ela pega a mochila e caminha em direção
às garotas que riem, seu andar pesado, mas determinado.
Cada garoto na sala a observa caminhar para a primeira fila de mesas e
eu não preciso seguir o exemplo para saber o que eles estão olhando: pernas
de stripper, seios empinados e uma bunda alta e redonda que se flexiona a
cada passo.
A parte primitiva e faminta de mim quer se juntar a eles para apreciar
enquanto que a parte protetora quer cobri-la com um casaco enorme. Em
vez disso, o disciplinador assume o controle e dá um tapa de advertência na
parte de trás da cabeça juvenil mais próxima.
Sebastian se encolhe e me lança um olhar assustador.
— Para o que foi isso?
Arranco o celular de sua mão e o jogo nas proximidades da minha mesa,
ultrapassando-a e deslizando para o outro lado até cair no chão.
O resto da sala explode em comoção, guardando os celulares dentro dos
bolsos das mochilas. Todo mundo, exceto Ivory. Mãos dadas em cima da
mesa e sem celular à vista, ela me olha com uma expressão cautelosa.
Sebastian brinca com uma mecha de seu cabelo extremamente oleoso.
— Se quebrou o meu celular…
Levanto uma sobrancelha, meu tom duro.
— Vá em frente.
Ele dá de ombros.
— Meu pai vai me dar um novo.
Mas é claro e seria hipocrisia minha condenar esse garoto por ser um
completo idiota. Eu não era diferente na sua idade, com pais ricos e um ego
inflado de autoimportância. Merda, eu ainda sou um idiota, mas agora eu
sou responsável pelas minhas ações.
Ando para a frente da sala, as mãos unidas nas costas.
— Sejam bem-vindos à teoria musical do terceiro ano. Eu sou o sr.
Marceaux e serei o diretor musical no seu último ano aqui no Instituto Le
Moyne. Depois dessa aula, vocês irão para suas aulas magistrais em
disciplinas específicas. Estudantes de piano permanecerão comigo. Antes
de começarmos, o que vocês querem saber sobre mim?
A garota asiática que Ivory escolheu se sentar ao lado, levanta a mão.
Gesticulo em direção a ela.
— Se apresente, por favor.
Ela se levanta ao lado da mesa.
— Ellie Lai. Violoncelo. — Ela balança nos pés. — Qual é o seu
histórico?
Dou um aceno e espero até ela sentar na cadeira.
— Tenho um mestrado em música pelo Conservatório Leopold em Nova
Iorque. Sou membro da Orquestra Sinfônica de Louisiana e meu trabalho
mais recente foi como diretor da Escola Preparatória Shreveport onde eu
também dirigia o programa de música.
Prescott se mostra fazendo alongamento e sorrindo. Então ele de forma
despreocupada joga os braços no ar e fala sem minha permissão.
— Você tem o quê… Vinte e sete anos? Vinte e oito? — Sua voz arrasta
com rivalidade. — Como você conseguiu seu mestrado, ensinar e se tornar
diretor, tudo em tão pouco tempo? Como, sr. M?
Eu trabalhei pra caralho, seu filhinho da puta preguiçoso.
E pensar que em um rápido deslize do zíper eu perdi tudo, incluindo algo
que nunca quis ter e que acabou sendo a única coisa que importava.
O simples pensamento de Joanne sentada atrás da minha mesa em
Shreveport faz com que meu peito vibre de raiva. Mas imaginá-la seguindo
com a sua vida sem mim faz com que apareça uma fumaça tóxica de
veneno tão invasiva que posso sentir o cheiro da traição em cada respiração
sufocada.
Devagar, rolo o pescoço clareando meus pensamentos e me controlando.
— Eu me formei na graduação mais cedo e dei aula no ensino médio em
Manhattan enquanto fazia o mestrado. Alguma outra pergunta?
Ivory levanta a mão.
— Sim?
Ela permanece sentada sem se mexer e seu olhar escuro e aguçado vem
direto até mim.
— Você toca piano? Quero dizer, é claro que sim, já que será o meu tutor,
mas você toca piano na Orquestra Sinfônica?
Deus, a voz dela… Não é preguiçosa ou estridente como a das outras
garotas de sua idade. É complexa e fascinante como gotas de chuva à meia-
noite.
— Sim, eu toco piano na Orquestra.
Seu sorriso é uma construção noturna que se desenvolve lentamente, uma
expansão tranquila da boca aos olhos.
— Como solista?
— Às vezes.
— Uau.
Não só estou surpreso com sua linha de questionamento, mas também
pela maneira respeitosa que ela olha para mim e faz minha pele zumbir. E
não gosto disso. Estou orgulhoso das minhas conquistas, mas não quando
esse sentimento arrogante me distrai da minha amargura arduamente ganha.
Dispenso as mãos restantes que estão levantadas com um tom de voz
afiado.
— Abram seus livros de teoria musical no capítulo três. Vamos pular
para… — Minha atenção se fixa em Ivory enquanto toda a turma segue
minhas ordens, exceto ela. — Você precisa de um aparelho auditivo, srta.
Westbrook?
— Não. — Ela deixa as mãos caírem no colo e encontra meus olhos. —
Os outros professores me dão uma semana para eu comprar meus livros.
— Eu pareço com os seus outros professores?
— Não, sr. Marceaux. — Uma voz feminina soa no fundo da sala. —
Você com certeza não parece.
Um coro de risadinhas segue, fazendo minha irritação curvar meus
dedos.
Pego meu livro didático na pasta e coloco na mesa dela.
— Capítulo três. — Eu me inclino, aproximando meu rosto do dela. —
Tente acompanhar.
Ela pisca rápido.
— Sim, senhor.
Sua resposta sussurrada toca um desejo pulsante, destrutiva e muito
adulta dentro de mim. Minha pele esquenta e minhas palmas escorregam
com o suor.
Jesus Cristo, vou precisar de uma foda forte essa noite. Couro, corda e
golpes de atrito. Sem palavra de segurança. Sem cuidados pegajosos
posteriores. Chloe ou Deb irão servir. Talvez as duas.
Foco, Emeric.
— Peguem seus tablets e abram no meu website. — De costas para a
turma, continuo falando enquanto escrevo o endereço no quadro branco. —
Encontrarão todas as minhas aulas lá. Eu espero que vocês acompanhem.
Quando encaro a turma, Ivory não se mexeu para seguir minhas
instruções.
Sinto uma veia pulsar em minha testa e coloco os punhos nos quadris.
— Deixe-me adivinhar. Nada de tablet?
— Ela pode sentar aqui — Prescott fala, acariciando o colo —, e dividir
comigo.
Ela aperta a mandíbula e levanta o dedo do meio para ele.
Hesito entre querer socar a cara de Prescott ou chicotear a perfeita bunda
de Ivory. Nenhuma das duas é uma opção legal e a última faz meu sangue
ferver só de pensar.
Minha atenção mergulha em seus lábios por um longo tempo antes de me
dirigir a classe.
— Leiam o capítulo e respondam o questionário no final do capítulo.
Curvo meu dedo para Ivory em um gesto de siga-me.
— Venha para o corredor.
5

Ivory

Eu sigo o sr. Marceaux para fora da sala de aula, com a boca seca e as mãos
suadas. Enquanto a porta fecha atrás dele, minhas entranhas se contorcem
em uma enxurrada de mil punhos.
Ele não é um homem alto, mas ele parece gigante no corredor vazio, uma
gigante montanha brava repercutindo.
Se minha vida dependesse da primeira impressão dele sobre mim, eu fodi
com a minha vida.
Ele esfrega uma mão no rosto, passando-a até o lábio e me encara pelo
que parece ser uma eternidade.
— Você vem para minha aula despreparada e…
— Eu já expliquei a questão do livro com a secretária. Eles sempre me
dão a primeira semana para…
— Não me interrompa — ele diz duramente e se inclina, apoiando a mão
na parede ao lado da minha cabeça.
Um fluxo de sangue atinge minhas bochechas com seus intimidantes
olhos azuis. Sua boca está tão perto que posso sentir um ligeiro cheiro de
canela do chiclete no hálito dele e meu estômago se revira em desconforto.
— Você está deliberadamente tentando desperdiçar o meu tempo? — Sua
mandíbula endurece. — Sem choramingar desculpas ou mentir, você tem
cinco palavras para explicar por que não tem o material.
Cinco palavras? Esse cara está falando sério? Ele pode ir se foder porque
eu só vou dar quatro.
— Eu moro no Treme.
— Treme — ele repete, inexpressivo.
Eu odeio como me sinto rígida e desconfortável sob seu olhar. Eu quero
que ele olhe para outro lugar porque odeio seus olhos, odeio os vívidos
aspectos de safira e o modo como as congelantes faíscas afiadas ficam
nítidas sob a luz fluorescente. Nada poderia ser gentil ou seguro naquele
olhar.
Sua garganta se move no profundo bolso sombrio acima da sua gravata.
— Por quê?
— Por que o quê?
— Por que você mora em Treme?
Ele não só faz uma pergunta, ele estala como um chicote. Como uma
punição que eu não merecia.
Estou a centímetros de distância dele, minhas costas prensadas na parede
e me sentindo na defensiva, encurralada e meus pelos arrepiados por
vingança.
— Ah, sim. Esqueci que tem um diploma muito chique, então vou
simplificar para você.
— Cuidado com a porra do seu tom.
É quase um sussurro, preso e mantido no pequeno espaço entre nós, mas
eu consigo sentir vibrar através de mim como um barulho trovejante.
Ele não disse nada de choramingar desculpas ou mentir? Muito bem.
Eu limpo a atitude da voz e lhe dou a verdade pura e não polida.
— Eu moro no Treme porque minha família não pode arcar com uma
mansão no Garden District, sr. Marceaux. Eu não posso comprar um celular
ou qualquer tipo de aparelho eletrônico. Eu não posso comprar um tênis de
corrida ou comida para o meu gato. E esses… Esses braceletes eletrônicos
que todos os meus colegas usam quando estão se exercitando? Eu não sei
para o quê servem, mas eu não posso comprar um desses também. E neste
exato momento, eu não tenho dinheiro para os materiais da escola. Mas vou
ter até o final da semana.
Se endireitando, ele dá um passo para trás e abaixa sua cabeça. Isso é um
maldito sorriso que ele está escondendo? Eu juro por Deus que vi um. Ele
realmente está aproveitando dessa patética avaliação da minha vida? Que
merda de pessoa. Esse é o professor que eu deveria admirar? Aquele que
vai me ajudar ou me destruir? Meus pulmões se agitam, batendo juntos.
Quando ele levanta a cabeça, seus lábios estão em uma linha reta e seus
olhos profundamente gelados parecem manipular sua expressão,
distorcendo para uma montagem de outros rostos que me assombram
enquanto durmo.
— Eu deveria sentir pena de você?
— Nunca. — Fervilho cerrando os dentes. — Eu nunca iria querer isso.
— Não? Então o quê? Espera que eu faça exceções para você?
— Não, só… — Eu nunca conheci um idiota mais insensível e hipócrita.
— Só me reporte ou faça seja lá o que vá fazer.
Percebo que algo não está certo no momento que ele olha para o corredor
para verificar se estamos sozinhos. Eu sei que toda essa situação é
inapropriada quando ele se curva em minha direção e coloca suas mãos na
parede, me prendendo. E eu sei que não há uma maldita coisa que eu possa
fazer quando ele sussurra por cima das batidas dos meus ouvidos.
— Não se preocupe com sua punição. — A atenção dele volta para os
meus lábios antes de retornarem para os meus olhos. — Vou cuidar disso
depois.
E assim do nada, minha força, minha coragem, tudo o que eu desejava ter
agora, me abandonam nos pesados braços do medo. Eu estive nessa posição
incontáveis vezes. É a primeira vez com um professor, mas ele não é
diferente daqueles outros aproveitadores. Eu poderia reportar ele, mas em
quem acreditariam? A garota com a reputação de puta ou o antigo diretor da
Shreveport? E enquanto eu sei que não posso subjugá-lo, sei que vou
sobreviver. Eu até talvez possa controlar minhas emoções enquanto está
acontecendo como um Noturno, Op. 27 Nº 2 de Chopin em Ré Bemol
Maior.
Eu me assusto quando sua mão sobe, não para agarrar meus peitos, mas
para segurar meu queixo para que ele pudesse ver melhor o meu lábio.
— Você precisa ir para a enfermaria e pedir para que coloquem algo
nesse corte.
Só quando ele me solta e desliza as mãos para dentro dos bolsos que
percebo que estou tremendo. Ele dá um passo para trás, cotovelos largos e
ombros soltos. Um calafrio dissipa pelo meu corpo.
Ele me observa com seus olhos azuis árticos, não tenho certeza se devo ir
para a enfermaria ou esperar ser dispensada. Por alguma razão, isso
importa. Como se ele estivesse me testando. Então, eu aguardo.
Ele é um idiota imprevisível e sem coração, mas também me surpreende.
Ele não forçou sua boca na minha ou colocou seus dedos entre minhas
pernas. Ele… Deu um passo para trás?
Talvez eu ainda tenha chance de provar que não sou só uma garota pobre
ou alguém para apalpar no corredor por cinco minutos.
Um constante clique de sons agudos preenche o silêncio entre nós. Sigo o
barulho com meu olhar, traçando sob sua gravata e colete, visualmente
traçando o escuro cabelo em seu antebraço exposto e parando no relógio
mecânico em seu pulso.
Rodas em movimentos com pontas semelhantes a dentes giram dentro do
enorme mostrador, tiquetaqueando e medindo o ritmo do tempo como um
metrônomo. Será que cada momento que passo com ele significará uma
sequência irreversível no futuro? Ou ele me prenderá aqui, no presente,
nessa vida?
— Srta. Westbrook.
Volto minha atenção para seu rosto, as linhas angulares de seu queixo, as
sombras escuras em sua bochecha onde a barba irá crescer e a curva dos
lábios que não foram machucados pela circunstância. Ele parece intocável.
Talvez seus punhos sejam cruéis como sua beleza. Só de olhar para ele
parece como se eu estive respirando fogo.
Porque ele é perigoso. E ele também parece saber disso ao empurrar um
dedo impaciente em direção à enfermaria, sua voz cheia de urgência.
— Vá.
Eu me viro e corro em direção ao corredor com o peso de seu olhar
pressionado nas minhas costas.
6

Emeric

Ivory não olha para trás enquanto corre pelo corredor, ela não se atreve a
encontrar meus olhos. Contudo, a pressa descontrolada em seus passos me
fala tudo. Eu mexi com ela. Não minha influência profissional, mas minha
presença masculina. Eu a amedronto.
Um grande sorriso aparece em minha boca.
Separados pelo comprimento do corredor, eu ainda sinto os e se
queimando entre nós. Eu sei que ela imaginou a gente junto quando a
encurralei na parede. Tenho certeza que ela sentiu a troca de energia, talvez
até tenha detestado, já que a respiração dela acelerou e as pupilas dilataram.
E mesmo assim, ela aguardou minha permissão para sair.
Sabendo disso, observo ela correr e a visão do seu corpo curvilíneo
balançando inocentemente, tudo desencadeia uma necessidade predatória
dentro de mim. A necessidade de perseguir.
Mas eu não vou. Não aqui. Nunca. Respiro e aguardo que minha ereção
receba a mensagem.
No momento que ela desaparece na esquina, eu me encosto na parede.
Ela é mesmo o tipo de garota que me atraí. Uma mulher que foge quando
caçada e ganha vida quando é pega. Uma mulher que se curva às punições e
procura por aceitação ao ser humilhada. Uma mulher que morde uma mão
pesada apenas para derreter em torno do punho implacável que bloqueia seu
ar.
Eu exigi sua honestidade – sem choramingar desculpas ou mentiras – e
esperei que ela recuasse, me desobedecesse ou me mandasse para a puta
que o pariu. Mas ela não o fez, não poderia. Foi o momento que eu percebi
que é da sua natureza me dar o que eu queria. Quando ela expôs os detalhes
constrangedores da sua pobre vida, oferecendo suas vulnerabilidades para
que eu pudesse zombar, que Deus me ajude, foi maravilhoso, trágico e
sedutor – a trindade da tentação.
Uma gulosa palpitação apertou a frente da minha calça, mas a reação não
significa nada. É simples, na verdade. Quero sexo. Sexo indecente e
pervertido. Nada mais. Por mais machucado e furioso que eu esteja do meu
último erro, estou relutante em seguir em frente e incapaz de deixar que a
Joanne vá. Mas eu também sou rancoroso e vingativo o suficiente para
foder quantas mulheres possíveis com o controle bruto que Joanne deseja e
não pode mais ter. Talvez ela se engasgue com seu ciúme venenoso.
O que faz de Ivory uma provocação tentadora. Eu posso dar a ela
exatamente o que ela precisa. Eu posso treiná-la, objetificá-la e corrompê-
la, e ela deixaria porque se entregar é a estrutura da sua sexualidade.
Mas eu também poderia me perder nela, porque ela é o tipo de mulher
com quem eu cometo erros.
Exceto que ela não é uma mulher.
Como aluna do último ano, ela tem pelo menos dezessete anos, a idade
legal para o consentimento. Mas ela ainda é uma criança com dez anos a
menos do que eu e a conduta sexual entre professor e estudante é punido
com prisão, não importa a idade.
A concepção é desanimadora, esvaziando meu pau e mantendo minhas
mãos quietas com muito mais facilidade.
De volta a sala de aula, os alunos me bombardeiam com perguntas sobre
escala cromática e o ciclo das quintas. Devagar, minha fixação em Ivory
escorrega para os cantos da minha mente.
Até que a porta abre e seus olhos escuros encontram os meus de
imediato.
Continuo com a aula enquanto ela desliza atrás da mesa, seu lábio
inferior brilhando com a pomada. Não olho para ela por mais de meio
segundo. Eu sou o adulto aqui, aquele em controle das nossas interações.
Ignoro minha fascinação por ela, fingindo que não quero devorá-la com
meu olhar e colocando limites apropriados. Estou aqui para ensinar a ela e
isso não inclui instruções sobre como chupar corretamente o meu pau.
Para falar a verdade, apesar do meu desgraçado final como diretor de
Shreveport, estou animado por estar de volta à sala de aula. Nada me
completa como o sentimento de pertencimento em estar diante de uma
plateia extasiada e poder chamar atenção com o som da minha voz. Isso não
é um emprego. É um bom uso das minhas necessidades para influenciar e
dominar, um lugar onde posso disciplinar as fraquezas, moldar as mentes
confiantes e inspirar os estudantes com minha paixão pela música.
Minhas veias pulsam com energia enquanto escuto os alunos discutirem
sobre a aplicação do cantochão. Eu me sento em uma cadeira de frente para
a sala, acenando em encorajamento e interferindo somente quando eles
saem do tópico. Eles olham para mim em busca de conhecimento e
estremecem sob minhas ordens. E eu gosto disso.
Foi por isso que eu não lutei para manter meu trabalho em Shreveport.
Eu preciso disso… Dessa liberdade para deixar todas as besteiras
administrativas para trás e focar no meu amor pelo aprendizado.
A discussão na classe aumento o volume, vozes se chocando à medida
que o debate sobre o uso da pauta musical aumenta. Estou a segundos de
pôr um final a discussão quando Ivory entra.
— Gente, relações comuns em pautas são estereotipadas. — Ela franze a
testa. — Mas ainda é possível obter um sentimento de emoção na música.
— Ela rapidamente reforça suas ideias com exemplos válidos com o
Concerto para Violino de Schoenberg.
Nenhuma vez ela menciona o texto. Nem mesmo quando cita as
composições ornamentais por número de opus. A turma escuta em silêncio
e quando o sinal toca, ela persuadiu o debate magnificamente.
Eu fico… impressionado. Ela conhece o material quase tão bem quanto
eu. Se ela tocar piano com a mesma aptidão, vou ter que puni-la só por me
fazer ficar encantado pra porra.
Seus olhos encontram os meus enquanto a turma vai diminuindo. Restam
cinco estudantes, mas estou muito focado em uma para notar os outros. Tem
algo reconhecível em seu olhar. Desconfiança? Acusação? Abuso. O que
quer que ela esteja expondo é ao mesmo tempo ofensivo e assustador.
Endureço meu olhar, uma repreensão silenciosa. Ela afasta o olhar,
esfregando os lábios com pomada enquanto segue seus colegas.
Três meninos e duas meninas compõem os pianistas do último ano do Le
Moyne, incluindo o idiota hipster, Sebastian Roth. Ele muda de assento
durante as aulas, deixando uma fileira entre eles ao se sentar próximo de
Ivory. Vou permitir desde que ele não olhe para ela, nem um maldito olhar.
Como os arquivos dos estudantes não chegaram para minha mesa antes
da hora do almoço, não tive tempo de ler. Mas eu sabia que as últimas aulas
da minha agenda seriam com um grupo íntimo. As vantagens de
desembolsar uma mensalidade tão cara são muitas, todas ilustradas na
brilhante ficha do Le Moyne com uma página inteira de 1:5 dedicada à
relação professor-aluno.
— Então é assim que os melhores pianistas da Le Moyne se parecem? —
falo com dúvida, deixando claro que eles teriam que se provar. — Vocês
acham que têm o necessário para se tornarem pianistas, compositores e
professores virtuosos, qualquer coisa que não sejam pirralhos privilegiados
e esnobes?
Exceto Ivory. Nada nela fede a privilégio, suas roupas e seus sapatos
esfarrapados e sua incapacidade de comprar os livros. Como é que uma
garota de um bairro pobre consegue uma vaga aqui? É estranho. E
perturbador.
Forçando-a a sair da minha mente, ando pelas fileiras com minhas mãos
cruzadas atrás de mim e estudo cada um dos cinco estudantes, sem registrar
seus traços individuais. Eu não dou a mínima para como eles se parecem.
Estou procurando por colunas eretas, lábios separados e olhos alertas.
Cinco pares de olhos se estreitam em mim, seus corpos inclinados para
seguir meus movimentos e as respirações engasgadas, esperando enquanto
passo por cada mesa. Eu tenho a atenção deles.
— Estaremos juntos três horas por dia, todos os dias até o fim do ano
letivo. teoria musical, seminário de piano, aula magistral de apresentação e
para alguns de vocês, aulas particulares… Foi para isso que o papai e a
mamãe gastaram tanto. — Minha caminhada sem pressa acaba na frente da
sala e eu me viro para olhar eles. — Não desperdicem meu tempo e eu não
desperdiçarei o dinheiro de seus pais. Não me levem a sério e eu com
certeza foderei com as perspectivas de futuro de vocês. Estamos
entendidos?
No silêncio que se segue, quase posso sentir o cheiro da mistura de
apreensão e começo de respeito.
— Não vou dar aula ou colocá-los no banco do piano hoje. — Olho para
os arquivos dos alunos na minha mesa. — Vou usar as próximas horas para
uma discussão individual com cada um de vocês. Não pensem nisso como
uma entrevista, apenas uma pequena reunião para ajudar a me familiarizar
com seu histórico e objetivos acadêmicos.
Sem convite, meus pensamentos voltam para Ivory e todas as maneiras
com a qual eu não posso conhecê-la. Passo uma mão pelo cabelo, evitando
o piscar de seus olhos. Eu me coço para conversar com ela novamente, para
saber como uma garota do Treme consegue pagar uma das mensalidades
mais caras do país.
Talvez eu não quisesse saber.
Mas eu sei que preciso de um momento para reunir um pouco de
autocontrole.
— Sr. Roth, começarei com você.
Vou guardar a tentação para o último.
7

Ivory

Giro o lápis entre os dedos e tento não abrir um corte em meu lábio.
Sentada no chão do fundo da sala em forma de L, observo o sr. Marceaux
através do labirinto de pernas das cadeiras enquanto ele administra as
reuniões individuais em sua mesa.
Um grande espaço separa a gente, o comprimento de duas salas de aulas
normais cheias de mesas e instrumentos. Mas quando ele olha na minha
direção, o que é perturbadoramente frequente, posso vê-lo. Eu também
posso me mexer um pouco e obstruir o contato visual.
Às vezes não me mexo, meu olhar paralisado sob a força do dele. Por
quê? Essa preocupação que tenho com ele é a coisa mais estranha. Eu quero
aprender mais sobre ele – o que ele come, o que ele escuta e aonde ele vai
quando não está aqui. Quero estudar cada movimento calculado dele,
observar o caminho de seus dedos no queixo, encarar os traços robustos de
seu rosto e memorizar a forma como a calça delineia sua forma. Ele é
encantador, uma distração e sem dúvida assustador.
Por que não posso focar em outra coisa? Isso não tem nada a ver com a
minha ambição para a universidade e seu papel nisso. Santo Deus, eu nem
cheguei a pensar nisso. Eu só quero… O quê? Que ele olhe para mim? Eu
odeio seus olhos, ainda assim, eu observo os dele, esperando que se virem
em minha direção. Isso é tão fodido.
Ele disse que poderíamos usar o período de tempo livre para estudarmos,
mas eu não consigo me concentrar. Eu não consigo pensar em nada a não
ser o enigma na frente da sala de aula.
Dois estudantes, Sebastian e Lester, deixaram a sala após a reunião.
Sarah escolheu ficar depois da vez dela e Chris está lá neste momento,
empoleirado e ereto na cadeira, acenando com a cabeça para qualquer coisa
que o sr. Marceaux esteja dizendo.
Sobrando apenas eu e a espera pela minha vez, que está esfolando minhas
entranhas.
— Psiu. Ivory.
Eu me viro em direção a Sarah que copia minha posição de pernas
cruzadas – nossas saias esticadas sobre os joelhos por recato – na outra
extremidade da parede dos fundos.
— Vem cá — sussurra.
Balanço a cabeça, relutante em desistir da visão.
Com um suspiro, ela abaixa o livro e engatinha em minha direção.
Isso vai ser interessante. Eu acho que ela falou comigo duas vezes nos
últimos três anos. Eu desisti de ser sua amiga quando ela disse que o
hambúrguer que eu estava comendo era feito de cobiça, mentiras e
assassinatos. Eu não tenho o luxo de poder escolher comidas que salvam
animais de fazendas e boicotam agendas políticas.
Seu cabelo castanho e liso é tão comprido que se arrasta no chão
enquanto ela se aproxima até mim de quatro. Ela tem um visual hippie à
moda antiga com cordas de contas multicoloridas penduradas no pescoço,
um vestido longo e esvoaçante que ela amarra na coxa e um brilho travesso
em seu olhar. Tenho quase certeza de que ela não está usando sutiã, mas ela
tem o tipo de constituição esbelta que não requer um.
Ela desaba de forma esparramada ao meu lado, braços e pernas
compridos, sorrindo. O que ela está tramando?
Em um volume muito baixo para ser escutado além do nosso grupo, ela
pergunta:
— O que você acha dele?
Pode me matar. Eu não vou conversar sobre isso com ela.
— Ele é severo.
Ela balança em direção ao sr. Marceaux e linhas retas se formam em sua
testa.
— Ele não. Quero dizer, sim, ele é severo, gostoso e… Alô? Você não
escutou sobre seus outros usos para o cinto?
O cinto dele? Balanço minha cabeça.
— O que você quer dizer?
— É só um boato. Eu quero falar sobre Chris Stevens.
Eu não tenho nenhuma opinião sobre Chris, a não ser que ele tentou
dormir comigo no segundo ano e eu tenho tentado evitá-lo desde então.
— O que tem ele?
— Você transou com ele?
Minhas bochechas queimam.
— O quê!
Sr. Marceaux lança sua atenção para mim.
Merda. Diminuo a voz, cortando as palavras.
— Eu não fiz nada com ele.
— Desculpa, desculpa. É só que… — Ela pega uma mecha do cabelo e
começa a trançá-lo em uma trança fina. — Eu sei que você esteve com
Sebastian, Prescott e… outros. Eles não calam a boca sobre isso e, bem,
esqueça. Eu estava errada em assumir. — Ela deixa a trança cair e me
mostra um par de covinhas. — Estamos bem?
— Sim, estamos bem. — Eu acho?
— Ótimo, porque eu preciso de uns conselhos. — Ela abaixa o queixo e
sussurra: — Sobre sexo. E como você é… hum…
Uma puta? Uma prostituta? Uma vadia suja? Luto com meus ombros
para relaxarem.
— Eu sou o quê?
— Experiente.
Cerro os dentes.
Ela não parece perceber.
— Chris e eu temos uma coisa. Tipo, nós já ficamos e eu tenho… Eu não
sei, me guardado para uma ocasião especial, sabe?
Não, eu não sei. Eu não consigo imaginar alguém ou algo sendo especial
o suficiente para passar por isso.
Ela aproxima tanto o rosto do meu que tudo que eu consigo ver são suas
sardas.
— Como é?
Eu me inclino para trás, ficando mais desconfortável a cada segundo que
passa.
— O quê? Sexo?
— É. — Ela lambe seus lábios. — Isso.
Só de pensar em sexo, meu estômago fervilha com milhares de abelhas.
Aguentar isso é pior do que lamber uma afta escorrendo pus e pele morta.
Mas eu não sei se é assim para todo mundo – as pessoas agem como se as
garotas deveriam gostar disso – então eu dou de ombros.
Ela inclina a cabeça.
— Dói? A primeira vez?
— Sim. — Minha voz falha e esclareço. — Dói. — Nunca para de doer.
— Quantos anos você tinha?
Eu não quero falar sobre isso, mas ao mesmo tempo meu peito aperta
com uma insuportável vontade de compartilhar. Ninguém nunca havia me
perguntado sobre minhas experiências sexuais. Com certeza, não a minha
mãe e eu nunca tive uma melhor amiga. Não é isso o que eu sempre quis?
Conversa de garotas sem julgamentos?
Procuro em seu rosto por sinais de crueldade e só encontro curiosidade
nos olhos brilhantes. Isso produz uma sensação quente no fundo do meu
núcleo. Ela está interessada, talvez até com inveja. Porque eu tenho algo
que ela não. Experiência.
Esticando as pernas, descanso minha cabeça na parede.
— Eu tinha treze anos.
— Uau. — Seu rosto brilha com deslumbre. — Quem? Como? Me conta
tudo.
As palavras vêm com facilidade, jorrada de uma memória tatuada em
cada célula do meu corpo.
— Meu irmão tinha acabado de cumprir seu tempo no Corpo dos
Fuzileiros Navais e voltou com um dos homens da sua unidade. Seu melhor
amigo.
Eu estava tão apaixonada por Lorenzo, tonta por sua boa aparência,
grandes músculos de batalhas e charme robusto. E ele olhou para mim
como se eu fosse a garota mais bonita que ele já viu.
Ele ainda olha para mim e eu o temo no fundo dos meus ossos.
Sarah cobre a boca, seu sorriso escapando entre os dedos.
— Você entregou sua virgindade ao melhor amigo do seu irmão?
Arrepios sobem pela minha coluna.
— Ele estava ficando com a gente até que pudesse arranjar seu próprio
lugar. Eu acordei uma noite e não consegui voltar a dormir, então saí para
me sentar no deck dos fundos.
Só fazia um mês desde que meu pai havia morrido e a perda ainda era tão
dolorosa, um aperto constante em meu peito. Ele costumava dizer, nada é
inconcebível e tudo é possível. A prova está na magia da música. Então lá
estava eu, murmurando sua música preferida de Herbie Hancock, desejando
pelo inconcebível: que ele voltasse.
Sarah se aproxima, sua expressão irradiando mais entusiasmo do que a
realidade que aquela noite merece.
— O que aconteceu?
— O amigo do meu irmão saiu e me prendeu na escada. Ele era tão
grande. Grande em todos os lugares. E forte. Ele sabia o que queria e eu não
pude impedi-lo.
Não consegui impedir que a escada de concreto arranhasse meus peitos e
minhas pernas enquanto ele pegava o que queria por trás. A mão em minha
boca abafando meus gritos. O som da minha camisola rasgando e o cheiro
do seu hálito apodrecendo o ar. A dor entre minhas pernas… As lágrimas, o
sangue, o dolorido por dias seguidos quando ele pegou de novo e de novo.
— Cara. — Sarah relaxou a postura na parede. — Isso soa tão quente.
É mesmo?
— Você tem tanta sorte. — Ela brinca com as pontas do cabelo. — Você
tem peitos, experiência e caras como esse dando em cima de você. Quero
isso. Eu acho que estava com medo, mas definitivamente estou pronta
para… você sabe… com Chris.
Deve ter alguma coisa de errado comigo, porque peitos, sexo e tudo o
que ela disse me fazem quere vomitar minhas tripas.
— Sarah, não…
— Entre eu e você, as garotas daqui só são malvadas com você porque
estão com ciúmes. Quero dizer, olhe para você. Homens querem isso. —
Ela balança uma mão para indicar o meu corpo. — Não é de admirar que
você dormiu com metade da escola.
Bile prende minha garganta e engulo de volta repetidas vezes para mantê-
lo no estômago.
— Ah, veja, ele acabou. — Sarah se levanta de um salto, pega seus livros
e corre apressada pela sala até Chris.
Parte de mim quer derrubá-la no chão e implorá-la para ficar longe dele.
Mas a outra parte, a parte egoísta, almeja sua aceitação. Se ela fizer sexo
com Chris, ela vai ser igual a mim. Talvez ela vá falar mais comigo,
confidenciar comigo. Talvez eu possa compartilhar outras coisas, coisas
assustadoras sobre homens e suas necessidades.
— Srta. Westbrook. — O sr. Marceaux se levanta da cadeira com os
punhos nos quadris e um frio nos olhos. — Não me faça esperar.
8

Emeric

Tento ler o arquivo de estudante dela, mas as palavras fogem. Estou muito
distraído, todos os meus pensamentos se afunilam em direção a garota que
está sentada do outro lado da mesa. Mandei todos os outros estudantes para
casa e agora é só Ivory, eu e essa distração inconveniente.
Seus dedos finos se juntam no colo, as costas eretas e o cabelo escuro cai
gracioso por volta das linhas de seu pescoço. Um sorriso se forma em seus
lábios, uma expressão que parece vir naturalmente a ela, porém menor do
que os antecessores. Instável. O tipo de sorriso que garotinhas dão quando
estão assustadas.
Deixo o arquivo cair na mesa e me inclino para frente, invadindo sua
invisível bolha de tensão.
— Do que você tem medo?
Eu sei a resposta, mas quero ouvir como soa em seus lábios.
— De nada. — Ela coça um dedo no nariz. Um pequeno gesto revelador.
Ela está mentindo.
Bato um punho na mesa com força o suficiente para fazê-la arfar.
— Essa é a última vez que vai mentir para mim. — Arrancarei a verdade
dela se for preciso. — Me diga que entendeu.
Uma veia salta e vibra em sua garganta.
— Sim, entendi.
— Bom. — Meu olhar cai para o V em sua camisa, o profundo decote e o
alfinete de segurança que segura quase tudo. Rápido, impeço meus olhos,
treinando-os para seu rosto. — Agora responda minha pergunta.
Ela esfrega as palmas nas coxas e mantém meu olhar.
— Você, sr. Marceaux. Você me preocupa.
Agora sim, muito melhor. Eu quero que ela alimente sua honestidade
comigo, respiração por respiração trêmula.
— Explique o que você quer dizer.
Ela acena para si mesma como se invocando sua coragem.
— Você é inteligente e rigoroso como os outros professores, mas você
tem uma abordagem e um temperamento de um bárbaro sa… — Ela aperta
os lábios um no outro.
— Linguajar é permitido na minha sala de aula, srta. Westbrook. —
Estreito meus olhos. — Desde que usado de forma construtiva.
Ela estreita seus olhos de volta.
— Eu ia dizer sacana, mas eu não sei se de forma construtiva.
Pelo menos ela está pensando em sacanagem.
— Me dê um exemplo do meu suposto comportamento e eu irei decidir
como é construtivo.
Sua boca se abre como se estivesse pasma com a minha resposta.
— Que tal quando estávamos no corredor? Quando eu falei da minha
situação financeira e você… Você sorriu?
Merda, ela viu aquilo?
Eu não posso falar para ela que eu sorri porque a vulnerabilidade dela me
deixou no ápice do desejo e duro como uma pedra. Mas eu posso dar a ela
sinceridade.
— Você está certa. Eu estava errado e peço desculpas. — Pego o arquivo
e folheio as impressões. — Vamos conversar sobre as suas condições.
Vejo a página com seus dados e confirmo seu endereço no Treme. Pulo o
resumo de suas excepcionais notas escolares e notas no teste de
qualificação, me prendendo nos detalhes que me importam mais.
Data de nascimento?
Ela vai fazer 18 anos na primavera.
Pais?
William Westbrook. Falecido.
Lisa Westbrook. Desempregada.
Aquilo explica sua escassez de fundos, mas não como ela paga por uma
escola particular. Espera…
Volto para o nome do pai.
— William Westbrook?
Seus olhos se estreitam. Olho de novo para a página, tentando conectar
os detalhes. Westbrook, falecido, do Treme, filha toca piano…
Jesus Cristo, não acredito que não conectei seu nome antes.
— Você é a filha de Willy Westbrook?
Seus olhos se arregalam, brilhantes e esperançosos como seu sorriso.
— Você ouviu falar dele?
— Eu cresci em Nova Orleans, querida. Todo mundo daqui já ouviu falar
no Piano Bar de Willy.
Seu olhar se volta para dentro e seu sorriso suaviza.
— Eu escutei que é um lugar legal. Os turistas adoram.
Ela diz isso como se nunca tivesse ido, o que contradiz a imagem que eu
tenho dela sentada atrás do famoso piano de Willy depois do expediente e
sonhando em preencher seu talentoso lugar.
Descanso meus cotovelos na mesa, ficando mais próximo.
— Você não mora naquela rua? Você nunca esteve lá?
Ela ergue as sobrancelhas.
— É um bar para maiores de 18 anos. Eu não posso entrar.
Meu cérebro embarca em uma nuvem de confusão.
— Você não vai lá quando está fechado para ajudar a cuidar dos
negócios? Ainda está na sua família, certo?
Exceto que o arquivo diz que sua mãe está desempregada.
Seu olhar cai para o colo.
— Papai vendeu o bar quando eu tinha 10 anos.
Eu odeio quando não posso ver seus olhos.
— Olhe para mim quando estiver falando.
Ela levanta a cabeça, sua voz calma, plena.
— O novo dono manteve o nome e deixou que papai continuasse a tocar
piano lá até que…
Até que uma briga começou no bar, tiros foram disparadas e Willy foi
atingido no peito enquanto tentava dominar o arruaceiro.
Minha familiaridade com a história deveria estar escrita em meu rosto,
porque ela diz:
— Então você sabe o que aconteceu.
— Estava em todos os noticiários.
Ela assente, engole em seco.
A morte de Willy chamou muita atenção. Ele não era somente um
pianista branco de jazz em um bairro de negros, ele também era adorado e
respeitado pela comunidade. O bar dele trazia uma boa quantidade de
dólares turísticos para o Treme e pelo que ouvi, sua popularidade manteve
os negócios bem por anos.
Eu me lembro especificamente de assistir as notícias na televisão sobre
sua morte enquanto visitava Nova Orleans – essa visita em particular foi um
ponto crucial na minha vida. Isso foi… quatro anos atrás? Eu tinha acabado
de receber meu mestrado da Leopold e estava pensando se deveria manter
meu emprego de professor em Nova Iorque ou procurar por um trabalho
mais perto da minha cidade natal.
Na mesma semana, aceitei uma oferta de emprego na Escola Preparatória
Shreveport. E conheci Joanne.
Eu tinha 23 anos naquela época, o que significa que Ivory tinha 13 anos
quando seu pai foi assassinado.
Ela está sentada na minha frente, vigilante e quieta. À medida que o
silêncio se estica, uma sútil transformação aparece em seu corpo, curvando-
o para si mesma e fazendo com que ela pareça menor. Ela pega uma costura
em sua manga, trazendo minha atenção para a costura em sua camisa e
todos os lugares onde as costuras estão se desfazendo. Suas roupas são
baratas, velhas ou gastas pelo uso. Provavelmente todas as opções acima.
Não há um traço de maquiagem em seu rosto bronzeado. Nada de
brincos, braceletes ou qualquer tipo de joia. Nenhum cheiro de perfume
também. Ela com certeza não precisa de nenhum tipo de melhoria para ficar
bonita. Sua beleza natural supera todas as mulheres em que já coloquei
meus olhos na vida. Contudo, não é por isso que ela fica sem isso.
Não vou fingir que sei como é viver na pobreza, muito menos perder um
progenitor da maneira que ela perdeu. Meu pai é um médico bem-sucedido
e minha mãe se aposentou como diretora e reitora da Leopold. Quando
retornei para Louisiana depois da universidade, eles se mudaram comigo
para permanecer perto de seu único filho. O amor e suporte deles para mim
são tão confiáveis quanto sua fortuna e quando eu digo que eles são ricos é
um eufemismo. A família Marceaux detém a patente dos suportes de
madeiras utilizados nos pianos. Estou com o futuro garantido para o resto
da vida assim como meus filhos e seus filhos estarão, contanto que pianos
estejam em produção.
Dinheiro de gerações passadas são abundantes nas famílias no Le Moyne,
a não ser Ivory. Então porque Willy Westbrook vendeu seu próspero
negócio só para continuar trabalhando lá como artista, ganhando o tipo de
salário servil que deixou sua filha na miséria?
Eu folheio o arquivo dela, procurando pelos pagamentos das
mensalidades. Uma pequena anotação na última página indica que as
mensalidades dos quatro anos foram pagas integralmente sete anos atrás.
Meu pai vendeu o bar quando eu tinha 10 anos.
Encontro seus olhos.
— Ele vendeu o negócio para te matricular aqui?
Ela se mexe na cadeira, se curvando para trás, mas sem desviar o olhar.
— Ele recebeu uma proposta que era o suficiente para cobrir o programa
de quatro anos, então ele… — Ela fecha os olhos, depois os abre. — Sim.
Ele vendeu tudo para garantir minha vaga aqui.
E três anos depois ele morreu, deixando a filha tão quebrada que não
consegue nem comprar os livros.
Não me importo em esconder o desprezo em minha voz.
— Isso foi extremamente estúpido.
Chamas queimam em seus olhos enquanto ela avança para a frente, suas
mãos agarrando as bordas da mesa.
— Papai olhava para mim e via algo que valia a pena acreditar antes que
eu mesma pudesse acreditar em mim. Não tem nada de estúpido nisso.
Ela me encara como se esperasse que eu entrasse na onda e acreditasse
nela também. Mas na verdade, ela só parecia uma garotinha na defensiva e
brava. É inconveniente.
— Você não tem mais 13 anos. Cresça e pare de chamá-lo de papai.
— Não me diga como eu posso ou não o chamar. — Seu rosto ficou
vermelho em um adorável tom de devoção. — Ele é o meu pai, minha vida
e não tem nada a ver com você!
Cristo, essa garota tem história e dado o corte em seu lábio, vai muito
além de problemas com o papai. Abuso físico é fácil de descobrir. Contudo,
trauma sexual é um grande salto. Mas eu sou desconfiado por natureza e
estou muito curioso sobre ela. Apesar dessas faíscas ousadas em seus olhos,
sua postura tem a tendência de se curvar em autodefesa, evidência que
alguém do seu passado ou presente a machuca.
Eu quero cavar dentro dela, esculpir as facetas úteis da sua miséria e
destruir o resto.
— Ele era o seu pai e você tem sua própria vida. Siga em frente.
Sua bochecha se contrai.
— Eu te odeio.
E eu odeio o quanto eu quero punir a boca dela esfregando meu pau nela.
— Você teve sucesso em mostrar sua imaturidade, srta. Westbrook. Se
você quer permanecer sob minha orientação, vai parar de se queixar como
uma adolescente e começar a agir como uma adulta.
Ela funga, seus ombros retos.
— Você não tem uma opinião muito boa sobre mim. — Ela encara
através da sala, seu olhar vagando pela parede de instrumentos. — Eu
estraguei tudo mesmo.
— Olhe para mim.
Ela o faz, rapidamente.
O perfume enjoativo de sua obediência lambe minha pele. Eu quero me
banhar nele, prová-lo e saboreá-lo.
— Por que você está aqui? Por que seu pai decidiu quando você tinha 10
anos que se tornaria uma pianista?
Suas sobrancelhas se juntam.
— Não, esse é o meu sonho também e “tenho obrigação a ser diligente”.
Ela pode citar Bach. Bom para ela.
— Qual é exatamente o seu sonho? — Abro o arquivo na seção de
admissão das universidades. — De acordo com isso, você não tem objetivos
e não tem ambições. O que vai fazer depois do ensino médio?
— O quê? — Indignação grita através de sua voz. Ela se lança através da
mesa e pega a página da minha mão, seus olhos voando pelas colunas
vazias. — Por que está em branco? Tem que ter algum erro aqui. Eu
tenho… eu tenho… Deus! Eu tenho sido inflexível sobre…
— Sente-se!
— Sr. Marceaux, isso não está certo. Você precisa me escutar… — Sua
voz diminui, arrastando-se para um silêncio assustador sob a força do meu
olhar.
Ela se abaixa na cadeira, o rosto ficando vermelho e as mãos trêmulas
farfalhando o papel.
Coloco meus dedos no queixo.
— Agora me fale em um tom de voz calmo, o que você espera ver nessa
página?
— Que eu vou para Leopold.
De jeito nenhum.
Exceto que a força inabalável de seu olhar argumenta que ela tem
determinação para fazer isso acontecer e a elevação em seu queixo me
desafia a afirmar o contrário.
Eu aceito o desafio.
— Você sabe que só três por cento dos candidatos são aceitos por ano?
Vários de seus colegas se aplicaram mesmo que a Leopold não tenho
aceitado nenhum estudante do Le Moyne em três anos. Talvez, só talvez,
um de vocês vá conseguir entrar no ano que vem.
Não tem nenhum talvez nisso. Minha mãe ainda mantém um assento do
Conselho de Diretores da Leopold e tem os meios para aprovar uma de
minhas referências. Eu estou confiante que ela irá fazer isso. Por mim.
Contudo. Embora a aceitação de um estudante no rigoroso processo de
aceitação não levante suspeitas, dois com certeza levantariam suspeitas e
colocaria a integridade da minha mãe em dúvida. Eu nunca pediria isso para
ela.
Recosto na cadeira, folheando as impressões para ter certeza que não
esqueci as anotações sobre as metas da universidade de Ivory.
— Você já deveria ter se inscrito para o processo de matrícula. Não tem
nada aqui que indique que você tem interesse em perseguir uma empreitada
tão impossível.
— Tudo é possível, sr. Marceaux. — Ela joga a página em branco na
mesa. — E eu me inscrevi. Três anos atrás. Na verdade, a sra. McCracken
tinha a intenção de me indicar como a principal candidata.
Isso explica o porquê de Beverly ter forçado Barb McCracken em uma
aposentadoria e ter me trazido aqui como seu substituto. Quando aceitei o
acordo, eu sabia que haveria estudantes mais dignos de minha referência do
que o filho de Beverly, mas eu não esperava sentir toda essa culpa
emaranhada no estômago.
Ivory Westbrook apresenta um dilema moral e eu ainda nem a escutei
tocar. Talvez seu talento seja medíocre e eu possa empurrar o conflito de
interesse para o canto.
Ela encara minha gravata, uma fuga de pensamentos passando pelos seus
olhos. Longos segundos se passam. Em algum lugar do corredor, uma
clarineta toca em uma perfeita nota.
Finalmente, ela encontra meu olhar.
— Minha presença não é exatamente desejada por aqui. Eu não visto as
roupas certas, nem dirijo o carro certo. — Ela ri. — Eu nem dirijo um carro.
E com certeza eu não trago doações ou conexões glamorosas. A única coisa
que tenho para oferecer é o meu talento. Deveria ser o suficiente. Deveria
ser a única coisa que importa. No entanto, essa escola tem sido contra mim
desde o meu primeiro dia.
Nada que ela diz me surpreende. Ela é um carneirinho perdido em uma
matilha de lobos ferozes. Então por que ela não mira um pouco mais para
baixo? Tentar uma universidade um pouco mais fácil e se retirar do alvo?
Por que a Leopold?
Mantenho minha expressão indiferente, adiando minhas perguntas até
que ela tenha acabado.
Ela toca na página em branco e empurra em minha direção.
— Alguém apagou minha proposta para a Leopold junto de todo o
trabalho de preparação que eu fiz para apoiar minha elegibilidade. A sra.
McCracken me falou que colocou tudo no meu arquivo. Eu não quero
acusar ninguém, mas alguém dessa escola não gosta de mim e esse alguém
tem um filho que está competindo comigo pela vaga.
Beverly Rivard apagou o arquivo dela, uma conclusão que eu também já
tinha chegado.
— Por que a Leopold?
— É o melhor conservatório do país.
— E?
— E? — Seus olhos se iluminam. — A rigorosa educação que os alunos
recebem lá é incomparável. Eles têm um corpo docente de elite, as
instalações são de alto nível e o melhor histórico em impulsionar os alunos
para a carreira musical. — Registrando os nomes em seus dedos, ela lista
ex-alunos notáveis como compositores, maestros e pianistas renomados,
então ela adiciona: — E você, sr. Marceaux. Quero dizer, você está na
Orquestra Sinfônica de Louisiana.
Eu estou para chamá-la de bajuladora, mas então ela me surpreende.
— Eu não quero só me apresentar. — Ela junta as mãos, seus olhos
perdendo o foco. — Eu quero ocupar a cadeira principal em uma grande
orquestra e sentar ao lado do melhor dos melhores em um local lotado,
tremendo sob a luz do palco. Eu quero estar lá, fazer parte de tudo quando a
música começar.
Esse não é um argumento que ela preparou com antecedência. A paixão
em sua voz é de mil decibéis de intensidade, todo o corpo vibrando com a
perspectiva de suas palavras.
Ela abaixa suas mãos e encontra meus olhos.
— Além disso, como você já sabe, cada estudante aceito na Leopold
recebe uma bolsa que cobre toda a mensalidade. Não importa quem você
seja ou qual seja o seu histórico…
Compartilhamos um olhar e nesse espaço de compreensão, término
mentalmente sua frase. Leopold tem prestígio e riqueza o suficiente para
não se preocupar com a conta bancária dos estudantes. A universidade
avalia os candidatos somente com seu talento.
— Muito bem. — Esfrego a nuca e torço para que ela seja uma péssima
pianista. — Vou atualizar seu arquivo e partiremos daí.
Sob circunstâncias normais, ser a melhor da sua turma faria com que ela
entrasse na Leopold. Mas Beverly me contratou para garantir que isso não
acontecesse. Leopold aceitará Prescott Rivard porque farei isso acontecer.
Todo os outros do Le Moyne ficarão esquecidos. Isso é péssimo para Ivory,
mas a vida é uma merda.
— Obrigada. — Ela sorri, sua postura relaxando.
— Ainda temos mais um assunto para discutir.
Eu guardo o arquivo, me levanto da cadeira e dou a volta na mesa para
me sentar na borda ao lado dela, encarando-a.
Com as pernas fechadas, ela coloca os pés – um pé descalço em cima do
outro – na perna da minha mesa. Examino o chão localizando seus sapatos
surrados debaixo da cadeira. Suspeito que as bordas de plástico rasgadas
irritem seus pés depois de usá-los o dia todo.
Quando ela olha para cima, ponho um dedo embaixo de seu queixo,
mantendo a posição da cabeça.
— O que aconteceu com o seu lábio?
Como esperado, ela tenta abaixar o queixo. Uma resposta evasiva. Cada
parte do meu corpo me fala que alguém a machucou.
Aplico uma pequena, mas, ainda assim, inconfundível pressão na sua
pele macia.
— Levante-se.
Sua respiração se acelera quando ela levanta da cadeira, guiada pelo meu
toque sob sua mandíbula.
Quando alcança sua altura total, deixo minha mão cair.
— Fiz uma pergunta e antes que responda, se lembre do que eu falei
sobre mentiras.
Ela pressiona os lábios um no outro.
Eu tento uma tática nova.
— Como seu professor, sou obrigado a relatar. Você sabe o que isso
significa?
Seus olhos como ébano líquido piscam. Ela é dolorosamente bonita e eu
estou tão fodido.
Desdobro do meu canto na mesa. De frente para ela, sou uma cabeça
mais alta e muito maior.
— Quer dizer que eu sou obrigado a relatar qualquer suspeita de maltrato
infantis ao serviço de proteção.
— Não! — Seus dedos voam para seu lábio cortado. — Você não precisa
saber sobre isso. Meu irmão… ele e eu discutimos essa manhã como
quaisquer irmãos fazem. É completamente normal.
Normal? Acho que não.
— Quantos anos ele tem?
Ela inclina o quadril na borda da mesa, uma pose casual, mas ela não está
me enganando.
— Ele tem 26 anos.
Uns dez anos a mais para já ter juízo. Se aquele maldito bateu nela, eu
não vou reportá-lo. Vou encontrá-lo e quebrar a merda do rosto dele.
— Ele bateu em você?
— Ele… hum, bem, estávamos discutindo e hum… — Ela escolhe as
palavras com cuidado, a testa franzida em concentração, com certeza
tentando evitar uma mentira. — Acabei acertando o portal da porta.
— Ele. Bateu. Em. Você?
Ela solta a respiração.
— Ele me deu um tapa. Isso — Ela aponta para o lábio —, foi o portal da
porta.
Uma chama de raiva irrompe de dentro de mim, correndo até a superfície
e queimando minha pele.
— Com que frequência?
Ela abraça a barriga, seus olhos no chão, me enfurecendo ainda mais.
— Responda!
— Não faça isso. Eu não posso… já tenho problemas demais para lidar
agora.
— Levante sua camisa. — O que estou fazendo? Merda, isso é uma
péssima ideia, mas eu preciso saber. — Mostre suas costelas.
Ela olha ao redor, seus olhos presos no corredor.
— Se alguém entrar, a pessoa não poderá ver ao redor do meu corpo. —
Dobro meus joelhos, colocando meu rosto próximo do dela. — Eu sou
obrigado a ajudá-la, srta. Westbrook. Prove que não está coberta em
hematomas e não farei o relatório.
Em vez disso, baterei no irmão dela.
Seus dedos agarram a bainha da camisa, sua expressão se estreitando e
seus olhos se fechando. Ela está tão parada que eu não tenho certeza se ela
está respirando.
— Isso é só um exame, é para o seu próprio bem. Nada inapropriado. —
É ilegal para caralho, mas não consigo me conter. — Estou esperando.
Ela levanta seu olhar dos botões do meu colete até o nó da minha gravata,
demorando lá antes de arrastar seu olhar para cima, em uma viagem
dolorosamente lenta pela minha boca. Quando encontra meus olhos, um
zumbido agudo sai do fundo da sua garganta.
Então, ela levanta a camisa.
9

Ivory

Ele é um professor. Ele não vai me machucar.


Devagar e tremendo, seguro a bainha da camisa acima do umbigo.
Ele só vai fazer o trabalho dele.
Arrepios percorrem minha pele com a inabalável pressão de seu olhar, a
adrenalina das batidas do meu coração e o ar frio ao levantar o algodão cada
vez mais para mostrar minhas costelas.
Ele prometeu nada de inapropriado.
Então por que isso parece errado?
Isso é errado.
Empurro a camisa para baixo e me viro para pegar minhas coisas. Suas
mãos seguram meu braço, seus dedos cravando enquanto ele me balança de
volta a posição.
— Me mostre ou vou relatar o seu machucado.
Sua voz ricocheteia pelo meu crânio, afiado e rigoroso. Se ele me
reportar, eu poderia perder minha casa, minha educação e meu gato. E
Shane… meu Deus, meu irmão se vingaria com uma fúria dolorosa.
Meu estômago treme quando levanto a blusa. Ele solta o meu braço
enquanto seguro a camisa sob o peso dos meus seios e encontro seus olhos.
Tudo o que eu vejo é o azul gelo de uma paisagem ártica sem fim como
se estivesse observando um mundo desconhecido.
Suas narinas se dilatam e os músculos do seu rosto se endurecem com
emoções que eu não consigo entender. Eu não estou escondendo nada. De
qualquer forma, nada debaixo da minha camisa. Além do corte no meu
lábio, Shane não tem deixado nenhum arranhão em mim desde a noite que o
encontrei fodendo uma pobre garota no sofá – na minha cama. Não bater na
minha própria porta da frente me rendeu um hematoma feio na barriga, mas
o sr. Marceaux não encontrará isso. O roxo desapareceu na semana passada.
Ele agacha, seu olhar glacial passando pelo meu tronco, para cintura
baixa da minha saia e caindo para a bainha na altura do joelho.
— Agora levante a saia.
Mudo minha atenção para o vão da porta e para o corredor vazio. Sua
posição curvada o coloca no nível da minha pélvis e agora seu corpo não
me protege mais do tráfego do corredor. O último sinal tocou meia hora
atrás, mas vários alunos ficam depois do horário para as aulas particulares.
Agora mesmo, as notas intactas de uma clarineta tocam no final do
corredor.
Qualquer pessoa pode passar e assumir o pior. Aqui estou eu, a puta da
escola, mostrando o corpo para um professor.
O chão gelado embaixo do meu pé descalço me faz sentir ainda mais
pelada. Eu desejava não ter tirado os sapatos durante a reunião.
— Não temos privacidade. Alguém pode me ver.
— Sou eu quem me preocupo com isso. — Seus braços cobrem seus
joelhos, suas fortes mãos flexionando no V de suas coxas. — Eu não vou
repetir a ordem.
Abaixo a blusa cobrindo a barriga. Agora a minha saia? Meu Deus, o que
devo fazer? Fisicamente ele está em uma posição incomum para um
homem, mais baixo do que eu e seu rosto abaixo do meu quadril. Mais
vulnerável, certo? Apesar disso, ele ainda está tentando pegar de alguma
maneira. Eu poderia bater em seu nariz e correr. Mas eu não tenho tanta
certeza que preciso fazer isso. Ou que quero fazer isso.
Merda. Eu curvo meus dedos ao redor da frente da saia, amontoando e
levantando até o meio das coxas, deixando minhas pernas expostas.
— Mais alto.
Levanto a bainha mais um centímetro. Sem dúvida ele pode ver minhas
pernas tremendo? O quanto ele quer que eu levante?
— Mais alto.
Sua voz sussurra de forma áspera no espaço que separa seu rosto das
minhas coxas. Suas mãos também estão lá, suspensas entre nós, perto o
suficiente para ele me pegar entre as pernas caso esse seja seu plano. Um
ligeiro tremor percorre seus dedos e meus músculos se contraem.
Mas ele é um professor. Ele não tem permissão para me tocar.
Como sua aluna, eu supostamente deveria confiar nele e fazer o que ele
me manda.
Eu amasso o material solto da saia na virilha, segurando e dando a ele
uma visão completa da minha perna sem revelar muito.
— O que você está procurando?
— Amplie sua posição.
Escorrego meus pés para os lados, balançando com o esforço.
— Desse jeito mesmo — ele ofega. — Boa garota.
Seu elogio me envolve como um abraço caloroso. Eu não consigo me
lembrar a última vez que alguém me envolveu sem me machucar, mas se o
sr. Marceaux continuar me chamando de boa garota pelos próximos nove
meses, talvez eu não precise de outro abraço de novo.
Ele abaixa a cabeça, chegando mais perto.
— Estou procurando por marcas na parte interna das suas coxas.
Lorenzo já deixou marcas lá, assim como inúmeros outros garotos. Os
malvados sempre fazem, se esfregando, investindo e durando muito tempo.
Mas o sr. Marceaux não sabe sobre os outros garotos.
— Meu irmão nunca iria…
— Não estou sugerindo que ele iria.
Minha garganta se fecha. Ele já ouviu sobre a minha reputação? Ele está
procurando por evidências do meu comportamento?
— Você tem uma pele escura. — Ele olha para cima, estudando minha
expressão, muito firme e muito intenso. — É fácil para esconder
hematomas.
Eu me engasgo em uma risada nervosa.
— Minha mãe me diz que eu sou muito pálida. Inferno, ela reclama que
ela é muito branca e ela é parte negra.
— Abaixe a saia. — Ele se levanta, as mãos presas nos quadris. — Me
fale da sua mãe.
Estico o tecido ao redor das minhas pernas.
— Todo mundo diz que ela se parece com Halle Berry, mas…
— Eu não me importo como ela se parece. O que ela faz?
Drogas. Homens. Quando ela não tem nada disso, ela senta no seu quarto
e chora.
Se eu compartilhar isso com ele, é possível que ele sorria da minha
desgraça.
— Ela está entre empregos.
— Qual era a posição dela sobre seu pai vender o negócio dele por você?
Ela me odeia tanto que seus lábios se torcem sempre que olha para mim.
— Eles discutiram sobre isso. — Ajusto o alfinete de segurança e os
botões na camisa. — Ela não ficou feliz por ter perdido a discussão, então
não espere que ela apareça nas reuniões de pais e professores.
— Seres humanos são catástrofes miseráveis. Eles erram. E fazem as
coisas erradas. — Ele esfrega a parte de trás da cabeça. — Se ela não mudar
de opinião, isso é com ela.
Uau, isso foi… inesperado. Surpreendentemente atencioso e muito
profundo. Apesar de que agora quero saber quais erros ele comete. Com
sorte, nenhum que afetará meus objetivos.
Ele abaixa a mão e faz um movimento circular.
— Se vire e me mostre suas costas.
Meu pulso acelera. Mais vistoria? Só que desta vez eu não serei capaz de
ver suas mãos.
Abro a boca para discutir, mas a expressão dura em seus olhos me faz
mudar de ideia.
Com uma respiração profunda, viro de costas, coloco dedos trêmulos
debaixo da camisa e a arrastado dos quadris até as axilas.
O rangido de seus sapatos de couros, os sussurros de sua respiração e o
calor de seu corpo, tudo nele parece uma violação de privacidade. Eu queria
poder ver sua expressão, porque parece ter abandonado a procura por
hematomas para encarar a tatuagem em minhas costas. O arabesco
desbotado envolve um lado da minha cintura, sobe pela minha coluna e se
enrola no ombro oposto.
Eu me preparo para uma de suas broncas em voz afiada. Eu sou muito
nova. Tatuagens são muito ruins. Mas eu não me importo com a opinião
dele sobre isso. A tatuagem é muito pessoal, preciosa e minha.
Sem aviso, suas mãos param nas minhas costas e não na minha pele, mas
nas dobras da camisa. Ele dá um puxão no tecido na minha mão e empurra
cintura abaixo.
Alarmada, eu me viro.
— O que está errado?
Ele está mais distante do que eu esperava, vários passos entre nós, com
suas mãos fechadas atrás de suas costas e sua atenção na porta.
Eu sigo seu olhar no momento que a srta. Augustin entra.
Ela para na soleira, segurando a alça da bolsa no ombro.
— Ah, eu não imaginava que você estaria com uma aluna. — Ela lança
olhares furtivos entre mim e o sr. Marceaux, pra cá e pra lá, de cima para
baixo, e para em mim. — Olá, Ivory. Você teve um bom verão?
Curvo meus dedos no mármore, desejando meus malditos sapatos.
— Claro.
— Maravilha. — Ela retorna sua atenção para o meu professor, sua mão
levantando para trilhar o pescoço e varrer uma mecha de cabelo loiro. — Sr.
Marceaux você vai, hum, sair logo?
Ela olha para ele como minha mãe olha para seus namorados, os olhos
brilhando de adoração e estupidez.
Dentre todos os professores de música, a sra. Augustin é a mais bela e
jovem. Ela também é irritantemente intrometida, mas Ellie a elogia, então
acho que ela é uma boa professora de cordas.
O sr. Marceaux inclina a cabeça.
— A srta. Westbrook tem aulas particulares até as sete horas da noite.
Eu tenho?
Uma leveza repentina se levanta em meu peito. A sra. McCracken ficava
até tarde da noite para me ensinar, mas eu ainda não tinha trabalhado a
coragem para pedir a ele horas extras.
Sua postura é tão alta e confiante diante de mim, seus pés bem plantados
e cada centímetro da sua postura esculpida com autoridade enquanto ele
estuda a srta. Augustin.
— Eu não irei para casa cedo. Essa noite ou qualquer outra noite.
— Ah. — O rosto dela abranda e todo o corpo murcha. — Tudo bem.
Bem…
A única coisa que ela move é a comprida perna fina enquanto arrasta o
calcanhar do seu salto alto para trás e balança no chão atrás dela,
demorando. Esperando para ele dizer algo mais?
Finalmente, ela se endireita.
— Estou indo para casa. — Ela aponta para o final do corredor, rindo
baixinho, sorrindo e agindo de uma forma muito estranha. — Então, bem,
tenha uma boa noite?
A pergunta na voz dela me tira do sério. Ele já disse que está ficando para
minhas aulas particulares. Ela deveria ir embora.
Mas então eu ficaria sozinha com ele de novo. Como é possível que eu
me sinta possessiva e aterrorizada por ele ao mesmo tempo?
Ele termina o arrastar embaraçoso dos pés dela com um firme:
— Boa noite, srta. Augustin.
Conforme ela some no corredor, eu repito a conversa deles com o
subtexto.
— Ela acabou de te chamar para sair?
Ele se volta para mim com uma carranca irritada no rosto.
— Isso não é da sua conta.
É provável que não, mas me sinto magnificamente tonta sobre toda a
conversa. Quero dizer, ele disse não para ela. Não para hoje à noite ou
qualquer outra noite, porque ele estará comigo me ajudando.
Talvez eu não tenha estragado as coisas tanto quanto pensei.
— Teremos aulas de piano hoje à noite?
Veias tremem no pescoço dele.
— Não.
— Mas você acabou de dizer…
— Aqui está a lição desta noite. — Ele diminui a distância entre nós e se
inclina para dentro do meu espaço. — Não me questione. Não minta para
mim. E nunca tire seus olhos de mim. — Ele se endireita. — Sente-se.
Essas exigências são ridículas, mas me encontro caindo na cadeira e
prendendo meus olhos nos dele.
Ele coça um dedo no pescoço e dá um puxão no colarinho atrás da
gravata. Desistindo da tentativa de afrouxá-la, ele se agacha na minha
frente.
— Quando você fez a tatuagem?
Não tem jeito de conseguir responder essa pergunta sem mentir, mas eu
posso dar isso a ele.
— Eu tinha 13 anos.
Alguma coisa cintila em seus olhos. Compreensão? Ele sabe quantos
anos eu tinha quando eu perdi o papai… Meu pai. Meu pai. Deus, até nos
pensamentos estou tentando agradar o sr. Marceaux. Mas talvez ele esteja
certo sobre minha imaturidade. Se meu pai ainda estivesse vivo hoje, eu o
estaria chamando de papai?
Em vez de fazer mais perguntas sobre a tatuagem, o sr. Marceaux alcança
embaixo da minha cadeira e arrasta meus sapatos em direção aos seus pés.
Sua curva põe seu rosto a centímetros do meu colo, mas ele mantém seus
olhos nos meus ao mesmo tempo que seus braços se movem ao redor das
minhas panturrilhas.
Com seus joelhos em cada lado das minhas pernas, eu não me sinto
presa, mas minha barriga se contorce do mesmo jeito. Eu não entendo o
porquê de ele estar segurando minhas sapatilhas surradas, o porquê de ele
estar examinando seu interior ou o que ele está planejando para mim em
seguida.
Com meu sapato em uma mão, ele alcança meu pé. No momento que
seus dedos roçam a parte de trás do meu tornozelo, pulo na cadeira.
Ele fixa seu olhar duro em mim, sua carranca em desacordo com o
carinho em sua mão. Sem pressa, ele acaricia ao longo do tornozelo,
traçando os ossos nas laterais e segurando meu calcanhar, levantando-o.
Estou sem palavras, confusa pela gentileza e perdida na sensação. O
mundo inteiro diminui para o calor de suas palmas, à maneira cuidadosa
com que ele desliza meus dedos no sapato e a absoluta concentração que ele
dá para a tarefa.
Ele abaixa meu pé no chão e eu exalo uma lufada de ar. Então ele muda
para a outra perna.
Por que ele está fazendo isso? O que ele ganha fazendo isso? Ele espera
que eu mostre meus peitos a ele? Que eu lhe dê um boquete? Sexo?
Empurro meu pé para fora de seu alcance.
— Eu posso fazer isso.
Ele fecha os punhos nas pernas e me prende com aqueles olhos gelados
azul-cobalto.
— Qual é a lição desta noite?
— Não questioná-lo?
Talvez isso seja uma pequena coisa para ele, mas para mim não é.
Homens não me tocam a não ser que queiram algo de mim e seu toque é
assustador. É muito bom. Muito íntimo. De um jeito muito íntimo para uma
aluna e um professor.
Ele estende a palma da mão, esperando. Eu quero perguntar o que ele
quer de mim, mas isso seria falhar na aula.
Movo meu pé em direção a sua mão e ele dá a mesma atenção que antes.
Um leve acariciar. Dedos como veludo envolvendo meus ossos. Pegando?
Dando? Eu não sei o que é isso. Cada carícia da ponta dos seus dedos faz
com que minhas pernas formiguem, fazendo meu coração palpitar e todo o
meu corpo ficar hiperconsciente. Isso me assusta. Ele me assusta.
Quando ele desliza o sapato no meu outro pé, coloco os pés debaixo da
cadeira e os joelhos colados um no outro, temendo sua próxima demanda.
Ele se levanta, sua expressão sombria sob as sobrancelhas escuras e sua
respiração mais ruidosa do que deveria. Conheço aquele olhar carente,
aquele som faminto. Meu sangue congela.
Agora é o momento para correr, mas meus pés não estão se movendo. Por
quê? Sinto que eu preciso de sua permissão.
Eu quero sua permissão.
Se virando em direção à mesa, ele pressiona as mãos na superfície.
— Vá para casa, srta. Westbrook.
Um alívio desce pela meu corpo, mas é interrompido pelo próximo
pensamento.
Eu posso pegar qualquer uma das saídas do Pavilhão Meia-Lua, correr
através do estacionamento ou do parque e ziguezaguear pelas ruas até o
ponto de ônibus. Não importa por qual caminho eu vá. Prescott vai me
alcançar. Ele vai me encontrar. Ele sempre me encontra.
Então para casa, onde Lorenzo pode estar esperando e onde Shane pode
estar fodendo na minha cama.
Quem é mais assustador? Prescott? Lorenzo? Shane?
Sr. Marceaux.
Pego minha mochila e vou em direção ao corredor.
10

Ivory

O ar abafado agarra na minha pele enquanto faço o caminho de dez minutos


do Le Moyne até a rota 91. Caramba, como é bom fazer uma pausa daquela
sala de aula. Eu não sei se é o sr. Marceaux ou as sensações assustadoras
que ele inflama em mim, mas eu não conseguia correr rápido o suficiente de
lá.
Ele é agressivo e muito bem construído como outros homens. Talvez
mais. Mas ele teve diversas oportunidades de me pegar e não o fez.
Por que ele é um professor? Ou por que ele não é como qualquer outro
homem?
Eu não estou pronta para confiar nesses pensamentos ou como fazem me
sentir.
A lua crescente paira no céu alto, pintando um fraco brilho sobre as
mansões pré-guerra que ladeiam a Coliseum Street. A calçada de tijolos é
pavimentada com um padrão em espinha de peixe e cercado por cercas de
ferro forjado, luminárias a gás e vegetação fluorescente que infunde o ar
com a fragrância do verão.
As fundações imponentes das casas se encostam nessas cercas e as
janelas iluminadas me dão um vislumbre do interior brilhando com
candelabros, grandes escadarias e ricos trabalhos de madeira. Carros
luxuosos enfileirados na estreita rua e jardins imaculados adornam os becos.
Em todos os lugares que olho, vejo as ricas gerações se vangloriando,
aquelas que vieram do açúcar, do algodão e do transporte marítimo.
Será que o sr. Marceaux mora em uma daquelas casas? Será que a
riqueza de sua família é antiga? Le Moyne atrai vários residentes do Garden
District, incluindo Beverly Rivard.
Eu não sei qual é a casa de Prescott Rivard, mas ele sabe qual caminho
eu pego para ir para minha casa. Existem apenas algumas opções entre a
escola e a rota do ônibus. Minhas pernas coçam para andar mais rápido,
para postergar o encontro para outro dia. Porém, quanto mais eu postergar
ao entrar em contato com ele, mais difícil será para pagar as contas deste
mês.
No meio do caminho para a parada de ônibus, um som familiar de uma
moto irrompe o silêncio da rua. Se aproximando por trás, ficando mais alta
e mais rápido.
Os pelos da minha nuca se arrepiam. Espio pelo ombro e vislumbro um
capacete preto, jaqueta preta e detestáveis carenagens laranjas. Meu coração
acelera com o motorista e eu acelero o passo. Se o motorista levantar o
queixo, poderei ver Destruir tatuado no pescoço.
Cada pisada forte do meu andar vibra pelas minhas solas finas. Eu
deveria saber que Lorenzo viria me procurar. Ele sempre faz quando se
cansa de esperar. E já se passaram duas semanas desde a última vez que ele
me pegou e sangrei pela bunda por horas.
Minha barriga se contrai enquanto a cabeça gira com as opções. O
próximo cruzamento de ruas é uma corrida de trinta segundos. Talvez eu
possa despistá-lo.
Acelero o passo, procurando por uma entrada entre as mansões. Não
encontrarei uma. As cercas circundam os generosos terrenos que são
equipados com câmeras de segurança e alarmes. Os ferros forjados e tijolos
cercam a rua dos dois lados. Eu não terei para onde ir quando ele me
alcançar.
— Suba na moto. — Mesmo abafado pelo capacete, seu grito é duro e
cruel.
— Vou pegar o ônibus. — Ando rápido, curvando meus ombros e a
mochila batendo nas pernas.
Ele acelera o motor, andando com a moto ao meu lado. Minhas pernas
tremem e a ponta do meu sapato prende em um tijolo lascado. O impulso
me joga para a frente. Eu mantenho meu equilíbrio, mas… Caramba, perco
o sapato.
Giro para trás, meu pulso batendo na garganta e meu pé dentro do vinil
rachado.
Um par de faróis surge na rua atrás do foguete entre as pernas de
Lorenzo. Olho cegamente para os raios de luzes, esperando e torcendo. Pelo
quê?
Cabelo preto, olhos azuis, presença imponente…
Até parece.
Lorenzo para perto de mim e fora do alcance de um braço, seu capacete
inclinado em minha direção.
— Não vou falar de novo. Coloque sua bunda nessa moto.
O carro se aproxima e diminui a velocidade, girando em torno de
Lorenzo. Grade frontal larga, pintura metálica prateada e pneus grossos, o
Cadillac CTS Sedan é o brinquedo perfeito para jovens ricos e idiotas
passearem por aí.
Idiotas como Prescott.
Ele para na frente de Lorenzo e se curva no banco da frente para abrir a
porta do passageiro.
O capacete de Lorenzo gira em direção ao carro.
— Quem diabos é esse?
Esse é uma distração. Graças a Deus. Eu não vou ser capaz de me
esquivar de Lorenzo para sempre e com certeza não gosto de subir no carro
de Prescott. Mas neste momento, eu escolho Prescott em vez de Lorenzo.
Prescott não se força por trás e na minha bunda.
Eu me lanço para a frente, correndo o largo caminho ao redor da moto e
sento no banco da frente do Cadillac.
— Vai.
O motor da moto engasga quando empurrada para a frente. Bato a porta
com força, fazendo barulho.
Prescott se curva sobre o console, torcendo o pescoço para encarar
Lorenzo.
— Quem é aquele cara?
— Algum esquisito. Vamos.
Ele aperta o acelerador e a explosão da propulsão empurra meu corpo no
assento de couro. Minha ansiedade e medo ficam para atrás em uma fumaça
de exaustão. Relaxo pelo menos um pouquinho, porque agora estou presa
com Prescott.
Seu comprido corpo se esparrama pelo assento de couro, seus dedos
tocam vários dispositivos brilhantes no painel. Eu não consigo começar a
descrever o quanto esse carro custa. Seus pais devem ganhar muito dinheiro
para conseguirem comprar para ele. É um carro foda? Sem dúvida
nenhuma. Eu estou com ciúmes dele?
Eu prefiro não ficar com ciúmes de ninguém, em especial Prescott. Eu
olho para ele, observando sua mandíbula de um ângulo acentuado, a marca
do seu cabelo loiro atrás da orelha e o perfil do longo e reto nariz dele. Ele é
mais magro que o sr. Marceaux, os músculos menos desenvolvidos e as
mãos e pau menores. Não que eu tenho visto o pau de Marceaux, mas eu
aposto que é maior.
Isso não é bom.
Meu coração pula. Por que diabos eu estou pensando nisso? Por que
estou comparando os dois?
Prescott muda de marcha e em seguida estende a mão para colocar um
dedo por debaixo da bainha da minha saia.
— Eu vou fazer você gozar esta noite.
Bato para afastar sua mão. Jesus Cristo, eu nunca deveria ter provocado
ele com o comentário sobre o piercing. Idiota, idiota, idiota!
— Cadê o seu dever de casa?
Ele reduz a marcha em uma curva e aponta com o polegar por cima do
ombro. O indicador do cinto de segurança apita quando me ajoelho na
abertura dos bancos da frente em direção ao banco de trás.
Recolho suas pastas do chão e um único farol preenche minha visão pela
janela traseira.
— Ele está nos seguindo.
Prescott joga o carro em alta velocidade. Mansões passam como borrões.
Placas de pare e cruzamento vêm e vão. Acho que ele não está preocupado
em infringir as leis. Felizmente, Lorenzo não compartilha de sua
irresponsabilidade. A moto mantém o limite de velocidade e para em cada
placa de pare. Talvez Lorenzo esteja drogado ou com mandados pendentes.
Qualquer que seja a razão, ele ficou para trás e por fim fora do campo de
visão.
Soltando um suspiro pesado, recolho o resto das pastas de Prescott.
— Você o despistou.
Prescott levanta a saia até o meu quadril e aperta minha boceta por cima
do tecido da calcinha.
— Gata, eu vou te foder tanto essa noite.
Eu giro de volta no assento da frente, me encostando e tentando controlar
minha respiração.
Minha mão treme enquanto afivelo o cinto de segurança.
— Não, você não vai.
Minha resposta tem um pesado tom de convicção. E talvez um
pouquinho de dúvida. Eu já escapei das investidas de Prescott antes, mas
posso contar nos dedos essas vezes.
Ele ri.
— Veremos.
Quando ele vira na Jackson Avenue e se afasta do rio, não preciso
perguntar para onde estamos indo. Durante a viagem de seis minutos para
nosso local de costume, uso uma das luzes do teto para folhear suas tarefas
e anotações. Ele é bem-organizado para uma pessoa que não está
interessado em deveres de casa e suas tarefas estão descritas em uma
caligrafia impecável com as datas de entrega anotadas. Tudo o que ele
detalhou é viável e fácil o suficiente para trabalhar com os meus próprios
trabalhos.
Ele para em um estacionamento vazio, cercado por um amontoado de
ervas daninhas e casas que não sobreviveram ao último furacão, fechadas
por tábuas de madeira.
Desligando o motor, ele se vira para mim.
— Eu tenho uma proposta.
Um calafrio percorre o meu corpo. Tudo o que ele propõe vem com um
doloroso preço.
Ele se inclina em minha direção, seu rosto a centímetros de distância e
moldados pela escuridão.
— Eu sei que você está fazendo o dever de casa de vários amigos meus e
sabe-se lá quantos outros mais.
Eu não tive oportunidade de falar com os outros garotos sobre horários e
trabalhos. Outra temível tarefa na minha lista de afazeres.
Sua mão percorre minha coxa, fazendo seu caminho para o espaço entre
minhas pernas. Eu me afasto e minhas pernas colidem com a porta.
Com um grunhido, ele olha para a frente, sua postura rígida e seus dedos
curvados ao redor do volante. Dedos que eu não quero em nenhum lugar
perto de mim.
Ele inclina a cabeça contra o encosto de cabeça.
— Eu não quero dividir você.
— Que pena.
— Merda, Ivory! Você é tão… — Ele esfrega a bochecha sem barba e
suaviza seu tom. — Eu tive um aumento na mesada. Eu vou pagar mais, o
suficiente para cobrir o que você está ganhando com todos os outros, se
parar de vê-los. Me dê o seu preço.
Ele não pode arcar. Na cabeça, somo os serviços mensais, a hipoteca, a
alimentação e adiciono um pouco mais para os materiais da escola. Merda,
isso é muito dinheiro. Respirando fundo, dou os números.
— Feito.
O quê? A porra da mesada dele cobre todos os meus gastos?
Eu passo meus braços envolta da barriga.
— Tudo o que tenho que fazer é parar de ajudar os outros?
— Isso. E parar de lutar comigo sobre isso. — Seus dedos envolvem meu
joelho, puxando minha perna em sua direção.
— Eu… Eu… — Minha respiração acelera à medida que tento me livrar
de seu aperto. — Eu não posso. — Meu peito agita, minha luta contra sua
mão é inútil. — Me deixe sair.
— Eu vou pegar isso de qualquer maneira. Para de fazer isso tão difícil.
— Ele me solta e levanta sua mão. — O que vai ser?
Balanço contra a porta e cubro meu rosto com a mão. Merda, que escolha
eu tenho?
Eu posso me afastar de Prescott, esquecer do seu dinheiro e tentar
compensar a perda com todos os outros caras que querem a mesma coisa
que ele.
Ou eu posso mandar todos ele à merda e negligenciar a hipoteca. Eu não
tenho 18 anos. Eu posso ir até o serviço social e explicar minha situação.
Talvez eles vão intervir e me colocar em uma família adotiva. Mas tem uma
boa chance de a nova família morar muito longe para se descolar até Le
Moyne. Eu posso por meu destino na mão de algum adulto que decidirá
onde vou estudar? E quanto à Schubert? Uma família temporária talvez não
me deixe levá-lo. Meu coração aperta só de pensar nele. Ele não é só um
gato. Schubert é o último presente que meu pai me deu antes de morrer. Ele
é a única forma de amor viva que ainda tenho para poder passar meus
braços em volta.
Ou eu posso aceitar a proposta de Prescott, suportar apenas um babaca
adolescente e manter minha casa, minha educação e meu gato.
A pressão das lágrimas arde meus olhos conforme forço minha boca
dizer a resposta.
— Está bem.
— Está bem? — Ele senta, todo o corpo virando para me encarar. —
Tudo bem… Hum… — Ele se contorce, examinando o terreno vazio e
coberto de mato, parando quando seu olhar chega ao banco de trás. — Saia.
Com uma mão tremendo, ponho as pastas no chão e abro a porta para sair
em um emaranhado de vinhas.
Ele está fora do carro e do meu lado em um piscar de luz. Um enorme
sorriso contorce seu rosto quando ele abre a porta do banco de trás.
— Aí dentro. De costas.
Não, não, não. Meus pulmões procuram por ar e cada músculo em meu
corpo enrijece.
— Ivoryyyyy — ele rosna. — Não é assim que isso funciona. Eu não vou
pagar enquanto eu não tiver meu pau molhado.
Deus, ele já está com uma camisinha na mão.
A grama alta roça meu tornozelo. O cantar dos insetos noturnos sai das
sombras do concreto quebrado. Em algum lugar à distância, um cachorro
late. Um outro se junta. Mas é o horrível som de um zíper que chia pelos
meus ouvidos.
Ele segura seu pau na mão, a coisa bulbosa inchada ao máximo e
apontada direto para mim enquanto ele rola a camisinha. A náusea formiga
e a saliva corre para minha boca.
Quando seus olhos encontram os meus, sua expressão determinada
parece fantasmagórica e sinistra sob o luar.
— Vamos fazer isso do jeito fácil ou do jeito difícil? Um deles faz você
ganhar dinheiro.
O brilho de lágrimas embaça minha visão. Eu fiz esse acordo sabendo o
que viria em seguida. Aguente firme e lide com isso, Ivory.
Eu me viro para a porta que espera e pressiono as palmas da mão nos
olhos, deslizando para dentro do carro.
Meu cérebro já está buscando pelas notas sombrias da Sonata Nº 9 de
Scriabin. A melodia toca em minha cabeça quando o peso do corpo dele
pressiona minhas costas no assento do banco. Imagino as teclas
complicadas enquanto ele empurra a calcinha para o lado e entra em mim,
grunhindo e empurrando. Tão seco, tão dolorido e a queimação entre as
minhas pernas persuadem mais lágrimas a escorrerem dos meus olhos. Eu
foco no interior, deixando-o do lado de fora. Eu estou quase perdida na
dissonante música na minha mente quando uma música toca do bolso de
Prescott.
— Merda. — Ele se atrapalha com as pernas e puxa o celular das dobras
da calça. — Puta que pariu!
— Saia de cima de mim.
— Não. E eu tenho que atender essa ligação, então fique calada.
Empurro seu peito, mas ele não cede. Seus quadris empurram com mais
força ao mesmo tempo que ódio cai em grandes gotas dos meus olhos.
— É a minha mãe. — Ele coloca o celular no assento acima da minha
cabeça, o toque alegre fazendo meus ouvidos sangrar. — Se ela ouvir você,
o máximo que vai acontecer comigo é uma perda na mesada. Mas você…
— Seu dedo paira sobre a tela enquanto seu quadril se agarra ao meu. —
Você será expulsa da escola.
Antes que eu possa dizer a ele que ele é um filho da puta, ele toca na tela
e põe no viva-voz.
— O que foi, mãe? — Ele levanta a pélvis e bate contra mim, o desejo
em seu rosto iluminada pelo brilho da tela.
— Onde você está? — A voz severa da diretora late através do telefone.
— Na casa de Avery.
Quem é Avery? Eu me contorço embaixo dele, desejando que isso acabe.
— Você parece sem fôlego, filho — ela diz.
Ele segura meu peito e aperta.
— Levantamento de peso. Ela tem uma sala de treino maneira.
— Ah? Bem, diga a mãe dela que eu mandei um oi e que precisamos nos
encontrar logo para um chá.
— Pode deixar.
— Mantenha as mãos para si mesmo, filho. Eu não quero nenhum
problema com os pais dela.
Eu mordo o lábio para evitar chorar alto. Seus movimentos aceleram,
ficando inconstantes. Graças a Deus, ele está quase lá, mas como ele pode
fazer isso enquanto está conversando com a mãe? Ele é tão nojento que
minha pele recua em todos os lugares que seu calor penetra minhas roupas.
— Eu vi você falando com aquela garota Westbrook na hora almoço — a
diretora fala.
Meu pulso dispara, mas Prescott está em uma dimensão bem diferente.
Sua boca se abre em um grito silencioso enquanto seu corpo treme e se
contorce quando ele goza. No momento que termina, eu o empurro para
fora de mim.
—– Prescott? — A diretora respira pelo celular. — Você está me
escutando?
— Estou. Ivory é legal. — Ele me encara e fala, para uma ótima transa.
Sem desviar o olhar, ele fala alto: — Eu não sei por que você tem algo
contra ela.
— Ela está tentando roubar sua vaga na Leopold, Prescott. Além disso,
ela tem uma reputação com os garotos da escola. Fique longe dela.
Ele esfrega um dedo na sobrancelha.
— Sim, que seja. Tenho que ir.
— Prescott…
Ele desliga e joga o celular no banco da frente.
— Você gozou?
Eu me afasto dele, limpando as lágrimas em segredo enquanto rosno:
— Mas é claro que não, seu idiota.
Ele realmente acredita que eu gostei? Nunca tive um orgasmo, pelo
menos não que eu saiba. Mas se eu for capaz de ter um, não seria com ele.
Eu ajeito a calcinha e abaixo a saia.
— Quem é Avery?
Ele tira a camisinha e ajeita a calça.
— Minha namorada.
— Namorada? — Uma bola se forma na minha garganta. — Por que
você está traindo a namorada?
— Ela é uma puritana. Mas você não é, é? — Ele alcança o V na minha
camisa.
Eu bato na sua mão, afastando-a e pego a mochila do banco da frente.
— Aposto que você fodeu com mais caras do que as teclas de um piano.
Oitenta e oito caras? Um calor aquece meu rosto ao abrir a porta do carro
e pular para fora. A verdade é que eu não tenho certeza do número. Talvez
metade disso? Talvez mais.
Ele sai pela outra porta do carro e seus olhos encaram os meus através do
teto do carro.
— Cinquenta e dois caras brancos no Le Moyne e trinta e seis caras
negros no Treme. Estou certo?
Cinquenta e duas teclas brancas e trinta e seis teclas pretas.
Ele se acha esperto com sua comparação doentia, mas ele não tem ideia
de como seus comentários doem. Sim, eu transei com muitos homens
diferentes. Nem todas as minhas experiências foram como essa. Às vezes
estou muito fraca e não tenho força física ou tamanho o suficiente para
parar. Outras vezes, me sinto enganada, subornada e presa… Por palavras
bonitas. Quando eu era mais nova, eu deixava que homens me tocassem em
um estúpido desespero para sentir afeto, mas acabei aprendendo que não há
nenhum afeto em um pau duro. Ainda assim, tem momentos que me pego
pensando, desta vez será diferente? Talvez esse irá me segurar apertado e
me amará. Talvez seja bom e eu caio de novo na armadilha.
Mas depois dos comentários odiosos de Prescott, eu nem quero seu
maldito dinheiro. Eu me afasto, prendendo a alça da mochila no ombro. Os
projetos do Centro da Cidade se estendem ao meu redor, mas eu sei o
caminho, tendo andado nesta rua todas as vezes que Prescott me fodeu
naquele lugar. Cinco quarteirões daqui eu posso pegar o ônibus para casa.
O motor do Cadillac liga e um momento depois, anda em minha direção.
Ele estende um braço para fora da janela, sua mão segurando um maço
de notas.
Eu encaro aquilo, precisando do dinheiro e odiando a mim mesma.
— Com que frequência tenho que fazer isso?
— Quando eu quiser. — Uma mecha de cabelo cai em seu olho. — Meu
primeiro trabalho é para segunda-feira, então nos veremos de novo essa
semana. Na próxima vez, eu farei você gozar.
Uma onda de raiva queima minhas veias. Eu o odeio. Mas preciso dele.
Engulo meu orgulho e arranco o dinheiro de sua mão.
Ele me lança um sorriso saciado e vai embora, me deixando na beira da
rua como a prostituta que sou.
11

Emeric

Com o endereço do arquivo da Ivory no mapa do celular, viro o meu velho


GTO na rua dela. Isso não parece perseguição, mas também não parece ser
completamente racional. O que posso dizer? Nunca precisei de uma
desculpa para bater em alguém. Eu só nunca imaginei que a pessoa que eu
bateria essa noite seria o irmão dela. Ainda assim, aqui estou eu.
Não tenho um plano, só que Ivory não pode saber que eu estou aqui.
Deveria ter reportado seu lábio inchado. Com certeza, não deveria ter
procurado por malditos hematomas em seu corpo. Mas isso? Aparecer em
sua casa? Isso é definitivamente cruzar o território do-que-porra-estou-
fazendo.
O crepúsculo escurece o horizonte e não há nenhum poste na rua. Talvez
eu possa persuadir seu irmão a sair de casa sem que ela me veja e bater nele
antes que ele tenha a chance de memorizar meu rosto. Claro que se ela tiver
um vislumbre do meu carro, ela saberá. O GTO Pontiac de 1970 é muito
fácil de ser reconhecido. Se ela não o viu no estacionamento da escola essa
noite, ela irá antes do ano acabar.
Eu deveria ter pego um táxi, mas eu não estava exatamente pensando
quando saí da sala de aula e dirigi direto até aqui.
Seguindo o GPS, me esgueirei na fileira de casas caindo aos pedaços.
Não, não me esgueirei. O potente motor americano debaixo do capô é um
455 V8 e seu estrondo fez os residentes se inclinarem para frente de suas
varandas. Pedestres param de andar e olham fixamente. E me passa pela
cabeça que não vou poder deixar o carro na rua dela. Seria roubado em
alguns minutos.
Apenas alguns quarteirões do French Quarter, Treme é o lugar que
turistas são avisados para não irem nem durante a luz do dia, muito menos à
noite. Não visito esse lado desde que eu era um garoto rebelde. Esqueci de
todo o grafite, janelas fechadas com tábuas e grupos de homens nos cantos
das esquinas olhando ao redor como se estivessem escondendo algo. Como
ela mora aqui e não é assaltada todos os dias?
Ela não tem nada de valor para ser assaltada.
Exceto sua inocência. Apesar de eu ter certeza que isso foi roubado há
muito tempo. A pergunta que persiste é, quanto dano foi feito? Entendo sua
reação comigo, seus olhares de medo e desejo de agradar. São seus reflexos
naturais para um homem dominante. Mas as camadas de escuridão que
repousam sob as suas expressões, são as experiências que a fortaleceram e
os custos que a deformaram. Não é só um irmão abusivo ou pai morto, mas
alguma coisa mais. Alguma coisa sexualmente traumática.
Raiva queima em minhas veias, me incitando em direção a casa dela e
em rumo ao desconhecido que me aguarda lá.
Eu localizei o número da rua dela em um tapume desgastado na
construção estreita. A tinta branca descascada dá lugar à madeira podre e o
telhado inclinado sob a varanda não parece ser seguro o suficiente para ficar
embaixo. As casas são muito próximas uma da outra para acomodar um
caminho de acesso e não há carros parados na frente. Sem luzes acesas do
lado de dentro. Sem movimentos pela janela e a não ser que esteja sentada
no escuro, ela não está em casa.
No meu caminho para cá, eu imaginei o pior. Mas alguém pode
argumentar que a casa ao lado da dela está muito pior, o exterior está
revestido em pedaços de madeira compensada e toda a estrutura está
inclinada na fundação. Alguém inclusive escreveu com spray na porta do
vizinho: O lar é uma sensação passageira que estou tentando consertar.
Enquanto fico parado na frente da casa dela, imaginando as condições
dilapidadas lá dentro, um nó de desconforto se forma nas minhas entranhas.
Talvez ela não tenha eletricidade? Se sua mãe é desempregada, quem paga
as contas? O irmão?
Temeroso que Ivory chegará em casa e perceberá o meu carro, não me
demoro. Alguns quarteirões de distância, paro em um estacionamento
cheio, operando através da intuição e com perversa sensação de
curiosidade.
Notas de blues vindo de um trompetista chegam até mim quando entro no
Piano Bar de Willy. Eu nunca estive aqui, mas não é diferente dos outros
bares decadentes que eu já frequentei no passar dos anos em Nova Orleans.
Sujo e parecido com uma caverna, a iluminação é escassa e as paredes de
tijolos expostas dão a sensação de uma taverna no porão. O tipo de taverna
que um homem leva um tiro.
Onde foi que o pai dela morreu? Próximo do piano? Ou perto das mesas
altas? Ou bem aqui, onde eu pairo entre a porta e o bar?
Este lugar recebe muitos turistas intrometidos, então não me surpreende
que ninguém lança um olhar em minha direção. Examino a multidão
discreta e miro no outro único homem branco. Está muito escuro para
distinguir os detalhes, mas ele parecer ser próximo da minha idade com
cabelos loiros e pele pálida. Combina com a imagem que encontrei no
Google no caminho para cá de um jovem Willy Westbrook. Isso pode ser
sorte?
Ajusto a aba enrolada do meu chapéu fedora para mais baixo da cabeça e
ando na direção do bar, acenando para a bartender.
— Aquele é o filho de Willy?
Ela levanta os olhos para seguir a direção do meu aceno de cabeça, seu
cabelo branco formando um brilho etéreo em torno da sua pele escura.
— Uhum. — Ela volta sua atenção para o drinque que está preparando.
— É ele mesmo, querido.
— Obrigado. — Enganchando meus polegares nos bolsos da frente,
vagueio até a cabine em semicírculo e me elevo sobre sua mesa.
Com uma garota em cada braço, ele levanta sua expressão para minha
postura relaxada e para no meu rosto.
— Eu te conheço?
O canto sombreado da cabine escurece sua expressão, mas seus
movimentos lentos e fala arrastadas são difíceis de não perceber. Chapado
ou bêbado, ele provavelmente está muito alterado para se lembrar de mim
amanhã.
— Você é o garoto de Willy?
— Aham. — Ele alcança sua cerveja, derramando na mesa. — E daí?
Eu quero dizer a ele o motivo para eu estar aqui, que eu sou o que
acontece quando ele machuca a própria irmã. Mas se eu mencionar Ivory,
talvez ele possa retaliar nela.
Mantendo meu rosto em uma posição afastada da luz fraca, curvo sobre a
mesa e bato meu punho no nariz dele.
As garotas voam para longe e disparam para fora da cabine enquanto a
cabeça dele cai para trás e se apoia nos ombros. O branco de seus olhos rola
e desaparece atrás de suas pálpebras enquanto seu corpo desliza pelo banco.
O sangue de suas narinas forma rios idênticos sobre seu lábio e respigam
na camisa. A embriaguez dele tem mais a ver com o nocaute do que minhas
habilidades de boxe. Eu esperava ver ele se retorcer em agonia, mas
também há prazer em saber que ele vai acordar com a pulsante dor do nariz
quebrado.
A multidão não parece ter nenhuma lealdade ao filho de Willy, porque
ninguém faz um movimento para defendê-lo enquanto eu ando em direção
às portas. Eu sei que esse é um bairro violento, mas caramba, eles nem
olham em minha direção enquanto saio com tanta discrição quanto entrei.
Alguns minutos depois, me encontro parado na rua da casa de Ivory com
o motor desligado e minha atenção colada à porta da frente. Ela já deveria
ter chegado, mas está tudo escuro além das janelas da frente e laterais. Onde
diabos ela está?
Considero ir embora quando uma moto esportiva laranja para no meio fio
em frente à casa. O motoqueiro tira o capacete revelando o cabelo preto e a
pele escura. Negro ou latino? Ele é muito novo para estar namorando Lisa
Westbrook. É melhor que ele não seja a merda do namorado de Ivory.
Eu me inclino para a frente no volante, esticando o pescoço enquanto ele
caminha pela varanda espiando pela janela. Ele não bate na porta, em vez
disso, ele anda pelo beco estreito entre as casas e desaparece no fundo.
Meus nervos endurecem. Ele é algum amigo da família? Um primo? Um
maldito ladrão? Digito o número da placa da moto no meu celular e um
instante depois ele emerge do beco, tragando um cigarro. Ele passa uma
perna pela moto, coloca o capacete e ronca o motor, sumindo sem nem
olhar em minha direção.
Aquilo foi estranho.
Eu deveria ir. Não tenho negócios aqui.
Trinta minutos depois, ainda estou me falando isso.
Cada arruaceiro que passa, cada carro que cruza a rua, minha impaciência
se multiplica, retorcendo por mim com convulsões e sobressaltos. Onze
horas da noite em um dia de escola e ela está em algum lugar fazendo só
Deus sabe o quê. Eu quero amarrá-la em sua cama e bater nela por ser tão
irresponsável. Onde diabos está a mãe dela?
Isso não é problema meu. Alcanço à ignição assim que meu celular toca
com uma mensagem.
Deb: Nosso compromisso para essa noite ainda está de pé?
Quando mandei uma mensagem para ela entre as aulas, encarava o corpo
tenso de Ivory e estava ansioso para ir. Mas agora?
Eu: Outra hora
Deb: Eu fui uma garota má hoje. Me dê umas palmadas!
Meu pau nem se contrai.
Deb: Posso fingir ser ela de novo.
Por ela, ela quer dizer Joanne. O único problema é que Joanne não é a ela
que está fodendo com a minha cabeça.
Eu: Você parece carente. O oposto de sensual.
Deb: *beicinho*
Eu: Continua não sendo sensual.
Deb: Me desculpe, senhor.
Eu: Você pode me compensar continuando com aquele favor que pedi.
Deb: O cara da GM?
O marido de Beverly Rivard, Howard, possui uma rede de
concessionárias GM. Eu ouvi que suas práticas comerciais são tão sujas
quanto sua mulher, mas ainda preciso confirmar se ele trai sua mulher. Se
alguém pode seduzi-lo, esse alguém é Deb.
Eu: Sim. Seja discreta e preste atenção à iluminação. O rosto dele
precisa estar nítido no vídeo.
Deb: Sim, senhor.
Deb: Não posso fazer você mudar de ideia quanto à hoje à noite?
Eu: Boa noite, Deb.
O que eu estou fazendo? Por que eu estou aqui? Para me certificar de que
ela chegou em casa em segurança?
Merda, eu só quero vê-la de novo. Só um vislumbre antes de encarar o
vazio da minha casa.
Dez minutos depois, meu desejo se materializa na calçada da frente.
Mesmo na luz fraca do luar, a curva dos seus seios, da sua cintura e seus
largos quadris são distinguíveis. Erótico. Tão cativante.
Com o meu carro oculto atrás de um caminhão, meu corpo inteiro se
inclina no painel da porta para mantê-la no meu campo de visão.
Suas longas pernas a carregam em direção à casa, devagar e sem pressa,
seu queixo erguido e os ombros relaxados. Ela não está com medo aqui, não
como em minha sala de aula. Que irônico dado ao perigo de bairro.
No interior da minha alma depravada, me emociono por ser a coisa que
ela teme. Quero reivindicar a apreensão, o pavor e a incerteza dela. Eu
quero tomar posse de todas as emoções dela e ser a razão pela qual ela
treme e chora.
Naquele momento, finjo não ser seu professor. Com a mão segurando o
volante e meu ombro pressionado a porta, observo a mulher linda que
caminha em minha direção. Ela é bastante exótica com seus enormes olhos
e os compridos cabelos escuros, tão incrivelmente deslumbrante que eu não
seria capaz de me parar de aproximar dela. Pararia alguns passos de
distância, manteria seu olhar e deixaria o silêncio maleável envolver a gente
em um casulo íntimo. Eu não precisaria de palavras, só a compreensão dela
sobre o meu corpo, minha intenção e minha confiança em dar a ela o que
ela deseja.
Ela pode não saber, mas precisa de limites muito claros, disciplina e um
homem em quem ela possa confiar para empurrá-la para fora de sua zona de
conforto. Ela ainda pode não me reconhecer como esse homem, mas ela irá.
Então o quê?
Estacionado cinco casas à distância, eu não posso me focar em nada mais
além dela. O que vai acontecer amanhã quando me sentar ao seu lado no
banco do piano, respirando o cheiro de sua pele? Como diabos vou me
concentrar?
Com o motor desligado, a falta de ar é asfixiante. Minha camiseta está
encharcada de suor e a gravata tinha sido descartada há muito tempo. Eu
estou queimando, impaciente e dolorido por ela. Com tesão pra caralho.
Ela para na frente da porta e destranca com a chave da mochila. Se
esticando para acender as luzes internas, ela não passa da soleira antes que
um gato laranja saia correndo. Enquanto ele salta ao redor de suas pernas,
jogando o corpo no tornozelo dela, suas palavras voltam à minha mente.
Eu não posso arcar com sapatos de corrida ou comida para meu gato.
Uma intensa pressão se dissipa nos meus músculos, insistindo que eu
invada sua vida e conserte seus problemas. Eu tenho dinheiro, determinação
e desejo para melhorar sua situação. Como seu professor, ela é minha
responsabilidade. Para cuidar. Para proteger.
Tudo isso é apropriado desde que eu não imagine sua boceta apertada em
volta do meu pau.
Ela pega o gato e acaricia em seu pescoço enquanto o carrega para
dentro. A porta se fecha e as cortinas caem sobre a janela, me deixando de
fora. Hora de ir.
No caminho de volta para o Garden District, resolvo manter o
profissionalismo perto da srta. Westbrook. Se eu terminar o ano sem me
enterrar entre as pernas dela, talvez eu possa encontrar um futuro
satisfatório no Le Moyne. Claro que manter minhas mãos longe dela,
significa que meu futuro não incluirá uma cela.
Ao entrar na minha casa, sou recebido pelas pilhas de caixas embaladas,
paredes vazias e uma total falta de calor apesar da umidade. Eu me mudei
três meses atrás, mas eu realmente não me mudei. Desembalar parece muito
com aceitação.
Aceitação de uma vida sem Joanne.
Ando pela sala de estar espaçosa, a sala da lareira e a cozinha, cada canto
e arco adornado com molduras personalizadas e tons terrosos profundos.
Talvez amanhã eu comece a arrumar os quartos com os móveis e pertences
pessoais. Mas essa noite, tudo o que eu preciso é da brilhante peça de
artesanato que está no final do corredor.
Eu faço meu caminho até lá, virando na minha sala favorita e o motivo
pelo qual eu comprei esse imóvel sobrevalorizado. As imaculadas madeiras
brilham sob o candelabro e a lareira gótica na extremidade trazem imagens
de terras distantes e culturas místicas. Mas é o ponto central na sala que
demanda toda a minha atenção.
Eu me aproximo do Fazioli, o piano de cauda para concertos do meu avô,
corro um dedo pelo corpo curvado. Raro e extremamente valorizado, levou
três anos para ser feito, produzido com magníficos materiais e as dobradiças
e parafusos banhado à ouro. O coração do piano é esculpido das mesmas
árvores de abetos vermelhos que Stradivari usou para fazer seus famosos
violinos. Mas não é por isso que admiro essa besta atraente.
Sento na minha posição, atrás das teclas e deixo que meu humor decida a
melodia. Respirando fundo, passo os dedos pela introdução de “Toxicity”
do System of a Down. À medida que a música de metal muda o ritmo,
ficando mais pesada e mais agressiva, cada músculo no meu corpo se
contrai. Meus dedos se agarram às notas, meu torso e minha cabeça
balançando no ritmo da batida destacada, meu corpo inteiro sendo
capturado e controlado pela acústica.
A majestosa projeção me impulsiona para a nota mais alta enquanto bato
minhas mãos nas teclas, lutando com cada molécula de poder que o piano
oferece. A claridade cristalina me encanta, me consome e me faz me
apaixonar de novo por esse instrumento. Eu dependo dessa experiência.
Dediquei toda a minha vida para dominá-lo e preciso dele para me carregar
através desses dias e meses sem Joanne.
Talvez eu tenha alcançado o auge do meu sucesso no mundo da música.
Talvez eu esteja destinado a ser um homem solitário e amargo.
Ou talvez, eu ainda não tenha encontrado meu lugar, meu papel em tudo
aquilo e talvez – como Ivory disse tão apaixonada – eu vou estar lá quando
a música começar.
12

Emeric

É universalmente conhecido que quanto mais proibido algo é, mais


desejável isso se torna. Sinto essa verdade como um soco nas bolas quando
entro na sala de aula depois do almoço e encontro o objeto proibido do meu
desejo aguardando por mim.
Ivory está parada perto da minha mesa, sozinha e me observando com
seus grandes olhos escuros. Com os braços cruzados embaixo dos seios e o
queixo levantado irradiando atitude, ela não tem ideia do quanto eu quero
contê-la, chicoteá-la e fodê-la.
O vestido preto pendura nela como uma lona em sua pequena estrutura, o
que só exalta a memória do seu corpo nu e dá poder ao segredo que
compartilhamos. Ela está pensando em ontem quando memorizei toda pele
que ela está escondendo? A pinta na costela logo abaixo do seio direito, o
delicado caminho das sardas em sua coxa tonificada e a tatuagem
decorativa percorrendo suas costas – tudo isso pertence a mim agora. Eu
desejo por uma outra espiada, mais pele e mais Ivory.
Ela endireita a coluna, empurrando sem querer o amplo peito e me encara
como se estivesse lendo minha mente e achando isso terrível.
Assim como não posso mais parar que meu coração seja arrancando do
meu peito – obrigado por isso, Joanne –, não posso controlar a forma
primitiva que meu corpo reage a Ivory Westbrook.
Calor percorre meus músculos quando diminuo a distância entre nós.
Minha boca seca enquanto seus olhos seguem os meus movimentos ao
redor da mesa. A pressão crescente atrás do meu abdômen aumenta
enquanto observo a forma sensual de seus lábios, a veia saliente em sua
garganta e a cautela em seu olhar.
Eu junto minhas mãos atrás das costas, reprimindo o desejo de arrancar a
gravata sufocante em volta do meu pescoço.
— Srta. Westbrook. — Forço minha atenção para acima de sua boca. —
Você chegou cedo.
Ela aponta um dedo para os livros empilhados na mesa entre nós.
— Encontrei isso no meu armário.
Olho para os materiais que comprei na livraria da escola essa manhã.
— De nada.
— Então foi você. — Ela fecha os olhos, inala fundo e retoma seu olhar.
— Eu não vou aceitar…
— Você vai.
— Isso? — Ela pega o tablet ainda fechado da pilha de livros e estende
em minha direção. — Eu não posso aceitar.
— Você pode. — Eu me viro e começo a escrever o tópico de discussão
do próximo período no quadro branco.
Seus passos se aproximam, parando próximo de mim. Eu não olho para
ela, mas sinto sua proximidade como um zumbindo elétrico. Uma cacofonia
de emoções pulsa de sua respiração acelerada e do rangido de seus dentes.
Ela pode apenas me dizer que é uma confusão ansiosa.
Em vez disso, ela fala:
— Eu não aceito esmolas, sr. Marceaux.
Maldito orgulho dela. Prefiro não atacar verbalmente essa coisa simples,
mas não é fácil quando o assunto se trata dessa garota.
Movo o marcador pelo quadro, a ponta de feltro rangendo no silêncio.
— Você supõe demais, srta. Westbrook. Você vai me pagar de volta.
— É disso que eu tenho medo.
Ela murmura tão baixo que eu não tenho certeza se escutei corretamente.
Tampo o marcador e olho para ela.
— Repita isso.
— Eu… — Ela mantém os braços nas laterais do corpo como se estivesse
se forçando para não se mexer. — Que tipo de pagamento?
Meu pulso se acelera quando os alarmes soam em minha cabeça. Ela tem
uma riqueza de bens que a maioria de homens de sangue quente valorizam
mais do que dinheiro. Se ela está ou não consciente de sua beleza atraente,
sua pergunta não se originou da ingenuidade. Experiência mostrou a ela o
que os homens querem dela e esse pensamento faz meu sangue ferver.
— Dinheiro. Cheque pessoal. — Minha voz ecoa pela sala, impetuosa e
brava. — Qualquer coisa desse gênero. — Suavizo meu tom. — Que tipo
de pagamento você estava esperando que eu fosse querer?
— Ah, eu… — Ela engole em seco e encara a direção da porta. — Eu
não sei.
O distante som de vozes ecoam pelo corredor, um lembrete que a aula irá
recomeçar em alguns minutos.
— A verdade, Senhorita Westbrook.
Seus olhos mergulham em direção à minha virilha antes de se afastarem.
Merda. Não vou fazê-la dizer em voz alta. À essa altura, não posso
suportar escutar.
Ela está consciente do meu interesse inadequado por ela e agora sabe que
eu sei que está consciente. Mas ela avalia mal o jeito que opero. Eu nunca
obrigaria uma mulher a fazer sexo, muito menos uma estudante. Enquanto
aquilo me enfurece em um nível que faz minhas mãos tremerem, a
facilidade com que ela considerou sexo como a forma de pagamento, me
faz querer matar alguém.
Talvez eu esteja paranoico. Talvez tenha perdido minha cabeça, mas
caramba, estou convencido que ela tem sofrido abuso sexual. Alguém do
seu passado? Ainda está acontecendo? Quem é o filho da mãe que a está
machucando?
Fecho as mãos no quadril e olho para ela enquanto tudo dentro de mim
ferve até explodir.
— Há outro professor pedindo por favores inapropriados?
— Não!
Um pequeno alívio, mas me deixa sem ideia de quem pode ser.
— Então quem é?
Ela dá um passo para trás quando vários estudantes entram na sala de
aula, rindo e alheios. A conversa terá que ser adiada, mas tem algo mais que
não pode esperar. Eu me junto a ela na minha mesa enquanto ela recolhe os
livros empilhados.
Sob o pretexto de ligar o notebook, observo Ivory com os cantos dos
olhos e diminuo minha voz para que apenas ela escute.
— Acredito que seu irmão não encostou em você ontem à noite.
Seu sorriso é relutante, as covinhas no canto da boca se rastejando para
os lábios.
— Shane chegou tropeçando e com um nariz quebrado, reclamando de
dor de cabeça até desmaiar. Acho que isso é carma, hum?
— Sim. — Minha boca se contrai. — Carma.
Com os braços carregados de livros, ela se vira em direção a sala cheia de
estudantes, para e então gira em minha direção.
— Obrigada. — Ela encara minha gravata, seu queixo prendendo o tablet
no topo da torre de livros em seus braços. — Vou te reembolsar assim que
eu puder.
Balançando a cabeça, volto para o quadro branco.
Talvez eu tenha feito as coisas mais difíceis para ela. Seja lá o que ela faz
para ganhar dinheiro, ela tem que fazer mais para me pagar de volta. Mas os
materiais da escola são obrigatórios. Além disso, eu não tenho a intenção de
aceitar o reembolso dela.
Embora eu saiba que seu amor-próprio emerge para pagar suas coisas e
não receber esmolas, passo as próximas três horas obcecado em achar uma
maneira para poder tirar essa ideia de sua cabeça sem cruzar a linha.
Se sua mãe está desempregada, como ela pode me pagar de volta?
Estudantes de música não podem trabalhar em empregos regulares. Eles não
têm tempo para mais nada além da escola e de praticar. Inferno, estudantes
devem praticar seus instrumentos por pelo menos quatro horas por dia,
todos os dias e por anos. Se não fizerem, eles ficam para trás, perdem sua
vantagem competitiva e qualquer esperança de uma carreira musical.
Perguntas sobre sua situação financeira perambulam no fundo da minha
mente pelas próximas horas. Uma garota bela e jovem como ela, de uma
vizinhança como o Treme, tem uma série de métodos indesejáveis para
ganhar dinheiro rápido. Drogas e prostituições estão no topo da lista, mas
eu me recuso a imaginá-la se humilhando desse jeito. É assustador demais.
Quando o último sinal toca, os alunos de piano saem da sala de aula,
exceto Ivory que coloca seus pertences em uma mesa perto da porta e me
olha com expectativa.
— Os outros não têm aulas particulares?
— Sebastian Roth e Lester Thierry tem seus próprios professores em
casa.
— Eu sei. — Sua testa franze. — Mas Chris e Sarah sempre tiram
proveito das lições daqui.
— Eles optaram por estudar sob a orientação da sra. Romero.
Plantei a sugestão em Chris e Sarah nas reuniões de ontem, insinuando
que a outra professora de piano tinha algumas vagas abertas para depois da
escola e que sua abordagem é mais suave e poderia ser uma boa
combinação para eles. É uma verdade parcial. A sra. Romero ensina aos
alunos mais novos e já estava bem ocupada. Mas ela trabalha para mim e,
desta forma, eu determino seus horários.
Os lábios de Ivory se separam ao absorver a informação.
— Isso significa que terei você todos os dias só para mim das três às
sete?
Foda-se, mas eu amo o som disso.
Seus olhos expandem.
— Ah merda, eu não quis dizer…
— Eu sei o que você quis dizer e, sim, serei seu mentor.
Como uma regra geral, prefiro cuidar de só um ou dois estudantes de
cada vez. Apesar das minhas intenções com Ivory terem muito pouco a ver
com seu desenvolvimento pessoal. Quando se trata de me torturar, eu sou o
diretor do esforço, determinado a suportar todo o ano letivo com as bolas
inchadas, dolorosas e sensíveis.
Fecho a porta e caminho para o canto da sala em forma de L.
Repousando o quadril no piano de cauda Bösendorfer, espero ela se juntar a
mim para então bater meus dedos na superfície lustrosa e preta.
— Quatro horas todos os dias.
Um enorme sorriso domina seu rosto.
— Eu não vou desperdiçar o seu tempo.
— Não, você não vai. — Posso olhar para ela vinte e quatro horas por dia
e me sentir como o pervertido mais produtivo no mundo. Porém, se eu não
acabar com esses pensamentos na minha cabeça, nosso tempo juntos vai
acabar antes mesmo de começar. — Você praticou ontem à noite?
— Mas é claro que sim.
Ela não fica tensa, muda a respiração ou transmite vulnerabilidade de
nenhuma maneira. Ela está falando a verdade, o que pode explicar seu
paradeiro noite passada.
— Onde você pratica? — Percebendo que implica que eu sei que ela não
estava em casa, reformulo a pergunta. — Você tem seu próprio piano?
— Não mais. — Seu cabelo escuro escapa da curva da orelha e cai no
ombro. Ela junta na curva do pescoço e torce em uma corda pelo peito. —
Minha mãe vendeu o piano do meu pai depois que ele morreu.
Meu pai, não papai. Mordo a parte de dentro da bochecha para esconder
minha satisfação.
— Tem uma loja de música no final da rua da minha casa. — De frente
para mim, ela apoia um cotovelo na borda do piano e espelha minha
posição. — O dono me deixa praticar em seu Steinway até onze horas da
noite todos os dias.
O que coincide com a hora que ela chegou em casa. Então por que eu não
consigo afastar a sensação que ela está deixando algo de fora?
Porque ela não está olhando para mim. Ela está brincando com as pontas
do cabelo e para onde quer que seus pensamentos tenham divagado, e
distraída no silêncio.
Coloco um dedo sob seu queixo, levantando-o para reconquistar sua
atenção.
— Hora de finalizarmos nossa conversa.
Seus lábios se estreitam.
— Quem pediu por favores inapropriados?
Ela se vira e abaixa até o banco do piano.
— Sem mentiras?
— Eu não oriento mentirosos, srta. Westbrook.
Ela acena, sua expressão triste.
— A verdade é que eu preciso da sua ajuda. — Suas mãos percorrem as
teclas sem apertá-las. — Com isso. Dominando o piano. — Ela estica os
dedos. — Eu sou a melhor pianista desta escola, sabe?
— É mesmo?
Ela olha para mim através dos cílios.
— Posso até ser melhor do que você.
Minha barriga afunda na presença de seu sorriso tentador.
— Não se empolgue.
— Você está certo. — Ela estuda seus dedos nas teclas. — Eu tenho
muito para aprender. Mas com o professor certo e concentração suficiente,
estarei fora daqui em um ano. Fora do Treme. Essa é a melhor verdade que
eu posso dar, sr. Marceaux. — Ela puxa as mãos para seu colo e me encara
com olhos suplicantes. — Se você se concentrar na outra parte da minha
vida, as coisas não relacionadas ao meu talento vão arruinar o meu futuro. E
se você envolver o serviço social, a oportunidade que eu tenho aqui será
tirada de mim.
Ela está quase admitindo que não vou gostar do que encontrarei quando
fuçar em seus assuntos. Não planejo envolver o serviço social e ela não
precisa saber até que ponto sou capaz de investigar uma pessoa.
Mas eu prefiro ouvir dela.
— Responda minha pergunta.
— Eu não posso. Por favor.
Isso é tudo o que é preciso, o som sedutor dela implorando em três
sílabas ofegantes. E ela possui cada nervo no meu corpo. Quero ouvir
aquele som enquanto ela se ajoelha diante de mim, me libera das calças e
me guia em direção à sua boca.
Recomponha-se, imbecil.
Está claro que ela não vai me contar quem está se aproveitando dela, mas
eu vou descobrir.
— Muito bem. — Agito a mão em direção ao piano. — Toque para mim.
Ela ajusta o banco, tira os sapatos esfarrapados e posiciona os pés nos
pedais. Com as mãos sob os joelhos, ela me dá sua atenção.
— Barroco? Clássico? Jazz?
— Me surpreenda.
Olhando o teclado, ela controla a respiração. Uma corrente de serenidade
flutua dela enquanto sua postura relaxa e seu rosto suaviza. Então ela
levanta as mãos, seu rosto curvado em direção às teclas e, porra, seus dedos
voam. O concerto que ela escolhe é pura insanidade, uma alta complexidade
no tempo com muitas notas. Islamey, Fantasia Oriental de Balakirev é uma
das cadências mais desafiadoras em todo o repertório do piano clássico e
ela toca como uma especialista.
Ela é um furacão de pulsos batendo, dedos violentos e quadril
balançando. Seu queixo e sua cabeça balançam nas batidas energéticas e sua
expressão é a imagem de intensa concentração. Mas minha audição crítica
não deixa escapar quando ela atinge os acordes com muita força, acelera
rápido demais e toca as todas as semicolcheias como colcheias triplas.
É por isso que eu não gosto de tocar essa peça. Eu a dominei na
universidade, mas é um maldito pesadelo. A dificuldade e o desconforto em
posicionar os dedos, a mão esquerda pulando sobre a direita e ao final dos
oito minutos, o banho de suor que fico. Fora que não sou um fã de
interpretação clássica, o que é irônico já que tenho um assento na Orquestra
Sinfônica de Louisiana.
Apesar dos mínimos erros de Ivory, ela manipula muito bem a
flexibilidade rítmica dentro dos compassos enquanto segue as notas com
suas próprias convicções artísticas. Eu me encontro exalando com ela e me
curvando para mais perto enquanto ela cai nas batidas fortes,
completamente hipnotizada pelo salto de suas mãos. Ela dá vida às notas, as
linhas horizontais e verticais do compasso, tornando essa a melhor
performance que eu já ouvi desta peça.
Ela finaliza com o varrer dos braços e solta um suspiro silencioso. Suor
pontilha ao longo do contorno do couro cabeludo e suas mãos tremem no
colo.
Um longo momento se passa antes que ela arraste seu olhar para o meu e
pigarreie.
— Então?
— Você acertou as notas com muita força e seu rubato é bruto e muito
rápido. Muito erros.
Ela balança a cabeça, seus ombros caindo.
— Isso é um instrumento, srta. Westbrook, não uma arma. Você está
fazendo música, não atirando notas na plateia.
— Eu sei — ela diz baixinho. — Projeção é uma arte que ainda estou…
tentando… — Seu queixo treme e lágrimas brilham nos olhos antes dela
desviar o olhar e sussurrar: — Merda.
Se ela quer um professor que elogia apenas para equilibrar as críticas, ela
está com o homem errado. Sou um idiota e como eu disse a ela ontem,
respeito comentários construtivos. E também não terminei minha avaliação.
Eu me aproximo do banco do piano e sento, forçando que ela abrisse
espaço para mim. Ela escorrega para a borda, o assento mal aguentando nós
dois. Nossos ombros, quadris e coxas se tocam e não é acidental. Eu quero
que ela sinta cada ponto de contato e aprenda a confiar nisso. Confiar em
mim.
— O que eu disse sobre choramingar?
Seus ombros saltam para trás e ela olha para a frente, sua voz esganiçada.
— Me desculpa. Não sei por que eu… Eu fiquei um pouco
sobrecarregada. Acho que queria que você…
— Pare de falar.
Ela pressiona seus lábios um no outro.
Eu me viro para encará-la e a posição empurra o comprimento da minha
coxa na dela. O calor de sua perna penetra na minha e seguro as mãos no
colo para não estender a mão e subir a bainha do seu vestido.
— Não desenvolvi a habilidade para tentar Islamey até a universidade e
eu não conseguia tocá-la toda até o meu último ano na graduação.
Seus olhos se voltam para os meus, grandes e redondos e cheios de
umidade.
Eu seguro a curva delicada de sua mandíbula e passo meu polegar para
pegar uma lágrima.
— Poucas pessoas podem tocar essa peça. Na verdade, Balakirev admitiu
que há alguns trechos em sua composição que nem ele conseguia controlar.
Ela se inclina na minha mão, pelo visto inconsciente do que ela está
fazendo enquanto se agarra às minhas palavras.
— Sua interpretação é extraordinariamente apaixonada e impressionante.
— Assim como você. — Estou emocionado.
Sua respiração fica mais rápida, levantando o peito.
— Ah, meu Deus, sério? Eu… — Mais lágrimas escorrem pelo rosto e
ela se afasta para limpar o rosto. — Droga, eu não estou choramingando. Eu
juro.
— Por que você escolheu essa?
— Islamey?
— Sim.
Ela me encara com um sorriso aliviado.
— O dono da loja de música de quem falei, aquela onde eu pratico? Seu
nome é Stogie e…
— O que você dá a ele em troca de praticar lá?
Seu sorriso desaparece quando ela se dá conta do que estou insinuando.
— Nada! Ele é o homem mais gentil que eu conheço. — Ela estremece.
— Sem ofensa.
— Nós dois sabemos que não sou um homem gentil. Continue.
Ela morde o lábio e seu sorriso reaparece, puxando os cantos.
— Ele é muito velho e teimoso e recusa a tomar os remédios. Então eu
fiz um acordo com ele. Se eu aprendesse Islamey, ele tomaria os remédios
sem minhas insistências. — Ela encolhe os ombros. — Levei o verão todo.
Durante o dia todo, todos os dias.
— Dedicação.
Seu sorriso permanece.
— Minhas mãos ainda doem.
— Acostume-se. Enquanto você tocava aquela peça lindamente, não
estava perfeita. Vamos começar com Étude Op. 10, Nº 5 de Chopin para que
você fique mais confortável com a quantidade apropriada de pressão nas
teclas pretas.
Enquanto ela puxa a partitura e mergulha na Étude, eu não me movo, não
quero dar espaço a ela. Estou relutante em dar a ela qualquer margem para
manobra.
Eu me sentei com Prescott Rivard essa manhã em uma reunião
improvisada com o seu professor de guitarra. Depois fiz os turnos com os
outros melhores alunos do Le Moyne. O talento é impressionante, mas
nenhum é competente ou motivado como Ivory Westbrook.
Eu pretendo cultivá-la, poli-la e discipliná-la enquanto extraio cada gota
que posso desse prazer doentio. Mas eu não posso dar a única coisa que ela
deseja. Eu quero esse trabalho, o que significa que ela não terá a Leopold
em seu futuro.
13

Ivory

— Eu vou para a Leopold. — Paro o marcador no meio do rabisco, a


ponta pressionada no quadro branco enquanto o rangido dos sapatos do sr.
Marceaux se aproxima por trás.
A altura dele lança uma sombra nas minhas costas enquanto sua
respiração agita meu cabelo, seu sussurro como uma fita de cetim traçando
o meu ombro.
— Menos conversa, mais escrita.
É apenas o quinto dia de aula e já estou planejando todos os jeitos que
posso matá-lo.
Quero envenenar seu café por começar a aula particular de hoje com uma
punição. Apesar de ter esquecido tudo sobre interromper a aula dele no
primeiro dia, ele estava feliz por me lembrar ao empurrar um marcador em
minha mão e me conduzir até o quadro branco na parede.
Eu quero estrangulá-lo com sua odiosa gravata de flores amarelas por me
fazer escrever em uma repetição sem fim: Eu não vou desperdiçar o tempo
do sr. Marceaux.
Com linhas grandes e largas, rabisco outra frase ao mesmo tempo que
falo:
— Eu tenho 17 anos, não 7.
Golpe.
Uma picada afiada queima nos meus braços e minha mão voa para
esfregar a dor.
Quero arrancar aquela batuta de maestro da sua mão e enfiar na garganta
dele. Porque, sério, onde está a orquestra? Não tem uma, ainda assim ele
está girando aquela maldita coisa como Pherekydes de Patrae e batendo no
meu braço como uma freira empunhando uma régua.
— Isso é desperdiçar o tempo de nós dois — resmungo ao mesmo tempo
que rabisco outra frase que afirma o oposto.
Golpe.
Um estalo de calor floresce nas minhas costas, bem acima do meu
cóccix. Desgraçado, aquilo dói. Mas também não é a pior dor. Se alguém
levantasse uma batuta para mim – Lorenzo ou Prescott, por exemplo – eu
rosnaria e daria socos. Mas esse é o meu professor e quero agradá-lo.
Enquanto planejo sua morte.
Quero o professor de três dias atrás de volta. Aquele que tocou o meu
rosto com tanta ternura e disse que minha apresentação o emocionou. Para
onde aquele homem foi?
Talvez seja minha culpa. Estive ausente, temendo essa noite a semana
inteira. Eu não posso adiar Prescott por mais tempo. Seu dever de casa já
está feito e estou uma mistura de nervos e raiva ao mesmo tempo. E com o
final de semana começando amanhã, terei dois dias em casa. Dois dias com
Lorenzo e sua indignação por não ter conseguido me localizar a semana
toda.
— O que eu disse sobre me questionar? — Os passos do sr. Marceaux
atrás de mim e seus olhos de gelo arrepiam os cabelos na minha nuca.
Se eu não o conhecesse melhor, o que não conheço, diria que ele está
gostando.
— Dizer a um estudante para não questionar seu professor é a pior regra
na história das regras.
Enrijeço pronta para outro golpe, que não vem.
Ele inclina um ombro próximo a mim na parte em branco do quadro, suas
mãos atrás das costas e um sorriso muito bonito no rosto.
— Vou reformular. Não questione os meus métodos. — Seu olhar afiado
vai para o quadro. — Apague as últimas cinco frases e tente de novo com a
caligrafia condizente a uma garota de 17 anos.
Pressiono o apagador no quadro com golpes fortes e começo de novo.
— Posso escrever e falar ao mesmo tempo e quero falar sobre Leopold.
— Você não é boa o suficiente para Leopold.
Giro na direção dele durante a vibração das batidas do meu coração em
meus ouvidos.
— Você disse que minha interpretação de Islamey era
extraordinariamente apaixonada e maravilhosa.
Parados alguns passos de distância, ele me observa com os olhos
semicerrados – Entediado? Sonolento? – e encolhe os ombros sem
entusiasmo.
— Aquilo eram superlativos sem sentido que agora me arrependo de ter
usado.
Meus músculos estremecem quando uma onda de raiva me atinge.
Minhas mãos se fecham em punhos e antes que meu cérebro possa me
acompanhar, recuo o marcador e arremesso. Acertando bem na testa dele.
O marcador bate nas feições carrancudas dele e rola pelo chão ao lado de
seu Dr. Martens. Ele olha para o marcador, surpreso com uma imobilidade
aterrorizante, antes de atirar a batuta do maestro na mesa e nivelar seus
olhos glaciais em mim.
Merdamerdamerda. Meu rosto pega fogo e eu tropeço para trás. Meu
ombro bate no quadro branco, mas continuo, deslizando pela parede e em
direção a porta. Que merda tem de errado comigo? Eu nunca perco a calma.
Puta merda, eu nunca joguei marcadores nos meus professores!
Ele me alcança, limpa a testa e olha carrancudo para seus dedos. Sim, sr.
Marceaux, o ponto preto e grosso da minha vergonha está manchado agora
em sua testa furiosa e vincada.
— Me desculpa. — Olho de relance para a porta fechada, desejando que
eu estivesse do outro lado, no final do corredor e bem longe do que quer
que venha a seguir.
Sem retirar seus olhos dos meus, ele levanta o queixo e afrouxa o nó da
gravata. Merda, isso não pode ser bom.
Enquanto suas mãos deslizam pela seda, eu me lembro de outro rumor
que escutei essa manhã sobre as maneiras depravadas como ele usa suas
gravatas, seus cintos e outros diversos acessórios. Não acredito em fofocas,
mas enquanto encaro dentro de seus olhos cruéis, caio no abismo de
imagens sussurradas com a barriga afundando.
Com o nó pendurado frouxo embaixo do colarinho, ele dobra o dedo.
— Venha comigo.
Duas palavras faladas sem muito esforço que apesar disso tem o poder de
devastar o meu futuro. Medo balança minha barriga. Se ele me levar para o
escritório da diretora, será uma suspensão? Ou jogar objetos no meu
professor conta como expulsão?
Mas ele não anda em direção à saída. Ele avança para do fundo da sala e
vira no canto, fora de vista. Eu olho pela pequena janela na porta, para o
vazio do corredor e tremo com a indecisão.
Correr vai apenas piorar essa situação.
Eu me forço para a frente, com as pernas bambas passo pelas fileiras de
mesas. Cada centímetro do meu corpo está tenso, correndo sob um fio de
tensão que conecta o caminho dos meus pés para o que quer que me
aguarda na esquina. No momento que chego no piano e encontro-o sentado
de lado na ponta do banco, meu pulso está vibrando e lutando em minhas
veias.
Ele aponta para o chão e entre suas coxas abertas, balançando o pulso
como se ajeitando a posição do relógio pesado.
As mangas da camisa listrada em cinza e branco se reúnem em torno de
seus cotovelos. Ele está usando outro daqueles coletes, esse preto com
pequenos botões brancos. Minha atenção muda da gravata amarela para sua
mandíbula sombreada, a linha reta de seus lábios e ao mesmo tempo que
caio na arrepiante armadilha de seus olhos, percebo, em pânico, que estou
fazendo-o esperar.
Corro para a frente e fico onde ele me indicou, balançando instável entre
suas pernas abertas.
Ali está o dedo dobrado de novo, gesticulando para que eu chegasse mais
perto, mais perto e Deus me ajude, quando estou na posição que ele me
quer, meus peitos estão bem na cara dele. Eu curvo minha coluna, tentando
controlá-los, mas caramba, eles estão lá e não há nada que eu possa fazer
sobre isso.
Um calor atravessa minhas bochechas, ele encara descaradamente por
baixo da gola da minha camisa. E isso me faz eu me sentir nojenta, barata e
com muita raiva, mesmo.
Eu pego o decote para dar um puxão.
Sua mão pega o meu pulso, puxando meu braço de volta para minha
lateral.
— Pare de se mexer e endireite as costas.
Eu faço como ele diz, mesmo que eu esteja a ponto de explodir com a
ansiedade da posição dos nossos corpos e o silêncio dele com o incidente
com o marcador.
— Você vai me reportar para a diretora?
— Eu cuido das minhas próprias punições. — Ele aponta para sua testa.
— Cuide disso.
— Cuidar disso? — Engulo em seco. — Tipo limpar?
Ele me encara como se eu fosse a garota mais burra no mundo. Bem, sim,
só uma garota burra se colocaria em uma situação como essa.
Com uma mão tremendo, pressiono a ponta do meu polegar na tinta em
cima de sua sobrancelha. Eu não sei o que eu esperava – escamas
reptilianas frias? –, mas sua pele é macia, quente e humana. Enquanto
pressiono com mais força, minha mão livre segura a parte de trás de sua
cabeça e meus dedos deslizam pelos fios pretos macios. Parece tão…
pessoal, afetuoso, estranho.
Seu rosto paira centímetros abaixo do meu, os músculos de suas
bochechas relaxados, os lábios entreabertos e os grossos cílios para baixo.
Ele é muito bonito, mesmo que cada coisa sobre ele seja potencialmente
masculino. Desde o cheiro amadeirado do seu shampoo e o formato
quadrado do queixo até sua cintura afunilada e a maneira como suas pernas
musculosas esticam o corte simples da calça preta, está tudo lá para me
lembrar que meu futuro depende dos caprichos de um homem.
Um homem com tinta na testa.
Esfrego com mais força.
— Não está saindo.
— Use a saliva.
Meu medidor de nojo interno gira em direção ao eca, mas eu já estou
com problemas até os meus seios, então lambo meu polegar e volto a
esfregar.
— Qual é o meu castigo?
— Está saindo?
— Está. Me desculpe mesmo, sr. Marceaux. — Limpo os últimos
vestígios e deixo os braços caírem. — Já está limpo.
— Ponha seus braços onde estavam.
Por que ele iria querer meus braços em seu cabelo? Em seu rosto? Parece
tão… estranho. Impróprio. Mas ele pediu. Não, ele mandou. Caramba, por
que é tão difícil desobedecer a ele?
Eu volto com as minhas mãos para o exato lugar onde estavam e por
algum motivo é mais fácil dessa vez, menos desconfortável. Ele me encara
e os vários tons de azuis no seu olhar brilham sob as lâmpadas
fluorescentes. Sua boca é um pouco carnuda, mas não de um jeito
desagradável. De alguma forma, seus lábios cheios o fazem parecer mais
suave. Eu acho que são meus atributos favoritos.
O fato de eu ter um atributo favorito em um homem me faz dar uma
pausa, mas não me lembro de ver um homem tão atraente quanto o sr.
Marceaux. Não na TV, revistas ou pessoalmente. Com certeza, não tão
perto. Na verdade, estou consciente da pressão de suas coxas na parte de
fora das minhas pernas, a virilha de sua calça encostada no meu joelho e o
calor da sua respiração sussurrando na minha clavícula. Mas é a sua cabeça
em minhas mãos que me fazem, ao mesmo tempo, querer afastá-lo e puxá-
lo para mais perto.
Nunca toquei em um homem dessa maneira. As cócegas de seu cabelo
entre meus dedos, os traços musculosos do seu rosto sob a minha mão e o
arranhar de sua barba por fazer, cada sensação em meus dedos me enchem
de medo, excitação e todo o caos no meio.
Eu penso de novo no rumor sobre o porquê de ele ter deixado Shreveport.
A mesma coisa pode acontecer aqui, comigo? Meus dedos apertam em sua
cabeça.
Ele lambe os lábios.
— Me conte no que você está pensando.
Quero afastar minhas mãos, mas eu não ouso.
— Eu ouvi umas garotas sussurrando sobre você no primeiro horário.
— Continue.
— Elas disseram que seu primeiro nome é Emeric.
— Muito pouco provável cochichar sobre isso. — Seus pulsos descansam
em suas coxas, seus dedos suspensos atrás de mim e a proximidade fazem
com que rocem em minhas pernas. — O que mais?
— Shreveport.
— Ah. — Seus dedos se esfregam na parte de trás do meu joelho e tenho
certeza de que dessa vez ele está fazendo intencionalmente. — Srta.
Westbrook, não me faça arrancar todos os detalhes de você.
— Elas disseram que você foi demitido. — Minha palma parece muito
pegajosa na sua bochecha, então coloco-as no colarinho de sua camisa. —
Porque alguém entrou na sala de aula e o encontrou com uma mulher.
Ele arqueia uma sobrancelha.
— Isso é tudo?
— Não. — Pigarreio. — Pelo visto, a boca dela estava amordaçada com
sua gravata.
— E?
— Os pulsos dela estavam presos com seu cinto. — Corro com o resto
das palavras. — O corpo dela estava curvado na mesa enquanto você
transava com ela por trás. Isso foi tudo que eu ouvi.
Suas mãos se fecham na parte de trás do meu joelho.
— Uau.
Uau mesmo. As coisas doidas que as pessoas falam…
Um sorriso desliza em seus lábios.
— Isso é surpreendentemente preciso.
— O quê? — Meu peito arfa enquanto empurro seus ombros.
Ele antecipa meu movimento, seu braço enganchando em volta das
minhas pernas para, então, se mover para cima e circundar minha cintura
enquanto se levanta. Ele chuta o banco para fora do caminho e gira a gente
em direção a parede mais próxima.
Minhas costas são pressionadas contra os tijolos com seu peito alinhando
ao meu, me prendendo ali.
— Respirações profundas, Ivory.
Ivory. A palavra mais íntima que ouvi de sua boca. Minha pele estremece
com uma satisfação esquisita.
Ela toca meu pescoço com seus lábios.
— Você não está respirando.
Preencho meus pulmões, mas não ajuda. Eu me sinto tão pequena e
insubstancial em seus fortes braços e presa no seu grande corpo. Seu
peitoral, bíceps, barriga, coxas… Meu Deus, ele está duro em todas as
partes que estou mole. E quente. Muito quente. Eu acho que estou com
febre. Eu com certeza vomitarei se ele tirar a gravata e o cinto.
Com minhas mãos apertando seus ombros, tento empurrar o músculo
imóvel.
— Por favor, não faça essas coisas comigo.
Ele suspira, acariciando seu nariz ao longo do meu queixo.
— Foi consensual. Você sabe o que isso significa?
Balanço a cabeça, não com muita certeza, mas talvez eu saiba.
— Como um acordo?
— Sim. Só que ela não apenas concordou. Ela implorou.
— Por quê? Por que ela iria querer isso?
— Joanne é… — Ele desvia o olhar e estica o pescoço para esfregar o
queixo no ombro. Suas sobrancelhas se erguem e toda seu comportamento
parece repentino e estranhamente subjugado. Sua intensidade retorna junto
com seu olhar e seu braço aperta mais em volta da minha cintura. — Ela é
como você.
— Eu? — Eu me contorço contra ele. — Eu não quero essas coisas. Você
nem me conhece.
— Me diga o que você está sentindo nesse exato momento.
— Medo. Você está me assustando.
Seus lábios pairam um beijo à distância, a sugestão do chiclete de canela
perfumando seu hálito.
— Sim, mas tem mais alguma coisa. Descreva.
— Meu coração está acelerado. Estou queimando e minha barriga parece
uma pedra de gelo.
— Seu coração e sua barriga. O que mais? Descreva a sensação em seus
mamilos.
Uma onda de calor sobe pelo meu pescoço, passa pelo meu peito e se
forma entre as minhas pernas. Aperto minhas coxas uma na outra,
humilhada pela reação, confusa pela onda de emoções incomuns, mas eu
me prendo no sentimento que eu entendo.
— Isso é errado.
— Não é errado. É inapropriado. Mas fomos muito além do inapropriado
no primeiro dia. Me fale como estão os seus mamilos. Eu não vou criticar
sua resposta contanto que seja a verdade.
Aspiro o ar em uma respiração instável e dou a ele o que ele quer.
— Desejando e duros.
— Boa garota.
O formigar entre as minhas pernas fica mais forte, mais pesado e mais
exigente.
Ele empurra seu quadril no meu para eu parar de me contorcer e a parte
mais dura dele, a parte que eu mais odeio, golpeia minha barriga.
— Agora, ponha um nome em todas essas emoções.
— Eu não sei. — Não consigo respirar. Não consigo pensar. — Eu não
posso.
— Procure fundo, Ivory.
Minha garganta se fecha.
— O que você sente quando você não come?
— Fome.
Seus olhos duros estão muito perto, muito perigosos.
— Que tal quando você vê um belo piano?
— Desejo.
— E quando a elogiei depois da sua apresentação de Islamey?
— Vontade por mais.
— Fome. Desejo. Vontade. É isso que você está sentindo enquanto a
seguro na parede?
É isso? A dolorida fome por algo entre as minhas pernas, meu batimento
cardíaco descontrolado e a necessidade ardente de expressar, falar sobre
isso? Minha cabeça está muito confusa. Sim, ele é um homem muito bonito
e eu escuto todas as garotas falarem sobre quererem fazer sexo com ele. E
sim, eu anseio por sua apreciação do meu talento, por seus elogios de boa
garota e sua mão quente em meu rosto, mas isso? O comprimento do seu
corpo no meu? Me segurar imóvel?
Ele só está me segurando. Ele não está agarrando meus peitos ou se
empurrando entre as minhas pernas. Ele está me dando atenção.
Perguntando sobre meus sentimentos. Sem pegar.
Jesus, eu quero mesmo isso, de alguém em quem eu possa confiar, do
meu professor e eu não deveria.
— Eu acho que é desejo. E vergonha. — Humilhação.
Ele pressiona seus lábios na minha testa.
— Hum. Essa é a minha garota.
— Eu não quero ser amordaçada, amarrada e…
Seu dedo cai na minha boca antes de retornar para minhas costas.
— Agora não. Mas você vai pensar nisso. A ideia vai consumi-la. Então
iremos conversar sobre isso de novo.
— Mas você é o meu professor!
— Eu disse que iremos conversar sobre isso. — Ele se inclina para trás e
descansa as mãos em meus quadris. — Onde você vai arrumar o dinheiro
para me pagar de volta?
A mudança de assunto me dá uma chicotada.
— Eu vou tê-lo até segunda-feira, prometo.
— Não foi isso que eu perguntei.
Fecho os olhos, bloqueando seu olhar perspicaz. Ele sabe que minha mãe
é desempregada. Eu estou aqui até as sete horas todas as noites e praticando
na loja de Stogie até as onze horas, então ele sabe que eu não consigo
trabalhar. Não tem possibilidade de falar para ele que estou fazendo o dever
de casa de Prescott e basicamente me prostituindo para pagar as contas de
casa. E eu não sei o porquê, mas mentir para ele me assusta mais do que ele
descobrir a verdade.
Abrindo meus olhos, eu faço a única coisa que posso. Balanço a cabeça.
Sua expressão se endurece e seu olhar de desconfiança afeta todo o meu
mundo.
— Vamos falar sobre a punição por jogar porcarias em seu professor.
Ele está a centímetros do meu rosto, com uma expressão assustadora e
um corpo com o dobro do meu tamanho. Isso não é castigo o suficiente?
— Você tem uma escolha. Me falar de onde você arranja seu dinheiro.
Ou deixar sua bunda descoberta para umas palmadas.
Todo o meu sangue escorre do meu rosto para o meu pé. Não há escolha.
14

Emeric

Eu flexiono minhas mãos na cintura de Ivory, todo o meu corpo vibrando


com pensamentos de ruborizar sua bunda dura. Mas meu cérebro grita para
que ela escolha a outra opção, para me contar seus segredos e me conduzir
para longe dessa tentação perigosa.
Com a parede atrás das costas delas e seus maravilhosos peitos subindo e
descendo no meu peitoral, ela levanta seus olhos marrons e sussurra:
— As palmadas.
Sua resposta ofegante me atinge no estômago e vai para minha virilha,
arrancando um som gutural da minha garganta e impulsionando meu quadril
contra ela em um desejo agudo. Ela arfa quando me sente. Merda, como ela
pode não me sentir? Eu nunca estive tão duro assim em toda minha vida.
Isso é um erro. É Shreveport, Joanne e uma maldita ladeira escorregadia
para a ruína, tudo de novo.
Seguro meu corpo imóvel no dela, meus dedos cavando sua cintura.
Ela não é Joanne. Isso não é amor ou apego. Não é nem sexo. Eu estou
em controle e seu castigo é merecido.
Soltando Ivory, eu me afasto e acalmo a respiração.
Eu dei uma escolha para ela e eu sou um homem de palavra.
— Vire-se. Mãos na parede.
Seu rosto mostra o medo enquanto gira devagar e segue meu comando. A
fina saia marrom faz um contorno erótico em torno de sua bunda atrevida –
muito melhor que a lona preta que ela estava usando alguns dias atrás. As
protuberâncias em suas nádegas não são nem muito grandes nem muito
pequenas, proporcionais com sua cintura estreita e perfeitas para minhas
mãos.
Mas a bainha desfiada e o grosseiro tecido desbotado são um lembrete
que isso não é só sobre o que está debaixo da saia. Além do meu desejo de
disciplinar e do prazer, eu sinto esse profundo desejo doloroso de sustentá-
la de todas as maneiras.
— Não se mexa.
Eu recuo e ajeito a protuberância atrás do zíper. Saindo da alcova e
entrando na parte principal da sala de aula, encaro a porta. Ainda está
fechada. Não tem tranca, mas as dobradiças irão chiar se forem abertas, me
dando cerca de cinco segundos antes do intruso chegar até a sala e virar no
corredor.
Enquanto eu volto para Ivory, meu celular vibra no bolso. Irritado com a
interrupção, considero ignorar, mas talvez irá me distrair do erro que estou
para fazer. Eu olho para a tela.
Joanne: Estou na cidade esse final de semana. Eu preciso te ver.
O espaço vazio em meu coração aperta com força. Puxo um chiclete do
bolso e amasso nos meus molares.
O celular toca de novo.
Joanne: Preciso do seu endereço.
Ela é persistente o suficiente para encontrá-lo, mas não vai conseguir de
mim.
E agora eu estou mais excitado do que trinta segundos atrás.
Desligo o celular, jogo na mesa mais próxima e volto minha atenção para
Ivory.
As mãos espalmadas na parede e o olhar no chão, ela não se moveu.
Exceto seus pés. Eles estão juntos agora e seus joelhos visivelmente
tremendo debaixo da saia.
Ela sabe que isso é inapropriado, que estamos fazendo algo que não
deveríamos. Mas duvido que ela esteja ciente que a emoção desse risco, a
chance de sermos pegos, está neste momento aumentando a transmissão de
dopamina e aumentando a excitação que corre pelo seu corpo.
A possibilidade de escapar de algo perversamente proibido só alimenta a
besta em mim e me deixa mais faminto.
Eu me aproximo.
— Estenda sua postura.
Ela desliza os pés e inclina a cabeça como se estivesse me ouvindo.
Suavizo meus passos, forçando Ivory a se concentrar mais para rastrear
minha aproximação.
Quando eu a alcanço, eu invado, pressionando minha excitação em seu
traseiro. Sem esfregar. Só para deixá-la sentir o quanto nos encaixamos bem
ao mesmo tempo que a seguro contra mim com minhas mãos em seus
quadris. Seus ombros enrijecem na altura das suas orelhas e sua respiração
fica presa na garganta.
Eu penteio seu cabelo para o lado, trilhando um dedo por sua nunca
enquanto deslizo minha bochecha junto à dela.
— Última chance para mudar de ideia.
Não mude de ideia.
Suas palavras saem apressadas em meio à sua respiração entrecortada.
— Acabe logo com isso.
Meu coração acelera ao me virar para a direita e bater minha mão
dominante em sua bunda. É só um golpe de aquecimento, mas ela voa para
a ponta dos seus pés e deixa sair um gritinho sensual.
Meu pau incha, pulsando e preso na minha perna. Meus dedos formigam
para tocá-la e acariciar seu impecável corpo.
— Abra sua boca.
Seu perfil se aperta. Então seus lábios se separam, hesitantes, seu queixo
tremendo de apreensão. Tão linda.
Eu tiro o chiclete macio de minha boca e ponho dentro da dela. Ela recua,
mas seguro sua cabeça e coloco o chiclete de canela entre seus molares com
deslizar do meu dedo.
— Morda. — Acaricio sua mandíbula enquanto ela flexiona. — Boa
garota. Agora segure aí. Sem gritar.
Deslizo minhas mãos por suas coxas, esticando para alcançar sua pele
nua. Sua respiração acelera quando recolho a saia em minhas mãos, subindo
mais e mais, acima do seu magnífico traseiro e em volta da sua cintura.
Arrepios estimulam a parte de baixo da minha mão no momento que
acaricio a parte de trás de suas pernas, o vinco entre suas coxas, seu traseiro
e o acabamento da calcinha que divide suas nádegas. Prendendo meu dedo
debaixo das bordas arredondadas, eu arrasto o tecido para cima, puxando o
pequeno pedaço pelo comprimento da sua fenda para expor mais carne.
Seus glúteos se flexionam e se contorcem nas minhas mãos e meu pulso
acelera. Ela é tão macia e firme, trêmula e quente. Tão malditamente
receptiva.
Quero arrancar sua calcinha, mas o vislumbre de sua boceta tornaria
impossível manter meu pau dentro da calça.
Prestando atenção na porta, dou um passo para trás. A visão de sua bunda
enfeitada com a renda e o pedaço do algodão cobrindo a forma excitante da
sua boceta, ameaçam dobrar o meu joelho.
— Quatro golpes — digo ríspido e fortaleço minha voz. — Duas em cada
nádega.
Ela encara a parede, os dedos se curvando nos tijolos enquanto uma série
de contrações oscilam em suas nádegas.
Com uma respiração profunda, deixo minha mão voar, aplicando mais
força desta vez, mas ainda assim me segurando. O tapa ecoa pela sala e seu
corpo responde como uma corda de violão, se esticando e vibrando, suas
cordas vocais cantarolando delicadamente. Então ela se ajeita, ficando mais
sólida e parada.
Uma marca de mão rosa brota em sua carne. Eu massageio a pele quente
e ela agita seu traseiro, de leve, mas isso diz bastante. Ela está com medo,
aterrorizada, mas não está correndo, gritando ou me afastando. Ela está
esfregando seu traseiro com o meu toque, pronta para que eu a leve onde eu
quero que ela vá.
Dando um passo para o lado, disparo os próximos três tapas em uma
sucessão rápida, cada um mais forte do que o último e alternando nas
nádegas. Ela choraminga baixinho, curva as costas, sacode o bumbum e fica
na ponta dos pés. E nunca larga a parede.
Ela gosta da brutalidade, quer ser humilhada e precisa ser dominada. Se
ela está consciente disso, ela nunca vai admitir. É provável que nunca tenha
experimentado do jeito certo com a pessoa certa.
Em uma sala de aula com seu professor… Ainda não é certo. Contudo,
aqui está ela, pendurada na parede com seus pés separados e bunda pra fora
porque eu dei uma ordem.
Ela foi feita para mim, para ser instruída, punida e apreciada. Eu quero
entrar nela com uma intensidade agonizante que meu corpo treme. Quero
entrar em sua boca, sua boceta e sua alma. Quero parti-la em pedaços com
meu pau, depois juntá-la de volta e fazer tudo de novo. Merda, eu preciso
dessa garota.
E não posso tê-la.
Sua testa descansa na parede e com um suspiro pesado, a tensão escorre
dos seus músculos.
Eu me agacho atrás dela e arrumo sua calcinha, esfregando gentilmente a
pele rosada e empolgado com o jeito que suas pernas tremem a cada toque
meu. Ajeito sua saia com a mesma atenção, amassando meus dedos na
bunda e nas coxas com o mesmo movimento suave. Quando me levanto,
trago seu rosto para me encarar e minhas mãos em seu quadril para firmá-
la.
Ela pisca para mim, olhos desfocados e vincos enrugando sua testa.
— Para onde você foi, bela garota?
— Para algum lugar profundo.
Endorfina, adrenalina, medo e excitação fazem um coquetel inebriante e
ela parece toda deslumbrante em sua descoberta.
Agarro seu queixo, levantando-o mais alto.
— O chiclete?
Ela cobre sua boca e sussurra por detrás dos dedos.
— Acabei de engolir.
Na próxima vez, irei lembrá-la de mantê-lo para que ela possa me
devolver enquanto minha língua está em seus lábios.
Eu a pego, enganchando os braços atrás dos joelhos e das costas dela. Ela
parece tão robusta e sólida com sua altura, suas curvas e seus peitos
grandes, mas embalada no meu peitoral, ela é leve como uma pena, apenas
cinquenta quilos.
Sentando no banco do piano, seguro-a de lado nas minhas coxas e arrasto
um dedo pelo braço dela.
Ela estremece e se contorce no meu colo, causando estragos na minha
ereção latejante. Mas ela não foge disso e muito pelo contrário, ela se vira
para me encarar.
— Aquela coisa que você acabou de fazer com o seu dedo? — Com um
braço preso entre nós, ela olha para o outro, onde ele se dobra no colo dela.
— Você vai fazer aquilo de novo?
O toque? É isso que ela quer?
Ela quer carinho.
Afasto minha boca alguns centímetros da dela e congelo meu olhar.
— Implore.
Seu queixo cai e a mandíbula aperta, mas ela não desvia o olhar. Depois
de uma batida, duas, três, sua expressão relaxa e seus lábios se abrem.
— Por favor.
Uma onda de calor me percorre. Eu sou um escravo para essas palavras
na respiração dela.
Tocando meus dedos em seu ombro, percorro as mangas curtas e desço
pela pele acetinada de seu braço esbelto, demorando nas articulações da sua
mão. Quando ela estica os dedos, eu traço o comprimento, maravilhado
com a forma que ossos tão frágeis podem se mover tão ferozes nas teclas do
piano.
Seus cílios se abaixam e suas narinas se dilatam com as longas e
profundas inspirações. Ela ama isso, minha mão nas suas, dando-lhe prazer.
Quando ela abre os olhos, suas pupilas dilatadas tomam os tons
amarronzados.
— O que mais você sabe fazer?
Cristo, essa garota está me matando. Sua inocência, curiosidade e valiosa
submissão, é tudo essência, pedindo para ser moldada. Mas, não é só isso.
Sua autenticidade e a falta de privilégio belisca algo dentro de mim. E me
faz me sentir protetor. Possessivo. Talvez até… Desejado?
— Eu posso fazer muitas coisas, Ivory. — Toco o lado do seu rosto,
passando meus dedos por seu cabelo grosso e arrastando o dedo por sua
orelha, segurando a parte de trás de sua cabeça. — Mas essa situação… É
delicada. — Pecaminosa. Perigosa. Criminal.
Quero mostrar pra você mesmo assim.
Eu me inclino para perto, tão perto que nossas respirações se fundem.
Vou mostrar a você enquanto estou enterrado profundamente em sua
garganta.
Tão perto que nossos lábios roçam um no outro, se separam e flutuam em
antecipação para se tocarem mais uma vez.
Vou mostrar ao gozar nas paredes de sua boceta.
Suas coxas se apertam nas minhas e meu coração se acelera.
Vou mostrar quando estiver marcando você. Possuindo você. Apreciando
você.
Eu quero beijá-la. Eu preciso. Só um gostinho.
Apertando minha mão no emaranhado do seu cabelo, eu a puxo em
direção à minha boca…
E paro.
Alguma coisa se moveu nas proximidades do canto? Eu me empurro para
a frente e registro o ranger das dobradiças alguns segundos atrasados.
A pequena professora loira do departamento de cordas surge no canto
assim que derrubo Ivory ao meu lado no banco. Um sabor amargo inunda
minha boca. Será que a srta. Augustin a viu no meu colo? Ela com certeza
nos viu nos separando.
Seus olhos redondos se estreitam, indo de mim e para a estudante que eu
acabei de bater eroticamente. Prendo a respiração.
Aqui está a coisa sobre ereções. Eles não esvaziam só porque o resto do
corpo está perturbado. A escola poderia estar em chamas e a maldita coisa
ficará atiçada e orgulhosa como um mastro de bandeira, chamando atenção
no pior momento possível.
Graças a Deus, o piano se encontra entre minha ereção e a srta. Augustin.
— Estou interrompendo alguma coisa? — Desconfiança carrega seu tom.
— Já passam das sete e eu pensei…
Ela pensou que poderia dar sequência a todos aqueles olhares acalorados
que vem me dando no corredor, na sala dos professores e na reunião de
equipe toda a semana. Ela pensou que poderia passar por aqui em uma
sexta-feira à noite e me persuadir até parar na minha cama.
— Problema nenhum — digo casualmente. Andrea Augustin é o
problema, um que eu estou preparado para lidar. — A srta. Westbrook já
estava de saída.
Ivory desliza para fora do banco e vai embora sem olhar para mim. Não,
sua atenção se concentra na outra professora. Não posso ver seu rosto, mas
ela dá a srta. Augustin um amplo espaço, seus passos rígidos enquanto
desaparece ao redor do canto.
— Tenha um bom final de semana, Ivory — Andrea fala atrás dela.
A porta para o corredor se fecha com um clique desanimado.
Cada músculo em meu corpo enrijece para que eu corra atrás dela, mas
eu tenho que lidar com esse problema primeiro.
Andrea se vira para mim, as mãos nos quadris e a voz mudando de um
tom agradável para um tom raivoso.
— O que você estava fazendo com ela?
Na hierarquia do corpo docente, ela está abaixo de mim. Eu sou o diretor
dos Estudos de Teclas e ela é só uma professora. Eu quero usar isso em
minha vantagem, mas ela viu o que viu. O suficiente para reportar meu
comportamento. O suficiente para me fazer ser demitido. Ou preso.
Com Ivory, não quero nada além da verdade entre nós. Com Andrea?
Tudo o que vou dar a ela é a mentira mais bem vestida.
— Estive esperando por você.
Seus braços se abaixam nas suas laterais e ela pisca.
— Estava? — Seus olhos se estreitam de novo. — Por que Ivory
Westbrook estava em seu colo?
Eu pisco para efeito e agora que meu pau finalmente se acalmou, me
levanto.
— Preciso juntar minhas coisas. Me siga e explicarei.
Caminhando para a frente da sala, me aproximo dela, mais perto que o
socialmente aceito, com meu braço roçando no dela e meu pescoço esticado
para dar a ela o impacto total do meu olhar. — Você sabia que o pai dela
morreu? Que ele foi assassinado alguns anos atrás?
— Sim. Todo mundo sabe disso.
— Bem, eu não. — Na minha mesa, finjo desligar o computador e, ao em
vez disso, abro um programa e inclino a tampa traseira em direção a ela. —
Ela acabou de me falar sobre isso, ficou um pouco chorosa e eu a confortei.
— No seu colo? — Ela cruza os braços.
É uma mentira absurda, mesmo agora. Vou ter que cuidar disso do jeito
mais difícil.
Ando ao redor da mesa, as mãos atrás das costas e deixo meu olhar cair
no corpo dela.
— Eu sei o que você quer, Andrea.
Ela anda para trás, esbarrando na mesa de um estudante e seus dedos
levantam para brincar com o brinco.
— O que você quer dizer?
— Não seja recatada. Eu já vi você me observando, seus sorrisos
sedutores, o jeito como você brinca com o seu cabelo e as joias quando
estou olhando você.
Suas mãos caem e ela respira.
— Emeric…
Em três passos, fecho a distância, apertando-a contra a mesa sem tocá-la.
Afrouxo minha gravata pelo resto do caminho e a deslizo para fora do
pescoço. Se Ivory ouviu sobre os detalhes de Shreveport, é bem provável
que Andrea também tenha e esteja pensando sobre isso agora. Aposto que
os rumores são a razão pela qual ela esteja aqui, o rosto corando e os olhos
encapuzados seguindo a trilha da seda enquanto envolvo-o na mão.
Coloco minha boca próxima do seu ouvido.
— Você quer que eu a amarre.
Ela senta, sua bunda empoleirada na mesa atrás dela. Seus joelhos se
abrem mais um pouco, acolhendo o empurrão dos meus quadris.
— Você quer que eu a alimente com o meu pau. — Minha voz se torna
áspera, insinuando que eu também quero isso.
Infelizmente, meu pau inexpressivo se recusa a participar desse plano,
então eu mantenho uma distância entre mim e o ápice de suas coxas,
coberta pelo tecido solto de sua saia.
Ela aperta meus bíceps e empurra seus pequenos peitos, mas sua atenção
muda para a porta fechada.
Coloco a boca sob seu pescoço, exalando um ar de desejo fingido.
— Todo mundo foi para casa no fim de semana, certo?
— Sim.
— Além de mim, ninguém mais pode ver a gente da janela. — Reclino.
— Eu vou dar uma chance, Andrea. Me fale exatamente o que você quer.
Seu olhar cai para a gravata envolta na minha mão e seus dedos seguem,
traçando a seda apertada.
— Eu… Eu… Quero o que você disse. Mas não podemos. Não aqui.
Ela olha de volta para a porta, lambendo seus lábios.
— Não, não aqui. — Eu me afasto e retorno para a mesa, me inclinando
sobre a borda ao lado do computador. — Antes que eu decida levá-la para
casa, você tem que me mostrar o quanto me quer.
Excitação brilha em seu rosto. Então suas sobrancelhas se afundam.
— Co… Como?
— Me mostre como está molhada. Vá em frente. Ninguém vai ver.
Sua expressão se contorce com a incerteza, lutando contra o desejo. Eu
sei o que vai ganhar, mas ela demora no silêncio, trabalhando em uma
confusão ofegante e um ruborizado de ansiedade.
Finalmente sua respiração se aquieta e suas mãos se atrapalham com as
dobras de sua saia.
— Abra suas pernas, Andrea.
Ela faz, olhos na porta enquanto apalpa a virilha de cetim.
— Como eu…
— Debaixo da calcinha. Assim mesmo.
Ela joga a cabeça e faz alguns barulhos.
Eu não estou realmente prestando atenção, mas eu a deixo se esfregar lá
por um tempo.
— Agora levante a mão.
Ela levanta os braços e sorri para seus dedos. Eu não dou a mínima se ela
está molhada ou não. Eu tenho o que preciso.
Bato na tecla do computador, questionando a sensatez em dizê-la sobre o
que eu fiz.
É melhor ser proativo do que reativo.
Segurando a tela, viro o computador em sua direção e volto o vídeo para
a suculenta parte.
Surpresa vem primeiro, empalidecendo sua pele e paralisando seu corpo.
Indignação vem depois.
— O qu… — Ela abaixa a saia para o lugar, fecha as mãos nas laterais e
corre em minha direção. — O que você… Ah Meu Deus, você gravou
aquilo!
Com a câmera na parte de trás do computador, gravei tudo enquanto
permanecia fora da tela durante o trecho incriminatório.
Fecho a tela.
— Não se meta comigo, srta. Augustin.
Ela recua, os braços envolvendo sua cintura e me encarando com horror.
— Por que você… — O vermelho profundo inflama suas bochechas. —
Ah Deus, o que você vai fazer com isso? Isso é sobre Ivory? — Ela cobre o
rosto com as mãos e um soluço distorce suas palavras. — Eu preciso…
trabalhar. Eu não posso perder… Você não pode fazer isso.
— Eu não fiz nada com Ivory. Mas você acabou de se masturbar na
minha sala de aula. — Guardo o computador e a gravata na pasta antes de
me virar para ela com uma expressão que combina com meu tom mais
intimidador. — Fique longe da minha sala de aula, fora dos meus assuntos e
ninguém verá esse vídeo.
Ela me encara de volta, derrotada. Traída. Sim, eu sei muito bem o
sentimento. Só que eu não estou tentando roubar o trabalho de Andrea. Eu
só quero manter o que tenho.
Ódio banham seus olhos.
— O que eles dizem sobre você é verdade, então.
— Você não sabe nem a metade. — Coloco a pasta no ombro, lanço um
sorriso charmoso para ela e caminho para o corredor. — Boa noite, srta.
Augustin.
15

Ivory

Prescott enrola a mão no meu cabelo, segurando minha cabeça no seu colo.
Seu pênis apunhala a parte de trás da minha garganta e eu engasgo.
Gravata com flores amarelas. Chiclete de canela.
A fivela de seu cinto agita com os golpes. O console entre os assentos
bate nos meus peitos.
Olhos azuis assustadores. O calor de suas palmas no meu traseiro.
Uma música pesada soa no rádio e eu não consigo encontrar meu porto
seguro. Eu não estou entorpecida, não estou longe o suficiente. Eu estou
tentando, tentando… Não consigo alcançar as notas da Sonata Nº 9 de
Scriabin.
O tique-taque de um relógio mecânico. O suave golpe das respirações
dele.
Lágrimas banham meus olhos e agarram aos meus cílios. Eu não posso
me concentrar. Não posso escapar.
Tudo o que eu consigo pensar é nas palmadas e em como eu não me
importaria se terminasse com um quase beijo do sr. Marceaux.
16

Emeric

Preso entre a delicatéssen Fique Com Ele e a joalheria vintage chamada


Penhor da Morte, encontra-se a única loja de música do Treme. Pelo
menos, eu acho que é a única loja de música. Parado na calçada quebrada,
penduro os óculos de sol no colarinho da camiseta e semicerro meus olhos
para o brilho do sol.
Barras de segurança cruzam o vidro da frente. Não tem placas de aberto
ou qualquer tipo de anúncio e a sujeira obscurece minha visão do interior
escuro. Como hoje é sábado, a loja pode não estar aberta. E é menos
provável encontrar Ivory lá dentro.
Mas não estou aqui por ela. Não consegui dormir na noite passada
pensando em como ela arranja o dinheiro e quem pôs aquelas perturbadoras
sombras em seus olhos. Esse cara, Stogie, pode ser o caminho para as
respostas e com sorte essa visita irá acalmar minha persistente necessidade
de conhecer o homem com quem ela passa a maior parte do tempo.
Confiro meu celular para confirmar o endereço e tento a porta.
O tilintar do sino em cima da porta me anuncia quando entro em uma
sala de instrumentos desordenada. Vozes sussurram no fundo, guiando meus
pés através do labirinto de estantes, baterias e diversas porcarias.
— Você precisa comer mais.
Eu não posso vê-la ao redor das fileiras de estantes expostas, mas seu
ritmo sensual acelera meus passos e vibra meu corpo com excitação.
Vim aqui para encontrar um homem com o nome em homenagem a um
charuto, esperava entrar em uma nuvem de couro velho e fumaça, mas, ao
invés disso, o ar é impressionantemente puro, em especial para um prédio
tão velho.
— Pare de me perturbar — uma voz grave fala. — E deixe um velho
homem descansar.
— Mas você tem um cliente. — O suspiro dela vêm de trás de uma
prateleira alta e cheia de livros.
Entro no campo de visão e a encontro sentada no chão, de costas para a
parede e as pernas nuas esticadas. Minhas mãos flexionam em um
silencioso agradecimento aos deuses da moda pelos shorts curtos. Ela é a
fantasia seminua de pele bronzeada e curvas desonestas. Uma fantasia
ilegal.
As suas pálpebras levantam e seus olhos colidem com os meus, se
alargando. Os vários livros em suas mãos tombam no chão se juntando a
vários outros ao redor dela.
— Sr. Marceaux?
— Srta. Westbrook. — Fico impressionado com o desejo selvagem de
sorrir como um idiota, mas consigo manter a inabalável máscara.
Seu olhar varre meu cabelo desgrenhado, da minha camiseta ao meu
short jeans escuro e meu Dr. Martens. Eu queria poder ler seus pensamentos
enquanto ela me observa pela primeira vez sem a pompa de coletes e
gravatas. Ela faz outra varredura da cabeça aos pés, mordisca o lábio e
provoca uma torrente de emoções dentro de mim.
O homem mais velho ao seu lado se ajeita na cadeira de metal. O boné de
beisebol desgastado está empoleirado no alto da cabeça careca e rugas
horizontais enrugam a ponte larga de seu nariz, aprofundando mais as linhas
da sobrancelha escura. O sorriso de boca fechada dele é do tipo que homens
usam quando não tem dentes e tem… oitenta? Noventa anos? Eu não sei,
mas esse homem é velho.
Seus braços tremem quando se estica para a parede em uma tentativa de
se levantar.
— Não se levante. — Ando em sua direção e ofereço minha mão para ele
apertar. — Sou Emeric. Você deve ser…
— Stogie. — Ele fecha minha mão em um surpreendente aperto forte e
senta de volta.
Ivory se curva para se levantar e sua regata minúscula me lança uma
visão pecaminosa de seus seios cheios. Jesus Cristo, porra, se ela não
ajustar aquela regata, sairei do seis para meia noite sem ter como esconder.
Puxando de leve o decote, ela me estuda com uma expressão perplexa.
— O que você está fazendo aqui?
Encontro a expressão atenta de Stogie e deixo que ele veja as perguntas
na minha. Você sabe por que estou aqui? O quanto você conhece Ivory?
Ele prende seus dedos debaixo do elástico de seus suspensórios
vermelhos e me olha descaradamente de cima a baixo. Seu sorriso
desaparece e seus traços esqueléticos se endurecem. Parece que suas
cataratas veem muito mais do que deixam transparecer.
— Ivory, por que você não vai lá no fundo aquecer uma das comidas
congeladas?
Ela cruza os braços, estreitando os olhos.
— Ah, agora você quer comer?
— Eu adoraria uma xícara fresca de café e também um pouco daquele
cobbler que você fez. — Ele agarra o assento da cadeira e gira para a frente.
— Não faça um homem velho esperar.
Ela bufa e sai da pilha de livros, apontando um dedo para ele.
— Seja legal.
Então olha para mim, sua expressão vulnerável e hesitante como se
pedido para que eu faça o mesmo.
No momento que ela desaparece na sala dos fundos, ele faz uma tentativa
devagar e dolorosa para ficar de pé enquanto mantém meu olhar.
— Eu conheço o seu tipo.
Meus pelos arrepiam, mas as boas maneiras que minha mãe enraizou em
mim me faz estender a mão para ajudá-lo a se levantar.
Ele olha para minha mão, zomba dela e se levanta em pernas instáveis.
Engulo minha irritação.
— Me ilumine quanto ao meu tipo.
Seu corpo curvado passa por mim e vai em direção à frente da loja. Eu o
sigo, feliz por estar me movendo para fora do alcance da audição de Ivory.
Ele circula para a parte de trás do balcão da frente e se acomoda em um
banco alto. Sem pressa, ele examina meu relógio caro, meu corpo em
forma, minha postura larga e levanta o queixo. Eu sei o que ele vê. Um
homem rico e arrogante no seu ápice sexual parado em um bairro decadente
por um motivo.
Ele poderia estar certo.
Por fim, ele se inclina para a frente e descansa os antebraços velhos no
balcão.
— Aquela garota passou por situações difíceis e você é o tipo de homem
que só vai piorar as coisas.
Sob suas palavras, há um tesouro nas respostas e preciso descobrir cada
um deles.
— Explique.
— Você é o tipo de homem que quando coloca os olhos em algo, não
desiste até conseguir o que quer.
Ele é astuto demais para fingimento, então não me importo em bancar o
burro.
— Não importa no que eu coloquei meus olhos. Sou o professor dela.
— Sim. — Julgamento enruga seus olhos. — Você é.
Controlo minha respiração, sem expressão.
— Ela conversa com você. Sobre mim.
— Ela não falou nada incriminatório, mas não precisa. Ela mencionou
você mais vezes nas últimas semanas do que todos os seus professores
juntos nos últimos três anos. — Ele tamborila os dedos nodosos no vidro do
balcão. — Seja lá o que esteja fazendo com ela, ela quer confiar em você.
— Sua mão se acalma e os olhos não piscam. — O tipo de confiança que
ela não dá para ninguém. Mas quando você conseguir o que quer e
abandoná-la como seu tipo faz, a desconfiança dela em homens será
irreparável.
Uma onda gelada de tontura toma conta de mim enquanto minha mente
pula para imagens de homens mais velhos, homens brutais, a estuprando.
Eu ponho minha palma calmamente no balcão e me inclino.
— Conte o que aconteceu com ela.
Ele desvia o olhar, sua atenção na sala dos fundos.
— Ela não fala sobre as coisas ruins. Eu não tenho nem certeza se ela
sabe diferencia o ruim do que não é tão ruim. O que aconteceu com ela foi a
vida. É tudo o que ela sabe. — Seus olhos nublados voltam para os meus.
— Ela não é somente pobre financeiramente. Ela está carente em amor,
afeto e proteção. Ela precisa de algum bom exemplo em sua vida, alguém
com um interesse generoso nela.
— Você não é esse exemplo?
— Eu apenas sou um homem velho e falido com um pé na cova. Não
posso comprar livros e aparelhos extravagantes. Não mantenho o sonho
dela de estar em uma universidade de música em minhas mãos. E eu não
tenho o poder de roubar o coração dela.
Uma onda esmagadora de respeito cresce em meu peito. Não posso
invejar esse homem por se importar o suficiente com ela para dizer essas
merdas na minha cara. Eu não posso nem discutir com ele, porque de certa
forma, ele está certo. Eu não tenho nada a oferecer para ela além de mágoa
e decepção.
— Mas você dá a ela um lugar para praticar. — Olhando para trás de
mim, vejo o único piano na loja e aponto meu queixo na direção do velho
Steinway. — Está à venda?
O olhar tenso em seus olhos diz que não, mas as tábuas do assoalho
lascado, as prateleiras precárias e a aparência em ruínas da loja me falam
que ele precisa do faturamento. Desesperadamente.
— Ela não sabe que recebi propostas por ele. — Suas mãos se juntas sob
o balcão. — Não venderei o piano dela.
Mas um dia, talvez logo, ele será forçado a aceitar uma dessas propostas
porque é a mercadoria mais valiosa em seu inventário.
Puxo minha carteira do bolso de trás e ponho meu cartão de crédito no
balcão.
— Cobre no meu cartão junto com os custos de ser entregue na casa dela.
Ele encara o American Express preto antes de levantar o olhar vítreo para
mim.
— Ela não quer o piano na casa dela. Ela está aqui porque ela não quer
estar lá.
Minha barriga afunda com pavor.
— Muito bem. Mantenha aqui. Ponha o recibo no nome dela e não diga a
ela que é a proprietária ou quem comprou a não ser que ela pergunte. —
Deslizo o cartão nas mãos trêmulas dele e espero-o olhar para mim. — O
que ela está evitando em casa? Você a conhece bem o suficiente para ter um
bom palpite.
Ele pega o cartão e gira para a caixa registradora.
— O que você ganha com isso? — Ele aponta para o piano.
— Paz de espírito. Responda minha pergunta.
Ele registra a compra, lábios apertados entre as gengivas e se recusando a
falar.
Ivory surge do quarto dos fundos com uma bandeja de comida e coloca o
prato descartável com macarrão e algum tipo de sobremesa comprometida
no balcão.
— Eu… hum… — Ela encara as bordas da massa que queimaram. —
Queimei? Ou talvez… — Ela põe um dedo no centro massudo e a coisa
toda desmorona. Suas bochechas enrubescem. — Eu devesse ficar com o
que sou boa em fazer.
Como receber palmadas e tocar piano? Ou melhor ainda, tocar piano
enquanto eu dou umas palmadas nela.
Ela olha para Stogie, o cartão em sua mão e encontra meu olhar.
— O que você comprou?
Endureço meu olhar em um silencioso não é da sua conta.
— Você já almoçou?
Ela balança a cabeça.
— Junte suas coisas e venha comigo.
— Ah, eu… — Com minha expressão impaciente, ela esfrega a nunca.
— Está bem.
Logo que ela sai do alcance da voz, eu viro para o Stogie.
— Como suas despesas são pagas?
— Acredito que ela cubra a maior parte disso. — Ele me observa
atentamente. — Eu a emprego no verão para ajudá-la com parte disso.
— E quando ela está na escola?
Ele coloca o recibo e a caneta no balcão e coça a bochecha com barba.
— Eu não sei.
O conflito em seus olhos escuros confirma que ela não compartilha
desses detalhes, mas…
— Ela pode não falar, mas você sabe.
Ele devolve meu cartão. Eu pego, mas ele não solta, sua atenção no
pedaço quadrado de plástico que conecta nossas mãos.
— Você também sabe.
Admiradores. Assediadores. Pervertidos. Homens com dinheiro,
necessidades e imoralidade para emboscar uma jovem garota bonita?
Sinto meus músculos se retesando e apertando meu pescoço enquanto a
raiva queima minha garganta.
— Eu não comprei esse piano para…
— Eu sei. Foi por isso que vendi para você e o porquê de nunca dizer a
ela que foi você quem comprou, mesmo se ela perguntar. — Ele se
aproxima, mãos apoiadas no balcão. — Ela não deve nada a você.
— Acredite você ou não, eu estou preocupado com o bem-estar dela,
principalmente referente a casa dela. — Assino o recibo e escrevo o número
do meu celular no topo. — Me ligue se algo suspeito, qualquer coisa,
acontecer com ela.
Ivory retorna para a frente com uma mochila estufada nos braços. Eu me
mexo para tirar o peso dela, mas ela balança a cabeça.
— Eu vou estar de volta de noite. — Ela guarda atrás do balcão da frente
e se despede de Stogie.
Segurando a porta da frente para ela, olho para o homem velho.
— Prazer em conhecê-lo.
Ele acena, sua boca puxando para baixo nos cantos.
Sim, ele tem todo o direito de não confiar em mim. Também não confio
em mim.
17

Ivory

— A delicatéssen ao lado é boa? — O sr. Marceaux segura a porta


enquanto o sigo para fora da loja de Stogie.
— Só os melhores sanduíches de Nova Orleans. — Sinto um friozinho na
barriga. Porque estou com fome. De comida. Não porque estou comendo
com o sr. Marceaux.
Em vez de virar na delicatéssen, ele anda até a calçada em direção à porta
do passageiro do brilhante carro desportivo preto.
— Fique aqui enquanto vou buscar nosso almoço.
Observo emblema do GTO no painel da porta, o painel de madeira no
estilo dos anos 1970 e o interior de vinil preto, me perguntando por que ele
dirige um carro tão antigo.
— Não vamos comer aqui?
Ele tira os óculos aviadores do colarinho da camisa para colocá-los.
— Não.
Tudo dentro de mim se derrete. Por causa do calor do sol ofuscante?
Definitivamente do sol.
Eu me abaixo no banco e dou a ele meu pedido enquanto ele liga o motor
e o ar-condicionado.
Enquanto ele anda com longas passadas fluídas em direção à
delicatéssen, não posso desviar o olhar dele porque, meu Pai amado, eu
nunca o imaginei em qualquer coisa que não fosse gravata, colete e camisa
de botões com mangas arregaçadas. Mas ele veste jeans como uma segunda
pele. O jeans foi feito para o seu corpo, cobrindo sua bunda e esticando nas
coxas quando ele anda. A camisa cinza estreita se agarra aos músculos
rígidos das costas e dos ombros, as mangas esticando ao redor das
saliências de seus bíceps, assim como naqueles modelos nas revistas fitness.
Eu gosto mais das roupas elegantes. Elas são seguras como uma barreira
profissional para me lembrar que ele é meu professor.
Quando ele desaparece na delicatéssen, mudo minha atenção para o
carro. O barulho alto do motor e a fumaça de óleo queimado do
escapamento. O aroma acolhedor de canela flutua da cartela de chiclete que
assa do painel. O assento duro vibra debaixo de mim com a força do motor.
Os botões prateados do rádio antigo e Axl Rose canta pelos alto-falantes. É
tudo tão distinto e diferente, fascinante e masculino. Assim como ele.
Parece ser surreal, sentar aqui. Em seu espaço pessoal. De bom grado.
É só um almoço.
Com o meu professor. Em um sábado.
Passo as mãos úmidas nas coxas, desejando estar usando algo mais
agradável. E menos revelador.
Por que ele está aqui? No meu bairro? Ninguém do Le Moyne se arrisca
a vir ao meu mundo, achando que pobreza pode manchar seus sapatos caros
ou algo assim. Ainda assim, aqui está ele. O que ele quer?
No momento em que ele volta, meus nervos estão retorcidos à níveis
nauseantes.
— Aonde nós vamos? — pergunto.
— Para o fim da rua. — Ele pega no volante com uma mão forte e entra
no tráfico, devagar e confiante como se isso fosse uma estrada e ele tivesse
todo o tempo no mundo.
Um minuto depois, ele para no parque Luis Armstrong e coloca seu
óculos de sol em um suporte para copo. Uma pequena caminhada leva a
gente até um banco sombreado no parque, onde sentamos lado a lado e
atacamos nossos sanduíches Fique Com Ele. O pão grosso está empilhado
com carnes e queijos, exigindo duas mãos para segurar.
Na metade do sanduíche minha barriga dói. Embrulho a sobra, limpo
minha boca com guardanapo e olho para o lago tingido de verde para os
patos.
— Sobre o que você e Stogie conversaram?
— Você.
Talvez eu devesse ficar surpresa com sua honestidade, mas não fico. Ele
sempre foi direto comigo, um traço do qual passei a depender. Se eu apenas
pudesse fazer a mesma coisa. Quero contar tudo para ele. Mas ele me
denunciaria. Como não faria?
Ele dá outra mordida e, em segredo, estudo o flexionar do seu queixo e o
movimento de sua garganta ao mastigar. É estranho observá-lo comer. Eu
nunca fiz isso. Não consciente. Eu sinto como se estivesse invadindo sua
privacidade.
Quando ele vai dar outra mordida, percebo que ele não vai entrar em
detalhes.
— O que sobre mim?
Ele engole e sorri.
— Isso é muito bom. — Outra mordida. Então, outra.
Dois jovens garotos negros andam pelo caminho do lado oposto do lago,
mas, fora isso, o parque está vazio e o sol muito alto e quente para um
passeio preguiçoso.
— Sr. Marceaux…
Ele continua a me ignorar enquanto termina seu almoço entre goles de
água da garrafa. Então, coloca minha porção não comida de lado, joga o
lixo fora e se inclina no banco do parque ao meu lado, sua mão relaxada nas
coxas.
— Perguntei pra ele como suas despesas são pagas.
Deus, ele é como um cachorro com um osso. Abro e fecho a tampa da
minha garrafa d’água. O que Stogie pensaria de mim se soubesse o que eu
estou fazendo? E o sr. Marceaux? É provável que ele daria umas palmadas e
depois me expulsaria. Meu coração acelera.
— Sobre o que mais vocês conversaram?
Ele vira para me encarar.
— Me fale o porquê de eu estar aqui.
Para terminar aquele quase beijo? Eu quero aquilo? Minhas mãos
tremem.
— Eu não sei.
— Você sabe sim e eu quero escutar você falar.
Desvio meu olhar para encarar o lago, mas cada centímetro do meu corpo
quer focar nele, na mudança da sua respiração, no tique-taque do seu
relógio, no levantar do seu braço quando ele toca o meu queixo e direciona
minha cabeça para ele.
Seus olhos refletem todos os tons luminosos do céu, mas são frios e tão
aterrorizantes de perto. Eu foco em algo seguro, os patos no lago. Mas seu
olhar preenche minha visão, seu rosto ficando comigo e todo o seu corpo
mexendo, antecipando meus movimentos. Ele não me deixa escapar dele.
Eu quero correr.
E eu quero que ele me pegue.
A luta em meus músculos evapora quando ele me puxa para seu colo.
Meu pulso acelera quando ele arruma minhas pernas para que eu o monte.
Suas coxas são colunas de pedras debaixo de mim, fortes e acolhedoras.
Sentar nele, contra ele, não é um sentimento ruim. É muito mais seguro
do que estar embaixo dele, o que é minha única experiência com outros
homens. Mas eu não sei onde colocar as mãos. Depois de um momento
constrangedor, deixo meus dedos flutuar para sua camiseta.
Seu peitoral se contrai na minha palma, os cumes e recuos dos músculos
são como tijolos em minhas mãos, tão diferente de qualquer outro que eu já
senti.
Reúno toda minha coragem para olhar para cima, absorvo as sombras em
sua mandíbula e as curvas definidas de suas bochechas. A tonalidade de
azul em seus olhos meteóricos disparam uma voltagem de calor lá no fundo,
abaixo da minha cintura, entre as minhas pernas. A sensação me faz querer
alcançar seus lábios e traçar sua forma. Mas estou muito nervosa, muito
insegura.
Eu sinto como se tivessem cordas invisíveis entre a gente e que estão se
enrolando mais, puxando, encolhendo e vibrando com tensão.
Balanço para mais perto.
— É por isso que você está aqui?
Ele me encontra no meio do caminho, abaixando a cabeça e sua boca
arrasta um suspiro pelo meu pescoço.
Eu tremo e me aqueço. Meus dedos apertam sua camisa, meu quadril está
relaxado em seu colo e o conflito de emoções frenéticas agitam meu
cérebro. A posição coloca minha boceta bem em cima dele, alinhada com
sua longa e rígida evidência de desejo. Deveria ser o suficiente para me
fazer recuar, para me afastar, mas eu não posso. Eu não quero.
— Ivory — ele ofega no meu queixo. Suas mãos apertam as minhas
costas, puxando meu peito para o seu enquanto ele mordisca uma trilha de
prazer no canto dos meus lábios. — Sim.
Sua boca desliza na minha, os lábios varrendo, quentes, macios e
agradáveis. Mãos fortes movem para o meu pescoço, segurando minha
mandíbula e inclinado minha cabeça. Ele pressiona seus lábios com mais
força, separando-os e abrindo os meus, o primeiro contato de sua língua
dispara uma corrente de eletricidade pela minha coluna.
Meu corpo todo deveria estar tremendo, encolhendo de desgosto, no
entanto, a fricção da sua língua, o sabor da sua boca e a pressão dos dedos
na minha cabeça derretem meu íntimo em uma necessidade carente. Em vez
de me afastar das investidas da língua dele, eu me inclino, esticando minha
boca e aprofundando a conexão.
Um gemido vibra em seu peitoral e o meu próprio gemido sai como
garras enquanto seus lábios se movem deliciosos e firmes nos meus, me
tocando de uma maneira que nunca quis ou gostei. Pelos últimos quatro
anos, fui alimentada por piscinas de babas e amordaçada por inúmeras
línguas investigadoras. Mas eu nunca fui beijada. Não desse jeito. E eu
nunca beijei de volta. Nunca experimentei esse tipo de intimidade com um
homem enquanto pensava: Não pare.
As mãos em minha cabeça me guiam para mais perto, mandando que eu
esteja com ele. Que loucura é eu não querer estar em qualquer outro lugar?
Eu não posso nem fechar meus olhos com medo que ele desapareça.
Uma moita de cílios pretos se espalha sobre suas maçãs do rosto. Os
músculos em seu rosto se contraem com a urgência de mexer sua língua.
— Você é tão linda — ele sussurra nos meus lábios antes de atacar minha
boca com um desejo renovado.
Seu peitoral e quadril balançam contra mim. Minha respiração acelera e a
respiração dele libera grunhidos de satisfação de sua garganta.
— Eu não consigo me afastar. — Outro beijo inebriante. — Eu quero
você. — Ele mordisca meu lábio inferior, lambe entre meus lábios para
então descansar sua testa na minha. — Você me faz querer ter coisas que
não posso ter.
Eu me inclino para a frente para voltar a apertar nossas bocas, mas seu
aperto no meu queixo me mantém imóvel.
— Temos que parar. — Seus dedos passam pelo meu cabelo enquanto
seu rosto se afasta, deixando um calafrio em minhas bochechas.
Eu coloco minhas palmas em seu peitoral úmido.
— Eu não o beijei para melhorar minhas chancas na Leopold.
— Ah, Ivory. — Suas mãos tremem ao deslizarem pelo meu pescoço,
pelos meus ombros e pelos meus braços. — Tão jovem e direta. — Ele
agarra minhas coxas, logo abaixo da bainha do short e mexe seu quadril sob
minha bunda. — E tão perfeita.
Seu comprimento duro vibra sob a costura do meu short. Por que isso não
está provocando meu reflexo de vômito? Por que não estou me encolhendo
e procurando pelo meu porto seguro na minha mente?
Por que eu quero abrir o fecho do jeans dele e olhar aquela parte
misteriosa dele? Por que eu quero segurá-lo em minhas mãos e fazer o
corpo dele se curvar em prazer?
— Isso termina agora. — Ele agarra meu quadril e me coloca no banco
ao lado dele.
Meu peito aperta, rejeitando essas palavras. Sem mais toques? Sem mais
beijos?
— O quê? Por quê?
— É arriscado. Perigoso. — Ele se inclina para a frente e apoia os
cotovelos nos joelhos abertos, encarando o parque.
— Por causa da srta. Augustin?
— Ela não é uma preocupação, mas terão outros. — Seus olhos se
movem para os meus, duros e fixos. — Sempre há alguém observando,
esperando para arruinar a prosperidade da vida dos outros.
Ninguém quer a minha vida e as pessoas não se preocupam com as coisas
que acontecem no Treme.
— Você pode vir aqui e me beijar sempre que…
— Eu não sou um adolescente, Ivory. Isso não é um encontro de amassos
inocentes atrás da arquibancada. — Em um borrão, ele está em mim, seu
peitoral contra mim e fortes dedos presos ao redor do meu pescoço. — As
coisas que eu quero fazer com você lhe dariam pesadelos.
Ele está tentando me assustar, mas ele não está cortando o meu ar. Ele
administra as punições, mas a doença dentro de mim anseia por mais
palmadas. Ele não me dá pesadelos. Ele me faz voar no ar como em um
sonho.
Ele solta o meu pescoço e senta na ponta do banco, colocando sessenta
centímetros de agitação entre nós. Minhas mãos tremem para alcançá-lo,
todo o meu corpo pede para subir de volta no colo dele e retornar para a
segurança de seus braços. Pela primeira vez na minha vida, quero que um
homem me toque e ele está… me afastando?
— Eu não quero que isso termine — sussurro, a parte de trás dos meus
olhos queimando.
— Eu não pedi sua opinião.
Sua rejeição aterrissa no meu estômago como carvão queimando,
roubando minha respiração e enchendo meus canais lacrimais.
— Merda. — Ele olha para meus olhos molhados, empalidecendo sob um
brilho de suor. — Você não pode se apaixonar por mim.
— Não posso… O quê? — Eu me recosto, respirando fundo e limpando
uma lágrima fugitiva. — Meu Deus do céu! De todas as coisas arrogantes e
convencidas para se dizer! Eu nunca me apaixonaria.
— Estou ofendido. — Ele ri, mas é forçado. — Garotas do ensino médio
tem um jeito de se apaixonar rápido e ignorantemente.
— Bem, eu estou ofendida por você achar que sou ignorante. — Puxo a
bainha do short. — Não se preocupe, sr. Marceaux. Pensamentos
apaixonados nem passaram pela minha cabeça.
Ele encara o lago.
— Eu sei que você não ignorante, Ivory. Só é…
Com uma mão descansando em sua boca, ele se curva sobre o joelho
assistindo aos patos limparem as penas e mergulhar na água. Mas ele não
está realmente vendo, não com seu olhar para dentro e sua expressão
mudando com o que quer que ele esteja pensando.
Por que ele sequer mencionaria amor? Se sua mente está lá, isso quer
dizer que ele está sentindo alguma coisa? Foi um beijo bom. Pelo amor de
Deus, foi um beijo que vou lembrar para o resto da minha vida, o qual irei
comparar com todos os beijos no futuro. Mas amar? O que ele sequer sabe
sobre isso?
Lanço meu olhar nele e algo doloroso surge em minha mente.
— Você a amou, não é? A professora em Shreveport? Joanne?
Por favor, diga que não.
Ele abaixa as mãos, segurando-as entre os joelhos, antebraços apoiados
nas coxas enquanto encara o chão.
— Eu ainda amo. — Ele encontra meus olhos. — Tanto quanto a odeio.
Ciúmes queima ignorantemente no meu interior, surgindo como uma bola
na minha garganta. Eu adoraria ser amada, mesmo que venha com ódio. É
melhor do que nada.
— Você vai me dizer o que aconteceu?
Ele se reclina e recosta um braço nas costas do banco.
— Eu valorizo a honestidade entre a gente. — Ele passa a mão pelas
pontas do meu cabelo. — Não quero que acabe.
Meu coração aperta com o pensamento de qualquer coisa acabar entre a
gente, mas eu nunca mentiria para ele. Pelo menos, não com coisas que não
me fariam ser expulsa.
— Estávamos juntos por quatro anos. — Seus dedos se movem pelo meu
cabelo, suaves e hipnóticos. — Com a política de não confraternização de
Shreveport, nossa relação era um segredo. Tínhamos casas separadas, mas
morávamos juntos em uma. Dirigíamos separados para a escola.
Mantínhamos nossas interações profissionais no trabalho. Até que…
Ele não precisa terminar a frase. Imagens da boca dela amordaçada com a
gravata dele, os pulsos presos com o cinto e seu corpo curvado enquanto ele
fodia ela em uma mesa me consome. Ela é uma musicista melhor do que
eu? Mais inteligente? Mais bonita? Ele falou para ela que ela era bonita
para caralho também? Fecho as mãos em punhos. A posição sexual não me
afeta tanto quanto a ideia de ele estar fazendo aquelas coisas com outra
pessoa.
Com uma mão em meus cabelos, ele se aproxima e coloca a outra mão
nos meus punhos, abrindo-os.
— Nós só estávamos brincando com uma fantasia. Tendo um pouco de
diversão depois do expediente.
— Então o que aconteceu? Como você perdeu… Merda, ela armou para
você?
Seus dedos se contorcem nos meus.
— Não. Mas ter sido pega daquele jeito a colocou em uma posição
insegura. Ela poderia admitir que violou a política de não confraternização,
que ela foi voluntariamente amarrada e perder o emprego sob o véu da
vergonha que a seguiria onde quer que ela fosse. Ou poderia dizer o que
parecia. Amarrada, amordaçada e estuprada. De qualquer forma, eu seria
demitido.
Estuprada. Repito aquela palavra na minha cabeça, examinando de todos
os ângulos. Acho que eu vivenciei algumas vezes, mas não soube o que
fazer sobre isso. Uma garota pode dizer que foi forçada. Um homem pode
afirmar que ela queria. A polícia é quem decide quem está falando a
verdade, mas e se eles ficam ao lado do homem? Ele irá se vingar da
garota.
Mas não parece que o sr. Marceaux se vingou.
Uma absurda vontade de proteger – protegê-lo – vibra em mim.
— Você poderia ter se defendido. Ter falado para eles do relacionamento.
Ter provado que moravam juntos. No mínimo, ela teria perdido o emprego e
você não teria sido acusado de forçá-la.
— As acusações de estupro não foram mantidas. O estigma foi, mas eu
não dou a mínima para isso. Tem milhões de coisas que eu posso fazer para
arruinar o emprego dela. Coisas que eu ainda posso fazer.
— Mas você a ama. — Deus, por que meu coração dói tanto?
Sua expressão escurece em uma profunda expressão carrancuda.
— E ela ama a carreira. — Ele retira sua mão e vira para a frente no
banco, seu perfil marcado com dor. — Agora, ela é a diretora da Escola
Preparatória Shreveport.
Que vadia.
— Desculpa, mas ela parece ser horrível. Como é possível que você a
ame?
Ele aperta a ponte do nariz e fecha os olhos.
— Às vezes você ama pessoas que não deveria e no infinito espaço
daquele amor, nada mais importa. — Quando ele levanta a cabeça, toda a
sua postura muda. O homem no colete e gravata retorna com uma
mandíbula robusta e olhos duros enquanto levanta e junta as mãos nas
costas. — Sem mais toques e beijos, srta. Westbrook. Eu sou o seu
professor, seu orientador e nada mais.
Pulo nos meus pés.
— Eu nunca faria isso com você. Eu não consigo nem pensar em arruinar
sua carreira.
Ele ri, mas o som parece mais um rosnado.
— Se formos pegos fazendo algo inapropriado, você teria que escolher
entre minha carreira e sua educação, entre um homem que conhece há uma
semana e o sonho que correu atrás por três anos. Qual escolha você faria?
Leopold aparece em minha cabeça, mas eu luto com essa ideia, me
recusando a admitir.
— Seremos cuidadosos.
— Exato. Vá para casa. — Ele aponta seu dedo na direção à minha casa.
Eu olho sobre o meu ombro. Se não fosse pelas árvores, conseguiria ver
minha casa daqui. Como ele sabe onde moro? O endereço no meu arquivo?
Quando olho de volta, ele está se afastando, mãos enfiadas nos bolsos da
frente e cabeça baixa. Um tipo de anseio sangrento e miserável atravessa
meu peito. Para ele acabou.
Pego meu sanduíche inacabado do banco e faço uma caminhada difícil
em direção à minha casa. Talvez eu não tenha que obedecê-lo dessa vez?
Talvez essa seja uma daquelas regras que foram feitas para serem
quebradas?
Girando, corro atrás dele. Ele para ao som das minhas sapatilhas, seus
largos ombros apertando a camiseta. Mas ele não se vira.
Círculo o grande pilar do corpo dele e inferno, ele é tão alto, sombrio e
lindo. E bravo. Linhas profundas se espalham nos cantos gélidos dos seus
olhos, seus lábios em uma linha reta de desagrado e veias no pescoço
esticadas sob a pele da barba.
Erguendo minhas costas, me aproximo dele e envolvo meus braços ao
redor do seu quadril. Cada sólido centímetro que toco se flexiona com
músculos.
Ele mantém as mãos no bolso, o peitoral levantando com a respiração
profunda.
— Você está me desobedecendo.
Pressiono minha bochecha na borda do seu peitoral.
— Eu não vou machucá-lo. Prometo.
— Sou eu quem vai machucar você.
— Tudo bem.
Suas mãos empurram meus ombros, me forçando a dar um passo para
trás, mas ele não me solta. Ele curva os joelhos, seus olhos ficando no
mesmo nível que os meus.
— Me diga quem machucou você e eu darei qualquer coisa que queira.
Meu pulso se acelera e meus dentes rangem. Ele planejou isso? Ele me
tocou e me beijou até que minha cabeça girasse só para retirar tudo para que
ele possa balançar como um incentivo para eu falar?
Eu recuo, saindo do alcance de seus braços e balançando a cabeça.
Minha expressão endurece e minha barriga cede à pressão. Odeio
desapontá-lo.
Com uma mão em seus quadris e a outra apontada para minha casa, ele
encara o chão.
Bom, porque eu odeio seus olhos. E eu também os adoro. Especialmente
quando ele me toca e fala que sou bonita. E agora, ele está me punido se
recusando a olhar para mim.
Em uma névoa de vergonha, agarro o sanduíche no peito e arrasto meus
pés para casa. Enquanto caminho, olho por cima do ombro. Ele não se
mexe. Eu não posso ver seus olhos, mas sei que eles estão me seguindo, me
observando, me protegendo.
Não importa o que isso seja, o quanto seja inapropriado e arriscado, ele
não quer que isso acabe. Ficar quatro horas sozinhos por dia juntos pelo
resto do ano, só se tornará em mais: mais castigos, mais música e mais sr.
Marceaux. Não me importo com o que ele diz. Isso não acabou.
18

Emeric

— Acabou. — Bato a garrafa da cerveja com mais força do que pretendia


e me encolho ao som de estalo na mesa de vidro da minha mãe. Merda.
Esfrego um dedo na lasca e dou um olhar de desculpas para ela. —
Desculpa, mãe.
— Eu não me importo com a maldita mesa. Estou preocupada com você.
— Ela fecha a garrafa de vinho no balcão de trás com a rolha e cruza a
cozinha para sentar ao meu lado, uma taça de vinho tinto na mão.
Colocando na mesa, ela gira a haste e reúne as palavras. — Eu sei que você
tem estado infeliz faz um tempo, mas isso é diferente. Você tem estado um
chato temperamental e rabugento nas últimas semanas.
Cinco semanas, para ser exato.
Cinco semanas desde que beijei Ivory. Desde que senti sua pele debaixo
da minha mão. Desde que a puni de acordo com o que nós dois
precisávamos. Cinco agonizantes semanas desde que a mandei para casa no
parque com um arrependimento que invadia meu sistema nervoso.
— Querido. — Ela põe sua mão no meu antebraço e dá um aperto firme.
— A Joanne sabe que acabou?
Joanne ainda me manda mensagens, mas suas mensagens não são
respondidas. Eu sei o que ela quer, ela sabe o que eu quero e nenhum de nós
está disposto a se comprometer.
— Ela ainda se recusa com teimosia a aceitar os meus termos. —
Empurro uma mecha muito longa da testa com uma mão. Jesus, preciso de
um corte de cabelo. — Isso não tem nada a ver com ela.
— Ah. — Os persistentes olhos azuis da minha mãe percorrem meu rosto
à procura de respostas. — Isso não é sobre o seu carro, é?
— Não, eu consegui o carro de volta ontem.
Apesar daquilo me deixar com um humor infernal. Depois que deixei
Ivory ir embora, fui até o estacionamento do parque e meu GTO tinha
sumido. Roubado. Levado. Eu tive que ligar para Deb me levar até a
delegacia. Quando ela me deixou em casa, permaneci parado na entrada,
vibrando com uma agitação ao dizer a ela, não, eu não vou foder você hoje.
Eu deveria ter sido mais gentil com ela por estar me ajudando – com a
carona e o marido de Beverly Rivard –, mas eu estava distraído demais para
deixá-la entrar.
O GTO não foi a única coisa que perdi no parque aquele dia.
Os policiais recuperaram meu carro, o interior destruído e retirado.
Levou semanas para trazê-lo de volta a uma condição boa.
Mas Ivory… Minha mão fecha ao redor da garrafa. Estou fazendo todo
esforço possível que posso para garantir que o que há entre nós não seja
reestabelecido. A atração permanece, mais forte do que nunca, queimando
como uma brasa. E ela vibra para ser alimentada quando estou sentado ao
lado de Ivory no banco do piano, faíscas sibilando quando bato no pulso
dela quando perde uma nota e estalando e estourando toda vez que nossos
olhos se conectam.
Nossa primeira semana foi tão rápida que meus nervos ainda estão à solta
com fome. Se eu não tivesse recuado, ela estaria na minha cama neste
momento, seu corpo jovem de 17 anos curvado e corando sob o meu cinto e
seus enormes olhos de adoração me implorando por coisas que não posso
dar a ela. Leopold. Um relacionamento aberto e legal. Meu coração…
Ela é muito nova para separar sexo de amor e eu perdi o completo
interesse em qualquer coisa que não seja prazer físico.
Quando você conseguir o que quer, a desconfiança dela em homens será
irreparável.
Minha mãe me observa daquele jeito intuitivo que ela sempre faz, sua
suave expressão emoldurada pelos cabelos pretos que enrolam acima de
seus ombros. Ela estende a mão para mexer na ponta de uma mecha solta,
escovando-o para frente e para trás em seu queixo enquanto me estuda.
Bebo a cerveja e finjo ignorá-la.
Ela deixa a mão cair e inclina a cabeça.
— Você conheceu alguém.
Aqui vamos nós.
— Não, eu…
— Emeric Michael Marceaux, não minta para a sua mãe.
Eu me levanto e vou para o balcão, inclinando sobre ele e balançando a
garrafa na borda.
— Não vou falar sobre isso com a minha mãe.
Eu quero, mas expressar isso tornaria real.
Passos se aproximam da porta da cozinha.
— Não vai falar sobre o quê? — meu pai questiona, seus óculos de
leitura pendurados na ponta do nariz e seu rosto enfiado no celular.
— Emeric conheceu alguém. — Ela sorri sob a borda da taça de vinho,
seus olhos presos nos meus.
Sem tirar os olhos do celular, ele caminha até ela e desliza os dedos pela
nuca dela.
— Vamos torcer para que ela seja melhor do que a última.
Melhor? Joanne é realidade. Ivory é um sonho inebriante, do tipo que
visita um homem à noite, coberta pela escuridão do crepúsculo e perseguida
com segurança nos cantos da mente. Mas durante o dia, ela é uma fantasia
perigosa, tentando os homens a fazer coisas com os olhos bem abertos.
— Quem é ela? — Minha mãe toma um gole do vinho.
— Ela está fora de alcance — digo rápido e me viro para meu pai. —
Como está aquele novo médico que contratou para a clínica?
— Ele está… Bem. — Hesitação estreita sua voz.
É claro que ele sabe que estou desviando da pergunta.
Ele guarda o telefone no bolso e se abaixa na cadeira do lado oposto à
minha mãe na mesa redonda.
— Essa mulher é casada?
Eu nego com a cabeça e olho para os meus Dr. Martens.
É sábado à noite. Eu deveria estar em um quarto de hotel no French
Quarter amarrando os enormes peitos de Chloe, açoitando a bunda de Deb e
cheirando a sexo. Mas no momento que entrei no GTO, minha mente vagou
para Ivory. Meu subconsciente tomou conta do volante e alguns minutos
depois, eu estava sentado na calçada da casa dos meus pais no Garden
District.
Porque eu preciso falar sobre isso. Se tiver alguém neste mundo que
confio o suficiente para esta conversa, eles estão nesta sala. Eles sabem do
acordo que fiz com Beverly assim como cada detalhe sórdido da minha
relação com Joanne. Em nenhum momento eles me julgaram. Inferno, eles
contrataram um time de advogados que convenceram Joanne a desistir das
acusações de estupro.
— Ela é…? — O tom da pergunta da minha mãe soa com alarme. E
compreensão. — Ah não, Emeric.
Antes da minha mãe subir na hierarquia como reitora da Leopold, ela foi
professora de ensino médio. Quando eu era mais novo, a sra. Laura
Marceaux era bonita demais para o meu conforto com seu bando de
admiradores adolescentes, incluído os rapazes com quem eu andava por aí.
Mesmo nos seus 50 anos, ela ainda virava cabeças com seu rosto jovial,
sorriso caloroso e olhos gentis.
Aqueles olhos estão cravados em mim agora, arregalados e sem piscar
porque ela sabe o que estou deixando de fora.
Eu giro em direção ao balcão e apoio meus braços na superfície de
granito, meus ombros caindo com os pesos das minhas palavras.
— Acabou.
— O que exatamente acabou? — Sua voz soa atrás de mim, cheia de
preocupação.
— Sente-se — meu pai diz com menos ternura.
Termino a cerveja, pego outra e sento na cadeira entre eles.
— Ela é uma aluna do último ano no Le Moyne. — Deixo aquilo assentar
na mesa antes de continuar. — Quando ela entrou na minha sala no
primeiro dia… Eu juro por Deus, achei que ela fosse uma professora. —
Esfrego uma mão no rosto e dou outro grande gole. — Ela não se parece
com uma aluna do ensino médio.
Minha mãe estica o braço na mesa e descansa sua mão em meu pulso.
Eles não me interrompem enquanto explico a situação financeira de
Ivory, seu talento com a música, minhas suspeitas de abuso, minha visita a
Stogie e o desejo dela de estudar na Leopold. Eles compartilham olhares
ansiosos quando eu menciono o beijo no parque e as últimas cinco semanas
no inferno. Eu até admito estar dirigindo pelas ruas após as aulas privadas
dela tentando rastrear o caminho para a parada de ônibus. Mas ela nunca faz
o mesmo caminho e muitas vezes, não a vejo.
Luto com a urgência de deixar de fora a parte mais implicante, mas
minha necessidade por transparência ganha.
— Eu dei umas palmadas nela. Na sala de aula.
Seus rostos empalidecem, mas nenhum deles pergunta se foi consensual.
A confiança deles em mim é infinita, o que faz com que a última parte seja
mais fácil de falar.
— E então fui pego com ela no meu colo. Por uma colega. — Shreveport
tudo de novo. — Eu a chantageei. Na sala de aula.
Minha mãe pega o vinho e toma todo.
Quando encontro os olhos do meu pai, ele está recostado, removendo
seus óculos e limpando com um pedaço da camisa.
— Como você a chantageou?
— Você não quer saber.
— Bem. — Minha mãe se levanta e vai até o balcão para se servir de
mais vinho. — Você com certeza sabe como testar os limites da aceitação
social, mas eu sei de onde puxou isso. — Ela volta para a mesa, seus olhos
brilhando para o meu pai. — Seu pai adora me dar umas palmadas…
— Mãe — resmungo. — Não faça isso mais estranho.
Ela se abaixa na cadeira, sua expressão séria.
— Você disse que ela é uma pianista talentosa? Ela é mais merecedora da
Leopold do que a pessoa que você quer que eu coloque?
Apesar de ter se aposentado, minha mãe ainda voa para Nova Iorque uma
vez ao mês para reunião da diretoria. Mesmo com tudo o que eu disse a ela,
eu sei que ela garantirá a posição para uma das minhas indicações.
O acordo com Beverly tem me atormentado por semanas. Ivory pertence
à Leopold. Não porque ela é bonita e genuína e precisa desesperadamente
ser salva. Ela é tudo isso, mas devo a ela minha indicação porque ela é a
melhor musicista do Le Moyne.
— Sem sombra de dúvida, ela merece aquele lugar. — Meu peitoral
levanta com a paixão em minha voz. — Ela é incrível.
— Você está em uma posição difícil. — A mão da minha mãe encontra a
minha e aperta meus dedos. — Eu não o invejo, mas querido, se você tentar
uma relação com ela, não terminará como Shreveport.
Porque eu não cometi nenhum crime com Joanne. Nossa relação era
consensual, não ilegal. Mas com Ivory? Má conduta entre aluno-professor
não é varrida para debaixo do tapete. Vira manchete nas notícias. Nem os
melhores advogados no mundo poderiam me salvar das acusações que se
seguiriam se eu fosse pego com ela.
— Você precisa se libertar, filho. — Meu pai coloca os óculos no nariz e
cruza os braços na mesa, inclinando-se. — Se demita daquele trabalho,
termine as coisas de uma vez por todas com a Joanne e mude-se para outro
estado. As merdas de Shreveport só pode te seguir até certo ponto.
Minha mãe discorda com cabeça.
— Frank, não fale isso para ele. Nossa família acabou de se juntar de
novo em Nova Orleans e…
— Não, mãe. Ele está certo. — Eu me afasto da mesa e termino a cerveja
inacabada na pia.
Já estou delirantemente bêbado por Ivory Westbrook e não sei quanto
tempo mais posso aguentar sem ceder.
Eu posso manter esse emprego e tentar ignorar essa atração proibida até
falhar e correr o risco de ser preso. Ou eu posso me demitir do Le Moyne,
remover a tentação da minha vida e, foda-se, nunca mais ver ela de novo.
Meu peito aperto com a agonizante verdade. Eu sei… Deus me ajude, eu
sei o que tenho que fazer.
19

Ivory

— Isso é tudo culpa sua!


O grito cheio de lágrimas da minha mãe me machuca, mas é o ódio em
seus olhos escuros que mais me machuca.
Eu nem sei pelo que estou sendo acusada. É de madrugada, e ela entrou
em um rompante acendendo as luzes e me acordando com suas lamentações
malucas.
Deitada no sofá onde durmo, puxo minhas pernas pra mais perto do meu
corpo, me encolhendo de lado e segurando Schubert no meu peito.
— Co… Como? Como assim o que é minha culpa?
Ela veio para casa um mês atrás, chorando sobre o namorado ter
terminado com ela. E desde então, ela não tem parado de chorar.
— Se não fosse pela sua… sua… — Ela anda pela sala, tropeçando no
próprio pé e puxando as mechas de cabelo cortada. — Merda de egoísmo!
Ela foi bonita uma vez, graciosa e cheia de curvas com alegria brilhando
em seus olhos. Mas as drogas e o luto a emagreceram até os ossos e a
deixaram rancorosa. Meu pai estaria de coração partido ao vê-la desse jeito,
assim como eu.
Se eu não for aceita na Leopold, se eu não achar meu caminho para fora
do Treme, acabarei igual a ela? Sempre que minha mente pensa no futuro,
me vejo acorrentada a Lorenzo e suas necessidade violentas. Como eu não
poderia me voltar para as drogas como uma fuga do tormento de seus
toques? O futuro me assusta, mas também me fortalece. Eu vou sair daqui,
não importa o preço.
Minha mãe tropeça pela sala, arranhando seu rosto como se estivesse
tentando remover objetos imaginários. Ela deve estar ficando sóbria do que
quer que ela tenha se envenenado, todo o seu corpo se ajustando à tristeza.
Ela me culpa por isso. Sua tristeza. Eu sou o motivo que ela usa, o
motivo dela ser pobre, o motivo para ela não conseguir achar um emprego
ou manter um namorado.
Eu suponho, que de alguma forma, eu sou responsável pelo sofrimento
dela. Meu peito dói com o anseio de ir até ela para abraçá-la e confortá-la.
Mas ela não tolera essas coisas de mim.
Vários passos soam na parte de trás da casa. Enterro meu nariz no cheiro
reconfortante do pelo de gatinho de Schubert e estabilizo minha respiração.
Lorenzo e Shane entram na sala, ambos vestidos em jeans e camisetas.
Saindo ou voltando para casa? Visualizo meu relógio na mesinha. 3:15 da
manhã. Esfrego os olhos. Eu tenho que me arrumar para a escola em duas
horas.
Lorenzo dá um amplo espaço para minha mãe enquanto Shane vai até
ela, puxando as mãos dela do rosto.
— Mãe, para. Você está se machucando. — Ele ajeita as alças da
camisola em seus ombros ossudos e olha para mim. — Por que você está a
deixando fazer isso?
Sério? Eu sento, segurando Schubert em meu colo.
— Não sou eu quem está alimento ela com drogas.
Lorenzo se reclina na ponta oposta do sofá, olhando para minha mãe com
diversão. Eu corro uma mão trêmula nos pelos de Schubert. Lorenzo não
vai tentar nada. Talvez ele nem olhe para mim.
Minha mãe traz um turbilhão de drama quando volta para casa, mas há
segurança em sua presença. Ela e Shane não acreditam nas minhas
acusações sobre Lorenzo estar me machucando, mas Lorenzo sempre está
em seu melhor comportamento quando eles estão no ambiente. Eu escapei
do barulho da moto dele nas minhas caminhadas de ida e volta da escola e
ele nem sequer me tocou desde que minha mãe voltou para casa. Mesmo
assim, a impaciência pulsando dele é perceptível.
Minha mãe olha para Shane, sua expressão suavizando por um momento
antes de atravessar a sala até em mim.
— Você tirou tudo de mim.
Minha garganta fecha e queima.
Ela anda em minha direção, esticando seu braço esquelético.
— Eu queria que você nunca tivesse nascido.
Lágrimas se formam em meus olhos. São as drogas falando.
Outro passo, esse mais forte e mais sóbrio, seus olhos duros e límpidos.
— Eu te odeio, vadiazinha egoísta.
Umidade borra minha visão e mesmo que ela tenha me dito essas
palavras um milhão de vezes, eu ainda tento:
— Eu te amo, mãe.
Ela pula em cima de mim, gritando, mas Shane a pega com um braço
enganchado na cintura dela.
— Eu te odeio. Eu te odeio. — Ela resiste ao aperto dele, tentando chegar
até mim, seus peitos balançando e saindo de sua camisola frágil. — Você
arruinou minha vida!
— Eu sei, mãe. — Shane a arrasta para fora da sala. — Eu vou pegar o
que você precisa.
Ela não precisa das drogas que ele vai injetar nela. Ela precisa de um
emprego, de uma paixão e de determinação.
Eu me encolho com Schubert, me concentrando no entalhe do teto de
madeira e tentando parar as lágrimas de escaparem. Talvez eu também
precise fazer parte de algo.
Os gritos dela ecoam pela casa e devagar vão diminuindo em soluços.
— Ele amava mais ela. Ele tirou da gente, Shane, e deu tudo para ela.
Meu coração aperta em meu peito e as lágrimas caem, forte e rápido. Eu
espero o sofá quicar embaixo de mim e quando faz, Schubert se mexe nos
meus braços.
O quadril de Lorenzo bate no meu pé quando se mexe. Ele se inclina e
me força a recostar, os tendões em seu pescoço ondulando a tatuagem
Destruir.
— Você acha que pode me evitar para sempre?
— Esse é o plano. — Empurro o peitoral dele quando um novo fluxo de
lágrimas chega aos meus ouvidos.
Seus olhos pretos ficam incrivelmente mais escuros.
— Tão, tão linda.
Ele passa uma mão entre as minhas pernas, mas o casulo de cobertores
me protege. Por um breve momento, eu imagino a porta da frente se abrindo
e o sr. Marceaux parado na entrada com seus olhos assustadores. Eu aposto
que Lorenzo ficaria com medo dele, talvez o suficiente para me deixar em
paz.
Mas o sr. Marceaux não voltará ao Treme. Não essa noite. Nem nunca.
Em uma onda de raiva, chuto e empurro, acertando as costelas de
Lorenzo e tentando me libertar dos cobertores em uma tentativa de escape.
Ele pega os meus joelhos e os mantém imóveis. Arranho os seus braços,
meus pulmões ofegantes com meu pulso acelerado.
O baque pesado dos passos de Shane indicam sua aproximação e nós dois
congelamos.
Lorenzo retrai suas mãos e se vira para a frente no momento que Shane
entra na sala.
— Você está sentado muito próximo, idiota. — Shane bate na lateral da
cabeça de Lorenzo. — Mexa-se.
Respiro fundo e ajeito as cobertas ao meu redor.
— Estou indo para casa de qualquer maneira. — Lorenzo levanta e troca
um bater de palmas e um soquinho com Shane.
Quando a porta se fecha atrás de Lorenzo, Shane se abaixa perto de mim
e pega um pacote de cigarro do bolso.
Adrenalina corre em minhas veias, vibrando meus nervos.
— Eu não o quero aqui.
— Cala a boca, Ivory. — Ele acende um cigarro e se encosta no sofá.
Eu decido tentar uma nova palavra.
— Ele me estupra, Shane.
Seu rosto fica vermelho antes de ficar sombrio enquanto ele aponta o
cigarro na direção da porta.
— Aquele cara salvou minha vida no Iraque. — Sua voz aumenta e seus
braços tremem. — Eu não estaria aqui, respirando, se não fosse por ele.
Então, enquanto estiver aí saltitando nesses shortinhos e provocando o cara
com suas malditas tetas, lembre-se disso. Lembre-se que aquele cara é a
razão para eu estar vivo.
Eu escutei essa história, mas salvar a vida de alguém não dá o direito de
transar com a irmã. E os irmãos não deveriam defender as irmãs? Talvez ele
não ache que eu mereça esse tipo de amor.
Puxo as cobertas para mais perto de mim e digo baixo, inutilmente.
— Eu não saltito e não tenho muitas roupas. Esse short é da mamãe.
— Mais uma coisa que você tirou dela.
Talvez ele vá me bater e talvez o sr. Marceaux irá reportar meus novos
hematomas, mas, caramba, eu não posso deixar isso quieto.
— Eu pago as contas. Não é você. Não é ela. Ela nem sequer me
perguntou uma vez sobre a escola ou de onde eu arranjo o dinheiro. Mas eu
estou lá fora, me esforçando para garantir que a gente não perca essa casa.
Ele dá uma tragada no cigarro, sua expressão tensa.
— É, aposto que você está dando duro. Onde você arruma o dinheiro? —
Ele me lança um olhar demorado. — Você é uma puta?
Vergonha se junta na minha garganta. Balanço a cabeça. Deus, e se ele
souber? Eu não quero descobrir o que ele faria.
— Foda isso. — Ele levanta e joga as cinzas no chão. — E foda-se você.
— Ele vai até a porta e abre, mas lança uma olha para mim sob o ombro. —
Mamãe está certa, sabe. Nosso pai vendeu o nosso futuro para comprar o
seu. Ele realmente te amava mais.
A porta bate atrás dele, tirando mais lágrimas de meus olhos.
Eu entendo. Mesmo. O ressentimento deles comigo vale duzentos mil
dólares.
Depois de apagar as luzes e retornar para o sofá, Schubert se junta a mim
no escuro, ronronando e se aninhando no meu peito. Às vezes eu penso que
o amor de Schubert é uma extensão do amor do meu pai. Meu pai o acolheu
e me surpreendeu com ele, então morreu no dia seguinte. É como se ele
soubesse o que estava para acontecer e quisesse garantir que parte do seu
coração ficasse aqui, para me consolar quando eu mais precisasse dele.
Mas eu não acho que o meu pai me amasse mais do que eles. Ele só
estava tentando fazer uma coisa boa com a minha educação. Apesar disso,
eu posso imaginar como eles se sentem. Eu mal posso respirar após a
rejeição do sr. Marceaux e isso não era nem perto de amar.
Pelo menos, Marceaux não parou com as aulas privadas. Eu deveria estar
feliz por isso, mas as últimas cinco semanas só me fez ficar brava.
Completamente chateada. Suas estritas relações profissionais e postura fria
são lembretes diários que eu não sou boa o suficiente.
Não sou boa o suficiente para Leopold.
Não sou boa o suficiente para arriscar estar comigo.
20

Emeric

Apesar das minhas dúvidas sobre o futuro de Ivory, eu foco no meu próprio
futuro. Passo o resto do final de semana procurando por trabalhos de
ensino. No domingo à noite, me inscrevi para algumas vagas de meio de
semestres fora do estado.
Eu detesto a ideia de sair de Louisiana sem resolver uma última coisa
com Joanne. Mas eu tenho opções e talvez com um pouco de autocontrole,
manterei as coisas profissionais com Ivory até essas opções darem certo.
Mas não diminui o sentimento intoxicante em meu corpo. Ao cruzar o
estacionamento do campus na manhã seguinte, minha expectativa de vê-la
me faz assobiar “Patience” com a contagiante alegria do Axl Rose. Meu
sangue bombeia quente e meus músculos flexionam em cada passo que dou
na direção ao Pavilhão Meia-Lua.
A mente trabalha de formas engraçadas, me fazendo raciocinar todo tipo
de besteira ao entrar no prédio. Se estou indo embora, não vai ter problema
tocá-la hoje. Só uma vez. Outra degustação do lábio dela. Isso é tudo.
Cara, por que estou considerando me demitir? Eu não posso abandoná-la.
Como irei respirar? Isso é besteira.
Meus passos se afastam da sala de aula e mudam em direção ao Centro
do Campus por motivos que só podem ser descritos como obsessão.
Eu passo uma mão pelo cabelo e diminuo meus passos. Eu não me
lembro de me sentir feroz e fora de controle com Joanne. Mas eu também
não dei em cima dela. Não no começo e com certeza não no final. Nunca
dei em cima de uma mulher. Nunca precisei. Isso por si só me faz
questionar por que estou esticando o pescoço e examinando a multidão de
estudantes, esperando vislumbrar longos cabelos escuros. Ivory Westbrook
está fodendo com a minha cabeça.
Alguns corredores depois, vejo Ivory encostada na parede dos armários
sorrindo para Ellie Lai.
O vislumbre dela envia um calor de satisfação por mim, prendendo
minhas pernas e me paralisando à seis metros de distância. Minha obsessão
pode ser ridícula, mas não deixa de ser real. Estou completamente
hipnotizado por ela.
Ela se destaca dentre todos nesta escola. Não por causa do estilo
monótono da blusa branca de botões e a saia preta esfarrapada, mas porque
ela brilha acima de suas limitações financeiras, exalando uma beleza que
não pode ser comprada. Tudo parece apagado em comparação a pele
brilhante, o brilho dos olhos e a potência da aura. Estou tão perdidamente
atraído por ela que não consigo ver direito.
O fluxo de estudantes entre a gente é grande, mas só leva um segundo
para ela sentir minha presença. Quando seus olhos encontram os meus, seu
sorriso escapa. Seus lábios se separam e uma mão se fecha em punho na
lateral.
Ela está com raiva de mim por ter posto um espaço entre nós, mas
entende por que eu fiz isso. Mesmo assim, nós dois sabemos que aquele
espaço não serviu de nada. A cada dia que passa, fica mais tenso e delicado,
se esforçando para sucumbir e desaparecer. Como neste exato momento.
Seu olhar prende o meu, me perfurando com um apelo vulnerável.
Assume o risco. Encontre um jeito. Eu preciso de você. Talvez isso seja
apenas reflexos dos meus próprios pensamentos, mas eu quero agarrar seu
pulso, forçar seus dedos a se abrirem e prendê-los ao redor dos meus
enquanto prometo dar tudo o que ela quiser.
Ellie cutuca o braço de Ivory e, num piscar de olhos, ela desvia a atenção
quebrando a conexão.
Eu pisco e respiro frustrado enquanto a atenção de Ellie muda de Ivory
para mim. Merda.
Relaxando os ombros, dou a elas um leve aceno de cabeça e viro para
baixo no corredor. Graças a Deus, nenhum outro estudante pareceu perceber
minha fixação congelada. Passo as mãos pelo rosto e luto contra o ardente
desejo de olhar de relance para Ivory outra vez.
No momento que chego ao Pavilhão Meia-Lua, minha cabeça está uma
bagunça de argumentos incoerentes. Eu posso dar a nós dois o que
queremos. Mas eu posso mantê-la segura das consequências? Ela está
segura agora? Sem tê-la ao meu lado cada maldito segundo eu não tenho
ideia de quem ou o que está a ameaçando. Eu odeio isso.
Eu me aproximo de um cruzamento vazio e paro ao som de vozes
familiares no corredor.
— Eu não me importo com o que ela concordou. — O protesto agudo do
Sebastian Routh arranha minha pele.
Quem é ela? Eu ando para mais perto da borda, ficando fora do campo de
visão.
— Cara, me solta.
Eu reconheceria a voz nasalada de Prescott Rivard em qualquer lugar.
Esses dois idiotas são amigos inseparáveis, o que desperta minha
curiosidade sobre a discussão.
— Eu tenho um acordo com ela por tipo desde sempre — Sebastian
sussurra. — Ela não pertence a você.
Paranoia me acerta no tórax. Só tem uma garota nessa escola por quem
eu brigaria e sei exatamente como eles olham para ela todos os dias na sala
de aula. Eu espero que para o bem deles, eles estejam falando de outra
pessoa.
Seus resmungos pesados ecoam pelo corredor, seguido pelo barulho dos
sapatos. Se eles virarem no corredor, vão me ver e serei interrogado. Mas eu
espero, escutando a briga deles enquanto seguro a respiração. Falem o nome
da garota. Falem a merda do nome dela.
— Pare! Você está amassando a minha camisa — Prescott fala. — Não
podemos fazer isso aqui. Se minha mãe escuta a gente…
— Eu não dou a mínima! — Sebastian grita.
No final do corredor, algumas garotas se viram e congelam no meio do
caminho. Eu aponto inflexível para a direção oposta e elas se viram para
fugir.
— Você é quem vai ter problema. — Sebastian diminui a voz, sua
respiração acelerada. — Já que é o único a fodendo agora, talvez eu faça
uma visita a sua querida mamãezinha e conte como você tem gastado sua
mesada.
Minhas mãos se fecham e minha visão turva logo que conecto as
motivações dos ricos garotos tarados com as de uma linda garota com uma
fonte de renda desconhecida.
Adrenalina treme meu corpo e encurta minha respiração. Eu quero bater
em algo, meus dedos cravados nas palmas. Quero matar os filhos da puta.
— Você não faria isso — Prescott fala, seu tom venenoso.
— Não me teste — Sebastian grunhe.
O som de articulações batendo em carne chega aos meus ouvidos no
instante que Sebastian entra no meu campo de visão. Ele pousa nos meus
pés, seus óculos com armação de plástico tortos na testa.
Segurando a boca, o hipster magricela geme e rola para o lado.
— Seu psicopata do caralho!
Prescott o ataca do corredor. Nenhum deles me vê, Prescott se agachando
sobre Sebastian e erguendo o punho para trás…
— Fiquem de pé.
Eles congelam ao som da minha voz e levantam os olhos, os rostos
empalidecendo e demonstrando expressões de puta merda.
Sebastian se recupera primeiro, se esforçando para sair debaixo de
Prescott e ficar de pé. Ele ajeita os óculos e aponta para o filho da diretora.
— Ele me bateu. Você viu, não é?
O covarde nem está sangrando.
Prescott dá uma risadinha, esticando a gravata sem pressa no chão.
Recusando-se a me reconhecer. Eu posso mudar isso.
Pego a gravata dele e o puxo para cima. Ele cambaleia ao mesmo tempo
que o giro. Bato com ele na parede e prendo minha mão em volta de seu
pescoço.
— O nome dela.
Cabelo loiro cai sob seus olhos, seus lábios se afastando de sua mordida.
— O quê?
Que Deus me ajude, se ele tiver enfiado seu pau na minha garota…
Não vá por aí, Emeric.
Colo meu rosto no dele e o deixo sentir a fúria na minha respiração.
— A garota que você está fodendo. Me dê o nome dela.
Sua garganta balança contra a pressão da minha mão. Temos a mesma
altura, mas eu tenho pelo menos trinta quilos de adultos sobre ele. Porque
eu sou o adulto, a figura autoritária que deveria estar separando brigas, não
começando uma.
Afrouxo meu aperto, mas me recuso a soltá-lo. Quero esmagar sua
garganta desengonçada só por infectar minha cabeça com imagens dele com
a Ivory.
— Má conduta sexual irá fazê-lo ser expulso, sr. Rivard. Quem é a
garota?
— Avery — ele gagueja. — Mas só para deixar claro… Nós não
estamos… fazendo sexo.
Avery, não Ivory. Os nomes são muito parecidos como se tivesse pensado
na Ivory ao mesmo tempo que cospe outro.
Encaro Sebastian.
— Quem é Avery?
Ele encara Prescott muito bravo.
— Avery Perrault é a namorada dele. Ela estuda na St. Catherine.
Ele está mentindo? Estou muito tenso para pegar os sinais.
— Fale do arranjo que você tem com ela.
Os olhos de Sebastian brilham atrás do óculos, sua voz baixa e dolorosa.
— Ela costumava sair comigo, mas não mais.
Se sair não é um eufemismo para sexo, então eu não sei mais o que é. E
se isso é sobre Ivory, por que ele mentiria? Para ela não poder contradizer a
história deles? Tem mais do que isso? Pagá-la para transar vai além de
expulsão. Se pegos, os três podem ser acusados como adultos por violarem
as leis de prostituição. Meu peito aperta com pensamentos de Ivory sendo
presa.
Volto minha atenção para o imbecil respirando com dificuldade na minha
mão.
— Como você está gastando sua mesada?
— E-eu… c-compro coisas para Avery. — Ele pega na minha mão. —
Porque ela é a minha namorada.
Cada canto do meu corpo se contorce com irritabilidade. Eu o solto e
estico minha mão.
— Desbloqueiem o celular e me entreguem. Os dois.
Eles trocam olhares hostis e fazem o que eu digo. Uma rápida rolagem
nos registros confirma que ambos tem se comunicado com um contato
chamado Avery. Nenhum dos celulares tem Ivory nos contatos.
Porque ela não tem um celular.
Devolvo os dispositivos e examino suas posturas tensas e expressões
indignadas, procurando por um vislumbre de mentira. Eu quero falar o
nome de Ivory, de alguma forma trazê-la para a conversa e estudar as
reações deles. Mas eu não posso fazer isso sem deixar meus próprios
interesses óbvios.
Contudo, eu posso reportar eles por brigar.
Vinte minutos depois, estou em pé atrás da mesa de Beverly Rivard com
as mãos cruzadas nas costas. Eu não digo uma palavra enquanto os garotos
explicam a disputa deles por Avery Perrault, como tudo não passou de um
mal-entendido e que a honra de todos ainda está intacta e blá, blá e um
maldito blá.
Prescott se inclina para a frente na cadeira com seus braços balançando
em minha direção.
— Então ele tentou me estrangular!
A diretora muda a direção de seus olhos cinzentos para mim.
— Sr. Marceaux, você está ciente da política de não tocar?
— Sim. — Inclino a cabeça. — Você está ciente que seu filho é um
cretino?
— Viu o que estou dizendo? — Prescott joga as mãos no ar e despenca
na cadeira. — Ele é doido pra caralho.
Beverly anda ao redor da mesa, só parando na parede de janelas e
encarando os gramados bem-cuidados do lado de fora.
— Sr. Rivard e sr. Roth, vocês serão advertidos pelo linguajar e por
brigar. — Ela se vira, braços cruzados embaixo dos peitos e calmamente
absorve suas expressões indignadas. — Esperem no corredor enquanto
troco uma palavrinha com o sr. Marceaux.
Um turbilhão de emoções me invade e liderar uma investida é o tipo de
urgência pesada e de mau pressagio. Se eles estão mentindo sobre a
namorada, eu não vou encontrar a verdade neste escritório. Preciso realizar
minha própria investigação sobre as atividades deles após a escola.
Quando a porta se fecha atrás deles, Beverly deixa os braços caírem e
fica mais alta, mais rígida e seus olhos afiados olham os meus.
— Se você colocar as mãos no meu filho de novo…
— Esse é o pupilo que você quer que eu envie para a Leopold? —
Aponto um dedo para a porta. — Aquele babaca não vai durar um mês lá.
Sua cabeça treme com a força do grito.
— Chega!
Ela toca no colarinho da camisa e fecha os olhos, respirando fundo.
Ando devagar até ela, parando a centímetros de distância. Imponente
sobre ela, espero ela olhar para mim.
Minhas entranhas queimam com uma raiva ansiosa, mas mantenho meu
timbre suave e meus olhos calmos.
— Quando ele fizer algo que eu desaprovo, lidarei da maldita forma que
eu queira. Se não gostar, nosso acordo está cancelado.
Enquanto caminho para a porta, ela diz:
— Eu irei demiti-lo.
— Não, você não vai. — Não preciso dizer a ela que estou pensando em
me demitir. — Eu sou seu único meio para a Leopold.
21

Ivory

Algo está errado hoje. Sinto algo de estranho no ar logo que entro na Sala
1A. Prescott e Sebastian estão sentados em cantos opostos da sala de aula.
Estranho. Quase tão estranho como a forma dura e rancorosa que estão
olhando para mim. O sr. Marceaux está de pé atrás da mesa, também me
encarando de uma forma dura. Mas tem algo a mais em sua expressão.
Algo que não tenho visto em cinco semanas.
Ele olha para mim como se estivesse visualizando me dar umas
palmadas. Uma sútil chama contida aparece em seu olhar, piscando como se
estivesse crescendo por um tempo, crescendo e se fortalecendo atrás de seus
grossos cílios e agora, talvez tenha se tornado grande demais, faminto
demais para suprimir.
Pode ser que eu esteja imaginado, mas a sensação pesada e grave como o
som de um baixo que bate nas minhas entranhas é definitivamente real.
Estudo-o com atenção enquanto encontro meu assento, enquanto ele
começa a aula e enquanto ele guia a turma pela próxima hora de debate.
Nesses incontáveis momentos quando ele encontra meus olhos, uma
ressonância irradia dele como se ele estivesse experimentando algo que está
ansioso para compartilhar comigo.
Ele segura meu olhar.
— Cada minuto que não estão na escola, devem estar praticando o
instrumento de vocês.
Agora que estamos em outubro, temos vários eventos para nos preparar
sendo o maior deles o Feriado de Celebração da Assembleia de Música.
Enquanto ele passa pelo calendário de apresentações, me recordo que ele
ainda não escolheu o pianista solo. Eu sei que sou a melhor, mas não sei se
ele concorda. Sua avaliação nas minhas habilidades é tão grossa e
humilhante. Mesmo assim, sua avaliação me estimula a tentar mais, a ser a
melhor, a agradá-lo.
Ele continua me olhando enquanto fala. Eu sou sempre a primeira a
desviar o olhar, sua intensidade é muito forte para aguentar por muito tempo
e me faz ficar tonta. Mas quando devolvo o seu olhar – e eu sempre faço –,
percebo que seus dedos estão trêmulos ou sua língua está molhando o lábio
inferior, provas que não sou a única sentindo essa presença mais profunda e
essa atmosfera entre a gente.
O que mudou? O que faz um homem ir de me dar umas palmadas e me
beijar para cinco semanas de rejeição e depois para uma atmosfera de que
quer me foder?
Na hora que o último sinal ressoa e a classe se esvazia, eu já fiquei tão
suscetível aos clarões das chamas em seus olhos que ele não precisa me
dizer para ficar sentada. No momento que ficamos sozinhos, seu único olhar
me paralisa. Um comando silencioso. Não se mexa.
Com passos firmes e determinados, ele se aproxima da minha mesa, gira
na borda e se abaixa na curta distância, invadindo meu espaço pessoal da
forma predatória que ele faz.
Ele olha para mim, eu olho para ele e um formigar tonto passa pelos
meus membros.
— Sr. Marceaux? — Cristo, meu coração vai sair pela boca. — O que
você está fazendo?
— Fale sobre Prescott Rivard.
Meu coração para de bater.
— Como?
Ele bate o punho na mesa e o eco da batida reverbera em sintonia com
seu timbre em um D baixo.
— Me responda!
Meus ombros se curvam para a frente e minha garganta se fecha. Ele
descobriu? Eu deveria encontrar com Prescott de novo hoje à noite. E se
aquele maldito cretino me dedurou? Mas por que ele faria isso? Prescott
ficaria tão ferrado quanto eu.
Fique calma. O sr. Marceaux não sabe de nada.
— Prescott é meu maior competidor para a Leopold. Mas eu sou
melhor…
— Isso não. — Sua voz se nivela a uma calma composição. — Me fale
sobre a sua relação com ele fora da escola.
Abro a boca para inventar uma mentira, mas as palavras não saem. Eu
não posso ser desonesta com ele, não sei por quê. Então, falo a simples
verdade.
— Eu o odeio.
— Por quê?
— Ele dirige por aí com seu carro sofisticado, usa seu sorriso bom
demais para todo mundo e é seu próprio absorventezinho.
Ele levanta uma sobrancelha.
— Absorventezinho?
— Sim. Como um absorvente. Um absorvente usado, nojento e pegajoso.
Ele esfrega uma mão na boca me encarando como se eu estivesse falando
uma outra língua. Deixando a mão cair na mesa, ele estreita os olhos.
— Explique o que você quer dizer.
— Você realmente quer que eu… Ok, tudo bem. Um absorvente é
repulsivo. Ele dilata e expande com sangue. Ele pinga por todos os lugares,
fede e…
— Pare. Por que Prescott é repulsivo?
— Você tem que perguntar?
Ele endireita, enfia os dedos nos bolsos da frente e, pela primeira vez em
semanas, me dá um meio sorriso.
— Não, acho que não.
Silêncio envolve a gente, mas não está quieto. O ar está tão carregado e
cheio de batidas que eu me perco na música que soa entre a gente. O olhar
em seus olhos… Meu Deus, é esmagadoramente sexual. Não do jeito quero
foder você. É provável que ele esteja pensando nisso, mas sua expressão
emana um tipo de sensualidade que promete mais como se só a troca de
olhares pelo resto da eternidade já fosse íntimo, incrível e perfeito, com ou
sem sexo.
É um conceito que luto para entender. Só de pensar em sexo com ele, me
remexo em uma pilha de conflito. Mas eu não preciso compreender ou
analisar. Eu sinto.
O ritmo da nossa respiração toca uma delicada música de necessidade e
desejo e desejo no fundo e enquanto os tons sexuais não são necessários em
nossa comunicação silenciosa, ele adiciona ritmo e sabor no coração da
nossa música.
— Sr. Marceaux? — Esfrego minhas palmas nas coxas, segurando meu
olhar ao sussurrar. — Você está compartilhando suas notas.
Linhas de expressão se formam em sua testa enquanto ele agarra a parte
de trás do pescoço.
— O quê?
— Eu sinto suas notas. Aqui. — Toco meu esterno, minha voz tremendo.
— Elas são sombrias e hipnóticas como sua respiração e a batida do seu
coração.
Ele dá um passo para trás, então outro e mais um. Não importa a
distância. Eu ainda o escuto. Eu ainda o sinto. Ele está dentro de mim.
Se virando, ele vagueia até a frente da sala, ziguezagueando, trocando de
direção como se não soubesse para onde ir. Ele acaba na sua mesa,
atrapalhando-se com o computador.
— Você vai trabalhar com o Concerto Nº 2 de Prokofiev hoje — ele diz
de costas para mim. — Vá se aquecer.
Merda. Aquela é uma obra que requer uma quantidade incrível de
concentração. Foi por isso que ele escolheu? Para me distrair?
Decepção se enterra em meu peito quando me levanto da mesa para
seguir seu comando.
Pelas próximas quatro horas, aguento seus golpes de mão e suas duras
críticas sobre minha apresentação de piano, tudo enquanto me arrependo de
ter contado a forma como ele me faz sentir. Eu deveria ter focado primeiro
em me preparar e nutrido as palavras antes de jogá-las meio-formadas no
vento da instabilidade dele, com a ridícula esperança que isso prenderia e
manteria seu afeto por mim.
Ele me libera às sete horas, nem um minuto depois, com uma voz
imutável e de partir o coração.
— Boa noite, srta. Westbrook.
Só que eu não posso ir para casa. Trinta minutos depois, estou sentada no
terreno baldio dos projetos e no banco de trás do Cadillac de Prescott,
observando-o colocar uma camisinha pela sétima vez desde que a escola
voltou.
Eu posso fazer. Desde que ele não tente foder pela bunda – algo que ele
nunca tentou –, eu posso aguentar. Eu sempre aguento.
— Eu não deveria estar aqui. — Ele alcança debaixo da minha saia.
Meu corpo está dormente, mas não dormente o suficiente. Eu sinto seus
dedos puxando minha calcinha. Eu sinto a gula que ele exala no meu rosto.
— Eu fiquei de castigo hoje. — Ele arrasta a roupa íntima pelas minhas
pernas e para fora do meu pé. — Por dois meses.
O nada ressoa no meu ouvido. Tudo está muito quieto, muito sem vida na
ausência do sr. Marceaux.
— Mas eu vou dar um jeito de me encontrar com você. — Ele me
empurra de costas.
Eu não posso fazer isso de novo. Não posso aguentar suas mãos, suas
estocadas, os sons do seu prazer. Essa coisa que ele faz comigo não é
estupro, mas ainda parece ser forçado, indesejado e pavoroso. Se eu disser
não para ele, ele forçará. Talvez eu possa lutar com ele dessa vez, mas o que
acontecerá com as minhas contas? Meu futuro?
Ele afasta meus joelhos e eu os empurro de volta.
— O que você está fazendo? — Ajoelhado sobre mim, ele empurra as
calças pelas coxas.
Os resultados das minhas escolhas são tão ilógicos. Se eu mantiver
minhas pernas fechadas, é possível que eu perca minha casa e me torne uma
viciada em cocaína como a minha mãe. Se eu deixar Prescott fazer o que ele
quer, eu tenho a chance de algo grande. Que baita confusão está a minha
vida.
Empurro minhas mãos contra ele, segurando-o distante.
— Eu não quero isso.
Mas eu quero. Eu quero isso de um jeito não pegajoso, não carente e de
dar e receber. Eu quero me conectar com um homem da forma como quero
que minha música se conecte com a plateia. Emocionalmente. Profundo. De
forma natural.
Eu quero isso com alguém que se importe.
Ele força seu quadril entre as minhas pernas e luta com meus braços
trêmulos.
— Qual é o seu problema?
— Isso. — Bato meu antebraço no peitoral dele. — Você.
Um ronco gutural soa à distância, ficando mais alto e mais perto,
vibrando pelo meu corpo.
Os pelos do meu braço se arrepiam e forço meus olhos na escuridão do
banco de trás, incapaz de ver.
— Isso é… — Pego os ombros de Prescott enquanto ele tentar montar em
mim. Tento empurrá-lo, um desperdício de esforço. — Isso é um GTO?
— O caralho se eu sei. — Ele guia seu pau, espreitando ao redor da
minha entrada. — Fique parada.
O barulho do carro está próximo. Próximo o suficiente para parar na rua.
Próximo o suficiente para que Prescott levante a cabeça para olhar através
da janela traseira.
— Merda — ele sussurra. — Alguém está aqui.
Meu sangue congela. Ele está procurando por mim? Procuro por ar e me
empurro contra o peitoral gelado de Prescott.
Ele não pode me ver assim. Ele não pode. Ele não pode.
Eu chuto e resisto, tentando arrumar a saia, incapaz de mover o peso de
Prescott.
— Mexa-se! — Deus, eu não consigo fechar minhas pernas.
A porta atrás dele abre e a súbita luz do teto machuca os meus olhos. Um
braço entra e em um piscar de olhos, Prescott é jogado para fora do carro,
voando de costas e desaparecendo na escuridão da noite.
Os sons de grunhidos de dor harmonizam com o ronronar da marcha
lenta do GTO. Eu luto com a saia, puxando-a pelas minhas pernas, meus
olhos bem abertos e presos na porta aberta.
Passos se aproximam, o ruído de botas no cascalho. Calça preta, colete e
então a gravata aparecem na estrutura da porta. Ele se curva para baixo e
quando seu rosto se abaixa para o campo de visão, tudo o que vejo são seus
olhos homicidas.
Eu não me movo. Não respiro. É isso. Ele pode muito bem me matar,
porque minha vida acaba agora.
Sem Le Moyne. Sem Leopold. Sem futuro.
Sem música com o sr. Marceaux.
Ele aponta um dedo na direção da rua e grita:
— Ponha a porra da sua bunda no meu carro!
22

Emeric

O filho da puta vai morrer.


Eu deixo Ivory recolhendo as coisas no carro e me viro como um furacão
para os resmungos do merdinha no chão. Apesar da minha nuvem de raiva,
consigo manter os socos nas costelas de Prescott depois de o arrancar do
assento de trás do carro. Mas enquanto ele me olha, os braços cruzados na
cintura, minhas mãos se contorcem para quebrar cada osso em seu rosto
contorcido.
As sombras do projeto do Centro da Cidade cobrem o terreno vazio. As
paredes decrépitas dos prédios de apartamentos são mal iluminadas e os
bosques de matos e lixo cheiram à abandono. Trepadeiras de folhas grossas
sobem os postes de luzes e as fundações em ruínas formam um véu protetor
na ausência da luz do luar.
Prescott se estende de costas com suas calças abaixadas em volta das
coxas. Bastou um olhar para a camisinha pendurada em seu pau flácido para
meu controle se desintegrar. Insanidade que eu nunca conheci explodiu
forte e ferveu dentro de mim, comprimindo meu peito e queimando meus
músculos.
Esse é o local perfeito para matar alguém. Ninguém vai ver. Ninguém vai
se importar.
Eu me curvo sobre ele e aperto meus dedos ao redor da garganta dele.
— Você está morto.
Ele arranha minha mão, sugando o ar.
— N… não é só comigo. Ela é uma puta e… f… f… fode todo mundo.
Uma fúria primitiva me sufoca, cegando minha visão e embaçando minha
mente. Eu me mexo por instinto, recuando e cravando rapidamente meus
dedos no peitoral dele.
Um grito sai de seu pulmão.
— Deus, por favor, por favor…
— Você nunca mais… — Acerto seu estômago —, vai tocar nela. —
Outro golpe, no alto de suas costelas. — De novo.
Então o ataco. O som de seu choro, a dor nas minhas mãos, o esforço da
minha respiração, tudo desaparece no momento que trago a ira do inferno
sob nele. Seus braços disparam para cima, me afastando, mas o esmurro,
acertando cada centímetro em seu torso exposto.
— Sr. Marceaux! — Ivory grita de trás de mim.
Eu fervo com sua desobediência.
— Entre no maldito carro!
Prescott tenta girar para fugir e eu o puxo de volta, golpeando minha mão
em sua bochecha.
— Sr. Marceaux, pare! — ela grita, mais de perto agora, a centímetros de
distância.
Estou agitado e minha visão limitada consumida com sangue, vingança e
ossos quebrados. A cada golpe dos meus punhos, seus apelos e gritos não
são mais registrados… Até sua boca se mover tão perto, sua respiração
roçando minha orelha.
— Emeric.
Congelo no meio do golpe, minhas veias queimando para terminar isso.
Curvada atrás de mim, ela passa seus braços sobre meus ombros, seu
peito nas minhas costas e seus dedos cavando minha camisa. Seu rosto está
ao lado do meu e ela sussurra:
— Você não vai só perder seu emprego. Vai para cadeia. Ele não é digno
disso.
Alcanço a mão dela e aperto com força no meu peito.
— Mas você é. Você é digna.
Ela choraminga e aperta meus dedos.
— Eu sinto muito. Eu nunca quis… — Ela tenta me afastar. — Por favor.
Me leve para casa.
Por favor. Inferno, essas palavras em seus lábios.
Fico em pé, jogando-a para trás com a força do meu corpo. Com uma
mão em seu braço para equilibrá-la, uso a outra para apontar na direção do
meu carro.
— Não vou dizer outra vez.
Seus olhos estão bem abertos e vidrados, ela ajeita a alça da mochila no
ombro e arrasta os pés até o GTO.
O som de ânsia de vômito me leva de volta para Prescott. Com a calça no
lugar, ele balança nas mãos e joelhos e esvazia o estômago em um
emaranhado de ervas daninhas, soluçando entre cada contração.
Esperando que ele termine, respiro fundo e tento reunir alguma aparência
de controle. Eu não sou um assassino. Caramba, antes de Ivory, eu nunca
tinha balançado meu punho desde que estava abastecido com testosterona
de adolescente.
Olha para ela de vislumbre, sua postura derrotada e expressão
aterrorizada enquanto entra no carro. Mudo a atenção para minhas mãos
inchadas, surpreso por vê-las tremendo violentamente. Ela me transformou
em um animal assassino.
Ela vai pagar por deixar esse babaca entrar em seu corpo. Mas os
machucados que vão cobrir seu peitoral pelas próximas semanas? Isso é
comigo.
— Levante-se. — Agarro seu cabelo, saboreando seus gritos de lamento
enquanto arrasto-o em direção ao Cadillac e o empurro no banco do
motorista.
Tremores se contorcem ao longo de seus braços magrelas, seu rosto
pálido e encharcado de lágrimas ao olhar para a frente. Não há sangue
visível em nenhuma parte da pele exposta. Se não fosse por sua expressão
de dor e suas roupas sujas, ninguém saberia que eu dei uma surra nele.
Com um braço apoiado no topo da porta, me inclino.
— Olhe para mim.
Ele se encolhe e suas mãos voam para bloquear o rosto.
— Não me bata.
Meus punhos flexionam para bater, para sentir o corpo dele cedendo sob
a força da minha angústia, mas eu abaixo, guardando-os para Ivory.
Logo que ele percebe que eu não estou pendendo nem indo a lugar
nenhum, ele arrasta os olhos vermelhos para mim.
— Você tem duas escolhas. — Pronuncio cada palavra baixa e
deliberada. — Primeira. Não falar para ninguém o que aconteceu. Nem uma
palavra sobre o que você estava fazendo com a srta. Westbrook. Deixe que
esses machucados sarem sem mostrar para ninguém e esse será sua única
punição por pagar uma garota para transar.
Seus olhos se estreitam em um olhar fulminante.
Eu correspondo seu olhar o que faz com que ele murche.
— Segunda. Manque por aí como um covarde. Diga a diretora o que você
fez para merecer esses machucados e diga adeus à Leopold. Não importa o
quanto minhas conexões são poderosas, não há conservatório no mundo que
aceite um candidato encarando acusações por comprar serviços sexuais.
Seus olhos saltam.
— Mas eu só tenho 17 anos!
— Isso é velho o suficiente para ser acusado como um adulto e jovem o
suficiente para ser a bela do baile na prisão estadual.
— Meu Deus, meu Deus, isso não pode estar acontecendo. — Ele abraça
a barriga e me dá um olhar suplicante. — Você não vai contar para a minha
mãe?
Eu deveria tê-lo quebrado. Eu deveria ter deixado ele sangrando em uma
pilha de sangue para que os abutres se alimentassem.
— Isso é entre você e eu. Mantenha sua boca fechada, fique bem longe
da srta. Westbrook… E quando eu digo ficar longe dela, eu quero dizer para
não pensar nela, não falar com ela ou olhar para ela. Apague-a da sua
maldita cabeça. Faça isso e a diretora não escutará do seu crime.
— Tudo bem. — Ele segura o volante, acenando e engolindo. — Eu
posso fazer isso.
Não estou convencido. Se ele estiver viciado em Ivory tanto quanto eu
estou, ele não vai conseguir ficar afastado. Mas por agora, assustá-lo é a
melhor opção que tenho.
Bato a porta e caminho até o GTO.
Ela gostou de trepar com ele? Ela vai me odiar por separá-los?
Impossível. Ela o comparou com um absorvente sujo de sangue.
Mas e quanto aos outros garotos? Outros clientes?
Bem no fundo, eu sei que ela não queria estar ali. Ela inclusive não
conhecia o conceito de desejo sexual até me conhecer. Mas encontrá-la com
outra pessoa é um soco esmagador para o meu orgulho. Cristo, eu nem
consigo olhar para outra mulher, ainda sim, aqui está ela… com ele.
Uma fúria invejosa abre caminho no meu peito, roubando meu ar e
acelerando meus passos.
Ela deveria ter vindo até mim, confiado em mim, me pedido ajuda. Ao
contrário, ela escolheu isso. Ele.
Lembranças do assento do banco de trás surgem na minha mente, me
atormentando com as imagens das pernas delas afastadas, a bunda dele
pelada e a camisinha.
Minhas pernas ficam tensas para virar, meus pulsos formigando para
pulverizar a garganta dele até que pare de respirar. Mas eu continuo
andando, minha atenção nela, no que pretendo fazer.
De todas as minhas paixões, disciplinar uma mulher é a mais empolgante.
A mais excitante. O motivo para eu trabalhar, foder e respirar. Eu posso
fazer isso sem destruí-la. Se eu mantiver meu temperamento sob controle,
eu serei capaz de abrir algo dentro dela que ela nunca pensou que existiria.
Dor e prazer. Medo e excitação. Dar e pegar. Quando ela entender como
essas coisas funcionam juntas, isso irá mudá-la, fortalecê-la e amarrá-la a
mim de maneira irreversível.
A parte racional do meu cérebro exige que a leve para casa, desista do
meu emprego e acabe com essa obsessão perigosa. Mas eu cheguei a um
ponto sem retorno.
Não é mais uma questão de se ou quando.
Essa noite, ela vai se curvar para minha punição, tremer ao meu toque e
eu arriscarei tudo para mostrar a Ivory exatamente o que ela significa para
mim.
23

Emeric

A tensão dentro do GTO é tão sufocante e desorientadora quanto minha


raiva. Eu agradeço o silêncio de Ivory, mas a descrição dos pensamentos
dela me deixa cada vez mais firme ao passar pelas ruas.
Quando ultrapasso a curva para o Treme, ela se contorce no assento e
aponta.
— Minha casa é… — Seu olhar voa até o meu. — Você não está me
levando para casa?
Parando no semáforo, viro para ela.
— Alguém vai notar se você não voltar para casa hoje à noite? Sua mãe?
Seu irmão?
Já achava que olhos dela eram escuros, mas agora são da cor de
pesadelos. Mesmo com os faróis que passam, eles me atraem e gelam meus
ossos.
Ela encara o colo, sua cabeça balançando e sua voz trêmula muito suave.
— O que você vai fazer comigo?
Ela está pensando no pior. Escuto isso nas lufadas estridentes de sua
respiração e isso me enfurece. Mas eu não posso culpá-la. Ela me viu
enquanto eu perdia a cabeça com Prescott e com a certeza que posso sentir
seu medo, ela pode sentir minha necessidade vibrante de compensação.
Eu me estico e pego sua mão no colo.
— Preste bastante atenção, Ivory. — Aperto seus dedos trêmulos. — Eu
nunca baterei em você com raiva. Quando eu bater na sua bunda, você vai
adorar tanto quanto vai odiar. Me diga que entendeu.
Sua respiração acelera e um soluço paira na borda da sua voz.
— Você não vai me bater com raiva. — Ela toca na pele rasgada das
juntas dos meus dedos. — Como você me achou?
— Sebastian Roth estava disposto a entregar o estacionamento favorito
do melhor amigo. — Uma torrente de animosidade invade minha garganta e
sou incapaz de parar. — Você estava trepando com ele e Prescott? Quantos
outros mais?
Ela tenta afastar a mão, mas eu seguro com mais força. Seus dedos caem
fracos enquanto os meus continuam tremendo da ligeira adrenalina.
Talvez seja melhor que ela não responda enquanto estou dirigindo. Estou
prestes a explodir, então seria bem capaz de pular com o carro da ponte.
Lasalle Street, quinze quarteirões, duas voltas e um portão de alta
segurança, aqui estou, sentando na calçada da minha casa, prestes a cometer
o maior erro da minha vida.
Uma luminária a gás por perto ilumina o interior do carro, mas estamos
parados nos fundos, cercados por enormes carvalhos e escondidos da rua.
Quando me viro no assento para olhá-la, ela não está encarando minha
enorme propriedade com olhos invejosos. Ela não está examinando a
paisagem de milhões de dólares com a boca aberta. Ela está olhando para
mim. Como se eu fosse a única coisa que existe nesse mundo. Como se eu
fosse mais importante do que toda a riqueza que a circunda.
Eu me sinto impotente sob seu olhar, perdido nas sombras da tragédia, do
medo e da negligência. Mas tem um brilho de luz nas profundezas escuras.
Enquanto ela se aproxima, procurando, meu coração bate rápido em
realização. Esse pequeno brilho em seus olhos é confiança.
É quando eu escuto.
O ritmo das nossas respirações. As batidas de nossos corações. O crepitar
no ar.
O delicioso ritmo que pulsa de mim, acordando sensações que eu nunca
senti e compondo uma melodia que eu nunca escutei.
Nossas hipnóticas notas sombrias.
Isso é muito mais do que castigo e prazer proibido.
Ela nunca poderia ser um erro.
— Nós vamos… — Ela inclina a cabeça e procura pelo meu rosto. —
Fazer a coisa da vibração à noite toda? Estou bem com isso, mas não saber
o que vem a seguir, me deixa… hum, um pouco nervosa.
Traço um dedo pela bochecha dela e por toda extensão do seu lábio
inferior.
— Diga que confia em mim.
Ela mordisca o canto da boca.
— Você me deu todos os motivos para não confiar.
Deixo minha mão cair, mas ela pega e leva de volta para seu rosto.
— Mas você também me mostrou todas as razões que eu deveria. — Ela
segura minha mão e aperta na sua bochecha. — Obrigada por me encontrar.
— Seus dedos traçam os cortes nas juntas dos meus e seus olhos brilham
com lágrimas. — Por me proteger.
Cristo, essa garota… Ela é a minha música, meu lugar nessa vida, meu
papel nisso tudo.
Eu me movo e toco meus lábios nos dela.
— Você vai me seguir para dentro. — Passo minha mão em seu cabelo
fino. — Vai me contar tudo o que eu quero saber. — Fortaleço meu aperto e
puxo sua cabeça para trás. — Então, testarei sua confiança em mim. Diga
que sim.
Seus olhos piscam com vulnerabilidade e desespero. Então ela pisca e
respira, relaxando sob meu aperto.
— Sim, sr. Marceaux.
24

Ivory

Sigo o sr. Marceaux pela enorme monstruosidade que é a mansão. Entre as


perguntas que vou ter que responder e qualquer que seja o castigo que
seguirá, minhas pernas ameaçam ceder a cada passo.
Ele toca na parte de baixo das minhas costas e me conduz para frente.
Estranha, os tremores em suas mãos me dão força como se ele estivesse tão
assustado quanto eu.
Seus dedos estiveram tremendo desde que ele entrou no GTO, sua
respiração instável em volume e ritmo por todo o caminho até aqui. Estou
bem familiarizada com os sinais de um homem com necessidade, mas isso
parece diferente, seguro de alguma forma. Talvez seja porque ele não está
me atacado como os outros homens que eu encontro. Ou talvez porque as
mãos que estão nas minhas costas estejam me guiado, não me forçando.
Passamos por uma sala de estar preenchida com móveis de couro macio,
uma sala de lareira com mais sofás e uma enorme cozinha brilhando em aço
inoxidável. Comparando com o sombrio exterior gótico vitoriano de pedras
e torres, o interior é caloroso e brilhante, ostentando o tipo de luxo que eu
não tenho certeza que um salário de professor poderia arcar.
Lustres feitos de ferro forjado, cortinas longas e pesadas, pisos de
madeira brilhante, papel de parede de damasco preto, é tudo tão antigo e
moderno ao mesmo tempo. Uma profunda reflexão da personalidade dele.
Ele parece uma alma nobre antiga no sentido que ele ama conhecimento e
verdades – essas atividades o interessam muito mais do que as últimas
fofocas ou carros de alta tecnologia. Contudo, depois de três meses de aula,
eu aprendi que ele também aprecia a transitoriedade da vida, as tendências
fugazes e o modo como as pessoas e a música mudam ao longo do tempo.
Depois de incontáveis ambientes, uma escada em espiral que percorre o
saguão e um labirinto de corredores, perco o rumo. Por que um único
homem precisaria de tanto espaço?
Eu não me importo com quanto dinheiro ele tem ou de onde vêm. Estou
mais interessada naquele homem e onde ele está me levando.
— Sr. Marceaux?
— É Emeric. — Ele se detém para se virar para mim, passando seu
polegar pela minha bochecha. — Sou o sr. Marceaux quando sou seu
professor.
Seu toque provoca um arrepio na minha pele que eletrifica meu coração.
— Se não é meu professor neste instante, então quem é você?
Os mecanismos de seu relógio fazem tique-taque no meu ouvido quando
ele desliza seus dedos pelos meus cabelos e segura meu rosto enquadrando-
o entre suas mãos.
— Eu não acho que você esteja pronta para escutar isso.
Talvez eu não esteja, mas acho que ele está me mostrando. Encarando
seus turbulentos olhos azuis, as paredes com candelabros, as portas em
arcos e a madeira escura no corredor se dissolvem em esquecimento. Ele
está com seu rosto sério, aquele que diz eu quero foder você e muito mais.
Esse olhar dele revira minha barriga, puxando minha respiração através
de uma névoa de felicidade diáfana e de confusão. Ele não acalma o desejo
em sua expressão, mas também não age de acordo com ela. Como se ele
estivesse deixando-a crescer por conta própria enquanto a mantém contida.
Como se ele estivesse aproveitando a forma como faz ele se sentir sem
confiá-la a mim.
Eu poderia ficar em pé ali olhando para ele a noite toda, para seus
perfeitos traços de modelo, a barba por fazer em sua mandíbula esculpida e
a chama dançando em seus olhos. As pontas dos meus dedos correm pelo
cabelo dele. Mas, de leve, diferente da maneira como ele passa suas mãos
pelos fios pretos quando está com raiva.
Ele é simplesmente… tão… lindo. Muito gostoso para ser um professor.
Mas é o seu autocontrole que me atrai mais. Engraçado isso, já que ele
mostrou zero controle com Prescott. Ou ele fez? Prescott ainda está
respirando.
Quando se trata de mim, seu controle está evidente em sua expressão
tensa e sua respiração ainda mais tensa. Ele quer, mas não pega. Apenas
aquilo me atrai mais por ele.
Agarro as mangas enroladas em seu cotovelo e deslizo meus dedos pelo
comprimento dos antebraços musculosos dele.
— Posso cuidar das suas mãos?
— Depois. — Seu rosto se aproxima um pouco mais.
— Eu não entendo você, sr. Mar… Emeric. Você foi de dar palmadas
para cinco semanas de nada para balançar os punhos para… — Hesitante,
estendo a mão querendo tocar sua bochecha quente e esculpida. — Para
olhar para mim dessa maneira. Por quê?
— Bem, uma coisa aconteceu recentemente. — Ele me dá um meio
sorriso. — Cerca de dez minutos atrás. — Ele move seu rosto para minha
mão e pressiona os lábios no meu pulso. — Eu tive uma epifania.
No carro? Meu coração acelera.
— O que você quer dizer?
— Eu percebi que estive em negação desde… — Seu olhar se abaixa sem
demora para minha boca, então retorna para meus olhos. — Por um tempo.
— Negação sobre o quê?
Ele se aproxima, passa as mãos pelo meu cabelo e segura minha
bochecha em seu peitoral.
— Não vamos dar um nome pra isso agora.
Amor surge em minha mente, indesejada e seguido rápido por abraço.
Por instinto, meus braços envolvem o tronco dele. Minhas mãos apertam a
lã do colete e, músculo por músculo, relaxo nele. Seus dedos trilham
minhas costas, liberando calafrios da cabeça aos pés. O círculo de seus
braços se estreita e cada célula dentro de mim se torna hiperconsciente de
cada centímetro de seu corpo.
A imponente altura dele e o corpo duro o faz parecer intimidador e
protetor, inabalável e acolhedor, estranho e incrivelmente certo.
Meu pai costumava me abraçar e eu sinto falta desse amor com uma
insuportável angústia. Stogie me ama de uma forma sem abraço e protetor
como um tio. Mas essa é a extensão da minha experiência com o conceito.
Explorar alguma coisa como amor com Emeric é terrivelmente
irresponsável. Ele é muito instável, imprevisível e muito intenso. Ele daria
em um dia e pegaria de volta no outro? Ele me provocaria com isso, me
faria implorar e usaria contra mim?
Mesmo assim, prefiro receber em porções a nunca ter isso.
Exceto que ele é meu professor. Ele mesmo disse que eu não poderia me
apaixonar por ele. E ele ama outra mulher.
O que sou para ele? Meu estômago queima com ciúmes e apreensão, mas
não dói tanto com seus braços me segurando e sua boca descansando no
topo da minha cabeça.
O que quer que isso seja… Essa coisa que ele tem estado em negação,
parece estar fazendo seu coração bater rápido. Ou talvez seja o abraço que
esteja causando essas batidas pesadas no meu ouvido. Talvez seja tudo a
mesma coisa.
Eu mexo a cabeça para olhar para ele.
— Você está com medo?
Ele me solta para dar um passo trás, sua atenção em sua mão enquanto
estica a gravata listrada preta e branca.
Cerro os dentes. Merda, eu quero que ele seja dono de seus sentimentos,
não que os puxe de volta e os esconda. Abro minha boca para dizer isso,
mas seus olhos seduzem os meus e esqueço de respirar.
Naquele momento… meu Deus, parece uma vida inteira em construção.
Suas mãos enrolam o meu pescoço, me puxando para um beijo tão intenso
que me toca em todos os lugares. Segundos parecem ser horas. A carícia de
sua mão rouba a força dos meus joelhos. No momento que ele oferece a
língua, uma corrente elétrica corre solta pela minha pele. Seu gemido suave
vibra na minha boca, provocando uma pulsação quente entre as minhas
pernas. E sua resposta…
— Sim. — Suas mãos seguram meu pescoço, de um jeito confortável e
possessivo, seus beijos abrindo um caminho trêmulo até minha orelha para
falar. — Eu estou com medo.
Meus dedos encontram o cabelo dele, puxando sua boca de volta para a
minha.
— Medo do quê?
— Ser pego. — Ele nos vira, pressionando minhas costas na parede e
sussurrando entre as lambidas drogadas pelo meu lábio. — De ir para a
cadeia.
Eu quero discutir, mas não tenho voz, não tenho fôlego, só a boca
pecaminosa dele e o suporte de seu peitoral forte contra o meu.
Ele mexe a cabeça, entrelaçando nossas línguas, mais fundo e mais
rápido, e flutuo nas correntes térmicas que se contorcem entre a gente. A
costura da minha calcinha parece molhada e a temperatura do meu corpo
aumenta para níveis febris. O algodão da minha camisa e o elástico do meu
sutiã formigam e apertam minha pele. Eu quero tirá-los.
— Estou com medo de machucar você. — Ele mexe a cabeça para a
direção oposta, um ângulo novo, comendo minha boca como se ele não
pudesse alcançar fundo o suficiente. —Mas eu não vou parar, Ivory. —
Outro beijo faminto. — Você é minha.
Uma sensação de pertencimento enche meu peito. Parece tão grande,
cheio e muito bom para ser verdade. Eu não sei se posso confiar nisso.
Enquanto hesito, seu calor e sua força desaparecem, me deixando bamba na
parede.
Ele agarra meu pulso e me puxa para frente dele no corredor, me
conduzindo para a frente. Eu tento um passo instável, mas ele está atrás de
mim, seus dedos fortes deslizando pela minha cintura e pelo meu quadril até
chegar nas minhas coxas.
Sua boca traça a linha do meu ombro e mordisca ao longo do meu
pescoço. Ele para na minha orelha, seu tom rouco.
— Último quarto à direita.
Com uma respiração incerta, eu ando na frente. Seus passos me seguem
de perto e não posso deixar de esticar meu pescoço para segurar seu olhar
aceso. Quando alcanço a porta, eu me viro e volto, minha atenção
paralisada por todas as emoções sem nome que endurece a expressão severa
dele.
Eu deveria estar ansiosa. Deveria estar morrendo de medo. Mas ele não é
Lorenzo ou Prescott ou os incontáveis outros que me fazem querer morrer.
Emeric me fez me sentir mais viva essa noite do que eu jamais me senti em
dezessete anos.
Minha visão periférica vê uma cama, alguns móveis, bastante cinza e
preto. O quarto dele? Eu não olho ao redor, não desvio meu olhar do
homem que está pondo em risco sua carreira e sua liberdade para estar
comigo.
Ele se aproxima, sua proximidade esmagadora me perseguindo por trás,
devagar e sem fôlego, aprofundando no quarto. Ele fará suas perguntas
agora? A verdade irá fazê-lo ter repulsa a ponto do ódio? Houve tão poucas
pessoas na minha vida que acreditaram em mim. Não suporto pensar em
perder esse olhar protetor no rosto dele.
Ele pega minha cintura e me puxa para ele, sua voz baixa e gutural.
— Você não faz ideia do que isso faz comigo.
— O quê?
— O jeito como você me encara como se eu valesse mais do que… —
Ele olha ao redor do quarto. — Uma extravagante casa.
Um rubor surge em minhas bochechas. O que ele está dizendo? Porque
eu sou pobre, eu deveria estar chocada e de boca aberta com as coisas dele?
Eu me importo mais com ele do que todo o dinheiro no mundo. Mas talvez
eu não devesse. Talvez ele ache que eu seja uma adolescente apaixonada.
Estreito meus olhos.
— A modelagem neste lugar… está em todo lugar. Desenhos recortados
no teto do quarto, painéis quadrados nas paredes e trilhos de cadeiras
percorrem todo o comprimento do hall. Eu poderia arrancar tudo e penhorar
enquanto você está…
— Malcriada. — Seu lindo rosto se abre em um sorriso enquanto ele me
leva para a borda do colchão.
Ele me deixa ali antes de ir para a cômoda e esvazia os bolsos enquanto
sou atingida com uma dose da realidade. Eu estou no quarto do sr.
Marceaux. Sentada na cama dele. Vendo-o fazer coisas, coisas pessoais em
seu espaço pessoal, que nenhuma outra pessoa da escola já testemunhou.
De costas para mim, ele coloca a carteira e as chaves em um prato de
madeira. Seu celular e relógio mecânico em seguida. O colete cai em cima
das costas de uma cadeira de couro macio, seguido pela gravata.
Quando suas mãos caem em seu cinto, minha respiração acelera.
Ele se mexe para me ver, seus dedos abrindo a fivela devagar.
— Chegou a hora de abordar o assunto que temos evitado.
Minha barriga embrulha e uma onda vertigem me arrepia.
Ele desliza o cinto, enrolando-o e colocando-o na mesinha de cabeceira
próximo da cama.
— Sem mentiras. — Ele junta as mãos atrás das costas, os ombros
quadrados esticando a camisa branca em seu peitoral e o olhar endurecedor.
— Omitir é o mesmo que mentir.
Merda! Fecho meus olhos com força. Merda, merda do caralho.
— Ivory.
Abro os olhos e o encontro me estudando. Claro que ele está. Sempre
observando. Sempre vendo demais. Mordo meu lábio. Isso não vai acabar
bem.
— É provável que eu vá perder a calma de novo. — Ele olha para os pés,
sorrindo para si mesmo. — Já que eu não consigo controlar meu
temperamento no que diz respeito a você. — Ele olha para cima através de
um véu de cílios grossos. — Lembre-se do que eu disse sobre isso.
Minhas sobrancelhas se contraem enquanto penso.
— Você nunca bateu em uma mulher com raiva?
— Boa garota.
Meus pulmões se expandem, respirando essas palavras.
Ele se ajoelha na minha frente, seu peitoral tocando nos meus joelhos
fechados e suas mãos no meu quadril.
— Eu sei que você precisa de dinheiro e deduzi que Prescott e Sebastian
pagam você. — Seus olhos brilham com raiva. — Fale como e quando os
acordos começaram.
Eu quero acariciar o rosto dele, mas o ângulo faz com que a estrutura do
seu osso de repente pareça pontiagudo e intocável. Então, ponho minha
palma na testa acalorada dele, onde descansa junto da minha coxa.
— Eu vou dizer a você, prometo. Mas o que vai acontecer com a minha
educação e Leo…
— Leopold é irrelevante. Isso não é uma reunião aluno-professor. — Ele
se mexe, agarra a bainha da minha saia e empurra pelas minhas coxas até
ficar logo abaixo da calcinha.
Mantenho meus joelhos juntos, mas não luto com ele.
— Isso é sobre você e eu, Ivory. — Seus dedos deslizam embaixo do
tecido acumulado, traçando a fenda escondida entre as minhas pernas e
quadris. — Somos apenas um homem e uma mulher compartilhando de um
momento íntimo de honestidade.
Eu gosto do som disso quase tanto quanto do suave toque de seus dedos.
Um longo silêncio se estende entre nós, durante o tempo no qual não é
contado ou pesado. Por fim, seu carinho me acalma o suficiente para eu
falar.
— No primeiro ano, eu estava desesperada para fazer amizades e me
encaixar, então ofereci ajuda com o dever de casa de algumas pessoas. —
Suor escorre das minhas palmas e aperto elas na dobra das minhas coxas
nuas. — Só os garotos aceitaram. Prescott e seus amigos. Em algum
momento no primeiro ano, minha tutoria virou eu fazer o dever de casa para
eles.
— E o que eu vi no carro?
— Eles tocavam, beijavam e pegavam coisas que eu não queria dar.
Emeric se levanta, as mãos passando pelos cabelos e uma sinfonia
violenta se choca e vibra em seus olhos.
— Eles pegavam coisas… — Ele deixa os braços caírem e flexiona seus
punhos nas laterais. — Explique isso.
Explico como ameacei parar de ajudá-los, como eles ofereceram para me
pagar se eu continuasse e como eu estava desesperada pela renda para
manter minha casa. No momento em que cheguei a parte sobre eles
pegarem mais do que o dever de casa, Emeric está andando furioso pelo
quarto.
Se ele vai se desestressar, tem espaço para fazer. Quero dizer, é o maior
quarto que eu já vi e com nada no chão para fazê-lo tropeçar. Para um
homem, ele é surpreendentemente arrumado.
E para uma garota que está dentro da jaula com o leão caminhando, é
estranho como me sinto desprendida. Até livre.
Por fim, expressar essas coisas é libertador e ele absorve cada palavra
como se estivesse vivendo, sentindo. Sim, ele está bravo, mas não
direcionou para mim. Ele se importa o suficiente para estar com raiva por
mim.
Ele para na minha frente, seu rosto vermelho como suas juntas inchadas.
— Você disse não para eles?
Direcionando meu olhar para seu Dr. Martens, eu aceno com a cabeça.
— Por um tempo.
— Defina um tempo.
— Os primeiros dois anos.
— Eles te estupraram. Por anos. — Sua voz mordaz se torna um berro.
— Olhe para mim!
Meu olhar pula para o dele. O horror gravado em seu rosto faz meu
coração bater tão forte que dói.
Como explico essas coisas vergonhosas quando nem eu estou certa sobre
nada disso?
— Eu não sei.
— Não tem eu não sei sobre isso, Ivory. — Ele pega na parte de trás do
pescoço com as duas mãos e anda em um pequeno círculo. — Ou você
estava disposta ou não estava. Qual é?
— Às vezes eu me sentia presa pelas circunstâncias. Às vezes, eu era
pressionada. Outras vezes, eu só deixava acontecer.
— Você só deixava acontecer — ele repete com veneno. — Besteira!
O estrondo do seu grito me atinge no ombro. Ele gira e bate seu punho na
parede, arrancando um suspiro da minha garganta.
Eu pulo da cama, abaixando minha saia enquanto me aproximo por trás
dele com cautela.
— Emeric.
Ele abre outro buraco e outro, seus braços flexionando e contraindo com
o impacto ao mesmo tempo que poeira e pedras explodem ao redor dele.
— Emeric, pare!
Respirando pesadamente, ele apoia o antebraço na parede e descansa a
testa no braço, posicionando a cabeça para olhar para mim.
— Qual desses filhos da puta tirou sua virgindade?
— Ninguém no Le Moyne. — Dou um passo para mais perto, ao alcance
do seu braço. — Eu já estava… — Usada. Arruinada.
Ele me alcança e me puxa contra si, me prendendo entre seu peitoral duro
e a parede.
Sangue e poeira cobrem os nós da mão que ele levanta gentilmente para
acariciar minha bochecha.
— Tem mais que você não está contando.
Mais homens que pegaram. Mais verdades para compartilhar. Eu contarei
tudo a ele, porque ele não me afastou, em nenhum momento me olhou com
repulsa.
Ele descansa sua testa na minha, os dedos descansando em minha
bochecha e diz com pressa:
— Eu queria te chicotear por ser tão malditamente desinformada sobre
estupro.
Mas eu estou aprendendo sobre as diferenças, assim como em quem
confiar e a quem pedir ajuda. Sempre achei que o lugar mais seguro para ir
fosse na minha cabeça, que ninguém poderia me machucar ali. Mas parada
entre a parede quebrada e o homem fumegante que a destruiu, eu nunca me
senti mais segura.
Eu seguro sua mão no meu rosto e encontro seu olhar apaixonado.
— Eu confio em você.
Todos os meus segredos nojentos enfim me alcançaram. Mas pela
primeira vez na vida, não tenho que encará-los sozinha.
25

Emeric

Meu autocontrole é uma maldita piada e parte imperturbável do meu


cérebro está perdido nas imagens de Ivory encurralada, machucada e
sozinha. Minhas mãos tremem enquanto estou à beira da brutalidade
maníaca, consumido pela dor de cabeça que só pode ser confortada com
derramamento de sangue.
Eu sabia que havia abuso sexual, mas parte de mim acreditava que estava
no passado como se tivesse sido um singelo momento horrível na vida dela.
Eu nunca imaginei que fosse anos de estupro.
Quantos filhos da puta eu vou ter que matar? E enquanto eu estou
matando os pesadelos dela, como irei me parar de virar o pior de todos?
A visão de Ivory sobre sexo provavelmente está danificada pra caralho.
Como ela irá responder ao sexo comigo? Ela irá congelar? Estou
pressionando-a muito rápido? O que diabos eu faço agora, devo fazer
alguma coisa, em relação ao nosso relacionamento?
Meu coração bate alto, rápido e meus músculos expandem com a direção
dos meus pensamentos.
— Ei. — Ela segura minha mão machucada em sua bochecha. — Você
está ficando todo tenso de novo.
Eu acho que ela é mais maluca do que eu. Ela não se encolhe ou tenta
colocar uma distância segura entre a gente. Ao invés disso, ela me dá um
sorriso gentil e me olha com seus grandes olhos castanhos cheios de
confiança.
Sim, eu trouxe Ivory para minha casa para mantê-la segura, mas ela não
tem ideia de como estou perto de estourar. Meu corpo inteiro treme para
curvá-la e fodê-la com tanta força que eu serei tudo o que ela irá se lembrar.
E isso irá destruí-la.
Dou um passo para trás e aponto um dedo trêmulo em direção a cama.
— Sente.
Ela desamarrota a saia e segue minha ordem, olhando de forma nervosa
para o cinto na mesinha de cabeceira.
Minha palma está quente e dolorida, meu braço enrijecendo para balançar
aquele cinto. Menos por causa da raiva e mais porque estou desesperado
para colocar toda essa merda para trás e passar o resto da noite levando-a ao
êxtase orgástico.
Mas não é como se eu pudesse ir até ela com um cinto na mão. Isso
acabaria com sua confiança. Eu tenho que ensiná-la que há uma maneira
para uma dor melhor e mais significativa do que a que ela experimentou. O
tipo disposto.
Para fazer isso, tenho que me recompor.
Com respirações controladas, tiro um momento para desfrutar da beleza
dela, absorvendo seu perfeito nariz arrebitado, a pele morena e os cabelos
escuros brilhantes. Mas é a ousadia em seus olhos, a força no sorriso e o
poder da aura que me acalmam. É impossível não gravitar em torno dela, de
não ficar cativado pela graça e tenacidade que ela emana.
Olhando para ela, percebo com uma clareza surpreendente que ela não
precisa que eu mate seu passado. Ela já viveu isso e saiu do outro lado com
mais coragem que qualquer outra pessoa que eu conheço.
Mas ela precisa que eu a escute, que a apoie sem perder a cabeça e acima
de tudo, que a proteja de se machucar no futuro.
Com um pulso mais estável e a dor de cabeça diminuindo, me junto a ela
na borda da cama, meus pés ao lado dos dela no chão. Curvando-me sobre
seu colo, alcanço seus tornozelos. Sempre odiei seus sapatos colados desde
o primeiro dia de aula quando os coloquei em seus pés. Eles não são bons o
suficiente para ela e vê-la andando por aí neles semana após semana, me faz
querer dar a ela cada centavo que eu tenho.
Empurro as pequenas sapatilhas pretas de seus calcanhares e deixo cair
no chão. Se ela soubesse quantos substitutos tamanho trinta e seis eu
comprei para ela. Todo o maldito closet atrás de mim está preenchido não
só com sapatos, mas roupas e bolsas e… Cristo, eu pareço com um
psicopata até na minha cabeça.
Eu nem gosto de fazer compras. Odeio pra caralho. Mas nas últimas
cinco semanas, foi a maneira mais inofensiva que encontrei para canalizar
minha obsessão inapropriada por ela.
Colocando-a de lado em meu colo, subo no colchão e me recosto na
cabeceira da cama.
Com meus braços envolvidos ao redor de seu corpo delicado, acaricio as
costas dela.
— Me fale sobre sua primeira vez. Quantos anos você tinha?
Ela recosta a bochecha no meu ombro, sua voz hesitante.
— Você primeiro.
Um indignado me responda surge em minha garganta, mas engulo, me
lembrando que honestidade é recíproco.
Beijo sua testa.
— Eu tinha 16 anos. Ela também. Uma namorada de verão. Foi… —
Doce. Estranho. Baunilha. — Tranquilo. Terminamos pouco tempo depois.
Ela mexe com o botão da minha camisa debaixo do queixo.
— É estranho que eu queira caçá-la e arrancar fora os olhos dela por ter
tido uma primeira vez tranquila?
Uma risada irrompe do meu peito e flexiono minha mão inchada no colo
dela.
— Se isso é maluco, eu devia ser internado. — Por ser descontrolado,
insano e violentamente protetor com essa garota.
Ela ri baixinho, seus dedos traçando círculos ao redor da bagunça que
estão meus dedos.
— Eu quero limpar sua mão.
— Quando tivermos terminado.
Posicionada de lado no meu colo, ela se inclina no meu peitoral e prende
um braço ao redor das minhas costas, pressionando seu rosto no meu
pescoço como se quisesse me manter próximo.
Eu não estou indo a lugar nenhum.
— Eu tinha 13 anos na minha primeira vez.
Fecho meus olhos e lembro de respirar.
— Foi o amigo do meu irmão quem fez isso, atrás da minha casa, na
escada.
Fervo. Caralho, cada poro no meu corpo queima. O irmão dela é nove
anos mais velho. Se o amigo for da mesma idade, aquele pedófilo nojento
doente tinha 22 anos quando fodeu o corpo de 13 anos dela.
Ficar ali sentado segurando Ivory no meu corpo e não explodir em um
ataque de fúria estrondoso e furioso é tudo o que eu posso fazer.
— A idade dele?
Ela se mexe para mover para cima do meu peitoral e passar os braços por
cima dos meus ombros, descansando a testa do lado da minha.
— Mesma idade que você.
Eu sei que estou a apertando com muita força quando ela chia e enfia as
unhas no meu pescoço. Perguntas se acumulam em meio às vibrações de
rosnados na minha garganta, mas não tenho a possibilidade de formar sons
sofisticados agora, muito menos palavras.
Ela acaricia meu ombro como se estivesse confortando um maldito
cachorro raivoso.
— Eu disse para ele não, lutei contra ele, odiei aquilo. Eu sei o que isso
significa agora, mas eu não entendia naquela época.
— Ivory.
— Só me deixe terminar. — Ela se afasta do meu peitoral, encarando a
porta do banheiro da suíte ao mesmo tempo que seus dedos brincam com os
botões da minha camisa. — Depois que aconteceu, eu fiquei muito
perturbada na cabeça. Eu deixei qualquer um e todos fazerem sexo comigo
como se eu estivesse tentando provar para mim mesma que eu não era
fraca. Eu não queria chorar por isso. Eu queria ser capaz de dizer “eu
decidi, eu estou fazendo isso”. E ele e ele e…
— Quantos? — resmungo com os dentes cerrados.
Ela pisca e balança a cabeça. Quando ela balança de novo, seus olhos
brilham com as lágrimas.
— Não funcionou da forma como eu queria.
— Pare com essa choradeira e me fale quantos eles houve.
Sua mandíbula enrijece e ela nivela seu olhar encharcado de lágrimas.
— Eu não sei, está bem? Sessenta? Oitenta? Talvez mais? Eu não fico
contando porque não quero saber!
Minha barriga endurece. Porra, eu sou dez anos mais velho do que ela e
sessenta é o dobro do número de parceiras que eu já tive. E esse é o menor
número dela.
Sua atenção se volta para o banheiro.
— Vá em frente e diga. Que eu sou uma vagabunda. Uma vadia nojenta.
Pego o queixo dela com um forte aperto e levanto o rosto dela até o meu,
minha voz áspera.
— Jamais coloque palavras na minha boca.
Quando eu a solto, ela puxa os joelhos entre nossos peitos, sua bunda
dura cavando minhas coxas onde se senta de lado no meu colo. Suas pernas
se contorcem para se juntar ainda mais olhando o banheiro de novo. Meu
primeiro pensamento foi que ela precisava fazer xixi. Mas dada a conversa,
eu sei que tem algo a mais acontecendo.
Prendo o cabelo dela atrás da orelha e traço meu dedo pelo pescoço dela.
— Prescott… Tocou em você ou fez sexo com você essa noite antes de
eu chegar?
Ela abraça os joelhos, sua expressão dura.
— Não.
Eu não achava, mas ser pega naquela posição deve ter sido humilhante
para ela.
— Então me fale porque você está encarando o banheiro.
Seus cílios varrem para baixo.
— Eu gostaria muito de… de tomar um banho.
— Por quê?
— Eu sou suja — ela sussurra.
Meus dentes cerram. Vai levar uma grande quantidade de tempo e
paciência para reparar a dignidade dela, e eu vou começar neste maldito
momento.
— Você sabe o que aconteceu no momento que arranquei Prescott para
fora daquele carro? Eu afirmei propriedade sobre você. Sei que você não
sabe o significado disso ainda, então vou simplificar. — Agarro seu pescoço
e mantenho seu olhar. — Você é minha. Isso significa que cada maravilhoso
centímetro do seu corpo, cada pensamento em sua cabeça e cada palavra
que sai da sua boca me afeta. Se chamar de suja ou qualquer outro adjetivo
ofensivo é um insulto à minha garota, algo que não irei tolerar. Fale que
entendeu.
Seu pescoço relaxa na minha mão, seus olhos redondos e penetrantes.
— Entendi.
Linda pra caralho.
Solto seu pescoço e toco na junção dos seus joelhos fechados.
— Separe suas pernas.
O corte justo da saia não permite muito, mas eu só preciso de espaço
suficiente para minha mão.
Ela olha para os meus dedos e seus olhos grandes vão para os meus. Seja
lá o que viu em meu rosto, suaviza as expressões de preocupação no rosto
dela. Os braços caem para suas laterais e a cada respiração ela separa os
joelhos.
Porra, eu anseio por despi-la para saborear cada gloriosa curva e
mergulhar em seu corpo. Seremos tão selvagens juntos, agarrados e
imprudentes, desarrumados e bêbados pelo prazer. Sinto a promessa dessa
agitação no ar entre nós, sacudindo minhas pernas debaixo da bunda dela e
fluindo na minha palma ao deslizar os dedos pelo interior da coxa dela.
Quanto mais fundo eu alcanço embaixo da saia dela, mais quente e mais
úmida é sua pele. Observo sua expressão por sinais de pânico e me
aproximo de sua boceta.
A centímetros do meu destino, afago sua coxa, provocando-a.
— Eu não vou apagar seu comentário de auto-ódio com palavras
floreadas como você é bonita, atraente e perfeita, porque eu suspeito que
você ouviu tudo isso, muito provável que falado entre respirações pesadas
que a assombram quando você dorme.
Seu lábio de baixo treme, o resto do corpo imóvel e rígido.
— Em vez disso, vou mostrar exatamente como você não é suja. — Toco
a costura da calcinha.
Cetim úmido encontra meus dedos e meu pau empurra o quadril dela.
Cristo, eu quero essa garota. É essa a sensação de inchaço e comprimido na
base da minha coluna que fazem minhas coxas e minhas bolas apertarem.
Não sei como vou me parar de pegar dela assim como qualquer outro
babaca selvagem logo que me livrar das barreiras entre nós.
Seu olhar se prende ao meu enquanto aperta meu antebraço, não me
afastado, mas deslizando os dedos pelo comprimento do músculo como se
sentisse a maneira que se move.
Viro meu pulso e prendo um dedo debaixo da borda de cetim entre a
perna e a boceta dela. Com um movimento longo e devagar, deslizo meu
dedo para a abertura do clitóris dela, separando sua carne e saboreando a
sensação de cabelos curtos e macios. Ao deslizar uma e outra vez, ela vai
ficando mais molhada. Sua boceta incha, suas pernas tremem e eu me
emociono pra caralho com a ideia de dar a ela o prazer em uma forma que
ninguém fez antes.
Ela planta os pés no colchão, agarrando-se ao meu braço com as duas
mãos. Seus grandes seios levantam e caem ao sedutor som de sua respiração
que persegue o silêncio do quarto.
Seus lábios entreabertos, a flexão de sua bunda no meu quadril e a
sensação de sua excitação cobrindo meus dedos me excitam de maneiras
que nunca conheci. Isso atinge muito mais do que a rígida pressão entre as
pernas. Ela está nas minhas veias, ardente e sem peso. Ela está na minha
cabeça, como um sussurro de promessas. Ela está no meu coração,
suavizando-o, consertando-o e fazendo-o bater de novo.
Removo a mão e levanto até a minha boca. Mantendo seu olhar, chupo
cada dedo, devagar e deliberadamente.
— Você tem um gosto sujo, Ivory. No sentindo mais agradável, delicioso
e viciante da palavra.
Seu queixo cai em um suspiro silencioso. Ela fecha a boca para abrir de
novo, mas eu a interrompo com um beijo. Minha mão desliza pelo seu rosto
e cabelo, segurando-a em mim enquanto caço sua língua, pegando-a e
enroscando-a com a minha. Ela me segue, as mãos presas no meu cabelo e
gemendo em minha boca, lambendo seu sabor da minha boca.
Necessidade serpenteia aos poucos e aperta meu corpo. A estrutura da
cama range sob o beijo profundo que dou nela, puxando-a para mais perto,
buscando por ela com os dedos e dentes, silenciosamente exigindo que ela
pegue tudo o que estou oferecendo, porque é tudo para ela. Eu sou dela.
Ela mexe os lábios sob os meus, sua voz rouca.
— Caramba, você… você sabe mesmo como beijar.
Sua sedutora respiração esculpe espaço nos meus pulmões e com cada
uma de suas pequenas respirações, aquele espaço fica cada vez mais cheio.
Quando ela pigarreia, escuto sua pergunta na respiração que segue. E
agora?
Eu tenho mais perguntas, mais do que existem nos minutos restantes da
noite. Mas ela não comeu, exaustão pesa muito nas pálpebras e nós não
vamos sair deste quarto enquanto ela não aprender uma lição crucial.
Com grande relutância, tiro ela do meu colo para colocá-la na cama. Seu
olhar cai de imediato na barraca na minha calça. Ela também pode se
acostumar com isso.
Eu me levanto e pego meu comprimento rígido, forçando-o para a lateral
da calça.
— Várias semanas atrás, você disse que não queria ser amarrada e
amordaçada, e o que mais você acha que essas coisas acompanham. —
Alcanço o cinto e dobro ao meio, segurando firme na pontas. — Mas você
pensou sobre isso.
Ela encara o cinto de couro e esfrega as mãos no colo.
— Eu… eu não me importei com as palmadas.
— Essa é uma meia verdade. Tente de novo.
Frustração enruga sua testa.
— Tudo bem, eu gostei. Mas isso não faz sentido. Foi humilhante e
doloroso.
— Defina doloroso.
— Foi… Eu não sei. Deveria ter me assustado. Em vez disso, só me fez
me sentir quente e confusa por toda parte. Talvez seja porque você não me
assusta. Porque eu… eu gosto… — Ela lança o olhar para as mãos.
— Olhe para mim.
Ela o faz, seu dente serrando o lábio.
— Eu gosto de você. Você me faz querer coisas que eu nunca… — Ela
muda o olhar antes de rapidamente retornar para mim. — Eu quero suas
palmadas, beijos e… mais.
— Boa garota. — Debruçado sobre sua posição dobrada, eu pego seu
queixo com minha mão livre e beijo sua boca.
No momento que nossas línguas se conectam, fico perdido no deslizar
sem rumo e sensual de nossos lábios. Ela é uma fantasia em carne e osso,
livre de convenções, vibrando em minhas mãos e implorando para ser
direcionada.
Eu me endireito e dou um passo para trás.
— A dor que você experimentou com os outros homens… Aquilo foi
inaceitável, Ivory, porque não foi consensual. — Pontuo cada sílaba em um
tom severo. — Você não é a culpada. Você nunca vai se culpar. Diga sim se
você entendeu.
Ela se senta mais alto, seu queixo levantando mais.
— Sim.
Aquele brilho de confiança na postura dela faz maravilhas para o meu
ego. Estamos fazendo progresso e, caramba, aquilo me faz ficar duro como
uma rocha…
Expando minha postura, o cinto dobrado pendurado do meu lado.
— Assim como a palmada, vou mostrar uma dor boa. O tipo de dor que
você controla. Você terá todo o poder aqui, porque no momento que disser
não…
Seus ombros se endurecem, um lembrete que aquela palavra na
experiência dela é uma filha da puta inútil.
Uma nova explosão de raiva esquenta meu sangue. Passo a mão pelo
cabelo e respiro fundo.
— Esqueça isso. Me dê uma palavra que usaria naturalmente no lugar de
não. Algo como…
— Scriabin.
A velocidade que ela fala aquilo me surpreende. E por que um
compositor russo? Enquanto encaro as sombras de seus olhos castanhos cor
de lama, decido que Scriabin é bastante adequado dada a qualidade
conflitante e dissonante de sua música.
Flexiono a mão, meu coração batendo furioso.
— Quando disser Scriabin, eu paro.
Ela examina meu rosto, meus ombros e o cinto na minha mão. Uma cara
feia puxa a boca dela.
— Eu preciso da sua confiança, Ivory.
Ela olha para mim, seus lábios se abrindo.
— Você tem.
— Mostre. — A dor no meu pau se intensifica. — Pés no chão e peito no
colchão.
Quando ela obedece, o aperto nas minhas costelas se afrouxa.
Eu paro atrás dela e traço a dobra do cinto de couro nas suas pernas e ao
redor da bunda. Minhas mãos continuam indo para cima, segurando o cinto
enquanto estendo as mãos dela acima do rosto.
— Fale por que você está sendo punida.
Com os dedos enrolando a colcha, ela descansa a bochecha na cama e
encontra meus olhos.
— Por vender meu corpo.
— Esse não é… — Sinto o tremor da minha indignação até o pé. — Me
escute. Você estava em uma situação desesperadora e aqueles desgraçados
pegaram mais do que ofereceu. Estou punindo você por se colocar dentro
daquele carro em vez de vir até mim.
Ela começa a se levantar, mas eu a prendo com o meu peso, meu peitoral
nas costas dela e o meu pau faminto na sua bunda.
— Mas você é o meu professor — ela diz com calma. — Eu não sabia o
que ia fazer…
— Você também tem Stogie. E a polícia, o serviço social… Você teve
opções.
Seus músculos murcham embaixo de mim.
— Você está certo.
— Certo e puto. Você recusou minha ajuda com os livros, mas aceitou
dinheiro daqueles cretinos. Você não confiou em mim o suficiente, mas
confiou naqueles garotos com acordos arriscados.
Ela acena, sua boca suave em concordância. Mas eu sei que sua mente
deveria estar pensando no futuro, buscando por novas soluções para
problemas persistentes. Traço meus lábios pela mandíbula dela.
— Você é minha, Ivory. Isso quer dizer que seus problemas são meus.
Suas contas, suas preocupações, sua segurança… — Beijo o canto da boca
dela. — Tudo isso me pertence.
Ela solta um suspiro pesado.
Eu me curvo para baixo, passo minhas mãos pelas suas roupas. Seu
ombro esbelto, a curvatura da sua coluna e a elevação da bunda, há tanta
feminilidade para tocar, devorar e bater.
Eu me agacho atrás dela, meus músculos zumbindo com excitação. Com
o cinto na mão, eu a deixo sentir a faixa de couro deslizar sobre a saia até a
cintura. Coxas tonificadas e sardas, bunda empinada e pele cremosa,
arrepios e cetim rosa… é tudo meu. Mas preciso tirar a calcinha.
Enquanto a puxo até os pés e ando para trás, tudo dentro de mim se reduz
a um único instinto. Meu Deus, porra, eu quero estar dentro dela com uma
ferocidade cega, mas eu consigo manter meus pés no chão e minha mão
fora do meu pau.
— Qual é a sua palavra de segurança?
— Scriabin — ela ofega, agarrando a colcha.
A visão que tenho dela curvada faz meu pau balançar dolorosamente nas
calças, quase rasgando o zíper. Ela se toca quando está sozinha? Algum
homem já deu prazer para ela? Eu duvido muito, mas eu preciso da
confirmação, mesmo que me seduza a amarrá-la e fodê-la até quebrá-la.
— Só mais uma pergunta. — Acaricio sua coxa com um dedo e o deslizo
pela carne macia e molhada entre suas pernas. — Você já teve um orgasmo?
26

Ivory

Pressiono meu rosto no cheiro viril da cama de Emeric e forço minhas


pernas bambas de me impedir de deslizar para o chão. Ar fresco roça meu
traseiro e seus dedos… Inferno, os dedos dele deslizam para frente e para
trás nas minhas coxas, produzindo o mais estranho e mais revigorante calor
lá embaixo.
Não consigo pensar em mais nada a não ser o percurso de suas carícias,
todo o meu corpo cantando para ele fazer aquilo… aquilo… exatamente o
que ele está fazendo. Por favor, não pare, não…
Ele para, me segurando com sua grande palma.
— Não vou repetir a pergunta.
Pressiono os dentes no lábio, odiando seu tom grosseiro e impaciente. Ou
talvez ame aquele tom.
— Eu não sei. Eu… Eu me toco de vez em quando. — Eu tentei criar o
muito intenso “Isso mesmo, bem aí!” que as mulheres no meu bairro ficam
falando, mas nunca foi tão bom quanto dizem. — Pode acontecer quando eu
não gosto?
Suas mãos flexionam na minha boceta.
— Todos esses filhos da puta e nenhum deles fez você alcançar um
orgasmo. — Ele relaxa os dedos, acariciando devagar. — Será diferente
daqui para a frente.
A próxima carícia atinge todo o caminho para dentro, me empurrando em
um mundo novo e diferente. Ar sai dos meus pulmões e meu corpo se
contrai em torno da invasão. Meu Deus do céu, isso é tão… indolor. Não é
seco, abrasador ou muito apertado.
Com movimentos de dedos escorregadios, ele enfia de novo e de novo.
Um prazer líquido e indutor de coma percorre meu corpo. Meus mamilos
ficam mais rígidos e minha pulsação enlouquece. Cravo meus dedos dos
pés no tapete enquanto os ruidosos sons do gemido dele impregnam pelo
quarto.
Calor percorre meu rosto. Eu sei que isso é desejo e que ele encontrou o
gatilho misterioso para liberar minha lubrificação natural, para me mostrar
como querer isso. Mas eu estou escorrendo por toda a mão dele. É normal
ser tão bagunçado?
Ele se agacha, enterrando seus dedos dentro de mim enquanto sua outra
mão arrasta o cinto pela minha coxa. O couro balança contra mim como sua
respiração. E sua voz.
— Molhada pra caralho.
— Sinto muito. Eu não sei por que…
— Não — ele rosna, mergulhando os dedos para dentro e para fora,
massageando e esfregando com muito controle. — É assim que se sente ao
ser cuidada, ao receber prazer de alguém que quer dar desesperadamente.
— Seus lábios roçam minhas coxas. — Eu sei como tocar na minha garota.
Ele sabe como ser ambos, lânguido e masculino e como me persuadir a
me render só com o poder das forças de suas palavras. Eu nunca estive com
alguém tão poderoso e confiante que também pode permanecer calmo o
suficiente para me tocar desse jeito.
Seus dedos deixam meu corpo e o calor dele desaparece. Viro meu corpo
e pego um vislumbre de profundos olhos marinhos enquanto ele se endireita
e passa a mão molhada pela boca.
Essa é a segunda vez que ele me provou. É obsceno e ainda assim
fascinante, tudo ao mesmo tempo.
Ele anda para o lado.
— Não mexa as mãos.
Enrolo meus dedos nos lençóis acima da minha cabeça ao mesmo tempo
que o ar assobiava atrás de mim. Um golpe ardente pousa na minha bunda e
eu não posso impedir que minha mão voe para trás para esfregar a dor.
Mas a boca dele já está lá, selada sobre o ataque quente, chupando e
lambendo. Ele agarra meu pulso, prendendo no colchão enquanto seus
lábios transformam a dor em algo completamente diferente. O varrer de sua
boca afugenta o ardor, deixando um tipo de formigamento viciante na
minha pele.
Talvez seja porque ele passou muito tempo me tocando primeiro, me
suspendendo em um estado de superestimulação, mas eu não me acovardo
quando ele fica de pé para golpear de novo. Meu corpo já está zumbindo
como um viciado. Eu quero mais.
Exceto que ele não bate. Ele se afasta da cama com passos determinados
e desaparece dentro do closet. Que merda é essa?
Um segundo depois, ele sai com uma mochila preta e a abre na cama ao
lado da minha cabeça. Algemas de couro caem no colchão seguido por
faixas de náilon.
Meu coração bate tão alto que é possível abafar uma orquestra.
— Pra… pra que é isso?
Ele desenrola a faixa, agachando-se enquanto as prende na estrutura da
cama.
— Se você tivesse mexido a mão um segundo mais cedo, o cinto poderia
ter partido seus dedos. Talvez até quebrado. Vamos fazer isso sem por sua
carreira de pianista em risco.
Fala o homem que socou a parede.
Ergo as sobrancelhas e aponto para as juntas de suas mãos machucadas.
— Quando é a sua próxima apresentação na orquestra?
— Em duas semanas. — Ele estica a mão inchada para dar umas
palmadinhas na beirada da cama. — Braços aqui.
— Você vai me amarrar?
— Eu vou protege-la. — Ele abre a primeira algema de couro. — Isso ou
sua palavra de segurança. Decida.
Eu penso em mim mesmas nessas amarras, presa e incapaz de escapar
quando ele golpear minha bunda, beijar para afastar a dor e me fazer o
centro de seu universo. Ele não está me forçando. Ele está me empoderando
com uma escolha, com uma oferta para me levar para algum lugar excitante
quando ninguém mais se preocupou.
Eu recosto minha bochecha no colchão e estico meus braços acima da
cabeça.
— Sua confiança é intoxicante. — De súbito, as mãos deles estão em
meu rosto, inclinando minha cabeça enquanto sua boca cai na minha.
Derreto sob a reivindicação dos lábios deles. Esse beijo é mais exigente
que os antecessores, mais faminto e letal, sua língua entrelaçando com a
minha e seu forte maxilar arranhando minha pele em uma queimadura
deliciosa.
Ele rompe o beijo e volta para as algemas, ligando-as as faixas e
prendendo-as em volta dos meus pulsos. Seus dedos se movem habilmente
nas fivelas e travas.
Quantas vezes ele já fez isso? Com quantas mulheres?
Com o meu passado, eu não estou em posição de estar com ciúmes, mas
isso não impede a dor dilacerante na minha barriga.
Seu toque me tira dos meus pensamentos. Ele está aqui comigo, traçando
arrepios pelos meus braços ao assegurar as algemas.
Ao terminar, ele se mexe para ficar atrás de mim, mãos em meus quadris
puxando minha bunda para suas coxas. As faixas pressionam com o
movimento, as algemas segurando minhas mãos acima da cabeça.
Porém, eu não me sinto presa ou pressionada. Eu me sinto ancorada. A
ele.
O cinto dobrado balança no meu perímetro antes de um novo golpe arder
minha bunda. Ele provoca o golpe com toques suaves e seus lábios se
juntam, beijando e apaziguando a dor persistente. Então bate de novo.
Bate, massageia e beija. Eu não sei quantas vezes ele repete esses passos.
Em algum momento, entro em um transe maravilhoso, me perdendo em
algum lugar flutuante onde só tem ele, eu e a harmonia das nossas
respirações.
É assim que eu deveria me sentir quando duas pessoas se encontram,
dispostas e desenfreadas. Como seria o sexo com ele? Eu não consigo nem
imaginar. A conexão emocional por si só poderia explodir meu cérebro.
Ele cobre o calor no meu traseiro com carícias e beijos, acendendo um
sentimento enorme dentro de mim. O ponto sensível entre minhas pernas se
manifesta e pega fogo, energizando minhas terminações nervosas e se
expandindo para partes do meu corpo que eu nem sabia que existiam.
Alguma coisa está vindo, alguma coisa maravilhosa, mas antes que a
sensação atinja o ponto de ruptura, ele dá um passo para trás para golpear
de novo.
Repetidamente, ele me traz para mais perto da borda, me queimando com
mais desejo e me provocando com um golpe de cada vez.
Quando os golpes quentes e toques afetuosos param de vez, gemo na
colcha.
— Você acabou?
Sua gargalhada pesada o segue ao redor da cama onde ele se curva para
soltar as algemas. Estou muito mole e sem peso para me mover. Mas minha
boceta pulsa com o vazio, apertada e encharcada além do constrangimento.
Eu não me importo. Eu preciso… preciso…
— Por favor.
Subindo na cama, ele me gira de costas e monta no meu quadril. Sua
ereção está bem ali, tentando abrir um buraco na minha calcinha. Mas ele
não a libera ou olha para ela.
Ele pesa o suficiente para me esmagar, mas seus quadris se contraem ao
meu lado, sustentando seu volume. Seu olhar se abaixa para a minha
camisa, agarrando-a e rasgando. A minha camisa mais bonita. Mas o olhar
em seu rosto me faz esquecer o motivo para me importar.
Seus lábios se separam com a força da respiração e seus olhos me
percorrem como um vasto oceano, pesado e fundo, me afogando em
admiração.
Homens já sentaram em mim daquele jeito, mas apenas durante lutas
onde meus braços estavam balançando e meus quadris resistindo. Ninguém
jamais me montou em uma posição tão vulnerável sem forçar e pegar. E de
calça.
Ele pega o cetim branco do sutiã da minha mãe, o tecido muito pequeno
para cobrir por completo meus seios. Com um gemido, ele puxa as taças do
sutiã para debaixo dos meus seios, expondo-os.
— Se você soubesse quantas vezes eu imaginei isso nos últimos meses,
como pareceriam, qual seria o sabor, como ficariam amarrados em cordas…
— Eu imaginei você também. — Levanto a mão para alcançar o
comprimento duro embaixo das calças dele.
Ele pega meu pulso e se mexe, seu peitoral sob o meu e sua voz gutural.
— Se você me tocar, não vou resistir. Estou me contendo por pouco.
Parte de mim quer ver como ele se parece quando se solta. Mas eu prefiro
ceder à minha curiosidade e saber para onde ele está levando isso e deixá-lo
liderar.
Com uma mão trêmula, ele traça a borda extrema do meu seio. Sua outra
mão se emaranha em meu cabelo enquanto ele se inclina e prova meu lábio.
Eu amo o sabor de canela na língua dele. É tão exclusivo dele, só uma
das milhares de coisas que o distingue de todos os outros. Quando estou
com ele, os machucados dentro de mim se escondem. Ou talvez
desaparecem. Não consigo senti-los ou sentir o medo que eles provocam.
Por quê? Por ser tão protetor? Por ser dolorosamente carinhoso mesmo
quando está me punindo?
Ele é um profundo poço de descobertas e espero que ele me dê o tempo e
a permissão para aprender tudo sobre ele.
Ele sai de cima dos meus quadris para se deitar do meu lado, me
encarando. A mão em meu cabelo prende com mais força e seus lábios
ficam nos meus, cada mordida e enrolar de língua causando um arrepio
elétrico no meu corpo.
Sua mão livre desce para minha garganta, traçando um caminho entre
meus seios, por cima da minha barriga e mergulha entre minhas pernas. Eu
arquejo contra sua boca, meus dedos agarrando seus ombros.
A posição do dedo dele me atordoa e pulsa na pressão diabólica que ele
esfrega em mim. Ele enfia um dedo e depois dois dentro de mim, me
fazendo contorcer na mão dele, minha pele queimando e exposta sob o
olhar dele.
Eu devo parecer ridícula com minha saia enrolada na cintura e meu sutiã
pequeno demais empurrado para baixo dos meus seios. Mas ele não parece
se importar.
Ele lança olhares para meus seios nus, mesmo com sua boca se
banqueteando dos meus lábios. Eu odeio meu busto, mas amo como ele fica
encarando como se apreciasse o que está vendo, como se ele nunca quisesse
outra mulher da forma como me quer. Meu corpo o agrada. Eu o agrado.
O comprimento do corpo dele treme sob o meu, todas as bordas afiadas e
músculos contraídos. Eu não sei quando ele tirou os sapatos, mas seus pés
com meias roçam meus dedos. A camisa e a calça que ainda estão lá não
diminuem o calor que emana dele. Sua intensidade me sufoca e seus ruídos
graves estremecem minha pele. Ele é um homem faminto e carente, e eu
quero alimentá-lo.
Sua mão agarra meu cabelo, segurando meus lábios nos dele enquanto
nossas línguas lambem e entrelaçam juntas, quentes e molhadas, famintas e
vulneráveis. Sua ereção balança em contato com a minha coxa em círculos
enlouquecedores e a combustão de sensações lambem minha pele,
endurecendo meus mamilos em pontos dolorosos.
Ele afasta a boca para devorar meus seios com uma língua quente.
Chupando e lambendo, ele puxa um bico mais fundo em sua boca enquanto
os dedos e o dedão continuam o ataque perverso.
Eu vou explodir. Eu sinto queimar bem no fundo do meu núcleo,
crescendo rápido e mais quente, roubando o meu ar. Seus lábios retornam
para os meus, engolindo meus gemidos. Seu beijo, seu cheiro e a sensação
da sua força me cercando… Meus músculos tremem com todo esse prazer
avassalador.
Um tremor escapa de seus braços, estimulando seus dedos a irem mais
rápidos e seu quadril mais forte.
— Goze, Ivory — ele ofega nos meus lábios. — Goze na minha mão
toda.
Minha boca afrouxa, meu queixo inclina para cima tentando alcançar.
Caio em seu olhar ardente e sinto a pressão se expandindo, bem ali, como
uma tempestade se formando dentro de mim, coletando e fortalecendo. Mas
eu não sei como deixar acontecer.
— Eu… eu estou tentando. Eu não sei…
— Tire isso da cabeça. — Ele gira o dedão e passa a língua pelos meus
lábios maleáveis. — Esqueça de tudo.
Minhas confissões de mais cedo foram surpreendentemente libertadoras.
Eu deveria ter relaxado o suficiente para fazer isso com ele. E estou
relaxada, mas também nervosa sobre o que está acontecendo e o que isso
significa.
Ele balança com a urgência da excitação, se esfregando selvagemente nas
minhas coxas enquanto me apalpa até a insanidade. A cada círculo do seu
dedão e movimento da sua mão, minha liberação paira na borda, estimulada
com determinação, mas oscilando com incerteza.
— Pare de pensar, caramba, e me sinta. — Ele guia o pau para minha
coxa, sua respiração presa na garganta. — Sinta o quanto eu quero você. O
quanto eu quero você comigo. Não vou gozar sem você.
Uma barreira invisível se quebra dentro de mim e uma onda de calor
trêmula e esmagadora sai da minha coluna, detonando pelo meu útero e
estilhaçando cada neurônio no meu corpo. A surpresa disso rouba minha
respiração, minhas costas se curvam com a força de tantas sensações novas
e frenéticas.
— Ah Deus, agora sim. Tão linda — ele rosna. — Tão minha. — Seus
dedos, quadril e respiração ficam ofegantes, trabalhando em conjunto e me
empurrando mais fundo em um emaranhado de felicidade e fragmentando
sua voz. — Caralho, eu vou…
Ele goza com um grito estrangulado, seu corpo estremecendo ao rolar
meio caminho até mim e capturar minha boca em um beijo sem fôlego. Seu
peso relaxa no meu e o balanço do seu quadril diminui para um roçar
preguiçoso. Suas mãos deslizam de fora das minhas pernas, seu peitoral
duro arfando no meu. Mas seus movimentos estão devagar, reverentemente
gentis enquanto segura minha mandíbula e me beija em um universo
relaxado e sonhador.
Eu morri em algum lugar entre meu gozo e o dele. E agora eu sei como é
me sentir viva.
Não pareço conseguir mexer os músculos do rosto para beijá-lo de volta.
Minha pele está quente e escorregadia com suor, mas quem se importa?
Cada centímetro do meu corpo está em uma dormência luxuriante, letárgica
e feliz.
Ele mantém meu olhar, seus olhos arregalados e fascinados enquanto
sufoca um som irregular nos meus lábios.
— Agora eu sei por que você é ilegal.
27

Emeric

Levanto os magníficos membros exaustos de Ivory, moldando minhas mãos


ao redor das curvas flexíveis e tocando mais do que o necessário para tirar
sua camisa pelos braços.
— Ainda comigo, dorminhoca?
Seus olhos castanhos encapuzados fazem uma escalada lenta pela minha
boca antes de encontrar o meu olhar.
— Hum.
Meu sorriso é tão profundo que sinto em meus pulmões como uma
respiração nutritiva. Não há limites para o que eu faria para colocar aquele
olhar em seu rosto todas as noites. Mas quais sãos os limites dela? O que
ela está disposta a apostar? Sua educação? Seu futuro?
Se ela for pega na minha casa, eu que estou em perigo. Eu sou o adulto,
tirando proveito de uma estudante, de uma vítima. Enquanto posso acabar
travando uma batalha legal, ela estaria a salva de toda a culpa.
Quando eu colocar minha cabeça no lugar, descobrirei um plano. Mas por
enquanto, a segurança dela é de longe muito mais importante do que as
consequências que posso sofrer.
Retiro o resto das roupas dela. Quando jogo a última peça no chão, sou
deixado com uma visão tentadora pra caralho de algo que eu não poderia ter
sonhado – e o diabo sabe que eu tentei por semanas.
Esparramada na minha cama, sua figura nua em forma de ampulheta atrai
cada nervo, órgão e tecido conjuntivo masculino em meu corpo. Da sua
boca molhada e da indolência em seus músculos até seu busto abundante e
clitóris ruborizado, ela me atrai e me segura em um fascínio irracional.
Ela não disse uma palavra desde que gozou em meus dedos. Ela parece
estar em choque. Ou em completo êxtase. Sem dúvida admirada, dado o
arregalar de seus olhos enquanto passa as mãos entre as pernas para sentir o
inchado de sua boceta.
Deus Todo-Poderoso, ela é a inocência envolta em pecado.
A parte inocente me choca mais. Eu não só cruzei a linha como seu
professor, como há uma diferença de dez anos entre a gente. Acrescente a
isso seu passado abusivo e a maneira impiedosa e dominante que eu fodo,
estamos navegando em uma mina terrestre. Se eu me mover rápido demais
ou der o passo errado, as consequências serão devastadoras.
Corro meus dedos sob os dela, esfregando os cachos escuros em sua
boceta.
— Não se depile.
Ela olha nossas mãos e volta para meu rosto.
— Por que não?
— Eu não quero sentir que estou… — Tocando uma garotinha. — Você
é jovem, Ivory. Eu não preciso de quaisquer outros lembretes.
— Eu já estive com vários outros caras mais velho que você. — O calor
floresce em suas bochechas e ela puxa suas mãos para afastá-las. — Eu não
deveria ter dito isso.
O impulso de mandá-la nunca mais mencionar outro cara queima em
minha garganta, mas o engulo de volta.
— Se você precisar falar sobre isso, sobre eles, eu quero ser a pessoa que
recorre. — Eu beijo seus lábios e traço meus dedos até sua boceta. — Está
bem?
— Está bem. — Ela pega meu pulso e aperta. — Obrigada.
Eu pulo para fora da cama e bato em sua coxa.
— De pé.
Dez minutos depois, o vapor embebe o banheiro, embaçando meu reflexo
no espelho assim como a porta do chuveiro atrás de mim. Os respingos de
água nos azulejos transmitem seus movimentos enquanto o cheiro
amadeirado do shampoo impregna minha respiração. Há algo de muito
satisfatório com ela usando as minhas coisas, cheirando igual a mim e
ficando à vontade no meu espaço.
Quado ela toma banho, limpo meu pau na pia, chocado e fascinado por
ter gozado na cueca. Não faço isso desde o ensino médio, mas isso não
deveria me surpreender. Estou me masturbando como um maldito viciado
há semanas.
Preciso de cada milímetro de autocontrole que ainda tenho para não me
juntar a ela no chuveiro. Eu quero fodê-la minuciosamente, por completo e
de todas as maneiras imagináveis, mas tenho que mostrar a ela que não sou
como os outros. Cada passo com ela é um risco e ainda há muitas perguntas
não respondidas.
Limpo as juntas dos dedos e aplico pomada antibiótica dos suprimentos
de debaixo da pia.
— Você está tomando a pílula?
Sua silhueta enevoada congela atrás da porta do chuveiro.
— Não.
Viro para encará-la, me esforçando para distinguir a forma do seu corpo
no vapor.
— Você usa camisinha?
Ela pressiona uma mão na porta de vidro como se precisasse do
equilíbrio.
— Quando posso.
Fecho os punhos, mas a próxima coisa que deveria socar é a minha
própria estúpida boca. Eu poderia ser mais insensível? Mas é claro que ela
nem sempre usa camisinha. Se um homem não para com um não, ele com
certeza não vai parar para pôr uma.
Eu consigo segurar meu gênio, mas o acelerar quente do meu pulso e a
ardente raiva sobe pelo meu corpo me impulsionando a sair do banheiro.
— Vou arranjar alguma coisa para você vestir — grito do quarto. — Me
encontre na cozinha.
Jogando uma das minhas camisas na cama para ela, tiro minhas roupas e
visto calças de flanelas.
No meu caminho para fora, pego meu celular e faço uma ligação para a
clínica do meu pai. Como esperado, vai direto para o correio de voz. Meus
pés descalços andam pelo carpete da escada e em direção a cozinha
conforme digo ao gravador quem sou e o que eu preciso.
Eu poderia ter ligado para o meu pai e marcado um horário, mas não
quero preencher seu questionário essa noite. Não quando eu não tenho todas
as respostas.
Na hora que ela chega no portal da cozinha, tenho dois pratos de linguine
à carbonara esquentados servidos na ilha.
Ela paira na soleira, seus profundos olhos castanhos vagando entre a
comida e meu peito nu. Sua expressão se enruga com cada emoção
existente antes de suavizar em um sorriso.
— Você cozinhou?
— Foi o serviço de buffet quem fez. — Pego dois copos e uma jarra de
chá doce. — O forno esquentou.
Ela se aproxima da ilha, puxando a camisa que está no meio das coxas
para as pernas bronzeadas. O longo cabelo molhando umedece a camisa
branca de algodão no peito, revelando mamilos tensos e ombros delicados.
Descubro ser impossível desviar o olhar. É como se cada fibra do meu
corpo estivesse sendo vinculado a ela e em cada movimento que ela faz, me
mexo junto, ficando mais perto, mais fundo.
Eu nunca tive uma chance.
— Obrigada. — Ela senta no banco de bar, enfiando a borda da camisa
entre as pernas. — Tem um cheiro incrível.
Sento no banco ao lado dela virando para olhá-la e coloco o garfo no
macarrão.
Seus olhos voltam para o meu peitoral.
Ergo uma sobrancelha.
— O quê?
Ela ergue um dedo na minha frente batendo-o no ar, sua concentração
passando dos meus ombros para o meu quadril.
Ela está contando?
Merda, meu peitoral salta. Tudo o que ela precisa fazer é me olhar e meu
corpo já reage.
Sua mão caí e ela volta para o jantar, murmurando:
— Dose recuos e dez saliências musculares.
Olho para baixo, tentando entender o que ela está murmurando. Eu passo
duas horas por dia, sete dias da semana na academia da minha casa,
aprimorando meu físico para uma forma excelente pelo mesmo motivo que
qualquer outro cara malha. Para transar. Mas agora eu quero levantar os
pesos só para vê-la contar meus músculos outra vez.
Ela suga um macarrão do garfo, toda risonha.
— Você não parece com um professor.
— Você não parece com uma aluna.
Seu sorriso se desintegra.
Passo a mão no rosto, desejando poder pegar de volta aquelas palavras.
Quantas vezes sua aparência atraiu o tipo errado de atenção? Ela me atraiu.
Ela balança o garfo para cima e para baixo no comprimento do meu
corpo.
— Você faria mais dinheiro sendo modelo do que professor.
— Eu pareço precisar de dinheiro?
— Bom argumento. — Ela verifica a cozinha, observando os
eletrodomésticos de última geração que nunca são usados. Ela não pergunta
pela origem do meu dinheiro, mas eu sei que está imaginando.
Engulo uma mordida da massa amanteigada e enrolo mais macarrão ao
redor do garfo.
— Minha família detém a patente dos suportes de madeira dos pianos.
— Uau. Sério mesmo?
— Mesmo. Então dinheiro não é meu incentivo para trabalhar.
— Por que trabalhar? Você poderia viver em um iate, beber rum e deixar
crescer uma barba fedorenta. — Suas sobrancelhas levantam. — Como um
pirata.
— Um pirata. — Meus lábios estremecem. — Por mais atraente que isso
pareça, monotonia não me atrai. — Eu enlouqueceria pra caralho. — Eu
preciso de desafios e sucesso próprio, e encontro essas coisas tocando
piano, ensinando… — Dou a ela um olhar estreito. — E disciplinando.
Seus olhos cintilam.
— Você é muito bom nesse último.
— Mas não nos outros?
Um sorriso malicioso aparece no canto da boca dela.
— Eu nunca escutei você tocando.
— Eu toco todas as noites. — Menos essa noite que não serei capaz de
tocar.
Encaro minha mão latejante sem nenhum arrependimento.
Ela raspa uma garfada de linguine.
— Eu sei que essa casa é grande, mas eu não vi um piano.
— Vou mostrar o lugar outra hora. Termine seu jantar.
Ela engole o restante da massa, seguido por goles do chá doce.
Termino o meu logo em seguida e deslizo o prato para longe.
— Marquei uma consulta com um médico para você.
Seu garfo ressoa contra o prato, sua voz um sussurro.
— Eu não tenho seguro ou dinheiro para pagar.
Minhas mãos flexionam. Eu quero machucar a mãe dela e cada pessoa
que nunca esteve lá por ela.
— Cuido disso.
— Eu não posso…
Bato meu punho no balcão, chacoalhando a louça.
— Você irá nessa consulta e fará um exame médico completo, pelo bem
da sua saúde e pela minha maldita paz de espírito.
Mandíbula apertada, ela me lança um olhar teimoso.
Ela pode franzir a testa o tanto quanto quiser. Eu não terminei.
— Desse momento em diante, as palavras eu não posso estão fora do seu
vocabulário. — Eu me inclino para a frente até que tudo o que ela possa ver
são os meus olhos. — Fui claro?
— Ah, você foi claro. — Ela segura meu olhar. — E abrasivo e grosseiro.
Você tem um péssimo temperamento.
Um tipo brincalhão de juventude brilha em seus olhos, mas há algo a
mais ali também. Seus lábios se separam para permitir que a respiração
entre e ela não está piscando como se estivesse forçando uma máscara de
dureza e bravura.
Lá no fundo, ela está com medo. De me enfrentar? De me decepcionar?
De confiar no que está acontecendo entre nós?
Diminuo o espaço entre a gente e a beijo sem piedade. Segurando o rosto
dela entre as minhas mãos, eu trabalho minha língua na dela, nos fundindo,
lambendo e mordendo e inundando-a até a última gota de ardor que sinto
por ela. Eu amo sua força em face ao medo, sua determinação apesar de
todos os seus obstáculos, e foda-se, eu amo a boca dela. A forma como a
sucção quente e molhada dos seus lábios envolvem minha língua e endurece
meu pau.
Ela se inclina para trás nas minhas mãos e procura meus olhos. Nós nos
encaramos, os peitos arfando, suspensos na energia que pulsa entre nós.
Após um interminável tempo de batidas dos corações, ela pisca.
— Eu tenho o dinheiro para pagar os livros… mas… posso ver… — Ela
se encolhe com o calor subindo pelo meu rosto. — Que agora é uma
péssima hora para trazer isso à tona.
Empilho os pratos e carrego até a pia.
— Até amanhã à noite, eu quero uma lista com todas as suas despesas e
coisas que você precisa. — Lanço um olhar duro na direção dela por cima
do ombro. — Coisas que eu não saberia comprar.
Ela se junta a mim na pia, sua expressão presa em frustração.
Passo o prato na água e entrego-o a ela.
— Eu sei que você é forte e corajosa o suficiente para aguentar por conta
própria. Merda, você tem feito isso por anos. — Esfrego meus dedos sobre
sua mandíbula rígida. — Mas agora você tem ajuda. Estou aqui para fazer
as suas dificuldades um pouco menos difíceis. Você contará comigo.
Ela encara as prateleiras na máquina de lavar louça, põe os pratos do jeito
errado, estuda por um momento antes de virá-los.
— Assim?
Eu aceno. A constatação que ela nunca arrumou uma máquina de lavar
louça, me faz apreciar várias coisas na vida, colocando Ivory no topo da
lista.
Com uma expressão estoica, ela me ajuda a terminar de arrumar a louça
em silêncio. Dou um tempo para ela pensar e ponderar seu orgulho frente ao
meu. Quando a limpeza está completa e os balcões foram enxugados, me
viro para ela.
Ela está fora do alcance de meus braços, seu pequeno corpo engolido
pela camiseta e seus olhos nos pés descalços.
— A coisa que eu mais valorizo não custa um centavo, contudo parece
ser o mais difícil para as pessoas darem.
Amizade? Proteção? Amor? Minha cabeça gira, procurando pela
resposta.
— Me fale e é seu.
Seus olhos encontram os meus e ela dá um passo para frente. Outro passo
e seus braços circundam minha cintura. Ela pressiona sua bochecha no meu
peitoral, pele com pele e solta um suspiro pesado.
Um abraço. Isso é a coisa que ela mais valoriza.
Minhas costelas apertam quando a abraço, esmagando-a o mais perto
possível sem machucar sua pele macia. Ela é um pouco mais baixa, muito
baixa para sentir seu coração batendo junto do meu. Então, eu a pego por
baixo dos joelhos e pelas costas, puxo-a para cima e coloco-a contra meu
peitoral.
Aperto o interruptor de luz com o cotovelo e sigo para as escadas.
Ela se aconchega em mim, mãos percorrendo meus ombros e deslizando
no meu cabelo. Todo o corpo dela relaxado em meus braços, acariciando
seu rosto na minha bochecha, tocando, respirando e me sentindo.
— Eu deveria falar para você me pôr no chão, mas estou gostando muito
disso.
Ainda bem, porque eu não vou soltá-la.
Chegando no quarto, ela murmura no meu pescoço:
— Eu preciso ir para casa de manhã para pegar roupas e alimentar o
Schubert.
Mordo meu sorriso.
— Você o alimenta com cérebros?
— O quê? — Sua expressão assustada ameniza em um sorriso cintilante.
— Não o Schubert morto. Meu gato.
— Vamos dar uma passada na sua casa antes da escola, mas você não
precisa de roupas.
Entro no closet e a coloco no chão. Dando um passo para trás, me
espreguiço no batente da porta para bloquear a saída. Quando ela perceber o
quanto sou maluco pra porra, não há como dizer a rapidez que ela vai
correr.
Ela caminha em volta da ilha no centro, esfregando a nuca.
— Seu closet é maior do que a minha casa.
Deslizo minhas mãos para dentro dos bolsos da calça de flanela.
Seu olhar prende na parede oposta e seus passos hesitantes a levam
naquela direção. Ela passa mão pelas longas prateleiras de saltos altos,
sapatilhas, sandálias e tênis. Inclinando a cabeça, ela encara as prateleiras
de vestidos, camisas e calças. A parede inteira é dela.
Suas omoplatas apertam, suas mãos caem nas laterais ao falar de costas
para mim.
— Você tem um estilo de vida alternativo que eu não sei? Um fetiche
com roupas de mulheres?
— Algo assim.
Ela pega um sapato bege da Louboutin na prateleira e verifica o tamanho.
— Como você… — ela ofega, retornando o sapato cuidadosamente em
seu lugar. — No primeiro dia quando você me calçou com o sapato.
Meu sangue pulsa denso e quente nas veias. Separados por uma ilha e o
comprimento do quarto, eu a observo examinar as roupas, antecipando suas
próximas palavras.
— Eu não… — Ela se vira para mim, seus olhos brilhando com lágrimas
não derramadas. — Eu sei. Sem eu não posso. Sem questionar os seus
métodos. — Ela prende um braço em volta da própria cintura e pressiona
um punho na boca, me encarando por debaixo dos cílios. — É muito para
absorver, mas estou tentando. — Ela endireita as costas, olhando para as
roupas atrás dela. — É só… Isso tudo é demais, muito rápido e…
— Venha aqui. — Retiro as mãos dos bolsos, minha postura aberta para
acolhê-la.
Ela atravessa o quarto em uma visão de pele escura, algodão fino e
fascínio.
Quando ela chega até mim, levanto-a para carregá-la até a cama.
— O que é meu, é seu, Ivory. Quanto mais cedo você aceitar isso, melhor
será.
Se mexendo debaixo das cobertas, ela olha para mim.
— E se eu não aceitar?
Deslizo para baixo junto dela, puxando-a para o meu peitoral e enlaço
nossas pernas.
— Então você terá que aguentar mais do meu… Como você chamou? —
Eu me inclino e beijo seu lábio inferior. — Temperamento abrasivo e
grosseiro.
— Tem medicação para isso.
— Você é o único medicamento que preciso. — Esticando a mão para
trás, apago a luz e descanso a cabeça no travesseiro dela, nossos rostos a
centímetros de distância.
A iluminação das luminárias a gás e o luar entram pelas janelas
próximas, cobrindo-nos em um silêncio pálido. Os olhos dela cintilam com
admiração, preocupação e palavras não ditas, refletindo todas as emoções
que emito abertamente nos meus.
Esfrego seu cabelo para trás da orelha.
— Eu não compartilho. Isso significa que sem mais garotos do ensino
médio ou da vizinhança. Você está na minha cama, de ninguém mais.
Ela abre a boca.
Coloco um dedo para depois traçar a suave curva dos seus lábios.
— Vou protegê-la daqueles que não respondem ao não.
— E quanto a você? — Sua perna gira na curva da minha, sua voz baixa
e desconfiada. — Há outras mulheres?
— Você é a única.
Eu recusei todas as malditas mulheres desde que a conheci. É a primeira
vez na minha vida adulta que eu fiquei tanto tempo sem sexo.
Linhas verticais se formam em seu rosto.
— E quanto ao seu amor e ódio pela Joanne?
— Ela é complicada. Mas eu não a vejo há seis meses.
Eu não contei tudo a Ivory, mas eu preciso fazer uma decisão sobre essa
bagunça antes de expô-la a isso. E tem um segundo segredo que eu escondi
dela, um mais urgente que eu preciso abordar agora.
— Eu tenho algo para dizer sobre Prescott Rivard.
Sua expressão se estilhaça em piscinas ondulantes de marrom.
— Ele vai conseguir fazer você ser demitido? Ou apresentar queixa?
— Eu o assustei o suficiente para mantê-lo em silêncio por um tempo,
mas cedo ou tarde aquele medo vai azedar e o rancor vai aumentar. Então…
não sei.
— Irei até a polícia e explicarei o que aconteceu.
— Não, você não vai. — Prendo um braço nas costas dela, me
preparando para ela se afastar. — Eu prometi a mãe dele uma vaga na
Leopold para Prescott.
Ela congela por um momento antes de seu corpo enrijecer no meu
abraço.
— Como? Por quê?
— Ela me deu uma carreira no Le Moyne em troca das minhas conexões.
Para que Prescott entre na Leopold.
— Conexões? Leopold admite seus alunos apenas por seu talento.
— Minha mãe tem um assento no Conselho de Diretores. Ela vai passá-lo
sem uma audição formal.
Ela estuda minha expressão, curvando sua mão no peito entre a gente.
— Isso afeta as minhas chances, não é?
— Se eu indicar você, os recrutadores virão. Assistirão a uma
apresentação da escola e…
Sua respiração fica presa em sua garganta.
— Eles vão ver Prescott tocar e no final rejeitarão a candidatura.
— E aceitarão a sua. — Passo a mão pelo cabelo dela e descanso meus
lábios em sua testa. — Você tem mais talento que qualquer outro no Le
Moyne, mas se eu pedir para minha mãe passar duas inscrições…
— De jeito nenhum. — Ela puxa a cabeça para trás. — Quando eu for
aceita na Leopold, será só por merecimento e talento.
Abraço ela contra mim enquanto o arrependimento bate. Não posso
suportar a ideia de foder com ela.
— Vou resolver tudo.
— Como? Você aceitou aquele acordo por um motivo, certo? Por causa
de Shreveport?
— Sim, mas eu posso aceitar um emprego fora do estado. — Inclino o
queixo dela mais para cima e a beijo, sorrindo no seu lábio. — Ou eu posso
me tornar um pirata.
De qualquer forma, depois da merda de hoje com Prescott, minha
demissão traz novas complicações para Ivory.
Ela acaricia minha mandíbula.
— A diretora só irá substituí-lo por um outro acordo. Ela contratou você
sob condições injustas e apagou as recomendações da sra. McCracken do
meu arquivo, então claramente, ela está em uma missão diabólica. Por que
ela quer que seu filho vá tanto para lá?
— É a melhor escola com as doações mais ricas. A aceitação de Prescott
é seu caminho para elevar o poder e status do Le Moyne. Ou quem sabe?
Talvez ela deseje sentar no conselho da Leopold algum dia.
Ela acena com a cabeça, seu rosto franzido em contemplação.
— Se você se demitir, Prescott não terá incentivo o suficiente para ficar
com a boca fechada. Depois dessa noite, ele pode dar para a mãe dele toda
vantagem que ela precisa para se livrar de mim.
Exatamente o que eu pensei. Sem mais nem menos, eu sei com absoluta
certeza que eu não vou deixar Le Moyne ou Ivory. Eu sou mais inteligente e
mais malvado do que Beverly Rivard e eu tenho alguns meses para decidir
o método e o nível de crueldade que irei usar para derrotá-la.
— Eu entendo o motivo de você ter feito isso. Porque você aceitou o
acordo. — Ivory traça os dedos pelo meu peitoral, observando cada
movimento. — Mesmo depois do que a Joanne fez, é difícil se desapegar.
De seguir em frente.
Minha respiração fica presa com a precisão da declaração. Ela está certa,
mas ela não sabe o verdadeiro problema, aquele que estou trabalhando para
resolver com Joanne. E meus sentimentos por Joanne? Esses foram
entorpecidos o suficiente para que não conduzam mais minhas ações.
As pálpebras de Ivory tremem pesadas e seus membros relaxam ao meu
redor enquanto sussurra baixinho.
— Tudo é possível.
— Como?
— Eu vou para a Leopold.
Sua teimosia é inconveniente. E bastante admirável. Infelizmente, eu não
tenho ideia do que vou fazer sobre isso.
Eu odeio adiar o sono dela, mas tem mais uma coisa que eu preciso saber.
— Onde está o amigo do seu irmão?
Seus olhos se abrem e sua voz fica presa na garganta.
— O quê?
— Ele desapareceu depois de estuprá-la? Ou ele ainda está por aqui?
Sua pele fica pálida na luz fraca, suas maçãs do rosto pressionadas contra
sua pele tensa.
Tudo dentro de mim para, asfixiando minha garganta e engrossando
minha voz.
— Me fala.
Ela joga as cobertas para trás, rola para cima de mim e recosta a testa na
minha.
— Chega de socos por hoje.
Seguro sua bunda firme embaixo da camisa e tento concentrar minha
energia no corpo dela e não no que foi feito com o corpo dela.
— Quando foi a última vez que ele tocou em você?
Ela apoia os joelhos nas minhas laterais, montando em mim enquanto
segura meu rosto entre suas mãos.
— Ele não tem me estuprado desde agosto.
Agosto? Dou uma guinada para me sentar, minha visão borrada por
pontos vermelhos.
— Esse último agosto? Dois meses atrás?
Ela se segura ao meu peitoral, prendendo minha cabeça enquanto amassa
seus lábios nos meus. No momento que sua língua procura por uma entrada,
eu a beijo de volta, raivoso, possessivo, enroscando minha mão no seu
cabelo e puxando seu quadril no meu.
Mordo seu lábio.
— O nome dele.
Ela balança a boceta no meu pau, empurrando sua língua e me distraindo
pra cacete.
Eu afasto minha boca.
— O nome dele.
Ela se afunda, seu sussurro oco.
— Lorenzo Gandara.
Latino? O mesmo filho da puta que espreitou a casa dela naquela noite?
— Ele dirige uma moto esportiva laranja?
A ponta de seus dedos cava a parte de trás da minha nuca.
— Como você sabe isso?
28

Ivory

— Vá dormir.
Essa é a única resposta que Emeric dá as minhas infinitas perguntas sobre
Lorenzo. No final, as minhas preocupações se dissolvem com o peso do
cansaço.
Eu me aconchego mais perto da rígida parede do peitoral dele, protegida
pelo volume do seu braço e defendida pelo olhar vigilante. Caio
rapidamente no sono, perdida em um grande espaço atemporal onde para
sempre não é longo o suficiente.
Nunca me senti assim tão leve como se uma estranha sensação
atmosférica tivesse substituído meus ossos e peles, e não há mais nada além
da minha respiração. Sopros suaves e flutuantes de éter. Cada respiração
forma uma nuvem que junta as outras na deriva ao meu redor em um vasto
céu azul.
Estou sonhando. Tento agarrar o encantamento. É tão seguro e delicado
aqui que não quero ir embora. Não acorde.
Pisco contra os lampejos de safiras aureolados pela luz da lâmpada.
— Bom dia. — Os olhos azuis de Emeric preenchem meu horizonte,
muito profundos e imponentes, brilhando com todas as cores e estrelas do
céu.
Estico meus braços acima da cabeça, deleitando na maciez da cama dele.
— Estou sonhando.
Ele se ergue sobre mim, os bíceps amontoando enquanto ele planta as
palmas na borda do colchão.
— Ainda está sonhando?
— Bem, eu estava no paraíso. — Alcanço para acariciar a barba de
ontem na mandíbula dele. — Até o diabo aparecer.
Seus lábios se curvam em um sorriso territorial, seus traços mais rosados
que o normal. Sua pele está úmida sob meus dedos, o cabelo escuro
pingando na testa.
— Você já tomou banho? — Mudo minha atenção do rosto, passando
pela camisa molhada e paro no short de academia. — Ah, você malhou.
Que horas são?
Viro para o meu lado e encontro o relógio na mesa de cabeceira. 5:15 da
manhã. A escola não começa por duas horas.
Ele se endireita, mexendo os ombros.
— De quanto tempo você precisa para ficar pronta?
Eu me sento, o quarto girando ao meu redor enquanto me recordo da
nossa conversa inacabada de ontem à noite.
— Depende. Você não me contou como conhece Lorenzo.
— Ele não é mais preocupação sua. — Ele anda em direção ao banheiro.
— Você não pode só ir bater nele. — Deslizo para fora da cama e ajeito a
camisa nas minhas coxas. — Ele é um ex-Fuzileiro Naval, um bandido,
talvez até um criminoso. E você só é…
Ele me lança um olhar escaldante que murcha o resto das minhas
palavras na garganta. Os punhos dele se abrem e fecham nas laterais, suas
juntas dilaceradas brilham em vermelho. Está bem, talvez ele pudesse dar
alguns socos, mas…
— É muito arriscado. — Caio na borda do colchão, tremendo com ideia
de ele lutar com mais um dos meus monstros.
É raro as vezes que Lorenzo vem a minha casa sem Shane, então seriam
eles contra meu professor. Nada de bom viria disso.
Encontro seus olhos.
— A polícia pode ser chamada. Você pode ir para a prisão. Ou pior, se
você continuar batendo em coisas, pode quebrar suas mãos e perder sua
habilidade de tocar piano.
Ele caminha ao meu redor, sua expressão marmorizada com linhas
sombrias de intensidade.
— Apesar do que você viu, não costumo enfrentar meus problemas com
meus punhos. — Ele levanta um desses punhos e acaricia minha mandíbula.
— Prefiro um planejamento sútil e enganoso. Lorenzo Gandara nem vai me
ver chegar.
Ceeerto. Então ele vai… o quê? Atingi-lo em sua bunda como um ninja?
Ele retorna ao banheiro, sua voz um ruído sobre o ombro.
— Vou tomar um banho. Depois o banheiro é seu.
A porta se fecha atrás dele, seguido pelo clique oco da tranca.
Caio de volta na cama, a camisa subindo até a cintura e me expondo ao ar
frio. Eu não sei o que ele fez com a minha calcinha. Eu não me importo. Ele
já me viu pelada e colocou seus dedos dentro de mim. Mesmo assim tudo
que ele me deixou ver foi seu peitoral nu.
Por que ele trancou a porta? O que ele está escondendo? Meu pulso
acelera com as teorias ridículas que surgem na minha cabeça. O pau dele é
deformado? Ou ele não me quer perto enquanto o médico não me checar
para doenças?
Minhas emoções transbordam, mas o sentimento mais afiado é aquele
bem no fundo do núcleo. Só pensar nele pelado manda um tremor pelas
minhas coxas e uma descarga entre as minhas pernas.
Sensações que nunca estiveram ali antes surgiram como uma febre. Eu
me sinto quente e excitada pra caramba. Pelo meu professor.
É errado. Estar aqui é errado. Deslizar a mão pela minha boceta também
parece errado, mas eu faço de qualquer jeito, acariciando exatamente do
jeito que ele acariciou, mergulhou e circulou. Meus dedos são os dedos
dele, acariciando, dando e construindo aquela maravilha de energia dentro
de mim.
Logo, meu corpo assume o controle, minha mão mexendo do jeito que eu
quero que ela se mexa, provocando arrepios pela minha pele e produzindo
uma quantidade inacreditável de calor molhado sob meu toque.
Minhas pernas se abrem e minha cabeça vai para trás, meu pescoço
esticando enquanto acaricio meu clitóris e enfio dois dedos, para fora e para
cima, para baixo e de volta para dentro.
Ele está logo atrás daquela porta, esfregando sabão por todo seu pau, se
tocando e acariciando. Abençoado Deus, eu quero isso. Eu aposto que seu
corpo nu é uma visão lendária de se contemplar.
A pressão dentro de mim explode, cortando meu ar enquanto o prazer me
domina em uma corrente elétrica acolhedora. Eu estremeço e me inclino,
ofegando com gemidos guturais. Puta merda, talvez eu possa fazer isso de
novo. Depois de recuperar minha respiração. Quantos desses eu posso ter
consecutivos?
Guio meus dedos para minha entrada escorregadia. Talvez só mais uma
antes dele…
Está muito quieto. O chuveiro está desligado?
A porta do banheiro se abre e ele sai em uma névoa de vapor.
Puxo minha mão e deslizo a camisa para baixo.
Ele agarra a toalha na cintura enquanto seus olhos árticos prendem os
meus.
Nenhum de nós respira. Ou se mexe.
Ele sabe.
— Você se tocou.
Meu rosto esquenta à níveis nucleares.
Ele agarra o portal da porta, apertando com tanta força que a madeira
estala. Seus olhos nublados de dor e endurecidos com determinação, então
ele recua e fecha a porta entre nós.
Eu suspiro, envergonhada além do imaginável.
Um estrondo atinge a madeira do outro lado. O clique da tranca seguido
pelo som do chuveiro sendo ligado outra vez.
Que merda acabou de acontecer? O que eu deveria fazer? Assim que ele
sair, eu terei que encará-lo.
Merda, me recuso a ficar envergonhada por isso.
Ando rapidamente pelo quarto, bato na porta.
— Emeric?
— Cinco minutos! — Seu grito abafado soa muito perto para ele estar no
chuveiro.
— Você está bravo?
— Não, Ivory — ele resmunga.
— Então o quê?
Ele faz um barulho de grunhido profundo.
— Merda, você está me matando aqui.
Eu me afasto da porta e me sento na cama. Ele não tentou fazer sexo
comigo, mas todos aqueles beijos, toques e encaradas me diz que ele quer.
Dada à minha nojenta vida sexual, eu posso imaginar porque ele não quer.
Porém, uma coisa com a qual eu posso contar é a sua franqueza. Então,
em vez de ficar enjoada com suposições, ando em direção à loucura que
está seu armário.
Roupas e sapatos se alinham em uma parede três vezes a minha altura. A
qualidade dos tecidos e costuras são diferentes de tudo o que já toquei.
Abro as gavetas embutidas ao lado e encontro um monte de rendas, cetins, e
meu Deus, lingerie de couro. As etiquetas foram removidas, mas tudo
parece ser novo e exatamente do meu tamanho. Eu moldo os bojos de um
sutiã vermelho ao redor dos meus seios. Caimento perfeito. Merda, como
ele sabe o tamanho dos meus seios?
Cinco minutos depois, a porta do banheiro abre. Saio do closet, ainda
vestida com a camisa dele e volto até a cama para sentar na borda.
Seu cabelo preto está quase seco e a tensão de mais cedo em seus
músculos sumiu. Minha atenção se volta para a protuberância embaixo da
toalha. Eu aposto que ele se masturbou, mas por que com a porta fechada e
com o chuveiro ligado? Emeric Marceaux não fica envergonhado.
Ele se senta ao meu lado na cama, coloca a mão machucada em meu colo
e entrelaça nossos dedos.
— Para esclarecer minha reação mais cedo… de forma alguma, eu me
oponho a você se masturbar.
Só de ouvi-lo dizer aquela palavra atrevida, desperta um incêndio dentro
de mim.
— Isso é bom, porque sem dúvida farei de novo. — Levanto uma
sobrancelha ousada. — Queira você ou não.
— Você está me matando — ele sussurra.
— Por quê? — Por que não apenas me tocar em vez disso?
Ele puxa nossas mãos entrelaçadas para entre seus joelhos abertos e apoia
nossos cotovelos na toalha que cobre suas coxas.
— Eu amo que você queira se dar prazer. — Ele me lança um olhar
sensual. — Eu amo isso um pouquinho demais.
— Eu escuto um mas vindo aí.
— Mas… — Ele me lança outro sorriso de tirar o fôlego. — Eu não vou
mostrar o quanto eu realmente amo até que esteja pronta.
— Você quer dizer que não vai me mostrar sua ereção?
Ele fecha os olhos.
— Eu não sou um amante gentil, Ivory. — Ele olha para cima, seu olhar
parando nos meus lábios. — Estou confiante que com tempo você vai
perceber que não quer gentileza. Até lá, esperarei.
— Atrás de portas trancadas?
Ele concorda com a cabeça.
Belisco meu lábio.
— Com uma ereção?
O canto de sua boca se levanta.
Olho para o contorno do pau dele embaixo da toalha.
— Você se masturbou?
O poder do olhar dele me enlouquece, ele passa a mão sobre sua
mandíbula, esfregando, me encarando e esfregando com mais força.
Eu realmente não deveria atiçar a fera, mas… Respiro fundo. Voz dura.
— Na próxima vez que você se masturbar, quero assistir.
Sua respiração para antes que ele se jogue. Seu peitoral colide com o
meu, me jogado para trás no colchão. Um oomph escapa da minha boca,
mas a boca dele está ali, devorando minha voz, meu ar e minha sanidade.
O peso do corpo dele afunda o meu nos lençóis, sua força contraindo ao
meu redor ao mesmo tempo que sua mão desliza pela minha costela e tira a
camisa. Meus dedos se fecham no cabelo dele, enrolando nas mechas
úmidas enquanto ele me beija com lábios firmes e uma devastadora e
imperativa língua.
Presa pelo seu tamanho e minha boca controlada pela dele, apenas fecho
meus olhos e aproveito o carinho feroz. Ele pega meu mamilo e dá um
puxão dolorido. Quando arquejo, ele geme. Balanço meu quadril e ele
aperta o dele, me prendendo na cama e pressionando seu comprimento duro
no meu núcleo. Um pouco mais disso e a toalha dele cairia. Talvez eu
pudesse ajudar?
Alcanço atrás dele e deslizo uma mão pelos músculos das suas costas.
Quando meus dedos encontram a toalha, deslizo para debaixo e encontro o
aumento do músculo duro e firme. Meu Deus, como é possível que a bunda
de um homem seja tão irresistível? Eu quero sentir com as duas mãos, mas
seu corpo é muito comprido para agarrar direito. Estico meus braços
tentando alcançar…
Ele agarra meu pescoço e aperta. A força de seu aperto empurra meu
queixo para cima e minhas mãos perdem centímetros preciosos de suas
costas.
O ângulo da minha boca dá um acesso profundo para ele, sua língua
curvando ao redor da minha e sua respiração úmida esquentando meu rosto.
— Eu sou um maldito animal violento perto de você.
Quero dizer a ele para me usar seja qual for a maneira que alimente seu
desejo, mas quanto mais seus dedos se fecham ao redor do meu pescoço, é
demais. Meus pulmões queimam por oxigênio e pontos pretos invadem
minha visão. O pânico aumenta, minha mandíbula trabalhando contra ele.
Sem beijos. Lutando.
Não consigo respirar. Minhas mãos batem em suas costas, meu corpo
tentando escapar. Solta. Solta.
As mãos ao redor do meu pescoço desaparecem, seguidos pelo seu peso.
Agarro meu pescoço e ofego por ar enquanto medo congela meu sangue e
lágrimas borram minha visão.
Ele fica em pé ao lado da cama, ajeitando a toalha no comprimento duro
e saliente que ainda tenho que ver.
Mexendo no cabelo, ele olha para mim.
— Você não está pronta.
Solto o pescoço dolorido e me sento, balançando com um tremor no
corpo inteiro.
— Pronta para o quê? Sexo?
— Pra mim! — Ele caminha até a cômoda e pega meias xadrez e cueca
preta. — Mantenha isso em mente na próxima vez que pedir para ver eu me
masturbando.
Minha barriga afunda.
— Eu não entendo. Por que você me estrangulou? Para me assustar?
Se foi para isso, funcionou. Meu coração ainda está acelerado.
— Para mostrar a você. — Ele cruza o quarto, parando no pé da cama e
franzindo a testa para sua ereção embaixo da toalha. Então seu olhar penetra
o meu. — Eu tenho orgasmos vendo seu corpo se curvar em angústia,
sabendo que fui eu quem coloquei essas lágrimas em seus olhos. Porém, só
quando você me dá esse prazer livremente e com absoluta confiança.
Eu dei isso por espontaneidade? Eu ainda tinha uma escolha?
— Se você se importa comigo, porque não podemos fazer isso sem… as
lágrimas?
Seu cabelo preto desengonçado e cílios grossos dão a ele uma aparência
mais suave, mas o afiado de seus olhos azuis me lembram que se há alguma
gentileza dentro dele é facilmente sufocado pelo seu temperamento
meteórico.
Ele olha para o relógio antes de olhar de volta para mim.
— Eu tenho uma profunda necessidade sexual em pressionar as mulheres
para fora de suas zonas de conforto. Quando você estiver pronta para me
deixar levá-la lá, você lutará com cada instinto em seu corpo, mas eu
prometo… O resultado será muito mais satisfatório que um orgasmo.
O que poderia ser melhor que um orgasmo? É alguma coisa profunda
como aquela sensação quente que preenche meu peito quando sei que ele
está desfrutando de mim? Dar prazer a ele eleva o meu a níveis eufóricos.
Então, sim, talvez tenha mais da intimidade do que apenas me deitar de
costas enquanto ele fica em cima de mim. Mas eu não tenho ideia do que
poderia ser.
Engulo em seco. Não sei como me sinto em ser sufocada. Será que vai
além da minha zona de conforto? O que ele vai tentar depois?
— Por que você quer me pressionar assim?
— É a confiança extrema, e o poder nisso é incomparável.
Apesar do meu desconforto borbulhante, consigo manter minha voz
firme.
— Eu não quero que ninguém tenha poder sob…
— Não, Ivory. É você quem tem o poder. É você quem define os limites e
decide quando parar. — Ele franze a testa para mim enquanto uma
contração patina pelo seu peitoral sem pelos. — Você não usou sua palavra
de segurança.
Merda, eu esqueci.
— Eu não conseguia falar com sua mão…
— Besteira. Você nem tentou.
Ajeito a camisa nas coxas.
— Essa é a lição, não é?
— Sim. — Sem outra palavra, ele entra no closet e me deixa em um
amontoado de agitação.
Alguns minutos depois, ele emerge completamente vestido e me diz para
ir até a cozinha quando eu estiver pronta para sair.
O propósito dessa lição me consome enquanto tomo banho, penteio o
cabelo e escovo os dentes, e me visto sozinha no quarto. Eu sei que minhas
percepções sobre sexo e homens são distorcidas, mas a pressão de sua mão
no meu pescoço não foi nada se comparada aos últimos quatros anos de
medo e dor. Não faz dos métodos dele aceitáveis, mas a surpreendente
forma com que ele faz as coisas pode até ser eficaz.
Na próxima vez que ele me fizer desconfortável, tenho certeza que
estarei pensando na palavra de segurança. E ele vai me ouvir. Desde que o
conheço, ele não pegou uma única coisa que eu não estava disposta a dar
para ele. Meu Deus, tem poder nisso. Saber que ele vai parar quando eu
disser a palavra, me faz mais alta, mais firme… mais leve.
Desço as escadas com o couro macio dos sapatos novos. As adoráveis
sapatilhas têm pequenos espinhos prateados e malha preta ao redor dos
dedos. Elas adicionam um toque moderno ao vestido de malha vermelho.
As mangas três-quartos vão me manter aquecida nas noites de outono. A
bainha reta passa dos meus joelhos e o corpete tem essa faixa legal que
cruza de trás para frente e amarra na cintura.
A roupa toda faz eu me sentir elegante e… valorizada. Uma voz irritante
em minha cabeça me diz que eu não mereci essas roupas. Tirando que
Emeric deu elas a mim sob o entendimento claro que eu pertenço a ele e,
por sua vez, tudo o que ele tem pertence a mim. Difícil de fazer minha
mente aceitar isso. Mas, por enquanto, vestirei essas roupas porque os
presentes deles significam mais do que meu maldito orgulho.
Encontro Emeric sentado na ilha da cozinha, pegando do prato de pães
com ovos, queijos e bacon. Sua atenção pula para mim. Ele congela. Só os
seus olhos se mexem, esquentando por debaixo das sobrancelhas escuras ao
mesmo tempo que faz uma excursão despreocupada de cima a baixo pelo
meu corpo.
É obvio que ele comprou essas roupas porque meu atual guarda-roupa
está desprovido. Mas enquanto ele continua a olhar da cabeça aos pés,
percebo que ele foi às compras porque estava pensando em mim, talvez
imaginando como eu ficaria vestida em coisas como essas.
Na última olhada, suas expressões faciais duras como pedra suavizam
com satisfação. Alguma coisa dentro de mim pega e guarda. Eu ponho esse
olhar no rosto dele só de aceitar o presente. Eu não sei o que é, mas saber
que o agrado combina tão bem com todas as novas emoções que ele
desperta em mim.
Seus olhos encontram com os meus.
— O vestido mais sortudo do planeta.
Meu coração gira em uma cadência de batidas pesadas.
— Não acredito como ficou bom.
Ele olha para os meus lábios.
— Sente e coma.
A gravata marrom estampada, as abotoaduras brancas e a calça marrom
dele ficariam antiquadas em qualquer outro homem. Mas nele, é uma
afirmação do estilo metropolitano atraente. Inferno, ele poderia usar gola
levantada e shortinhos enfeitados, e mulheres abaixariam as calcinhas
enquanto ele caminha.
O sólido cheiro de café rodopia por mim enquanto sento ao lado dele.
— Sem colete hoje?
— Jaqueta.
Olho para a jaqueta de camurça marrom pendurada nas costas de sua
cadeira. As mangas compridas podem ajudar a esconder os cortes em seus
dedos.
Ele enche meu prato, serve suco e descansa uma mão na minha coxa. Eu
não tenho sido cuidada desse jeito desde que meu pai estava vivo. Sentada
aqui em roupas boas e colocando comida na minha barriga, estudo Emeric
como uma garota órfã faria com o seu protetor, como uma estudante com
seu professor, mas mais do que isso. Olho para ele como uma mulher que
abre seu coração para um homem.
Ele preenche tantos vazios em minha vida e meu desejo por ele só me
aproxima mais, perto de um mundo com o qual eu apenas sonhei. Um
mundo onde eu interajo com um homem porque eu quero, porque ele se
importa comigo tanto quanto eu me importo com ele.
Exceto que ele diz que eu não estou pronta.
Antes de conhecê-lo, gentileza era tudo o que eu queria, mas agora?
Quando comecei meus estudos formais em música, adquiri uma
apreciação apurada no uso dos contrapontos de Bach. Aqueles que não
sabem como escutar sua música, escutarão uma confusão de linhas
barulhentas. Mas o que ele compôs são múltiplas melodias com cada mão
tocando uma versão diferente da mesma música.
Emeric aplica o contraponto em tudo o que ele faz. Em uma mão, ele
toca com ternura e autocontrole ao mesmo tempo que com a outra mão bate
com intensidade e dominância. Seu método pode ser contraditório, mas ele
executa em uma perfeita harmonia.
Largo o garfo e aperto seus dedos na minha coxa.
— Quando vou saber se estou pronta?
Ele levanta minha mão e pressiona um beijo na palma.
— Eu saberei.
Investigo seu rosto, prologando em seus lábios esculpidos, a mandíbula
recém-barbeada e os olhos ultramarinos.
— Então o quê?
Promessas dançam como notas sombrias em seus olhos.
— Então você vai agradecer pela palavra de segurança.
Um arrepio sobe pela minha coluna e uma dor explode entre as minhas
pernas. Eu quero o que ele oferece assim como não quero. Ou talvez eu
queira não querer.
Esfrego a mão na nuca antes de atacar o café da manhã.
Ele termina tudo no prato antes de afastá-lo.
— Quando você não estiver na escola ou aqui, vai estar ao meu lado.
Eu me engasgo, murmurando com o queijo mordido.
— Como que isso funciona?
— Não fale com a boca cheia.
Mastigo rápido para engolir.
— Quando eu for para casa…
— Você mora comigo agora.
Enrijeço com suas palavras penetrando meus tímpanos. Eu as escuto, mas
seus significados não sincronizam com meu cérebro.
Ele bebe seu café encarando seu celular antes de olhar para mim como se
tivesse me falado para vir jantar, não para me mudar.
Eu o encaro com a boca aberta.
— Você está de sacanagem comigo.
Levando a caneca para seus lábios, ele me encara de volta, sem um sinal
de sorriso em seus olhos.
Ele está sério.
Eu perdi toda uma conversa em que ele me pede para vir morar aqui? Ah,
espera. Ele não pede por nada.
Relaxo as costas da cadeira.
— Isso é por causa de Lorenzo.
— É um motivo prático. — Ele reabastece sua caneca com a jarra na ilha
e volta ao celular.
Porra de regra eu não posso, porque eu quero gritar essas palavras várias
vezes.
— É contra a lei. Você é meu professor!
— Você é minha garota. — Ele desliza a tela do celular preguiçosamente.
— Essa é a única lei que você precisa se preocupar.
O quê? Minha cabeça martela.
— Você é maluco.
— Você é minha.
— E se alguém descobrir?
Ele desliza o e-mail, sem se importar com o mundo.
— Esse problema é meu.
— Mas Schubert…
Ele abaixa o celular e aperta seus lábios nos meus em um beijo que diz
cale a boca e confie em mim. Então ele se recosta e volta para o e-mail.
— Vamos buscar o gato depois da escola.
29

Emeric

Três quadras de distância da casa de Ivory, eu desligo o GTO na rua


enquanto ela alimenta o gato. A moto laranja não está ali, mas eu não sei se
mais alguém está em casa.
Se eu tivesse uma explicação legal para estar chegando com ela às seis e
meia da manhã, eu estaria com ela naquela casa neste instante. Em vez
disso, sou forçado a monitorar Ivory à distância, através da conexão de
nossos celulares, pronto para fazer qualquer coisa que seja necessária para
ser seu porto seguro.
A primeira luz do amanhecer ilumina as telhas irregulares das casas ao
redor. Seguro meu celular em um aperto firme, odiando que não posso vê-la
andando no interior. Mas a escuto através do alto-falante. Cada suspiro de
sua respiração no fone de ouvido atrai a minha.
Antes de saímos da minha casa, entrego a ela um celular que comprei
semanas atrás. Ela embalou em suas mãos como se fosse um inestimável
violino Vieuxtemps, sua expressão pálida impregnada com uma aceitação
relutante. Anseio por sua reação quando lhe der um carro.
— Sua mãe ou seu irmão estão aí? — pergunto pelo celular.
— Ambos — sussurra. — Dormindo.
Se eu escutar um suspiro ou um singelo som preocupante, vou estar
naquela porta em menos de dez segundos.
Flexiono a mão no volante, as juntas machucadas espreitando por
debaixo da manga comprida. É bem provável que Ivory saiba que estou
usando esse casaco para esconder os cortes. Eu não quero que ela se
preocupe com o que as pessoas pensam ou deixam de pensar. Esse é o meu
trabalho.
Ao me concentrar no farfalhar de seus movimentos através do celular,
minha mente volta para o quarto essa manhã e a maneira erótica da
sensação de seu pescoço no meu aperto. Ela confia em mim, ainda sim
entrou em pânico, lutando com seu corpo e me implorando com seus olhos,
da mesma maneira que ela faria com qualquer outro homem. Isso é
inaceitável.
Asfixia, chicotadas e obter prazer com qualquer tipo de dor e humilhação
não é para os fracos de coração. Se eu tivesse qualquer tipo de dúvida sobre
o que a excita, minha abordagem seria diferente. Se ela fosse tímida demais
para manter meu olhar, ela nem teria chamado minha atenção em primeiro
lugar.
Se ela fosse qualquer outra pessoa, eu não estaria sentado aqui, cem por
cento empenhado e arriscando meu pescoço para estar com ela.
Ivory Westbrook não é frágil. Ela é construída para o meu tipo de
proteção e apetite por dominância. Tratá-la com luvas de seda seria um
grande desserviço com ela.
Sua força emocional é uma das muitas razões pela qual estou
freneticamente atraído por ela. Sim, ela é a criatura mais bonita que eu já vi,
mas estou fascinado por todo o pacote. Ela se defende quando acha que
estou errado, ainda sim ela fica molhada com a força da minha voz e o calor
do meu cinto. Eu aposto o Fazioli do meu avô que sexo normal e monótono
com um homem pouco assertivo a sufocaria.
Independente que essas qualidades venham de sua submissão por
natureza ou de seu passado abusivo, é minha responsabilidade como seu
primeiro parceiro sexual de verdade fazê-la ficar consciente dos vários
aspectos do prazer. Sexo não tem que obedecer aos padrões da sociedade
para ser saudável. Não tem que ser devagar e suave para ser seguro. E não
tem que ser livre de algemas de couro para ser consensual.
Ela está aprendendo, mas o quanto de informação é suficiente? Essa é a
parte difícil.
Eu quero Ivory e essa necessidade é uma interminável batida latejante
dentro de mim, como uma música inacabada batendo contra meu tórax para
sair. Mudá-la para minha casa e dormir ao lado dela sem transar é pura
tortura. Mas eu sei que ela está ciente da minha restrição e eu também sei o
quanto ela aprecia e respeita isso.
O fato de eu ansiar por amarrá-la, afundar meus dentes em seus seios e
estrangular seus gemidos não é o problema. A própria circunstância de seu
abuso combinado com meu papel como seu professor, faz com que até
mesmo a mais gentil intimidade com ela se torne difícil. Eu poderia
persuadi-la a abrir as pernas com palavras eloquentes, fodê-la com doçura e
ela deixaria acontecer porque isso é o único jeito que ela sabe responder a
um homem.
Bem, foda-se isso. Antes de eu entrar no corpo dela, ela vai estar comigo
mental e emocionalmente, em seus termos, fazendo uma escolha consciente
entre me parar ou se entregar a mim. Diferente dessa manhã quando minhas
mãos estavam em volta de seu pescoço. Porque ela ainda não entende o que
quer dizer estar disposta.
Alguns minutos depois, ela retorna ao carro e trava o cinto de segurança.
Acelero, observando sua postura relaxada no meu canto periférico.
— Eles não acordaram?
— Não. — Um suave sorriso aparece em seus lábios. — Schubert sente a
minha falta. — Ela se vira no assento para me ver. — Emeric, precisamos
conversar…
— Se é sobre você se mudar, isso é inegociável.
— Eu tenho direito a opinar sobre onde vou morar.
— Não quando se trata da sua segurança. — Mudo a direção para a
Rampart Street e sigo em direção ao Le Moyne. — Com Shane e Lorenzo
naquela casa, eu não preciso dizer como é inseguro morar lá.
Ela franze os lábios em uma carranca.
Descanso minha mão em sua coxa.
— Pare de lutar contra isso.
— Sou sua aluna. Se alguém descobrir que estou morando com você…
— Eu serei preso e você estará livre e longe de todas as consequências.
— Exatamente. Eu não quero isso!
— O risco é meu. — Infundo minha voz com autoridade, uma entonação
que a lembra que eu sou a solução para sua situação apenas porque estou no
comando, no controle e é meu objetivo, acima de tudo, mantê-la em
segurança. — Essa é a minha decisão e você não vai me questionar sobre
isso de novo.
Ao mesmo tempo que diminuo no semáforo, ela solta o cinto de
segurança e se inclina sobre o console.
Sua mão faz uma familiar varredura em meu cabelo, seus olhos sorrindo
para mim.
— Você é meio charmoso quando fica todo sério e mandão. — Ela abaixa
o queixo e agrava a voz. — Tipo eu sou o homem, estabelecendo a lei e é
assim que será.
Fofo. Balanço a cabeça, lutando contra um sorriso.
Ela aperta os dedos no meu couro cabeludo e afasta sua boca a uma curta
distância.
— Mas eu tenho minha própria mente e voz, e você vai escutar quando e
como eu quiser.
Encaro seus lábios, contente e excitado.
— Não espero menos, srta. Westbrook.
Assim como ela espera que eu vá interrompê-la quando ela me questiona.
— Bom. — Um brilho cintila em seu olhar. — Você também deve
esperar que eu não vou desistir de Leopold.
Mas é claro que ela não vai, o que significa que devo descobrir como
fazer isso funcionar.
Ela desliza seus dedos pela minha mandíbula, segurando meu rosto
enquanto me beija. Ninguém do Le Moyne se aventuraria nessa parte da
cidade, então os motoristas que passam podem ficar boquiabertos o quanto
quiserem.
Lambo os lábios dela e pressiono com mais força para juntar nossas
línguas. Só um afago, um movimento sugestivo, mas é tudo o que preciso.
Ela geme, inclinando a cabeça para uma conexão mais profunda, seu peito
se aproximando, ofegando por ar. Cristo, o desejo dela é tão impressionante
quanto o meu.
A luz do semáforo vai mudar a qualquer momento. Eu não me importo.
Eu assumo o controle do beijo, agarrando o quadril dela e nos empurrando
no console. Com meu pé firmemente pressionado no freio, eu dou uma
provocação completa com a língua, atacando e chicoteando entre seus
lábios, ao mesmo tempo que minhas mãos se abaixam para pegar a bunda
dela em um aperto contundente.
Uma buzina soa atrás da gente. Nos separamos, rindo através de pesadas
respirações como estudantes.
Impulsiono o carro para a frente, minha atenção correndo entre ela e a
estrada.
— Toda vez que eu te ver hoje, vou lembrar desse beijo.
Ela coloca o cabelo atrás da orelha e me dá um olhar sensual.
— Eu também.
À medida que blocos de prédios se misturam, estabelecemos em um nexo
vibrante, um vínculo sem palavras estabelecido com uma troca de olhares e
sorrisos. É algo tão confortável, essa energia entre a gente como se
estivéssemos em nosso mundo privado onde erros do passado, sonhos
universitários e regras aluno-professor não existem. Aqui, nesta reclusa
suspensão de tempo e espaço, nada pode nos separar.
Entrelaço nossos dedos no colo dela.
— Me fale o que está pensando.
Ela rola a língua no interior de sua bochecha.
— É estranho sentar em seu carro, vestida com roupas boas e me sentir
saciada com um grande café da manhã. Minha barriga está feliz. — Ela
fecha os olhos antes de abrir de novo, prendendo nos meus. — Estou feliz.
E assustada. Acho que estou bastante assustada, mas a felicidade… não
aparece com frequência e estou com muito medo de perdê-la.
Ela provavelmente está pensando em seu pai e a segurança que perdeu
quando ele morreu.
Quero ordenar a ela que deixe todas as suas preocupações comigo, mas
não funciona desse jeito, então ofereço a ela uma perspectiva diferente.
— Quando estamos juntos, Ivory, quando é só eu e você desse jeito,
felicidade só pode ser limitada por nós. Fazemos as regras e decidimos
como isso vai acontecer. Nosso mundo é tão ilimitado e real como nosso
sentimento um pelo outro.
Ela levanta minha mão e deposita um beijo em meus dedos.
— Obrigada.
— Por?
— Por sempre saber o que falar. — Ela segura minha mão embaixo do
seu queixo. — Por me alimentar. Por me deixar alimentar Schubert. Pelo
celular, pelas roupas e…
— De nada.
Eu juro que seu coração está embrulhado ao redor do meu, esticando,
ronronando e massageando as paredes do meu peito. É aterrorizante e
emocionante o jeito como ela se esgueirou para dentro de mim tão
rapidamente.
Alguns quarteirões da escola, eu paro em uma rua lateral silenciosa.
— Não estou feliz sobre isso.
Ela abre a porta e me manda um sorriso relaxado.
— Eu caminho para a escola todos os dias.
— Não gosto do sigilo.
Já passei por isso, já fiz essa dança com Joanne. Ivory merece mais.
Mas se sou for pego, ela volta para o Treme, para Lorenzo Gandara e seu
desespero financeiro. Eu sou o responsável por protegê-la de tudo.
Pego a nuca dela e a puxo para um beijo.
— Não será sempre assim.
Quando ela se formar, eu não serei seu professor. Nossa relação será
legítima e… ela irá para a universidade, onde quer isso seja. Depois o quê?
Eu a seguirei? Ela irá querer que eu vá? Ela não terá opção de escolher.
Ivory descansa a testa na minha.
— Não faça promessas que não possa cumprir.
Meu rosto esquenta enquanto a convicção endurece minha barriga.
— Eu vou fazer o que…
Ela pressiona seus lábios macios nos meus e de imediato diminui meu
temperamento crescente, me beijando até meu pau inchar.
Muito cedo, ela recua.
— Podemos discutir o futuro depois que eu absorver tudo o que está
acontecendo agora.
E com isso, ela desliza para fora do carro. Seu corpo incrível, seu traseiro
gostoso e as pernas compridas, tudo iluminado pelo sol. Muito
impressionante.
Colocando no ombro sua nova bolsa carteiro, ela abaixa a cabeça para
passar pela alça da bolsa. O decote do seu vestido abre, me dando uma
visão pecaminosa de seus jovens e firmes seios em contraste com o sutiã de
seda vermelha.
Ela me pega observando e levanta uma sobrancelha.
Como eu posso não olhar? É programação genética e Ivory tem peitos
grandes.
Um dos cantos de sua boca se levanta em um sorriso sedutor.
— Te vejo na aula, sr. Marceaux.
Ela se afasta, me deixando sem oxigênio dentro do carro. Abaixo a janela
e acelero o motor algumas vezes para chamar sua atenção.
Olhando por cima do ombro, ela esconde um sorriso entre os dentes
mordiscando.
— Você está tentando competir comigo ou me impressionar?
Eu só queria vê-la sorrir mais uma vez. Agora eu posso respirar de novo.
30

Emeric

Eu passo o dia escutando sussurros e prestando atenção à expressões sutis.


Beverly Rivard me cumprimenta na sala dos professores com um olhar
zangado de desdém. Nada novo. Andrea Augustin me observa à distância,
desconfiada e magoada. Ela vai superar. Prescott fica fora do meu caminho
nos corredores e se esgueira para seu assento durante as aulas. É ele quem
mais me preocupa. Eu o humilhei na frente de Ivory noite passada, um
horrível golpe para seu ego de menino. Mas se ele abrir a boca, ele tem
mais a perder do que sua dignidade.
Na sala de aula, Ivory mantém sua postura de estudante. Ela não mantém
meu olhar por muito tempo. Não flerta ou mostra afeto. Mas a tensão sexual
entre nós paira como uma corrente elétrica. Se alguém souber o que
procurar, eles perceberão. Prescott deve ter noção depois da maneira que a
defendi, mas ele não se atreve a olhar para mim ou para ela. Por enquanto,
tudo o que posso fazer é mantê-lo sobre minha vigilância.
Depois da aula particular de Ivory, voltamos para a casa dela. O céu sem
estrela e a ausência de luz deixa sua rua em uma macha de sombras.
Estaciono o GTO no mesmo local que usei de manhã, observo a
escuridão além da janela.
— Ninguém está em casa.
Desligo o motor e me junto a ela na rua.
Ela balança a cabeça e aponta de volta para o carro.
— Fique aqui. Alguém pode voltar para casa.
É arriscado, mas ela não vai entrar em uma casa escura sozinha à noite.
Tampouco carregar um gato e todos os pertences dela sozinha. Mas, em
caso de seu irmão aparecer, eu preciso prepará-la para uma desagradável
reintrodução.
Pego sua mão e a arrasto até a varanda da frente.
— Eu conheci Shane um tempo atrás.
— O quê? — Ela para na calçada e me encara com seus olhos
arregalados.
Puxo seus dedos apertados, forçando seus pés a me seguirem até a
escada.
— Ele não sabe quem eu sou, e infelizmente, ele não sabe por que que
quebrei seu nariz.
Ela arqueja, seus passos hesitantes, mas eu a mantenho em movimento.
— Aquilo foi você? — Suas sobrancelhas se abaixam enquanto destranca
a porta. Um suspiro sai de seus lábios. — Por causa do meu lábio
machucado.
— Ninguém machuca minha garota.
— Eu amo quando você diz isso — ela sussurra.
Com mãos gentis, ela endireita minha gravata, seus dedos vagando pela
seda antes de se virar.
Quando ela abre a porta, o cheiro de fumaça de cigarro velho atinge meu
nariz.
Um segundo depois, um gato malhado laranja corre das profundas
sombras e para aos pés dela, ronronando como um motor e se esfregando
nos tornozelos dela.
Ela o apanha, aninhando sua cabeça redonda no decote como se ele fosse
a coisa mais importante nesse mundo.
Enfio as mãos nos bolsos e tento controlar meus ciúmes de um maldito
gato.
— Você vai me deixar entrar em algum momento ainda dessa noite?
— Tão impaciente. — Ela aperta o interruptor na parede, inundando a
pequena sala com luz. Então ela estende o gato para mim, colocando-o em
meus braços e me forçando a pegá-lo. — Só preciso pegar as coisas dele.
Enquanto ela corre pela fileira de portas em direção ao fundo da casa, a
bola de pelo em meus braços lança nada mais do que milhares de pelos
laranjas por todo o meu casaco de camurça.
Entro, olhando para ele.
— Você vai mijar em todos os meus tapetes?
Olhos redondos e dourados piscam com preguiça. Então, ele arrasta sua
bochecha peluda pelo meu peitoral, enterrando-se.
Eu nunca morei com um animal de estimação, mas ele parece ser
amigável o suficiente. Mas a queda de pelo…
— Podemos depilar essa coisa? — grito para o quarto dos fundos.
O rangido de seus passos param.
— Eu achei que você não gostava de nada depilado.
Um sorriso aparece em meu rosto. Touché, minha bela garota.
Carrego Schubert pela apertada sala de estar. Está limpo porque não tem
uma maldita coisa aqui além de uma caixa com roupas no canto, uma
mesinha e um sofá com almofadas flácidas. Continuando até os fundos,
passo por um quarto e então por outro, ambos mal cabiam o colchão no
chão e a bagunça de roupas e cinzeiros.
Nenhum dos quartos parece com a garota que eu conheço. Ivory é
organizada, suas roupas são poucas e simples e ela não fuma. Constatação
aperta meu peito e me faz acelerar os passos.
Chego no último cômodo, na cozinha e encontro Ivory levantando uma
caixa de areia próxima da porta dos fundos.
— Onde você dorme?
Ela pega algumas latas de comida para gato do balcão desordenado e
passa por mim até o quarto mais próximo.
— Esse é o quarto da minha mãe.
Ando atrás dela, acariciando o gato e soltando mais pelos. Meu coração
bate no meu peito enquanto absorvo as condições na qual ela vive. Quando
ela alcança o segundo quarto, eu sei o que ela vai dizer e não quero ouvir.
— Esse é o quarto de Shane. — Ela encara fixamente as pilhas de roupas
sujas. — Costumava ser meu, mas quando meu pai morreu, Shane se
mudou de volta. Então…
Ela continua em frente, retornando para a sala da frente. Minha barriga
cede quando olho com novos olhos para o sofá caído.
— É aqui que eu durmo. — Ela olha para mim com expectativa. —
Pronto para ir?
Engulo a raiva com o lembrete que ela nunca mais vai dormir em um
maldito sofá de novo.
— Isso é tudo o que você está trazendo? — Aponto para a pequena
panela e as latas em seus braços.
Seus olhos se abaixam para o gato ronronando no meu peitoral e ela dá
um sorriso caloroso.
— Ele é tudo que ainda tenho aqui.
Enquanto dirijo para fora de seu bairro, a tensão em meus músculos
relaxa com cada bairro que ponho entre ela e aquela casa. Eu nunca me
senti tão certo sobre uma decisão quanto essa.
Com o gato agachado e miando no banco de trás, tem só mais uma coisa
que a traz de volta para o Treme.
Eu faço uma parada não planejada, parando ao longo do meio-fio e das
janelas gradeadas da loja.
Ela se vira no assento procurando pelo meu rosto.
— O que estamos fazendo aqui?
— O homem não vê você há alguns dias. Vá até lá, dê a ele seu novo
número e diga que está segura.
Aquilo me rende um grande sorriso antes dela sair e correr para entrar.
Uma hora depois, jantando na minha cozinha com uma porção de
quesadilhas, Ivory me dá por escrito uma lista com suas contas. Exatamente
como especifiquei, inclui itens que ela precisa comprar como materiais
escolares diversos, desodorante e absorventes. Sorrio quando vejo
anticoncepcional na lista.
Ela tenta me dizer o que eu irei e o que não irei fazer com as contas, mas
eu a calo com meus lábios unidos aos dela e meus dedos na sua boceta.
Suas costas se curvam na ilha da cozinha, nossos pratos vazios
chacoalhando com a pressão da minha mão. Dois orgasmos depois, ela
tropeça até a sala de estar para fazer seu dever de casa, discussão esquecida.
Minhas juntas machucadas ainda estão muito sensíveis para tocar piano,
então corro na esteira, tomo banho e me masturbo com as imagens da
cabeça dela inclinada para trás, pescoço exposto, pernas afastadas, se
contorcendo e vulnerável em meus braços. Vulnerável a todas as coisas
indecentes e depravadas que sonho em fazer em cada buraco do corpo dela.
Cristo, se ela soubesse as coisas que planejei para fazer com ela.
Antes de sair do chuveiro, me masturbo mais uma vez porque, porra, eu
vou dormir ao lado dela essa noite.
Falo para mim mesmo que ela não está pronta para o jeito pervertido e
selvagem que faço sexo, mas no fundo da minha mente, tem uma data de
validade para meu autocontrole. Uma data que está ligada a consulta dela
com o médico no sábado – daqui a quatro dias. Eu tenho essa forte
necessidade de estar com ela sem nada entre a gente, incluindo camisinhas.
Uma vez que os resultados confirmem que eu posso fazer isso, tudo muda.
Ela volta para o quarto para terminar seu dever de casa com Schubert
curvado ao seu lado. Vou para o meu escritório e estabeleço os pagamentos
para cobrir as míseras despesas da família dela. Considero pagar a hipoteca
deles. Seria mais fácil, mas fodam-se. Vou custear as despesas deles até
Ivory se formar, só porque eu não quero dar a eles um motivo para procurá-
la. Depois disso, eles podem dormir debaixo da porra de uma ponte.
Ligo para meu serviço de buffet e faço eles adicionaram Stogie na rota
diária deles. Ele pode recusar a comida. Ou talvez ele possa ver isso como
é: a minha gratidão por oferecer a Ivory um lugar seguro por todos esses
anos.
Com isso finalizado, faço mais alguns telefonemas para encontrar um
detetive particular e faço contato. Terminando a conversa, o detetive tem
muito pouco para seguir em frente. Um nome. Um número de placa. Mas
ele me garante que é o suficiente.
Até o final da semana, o detetive particular prova seu valor fornecendo
tudo o que preciso para seguir em frente.
Eu sei perfeitamente como lidar com Lorenzo Gandara.
31

Ivory

Sexta-feira na hora do almoço, estou caminhando em direção ao meu


armário no Campus Central. Ellie corre ao meu lado, falando sobre como
meus passos são largos ao andar. Em vez de apontar que as pernas dela são
mais curtas que as minhas, diminuo meu passo e bato de lado no quadril
dela.
— Você parece diferente. — Ela sorri para mim, piscando seus olhos
castanhos angulares. — Isso é tudo o que estou dizendo.
Ela não mencionou as roupas novas. Não, ela está muito ocupada
tentando encontrar o significado escondido por trás do meu jeito de
caminhar.
— Você está… mais leve. Sabe, leve como uma pluma. — Ela salta na
minha frente e bate de costas nos nossos armários, seu rabo de cavalo preto
enroscando ao redor do seu pescoço. — Você está namorando um garoto,
não é?
Eu não sei o que Emeric é meu, mas com certeza ele não é um garoto.
— Então você está dizendo que um cara é um remédio especial para
perda de peso? Ou talvez você esteja dizendo que eu esteja com gases?
Ela ri e se vira para colocar sua combinação.
— Você é tão estranha.
Abro meu armário e encontro um pequeno papel dobrado no topo dos
meus livros. Com um grande sorriso, estico a mão para tocá-lo. Acariciá-lo.
Emeric tem me deixado bilhetes a semana inteira. Só de imaginá-lo
rabiscando cada um em sua eloquente caligrafia e saindo do seu caminho
para enfiá-lo na abertura da porta do meu armário, faz meu peito vibrar.
Ellie está em pé alguns centímetros de distância, distraída com o celular.
Seguro o bilhete dentro do armário e o abro.
Eu quero você.
Esperarei por você.
Você me tem.
Ele faz minha alma estremecer. Leio de novo e todo o meu corpo dói.
Quando fecho meus olhos, escuto sua profunda voz, sinto seu toque quente
e o sabor de canela de sua respiração. Ele está comigo, sempre me
cercando, me levantando. Droga, talvez eu esteja mais leve.
O clique de saltos se aproxima por de trás de mim. Amasso o bilhete na
minha mão e olho por cima do ombro.
Ann se recosta no armário entre mim e Ellie, e me dá uma olhada.
— As garotas têm conversado.
Uhum. Ela está aqui, em nome da população feminina, para me lembrar
que ela é mais bonita, mais inteligente e mais popular.
Deslizo a mão para dentro da bolsa carteiro e solto o bilhete amassado.
Então me viro para encará-la de frente, usando o mesmo sorriso que meu
pai sempre falou ser minha maior arma.
Seu olhar de desprezo distorce sua pele negra lisa e traços perfeitos.
— Este é um vestido Dolce & Gabanna.
Olho para o vestido com estampas de margaridas amarela e branca,
amando como a silhueta em linha A encaixa no meu corpo.
— Está bem.
— Ontem você usou um Valentino. Antes de ontem, você usou um Oscar
de la Renta. Sério, Ivory. Agora você é uma ladra de lojas?
Por que Emeric não escolheu algumas roupas do Walmart? Eu não
saberia a maldita diferença.
Porque ele não faz nada a menos que seja exagerado.
Ellie anda até mim, colocando sua mochila enorme por cima do ombro.
— Deixe-a em paz, Ann.
— Está tudo bem. — Aponto em direção ao Pavilhão Meia-Lua. — Eu te
alcanço, tudo bem?
Ela me dá um sorriso simpático e anda em direção a nossa próxima aula.
Eu me viro de volta para Ann e considero uma resposta repulsiva porque
é muito engraçado vê-la sofrer. Eu poderia falar que eu fodi com o gerente
da loja Neiman Marcus. É lá que as pessoas vão comprar essas roupas? Eu
não sei, mas essa sugestão acerta muito perto dos meus acordos anteriores.
Ah, eu sei…
— Comecei a vender meus óvulos.
Seus olhos castanhos se arregalam.
— Você… o quê?
— Óvulos. — Dou de ombros. — Quem sabia que ovulação poderia ser
tão lucrativa? Com minha boa aparência e excelente notas do SAT, centros
de fertilidade me pagam o dobro da taxa atual.
Ela faz um barulho engasgado.
— Isso é nojento.
— Assim como sua atitude. — Fecho o armário e ando ao redor dela. —
Mas, fico muito emocionada pela forma como você presta atenção em mim.
Traz novos ares para nossa amizade. Talvez possamos ir fazer compras e ter
festas do pijama. — Prefiro ser esmagada por um piano de quinhentos e
cinquenta quilos. — Poderíamos arranjar colares de melhores amigas…
— Você é tão vadia.
— … ou não. — Dou um tapinha em seu ombro ossudo quando passo. —
Obrigada por ser sincera.
Várias horas depois, estou sentada atrás de um Steinway no palco do
teatro do campus. Emeric mudou minhas aulas particulares para cá alguns
dias atrás para me deixar confortável com a acústica. O Feriado de
Celebração da Assembleia de Música é daqui há dois meses. Como uma das
maiores apresentação do Le Moyne, o balé é aberto ao público e apresenta
os melhores músicos e dançarinos da Academia.
Piano é uma pequena parte da produção, mas eu amaria fazer parte disso.
Emeric ainda não anunciou quem ocupará a vaga. Ele leva seu trabalho tão
a sério que ele não está me dando nenhuma vantagem só porque estamos
juntos. Eu tenho que merecer e não há uma célula em mim que questiona
isso nele.
Embora ele tenha uma maneira frustrante de me fazer esperar pelas
coisas.
Quando ele se juntou a mim na cozinha essa manhã, ele me falou que é
lindo me ver esperar.
De bom grado ficarei exausta esperando por ele. Esperar por ele é
disciplina. Esperar por seu afeto. Esperar pelo desconhecido.
— Comece de novo. — Sua voz explode das sombras dos assentos
enfileirados.
Nós temos o teatro para nós. Ele está em algum lugar da primeira fileira,
mas não consigo vê-lo além das luzes ofuscantes do palco.
Curvada sobre o piano, mergulho no O Quebra-Nozes de Tchaikovsky.
Minhas mãos voam através das explosões trêmulas, os pulsos estalando
sobre a mudança rápida das teclas. Eu já toquei essa peça tantas vezes que
sei de cor, meus dedos se movem por vontade própria, perfeitamente
adaptados às notas.
Quando o mostrador do meu relógio chegas às sete horas, transpiração
lambe minha pele e espasmos machucam as articulações dos meus ombros e
das mãos. Emeric só me interrompeu algumas poucas vezes para apontar
deslizes. Inferno, ele tem estado tão tranquilo pela última hora que me
pergunto se ele foi embora.
Eu me viro no banco do piano e pisco contra as luzes.
— Você adormeceu aí?
— Não. — Ele pigarreia. — Isso foi excelente, srta. Westbrook. — Sua
voz sombria e profunda ecoa pelo teatro. — Esse palco não é grande o
suficiente para você.
Fios de calor desenrolam dentro de mim, espiralando pelos meus braços
até entre meus peitos e ao redor da minha coluna.
— E quanto aos palcos da Leopold? — Inclino a cabeça, piscando contra
as luzes. — Você sabe, já que é para lá que eu vou.
— Leopold é só uma ideia presa em sua cabeça. Pense grande. Acima.
Acima do que o melhor conservatório? Franzo meus lábios.
— Como o quê?
— Não há uma audiência no mundo grande o suficiente para conter você.
Mas você precisa de uma apaixonada o suficiente para abraçar você.
Uau. Eu nunca pensei sobre isso desse jeito.
— Venha aqui.
É uma ordem que ele daria para qualquer um de seus estudantes como
sente-se, pare de falar, responda a pergunta. Mas para mim, há um
significado mais profundo, um que não pertence entre as paredes da escola.
Minhas coxas tremem quando me levanto do banco. Minha respiração
acelera ao me aproximar dele, descendo os degraus do palco e em direção à
escuridão dos assentos vazios.
Ele se senta na lateral da primeira fileira, além das luzes do palco. Com
um tornozelo apoiado no outro joelho e braços apoiados nos descansos de
braços, ele é a imagem de autocontrole calmo. Mas seus olhos frios e
focados, perfuram os meus.
Paro ao alcance de um braço, minha atenção caindo para o comprimento
longo e duro subindo em sua calça.
— Ivory. — Seu tom sensual levanta minha cabeça.
Esfrego a nuca.
— Você está… hum, duro. É por causa da minha apresentação?
— Tudo o que você faz me excita — ele sussurra. — Principalmente os
movimentos femininos do seu corpo quando você toca. Eu a quero nua,
sentada no meu piano e balançando os seus quadris como se estivessem
fodendo as notas.
Um raio de calor dispara entre as minhas pernas, iluminando cada
centímetro de mim. Eu quero libertá-lo de suas calças e sentir o peso de seu
pau nas minhas mãos. Na minha boca.
Ele golpeia um dedo em seu lábio inferior.
— A posição de solista no balé é sua.
Um sinal de felicidade formiga em meus membros.
— Obrigada.
— Eu amo quando você está grata. — Ele lambe seu lábio inferior. —
Mas você mereceu, Ivory. Você vai roubar o espetáculo.
Suas palavram elogiam meu talento, mas o brilho ardente em seus olhos
aprecia tudo em mim enquanto seu olhar aprecia os traços do meu corpo e
investiga por debaixo da minha pele. Ele me conhece em um nível
profundo, melhor do que qualquer outra pessoa e gosta do que vê em mim.
Uma súbita e muito específica necessidade ecoa em meu peito,
despertada do núcleo do meu ser. Uma necessidade de satisfazê-lo, de sentir
o poder em dar a ele esse presente.
Eu puxo o pé apoiado no joelho, até que ele abaixa no chão. Ele se
levanta, mas eu o paro com as minhas mãos em suas coxas duras como
pedra. Então, eu me ajoelho entre suas pernas abertas.
Ele agarra meu cabelo, sua entonação dura com o aviso.
— Ivory.
Com um impulso de coragem, seguro seu pau dentro das calças e toco
pela primeira vez.
— Eu quero saborear isso.
— Porra. — Sua respiração vagueia pelo amplo auditório. A mão em
meu cabelo puxa, espalhando dor em todo o meu couro cabeludo. — Aqui
não.
Se voltarmos para a casa dele, vou perder a coragem no caminho. Eu
odeio a sensação de um homem em minha boca desde a primeira vez que
Lorenzo me levou até lá. O engasgo, a perda de ar e a humilhação de algo
tão desprezível gozando em toda a minha língua…
Eu quero que isso seja diferente com Emeric. Eu preciso que ele me
mostre como fazer isso com prazer.
Cercada pelos músculos rígidos de seu peitoral e pernas, acaricio minha
mão na pulsação inchada de sua ereção.
— Irei rastejar para você. Me curvar a você. Não importa o que você
queira, eu quero. Só… me dê isso.
Um barulho pesado e rouco escapa de seus lábios.
— Puta que pariu. Como é que vou dizer não para isso?
Ele envolve meus cabelos em seu punho, seu olhar atravessando o
auditório e parando nas portas fechadas.
Será que ele está pensando em Joanne e no momento que eles foram
pegos?
São depois das sete horas em uma sexta-feira à noite. Somos as duas
únicas pessoas no Pavilhão Meia-Lua e ninguém vem aqui depois do
horário das aulas. Mas se essas portas se abrirem, eu vou estar nos meus pés
antes que sejamos pegos. Além disso, só as minhas costas estão sendo
iluminadas pela borda fraca das luzes. Ninguém pode vê-lo nas sombras.
Eu sei que ele considerou tudo isso antes de sussurrar bruscamente:
— Me liberte.
Excitação me percorre quando afrouxo seu cinto e deslizo o zíper.
Minhas mãos tremem e minha boca inunda com saliva.
O punho em meu cabelo se fecha quando uma corrente de tensão passa
por seu corpo. Ele levanta os quadris, puxando a calça com a mão livre.
Quando o zíper se move para baixo do pesado saco, minha barriga treme de
expectativa por tocá-lo.
No espaço escuro entre nós, o comprimento dele se projeta, longo e
bonito, pulsando com as veias. Minhas mãos flutuam em direção a ele,
dedos curvados ao redor da base grossa.
Ele me puxa para trás pelo cabelo e estuda o meu rosto, seus olhos azuis
com um fraco brilho na escuridão.
— No momento que você quiser que isso pare, levante sua cabeça no ar.
Por que eu não serei capaz de usar minha voz? O medo se infiltra, mas eu
o empurro para longe. Eu tenho a força de ser vulnerável com ele.
— Eu irei.
Ele solta meu cabelo e agarra os descansos de braço com as duas mãos.
— Agora, me chupa.
Ajoelhada entre ele e com os meus dedos tremendos nos curtos cabelos
escuros em sua virilha, abaixo a cabeça e deslizo minha bochecha pelo seu
pau, acariciando, beijando e saboreando a sensação de aço revestida em
carne sedosa.
Seu corpo inteiro derrete na cadeira.
Arrasto meu nariz em seu comprimento, cheirando o aroma de homem
que eu confio, puxando seu almíscar amadeirado para dentro dos meus
pulmões.
Um gemido corta sua respiração e suas pernas se alargam, esticando as
costuras ao redor de seu zíper.
— Pare de brincar com ele e chupe-o.
Sorrindo, giro minha língua pela ponta, arrancando um arquejo da
garganta dele. A visão de seus punhos esbranquiçado ao redor do descanso
de braço produz uma pulsação entre as minhas pernas. O puxão de seu pau
nos meus lábios leva um calor úmido para meu núcleo. O prazer dele é meu
prazer.
Enquanto eu chupo e lambo a coroa, alcanço sua cueca para provocar
suas bolas com o amassar dos meus dedos. Então fecho meus olhos e puxo-
o para minha boca.
— Ah, caralho — ele grunhe. — Desse jeito. Mais fundo. Achate a
língua. Assim. — Suas pernas tremem. — Jesus, Ivory. Desse jeito mesmo.
Eu me emociono com seu elogio e balanço a cabeça mais rápido. Quando
ele não está revirando o pescoço para ver a porta, eu sei que ele está me
observando, absorvendo o contentamento em meu rosto enquanto eu
ofereço e entrego. Imaginar o desejo em seus olhos, me recarrega quase
tanto quanto a maneira como ele me domina a cada passo do caminho.
Cuspa. Lamba sob a cabeça. Gire seu punho. Vá fundo.
Inferno, esse homem. Ele não pode ficar só sentado ali e aproveitar o
boquete. Seus sussurros severos exigem que eu faça do jeito que ele gosta,
mandando os movimentos exatos para fazer. Chupe mais rápido. Acaricie
com mais força. Deixe-o molhado.
Ele é um completo maníaco por controle, mas eu sabia que ele
responderia exatamente dessa maneira. Eu o amo desse jeito. Sua maldita
boca suja e a grosseria em seu timbre fazem meus lábios formigarem e
meus mamilos endurecerem.
Quando ele perde o último do seu controle, não tem aviso. Em um
borrão, ele agarra meu cabelo e bate minha cabeça para baixo. Eu me
engasgo, babando cruelmente e sugando por ar. Um grunhido doloroso
escapa dele enquanto ele empurra seus quadris e impulsiona com força,
mais fundo. Eu engasgo com o modo tão violento que meus olhos se
enchem de lágrimas com a pressão e meus dedos lutam para se apoiar nas
sobras da calça dele.
As duas mãos entrelaçadas no meu cabelo enquanto ele segura meu rosto
contra sua virilha, seu pau cavando na minha garganta, sua voz rouca.
— Levante sua mão, merda, e eu paro.
Minhas mãos estão livres. Eu posso levantá-las a qualquer momento.
Então, ele irá me soltar e o desconforto irá passar. O poder nisso abre algo
dentro de mim.
Eu quero isso. Eu sinto isso em um nível visceral, essa necessidade dele
de foder minha boca selvagemente, descuidada e sem pensar. Talvez porque
ele se conteve por tanto tempo, se conteve por mim, eu anseio dar isso a ele.
Ou por acaso eu queira essa dor tão forte e bem no fundo dentro de mim
que ele é tudo o que eu sinto.
Com a cabeça larga batendo na parte de trás da minha garganta e
provocando minhas vias aéreas, já machuca. Minhas amígdalas parecem
com dolorosas massas de tecidos inchados. Ele está fazendo isso porque ele
quer e eu amo isso, desejo isso como qualquer mulher decente jamais faria.
Eu nunca fui decente. Eu sou suja – o tipo de suja de Emeric que deixa
uma reivindicadora dor prazerosa em minha garganta. Ele tenta me foder
tão intenso quanto pode porque ele é o meu mestre, o homem que eu desejo
da maneira mais sombria e mais terrivelmente bonita possível.
— Levante… a… porra… da… sua… mão. — Ele pontua cada palavra
com golpes na minha boca.
Enterro minhas unhas nas coxas dele, um apelo silencioso. Não pare.
Ele apunhala seus quadris e puxa meus cabelos, pernas tremendo e
respiração ofegante fora de controle. Quando eu acho que não aguento
mais, o equilíbrio muda. Ele fica quieto, diminuindo suas investidas,
acariciando meu cabelo e preenchendo minha boca com seu orgasmo.
Meu nome ecoa pelo auditório ao mesmo tempo que seu corpo
convulsiona e suspira.
O poder é meu. Eu desfruto disso. Suas mãos tremem e eu as pego,
segurando-as, nossos dedos entrelaçados. Eu o tenho.
32

Ivory

Na manhã seguinte, protejo meus olhos dos raios solares e ando em direção
a um carro estranho na entrada de Emeric.
— O que é aquilo?
Ele me segue para fora de casa e anda na minha frente.
— Um Porsche Cayenne.
— Tudo bem. Por que está aqui? — Pensei que ele fosse me levar para a
consulta médica no carro dele. — De onde que isso veio?
Suas pernas fortes o levam em direção ao SUV esportivo branco, sua
maravilhosa bunda flexionada no jeans de cintura baixa. Com o chiado da
chave, ele destranca o carro e abre a porta do motorista antes de se virar
para mim em uma postura ampla e braços cruzados em frente ao peitoral.
A camisa estica ao redor dos bíceps definidos e ombros formidáveis, e os
vincos do jeans delineiam a protuberância entre suas pernas. Eu encaro sem
arrependimento, um sorriso se abrindo em meu rosto ao me lembrar do jeito
que seu pau duro bateu na minha garganta na noite passada.
— Olhe para mim. — Reprovação endurece seu tom de voz. Levanto
meu olhar e ele diz: — Mandei que entregassem essa manhã.
Cerro os dentes. É bom que esse carro não seja para mim.
— Pensei que ia preferir americanos bebedores de gasolina e barulhentos.
O azul de seus olhos brilha magneticamente ao sol.
— Verdade. Mas essa é um dos SUVs mais seguros no mercado.
Aham, é para mim, porra. Outro presente que não preciso. Agora eu sei
por que ele me perguntou mais cedo nessa semana se eu tinha carteira de
motorista.
— Obrigada, mas não…
— Nós não estamos discutindo sobre isso.
— Hum, sim, nós estamos. Já é difícil o suficiente explicar meu guarda-
roupa na escola. Mas o carro? Impossível. — Coloco as mãos no quadril. —
Devolva.
— Não. — Ele joga a chave em minha direção.
Deixo-a cair na calçada aos meus pés e dou a ele meu melhor olhar.
Sua boca se estica em uma linha severa.
Ah, porra. Meu pulso acelera.
Ele junta as mãos atrás das costas e me espreita, devagar e
metodicamente, seus olhos penetrando os meus.
Dupla merda. Abaixo meus braços para as laterais e examino o quintal.
Estamos atrás da propriedade, escondidos da rua. Os carvalhos imponentes
formam uma parede viva de privacidade entre os lotes. Não que eu esteja
com medo de ficar sozinha com ele desse jeito. Ou talvez esteja, mas
qualquer medo que eu tenha é sufocado pela mistura inebriante de dar e
receber que nos funde de forma tão linda.
Contudo, não significa que eu tenha que aceitar um carro. Abaixo meu
olhar para a chave.
— Olhos em mim!
Minha atenção voa para os traços esculpidos em seu rosto e as veias
pulsantes em sua sobrancelha. Já se passaram alguns dias desde que eu o
irritei, mas eu conheço aquele olhar. Ao mesmo tempo que ele me circunda,
estou dançando e me encolhendo por dentro, antecipando uma mão
estrangulando minha garganta ou uma mão batendo forte na minha bunda.
Talvez ele finalmente faça sexo comigo, bem aqui em plena luz do dia. Eu
aceitaria qualquer um ou tudo isso. Eu estive em um estado tão elevado de
excitação desde que eu me mudei que eu poderia muito bem tirar minhas
roupas e tomar a decisão por ele.
Ele para atrás de mim sem me tocar, mas próximo o suficiente para
mexer meu cabelo com sua respiração.
— Eu já tive meus dedos dentro da sua boceta, meu pau na sua boca e o
seu sabor em meus lábios. Eu sou a única pessoa no planeta que sabe como
você fica linda quando goza. Todas aquelas sardas na sua coxa, os sons que
você faz quando dorme, a paixão que você invoca ao tocar piano, tudo
sobre você é precioso e insubstituível. Então, eu vou, sim, embrulhá-la nas
melhores coisas e protegê-la em um carro seguro. E você irá me agradecer
com esses deslumbrantes lábios ao redor do meu pau quando entrarmos em
casa.
Meu coração sobe e desce com cada palavra, minha respiração
gaguejando ruidosamente.
— Esse sou eu, Ivory, e você é a parte mais essencial e mais importante
em mim. — Ele se afasta. — Agora se incline.
Meus joelhos vacilam com suas palavras. Alcanço meu Chucks preto nos
pés e o jeans de grife chique que separa minhas coxas. A desvantagem do
jeans de cintura baixa? Ele está tendo uma visão perversa da minha bunda
agora mesmo.
Sua palma bate de encontro a minha bunda com uma força que rouba
minha respiração e me empurra para a frente. Contudo, ele passa seu braço
ao redor da cintura e a mão me mantém dobrada na posição. Doce Jesus,
minha nádega está pegando fogo. O calor se espalhando por fora e
circulando pelo meu sangue para se acumular entre as minhas pernas.
Ele esfrega o local, limitado pelo bolso fortemente costurado em meus
jeans.
— Pegue a chave.
Pendurada no braço dele, pego a chave do chão no piso de lajota.
Ele agarra meu bíceps e me leva até o carro.
— Eu deixaria sua bunda vermelha se você não fosse mostrá-la ao
médico. — Ele para na porta do motorista. — Mãos no teto.
Merda. E agora? Coloco a chave no assento e as palmas no teto branco
brilhante, manchando a pintura imaculada com suor.
Seus dedos vagueiam pelo meu quadril abrindo um botão do jeans. Meu
coração acelera em um calor febril crescente. Ele abre o zíper e, com um
empurrão, coloca tudo aos meus pés.
Ficar parada do lado de fora à luz do dia pelada da cintura para baixo… é
a primeira vez para mim. Não consigo decidir se estou tremendo com
emoção de alguém ver, do medo da dor inevitável ou da antecipação ardente
do toque dele em mim de novo. De certo, todas as opções acima.
— Abaixa e segura no assento.
Sigo seu comando com uma sensação de paz tomando conta de mim. O
que quer que ele faça a seguir, me fará sentir um pouco menos perdida.
Cada vez que ele me pega com a mão, ele abre uma porta que mostra mais
sobre mim. A pessoa que ele revela não está envergonhada ou fraca. Por
fim estou descobrindo o que quero.
Seu Dr. Martens se arrasta nos tijolos enquanto ele se abaixa atrás de
mim. Suas mãos envolvem minhas coxas e no segundo seguinte, ele enterra
o nariz na minha boceta.
Um estalo de vergonha cora meu rosto. Mas de forma rápida, transformo
em uma corrente de desejo ao mesmo tempo que a respiração dele roça
minha carne. Uma profunda respiração segue e seus dedos se apertam nas
minhas pernas.
Ele está me cheirando. Bem lá embaixo. Profundamente e várias vezes.
Eu nunca imaginei que ficaria tão excitada com isso, mas estou tremendo e
ofegante com a sensação estranha e incrível. Ele está tremendo também e…
Ah, puta que pariu, ele está me lambendo e beijando minha boceta do jeito
que ele beija minha boca. Outra – puta merda – primeira vez.
Mordo meu lábio em um choro silencioso enquanto ele enfia sua língua
entre as minhas pernas. Ele percorre minhas dobras com mordidas brutas na
pele sensível e arranhões com sua barba por fazer. É dor e prazer, soprano e
baixo, e cada oitava no meio. Vou gozar. Eu sinto o puxão e alcanço aquele
lugar maravilhoso, balançando minha boceta no seu rosto e cravando meus
dedos no assento de couro. Quase lá. Quase…
Ele se afasta.
Eu me endireito para me virar para ele e agarrá-lo, mas ele está bem ali,
me pegando no emaranhado de jeans com suas mãos no meu quadril e sua
língua na minha boca. Ele desliza seus lábios nos meus em movimentos
escorregadios, espalhando o sabor picante de minha excitação entre a gente.
Ele para o beijo e sobe a calcinha nas minhas pernas trêmulas.
Minhas entranhas pulsam, doendo para terminar o que ele começou.
— Eu não gozei.
— Eu sei. — Ele puxa meu jeans, fechando. Então ele agarra minha mão
e pressiona em sua ereção atrás do zíper. — Vou esperar por você.
— Você não vai na consulta comigo?
Arrependimento marca seu rosto e ele solta minha mão.
Lógico, ele não pode ir. Alguém pode nos ver juntos. Mentalmente me
bato.
— Foi por isso que me deu o carro.
Ele segura meu rosto e me beija.
— Me desculpa. — Eu me inclino para trás e olho para ele através dos
meus cílios. — Fui uma criança mimada sobre isso.
— A mais mimada.
— Por que não me contou?
Um sorriso se abre em seu maravilhoso rosto.
— Onde estaria a graça nisso?
Ele gosta quando eu não me comporto bem para que ele possa me
disciplinar? Lição de hoje: a pior punição é um orgasmo negado.
Quando estou sentada no assento do motorista, ele se inclina sobre a
janela aberta e me dá um olhar duro.
— Não discuta com o médico.
— Não irei.
— Faça o exame de sangue.
— Farei.
— E pegue o anticoncepcional que ele prescrever.
Meu pulso acelera.
— Com certeza.
Esses olhos duros suavizam em um olhar que eu nunca vi antes nele.
— Volte para mim.
Alcanço sua mandíbula sombreada para acariciar.
— Conte com isso.
33

Ivory

Um desconforto fervilha dentro mim enquanto dirijo pela entrada de


Emeric. Talvez seja porque estou usando roupas de marca, dirigindo um
carro caro e obcecada por um homem sem ideia para onde estou indo. Eu
sei meu caminho para a clínica, mas e depois? Os próximos meses? Depois
que me formar? Para onde eu vou e como irei chegar até lá?
Eu sei que Emeric pretende me manter por perto. Isso me encanta tanto
quanto me perturba. Parte do motivo pelo qual quero ir para Leopold é para
sair do Treme. Bem, eu consegui e aqui estou eu, em um endereço que até
Ann invejaria. Mas eu anseio por continuar praticando piano e não só sob as
instruções do meu professor. Mas dos melhores professores que a Leopold
tem para oferecer. Como eu poderia jogar fora meu sonho por um homem e
me perdoar? Como Emeric poderia me respeitar se eu fizesse isso?
Ele não poderia. De todas as lições que ele me ensinou dentro e fora da
sala de aula, a mais profunda é como reconhecer a própria força e ir atrás do
que quero.
Em meio aos meus pensamentos agitados, me pergunto sobre minha mãe
e Shane. Será que eles questionam onde estou? Emeric mantém as contas
em dia, então talvez eles nem se importem. Ou talvez estejam muito
drogados para perceber minha ausência. Tento não remoer isso. As coisas
que eu quero deles, seus interesses e preocupações, morreram junto com
meu pai. Minha família está quebrada, uma verdade angustiante que aceitei
muito tempo atrás.
Alguns minutos da casa dele, estaciono o Porsche em frente ao Saúde da
Família do Sul. Colocando o celular no bolso de trás, entro no prédio
moderno de um único andar.
Algumas poucas pessoas estão na sala de espera, mas nenhuma delas
levanta o olhar de seus celulares quando entro. Faço o registro, preencho os
formulários e retorno-os para a mulher de meia idade atrás do balcão.
— Sente-se. — Ela coloca seu cabelo castanho ondulado atrás da orelha.
— O dr. Marceaux irá vê-la em breve.
Enrijeço, minha atenção correndo atrás dos panfletos nas prateleiras à
procura de algo que confirme o que escutei.
— Você disse Marceaux?
— Esse não é… — Ela olha para a tela do computador. — Aqui diz que
você solicitou o dr. Marceaux.
Meu sangue congela. Emeric mencionou que seu pai era médico, mas eu
supus que ele trabalhava em algum hospital chique ou algo assim. Pelo
amor de Deus, por que ele me mandaria até o seu pai para que ele
examinasse minha vagina? Quem sabe esse doutor é um Marceaux
diferente? É um sobrenome comum?
— Ele tem… — É muito arriscado perguntar isso? Foda-se. — O dr.
Marceaux tem um filho? Professor?
— Ah, sim. — A mulher abre um grande sorriso e recosta na cadeira,
olhando para mim. — Pelo olhar em seu rosto, suponho que ele tenha você
sob seu feitiço também.
— Não. Eu… — Minhas bochechas queimam. — O que você quer dizer?
— Toda vez que aquele belo homem entra aqui, ele deixa as mulheres em
um estado de confusão. — Ela ri. — Pegue um número, querida. Há uma
longa fila de mulheres esperando por um pedaço.
Ela acabou mesmo de dizer isso? Rangendo os dentes, encontro uma
cadeira e pego o celular. Eu tenho dois nomes nos meus contatos. Stogie e
Senhor&Mestre. O último foi a tentativa de humor de Emeric quando
configurou o telefone. Eu não tive coragem de mudar.
Abro o aplicativo de mensagens.
Eu: VC me mandou para o seu pai??? Pra pegar anticoncepcional? VC
é doido?
As portas da frente se abrem e uma mulher muito grávida anda até o
balcão. Ela é toda barriga. Magra e pequena em todos os outros lugares.
Como diabos ela consegue andar tão graciosamente nesses saltos-altos?
A vibração de uma mensagem recebida chama minha atenção de volta
para o celular.
Senhor&Mestre: Ele vai fazer tudo menos o Papanicolau. Não me
questione.
Mas ele irá me ver em um robe fino e me verificar para DSTs?
Eu: Ele sabe sobre a gente?
Senhor&Mestre: Sim.
Sim? Isso é tudo o que ele vai dizer?
Aperto a ponte do meu nariz, debatendo a sabedoria de sair.
— Preciso vê-lo neste instante. — A mulher grávida aumenta o tom de
voz, me fazendo levantar os olhos.
Ela junta seu longo cabelo para segurá-los longe de sua pele pálida, sua
postura tensa gritando com frustração.
— Senhora — a recepcionista diz com firmeza —, se me der suas
informações, marcarei…
— Volte lá e diga que Joanne está aqui.
Minha barriga se contrai ao mesmo tempo que todo o meu mundo se
estreita para a barriga. Ela não pode ser a Joanne dele. Essa… essa mulher
está grávida. Muito grávida. Tipo, facilmente uns sete ou oito meses.
Emeric me disse que não a viu faz seis meses.
Meu peito se aperta. Não. Não, não, não. Emeric teria me falado.
A recepcionista se levanta.
— O dr. Marceaux está lhe esperando?
— Estou carregando o neto dele. — Ela aponta para a barriga. — Passe
VIP. Eu preciso vê-lo. Agora.
Náusea percorre meu estômago, revirando-o. Isso não é verdade. Eu devo
ter escutado errado.
A recepcionista arregala os olhos antes de deslizar pelo corredor para os
fundos.
Relaxando contra o balão. Joanne descansa o celular no ponta da barriga
de grávida. Do bebê do Emeric.
Minhas entranhas se agitam com bile. Verifico a sala de espera à procura
de um banheiro, meu olhar alcançando um e se prendendo nele. Ela me dá
um pequeno sorriso e segue em frente, sentando-se na cadeira ao lado da
minha.
Seu pequeno nariz, traços planos e suaves, e olhos próximos dão a ela
uma pequena aparência de fada, uma que fica muito boa nela. Muito boa
mesmo. Ela é dolorosamente bonita como a perfeita combinação de Kristen
Bell e Keira Knightley.
Não é de admirar que ele a ame.
A mãe do seu filho.
Junto minhas mãos para parar o tremor. Por que ele não me contou? Ele
está tentando resolver a situação com ela? Para que eles possam ser uma
família feliz?
Lágrimas espreitam, queimando meus olhos e uma horrível dor fecha
minha garganta. Salto do assento e ando o mais calma que posso até o
banheiro para uma única pessoa. Assim que fecho a porta, solto uma
respiração alta e irregular, atendendo a última chamada discada no meu
celular.
A voz grave de Emeric roça meu ouvido.
— Ivory.
— Sua namorada grávida está aqui.
Por favor, me diga que estou errada. Meu peito dói com tanta
intensidade que não posso respirar.
A ligação fica em silêncio por um momento pesado. Então uma
enxurrada de sons passa. Sua respiração, a batida da porta, o ronco do
motor…
— Estarei aí em três minutos.
Então é verdade. A gravidade daquilo tira a força das minhas pernas.
Escorrego pela porta, caindo no chão e tentando manter as lágrimas de
oscilar minha voz.
— Você mentiu para mim.
— Best…
— Omitir é o mesmo que mentir. — Aperto o celular. — Palavras suas.
Sua respiração pesada ruge através da ligação.
— Diga que não falou com ela.
— Por quê? — Meu queixo treme. — Por que sou seu segredo sujo? Sua
amante enquanto você trabalha no seu relacionamento…
— Que Deus me ajude… — Sua voz está tão fria que arrepia os pelos da
minha nuca. — Eu vou destruir meu maldito cinto na sua bunda.
Abaixo o telefone, respiro fundo e me acalmo, para, em seguida, levantá-
lo de volta à minha orelha.
— Você é um canalha.
— Continue, Ivory. Você não vai andar por semanas.
— Por que não me disse?
Um baque alto vibra através do celular, em desacordo com a sedosidade
de sua voz.
— Isso é problema meu, um que irá desaparecer em breve.
— O quê? — Indignação aumenta minha voz. — Você não pode apenas
fazer um bebê desaparecer!
— Diminua a porra da sua voz. Onde você está?
— No inferno.
— Melodrama não combina com você.
Eu soco um punho patético na parede de azulejos.
— Vá se foder.
— Vá você se foder por fazer suposições sobre merda que não sabe! —
ele troveja.
— O bebê é seu?
— Eu fiz uma pergunta! — ele grita antes de controlar sua voz. — Você
está me fazendo esperar.
— Bom. — Sentada no chão do banheiro, me apoio na porta, esticando
minhas pernas para a frente. — Você pode ir se foder com sua espera.
— Estou do lado de fora. — O barulho da sua respiração força o silêncio,
seguida pelo estrondo da porta do carro. — Ouça com cuidado. Eu sei que
você está machucada e que fui eu quem causou isso. Mas você vai superar
essa porra e confiar em mim.
Ele não pode estar falando sério. Eu não me dou ao trabalho de
responder.
— Lidarei com Joanne — ele diz. — E você irá para a porra daquela
consulta.
Ele termina a ligação e eu encaro a tela em incredulidade. Eu fico no
chão, rangendo os dentes e amaldiçoando o sexo oposto.
Homens que elogiam e prometem são os que mais machucam. Eles
coagem, subornam e fodem com a minha cabeça. Para depois foder com o
meu corpo, deixando o tipo de medo que ninguém pode ver.
Eu achei que ele fosse diferente. Agora, eu não tenho tanta certeza.
Mas eu sei que ele não é do tipo de engravidar uma mulher e abandonar.
Ele é muito controlador e obsessivo para não se envolver por completo na
vida da criança.
E foi por isso que ele aceitou o acordo com a diretora em vez de sair do
estado.
Eu amo isso nele. Porém, também odeio. Sou ciumenta e egoísta. Eu
abraço a dor que se retorce na minha barriga. Deus, isso dói pra caralho.
Um punho bate na porta.
— Ivory Westbrook?
A voz desconhecida é intensamente masculina. É provável que seja o
enfermeiro ou o pai de Emeric. Então, o que faço? Temo ver Emeric com
Joanne, mas eu não posso ficar aqui para sempre.
Fico de pé, enxugo umas lágrimas perdidas e abro a porta.
O homem parado do outro lado é trinta centímetros mais alto do que eu.
Dr. Frank Marceaux está bordado em seu jaleco, mas não há nada familiar
em seus traços bonitos. Rugas marcam sua testa, embora não sejam muitas.
Ele deve estar na casa do cinquenta. Cabelos castanhos-avermelhados estão
penteados para trás de um bico de viúva severo. As sobrancelhas grossas se
curvam sobre os olhos verdes e um pequeno brinco dourado pende em sua
orelha.
Contudo, é sua presença que indica a semelhança familiar. Mãos atrás das
costas, pés plantando em uma postura vasta, ele me estuda com muita
atenção. Um arrepio sobe pela minha coluna.
Ele levanta uma sobrancelha castanho-avermelhado.
— Você está pronta?
Não, definitivamente não. Deslizo o celular no bolso de trás.
— Sim.
Ao mesmo tempo que o sigo pela sala de espera, meu olhar se prende na
parede de janelas e na cena acontecendo do lado de fora no estacionamento.
Meus pés se prendem no chão e cada célula em meu corpo se concentra em
Emeric.
Ele anda ao redor de Joanne. Sua boca se move, seu olhar incendeia, mas
sua postura em geral demonstra uma confiança calma.
Ela encara sua mão que esfrega a barriga, cabeça baixa e lábios em uma
linha reta. Deve ser o mesmo aspecto que eu tenho quando ele está me
ensinando uma lição.
Ciúme queima quente e feroz no meu peito.
— Ivory — Dr. Marceaux fala.
Ando em frente e então paro.
Emeric para atrás de Joanne, respirando na nuca dela e as mãos em seus
próprios quadris, nenhuma parte dele toca nela, mas, ainda assim, ele está
muito perto. O tipo de proximidade que duas pessoas compartilham quando
passam muito tempo juntas. Quando têm familiaridade e intimidade.
Meu coração aperta e treme. Ele a conhece melhor do que eu. Ele já
esteve dentro dela, colocou um bebê dentro dela e eu sou… Eu não sei o
que sou para ele. Nós não transamos ainda.
— Ivory. — Dr. Marceaux para na minha frente, bloqueando a visão. —
Me siga.
Eu não consigo fazer meus pés se moverem, mas meus olhos funcionam
muito bem ao queimar as imagens de Emeric e Joanne no meu cérebro e
deixar escorrer lágrimas por todo o meu maldito rosto.
Dr. Marceaux gentilmente pega nos meus ombros e me guia para a sala
de exame. No momento que ele fecha a porta, ele aponta um dedo para a
mesa de exame.
— Sente-se.
Eu pulo ao comando de sua voz e corro para a mesa, amassando o papel
em cima do vinil ao subir.
Ele coloca uma caixa de lenços ao lado do meu quadril, o que faz com
que eu me sinta uma garotinha emotiva. Agarro um de qualquer jeito e
limpo meu rosto.
Abaixando-se na cadeira, ele gira pelo chão até estar sentado na minha
frente.
— Ele não falou sobre ela?
Amasso o lenço de papel no meu punho e endireito os ombros.
— Não sobre a gravidez.
Um músculo se contrai em sua mandíbula e seus olhos duros se
estreitam, espalhando as rugas nos cantos.
— É dele?
— Ele não sabe.
Minha respiração se acelera.
— Ele não… Ela estava com outra pessoa? Ela o traiu?
— Ele não tem provas disso.
— Ah. — Meu peito esvazia. — Ela disse a recepcionista que está
carregando seu neto.
Ele gira em direção às gavetas atrás dele e pega os equipamentos e
apetrechos, me dando um alívio momentâneo de seu olhar inflexível.
— Eu sei que você está morando com ele. — Ele abre os pacotes com os
equipamentos. — Eu não vou palestrar sobre os riscos que você e ele estão
correndo. Eu dei a ele minha opinião ontem à noite no telefone. — Ele volta
para mim, sua expressão pensativa. — Emeric é teimoso e incontrolável
quando sua paixão é provocada.
Eu discordo com a parte do incontrolável. Pelo menos quando se trata
dos meus limites. No que diz respeito à paixão dele, estou recebendo isso
pelos últimos dois meses. Eu acho que é por isso que esse segredo que ele
escondeu de mim parece como uma faca em meu peito.
O dr. Marceaux coloca seus óculos de leitura e pega o monitor de pressão
arterial. Sem me pedir para mudar as roupas, ele começa a examinar acima
da cintura. Pelos próximos dez minutos, ele cutuca, fura e tira o sangue ao
mesmo tempo que respondo suas perguntas médicas, incluído aquelas sobre
meu histórico sexual e contratempos com proteção.
Ele mantém sua conduta profissional, mas me pergunto se ele pensa se
sou uma puta interesseira.
Enquanto ele faz anotações em seu tablet, a porta se abre.
Emeric entra e fecha a porta, seus olhos congelantes encontram e
prendem os meus.
Arrepios passam por mim e acho difícil desviar o olhar.
O dr. Marceaux se levanta, sua voz entrecortada.
— O que você está fazendo aqui?
Emeric não interrompe o contato visual comigo. Há tantas emoções
escapando dele que eu não sei como classificá-las. Raiva é a mais fácil de
reconhecer, travando sua mandíbula e ressaltando as veias em seus
antebraços. Contudo, tem uma corrente de algo mais vulnerável. Seus dedos
se contorcem ao lado do corpo e seus tendões destacam seu pescoço. Ele
está com medo? Com medo de que eu vá embora? Ou é o meu desejo?
O dr. Marceaux se move em direção a porta, sua voz baixa e dura.
— Emeric, há cinco enfermeiras aqui hoje, observando cada passo seu.
Eu não serei capaz de conter a fofoca.
Emeric mantém meu olhar enquanto fala com seu pai.
— Depois da cena que Joanne acabou de fazer, elas irão pensar que vim
aqui conversar com você.
— Ela ainda está aqui? — Relaxo as mãos no colo e tento parecer
corajosa e madura. — O que vocês conversaram?
— Vocês podem conversar sobre isso em casa. — O dr. Marceaux puxa
um robe da gaveta e coloca na minha frente. — O dr. Hill estará aqui a
qualquer minuto para o exame pélvico.
— Eu vou ficar. — Emeric se encosta no batente, as mãos no bolso,
acomodando-se.
— Não, você não vai. — Pego o robe, virando-o de todas as maneiras
possíveis para entender. — Isso já é embaraçoso o suficiente. Além disso,
estou irritada com você.
Ele arranca o avental das minhas mãos e o segura aberto.
— É assim.
O dr. Marceaux segura a maçaneta.
— Vamos, filho.
Em um piscar de olhos, Emeric encerra a distância entre nós, segura o
cabelo na minha nuca e põem sua boca na minha orelha.
— Nós não terminamos.
Então ele segue seu pai para fora da sala, me deixando ofegante e mais
confusa do que antes.
Em um transe, faço xixi em um copo e visto o estranho robe na sala de
exame. O idoso dr. Hill chega com a notícia que não estou grávida para
depois me entregar um pacote de anticoncepcionais, fazer exame de mama
e enfiar sua mão e outras coisas invasivas na minha vagina.
No momento que subo no Porsche, minha cabeça está latejando com uma
enxurrada de perguntas. Para aonde eu vou? O que devo fazer?
Agarro o volante e procuro no meu interior pela melhor decisão. Ir para a
casa dele não quer dizer que estou desesperada ou carente. Eu sempre posso
voltar para casa e retornar para o modo como as coisas eram.
Apesar disso, eu não sou uma garota de fugir das minhas discussões. Eu
preciso de respostas e só tem um lugar onde encontrá-las.
Alguns minutos depois, ponho meu código no portão de segurança, um
código que Emeric me deixou escolher sozinha. Então paro ao lado do GTO
e entro na casa pela porta destrancada nos fundos.
Schubert me recebe no vestíbulo com uma massagem ronronante nas
pernas. Ao pegá-lo, sou distraída pela melodia abafada de um piano. Ele
está tocando?
Dou ao gatinho um aconchego antes de colocá-lo no chão e seguir as
notas através dos corredores sinuosos.
Já espiei sua sala de música várias vezes, admirei seu Fazioli de longe,
mas nunca entrei. Eu tinha essa ideia de que ele me levaria até lá quando
sua mão estivesse curada. Então ele sentaria atrás do teclado e tocaria algo
incrível como Gaspard de la Nuit de Ravel.
Porém, eu não escuto Ravel, Brahms ou Liszt ao me aproximar. Ele está
tocando Metallica.
Congelo na porta, presa em uma cativação paralisante quando a melodia
família de “Nothing Else Matters” me envolve. A seis metros de distância,
ele balança no banco, olhos fechados, perfil relaxado e antebraços
flexionados ao martelar as teclas.
Ele é formado no conservatório, mas toca metal no piano? Sem uma
partitura. Somente os virtuosos podem replicar de forma tão suave peças
que já ouviram. Estou completamente impressionada.
Quando lembro de respirar, meu pulmão se expande, inalando a visão
dele, o arranjo comovente das notas e a energia no ar.
Cabeça baixa, cabelo preto pendurado sobre sua testa, ele balança a
mandíbula de um lado para o outro em um ritmo lento com a música. A
melodia é uma súplica em desespero misturada com desejo e ele a abre com
golpes experientes, batendo seu pé descalço suavemente, sua postura uma
poderosa contração de músculos debaixo da blusa branca.
O mostrador do seu relógio brilha à luz enquanto ele salta entre as
oitavas. Com cada movimento de seu pulso, eu imagino aquela mão
chicoteando minha pele. A extensão e flexão de seus dedos me fazem
desejar que eles estivessem enrolados ao redor da minha garganta com a
mesma paixão e intensidade. Seus quadris rolam e eu tremo para montar em
seu colo e cavalgar na onda de seu corpo ao mesmo tempo que ele toca.
Nas mãos certas, o piano pode roubar a alma. Sem dúvidas, suas mãos
foram feitas para as teclas, porque eu não só sinto as notas dentro de mim
como elas me devoram como uma chama sombria e voraz.
Ele é tão sensual e talentoso que eu não sei o que vou fazer com os
sentimentos perigosos que ele provoca em mim. Eu supostamente deveria
estar brava com ele e exigindo respostas. Eu deveria estar perdida, insegura.
Em vez disso, me sinto reivindicada como se ele estivesse acariciando
cada tecla comigo em sua mente. Nós não terminamos. Ele me quer aqui,
apesar de ele não ter reconhecido minha presença.
Leva vários minutos para perceber a tampa do Fazioli fechada. Ele se
esquece de abrir? Olhando mais de perto, eu vejo algo que não lhe pertence.
Alças pretas familiares prendem-se por baixo do piano, esticando através
da parte superior preta e presas às algemas de couro próxima ao teclado.
Meu pulso dispara e meu olhar volta para seu rosto.
Seus olhos ainda estão fechados. Eu poderia fugir pelo corredor e… E
então? Eu não vou a qualquer lugar até conversar com ele.
Estou com medo do que ele planejou para mim? Bem, meus lábios estão
dormentes e meu coração está batendo fora de controle. Mas eu tenho
certeza de que essas algemas irão levar à respostas sobre Joanne assim
como sobre mim mesma. Se a verdade for muito dolorosa, ele irá me soltar
com uma palavra.
Fico mais ereta, mas ainda não confiante o suficiente para entrar na sala.
A música chega ao fim e ele descansa as mãos no colo.
Levantando a cabeça, ele vira seus olhos glaciais para mim.
— Deixe todas as suas roupas na porta.
34

Emeric

— Metallica. — Ivory coloca as mãos nos bolsos de trás do jeans e me dá


a tentativa de um sorriso. — Isso foi muito bom.
Eu fui treinado pelo melhor, formado na Leopold e tenho um assento na
Orquestra Sinfônica de Louisiana. Em nenhum momento na minha carreira
musical, eu me importei com o que achavam do meu talento.
Até agora.
Ela está congelada na entrada por cinco minutos e bom é o único elogio
que seus lábios maravilhosos pronunciam?
Quando nos conhecemos, eu estava preocupado que o equilíbrio entre
nós fosse pesadamente inclinado que eu fosse subjugar Ivory e tirar
proveito dela. Eu peso o dobro dela. Tenho 27 anos e ela tem 17. Eu sou um
dominante e ela é minha aluna do ensino médio. Cristo, eu tinha tantas
dúvidas.
Mas, não mais.
Sentado aqui e ansiando por sua mente brilhante de pianista para jorrar
poesia sobre minha música, percebo que ela não tem só o poder no quarto.
Ela comanda minhas emoções, testa minha segurança e me caça em cada
pensamento. Ela poderia me destruir, não apenas meu trabalho, mas cada
fibra de quem eu sou e ela nem sabe disso.
É responsabilidade minha balancear a harmonia entre nós e administrar
nossos papéis. Neste exato momento, ela está me desobedecendo e eu irei
lembrá-la o que significa ser minha.
— Suas roupas. Agora.
Estremecendo sob meu tom duro, ela olha para as contenções no Fazioli.
Seu peito arfa uma, duas vezes. Então, ela fecha os olhos e tira a camisa por
cima da cabeça, deixando o tecido cair no chão.
Seus peitos incham na taça rosada de renda, seu abdômen tonificado
envolto de pele dourada escura. Essas pernas sensuais… Fecho minhas
mãos. Ela está me fazendo esperar, seus dedos parados no botão da calça
jeans.
Eu me levanto do banco do piano, o dom está assumindo. Endireito
minha coluna, ajeito meus ombros e controlo minha respiração. Ela me
assiste com olhos semicerrados, lábios separados e mãos caindo para a
curva das coxas.
Mesmo sabendo que sua confiança em mim foi fragmentada na clínica, é
incrivelmente satisfatório vê-la parada aqui, sem falar em considerar o
comando. Mas para que dê certo entre nós, é importante empurrá-la para a
beirada, para aquele lugar que ela me teme e me respeita, mas não tanto que
ela não possa respirar.
Eu me forço a recuar um pouco, para usar menos rosnados e mais
gentilezas.
Ao me aproximar dela devagar, mantenho seu olhar com uma atenção
firme. Assim que entro no seu espaço, seu queixo se abaixa, a respiração
falha, mas são aqueles enormes olhos que ficam comigo, recusando a
desviar o olhar. Tão corajosa. Tão, tão intoxicante.
Eu me agacho e, com movimentos lentos, abro o zíper da calça jeans.
Pairando o lábio a um centímetro de sua calcinha, arrasto a calça por suas
pernas. Ela treme enquanto olho para ela e tomo o meu tempo beijando sua
pele ao redor do cetim rosa.
Com meus dedos na parte de trás de suas panturrilhas, arrasto os dedos
por suas pernas, falando suavemente, mas com firmeza:
— Tire os sapatos.
Ao mesmo tempo que ela os tira, sua rápida obediência vira uma pressão
faminta na minha virilha. Minhas mãos traçam a ascensão de sua bunda e
meus lábios seguem o declive de seu umbigo. Ela suspira e seus quadris
reviram, seus dedos adentram meus cabelos, agarrando-se a mim à procura
de equilíbrio.
Puta que pariu, eu a quero no meu pau, apertada e se entregando a mim
com todos os sentidos em espasmos.
Chuto os tênis para o lado e a guio para fora dos jeans e das meias. Com
toques leves, faço cócegas em uma linha de zigue-zague em sua coluna e
brinco com o fecho de seu sutiã ao mesmo tempo em que subo pelo seu
corpo com beijos sensuais em um caminho entre seus peitos.
Sua cabeça cai para trás e seu corpo esguio balança em meus braços. Ela
cheira a sabão de jasmim, quente pela excitação e intensa como Ivory.
Meu pau sacode no jeans, preso e exigente. Ainda não.
Provoco o fecho do sutiã e minha boca desliza pela delicada clavícula
dela. Subindo mais, eu beijo a coluna esbelta de seu pescoço e mordisco ao
longo de sua mandíbula.
Nossas testas se tocam quando abro o sutiã e coloco a palma nas suas
costas. Nossas respirações se aceleram, fundindo-se, nossos lábios
gravitando próximos, cada vez mais perto. Quando nossas bocas finalmente
se encontram, ela derrete nos meus braços.
Minhas mãos vão para seu rosto, meus polegares acariciando suas
bochechas ao mesmo tempo que devoro seus gemidos sedutores. Eu a beijo
agressivamente, ordenando-a sem palavras para que confie em mim.
Chicoteio minha língua na dela, uma promessa de dor e êxtase iminentes.
Sua boca separa em aceitação e suas mãos se fecham na minha cintura, me
puxando para mais perto dela.
Interrompo o beijo e deixo meus dedos demorarem nas alças em seus
ombros. Meus olhos nunca deixando os dela, deslizo com delicadeza o sutiã
pelos seus braços. Seus mamilos estão tão duros que a renda prende neles.
Devagar, deslizo o tecido para longe, expondo sua deliciosa pele. Ela
respira bruscamente quando o sutiã atinge o chão.
Jesus Cristo, ela é a perfeição. Eu preciso me enterrar dentro dela e lutar
para pensar além da minha ereção furiosa.
Dando um passo para trás, deixo meu olhar vagar por seu corpo esbelto e
magro, adorando cada flexão, cada contração e os ossos frágeis enquanto
ela me observa com seus olhos redondos. Peitos cheios e alegres sobem
juntos da sua respiração, os quadris estreitos se movendo com ansiedade e
uma mancha molhada escurece o cetim da sua calcinha rosa.
Seu corpo ama meu toque, mas sua mente ainda não me perdoou. Se eu
não a deixar dar o próximo passo por conta própria, ela só irá se sentir pior
depois disso.
Aponto para a calcinha.
— Tire ou diga sua palavra.
Mordendo o lábio, ela prende os dedos no cetim, abaixando-o pelas
pernas e chutando-o. Seu olhar nunca deixa meu rosto, observando com
cautela, curiosidade e desejo inegável.
Ando ao redor dela, deleitando-me com sua nudez estonteante e a
maneira como sua respiração para e começa a cada passo que dou. Meus
dedos traçam o padrão do arabesco tatuado da cintura ao ombro oposto.
Ela estremece com a sensação, arquejando e esticando o pescoço para
que eu veja.
Pressiono meu peito em suas costas, dedos atormentando seu quadril.
— Você irá me falar sobre essa sua tatuagem. Não agora. — Descanso
minha boca na junção de seu pescoço e ombro, e lambo. — Talvez não hoje
ou essa semana. — Deslizando minhas mãos por sua pélvis, mergulho entre
suas pernas e deslizo em suas dobras molhadas. — Mas você irá me contar
em breve.
Ela solta um suspiro pesado e arqueia o pescoço, inclinando a cabeça
para o lado para dar um acesso mais fácil.
Ponho meus dentes no seu ombro e mordo. Ela choraminga e se contorce
contra mim, seus braços levantando e os dedos procurando pelo meu
cabelo.
Beijando a área dolorida, dou um passo para trás.
— Me siga. — Guio Ivory até o Fazioli e aponto para a borda acima do
teclado. — Sente-se na borda. Pernas separadas. Pé direito nas teclas mais
baixas e pé esquerdo nas mais altas.
Mesmo com uma incerteza em sua expressão, ela sobe na posição e
preenche o silêncio com notas aleatórias.
Alças de nylon vagueiam por debaixo do piano e sobre a tampa, duas de
cada lado e todas as quatro presas a algemas de couro. Eu prendo duas em
seus pulsos, apertando-as com um puxão forte atrás dela, fazendo-a
suspirar.
Com seus braços contidos nas costas, seus olhos acompanham meus
movimentos, seus lábios separados e os ombros elevados. Ela parece estar
lutando contra a postura, batalhando com o medo que puxa seu corpo para
si mesma.
Enquanto cruzo na frente dela, acaricio as costas dos meus dedos ao
longo da parte interna de sua perna estendida.
— Qual é a palavra que faz isso parar?
— Scriabin — ela ofega, me observando com cautela.
— Você irá usá-la?
Ela acena com a cabeça, medo agitando seus olhos.
— Se eu precisar.
— Boa garota.
Com as duas outras algemas, prendo seus tornozelos de encontro a
moldura que prende o teclado. Então, me afasto e absorvo a visão erótica
diante de mim.
Empoleirada na borda da tampa com as coxas abertas o suficiente para
segurar todo teclado entre os pés e os braços contidos atrás dela, a imagem
perfeita de luxúria, tormento, força e confiança. Sua boceta está aberta,
rosada e encharcada, implorando pelo meu pau. Sua língua espreita a parte
debaixo do lábio inferior.
Eu nunca quis tanto alguém como a quero. Não só o seu corpo. Eu quero
tudo dela. Ela é a emoção mais forte que eu já senti.
Eu ajeito a dor latejante em meus jeans.
— Estou tão excitado que quero deitar e morrer.
— Morrer é um jeito de se livrar dessa ereção.
O brilho brincalhão em seus olhos me deixa incrivelmente mais duro.
— Ou. — Ela morde o lábio. — Tem… você sabe, outra maneira.
Seguro-a em um momento suspenso de contato visual ao mesmo tempo
que minha mão acaricia meu pau preso.
— É isso o que você quer, Ivory? Sua boceta está molhada e pronta para
mim. Eu poderia entrar e foder você com tanta força que me sentiria por
vários dias.
Ela desvia o olhar, narinas dilatam e músculos ficam tensos nas algemas.
Ela poderia estar pronta para se entregar essa manhã, mas não mais agora.
Não depois de ver minha ex.
— Olhe para mim. — Espero por seus olhos antes de pegar meu cinto. —
Você ganha dois golpes por se referir a outra pessoa que não seja você como
minha namorada.
— Mas Jo…
— Não diga a porra do nome dela. — Calor percorre minhas veias. —
Chegaremos a isso, mas bem aqui, neste momento, somos nós. Você e eu e
ninguém mais.
Rugas se formam em sua testa antes de suavizarem.
— Muito bem. Dois golpes. — O canto de sua boca se levanta. — Faça o
seu pior.
Agora ela está sorrindo, completamente ingênua sobre onde irei fazer o
meu pior.
Inclino a cabeça.
— Quanto à atitude que você me deu no telefone… — Puxo o cinto do
meu jeans e o dobro ao meio. — Seis orgasmos pelos seus comentários
malcriados.
— Orgasmos, hein? — Ela ri, relaxando nas restrições. — Nossa, isso
soa mesmo como tortura.
Meus lábios se contorcem. Ah, será mesmo.
35

Ivory

A borda da tampa do piano entra na minha bunda e os músculos da parte


interna da minha coxa se esticam em uma posição travada e aberta. Porém,
é o olhar azul e aquecido que traça cada linha do meu corpo que me
mantém cativa. Eu me endireito o mais alto possível, meu coração batendo
forte e meu corpo pedindo pela dor e afeição de Emeric.
Já que estou sentada em seu habitual alvo, onde ele dará as palmadas?
Minhas coxas? Minhas costas? Olho para a extensão do meu torso e um
calafrio sobe pelo meu pescoço. Com minhas pernas estendidas e meus
braços presos atrás de mim, meus peitos e minha buceta estão na frente e no
centro. Com certeza, esse não é…
Meu olhar dispara para cima, mas ele não está olhando para os meus
olhos. Sua atenção está colada no meu peito, sua mão fechada no final do
cinto. Não, ele não iria. Não em um lugar tão vulnerável. Meus mamilos
latejam só de pensar.
Prosseguindo em minha direção com pés silenciosos, ele desliza para o
lado do banco e coloca seu rosto junto do meu, estudando minha expressão,
assistindo minha respiração e fazendo um exame visual minucioso das
minhas partes mais escuras e mais depravadas.
Eu engulo em seco.
— Onde você vai…
Ele trava sua boca na minha, lambendo, chupando e girando meu cérebro
para fora do eixo. Deslizando seus lábios pelo meu pescoço, para cima e
para baixo, devagar e doloroso, ele cobre minha garganta com sussurros
prazerosos. Minha cabeça cai para trás com um suspiro. Sua boca é tão
gentil e segura que é como se ele estivesse beijando minha alma. Por favor,
não pare.
Sua mão se junta, acariciando de leve minha lateral e por cima do meu
peito. Seus quatro dedos, quatro minúsculos pontos de contato, recarregam
minhas veias com eletricidade que vibram pelo meu corpo através de
múltiplos arpejos em questões de segundos.
— Eu preciso de você. — As palavras correm para fora dos meus lábios,
sussurradas e espontâneas.
— Você me tem — ele fala baixinho, descendo a cabeça para morder
meu mamilo.
Eu grito, consumida pela dor, empurrando as algemas e indo a lugar
nenhum.
Ele ri e morde de novo, puxando o bico com seus dentes até que ele lateje
e estique para ficar fora de forma.
Quando ele passa para o outro, prendo minha respiração e balanço a
cabeça.
Seus lábios roçam no meu mamilo, provocando, e seus olhos piscam para
mim com tanta necessidade agitando as profundezas dos intensos azuis.
— Respire.
No momento que respiro, ele afunda seus dentes. Grito em agonia e
empurro meu quadril, escorregando para fora da borda. Ele me segura,
deslizando minha bunda de volta para o lugar ao mesmo tempo que seus
dentes rasgam minha carne sensível, sugando com força e me incendiando.
— Pare! — Soluço, contorcendo meus pulsos nas algemas. — Por favor,
pare.
Girando sua língua, ele lambe a queimadura horrível, sua voz uma
rouquidão áspera.
— Eu não ouvi sua palavra.
Lágrimas enchem meus olhos e todo o meu corpo treme como a corda de
uma harpa.
Ele se inclina sobre o meu rosto e mostra os dentes.
— Diga.
Chupo meu lábio inferior e olho para baixo. Porra, parece que ele partiu
meus mamilos, mas eles ainda estão lá, grandes, duros e vermelhos
furiosos. Sem uma gosta de sangue.
Ele dá um passo para o lado e bate o cinto dobrado na perna.
— Onde está a pirralhinha arrogante de alguns momentos atrás?
— Você mordeu meus seios!
— Você acabou de aumentar seus orgasmos para sete. Já terminou?
Se ele está tentando me provocar para dizer as palavras, ele terá que
tentar mais.
Giro mus pulsos atrás de mim e dou uma dedada. Uma pena que ele não
possa ver.
— Estou bem.
Ele levanta o cinto e toca a alça de couro no meu mamilo. Uma corrente
de tremores oscila em mim.
Seus olhos encontram os meus e se abaixam para o meu peito antes de
voltar para o meu rosto.
Endureço minha expressão e levanto o queixo.
O tempo fica imóvel quando ele inclina a cabeça e abre ligeiramente a
boca. Então, ele balança.
Couro chicoteia meu mamilo inchado em um piscar ardente. Um suspiro
fica preso na garganta e lágrimas borram minha visão. Ele não me dá um
segundo para me recompor antes de um segundo golpe no outro mamilo.
Minhas costas se curvam e engulo um grito ao mesmo tempo que minha
mente luta para entender a dor. Como eu cheguei aqui? Por que estou
deixando isso acontecer? O que diabos estou fazendo?
O cinto atinge o chão, me fazendo pular. Ele alcança atrás do pescoço e
puxa a camisa sobre a cabeça. O jeans está pendurado baixo em sua cintura
afunilada, o peito nu flexionado e amontoado com as subidas e descidas de
seus músculos.
Na respiração seguinte, ele está em cima de mim, as mãos no meu cabelo
e os lábios perseguindo o caminho das lágrimas pela minha bochecha.
— Tão lindo quando você chora por mim. — Ele espalha beijos nos
meus olhos, nariz e boca junto com seus dedos traçando pelo meu cabelo.
— Ah, Ivory. Você não tem ideia do que faz comigo.
A vibração de sua voz e a sensibilidade de seu toque acalma a chama dos
meus mamilos e alimenta uma nova chama em meu núcleo.
— Me diga — falo, minha voz esganiçada.
Ele deixa sua testa cair na minha.
— Irei te mostrar.
Arrastando o banco do piano para mais perto, ele se senta. A posição
coloca sua boca a centímetros da minha boceta. Os dedos espalhados sobre
as teclas, ele mergulha em uma música rouca e violenta. Outro cover de
metal, mas eu não consigo distinguir. Estou perdida nas notas que batem e
tremem com a dor nos meus mamilos, me perguntando se esses sete
orgasmos serão dele ou meu.
Testo as amarras no meu tornozelo, minhas pernas doendo com o
alongamento prolongado.
— Que música é essa?
Seus olhos vagueiam entre meus lábios e minha boceta, suas mãos
batendo nas teclas.
— “Symphony of Destruction” da Megadeth.
Nunca ouvi, mas, porra, soa ameaçadora.
Ele vem para a frente e pressiona sua boca no interior da minha coxa.
Meu corpo inteiro para em antecipação com ele deslizando seus lábios em
direção ao meu núcleo. Sua mão se move loucamente pelas teclas e quando
ele chega ao vinco na minha coxa, ele muda de direção sem errar a melodia.
Ele lambe o caminho no meu joelho, beliscando e sugando minha pele, para
depois mudar de volta para minha boceta.
Com seus lábios pairando em cima da minha boceta, ele muda a música
para uma que reconheço de imediato.
Caio em um gemido de alegria.
— Você tem que estar de brincadeira comigo.
Ele me dá um sorriso antes de enterrar seu rosto entre as minhas pernas.
Quando ele curva a língua nas minhas dobras, o piano vibra ao som de
“Smells Like Teen Spirits” do Nirvana.
O fervilhar das sensações embaixo dos seus lábios me enterram em uma
confusão ofegante de desejos. Ele sonda profundamente com golpes
penetrantes e quando encontra meu clitóris, não leva muito tempo. Já estou
preparada com todos os toques e beijos, e porra, até mesmo as chicotadas
em meus seios me deixam molhada.
Eu gozo com um gemido alto e ofegante, balançando meu quadril na sua
boca implacável enquanto meus membros empurram as amarras.
Suas mãos se atrapalham nas teclas, perdendo o ritmo antes de pegá-las
de novo.
— Esse foi um — ele fala em uma voz rouca.
Encontro seus olhos, ofegando e tremendo.
— Impossível. Eu…
Eu não posso dizer eu não posso. Mas, sério? Mais seis? Ele é muito
diabólico com as suas punições. Eu vou morrer.
Ele pressiona um beijo no meu clitóris antes de atacar com seus lábios e
dentes. Eu grito junto do segundo e do terceiro orgasmo. Depois disso, eu
não escuto mais a música ou sinto as vibrações pelo meu corpo ou ao redor
de mim no ambiente. Cada sentido se estreita à língua que está dentro de
mim e a enxurrada de sensações de escalada e queda que atacam meu
corpo.
Depois do quarto orgasmo, eu alcanço uma estranha sensação de estado
catatônico. Minha boceta formiga com superestimulação, as terminações
nervosas no meu clitóris ardem contra o golpe mais leve de sua língua. Mas,
ele não para. Não quando eu mando-o ir para o inferno ou o chamo de filho
da puta sádico.
Ele me silencia apertando os dentes envolta do meu feixe de nervos.
Ele não está tocando piano mais porque esses talentosos dedos estão
dentro de mim, me levando a um inferno tortuoso de prazer.
— Você tem que parar — falo nas amarras, minhas pernas abertas
tremendo com exaustão. — Por favor. Já chega pra mim.
Seus lábios molhados se enterram, beijando e lambendo, seu gemido
tocando um tipo diferente de música pelo meu núcleo. Um momento
depois, ele curva três dedos dentro de mim e gira outro em um orgasmo
agonizante em meu corpo.
— Seis. — Ele se recosta e limpa a boca com a parte de trás da mão. —
O último será comigo.
— Sem mais. — Minha cabeça está tão pesada que meu queixo cai de
encontro com meu peito ao mesmo tempo que procuro por ar. — Por favor.
Ele levanta meu queixo com seus dedos, seu olhar queimando nos meus
lábios, sua voz um sussurro irregular.
— Eu amo quando você implora.
Ele se levanta e com alguns movimentos de seus pulsos, ele me liberta
das alças.
Eu caio nele, meus músculos como água, derramando e caindo. Mas ele
me pega, meu corpo flácido presos por braços fortes e suportado por um
peitoral muito bom.
O calor de seus antebraços desaparece nas minhas costas, substituídos
pela dura superfície da tampa do piano. Ele me deita de bruços, meu pé
apontando para longe do teclado e os ombros na borda onde eu estava
sentada antes. Minha cabeça balança para baixo, batendo nas teclas.
Minha pele, já hipersensível, fica mais quente e o sangue corre para o
meu cérebro com a força da gravidade.
— O que você está fazendo?
Ele circula o piano, inspecionando o meu corpo como se estivesse
memorizando cada pedaço. Seus dedos fazem cócegas ao percorrer minha
pele enquanto começa pela minha garganta, deslizando pelo esterno,
virando no meu umbigo e prolongando entre as minhas pernas.
Minha pélvis se eleva com seu toque, esforçando para manter esse ponto
de contato. Apesar do fato que ele acabou de me morder, amassar meus
seios e me torturar com orgasmos, eu quero mais. Ele deve ter se conectado
ao meu cérebro.
Prendendo as algemas ao redor dos meus pulsos e tornozelos, ele me
prende no Faziolo como um X. Quando ele volta para minha cabeça, ele me
dá uma visão de cabeça para baixo da haste de aço que empurra seu zíper.
Ele abre o zíper.
— Você sabe o quanto duro chupar. — Abaixando o jeans, ele libera seu
pau considerável, a pele rosada esticada sobre a cintura larga. — Você sabe
o quanto rápido ou devagar mover essa língua perversa.
O calor se acumula e lateja entre minhas coxas com cada palavra.
Tocando sua coroa na minha boca invertida, ele cerra os punhos em sua
ereção e borra o líquido pré-ejaculatório salgado em minha boca.
— Bata com a sua mão direita se quiser que isso pare. Me diga que
entendeu.
— Eu… — Minha boceta aperta, vazia e carente. Um sentimento tão
estranho para experimentar. — Baterei se precisar.
Ele envolve uma mão embaixo da minha cabeça pendurada, seus dedos
servindo como amortecedor entre o meu crânio e o revestimento de
madeira. Com os olhos semicerrados e sempre me observando, ele agarra
sua ereção esfregando na minha bochecha e batendo a ponta na minha boca.
Abro minha boca, por instinto, ansiosa. Faça isso logo.
Seu olhar percorre o comprimento do meu corpo enquanto ele pressiona
na minha língua. Sua respiração estremece e ele empurra.
Ele não facilita. Ele empurra implacavelmente e sem parar. Mais e mais
vezes, ele enfia seu pau nos meus lábios, fodendo minha boca como se
estivesse mergulhando entre minhas pernas.
Suas coxas flexionam na minha testa ao mesmo tempo que ele aperta
seus dedos no meu crânio, emaranhando meu cabelo e segurando minha
cabeça. Eu só posso me deitar ali, mãos e pernas amarradas, garganta
relaxada e mandíbula esticada para o prazer dele.
Curvado sobre o meu peito, ele aperta meu seio com a mão livre,
beliscando meu mamilo e atormentando-o com sua boca quente.
Eu me rendo a uma admiração drogada com seu comprimento entrando
mais fundo em minha garganta, seu quadril girando e rolando com urgência.
É assim que ele pareceria se estivesse preenchendo minha boceta. A tensão
de seus músculos, sua bunda flexionada e a força do seu pênis compõem
uma dança sedutora de intensidade. Ele dá tanto quanto pega, sua fome
espalhando pela minha pele, distorcendo meus gemidos ao redor do seu
comprimento latejante, me superando.
Segurando minha cabeça contra seus impulsos, ele desliza a outra mão
para minha barriga e enfia dois dedos em mim, provocando uma
necessidade apertada nos meus músculos internos.
— Não vou aguentar muito mais tempo. — Sua respiração afiada corta o
ar. — Vamos fazer isso juntos.
Ele muda seu toque para o meu clitóris suave e aplica uma pressão sólida
e giratória. Meus quadris se impulsionam, girando e balançando nos dedos
dele. Bem aí, bem aí.
Um espasmo de calor formigante explode sob sua carícia diabólica.
Ele goza na minha língua, sua testa caindo em meu peito quando ele nos
acaricia em um dueto orgástico de gemidos e tremores.
Com avidez, engulo seu gozo e ofego sobre meu próprio balançar. Seu
pau se contorce nos meus lábios e a parte interna das minhas coxas
estremece com os tremores remanescentes do orgasmo de número sete.
Ele se afasta para liberar as algemas, me levantando e me movendo,
membro por membro derretido. Eu me penduro como uma boneca de pano
em seus braços enquanto ele me carrega para o banco do piano e arruma
minhas pernas abertas ao redor da cintura dele.
Caio de encontro a ele, peito com peito, pele com pele e abraço seus
ombros largos.
— Essa foi a pior tortura de todos os tempos.
Rindo, ele beija minha bochecha e me pega por trás, dedos nas teclas.
Com uma respiração profunda, ele nos envolve em uma suave música,
tranquilizando o bater do meu coração com “Comfortably Numb” do Pink
Floyd.
Eu me enrolo nele, absorvendo a flexão e o balanço de seu corpo
enquanto ele toca. O ritmo de sua respiração sincroniza com a melodia,
acompanhando o meu. Sua pele, tão macia e quente, tem o cheiro
amadeirado e masculino e seguro. Enterro meu nariz em seu pescoço e
preencho meus pulmões.
Com minhas pernas e braços presos ao redor dele, me agarro ao pilar do
seu torso. Esse homem bruto é minha casa. Seu inferno é meu paraíso.
Eu sou a sua Ivory e ele é as minhas notas sombrias.
Não importa o que aconteça, nunca me arrependerei disso. Eu nunca me
arrependerei dele.
Ele termina a música em uma nota baixa e profunda, então desliza sua
mão forte pelas minhas costas, massageando minha coluna.
Ele me abraça com força em seu peitoral, e abaixa seus lábios para o meu
ombro, sua voz baixa e gentil.
— Eu não sabia que ela estava grávida até depois…
Depois de Shreveport. Depois de sua traição.
Beijo seu pescoço dele e passo meus dedos por seu cabelo, junto de uma
amargura que explode dentro de mim.
— Ela está grávida de sete meses. — Ele inspira e expira. — O bebê
pode ser meu. Ou não.
Levanto a cabeça e encontro seu olhar duro.
— Você acha que…
Ele pisca, sua expressão em conflito.
— Eu não sei. Nunca ouve uma indicação de traição e eu sou um bom
observador.
Difícil de discutir com isso.
— Então por que você está questionando isso?
Ele prende meu cabelo atrás da orelha, seus dedos demorando no meu
queixo.
— Eu nunca achei que ela poderia me trair do jeito que ela fez. Se ela
pôde fazer aquilo…
— Ela poderia ser infiel.
Ele abaixa a mão para acariciar meu quadril, seus olhos seguindo os
movimentos.
— Quando eu estava em Shreveport, eu trabalhava longas horas. Dia e
noite. Raramente estava em casa.
Ela poderia estar fazendo qualquer coisa nesse tempo. Com qualquer
pessoa. Talvez ele não fosse tão observador naquela época?
Eu engulo em seco, ao redor da dor na minha garganta.
— Por que ela estava na clínica hoje?
Seu olhar se levanta para o meu.
— Eu tenho ignorado as mensagens dela. O único jeito que ela sabe
como me encontrar é através do meu pai.
— O que ela quer? — Minha voz treme com os nervos fragilizados. —
Se reconciliar com você? Continuar de onde parou?
— Sim. — Ele segura a parte de trás do meu pescoço quando começo a
me afastar. — Ela quer meu dinheiro, Ivory.
Eu acho difícil acreditar nisso. Qualquer pessoa com metade do cérebro
sabe que qualquer amor que esse homem ofereça é mais valioso que todo o
dinheiro no mundo.
Eu me inclino para a frente e penteio seu cabelo curto na parte de trás de
sua cabeça com as pontas dos meus dedos.
— De quanto dinheiro nós estamos falando?
— Metade da minha herança. Milhões. Eu daria de bom grado se eu
soubesse que essa criança é minha. — Ele cruza os braços nas minhas
costas, me segurando contra ele. — Eu dei meu sangue meses atrás como
minha demanda pelo teste de paternidade. Ela ainda tem que me fornecer o
resultado.
— Isso não é um bom sinal para ela. Quero dizer, se o filho é seu…
— Estaria tudo resolvido e ela seria uma mulher muito rica. — Ele olha
para mim, seus olhos rodopiando em pensamentos. — Ela sabe os meus
termos. Eu quero o resultado desse teste. Se o bebê não for meu, ela não
ganha um centavo e eu nunca mais terei que vê-la ou pensar nela de novo.
Se for meu, eu serei o pai em todo o sentido da palavra.
E Joanne estará totalmente inserida em sua vida. Meu coração bate
rápido antes de se partir.
Ele segura meu pescoço, procurando pelo meu rosto.
— Não há Joanne e eu. Eu sou seu. Me diga que entendeu.
Fecho meus olhos contra a intensidade dos deles.
— Você disse que a ama.
— Eu também disse que a odeio. — Com uma respiração profunda, ele
abaixa sua testa na minha. — Então, eu encontrei algo mais importante do
que amor e ódio.
Paro de respirar, meus olhos abrindo num instante.
— O quê?
— Você.
Meu pulso acelera, minha respiração fica rápida. Como ele pode destruir
minha confiança e costurá-la por completo em tão pouco tempo?
— Me desculpa, Ivory. Eu deveria ter falado para você. — Ele esfrega
minhas costas. — Você tem o suficiente para se preocupar e eu só… Eu
confio nos meus instintos e eles estão dizendo que ela está mentindo.
— Eu te perdoo. — Profunda e infinitamente. Descanso meu rosto em
seu ombro. — O que vai acontecer agora?
— Eu nunca quis ameaçar a carreira dela. Não quero deixá-la
desempregada com um bebê. Mas eu preciso saber se a criança é minha. —
Os músculos abaixo de mim endurecem com tensão e sua voz se aguça. —
Ela tem até a semana que vem para provar a paternidade. Se ela não
cumprir com o prazo, o Conselho de Shreveport irá receber umas malditas
fotos condenatórias da indecente e enganadora diretora.
36

Emeric

As próximas semanas passam em um borrão de inquietude. Com Lorenzo


Gandara ainda solto e minha constante paranoia sobre a situação da minha
vida com Ivory, estou no limite, irritado e exausto para caralho.
Adicionando ao meu estresse tem a apresentação da orquestra dessa
semana.
Entre as reuniões noturnas e os ensaios gerais para a orquestra e as aulas
particulares e os deveres de casa de Ivory, temos pouco tempo de descanso.
As poucas vezes que fui capaz de prendê-la com meus dedos em sua
boceta, estávamos apressados ou exaustos. Não poder transar com ela é um
tormento pior que a morte, mas o momento e o meu foco precisam ser
perfeitos.
Eu quero namorar com ela e estou frustrado pela minha incapacidade de
fazer isso. Ela nunca foi levada a um jantar romântico ou foi girada pela
pista de dança, toda arrumada para uma noite fora e com um homem que a
aprecia por simplesmente gostar de sua companhia. Eu anseio por dar essas
coisas para ela, sem a expectativa de sexo. Mas me aventurar com ela em
público terá que esperar.
Lembrar que ela só tem 17 anos acalma um pouco da minha impaciência.
Ela ainda tem uma vida inteira para experienciar e eu pretendo ser parte
disso.
Até lá, valorizo nossos poucos momentos antes de dormir, nesse pequeno
espaço de tempo quando ela curva seu corpo ao meu redor. Com a bola de
pelo aninhada em nossos pés, compartilhamos histórias das nossas vidas,
partes aleatórias de nós mesmos até que ela caia na terra dos sonhos. Sem
falhar, fico deitado por longas horas depois, segurando-a com força
enquanto as notícias iminentes de três coisas cruciais monopolizam minha
cabeça.
Primeiro, é quinta-feira e ainda não ouvi de Joanne. Nenhuma mensagem
ou ligação. A lógica me diz que se o bebê fosse meu, ela já teria
providenciado as provas meses atrás. Porém, ela gosta de jogos mentais e
me fazer esperar é como um modo de me controlar.
Segundo, meu pai agilizou o exame de sangue de Ivory e os resultados
estão para sair a qualquer dia. Uma vez que eu tenha seu atestado de saúde,
eu não serei capaz de me impedir de fodê-la na próxima semana. Eu sei que
ela acha que está pronta, mas ela ainda tem que usar sua palavra de
segurança. Quando eu transar com ela, ela se deitará embaixo de mim –
como fez para qualquer outro babaca – e silenciosamente me pedirá para
parar? Ou estará comigo, fazendo uma escolha consciente de se render para
mim por completo?
Eu preciso, pelo menos, encontrar um de seus limites rígidos e fazê-la
confrontá-lo. Então, eu saberei.
A última coisa que tem ocupado minha cabeça é Lorenzo Gandara.
Depois de implementar meu plano para removê-lo como uma ameaça para
Ivory, fiquei preso em um padrão de espera, queimando para ver se
concretizar. A espera é enlouquecedora, me fazendo questionar a
sagacidade da minha abordagem. Talvez eu devesse ter cuidado dele mais
diretamente, os riscos legais que se danem.
Não ajuda que Ivory pergunte dele todo santo dia. Eu fui honesto com ela
sobre os procedimentos em curso, mas se isso não der em nada, eu não
esclareci para ela minhas intenções de matar aquele filho da puta.
Duvido que ela se importaria, contanto que não interfira com seus
sonhos. Ivory é bastante ambiciosa. Ela vive pelo seu lema, tudo é possível,
e seu tudo é a torre de marfim na Leopold. Não estou com pressa para
aborrecer o equilíbrio frágil entre ela, eu e a diretora, mas quando o
momento chegar, Ivory e eu teremos algumas decisões a tomar.
Por um lado positivo, Prescott Rivard parece estar cooperando. Eu atribuí
suas atividades ao meu detetive particular, suas ligações e seus movimentos
todos monitorados discretamente e relatados para mim. Não tem sinais de
retaliação.
Na sexta-feira, tudo muda.
A tarde chegou em uma sucessão rápida de ligações e mensagens. A
explosão de interrupções me impossibilitou de dar a aula, então dou aos
alunos alguns trabalhos para ocupá-los e enterro minha cabeça no telefone.
Ivory me observa com cuidado de sua mesa, levantando uma sobrancelha
arqueada em um suspeito o que diabos você está fazendo.
Dou a ela um olhar duro, mas por dentro, mal estou conseguindo me
controlar. No momento que o último sinal toca, estou incapaz de manter a
porra das minhas emoções raivosas sob controle.
Quando o último aluno sai da sala de aula, bato a porta para fechá-la e
agarro Ivory em sua mesa, jogando-a na parede mais próxima.
Ela grita, esticando seus dedos para alcançar o chão.
— O que você…
Ataco sua boca e devoro seus lábios, faminto e possuído, minhas mãos
voando sobre cada centímetro dela que consigo alcançar, acariciando,
agarrando e tocando. Meu pau endurece e meu pulso explode. Sem mais
espera. Eu preciso dela pra caralho.
— Alguém… pode… ver — ela ofega entre os beijos, empurrando e
puxando o meu peito, sua atenção se estreitando em direção a janela da
porta.
Mordo seu lábio, emocionado com a suave sensação de seu corpo de
encontro ao meu.
— Sem aulas essa noite. Vá para casa. Irei te encontrar lá.
Com uma quantidade estupenda de força de vontade, eu a libero e corro
em direção a minha mesa.
— O que aconteceu? — Ela me encara, olhos abertos e congelada onde a
deixei. — Isso é sobre…
— Eu lhe dei uma ordem — digo baixo e duro.
Eu me viro de costas para ela, coloco minhas coisas na pasta, meu sangue
rugindo com uma pesada e urgente necessidade. Se ela não sair nesse exato
segundo eu vou foder com ela contra o quadro branco.
No instante que seus passos somem no corredor, endireito meu pau
inchado fazendo-o menos visível com a ponta presa embaixo do cinto.
Então vou atrás dela em uma distância modesta. Do lado de fora, observo-a
da entrada principal enquanto cruza o estacionamento e com segurança
entra no Porsche. A mesma coisa que eu faço todas as noites. Exceto que
essa noite é diferente.
Hoje à noite, a espera acabou.
A viagem de três minutos pareceram ser três horas. Corro pela casa e a
encontro na cozinha com Schubert aninhado em seu pescoço.
Ela mordisca seu lábio inferior, seus grandes olhos castanhos redondos e
atentos.
— Você conseguiu o resultado do teste?
Do teste de paternidade? Do exame de sangue dela? Qualquer que seja o
que ela quer dizer, eu estou muito excitado para isso.
Separados pelo comprimento da cozinha, dou um passo até ela.
— O bebê não é meu.
Ela esconde sua expressão na cabeça peluda de Schubert.
— Não faça isso. — Eu me aproximo, dez metros de distância e absorvo
sua respiração acelerada. — Nunca se esconda de mim.
Colocando o gato no chão, ela lhe dá um tapinha no traseiro. Então se
endireita e me encara de frente. Seus lábios se estreitam, mas o sorriso em
seus olhos é ofuscante.
— Você está… feliz sobre isso? Ou você queria… — Seu olhar escurece,
sua voz quase um sussurro. — O bebê?
Dois meses atrás, eu não estaria devastado pela prova que Joanne tão
insensivelmente me traiu e desperdiçou nossa vida juntos. Mas agora?
Estou voando em nuvens de emoções liberadas, sendo a gratidão a principal
delas. Eu quero agradecê-la por ser uma puta traidora. Se ela não tivesse me
traído, eu ainda estaria com ela, inconsciente de que o amor mais profundo
e mais forte brilha nos olhos castanhos e em um coração altruísta de 17
anos.
Mais alguns passos e paro. Seis passos de distância. Eu preciso contar o
resto para Ivory antes que ela esteja ao alcance do meu braço. Antes que eu
perca o controle sobre o meu autocontrole.
— Eu quero um filho. Vários, na realidade. Algum dia. Em um futuro
muito distante. Com você.
Ela toca os lábios separados e bate dedos ansiosos na ilha.
— Lorenzo foi preso.
Ela arqueja e põe as mãos no balcão de trás, respirando fundo.
Com uma ficha criminal de um quilômetro e meio de extensão, ele é
procurado por suspeita de assalto, posse de drogas e assalto à mão armada.
Meu detetive particular identificou sua rotina e pontos de encontro, passou
as informações para o Departamento de Polícia de Nova Orleans e se
apoiou duramente ao sargento da polícia até que as prioridades fossem
ajustadas e a prisão fosse feita.
Lágrimas brotam nos olhos de Ivory, suas mãos tremendo na superfície
de granito.
— Por quanto tempo?
— Ele pode pegar anos por múltiplos crimes. A fiança estabelecida em
duzentos mil reais.
Ela acena com a cabeça ao mesmo tempo que um sorriso trêmulo se abre
em seu lábio.
— Obrigada.
Quando ela se aproxima, eu a paro com uma expressão tensa. Eu a quero.
Demais.
Ela inclina a cabeça e lambe os lábios.
— Você acreditou em mim quando a minha própria família me chamou
de vadia e mentirosa. Eu tenho corrido dele por quatro anos e em uma
semana, você o retirou da minha vida. — Ela me encara com admiração. —
Emeric, você fez algo por mim que ninguém faz a muito tempo.
Ela não esclarece o que é isso, mas eu posso preencher os espaços em
branco. Eu a fiz se sentir segura.
— Eu gostaria que fosse mais. — Flexiono minha mão na ilha, segurando
seu olhar. — Eu queria que ele fosse punido por estupro, Ivory. Se você
mudar de ideia sobre fazer a acusação, estarei com você em cada etapa do
caminho.
— Não. — Sua mandíbula endurece. — Quero seguir em frente.
Ela está preocupada que ele venha atrás dela e, pra ser sincero, também
estou. Eu não quero Ivory ligada ao ódio dele de qualquer maneira. Ele não
ficará preso para sempre e eu terei que lidar com sua inevitável liberdade
quando esse dia chegar. E será menos perigoso para Ivory se ele não a
culpar pelos próximos anos que ele estiver apodrecendo na cadeia.
Quanto a melhor notícia do dia que eu recebi essa tarde… Fecho a pouca
distância entre a gente e perambulo ao redor dela, deslizando de leve meus
dedos pelo braço dela.
Ela treme, vira o pescoço para manter o contato visual.
Paro atrás dela e seguro sua cintura. Com seu corpo de frente para o
balcão, espalmo suas mãos na porta do armário acima de sua cabeça.
— Não se mexa.
Ela sorri para mim por cima dos ombros.
— E se eu fizer?
Malcriada. Bato na sua maravilhosa bunda com uma mão.
Ela voa para a ponta dos pés, inclinando a cabeça para trás com um
chiado de surpresa. Mas suas mãos permanecem onde eu as coloquei.
— Que garota boa — sussurro em sua orelha, fazendo todo o seu corpo
tremer.
Sua receptividade é tão excitante. Eu tenho estado duro desde o dia que a
conheci, mas eu finalmente, finalmente, diminuirei essa dor de longa data
entre nós.
A não ser que ela use sua palavra.
Cubro suas mãos com as minhas, pressionando-as no armário, um
lembrete silencioso. Então, desço por seus braços nus, os dedos acariciando
sua pele antes de ir para as curvas externas de seus seios para acariciá-las.
Ela fica quieta para mim, mas há uma sútil agitação em sua postura ao
levantar e se inclinar em direção ao meu toque. Sua cabeça inclinando e
seus olhos alertas, seguindo cada movimento meu.
Uso minhas mãos para percorrer o material duro de seu vestido preto,
traçando o contorno de seus músculos e os ossos do quadril por baixo.
Quando alcanço a bainha em seu joelho, subo recolhendo seu vestido até
suas coxas, acima de sua bunda flexível e deixo-o preso em sua cintura.
Com seus olhos virados me assistindo, seus cílios se abaixam junto com
minha boca na parte de trás de seu vestido. Ela suspira, curvando-se no
balcão e deixando sua cabeça cair entre seus braços levantados.
Agachado atrás dela, ocupo minhas mãos com suas altas e redondas
nádegas. A renda preta da calcinha parece tão pecaminosa nela. Uma pena
que essa é a última vez que ela irá usá-la.
Pego as pequenas faixas ao redor de seu quadril e rasgo.
O som do rasgo da renda traz sua cabeça de volta.
— Eu gostava dessa.
— Comprarei mais umas cem para você e rasgarei cada uma do seu
maravilhoso traseiro.
Ao ficar de pé, alcanço a parte da frente de suas pernas e arrasto meus
dedos para dentro de suas coxas internas. Seus membros trêmulos e
gemidos roucos queimam um calor no meu pau, endurecendo como um
doloroso aço.
Quando minha mão encontra os pelos macios em sua boceta, puxo com
força os fios curtos. Ela morde o lábio inferior, abafando um suspiro.
Meu coração bate rápido, com força. Pressiono meu peitoral nas suas
costas, afasto seus pés e deslizo meu dedo por sua fenda.
Sua cabeça cai de volta para o meu ombro e sua boca procura pela minha.
Eu me esquivo dela, fazendo cócegas em sua mandíbula, pelo seu pescoço,
cobrindo sua pele com minha respiração.
— Meu Deus, Emeric. Eu nunca me senti desse jeito.
— Shhh. — Mordisco seu ombro, deixando-a sentir meus dentes, minha
língua e o calor crescendo dentro de mim.
Sua cabeça gira, expondo seu pescoço para os meus beijos. Chupo o
lóbulo da sua orelha, circulando minha língua ao mesmo tempo que
mergulho meus dedos dentro de sua boceta escorregadia. Puta que pariu, ela
está tão quente, molhada e apertada.
Ela choraminga e esfrega sua bunda em meu pau, impulsionando meus
toques provocativos em uma ofegante e um imprescindível balançar.
Nossos corpos rolam juntos, fodendo sem penetração. Meu pau está
alinhando, mas minhas calças estão no caminho.
Impulsiono meus dedos em sua boceta molhada, saboreando o apertar das
suas paredes internas.
— Você está limpa.
Suas mãos se contorcem na porta do armário.
— Limpa?
— O resultado do seu exame. — Deslizo meu toque em direção ao seu
anel anal. — Nós dois estamos limpos.
Ela aperta sua bunda.
— Nós vamos…? — Seus glúteos apertam meus dedos provocativos. —
Não! Aí não. — Ela se assusta. — O que você está fazendo?
— Eu vou foder você, Ivory. Hoje à noite. Neste exato momento. — Eu
balanço contra seu quadril, esfregando meu dedo na sua fenda, provocando
aquele anel apertado de tão pequeno. Eu anseio por levá-la lá, para foder
cada buraco em seu corpo.
Segurando seu quadril em um aperto contundente, alcanço bem dentro de
duas pernas, pressionando meu dedo contra a pequena dobra de pele.
Um lamento doloroso sai de sua garganta e suas mãos caem do armário.
— Scriabin.
Dou um solavanco para trás, meu pulso acelerado e mãos no ar.
— Ivory?
Porra, ela usou sua palavra. Ela usou a porra da sua palavra.
Um tremor percorre todo o seu corpo, seu torso curvado contra o balcão,
as coxas apertadas juntas e os braços ao redor da cintura.
— Eu não po-po-posso.
Frustração me golpeia, raivosa e cruel. E irracional. Eu a faço recuar,
respirando com força e fundo para logo em seguida, entender
desesperadamente.
Relaxando meus braços nas laterais, tento amolecer minha voz.
— Seja específica.
— Não o meu… — Ela abaixa o vestido pelas pernas e se vira para mim,
os olhos vidrados e apavorados. — Ali atrás não.
— Você já foi tocada ali?
Ela fica desapontada e se curva para si mesma.
Ódio transborda das minhas veias como lava. Eu não a examinei perto o
suficiente para ver cicatrizes, mas é obvio que alguém a sodomizou. É
possível que tenha sido vários alguéns.
Imagens horríveis penetram minha cabeça, acelerando a batida do meu
coração em uma macabra orquestra de violência.
— Sem anal. — Aperto minhas mãos trêmulas e dou um passo cuidadoso
para frente. — Esse é o seu limite?
— Eu não posso, Emeric. — Ela vai para trás e bate de encontro a
bancada, sua expressão presa em tormento. — Por favor, não faça isso.
Minha barriga se aperta. Ela acha que eu forçaria?
— Ivory. — Outro passo, minha voz rouca, grave com a mágoa. — Eu
não vou te tocar aí. Eu prometo.
Ela encara a porta, queixo e joelhos tremendo. Ela parece querer correr.
— Olhos em mim — digo gentilmente e aguardo ela obedecer. — Esse é
o seu único limite?
Por favor, diga que sim. Eu pensei mesmo que ela estava disposta a
transar. Como diabos eu julguei isso mal?
— Eu… eu não sei.
Meus pulmões se apertam, procurando por ar. Fico parado a um braço de
distância, respeitando sua zona de segurança. Mas eu não estou pronto para
recuar. Sem sombra de dúvida não vou desistir.
Ela tem todo o poder aqui e, maldição, eu vou fazer tudo que for
necessário para mostrar a ela.
Mantenho o nível da minha voz, mas firme.
— Você tem duas escolhas. Primeira, ande pelo corredor e sente-se no
piano, me esperando para começarmos a sua aula. Segunda, vá lá para cima
até o quarto e remova toda a sua roupa e me espere para fodê-la. —
Endureço meu olhar. — Sem anal, Ivory. Você tem a minha palavra.
Com os braços ao redor dos peitos, ela esfrega os bíceps, ainda sem olhar
para mim.
Imponho convicção em minha voz.
— Não importa a escolha, não haverá decepção ou vergonha. Não de
mim nem de você. Entendeu?
— Sim. — Um suspiro trêmulo.
— Vá.
No segundo que ela está fora de vista, eu me viro para o balcão e bato
meu punho no granito. Merda, merda, merda. Eu deveria saber que ela não
queria ser tocada ali. Eu não deveria tê-la forçado.
Não, isso é besteira. Se eu pudesse pensar além do meu maldito pau
dolorido por mais de um maldito minuto… Respire fundo.
A gente acabou de dar um passo à frente. Ela usou sua palavra e me
mostrou um de seus limites. Agora eu posso confiar que ela irá usá-lo de
novo. Irei esperar por uma eternidade se precisar.
O tapete com pequenos pés chama minha atenção para o chão. Schubert
se empina ao meu redor e inclina o corpo na minha perna, cobrindo minha
calça preta em pelos laranjas.
Eu me abaixo e o pego.
— Ela vai me afastar, não vai? — Pressiono meus lábios em sua cabeça,
segurando-o no meu peitoral. — Merda, eu quero matar cada canalha que já
tocou nela.
Ele ronrona como um motor e arqueia seu pescoço à espera de carinho.
Curvando meus dedos embaixo de seu queixo, eu obedeço. Logo, meu
pulso uniformiza e meus músculos relaxam.
— Vamos encontrar nossa garota.
Coloco-o no chão e o sigo para fora da cozinha, através da sala da lareira
e para dentro da sala de estar. Ele vira para o sofá e se estica em uma das
almofadas.
Bem à frente e no final do corredor está a sala de música. Para a direita e
em direção a…
Um delicado sapato preto está no tapete do saguão. Meu pulso se acelera.
Vou em direção ao sapato, afrouxando a gravata em volta do meu
pescoço ao mesmo tempo que olho para a escada. Um segundo sapato
empoleira-se na curva do degrau.
Ela escolheu o quarto.
Meu pau pulsa e minha respiração se acelera. Avanço, correndo pela
escada e pela esquina.
A visão do seu vestido preto no chão do corredor me estimula a ir mais
rápido, criando uma pressão faminta na base da minha coluna. Quando eu
chego na porta do quarto, encontro a porta fechada, a maçaneta adornada
com seu sutiã preto rendado.
Cristo, ela está me virando do avesso. Ajeito a rigidez dolorosa na minha
calça e respiro várias vezes para me acalmar. Então, abro a porta.
37

Ivory

A porta do quarto abre e suspiro em sinal de alívio.


Parada ao lado da cama, pelada e vulnerável, nos encaramos. Vê-lo
emoldurado na porta e me observando com aqueles olhos duros me tiram o
fôlego.
Estou em um grande conflito sem saber o motivo de ter usado a minha
palavra. Como que eu deixei um momento paralisante de terror superar
cada grama de confiança que eu tenho nele?
Emeric não só parou como também não explodiu em um ataque de raiva.
Sua reação paciente e seu controle confiável mostram que o meu medo nele
era injustificado e fraco. Eu sou tão problemática que não posso ter um
relacionamento íntimo com uma um homem que escolheria morrer a me pôr
em perigo?
Sua camisa azul-claro está aberta no colarinho e a gravata cobalto
desabotoada está pendurada ao redor do pescoço. O colete é uma manta
multicolorida de azul, cinza e preto. Pareceria monótono em um cabideiro,
mas com seus olhos de safira, mandíbula esculpida e cabelo preto
bagunçado, ele o vende como um modelo de catálogo de tendências.
Jesus Cristo, ele é dolorosamente bonito. Mas, é a sinergia de sua aura
dominante e a sua devoção inabalável que o torna sobretudo eficaz em
roubar corações
Em vez de se forçar contra minha bunda ou me expulsar de sua casa, ele
me deu uma escolha.
Agora que ele está aqui, eu não sei o que dizer ou como nos levar de
volta para o modo como as coisas eram. Mas eu não tenho que fazer nada.
Ele cruza o quarto com passos naturais, emoldura meu rosto em suas
mãos fortes e esfrega seus lábios nos meus.
— Você está bem?
— Sim. — Minha respiração engasgada. — Me desculpa.
— Nunca se desculpe por usar sua palavra. — Ele beija minha boca e
volta a olhar nos meus olhos. — Todo mundo tem seus limites.
Balanço a cabeça.
— Você? Qual é o seu?
Ele se abaixa, agachando entre as minhas pernas e desliza a mão pelo
meu pescoço.
— Defecação.
— Defe… o quê?
— Dejetos. Fezes. Isso é um grande não.
— Meu Deus do céu, tem pessoas que fazem isso?
— Sim. — Ele luta contra um sorriso trêmulo e ganha, nivelando os
lábios. — E zoofilia. Também é meu limite.
Minha garganta se agita.
— Como sua mente sequer chega lá?
— Você tem que perguntar?
Dou um sorriso largo. Ele é um homem pervertido e tarado, e porra, eu
amo isso nele.
— Bom saber que você não irá se aproveitar do pobre Schubert.
Ele faz uma expressão de desgosto.
— Isso é a sua mente indo lá.
— Você começou.
Ele molda sua mão ao redor da minha cintura, seus dedos traçando meus
ossos do quadril.
— Sem compartilhar. Para sempre. Você é minha. Eu sou seu. Esse é o
meu limite mais difícil.
— Você prefere que eu cague em você do que faça sexo com outra
pessoa?
— Sim. — Seu olhar voa para o meu, as profundezas azuis endurecidas e
cimentadas com um tom mordaz. — Se outro homem tocar em você, minha
resposta será assassinato. Lembre-se disso.
— Tudo bem — sussurro.
Ele levanta, seus dedos descendo pela frente do colete e soltando cada
botão devagar enquanto seus olhos percorrem meu corpo.
— Se masturbe.
Separando as pernas, deslizo uma mão entre as minhas coxas. Seu colete
cai no chão e meus mamilos endurecem com a súbita onda de excitação.
Ele remove a gravata e desabotoa a camisa da mesma maneira, sem
pressa e pelo visto satisfeito com a visão. Sua cabeça se inclina
minuciosamente, separando os lábios enquanto o olhar segue o movimento
dos meus dedos no meu clitóris.
Acaricio devagar, observando Emeric me assistindo, minha pulsação
balbuciando em um ritmo legato suave em minhas veias.
Ele encolhe os ombros na manga da camisa, expondo a curva de seus
bíceps, seu abdômen e peitoral definidos. Então ele se curva para remover
os sapatos e as meias, nunca desviando o olhar.
— Deite de costas. Alargando suas pernas.
Vou para o centro da cama, deitando de lado no colchão e girando meus
dedos nas dobras molhadas. A sensibilidade do meu toque e sua atenção
ininterrupta em mim alimenta um fogo no meu núcleo. Estou tão
sintonizada a ele, com a harmonia de sua respiração e os tremores sutis de
suas mãos. Isso vem do hábito de ter sua presença no prazer sexual e se
solidifica com o conhecimento que ele nunca vai me decepcionar.
Com uma economia de movimentos, ele afrouxa o cinto, abre a calça e
empurra o resto de suas roupas para o chão. Eu já vi partes e pedaços duros
como rocha do seu corpo, mas eu nunca o vi por completo, totalmente em
forma. Deus misericordioso, ele dá um novo sentindo para musculoso.
Seu pau se entende, projetando acima das colunas de suas coxas
poderosas. Ele não o toca e nem mesmo reconhece quando se aproxima,
seus olhos fixos nos meus e sua expressão intensa.
Ele pega meu tornozelo e me vira no colchão, arrastando minhas pernas e
rodando minha posição até que minha cabeça esteja próxima da cabeceira.
Ele para comigo ao pé da cama e se inclina para a frente.
O recuo do seu joelho no colchão faz meu coração saltar. A expressão
predatória em seus olhos para minha respiração. Ele rasteja sobre mim,
pernas ao redor das minhas, andando sob as mãos e montando nas minhas
coxas.
Eu esperava que ele abrisse minhas pernas e se empurrasse entre elas,
mas ele já me provou que ele não é como os outros.
Flutuando em cima da minha boca, ele funde sua boca na minha
enquanto sua mão percorre meu corpo, acariciando e apalpando meu peito,
coxas e boceta. Sua língua impaciente, sua respiração pesada e toques
diabólicos me deixam loucamente sem fôlego.
Puxo seu ombro ao tentar trazê-lo para mais perto.
— Você vai… deitar sobre mim? Me deixar sentir o seu peso?
Ele já me prendeu contra uma parede, me amarrou no piano e me
masturbou na ilha da cozinha, mas nunca estive em uma posição como essa
com ele. Não importa quantas vezes eu imagine, não será nada como eu
experienciei.
Com as minhas coxas apertadas entre as dele, ele segura a parte de trás da
minha cabeça com as duas mãos e abaixa seu comprido corpo em cima do
meu. Seus olhos procuram meu rosto assim que seu peso me afunda no
colchão, seu peitoral cobrindo o meu em calor e músculo.
Minha boca se abre em um suspiro de felicidade e ele a pega, sua língua
deslizando e reivindicando, seus lábios firmes e agressivos, e tudo meu. Seu
tamanho volumoso me sufoca em segurança, sua força é um escudo de
proteção e suas mãos apoiam minha cabeça como se estivesse em súplica.
Nos beijamos através de uma infinita sonata de batidas de coração e
gemidos, nossas testas rolando juntas e nossos quadris se movendo com
avidez. Nossos corpos balançam em uma onda sincronizada, prendendo o
comprimento de aço dele entre a gente.
Estou morrendo de medo de pensar em sua grande circunferência sendo
empurrada dentro de mim. Mas, estou pronta. Eu nunca estive tão pronta
para isso.
Flexiono minhas coxas, tentando abri-las. Por que ele não separou
minhas pernas ainda?
— Não me teste, Ivory. — Ele alcança dentro da gente e esfrega seus
dedos pela abertura escorregadia na minha boceta. — Do jeito que meus
pensamentos estão neste exato momento, irei parti-la ao meio.
Na próxima respiração, ele vira a gente, me pondo para cima e dobrando
minhas pernas para montar seu quadril.
— Estou dando isso para você. Só dessa vez. — Ele estende as mãos
sobre a cabeça e agarra as hastes da cabeceira. — Minhas mãos não se
moverão. Ficarei aqui deitado e parado enquanto você fode comigo.
Ah.
Uau.
Tudo bem, isso é… diferente. E muito bom.
Até que eu olho para baixo, para seu grande e comprido pau crescendo na
minha frente. Como isso funciona? Ele quer que eu… sente nisso?
Encontro seus olhos, balançando a cabeça.
— Eu nunca…
Seus dedos empalidecem ao redor das hastes, sua expressão atormentada.
É raiva?
— Você nunca esteve por cima? — ele rosna.
— Nunca. — Uma energia nervosa passa por mim. Agarro seu pau com
as duas mãos, acariciando para cima e para baixo, familiarizando-me com
seu tamanho. — Eu não sei, Emeric. Eu posso mesmo caber…
Sua respiração sai acelerada.
— Porra, Ivory. Eu vou caber. — Os tendões de seu antebraço se esticam
com o aperto na cabeceira. — Você está me atormentado aqui.
Flexionando suas coxas embaixo de mim, ele me prende com um olhar
tão essencial para quem ele é. A confiança em seus olhos me dizem para
calar a boca e prestar atenção porque ele está prestes a compartilhar uma
experiência arrebatadora comigo. É a sua expressão mais poderosa, uma
que provavelmente o faz transar sem uma única palavra falada e mais vezes
que eu gostaria de pensar.
— Esse olhar que você está me dando… — Aperto meus dedos ao redor
do seu pau, desfrutando do som de sua respiração estrangulada. — Você o
usa quando está se apresentando no palco?
Seus quadris se mexem embaixo de mim, sua voz torturada.
— O quê?
— Você fode com as mulheres da plateia?
— Ivory, suba no meu pau antes que eu enlouqueça.
Eu me abaixo e ponho um beijo na coroa bulbosa em uma saudação
afetuosa. O próximo beijo é um apelo para ser gentil.
Então, subo nos meus joelhos e posiciono entre as minhas pernas.
Fiel à sua palavra, ele não empurra ou move as mãos. Seus olhos brilham
como chamas azuis ao me esperar guiá-lo para dentro.
Eu me abaixo nele, centímetro por centímetro, maravilhada com a
sensação de esticamento, o deslizamento fácil e o ajuste perfeito. Nunca é
tão molhado, tão cuidadoso. Porra, eu me sinto tão completa. Faminta.
Aliviada.
O som do gemido gutural dele me estimula a ir mais rápido. Quando ele
está todo dentro, aperto meus músculos internos ao redor dele.
Seus olhos se fecham, os músculos da sua mandíbula flexionando, seu
corpo tremendo embaixo de mim. Eu não acho que ele está respirando.
— Emeric?
Um grunhido gutural é a única resposta que ele dá, carregando meus
sentidos já sobrecarregados com excitação. E eu ainda nem me mexi.
Inclino para a frente e pressiono meus lábios no seu peitoral rígido com
tensão.
— É isso. Nós estamos transando.
Seus olhos se abrem e ele solta uma risada dolorosa.
— Nós não estamos fazendo nada. — Suas mãos apertam ao redor da
cabeceira, sua expressão dura e exigente. — Foda o meu pau, Ivory.
Mexo meu quadril testando a sensação dele deslizando dentro do meu
interior e me preenchendo com choques de estática.
Seu corpo todo treme embaixo de mim.
— Mais rápido.
Com minhas palmas em seu peito, giro ao redor do seu pau, levantando e
balançando. Os movimentos arrastados e agradáveis são irreais. Os
pequenos choques de eletricidade, os sons ofegantes de nossas respirações,
tudo gira em torno de onde estamos unidos.
Ele levanta a cabeça, me observando com intensidade.
— Cavalgue.
Eu faço, de bom grado e desenfreada.
— Porra, aperte. — Suas mãos escorregam da cabeceira, mas com a
mesma rapidez, ele ajusta o aperto. — Mais forte, Ivory. Mais fundo.
Eu me solto, levantando os braços atrás da cabeça, fechando os olhos e
circulando meu quadril. Quando eu pulo, meus seios balançam e a estrutura
da cama range. Ao abaixar e levar, meu clitóris pega fogo.
Eu poderia atingir o ápice desse jeito. Um orgasmo genuíno. Com um
pau dentro de mim. O pau do sr. Marceaux. Difícil de ignorar o significado
disso.
— Ah, merda. — A cabeceira range em seu aperto. — Olhe para você.
Abro meus olhos para colidir com o dele, um sorriso puxando minhas
bochechas.
— Estou fodendo meu professor.
— Jesus Cristo, Ivory. — Seus bíceps flexionam acima de sua cabeça,
suas coxas enrijecidas embaixo de mim. — Me dê a sua boca.
Deslizo até seu peito e empurro meu quadril, deliciando-me com a
sensação da nova posição. Quando chego no seu lábio, sua língua procura
pela minha, girando e saboreando.
Ele estala os dentes para mim, seus músculos amontoando e contorcendo.
— Sua boceta molhada está pingando em cima de mim.
Sua boca suja fortalece a maré dentro de mim. Eu passo minhas mãos
pelos bíceps dele e seguro seu rosto, o arranhão de sua barba raspada em
minhas palmas. Ele aprofunda o beijo, o esticar forte de sua mandíbula tão
erótico quanto a maneira pecaminosa do deslizar da língua dele.
Sinto falta de suas mãos em mim embora não a do açoitar e do prazer
doloroso do seu cinto. Também não gosto do seu silêncio. Anseio por suas
ordens que comandam cada movimento meu. Mas, de repente, ele parece
incapaz de falar. Com seu corpo tão rígido e duro, suspeito que ele esteja
tomando uma grande dose de concentração para não mover os quadris ou
soltar a cabeceira.
Sem mais tortura.
Com minhas mãos em seu rosto, beijo-o com força, apaixonadamente ao
mesmo tempo que mexo minha boceta para cima e para baixo no seu
comprimento, procurando pela posição. Quando encontro, todos os meus
nervos, células e pensamentos se aceleram para meu ventre, recolhendo,
pressurizando e explodindo por todo o meu corpo em uma série de
percussões aceleradas.
Minha boca abre em um grito silencioso, meu olhar preso no dele. Seus
lábios se abrem juntos dos meus, suas pupilas dilatadas e suas mãos voando
para a parte de trás da minha cabeça. Então, ele está me beijando
implacavelmente, batendo seus quadris e me levando a um outro orgasmo.
Ele nos gira, as mãos em meu rosto, sua boca e respiração consumido as
minhas. Nossas línguas batalham, lambendo e chicoteando quando seu peso
esmaga meu peito e seu pau me preenche. Sem parar, ele bate seu quadril
com impulsos duros e perversos. Estico meu braço para baixo, colocando
minhas mãos nos duros músculos de seu traseiro pela primeira vez e seguro.
Meu Deus, é um traseiro perfeito. Ele é perfeito por toda parte. A canela
em sua língua, as notas baixas e sombrias em sua voz e a visão dele em
jeans e camisetas, gravatas e colete, e sem nada. Eu nunca terei o suficiente.
O ritmo das suas estocadas aumenta e sacode, caindo em um staccato
abrupto. Ele arranca sua boca da minha, sua mão caindo no colchão para
apoiar a curva de suas costas enquanto ruge em um orgasmo. Seus olhos me
encarando através de cada grito ofegante, me falando que sou a razão do
seu prazer, o coração dele.
Abaixando a cabeça para meu ombro, ele parece estar desacelerando,
tentado acalmar a respiração pesada. Mas a pressão dos dentes na minha
pele, me prende em uma borda elevada excitação.
Um momento depois, ele prende meus braços acima da minha cabeça, o
quadril batendo, o pau latejando dentro de mim.
— Lembre-se da sua palavra.
Meus olhos se arregalam.
— Nós não terminamos?
Ele faz o som de tsc, fecha uma mão forte no meu peito e morde meu
mamilo.
Então, ele me fode.
Por quatro horas.
Seu ritmo varia entre selvagem e gentil, seu tempo mudando rápido com
as inúmeras posições alternadas. Ele me coloca de quatro e bate no meu
traseiro enquanto impulsiona por trás. Ele me joga de costas, prende minha
garganta com seus dedos e me fode com minhas coxas apertadas entre as
dele. A coreografia fica um pouco nebulosa depois disso, enquanto meu
corpo se rende ao mundo flutuante e pervertido de Emeric Marceaux.
Grande parte da noite passa pelas pálpebras pesadas dos meus olhos em
um cobertor de pele escorregadio de suor, carícias ternas e beijos
apaixonados. Mas como este é Emeric e seu jeito é impregnado com a
dominação, exige uma sutileza emocional e mental que vai muito além do
ato sexual. Ele me fala quando, onde e com quanta força, e rolo com ele,
anseio por ele e minha necessidade de satisfazê-lo supera tudo.
Por sua vez, ele me dá prazer. Direto para o coma.
— Ivory? — Ele morde minha coxa.
Não consigo nem me mexer. Por que eu preciso? Ele mesmo irá me
mover.
Tendo acabado de sair do chuveiro, onde ele me fodeu na parede de
azulejos, eu me deito de bruços na cama. Pelada, ruborizada e saciada, tento
me convencer a levantar a mão para afastar o cabelo molhado do rosto. Vou
fazer isso em um minuto.
Ele se move para cima do meu corpo e esfrega os fios molhados para trás
da minha orelha.
— Você é dez anos mais nova do que eu. Não me fale que um homem
velho cansou você.
Bufo – é o máximo de energia que consigo reunir. Porém, em minha
defesa, ele malha duas horas todos os dias.
O colchão balança ao meu redor enquanto ele se movimenta, beijando
cada pedaço do meu corpo desde a cabeça até os pés. Não leva muito tempo
até que eu caio em um extasiante sono, sob seu afeto.
Quando acordo, ele está esticado do meu lado com uma toalha presa em
sua cintura, traçando um dedo pela minha coluna.
— Por quanto tempo eu dormi?
— Quinze minutos.
Dobro meus braços embaixo da bochecha e encontro seus olhos
semicerrados.
— Eu nunca fiz isso.
Ele alcança atrás de si e pega um copo d’água da mesinha de cabeceira
antes de me entregar.
— O quê?
Depois de um longo e refrescante gole, entrego de volta e mudo de
assunto.
— Você não jantou.
Ele retorna o copo antes de me deitar de lado, descansando a cabeça na
curva do braço.
— Nenhum de nós comeu. Termine o que você ia dizer.
Estendo a mão e traço a curva do seu lábio superior.
— As coisas depois. Isso. Sempre foi sexo e correr, às vezes seguido por
lágrimas e me esconder. — Dou um sorriso suave para ele. — Eu gosto
disso. Bastante.
Ele me puxa de encontro ao seu peitoral e beija minha testa. A calma de
nossa respiração nos envolve e ele me abraça desse jeito por tanto tempo
que me pergunto se ele adormeceu.
Por fim, seu sussurro quebra o silêncio.
— Eu também gosto, Ivory. Tanto que estou apavorado que isso seja
tirado de nós.
Envolvo meu braço em suas costas amplas.
— Seremos cuidadosos.
— Precisamos ser mais discretos na escola.
Raspo minha unha em seu mamilo.
— Você precisa parar de me encarar dessa maneira.
— De que maneira? — Um sorriso provoca seus lábios.
— Aquela que diz… — Engrosso minha voz. — Venha aqui, srta.
Westbrook. Olhe para mim, srta. Westbrook. De joelhos…
Ele abre um sorriso malandro em seu rosto.
Rolo para fora de alcance, minha voz zombeteira desabando em uma
risada.
— Chupe o meu pau, srta. Westbrook.
Ele mostra os dentes e rasteja atrás de mim, perdendo a toalha no
processo.
Meus olhos passam por seu peitoral, parando no pau dele. Está… macio?
Puta que pariu, parece estranho. Inclino a cabeça, tentando ter uma visão
melhor.
Ele se senta sobre os tornozelos e estreita os olhos.
— Vai me deixar com complexo.
— Eu nunca… — Inclino para seu colo e embrulho-o na minha mão.
Ainda é pesado, só… — Tão macio.
Ele me encara curioso.
— Continue tocando-o e não será.
Verdade, em questão de segundos começa a enrijecer. Estou familiarizada
com essa parte e ele é o maior e mais forte de todos. Ironicamente, ele é
também o mais seguro.
Ele balança o braço e bate na minha bunda.
— Não terminei com você, mas precisamos comer.
Conseguimos comer metade da pizza de pepperoni gourmet antes dele
me dobrar na ilha da cozinha e me provar exatamente como ele não
terminou comigo.
Eu espero que ele nunca termine.
38

Emeric

Na noite seguinte, me estico atrás do piano durante o intervalo da Sinfonia


Nº 9 de Mahler e puxo a sufocante gravata borboleta. O smoking é um dos
muitos da minha coleção particular, feito sob medida e desenhado com um
acabamento de qualidade. Não importa como foi caro. Os tecidos restritivos
me dão coceira e superaquecem. Todo o visual arrogante não combina
comigo.
Nem essa música.
Joanne nunca foi as apresentações, alegando tédio ao ouvir as mesmas
obras de arte nos programas do concerto ano após anos. Posso culpá-la?
Embora eu aprecie as clássicas, duvido que Gustav Mahler pretendia que
suas sinfonias se tornassem negócios comerciais de repetição irracional. Só
em seus cinquenta anos, ele regeu sua segunda sinfonia dez vezes.
Examino o estilo Belas-Artes do teatro filarmônico, cercado por uma
orquestra de velhos pomposos flatulentos e músicos em tempo-integral, a
maioria dos quais tem seus próprios salões residenciais. Em vez de compor
música moderna apaixonada, eles parecem se contentar ao desperdiçar seus
extraordinários talentos em rotinas reaproveitadas do repertório clássico.
Mas eu não estou contente. Nem um pouquinho.
Então por que estou aqui, remoendo nesta lamentação?
Garantir um assento na orquestra era um progresso natural para minha
carreira musical, um altamente notável. Era um meio de autojustificação,
uma validação para todo o meu trabalho duro e talento. Somente quando
meu objetivo foi alcançado que percebi que era a ambição errada para mim.
Eu quero criar minha própria música, explorar minha imaginação e
transformar o piano clássico em algo novo e selvagem. E eu quero
compartilhar essa paixão, ensiná-la e abrir mentes ansiosas para novas
ideias.
Sentado atrás da fileira de cordas, observo as silhuetas sombreadas dos
frequentadores nos assentos dos balcões. Um sorriso torce meus lábios
quando a pergunta de Ivory provoca minha mente.
Você fode com as mulheres da plateia?
Houve várias semanas seguintes depois de Joanne que o ponto alto dos
meus concertos era encontrar minha próxima trepada. Agora?
Meu olhar se conecta com a figura mais atraente deste teatro, a única
razão pela qual estou sorrindo essa noite.
Ela senta na fileira da frente, cintilando como uma ária brilhante cercada
por instrumentos escuros. Seu vestido Versace vermelho segue as linhas
sinuosas do seu corpo, dos seios aos pés e a fenda na altura da coxa bordada
com cristais Swarovski.
Eu sei de cada detalhe por que eu mesmo o escolhi a dedo – assim como
eu fiz com todas as roupas dela. Mas eu escolhi esse vestido em particular
para uma noite exatamente como essa, imaginando-a usando enquanto
assistia a uma das minhas apresentações.
Apesar da minha apreensão sobre ela frequentar o concerto, vê-la naquele
vestido de gala quase faz o risco valer a pena. Quase.
Os pais dos alunos do Instituto Le Moyne frequentam esse espaço e
apesar de Ivory ter dirigido separadamente com Stogie a reboque, me
preocupo com as pessoas erradas fazerem as ligações certas a respeito do
nosso relacionamento. Mas ela me implorou para vir, seduzindo-me com
um por favor em seus lábios. Então, eu garanti dois assentos na primeira
fila e preparei seu encontro.
Sentado ao lado dela, Stogie, relutantemente, veste smoking que eu
comprei para ele, sua mão grande esfregando várias vezes sua careca como
se estivesse lamentando a ausência de seu amado boné de beisebol. Que
dupla eles fazem. Dois musicistas apaixonados pela interpretação clássica e
essa é a primeira apresentação filarmônica deles?
Eu me pergunto se vai corresponder às expectativas deles. Prestarei
bastante atenção à reação de Ivory depois do show assim como sua reação a
outras coisas que planejei para ela nos próximos meses. Ela afirma que quer
frequentar Leopold, que seu maior sonho é sentar onde estou sentado agora,
em um espaço lotado, tremendo sob as luzes do palco.
Mas o que ela sabe de verdade sobre o mundo da música e as
oportunidades disponíveis para ela? Eu pretendo esclarecer para ela. Então,
se ela ainda quiser ir para a Leopold, eu tenho um plano para fazer isso
acontecer.
Duas seções afastadas, meus pais ocupam seus assentos com ingressos
para a temporada, cabeças inclinadas juntas em uma conversa. Eu pedi para
que eles não abordassem Ivory hoje, a fim de manter sua dissociação de
mim fora da escola.
Ivory e eu aceitamos de boa vontade os riscos do nosso envolvimento.
Mas também coloca o modo de vida dos meus pais em perigo. Se eu sou
pego com ela, ninguém iria a um médico cujo filho foi condenado por
pedofilia. E a minha mãe? Leopold iria queimá-la na fogueira. Então, tenho
impedido minha mãe das apresentações.
O concerto acabou e as três semanas seguintes flutuam com uma
extasiante névoa de Ivory.
Quando o Dia de Ação de Graças chega, finalmente cedo nas exigências
da minha mãe em conhecê-la.
Enquanto dirijo minha aluna de 17 anos para a casa dos meus pais para a
ceia do peru, estou em aflito, não me sentindo nem um pouco melhor sobre
o sigilo de nosso relacionamento.
No momento que minha mãe abre a porta e encara minha mão
entrelaçada com força na de Ivory, meus pelos se arrepiam.
Sim, eu sou seu professor. Sim, eu enfio meu pau nela, com um rigor e
depravação genuína, dia e noite. Mas a intensidade de meus sentimentos por
ela vai além das leis de merda que eu realmente não dou a mínima para o
que os outros pensam.
Mas, meus pais se preocupam. Eles também são excessivamente
solidários e dedicados a minha felicidade. Foi por isso que eu a trouxe aqui.
Ela teve um pai como os meus uma vez.
Eu quero que ela vivencie esse tipo de amor de novo.
39

Ivory

Depois do jantar, recosto no sofá e ajeito o cós da saia para aliviar minha
barriga dolorida. Eu não sei se é por causa do meu excesso de peru, purê de
batata e pão amanteigado ou se estou cheia dos velhos nervos por estar
sozinha com Laura Marceaux.
— Eu posso ver por que ele está tão apaixonado por você. — Ela me dá
um sorriso acolhedor e recosta na cadeira ao lado do sofá.
Meu olhar vagueia pela porta da cozinha e para na camiseta branca que
estica nas costas de Emeric. Sentado na mesa com seu pai, ele se monta nas
costas de uma cadeira, imerso na conversa. Não posso ver seu rosto ou
escutar o que fala, mas as notas graves em sua voz vibram por mim, me
acalmando como uma canção de ninar.
Ele não usa cueca debaixo dos jeans e, nesse momento, o jeans está
perigosamente abaixo de seus quadris, mal cobrindo os músculos duros de
sua bunda. Se ele se inclinar mais um pouquinho, minha visão ficará muito
mais distraída.
Pigarreio.
— Estou apaixonada por ele também.
Ela balança o vinho tinto na taça, me estudando com atenção. É tão
estranho ver os olhos azuis de Emeric em uma expressão suave. Ela é
intimidante de tão linda. Nem um fio cinza em seu cabelo preto na altura
dos ombros. Mas há décadas de sabedoria na maneira como ela olha para
mim, como se ela pudesse ler meus pensamentos e entendê-los.
Ela bebe o vinho.
— Vocês dois parecem felizes. Talvez um pouco no limite, mas felizes.
Vocês só têm morado juntos por o que… um mês?
— Cinco semanas.
Ela acha que isso é insuficiente? Que cinco semanas não são o suficiente
para medir a seriedade de um relacionamento?
Eu quero salientar que estivemos emocionalmente envolvidos em ambos
por três meses e que a parte do sexo mesmo só aconteceu três semanas
atrás, mas isso é informação demais. Além disso, no caminho para cá,
Emeric me proibiu de agir de forma estranha sobre nós. Sem vergonha. Seja
você mesma. Eles não nos julgarão.
Ao que parece, ele estava certo. Laura continua como se a coisa mais
importante em sua mente fossem as histórias sobre a infância rabugenta de
Emeric. Sua bondade acabou por me abrir o suficiente para compartilhar
histórias do meu pai. Evitamos falar sobre Leopold, um conflito de interesse
muito sensível. Mas não nos impede de estabelecer uma troca confortável
como se eu fosse apenas uma namorada normal, conhecendo a família.
Uma hora depois, estou completamente extasiada com ela. Sua
disposição é tão leve e refrescante. Seus olhos gentis e seu sorriso sincero
irradiam o tipo de serenidade que só vem de uma felicidade profunda.
Ela é a personificação do calor e afeto materno. Um contraste devastador
da minha própria mãe. Ela me faz sentir aceita, cultivada e… jovem, mas
apenas da melhor maneira.
Na cozinha, o dr. Marceaux se levanta da mesa, aperta o ombro de
Emeric e desaparece no final do corredor que leva ao interior da
propriedade.
— Se você não se importa… — Laura levanta da cadeira. — Vou ver
aonde Frank foi. — Ao passar pelo sofá, ela alcança e aperta minha mão. —
Foi tão bom finalmente conhecê-la, Ivory.
Deixo a ternura de suas palavras penetrar.
— Você também.
Emeric não se mexeu do seu assento na cozinha, seus antebraços
dobrados nas costas da cadeira.
Em pé, arrumo a sedutora saia no meio da coxa. Eu me sinto bonita, mas
não chamativa e minha blusa verde sem mangas está abotoada por cima de
uma camisola fina. Se eu fizesse minhas próprias compras, o conjunto é
algo que eu não teria escolhido.
Eu me aproximo das suas costas e observo a pele acima de seu jeans de
cintura baixa. Sem aparecer o cofrinho. Ele é legal demais para isso. Mas
uma sombra provoca o vale entre suas nádegas musculosas. É muito
convidativo para ignorar.
Mergulho um dedo embaixo do jeans e traço aquela fenda sedutora.
Ele puxa uma respiração longa e profunda, sua voz rouca.
— Ivory.
Acariciando o topo da sua fenda, coloco minha boca próxima de sua
orelha e sussurro:
— Eu amo o seu traseiro.
Seu quadril balança e a testa dele abaixa no braço dobrado.
— Meu traseiro também ama você.
Minha respiração vacila. Seu traseiro me ama ou ele me ama? Quero que
signifique ambos.
Coloco minhas palmas sobre os músculos magros ao longo das suas
costas e acaricio em círculos lentos. Ainda acho surpreendente que consigo
tocá-lo assim. Apenas caminhar até ele e mostrar carinho. Como é louco
que eu queira mesmo colocar minhas mãos nele?
As últimas cinco semanas mudou radicalmente minha percepção sobre
mim mesma e minha habilidade de fazer coisas normais com um homem.
Inclinando meu corpo, passo meus braços ao redor do seu pescoço e
pressiono a parte superior do meu corpo no dele.
Com a cabeça inclinada para baixo, ele envolve uma mão grande nos
meus pulsos, algemando-os no seu peito.
— Uma das coisas mais eróticas que uma mulher pode fazer é esfregar os
seios nas costas de um homem e Ivory, seus seios são pecaminosos.
Meu Deus, seus pais podem ouvi-lo. Tento me levantar para afastar meus
peitos, mas ele me segura com seu aperto nos meus braços. Minha atenção
volta para o corredor vazio.
— Ainda mais sensual, é que você nem está tentando me excitar. — Ele
vira a cabeça e morde meu bíceps.
Minha boca se abre em um arquejo silencioso, minha respiração presa em
antecipação. O que farei com esse homem travesso? Se ele me tocar em
maneiras mais provocativas, não vou me importar onde estamos e quem
está assistindo.
Ele desliza os lábios no meu braço e eu derreto em suas costas.
Sua mão livre flutua atrás de mim, agarrando a pele nua da minha coxa
embaixo da saia.
— Minha mãe lhe interrogou?
Beijo seu pescoço, saboreando seu cheiro quente.
— Me tornei imune aos métodos de interrogatório dos Marceaux.
— É mesmo?
A pressão de seus dedos na minha mão acelera meu pulso. Seu polegar
acaricia a parte interior do meu pulso e eu sei que ele pode sentir a agitação
da batida do meu coração.
Enterro meu nariz no seu cabelo macio atrás da orelha, respirando o
cheiro amadeirado do shampoo.
— O que você conversou com o seu pai?
— Sobre você. Nós.
Com o restringir de sua mão ao redor de seu pulso, ele me puxa para o
seu lado. Então ele levanta da cadeira, pega seu chapéu fedora de feltro
cinza e o coloca em sua cabeça com uma inclinação tão sútil que pode ser
acidental.
Não me engano. Tudo o que ele faz é insidiosamente calculado. Como
combinar seu jeans e a camiseta branca com seu chapéu fedora? Quase
inofensivo assim como se ele tivesse escolhido algo rápido. Mas caramba,
ele sabia que aquele olhar sensual me deixaria como uma espuma luxuosa.
Contudo, é o seu olhar fixo, os profundos oceanos de seus olhos sob a
aba do chapéu fedora que me faz nunca querer desviar o olhar.
O ambiente escurece até que eu só esteja ciente dele e as batidas
pulsantes entre nós. Afundo nas ondas sedutoras do desejo, naquele abismo
deliciosamente sombrio que anseia por seu aperto de castigo, a voz rouca e
os impulsos perversos.
Aqui não.
Com grandes esforços, me trago de volta à superfície e respiro fundo.
— O que você conversou com o seu pai sobre nós? O que ele disse?
Será que o pai dele não aprova nosso relacionamento? Será que Emeric
está tendo dúvidas?
Os dedos ao redor dos meus pulsos apertam e ele puxa meu braço pra trás
das costas. O movimento me empurra direto para sua ereção.
Seus olhos prendem nos meus.
— Ele queria ter certeza que eu tinha tudo sob controle e se eu ponderei
tudo. — Com meus braços presos atrás das costas, ele suporta meu rosto
com sua mão livre. — Estou trabalhando em algumas medidas de precaução
para nós manter seguros até que você se forme.
— Como o quê? — Eu odeio essa constante ameaça que paira sob nós, de
alguém querer nos machucar.
Ele esfrega seus lábios nos meus.
— Você confia em mim?
— Imensamente.
Seu lábio prende meu lábio inferior.
— Vamos para casa e cuidar do seu amontoado de pelos.
Sorrio no beijo.
— Schubert?
— Ele também.
Nos despedimos dos pais deles, subimos no carro e dirigimos até sua casa
sem agarramos um ao outro. Mas no segundo que a porta da garagem se
fecha atrás do GTO, ele me dá um olhar que dissolve todos os ossos do meu
corpo.
Em um movimento fluído, ele joga o chapéu, solta nossos cintos de
segurança e joga o assento para trás, para longe do volante.
Suas mãos voam para o zíper, puxando-o para baixo e liberando seu pau
duro.
— Me cavalgue.
Um rouco comando e estou molhada na hora.
Eu me lanço sobre ele, batendo um joelho no console ao mesmo tempo
que caio em seu colo. Ele puxa minhas pernas ao redor dele, minha bunda
batendo no volante e buzinando. Rimos com as nossas bocas moldadas uma
na outra, suas mãos debaixo da minha saia e meus dedos emaranhados em
seu cabelo sensual pra porra.
Puxando a costura da minha calcinha para o lado, ele coloca os dedos
dentro de mim.
— Pronta pra caralho.
Então, ele me enfia em seu pau.
Eu gemo com as sensações de explosão, apertando meus músculos
internos e arqueando minhas costas. Ele agarra meu traseiro com uma mão
e a parte de trás da minha cabeça com a outra, empurrando vigorosamente e
me segurando com tanta força que ele é a única saída que existe.
Ele bate embaixo de mim com golpes lancinantes enquanto a mão na
minha cabeça direciona o ângulo e aprofunda o beijo. Sua língua fode a
minha boca do mesmo jeito que seu pau enche minha boceta. Profundo,
urgente e completamente irrestrito.
Seus músculos tremem e se contraem. Seus gemidos roucos endurecem
meus mamilos e o mexer sensual e faminto de seu quadril me reduz a uma
poça trêmula de rendição.
Eu me dissolvo nas faixas de aço do seu braço enquanto ele me beija até
eu perder os sentidos, me arrastando para cima e para baixo do seu
comprimento e se masturbando no aperto do meu corpo.
Eu gozo, pesado e demorado, arranhando minhas unhas em seu couro
cabeludo e uivando seu nome com minha garganta. Ele empurra para dentro
de mim em um rangido implacável, abaixa a cabeça cair no meu ombro e
expulsa seu gozo com um gemido profundo e gutural.
Quando ele levanta a cabeça, nos encaramos, ofegantes, agarrados com
força, lábios tocando e nos liberando. Ele traça seu nariz no meu, seus olhos
tão perto e nunca desviando o olhar. Estou tão perdida nesse homem, tão
envolvida, coração aberto e alma tremendo.
Não somos apenas um professor e uma aluna, um dominador e uma
submissa, um homem e uma mulher.
— Nós somos um concerto infinito. — Beijo seu lábio. — Uma obra de
arte musical.
Ele arrasta seu lábio pela minha mandíbula, seu pau gozando dentro de
mim.
— Como a Missa Negra de Scriabin?
Muito desafinado.
Levanto meu pescoço para seus lábios.
— Eu estava pensando na linha de Ode à Alegria de Beethoven.
— Fraco. — Ele morde a pele embaixo da minha orelha. — Nós somos
mais para “Hot For Teacher” da Van Halen.
Meu Deus. Eu sufoco meu sorriso.
— Você está arruinando minha analogia. Isso não é nem uma peça.
— Nós iremos compor nossa própria peça. — Sua boca desliza pelo meu
pescoço, beijando e lambendo. — Uma música que nunca irá acabar.
Eu amo como isso soa.
40

Ivory

Duas semanas depois, caminho pelo estacionamento da escola, procurando


pela chave do carro na minha bolsa carteiro. O sol já foi embora a muito
tempo e está passando em algum lugar no sul com adormecidos em meia
hora. Cara, minha bunda está arrastando.
Na escola, Emeric tem me feito dar duro atrás do piano para a preparação
da apresentação de férias neste fim de semana. Em casa, ele tem dado duro
comigo contra a parede, amarrada na cabeceira da cama e ajoelhado sob o
calor do cinto. Ele é um interminável treino cardiovascular e de alta
intensidade. Juro, não sei onde ele encontra energia.
Só tem alguns poucos carros espalhados pelo estacionamento, o Porsche
em uma ponta e o GTO na outra. A escuridão ao redor esfria o ar, gelando
minha pele embaixo do suéter fino. A iluminação escassa não ajuda na
minha busca pela chave. Eu vasculho os livros didáticos na minha mochila,
de cabeça baixa e xingando baixinho.
Encontrei. Aperto o botão de destrancar e encolho ao som alto do alarme.
Quando olho para cima, fico cara à cara com a última pessoa que eu
esperaria ver.
A dois metros de distância e encostado no Porsche, meu irmão me dá um
sorriso imprestável.
— Por onde você tem andado, Ivory?
Meus músculos congelam. Como ele sabe que aquele é o meu carro? Ele
tem me seguido? Ele sabe onde eu moro? Com quem meu moro?
Mexo no chaveiro. Não adianta esconder, já fiz o maldito carro iluminar.
— Levou dois meses para você vir atrás de mim? Uau, Shane. Eu acho
que deveria me sentir especial por você ter notado minha falta.
Ele se endireita e pega um cigarro do maço no bolso. A linha de cabelo
loiro recua na testa larga e pálida, suas bochechas afundadas sob os olhos
escuros. Ele parece tão cansado como me sinto. E mais magro. Seu jeans e
camisa de flanela pendem em seu corpo alto e magro.
Que merda aconteceu com ele? Isso tem alguma coisa a ver com a prisão
do Lorenzo? Meu peito se aperta.
— Belo carro. — Ele acende o cigarro e passa a mão sobre o capô
branco. — Como você conseguiu? Se prostituindo?
Meu dedo trêmulo se curva ao redor da alça da bolsa carteiro. Emeric
está logo atrás de mim e Shane irá reconhecê-lo da noite que ele quebrou o
nariz de Shane. Se eu correr de volta para dentro, talvez eu possa driblar
ele.
Giro em direção ao Pavilhão Meia-Lua. Tarde demais. Emeric está no
meio do caminho, seus passos largos devorando o asfalto e vindo em minha
direção. Não consigo ver seu rosto na distância, mas eu sei exatamente o
que vou encontrar em seus olhos. Os cabelos do meu braço arrepiam.
Como posso avisá-lo que a sombra atrás de mim é o meu irmão?
Qualquer coisa que eu faça deixará Shane desconfiado. Ele está bloqueando
meu caminho para o carro, mas eu poderia andar na posição oposta, descer
a estrada ou algo assim. Emeric me perseguiria.
Shane também. Ele veio aqui por um motivo e não vai embora até
conseguir o que quer.
Não tem nada que eu possa fazer para impedir esse confronto.
Eu me viro de volta para o Shane, minha barriga ao avesso.
— O que você quer?
Ele solta a fumaça do cigarro.
— Mamãe se foi.
— E? Ela sempre…
— Não, ela empacotou suas merdas um mês atrás e des… — Seus olhos
mudam para cima do meu ombro, afunilando nas fendas. — Caralho, eu
conheço aquele cara.
Merda. Meu pulso acelera pela garganta. Por que Emeric não pode me
deixar cuidar disso?
— Algum problema por aqui? — Sua voz fria está atrás de mim, minha
coluna formigando.
Emeric para na minha frente, mãos juntas atrás das costas rígidas e seu
terno caro impregnando o ar com autoridade.
Shane pode ter perdido peso, mas sua estrutura é mais alta e mais larga
que a de Emeric. Se isso se tornar em um problema físico, Emeric poderá
nunca mais tocar piano.
Eu me mexo para o lado de Emeric. Ele se move comigo como se para
me bloquear de novo, então para plantando os pés em uma postura ampla.
Ele sabe tão bem quanto eu a importância de manter um comportamento
neutro na frente do meu irmão. Ele está aqui para investigar um invasor, não
proteger sua namorada.
Shane o observa da cabeça aos pés, jogando as cinzas na distância de um
metro e oitenta entre eles.
— Você trabalha na escola de Ivory? É um professor ou algo assim?
Emeric inclina a cabeça, olhos em Shane.
— Srta. Westbrook, esse homem está lhe incomodando?
Preciso escolher minhas palavras com cuidado. A intensidade na maneira
como Shane olha de Emeric para mim, diz que ele está tentando entender
por que um professor da minha escola arrogante entrou em um bar e deu um
soco nele há quatro meses.
Encaro os ângulos duro como pedra nas feições de Emeric e volto para o
Shane.
— Esse é o meu irmão e ele estava indo embora.
Shane sorri.
— Preciso de algumas respostas, irmãzinha. Como, eu não sei… Com
quem você está morando? E por que esse garoto de fraternidade — Ele
balança o cigarro para Emeric —, quebrou a porra do meu nariz?
Com sua atenção voltada para Shane, Emeric não se mexe, nem um
centímetro. Seu silêncio é um tanto chocante, mas tem um propósito em
tudo o que ele faz. Uma palavra falada revela coisas. Silêncio revela menos
ainda. Mas Shane não vai deixar isso passar, então abro minha boca.
— Estou ficando com uma amiga da escola. — Arrumo meus lábios em
uma demonstração de admiração. — Ela tem essa casa gigante e esses
carros extras. — Aponto para o Porsche. — Você pode me culpar por sair
do nosso lixão para morar em uma mansão? Uma mansão, Shane. De
verdade.
Ele me estuda com desconfiança.
— Não sabia que você dava a mínima para essas coisas.
E não dou, mas, caramba, não posso dizer a verdade.
— Aonde mamãe foi?
Ele deixa o cigarro cair e o amassa com a bota.
— Não sei. — Suas sobrancelhas se juntam, sua atenção passando de
Emeric para mim. — O telefone dela está desligado. Nenhum bilhete. Sem
ligações. Nem mesmo um foda-se, tenha uma boa vida.
Mesmo em suas constantes ausências, ela sempre mantinha contato com
Shane.
Esfrego meus braços.
— Você acha que ela está com problemas?
— Nah. — Ele dá de ombros, olhando para o asfalto. — Ela encontrou
algo melhor, só isso.
Algo melhor do que a família. De certa forma, acho que eu também.
Trocamos olhares suspensos e por um pequeno instante de batimento
cardíaco, vejo aquele garoto de antes de se alistar nos Fuzileiros Navais. O
irmão que costumava me levar para a escola, colocar chiclete no meu
cabelo e desenhar pênis nos meus livros de música. Um filho que amou seu
pai tanto quanto eu. Enquanto encaramos um ao outro, compartilhamos um
raro momento de perda, pelo nosso pai, nossa mãe e o amor que um dia
tivemos um pelo outro.
Ele pisca quebrando a conexão e esfrega a nuca.
— Alguém ainda está pagando as contas.
Espero a reação de Emeric, mas ele fica parado e em silêncio como uma
sentinela, sem dúvida pesando cada palavra falada e preparando para expor
nossa relação caso Shane faça algo estúpido.
— Não vou deixá-lo sem teto. — Por agora. Eu mando um obrigada
silencioso para o homem ao meu lado por cobrir todos os gastos e fazer isso
mais fácil.
— Estou indo embora por um tempo. — Shane anda em nossa direção,
devagar, braços nas laterais e expressão taciturno. — Mas eu não quero
perder a casa do papai.
Minha cabeça gira.
— Aonde você está indo?
Ele para a um braço de distância de Emeric e corajosamente tira algo da
lapela da jaqueta de Emeric.
Tensão toma conta da postura de Emeric, seus lábios se esticando em
uma linha reta. Paro de respirar.
Shane segura um dos cabelos alaranjados de Schubert entre seus dedos.
Um sorriso torce seus lábios.
— Eu costumava viver com um gato. Aquela maldita coisa espalhava
pelos nas minhas roupas. — Ele gira o cabelo e me nivela com um olhar. —
Sinto falta dele.
Medo surge do fundo da minha garganta e minha pele em um suor
enjoativo. Ele sabe. Deus, ele sabe, porra.
Seu olhar encontra o meu, seu tom amargo suave.
— Foda-se. — Enfiando a mão no bolso ele se afasta. — Tenha uma
ótima vida.
Seguro minha respiração enquanto sua silhueta escura cruza o
estacionamento e desparece nas sombras da rua. A estrada que irá levá-lo
para a parada de ônibus. Para qualquer que seja o lugar que ele está indo.
Quem sabe para um lugar onde ele esqueça tudo sobre mim e o homem ao
meu lado.
O sussurro afiado de Emeric me tira do meu transe sem fôlego.
— Entre no carro.
41

Emeric

Estico a marcha, correndo mais forte e mais rápido, deixando-o queimar


profundamente em meus músculos. O visor digital na esteira indica 12.98
quilômetros. Ainda tenho mais três quilômetros para correr, mas talvez eu
possa encurtar essa manhã. É sábado e estou ansioso para voltar para a
cama com Ivory.
Eu ainda estaria com ela na cama se meu alarme interno não tivesse me
acordado. Ou talvez tivesse sido um pesadelo. Acordado ou dormindo, eu
não consigo afastar esse sentimento crônico de pavor.
Já se passaram cinco dias desde que Shane Westbrook desapareceu. Ele
andou para fora do estacionamento e puff. Sumiu. Depois que coloquei
Ivory dentro do seu carro, dirigi pelas ruas à procura dele. Então, passei as
buscas para meu detetive particular.
Não havia nenhum sinal dele na casa – dele ou minha –, no bar em Treme
ou em qualquer outro lugar de Nova Orleans.
De todas as maneiras que ele poderia expor minha relação com Ivory, eu
continuo me perguntando por que ele faria? Ele não tem nada para ganhar
com isso – exceto minha retaliação. Por que ele seria ingrato e mexeria com
a pessoa que paga suas contas? Fazer isso só faria com que ele perdesse a
casa do pai, o que parecia ser o propósito da sua visita surpresa. Isso e dizer
adeus a Ivory.
Uma boa porra de livramento.
O som dos meus tênis marca o ritmo da minha respiração enquanto meus
pensamentos voltam para essa noite. O Feriado de Celebração da
Assembleia de Música será um evento de lotação esgotada. Ivory está anos
à frente de seus colegas e é muito talentosa para os concertos que ela toca.
Mas estou ansioso para estar lá. Quero estar ao seu lado essa noite e todas
as outras noites com uma visão privilegiada de cada momento que ela treme
embaixo das luzes de seus sonhos.
No meio do meu acalmar, a campainha toca. Aperto o botão de parar e
pego a toalha, meu pulso acelerado.
O portão de segurança não abrange a entrada da frente, então qualquer
pessoa pode caminhar até a porta da frente diretamente da rua. Quem diabos
estaria aqui às sete horas da manhã?
Corro pela casa, enxugando o suor no meu peitoral nu e do pescoço.
Ivory está parada em frente à porta aberta e de costas para mim, sua
silhueta aureolada pelo brilho do amanhecer.
Que merda ela está fazendo? Ela está bloqueando minha visão de quem
quer que esteja na entrada. Se é alguém da escola…
— Eu sou uma amiga de Emeric — fala uma familiar voz felina.
Em três passos alcanço a porta e encontro os vívidos olhos cor de avelã
de Deb. Ela passou algum tempo arrumando seu cabelo castanho-claro essa
manhã, seus seios cheios e pernas bem torneadas à mostra no vestido
provocativo.
Suspeito que essa visita seja uma mistura de negócios e prazer.
— Você deveria ter ligado.
— Eu pensei… — Seu sorriso revela seus pensamentos obscenos, que
escapa quando encontra o olhar da Ivory. — Eu não sabia que você tinha
companhia.
Não é da conta dela com quem eu passo meu tempo. Mas ela é uma
pessoa boa e eu não tenho motivo para ser um babaca.
Ivory cruza os braços sob o peito, seus seios ameaçando sair da pequena
camisola.
— Você a conhece?
— Sim. — Seguro os músculos da parte de trás do braço dela e aplico
uma pressão de advertência. — Essa é Deb.
Ivory aperta a mandíbula e amplia a postura no short de dormir atrevido
que mais revela sua bunda do que cobre. Meu pau se contrai.
— Ivory. — Espero ela olhar para mim. — Deb e eu temos algumas
coisas para conversar. Comece a preparar o café.
Ela pressiona seus lábios retos, estudando Deb por debaixo de seus cílios
antes de sair enfurecida para a cozinha.
Fico atraído a puxar aquele shortinho sensual para baixo e despir a porra
da sua bunda.
No momento que ela desaparece ao virar o corredor, Deb entra e acaricia
meu peitoral com suas mãos.
— Deus, como eu senti sua falta.
Pego seu pulso afastando-o, endurecendo minha expressão com um olhar
que faz sua postura murchar.
Ela contorce seu braço até que eu o solte, decepção franzindo seu rosto.
— Quem é ela?
— Ela é algo sério.
— Eu vejo isso. Ela também é um pouco territorial, você não acha? Onde
a encontrou?
— Onde não importa. O que importa é que ela não está indo à lugar
nenhum.
Ela examina meu rosto e seus ombros colapsam.
— Meu Deus, você a ama?
Também não é problema dela. Eu me viro para ir em direção a cozinha,
esperando que ela me siga.
— Você pegou o gravador?
Ela se aproxima, enfia uma mão na bolsa e segura um pen-drive.
Pego dela, torcendo para que eu nunca tenha que usá-lo.
Na cozinha, Ivory se curva na minha máquina de café Astra de vários mil
dólares, apertando os olhos para todos os botões. Quando ela olha para
cima, sua atenção se tranca em Deb e um músculo salta em sua bochecha.
Ela volta a se concentrar em mim, seu dedo apertando os botões às cegas
e atrevidamente.
— Essa coisa não funciona.
Eu sinto meu sorriso por todo o caminho até meu pau.
— Você colocou os grãos de café?
— Grãos? — Ela encara para o funil em cima. — Isso?
Adorável. Com minhas mãos em seu quadril, guio ela para o lado.
Deb se acomoda na ilha atrás da gente.
— Lugar agradável.
A confirmação que ela nunca esteve aqui deve acalmar um pouco dos
ciúmes de Ivory. Dou uma olhada para ela.
Não. Os braços de Ivory voltam para a posição cruzada sob os seios
pesados.
Eu me concentro no café, coloco os grãos na colher, descartando aqueles
que sobem acima da borda. É um hábito pouco prático, um que gosto por
pura inutilidade.
— Sessenta grãos? — Ivory pergunta.
— Sim. — Compartilho um sorriso com ela, maravilhando da riqueza de
sua mente. — Se eu encher a colher acima da borda…
Deb observa a gente da ilha.
— Por que sessenta?
Ivory encosta no balcão.
— Beethoven contava sessenta grãos todas as vezes que fazia café. Ele
afirmava que fazia a melhor xícara. — Ela levanta uma sobrancelha para
mim. — Ele era rigidamente meticuloso.
Ela está tentando me insultar, mas eu sei que ela ama minha atenção aos
detalhes.
— Então… Ivory? — Deb apoia o queixo na mão. — Você é musicista
como o Emeric?
— Sim. — Ivory sorri, docemente. — Emeric e eu fomos para a Leopold
juntos.
O que ela está aprontando?
Seu sorriso não parece tão doce quando ela olha na minha direção.
— Ele ainda tem dificuldades para aceitar que eu me formei com honras
mais altas do que ele.
Mordo a parte interna da minha bochecha. Vou machucá-la com tanta
brutalidade que ela verá triplicado.
Com o café preparado e servido, Deb gasta os próximos vinte minutos
descrevendo seu caso adúltero com o marido da diretora, Howard Rivard.
Ela vem fodendo o sr. Rivard por semanas sem seu conhecimento sobre as
gravações ou suspeitas de chantagem. Isso é mais do que o suficiente.
Ivory se recusa a se juntar a gente na ilha, ficando em sua teimosa
posição de costas para o balcão. Durante os relatos de Deb, a expressão de
Ivory se transforma de surpresa para desgosto ao mesmo tempo que
mantém um forte olhar de antagonismo.
Deb parece alheia, sua atenção completamente focada em mim.
— Para um homem velho, ele é muito viril mesmo. — Ela pisca para
mim. — Mas ele não é páreo para você, senhor.
— Chega. — Ivory avança em direção à ilha e bate a mão na superfície, a
outra apontando trêmula para Deb. — Quem ela é para você?
Olho para o meu relógio para perceber que não estou usando-o. Mas eu
acho que ainda é cedo. Eu terei muito tempo antes de sua apresentação para
extrair uma punição apropriada.
Fingindo ignorar a explosão de Ivory, me levanto.
— Obrigado, Deb, por ter feito isso.
Ela se levanta, olhado de Ivory para mim, seus lábios rejeitados.
— Então é isso.
— É isso. — Só há uma mulher no meu futuro e ela deve levar umas
palmadas. — Vou te levar até lá fora.
O olhar fumegante de Ivory me segue até eu virar no corredor. Desejo
felicidades para Deb na porta e fecho com um suspiro aliviado de
determinação antes de voltar para a cozinha.
Ivory caminha ao longo do balcão, suas mãos fechadas na sua lateral.
— Você transou com aquela mulher. Isso é óbvio. Mas, o que mais está
acontecendo? Por que ela faz coisas para você? — Sua voz aumenta para
um entonação maníaca, seus passos acelerando enquanto circula a ilha. —
Ah, certo. Porque ela quer você. Ela quer tanto você que estou surpresa que
ela não tenha puxado seu pau para fora e chupado…
— Ivory.
A batida da minha voz a faz parar por completo.
Entrelaçando meus dedos atrás das costas, dou a ela uma lista curta e
específica de comandos, finalizando com um:
— Vá.
Um rubor se espalha pelo seu pescoço e peito, e eu aposto que viaja mais
para baixo e lambe sua doce boceta como um beijo quente. Ela quer o que
eu ofereço mais do que teme.
Ela sai da cozinha e sirvo outra xícara de café.
Suas necessidades, desejos e medos são profundos. Tão profundos que
ela poderia se perder facilmente na escuridão. Ela precisa de uma corda,
não uma que a prenda ao seu terrível passado, mas uma forte e inquebrável
para guiá-la adiante. As amarras podem prendê-la, mas eu estou guindo-a
para outra ponta.
Eu nunca soltarei.
Com Schubert aos meus pés, eu faço para ele um prato com restos de
frango, sorrindo ao lembrar do tom severo de Ivory quando ela se mudou.
Nada de restos de comida, Emeric!
Sentando o gato no meu colo, deixo-o comer o prato de frango na ilha. É
um segredo inofensivo entre Schubert e eu.
Acaricio o pescoço dele enquanto ele come e desfruto do meu café.
Quando ele termina, tomo um banho e coloco jeans. Então, pego meu cinto
preferido, um pedaço de corda e encontro-a esperando por mim na sala de
música.
Pelada e curvada sobre o teclado do piano, ele descansa as palmas na
tampa ao lado das algemas. Exatamente como instruí. Sua malícia pode ser
o meu combustível, mas a sua obediência é a porra da minha chama.
Sem falar, prendo seus pulsos nas algemas e uso a corda para amarrar um
simples arnês para seio ao redor do seu peito, certificando que as seções
verticais pressionem seu mamilo. Ela me assiste com seus grandes olhos
castanhos, sua curiosidade momentaneamente substituindo a raiva.
Quando seus seios estão amarrados, aperto as alças, prendendo-a no
piano até que seus peitos se esfregam no teclado.
Quando tomo meu lugar atrás dela, a visão erótica dela coloca minha
excitação a beira de explodir.
Em movimentos provocativos, passo o cinto por toda elevação perfeita de
seu traseiro.
— Qual foi a primeira regra que eu te ensinei?
Com sua bochecha pressionada contra a superfície do piano, seus lábios
se projetam em um suspiro pesado.
— Sem mentiras. Sem questionar seus métodos. Nunca olhar para longe.
— Ela estica o pescoço para me encarar. — E sempre xingar você por ser
um idiota.
Balanço o cinto, meu pau latejando dolorosamente ao som do seu grito
agudo.
— Peça desculpas.
— Vá se foder. Essa é a minha regra e ela permanece. Seja lá o que você
está fazendo com aquela mulher… — Seu queixo treme, sua voz é um
rosnado irritado. — Você é um idiota.
Reprimo um sorriso, dou outro golpe forte.
— Você acabou de dobrar seus golpes. Me diga o que estava passando
pela sua cabeça teimosa quando atendeu a porta.
— Eu verifiquei pela janela primeiro. Eu nunca a tinha visto antes. Não
na escola ou…
— Você tem certeza? Você pode identificar cada pai de cada aluno?
Ela fecha os olhos e geme.
— Não.
— Você fez merda.
— Sim.
— Sem riscos desnecessários, Ivory.
— Tudo bem. — Ela balança seu quadril.
Deixo o cinto voar, batendo, chicoteando e golpeando seu traseiro como
uma bateria, cada golpe enchendo o ambiente com seus gemidos musicais.
Quando seu traseiro brilha quente e vermelho, me inclino sobre a curva
das suas costas, abraçando com força seu torso esbelto e deixo que ela sinta
minha respiração junto com a dela. Meus lábios tocam seu ombro e sua
respiração se engasga. Seguro seu peito, apertando a corda ao redor de seu
mamilo e ela esmaga seu traseiro febril contra meu pau preso.
Seguro ela lá, acariciando e beijando, até que sua respiração caia em um
ritmo junto do meu.
— Quando eu conheci Deb durante o verão, ela tinha alguns problemas
financeiros. Paguei suas dívidas e ela fez alguns favores para mim. Nosso
relacionamento era físico, prático e conveniente. — Lambo a pele macia de
seu pescoço, afagando sua orelha com tons de murmúrio. — Nós não somos
íntimos desde que a escola começou.
Ela acena, todo o seu corpo levantando em direção a minha voz,
tremendo embaixo dos meus lábios e ronronando pelo meu toque.
— Imaginá-la com você faz eu me sentir muito confusa.
Bem-vinda ao meu mundo. Com o cinto em meu aperto, provoco-a,
arrastando o couro para cima e para baixo no V do interior das suas coxas.
— Você nunca mais irá vê-la.
— Graças a Deus.
Solto ela de forma abrupta e dou um passo para trás.
— Eu, por outro lado, tenho que passar horas todos os dias com Prescott,
Sebastian e todos os outros filhos da puta que tocaram em você.
— Merda. — Ela fecha os olhos. — Eu nunca pensei nisso.
Balanço o cinto de novo, sem parar. Ela fica tensa, choraminga e sacode
as amarras. Meu pau pulsa com o som de cada golpe duro, minha atenção
presa na contorção de sua bela bunda enquanto alterno entre as nádegas, as
coxas e as laterais de suas pernas.
Em questão de minutos, ela mergulha na dor, seus músculos relaxando e
toda aquela pele lisa e dourada como uma tela de listras rosas.
Cada pressão do calor abrasador é um lembrete que ela não é a única que
sente ciúmes, é possessiva e problemática. Contudo, tem um significado
mais profundo para essa dor. Dá a ela o poder para abrir sua mente. Para
consertar ferimentos emocionais infligidos por outros homens que a
usaram. Para colocar todos os seus medos nas minhas mãos, confiando em
mim para protegê-la.
— Por favor, Emeric. — Ela inclina o pescoço para me ver, seus olhos
semicerrados e nublados em uma névoa de agonia e prazer.
Seu olhar suplicante e a pressa faminta de sua respiração provocam uma
corrente primitiva por mim. Eu amo fodê-la, mas nada se compara com esse
momento, implorando com uma expressão enevoada e seus dedos se
curvando contra as algemas, sua excitação escorrendo pelas coxas.
Agarro as cordas em suas costas e aperto o arnês sobre seu mamilo,
estimulando-a até que ela solte um gemido rouco. Então, eu a açoito de
novo, com mais força, mais rápido, saboreando o vínculo em nosso contato
visual.
Ela é minha e sua expressão me diz que ela sabe disso, seu corpo
tremendo para que eu a pegue e empurre. Para puni-la tão dolorosamente
que ela chore apenas por mim, sabendo que eu a manterei segura de
qualquer pessoa que queira machucá-la.
Quando as lágrimas por fim escorrem, ela cai no teclado e abaixa a
cabeça na tampa do piano. Sua pele corada e tremendo, seu quadril relaxado
com uma necessidade irracional. Ela é tão cativante que deixo o cinto cair,
incapaz de parar meu frenesi para tirar meus jeans com urgência.
Eu luto com os jeans nas pernas e nos pés. Então, me lanço sobre ela,
enfiando meus dedos dentro de sua boceta molhada abrindo-a. Ela geme e
se contorce no encontro com a minha mão, me deixando duro pra caralho,
que não tenho paciência para desacelerar isso.
Aperto meu pau com dedos trêmulos e alinho nossos corpos, me
enterrando em uma longa estocada. Nós gememos em um concerto, nossos
quadris colidindo juntos e aprofundando nossa conexão. Meu Deus, ela tem
uma sensação tão boa. Eu impulsiono com mais força, afundando e
recuando, obcecado e encantado com o aperto confortável de sua boceta.
Deslizando minhas mãos pelo seu braço, prendo meus polegares debaixo
das algemas, entrelaçando nossos dedos. Ela mantém o aperto e prende meu
pau, sua respiração uma motivação musical de desejo.
Suas reações, suas emoções e cada movimento que ela faz, pertence a
mim. Completamente sob meu comando para se curvar a minha vontade.
Ela também me possui da mesma maneira. Eu sou dela.
Deitando nas suas costas, mostro através do calor do meu corpo que ela
me possui. Enquanto eu bato dentro dela, perdido no seu calor, ela descansa
a cabeça no piano e se engasga com os olhos fechados. Sua boca macia, a
sensação do seu corpo contra o meu e a felicidade em seus músculos tensos
ao meu redor me impulsionam para a liberação.
— Nós vamos gozar, Ivory. — Bato meus quadris e aperto meus dedos
nos delas enquanto a pressão no meu pau cresce, ameaçando explodir. —
Agora.
Com sua mente e seu corpo sob a minha responsabilidade, ela salta do
penhasco comigo, gemendo e ofegando enquanto nós dois mergulhamos
juntos em uma explosão de harmonia e prazer.
Deslizo meus lábios nas suas costas, cobrindo sua pele com respirações
ofegantes. Ela é tão sensível, tremendo com os meus toques. Porra, eu amo
isso quase tanto quanto a maneira que ela se esforça nas restrições para se
arquear no roçar da minha boca. Eu fico lá, segurando-a em um alívio
saciado, fascinado pela linguagem lírica das batidas de nossos corações.
Depois de um tempo, saímos do estado de exaustão do êxtase. Depois
que desamarro Ivory, comemos o café da manhã e retornamos para a cama
em um nó de pernas e braços entrelaçados. Lá, eu faço amor com ela sem
briga ou urgência. Meus quadris balançam preguiçosamente entre as coxas
delas, seus tornozelos cruzando minhas costas e minha mente se deleitando
com a sensação de ternura do prazer sexual. Eu posso fodê-la com
suavidade ou violência, papai-mamãe ou de cabeça para baixo. Contanto
que eu esteja dentro dela e com ela, conectado a ela em cada sentido, não
importa.
Cedo demais, o sol desce pela janela e mergulha no horizonte. Eu não
quero sair do casulo de seu corpo, mas é hora de nos arrumarmos.
De banho tomado, barba feita e preparado, fico de pé na cômoda com o
smoking, colocando a porra da gravata borboleta ao redor do meu pescoço.
O som dos seus passos saindo do closet faz minha cabeça girar.
O primeiro vislumbre faz meu coração parar. Enquanto eu absorvo a
visão, meu pulso começa de novo, batendo muito alto e mais rápido, soando
o sino de adoração completa e absoluta.
Com renda marfim, o vestido Louis Vuitton cobre seus traços incríveis,
desde o decote canoa até os salto-alto de cristais em seus pés. Eu comprei o
vestido depois da primeira vez que a escutei tocar, sabendo sem dúvida
nenhuma que ela iria usá-lo essa noite na apresentação no auditório lotado.
— Vire… — Minha voz falha. Tusso atrás do meu punho. — Vire-se.
Um sorriso tímido levanta seus lábios enquanto ela gira. Seu longo
cabelo escuro está preso em um elegante nó bagunçado na sua nuca com
mechas desobedientes que descem pelo seu pescoço. Alças finas de marfim
envolvem seus ombros, deixando uma extensão das costas à mostra.
Arabescos pretos tatuados desenham uma videira graciosa e sinuosa da
nuca até a cintura, girando próspero pelas costas e ao redor de suas
omoplatas. Ela é tão cativante que meu peito queima com o lembrete de
respirar.
Cruzando o quarto até que eu esteja na frente dela, esfrego meus lábios
pelo comprimento de seu ombro.
— Tão linda que estou tremendo.
Deixo que ela sinta o tremor em meus dedos ao traçar o trabalho delicado
em sua coluna.
Ela cantarola baixinho, sua cabeça tombando.
— A tatuagem foi meu primeiro acordo.
Congelo, em seguida, retomo minhas carícias, meu estômago revirando.
— Você tinha 13 anos.
— Sim. Eu fiz depois que meu pai morreu. — Sua mão alcança as costas,
encontrando minha mão em um dos lados e puxando-a até seu quadril para
descansar. — Logo depois que Lorenzo…
Só a menção do nome dele me faz querer enfiar minha mão na cara dele
até que ele se engasgue com seu próprio sangue.
Seus ombros ficam tensos, relaxo.
— O tatuador me recusou por causa da minha idade. Até que eu sugeri
um tipo diferente de pagamento.
Continuo traçando as espirais tatuadas, deixando a maciez de sua pele
acalmar minha raiva crescente.
— Você ofereceu sexo a ele.
Ela concorda com a cabeça.
— Eu precisava dessa tatuagem.
De costas para mim, não consigo ver seus olhos, mas a emoção em sua
voz aperta meu peito.
— Meu pai afirmava que não só vias as notas quando tocava como ele
podia vê-las se enrolando no ar como arabescos. Cada música era uma
imagem gráfica em sua mente e ele desenhava esses enfeites nas margens
de suas partituras.
Quando eu tinha 13 anos, eu brincava com o meu pau enquanto sonhava
acordado com as garotas – qualquer garota – tocando-o.
Olho para a curva em suas costas, meus dedos seguindo as curvas
tatuadas com uma nova valorização.
— Que música é essa?
Ela me dá um sorriso lacrimejante por cima do ombro.
— A música favorita dele do Herbie Hancock, “Someday My Prince Will
Come”.
Não sou nenhum príncipe, mas quando estou enterrado dentro de Ivory,
eu sempre gozarei.
Andando em volta dela, removo uma pulseira de platina do meu bolso e
fecho ao redor de seu pulso.
Ela a estuda com os olhos arregalados, segurando o pequeno amuleto de
sapo entre seus dedos.
— Edvard Grieg mantinha uma estatueta de sapo em seu bolso o tempo
todo. — Curvo a mão em sua cintura, dedos apertando suas costas nuas. —
E ele iria esfregá-lo antes do concerto para boa sorte.
Ela balança a cabeça e me beija, respirando contra meus lábios.
— Obrigada.
Naquela noite, ela toca com mais paixão e habilidade do que todos os
seus colegas juntos. Stogie assiste da audiência, seu rosto esticado em um
grande sorriso. Eu assisto da lateral do palco, meu coração batendo no ritmo
de seus dedos.
Tudo está bem.
Joanne, Shane e Lorenzo se foram. Prescott e a srta. Augustin estão
contidos. A diretora não tem nada contra mim enquanto eu tenho
chantagens o suficiente para arruinar sua carreira. Eu tenho sido muito
cuidadoso.
Tudo está perfeito.
Perfeito demais. Como se a vida tivesse me dado uma música preenchida
com alegrias até o fundo da alma e me disse para saborear cada nota.
Porque mais cedo ou mais tarde, a música irá acabar.
42

Ivory

O Natal veio e passou com um borrão de extravagantes presentes e sorrisos


acalorados na casa dos pais dele. Emeric e eu passamos o resto das nossas
duas semanas de férias em casa, na cama, enfiados em uma bolha
indestrutível de felicidade de sussurros, carícias e beijos. Cada segundo
com ele parece um sonho como se a qualquer momento alguém fosse
cruelmente balançar meu ombro me forçando a acordar.
Desde que me mudei, nossas saídas para fora de casa têm se limitado a ir
para a escola, as visitas semanais de Stogie e aos jantares de final de
semana com os Marceaux. Não houve noites de namoro no cinema ou
caminhadas de mãos dadas pelo Rio Mississippi. Fazemos coisas normais
na privacidade do nosso próprio mundo como assistir a uma série na TV
estrelando piratas barbados com dentes perfeitos.
Não importa muito o que fazemos contanto que eu o tenha para fazer
junto comigo.
Quando eu me formar, estaremos livres das restrições aluno-professor.
Chega de se esconder e viver com medo. Então…
Ele diz que Leopold é meu, caso eu queira. Eu não sei como. Se ele
rompe o acordo com a diretora, todo o nosso mundo desaba. Pretendo
perseguir uma vaga lá por conta própria. Talvez me leve anos. Talvez eu me
mude para lá e bata na porta dos recrutas todos os dias até que eles se
cansem de me ver.
Ele diz que irá se mudar para Nova Iorque comigo enquanto trabalho no
meu diploma. Isso faz meu coração disparar, mas eu não posso pedir para
ela largar seu trabalho e sua família.
Ele diz que posso fazer o que quer que esteja na minha cabeça. E eu
acredito nele.
Dezembro termina com uma passagem sem harmonia em minha vida,
uma coda para o Treme e minha família desfeita.
Janeiro é o prelúdio de uma nova música, prometendo um ano de difíceis
decisões.
Fevereiro passa em um glissando de deveres de casa, aulas de piano e
noites tranquilas com Emeric.
Março começa com uma contagem regressiva para as férias de
primavera, um clima excepcionalmente quente e…
Uma infecção urinária.
Agachada no vaso sanitário, me inclino em dor. Não me mexi por trinta
minutos, cada gotinha de xixi queimando entre minhas pernas.
— Vou me atrasar para a escola.
Emeric se agacha na minha frente e repousa as costas da mão na minha
testa, a preocupação escurecendo seus olhos azuis.
— Ainda sem febre, mas você vai ficar em casa e ponto final. — Ele
enfia um copo d’água nas minhas mãos. — Beba.
Mais água significa urinar mais, o que significa mais queimação.
— Sem mais água.
Ele arruma meus dedos ao redor do copo, me forçando a segurar.
— Desidratação é o motivo para você estar sentada aqui.
— E muito sexo. — Consigo sorrir e dar um gole.
— Isso não existe. — Suas palmas deslizam pelas minhas coxas nuas,
acariciando com ternura. — Continue bebendo.
Forço o líquido na garganta com um olhar feio. O cabelo preto no topo de
sua cabeça é uma rebelião sensual enquanto os lados aparados gritam Sr.
Professor. Com seu maxilar recém-barbeado, o perfume muito masculino, o
colete cinza e a jaqueta, ele está pronto para enfrentar o mundo. Ou pelo
menos uma escola cheia de adolescentes privilegiados.
Meu rabo de cavalo bagunçado balança na frente da única coisa que
estou usando – a camisa dele do Guns N’ Roses. Não ficarei pronta para ir
tão cedo. Minha barriga embrulha. Pela primeira vez em quatro anos, irei
perder um dia de aula.
— Eu sei que dói. — Ele pega o copo para colocá-lo no chão e esfrega
seu polegar no meu lábio inferior. — Meu pai está trazendo remédio.
Meu corpo se curva em uma onda afiada de dor, liberando outro fluxo de
xixi. Eu solto um grunhido, meus olhos lacrimejando através da pavorosa
queimação.
— Foda-se. — Ele alcança o nó da gravata. — Eu vou ficar aqui.
— Pra quê? — Pego sua mão, parando seu ataque ao colarinho da
camisa. — O que você faria? Sentar aqui e me ver fazendo xixi o dia todo?
Seus olhos piscam.
— Sim.
— Péssima ideia. — Entrelaço nossos dedos juntos e seguro-os entre
meus joelhos. — Como irá parecer se nós dois faltarmos? Nenhum de nós
jamais perde às aulas. As pessoas irão perceber.
Ele arrasta a mão livre pelo rosto, sua expressão de dor. O segredo do
nosso relacionamento, me ver doente e me deixar sozinha, tudo isso o
atormenta.
Eu me inclino para frente para beijá-lo, desejando que meus dentes
estivessem limpos.
— Isso já é embaraçoso o suficiente sem seus olhos de falcão nas minhas
partes íntimas.
Isso realmente não é o problema. Estou bem acostumada com suas
invasões. Estando no meu período ou usando o banheiro, ele não conhece o
conceito de espaço pessoal, sempre pairando, interrogando e me
examinando por dentro e por fora. Mesmo assim, eu entendo. Porque eu sou
tão obcecada por ele quanto.
Endireitando minhas costas, eu uso um de seus comandos favoritos.
— Vá.
Esperava que sua mandíbula enrijecesse e sua voz quebrasse as paredes
de sua indignação. Mas o que eu encontro em seus olhos é algo
completamente diferente. Algo que tem se expandindo entre a gente por
meses, dobrando de tamanho quando estamos juntos e crescendo em força
quando estamos separados. Como se por fim ousado o suficiente, tudo o
que sentimos um pelo outro se reúne em um sentimento monumental que
brilha em seus olhos.
Ele prende suas mãos ao redor do meu quadril.
— Eu te amo.
Ali está. Dito sem fogos de artifícios, recebidos sem lágrimas
sentimentais e absorvidas sem nenhum ricochetar de um trovão distante.
É simples, real e bem ali.
No banheiro.
Seguro seu rosto, olhos conectados, corações batendo em sintonia.
— Você esperou até agora para me dizer isso?
Os cantos de sua boca se levantam.
— Não é como se você não soubesse.
— Sim, mas uma garota nunca esquece a primeira vez que escuta a
pessoa que tem uma quedinha dizendo essas palavras. — Luto com um
sorriso. — Eu sempre lembrarei desse momento com a imagem de estar
sentada no vaso sanitário formando a impressão de um anel no meu traseiro.
Ele descansa sua testa na minha.
— Você disse pessoa que tem uma quedinha?
— Não qualquer quedinha. — Toco nossos lábios juntos. — Uma
quedinha no meu professor gostoso que também é meu Mestre arrogante. E
o homem que eu amo.
Não importa se estou sentada no vaso sanitário, de pernas abertas no
piano dele ou montada em seu quadril. Esse é o nosso mundo secreto e é
mais significativo do que qualquer ambição que eu já estabeleci para mim.
Nosso relacionamento não é prático ou conveniente. E não é só físico.
Precisamos um do outro, não porque nossos corpos se encaixam um no
outro tão bem, mas porque nossos corações batem na mesma melodia e pela
mesma razão.
— Diga — ele ofega.
— Eu te amo. — Eu não sou a primeira mulher que diz essas palavras
para ele, mas vou me certificar de que seja a última que diz. — O tipo de
amor que não acaba em traição.
Suas mãos se fecham no meu quadril.
— Não irá terminar de jeito nenhum. Para sempre.
Ele me beija apaixonada e dolorosamente, sua boca moldando a minha
como se estivesse tentando transmitir as profundezas de suas palavras. Ele
me beija até minha bexiga uivar de novo.
Demorando mais do que deveria, ele me coloca na cama e empilha na
mesinha de cabeceira comida e água. Então, ele sai do quarto e retorna
alguns minutos depois com Schubert enrolado em seus braços.
Eu me curvo de lado, sorrindo apesar do desconforto.
— Você pensou em tudo.
— Não em tudo. — Colocando Schubert ao meu lado, ele afaga o gatinho
que ronrona com um preguiçoso contentamento. — Ainda não descobri um
jeito de ficar em casa com você.
— Você está atrasado, sr. Marceaux. Saia daqui.
Ele pressiona um beijo nos meus lábios.
— Meu pai tem seu próprio código para entrar, então fique aqui em cima.
Durma um pouco, ele estará aqui em breve.
Fecho os olhos e acaricio Schubert, tentando ignorar a urgência irritante
de fazer xixi de novo. Sinto Emeric pairando na porta por um momento de
silêncio antes de seus passos desaparecerem pelo corredor.
O bip do alarme me diz que ele o ligou. A batida da porta mostra sua
frustração por sair.
O sono me puxa em alguns minutos. É um tipo de sono desorientador e
desconfortável que me faz saltar entre a consciência e a terra dos sonos.
Minutos se passam, ou talvez horas, enquanto minha mente repete a ternura
de Emeric ao mesmo tempo que meu corpo implora para liberar minha
bexiga.
Em algum momento, o sistema de alarme soa seu atraso de trinta
segundos, abrindo meus olhos. Eu me forço a levantar e faço uma corrida
louca para o banheiro. Depois de uma grande quantidade de alívio gotejante
e dor escaldante, discuto sobre procurar um short. No mínimo, eu deveria
colocar roupas íntimas.
Foda-se. Eu estou doente e ele é um médico, além disso o closet está
muito longe. Esticando a camiseta pelas minhas coxas, rolo para debaixo
dos cobertores e espero a entrega abençoada dos remédios.
Eu devo ter adormecido. Schubert salta da cama, me assustando em um
estado de sonolência ao tentar compreender a silhueta que está na porta.
Jeans azul. Camiseta preta com gola em V. Pele escura. Braços
reforçados… Encaro a tatuagem, Destruir, em seu pescoço e engasgo.
Estou sonhando? Tendo um pesadelo? Isso não pode ser real.
Internamente, me permito dar uma olhada. Meu coração está batendo forte,
os pulmões ofegantes e a garganta apertada. Isso está mesmo acontecendo.
Um espasmo corre pelo meu corpo.
Lorenzo me encara de volta com os olhos arregalados.
— Você deveria estar na escola.
Meu sangue congela ao mesmo tempo que ando para trás, arrastando o
lençol comigo.
— Você deveria estar na prisão!
Ele inclina a cabeça e dá um passo para dentro do quarto.
— Como você sabe sobre isso?
— Por que você está aqui? O que você quer? — Com respirações
ásperas, passo uma mão embaixo do cobertor e procuro ao redor. Onde está
meu celular? Merda, eu sei que Emeric deixou perto de mim. Onde está?
Onde está?
Ele entra no quarto e para na frente do closet. A cama fica no centro com
o banheiro do outro lado da porta. Tem uma tranca naquela porta. Abro
caminho pelo colchão naquela direção.
Mantendo seu corpo inclinado na minha direção, ele olha para dentro do
closet, seu olhar desprezível manchando tudo o que ele olha.
— Shane e eu estivemos investigando o lugar.
Shane… Investigar… Minha cabeça gira enquanto secretamente pego o
cobertor. Onde está o maldito celular?
Seu olhar cai nas minhas mãos trêmulas e eu congelo. Eu não quero dar
nenhum motivo para ele me atacar.
O Shane está na casa? Eles estão aqui para roubar Emeric? Lorenzo foi
preso por roubo, mas…
— Como você entrou?
Devagar, mudo minhas pernas embaixo do cobertor, torcendo para
esbarrar no celular enquanto sutilmente me mexo para perto da borda mais
perto do banheiro.
Lorenzo cruza os braços no peitoral e me estuda.
— Eu sei sobre o sistema de alarme assim como o código atribuído para
cada usuário. Shane adivinhou o seu na terceira tentativa.
A data que o meu pai morreu. Meu coração afunda.
Ele pisca.
— O elo mais fraco da segurança é o ser humano.
Uma dor sufocante aperta o meu peito. Por que isso está acontecendo?
Não posso suportar se ele me tocar de novo. Que merda eu vou fazer?
Meus olhos borram com lágrimas.
— Você tem que ir embora. Estou esperando uma entrega a qualquer
momento.
Ele se aproxima.
— Seu irmão está lá fora de vigia.
E Shane não sabe que estou em casa? Merda. Merda. Merda.
Eu me aproximo da borda, desembolando minhas pernas dos cobertores.
Lorenzo para três metros da cama, me observando.
— Não faça nada de estúpido, Ivory. Eu sei que o riquinho com quem
você está transando está na escola. Temos horas antes dele voltar para casa.
— Seu sorriso forma uma fissura perversa no seu rosto. — Você me deve
meses.
Mudando de curso, ele vira em direção ao pé da cama. Antecipando
minha fuga para o banheiro? Ele é rápido, mais forte. Se eu correr, ele vai
me vencer ali.
— Onde está o cofre? — ele pergunta, circulando a cama.
Está no escritório do Emeric e eu sei a maldita combinação. Mas ele não
vai levar só o dinheiro. Não mais agora que ele me viu. Levo minha atenção
para o closet.
Ele segue meu olhar, seu corpo virando, distraído.
Gasto trinta segundos procurando nos lençóis pelo meu celular antes de
afastá-los para sair da cama e correr pra caralho até o banheiro. Coração
acelerado, derrapo pela porta enquanto ele me persegue, gritando:
— Ivory!
Estou hiperventilando no momento que a porta bate. Bato na tranca. De
novo e de novo. Então dou um passo para trás, tonta, enjoada e lutando para
respirar. Será que o portal da porta irá aguentar? A moldura parece ser
grossa e resistente. Mas será que impedirá Lorenzo?
Não por muito tempo.
Seus punhos batem na porta.
— Ivory! Abra a porra dessa porta!
Giro, examinando o banheiro em busca de fuga, autodefesa, uma arma. A
janela em meia-lua é muito alta, muito pequena, muito indestrutível.
Arranco as gavetas e os armários à procura de alguma coisa, qualquer coisa.
Deus, isso não pode estar acontecendo. Como ele saiu da prisão? Por que
tem como alvo a porra dessa casa?
Shane.
Aquele filho da mãe egoísta sabia que eu morava com Emeric. Ele sumiu
por três meses. Tempo mais do que o suficiente para descobrir onde eu
moro. Ou talvez ele soubesse o tempo todo.
A batida dura na porta revira minha barriga.
— Ivory, se você não abrir a porra dessa porta, eu terei que fazer isso da
maneira difícil.
Um calafrio percorre minha espinha. As batidas param.
Seguro uma escova de dente antes de descartá-la por uma escova de
cabelo. Que merda eu vou fazer com isso?
— Aqui, gatinho, gatinho — Lorenzo chama, baixinho.
A escova de cabelo bate no chão quando todo o sangue do meu corpo
corre para os meus pés. Não, não, não.
— Vem aqui, Schubert.
Sua doce voz doentia e sons suaves de persuasão embrulham meu
estômago e enchem meus olhos de lágrimas. Então ele assobia, usando a
mesmo chamado de gatos que ele me ouviu usar durante anos.
Tudo dentro de mim se enrola em horror. Voo até a porta e pressiono
minhas palmas contra ele. Corra, Schubert. Por favor, Deus, corra.
A batida do meu coração ecoa em meus ouvidos enquanto o silêncio se
aproxima do outro lado. Eu olho para a maçaneta. Emeric iria bater na
minha bunda só de pensar em abri-la. Mas Schubert…
Seu longo e doloroso uivo passa pela porta e sacode meus ossos.
Um soluço sai da minha garganta e um tremor violento atinge minhas
pernas.
— Deixe-o ir! — Minha mão cai para a maçaneta, apertando-a com
bastante forte. — Vamos conversar sobre isso. Só… por favor, solta ele.
Schubert solta outro grito de lamento, dessa vez mais alto, mais
enlouquecido.
Eu abro a porta e saio cambaleando, meus olhos procurando
freneticamente.
Lorenzo inclina um ombro na parede ao lado do banheiro, sua mão ao
redor do pescoço de Schubert enquanto o corpo do gato se contorce em dor.
— Para! — Me jogo sobre ele, gritando e balançando histericamente. —
Você está machucando-o!
Ele me chuta na barriga, me tirando o fôlego e me jogando no chão. Sua
mão se fecha no pequeno pescoço de Schubert com tanta força que as costas
de Schubert se arqueiam e se debatem contra a restrição.
Eu me levanto, o medo me despedaçando enquanto me jogo sob ele de
novo.
— Por favor, solta ele. Por favor. — Eu lamento incontrolavelmente,
agarrando seu braço e incapaz de parar seu aperto torturante. — Ele não
consegue respirar. Ah Deus, para!
— Fique de quatro, bunda para o ar.
Cada músculo em meu corpo trava em terror enquanto o buraco
vulnerável na minha bunda se aperta com a angustiante lembrança. Eu não
posso. Não ali. Eu não posso. Eu não posso.
— Faça isso! — ele ruge.
Minha cabeça treme sozinha, tomando controle da minha resposta. Eu
quero ser forte o suficiente para o que quer que precise para libertar
Schubert. Mas minha mandíbula está grudada, minhas pernas tão
congeladas que não consigo senti-las.
Todo o seu comportamento muda, contorcendo e apertando, sua
expressão se transformando de podre e feia para horrível e má. Eu vejo sua
intenção chegando em uma fração de segundos antes de acontecer. Mas eu
me movo tão devagar, muito fraca para tirar sua mão do pescoço de
Schubert, de parar seu braço de balançar, para evitar que meu amado
gatinho bata na parede.
O corpo flácido de Schubert cai no chão e algo dentro de mim se quebra,
estilhaçada e se encolhida. Meus ouvidos o ouvem bater contra o piso de
madeira. Meus olhos traçam a curva estranha e imóvel da sua coluna. Mas
minha mente se recusa a aceitar. Ele não está morto. Ele não está. Ele não
pode morrer.
O chão se levanta e bate contra os meus joelhos. Estou gritando, mas uma
mão tapa minha boca. Estou rastejando para alcançá-lo, mas um grande
peso nas minhas costas me prende. Estou chorando, mas não sinto as
lágrimas. Determinação me guia, meus braços se esforçando para o meu
gatinho destruído, ansiando por pegá-lo. Ele precisa de mim para confortá-
lo, para consertá-lo.
Mas sua cabeça está em um ângulo errado. Os olhos abertos. Não se
mexendo. Olhando, mas não vendo. Deus, por que ele não está se
movendo?
A parte lúcida do meu cérebro sabe. Mas eu enterro, colocando toda a
minha força em alcançá-lo, desesperadamente balançá-lo para acordá-lo,
para ouvir seu ronronar, para vê-lo mudar desses olhos arregalados.
Até que a pressão da carne escura sonda entre as minhas pernas.
A escuridão arrepiante da morte paira sobre meus sentidos. Entorpecendo
as mãos no meu quadril. Aliviando o peitoral nas minhas costas.
Silenciando o som da respiração faminta.
— Scriabin. — Soluço, os dedos esticando e batendo contra a almofada
macia das patas de um gatinho. — Scriabin.
Só mais alguns centímetros e eu serei capaz de puxar Schubert para os
meus braços.
A pressão forte contra o meu núcleo se ajusta, realinhando com o anel de
músculo na minha bunda. Fecho meus olhos com força, prestar atenção ao
meu corpo trará uma dor agonizante. Então me concentro nas notas em
minha cabeça, na sonata dissonante, na escuridão mortal onde posso segurar
meu gatinho.
Lute, Ivory. A voz de Emeric rompe em minha cabeça. Lute e vença essa
merda.
A ereção empurra contra minha barreira, queimando minhas terminações
nervosas. Giro meu pescoço e afundo meus dentes dentro da carne dos
bíceps do Lorenzo. Com força.
Ele berra e levanta o braço para trás.
Assim que seu punho voa em minha direção, a voz frenética de Shane
ecoa em algum lugar no andar de baixo.
— Lorenzo! Cara, cadê você?
O soco encontra meu rosto.
43

Emeric

Paro o GTO no portão e digito meu código. Com todos os vizinhos no


trabalho, a rua está deserta e silenciosa. Eu não gosto de silêncio. Faz meus
instintos ficarem cheios de paranoia.
Sem dúvida nenhuma meus nervos estão relacionados com a aposta de
cancelar minhas aulas da tarde. Mas já que meu pai atrasou na clínica,
aleguei problemas familiares, danem-se as consequências, e peguei as
prescrições no caminho de casa.
Quando o portão abriu, segui ao redor da propriedade imaginando se
Ivory escuta o estrondo do motor.
Bato nos freios. O que…
Um velho Honda preto está parado próximo da porta dos fundos.
Desconhecido. Vazio. Sem identificação.
Meu estômago endurece em gelo. Ivory.
Não respiro até chegar em casa. O alarme não está ligado.
A próxima respiração não sai enquanto eu não chego à cozinha. Passos
no segundo andar.
Corro pela sala de estar, cada célula em meu corpo hiperalerta. Quem
diabos está aqui?
— Lorenzo, ele está na entrada! — a voz de um homem ecoa no piso
superior.
Shane. Meu sangue gela quando corro em direção ao saguão. Ele disse
Lorenzo? Como é possível?
Lorenzo está na porra da minha casa.
Com Ivory.
A raiva me impulsiona escada acima, em cada passo, um oponente entre
mim e ela. Subo mais rápido, subindo dois, três degraus de uma vez.
— Que porra é essa? — Shane ruge da direção do meu quarto. — Saia de
perto dela!
Não! Ah, Jesus Cristo, merda, não! Urgência se funde aos meus
músculos, me empurrando mais rápido, mais forte, travando minha
mandíbula. Por que eu não posso escutá-la?
Subo o último degrau, mas a distância remanescente parece estar
forçando meu coração a saltar do meu peito. O patamar é muito grande, o
corredor é muito comprido. Estou muito distante. Eu nunca deveria ter
saído. Eu falhei com ela e estou fumegando de arrependimento. Desgraça,
estou tremendo com meu desespero para alcançá-la.
Sigo os sons de gritarias crescentes. Quase lá. Mais alguns passos. Me
apresso pela porta, minha atenção no outro lado do quarto.
Ivory fica imóvel em minha camiseta. Sangue em seus lábios. Uma
expressão vazia. Schubert em seus braços. Morto.
Os punhos cerrados de Shane. Machucados no rosto e nos braços de
Lorenzo. Seu zíper aberto.
Cada milésimo de segundo queima dentro de mim com uma maldade que
cambaleia meus passos.
Ninguém me nota.
Estou em menor número, desarmado e cheio de fúria. Tudo dentro de
mim me puxa para Ivory, mas luto contra isso, recusando olhar para ela ou
pensar nela. Se eu fizer, vou perder a porra da minha cabeça.
Ficando na borda do quarto, fecho a distância. Ivory está a poucos metros
de distância do confronto entre Shane e Lorenzo.
— Você a estuprou, seu filho da puta? — Shane enfia um soco em
Lorenzo, sua cabeça esquivando. — Ela estava falando a verdade esse
tempo todo?
Uma intensão fria e letal se espalha por mim, aumentando minha
respiração. Meus punhos se flexionam para a destruição. Meu coração
endurece para a morte permanente e irrevogável. Eu vou acabar com isso.
Meus impulsos tomam o controle, minhas mãos caindo para meu cinto e
puxando-o livre enquanto veneno ferve em minhas veias.
Lorenzo amplia sua postura.
— Mano, olha o que ela fez no meu rosto.
— Você estava em cima dela! — Shane ataca ele, os braços balançando.
Lorenzo se abaixa, prendo-o pela cintura e levando-o para o chão com
uma série de socos.
Eu me aproximo com os pés rápidos e silenciosos, deslizando a ponta do
cinto pela fivela. A um pé de distância, fico parado atrás de Lorenzo. Shane
se esparrama de costas com Lorenzo ajoelhado sobre ele. Tenho certeza de
que Shane me vê, mas eles dois estão trocando socos, bloqueando e
gemendo.
Enfio a fivela do cinto na cabeça do Lorenzo e seguro minha loucura
junto com os dois punhos.
Os olhos de Shane, vermelhos e indignados, colidem com os meus.
Lorenzo vira o pescoço.
Prendo o cinto em volta da garganta de Lorenzo, torcendo a ponta com
toda a força da minha ira.
Seu corpo se arremessa para trás com a crueldade do meu puxão, se
debatendo no chão e as mãos arranhando o cinto. Eu aguento, puxando com
mais força, alimentada com um propósito malicioso.
Shane rasteja em direção ao corpo de Lorenzo e me encara com olhos
ferozes. Como vou lutar com ele enquanto seguro o cinto?
Com um grito de raiva, ele dá uma joelhada no peitoral do amigo, seus
punhos esmurrando o rosto de Lorenzo. Vacilo atordoado e ajusto meu
aperto, puxando o cinto com força total.
O peso de Shane prende Lorenzo no chão enquanto eu fico em cima deles
e torço o estrangulamento mais e mais apertado, a brutalidade sendo
imprescindível para isso acabar e irrompendo minha respiração vacilante.
Dedos cerrados ao redor do couro, encontro os olhos castanhos
despedaçados de Ivory. Estou matando um homem na frente dela, a sangue
frio, consciente e sem arrependimento. Não há volta nisso.
Suas pernas sustentam sua postura imóvel. Suas mãos seguram o corpo
morto de Schubert. Seus olhos estão comigo, mas ela não está aqui. Ela não
está comigo.
Provavelmente para o melhor, porque eu não vou parar até que esse filho
da puta não possa machucá-la mais.
O celular no meu bolso vibra com uma ligação. A escola? Meus pais? A
porra da polícia seguindo atividades suspeitas? Merda!
A mandíbula de Lorenzo abre a boca em um grito silencioso. Sangue
espalha pelo seu rosto, os olhos inchados, sua pele mudando de vermelha
para azul.
Fico de pé em um lado, mão adormecendo ao redor do cinto. Do outro
lado de Lorenzo, Shane o pressiona no chão ao mesmo tempo que seu corpo
se contorce, as pernas chutando e os dedos arranhando o couro do cinto em
volta de sua garganta.
O estrangulamento é um caminho terrivelmente lento para morrer. Nesses
horrorosos minutos, a enormidade do que estou fazendo tem tempo para
deslizar sobre minha pele e sufocar meus órgãos vitais. Eu me mantenho
firme com o lembrete que a minha responsabilidade de proteger Ivory se
sobrepõe a todo o resto.
Os dedos de Lorenzo caem de sua garganta e com um puxão de pernas,
ele perde a luta.
Acabou.
Shane cai de bunda, mãos voando para a nuca, sua boca aberta com
exaustão. Terror. Choque.
Adrenalina percorre meu corpo enquanto solto o cinto e pressiono meus
dedos trêmulos contra o inchado Destruir na garganta de Lorenzo. Sem
pulso. Tem uma ironia nisso, alguma coisa que eu contemplarei quando as
nossas feridas já não estiverem mais abertas.
Dou um passo para trás e tiro a jaqueta, suando contra as crises de
conflito entre alívio e realidade.
Eu acabei de matar um homem.
Um homem que invadiu minha cada.
Que matou nosso gato.
Que tentou e talvez tenha sucedido em estuprar Ivory de novo.
Porque eu não estava aqui.
Meu peito queima, todo o meu mundo girando em volta dela.
— Ivory?
Pela primeira vez desde que entrei, ela se mexe. Só os seus olhos
mudando para mim. Sangue escorre de seu nariz, manchando seus lábios e
pontos na frente da camisa dela.
Meu estômago revira. Eu preciso pegar o gato, abraçá-la e eliminar a
distância entre a gente. Eu caminho até ela.
Ela recua, seus braços apertando o corpo pendurado de Schubert.
Não está pronta para deixá-lo ir? Não está pronta para me deixar tocá-la?
Eu entendo, mas, porra, sinto sua rejeição como um soco no meu
coração.
Olho para Shane para confirmar que ele ainda está atordoada, encarando
o corpo sem piscar e com olhos vidrados.
Meu bolso vibra com uma mensagem de alerta. Merda. Quem quer que
esteja tentando entrar em contato comigo escolheu um péssimo momento.
Afrouxo e tiro minha gravata. Então, paro em frente a Ivory e esfrego um
dedo em seu queixo. Ela não reage, seu olhar distante e sem foco. Quando
abaixo minha carícia para seu braço ao redor de Schubert, ela solta um
lamento angustiado e tropeça.
Tudo bem. Não vou separá-la do gato.
— Eu só preciso saber se você está bem.
Seu comportamento fica frio e distante, exceto pelos seus braços que
seguram Schubert com força.
— Eu lutei com ele. — Sua voz é um metrônomo vazio. — Mordi ele.
Arranhei seu rosto.
— Boa garota. — Eu queria tanto puxá-la para mim, mas se eu fizer, irei
desmoronar. Eu tenho que manter minha cabeça no lugar até que essa
bagunça esteja arrumada. — Ele estuprou…
— Não. — Um lampejo de vida se agita nas profundezas de seus olhos.
— Shane o parou.
Seu irmão teve um golpe de consciência? Um transplante de coração
repentino? Um plano escondido? O inferno sabe por que ele se intrometeu,
mas, porra, estou respirando um pouquinho melhor sabendo o que ele fez.
A respiração ofegante de Shane fica mais alta, mais frenética, seus olhos
vermelhos no desperdício de vida que era Lorenzo. Talvez Shane não seja
uma ameaça naquele momento, mas será se ele fugir. Pra ser sincero, ele
está a segundos de ter um colapso.
Outra mensagem chega. Puxo o celular do meu bolso, mas o choro
gutural de Shane chama minha atenção.
Ele cobre o rosto com as mãos, chorando como a porra de um marica.
— Ele era meu melhor amigo. — Seu corpo sacode. — Ah, Deus, ele
salvou minha vida e a gente o matou.
Mantenho uma postura imponente sobre ele, uma posição de poder.
— Nós matamos um saco de merda que tem estuprado sua irmã por
quatro anos.
Fechando a mandíbula, ele desvia o olhar.
Ivory encara o chão, sua expressão em branco. Ela está em choque. Mas
ela é forte pra caralho. Não tenho dúvida que ela será insolente comigo de
novo em pouco tempo.
Volto a focar em Shane e endureço minha voz com autoridade.
— Você está em uma situação pior do que a minha.
Seus olhos se levantam, lágrimas escorrendo pelo seu rosto.
— Como assim? Nós dois…
— Doutrina do castelo. No Estado de Louisiana, eu tenho o direito de
defender os outros e a mim mesmo na minha propriedade. Isso inclui o uso
de força letal. Homicídio justificado. — Aponto para Ivory. — Está
justificado pra porra.
O problema é, se ele ligar para a polícia, eu serei preso por um crime
diferente. Minha aluna do ensino médio não estava só visitando minha casa
enquanto eu estava na aula. Ela está morando aqui. Eu não serei capaz de
esconder isso. Não com Shane envolvido. Se entregá-lo, ele irá retornar a
favor.
Eu tenho duas opções. Ligar para as autoridades e encarar um julgamento
aluno-professor publicado que iria não só destruir minha carreira, mas
também o futuro de Ivory. Ou lidar com o corpo e fazer tudo isso
desaparecer.
A segunda só funcionará se Shane cooperar. Por mais que eu queira
enterrar sua bunda inútil com Lorenzo, estamos nisso juntos.
Olho para o meu celular. Uma ligação perdida e duas mensagens do meu
detetive particular.
Smith: Gandara está solto.
Não me diga. Olho para Schubert nos braços de Ivory, seu pescoço
pendendo em uma posição estranha como se estivesse quebrado. Uma nova
onda de raiva passa por mim.
Smith: Liberado ontem. Meu informante acabou de me contatar. O
advogado argumentou estresse pós-traumático como fundamento para
defesa de insanidade. Entrarei em contato assim que localizar o paradeiro
de Gandara.
Lorenzo ainda tinha um ano de sentença. Pelo menos agora eu não tenho
que me preocupar com sua liberação.
Eu digito uma afirmação, que é o que eu faria se eu não tivesse de pé
sobre um cadáver. Eu deixarei que o detetive particular procure pelo
Lorenzo. É um risco, mas preciso saber se sua investigação irá levá-lo de
volta a mim.
O olhar de Shane corre do celular em minha mão para a porta como se
considerando escapar.
— Você não pode falar para a polícia, cara. Eu impedi Lorenzo de
estuprá-la! — Sua voz aumenta. — Eu matei meu melhor amigo. Por ela.
— Cala a porra da sua boca. — Aperto enviar a mensagem e arrasto meu
olhar para o dele. — Você invadiu minha casa. Você é um cúmplice em um
assassinato. Se você fugir, farei a ligação. Se você me der o que eu quero,
isso fica entre nós três.
Ele engole.
— O que você quer?
— Respostas. Cooperação. — Bato a mão no corpo. De jeito nenhum
posso levantar esse grande filho da puta sozinho. — Então você poderá
rastejar de volta para o buraco que você tem estado pelos últimos três meses
e nunca mais voltar.
— Tudo bem. — Ele acena com a cabeça, sua garganta sacudindo e seus
olhos espertos. — Eu posso fazer isso.
Eu não confio nele. Em um mundo perfeito, eu teria matado Lorenzo sem
que outra alma viva soubesse. Duas testemunhas são dois riscos demais.
Ivory não vai me trair, mas qualquer conhecimento que ela tenha sobre os
meus próximos passos pode incriminá-la. Eu preciso distanciar ela disso.
Eu também preciso separá-la de Schubert.
— Ivory. — Enquanto a espero olhar para mim, me lembro do motivo
pelo qual voltei para casa. — Você precisa usar o banheiro?
— Eu… — Ela abraça o gato contra o pescoço, para suas pernas nuas,
para o chão perto do banheiro e de volta para suas pernas. — Eu posso
ter… — Seu queixo treme. — Me desculpa.
Desculpa pelo quê? Liberar sua bexiga enquanto lutava com um
estuprador?
Pego seus braços e a puxo contra mim.
— Eu espero que você tenha mijado em cima dele.
Sua mão acaricia o pelo do gato.
— Eu também espero.
Deslizo meu braço ao redor de sua cintura, colocando-a contra mim e
com Schubert entre nós. Mexo minha outra mão sobre os olhos dele,
fechando-os, acariciando seu pelo macio e me deixo lamentar sua morte.
Ele foi um presente de seu pai, seu conforto quando ela estava com
medo, seu amigo quando ela não tinha ninguém. Ele era tudo o que ela
tinha quando ela perdeu alguém que amava. Agora, ela tem a mim.
Seguro-a até que as lágrimas escorram e acaricio suas costas enquanto ela
soluça silenciosamente. Seus tremores me machucam. Sua dor aumenta a
minha.
Shane assiste a gente de alguns metros de distância, seus olhos úmidos e
turvo, ruídos estrangulados como se ele estivesse tentando conter seus
próprios choros. Talvez seja culpa. Espero que ele engasgue com ela.
Com relutância, me afasto.
— Hora de dizer adeus.
O olhar de desolação em seu lindo rosto ameaça me deixar de joelhos.
Endureço minha postura e gesticulo para que Shane se aproxime.
— Seu irmão vai levar Schubert.
Seus braços apertam ao redor do gato enquanto um soluço sobe do fundo
de seu peito.
Seguro seu rosto.
— Me desculpa, Ivory. Eu daria tudo para poder fazer esse momento
mais fácil. — Pressiono um beijo em sua testa. — Iremos enterrá-lo no
jardim. Irei construir um memorial lá, qualquer coisa que você queira, está
bem?
Lágrimas descem por suas bochechas, misturando com o sangue em sua
bochecha enquanto encara o gato.
Aceno para Shane.
Depois de alguns choros de protestos, ela afrouxa seu aperto. Shane
embrulha o corpo contra seu peito, seu rosto triste.
Viro-a para guiá-la até o banheiro e aponto para a banheira.
— Eu volto já.
Agarrando uma toalha, saio e fecho a porta atrás de mim antes de
encontrar com os olhos de Shane.
— Quem sabe que você está aqui?
Ele se contrai.
— Ninguém. Eu juro.
Suas promessas não significam nada para mim.
— Saia pelas portas do fundo e pegue os remédios no meu GTO.
Estacione o Honda na garagem. Você encontrará uma lona e fita adesiva lá.
— Deixo a toalha cair próxima ao corpo. — Pegue o que mais você achar
que precisaremos.
Se ele fosse fugir, já teria feito. Se mudar de ideia, eu não serei capaz de
pará-lo. Então, deixo-o ali com o gato em seus braços e torço para ele ser
mais inteligente do que parece.
No banheiro, dou a Ivory alguns comprimidos para dormir, arregaço as
mangas e, em silêncio e com calma, dou um banho nela até ela adormecer.
Odeio sedá-la, mas não quero deixá-la acordada e sofrendo sozinha. Ela
precisa ficar apagada por quanto tempo seja necessário para lidarmos com o
corpo.
A urgência de ligar para os meus pais me incomoda. Mamãe poderia ficar
com ela, mas torná-los cúmplices para descartar o corpo não é uma opção.
Quando um punho bate na porta do banheiro, parte da tensão alivia meus
ombros.
Olho para Ivory, sua pele rosada da água quente e seus olhos fechados
com fadiga.
— Se eu a deixá-la aqui por alguns minutos, você vai se afogar?
Seus cílios levantam e uma sugestão de um pequeno sorriso aparece em
seus lábios.
— Se você não parar de ficar me observando, talvez eu afogue você.
Essa é a minha garota. Pressiono um beijo em sua testa, seu nariz e sua
boca. Então vou em direção a porta.
— Emeric?
Eu me viro, meu pulso cantando ao som de sua voz.
Ela inclina a cabeça para trás na borda.
— Obrigada.
Duvido que ela esteja me agradecendo por uma coisa em específico. Sua
gratidão é sempre abrangente. Cristo, como eu amo essa garota.
— Eu já volto. — Saio e fecho a porta.
Shane já embrulhou a lona e passou a fita adesiva. Ele varre a tolha sobre
o piso de madeira, limpando qualquer urina ou sangue, sua expressão sem
cor está gravada com tormento.
Paro atrás dele.
— Você parece já ter feito isso antes.
— Nunca.
Medo, choque, repulsa… Tem tantas emoções avassaladoras naquele
sussurro que acredito nele.
Com o corpo ensacado, o arrastamos pelo corredor. Eu o deixo na escada
e volto para Ivory.
Pelo tempo que a visto, dou o remédio e a coloco na cama, ela está
profundamente adormecida sob o peso da sedação.
Procuro por sangue no chão de madeira a cada passagem que faço pelo
quarto. Farei uma limpeza completa mais tarde, mas para os olhos
despretensiosos, não há nenhuma indicação que um crime foi cometido
aqui.
Visto uma camiseta Henley e jeans antes de encontrar Shane sentado no
topo da escada, olhando para o vazio.
— Vamos acabar com isso. — Minha voz o faz pular.
Alguns minutos depois, o corpo está no Honda dentro da garagem.
Entrego uma pá ao Shane.
— Onde está Schubert?
Ele pega a pá, seus olhos cravados no porta-malas fechado do carro.
— Não deveríamos cuidar daquilo primeiro?
— Ao anoitecer. — Vou em direção ao corredor que leva ao jardim. —
Precisamos conversar.
Do lado de fora, o sol desliza por trás da torre monolítica da minha casa,
desaparecendo no céu listrado em cores violetas.
Cercados por carvalhos e arbustos floridos, coloco o corpo de Schubert
no chão e direciono Shane para um lugar ao lado do banco de concreto no
jardim.
— Onde você esteve esses últimos três meses?
Ele enfia a pá no adubo e começa a cavar.
— Não estava em Nova Orleans.
Se eu pressionar, é provável que ele minta sobre sua localização. Ele
disse que pegou um voo. Talvez isso ajude o detetive particular a localizá-lo
dessa vez.
Sento no banco e observo seu cabelo loiro recuado, sua pele pálida e a
estupidez que emana de seus olhos sem brilho. Difícil de imaginar que ele
esteja relacionado a Ivory.
Respiro fundo e descanso meus cotovelos nos joelhos abertos.
— Diga como isso aconteceu.
Trabalhando a pá pela terra, ele fala em um sussurro cansado:
— Lorenzo me ligou ontem e disse que foi liberado… — Ele para e olha
para mim hesitando. — Ele estava na prisão por assalto.
Ou ele está brincando comigo ou ele não sabe do meu envolvimento na
prisão de Lorenzo. Burro como ele é, estou inclinado para a última. Isso
quer dizer que ele não quis mencionar sua condenação por assalto por outro
motivo. Eu posso imaginar o porquê.
Ele volta para sua tarefa.
— Ele me ligou quando saiu, ele disse que perdeu o apartamento e
precisava de dinheiro, rápido. — Ele joga mais terra, evitando meus olhos.
— Eu devia minha vida a ele, então oferecei uma solução e voei para casa
para ajudá-lo.
Olho para minha propriedade enquanto as peças vão se juntando devagar.
Shane deve ter seguido Ivory de volta para casa antes de se aproximar dela
no estacionamento. Se for, ele já sabia onde ela morava. Quando ele meu
viu naquela noite e me reconheceu como o cara que deu um soco nele, ele
entendeu nosso relacionamento e com quem ela vivia. Nosso cronograma é
obvio, então ele apostou na suposição que deveríamos estar na escola.
— Você veio me roubar. — Minhas mãos se fecham. — Como você
entrou?
Ele para antes de voltar a cavar.
— Adivinhei o código dela.
Merda. Isso é um grande descuido da minha parte.
Então o quê? Lorenzo entrou sozinho enquanto Shane vigiava? Ela lutou
com ele. De alguma forma, o gato foi puxado para o meio. Não vou exigir
esses detalhes dele. Ela vai me dar um relato honesto quando estiver pronta.
Ele encara o chão, a voz apertada.
— Ela não deveria estar aqui.
— Exceto que ela estava. O que você acha que Lorenzo pretendia fazer
depois que a estuprasse? Você acha que ele deixaria ela viva para identificá-
lo depois que roubasse o lugar?
— Ah, Deus. — Sua cabeça abaixa, seus dedos segurando com tanta
força ao redor do cabo da pá que deve estar cortando sua circulação.
— Você sabe por que eu o soquei naquela noite?
Ele encara a terra, as narinas alargando.
— Ela veio para a escola com um corte no lábio. — Deixo minha repulsa
aparecer nas palavras.
Seus olhos se fecham, seu rosto preso em dor.
Eu acho um pouco de conforto doentio em sua culpa.
— Um irmão deveria cuidar de sua irmã. Enfrentar os valentões por ela.
Andar na porra do fogo por ela.
Ele apoia na pá como uma muleta, todo o seu corpo tremendo.
— Eu fodi tudo, está bem? — Ele solta o cabo e esfrega sua mão pela
cabeça, seus olhos cheios de angústia. — Ela tentou me contar por anos,
mas eu não escutei. Eu estava tão… bravo com ela. Sobre a coisa da escola
e a relação dela com nosso pai. Então, aqui está ela, vivendo nessa mansão
gigante…
Eu não acho que ele esteja falando por minha causa e eu não dou a
mínima para quais sejam suas desculpas de merda. Eu só preciso saber se
ele vai continuar a ameaçar Ivory.
Levantando do banco, pego a pá para continuar a cavar.
— Então, a ligação de Lorenzo você teve a ideia de pegar dela. Com a
experiência de roubo dele, você pulou na oportunidade de roubar um pouco
da felicidade dela para você mesmo.
Ele deixa os braços caírem nas laterais e encara a casa, sua voz um
resmungo.
— Sim.
Coloco o gato no buraco, engulo um nó de tristeza e retorno para a terra.
— Eu deveria estar enterrando você em vez de Schubert.
Uma carranca contorce seu rosto, seus olhos ignorantes iluminados com
convicção.
— Eu prometo que eu não vou causar mais problemas a ela. Merda, eu
irei passar o resto da porra da minha vida longe dela. É a única coisa que
posso oferecer a ela.
Eu terei um detetive particular na minha folha de pagamento pelo resto
da vida dela para garantir isso.
— É hora de lidar com a outra coisa.
— Sim. — Ele levanta o queixo, olhado em direção do céu escurecendo
no horizonte leste. — Eu conheço um lugar.
44

Ivory

No momento que acordo, meus músculos tensionam com as memórias do


evento do dia. Uma lâmpada fraca brilha no quarto, lançando sombras na
expressão sombria do meu irmão onde ele recosta na cadeira ao lado da
cama. É perturbador vê-lo nessa casa, um lugar que sempre representou
segurança, felicidade e amor. Mas não estou assustada. Emeric o mataria
antes de permiti-lo ficar sozinho comigo de novo.
Mudo minha atenção para o comprimento no colchão e encontro devoção
vigilante nos olhos azul cintilante. Meu coração zumbe.
Uma vez, Emeric me falou que se alguém me tocasse, sua reação seria de
assassinato. Ele é um homem de palavra. Lorenzo se foi. Morto. Não é
capaz de me machucar mais. Ainda sinto o peso do choque me
sobrecarregar, minhas entranhas doendo com a perda de Schubert e se
contorcendo de preocupação com Emeric ter feito uma aposta tão drástica
com seu futuro para me proteger. Mas iremos superar isso juntos, não
importa o quê.
Sentado na cama ao lado dos meus pés, ele passa uma mão pelo longo
contorno das minhas pernas nos cobertores. Seu rosto esculpido está
suavizado em um semblante calmo e emoldurado pela exaustão. Seu cabelo
preto está espetado em um caos perfeito e uma camiseta Henley cinza-aço
se estica em seus ombros, acentuando a força do seu pescoço. Ele arrisca
esse pescoço repetidas vezes por mim e hoje não foi diferente.
Meu sorriso de gratidão vem fácil
— Por quanto tempo eu fiquei apagada?
Sua mandíbula mexe, mastigando o chiclete em sua boca.
— Seis horas.
Estou consciente que ele gastou esse tempo lidando com o corpo de
Lorenzo. O que ele fez com isso? O oscilar em seu olhar me diz que ele já
antecipava essa pergunta, mas também tem um olhar duro ali. Ele não vai
me dizer.
Não quero que ele carregue esse fardo sozinho, mas é importante para ele
me manter isolada dos detalhes. Pressioná-lo só o faria ficar mais frustrado
e confuso.
Eu posso ser racional nessa única coisa.
Sua mão se mexe pela dobra do meu joelho, seu polegar raspando nas
cobertas.
— Seu irmão está indo embora. — Ele olha para Shane e endure a voz.
— Para sempre dessa vez.
Soltando um suspiro, verifico o que estou vestindo – outra camiseta de
Emeric. Nada de calcinha. Mudo de posição para ficar sentada de costas na
cabeceira, arrastando os cobertores comigo antes de encontrar com os olhos
de Shane.
Ele corre para a beirada da cadeira e esfrega as palmas das mãos pelos
jeans, observando o movimento.
— É um pouco tarde, mas vou dizer isso de qualquer maneira. — Ele
olha para mim. — Sinto muito.
Duas palavras não apagam anos de abusos e merdas. Contudo, suas ações
hoje, sua escolha em mim em vez de Lorenzo, foram fortes e verdadeiras,
rachando a horrível barreira entre a gente.
Uma rachadura não acaba com uma parede. Mas deixa para trás um
ponto falho, um que sempre estará ali. Cada vez que eu pensar nele, sentirei
essa rachadura e me lembrarei com carinho.
Emeric estuda nossa interação, sua expressão neutra, seu carinho
duradouro no meu tornozelo.
Shane levanta a mão para pegar a minha, fazendo uma estranha hesitação
no espaço que separa a gente antes de prender nossos dedos juntos.
Ele dá um sorriso triste, aperta minha mão e sussurra:
— Vá se foder, Ivory.
Eu aperto de volta.
— Tenha uma ótima vida, Shane.
Ele afasta sua mão, depois seus olhos e anda para fora da porta sem olhar
para trás.
Uma pontada de dor pela perda esmaga meu peito. A urgência de parar
ele tensionam minhas pernas.
Mas ele invadiu a casa de Emeric. Ele me bateu por anos. Eu não sou
mais uma vítima. Com esses lembretes, deixo-o ir.
Emeric o leva para fora. Quando retorna alguns minutos depois, ele se
despe e desliza na cama ao meu lado, curvando seu corpo ao redor do meu.
Desfruto do calor da pele dele e entrelaço nossas pernas juntas e com um
suspiro, derreto em seu peitoral.
Em vez de ordenar que eu fale, coma ou tome meus medicamentos, ele
toca sua boca nos meus ombros, pescoço e por fim meu queixo. Quando me
viro em seus braços, ele provoca meus lábios para se abrirem e desliza sua
língua para dentro e de encontro a minha. A barba de seu queixo massageia
suavemente. O sabor de canela em sua respiração e seus lábios uma pressão
firme de sensualidade.
A boca dele é o melhor lugar para se perder.
Com minhas mãos nos entalhes sensuais na cintura dele, eu belisco,
lambo e saboreio, sem pressa, seguindo sua liderança. É um beijo sem
expectativas, uma simples fusão de lábios pelo conforto da conexão.
Mantemos esse clima suave pelo resto da noite.
A manhã seguinte começa com uma briga.
Ele diz que não iremos para a escola. Ele pode fazer o que ele quiser. Eu
vou. Ele acha que eu preciso descansar e se recusa a me deixar em casa
sozinha. É sexta-feira. Eu posso descansar no final de semana. Se nós dois
perdemos mais um dia, nós podemos muito bem anunciar nosso
relacionamento pelo intercomunicador.
Discutimos por uma hora e eu ganho. Acontece que é um dia tranquilo. E
inútil. Minha concentração está uma merda. Emeric pode estar certo sobre
uma coisa, eu preciso de descanso – o tipo mental.
Na tarde de sábado, o local dolorido onde Lorenzo me chutou fica com
um tom escuro de roxo. O horror de Emeric ao ver é o estímulo para nossa
inevitável conversa.
Entramos na banheira, minhas costas no peitoral dele e suas pernas
envoltas nas minhas. Ao lhe explicar o que aconteceu, ele agita o sabonete
pela minha pele, seus dedos massageando e acalmando. Dou a ele cada
detalhe corajoso, minha voz segura no começo. Quando conto a ele sobre
minha tentativa estúpida de usar minha palavra de segurança, seu corpo se
torna pedra embaixo do meu. E minha voz vacila a partir daí. Quando me
lembro daqueles momentos finais com o corpo de Schubert em meus
braços, desmorono nele.
Dói. Aquela bolinha de pelo era uma parte tão essencial na minha vida e
eu sofro com sua ausência. Mas não estou destruída. Não como eu estava
quando perdi meu pai. É mais fácil dessa vez. Sinto em cada toque e olhar
que Emeric me dá, aquele apoio tão necessário de outra pessoa me
segurando durante esses momentos em que luto para ficar de pé sozinha.
Naquela noite, ele ronca suavemente ao meu lado, seu peito pressionado
nas minhas costas, nossos membros entrelaçados e nossos corpos alinhados.
Não consigo me juntar a ele no sono, minha mente está muito inquieta,
pensando sobre sua reação ao escutar eu usar minha palavra com Lorenzo.
Nada mudou entre Emeric e eu. Não transamos desde aquele dia, mas eu
tive uma infecção na bexiga. Seus olhares demorados ainda me fazem
ronronar. Seus beijos curvam os dedos do meu pé. O que eu não sei é como
vou responder quando ele me amarrar, agarrar minha garganta ou levantar
seu cinto. Eu confio nele, sem dúvidas. Mas eu confio em uma palavra –
qualquer palavra – o suficiente para usar de novo?
Antes de conhecê-lo, a sonata de Scriabin era uma massa preta em minha
mente, um lugar que eu ia quando algo de terrível acontecia com meu
corpo.
Nos últimos cinco meses, essas teclas pretas viraram sinônimos com
Emeric e a segurança que ele me dá. Será que eu arruinei usando a palavra
com o homem errado?
Toco a sonata na minha cabeça, mas não a sinto. Eu preciso escutá-la.
Esgueirando para fora de seus braços pesados, escuto sua respiração
regularizar antes de ir de mansinho até a sala de música.
Com a porta fechada, a sala deve ser a prova de som. Sento atrás do
piano, absorvendo o silêncio e clareando a cabeça. Depois de algumas
respirações calmas, corro meus dedos pelas teclas e entro na Sonata Nº 9 de
Scriabin.
É bruto no início, a melodia ecoa pela sala em um ritmo desconexo. Mas
continuo, transformando minha interpretação de misteriosa e neurótica em
algo nebuloso e meditativo. A sonata flutua por mim em uma nuvem de
notas. Minha mente absorve, reflete.
Parece seguro. O tipo de segurança que me envolve nos momentos mais
sombrios. Está fazendo isso agora, afastando a sala, embaçando minha
cabeça e me mergulhando na dissonância.
A não ser que, de repente não sinto vontade de tocar. Descanso minhas
mãos no colo. A sonata é um lugar para ir e um mundo para falar quando
atinge meu limite. Mas eu gosto? Nem tanto. Isso não… me emociona.
Quero tentar algo diferente. Algo além de Chopin, Rachmaninov e
Debussy.
Minha atenção vai para a porta e me assusto.
Emeric se apoia na moldura, braços relaxados nas laterais e seu celular
em uma das mãos. Ele tem estado em constante comunicação com o
detetive particular nos últimos dois dias. Por acaso, rastreando Shane.
Quem sabe algo envolvendo Lorenzo também. Ele não me fala e eu não
pergunto.
Calça de pijama preto ficam sedutoramente baixas em seu quadril, o V de
seu abdômen apontando como uma flecha para a protuberância macia no
algodão.
Levanto uma sobrancelha.
— Há quanto tempo você está aí?
— Eu segui você. — Sua sobrancelha levanta, seus olhos escuros,
atormentados. — Você tocou Scriabin.
— Sim. Eu precisava saber. — Olho para o teclado. — Não vou ter mais
medo de dizer não para você. Com a palavra. — Volto para ele. — Confie
em mim que eu irei usá-la.
Ele se endireita, estudando-me atentamente.
— Esteja segura, Ivory.
— Eu estou segura. É seguro. — Enrugo meu nariz. — E um pouco
entediada.
Seus olhos brilham.
— Estou intrigado. — Ele espreita até mim. — Nomeie uma música que
não seja entediante.
O tique-taque do seu relógio. A harmonia das nossas respirações. O
ritmo do seu coração. As notas que sinto sempre que estou perto de você.
— “I Will Follow You In The Dark”.
Ele para atrás de mim e coloca seu celular no banco ao lado de seu
quadril.
— Death Cabe for Cutie?
Confirmo com a cabeça.
— Escolha interessante. — Ele mexe meu cabelo para o lado e traça os
nós dos dedos pela linha do meu pescoço. — Toque.
— Eu não tenho a partitura.
— Você não precisa dela. — Seus lábios seguem o caminho de seus
dedos, sua respiração acariciando minha orelha. — Você tem o melhor
professor do mundo.
Arrepio.
— Tão convencido.
Ele dá uma mordida calorosa no meu pescoço e se afasta.
— Levante seus braços.
Eu faço, relembrando de suas palavras na noite que chupei seu pau no
auditório do Le Moyne.
Eu quero você pelada, sentada no meu piano e rolando seu quadril como
se estivesse fodendo as notas.
Ele puxa a camiseta acima da minha cabeça e deixa-a cair, me deixando
completamente nua sob seu olhar. Com suas mãos no meu quadril, ele me
levanta e se senta no lugar, me posicionando em seu colo e diante ao
teclado.
Isso é diferente. Estou um pouco mais alta, mas seus braços estão ao meu
redor e suas mãos guiam as minhas nas teclas. Relaxo meu peso em suas
poderosas coxas, os joelhos juntos entre os deles e tremendo em
antecipação.
Ele toca a música em seu celular e o coloca no banco. Na próxima
respiração, o arranjo inspirador da música e da letra escorrem pelo alto
falante. Suas mãos se movem embaixo da minha e me guiam pela simples
complexidade dos acordes.
Espalho meus dedos nos espaços entre os dele. Minhas mãos são
menores, mais ossudas e de pele mais escura, mas se moldam com as dele
de forma primorosa como se nossas mãos fossem feitas para serem unidas
dessa forma, para nos abraçarmos e para criarmos música juntos.
Ao me atrapalhar, fico frustrada com minha incapacidade de entender. Eu
posso recriar peças clássicas sem partitura, só aquelas que toquei um zilhão
de vezes. Como que ele consegue só pegar as notas misteriosas no ar e sem
orientação visual? É insano. E brilhante.
— Escute. — Ele esfrega sua boca ao redor da minha nuca. — Sinta.
Fecho meus olhos e me concentro na batida, no deslizar de seus dedos e
no balanço e na flexão de seus músculos tensos ao meu redor. Sua
respiração no meu pescoço e as contrações de sua perna fazem mais fácil
para prever seus movimentos e ritmos. Eu não só sinto a música. Eu o sinto
assim como os vocais que nos conduzem através de cada compasso,
pintando imagens apaixonadas sobre o medo de ser o coração do amor.
Eu não sei quantas vezes ele repte a música. Estou perdida em seus
braços e no significado da letra. Nosso amor é um risco, uma aventura e
real. É fundada no medo? Talvez, mas é um medo respeitoso porque nosso
amor é todo-poderoso e intenso.
A pele esticada em seu peito roça nas minhas costas nuas, a fricção
erótica e prazerosa, seu corpo um condutor de calor sensual e som. Balanço
meu quadril contra o dele, liberada pela minha nudez, balançando com a
música e fodendo as notas.
Ele geme, um estrondo sensual e uma de suas mãos sai de debaixo da
minha. Carrego a melodia, errando umas teclas, mas mantendo o ritmo
enquanto ele arrasta os dedos pela minha coxa, ao longo da minha costela e
ao redor do meu mamilo.
Suspiro ao mesmo tempo que o pau dele enrijece embaixo do meu
traseiro.
Sua outra mão desliza do teclado para encontrar com a primeira, meu
pulso acelerando. Seus dedos vagam famintos ao redor dos meus seios, para
cima e para baixo da minha perna, pelos meus braços, sempre voltando para
o meu peito. Quando sua boca cai na minha garganta, minhas mãos vacilam
arruinando a melodia, mas não me importo. Ele estava tocando a melhor
música, a nossa música, ajustada ao ritmo de nossas respirações e as batidas
dos nossos corações.
Além disso, sua ereção é outra distração, presa debaixo de mim e
bombeando com sangue. Eu quero tirá-la da calça e deslizá-la para baixo
pelo longo comprimento duro enquanto continuo tocando o piano.
Separo minhas pernas, enganchando-as nas dele, minhas mãos
atrapalhando dois compassos da música.
— Emeric.
Sua língua traça o escudo do meu ouvido, seus dedos mergulhando entre
as minhas coxas, sondando, vagando pelo meu clitóris e afundando na
minha boceta.
— Tão molhada para mim.
Ofegante, desisti do teclado e agarro suas coxas onde estão flexionadas
entre as minhas. As investidas diabólicas de seus dedos arqueiam minhas
costas, me fazendo gemer e impulsionar em uma luxúria fervente que
cresce.
Eu puxo a calça do pijama.
— Tire isso. Eu preciso de você.
A gravação no celular termina, o súbito silêncio amplificado com o coro
de nossas respirações.
Ele belisca meu clitóris com uma quantidade perversa de pressão que
dispara um prazer doloroso pelo meu núcleo. Trabalhando as duas mãos nas
minhas pernas, ele dá tapas e afagos, movimentos e investidas. Implacável
ou gentil, dando ou recebendo, cada toque é uma declaração total de
compromisso.
Com um braço ao redor da minha cintura, ele levanta meu quadril e
empurra sua calça para o chão, chutando-a. Tremo quando ele me abaixa
em seu pau e empurra para dentro. Ele é duro e persistente, grosso e
agressivo, seus dedos cavando em meu quadril e controlando o
deslizamento para cima e para baixo do meu corpo com uma confiança
poderosa.
Agarro seus antebraços fortes e me seguro, minha cabeça inclinando para
trás do seu ombro e meus músculos internos se contraindo em cada
impulso. O deslizamento profundo do pau quente estica minha boceta, me
enchendo. Meu corpo canta para ele com cada batida de pernas, puxando
para dentro, prendendo-o e segurando-o ali. Ele pertence dentro de mim,
comigo.
— Apertada pra caralho. — Batendo seu quadril. — Escorrendo em cima
de mim. — Ele geme, seus dedos apertando meu quadril. — Amo sua
boceta gostosa.
Eu amo a boca suja dele.
Ele balança contra mim em círculos apertados, seu timbre baixo e áspero.
— Toque a música.
Agora? Sem a gravação? Mesmo que eu tivesse minha concentração
total, eu teria dificuldade. Mas enquanto ele me fode? Impossível.
Viro meu pescoço para olhá-lo. Sua mão mergulha em meu cabelo, puxa
minha cabeça para a frente e inclina para o lado. O roçar de seus dentes no
meu ombro me faz estremecer. A porra da mordida consegue arrancar um
grito da minha garganta.
A queimadura pungente entra nos meus músculos, carregando e rolando
como eletricidade liquida. Puta merda, esse vai deixar uma marca.
Enfio minhas unhas nos antebraços duros como pedra dele.
— Você é um animal.
Ele ri, me levanta do seu pau e bate sua mão na minha bunda. Com um
grito, caio para a frente e me seguro no piano, dedos espalmados nas teclas.
O homem sabe exatamente como ter o que quer.
Ele me puxa de volta para baixo, empurrando dentro de mim com uma
força que traz lágrimas aos meus olhos. É uma dor feliz e avassaladora, do
tipo que estimula a mente, desperta o corpo e estremece a alma.
Ele aumenta a sensação ao girar em impulsos tenro, garantindo que eu
sinta cada centímetro grosso dele se arrastando ao longo da minha parede
sensível.
— Toque a música, Ivory. — Ele belisca meu ombro, levantando a mão
para amassar meu seio.
Com caricias focadas, me jogo nas partes que me lembro, mentalmente
percorrendo os acordes e deixando meus dedos seguirem.
Ele beija meu pescoço, saboreando minha pele, nossos corpos
balançando e estremecendo enquanto a música nos leva a uma dança
lânguida. Ele me fode devagar e sensualmente. O movimento dos nossos
quadris agita em sincronia com meus dedos nas teclas ao mesmo tempo que
o som do nosso amor sussurra em um ritmo apaixonado.
Nós somos a canção final do amor.
A ponta da língua dele circula minha orelha.
— Goze.
Meu corpo obedece de imediato e solto um gemido através da onda
vigorosa de prazer, apertando em torno do seu comprimento e meus dedos
pressionando as teclas sem rumo.
— Ivory — ele geme, segurando meu quadril no dele enquanto a
pulsação quente de seu pau inchado me preenche, me marcando, me
reivindicando.
Torço meu pescoço para vê-lo nos espasmos de seu prazer.
O ar sai dos meus pulmões com a visão de suas pupilas dilatadas e
cercadas por redemoinhos intensamente lindos de fogo azul. Eu costumava
odiar seus olhos, incapaz de imaginar gentileza e segurança nessas
profundezas cristalinas. Eu estava tão errada. Essa é a única visão que
quero, ao acordar, ao ir dormir e em todos os outros segundos.
Eu me levanto e, rapidamente, giro para montar em seu colo, deslizando
de volta para seu pau. O beijo que se segue é uma busca mútua de lábios
encontrados no espaço entre nós e motivados por uma necessidade
compartilhada de conectar de todas as maneiras.
Ele é isso para mim, o apogeu da minha felicidade. Todas as estradas, por
mais perigosas e sinuosas que sejam, levam a este homem: meu professor, a
música da minha alma.
Eu quero ir para Leopold para aprender do melhor do melhor, ainda
assim, aqui estou eu, sentada no pau de um dos ex-alunos mais brilhantes.
Seja por pura sorte ou algum tipo de mágica do destino que me trouxe aqui,
eu não irei desperdiçá-lo.
Inclinando-me para trás, seguro seu rosto esculpido com as mãos.
— Me ensine a tocar.
— Srta. Westbrook. — Seus lábios formam uma linha reta. — Eu estou
ensinando…
— Não. — Eu beijo aquela boca dura porque, sério, é difícil de ignorar.
— Me ensine da forma que você me ensinou hoje à noite. Sem a teoria
musical clássica e os livros técnicos. Eu quero tocar… o que eu quiser tocar.
Um sorriso muito viril abre em seus lábios, seu pau empurrando dentro
de mim.
— Vire-se. Mãos nas teclas.
E assim vai. Pelas próximas semanas, ele me ensina como tocar qualquer
música de rock ou pop que se adapte ao meu humor enquanto ele me
segura, me toca, me beija e me fode.
Algumas músicas são mais difíceis que as outras. Todas elas me
desafiam. Eu não uso partituras, mas eu não preciso. Não com seus dedos
embaixo dos meus, me mostrando e sua voz na minha orelha, me
instruindo.
Dominar a música moderna não irá me ajudar a entrar na Leopold, mas,
caramba, isso me abre um novo mundo de compositores fora das salas de
aulas e dos livros didáticos. Eu descubro uma paixão por misturar obras-
primas clássicas com os quarenta melhores sucessos. Há algo sobre a
originalidade e distinção ao colocar meu próprio toque na música. Ele
atinge uma nota brilhante, respirando dentro de mim.
Claro, o entusiasmo de Emeric ao me ensinar e disciplinar não é uma
surpresa. Ele gosta disso, sobretudo quando escorrego. Deus, esse homem
ama dar umas palmadas na minha bunda. Mas é o seu encorajamento sem
fim que me lembra o motivo de eu ser tão feroz, profunda e loucamente
apaixonada por ele.
Meu aniversário de dezoito anos cai na última sexta-feira de abril.
Naquela manhã, acordo com ele montado nos meus quadris, mãos plantadas
nas laterais da minha cabeça e os olhos azuis preencho meu horizonte.
Perfeito.
Ele coloca seu rosto junto do meu, sua expressão séria.
— Vou fazer algumas perguntas, mas antes da sua resposta… me tire da
equação. Eu vou aonde você vai. Ficamos juntos não importa o quê.
Tudo bem. Aceno com a cabeça
Ele pesquisa em meu rosto.
— Você quer ir para a Leopold?
— Mas é claro. — Levanto as sobrancelhas. — O que mais eu faria da
minha vida?
— Qualquer coisa que você queira. — Ele me beija, sua voz em um
ritmo sedoso de notas. — O que Ivory Westbrook quer?
Bem, essa é fácil.
— Eu quero tocar piano com você ao meu lado no centro do palco.
Ele sorri, claramente gostando da resposta.
— Como você vai chegar lá?
Hummm. Essa é uma pergunta traiçoeira? Eu sempre acreditei que um
treinamento rigoroso, persistente e prestigioso me ajudaria a alcançar meu
sonho. Leopold não é a melhor escolha para obter essas coisas?
Franzo meus lábios.
— Eu não sei.
Ele pega algo por cima da minha cabeça e me entrega… Passagens de
avião?
— Vamos descobrir.
 
45

Emeric

Na manhã do sábado, não voamos de Nova Orleans. Eu dirijo por uma hora
e meia para pegarmos o avião de Baton Rouge. Uma cidade onde não
conheço ninguém. Mas enquanto andamos pelo aeroporto – sem nos
tocarmos – desconfio pra caralho de cada pessoa que olha em nossa direção.
Eles me conhecem? Eles estão associados ao Le Moyne? Eu poderia
explicar nosso passeio para a escola, mas isso não impediu minha pele de se
arrepiar com a paranoia.
Quando saímos do avião no nosso destino final, eu finalmente me deixo
relaxar.
Ivory se senta ao meu lado na limosine, seus olhos percorrendo todos os
lugares, sua expressão uma representação hipnotizante de admiração. O
sorriso largo, os olhos brilhando e a hiperatividade saltitante estão
constantes desde que dei a ele passagem de primeira classe ontem à noite.
Ela nunca esteve fora de Nova Orleans. Nunca esteve em um avião ou em
uma limosine ou em um hotel.
Se manter esse sorriso no rosto dela, mostrarei cada canto do mundo.
Já se passaram dois meses desde que Schubert morreu e sua felicidade
não voltou totalmente. Até agora. Foda-se se isso não faz todo o meu
nervosismo de mais cedo valer a pena.
Pela primeira vez desde que saímos de Baton Rouge, toco nela, não como
um professor, mas como o homem que a ama. Na privacidade da limosine,
passo um braço em volta de suas costas e a puxo para o meu lado. Descanso
meus lábios em sua têmpora e acaricio a dobra de sua coxa e quadril.
Ele suspira, seu corpo derretendo no meu aperto.
— Uma limosine, Emeric. É… desnecessário, mas uau. — Ela se inclina
para a frente, seu olhar preso na janela a seu lado e sua boca aberta ao ver a
metrópole de vidro ao redor dos arranha-céus. — Eu não posso acreditar
que estou em Nova Iorque.
Seguro uma mecha do cabelo dela e puxo.
— Não pode?
Ela me dá um sorriso gostoso e joga uma perna em cima do meu colo,
montando-me, peito a peito.
Com sua mão em meu rosto, ela toca seu sorriso no meu.
— Eu não posso, eu não posso, eu não posso.
Eu a curvaria em meu colo e daria várias palmadas em seu traseiro
perfeito, mas estamos a cinco minutos de distância da nossa primeira
parada. Então, em vez disso, belisco o mamilo dela através do vestido e
seguro.
Ela agarra meu pulso e tenta recuar, mas o movimento aperta meus dedos
e alonga o seixo de carne.
Segurando minha gravata, ela puxa com força. Isso só faz com que
nossos lábios se aproximem. Tiro vantagem e a beijo com avidez enquanto
aperto seu mamilo com força.
Seu corpo se contorce, uma curva tortuosa de carne envolta da seda preta
enquanto ela solta respirações pesadas.
— Eu nunca mais direi eu não posso de novo. Só, por favor… meu
mamilo!
Sangue corre para o meu pau, fazendo-o crescer.
Solto ela.
— Boa garota.
Ela esfrega o seio.
— Tão malvado.
Vislumbro o sorriso através de seu beicinho.
— Você ama.
Ela sai de cima do meu colo, mas fica perto, apoiando-se nas minhas
coxas para espiar pela janela.
— Estamos indo para a Leopold primeiro?
Ruas e placas familiares passam. Estamos a um quarteirão de distância.
Ela acha que estamos arrumados para uma reserva de jantar elegante e
que o propósito desse passeio é abrir seus olhos para a vida no campus da
Leopold.
O que ela não sabe é que eu a trouxe aqui para abrir as portas.
Quando a limosine para, ela olha para a entrada do prédio e arqueja. Seu
cotovelo balança um centímetro do meu rosto em sua corrida pelo meu colo
para sair do lado mais próximo das portas brilhantes da frente.
Encontro os olhos do motorista.
— Vamos demorar duas horas.
Eu me junto a ela na calçada, o vento forte gelando minha nuca. Mas
quase não sinto no calor de seu sorriso ofuscante e ao olhar para o campus
onde passei cinco anos da minha vida, ganhando minha graduação e meu
mestrado.
— Puta que pariu. — Ela prende um braço ao redor do meu, segurando
apertado. — Isso está mesmo acontecendo. Estou aqui de verdade.
Por mais que eu deteste nosso segredo, forço um tom de advertência dos
meus lábios.
— Srta. Westbrook.
— Merda. — Ela deixa o braço cair, se afasta para uma distância
apropriada e olha para a frente. — Sinto muito. — O canto da sua boca se
contorce. — Sr. Marceaux.
Espertinha.
— Me siga. — Guio Ivory para dentro e pelos corredores.
Eu não venho aqui desde que me formei quatro anos atrás. Nostalgia
surge dentro de mim, mas não levo muito tempo para olhar ao redor. Nós
temos uma entrevista.
Ela anda rápido para acompanhar meus longos passos, seus saltos
batendo contra o chão de cimento.
— Você não é um bom guia turístico. Tenha calma.
— Iremos explorar depois. — Paro em frente a uma porta fechada no
Pavilhão Richard e me viro para ela.
Ela me estuda, olha para a porta e volta a olhar para mim. Suas mãos
esfregam a frente do vestido.
— O que estamos fazendo? — Ela estreita seus olhos, suspeita em seu
tom. — O que você fez?
— Você está aqui para uma audição.
Sua boca abre, tentando formar palavras.
— Agora? — Ela pega o pingente de sapo no bracelete, esfregando com
ansiedade seus dedos, sua voz um sussurro áspero. — Por que você não me
falou?
— Por causa disso. — Toco suas mãos inquietas e deixo meu braço cair.
— Sua empolgação com esse passeio seria arruinada pela ansiedade.
Ela balança a cabeça bruscamente, seus olhos arregalados e aterrorizados.
O corredor está vazio, mas não posso arriscar um beijo. Em vez disso,
deixo que ela veja meu profundo suporte e amor no meu olhar.
— Lembre-se, seu som é a primeira coisa que os membros do painel irão
julgá-la e eles farão isso nos primeiros trinta segundos.
— Ah, Deus. — Ela respira fundo. — Que peças devo tocar?
— Toque o que mais lhe identifica, o que você acha que toque bem e o
que combine com seu estilo e ambição. Deixe que vejam o excelente
coração de Ivory Westbrook.
Confiro meu relógio. Está na hora. Eu me viro e abro a porta.
A sala de aula no estilo estádio não mudou nada desde todos aqueles
semestres que passei tomando notas lá em cima, nas arquibancadas. O
mesmo piano de cauda Steinway fica na frente, perto da porta. É como
entrar no túnel do tempo.
Com Ivory ao meu lado, ando em direção a mulher de meia-idade e dois
homens velhos e esguios na primeira fileira. Eu nunca os conheci, mas
estive em contato com a mulher, Gail Gatlin, que fica em pé e cruza a sala
para nos receber.
Seus severos olhos cinzentos me observam por trás dos óculos de aros
dourados. Cabelos castanho-areia estão penteados para trás de uma tez que
provavelmente vê pouco ou nenhuma luz do sol. Sua altura é baixa e
rechonchuda, ainda sim irradia uma autoridade confiante.
Ela estende a mão, balançando a minha.
— Bem-vindo de volta, sr. Marceaux.
— Obrigado por nos receber hoje. — Aponto para Ivory. — Essa é minha
pupila, Ivory Westbrook.
— Eu sou a sra. Gatlin. — Gail balança a mão esticada de Ivory. — Você
deve ser alguém bastante extraordinário para que o sr. Marceaux a traga até
aqui ele mesmo. A avalição dele sobre seu talento foi convincente o
suficiente para reunir o painel de jurados em um sábado.
Em outras palavras, não desperdice nosso tempo. Eu não teria trazido ela
aqui se eu achasse que ela faria.
Gail aponta para os dois homens esperando na fileira da frente.
— Não costumamos interagir com os candidatos, mas como essa é uma
audição incomum, será um pouco livre. Comece quando estiver pronta. —
Ela indica o piano e toma seu lugar.
Ivory se acomoda atrás do Steinway, seus dedos esfregando o pingente de
sapo. Encontro uma cadeira na lateral que me dá uma visão direta do rosto
dela enquanto olha para o teclado.
Minha perna balança e fico tenso na quietude. O que ela irá tocar?
Neste exato momento, seu rosto me lembra “Silent Lucidity” do
Queensryche. O canto de seus lábios se ergue em autocontrole, os cantos
curvados arqueados em uma aptidão luminosa enquanto ela vê seu sonho
bem de frente. Um sonho que só começou.
Mas Queensryche não estará em seu repertório. Ele investigou Leopold
por anos e sabe que a audição requer peças padrões de concertos do século
XIX, movimentos contrastando de uma partita de Bach e arpejos em três
oitavas com dupla pausa.
O que quer que ela escolha tocar, ela pode arrasar de olhos fechados.
Curvando-se sobre as teclas, ela move seus dedos e balança devagar em
um prelúdio. Eu não reconheço a peça de imediato. Não é barroco ou
clássica… Minha respiração fica presa. É uma banda pop irlandesa.
Todo o meu corpo trava, minha mão flexionada ao redor do descanso de
braço. Que merda ela está fazendo?
Os acordes de desespero de “All I Want” de Kodaline preenchem a sala
com uma forte corrente de tristeza e positividade. As letras não ditas
passam pela minha cabeça e a mensagem que só pode ser interpretada é:
Acabou, mas eu irei encontrar alguém. A vida irá continuar.
É uma música de rompimento.
Meu coração para, afundando no poço da negação enquanto as notas do
piano batem em meu coração. Por que ela está tocando essa música? É uma
mensagem para mim?
Olhe para mim, Ivory.
Seus olhos piscam para os meus antes de voltar para o teclado, o
vislumbre rápido demais para ler. Eu anseio para que ela olhe para cima de
novo para que me dê algo que possa me tirar da porra dessa névoa.
Eu falei para ela que eu a seguiria a qualquer lugar. Eu a trouxe aqui
sabendo que ela entraria. Eu estou totalmente comprometido a voltar para
Nova Iorque com ela. Então que merda ela está tentando me dizer? E por
que ela está arruinando sua audição para fazer isso?
Os jurados se mexem desconfortáveis em seus assentos. A qualquer
segundo, eles irão interrompê-la.
Isso está indo completamente errado. Não, não errado. Tem tanta paixão
e profundidade na maneira como ela bate naquelas teclas. Sua execução é
perfeita. Mas a música não mostra os talentos técnicos dela. Com certeza
não atende aos requisitos da audição.
Gail levanta uma mão em um movimento de interrupção, irritação em sua
voz.
— Srta. Westbrook.
Ivory para, olhando para a mulher com expectativa.
Com um suspiro aborrecido, Gail gesticula para as paredes ao redor.
 — Essa é a Leopold, não a Escola de Pop.
Devagar e sutil, os olhos de Ivory param em mim conectando-os com os
meus. Naquele fragmento de segundo, eu vejo o coração da mulher que
amo e está sorrindo para mim com uma determinação radiante. É apenas um
momento de contato visual, mas eu sinto como se ela estivesse aqui do meu
lado, me garantindo que está tudo bem no nosso mundo. Meu pulso acelera
nas veias.
Ela sabe exatamente o que ela quer e ela não só está me dizendo, ela está
me mostrando da forma mais impressionante possível. Na audição pelo seu
sonho. Através de uma música que ela mais se identifica.
Mantenho minha expressão de indiferença e com tranquilidade, junto
minhas mãos sob o colo. Mas por dentro, estou tremendo com choque de
compreensão. Ela não está terminando comigo. Ela está dizendo adeus para
a Leopold. O que eu não entendo é por quê? O que mudou?
Gail se reclina na cadeira.
— Por que você quer frequentar essa escola?
Ombros para trás e coluna reta, Ivory levanta o queixo.
— Para aprender com o melhor dos melhores.
— Posso ver. — Gail ajusta seus óculos. — O que você está procurando
em um professor?
Ivory sorri, seus olhos em chama.
— Conhecimento, é claro. Pulso firme para me pressionar. Uma mente
não tradicional para expandir minha própria mente. E disciplina. — Seu
olhar vem até mim e volta para os jurados. — Quando for necessário.
Sua resposta está direcionada para Gail, mas eu sei que suas palavras são
para mim. Incorporo cada característica que ela mencionou. Eu sou o
professor ideal dela.
A boca de Gail forma uma linha reta.
— Leopold é uma escola tradicional e os nossos treinamentos se
concentram em clássicos, barrocos…
Ivory se vira para o piano e toca a parte mais difícil de Islamey, Fantasia
Oriental do Balakirev.
Se ela não pretende estudar aqui, eu não sei o que ela está tentando
provar. Ainda assim, a intensidade da sua performance vibra pela sala com
entusiasmo. Não há erros de ritmo, notas e dinâmica. Cada som que ela
produz é impecável.
Todos os três jurados se inclinam para a frente de suas cadeiras, olhos
arregalados e bocas abertas. Sim, eles estão impressionados. Eles deveriam
estar mesmo. Eu aposto que eles nunca viram alguém tentar Islamey em
uma audição, muito menos conseguir fazer com uma habilidade imaculada.
Ivory para a peça e levanta uma sobrancelha para eles. Eu me sinto
orgulhoso até os dedos dos pés.
Gail descansa seus dedos na boca, em seguida, alisa o cabelo para trás.
— Muito bem, srta. Westbrook. Você tem a nossa atenção.
Com um sorriso reservado, Ivory se levanta ajeitando o vestido preto
antes de seguir em direção a eles.
— Eu passei toda a minha vida dizendo “Eu quero entrar na Leopold.” A
maior parte dos musicistas quer, sabe? Mas eu tenho me vendido baixo.
Tem alguns professores de pianos excelentes do lado de fora dessas paredes.
Eu posso passar felizmente os próximos anos aperfeiçoando minhas
habilidades sem me mudar para Nova Iorque.
Meu coração bate tão alto que me pergunto se eles podem escutar do
outro lado da sala. Fico de pé e dou um passo para o lado de Ivory, minhas
mãos fechadas juntas atrás das costas em um suporte silencioso.
Gail se levanta, sua expressão gravada em determinação.
— Eu preciso conversar com os meus colegas… — Quando os dois
homens acenam para ela, ela endurece a voz. — Ficaríamos honrados em
tê-la se juntando a nós.
Ivory balança a cabeça.
— Obrigada, mas eu fiz minha decisão.
Estendendo um braço, Gail entrega um cartão de visita a ela.
— É uma oferta aberta. Se você não encontrar o professor que você está
procurando, esse ano, ano que vem ou em qualquer momento no futuro, nós
teremos um assento para você.
Despedidas são trocadas e Ivory e eu andamos silenciosamente pelos
corredores, minha cabeça latejando com perguntas.
Quando chegamos a um pátio vazio do lado de fora, não consigo segurar
mais minha língua.
— Me fale por que você fez isso. Que merda fez você mudar de ideia?
Ela envolve sua cintura com braços e treme no ar frio.
— Eu não quero viver aqui. É tão frio.
Posso escutar o sorriso em sua voz e tiro minha jaqueta, colocando-o em
seus ombros.
Ela se enterra na lã, mantendo seus pés no ritmo dos meus.
— Quando me sentei atrás daquele piano, eu imaginei como seria
aprender de um professor, um tutor, que não fosse você. Então, eu toquei a
música que combinava comigo em vez da requisitada. Uma música que
expressa paixão e voz, algo que eu nunca senti nas obras dos livros
didáticos. Os jurados não aprovaram e foi quando eu soube. — Ela para e
pisca para mim. — Se eu me inscrevesse aqui, eu seria forçada a me
conformar com as instruções de alguém que não me conhece enquanto
praticava músicas que não me emocionavam.
Ondas de calor se espalham pelo meu peito, mas eu me pergunto se ela
considerou todas os pontos.
— Você não receberá um diploma sob a minha tutela. Se ainda está
buscando por aquele lugar na orquestra, não terá pedigree e prestígio para
colocar você lá.
Ela dá de ombros.
— Uma orquestra, um teatro, um estádio… O onde não é o importante.
Eu quero as luzes, a plateia e a música. Eu acho que eu tenho muito para
descobri ainda e se eu descobrir que eu preciso de um diploma, vou atrás de
conseguir. — Ela segura o cartão de visita e sorri.
— Foi por isso que você tocou Islamey.
— Planos Bs são sempre bons de se ter. Você nunca sabe. Meu atual
professor pode colocar os olhos em outra aluna. — Ela sorri. — Professores
de ensino médio têm um jeito de se apaixonar rápido e ignorantemente.
Minha mão se flexiona, queimando para bater contra a bunda dela.
— Você me impressiona.
Ela sorri.
— Eu tento.
Perambulamos no prédio ao lado e dou a ela um passeio adequado. Seu
interesse no campus se concentra onde eu gastava meu tempo e não de
como as instalações a ajudariam caso ela mudasse de ideia. Ela parece bem
e realmente em paz com sua decisão.
Já que é final de semana, os corredores estão escuros e vazios. Ainda
assim, mantenho uma distância profissional, andando lado a lado e
apontando para meus locais favoritos e compartilhando memórias sobre as
pessoas com quem eu saia.
— Eu não entendo. — Ela me segue até um corredor sem saída. — Eu
conheço você por oito meses e só escutei você tocando rock de velho no
piano.
— Rock de velho?
— Guns N’ Roses, Megadeth, AC/DC… quero dizer, isso é o que você
gosta, então como lidou com o treinamento de clássicos quando não estava
interessado?
— Eu estava prestes à mostrar para você.
No final do corredor vazio, balanço a maçaneta da última porta. Ela se
abre e eu a conduzo para dentro, fechando e trancando a porta atrás de mim.
Minhas mãos tocam o interruptor das luzes em uma memória reflexiva e
a lâmpada fluorescente no teto ganha vida.
A sala de ensaio espartana é à prova de som e grande o suficiente para
acomodar o piano vertical e duas pessoas. Ela olha ao redor e me dá um
olhar confuso.
Eu me inclino na vertical.
— Eu passei todos os dias aqui, praticando as músicas que eu gostava
sem as rígidas instruções dos meus tutores. Eu me sentava bem aqui com os
meus fones de ouvido e minha lista de músicas repetindo. Foi bem aqui que
me apaixonei por metal no piano.
Ela passa a mão pela tampa do teclado, avançando em minha direção.
— Todos os dias? Neste piano?
— Sim.
Tirando a jaqueta, ela coloca-o no banco.
— Sozinho?
— Claro.
Ela para ao alcance de um braço.
— Alguma vez você trouxe uma garota aqui?
— Só uma. — Meu pau se contorce. — A calcinha dela está em perigo
de ser arrancada.
— Eu não estou usando calcinha.
Merda, estou duro. Como que eu não percebi sua bunda nua quando ela
estava montada em mim na limosine?
Olho para a porta e me lembro que está trancada.
Um sorriso malicioso se abre em seus lábios.
— Você se masturbou aqui?
Tusso com um sorriso.
Ela anda para a minha frente e pega minha gravata.
— Você fez.
Eu realmente fiz.
Ela olha para o piano, mordendo o sorriso.
— Eu aposto que você gozou nas teclas. Eu me pergunto se ainda estão…
— Você quer me ver gozar? — Pego sua mão e seguro sua palma contra
minha ereção, desesperado por alívio. — Você pode ver pingar da sua
boceta.
Minha outra mão vai para o cabelo dela, emaranhando os fios grossos ao
mesmo tempo que a puxo para minha boca.
O beijo começa gentil e mergulha direto para carícias duras e agressivas.
Os dedos dela apertam minha calça, estimulando meus quadris em
movimentos e balançam nas mãos delas ao mesmo tempo que minha língua
chicoteia e lambe a boca dela. Eu mordo com força seu lábio inferior e puta
merda, suas unhas entram nas minhas bolas.
Giro ela na parede acarpetada, peito com peito e prendo os braços dela
acima da parede. Ela olha para mim, seus lábios carnudos, sensuais e
inchados com desejo. É aquele olhar sensual pra caralho que ela sempre dá
depois que eu a beijo até um transe. O tipo de beijo que faz o corpo todo
dela pesado e mole com desejo.
Balançando meu pau na boceta dela, traço minha língua pelo seu
pescoço.
— Você se lembra da primeira vez que estivemos nessa posição?
Ela estica o pescoço para minha boca.
— No corredor, no primeiro dia de aula. Não exatamente na mesma
posição.
— Eu queria conter você desse mesmo jeito e morder sua boca
inteligente. — Afundo meus dentes no lábio inferior dela, sem piedade, e
solto ela.
Sua respiração acelera.
— Você me assustou pra caralho naquele dia.
— E agora?
— Você me assusta de um jeito diferente. — Ela beija um lugar acima do
meu coração fazendo meu pulso acelerar. — Do melhor jeito.
Ela segue meu comando e eu inclino meu peso contra ela, restringindo-a
enquanto pego meu cinto, me atrapalhando para afrouxá-lo. Estou tremendo
com a necessidade de me enterrar nela e empurrar forte, rápido e sem
remorso. Eu nem me importo onde estamos.
Empurro minha calça e cueca para minhas coxas e seguro meu pau,
acariciando com uma mão enquanto puxo o vestido com a outra.
Meus dedos a encontram nua, macia e molhada. Graças a Deus, porque
eu já estou me alinhando e… Ahhh! Porra, essa primeira investida dentro
dela sempre me tira o ar. Ela é tão apertada, tão molhada e quente. Eu me
solto, sem me segurar enquanto bato nela, de novo e de novo, perdido no
confortável aperto de seu corpo.
Suas mãos ficam na parede e suas coxas tremem junto das minhas.
Eu a levanto, prendendo suas pernas ao redor da minha cintura e
mergulho meu quadril, fundo e feroz.
— Eu amo pra caralho sua boceta.
Com um gemido, ela curva as costas, tornozelos cruzados nas minhas
costas e aqueles olhos castanho-escuro dilatados, presos em mim.
Meu corpo endurece com meu desespero para gozar. Ela se sente bem pra
caralho, perfeita pra porra envolta do meu pau. Eu quero explodir.
Pego a parte de trás da cabeça dela e pressiono sua boca na minha. Sem
beijar. Eu estou muito desenfreado e desesperado para isso. Prendo nossos
lábios, nos segurando firmemente juntos, saboreado as respirações dela ao
mesmo tempo que solto um gemido e empurro para fodê-la até o clímax.
Seu peito arfa através de uma série de gemidos crescentes, suas mãos
deslizando para cima e para baixo na parede. No instante em que ela aperta
em torno de mim e seu corpo estremece em um orgasmo, eu gozo tão forte
que minha cabeça gira.
— Caaaaralho!
Eu coloco minha testa junto a dela, segurando-a na parede e beijando-a,
preguiçosamente e ofegando em vibrações persistentes de prazer.
Ela envolve seus braços envolta do meu pescoço, os lábios separados e
provocando os meus.
— Você é tudo o que preciso.
— Hum. Eu amo isso.
Eu me afasto do calor do corpo dela, sabendo que estarei de volta até o
final do dia.
— Só temos vinte e quatro horas. Hora de conhecer a cidade.
Por meio da limosine, dou a ela um passeio rápido pelo Central Park e a
Estátua da Liberdade. Andamos pelas ruas lotadas da Times Square e
jantamos em um restaurante chique que tive que reservar com dois meses
de antecedência. Não é o meu estilo, mas é algo que quero que ela
experimente.
Tarde da noite, deitamos pelados na cama da Suíte Presidencial no Hotel
Four Seasons. Eu estive dentro dela por tanto tempo que meu pau ficou
dormente. Mas em vinte minutos, estarei pronto para entrar de novo.
Ela me observa com os olhos pesados, os braços estendidos acima da
cabeça e os pulsos presos juntos pelo meu cinto. Ela não se importa de
mexê-los ou pedir para desamarrá-la. Eu não tenho certeza se ela tem
energia suficiente para falar.
Eu me abaixo pelas curvas dela e beijo seu quadril, mordendo o osso com
pressão o suficiente para fazê-la tremer.
— Como você entrou… — Ele contorce os pulsos na algema de cinto. —
Nisso?
Engatinhando para cima do corpo dela, eu desfaço as amarras e
massageio os braços dela.
— Quando eu tinha 15 anos, eu encontrei uns livros escondidos no
escritório do meu pai.
Seus olhos arregalam, acordando com alerta.
— Tipo livros de sexo selvagem.
Fecho meus dedos envolta dos seios dela, apertando-os para rolar minha
língua ao redor do mamilo.
— Livro de sadomasoquismo. Fetiche. Coisa de Mestre-Escravo. Eu
fiquei rapidamente… — Duro como a porra de uma pedra. — Intrigado.
Nos anos seguintes, eu pesquisei mais. Obcecado sobre isso. Mas eu não
tive bolas o suficiente para tentar nada até que eu fui para a universidade.
A veia na garganta dela pulsa.
— Com uma garota em Nova Iorque?
— Ninguém importante. — Eu nem lembro o nome dela.
Ela relaxa nos lençóis macios, seus dedos descuidados penteando meu
cabelo enquanto lambo, mordo e acaricio os seios dela. Ela é tão bonita que
não consigo manter minhas mãos longe dela.
Seus dedos ainda estão no meu cabelo.
— Quais foram os riscos que você correu hoje? Se eu tivesse aceitado o
lugar na Leopold, o que teria acontecido com seu trabalho e a diretora?
— Os riscos são nulos. Eu quero que você volte sua atenção para se
formar. — Dou um olhar de aço para ela. — Confie em mim.
— Está bem.
Trazê-la aqui não colocou a educação dela em risco. Eu sabia que os
jurados iriam aceitá-la. Se Beverly Rivard está jogando duplo por trás de
mim, não irá impedir Ivory de se formar no Le Moyne ou alcançar o futuro
que ela quer.
Faltam apenas três semanas de aulas e Beverly acredita que eu já
coloquei as inscrições de Prescott na pasta de processo de candidatura. Eu
não o fiz e não farei. Ele irá entrar em um conservatório. Só não será a
Leopold. No momento que Beverly descobrir isso, Ivory estará formada e
eu terei entregado minha demissão.
Refleti bastante pelos últimos meses. Ivory quer aprender e eu quero
ensinar. Iremos ter essas coisas um do outro. Depois?
Ela tem uma imagem muito específica do que é seu objetivo final… As
luzes, a plateia, a música. Minhas ambições não são muito diferentes.
Eu sei exatamente como vou fazer nosso sonho se alinhar.
46

Emeric

Na segunda-feira seguinte ao passeio para Nova Iorque, me encontro


sentado no escritório de Beverly Rivard, trocando olhares com ela, que está
sentada em sua mesa. Eu não tenho ideia do porquê de estar aqui, apenas
que fui chamado depois do segundo período. É sobre Leopold? Andrea
Augustin? Prescott? Cada possibilidade é um intruso rancoroso que está
tentando penetrar minhas defesas e roubar meu futuro com Ivory.
Nos oito meses que conheço Ivory, tudo tem sido uma porra de uma
guerra, o mundo contra ela e eu. Mas Shane foi localizado – trabalhando
como um operário em uma equipe de construção no Tennessee. Lorenzo
ainda está desaparecido – meu detetive particular está embaraçado de dizer
que a trilha esfriou.
Eu estive esperando até que o outro lado desistisse para abandonar.
Beverly prolonga o silêncio, me observando com olhos afiados e
provavelmente em uma tentativa de me fazer sofrer.
Estou lutando uma batalha de alta adrenalina por dentro, mas eu
mantenho minha postura relaxada e forço uma expressão entediada em meu
rosto.
Ela endireita as mangas compridas do terninho e dá um tapinha no coque
loiro-acinzentado em sua nuca. Quando ela termina de se arrumar, ela olha
para mim e funga.
— Eu tenho péssimas notícias.
O que quer que seja, ela parece presunçosa sobre isso. Isso não é bom
para mim.
Recosto na cadeira com uma informalidade exagerada.
Ela abre o tablet na mesa e encontra meus olhos.
— Um de seus alunos foi expulso essa manhã.
Eu tenho milhares de alunos, mas lá no fundo, eu sei de quem ela está
falando e é um excruciante soco na barriga.
O segundo soco vem quando ela gira o tablet e desliza sobre a mesa.
Um vídeo silencioso reproduz na tela. Está granulado e escuro nas
bordas, mas o palco do auditório do Le Moyne brilha embaixo das luzes do
teto. Na frente e no centro está Ivory, levantando-se do piano em um vestido
estampado com margaridas amarelas e brancas.
Assisto com horror enquanto ela sai do palco e anda até a borda da tela
para se ajoelhar entre um par de pernas sem corpo. Escuridão engole tudo
na frente dela. O rosto, as roupas, os sapatos, nada identifica a pessoa
sentada nas sombras na fileira da frente.
Mas eu me lembro do olhar sedutor em seus olhos antes que o vídeo
mostre. Eu me lembro das palavras em seus lábios antes que se movam
silenciosamente na tela.
Irei rastejar para você. Me curvar para você. Não importa o que você
queira, eu quero. Só… me dê isso.
Minhas entranhas endurecem como brasas ardentes, assobiando vapor em
minhas veias. Se o olhar de Beverly não estivesse me queimando, se as
consequências deste vídeo não estivessem fervilhando em mim como
combustível, eu estaria assistindo o lembrete com um pau duro e um sorriso
faminto. Contudo, eu me forço a assistir como o homem que Beverly achou
que eu era ao me contratar: um professor cansado e insensível que só se
preocupa com seus próprios objetivos.
Regulo a respiração e coloco um disfarce em minha expressão, cotovelo
no descanso de braço e o queixo descansando em uma mão frouxa fechada.
Eu poderia pausar o vídeo, mas eu preciso saber se a câmera me gravou
quando saí.
A gravação mostra uma mão indistinguível no cabelo de Ivory e sua
cabeça balançando para cima e para baixo no meu colo. Termina com ela
seguindo uma silhueta escura para a escuridão.
Nada no vídeo me incrimina. Difícil encontrar alívio nisso quando Ivory
foi expulsa da escola três semanas antes da merda da formatura.
Beverly estuda meu rosto, sua boca presa em uma linha reta. Ela está
procurando por uma reação minha. É preciso cada grama de controle que
tenho para não dar a ela um disparo rápido de perguntas que perfuram
minha cabeça com dois buracos sangrando.
Eu não sou o único professor de Ivory, mas eu aposto que eu fui o único
que Beverly chamou para a exibição do vídeo. O que ela sabe? A filmagem
é de cinco meses atrás. Há quanto tempo ela tem isso guardado? Por que ela
só está usada agora?
Algumas dessas respostas pode se revelar se eu entender por que o teatro
foi equipado com câmeras ao vivo.
Viro minha cabeça.
— Pela lei, é preciso do consentimento dos pais assinado para gravar ou
fotografar um aluno, especialmente quando isso invade a privacidade deles.
O que você estava pensando? Você sabe que essas leis existem sobretudo
para proteger a má conduta dos alunos da atenção pública.
Ela muda seu olhar para o tablet na minha frente.
— A escola não colocou essa câmera. Foi de um dispositivo pessoal de
alguém.
Aqui vamos nós. Esse alguém ou é Andrea Augustin, ou Prescott. Ambos
sabiam que eu mudei as aulas de Ivory para o auditório e ambos têm motivo
para foder comigo. Mas, se eles armaram para mim, eles saberiam que sou
eu na gravação.
Meu pulso dispara quando coloco um tom impassível em minha voz.
— Você interrogou a srta. Westbrook antes de mandá-la para casa?
— Mas é claro que sim. Ela se recusou a… colaborar.
— Explique.
— Ela não disse uma palavra depois que eu mostrei o vídeo. — Ela dá de
ombros. — Problema dela.
Cristo, Ivory deve estar enlouquecendo agora. Por que ela não me ligou?
Minha temperatura aumenta, mas mantenho uma fachada relaxada.
— Ela não quis contar a identidade do rapaz no vídeo?
Beverly bufa.
— Ela não quis responder nenhuma das minhas perguntas.
Em uma relação professor-aluno, o aluno é a vítima e, portanto, imune
aos castigos da escola ou ação criminal. Tudo o que Ivory tinha que fazer
era dizer o meu nome e ela seria exonerada.
Em vez disso, ela deixou que Beverly acreditasse que a má conduta
sexual foi com outro aluno, sabendo que o resultado seria sua própria
expulsão. Quatro anos no Le Moyne e ela desistiu do seu diploma do ensino
médio. Um que seu pai sacrificou tudo para que ela recebesse.
E ela se afastou disso.
Para me proteger.
Irei corrigir isso neste instante.
— Esse sou eu. — Aponto para o vídeo na tela.
Beverly pisca.
— Sr. Marceaux…
— Com certeza você percebeu isso com base no tamanho substancial do
pênis. — Sorrio. — Eu posso puxá-lo para fora, se você precisa de prova.
Ela parece que vai vomitar, mas por baixo do nojento, não há um pingo
de surpresa.
— Eu não sei o que você está tramando, mas eu não acredito por um
minuto que pretendia arruinar sua carreira e ir para a cadeia por causa
dessa… dessa… — Ela estremece ao meu olhar assassino. — Garota.
A evidência de até onde irei por Ivory está apodrecendo no fundo de um
pântano de Louisiana.
Puxo meu celular do bolso.
Beverly estica um braço na mesa.
— O que você está fazendo?
— Emeric. — O som da voz encharcada de lágrima de Ivory faz meu
peito afundar.
Pressiono o celular mais apertado na minha orelha.
— Onde você está?
— Sentada no estacionamento. — Seu tom aumenta uma oitava. — Ah,
Deus, Emeric. Eu queria ligar para você, mas eu estava com medo de que
você estivesse com a diretora e…
— Eu estou com ela nesse momento. — Sorrio ao ver Beverly rangendo
os dentes com violência. — Volte para dentro.
— Mas eu fui…
— Você não está expulsa. Venha direto para o escritório dela. — Termino
a ligação.
Beverly se inclina para a frente, as mãos cerradas na mesa, os olhos duros
afunilando.
— Eu vou entregá-lo para as autoridades.
Exceto que ela não fez a ligação ainda.
Porque ela ainda precisa da indicação para Prescott. E porque um assédio
sexual entre uma aluna e um professor seria uma terrível publicidade para o
Le Moyne.
— Vamos direto ao ponto, Beverly. — Coloco o telefone no meu joelho e
bato um dedo nele. — Está claro que você tirou esse vídeo do seu arsenal
para se livrar de Ivory. Me fale o porquê de você ter escolhido hoje, dentre
todos os dias, para fazer.
Ela se endireita e respira fundo.
— Eu recebi uma ligação perturbadora ontem à noite. — Raiva aparece
em seu pescoço. — Você a levou para Leopold. Para uma audição.
Minha suposição estava correta sobre suas conexões duas caras.
— Para quem você ligou?
— Alguém que tem acesso aos arquivos de admissão. O corpo docente da
Leopold está em uma agitação sobre a prodigiosa jovem do Le Moyne. No
entanto, ninguém sequer mencionou o nome de Prescott.
Estou em uma posição difícil aqui.
— Prescott armou aquela câmera e deu essa gravação para você meses
atrás. Você não queria usar porque não queria um escândalo. Agora está em
pânico, porque percebeu que eu não tenho intenção de passar seu filho
imprestável além das audições.
Primeiro, ele não é bom o suficiente para a Leopold. Segundo eu chamei
atenção para mim mesmo depois da audição de Ivory. O corpo docente da
Leopold iria questionar o porquê de não ter levado Prescott junto para
audição. Alguém pesquisaria e perceberia o envolvimento da minha mãe.
Beverly me chamou aqui para que ela pudesse me dar a péssima notícia
sobre Ivory ela mesma e se vangloriar de ter vantagem. Ela esperava que eu
fosse deixar Ivory assumir a culpa sozinha e usar Prescott como motivo
para manter meu trabalho.
Agora, sem saber o que fazer, ela está ameaçando ligar para a polícia.
Exceto que o vídeo não me implica.
Ela não tem nada.
Pego o tablet da mesa e entro no navegador.
— Ivory irá se formar no Le Moyne e você irá tratá-la com o maior
respeito.
— Não! — Beverly me encara com tanta fúria que acho que se globos
oculares podem saltar para fora. — Eu a quero fora da minha escola.
Entrando em uma plataforma de armazenamento na nuvem, acesso a
conta que configurei no caso de Beverly decidir ser uma vadia.
Expulsar Ivory da escola? Com certeza uma vadia.
Eu abro o primeiro vídeo e viro o tablet, gostando bastante da simbólica
virada de mesas.
Beverly pega da minha mão. Enquanto ela encara a tela, seus dedos se
fecham ao redor da capa de plástico.
Um punho bate suavemente na porta.
Deixo Beverly assistir ao marido bater na bunda da Deb e abro a porta.
Encontro grandes olhos castanhos, avermelhados e inchados.
Ivory entra em silêncio. Fecho a porta, entrelaço nossos dedos juntos e
guio ela para uma das cadeiras em frente à mesa de Beverly.
Sentamos lado a lado, mãos dadas. Ela muda seu olhar dos nossos dedos
para Beverly e então para meu rosto, suas sobrancelhas levantando-se em
questionamento.
Eu adoraria beijá-la, mas isso seria exagerar.
— Beverly estava para mandá-la de volta para a aula.
Beverly levanta o olhar da tela, sua pele pálida. Ela não chora, se
enfurece ou congela. Eu suspeitava que ela já sabia das traições do marido.
Mas dada a forte necessidade dela de manter a imagem que cativa e
impressiona todo mundo ao redor dela, não iria querer que ninguém
soubesse que seu casamento é uma pilha de merda.
Imagino que agora ela esteja se cagando mentalmente enquanto pensa
nas consequências se esses vídeos se tornarem públicos. Sua carreira como
diretora? Ferrada. O rosto do marido dela em todas as propagandas de
carros? Sempre associado ao dinheiro atirado na bunda de Deb. As
conexões de Prescott com outras universidades? Tão inútil quanto sua
habilidade musical.
Com um olhar de derrota, ela desliga o tablet e o coloca de lado.
— O que você quer?
Aperto a mão da Ivory.
— Eu já falei.
Beverly endurece a mandíbula.
— Eu não posso permitir isso… — Ela balança uma mão entre a gente.
— Continue na minha escola. Termine as coisas com a srta. Westbrook.
De jeito nenhum. Mas estou disposto a um meio-termo.
— Ivory fica. Entregarei minha demissão imediatamente.
Ivory se retrai ao meu lado.
— Emeric, não…
Aperto meus dedos ao redor de seu pulso em uma algema apertada,
lembrando-a de confiar em mim. Eu a tenho.
Meu olhar inabalável se estreita para Beverly.
— Mande Ivory retornar para a aula.
Beverly me encara do outro lado da mesa, seus olhos profundos como
caldeirões do ódio.
— Srta. Westbrook, volte para a sala.
47

Ivory

Eu acordo do mesmo jeito que na maioria das manhãs: sonolenta, feliz e


excitada. Exceto que hoje é diferente.
Hoje, eu estou sonolenta, feliz e excitada com a formatura do Instituto Le
Moyne.
A cerimônia foi realizada no auditório do campus. O mesmo auditório
que quase me custou meu diploma. Stogie e os pais de Emeric estavam lá.
A diretora exigiu que Emeric não mostrasse seu rosto, apesar de eu achar
ter visto seu chapéu fedora na multidão. Quando eu perguntei a ele sobre
isso, ele me deu um beijo em um estupor acalorado e pegajoso. Eu adoraria
um desses beijos agora.
Alcanço atrás de mim, esperando esbarrar em uma pele quente. Ao invés
disso, encontro lençóis frios e desocupado.
Soltando uma respiração, sento e olho para o relógio. 7:13 da manhã.
Desgraçado. Ele me disse que os treinos matinais iriam parar. Eu odeio
acordar sozinha.
Desço da cama e enrolo o robe ao redor do meu corpo nu antes de sair
atrás dele.
Dez minutos depois, encontro o nada e checo a garagem. Seu GTO
sumiu. Talvez ele esteja comprando o café da manhã?
Entrando na cozinha, algo se mexe na minha visão periférica.
— Mas que merda?
Giro assim que uma faixinha de dardos preta atravessa o chão e
desaparece ao redor da ilha. Tem um rato na casa?
Cuidadosamente, viro no canto nas pontas dos pés e suspiro.
— Ah, meu… O quê? — Cubro meu sorriso com meus dedos trêmulos.
Bastou um olhar naqueles olhos amarelos para fazer minha visão ficar
turva.
Um gatinho. Ele trouxe um gatinho para casa. Minha garganta aperta.
O pelo preto como carvão cobre o corpo do gato desde as pontas das
orelhas até a ponta da cauda. Eu pressiono meus lábios quando um soluço
aparece.
Na próxima batida do coração, estou chorando pra caralho. Uma droga de
bagunça de lamentos encharcados, nariz escorrendo e soluços barulhentos
sem motivos para que façam sentido. Eu fiz a mesma coisa quando meu pai
me deu Schubert.
Limpo minhas bochechas com as costas das mãos e devagar me abaixo
em um agachar, cuidadosa para não assustar… Ele? Ela? Conhecendo
Emeric, ele iria querer outro homem na casa.
Excitação me percorre quando vejo dois pingentes pendurados na coleira
preta.
Ofereço minha mão em um cumprimento. Ele cheira meus dedos, marca-
os e os faz dele. Eu derreto.
Pegando o gatinho, o aconchego no meu pescoço e mergulho em um
ronronar vibrante. Eu sentia tanta falta disso.
Com dedos trêmulos, examino os pingentes de prata. O primeiro é uma
placa de identificação com um nome gravado. Kodaline.
A banda irlandesa de pop que toquei na minha audição.
Balanço a cabeça sorrindo. Deus, eu amo esse meu homem.
O segundo pingente é um medalhão em forma de coração com uma clave
de sol gravada na frente. Abro o trinco e um bilhetinho cai dobrado na
palma da minha mão.
Sentando no banco mais próximo, coloco Kodaline no meu colo e revelo
o pequeno pedaço de papel.
É um endereço no French Quarter. Rabiscado embaixo do nome da rua
em sua caligrafia masculina sensual está um “Não me deixe esperando”.
O que ele fez agora?
Sorrio enquanto tomo um banho, ajeito meu cabelo e deslizo em um
vestido rockabilly casual preto com estampa de rosas cinzas. O corpete sem
alças abraça sedutoramente meu decote, um laço galanteador na cintura e a
saia flare nos joelhos. Combino com sapatos pinup vermelho – tão
confortáveis quanto saltos podem ser, de qualquer maneira. Sapatilhas
seriam mais confortáveis, mas quero estar bonita para ele, para o que quer
que ele esteja planejando.
Meu sorriso fica cada vez maior no caminho para lá, fazendo minhas
bochechas doerem pela insistência de não diminuir. Sorrir faz parte de mim
tanto quanto as roupas que ele escolheu, a dor com que ele me dá prazer e a
música que ele toca em meu coração.
Com o endereço traçado no meu celular, sigo as direções para um local
popular para café da manhã no French Quarter. A brisa morna beija meu
rosto enquanto ando rápido pela passagem de laje que circunda o ambiente
histórico e a arquitetura proeminente de Nova Orleans.
A luz do sol brilha nos telhados campanários, nos frontões e nas
mansardas, o orvalho grudado nas luminárias a gás e os turistas ansiosos
que se reuniam em torno dos vendedores que montavam as barracas
embaixo das árvores floridas no Jackson Square. É uma bela manhã do sul.
Como eu poderia ter me afastado disso?
Entro no restaurante e o vejo de imediato em uma mesa do canto bebendo
seu café. Os olhos azuis dele encontram os meus e pela segunda vez essa
manhã, me derreto.
Ele me observa com atenção enquanto cruzo o restaurante movimentado,
seu olhar vagando para cima e para baixo, profundamente dentro de mim.
Quando chego na mesa, ele fica de pé e entrelaça nossos dedos juntos.
— Você está deslumbrante.
O cabelo preto cai sobre os lados cortados em mechas desgrenhadas, sem
dúvida bagunçados por seus dedos desde o momento que acordou. A
camisa azul-cobalto que combina com seus olhos, está aberta sobre uma
camiseta branca. Seu jeans solto fica embaixo de seu quadril afunilado, um
ajuste tão perfeito que é como se cada fio fosse tecido para abraçar suas
pernas e cobrir sua protuberância impressionante.
Ele parece um homem que pretende passar um dia preguiçoso passeando
pelo cais. Talvez seja esse o plano?
— Você parece muito bem também. — Sorrio para ele. Em vez de me
sentar na frente dele, o sigo para envolver meus braços ao redor de seus
ombros e manter meus lábios junto dos dele. — Obrigada por Kodaline.
— Melhores amigos, presumo?
— Amor instantâneo.
Ele estica a conversa pelo café da manhã, mantendo o bate-papo
tranquilo e despretensioso. Ele não me contou como passou minhas últimas
três semanas de aula, mas o seu comportamento tem estado focado e
impulsionado com propósito. Quando me intrometo, é sempre a mesma
resposta. Confie em mim.
Estou recebendo esse olhar neste instante, o brilho do espere e veja em
seus olhos. Eu não me importo com o que ele está escondendo de mim.
Estou feliz só de aproveitar sua companhia, segurar sua mão como sua
namorada e beijar seus lábios em público. Sem mais esconder-se ou viver
com medo. Estamos finalmente livres.
Depois do café da manhã, andamos pelas ruas estreitas do French
Quarter, os dedos entrelaçados e trocando olhares e sorrisos furtivos.
Com as lojas embaixo e casas em cima, as fileiras de prédios
impressionam com os suportes de ferros forjado à mão, as colunas iônicas
caneladas e varandas famosas por arremessar contas.
Ele para em frente a uma dessas estruturas, puxa um chaveiro do bolso e
inclina a cabeça para cima. Sigo seu olhar e seguro a respiração.
Uma placa grande e redonda está pendurada por correntes de metal
embaixo de uma saliência imponente. A moldura com arabescos forjado em
ferro preto e o nome do nosso negócio fazem minha boca ficar seca.
Emeric e Ivory
Duelo de Piano Bar
Minha respiração retorna em uma lufada, só para ser tomado de novo
quando Emeric me tira do chão. Ele me embala de encontro ao seu peitoral,
destranca a porta de vidro e me carrega para dentro.
— Puta merda. — Meu coração acelera. Meus braços tremem. Meu
corpo todo flutua em um sonho. — Como você… Quando você… Isso é
seu? Eu não posso mesmo.
— Calma. — Ele me coloca de pé sob pernas bambas e tranca a porta
atrás da gente. — Respira fundo.
Meu peito arfa ao observar as fundas paredes de mogno, espelhos góticos
e piso de mosaico preto e marfim. É clássico e sofisticado, moderno com
um estilo meio lounge. Bem no coração do French Quarter, só o valor desta
propriedade neste lugar deve ter custado milhões. Estou atordoada em um
silêncio perplexo.
Dois pianos de cauda estão em uma plataforma no centro, de costas um
para o outro. Os teclados estão próximos um do outro o suficiente para
compartilhar o longo piano entre eles. Esses serão os nossos pianos? Onde
iremos tocar juntos? Com as luzes, a plateia e a música?
— Meu Deus do céu, Emeric. Me belisca.
Ele faz, bem no mamilo e com força o suficiente para me fazer gritar.
Ao me levar para o bar ornamentado, ele se inclina na borda.
— Quando eu comprei alguns meses atrás, tentei encontrar alguma
brecha, mas por causa disso… — Aponta para a prateleira de licores na
parede. — Seu nome não estará na licença comercial até que você complete
vinte e um anos. — Ele levanta minha mão e pressiona um beijo nos meus
dedos. — Até lá você será a sra. Ivory Marceaux.
Meu coração canta uma melodia de desmaio.
— Você tem certeza quanto a isso?
— Pode apostar esse seu doce traseiro. — Ele bate sua palma no meu
traseiro com um whack que ecoa. — Vá explorar.
Tem tanta coisa para assimilar que estou tremendo com a importância de
tudo isso. Um bar com piano. Assim como o do meu pai.
Lágrimas trêmulas e de alegria escorrem pelas minhas bochechas
enquanto faço o circuito ao redor das mesas altas, cadeiras de veludo macio
vermelho e sofás de couro preto. Luzes à luz de velas iluminam o espaço
com um brilho quente. E os pianos…
Paro ao lado de um dos Steinways e meus dedos rapidamente encontram
um arranhado familiar na tampa. Meu olhar lacrimejante cai em Emeric do
outro lado do ambiente.
Apoiado no bar, ele desliza um chiclete na boca e cruza os tornozelos.
— Comprei no dia que conheci o Stogie. É seu.
Olho de volta para o piano e engulo em torno da felicidade que cresce em
minha garganta.
— Você vai me deixar feia, me fazendo chorar.
— Vou comprar pianos para você todos os dias só para ver suas lindas
lágrimas. — Ele anda até mim, suas mãos fechadas atrás das costas.
Essa expressão em seus olhos e a devoção cercada por desejo, são os
meus tons centrais, minhas notas musicais e aquele que induz a onda de
vibrações perfeitas em mim, me equilibrando.
Ele se move para trás de mim, deslizando um braço pela minha cintura e
me segurando em seu corpo, seu pau endurecendo na minha bunda.
— Stogie vendeu a loja.
Olho para ele, surpresa.
Ele esfrega sua boca na minha orelha.
— A chatice não queria se aposentar, mas chegamos a um consenso. Ele
vai me ajudar com o inventário e com a contratação, e eu irei colocá-lo em
uma daquelas casas de arquitetura Creole a um quarteirão de distância.
Sobrecarregada de emoções, tento desembaralhar meu cérebro ao analisar
tudo o que ele fez e o futuro que ele difundiu na minha frente.
— E o seu ensino? Como esse bar cumpre isso?
— Eu ainda tenho você. Quando você me superar…
— Nunca irei te superar.
—… tem um segundo andar inteiro com uma entrada separada na parte
de trás. Irei abrir uma escola de rock velho e ensinarei metal no piano.
Uau. Ele pensou em tudo, o que me deixa com apenas uma coisa para
dizer.
Obrigada. Eu poderia vocalizar um milhão de vezes, mas não preciso.
Ele vê o rio salgado que desce pelas minhas bochechas. Ele sente o tremor
do meu corpo no dele. Ele escuta os assobios acelerados na minha
respiração.
Palavras não são precisas porque temos algo melhor: nossas notas. É só a
gente e nossa música, a sintonia pulsando entre a gente, alimentando,
misturando e nos fazendo um.
Ele me gira em seus braços e me aperta contra ele. Prendo minhas mãos
nas costas dele, descanso minha bochecha na parede calorosa de seu
peitoral e fecho meus olhos enquanto ele balança com a batida de nossos
corações. Algum dia em breve, iremos fazer isso, bem aqui, enquanto a
multidão nos aplaude, brinda e implora por uma repetição.
Suspiro. A realidade é muito melhor do que qualquer sonho que eu tive.
Ele prende um dedo embaixo do meu queixo, levantando meu rosto e
pondo sua boca na minha. Ele tem gosto de canela e desejo, seus lábios
firmes, devorando com o conforto da familiaridade.
Ele me passa seu chiclete com o giro de sua língua. A próxima investida
arrebatadora pega de volta. A mordida de seus dentes no meu lábio nos
mantém juntos.
As mãos dele desliza embaixo do vestido e pega a parte de trás das
minhas coxas, me levantando para a borda do piano para que ele possa
aprofundar o beijo. Para que ele possa provocar seus dedos entre as minhas
pernas. Para que ele possa arrancar…
Ali se vai a minha calcinha, atirada em um amassado de seda atrás dele.
Agarro o cabelo sensual dele ao mesmo tempo que os dedos dele
mergulham dentro de mim, agitando meus músculos sob a feição da
sensualidade de seu toque. A outra mão dele arranca o corpete do vestido
para que seus lábios possam ir até lá, enrolando e sugando meu mamilo
com sua boca quente.
Minha cabeça cai para trás, minha coluna dobrando no braço dele que
está nas minhas costas enquanto gemidos saem de minha boca. Jesus, ele
sabe como usar esses dedos. No piano. Na minha boceta. Ao redor do meu
coração.
Eu amo esse homem. Eu o amo e continuarei amando mesmo quando ele
tiver noventa e eu oitenta. Sorrio com a imagem dele enrugado.
Seus olhos se levantam para os meus e sua boca solta o meu mamilo.
— O que é tão engraçado?
Traço a curva molhada de seus lábios com um dedo.
— Quando você estiver muito velho para erguê-lo, eu ainda vou amar
você.
Ele curva os dedos dentro de mim e coloca seu rosto no meu, mostrando
os dentes em um sorriso malicioso.
— Viagra, querida.
Balanço a cabeça. Ele tem uma solução para tudo.
Ele remove os dedos de dentro de mim e abre os botões do seu jeans.
— Eu passei todos os dias das últimas três semanas aqui. — Ele abre o
zíper e arranca a saia do meu vestido do caminho. — Todos os dias
imaginando fodê-la aqui, exatamente desse jeito.
— Você poderia ter me dito. — Balanço na borda do piano, minhas
pernas nuas tremendo ao redor do quadril dele. — Eu teria vindo.
— Ah, Ivory. — Ele coloca a borda da cabeça do seu pau na minha
boceta. — Você vai gozar.
Seu olhar mantém o meu enquanto ele empurra. Um gemido baixinho
ressoa de seu peitoral.
Prazer inunda meu corpo em uma corrente de chicotadas, uma em cima
do outro, reunindo em uma névoa de prazer avassaladora.
Ele me beija apaixonadamente enquanto nossos corpos deslizam juntos,
balançando na borda do piano. Meus dedos afundam no cabelo dele. Nossas
respirações se misturando na harmonia dos gemidos ofegantes e meu
quadril absorvendo o impacto do dele enquanto ele nos fode em um
crescendo selvagem e frenético.
Seus olhos nunca deixam os meus enquanto envolve meu pescoço em sua
mão. Ele aperta e eu suspiro em uma pressão extasiante.
Eu amo quando ele me segura.
— Mais forte.
Seus dedos apertam e ele guia seu quadril mais rápido, sua urgência
impiedosa.
Nos esticamos um para o outro, mãos fechadas e olhos fixos enquanto
voamos, perdidos em nosso mundo privado de notas e sonhos.
48

Ivory

Três anos depois

Pessoas do mundo inteiro vem ao French Quarter para a comida, a cultura e


a música. A Bourbon Street é uma festa sem fim, dia e noite. Nosso duelo
de piano bar está bem no centro, crescendo cada vez mais com o
transbordar de turistas entusiastas. Na maioria das noites, a fila do lado de
fora da porta chega a dois quarteirões.
O som de risadas, o tilintar de copos e arrastar de sapatos carregam a
atmosfera com entusiasmo. Estamos tão cheios essa noite que o calor dos
corpos combinados sufoca o ar, fazendo ficar mais quente com as luzes
brilhando acima de nós.
Estremeço com os nervos felizes e dou um longo gole na minha cerveja,
retornando-o para a prateleira no meu piano.
Stogie se senta atrás do bar, tão velho quanto vigas de noventa anos,
sorrindo um sorriso juvenil. Laura e Frank Marceaux bebem suas bebidas
na área de estar, cercados por seus amigos.
Compartilhando o banco comigo, Emeric olha para o outro lado, o
movimento de seu quadril criando um deslizar prazeroso no meu.
Nossos pianos ficam em direções opostas e ligeiramente fora do centro
para permitir espaço para os cotovelos enquanto tocamos lado a lado.
Ele se recosta no teclado do meu piano, seus olhos varrendo meu vestido
marfim justo.
— Você parece boa o suficiente para comer essa noite, sra. Marceaux.
Eu observo seus jeans, camiseta branca e seu chapéu fedora cinza e quase
ronrono com apreciação.
— Espero que esteja com fome, sr. Marceaux.
— Infinitamente. — Ele se lança em mim, agarrando meu cabelo e me
dando um beijo tão escandaloso que a multidão explode em assobios e
vaias.
Quando ele separa o beijo, meu corpo nada em seu calor insistente.
Eu me concentro em seus olhos azuis brilhantes.
— O que iremos duelar primeiro?
Sorrindo, ele posiciona os dedos no seu teclado e cutuca meu ombro com
o seu.
— Guns N’ Roses.
Abro um sorriso e tremo sob as luzes.
— E Kodaline.
Então, a música começa…
Playlist

Sonata Nº 9 de Scriabin
“Toxicity” do System Of A Down
Islamey, Fantasia Oriental de Balakirev
“Patience” do Guns N’ Roses
“Nothing Else Matters” do Metallica
“Symphony of Destruction” do Megadeth
“Smells Like Teen Spirit” do Nirvana
“Comfortably Numb” do Pink Floyd
“I Will Follow You Into the Dark” do Death Cab for Cutie
“All I Want” do Kodaline
Sobre Pam Godwin

Autora best-seller do New York Times e do USA Today, Pam Godwin


mora em Midwest com o marido, os dois filhos e um papagaio boca suja.
Quando ela fugiu, visitou catorze países em cinco continentes e frequentou
três universidades. Ela se casou com o vocalista da sua banda de rock
favorita.
Café Java, tabaco e romances dark são seus prazeres favoritos e podem
ser considerados menos saudáveis do que sua aversão por dormir, comer
carne e bonecas com olhos que piscam.
Table of Contents
Sinopse
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Playlist
Sobre Pam Godwin

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