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Believer
Resumption
Livros Únicos
Summer Camp
Sombras do Passado
Trilogia Recomeços
Por mim
Série Gorillas
First Time
ISBN: 978-65-00-75361-5
Oi meus amores, que prazer estar aqui com vocês
novamente, ou pela primeira vez.
Com amor,
K.A. PEIXOTO.
Escute a playlist no Spotify clicando aqui.
"Que as dores das nossas almas nunca sejam maiores do que a
nossa força de nos manter em pé, prontos para vencermos mais
uma batalha e provar a nós mesmo que somos muito mais do que
um passado difícil e cruel.”
Vários anos atrás.
Sei que ele não gosta porque fica um cheiro ruim, mas eu já
tinha lavado toda a louça, limpado o chão e lavado o quintal todinho.
Acabei esquecendo de conferir o ralinho e as minhas costas ainda
estão doendo da surra de cinto que levei por causa disso. Tentei
olhar pelo espelho, mas ele também quebrou e só sobrou um pedaço
preso na porta do guarda-roupa.
Como seria se o meu pai não tivesse morrido? Será que ele
seria bom comigo?
Apenas isso.
Aqui em casa eu faço tudo o que ele manda, não posso nem
descansar depois que chego da escola porque ele diz que é minha
obrigação ajudar em tudo, já que eu como demais e as compras do
mercado ficam caras por minha culpa.
E isso não faz sentido, tem dia que ele coloca tanta comida no
prato dele que nem sobra para mim.
Mas acho que o Renato está certo, eu sou tão burro que nem
sou capaz de me matar.
Meu coração bate tão rápido que chega a doer na hora que
respiro.
Sei o que ele está fazendo, sei o que significa quando ele
transa a força com ela.
Saio dali limpando o meu rosto enquanto as lágrimas
começam a descer sem que eu consiga controlá-las.
Eu não respondo, apenas tento fazer com que meu corpo pare
de tremer.
Está tão drogado que nem lembra que acabou de fazer isso.
— Merda!
Como assim?
— Meu amor, se eu for com você, ele irá atrás da gente! — diz
enquanto faz um carinho no meu rosto. — Eu estou juntando esse
dinheiro há um ano, tem o suficiente para você conseguir ficar bem
por um tempo! E eu também coloquei o número de uma antiga amiga
minha, sei que ela vai te ajudar.
— Alô?
— Oi… é a Luciana?
Dias atuais.
Queria ter boas lembranças com ela, uma só que fosse, mas
lembrar da minha infância é como voltar aos acontecimentos e sentir
na pele novamente tudo de ruim que eu havia passado.
Limpo minha calça, dou uma olhada na lápide mais uma vez e
vou embora do cemitério, com o coração apertado de saudade de
algo que eu nunca vivi com a minha mãe.
Entro no meu carro e pego o celular que havia deixado ali
para não ter nenhuma interrupção.
Ótimo.
Paro bem na frente dela e abro a porta por dentro para que
entre.
Viro para trás para tentar dar ré, mas já tem vários carros
atrás do meu.
— Ótimo! — resmungo.
— Certo.
— Está.
Saio logo depois, vou até ela e pego a caixa dos seus braços.
— O que é isso?
— Maria INSS é tipo Maria farda, sabe? — Faço que não com
a cabeça. — Nossa, você é muito desatualizado! É quando uma
mulher gosta de homens mais velhos! INSS, entendeu? — Faz um
gesto com as mãos perto do rosto, balançando o polegar e o
indicador, como se essas informações fossem óbvias.
Ele finge um arrepio, Alana ri, o convida para entrar, mas sai
andando na nossa frente, sem esperar por nós.
Merda.
As coisas não podem seguir por esse rumo, o clima entre nós
dois não pode ficar diferente do habitual.
Porra!
Acho que até dou menos atenção para ele do que antes,
porque sempre fico com a sensação de que minha mãe vai perceber
e o evito a qualquer custo.
Hormônios traidores.
É o meu dom.
Muito mesmo.
Claro que vou ignorar essa atração, mas não posso fingir para
mim mesma que ela não existe.
Ela ri ao me ouvir.
Mas, por algum motivo que eu ainda não sei, confio nele.
Ela foi professora de dança por muitos anos, mas teve que
parar por conta de uma hérnia na lombar.
Essa era a ideia, mas não sei por que fiz aquele caralho.
— Eu também não sei por que fiz… não pensei direito! É que
ultimamente o meu apetit… esquece, não é nada importante.
Que estranho!
— Tudo bem, vou ver aqui o que aconteceu! Mas isso travou
alguma máquina? — Escuto o que o novo estagiário me explica e já
me sento, deixando a xícara no suporte e digitando alguns comandos
para chegar no lugar onde está dando problema. — Já achei, vou
resolver e entro em contato daqui a alguns minutos.
Quando descobri o que ela fez e pedi o divórcio, sem nem ter
que precisar usar o trabalho como desculpa para nos separar, foi um
alívio. E mesmo que ela não merecesse, para ter paz, eu deixei tudo
que era meu para ela.
Ela fingiu que estava tudo bem e com uns três anos de
casamento começou com as tentativas de me convencer do
contrário.
É a minha irmã.
— Saí do emprego!
— De novo, Beatriz?
Minha mão ficou doendo uns três dias, mas o nariz quebrado
dele deve ter doído muito mais.
Eu bufo ao ouvi-la.
Merda.
Não lembro a última vez que curti tanto uma balada como a de
ontem. E sair com a Beatriz é uma garantia de diversão, ela não para
de falar bobagens que me arrancam altas gargalhadas.
— Vai valer muito a pena, Alana! E é ótimo ver como você não
se acomodou depois de se formar, que está querendo se especializar
em algumas áreas diferentes — diz e eu sorrio. — E para mim, como
seu chefe, te dou todo o apoio. Podemos conversar depois sobre
alterar o seu horário, se for necessário. Você pode chegar mais
tarde, se quiser fazer de manhã, ou sair mais cedo se for à noite.
Espero alguns minutos para ter certeza que não vou vomitar
mais, me levanto e escovo bem os dentes e a língua, querendo tirar
todo o gosto amargo que ficou.
Que vergonha!
39 dias de atraso.
Meu Deus!
O quê?
Alana.
Fico tão surpreso que demoro um pouco para atender.
— Alana? Está tudo bem? Sua mãe está bem?
— Minha mãe está ótima, por enquanto.
A voz dela está diferente, parece assustada… desesperada,
na verdade.
— O que houve então? Você precisa de alguma coisa?
— Sim, preciso!
— Pode dizer. Cheguei em casa agora, mas posso passar na
sua.
— Não! Se você for lá em casa, minha mãe vai estranhar se
souber que eu te chamei. — Ela faz uma pausa que me deixa um
pouco tenso. — Lembra da última viagem para a sua casa de praia?
— Eu respondo só um “uhum”, porque é óbvio que eu lembro.
Inclusive, falamos disso esses dias. — Então… nós agora teremos
uma eterna lembrança daquela noite.
Eterna lembrança?
Será que ela está bêbada? Ainda é cedo para isso, mas talvez
ela nem tenha dormido em casa.
Não!
Que merda!
◆◆◆
◆◆◆
Sei que ela vai falar com ele e André ficará irritado comigo,
mas eu prefiro isso a me arrepender depois de não ter contado a
alguém.
— Por quê?
— Crises?
A história dele nunca para de ficar pior. O que mais deve ter
acontecido?
Ela não faz ideia do quão burro ele foi, não faz ideia mesmo.
13
Eu queria ficar irritado com ela, mas eu sei que ela não fez por
mal, que se assustou com o que falei e deve ter ficado ainda mais
assustada com a reação da minha irmã.
Quero que ele apodreça, que veja seu nome nas notícias só
que diferente de como ele vê agora.
Não que eu possa falar de quem faça isso, sendo que por
muitos anos trabalhei como hacker para pessoas importantes e
instituições que ninguém nunca pode nem imaginar.
Em minha defesa, tudo que eu fiz foi para que fosse usado de
forma que ajudasse as pessoas. Se eles realmente usaram só para
isso eu já não sei e acho improvável, mas eles precisavam de mim
para fazer a maioria das coisas e sempre me recusei quando achava
que era algo errado.
— E quem seria?
Eu concordo.
◆◆◆
— Alô?
Tiro uma foto e mando para a amiga dela, avisando que pelo
visto foi só um sono profundo.
Sinto minha cara esquentar na hora que percebo que ela está
tendo um sonho erótico comigo.
Diferente, sei.
— Qual?
Não é possível.
Porque não faz sentido o short ser tão pequeno, mal cobre a
bunda dela.
Olhei para ela várias vezes enquanto fazia isso, acho que nem
está percebendo.
Bom para ela, porque acho que um toque inocente como esse
nunca me deixou tão em alerta como agora.
— Por favor, não diga que é esse tipo de homem que não
reconhece a beleza em outro.
— E o último?
— É o vocalista do NX Zero!
Penso um pouco.
— Nunca.
— Sim!
É fácil, eu consigo.
— Eu te beijaria de volta!
Eu enlouqueci, definitivamente.
Alana não pensa nem duas vezes antes de tirar a coberta de
cima dela, chegar perto de mim e montar em meu colo.
Puta merda.
Meu pau pulsa tanto dentro da cueca que parece que meu
coração está batendo dentro dele.
Esse primeiro toque já faz com que todo o meu maldito corpo
se arrepie.
Ela olha para o meu pau da mesma maneira que tem olhado
para os pirulitos, cheia de fome e vontade.
Sua boca macia encosta na cabeça e ela roça seus lábios por
todo o comprimento antes de passar a língua pelo mesmo caminho,
fazendo com que se torne mais gostoso gradualmente.
O elogio faz com que ela se empolgue ainda mais e uma das
suas mãos delicadas segura as minhas bolas e ela começa a apalpá-
las devagar, descobrindo se é alguma coisa que eu gosto, e porra, é
delicioso.
— Safada!
Ela morde o meu lábio infeiror depois que afasto a minha boca
e eu aliso o seu rosto, querendo muito saber se ela gosta de levar
uns tapas… porra, só de imaginar eu fico ainda mais louco.
Isso é bom.
Muito bom.
Ela pisca para mim e olha para a sua roupa espalhada pelo
chão.
Decidi que vou culpar meus hormônios por qualquer coisa que
eu não deveria fazer enquanto grávida, mas ainda assim fiz.
Com o André não tem nada disso. Ele sabe que estou grávida,
tem cuidado e, caramba, ele é gostoso demais.
Ela convidou o André para almoçar, como sempre, mas foi tão
tenso.
Ela se olha mais uma vez no espelho, pega a sua bolsa que
havia pendurado no suporte e vai embora ao se despedir.
E além de ter feito uma sala nova e maior para ele, também
fez mais outras três.
— Oi, Gab…
É a coisa mais triste que eu já vivi, não sei como minha amiga
vai lidar com isso.
Vou para uma das cadeiras que fica do lado de fora da sala e
aproveito para tentar ligar para o Marcus várias vezes. Não sei
quantas horas passam até que ele me retorna.
— Oi, Marcus.
— O que aconteceu, Alana? Fiquei com o celular desligado,
porque estava em reunião praticamente o dia todo.
Como dar uma notícia como essa?
Como avisar que uma pessoa incrível como o Paulo está
partindo?
A vontade de chorar cresce novamente em meu peito.
— É o tio Paulo — minha voz quase some e eu soluço antes
de continuar falando: — Você está longe? A Gabriela vai precisar de
você aqui.
— Estou em São Paulo, acho que chego aí em 3 horas.
— Impossível chegar tão rápido, mas eu vou estar aqui com a
Gabriela. — Pauso novamente, tentando controlar a respiração para
terminar de falar. — Merda, isso não deveria estar acontecendo com
ele.
— Nós vamos dar um jeito. Minha irmã está aí?
— Sim, está nesse momento conversando com a Gabriela.
Ela chegou aqui bem cedo e não foi embora até agora.
— Certo! Me liga caso qualquer coisa… mude.
Ele desliga a ligação logo depois e eu seguro a mão do Guto,
que chegou há alguns minutos e está sentado ao meu lado.
Ficamos em silêncio por tanto tempo que parecia que o tempo
nem estava passando. Algumas outras pessoas chegam no hospital
e em algum momento eu escuto a voz da minha mãe e vejo o André
atrás dela.
Abraço-a e depois a atualizo sobre o que aconteceu.
André senta em uma cadeira mais distante, cruza as duas
mãos entre as pernas e fica daquele jeito por horas, olhando para os
próprios pés.
Marcus também chega e vai direto para o quarto onde tio
Paulo está. As pessoas saem de lá para deixá-los conversar e todo o
resto acontece tão rápido que eu só entendo que o Paulo se foi ao
ouvir o grito mais sofrido que a minha amiga já deu em toda a sua
vida.
Não tem uma pessoa aqui que não se emocione, é impossível
não sentir a dor dela tocar em todos nós.
Marcus tira a minha amiga do quarto em seu colo e ninguém o
impede quando eles vão embora. Ela precisa disso, precisa de um
tempo sozinha para entender o que está acontecendo e ficarmos em
cima dela não vai ajudar em nada.
A irmã do Marcus vem conversar conosco e depois todos
vamos embora.
Guto fica me abraçando de lado o tempo todo e andamos
assim até o meu carro.
— Vocês precisam de carona? — André pergunta quando
chegamos perto do carro dele, que está estacionado antes do meu.
— Eu vim com o meu, mas obrigada — digo e vejo que ele
continua me olhando, provavelmente querendo falar mais alguma
coisa, mas sem saber como fazer isso na frente da minha mãe e do
Guto. — Te atualizo sobre o enterro, tá bom?
Ele concorda apenas com um leve movimento de cabeça, dá
um beijo na bochecha da minha mãe e entra no carro, bem sério.
— Acho que ver a Gabriela daquele jeito o abalou — Guto fala
assim que entramos em meu carro.
André passa na minha frente devagar e me dá uma encarada
que não dura nem meio segundo antes de acelerar e sumir na rua,
indo em uma direção que não é o nosso bairro.
Será que ele está bem?
Ligo o carro, deixo o Guto na casa dele e depois vou para a
minha.
Minha mãe e eu ficamos juntas na cozinha enquanto ela faz
um lanche e lembramos de vários momentos incríveis que tivemos
com o tio Paulo, em como ele era um homem alegre e
apaixonadíssimo pela falecida esposa.
— No dia que eu encontrar alguém, quero que me ame como
o Paulo amou a Andréa.
Minha mãe sorri e alisa o meu rosto.
— Estarei torcendo para que você tenha essa sorte, minha
filha! Eu já tive o meu grande amor e sinto que sempre o levarei no
coração comigo. — Ela olha na direção da foto grande que tem na
sala, com nós três. — Queria tanto que tivesse convivido por mais
tempo com o seu pai.
Eu também queria.
Nós duas fechamos a casa depois de encerrarmos nossa
conversa, nos despedimos e cada uma vai para o seu quarto.
Na mesma hora, pego o meu celular e mando uma mensagem
para o André.
Eu: Você está bem? Fiquei preocupada.
Fico olhando, esperando que ele me responda.
André: Já chegou em casa, né? Está sozinha?
Eu: Sim para ambas as perguntas.
André: Posso te ligar?
Eu: Claro.
Segundos depois, aparece a chamada e eu atendo.
— Como você está? — me pergunta.
— Muito triste e sentindo que vou chorar o resto da noite. E
você?
— Fiquei triste pela Gabriela e pelo Paulo, ele sempre foi
incrível com todo mundo… Nunca vou entender por que a vida é tão
cruel para algumas pessoas e para outras não.
Começo a me despir enquanto falo com ele, querendo tomar
um banho para tirar o clima péssimo do hospital do meu corpo.
— Penso a mesma coisa, mas como a minha mãe sempre diz,
a vida é fodidamente escrota e injusta.
— Sua mãe está certa.
— Ela sempre está.
Ficamos um tempo em silêncio até que ele volta a falar:
— Você e o Gustavo… têm alguma coisa?
Que pergunta estranha.
— Hã? Como assim?
— Vocês já ficaram ou namoraram?
— Não, credo!
— Humm.
De onde ele tirou essa ideia? Que coisa de doido.
— Sabia que a cortina do seu quarto é muito transparente?
— Sabia, por quê?
— Daqui de fora consigo ver perfeitamente que você está só
com um sutiã branco de renda.
O quê?
Esse homem só pode ser maluco.
Viro na direção da janela e vejo que ele está lá fora, dentro do
carro, com o vidro abaixado.
— O que você está fazendo aqui?
— Pensei que talvez não fosse querer ficar sozinha…
E eu realmente não quero, pensei em talvez invadir o quarto
da minha mãe e dormir com ela, como fazia quando era mais nova.
Não estava em meus planos que o André fosse aparecer.
Não mesmo.
— Estou indo aí.
Me enfio no primeiro short que eu acho e pego uma regatinha
branca que vou vestindo pelo caminho.
Dou uma olhada na janela dos vizinhos para ter certeza que
não tem ninguém bisbilhotando e entro rápido no carro dele.
— Você é doido, né? Se minha mãe me ver aqui dentro, com
certeza vai perceber que tem algo muito estranho acontecendo!
Ele fica me olhando quieto, seu olhar desce pelo meu corpo e
depois volta a olhar nos meus olhos.
— Qual foi a última hora que se alimentou?
Paro para pensar e percebo que só tomei café da manhã e
depois almocei.
— Meio dia, por aí.
— Porra, Alana! Você precisa se alimentar direito. — Ele liga o
carro e eu fico meio desesperada porque estou horrível. — Vamos
aqui perto, não se preocupe — diz quando nota que fiquei receosa.
— Eu estou horrorosa, André.
Ele solta uma risada abafada, sem humor nenhum.
— Nem se você tentasse muito conseguiria.
Mas não vou reclamar, porque estou morrendo de fome e a
companhia dele não é tão ruim como antes eu achava que poderia
ser.
16
— Desculpa… — sussurra.
A conversa com a minha mãe foi uma das coisas mais difíceis
que eu já fiz em toda a minha vida, até hoje.
Ela não brigou comigo, como eu pensei que aconteceria,
apenas deixou claro o quanto está magoada pelo que fizemos nas
costas dela e preocupada comigo e o bebê.
— Então você aceitou essa condição dele? — minha mãe
pergunta, querendo confirmar que ouviu direito.
Contei tudo para ela.
Ou quase, estou ainda pensando em como falar que estamos
meio que ficando.
— É, mãe. Mas eu realmente acredito que ele pode mudar de
ideia.
— Querida, eu não teria tanta certeza.
É, eu também não deveria.
Porém, não consigo ir contra essa voz dentro da minha
cabeça que repete incansavelmente que vai dar certo.
— Eu preciso pelo menos tentar — falo a mesma coisa que
falei para a Gabi, Beatriz e Rennan.
Todos acham que eu enlouqueci, que é uma ideia idiota e que
vou me magoar.
Mas estou decidida.
Minha mãe está sentada de frente para mim, na minha cama.
Ela pega as minhas mãos, segurando-as com firmeza.
— Eu irei te apoiar na sua decisão, meu amor. — Hã? Não
esperava por isso. — Sei como é sentir a necessidade de fazer tudo
que estiver ao nosso alcance pelo nosso filho. Você já tem 23 anos e
eu ainda calculo cada passo da minha vida, pensando em como isso
pode te afetar.
— Se eu conseguir ser a metade da mãe que você é para
mim, meu bebê já terá muita sorte.
Ela me olha com seus olhos cheios de lágrimas, enquanto eu
já nem controlo mais e deixo que as minhas escorram pelo meu
rosto.
— Tenho certeza que será… não sei como não percebi antes.
Você está com um brilho diferente, seus seios estão ficando enormes
e os absorventes estão prestes a fazer aniversário dentro do armário
do banheiro — solta uma risada abafada. — Vai se preparando,
porque as coisas podem acontecer bem debaixo do seu nariz e você
nem perceber.
Minha mãe me dá uma leve alfinetada, mas eu apenas rio.
— Eu te amo, mãe! Sinto muito por ter te decepcionado.
— Vai ficar tudo bem, amor. Eu só preciso conseguir digerir
que o meu melhor amigo é pai do meu neto — diz e balança a
cabeça, desacreditada. — Nunca, em toda a minha vida, eu pensei
que estaria falando uma frase como essa.
E eu menos ainda.
— Talvez isso vire uma piada futuramente? — arrisco e ela me
olha séria, mas depois ri.
— Isso ainda parece uma piada, para ser sincera. — Ela se
levanta e olha o meu quarto com os móveis em lugares diferentes. —
Por isso você fez essa mudança? Para caber um berço? — Faço que
sim. — Acho melhor trocarmos de quarto. O meu é suíte e é quase o
dobro do tamanho do seu.
Me levanto também e já começo a dizer que não.
— Não, mãe. Eu sei que você ama o seu quarto, do jeitinho
que ele é, e eu tenho que dar o meu jeito aqui.
— Oh, meu amor… você ainda não entendeu que isso é o de
menos? É só um quarto! E eu prefiro mil vezes você e o meu neto
com um maior conforto do que eu. E o outro banheiro é coladinho
nesse cômodo, não será problema nenhum.
— Mas, mãe…
— Não teima, Alana! Acredite, você ficará muito grata em ter
um quarto maior, onde poderá colocar a caminha dele quando ele for
crescendo… depois poderíamos até fazer uma parede de Drywall
para dividir em dois quartos.
Fico prestando atenção nela enquanto vai falando todas as
ideias que já teve para o neto que acabou de descobrir. E eu não
tenho como ser mais grata por tê-la como mãe.
Eu realmente sou muito sortuda.
Seremos um time incrível.
Aproveito que o clima voltou a ficar tranquilo e mostro todas
as fotos que salvei no Pinterest da decoração que quero fazer.
O quarto na verdade será dele, e eu colocarei a minha cama
em um cantinho e dormirei lá.
Quero que ele fique confortável, é só isso que importa.
E acabo de entender o que a minha mãe quis fazer ao me
oferecer o quarto dela.
Nós duas vamos até lá e começamos a idealizar várias coisas,
que eu sinceramente não sei de onde iremos tirar dinheiro para tudo
isso, mas imaginar é de graça e muito divertido.
— Talvez eu coloque o projeto da cozinha do buffet para a
frente — ela comenta.
— Claro que não! — digo. — Você não vai adiar
absolutamente nada por causa do bebê, mãe. Eu sei que quer e vai
me ajudar em muitas coisas, mas as responsabilidades são minhas,
não faça isso.
Ela fica me olhando e depois me puxa para um abraço.
— Estou tão orgulhosa da filha que eu criei, meu Deus! — Ela
beija o meu rosto com força. — Além da Gabriela, quem sabe da sua
gravidez?
— Só o Rennan e a Beatriz. Agora que você já sabe, não vou
esconder mais.
Minha mãe pede para eu esperar um pouco, sai do quarto e
minutos depois volta com o celular na mão.
— Precisamos registrar esse momento.
Ela fica toda empenhada em procurar uma foto bonita na
internet para eu poder imitar, arruma toda a cama e faz com que eu
fique na mesma pose e tiramos algumas fotos com a minha barriga
de fora.
Algumas ficaram ótimas e eu amei.
— É a primeira foto da minha barriga.
— Que bom que fiz parte disso — comenta toda chorosa. —
Quando é a sua próxima consulta? Eu gostaria de te acompanhar, se
não tiver problema.
— Eu vou amar, mãe… ele tem o coraçãozinho tão forte.
— Certeza que eu vou chorar.
Rio ao ouvi-la.
— Com certeza!
Voltamos até o meu quarto e eu mostro a ultra.
— Você acha que é menina ou menino?
— Menino — respondo.
Desde que descobri que estou grávida, em todas as situações
que me imagino com o bebê aqui fora, sempre o vejo como um
menininho lindo, com a cara do André.
— Se for, não estarei preparada para vê-lo cheio de
namoradinhas.
Eu rio alto ao ouvi-la.
— Mãe, mas a criança ainda nem nasceu.
— Elas crescem rápido, meu amor. Veja você! Sinto como se
tivesse te parido ontem, desesperada, achando que não ia dar conta,
com o seu pai falando que iríamos dar um jeito e que tudo daria certo
no final — ela faz uma pausa, sorrindo ao lembrar dele. — E ele
estava certo! Mas, com certeza, o seu pai teria matado o André. Não
seria tão tranquilo quanto eu, de jeito nenhum.
Queria tanto que ele estivesse aqui conosco, vivendo esse
momento juntos.
Acredito que além de um ótimo pai, ele seria um vovô babão,
da mesma forma que a minha mãe será.
Nós voltamos a planejar o quarto, eu aproveito para mandar
uma mensagem para o Guto, contando da gravidez em um convite
para ele ser padrinho. Ele manda um áudio comemorando e
chorando.
Depois de ter contado para ele, posto a foto no Instagram.
Na mesma hora, várias pessoas começam a comentar, me
desejando felicidades e que o bebê nasça com saúde.
E agora todos vão saber que estou grávida.
Deus proteja a língua das minhas vizinhas quando elas
descobrirem. Elas sempre falavam que eu iria aparecer buchuda
desde os meus 15 anos… demorou quase 10 anos, mas agora
aconteceu.
Elas terão mais um motivo para se juntar nas cadeiras de
plástico, em frente aos seus portões, para falar de mim.
Vou aproveitar para matá-las de curiosidade, porque sei que
irão perguntar quem é o pai e eu já deixei claro para a minha mãe
que não quero que as pessoas saibam por enquanto.
Se no final, minha mãe e as demais pessoas que sabem
quem é o pai estiverem certos e o André não mudar de ideia, não
quero que os outros saibam que é ele, para evitar qualquer tipo de
desconforto no futuro.
24
◆◆◆
Dia da surpresa.
Não sei o que eles inventaram, mas tenho certeza que é
longe.
Estamos há mais de uma hora no carro e eu estou surtando
com essa venda nos olhos.
Até música alta eles colocaram, evitando que qualquer som
específico faça com que eu descubra para onde estamos indo.
Bato as minhas unhas em minhas pernas, querendo que esse
bendito destino chegue logo.
— Estamos quase, amiga — Gabi diz, provavelmente
percebendo a minha ansiedade. — Prometo que vai valer a pena
esse pequeno sufoco e desespero.
A sorte dela é que eu tenho certeza que ela não faria isso se
realmente não fosse valer a pena.
Os dois conversam mais um pouco comigo, tentando me
distrair e até que dá certo por alguns minutos, mas depois eu fico
agoniada novamente.
— Chegamos! — Marcus diz e eu sinto que o carro parou.
— Amém! Vocês estão torturando uma grávida e eu tenho
certeza que é algum tipo de crime.
Ouço os dois rirem e depois a Gabi segura a minha mão ao
abrir a porta do carro, me ajudando a sair com cuidado para eu não
me acidentar.
— Espera um pouquinho! — Ouço um portão se abrir e tenho
quase certeza que Marcus corre para longe de nós e segundos
depois volta, segurando na minha outra mão e me levando para
algum lugar que ainda não sei onde é.
O chão parece de grama, porque sinto o meu salto afundar
um pouco toda vez que eu piso e o lugar provavelmente é aberto,
porque corre bastante vento e consigo sentir um cheirinho de
maresia.
Gabriela me para, coloca a mão onde fica o fecho da venda e
solta, fazendo com que eu finalmente veja onde estou.
— Surpresa! — muitas pessoas gritam e eu coloco as mãos
no rosto, sentindo a minha boca aberta em choque com a cena linda
que vejo.
É um chá de fraldas surpresa.
Não consigo sair do lugar e começo a abanar o rosto para não
chorar e estragar a maquiagem linda que eu fiz.
— Não acredito que vocês conseguiram fazer tudo isso pelas
minhas costas! — falo para todo mundo ouvir.
Puxo a Gabi e o Marcus para um abraço apertado.
— Obrigada por terem feito parte disso.
Gabi tenta não chorar, mas fica abanando o rosto igual a mim,
poucos segundos atrás.
— Obrigada você por ter me dado a benção de ser madrinha
desse bebê.
Ela beija o meu rosto e depois dá um tapinha na minha bunda,
me incentivando a ir falar com as demais pessoas.
E só quando dou uma olhada ao redor, me situando de onde
estou, que reconheço que é a casa de praia do André, em Cabo Frio.
Por isso demoramos tanto para chegar.
A decoração é a coisa mais linda.
É toda em tons pastéis, igual ao quartinho do bebê. No meio
de onde colocaram a maior parte da decoração, tem um painel com
uma interrogação, porque não sabemos o sexo ainda, e também tem
um arco de bolas lindo, vários ursos em tamanhos diferentes para
decorar ao redor da mesa, onde tem um bolo e alguns docinhos.
Só quando vou até onde a maioria das pessoas estão, que
vejo na parede que eu estava de costas, uma foto minha, enorme.
Ela foi tirada em Petrópolis, mas eu não lembro em que
momento eu tirei…
— Eu realmente estou uma grávida linda! — me elogio e o
Gustavo ri do meu lado, se aproximando para me dar um abraço
apertado e gostoso.
— Você é linda sempre, Lana. — Ele beija o meu rosto. —
Gostou da surpresa?
— Eu amei!
— Acho que você vai amar ainda mais ao descobrir que todos
que estão aqui ajudaram de alguma forma.
— Todos? — ele confirma e eu sinto vontade de chorar.
— Sua mãe e Gabi ficaram dias para conseguir pegar o
número de todo mundo e fazer um grupo para organizar. — Ele pega
o celular e me mostra o grupo que estava arquivado. — A gente
queria que você soubesse o quanto te amamos e como essa criança
terá muitos titios doidos por ela.
Por que eu me maquiei? Era para ter vindo sem nada, assim
não corria o risco de ficar igual a um panda, porque sei que cada
pessoa que vier falar comigo vai me fazer chorar.
— Vocês são incríveis! — Abraço o meu amigo novamente e
depois vou falar com todo mundo.
Danilo, Camis e o namorado dela estão sentados em uma das
mesas, falo com eles e ainda recebo um carinho na barriga de cada
um. O namorado dela até arrisca em dizer que acha que é uma
menina.
Falo com os pais do Guto, com os meus tios que moram em
outro estado e quase nem conseguimos nos ver pessoalmente pelas
vidas corridas e a distância.
Alguns amigos da faculdade vieram, que são os poucos que
ainda mantenho contato, duas vizinhas que são as únicas que não
ficam falando da vida dos outros e mais algumas pessoas que eu fico
feliz que tenham vindo.
— Como vocês esconderam isso de mim tão bem? —
pergunto assim que eu chego na mesa onde está a família do André
e abraço todos eles. — Eu amei, obrigada por terem feito isso.
— Você merece, meu bem! E esse neném terá duas avós
babonas para estragá-lo e te deixar doida.
Eu rio ao ouvi-la e sinto o bebê mexer.
— Ele já ama a vovó! — Puxo a mão dela e coloco bem em
cima de onde ele está mexendo e Luciana fica com os olhos
marejados.
— Vovó Lu te ama, querido! — ela fala perto da barriga.
— A titia Bia, a mais bonita, também! — Ela disputa o espaço
com a mãe para poder falar e me arranca uma risada sincera.
Peço licença a eles e vou até a minha mãe, que está com um
lenço na mão, secando as lágrimas o tempo todo.
Basta apenas que eu olhe em seus olhos e nós duas
começamos a chorar.
— Eu nem sei como dizer o quanto te amo, mãe.
— Que coincidência, eu ia falar exatamente isso.
Seus braços se fecham ao redor do meu corpo e eu fico ali,
abraçando a pessoa mais incrível desse mundo todo, que é a minha
inspiração, meu alicerce e a melhor mãe do mundo.
— Tem mais uma surpresa para você! — ela diz no meu
ouvido e me puxa até o painel onde tem uma interrogação. Só
quando chego bem perto que consigo notar que é um tecido solto por
cima do painel e ela tira um envelope que estava preso na parte de
trás. — Gabi tinha combinado com a sua doutora, na última consulta,
para não te contar o sexo se já tivesse como saber e ela viu, mas te
enganou para a surpresa de hoje ser ainda mais completa.
Ela coloca o envelope em cima das minhas duas mãos.
— O sexo do meu bebê está aqui neste papel?
— Sim, meu amor. Mas ela não contou para ninguém sobre
essa parte da surpresa, porque não sabíamos se você iria querer
compartilhar com todo mundo ou não.
Deus, será que vou conseguir parar de chorar algum dia?
— É claro que eu quero que todos saibam… sei que todos
que estão aqui realmente gostam de mim e do bebê, ninguém sairia
de Laranjeiras para Cabo Frio a troco de nada. — Ela ri e concorda.
— Vamos ver juntas? — pergunto.
— Tem certeza? Esse momento é seu, meu amor.
— E eu quero passar com a pessoa que eu sei que me ama
mais do que tudo.
Ela respira fundo para não chorar mais e fica lado a lado
comigo.
Também preciso respirar fundo e abro o papel com cuidado,
sentindo minhas mãos tremerem mais do que o normal.
Vejo que antes do resultado tem um recadinho escrito à mão.
Reconheço a letra e sei que foi a Gabi que escreveu.
“Oi, mamãe, sei que você está ansiosa para saber se eu sou
menino ou menina, mas primeiro queria te falar uma coisa.
A dindinha disse que você é linda, cheia de vida e a outra
metade dela. Não sei o que isso significa, mas ela cochichou na
barriguinha que é uma coisa boa e que eu sou muito sortudo por
estar sendo gerado por você.
E eu adoro conversar com a dindinha, também falei para ela
que me sinto muito amado por você desde a primeira vez que fez um
carinho na barriga e falou que iria me amar com todo o seu coração.
E você já faz isso!
Mamãe, ainda vai demorar um pouco até eu conseguir te falar
isso, mas eu te amo muito! Quando eu fizer alguma besteira e
parecer que não, lembre-se que é só um momento passageiro.
Estou ansioso para te conhecer, mamãe!”
Minha vista está tão embaçada que demoro mais que o
normal para conseguir ler.
Olho na direção da Gabi, que está de longe vendo que estou
lendo a carta e falo sem som que a amo.
— Pronta? — minha mãe pergunta e eu faço que sim com a
cabeça, sem conseguir esboçar uma palavra sequer.
Puxo o papel com o recadinho e logo atrás dele já aparece o
resultado.
Sexo: masculino.
Meu corpo todo se arrepia e eu não sei se começo a chorar ou
rir.
Minha mãe me abraça e nós duas começamos a pular
agarradas uma na outra e provavelmente chamando a atenção das
pessoas que não entendem nada.
— Estou tão feliz por saber que terei um garotinho correndo
naquela casa e nos deixando doida — ela diz quando nos afastamos
e eu rio mais.
— Eu soube desde o início, mãe. Mas agora que tenho
certeza, posso dizer que é a realização do meu sonho.
Guardo o papel com muito cuidado, porque quero ter para
sempre tanto o resultado do exame quanto a cartinha que a Gabriela
fez.
— Gente! — falo alto para todo mundo ouvir. — Eu tenho um
recado para dar… — Gabriela vem correndo até onde estou e fica do
lado do painel, segurando o tecido que está com a interrogação. —
Eu estou esperando um menino! — digo o mais alto que consigo e
todo mundo começa a bater palmas, gritar e comemorar junto
comigo.
Olho para trás e vejo que debaixo da interrogação está escrito
“Baby Boy”.
Ela realmente pensou em tudo.
Quase todo mundo vem me abraçar e fica uma confusão de
pessoas e braços, mas eu amo e aceito as felicitações de todos eles.
Sinto o meu coração quase parar quando me viro um pouco,
encontrando André encostado em uma parede ao fundo, de braços
cruzados e com os olhos marejados.
Eu não sei o que sentir, mas o sorrisinho que ele não
consegue conter faz com que eu queira chorar novamente.
34
◆◆◆
1 mês depois.
Com certeza farei uma cesariana, está decidido.
Não tem a menor chance de eu conseguir colocar essa
criança para fora de forma natural, não mesmo.
Ainda estou apavorada com todos os vídeos que eu assisti
sobre isso.
Parabéns para quem consegue, mas não vai rolar para mim.
Gabriela e Beatriz estão deitadas na minha cama, as duas se
dividindo entre ler alto os itens que outras mamães aconselham a
levar na bolsa da maternidade.
Já me perdi várias vezes e tivemos que conferir de novo se eu
peguei tudo ou não.
— Lana, está absolutamente tudo aí! — Bia fala. — Na
verdade, tem mais coisas do que você realmente precisa.
É, eu acho que ela está certa.
A mala está lotada porque eu quis colocar coisas a mais, só
para garantir e não correr o risco de não faltar nada para ele.
— E como está sendo esse início de faculdade? Está
gostando? — pergunto a ela e Gabi se anima para ouvir o que ela
tem a dizer.
— Eu estou realizada, meninas! A faculdade é incrível, o curso
é o dos meus sonhos e voltar a ter um propósito, algo em que focar é
sem igual.
Fico tão feliz por ela.
Beatriz é incrível, muito divertida e tem um coração enorme,
torço para que a vida dela seja linda igualzinha a ela.
— Ficarei aguardando ansiosa pela sua formação — Gabi
comenta. — Posso tentar conseguir um estágio para você quando
chegar nessa parte da faculdade.
Beatriz se ilumina ao ouvir isso e começa a explicar as
matérias que está tendo.
Eu, obviamente, não entendo metade do que ela fala, mas
como a Gabi é do ramo imobiliário, entende muito bem.
Deixo as duas conversando e aproveito para pegar o meu
celular e dar uma fuxicadinha nas redes sociais.
Uma das primeiras coisas que aparecem é a foto que o André
postou ainda há pouco.
É a sua mão em minha barriga.
A legenda são vários corações azuis e eu fico toda boba, com
vontade de comentar, mas as pessoas ainda não sabem que ele é o
pai.
Depois do chá de fraldas e aquela conversa muito pesada,
mas que me fez entender o real motivo de ele não querer ser
presente, ele tem se mostrado disposto a tentar.
As coisas entre nós dois não voltaram da forma que estavam.
Eu gosto dele, isso é um fato, porém, não posso me colocar
em risco de me apaixonar por ele.
Não, enquanto meu foco é ajudá-lo a superar todo esse medo
aos poucos, mostrando que ele é capaz, sim, de ser um ótimo pai,
sem o reflexo do Renato em suas atitudes.
Foi um choque absurdo saber o que aconteceu com o Rennan
e depois ele até veio falar comigo, porque o André o informou que
me contou.
Rennan disse que ele sabe disso desde novo e que em
nenhum outro momento o André foi agressivo ou qualquer coisa
próximo disso.
Agora, mais do que nunca, eu entendo o medo dele sobre a
paternidade, mas quero que isso dê certo, que ele consiga ser o pai
que não teve.
Quero que ele se inspire na garra da Luciana, que criou três
filhos sozinha. Ou até mesmo a minha mãe, que perdeu o marido
cedo demais e teve que ser meu pai e minha mãe ao mesmo tempo.
Está sendo um passo de cada vez e o que importa é que ele
está tentando mesmo com medo.
E parece que só ele não percebe o quão carinhoso já é com o
filho.
O laço já está sendo formado e eu estou achando lindo
assistir isso acontecer desde o começo.
— Alana, tem visita para você! — minha mãe fala alto e eu
saio do quarto direto para a sala, encontrando o André de pé ao lado
do sofá.
Minha mãe está tentando perdoar o amigo aos poucos, mas
não está sendo nada fácil.
— Oi, André, está tudo bem?
— Sim! — Ele se aproxima. — E vocês dois? — André se
abaixa na minha frente e sorri para a minha barriga, como se fosse
capaz de enxergá-lo dentro dela. — E aí, garotão! Se comportou
essa noite?
O bebê mexe na mesma hora e eu sorrio.
— Estamos bem, só cada dia tem ficado mais desconfortável
para dormir.
— A almofada não ajuda?
André comprou uma almofada que na internet diz que ajuda
as gestantes a ter uma posição melhor para dormir, mas a realidade
é que não está funcionando nem um pouco para mim.
— Quem me dera! — reclamo. — Mas o que veio fazer aqui?
— Quero te mostrar uma coisa lá em casa!
Na casa dele?
Que estranho!
Peço para a minha mãe avisar às meninas que eu volto em
alguns minutos e vou com o André.
Sinto que ele está um pouco nervoso e a sua mão está fria,
encostada em minha barriga enquanto dirige.
Ele segura a minha mão e me leva até onde é o quarto de
visitas, porém, ao parar de frente para a porta, eu já entendo o que
ele fez.
A porta está decorada como se fizesse parte de um cenário
com o tema de Safari.
— Entre e veja se gosta!
Abro a porta e me deparo com um quarto infantil lindo, cheio
de cores, animais pintados nas paredes e muito bem equipado.
Passo a mão pelos móveis enquanto ando pelo cômodo e me
sinto tão feliz em saber que o nosso filho também terá o próprio
espaço dele na casa do pai.
— Está lindo, André! — Vejo um porta-retrato com a mesma
foto minha que tinha no chá de fraldas, e que eu peguei para mim.
— Você gostou? Estava com medo de que achasse ruim, mas
esse quarto não significa que ele ficará sozinho comigo enquanto for
pequ…
— Não precisa se justificar! É a casa do pai dele, foi incrível
você ter feito um quartinho tão especial — o corto porque ele precisa
entender que confio nele.
E que estarei por perto enquanto ele se sentir inseguro.
— Comprei até uma poltrona para você ficar confortável.
— Eu vi… está tudo perfeito! Você pensou em cada detalhe.
Ele sorri, orgulhoso dele mesmo.
E realmente deveria estar.
Eu também estou.
Cada passo é importante e vê-lo empenhado e empolgado me
deixa feliz demais.
O que ele mais fugia, parece ser exatamente a coisa que
faltava em sua vida para trazer leveza e fazê-lo entender que ele é
muito mais do que achava que era.
André vai até o guarda-roupa, tira lá de dentro um saco e me
entrega.
Na mesma hora que eu pego, vejo que são vários pirulitos
sem açúcar e rio.
— Você é maravilhoso, obrigada!
— E você é linda! — rebate, me pegando de surpresa. —
Desculpa, mas eu não consigo resistir de pelo menos te elogiar —
confessa. — Estou sentindo sua falta, Alana. Sinto falta do seu beijo,
de dormirmos juntos, de te ver acordar… sinto falta da intensidade
do que estávamos vivendo.
Meu coração começa a bater forte ao ouvi-lo e sinto as
minhas mãos suarem.
André é o único homem que consegue me deixar assim,
nervosa. Parece que todo o meu corpo, inclusive o coração, clama
por ele.
— Eu também sinto a sua falta… — confesso.
— E por que nós não voltamos de onde paramos? — Se
aproxima e me pergunta. — Sei que te chateei, e posso pedir perdão
todos os dias pelo resto da minha vida, mas eu realmente achei que
estava fazendo a melhor escolha.
— Eu sei disso.
Ele dá mais um passo de encontro a mim e a sua mão grande
joga o meu cabelo para trás, deixando os meus ombros descobertos,
ele passa a mão em um lado, descendo até o meu braço.
— É uma tortura te ter por perto, porque eu sempre quero
mais e não posso.
Você pode!
Eu me arrepio toda e encaro a sua boca bonita, com os lábios
naturalmente rosados e a sua barba sempre tão bem feita.
Esse homem parece ter sido esculpido.
Seu corpo é lindo, forte e gostoso. Ele é inteligente,
engraçado quando quer e uma das melhores companhias que já tive.
Porém, é o pai do meu filho, e eu não quero confundir as
coisas.
— Não quero acabar arrumando problemas no futuro.
— Que problemas você acha que arrumaria?
— Quando esse fogo todo acabar? O que faremos? —
pergunto. — Não quero dar chance para que algo de errado
aconteça e nós dois tenhamos que viver em pé de guerra como
vários pais separados.
André afasta a mão do meu corpo e me olha sério.
— Acho que você não me entendeu… eu não quero você
apenas para continuarmos transando, Alana! Eu quero você para ser
minha!
Isso é tão homem das cavernas, contudo, sinto como se a
minha boceta tivesse virado um pisca-pisca de Natal.
— Você enlouqueceu! — respondo.
— Sim, enlouqueci! — rebate. — Enlouqueci quando achei
que era uma boa ideia ficar com uma mulher 20 anos mais nova que
eu, enlouqueci quando continuei ficando com ela depois de descobrir
que havia a engravidado, enlouqueci muito quando meus
pensamentos me levavam até essa loira atrevida, com a boca
gostosa e a língua afiada. — Ele se aproxima novamente. —
Enlouqueci quando permiti que essa mulher visse tudo o que eu
escondo atrás dos muros que ergui com tanto cuidado… enlouqueci
quando me dei conta que estava apaixonado pela filha da minha
melhor amiga.
Merda, eu não estava esperando por isso.
Apaixonado?
Ai, meu Deus.
Eu estou hiperventilando.
André sorri todo charmoso e coloca uma mão em meu rosto.
— Eu te falei que não sabia ser pouco intenso, amor! E eu só
quero que você me deixe fazer parte da sua vida por completo, que
me deixe fazer comida para você nas noites que estiver cansada,
que me deixe esquentar a água da banheira e te fazer uma
massagem no pé… quero poder te beijar na frente de todo mundo,
andar de mãos dadas e assumir que eu sou o pai do seu bebê.
Isso é intenso.
E meu coração parece querer rasgar o meu peito de tão
agitado que está.
Só percebo que estou sorrindo feito boba porque minhas
bochechas começam a doer.
— Você está me pedindo em namoro, André Nolasco?
Ele sorri e concorda.
— Me sinto velho para isso, mas, sim. Eu quero que você seja
a minha namorada, amor.
Por que é tão gostoso ouvi-lo me chamar de amor?
E por que parece ter várias vozes na minha cabeça gritando a
palavra sim incontáveis vezes?
Como eu saí do discurso de “vou ser só amiga para apoiá-lo
na sua jornada em ser pai” para “meu Deus, eu quero que esse
homem me chame de minha mais vezes”.
— Eu aceito se você prometer que não vai querer pular
nenhuma etapa. Vamos namorar bonitinho, cada um em sua casa,
sem ficar se afobando e nem muito menos me invente de fazer igual
a esses filmes que o cara é mais velho e quer casar logo.
Ele ri alto e me puxa pela cintura, colando nossos corpos.
— Eu prometo que vou tentar, pode ser assim?
— Isso já serve.
André sorri, me olha fundo nos olhos e depois cola a sua boca
na minha.
Que saudade que eu estava de beijá-lo, parecia que já fazia
anos desde a última vez.
André me beija com carinho, alisando a minha cintura e me
mantendo colada nele.
— Nós precisamos fazer uma coisa — ele sussurra com a
boca colada na minha e eu só murmuro um “o quê?”. — Contar para
a sua mãe.
Puta que pariu.
É hoje que eu mato ela de vez.
36
Ela ri.
Mesmo morto é isso que ele merece, que saibam o lixo de ser
humano que ele era.
É o Eduardo.
Decidi que não queria ter mais nenhum envolvimento com ele,
e entendi depois de ter contado para a psicóloga o que eu estava
planejando, que fazer isso só alimentaria mais ainda o peso dele na
minha vida.
— Oi, Bi…
Hoje?
Não!
— Arrasada! — diz com a voz chorosa. — Não era para ele ter
nascido agora, André. Ele é tão pequeno e frágil, não tem nem 2
quilos.
— Vai dar tudo certo e nós estaremos aqui todos os dias que
ele também estiver!
◆◆◆
2 semanas depois.
Agora mesmo ela está lá tirando o leite pela última vez antes
de irmos embora.
Alana sempre chora, eu tento ser forte por nós dois, mas não
poder levá-lo para casa é terrível.
— Está bem.
Nenhum dos dois sai do lugar e Alana fica olhando para ele,
sem desviar o olhar.
— Pedro Henrique!
— Hã?
E é perfeito.
— Eu amei!
— Eu também. — O sorriso dela é enorme, lindo. — E você,
meu bem? Gostou?
4 meses depois.
Ele é um amor.
Ele fez de tudo para que eu não largasse a pós, então toda
terça e quarta nós três vamos para Niterói, ele vai todo equipado
com tudo que o Pedrinho possa precisar e fica pelos corredores da
faculdade com ele no colo ou no carrinho.
No primeiro mês foi muito difícil, porque não tinha como levá-
lo, mas eu tenho uma rede de apoio incrível.
Enquanto eu ia para lá sozinha, a contragosto do André,
sempre ficava mais alguém com eles, porque sabiam que ele ainda
não conseguia pegar o filho. Bia, Gabriela, Luciana e minha mãe se
dividiram para nos ajudar.
Descobri que André morre de ciúmes dele, mas acho que não
tem necessidade.
Houve um tempo que eu até achei que ele tinha interesse por
mim, mas como ele nunca falou nada e nem jogou alguma piada ou
flertou comigo, deduzi que é só o seu jeito muito simpático mesmo.
André tem um fogo sem fim, e eu amo isso nele, porque sou
do mesmo jeito.
Foi uma tortura ter esse homem do meu lado todo dia e não
poder tê-lo dentro de mim, mas claro que fizemos uma coisinha ou
outra, o que no final deixava ainda mais difícil de manter o
resguardo.
— Eu te ajudo.
Ele vai escorregando uma das suas mãos até o meio das
minhas pernas e as afasta um pouco, querendo ter espaço para
separar os meus lábios e roçar os seus dedos entre eles, me
fazendo perder o controle da minha respiração.
— Você vai gozar no meu pau, junto comigo — ele diz quando
se afasta e fica de pé, novamente me virando só que dessa vez de
costas para ele.
— Sou tão sortudo que até o meu filho me ajuda para que eu
consiga ter um tempinho com a gostosa da mamãe dele!
FIM.
3 anos depois.
Hoje é um dia muito especial.
A inauguração da minha clínica odontológica.
Depois que consegui concluir a minha pós-graduação em
bucomaxilofacial, acabei me interessando muito mais por essa área
do que eu imaginei que seria. André me incentivou a ir em palestras,
seminários e eu acabei fazendo ótimos contatos, tive cursos
superexclusivos com dentistas incríveis especializados e acabei me
tornando referência na clínica do Danilo, que está junto comigo como
meu sócio.
Eu nunca poderia deixá-lo depois de tudo o que ele fez por
mim, de tanta ajuda e apoio que me deu, ainda mais depois que o
Pedrinho nasceu.
Danilo é um anjo em minha vida, e hoje também se tornou um
grande amigo do André.
Me despeço da maquiadora que veio aqui em casa me
arrumar e volto lá para dentro para conferir como os meninos estão.
Deixei a função de arrumar o Pedro com o André, mas os dois
sempre acabam brincando mais naquele banheiro do que de fato
tomando banho, é sempre um caos.
Mas graças a Deus eu entro no nosso quarto e vejo que meu
filho já está arrumado, com o cabelinho penteado e meu marido está
terminando de passar um perfume nele.
— Olha, mamãe! Estou igual ao papai. — Mostra a camisa de
botão, que é bem parecida com a que o André está vestindo.
Vou até os dois, dou um beijo gostoso, um cheiro no meu filho
e depois um selinho no André.
— Vocês dois estão lindos! — digo e o Pedrinho fica todo
bobo com o elogio, fazendo algumas gracinhas.
— Você é sempre a mulher mais linda de todos os lugares,
mas hoje você conseguiu elevar ainda mais a sua beleza… não tem
pena das meras mortais, meu amor?
Eu rio ao ouvi-lo, sempre muito galanteador.
— Eu te conheço, André… sei o que você quer quando fala
assim!
Ele ergue as duas sobrancelhas ao mesmo tempo e aperta a
minha bunda quando vê que o nosso filho está distraído com outra
coisa.
— Mas eu não falei nenhuma mentira, amor… — Ele beija o
meu pescoço e eu preciso empurrá-lo, antes que a gente invente de
dar uma rapidinha, achando que não vai demorar, que ficaremos
inteiros e no final tudo vira um caos.
André pisca para mim e chama o Pedro para colocar o tênis
nele.
Enquanto isso, vou até o outro quarto, da Ana Clara, e aliso a
minha barriga que já está enorme, chegando no oitavo mês.
Estou tão ansiosa pela chegada dela, porque não me
imaginava sendo mãe de mais um. Pedro vale por 30 crianças.
Ele é incrível, uma criança carinhosa e muito educada, mas
tem uma energia que não acaba e sempre aprende coisas que não
deveria aprender tão cedo.
E para piorar, ele é muito fofoqueiro, sempre escuta o que
estamos falando e depois fica repetindo, então temos que ter um
cuidado redobrado com tudo que falamos perto desse garotinho que
tem 3 aninhos, mas parece ter mais, de tão inteligente que é.
Eu amo muito o meu filho, porém, os meus cabelos já estão
ficando brancos e eu sei que 90% da culpa é dele.
— Por favor, filha, seja tranquila! Sua mãe não vai aguentar
dois assim, meu coração vai parar antes que vocês cheguem na
adolescência ao mesmo tempo.
Ela se agita na barriga, e eu tenho quase certeza que isso foi
ela rindo, vendo que eu estou muito ferrada e que será duas vezes
mais agitada que o irmão.
E é só pensar nisso que ele passa correndo pelo meu lado,
gritando uma palavra que eu nunca ouvi na vida e que tenho até
medo de tentar entender o que de fato ele está falando.
André sai do nosso quarto rindo e logo em seguida corre atrás
do filho, repetindo a mesma palavra esquisita.
E eu só consigo rir, porque no final das contas, sou muito
grata pela família que eu tenho.
André foi algo proibido que deu muito certo, muito mesmo.
Não me arrependo de absolutamente nada que vivi com ele,
se eu tivesse a chance de voltar no Carnaval de 2023 e fazer
diferente, eu não faria, porque não valeria a pena ter uma vida que
não seja exatamente como a minha é hoje.
Nós três conseguimos finalmente sair de casa e como a minha
barriga está muito grande e eu não consigo mais pegar o Pedro no
colo, o que em muitos momentos gera um ciúmes no meu filho,
André o coloca na cadeirinha e eu só espero para dar um beijinho
nele, que é um ritual nosso.
Depois de conferirmos se pegamos tudo, André dá partida e
nós vamos em direção a minha clínica, que provavelmente já deve
estar com todos os convidados nos esperando.
Ver onde eu cheguei me causa uma nostalgia gostosa.
Se alguém me falasse que eu iria conseguir me livrar de todas
as minhas dívidas, que na verdade quem pagou a pequena fortuna
do FIES e o financiamento do carro foi o André, como presente de
primeiro ano de namoro, e que agora eu estaria abrindo a minha
clínica, com o dinheiro suado do meu trabalho, eu não iria acreditar.
André queria investir nela, mas ele já faz muito por mim, em
todos os sentidos, inclusive financeiro, então eu me esforcei muito
para conseguir fazer isso sozinha.
— Você é merecedora disso tudo, amor — ele comenta, como
se fosse capaz de ler a minha mente. — Sou muito orgulhoso de ter
insistido em casar com você e depois de um ano de humilhação,
você ter me pedido em casamento e ter me tornado o seu marido.
Eu rio ao ouvi-lo.
— Eu também te amo, meu amor.
Ele beija a minha mão e depois a coloca em sua coxa,
mantendo a sua por cima da minha e fazendo um carinho gostoso
nela.
Alguns minutos depois, nós chegamos na frente da clínica e
estacionamos na vaga que é reservada para mim.
Sinto uma ansiedade muito grande crescer em meu peito
quando vejo todos lá dentro, mas saio com calma e vou até o banco
de trás para soltar o Pedro da cadeirinha.
— Mamãe, eu sou pilanha?
Sinto o meu coração sair do peito, rolar no chão e depois
voltar para dentro de mim como se fosse um ioiô.
— Meu filho, de onde você tirou isso?
André está do outro lado do carro, agachado e prendendo o
riso ao ouvir o que o filho acabou de me perguntar.
— Eu ouvi a titia Bibi falando que… mamãe! Ela falou que ser
pilanha é legal — me explica enquanto eu seguro nas suas
mãozinhas para pular do carro. — Eu quelo ser pilanha, mãe! Deixa?
Deus, nessas horas me dá muita sabedoria e calma para
conseguir lidar com essas furadas que o Pedro Henrique me coloca.
Me abaixo para falar com ele, sem me importar que as minhas
costas vão doer.
— Meu amor, isso é coisa de adulto e você não pode repetir,
tá bom? — Ele faz que sim com a cabeça e eu estranho porque foi
fácil demais. — Promete para mamãe que não vai mais repetir essa
palavra?
— Tá bom, mamãe! — Ele me abraça pelo pescoço e eu não
confio nem um pouquinho nessa cena.
Esse garoto é uma figura e fingido que só ele.
André vem até a gente, com o rosto vermelho de tanto ter
prendido a risada e dou um beliscão nele por ter me deixado nessa
sozinha, mas ele sussurra um “desculpa, mas eu não ia aguentar” e
eu acabo rindo.
Pedro vai acabar comigo qualquer dia, eu tenho certeza disso.
Assim que nós entramos na clínica, todo mundo começa a
bater palmas, até o Pedrinho e eu percebo que foi combinado por
eles. E não consigo segurar as lágrimas, porque são tantos rostos
carinhosos e orgulhosos olhando para mim que é impossível não me
sentir especial.
E assim que todos param, o meu filho acaba com o clima e sai
correndo até a Gabriela e berrando uma nova informação.
— Dindinha, eu sou pilanha!
Todo mundo fica dividido entre o choque e a vontade de rir.
Sinto o meu rosto esquentar tanto, que parece que minha
cabeça vai explodir.
Minha mãe se aproxima de mim, me dá um abraço e depois
sussurra:
— É, meu amor… ser mãe é isso aí, padecer no paraíso —
debocha e solta mais uma risada. — Os filhos são ótimos, fazem as
coisas debaixo do nosso nariz e a gente nem sempre consegue ter o
controle! Né, André? — Desvia o olhar para o seu amigo, e eu
entendo na hora o que ela acabou de fazer.
Quando minha mãe descobriu sobre nós dois, ela falou essa
frase para mim e disse para eu me preparar.
A verdade é que eu acho que não me preparei o suficiente.
Falo com os demais convidados, brindo com o meu suco,
comemoro com todos e depois vou até o mezanino do segundo
andar para sentar em uma das cadeiras de espera e tentar relaxar os
meus pés que estão me matando.
E aqui de cima eu vejo como sou sortuda em ter todas essas
pessoas comigo.
Rennan e Beatriz, que também são os padrinhos do Pedro,
tomaram rumos que nunca pensamos que tomariam.
Rennan casou, está apaixonado e a sua esposa é incrível, eu
a adoro demais, se tornou uma das minhas amigas mais próximas. E
a Beatriz não só casou, como divorciou e agora está noiva
novamente, mas eu tenho as minhas dúvidas sobre esse
relacionamento, eu sinto que ela ainda gosta do ex-marido, que
também está aqui, porque acabou se tornando alguém da família e
os dois mantêm um bom relacionamento, não tendo problemas em
estarem no mesmo ambiente.
Ao lado deles, vejo o Guto, que segue solteiro depois de ter se
apaixonado por uma mulher misteriosa que nós nunca conhecemos
pessoalmente, mas que fez um estrago no coração dele.
Ele é ótimo com o Pedro, parecem duas crianças quando se
juntam.
André chega onde estou e se senta ao meu lado.
— Está feliz, meu amor? — pergunta.
— Muito, amor. — Seguro a mão dele, entrelaçando os
nossos dedos. — Obrigada por me apoiar em absolutamente tudo.
Ele sorri e faz um carinho em meu rosto antes de me dar um
beijo casto nos lábios.
— Eu que deveria te dizer obrigado todo dia… você me
salvou, meu amor! Eu estava me afundando nas sombras do
passado sem nem perceber, e você trouxe a sua luz linda com direito
a uma outra pequena luz crescendo dentro da sua barriga, que agora
parece se esforçar para nos fazer passar vergonha. — Eu rio ao
ouvi-lo. — Por isso, eu quem agradeço, meu amor… eu te amo em
uma proporção inexplicável, que até me assusta.
— Nós formamos um belo time, né? — pergunto e ele
concorda. — Eu amo você e a nossa família… porém, eu ficaria
muito feliz se fizesse uma vasectomia!
Ele ri, porque ele está fugindo desse assunto desde a primeira
vez que eu pedi.
— Amor… mas só temos dois!
— André, no momento em que você se transformar em um
cavalo-marinho e conseguir carregar o bebê até nascer, eu topo ter
dez. Mas enquanto eu tiver que ficar buchuda, com dor nas costas e
não cabendo em nenhuma roupa, a fábrica ficará fechada.
Ele beija o meu rosto, o meu ombro e depois me dá um
selinho.
— E se adotarmos mais um casal?
— Você vai se aposentar para cuidar dessas crianças?
Porque se sim, podemos ir em um orfanato amanhã ver toda a
papelada.
André levanta e me puxa para ficar de pé.
— Fechou, então, meu amor.
Ele me beija e desce, falando que estará me esperando lá
embaixo com os demais convidados.
Eu nunca sei quando esse homem está falando sério ou
tirando uma com a minha cara, contudo, eu não me surpreenderia se
na segunda de manhã ele acordasse me chamando para irmos a um
orfanato.
E pior que a ideia de adotarmos é muito boa…
— Você é pilanha também? — Escuto o Pedro perguntando a
alguém e desço na mesma hora, já desistindo da ideia de outros dois
filhos.
Ele está nas costas do Marcus, que tenta distraí-lo para
esquecer essa ideia doida.
Minha amiga fica ao lado do marido, rindo dos dois brincando
e também fazendo carinho na barriga dela, que está bem menor do
que a minha.
A vida foi boa e generosa com todos nós, cada um aqui
mudou e evoluiu de algum jeito.
Até a minha mãe está noiva do misterioso cara que conheceu
no Tinder e que ela demorou quase um ano para me apresentar.
Rogério é ótimo com ela, comigo e com o meu filho.
É um avô do jeitinho que eu sonhei que o meu pai seria.
E saber que minha mãe tem alguém com ela todos os dias
desde que saí da nossa casa, me conforta.
Eu definitivamente sou uma mulher de sorte e feliz, muito feliz.
Finalizamos mais uma história juntos! E eu espero que a
experiência tenha sido ao menos divertida. Já vou pedir que não
esqueça de avaliar na Amazon e no Skoob, isso me ajuda muito e
faz com que os meus livros cheguem em mais pessoas!