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Copyright © 2023 Fran Nanii

Capa: Dennis Romoaldo


Diagramação: Fran Nanii
Revisão: Lucelia Martins

Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com nomes, datas ou


acontecimentos reais é mera coincidência.

Todos os direitos reservados.

É proibido armazenamento e/ou reprodução total ou parcial desta obra


através de quaisquer meios sem a autorização da autora.

A violação autoral é crime, previsto na lei nº 9.610/98, com aplicação legal


pelo artigo 184 do Código Penal.
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Epílogo
Raul Aguilar é um pai solo que vive em função do seu filho em uma
casa de luxo afastada da cidade. Amargo e controlador, ele pensa ter tudo
em suas mãos até que alguém se muda para a casa ao lado, que estava vazia
desde antes dele se mudar e que a qual ele também comprou.

Sofie Wiebke ganha uma chance de recomeçar sua vida, está animada
e otimista, mas isso começa a desmoronar quando um desconhecido
arrogante alega ter comprado a casa que ela recebeu de herança dos avós.

Entre traumas do passado, destemperos e palavras incendiárias, eles


irão se enfrentar como fogo ardente, mas o destino - e uma criança muito
fofa em busca de uma mãe - tem planos muito diferentes para eles.

Resta saber se eles vão se permitir viver um amor avassalador em


meio a tanto caos de emoções.
Prólogo

É engraçado como lutamos bravamente para conseguir o tão sonhado


amor e em questão de segundos, ou uma palavra mal dita pode esmorecer
tudo o que você construiu.

Há alguns anos eu vivia desorientado e consumido pela culpa por ter


sido o responsável pelo meu melhor amigo ter perdido o amor da vida dele.
Mas a vida é engraçada, nos levou até o outro lado do mundo e foi lá que
reencontramos a moça a quem eu havia proporcionado uma grande
humilhação, foi então que tomei coragem e fiz tudo para me redimir.

Qual foi o resultado da minha redenção?

Meu amigo vive feliz com a amada esposa e filhos, e eu também


encontrei o amor. Achei alguém especial que trouxe luz para a minha vida
depois da grande tempestade: Magda.

Conheci Magda no Pub de Macarena, a esposa de Pedro, meu melhor


amigo, na mesma noite em que reencontramos a Macarena.

A história de Pedro e Macarena é muito conturbada, dolorosa, e como


eu havia ficado entre eles tanto no início quanto depois de se acertarem em
uma situação que devia ajuda a Maca, acabei entrando em um looping
infinito de escuridão por ter que tomar uma decisão difícil, mas Magda me
tirou de lá, mostrando-me como a vida podia ser bela.

Então eu não podia estar mais feliz, me casei com a mulher da minha
vida e ela me deu um lindo filho.

Minha vida estava completa e perfeita.


Era meio da tarde e eu estava em um canteiro de obras com Pedro,
meu sócio e melhor amigo, quando meu celular sinalizou uma mensagem.

“Venha para casa agora”

Estranhei a mensagem àquela hora do dia, Magda nunca me pedira


um dia sequer para deixar o trabalho.

— Algum problema? — perguntou Pedro ao me ver conferir o


celular com o cenho franzido.

— Magda quer que eu vá para casa — respondi.

— Bem, preciso de você aqui, mas vá. Só não se esqueça de vir


jantar essa noite. Macarena está animada por podermos nos reunir, esses
dias que ela ficou no Brasil foram um pouco tensos para ela, então vamos
comer uma boa comida e jogar conversa fora.

— Estaremos lá — respondi, tocando em seu ombro e segui para


fora da obra já apertando o botão de discar para Magda. Ela atendeu no
primeiro toque. — Querida, estou indo. O que houve?

— Venha agora, Raul — respondeu chorando.

— Estou indo, meu bem! Se acalme, o que aconteceu? Estou


ficando preocupado.

— Só venha — respondeu e encerrou a ligação em seguida.

Minha cabeça fervilhava com as possibilidades e me deixava


nervoso. Cheguei em casa em tempo recorde e entrei correndo pela porta da
sala.

Magda andava de um lado para o outro entre o sofá e a estante de


livros, concentrei minha atenção nela, mas as malas no canto da sala não me
passaram despercebidas.

— O que houve, querida? Você me deixou louco de preocupação.


Onde está o Davi? — eu quis saber.

— Eu não posso, Raul! Não posso mais — disse ela, chorando.

— Não pode o quê? Do que você está falando, querida?

— Eu não posso ter uma criança agora, Raul. Isso é um castigo de


Deus pra você, por causa de tudo o que você fez. Aquele menino é para
você pagar todos os seus pecados e eu não vou arcar com isso.

— Que merda você tá falando, Magda? Você está se ouvindo? Onde


está o Davi?

— Está na cozinha com aquele maldito chocalho. Tenho uma vida


toda pela frente, ele só vai me atrasar, não posso abandonar os meus sonhos.

— Magda se acalma! Não vou levar em consideração o que você


disse, você só está nervosa. Tudo é novo para nós dois, não é só para você,
vamos nos adaptar — falei, tentando manter a calma.

— Eu não quero me adaptar àquele menino. Não quero uma criança


que vai me dar trabalho por anos e me fazer abandonar o futuro que eu
havia programado para mim.

— Magda, o seu filho está bem ali ouvindo toda essa merda que
você está dizendo. Cale a porra da sua boca, você vai magoá-lo.

— Magoá-lo? — perguntou, rindo. — Ele veio de intrometido em


nossas vidas.
— Eu só posso estar tendo um pesadelo, ele é fruto do nosso amor,
Magda — falei, seguindo para a cozinha.

— Então você precisa escolher, Raul — disse ela e eu parei de andar


bem quando estava entre a sala e a cozinha.

— Escolher? — perguntei, me virando para Magda de novo.

— Vamos dar esse garoto para a adoção, tenho certeza que as freiras
cuidarão dele com carinho.

Por um momento fiquei sem reação, não podia acreditar no que


estava ouvindo. O barulho do chocalho que Davi brincava me trouxe de
volta a realidade e olhei para ele, sentadinho em um tapete, brincando,
parecendo alheio a tudo que estava acontecendo.

— A outra opção? — perguntei.

— Vou embora daqui e te deixarei sozinho com esse fardo. Nunca


mais você me verá.

— Pegue suas coisas e saia daqui agora — respondi já dando as


costas a ela.

— Vai perder a mulher da sua vida, a mulher que você ama por
causa de uma criança indesejada? — gritou indignada.

— Meça as suas palavras para falar do meu filho. E se você não o


ama, só o que eu tenho a dizer é: desapareça das nossas vidas. Estaremos
muito melhor sem você.

Dei-lhe as costas outra vez e entrei na cozinha. Meus olhos ardiam


com as lágrimas que queriam cair, cheguei perto de Davi, observando-o, ele
bateu o chocalho no chão, fazendo um barulho mais alto e se assustou,
então voltou a chacoalhar o brinquedo.
Passei as mãos pelos cabelos, em seguida sequei os olhos, alisei a
barba e sentei-me de frente para o Davi. Ouvi o carro de Magda sair
cantando pneu, deixando claro seu descontentamento com a minha escolha,
mas ignorei. Observei meu filho por mais alguns segundos e tentei pegar
em sua mãozinha, mas ele rejeitou meu toque, mantendo sua atenção no
objeto que tinha nas mãos.

— Eu te amo, meu reizinho e só o que importa e sempre vai


importar é você — falei, engolindo o nó que se instalou em minha garganta,
e Davi me ofereceu um sorriso perfeito e banguela com apenas alguns
dentinhos. Senti as lágrimas brotarem em meus olhos outra vez e minha voz
embargou com força, quase não saindo. — Vamos fazer de tudo para que
você seja um grande garoto... — sequei as lágrimas com as costas da mão e
tentei engolir o choro — e irei me adaptar a você... — minha voz falhou e a
dor no peito era dilacerante, não por mim, por ele... por não ter uma mãe
digna dele de verdade — da forma como você quiser e permitir, carinha.
Juntos vamos comemorar todas as suas vitórias. E eu sei que você terá
muitas.

— Mama — balbuciou Davi, olhando na direção da sala, onde


pensava que sua mãe estava.

Se existia algum pedaço do meu coração inteiro, naquele momento


foi pulverizado, pois para a minha total surpresa, meu filho chamou pela
mãe que havia acabado de abandoná-lo, e o pior? Aquela era a primeira
palavra que ele dizia.
Capítulo 1
5 anos depois

— Davi, vamos tomar café da manhã — chamei, pegando em sua


mãozinha e o levando até a cozinha.

— Papai pode ser melancia? — perguntou, com os olhinhos


brilhantes em mim.

— Sim, melancia e outras frutas, do jeito que você gosta.

Acomodei Davi à mesa e entreguei-lhe a colher para que comesse.


Coloquei o copo de leite com achocolatado à sua direita, como ele gostava.
Davi tinha passado uma noite agitada com pesadelos, e a buzina de um
caminhão soou alta, assustando-o, fazendo-o dar um pulo na cadeira.

— Ai que susto, papai!

— Calma aí, carinha! O papai está aqui, fica calmo — falei,


tentando acalmá-lo, mas já era tarde demais, ele estava de mau-humor e
agitado.

Davi começou a resmungar de maneira incessante, dando passos,


agitado e nervoso. Corri para a janela, tentando entender como poderia ter
uma buzina de caminhão ali, já que eu morava em uma propriedade
afastada da cidade e havia apenas mais uma residência ali e, por sorte,
consegui encontrar o proprietário e adquiri a propriedade também, eu tinha
grandes planos para o enorme terreno.

Meus olhos quase saltaram das órbitas quando avistei um caminhão


de mudança estacionando em frente à casa ao lado.
Em frente a minha outra casa.

Mas que merda estava acontecendo?

Davi andava de um lado para o outro, agitado, tampando os ouvidos


e chorando, e o maldito caminhão não parava de buzinar. Corri até a sala e
peguei os grandes fones de ouvido sem fio que estavam no aparador do
painel da televisão, conectei ao aparelho e liberei o player do filme,
correndo de volta para Davi.

— Davi, vamos colocar os fones — falei, mas ele me ignorou.

Tentei colocar os fones nele, mas sua mãozinha rápida empurrou as


minhas com nervosismo.

— Vanellope, Davi — falei e finalmente consegui sua atenção.

O choro cessou e sua cabecinha virou rápido em minha direção.


Repeti o nome da personagem do filme que ele gostava e assim ele me
deixou colocar os fones, se acalmando assim que ouviu a voz da garotinha
sapeca do desenho animado. Peguei sua mãozinha e o levei para a frente da
televisão. Não gostava de deixá-lo muito tempo na frente do aparelho, mas
às vezes era necessário.

Davi sentou-se e prestou atenção como sempre fazia quando estava


empolgado com algo que assistia, especialmente se fosse o filme Detona
Ralph e eu sorri. Quando tive certeza que ele havia se acalmado do barulho
do caminhão e se entretido com a televisão, saí da minha casa, encostando a
porta.

— Ei? O que pensa que está fazendo? — perguntei ao motorista do


caminhão.

— Tentando fazer meu trabalho, senhor, mas parece que a dona da


casa não está aí — respondeu ele, saindo do veículo.
— A dona da casa? Eu sou o dono dessa casa — informei.

— Ótimo! Então vamos descarregar rapidinho, porque temos outro


trabalho para fazer.

— Nada disso! Não solicitei mudança nenhuma, está havendo


algum engano — falei rispidamente.

O homem enrugou a testa em uma expressão confusa e se virou para


os colegas que estavam dentro do caminhão.

— Vocês erraram o endereço? — perguntou.

— Não. Estrada 101, lote 08. É aqui mesmo — confirmou o outro.

— Impossível, eu sou o dono dessa casa — falei.

— Senhor, se bem vi, você saiu daquela casa ali, não desta. Por
favor, onde está a moça que nos contratou?

— Não sei de que moça está falando... — eu dizia, mas fui


interrompido.

— Ah, essa deve ser eu — soou uma voz doce e fina. Irritante. —
Desculpem o atraso — disse ela ao motorista.

— Sem problemas, moça! Vamos descarregar.

— Hã hã, nada de descarregar. Você por acaso está ficando louca?


— perguntei a moça.

— Desculpe, senhor, não estou entendendo — disse ela, confusa.

— Olha, moça, não quero ser grosseiro, mas não pode descarregar
suas coisas na minha casa — falei.
— Sua casa? — Ela olhou para ambas as minhas propriedades,
alternando o olhar entre uma e outra. — O senhor mora ali? — perguntou,
apontando para a casa em que eu morava com Davi.

— Sim.

Ela me olhou como se eu fosse algum maluco.

— Era só o que me faltava: um vizinho lunático — sussurrou para si


mesma, mas eu a ouvi.

— Como é que é? — perguntei.

— Ah, me desculpe, não é nada, mas deixe eu lhe explicar uma


coisa — pediu e caminhou até a cerca viva baixa, que tinha algumas falhas,
e que dividia o terreno das propriedades. — Está vendo essa cerca? —
perguntou e estreitei os olhos em sua direção. — Então, do lado de lá —
apontou para o meu gramado — não posso descarregar nada porque é sua
casa. Do lado de cá — apontou para o gramado do outro lado da cerca —
posso descarregar o que eu quiser porque é o meu gramado. Entendeu?

Ah, uma cínica! Sorri para ela de forma sombria, o que a fez se
encolher um pouco.

— Acho que você não entendeu, esse gramado — apontei para o


gramado da casa em que eu morava — é meu. E essa porra de gramado —
apontei para o outro lado da cerca — é meu também — falei e ela riu. —
Qual é a graça, menina?

— Você só pode estar ficando louco!

— Estou bem lúcido, agora pegue suas tralhas e se manda daqui


antes que eu perca a paciência — falei e ela arqueou uma sobrancelha em
desafio para mim.
— Essa porra de gramado, como você mesmo disse, é dos meus
avós desde 1970.

— Pode ter sido deles, mas comprei essa casa faz mais de um ano.
Sinto muito se seus avós não te contaram.

— O quê? — perguntou, confusa, a voz ficando ainda mais fina e


irritante.

— EU COM-PRE-I, entendeu? — falei, devagar.

— Idiota, não me trate como se eu fosse uma imbecil. Eu entendi o


que você disse, mas está mentindo, isso não tem como ser verdade, acabei
de receber o documento legal que me garante a posse do imóvel. Está no
meu nome.

— O meu imóvel está no seu nome? Deve estar mesmo ficando


louca!

— Não estou louca! — disse ela, tirando alguns papéis da bolsa. —


Veja!

Peguei os documentos de suas mãos e os li com atenção, segundo


aqueles papéis ela tinha razão, mas então...

— Deve estar havendo algum engano. Não pode ser — falei e


encarei o rosto vermelho da garota. — É falso! — acusei.

— Vá a merda, seu idiota! — disse ela e me deu as costas,


caminhando até os caras do caminhão que nos observavam com
curiosidade. — Descarreguem!

— Não! — falei, seguindo-a e peguei em seu braço, tentando ser o


menos indelicado possível. — Deve estar havendo algum engano, essa casa
é minha.
— Sai pra lá, Tiozão — disse ela, se livrando da minha mão.

As cabeças dos caras da mudança se voltaram para mim.

— Do que você me chamou? — perguntei, chocado.

Ela me chamou de Tiozão?

Os caras se voltaram para ela como se aguardassem a réplica que ela


me daria.

— Tiozão! Está com problema de audição? Deve ser problema pela


idade avançada.

Meus olhos estavam nos dela, mas pela visão periférica vi os caras
se virando na minha direção.

— Quantos anos você tem, menina? Doze?

O rosto dela ficou ainda mais vermelho.

— Vinte e um, eu tenho vinte e um anos, mas você nem deve se


lembrar mais de como é ter essa idade, então deixa pra lá. Olha só, eu tenho
um montão de coisas para organizar, então vai assistir a Wetten, das...?[1] ou
sei lá o quê, e me deixa em paz — disse a desaforada e me deu as costas,
dando ordens aos caras da mudança que a obedeceram de pronto.

Abismado com a audácia dela, dirigi meu olhar para a minha casa e
vi só o topo da cabeça de Davi passando pela janela da cozinha, alguma
coisa tinha acontecido e eu não poderia deixá-lo mais tempo sozinho.

— Virei com um oficial de justiça e jogarei suas coisas na rua,


garota abusada — falei e corri para casa enquanto ela me ignorava.

Ah, eu queria ver a cara dela quando o oficial fosse até ela e pedisse
para sair da minha propriedade.
Capítulo 2

Era só o que me faltava!

Um vizinho babaca!

Eu estava me mudando para a antiga casa dos meus avós justamente


por ser afastada da cidade, um lugar de paz onde eu poderia ficar tranquila e
escrever com o sossego que necessitava. Eu era escritora de romances e
estava com bloqueio criativo, não escrevia nada que prestava já fazia quase
três meses e as provas da faculdade não estavam colaborando comigo,
ocuparam minha mente quase que cem por cento nas últimas semanas, mas
graças a Deus as férias de verão haviam começado e eu enfim teria tempo
de me sentar e lutar contra o maldito bloqueio criativo.

Tudo o que eu não precisava era um vizinho chato que iria me


encher o saco, eu precisava de sossego para conseguir terminar de escrever
aquela história. Assim que todos os móveis estavam no lugar e as inúmeras
caixas estavam espalhadas pela casa, comecei a desempacotar tudo, mas
não sem antes colocar a cafeteira para funcionar.

A primeira caixa que abri em meu quarto tinha por cima de todos os
itens guardados nela, um porta-retratos com uma foto minha com a minha
sobrinha, Pietra. Sorri ao tocar o vidro do porta-retratos, já estava com
saudades daquela pestinha.

Coloquei a foto na mesa de cabeceira do lado esquerdo da minha


cama. Em breve teria que ligar para ela. Peguei meus quadros com as capas
de todos os livros que eu já havia escrito e os empilhei em cima da outra
cômoda, ainda precisaria furar a parede para pendurá-los, então guardei
mais alguns pertences e ouvi a cafeteira apitar, sinalizando que o café havia
ficado pronto.
Segui para a cozinha e peguei meu café, a xícara quente em minhas
mãos enquanto a fumaça espiralava no ar, levando o perfume do café até
mim, me oferecia a sensação de estar em casa. Fiquei de frente para a janela
e observei a montanha, ignorando a casa vizinha que tampava parcialmente
a visão do belo e majestoso monte coberto por árvores de diversas espécies,
então fechei os olhos por um momento, imaginando que Carly, a
protagonista da minha nova história, poderia ir para uma montanha, tirar
férias, e Levi, o protagonista, poderia ir atrás dela e eu enfim colocaria a
primeira cena hot da história.

Sorri, as ideias já começavam a fluir, passar aquele tempo ali ia me


fazer bem. Abri os olhos com calma, mas os mantive na xícara, vendo as
espirais que se formavam no ar pela alta temperatura, então tomei um gole.
Quando levantei meu olhar para a janela de novo, na intenção de observar
por mais tempo a bela montanha, meus olhos foram atraídos para uma das
janelas da casa vizinha.

E lá estava ele!

Meu vizinho maluco mantinha o telefone no ouvido, parecia


exaltado, agitando as mãos no ar e mantinha os olhos em mim também.
Senti minhas sobrancelhas se juntarem, ele realmente era estranho,
inventando essa história de ter comprado a casa dos meus avós. Eu podia
ver como ele me encarava com raiva, estava mesmo muito bravo, com
certeza era recluso e chato, por isso arrumou aquela confusão toda.

O cara desligou o telefone, deixando os braços caírem, ainda com os


olhos nos meus começou a balançar a cabeça de um lado para o outro, bem
devagar. Sem querer esbocei uma careta estranha e o vi fechar todas as
cortinas que poderiam me dar visão do interior de sua casa.

Eu hein, que cara estranho!


No outro dia, acordei cedo e saí para o meu gramado à procura de
um bom lugar para colocar minha mobília de jardim, afinal era nesse
cantinho especial que eu passaria a maior parte dos meus dias, enquanto
escrevia.

O imenso Carvalho ainda estava lá, enorme, majestoso, oferecendo


uma grande sombra perto do canteiro de Hortênsias. Era o lugar perfeito!

Carreguei com um pouco de dificuldade as poltronas, colocando-as


em lugares estratégicos, então precisava levar a mesa, mas droga... ela era
muito pesada para ser carregada por mim sozinha. Tentei puxá-la, empurrá-
la, mas nada a fez se mover do local onde os caras da mudança haviam
deixado-a, em frente a minha porta da cozinha.

Eu já estava suada e ofegante de tanto fazer esforço para movê-la


quando ouvi o barulho de um cortador de gramas sendo ligado, atraindo
imediatamente a minha atenção. Meu vizinho estranho estava lá, iniciando
o corte do seu gramado, vestindo uma calça de moletom e camiseta.
Respirei fundo e engoli o meu orgulho, caminhando até a cerca em seguida,
perto de onde ele estava com o cortador.

— Oi, bom dia, vizinho! — cumprimentei com um ensaio de


sorriso, mas ele me ignorou. — Oi? — tentei de novo e outra vez fui
ignorada.

Respirei fundo, engolindo um pouco mais do meu orgulho e


atravessei a cerca viva às costas dele agora. Aproximei-me e toquei seu
ombro, senti ele enrijecer o corpo e parar de andar, fazendo-me trombar em
suas costas grandes e fortes. Então ele desligou o cortador e se virou na
minha direção, tirando os fones de ouvido bluetooth que eu não tinha visto
antes.
— O quê? — perguntou com a voz grave e uma carranca
distorcendo seu rosto.

— Oi, bom dia! — cumprimentei outra vez, tentando sorrir e


parecer simpática.

Ele não respondeu, só permaneceu com o rosto carrancudo de quem


queria arrancar meus olhos.

— Ãhn — gaguejei e tive que engolir em seco. — Será que você


pode me ajudar, por favor? Prometo que será rápido.

O homem levantou uma das sobrancelhas em minha direção, como


se pedisse uma explicação.

— Então, é que estou com um probleminha para levar a mesa até o


Carvalho, só preciso que me ajude a carregá-la até ali, por favor — falei
dando alguns passos atrás, apontando a mesa de ferro.

— Não — respondeu grosseiro e me deu as costas outra vez.

— Ei? Ei? — chamei e avancei até ele outra vez. — É só um favor,


a mesa está trancando a passagem da minha porta da cozinha.

— Eu não tô nem aí. Não é problema meu — foi a resposta que ele
me ofereceu.

O cretino colocou os fones de ouvido outra vez e ligou o cortador,


seguindo seu caminho na grama e me ignorando, deixando-me de boca
aberta com tanta grosseria. Demorei uns cinco segundos para que caísse a
minha ficha de verdade, então passei pela cerca de novo e caminhei até a
mesa.

Fechei os olhos por um momento, tentando pensar no que fazer para


tirar aquela mesa dali, mas nada me ocorria, então voltei a tentar empurrá-
la, fazendo meus pés patinarem. Que maldito ferro absurdamente pesado é
esse?

Quando senti o suor escorrer pela minha testa, parei de forçar e


tomei fôlego, limpando as gotas de suor com as costas das mãos. Meu olhar
foi atraído para o gramado vizinho e lá estava o idiota, cortando a grama
perto da cerca, me observando e a sombra de um sorriso de zombaria
dançava em seus lábios.

A raiva me invadiu, o cretino estava zombando de mim por não


conseguir tirar a mesa, então voltei a puxar a mesa com afinco. Dessa vez
consegui arrastá-la alguns centímetros, sorri para mim mesma.

Rá! Ri agora, imbecil!

Animada com o progresso, consegui arrastar o móvel por mais


alguns centímetros, exultante por dentro por estar esfregando na cara do
vizinho que eu não precisava dele, mas foi aí que me esqueci do pequeno
degrau que havia ali.

Puxei a mesa com tudo, dei um passo para trás, em falso, então caí
com a mesa em cima de mim. Um grito escapou da minha garganta, o ferro
da mesa encostou no meu quadril, ficando amparada pelo degrau de cima e
a grande pedra que havia ali do lado, doeu um pouco, mas eu tive sorte por
ela ter sido barrada antes que me atingisse com força total. Tentei empurrá-
la de cima de mim, mas não consegui.

— Merda! — praguejei enquanto fazia força para tirar o móvel, mas


sem sucesso.

Apertei os olhos e resmunguei, cobrindo o rosto com as mãos,


irritada e com dor, então, sem que eu fizesse esforço algum, fui libertada do
ferro frio da mesa que estava em meu quadril.

— Você está bem? — ouvi a voz do cretino se aproximando do meu


rosto e abri os olhos.
Ele havia tirado a mesa de cima de mim e já estava de joelhos ao
meu lado, segurando meu rosto, parecia preocupado.

— Estou, quer dizer, eu acho que sim — respondi, me livrando do


seu toque e me sentando, gemendo com o movimento. — Merda!

— Você se machucou, deixe-me ver — pediu ele.

— Não — neguei com raiva e me levantei, gemendo um pouco.


Com certeza não tinha quebrado nada, mas estava doendo pra cacete.

— Está com dor, com certeza se machucou.

— Estou bem — praticamente gritei. — Não preciso mais da sua


ajuda.

Se ele tivesse me ajudado quando pedi, poderíamos ter evitado


aquilo. Não que ele tivesse obrigação, mas não custava ajudar sua vizinha, é
a política da boa vizinhança e educação. Foi aí que ouvimos o barulho de
água, nossas cabeças se viraram em direção ao som ao mesmo tempo.

Minha boca se abriu em descrença ao ver a mesa que ao ser tirada


de cima de mim, provavelmente foi deixada de forma que rolassem já que
era redonda e o terreno íngreme e assim ela fez até cair na piscina. Por um
momento fiquei observando-a afundar na água da piscina.

— Bem... pelo menos ela não está mais na porta da sua cozinha —
disse ele, com uma expressão de tédio, dando-me as costas em seguida.

Abismada com a cara de pau dele, não tive reação alguma até que
ele entrasse em sua casa. Respirei fundo, tentando me acalmar do susto,
então entrei em minha casa também.
Capítulo 3

Pela janela da sala vi o carro de Pedro encostar em frente à minha


casa. Meu melhor amigo e sócio carregava uma grande papelada nas mãos e
eu sabia exatamente o que era. A minha chave para tirar aquela abusada da
minha casa de maneira correta.

Abri a porta e ele entrou.

— Oi Davi — Pedro se abaixou para cumprimentar meu filho.

— Padrinho — Davi o cumprimentou, agarrando-se em seu pescoço


e o abraçando.

— Tudo bem, campeão?

— Sim — respondeu Davi. — Luan?

— Luan está no colégio agora.

— Tá bom — disse ele e caminhou até o carrinho de brinquedo que


ficara esquecido no meio da sala quando Pedro chegou, então meu amigo se
levantou, me encarando.

— Está tudo bem?

— Está sim, fora o episódio de ontem com o barulho das buzinas do


caminhão de mudança, está tudo certo — respondi.

Pedro suspirou, como se estivesse frustrado e foi até a janela lateral


da sala, separou a persiana com os dedos e observou a casa ao lado.

— Então alguém se mudou mesmo para a casa ao lado?


— Sim, alguém se mudou para a minha casa — respondi, indicando
o sofá para ele. — Espero que essa papelada seja o meu aval para tirar a
enxerida dali.

Pedro apertou os olhos e me encarou em seguida.

— Sinto muito, meu amigo, mas acho que não vai poder tirá-la. Ao
menos não por enquanto.

— Como assim? — perguntei, me levantando do sofá.

— O contrato de venda e esse registro da propriedade em seu nome


não tem valor judicial.

— O quê?

— Ao que parece, quem te vendeu a casa foi um parente da sua


nova vizinha e ele não tinha poder nenhum para fazer isso, então não
registrou devidamente esses documentos, esses carimbos e assinaturas são
falsos, além de que aqui o imóvel está no nome dele, e na verdade, a
propriedade estava registrada no nome de outra pessoa, o verdadeiro dono e
há alguns dias foi transferida para a neta do real proprietário, Sofie Wiebke.

— Isso não pode ser possível!

— Raul, quando você comprou essa casa aqui, você sequer chegou a
ir ao cartório para os registros, confiou no antigo proprietário para isso e eu
te adverti sobre os riscos, não acredito que fez a mesma coisa com a compra
da casa ao lado.

Joguei-me no sofá.

— Fiz — admiti o erro.


— Mas que porr... — Pedro se interrompeu antes que o palavrão
saísse por completo, olhou para Davi que estava com os olhos cravados
nele. — Raul, pelo amor de Deus! Sei que os cuidados com o Davi são sua
prioridade, mas para certas coisas não pode deixar isso no caminho. Poderia
ter pedido ajuda, se não quisesse que ficássemos com o Davi, poderia ter
me pedido para comparecer ao cartório.

— Vocês já fazem demais, não quis incomodar.

— Quanto pagou pela casa? — quis saber.

— Quinhentos e dez mil — revelei.

Pedro fechou os olhos com força, provavelmente segurando outro


palavrão. Era proibido falar palavrão perto do Davi ou de seus filhos.

— Não acredito que perdeu esse dinheiro.

— Não acredito que perdi minha paz. Terei mesmo que aguentar a
garota morando aí do lado, ela vai incomodar — falei, andando de um lado
para o outro.

Aquilo não podia estar acontecendo.

— Precisa registrar uma queixa no DP contra o homem que te


enganou e sobre a moça... Ela não tem culpa... Pode ser uma boa pessoa.

— Ela é irritante.

— Então chegou a conversar com ela?

— Não exatamente — falei e Pedro arqueou uma sobrancelha para


mim.

— O que aconteceu exatamente? — perguntou Pedro quando Davi


começou a dançar uma musiquinha que tocou em um comercial na
televisão.

— Nada — respondi.

— Raul? — insistiu.

A campainha da minha casa tocou... TOCOU...

Pisquei confuso e Davi se agitou um pouco pela novidade, mas


como o som apesar de alto foi rápido e uma única vez, ele se entreteu com o
brinquedo outra vez. Minha campainha nunca tocava. Pedro olhou para
mim com uma sobrancelha levantada.

— Não vai atender? — quis saber, se levantando e espiando pela


janela.

— Deve ter sido o vento. — Para mim aquela era a resposta mais
segura.

— Ou uma garota bem bonita — sugeriu ele.

— Uma com os cabelos castanhos...

— Sim — concordou.

— Rosto angelical...

— Isso.

— Seios fartos...

— É — concordou ele, sorrindo. — É ela? A sua vizinha?

— Sim, com certeza é o meu tormento.


— Não faz nem vinte e quatro horas que ela é sua vizinha, como
pode saber que é seu tormento?

— Não precisei nem de cinco minutos perto dela para ter certeza
disso — falei, me levantando e correndo para a porta antes que ela tocasse
de novo a campainha.

— O que você quer? — foi o que eu disse quando abri a porta para
ver minha vizinha, mas ela não estava sozinha.

— Bom dia, senhor Aguilar! — cumprimentou o homem


engravatado que estava com ela.

— Bom dia! — respondi.

— Eu sou Symon Klein, advogado da senhorita Wiebke, podemos


conversar por um momento?

— É claro — respondi, encarando a moça, já sabendo do que se


tratava.

Pedro, ao ouvir a conversa, veio atrás de mim e lhe dei espaço para
que ele saísse, fechando a porta atrás de nós.

— Conversaremos na varanda, é claro — disse a moça.

Eu sabia que era grosseria não convidá-los a entrar, mas não poderia
deixar estranhos entrar em minha casa, Davi ficaria incomodado.

— Bem, a senhorita Wiebke me contatou para verificar uma


situação em que o senhor alega ser o proprietário do imóvel ao lado, mas...

— Não precisa esclarecer nada, já sei que não sou proprietário


daquela casa — falei.
— Então estava só fazendo alarde à toa? Pensei que tivesse algum
problema com a transferência da casa para o meu nome — disse a moça,
indignada.

— Na verdade — Pedro começou —, houve sim um engano,


estávamos esclarecendo isso agora.

— Já chega, Pedro — eu o barrei e fiz sinal para que ele entrasse.


Meu amigo me dirigiu um olhar de advertência quando abri a porta para que
ele entrasse. — Como ele disse, houve um engano. Eu sinto muito,
senhorita Wiebke. Não voltarei a incomodá-la — finalizei e entrei em
minha casa também, fechando a porta na cara deles.

Não demorou muito até que a moça saísse do meu quintal e se


despedisse de seu advogado em frente à sua casa.

— Precisava ser tão mal educado? Ela não tem culpa por você ter
sido enrolado, o que aconteceu por negligência sua mesmo, vamos deixar
claro — Pedro ralhou comigo.

— Dá um tempo, Pedro — pedi e procurei por Davi.

Ele estava na cozinha, pegou uma cebola e a mordeu com gosto.

— Não, filho! Não! Isso não é bom! — tentei explicar a ele.

— Isso não é maçã, papai — disse ele, me entregando a cebola e


fazendo uma careta..

— Não, filho, é cebola e vai te dar dor de estômago.

Abri o armário e peguei uma maçã, oferecendo a ele em seguida.


Dei-lhe também um pouco de água, o qual ele aceitou de bom grado, então
retornou para a sala.
Pela janela da cozinha, observei a casa ao lado e soltei o ar com
força, finalmente digerindo toda aquela história de merda.

— Então eu vou mesmo ter que aguentar ela — falei para mim
mesmo.

— Ela não parece tão ruim — disse Pedro, atrás de mim.

— Vou construir um muro bem alto, mande alguns homens e


material amanhã — falei.

Pedro e eu tínhamos uma empresa de engenharia e arquitetura e há


alguns anos havíamos nos estabelecido ali na Alemanha, porém, depois que
a mãe de Davi, se é que podia chamá-la assim, foi embora, não voltei mais
à empresa, trabalhava de casa, fazendo os projetos no sistema online.

— Pode erguer o muro, mas a garota vai continuar logo ali. Não seja
iludido, Raul. Não construa o muro, é um trabalho desnecessário, ao menos
por enquanto. Veja como as coisas fluirão nos próximos dias, e se ela
incomodar mesmo, levantaremos um muro.

— Prefiro prevenir do que remediar.

— Não seja tolo. Você está nervoso, a garota é sozinha, não vai
fazer barulho a ponto de incomodar vocês.

— Veremos! — falei, concordando em esperar alguns dias e Pedro


bateu em meu ombro.

— Maca quer que vocês jantem em casa amanhã.

— Estaremos lá — garanti.
O jantar na casa de Pedro e Macarena havia ocorrido como sempre.
Era bom que Davi se distraísse um pouco. Apesar de mais velho, Luan, um
dos filhos gêmeos de Pedro, adorava ficar com sua irmã mais nova e Davi,
que tinham praticamente a mesma idade, mas não nos demoramos muito lá.

Davi dormiu no assento dentro do carro no caminho para casa.


Quando cheguei perto de casa, estranhei os carros estacionados na rua.
Estacionei em minha garagem, desci do veículo e olhei na direção do som:
a casa da vizinha. É claro que Miss Quinta Série daria uma festa!

Com cuidado, peguei Davi no colo e o levei para seu quarto. Por
sorte, ele não acordou com o barulho. Fechei a porta do seu quartinho,
deixando o abajur aceso e fui para a janela da minha cozinha. Não tinha
tanta gente na casa da vizinha, ao menos não à vista, cerca de dez pessoas,
mas faziam barulho como se houvesse cinquenta.

Liguei para a polícia, reclamando do barulho, mas me informaram


que não podiam fazer nada já que ainda não eram 22h e achei aquilo um
absurdo. Sentei-me no sofá e aguardei, mas não consegui me conter, fui até
lá.

Bati na porta diversas vezes, mas ninguém atendeu, então dei a volta
e segui para os fundos da casa, onde estavam os jovens.

— Não pode entrar aqui, cara. É uma propriedade privada — disse


um dos rapazes ao notar a minha aproximação.

— Eu sei que é privada, eu só...

— Ah não! — gemeu alguém bem ao nosso lado.


Ela!

— Ah, aí está você! — falei.

— O que você quer agora? — perguntou ela.

— Você conhece esse cara? — um dos rapazes perguntou.

— Sim, ele é o meu vizinho — disse a garota, revirando os olhos e


senti vontade de repreendê-la por fazer aquilo.

— O da mesa? — perguntou uma garota, parecendo surpresa.

— O próprio!

— Olha, eu... — eu dizia, mas me interromperam outra vez.

— Obrigado, cara! — disse o primeiro rapaz, batendo no meu


ombro de forma amigável.

— Pelo quê exatamente está me agradecendo?

Eu não fazia ideia, por isso dirigi meu olhar à garota irritante que
agora era minha vizinha e ela deu de ombros.

— A ideia da mesa dentro da piscina foi realmente muito boa —


disse uma garota.

Olhei para a piscina e lá estava a maldita mesa cheia de


universitários sentados ao redor dela - DENTRO DA PISCINA - jogando
algum tipo de jogo idiota. Eles gritaram e jogaram um monte de água para
fora da piscina.

Olhei para os meus sapatos agora encharcados e encarei a garota em


seguida.
— Não pode dar uma festa aqui — falei.

— Não é uma festa. É só uma reunião de amigos — argumentou.

— Abaixe o volume do som!

— Nem está tão alto, mas vou abaixar mesmo...

— Abaixe agora!

Sofie me encarou, parecendo mudar de postura.

— Me ouviu falar que eu ia abaixar?

— Ainda estou ouvindo a música. As crianças não deveriam estar


dormindo à essa hora? — falei.

— Ih, olha o cara — zombou um dos caras, me encarando de cima a


baixo.

Coitado!

— Crianças? Só porque você é velho não quer dizer que somos


crianças, tiozão — disse a encrenqueira, estufando o peito e, não,
definitivamente ela não parecia uma criança naquele biquíni.

Forcei o pensamento para longe de onde minha mente me levava


sem querer.

— Abaixe o som agora, mocinha!

— Tudo bem, pai — zombou ela, abaixando o volume do som por


um controle remoto. — Satisfeito?

Arqueei as sobrancelhas para ela e segui pelo gramado mesmo,


passando sem dificuldade por uma falha na cerca viva e entrei em casa.
Capítulo 4

— Quem é ele? — perguntou Aída, minha melhor amiga, chegando


bem perto de mim.

— Meu vizinho — respondi.

— Que cara estranho! — disse Adan, virando sua lata de cerveja


logo em seguida.

— Ele é uma delícia! — Aída praticamente ronronou.

— Ele é velho e chato — garanti.

— Ahan — balbuciou minha amiga, seguindo meu vizinho com os


olhos até que ele entrasse em sua casa.

— De que lado você está? — perguntei, já que havia contado a ela


toda a história.

— Amiga, estou do seu lado, mas gostaria muito também de estar


em cima dele, em baixo e em várias outras posições.

— Você é nojenta! — ralhei.

— As coisas estão tão feias assim que precisa cobiçar um cara tão
velho, Aída — zombou Adan.

— Só porque você é meu irmão, não pode falar assim, imbecil —


ralhou ela, dando-lhe um peteleco.

O vizinho fechou a porta e em seguida a cortina da cozinha, então,


só para irritá-lo, ergui o som bem alto, fazendo-o abrir a cortina outra vez
bem rápido, me encarando parecendo estar possuído por algum tipo de
demônio. Desliguei na hora e acenei sorrindo, ganhando um olhar assassino
e as cortinas se fecharam outra vez.

Adan largou sua lata de cerveja em cima da mesa, me deu um beijo


na bochecha e correu, pulando na piscina em seguida. Aída me encarou,
fazendo uma careta estranha e sugestiva.

— O que foi agora? — perguntei, já sabendo qual era o assunto.

— Você não me disse que seu vizinho além de ser um pé no saco era
também um grande de um gostoso — disse ela.

— Não sei onde você viu isso. Ele mal aguenta andar, aposto que
sente dor nos quadris pela idade avançada — falei, mesmo sabendo que não
era verdade.

— Tá de brincadeira? Ele é um absurdo de gostoso!

— Tá... ele é um pouco fisicamente atraente — admiti, relutante.

— Fisicamente atraente? — riu ela.

— Ué...

— Pelo amor de Deus, Sofie! O homem é delicioso.

— É velho...

— Tem cara de quem sabe o que faz.

— Sim, ele sabia bem como nos fazer abaixar o som, aliás, pode não
fazer isso de novo?

— O quê? — fingiu inocência.


— Não finja demência — ralhei, apertando a garrafa plástica em
que ela bebia água, fazendo-a quase engasgar. — Primeiro você trouxe todo
mundo pra cá...

— É uma festa de inauguração da sua nova casa.

— Não quero festas, Aída, sabe disso. E outra, assim que o carro
apontou na curva, você ergueu o som. Fez de propósito para que ele viesse
reclamar.

— Eu estava curiosa, ué, precisava saber se você estava segura ou se


um maluco estava morando na casa ao lado da sua.

— Ah, sim e agora vai me dizer que está tranquila.

— Mais segura só se estivesse dormindo na cama dele.

— Pelo amor de Deus, Aída! — ralhei e ela riu.

— Não seja tão séria, amiga. Nem te reconheço mais.

— Você sabe que a minha situação não está nada fácil. Vim pra cá
pra ver se consigo escrever um romance que emplaque de vez e me ajude a
sair dessa merda em que me enfiei.

— Não fale assim. Seja positiva, vai dar certo!

— Eu tenho pouco tempo, preciso de dinheiro, minhas reservas


estão acabando e já estamos quase no final do prazo do pagamento do
próximo semestre da faculdade.

— Falta muito para terminar o livro?

— Falta, nem consegui colocar a primeira cena hot ainda, eles mal
se envolveram — reclamei — e não consigo fazer fluir. Vou precisar de um
emprego e conciliar com a escrita e a faculdade.
Falei e ela desviou os olhos dos meus por um segundo, voltando a
me encarar em seguida.

— Eu posso tentar uma vaga para você.

— O quê? Não! De jeito nenhum!

— Você sabe que ninguém vai te tocar sem a sua permissão.

— Não, Aída, não vou fazer isso.

— É só dança, Sofie.

— Sem roupa!

— Mas é só dança e pagam muito bem. Se quiser mais grana, bem,


tem outras opções, mas podemos deixar claro que você não vai para os
quartos.

— Você tem feito isso, Aída?

— Eu? Claro que não, Sofie!

— Não entre nessa, Aída.

— Não vou! Eu só danço, eu juro. Vou falar com o meu gerente,


dizer a ele que fazíamos as aulas de dança juntas, que você é especialista
em pole...

— Não sou especialista, fiz aquelas aulas por curiosidade, você sabe
disso.

— Eu sei, amiga, mas você é realmente muito boa. Pensa, é algo


temporário, as gorjetas são espetaculares e você só fica o tempo necessário
para juntar o dinheiro que precisa. Ninguém vai te forçar a nada. Você vai,
dança, tira a roupa, pega toda a grana e volta pra sua casa com a cabeça
relaxada para escrever sem preocupação nenhuma.

— Não, Aída. Eu não vou.

— Ok, ok. Se mudar de ideia me avise.

— Não vou!

Quando o relógio despertou às 6h da manhã eu quase não acreditei,


queria dormir mais. O pessoal havia ido embora tarde na noite anterior e eu
me sentia cansada demais, apesar de não ter bebido uma gota de álcool
sequer.

Me arrastei até a cafeteira e enquanto ela fazia o seu milagre, tomei


um banho para despertar. Assim que me enrolei no roupão felpudo, meu
celular tocou, sinalizando uma chamada de vídeo.

— Oi princesa! — atendi animada, me jogando na cama, mas assim


que vi seus olhinhos brilhantes de lágrimas, me sentei na cama, em alerta.
— O que houve, meu amor?

— Tia — disse ela e começou a chorar mais, com certeza estava me


ligado escondida outra vez, já que estava debaixo da cama.

— Diga, princesa, o que aconteceu? Onde está o seu pai?

— Papai está lá fora, conversando com o homem bravo.

— Que homem bravo, Pietra? Você sabe o nome dele?


— Não! Quando a gente chegou da polícia, o homem mau tava
esperando o papai. Ele me entregou o celular dele e eu corri pra dentro.

Não! Não! Aquilo não podia estar acontecendo!

— O que vocês foram fazer na polícia, Pietra?

— Os policiais buscaram a gente de noite.

— Como assim buscaram?

— Eles derrubaram a porta, o papai estava no banheiro e eu estava


assistindo televisão. Daí eles prenderam o papai e a minha mãe me buscou.
E agora o papai foi me buscar na casa da mamãe e...

— Pietra? — ouvi a voz do meu irmão ao fundo. — Pietra?

— Princesa passa o telefone pro seu pai, tá bem?

— Tá bom. Papai, aqui! — disse ela, saindo debaixo da cama.

— O que você está fazendo, filha? — meu irmão quis saber.

Eu tremia de nervoso.

— Falando com a tia Sofie — respondeu Pietra.

— O quê? Oi Sofie! — cumprimentou meu irmão, enfim


aparecendo na câmera do celular.

Levei uma mão à boca, chocada.

— Que merda aconteceu, Jordan?

O rosto dele estava todo machucado.


— Não foi nada demais.

— Nada demais? Tá me zoando? Pietra disse que a polícia invadiu a


sua casa e te prendeu. E não ouse brigar com ela, a garota está assustada.

— Eu sei, eu sei — disse ele, deixando os ombros caírem. —


Tadinha, ficou tão assustada.

— Que porra você fez, Jordan?

— Não foi nada.

— Sim, a polícia te levou por nada. Desembucha, Jordan!

— Alguém fez uma denúncia de que havia drogas aqui em casa, eles
vieram verificar, mas não tinha nada, tanto é que estou solto. Só os
acompanhei para prestar esclarecimento. Com certeza é alguma coisa da
Clara, sabe que ela está metida com drogas, não é à toa que tenho a guarda
da Pietra.

— Jura pra mim que você não tá metido nessa merda, Jordan.

— Eu juro, Sofie!

— Pietra disse que você estava conversando com um homem bravo.

— Era o dono da casa. Clara tinha um cartão da minha conta ainda,


o dinheiro do aluguel estava lá, ela torrou e fiquei sem ter como pagar o
proprietário da casa, que ficou uma fera, mas expliquei a situação e ele me
deu mais alguns dias para conseguir o dinheiro.

— Que droga, Jordan! Precisa cancelar esse cartão.

— Já fiz isso — disse ele, esfregando a mão no rosto machucado.


Eu o observei por um momento, eu amava tanto meu irmão que era
raro eu pensar no fato de que ele havia sido adotado. Eu o amava e me
preocupava como se ele tivesse o meu sangue, sempre fomos assim.

— Você não está mentindo para mim, está? — perguntei.

— É claro que não, Sof! Até parece que você não me conhece —
disse ele, chateado.

— Desculpe, desculpe!

— A vó deixou a casa para nós dois. Prometemos não vendê-la, mas


vocês podem vir morar comigo, seria tão bom — propus.

— Não, Sof. Fique aí em paz, trabalhe, estude e siga a sua vida. Eu


dou conta das coisas aqui. Ademais, sabe que tudo ficaria mais difícil, é
muito longe do meu trabalho, da creche da Pietra, tudo se tornaria mais
difícil e já tomei providências para que o que aconteceu esse mês não
aconteça mais.

— Tudo bem, mas sabe que se mudar de ideia, as portas estão


abertas, né?

— É claro que sei, mas será que podemos conversar depois? Preciso
acalmar a Pietra e encontrar a melhor forma de explicar a ela o que
aconteceu.

— É claro, vai lá. Dá um beijo nela por mim. Eu já estou morrendo


de saudade de vocês.

— Nós também, Sof.

— Amo vocês.

— Nós também te amamos.


Capítulo 5

Sentei-me na poltrona no jardim, coloquei a xícara de café na


poltrona ao lado e o notebook no colo, já que a maldita mesa ainda estava
dentro da piscina.

Há quatro dias que eu me sentava ali e passava horas escrevendo. A


mente estava clara e o bloqueio parecia ter desaparecido. A história estava
fluindo e finalmente consegui colocar a primeira cena hot do casal, mas não
tinha certeza se estava boa o suficiente, por isso fiz o meu ritual de sempre,
li a cena em voz alta para ver se fazia sentido.

O começo estava bom, excitante sem ser exagerado, mas quando


cheguei realmente ao clímax da cena, uma gargalhada soou alta do outro
lado da cerca viva, me assustando.

— Que porra é essa? — perguntou o velhote do outro lado da cerca,


ainda gargalhando e fechei os olhos com força.

O vizinho tinha ouvido em alto e bom som eu ler a cena hot. Eu ia


morrer de vergonha, com certeza! Minha voz nem saía para respondê-lo e
muito menos consegui me virar para encará-lo.

— Ele introduziu o pau na flor dela? Tá de brincadeira? Isso é


ridículo demais! — zombou, gargalhando ainda mais e não consegui conter
o gemido de frustração que escapou pelos meus lábios. — Flor? Ela é o
que, um jardim? — riu ainda mais.

— Na verdade, sim — falei e ele segurou o riso quando me virei


para ele, seguindo até o limite do meu terreno, a cerca viva onde ele estava
agachado, mexendo na terra, consertando a falha na cerca.

— Como assim? — perguntou, curioso, ficando sério dessa vez.


— É como se ela fosse um jardim dos prazeres — parafraseei.

O homem enrugou a testa por um momento e meneou a cabeça,


como se tivesse entendido, então voltou a gargalhar em seguida, caindo
para trás, sentado no chão, praticamente rolando no chão.

— Imbecil! — ataquei e saí de perto da cerca, recolhendo as minhas


coisas para entrar. — Não se pode nem trabalhar em paz aqui.

— Ei, ei, desculpe — pediu ele, se levantando e parando de rir aos


poucos. — Pode trabalhar tranquila, aliás o que você faz da vida?

— Você é ridículo, não entendeu nada...

— Sim, eu entendi. O pau do cara é vegano, não come boceta, só


flor — zombou e comecei a me afastar. — Ei, você não disse o que faz,
traduz filmes pornôs bregas?

Eu queria ignorá-lo, mas ele era cretino demais, então resolvi


provocar da forma que eu já havia percebido que o atingia. Então, deixei o
notebook sobre o banco outra vez e voltei até a cerca viva, de onde ele me
encarava com zombaria e um sorrisinho de merda nos lábios sob a barba
espessa.

— Não, eu não traduzo filmes pornôs. Eu sou escritora de romances


hot, o que você não entende, é claro, já que a sua mulher...

— Não tenho mulher — objetou.

— Oh, é claro, e como eu dizia, você não entende porque é tão


velho que nem deve se lembrar de como é fazer amor, tiozão! — falei e vi o
sorriso dele morrer aos poucos e seus olhos estreitarem na minha direção.

— O que você disse?


O homem passou pela cerca, os olhos fixos nos meus, se
aproximando cada vez mais. Dei alguns passos para trás, até tropeçar em
uma pedra, mas eu não caí. O vizinho me segurou rápido e meu peito bateu
contra o seu, minhas mãos instintivamente foram para o seu abdômen, ele
estava suado pelo sol forte e só naquele momento percebi que ele estava
sem camisa.

Instintivamente meus olhos foram para o abdômen sob minhas mãos


e me surpreendi com o tanquinho que encontrei. Uma de suas mãos estava
em minhas costas, amparando-me e a outra foi até o meu queixo, forçando
meu olhar a subir para o seu rosto.

— Ei garota, eu tô aqui em cima — disse ele, mas eu estava


hipnotizada pela boca bonita sob os pelos da barba, mas muito consciente
de seu corpo colado ao meu. — E apesar de velho, eu te garanto que daria
conta sem esforço nenhum de deixar qualquer mulher satisfeita na cama.

— É? — perguntei, afetada como uma idiota e vi a sombra de um


sorriso delinear os lábios dele.

— É, e só para você saber, eu realmente não me lembro de como


fazer amor, eu sou mais do tipo que te comeria inteira, garota, usando
palavras tão sujas que, a julgar pelo que acabei de ouvir, te deixariam
horrorizada e molhada no mesmo nível — disse ele e eu ofeguei, me
sentindo quente e excitada ao ouvir as palavras dele, observando a boca,
sentindo vontade de mordê-la e me repreendi mentalmente por isso. —
Agora some da minha frente antes que eu diga ou faça coisas das quais eu
me arrependa — finalizou, encarando a minha boca como eu fazia com a
dele.

E como se nada tivesse acontecido, ele me soltou e se afastou.


Fiquei aturdida por um segundo ou dois.

— Vai! — disse ele, passando pela cerca viva e apressei meus


passos em direção à casa. — O computador, garota — avisou em tom de
advertência.
Quando me virei para ele outra vez, ele já seguia em direção à
própria casa, corri até o banco, peguei o notebook e segui para dentro da
minha casa, irritada e excitada.

Inferno de velhote!

Era quase 23h e eu ainda estava no jardim, dessa vez, perto da


piscina. O clima estava agradável e eu aproveitei para escrever enquanto as
ideias fluíam. Me surpreendi quando meu celular tocou, era um número que
eu não conhecia, não costumava atender chamadas assim, mas tive um
pressentimento de que precisava atender, afinal, aquela hora da noite, podia
ser alguma emergência.

— Alô! — atendi.

— Boa noite, é a Sofie? — uma mulher que eu não conhecia


perguntou.

— Sim, sou eu.

— Sofie, eu sou a Lisa. Estou com a Pietra aqui...

— O que houve? — perguntei deixando o notebook de lado,


levantando-me, já procurando as chaves do carro.

— Se acalme, ela está bem. Quer dizer, o pai dela não está em casa e
ela estava com medo, sou vizinha deles e ela correu até a minha casa, mas
não se lembrava do telefone da mãe, só o seu.
— Tudo bem, eu estou indo para aí agora mesmo, pode ficar com
ela até que eu consiga chegar, por favor?

— É claro. Moro na casa amarela, à esquerda da casa da Pietra.

— Tudo bem, Lisa, chego aí em vinte minutos — garanti.

— Tudo bem.

Mas que droga, Jordan! Que merda você tá fazendo que deixou a
criança sozinha?

Eu estava desesperada e indignada, não podia acreditar que meu


irmão tinha feito tamanha irresponsabilidade. Com um misto de raiva e
preocupação, dirigi rápido até estacionar em frente à casa do meu irmão e
corri para a casa vizinha onde Pietra estava. Tentei manter a calma quando
bati à porta, mas assim que Pietra apareceu em meu campo de visão,
correndo assustada até mim, quase não consegui me conter. Me abaixei,
abraçando Pietra apertado e pegando-a no colo, tentando acalmá-la.

— Está tudo bem, querida! Titia está aqui agora — garanti,


afagando seus cabelos enquanto suas mãozinhas circundavam meu pescoço.
— Obrigada! — agradeci a mulher que abriu a porta.

— Tudo bem.

— Você sabe o que aconteceu?

— Só o que a Pietra contou. Disse que o pai saiu, dizendo que


voltava logo, mas ele estava demorando e quando ela se deu conta já estava
escuro, sentiu medo e correu para cá — explicou a mulher.

— Entendi. Muito obrigada por me avisar, eu vou levá-la comigo e


avisar meu irmão.
— Ele tem sorte da menina ter vindo para cá. Se fosse outro vizinho
já teria acionado a polícia.

— Eu sei, eu sei e agradeço demais por você não ter feito isso.

— Tudo bem, mas espero que entenda que se voltar a acontecer, não
terei outra saída. Não posso permitir que uma garotinha de cinco aninhos
fique em perigo.

— Eu entendo e você está certa. Obrigada, eu vou falar com o


Jordan e não vai acontecer de novo— garanti, me despedindo em seguida e
levando Pietra para o meu carro.

No caminho para casa tentei ligar para o meu irmão diversas vezes,
mas as chamadas iam direto para a caixa de mensagens, o que me deixava
ainda mais nervosa. Para piorar a situação começou a chover, eu odiava o
tempo de chuva, os raios e trovões me deixavam apavorada.

Eu já havia pegado a estrada da colina que levava à minha casa


quando um raio cortou o céu. Estremeci de leve e senti a mãozinha pequena
e quente de Pietra sobre a minha no câmbio do carro.

— Calma, tia! O raio está muito longe — disse ela.

— Você tem toda razão — falei, tentando sorrir para ela.

Por sorte, não demorou nem cinco minutos para eu estacionar em


minha garagem e correr com ela para dentro de casa.

— Você está com fome? — perguntei.

— Muuuuuitaaa — disse ela, de forma exagerada, passando a mão


na barriga e revirando os olhinhos de um jeito engraçado.

— Que tal uma lasanha? — ofereci já que já tinha montado uma


pela manhã e deixado na geladeira para só assar à noite. E também por ser
uma das poucas coisas que eu sabia cozinhar.

Pietra me ajudava a arrumar a mesa para jantarmos, quando um


relâmpago iluminou o céu pela janela e estremeci, fechando os olhos e
respirando fundo em seguida, tentando me acalmar daquele pavor, e como
um estalo lembrei que havia deixado o notebook na cadeira perto da piscina
quando sai correndo para buscar Pietra.

— Droga! — xinguei.

— Tia! — ralhou Pietra.

— Fica aqui, Pietra — falei, vendo seus olhinhos curiosos me


encararem e corri para fora.

A chuva estava forte e gelada demais, me molhando por completo


enquanto eu corria até o notebook, tentando não escorregar na grama
molhada. Outro raio atravessou o céu, acompanhado de um trovão alto,
assustando-me, me fazendo parar de correr e tampar os ouvidos, gritando
alto.

Ao fundo ouvi Pietra gritando, ela estava na porta da cozinha


quando a avistei e fiz sinal para que ela ficasse ali. Voltei a correr para a
beira da piscina, peguei o notebook, planner de escrita e as canetas, tudo
encharcado e corri de volta para casa, molhando todo o piso.

— Você se molhou um pouco, tia — disse Pietra.

Olhei para o meu reflexo nas portas de vidro do armário da cozinha,


parecia um pinto molhado, o cabelo e roupas pingando e o rímel
escorrendo. Passei a manga da blusa no rosto tentando limpar, mas ficou
ainda pior.

— Não se preocupa, tia, você continua linda.

— Sério? — perguntei, encarando-a e ela fez uma careta estranha.


— Não, mas eu não quero que você fique triste — disse, dando
tapinhas na minha perna molhada e eu ri.

— Amo a sua sinceridade, Pietra — falei, mas então me lembrei do


notebook. — Ah, não!

Levantei o aparelho e não parava de escorrer água dele. É claro que


ele nunca mais ligaria. Minha garganta parecia querer se fechar e os meus
olhos arderam com as lágrimas que me vieram, mas eu não podia chorar na
frente da Pietra.

— Ih, tia, seca ele com o secador. Quando meu cabelo tá pingando
assim, meu pai seca ele com o secador.

Encarei a garotinha de olhos grandes que me encarava esperançosa.

— É claro que vou fazer isso, mas só depois ou a nossa lasanha vai
esfriar. Querida, pode escolher um desenho para assistirmos depois do
jantar? Vou tirar essa roupa molhada e já volto — pedi, sentindo minha voz
embargar.

— Tá bom — concordou ela, animada, correndo para a sala.

Entrei no banheiro, já tirando a roupa molhada e engolindo o choro,


abri o chuveiro na água quente e entrei, deixando a temperatura alta tirar a
friagem do meu corpo, mas não demorei ali, não podia deixar Pietra
sozinha.

Já mais calma, voltei para a sala, deixando o problema do notebook


para resolver depois.

— Vamos jantar? — chamei.

— Lasanha! — disse ela, animada demais.


— Lasanha! — a imitei, seguindo para a cozinha de mãos dadas
com ela.

Sentamos e comemos enquanto ela falava sobre a escola que


gostaria de frequentar. Depois disso, dei um banho em Pietra e seguimos
para a sala e assistimos o desenho que ela havia escolhido, enquanto eu
tentava ligar insistentemente para Jordan e enviava mensagens no
WhatsApp dele que nem sequer as recebia.

— Tia? — chamou Pietra, com a voz sonolenta já, com a cabeça em


meu colo.

— Sim, querida!

— Amanhã podemos chamá-lo para brincar?

— Quem? — perguntei curiosa.

— O menininho.

— Não tem um menininho aqui, meu bem.

— Aqui não, tia, na casa do vizinho — disse ela e senti meu cenho
franzir.

— Lá também não tem um menino.

— Tem sim, eu vi ele pela janela.

A pobrezinha estava delirando de tanto sono.

— Conversamos sobre isso amanhã — falei, não querendo


contrariá-la e despertá-la do sono que estava quase embalado. Na manhã
seguinte ela nem se lembraria disso, afinal, não havia garoto nenhum.
Não demorou nem dez minutos para que ela adormecesse, já que era
muito tarde da noite. Então por um aplicativo no celular fiz a compra de um
novo notebook, usando todo o limite do cartão de crédito que eu odiava
usar, mas que era necessário naquele momento, parcelando o pagamento em
dezoito vezes. Se eu não tinha dinheiro para pagar a faculdade, como teria
para pagar de uma vez o computador novo, mas eu não tinha escapatória,
era a minha ferramenta de trabalho, não tinha como correr dessa despesa.
Capítulo 6

Acordei com o celular tocando, nem verifiquei o número, só atendi


rápido para que não acordasse Pietra.

— Alô!

— Sof, graças a Deus! — disse Jordan, do outro lado da linha.

— Seu filho da puta! — xinguei sem nem pensar, me exaltando, e


em seguida lembrando-me de Pietra que estava adormecida ao meu lado.

Levantei rápido e segui para a cozinha.

— Onde você se meteu? — perguntei.

— Preciso de você, queria ter ligado ontem, mas não pude...

— Não pode? Tá de brincadeira, Jordan? Você deixou a Pietra


sozinha!

— Eu sei, eu sei, era para ter sido rápido...

— Rápido? Nem que você só vá na esquina, Jordan, ela tem cinco


anos.

— Eu sei, ela está com você?

— É claro que ela está comigo. Eu vou te matar se não chegar aqui
na minha casa em cinco minutos!

— Não vai rolar, Sof. Uma coisa aconteceu — disse ele e me


controlei para não gritar, por isso saí para o quintal, lá eu poderia berrar
com aquele inconsequente sem acordar minha sobrinha.

— Que porra pode ter acontecido para você abandonar a sua filha de
cinco anos sozinha em casa e só ligar atrás dela no dia seguinte?

O tempo estava fresco por conta da chuva da noite anterior e eu


andava de um lado para o outro no gramado.

— Estou na cadeia! — disse e eu paralisei.

— O que você disse? — perguntei com a voz fraca.

— Estou preso.

— Você disse que não estava mexendo com nada ilícito, Jordan.

— Desculpe, Sof, a verdade é que eu perdi o emprego, a mãe da


Pietra estava mexendo tudo para conseguir tirá-la de mim, sabe que não
posso viver sem a minha filha, me enfiei em uma enrascada.

— Puta merda, Jordan! Não acredito nisso! — falei, levando uma


mão à boca.

— Eu sinto muito, Sof.

— Vou conseguir um advogado...

— Não, vou usar um da defesa estadual. O que preciso é que fique


com a Pietra e não diga nada à mãe dela.

— Como assim, Jordan?

— Por favor, eu vou dar um jeito nisso, mas a mãe dela não pode
saber.
— Ela vai desconfiar quando souber que vocês magicamente
desapareceram.

— Não, eu vou ligar e dizer que vou viajar com a Pietra, como ela
não pode opinar nisso, vai ter que aceitar e pronto. Por favor, cuide dela.

— É claro que eu vou cuidar — falei após um suspiro cansado. —


Não acredito que você se meteu nisso.

— Me perdoe, Sof, por favor me perdoe. Preciso que me prometa


uma coisa.

— O que?

— Prometa que não virá até a penitenciária para as visitas. Nem


você e nem a Pietra vão chegar perto desse lugar.

— Ai meu Deus, Jordan — falei, segurando para não chorar.

— Prometa, Sofie! — exigiu. — Meu tempo está acabando e a


ligação vai cair. — Prometa!

— Tudo bem, eu prometo!

Uma ova que prometia!

— Eu te amo, irmãzinha.

— Eu também te amo.

— Ah, se por acaso...

A ligação caiu. Olhei para o aparelho celular, tentando acalmar


meus nervos, não podia acreditar naquilo. Tive a impressão de estar sendo
observada, então meus olhos correram imediatamente para a janela da
cozinha do meu vizinho e lá estava ele. Parecia estar coando café ou
fazendo um chá, já que bastante vapor espiralava, embaçando o vidro da
janela, seu olhar me olhava em reprovação.

Quer merda ele achava que eu estava fazendo agora?

Senti o vento fresco e só então fui me dando conta da porcaria: eu


estava só de calcinha e sutiã no meu jardim.

Era coisa demais para digerir. Não conseguia acreditar que meu
irmão tinha se metido naquela confusão. Precisei ir ao supermercado, meu
congelador estava cheio de comida industrializada congelada e Pietra não
poderia comer aquilo. Como eu faria comida saudável para ela? Não tinha
ideia, quando morava com ela e Jordan, meu irmão era quem cozinhava
para nós, eu era péssima na cozinha, mas daria um jeito. Também passamos
na casa do meu irmão para pegar as roupas e pertences de Pietra.

No caminho para casa, meu celular sinalizou uma mensagem do


aplicativo de vendas, informando que minha encomenda havia sido
entregue a alguém chamado Pedro.

Pelo amor de Deus, quem é Pedro?

Conferi a mensagem por completo e para o meu desagrado meu


notebook havia sido entregue na casa do vizinho, mas o nome dele não era
Pedro, era?

Estacionei o carro e entrei em casa com a Pietra e as sacolas. Peguei


um iogurte que Pietra havia me pedido no supermercado e entreguei a ela
junto com uma colher.

— Querida, sente-se e coma todo o seu iogurte. A titia já vem.


— Mas você não vai demorar como o meu pai, né? — perguntou e
meu coração se partiu.

— Não, meu amor. É claro que não — garanti, voltando até ela e a
abraçando. — Só vou na casa do vizinho aqui do lado pegar minha
encomenda que chegou.

— No vizinho? — perguntou com os olhos brilhando.

— Sim, não vou demorar mais que cinco minutos, tá bom?

— Podemos convidar o menininho para brincar comigo?

— Meu amor, não há menininho algum.

— Claro que tem, né tia. Eu vi ele na janela.

— Querida, estava chovendo muito, o que você viu foi só uma


sombra.

— Era um menino, tia. Eu tenho certeza.

— Tudo bem, eu vou ver, tá?! — falei sem querer contrariá-la mais,
mesmo sabendo que não havia menino algum.

Fechei a porta de casa e segui para o gramado do vizinho, seguindo


até a sua porta. Suspirei, frustrada por ter que lidar com ele outra vez.
Aquele homem me cansava. Então toquei a campainha.

— O que você quer, garota? — disse ele assim que abriu a porta.

— Como sabia que era eu?

— Ninguém vem aqui, só você — provocou.


— É e eu posso entender o porquê — devolvi a provocação, fazendo
uma cara de tédio.

— Eu vou pegar a sua encomenda, só vai levar um minuto, está


misturado às minhas caixas.

— Tudo bem — falei quando ele abriu a porta de volta para entrar.

— Você não pode entrar, é claro. Sinta-se à vontade na varanda —


disse ele e fechou a porta na minha cara.

— Grosso! — resmunguei para mim mesma. — Como se eu fosse


querer entrar nesse muquifo — falei, mas tinha bastante noção de que a
casa não parecia ser muquifo nenhum se contasse com como a fachada era
muito limpa, bem pintada e cuidada, assim como o jardim.

Poucos minutos se passaram até que o homem voltasse para a


varanda com o pacote nas mãos.

— Espero que não seja nada que quebre, o deixei cair duas vezes
sem querer.

— O quê? Está de brincadeira? — perguntei, me exaltando e


pegando o pacote de suas mãos, fazendo-o gargalhar.

— Eu estou brincando! O pacote está intacto.

— Isso não é brincadeira que se faça — ralhei.

— Ela não se parece com um demônio sedutor, mesmo que eu não


saiba o que é sedutor, papai — a voz de uma criança veio da porta que
agora estava um pouco aberta.

— Como é que é? — perguntei.


— Davi, eu não falei pra você ficar lá dentro com o seu padrinho?
— meu vizinho ralhou com a criança, levando as mãos à cabeça.

— Então eu sou um demônio sedutor? — perguntei para o vizinho.

— Não, você é muito bonita — disse o garotinho com os olhinhos


brilhando na minha direção.

Dei alguns passos até que estivesse perto o suficiente e sorri para
ele.

— Obrigada, rapazinho — falei, sendo simpática com ele.

— Eu concordo com o que o padrinho Pedro disse — falou o


garotinho.

Pedro, ah, a pessoa que recebeu minha encomenda.

— O que o Pedro disse? — perguntou o vizinho, parecendo curioso.

— Ele disse que o papai precisa de uma mulher bonita pra fazer sexy
e relaxar — disse o garoto e senti meus olhos arregalarem, quase deixando
o pacote cair. — Papai, faz sexy com ela!

Uma gargalhada masculina explodiu dentro da casa e senti meu


rosto queimar, me levantando rápido.

— Davi, não sei da onde você tirou isso. Entre agora — disse o
vizinho e passou por mim.

— Ué, foi o padrinho que disse quando eu estava de fone jogando


videogame — disse o garoto e se virou pra mim, colocando a mão no rosto
como se fosse me contar um segredo. — O jogo estava sem som, eu ouvi
tudinho.
Não consegui me aguentar e acabei gargalhando, assim como a
pessoa que estava dentro da casa.

— Entre agora, Davi e vamos ter uma conversa depois.

— Só porque eu deixei o jogo sem som? — perguntou o garoto,


virando a cabecinha de lado de um jeitinho fofo.

— Davi! — ralhou o homem e só então olhei para ele que mantinha


uma mão na testa e o rosto estava em um tom avermelhado, ao menos onde
a barba não cobria.

— Vamos lá, campeão, vou te dar sorvete — disse a voz de quem ria
dentro da casa.

Um homem ruivo e muito bonito saiu pela porta e bagunçou o


cabelo do garoto. Ah, eu me lembrava dele, era o homem que tentou
intervir no dia em que vim com o advogado.

— Prazer, eu sou o Pedro — disse ele, me estendendo a mão.

— Sofie — respondi, aceitando seu toque.

— Bem, deixe eu entrar com esse garotinho antes que ele faça o pai
dele enfartar. Foi um prazer, Sofie — disse ele e entrou sem esperar uma
resposta, levando o garoto consigo.

— Desculpe por isso. Eu juro que não falávamos nada nesse teor
envolvendo você. Pedro falou umas abobrinhas quando pensamos que o
Davi não estava ouvindo e ele só...

— Eu sei, não se preocupe. Sei bem como são as crianças.

— Mas vou conversar com ele.


— Tudo bem. — Nos encaramos em silêncio por um momento e um
clima estranho se instalou. — Ahn, obrigada por receber meu pacote.

— Não há porque agradecer, não custava nada — disse ele e


comecei a andar pelo gramado, seguindo para a cerca viva, eu passaria pela
falha da folhagem mesmo.

— Bom, agora eu já sei três coisas sobre você — falei, enquanto me


afastava devagar.

— O que? — perguntou da varanda.

— Que tem um filho e que sabe ser gentil se quiser — falei e olhei
para trás. Ele sorria.

Ai meu Deus! Ele estava mesmo sorrindo.

— E a terceira?

Sorri para mim mesma, não podia perder aquela oportunidade.

— Que você está precisando transar — falei e ele gargalhou.

— Entre na sua casa antes que eu te diga o que não devo, garota —
disse, ainda rindo quando eu já havia atravessado a cerca viva.

O ronco de um motor de carro chamou a minha atenção e observei o


carro preto com os vidros escuros que passava na rua bem devagar e logo
entrei em casa.
Capítulo 7

— Davi! — chamei assim que entrei em casa.

— Sim, papai — respondeu ele.

— O que foi aquilo? Por que disse aquelas coisas àquela moça?

— Porque era a verdade, papai.

— Você não podia ter dito aquilo, quase morri de vergonha.

— Então eu deveria mentir? — perguntou ele, parecendo confuso.

— Agora ele te pegou — disse Pedro, sentado no sofá, se divertindo


com a situação.

— Você disse que não pode mentir, papai.

— Você tem toda razão, filho, não pode mentir, mas não havia
necessidade de dizer.

— Mas o padrinho disse que você tá chato assim porque precisa


fazer sexy...

— Doce Jesus! — lamentei e Pedro riu.

— Afinal, o que é sexy? Por que você não fez com ela, papai?

— Você gostaria de explicar isso a ele, Pedro? — sugeri.

— Estou bem, pode explicar você — disse ele e eu revirei os olhos.


— Você ainda não entende, filho — falei me ajoelhando para ficar
da sua altura. — Quando tiver idade suficiente, eu te explicarei tudo,
combinado?

— Combinado, papai. Mas você pode fazer logo com ela para deixar
de ficar tão chato como está sendo nos últimos dias? — pediu.

— Prometo que vou melhorar isso.

— Vou poder brincar na piscina? — perguntou, animado.

— Infelizmente não, Davi. A piscina não é mais nossa. É da vizinha.

— Por que?

— É complicado, mas não temos mais o direito de usá-la. Mas o


papai construirá uma no quintal dessa casa aqui, só precisa ter paciência,
combinado?

— Combinado!

Davi era uma criança geniosa quando queria ser, mas no geral era
fácil de lidar com ele, uma boa conversa sempre resolvia as coisas desde
que ele tivesse tido uma boa noite de sono sem pesadelos.

— Mais uma coisa, Davi — falei e ele deixou os ombrinhos caírem,


já sabendo do que se tratava. — Que história é essa de ficar ouvindo
conversa dos adultos?

— Eu sei que foi errado, papai. Me desculpe — pediu, abaixando a


cabeça.

— Tudo bem, olhe para mim — pedi e ele obedeceu — desculpo, se


prometer que não fará outra vez.

Davi desviou os olhos dos meus, tentando se livrar da promessa.


— Davi?

Ele suspirou e voltou a me encarar.

— Tudo bem.

— Bom garoto! Agora vá lavar as mãos que vou servir o almoço —


falei e ele correu em direção ao banheiro, então me virei na direção de
Pedro que se levantou, levando as mãos ao alto, em defesa.

— O que foi? A culpa não é minha dele ter desligado o som dos
fones.

— Não, mas se não tivesse dito todas aquelas asneiras ele não tinha
repetido para a garota — falei, indo para a cozinha servir o almoço e Pedro
me acompanhou.

— Aquilo foi demais — disse ele, gargalhando.

— Pedro, não tem graça, ela é a minha vizinha.

— Como se você perdoasse alguma vizinha alguns anos atrás, deixe


de ser tão chato, Raul. Ela é uma moça bonita e parece ser muito simpática
e interessante.

— Você nem pode imaginar — soltei sem querer.

— Como assim?

— Como assim o quê?

— O que aconteceu?

— Nada aconteceu. Pegue os pratos.


— Algo aconteceu — disse ele, pegando os pratos e dispondo-os na
mesa enquanto eu colocava os talheres e copos.

— Não foi nada, só uma conversa.

— Já é alguma coisa, você parecia só rosnar para ela antes disso —


zombou.

— Engraçadinho. Eu a ouvi outro dia, falando sozinha.

— As malucas são as melhores.

— Ela não estava necessariamente falando sozinha, estava lendo


algo.

— Lendo? Então ainda é inteligente, culta, gosta de ler.

— Na verdade, ela é escritora — falei e ele me encarou com as


sobrancelhas arqueadas.

— Uau, isso é que é surpresa.

— Sim — respondi.

— E o que ela escreve?

Lembrei-me das palavras que ela havia lido sem saber que eu estava
ali. A garota havia usado termos estranhos, mas ainda assim o contexto da
cena era bom, excitante e surpreendente.

— Ah... romance, eu acho.

Eu não diria a ele que ela estava escrevendo uma putaria das boas.

Pedro franziu as sobrancelhas.


— Sério? — perguntou.

— Sim, parecia ser muito bom.

— É, acho que é um gênero que combina com ela.

Aquela sensualidade toda? Mesmo que com palavras ruins?

— Ah, sim, acho que sim — admiti, soltando o ar com força. — O


Davi está demorando, vou lá ver.

— Ok.

Caminhei até o banheiro social, mas Davi não estava ali, devia ter
ido para o banheiro do próprio quarto, então foi para lá que me encaminhei.
Meu celular sinalizou uma mensagem de um dos clientes que eu estava
atendendo de forma remota, por isso parei na porta do quarto do Davi e
comecei a responder o cara, ele era exigente e sistemático, mas era um
excelente projeto, não podia perdê-lo.

— Eu preciso almoçar agora, ou o meu pai vai ficar bravo comigo


— ouvi a voz de Davi, mas continuei a digitar sem prestar muita atenção no
que ele dizia.

— Vai ser divertido, eu prometo — disse uma voz mais fina.

— Mas meu pai vai brigar comigo.

— Não vai não, é só você pedir pra ele.

— Tá bom.

Guardei o celular no bolso e abri a porta do quarto do meu filho. Ele


estava de frente para a janela, mas se virou rápido em minha direção, o
tablet estava em sua mão.
— Guarde o tablet, Davi, eu já disse que é hora de almoçar, depois
você conversa mais com a sua gatinha virtual.

— Tudo bem, papai — concordou ele, ainda com os olhinhos


arregalados por ter sido pego no flagra.

Davi colocou o tablet sobre a cômoda e correu para a cozinha. Antes


que eu fechasse a porta, ouvi uma risadinha, voltei meus olhos para o tablet
sobre a cômoda e segui até ele, Davi devia tê-lo deixado ligado. Mas
quando cheguei até ele estranhamente a tela estava apagada, o aparelho
devia estar com algum tipo de vírus daqueles joguinhos e não estava
desligando direito, precisaria formatá-lo para que não começasse a travar
quando Davi o usasse.

Voltei para a cozinha e Pedro já servia o Davi.

— O Campana enviou uma mensagem, quer uma reunião presencial


— informei.

— Quando? — perguntou Pedro.

— Na semana que vem.

— Droga, Raul, semana que vem estarei muito enrolado, tente


mudar para a outra semana.

— Tudo bem, eu vou — falei e Pedro se virou lentamente na minha


direção.

— Vai?

— Tem algum problema? — perguntei, cruzando os braços.

Desde que Magda tinha ido embora, eu vivia só dentro daquela casa
para cuidar do Davi, saía apenas para jantares esporádicos na casa dele com
Macarena.
— Não tem problema nenhum. Isso é perfeito. Pedirei a Maca para
ficar com o Davi, ela vai amar.

— Não precisa. Segunda-feira o Davi vai começar a frequentar uma


escola.

— Eu vou? — perguntou meu filho, com os olhinhos brilhando em


minha direção.

— Sim, filho, você vai.

— Ebaaa — comemorou ele e eu sorri.

— Ele já está mesmo na idade.

— Sim, no tempo certo. Ah, vamos comer.

Sentei-me à mesa e almoçamos em um clima de euforia do Davi


pela novidade.

Pedro e eu estávamos trabalhando na sala enquanto Davi tirava uma


soneca.

— O que foi, Pedro? Desembucha — falei quando perdi a paciência


depois dele me encarar diversas vezes sorrindo.

— Não é nada. Só estou realmente feliz por você.

— Por mim? — perguntei sem entender.


— Estou feliz que finalmente esteja pronto para dar esse grande
passo de deixar o Davi frequentar a escola e você poder retornar aos poucos
à sua vida.

— Essa é a minha vida, Pedro.

— Eu sei, Raul, você passou esses anos só em função de ser pai do


Davi, e admiro isso, mas você também precisa viver...

— Só vou a uma reunião presencial, não é nada demais.

— Eu sei, mas já é um começo, vai sair dessa casa. Essa decisão que
tomou fará muito bem tanto a você quanto ao Davi.

— Eu sei, ele está na idade de começar a frequentar a escola, então


ele vai. Aliás, já está na hora de acordá-lo ou ele não dormirá bem à noite.

— Tudo bem, deixa que eu vou acordar o moleque — se ofereceu e


não recusei. Davi era muito apegado ao padrinho, acordaria de bom humor.

Deixei o notebook na mesa de centro da sala, assim como toda a


papelada e segui para a cozinha para preparar um lanche para meu filho.
Não consegui evitar olhar pela janela em direção a casa da vizinha. Ela
estava lá, sentada em uma das cadeiras, usava um shorts curto e uma regata,
o notebook estava em seu colo enquanto ela digitava furiosamente, mas
podia ver também o leve movimento de sua cabeça que se alternava entre o
computador e a piscina, a qual a casa tampava parcialmente a visão. A água
parecia agitada, então alguém estava lá com ela, suspirei e mexi o copo de
leite com achocolatado.

Quando me virei em direção à mesa, Pedro entrou apavorado na


cozinha.

— O Davi não está no quarto e em nenhum lugar da casa —


anunciou.
— O que? Como assim? Você olhou embaixo do edredom, Pedro?
— perguntei, deixando o copo sobre a mesa e seguindo para o quarto.

Para o meu desespero, Davi não estava mesmo lá. Nem nos
banheiros, nos outros quartos e em nenhum outro cômodo da casa. O que
estava acontecendo? Davi nunca saía sequer para o quintal sem avisar, por
isso senti meu coração acelerar.

Voltando para a cozinha, onde eu tinha a visão completa de um dos


lados do quintal, passei os olhos pelo gramado limpo, ele não estava ali,
então corri para a garagem e para a oficina que ficavam do outro lado do
quintal, Davi gostava de ir ali, mas ele não estava, olhei a trilha que levava
até a floresta, mas ele não seguiria para lá sozinho, seguiria?

— Raul? — Pedro gritou do outro lado e corri para lá.

— Encontrou? — perguntei.

— Acho que sim, ouça — disse ele e me atentei.

Risadinhas infantis soavam junto ao barulho de água.

— Não é possível! — falei e atravessei a falha na cerca viva, rápido,


seguindo em direção à piscina.

Lá estava o danadinho, em sua sunga, com uma bóia, brincando com


uma garotinha também com uma bóia.

— Davi! — chamei e minha vizinha que estava de costas para mim,


com os olhos na piscina, se assustou.

— Vizinho, que susto! — disse ela, mas sorria e se levantou. —


Quero agradecer...

— Por que não me avisou que meu filho tinha vindo para cá? —
perguntei. — Davi, saia agora!
— Ah, eu... me desculpe, eu achei que você sabia. Pietra foi
convidá-lo e quando ele chegou aqui todo arrumadinho para a piscina,
pensei que você tivesse permitido — disse ela.

— Não, eu não permiti. Ele fugiu de casa, você deveria ter avisado.
Não sabe como são as crianças?

— Você tem toda razão, me desculpe — pediu ela.

— E você tem uma filha? Deixou sua filha por aí todos esses dias?
— me irritei com ela e me voltei para Davi em seguida. — Davi, já disse
para sair daí agora!

— Ah, não, papai!

— Pietra não é minha filha — respondeu a vizinha.

— Ah, e os pais dela sabem que ela está aqui?

— Raul não seja rude — avisou Pedro.

— A mãe da Pietra é viciada em drogas e o pai está com problemas.


Ela é minha sobrinha, tenho vinte e um anos, não faço ideia de como ser
uma mãe, mas eu sou a melhor chance daquela garotinha no momento. Me
desculpe por não tê-lo avisado que seu filho estava aqui, mas como eu
disse, não sou mãe, não tenho experiência, realmente pensei que ele tivesse
te avisado. A culpa não é minha se você não ficou de olho no seu filho
também, ele está aqui há mais de uma hora e você sequer havia percebido
que ele não estava em casa.

Aquilo me acertou em cheio, foi como uma bofetada na cara.


Ficamos em silêncio por um momento, nos encarando, Pedro também não
se pronunciou, somente o barulho da água em que as crianças brincavam e
suas risadinhas é que soavam ao nosso redor. Ela tinha razão, eu a havia
julgado mal e a culpa do meu filho ter fugido não era dela, ela não havia
tirado ele de dentro da minha casa e já fazia muito tempo que ele não estava
lá e eu nem havia percebido sua ausência.

— Me desculpe — fui o primeiro a falar e ela pareceu soltar o ar


com força enquanto Pedro se aproximava da piscina para falar com Davi, vi
quando água espirrou para fora da piscina quando as crianças se
aproximaram da borda, molhando os sapatos dele.

— Tudo bem.

— Vamos, Davi! — chamei.

— Deixe-o ficar — pediu a vizinha e olhei para ela.

— Ele saiu de casa sem avisar. Não posso deixá-lo.

— Eu sei, ele errou, mas é só uma criança. Deixo-o ficar e depois,


quando levá-lo para casa mais tarde, converse com ele e explique o quanto
foi errado, mas não tire a alegria dele agora, veja como está feliz. Ele disse
que nunca tem amiguinhos para brincar — disse ela e eu puxei o ar com
força.

Ela tinha razão e era a primeira vez que ele fazia aquilo. Olhei para
ele na piscina, todo feliz com a nova amiga, parecendo contar tudo ao
Pedro, então decidi que o deixaria ter seu momento de diversão e mais tarde
conversaríamos sobre o que ele havia feito de errado. Me dei conta naquele
momento também da conversa que ele estava tendo quando eu estava
parado à porta do seu quarto, não era com o tablet, mas sim com a
garotinha.

— Oi — disse a garotinha, sorrindo para mim.

— Oi — respondi.

— Você quer brincar na piscina com a gente? — convidou ela. —


Minha titia não pode, ela tem que trabalhar.
— Não posso entrar na água agora, mocinha — respondi, tentando
não parecer duro.

— Por que? Você é um homem tão grande e não sabe nadar numa
piscina pequenininha como essa? Tia, coloca bóias de braço nele — sugeriu
a garotinha e Pedro e Sofie riram.

— Ah, vai ficar uma graça — zombou Pedro.

— Pedro, já atingiu sua cota por hoje.

— Pode brincar com Davi na piscina, se quiser — sugeriu a vizinha.

— Não, tudo bem, mas se não for incomodar, eu gostaria de ficar ali
por perto, só para vigiar — falei.

— Eu estava cuidando deles o tempo todo — disse ela.

— Eu sei, não estou dizendo o contrário de forma alguma. Eu só


sou... meio sistemático com o meu filho. E assim, você pode trabalhar mais
tranquila também, eu fico ali de olho neles e não atrapalho o seu trabalho —
falei e ela arqueou uma sobrancelha para mim, provavelmente se lembrando
da última vez em que estava trabalhando e eu estava por perto. — Eu
prometo! Só não pode ler em voz alta perto das crianças.

— Não me ofenda! Não tenho experiência como mãe, mas não sou
idiota, jamais leria algo como aquilo perto das crianças e nem estou
escrevendo nada naquele sentido no momento — disse ela, ficando
vermelha.

— Aquilo o que? — perguntou Pedro, se aproximando.

— Nada demais — respondi, poupando-a de ter que explicar, ela já


estava corada o suficiente, aliás a pele dela ficava linda naquele tom.
— Tudo bem — respondeu Pedro, parecendo desconfiado. — Bom,
eu já vou indo. Fique tranquilo, vou pegar minhas coisas e encosto a sua
porta — disse, se encaminhando para a minha casa e só acenei em resposta,
mas ele não deu dez passos antes de se voltar para nós. — Acho que você
tem visita — falou para a vizinha que franziu o cenho.

— Jura? — perguntou se virando e começando a dar a volta na casa.

— Ah, não, bem, se era aqui, já foi.

Estiquei o pescoço a tempo de ver um carro preto passar na rua e


virar a esquina.

— Acho que não era aqui não, eu não conheço o carro — disse ela.

— Estranho, estava parado em frente a sua casa.

— Que estranho mesmo! Bem, se não for engano a pessoa volta —


disse ela.

— Sim, bem já vou indo então. Até mais — disse Pedro e acenei de
volta assim como Sofie.

Ela voltou até mim.

— Pode se sentar onde se sentir mais confortável, vou pegar uma


limonada.

— Não precisa — respondi.

— Tudo bem, eu faço questão — disse, entrando na casa.

Peguei uma das cadeiras que estavam ali e a coloquei perto da


piscina, do lado de onde as crianças brincavam.

— Olha, papai — disse Davi, virando uma cambalhota na água.


— Eu também sei fazer — disse a garotinha e o imitou.

Eles estavam na parte rasa da piscina e ainda assim estavam seguros


pelas bóias de braço. Sofie caminhou até mim com uma bandeja com quatro
copos de limonada.

— Venham, crianças! O sol está muito quente, bebam a limonada


geladinha.

— Não está muito gelado? — perguntei, me levantando quando ela


entregava o primeiro copo ao Davi, então ela me encarou.

— Não vai fazer mal. Está gelada, mas a água da piscina está mais
— disse ela e eu fiquei sem graça.

— Você tem razão. Não vai fazer mal.

— Não, não vai — disse sorrindo e entregou o outro copo à


garotinha. — Desculpe, nada de copos de vidro na beirada da piscina —
falou me entregando um copo de plástico com um canudo maluco acoplado
e eu sorri.

— Você diz não ter experiência como mãe, mas tem itens na sua
casa que gritam maternidade — falei, aceitando o copo. O canudo tinha
olhos de caranguejo.

— Ah, não! Os copos só gritam “eu sou uma tia divertida que gosta
de agradar a sobrinha” — disse ela sorrindo e não consegui evitar sorrir
também.

Sofie olhou para o céu, na direção do sol forte, tapando os olhos


com uma das mãos e depois se voltou para mim novamente.

— Você pode ficar ali na sombra, sabe?! Eles estão seguros e são só
uns cinco passos de diferença — disse ela.
— Eu... eu prefiro assim — falei.

— Tudo bem, então.

— Pode trabalhar tranquila, eu vou ficar aqui de olho neles.

— Está certo — disse e voltou para o lugar que estava antes, do


outro lado da piscina, pegou o notebook no colo outra vez e lançando um
último olhar em minha direção, voltou a digitar furiosamente.
Capítulo 8

Os vizinhos já haviam ido embora e eu tinha acabado de colocar


Pietra no banho quando vi uma movimentação pela janela, alguém parecia
estar andando do lado de fora da casa e me perguntei se Raul tinha
esquecido algo do Davi ali.

— Oi? — chamei, mas não responderam. — Oi?

Comecei a caminhar para a porta da frente, para onde ele parecia ter
ido, abri a porta, mas ele não estava ali, então saí.

— Vizinho?

Da ponta da varanda olhei para um lado e para o outro, mas


ninguém estava ali.

— Que estranho! — falei ao perceber que não havia ninguém ali,


então me virei para entrar em casa, mas um homem bloqueava a porta e
acabei soltando um grito de susto.

— Oh, me desculpe, eu não quis assustá-la, querida — disse o


homem.

— Quem é você? — perguntei em alerta.

— Eu sou o Malvo.

— Malvo? — perguntei, confusa.

— Sim, eu... sou... amigo do seu irmão — disse ele, dando passos
em minha direção.
— O Jordan não está aqui.

— Eu sei disso. A Pietra está?

Nesse momento passei por ele e puxei a porta, fechando-a, mas não
sem ele segurar o meu braço, deixando-me do lado de fora, junto com ele.

— O que você quer?

— O Jordan, bem... ele me deve.

— Não sei quando ele vai voltar e não tenho nada a ver com as
coisas dele.

— Eu sei, querida — disse pegando uma mecha do meu cabelo que


havia se soltado do coque.

— Não toque em mim! — falei, exaltada e ele sorriu.

— É o seguinte, vadia! — disse, pressionando seu corpo ao meu na


parede, segurando com força o meu maxilar. — O seu irmão me deve muito
dinheiro e eu nunca perco, então você vai pagar.

— Eu não tenho dinheiro — falei com dificuldade pelo aperto dele.

— Vai ter que dar o seu jeito, porque se não me pagar com dinheiro,
vai ter que me pagar de outra forma — disse, levando sua perna ao meio
das minhas. — Caso contrário, seu irmão que está na cadeia não vai nem
chegar ao julgamento, porque vou mandar matá-lo e será bem doloroso para
ele, me entendeu?

Meus olhos ardiam de desespero e pelo aperto em meu maxilar que


doía muito.

— Tia? — ouvi Pietra chamando.


— Ah, a doce Pietra está aqui também! — disse ele e me debati,
para impedi-lo de ir até ela.

— Deixe ela em paz! — gritei e consegui empurrá-lo.

— Ei, o que está acontecendo aí? — A voz forte de Raul veio do


outro lado da cerca.

— Diga que está tudo bem, ou eu vou voltar e não vou poupar a
pequena Pietra — ameaçou o homem em tom baixo para que só eu ouvisse.

— Está tudo bem, vizinho — respondi tentando não vacilar a voz.

— Tem certeza? — perguntou Raul, se aproximando mais.

— Sim — respondi, mas mantinha meus olhos no homem à minha


frente.

— São setenta e dois mil. Você tem um mês a partir de hoje — disse
o homem e começou a caminhar para fora do meu quintal.

— Ei? — chamou Raul.

— Raul, não! Está tudo bem — falei, chamando a atenção dele que
se voltou para mim outra vez, chegando na varanda em poucos passos.

— Você está bem? — perguntou.

— Sim. Era só o meu tio, nos desentendemos, foi só isso.

— Precisa de alguma coisa? Quer que eu chame a polícia? Ele


parecia agressivo.

— Não, pode ficar tranquilo, ele é inofensivo — menti sem


conseguir encará-lo.
— Se você diz.

— Obrigada mesmo assim.

— Não por isso. Ah, eu queria agradecer por hoje. Davi se divertiu
muito.

— Tudo bem, foi um prazer, ele pode vir quando quiser, a Pietra
também adorou — falei, tentando sorrir, mas não o deixe se aproximar
muito ou perceberia que eu estava tremendo.

— Tiaaaaa? — Pietra chamou outra vez.

— Eu preciso entrar, boa noite!

— Boa noite — respondeu ele.

Entrei rápido em casa, me encostando à porta, tentando me acalmar


e entender o que havia acontecido.

— Tiaaaaa?

— Eu já estou indo, querida — respondi e tentei me controlar, indo


até ela, para tirá-la do banho.

Cobri Pietra em minha cama e voltei para a sala. Separei as abas da


persiana com os dedos e espiei do lado de fora, tudo estava tranquilo, não
havia ninguém. Nem sinal daquele homem, mas eu sabia que a ameaça era
real. Eu precisava do dinheiro, então sabia o que teria que fazer. Voltei ao
meu quarto, acendi a luz do abajur e fechei a porta, deixando Pietra
dormindo tranquila e voltando para a sala com o meu celular, então liguei
para ela.

— Oi amiga, e aí tudo bem?

— Estou bem — menti. — E você?

— Estou ótima! Amiga, entro no palco a qualquer momento.

— Certo! Ah, pode ver se consegue aquela vaga para mim? — pedi
sem jeito.

Houve um silêncio do outro lado da linha.

— Aída?

— Ah, sim, é claro, amiga. Eu só fiquei surpresa. Vou ajeitar isso


para você hoje mesmo — disse, animada.

— Obrigada!

— Você sabe que não tem que me agradecer por isso. Mais tarde eu
te ligo, amiga, estão me chamando. Beijo, eu te amo.

— Também te amo — finalizei.

Não acreditava que estava fazendo aquilo, mas eu não tinha outra
saída. O dinheiro que eu tinha mal estava me sustentando, e agora eu ainda
tinha a minha sobrinha para sustentar, e para piorar a situação, teria que
pagar uma dívida absurda de Jordan. E tinha a faculdade... eu teria que
trancar a faculdade e encontrar alguém para cuidar da Pietra enquanto eu
estivesse trabalhando à noite como stripper.

Quando foi que a minha vida virou de ponta cabeça daquele jeito?
Louise era uma garota de dezessete anos que morava nas
proximidades e tinha ótimas referências como babá. Ela cobrava por hora e
estava disponível para cuidar de Pietra de quinta à domingo, os dias em que
eu trabalharia na boate.

A garota havia chegado mais cedo na minha casa no primeiro dia de


trabalho para que eu apresentasse ela à Pietra e explicasse tudo e assim que
terminei, ouvi Davi chamando. Pietra saiu correndo na direção da porta da
frente, de encontro ao novo amiguinho e eu a acompanhei.

— Oi Pietra. Tia Sof — ele havia aprendido a me chamar daquele


jeito e eu adorava.

— Oi Davi — Pietra e eu respondemos em uníssono.

— Boa noite! — cumprimentou Raul, que vinha se aproximando


pela cerca.

— Boa noite — respondi de volta.

— Tia Sof, vem jantar em casa com a gente, meu pai fez uma
comida deliciosa e a gente pode jogar videogame — disse Davi, todo
afobado e animado.

— Oba! — gritou Pietra.

— Ah...

— Venham! — insistiu Raul.


— Podemos, tia, por favor! — pediu Pietra, juntando as mãozinhas
em súplica.

— Ah, eu sinto muito, hoje não vai dar — recusei.

— Qual é, Sofie?! Deixe as crianças se divertirem, venham.

Eu estava surpresa com o convite dele, parecia sincero e eu adoraria


ir, mas não podia.

— Eu sinto muito, mas estou saindo para trabalhar e Pietra vai ficar
com a babá.

— Não sabia que tinha outro trabalho que não fosse seus livros —
disse Raul.

— Pois é, eu precisei — falei, olhando na direção da Pietra e ele


entendeu, assentindo com a cabeça.

— Precisa de ajuda? — perguntou.

— Não, tudo bem. Consegui uma babá.

— Certo, então deixe ao menos elas jantarem em casa e as crianças


jogarem uma hora de videogame. Prometo que aviso assim que saírem da
minha casa e estiverem dentro da sua.

— E como pretende me avisar? — perguntei estreitando os olhos em


sua direção.

— Uma mensagem, talvez?!

— É uma desculpa para pegar o meu telefone? — zombei.

— É, eu acho que é isso também — disse ele e me surpreendi.


— Eu estava brincando com você.

— Eu não — admitiu e fiquei sem reação por um momento, ficamos


nos encarando em silêncio por alguns segundos.

— Tia Sof, você vai namorar o meu pai? — perguntou Davi,


cortando o silêncio e Pietra soltou uma risadinha.

— Bem que ela quer, Davi — brincou Raul.

— Engraçadinho!

— Vamos lá, Sofie, deixe-os jogar um pouco, a sua babá também


vai, e como eu disse, você me passa o seu telefone e eu te aviso assim que
elas estiverem em sua casa.

Olhei para a babá, por um momento.

— Ele é o vizinho? Se você confia nele, por mim tá ok! Também


posso te avisar assim que estivermos de volta — disse ela.

— Por favor, tia — pediu Pietra e em seguida Davi repetiu seu


pedido.

Não consegui dizer não aqueles dois anjinhos lindos.

— Tudo bem, mas vocês vão me avisar quando estiverem de volta


— falei com a babá. — E se vocês dois fizerem bagunça, não deixo mais —
falei.

As crianças comemoraram e Raul sorriu para mim.

— Obrigado — disse ele.

— Tudo bem — falei conferindo as horas no celular. — Preciso ir


ou vou me atrasar. Louise, me avise assim que estiverem de volta.
— Tudo bem — disse a garota.

— Se lembra de tudo que te expliquei? — perguntei.

— Sim, senhora. Vá tranquila, qualquer coisa eu te ligo — disse ela.

— Certo! Chego por volta da 1h da manhã como combinamos —


falei e não me passou despercebido a forma como Raul franziu as
sobrancelhas.

— Tudo bem, vá tranquila!

— Você também, qualquer coisa enquanto elas estiverem lá, me


ligue — falei para Raul.

— Tudo bem.

Virei-me e saí em direção ao meu carro na garagem, seguindo para o


trabalho logo em seguida.
Capítulo 9

Estacionei meu carro a duas quadras da boate e terminei de chegar a


pé. Aída já me aguardava na entrada dos fundos.

— Ah, estou tão animada que vamos trabalhar juntas. Estou feliz
que tenha tomado essa decisão, mas estou curiosa, o que te fez mudar de
ideia?

— Jordan está preso e Pietra veio morar comigo — despejei de uma


vez.

— Como é que é? — perguntou surpresa.

— Exatamente isso que você ouviu.

— Mas o que aconteceu com o cabeçudo do Jordan?

— Podemos não falar nisso, por favor, estou esgotada desse assunto.

— É claro, amiga, você sabe que pode conversar comigo quando e


se quiser, não é?

— Claro que sei.

— Ótimo, desculpe, mas tenho que perguntar. Onde está a baixinha?

— Ficou em casa com a babá.

— Certo, então agora você também precisa pagar uma babá, vamos
entrar logo para eu te apresentar a todo mundo.
— Não, Aída, não quero ser apresentada a todo mundo — falei e ela
suspirou.

— Tudo bem, mas ao Andreas você vai ter que ser apresentada. Ele
é o chefe, então não tem como correr.

— Tudo bem.

— Vem comigo e não se preocupe, ele é legal — disse ela, pegando


na minha mão e me arrastando para uma sala no mezanino da boate.

O lugar ainda estava fechado, então todas as luzes estavam acesas e


não tocava música alguma, mas diversos funcionários circulavam por ali,
arrumando tudo.

— Andreas? — chamou ela ao bater na porta do que parecia ser um


escritório.

— Entre, Aída — permitiu a voz masculina.

Um homem bonito e jovem estava sentado à mesa, tinha grandes


óculos de grau no rosto e um porte elegante. Eu jamais diria que alguém
como ele seria o chefe de um lugar como aquele.

— Esta é a Sofie, a garota que te falei — disse minha amiga e só


então seu chefe tirou os olhos do papel, me encarando por um momento que
pareceu longo demais, mas não me deixei abater.

— Não se encolhe com uma simples encarada, já é um bom começo.


Então, você sabe dançar...

— Sofie — informei meu nome.

— Você sabe dançar, Sofie? — repetiu ele.

— Sei.
— Então vamos ver — disse ele, indicando a porta pela qual
entramos e se levantou.

Descemos as escadas e seguimos em direção a um grande palco que


imaginei ser o central da boate. Ele se encaminhou até a mesa de som e
falou com o homem que estava lá e então retornou até nós, sentou-se em
uma das luxuosas poltronas e fez sinal para que Aída se sentasse ao seu
lado.

— Suba e dance — disse ele.

Sem questionar eu subi. Still don’t know my name do Labrinth soou


alto no recinto e me assustei com o estrondo, as sobrancelhas de Andreas se
arquearam em minha direção e dei graças por ter escolhido ir de scarpins
até lá, o salto me ajudaria, apesar da calça jeans.

Devagar, fiquei de costas para a barra de pole dance e deslizei por


ela até ficar de joelhos no chão. Apoiei as duas mãos no chão, ficando um
pouco inclinada para frente, deixando a música me levar, abri um pouco
mais os joelhos, deslizando no chão e depois fechei um pouco, fazendo meu
quadril subir e descer, então inclinei o corpo para frente, deslizando as mãos
enquanto meu quadril subiu bem no alto e minhas costas abaixadas, meu
rosto colado no chão com os cabelos espalhados, evidenciando o
movimento da minha bunda.

Depois, abaixei o quadril, deitando no chão por completo,


levantando meus pés para trás, deixando os saltos encostarem na minha
bunda, erguendo o quadril em seguida e logo depois o tronco também,
jogando a cabeça para trás, alcançando com as mãos a barra de ferro, me
puxando e colando minhas costas à barra.

Girei meu corpo, levantando uma das pernas para passar pela barra e
então me levando, ondulando o corpo. Continuei meus movimentos,
deixando me levar pela música, assim como eu fazia nas aulas e quando
percebi o som parou ao final da canção e Andreas estava de pé me
aplaudindo.

— Se fez isso sem nem se preparar e sem estar vestida corretamente,


imagino o que pode fazer nas situações adequadas. Está contratada!

Aída sorriu grande e eu só assenti com a cabeça, descendo do palco


em seguida.

— Você começa hoje mesmo! Seu turno é o primeiro — disse


Andreas e saiu.

— Eu falei que você conseguia — disse Aída.

— Preciso do trabalho, amiga, mas ainda não estou convencida de


que quero isso.

— Deixa de ser boba, aqui todo mundo é amigável e quando as


portas se abrirem, todos estarão de máscaras, ninguém de fora vai te
reconhecer e ninguém de dentro pode contar quem você é, fique tranquila
— disse ela e eu soltei o ar com força, me dando por vencida, aquilo ia
realmente acontecer.

— Não consigo ficar tranquila — falei e a vi conferir o celular que


tocava e rejeitar a chamada em seguida.

— Olha, eu vou estar do seu lado, tá. A boate é um ambiente


diferente, mas vamos tentar deixar as coisas mais leves. E pense, seu talento
é indiscutível, o salário é excelente e você vai ganhar muitas gorjetas —
falou rejeitando mais uma chamada

— É só nisso que estou tentando pensar, no dinheiro.

— Então pronto, seu turno é o primeiro, no máximo meia-noite já


estará saindo daqui e vai embora hoje mesmo com os bolsos cheios, isso vai
te animar com certeza.
— Eu espero que sim.

— Então venha, temos que falar com a Landa, ela é quem arruma os
figurinos — disse rejeitando uma terceira chamada.

— Está tudo bem? — perguntei apontando o celular.

— Sim — disse simplesmente, mas parecia nervosa.

— Aída, sabe que pode contar comigo para qualquer coisa.

— Eu sei — disse ela, me abraçando em seguida. — Fica tranquila.

Assim seguimos até a mulher que arrumava os figurinos.

Quase uma hora depois a boate estava aberta, cheia de clientes, eu


maquiada, vestida em um conjunto de lingerie azul marinho que se
destacava em minha pele, olhando para Aída que vestia uma lingerie igual a
minha, mas de cor vermelha que deixava sua pele chocolate ainda mais
sedutora, ambas usávamos um salto ridiculamente alto e máscaras de renda
que cobriam parcialmente o rosto.

— Boa sorte, amiga — disse ela, me abraçando.

— Obrigada, a você também — respondi, retribuindo o abraço.

— É hora do show! — disse ela, indo para o seu posto enquanto fui
para o que me foi indicado.
O primeiro palco em que eu dançaria era um dos pequenos, haviam
sete homens sentados ali, todos bebendo e me olhando dançar como se eu
fosse um pedaço de carne. Ao final de duas músicas, me aproximei e eles
me encheram de notas de dinheiro, então fui para o próximo palco, assim
como haviam me instruído. Mais duas danças e muito mais dinheiro, a
diferença desse era que a maioria daqueles homens sequer prestaram
atenção à dança, mais fumavam e discutiam sobre algo, passando os olhos
por mim vez ou outra, mas o dinheiro estava lá. Então segui para o
próximo.

Às 23h45m Andreas mandou me chamar em seu escritório.

— Mandou me chamar? — perguntei depois de entrar em sua sala.

— Sim. Vejo que a sua primeira noite de trabalho foi proveitosa.


Recebi muitos elogios. Como foram as gorjetas?

— Recebi isso aqui — falei, mostrando todo o dinheiro.

— Certo, eu não vou conferir. Aqui funciona o seguinte, quando for


sair, passa pelo Elias na saída de funcionários, acima da mesa dele tem uma
câmera, você conta as suas gorjetas ali e deixa vinte por cento. O restante é
seu. Pode voltar amanhã. Por hoje é só.

— Obrigada — falei e ele me dispensou com um aceno de mão.

Voltei ao camarim geral onde outras garotas estavam se produzindo


para ainda entrarem no palco, troquei de roupa, peguei minha mochila,
deixei o dinheiro da boate com o homem indicado e fui para casa.
Capítulo 10

A noite havia sido divertida. Davi e Pietra tinham jogado


videogame, jantado e brincado bastante. Louise, a babá, era educada e
embora ficasse bastante no celular, mantinha sempre os olhos em Pietra.

Davi e eu as acompanhamos até a porta de casa e só retornamos


quando elas estavam trancadas pelo lado de dentro. Meu filho já estava na
cama dormindo quando peguei uma cerveja e me sentei no quintal. No
quintal da vizinha para ser mais exato. Eu gostava dali, era onde eu
costumava ficar quando pensava que a casa era minha, era o lugar perfeito
para ver o que eu queria.

Vi quando ela chegou, estacionou o carro, pagou a babá e a


dispensou. Ela se deitou no gramado mesmo, nem havia notado a minha
presença ali. Sofie ergueu o rosto para o céu noturno, deixando a luz do luar
banhar sua face. Primeiro ela ficou de olhos fechados e só depois os abriu e
ficou por alguns minutos admirando a noite. Não consegui me conter,
levantei-me e caminhei até ela.

— Está uma noite realmente bonita hoje — falei.

— Você me assustou — disse ela, mas nem havia se movido.

— Desculpe, não foi a minha intenção — falei, me sentando ao lado


dela e em seguida, me deitando também. — Foi um bom primeiro dia de
trabalho?

— É, pode se dizer que sim — respondeu.

— Você não parece muito animada.

— Eu estou sim. E muito grata por ter conseguido o trabalho.


— E posso saber no que está trabalhando?

Ela ficou em silêncio por um momento.

— Trabalho de garçonete — disse, por fim.

— Não gosta do trabalho? Alguém mexeu com você, por isso parece
incomodada? — perguntei, curioso.

— Não. Foi tudo tranquilo — disse, mas parecia desconfortável.

Eu queria saber o que havia acontecido, mas não podia invadir a sua
privacidade, ela havia me contado até demais, então resolvi mudar de
assunto.

— A lua parece maior que o normal hoje — observei.

— Isso porque hoje temos uma superlua.

— Isso realmente existe? — perguntei e ela se sentou rápido.

— É claro que sim! — falou, me encarando como se eu fosse louco.


— Acontece quando a lua cheia atinge um ponto chamado Perigeu, é
quando ela mais se aproxima da terra. O tamanho dela aumenta em quinze
por cento e ela fica trinta por cento mais brilhante, mas temos a sensação
dessas proporções serem bem maiores e ela fica absolutamente perfeita —
despejou de uma vez, muito animada de repente.

— Isso é sério? — perguntei.

— É claro que é.

Eu sabia que era, mesmo sendo formado em arquitetura e


urbanismo, havia estudado astronomia porque amava, mas queria vê-la
explicar tudo com aquela animação e devoção que combinava com a minha.
Afinal, era exatamente pela Lua Cheia de Perigeu que eu havia ido me
sentar ali.

— Nossa, isso é realmente muito interessante. Não sabia que uma


Miss Quinta Série teria conhecimentos assim — mexi e ela me acertou de
leve na barriga, como se fosse uma brincadeira.

— Então quer dizer que a Miss Quinta Série superou os


conhecimentos do tiozão? — zombou.

— É, eu acho que sim. Ei? Tiozão? Não me faça te castigar,


garotinha.

— Até parece! — brincou e aproximei minha mão do seu cabelo


para tirar uma folha que havia ficado presa ali.

Seu olhar alcançou o meu e algo diferente brilhou neles. Tirei a


folha sem nem mesmo olhar mais para seus cabelos e os acariciei de leve,
os cachos eram macios e cheiravam a coco, meus olhos presos nos dela. Me
aproximei um pouco mais, por instinto e a vi fazer o mesmo.

Algo agitou meu peito, algo que pensei que não sentiria de novo.
Não, não era amor, não era paixão, mas uma agitação que fazia meu sangue
correr rápido nas veias. Eu sabia que tinha que me afastar, levantar e ir
embora naquele momento sem olhar para trás. Sabia que se não fizesse
naquele momento, não teria forças para fazer depois, eu podia sentir ela
derrubando minhas barreiras, o coração querendo estourar as costelas, o
sangue fluindo rápido e eu nem havia beijado a garota. Sabia que estar
preso em seu olhar não era bom, mas que se conseguisse escapar, ele
correria para seus lábios e era lá que eu terminaria de me perder e não teria
volta.

Puxei o ar com força enquanto ela parecia fazer o mesmo e me


preparei para me levantar, mas meus olhos traidores cometeram o erro que
eu sabia que não poderia cometer, recaíram sobre a boca de lábios cheios e
vermelhos que imploraram para serem beijados.
Então eu a beijei.

Sentir a maciez e a umidade daqueles lábios nos meus quase me


enlouqueceu e achei que meu coração sairia pela boca, eu parecia um
maldito adolescente beijando a primeira garota na vida. Eu a deitei na
grama, cobrindo parcialmente seu corpo com o meu sem parar o beijo e ela
não ofereceu resistência alguma, beijando-me de volta na mesma
intensidade.

Acariciei seu rosto enquanto minha língua deslizava pela sua,


sentindo o seu sabor doce e quente ao mesmo tempo e eu não conseguia e
nem queria acabar com aquele beijo, mas quando precisamos de ar e beijei
sua bochecha, Sofie se levantou e entrou em casa sem dizer nenhuma
palavra.

Me joguei para trás na grama, deitado de costas outra vez e encarei a


superlua que havia sido testemunha do nosso beijo. Eu não sabia dizer se
tinha passado dos limites, já que ela havia me correspondido na mesma
intensidade e eu não conseguia me arrepender de tê-la beijado. Não foi um
erro. Se Davi não contasse, aquele beijo havia sido a melhor coisa na minha
vida em muito tempo. Ela havia chegado e mudado tudo por ali, agitado as
coisas, me enlouquecido um pouco, confesso, mas também me fez lembrar
de que sou homem também e não só pai. E eu gostava de me sentir daquela
forma também.

Respirei fundo e me levantei. Havia ganhado minha noite e tinha


sido uma grata surpresa, então voltei para a minha casa.
Três dias haviam se passado e eu não tinha falado mais com Sofie.
Via Pietra correndo pela casa, mas tive só o vislumbre de sua tia pelas
janelas e como o tempo estava chuvoso, elas não haviam saído para o
quintal. Tinha ido chamá-las duas vezes, inventando desculpas
esfarrapadas, mas em ambas as vezes Pietra disse que Sofie estava no
banho. Eu a vi sair e chegar do trabalho, mas não a incomodei.

Na segunda-feira de manhã, Davi estava muito animado para o seu


primeiro dia de aula. O carro de Sofie deixava a sua garagem quando
saímos pela porta da cozinha, entramos no meu carro e seguimos para a
escola.

Estacionei perto do portão da escola. Muitas crianças chegavam


acompanhadas de seus pais, algumas sorridentes, outras nem tanto. Davi era
do time que não se cabia de tanta animação. Eu me sentia feliz por ele
iniciar uma nova etapa, mas também um pouco ofendido por observá-lo não
ver a hora de seguir aquilo sem mim.

Sorri para mim mesmo, que bobeira me sentir daquela forma, mas
aquele garotinho tem sido a minha vida. Tínhamos passado por muita coisa,
vê-lo seguir em frente daquela forma era uma vitória. Terminamos de fazer
o caminho até o portão da escola a pé, um garotinho passou correndo por
nós e trombou em Davi, quase fazendo-o cair, ele chegou a dar alguns
passos trôpegos, mas o segurei antes que caísse.

— Está tudo bem, filho? — perguntei, preocupado, me abaixando


para ficar da sua altura.

Davi sorriu grande, sem perder nenhum pingo da animação que


sentia.
— Tá tudo bem, pai. Foi só um esbarrão — disse ele e franzi a testa.

— Você tem razão — concordei e sorri de volta.

Juntos demos os últimos passos até alcançar o portão do colégio.

— Desculpe, senhor, mas a partir deste portão somente os alunos


podem entrar — disse a mulher simpática que recepcionava os alunos.

— Mas é o primeiro dia dele — falei.

— Eu entendo, senhor, mas é a política da escola. Acredito que o


senhor esteja ciente das regras.

— Bem, sim, mas pensei que por ser o primeiro dia dele...

— Pai — Davi me interrompeu, puxando a minha camiseta preta.

— Sim — respondi.

— Eu entro, tá tudo bem.

— Tem certeza?

— Claro, né pai?! É só escola — disse o óbvio.

— É, é só escola — concordei.

Davi deu alguns passos para dentro, mas retornou em seguida,


parando em minha frente e eu me abaixei para abraçá-lo.

— Vai ficar tudo bem, pai — disse ele, retribuindo o abraço e me


dando tapinhas nas costas. — Não precisa chorar, você já é grande.

Eu ri e sequei os olhos.
— Você tem toda razão. Obrigado por me lembrar disso. Eu te amo,
carinha! Vai lá!

— Eu também te amo — disse ele e se preparou para entrar outra


vez.

— Espera, só mais um minutinho, só mais um abraço.

— Tá bom, pai — disse Davi, sorrindo.

O sinal da escola tocou, informando que era o momento de ir para a


sala de aula.

— É só dizer qual a sua série para aquela moça ali e ela vai te ajudar
a encontrar a sua sala — a mulher no portão disse para o Davi que assentiu
com a cabeça e a agradeceu, correndo para dentro em seguida.

Eu estava sentindo aquela mudança mais do que ele.


Capítulo 11

Depois de deixar Davi na escola, segui para a empresa para a


reunião que tinha com o responsável pela empresa Campana e logo depois
seguimos para uma inspeção na obra. Fazia anos que eu não atendia um
cliente pessoalmente e para ser sincero, eu sentia muita falta daquilo, era o
que eu amava fazer.

— Que bom te ter de volta aqui, cara — comemorou Pedro,


entrando em meu escritório que havia sido mantido.

— Acostume-se, estarei aqui todos os dias.

— É isso aí, cara.

Era quase 15h e eu comecei a guardar minhas coisas na pasta.

— Já vai? — perguntou meu amigo.

— Sim, tenho algo a fazer antes de buscar o Davi na escola.

— É claro. E como está a dona encrenca? — perguntou, se referindo


a Sofie.

— Ah, não a vi nos últimos dias, mas acredito que deva estar
ocupada trabalhando.

— Uhn, e esse sorrisinho quando falei o nome dela significa o quê??

— Que sorrisinho? Não tem sorriso nenhum, está imaginando coisas


— me defendi, mas sabia que ele tinha razão.

Eu estava louco para vê-la outra vez.


— Se você está dizendo — zombou.

— Tô indo — cortei, passando por ele.

— Até amanhã.

— Até.

Dirigi até em casa, desci do carro e observei a casa de Sofie, estava


tudo fechado e em silêncio. Ela provavelmente não estava em casa, mas
ainda assim eu devia algo a ela.

Tirei os sapatos e as meias, também a camisa social branca e entrei


na piscina. Caminhei alguns poucos passos, mas senti uma movimentação
estranha ali na parte mais funda. Então ela emergiu. Os cabelos cacheados
e geralmente volumosos estavam só ondulados e encharcados, dando a ela
um ar sexy pra caralho. O biquíni preto destacava ainda mais sua pele clara.

— Tá querendo me matar de susto? O que está fazendo aqui? —


perguntou, assustada.

— Desculpe, não foi a minha intenção. Eu não sabia que estava na


piscina, não a vi.

— Não me viu, por isso invadiu? — perguntou, sorrindo agora.

— Não invadi. Em primeiro lugar você disse que podíamos vir


quando quiséssemos, e em segundo lugar, na verdade vim fazer outra coisa.

— Que outra coisa poderia fazer na minha piscina? — perguntou


nadando para trás até chegar à mesa de ferro que ainda estava ali, sentando-
se nela.

Nadei até ela, parando a poucos centímetros.


— Bem, essa belezinha aí veio parar aqui dentro por minha culpa.

— Não foi bem culpa só sua — disse ela, fazendo uma cara de
culpada que achei bonitinha. Não consegui evitar sorrir.

— Não, mas eu poderia ter te ajudado e não fiz.

— Como uma criança pirracenta — zombou.

Passei a mão pelos meus cabelos, retirando o excesso de água, um


pouco constrangido por ela ter razão sobre o meu comportamento infantil
naquele dia.

— Sim, como uma criança pirracenta — admiti e ela me presenteou


com um enorme sorriso. — Eu queria me desculpar, por isso vim até aqui,
para tirar a mesa daqui de dentro.

— Sabe que já me acostumei com ela aqui.

— Posso deixá-la se quiser, mas acho que ter onde apoiar o


notebook enquanto escreve no jardim ao invés de ficar com ele sobre as
suas pernas pode ajudar com essa sua dor nas costas — falei e ela arregalou
os olhos.

— Como sabe que ando com dor nas costas?

— Tenho visto suas caretas enquanto tenta se alongar.

— Ah — balbuciou sem jeito. — É, o melhor a fazer é levar a mesa


para o lugar dela mesmo. Mas é muito pesada, não acho que vai conseguir
tirá-la sozinho e neste caso, a minha ajuda não faria muita diferença.

— Não me insulte, garota. Eu dou conta — falei e a vi engolir em


seco, se remexendo na mesa. — Mas você realmente vai precisar sair daí de
cima.
Ela riu, subitamente parecia nervosa, desviando o olhar do meu e se
remexendo um pouco, como se estivesse desconfortável.

— Está tudo bem aí? — perguntei.

— Sim, ah... — Ela parecia realmente desconfortável.

— Então...? — questionei, achando graça do nervosismo dela, que


revirou os olhos.

— Está bem, estou com um problema — admitiu e suas bochechas


ficaram coradas como jamais tinha visto, mesmo no dia em que a flagrei
lendo aquela cena erótica ruim.

— Tudo bem, o que está acontecendo? — perguntei, curioso e Sofie


cobriu o rosto com as mãos.

— É a minha cadhsus — disse ela, a última palavra inteligível.

— O quê?

Sofie liberou um resmungo de frustração. Dei mais um passo,


ficando bem perto e segurei seus pulsos com gentileza, afastando-os de seu
rosto. Ela fechava os olhos apertados com força.

— Sofie? — chamei.

— Uhm — resmungou.

— Qual o problema? Eu não consegui entender o que você disse —


falei e ela resmungou em frustração outra vez. — Olhe para mim — pedi,
mas ela negou com a cabeça. — Ei, se não me disser o que está
acontecendo, não posso te ajudar.

— É a minha calcinha — disse de uma vez, ainda com os olhos


fechados.
— O quê? — perguntei, surpreso e ela respirou fundo, enfim
abrindo os olhos, me encarando com o rosto ainda muito vermelho.

— A minha calcinha saiu. Perdi ela na água — despejou de uma vez


e senti meus olhos se arregalarem.

— Então... você... está... pelada?

— Sim, estou — admitiu com um gemido de frustração em seguida.

— Ah — foi só o que consegui dizer.

Porra, ela só podia estar de sacanagem comigo!

— Meu Deus, não acredito nisso.

— Tudo bem, eu... vou mergulhar e achar a sua calcinha pra você —
sugeri.

— Isso não pode ficar mais humilhante, né? — perguntou irritada e


eu não consegui segurar a risada. — Não ria, idiota!

— Desculpe! — pedi, tentando segurar o riso.

— Encontre de uma vez a calcinha — pediu, abaixando as mãos em


direção às pernas, provavelmente tentando tapar as partes íntimas.

— Não se preocupe, não vou olhar para você.

— Eu acho bom — disse com a voz um pouco mais estridente que o


normal.

Não consegui evitar o sorriso e ela parecia me fuzilar com o olhar.


Enchi os pulmões de ar e mergulhei, tentei olhar por todos os lados em
busca da calcinha, mas não foi necessário esforço nenhum. A pequena peça
de tecido preto estava logo abaixo dos pés dela, só um pouco para trás, mais
embaixo da mesa. Me preparei para me aproximar mais, mas ela surtaria
quando percebesse que eu estava perto demais, então emergi.

— Eu encontrei — falei.

— Então me entregue — exigiu, esticando a mão em minha direção.

— Não está comigo. É que ela está bem embaixo dos seus pés,
pouca coisa para trás.

— Eu pego então — disse ela, descendo da mesa, tentando alcançar


a calcinha com os pés. — Droga! Droga!

— O que foi?

— Eu a perdi.

— Bem, você pode se abaixar e mergulhar para pegá-la.

— É — disse simplesmente, e tomando uma respiração profunda,


ela se abaixou na água.

Ela parecia desajeitada e passou quase um minuto inteiro lá


embaixo, provavelmente vestindo a calcinha. Seus pés tocaram as minhas
pernas e então ela emergiu, mas não parecia feliz.

— O que foi?

— Não encontrei — disse, irritada.

— Como assim não encontrou? Estava logo abaixo de você.

Ela suspirou.

— Eu não consigo abrir os olhos embaixo da água.


— Mas você não estava mergulhando agora mesmo?

— Sim, mas me guio pelos meus outros sentidos, não consigo abrir
os olhos, me dá agonia demais — disse, se sentando na mesa outra vez.

— Tá legal, eu vou lá pegar — falei e ela assentiu.

Enchi os pulmões de ar e submergi. Toquei o fundo da piscina e com


uma braçada só, cheguei na mesa. Sofie estava sentada sobre ela, as pernas
cruzadas. Não olhei para cima para não desrespeitar a privacidade dela.

Me estiquei, segurando um dos pés da mesa e alcancei a peça


pequena. Quando tentava sair debaixo da mesa, um dos pés de Sofia roçou
levemente as minhas costas, o movimento havia sido involuntário, já que a
senti recolher o pé depressa.

Assim que sai debaixo dos seus pés, meus olhos involuntariamente
recaíram nas unhas bem feitas e foram subindo lentamente por suas pernas
até os joelhos enquanto eu emergia devagar. As coxas torneadas,
acomodadas sobre a mesa ainda sob a água. O que parecia ser uma
tatuagem marcava a sua pele na linha do quadril, eu não conseguia
distinguir o desenho naquele momento. Só me dei conta do que estava
fazendo quando meus olhos atingiram o ponto em que suas mãos tapavam.
Sacudi a cabeça, tentando tomar meu foco de volta e segui os poucos
centímetros até a superfície.

— Aqui está — falei, estendendo a peça para ela.

Como havia emergido do ponto onde estava, bem abaixo, eu havia


ficado realmente bem perto dela. Eu pretendia entregar a peça e me afastar,
mas os olhos dela desceram para os meus lábios. A vi engolir em seco logo
após sua língua umedecer com gentileza seu lábio inferior.

Porra, eu precisava beijá-la de novo. Me aproximei e minha mão


tocou a sua bochecha, eu parecia hipnotizado pelos lábios vermelhos e
macios dela que eu sabia exatamente qual era o gosto.

Sofie parecia na mesma sintonia que eu e fechou os olhos ao sentir


meu toque em seu rosto. Porém, algo - provavelmente vindo do quinto dos
infernos - a fez sair daquela bolha de encanto em que estávamos presos. Ela
balançou a cabeça de um lado para o outro, como se tentasse dissipar a
sensação e, rápido demais, tirou a calcinha da minha mão, empurrando-me
em seguida.

Mesmo que ela não tenha usado praticamente força nenhuma, e que
dentro da água tinha menos impacto ainda, soltei meu corpo para trás,
afundando na água para esfriar a cabeça rapidamente e já voltando à
superfície.

— Como se atreve a chegar tão perto assim? Eu estou sem calcinha


— disse, se remexendo, provavelmente vestindo a calcinha.

— Olha, isso às vezes ajuda — provoquei enquanto boiava.

— Cretino! — se irritou e eu gargalhei. — Tire a mesa de dentro da


piscina!

— Sim, senhora — zombei e me virei, vendo-a sair da piscina. — E


pare de me olhar!

Eu ri outra vez.

— Como sabe que estou olhando pra você?

— Você é um velho babão, para onde mais estaria olhando? —


zombou, ainda de costas.

— Não me provoca, garota! — falei e a vi sorrir sobre o ombro.

Nadei de volta até à mesa enquanto Sofie entrava na casa. Tirar a


mesa de ferro dali não foi nada fácil, a água parecia empurrá-la para baixo
enquanto eu tentava levantá-la, mas enfim consegui.

— Pega — disse Sofie, entregando-me uma toalha para eu me secar.

— Obrigado! — agradeci, jogando a toalha sobre o ombro esquerdo.

Peguei a mesa, dessa vez com mais facilidade já que estava fora da
água e a levei até seu devido lugar. Então comecei a me secar com a toalha.

— Obrigada por retirar a mesa — disse ela.

— Não há o que agradecer.

— Bem, aproveite que está de tão bom humor e roce a grama —


brincou, rindo em seguida.

— Tudo bem...

— O quê? — perguntou, confusa de repente.

— Eu roço a grama. Hoje preciso buscar o Davi na escola — falei


conferindo as horas no relógio à prova d’água. — Amanhã preciso ir à
empresa de novo, mas na quarta eu roço, pode ser?

— Não — negou.

— Como é?

— Eu estava brincando com você. Não tem que fazer isso.

— Não custa nada. Vou roçar a minha e já roço a sua, não é trabalho
algum, é só atravessar a cerca.

— Então eu vou pagar. Diga o preço — disse, quase ofendida.

— Sofie, não vou cobrar dinheiro de você, pelo amor de Deus.


— Eu faço questão de pagar — disse e tive uma ideia.

— Ok — concordei.

— Diga o preço.

— Um encontro comigo — sugeri e os olhos dela saltaram em


surpresa.

— O quê? Não! — negou e eu sorri.

— Por que não?

— Porque... Porque... — Sofie tentava encontrar uma desculpa e


arqueei as sobrancelhas, encarando-a. — Porque... você... Porque você é
velho — a última frase, depois que ela parou de gaguejar, saiu com a voz
estridente e eu ri.

— É sério? Sou tão velho assim pra te causar repulsa? — zombei,


sabia que tinha mais idade que ela, mas também estava bem ciente de que
eu não era um homem de se jogar fora, tinha que dar um jeito na barba
descuidada, mas não era feio, mantinha meus exercícios em dia com a
academia que tinha em casa e era bem consciente sobre meu corpo chamar
atenção, mesmo depois que Magda foi embora e decidi não me relacionar
mais com ninguém, via os olhares femininos em minha direção e havia
recebido inúmeros convites para sair, alguns até mais diretos. E mais do que
qualquer outra coisa que pudesse importar, eu sabia muito bem que ela
havia gostado daquele beijo tanto quanto eu.

Os olhos de Sofie escorregaram para meu peito e em seguida minha


barriga, minha calça social pendia nos quadril, mas estava molhada da
piscina e o tecido grudava em minhas coxas. Não consegui evitar o sorriso
ao mirar o olhar de cobiça dela sobre mim.
— Então, quando vamos sair para jantar? — perguntei, atraindo sua
atenção.

— Não posso, eu tenho namorado — despejou de uma vez,


desviando os olhos dos meus.

— Isso aí é mentira! — acusei.

— É mesmo — admitiu, torcendo as mãos.

— Então, quando? — insisti.

— Não corte a grama, Raul. Eu não vou sair com você — disse com
a voz calma.

— Tudo bem — concordei com um suspiro, precisava respeitar a


decisão dela. — Mas eu posso saber porquê? — perguntei e ela me encarou
outra vez.

— Somos vizinhos, agora que estamos em paz não podemos correr


o risco.

— Risco de quê?

— Disso virar uma guerra de constrangimento de novo quando as


coisas derem errado — disse e eu fiquei pensativo por um momento.

— Quando foi que você decidiu que algo que nem começou ainda
vai dar errado?

— Não me leve a mal. Você é um pai perfeito, tem sido um vizinho


gentil, mas não é homem para mim — disse e se virou para se afastar, mas
segurei seu braço, fazendo-a se voltar para mim outra vez.

— Ei, espera! O que quer dizer com eu não sou homem para você?
— perguntei e ela suspirou.
— Eu não sou como essas mulheres que você está acostumado.

— Eu sei disso! E é por isso que estou interessado em você. Olha só


— falei e ela me encarou. —, quando vim pra cá, para tirar a mesa da
piscina, eu tinha esperanças de te encontrar, mas também prometi a mim
mesmo que não ia tentar te levar para a cama... embora eu queira muito isso
também — admiti e ela riu.

— Se não está tentando me levar para a cama, está fazendo o quê?

— Te tratando como você merece. Vamos jantar, conversar, nos


conhecer.

— E depois?

— Depois a gente vê o que rola, isso quem vai decidir vai ser você.
Vou ser o que você quiser que eu seja. Quer me conhecer a fundo primeiro?
Ok, por mim tudo bem. Quer que sejamos amigos com benefícios? Eu topo.
Ficar comigo sem compromisso? Tô dentro também. Se for pra ser algo
mais, vamos deixar rolar e ver no que dá.

— Vai aceitar mesmo se eu quiser ser só sua amiga? — perguntou,


arqueando uma sobrancelha para mim.

— Não é exatamente o que eu desejo, mas se você me conhecer e


essa for a sua decisão final, eu vou aceitar. Eu vou ser o que você precisar
que eu seja.

Ela me encarou por um longo tempo.

— Eu não sei!

— Eu não vou te magoar, Sofie — Ao menos não intencionalmente


foi o que pensei.
— Posso pensar?

— Mantemos pelo menos um jantar hoje para as crianças


brincarem? Acredito que seja a sua folga.

— Tudo bem — concordou, sorrindo.

Já era um começo.
Capítulo 12

Tomei uma chuveirada rápida e me vesti. Precisava buscar Pietra na


escola. Ela ainda não estava na idade obrigatória de ir, mas como Jordan
trabalhava fora, ele havia matriculado ela para iniciar naquele ano e aquela
ideia já estava plantada em sua cabecinha, então não tive como evitar.

Eu tinha evitado Raul o fim de semana todo, depois do beijo. Eu


gostei demais, mas não podia deixar aquilo me dominar. Eu estava com
problemas sérios e precisava resolvê-los, não podia me distrair, mas um
jantar não faria mal, as crianças estariam lá, o que de mais poderia
acontecer?

Já de noite, Pietra estava ansiosa pelo jantar.

— Vamos tia, vamos!

— Calma, querida. Estou secando meu cabelo.

— Posso te esperar no jardim então?

Eu a encarei, os olhinhos suplicantes, as mãozinhas se retorcendo,


ela estava realmente feliz em jantar na casa dos vizinhos. Eu sorri para ela.

— Pode, mas não é para correr para a casa dos vizinhos, é para me
esperar no jardim.

— Tá bom — disse ela, agarrando-se às minhas pernas por um


segundo e em seguida correndo para fora.

Sorri para mim mesma no espelho e voltei a secar os cabelos, faltava


muito pouco. Quando finalizei, passei um lápis preto nos olhos, gloss nos
lábios, ajeitei o vestido e encarei o meu reflexo no espelho.
— Não é um encontro. É só um jantar civilizado entre vizinhos para
as crianças brincarem — repeti isso duas vezes, mas nem eu mesma
acreditava naquilo.

Ensaiei um sorriso educado, tentando aparentar calma.

— Boa noite, vizinho! Ah, obrigada, você também está muito


bonito... — ensaiei. — Ah, que droga eu tô fazendo?

Raul era um homem experiente, farejaria qualquer sinal de


nervosismo meu, não adiantava ensaiar. Suspirei e me encarei no espelho
uma última vez. Era hora de ir.

Encostei a janela do quarto, em seguida a da cozinha e a da sala,


então segui para a porta da frente. Enquanto trancava a porta, ouvi uma
risadinha de Pietra, Davi devia estar com ela. Coloquei a chave no bolso e
segui para a lateral da casa. Meu coração quase parou com o que vi.

Pietra ria enquanto tentava acariciar um passarinho azul que estava


na mão de Malvo, o traficante para quem meu irmão devia dinheiro.

— Afaste-se dela agora — ordenei, tentando fazer com que minha


voz não vacilasse.

Andei rápido até eles, colocando Pietra atrás de mim, ficando entre
os dois. Malvo sorriu de forma nojenta para mim, deslizando o olhar pelo
meu corpo, estremeci.

— O que você quer? — perguntei, deixando o nervosismo


transparecer.

— Ele é amigo do papai, tia — disse Pietra em toda a sua inocência.

— Vá embora — falei.
— Tudo bem — disse ele, piscando um olho para mim. — Tchau,
Pietra.

— Tchau — disse ela, animada, sem nem imaginar o perigo que


corria.

O homem se afastou, entrou em seu carro e partiu. Meu coração


batia rápido e minhas pernas tremiam.

— Vamos, tia?

— Só um minuto, querida — pedi.

— Tá cansada? Você trabalhou muito enquanto eu estava na


escolinha? — perguntou com doçura.

— Sim, querida. É isso — falei e me ajoelhei à sua frente, pegando


as suas mãozinhas e olhando em seus olhos. — Já não conversamos sobre
falar com estranhos?

— Mas ele é amigo do papai.

— Como você sabe disso? Já viu ele antes?

— Não, mas ele me disse que é amigo dele — disse com uma
inocência assustadora.

— Mas ele mentiu. Não quero que você fale com estranhos, muito
menos com aquele homem. Tudo bem? — falei e ela desviou os olhinhos.
— Combinado, Pietra? — usei um tom mais duro do que eu pretendia.

— Tudo bem. Você tá brava comigo? — Os olhinhos pareciam


juntar lágrimas.

— Não, não querida. Eu não estou brava, venha aqui.


A puxei para um abraço e em seguida sequei seus olhinhos.

— Está tudo bem. Vamos para a casa do Davi?

— Siiim!

Me levantei, pegando na sua mão e atravessando a cerca. Tentei me


acalmar enquanto seguia para a casa do vizinho e respirei fundo antes de
bater na porta.

— Elas chegaram! Elas chegaram! Elas chegaram! — Davi


praticamente gritava dentro da casa e eu podia ouvir seus pezinhos correndo
de um lado para o outro.

Raul lhe disse algo que não consegui entender o que era e em
seguida abriu a porta com um grande sorriso, aquele que fazia minha
calcinha ficar molhada mesmo sem querer.

— Oi — disse ele. — Sejam bem-vindas.

— Obrigada — Pietra e eu respondemos em uníssono.

Raul abriu espaço para que entrássemos e assim fizemos. A casa


dele era de muito bom gosto e estava muito bem arrumada. O cheiro de
assado perfumava toda a casa.

— O cheiro está bom — falei.

— Espero que o sabor também esteja — brincou Raul.

— Papai, podemos jogar videogame? — pediu Davi.

— É claro que podem — concedeu Raul e então se virou para mim


outra vez. — Uma taça de vinho? — ofereceu.

— Ah, eu não...
— É a sua folga. Uma taça não vai te trazer problema algum.

— Tudo bem — concordei e ele sorriu.

Raul seguiu até o que achei que fosse a cozinha e eu o acompanhei.


O lugar era grande, eu podia ter uma piscina, mas a casa dele era imensa e
muito melhor do que a minha. Tudo ali tinha requinte e gritava dinheiro.

— Você é rico, por acaso? — perguntei sem nem me dar conta da


asneira que estava falando.

Raul riu enquanto pegava a garrafa de vinho e duas taças.

— Se eu disser que sou, te convenço a me beijar? — perguntou,


divertido, servindo o vinho.

— Não — respondi no mesmo humor que ele.

— Não sou nenhum milionário, mas tenho alguma coisa — se


gabou, chegando perto e me entregando uma taça.

— Metido — zombei e ele sorriu mais.

Olhei para uma cristaleira cheia de peças que eu não duvidava que
fossem de cristal.

— Isso é... — eu perguntaria para ter certeza, mas quando me virei


para ele, sua boca pegou a minha de surpresa em um beijo cálido e rápido.
— Eu disse que não teria vantagem por ser rico — falei quando ele se
afastou alguns centímetros e bebeu da taça.

— Eu sei.

— Você disse que me deixaria escolher como as coisas seriam, não


pode me beijar.
— Sofie, prometi que você é quem decidirá como as coisas vão ser,
mas isso não quer dizer que eu não vá tentar te roubar tantos beijos quanto
eu puder — disse e eu engoli em seco enquanto ele tomava outro gole.

— Não pode fazer isso — falei, mas minha voz estava baixa, eu
estava estranhamente hipnotizada pela gota de vinho que se alojou na suave
curva do seu lábio inferior.

Raul sorriu um pouco e umedeceu os lábios com a língua,


recolhendo a gota de vinho e deu um passo à frente, ficando a poucos
centímetros de mim. Ele se abaixou um pouco, deixando seu rosto na altura
do meu e como se não fosse nada, passou a ponta da língua em meus lábios.

— A gente pode fazer o que quiser, Sofie. E vamos. Só cabe a você


decidir se vamos deixar isso entre nós ou explanar pro mundo — disse e se
afastou.

Ele podia ter bem mais idade que eu, mas era bonito e sexy como o
inferno, e sabia exatamente como usar isso à seu favor.

Raul soltou a taça, enquanto eu bebi todo o vinho da minha. Ele se


abaixou e conferiu o assado e em seguida as panelas sobre o fogão.

— Mais uns cinco minutos e já vou servir — disse ele, se virando


para mim e serviu mais uma taça de vinho.

— Está querendo me deixar bêbada? — brinquei.

Ele me olhou surpreso e interrompeu o movimento que fazia para


me entregar a taça.

— Você é fraca para bebidas alcoólicas?

— Não.
— Ah, ótimo! Não posso correr o risco de ao fim da noite te dar o
melhor beijo da sua vida e você ter a desculpa que só gostou porque estava
bêbada — disse, me entregando enfim a taça.

— O seu ego é impressionante!

— Eu sei, mas faço jus a ele, não se preocupe.

— Convencido!

Raul se aproximou de mim, mas não teve tempo suficiente para


qualquer aproximação maior, já que as crianças entraram na cozinha.

— Tio Raul? — chamou Pietra.

— Pietra, o Raul não te deu liberdade para chamá-lo assim — eu


tentava explicar, mas Raul me interrompeu.

— É claro que dei. No dia em que ela e a babá jantaram aqui.

— Ah, eu não sabia disso! — falei e Pietra deu uma risadinha.

— O que você quer, princesa? — perguntou Raul, abaixando-se para


ficar de frente com Pietra.

— Davi disse que você faz os melhores cupcakes com gotas de


chocolate.

— Ele disse é? — Raul sorriu para ela e para o filho que estava ao
lado dela.

— Sim — admitiu Davi.

— Podemos fazer? — pediu Pietra.

— Não! — neguei. — Pietra hoje o Raul já fez o jantar.


— Você é maluca? — perguntou Raul para mim. — Como pode
dizer não a esses olhinhos lindos de princesa? É claro que faremos, logo
após o jantar.

— Oba — comemoraram as crianças e correram para a sala.

— Está mimando demais ela. A babá me disse que no sábado e no


domingo levou sobremesa para elas.

— Eu queria mimar você também, mas você não parece muito


propensa a me permitir isso.

— Tudo o que você diz tem que ser tão... tão... — falei e ele
arqueou as sobrancelhas, estava claramente se divertindo. — Ah, esquece!

— Estamos só conversando e estou sendo sincero. Vai ver que tenho


razão quando admitir no fim da noite que eu te dei o melhor beijo da sua
vida.

— Lembre de marcarmos o próximo jantar mais cedo. Pelo visto,


quando você janta tarde assim, fica sonhando acordado porque, tendo a
idade que tem, já passou muito da hora de dormir, tadinho — zombei.

— Não me provoca, garota! — advertiu e eu ri. — Se bem que...


não me passou despercebido que você disse o próximo jantar, isso quer
dizer que estou no caminho certo — disse, voltando para o fogão.

— Não fique se achando. Foi só uma brincadeira, eu não decidi


nada.

— Tudo bem, não estou preocupado. Se isso aqui não te convencer


— disse, tirando o assado do forno e colocando sobre a pia, bem perto de
onde eu estava —, meu beijo te convence.
Ele olhou bem dentro dos meus olhos para dizer isso e se aproximou
um pouco. Eu estava parecendo aquelas adolescentes bobonas, encantadas
com o jogador popular. Pensei que ele fosse me beijar, mas não, ele tocou a
ponta do meu nariz com o dedo indicador e sorriu.

— Desculpe, não consigo me controlar quando estou perto de você.


É muito divertido mexer com você, te provocar assim — admitiu enquanto
cortava o assado para servir.

— Então, o lance do melhor beijo...

— Ah, não! Isso é verdade mesmo, não é provocação — disse,


encarando sério e depois riu. — É tão fácil mexer com você.

— Não seja idiota, Raul!

— Desculpe, desculpe! Prometo que vou tentar me controlar. Pode


chamar as crianças para jantarmos?

— É claro!
Capítulo 13

O jantar correu bem e tranquilo. A comida estava saborosa e as


crianças adoraram. Conversamos e demos muita risada com as novidades
que Davi e Pietra tinham para contar sobre a escola.

Raul era muito organizado, havia somente a louça que usamos


durante o jantar para lavar, todo o restante que fora usado para os preparos
ele já tinha organizado, lavado e guardado. As crianças voltaram para a sala
e me levantei da mesa, começando a recolher os pratos.

— O que está fazendo? — perguntou ele.

— Você fez o jantar. Eu lavo os pratos.

— Nada disso! Você é minha convidada.

— Você já teve trabalho com o jantar. Não é justo.

— Não tive trabalho nenhum com o jantar e vou ter menos ainda
com esses pratos — disse ele, abrindo uma das portas do armário, revelando
uma lavadora de louças, onde o que eu imaginei ser a louça utilizada para
preparar o jantar estava.

— Ah, trapaceiro! — brinquei e ele riu.

— Não é trapaça. É praticidade.

— Com toda certeza.

Raul pegou os pratos das minhas mãos e os colocou na lavadora,


assim como todas as outras coisas que havíamos sujado. Em seguida,
retirou uma tigela do armário e a colocou sobre a mesa.
— Pode me fazer o favor de pegar a farinha nessa porta bem atrás
de você? — pediu ele.

— É claro — respondi e abri a porta, pegando o que ele pediu. —


Aqui está!

— Obrigado — disse ele, pegando o pote de farinha, se inclinando e


dando outro beijo em minha boca, como se aquilo fosse algo natural entre
nós. — O que foi? — perguntou quando não me movi após ele se afastar,
pegando outros utensílios.

— Você sabe o que foi — falei, balançando a cabeça em negativa,


mas sorria e ele sorriu também.

Com agilidade, Raul começou a colocar ingredientes e mais


ingredientes e em menos de cinco minutos uma massa lisa e encorpada
estava pronta, apenas esperando as gotas de chocolate.

— Uau — falei, vendo-o colocar as gotas de chocolate na massa. —


Não é muito doce para as crianças comerem à noite?

— Relaxa, não tem muito açúcar, especialmente o chocolate. Prova


aqui — ofereceu, colocando um pedaço do chocolate na minha boca.

Seu polegar acariciou meu lábio inferior, enviando arrepios por todo
o meu corpo que ansiava por ele. Era inacreditável como tudo o que Raul
dizia ou fazia, soava puramente sexual e excitante.

— Que tal? — perguntou, parecendo naquele momento, alheio ao


que causava em mim.

— Muito bom.

— Ótimo! Vamos colocá-los para assar — disse, colocando a massa


nas forminhas e em seguida, no forno.
— Eu vou ver as crianças — falei e segui para a sala, tentando fugir
um pouco daquela aura excitante que no momento só eu parecia estar
percebendo.

Davi e Pietra jogavam um jogo de corrida de carros no videogame e


riam horrores. Fiquei ali observando-os. Pietra era a mais animada dos dois,
isso porque ela estava vencendo. O carrinho de Davi às vezes ultrapassava o
dela, mas parava e assim ela passava à frente outra vez. Não consegui
deixar de sorrir quando percebi o que acontecia: Davi estava deixando ela
vencer.

O carrinho de Pietra passou a linha de chegada antes do dele, dando


a vitória a ela. A garotinha ficou eufórica, soltou o controle e abraçou Davi
de forma desajeitada. O garoto sorriu também, ainda mais quando ela lhe
deu um beijo na bochecha, ele ficou surpreso e seus olhinhos quase
saltaram, foi a coisa mais fofa de se ver.

— O que está acontecendo? — a voz de Raul soou ao meu ouvido,


me assustando.

— Ai que susto, está tentando me matar?

— Não de susto — disse ele, com aquele maldito sorriso de lado e


olhou para as crianças em seguida. — Então, o que está acontecendo? Por
que estamos comemorando?

— Pietra venceu o Davi no jogo de corrida — falei e Raul pareceu


achar graça.

— Ela é tão boa assim? O Davi deve estar desconsolado, é o jogo


que ele melhor joga.

— Não, ela é bem ruim na verdade.

— O que? — perguntou se virando para mim outra vez.


— É que o Davi é um cavalheiro, sabe — brinquei.

— Ah, estou sendo cavalheiro com você também. Eu fiz o jantar e


assei cupcakes.

— Mas me beijou sem a minha permissão — falei, baixando o tom


da voz para que as crianças não nos ouvissem e o sorriso de lado voltou aos
lábios dele.

— Tudo bem. Posso te beijar? — pediu, zombando e arqueei uma


sobrancelha. — Ah... por favor?

— Ridículo! Estou com sede — falei e voltei para a cozinha,


precisava de um copo d’água.

Antes que eu pudesse pegar um copo, Raul me segurou pela cintura,


me girou, deixando-me de frente para ele, me levantou e colocou sentada
sobre um dos balcões, uma de suas mãos entremeou meus cabelos e os
segurou forte, expondo meu pescoço onde seu nariz deslizou, fazendo-me
ficar ofegante, e quando seus lábios alcançaram minha orelha ele disse:

— Posso assar cupcakes, mas ainda sou homem, não consigo deixar
de te desejar. Não sei como você colocou esse feitiço em mim, nem te
provei e já tenho a certeza de que seremos incríveis juntos, Sofie. Você tem
que me dar uma chance.

— Não vou transar com você — tive forças para dizer, mesmo meu
corpo gritando o contrário das palavras que eu dizia.

— Não. É claro que hoje não. Eu sei disso e não tem problema
algum. Sei ser paciente, não vou desistir de você.

Antes que eu pudesse responder, sua mão em meu cabelo guiou


minha boca para a dele, dando oportunidade de eu recusá-lo, mas não o fiz
e nem queria fazer. Um sorrisinho surgiu em seus lábios enquanto nos
beijávamos e eu sabia que estava perdida. Nossas línguas se acariciavam
em uma sintonia perfeita e a cada segundo daquele beijo eloquente, eu me
sentia cada vez mais e mais quente, propensa a receber qualquer coisa que
ele quisesse me oferecer.

O barulho de pezinhos correndo pelo chão de piso laminado e


risadinhas soou perto demais. As crianças estavam para entrar na cozinha.
Em um rompante de desespero para que elas não nos pegassem daquele
jeito, uma das minhas mãos que estava em seus cabelos curtos, os puxou,
separando-nos e segurei seu queixo abrindo a sua boca.

— Tia, o que você tá fazendo? — Pietra perguntou, parada ao lado


de Davi que também nos observava.

— Vendo se tem algum dente estragado na boca do Raul.

— Tem que escovar os dentes, tio Raul.

— Você tem toda razão, princesa — disse ele de forma desajeitada,


já que por nervoso eu ainda segurava sua boca aberta.

Aquilo tinha ido de zero a cem rápido demais.

Soltei Raul, que mordeu o lábio inferior para não rir.

— O cupcake está pronto, papai? — perguntou Davi.

— Está quase, só mais alguns minutinhos.

— Tá bom — concordou Davi e correu para a sala junto com Pietra.

Raul riu e empurrei seu ombro quando ele tentou se aproximar outra
vez.

— Vou olhar o forno, me ajuda com um leite quente para as


crianças? — pediu.
— É claro.
Capítulo 14

Depois das crianças comerem o cupcake com o leite quente,


iniciamos uma disputa de meninas contra meninos no videogame. Davi e
Pietra decidiram após algumas partidas que torcer por mim e Raul enquanto
jogávamos era mais divertido, até porque Davi não tinha coragem de ganhar
de Pietra. O mesmo não acontecia com Raul em relação a mim, precisei me
esforçar para ganhar algumas partidas.

Quando percebemos, estávamos competindo e as crianças dormiam


no grande e macio sofá. Raul pegou uma manta que estava em um cesto
bonito perto do sofá e os cobriu.

— Não precisa cobrir a Pietra. Já está na hora de ir embora — falei.

— Ah, qual é?! Fica mais um pouco. Agora que eles dormiram,
podemos conversar mais tranquilos — disse e jogou outra manta sobre as
minhas pernas. — Já faz anos que moro aqui na Alemanha, mas não me
acostumo com esse clima mais fresco à noite durante o verão.

— Então você não é daqui? — perguntei, encarando-o.

— Não, eu sou brasileiro.

— Meu Deus, eu jamais adivinharia. Você fala tão bem o alemão,


não dá para perceber sotaque algum. Eu podia jurar que você era daqui.

— Me mudei para cá há alguns anos. E não é só o meu alemão que é


bom — zombou.

— Você não toma jeito — brinquei e toquei meu ombro no dele.


— Desculpa, eu não consigo evitar. Enfim, vim à trabalho para a
Alemanha junto com Pedro e a nossa equipe e resolvemos nos estabelecer
aqui.

— Pedro, o ruivo — lembrei dele.

— Sim. E você o que faz da vida?

Senti o gelo correr pelas minhas veias.

— Escrevo livros de romance, você sabe. — Não era mentira.

— Disso eu sei — falou, tocando a ponta do meu nariz com o


indicador. — Estou falando do seu novo emprego, o dos fins de semana,
engraçadinha.

Eu podia ouvir meu coração batendo forte, odiava mentir, nem sabia
fazer aquilo e era uma merda.

— Eu... eu sou... — Não podia dizer que era dançarina strepper.


Raul me encarava, paciente, em expectativa. — Eu sou garçonete.

— Foi o que me disse no outro dia. E está gostando?

— Não é exatamente o que quero — eu falava do real emprego que


eu tinha —, mas é o que preciso nesse momento — finalizei olhando para
Pietra que dormia serena.

— Entendo. Quando você se mudou, nas vezes que conversamos,


naquele dia da sua festa, não cheguei a ver Pietra.

— Ela não estava comigo ainda.

— Ela disse que o pai está viajando.


— É, mais ou menos isso — falei, sem conseguir esconder meu
descontentamento com a situação de Jordan.

— Ele está com problemas? Precisa de algum tipo de ajuda?

— Não — menti, mas sem querer dar mais lado para aquela
conversa.

— Tudo bem — concordou ele, parecendo perceber meu


desconforto.

— Vou para casa — anunciei e me levantei.

— Eu diria que está cedo, porque quero que fique mais, mas acho
que já tive mais do que mereço hoje — falou e eu ri de leve. — Obrigado
por vir. Obrigado pela companhia, por tudo. Ah, por ver se tinha dentes
estragados na minha boca também.

Eu ri enquanto me inclinava para pegar Pietra.

— Deixa que eu pego ela — ofereceu.

— Tudo bem, eu posso levar.

— Me deixa fazer isso, me deixa te ajudar — pediu e tive a


impressão de que ele não falava só sobre carregar a Pietra para mim até em
casa.

Então ele a pegou nos braços, enrolando-a na manta que estava


sobre as minhas pernas a minutos atrás e eu ajeitei a outra sobre Davi.

Raul colocou Pietra no quartinho que eu havia arrumado para ela e a


cobriu, logo estávamos na porta da frente da minha casa.

— Obrigada por hoje — agradeci e fui sincera.


— Sou eu quem tem que agradecer — disse ele. — Vamos repetir,
as crianças gostam de brincar e eu... também.

A voz dele estava baixa, ele se aproximou e me beijou de leve.

— Está pronta para admitir? — perguntou e eu sabia do que ele


estava falando. Desviei o olhar, mas sua mão gentil acariciou meu rosto,
puxando meu olhar de volta para o seu. — Tudo bem, eu já sei a resposta.
Boa noite!

— Boa noite, convencido — respondi, sorrindo.

Raul me deu um beijo na bochecha e então seguiu pelo gramado até


atravessar a falha na cerca viva.

— Ah, você vai escrever ainda hoje? — perguntou ele e franzi as


sobrancelhas.

— Na verdade, sim.

— Tá legal! Se precisar de inspiração para aquelas cenas, já sabe


onde me encontrar. Estou à disposição!

Eu ri e ele acenou com a mão, então terminou seu caminho até sua
casa, parando na varanda, esperando que eu entrasse e fechasse a porta, para
só então entrar também.

Na terça à noite, Aída veio para a minha casa. Enquanto eu


preparava o jantar, ela brincava com Pietra. Pela janela da cozinha, vi Raul
na varanda. Ele acenou para mim e acenei de volta.
— Quem tá lá fora? — perguntou Aída, me assustando.

— Que droga, Aída, você me assustou! — falei, enquanto ela


esticava o pescoço para olhar para fora.

— Quem está lá? É o vizinho? — perguntou, curiosa.

Eu não havia contado nada a ela ainda.

— Não.

— Mas você acenou — disse, estreitando os olhos na minha direção.

— Acenei para o Davi — menti.

— O Davi tá lá fora? — Pietra perguntou, animada.

— Não, querida. Eu o vi pela janela.

— Quem é Davi? — Aída quis saber.

— É o filho do tio Raul — respondeu Pietra.

— Do tio Raul? — Aída perguntou a Pietra, mas olhava para mim


com ar sugestivo.

— Pietra, querida, pode desligar a televisão para jantarmos? — pedi


e ela correu para a sala.

— Então transformou o vizinho gostosão em tio da Pietra e nem me


contou nada, sua safada?

— Não é assim.

— Me conta como é então — disse, zombeteira, movimentando as


sobrancelhas.
— Mais tarde, eu conto. Depois que a Pietra dormir, pode ser?

Seus olhos se arregalaram.

— Sua vadia, então você pegou ele mesmo. Que delícia!

— O que é uma delícia? Eu também quero, tia — disse Pietra em


toda a sua inocência, entrando na cozinha outra vez.

— Não é nada disso — sussurrei para Aída. — Uma delícia é a


lasanha que vamos jantar.

— Lasanha de novo, tia? Não fica triste, mas eu gosto mais da


comida do tio Raul — disse ela e Aída mantinha os olhos estreitos em mim.

— Vocês comem muito na casa do tio Raul, Pietra?

— Às vezes.

— Só jantamos lá uma vez — corrigi.

— Eu já jantei duas vezes e quando a tia sai pra trabalhar de noite,


ele trás doce pra gente — Pietra entregou.

— Nossa, que atencioso! — disse Aída, cheia de más intenções.

— Já chega de falar dos vizinhos. Essa é uma noite das meninas,


vamos manter o foco em nós. Comam antes que esfrie — falei, tentando
cortar o assunto.

Aída me infernizaria mais tarde, então não tinha porque ficar me


torturando durante o jantar também, era melhor beber, então virei toda a
taça de vinho de uma vez. Jantamos em um clima divertido, Pietra tinha
muito para contar sobre o segundo dia na escolinha, estava muito animada e
era bom vê-la daquele jeito.
Depois do jantar, Aída pintou as unhas de Pietra de rosa neon e
depois, fez o mesmo com as minhas unhas dos pés enquanto minha
sobrinha estava deitada no meu colo e assistíamos um filme infantil sobre
trolls coloridos e felizes. Não demorou muito para que Pietra dormisse e
Aída se ofereceu mais do que depressa para levá-la para a cama.

Escorreguei no sofá e fingi dormir, só para irritá-la, pois sabia que


não poderia fugir daquela conversa.

— Não se faz de sonsa não, Sofie — disse ela e eu podia imaginá-la


com as mãos na cintura, parada à minha frente, me encarando com cara de
deboche, então eu ri. — Estou morrendo à minguas aqui já tem mais de
hora, pode me contar tudo agora mesmo.

Sentei-me e ela se sentou ao meu lado, me encarando, parecendo


uma criança esperando ouvir um conto de fadas, mas eu sabia que o conto
de fadas que ela esperava tinha um pouco mais de safadeza.

— Nós nos beijamos — joguei direto e a maluca pulou no sofá,


ficando de joelhos.

— Como você fala isso assim do nada?

— Ué, não era o que você queria ouvir?

— Sim, mas eu esperava pelo menos um eu tentei evitar, estávamos


querendo nos matar e blá blá blá e só depois o beijo — falou, rindo.

— Decidi simplificar pra você.

— Mas e daí? O que rolou?

— Ué, nos beijamos, foi isso.


— Não, eu quero detalhes, Sof — pediu e eu revirei os olhos. —
Espera!

Aída se levantou e correu para a cozinha, voltando minutos depois,


abrindo um grande pote de sorvete de morango e me entregando uma das
colheres que ela havia trazido.

— Agora estamos prontas de verdade para essa conversa. Vamos lá,


quero os detalhes sórdidos.

— No primeiro dia de trabalho na boate, quando cheguei e fui para


o jardim ver a superlua, ele estava lá.

— E?

— Conversamos um pouco, ele me fez rir...

— Ah, é claro, os que fazem rir são os mais prejudiciais para nós.
Começa com brincadeirinhas e quando percebemos estamos rindo na cama
deles, eu te entendo.

— Não seja tonta — falei, rindo. — Acredite, ele não é desse tipo.

— Do que te leva pra cama?

— Do tipo engraçado.

— Ah, sim, ele é bem do tipo gostoso mesmo — disse ela e eu


revirei os olhos. — E então?

— Então depois do beijo, agi como uma adolescente e corri pra


dentro de casa.

— Por quê?

— Porque não posso me distrair agora.


— Para com isso, vocês são adultos! — Para ela parecia simples, ela
não tinha ideia do que estava acontecendo de verdade, sabia que Jordan
estava preso, mas nem imaginava a situação da dívida dele. — Por favor,
me diz que não foi só isso — pediu e eu sorri. — É isso aí, garota!
Continua!

— Ontem... ai meu Deus, não dá pra contar isso.

— O que? Me conta logo, vou morrer aqui — disse com a boca


cheia de sorvete.

— Eu estava nadando na piscina enquanto a Pietra estava na escola


ontem. Estava tentando espairecer para escrever, já estava cansada e tensa.

— Ele te ajudou a tirar essa tensão? — perguntou, maliciosa.

— Não! — quase gritei. — Mas se parar para pensar, se fosse isso


teria sido menos ruim.

— Ai meu Deus, o que rolou? — perguntou em expectativa e ao


invés de responder, enchi a boca de sorvete, enrolando. — Sofie? — quase
gritou, tomada pela curiosidade e eu ri.

— Meu Deus, foi o maior fiasco, a maior vergonha da minha vida.

— O que? — perguntou quase me espremendo no sofá.

— Conversamos, ele estava dentro da piscina também porque ia


tirar a mesa de lá e quando fui me sentar na mesa que estava dentro da
piscina, não sei que merda aconteceu, a calcinha do biquíni enroscou e saiu.

Ela franziu o cenho, como se não tivesse entendido direito.

— Como assim?
— Tipo assim, a calcinha saiu e eu fiquei pelada dentro da piscina
com o vizinho lá dentro — contei e ela me encarou, séria por um momento,
parecia estar absorvendo a informação.

Do nada minha amiga começou a gargalhar.

— Que merda! Ou isso foi extremamente excitante ou muito


constrangedor — disse ela.

— Constrangedor! Com certeza foi muito constrangedor.

— Mas e daí? Continua.

— Ele não ia embora e não tive outra escolha a não ser contar que
estava sem a calcinha — falei e ela gargalhou outra vez.

— E daí?

— E daí que eu tentei pegar a calcinha, mas não consegui, então ele
teve que mergulhar e pegar pra mim.

— Meu Deus, você tem noção? — ela ria.

— Tá de brincadeira? Eu queria morrer. Mas depois que me vesti e


saí da piscina, ele tirou a mesa e saiu também. Rolou um clima...

— Daí você beijou ele de novo?

— Não, mas ele praticamente me obrigou a ir em um jantar na casa


dele. E nossa! — falei, tampando o rosto.

— Conta, mulher!

— Foi legal.
— Legal? Como assim foi legal? Eu esperava algo como ele é
espetacular, me enforcou, ou qualquer coisa assim.

— Cretina! — insultei e ela riu. — Nós não transamos. Nos


beijamos algumas vezes, mas não passou disso. As crianças estavam na
casa também e...

— E?

— Bem, como eu já disse, não posso me distrair agora. Eu disse a


ele que não queria nada disso, mas ele me surpreendeu, disse que eu vou
decidir sobre nós, na verdade ele foi muito legal com relação a isso, disse
que terá paciência...

— O cara tem colhões, sabe jogar com você. Amiga, vou te dar um
conselho, esse tipo de homem é perigoso, não te lembra ninguém?

— Ah sim, lembra os cretinos que escrevo nos meus livros.

— Exato! E o que você me diz sobre esses cretinos?

— Eles só tem sua redenção nos livros e isso porque são escritos por
mim que sou mulher, na vida real eles são só cretinos mesmo.

— Exato! Então presta atenção, vai lá, senta nele, senta muito
mesmo porque o cara é um absurdo de gostoso, mas não se envolve mais do
que sexualmente. Aproveite, mas deixe seu coração seguro.

— Eu sei disso! Mas sinceramente não acho conveniente...

Ela não me deixou falar mais, enfiou sua colher cheia de sorvete na
minha boca, fazendo-me parar de falar.

— Não diga nada do que pode se arrepender — disse e gargalhou.


— Você vai acabar acordando a Pietra — falei com a boca ainda
cheia de sorvete.

— Desculpe!

— Deixou a luz do abajur acesa? — perguntei e ela franziu o cenho.

— Não, era pra ter deixado?

— Sim, ela tem medo do escuro, pode ficar com medo se acordar no
meio da noite.

— Ah, tadinha, eu vou lá acender.

— Tudo bem, eu vou — falei, já me levantando.

Caminhei até o quartinho de Pietra e abri a porta com cuidado,


estava realmente escuro e a maluquinha da Aída havia deixado a janela um
pouco aberta, porque uma brisa fresca entrava, balançando de leve a
cortina. Acendi o abajur e me virei para cobrir minha sobrinha, mas a cama
estava toda desarrumada e Pietra não estava ali. E, para o meu total
desespero, um passarinho morto estava em seu travesseiro, o mesmo
passarinho azul que Malvo segurava para que Pietra acariciasse na noite
anterior.

O desespero tomou conta de mim por completo.

— Não! Não! Não! — comecei a chorar desesperada. — Pietra?


Pietra? — chamei e corri para a janela aberta.

Meu coração gelou quando ao fundo do meu quintal, logo após a


piscina, em uma das cadeiras, alguém estava sentado, fumando. Eu não
conseguia ver quem era, mas minha mente gritava que eu sabia exatamente.
Não me dei ao trabalho de ir para a porta, pulei pela janela e corri até ele.
— O que você fez com ela? Onde ela está? — perguntei, sentindo as
lágrimas quentes escorrendo pelo meu rosto e o peito doendo.

Quando eu estava a apenas dois passos dele, Malvo se levantou e


jogou o cigarro no chão, pisando em cima para apagá-lo.

— Onde ela está, seu monstro de merda? — perguntei, sem


conseguir me conter, esmurrando seu peito.

Malvo riu e logo depois segurou meus pulsos, me abraçando em


seguida.

— Ela é só uma criança! — falei, empurrando-o para sair de seu


aperto.

Ele não dificultou para mim, deixando-me sair.

— Ela é uma criança muito educada...

— Me devolva ela agora! Por que a pegou? Ainda não acabou o


prazo — o interrompi e ele sorriu com maldade.

— Ora, ela não está comigo, não está vendo, querida?

— Devolva ela, eu faço o que você quiser — falei, caindo com meus
joelhos batendo no chão.

— Não, não, querida, assim não tem graça. A sua proposta é


tentadora, mas assim é muito fácil, eu gosto de desafio — disse, se
abaixando e tocando meu rosto, tentando secar minhas lágrimas que
escorriam de forma descontrolada. Senti asco, mas daria a ele o que
quisesse para que me devolvesse a minha menina.

— Me devolva ela!
— Ei, o que está acontecendo? — a voz de Aída soou alta atrás de
nós e eu podia ouvir seus passos se aproximando rápido.

Malvo pegou meu queixo com delicadeza e direcionou meu rosto


para o seu.

— A garotinha pulou a janela e correu para a casa vizinha, entrou


pela janela lá também, um garoto a ajudou. Ela é bem sapeca pra idade.

— Ei? — Aída chamou de novo, já estava dando a volta na piscina.

Olhei para a casa de Raul, uma luz fraca iluminava o quarto de Davi
e as luzes da sala e cozinha ainda estavam acesas.

— Mas o pássaro... — sussurrei mais para mim do que para


qualquer outra pessoa.

— Depois que a sapequinha estava em segurança dentro da casa do


seu vizinho, eu entrei no quarto dela e deixei o pássaro. Viu só como você
me deve ainda mais? — disse, chamando minha atenção, atraindo meu
olhar outra vez. — Eu cuidei dela pra você, deveria ser mais grata e trancar
melhor a sua casa, nunca se sabe quem pode entrar. — O sorriso que ele me
ofereceu fez meu sangue gelar. — Seu tempo está passando, querida —
finalizou ele e tocou seus lábios nojentos nos meus.

— O que está acontecendo? Quem é você? — Aída finalmente


chegou até nós.

Malvo se levantou, me ajudando a fazer o mesmo, como se fosse um


cavalheiro.

— Três semanas! — disse e saiu.

— Amiga, o que está acontecendo? — Aída perguntou.

— Pietra está no Raul — falei.


— Ela não estava dormindo? — perguntou.

— Ela fugiu enquanto conversávamos — falei já correndo para a


casa ao lado.

— Sofie? — Aída me chamou, mas não parei.


Capítulo 15

Naquela noite eu havia decidido trabalhar na sala ao invés do


escritório em casa. Davi já estava no quarto e me entreti com o projeto dos
Campana.

Me assustei ao ouvir a porta da minha cozinha abrir com um


estrondo e me levantei rápido, vendo uma Sofie chorosa irromper pela
soleira entre a cozinha e a sala e seguir para o corredor dos quartos sem
nem ao menos me olhar.

— Sofie? — chamei.

Outra moça chegou à soleira e a encarei. Ela deu de ombros, como


se também não estivesse entendendo nada, mas não passou dali, então segui
atrás de Sofie.

Cheguei ao quarto de Davi e lá estava ela, então entendi o motivo do


seu desespero. Pietra estava em cima da cama de Davi e Sofie a abraçava
apertado.

— Nunca mais faça isso, Pietra! Você quase me matou do coração


— disse Sofie.

Eu a entendia.

— Eu já ia voltar, tia.

— Me deixou muito preocupada.

— Desculpa, tia.

— Tudo bem, só não faça mais isso, nunca mais.


— Eu não vou fazer.

— Eu não sabia que ela estava aqui, ou teria te avisado. Pensei que
Davi estava dormindo também — falei.

— Eu sei.

— Deveriam ter me avisado — falei para Davi e ele fez a cara de


culpado mais fofa que eu já vi. Sofie também percebeu e acariciou de leve
os cabelos dele.

— Desculpe — pediu Davi e assenti.

— Se despeça, Pietra. Vamos para casa — disse Sofie se levantando


da cama.

— Não é tão tarde, porque não deixamos eles conversarem mais um


pouco enquanto tomamos um café ou uma cerveja ou outra coisa que você
prefira — quando percebi já tinha jogado essa.

Percebi naquele momento que eu estava mesmo desesperado pela


atenção dela.

— Acho melhor... — Sofie dizia, mas foi interrompida.

— Acho uma ótima ideia. Uma cerveja seria ótimo! — disse a outra
moça atrás de mim e Sofie a encarou com um olhar de repreensão. — Só
uma, para não fazer desfeita.

— É só uma — falei e olhei para a amiga dela que sorriu, cúmplice.

Ótimo, aparentemente eu tinha uma aliada! Sofie revirou os olhos.

— Tá, mas só uma — concordou Sofie, vindo até nós.


Fiz sinal para que fossem na frente e elas seguiram, mas o olhar
mortal que Sofie dirigiu à amiga não me passou despercebido.

— Podem se sentar na sala, vou pegar as cervejas — falei.

Quando cheguei à sala, elas estavam sentadas conversando baixo.


Entreguei uma lata a cada uma e abri a minha, sentando-me no carpete,
assim como elas, porém, do lado oposto, ficando de frente para Sofie.

— Então, você não parece tão chato como no dia da festa — disse a
amiga e eu ri.

— Ai socorro! — ralhou Sofie.

— Você é quem mesmo? — perguntei.

— Aída, melhor amiga e confidente da Sofie — disse ela, arqueando


as sobrancelhas para mim.

— Prazer, Aída! Eu sou Raul.

— Eu sei.

Conversamos sobre banalidades e descobri que Aída trabalhava


junto com Sofie.

— E como é que é, vocês estão oficialmente se pegando? —


perguntou Aída de repente, quando já estávamos na segunda lata de cerveja.

Sofie engasgou com a cerveja e eu ri outra vez.

— Você está bem? — perguntei, me ajoelhando, ficando mais


próximo para ajudá-la.

— Eu estou bem — disse Sofie. — Eu vou embora.


— Não vá — pedi.

— Desculpe, Aída não sabe se comportar.

— O que foi? Você não me deu detalhes, estou curiosa — disse a


amiga.

— Cala a boca, pelo amor de Deus, Aída, antes que você me mate
de vergonha — disse Sofie, estava com vergonha.

— Ah, o momento ficou chato? — disse a amiga, com ironia. —


Então eu vou fingir que vou ao banheiro.

— Segunda porta à esquerda — orientei, mas mantinha meus olhos


em Sofie que tinha rosto corado e o olhar no chão. — A sua amiga...

— Ela é maluca e sem noção, me desculpe — me interrompeu e eu


ri.

— Não se preocupe. Não foi nada demais, afinal ela só estava


curiosa sobre a gente.

— A gente? Existe um a gente?

— Não existe? — perguntei, segurando em suas pernas e a puxando


para mim.

— Ah, vejam só — disse baixo Aída, entrando na sala com Pietra no


colo. — As crianças dormiram, eu cobri o garotinho e estou levando a
Pietra para casa.

— Vamos lá então — disse Sofie, tentando se levantar.

— Não, pode ficar mais um pouco. Eu cuido dela — ofereceu a


amiga dela.
— Não... — Sofie negava, mas segurei suas mãos e a interrompi.

— Fique — pedi. — Por cinco minutos.

— Ah, não, se for para ficar por cinco minutos ela nem fica. Pelo
amor de Deus, senhor Raul, você é um homem experiente, faça valer à pena
— disse Aída.

— Se ela deixar... — brinquei e Sofie resmungou em frustração. Era


divertido vê-la daquela forma e a amiga sabia exatamente o que dizer para
deixá-la constrangida.

— Ótimo, agarra ela com a mão por baixo do cabelo, assim bem na
nuca que ela fica molinha, molinha — disse Aída, piscando para mim e eu
ri de leve.

— Obrigado pela dica, eu vou tentar.

— Ai meu Deus, isso não está acontecendo!

Aída me ofereceu uma última piscadela e saiu com Pietra no colo,


nos deixando sozinhos ali. Sofie mantinha a cabeça baixa e fazia um
movimento negativo repetitivo, como se não acreditasse que a amiga tivesse
dito aquelas coisas. Foi inevitável sorrir. Era incrível como ela transmitia
tanta sensualidade a ainda assim uma certa inocência.

Toquei seu queixo, direcionando seu rosto para o meu. Seus olhos
brilhantes e intensos encararam os meus e logo em seguida recaíram sobre
meus lábios. Não consegui mais me segurar e a beijei.

Segurei seu rosto e conduzi o beijo. As mãos dela entremearam


meus cabelos, as unhas raspando de leve meu couro cabeludo enquanto o
beijo se transformava em algo cada vez mais intenso e cúmplice, Sofie
parecia cada vez mais propícia às minhas investidas.
Sem interromper o beijo, alcancei o controle das luzes que estava
sobre o sofá e as diminuí, deixando praticamente só a luz da lareira nos
iluminando, o que dava ao ambiente uma atmosfera romântica e
apaixonante. As mãos dela que pareciam mais tímidas no começo, se
mantendo em minha nuca desceram para o meu abdômen, causando-me
arrepios.

Sentindo a necessidade de ter mais dela, puxei mais seu corpo de


encontro ao meu. Sofie não demonstrou resistência quando me sentei no
chão outra vez, trazendo-a comigo, para o meu colo, montada em mim. De
forma inconsciente minhas mãos entremearam seus cabelos e os agarrei,
não conseguindo evitar o sorriso ao ouvi-la gemer em minha boca, me
fazendo lembrar do que Aída havia dito.

Como já era noite e ela provavelmente já estava indo dormir quando


percebeu que Pietra havia sumido e viera para a minha casa, Sofie estava
vestida com um pijama curto e fino, o que me deixava muito feliz. Deslizei
minhas mãos por suas coxas nuas e arrepiadas e ofeguei quando ela rebolou
no meu colo. Minha boca escorregou pelo seu maxilar e ela inclinou a
cabeça, oferecendo-me o pescoço delicado. Provei sua pele macia e
perfumada, beijando, chupando e lambendo, fazendo-a ofegar enquanto
minhas mãos se insinuavam por baixo da barra da blusinha do seu pijama.

Meu polegar roçou a curva do seu seio esquerdo quando minha


língua deslizava a linha do decote do pijama. Sofie tinha seios pequenos e
lindos e eu mal podia esperar para sentir a textura e peso deles, então
testando-a, subi mais a mão e ela não protestou. Um gemido fraco escapou
dos seus lábios quando meu polegar tocou seu mamilo entumescido
enquanto minha palma sentia o seio por completo.

Abaixei uma das alças finas do seu pijama, deixando um dos seus
seios à mostra e sem me conter capturei o mamilo rijo com a boca. Sofie se
inclinou mais em direção ao meu rosto quando chupei e um gemido mais
alto saiu da sua boca. Havia coisas muito sujas que eu queria fazer com ela,
mas aquela primeira vez merecia ser do jeito dela. Uma das minhas mãos
apoiou suas costas enquanto ela jogava a cabeça para trás quando minha
outra mão se infiltrou em seu shorts fino, acariciando sua boceta por cima
da calcinha.

Porra, ela era perfeita!

Segurei seu corpo macio e a deitei, cobrindo seu corpo com o meu.
Minha boca encontrou a dela outra vez, cheia de desejo e ela correspondeu
à altura. A livrei completamente da blusa e ela estava linda, os cabelos
espalhados pelo tapete e me ofereceu um sorriso que parecia tímido, mas o
olhar era voraz, incentivando-me a continuar. Desci meus lábios até seus
seios, chupando um, depois o outro e deslizei minha língua pelo seu
abdômen liso.

Segurei o cós do shortinho, me ajoelhei entre suas pernas e deslizei


a peça para fora do seu corpo, deixando-a só de calcinha. Seguirei um dos
seus pés e o beijei, trilhando um caminho de beijos pela sua perna até
chegar ao meio de suas coxas, lambendo e mordiscando de leve. Suas mãos
tocaram meus cabelos no momento em que puxei sua calcinha para o lado
usando os dentes. Minha língua deslizou desde sua abertura até o clitóris,
fazendo-a estremecer e gemer, agarrando meus cabelos com força.

Continuei beijando sua boceta e acariciando seus seios enquanto ela


se contorcia em minhas mãos. Circulei seu clitóris com a ponta da língua e
ergui o olhar até seu rosto, tendo a surpresa de que ela mantinha os olhos
em mim e aquilo me deu mais tesão ainda, fazendo meu pau latejar dentro
da calça de moletom.

— Raul, eu quero você agora — disse ela, ofegante.

— O que você quiser, meu doce — falei, puxando a camiseta por


cima da cabeça e ela suspirou ao mirar meu abdômen nu.

Sofie me surpreendeu ainda mais quando se levantou e puxou o


cordão da minha calça, deixando-a frouxa e a puxando para baixo junto
com a boxer. Em seguida me empurrou, fazendo-me sentar no chão,
encostando as costas no sofá e me montou como antes.
Sua boca atacou a minha em um beijo voraz e luxurioso, enquanto
minhas mãos exploravam o corpo dela, sua excitação molhando meus dedos
enquanto entravam e saíam de sua boceta. Então a encaixei no meu pau, ela
rebolou e segurei seus cabelos com um pouco mais de força do que havia
feito antes.

— Olha pra mim, Sofie — pedi, mas ela mantinha os olhos


fechados, então intensifiquei um pouco o aperto em seus cabelos. — Olha
pra mim agora, Sofie! Quero ver seus olhos enquanto você é preenchida
pelo meu pau pela primeira vez.

Naquele momento ela me obedeceu e seus olhos se abriram para os


meus, então ela deslizou lentamente até que eu a preenchesse por completo,
os lábios entreabertos, os olhos ameaçando voltar a se fecharem, eu queria...
Não! Aquela noite não era sobre mim, era sobre ela e eu precisava segurar
meus instintos.

Meu pau pulsava dentro dela e quando ela rebolou outra vez, fui
tomado pela sensação mais espetacular que eu não sentia há muito tempo.
Soltei seus cabelos e a segurei pelos quadris, guiando seus movimentos que
inicialmente eram calmos, lentos, deliciosos e quase torturantes. Um
gemido escapou da minha boca e a testa dela tocou a minha.

Nossos movimentos pareciam sincronizados, ela subia e descia


enquanto eu não conseguia deixar de arremeter de baixo para cima na
mesma sintonia que ela. Minhas mãos exploravam seu corpo delicioso e as
dela haviam perdido totalmente a timidez do início, enlouquecendo-me com
seus toques também.

Sofie apoiou as duas mãos no meu peito, levantando um pouco mais


o quadril, realizando movimentos que estavam me levando ao limite e gemi
alto, estava realmente por um fio. Senti sua boceta se apertar ao redor do
meu pau e os primeiros espasmos começarem a atingir seu corpo pequeno.
Ela cravou as unhas no meu peito e gemeu alto, jogando a cabeça para trás
enquanto eu a segurava, arremetendo contra ela enquanto seu corpo
estremecia em um orgasmo lindo.

Seus olhos alcançaram os meus e um suspiro deixou seus lábios,


mas eu não tinha parado de estocar dentro dela.

— Não vou conseguir segurar, Sofie — admiti e ela sorriu quando


eu gemi, rebolou e então me desmontou, se ajoelhando entre minhas pernas,
colocando meu pau na boca e sugando. — Sofie, se não quiser que eu...

Não consegui dizer mais nada, com a mão ela apertou a base do meu
pau e circulou a glande com a língua quente e macia logo antes de engoli-lo
por completo, sugando em seguida, fazendo-me gozar em sua boca.

— Porra, Sofie! — foi o que consegui dizer quando terminei e ela


sorriu, limpando o lábio inferior com o dedo indicador. — Você é perfeita
demais!

E era mesmo, ela era o meu número e se antes eu tinha muitas ideias
do que fazer com ela, agora seria um pecado se eu não realizasse todas.
Capítulo 16

O sol entrava pela janela, eram os primeiros raios, eu podia


perceber, e eles vinham direto para os meus olhos. Virei-me na cama,
tentando evitá-los. Meus olhos se abriram só um pouquinho e me assustei
ao avistar alguém do meu lado, com o rosto bem perto do meu.

Aída.

Não! Aída, não!

Aída com cara de psicopata.

O susto foi tanto que caí da cama.

— Que droga, Aída! Quer me matar? — perguntei, me sentando no


chão onde havia caído. — Ai! — reclamei, segurando meu cotovelo.

— Desculpa, não consegui evitar — disse ela, me oferecendo uma


xícara de café.

— Que horas são?

— Quase 6h.

— Da manhã? Tá louca? Por que me acordou a essa hora? —


reclamei.

— Não te acordei. Você acordou sozinha, eu estava aqui


pacientemente te esperando acordar.

— Parecendo uma psicopata, você quer dizer.


— Tanto faz. Agora chega de enrolar e fala logo.

— Falar o que?

— Não se faça de desentendida, Sofie.

— Não me irrita uma hora dessas não, Aída. Minha alma ainda não
fez download pro corpo, vai ter que ser mais específica — falei, tomando
um gole do café.

— Ah, não! Ele é ruim? O que foi, o pau dele é uma minhoquinha?

— O que? — perguntei, quase cuspindo o café.

— Poxa, estou decepcionada, estava esperando pelo menos uns


vinte e dois centímetros como nos seus livros.

— Deixa de ser doida, do que você tá falando?

— De você e do vizinho, não testa a minha paciência, Sofie. Pode


contar logo tudo o que aconteceu depois que eu saí de lá.

A lembrança dela me fazendo passar vergonha me veio à mente.

— Ah, por falar nisso, obrigada pela vergonha alheia que me fez
passar.

— Por nada — zombou, sorrindo, cínica. — Aliás, ele segurou seu


cabelo do jeito que você gosta? — perguntou, arqueando as sobrancelhas
em provocação.

Imagens da noite anterior me vieram e lembrei-me dele segurar


meus cabelos segundos antes de eu sentar no seu colo. Meu Deus!

— É, eu acho que sim — falei, sem jeito.


— Não vai me dar muitos detalhes, né, malvada?! Mas pelo menos
me diga, e aí, foi bom?

Forcei a mente.

Nos beijávamos, ele segurou meus cabelos, eu sentei no colo dele,


uma série de borrões na minha mente e depois disso...

Nada!

Um grande nada!

— Sofie?

— Não aconteceu nada demais.

— Mas você demorou a beça lá.

— Mas nada demais aconteceu ainda.

— Jura? — perguntou como se estivesse chocada.

Não, eu não jurava, eu nem sabia o que tinha acontecido, alguns


flashes me atravessavam, mas nada de concreto. Eu havia feito a grande
idiotice de misturar vinho, que bebemos em casa antes de Pietra
desaparecer, e cerveja na casa do Raul. Aquilo nunca acabava bem e eu
nunca lembrava de nada, mesmo que não tivesse bebido tanto assim.

— Juro — menti e ela franziu as sobrancelhas.

— Então... você gosta daquele outro cara? — perguntou, me


encarando.

— Que outro cara? — perguntei, confusa.

— O que te beijou perto da piscina ontem.


Gelo correu as minhas veias e uma náusea me atingiu tão forte que
quase não consegui chegar no banheiro para vomitar. No momento em que
aconteceu, eu nem havia me dado conta por completo porque minha cabeça
estava cem por cento em Pietra, mas naquele momento, pensando em tudo,
me enojava de um tanto surreal.

— Você tá bem? — perguntou Aída, olhando pela janela da cozinha.

— Acho que sim — falei, levanto a mão à testa.

— Tá passando mal porque misturou vinho e cerveja, né? Desculpe


por isso, fui eu quem aceitou o convite do vizinho.

— Armou para mim, você quer dizer — falei e ela virou na minha
direção, dando um sorriso genuíno e depois se voltou para o quintal outra
vez.

Só então percebi o barulho do cortador de gramas e me aproximei


dela.

— Não acredito que vocês não transaram nem um pouquinho ontem.


Isso é um absurdo, ele está visivelmente interessado em você e você nele. É
pelo outro cara?

— Esquece o outro cara, Aída — falei e ela assentiu.

Vi Raul com o cortador no meu gramado, fazendo o que havia


prometido.

— Mas e ele? Fala sério, amiga — disse ela enquanto admiramos


Raul sem camisa e de costas para nós, os músculos definidos saltando ainda
mais enquanto empurrava o cortador de grama. — Olha, eu vou te falar, era
dois pocotó em cima desse homem e eu já estava gritando irra!
Não consegui evitar gargalhar e ela riu também. Por sorte, Raul não
percebeu, provavelmente o barulho alto do cortador encobria nossas
gargalhadas.

— Você vai ficar bem? — perguntou, se virando para mim.

— É claro — respondi e ela me abraçou.

— Certo, preciso resolver algumas coisas. Mas...

— Mas...?

— Posso voltar à noite? — perguntou sem jeito.

— Desde quando você precisa perguntar? É claro que pode.

— Obrigada — disse, beijando meu rosto e saindo pela porta da


cozinha mesmo.

Havia alguma coisa errada, mas não era o momento de pressioná-la,


eu deixaria isso pra depois. Raul se virou e Aída acenou para ele, que
acenou de volta e então ele se virou por completo na direção da janela que
eu estava.

Ele acenou para mim, sorrindo, e eu acenei de volta. Meu Deus, o


que tinha realmente acontecido?

— Tia, tá na hora de ir pra escolinha? — Pietra, sonolenta,


perguntou atrás de mim, atraindo a minha atenção para ela.

— Bom dia, querida! Daqui a pouquinho — falei, sorrindo e


caminhando até ela. — Que tal um banho para despertar enquanto eu
preparo o seu café da manhã?

— Tudo bem — disse ela, coçando os olhinhos e caminhando para o


banheiro.
Fui atrás dela, ajudei a tirar seu pijama e liguei o chuveiro em uma
água morninha do jeito que ela gostava e voltei para a cozinha.

Enquanto preparava o café da manhã dela, meu telefone tocou.

— Alô! — atendi.

— Sof. — Suspirei ao ouvir a voz do meu irmão.

— Jordan, como você está?

— Estou bem, se é que se pode ficar bem nesse lugar. Como você
está? E Pietra?

— Estamos bem.

— Graças a Deus.

— Jordan, quem é Malvo? — perguntei de uma vez, mas meu irmão


ficou em silêncio por um momento.

— Não deixe ele chegar perto de vocês, Sof. O que está


acontecendo?

— Você deve pra ele?

— Porra, ele te procurou? Sofie, tem que tomar cuidado. Não pode
deixar ele se aproximar de vocês.

— Sério, Jordan? E como é que eu vou fazer isso? O cara é um


bandido, bateu na minha porta e me ameaçou.

— Merda! Desculpa por isso, Sof.

— Desculpas não me ajudam, Jordan.


— Eu sei, eu sei. Eu vou dar um jeito nisso. Meu tempo está
acabando, só liguei para saber como vocês estão — disse e eu suspirei.

— Olha Jordan... — A ligação caiu.

Pietra apareceu na cozinha, já vestida com o uniforme, porém a


camiseta estava de trás para frente, eu ri.

— Venha aqui, princesa, deixa eu arrumar isso — chamei e ela


correu, sorrindo. Tirei sua camiseta e a vesti nela de forma correta. —
Sente-se, o café da manhã está pronto.

Pietra sentou-se em seu lugar e a servi. Ela comia animada, a garota


parecia ter uma solitária na barriga, eu não tinha ideia de para onde ia toda a
comida que ela ingeria.

— Pietra, temos que conversar sobre um assunto muito sério —


falei e vi a sua animação diminuir.

— Por causa de ontem? — perguntou.

— Sim.

— Desculpa, tia.

— Já te desculpei, mas você me assustou.

— Não queria te assustar, a gente só queria que você fosse na casa


do tio Raul — falou e aquilo me chamou atenção.

— Como é? — perguntei e ela desviou os olhos, enchendo a boca de


panqueca, fazendo sinal de que não podia me responder porque estava com
a boca cheia.
Estreitei meus olhos na direção dela e ela deu um risinho.
Safadinha!

— Pietra?

— Sim, tia — disse, colocando um pedaço de morango na boca,


fingindo uma inocência que dava até vontade de rir.

— O que você quis dizer com a gente só queria que você fosse na
casa do tio Raul? — perguntei e podia ver ela segurando a risadinha. —
Pietra?

Ela revirou os olhinhos.

— Tá bom, tia! Davi e eu já tínhamos combinado.

— Combinado o que?

— Eu ir pra lá pra você ir atrás de mim.

— Por quê? — perguntei e ela desviou o olhar outra vez. — Pietra?

— Pra vocês namorarem — admitiu e meus olhos quase saltaram.

— Como é que é? De onde vocês tiraram isso.

— Davi disse que o padrinho dele disse que a madrinha dele leu um
livro que a moça namorava o vizinho que tinha filho e eles ficaram felizes
— falou e engoli em seco. — Vocês vão namorar e ser felizes, tia?

— O que? Não... é... não. Ah, olha isso não é conversa para uma
criança da sua idade. Vamos logo ou vai se atrasar pra escola.

— Tá bom — concordou se levantando.


Capítulo 17

Quando saí para a garagem, Raul colocava Davi em um carro que eu


já tinha visto ali e imaginava ser o do ruivo, mas o cortador de gramas ainda
estava no meu gramado. Raul acenou para mim e acenei de volta,
colocando Pietra no carro e segui em direção à escolinha dela.

Quando retornei para casa, Raul roçava a grama do próprio quintal,


o olhar que ele me dirigiu me fez ficar quente, por mais que a minha mente
não se lembrasse de quase nada da noite anterior, meu corpo parecia se
lembrar muito bem dele, pois seus olhos em mim, mesmo que à certa
distância, me fez ficar quente e arrepiada ao mesmo tempo.

Entrei em casa preparada para escrever um hot e continuar a


história. Sentei-me à mesa da cozinha e abri o arquivo no notebook, mas
não conseguia me concentrar. Escrevia e apagava, nada do que eu colocava
ali parecia certo e eu estava ficando frustrada. Então meu celular sinalizou
uma mensagem de texto.

“Bom dia, vizinha! Sua grama está cortada como o prometido. Sei
que combinamos apenas o jantar de segunda, mas posso te esperar hoje à
noite?”

Fiquei quase cinco minutos olhando para a mensagem. Forcei a


mente, não havia passado meu número para ele. Nem no primeiro dia em
que a babá e Pietra foram jantar lá, mas antes que eu pudesse responder a
mensagem, o telefone tocou.

Puta que pariu, era ele!

— Alô! — atendi.

— Bom dia!
— Bom dia!

— Tudo bem? — perguntou.

— Como tem o meu telefone? — questionei e houve um silêncio do


outro lado da linha.

Me levantei e fui até a pia da cozinha, onde estava a garrafa de café


e me servi uma xícara, vendo-o em sua varanda, já trocado para trabalhar,
imaginei, ele usava terno e gravata.

— Você me passou seu telefone ontem à noite — respondeu,


virando-se de repente na direção da minha janela, como se percebesse que
eu estava ali e me pegou no flagra, observando-o.

É claro que passei!

— Foi? Ah, desculpe! — falei, se eu não lembrava nem se


realmente tinha acontecido algo com a gente, como eu poderia me lembrar
de ter passado o telefone.

— Sofie, está tudo bem?

— Sim — foi só o que respondi, porque não sabia como dizer que
não me lembrava daquilo porque implicaria em outras coisas.

Então o vi caminhar em direção à minha casa. Ele estava vindo, puta


que pariu, ele estava vindo! Muito rápido ele chegou à porta da minha
cozinha. Seus olhos encontraram os meus.

— Não pode ficar estranha comigo por causa do que houve ontem.
Por favor, Sofie! — disse ele, do lado de fora da cozinha, segurando com as
duas mãos o batente da porta.

É tinha acontecido mesmo então. Meu Deus!


— Não vou — falei e tentei sorrir, mas a impressão que eu tinha era
que estava parecendo uma idiota. — Quer café? — ofereci, tentando soar
natural e ele sorriu.

— Eu quero sim. Preciso ir trabalhar na empresa hoje, mas não vou


recusar um café na sua companhia.

— Entre — convidei e assim ele fez.

Servi outra xícara de café e entreguei ao Raul. Escorei meu quadril


no balcão, ficando de frente para ele, que espelhou meu movimento,
escorando-se na mesa.

— E então, posso te esperar para o jantar? Você e a Pietra, é claro —


disse ele e suspirei. — Tá legal, o que está acontecendo?

— Não está acontecendo nada.

— Primeiro você me pergunta como tenho seu contato, sendo que


você me passou ontem à noite e está toda estranha. Sofie, algo está
acontecendo. Tem que me dizer, estou às cegas aqui. Você não curtiu a noite
passada, é isso? Tudo bem se você não quiser mais, se não tiver curtido,
mas não pode ficar assim comigo.

— A noite passada... — eu tentava falar e ele arqueou uma


sobrancelha para mim. — Você... ah...

Eu com certeza estava parecendo uma idiota, porque ele sorriu.

— Eu...? — incentivou-me a falar mais.

— Você está feliz com o que aconteceu? Quer dizer... foi... bom? —
Minha voz saiu um pouco esganiçada no final.
Raul sorriu grande, deixou a xícara sobre a mesa e deu os passos
que faltavam para chegar até mim. Suas mãos tocaram meu rosto com
suavidade, uma de cada lado, segurando-me com gentileza, levando meu
olhar ao seu.

— Então é com isso que está preocupada? Meu doce, foi incrível!

— Seu doce, é? — perguntei, achando graça.

— É, pelo menos eu quero que seja — disse ele e eu ri. — É, deve


estar achando que isso é coisa de gente velha, né? — Não consegui evitar a
gargalhada e os lábios dele tocaram os meus em um selinho carinhoso. —
Sabe o que é engraçado? — perguntou levanto meu olhar ao dele outra vez.

— O que?

— Não te ouvi reclamar desse apelido ontem à noite — zombou,


estreitando os olhos em provocação.

Meu coração errou uma batida, como eu poderia não lembrar?


Tentei disfarçar, mas ele percebeu.

— Qual é, Sofie? Não é só isso. O que está acontecendo de verdade?


— perguntou e eu suspirei, não adiantava correr.

— É que o que aconteceu não existe pra mim. Eu...

Vi as sobrancelhas dele se levantarem em surpresa logo antes dele


me interromper.

— Mas existiu. Você pode querer esquecer, eu respeitaria isso, não


tem problema.

— Então não tem problema?


— Não — disse, desviando o olhar e se afastando um pouco. —
Não, não... sim! Tem problema, para mim tem. Eu respeitaria a sua vontade,
mas não é o que eu quero.

— Acho que você não entendeu, Raul. Não é que eu queira


esquecer, eu... — Eu tentava encontrar uma forma de dizer a ele.

— Precisa? É isso que você quer dizer? Que precisa esquecer? Sério
que vai jogar essa pra cima de mim? É só admitir que não foi como você
queria que fosse, por isso não quer mais. Somos adultos.

Eu podia sentir o ego dele sendo ferido, estava entendendo tudo


errado, mas a verdade é que eu estava até me divertindo vendo ele daquele
jeito, pensando que eu estava rejeitando-o. Ele não tinha ideia!

— Eu não me lembro! — despejei de uma vez para acabar com a


agonia dele.

— O que?

— Eu não me lembro de nada — falei e vi seus olhos abrirem mais.

Raul me encarou por um momento, parecia confuso.

— Como assim não lembra de nada?

— Não lembro, simples assim.

— Não lembra... da gente transando? — perguntou.

— Exatamente.

— Não é possível! Foi tão comum assim? — perguntou e eu ri.

— Não é isso — respondi. — Eu tomei aquela cerveja na sua casa...


— Está tentando me enrolar, foram só duas cervejas, Sofie. Me
respeita! — disse, indignado e eu ri ainda mais.

Não deveria estar rindo, mas não conseguia segurar.

— Não! Eu já tinha bebido muito vinho aqui em casa antes de ir


para lá. Toda vez que misturo, acabo tendo algo assim.

— Espera! Então quer dizer que você realmente não se lembra?

— Desculpe, mas não.

Raul pareceu meio perdido naquele momento.

— Você tem... reservas quanto ao que aconteceu, quer dizer, vamos


voltar à estaca zero? Se tivermos que voltar, não tem problema, não estou
reclamando, só quero entender para saber como agir daqui para frente.

— Raul, você é uma fraude total. Parece um ogro quase sempre,


mas a verdade é que é muito fofo.

— Eu não sou fofo! — reclamou, indignado.

— É claro que é — falei, me aproximando como ele tinha feito


anteriormente.

— Não tenho nada de fofo, Sofie.

— Claro que é, até me deu um apelido bonitinho — zombei e ele


desviou o olhar rapidamente. — Eu gostei do apelido.

Raul sorriu e voltou a me encarar, ficamos assim por um momento.

— Me desculpe por não me lembrar, eu juro que queria — admiti e


ele pareceu me analisar.
— Não se preocupe com isso, meu doce. Fique tranquila, a partir de
hoje vou garantir que você nunca mais se esqueça.

Aquela promessa fez meu sangue correr rápido nas veias e me senti
quente. Raul me segurou pela cintura, colando nossos corpos. Seu polegar
roçou meus lábios um segundo antes de sua mão forte entremear meus
cabelos, segurando firme, do jeito que eu gostava e me perguntei como ele
podia saber daquilo. Sua boca atacou a minha em um beijo insano, não
havia calma como das outras vezes, aquele beijo era diferente e eu gostava.

Um gemido rouco escapou da sua boca e com a mão que estava


livre, Raul me enlaçou pela cintura, impulsionando-me para cima, para o
seu colo e enlacei as pernas em sua cintura. Ele deu alguns passos e senti
minhas costas baterem em uma coluna na parede, o impacto foi um pouco
rude, mas não me importei, estava envolvida demais em seu beijo
eloquente, sentindo seu pau duro sob a calça social que estava em contato
com a minha calcinha já que estava de vestido.

Sua mão forçou mais o aperto em meus cabelos, puxando minha


cabeça para o lado, expondo meu pescoço. Seus lábios correram rápido pela
minha pele fina até chegar ao decote do vestido tomara-que-caia e sua
língua adentrou a borda, lambendo. Sua mão ansiosa abaixou meu vestido
até a cintura com um único puxão e como eu não usava sutiã a língua
atrevida tratou de lamber e chupar meus mamilos, um depois o outro e eu
sabia que a minha calcinha estava arruinada.

Deixei escapar um gemido quando seus dentes deteram um dos


meus mamilos e não consegui manter os olhos abertos quando seus dedos
afastaram minha calcinha para o lado e ele me acariciou ali.

— Sua cabeça pode não se lembrar, mas sua boceta parece me


reconhecer muito bem. Você tá toda melada pra mim, meu doce! —
sussurrou no meu ouvido e estremeci só com as suas palavras.

Um de seus dedos entrou em mim, fazendo-me gemer e ofegar. Sem


interromper o movimento do dedo, Raul nos girou e me levou até a mesa,
colocando-me sobre ela e tirando os dedos de dentro de mim, me deixando
com ainda mais vontade de tê-lo. Tentei segurá-lo pelo terno, mas ele se
afastou alguns passos e me observou por um momento.

— Sei que para você é a nossa primeira vez, mas hoje vai ser do
meu jeito — disse, enquanto eu o observava tirar a gravata cor vinho. Ele
estava um absurdo de gostoso naquele terno, o pau marcando a calça social
justa. — Sofie? — chamou a minha atenção e meus olhos miraram os dele,
escurecidos pelo desejo, e eu assenti com a cabeça. — Tem que me dizer se
algo não estiver confortável.

— Estou muito confortável — falei, sorrindo.

— Não estou falando de agora, meu doce. Apenas me avise — disse


e eu assenti.

Raul voltou a se aproximar e beijou minha boca, segurando meu


lábio inferior entre os dentes por um momento, pegando minhas duas mãos
em seguida. Senti o tecido macio passando pelos meus pulsos e só então
percebi que ele amarrava as minhas mãos. Acho que eu ia gostar daquilo.
Então ele voltou a se afastar, e me observou de novo. Tirou o terno, depois
desabotoou a camisa branca e eu só conseguia pensar que queria lamber
aquele abdômen, mas duvidava que ele deixaria naquele momento. Então os
sapatos, meias e calças também estavam no chão, ficando só de cueca boxer
branca que deixava evidente seu volume e... Uhh, como eu podia não me
lembrar daquilo?

Ele veio até mim outra vez, apoiando as mãos uma de cada lado do
meu quadril na mesa.

— Abra as pernas para mim, meu doce! — sussurrou no meu


ouvido.

Caramba, tudo que ele dizia parecia erótico de uma forma tão
surreal que me fazia vibrar em antecipação aos seus próximos passos. Fiz o
que ele pediu, abrindo as pernas e ele lambeu meus lábios, empurrando-me
para a deitar na mesa em seguida.

— Os braços ficam aqui — disse, levantando meus braços acima da


minha cabeça e eu assenti.

Ele levantou a barra do meu vestido até a minha cintura, juntando


com o decote que já estava ali antes. Se ajoelhou e com os dedos puxou
mais minha calcinha para o lado e deslizou um dos seus dedos por toda a
minha boceta, terminando o movimento em meu clitóris, me fazendo
contorcer sobre a mesa.

Quando seu dedo voltou a me invadir, seguido de um segundo dedo,


senti sua língua em minha boceta e não consegui conter o gemido. Raul era
habilidoso com a língua e aquilo estava me enlouquecendo, levando-me
cada vez mais para o precipício. A cada lambida ou chupada, associada aos
dedos que entravam e saíam de mim com uma destreza surreal, eu ficava
mais e mais perto de ter um orgasmo, mas quando senti que estava bem à
beira do precipício, ele se afastou.

— Não! — reclamei e ele sorriu.

Raul se levantou e cobriu meu corpo com o seu, me beijando,


segurou meu rosto e me encarou, e como se estivesse se segurando para não
fazer algo, fechou os olhos e respirou fundo por um segundo. Quando seu
olhar encontrou o meu outra vez, ele se levantou e me puxou pela gravata
que estava em meus pulsos.

Tirou-me da mesa, me colocando de pé no chão e me virou de


costas. Ainda me guiando pela gravata, posicionou minhas mãos sobre a
mesa e roçou seu pau em minha bunda, eu nem tinha visto em que momento
ele havia retirado a boxer branca.

— Empina essa bunda pra mim, meu doce! — sussurrou.


— O quê? — perguntei e no mesmo momento senti um tapa
estalado na minha bunda.

— Empina a porra da bunda pra mim, Sofie — repetiu, dessa vez


usando um tom alto e mais duro. Fiz o que ele pediu e outro tapa me
acertou na bunda, dessa vez do outro lado. — Empina mais! — Ele não
estava pedindo. Estava mandando. E eu obedeci. — Fica assim.

Suas mãos desceram pelas minhas costas e alcançaram a minha


bunda. Sua língua tocou minha boceta e subiu, deslizando, fazendo seu
caminho até chegar no alto da minha coluna, me deixando toda arrepiada.
Eu duvidava que já havia ficado excitada naquele nível, a ponto de que se
ele dissesse que eu precisava implorar por ele, eu imploraria sem nem
pensar duas vezes.

Sua mão agarrou meu cabelo, puxando minha cabeça para trás e
como ele era bem mais alto que eu, sua boca alcançou a minha em um beijo
ao contrário, com meu nariz em seu pescoço, sentindo seu perfume
inebriante.

— Abra as pernas, Sofie — disse com os lábios ainda nos meus.

Então outro tapa na bunda veio, dessa vez muito forte, mas antes
que eu pudesse reclamar, senti seu pau deslizar para dentro de mim, me
fazendo gemer alto e estremecer ao senti-lo todo dentro de mim.

Ele apertou meu quadril com força, mas se manteve imóvel por um
momento, para que eu me acostumasse, mas isso não durou muito. Ele
passou a entrar e sair de mim duro e forte, fazendo-me choramingar de
tanto prazer, de uma forma que eu nem sabia explicar. Era sexo, eu já tinha
feito antes, mas ainda assim era diferente de todas as outras vezes que
sempre pareciam iguais, era insano, bruto e eu estava amando que fosse
com ele.

Uma de suas mãos correu para o meu clitóris e me senti explodir em


um orgasmo violento, gemendo seu nome, enquanto ele mantinha o ritmo.
— Isso, goza pra mim, meu doce — disse enquanto eu mantinha os
olhos fechados apertado, estremecendo em suas mãos fortes que me
mantinham no lugar.

Raul segurou a gravata, puxando meus braços para frente e


empurrando meu tronco contra a mesa. Levantou uma das minhas pernas,
colocando-a sobre a mesa também e continuou estocando forte dentro de
mim. Eu tinha completa noção de que ficaria dolorida depois, mas eu não
me importava, só queria senti-lo. Ouvi um gemido gutural escapar de seus
lábios e o aperto no meu quadril aumentar, sabia que ele estava gozando
também, por isso rebolei.

— Porra, Sofie — disse entredentes e só parou de se mover quando


havia terminado.

Raul se deixou cair sobre minhas costas, beijando meu ombro, com
a respiração tão ofegante quanto a minha, puxou meu rosto para o lado e me
beijou de uma forma doce que contrastava totalmente com a forma bruta e
animal com que estávamos transando à pouco.

Ele se endireitou e desamarrou a gravata das minhas mãos,


acariciando meus pulsos em seguida, onde havia uma leve marca que o
aperto havia deixado na pele e ajeitou meu vestido e calcinha no lugar.

— Tudo bem? — perguntou e assenti, eu não conseguiria falar


naquele momento e ele sorriu. — Você não pode mais esquecer — brincou
e eu ri.

— Acredite, eu não vou — falei e ele me beijou.

Me ajudou a me levantar e em seguida se vestiu.

— Eu realmente preciso ir para a empresa, já estou atrasado para


atender um cliente. Você vai ficar bem?
— Vou sim. Vá trabalhar.

— Ótimo — disse, acariciando meus cabelos. — Posso esperar


vocês para o jantar? — perguntou e assenti. — Ok, às 19h então.

Com isso ele tocou seus lábios nos meus em um selinho singelo e
carinhoso e saiu pela porta da cozinha. Fui até a janela e o observei andar
pelo gramado, então Aída vinha vindo, passou por ele e entrou em casa,
quase que no mesmo momento em que ele entrou na dele.
Capítulo 18

— Oi.

— Oi. Resolveu o que precisava resolver? — perguntei.

— Sim, sim. Agora vim ler seu livro — disse sorrindo e veio até
mim na janela. Raul saía outra vez, seguindo em direção ao seu carro. — Ai
amiga, olha esse homem, até de terno dá pra ver as curvas dos gominhos do
abdômen e olha as curvas daquela bunda, fala sério, olha a sua cara de
tesão, você tá sem freio e ele cheio de curva daquele jeito, porque não
marca logo um acidente com ele.

— De onde você tira essas asneiras, Aída? — perguntei rindo.

— Sei lá, olhar pra um homem desses me deixa confusa. Aproveita


e dá logo pra esse cara, Sofie — disse e finalmente me encarou de verdade,
me analisando. — Ah, você já deu, não é? Você já deu!

— O quê? Não! — tentei disfarçar.

— É claro que deu, olha essa sua cara de quenga e esse cabelo todo
embaraçado — disse, levando uma mão à boca, segurando o riso. — Puta
que pariu, foi uma foda de respeito, né? Eu sabia!

— Não sei de onde você tirou isso, tentei disfarçar e comecei a


caminhar até a mesa.

— Ah, Sofie, se essa sua cara de bem comida e o cabelo


desgrenhado não contassem tudo já, o seu vestido enroscado na calcinha e
essa bunda vermelha te entregariam na boa.
Senti meu rosto queimar e ela gargalhou. Desenrosquei o vestido e
cobri o rosto com a mão.

— Ai droga! — praguejei e ela riu ainda mais.

— Foi bom, não foi? Tô vendo pela sua cara, sua puta safada.

— É, foi — admiti e ela correu me abraçar.

— Ele te enforcou? — zombou.

— Cala a boca, Aída, olha você tem sérios problemas — zombei e


ela riu.

— Quando foi que você comprou um celular novo? — perguntou.

— Não comprei — respondi enquanto pegava um bolo para


comermos.

— Então esse aqui é do vizinho? — perguntou, chamando a minha


atenção.

— Droga! Ele esqueceu, dá aqui que vou guardar.

— O quê? Não!

— Aída?

— Vamos fuçar.

— Isso é invasão de privacidade.

— É, mas pela cor que a sua bunda tá, ele também invadiu muita
coisa sua, então você tem o direito. E olha... sem senha!

— Aída, não!
— Nossa, só tem foto de menino aqui.

— Aída para, me dá isso aqui — falei e tentei pegar o aparelho, mas


ela não deixou.

— Espera o que é isso? Ai merda!

— O que? — perguntei, curiosa.

— Uma foto da família feliz.

— Aída, isso é errado!

— Que merda, ela é linda!

— O quê? Deixa eu ver isso aqui — exigi, aquilo realmente chamou


a minha atenção e fiquei curiosa.

Enfim consegui pegar o aparelho e olhei a foto. Raul abraçava uma


mulher por trás e no colo dela havia um bebê, Davi. Engoli em seco.

— O que será que aconteceu com ela? — perguntou Aída.

— Eu não sei — falei, não querendo expor o que eu já havia


presumido.

— Por que será que se divorciaram?

— Não acho que tenham se divorciado.

— Acha que ele é casado? Sofie, pegando homem casado, quem te


viu e quem te vê, hein — zombou.

— Não seja tonta. É claro que ele não é casado.


— Então eu não entendi.

— Acho que ele é viúvo.

— Por que?

— Fala sério, Aída! Se essa mulher estivesse viva, Davi passaria


mais tempo com ela, não é?

— Ela pode ter aberto mão do garoto, não pode?

— É claro que não, Aída. Que mãe seria capaz de abandonar um


filho?

— Você ficaria surpresa.

— Clara é viciada em drogas, a vida dela é um caos e ainda assim


ela luta bravamente pela Pietra.

— É, você pode ter razão.

— Nossa, você é uma garota de sorte. Seu namorado é gostosão,


rico e sem ex com filho pra atazanar a sua vida.

— Aída, a sua empatia pelas pessoas me comove.

— Tenho empatia por você — disse ela e beijou a minha bochecha,


me fazendo sorrir.

— Vem comer.

Coloquei o celular sobre o balcão e sentei-me à mesa, sentindo


minha bunda doer um pouco pelos tapas que Raul tinha me dado. Aída
percebeu meu desconforto e riu.

— Era disso que eu tava falando — disse ela.


— Você tem sérios problemas.

— Você nem imagina — falou, brincando.

Aída estava jogada no sofá, lendo o arquivo que eu havia enviado


para o Kindle e eu estava na mesa, digitando, concentrada na história
quando o celular de Raul tocou sobre o balcão. Minha amiga se sentou
rápido no sofá, eu olhei da direção do aparelho e sabia que ela estava
fazendo o mesmo.

— Aída, não! — alertei, sabia bem que ela estava louca para
atender.

— Pode ser importante — disse ela.


— Não é da nossa conta. Não podemos atender o celular de outra
pessoa.

— É o celular do seu namorado.

— Ele não é meu namorado.

— Mas vai ser — disse e eu revirei os olhos.

Ela começou a caminhar devagar na direção do aparelho e eu entrei


em sua frente.

— Qual é, Sofie?

— Não seja enxerida.


— Aí, oh, parou de tocar — reclamou.

— Ótimo — falei, sorrindo, comemorando cedo demais, pois o


celular voltou a tocar.

Aída me empurrou e correu para o aparelho, atendendo-o em


seguida.

— Alô!

Fechei os olhos com força, querendo enforcá-la.

— Ah, só um minuto, por favor — falou ao celular e me estendeu o


aparelho.

— O quê?

— Fala aqui parece importante — disse ela.

— Tá de brincadeira? Foi você que atendeu.

— Disseram que é da escola do Davi, parece que aconteceu alguma


coisa com o menino.

Senti meu sangue gelar nas veias e tomei o aparelho de sua mão.

— Alô.

— Oi, eu Mirna, gostaria de falar com o senhor Aguilar.

— Mirna, o Raul não está aqui agora. Ele esqueceu o celular —


falei. — Aconteceu alguma coisa com o Davi?

— Sim, ele passou mal e como temos a autorização do senhor


Aguilar por escrito, o levamos para o hospital central.
— Tudo bem. Eu vou para lá agora e darei um jeito de avisar o
Raul.

— Obrigada, senhora Aguilar, estamos aguardando vocês — disse e


encerrou a chamada.

Droga!

— O que eu faço, o que eu faço? — pensei alto.

— Vamos pra lá e no caminho damos um jeito de avisar o pai dele


— sugeriu Aída. — Deixa que eu dirijo.

Entramos no carro e eu tentava pensar em como avisaria Raul já que


eu nem sabia onde ele trabalhava, então me lembrei do Ruivo. Pedro era seu
nome, e como não era um nome comum na Alemanha, não devia ter muitos
na agenda dele. Odiava ter que invadir a privacidade de Raul fuçando em
seu celular, mas era uma emergência. Encontrei um único contato com o
nome de Pedro, então apertei o botão da discagem.
Capítulo 19

Eu estava no escritório, discutindo com Raul sobre quem iria


recepcionar o cliente que nos visitaria quando o celular de Pedro tocou.

— Por que está me ligando? — perguntou.

— Não estou — falei, batendo as mãos nos bolsos da calça à


procura do aparelho e quando não o encontrei, conferi os bolsos do terno
que estava pendurado.

— Merda! Acho que perdi, atenda logo.

— Alô! — atendeu e esperou que a outra pessoa falasse. — Sim,


sou eu. Quem fala? — Esperou a resposta. — Ah, sim. Só um momento.

Meu amigo me encarou com um risinho debochado.

— Você não perdeu o celular, esqueceu na casa da sua vizinha —


disse baixo, tampando o microfone do aparelho e eu sorri. — Ela quer falar
com você.

Peguei o celular e levei ao ouvido.

— Oi, meu doce.

— Raul, desculpe ligar... — meu coração bateu acelerado ao ouvir a


voz dela.

— Tudo bem.

— É uma emergência.
— O que houve? Você está bem? — perguntei, começando a me
preocupar.

— Eu estou, mas você esqueceu o celular na minha casa e ligaram


da escola do Davi. Parece que ele passou mal e o levaram para o Hospital
Central — disse rápido demais, parecia apavorada.

— Hospital Central? Porra, isso é longe a beça daqui, vou levar pelo
menos uma hora para chegar lá — lamentei, me desesperando, já
procurando as chaves do carro. — Ele não pode ficar sozinho, tem medo de
hospital.

— Tudo bem, eu já estou indo pra lá. Bem, não sou você, mas acho
que pelo menos sou alguém conhecido para ele não se sentir sozinho até
você chegar — disse ela e parei no meio do movimento de vestir o terno.

— Você tá indo pra lá mesmo? — perguntei perplexo.

— Estou, mas... bem fiquei preocupada quando a escola ligou, não


queria ser invasiva. Se for um problema eu volto para casa.

— Não! Vá, por favor! Chego o mais rápido que puder.

— Tá certo.

Encerrei a chamada e me virei para Pedro.

— O que houve? — Ele quis saber.

— Davi está no hospital — informei, já me virando para sair da sala.

— Meu Deus, o que aconteceu? — perguntou enquanto eu


caminhava com ele ao meu encalço.

— Não sei ao certo. Ele passou mal na escola e o levaram para o


Hospital Central.
Entramos no elevador que dava acesso ao estacionamento da
empresa.

— Vamos demorar uma eternidade para chegar lá.

— Eu sei — falei, soltando uma respiração forte, esfregando as


mãos no rosto. — Pelo menos a Sofie está indo para lá, ela está mais perto.

— Que bom. — Foi o que ele disse, sabia que não era hora para
piadinhas.

Assim que chegamos ao hospital, fomos encaminhados para a ala


pediátrica. Reconheci a responsável pela escola sentada em uma poltrona do
lado de fora do quarto que nos foi indicado.

— Senhor Raul, que bom que chegou.

— O que aconteceu? — perguntei.

— Ele reclamou de uma leve tontura. O acalmamos e aparentemente


ele havia ficado bem, mas durante a aula de Educação Física ele caiu duas
vezes e então começou a sentir falta de ar, então o trouxemos — explicou a
mulher.

— Certo, obrigado por trazê-lo e avisar.

— Ah, a moça está com o Davi, ele quis que ela permanecesse no
quarto, mas como ela disse que não é a senhora Aguilar, não podia deixá-lo
na responsabilidade dela, por isso aguardei a sua chegada.

— Tudo bem, obrigado.

— Qualquer coisa entre em contato conosco por favor.


Assenti e a mulher seguiu pelo corredor, então entrei no quarto.
Davi estava sentado no leito e Sofie sentada próximo aos pés, eles jogavam
algum tipo de joguinho de tabuleiro e riam.

— Vizinho — cumprimentou a amiga dela que eu não havia


percebido estar sentada em uma poltrona no canto.

Sofie e Davi se viraram em minha direção. Ele parecia um pouco


abatido, mas sorria.

— Oi — falei, começando a caminhar até o meu filho.

— Oi papai.

— O que aconteceu? — perguntei.

— As coisas começaram a girar e eu caí, depois eu não conseguia


fazer o ar entrar e ficava fazendo assim — disse Davi e começou a imitar o
momento em que ficou com falta de ar.

— Eu sinto muito — falei, abraçando-o.

— Tá tudo bem agora. Não vai chorar de novo, né papai? Você é um


menino grande, eu já falei isso — disse ele e todos riram, enquanto eu
secava os olhos discretamente.

Aquele garotinho era a minha vida, era por ele que eu vivia e não
estava sabendo lidar com tantas mudanças. Por anos o mantive ao meu lado
o tempo todo, priorizando ele, e vê-lo passar mal enquanto eu não estava
cuidando dele era aterrorizante para mim.

— Você tem toda razão — respondi, beijando sua cabeça e


abraçando-o outra vez. Então me virei para Sofie. — Obrigado por vir —
agradeci e ela assentiu com um sorriso singelo e um gesto de mão como se
não tivesse sido nada, mas para mim tinha sido. — O que o médico disse?
— Aparentemente o Davi está bem agora, fez exames e os que já
saíram os resultados está tudo bem. A respiração dele está normalizada,
quando chegou parece que ele tinha um pouquinho de dificuldade de
respirar, mas já estava melhor do que quando passou mal na escola, mas já
tiraram o respiradouro dele como vê.

— A cabeça? Ele teve tonturas, fez exames da cabeça? Fez uma


tomografia?

Aquele assunto me assombrava.

— Calma, ele fez uma tomografia por conta das tonturas e está tudo
bem também, nenhum sinal fora do normal para crianças saudáveis da idade
dele. Alguns exames, inclusive o de sangue, parece que não ficaram prontos
ainda, estamos aguardando o médico — explicou Sofie.

— Certo, graças a Deus!

— E aí campeão? — Pedro se aproximou de Davi que lhe abraçou


também e engataram uma conversa.

— Eu vou buscar café para todos — disse a amiga.

— Ei, você não tem quatro mãos, eu vou com você — se ofereceu
Pedro.

— Tudo bem. Você é solteiro? — ela perguntou e Pedro riu, vi Sofie


tampar o rosto com as duas mãos e resmungar alguma coisa que não
consegui entender o que era.

— Não. Eu sou casado.

— Droga, você é um gato.

— Obrigado, mas eu realmente sou muito bem casado e pai de


quatro filhos.
— Ah que pena, para mim é claro. Tenho um tipo de fetiche em
ruivos, mas não temos muitos por aqui, sabe? — disse ela e ouvi Pedro rir
antes que a porta fosse fechada.

— Meu Deus, ela não toma jeito. Preciso pedir desculpas ao seu
amigo — lamentou Sofie.

— Tá tudo bem, Pedro sabe se virar muito bem nessas situações.

— Diga que ele não vai contar à esposa e que ela vai dar uma surra
na Aída. Ela pode ser sem noção, mas é uma boa pessoa.

— Não, não, uma surra não — falei, franzindo a sobrancelha,


imaginando o que a Maca faria se pegasse alguém de gracinha com Pedro.
— A Macarena tem um jeito um tanto... diferente de lidar com essas coisas
também.

Eu conseguia ouvir o som da Poder de Persuasão sendo engatilhada


enquanto Macarena me mantinha na mira da arma quando a encontrei pela
primeira vez na Alemanha.[2]

Um frio chegou a percorrer a minha coluna, eu dava graças a Deus


que havia conseguido consertar as coisas, ou poderia nem estar ali para
contar a história.

— Que bom que eles combinam.

— Você nem imagina o quanto — falei, me lembrando da história


dos meus amigos.

— A madrinha é muito boazinha, menos quando ela tá no pub —


disse Davi, fazendo uma careta estranha.

— Ela bebe até cair? — perguntou Sofie de uma vez, fechando os


olhos em seguida, como se tivesse feito a pergunta por impulso e se
arrependido logo em seguida.

Eu sorri.

— Não, não. Ela tem um pub, mas antes que Pedro retornasse para a
vida dela, ela cuidava de tudo sozinha, só trabalhavam mulheres lá, então
ela aprendeu um jeito diferente de lidar com as coisas.

— Ah — foi o que ela disse e fiquei com vontade de rir.

O médico entrou naquele momento.

— Boa tarde! — cumprimentou.

— Boa tarde! — Sofie e eu respondemos em uníssono.

— E então garotão, como se sente? — perguntou o médico e lhe dei


espaço para que chegasse até Davi. Sofie também se levantou dos pés da
cama.

— Eu estou bem — Davi respondeu.

— Que bom, vamos colocar isso aqui de novo para ver como está a
sua respiração? Você já viu que não dói — sugeriu o médico e Davi aceitou.
— O senhor é o pai? — perguntou, se virando para mim.

— Sim — respondi e ele assentiu, se voltando para os aparelhos.

— Veja, pai! O nível de oxigênio dele já está normalizado. Teve


mais tonturas?

— Não, senhor — respondeu Davi.

— Ótimo! Vou te deixar ir para casa, mas antes preciso conversar


com o seu pai um minutinho — disse o médico e eu assenti.
— Pode falar, doutor.

— Vamos ao meu consultório, por favor.

— Eu fico com ele — Sofie se ofereceu e assenti, mas vi a


preocupação em seu olhar.

Assenti e o médico me indicou o caminho e quando nos sentamos,


ele pegou uma pasta com o que pareciam ser exames. Me explicou tudo,
aparentemente em todos aqueles exames estava tudo bem, até que ele pegou
o hemograma.

— Porém, senhor Aguilar, o Davi está apresentando algumas


alterações no sangue. Precisaremos de exames mais detalhados, então
colheremos mais sangue e o deixarei ir para casa. Deixe-o descansar por
hoje e depois ele poderá retornar às aulas, porém não quero que ele faça
grandes exercícios físicos na escola por enquanto.

— Avisarei a escola. Mas o que ele tem? — perguntei, sentindo meu


coração apertado.

— Não tenho um laudo, senhor Aguilar. É necessário ter todos os


exames em mãos.

— Compreendo, mas...

— Vamos dizer que seja uma anemia, ok?

— Ok, mas e cabeça dele, doutor? As tonturas me deixaram


realmente preocupado, não existe nenhuma hipótese de ter nada escondido
ali?

— Não se preocupe! O cérebro dele está cem por cento. Vá para


casa, cuide do seu filho e o mantenha tranquilo. É isso que precisa fazer por
enquanto.
— Tudo bem.

— Só mais uma coisa, como foi a escola que deu entrada na ficha
dele hoje, não há muitas informações, preciso saber o tipo sanguíneo do
senhor e o da mãe do Davi.

— Ah, certo, o meu é B e o da mãe dele é O — informei.

O médico parou de anotar por um instante e ajeitou os óculos no


rosto, terminou a anotação, conferiu os papéis e retirou uma folha de baixo
de todos.

— Preciso que assine aqui, senhor Aguilar. Esta é a liberação dele,


só é necessário passar na tesouraria primeiro para que tudo seja liberado de
fato.

— É claro.

Me levantei e segui pelo corredor, preocupado, ao menos a minha


maior preocupação estava descartada. Uma anemia? Isso não era tão difícil
de resolver, né? Entrei na tesouraria e acertei o valor da internação,
voltando para o quarto em seguida e deixamos o hospital.
Capítulo 20

O jantar da noite anterior havia sido calmo e tranquilo, já que a


minha mente estava cem por cento em Davi. Sofie não queria ir, não queria
incomodar, mas eu queria que ela fosse e Davi também. Ela e Pietra nos
faziam bem, tinham dado uma nova cor à nossa vida.

— Não gosto de ter que te usar assim, Maca — falei a minha amiga
que estava em minha casa naquele início de noite de quinta-feira.

— Deixa de ser bobo, as crianças adoram brincar. Além disso, você


sabe que eu amo ficar com o meu afilhado, você não deixa ele com a gente
tempo suficiente.

— Você é a melhor. E vou te pagar por essas horas que ficará com
ele.

— Não me ofenda, Raul — disse ela, se levantando do sofá


enquanto Davi corria com o segundo casal de gêmeos que ela tinha.

— Não é justo.

— Se você insiste, quero outra coisa como pagamento.

— O que você quiser — concedi.

— Ótimo! Quero conhecê-la — disse, sorrindo grande.

— O quê? — me fiz de desentendido, sabia muito bem de quem


aquela enxerida estava falando.

— A garota. Que tal sábado à tarde?


— Tudo bem, peça para as crianças chamarem a Pietra, a babá deve
vir junto.

— Ah, vou adorar conhecer a garotinha, mas era da tia dela que eu
estava falando. A escritora.

— Como você tem tantas informações? Seu marido é muito


fofoqueiro, aquele ruivo dos infernos — reclamei e ela riu.

— É sério, eu quero conhecê-la, por favor. Prometo que não vou


contar seus podres.

— Disso eu duvido, mas, de toda forma, não há motivo para


conhecê-la. Não estamos namorando.

— Mas você quer, posso ver na sua cara.

— Não tenho mais idade para isso.

— Você não tem nem quarenta anos, Raul, deixe de ser bobo. E,
além do mais, faz anos que não te vejo assim.

— Assim como? — perguntei fazendo uma careta.

— Apaixonado.

— Não tô apaixonado, deixa de ser louca, mulher — falei e ela riu.

— Pode continuar se enganando, mas todo mundo tá vendo, não te


vejo assim desde... — ela mesma se interrompeu, percebendo que entraria
em um assunto que não era propício para aquele momento. Nem para
nenhum outro.

— É diferente.

— É claro que é, por isso quero conhecê-la.


— Vamos ver, vou falar com ela. Se ela estiver confortável, falo pra
você — falei e ela desviou o olhar, torcendo a boca de lado um pouquinho e
estreitei os olhos em sua direção. — Macarena?

— Hum? — se fez de sonsa.

— Desembucha!

— O que? Eu não fiz nada!

— Qual é, Macarena? Você já apontou uma espingarda pra minha


cara, eu já chorei no seu colo e fiquei mais de ano sem falar com meu
melhor amigo porque fiz uma merda muito grande só pra poder cumprir a
promessa que te fiz, vai se fazer de sonsa comigo agora? Pode contar —
falei, me aproximando.

— Eu posso ter pego o telefone dela escondido nos papéis que o


Pedro tem sobre o processo da casa, e mandado mensagem pra ela hoje —
confessou, apertando os lábios um no outro.

— Tá de brincadeira?

— Eu só queria fazer amizade.

— Cobra peçonhenta — ataquei, mas ela sabia que era de


brincadeira e sorriu.

— Então, sábado ela não vai trabalhar, por isso vamos levar as
crianças pra brincar na piscina da casa dela.

— Vamos?

— É claro que vamos — disse e passou por mim, me dando um


beijo na bochecha antes de seguir para a cozinha.
Suspirei, não tinha como barrar uma mulher enxerida como a
Macarena, eu já sabia disso, a conhecia muito bem.

— Não acredito que fez isso sem falar comigo.

— Vai ser um almoço — gritou da cozinha. — Você não está


atrasado?

— Puta que pariu! — praguejar olhando para o relógio e as três


crianças ao meu redor me encararam, suas expressões espantadas,
alternando seus olhares entre mim e o pote do palavrão. — Tá, eu coloco
um dólar no pote.

Tirei a carteira do bolso, peguei uma nota e depositei no pote.

— Estou indo, Maca. Qualquer coisa, me ligue.

— Vai tranquilo.

Eu havia recepcionado o cliente no aeroporto, o levado até o hotel


para fazer o check in e feito um tour com ele pela cidade da forma como ele
havia me pedido. Eu queria levá-lo ao pub da Macarena para que ele
conhecesse a cerveja artesanal, mas ele já havia pesquisado sobre um pub
no centro.

Nos sentamos lá, bebemos e comemos, mas eu só conseguia pensar


em em qual daqueles lugares Sofie trabalhava, pelo que ela havia me dito,
era naquela região. Ao fim da noite, meu cliente quis visitar uma boate
famosa onde garotas dançavam e tiravam a roupa. Tentou me convencer a
entrar com ele, mas eu realmente queria ir para casa, por isso eu o deixaria
na boate e iria embora. Na rua do estabelecimento não havia um lugar
sequer para estacionar, por isso precisei estacionar na rua de trás. Levei o
homem até a porta da boate e dei um bom dinheiro para que o segurança o
colocasse em um táxi e o enviasse para o endereço indicado assim que ele
saísse do estabelecimento.

— Vamos lá, Raul! Vamos nos divertir um pouco, ver algumas


mulheres linda, não é tão tarde — ainda insistiu.

Olhei para dentro do estabelecimento, pouco se via dali. Suspirei.

— Vai ficar para outro dia.

— Vou cobrar.

Eu sorri e o homem entrou, então caminhei até o meu carro. Conferi


o celular e Pedro havia me enviado uma mensagem, pedindo para que eu
levasse pizza. Tinha uma bem perto dali, então caminhei até lá e esperei até
que ficasse pronta.

Quando eu retornava para o meu carro para enfim ir para casa,


avistei uma cena cômica mais à frente de onde eu havia estacionado meu
carro. A rua não era tão bem iluminada, mas eu a reconheceria em qualquer
lugar.

Sofie estava muito brava, chutando a roda de um carro,


provavelmente o dela, e xingando. Coloquei as caixas de pizza dentro do
meu carro e caminhei até ela, segurando para não rir de sua indignação com
o automóvel.

— Carro de merda! Lata velha dos infernos! — praguejava


enquanto chutava o pneu.

— Não sei o que esse carro fez pra você, mas vai acabar se
machucando assim, meu doce — falei e ela se assustou.
— Quer me matar do coração? — perguntou alto demais, levando a
mão ao peito.

— Achei que já tivesse deixado claro que do coração não — falei,


parado com as mãos nos bolsos e a vi se remexer, se endireitando logo em
seguida. — O que houve?

— Ele não liga — disse ela e arqueei uma sobrancelha.

— Onde está a chave? — perguntei e ela me ofereceu a chave do


carro.

— Vamos ver. Tem combustível? — perguntei por reflexo.

— É claro que tem combustível, não sou nenhuma idiota — disse,


extressada, olhando para os lados, parecia preocupada.

— Eu não disse isso.

— Deixe-o aí, vou pedir um táxi — disse, ainda olhando para os


lados.

— Calma, Sofie. Está esperando alguém? — perguntei.

— É claro que não, só estou cansada e quero ir para casa.

— Tudo bem, deixe-me ver.

Dei a volta no carro e entrei, inserindo a chave na ignição e a


girando, já vendo o problema.

— Está com problema na injeção eletrônica. Vou chamar um


guincho e vamos pra casa, eu te levo — falei e ela assentiu.

Liguei para o guincho e deixei a chave no painel, eles chegariam em


breve. Então entramos no meu carro e segui para casa.
— Você parece nervosa, é só pelo carro ou houve algum problema
no trabalho? — perguntei, curioso.

— É, eu tive um pequeno problema, desculpe por ser tão rude, não


foi a minha intenção.

— Tudo bem, todo mundo tem o direito de ter dias ruins — falei e
ela sorriu fraco.

— Você é um cara legal!

— Só agora você percebeu isso? — brinquei e ela revirou os olhos.


— Quer me contar sobre o seu problema no trabalho.

— Não.

— Posso te ajudar em algo?

— Também não. Só preciso chegar em casa e descansar. Onde você


trabalha afinal? Fiquei curioso.

— O que faz na rua tão tarde? — perguntou. — Não que eu esteja


cobrando algo, é só que... e o Davi?

— Eu estava recepcionando um cliente. Deixei ele em um lugar e


Pedro me pediu pizza. Ele e Macarena estão em casa com Davi.

— Ah, sim entendi.

Não me passou despercebido que ela havia se esquivado da pergunta


sobre o seu local de trabalho. Será que tinha medo que eu fosse até lá?

O restante do caminho fizemos em uma conversa sobre como Davi


estava. Quando estacionei o carro em minha garagem, segurei o braço dela
antes que ela descesse.
— Ei.

— O que foi?

— Tem pizza e meus amigos estão lá dentro. Pedro você já conhece,


mas a mulher dele, a enxerida que te enviou mensagem hoje mais cedo —
eu falava e ela sorriu — ela vai te encher de perguntas.

— Você contou a ela?

— Não, mas o Pedro sabia que eu estava afim de você e ele é


fofoqueiro, eles sabem que está rolando algo — falei e Sofie riu.

Eu descobri que adorava aquele som.

— Não precisava ter aceitado conhecê-la sábado.

— Eu sei, mas eu quis, ela parece legal — respondeu, dando de


ombros, então acariciei sua bochecha, segurando seu rosto entre minhas
mãos. — A não ser que você não queira isso.

— É claro que eu quero, inclusive, como eu dizia, ela está lá dentro,


não quero te pressionar de forma alguma, mas se quiser entrar para comer e
conversar com a gente — ofereci e ela pareceu pensar.

— Acho que vou segurar esse encontro para sábado. Estou cansada
demais — disse, fechando os olhos.

— Entendo. Deve estar com os pés doendo de tanto andar para


servir as mesas — falei e a vi engolir em seco, o trabalho devia estar
mesmo exigindo muito dela.

— Sim, meus pés estão me matando. Só quero um banho e dormir.


Além do mais, preciso dispensar a babá por hoje.
— Tudo bem — falei e acariciei sua bochecha outra vez.

Sofie fechou os olhos com a carícia e toquei seu lábio inferior com
meu polegar. Seus lábios se entreabriram com o meu toque e me aproximei,
beijando-a, deixando nossas línguas se envolverem naquela carícia calma e
excitante ao mesmo tempo.

— Eu realmente preciso ir — disse quando encerramos o beijo.

— Tudo bem, boa noite então — falei e toquei meus lábios nos dela
de forma singela.

— Boa noite! — respondeu e saiu do carro.

Também desci do carro e fiquei observando-a até que ela entrasse


em casa em segurança. Me virei para a minha casa e Macarena e Pedro
estavam na janela. Ótimo, pela hora as crianças deviam estar dormindo, eles
iam me encher o saco.

Suspirei e entrei para enfrentar as feras/cupido/fofoqueiras.


Capítulo 21

Meu coração quase havia parado de bater quando vi Raul na noite


passada perto do meu emprego. Estava desesperada para sair de lá com ele
antes que algum outro funcionário saísse do clube e fosse falar comigo e ele
descobrisse onde eu realmente trabalhava.

Na sexta-feira Raul me levou até a oficina onde meu carro estava e


tudo já havia sido consertado. Guardei o cartão do mecânico, já que o
conserto havia ficado absurdamente barato, se precisasse de novo, era nele
que levaria.

De noite, estava no trabalho quando Andreas entrou no camarim das


dançarinas. Um dos garçons servia um shot de tequila para cada dançarina
presente.

— O que estamos comemorando? — Nina, uma das dançarinas


perguntou.

Andreas sorriu e caminhou até onde Aída e eu estávamos.

— Estamos comemorando uma das melhores noites desse lugar. A


casa está incrivelmente cheia e advinha graças a quem? — disse Andreas.
— Graças às minhas duas melhores meninas: Aída e Sofie. Que todas vocês
possam ser tão boas quanto elas.

Andrea levantou um brinde nada bom, o que geraria uma rincha


enorme entre as garotas dali, e dessa vez eu estava inclusa, recebendo
olhares de merda na minha direção enquanto todas viravam seus shots.

— Beba, querida. Beba — ofereceu Andreas quando percebeu que


eu não havia bebido.
— Não quero, obrigada.

— Sofie, vamos, beba — disse, dessa vez usando um tom um pouco


mais duro. — Volte para o palco para a sua última dança da noite, quando
voltar, quero falar com você.

— Tudo bem — concordei e segui para o palco.

Depois da dança, subi até o escritório onde Andreas me aguardava e


bati na porta.

— Entre — concedeu e entrei. — Ah, minha pupila, estrela desse


lugar — disse, se levantando e vindo até mim, direcionando-me para o sofá
de luxo que havia ali e não para a sua mesa.

— Queria falar comigo.

— Sim. Eu não estava brincando quando disse que você e a sua


amiga estão atraindo muitos clientes, são talentosas.

— Obrigada — agradeci, mesmo que eu não me orgulhasse daquilo.

— Você está me trazendo muitos clientes e ainda mais lucro, Sofie.


Mas isso pode melhorar ainda mais para nós dois.

— Como assim?

— Tenho uma proposta, quer ouvir para pensar a respeito? — quis


saber, e se fosse uma chance de eu conseguir o dinheiro mais rápido e cair
fora dali, eu ouviria.

— É claro.

— Você conhece a nossa política dos quartos privados...

— Não vou me prostituir.


Queria dinheiro, faria o que fosse possível, mas aquilo estava fora
do meu limite.

— Ouça — disse, tocando meu rosto, me afastei. — Se acalme, só te


toquei para te acalmar, você não faz o meu tipo. Veja bem, sei que não gosta
da ideia de se deitar com caras diversos, então podemos fazer melhor. Você
não será como as outras garotas, você é a minha estrela, então durante
algumas semanas podemos te anunciar, os clientes darão seus lances e quem
pagar mais arremata uma noite com você.

— O quê? Não!

— Shiiii, ouça — disse, tocando meus lábios com o indicador para


me fazer calar e ouvi-lo. — Nós vamos colocar o lance mínimo de
cinquenta mil dólares, quem oferecer mais, leva a noite, porém, para dar um
lance, é necessário pagar dez por cento do valor do lance inicial. É algo
para peixes grandes, Sofie.

— Ninguém vai pagar isso.

— Você se subestima, minha flor, já andei sondando os clientes que


vem me procurar porque querem uma noite com você, eu sempre digo que
você não faz isso porque é virgem, eles estão fervorosos, malucos por você.
Todos esses peixes grandes têm dinheiro de sobra para pagar o preço e
concordaram em pagar a taxa para dar o lance.

— Isso é ridículo!

— Não querida, para nós dois isso são negócios, para eles, uma
disputa de quem é maior para passar a noite com a dançarina virgem mais
linda da casa.

— Andreas, eu não...
— Shiii! Não quero uma resposta agora. Vá para a sua casa e pense.
Como incentivo, todo o lucro do que você ganhou hoje, é seu, não vou
cobrar a porcentagem da casa. Vá para a sua casa, tome um longo banho,
relaxe e pense. Depois voltamos a conversar. Agora pode ir.

Me levantei e saí de seu escritório, passei pela portaria dos


funcionários e o rapaz não me cobrou a porcentagem da casa, o que
indicava que Andreas já havia passado as ordens. Caminhei pelo
estacionamento grande e escuro, estava para alcançar o portão de saída para
a outra rua onde meu carro estava estacionado, quando um braço me
segurou.

— Então é aqui que você está juntando a grana para me pagar? —


perguntou Malvo e senti meus pelos se eriçarem por medo.

— O que você quer? — perguntei, mas ele não me respondeu.

Malvo me encarou de cima a baixo e tomou minha bolsa de mim.

— Me devolve — pedi, tentando pegar minha bolsa de volta.

— Calma, olha! — disse ele, pegando todo o dinheiro daquela noite


que estava na bolsa. — Vou ficar com isso como pagamento por ter cuidado
da fedelha enquanto ela fugia pra casa do vizinho.

— Não! Socorro! — gritei para um homem que estava fumando


mais para a lateral do estacionamento, mas ele me ignorou.

Tentei me aproximar outra vez, mas ele me empurrou, derrubando-


me nas pedras do chão estacionamento, jogando a bolsa em mim em
seguida. Guardou o dinheiro no bolso e depois se ajoelhou, deixando seu
rosto na altura do meu.

— Sua vadia de merda! Eu estava sendo paciente porque achei que


você era uma boa moça, agora que vi que você é uma puta xexelenta,
acabou a minha simpatia por você. Você tem duas semanas para me pagar
com dinheiro ou de outra forma — disse, passando a mãos no meio das
minhas pernas, o afastei, me arrastando para trás, sentindo os olhos cheios
de lágrimas. — Caso contrário, o Jordan e a Pietra irão pagar com a vida,
me entendeu.

— Não, por favor!

— Duas semanas — disse e se levantou, deixando-me ali.

Comecei a chorar e conferi meu joelho que doía, uma pedra havia
furado o jeans e cortado a pele, não era nada profundo, mas estava ardendo
bastante, minhas mãos também estavam raladas pelo impacto com o chão
nas pedras. Limpei as mãos na calça e sequei o rosto, tentando me acalmar,
então uma mão apareceu em frente ao meu rosto, oferecendo ajuda.

Era o cara do cigarro.

Olhei para cima e o reconheci de imediato. Era um ex-namorado de


Aída.

— Não era pra você estar na cadeia? O que está fazendo aqui?

— É bom ver você também, Sofie.

— Para de graça, o que está fazendo aqui.

— Vim falar com a Aída.

— Pelo amor de Deus, Karl, deixe a Aída em paz. Ela está melhor
sem você.

— Ela virou uma puta de boate, será que está mesmo melhor sem
mim? — foi irônico.

— Ela não é uma puta, não sai com nenhum cliente.


— Mas tira a roupa e não tente falar que é mentira, eu estava lá
dentro, eu vi.

— Deixa ela em paz.

— Eu vou deixar — disse, soltando um suspiro. — Não quero


confusão, só quero uma conversa para colocar um ponto final, não tivemos
essa chance, você sabe.

— Certo.

— Não é da minha conta, mas o que aconteceu aqui?

— Fui assaltada, você não viu? — menti. — Aliás, você poderia ter
me ajudado.

— Primeiro, nós dois sabemos que aquilo não foi um assalto, isso
está bem claro. Segundo, eu jamais entraria no caminho do Malvo, não sou
idiota.

— Você o conhece?

— Fala sério, quanto está devendo pra ele? Nunca imaginei que
você mexesse com drogas, Sofie, das amigas da Aída, você sempre foi a
mais correta. Se bem que...

Ele não terminou a frase, mas olhou para os fundos da boate e eu


sabia o que ele queria dizer.

— Eu não devo a ele.

— Quem deve então? Porque está na cara que ele estava cobrando
você, ainda que estivesse sendo gentil.

— Gentil? Você viu o que aconteceu?


— Acredite em mim, ele foi extremamente gentil com você levando
em conta que deve dinheiro a ele, já o vi matar pessoas por muito menos —
disse e senti meu sangue gelar.

— A dívida não é minha — falei e Karl me analisou por um


momento.

— Então é verdade que o Jordan foi preso? Não acreditei quando


me disseram. A dívida é dele, não é mesmo?

— É, você conhece aquele homem, por favor me diga uma forma de


me livrar disso.

— Pague a ele.

— Não tenho esse dinheiro e ele acabou de diminuir o meu prazo —


falei, desesperada.

Karl suspirou.

— Então é o fim para você, não tem escapatória, você tá fodida!

— Merda! Merda! Merda!

— Fuja, some da cidade, vá para muito longe — aconselhou.

— Ele vai matar o Jordan.

— Eu sei, não acha que é uma boa hora para ser egoísta? A dívida
não é sua.

— Não posso deixar meu irmão morrer.

— Beleza, então consiga o dinheiro, caso contrário ele vai matar o


Jordan, e tem a outra opção: Malvo vai fazer de você a puta dele, vai te
comer o quanto quiser e quando enjoar, vai raspar a sua cabeça, dar pros
homens dele comer e depois te matar e jogar em uma vala. Não quero te
assustar, só estou te falando a verdade para que tenha certeza de que quer
mesmo assumir o B.O do seu irmão.

— E se eu... — uma viatura da polícia passava na rua quando eu


disse isso.

— Polícia não é uma opção, ele é mais liso que sabonete, os caras
não conseguem pegar ele, se fizer isso o único resultado será que depois
que ele enjoar de você, vai te obrigar a chupar o pau dele logo antes de
arrancar seus dentes e cortar sua língua, pra só depois te matar. E o Jordan
já vai estar morto também.

— Meu Deus!

— Desculpa, mas como eu simpatizava com você antes de ser preso,


me senti na obrigação de te alertar — disse e voltou a andar pelo
estacionamento, acendendo outro cigarro.

Saí de lá e entrei no meu carro, então peguei o celular e liguei para


minha amiga.

— Oi amiga — atendeu.

— Tá sabendo que o Karl saiu da cadeia? — perguntei e houve um


grande silêncio do outro lado da linha. — Aída!

— Desculpa, Sof. Não queria te preocupar.

— Tá de brincadeira?

— Ele falou com você?

— Muito brevemente. É por isso que tem passado as noites lá em


casa? Está com medo dele?
— Sim.

— Merda! Você não podia me esconder isso. Escuta, vou te esperar


aqui no carro, quando você for sair, me avisa que eu entro e saímos juntas,
ele está no estacionamento.

— Não precisa me esperar. Eu sei que ele está lá, já falei com o
Andreas e expliquei. Andreas vai me levar embora. Posso ir pra sua casa de
novo?

— É claro, vou te esperar acordada.

— Obrigada, amiga.

— Se cuida, por favor.

— Pode deixar, preciso entrar no palco.

— Vai lá.

Então eu dirigi para a minha casa, a cabeça a milhão, preocupada


com Aída e em desespero pela minha situação com o traficante.
Capítulo 22

Sábado chegou rápido e para o meu desespero, Macarena estava


animada demais. Pietra e Davi já estavam no jardim com suas roupas de
banho. Meu filho parecia bem, quem visse, nem diria que esteve no hospital
naquela semana. Os gêmeos mais novos se juntaram a eles no jardim.

— Onde estão Luan e Laura? — perguntei sobre os gêmeos mais


velhos.

— Preferiram ir ao shopping — disse Pedro.

— Vamos logo, parem de enrolar — reclamou Macarena, ansiosa e


Pedro e eu nos encaramos, ele me fez um sinal, querendo dizer que eu
estava ferrado e Macarena o cutucou. — Estou vendo!

Seguimos para a casa de Sofie que já arrumava tudo.

— Oi — cumprimentei, me aproximando.

As crianças não estavam por perto, então toquei meus lábios nos
dela de forma rápida e ela me correspondeu sem resistência alguma.
Quando me virei, Macarena sorria e eu revirei os olhos.

— Não ligue pra ela — sussurrei para Sofie que soltou um risinho
baixo. Peguei a sua mão e demos os poucos passos até chegar em meus
amigos. — Sofie, o Pedro você já conhece e essa é a Macarena, a esposa
enxerida dele. Maca, Sofie.

— Oi — disse Sofie, estendendo a mão para Macarena que ignorou


seu gesto e a surpreendeu, abraçando-a.

— Oi, é um prazer te conhecer.


— O prazer é meu — respondeu Sofie, retribuindo o abraço e
sorrindo.

— Vou te ajudar com o almoço, os meninos cuidam da


churrasqueira e ficam de olho nas crianças, não é mesmo? — sugeriu
Macarena.

— Eu não me oponho, só não assuste ela , Maca. Por favor, lembre-


se do que conversamos.

— Prometo me comportar — disse Macarena, rindo em seguida e


Sofie a acompanhou.

As duas seguiram para a cozinha enquanto Pedro e eu


acompanhávamos com o olhar até elas sumirem de vista, então nos
encaramos.

— O que? — perguntou ele, constrangido.

— O que? — perguntei na mesma situação.

— Hum — balbuciou.

Parecíamos dois idiotas.

— Vai arrumar a churrasqueira que vou trazer as crianças aqui para


perto — sugeri.

— Tá.

Dei a volta na casa e chamei as crianças que obedeceram de pronto.


Como eles já estavam com roupa de banho, só coloquei as boias em todos
eles e os liberei para a piscina. Os gêmeos de Pedro tinham pouco menos de
um ano de diferença de idade de Davi, tinham a idade de Pietra.
A churrasqueira estava perto da piscina, então tínhamos a visão
clara das crianças. Abri uma das cervejas de Macarena e comecei a beber
enquanto Pedro colocava a carne para assar.

— Você bem que podia me ajudar.

— Foi mal, estou cuidando das crianças — zombei.

— É claro. Mas e aí, como estão as coisas?

— Vai precisar ser mais específico, Pedro.

— Você e a Sofie, como andam as coisas? — perguntou e eu


suspirei.

— Não sei bem, mas gosto dela.

— Ela parece gostar de você e do Davi também.

— Ah, sim. Eles se dão muito bem — falei, lembrando-me de como


ela o tratava e de como ficou preocupada no dia que Davi passou mal na
escola.

— E então?

— Eu não sei, quero fazer as coisas do jeito certo com ela, mas não
tenho certeza se ela quer isso também.

— Se não perguntar, nunca vai saber.

— E se ela disser que não quer? — perguntei, preocupado, bebendo


mais da cerveja.

— Tenho certeza de que você vai encontrar um modo dela mudar de


ideia e dizer que quer.
— Você tem confiança demais em mim — falei rindo.

— Eu só te conheço. A gente já entrou no soco, você criou o maior


caos na minha vida e quase matou a minha esposa só para conseguir o que
queria, que era manter uma promessa do demônio que fez para ela e ainda
assim conseguiu encontrar um jeito de voltarmos a ser amigos. Convencer
uma garota a namorar com você vai ser fichinha.

— Não é uma garota.

— Eu sei, eu sei. Ainda assim você dá conta — disse ele, erguendo


sua cerveja em direção à minha, como se brindasse.

— Tomara.

As garotas haviam organizado uma mesa para as crianças, que


comiam um pouco mais adiante. Estávamos em nossa própria mesa,
havíamos acabado de almoçar e Macarena e Pedro se aproximaram da mesa
das crianças para ajudar os gêmeos.

— Ela é legal — disse Sofie, se referindo a Macarena.

— Ela é sim. É uma das melhores pessoas que já conheci.

— Ah, é? Ela me contou umas coisas suas — disse ela e eu revirei


os olhos.

— É claro, com certeza coisas bem constrangedoras.

— Sim — admitiu, rindo.

— Não ria — adverti de brincadeira e segurei sua perna.

Assim como Macarena, Sofie vestia um biquíni e uma saída de


banho por cima, um tecido branco e leve.
— Eu te falei como você está bonita hoje?

— Na verdade, já falou duas vezes.

— Jura? — perguntei, sorrindo.

— Mas pode dizer de novo — disse ela, sorrindo também.

— Você está incrivelmente linda — falei e subi um pouco a mão por


sua coxa.

Na parte de baixo da mesa havia uma divisória, ninguém veria.

— Raul — ralhou ela.

Apoiei meu cotovelo na mesa e a encarei.

— Quero conversar com você mais tarde, mas antes, eu preciso estar
dentro de você — falei quando meus dedos roçaram o tecido da sua
calcinha.

— Raul — disse ela, olhando em volta.

— Não tem ninguém vendo — sussurrei. — Shiii!

Com a mão, abri um pouco as suas pernas e acariciei sua boceta por
cima da calcinha, fazendo com que ela olhasse rápido em volta outra vez,
verificando se ninguém estava nos observando. Ela estava ofegante. Apertei
sua coxa de leve antes de afastar o tecido da calcinha para o lado e acariciá-
la de verdade, correndo meus dedos pelas dobras de sua boceta, sentindo-a
ficar molhada, roçando meu polegar em seu clitóris, fazendo-a estremecer
de leve.

— Você gosta do perigo de ser pega, não gosta? — perguntei.

— O... O quê? — gaguejou.


— Se eu te tocasse assim enquanto estivéssemos sozinhos, você
ficaria excitada, não pingaria tão rápido assim como está agora. A
possibilidade de sermos pegos fazendo isso é que te excita mais — falei e
inseri um dedo em sua boceta, vendo-a morder os lábios. Eu não podia
negar que estava tão excitado quanto ela. — Vá para o banheiro e me espere
lá — falei e tirei minhas mãos dela.

— O quê? — perguntou, confusa e atordoada.

— Não tranque a porta, meu doce — falei, lambendo os dedos que a


segundos atrás estavam dentro dela.

Me levantei e segui até meus amigos, ajudando-os com as crianças.


Sofie pareceu meio perdida por alguns minutos, mas logo se levantou e
entrou na casa, esperei mais alguns minutos e fui para lá também. Quando
peguei a maçaneta da porta, estava destrancada como eu havia pedido.

— Boa garota — falei encarando-a.

Sofie parecia um pouco ansiosa e perdida. Me aproximei e a beijei,


sentindo suas mãos se embrenharem em meus cabelos. Ela parecia quase
desesperada por mim e eu amei aquilo. Desci uma das mãos até a sua
boceta e voltei a acariciá-la, me surpreendi quando sua mão veio até a
minha bermuda, abaixando o elástico, deixando a peça cair no chão,
aproveitei o momento e tirei a peça de roupa que ela usava por cima do
biquíni também.

Com os olhos nos meus, ela se abaixou, ficando de joelhos no chão


do banheiro e segurando meu pau. Ainda com o olhar preso ao meu, sua
língua lambeu toda a minha extensão, circulou minha glande e depois o
engoliu por completo, fazendo-me agarrar seus cabelos e conter um
gemido. O boquete dela era tão perfeito quanto ela e eu tinha a sensação de
que se ela me exigisse qualquer coisa enquanto estivesse de joelhos daquele
jeito com meu pau na boca eu cederia sem resistência alguma.
Uma batida soou na porta e Sofie parou os movimentos, fiz sinal de
silêncio para ela e projetei meu quadril para frente, enfiando mais meu pau
dentro da boca dela. Seus olhos estavam presos aos meus, abertos demais
por ter alguém na porta, eu sorri e fiz sinal para que ela continuasse, então
ela continuou.

— Raul? — Pedro me chamou na porta.

Saí da boca da Sofie antes de responder.

— Sim.

Ela se levantou rápido, pegando sua roupa e eu neguei com a


cabeça, tirando a peça das suas mãos e jogando no chão outra vez.

— Preciso usar o banheiro — disse Pedro.

— Tem outro banheiro aqui — sussurrei para Sofie.

— No meu quarto, primeira porta à esquerda — sussurrou de volta.

— Use o do quarto da Sofie, primeira porta à esquerda — falei alto


para que meu amigo me ouvisse.

Puxei Sofie e a levantei, sentando-a sobre a bancada da pia, seus


olhos em mim. Desamarrei a parte de cima do seu biquíni e mandei a peça
para o chão também.

— Sofie não está lá no fundo, deve estar no banheiro do quarto dela.

Os olhos assustados de Sofie demonstraram seu medo e eu sorri.

— Ela não está lá não — falei alto e lambi um dos seus seios,
sugando-o em seguida e ela não conseguiu conter um gemidinho.

— O que foi isso? Tá tudo bem aí? — perguntou Pedro.


— Tá sim — respondi, fazendo sinal de silêncio para Sofie.

Desamarrei os laços da sua calcinha e retirei a peça enquanto


chupava seus seios e ela mordia os lábios, tentando segurar os gemidos.
Pedro não poderia ter aparecido em hora melhor, era visível que ela estava
com medo, mas sua excitação era surreal.

— Abra a boca, meu doce — sussurrei em seu ouvido, sentindo a


pele do seu pescoço ficar arrepiada.

Ela me encarou, incerta e repeti o meu pedido, dessa vez olhando


para ela, mas sem emitir som nenhum. Ela vacilou por um instante, mas fez
o que eu mandei, então peguei sua calcinha, embolei e coloquei um pedaço
em sua boca.

— Isso é pra te ajudar a não fazer barulho — sussurrei outra vez em


seu ouvido e encaixei meu pau na entrada de sua boceta quente e molhada.

Mantive meus olhos nela e deslizei um pouco para dentro dela,


vendo seus dentes se apertarem ao redor do tecido da calcinha e sorri,
terminando de entrar por completo nela, sentindo sua boceta me apertar.

— Raul? Vai demorar? Eu realmente preciso usar o banheiro.

Sai totalmente de dentro da Sofie e depois me enterrei outra vez,


lentamente, vendo seus olhos que estavam em mim, vacilarem, querendo se
fechar. Abocanhei um dos seus mamilos e suguei, enquanto entrava e saía
devagar de dentro dela.

— Vou demorar, Pedro — falei alto e aproximei minha boca do seu


ouvido outra vez. — Que delícia te comer assim, meu doce — sussurrei.

Ela não respondeu com palavras, nem poderia com a calcinha na


boca, mas rebolou no meu pau. Safada deliciosa!
— Raul? — Pedro chamou outra vez e ela olhou na direção da
porta, eu sorri.

— Pedro vá na minha casa. Sabe que está aberta — falei e comecei


a entrar e sair de Sofie com mais força e velocidade, fazendo-a morder a
calcinha ainda mais forte para se conter.

— Tá — Pedro concordou e ouvimos seus passos se afastando.

Mantive o ritmo e toquei seu clitóris enquanto chupava seus seios,


não poderíamos demorar muito, mas não podia deixá-la sair dali sem ter um
orgasmo. Não levaram mais que poucos minutos para que ela se rendesse e
eu sentisse sua boceta espremer meu pau como se me sugasse e seu corpo
dar os primeiros tremores, era lindo como ela gozava, eu estava ficando
viciado nela e não me segurei também, tendo um orgasmo espetacular.
Capítulo 23

Voltei para a piscina e Pedro estava na água. Entrei também,


Macarena estava com as crianças do outro lado da piscina e eu me
aproximei do meu amigo.

— Não foi no banheiro lá em casa? — perguntei, aceitando a


cerveja que ele tirou de uma caixa térmica que estava ali na beirada da
piscina e me entregou.

— Não, eu usei o banheiro do quarto da Sofie. Ela não estava lá,


acredita? — zombou, me encarando.

— Que coisa! — falei e ele riu enquanto eu tomava um gole da


cerveja. — Não deixe ela constrangida, se fizer isso, eu juro que quebro a
sua cara.

— Fique tranquilo, sabe que eu não faria isso — garantiu e eu


assenti.

Não demorou muito para que Sofie saísse da casa, trazendo consigo
uma tigela de doce.

Passamos uma tarde agradável na casa de Sofie e no início da noite


ela saiu para trabalhar. No domingo eu não a vi, estava me sentindo um
pouco ansioso. Queria ter conversado à sós antes que ela saísse para o
trabalho, mas não consegui, o jeito seria conversa com ela na segunda, já
que no domingo à noite ela estava trabalhando e meu cliente, o mesmo da
noite de quinta-feira, havia praticamente intimado Pedro e eu para
acompanhá-lo ao tal clube no centro. Eu não podia deixar Pedro naquela
situação, então precisei ir. A ideia era simples, acompanhá-lo, passar uma
meia hora lá e depois inventar uma desculpa e dar o fora.

O lugar era mal iluminado, a não ser os palcos em que as mulheres


dançavam. Meu cliente havia reservado um palco particular para ele, eu e
os dois sócios dele que haviam chegado no sábado. Peguei meu celular bem
quando uma dançarina entrava, já haviam passado duas por ali.

Abri a conversa de Sofie, eu havia convidado ela para conversar


depois que ela saísse do trabalho, mas ela ainda não havia visualizado a
mensagem. Suspirei, tentando encontrar uma desculpa para sair dali quando
a dançarina se aproximou mais da beirada do palco, fazendo um movimento
sensual.

Meus olhos encontraram os dela, seu rosto estava mascarado, só sua


boca e maxilar escapavam da máscara além do recorte nos olhos. Seu olhar
me pareceu muito familiar, fez meu coração disparar, uma sensação
estranha que eu sabia que a moça também havia sentido, já que ela vacilou
por um momento antes de cortar o contato visual comigo.

Tentei imaginar seu rosto por baixo da máscara, mas muito pouco
dava para ver. A analisei com cuidado, e só a Sofie vinha na minha cabeça.
Eu estava realmente apaixonado, porque aquela não era a minha doce Sofie,
aquela era uma mulher loira, desinibida e quando conferi sua coxa, não
havia tatuagem. Não, por mais que os olhos me lembrassem dela, não era a
minha Sofie.

Eu ri sozinho quando a moça se virou para o outro lado. É claro que


não era a minha Sofie, ela não era assim. A minha Sofie nunca entraria em
um lugar como aquele e era por isso que eu tinha que sair logo daquele
lugar.

— Preciso ir — informei ao meu cliente.


— Mas chegamos não tem nem uma hora — reclamou.

— Eu sei, eu sei, mas preciso encontrar a minha namorada.

— Ah, isso é motivo suficiente. Vá dar atenção à sua garota.

Peguei minha carteira, tirei duzentos dólares e estiquei o braço,


deixando o dinheiro sobre o palco particular. Eu nunca mais veria aquela
dançarina, mas por ter me lembrado da Sofie e que ali não era o meu lugar,
eu queria agradecer.

Saí da boate já com o celular no ouvido, ligando para Sofie, mas não
fui atendido. Entrei no carro e dei uma volta por ali, não a encontrei nos
bares em que olhei enquanto passava na rua em que ela trabalhava, então
fui para casa esperá-la.

Davi e Pietra já haviam dormido. Davi estava na minha casa e eu


estava com a babá eletrônica. Pietra estava dentro da casa de Sofie, a babá
estava de olho nela e eu esperava por Sofie em seu gramado, olhando as
estrelas.

Era quase 1h da manhã quando ela estacionou, ainda não acreditava


como ela era inocente por ter acreditado no mecânico que mentia mal pra
cacete quando ele disse o valor do conserto do carro dela. Antes de nos
envolvermos ela havia comentado que precisou encontrar outro emprego
além da escrita porque precisava do dinheiro e o conserto do carro tinha
ficado em mais de três mil dólares, então eu paguei e pedi ao mecânico que
não contasse nada, ela era orgulhosa e eu sabia que não aceitaria a minha
ajuda.

— Sofie — chamei quando ela chegou à porta, não tinha me visto.


— Falo com você amanhã, Raul — disse e entrou em casa rápido.

Logo a babá saiu.

— A Sofie está bem? — perguntei e ela pareceu incerta.

— Não tenho certeza, parece que está gripada — disse a garota. —


Olha, meu pai chegou para me buscar, boa noite senhor Aguilar.

— Boa noite — falei e ela correu para o carro que a aguardava.

Quando olhei para a casa de Sofie, todas as luzes já estavam


apagadas, então enviei uma mensagem.

“Você está bem? A babá disse que você está com gripe, fiquei
preocupado.”

Ela estava online, mas não abriu minha mensagem.

“Está com algum problema? Por favor, me diga como ajudá-la.”

Continuou online e sem abrir as mensagens. Suspirei e voltei para a


minha casa. Precisava descansar, no dia seguinte precisaria levar Davi cedo
para a escola e ir direto para a empresa, finalizar o contrato com aqueles
clientes.

Na manhã seguinte fiz tudo o que precisava fazer e perto da hora do


almoço voltei para casa. Sofie não havia me respondido e sua casa estava
toda fechada, porém o carro estava na garagem. Eu estava ficando
realmente preocupado. Então bati em sua porta, mas não obtive resposta.
— Sofie? — chamei ao bater pela segunda vez e ouvi barulho
dentro da casa. — Meu doce, estou preocupado, o que está acontecendo? —
Nenhuma resposta, mas olhando pela janela, mesmo com a cortina fechada,
podia ver o vislumbre de alguém sentado do sofá. — Se não me responder
eu vou arrombar, estou realmente preocupado.

— Não precisa se preocupar — disse ela do lado de dentro.

— Sofie, meu doce, você está bem? — perguntei, colando o ouvido


à porta.

— Não, eu estou doente — respondeu, podia ouvi-la se


movimentando pela sala.

— Abra a porta, vou te levar ao médico.

— Não preciso de médico, já estou medicada.

— Então abra a porta, mulher!

— Não posso!

— Sofie, abra a porta, me deixe cuidar de você.

— Não precisa. Eu vou ficar bem.

— Por que não quer abrir?

— Não quero te passar nada.

— Deixe de besteira, abra a porta.

— Não — gritou e percebi que estava no seu limite, eu havia


insistido demais, mas só porque estava preocupado. — Quer dizer, eu me
sentiria mal se você ficasse doente por minha causa.
— Sou saudável como um touro, meu doce. Não vou ficar doente.
Me desculpe por insistir, só estou preocupado e quero cuidar de você.

— Vá para casa, eu vou ficar bem em algum momento.

— Ah, tudo bem. Olha só, eu comprei uma sopa para você, está aqui
na porta. Mas que tal amanhã almoçarmos juntos? Quero conversar com
você. Como você já está medicada e é só gripe, amanhã já deve estar
melhor, não é?

— Não acho que estarei melhor amanhã.

— Depois de amanhã então?

— Não.

— Na quinta?

— Posso ficar doente por muito tempo, Raul — disse ela.

Eu não conseguia entender. Algo estava muito errado. Eu tinha feito


algo errado, na noite anterior ela nem tinha falado comigo, mas eu não
podia forçá-la a falar. Passei as mãos repetidamente no rosto e respirei
fundo.

— Tudo bem, meu doce. Eu vou ficar te esperando melhorar. A


qualquer hora, em qualquer lugar, é só me ligar, eu venho. Estou deixando a
sopa aqui — falei e segui para a minha casa.

Fiquei olhando pela janela e em menos de cinco minutos a porta se


abriu e ela pegou o pacote. Não vi ela sair para buscar Pietra,
costumávamos sair mais ou menos no mesmo horário.
Capítulo 24

No jantar fiz uma sopa de galinha, bem reforçada para mim e Davi
jantarmos, coloquei metade do conteúdo em um pote com tampa, pão e
suco de laranja em uma garrafa e levei até a casa dela de novo. Bati na
porta, avisei que estava deixando a comida e voltei para casa. Como no
almoço, ela esperou um pouco e depois abriu a porta, pegando o pacote.

Na terça eu fiz a mesma coisa, variando apenas o cardápio da sopa.


Meu celular estava sobre a mesa e apitou, sinalizando uma mensagem. Não
abria mensagens durante o jantar, mas deixava ele por perto por conta de
acontecer alguma emergência, mas não consegui me conter e esperar
terminar o jantar quando vi uma mensagem de um número desconhecido,
mas que tinha a foto de Aída, era um áudio.

“Oi, tio Raul! — era voz da Pietra. — Eu estou na casa da tia Aída
enquanto a minha tia está dodói. Fala pro Davi que eu tô com saudade.”

— Pietra, papai! É a Pietra! — Davi se agitou, estava sentindo falta


da amiguinha.

— Sim, filho. É ela.

— Eu posso responder? — perguntou, animado.

— É claro.

Davi gravou uma mensagem de voz e enviei para o número que


agora sabia que era de Aída, salvei o contato e enviei uma mensagem por
escrito.

“Aída, o que está acontecendo?”


Aída: “Por que?”

“Por que Sofie está trancada em casa e a Pietra está com você?”

Aída: “Pietra está comigo porque a mãe dela descobriu que o


Jordan tá preso e a Sofie quem está com a menina.”

Senti minhas sobrancelhas se juntarem.

“Jordan é o pai da Pietra? O irmão da Sofie está na cadeia?”

Aída: “Ai, merda! Não pode dizer a ela que eu contei.”

“Não direi nada. Mas porque a mãe da Pietra não pode ficar com
ela? Isso não ajudaria a Sofie?”

Aída: “Ela é viciada em drogas.”

“Certo, precisam de ajuda com isso? E, isso não explica porque a


Sofie está trancada em casa. Achei que estávamos bem, mas agora ela não
abre a porta para mim, não me atende e nem responde as minhas
mensagens.”

Aída visualizou a mensagem, mas demorou alguns minutos para


responder, o que me deixou ansioso.

Aída: “Para você está tudo bem? Quer dizer, só ela que está
estranha por algo?”

Não entendi o que ela quis dizer.

“Eu juro que não sei o que fiz de errado, por favor me ajude. Me
diga o que preciso fazer para que ela abra a porta para mim.”

Aída: “E o que dirá quando ela abrir?”


“Se quer a verdade, tenho sentimentos por ela e é sobre isso que
quero falar, não quero que ela se afaste, a quero comigo.”

Aída: “Sério?”

“Sim”

Aída: “Vou ver se consigo descobrir algo e te aviso.”

“Obrigado.”

Quando enviei a última mensagem já tínhamos terminado o jantar e


fomos para a sala. Joguei-me no sofá com um suspiro frustrado e Davi fez o
mesmo. Chegava a ser patético eu estar sentindo falta dela daquele jeito,
fazia tão pouco tempo que estávamos juntos e eu já parecia um cachorro
adestrado.

— Quer jogar videogame? — ofereci ao Davi, mas eu não estava


animado para aquilo.

— Não — respondeu ele de forma arrastada, tão desanimado quanto


eu.

Suspirei e o vi fazer o mesmo.

— Tá com saudade das garotas? — perguntei.

— Sim. É muito chato sem elas — disse, se jogando para trás,


entediado.

— É, você tem toda razão.

— A Pietra é minha namorada — despejou, me chamando a


atenção.

— Como é que é? — perguntei, me virando para ele.


— Eu quero casar com ela.

— É sério? — perguntei, achando graça.

— É, eu gosto de brincar com ela.

— Isso é bom — concordei, voltando a me acomodar no sofá.

— Eu quero fazer sexy com ela — disse e eu me ajeitei no sofá.

— Davi, que conversa é essa? Não quero ouvir você repetir isso —
ralhei.

— Mas você fez sexy com a Sofie. Ela vai ser a minha mãe?

Senti meus olhos praticamente saltarem da órbita ocular.

— Davi? — me exaltei.

— É que o tio Pedro disse que você ia ficar mais legal se fizesse
sexy, e você tá legal agora então... — disse, me encarando sem
constrangimento nenhum.

Já eu, por outro lado, não estava sabendo lidar com aquela situação.
Eu precisava matar o meu melhor amigo.

— Davi, presta atenção, você não tem idade para conversar sobre
essas coisas — tentei explicar com calma.

— Mas um menino da minha escola fala — contrapôs e eu não sabia


o que responder. — O que é sexy? O menino da minha escola disse que é
quando um menino e uma menina beija pelado...

— Meu Deus, me ajuda, eu não sei lidar com isso — lamentei,


procurando uma saída para aquela conversa.
— E daí os bebês nascem.

— Eu... eu... Davi o que fazemos quando o papai não sabe muito
sobre um assunto que você quer que eu explique?

— Você pesquisa e conversamos outro dia — respondeu, juntando


as mãozinhas no colo.

— Isso, exatamente! Eu vou pesquisar e te conto depois — tentei


aquela saída.

— Mas você é meu pai, então você beijou a minha mãe pelado, por
isso eu nasci, né?

— Que tal sorvete com muita calda de chocolate e chantilly — dei


minha última tacada de desespero.

— Agora de noite? — perguntou com os olhinhos brilhando, eu não


o deixava comer doces assim tão tarde, pois atrapalhava o sono dele.

— Sim, mas só se me prometer que não vai mais tocar nesse assunto
hoje.

— Prometo! — concordou, animado, já pulando do sofá e correndo


para a cozinha.

Tomei uma respiração, parcialmente aliviado e o segui. Aquela tinha


sido por pouco! Servi o sorvete para nós dois e comemos, eu já colocava a
louça na lavadora quando meu celular tocou.

— Alô — atendi.

— Boa noite, senhor Aguilar?

— Sim, sou eu.


— Senhor Aguilar, aqui é do Hospital Central. Os exames do Davi
Aguilar ficaram prontos e o médico dele pediu para que marcasse com o
senhor amanhã às 14h. Posso confirmar?

— Sim, claro! Confirme — falei, passando a mão pela barba.

— Não é necessário trazer paciente. Só o senhor mesmo —


informou.

— Ótimo! Estarei aí — falei, me sentindo mais aliviado.

Ao menos uma boa notícia.

Tive que passar cerca de mais duas horas com Davi acordado, o
açúcar do sorvete o manteve acordado por mais tempo que de costume.
Depois de um longo banho quente me deixei em minha cama e como um
adolescente ansioso abri a conversa da Sofie, pensando se enviava uma
mensagem ou não quando a palavra “digitando” apareceu embaixo do seu
nome.
Capítulo 25

Eu estava desesperada. Em uma das danças daquela noite me


deparei com Raul em uma das poltronas. Eu usava a peruca loira como
sempre e tampava a tatuagem com uma maquiagem muito boa, mas pela
forma como ele me olhou, eu tinha certeza que ele tinha me reconhecido.

Ao chegar em casa, ele me esperava no jardim, provavelmente iria


me escurraçar e aquele foi meu momento de maior desespero, então eu fugi.
Para ajudar, Clara havia descoberto sobre Jordan e veio atrás de Pietra, não
sabia o que dizer, e como Pietra não estava em casa naquele momento,
neguei que ela estivesse comigo, então pedi que Aída ficasse com ela e me
tranquei em casa.

Raul vinha na hora do almoço e do jantar para me deixar comida


quente, pensando que eu estava doente, mas eu não estava, só queria evitar
a conversa onde ele terminava tudo antes mesmo de começar de verdade.

Eu estava jogada no sofá, em uma poça de miséria e autopiedade


quando meu celular tocou, mas daquela vez não era Raul, era Aída.

— Alô.

— Amiga, abre a porta pro vizinho. Ele não sabe de nada.

— Como assim? Do que você tá falando?

— Seu namorado não te reconheceu, não faz ideia de que era você.
Está todo preocupado, tentando encontrar qual foi o momento em que errou
com você para que o afastasse assim.

— Como você sabe disso?


— Falei com ele, ué!

— Tá de brincadeira?

— Não, a Pietra estava com saudade do amiguinho, então deixei ela


enviar um áudio pra ele, então seu namorado veio desesperado conversar
comigo e saber o que estava acontecendo. O homem tá morrendo às
minguas pensando que fez algo errado, Sofie. Tenha dó!

— É sério?

— É claro que é, acha que eu ia te colocar em uma roubada? —


perguntou e nós duas rimos, sabíamos que aquilo já havia acontecido
diversas vezes. — Tá, eu sei, mas dessa vez não é roubada, vou desligar,
tirar print e te mandar tudo.

— Obrigada!

— Pietra está ótima! Se divertindo à beça com a tia Aída.

— Imagino!

— Já coloquei ela na cama e está dormindo feito um anjinho, falo


com você depois. Beijo.

— Beijo.

Encerrei a chamada e abri a conversa com o Raul, ele havia ligado


diversas vezes e enviado várias mensagens. O celular sinalizou as
mensagens de mídia da Aída e pulei para a conversa dela, lendo em seguida
a conversa dos prints. Meu coração se apertou por ele. Não podia deixá-lo
daquele jeito, mas também precisava dar um jeito de conseguir logo o
dinheiro de Malvo para sair daquele trabalho antes que ele acabasse de vez
com a minha vida.
Reabri a conversa do Raul, ele estava online, então comecei a digitar
sem nem pensar direito.

“Estou melhor! Conversamos amanhã?”

Sua resposta veio de forma instantânea, como se já estivesse com a


conversa aberta.

“É claro! Assim que eu deixar o Davi na escola?”

“Pode ser, vou ficar esperando.”

Ele não respondeu mais, nem mesmo visualizou, então fui me deitar
e dormir para enfrentar o próximo dia e ter certeza de que ele não estava só
nos enrolando.

Pela manhã, liguei por chamada de vídeo para Aída e falei com
Pietra que estava de saída para a escolinha, depois tomei um banho. Tinha
acabado de pentear os cabelos quando ouvi a batida na porta e meu coração
acelerou. Respirei fundo, fui até a porta e a abri, mas o ar pareceu me faltar.
Raul usava um social all black e segurava um grande buquê de rosas
vermelhas.

— Oi — disse com a voz grave que me deixou arrepiada.

— Oi, entra.

— São pra você — disse, me oferecendo as rosas.

— Obrigada. — Peguei as flores e inalei seu perfume inebriante. —


Eu amo rosas vermelhas.
— Ainda bem que acertei — articulou, todo sem jeito.

Raul entrou e parou bem no meio da sala.

— Como você está? — perguntou.

— Eu estou...

Não consegui terminar minha resposta, ele avançou sobre mim e me


beijou, desesperado e eu retribuí na mesma intensidade.

— Me desculpe, eu queria fazer as coisas certas e ir com calma, mas


não consegui me segurar. Eu senti muito a sua falta — disse, me abraçando
e beijando o topo da minha cabeça.

— Eu também senti — admiti.

— Me prometa que não vai fazer isso de novo, por favor. Eu quase
enlouqueci, não sabia o que fazer, queria cuidar de você. Não me afaste de
novo dessa forma, por favor — disse, segurando meu rosto entre suas mãos,
seus olhos nos meus.

— Desculpe! Não foi a minha intenção — falei, me sentindo


culpada por ter deixado ele preocupado, sendo que a culpada por tudo
aquilo era só eu.

— Quero dizer uma coisa, não é exatamente fácil para mim fazer
isso, mas preciso.

— Diga — pedi, me sentindo ansiosa.

— Eu... gosto de você — falou e eu sorri.

— Eu também gosto de você.


— Não, você não está entendendo — disse, começando a andar pela
sala. — Eu...

Eu o segurei pelo braço, forçando-o a olhar para mim.

— Porra, eu tô muito apaixonado por você e quero que seja minha


namorada — despejou de uma vez e não consegui evitar que meu sorriso
aumentasse ainda mais. — Queria fazer isso de outra forma, de um jeito
mais romântico, mas não consigo, não sei fazer isso.

— Também estou apaixonada por você — falei e seus olhos


surpresos me encararam outra vez.

— Você é perfeita — falou e me beijou. — Diz que aceita namorar


comigo.

— Aceito — falei e ele me beijou outra vez.

Raul acariciou uma das rosas do buquê que ainda estava na minha
mão esquerda.

— Olha só, preste atenção no que vou dizer.

— Certo!

— Essas rosas são o símbolo do nosso amor. Enquanto a última rosa


estiver viva, estarei apaixonado por você — disse e fiquei confusa,
decepcionada um pouco até.

— Só enquanto essas rosas durarem? — perguntei.

— Até a última morrer — respondeu.

— Mas isso é em três ou quatro dia — falei e ele percebeu meu


descontentamento, então riu e selou nossos lábios de forma singela.
— Acredite, você pode se surpreender. Agora me dê isso aqui.

Ele tirou as rosas da minha mão e as colocou sobre a mesa, me


pegou no colo e me levou para o meu quarto.
Capítulo 26

Minha mente e coração pareciam em paz, tinha conseguido a minha


garota, agora só faltava falar com o médico de Davi para a confirmação de
que tudo estava bem para poder dizer que todos os últimos acontecimentos
haviam sido os melhores.

Cheguei ao hospital no horário certo e o médico já me aguardava.

— Boa tarde, senhor Aguilar — cumprimentou-me.

— Boa tarde, doutor.

— Como está o nosso pequeno Davi? — perguntou, me indicando a


cadeira para que me sentasse à sua frente.

— Está muito bem — informei e ele assentiu.

— Que bom, ao menos isso — disse e aquilo me deixou em alerta.

— Ao menos isso? Como sua assistente disse que não precisava


trazê-lo, presumi que estava tudo bem com os exames. Estou errado? —
perguntei e o vi suspirar e em seguida menear a cabeça.

— Na verdade, pedi para que ele não viesse, para que pudéssemos
conversar com tranquilidade e francamente.

— O que ele tem?

— Davi tem o que chamamos de Aplasia Medular. O senhor tem


noção do que seja?

— Não! — Minha resposta saiu quase sem voz, estava com medo.
— Aplasia medular também é conhecida como Anemia Aplástica. O
tecido medular normal é substituído por um tecido gorduroso que impede a
formação correta das células sanguíneas.

— O que isso quer dizer, doutor? Seja objetivo, meu filho pode
morrer?

Ele ficou em silêncio por um momento.

— Calma, não é assim que funciona.

— O que preciso fazer para ajudá-lo?

Minha mente trabalhava a mil por hora.

— Vamos entrar com medicações e transfusão de sangue, então


veremos como ele reage — explicou e eu assenti. — Precisamos encontrar
doadores.

— Sou saudável, faça os exames necessários e tire o que precisar do


meu sangue e coloque nele.

— Não funciona dessa forma, senhor Aguilar. Precisamos de um


doador compatível.

— Mas eu sou o pai dele.

— Na verdade, nem sempre. Além do mais, entendo que o senhor


esteja nervoso, mas acho que deve ser de seu conhecimento que pais
adotivos não têm o mesmo sangue da criança, por mais que quisessem, né
— brincou, rindo e senti uma batida do meu coração falhar.

— Como assim?

— Ah, o senhor sabe, por não ser o pai biológico...


— Como é que é? — A pergunta saiu em um fiapo de voz e só então
o médico se deu conta.

— O senhor não adotou o garoto? — perguntou e só então ele


percebeu o que acontecia. — Então essa conversa deveria estar sendo feita
de outra forma. Onde está a sua esposa?

— Não tenho esposa! A mãe biológica dele nos deixou quando ele
era muito pequeno. O senhor quer mesmo dizer o que penso que disse? —
perguntei, sem reação alguma.

— Eu sinto muito, mas agora não tenho como voltar atrás. Davi não
é filho biológico do senhor...

— Está enganado. Não pode ser.

— O senhor informou que seu tipo sanguíneo é B, correto?

— Sim.

— A mãe do Davi é tipo O, isso foi o que o senhor informou, há


alguma possibilidade dessa informação não estar correta?

— Nenhuma possibilidade. Eu tenho certeza absoluta.

— Eu não deveria estar agindo dessa forma, mas vou ser sincero
com o senhor, a situação do seu filho é crítica e preciso que entenda que não
pode ajudá-lo no transplante. Com a mãe sendo tipo O e o Davi sendo tipo
A não existe a menor possibilidade do senhor, tipo B ser o pai dele.
Podemos realizar um teste de DNA para a confirmação oficial, mas já
adianto que não há a menor possibilidade — disse e eu assenti. — Quer um
copo d’água? O senhor se sente bem?

Meu mundo estava ruindo.


— Estou bem. Vamos esquecer esse assunto, quero saber o que
preciso para ajudar meu filho. — As últimas palavras quase nem saíram.

— É claro.

O médico me explicou tudo e eu daria um jeito. Ainda na recepção


do hospital, liguei para todos que conhecia e consegui um bom número de
pessoas que concordaram em comparecer ao hospital naquele mesmo dia e
no dia seguinte para a doação de sangue.

Pedi para que Pedro pegasse Davi na escola e ficasse com ele,
precisava digerir aquilo, não poderia contar a ele, não naquele momento,
por isso não podia deixá-lo perceber nada. Me lembro de ter entrado no
carro e depois: nada. Já era noite quando parei de dirigir sem rumo e
finalmente cheguei em casa.

Peguei uma jarra de água na geladeira e bebi todo o líquido de uma


vez, tentando limpar a mente e sair da inércia em que eu me encontrava.
Sem que eu me desse conta, o jarro escorregou da minha mão e estilhaçou
no chão.

Fiquei por um minuto inteiro olhando os cacos de vidro espalhados


pelo chão, ao redor dos meus pés descalços, os olhos marejados,
embaçando as vistas. Então o primeiro grito escapou da minha boca, alto e
agoniante. Passei a mão pelo balcão, derrubando no chão tudo que tinha ali,
e quando cheguei ao final do móvel, era a cristaleira que estava na minha
frente.

Com as duas mãos a puxei, estava pesada, mas a virei, derrubando


tudo o que havia ali, fazendo a maior bagunça de vidro e cristal no chão, e
continuei quebrando tudo o que via pela frente. Eu podia sentir meus pés
sendo feridos, mas aquela dor não era nada perto da dor que eu sentia no
peito.

Aquilo não podia estar acontecendo, meu filho não podia estar
doente daquela forma.
Meu filho...

Meu filho...

Porra, eu não era o pai dele!

Meu peito sangrava, não por Magda ter me enganado, mas por eu
realmente não ser o verdadeiro pai dele. Davi era tudo na minha vida e eu o
amava como nunca tinha amado ninguém. Ele era tudo para mim e eu era
tudo para ele e só de imaginar que em algum momento ele poderia querer ir
atrás de seu verdadeiro pai e eu ficaria para trás, destroçou meu peito.

Ouvi alguém me chamar ao fundo, mas não parei de quebrar as


coisas, precisava tirar aquela dor do peito para poder correr e cuidar do meu
menino. Senti mãos nos meus braços, tentando me parar, mas não permiti,
então o corpo pequeno e macio me abraçou, tentei empurrá-lo para longe,
mas não consegui.

As mãos pequenas acariciavam minhas costas de leve e senti o seu


perfume. Sofie. A abracei de volta, apertando seu corpo contra o meu. Eu
não conseguia enxergá-la por causa das lágrimas que embaçavam meus
olhos, mas sabia que era ela.

— Calma, tá tudo bem — ouvi sua voz sussurrar. — Venha, seus pés
estão machucados.

Eu não me importava com os ferimentos na pele, era o coração que


sangrava mais, mas me deixei levar por ela. Demos mais alguns passos até
estarmos na sala, então logo estávamos sentados no tapete macio.

Sofie me puxou para ela, me abraçando, eu sabia que não tinha


como estar no colo dela, já que era muito maior, mas era assim que eu me
sentia, como se ela me desse colo e começou a acariciar meus cabelos com
uma das mãos e com a outra, tentou secar minhas lágrimas, embora elas não
parassem de escorrer pelo meu rosto.
— Se acalma, eu estou aqui com você, tá? — disse ela e eu assenti,
segurando sua mão e levando aos lábios em um beijo singelo. — Quer me
contar o que houve?

— Eu não sou o pai dele — falei.

— Como assim? — perguntou, rápido demais.

— Acabei de descobrir que Davi não é meu filho biológico.

— Tudo bem, isso não importa de verdade — disse após um minuto


inteiro de silêncio.

— Como não importa? Eu não sou o pai dele, porra!

— Que conversa é essa? É claro que você é o pai dele!

— Não existe a menor possibilidade dele ser meu filho biológico.

— Filho biológico! — disse com desdém. — Você deixou de amá-lo


ao menos um pouquinho por saber dessa informação?

— É claro que não — falei, indignado, sentando-me e me virando


de frente para ela. — Eu amo aquele garoto mais do que tudo, daria a minha
vida por ele.

— E se ele deixasse de te amar, você ainda continuaria amando ele


do mesmo jeito?

— Sem nem pensar duas vezes, com toda certeza!

— Então mande a porra da biologia à merda! Você é o pai daquele


garoto e ponto. Não é difícil entender isso.

— Acha que ele vai deixar de me amar quando descobrir isso?


— Eu duvido muito! Você é o herói dele. A relação de vocês é
incrível, existem pais e filhos biológicos que não tem nem dez por cento da
relação que você tem com ele, Raul. Sei que não deve ser fácil receber uma
bomba dessas assim, mas não muda a vida de vocês, não da forma como
você está pensando que mudará.

— Muda porque meu filho precisa de um doador e eu não posso ser


essa pessoa porque não sou compatível com ele — revelei e ela ficou em
silêncio.

— Em primeiro lugar, mesmo não sendo compatível, tenho certeza


de que não medirá esforços para conseguir alguém que seja.

— Já arrumei as pessoas que precisavam.

— Ótimo! Sabe o que isso quer dizer? Que você fez o que o pai dele
deveria fazer. Você foi pai!. Agora, me diga, porque ele precisa de um
doador?

Respirei fundo.

— Ele tem Aplasia Medular, vai precisar de tratamento.

— Vamos fazer então. Do que precisamos?

— Inicialmente, ele vai usar medicamentos e fazer uma transfusão


de sangue amanhã mesmo — falei e ela assentiu. — Mas pode não dar
certo.

— Vamos deixar para pensar nisso quando chegar a hora e se


acontecer, tudo bem? Precisamos ser positivos e dar apoio a ele.

— Você tem toda razão.


Capítulo 27

Logo após a transfusão de sangue de Davi na tarde do dia seguinte,


fomos para sua casa. Eu havia buscado Pietra para animá-lo já que Clara
parecia ter desaparecido em suas loucuras em dias seguidos se drogando.

Ele estava deitado em sua cama, descansando enquanto Pietra


mantinha um livro nas mãos, mas como ainda não sabia ler, inventava uma
história através das ilustrações nas páginas do livro. Raul e eu ouvíamos
também enquanto os observamos.

— E fimmmmm — disse Pietra. — Eu tô com sede.

— Vamos lá, princesa, eu vou te dar água — ofereceu Raul.

— Eu vou — falei.

— Não, pode deixar — disse ele e aceitei.

Raul e Pietra saíram do quarto e eu me aproximei da cama do Davi,


me sentando no chão, deixando meu rosto na altura do dele.

— Como se sente? — perguntei.

— Estou um pouco suado — disse ele.

— Quer um banho de banheira no quarto do seu pai? — ofereci e


ele assentiu.

— Ok, vamos lá — falei, pegando-o no colo e levando para o


banheiro do quarto de Raul.
Coloquei a banheira para encher e tirei sua roupinha, mas o deixei
de cuequinha. Muito rápido, a banheira já tinha água o suficiente e o
coloquei dentro dela. Ele parecia abatido e meu coração se apertava.

— Está gostoso? — perguntei, jogando água morna em suas costas


pequenas e em seguida em seus cabelinhos loiros.

— Sim — respondeu com a voz fraca.

— Tá tudo bem aí? — Raul perguntou, abrindo a porta do banheiro.

— Sim, ele estava suado. Já vamos voltar para lá.

— Certo! Pietra e eu vamos preparar um chá com biscoitos então.

— Ótimo! — concordei e ele saiu, deixando Davi e eu a sós outra


vez.

— Sofie? — Davi me chamou.

— Sim, querido — respondi, jogando mais água em sua cabecinha.

— Sabe o que eu queria?

— O que, querido?

— Uma mamãe. Meu pai é bom, mas eu queria uma mamãe


também. Por que a minha mãe não me quis?

Aquilo cortou meu coração.

— Quem te disse isso?

— Um menino na escola, ele disse que se a minha mãe não morreu,


é porque ela não me quis e foi embora. Por que ela não me quis? Eu fui um
menino mau?
— Não, é claro que não. Você é um ótimo menino — garanti,
sentindo meus olhos marejarem e o peito muito apertado. — Qualquer
mulher teria sorte de ser sua mãe.

— Então... você vai ser a minha mãe?

Meu coração quebrou por completo quando seus olhinhos azuis tão
intensos e cheios de esperança miraram os meus. Eu não sabia o que dizer.

— Eu... — suspirei, não podia magoá-lo. — Eu vou ser o que você


quiser que eu seja e o que o seu pai permitir, tá legal? — ofereci e ele abriu
um grande sorriso, mesmo que parecesse muito cansado.

— Obrigado — disse e me agarrou.

Não me importei com seu cabelinho molhando toda a minha blusa,


só pensava que queria sim ser a mãe dele, porque o amava como um filho.

Davi saiu da banheira quase dormindo e o levei direto para a cama,


ele definitivamente não veria a cara do chá com bolachas. Vi seus olhinhos
fecharem quando o cobri com o edredom.

— Boa noite, mamãe — disse ela e beijei sua testa. — Eu te amo.

— Eu também te amo, meu anjinho.

No caminho para a cozinha, encontrei Pietra dormindo no sofá da


sala que estava aberto, atingindo o tamanho de uma cama de casal, já
coberta por uma manta e rodeada de diversos travesseiros.

— Pietra apagou — disse Raul quando cheguei à cozinha.

Ele estava de frente para a janela da cozinha, de costas para mim,


mas parecia ter percebido a minha presença quando entrei, mesmo que eu
estivesse em silêncio absoluto.
— Davi também — informei.

— Imaginei que sim. Chá? — ofereceu.

— Sim — aceitei e cheguei até ele, pegando uma xícara e me


servindo.

Ele suspirou.

— Eu ouvi — disse quando bebi do primeiro gole.

— O que?

— O que o Davi te disse.

— Ah, isso.

— Não quero que se sinta pressionada a nada.

— Não me sinto, mas tenho que dizer que não conheço a mãe dele,
mas a odeio como nunca odiei ninguém.

— Eu também — admitiu, me encarando. — Começamos a namorar


ontem e hoje meu filho te pede para ser mãe dele. Não está assustada?

— Me sinto a mulher de mais sorte no mundo por um garoto como


ele querer que eu seja sua mãe. Independente do nosso namoro, eu aprendi a
amar aquele garotinho, Raul.

— Eu acredito, porque o mesmo aconteceu comigo e Pietra. Aliás,


por falar nela, temos que conversar sobre um assunto. Quer me contar
alguma coisa?

Suspirei cansada.
— Seu filho me pediu para ser mãe dele, não posso te esconder
nada.

Só uma coisa, na verdade! Ou duas!

— A questão não é não poder esconder, é querer me dizer, saber que


pode contar comigo — disse e suspirei outra vez.

— Meu irmão foi preso. Eu queria te contar, mas fiquei com medo.

— Por que seu irmão foi preso? — perguntou.

— Drogas.

— E você estava envolvida? Ajudou ele com essas coisas?

— Não! O que acha que sou? É claro que não, inclusive só soube
que ele estava envolvido com isso quando ele foi preso e precisei ficar com
Pietra — expliquei, indignada pela pergunta dele.

— Então não havia porque ter medo de me contar — disse, tirando a


xícara da minha mão e segurando meu rosto entre suas mãos. — Foi seu
irmão quem errou, não você, meu doce. Não tem porque se envergonhar.

— Obrigada — falei e ele tocou seus lábios nos meus.

— Precisa de ajuda? Com isso do seu irmão, quero dizer?

Meu coração acelerou. Eu precisava de dinheiro, muito dinheiro e


não podia pedir isso a ele.

— Não, está tudo sob controle. Consegui marcar uma visita no


presídio na semana que vem, por mais que ele não queira que eu vá lá.

— Seu irmão tem razão, não é lugar para você, mas te entendo.
— Só quero ver se ele está bem, nada mais, não ficarei voltando lá.

— Ótimo! Mas eu vou te levar, tudo bem? — perguntou e eu


assenti. — Promete não me esconder mais nada?

Não!

— Sim — menti e seus lábios tocaram os meus outra vez.

— Posso fazer uma pergunta que me deixou curioso sobre outro


assunto?

— Claro — concedi.

— O que rolou lá dentro do consultório durante a transfusão? Você


ficou muito pálida, achei que fosse desmaiar.

— Ah, isso — falei, tentando tampar o rosto com as duas mãos.

— Qual é? Não se esconda! Me conte! — pediu, segurando meus


pulsos com gentileza, mas com força suficiente para tirá-las do meu rosto.

— Tá, tá, eu conto. Tenho um pavor terrível de agulhas. Eu já estava


preparada para não olhar enquanto furavam o Davi, mas quando me virei,
tinha uma agulha no balcão, e o meu pavor é tanto que mesmo só estando
ali jogada, passei mal.

— Nossa! — disse, tentando parecer sério, mas era visível que


estava se segurando para não rir da minha cara.

— Vai pode rir — falei e ele gargalhou.

— Desculpe — falou e fiz um biquinho de brincadeira, recebendo


um beijinho logo em seguida. — Ah, amanhã logo cedo preciso agradecer
ao Davi.
— Pelo que?

— Por te abraçar molhado.

— Como é? — perguntei, confusa por um momento, mas os olhos


de Raul desceram até o meu peito e entendi.

Minha blusa branca estava totalmente transparente porque estava


molhada, deixando bem à mostra minha lingerie.

— Abusado! — ralhei de brincadeira e ele riu mais.

Afundou seu rosto na grande mancha molhada, e suas mãos


seguraram meus seios.

— Eles são deliciosos!

— São seus — falei e seu olhar subiu até o meu, exibindo aquele
brilho safado que me fazia ansiar por ele.

— Com certeza são — disse, segurando minhas coxas e levantando-


me para o seu colo.

— Sim, mas já está muito tarde, preciso ir para casa.

— Não vá — pediu e eu ri.

— Como não?

— Não vá, simples assim. Fique aqui hoje. A sua casa é ali do lado
mesmo. O sofá é enorme e tão confortável quanto uma cama, Pietra ficará
bem ali. E, além do mais, eu já tranquei toda a casa.

— Ah... você já tinha programado tudo, não é?


— Tinha sim! Estou morrendo de saudades, não tivemos tempo
desde que eu te pedi para ser a minha namorada, precisamos oficializar isso
da forma correta.

— É mesmo? E como seria isso?

— Comigo enterrado bem fundo em você a noite toda — sussurrou


em meu ouvido e me desmanchei em seus braços.

— Eu acho justo.

— Ótimo.

Raul caminhou comigo em seu colo para o meu quarto enquanto eu


beijava seu pescoço.
Capítulo 28

Na sexta-feira passei no hospital para saber sobre os novos exames


de Davi, não havia contado a ninguém que já estavam prontos, porque não
queria preocupá-los. O médico já me aguardava como na vez anterior.

— As notícias não são tão boas como queríamos, senhor Aguilar —


disse o doutor e eu soltei o ar com força, aquilo era tudo o que eu não
queria ouvir.

— Em que pé estamos?

— A Aplasia se mostrou resistente à transfusão de sangue,


comprovando sua severidade.

— E como procedemos agora?

— A única chance dele é um transplante de medula. O senhor já


ouviu falar?

— Sim, eu sei como funciona — falei, cansado. Não queria ter que
judiar mais do meu filho.

— Ótimo! Já estamos fazendo uma busca em nossos bancos de


doadores, na esperança de que haja alguém compatível, mas seria bom se o
senhor conseguisse possíveis doadores que estivessem dispostos a doar.
Inicialmente eles teriam que vir ao hospital só para fazer o teste de
compatibilidade com ele.

— Vou providenciar isso, quanto tempo temos? — perguntei,


tentando manter a calma.
— Digamos que precisamos disso o mais rápido possível. Se
encontrássemos um doador hoje, Davi passaria por esse procedimento antes
do dia terminar — disse e eu assenti.

Saí do consultório desolado. Outra luta começaria para conseguir


um doador. Não que eu não estivesse disposto, estava e daria a minha se
fosse necessário, meu desolamento era devido ao Davi precisar passar por
aquilo.

Não fui para o escritório, fui direto para casa. Macarena estava lá
com Davi que ainda não tinha retornado às aulas. Um homem estranho
estava à porta de Sofie, ele parecia bater enfurecidamente, por isso me
aproximei.

— Oi — cumprimentei e o estranho se virou em minha direção.

— Dá o fora — falou e voltou a bater na porta. — Sofie, sua


desgraçada, abra a porta!

Olhei para a garagem e o carro dela não estava lá.

— Sofie não está — falei.

— Já falei pra dar o fora, otário! Sua puta desgraçada, abra! —


berrou.

Entrei em sua frente.

— Do que você chamou ela? Está louco?

— E quem é você, afinal?

— Sou o namorado dela, tem um problema com ela? Pode resolver


comigo!

Aquilo chamou a atenção dele.


— Namorado? Dessa vadia?

— Se falar dela assim outra vez — falei, agarrando-o pela gola da


camiseta —, não vai sobrar um dente nessa boca.

Ele riu. Eu já estava no meu limite com a doença de Davi, não seria
difícil descontar tudo em um monte de merda como aquele.

— É sério que você está defendendo uma puta que tira a roupa pra
ganhar a vida? — disse ele.

— Acho que você está enganado.

— Não, Sofie Wiebek, é streeper.

— Está errado. Ela é escritora e garçonete alguns dias da semana —


falei e ele riu.

— É escritora, seja lá o que isso quer dizer, e puta em alguns dias de


semana — zombou. — Porra, você é namorado dela e nem sabe que ela é
uma prostituta de merda naquela boate famosa do centro? Você é mais
idiota do que pensei.

Sem pensar duas vezes, soquei seu rosto e ele caiu no chão, ainda
rindo.

— Isso não vai ficar assim, você não sabe com quem mexeu! Mas
antes de acabar com você, vou deixar você se resolver com ela, dá uma
passada na kiss hoje à noite, isso vai ser divertido — disse, saindo do
quintal.

Eu tentava me acalmar, aquilo não era verdade. Sofie não era


daquele jeito, nunca faria uma coisa daquelas. Não podia ser verdade. Eu
tinha certeza de que não era.
Era final de tarde quando Sofie chegou em minha casa para ver Davi
antes de ir para o trabalho. Minha cabeça girava, mas eu não podia
perguntar aquilo a ela. Sofie ficaria ofendida, mas as palavras daquele
cretino não saíam da minha mente.

— Então, novidades sobre o Davi? — perguntou.

— Sim, vamos precisar de um transplante de medula — contei.

— Nossa! E já temos um doador?

— Já tem um pessoal fazendo teste de compatibilidade, parece que


não é tão fácil assim conseguir um doador compatível.

— Nós vamos conseguir!

— É claro que vamos — concordei, gostava da positividade dela. —


Ele já sabe?

— Ainda não. Não quero deixá-lo ansioso, sabe?

— Está certo — disse, cortando uma fatia de pão. — Ai! Droga!

— O que foi? — perguntei, me levantando da cadeira e indo até ela.

— Não foi nada, só cortei o dedo.

— Me deixe ver — pedi.

— Não, tudo bem, não foi nada — disse, lavando o dedo na pia.
Peguei sua mão, o corte realmente não era fundo, mas peguei a
caixa de primeiros socorros, desinfetei o corte para não correr o risco de
infeccionar e coloquei um curativo pequeno.

— Pensando bem, está doendo bastante, acho que preciso de um


beijinho — disse ela, fazendo um bico fofo e a beijei, rindo.

— Melhorou?

— É, eu acho que sim.

— Posso te buscar no trabalho hoje? — perguntei por impulso.

— Estou indo de carro, Raul. Não faz sentido. Mas se me esperar


acordado, eu vou adorar.

— Vou esperar, mas fico preocupado com você andando sozinha por
aí à noite.

— Não se preocupe — disse sorrindo.

— Você não me contou em qual estabelecimento trabalha, isso não é


justo — falei e vi seu sorriso vacilar, seus olhos desviaram por um
momento, batendo no relógio à nossa esquerda.

— Merda! Estou atrasada! — articulou, se livrando do meu toque,


pegando sua bolsa sobre a mesa. — Como fui perder a hora assim? Me
espere acordado, amor. Até mais tarde!

Sofie tocou seus lábios nos meus rapidamente e seguiu para a porta,
correndo pelo gramado e aquilo me fez ter os piores pensamentos possíveis.

Mais tarde, Pietra e Davi jogavam videogame enquanto a babá se


divertia com eles. Já havíamos jantado.

— Louise? — chamei.
— Sim?

— Venha aqui por favor.

Eu estava na cozinha.

— Precisa de algo, senhor Raul? — perguntou solícita e sorridente


como sempre.

— Preciso buscar algo no centro. Poderia olhar as crianças por cerca


de uma hora? Eu dobro o valor da sua noite.

— Imagina, claro que fico e não precisa me pagar a mais.

— Eu faço questão. E não demoro.

— Vá tranquilo, as crianças estão bem e logo estarão dormindo. Não


sairei daqui.

— Obrigado — agradeci e peguei as chaves do carro e a carteira.

Dirigi pela cidade, enrolei uns bons minutos antes de estacionar o


carro bem atrás do carro dela. Enrolei mais algum tempo na porta do
estabelecimento, parecia querer adiar aquele momento que eu nem sabia se
era real. A imagem dos olhos da dançarina loira me veio à mente. Não, não
podia ser ela. Aquela mulher não tinha a tatuagem, não era possível.

Tomei coragem e entrei na boate. Caminhei por ali e abordei um


barman.

— Boa noite!

— Boa noite, senhor!


— Uma das dançarinas. Loira, olhos castanhos, corpo escultural —
falei e ele sorriu.

— Temos várias dessas aqui — respondeu. — Elas circulam pelos


palcos da área VIP, nas mesas, sabe?

— Ótimo, então eu quero uma mesa dessas.

Ele fez sinal para uma mulher que estava mais adiante.

— Em que posso ajudar? — perguntou a mulher.

— Este senhor quer uma mesa na área VIP — informou o barman.

— É claro — concordou toda sorridente. — Mesa para quantas


pessoas?

— Só para mim.

— Certo, me acompanhe, por favor — pediu e assim eu fiz.

Sentei-me à mesa e uma dançarina logo surgiu, eu a olhei e não, não


era Sofie. Dei-lhe algumas notas e aguardei ansioso a próxima, que também
não era ela. E depois veio outra e outra. Eu já estava para desistir daquela
loucura, me culpando e repreendendo mentalmente por ter pensado aquilo
de Sofie que àquela hora já devia estar cansada de tanto servir mesas,
quando uma nova dançarina entrou.

Era a loira da outra noite, ela vacilou por um momento como da


outra vez, começou a dançar, mas não me encarava. Seu rosto estava
encoberto pela máscara como da outra vez, seu corpo era idêntico ao de
Sofie, mas não podia ser ela, é claro que o cabelo loiro poderia muito bem
ser uma peruca, mas não tinha a tatuagem, não podia ser ela.

Seu olhar encontrou o meu por um segundo e aquela sensação de


estar em casa me atingiu, foi então que lembrei de um detalhe. Meus olhos
desceram para a sua mão esquerda que estava na barra de ferro, então eu vi
o curativo que eu havia colocado em seu dedo horas atrás.
Capítulo 29

Eu sabia que tinha perdido tudo quando o olhar de Raul alcançou


minha mão, o maldito curativo. Ele se levantou, pegou a carteira, tirou
diversas cédulas de dinheiro e as jogou sobre o pequeno palco particular
onde eu dançava.

— Foi um belo show! — disse ele, eu não podia ouvi-lo, mas foi o
que seus lábios disseram.

Ele sabia!

Sabia que era eu.

Merda!

Saí do palco assim que ele me deu as costas e corri para o camarim.
Tirei aquela tralha toda, vesti minhas roupas e corri para fora, na direção do
meu carro. E lá estava ele, encostado em seu carro que estava estacionado
logo atrás do meu.

— Você chegou rápido, acho que não fez todas as danças da noite —
falou.

— Raul, eu posso explicar — tentei.

— Explicar o que, porra? Que você é uma vadia de merda? —


gritou, perdendo o controle e me encolhi.

Ele respirou fundo, se controlando outra vez.

— Não é assim, tenho um...


— Tem um motivo? O que poderia acontecer para você decidir tirar
a roupa por dinheiro? Porra, eu te pedi... pedi pra não me esconder nada.
Qualquer que fosse o seu problema, você podia contar comigo. Era dinheiro
que queria? Arrumar a sua vida? Por que não me pediu? Eu poderia te pagar
pra ser a minha puta de luxo — disse e eu senti o golpe de suas palavras na
barriga.

— Bem, qualquer que seja o motivo, agora não importa mais —


falei.

— Não, não importa. Nunca mais eu quero ter que olhar pra sua
cara. Aliás, só a nível de curiosidade, com quantos caras você trepava por
dia antes de chegar em casa e trepar comigo?

Naquele momento não me contive, quando percebi minha mão já


tinha acertado seu rosto e eu não me arrependia.

— Nunca mais repita qualquer coisa parecida, idiota! — falei e


segui até meu carro. Desativei o alarme. — Você tinha toda razão quando
disse que me amaria até a última rosa morrer, ao sair de casa vi que só tinha
uma viva, amanhã já deve morrer também.

Raul desviou os olhos por um momento e engoliu em seco.

— Realmente, infelizmente, até a última rosa morrer — disse e


entrou em seu próprio carro, dando partida e acelerando.

Entrei em meu carro e chorei, me deixei desmoronar, eu havia


perdido meu porto seguro.
Quando cheguei em casa, Louise entrava com Pietra dormindo em
seus braços, a paguei e dispensei por aquela noite. Olhei para a casa de
Raul, as luzes ainda estavam acesas e senti raiva. Eu havia errado, estava
dançando e às vezes tirando a roupa por dinheiro, mas era para evitar que
aquele louco matasse meu irmão. E nunca, em hipótese alguma eu havia
me deitado com qualquer um daqueles homens, não me prostituía, embora
tivesse oportunidade de fazer isso para conseguir o dinheiro mais rápido.

Meus olhos se voltaram para o jarro com as flores, uma delas estava
lá vermelha e viva, exatamente como quando eu havia saído. As tirei do
vaso, pingando água mesmo e saí pela porta da cozinha, abri a lata de lixo
para jogá-las fora, mas não consegui. O choro voltou a me alcançar e não
consegui contê-lo. Voltei para dentro de casa, abri um dos gavetões da
cozinha que estava vazio e coloquei as rosas lá, indo para a cama logo em
seguida.

A segunda-feira chegou rápido. No sábado eu havia visto Raul e


Davi saírem logo pela manhã e desde então não retornaram. Enviei uma
mensagem para Macarena, mas ela não parecia propensa a conversar
comigo, porém, não me negou informações sobre o estado de saúde de
Davi, que ainda estava à procura de um doador compatível.

Depois de deixar Pietra na escola, segui para a penitenciária, seria a


primeira visita ao Jordan.

— Eu disse pra você não vir — ralhou ele de primeira.

— Jordan, meu Deus! O que diabos aconteceu com você? —


perguntei me aproximando, dando a volta na mesa em que estávamos.
O rosto do meu irmão estava todo machucado e um dos seus braços
engessado.

— Não tem que se preocupar com isso.

— Como não? A sua cara está arrebentada — falei, segurando seu


rosto e analisando os ferimentos.

— Não é nada, só me abraça! — pediu e eu suspirei, fazendo o que


ele havia me pedido.

— Eu te amo — falei.

— Eu também. Me escuta, não quero você aqui, não é lugar pra


você.

— Eu precisava te ver.

— Não pode, Sofie. Por favor, obedeça e não volte.

— Tá ok.

— O Malvo te deixou em paz?

— Foi ele que fez isso?

— Caso você não saiba, ele não está preso.

— Mas tem gente aí dentro, não é. Foi ele que fez isso ou não? —
perguntei e ele desviou o olhar.

— Não! — Estava mentindo, eu o conhecia e sabia disso.

— Tá. Você deve mesmo todo aquele dinheiro pra ele? — perguntei
e ele suspirou.
— No desespero de não ser pego com as drogas para não ser preso,
joguei toda a coca dele no vaso sanitário.

— Que merda, Jordan!

— É, eu sei.

Meu irmão parecia muito cansado e eu podia imaginar a situação


dele ali.

— Foi ele, né? — insisti na pergunta, apontando para o seu braço.

— Eu vou pagá-lo, não precisa se preocupar.

Só eu sabia o quanto tinha que me preocupar.

— Tudo bem — menti.

— Eu te amo, Sofie, mas você precisa ir embora. Eu sei que falhei


com você, com a Pietra e com a memória dos nossos pais e da vovó, mas te
ver aqui nesse lugar imundo, faz eu me sentir ainda mais miserável, você
não tinha nunca que colocar os pés num lugar como esse — disse, com os
olhos cheios de lágrimas e eu assenti.

— Eu te amo demais, Jordan. Vou fazer a sua vontade, mas não


hesite em me ligar se precisar de algo ou acontecer alguma coisa, por favor.
Não me deixe no escuro enquanto espero você lá fora.

— Tudo bem, cuida da Pietra pra mim e sempre lembre ela do


quanto eu a amo — disse me abraçando.

Nos despedimos e fui embora. Saí de lá sabendo exatamente o que


tinha que fazer. Entrei no carro, mas antes que eu desse partida, meu celular
tocou, mostrando na tela um número que eu ansiava muito para que me
ligasse.
Bati na porta do escritório e aguardei a liberação para entrar. O rosto
dele se iluminou ao me ver.

— Você! Minha estrela, a que devo a honra de ser brindado com a


sua presença em plena segunda-feira? É o que estou pensando? —
perguntou, animado.

— Sim, Andreas. Eu aceito o leilão.

— Maravilhoso, essa é uma ótima decisão! — disse ele, se


levantando e vindo até mim para me abraçar. — Eu sabia que mudaria de
ideia.

— Mas tenho as minhas condições.

— Pode dizer — concedeu.

— O leilão vai durar uma semana só e a noite acontecerá na semana


seguinte.

— Tudo bem.

— Mas preciso da minha parte do dinheiro assim que o leilão


terminar.

— As coisas não funcionam assim, querida.

— Se não for assim, não aceito — insisti e ele me analisou.

— Está com problemas financeiros, querida?


— Só estou aqui por causa deles — admiti e ele assentiu.

— Aceito, mas terá que assinar um contrato.

— Assino qualquer merda que você queira.

— Ótimo! Vou agilizar tudo.


Capítulo 30

Eu havia seguido para a minha casa antiga, lembranças da Magda


eram menos dolorosas que as de Sofie. Meu coração estava em pedaços,
mas eu tinha que me manter forte pelo meu filho. Estava coando um café
enquanto os olhos de Sofie não saíam da minha mente.

— Papai, olha — chamou Davi e me virei em sua direção.

Meu coração acelerou com a cena, o pijama azul claro de Davi


estava manchado com o sangue que escorria de seu nariz. Vi seus olhinhos
amolecerem e por sorte consegui chegar até ele antes que ele caísse no
chão.

Com seu corpinho inerte em meus braços, corri para o meu carro, e
dei graças por estar ali já que a casa ficava a menos de dez minutos do
Hospital Central. Deitei o banco da frente e coloquei Davi ali, o prendendo
com o cinto de segurança, corri para o banco do motorista, dando partida e
arrancando com o carro. Quando eu estava estacionando o carro, meu
celular tocou no painel, informando uma chamada do próprio hospital.

— Oi.. Alô... Alô... — atendi enquanto pegava Davi nos braços


outra vez.

— Boa tarde, senhor Aguilar. Tudo bem?

— Não, meu filho está sangrando pelo nariz e desmaiou.

— Vou enviar uma unidade de atendimento até o senhor agora


mesmo.

— Não precisa, estou no estacionamento do hospital.


— Certo, o senhor está perto de qual entrada?

— Entrei no estacionamento pela ala leste.

— Certo, pode entrar pela porta mais próxima, estou enviando uma
equipe de encontro com o senhor.

— Obrigado — agradeci, correndo pelo estacionamento.

Passei correndo pela recepção que não pareceu surpresa e nem me


barrou, provavelmente já haviam sido avisados. Quando virei o corredor,
médicos e enfermeiros já corriam de encontro comigo.

Tiraram Davi dos meus braços e o levaram. Eu corri atrás, como ele
era criança e não estava entrando em um centro cirúrgico, eu podia
permanecer com ele. O médico que estava cuidando do caso do Davi já nos
aguardava e em poucos minutos meu filho estava acordado, sentado na
cama e sem sangramento. Aparentemente aqueles eram alguns dos sintomas
que podiam aparecer pela condição da Aplasia Medular.

— Senhor Aguilar, no momento em que chegou, minha assistente


tentava contatá-lo para dar-lhe boas notícias — disse o médico.

— Vocês encontraram? — perguntei, esperançoso.

— Sim, temos o doador. Ligamos para que o senhor viesse


imediatamente. Estou indo nesse momento colher a medula.

Sem conseguir me conter, eu o abracei.

— Obrigado, doutor.

— Não há o que agradecer, vamos salvar aquele garotinho ali.

— Sim — concordei, sorrindo.


Eu estava parecendo bipolar, há minutos estava desesperado e
naquele momento não conseguia parar de sorrir e me sentir grato.

Tudo foi preparado, Davi recebeu um tratamento que ataca as


células doentes, destruindo a própria medula, para só então receber a nova
medula.

O transplante havia sido mais tranquilo do que imaginei, foi muito


parecido com a transfusão de sangue e Davi já estava no quarto, se
recuperando.

— Não quer descansar um pouco? Eu fico com ele — ofereceu


Macarena.

— Não, estou bem.

— Vá ao menos tomar um café. Você está péssimo! — disse e


arqueei uma sobrancelha em sua direção.

— Acho melhor não. Você saiu agora pouco para tomar um café e
voltou azeda desse jeito. Deus me livre de tomar dessa bomba também —
falei e ela continuou me encarando. — Que merda aconteceu lá fora?

— Não aconteceu nada, sai daqui e me deixe cuidar do meu


afilhado.

— Tem falado com a Sofie? — perguntou.

— Você sabe bem como espantar um homem. Tô indo.

Me levantei e saí do quarto, seguindo até o refeitório do hospital.


Pedi um expresso e me sentei em uma das mesas. Como o refeitório era em
um dos andares superiores, fiquei observando pelo vidro a avenida
movimentada lá embaixo. Uma risadinha me chamou a atenção, mas foi tão
rápida que pensei que tinha imaginado e não de fato ouvido.
Beberiquei o café que estava horrível por sinal e eu podia entender o
mau humor de Macarena, então ouvi outra vez o riso que eu sabia muito
bem de quem era. Procurei por ela e a encontrei, junto com ela estava Aída.
Alguma coisa havia acontecido e eu não consegui não me preocupar.

Me levantei e caminhei até ela.

— Oi — cumprimentei.

Aída pareceu surpresa em me ver e não parecia ter sido uma


surpresa boa.

— Tio Raul! — Pietra quase gritou, se levantou e agarrou as minhas


pernas.

— Oi, princesa — falei, me abaixando e abraçando-a.

— Eu tava com saudade. Onde tá o Davi?

— Eu também estava com saudades — falei e vi Aída revirar os


olhos. — O Davi está dormindo agora.

— Uma hora dessas? Que preguiçoso! Tá parecendo a tia Sofie —


disse a garotinha e quando meus olhos voltaram para Aída, ela desviou os
dela.

— Sua tia está aqui?

— Aqui? Não! Aqui só tem mesas, como ela ia dormir? Ela tá no


quarto branco.

— Quarto branco?

— É que enfiaram uma agulha muito muito muito grande nas costas
dela — disse arregalando os olhos de forma exagerada e abrindo os braços
o máximo que podia.
— Pietra, meu amor, vai escolher outro doce — disse Aída enquanto
eu tentava processar a informação.

— Eu posso comer outro?

— Se for calar a sua linda boquinha pode, meu amor. Escolhe ali
que a tia já vai lá te ajudar.

A garotinha não pensou duas vezes, saiu correndo em direção a


vitrine de bolos e tortas.

— O que a Pietra quis dizer? — consegui perguntar.

— Acho que você já sabe essa resposta — disse Aída, se


levantando.

— Mas ela tem fobia de agulhas.

— Passou o inferno, mas fez o que tinha que fazer pra salvar o seu
filho — jogou na minha cara.

Levei as mãos ao rosto e alisei a barba.

— Você é um puta de um cretino e ainda assim ela pensa no seu


filho. Você não a merece.

— Você não sabe de nada. Não sabe o que ela estava fazendo.

— O que ela estava fazendo?

— Tirando a roupa, se prostituindo.

— Você nem a ouviu.

— Nem precisava.
— Não que seja da sua conta, mas Sofie nunca saiu com cliente
algum.

— Quer mesmo que eu acredite nisso?

— Bem, tem uma fila de clientes oferecendo mais de cinquenta mil


dólares para ter uma noite com ela, sabe por quê? Porque ela nunca saiu
com ninguém de lá, diferente de mim, e de qualquer outra garota daquele
lugar. Sofie nem queria estar lá, um traficante perigoso estava ameaçando a
vida dela, a de Pietra e a do irmão dela que está na cadeia caso ela não
pagasse uma tal dívida que diz que o Jordan tem com ele. Ah, sim, você o
conhece, é o cara que esteve na casa dela e te contou onde ela estava
trabalhando. Sofie odeia aquele trabalho, mas estava tentando salvar a vida
da sobrinha e do irmão, ia lá dançava, tirava a roupa às vezes, mas nunca
deixou que ninguém a tocasse. Ela está desesperada para pagar a dívida, a
cada semana o irmão dela leva uma nova surra, mas ainda assim ela
guardou esses problemas no bolso e veio salvar a vida do seu filho. Então
não acreditar nisso é um favor que você faz a ela, que já tem problemas
demais, não precisa de um cretino de merda como você para deixar ela
ainda pior.

Aída havia jogado tudo na minha cara, de uma vez, sem me dar a
chance de responder, então saiu atrás de Pietra, me deixando ali, inerte.

Depois de Davi acordar de seu sono e comer, mostrando que estava


bem, o deixei com Macarena outra vez e fiz o que tinha que fazer, fui atrás
dela.

Bati na porta e a abri. Os olhos curiosos de Sofie correram até mim


e ela se assustou ao me ver. Ela estava sozinha.

— Raul?

— Oi.
— O que quer?

— Em primeiro lugar, agradecer por salvar a vida do Davi — falei,


me aproximando.

— Não tem que agradecer.

— É claro que eu tenho. Devo tudo a você — falei e ela desviou o


olhar. — Como se sente?

— Você não tem que fazer isso — me cortou e suspirei.

— Eu sei de tudo.

— Tudo o que?

— Tudo. Absolutamente tudo. Aída me contou.

— E daí?

— Quero pedir perdão, não fui justo com você.

— Está pedindo perdão porque está com dor na consciência?

— Porque eu te amo — admiti.

— Está um pouco tarde para isso, não acha?

— Sofie, eu errei, eu sei ,me perdoe. Eu não imaginava.

— Não, você não imaginava, não fazia ideia. Sabe por quê? Porque
é teimoso feito uma mula, é preconceituoso e julga todo mundo como se
fosse Deus.

— Me desculpe...
— Vai embora.

— Como é?

— Vai embora agora. É tarde demais pra você.

— Não faça isso, Sofie, vamos conversar.

— Saia — disse, se deitando no leito outra vez e me dando as


costas.

Então eu fiz a sua vontade naquele momento e fui embora porque


ela tinha toda razão.
Capítulo 31

Dias depois, quando eu já estava recuperada, voltei à boate. Andreas


já havia pago o meu adiantamento e eu havia repassado tudo ao asqueroso
do Malvo, mas faltava a parte que exigia tudo de mim, onde eu perderia a
minha alma. O tal cliente havia pago uma quantidade absurda de dinheiro
por aquela noite o que havia deixado Andreas extremamente satisfeito.

Estacionei meu carro em frente a enorme casa de luxo e respirei


fundo. Aquele seria o maior sacrifício que eu faria e estava na hora de
enfrentá-lo. Toquei a campainha e aguardei.

Meus olhos quase saltaram quando o dono da casa abriu a porta.

— Tá de brincadeira? — perguntei, mirando Raul nos olhos.

— Boa noite, Sofie — cumprimentou-me, abrindo espaço para que


eu entrasse.

— Qual é a sua? Pagou mesmo todo aquele dinheiro? Bem, enfim


me tornei o que você tanto disse que eu era.

— Não. Quer dizer, sim, eu paguei. Mas não é nada do que você
está pensando. Não estou te julgando, nem nada assim.

— Deixe pra lá, vamos acabar logo com isso — falei, tirando meu
casaco, revelando o conjunto de lingerie, a única coisa que eu usava por
baixo.

Vi Raul ofegar.

— Pode se vestir? — pediu.


— Por favor, não vamos prolongar isso. Pegue de uma vez o que
comprou para que eu possa ir embora logo depois.

Raul fechou os olhos com força e logo em seguida deu os passos


que nos separaram, segurou em minha cintura, empurrando-me, prensando-
me contra a parede.

— É isso que você quer? Que eu te coma e depois tu vá embora e


nunca mais olhe na sua cara? — perguntou.

— Não foi o que você comprou? Só estou te entregando.

— Não foi isso que eu comprei. Apenas paguei para que outro cara
não tivesse isso, Sabe por quê?

— Por quê?

— Porque eu sou o único filho da puta que pode te tocar, Sofie.

— Até parece — zombei, mas minha voz saiu fraca e com muito
menos sarcasmo do que eu gostaria.

— Quantos homens te tocaram depois que me enterrei pela primeira


vez em você? Não, nem precisa responder essa. Quantos homens
conseguiram te deixar excitada como agora sem sequer te tocar como
acontece com a gente, Sofie? E não ouse negar, posso sentir o cheiro da sua
excitação daqui.

Filho da puta!

— Sabe por que isso acontece, Sofie? — perguntou e neguei com a


cabeça, incapaz de respondê-lo. — Porque somos um do outro, eu jamais
poderia deixar que outro te tocasse porque você é minha e eu sou
fodidamente seu. Eu te amo.
— Desculpe, mas acho que você deixou bem claro que seu amor
duraria enquanto aquelas rosas vivessem — falei e ele sorriu.

— E elas morreram todas? — perguntou.

— É claro que sim!

— Onde elas estão?

— No lixo!

— Duvido!

— Vamos fazer assim. Se me mostrar as rosas e elas estiverem


mesmo todas mortas, eu te deixo em paz, caso contrário, esqueceremos tudo
isso e você terá que me dar uma segunda chance — disse e eu ri.

— Raul, já fazem semanas. Você sabe que não tem a mínima


possibilidade de uma rosa sobreviver a tanto tempo assim — falei e ele
sorriu.

— Veremos. Vamos ver as rosas.

— Você só pode estar ficando louco — falei e ele me soltou,


pegando meu casaco do chão e me entregando.

— Não que eu não tenha amado a lingerie, mas preciso que se vista,
meu doce. Tenho uma aposta para ganhar e recuperar a minha mulher.

— Você deve ser mesmo muito louco.

— Veremos.

Vesti meu casaco, estava com muita raiva. Entrei em meu carro e
Raul também.
— Vai voltar pra casa a pé e sozinho quando ver as rosas todas
mortas — falei e ele só sorriu.

Dirigi até a minha casa, abri a porta e entrei, tudo com ele ao meu
encalço. Parei em frente ao armário, com a mão no puxador da gaveta que
eu não abria desde o dia em que tinha jogado as rosas ali. Ambos
olhávamos para a gaveta fechada, em expectativa.

— Preparado pra perder e eu chutar a sua bunda pra fora daqui? —


perguntei e ele riu.

— Manda ver, meu doce.

— Não me chame assim.

— Meu doce — repetiu só para me irritar.

Abri a gaveta de uma vez. Os talos estavam lá, as pétalas, a maioria


soltas de suas hastes, secas e escurecidas e em meio a elas, uma única rosa,
vermelha e intacta. Me virei, rápido, não acreditando.

— Como? — perguntei em choque e maravilhada ao mesmo tempo.


Raul deu de ombros.

— Eu disse. Achou mesmo que eu apostaria em algo que poderia


perder?

— Mas...

Raul, me segurou pela cintura, levando meu corpo mais para perto
do seu.

— Quando te dei aquelas flores, eu não tinha ideia de que ia


acontecer tudo isso, mas no fundo eu sabia que independente do que
acontecesse, mesmo que se não ficássemos juntos, eu continuaria te
amando. Eu nunca havia amado ninguém assim, Sofie. Isso — disse,
fazendo um sinal entre nós — é algo que nem todo mundo conquista na
vida e é algo tão forte, tão surreal que mesmo quando a gente é idiota como
eu fui, não podemos fugir.

— Mas...

— Não lute contra isso. Já chega de tantos desentendimentos e


sofrimentos. Davi e eu sentimos a sua falta, e de Pietra. Da nossa família,
sabe?

— Nossa família? — perguntei e ele assentiu.

Sim, era aquilo que éramos antes de tudo acontecer, uma verdadeira
família.

— Por favor, Sofie, me perdoe por ser um idiota. Sei que não
mereço o seu perdão, mas preciso dele. Nossa família precisa! — disse,
acariciando meu rosto, sua boca muito próxima à minha.

Então eu o beijei, dando a minha resposta.

— Mas como ela sobreviveu?

— Sobreviveu pelo amor, sabia que eu não podia deixar de te amar,


por isso ela se manteve forte e sobreviveu mais que as outras e vai
continuar intacta até que eu morra.

— Como pode isso ser verdade?

— Bem, é verdade em partes.

— Como assim.

— Que ela vai continuar intacta? Verdade! Que sobreviveu porque


eu te amo? Bem, pegue-a — pediu, sorrindo.
Estiquei a mão e sem sair de seu abraço, peguei a rosa, só então
prestando atenção nela. Entendendo tudo.

— Isso é trapaça! — acusei, rindo.

— Não é!

— É uma rosa de plástico, nunca ia morrer. Você mentiu.

— Não, eu não menti. Em nenhum momento eu disse que eram


todas rosas iguais, eu disse que te amaria até que a última rosa morresse.

— Mas ela nunca ia morrer.

— E nem o meu amor acabar. Volte pra nossa família.

— Eu volto, mas não por sua causa. Só vou pelo meu menino.

— É claro, só pelo Davi — disse e voltou a me beijar, nós dois


sabíamos que aquela não era a verdade.
Epílogo
Dois anos depois

Cheguei em casa com as rosas, tirei as antigas que já estavam


murchas no vaso e coloquei as novas, deixando a nossa rosa especial entre
elas como sempre.

— Como foi seu dia, querida? — perguntei.

— Na verdade, recebi uma proposta de publicação de uma editora


— disse ela.

— Jura? Meu doce, isso é fantástico! Meu parabéns, precisamos


comemorar!

— Sim, vamos ao pub da Macarena.

— Perfeito! Venha, me dê um beijo, estou orgulhoso de você.

— Obrigada — disse ela e se levantou, me abraçando em seguida e


me beijando.

— Uau, o que foi isso? — perguntei, surpreso.

— Foi a Anika, ela se mexeu. Você sentiu também?

— Sim, eu... — não consegui terminar de responder, pois minha


filha que ainda estava no ventre da minha esposa estava se mexendo e eu a
sentia pela primeira vez. — Davi? Pietra? Corram, Anika está se mexendo.

As crianças deixaram o videogame de lado e correram até nós,


animados, colocando as mãos na barriga de sua mãe. Davi chamava Sofie
de mãe, Pietra mantinha o tia, mas Sofie fazia o papel de sua mãe muito
mais do que Clara e ela considerava Anika, o bebê na barriga de Sofie sua
irmãzinha.

Olhei para a minha família e nem conseguia acreditar o quão


sortudo eu era por tê-la. O quanto eu era abençoado. Sofie ergueu os olhos
em minha direção enquanto as crianças estavam agitadas tentando sentir a
bebê. Aqueles mesmo olhos que me encararam em uma disputa feroz por
uma casa entre a miss quinta série e o tiozão da casa ao lado.

Me dei conta de que eu era a única pessoa que se sentia grata por ter
levado um golpe de mais de quinhentos mil dólares ao comprar uma casa de
alguém que não era o proprietário, afinal, foi aquilo que me trouxe a
verdadeira felicidade.
Me conte o que você achou dessa história! Ficarei honrada se você puder
avaliar o livro, assim você ajuda outros leitores e a mim também.
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(Clique aqui) estão abertos para conversas e surtos.
Beijinhos
Fran Nanii
[1]
É um game show alemão criado por Frank Elstner e transmitido pela primeira vez em 14 de
fevereiro de 1981.
[2]
Cena do livro Os Gêmeos Rejeitados do CEO.

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