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1ª Edição

2023

Copyright © 2023 Scarlett Castello

Revisão: Paula Domingues

Diagramação Digital: Paula Domingues

Capa: Paola Santiago

Esta é uma obra ficcional.

Qualquer semelhança entre nomes, locais ou fatos da vida real é mera


coincidência.

Todos os direitos são reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser
utilizada ou reproduzida em quaisquer meios existentes sem a autorização
por escrito da autora.

A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei nº


9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
“Vou proteger seu coração como você aceita o meu cheio de cicatrizes.”

Levi Vittileno viu o seu mundo ruir ao perder sua esposa em um acidente
trágico. Agora, 2 anos depois, ele precisa voltar a viver e conquistar o amor do
seu filho Lorran, que não o enxerga como pai.

Ele só não imaginava que um furacão em forma de mulher iria surgir para
fazer seu coração cheio de cicatrizes voltar a bater.

Olivia Baptista, sempre sonhou em ser mãe, mas após tantas decepções ela
decide que terá seu filho sozinha e não mede esforços para que isso aconteça, já
que não acredita que exista um amor para si.

Lorran Vittileno em seus 2 anos de vida nunca viu em Levi um pai, cresceu
aos cuidados do tio e agora depois de uma mudança de pais, se encanta por
Olivia, fazendo assim com que ela seja contratada para ser sua babá.

“Você me fez voltar a querer viver novamente.”

Ela o faz lembrar de como é viver.

Ele a faz desejar uma família mais do que tudo.


Quando Olivia finalmente entrega o coração a Levi e acaba sendo rejeitada
por ele não conseguir esquecer a ex-esposa morta, ela descobre que está grávida,
com o coração aos pedaços, um filho no ventre e o amor que sente pelo Lorran,
ela toma a decisão de ir embora com o menino.

Pode um coração tão machucado pelo luto, voltar a amar?


Este livro aborda assuntos que contém gatilhos, bem como... Alcoolismo,
Abandono Parental, Suicídio, Luto, e Depressão
SINOPSE

AVISO
SUMÁRIO
EPÍGRAFE
PROLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
EPILOGO
OBRAS DA AUTORA
UMA FILHA PARA O BILIONÁRIO ITALIANO (IRMÃOS VITTILENO)
LIAM : A OBSESSÃO DO BAD BOY (BULLDOGS YALE)
SIGAM A AUTORA
Vai ser difícil de superar, e você jamais esquecerá, mas acredite que, com
o tempo, tudo ficará melhor. Pois o tempo trará serenidade e aceitação, e então,
só restará a saudade, mas, para combatê-la, você terá as lembranças que
guardará para sempre.

Desconhecido
Levi

3 ANOS ANTES.
— Estamos atrasados amor — Blanca chama da sala.

— Só um minuto.

Finalizo o nó da gravata, e abotoo o botão do paletó. Vou ao encontro da


minha esposa na sala e sorrio ao vê-la sentada no sofá, alisando sua barriga de 9
meses e 4 dias. Nosso filho nascerá a qualquer instante.

Estamos felizes, eufóricos, e loucos para conhecer nosso meninão.

— Venha para a mamãe Lorran — a voz doce com um toque de veludo


acelera o meu coração apaixonado.

Quando conheci Blanca eu sabia que ela seria a mulher da minha vida. Não
demorou três meses para que eu a pedisse em casamento. A escolha mais certa
que fiz, foram anos de felicidades e realizações.

Com o nosso pequeno a caminho, eu não poderia desejar mais nada, além
de a ter comigo para sempre.
Quando a imagino ninando nosso menino, correndo atrás dele pela casa,
brigando comigo por colocar a frauda errada, ou achando fofo quando eu o
colocar para dormir. Os primeiros passos, o choro pelo dentinho crescendo.
Pensar em todos esses momentos que teremos juntos, me enche de felicidade.

Não estou mais sozinho no mundo, eu a encontrei e agora traremos a nossa


mistura, o fruto do nosso amor ao mundo.

— Vamos? — beijo seu ombro inspirando o cheiro doce da pele.

— Finalmente — se levanta com dificuldade. Tento a ajudar, mas com um


gesto de mão ela me dispensa. — Eu ainda posso fazer isso sozinha — suspira
cansada.

— E eu te segurar — beijo sua bochecha — mulher maravilha.

— Donzelo que leva um século se arrumando — bate no meu ombro,


rindo.

— Você nunca reclama quando eu tiro a roupa, por que faz quando a visto?
— Belisco a ponta do seu nariz e ela gargalha, enquanto me bate no ombro.

— Pelado você é mais bonito — rosna.

— Posso tirar tudo — seguro a borda do paletó e faço menção de o


remover, Blanca me desafia a tirá-lo, com o olhar — pensando bem... estamos
atrasados — seguro em sua cintura fazendo-a caminhar — vamos logo sua
tarada, na volta eu tiro tudo para você.

— Só vou poder olhar, enquanto Lorran não nascer, nós não teremos mais
diversão de adultos. — Gargalho da sua escolha de palavras

— Você fica uma graça tomando cuidado com o palavreado.


— Lorran não vai crescer sabendo um palavrão, temos de começar a nos
policiar com ele ainda na barriga — aponta um dedo para mim, e sorrio para ela.

— Vamos, mamãe coruja.

Deixamos o apartamento em que moramos na Itália entre risos e


brincadeiras. A caminho para o baile beneficente organizado pela empresa da
minha família, a VITTILENO, em prol das crianças que sofreram com o
desabamento devido ao terremoto nas Filipinas.

Fiz a doação de cinco modelos de minha criação para serem leiloados no


evento, e o dinheiro arrecadado, será convertido em alimentos.

Sou grato ao Louis, meu irmão mais velho, por ser o próximo herdeiro da
VITTILENO, graças a isso pude estudar moda e me especializar naquilo que eu
amo fazer.

Criar modelos de roupas, ver as pessoas os usando e amando minhas obras


de artes.

Não assino com o meu nome para não atrair mais atenção da mídia para
mim. Apesar de tudo, sou uma pessoa reservada, que prefere manter a vida
privada.

O assédio que sofro por ser um Vittileno me incomoda desde pequeno. Ser
bonito não ajudou muito, herdei a beleza da minha mãe, igual aos meus irmãos.
Temia um dia encontrar uma mulher que me quisesse por ser um Vittileno, ou
devido à minha aparência.

Blanca apareceu como um presente dos céus, alguém que me ama por eu
ser quem eu sou. Minha beleza e dinheiro nunca a impressionaram, é ao meu
coração e minha alma livre que ela ama.

E eu a amo cada dia mais.


A conheci em um dos desfiles da minha grife. A modelo mais linda, que
usou a peça-chave da coleção, no primeiro momento ela me dispensou por ser
um dos Vittileno, e seu patrão.

Eu insisti, todos os dias, por mais de um ano. No fim, três meses depois do
nosso primeiro encontro, o amor venceu, e hoje estamos aqui, casados e
esperando nosso primeiro filho.

Encaro a minha esposa sentada no banco de trás, ao meu lado no carro que
nos leva ao evento. Seguro seu queixo e ela me encara sorrindo. Uma luz forte
ilumina o seu rosto. A buzina do nosso motorista explode. Olho para a frente e
fico cego pelo clarão.

Não vejo mais nada depois disso.

****

Acordo com a cabeça latejando.

— Levi — vejo meu pai, assustado, pairando acima de mim — graças a


Deus, filho.

— O-oque?... — Minha garganta está seca, e engulo em seco.

— Aqui — com a ajuda dele bebo um pouco de água, acalmando a


quentura na garganta.

— Blanca? — pergunto.

— Filho — lágrimas nascem em seus olhos.

— Pai... — o desespero gela a minha alma.

— Vai ficar tudo bem — ele beija minha cabeça, e a dor causada por seu
ato, me faz revirar os olhos e me afastar dele. — Vou chamar o médico — ele se
afasta, me deixando sozinho.

A tontura faz com que eu tenha ânsia de vômito. Preciso saber o que
aconteceu com a minha mulher e meu filho. Tento mexer a perna direita, e a dor
é excruciante, corta da ponta do pé a minha coxa, inclino a cabeça tentando ver o
que me prende, e sou forçado para trás pela tontura.

— Calma — Louis aparece no meu campo de visão, os olhos vermelhos e


inchados. — Você fraturou a perna em três lugares, não pode se levantar.

— Blanca? — peço com as lágrimas turvando minha visão.

— Na UTI, os ferimentos dela foram leves, mas o parto do Lorran teve de


ser prematuro, vai ficar tudo bem.

— E-ele... tá b-bem? — esforço para conseguir falar.

— Sim, é um lindo bebezinho de 3 quilos e 500 gramas. — Seu sorriso me


conforta.

— Quero vê-lo.

— Por enquanto ele dorme no berçário, quando você receber alta eu te levo
lá — Louis segura minha mão, fazendo carinho.

Aliviado, por saber que ambos estão vivos, eu cedo a tontura e desmaio.

A semana passa da mesma forma, com Blanca na UTI, o Lorran no


berçário, e eu preso nesse quarto, oscilando entre a consciência e o torpor.

Recebo alta duas semanas após o acidente de trânsito, a primeira coisa que
peço, é para ver minha esposa, mas as visitas estão restritas, para garantir que ela
não tenha uma infecção.
O acidente aconteceu devido a uma moto, que cortou na frente de um
caminhão, e o susto fez o motorista perder o controle do volante, invadindo a
contramão.

O motorista do carro não teve tempo de desviar, e bateu, ele morreu na


hora, enquanto eu e a Blanca fomos levados ao hospital.

Arrepios sobem pelo meu corpo ao lembrar que a minha mãe faleceu da
mesma forma.

Um acidente, causado pela perda do controle do carro durante a intensa


chuva, quando ela voltava para casa. O motorista faleceu no local do acidente, e
minha mãe ficou internada por dias, até não conseguir mais lutar por conta dos
ferimentos, e nos deixar.

Rezo aos céus para que o destino dado a minha mãe não seja o mesmo da
Blanca.

Tento ser otimista, e acredito que tudo ficará bem, que ela vai sair dessa e
voltar para mim, e o nosso filho. Todos os dias em que ela continua dormindo, e
perdendo aos poucos as funções dos órgãos, são agulhadas enfiadas no meu
coração.

Ela teve uma hemorragia durante o nascimento do Lorran, misturado com


o sangue que tinha perdido devido ao ferimento profundo no braço esquerdo,
precisou de transfusão sanguínea urgente.

Por falta de bolsas de sangue AB positivo, ela teve falência do fígado e


rins, e agora, outros órgãos estão em risco de falência.

O coração não bombeia em plena capacidade, e o pulmão, não envia


oxigênio para as células. Rogo pedindo a Deus há cada instante do dia para que
ela consiga lutar pela sua vida.
Eu e nosso menino precisamos dela.

— Quer ir ver o Lorran? — Louis pergunta quando termino de vestir


minha roupa, e sento na cadeira de rodas.

— Vamos — tento sorrir pelo meu meninão.

A porta do quarto abre, e o médico responsável pelo tratamento da Blanca


entra com o semblante triste.

— Sinto muito Levi — aproxima cruzando as mãos na frente do corpo —


fizemos tudo que podíamos por sua esposa, mas infelizmente, ela não resistiu, e
teve uma parada cardíaca.

O mundo desaba em escuridão ao meu redor.


Levi

Um ano após o acidente.


Perdão, Blanca.

Vejo meu filho no berço, dormindo com um pijama de ursinhos, agarrado


na pelúcia que a mãe comprou quando ela estava com sete meses de gestação,
trouxemos todas as suas coisas na mudança, as minha eu queimei.

Não consegui voltar para a nossa casa, a escuridão tomando as paredes,


tornou-se impossível respirar lá dentro. Tive um ataque de pânico quando passei
pelas portas, e fui levado de volta ao hospital, passei uma semana internado até
conseguir me acalmar e receber alta.

Louis assumiu a responsabilidade de cuidar de mim e do Lorran, viemos


morar com ele. Sua casa foi adaptada para nos receber, o quarto do Lorran
decorado com imagens infantis e ursos que ele adora brincar, enquanto o observo
de longe, com medo de tocar no meu pequeno e o machucar, ele parece tão frágil
e pequeno.

As minhas coisas lembravam a Blanca em tudo, na gravata que ela


amarrava, os desenhos que ela analisava e dava palpites de como melhorar, o
sabonete que ela comprava, e adorava cheirar em minha pele, o perfume que a
fazia franzir o nariz, e dizer que não sabia como eu aguentava aquele cheiro.

Todas as lembranças dolorosas que eu queimei quando se tornou


impossível continuar relembrando ao olhar para elas.

Um ano se passou desde que eu perdi o amor da minha vida e a razão pela
qual eu seguia em frente. Minha mãe morreu quando eu ainda era jovem, em um
acidente de carro, e agora... anos depois, outro acidente levou a mulher que eu
mais amei, e sonhava em passar a vida ao lado dela.

Briguei com a Lira, minha irmã mais nova, quando ela me fez ir ao
psicólogo semana passada, e eu não quis o tratamento, passei uma hora sentado
em silêncio, enquanto o psicólogo me fazia perguntas sem respostas. Explodi
com ela, por me fazer passar por aquilo, e com lágrimas nos olhos, minha irmã
voltou aos Estados Unidos, destruída, sem conseguir assistir a minha
autodestruição sem fazer nada.

As pessoas ao meu redor não conseguem entender como eu posso ter me


deixado afundar no luto e ignorado o meu filho. Eu não desprezo o Lorran, não o
quero longe, eu só não sei o que fazer sem ela aqui. Lorran é a cara da mãe, o
nariz pequeninho e afinado, os lábios de um tom rosinha, com uma curvatura de
coração, como os de Blanca.

Meu filho me lembra a todo instante quem eu perdi, olhar para ele é como
ver o futuro que eu tinha, se desmoronando na minha frente, dia após dia.

Quanto mais essa sensação se afunda em meu peito, mais eu fujo dele, não
querendo contaminar um anjo indefeso com a minha podridão.

Minha mãe morreu... Minha esposa morreu.

Por que eu continuo vivo?


E se o Lorran morrer, por ser meu filho?

Meu irmão também morrerá?

Meu pai?...

Minha irmã?...

Todos vão morrer, e eu vou continuar vagando como um fantasma nesse


mundo sem cor. Bebo um longo gole do uísque, o álcool não traz mais o
entorpecimento de que preciso para continuar vivendo. A dor a cada dia mais
forte e impossível de ser controlada.

A mão treme quando a aproximo da cabeça do Lorran, cabelos louros em


tufos volumosos. O peito dele desce e sobe ritmado enquanto sua boquinha se
abre em um bocejo, e os olhos azuis como os meus me encaram sonolento.

Afasto a mão, não posso contaminar meu filho com a minha escuridão. Ele
é um anjo de luz, não vou permitir que um demônio como, eu manche sua vida e
o amaldiçoe com uma morte precoce.

Nunca mais pessoas que eu amo irão morrer por fazerem parte da minha
vida, vou proteger o Lorran, meu pai, minha irmã, e irmão, do destino cruel.

Perdão, Blanca.

Lorran estica um dedo tentando agarrar minha mão, a garrafa de uísque


balança quando me afasto dele, como se tivesse sido empurrado. Cambaleio e
caio no chão, fazendo barulho por ter esmagado um de seus brinquedos.

O choro do Lorran explode como uma bomba, em menos de três segundos


Louis chega na porta do quarto. A expressão de meu irmão mais velho me joga
mais fundo no abismo, repleto de pena e tristeza.

Eu não sirvo mais para viver nesse mundo.


Sou um fantasma que só tem causado incomodo para todos ao meu redor.

Louis não trabalha direito, meu pai não para de se preocupar. E mandei
embora minha irmã mais nova, que só queria o meu bem, eu sou uma praga que
deve ser exterminada.

— Lorran seria mais feliz — a voz arrastada pela embriagues — se você


fosse o pai dele — aponto para meu irmão, apoio a mão no chão para me
levantar, tropeçando, firmo o corpo. — Quer ele para você? — algo molhado
enche a face de meu rosto.

— Não diga besteiras Levi — Louis se aproxima, e me senta na cadeira de


ninar do Lorran. — Você precisa voltar a terapia, procurar ajuda para poder sair
da depressão — ele agarra a garrafa de uísque — e parar de beber!

— Lorran tá chorando — o soluço que achei ter ouvido do meu filho, sai
da minha garganta — vá ajudar ele.

— Não é o Lorran, Levi — Louis segura meu rosto — é você. Vamos


tomar um banho.

Louis sempre foi o certinho, centrado, e quem me ajudava a fugir de casa


para ir nas festas da escola, sem nossos pais saberem.

Desde que nossa mãe morreu, é o Louis quem tem ajudado nosso pai a nos
criar.

Eu não tenho o direito de impedir a vida adulta do meu irmão, sou um


estorvo para ele e todos ao meu redor.

— Vou me deitar — falo em um fio de voz quase impossível de ser ouvido


— cuida do Lorran?

— Claro.
— Prometa Louis — agarro seus ombros o fazendo me encarar nos olhos
— nunca deixe o Lorran sozinho, cuide do meu filho, seja o pai que eu não
consigo ser.

— Eu sempre vou cuidar do Lorran. — Meu irmão encosta a testa na


minha — e de você, da Lira, do nosso pai. Vocês são a minha família, vamos
superar isso juntos.

— Não tenho salvação Lou — saio de seu abraço, olho para meu filho no
berço que brinca com o ursinho. — Cuide bem do garoto, você será um pai
melhor do que eu.

— Levi... — a voz pesada não me alcança.

Deixo o quarto do Lorran cambaleando para o meu. A vista embaçada pela


bebida, e lembranças do rosto de Blanca na última vez que a vi.

Ela ama o nosso menino.

É ela quem devia estar naquele quarto comigo.

Por que eu não fui no lugar dela?

Blanca, meu amor, eu sinto tanto a sua falta.

Abro a porta do quarto, vou para o closet, e vejo a corda que deixei
pendurada entre os fortes cabideiros. Roupas que não foram usadas desde que a
Lira as comprou, quando toquei fogo nas minhas, não tem sentido serem usadas.

Perdi a paixão que tinha pela moda, não crio mais nada, não vivo, só passo
um dia pelo outro bebendo, dormindo e me enchendo de remédios, buscando o
esquecimento.

Não consigo encontrar aquilo que procuro na bebida, nos medicamentos, e


no sono.
Blanca sempre aparece quando fecho os olhos, o rosto iluminado, o sorriso
doce, a mão na barriga acariciando nosso bebê. Ela nunca saberá como é o rosto
do nosso menino, o cheiro dele, a voz, não pode ver quando ele coloca o pezinho
na boca e morde, achando graça da pequena travessura.

Ela se foi, e eu continuo preso nesse inferno de mundo, a alma morta por
dentro, tendo de seguir em frente ao corpo que insiste em permanecer respirando.
Meu coração podia simplesmente parar, os pulmões não enviarem mais ar, tudo
podia desaparecer.

Eu não aguento mais sentir, e viver nesse inferno de prisão.

Caminho até a corda, subo no banquinho, e a passo no meu pescoço. Fecho


os olhos, inspiro fundo, e salto.

Perdão, Blanca.

As veias aéreas queimam. A cabeça explode pela falta de oxigênio. O


pulmão e coração em ritmos descompassados. A dor é excruciante, como se
minha cabeça estivesse sendo partida em duas. Por impulso, seguro a corda ao
redor do pescoço, não vou tira-la, não posso continuar existindo quando tudo em
mim morreu.

A visão embaça, escurece, o entorpecimento tomando meus músculos que


cansam de lutar contra a perda de oxigênio. Sinto o coração batendo lentamente,
o pulmão rasgando pela falta de ar. Os braços pendem ao lado do corpo e a
cabeça tomba.

Estou morrendo.

Vou te encontrar Blanca.

O Louis cuidara bem do nosso menino.


— LEVI! — escuto ao longe, não adianta, ninguém pode me alcançar.

O corpo balança violentamente, a corda é rompida e desabo em braços


fortes, impedindo a minha queda. Sou colocado no chão, sinto a pressão em meu
peito, ar injetado na garganta queimar.

— ACORDA — ele grita, desespero.

Tusso, me deitando de lado, e vomitando.

Mal termino de expelir os líquidos, e sou pego em braços protetores,


lágrimas molham minha cabeça enquanto ele soluça se certificando de que estou
vivo.

Mais uma vez a morte bateu a minha porta.

Outra vez fui impedido de ser levado.

Eu só quero desaparecer.

— Nunca mais faça isso, me ouviu? — Louis me aperta forte contra ele,
como se fosse capaz de tirar a minha dor.

— Eu não consigo mais continuar — digo com a voz rouca e falha, a


garganta arde como se tivesse engolido areia.

— Deixa eu te ajudar Levi, por favor — meu irmão chora em desespero.


Continuo causando dor aos que são importantes para mim.

— Enquanto eu existir, você vai permanecer preso nessa dor, se


preocupando comigo, me deixa acabar com o sofrimento.

— Isso não é resposta, Levi — Louis segura meus ombros e me sacode,


me obrigando a encará-lo — hoje pode doer como o inferno, amanhã também,
mas você não pode prever o futuro, não sabe como será daqui a um ano, dois...,
três..., porra, você não pode viver assim!

— Eu não estou vivendo Louis, só existindo.

— Blanca nunca te perdoara se você abandonar o Lorran, faz ideia de


como ele vai crescer? Sabendo que o pai se matou depois da morte da mãe?

— Diga que você é o pai dele e me apague da existência.

— NUNCA! — Louis grita e volta a me abraçar. — Me prometa Levi,


você não vai fazer isso de novo.

— Não posso.

— Se você se matar, eu vou junto — ódio purga em sua voz.

— Não! — me solto com dificuldade, encarando o rosto do meu irmão.


Inchado, vermelho, e banhado em lágrimas de sofrimento — você não pode
morrer, o Lorran precisa que você, seja o pai dele.

— Ele precisa de você — aperta minha testa contra a sua — deixa eu te


ajudar, eu prometo que a dor vai passar.

— E se não passar?

— Não existe essa possibilidade.

Eu quero acreditar no Louis como sempre fiz.

Meu irmão nunca mentiu para mim, e por ele, eu vou tentar, só mais um
pouco.

— Não prometo nada.


— Já é um começo — beija minha cabeça, e com dificuldade, consegue me
levar para o banho.

— Prometa que cuidará do Lorran, Louis — peço novamente, antes da


água tocar meu corpo.

— Vou cuidar de você e dele — assinto em positivo.

Eu vou tentar só mais um pouquinho, pelo Lorran e pelo Louis.

Perdão, Blanca...

Por não conseguir seguir sem você aqui.


Levi

Dias atuais.
— Eu preciso ir para o Brasil, Levi, venha comigo — Louis pede.

Deitado na cama, escondido do mundo, eu coloco a cabeça para fora das


cobertas e vejo o meu irmão. Que segura o Lorran dormindo nos braços, agarrado
nas suas pelúcias de gato e cachorro.

— Fazer o quê? — viro, procuro pelo relógio no quarto e vejo que já são
vinte horas e cinco minutos, não lembro se acordei hoje, ou estou dormindo
desde ontem.

— Para a sucessão da VITTILENO, eu preciso passar ao menos um ano a


frente da empresa no Brasil, e preciso resolver uns problemas que identifiquei
nos relatórios. Não posso fazer isso da Itália, e não consigo partir deixando você
e o Lorran aqui.

Sua voz mansa e baixa, acho que ele não quer acordar o Lorran. Me sento
na cama, e esfrego o rosto sem saber o que fazer. Brasil ou Itália, meu purgatório
será o mesmo. Abandonei mais uma vez a terapia, não consigo me comunicar
com os estranhos, que querem que eu fale da minha vida e de Blanca, da dor que
me atormenta.

Fui diagnosticado com depressão e alcoolismo.

Desde então, o Louis tem ficado no meu pé, e tomando cuidado para que
eu não ingira bebidas alcoólicas.

Me levar para o Brasil, vai garantir que ele possa continuar me vigiando e
impedindo que eu me mate, sei que prometi nunca mais fazer isso, mas o
pensamento não saiu da minha mente, nem por um segundo, desde aquele dia.

Lorran cresce a cada dia, e eu perco seu desenvolvimento enquanto me


escondo no quarto. Encaro meu irmão, ele tem esperança no olhar, vejo meu filho
dormindo confortável em seus braços, quando eu sou incapaz de o segurar dessa
forma.

Perdi o controle da minha vida, e nesse segundo, eu tomo a decisão, pelo


Lorran.

— Vou com você, mas não espere que eu me comunique com ninguém —
franzo o nariz — deixa ao menos eu beber um dia por semana, ceda em algo,
também.

— Sem bebidas para você — diz levantando — arrume sua mala, partimos
de manhã.

— Quando você pretendia me contar que iriamos viajar? Horas antes de


entrar no avião?

— Algo do tipo — dá de ombros e sai.

Ele tenta controlar que eu não beba, impedindo os funcionários de comprar


bebidas para mim e com a mídia sempre de olho nos meus passos, não consigo
beber em paz em um bar. No Brasil, talvez seja mais fácil de conseguir
convencer alguém a me trazer bebida, ou de ir a algum lugar.

Vou porque meu irmão me pediu, e eu preciso tentar recomeçar, mas os


pensamentos pedindo por álcool não são um bom sinal. Estou sóbrio tem um
mês, e o inferno continua o mesmo.

****

Ainda não processei que acordei, e fui colocado em um avião com o Louis
e meu pai, em direção ao Brasil. Louis tem perdendo a paciência comigo, e sei
que a culpa é minha, pelas brigas que tivemos devido à bebida no último mês.

Tenho sido um bosta de irmão e um pai miserável, prova disso, é o fato do


meu filho me chamar mais de stronzzo do que de Levi.

Ele nunca me chamou de pai.

Não o culpo.

Eu fico perdido dentro da escuridão a maioria do tempo, não o olho como


merecia. O pensamento de contaminar o Lorran com a minha podridão, faz com
que eu queira desaparecer no mundo.

Ele estaria melhor se o Louis fosse o pai dele.

Prometi ao Louis e ao meu pai que não tentaria o suicídio novamente, que
me manteria firme, pelo Lorran. A bebida, misturada aos remédios, tem sido meu
conforto quando o mundo ao meu redor escurece. A temperatura cai graus,
trazendo um frio de gelar os ossos, e as lágrimas brotam incessantemente.

Eu não vejo os dias passarem quando estou dopado pela medicação e o


álcool. É mais fácil de continuar existindo quando não sinto nada.
Queria que o Louis conseguisse entender que as drogas me ajudam a
continuar vivo, sem elas, os dias se misturam em um só, e a dor consome minha
alma.

Trancando nesse avião, encaro o Lorran brincar com seu ursinho, fazendo
sons de bebê. Ele é tão lindo, um pequeno anjo, iluminando a escuridão da minha
vida.

— Lorran — chamo baixinho, os olhos azuis idênticos aos meus me fitam


com interesse. — Tudo bem? — pergunto receoso.

Não sei me comunicar com meu próprio filho, isso é patético!

— Zim — responde mostrando os dentinhos de leite pequenininhos.

É injusto a Blanca não poder ver como ele fica lindo com os dentes
preenchendo a boquinha rosada e pequena. As bochechas protuberantes e os
olhos inocentes, astutos, prestando atenção ao redor como um mini falcão.

— Quer? — Estende os bracinhos entregando a pelúcia de gato.

A mão treme ao esticar para pegar o bichinho, e tento não deixar ele
perceber. Lorran começa a fazer sons de cachorro empurrando sua pelúcia contra
a minha, em uma pequena briga. Aproveito que ele está sentado de frente para
mim, preso a cadeira, e fico movendo o gatinho no ar, fugindo do seu ataque.

Ele sorri como poucas vezes o vejo fazendo para mim. Tenta pular no
acento, querendo alcançar o gatinho, faz bico por não conseguir. Um riso tímido
escapa entre meus lábios e grunhindo eu esfrego o gatinho no Lorran, que se
desmancha em gargalhas.

Por que eu nunca brinquei com meu filho?


Ver seu sorriso inocente por minha causa aquece uma parte morta dentro
de mim.

O pequeno momento de alegria some tão rápido quanto veio.

O avião escurece, as luzes piscam. Lorran parece não perceber o que


acontece ao seu redor. As paredes tremem, busco pelo meu irmão e ele continua
concentrado digitando em seu notebook enquanto conversa com nosso pai.

— Mexe — Lorran pula inquieto na cadeira.

Deixo o gatinho ao seu lado e removo meu cinto de segurança, corro para o
banheiro enquanto as cadeiras do avião vão sendo tomadas, uma a uma pela
escuridão.

Entro na cabine e a fecho, acendo a luz, e ela não responde. As mãos


tremem ao buscar o celular no bolso e ligar a lanterna. A densa escuridão devora
a iluminação proveniente do aparelho. Me encolho no chão e prendo a cabeça
entre as pernas, o ar escasso nos pulmões.

É sempre assim quando tento me aproximar dele, as sombras vêm me


buscar, lembrando que eu não posso contaminar o Lorran.

Ele é o pequeno anjo que a Blanca deixou para iluminar o mundo, e eu...

Eu não sou nada...

Além da destruição.

****

— Levi? — Louis me chama do outro lado da porta — o avião vai pousar,


você precisa voltar para o seu lugar.

— Certo — respondo com a voz rouca.


Levanto a cabeça esperando encontrar as sombras e sou banhado pela luz
invadindo a janela do banheiro.

Não sei quanto tempo passei na cabine, as costas doem pela posição
encolhida, os olhos ardem, e a garganta arranha. Evito encarar o meu reflexo no
espelho, lavo o rosto e abro a porta.

Louis me encara de testa franzida.

— Tudo bem? Você passou muito tempo aí dentro.

— Não precisa se preocupar — desvio dele, é doloroso encarar meu irmão


e a preocupação em suas faces.

— Filho — meu pai chama com o tom de voz preocupado, que faz eu odiar
cada segundo, por causar sofrimento a ele pelo meu estado.

— Estou bem — passo por ele.

A mão áspera agarra meu pulso e sou puxado para um abraço. Nunca fui
bom em controlar as lágrimas, e quando recebo o calor do meu pai, derretendo o
gelo em meus ossos, eu soluço.

Eu não tinha o direito de o preocupar desse jeito. Louis não deveria parar
de trabalhar para ficar checando se eu me matei, ou se não expus o Lorran a uma
situação deplorável.

Se eu sumisse, eles nunca mais teriam de se preocupar.

Antes que o pensamento ganhe forma, eu o movo para longe. Sacudo a


cabeça, e dou leves tapas nas costas do meu pai, indicando que ele pode me
soltar. Os olhos iguais aos meus me encaram, preocupados e cheios de amor, não
consigo corresponder ao seu sentimento.
Abaixo a cabeça e retorno ao meu acento. Lorran dorme agarrado com suas
pelúcias, melhor assim, quanto menos contato tivermos, mais eu o protejo.

Agulhas perfuram meu peito por saber que o Lorran nunca soube o que era
ser olhado com amor paternal, como o meu pai faz por mim.

O que eu estou fazendo com nosso menino, Blanca?

Enquanto a aeronave perde altitude, eu choro silencioso. Decepcionado


comigo mesmo por infligir sofrimento ao Lorran, ele não merecia esse destino.
Não merecia um pai de bosta como eu.

O avião pousa e o trajeto ao apartamento é lento e angustiante. Preciso me


esconder na segurança do meu quarto. Os efeitos do delírio de antes retornam, e
o mundo começa a escurecer, quanto mais avançamos cidade adentro.

Uma das terapeutas que tive, disse que isso era um efeito da depressão. O
mundo perdendo a cor, tornando-se frio e indesejável de se viver, quando nos
perdemos dentro de nós, incapaz de encarar a realidade e enfrentar os problemas.

Já faz dois anos que a Blanca morreu, ainda não superei a sua perda, e vivo
em um eterno luto.

O pavor de me tornar a razão da morte da minha família, de machucar


Lorran, ao ser um pai para ele, e depois o fazer sofrer por eu partir.

Não estou pronto para encarar a realidade: um mundo em que a Blanca não
existe, e que eu deveria ser o pai para o pequeno anjo que não me vê como tal,
por consequência das minhas ações. Se eu sumir agora, ele não sofrerá como eu
sofri com a morte da minha mãe.

O Lorran tem o Louis, e o Louis tem o Lorran.

Não precisam de mim, e mesmo assim não me deixam ir embora.


Chegamos no apartamento, e termino o tour até saber onde é o meu quarto.
Me deito, fugindo da realidade que me esmaga. Os gritos animados do Lorran
explorando com o tio preenchem meus ouvidos, como eles conseguem ser felizes
nesse mundo escuro e frio?

****

— Estou saindo Levi, vamos? — Acordo com o Louis batendo na minha


perna.

— Você vai me deixar em paz se eu for? — coloco a cabeça para fora da


coberta, o sol ilumina o dia.

— Deixarei pelo resto da noite.

Eu me escondi do mundo enquanto tudo continuava sombrio. A luz, que


poucas vezes eu via na Itália, brilha ao ponto de ser cegante. Talvez seja um sinal
de que algo de bom possa vir desse passeio.

— Cazzo — reclamo saindo da cama.

Tomo um banho rápido sem me importar se estou me lavando direito. Faço


o mínimo para que o Louis não me mande tomar outro. As parcas energias que
eu tenho, vão embora quando chego na sala, sento-me no sofá, e vejo o Lorran
brincar com o Ipad, enquanto um desenho passa na tv.

Observo meu filho distraído com o jogo, quando as nuvens de sombra


rondam ao seu redor. Não faz nem cinco minutos que estou na sua presença e o
contamino. Eu não mereço olhar para esse anjo, eu não mereço continuar aqui.

Levo as mãos ao rosto, evitando que o Lorran perceba meu choro, o peito
queimando pelo desespero.
Mãos pequenas seguram as minhas, e relutante eu deixo o Lorran me fazer
o encarar. Meu menino coloca o Ipad na minha mão, impedindo que eu tampe o
rosto novamente, dá play numa música infantil, italiana, e começa a dançar e
bater palminhas. As nuvens vão embora, sendo iluminadas pelos raios que o meu
pequeno provoca.

Rio da sua dancinha, deixo o aparelho de lado e começo a bater palmas


com ele, que gargalha gostoso quando percebe que estou brincando junto.

Aos poucos a queimação diminui, e consigo respirar novamente. Quero


tocar o Lorran, e o puxar para um beijo, mas não posso macular sua aura
brilhante com a minha.

Não é justo com ele.

— Vamos? — ele estende a mão, e tremendo, eu seguro sua mãozinha,


rezando para que ele não se contamine.

— Levi — fecho as pálpebras tentando conter as lágrimas. Meu filho


nunca será capaz de me chamar de pai, enquanto eu continuar não sendo um para
ele — você tá bien?

Forço a voz para responder, não quero que ele se preocupe. Embora, não
consiga controlar o choro.

— Sim, e você?

— Tambum, não clhola, eu te dou popolate [1]— à lembrança da minha


mãe fazendo isso, para acalentar meu choro quando era pequeno, sorrio para o
Lorran.

— Obrigado, já me sinto melhor — mordo o doce, e divido com ele a outra


metade.
— ZIOOOOO! — Chama impaciente quando termina de comer o doce.

— Vamos passear? — Louis tem os olhos vermelhos quando estende a


mão ao Lorran.

Talvez ele tenha observado escondido a minha interação com o Lorran.


Louis acredita que um dia eu serei um pai para o pequeno. Preciso poder
acreditar também, ou nunca poderei olhar para o Lorran sem medo de o
contaminar.

— Bolha[2] — pula animado, ainda segurando a minha mão ele pega a do


tio e dispara para a porta.

Eu sei que não tenho o direito, mas por um segundo eu anseio ser um pai
para o Lorran.
Olivia
Foi paixão à primeira vista.

Meus relacionados se iniciavam com essa frase, e pouco tempo depois, eu


descobria que foi, ilusão à primeira vista.

Tenho 26 anos, sou formada em pedagogia, trabalho em uma creche com


crianças fofas e preciosas.

O desejo de ser mãe surgiu cedo em mim, após cuidar da minha irmã mais
nova, Bianca, após nossa mãe morrer de câncer, quando eu tinha 6 anos.

Guardo lembranças preciosas com ela no meu coração, e tentei ser tudo
que a Bianca precisava enquanto crescia.

Um dia eu esperava minha mãe me acordar para a escola, no outro eu


usava o despertador. Tirava o leite da geladeira e fazia pão com manteiga para
tomar café, enquanto o meu pai chorava pela perda da esposa.

Eu levantava a Bianca, dava de comer a ela, beijava sua testa, a do meu


pai, e depois saia para a escola.
Tinha acabado de iniciar a alfabetização, e a escola ficava a duas ruas de
distância.

Geralmente, as vizinhas que levavam os filhos, me faziam companhia e


tomavam cuidado para nada acontecer comigo no trajeto de ida e volta para a
escola. Foi assim que eu me criei sozinha, vendo meu pai chorar pelos cantos,
minha irmã chamando pela mãe, e eu engolindo o choro, para ser forte por eles.

Meu pai só acordou para a vida e voltou a trabalhar, quando os alimentos


começaram a faltar dentro de casa, e ele me viu pedindo comida nas vizinhas,
para que a Bianca pudesse comer.

Desde então, tem sido mais presente e cuidadoso, não deixando faltar nada.

Eu me ressinto com meu pai, não tive uma infância, cuidei dele, da minha
irmã, e quando adolescente, precisava ouvir o quanto era importante eu me
manter pura. Brigávamos muito, e em algumas dessas brigas, cheguei a jogar na
cara dele que era um péssimo pai, por ter nós abandonado quando nossa mãe
morreu.

Naquele dia, ele entendeu a dor que carreguei durante anos. Nunca deixei a
Bianca saber como eu me sentia, quero protegê-la de tudo e todos, inclusive dos
sentimentos ruins que guardo dentro do peito.

Foram longos anos até a Bianca se tornar independente, hoje ela se formou
e conseguiu um emprego estável em uma grande empresa. Não poderia estar
mais orgulhosa da minha menina.

Finalmente, senti que estava livre do dever de cuidar da Bianca, e podia


aproveitar mais a mim mesma.

Sou namoradeira desde a adolescência, nunca fui muito fundo com os


caras que conhecia, a maioria se mostravam babacas que não mereciam o meu
tempo. E o medo de transar e engravidar jovem, me apavorava a alma.

Passei anos virgem, mesmo gostando de dar uns beijinhos em carinhas


bonitos. Todos faziam por onde partir meu coração, e como uma boba, continuei
acreditando no amor, que alguém cuidaria de mim, veria minhas feridas e beijaria
todas com paixão.

Quando conheci o Roberto na faculdade, fazíamos o mesmo curso, ele era


divertido, extrovertido, cheio de vida, e se dava bem com as crianças do nosso
campo de estágio. Passei quatro períodos apaixonada, ele me deu uma chance,
jantamos, conversamos, e nos beijamos.

Daquela vez eu estava certa: ele era o cara, o homem da minha vida,
casaríamos e teríamos uma família. Me entreguei a paixão sem pensar duas
vezes, eu tinha certeza da pessoa ao meu lado, não existiam motivos para recusar
suas investidas, transamos muitas vezes, apaixonados, eu sentia que ele era o
meu porto seguro. Éramos um casal que se amava.

Durante a formatura, Roberto levou a família dele, fiquei nervosa,


acreditando que conheceria meus sogros naquela noite. Quando cheguei ao teatro
com a minha família, eu o vi, lindo, de beca e capelo, sorrindo enquanto tirava
fotos.

Eu dei um passo em sua direção, no segundo travei no lugar, e senti o


coração espetado por uma estaca.

Roberto segurava uma mulher nos braços, ele a abraçou demoradamente,


tiraram fotos, e quando achei que ele a largaria, seus lábios se tocaram, e sua
família aplaudia.

Desnorteada, fui até ele, sua expressão não se abalou, me apresentou como
uma amiga do curso, e nada mais.
Fiquei sem chão, as mãos suando frio, a vista embaçada. Travei o choro,
cumprimentei aquelas pessoas, e quando ficamos em fila para entrar com os
padrinhos, eu me agarrei ao meu pai e escondi o rosto em seu ombro. Sem dizer
mais nada, ele segurou minha cabeça, beijou minha testa e disse o quanto me
amava e estava feliz pela minha conquista.

Não sei como sobrevivi a formatura, quando tudo acabou, encontrei o


Roberto em um restaurante, dias depois.

Confusa e desnorteada, ouvi enquanto ele ficava surpreso, por eu declarar


meus sentimentos, chorando por ser usada.

Sem arrependimentos ele me disse; ... “Eu nunca te pedi em namoro, não
foi minha culpa se você se iludiu”.

Mais uma vez, o “amor à primeira vista” tornou-se “ilusão à primeira


vista”. Após o Roberto, não consegui me relacionar com outros homens de forma
afetiva, o medo de me machucarem persistia enraizado na minha alma. Aceitei
que nasci para cuidar, e não ser cuidada.

Os anos foram passando e a vontade de ser mãe crescendo novamente. Eu


já não tenho esperanças de formar uma família com um homem, por isso, decidi
que teria meu filho sozinha.

Busquei os meios legais que poderia fazer isso e fiz o meu cadastro para a
adoção, também procurei por meio de inseminação artificial, mas com o que
ganho no momento, não conseguiria pagar o procedimento.

Faz dois anos que entrei no cadastro de adoção e fiquei perplexa quando
me perguntaram qual o tipo de criança que eu queria, se era branca, negra,
menina, menino, olhos azuis ou marrons, e todo o tipo de pergunta absurda.
Senti que estava montando um sanduíche em vez de me preparando para
receber meu filho.

Fui enfática quando disse que não tinha preferência de nenhum tipo, que
queria uma criança para amar e ser amada, que aceitava grupos de irmãos, e
crianças com deficiência, pois se estivessem sendo gerados no meu ventre eu
nunca poderia escolher como eles seriam.

É injusto que o sistema de adoção tenha uma seleção ridícula como essa. A
moça ficou feliz pela minha resposta, e disse que quando uma criança com o
perfil que escolhi aparecesse, eu seria chamada, e depois seguiríamos o processo
de adoção.

Até o momento não consegui nada, pois a ordem, é de acordo, com as


famílias que se inscreveram antes de mim.

O fato de trabalhar em uma creche particular e de prestígio vai me ajudar


se eu pegar uma criança com menos de 6 anos. A levaria de dia para o trabalho
comigo, e a noite ficaríamos em casa, seria mãe solteira em tempo integral.

Estou quase enlouquecendo com a angústia e incerteza de não saber se


conseguirei realizar meu sonho, e transando com o primeiro que aparecer, vou
furar a camisinha, e depois o cara nunca vai saber que me engravidou. Terei meu
bebê e poderei realizar meu maior sonho, ser mãe.

Amar alguém sem esperar nada em troca, criar uma pessoa, ser o seu ponto
seguro, a felicidade, o mundo de uma pequena parte minha. E esse pequeno ser
que nascerá de mim, vai me amar incondicionalmente, e quando eu ficar
velhinha, serei cuidada, amparada, e finalmente poderei descansar em paz.

— Olivia — a supervisora me chama, deixo meus alunos que pintam e vou


até ela.
— Sim?

— Precisamos da sua ajuda — Ela olha a sala e depois a mim — pode ir


até a direção, eu fico com eles.

— Certo.

Caminho pelas paredes coloridas, pintadas com animais e bonecos infantis.


Eu amo trabalhar na Creche Zoológico dos Pequenos. Consegui esse emprego
graças ao meu pai, por ser segurança particular do dono, falou bem de mim, e o
convenceu a me dar uma chance.

Tenho minhas desavenças ideológicas com meu pai, mas ele nunca deixou
de me amparar por brigarmos e pensarmos diferente. Bato na porta da diretora, e
quando entro, levo um segundo para processar o homem a minha frente.

Uma beleza destruída.

Louro dos olhos azuis. Alto e magro, ao ponto de a roupa ser folgada. Os
ombros encolhidos, e a expressão desolada, com olheiras negras e olhar
quebrado.

Ele é lindo, mesmo parecendo destruído.

— Ah, Olivia! — Dolores, a diretora me cumprimenta. — Preciso da sua


ajuda, meu italiano não está funcionando bem — ela ri sem graça.

Dolores não fala uma palavra em italiano, é fluente em inglês e espanhol,


mas nunca se dedicou a outros idiomas.

— Como posso ajudar? — entro na sala ficando ao lado do homem.

Observo ao redor, e vejo o pequeno menino, brincando na mesinha no


canto da sala. As bochechas mais gostosas que já vi, tenho vontade de ir até ele e
bagunçar o cabelo de fios dourados como ouro.
— Levi deseja matricular o Lorran na nossa creche, mas ambos só falam
italiano.

Contenho o ímpeto de arquear a sobrancelha. É comum em países da


Europa, eles serem dotados em mais de uma língua, aprendem no dia a dia novos
idiomas. Principalmente aqueles que tem empregados em suas residências, que se
originam de outros países.

— Nem inglês? — questiono.

— Ou ele não fala, ou não quer se comunicar comigo — fala baixinho,


envergonhada.

— Entendi, serei a intérprete — sorrio para o homem que me ignora, como


se eu não existisse.

— Vamos — Dolores aponta a cadeira a frente e me sento, Levi faz o


mesmo.

O cheiro dele não é exatamente agradável, como se tivesse tomado banho


às pressas e esquecido de passar um desodorante ou perfume. Fico preocupada
quanto a criança por conviver com esse homem como seu pai. Onde estará a mãe
do menino?

— Bom dia, você trouxe os documentos do seu filho? — pergunto em


italiano, ele pega uma pasta na bolsa, e me entrega.

— Estão todos aqui dentro — responde também em italiano, a voz grave


em tom baixo me causa pequenos arrepios.

Continuamos o processo de matrícula, enquanto eu sou a intérprete para


que ambos possam se entender. Quando terminamos, ele diz que trará o menino
no dia seguinte, e o chama.
O pequeno pega a folha em que desenhava e entrega ao pai, as mãos dele
tremem ao segurar o papel, e um pequeno sorriso desponta no canto de seus
lábios, antes dele fechar a expressão novamente e estender a mão, segurando a do
filho e partindo.

Queria ter tido tempo de conversar mais com a criança. Ele parece um
doce, e muito fofinho.

— Coloca o menino na minha turma — peço a Dolores.

— Já estava pensando em fazer isso — ela me entrega os papeis da


matrícula — a mãe do menino faleceu quando ele nasceu. — Ela lê a ficha e bate
na testa — esquecemos de pedir um número reserva, de outra pessoa que fique
responsável pelo Lorran, caso não consigamos contatar Levi.

— Foi a confusão pela tradução do idioma — sorrio para ela — quando ele
vier amanhã deixar o Lorran pegaremos o contato.

— Sim, por favor, não esqueça.

— Pode deixar.

Sorrio, e retorno a minha sala, a lembrança do pequeno italiano


preenchendo meus pensamentos.
Levi
Fico intrigado pela cara de idiota do Louis.

Já faz mais de uma hora que ele retornou da empresa, após o segundo dia
de trabalho, e continua encarando a tela do notebook sem digitar uma palavra no
arquivo aberto, ou mudar a página.

— O que você tem? — pergunto, sentando-me ao seu lado.

— Nada, por quê? — sacode a cabeça e bate no rosto, sinal de quando ele
precisa manter o foco.

— Já faz mais de uma hora que você encara esse notebook sem fazer nada
— aponto a tela — sei que não sou a melhor companhia dos últimos tempos, mas
se quiser conversar — dou de ombros.

— Não aconteceu nada de mais — fecha a tela, coçando a cabeça. — E


você não é uma companhia ruim, só não está no seu melhor momento.

— Corta o papo furado e diga logo o que aconteceu. Aproveite que estou
mostrando interesse.
São raros os dias em que realmente tenho vontade de conversar com o
Louis. Após matricular o Lorran, me sinto mais disposto a fazer alguma coisa,
além de ficar trancado debaixo das cobertas.

— Tem essa mulher — faz gestos com as mãos — a gente se conheceu na


festa da empresa. Transamos, e descobri que ela é minha secretária.

— Porra! Logo você que não se envolve com funcionárias.

— E isso não é a pior parte. — Ele se levanta andando de um lado ao outro


— ela me disse que era virgem, aquilo mexeu comigo, e fiz sexo mais carinhoso,
com cuidado — Louis esfrega o rosto — quantos cabaços você já tirou?

— Alguns — dou de ombros, não me importo muito com essa parte. —


Que diferença isso faz?

— TODA — Exclama abrindo os braços. Fico surpreso por sua reação,


Louis tende a ser calmo e calculista.

— Não sei se entendi — coço a cabeça, tentando acompanhar o raciocínio


dele.

— Quando uma cereja é estourada tem sangue. Quando olhei os lençóis e a


camisinha, não encontrei nada. Acredito que ela mentiu para mim, deixei um
pagamento pelo sexo e fui embora. E agora a desgraçada é minha secretaria, e
fica me olhando como se eu fosse o babaca da história, e não ela a mentirosa!

— E se ela não estiver mentindo? Não conheço a moça, mas sei que nem
toda primeira vez é igual.

— Não, isso é uma regra — bate na mão irritado — toda mulher na


primeira vez sangra em algum momento, durante ou depois. Mas não tinha nada
que provasse que ela era virgem!
— E qual a teoria maluca que passa pela sua cabeça?

Louis às vezes tende a ser muito insistente, quando convicto de algo.


Dificilmente ele escuta outras pessoas, não conheço a mulher, e não posso atestar
por sua honra. Contudo, não estou convencido sobre a certeza do meu irmão
nesse caso.

Se tratando de mulher, ele perde a razão, e suas desconfianças o fazem


quase alucinar bolando teorias conspiratórias de que toda mulher do mundo quer
ferrar com a vida dele.

O histórico do Louis é péssimo com mulheres querendo o enganar, ao


contrário de mim, que até conhecer a Blanca, era um apaixonado pelo corpo
feminino e me envolvia sem medo.

O Louis se envolve cheio de desconfianças, muitas mulheres tentaram


enganar meu irmão com falsas virgindades e gravidez, para o fazer casar com
elas. Até da Máfia Italiana ele já foi alvo de golpe para casamento.

— Ela usou a cartada da virgindade para me fazer ser delicado com ela,
criar apego — morde o lábio, enraivecido — ela me paga, vou fazer com que
confesse que mentiu para mim.

— Lembre-se que no trabalho você é o chefe dela — estico as pernas e o


pescoço — se o pai descobrir isso, vai arrancar suas bolas.

— Ele não vai ficar sabendo de nada — me encara com seu olhar de águia
— e você vai continuar calado sobre isso.

Simulo um zíper sendo passado na boca e jogo a chave fora. Louis suspira,
sentando-se ao meu lado novamente.

— Faz tempo que não reclamo de mulher com você — bate na minha coxa
— obrigado por me ouvir.
— Quer minha opinião? — ignoro o sentimentalismo sobre como temos
nos afastados durante a minha depressão.

— Manda.

— Talvez ela não tenha mentido. Não sabemos ao certo como a virgindade
é tratada no Brasil, vai que ela fez algo para esconder o sangue.

— Até da camisinha?

— Seu nojento — me afasto dele e Louis gargalha.

— Não tem como eu ter errado, pensei em todas as possibilidades para


essa situação. — Pega o notebook e se levanta — vou fazê-la confessar que
tentou me enganar.

Vai embora resmungando sobre nunca ser feito de trouxa. Enquanto eu me


apaixonei somente por uma mulher, o Louis nunca experimentou o sentimento.
Sempre correndo, buscando realizar com perfeição os estudos, encargos na
empresa, e atento a todas com quem se envolvia.

A dor de perder quem ama é excruciante. Desejo que meu irmão nunca
passe por tal sentimento.

O Brasil tem de ser bom para um de nós dois.

Continuo na mesma, um pai de bosta, e irmão pior ainda.

— Eu adloro popolate — Lorran entra cantando na sala, com as bochechas


cheias de chocolate e as mãos segurando a barra devorada.

— Quem te deixou comer todo esse doce? — inclino na sua direção.

Percebendo que não está sozinho, Lorran trava no lugar e os olhos


arregalam de susto. Enfia o resto da barra de uma vez na boca, e desvia a atenção
para a janela da sacada. As mãos rapidamente vão para trás do corpo.

— Não adianta esconder Lorran, eu vi que você comeu chocolate —


verifico as horas no relógio — daqui a pouco é a sua janta, quem te deu
permissão para comer doce?

— Zio — continua desconfiado.

— Não pode mentir Lorran, é errado. — Fico de joelhos — vá tomar um


banho, você não pode comer chocolate antes das refeições.

Lorran faz bico, os olhos ficam vermelhos e o choro irrompe como uma
represa sendo aberta.

— Não tem motivo para chorar — falo, e ele grita, intensificando o choro.

— Stronzo! — Grita.

— O que aconteceu? — Louis entra na sala, ver o choro do Lorran, e a


mim, ele coloca as mãos na cintura e fecha a cara.

— Zio! — Lorran soluça indo para os braços do tio — Levi bligo imo[3].

— Por quê? — Louis não se importa com a sujeira do chocolate no Lorran,


o pegando no colo.

— Num tei — se encolhe no pescoço do tio.

— Levi? — pergunta, os olhos desconfiados de que briguei com o Lorran.

— Eu só disse para ele não comer chocolate antes da janta — me levanto.

O incômodo por fazer o Lorran chorar espezinha meu peito.

— Desculpa Lorran, me perdoa — a voz embarga, a visão embaça, o bolo


na garganta dificulta falar.
— Você tem razão — Louis encara o Lorran — não pode comer chocolate
antes das refeições, Lorran.

— Eu sou um merda — encolho — se tivesse te deixado falar, ele não teria


chorado — soluço, sem coragem de encarar aos dois — me perdoa.

Peço, saio da sala, o caminho para o quarto é tomado pela escuridão. Abro
a porta e a fecho com um baque, não conseguindo ouvir as vozes que chamam
meu nome.

A mão treme, e as pernas cambaleiam ao andar até o armário com meus


remédios. Jogo as roupas no chão, e pego os comprimidos, engolindo sem água,
encolhido no canto da parede, eu sou envolto pela escuridão que me abraça.

Eu não devo me aproximar do Lorran, vou continuar magoando seu


coração e o fazendo sofrer enquanto estiver ao seu lado.

****

Desperto com o som do celular tocando, meio grogue, me arrasto pelo


quarto até encontrar o aparelho em cima da mesa. Um aviso toca na tela “deixar
o Lorran na creche” o efeito dos remédios de ontem ainda impregnado em meu
organismo.

Deveria mandar o Louis acompanhar o Levi para a creche em vez de fazer


isso sozinho, posso acabar magoando novamente os sentimentos do pequeno.

Batidas soam na porta seguido da voz

— Senhor Levi, hora de deixar o Lorran na creche — a governanta fala em


português. Não a respondo, não quero que saiba que entendo seu idioma.

A cabeça explode e o estômago revira, a ânsia de vômito misturada com a


náusea. Preciso de um comprimido, abro a gaveta e pego um antiácido, e um para
a dor. Engulo ambos no seco, sacudo a cabeça e me levanto.

Abro a porta, e a escuridão continua em todos os lados. Caminho com


dificuldade até a sala onde o Lorran me espera com a mochila e animado para ir à
creche.

Ele prefere ficar lá do que no apartamento comigo, mas por qual razão ele
iria preferir a mim? Não passo de uma praga em sua vida.

— Vamos — chamo.

Ele se levanta e vai para a porta sem esperar por mim. Descemos em
silêncios no elevador e permanecemos assim durante o trajeto para a escola.

Louis não confia em deixar o Lorran sozinho com um segurança o


buscando e trazendo dos lugares, tem medo que algo de ruim aconteça, e que o
Lorran precise de um responsável para o socorrer.

Eu não sirvo de nada.

Ele fica mais seguro com o motorista do que comigo.

A cidade é tomada pelas sombras, as pessoas andando na calçada são


sugadas e desaparecem. Lorran brincando com o tablet ao meu lado é envolto
pelas nuvens negras.

— Lorran — chamo seu nome, com medo dele ser machucado — o que
você quer fazer hoje? — Tento uma conversa, qualquer coisa capaz de o manter a
salvo.

— Num sei — dá de ombros e continua jogado no tablet.

— Quer ir ao zoológico? — pergunto, sem saber ao certo o que estou


fazendo.
O desesperado para o afastar da escuridão que consome o mundo,
atormenta minha mente, confunde o que eu posso fazer para ajudar meu filho.
Ele não merece ser tomado por essa dor.

— Sí — finalmente me olha, os fios de ouro brilham espantando as


sombras ao seu redor.

— Combinado.

Chegamos à creche, e as sombras permanecem ao redor. Desço com ele do


carro e o levo a sua sala, tentando não demonstrar o quanto estou desestabilizado.
Na porta, a professora espera por ele, ela sorri iluminando o corredor e mandando
embora as trevas negras.

Lorran vai ficar seguro enquanto a tiver por perto.

Entrego meu filho ao raio de sol e vou embora, dominado pela tempestade.
Vejo o carro me esperando, se eu sumir e deixar o Lorran com aquela mulher, ele
nunca mais ficará envolto da dor, poderá sorrir novamente e ser feliz.

Não penso muito quando ignoro o carro e ando sem rumo pela cidade.

E não contaminarei meu filho, ele merece a luz.


Olivia
Lorran se joga nos meus braços quando o pai vai embora. Divido a atenção
entre o pequeno sorridente, e o homem de ombros curvados e expressão
desesperadora.

Ele parece a ponto de pular de um penhasco, não sei explicar, mas tenho o
impulso de querer o segurar.

— Tudo bem fofinho? — pergunto em italiano, o menino ganha vida ao


ouvir seu idioma, e sorri, mostrando os dentinhos de leite.

— Sí, como tchama[4]? — eu sou apaixonada em bebenez, as línguas que


somente essas coisinhas preciosas falam e conseguem entender. Ainda mais
quando acrescentado o sotaque italiano, da vontade de morder as bochechas dele.

Lorran é muito fofinho e simpático, de cara se jogou nos meus braços e me


recebeu com um sorriso no rosto. Meu útero coça de vontade para ser mãe ao
olhar essa fofura, e imaginar como seria ele me beijar a bochecha e chamar de
mamãe.

— Sou a Zia Olivia — seguro sua mão e o coloco no chão — vamos


conhecer seus colegas de classe?
Lorran acena em positivo, pede colo novamente, e fico com vontade de
ceder ao seu pedido. Me controlo quando a mãe da Suzana chega trazendo a linda
menina, negra de cachos esvoaçantes, que parecem uma coroa ao redor do rosto
redondinho e bochechudo.

— Vivia! — Lorran chama insistindo pelo colo e o pego, entendo a


necessidade especial de uma criança estrangeira em uma sala que ninguém fala
seu idioma. Ele me vê como um porto seguro, alguém que o entende e será capaz
de o ajudar.

Acho muito fofo ele me chamar de “vivia” em vez de Olivia ou de Zia,


como me apresentei. Seguro o fofinho e sorrio para a Suzana e a mãe dela, Carla.
Ambas sorriem ao me ver, e a menina pula no colo da mãe, querendo o abraço
que dou em todos os meus alunos ao recebê-los na porta da sala.

— Bom dia, Carla, e Suzana — beijo a mão da Suzana e sorrio para Carla.

— Que menino mais lindo — Carla pega na mão do Lorran e ele se derrete
sorrindo para ela, dengoso. — Que fofura, meu Deus! — A voz dela fica um
oitavo mais alta, chamando a atenção das mães que estão no corredor — ele é
brasileiro?

— Não, italiano — respondo, logo uma rodinha se forma ao nosso redor, e


Lorran fica todo tímido, sorrindo com as bochechas vermelhas e se encolhendo
nos meus braços. — Não fala português ainda.

— Ele é um fofo! — Dona Paola diz, uma senhora rica que sempre deixa
os netos na creche. — Come sta il bambino[5]?

— Bene — Lorran responde e faz um “ploc” com a boca, fazendo a


senhora levar as mãos as bochechas e gargalhar encantada pelo carisma do
pequeno.
— Ele lai ser nosso toleguinha? — Suzana pergunta, a língua embolada
para falar, ela tem dois anos e quatro meses, e é a minha gostosa, sou apaixonada
por todos os meus alunos, e quando eles falam em bebenes preciso me controlar
para não morrer de amores todas às vezes.

— Sim, vai ser amiguinha dele? — pergunto a ela que acena em positivo e
estende a mão para o Lorran.

— Sou a Suzana — fala orgulhosa, e Lorran, apesar de não entender o que


ela diz, segura a mão dela de volta e sorri.

— Ele não fala português ainda, Suzana — a mãe dela fala — seja
boazinha com ele e o ajude, assim como a mamãe te ensina a falar, combinado?

— Sim mamãe.

— Até mais Olivia — Carla se despede, dá um beijo na filha e vai embora.

— Bom dia, senhoras — digo para as mães no corredor — vou começar a


aula com os pequenos.

— Até mais.

— Depois voltamos para ver o fofinho.

— Tenham um bom dia crianças.

— Te vejo mais tarde.

Elas falam e vão embora quando fecho a porta.

— Lorran, seu pai colocou as coisas que pedi na sua mochila? — pergunto
em italiano e ele dá de ombros.

O coloco no chão e pego sua bolsa para guardar na estante junto da


mochila dos outros alunos. Abro e vejo que a lista dada ao Levi ontem foi
cumprida à risca, toalha para banho, escova de dentes, troca de roupa, e frauda,
lençol para dormir o sono da tarde, dentre outras coisas, tudo bordado com o
nome dele na ponta.

Ao menos isso, Levi conseguiu fazer, tinha a impressão de que o homem


passaria a noite trancado em um quarto afundando em choro. Eu entendo a dor
que a perda do conjugue pode causar na pessoa, vi isso acontecer com o meu pai.
Mas em hipótese alguma podemos deixar a dor consumir nossas vidas e
abandonar os filhos.

É neles que devemos encontrar forças para continuar seguindo em frente, e


por eles, não desistir da vida.

— Lorran, sempre que sentir dificuldade em se comunica com seus colegas


me avise, vou apresentar você a eles — pego sua mão e ficamos na frente da
turma — atenção, crianças, esse é o Lorran, ele é italiano e ainda não fala
português, sejam bonzinhos com ele e o ajudem a entender as coisas, a paciência
é fundamental. Posso contar com a ajuda de vocês para o Lorran ser bem
recebido?

— Sim, tia Olivia — respondem em uníssono, e sorrio para os meus


pequenos.

— Hoje vamos aprender as cores em português, e em italiano, para que o


Lorran possa entender, se tiverem dúvidas perguntem, certo?

— Cerlo — respondem, e sorrio para eles.

— Lorran pode sentar-se com seus colegas — aponto a todos que sentam
espalhados em cima do tatame no chão da sala — hoje vamos aprender o nome
das cores, vou ensinar em italiano e português, quero que você preste atenção, ou
se sentir dificuldade, me fale, desse jeito poderá aprender mais fácil a língua,
combinado? — falo em italiano com calma, sendo observada pelas pedras azuis
que ele tem nos olhos.

— Sì zia Vivia — senta ao lado da Suzana que sorri para ele, e Lorran faz o
mesmo.

Inicio a aula, e tudo corre bem, noto que algumas crianças se divertem
mais do que outras, aprendendo italiano, e ficam repetindo as palavras até
acertarem a pronúncia correta da cor no outro idioma.

Na hora do almoço os levo para o refeitório, e cada um faz sua refeição,


Lorran se adapta fácil aos meninos, mesmo não conseguindo falar no mesmo
idioma que os outros, eles fazem gestos para sinalizar o que querem dizer.

Após o almoço, os levo ao banheiro, primeiro as meninas, e os meninos


acompanhados de outro professor para o banho e escovar os dentes.

A hora da soneca é tranquila, meus anjinhos dormem nos colchonetes com


seus lençóis, e eu aproveito para corrigir a folha que eles me entregaram da
atividade de sinalização das cores.

Fico feliz ao ver que muitos escreveram em português e italiano, e que o


Lorran fez em ambos os idiomas. Trocaram muitas letras, e algumas palavras em
outro idioma, ficaram erradas. Fico feliz por meus alunos serem fofos e se
preocuparem com a inclusão do coleguinha, torço para que ele consiga se adaptar
bem.

A hora de ir embora chega, e um a um vou deixando os pequenos com seus


responsáveis até sobrar somente o Lorran, que brinca no caderno de desenho, não
parecendo preocupado com o pai não ter aparecido ainda.

— Lorran, seu pai sabe a hora de te buscar? — pergunto e ele dá de


ombros.
— O Levi?

É estranho que ele conheça o pai pelo nome.

— Vamos esperar mais um pouco.

E esse pouco se torna em mais uma hora, já são 19 horas e nem sinal do
Levi aparecer. Fico com o Lorran na sala da diretora, que preocupada tenta
contato com Levi e nada.

Vejo o menino que dorme no sofá, tentando encontrar uma solução, olho
na folha de contatos e o nome Vittileno se destaca e um pensamento me ocorre.

— Quais as chances de ele ser irmão do Louis Vittileno? — pergunto a


diretora, busco o celular no bolso e procuro o número da minha irmã.

— Altas — ela me encara com esperança de uma solução — você tem o


número da empresa? Podemos tentar contato.

— Minha irmã é secretária do Louis, vou ligar para ela.

Bianca atende no primeiro toque.

— Oi, maninha — tento disfarçar a preocupação no tom de voz.

— Estou ocupada — sussurra, odeio a incomodar, sabendo como seu chefe


é chato.

— Preciso da sua ajuda, você trabalha para o Louis Vittileno, né?

— Sim.

— Preciso que você avise a ele que estou com seu sobrinho, o pai não o
veio buscar, e nem o motorista, preciso saber onde é a casa dele para o deixar lá,
mas o Lorran não sabe, e na secretaria o pai deixou somente o número dele para
contato, ao qual não é atendido as ligações, e o endereço ele não soube dar, ficou
de o trazer depois, e não fez.

— Minha nossa, deve ser por isso que o Louis está uma fera. — Bianca
exclama, e quase posso a ver colocando a mão no peito preocupada.

— Imagino, pode passar para ele?

— Eu vou tentar, mas não se assuste com os gritos dele.

Tenho vontade de socar o Louis por fazer minha irmã ter medo, contudo,
no momento, preciso manter a calma e garantir que Lorran possa voltar para casa
em segurança.

— Fique com o Lorran aí, já mandei um carro buscá-lo, por favor, o


acompanhe até em casa, não gosto de deixá-lo sozinho nos veículos.

O homem é uma escavadeira me dando ordens sem nem dizer “oi”


primeiro. O sangue ferve pela sua grosseria, e o estresse causado pelo Levi faz
com que eu não consiga segurar a língua.

— Senhor Vittileno seja educado! Estou há mais de duas horas tentando


contatar uma pessoa que possa vir buscar o Lorran, e não fui mal-educada com
você! Guarde seus gritos para o irresponsável do Levi, e não para quem está
tentando resolver a situação.

O homem suspira do outro lado e fica mudo por breves segundos, estou
pronta para uma briga.

— Meu irmão não está bem, mas vou providenciar que isso não torne a
acontecer, obrigado.

Sou surpreendida por ele abaixar o tom e agradecido. Ao menos se tocou


que não sou seu saco de pancadas.
— De nada, levarei o Lorran quando o motorista chegar.

Ele desliga

— O que foi isso? — Dolores pergunta.

— O cara é um mal-educado, atendeu me dando ordens e gritando!

— Que irresponsável, tenho pena do Lorran, cercado de pessoas assim.


Você vai levar o menino?

— Sim, ele me pediu para o acompanhar até em casa, vou aproveitar e


pegar o endereço e contato do Louis, caso algo assim aconteça novamente.

— Onde será que o Levi se meteu?

— Não sei — pego o Lorran no colo e coloco a mochila nas minhas costas
— mas espero que o Louis grite muito com ele.

— Não se meta nessa briga, Olivia, você é a professora do Lorran, não


passe dos limites.

— Os limites já foram passados, até amanhã.

Saio da sala não querendo ouvir mais nada, fervendo de raiva pela
irresponsabilidade do Levi, e por ouvir gritos do Louis.

Esses dois italianos que se preparem, eles vão conhecer o quanto uma
brasileira pode ser esquentada quando mexem com uma criança indefesa!
Levi
Antes que o segurança possa me seguir, eu entro em uma lanchonete e vou
para o banheiro. O horário de pico facilita que ninguém me incomode. Tranco a
porta e me sento na privada, vejo as horas e decido que vou esperar meia hora
aqui dentro, ou até alguém precisar usar o banheiro.

O tempo passa lentamente, cada minuto parece uma hora, e quando


finalmente o relógio marca que se passou meia hora eu saio. Na lanchonete as
pessoas falam alto enquanto tomam seu café da manhã, os clientes não parecem
incomodados pelo barulho no local. Aquilo fere meus ouvidos e saio olhando ao
redor para ter certeza de que o segurança foi embora.

Não conheço muito da cidade de São Paulo, vim aqui poucas vezes para
desfiles dos meus modelos, durante o São Paulo Fashion Week.

O último ano em que participei, Blanca desfilou um modelo de grávida, era


perfeito, ajustando-se as curvas, a barriga protuberante, e os pés descalços pelo
inchaço. Foi o último desfile dela, iria parar a carreira para cuidar do Lorran, mas
a morte a levou antes disso.

Caminho sem rumo enquanto as ruas que deveriam ser claras pelo sol são
sombrias e frias. As pessoas andam pelas calçadas apressadas, esbarrando umas
nas outras, ou parando nas barraquinhas de comida, e entrando nas lojas ao longo
do calçadão.

Não sei por quando tempo perambulo sem rumo, dobrando as esquinas,
passando nas fachas de pedestre.

Vejo a escada para o metrô e entro, talvez lá dentro eu consiga encontrar


um rumo para ir. Sou obrigado a comprar um cartão de acesso, o faço, e entro na
cabine lotada de pessoas.

Como é possível estar rodeado por tantos corpos e sentir o frio gelando
minha alma, sozinho. O desespero para fazer besteira se implanta na minha
mente, após muitas estações, e o metrô vagar, eu desço em uma, no bairro Vila
Olímpia.

Tem bares por todas as partes, mesas sendo abertas do lado de fora,
ocupando parte da calçada. Fito o céu que ganha um tom alaranjado enquanto o
sol de põem, trazendo a todos como é o meu mundo.

Faz um mês que não bebo, geralmente o faço escondido do Louis, e hoje,
minha boca seca de vontade por uma gota de álcool.

Como um maldito viciado, eu caminho vidrado para o bar, o cérebro


apitando e exigindo pela substância, e o entorpecimento que ela me causa.

Entro no lugar e vou direto para uma mesa, perto do bar. Os garçons se
olham e me fitam, antes de um deles vir me atender com um sorriso no rosto.
Não tenho vontade de retribuir, pego o cardápio e vejo as opções de bebida, por
sorte entrei em um que tem uísque.

— Uma garrafa — falo em português, fingir que não falo o idioma não vai
servir nesse momento.

— Pagamento no dinheiro ou cartão?


— Cartão — pego a carteira e passo na maquineta.

— Volto em um instante.

Estar no Brasil me permite não me comunicar com as pessoas ao meu


redor, e ignorar tudo que elas falam, fingindo que não entendo o idioma.

Se querem a minha atenção, que falem em italiano. A professora do Lorran


invade minha mente, a mulher de nariz arrebitado que sabe falar italiano, e pensa
que eu não compreendi o que ela falou com a diretora.

Ela nem tentou esconder a vontade que teve de questionar quando a outra
disse que eu só falava italiano. E muito menos o quanto ver o Lorran a deixou
feliz. Por que eu não consigo sentir o mesmo pelo meu filho? Ela abriu os braços
com facilidade para ele, sorriu e o cumprimento.

Lorran se jogou nos braços dela com alegria, eles nunca tiveram contato
antes, e meu filho ansiou mais pelos braços de uma estranha do que os meus. Eu
sou um bosta que não deveria sentir inveja da desconhecida. Me corrói saber o
quanto eu não sou importante para o Lorran, queria o proteger da escuridão que
me cerca, me afastando e o mantendo a salvo, mas ao invés disso estou me
tornando invisível para meu filho.

— Aqui, senhor — o garçom coloca o uísque na minha mesa. — Gostaria


de algo para comer?

— Qualquer coisa — peço só para não pensar que estou aqui somente para
encher a cara.

— Volto logo.

Ele sai e pego o copo, enchendo-o com o líquido âmbar, a língua saliva de
vontade. Levo a bebida a boca com a mão tremendo pela ansiedade de me
embebedar, após um mês de abstinência. O uísque desce queimando pela
garganta, tomo a dose em um único gole, e bato o copo a mesa, apreciando o
ardor causado no corpo, finalmente o frio começa a ir embora.

— Era disso que eu precisava — falo sozinho em italiano. Percebo um


balde de gelo ao lado da garrafa e coloco dois cubos dentro do copo, derramo
novamente o líquido, antes mesmo que o uísque esfrie eu consumo o conteúdo.

Fecho os olhos, inclino o corpo para trás na cadeira e aproveito as


sensações que somente a bebida pode me trazer. A queimação, o calor, o gosto, e
finalmente, a sensação de que estou vivo.

Não demoro para tomar outra dose, seguida de mais uma.

— Aqui, senhor — o garçom coloca um prato na mesa — rodelas de


cebola empanada com molho especial acompanhando, vai querer mais alguma
coisa?

— Por enquanto não — consigo pronunciar sem problemas, apesar de ter


bebido cinco doses, ainda não me sinto bêbado.

Pago pelo prato, e ele vai embora.

As pessoas começam a chegar depois das dezenove horas, já comi metade


das cebolas empanadas e tomei metade da garrafa de uísque. A maldita
resistência ao álcool não me deixa ficar bêbado com somente essa quantia,
continuo virando um copo atrás do outro, observando ao meu redor.

Como essas pessoas conseguem ficar felizes, sair com outras e rirem sem
preocupação? Nunca, perderam alguém querido ou tiveram o seu mundo
desmoronando, elas não sabem o que é ter um filho, e ser incapaz de desenvolver
vínculos com ele, de ter medo de o machucar, e o fazer chorar, e mesmo assim
sofrer por perceber que não significam nada para eles.
Ninguém nesse lugar entende a minha dor, o quanto a alma em meu corpo
é queimada diariamente. Bebo sem moderação, algumas pessoas me olham torto,
inclusive os garçons, devem ter medo de que eu faça alguma merda ou incomode
os clientes, eu só quero ficar bebendo isolado em meu mundo.

Quando a garrafa termina peço outra, a cabeça nubla, e não sinto bem
meus dedos, quando pego o cartão e o aproximo da maquineta. O bipe da compra
aprovada, recolho o cartão e acho que o guardo na carteira, não tenho certeza.

— O senhor quer que eu chame um taxi? — ele pergunta, o encaro, vendo


dois dele, na minha frente.

— Não — a fala arrasta, a língua está dormente e difícil de movimentar.

Pego minha garrafa e torno a beber, mantendo a compostura de antes,


despejar o líquido âmbar no copo e depois o levar a boca.

Gotas deslizam pelo canto dos lábios e os limpo com um gesto brusco. A
cabeça pesa dez quilos a mais, com lentidão, deito o braço na mesa e apoio a
cabeça nele. Aos poucos o entorpecimento que eu buscava chega e tudo ao meu
redor para.

— Finalmente te encontrei! — alguém fala alto demais perto de mim.

— Você o conhece? — perguntam.

— Sim, é o meu patrão — responde e sinto o corpo ser sacolejado —


acorda Levi, te procurei feito um louco!

— Ham? — abro a pálpebra, não enxergando direito o que tem a minha


frente.

— Você conhece esse senhor? — o garçom me pergunta — ele bebeu


muito, mas não posso deixar que saia daqui sem ter certeza de que se conhecem.
— Isso é ridículo — respondem a ele — veja, eu sou o segurança dele —
acho que ele mostra algo ao outro — e agora, podemos ir?

— Sim, desculpe por isso, senhor.

— Não foi nada.

Não entendo o que acontece ao meu redor, só que sou amparado por braços
fortes. As pernas viram gelatinas, e com muito custo consigo me firmar em cima
delas.

Vejo a garrafa de uísque pela metade em cima da mesa e a pego, trazendo


para perto de mim.

— Vamos senhor Vittileno.

Quem me carrega?

Miro o rosto do homem, e ele me lembra vagamente o segurança de mais


cedo. Deve ser o que despistei, como ele conseguiu me achar? Não faço ideia,
estou cansado demais para pensar nisso agora.

Sou arrastado para fora do bar e colocado em um veículo. Apago


segurando firme a garrafa de uísque.

Acordo ao ser puxado novamente, dessa vez consigo ver que estou na
garagem do prédio em que moro. O caminho para o apartamento é feito entre
clarões e apagões da minha mente entorpecida. Passamos pela porta, e o raio de
sol que vi mais cedo me encara do sofá com as mãos na cintura.

— Onde diabos você se meteu? — ela sussurra em italiano.

Rio de sua cara de raiva, ela até que fica fofinha com as bochechas
vermelhas, fumaça rodeia sua cabeça, acho que vai explodir a qualquer segundo
se continuar irritada desse jeito.
— Vo........cê vai explorrrrrrrrdir — respondo embolado e cambaleio em
sua direção, é bom poder falar em italiano sem me preocupar se vão me entender
ou não.

— Quem vai explodir é você, seu bêbado irresponsável! Como pode


esquecer o Lorran na creche? — ela para perto de mim e luto para não cair. O
segurança continua me segurando.

— Ele não pleciza de mim — mastigo a saliva, a sede me atacando


repentinamente.

— Ele é seu filho! — Ela se exalta em um quase grito e fecho as pálpebras


sentindo a cabeça explodir.

— Vá se foder — digo, não tenho motivos para aturar essa merda de uma
estranha — sua piranha — aponto o dedo na sua cara.

Ela bate na minha mão, não sinto nada pelo seu toque brusco e rio da sua
cara. Que mulher fraquinha.

— Fracoteeeeeeeeeeeee — cantarolo.

— Como você ousa? O Lorran ficou por horas te esperando.

— E daí? Ele tinha você! — falo alto.

— Não grita ou o Lorran vai acordar — pede fazendo gestos com as mãos.

— NÃO PROVLOQUE — Grito.

— Levi? — uma vozinha fina chama e o vejo na porta da sala.

— Não me veja assim.

Estou bêbado, falando merda, e ver os olhinhos inocentes do Lorran me


encarando decepcionados.
Eu esqueci dele, sou um bosta!

— Me perdoa Lorran.

Peço, me solto do segurança e tento chegar perto do meu filho, ele corre
para os braços da professora, e isso era a estaca que faltava ser enfiada no meu
coração. O que eu esperava que ele fizesse? Eu não mereço esse garoto, nunca
tive o direito de me considerar um pai.

Cambaleio com a garrafa de uísque para o quarto, bato a porta atrás de


mim, e bebo o líquido até apagar jogado na cama.

Quero poder nunca mais acordar.


Olivia
— Tia Vivia — Lorran coça os olhos vermelhos, os lábios tremem na
iminência do choro.

— Não chora fofinho — o pego nos braços e balanço de um lado ao outro


— não fica chateado, não foi nada de mais — uso um tom de voz macio para o
acalmar.

— Levi bligo cum ocê — funga, tentando controlar o choro.

— Não foi uma briga — me sento no sofá com ele no meu colo — seu pai
não está bem, discutimos porque ele não foi te buscar na escola. O Levi sente
muito por agir errado.

Não tenho certeza se ele realmente se arrepende.

Quando chegou, estava bêbado e devastado, mas quando viu o Lorran foi
como se algo dentro daquele homem fosse atingido por um raio, e o choque o
fizesse ver pela primeira vez a realidade toxica em que ele obriga a criança a
viver.

Lorran não merecia crescer com um pai como esse por perto, a falta da
mãe já é motivo o suficiente para a criança crescer traumatiza, insegura, e
sentindo que falta um pedaço do ser dela em todos os instantes do seu
desenvolvimento.

Foi assim durante a minha vida, cresci sem uma mãe presente, e com um
pai afundado em depressão.

Não vou permitir que o Lorran saiba a dor que a falta dos pais causa. Nem
que eu tenha de abrir a cabeça do Levi ao meio para o fazer compreender o mal
que está fazendo ao Lorran e que ainda dá tempo de remediar a situação se ele se
esforçar.

Ele vai ser um pai para esse menino.

Estou sendo intrometida, atrevida, e passando de todos os limites, mas uma


criança pede socorro pelo choro. Eu não vou ignorar a dor do Lorran, não serei
omissa nesse abandono parental.

— Ele tá dodói? — pergunta com os olhos inocente e o choro contido.

— Sim, bem aqui — toco no coração do Lorran — a gente não consegue


ver, mas dói dentro dele, vamos fazer o papai melhorar? — Lorran sorri para
mim, e beijo suas bochechas.

Eu não deveria me intrometer, mas quem pediu a minha ajuda foi esse
pequeno anjo, e não posso ignorar a ligação que se formou entre nós nesses
poucos dias.

— Num é papai, é o Levi — estende o ursinho para mim — blinca


comigo?

Ele nem o considera como um pai, o quanto a relação deles dois foi
quebrada?

— Sim.
Lorran desce do meu colo e pega uma máscara de dinossauro, me entrega e
depois corre pela sala. Visto a máscara e o persigo fazendo sons de dinossauro
enquanto ele grita feliz.

Antes que eu possa o parar, Lorran corre pelo apartamento, entra no


corredor e some por uma porta, vou atrás e estanco quando vejo o Levi deitado
na cama com uma garrafa de uísque derramando no chão.

Lorran ignora a garrafa como se aquilo fosse normal e sobe em cima da


cama, ele se equilibra subindo nas costas do pai, e começa a pular e rir
escandalosamente. Levi abre os olhos e encara o menino em cima dele, me
apresso para pegar o Lorran, paraliso no lugar.

Levi se vira derrubando o Lorran na cama, que começa a rir mais alto
quando o pai faz cócegas em sua barriga simulando mordidas na pele. Não tenho
certeza se ele entende o que faz com o filho, mas observo o momento com um nó
na garganta.

Talvez ele não tenha desistido do Lorran, só não sabe como ser um pai para
o pequeno.

— O que faz aqui pequeno ouro? — Levi pergunta com a voz arrastada e a
língua presa.

— Blincar — Lorran estende os bracinhos querendo mais das cócegas.


Levi continua encarando o filho com uma dor profunda, capaz de ser sentida de
onde estou, ao pé da cama.

— Cuida dele para mim? — Para a minha surpresa, Levi fala em


português, ele me encara com lágrimas grossas escorrendo pelas bochechas —
não deixa a escuridão tirar o brilho dele — desliza a mão pela cabeça do filho e
beija seus cabelos. A cabeça pende para o lado e percebo que ele dorme.
— Levi? — Lorran chama e cutuca a bochecha do pai — mimiu.

— Vem Lorran, vamos brincar na sala — me recupero do impacto que foi


esse momento, e pego o Lorran no colo, o levando para a sala, e correndo atrás
dele.

A porta do apartamento é aberta, e um homem muito lindo de cabelos


louros e olhos azuis cristalino entra. O terno amarrotado e a expressão
preocupada. Quando ele ve Lorran brincando comigo, relaxa os ombros, o
baixinho ao ver o tio se joga em seus braços, e a fúria me enche novamente.

Esse desgraçado que atormenta a minha irmã no emprego e não cuida


direito do irmão depressivo e do sobrinho.

— Zio!!! Alvo do dinussuro [6]


— Lorran comemora que não consigo o
pegar, e admitindo a derrota, eu me jogo no chão.

— Sei un piccolo molto intelligente [7]— Sorrio para o neném e ele se joga
em meus braços novamente.

— Vuoi di più [8]— pula, e preciso tomar cuidado para que não caia.

— Vai a giocare un po ', ho bisogno di parlare con tuo zio [9]— o coloco no
chão, e o Lorran vai para os brinquedos. Aperto os punhos quando me viro para o
Louis, a vontade de falar mais do que posso na frente do Lorran.

— Eu sinto muito, o Levi deveria ter ido buscá-lo, não sei o que aconteceu.
— Tenta se explicar, como não sabe o que aconteceu? Deixou uma criança na
responsabilidade de um incapaz! É o que tenho vontade de gritar, mas por
respeito ao desenvolvimento do Lorran eu me contenho.

— Seu irmão chegou recentemente fedendo a cachaça. — Me limito a


dizer, não vou aliviar a barra do Levi.
— Eu vou cuidar disso, obrigado por trazer o Lorran para casa. — Se
limita a dizer.

— Que isso não se repita — aponto o dedo na cara dele, querendo fazer
muito mais — amanhã, se ele for esquecido de novo, vou ligar para o conselho
tutelar e fazer uma denúncia contra o seu irmão e você, por abandono parental.

— Já disse que isso não irá se repetir — vejo como ele se controla para não
gritar comigo, a forma, como aperta os punhos, e os lábios são prensados em
uma linha de tensão.

— Assim espero, e contrate uma babá que fale italiano, o Lorran se sente
sozinho quando você não está.

— Não é tão fácil conseguir alguém de última hora, fluente em italiano —


ele suspira, de certa querendo me convencer a amansar.

— Eu falo italiano muito bem e cuido dos meus alunos em horário de aula.
Eu e você devemos ter uma conversa séria sobre o Levi ser o responsável do
Lorran, mas considerando que o dia já foi bastante estressante eu vou embora.

— Você é muito atrevida — fala com os dentes cerrados.

— Você não viu nada — pego minha bolsa, quase deixando escapar que
não sou tão passiva quanto a minha irmã. — Anota o número do seu celular, caso
eu precise te ligar novamente — estendo o celular para ele que o pega, e faz o
que pedi.

— Boa noite professora Olivia — fala pausado, arrebito o nariz para ele.

— Boa noite, Louis.

Vou até o Lorran e me despeço do pequeno com um beijo na bochecha.


Saio e chamo um táxi para meu apartamento. O caminho inteiro penso o
quanto o Lorran precisa de uma figura paterna de verdade, por mais que o tio
esteja lá por ele, não é o pai, e o menino não parece reconhecer ninguém como
tal.

Em casa, organizo umas coisas do trabalho antes de ligar para a minha


irmã.

— Bianca, vamos sair — peço antes que ela possa dizer “oi” — topa um
espetinho?

— Tô cansada, Olivia — a voz rouca não me engana, ela estava chorando.

— O que o babaca do seu chefe fez? — levanto do sofá e calço minha


sapatilha — chego aí em dois minutos, vá se arrumar, vamos beber e falar mal
desses italianos!

Não espero ela responder, sei que vai recusar. Desligo a ligação e me visto
rápido, chamo um táxi, e muitos minutos depois desço em frente à casa do meu
pai. Um aperto comprime meu peito ao ver a casa em que cresci, desde que fui
embora, sinto muitas saudades de falar com minha irmã todos os dias, e até das
brigas com o meu pai.

— Vamos — chamo do portão.

Procuro pela chave na bolsa e percebo que acabei esquecendo em casa.

— Não me diga que perdeu sua chave — ouço uma voz grossa atrás de
mim, viro e vejo meu pai com seu uniforme de segurança dentro do carro que usa
para trabalhar.

— Não dessa vez — me afasto para que o portão seja aberto


automaticamente — só esqueci em casa.
— Não esquece a cabeça porque não pode a remover — debocha antes de
entrar, aproveito e faço o mesmo.

— Sai apressada — passo por ele e vou atrás da minha irmã. — Vamos
Bianca!

— Sua irmã trabalha cedo, não a leve para beber a essa hora! — lá vem as
reclamações.

— São nove horas, vamos jantar — finjo não me importar com sua
alfinetada. Ele é sempre assim, acusa antes de perguntar.

— Não demorem.

— Eu não tenho mais 15 anos, pai — o encaro, cansada de como me trata


— não sou mais uma criança para você controlar meu horário de saída e chegada.

— Como se algum dia você tivesse me deixado fazer isso. — O escarnio


em sua voz me faz revirar os olhos, eu deveria ter esperado a Bianca na
churrascaria.

— Não comecem — Bianca pede — vou sair para jantar com a minha
irmã, sei das minhas responsabilidades, pai — beija a bochecha dele e o homem
derrete. Bianca é sempre assim, nunca o enfrenta.

— Traga um espeto de bacon com alho para mim — pede a ela, que
concorda.

Saio com a Bianca e vamos em silêncio até a churrascaria, nos sentamos


em uma mesa no lado de dentro e pedimos uma cerveja e algo para comer.

— Eu odeio aquele italiano — falamos em uníssono e rimos.

— Primeiro você — digo a ela — o que o babaca fez?


— Ele acha que fingi que era virgem! — As bochechas dela ficam
vermelhas, apesar da raiva ela fala baixinho para as pessoas não ouvirem.

— Tem como fingir isso? — pergunto e bebo a cerveja geladinha.

— Na cabeça daquele idiota, sim! — Bebe o copo de uma vez e pede outro
ao garçom.

— Vai com calma ou a ressaca vem forte.

— Eu tô tão frustrada — se encolhe na mesa — ele tinha sido perfeito


enquanto a gente… você sabe — fica vermelha e acho graça — e depois fez
aquela merda toda, não consigo entender.

— Deve ser de família, o irmão tem uma relação tão ruim com o filho que
o Lorran nem o chama de pai.

— Isso é pesado, eu soube que ele tem depressão desde que a mãe do
Lorran morreu, logo que ele nasceu.

— Uma merda — bebo o resto da cerveja e peço outra — você deveria ver
o menino, é muito carismático e apaixonante — suspiro.

— Não se envolva demais Olivia — Bianca segura minha mão — sei que
você quer ser mãe e pode acabar se apegando demais ao Lorran.

— Eu sei.

Não conto a Bianca que eu já me envolvi emocionalmente com o pequeno,


e quero a cabeça do pai dele em uma estaca.

Pelo resto da noite, bebemos e falamos mal dos irmãos italianos que estão
tirando a nossa paz.
Levi
Acordo com uma puta ressaca, a cabeça partida em duas. As janelas do
quarto são abertas, e a claridade me cega. Uma figura alta se projeta na minha
frente. Pisco tentando entender quem é.

— Hoje você vai tomar um rumo na sua vida! — A voz grossa, raivosa. Só
pode ser o Louis.

Deito-me para o outro lado e cubro a cabeça com as cobertas, sem


paciência para os gritos dele.

— Nada disso, Levi, já deixei essa situação ir longe demais — as cobertas


são puxadas e me levanto com raiva.

— Que porra Louis, me deixa! — Grito.

Louis espuma de raiva, eu vejo seu braço subindo, a mão fechando, e o


punho vindo na minha direção. Não esforço para desviar do soco no estômago,
perco o ar e caio de joelhos tentado recuperar o folego.

Ele segura meus ombros e me põem contra a parede, o rosto a centímetros


do meu.
— Isso foi por esquecer o Lorran — rosna enfurecido — de todas as
merdas que você já fez essa foi a pior Levi, enquanto você só se machucava eu
fechava os olhos e acreditava que você ainda teria uma salvação, que iria
conseguir sair da merda desse buraco, mas agora acabou!

Semicerro os olhos, o que ele quer dizer com isso?

— Vai deixar eu me matar? — pergunto e recebo um tapa na cara como


resposta.

— Nunca mais fale essa merda, a partir de hoje você vai voltar a viver.

— Não seja ridículo, Louis, sabemos que já estou morto por dentro há
muito tempo. Você que não me deixa partir.

— Você vai ter uma rotina agora, todos os dias — ele me ignora — vamos
malhar juntos, depois vai levar o Levi para a creche enquanto eu trabalho, e você
vai para a terapia. Já achei um terapeuta brasileiro que vai falar em italiano com
você já que se recusa a usar o português.

— Vai ser a mesma merda de sempre. — Desvio a atenção dele, odiando


esse plano.

— Quando sair da terapia, você vai se ocupar com qualquer merda que
seja, nem que eu tenha de te fazer ficar ao meu lado no trabalho. Depois vai
buscar o Lorran na creche, e aí vai ter um tempo com o seu filho.

— Não pode me obrigar — soo birrento.

— E você não vai continuar vivendo na escuridão. Nunca mais esqueça o


Lorran na creche, ou eu juro que te jogo em um hospital psiquiátrico.

— Zio? — Lorran aparece na porta, vestido o uniforme da creche e com a


pelúcia de gato debaixo do braço.
— Você — Louis sussurra para que somente eu ouça — nunca o ensinou a
te chamar de pai, acha mesmo que pode continuar nessa situação para sempre?
Se não pode fazer isso por você ou por mim. Faça pelo Lorran, ele merece a
chance de ter um pai.

As palavras do Louis machucam mais do que o soco e o tapa que ele me


deu.

Lorran aprendeu a falar “zio” e “nonno”, porque ele foi ensinado pelo meu
irmão e pai, a os chamar dessa forma. Eu nunca passei tempo o suficiente com
meu filho enquanto ele cresce para o ensinar a me chamar de “papà”. Ele escuta a
todos me chamando de Levi, e imitou, nem meu nome eu fui capaz de o ensinar.

Os filhos só descobrem os nomes dos pais depois que crescem e escutam


outras pessoas chamando, e percebem que “pai” e “mãe” não é exclusivo deles e
de seus pais. Que toda uma sociedade denomina assim aqueles que se dedicam a
criação de um filho.

Eu tirei do Lorran o choque de perceber qual era o meu verdadeiro nome, e


nunca o ensinei a ver uma foto da mãe e a chamar de “mamma”.

— Eu vou tentar — digo baixinho — promete não me largar?

Não sei de onde vem a dor que me assola ao imaginar meu irmão
desistindo de mim. Não posso perder a única pessoa que luta por mim quando eu
sou incapaz de fazer isso.

— Nunca te deixaria — Louis me abraça, e sinto as lágrimas molhando a


pele do meu ombro desnudo.

— Quelo — Lorran corre e se joga no meio de nós dois.

— Prometo tentar Lorran — beijo sua cabeça com cuidado para não o
machucar. Ele parece tão delicado, e poderia quebrar a qualquer momento pelo
meu toque.

— O qule? — me olha com as irises azuis, cheio de curiosidade. Como ele


pode não me odiar quando sou tão nocivo?

— Ser um pai para você — aliso sua bochecha e ele franze a testa, não
entendendo o que quero dizer.

Lorran sabe o que é ter um tio, um avô.

O farei descobrir como é ter um pai ao seu lado. Vai ser um caminho longo
e doloroso, como tem sido diariamente, mas eu vou tentar.

Eu finalmente percebi o resultado do meu afastamento, e o quanto isso


machuca, a única pessoa que não tem culpa de nada da situação em que vivo, e a
única que realmente vai sofrer como eu sofro quando perceber a falta que uma
mãe faz.

Eu nunca parei para pensar o quanto poderia prejudicar o Lorran no futuro,


quando ele sentir a falta de uma mãe, se é que já não sente. Que ter um pai
ausente e de bosta como eu só iria causar mais sofrimento ao meu filho.

A Blanca morreu.

Eu continuo aqui.

Vou fazer o Lorran e a mim, constantemente lembrar que:

Eu. Ainda. Estou. Vivo.

— Levi tá englaclado.

Acho graça de como ele fica fofinho embolando as palavras e trocando o


“r” pelo “l”. Reflito pensando se alguma vez eu percebi o Lorran falando dessa
forma e o achei fofo, não consigo lembrar se já aconteceu.
Encaro o meu filho analisando seu rostinho redondo, com as bochechas
proeminentes, os cabelos louros brilhando a luz do sol, e o corpinho pequeno
jogado em cima do meu.

A maioria das vezes em que prestava atenção no Lorran era quando


brigávamos por besteiras, ou quando a escuridão o envolvia.

Hoje eu vejo o meu filho por quem ele realmente é.

Uma criança inocente que precisa de um pai em sua vida... uma criança,
que perdeu a mãe no momento de seu nascimento... uma criança com dois anos,
em que todos os seus aniversários, eu passava bêbado, chorando a perda da
minha esposa.

Uma criança que nunca foi abraçada por mim.

As mãos tremem quando levanto ao redor de seu corpo e o envolvo com


medo de o machucar. Lorran percebe o que faço e deita a cabeça em meu ombro,
sorrindo para mim. As lágrimas deslizam pelas minhas bochechas pingando na
dele.

Como pude perder tanto tempo? Como fui capaz de o abandonar?

— Me perdoa? — peço.

— Polque?

— Por não ser presente.

Ele franze a sobrancelha sem entender, e antes de o traumatizar, deixo a luz


envolver seu corpo quando beijo novamente sua cabeça. Inspiro seu cheiro de
neném. Lorran fica inquieto e sai do meu abraço, Louis chora enquanto observa o
sobrinho deixar o quarto.

— Vamos irmão?
— Sim — aceno em positivo.

Vou para o banho e não me olho no espelho, imagino que devo parecer um
zumbi. Tomo banho, e pela primeira vez, penteio os cabelos sem ser obrigado
pelo Louis ou meu pai.

Os fios doem quando passo o pente entre eles, emaranhado e ressecados.


Coço a barba, e os pelos me incomodam, sem encarar o espelho, pego o
barbeador elétrico e o passo na pele. Os fios louros caindo na pia.

Faz anos que não tenho vontade de limpar o corpo e arrumar os cabelos.

Acho que finalmente aceitar a dor que causei no meu filho, e que devo
buscar ajuda e melhorar, foram um estopim para poder começar a cuidar de mim
mesmo.

Tomo café com meu irmão e filho, Lorran brinca com a comida, e não sei
como o fazer comer sem ficar todo sujo. Observo enquanto o Louis passa o
babador no pescoço dele, e com uma mão, leva a comida a boca do Lorran e a
outra a sua própria. Eu nunca fiz isso e não sei se conseguiria agora.

— Precisamos de uma babá que possa se comunicar com o Lorran —


Louis diz.

— Traga uma da Itália.

— Já tentei, mas não consegui nenhuma — suspira — até quando vai ficar
fingindo que não fala português?

— Eu não falo português — desvio o olhar dele.

— Eu sei que você é fluente, lembre-se que fui eu quem te ensinou. Não
consigo entender o motivo dessa birra com o idioma.
— Você me arrastou da Itália para cá — a irritação ferve no meu sangue —
não espere que eu seja totalmente receptivo — jogo o guardanapo na mesa, sem
paciência para continuar aqui — vamos Lorran, hora da creche.

— Levi não saia assim — Louis pede e o ignoro.

Pego o menino e vamos para o carro. Lorran fica assistindo desenhos em


seu Ipad enquanto eu encaro a janela, o dia começa a ficar nublado, e não sei se é
resultado da minha depressão ou se o tempo mudou.

A discursão idiota com o Louis azedou meu bom humor repentino,


mandando embora minha vontade de seguir em frente.

Quero as cobertas e me esconder do mundo.

— Levi — Lorran me chama, percebo que paramos em frente a creche. —


vlamos?

Ele precisa de mim.

Mordo a bochecha e seguro sua mão. Um momento de briga com o Louis e


eu quis desistir de tudo. Se eu retroceder agora perderei a chance de o Lorran ser
feliz, e crescer sabendo o que é ter um pai. Engulo em seco e vou com ele até a
porta da sala de aula. A professora de ontem me olha com raiva e sorri para o
meu menino.

— Lorran como você está lindo! — O menino fica todo risinho, com as
bochechas vermelhas enquanto corre para os braços dela — dormiu bem?

— Sì — acena e a abraça.

Eu tenho de seguir em frente para que meu filho seja capaz de me abraçar e
beijar com a mesma felicidade que ele fez pela professora.
— Desculpe por ontem — peço a ela que me olha atenta — eu não tenho
como justificar meu comportamento, mas o incidente me fez perceber o que
estou fazendo de errado — encaro o Lorran — vou tentar melhorar, mas
enquanto isso não acontece, me ajuda a cuidar dele?

— O que você está pedindo? — pergunta desconfiada.

— Só continue sendo boa para ele — seguro a mão do Lorran — até mais
tarde, hoje eu te busco no horário.

— Celto.

Lorran desce do colo da professora e corre para a sala de aula, vejo quando
ele cumprimenta os amigos com sorriso, e é bem recebido por eles.

— Ele é um garoto maravilhoso — a professora fala — não o magoe mais.

— Não vou.

Não sei se prometo isso a ela ou a mim, mas vou fazer o possível para
cumprir com a minha palavra.

Saio da creche decidido a procurar por um psicólogo, não consigo sair


desse poço sozinho. Prova, é a vontade de beber rondando minha cabeça, e a
necessidade pelos remédios que me trazem o esquecimento.

Pelo Lorran eu vou tentar uma última vez, com mais afinco do que em
todas as outras.

Ele merece a chance de ter um pai.


Levi
Encaro a mensagem no celular com o endereço do psicólogo que o Louis
marcou consulta para mim. Dentro do carro, de frente para o prédio, eu fico
hesitante quanto a entrar. Já tentei outras vezes e nunca deu certo, por que agora
seria diferente?

Você tem o Lorran e quer melhorar por ele.

Uma voz sussurra ao meu ouvido, busco por outra pessoa dentro do carro,
e só vejo o segurança que mantem o olho no lado de fora. Acho que estou
realmente enlouquecendo, passei a ouvir coisas.

A voz tem razão, das outras vezes eu não queria melhorar, ainda me sinto
no fundo do poço, rondado por escuridão. Tenho de ser forte e sair desse carro,
falar com o psicólogo, e buscar pela melhora, é a vida do Lorran que está em
jogo, não somente a minha.

Meu celular toca e vejo o nome da minha irmã, faz tempo que não nos
falamos.

— Oi — atendo.
— Senti que você precisava de mim — Lira tem a voz doce e chorosa —
Louis me contou que vocês estão no Brasil e imaginei o quanto deve ser difícil
para você se adaptar.

— Uma merda — sussurro, o bolo na garganta ao lembrar a última vez que


falei com a Lira, e como a machuquei com as palavras — me desculpa? Eu fui...
horrível com você.

— Tem razão, um completo idiota — soluça — me leve para jantar quando


eu chegar aí, e vamos passar uma tinta por cima de tudo, estou com saudades
Levi.

— Passar tinta não é a solução Lira — suspiro — eu vou me consultar com


um psicólogo agora, preciso tentar sair desse poço, o Lorran... ele precisa de um
pai.

— Ah, meu irmão — ela soluça — você não faz ideia do quanto me deixa
feliz saber que finalmente quer procurar tratamento. Eu estava errada da outra
vez, não podia ter te forçado, aquilo só te machucou.

— Você nunca fez nada errado, não se culpe Lira.

— O que te fez mudar de ideia?

— Perceber que estou sendo um trauma na vida do Lorran — dói aceitar a


verdade, rasga meu peito mil pedaços — se eu não me cuidar, é ele quem vai
precisar de terapia no futuro.

Lira chora do outro lado e fica difícil entender o que ela fala entre os
soluços. Usando minha irmã de força, eu saio do carro e entro no prédio, com ela
na linha, como se estivesse segurando a minha mão. Pego o elevador até o quinto
andar, quando as portas se abrem, a Lira para de chorar e funga.

— Você vai ser um ótimo pai.


— Não, eu vou ser um pai, só isso já basta.

Na recepção tem outras duas pessoas sentadas no sofá, esperando, e uma


moça atrás de uma mesa. Ela me encara e indica que posso me sentar na cadeira
de frente a ela.

— Preciso ir — digo a Lira.

— Me liga quando terminar?

— Certo.

Desligo e faço a minha ficha com a atendente, menos de meia hora depois
sou chamado na sala do psicólogo.

O homem é mais jovem do que eu esperava, deve estar na casa dos seus
trinta anos. Sentado na poltrona, ele aponta o sofá para que eu me acomode.

A sala é desnecessariamente iluminada, e isso incomoda a minha vista.

— Muito claro para você? — ele pergunta.

— Demais — sento-me no sofá e fecho os olhos.

— Vou ajustar a iluminação.

Aos poucos o ambiente vai ficando mais na penumbra, e agradeço por isso.
A sensação de ser observado como uma presa prestes a ser abatida ameniza,
sempre me senti assim com os outros psicólogos, como se eles estivessem me
julgando em vez de ajudando.

— Eu sou o Yuri Silva, você é o Levi Vittileno, certo?

— Sim, prazer — passo a mão no rosto, começando a ficar sufocado.


— Fique à vontade, quando você quiser começar... iniciamos, temos uma
hora para conversar.

— Não vai me encher de perguntas? — me levanto e ando de um lado ao


outro.

— Você quer que eu faça isso? — a penumbra impede que eu veja seus
olhos, mas sei que a cabeça dele está abaixada, não me analisa enquanto ando
feito um louco.

— Não, odeio isso.

— Eu também — fico surpreso, paro e o encaro — os pacientes vêm aqui


porque precisam de ajuda, os interrogar com perguntas só vai parecer que sou um
policial atrás de um criminoso.

Ele pausa e me sento, prestando mais atenção nele. Dessa vez o homem
inclina o rosto para cima e me encara, não que eu consiga ver muito de sua
expressão.

— Você quer ajuda com a dor que as outras pessoas não podem ver o
ferimento, e não vou cutucar a ferida. Esse é um espaço seguro Levi, só
falaremos do que você estiver pronto, e sem cobranças, cada pessoa tem o seu
ritmo, aos poucos... descobriremos o seu.

Fico quieto, suas palavras me deixam mais confortável. Aos poucos, o


frenesi que me atacou quando entrei aqui, dá espaço a uma estranha calmaria, e a
penumbra deixa de ser reconfortante e se torna opressora.

Eu vivo na escuridão há tanto tempo, que busquei por ela no primeiro


segundo de desconforto.

— Pode acender mais as luzes?


— Claro.

A iluminação retorna, mais fraca do que antes e mais agradável.

— Eu tenho um filho — digo após uns minutos em silêncio — ele nunca


me chamou de pai, e eu achava que era porque ele me odiava, por eu ser ausente
— a garganta trava e inspiro e expiro fundo três vezes — mas ontem, eu percebi
que nunca o ensinei a me chamar de pai.

Espero pelas perguntas, mas ele não faz nenhuma. Respeita o meu tempo
de descanso entre uma fala e outra.

— Eu não posso continuar magoando o Lorran ou vou jogá-lo em um poço


fundo igual ao meu, e não quero isso para ele. Por isso estou aqui, para ser
melhor pelo Lorran, não por mim.

— Buscar a cura pelo Lorran é uma mostra de que você também quer se
curar Levi, e encontrou no seu filho, a força para buscar ajuda.

— Eu só não quero continuar magoando-o.

Limpo as lágrimas que escorrem, e suspiro me sentindo exausto depois de


poucos segundos de conversa.

— Quando você se machucou?

— A Blanca morreu e eu fiquei sozinho, sem o amor da minha vida —


inclino para trás deitando a cabeça no encosto do sofá. — Nunca senti vontade de
falar sobre isso antes.

— Quando você busca para si a melhora, é como abrir uma porta que
esteve fechada durante anos em um segundo, nada passa por ela, no outro, tudo
transborda, arrombando as dobradiças e exigindo que sejam vistas.
— Boa forma de pensar — pondero em silêncio por mais tempo — sou
viciado em álcool e remédios.

— Com que frequência faz uso deles?

— Os remédios todos os dias, os psiquiatras passaram para tratar a


depressão, e os uso para esquecer. Álcool quando consigo beber escondido do
meu irmão.

— Ele te impede?

— Sim, ontem bebi feito um louco, esqueci o Lorran na creche, e em casa


levei esporro da professora dele. A mulher exala luz com o sorriso dela, não faz
ideia de como é sofrer com uma dor como a minha, como ela pode ter me
julgado?

— Veja a situação por outro ângulo, você esqueceu seu filho, e ela ficou
preocupada. Talvez ela não tenha te julgado, mas como professora, percebeu o
risco em que a criança foi exposta, e quis evitar que acontecesse novamente.

— Como sabe disso? — levanto a cabeça o encarando — conhece a


professorinha por acaso?

— Não, mas posso analisar a situação por fora, entendendo a posição de


uma pedagoga, e a sua.

— Eu sumi para beber — admito — nem pensei duas vezes antes de fazer
isso com o Lorran, eu sou um merda — escondo o rosto nas mãos.

— Temos muitas coisas para falar, ao que posso perceber. Quer começar
por uma, e depois vamos a outras? Separar as dores, e ir tratando os machucados
por vez pode ajudar de maneira mais eficaz.
— Pode ser — deito-me no sofá, me sentindo cansado — não sei por onde
começar.

— Qual a que te incomoda mais agora?

— Ter esquecido do Lorran por ter ido beber. Eu queria sumir, fazer a dor
passar, e fugi sem que percebessem, não me importei com ninguém além de mim.

— Vamos falar sobre o seu vício na bebida.

— Ela me leva ao esquecimento, não tem muito o que falar.

— Os vícios são nocivos por trazerem sensações momentâneas que


apaziguam a dor. A bebida te faz esquecer enquanto você a consome, mas
quando o efeito passa, as coisas continuam iguais, e você não sabe como
melhorar, como contornar a situação, a ansiedade ataca, o mundo parece sem
sentido, e a pressão que você sente para aliviar a dor te faz buscar aquilo que te
dá a falsa sensação de prazer, de que tudo vai ficar bem. É um círculo vicioso que
podemos reverter, se você estiver disposto.

— Tudo bem se eu cair?

— Vai ficar tudo bem se você se levantar, não é vergonhoso, ou sinal de


fraqueza cair. O importante é reunir forças para se levantar.

— Eu me sinto no fundo do poço, rodeado pela escuridão que obscurece os


meus dias.

— Você deu o primeiro passo na sua escalada, continue assim, um dia de


cada vez e quando perceber, os momentos de dor serão somente lembranças, e a
felicidade poderá vir sem a busca pelos vícios.

— Como faço para evitar a vontade de beber e usar os remédios?


— Seus medicamentos devem ser revistos pelo psiquiatra, marque uma
consulta quando sair daqui, temos ótimos profissionais nesse prédio. Ele vai te
ajudar com a medicação certa e com seu diagnóstico, como psicólogo, não posso
fazer isso. Quanto ao vício em bebida, precisamos achar catalisadores, coisas que
possam te distrair quando tiver vontade de beber, e te ajudar a se controlar.

— Meu irmão me prende em casa, sem me deixar sair.

— Não é uma boa opção, isso aumenta a compulsão para fazer o que não
te permitem. Você pode usar um elástico, sempre que sentir o desejo pelo álcool
estrale o elástico no seu pulso, o ardor na pele vai te ajudar a enfrentar a
compulsão.

— Não sei se um simples elástico pode ajudar — suspiro — é forte


demais.

— Você disse que quer melhorar pelo seu filho, tente passar um tempo
com ele, nem que seja somente o olhando, ou brincando, conversando,
passeando. Você acha que conseguiria evitar beber na frente dele?

— Sim, não o deixo me ver alcoolizado.

— Você se preocupa com o Lorran, isso é bom Levi.

— Sou um bosta, se me preocupasse o bastante não seria um pai de merda.

— Muitos pais expõem os filhos as drogas e as bebidas, você toma cuidado


para não o expor. Está aqui procurando ajuda, é um começo.

— Vou tentar. Me sinto cansado, posso ir embora?

— Faltam 10 minutos para a sessão acabar. Quero te ver três vezes por
semana. Agende as consultas do mês inteiro quando sair daqui, e te vejo na
próxima.
— Obrigado... — me levanto — por não me fazer sentir desconfortável.

— Aqui é o seu lugar seguro.

Assinto e vou embora. Marco as consultas durante o mês, e uma com um


novo psiquiatra, saio de lá com um pouco mais de confiança de que posso seguir
em frente do que quando entrei.

O Lorran merece que eu tente por ele, não me sinto bem, pelo contrário a
escuridão ainda caminha ao meu redor as quatro da tarde, quando vou buscá-lo
na creche. Mas nunca mais a deixarei me vencer sem lutar, ontem foi a última
vez que me entreguei.
Olivia
— Hora da filinha para esperar os pais — digo, e todos correm para a
parede ao lado da porta e ficam alinhados esperando serem chamados.

Abro a porta e fico surpresa ao ver o homem louro parado do outro lado.
Ele está diferente de ontem, os cabelos arrumados, a barba feita, e usando um
perfume forte.

As roupas arrumadas, e as mãos na frente do corpo cutucando as unhas.


Ele me encara e a imensidão de seus olhos azuis me deixa um pouco mexida, um
mar revolto repleto de tristeza.

— Boa tarde — ele diz em italiano.

— Eu sei que você fala português — queria ter soado menos arisca, mas
não consegui controlar a língua.

— Non so a cosa ti riferisci [10]— ele nem desvia o olhar, sustentando sua
mentira.

O safado vai realmente fingir que não fala português após ter se
comunicado comigo ontem? Fico na dúvida se ele lembra a conversa que
tivemos. Minha atenção é desviada para as mães que param no corredor e ficam
encarando o Levi com a mão na boca, surpresas pela beleza dele.

Decido não insistir quanto ao português, vou continuar falando em italiano


com ele, por enquanto.

— Lorran seu pai chegou — chamo o pequeno que vem caminhando


cabisbaixo.

— Num quelo ir — faz biquinho e encara o chão.

Agacho de frente para ele e pego suas mãos.

— É hora de ir para casa com o seu papai — Lorran aumenta o bico mais
ainda — amanhã a gente se ve cedinho, e passa o dia na creche, combinado?

— NÃO! — Fico surpresa com seu grito seguido do berreiro.

— É uma pena que você não queira ir comigo — Levi fala, noto que ele se
agachou ao meu lado, e com as mãos tremulas toca o braço do filho, chamando a
atenção — queria te levar para comer muito popolate com sorvete.

— Muito? — Tenho vontade de rir como o Lorran muda de ideia fácil


quando o assunto envolve doce.

— O tanto que você quiser — Levi olha no relógio no pulso — mas temos
de ir rápido, ou vai dar a hora da janta e você não poderá mais comer sorvete
com chocolate.

— Zia vivia vai? — e então entendo, Lorran não quer sair da creche por
minha causa.

— Não posso pequeno — ele volta a fazer bico e me arrependo de


machucar o coração desse anjinho.
— Plode sì! — bate o pé.

— Ele não quer ir embora com o pai?

Percebo a comoção de mães que se forma do lado de fora observando a


cena do Lorran, e cochichando sobre a situação. Me sinto mal por expor a criança
dessa forma, e pelos outros alunos que olham com cuidado o que irei fazer.

Alguns deles já insistiram em não voltar para casa ou me levar para sair,
como se fosse parte de suas famílias.

Nenhum deles perdeu um dos pais, ou passa por problemas em casa, não
entendem o pedido do Lorran e o quanto o menino se diverte quando está comigo
aqui na creche.

Ele deve querer repetir a brincadeira de ontem e o cuidado que tive com
ele, quando chegamos a sua casa e o dei banho e janta, o colocando para dormir
antes do Levi chegar fazendo zoada.

Fico encurralada sem saber o que fazer.

O coração grita para pegar o pequeno nos braços e o levar para casa, dar
banho, vestir sua roupinha e dar sua janta. Brincar um pouco antes dele dormir, e
depois o ninar nos braços até que o sono o domine.

Isso é algo que somente uma mãe faz, e eu não sou a mãe dele, ou muito
menos sua família.

— Lorran, vamos conversar depois — opto por esperar a plateia ir embora,


e, resolver a situação — você pode esperar dentro da sala?

— Sì — ele nem olha para o pai quando corre para se sentar no tapete.

— Desculpe por isso — digo ao Levi — quando eu terminar de entregar os


alunos a gente conversa melhor, pode ser.
— Certo — percebo o tom arisco em sua fala, acho que ele não esperava a
reação do Lorran, nem eu, mas não posso fazer muito se o menino prefere ficar
comigo do que com o pai ausente.

Levi entra na sala e se senta perto do Lorran, ambos calados, esperando


todos os alunos serem entregues aos seus pais. As mães curiosas tentam puxar
assunto querendo saber o que aconteceu, e quem é o “bonitão louro”, sorrio
educada para elas e digo que é assunto de família.

Quando o último aluno é entregue ao pai, eu fecho a porta da sala e


caminho até eles, sentando-me de frente para ambos, e Lorran sorri enquanto o
Levi continua emburrado.

Tenho quase certeza de que estou estragando algum plano dele com o filho.

— Lorran — chamo sua atenção — a zia não pode sair do trabalho com os
alunos, é proibido.

— Ontem ocê icou comligo[11].

— Foi uma situação especial porque eu não podia te deixar sozinho


enquanto seu pai não chegava.

— Vai emblola Levi.

Ele expulsa o pai sem pensar duas vezes, e preciso me controlar para ele
não perceber que achei engraçado seu jeitinho fofo e simples de falar.

Dói perceber o quanto Lorran não se importa e não reconhece o Levi como
pai. Eles não têm nenhum laço afetivo, e a relação entre eles é inexistente, tenho
vontade de fazer com que ambos possam se entender melhor.

— Lorran — Levi o chama — vamos embora comigo, prometo que vai ser
divertido.
— Num quelo — cruza os braços.

Eu sei que não posso ceder à chantagem do Lorran, ele só tem dois anos, e
faz birra querendo que sua vontade seja cumprida. Mas ver os olhinhos tristes, os
lábios tremendo, e as mãos cruzadas, mexe comigo, não consigo ignorar o quanto
o emocional dele pode ter sido machucado.

— Lorran fofinho — seguro seus braços — eu não posso ir com você hoje,
vou te esperar amanhã na creche para passarmos o dia junto de seus colegas,
agora você precisa ir para casa com seu pai.

— Vamos a uma sorveteria juntos — percebo que o Levi fala comigo — de


lá eu te deixo em casa, deve ser tempo suficiente para o Lorran se acalmar, o que
acha amigão?

— Tia vivia vai?

Mordo o lábio inferior dividida entre o certo a se fazer como a professora


dele, e meu lado humano, que implora para que eu proteja os sentimentos dessa
criança.

— Somente um sorvete — cedo, e Lorran pula no meu colo comemorando.

— Obrigada — Levi agradece.

— Não é por você — sussurro — vamos Lorran.

— Sì — ele fica de pé e estende a mão para mim, a pego e me levanto.

— Segura a minha também, Lorran — Levi pede, posso jurar que senti um
pouco de ciúmes na voz dele.

O pequeno pega a mão do pai, e saímos juntos da sala, desse jeito.


— Preciso ir à secretária antes — digo a eles — me espera do lado de fora,
por favor.

Lorran solta minha mão relutante, faço o caminho até a secretária e sou
parada por meus colegas, querendo saber o que foi a comoção na minha turma.
Omito deles parte da situação, é comum às vezes os alunos se apegarem demais,
e eles entendem isso, mas nunca cedemos a vontade dos pequenos, posso acabar
sendo demitida por me envolver demais.

Com as mãos suando frio, entro na secretaria e bato o ponto, registrando a


hora em que sai, pego minha bolsa no armário e vou embora, evitando assunto.

Do lado de fora, vejo Lorran e Levi em frente a uma SUV preta, esperando
por mim, vou até eles sem chamar a atenção dos meus colegas que saem, dou a
volta e entro no carro, agradecendo pelos vidros negros.

Estou me sentindo uma fugitiva por toda essa situação, não posso
continuar agindo impulsivamente, ou terei problemas no trabalho.

Perder esse emprego está fora de questão.

— Zia ta englaçada — Lorran zomba de mim, e rio, percebendo a tensão


em meus ombros.

— É por isso Lorran — Levi chama a atenção do filho — que não


podemos pedir que a Olivia nos acompanhe nos passeios depois da creche.

— Num tendi — Levi passa o cinto no Lorran na cadeirinha de proteção, e


o carro se move.

— A Olivia não pode ficar saindo do trabalho com a gente, porque ela tem
uma vida pessoal — Levi suspira, percebendo que o Lorran não entende o que
ele quer dizer.
— Lorran — o chamo — o que o seu pai quer dizer, é que eu tenho
afazeres depois do trabalho, e não posso deixar de cumprir eles porque você quer
que fiquemos juntos.

— Num pode? — fica tristinho de novo.

— Não posso, hoje será uma exceção por que vamos tomar sorvete, e você
ainda não tinha entendido, mas agora que já sabe, não vamos repetir essa saída,
entendeu?

— Sì — fica cabisbaixo.

— Seu Ipad — Levi entrega o aparelho e o Lorran não o pega, continua de


braços cruzados.

— Se você ficar irritado, não podemos aproveitar o dia de hoje juntos —


cutuco seu peito — não quer tomar sorvete comigo?

— Quelo.

— Me dá um sorriso de quem está animado.

Ele continua fazendo bico, e o cutuco na barriga fazendo cóceguinhas até


que esteja gargalhando alto e tenha esquecido a birra.

— É assim que eu gosto, sorridente — toco em seu nariz, e ele sorri para
mim, do jeitinho que derrete meu coração.

Não demora muito para chegarmos em uma sorveteria. Entramos os três, e


as pessoas nos olham, dê certo, pensando que somos uma família.

Lorran pede colo e o carrego nos braços, Levi vai para o balcão e
montamos os sorvetes, Lorran se esbalda no sabor de chocolate.
— Me ensina a dar de comer a ele? — Levi pede, o encaro incrédula, não
acredito que ele não sabe alimentar o filho.

— Tá.

Nos sentamos, e o Lorran insiste em ficar no meu colo, deixo meu sorvete
de frente a mim, e coloco o do Lorran entre mim e o Levi.

— Aproveita que ele tá de frente para você, segura a colher com pouco
sorvete ou ele vai se sujar mais do que comer, acho que é isso, não tem segredo.

— Certo.

Acho curioso como ele esfrega as mãos uma na outra parecendo se


preparar para uma grande batalha.

Levi coloca o sorvete na colher, uma quantidade pequena e me olha


perguntando se fez certo, aceno em positivo e ele leva a colher a boca do Lorran,
que abre e engole o conteúdo feliz da vida.

— Adolo popolate — acho graça do jeitinho fofo que ele fala, e cheiro sua
cabecinha.

— Você se envolve assim com todos os seus alunos? — tem aspereza na


voz dele, fico empertigada por seu tom de voz duro, estou ajudando na relação
dele com o filho, e se acha no direito de me julgar?

— Nenhum dos meus alunos se negam a sair com os pais, para que eu
precise intervir entre eles — digo em português.

— Parlare in italiano — rebate, ele continua fingindo que não entende o


que eu digo.

— Seu arrogante — sorte dele que o Lorran está em meus braços, e não
quero que ele entenda as ofensas ditas contra seu pai — você falou comigo em
português ontem, não tente me enganar se fingindo de idiota.

— Lorran quer mais sorvete?

— Sì.

Ele me ignora completamente, e pelo resto do tempo que passamos na


sorveteria finge que não entende quando falo em português com ele.

Me recuso a fazer a sua vontade, e só falo em italiano com o Lorran. No


carro a caminho da minha casa, Lorran pega no sono e consigo sair sem o
acordar, evitando outro escândalo.

O gosto amargo na boca pela forma arrogante que Levi me tratou me


empertiga. Eu só quero ajudar essa família e ele se recusa a ver isso? Mas esse
italiano vai ver que não pode mexer comigo e sair impune!
Levi
Quem aquela professorinha pensa que é?

Ela só pode ter feito alguma coisa para o Lorran se apegar a ela daquela
forma, não é normal que o menino faça birra diariamente quando tenho de ir
buscá-lo na creche.

Justo agora que estou buscando tratamento e tentando ser um pai de


verdade, o Lorran me rejeita, mas a culpa não é dele. É somente minha que o
abandonei desde o seu nascimento, mesmo morando debaixo do mesmo teto.

Foi isso tudo que a bebida e os remédios me tomaram: uma vida com meu
filho.

É mais fácil culpar as drogas do que admitir que eu sou a razão.

— Quelo zia vivia! — ele continua cantando enquanto roda pela casa em
protesto.

Os pés descalços e gordinhos batendo com firmeza no carpete da sala,


enquanto os braços sobem e descem em um protesto firme. Já faz três dias que a
birra dele tem piorado, e eu não sei o que fazer para o acalmar. Louis tem
passado mais tempo no escritório e não me dá suporte algum.
É a primeira vez que eu paro para cuidar do meu filho, é normal ser um
idiota que não sabe o que fazer, certo?

— Vamos tomar sorvete? — pergunto.

— Com a zia vivia? — para e os olhos dele brilham de vontade pela


companhia dela, suspiro frustrado.

— Não, só eu e você.

— Num quelo. — Faz bico e volta a marchar.

Passo a mão no rosto sem saber mais como barganhar com ele para o
convencer a parar de birra. Não faz nem dez minutos que chegamos da creche, e
estou me coçando para poder o deixar sozinho e fugir dessa perturbação na
minha cabeça.

Eu sou um idiota fraco e covarde, como pude pensar que de uma hora para
outra ele iria me aceitar? Se não tivesse a interferência daquela mulher maldita,
isso não estaria acontecendo, e eu poderia me comunicar com o Lorran sem todo
o estresse.

— Vamos tomar sorvete — levanto e vou à geladeira pegar o pote de


morango com chocolate. — Vem Lorran — ofereço uma colher a ele.

Lorran se aproxima com um bico maior ainda, pega a colher da minha


mão, e me abaixo para ele poder pegar o sorvete. A colher sobe acima de sua
cabeça e desce com velocidade no pote de sorvete, que balança na minha mão e
acaba caindo no chão.

O encaro incrédulo pela rebeldia, a cara fofinha dele explodindo em raiva


acumulada. Os braços cruzados fortemente na frente do corpo.
— Zia vivia! — grita na minha cara e depois sai correndo jogando tudo
que ele pega no chão.

O sangue ferve nas minhas veias e tenho ímpeto de gritar para o Lorran se
aquietar. Abro a boca e puxo o ar pronto para reclamar com ele. As mãos
pequenas pegam o Ipad em cima da mesa e o arremessa no chão com força
enquanto ele grita com toda a força pela Olivia.

— Chega Lorran! — Grito.

Ele me encara surpreso pela forma que falei com ele, e abre a boca ainda
mais, berrando alto.

— Santo Deus, que comoção é essa? — a governanta entra na sala e fica


horrorizada quando vê o estado entre a sala e a cozinha. — Não deixa o menino
quebrar as coisas!

A ignoro fingindo que não entendo seu idioma, ela é idiota ou o quê? Acha
mesmo que estou deixando o Lorran fazer essa zona na casa de propósito? Eu só
não sei que merda fazer com ele, se o Louis estivesse aqui saberia como acalmar
o Lorran, e o convencer de que não pode ficar com a professorinha dele direto,
aquela maldita!

Vai roubar meu filho de mim sem nem me dar a chance de lutar para que
ele possa ser meu.

— Para com isso, Lorran — vou até ele.

O tremor nas mãos aumenta a cada dia que fico sem beber, e sem os
medicamentos que usava para me dopar. Estou ingerindo uma nova medicação, e
ela ajuda a controlar a ansiedade melhor que a antiga, contudo, não afastou as
nuvens negras que se espalham ao redor.

— Vai tazer a zia vivia? — pergunta fazendo bico e calmo.


Esse moleque!

— Não.

— TE ODLEIO — Grita, alto demais com as bochechas ficando


vermelhas.

O impacto de suas palavras me derruba no chão. Como que posso ter


quebrado minha relação com ele até chegar a esse ponto? Lorran tenta virar a
mesa de centro, mas não consegue devido ao peso dela.

Meu peito aperta tão forte que o ar me falta, e corro para a varanda
tentando respirar.

Inspiro e expiro tantas vezes que o dia começa a escurecer e o céu ser
coberto pela lua, enquanto o Lorran continua revirando a casa, e a governanta vai
embora, não conseguindo lidar com a situação.

Somente eu e ele nesse apartamento, envolto em sombras.

Puxo os cabelos, eu prometi que seria melhor, e na primeira dificuldade,


estou deixando o Lorran sozinho. Levanto cambaleando e o pego nos braços,
apanho seus tênis na entrada da casa, e enquanto ele grita no meu colo, desço até
a garagem e chamo o motorista.

O Louis vai conseguir lidar com essa situação melhor do que eu, tenho
certeza.

— Quer morar com sua professora? Pois peça ao seu zio! Eu desisto dessa
merda.

Ainda sou incapaz de fazer tudo sozinho, mas isso não significa que não
posso chamar pelo meu irmão para me ajudar. Calço os sapatos do Lorran
quando ele se acalma, deve achar que o tio concordara com a vontade dele, como
sempre fez.

Chegamos na empresa e a ansiedade triplica quando entro no elevador,


Lorran continua se debatendo. No lóbi vejo a secretária do meu pai, entro
cambaleando e deixo o menino com ela, sem explicação, corro para a sala do
meu pai que sei que está vazia.

Fecho as portas atrás de mim e puxo o elástico no meu pulso, o ardor na


pele começa a me ajudar a me acalmar.

Quando consigo respirar sozinho, eu saio da sala e vejo que o Lorran


sumiu. Levo as mãos a cabeça entrando em desespero quando portas são abertas,
e Louis surge com fúria no rosto, e o Lorran em seu colo escondendo a cabeça na
curva do pescoço do tio.

Parece até um anjo.

Fico com raiva por perceber o quanto ele muda quando está na presença do
meu irmão. Comigo ele não quer conversa, mas com o Louis, fica mansinho.

Mordo a bochecha, tentando evitar que a fúria escape.

— O que está acontecendo aqui? — Louis questiona.

— O bonito do seu sobrinho cismou que quer morar com a professora dele,
estava fazendo um escândalo em casa quebrando os brinquedos. Não consegui
controlá-lo e disse para ele pedir isso a você, quem sabe assim ele perceba que é
loucura querer morar com a professora! — atropelo as palavras uma na outra, a
fúria correndo quente em minhas veias.

— Lorran, você não pode morar com sua professora — ao contrário do que
o Lorran esperava, o Louis não apoia sua maluquice, e agora Louis ve o que eu
estava passando quando o Lorran começa a chorar e esperneia nos braços dele.
— A professora é a minha irmã? — Uma moça ao lado do Louis, pergunta,
não a tinha notado ainda.

— Sim.

— Posso ligar para ela vir, conversar com o Lorran, e o acalmar. — Ela
pega o telefone, a Olivia tem uma irmã que trabalha com o Louis?

— Por favor, faça isso.

Louis caminha para sua sala e o seguimos, sem que ele diga nada.

A mulher que imagino que seja sua secretária, liga para a Olivia e a
observo de perto, e o jeito que meu irmão a encara. É ela quem esse idiota acha
que o enganou sobre a virgindade? Só de ver os ombros curvados, a voz mansa, e
o jeito que ela o encara pelo canto do olho, percebo a timidez da moça.

Não sei o que aconteceu entre eles, mas tenho certeza de que essa coisinha
indefesa seria incapaz de enganar alguém como o Louis. Ele com seu ego
gigantesco tem se enganado sozinho.

Como essa mulher pode ser irmã da professorinha? A outra parece a porra
de um furacão, devastando tudo por onde passa, enquanto ela é mais como uma
rosa em meio a primavera.

Lorran continua em um choro sentido no colo do tio, enquanto me sento no


sofá, e fico puxando o elástico até a pele no meu pulso ficar vermelha e dolorida.
E mesmo assim, não é o suficiente para fazer a vontade de beber passar, não
consigo lidar com a tensão no ar, com o Lorran chorando, querendo uma pessoa
que ele mal conhece, e com o Louis me recriminando com o olhar.

Eu sei que sou um pai de bosta, não precisa ficar passando isso na minha
cara a todo segundo!
— Com licença — a voz doce chega aos meus ouvidos, olho para a porta e
ela entra, ainda usando o uniforme da creche.

— Zia vivia! — Lorran fica afoito no colo do Louis, e desce correndo para
os braços da professora, com um sorriso no rosto.

O elástico estrala mais uma vez no meu pulso quando eu vejo o sorriso
dela para ele, os olhos cheios de carinho e o abraço, envolvendo Lorran, caloroso
como o de uma mãe. Eu sou um imbecil por pensar por um segundo em ficar
com raiva pelo Lorran a preferir, sou o pai dele há dois anos e nunca olhei, ou
abracei meu filho com tamanho amor.

A criança só quer ser amada.

A culpa não é dele ou dela, é somente minha.

Levo a mão ao rosto cobrindo os olhos e tentando sufocar os soluços que


irrompem do meu peito como uma represa. A dor me rasgando em dois por me
dar conta, mais uma vez, do quanto fiz meu filho sofrer por nunca o ter olhado
como merecia.

A Blanca me odiaria por causar a dor do abandono no Lorran.

Minha língua saliva, querendo beber, e a cabeça implora pelos remédios


que me jogam no esquecimento.

Enquanto eu ceder aos vícios, continuarei machucando o Lorran e a mim


mesmo. Abafo um grito que vem da minha alma, desespero, solidão, e tristeza,
disputando quem me machuca mais.

Eu preciso sair desse fundo sem poço ou vou continuar machucando o


Lorran e destruindo os sentimentos do meu filho.
Olivia
Lorran chora.

Levi chora.

Bianca chora.

Louis tem os olhos marejados querendo chorar.

E eu seguro como posso as lágrimas para que o Lorran não me veja


chorando, e pense que é por culpa dele.

— Zia vivia eu quelo fica com ocê — soluça e meu coração fica do
tamanho de uma uva.

Enxugo as bochechas do Lorran, molhadas pelas lágrimas, e beijo sua testa


o apertando forte em meus braços. Eu não podia me envolver, é errado dar
carinho e atenção para além do profissional a uma criança, mas o que fazer
quando ele me pede com os diamantes em seus olhos brilhando de tristeza?

Eu não consigo negar afeto a ele, corro um risco enorme de perder meu
emprego, mas o Lorran precisa mais de mim do que eu de dinheiro.
— Num golto de fica cum o Levi — soluça — fica comligo zia vivia.

— Oh meu Deus — tampo a boca contendo o soluço, o que esse


desgraçado fez com o menino para ele ter aversão ao pai dessa forma? Encaro
Levi com o ódio borbulhando em minhas veias, e o vejo chorando copiosamente
enquanto puxa um elástico diversas vezes no pulso.

— Você podia tudo na sua depressão — digo em português para que o


Lorran não entenda — menos causar dor no menino dessa forma, seu imbecil —
mordo a língua querendo dizer muito mais.

— Olivia — Louis chama em tom firme — não julgue o Levi sem saber
pelo que ele passou.

— Não o defenda ignorando os sentimentos da criança — evito dizer o


nome dele para não saber que falamos sobre ele — você acha que isso é normal?
Ele me conhece a menos de um mês, e já se apegou ao ponto de dizer que odeia o
pai e que prefere ficar comigo! Eu também tive um pai com depressão pela morte
da minha mãe, sei o quanto corta de dentro para fora ser abandonada pelo único
pai que restou!

— Olivia! — Bianca grita meu nome, a voz embargada e os olhos


transbordando choro — não fale sobre o nosso pai desse jeito, todos nós
sofremos.

— São com justificativas assim que crianças como ele crescem com
traumas e abandonadas pelos pais — aperto o Lorran em meus braços — se Levi
fosse responsável o suficiente para sofrer sem magoar o filho, essa situação não
aconteceria. Não é errado sentir a dor da perda, mas a transferir, e fazer outras
pessoas a sentirem, é cruel. Você impôs aos outros aquilo que te machuca para
não sofrer sozinho.

Travo os lábios ao sentir a eminência do choro.


A sala fica em silêncio completo enquanto o Lorran brinca com os fios do
meu cabelo, mais calmo agora que cheguei, e deve imaginar que ficaremos
juntos. Levi não se atreve a me olhar, as mãos dele tremem, as pernas e o tronco
tomado pelos soluços silenciosos. A esse ponto ele ignorou o elástico e se
encolhe na sua bolha de dor.

— Como podemos resolver isso? — Louis pergunta.

— Eu não sei o que fazer — admito — o Lorran precisa de cuidados de


uma babá em tempo integral

— Qual a sua disponibilidade? — Louis pergunta — quando não está na


creche, você trabalha fora?

— Não, fico em período integral na creche.

— Vou matricular o Lorran em tempo integral, quando ele não estiver lá e


você tiver acabado o seu expediente, aceita ser a babá dele?

— Ele já passa o dia na creche, não sabia disso? — fico confusa.

— Desculpe, acabei esquecendo — sacode a cabeça de um lado ao outro,


atordoado — com tudo isso, fiquei um pouco... enfim, você aceita a proposta?

— Levi vai entrar em contato com a creche pedindo para que eu não seja
demitida por aceitar o emprego de babá de um dos meus alunos, e explicando a
situação peculiar que envolve o Lorran. Ele vai passar o dia na creche, e depois
fico com ele em casa até que durma, Levi vai assumir responsabilidade como pai
de todos os dias, dar o café da manhã dele, e o levar e buscar na creche —
arrebito o nariz — e quero um bom salário para aguentar o escroto do seu irmão
no processo.

— Você fez muitas exigências — posso ver a veia saltando na testa do


Louis, ele não esperava por alguém que o contrarie.
— Estou aceitando isso pelo Lorran — aperto o pequeno — mas não
significa que vou permanecer alienada ao abandono parental do Levi, ele vai
aprender a ser um pai, e garantir que o futuro do filho não seja enfiado em
psicólogos tratando os traumas causados na infância.

— Eu aceito — Levi fala, a voz rouca e os olhos inchados de chorar. Ao


menos ele conseguiu se recompor um pouco, apesar dos soluços persistentes —
seja a babá do Lorran, e me ensine a cuidar do meu filho.

— Não vou ensinar nada — me levanto com o Lorran no colo — fique de


olho no que faço e aprenda sozinho. A primeira coisa é se tratar...

— Já faço isso — me corta — sua julgadora de nariz arrebitado — se


levanta, posso ver um pouco de raiva em seu semblante — você não sabe a
minha dor, não tem o direito de me julgar.

— Enquanto você for o causador da dor do Lorran eu vou te julgar e jogar


pedras!

— Já chega! — Louis pede.

Mastigo a bochecha tentando evitar uma briga pior, meu sangue ferve.
Mexam com tudo que puderem nesse mundo, mas não façam uma criança chorar
que eu me revolto e jogo pedras antes de perguntar o crime.

— Vocês dois cuidarão do Lorran o dia todo, não podem se matar dessa
forma — Louis continua — Olivia, suas exigências serão atendidas, o que acha
de um salário de três mil?

— Bom, mas se seu irmão me tirar muito o juízo, você vai pagar extra por
cada vez em que eu não o matar.

— Eu que deveria receber — Levi levanta apertando os punhos — por ter


de lidar com você, sua desaforada!
— Irresponsável!

— Parem os dois! — Bianca pede.

— Se continuarem brigando dessa forma na frente do Lorran — Louis


intervém — esse arranjo nunca dará certo.

— É só continuar falando em português com um sorriso no rosto, não é


Levi? — Arqueio a sobrancelha para ele que morde os lábios percebendo que a
todo momento, se comunicou comigo na minha língua materna, e não em italiano
— seu disfarce de italiano que não sabe português caiu por terra.

— Non so a cosa ti riferisci[12]. — Empina o queixo, e volta a usar o


italiano.

Não parece o homem que se debulhava em choro segundos atrás. Talvez,


seja disso que o Levi precisa, para acordar e perceber que precisa ser um pai de
verdade para o Lorran. De alguém que o jogue nos limites, e o faça sentir outra
coisa além da tristeza profunda, e se esse italiano continuar me irritando, pode ter
certeza de que eu serei essa pessoa.

Não o deixarei em paz um segundo da sua vida enquanto eu não ver o


Lorran o chamando de pai, e feliz por ter sua presença na vida dele.

— O que ocês falam? — Lorran pergunta, ainda mexendo em meu cabelo.

— Que vamos te levar para tomar sorvete — o balanço e ele gargalha,


esquecendo o choro de tempos atrás.

— Quelo — Levanta os bracinhos sorrindo sapeca, e beijo suas bochechas.

— Vai passar a mão na cabeça dele depois de uma birra que destruiu os
brinquedos? — Levi pergunta em italiano, e Lorran o encara com medo de ser
repreendido.
— Se sentiu melhor quebrando seus brinquedos, Lorran? — pergunto ao
pequeno que faz bico e olha para o chão.

— Num — responde em um muxoxo.

— Você pode sentir raiva, mas não deve descontar nas pessoas — olho o
Levi de rabo de olho — ou nos objetos. Para que você não esqueça que isso é
errado, vai ficar sem novos brinquedos por um mês.

— Até meu iiiipad? — puxa o som do “i” e preciso me controlar para não
morder essa fofura.

— Principalmente o Ipad, onde já se viu um bebê com um aparelho caro


desses? Inacreditável — encaro feio o pai e o tio dele, e ambos desviam o olhar
— só vai ter outro quando eu achar que você é responsável o suficiente para ter
um.

— Zia vivia — quer começar a fazer manha, e encaro com seriedade. Ele
murcha e dá de ombros, aceitando que não vou ser manipulada pela sua birra,
como o pai e o tio.

— Agora vamos tomar sorvete, por que foi um dia cansativo, não acha
fofinho?

— Sì — sorri fofinho, e beijo sua bochecha dando por encerrado o assunto.

— Vamos — viro de costas e abro a porta saindo, não chamo o Levi, ele
vem atrás da gente, e percebo que ainda aperta o elástico contra o pulso.
Entramos no elevador, e Levi fica perto demais, fico empertigada quando ele
aproxima a boca do meu ouvido.

— Você é um diabo — ele fala baixinho para que o Lorran não escute, e
pequenos arrepios correm pelo meu corpo, a voz um tom mais grave causa um
rebuliço dentro de mim.
Me afasto dele sem dizer mais nada,

Enquanto fazemos o caminho para a sorveteria, eu percebo que agora com


os três mil que vou ganhar por ser a babá do Lorran, e meu emprego garantido na
creche, terei dinheiro o suficiente para poder realizar o meu sonho.

Posso dar entrada no processo de inseminação artificial, usando o esperma


de um doador anônimo, o dinheiro extra será usado no meu tratamento, e com
isso não sofrerei mais, esperando na fila da adoção pelo meu filho, posso o gerar
dentro de mim.

Arfo baixinho pelo alívio que inunda o meu peito.

Meu sonho finalmente vai se tornar realidade.


Levi
— Não é assim Levi! — Olivia branda pela quinta vez, e eu aperto a faca
no punho, imaginando quantos anos de prisão vou pegar por esfaquear essa
maldita mulher!

— Eu estou cortando cenouras — ranjo os dentes tentando controlar a


irritação — o que diabos pode ser feito de errado ao cortar cenouras?!

— Fatie em pedaços menores — ela pega a faca da minha mão, deve ter
sentido minha intenção homicida. — Presta atenção! — exclama, desvio o olhar
do rosto dela, e vejo as fatias minúsculas que ela corta as cenouras.

— Não vai dar nem para sentir o gosto desse jeito!

— Exatamente! Criança tem aversão a comer vegetal naturalmente, e o


Lorran não é acostumado a essa alimentação, temos de introduzir aos poucos.

— Corta maior, isso vai sumir quando colocar na panela.

— Fica quieto — ela suspira sem paciência. — O acordo foi você ficar
observando calado, e não zoando feito uma gralha!

— Uma, o quê?
— Uma ave barulhenta — revira os olhos e me afasto, antes que eu cometa
um assassinato contra essa mulher.

— Não sei como você pode ser professora do jardim de infância com uma
atitude ridícula dessas.

— Você que não sabe ouvir nada do que eu digo, é pior que os meus
alunos, e olha que eles só têm entre dois e três anos!

— Sua insuportável — levanto as mãos simulando que a estrangulo.

— Seu asno!

— Asno! — Uma voz fininha fala atrás da gente, e me viro para ver o
Lorran dando risada da nova palavra descoberta.

— Agora vai ensinar palavrões ao menino — ralho.

— Lorran fofinho — ela se abaixa ficando na altura dele — não pode


chamar ninguém de asno, a zia vivia disse uma palavra feia — abanda a mão na
frente do rosto, e o Lorran dá mais risada.

— Sì zia vivia.

— Em português fofinho, como fala a palavra sì?

— Sim — faz um ploc e abre os bracinhos a abraçando pelo pescoço.

Faz três dias que a Olivia é a babá do Lorran, e nunca vi meu filho sorrir
tanto enquanto eu enlouqueço. Nem tenho tido tempo para ficar triste com esse
furacão devastador me dando ordens o tempo todo.

— Podem ir tomar banho, vocês dois — ela diz — vou terminar o jantar.

— Vamos Lorran — estendo a mão para ele, a tremedeira tem aumentado


conforme os dias sem beber e meus medicamentos vão aumentando.
Faço, um esforço sobre-humano, para não ceder à tentação, e esfolo o
pulso de tanto bater o elástico contra a pele, tentando controlar o frenesi que
corta minhas células, implorando pelo vício.

Ficar mais tempo com o Lorran ajuda, não quero expor meu filho a esse
comportamento nocivo, mas tenho medo de acabar me irritando com ele por
besteira e o fazer me odiar mais ainda.

Lorran parece em paz com a Olivia em sua vida, e por mais que eu odeie
essa mulher, não teria a coragem para acabar com o relacionamento deles, ou
manchar a paz que meu filho tem tido.

À noite, quando me recolho no quarto, eu sou envolto pela escuridão que


nubla meu sono e enche minha cabeça de pensamentos autodestrutivos, enquanto
o peito é rasgado em dois pela dor que só aumenta sem os sedativos que eu
usava. E de dia, eu coloco um sorriso no rosto e finjo ficar feliz e disposto para
fazer o que preciso.

Malhar com o Louis, me alimentar melhor, ir ao terapeuta, e ficar


assistindo tevê enquanto não dá a hora de buscar o Lorran na creche, e trazer o
diabo para a minha casa.

— Blora? — Lorran puxa minha mão, não tinha percebido que fiquei
parado encarando o teto como um idiota.

— Sì.

— Plotugues Levi — ele me repreende, agora que a Olivia ensina a língua


a ele, sou impelido de falar também.

Eu não quero me comunicar com as pessoas, e fingir ignorância quanto ao


idioma, ajuda que elas não queiram falar comigo. Maldita hora em que deixei o
diabo perceber que eu falo fluentemente o idioma, ela sempre me olha
atravessado quando finjo não entender o que diz em português.

Acho que ela poderia enfiar a faca em mim se pudesse.

— Sim — digo a contragosto.

Eu nunca dei banho no Lorran.

É a primeira vez que farei isso, e fico nervoso, e se eu o afogar na


banheira? Se a água queimar a sua pele ou tiver gelada demais e ele pegar um
resfriado? Olho para a Olivia, que voltou a cortar a cenoura em pedaços
inexistentes, e pondero em pedir sua orientação sobre como não matar meu filho
durante um banho.

— Olivia — chamo e ela se vira para mim — a... a-a — pigarreio tentando
não gaguejar tanto — água deve... — me calo, ela suspira pesado, com pena.

— Ajuste a temperatura para a morna, e deixe o Lorran colocar a mão


antes, ele vai saber se está boa ou não.

— Certo — aceno e vou embora, constrangido o suficiente por não saber


medir a temperatura da água.

— O ensine a lavar o pintinho — ela diz — ele não sabe fazer isso ainda, e
não consegui demonstrar apropriadamente como faz.

— Tá bem.

Imagens de quando meu pai me ensinou como lavar meu pênis surgem na
minha mente. É a lembrança mais antiga que tenho com ele, não imaginei que o
Louis não tivesse ensinado isso ao Lorran ainda, meu irmão não deveria ser um
superpai que sabe fazer tudo melhor do que eu?
Talvez ele só tenha feito tudo esse tempo todo, sem ensinar ao Lorran
como ser independente de cuidados externos. Mordo a bochecha para transferir a
dor do peito para a carne, eu fui ausente e relapso por anos com o Lorran, não
posso querer recriminar o Louis por não fazer algo que era a minha obrigação.

No banho tiro a roupa do Lorran e olho o corpo do meu filho pela primeira
vez, ele é tão pequeno e branquinho, os cabelos se fossem louro-branco,
deixariam Lorran um albino, por sorte ele puxou meu tom, e o cabelo é como
ouro brilhante e cheio de vida. Checo à temperatura da água e o Lorran aprova
quando coloca a mão na banheira.

— Lorran você sabe como lavar o pintinho? — pergunto quando passo o


sabonete nas minhas mãos.

— Não — acena em negativo e bate as mãos na água jogando gotas por


todos os lados, molho a camisa e a tiro.

— Vou te ensinar, presta atenção no que faço e você repete em si, certo?

— Celto — foca sua atenção em mim.

Tiro a roupa e entro na banheira com o Lorran, e o ensinando como lavar


sua parte intimida. Ele dá risada quando deixo o sabonete cair na água, mas com
paciência ele se limpa sem se machucar.

É a primeira vez que ensino algo ao meu filho, e a sensação é libertadora,


um peso saí dos meus ombros, e respirar se torna um pouco mais fácil enquanto
olho as bochechinhas vermelhas e o sorriso de dentes pequenos no rostinho dele.

— O do Levi é glande, polque? — Ele aponta para o meu pênis.

— Eu sou adulto, tudo meu é maior comparado ao seu — encosto sua mão
na minha.
— Verdade — exclama e abre a boca como se tivesse descoberto um
momento único. — Eu vou flicar glandão?

— Se comer direitinho, e fizer muito exercício físico, vai, sim, somos


homens grandes, de família.

— Verdade?

— Já viu como seu zio e seu nonno são altos?

— Sim — acena em positivo — enolmes.

— É de família, você vai ficar desse jeito quando crescer.

— Quelo clescel lolgo — se esforça para falar com a língua travando nas
consoantes.

— Não tenha pressa — aliso sua cabeça — acho que tenho de lavar seu
cabelo, feche os olhos para não cair shampoo.

— Celto.

Lavo o cabelo do Lorran com cuidado para não machucar sua cabeça e não
arder seus olhos. Quando termino, o enxugo e a mim, saio com a toalha enrolada
no quadril, e imito o mesmo no Lorran, que acha divertido.

Vamos para seu quarto e estanco na porta quando vejo a Olivia separando a
roupa dele na cama, ela me nota, e os olhos travam no meu corpo desnudo, as
bochechas ganham um tom de vermelho muito forte enquanto ela desvia o olhar
para qualquer canto no quarto que não na minha direção.

— Vai com a Olivia para ela colocar sua roupa, Lorran — o coloco no
chão e ele corre para ela.

Antes que ela possa dizer algo, eu saio do quarto.


O jeito que ela me encarou me incomoda, uma pontada no peito como se
eu tivesse feito alguma coisa errada. Vou para o quarto, e depois jantamos em
silêncio, evito conversar enquanto não consigo distinguir o incomodo que me
abateu.
Olivia

Alguns dias depois


É difícil lidar com o Levi quando ele tenta ser prestativo, mas é pior ainda
quando ele não quer ser útil para nada!

Acordo com o celular tocando, e a voz do Louis irritada, pedindo que eu vá


buscar o Lorran em casa e o levar para a creche. Esse italiano folgado gosta de
gritar com todo mundo, ele tem sorte que fiquei agradecida pelo que ele fez por
minha irmã, ou eu o receberia com uns bons gritos por alterar a voz para mim.

Quando o Louis não age como um prepotente arrogante, ele se torna um


cara minimamente descente. Ainda não sei o que minha irmã vê nele, eu percebo
o jeitinho envergonhado que ela fica quando está na presença dele, as bochechas
vermelhas e como olha para ele querendo muito mais do que ele dá.

Até uns dias atrás eu queria o mandar enfiar o ego no meio do rabo dele,
mas a Bianca passou por uma situação difícil, e que eu não poderia a proteger, e
o Louis fez isso no meu lugar.

Preciso lembrar de demonstrar minha gratidão por cuidar dela quando não
pude. Vou levar um porrete comigo, para o agradecer, e depois ameaçar, que ele
não pense que pode partir o coração da Bianca, ou eu que o partirei em dois.

Enquanto eu desisti de acreditar no amor, Bianca segue se apaixonando


cada dia mais por aquele italiano arrogante. Ao menos, o Louis faz alguma coisa,
ao contrário do Levi, pensei que ele estava melhorando por fazer as tarefas
mínimas de cuidado com o Lorran, e às vezes puxar papo com o menino e dar
pequenos risos olhando o filho.

Até ontem, quando o imbecil se trancou no quarto e pelo visto não saiu
mais.

Desligo o celular e me levanto, em três dias poderei dar início ao processo


de fertilização, e estou uma pilha de ansiedade, se der certo, meu sonho de ter um
filho, finalmente poderá se tornar realidade. Penso no Lorran, será que ele ficaria
feliz em saber que eu posso ter um filho? Imaginar que o pequeno possa ficar
com ciúmes ou magoado aperta meu coração, e por um segundo mínimo, eu
penso em desistir da ideia.

Me assusto com o quanto deixei me apegar ao Lorran, ao ponto de querer


adiar meu sonho de ser mãe para não magoar o coração do pequeno, pensando
que o abandonarei para cuidar do meu filho.

Ele sofreu muito em seus poucos anos de vida, em vez de meu futuro filho
ser um obstáculo para Lorran, vou fazer com que sejam melhores amigos.

Levanto e faço minha higiene matinal, quando saio do apartamento passo


na padaria e como um salgado, na rua vejo a SUV preta que busca o Lorran na
creche, e o motorista do lado de fora procurando por alguém, quando me vê
acena e vou até ele. Entro no carro ainda bebendo meu café e vamos para o
apartamento.

Checo meus e-mails e redes sociais no caminho, e vejo que uma colega de
faculdade casou e anunciou a gravidez.
Eu lembro de quando ela conheceu o namorado, ele era do curso de CIT e
muito charmoso, sempre a buscava na sala de aula, e as meninas o chamavam de
piegas, enquanto ela dava a língua para todas e sorria feliz, por encontrar o amor.

Será que agora ela continua com o mesmo sentimento de antes?

Como será que é amar alguém e ter a confiança de que aquela é a pessoa
certa? Eu não consigo acreditar que outros homens, serão capazes, de serem
diferentes dos meus ex que machucaram meu coração. Ninguém ama outra
pessoa eternamente, somente enquanto ela está presente.

Paramos no prédio e olho para cima, naquele lugar tem um homem que
amou tanto uma mulher que após a sua morte, entrou em depressão profunda, ao
ponto de esquecer do próprio filho. Realmente é amor o que ele sente, ou
somente a falta da presença dela, e o que ela significava em sua vida? Nunca
parei para entender as razões do Levi ser dessa forma, eu o julgo baseado na
minha situação que se assemelha ao do Lorran.

Talvez eu esteja sendo um pouco dura com ele.

Entro no elevador e quando saio ouço os gritos do Lorran, ele parece que
brinca com alguém, pelas gargalhadas. Bato na porta e ela é aberta pelo Louis,
com o sobrinho pendurado em seus ombros, Lorran usa somente uma cueca, com
os cabelos totalmente bagunçados, verifico a hora e temos menos de meia hora
para sair de casa e chegar a tempo na creche.

— Por que ele não está arrumado? — rango os dentes, a consideração que
eu tinha adquirido pelo Louis indo embora em um passe de mágica!

— A coisa está caótica Olivia — Louis suspira e vejo as bolsas negras


embaixo de seus olhos — hoje é a data que o Levi e a Blanca se casaram, e desde
ontem ele entrou em um mini surto — ele fala baixo em português para o Lorran
não entender — deixa para brigar comigo depois, agora tira o Lorran daqui que
eu vou cuidar do meu irmão antes de sair.

Ele me entrega o sobrinho e desaparece entre as portas, Lorran sorri para


mim e beija minha bochecha bem gostoso.

Um homem que nunca esqueceu o amor pela esposa, lembro com um


suspiro antes de beijar o Lorran e o levar para um banho apressado, enquanto
peço a governanta para preparar o café dele.

Lorran come sem fazer bagunça e vamos para a creche, quando estamos
saindo escuto gritos profundos da dor do Levi. O som parte minha alma, eu já o
vi chorando, mas nunca foi forte como nesse momento.

****

Voltamos para casa e as coisas continuam igual, o Levi trancado no quarto,


enquanto o Lorran começa a ficar inquieto, ele se apegou um pouco ao pai esses
dias em que ele esteve presente.

— Levi num vem janta? — pergunta, quando coloco outra colher de arroz
na boca dele.

— Acho que não fofinho.

— Polque? — entrego o guardanapo, a ele que limpa os cantos da boca e


abre pedindo mais. Estou começando a introduzir que ele coma os alimentos
mais sólidos, como frutas, sozinho, por enquanto os que precisam de uma colher
eu dou a ele.

— Acho que ele está doente.

— Vamos velifica? — antes que eu possa responder, o Lorran desce da


cadeira e corre para o quarto do pai.
Não sei o motivo, mas a porta do Levi nunca fica trancada e já percebi que
ela não tem chave na fechadura, talvez seja coisa do Louis com medo do irmão
fazer alguma besteira. Lorran entra como um pequeno furacão no quarto escuro e
sobe em cima do Levi, que não se mexe quando o pequeno começa a pular em
cima dele.

Acendo a luz, e o quarto está impecável, como se ninguém morasse ali, se


não fosse o Levi na cama, apagado, eu juraria que não tinha pessoas nesse quarto.
Lorran sacode o pai que não se mexe e começo a ficar irritada, tudo bem que ele
esteja doente e sentindo uma dor do inferno no coração, mas não se ignora um
filho.

— PARA LORRAN — Sua voz rouca branda debaixo do coberto e o


Lorran se assusta, ele treme e cai na cama começando a chorar, o pego no colo no
mesmo instante e quero espancar o Levi por fazer o Lorran chorar desse jeito.

— Calma, fofinho — peço o tirando do quarto antes que cometa um


assassinato.

— Polque ele glito comigo? — funga.

A culpa é minha por confiar nas outras vezes em que o Lorran pulou em
cima do Levi e ele não fez nada com o menino, no fundo, tive a pequena
esperança que ele fizesse como da outra vez e abraçasse o filho. Aquele
desgraçado vai ver que não se mexe com uma criança.

— Não pula mais em cima do Levi quando ele estiver daquele jeito, certo?
— peço encarando seu rostinho choroso, e ele funga antes de assentir.

— Levi tá dodói?

— Sim, bem aqui — passo a mão no peito dele — mas um dia ele vai ficar
bom.
— Polmete?

— Sim — beijo sua testa.

Odeio fazer promessas que não posso cumprir, e essa ao Lorran, me deixa
de coração na mão com medo de decepcionar o pequeno. Levi pode nunca
superar a depressão, e viver o resto de sua vida desse jeito, recluso, triste, com
dor, e causando no pequeno.

Demoro mais do que o normal para fazer Lorran dormir, e percebo como
ele olha para o quarto do pai com medo, talvez, de que ele saia de lá e grite
novamente.

Quando finalmente o coloco para dormir, eu decido que Levi vai aprender
que mesmo na dor dele, não pode machucar as pessoas ao seu redor. Lorran não
vai crescer como eu cresci, e as chances de que eu seja demitida pelo que estou
prestes a fazer são poucas, afinal, Lorran não me deixaria ir embora, e o Louis
faz tudo o que puder para que o sobrinho seja feliz.

Encho o balde com água, e com cuidado vou para o quarto do Levi, não
quero que ele escute o que estou prestes a fazer. Abro a porta e ele ainda dorme
embolado nas cobertas, aproximo, e com cuidado eu consigo subir na cama para
ficar acima de sua cabeça, posiciono o balde e viro o conteúdo encharcando o
Levi.

Ele empurra as cobertas e a água o cega, enquanto continuo jogando o


líquido até acabar. Levi cai da cama atordoado, limpando o rosto, e quando os
fios de cabelo saem de seus olhos ele procura a fonte do aguaceiro, e me acha em
cima da cama. Eu vejo o segundo exato em que a dor deixa as suas írises e se
transforma em raiva, quente, latente, e finalmente o fazendo reagir de uma forma
diferente.

— FICOU LOUCA? — Berra, ainda sentado no chão.


— Fala baixo que acabei de colocar o Lorran para dormir — deixo um
dedo em riste na frente da boca e desço da cama, ainda o olhando por cima —
você, nunca mais grite com o menino, ou eu juro que da próxima vez, a água vai
estar pegando fogo.

— Quem merda você pensa que é? — se levanta, a voz imbuída em raiva,


mas mais calma.

— A pessoa, que não vai, aceitar que você continue sendo um bosta de pai
— jogo o balde nos seus pés e ele pula no lugar — chega dessa merda de
depressão e de ficar magoando o Lorran.

— Você não faz ideia do que eu sinto — rosna na minha cara.

— Mas eu sei o que o Lorran sente — devolvo, Levi é uns bons


centímetros mais alto do que eu, e preciso empinar o nariz para o encarar nos
olhos.

Faíscas saltam de nossos corpos se chocando um contra o outro enquanto


nos desafiamos com o olhar. Levi não está disposto a ceder, e muito menos eu. É
a primeira vez que fico perto dele dessa forma, capaz de sentir sua respiração
pulsante contra meu rosto, nariz a um centímetro de se tocarem, e olhos fixos,
com o poder, de devorar a alma.

— Amanhã à noite se prepare — digo a ele — você vai sair dessa maldita
cama e aprender a viver a vida.

— Que merda você quer dizer com isso? — fica confuso.

— Que eu vou ser a babá do Lorran e te ensinar a viver novamente,


sairemos às 19h, invente a desculpa que quiser ao Louis, ele vai ficar com o
Lorran e você vai aprender que estar vivo, não é só ter um coração batendo no
corpo.
Saio do quarto sem esperar a sua resposta, pego minha bolsa em cima do
sofá e deixo o apartamento, do lado de fora me escoro contra a porta pensando o
que diabos eu acabei de fazer.

Merda, intimei o Levi a ir em um encontro comigo e nem sei direito o


motivo de ter feito isso.
Levi
Essa mulher é o cão.

Satanás deve ter tido medo dela e a expulsado do inferno, para ela vir me
punir pessoalmente por todos os pecados que cometi sendo um pai relapso para o
meu filho.

A água que jogou em mim, ainda pinga no piso do quarto enquanto eu fico
como um idiota encarando a porta do quarto por onde ela passou faz uma meia
hora.

Passei o dia sentindo uma dor dilacerante no meu peito lembrando do dia
do meu casamento com Blanca, e do nosso último aniversário junto, até essa
desgraçada vir me molhar, e falar essas merdas na minha cara, quem diabos ela
pensa que é?

Encaro a minha cama sem saber onde vou dormir agora que tudo ficou
ensopado. Tiro a roupa e me enxugo para vestir uma seca e vou para o quarto do
Lorran, não percebi que tinha brigado com ele até a Olivia chamar a minha
atenção, quando fiz isso?
O encontro dormindo dentro do berço, e me aproximo com calma, para não
perturbar seu sono. Lorran se mexe quando toco em sua testa e os olhos abrem
sonolentos, fechando em seguida e tornando a abrir quando ele me vê.

— Ocê tá bien? — pergunta com a voz rouca de sono.

— Desculpe ter gritado com você — o pego no colo e beijo sua cabeça,
inspirar o cheiro do Lorran ajuda a acalmar a tormenta em meu peito — não
percebi que tinha gritado.

— Tá bom — deita a cabeça no meu ombro e brinca com a gola da minha


camisa.

Não sei ao certo como agir com o Lorran agora, se o deixo dormindo no
berço ou faço alguma outra coisa, já são 21 horas da noite e sei que ele dorme
cedo. Mas o segurar no braço me trouxe uma calma que eu não posso perder
agora, a segurança de que tudo ficará bem se eu continuar o apertando firme em
meus braços.

— Quer dormir comigo? — pergunto.

— Sì — boceja.

Minha cama ficou ensopada e o sofá não é uma boa opção, olho ao redor e
não vejo um lugar confortável para mim e ele. O Louis já chegou em casa? Vou
para o quarto dele e vejo a cama arrumada indicando que ele não ficou por aqui,
parando para pensar, meu irmão tem dormido pouco em casa nos últimos dias, o
que será que tem acontecido com ele?

Entro e me deito na cama com o Lorran, que só agora percebo, que ainda
tem a pelúcia do gato agarrada em seus bracinhos. Ele se encolhe entre os lençóis
e dorme em dois instantes, apesar de ter passado o dia recluso na cama, estou
sentindo muito sono. Entro debaixo das cobertas e fico observando o pequeno
rostinho dele, até ser vencido pelo sono.

Acordo com Lorran saindo da cama sozinho, sem fazer barulho, os


pezinhos tocam o chão na ponta dos dedos enquanto ele fecha a porta atrás de si.
Me levanto e vou atrás dele, sem fazer barulho ou deixar que ele me perceba,
Lorran entra na cozinha e abre a geladeira, se esticando para conseguir pegar
alguma coisa dentro.

Pairo acima dele e vejo que ele quer uma garrafa de água, a pego, e depois
o levanto, colocando-o em cima do balcão de mármore, e sirvo a água em um
corpo de plástico. As mãos pequenas agarram o copo e o levam a boca, lá fora o
tempo está nublado e prometendo uma chuva forte, a governanta aparece na
cozinha, acena para mim e vai preparar o café da manhã.

— Banho? — pergunto ao Lorran que acena em positivo.

Em menos de duas horas ele e eu estamos arrumados e alimentados,


estranhamente, a infelicidade que me assolou ontem não faz presença, e consigo
o deixar na creche sem dificuldade ou acompanhado pelas sombras que
retornaram ontem.

Fico com uma pequena ansiedade quando descemos em frente a creche e


caminhamos para a sala de aula dele. Parada na porta com um sorriso no rosto
está a secretária do satanás usando a farda da creche e o cabelo preso em um rabo
de cavalo com alguns fios solto em seu pescoço.

É a primeira vez em que reparo na Olivia, ela tem olhos verdes e cabelos
castanho escuro, o rosto redondo com bochechas que ficam cheias sempre que
ela sorrir para os alunos, os dentes brancos e bem alinhados. Pescoço longo,
ombros pequenos, e uma cintura marcada pelo cinto da calça, que cobre a barra
da camisa. Ela é bonita, e eu nunca parei mais do que três segundos para analisar
a sua existência.
Por que ela me toca de maneira diferente dessa vez? Ontem eu queria
matá-la quando me tirou da cama, a dor me consumia em carne viva, e então o
ódio fez tudo desaparecer, e desde que dormi com o Lorran, tenho sentido uma
estranha letargia, nem dor e nem paz, algo como ficar flutuando em um limbo.
Por um segundo a depressão parece que me deixa em paz, e o frenesi por beber
começa a acalmar.

— Bom dia fofinho — se abaixa para beijar a bochecha do Lorran e


receber o carinho dele. — Tudo bem?

— Sì! Eu dolmi com o Levi — fala animado.

— Sério? — ela tenta não deixar que ele perceba o quanto fica chocada,
mas eu noto o franzir de sua sobrancelha e o olhar em descrença — e como foi
isso?

— Num sei, só dolmi — dá de ombros, e alguém o chama dentro da classe,


Lorran corre para encontrar com a coleguinha — tchau Levi — diz sem me olhar,
entretido.

— Eu te pego as 19h, já disse ao Louis que ele vai cuidar do Lorran —


Olivia chama minha atenção, e coço a cabeça, sem saber como proceder.

— Isso não vai dar certo — digo e vou embora.

Não existe a menor possibilidade desse encontro dar certo, eu não quero
me envolver com a Olivia. Amo a Blanca com a mesma intensidade de quando
ela estava viva, e nunca seria capaz de sentir tal coisa por outra mulher ou de trair
a imagem da minha esposa.

Entro no carro e lembro que hoje eu não fiz os exercícios com o Louis,
mando o segurança me deixar na empresa, talvez meu irmão possa me dar um
conselho sobre essa maluquice da Olivia, que eu nem sei o que é ainda.
Minha consulta com o psicólogo é somente as 14 horas, e ainda tenho
muito tempo sem nada para fazer enquanto enlouqueço.

Chego na empresa e não vejo a secretária dele do lado de fora, a do meu


pai sorri para mim e não fala nada, além de um cumprimento. Abro a porta da
sala do Louis e entro, o som de algo caindo chama a minha atenção, e vejo meu
irmão entre as pernas da Bianca enquanto o porta caneta foi ao chão.

Bianca tem os olhos arregalados me encarando com os lábios roxos e fecho


a porta atrás de mim, então o sem vergonha decidiu ter algo com ela e não me
contou nada? Louis vira para trás, e ao me ver, tem a mesma expressão surpresa
que a Bianca, ele faz sinal com os olhos de que devo ir embora, mas
curiosamente, estou ansioso para saber o que se passa entre esses dois.

Me sento no sofá e cruzo uma perna em cima da coxa esperando o que eles
vão fazer. A calça dele está perfeitamente arrumada, e sei que não deve ter o
pinto para fora, por isso só viro o rosto para o outro lado enquanto escuto
sussurros e a Bianca deixa a sala com um sorriso envergonhado.

— Esqueceu como se bate? — ele pergunta irritado, sentando-se no sofá de


frente para mim.

— Com certeza — digo e sorrio para ele — é essa a garota que você
achava que tinha mentido sobre ser virgem só para te fisgar?

— Sim — coça a cabeça — eu estava errado, a Bianca não fez isso, e fui
um asno por ter pensado mal dela.

— O grande Louis Vittileno admitindo que foi um asno, com certeza é o


fim dos tempos — debocho, e ele tem um olhar suave quando me encara.

— Vai fazendo piada seu engraçadinho — se estica e bate na minha perna.

— Onde você passou a noite? — pergunto.


— Com a Bianca — coça o queixo — estamos meio que juntos — dá de
ombros como se não fosse nada demais.

— Tem certeza de que você quer isso? — pergunto sério, sei o quanto o
Louis pode ser desconfiado com as mulheres e para ele se entregar tem de ter um
motivo.

— Sim, eu confio na Bianca — a certeza em seu olhar bate firme dentro de


mim — e sobre o que eu te disse sobre ela...

— Não esquenta — levanto as mãos — é assunto pessoal, e confio mais no


seu julgamento do que no meu — aponto para a porta — aquela moça tem uma
aura doce, não seja um completo idiota.

— O que te aconteceu? — ele me analisa desconfiado e feliz — você


parece diferente.

— Tomei um banho ontem à noite e dormi com o Lorran, acho que


renovou minhas energias — omito sobre a Olivia, ainda tô achando estranho, o
estranho limbo em que acordei.

— Desde quando um banho tem tamanho poder de mudança? Você fala


como se fosse um porco que nunca vê água — debocha, e rio.

Pela primeira vez em muitos anos eu realmente sou capaz de abrir a boca e
gargalhar. Meu Deus, o que está acontecendo comigo, e por que me sinto assim?
Cheio de endorfina.

— Vou nessa — me levanto — tenho de malhar, porque você não dormiu


em casa, e não me acordou para fazermos isso mais cedo.

— Eu malhei de outro jeito — se levanta rindo.


Sinto a estranha vontade de abraçar meu irmão e faço isso, ele retribui com
dois tapinhas na minha cabeça.

— Hoje à noite vou sair, toma conta do Lorran — digo.

— Você saindo? — me olha desconfiado — para onde, e com quem?

— Não é da sua conta, papai — brinco e o Louis fica mais desconfiado,


antes que ele possa fazer outras perguntas eu vou embora.

— Tchau!

Não sei o que aconteceu comigo, mas pela primeira vez em dois anos, eu
quero aproveitar um dia nublado em vez de me esconder debaixo dos
travesseiros. Inspiro fundo e vou para a academia, e depois, a minha sessão no
psicólogo, em que passamos horas falando sobre como me sinto estranho no
estado de limbo.

— Esse pode ter sido o seu ponto de vira Levi — ele diz.

— Não entendo, não aconteceu nada demais.

— Foi um conjunto de acontecimentos, aos poucos você estabeleceu uma


rotina, criou laços com seu filho e seu irmão. Interagiu com outras pessoas, e
mesmo que brigando com a Olivia, ela é capaz de te fazer sentir outra coisa além
da raiva.

— Eu vou continuar assim para sempre? É isso, venci a depressão?

— A depressão é formada por vários estágios, você passou os últimos anos


extremamente deprimido e sem vontade de viver. Agora que passou a realmente
viver os seus dias, você está evoluindo no estágio da depressão em que consegue
ter dias que não são nublados, isso não significa que ela não vá voltar ou que
você não possa ser feliz, somente que você percebeu que tem outros jeitos de
seguir em frente.

— Vou conviver com a depressão por muito mais tempo, é isso?

— Talvez, vamos continuar tratando seus sentimentos e o luto nas nossas


sessões, para que você consiga ter mais dias ensolarados do que sombrios.

— Isso parece uma boa promessa.

— Não é promessa Levi, é o resultado do seu tratamento.

— Certo.

Conversamos mais um pouco e vou embora, busco o Lorran na creche, e


ligo para o Louis buscá-lo que estou prestes a sair. Não acredito que vou usar
meu irmão para cuidar do meu filho enquanto saio com uma mulher. Isso parece
errado e certo ao mesmo tempo. Não consigo processar a fundo o que acontece
comigo, porque a campainha toca, e quando a abro, vejo uma Olivia que nunca
observei antes.

Cabelo solto e de maquiagem, realçando a beleza, vestido soltinho e uma


rasteirinha nos pés, a bolsa na mão enquanto ela me olha com expectativa no
olhar.

Não posso prever o que acontecera hoje, mas sei que estou animado para
descobrir, pela primeira vez em dois anos, não quero só dormir, me dopar e
beber.

Tenho vontade de viver.


Olivia
Levi está decente.

Convenço a mim mesma desse pensamento quando o encontro na porta do


apartamento. Trajando uma camisa de manga ¾ na cor marrom, e calça bege,
com sapato na mesma tonalidade, ele penteou os cabelos para trás, e acho que
nunca consegui ver tanto de seu rosto como nesse momento.

Os olhos azuis com uma depressão profunda e os lábios comprimidos.

Meu estomago dá cambalhotas, e só pode ser sinal de fome, não existe


outra razão para isso acontecer além da necessidade por comida, afinal, não me
alimento desde a hora do almoço.

— Vamos? — pergunto, quebrando o gelo que se passou nos últimos


minutos desde que ele abriu a porta.

— Para onde, exatamente? — fecha a porta atrás de si e sou atingida por


seu cheiro almiscarado.

— Você vai ver — dou meia volta na direção do elevador, aperto a bolsa
sem entender ao certo a ansiedade causada pelo nosso encontro.
— Espero que não esteja me levando para uma balada — resmunga —
devo ter ficado louco em concordar em sair com você.

— Eu que perdi a minha sanidade — reviro os olhos e entramos no


elevador, sozinhos nessa caixa fechada, o ar fica rarefeito e preenchido pelo
cheiro dele.

— Por que me arrastou para isso? — se escora no elevador — você me


detesta.

— Não exatamente, eu só não concordo com sua atitude paterna — dou de


ombros e o encaro de frente — olha eu adoro o Lorran e pretendo ver esse
menino crescer, mas se continuarmos em pé de guerra, em algum momento ele
será prejudicado, e eu prefiro perder um braço a machucar o Lorran.

— Você está passando de todos os limites, não deveria se envolver.

— E você deveria se envolver mais — rosno — o Lorran precisa de um


pai, ficar chafurdando na sua dor, não traz benefício a ninguém, hoje vamos sair
para você lembrar como é viver em sociedade!

— Eu sei que preciso mudar — bufa e mira o chão — estou me esforçando


na terapia, e não bebi uma gota de álcool desde aquele dia, é difícil Olivia — me
encara, por um segundo me arrependo de julgá-lo. Levi tem dor, e vontade de ser
melhor em sua expressão — você pode ter passado pelo inferno, mas sua
experiência não é a minha ou a do Lorran, você me julga sem nunca realmente
me entender.

— Você não está errado — empino o queixo, não querendo dar o braço a
torcer — e vou continuar te julgando enquanto não sentir que você se tornou um
pai para Lorran.
— E quando na sua cabeça julgadora seria esse momento? — arqueia a
sobrancelha.

— Quando ele te chamar de pai, podemos começar por isso.

— Você não tem medo de machucar as pessoas com suas palavras.

Não é uma pergunta, ele já percebeu que não tenho paciência, ou papas na
língua, para ser delicada com quem julgo que não merece.

— Ninguém se importa em me machucar, por que eu deveria fazer isso


pelos outros?

As portas se abrem e saímos sem terminar a conversa. É estranho me abrir


minimamente com Levi, e talvez esse passeio seja uma má ideia. Preciso lembrar
a razão de eu fazer isso: Lorran não pode conviver comigo e com o pai dele se
matando vinte e quatro horas, por coisas idiotas, um pouco de intimidade vai
ajudar na nossa relação com o pequeno.

— Vamos andando — digo a ele quando o vejo parado, olhando para os


lados como se esperasse o motorista — não é muito longe.

— Depende do que você considera longe — ele reclama quando me segue


pelas ruas de São Paulo.

— Vocês moram em um ótimo bairro, zona de gente rica — mostro a


língua e ele revira os olhos — um riquinho mimado como você precisa andar um
pouco.

Levi fica ao meu lado, coloca as mãos no bolso da calça e encara o céu,
como se ele visse algo que eu não fosse capaz. As estrelas acima da nossa cabeça
brilham com algumas nuvens cinzas ao redor. É uma bela noite para um passeio,
caso não chova, se acontecer, estou preparada com minha sombrinha.
— O trânsito daqui é sempre caótico? — ele pergunta, enquanto esperamos
na faixa de pedestre para atravessar na Rua Bela Cintra, ao nos dirigirmos para a
Avenida Paulista.

— Tem dia que fica pior, já tentou andar no metrô? — apresso o passo
quando o sinal fica vermelho para o pedestre, e ele me segue, acho fofo como ele
anda com as mãos dentro do bolso.

— Uma vez, quando fiquei bêbado, entrei no metrô sem destino. Não me
lembro ao certo o que fiz enquanto estava dentro dele.

— Por que você sumiu naquele dia? — pergunto, faz um tempinho que
queria saber o que houve.

— Hum — ele pondera — se eu contar vai te fazer me detestar menos?

— Com certeza não — dou de ombros — mas irei te julgar menos, caso eu
compreenda o motivo.

— No dia anterior eu tinha feito o Lorran chorar — curvo na esquina


pegando a Alameda Itu, e ele passa direto, volto e o puxo pela manga da camisa
— e aquilo me desestabilizou, minha depressão, tem momentos em que eu vejo
tudo perder a cor, o mundo se torna sombrio, e é como se eu caminhasse com
sombras ao meu redor. Quando deixei o Lorran na creche as sombras queriam o
pegar.

Levi se cala, ele encara ao redor como se estivesse pensando se deve ou


não continuar me contando o que aconteceu.

— Você pode falar comigo — toco seu cotovelo.

— O Lorran tem um brilho ao redor dele que sempre afasta as sombras,


mas eu tenho medo de que elas o machuquem e manchem sua alma, como
fizeram comigo. Quando eu te vi naquela manhã, você brilhava igual ao Lorran
— ele evita me encarar — na minha mente confusa eu achava que ele ficaria
melhor com você, que era um raio de sol, do que comigo, envolto em trevas, por
isso sumi e fui beber, desesperado por um alívio no meu tormento.

— Você foi embora por que queria protegê-lo, é isso?

— Basicamente — encolhe os ombros.

— E eu sou um raio de sol? — arqueio a sobrancelha meio incrédula,


nunca me chamaram dessa forma.

— Sim — ele vira o rosto para que eu não o veja, mas consigo visualizar
suas orelhas vermelhas — para de me encher com isso.

— Não estou fazendo nada — sorrio.

Puxo o cotovelo do Levi e o faço parar no meio da calçada e me encarar.


Levi é uns bons centímetros mais alto, suas bochechas estão rubras, e o olhos não
conseguem focar em mim por mais de três segundos antes de desviar. Seguro
suas bochechas e o faço se inclinar para que escute com atenção o que direi.

— Pode me usar como seu raio de sol quando a escuridão te atormentar,


faça o que for preciso para conseguir melhorar e ser um pai para o Lorran.

A forma dele me enxergar como uma luz faz meu coração amolecer para a
sua dor, e quero o ajudar mais do que o julgar.

— Eu não quero um relacionamento com você, amo a Blanca e isso não


vai mudar.

— Não estou oferecendo que tenhamos uma relação amorosa Levi — o


puxo mais ainda, encostado nossas testas uma na outra — somente que use
minha luz para clarear sua escuridão. — O solto — e eu não quero namorar com
você — o encaro de cima a baixo — você não é o meu tipo — me tremo,
simulando que a ideia de me relacionar com ele me dá nojo.

Não acredito que deixei esse idiota amolecer meu coração com o papo de
raio de sol!

— Arrogante — rosna se ofendendo por eu ter me tremido — eu que não


quero você, já estive com mulheres muito mais deslumbrantes.

— E eu acredito — coloco as mãos na cintura — já viu como o Lorran é


bonito? Com certeza puxou a mãe dele, ela deveria ser deslumbrante!

— Uma deusa, ao contrário de você que mais parece uma rata! — tira as
mãos do bolso e as abre apontando para mim.

Arfo, como ele ousa?

— Uma rata que você acabou de chamar de raio de sol! Seja mais
convincente em suas mentiras.

— A depressão me fez agir como louco por dizer isso, sua rata!

Seguro a bolsa com força e bato em seu ombro três vezes sufocando gritos
de frustração antes de me recuperar e começar a andar. Levi não perde tempo e
vem atrás de mim calado e bufando de raiva. Entramos na Rua Pedro João e
depois na Avenida Paulista em silencio total, quero esganar esse italiano
arrogante, como ele ousa me chamar de rata e supor que não sou bonita?

Eu sou linda, e não preciso que esse italiano diga algo para eu saber disso.
Foram anos cuidando da minha autoestima e percebendo como as pessoas
reagem a mim para poder me olhar no espelho com confiança e dizer que sou
bonita, não é ele que vai me fazer pensar minimamente diferente.
— Dá para você me dizer para onde vamos? — pergunta irritado atrás de
mim, acelerei o passo para não ter de ficar ao seu lado, estou muito arrependida
de o ter convidado hoje.

Paramos em frente ao parque Siqueira Campos e aponto para o prédio do


outro lado da Avenida Paulista.

— O Museu de Artes de São Paulo — aponto — vai ter uma exposição


hoje, e achei que ela poderia te ajudar.

— Sobre o que? — se desarma, depois de perceber que nosso passeio é


mais para ele do que para mim.

— Luto e depressão, como sair de um inverno sombrio e aproveitar a


primavera e a cor das flores — vamos para a faixa de pedestre e passamos.

Levi observa o prédio suspenso no ar por quatro colunas vermelhas


enormes. O bloco de concreto espelhados parece flutuar acima de nossas cabeças,
sustentado pela arquitetura perfeita do lugar, me faz lembrar de um bondinho que
é suspenso somente pelos cabos.

— Fica perto de mim para não se perder — peço a ele, Levi acena em
positivo e se posiciona ao meu lado.

Entramos e na porta vemos um quadro negro com uma pequena cabana


pintada em tons de cinza e branco, dentro dela podemos ver uma pessoa apoiada
na janela encarando a escuridão. Levi analisa a obra por minutos antes de se dar
por satisfeito, acredito que para ele, o significado foi mais profundo do que a
mim.

Em seguida, ao entrarmos, somos envoltos por cortinas pretas, o frio


artificial gela meus ossos e me encolho alisando os braços, enquanto percorremos
o corredor.
— É assim que eu me sinto — ele fala baixinho — quando a escuridão
aparece, tudo fica frio e sem perspectiva de uma saída, somente a solidão e a dor.

— Vamos achar a saída juntos — seguro sua mão e o puxo para andarmos
mais rápido, entramos em um corredor e nele tem neve por todo o lado, as
pinturas são de paisagens cobertas pelo gelo, e da pessoa que estava na cabana
andando por cada uma delas, se curvando quando fica difícil caminhar, e
chorando em desespero, olhando para o céu em busca de uma saída.

— É assim para você? — sussurro quando ele para de frente ao último


quadro, do homem olhando o abismo com um pé para fora, decidindo se pula ou
não.

— O abismo só o vi uma vez — ele tem os olhos marejados — quando


soube da morte da Blanca, eu caí no poço sem fundo — seus dedos se esticam
para a frente, sem tocar a tela — estou lá até agora, você acha que ele vai
conseguir sair?

— Vamos descobrir.

Envolvo meu braço no dele, percebendo que Levi perdeu a força nas
pernas, diante do cenário que expõem a sua dor. Eu sempre julguei o meu pai por
ter abandonado a mim e a Bianca quando minha mãe morreu, e ter sucumbido a
depressão, fiz o mesmo com Levi, suas lágrimas nunca fizeram meu coração
amolecer.

Ver o reconhecimento de si mesmo nas pinturas e cenários pelos quais


passamos, proporciona que eu enxergue o Levi como ele realmente é, não a
pessoa que pintei por causa do meu preconceito. Um homem quebrado que
caminha em meio a sombras e frio, sem conseguir visualizar uma saída para a dor
que o persegue.
Torço para que nossa vinda até aqui não seja em vão, e que no final, Levi
possa enxergar o caminho dele mesmo para a luz.
Levi
Estou exposto naquelas pinturas, não conheço o autor, nunca o vi, não sei
se é homem ou mulher. Mas essa pessoa conseguiu pegar a forma da minha dor e
a jogou nessas paredes, com uma precisão que assusta a minha alma, e faz com
que eu trema por dentro por encontrar o reconhecimento do que me aflige em
outra pessoa.

— Vamos continuar? — Olivia puxa meu braço e deixo que me guie.

Entramos em um corredor, feito por cortinas em tonalidade de dégradé.


Preto, cinza, branco, amarelo-claro, mais forte, e por fim, desaguando em uma
sala coberta de grandes telas de girassóis. O homem tem diferentes movimentos
nas telas.

A primeira ele está com medo de sair de sua cabana, fica olhando o lado de
fora com desejo por mais, na segunda, ele dá um passo para fora, e na terceira,
ele sai, e dessa vez o céu que ele encara não é frio e sombrio, mas repleto de luz
azul e amarelo, com flores do lado de fora por onde ele passa.

O abismo que ele encarava em dúvida de pular, se transformou em uma


cachoeira com muitos passados voando ao redor, quase posso sentir o calor que
emana desse lugar.
— É quentinho aqui — Olivia diz ao meu lado e lembro que ela estava
junto comigo, mergulhei na representação artística que acabei me esquecendo da
sua presença, e não notei as pessoas ao redor, imersas no que a obra transmite.

— Sim, quase inacreditável que passamos por aquela sala antes — digo.

— Tem mais uma.

Vamos juntos, as cortinas em cores do arco-íris esvoaçam para todos os


lados, com o vento as movimentando em espiral, na parte final da exposição,
ouvimos o som dos pássaros e o cheiro de flores preenche o ambiente.

Aqui tem somente a estátua de um homem, pintada em diversas cores em


cima de um jardim olhando as flores e feliz. Uma placa ao seu lado com um
texto, me aproximo para ler.

— Quer que traduza para você? — percebo o sarcasmo na voz dela e a


ignoro.

****

Eu perdi minha família para o covid-19.

Primeiro a minha esposa se foi, ela trabalhava como enfermeira.

Nosso menino morreu menos de 3 meses após a mãe.

A caçula, se foi com seis meses, ainda novinha.

Eu tive a doença e me entreguei, pronto para partir.

Mas não era a minha hora e fui curado.

O inverno chegou, e todos os dias eram escuros e frios.


Eu olhava da janela da minha casa, e não entendia como aquilo podia ter
acontecido.

Não existiam mais motivos para continuar vivendo.

As estações mudaram e tudo continuava igual dentro de mim.

Até que olhei para fora e vi o pequeno girassol.

Ele nasceu no meio do meu jardim devastado.

Minha esposa nunca me perdoaria por deixar o jardim dela daquele jeito.

Eu peguei uma pá de jardinagem e tirei o girassol do meio da podridão,


prometi que limparia o jardim, e depois me jogaria do abismo.

Levei meses limpando tudo, e quando finalmente podia plantar novamente,


o inverno voltou, a neve cobriu tudo, e eu não podia ir ainda, não tinha
terminado o jardim.

Quando a neve derreteu, eu peguei as raízes do pequeno girassol que


morreu com o frio e o plantei novamente.

Adicionei novas rosas, todas que minha esposa gostava.

Plantei algumas que lembrava os meus filhos.

Quando terminei meu jardim, eu percebi que não podia o abandonar, ou


ele voltaria a ser destruído.

Naquele dia eu percebi:

Minha esposa se foi.

Nossos filhos morreram.


Mas eu continuava vivo, enquanto eles viveram, eu fui amado e amei, isso
não mudou devido à morte deles.

Naquele dia eu decidi que queria continuar vivendo e cuidando do meu


jardim, para ele que nunca mais fosse devastado pelo inverno.

A vida é somente uma, perder quem amamos é um ciclo doloroso e


cotidiano que a humanidade passa.

Não é errado sobreviver, não é errado sentir dor, não é errado olhar uma
flor e sentir-se feliz.

Os que se foram não tem mais o poder de julgar o que é certo e errado no
mundo dos vivos.

Viva!... A vida continua florescendo, independente do seu inverno


pessoal.

Cabe a você, decidir continuar no frio ou aproveitar o calor.

Obrigado por vir aqui, conhecer a minha dor e ver a minha superação.

****

Enxugo o rosto e noto que Olivia também tem lágrimas nas bochechas.
Levo a mão ao seu rosto, amparando a gota no meu polegar e Olivia me encara,
com os olhos verdes brilhantes de felicidade, mesclado com tristeza e
compreensão.

— Pode continuar olhando para o seu raio de sol — a voz meio


embargada, tiro a mão de sua pele como se levasse um choque.

— Certo — me limito a dizer, com um bolo na garganta.


Saímos da galeria em silêncio, ainda processando o choque que a
exposição me causou. Apesar de não saber o nome do autor, eu compreendi a sua
dor.

Os dias de inverno me arrastaram com tudo para o fundo do poço, e o


pequeno girassol que sorriu para ele se materializou na forma de duas pessoas na
minha vida, meus dois raios de sol, o Lorran e a Olivia.

Por que ela ocupa essa posição na minha vida? Eu não a conheço, nunca a
tinha visto, antes de chegar naquela creche, e agora... saímos juntos, e ela pôde
encontrar algo para fazermos, com força suficiente para tocar a minha alma.

Nada disso parece errado.

— Vamos parar e respirar um pouco — ela aponta para os bancos no


parque, e nos dirigimos para os mais afastados, com privacidade para
conversamos.

— O que você quer falar? — pergunto quando o silêncio começa a ficar


incomodo.

— Eu tinha seis anos quando fiz meu café da manhã pela primeira vez e
acabei me queimando com a manteiga quente — ela desabafa — ia para a escola
todos os dias com as vizinhas me acompanhando porque iam deixar os filhos.
Quando o Dia das Mães chegava, eu sempre ficava triste, a minha não podia mais
ir, e eu era excluída de todas as dinâmicas, mas precisava ficar lá, vendo as mães
brincando com os filhos.

Encaro a Olivia e a vejo mordendo os lábios com força, deixando a pele


fina, branca pela pressão imposta.

— Quando me menstruei pela primeira vez, entrei em desespero, achando


que ia morrer — ela confessa e vejo a água se acumulando no canto de seus
olhos — faz ideia do que é acordar e ver que tem sangue entre suas pernas, sem
entender o que aconteceu? Naquela época eu ainda não tinha tido aulas sobre o
sistema reprodutivo feminino, e menstruação, minha mãe nunca tinha conversado
disso comigo, e foi assustador.

— Não sei como é isso — coço a cabeça.

— Claro que não, você é homem — me olha como se eu fosse um ET, que
não entendeu o que ela quis dizer — para mim o desespero foi a menstruação,
para o Lorran o que você acha que será? Quando ele acordar e perceber que
ejaculou dormindo, e ficar morto de vergonha, ou quando não conseguir
controlar o pênis ereto durante a puberdade. Já parou para pensar que se ninguém
o ensinar, ele nunca vai saber lidar com esses momentos? Com a voz mudando, e
ele sentindo receio de que o ridicularizem.

— Não imaginei nenhum desses cenários — encaro o chão e chuto uma


pedrinha.

— Exatamente, você esteve dois anos perdido na dor do luto, e não parou
para idealizar como seria o futuro com o seu filho, só enxergou a si mesmo. Use
a oportunidade que você está tendo agora de se tratar e aprender a cuidar do
Lorran, para criar um verdadeiro laço com ele, que o faça te chamar quando
quiser falar sobre como controlar o pênis, ou compartilhar o quanto é estranho a
mudança de voz, e quantas outras coisas homens puderem passar.

— Se eu falhar com ele — engasgo, o peito apertando.

— Tudo bem errar, o que você não pode, é continuar caído — ela levanta
— vem — estende a mão para mim e a pego — promete para mim que vai tomar
mais cuidado a partir de agora, e ser um pai para o Lorran? Não o faça recorrer
ao tio para tudo, como eu tive de buscar ajuda nas minhas tias.
— Prometo — aperto a mão dela — você vai me ajudar? Sei que pode soar
ridículo...

— Ei — ela me corta — não é ridículo pedir ajuda, Levi, sei que podemos
continuar nos matando, porque você ainda me tira do sério, mas vou te ajudar,
quando tiver alguma dúvida, me pergunte, pode ser pessoalmente ou por
mensagem de texto.

— Obrigada Olivia.

Acho que essa é a primeira vez em que a chamo pelo nome.

— Se quiser falar sobre a Blanca, eu vou ouvir com prazer — começa a


caminhar e me leva junto — pode declarar todo o seu amor por ela para mim, não
guarde mais a dor aqui dentro — toca meu peito — você não merece sofrer
sozinho.

— Eu falo, mas se você se abrir sobre sua mãe e seu pai comigo — ela
também carrega dor em seu coração — compartilhar nossas dores pode ser útil.

— Eu já contei uma, sua vez.

— Você só fala quando quer me repreender — aponto — não, foi algo do


coração.

— Que piegas Levi — ela ri.

— Como você soube que eu gostava de arte?

— Pesquisei seu nome no Google, e achei muita coisa em sites italianos,


muitos especulam que é você o estilista por trás das coleções lançadas pela
VITTILENO.

— Ganhei uma stalker? — brinco, e ela me empurra com o ombro, noto


que ainda estamos de mãos dadas e estranhamente não sinto vontade de me
afastar, interessante.

— Estava fazendo meu trabalho em prol do meu cliente, não vá se achando


— arrebita o nariz — agora me conte, é você o estilista famoso?

— Você poderia ganhar muito vendendo essa informação, nunca vou dizer.

— Para quem eu venderia? — pisca as pálpebras como uma boneca


inocente.

— Sei de cabeça uns 10 jornalistas que iriam adorar saber que sou o
VITTILENO.

— Ah rá! — Ela para e pula no lugar apontando o dedo para mim — é


realmente você o estilista!

— Eu não disse isso — desconverso.

— Você falou exatamente “que sou o VITTILENO” — Olivia comemora


no lugar, e acho divertido como ela sorri pela sua vitória — quanto será que vou
lucrar com essa informação?

— Faça isso e o Louis te demite — ameaço e ela paralisa me olhando


desconfiada.

— Não, o Lorran nunca permitiria.

— O Lorran não vai conseguir convencer o tio dele a manter a babá que
fará a empresa da família perder ações de investimento por descobrirem que sou
o VITTILENO, e que nos últimos dois anos, outro estilista assumiu a marca por
que não consegui criar um único designer.

— Vamos mudar isso — ela me solta e sinto falta do seu calor — faça um
modelo para mim — Olivia posa na minha frente com uma mão na cabeça e
outra na cintura, a perna para frente meio dobrada e a de trás totalmente esticada,
gargalho pela sua pose ridícula — pode chamar ela de: Olivia o raio de sol!

— Você é ridícula — empurro seu ombro e ela se segura no meu braço


gargalhando.

Olivia tropeça nos pés e perde o equilíbrio, me movo rápido na sua


direção, segurando-a para que não caia. Uma mão na cintura, a outra em seu
pulso, o queixo dela bate contra meu peito, e ela continua rindo feito uma
maluca.

Sua risada reverbera em meu corpo e a acompanho, gargalho olhando o


céu sem entender o que aconteceu de tão engraçado para estarmos soltando o riso
sem restrição.

Pela primeira vez em dois anos eu pude gargalhar sem peso no coração.

Olivia é meu raio de sol, mesmo quando é noite.


Olivia
Levi me tem em seus braços, enquanto gargalhamos da minha pose
ridícula. Não sei o que me deu para agir desse jeito com ele, mas percebo, que
essa foi a primeira vez em me divertir nos braços de um homem, sem medo de
que ele quebre o meu coração, ou esperando que me dê mais do que está
disposto.

Eu não sinto atração pelo Levi, não o amo, e nem o vejo como um
potencial relacionamento amoroso.

Ele é somente o Levi, pai do Lorran, que precisa de uma ajuda para
conseguir sair da depressão e poder ser um ser humano melhor, capaz de cuidar
do filho, e não causar mais traumas nele.

— Então, você estava me falando sobre sua lembrança mais feliz com a
Blanca? — pergunto como quem não quer nada, me afastando um passo ele.

— Não me lembro de mencionar isso.

Tem riso na sua voz e eu adoro como seus olhos ganharam um pouco mais
de vida, comparado à quando o encontrei mais cedo. Sua mão continua em minha
cintura, e aos poucos ela desliza até me soltar, enquanto a que agarra meu punho,
segura minha mão e entrelaça nossos dedos, quando ele nos conduz em uma
caminhada.

— Eu tenho certeza de que você disse como uma chantagem para que não
revele que você é o VITTILENO.

Não me surpreende que seja ele o estilista dos modelos que vi, de alguma
forma, eu soube que tinha a essência do Levi naquelas peças. Todas são
deslumbrantes, carregando com elas uma história em cada corte, e os momentos
em que poderiam ser usadas.

— Acho que é você quem está usando de chantagem comigo — ele ainda
ri, e eu amo o som da sua risada.

— Talvez..., funcionou?

— A Blanca adorava ir a desfiles de outros estilistas comigo, só para eu


apontar erros nas obras deles. — Confessa.

— Ela não teria coragem de fazer isso — fico chocada com a ousadia — é
o mesmo de ficar vendo seu ex com a atual, só para falar mal dela.

— Analogia interessante — ele ri gostoso — quando se é estilista, você


não consegue olhar uma peça de roupa, sem pensar no que poderá fazer para a
deixar melhor. É compulsório.

— O que acha do meu vestido? — pergunto.

Levi para e me encara, sua boca franze enquanto as sobrancelhas arqueiam.


Meu rosto pega fogo por ser analisada de perto por ele, tenho um pequeno ímpeto
de desviar o olhar, mas me mantenho firme. É bobeira me deixar afetar só porque
ele me analisa com cuidado, medindo minhas curvas, me sinto nua diante de sua
presença.
— As alças finas ficariam melhor se fossem transadas nas costas — ele
segura meus ombros e me vira — aqui elas ficam apertadas e sem graça — seus
dedos deslizam na minha pele causando pequenos arrepios em meus braços — se
fossem cruzadas em X — faz o movimento trançando de uma ponta a outra —
daria um ar mais ousado a peça, sem precisar colocar um decote. Você não é uma
pessoa recatada, usar roupas que não combinam com sua personalidade vão te
apagar.

Ele me solta, e não consigo me virar ainda, aconteceu algo nesse pequeno
espaço de tempo que mexe comigo, e não estou pronta para analisar emoções
supérfluas.

Faz um bom tempo desde que estive com um homem, e sinto falta do
carinho, e contato do sexo oposto, Levi só tocou no meu ponto fraco, a qual é a
pele das minhas costas, nada de mais, posso lidar com o arrepio na coluna.

— Bem observado — pigarro para a voz sair normal. — Coloquei um


vestido mais comportado por termos ido a uma exposição de arte, não queria
chamar a atenção.

— Mesmo se tivesse escolhido um que reflete sua personalidade, seria o


mesmo resultado. As pessoas estavam focadas na obra, e ninguém reparou em
quem estava ao seu redor, ao menos eu não notei, e em alguns momentos, acho
que esqueci que estava lá com você.

— Quer dizer que eu não chamo a atenção? — viro para ele, incomodada.

— Não, eu disse que quando nos ocupamos olhando para dentro de nós
mesmo, o mundo exterior desaparece — Levi vira o rosto observando os
arredores — já contei cinco caras diferentes que quase perderam o pescoço
virando para te ver passar.

— Não seja exagerado — abano não acreditando em suas palavras.


— Aquele ali — aponta com o queixo e sigo a direção indicada — guardou
o celular para poder te olhar, e passa a mão na calça a cada cinco minutos, deve
querer saber se somos namorados, ou se tem alguma chance contigo.

O cara realmente parece nervoso, ele é mais novo, posso ver por suas
feições jovens e com espinhas no nariz. Aproveito para observar os arredores, e
Levi tinha razão, realmente chamamos a atenção das pessoas que passam ao
redor, muitas mulheres perdidas na beleza dele.

— Você também é alvo de olhares — digo.

— Eu percebi, só não me importo — dá de ombros, e chega um pouco


mais perto, invadindo meu espaço pessoal — você liga?

— Não — sacudo a cabeça — não quero me envolver com ninguém.

Tenho vontade de compartilhar com o Levi o que irei fazer amanhã, não
contei nem mesmo para a minha irmã, mas a ansiedade que sufoca meu peito, faz
com que eu queira me abrir com ele.

— Posso te contar uma coisa e promete não me julgar?

— Como você tem me julgado? — arqueia a sobrancelha.

— Esquece — reviro os olhos e ando — não sei por que achei que poderia
conversar com você.

— Ei, estava brincando — segura meu cotovelo e nos leva para um banco
— pode falar.

— Quando você não está sendo um escroto, até que é legal — observo.

— Você não consegue passar um segundo sem me ofender?

— É mais forte do que eu — dou de ombros e ele sacode a cabeça.


— Diz o que queria falar.

— Eu quero ser mãe — confesso — sempre quis, mas ultimamente, sinto


como se eu estivesse buscando um sonho impossível.

— Eu percebi como você é apegada a crianças, imaginei que algo assim


pudesse acontecer.

— Já faz um tempo que estou na fila da adoção, e hoje de manhã, liguei


para saber se tinha tido algum progresso, e a atendente me falou que continuava
na mesma. Que a fila para adoção era extensa demais, e que quando chegasse a
minha vez, eu seria informada.

— Não sei o que é maior, as filas de adoção ou as crianças que esperam


para serem adotadas — ele pontua.

— Existem mais pessoas querendo adotar do que adotantes disponíveis, o


problema é que quem vai adotar, pode escolher a criança, se é menina ou menino,
cor da pele, idade é como se — travo, com receio de dizer o que penso e parecer
idiota.

— Estivessem escolhendo qual roupa usar no dia — ele completa minha


frase.

— Exatamente, e isso é tão errado — aperto os punhos — se você gerar


um filho no ventre não poderá escolher como ele será, por que para adotar
precisa fazer isso? É ridículo!

— Deveriam só entrar na fila e a criança que estivesse disponível ser


adotada.

— Basicamente, penso como você — abro a mão e encaro o Levi, ele


observa o céu. — Com o emprego de babá, agora eu posso tentar outro método
para ter um filho.
— Qual? — me encara.

— Inseminação artificial. Basicamente, vou escolher quem será o doador


de espermas disponível na clínica, e depois fazer o procedimento.

— Ainda continua optando por qual roupa usar — tem um pouco de


julgamento em sua voz, e reviro os olhos.

— Não é o mesmo — aponto para um dos caras que me olha — se eu fosse


transar com aquele cara, seria porque o acho bonito com a barba por fazer, e se
eu engravidar, tem chances do nosso filho se parecer com ele.

— Não tenha um filho sem amar o pai da criança, Olivia, isso é


deprimente.

— Falou aquele que é um pai ausente — aponto na sua cara e no mesmo


instante me arrependo. Levi fecha as feições e encolhe os braços rente ao corpo.

— Eu amo a Blanca, e para sempre vou tê-la em meu coração, meu


problema, é não saber lidar com o fato dela não estar aqui — confessa baixinho
— quero ser um bom pai para Lorran, e por isso estou tentando o meu melhor,
não posso esperar te agradar, quando não é com você que eu me importo.

Suas palavras têm fel, e me causam incomodo terrível no estômago.


Prendo os lábios um no outro tentando controlar a resposta que quero dar a ele,
um grande e belo, “foda-se”. Estávamos em um clima de paz grande demais para
ser verdade.

— Isso não importa, eu vou ter o meu bebê, independe de como seja.

— Você me julga por ser um pai ausente, mas estar tendo um filho por
inseminação artificial, vai fazer o seu bebê crescer sem um pai, e no futuro vai
contar a ele que nasceu de uma proveta?
Ele sabe onde me machucar.

É ácido em suas palavras.

Me ponho de pé sem querer o responder mais.

— Ao contrário de você, eu vou fazer com que meu filho de proveta saiba
que é amado. — Bufo — fui uma idiota por achar que poderíamos ter ao menos
uma amizade.

— Não, Olivia — ele se levanta — você só está irritada demais para


perceber que me julga sem olhar as minhas feridas, mas quando jogo sal nas
suas, você se ofende, como se eu estivesse te esfaqueando.

— Tem razão — meu queixo treme e aperto a bolsinha em minha mão —


sou egoísta, e penso mais em mim mesma do que nos outros. Vamos embora,
antes que a pequena trégua que tivemos essa noite vá pelos ares.

— Essa foi a melhor ideia que você teve — ele ferve em raiva.

Odeio admitir, mas eu realmente julguei o Levi por uma situação, em que
eu só vi a como eu me sentia pelo Lorran e do meu passado. Odeio o fato dele ter
falado sobre a minha ideia com insensibilidade, e como se eu fosse
inconsequente que não pensa nas coisas.

— Em prol — engulo meu orgulho — da pequena simpatia que tivemos


um pelo outro essa noite, eu vou guardar meus julgamentos para mim, e espero
que você faça o mesmo e possa agir como um ser humano descente.

— Como quiser — rosna — desde que você saiba como se portar com
outras pessoas.

— Sei perfeitamente — empino o queixo o desafiando.


Levi está perigosamente perto de mim, os olhos penetrando fundo em
minha alma, e sua respiração tocando a minha testa.

Se eu ficar na ponta dos pés, conseguirei sentir o sabor da sua boca, lábios
finos que eu encaro mais do que deveria. Meu estômago dá uma cambalhota, e
viro de costas, mexida, ele consegue me enlouquecer de raiva em segundos.

Antes de ter meu bebê, preciso aliviar a tensão sexual dos últimos meses
sem um companheiro, ela é a única razão pela qual achei a boca do Levi
minimamente atraente.

— Vamos embora.

Começo a andar, e ele vem atrás de mim sem falar mais nada.

Caminhamos em silêncio, e aproveito o momento para colocar a cabeça no


lugar e esfriar minhas emoções. Na frente do prédio, eu paro e o Levi não entra,
ele fica me encarando.

— Desculpe pelo que falei — fico surpresa com suas palavras — sua
situação é completamente diferente da minha, tenho certeza de que se a Blanca
pudesse, ela estaria aqui com Lorran, e eu não seria esse bosta de pai. É diferente
do seu bebê ser gerado por inseminação artificial, você vai estar presente em
cada momento e o amar, não duvido que possa explicar a situação do
concebimento dele sem dificuldades.

— Obrigada... por suas palavras.

Ele coça a cabeça e eu me desarmo, o caminho todo ele ficou refletindo


sobre o que aconteceu entre nós?

— De nada, espero que o clima de amizade não se desfaça pela minha


idiotice, é isso.
Levi não espera pela minha resposta e entra no prédio. Fico atônita na
calçada, processando o que acabou de acontecer. Ele realmente pediu desculpas,
e foi capaz de me entender?

Sorrio.

Levi ainda tem salvação e poderá ser um pai incrível para o Lorran.
Levi
— Vamos Lorran, hora de acordar — o sacudo pela bunda, e ele continua
de cara nos travesseiros, babando.

— Num quelo — responde manhoso e cobre a cabeça com o lençol — hoje


é felia — boceja.

— Hoje é domingo, e vamos almoçar com seu zio e seu nonno, levanta —
puxo seu quadril, obrigando-o a sentar, e ele coça os olhos antes de abrir a boca e
gritar com toda a força.

— NUM QUELO — encolhe a cabeça entre as pernas e coço o pescoço


sem saber o que fazer, já faz meia hora que tento o acordar.

— Será possível? — Louis entra no quarto — não consegue acordar o


menino sem uma briga?

— Ei! — ralho com ele — baixa o tom que não estou fazendo nada de
errado!

— Não, só uma confusão desnecessária — anda até o berço — vamos


Lorran, hora do banho para tomar seu café e podermos sair.
Como em um passe de mágica, o pequeno diabinho levanta os braços para
o tio, e sai do berço sem reclamar, enquanto é levado para o banheiro.

Vou atrás deles sem dizer nada, se o Louis acha que vai poder cortar minha
autoridade como pai, está enganado. No passado as coisas podem ter acontecido
assim, mas agora é diferente, e eu vou dar o banho no Lorran.

Pego meu filho de seus braços e o encaro de rosto fechado, ele pensa em
me responder por dois segundos, antes de franzir a testa. O deixo no meio do
corredor e vou com o Lorran para o banheiro.

— Você não pode continuar fazendo isso, Lorran — falo com meu filho, o
coloco no chão, e me agacho, ficando na altura dos seus olhos — sei que eu não
cuidava de você antes, mas agora as coisas estão diferentes, e eu quero fazer
melhor — seguro sua mão — me ajude para que eu possa ser um pai para você,
certo?

— Ocê num é pai, é o Levi.

A dor irradia do meu coração para meu corpo, percorrendo cada centímetro
de pele, sinto-a na ponta dos dedos das mãos e minhas pernas, que fraquejam.
Não vou permitir que a realidade de como o Lorran me ve, faça com que eu
fraqueje, estou determinado, e permanecerei até meu filho ser capaz de me ver
como pai.

— Não, Lorran, eu sou o seu pai. — A voz embarga e ele franze a testa,
como se fosse estranho pensar em mim assim.

— E mi madre? — noto as lágrimas nos cantos dos olhos dele, nunca falei
da Blanca para o Lorran, e hoje me arrependo disso. O que se passava na cabeça
do meu filho durante todos esses anos? Pensava que não tinha os pais, e que eu
era somente um conhecido que morava com ele?
— Sua mãe morreu quando você ainda era bebê — engasgo com as
palavras, seguro os braços dele e o trago para meu colo — eu sou o seu pai, e a
Blanca a sua mãe, ela te amou desde que descobriu que estava grávida de você.
— Beijo a testa dele quando o Levi começa a chorar. — Não chora anjinho.

— Eu num vou vel ela? — pergunta, no choro baixinho.

— Não tem como, ela foi para o céu — o aperto contra mim — quer ver
uma foto dela?

— Quelo.

Puxo o celular do meu bolso, enquanto o Lorran continua fungando


baixinho, puxando a gola da minha camisa. Busco as fotos da Blanca grávida e
mostro a ele.

— Essa é a sua mãe, Blanca, quando ela estava grávida de você.

— Cadê eu? — segura o celular analisando curioso a imagem.

— Bem aqui — aponto para a barriga dela — os bebês ficam dentro da


barriga da mãe até poderem sair.

— Onde tá a mamãe aglora? — me olha.

— No céu, quando morremos, nossos espíritos são levados para o céu, e de


lá, podemos ver as pessoas que amamos aqui na terra.

— Ela vilou um passainho? — enxugo seu rostinho.

— Não, ela virou luz — aliso seus cabelos, percebendo que o brilho que
enxergo ao redor dele se intensifica. — Sempre que você olhar para o céu, vai
ver a luz do dia ou da noite, e saberá que sua mãe olha por você.

— Eu amo a mamãe — ele beija a foto da Blanca e minha garganta trava.


— E o papai? — pergunto com medo da resposta.

— Talbem, aglora sei que tenlo um papai — ele sobe no meu colo e beija
minha bochecha.

— Me chama de pai, filho? — peço.

— Num de Levi? — leva o dedo ao queixo, pensando — eu golto de Levi.

Dois anos, lembro a mim mesmo, foram dois anos sendo chamado de Levi,
e não reconhecido como pai. Não posso ter pressa, e deixar que aconteça quando
o Lorran estiver pronto para isso.

— Me chame como você quiser — beijo sua bochechinha.

— Celto, bora mimi? — se agarra ao meu pescoço.

— Depois do banho, e do café da manhã.

Ele faz bico novamente e faço cócegas em sua barriga. O ajudo a escovar
os dentes, e depois dou seu banho.

Louis mexe no celular na sala enquanto dou café ao Lorran, noto como ele
tem andado mais sorridente ultimamente, principalmente quando está com a cara
enfiada no aparelho, e fica de risinhos.

— Louis — o chamo, deixo o Lorran dormir no sofá — o que aconteceu


que você tem estado diferente esses dias? — me sento ao seu lado e espio seu
celular, ele fala com a Bianca, com um coração ao lado do nome dela.

— Eu e a Bianca nos acertamos — sorri.

— Minha nossa — cubro os olhos — quase fico cego com sua felicidade
saltando ao seu redor.
— Acho que ela é a mulher certa — encaro o Louis e ele tem uma
expressão decidida.

— O que você quer dizer com isso?

— Lembra quando você me disse que iria se casar com a Blanca, no


segundo dia em que se conheceram?

— E eu estava certo — encosto a cabeça no encosto, lembrar da minha


esposa sempre me traz felicidade, mesclado com tristeza e dor, hoje somente a
alegria me visita.

— Finalmente eu entendo o que te fez agir daquele jeito — Louis imita a


minha pose — eu amo a Bianca, quero me casar com ela.

— Vai fundo.

— Faz cinco meses que estamos juntos, e eu amo aquela mulher — levanta
animado.

— Já se passou todo esse tempo desde que chegamos ao Brasil? Não tinha
percebido.

— Você anda ocupado brigando com Olivia para notar algo ao seu redor.

— Deixe de idiotice, não brigamos mais — viro o rosto para as janelas,


encarando o dia ensolarado.

— Verdade, já tem o quê? Uns três meses, que não a vejo querendo te
assassinar?

— Desde que fomos ao Museu — me arrependo na mesma hora de ter dito


isso.
— Como assim? — Louis se senta ao meu lado novamente — você saiu
com ela?

— Algo do tipo — não quero falar com ele, por algum motivo estranho,
fico com vergonha de admitir.

— Levi, me conte isso agora — Louis engrossa a voz, o que me faz


lembrar o nosso pai quando dava suas ordens.

— Faz uns meses que a Olivia me levou a uma exposição de arte, sobre
depressão e luto, e como o artista conseguiu superar. Eu já vinha me sentindo
melhor antes disso, e ver como um simples girassol o ajudou a voltar a enxergar
o mundo e querer viver, me fez perceber que eu já tenho o meu girassol, e que se
não cuidar dele, vai se tornar um jardim devastado.

Louis fica em silêncio por longos minutos.

— E a vontade de beber?

— Não passou totalmente — admito — quando sinto o frenesi da ânsia


pelo álcool eu me agarro ao Lorran. O ter por perto evita que eu procure pelo
álcool, não quero que ele seja exposto.

— Vocês ainda brigam tanto — Louis suspira — às vezes acho que vou
enlouquecer quando escuto você pedindo ao Lorran para ele fazer algo, e os
gritos começam.

— Lorran não me via como pai — admito — e não sabia que tinha uma
mãe. Não consigo imaginar a dor que causei no meu filho ao longo desses
últimos dois anos.

— Eu disse a ele uma vez que a mãe dele estava no céu — Louis admite
com tristeza — ele deve ter esquecido, ele mal tinha um ano.
— Hoje eu mostrei uma foto da Blanca a ele, acho que vou mandar fazer
um quadro dela, com várias fotos para que ele possa ver a mãe sempre que quiser
no quarto dele.

— É uma ótima ideia.

— E continuarei me esforçando, para o Lorran perceber que sou o pai dele,


e me chamar assim. — Travo por um segundo — eu disse que ele podia se referir
a mim como pai, mas ele achou estranho, que prefere “Levi”.

— É uma escalada — Louis aperta meu ombro — quando ele se sentir


confortável, vai te chamar assim e depois nunca mais parará.

— Eu espero — suspiro.

A campainha toca e fico intrigado com quem poderia ser, a Olivia não
trabalha aos domingos. Já faz um mês que dei esse dia de folga a ela, consigo me
manter mais estável nos cuidados do Lorran, e decidi que esse seria o meu dia
com o meu filho.

Louis pula do sofá depressa e vai abrir a porta, pelo tamanho do sorriso
dele, imagino que seja a Bianca. Ela entra acompanhada da irmã, Olivia veste um
shortinho desfiado, e uma blusa de magas, colada a suas curvas, com um casaco
leve caído nos ombros. O rosto carregado de maquiagem como nunca a vi usar
antes.

É a primeira vez que observo aquela mulher, ela é linda. Olivia tem peitos
fartos no decote singelo, coxas grossas, e panturrilhas torneadas. Os cabelos
presos em um meio coque, realçando a beleza de seu rosto redondo, e os olhos
verdes parecem duas esmeraldas enfeitando sua face.

— Você por aqui? — pergunto — seus dias de me infernizar são de


segunda a sábado, pode ir embora. — A provoco.
— O capeta não pode deixar seus súditos sem a sua presença, ou eles
choram pedindo punição — ela devolve com um sorriso no canto dos lábios.

— Cruzes — Bianca leva a mão ao peito e encara a irmã horrorizada —


isso é jeito de se referir a você mesma, Olivia?

— Estamos só brincando — ela bate o ombro no da irmã — certo, Levi?

— Claro — concordo fingindo que estou sendo forçado a isso.

— Ridículo — revira os olhos.

— Maluca — devolvo.

— Vocês não param — Louis ralha — vamos sair logo, quem sabe em
público eles se comportem bem.

— Você que deve se comportar bem — Olivia devolve — ainda não


aprovei seu relacionamento com a minha irmã.

— Olivia! — Bianca fica uns dez tons mais vermelha — para com isso.

— Sua irmã, que deveria ser aprovada por mim — digo a ela que me fita
furiosa — não sei se te quero na minha família — aponto para ela — sua
selvagem.

— Fica quieto Levi — ela joga uma almofada em mim e a pego, rindo.

— Zia vivia! — Lorran pula no sofá, e se joga no colo dela — tava cum
saldade! — ele sorri e tenho vontade de me estapear, por o Lorran não ter essa
reação comigo.

— Saudade, fofinho — ela toca no nariz dele — já tomou seu café?

— Olivia já são 11 horas, obvio que ele tomou café — ralho.


— Não sei se posso confiar em você — ela me olha de cima a baixo — vai
que enlouquece e come, a refeição do menino.

Lorran gargalha como ele sempre faz quando estamos brigando.

Encaro a Olivia, com riso em seu olhar, imagino que o meu esteja do
mesmo jeito. Estamos bem um com o outro, e apesar das implicâncias, eu gosto
da presença dela, na minha vida.
Olivia
Negativo. / Negativo. / Negativo. / Negativo. / Negativo.

Choro encarando os testes de gravidez em cima do banheiro no meu


apartamento, como é possível? Eu faço tudo o que o médico recomenda, me
alimento melhor, estou na academia, e pouco tenho me estressado, e mesmo
assim, os testes continuam dando negativo.

Eu só quero ser mãe.

Me encolho no chão do banheiro, chorando tudo que a minha alma exige.

O que fiz de errado para merecer esse castigo? Não consigo ter um
relacionamento saudável com um homem sem terminar de coração quebrado, a
fila da adoção nunca anda, e o meu nome não é chamado, consegui dinheiro
suficiente para pagar pela inseminação artificial, e os testes continuam dando
negativo.

Já fiz duas tentativas, o médico avisou que isso poderia acontecer. E agora
me encaro diante do meu terceiro fracasso.

Em cada um dos procedimentos, escolhi homens diferentes, para garantir


que pudesse ter uma maior chance de acerto, mas ao contrário do que imaginei,
só estou tendo decepção em cima de decepção.

Qual foi o meu maldito pecado para ser castigada com o desejo ardente de
ser mãe, e nunca conseguir engravidar ou adotar? Se ao menos um desconhecido
filho da puta me engravidasse, mas nem essa maldita sorte eu dou, pois não tenho
coragem de me relacionar com caras que não conheço, e quanto mais espero,
mais o tempo passa, e meu sonho se torna uma realidade nublada de pesadelos.

O alarme do celular toca em cima da bancada do banheiro, meu corpo dói,


a cabeça lateja, e tudo que eu queria, era poder me encolher debaixo da cama e
fingir que o mundo não existe.

Ao menos hoje, quero desaparecer e não olhar a luz do sol. É assim que o
Levi se sente? Como ele conseguiu continuar vivo com uma dor como essa,
assolando seu coração e caminhando no mundo sem cor?

Eu devia ter pegado mais leve com ele quando nos conhecemos.

Ele não é má pessoa, só alguém com depressão que precisou de ajuda para
se erguer, e poder formar laços com o filho. Lorran, meu pequeno anjinho de
sorriso lindo, ser a babá dele é uma benção e um tormento, eu o tenho para mim
ao mesmo tempo que não.

Limpo minhas lágrimas e lavo meu rosto, preciso ir trabalhar, e não posso
deixar que minha tristeza interfira na forma como cuido dos meus alunos, todos
eles precisam de atenção e cuidado, e não de alguém com o coração quebrado
pelas sucessivas decepções da vida.

Eu fiz todos os exames, o médico me garantiu que meu útero era saudável
e estava apto a gerar um bebê, então por que eu não consigo? Soluço, a água do
chuveiro se mesclando com o meu choro.
Evito tomar o café para não enjoar mais do que já me sinto, caminho para
fora, e vou para a creche, uso o tempo andando para tentar limpar a minha mente.

Minha poupança foi quase zerada com o tratamento, preciso juntar grana
novamente para poder fazer outro tratamento, e isso vai demorar no mínimo uns
três meses. Ainda tenho contas no cartão para pagar do último tratamento, e não
sei se consigo aguentar mais uma falha, por enquanto, vou focar em colocar a
cabeça no lugar.

Chego na creche, e percebo que estou atrasa, quando vejo a inspetora que
está recebendo meus alunos, e conversando com as mães, avisando que não sabe
o motivo do meu atraso.

— Bom dia — cumprimento a todas — desculpem a demora, não acordei


me sentindo bem.

— É gripe? — a mãe do Eduardo pergunta franzindo o nariz.

— Não senhora, somente cansaço.

— Imagino, ficar o dia todo com essas crianças e depois ser babá — a
crítica em sua voz não me passa despercebida — se eu soubesse que podia te
contratar, teria oferecido antes.

— O Lorran é um caso especial, ele precisava de alguém que falasse seu


idioma e pudesse o ajudar com o português.

— Contratassem uma professora de línguas!

Mordo a bochecha com o sangue fervendo para não ser grosseira com ela.
A Sofia é a mãe de um dos meus alunos, e devo sempre sorrir e ser gentil,
independente das idiotices que falem.
— Eduardo tem uma ótima babá — digo, por fim — ele não precisa dos
meus cuidados.

— Mas você é mais instruída do que aquela tonta — revira os olhos — eu


te pago o dobro para ser babá dele, o que acha?

— Desculpe Sofia, não é assim que funciona.

— Não seja esnobe, Olivia — ela me encara com fúria e arrogância —


passe na minha casa mais tarde e vamos acertar os termos.

— Ela não vai para lugar nenhum!

A voz grossa e potente diz atrás de mim, em um português, claro e firme.


Giro no lugar e dou de cara com Levi, encarando a Sofia com severidade, Lorran
em seu colo, observa o pai e imita a pose dele, tenho ímpeto de rir do pequeno,
mas o jeito que o Levi se porta, desperta algo dentro de mim.

— Não percebe que está sendo inconveniente? — Ele continua, não sei
como a Sofia ou a inspetora reagem. Estou focada demais em como meu ventre
aperta ao ver a masculinidade do Levi, a mandíbula travada, os olhos
enraivecidos, e as feições fortes e sexy, enquanto ele me defende.

— Q-quem é você? — Sofia pergunta.

— O pai do Lorran, e a pessoa de quem você quer roubar, a babá é do meu


filho, não permitirei que faça isso, a Olivia é a única que vai cuidar dele.

Eu poderia ser a mãe do Lorran.

Levi defenderia a esposa com esse mesmo vigor.

Ele envolve a mão no meu braço e me puxa para o seu lado.


Por que eu não tenho repulsa ou tento frear os pensamentos sobre fazer
parte dessa família? As batidas do meu coração ganham força ao passo que a
situação vai mexendo comigo, e abalando minhas estruturas.

Eu nunca o vi dessa forma, e ele é a primeira pessoa que me defende


quando me atacam. Sempre fiz isso sozinha, cuidei de mim mesma e dos outros,
lutei as minhas batalhas sem precisar pedir ajuda.

Ser cuidada, e sentir como se pudesse confiar em alguém e nas atitudes


dele, e que tudo dará certo. O calor que preenche meu peito, e faz meu coração
disparar, ansioso para saber quais serão suas próximas palavras, é resultado de
saber que tem alguém lutando por mim sem que eu peça ajuda?

Como seria me jogar em seus braços e deixar que ele me envolvesse igual
como faz com o Lorran? O pequeno também faria isso por mim, certo? Mordo a
bochecha tentando frear o descontrole emocional que me acomete, estou
fragilizada pelos negativos de hoje de manhã, e imaginando coisa onde não tem.

Pois pensar que Levi possa ter sentimentos por mim, para me defender,
abre brechas no meu coração que não poderia acontecer. Ele ama a esposa
falecida, tem se esforçado para criar vínculos com o filho, e nunca me olhou de
outra maneira que não seja com deboche, raiva, ou diversão, nunca o vi agir com
carinho ou proteção comigo, como nesse segundo.

Esse não é o Levi que eu conheço.

O outro é fácil me manter distante e não desenvolver sentimentos.

O Levi que me defende é um perigo para as minhas emoções.

— Agora entendo o motivo dela ter aceitado ser babá, com um homem
como você por perto — Sofia empina o nariz, e fico envergonhada por ela
insinuar que aceitei o cargo pelo Levi.
— Olivia aceitou ser babá porque o meu filho precisava dela, sua
amargurada. Não sabe nada sobre a minha família, ou a mulher que você quer
ofender, continue falando essas barbáries e irei te processar por insinuar que a
Olivia e eu temos um caso, a desmerecendo.

— Vamos nos acalmar, sim — a inspetora mede com um sorriso amarelo, e


recobro a noção do que acontece ao nosso redor.

— Sofia, por favor, não faça comentários desse tipo sobre mim — peço —
a diretora sabe que sou babá do Lorran, e concordou, ela, ao contrário de você,
está ciente da situação da criança.

— Que seja — Arrebita o nariz e vai embora.

— Desculpe por isso, Olivia — a inspetora pede — ela estava insistindo


em como a babá do Eduardo é, nas palavras dela, inútil... e queria que você
assumisse o lugar dela.

— A culpa não é sua, pode ir que eu tomo conta das coisas agora — agraço
a ela com um sorriso forçado.

— Você — Levi volta a usar o italiano — não deveria sorrir forçado — o


encaro, e sua mão vem a minha bochecha, alisando a superfície — fica mais
bonita quando o faz naturalmente.

— Isso foi uma cantada? — pergunto em baixa voz, ele me envolve em


uma bolha de calor que alivia a dor em meu peito.

— Não, Olivia, foi a verdade — me puxa um pouquinho para perto e toca


meu nariz — meu raio de sol deve sorrir quando sentir vontade, não quando
achar que deve.

— Não acredito que me chamou assim — arquejo.


— Tive de aceitar — sua mão se vai, e ele dá de ombros antes de beijar a
cabeça do Lorran — vocês dois são meus raios de sol. O que acha de jantar fora
hoje?

— Uma boa ideia — aceito, e dessa vez preciso conter o sorriso que insiste
em ganhar caminho no meu rosto.

— Saímos antes do Lorran dormir.

— Combinado, vou em casa buscar uma muda de roupa antes de ir para o


apartamento, após o expediente — coloco um fio de cabelo atrás da orelha.

— Eu te levo, e depois vamos para casa.

“Casa” soa diferente agora que foi pronunciado pelo Levi com carinho.

Ele realmente considera o apartamento o nosso lugar de convivência


familiar, admito que penso que moro mais lá do que na minha casa, e o quanto
me sinto mais confortável cercada por eles dois, do que sozinha.

— Zia vivia — Lorran chama, a carinha de interrogação, sem entender por


que não falei com ele ainda.

— Oi, meu pequeno — o pego no colo e encho sua bochecha de beijos. —


Até mais tarde Levi.

— Tchau Levi — Lorran manda beijinho para o pai que retribui e vai
embora.

Levi tem costas largas, e uma bunda avantajada. Meu rosto queima por
perceber o quanto esse homem parece atraente, ele tem ganhado peso desde que
passou a malhar com o irmão, e isso cai bem nele. Traz vida a quem, antes, era só
um zumbi. Levi começou a viver, em vez de somente existir, e sou feliz por ele
conseguir isso.
— Vamos fofinho? — pergunto ao Lorran quando retorno ao presente.

A maioria dos meus alunos estão na classe, espero mais um pouco pelos
que ainda faltam entrarem, e depois fecho a porta, e dou início a manhã de
atividades, hoje vou preparar eles para cantarem a música que será usada no
festival da creche, no final do mês.

O dia passa lentamente, e conforme me distraio com os pequenos, o aperto


no peito vai aliviando até se tornar somente um incômodo.

O dia termina, e vou com o Lorran para o SUV preto que nos espera na
porta da creche, lá dentro, Levi está sentado, usando uma calça branca e camisa
bege, noto o relógio prateado no pulso, e o sorriso em seu rosto.

Ele tem feito mais isso ultimamente, sorrindo e se arrumando. O cheiro


almiscarado domina o ambiente do carro, e agradeço aos céus pelo Lorran ficar
entre mim e o Levi no banco, ou iria sufocar de tanto cheirar esse homem no
pescoço. Meu baixo ventre aperta, e sinto desejo pelo Levi, não deveria me
portar dessa maneira, mas é impossível controlar o que o meu corpo dita que
sentirei.

— Pronta para sairmos juntos? — pergunta quando retorno ao carro, após


ter trocado de roupa.

— Você fala como se estivéssemos em um encontro — aponto, preciso que


ele fale que estou ficando louca e que tire essa ideia maluca da minha mente.

— Seria quase isso se o Lorran não fosse junto.

Desgraçado.

Meu coração dá um solavanco enorme dentro do peito, que o sinto batendo


até a minha garganta. O Levi não tem o direito de me fazer acreditar que estamos
tendo um encontro, ou que ele tem sentimentos por mim. Ele ama a Blanca, eu já
vi o quanto esse amor é forte, não é justo me iludir.

— Não me iluda Levi — peço.

— Eu nunca faria isso com você — sua mão estica até segurar meus dedos.
— Gosto da sua companhia Olivia, e quero passar mais tempo com você, não é
nada de mais, somos só bons amigos.

Ele não quis dizer isso, noto só pelo jeito que engole em seco, e como seu
olhar desvia para o lado.

— Eu só quero continuar me sentindo bem — agora ele me encara e vejo a


verdade em suas palavras — me ajuda a continuar vivendo.

— Claro.

Engulo em seco, sabendo o perigo que estou me enfiando com essa


promessa.
Levi

Noite anterior ao encontro


Eu quero falar com alguém sobre os sentimentos que corroem a minha
alma. Meu psicólogo me incentiva a ir em frente, diz que é bom para mim voltar
a sentir desejo por outra mulher, e que não é errado, pois eu continuo vivo, e
quando aceitei buscar a melhora, esse era um dos passos que eu iria acabar
dando.

Convivendo com outras pessoas e passando a apreciar a companhia delas,


mas tinha de ser logo a Olivia?

Aquela mulher maluca me tira do sério mais vezes do que sou capaz de
contar, e ainda assim, anseio a encontrar todos os dias de manhã com um sorriso
no rosto para receber o meu filho em seus braços, e depois no apartamento, onde
fica, horas brincando com ele e brigando comigo. Eu gosto das nossas
discussões, de ver como ela fica vermelha, com os olhos em chamas, decidindo
se me bate com as mãos ou com uma panela.

Provocar a Olivia me faz sentir vivo, torna a dor que rasga meu peito pela
morte da Blanca, mais fácil de lidar. O medo não vai embora, e volta a ganhar
espaço na minha mente, quando penso que posso ser o causador de alguma
tragédia para a Olivia, por se envolver comigo.

Meu psicólogo tenta com afinco fazer eu perceber que não tive culpa no
acidente da minha mãe, e no da Blanca, que foi um acaso do destino que elas
tenham morrido.

Não consigo me convencer disso com a facilidade que ele o faz, e gostaria
de comentar sobre, com o Louis, nunca o deixei saber que me sinto culpado pela
morte delas. Ele também perdeu a nossa mãe, posso ouvir sua voz me
questionando como seria minha culpa se eu não estava naquele carro, e não era
motivo dela voltar para casa.

Foi só mais um dia normal em que o inesperado aconteceu, do mesmo jeito


com a Blanca. As duas mulheres que mais amei na minha vida, mortas da mesma
forma, como eu não poderia ter relação com isso? Nem que seja amaldiçoando-as
com o meu azar ou que merda for.

É impossível pensar que se eu não as conhecesse, aquilo tudo não teria


acontecido, e elas ainda estariam preenchendo o mundo com cor.

Ouço o toque do celular em cima da mesinha de cabeceira no meu quarto e


pego o aparelho, o número da minha irmã pisca na tela, e fico surpreso, aqui já
passa das 4 horas da madrugada, para ela deve ser umas 00h.

— Oi — atendo.

— Te acordei? — Lira não está bem, percebo pelo seu tom de voz rouco, e
o fungado em seu nariz.

— Não, aconteceu alguma coisa? — sento-me na cama — quer falar por


vídeo?

— Pode ser.
Ela desliga, e dou inicio a uma chamada de vídeo, ligo o abajur para que
ela possa me ver, e quando o rosto da Lira aparece do outro lado, eu tenho
vontade de pegar um avião para Los Angeles e poder quebrar a cara de quem
machucou a minha irmã.

Os olhos vermelhos e inchados, a boca inchada, o nariz escorrendo, e


vermelho de uma ponta a outra, o choro se derrama em suas bochechas como
uma cachoeira.

Por ser branca e loura, como eu e Louis, Lira quando chora, fica parecendo
um pimentão e quando ela se transforma em um pimentão inchado, significa que
alguém partiu seu coração.

— Quem é o babaca que devo matar? — pergunto em um rosnado.

— Você parece tão bem — ela soluça e volta a chorar — eu quero ir para
casa, mas não posso abandonar a filmagem no final, vem ficar comigo Levi?

A tristeza por ver minha irmãzinha se desmanchando em lágrimas coloca


em segundo plano todos os meus problemas, e tudo o que eu preciso agora, é
poder cuidar da Lira. Ela sempre foi um doce, ao contrário do Louis e de mim,
que somos mais centrados. Lira esbanja sorrisos e gracejos, fazendo amizade
fácil e se apaixonando mais ainda.

— Quem te magoou? — pergunto, aperto o punho, não quero a chatear.

— Essa é a primeira vez em dois anos que você se preocupa comigo —


soluça novamente — eu quero um abraço — a voz desanda em um choro
sensível.

— Lira, fala comigo, por favor. O que aconteceu com você?

— Eu conheci esse cara — ela funga e esconde a cabeça no travesseiro —


ele é bem mais velho do que eu — é um pouco difícil de entender sua voz
abafada — e ficamos somente uma noite, e eu me apaixonei por ele, foi coisa de
amor à primeira vista Levi.

— Você sempre diz isso. Lira — suspiro, já perdi a conta de quantas vezes
ela se apaixonou à “primeira vista”.

— Dessa vez foi diferente — ralha. — Se for me julgar eu desligo, se eu


quisesse ouvir como sou inconsequente teria ligado para o Louis!

— Desculpa, o que o babaca fez?

— Ele é casado! — grita. — Aquele desgraçado tirou a aliança e ficou


comigo, e depois o vi a colocando no dedo, e ele admitiu ser casado, e agora
tenho de o encontrar diariamente nas filmagens porque ele foi cotado para a
administração do estúdio, e a esposa dele é a atriz principal da série que estou
dirigindo! Eu quero me encolher, sempre que o vejo com ela — grita e fecho os
olhos sentindo dor nos tímpanos.

— A esposa dele sabe sobre vocês?

— Não, e o pior de tudo, é que ela é legal — suspira — eles que são
estranhos juntos, parece que estão fazendo aquilo forçado.

— Por que você acha isso?

— A Candice sempre sorri para todo mundo e dá bom dia, traz café, e
nunca reclamou quando a mando repetir a mesma cena 300 mil vezes — funga se
preparando para um novo choro — mas quando ela fica no mesmo ambiente que
ele, é como se a alma da mulher fosse sugada para marte, e dá para perceber
que eles não se suportam, mas ficam se abraçando e se beijando no estúdio.

— O casamento deles pode estar em crise — Lira fica com fúria no olhar.
— CLARO QUE ESTÁ! — Grita — e aquele babaca ficou comigo, e agora
tá pegando a diretora de imagem! Eu vi os dois transando no trailer dela hoje de
manhã. Eu quero morrer e nunca mais olhar para ele — geme e volta a esconder
o rosto — e ele ainda teve a coragem de ficar falando comigo como se não nos
conhecêssemos.

— Arruma outro homem e faz ele ver vocês juntos. Aposto que deve ter
algum ator bonito querendo pegar a diretora deles.

— Seu escroto desgraçado, espero que morra engasgado — bate o celular


no travesseiro.

— Você já fez isso antes. Lira — a lembro — é a sua principal arma para
poder fazer um cara perceber que ele não tem importância na sua vida.

— Mas eu gosto desse desgraçado — ralha, e escuto quando ela esperneia


na cama.

— Desgoste!

— Você fala como se fosse fácil — volto a ver seu rosto — me conta
alguma novidade para me distrair? O Louis não atende o telefone, e você sempre
foi ótimo em me fazer sentir melhor.

— Acho que posso estar gostando de alguém — confesso para ela.

— Me conta tudo, isso é a melhor distração que você poderia me dar —


limpa os olhos.

Pela próxima hora relato para a Lira como foi o meu envolvimento com a
Olivia, e como a terapia tem me ajudado a entender meus sentimentos, e poder
colocar a cabeça no lugar.
Confesso para ela o medo que sinto de colocar a Olivia em perigo, e que
ainda acho que posso acordar qualquer dia com a dor dominando minha alma
novamente, e me excluindo da vida que construí para mim.

Falo sobre o Lorran, que estou determinado a fazer com que ele me veja
como um pai.

— E é isso — dou de ombros, olho para a janela e vejo o sol nascendo, não
dormi nada, e daqui a pouco vou preparar o café do Lorran.

— Levi você não faz ideia do quanto é bom saber que voltou a viver.

Lira tem os olhos menos inchados, e parou de chorar já tem uns 45


minutos.

— É estranho para mim — admito — eu ainda amo a Blanca, não posso tê-
la, porque ela morreu, mas não sinto que estou a traindo. Acho que estou
aceitando que ela realmente se foi, e não poderemos mais ficar juntos.

— A Blanca foi uma das pessoas mais legais que conheci — Lira sorri —
eu amava passar as noites conversando com ela e tomando sorvete, enquanto
você estava ocupado no ateliê, desenhando sua próxima coleção.

— Ela nem tentava me fazer parar de desenhar, somente aceitava que eu


focava, e o mundo ao meu redor desaparecia.

— Exatamente, ela teria sido uma mãe incrível para o Lorran. — Lira se
cala, e sinto que ela quer dizer mais — se eu passar dos limites me interrompa,
mas...

— Pode dizer.

— A Olivia parece amar muito o Lorran e você gosta dela, talvez essa seja
a chance de você voltar a amar, e do Lorran ter uma mãe. Não estou dizendo que
ele não tenha uma, mas sem a Blanca, ele vai crescer sentindo falta desse
carinho — Lira desvia o olhar da tela — às vezes eu queria que o nosso pai
arrumasse uma madrasta, somente para eu poder ter uma figura feminina para
me ajudar na adolescência. Se eu a tivesse, agora estaria buscando conselhos
maternos, ela saberia o que fazer com aquele filho da puta.

— Pega outro na frente dele — digo e ela gargalha — o pai nunca,


escolheria alguém ruim, deve ser por isso que não se apaixonou de novo.

— Você podia conversar com ele, de um viúvo para o outro, saber o que
ele pensa sobre se relacionar novamente.

— Vou fazer isso, obrigado.

— Estou aqui para quando precisar, e Levi — Lira sorri — você não tem
culpa da morte da nossa mãe ou da Blanca, a mamãe estava voltando para casa,
e a Blanca teria ido naquele desfile, com, ou sem você. Se privar de viver uma
nova experiência com a Olivia fará você não viver o amor novamente, e o
Lorran crescer sem uma mãe, dá uma chance para ela, significa uma segunda
oportunidade para vocês dois.

— Você tem razão — admito — acho que estou me preocupando demais.

— Você sempre foi assim — ela ri — lembra que ficou um ano pensando
em diversas formas de conquistar a Blanca, ao mesmo tempo, em que achava
que ela iria te dar um pé na bunda diferente, para cada nova ideia que você
tinha.

— Eu estava certo em todas, ela massacrou meu coração — é gostoso falar


da Blanca com a Lira.

— Deixe de ser dramático, você tinha uma fama de galinha maior que o
Louis.
— Nossa mãe ficaria decepcionada por como os três filhos dela tinham
fama de galinhas.

— Eu sempre fui uma lady! — a voz sobe um oitavo.

— A lady, que me liga de madrugada chorando por causa de homem, pega


outro na frente desse desgraçado e tudo ficará bem.

— Eu pego, se você chamar a Olivia para sair.

— Feito.

Eu já queria fazer isso, vou usar como um pretexto para que a minha irmã
possa superar o babaca que a faz sofrer.

— Quero uma foto de vocês dois juntos, não esqueça.

— Digo o mesmo de você.

— Venha me visitar.

— Lorran só terá férias daqui a uns meses para podermos viajar, enquanto
isso, venha ficar conosco quando as filmagens acabarem.

— Vou sim. — Gosto de a ver sorrindo, diferente de quando iniciamos a


ligação.

— Você fica linda ao sorrir.

— E você é um galanteador de primeira — Lira boceja — vou dormir, até


mais Levi.

— Tchau Lira.

Desligo, e me sinto mais leve, o sono bate e decido dormir um pouco,


antes de acordar o Lorran.
Olivia
— O que vamos fazer? — Lorran fala devagar cada palavra para acertar a
pronúncia.

— Vamos jantar — Levi responde e pega o filho no colo quando saímos do


carro.

— Oba — bate palminhas.

O restaurante é deslumbrante, acho que nunca estive em um lugar de


aparência chique. A frente é feita em madeira, com vidros mostrando o ambiente
interno iluminado por lustres, com plantas em cada coluna, um ar rústico e
sofisticado.

O maitre nos leva a uma mesa com cadeira para crianças, ao lado das
janelas com fonte de água, do lado de fora, pequenas luzes ao redor.

— É lindo — comento quando nos sentamos, Levi sorri para mim e


acomoda o Lorran antes de se sentar na cadeira de frente.

— Foi indicação do motorista, ele disse que os antigos patrões gostavam


de vir aqui.
— Não pesquisou na internet? Jurava que você tinha feito isso.

— Odeio pesquisar lugares na internet — franze o nariz — gosto de


indicações de quem já foi no lugar.

— Com certeza essa foi uma ótima aposta — sorrio para ele.

Estava me sentindo péssima de manhã, passar a tarde na creche ajudou a


aliviar a dorzinha no meu coração. Ficar aqui com Levi e Lorran me faz esquecer
de que quero desesperadamente um filho, e me iludo que tenho uma família que é
minha. Meu filho, Lorran, e meu marido Levi, como se um dia essa ilusão
pudesse ser real.

— Passei a noite em claro — ele admite — desculpe se eu estiver


parecendo cansado.

— Você tem um ótimo aspecto — sorrio por que acho que é a única coisa
de que consigo fazer no momento — por que me chamou para sair? É realmente
sério o que você disse no carro? — desvio a atenção para o Lorran, que assiste
um desenho no seu Ipad.

— Sim — ele estende uma mão e toca a minha por cima da mesa — eu
passei os últimos dois anos em depressão profunda, e sei que ainda não estou
recuperado, às vezes ainda sinto as trevas tomando conta da minha mente, e
quando isso acontece, eu olho para o Lorran ou para você, e a calma retorna.

Seus dedos acariciam os meus.

— Talvez eu esteja sendo um escroto por usar você para me sentir melhor,
mas eu quero isso, Olivia — seus olhos brilham pela sinceridade em suas
palavras — poder me sentir vivo novamente, e ter sentimentos por outras
pessoas, por você.
— Levi, eu já me machuquei muito em relacionamentos passados —
pigarreio forçando a voz a continuar firme — você ainda ama sua ex-mulher e
não sei se tem lugar para mim ao seu lado.

— Eu sempre amarei a Blanca — me magoa a certeza com que ele diz isso
— ela é a mãe biologia do Lorran e a minha primeira esposa, é a mulher com a
qual eu tive maior envolvimento amoroso e me casei, eu quis uma vida com ela
— tento puxar minha mão e ele não deixa — não nos separamos porque o amor
acabou, ou porque um magoou o outro, ela morreu, e eu continuo aqui.

Uma lágrima escorre pela sua bochecha e ele se apressa em a enxugar com
a mão livre. Minha garganta trava com a vontade de chorar, o amor à primeira
vista não existe para mim, e nenhum outro tipo.

— Eu sei que se ela estivesse viva eu não me apaixonaria novamente,


porque eu tinha a mulher dá, minha vida comigo. Eu nunca vou te enganar
Olivia, amei a Blanca no passado, e ela continuará tendo um lugar no meu
coração enquanto eu viver. — Ele inspira fundo. — Mas é somente isso que será
daqui em diante.

— O que você quer dizer? — pergunto em um fio de voz.

— Meu relacionamento com ela acabou no segundo em que ela morreu e


eu continuei vivo. O amor pode continuar, mas é somente isso que me restou
dela, o amor, e o Lorran — olha para o filho — eu te detesto — ele me diz isso
com carinho no olhar, e riso nos lábios — dou risada — você me deixa louco
desde o segundo em que nos conhecemos na sala da diretora, quando matriculei o
Lorran na creche, e os últimos cinco meses tem sido um verdadeiro campo
minado.

— Você é um insuportável! — acuso e gargalho, apesar das ofensas eu me


sinto feliz.
— Você também não é flor que se cheire, e como um maldito viciado que
sou, quero continuar cheirando a flor que me deixa louco de raiva em uma
proporção mais forte do que o voo de um foguete.

Gargalho e ele faz o mesmo, Lorran nos encara rindo, e começa a rir
também.

— Qualquer dia eu jogo uma panela na sua cabeça — enxugo as lágrimas


formadas pelo riso.

— E garanta que vai me levar ao hospital depois, ainda quero ser o pai do
Lorran.

— Farei esse favor a você, mas só por causa dele.

— É isso que eu quero Olivia — Levi fica sereno — continuar implicando


com você e me divertindo nas nossas briguinhas. Você me fez voltar a querer
viver novamente.

— Eu não fiz nada, você já tinha começado a terapia quando eu cheguei e


tentava se aproximar do Lorran.

— É verdade, vou reformular a minha frase, já que a senhora chatinha não


me deixa dar a ela alguma importância.

— Prefiro assim — arqueio o queixo e ele ri.

— Eu dei um passo, porque queria melhorar, e você segurou a minha mão


me ajudando a seguir em frente. Não foi com carinho ou delicadeza, como todos
ao meu redor faziam, você me jogou na beira do abismo, e me deixou escolher
pular ou voltar para seus braços, e hoje eu tomei essa decisão. Eu não vou pular,
vou segurar sua mão — aperta — e quero que caminhemos juntos para longe do
abismo, se você conseguir aceitar que eu sempre amarei a Blanca, mas isso não
vai me impedir de um dia te amar.
— Todo esse discurso e você ainda não me ama? — finjo de ofendida e ele
dá de ombros, fazendo uma carinha fofa.

— É mais ódio do que outra coisa, tenho uma veia masoquista bem aqui —
aponta para a cabeça.

— Adoro — rosno para ele que torna a gargalhar.

O peso que sentia em meu peito desaparece como bolhas no ar.

— Eu aceito seus sentimentos pela Blanca, compreendo que ela é a


verdadeira mãe do Lorran, e seu amor. Eu já fui muito rejeitada pelos homens
que amei, Levi — engulo em seco — obrigado por ser sincero comigo.

— Se um dia eu encontrar os babacas que partiram seu coração, eu vou dar


um soco neles, e depois agradecer por deixarem você livre para mim.

— Promete que será sincero comigo, e não vai me rejeitar? Não sei se
aguento outro golpe.

— Eu juro — ele beija meus dedos — vou proteger seu coração, igual a
como você aceita o meu cheio de cicatrizes.

— Vamos devagar — miro o Lorran — ele também será afetado se esse


arranjo não der certo.

— Eu perderia meu filho para você, tenho certeza — brinca.

— Você é esperto — gargalho.

— Vamos pedir?

— Claro.

Ele chama o garçom, e quando o homem se aproxima, eu fico em choque


ao ver Roberto, com a roupa branca e o avental preto, segurando um cardápio,
vindo até nós.

Ele tem um sorriso no rosto que murcha no instante em que me ve


acompanhada do Levi, e do Lorran.

— O-Olivia — gagueja.

— Oi — desvio o olhar, a humilhação que senti na formatura, quando o vi


com a família e a namorada, retorna.

— Quem é ele? — Levi pergunta em italiano, com uma sobrancelha


arqueada, encarando Roberto e a mim.

— Um dos babacas que partiu meu coração — respondo em italiano, e


ergo o queixo.

— Não sabia que você tinha casado — Roberto encara o Lorran e o Levi,
com um sorriso amarelo no rosto — e teve um filho!

— Por que da surpresa? — Levi pergunta a ele em português — não se


dirija a minha esposa com intimidade.

Tenho um solavanco quando ele me chama de esposa com naturalidade,


como se fosse corriqueiro em seu dia a dia me apresentar como sua.

— Desculpe por isso, senhor — Roberto abaixa a cabeça.

— Chame outro garçom para nos atender — Levi pede.

— Sim, senhor.

Roberto vai embora e respiro aliviada por me ver livre de sua presença.

— O que ele fez com você?


Conto a ele todo o envolvimento que tive com o Roberto, enquanto
esperamos os pratos que pedimos a um novo garçom, chegar. Lorran fica irritado
porque falamos em português, e começa a fazer birrar para usarmos o italiano.
Cedo, e evitamos falar sobre meu passado amoroso e desastroso na frente dele.
Em vez disso, Levi me conta sobre como era, quando ele fazia modelos.

— Não sente vontade de desenhar novamente? — pergunto.

— Até agora não, acho que preciso de uma nova musa — seu olhar
esquenta, e meu ventre revira.

— Quer que eu pose para você? — pergunto baixinho.

— Não sei se conseguiria me concentrar — ele analisa meu busto com


fome — você tem curvas tentadoras para um artista olhar, e não tocar.

— Pode tocar o quanto quiser — escondo o rosto atrás do meu vinho ao


beber um longo gole.

— Sexta de noite — ele diz e engasgo com a bebida.

— Amanhã? É muito cedo!

— Fiquei inspirado — inspira fundo fazendo drama de artista — vou criar


uma coleção inteira, e a chamar de raio de sol.

— Vai ser toda em amarelo?

— Preto — ele diz com seriedade — como a exposição que vimos, vou
contar uma história através das roupas.

— Do inverno a primavera, poderia chamar assim.

— Não, será raio de sol — puxa minha mão para a beijar novamente.
— Vou ganhar porcentagem por ser sua modelo? — arqueio a sobrancelha,
e ele morde minha pele.

— Vai poder usar e abusar do artista.

— Gostei dessa proposta — estreio as pálpebras — mas quero outra coisa


— baixo o tom de voz — muito dinheiro na minha conta.

Levi gargalha, e o Lorran acompanha o pai sem entender a piada, ele gosta
de quando rimos.

— Sua pequena aproveitadora!

— Tenho de fazer valer meus dotes — aponto um ombro para ele — quero
ao menos 50%

— Não seja gananciosa, Olivia — ele enxuga o canto dos olhos, e limpa a
boca com o guardanapo.

Levi tem lábios beijáveis, daqueles que quando se olha a distância, eu


tenho o ímpeto de chegar perto do homem, e testar se são realmente macios como
eu imagino.

— Depois conversamos sobre a minha porcentagem — termino de comer,


e limpo o Lorran, que sujou as mãos com o espaguete.

— Vamos fazer isso com muito cuidado — fica em pé e pega o filho no


colo, estendendo a mão para mim — acho que precisamos de outra babá para o
Lorran — diz em português — quero me aproveitar da dele.

— Seu sem-vergonha — bato em seu ombro e entrelaço nossos dedos.

— Você acordou a fera, é sua obrigação saciar a minha fome — ele tem
desejo pungente em seus olhos.
— Como quiser.

Saímos do restaurante rindo e felizes, sinto que coloquei no eixo todas as


pontas soltas da minha vida. Lorran dorme dentro do carro, no caminho para o
meu apartamento, e quando paramos no lado de fora, Levi desce do carro comigo
e segura minha cintura, impedindo que eu vá embora.

— Sei que queremos ir com calma — ele encosta a testa na minha — mas
estou louco para te beijar.

— Então beija.

Entrelaço os braços ao redor do seu pescoço, e deixo que ele se curve,


encostando os lábios nos meus. Macios, molhados e gostosos. Levi desliza sua
língua em minha boca pedindo passagem, e entrelaçando ela com a minha, gosto
de sua saliva misturada a minha, sinto minhas pernas virarem gelatina, pela
pressão se sua mão na minha cintura, me trazendo para perto de seu corpo.

O beijo poderia ter durado a noite toda, como acabado em questão de


segundo, que eu não saberia dizer. O solto quando meu pulmão queima
precisando de ar, ele distribui pequenos selinhos em meus lábios e bochecha.

— Não quero ir embora — confessa.

— Não quero que você vá — admito.

O beijo novamente, e quando começo a sentir um calor infernal subindo do


meu ventre para meu peito, eu sei que preciso parar agora, ou o levarei para o
meu apartamento, e o Lorran não pode dormir dentro do carro.

O solto devagar, encarando seus olhos azuis que brilham como dois
diamantes, eu mordo seu lábio inferior e me afasto um pouco.

— Até amanhã Levi.


— Tchau Olivia.

Ele me espera entrar, e depois vai embora. Ainda com um sorriso bobo, eu
entro no meu andar, tenho o coração jogado ao chão ao ver a Bianca no chão da
minha porta, dormindo.

— Meu Deus, Bianca! O que diabos?

— Fala baixo Olivia — ela pede com a voz rouca

— O que aconteceu? — fico de joelhos e a ajudo a se levantar, para


podermos entrar.

Deito Bianca com a cabeça no meu colo, e faço carinho em seus cabelos.

— Agora me diz o que aconteceu — peço.

— Armaram para mim, criaram provas falsas de que eu e a Marta, estamos


por trás da empresa fantasma que tem sido usada para desviar dinheiro da
VITTILENO, e o Louis acreditou em tudo, nem me deu uma chance de explicar.

— Não sei quem é mais idiota, ele ou o irmão.

Opto por não contar a Bianca sobre o meu relacionamento com Levi, e
deixar ela acreditar que ainda o detesto.

A Bianca, de coração partido pelo Louis, poderia até ficar feliz por mim e
pelo Levi, mas eu sei que ela ficaria preocupada sobre ter de encontrar o Louis,
quando eu e Levi estivéssemos juntos, ou em jantares de família, e tudo isso
partiria o coração da minha irmã.

Sei que vou estar a enganando ao fazer isso, mas no momento, é o melhor
caminho.
Tenho de pedir ao Levi para manter nossa relação recém iniciada em
segredo, Louis é um babaca de ego gigante, não sei se ele apoiaria o irmão, ou se
tentaria me demitir para evitar ver minha irmã, e ouvir minha opinião sobre essa
merda que aconteceu entre eles.

Eles realmente se gostavam, que droga Louis!

— O que houve? — Bianca pergunta.

— Levi me tira do sério, aquele italiano metido. — É essa a narrativa que


manterei.

— Achei que ele passasse o dia depressivo.

— Depressivo? Tente mais para implicante, até uma mamadeira que eu


faço para o Lorran ele se mete, dizendo que estou fazendo errado. Juro que estou
por um triz de bater na cabeça dele com um pau.

Continuamos conversando sobre a situação entre eles, e quando finalmente


ela se acalma, levanta-se rápido demais e desmaia.

Ligo para uma ambulância, e a levo ao hospital, lá descubro que minha


irmã está grávida do idiota que partiu seu coração, e a acusou de algo terrível.

Acho que quando se é para ser mãe, acontece fácil assim, Bianca
engravidou enquanto tomava anticoncepcional, e o pai do bebê, e ela, estão
separados, enquanto eu tento de mil formas ter um filho e não consigo.

Sufoco o sentimento ruim em meu peito, devo ser forte e apoiar Bianca, ela
precisa de mim e a colocarei em primeiro lugar, quantas vezes forem necessárias.
Levi
— O Louis é um asno — digo ao meu pai.

Estamos analisando os documentos entregues ao meu irmão, acusando


Bianca e a Marta de terem desviado fundos da empresa, enquanto ele chora e se
embebeda no quarto.

Fecho a última pasta e coço a cabeça, as decepções amorosas do Louis, o


cegaram ao ponto de não poder confiar em mais ninguém, por um lado, eu
entendo meu irmão, mas ainda o acho um imbecil por magoar uma mulher como
a Bianca.

— Vai contar a ele do seu envolvimento com a Olivia? — meu pai


pergunta.

— Não, deixa ele pensar que ainda a detesto, não quero que fique
ressentido com a Olivia, ou comigo.

— Fico feliz por você encontrar o amor novamente — ele toca meu ombro.

— Não é amor... ainda — decido ser sincero — eu tenho carinho pela


Olivia, e gosto dela, mas não posso afirmar que é um amor, principalmente
depois do que vivi com Blanca.
— Existem vários amores na vida, Levi, o seu e o da Blanca foi épico,
digno de cinema. Sua relação com a Olivia não precisa ser assim, pode ser a
calmaria, conforto, e confiança que ambos precisam.

— Não sei se entendi — franzo a sobrancelha.

— A Blanca te fez amar intensamente, e com toda a sua alma. Já Olivia, te


fez querer voltar a viver, a se apaixonar novamente, e ter novos objetivos de vida.
São amores diferentes em intensidades, que não se comparam, mas cada um
deles tem momentos, significados importantes, e únicos.

— Você se apaixonou novamente?

— Eu tive uma vida ao lado da sua mãe, terminamos porque ela morreu, e
nunca senti que precisava de mais depois que ela se foi. Nenhuma outra mulher
me fez sentir como a Cecília, não sei como será no futuro, tive meus casos de
uma noite ou duas, mas nenhuma me fez querer continuar voando com elas.

Meu pai se aproxima e toca meu ombro, me encarando nos olhos.

— Abra suas asas, filho, se o amor batesse na minha porta novamente, eu o


deixaria entrar.

— Obrigado, pai. — Ele também é viúvo, sabe o que eu sinto. É


reconfortante ouvir suas palavras.

— Vamos fazer o stronzo do seu irmão perceber que cometeu um erro.

— E dos grandes.

Saio do escritório e vou para a sala, onde encontro a Olivia com o Lorran.

— Filho, seu nonno chamou por você no escritório.

— Celto — ele desce rápido do sofá, e vai correndo atrás do avô.


— Chamou mesmo? — Olivia arqueia a sobrancelha quando chego perto
dela e roubo um beijo para mim.

— Eu tinha de despistar ele — murmuro em sua boca — lembra que ainda


estamos deixando eles acharem que nos odiamos? — puxo sua cintura para o
meu colo.

— É fácil fingir isso — ela diz entre beijos — você me tira do sério.

— Você que me enlouquece — deslizo a mão em seu joelho, e belisco a


carne da sua coxa.

— O que eu posso fazer se você não consegue ficar longe de mim? —


Morde meu pescoço, e aquilo causa uma reação direta no meu pau.

— Zia Viviaaaaaaaa — Lorran grita, e jogo a Olivia no chão.

— Ai! — ela grita quando bate a cabeça na mesa, e puxo uma almofada
para o meu colo. — Seu idiota — bate na minha coxa.

— Tal bligando? — Lorran pergunta entrando na sala.

— Por que me chamou fofinho? — ela pergunta, levantando e indo até ele,
os olhos fervendo de raiva, com certeza serei punido por tê-la jogado.

— Zio Lou tava clolando — fala mexendo os dedinhos — cadê meus


dolcinhos para deixa ele feliz?

Gargalho, Lorran herdou a mania da minha mãe de deixar as pessoas


felizes ao dar doces a elas.

— Vamos fazer um bolo, Lorran — o chamo.

— Bola — vem saltitando comigo para a cozinha.


Ele entra primeiro, e antes que eu passe pela porta, Olivia puxa o cós da
minha calça, me fazendo voltar. Ela fica na ponta dos pés, e quando acho que vai
me beijar, fecho os olhos, o ardor seguido da dor no meu pescoço faz eu me
encolher e resmungar. Ela me mordeu!

— Olivia!

— Isso é por ter me jogado no chão — volta a posição normal, e pisca os


cílios — faça de novo, e na próxima é no seu pau que vou morder para arrancar
um pedaço.

— Desalmada!

— Idiota — arrebita o nariz e vai embora, rebolando o quadril, e chamando


minha atenção para a sua bunda empinada e apertada na calça jeans.

Coço os dedos com vontade de estapear sua carne, e poder prová-la. Já


estamos juntos a quase uma semana, e não passamos de beijos contidos, que só
acende o fogo dentro de mim.

Eu quero essa mulher, e estou começando a sentir um novo vício


rastejando pela minha pele. Com o Louis sendo um babaca tristonho, não posso
deixá-lo cuidando do Lorran, para poder ter um tempo com a Olivia, meu irmão
não podia ter escolhido hora pior para ter o coração partido!

— Vamos arrumar outra babá para o Lorran — digo, e ela arqueia a


sobrancelha sugestiva — ao menos por uma noite.

— Tem certeza de que quer isso? — tem um pouco de dúvida e medo na


sua voz.

Me aproximo da Olivia e sussurro em seu ouvido.

— Eu quero você.
— Eu também — ronrona.

— Quel o clque? — Lorran embola as palavras e o vejo com a boca cheia


de chocolate.

— Lorran! — eu e ela falamos juntos, e rimos, o pequeno nos acompanha


gostando do clima leve no ambiente.

Ele pegou as barras na geladeira, enquanto eu pensava em comer a Olivia.


Desse jeito não conseguiremos um segundo de paz.

Limpo o Lorran, enquanto Olivia pega os utensílios e ingredientes para


fazermos um bolo de chocolate, e passamos a tarde ocupados fazendo o doce.

Na sala, assistimos a um filme com o Lorran agarrado na Olivia, faço


carinho na cabeça dele, querendo o trazer para mim. É torturante esperar que ele
queira o meu carinho, sei que é consequência das minhas ações, e o deixarei vir a
mim quando se sentir pronto, como eu me senti para ir até ele.

— Vou ao banheiro — Olivia diz e se levanta, a sigo com o olhar.

Ela demora mais do que o normal, e levanto, no corredor vejo quando a


porta do escritório do Louis é aberta, e Olivia o encara.

— Você é um idiota que não merecia a Bianca.

Louis parece mais decidido do que quando entrou, deve ter percebido o
erro que cometeu. Ele ignora a Olivia e vai para o quarto dele, ela volta para o
sofá e se senta ao meu lado, colocando o Lorran em cima dela.

Passo um braço ao redor de seus ombros, e cheiro sua cabeça, sei que a
vontade dela era de o xingar muito mais, agradeço por não fazer isso.

— Eu ainda detesto seu irmão.


— Ele foi enganado.

Conversamos baixinho, enquanto conto a ela a história do que eu e meu pai


achamos que aconteceu na empresa, e sobre o passado do Louis com outras
mulheres.

Ele também já foi magoado, e tem seus motivos para ser desconfiado
quanto a outras mulheres, mas não podia ter descontado na Bianca as frustrações
passadas.

— Ele sofre com a falta dela.

— Ela também, só sabe chorar em cima da cama com o coração partido.

— Acha que devemos ajudar eles dois a voltarem a ficar juntos?

— Por enquanto o Louis tem de tomar uma atitude, foi ele quem magoou a
Bianca, não vou fazer nada enquanto não tiver a certeza de que ele a ama.

— Estou indo para a suíça — Louis passa como um tornado pela sala.

— Viu — digo a ela — desesperado para arrumar a bagunça que ele fez.

— Vamos — continua observando, ela toca a cabeça do Lorran e


percebemos que ele dormiu — vou colocá-lo no berço.

— Certo.

A ajudo a levar o Lorran para o quarto dele, e quando fecho a porta atrás
de nós, eu pego a Olivia no colo e calo a sua boca com a minha.

Estamos sozinhos no apartamento, e vou aproveitar para fazer o que anseio


há dias com essa mulher.

A jogo contra a parede, e enredo minha língua na sua, em um beijo urgente


e cheio de desejo. Enfio minha mão dentro de sua blusa, puxando-a para cima, e
liberando seu busto, enfio o rosto entre o vão de seus peitos, e a cubro de beijos e
mordidas.

Olivia puxa meus cabelos e rebola o quadril contra minha barriga. Seguro
sua bunda com ambas as mãos, e cambaleio pelo corredor, até chegar ao meu
quarto.

— Levi — ela suspira mordendo minha orelha.

Um arrepio corta minha espinha, e jogo a Olivia na minha cama com


necessidade. Seguro a borda de sua calça e abro o botão, desço o zíper com
rapidez, enquanto puxo o tecido para fora de seu corpo, deixando-a somente com
a lingerie roxa.

Minhas bolas pesam dentro da cueca, tiro minha camisa com um braço,
antes de baixar as calças e subir em cima dela.

Fico afoito, com as mãos tremendo enquanto tento tirar seu sutiã. Sem
paciência, Olivia segura o feche e o tira, liberando os seios que pulam na minha
cara. Desço o rosto, segurando ambos nas mãos, e os cheiro, com um inspirar
profundo me embriagando pelo aroma sexy dela.

Mordo seu mamilo, e Olivia sufoca um grito contra a palma da mão.

— Vou te comer com minha boca e meu pau — a solto e deslizo o dedo em
sua calcinha molhada — não acorde o Lorran com seus gritos.

— Convencido — geme quando penetro meu dedo em seu calor, com


força, indo o mais fundo que posso nela — nunca me faria gritar — ela diz isso
com a voz entrecortada.

— É o que veremos.
Tiro sua calcinha, e arreganho suas pernas para mim, a bocetinha
brilhando, molhando os pelos ralos em sua pele. Desço o rosto de encontro a sua
carne e abocanho, me deliciando no gosto de seus fluidos.

Mordo seu clitóris, enfiando dois dedos em seu interior, e Olivia tem
solavancos no colchão, movendo o quadril feito louca, fazendo seu clitóris
escapar de meus lábios.

Ela sufoca os gritos, mordendo o travesseiro, não dando o braço a torcer.


Minhas bolas parecem mais pesadas dentro da minha cueca, e fico louco para
meter dentro dela, sinto que posso gozar somente a chupando.

— Nem meti meu pau em você e já está se contorcendo — a provoco.

— Deixa de falar e vem logo — agarra a barra da minha cueca e puxa meu
membro para fora, duro feito aço — você é enorme, porra, não vai caber em
mim.

— Vai deslizar na sua bocetinha melada.

— Coloca a camisinha e deixa de falar — geme, se deitando aberta.

— Acho que eu não tenho uma — Olivia parece que vai me matar com um
olhar.

— Eu parei com o anticoncepcional devido à inseminação, que merda Levi


— bate no colchão.

— Fica aí, vou pegar uma do Louis — beijo seus lábios e pulo da cama.

Enrolo uma toalha ao redor do quadril e vou para o quarto do Louis, acho
um pacote na gaveta e volto.

Estanco quando a vejo com os dedos deslizando no clitóris, dando prazer a


si mesma. Visto a camisinha e subo na cama, ficando entre suas pernas.
— Geme para mim — peço mordendo seu pescoço e me acomodando
entre suas pernas.

— Me come gostoso que eu gemo — ela abraça meu peitoral, e busca por
minha boca.

Meto meu pau na sua boceta, e sou abraçado pelo calor esmagador da
Olivia. Porra, ela é apertada, e ferve por dentro. Levo uns segundos me
acostumando com seu interior, antes de começar a socar forte, até sentir minhas
bolas batendo em sua bunda.

Olivia rebola o quadril, esfregando o clitóris em minha pélvis enquanto


geme gostoso no meu ouvido, intercalando com mordidas.

Fodo gostoso com ela, deslizando nossos corpos um no outro, roubando


beijos com gemidos, e criando uma conexão única entre nossas almas.

— Le-vi — geme, as paredes de seu interior me apertam, e a vejo


revirando os olhos, enquanto se desmancha em meu pau.

Meto mais duas vezes, antes de gozar na camisinha e desabar contra seu
corpo.

— Vai me matar — geme baixinho.

Giro de lado a trazendo para os meus braços, ambos respirando com


dificuldade.

— Você é perfeita — sussurro em seu ouvido.

Ficamos de chamego mais um pouco na cama, até irmos tomar um banho


juntos.

— Vou para casa — ela diz quando se veste.


— Dorme comigo — a puxo para a cama, e beijo seu lábio, dengoso.

— Bianca pode precisar de mim — murmura, não fazendo força para se


levantar.

— Liga para ela, se estiver tudo bem, você fica comigo — passo um braço
por cima de seu estomago e prendo sua perna com a minha.

— Você é muito carente.

— Completamente — beijo seu pescoço — perdidamente — a bochecha


— carente por você — toco seus lábios.

No fim a Bianca já estava dormindo, e Olivia fica a noite toda comigo.


Durmo em paz com ela em meus braços.
Levi
Corro pelos corredores brancos do hospital, tropeçando nos meus pés,
enquanto tento localizar onde fica a emergência. Uma enfermeira me guia, dobro
no corredor e vejo meu pai, sentado em uma sala perto das portas, de frente a sala
de emergência do hospital.

— Pai! — chamo e vou até ele.

— Ele vai ficar bem — ele segura meus ombros, me fazendo sentar —
respira Levi — pede. Acompanho seus movimentos de inspirar e expirar por
longos segundos, até me sentir calmo o suficiente.

— O que aconteceu?

— Alfredo continua investigando, uma bomba explodiu no carro do Louis,


e ele foi atingido por uma bala no meio do tiroteio.

— Quem fez isso?

— Não sei — aperta os punhos — quando descobrir vou matar o infeliz


que atentou contra a vida do meu filho.
— Ele foi para a Suécia investigar o desvio de dinheiro na VITTILENO,
só pode ter sido a pessoa responsável pelo roubo que tentou o matar. — Concluo.

— Desconfio disso também.

Louis continua em cirurgia pelas próximas quatro horas, enquanto eu e


meu pai tentamos não enlouquecer de preocupação.

Ele não pode morrer, não agora. Ele estava bem, saudável, amando uma
mulher que o amava, e era maravilhosa, e agora toda essa merda aconteceu.

Vai morrer, como a minha mãe morreu.

Partirá como a Blanca partiu.

Vou perder meu irmão mais velho, o único que nunca me abandonou, e
aguentou minha pior fase. O Lorran nunca vai conseguir superar a perda do tio,
isso não pode acontecer.

Não.

Não.

Não.

Cenas do meu irmão morrendo inundam minha mente, bato na cabeça


tentando as expulsar. Ele não pode morrer, ele não vai morrer, o Louis nunca me
deixaria.

Alguém me chama, não consigo ouvir o que fala, meu corpo sacode para
os lados, o mundo começa a ficar fora de foco. A respiração falta, e uma dor
insuportável irradia no meu coração. Ponho a mão em cima e arfo, tentando
respirar sem sucesso.

Apago.
Desperto, e a claridade do quarto me incomoda.

— Devagar — reconheço a voz doce ao meu lado.

— Lira?

— Sim — sua mão alisa meus cabelos, e consigo focar no rosto da minha
irmã, inchado pelo choro — você ficou tão lindo, ganhou peso, e um aspecto de
vida — ela sorri e me abraça forte.

Envolvo o corpo de minha irmã, e inspiro seu cheiro doce de flores, faz
muito tempo que não a vejo.

— Senti sua falta — digo a ela.

— Eu também — beija minha bochecha — cadê sua namorada?

— Quem? — Franzo a sobrancelha.

— O pai me contou que acha que você está finalmente namorando a babá
do Lorran, não ouse mentir — aponta o dedo para mim.

— Nunca te enganaria — sento-me e percebo que estou em um quarto


hospitalar — o que aconteceu comigo?

— Você teve um ataque de pânico e desmaiou, ficou apagado por 12 horas.

— E o que você faz aqui? — coço a cabeça — nosso pai?

— Quando ele me ligou para falar sobre o atentado que o Louis sofreu, eu
larguei as filmagens e corri para cá. Ele foi ficar com o Louis, enquanto eu cuido
de você.

— Foi tudo bem na cirurgia? — me sinto um pouco lento, e com muita


sede.
— Sim, ele não corre perigo, ao menos não hospitalares — me entrega
uma garrafa de água — usaram um sedativo em você para te acalmar.

— Entendi — bebo a garrafa inteira. — Vamos ficar com ele.

— Depois que o médico te atender, fique aqui.

Ela sai sem esperar a minha resposta.

O médico me alerta sobre a crise de pânico, e procurar ajuda psicológica,


informo que já estou sendo acompanhado e sou finalmente liberado. Vamos para
o quarto do Louis, quando entramos, ele desperta, e a Lira se joga em seus
braços.

— Nunca mais dê um susto desses na gente — peço sentindo as lágrimas


retornarem — eu achei que você fosse morrer — não consigo controlar a vontade
de abraçar o Louis, e o aperto, me arrependendo ao ouvir seus gemidos —
desculpa..., desculpa — peço ao me afastar, e limpar o rosto.

— Você quase me matou de susto Louis — Lira funga.

— Vem cá — ele a chama, e minha irmã se encolhe na cama com ele, sem
o machucar — Bianca?

Fecho os olhos, Louis não parece que compreende a gravidade da situação


em que ele se encontra.

— Não avisamos a ela filho — meu pai diz — pode ser perigoso envolver
a moça no que vai acontecer daqui em diante.

— O que houve comigo? — Lira sai de perto dele, e tomo o lugar dela,
segurando seu ombro, o fazendo focar em mim.

Explico ao Louis tudo o que aconteceu quando ele pousou no Brasil, e os


motivos pelos quais ele e a Bianca não podem mais ficar juntos. Ela só estaria
sendo colocada em risco.

Deus, se eu tivesse tido a chance de proteger a Blanca do acidente de carro,


teria agido sem pensar duas vezes. Não vou permitir que o Louis sofra a dor que
me destruiu.

— Bianca não pode saber disso, você tem de se afastar dela se não quiser
que ela seja pega no fogo cruzado, e acabe morta.

— Não, eu posso protegê-la. — Vejo o desespero nublando seu semblante,


e fico furioso pelo Louis querer a colocar em perigo, por egoísmo de não
conseguir ficar sem ela.

— Você não protegeu a si mesmo — grito — e se ela estivesse dentro


daquele avião com você? Ela poderia ter morrido — imagens da Blanca sendo
velada em um caixão, invocam a dor que senti no dia que soube de sua morte —
VOCÊ QUER A DOR DE PERDER O AMOR DA SUA VIDA? Resolva essa
maldita confusão antes de ir atrás dela, ou se culpe eternamente caso ela morra.

— Levi! — Lira grita comigo.

— NÃO! — Esbravejo com ela — você — aponto para o meu pai — sabe
a dor de perder quem você ama, o buraco que fica dentro da gente que nunca será
preenchido, por mais que encontre outro amor — encaro o Louis — EU DARIA
TUDO PARA TER A BLANCA DE VOLTA, EM MEUS BRAÇOS, e você que
diz amar a Bianca, quer mesmo a colocar em perigo e correr o risco de ela
morrer?!

— Eu sei que... — não o deixo continuar falando.

— DEPOIS QUE SE MORRE, NÃO TEM MAIS VOLTA. Seu imbecil!

Não suporto continuar olhando para o Louis, e saio do quarto, antes de


iniciar uma briga com meu irmão. Como ele pode ser tão idiota? A vida humana
não é como um prato que você quebra e joga os restos no lixo sem se importar,
depois que a pessoa dá o último suspiro, ela nunca mais volta, e quando isso
acontece só resta a dor para os que permanecem.

A vida deve ser valorizada enquanto ela ainda existe.

Eu devo valorizar a minha vida enquanto estou vivo.

O pensamento é como uma epifania em meu cérebro, e sei aonde devo ir, e
o que preciso fazer.

— Levi, espera — Lira puxa meu cotovelo — vamos conversar, não faça
besteira.

Aperto minha irmã com força em meus braços.

— Eu preciso ver a Olivia e comemorar que estamos vivos — beijo seus


cabelos várias vezes — vá ficar com o Louis, eu estou bem.

Sorrio para a minha irmã com o peito explodindo em vontade de viver, de


aproveitar o tempo que me resta no mundo com as pessoas queridas, eu estou
vivo, meu coração ainda bate, e eu ainda respiro. Eu continuo nesse mundo, a
Blanca, meu grande amor se foi, doeu tanto que me rasgou em dois, mas eu estou
aqui.

— Toma cuidado — ela beija minha bochecha e corro para o lado de fora.

Chamo um táxi, pela hora, a Olivia e o Lorran estão na creche ainda, deve
ser o momento do sono da tarde das crianças. Chego ao prédio, e os seguranças
liberam minha entrada após confirmarem que sou o pai do Lorran.

Corro pelos corredores, e paro arfante em frente a sala da Olivia, bato no


vidro e poucos segundos depois ela abre a porta.

— Eu quero viver com você.


Digo arfante, e antes que possa recuperar meu folego ou ouvir a sua
resposta, eu a puxo para o lado de fora e colo sua boca na minha. A beijando
como nunca fiz antes, com vida explodindo em cada lambida que dou na sua
língua, mordida em seus lábios, puxo seu rosto para mim, e colo meu corpo ao
dela, desesperado para a sentir.

Eu estou vivo, e quero continuar vivendo, com a Olivia e o Lorran.

— Eu estou na creche! — ela me empurra como se eu fosse um leproso, e


tudo que consigo fazer é agarrar sua cintura e voltar a devorá-la com um beijo.
— Levi! — exclama em meus lábios.

Minha costela dói pra cacete, e me encolho segurando o estomago quando


Olivia começa a beliscar a minha pele, para me fazer afastar dela.

— Ficou louco?! — Fala entre dentes aumentando os beliscões, até minhas


costas baterem contra a parede. Ela segura meu mamilo e o torce entre os dedos,
e eu vejo estrelas com a dor — quer que eu seja demitida e processada por
atentado ao pudor na frente de crianças menores de três anos? — bate no meu
ombro.

— Se continuar me batendo vai ser preza por agressão — belisco sua


barriga, e ela se encolhe com fúria no olhar.

— O que diabos? — ela me analisa bem, fico parado sorrindo para ela,
tenho vontade de deixar o mundo inteiro perceber o quanto essa mulher me faz
bem. Seguro seu rosto com delicadeza e a trago para perto de mim, beijando sua
testa inúmeras vezes.

— Eu. Quero. Viver. Com. Você — digo cada uma das palavras entre
beijos em sua face.
— Você parece diferente — me afasta e continua me analisando. — Que
história é essa de querer morar comigo?

— Não é morar Olivia — abaixo ficando na altura dos seus olhos — hoje
eu percebi o quanto devemos valorizar a vida que temos, e eu quero fazer isso
com você ao meu lado, viver as nossas vidas, juntos, enquanto vemos o Lorran
crescer e se desenvolver — minha voz trava por um segundo e engulo em seco
— eu abandonei a escuridão, e me joguei na luz, vive comigo?

— Você é um louco que vai custar meu emprego — passa os braços ao


redor do meu pescoço e me abraça — tenho de controlar sua loucura antes que
faça uma besteira.

— Isso foi um sim?

— Foi um; ... Eu vou caminhar ao seu lado enquanto estivermos vivendo.

A abraço e inspiro seu cheiro de sol e calmaria. Feliz por conseguir chegar
ao topo do poço em que vivi durante os últimos dois anos.

— Posso pegar o Lorran? — pergunto.

Ao meu filho eu devo muito mais do que beijos e palavras, que ele não
conseguirá compreender.

— Ainda temos o período da tarde, mas se quiser, eu o líbero mais cedo —


me solta — o que você planejou?

— Vamos passar a noite brincando juntos, esperando você chegar em casa.

— Vem me buscar?

— Não perco isso por nada.


— Espera aqui — beija minha bochecha e sai de meus braços, entrando na
sala e surgindo pouco tempo depois com o Lorran, com os olhos pesados de
sono.

— Levi? — coça o rostinho.

— Vamos passear? — estendo a mão para ele — quero muito brincar com
você hoje.

— Blola — estende a mão para mim e o pego no colo, enchendo suas


bochechas de beijos, e ele grita feliz. Lorran segura meu rosto e faz um bico
enorme antes de encostar os lábios no meu nariz e me encher de beijos também.

— Eu te amo muito filho — sussurro em seu ouvido, e Lorran aperta os


braços no meu pescoço — obrigado por ser você o meu menino, eu nunca mais
vou te deixar, te prometo, me dá uma chance de te fazer me amar?

— Eu amo o papai — ele fala baixinho no meu ouvido, e naquele segundo,


eu me sinto o pai mais realizado do mundo.

— Meu anjo — perco a força nas pernas e caio no chão, segurando o


Lorran forte em meus braços, inspirando seu cheiro de bebê, como pude ficar
tanto tempo o negligenciando? — Eu te amo tanto.

— Levi tá biem? — pergunta tentando olhar meu rosto.

É, acho que ainda vou ter de continuar mostrando que sou o pai dele, até
ele se acostumar a me chamar assim.

— Estou ótimo — beijo sua mãozinha — vamos brincar com o papai?

— Blola — se agarra novamente a mim e me levanto com ele — xau zia


vivia.

— Tchau fofinho — Olivia tem lágrimas contidas. — Até mais tarde.


— Tchau — digo a ela com vontade de falar muito mais.

Estou explodindo em um trilhão de emoções. Devo tomar cuidado para não


ficar afobado e falar tudo o que percebi, de uma vez, vou reconstruir a minha
vida, um relacionamento por vez, agora eu tenho meu filho, e a mulher com
quem quero viver. Ainda preciso resolver as coisas com meu irmão, e garantir
que minha família permaneça segura, nunca vou perder quem eu amo.
Olivia
— Você é louco — sussurro na boca dele.

Não consegui acreditar quando Levi parou na porta da creche, sem o


Lorran, e disse que deixou o filho com o avô para que ele pudesse ter uma noite
de solteiro comigo!

— Hoje eu posso ser tudo — me puxa para o seu colo dentro do carro.

Levi esbanja felicidade, é gostoso o beijar sentindo a vida transbordando


dos seus lábios para os meus, o jeito como ele me pega com força pela cintura, e
esfrega seu quadril contra o centro das minhas pernas.

Agarro seus cabelos e mordo seus lábios me deliciando com o fogo que
consome sua íris.

— O que deu em você? — pergunto o mantendo imobilizado para conter o


seu ataque.

— Louis sofreu um atentado, como você sabe, e isso me fez gritar com ele
quando insistiu em ir atrás da Bianca. Ele é louco por a querer por perto, sabendo
que tem um alvo em suas costas, enquanto eu brigava com ele, fui percebendo o
valor que temos de dar a vida, e a quem está ao nosso redor.
Seus olhos brilham, e minha garganta trava ao perceber que ele está se
declarando

— Lorran e você tem sido o meu centro nos últimos meses, e eu quero que
continuemos seguindo em frente, nós três — beija minha bochecha — eu amo o
meu filho, e vou ser o pai que ele merece, e você... — Levi me observa como se
não acreditasse que eu sou real — você não é a Blanca, e eu não sinto por você o
que sentia por ela.

Meu coração murcha dentro do peito como se estivesse sendo esmagado


por uma pedra de dez mil toneladas. Tenho ímpeto de sair do seu colo, mas ele
me segura firme, impedindo a minha fuga.

— Não fuja, me deixe terminar de falar — bate na minha bunda, e pulo


pelo susto.

— Ei! — ralho estapeando o seu peito.

— Fique quieta, estou me abrindo para você — firma meu quadril sobre os
eu — como eu dizia, você não é a Blanca, ela não é você, e eu não sou mais o
Levi que viveu com a Blanca. Aquelas duas pessoas vivem em um passado de
dois anos atrás, e nunca mais poderão encontrar a nós dois no presente.

— Levi faça mais sentido, por favor — peço, minha cabeça começando a
dar nós.

— O que eu quero dizer é; ... O Levi de hoje, quer estar com a Olivia, a
mulher que foi capaz de me ajudar a perceber o quanto eu perdi do mundo me
escondendo na escuridão, e a única que trouxe calor para o meu mundo frio. É
você, e somente você, Olivia, que eu quero para mim. — Ele beija meu nariz, e
forço os olhos a não chorar. — Você me aceita quebrado, amando uma pessoa
que ficou no meu passado de dois anos, e disposto a ter um presente e futuro com
você?
— Levi — murmuro o beijando com paixão e gosto de sal pelas pequenas
lágrimas, que insistem em escorrer dos meus olhos, o coração explodindo com
mil borboletas que voam por meu estômago.

— Preciso de uma confirmação Olivia — sussurra em meus lábios.

— Sim, eu te aceito do jeito que você é, passado, presente e futuro.

Digo por fim.

— Vamos para uma balada? — ele pede quando enfim solta meus lábios,
olho para fora, e vejo que estamos na frente do meu prédio.

— Não, prefere algo mais calmo?

— Não, hoje quero me divertir muito com você — beija meu pescoço.

— Você enlouqueceu mesmo — gargalho recebendo mordidas em meu


busto.

— Completamente, agora vá se arrumar — estrala um tapa na minha


bunda, e mordo seu ombro em resposta.

Volto para o meu acento, e damos a partida para a minha casa.

É um suplício ficar longe dele, quando tudo que eu quero, é me jogar em


seu colo e beijar muito a boca rosa que me encara, mordendo os lábios ao ponto
de ficarem brancos. Chegamos, e corro para meu apartamento. Bianca assiste à
tevê comendo um pote de coxinha, com refrigerante.

— Você não deveria comer isso — a alerto — lembra o que sua


nutricionista falou?

— Sim — as bochechas cheias — é desejo do bebê, não posso fazer nada


— engole mais uma coxinha.
— Sei — vou para o banheiro sem prolongar o assunto, meu italiano
espera por mim do lado de fora.

Bagunço todas as minhas roupas depois do banho, e opto por um conjunto


de short, com um cropped, na cor vinho, mostrando três dedos da minha barriga.
Calço meus sapatos de plataforma, e faço uma make o mais rápido que posso,
pela graça dos céus, deixei o cabelo preso, enrolado, e agora ele desce em ondas
arrumadas.

Termino de me arrumar, as 19 horas, e vejo que o Levi mandou várias


mensagens falando o que fazia enquanto me esperava.

— Vai para onde? — Bianca pergunta, ela ainda come suas coxinhas.

— Sair com umas amigas — pego o celular, e meu cartão — vai ficar bem
sem mim?

— Com certeza, vou já dormir — boceja — não me acorde quando chegar.

Beijo a bochecha dela e saio de casa.

Levi espera dentro do carro, e quando me vê, fico orgulhosa de mim


mesma pela produção que fiz, capaz de deixar um dos homens mais lindos que já
vi de boca aberta, com uma pequena baba escorrendo. Estico a mão e limpo o
canto de seus lábios.

— Não precisa babar, Levi.

— Eu estava esperando a minha namorada e acabo de encontrar uma


deusa. Se o pós-vida era bom desse jeito, eu deveria ter vindo antes.

Gargalho e bato no peito dele. Levi segura minha mão e me puxa para
perto dele, me sentando em seu colo novamente. O carro se movimenta, e ele faz
sinal com a cabeça de que devo voltar ao meu lugar e passar o cinto. Recordo de
que a mãe e a esposa morreram em acidentes de carro, não sei como ele consegue
entrar em um sem ter um ataque.

— Levi, você não tem medo de carros?

— Por um tempo eu tive, quando minha mãe morreu — seu olhar cai ao
encontro do meu — fiquei três meses sem conseguir andar de carro, e me
locomovendo de metrô ou bicicleta. Com a ajuda da Lira, eu fui me acostumando
novamente ao veículo, mas não consigo dirigir.

— O que você sente quando fica atrás do volante?

— As mãos tremem, o ar falta, e o medo de causar um acidente, é tudo o


que eu consigo pensar — ele descansa a cabeça no encosto e fecha as pálpebras
— Lira foi me ajudando, entrando primeiro em um carro parado, e depois ela saia
e entrava da garagem, dava voltas perto de casa, até conseguirmos nos locomover
pela cidade sem problemas. Depois disso, ela quis que eu voltasse a dirigir, não
deu muito certo, e me acostumei a usar os motoristas.

— Se um dia você quiser tentar de novo pode me chamar — toco sua mão
— não dirijo regulamente porque não tenho carro, embora seja uma ótima
motorista.

— Obrigado — beija minha palma — você não deveria ter falado sobre ser
boa motorista — morde minha pele, e arrepios cortam minha carne — agora
estou imaginando como seria gostoso te comer dentro desse carro.

— Levi! — fico vermelha, encaro o segurança, que não demonstra abalo


pelas palavras sacanas do patrão.

— Não seja tímida, meu raio de sol — seus lábios tocam meu pulso —
você está prestes a descobrir as mil formas das quais pretendo te comer.
— Minha nossa senhora — abano meu rosto com o calor subindo
perigosamente por meu corpo.

O carro para, e sou salva do ataque das mordidas do Levi. Observo que
estamos em um restaurante.

— Achei que iríamos a uma balada.

— Tenho de te alimentar antes de te comer. — Sorri sacana e pisca o olho.

Desço com as pernas tremulas em expectativas, não conhecia o lado sem


vergonha do Levi, e agora que o provei, quero muito mais.

Uma droga não irmos direto para o quarto dele, em público é vergonhoso
ouvir ele falar sobre a minha boceta, mesmo que seja em italiano.

— Qual o motivo de você não falar português? — questiono quando ele


segura minha mão, e entramos no estabelecimento.

— No início era por birra, eu não queria me comunicar com as pessoas, e


achava que fazê-las pensar que só falo italiano, as afastariam, e me deixariam em
paz — puxa meu corpo contra o seu — só não contava com você aparecendo e
me irritando em italiano — beija meu cabelo.

— Você fala português muito bem, e tem um sotaque sexy, se comunique


comigo assim — faço bico, e ele me beija demoradamente na entrada do
restaurante.

— Por você eu faço tudo — diz em português, e meu ventre contrai com o
sotaque carregado dele.

— Sim — murmuro querendo mais do que nunca um quarto para ficarmos


sozinhos.
— Boa noite — uma moça fala e nos soltamos, Levi ostenta um sorriso
lindo em seu rosto, o imito, deixando de lado a vergonha.

— Olá querida, mesa para dois, por favor — ele responde.

Seguimos a mocinha e nos sentamos perto do palco, pouco minutos após


pedirmos a refeição, se inicia uma música ao vivo. Levi só toma suco, e eu tomo
drink sem álcool.

Nunca fui muito de beber, e sei que ele é alcoólatra, e faz de tudo para se
manter sóbrio, só de estarmos em um ambiente como esse, pode ser uma
tentação.

— Você sente muita vontade de beber? — pergunto.

— Todos os dias — balança a cabeça ao ritmo da música — eu me escondi


no álcool por anos, é difícil parar, os medicamentos e a terapia ajudam. O resto,
depende da minha força de vontade em ter uma vida, sem o vício me
prejudicando, talvez um dia eu possa voltar a conseguir tomar somente uma taça,
ou algo do tipo, hoje eu sei que se ingerir uma gota, não vou conseguir parar.

— Se você confiar em mim para te ajudar — seguro sua mão — posso ser
sua guia.

— Eu vi que você não bebeu, obrigado por isso — beija minha mão com
carinho — quando sentir que estou pronto para tentar, eu te digo, mas por
enquanto, quero me manter sóbrio por anos.

— E eu te acompanho — remexo nossas mãos — nunca fui fã de beber,


para mim não faz falta.

— Vamos?

— Sim.
Levi paga a conta, e o motorista nos encontra no carro, noto os sacos de
lanche que ele joga no lixo, e fico tranquila por saber que fez uma refeição. O
caminho para a boate é feito com expectativa no ar, eu quero desesperadamente,
somente ir para casa e poder aproveitar do meu homem.

Ele quer dançar e lembrar que está vivo, e nada nesse mundo impediria o
Levi de ser feliz essa noite, e fazer o que ele deseja.

Acho que finalmente consegui encontrar o homem que vai me amar e me


dar a família com a qual eu sonho há anos.
Olivia
Chegamos à boate, e o lugar parece ser ótimo, a julgar pela fila de pessoas
que tem, esperando para entrar, as vibrações da música chegam a nós no lado de
fora, e Levi segura a minha mão, me conduzindo com confiança para a entrada.

As pessoas na fila cochicham sobre furarmos a fila, não tenho certeza de


como são as boates na Itália, e se o Levi sabe que precisa esperar a vez dele para
entrar.

— Boa noite, senhor Vittileno — o segurança o cumprimenta, sem que o


Levi fale nada — seu camarote foi preparado mais cedo, pode seguir a atendente
que ela irá levá-los, o que precisar, é só pedir que providenciaremos.

— Obrigado — ele responde.

Seguimos a mulher, que nos leva as escadas e depois a uma sala VIP, com
um barman, uma parede de vidro mostrando a pista de dança, e o palco. Quando
a porta se fecha atrás de nós, a música é interrompida, e tudo fica em silêncio,
observo os sofás vermelhos e a pista de dança, com luzes piscando. Com um
aceno de cabeça, o barman começa a preparar drinks.

— Sem álcool — Levi diz — certeza de que não quer beber?


— Sim.

— Se quiser descer lá embaixo me avisa, por enquanto, vou te provar aqui.

— Levi — ralho, e o barman ri, ao perceber que estou vergonhada pela


presença dele. — Nessas horas que você deveria falar italiano — bato em seu
braço, e o sem vergonha só faz rir, antes de me pegar no colo e se sentar no sofá,
comigo entre suas pernas.

— O barman vai preparar nossas bebidas e depois sairá por aquela porta,
nos dando privacidade total.

— Como você conseguiu isso? — olho ao redor ainda fascinada com a


privacidade do lugar e o luxo que esse ambiente grita.

— O dono daqui é louco para se tornar um acionista na VITTILENO, ou o


Louis e ele se tornem sócios, e ele possa expandir as boates dele para a Itália, só
precisei ligar para ele e pedir a sala, nada de mais.

— Ele espera que você consiga um lugar para ele na empresa — arqueio a
sobrancelha.

— O Saulo sabe que é o Louis quem comanda a empresa, e eu sou só um


artista recluso. No mínimo, ele espera que eu fale do lugar para o Louis, e meu
irmão tenha interesse em vir aqui.

— Pessoas com poder são assustadoras — brinco.

— Você nunca viu como o Louis ou a Lira são bajulados.

— Sua irmã? Ela é importante na empresa?

— Lira Vittileno, é a diretora mais disputada do cenário de filmes


americanos. Ela fez sucesso com três series na Itália, e depois foi para os Estados
Unidos, trabalhar em um grande estúdio, desde então, tem ficado por lá dando
vida as criações dela.

— Ela é incrível!

— Qualquer pessoa que tenha um negócio é louco para conseguir ser um


patrocinador nas produções da Lira, e poder exibir a marca, é sucesso na certa.
Uma vez, a protagonista usou um dos meus modelos, e no dia seguinte não
tínhamos mais estoque da peça.

— Preciso conhecer sua irmã.

— E você vai, amanhã durante o almoço, agora ela está cuidando do Louis,
e eu estou sendo o irmão irresponsável que só vai gritar com ele por ser idiota.

— Você fez certo — beijo sua testa — não quero o Louis perto da Bianca
agora, ela precisa descansar, e poder se recuperar do coração partido.

— Vamos primeiro ajudar eles individualmente, e depois a gente os junta.

— Acho melhor não contarmos que estamos juntos por enquanto, eles
podem ter pensamentos de que quererem usar a gente contra o outro, seja para o
bem ou mal.

— Quando quiser que eu te assuma, é só me dizer, e vou gritar aos quatro


hemisférios que você é minha.

Levi gira o quadril, e me joga no sofá, ficando entre minhas pernas. Seu
membro duro na calça pressiona o meu centro com força, e eu vejo pequenas
estrelas, quando suas unhas arranham a pele desnuda de minhas costas, misturada
as mordidas em meu queixo. O quadril empurrando contra o meu, causando uma
fricção deliciosa em meu centro.

— Levi — suspiro o puxando para mim e moendo meu centro contra ele.
Os tremores se espalham por meu corpo cadenciadamente, panturrilhas,
coxas, ventre, braços, até desaguar em minha cabeça. A jogo para trás e deixo
Levi morder a minha pele do jeito que ele quiser, molhando onde passa a língua,
e o ardor delicioso. Prendo seus fios de cabelo com as mãos, e o puxo,
precisando que ele me beije.

— Perdeu a vergonha, amore mio?

— Foda-se essa merda — arqueio com um forte espasmo — eu quero sua


língua em minha boceta, Levi.

— Apressadinha — beija minha orelha — quer dar um show para o


barman?

O medo de ser pega fazendo sexo evapora quando os dedos dele se enfiam
em meu short, e o frio da ponta de seu dedo toca meu clitóris, me fazendo
esquecer do mundo.

— Geme meu nome Olivia — ele manda e eu obedeço, delirando nos giros
rápidos em minha carne, que me encharca com o estímulo. Luto contra meu
quadril para o manter quieto enquanto Levi continua me torturando com o
volume de sua calça, metendo na minha entrada coberta, e os dedos apertando
meu grelinho, como se fosse uma gelatina.

— Leeeeevi — arfo em seu ouvido, arranhando seu pescoço ao puxar para


mim, e engolir sua boca com a minha — eu te quero muito — confesso — fica
comigo para sempre? — peço no auge da minha crise.

— Por toda a eternidade — beija minha testa, e mete o dedo fundo em meu
interior, roubando o ar de meus pulmões quando faz isso, e como um gancho,
puxa para fora arranhando minha parede em um lugar perigoso, que me faz ejetar
líquidos loucamente, enquanto gemo quente.
As células entram em ebulição, e todos os meus músculos tensionam
quando sou jogada no orgasmo delicioso. O mundo fica silencioso, e quando
relaxo os músculos eu volto aos poucos para a realidade.

Levi chupa os dedos se lambuzando com meu sabor.

— Posso colocar seu creme no meu drink? — Pede e faz “ploc” ao tirar o
dedo da boca — melhor ingrediente que já provei.

— Seu tarado — sorrio largada nas almofadas, totalmente satisfeita.

— Eu? Você que gozou gritando meu nome, e nem tirei sua roupa — ele
cheira meu pescoço — vou te comer naquele vidro, sobre todas aquelas pessoas.

— Não — arregalo os olhos, o medo da exposição me deixando inquieta.

— Ninguém poderá nos ver do lado de fora — ele me puxa para seu colo
— e você vai enlouquecer com a sensação de ser vista.

— Você é um voyeur ou algo do tipo?

— Quase isso — morde meu queixo — gosto da sensação do proibido, de


fazer sexo onde as pessoas não consideram permitido, e depois, ver como elas
estão alheias enquanto eu fodo gostoso — levanta comigo em seu colo. — Quer
experimentar?

— Tem certeza de que ninguém vai ver a gente? — observo todas aquelas
pessoas do lado de fora, dançando e muitas com o rosto para cima.

— Absoluta — estala um beijo em meu pescoço — igual como percebi


quando o barman saiu, antes de enfiar o dedo no seu short.

— Ele... — fixo o lugar onde ele estava, e realmente não tem ninguém lá,
além dos drinks no balcão.
— Gostou de imaginar que ele estava vendo-me te enlouquecer — Levi me
coloca no chão e vira de frente para os vidros — vamos fazer aquelas pessoas
ouvirem seus gritos? — Ele levanta minha perna, a apoiando na balaustra que
fica na altura do meu joelho.

— Eu esqueci que ele existia — assumo em meio a um suspiro, Levi


desliza os dedos na parte interna de minha coxa, subindo o tecido do short até
alcançar a minha virilha.

— Você continua encharcada — morde meu lóbulo, e deito a cabeça em


seu ombro — tira a roupa para mim, Olivia?

Ele me vira de frente, e aponta para o Pole dance. Tenho um pouco de


vergonha, não sou boa dançaria. Encaro Levi pronta para dizer que não, e vejo o
fogo incendiando sua face, aquiesço, quero fazer isso, quanto mais serei capaz de
o enlouquecer com meu corpo?

— Sente-se — ordeno.

Caminho rebolando até o Pole dance, e Levi aperta um controle, que


permite que a música da boate preencha o ambiente. Para a minha sorte toca uma
batida sensual.

Agarro o Pole, ficando de frente para ele e me abaixo, dando uma visão
ampla de minha bunda a ele, e recebendo um tapa em resposta, retorno devagar,
mexendo o quadril aos poucos.

Inspiro fundo antes de segurar a lateral da roupa e a baixar devagar,


mantendo a calcinha no lugar. Remexo para a frente e para trás, e com receio,
vou me encostando no poste, até sentir o metal frio em minha intimidade
pulsante.
Seguro a barra do cropped, e puxo para cima, liberando meus seios, não
usei sutiã. Arfo baixinho com a expectativa de como Levi vai me encarar quando
eu virar.

Giro ao redor da barra, a prendo com minhas pernas, e deixo que reparta
meus seios, ficando de frente para o homem, com o pau para fora das calças,
ereto como um tronco batendo em seu umbigo.

Não percebi quando ele ficou pelado, me delicio com a luxúria exalando
dele e batendo no meu corpo.

Ele fica em pé segurando o membro pela base, e vem até mim, com passos
lentos. Sem que ele precise falar, eu abro a boca e recebo sua grossura em meus
lábios. Levi é enorme, e não consigo cobrir nem metade dele, agarro firme o que
não consigo engolir, e coordeno os movimentos de minha cabeça com as mãos,
enquanto o meu homem abre a boca, e deixa gemidos deliciosos escaparem.

— Engole mais Olivia — ele pede — abre bem, e trava a respiração.

Faço como o Levi diz, e seu pau desliza em minha garganta, a ânsia vem
forte, me fazendo engasgar. Levi puxa para fora, limpando a baba no canto de
meus lábios antes de voltar a meter novamente, dessa vez ele desce mais, e juro
que vou vomitar, e, ao mesmo tempo, morrer de tesão com a delícia que é ter
esse homem entrando fundo na minha boca, e gemendo gostoso enquanto faz
isso.

— Porra de garganta profunda, aguenta meu gozo amore? — ele pede


aquilo como se estivesse me oferecendo água.

Sou incapaz de falar com sua grossura em minha língua, a mantendo cativa
de seu quadril, e pisco os olhos, molhados pela ânsia, tanto quanto minha vagina,
melada de desejo.
— Ah, Olivia — desliza o polegar em meu rosto, e volta a enfiar seu
cumprimento na minha garganta.

Paro de respirar, sua pélvis bate no meu nariz, e não sei como infernos
consegui o ter todo na minha boca. A garganta completamente dominada, engulo
em seco, desesperada para respirar, e bato em sua coxa o pedindo para sair.

Levi fecha os olhos e puxa o pau despejando seu jato quente e salgado na
minha boca, engulo tudo antes de começar a arfar, querendo vomitar.

— Boa menina — alisa meu rosto e me puxa para cima, beijando as


lágrimas que desceram por minha face. — Engoliu tudinho, como a boa putinha
que você é.

— Somente sua — arfo com a garganta ardendo.

Nunca imaginei que fossem me chamar de puta e eu iria gostar. Do Levi eu


quero ser tudo, a mulher da vida dele, a puta que o enlouquece na cama, e aquela
que preenche seu coração e vai ter uma família ao seu lado.

— Quer um presente? — pergunta distribuindo beijinhos em minha face.

— Sim.

— Vou te deixar escolher aonde vou te chupar, contra aquele vidro ou


nesse sofá.

Não preciso analisar as opções, tomada pela luxúria eu sei onde quero ser
devorada. Aponto a janela com a cabeça e Levi me pega no colo como uma
pluma.

Ele me deixa escorada contra o vidro, e fica de joelhos, os olhos fixos nos
meus enquanto ele segura minha perna, a colocando em cima de seu ombro, e
puxa minha calcinha em direções opostas rasgando o tecido encharcado.
O rosto desce contra meu centro cheirando minha virilha e intimidade,
como se ele estivesse me comendo com o nariz.

A língua quente, sugando meus líquidos enquanto ele bebe com ferocidade
no olhar. Bato a cabeça no vidro e grito ao ser mordida em diferentes lugares, até
sua boca se aquietar na minha entrada e ele enfiar a língua.

Dura e macia, alcançando meu pontinho mais sensível, e fazendo as luzes


da balada parecerem estrelas em meio ao meu delírio de prazer. Puxo seus
cabelos, prendo seu rosto com minhas coxas, o forçando a ir mais fundo. Perco a
respiração por segundos incontáveis e inspiro novamente, tentando manter minha
mente focada em qualquer coisa que não seja no quanto eu quero me desmanchar
na boca do Levi.

Ele morde minha entrada, e esse é o meu fim, despejo líquidos em sua
boca aberta, que engole em grandes goles tudo que tenho, a oferecer, sugando até
mesmo a minha alma.

Levi se certifica de ter me limpado toda com suas sucções e volta para
cima, metendo o pau dele, deslizando fácil em meu interior.

Sem forças nas pernas, eu desabo contra o vidro.

Ele segura minhas coxas e faz com que circule sua cintura com elas. Sua
boca chega perto da minha, e meu cheiro invade meus sentidos em um beijo,
misturando o sabor de ambos, animalesco, enquanto sou fodida contra o vidro em
investidas fortes e cruéis, de tão prazerosas.

— Olha para trás, Olivia — faço como ele manda — todas essas pessoas lá
embaixo e elas não fazem ideia de como eu estou comendo a boceta mais quente
desse lugar! — Rosna contra minha cabeça, a respiração quente em meu rosto.
Já desisti de tentar respirar, e aceitei que vou viver em um limbo de
pequenas arfadas de ar para continuar viva.

Meu corpo incendiando com os prazeres despertos, me cortando de uma


ponta a outra, enquanto Levi fala safadezas em meu ouvido.

— Gosta de ser comida com força? Posso quase sentir seu útero na cabeça
do meu pau.

— S-sim — gemo quase chorando de tamanho prazer arrancado por cada


pedacinho de pele do meu ser.

— Eu vou esporrar gostoso em você, Olivia, quero te comer assim todos os


dias, pela eternidade. Porra — ele bate no vidro com força — aperta meu pau
com sua boceta!

Ordena e eu obedeço, isso causa uma reação enlouquecedora nele, em que


suas estocadas tornam-se mais intensas contra minha pele. Ficarei assada sem
conseguir fechar as pernas, tamanha a força do seu quadril batendo contra o meu.

Fecho os olhos e arfo, com a cabeça explodindo, sentindo mil fogos de


artifício saindo do meu corpo ao mesmo tempo.

Levi geme gostoso contra mim, e mete fundo mais uma vez antes de
esporrar no meu interior. Desabo completamente contra seu corpo, e ele cai no
chão, me deixando em cima do seu peito, arfantes, suados, e completamente
satisfeitos.

— Eu vou te comer de novo — ele fala entre lufadas.

— Não aguento — protesto, a vagina ardendo.

— Não hoje, mas pelo resto dos nossos dias — beija minha cabeça, e
sorrio contra o seu peito.
Suas promessas são tudo o que eu mais quis ouvir de caras errados.
Demorou, chorei e me machuquei, no caminho para encontrar o homem que me
aceita, e que nunca seria capaz de me magoar.
Olivia
— Por favor, Olivia! — Louis continua implorando enquanto eu finjo que
não o escuto.

— Não vai chegar perto da minha irmã enquanto não resolver essa
situação! — Bato a colher de madeira em cima da bancada — tem um maluco
querendo te matar, e você quer ver a Bianca? Nem pensar!

— Eu já disse que amanhã será o fim dele — Louis suspira — vou expor
seus crimes, e em seguida ele será preso.

— Não me importa — arrebito o nariz — quando Bianca quiser te


encontrar, ela o fará!

Não aguento mais o Louis enchendo meu saco declarando o amor dele pela
Bianca, eu entendo que seu coração foi machucado muitas vezes no passado, e
tudo que ele falou, o que me fez ter um pouco mais de empatia pelo italiano
arrogante.

Eu sei que tem um segurança seguindo a mim e a Bianca, nos mantendo


segura dos inimigos dele, e que o homem só falta morrer de saudade.
Não irei deixar as provas do amor dele me convencerem, o Louis não vai
chegar perto da Bianca, até que a situação com os inimigos dele seja resolvida.

Minha irmã já tem passado por uma barra difícil com a gravidez de risco,
devido à pressão alta, e tenho medo de que a qualquer segundo ela passe mal e
perca a bebê, ou algo de pior aconteça com ela.

Como ela me pediu, eu mantive a gravidez em segredo de todas as pessoas,


incluindo do Levi. Nossa relação ficou mais sólida desde que ele me pediu para
viver com ele, e demonstra o quanto gosta de mim em todos os dias que
seguiriam.

Meu coração aperta do tamanho de uma amora quando o Lorran encara o


Levi, e fala “pai”, com a boca cheia de carinho, e como o Levi responde sorrindo
e o beijando.

O homem quebrado, que conheci na secretaria da creche, juntou seus


pedaços e tem desabrochado lindamente, buscando pelo sol como um girassol.

— Olivia! — ele branda e pisco — já que você não quer me ajudar ainda
— frisa bem a palavra — quero sua opinião em outra coisa, vem comigo
rapidinho?

— Deixa eu terminar de fazer a janta do Lorran.

— O Levi cuida disso — pega minha mão e me arrasta para fora do


apartamento.

— Você parece mais leve — digo quando entramos no elevador — com


menos peso nos ombros, apesar de viver com um alvo na cabeça.

— Eu já tenho calculado tudo que acontecerá nos próximos dias — a


certeza em seus olhos azuis me toca — vou destruir meus inimigos e recuperar a
mulher que eu amo.
— Não sei quanto ao segundo, mas boa sorte — dou tapinhas em seu
ombro.

— E você vai me ajudar — saímos no andar de cima, e vamos para um


apartamento vazio — o que acha daqui?

— Legal — dou de ombros.

— Quero morar aqui com a Bianca e construir uma família com ela —
noto como a voz dele assume um tom mais sério — vou falar com seu pai, e
fazer tudo direito, mas você me dá a usa benção?

— Você acusou a Bianca, e partiu o coração dela — levanto o dedo na cara


dele — a deixou sem nada, e ainda destruiu as coisas que ela tinha, faz ideia do
quanto estamos vivendo no limite por sua causa? — aperto os punhos — e apesar
dessas merdas todas, eu sei que você é um ser humano capaz de errar e acertar —
estapeio seu braço com raiva — nunca mais machuque o coração da minha irmã,
ou eu juro que vou te matar!

A Bianca não quer ver o Louis nem pintado de ouro. Grávida, e com
pressão alta, precisando de remédios, a situação piora a cada dia pela dor que ela
sente, por não o ter por perto.

O Louis também sofre, e não faz questão de esconder. Dois corações


separados pela ruindade das pessoas, não merecem continuar sofrendo.

Vou ajudar o Louis a reconquistar Bianca, não por causa dele ou dela, mas
porque ambos estavam vivendo uma história de amor, antes de serem separados.
Assim como não é certo, Levi continuar vivendo no luto, e esquecendo das
pessoas ao redor porque a esposa morreu, o Louis e a Bianca não devem
continuar sofrendo devido a outra pessoa.
— Quando eu sentir que ela está pronta, a trarei até você, enquanto isso,
continue respeitando o tempo que ela precisa.

— Farei isso — Louis pressiona as mãos inquieto — deixa eu cuidar dela


sem ela saber? Posso aumentar seu salário para ajudar na situação financeira de
vocês.

— Faça isso. — Mordo a bochecha, quase deixando escapar que ele vai ter
uma filha, e permanece alheio a essa situação.

Dou meia volta antes de fazer qualquer besteira, e deixo o apartamento que
ele comprou para viver com minha irmã. É isso que homens apaixonados fazem,
planejam um futuro, falam que amam, e querem viver com a pessoa a vida toda,
como o Levi tem feito comigo.

Bianca poderá em breve voltar aos braços do homem que ela ama,
enquanto eu continuo descobrindo meus sentimentos em relação ao Levi, que
crescem a cada dia, quase não cabendo no meu peito.

*****

Levi
— Você não se meta — Olivia aponta o dedo na minha cara.

— Eu deveria dizer isso a você! — Rebato — fica marcando encontros


entre a Bianca e o Louis, depois ela mata meu irmão e eu faço o quê?

— Chora — arrebita o nariz.

— Vocês vão brigar muito? — Lira coloca a cabeça na sala e sorri amarelo.

— Ah, oi — Olivia responde ficando mais calma.

— Essa é a minha irmã. Lira — apresento as duas.


Três meses atrás, quando Louis sofreu o atentado, e Lira veio correndo
para o Brasil, ela precisou voltar quase no mesmo dia em que soube que o Louis
estava de alta.

Após finalizar as filmagens, ela decidiu vir ficar um tempo conosco, até
precisar voltar para a organização do novo seriado que o estúdio quer que ela
dirija. Pelo jeito que minha irmã chegou, e na tristeza em seus olhos, suspeito
que ela esteja fugindo do cara que tem enchido seu saco.

Se eu pego aquele desgraçado, estouro os miolos dele.

— Prazer te conhecer — Olivia estende a mão, e Lira a puxa para um


abraço.

— É você o raio de sol do meu irmão? — Lira pergunta com um sorriso de


deboche no rosto.

— Um deles, o outro é o Lorran.

— Eu? — ao ouvir o nome, o pequeno aparece na sala segurando um


pirulito enquanto come o outro.

— Lorran! — Lira exclama — eu disse para não deixar seu pai e a Olivia
te verem comendo doce antes do jantar.

— Você fez isso? — ralho com ela que se esconde atrás da Olivia, mas
nem imagina que o verdadeiro perigo é a mulher, com fogo nos olhos, e não eu.

— Só uma coisinha. — A voz dela fica dez oitavos mais baixa.

— Lorran — Olivia chama, e ele vem olhando para baixo e escondendo o


pirulito atrás das costas — o que eu te disse sobre doces depois das 17 horas?

— Que num polde — fala baixinho, fazendo bico e mexendo os pés. Tenho
quase vontade de rir, se não fosse pela Olivia com as mãos na cintura o
encarando seria.

Porra, essa mulher fica um tesão quando séria, poderosa, dando ordens e
reclamando. Adoro quando ela me bate durante o sexo, e assume o controle em
nossos jogos de dominação.

Estremeço só de lembrar que ontem ela me bateu com uma régua enquanto
me punia por ser levado, e não a deixado gozar na minha língua.

Eu estou viciado, ensandecido, e louco pela Olivia, de uma forma que


nunca me senti antes. Ela entrou nas minhas veias e seria o inferno viver sem ela
ao meu lado, mandando, risonha, gostosa, carinhosa, um misto de emoções que a
tornam a mulher mais preciosa desse mundo.

Olivia se tornou meu raio de sol, e os poucos, tem ganhado mais e mais
espaço no meu coração. Às vezes penso que estou amando, mas tenho medo de
confundir o sentimento, e acabar magoando a mim, ou a ela.

Ir com calma é a melhor opção para nós dois. Não podemos correr o risco
de nos magoarmos novamente.

— Lira — Olivia encara minha irmã com ameaça, e até eu me encolho —


nessa casa não damos doces ao Lorran mais de uma vez por dia, ou antes, das
refeições. Ele é uma criança em fase de crescimento, e consumir essa quantidade
de açúcar não fará bem a ele, entendido?

— Sim! — Lira fica estática como uma vara, e depois corre para trás de
mim. Seguro sua cintura e a coloco de frente para a Olivia.

— Aguenta a bronca irmãzinha.

— Você gosta mesmo dessa mulher? — ela me pergunta com medo — ela
me apavora.
— Gosto — digo encarando a Olivia que amansa ao me ouvir — e quero
que você atenda ao pedido dela sobre doces ao Lorran.

— Certo — acena rápido demais e muitas vezes.

— Lorran vá guardar o pirulito, e jogue o que você está comendo fora, não
pode quebrar as regras.

— Pai? — ele me chama fazendo biquinho, o sem vergonha aprendeu a me


chamar de pai somente quando a Olivia briga com ele, querendo escapar e me
usando.

— Faça o que a Olivia pediu.

Ele sai marchando com os braços cruzados e reclamando em um idioma


que não consigo entender.

— Desde quando ele te chama assim? — Lira pergunta.

— Já tem um tempo, por enquanto o “Levi” persiste na boca dele —


suspiro — mas com paciência sei que ele vai se acostumar a me chamar de pai.

— Isso é maravilhoso Levi — ela me abraça pulando meu colo.

Giro a Lira no ar como costumava fazer quando éramos mais novos, e ela
gargalha feliz.

Uma batida alta na porta, e o Louis entra com a Bianca desmaiada em seus
braços. Solto a Lira, e Olivia corre para ver o que aconteceu com a irmã.

A comoção é grande, a correria maior ainda, quando a Bianca é levada ao


hospital, vou junto, e Lira fica em casa cuidando do Lorran.

— Eu não devia ter concordado — ela repete inúmeras vezes enquanto o


médico atende a Bianca.
— Eu não sei o que aconteceu — Louis diz caminhando em círculos — ela
estava bem, estamos conversando, ela ficou exaltada e depois disso, desmaiou.

Só preciso analisar a Olivia uma vez para saber que ela tem ciência do que
aconteceu com a irmã. Nossos olhares se encontram e ela balança a cabeça em
negativa, me pedindo para não falar nada.

Vejo o Louis e a preocupação dele, e entendo, é um segredo da Bianca, que


ela não quer contar ao meu irmão. Algo forte o suficiente para fazer a Olivia
manter a promessa de não falar, e ainda assim, fazer ela ter ajudado o Louis e a
Bianca a se encontrarem.

O médico se aproxima, e antes que a Olivia chegue nele o homem fala:

— A Bianca não pode sofrer graves estresses, ou isso vai prejudicar o


bebê.

— Ela... — Louis se engasga — está grávida?

Meu irmão fica de joelhos, segurando o peito enquanto tenta respirar.


Merda! Não fazia ideia de que a Bianca escondia uma gravidez, corro até Louis e
o apoio, ajudando que ele sente enquanto processa o que acabou de descobrir.

— Você sabia? — ele pergunta a Olivia.

— Não era meu dever contar — ela fala pressionando as unhas, e vejo o
quanto ela tem ficado aflita em esconder a gravidez da irmã.

— Não? — Louis se prepara para gritar e o empurro na cadeira.

— Não ouse levantar a voz para a Olivia — o ameaço — você que partiu o
coração da Bianca, e se a Olivia escolheu não dizer nada, não pode descontar a
raiva que sente de si mesmo nela.
Louis tem os olhos azuis em chamas, ele bate no meu braço e vai para o
quarto da Bianca. Olivia tenta o seguir, e a seguro. Posso ter controlado o Louis,
mas eu também tenho minhas perguntas.

— Vamos conversar.

— Vou falar com o pai do bebê — o médico diz — pela fúria dele dever
ser o que entrou. Se ele estressar a paciente, eu mando os seguranças o
expulsarem.

— Eu não podia contar — ela diz.

— Percebi — a puxo para meus braços — é por isso que você ficava
ouvindo as lamentações do Louis, sem querer arrancar a cabeça dele por magoar
sua irmã?

— Basicamente, desde o início, eu sabia que eles se amavam, e não era


justo ficarem separados devido a outra pessoa. Queria ter certeza de que a Bianca
estava segura antes de fazer alguma coisa para eles se resolverem.

— Não consigo imaginar o quanto foi difícil para você cuidar da Bianca e
não poder falar nada — beijo a cabeça dela, ficando mais calmo — não acredito
que o Louis vai ser pai.

— Ele será um pai incrível.

— Teve muito tempo de treino com o Lorran — encaro o chão.

— Ei — ela segura meu queixo, encontrando nossos olhares — você tem


sido um pai fantástico nesses últimos meses, e Lorran, eu, e todos, percebemos
isso. Sua irmã mal chegou dos Estados Unidos e já percebeu o quanto vocês
evoluíram como uma família.

— Obrigado por ter me apoiado em todo o caminho — beijo seu ombro.


— Eu quero tudo que pudermos ter juntos, Levi, um dia você vai poder
saber como é trocar uma frauda, mas por enquanto, se contente em fazer o Lorran
não comer doces escondidos.

— A Lira deve estar estragando-o agora.

— Eu a mato.

Rirmos juntos.

Olivia tem razão, perdi anos preciosos com o Lorran. Me lamentar por
causa disso não vai trazer de volta o tempo perdido, somente mais tristeza para
nossas vidas, e nunca mais quero ficar envolto de escuridão.

Não agora que eu tenho os meus sóis.


Olivia
Não consigo acreditar que a Bianca já completou a 35ª semana de
gravidez, e as coisas estão bem.

O Lorran, e o Levi, brigam menos, ambos continuam apegados a mim, e


Levi mantém a pose de que se incomoda com o quanto o Lorran me ama,
enquanto eu finjo que me irrito com as besteiras que ele, supostamente, faz para
me irritar.

Minha irmã está a alguns passos de perdoar o Louis, e eu sei que em breve
ele fará a jogada final, que derreterá o coração dela, e os dois poderão voltar a ser
o casal apaixonado que eram, antes de tudo desandar, e eu e o Levi poderemos
assumir que estamos juntos.

Eu não tenho motivos para me sentir mal, tenho ao meu lado um homem
que eu amo, minha irmã tem sido cuidada, e recebido tudo que precisa na
gravidez. Meu pai deixou de ser babaca com a Bianca e comigo, ele se limita a
uma convivência normal, Lorran é meu pequeno fofinho, que eu amo ficar perto,
cada dia mais o quero grudado comigo.

Não existem razões para meu coração ficar me incomodando com uma
dorzinha sempre que vejo Levi mostrando fotos da Blanca ao Lorran, e falando
sobre a mãe dele. Ela é a mãe do Lorran, não deveria me incomodar como a
palavra “mamãe” sai com facilidade de seus lábios, e não deveria me deixar
triste, como o Levi tem se esforçado para fazer Lorran reconhecer somente a
Blanca como mãe dele.

Posso ser a namorada do Levi, e a babá do Lorran, mas é só isso. No


máximo, me tornarei a madrasta dele, para quando crescer me odiar por estar
com o pai, substituindo o lugar da Blanca.

Eu engano a mim mesma, achando que um dia a poderei “substituir”, não


existe esse cargo para mim.

Sou a mulher que o Levi gosta e quer viver junto. E a que vai cuidar do
Lorran enquanto ele cresce, se um dia eu me casar com Levi, seremos uma
família, e Lorran terá irmãos.

Ele poderá considerar meus filhos como irmãos e querer bem a eles? Não
pensará que são crianças tomando o seu lugar, e vivendo o que o pai dele não
viveu com ele, isso nunca acontecerá, certo?

Pensamentos assim tem nublado minha mente nos últimos tempos, e


tornado meu coração pesado. Ontem recebi uma ligação informando que minha
situação na fila de adoção continua a mesma, e outra perguntando se vou querer
fazer outro processo de inseminação artificial.

Eu ainda quero ter filhos, por mim já teria engravidado do Levi, mas
exceto pela vez que ele esqueceu a camisinha na balada, não transamos mais sem
o preservativo.

Seria um indício de que ele talvez não queira filhos comigo, ou não esteja
pronto para ser pai, enquanto constrói a relação com o Lorran?
— Olivia! — Viro o rosto e o vejo deitado do meu lado, com o Lorran
entre nós, percebo estar encarando a página do livro enquanto me perdia em
pensamentos.

— Sim?

— Não ouviu o que eu falei?

— Pode repetir?

— O aniversário do Lorran é próxima semana, quero fazer uma festa para


ele.

Me deito nos travesseiros, e aliso a cabeleira loura do Lorran, dormindo


com o rosto no peito do pai. Dias assim tem se tornado rotineiro entre nós,
momentos vividos somente por uma família, e eu estou aqui, pensando o quanto
quero que esses dois sejam meus.

Meu marido.

Meu filho.

— Vamos levar ele ao zoológico, e depois fazemos os parabéns em casa,


com tema de animais, ele vai gostar. A Bianca não poderá participar, pela
condição dela, acha que o Louis irá?

— Com certeza, ele não perderia o aniversário do Lorran. E pelo que ele
me disse, vai trazer a Bianca para ver como ficou o quarto do bebê.

— Eu sei, podemos pedir para ele levar ela no dia do aniversário do


Lorran, e depois eles vinham cantar os parabéns.

— Gostei dessa ideia, vou chamar minha irmã.


— Certo — deixo o livro na mesinha e apago o abajur, me enrolando na
coberta.

— O que tem te incomodado? — ele pergunta baixinho — posso ouvir


daqui, as engrenagens na sua cabeça, rondando.

— Você sabe qual é o meu maior desejo? — sussurro.

— Ser mãe.

— E você deseja... — travo com medo de perguntar — ser o pai dos meus
filhos?

Levi fica em silêncio me encarando com a testa franzida, e me arrependo


de ter perguntado isso. Não é porque ele quer ficar comigo, que possa querer ter
outros filhos.

Fungo com os olhos ardendo, e viro de costas, não conseguindo sustentar


seu olhar afiado.

— Esquece — digo.

Ouço o farfalhar dos lençóis, e a coberta cobrindo minha cabeça é puxada


para baixo, me fazendo encarar o par de olhos azuis, cheios de sentimentos.
Fecho as pálpebras, não querendo ter mais essa conversa com ele, eu não gosto
de me sentir vulnerável e deixar que percebam que estou desestabilizada, Levi
consegue entrar na minha mente e alcançar onde mais dói.

— Vamos conversar lá fora — ele pede, e nego com a cabeça, Levi suspira
e puxa as cobertas novamente, ele segura minhas pernas, e minha cabeça, me
levando em seu colo para o lado de fora.

— Para, esquece o que eu disse, foi besteira — a voz embarga se


transformando em um suspiro baixinho.
— Não, vamos falar sobre o que tem te incomodado, e resolver a situação,
não gosto de ver você triste — beija meus cabelos, e sinto quando ele se senta no
sofá comigo em seus braços.

Levi me aperta forte, quase me deixando sem ar antes de me soltar.

— Eu só... — é difícil conseguir me abrir.

— Você quer ser mãe, e agora que estamos em um relacionamento, pensou


que poderia acontecer a qualquer instante, é isso?

Não tem emoção em sua voz, somente a certeza de que compreendeu a


situação. Eu estava certa em querer ficar calada, não deveria ter aberto a boca e o
deixado perceber o que tem me incomodado.

— Conversa comigo Olivia, ou não conseguiremos resolver o problema.

— Eu quero ser mãe — aperto meu punho escondendo o rosto em seu


peito — e posso ter confundido meu trabalho como babá.

— Não acho que seja errado você começar a pensar no Lorran de outra
forma — Levi segura meu queixo e puxa para cima, fecho os olhos firme,
acovardada para o encarar.

Deve pensar que quero roubar o lugar da verdadeira mãe do Lorran.

— Não posso fazer isso — tento sair de seu colo e sou presa mais forte.

— Pode, sim, o Lorran te admira, gosta de ficar na sua companhia, e


depois que começamos a namorar, ele tem se enfiado entre a gente como se
fossemos uma família. Eu percebo essas coisas, Olivia.

— Mas? — me preparo para o que virá.


— Eu quero que antes dele te ver como mãe, ele sabia que a Blanca foi a
pessoa que o trouxe ao mundo, e tenha na mente dele que ele pode te amar ou a
querer como mãe. Mas que nunca esqueça quem é a mãe biológica dele, a Blanca
não merece ser esquecida.

— Você já estava pensando sobre isso?

— Claro — sua mão desliza em minha coxa — bem antes de estarmos


juntos, eu via como o Lorran se apegou a você. Não tenho dúvidas de que se eu
pedisse para ele escolher entre mim e você, ele correria para seu colo sem pensar
duas vezes. É você a figura materna que o Lorran tem, não a Blanca, e isso me
preocupa, porque ela teria sido uma mãe incrível, e eu não quero que ele esqueça
dela.

— Seja claro quanto ao que você quer me dizer — peço, sentindo meu
coração ganhando esperanças que só poderão me machucar no futuro.

— Deixa o Lorran decidir se quer te chamar de mãe, quando ele fizer isso,
eu vou aceitar com um sorriso no rosto. — Ele hesita, e me preparo para as
palavras que podem partir meu coração — só não o deixe esquecer quem deu à
luz a ele. Lorran pode ter duas mães, e sei que Blanca iria querer alguém amando
e cuidando do filho dela como você faz.

Soluço, não conseguindo mais guardar para mim mesma, o turbilhão de


sentimentos que tem povoado minha alma desesperada para ser a mãe daquele
menininho.

— Não chora meu amor — Levi segura meu rosto, beijando minhas
lágrimas, e o encaro. As feições relaxadas e sem peso, certo da decisão que
tomou. — Você pode pedir para ele te chamar de “mãe”, mas deixa só ele
conhecer mais um pouquinho da Blanca?

— Sim — respondo em meio aos soluços.


Eu me enchi de medo achando que ele nunca aceitaria que eu me tornasse
a mãe do Lorran, e ao contrário do que pensei, ele já estava preparando o filho
para saber que ele teve uma mãe que o amou, e que se não tivesse morrido, teria
sido incrível, mas que agora ele tem a mim, e eu posso ser a mãe daquele
garotinho que eu tanto amo.

Meu peito explode de mil formas diferentes enquanto eu choro aliviada,


como nunca me senti na vida. Eu fui aceita, por ele e pelo Lorran, quando ele se
sentir pronto, me chamara de mãe. Não tem motivo para ter medo, não existem
razões para hesitar. Levi é o meu agora, e me entende como ninguém nunca foi
capaz.

Eu o amo.

— Você já é incrível com o Lorran, e sei que será uma mãe ainda melhor
— beija meu nariz e meus lábios, engolindo meu choro — só pega leve no doce
ou ele vai te odiar.

Dou risada em meio a minha crise.

— V-você..., a-acha?

— Com certeza, já viu o bico que ele faz quando você tira um doce dele?

— Ele vai superar isso — digo rindo, mais do que chorando, e Levi me
beija com intensidade, a língua preenchendo minha boca e dançando com a
minha. Sua mão desce por minha coxa, subindo e descendo, em um carinho
gostoso, finalizo o beijo com um selinho e descanso a cabeça em seu ombro.

— Desculpe por agir assim — peço depois de um tempo em silêncio.

— Desde que nos conhecemos eu sei que você quer ser mãe — ele alisa
meus cabelos — fiquei com medo de que estivesse ressentida comigo por não
tentar te engravidar ainda.
— Confesso que pensei a respeito.

— Me dá mais um tempinho? — pede, ouço o medo em sua voz — ainda


estou me tratando no psicólogo, não superei completamente a depressão, e luto
contra os dias sombrios, me ancorando em você e no Lorran, minha relação com
ele agora que começou a andar para frente, e eu... tenho medo de não ser um bom
pai.

— Você é um pai maravilhoso, e o Lorran sabe disso — seguro seu rosto e


descanso a testa na dele — quando estiver pronto, teremos o nosso bebê.

— Não consigo acreditar que você me quer como pai dos seus filhos —
Levi me enche de beijos fazendo cócegas em minha barriga.

— Escolhi bem, não foi? — brinco, lembrando da nossa conversa na praça


em frente ao museu.

— Sim, a melhor opção do cardápio — ele morde meu pescoço, e me


encolho em seus braços.

— Para — dou um gritinho fino, tentando escapar das mordidas e das


cócegas. Caio no chão, e a porta da frente é aberta. Levi paralisa e espia por cima
do sofá, Louis passa apressado, correndo para o quarto e não percebe nossa
presença na sala.

— Ainda não contamos para eles, né? — pergunta baixinho.

— Deixa eles se resolverem primeiro — beijo sua bochecha — vamos para


o quarto antes que ele volte.

— Certo.

Eu poderia ter falado antes para o Levi como me sentia, e tirado o peso das
costas que tem me enchido de preocupações.
Não tem mais hesitação em meu coração, Levi é o homem que será meu
marido e pai dos meus filhos, e quando Lorran estiver pronto, serei quem ele
chamará de mãe.
Levi
Lorran fica de boca aberta quando vê os macacos no zoológico, brincando
de pular de um galho para o outro, e interagindo entre eles.

Eu tenho feito tudo que pude para conseguir sorrir hoje e aproveitar o dia
com o meu filho e a Olivia.

As lembranças do dia do acidente estão martelando forte em minha mente,


e hoje que deveria ser feliz, comemorando o dia em que o meu garoto nasceu. Eu
só consigo pensar que em poucos dias será a data da morte da Blanca, e que estou
a milhões de quilômetros longe dela.

Sempre a visitei em seu ano de morte, e pensar em não o fazer dessa vez,
abre um buraco enorme em meu peito.

— Vamos ver as girafas — Olivia chama.

Reunimos a família hoje, Olivia, meu pai. Lira, e o Louis, que disse que
poderia ficar um pouco, antes de ir buscar a Bianca para ficarem juntos e
descerem para a festa de aniversário do Lorran.

Ele já mostrou o apartamento a ela, e conseguiu permissão do médico para


ela vir para a festa, passará só uma hora, e depois voltará ao hospital.
Meu irmão está feliz com a mulher que ama, e vão se casar após o
nascimento do bebê.

Eu tenho meu filho em meus braços, que finalmente me chama de pai mais
do que de Levi, pulando feliz ao ver os animais no zoológico.

A Lira parou de chorar pelo vacilão que a fez sofrer, e voltou a sorrir, e tem
sido uma ótima amiga para a Olivia.

Meu pai se aposentou, e tem vivido feliz, passando todas as tardes para
brincar com o Lorran e babar a Bianca, esperando a netinha dele nascer.

Porque eu sou o único que sente retroceder.

Há uns dias, prometi a Olivia que seria o pai dos filhos dela, e que o
Lorran poderá a chamar de mãe. A única pessoa que ele deveria chamar assim,
morreu, e em breve fará 3 anos da partida dela, ele nunca saberá o que é ser
segurado pelos braços calorosos da Blanca, ver o sorriso dela, que trazia vida ao
mundo, sentir o cheiro doce de sua pele.

Lorran nunca foi segurado pela mãe, e agora eu penso em colocar outra no
lugar dela? Como pude me deixar viver nessa mentira, e arrastar todas essas
pessoas comigo.

Não é certo colocar a Olivia no meio da minha escuridão, ela é um raio de


luz que será consumida por mim, o Lorran não merece um pai de merda como eu,
que em vez de aproveitar seu aniversário, só consigo pensar que em poucos dias,
sentirei novamente a dor de quando falaram que a Blanca faleceu.

— Vem com o nonno Lorran — ele se joga nos braços do meu pai que o
leva para perto das girafas.

— Quer conversar? — Olivia pergunta baixinho, nos separando do grupo.


— Não tem nada acontecendo — evito a encarar, sei que vou achar seu
olhar cheio de amor por um homem que não merece.

— O dia, de hoje, é difícil para você — não é uma pergunta, ela passa os
braços ao redor do meu pescoço, e tenho vontade de a afastar — tudo bem sentir
a falta dela e querer que ela estivesse aqui.

— Se a Blanca não tivesse morrido, eu e você não existiríamos, como pode


me dizer isso?

Eu sei que a feri com minhas palavras, e me arrependo no segundo em que


as digo. Olivia fica tensa e imóvel por longos minutos, antes de me soltar e fazer
com que eu a encare.

— Não volte para o passado, Levi — ela pede com a voz embargada —
você precisa continuar vivendo no presente, comigo e com o Lorran, somos sua
família agora, lembra?

Não posso a culpar por pensar assim, foi, eu que dei essas esperanças, e
agora queria poder retirar todas elas, e fazer com que a Olivia nunca tivesse se
apaixonado por mim.

Para ela não ter de sofrer com os dias sombrios que povoam minha mente e
escurecem meu coração, não deixando espaço para ela ficar nele.

— Não quero te magoar Olivia — a solto — vamos continuar a


comemoração do Lorran, prometo não estragar nada, só não me força, certo?

— Oh, querido, eu nunca faria isso — segura minha mão e a beija — me


chame para conversar se sentir que precisa.

— Certo.
O que eu preciso é beber e esquecer que a merda desse mundo existe, e que
a Blanca se transformou em cinzas no jazido de sua família na Itália.

Eu nunca mais a verei, e passarei o dia da sua morte longe dela, é esse o
tipo de ser humano desprezível que me tornei, alguém que abandona quem ele
ama, e coloca outra pessoa no lugar.

— Levi, vamos conversar — Louis me puxa sem deixar que eu responda.

— O que você quer? — sou ríspido.

Ele não me responde e continua me puxando entre as pessoas, até estarmos


em um lugar isolado, entre as plantas.

— Não faz isso cara. — Ele tem a expressão de tristeza e preocupação.

— O quê?

— Não joga fora tudo o que você conquistou nesse último ano. Eu sei o
quanto você fica deprimido e irritado nas semanas que antecedem a data do
aniversário da morte da Blanca, mas não faz isso com você e com a Olivia.

— Não temos nada — desvio o olhar.

— Mas querem ter — Louis cutuca meu peito — você voltou a viver, e não
é errado, pode sorrir e comemorar o aniversário do seu filho com a mulher que
você gosta. A Blanca nunca te julgaria por isso, não se torture.

— O Louis tem razão — A voz da Lira surge por trás do meu irmão — eu
e a Blanca éramos amigas, e eu também perdi alguém que amava naquele dia —
Lira passo os braços ao redor da minha cintura — ela te amou por cada segundo
em que respirou. E eu tenho certeza, de que se ela te visse agora, puxaria o seu
cabelo e mandaria você deixar de ser idiota, por estar perdendo o aniversário do
Lorran.
— Não fale por ela — peço com a garganta travada.

— Se eu não posso dizer que ela odiaria te ver desse jeito, você não pode
falar em ficar triste por não a ter aqui, ou pensar idiotices do tipo, que não
poderia ficar com a Olivia, ou comemorar o aniversário do Lorran sem culpa.

— Você não está sozinho, irmão — Louis segura meu ombro — se quiser,
podemos ficar conversando a noite, depois da festa.

— Você vai ficar com a Bianca — encolho sentindo os olhos arderem.

— Eu posso ficar com você — Lira sobe à cabeça encontrando meu olhar
— vamos fazer uma festa do pijama, e mandar a tristeza embora.

— Não somos mais crianças!

— Sempre vou ser infantil perto de vocês dois — ela se estica e beija
minha bochecha. — Seja sincero sobre seus sentimentos com a Olivia, ela vai
entender, e evitará discussão futura entre vocês por isso.

— Eu não mereço a Olivia.

— Seja capaz — Louis me encara — de fazer aquela mulher feliz, e você


vai ser merecedor.

— Papai! — Lorran chama alto, e o vejo no início da trilha, caminhando,


puxando a Olivia pela mão — paaaaaaaai.

— Vá ficar com o seu filho — Lira me solta.

— É o primeiro aniversário de vocês juntos, faça valer a pena Levi. —


Louis bate no meu ombro, me empurrando para a frente.

Aperto os punhos, evitando a tremedeira, e caminho para o Lorran e a


Olivia. Ela tem uma expressão preocupada, e limpo os olhos, na esperança que
não tenha percebido o meu choro.

Lorran se solta da mão dela e corre para mim, o pego no colo, e ele sorri,
segurando meu rosto com as mãos gordinhas.

— Você tem de ver os tilgles papai — ele encosta a testa na minha, falando
concentrado.

— Não acredito que tem tigres aqui — forço a voz a parecer espantada.

— Um montão — abre os braços — vamos?

— Bora.

Caminho com o Lorran no braço, focando na felicidade do meu filho, e a


usando para abafar os gritos em minha cabeça que insistem em dizer que é errado
eu estar aqui com ele e me divertindo.

Por que é errado querer viver?

Aperto os punhos, e encaro a Olivia, ela respeita meu silêncio, embora seu
rosto grite mil perguntas. Hoje eu fui um completo idiota com ela e com meu
filho, jogado em dores do passado que perturbam a minha mente e me fazem
esquecer do que realmente é importante, o presente.

Ajudou poder conversar com meus irmãos, e pelo resto do dia no


zoológico eu foco em manter Lorran feliz, conversando sobre os animais, e em
fazer a Olivia não se sentir deixada de lado. A ruga em sua testa não desaparece
quando chegamos, em casa, mas ela relaxa quando sorrio.

Estou vendo escuridão em todos os cantos das paredes, e lutando para me


manter firme, buscando apoio no sorriso da mulher que eu quero comigo e no
meu filho, que precisa de um pai que seja capaz de o amar e comemorar seus
aniversários ao seu lado.
— Bianca! — Olivia comemora quando a irmã passa pela porta, a barriga
enorme e pesada.

O que se passa pela cabeça dela ao ver a irmã mais nova gravida e de
casamento marcado, enquanto eu não estou pronto para construir a família que
ela precisa.

Olho o Lorran, que comemora quando a “zia bibi” dele chega.

— Você tá enolme — ele olha abismado para a barriga dela, e dou risada
pela primeira vez no dia.

— Sua priminha não para de chutar — Bianca se senta, e o Lorran fica ao


lado dela, com a cabeça em seu colo.

Todos prestam atenção na interação dele com ela.

Meus olhos são atraídos pela Olivia no canto, perto do sofá, olhando a
irmã com um desejo enorme de ser ela a pessoa grávida com quem o Lorran
conversa, querendo que o bebê nasça para brincar com ele.

Eu vou atrasar a vida dela se continuarmos juntos por mais tempo, a


impedindo de achar um cara decente que possa dar a família que ela precisa.

Pode ser a escuridão falando mais alto hoje, mas nesse segundo, eu decido;
... Não posso continuar com a Olivia e a fazendo mal, ela merece alguém
completo, e não um despedaçado como eu.

— Vamos cantar os parabéns! — Meu pai entra na sala com o bolo e a vela
acesa, Lorran fica em pé, e todos iniciamos a cantiga.

— De quem será o primeiro pedaço? — Lira pergunta entregando a fatia


no prato para ele.
Lorran desce do sofá e corre na minha direção, me abaixo quando ele me
entrega o prato com o bolo e gargalha.

— Para o papai.

A garganta trava e os olhos ardem, como ele consegue amar alguém como
eu? Seguro o prato com as mãos tremendo, e abraço o corpinho pequeno do meu
filho, inspirando seu cheiro e buscando forças para continuar em frente, e poder
voltar a ser feliz como nos últimos dias.

Não quero perder a felicidade que conquistei, mas se as coisas não


mudarem, só terei um destino a seguir.
Olivia
Cecilia Eduarda, o nome é uma homenagem à mãe do Louis, Cecilia, e a
minha mãe, Eduarda.

Minha sobrinha nasceu dois dias depois do aniversário do Lorran, e chegou


forte e saudável ao mundo, gritando com toda a força, sempre que quer se
alimentar, ou quando sente falta do colo do pai.

Nino a pequena Cecilia em meus braços.

O quarto dela, repleto de bichinhos desenhados nas paredes, que o Lorran


adora ficar olhando e pegando neles. Todos os dias ele pede para fazer aquilo no
quarto dele, e se o Levi não estivesse passando uma fase difícil devido à data de
morte da Blanca, que chega em 5 dias, não tenho dúvidas que ele já teria pintado
o quarto do filho, como fez com o da sobrinha.

Ele ainda se sentia bem quando fez as pinturas na parede, e mentiu para o
Louis, falando que eu o tinha desafiado dizendo que ele não conseguiria.

Para manter a carapuça, eu e o Lorran íamos ficar com ele, para o


“atrapalhar” enquanto desenhava. Quando ele terminou de desenhar o elefante,
foi a última tarde que tivemos em paz, os dias sombrios chegaram, e não
conseguimos fazer passar.

Parte meu coração ver como ele perdeu o brilho e a cor que ganhou nos
últimos dias.

É difícil fazer ele sair da cama e ir para a terapia, Louis que tem se
preocupado com a noiva e a filha, não consegue cuidar do irmão direito, e tem
atingido outro nível de cansaço.

A Lira precisou voltar aos Estados Unidos, para a estreia e promoções da


série de tevê que ela produziu, e ficou de retornar antes do casamento do irmão.

Resta somente a mim, Lorran, e ao Enrico, pai dele, para cuidarmos do


Levi, e o fazer ao menos se alimentar. Quando ele quis se ajudar e sair do fundo
do poço, Levi conseguiu sozinho, mas agora ele se entregou a dor por achar que
merece sofrer pela Blanca estar morta e ele vivo.

É errado e injusto, ele parou de viver e ficar com as pessoas que ele se
importa, para retornar ao passado.

Fico louca querendo fazer algo para o ajudar, e não consigo pensar em
nada.

Ele me expulsou, eu bato com uma marreta em suas paredes e não consigo
causar rachaduras. Se ele me amasse, eu deveria ser suficiente, capaz de colocar
sorrisos em seu rosto machucado, Lorran é o único que quando fala, Levi escuta,
ele ama o filho e quando amamos, fazemos de tudo por aquela pessoa.

— Não chora Livinha — Bianca pede.

Encaro minha irmã deitada na cama, e noto meu rosto molhado.


— Só estou emocionada demais, você agora é mãe Bianca — tento sorrir,
escondendo a dor em meu peito.

Não é certo eu achar injusto minha irmã ter se tornado mãe antes de mim.
Bianca nunca quis isso, tinha medo de ser uma mãe ruim, e agora aqui está ela,
conquistando tudo o que eu sempre quis e abdiquei para cuidar dela.

Não tive infância, vivia ocupada cuidando da casa e da Bianca, brigando


com meu pai, não pude viver minha adolescência, sempre preocupada com o
bullying que a Bianca sofria. Minha vida adulta passa diante dos meus olhos
enquanto a dela desabrocha em um mar de realizações.

É desrespeitoso eu me sentir derrotada, quando nunca competimos por


nada. Bianca encontrou um homem que a ama, e que destruiu seus inimigos para
eles ficarem juntos, alguém que ficou feliz em ter uma filha com ela, estão de
casamento marcado e uma vida cheia de alegria e amor para o futuro deles.

Fui eu que escolhi abdicar de tudo por ela, deveria me sentir feliz e
realizada por conseguir fazer isso direito. A inveja rasga meu peito junto da
incerteza sobre Levi.

Se todos os anos que se seguirem continuarem desse jeito, ele nunca me


aceitará como sua esposa, por ter medo de magoar a ex, morta.

Não poderei ser a mãe do Lorran, com a sombra da Blanca pairando em


sua cabeça, e no dia que Levi terminar comigo, e não gostar da minha presença
cuidando de seu filho, eu serei descartada como um pedaço de papel velho.

— Você gosta do Levi, não é? — Bianca pergunta baixinho, e estende os


braços pedindo pela filha, que começa a chorar — hora dela mamar, vem aqui il
mio piccola linda.
Entrego Cecilia para a mãe, e observo como ela agarra o peito da Bianca,
sugando com força o leite. Minha irmã faz careta pela dor, e eu a invejo, eu quero
isso, uma criança sugando meu peito com ferocidade ao ponto de machucar, e me
fazer pensar sobre dar a mamadeira para evitar a dor.

Eu quero tanto uma família, ser amada e amar na mesma intensidade. Por
que a vida é tão injusta comigo e me impede de ter o que anseio? Coloca um
homem quebrado no meu caminho que me deu esperanças de que tinha
encontrado tudo o que eu sempre quis, só para arrancar meu sonho de meus
braços e aumentar a ferida em meu coração.

— Eu... — hesito, não quero compartilhar com Bianca meus sentimentos.


Não agora que Levi passou de uma certeza para uma incógnita.

— Quando quiser falar estarei aqui para ouvir — Bianca segura minha
mão e sorri para mim.

Deito a cabeça em suas pernas, buscando consolo em seu colo. As lágrimas


se derramam como uma cachoeira de meus olhos, enquanto choro baixinho no
colo da Bianca.

Ela alisa meus cabelos, e sinto as pernas de minha sobrinha, sendo


apoiadas na minha cabeça, para minha irmã conseguir me dar conforto.

Nunca procurei o colo dela, teria sido mais fácil se eu tivesse dividido as
responsabilidades com a Bianca, ao invés de abraçar a todas?

— Você foi bem Olivia — Bianca tem a fala macia. — Conseguiu me criar
direito, e eu sou grata por tudo o que você abdicou por mim. Quando nossa mãe
morreu, eu ainda era muito pequena e tenho poucas lembranças com ela. Nunca
vou me esquecer de quando acordei na manhã seguinte ao falecimento dela, e te
vi na cozinha, passando manteiga em seu dedo por que tinha se queimado
fazendo um ovo para eu poder comer.
— Estava horrível e queimado — digo soluçando.

— Foi o ovo mais gostoso que provei na minha vida, ele foi feito pela irmã
que sufocou a dor dela, para poder cuidar da minha. Você sempre fez isso, esteve
lá, lutando todas as minhas batalhas enquanto eu te assistia, esquecendo de cuidar
de si mesma. Hoje eu estou feliz, e tenho a minha família, uma filha que eu amo,
e um noivo que sou loucamente apaixonada.

— Tenho orgulho de você — beijo sua perna, usando sua pele para limpar
o molhado do meu rosto.

— E eu de você, e me parte te ver triste dessa forma pelo Levi, não adianta
esconder, eu já percebi que você gosta dele, e ele de você. Mas Levi tem dores
profundas, e não sei se você conseguirá alcançá-lo. Não se sufoque mais por
outra pessoa, Olivia, ou você vai acabar morrendo por dentro.

É assim que eu me sinto, morrendo por dentro, quando o vejo sofrendo por
outra que ele amou com a própria vida, enquanto eu continuo batendo com uma
marreta na porta dele, sem conseguir causar impactos.

— Eu nunca vou ser feliz — sufoco um grito. A pequena Cecilia começa a


gemer no colo da mãe, incomodada pelo meu choro.

— Vai, sim, você esteve radiante nos últimos meses, e fez o que pode para
esconder de mim e não me magoar. Mas eu nunca ficaria triste por você ser feliz,
te ver alegre e com os olhos brilhando, me deu forças para continuar em frente.
Agora a única coisa que eu preciso de você, é que possa cuidar de si mesma e
sorrir novamente, você pode ser feliz Olivia. Não se prenda mais a dor de outra
pessoa.

— Eu deveria o deixar? — a simples ideia de abandonar o Levi rasga meu


peito em milhões de pedacinhos.
— Você deve se priorizar. Enquanto Levi não quiser sair do luto, nem
você, o Louis, o Enrico, ou a Lira, serão capazes de o fazer voltar a superfície.
Não pare seu mundo porque o Levi escolheu parar o dele. É doloroso e cruel o
que estou dizendo, mas só o falo por me preocupar com você Olivia.

Bianca começa a chorar e ela se mexe na cama. Seus braços puxam os


meus para cima, e encaro o rosto banhado da minha irmã. Cecilia foi colocada
nos travesseiros ao lado dela. Bianca alisa minhas bochechas e beija a minha
testa.

— Não aguento mais ver o quanto você sofre sem conseguir fazer nada, se
eu pudesse surrar o Levi até ele acordar para a vida. Não sei qual será a sua
escolha, mas eu vou te apoiar incondicionalmente no que decidir. Não abandone
seu sonho, ou o coloque em espera, por ninguém, pela primeira vez viva a sua
vida, Olivia.

Abraço Bianca e deságuo a dor do meu peito no colo dela. Minha


irmãzinha tem razão, eu nunca vivi para mim mesma. Deixei Levi entrar,
acreditando que com ele seria diferente, suas palavras, ações, desde o início eu
sabia que ele sofria por outra pessoa, e que seria difícil ter espaço em sua vida
para mim.

Eu estou exausta de não ser suficiente e de permanecer lutando contra a


maré, nadando sem nunca chegar à praia. Abafando meus sonhos e felicidade
para cuidar das dores de outra pessoa.

Ele sabe que estou aqui por ele e escolheu não me deixar entrar. Agora eu
vou ter de escolher a mim mesma.

Meu coração será partido de uma forma, ou de outra, ao menos dessa vez
eu vou me permitir escolher como acontecerá.
Fico com a Bianca pelo resto da tarde, e quando Louis retorna, carregando
o Lorran dormindo no colo, eu pego meu pequeno fofinho e o levo para a sua
casa.

O ambiente frio nos recebe em meio a escuridão, e lembro de quando fui


com Levi a exposição no museu, quando se abriu para mim sobre a dor em seu
coração.

Meu instinto grita que preciso dar mais uma chance a ele, e meu coração
magoado se prepara para mais uma rejeição. Quando estava com a minha irmã eu
me convenci de que conseguiria cuidar e me priorizar. E aqui, eu queimo
querendo fazer isso por ele.

Deixo Lorran em seu quarto e respiro fundo, vou tentar somente mais uma
vez, se o Levi me expulsar, eu vou embora da sua vida e voltarei a ficar sozinha,
lutando para ter um filho.

Caminho pelo corredor e bato na porta dele, baixinho, acho que ele não vai
ouvir. Bato com mais intensidade e pouco tempo depois ela se abre. O homem
que eu amo tem os olhos vermelhos, o peito desnudo, e os lábios inchados como
se tivesse passado horas mastigando a pele.

— Oi! — Digo, o coração dispara com medo da rejeição.

— Entra.

Ele me dá passagem e retorna para as cobertas, se escondendo do mundo.


A ponta dos dedos pinica, e coço tentando afastar a inquietação. Vou para a
cama, e deito ao lado dele, a mão treme quando a levanto e toco o seu rosto, Levi
fica de olhos fechados e me puxa para perto.

— Eu ainda te quero, Olivia — ele sussurra.

Sua frase machuca meu peito mais do que a rejeição.


Tem tristeza em cada uma das palavras, carrega dor e arrependimento. A
garganta trava com o bolo enorme, não tenho mais forças para lutar contra o
Levi, e insistir que ele me deixe entrar.

Se ele me amasse, não sofreríamos tanto para ficar juntos.

Só uma última vez. — Sussurro para mim como uma viciada prestes a usar
drogas após decidir que iria parar.

Aproximo minha boca da dele e o beijo, lábios frios me recebem com


tristeza. Afasto a cabeça para longe dele e sou surpreendida quando seu corpo se
posiciona em cima do meu.

— Eu vou melhorar meu raio de sol — ele sussurra em meu ouvido — me


perdoa por ser horrível com você.

— Você não está pronto para nós, Levi — soluço, a dor irradiando por meu
corpo como um veneno.

— Eu quero estar — ele beija meu pescoço — quero ficar com você, e
voltar aos dias em que estar junto não causava dor.

— Eu te machuco? — murmuro não conseguindo impedir o choro.

— Você nunca fez isso, eu que sou a fonte da dor — ele beija minhas
lágrimas. — Deixa eu tentar acertar as coisas, só mais uma vez? Por favor.

— Eu não aguento mais sofrer Levi.

— Eu sei — encosta os lábios nos meus — eu também quero ser feliz,


Olivia.

— Por favor, não faz isso comigo, eu não aguento mais ser insuficiente.

— Você é mais Olivia, sempre foi.


Levi me beija pela primeira vez em semanas, tristeza espalha do seu corpo
para o meu a cada toque. Ele desliza as mãos para baixo, tirando minha roupa, e
eu deixo, ao menos mais uma vez eu quero me sentir amada como nos últimos
meses.

Entrego meu corpo a ele sem reservas, arranho suas costas quando ele me
preenche sem o preservativo, o sentindo inteiro dentro de mim. Suspiro em seus
lábios, o beijo, desesperada, sabendo que essa é uma transa de despedida.

Não existe mais espaço para mim em sua dor, e não posso continuar
abdicando de meus sonhos por ele. Nunca mais colocarei a mim em segundo
plano.

Quando terminamos, Levi não me deixa ir embora, e agarra meu corpo


com força, adormeço em seus braços com as lágrimas caindo, e o coração
desfeito.
Olivia
Entro na clínica com as pernas bambas de ansiedade. Vou fazer novamente
outra inseminação artificial.

Nos últimos três dias eu senti que Levi estava se despedindo de mim, e que
não poderíamos ter um futuro juntos.

O medo de perder Lorran caso eu e o Levi terminemos, faz com que eu


continue aguentando a tristeza com a qual ele me beija, e como tem evitado olhar
em meus olhos quando transamos.

Não é comigo que ele quer estar, não são pelos meus beijos que ele
procura, e todo o fogo que queimava entre nós dois se dissipou, como o vento, ao
bater em uma parede.

Vou continuar tentando engravidar sozinha, e quando tiver meu bebê em


meu ventre, a dor vai amenizar, não tem como o sofrimento durar para sempre e
se prolongar, transformando os meus dias felizes em uma bolha de sofrimento.

Vou romper sozinha essa barreira e serei feliz, custe o que custar.

— Senhorita Olivia Baptista? — A recepcionista me chama — pode ir


fazer o teste de gravidez agora. — Ela aponta a sala ao lado. — Depois o doutor
te atenderá.

— Certo.

Caminho para a sala com as pernas bambas.

Eu não engravidei, tenho certeza disso, mas antes dos procedimentos


preciso fazer o teste, principalmente por ter uma vida sexualmente ativa.

Entro na sala branca e faço xixi em um copinho, coloco os testes de


gravidez dentro dele, e deixo o ambiente antes de ver o resultado.

Eu já sei o que se seguirá.

Vou para a sala do doutor e não o encontro lá dentro. Sento-me na cadeira


com o estômago dando voltas de ansiedade. Será a minha terceira tentativa, e
dizem que a terceira é a certa, não tem como dar errado.

O doador que escolhi é um homem saudável e bonito, brasileiro e formado


em direito. Não tem como falhar, dessa vez eu terei o meu bebê.

— Olivia — o doutor Campos entra com um sorriso no rosto — você não


parece muito bem, aconteceu algo?

— Nada de diferente — não quero mentir, ao menos com ele, anseio ser
sincera.

— Faz tempo que você não vem aqui, as coisas com o namorado estão
indo bem?

— Não muito — dou de ombros — ele foi casado, e quando a esposa


morreu entrou em depressão. Esses últimos dias tem sido difícil, e percebi que
não tem lugar para mim no coração dele.
— A depressão destrói a mente da pessoa e ao corpo. Não o culpe por agir
de forma errada nesses dias, ele precisa de ajuda, e sei que você conseguirá fazer
isso.

— Eu cansei de ajudar — sorrio com a vista nublada — ao menos uma


vez, gostaria que fizessem isso por mim.

— Estou aqui para ser a sua ajuda — ele segura minha mão — vamos ver
o resultado do teste, e depois damos início ao procedimento.

— Certo, mas não será diferente das outras vezes.

Duas batidas na porta e a enfermeira entra, carregando consigo os testes de


gravidez. Ela entrega ao doutor Campos que me olha com a sobrancelha franzida,
escondendo o resultado. Com um sinal de cabeça, a enfermeira deixa a sala e ele
guarda os testes na gaveta.

— Vamos conversar primeiro — ele cruza as mãos — você terminou com


o seu namorado?

— Não consigo — deslizo o dedo na bochecha limpando o molhado — eu


sei que preciso terminar com ele, e parar de sofrer. Tenho medo de perder o
contato com o Lorran, e ficar sem aquele menino na minha vida seria o inferno.

— Você não acredita que seu namorado possa ter salvação?

— Não mais — suspiro — enquanto ele não largar o fantasma da esposa,


ele nunca me dará uma chance.

— Olivia, preciso que você me ouça com atenção agora — ele se levanta e
se senta na cadeira ao meu lado — você é uma moça adorável, e será uma mãe
fantástica, sortudo é o Lorran por ter você com ele. Independente do seu
namorado não querer mais você perto do menino, sei que conseguirá um jeito de
ficar com ele.
— O tio dele pode fazer isso, acho que o Louis não teria coragem de me
afastar do Lorran.

— Você não está sozinha, nunca mais ficará.

— Como pode ter essa certeza? — inclino a cabeça para o lado.

— Não iremos mais fazer o procedimento.

— Como assim? — fico assustada, ele não pode tirar isso de mim.

— Você conseguiu, você está grávida Olivia.

O mundo para de girar ao meu redor, e tudo se torna brilhante.

— Eu... vou ter um bebê? — pergunto incrédula levando a mão ao ventre.

— Sim, parabéns.

Doutor Campos me envolve em seus braços, e eu fico atônita sem


conseguir acreditar que isso finalmente aconteceu.

Vou ter um bebê! Um filho para amar e ser amada, ninguém poderá tirar
ele de mim, e nunca mais estarei sozinha. Meu maior sonho se tornou realidade e
ninguém poderá apagar a felicidade que estou sentindo.

— Como é possível? — digo em meio aos risos e as lágrimas alegres.

— Você transou sem camisinha, não é obvio? — ele gargalha e o


acompanho.

Eu transei sem camisinha.

Eu... transei sem camisinha.

O pavor retorna ao meu peito como uma avalanche.


— O Levi é o pai — murcho.

— E você a mãe, não deixe o momento perder o brilho por causa desse
homem, você finalmente conseguiu!

Ele tem razão.

Eu realizei meu maior sonho, e não vou deixar a tristeza pelo meu
relacionamento ofuscar esse momento.

Levo a mão ao ventre e baixo a cabeça, encarando minha barriga lisa que
em breve ficará enorme.

— Eu amo você, minha pequena — sussurro.

— Acha que é uma menina? — ele pergunta brincalhão. — Mal soube que
será mãe e já previu o sexo.

— Tenho certeza, a minha menina está dentro de mim.

Sorrio.

Nada poderá arrancar a minha felicidade e quando eu me sentir pronta,


contarei ao Levi sobre o bebê. Não sei como ele vai reagir e vou esperar um
tempo, até ter certeza de que é seguro.

****

Levi
— Quelo um tilgle papai. — Lorran pede.

Hoje é o dia em que a Blanca morreu e tenho me agarrado ao Lorran como


um bote salva-vidas, para não correr para o bar e beber até apagar, e esquecer o
meu nome.
Tenho feito mal a ele com o meu afastamento e magoado a Olivia. Apesar
de ela não ter terminado comigo, eu sinto que a afastei e coloquei uma barreira
entre nós.

Sou um lixo que a usou todas as noites para não ficar sozinho, sentindo a
falta da Blanca, e que tem feito amor com ela buscando por outra pessoa.

A Olivia não é idiota, ela percebeu que faço isso, e tem deixado, não
entendo como ela pode aguentar um merda como eu sem me mandar embora.

Nossa relação está por um fio e a culpa é inteiramente minha. Não sei
como consertar o que se quebrou dentro de mim e na nossa relação. A única
coisa que consigo fazer, é pintar o quarto do Lorran com os animais que ele tem
me pedido, e rezar para que a Olivia tenha a coragem de ir embora.

Sou um fraco idiota, incapaz de a afastar por precisar dela ao meu lado, me
fazendo esquecer a dor da perda.

Não é justo com ela, não é certo fazer isso comigo. Antes dos dias
sombrios chegarem, eu estava com ela e me sentia bem, nunca pensei em a ter
usado como uma substituta, ela é o meu raio de sol, que perde a luz devido à
minha escuridão.

Eu tenho ciência das merdas que estou fazendo e não consigo impedir.
Continuo a procurar como um maldito viciado, enquanto rezo para que ela me
deixe e pare de machucar a si mesma com esperanças de que um dia eu vá mudar.

Não tem como eu ser diferente do que sou agora, Blanca deixou um vazio
dentro do meu peito que nunca será preenchido, e quando o vazio doer, eu não
poderei fazer nada além de me entregar a ele, deixando que consuma toda a
felicidade que eu não sou digno de receber.
— Beeeeeeeem glande — Lorran abre os braços quando termino o desenho
a lápis, do tigre na parede.

— Se ficar grande demais, os outros animais vão ter medo dele — digo,
sem coragem de apagar e fazer outro.

— Polqule? — se senta e suspira — tansei.

— Você não fez nada — rio e ele passa a mão na testa enxugando um falso
suor.

— Tansa da oldem, quelo tolme — levanta e sai correndo, provavelmente


para a cozinha atrás da Olivia.

Foco em desenhar os outros desenhos, e meu peito vai sendo comprimido,


e a vontade de beber chega a me enlouquecer.

Erro a tromba do elefante cinco vezes. Irritado, jogo o lápis no chão e saio
do quarto, vou para a cozinha e paro na porta quando vejo o Lorran em cima do
balcão e a Olivia esfregando o nariz no dele enquanto riem juntos.

Era para ser a Blanca.

Aperto os punhos com raiva do que vejo. Ela não tem o direito de se
infiltrar na vida do Lorran e o tratar com o carinho de uma mãe.

Ele já tem uma e não precisa outra.

— Lorran! — chamo com a voz grave e menino se assusta, pulando no


canto e me encarando de olhos arregalados. Olivia tem a mesma reação — vamos
terminar os desenhos.

— Sì papai — ele estende os braços para a Olivia, e ela o coloca no chão.


Lorran passa correndo por mim voltando ao quarto dele.
— Não precisa agir assim — ela pede em voz baixa.

— Você não é a mãe dele, não esqueça disso.

Os olhos dela nublam, trinca o queixo para que eu não perceba a


tremedeira que se espalha pelo seu corpo.

— A mãe do Lorran morreu há três anos, hoje é o dia mais triste da minha
vida, e só quero passar ele com o meu filho e tentando não morrer de tanta dor —
me aproximo dela com raiva na voz — não ouse pensar que você pode roubar o
Lorran de mim ou da Blanca. Você é a babá, nada mais!

— Vou embora. — Ela fala em um fio de voz e sai sem olhar para trás.

Eu destruí seu coração, quem sabe agora ela perceba que não sou o certo
para ela e se mantenha distante. Ninguém vai roubar o Lorran de mim
novamente, ou apagar a imagem da Blanca.

Volto para o quarto e o Lorran tem as mãos cheias de tinta passando elas
nas paredes.

— O que você fez? — tento não soar irritado.

— Patinha dos bilcinhos — noto que ele só marcou na parte em que fica a
pata dos animais.

— Vamos deixar isso melhor. — Me sento ao lado do Lorran.

A Olivia foi embora, a afastei antes de tornar sua vida um inferno pior por
continuar comigo. Eu só preciso do meu filho para sobreviver ao hoje, e nada
mudará isso.

Ela pode ser feliz sem mim em sua vida.


Olivia
Cada célula, músculo e articulação do meu corpo dói.

Passei os últimos cinco dias trancada em meu apartamento, chorando após


ouvir as palavras cruéis do Levi.

Enquanto me afogava na dor, decidi que não irei contar a ele sobre o bebê,
esse filho é somente meu, e quando perguntarem, eu digo que a inseminação
artificial deu certo.

Agora eu consigo entender o medo da Bianca em contar ao Louis sobre a


gravidez após ter sido rejeitada.

Eu fui jogada na lama como um rato morto, alguém que não adianta lutar
ou ficar ao lado.

Desprezada.

Rejeitada.

Sem amor.

Me dedicando mais do que recebo em troca.


Essa foi a história da minha vida, por que acreditei que seria diferente com
Levi? Logo ele, um homem depressivo, marcado por um grande amor.

Fui uma idiota pôr o deixar entrar no meu coração, por ter esperanças e me
iludido. Não posso culpar a ninguém além de mim, os sinais de que acabaríamos
assim sempre estiveram ali, eu só me recusei a ver.

Ele não deixava o Lorran me ver como uma mãe.

Concordou em não contar sobre o nosso relacionamento para ninguém, e


mesmo após nossos irmãos terem se resolvido, ele permaneceu me mantendo em
segredo.

A Bianca vai casar-se daqui a umas semanas, ela conseguiu tudo o que eu
sempre sonhei.

Um homem a amando.

Um casamento.

Um filho.

E eu recebi mais uma vez a rejeição e o desprezo, palavras cruéis ditas por
lábios que fingiram gostar de mim, e me usaram. Não tem mais volta, o Levi
nunca me amou, e não amara o nosso filho.

Meu bebê não vai saber o que é ser odiada, se sentir insuficiente e sozinha,
eu vou cuidar dela, serei uma mãe perfeita, e nunca a deixarei sentir a falta de um
pai na sua vida. Eu serei suficiente.

Contarei a todos a mesma história, e a verdade será guardada comigo a sete


chaves. Eu fiz a inseminação, deu certo e agora vou ser mãe. Tenho nove meses
para curar meu coração, não permitirei que minha filha venha ao mundo comigo
nesse estado.
A campainha toca e viro para o lado oposto, me recusando a receber
visitas.

— Zia viviaaaaaaaaaaa — ele grita e meu coração estremece.

Meu fofinho.

Faz sete dias que não vejo Lorran, e a saudade vinha comprimindo meus
pulmões, chegando a ficar difícil respirar, sem pensar nele e no quanto o queria
comigo.

As palavras do Levi foram um aviso claro; ... Eu não sou a mãe dele e não
tenho o direito de ficar perto.

Me levanto cambaleando, tenho me alimentado o máximo que posso para


não fazer mal a meu neném. Meu coração pode ter ficado em pedaços, mas não
vou deixar isso causar prejuízos a pequena que cresce em meu ventre.

Limpo os olhos, como se fosse adiantar de alguma coisa, o inchaço é tanto,


que mal consigo enxergar.

Destranco a porta e vejo o meu fofinho no colo do pai.

Levi não me encara e desvia o olhar para o lado oposto. Lorran estica os
braços e o pego no colo, inspirando seu cheirinho de bebê que aquece meu
coração magoado. Entro e fecho a porta, não quero ver o pai dele.

— Ocê tá bien? — ele pergunta com as mãozinhas em meu rosto, os


olhinhos azuis preocupados, e as bochechas vermelhas.

— Estou doente — minto, disse o mesmo na creche, e ao Louis, para


justificar meu sumiço.

Doutor Campos foi generoso comigo e me deu um atestado médico, para


corroborar com a minha história. Ele era o único a quem eu poderia pedir isso, e
sua ajuda foi bem-vinda, me permitiu sofrer em casa sem ninguém me
procurando.

— Dodói? — franze a testa e beija meu nariz — melholou?

— Com certeza fofinho — vou com o Lorran para a cama e deito com ele
ao meu lado, tenho medo de ficar o segurando com a bebê em meu ventre.

— Vamos pla casa? — Ele alisa meus cabelos e beijo sua mãozinha.

— Ainda não posso fofinho, fica um pouco comigo?

— Sì, senti sua falta zia vivia — ele se agarra ao meu pescoço. — Num
deixa eu.

— Eu te amo tanto Lorran — sussurro em sua cabeça, sentindo o cheiro de


seus cabelos — Seria incapaz de te deixar — aliso os fios de ouro.

— Amo a zia vivia — ele aperta mais meu pescoço, escondendo a cabeça,
tentando se fundir a mim.

As palavras do meu anjinho colam um pouco do machucado aberto em


meu peito. Como pude ficar sete dias longe dele? Sem ouvir sua doce voz, a
gargalhada gostosa, e poder passar o dia brincando e cuidando dele.

Nem que eu tenha de tirar o Lorran do Levi, nunca mais cometerei o erro
de pensar em ficar longe dele.

— Não vou te deixar fofinho.

— Polmete?

— Sim — beijo sua cabeça, e Lorran sorri. — Bola sisti?

— Sí.
Levanto com o Lorran e coloco um desenho na tevê para a assistirmos
enquanto aliso seus cabelos. Sou incapaz de negar algo a esse pequeno. Batidas
soam na porta, e depois o Levi entra.

— Olivia, precisamos conversar

— Não! — O ignoro — Lorran vai dormir aqui, depois eu ligo para o


Louis vir buscá-lo, pode ir embora.

— Eu tenho de falar com você Olivia — ele fala com pesar na voz, não o
encaro. Ele não tem o direito de partir meu coração quando está depressivo, e
depois vir com o rabo entre as pernas tentando me fazer voltar com ele.

— Saia da minha casa. — O encaro com fúria, e opto por falar em


português para o Lorran não entender.

Levi não tem a expressão de quem quer pedir desculpas ou qualquer merda
que justifique seus atos. Todos que me magoaram nunca me pediram perdão, ou
voltaram, atrás, ele não será diferente, eu que serei.

— Eu te deixei entrar e você pisou em mim sem pensar duas vezes, ou


considerar o quanto me faria mal. Eu aguentei a sua dor e suprimi a minha,
enquanto você foi um egoísta miserável que só pensou em si. Vá embora, quando
eu estiver com o Lorran você ficará longe. Se tentar me afastar dele, eu juro que
faço o Louis tirar a guarda dele de você.

— Lorran é meu filho! Não vou perdê-lo, e por isso...

— Então seja esperto, e não tente me irritar, agora saia. — Não o deixo
terminar de falar suas mentiras, ficar perto do Levi arde em meu coração.

— Eu vou para a Itália, vim deixar o Lorran para passar uns dias com você.

— Fuja o quanto quiser.


Ele deixa uma mala ao pé da porta, e depois vem até o Lorran, que estende
os braços para o pai e beija a bochecha dele, enquanto se despedem. Levi diz que
passara somente uma semana fora, e pede ao Lorran para se comportar, reviro os
olhos sem acreditar em como ele pode ser frio após partir meu coração.

— Papai sentiu sua falta — Lorran se esforça para falar correto, depois que
o pai vai embora.

— Como sabe disso fofinho?

— Eu vi — ele sobe no meu colo e deita a cabeça em meu peito — ele


ficava olando sua foto dileto, e clolava.

Não deixo que isso mexa comigo, provavelmente, Lorran se confundiu, e a


quem o Levi via, era Blanca, a única mulher que ele realmente amou.

****

Lorran fica comigo pelos próximos dias, e Levi manda mensagens,


perguntando do menino, deixo que o filho responda por áudio, me recuso a
dirigir a palavra a ele, mesmo por mensagem de texto.

Vou focar em mim, na gravidez, no Lorran, e em ser feliz.

Não deixarei a minha alegria ser determinada devido a um homem. Na


segunda volto a trabalhar na creche, e a ficar com o Lorran no apartamento, tento
ignorar a dorzinha no peito que sinto, ao lembrar dos momentos que passamos
juntos nesse lugar.

Entrar na cozinha é reviver quando ele despedaçou meu coração.

Louis vem buscar o Lorran para ficar a noite com ele e a Cecília, somos
todos apaixonados na pequena e sempre que posso fico por lá, ajudando a Bianca
com o resguardo.
Mas hoje eu preciso da minha cama, comer sorvete, e chorar, a mágoa
permanece obscurecendo os meus sentimentos, e não me deixando ser feliz.

— Você sabe o motivo dele ter ido a Itália? — Louis diz quando entrego
um Lorran dorminhoco em seus braços.

— Não quero saber sobre ele — desvio o olhar.

— Foi por você...

Endureço as feições e interrompo o Louis.

— Não defenda seu irmão, ir para outro continente depois do que ele fez
não vai mudar nada. Levi escolheu dizer cada uma das palavras que me
magoaram, e nada mudará isso.

Não espero por sua resposta e vou embora.

O casamento deles será em três dias, e viajaremos para a Itália, as 7 horas


da manhã. Passo a noite rolando na cama, sentindo um enjoou terrível e sem
saber o que fazer para melhorar, já que o remédio passado pela minha obstetra
não serve de nada.

Amanhã o verei e serei obrigada a ficar na mesma casa que ele durante os
preparativos, o casamento e os dias seguintes a festa acontecerem.

No total, duas semanas de puro inferno, precisando suportar ficar perto do


homem que me fez acreditar em um futuro juntos, e jogou tudo no lixo, que fugiu
quando as coisas ficaram complicadas me deixando para trás, destruída e grávida.

Bianca me olha com tristeza, e evito a encarar, se ela quer um casamento


pacífico e sem drama, não espere que eu vá me dar bem com Levi, ou seria capaz
de o enforcar por tirar a minha paz e ainda fazer morada em meu coração idiota.
Não serei boba novamente, por mais que eu ainda o ame e sofra com a
distância, ninguém pisará em mim.

Embarcamos sem dificuldade, e fico com o Lorran ao meu lado, ele se


estica direto para ver a prima no colo da Bianca, e eu tenho esperança de que um
dia ele tenha a mesma felicidade para brincar com a irmãzinha dele, que cresce
em meu ventre.

— Lorran — chamo baixinho.

— Sì zia vivia — eu amo quando ele me chama assim, e beijo suas


bochechas.

— Você ficaria feliz em ter uma irmãzinha?

— Muuuuuuuuuuito — abre os braços e sorri lindamente, mostrando os


dentinhos pequenos de leite.

— Vai ser um bom irmão mais velho?

— Com celteza — acena em positivo. — Me dá uma ilmanzinha?

Meus olhos lacrimejam, e eu beijo a cabeça dele.

Esconder a gravidez do Levi é uma coisa, ele magoou meu coração e


terminou tudo entre nós por não conseguir esquecer a esposa morta.

O Lorran não tem culpa de nada, e consigo imaginar o quanto ele seria um
irmão maravilhoso e apaixonado.

Pelo Lorran eu escolho contar a verdade sobre a paternidade da minha


filha, somente quando eu me sentir forte para aceitar que terei de conviver com
Levi como pai dela, sem sermos um casal. Lorran não merece pagar, novamente,
pelas idiotices do pai.
E sendo a mãe da irmã dele, talvez Lorran possa me ver como a mãe dele
também.

Meu pequeno fofinho criou raízes poderosas em meu coração, quero ser a
mãe dele, independe de ter uma filha gerada no meu ventre.

Eu tenho dois filhos, e por eles eu faço tudo.


CAPÍTULO 33

Levi

Dias antes
Já faz três dias que terminei com a Olivia e não tenho notícias dela.
Acabou, não a faço sofrer o luto que me atormenta. Não traio mais a Blanca
colocando outra em seu lugar e impedindo que o Lorran reconheça quem é a
única e verdadeira mãe dele. Envolver com outra pessoa foi um erro e um
pecado, nunca poderei pedir perdão o suficiente a nenhuma das duas reparando o
erro cometido.

Quero que meu filho entenda que não podemos mais continuar com a
Olivia em nossas vidas. A raiva com a qual ele joga os talhes no chão e grita a
plenos pulmões pedindo pela Olivia reforça o que eu já sabia: o Lorran se apegou
a ela como um filho a sua mãe, o amor entre eles não vai trazer felicidade e
somente tristeza. É a Blanca que ele tem de amar, não a Olivia.

— Lorran — seguro seus ombros e ele morde meu dedo. — Para filho, eu
já disse que a Olivia precisou ir embora, não chama mais ela.
— MENTILA (MENTIRA) — Grita em meio ao choro — eu quelo a
Olivia.

Sua birra me lembra de quando conheci a Olivia e o garoto se apegou a ela.


Se eu tivesse tido forças o suficiente para evitar essa situação de merda. O Lorran
nunca teria se apegado a Olivia e não estaria sofrendo agora. É tudo culpa
daquela maldita por se infiltra em nossas vidas e fazer o meu filho a querer como
quem precisa da mãe.

— Vem comigo — o pego no colo o levando para o quarto onde coloquei


vários porta-retratos da mãe dele na parede em um mural de animais. — Essa é a
sua mãe.

— Eu sei. — Soluça.

— Você ama a sua mãe?

— Sí.

— Por que chama pela Olivia? É a sua mãe quem você deve querer.

— NÃO — Ele grita e bate no meu rosto com os punhos — a mamãe tá no


céu, ela num fica colmigo, a zia vivia sim. Eu quelo a zia vivia! — Chora
esperneando em meus braços.

Eu recebo um soco forte em meu peito, o ar sessa em meus pulmões e caio


de joelhos soltando o Lorran que senta no chão chorando. Acompanho meu filho
em seu choro me dando conta da merda que eu fiz com o Lorran. Ele não chama
pela mãe, ele não conhece a mãe além das fotos, sabe que ela não pode estar com
ele.

É a Olivia quem da carinho e amor enquanto a Blanca é um fantasma que


usei para aprisionar meu filho e não o deixar ser feliz com o carinho de uma mãe
que o ame e possa o abraçar, colocar para dormir, dar comida e beijar seu rosto
até os lábios ficarem roxos e ele vermelho como a Olivia faz.

Faz 3 anos e 3 dias que a minha esposa morreu.

Lorran está com a Olivia a mais de um ano sendo cuidado e amado.

Eu a tive por meses ao meu lado e não consegui dar valor a mulher incrível
que ela era enquanto me perdia no luto pela mulher que eu amei com a vida. Foi
preciso meu filho de três anos chorar me dizendo que a mãe dele foi para o céu e
que a Olivia estava com ele para que eu pudesse perceber a merda que eu fiz.

Eu não protegi a imagem da Blanca.

Não honrei ao nosso sentimento.

Eu afastarei o Lorran da única mulher que ofereceu a ele o colo de uma


mãe.

Afastei de mim a única que foi capaz de me fazer ver a luz. Perceber a
burrada que fiz não ajuda a amezinhar como me sinto. Estou confuso sem saber o
que fazer. Aceitar a Olivia na minha e na vida do Lorran é deixar a Blanca para
trás e eu não consigo fazer isso, não importa o quanto tente. Mas não se trata
mais de mim, o Lorran precisa da Olivia e eu devo pensar nele.

Com o Lorran, meu único filho que chora implorando pela Olivia eu vou
fazer o que é certo, só preciso de coragem.

— Vem cá Lorran — o pego no colo e beijo seus cabelos — vamos fazer


um acordo, eu te levo para ver a Olivia, mas antes ajuda o papai a se sentir
melhor?

— Como?

— Só me abraça forte e me deixa sentir o seu amor.


— Eu te amo papai — ele aperta meu pescoço em seus braços e passamos
as próximas horas chorando em seu quarto de saudade da Olivia.

Ele dorme e o levo para o quarto comigo. Puxo o celular do bolso e a foto
da Olivia salta na tela de proteção. Ela e o Lorran brincando de pintar o rosto um
do outro na páscoa na creche. Abro a galeria do meu celular e vejo as inúmeras
fotos que tirei dela e do Lorran, dela comigo e do meu pequeno em meus braços.
Vejo os vídeos na galeria até o sono me nocautear.

Desperto com a gargalhada da Olivia e por um segundo acho que ela


retornou. Levanto a cabeça e vejo o Lorran deitado no meu peito vendo os vídeos
dele com a Olivia, ele também sente a falta dela. Beijo a cabeça dele e ficamos
assistindo juntos as imagens. Na hora do almoço subo para o apartamento do
Louis e deixo o Lorran admirando a prima com a Bianca e puxo meu irmão.

— Vou para a Itália amanhã e te encontro no seu casamento na casa de


primavera — digo quando ele fecha a porta do escritório.

— Explique-se — pede com calma sentando no sofá e o acompanho.

— Eu preciso ver a Blanca, vou na fazenda da Beatrice.

— Novamente, explique-se. — Cruza as mãos e suspiro.

— Eu gosto da Olivia e não consigo aceitar meus sentimentos por achar


que estou traindo a Blanca. O Lorran ver a Olivia como a mãe dele e eu não
quero isso com medo dele esquecer quem é a Blanca e estou sendo egoísta e um
desgraçado por agir dessa maneira com o Lorran e a Olivia. Preciso conversar
com a Blanca ou as cinzas dela. Não aguento mais viver nessa indecisão
machucando as pessoas que são importantes para mim.

— Uau.
Ele fica calado pelos minutos seguintes olhando ao redor.

— Você falou algo para a Olivia?

— Eu a expulsei da minha vida e do Lorran.

— Vacilou muito Levi — coça a cabeça — a Olivia não é doce como a


Bianca, ela é casca grossa e não sei se ela te perdoaria somente com palavras.

— Não precisa falar o que eu já sei. Antes de encarar a Olivia preciso


resolver as coisas com a Blanca, cuida do Lorran pra mim?

— Não.

— O que?

— O Lorran quer a Olivia e não a mim ou a Bianca, vá deixar ele na casa


dela e diga que vai viajar e peça para ela cuidar dele. Tenha a decência de fazer
isso seu idiota — Louis explode e bate na minha cabeça.

— Ai — reclamo e recebo mais tapas, me encolho no sofá.

— Você estava construindo uma família com ela seu stronzo se eu pudesse
arrancava suas orelhas fora. Certifique-se de explicar bem ao Lorran sua viagem
e resolva de uma vez por todas o seu passado.

Louis deixa o escritório e aliso meu braço atacado. Pego o celular e aviso
que vou usar o avião amanhã para uma viagem a Itália. Deixo o Lorran o dia com
a prima e de noite o levo para casa, dou a janta e deito com ele na minha cama.

— Filho.

— Sì papai.

— Amanhã eu vou voltar para a Itália por uns dias e vou te deixar com a
Olivia, tudo bem por você?
— Vai delmola pla volta? (demorar para)

— Não, vou encontrar vocês no casamento do seu tio.

— Celto, pode il. (Certo, pode ir) — Beija minha bochecha.

O coloco para dormir e me preparo para ver a Olivia amanhã.

Chegamos ao prédio em que ela mora, bato na porta e Lorran chama pela
Olivia. Ela abre a porta o pega no colo e fecha sem me deixar a ver direito. Fico
irritado com sua reação, fecho o punho pronto para bater novamente e recuo, não
tenho o direito, ela tem razão em não querer me ver. Retorno para meu
apartamento e arrumo as minhas malas e a do Lorran, vou deixar lá e ela terá de
falar comigo.

Termino e retorno ao apartamento dela a tarde. Bato novamente e não


escuto resposta, testo a maçaneta e a porta se abre. Olivia está deitada no sofá
com o Levi e marcha na minha direção com fúria. Antes que ela possa fecha a
porta eu falo:

— Olivia precisamos conversar

— Não! — ruge — o Lorran vai dormir aqui depois eu ligo para o Louis
vir buscar ele, pode ir embora.

— Eu tenho de falar com você Olivia — fico triste ao ver como ela tem
bolsas negras embaixo dos olhos, o cabelo prezo em um rabo de cavalo
emaranhado e parece mais magra.

Ver o resultado do meu egoísmo faz com que eu tenha mais certa: devo
resolver de uma vez por todas o meu passado para poder seguir em frente.

— Saia da minha casa. Eu te deixei entrar e você pisou em mim sem


pensar duas vezes ou considerar o quanto me faria mal. Eu aguentei a sua dor e
suprimi a minha, enquanto você foi um egoísta miserável que só pensou em si
mesmo. Vá embora, quando eu estiver com o Lorran você ficará longe. Se tentar
me afastar dele eu juro que faço o Louis tirar a guarda dele de você.

— Lorran é meu filho! Não vou perde-lo e por isso... — tento explicar a
ela o que acontece dentro da minha cabeça, mas é em vão, ela não vai me ouvir.

— Então seja esperto e não tente me irritar, agora saia.

— Eu vou para a Itália, vim deixar o Lorran para passar uns dias com você.
— Tento e sou cortado novamente.

— Fuja o quanto quiser.

Olivia fecha a porta e encaro a madeira com vontade de falar muito mais,
não tenho o direito e sei que ela não vai me escutar. Eu não ouço ninguém e
continuo fazendo idiotices.

Saio do apartamento para a Itália, chegou a hora de resolver as coisas com


o meu passado para que eu tenha um futuro.
Levi
A fazenda da Beatrice fica na zona rural da Itália.

É quase um vinhedo, onde ela produz um dos melhores vinhos do país,


chamamos de fazenda por ter animais espalhados pelo lugar, como a Bea sempre
quis.

Ao me casar com a Blanca, eu presenteei a Beatrice com o terreno, e a


apoiei, para que pudesse empreender o que ela quisesse.

O vinhedo foi ideia da Blanca, para que a irmã pudesse ter uma produção
que gerasse renda o suficiente para ela conseguir viver sem a pressão dos pais, e
poder se dedicar aos animais, sem pensar neles como forma de renda.

Ambas sofreram muito nas mãos dos genitores, e parte do motivo da


Blanca recusar ficar comigo, era porque os pais dela não apoiavam um estilista
como namorado da filha, preferiam um político.

Por ser a mais velha, Blanca deveria casar-se antes da Beatrice, e a mais
nova não podia ser envolver com homens, ficando reclusa dentro de casa, ou
somente saindo quando a irmã a levava junto.
Ser uma modelo foi a forma encontrada pelos pais delas para que Blanca
fosse exposta a homens poderosos, que pudessem se interessar em um
relacionamento com ela.

Quando descobri, tirei Blanca e Beatrice de casa, dei a Bea a fazenda que
ela queria, para viver em liberdade, com os animais que ela ama.

Acho que Lorran puxou da tia o carinho por animais, todas as pelúcias que
ele tem de bichinhos, foram presentes da Bea.

Quando Blanca morreu, os pais dela entraram na justiça querendo que a


filha fosse enterrada no jazido da família, enquanto eu e Beatrice, decidimos a
deixar descansar na fazenda, lugar em que ela se sentia confortável, e uma vez
pediu a Bea que quando morresse fosse enterrada lá, perto da irmã, e onde ela
amava, um lugar que eu e nossos filhos pudéssemos a visitar sem o peso da
família por perto.

O motorista para o carro em frente aos portões, e nossa presença é


informada.

A equipe de segurança foi algo que eu não abri mão após a morta da
Blanca, mesmo em meio a depressão, me preocupei de que Beatrice conseguisse
ficar em segurança, sem os pais a incomodando devido ao túmulo da Blanca ser
na fazenda.

Entramos, e após passar pela enorme plantação de vinho, o carro estaciona


e eu desço.

Bea espera por mim com um sorriso e os braços abertos. Os olhos azuis-
claro brilham, e o cabelo louro voa por seu rosto, enquanto ela tenta os controlar
e manter os braços abertos me recebendo. Com três passos chego a ela e envolvo
seu corpo em um abraço, sentindo o cheiro que me lembra a irmã.
Beatrice é poucos centímetros mais baixa que Blanca, o cabelo louro
escuro, e a pele bronzeada. Ao contrário de mim, a Beatrice grita felicidade e
vida, com a pele e o corpo. A solto, e ela encara meu rosto com carinho.

— Estava me perguntando quando você viria, se atrasou esse ano. — A


voz dela é doce e suave, traz conforto e carinho.

— Eu fiz besteira, uma idiotice enorme que não tem perdão.

— Vamos entrar e beber um café enquanto você me conta, ou quer ir direto


para o jazido da Blanca?

— Preciso falar com você antes, talvez me ajude a amenizar os


sentimentos que me corroem sobre Blanca.

— Ah, querido, o que houve?

Conto a ela tudo o que aconteceu desde que coloquei o pé no Brasil, e


quando parti o coração da Olivia no dia da morte da Blanca.

— Enquanto sofria pela perda de Blanca, eu magoei a Olivia, achei estar


fazendo o que era certo, logo a raiva passaria, e ela perceberia ser melhor viver
sem mim ao seu lado. Atormentado pelo fantasma da esposa que amo, nunca
poderei dar a ela o amor que merece, eu nem consigo dizer “eu te amo” sem
achar que estou traindo a Blanca.

— Levi, espera um segundo — Beatrice pede — respira fundo e expira,


você está tremendo muito, e com falta de ar, nem se deu conta.

Observo minhas mãos e pernas, ela tem razão.

— Vou pegar um chá para te ajudar enquanto conversamos.

Beatrice desaparece e eu continuo inspirando e expirando. Ela retorna com


o bule e duas xícaras, serve a minha e a dela. Beatrice franze a testa preocupada
mordendo os lábios ao me observar beber a bebida.

Queimo a língua, e me tremo mais ainda.

— Calma — ela segura minha mão.

Encaro seus olhos azuis, e a boca em bico, respirando devagar para que eu
a siga.

— Eu sei como é sofrer pela morte da Blanca, Levi, não fique ansioso
comigo. Acho que sou a única pessoa que poderá te ouvir sem te julgar, ou exigir
uma reação de melhora de você, então vamos devagar, certo?

— Você sente muito a falta dela?

— Todos os dias, mas isso não me impede de viver. Eu lembro dela com
felicidade, por ter uma irmã maravilhosa. Blanca por anos, foi minha pior
inimiga e melhor amiga, devido à relação tóxica que nossos pais criaram entre a
gente. Mas ela nunca desistiu de mim, e somente por causa dela hoje eu sou livre.

Lágrimas nublam seus olhos, e ela se cala, antes de prosseguir.

— Blanca não ficaria feliz se me visse perdendo tudo o que ela me deixou.
Me afogar no luto iria trazer tristeza a memória da minha irmã, e, eu não seria,
capaz de viver sabendo que a magoei. Eu continuei seguindo em frente, e fiz da
saudade a força para cuidar dos meus animais e dos negócios. Transformei o
amor que eu sentia por ela em vida, em um amor saudoso, do tipo em que eu
ainda posso a amar com todo o coração, mas nunca sentir que não poderei viver
sem ela comigo.

Nunca consegui pensar dessa maneira.

O mundo não tinha sentido sem a Blanca comigo.


A Beatrice deu sentido ao mundo, para poder continuar vivendo com a
Blanca no coração.

— Foram anos com sua irmã, jurando amor e lealdade, ficar com a Olivia
começou a me trazer um sentimento de traição, que se ampliou na semana de
morte da Blanca. Senti que estava apagando a imagem da minha esposa, e sendo
infiel, a traindo, e pior... fazendo outra pessoa cuidar do filho dela. Na minha
cabeça, o Lorran não pode crescer sem amar a Blanca, em minha insanidade, eu
sabia o que estava fazendo, e queria aquilo, que a Olivia fosse embora e nunca
mais voltasse. Que o Lorran tivesse somente a mim e a Blanca.

— Você disse isso a ela, não foi?

— Sim, a expulsei sem pensar duas vezes.

— Você sempre foi um homem justo, e agia com base nas suas emoções,
magoou a Olivia por não pensar na sua ação, somente no que te atormentava. Eu
consigo ver em seus olhos que você mudou de ideia sobre substituir a Blanca, o
que aconteceu?

— O Lorran, meu filho, que ama a Olivia como uma mãe, e não consegue
ficar sem ela. Ele me disse que a mãe dele estava no céu, e a Olivia com ele. Só
percebi o que estava tirando dele, quando entendi que a Blanca pode ser a mãe
biologia dele, mas é a Olivia quem dá amor, carinho, e cuida do Lorran como um
filho.

— Para aquele pequeno se apegar a ela assim, a Olivia deve ser uma
mulher incrível. Não acho que a Blanca sentiria ciúmes da Olivia, quem sabe
tenha sido a minha irmã que mandou essa mulher para cuidar do filho dela, já
pensou nisso?

— Nunca.
— A Blanca amou você e ao Lorran com a alma dela, não sabemos o que
acontece no, pós-morte, e nada impediria que uma alma guiasse vocês até aquela
creche, e fizesse você ver brilho na Olivia, quando só via isso no Lorran. Gosto
de acreditar que a Blanca continua cuidando de vocês, e mexendo com o
universo para que o homem da vida dela continue vivo, e possa ser feliz, e para
que o filho dela tenha a chance de ter uma mãe.

— Eu traí a Blanca, não acho que isso possa ser verdade — coço a cabeça
incrédulo demais para acreditar na teoria da Beatrice.

— Não Levi, você foi fiel a ela enquanto a Blanca respirava, os votos de
vocês terminaram no dia em que ela morreu. Continuar vivendo com medo de ser
infiel, ou de magoar a Blanca, tem causado mais danos do que uma traição. Você
realmente acredita que Blanca ficaria feliz em ver você e ao Lorran sofrendo?

— Não, ela nunca ficaria bem com isso — cutuco minhas unhas.

— Qual é o seu verdadeiro medo, Levi? Olhe para dentro de si, e perceba o
que te atormenta. Você falou sobre ter se sentido culpado pela morte da sua mãe
e da Blanca, depois disse estar traindo a Blanca ao colocar Olivia no lugar dela,
mas você não percebe a verdade. A Blanca morreu, sua mãe morreu, e você não
tem culpa no acidente que levou ambas, nascemos com dia, hora, e lugar,
morremos da mesma forma, e ninguém pode controlar isso.

— Se aquele caminhão...

— Se o caminhão não tivesse perdido o controle, se a chuva não estivesse


molhando a estrada, se eu não tivesse irritado a pessoa errada, se eu fosse uma
pessoa melhor, se a doença não existisse... — Beatrice segura meu braço e chega
perto do meu rosto. — Estamos sempre procurando motivos para justificar a
morte, e não aceitamos que ela é natural. Nascemos com um dia marcado para a
nossa morte, e não existe crença ou religião que possa impedir alguém de morrer.
Você pode ter uma morte pacífica, com idade avançada enquanto dorme, como
pode morrer brutalmente assassinado por um membro da máfia. Mesmo quando é
cometido um suicídio, não tem como ter a certeza de que aquilo vai levar ao fim
da pessoa.

— Você sabia... — interrompo e ela aperta meu braço fazendo eu me calar.

— Mesmo quando é cometido um suicídio, não tem como ter a certeza de


que aquilo vai levar ao fim da pessoa. A morte é incontrolável e inevitável, você
continua arranjando desculpas e se culpando, como se fosse um Deus, e não
aceita que você é somente um homem, um filho que perdeu a mãe, e um marido
que perdeu a esposa, e... um idiota que está perdendo uma mulher incrível, e seu
filho no processo, por não conseguir se livrar do medo que te acorrentou.

As palavras da Beatrice batem forte dentro de mim, e o muro que ergui nos
últimos anos desaba, deixando uma dor antiga jorrar para fora do meu corpo
enquanto um desespero novo se aproxima. O medo de perder quem continua
vivo, por ter me apegado a quem estava morta.

Eu posso amar as duas, respeitar a lembrança da Blanca, e ser feliz com a


Olivia, sem causar danos a nenhuma delas.

— Você tem razão.

— Agora vá se despedir da minha irmã, e vamos trabalhar a sua dor nos


próximos dias, temos só uma semana até o casamento do seu irmão.

— Certo.

Corro para o lugar que fica o túmulo da Blanca com o sol se ponto no
horizonte. A euforia por ter uma certeza, e um objetivo, pela primeira vez
dominando o meu peito.

Não vou mais me afogar em arrependimentos, ou sofrimento, serei feliz, e


vou rastejar o quanto for preciso para ter a Olivia de volta, e formar uma família
com ela e o Lorran.

O jardim ao redor do tumulo dela desabrochou, com lindas flores, no


centro, a pedra com o ano de nascimento e morte, um retrato da Blanca sorrindo,
e uma cruz acima.

Fico de joelhos de frente para ela, pela primeira vez que venho aqui, não
tenho vontade de chorar, somente de sorrir.

— Oi, meu amor, desculpe ter demorado a vir esse ano, acho que temos
muito o que conversar. Eu consegui me comunicar com o Lorran, e agora
estamos mais próximos. Ele cresceu tanto, você consegue ver ele do céu? Nosso
menino ficou enorme, e fala tanto, ele puxou a minha mãe o gosto por
chocolates.

Respiro fundo e coloco a mão em nossas alianças, guardadas em uma


caixinha de cimento embaixo da foto dela.

— Será que é verdade a teoria da Beatrice, que foi você quem me guiou a
Olivia, para que ela pudesse cuidar do Lorran e me fazer sentir vivo de novo?

Uma brisa toca meu rosto, balançando as folhas ao redor, se a Beatrice


estivesse aqui, diria que foi a Blanca me respondendo.

— Não é errado eu me apaixonar de novo, certo? Eu te amei enquanto


estava viva, e pelos dias e anos seguintes, e ainda te amo, eu só... acho que
aprendi a viver sem você ao meu lado, e não estava pronto para aceitar o nosso
final.

Abaixo o rosto colando a testa a sua lápide.

— Eu te amo Blanca, sempre vou te amar, sou grato pela nossa história de
amor, e por você ter me dado o Lorran, mas agora eu preciso ir atrás da Olivia. É
com ela quem eu quero ficar e ser feliz, você consegue me dar a sua benção
amor? — fecho os olhos, o vento se torna mais forte contra meu rosto, como um
carinho suave — é você, não é? Sempre falou que voltaria com o vento quando
eu estivesse perdido, e me mostraria a direção certa.

O vento se intensifica fazendo algumas pétalas das rosas se soltarem e


voarem para perto de mim. Levando com ele o peso que eu tinha em meu
coração, me permitindo respirar pela primeira vez em três anos, sem sentir que
sou culpado por continuar vivo, ou que fui o causador da morte da minha mãe e
da Blanca.

— Eu sempre irei te carregar em meu coração, mas agora estou pronto para
deixar outra pessoa entrar. Você aceita dividir espaço com ela? — mais uma vez
o vento ricocheteia contra meu rosto, bagunçado meus cabelos — estou
enrolando demais, é isso que você quer dizer? — como se me respondesse, uma
rajada me joga no chão e gargalho — eu entendi o recado, essa é a última vez
que te chamarei assim e falarei essas palavras.

Fico de joelhos, e beijo meus dedos, os levando a foto dela.

— Eu te amo Blanca, meu amor, nos vemos quando eu falecer, e prometo


que nunca mais tentarei causar a minha morte. Só não fica com ciúmes se eu
chegar junto da Olivia, certo?

A resposta que recebo é do vento calmo movendo as flores.

— Adeus, amor.

Me levanto, caminhando de volta para a casa com o coração leve,


observando as estrelas, no céu roxo.

Eu consegui superar a dor e a perda, aceitei a morte da Blanca, e que estou


pronto para viver com a Olivia, farei o que eu puder para a reconquistar, leve
quantos anos for preciso, eu a terei de volta.
****

A semana passa se arrastando, conforme imagino que vou rever a Olivia.


Converso com a Beatrice diariamente, e tenho escutado como passa os dias dela.

Fico preocupado de a Beatrice não ter encontrado ninguém para dividir a


vida, o coração dela continua magoado pelos pais, e não sei se ela será capaz de
se abrir novamente ao amor.

Quando finalmente o dia que eles chegarão a Itália chega, eu me preparo


para a encontrar.

— Vem comigo para o casamento? — chamo pela décima vez. — O Louis


vai gostar de te ver, e você poderá conhecer a Olivia, venha me dar sua benção
no lugar da Blanca.

— Você não desiste — ela suspira — vou arrumar as minhas coisas, espera
aqui.

Uma hora depois, chegamos à casa de primavera da minha família. Ouço


gritos em português vindo da cozinha, e Beatrice olha na mesma direção.

— Vou subir para meu quarto, você vai ver o que aconteceu. — Ela já tem
o costume de ficar aqui conosco, e sobe rapidamente as escadas.

Sigo na direção do som.

Vejo a Olivia brigando com o pai, que a encara furioso.

— Você enlouqueceu?! — Ele grita abrindo os braços.

— Para de gritar pai — Bianca pede e segura o marido pelo braço — o


senhor não sabe o que a fez tomar essa decisão.
— Você sempre foi assim — Marcelo tem os olhos molhados, e Olivia o
encara de queixo erguido, os outros podem não perceber, mas eu noto como o
queixo dela treme. — Faz o que quer sem se importar com o que os outros vão
pensar, você nunca pergunta, e age impulsivamente. Onde diabos eu errei na sua
criação? — fala desgostoso.

— Se você ao menos tivesse me criado — Olivia diz carregada de mágoa


— você nunca foi presente para mim, eu tive de me criar sozinha.

— Cresça, e pare de me culpar pelos seus erros.

— MEU FILHO NÃO É UM ERRO! — Ela berra.

— O quê? — pergunto — ela engravidou?

Olivia vira para mim, e o medo atravessa sua íris, mais rápido do que
consigo processar, o fato dela ter engravidado.

— Não vá tendo ideias — fala cheia de ódio comigo — continuei com a


inseminação artificial, e consegui engravidar, o bebê não é seu.

— ANTES FOSSE — Marcelo grita novamente — ao menos a criança


teria um pai presente, ao invés de ser criado pela mãe solteira, o que vai dizer a
ele quando perguntar pelo pai?

— Falarei a verdade. Eu queria ser mãe, e consegui, não tem mais nada a
ser falado.

— Por que você não pode ser como a Bianca, e ter engravidado de um
homem que te ama, e estivesse disposto a casar com você? Ter esse bebê em um
lar saudável.

— E você acha que alguém me ama? — Olivia não consegue mais segurar
as lágrimas que deságuam de seu rosto pequeno. — Eu devo ser um ser humano
horrível que nunca pôde encontrar o amor de um homem, nem você me amou pai
— o nariz dela escorre, e os soluços fazem seu peito tremer — eu tenho 27 anos
e nunca te ouvi dizer um “eu te amo” para mim, por que você não pode me amar?

— Não seja idiota, é claro que te amo — ele fala baixando a guarda.

Meu peito comprimi com uma nova dor tomando consciência do dano que
causei na Olivia.

— Não, não ama. — Ela olha ao redor, e seu olhar encontra o meu. — O
homem que eu amava me disse no dia do meu aniversário, que eu e ele não
poderíamos ficar juntos, e que eu não tinha o direito de querer ser a mãe do filho
dele. Ele era a minha última esperança de amar e ser amada.

Choro, com o peito comprimido de arrependimento pôr a ter magoado.

— Me perdoa — peço chegando perto — eu não...

— CALA A BOCA — grita — você não pensou no quanto me machucaria


ao dizer aquilo, no dano que deixaria. Vocês dois — olha de mim para o pai —
eu nunca fui importante o suficiente para vocês poderem me amar, e agora que
finalmente realizei meu sonho de ser mãe — leva a mão ao ventre — não
deixarei ninguém tirar isso de mim, ou roubar a minha felicidade. A Bianca e o
Louis vão se casar, e depois voltaremos para nossas vidas, não finjam que me
amam só por que joguei verdades na cara de vocês.

Ela não deixa ninguém a responder e sai da cozinha.

Eu fiz um estrago que não tem perdão ou volta.

Nos últimos dias, eu aprendi que somente a morte tem o poder, de colocar
o ponto final em uma história. Pode demorar 10 ou 50 anos, farei com que a
Olivia me perdoe, e se ela quiser, teremos a nossa família e serei um pai para o
seu bebê, como quero que ela seja a mãe do Lorran.
Olivia
Eu não queria que eles soubessem, mas não consegui evitar, o enjoo que
passei a tarde, pirou quando jantamos.

Meu pai desconfiou, e Bianca perguntou. Eu sabia que era questão de


tempo até a minha barriga começar a crescer, e eu ter de explicar quem era o pai
do bebê.

Optei por mentir para eles até decidir como contar sobre a gravidez ao
Levi, meu pai foi cruel em suas palavras, e eu queria machucá-lo, é injusto eu ser
a única ferida.

Quando vi o Levi, ele parecia bem, sem bolsas debaixo dos olhos, o cabelo
arrumado e o rosto mais rechonchudo. Ele estava bem, enquanto eu me acabo em
sofrimento devido à rejeição dele.

Disse o que estava preso em minha garganta e não me arrependo.

Os olhos azuis podem transbordar arrependimento ou pena, não me


importo em decifrar o que ele esconde em seu interior. Nunca mais colocarei
outra pessoa acima de mim, todos podem se desfazer na minha frente, que eu irei
continuar em frente, e priorizando o meu bem-estar.
Corro para fora da cozinha, e ouço passos atrás de mim, acelero na direção
do jardim, não quero ver ou falar com ninguém. Atravesso as portas de vidro, e
em meio a corrida eu tropeço na grama, indo ao encontro do chão, braços fortes
rodeiam minha cintura impedindo minha queda.

Eu conheço esse cheiro, é do primeiro homem que magoou meu coração, e


me fez viver buscando por algo que ele nunca me deu.

— Vamos conversar, por favor — meu pai pede beijando minha cabeça e
não o encaro, sento-me no chão de costas — como você pode pensar que eu não
te amo Olivia?

— Você nunca disse — fungo — cresci ouvindo suas repreensões, e


quando a mãe morreu, você me abandonou, sofrendo por ela — tremo com os
soluços.

— Eu deveria ter percebido o que acontecia com você antes.

Ele alisa o topo dos meus cabelos, e me puxa contra seu peito, afagando
minhas costas. Não tenho forças para continuar lutando contra ele ou qualquer
outra pessoa, cheguei ao meu limite emocional, e não sei o que fazer para me
sentir bem novamente.

— Vamos por parte, certo? — a voz dele fica mais grave — quando
conversei com a Bianca e percebi estar sendo injusto com ela, eu comecei a
lembrar do passado, e a notar que fiz o mesmo com você, fui duro demais na
criação de ambas, e causei feridas que vão para além da nossa relação.

— Você se desculpou com ela — murmuro — mas nunca pensou em falar


comigo.

— Eu estava com vergonha, Olivia — tento me soltar e ele me aperta mais


forte.
— Não seja ridículo — ralho.

— Você não é obrigada a acreditar, mas estou sendo sincero, fiquei


envergonhado ao perceber o que fiz com as minhas filhas, e não soube como
pedir desculpas. Nunca tivemos uma relação aberta, e eu não sabia como me
aproximar, fui te machucando ao longo do caminho, e hoje eu vejo o resultado
das minhas ações.

— Não importa mais — sussurro — não tem mais o que ser perdoado.

— Tem sim — sinto o nariz dele deslizando em minha cabeça — quando


sua mãe descobriu a doença, foi um choque para ambos, eu a amei com a minha
alma, e sem a Eduarda, respirar era dolorido. Quando você e a Bianca nasceram,
eu senti que estava sendo abençoado com anjos como resultado pelo meu amor e
o da Duda.

— Você esqueceu fácil disso — acuso, querendo o fazer sofrer como eu,
que seu peito seja despedaçado e rasgado.

— Eu prometi a Eduarda que iria cuidar de vocês, mas quando ela deu o
último suspiro, eu fui com ela, uma parte minha morreu, e a que ficou não sabia
como continuar. Me afoguei no luto e na bebida.

— Igual ao Levi, eu fui uma grande idiota por achar que ele seria diferente
de você — percebo, a relação tóxica que tentei fugir do meu pai, foi reproduzida
no Levi, e com isso o resultado foi o mesmo; ... Destruição.

— Não conheço o Levi, e não vou falar por ele, somente por mim. Eu não
conseguia ver nada ao redor pelos meses que se seguiram a morte da Eduarda.
Em uma manhã, eu acordei e você já tinha sete anos, vestia o uniforme da
Bianca, e dava de comer a ela, o resto de um pão velho. Você segurou a mão
dela, quando Bianca terminou de se alimentar, e a levou para escola, sem
reclamar da fome.
— Era final de mês e nossa tia não tinha enviado a cesta básica que ela
dava para nos ajudar enquanto você sofria, e eu não quis pedir as vizinhas, já
fazia três dias que me alimentava somente da merenda da escola, para que a
Bianca não passasse fome.

Pela primeira vez em anos eu escuto o meu pai chorando. Os braços dele
tremem ao me redor, enquanto ele tenta recuperar a respiração. Lembrar da
infância traz um gosto amargo, eu era pequena e precisava de proteção, mas ele
não conseguia me ver.

— Não consigo reparar o erro que cometi naquela época, quando vi aquilo,
eu me dei conta de que você e a Bianca continuavam vivas, e eu tinha de voltar a
trabalhar para sustentar a casa. Arrumei o primeiro emprego que consegui como
segurança, e usei o cartão para fazer a feira, quando você chegou, seus olhos se
iluminaram ao ver a comida, e eu te fiz uma promessa naquele dia, você lembra?

Tento recordar do que ele fala, as lembranças que tenho da infância se


resumem a dor e a fome, a cuidar da Bianca, e a ver o meu pai sofrendo.

— Você só tinha sete anos, e a Bianca 4 anos, eu nem sei como você tinha
conseguido a matricular em uma creche.

— Foi a tia Denise, ela que conseguiu a vaga, e mandava os alimentos.

— Denise não me contou, e ela será a próxima a quem vou agradecer por
cuidar dos meus anjos quando eu não pude.

— Você nunca fez nada — rosno.

— Eu fiz Olivia, mas você não lembra por que era pequena demais, o que
se instaurou no seu coração foi a dor. Quando vocês chegaram naquele dia, você
chorou ao ver os armários cheios, e a Bianca correu para o meu colo, eu me
ajoelhei na sua frente e prometi que não deixaria mais vocês passarem fome, e
iria cuidar novamente de ambas.

— Mentira — não pode ser verdade, eu não consigo me lembrar.

— Depois daquela vez, vocês voltaram a passar fome?

— Não — murmuro.

— Quem te acordava e arrumava a Bianca, e depois deixava ambas na


escola?

— Você.

Não tem como ser verdade, eu não consigo me lembrar da conversa com
ele, mas sei que depois que voltamos da escola naquele dia, o meu pai tinha
voltado a cuidar da casa e da gente.

Eu achava que ele tinha acordado para a vida e era somente isso, sem
conversar, sem se explicar ou pedir desculpas.

Bato no peito dele com os pulsos, ele não tem esse direito, após anos, não é
justo que me conte somente agora o que aconteceu naqueles dias sombrios.

Ele nunca cuidou da gente, não pode ser verdade, porque se for, eu passei a
vida presa na mágoa, e não abri meus olhos para o que acontecia ao meu redor
além do que imaginei.

— Eu fui duro com você e com a Bianca, não vou negar isso, me
entristecia te ver pulando de namorado em namorado, e saber que as vizinhas
falavam mal da minha menina, por como ela se comportava. Eu sabia que você
estava presa a mágoa que te causei na infância, mas eu não podia deixar que você
continuasse sendo vista como uma vagabunda, brigamos e discutimos mais vezes
do que sou capaz de lembrar.
— Você estava querendo me defender? — o encaro, os olhos vermelhos e
o rosto banhado em lágrimas, arfo ao ver a dor refletida nos olhos dele.

— Do meu jeito errado e cruel, sim. Eu queria que as pessoas parassem de


te chamar de vadia — ele alisa meu rosto — mas eu também estava preso a
vergonha pelo que te obriguei a passar, e sabia que a culpa era minha. Perdia o
controle quando discutíamos, e falei muita besteira, me perdoa por escolher a
forma errada de te proteger.

— Você não pode fazer isso — bato no peito dele com força enquanto grito
frustrada — não é justo me dizer isso tudo quando explodo, você partiu meu
coração — berro, caindo contra o peito dele, sem forças para continuar
alimentando o ódio.

— Você sempre foi o meu orgulho, Olivia — ele me abraça, o corpo


soluçando e balançando o meu — eu tenho todos os nossos momentos juntos
guardados em meu coração, quanto mais eu te via crescendo, mais eu queria te
pedir perdão, e dizer o quanto você me deixava orgulhoso. Lembra do dia da sua
formatura? Eu falei baixinho no seu ouvido que te amava. Você não me
respondeu, e não tenho certeza se percebeu, sua atenção estava focada em um
rapaz.

“Sem dizer mais nada, ele segurou minha cabeça, beijou minha testa e
disse o quanto me amava e estava feliz pela minha conquista.”

Era verdade, como eu pude esquecer disso?

A lembrança da formatura destrava a minha mente, e inúmeros momentos


retornam como uma bomba, explodindo em minha cabeça e permitindo ver o que
eu tinha apagado.

No ensino médio, meu pai indo me deixar e brigando com o Gustavo, o


garoto que tinha ficado comigo e espalhado que estávamos transando. Ele só
parou depois que levou uma prensa do meu pai.

Ele me defendeu, e eu esqueci.

Eu tinha saído para uma festa com minhas amigas, e já era quase três
horas, os pais delas buscaram a todas, e a minha carona não aconteceu, porque a
mãe da Julia foi de moto e eu fiquei sozinha.

Meu pai estava trabalhando, eu liguei para ele e depois ele chegou para me
pegar no carro do patrão. O caminho para casa foi com ele brigando e me
chamando de irresponsável.

Ele sabia que podia ser demitido, e foi me buscar. Ele cuidou de mim e eu
só absorvi as reclamações.

Era Dia das Mães no colégio, eu e Bianca estávamos tristes, e ele nos
levou para uma viagem ao sítio da família, passou o dia conosco e a tristeza foi
apagada pelos momentos em que estivemos juntos.

Ele não deixou que ficássemos magoadas pela ausência da nossa mãe.

Momentos de brigas, marcados, começam a ter a verdade sobre eles


revelados. Como eu pude ver somente o monstro, e esquecer que ele cuidava de
mim?

Desabo chorando contra seu corpo, a garganta doendo e a cabeça


explodindo. O mundo girando ao meu redor, ao perceber que mergulhei em um
poço de amargura e mágoas, moldando a realidade ao que eu queria acreditar,
pintando meu pai como um vilão, quando ele sofreu como eu e tentou consertar
as coisas cuidando de mim e da Bianca, por cada segundo desde a manhã que ele
acordou para a vida.

— O ódio tem obscurecido seu coração, e te impedido de ver o amor,


Olivia. No segundo em que o Levi entrou na cozinha, eu percebi que você estava
apaixonada, e que ele sentia o mesmo, conversa comigo minha menina, deixa eu
ser o seu pai. Já perdemos muitos anos presos na dor, vamos ser felizes juntos.
Eu te amo minha garotinha, guarde para sempre essas palavras.

— Papai — soluço, sem forças para continuar.

— Me perdoa por ser duro com você, quando soube do bebê, e que você
fez inseminação, fiquei louco, preocupado em como você criaria a criança
sozinha. Você nasceu para amar e ser amada Olivia, seu filho deveria ser
concebido com amor, e não por sua obsessão de ser mãe. O carinho que você
procura em um filho, você sempre o teve ao seu redor, minha menina, só estava
cega para perceber.

Sem forças, eu me encolho contra o carinho dele, e choro até meu corpo
desidratar e o ar entrar com dificuldade por meu nariz entupido. Sinto como se
tivesse chegado ao fim de uma maratona.

Liberta pela primeira vez do ódio.

— É do Levi. — Admito após segundos em silêncio.

— Vai contar a ele?

— Vou, o Lorran quer um irmãozinho, e eu amo tanto aquele menino — a


vontade de falar com meu pai transborda, e eu conto a ele tudo o que aconteceu
entre mim e o Levi desde que o conheci na creche, e como ele me jogou para fora
da sua vida.

— Não vou falar pelo Levi, mas talvez, existe a possibilidade de ele ter
feito o mesmo que você, se afogado no ódio, não conseguindo enxergar o amor
que ele tinha ao redor.

— Acredita nisso?
— Sim — beija minha testa — conversa com ele, sem a mágoa
obscurecendo seus pensamentos, Olivia, você já sabe como é viver com o ódio
no coração, te impedindo de ser feliz. O ouça com o coração, e não com a mente,
depois você decide o que fazer.

— Depois, não tenho forças para isso.

— Quando estiver pronta estarei aqui para te oferecer colo e muitos beijos
— enche meu rosto deles. — Vamos nos deitar, o sol está quase nascendo.

Olho para o céu e vejo o azul-claro tomando o lugar da escuridão. No


horizonte o sol nasce, trazendo um novo dia e iluminando meus pensamentos.

Eu vivi 20 anos mergulha na dor e no ódio, se eu repetir com o Levi o que


fiz com o meu pai, não poderei seguir em frente.

Eu quero amar e ser amada.

Não somente por um filho, mas por um marido, um amor que pare de me
magoar, e possa me fazer ser feliz. Vou escutar o Levi somente uma vez, para
decidir o que fazer em seguida.
Olivia
— Você é a minha madrinha e não pode continuar evitando o padrinho! —
Bianca bate o pé.

Já se passaram uns dias que conversei com o meu pai, e o Levi tenta
chamar a minha atenção para podermos resolver nossas pendências.

Antes eu estava espumando de raiva, e queria o magoar, mas as coisas


mudaram, e preciso de um tempo para mim, poder respirar e acalmar meus
sentimentos, ao invés de ir falar com ele para saber o que aconteceu naquele dia,
e se ele realmente me quer em sua vida.

Estou em dúvida se quero dar uma segunda chance a nós dois. Meu
coração continua apaixonado, e sem a mágoa pelo meu pai obscurecendo meus
pensamentos, tem se tornado, mais difícil, continuar firme, e longe do Levi, sem
vacilar quando me encara com os olhos cheios de arrependimento, e a boca
aberta para falar o que me recuso a ouvir por medo.

Medo dele não me querer mais.

Medo dele dizer que vai morar na Itália com o Lorran.

Medo de contar sobre a gravidez, e ele me rejeitar.


Medo dele não amar nosso bebê.

Medo de o perdoar, e depois de um ano, voltar a sofrer novamente quando


ele perceber que ama a Blanca, e prefere passar o dia da morte dela sofrendo, do
que comemorando meu aniversário comigo.

Eu e ela temos a data em comum, o dia da morte dela, e do meu


nascimento.

Estou com medo de abrir meu coração para o Levi novamente, me


entregar, e acabar do mesmo jeito, rejeitada.

— Quando formos entrar a gente se fala — dou de ombros.

Terminei a prova do vestido, e o casamento é amanhã. Estou uma pilha de


nervos em pensar que terei de caminhar com ele ao meu lado. Sem portas entre
nós, sem fones de ouvido me impedindo de escutar suas palavras. Sem meu pai
para o manter longe, e respeitar o meu tempo. Será somente eu e o Levi
caminhando pelo altar e ficando lado a lado, enquanto a minha irmã casa.

— Não — bate o pé — você vai conversar com ele agora, e chega de fugir.

— Você não pode decidir isso, Bianca — suspiro.

— Já cansei de te ver sendo a mulher maravilha, é o meu casamento, e


estou assumindo as rédeas da situação a partir de agora — cruza os braços — tira
o vestido e vá conversar com o Levi, pare de ser covarde!

— Me deixa ser covarde ao menos hoje — suspiro — prometo que depois


do casamento eu converso com ele, mas preciso de tempo para organizar o que
está aqui dentro — aliso meu peito.

— O filho que você espera é dele? — ela pergunta, mas vejo certeza em
seu olhar. Aceno em positivo e Bianca suspira — eu sabia, você nunca foi boa
mentirosa, e se o Levi acreditou naquilo, é um tapado. Você viu o quanto eu sofri
ao tentar esconder do Louis a paternidade da Cecília, e o quanto fui feliz após o
aceitar novamente. Viver com a mágoa só vai gerar mais sofrimento, Olivia.

Bianca se aproxima e alisa meu rosto, escondendo os fios de cabelo atrás


da minha orelha. Beija minha bochecha e me puxa para seus braços.

— Minha irmã que sempre quis ser amada e ter um bebê. Seu momento
chegou, você conseguiu engravidar, e tem um homem desesperado, querendo te
dar amor e uma família. Não passe mais um único segundo sofrendo por medo
ou raiva, sentimentos ruins nos destroem de dentro para fora, o amor cura todas
as feridas, trazendo uma felicidade que transborda.

— Depois do casamento — prometo a ela — eu só preciso de um


tempinho.

— Sua cabeça dura — empurra minha testa para trás — combinado, ao


menos fale civilizadamente com ele, ou diga que depois do casamento vocês
conversam. Ele já sofreu demais por um amor, não o faça repetir o ciclo por
outro.

— Tá — aceno.

— Vamos, temos muito o que resolver ainda.

O dia passa rápido e mal posso registrar os momentos com a minha irmã,
correndo de um lado ao outro com os preparativos.

Quando a noite chega, sentamos a mesa para jantar, e o Levi vem na minha
direção, quando é puxado pela Beatrice, que eu descobri ser a irmã da Blanca,
indiretamente e sem que eu tenha pedido, ela ajuda a manter o Levi distante.

Ela parece entender que estou fugindo, e que preciso respirar antes de o
encontrar, e podermos conversar para decidir sobre a nossa vida.
Já aceitei que vou contar a verdade sobre meu neném, não a privarei de ter
um pai devido à minha mágoa. O Lorran será um irmão maravilhoso, e meu peito
aquece só de imaginar ele brincando com ela.

— Zia vivia — Lorran corre para mim e o pego no colo — é veldade que
você vai ter um bebê?

— Sim, meu anjinho — beijo seu rosto e o sento ao meu lado para
jantarmos.

— Deixa eu blinca com ela? — os olhos dele brilham e aquilo faz eu


transbordar por dentro.

— O quanto você quiser — pego a mãozinha dele, e a coloco sobre o meu


ventre — ela ainda é do tamanho de uma castanha e vai ficar dentro da minha
barriga até poder vir ao mundo, quando ela chegar, promete que vai ser um
bom... — me calo ao perceber que iria dizer “irmãozinho”, observo ao redor, e
Levi tem os olhos fixos em mim, a expressão cheia de expectativa pela minha
fala — com ela — opto, mais seguro.

Lorran não saberia guardar o segredo, e o Levi não pode saber por outra
pessoa além de mim que será pai, tenho medo da reação dele.

— Sì — sorri e beijo sua bochecha — como ela entrou aí? A Zia Bibi não
me disse como a Cecilia entrou e saiu dela — faz bico e mordo sua bochecha o
fazendo rir.

— Eu desejei muito por um filho, e meu pedido foi atendido — aliso seus
cabelos — quando ela nascer, te conto como foi, combinado?

— Sí!

O jantar é servido, e comemos conversando, fujo do olhar intenso do Levi


o quanto posso. Ao terminamos, eu pego Lorran, e o levo para o meu quarto,
quase correndo em minha fuga.

Fecho a porta antes que o Levi consiga chegar até mim. Só mais um dia
para acalmar o meu coração, é disso que preciso.

— Levi! — Ouço a voz da Beatrice do outro lado da parede.

— Você precisa — Lira fala — deixar a Olivia respirar, homem!

— Passa já para o seu quarto! — Dou risada pela forma autoritária da


Beatrice.

— Se eu te pegar correndo atrás da Olivia de novo — Lira diz — juro que


vou te amarrar na cama até a hora da cerimônia.

— Vocês duas são uma dupla de capetas! — Ele esbraveja, e o Lorran


gargalha comigo. — Eu preciso falar com ela e não vou sair daqui até conseguir!

— Amanhã — eu grito — conversamos, vá embora.

— Promete? — posso quase ver os olhos pidões dele.

— Sim.

— Vamos nos resolver Olivia e tudo vai ficar bem — o sinto no outro lado
da porta.

— Vai imblola papai — Lorran pede rindo — zia vivia vai mimi com eu.

— Não me troca Lorran — Levi pede, e o filho gargalha mais, sem


entender a situação.

— Num to tolcando, só quero mimi com a zia vivia. Boa noite, papai.

— Vem anjinho — o pego pela mão e o levo ao banheiro para o banho, e


escovar os dentes.
Na cama, Lorran deita a cabeça em meu peito e fica alisando minha
barriga, enquanto faço carinho em sua cabeça para pegar no sono.

— Ela vai ser sua filhinha, zia vivia?

— Sim, fofinho.

Lorran levanta a cabeça escorando o queixo em meu peito, e o olhar dele


desvia várias vezes antes de focar em mim.

— Eu também quelo ser seu filhinho.

— Lorran — o puxo para cima, colando nossos narizes — você quer que
eu seja sua mãe? — minha garganta trava, mal consigo respirar tomada pela
emoção.

— Sì — beija a pontinha do meu nariz.

— Eu quero muito ser a sua mãe Lorran — sussurro sem conseguir conter
as lágrimas, e o encho de beijos, ouvindo a gargalhada gostosa do meu menino
— meu Lorran, meu filho — beijo sua bochecha até ele ficar vermelho, quando
cesso meu ataque e as lágrimas param, com o coração explodindo fogos de
artifício como no dia em que descobri que teria a minha menina.

— Mamãe — enche a boca para falar e repete a palavras várias vezes,


rindo enquanto o beijo.

— Meu filho!

— Vamos contar ao papai? — pergunta com tanta fofura que tenho


vontade de o morder.

— Sim, ele agora tem de saber que você é meu também.


Lorran se levanta em um pulo, e corre apressado para a porta do quarto,
ficando na pontinha dos pés para alcançar a fechadura. Acho fofo demais como
ele se estica, e abro a porta o deixando correr.

Essa é uma felicidade, e momento dele, se ele quer compartilhar, eu não


vou impedir. O sigo pelo corredor até parar de frente a porta do quarto do Levi.

— Oi?

Ele surge com a calça pendura no quadril, mostrando um pouco da pélvis,


e aquilo bate forte no meu ventre e o desejo ascende ao analisar seu corpo.

Ele ganhou peso, e o quadril ficou mais largo, peitos e ombros. O pescoço
grosso com uma veia saltada, a mandíbula dura e contraída ao me flagrar o
encarando.

Tenho saudade de ser beijada por sua boca rosa, carnuda, de ser chupada
por sua língua, e me sentir protegida em seus braços fortes. De dormir ouvindo o
som da respiração dele, e recebendo carinho dos seus dedos. De ficar eu, ele, e o
Lorran na cama, o pequeno dormindo entre nós, enquanto deixávamos nossos pés
entrelaçados.

Eu o quero.

Eu anseio por seu amor.

Meu peito sangra desde que ele foi embora, a ferida não consegue
cicatrizar pelo medo de uma nova rejeição, e vai continuar aberta enquanto eu o
mantiver longe.

Estou causando danos a mim mesma.

— Papai — Lorran chama sua atenção estendendo os braços — eu tenho


uma mamãe.
— Claro que tem — Levi fala sem entender o que o filho quis dizer. Ele
não vai me aceitar como a mãe do Lorran, dou um passo à frente, querendo calar
o pequeno, e paraliso — a Olivia é sua mamãe na terra, e a Blanca sua mamãe no
céu.

— Sì — Lorran comemora.

E eu vou ao chão.

Com as mesmas palavras que ele usou para me quebrar, ele fechou a ferida
aberta. Me aceitou como a mãe do Lorran, sem que eu falasse nada, sem que o
Lorran dissesse ou me chamasse assim.

Levi me aceitou.

Mesmo que eu o esteja afastando.

Eu fui realmente rejeitada naquele dia ou o Levi estava cego pela dor,
como eu passei a vida toda?

Vejo pés na minha frente e levanto o rosto, uma mão estendida para mim.

— Vamos colocar o Lorran para dormir, quando você estiver pronta


falamos.

— Certo.

Tremo ao segurar sua mão na minha, ele me puxa rápido e bato em seu
peito. Lorran aperta meu pescoço e o do pai.

— Somos uma família Olivia — Levi sussurra em meu ouvido e beija meu
ombro — não chore mais, você tem tudo o que sempre quis, estarei ao seu lado
durante o percurso. Você me aceitando ou não, como seu, o Lorran continua
sendo seu filho.
Transbordo em lágrimas enquanto sou acalentada pelos homens da minha
vida. Meu pequeno filhinho, e o homem que eu amo.

Levi não fala mais nada, enxuga as lágrimas no meu rosto, e puxa minha
mão para o seu quarto.

O sigo em silêncio, nos deitamos na cama com o Lorran entre nós, e seu
braço estica acima da cabeça do filho, alisando meus cabelos, as pernas
entrelaçadas enquanto pego no sono, presa nos olhos azuis.

Ele me aceitou como a mãe do Lorran, não tenho mais dúvidas quanto a
contar a verdade sobre a paternidade da minha menina.
Olivia
Acordo antes do Lorran e do Levi, observo pai e filho dormindo lado a
lado, e não consigo impedir o cenário na minha mente, do Lorran segurando a
irmã nos braços, e dela encostada no peito do Levi, dormindo tranquila, protegida
pelo pai.

— É bom, né? — ele pergunta de olhos, fechado, e me assusto — imaginar


nossa menininha dormindo conosco — abre as pálpebras, os olhos carregados de
carinho — será que ela terá seus cabelos castanho escuro ou louros como o meu?

— O-quê? — travo o ar na garganta, não tem como ele saber.

— Eu falhei com você Olivia. — Se senta devagar, passa por cima do


Lorran, apoia um braço de cada lado da minha cintura, e vem sobre mim,
enquanto me afasto, encostando a cabeça no travesseiro. — Fiquei cego em meio
a dor do luto, e não percebi a felicidade nos meus dias, causada por você e pelo
Lorran — seu nariz desce ao encontro do meu, e o coração dispara ensandecido
— você aceitou o meu filho como seu. — Desliza carinhos pelo meu rosto, fecho
os olhos não aguentando a ansiedade causada pela sua presença. — E se você me
rejeitar, e me mandar embora, eu vou ser teimoso e não partirei. Você pode não
querer, recusar, me bater, e me xingar. Continuarei aceitando sua filha como
minha — a mão dele repousa em meu ventre — eu vou ser o pai dela, e do
Lorran, você vai ser a mãe deles, estando juntos ou separados. Nada, nunca,
poderá mudar isso.

— Isso é seu pedido de desculpas? — entalo, não querendo colocar o


orgulho de parte, antes de conversamos direito.

— Não — beija minha bochecha, travo o pescoço me recusando a buscar


por seus lábios, ainda não — estou te informando como será o nosso futuro. Você
não vai ficar longe do Lorran, e eu não ficarei da sua bebê, se quiser, moramos
no mesmo apartamento, ou de frente para o outro, eu vou te perseguir enquanto
tiver ar em meus pulmões, e no além, entraremos juntos no paraíso.

— Você tem um ano — decido — prove que mudou com ações e não
palavras, e considero a sua proposta.

— Um ano é muito tempo para dois corações que se amam — ele


serpenteia os lábios perto dos meus, e arfo baixinho, abrindo a boca.

— Você passou três anos sofrendo pela Blanca, como vou confiar que não
me afastará novamente quando sentir a falta dela? Não posso me entregar sem ter
certeza Levi.

Fecho os olhos, exausta de lutar contra a corrente e de esconder meus


sentimentos.

Eu o quero de volta, quero seu amor e sua paixão, me sentir amada em seus
braços. Mas não posso entrar em uma nova relação com mágoas em meu peito
que me farão duvidar dele, e não conseguir ser sincera quanto aos meus
sentimentos, por medo da rejeição.

— Eu amo você, e a rejeição no dia do meu aniversário queima em meu


peito todos os dias, não quero viver cegada pelo ódio e no desespero. Eu me
recuso a viver com dúvidas, se você quiser, é um ano sem me tocar, beijar, e
declarações, ou o que você possa pensar para me fazer ceder, quero ter a certeza
de que você mudou antes de te deixar entrar novamente.

— Eu já entrei, Olivia — beija minha testa — tenho uma contraproposta.

— Como assim? Você não tem direito a negociação.

— Vamos fingir que eu tenho — morde minha orelha e me encolho.

— Passarei os próximos nove meses em quarentena, você me usa como


quiser, meu corpo, alma, e coração, a sua disposição e eu não vou exigir nada em
troca. — Ele tem a voz suave e o olhar decidido — Quando a bebê nascer, se
você me deixar registrar ela no meu nome, como o pai legitimo, será a prova do
seu perdão, nos três meses seguintes, vamos preparar o nosso casamento, e no
seu aniversário a gente se casa na igreja, templo, ou na mansão, onde você
decidir.

— Isso não é justo — soluço baixinho — você está mudando as regras.

— Eu quero que você seja feliz Olivia, quero te amar e te deixar fazer
perceber que eu pertenço a você, e você a mim — segura minha mão a levando
ao seu peito — eu te amo Olivia, esse coração bate por você, e continuará assim
para sempre.

Ali estão elas as palavras que ansiei ouvir feito uma louca desesperada
para ser amada. Engulo em seco, ele podia ter dito isso antes de me machucar
com crueldade.

Não posso o aceitar ainda, e não quero continuar longe, infligindo dor a
mim mesma. Não sei o que fazer ou qual caminho seguir, fecho os olhos
inspirando fundo e decidindo:

— Levi — murmuro, a um passo de ceder.


— Sim? — seus lábios tocam os meus de leve, um carinho, deixando que
eu decida se o beijo ou não.

— Não será do seu jeito — ergo o queixo — vou te usar como eu quiser e
só te terei quando eu estiver pronta.

— Pode usar do jeito que preferir — sua coxa desce entre a minha perna,
tocando meu ponto sensível — vou adorar ser seu bichinho de estimação — beija
meu pescoço — me maltrate ou me ame, mas não me mande embora.

— Seu desgraçado — soluço, agarrando forte seus ombros — você não vai
ser nada além do meu brinquedo, ouviu?

— Sim, senhora — morde meu lóbulo, e me encolho — quais suas ordens?

— Vá fazer o meu café — o empurro — e tenha modos perto do Lorran —


olho nosso menino dormindo, alheio ao que acontece com os pais.

— Sim senhora.

Ainda temos muito o que conversar, as mágoas não foram cicatrizadas por
completo. E ainda tenho medo de me magoar, vou usar esse ano para ter a certeza
de que Levi mudou, enquanto conversaremos sobre tudo o que aconteceu entre
nós.

Por enquanto, vou aproveitar a felicidade de ter meu menino, e saber que
ainda pode existir um futuro, em que eu esteja junto do pai dos meus filhos.

— Bom dia mamãe — Lorran desperta com preguiça, se esticando e


fazendo careta, beijo sua barriga arrancando gargalhadas dele.

— Bom dia meu filho — beijo sua bochecha — vamos tomar banho?

— Sì — estica os braços.
Levo o Lorran para o banho, e descemos para tomar café. O cheiro de
queimado chama nossa atenção, e corremos para a cozinha, onde o Levi coloca
uma frigideira na pia enquanto a Beatrice tem as mãos na cabeça.

— Eu só tentei fazer um ovo — ela diz.

— Você não pode chegar perto do fogão — Levi ponta para a mesa — vá
sentar que eu faço isso.

— O que aconteceu? — pergunto.

— A Beatrice tentando colocar fogo na mansão — Levi ralha — ela não


sabe fritar um ovo!

— Papai ta blabo — Lorran gargalha, achando a situação divertida — Zia


Bea — corre para a tia que o pega no colo, e o enche de beijos — eu tenho uma
mamãe — olha para mim e chama — vem conhecer minha zia Bea, mamãe.

— Oi — digo tímida, se essa mulher é a irmã da Blanca, ela pode não


gostar de ver o sobrinho me chamando assim.

— Prazer, Olivia — me puxa para um abraço, com o Lorran de lado —


estava louca para falar com você, mas tinha de controlar o afoito do Levi, para
ele te deixar respirar — alisa meu braço — não pegue leve com esse asno.

— Estou fazendo isso — digo rindo, e aliviada, ela tem carinho no rosto.

— Ouça minhas palavras como se fossem as da minha irmã: obrigada por


cuida do Lorran e ser a mãe dele — beija minha bochecha, e pisco contendo as
lágrimas, suas palavras tocam minha alma — e se você conseguir, não torture
muito o Levi, sei que você e ele já sofreram muito.

— Como... sabe?
— Ele passou os últimos dias na minha fazenda, curando a alma, e se
despedindo da Blanca, para poder libertar o coração dele do medo, da dor, e da
perda, para existir somente você. Eu te garanto, o coração dele só tem você —
me abraça novamente — quando estiver pronta, aceite a felicidade.

— Certo.

É o que respondo.

Então foi isso que ele fez nos últimos dias? Deu adeus a Blanca para
continuar comigo? Não sei o motivo, mas ouvir isso dá Beatrice, alivia
mais meu coração, do que escutar do Levi.

É uma prova de que ele realmente se esforçou, e pensa em mim, quando


me sentir pronta, ouvirei como foi esse momento de despedida e aceitação.

O dia passa voando com os preparativos do casamento, e quando a tarde


chega estou vestindo o vestido de madrinha, pronta para entrar com o Levi.

— Me ajuda — Lira pede pouco antes de ir para o lugar dela.

— O que houve? — questiono.

— Sabe o Daniel — aponta um dos convidados do Louis — ele é muito


gato, e eu quero ficar com ele — alterna o peso de um pé para o outro — acho
que ele quer também, desde que chegou fica me arrodeando, e puxando assunto.

— Ele é muito lindo — observo o homem sentado.

Em um terno sob medida, os cabelos negros aparados, e com fios grisalhos


que realçam o chame sexy exalando dele. O maxilar quadrado, e olhos castanhos
hipnotizantes.

Entendo o motivo da Lira se sentir atraída, eu também ficaria assim com


esse homem me devorando com o olhar, como ele faz com ela.
— E educado, gentil, com um cheiro — revira os olhos e abana o rosto —
enfim, eu tenho um dedo podre para homens, e não quero fazer besteira, me
ajuda?

— Com o quê?

— Sonda ele para saber quais são as intensões dele, flertando comigo desse
jeito.

— Lira, vocês nem se conhecem, e já quer saber se o homem, quer


namorar ou transar com você?

— Exatamente! — Arregala os olhos — faz isso por mim?

— Tá, me dá um segundo.

Caminho entre os convidados, e me sento ao lado do Daniel.

— Prazer, sou a irmã da noiva — o cumprimento.

— Bom te conhecer — olha para a Lira — diz a ela que se quiser falar
comigo terá de vir pessoalmente.

Fico empertigada pelo jeito convencido dele, me lembra ao Louis quando o


conheci.

— Vou dizer a ela para manter distância de um babaca como você!

Levanto e ele puxa minha mão.

— Desculpe, mas ela que tem fugido quando me aproximo. Se quer


informações, ela que venha descobrir.

— Idiota — reviro os olhos e volto para a Lira — ele é um cafajeste, igual


ao seu irmão, deu para perceber isso só conversando, não se envolva.
— Aí merda — balança as mãos — tenho um fraco enorme por cafajestes.

— Não caia na dele. Lira — peço sentindo que ela vai.

— Claro, pode deixar.

Lira não me escuta e vai se sentar ao lado do Daniel.

Tenho medo do que resultará desse envolvimento.

— Vamos? — tremo, ao ouvir a voz do Levi ao meu lado.

— Sim.

Seguro seu braço e sou embriagada pelo seu cheiro, exalando pelo paletó
cinza, abraçando suas curvas perfeitamente.

A cerimônia inicia, e quando caminho ao lado dele para o altar, eu sonho


em um dia ser eu vestida de noiva, sendo entregue por meu pai ao homem que
me ama.

Olho para o Levi, e ele tem os olhos fixos em mim.

Posso realmente acreditar que ele não me magoara novamente, e seremos


felizes juntos?
Levi
O Louis e a Bianca sumiram depois de algumas danças, Lorran e Cecilia
dormem com meu pai cuidando de ambos, e as tias babonas querendo velar pelo
sono dos mais novos.

Lira, eu tenho certeza de que a vi se agarrando com o amigo do Louis,


aquele cara não vale um centavo no quesito mulher, e se envolveu com a minha
irmã.

Quebro a cara dele se a fizer sofrer.

Beatrice conversa cheia de sorrisos com o Cowboy, filho do senhor que


cuida da nossa casa de primavera, não o conheço bem, mas vou ficar de olho
nesses dois.

Olivia tem um sorriso, observando a festa, e bate o pé no chão, inquieta.


Aproximo a boca do seu ouvido e sopro em sua pele a fazendo se arrepiar e dar
um saltinho.

Ela me encara com vontade de me bater, ou me beijar, deve estar decidindo


qual das duas é o mais adequado para a ocasião.
— O que você quer fazer? — ela rosna, e eu me tremo de vontade de ter
essa mulher de volta para mim.

— Eu disse para você me usar como o seu brinquedo, estou esperando —


abro os braços, oferecendo meu corpo.

Olivia semicerra as pálpebras, e vira para o lado me ignorando. Chego


perto do seu pescoço cheirando a pele sedosa

— Você também sente minha falta — deslizo o braço em sua cintura a


puxando para mim — vamos conversar e resolver nossos problemas, para
podermos nos amar.

— Um ano Levi. — Rosna.

— Sim, um longo e torturante ano, que podemos passar aproveitando


nosso filho e nossa menina — aliso seu ventre — de quantas semanas você está?

Ela fica quieta, duvidando se me conta a verdade ou não. Tenho suspeitas


sobre a real paternidade do bebê da Olivia, terminamos tem pouco menos de um
mês, se o bebê tiver mais de quatro semanas, ele é meu.

Enquanto estávamos juntos, ela parou com o procedimento, e não usava o


anticoncepcional, só utilizávamos camisinha, e algumas vezes fizemos sem.

Espero com expectativa por sua resposta, mas Olivia me frustra


levantando-se e indo embora. A sigo como um cachorrinho precisando da
atenção da dona para ser feliz.

Eu fiz muita merda e a magoei, e farei o dobro de merdas para ser capaz de
me perdoar e volte a ser minha. Vou mostrar a Olivia que eu sou um novo
homem, a farei me amar novamente, e nunca mais a deixarei partir.
Olivia entra na cozinha e ataca os docinhos em cima da mesa, comendo
dois de uma vez. Fico atrás dela e abraço seu corpo, descansando o queixo em
seu ombro. Beijo a pele lisa e deslizo as mãos em seu ventre sentindo minha
menina dentro dela.

— Vai devagar nos doces ou passará mal.

— Não importa — fala com a boca cheia.

— Claro que importa, não quero ver o meu amor passando mal e
prejudicando nossa menina — beijo seu pescoço, a fazendo se encolher em meus
braços — eu estava apavorado Olivia, por isso eu fiz aquela merda.

— Cala a boca — pede com a voz embargando e enfiando mais doce na


boca.

A giro em meus braços, e pego o pedaço do docinho que ela estava


mordendo, com meus dentes, beijando sua boca empanturrada com a minha.

Mal consigo deslizar minha língua em sua boca, e ela apoia as mãos em
meu peito, não me afasta e não me puxa, só me deixa ficar assim a beijando,
sufocado.

— Eu senti tanto a sua falta — murmuro, e beijo seu nariz. — Me perdoa


por não saber a data do seu aniversário e ter sido cruel — descanso a testa na sua,
encarando os olhos verdes, magoados — quando percebi que o Lorran estava te
vendo como mãe, nos dias que antecederam a morte da Blanca, eu entrei em
desespero achando que estava traindo a imagem dela, e que ela não me perdoaria
por dar uma mãe ao Lorran e o fazer esquecê-la.

— Não quero saber — ela luta para sair, e a mantenho presa entre mim e a
mesa, até suas forças minarem e ela esconder o rosto em meu peito.
— Mas precisa, eu vivi no luto por tempo demais, e quando comecei a sair,
eu tive uma epifania de felicidade que me fez ignorar todos os outros
sentimentos. Quando eles retornaram, foi intenso, e me fez perder a razão, agindo
como um maluco amargurado e magoando os que estavam perto de mim, e eram
a razão por eu ser feliz. A culpa consumiu a minha alma com força, devorando
tudo o que existia de bom.

— Poderia ter falado comigo — suspira, e noto que ela chora.

— Eu estava te magoando, podia ver isso em sua expressão quando me


olhava. Eu precisava te mandar para longe, te fazer escapar da bagunça que eu
era, e sabia que você não iria embora, a menos que eu magoasse seu coração.
Não pensei antes de agir, proferi palavras cruéis, e consegui te fazer ir embora e
me odiar, eu merecia aquilo, acreditava que o amor era proibido para mim, e
estava pecando em colocar outra no lugar da Blanca. — Respiro sem folego, após
falar muito.

Não tenho vontade de chorar, apesar de encarar o que fiz, sinto que devo
ser forte, e reparar o erro cometido, curar a ferida que sangra na mulher que eu
amo.

Mostrar a ela que não vou mais chorar e lamentar pela Blanca ter morrido.

— O que mudou? — Olivia chora baixinho contra meu peito, e beijo a


cabeça dela.

— Quando você saiu, eu não me senti aliviado como achei que ficaria.
Doeu mais do que pensei te mandar embora. Ardeu na minha alma como nunca,
a dor de perder a Blanca acabou comigo, mas a de te fazer sofrer — inspiro
controlando as lágrimas por lembrar como é ruim ficar sem ela — te mandar
embora com os olhos gritando desespero, aquilo foi como ter o ar deixando meus
pulmões, e depois daquele dia, não consegui respirar direito.
Puxo o rosto da Olivia para que ela me olhe.

— Não foi instantâneo — limpo suas lágrimas com os polegares. —


Briguei comigo mesmo, guerreando entre o que eu achava certo e a vontade de ir
atrás de você, dizer que te amo, e implorar pelo seu perdão — fico de joelhos e
escoro a cabeça em seu ventre — somente quando o Lorran chorou querendo
você, e dizendo que você era a mãe dele, que estava viva, e a Blanca no céu, foi
que percebi. Eu estava me apegando a um fantasma e fazendo meu filho e você
sofrerem uma dor que não era justo para nenhum de nós.

— E depois? — Ergo a cabeça, ela toca meus cabelos, e apesar das


lágrimas, consigo ver o olhar dela aliviando.

— Eu continuei perdido, desesperado para consertar meus erros, e sabia


que não ia conseguir fazer isso enquanto a Blanca estivesse em meu coração.
Deixei o Lorran com você, e vim me despedir da Blanca. Eu disse adeus a ela,
contei sobre você, e senti que ela estava me dando a benção dela, e a Beatrice me
fez acreditar que foi a Blanca quem te colocou no meu caminho, para amar o
nosso filho e a mim.

— Você tem certeza? — ela soluça forte, e fico em pé, segurando seu rosto
em minhas mãos.

— Como ar que entra em meus pulmões. Nunca mais vai existir Blanca
entre a gente Olivia, você é a única mãe que o Lorran terá, e se me permitir, serei
o pai de todos os seus filhos.

— Eu acredito em você — suspira e baixa o olhar, antes de me fitar


novamente determinada — mas meu peito ainda dói, e não conseguirei ter uma
relação enquanto o medo de que você acorde e não me queira mais persistir. Você
tem um ano para mostrar que mudou, não vou abrir mão.
— Serei seu brinquedinho? — pergunto sorrindo, e beijando suas
bochechas, feliz por ter uma chance de fazer a coisa certa.

— Não, será... qualquer coisa — suspira.

— Namorado, podemos começar assim — beijo seus lábios, aliviado


quando ela corresponde, agarrando meu pescoço — e no nascimento da nossa
menina, serei o pai dela — beijo a outra bochecha — e no dia do seu aniversário,
o seu marido.

— Vá com calma, rapaz — uma voz grossa fala atrás de nós, e vejo o
Marcelo segurando a Cecilia nos braços — antes de casar-se com a minha filha,
eu terei de dar a minha benção, você a fez sofrer demais — antes eu que consiga
evitar, sinto a dor do chute que ele dá em minha bunda, e me encolho.

Olivia gargalha de mim, sem intenção de me ajudar.

— Eu mereci essa — digo ficando em pé novamente — sou Levi, prazer


Marcelo — estendo a mão, e ele ajeita a Cecilia no colo, antes de apertar com
muita força meus dedos.

Tento não fazer careta, acho que ele quer quebrar meus ossos.

— Vou ficar de olho em você.

— Para pai — Olivia pede com riso na voz — eu vou torturar ele o
suficiente por nós dois.

— Não abra brecha para esse safado.

— Calma, sogrinho — brinco e recebo um olhar matador, engulo em seco,


e coço a garganta — vamos Olivia? Hora de dormir — me escondo atrás dela,
que ri ainda mais, quando o pai se aproxima e beija sua bochecha.
Pelo visto eles fizeram as pazes, e minha garota voltou a exalar raios de
luz.

— Você vai dormir no seu quarto — bate no meu peito e sai rebolando.

— Tchau! — Digo ao Marcelo antes de correr atrás da mulher que manda


em mim.

No corredor dos quartos ouço gemidos, e encaro a Olivia desconfiado,


quem está transando aqui em cima?

— É a Lira, ou a Beatrice? — sussurro segurando sua cintura.

— Não sei, espero que a Beatrice — ela fala de volta — o Daniel parece
ser um cafajeste.

— Se for ele tocando na minha irmã, eu arranco o pau dele.

— A Lira é grandinha, vai saber lidar com esse tipinho.

— Boa noite casal — Viro de costas e vejo a Beatrice com um sorriso no


rosto — Levi, o Dante é amigo seu? O que pode me dizer sobre ele? — trança o
braço no meu, com um sorriso enorme no rosto.

— Não o conheço bem, pergunta ao meu pai, acho que ele viu o menino
crescer, ou coisa assim.

— Ele é muito lindo — fala apaixonada.

— Concordo — Olivia diz, e giro o pescoço rápido na sua direção


estralando as vértebras.

— Como é?!

— Muito lindo! — estrala a língua na boca, e quero surrar a bunda dela.


— Sua safada — me solto da Beatrice, e Olivia corre gritando.

Ela alcança o quarto antes de mim e fecha a porta na minha cara.

— Até amanhã Levi — diz alegre.

— Você vai me torturar assim mesmo?

— Com certeza.

Bato a cabeça na porta frustrado por ser rejeitado.

Ao menos ela concordou em continuar me fazendo sofrer, e vou tentar a


Olivia como o próprio satanás, até ela me aceitar de volta em sua vida. Beijos,
cheiros, e palavras sacanas, vou preparar meu menor arsenal para a fazer ceder ao
meu charme, e quando tiver em cima dela, vou despejar palavras de amor que
amolecerão seu coração, e a fará com que ela confie em mim.

Só existe a Olivia, e nem que eu passe a eternidade provando isso, a farei


perceber que aprendi com meu erro e nunca mais deixarei a escuridão tomar
conta da minha vida.
Olivia
Voltamos para o Brasil, e o Levi se recusa a aceitar que eu more no meu
apartamento, e ele no dele com o Lorran.

Já faz um mês que retornamos, e todos os dias tenho dificuldade para ir


embora de seu apartamento, ou ele me prende, escondendo a chave, combina
com Lorran de ficar inventando que está doente, ou me segue até meu
apartamento, e entra aqui dentro com o Lorran e não vai embora até o dia
seguinte, quando vou para a creche.

Já bati tanto nele por isso, que estou com calos nas mãos.

Nunca o vi grudento dessa forma, e, ao mesmo tempo que adoro, eu odeio,


e quero o esganar por não me dar espaço. Os hormônios da gravidez estão me
deixando louca, uma hora eu quero transar loucamente, na outra vomitar minha
alma, e em seguida fico chorosa, deixando o Levi dormir ao meu lado e fazer
carinho em meus cabelos.

Não transamos ainda, é tudo recente, e quero ter a confiança de que não
vou me magoar se o deixa ficar em meu coração.
Por enquanto, temos mantido essa dinâmica, é bom, ele está perto,
respeitando minhas barreiras e me enchendo de carinho e confiança. Não sei se
conseguirei aguentar muito mais com a distância, ou escondendo que a minha
menina é filha dele.

— Na sua casa ou na minha? — ele pergunta quando entra na cozinha


segurando uma pasta preta.

— Aqui, estou cansada — bocejo me espreguiçando.

— Coloco o Lorran para dormir na cama dele, ou na nossa? — chega perto


e arrodeia minha cintura, descanso a cabeça em seu ombro, e aceito a massagem
em minhas costas.

— Na dele, hoje tenho necessidades — Levi fica todo animado e sai


correndo, para pôr o Lorran para dormir.

Termino de guardar as sobras, e vou para o banho, tranco a porta para o


espertinho não achar que estou o chamando para entrar. Visto a camisola e me
deito de lado na cama, minha barriga não cresceu muito nas últimas oito
semanas, somente um inchaço protuberante. Amanhã tenho um ultrassom, e vou
chamar o Levi para me acompanhar.

— Hora da diversão — ele tira a camisa animado com fogo nos olhos.

— Com certeza — jogo nele o pote de gel de massagem — pode começar


pelas minhas pernas, já estou sentindo os pés inchados — deito e gargalho com a
cara de cachorro que caiu da mudança.

— Vai ser a melhor massagem da sua vida, sua mulher infernal — morde
minha panturrilha, e me tremo.

Levi despeja o gel na minha perna esquerda e começa uma massagem lenta
em meu tornozelo, estralando as vértebras e aliviando a dor na sola do pé.
— Amanhã eu tenho um ultrassom...

— Que horas saímos? — ele nem me deixa terminar a frase, e rio. —


Lorran vai querer ir junto, vamos levá-lo?

— Minha consulta é às 9 horas.

— Qual o seu plano de saúde? Vou te trazer para o meu, e ter acesso a um
melhor.

— Não precisa, o que eu pago é bom, e...

— Quando se trata de saúde, quanto mais caro, mais acesso aos


procedimentos, nossa menina vai nascer em um parto humanizado, e você terá
um pré-natal seguro. Não abro mão disso, Olivia — a seriedade em seu olhar me
cala, é a primeira vez que ele toma as rédeas de uma situação, e gosto de como
me sinto com isso.

— Certo.

— Vai deixar para comprar o enxoval quando soubermos o sexo? — ele


pergunta subindo as mãos pelo interior da minha coxa, deslizando suavemente,
aplicando pressão com os dedos.

Tenho de respirar para manter o foco no que ele perguntou.

— Vamos iniciar com as coisas unissex primeiro — gemo quando o safado


toca minha virilha — já sei que é uma menina, e vou fazer o enxoval dela lilás,
com figuras de algodão-doce e ursinhos.

— Vou pintar todos no quarto que será dela — seus dedos deslizam na
borda da calcinha, e esqueço do que estávamos falando — algodão-doce,
ursinhos, e alguns gatinhos. Podemos comprar tudo amanhã, depois do exame.
Ele continua falando, e eu fecho os olhos, me entregando a carícia do seu
dedo deslizando sobre minha intimidade encharcada, por cima da calcinha.

Levi força a penetração pelo tecido, e eu me tremo, prendendo sua mão


com minha coxa. Ele desce o rosto ao encontro do meu, e beija meus lábios, até
que eu relaxe e solte sua mão.

Com mais liberdade, ele tira a peça de roupa e desce beijando meu corpo.
Eu queria ter mais forças, e poder resistir, mas o evitar só vai me causar dor
interna, e pode parecer que se passou pouco tempo, mas sinto como se
estivéssemos a uma eternidade separados, sem sentir um ao outro.

— É só sexo — digo ao ter minha camisola retirada, e quando ele fica nu,
colocando o pau enorme para fora.

— Não, é fazer amor — desliza para dentro de mim.

As paredes da minha vagina ardem pelo seu tamanho, encolho meus dedos,
agarrando seus ombros, o sentindo todo dentro de mim, e com uma saudade
enlouquecedora, agarro sua bunda durinha, forçando que ele me coma com mais
força.

Levi estabelece um ritmo lento entre nosso quadril, com os olhos travados
no meu e a boca pairando sobre a minha, gemendo como um maldito macho alfa.

— Sentiu minha falta como eu a sua? — ele pergunta baixinho — estava


enlouquecendo de vontade de me enfiar no seu calor, sente isso Olivia — desliza
devagarinho, empurrando a cabeça na parede interna, e eu vejo estrelas. — Diz
que me queria dentro de você — repete o movimento, me levando a insanidade,
nem se eu quisesse conseguiria falar.

— Levi — grito por seu nome ensandecida, com o corpo explodindo em


prazer.
— Isso, Olivia, fala o nome do seu homem — morde minha orelha, e uma
rajada de lubrificação deixa meu interior, facilitando suas investidas — diz o
nome do homem que vai se casar com você, e é o pai dos seus filhos.

— Levi — suspiro em meio a uma crise de quase choro, perto de alcançar


meu ápice.

— Eu te amo Olivia, diz que me ama.

Ignoro seu pedido, não vou ceder enquanto ele me fode. Belisco sua bunda,
e perco o ar, atingindo o clímax.

Ele rosna ao perceber que não me ganhou na conversa, e jorra pesado em


meu interior. Sustenta seu peso com os braços, e me enche de beijos, deslizando a
língua pela minha com carinho, beija minha testa, e sai de dentro de mim,
deitando-se ao meu lado.

Sua mão desliza em minha barriga, e ele beija meu ventre, com um sorriso.
É a primeira vez que o deixo me tocar dessa forma.

— Eu amo você, minha menininha — beija novamente meu ventre, e eu


travo em emoções.

— Você é o pai da minha bebê — admito.

— Eu sei — beija meu ventre — sou o pai dela, quando decidi que seria os
pais de todos os seus filhos — encontra nossos lábios um no outro.

— Não Levi — embargo, não pretendi contar agora. Ao ser envolta no


amor dele, e pelo sexo gostoso que fizemos, baixei a guarda... e não foi ruim
fazer isso — eu menti sobre a inseminação, não fiz o procedimento enquanto
estávamos juntos ou depois.
O rosto dele se ilumina, e Levi me enche de beijos até o ar faltar em meus
pulmões.

— Nossa garotinha — beija meu ventre — papai ama você e a mamãe,


prometo que antes de você nascer, eu vou ter casado com sua mãe.

— Não apresse as coisas. — Peço.

— Eu já apressei tudo, Olivia — ele me puxa para seu colo e dormirmos


abraçados.

Não é ruim ceder.

É maravilhoso deixar o amor dele entrar, e o peso sair.

No dia seguinte, vamos os três para o consultório, e o Lorran pula inquieto


querendo saber tudo sobre a irmã.

Levi tem um sorriso enorme no rosto, e fala para todos, que viemos a
primeira consulta da nossa bebê, juntos, já que a outra, eu realizei quando
descobri sobre a gravidez e não foi aprofundada como a de hoje, em que
poderemos ouvir os batimentos do coração dela.

Entramos na sala, e coloco o avental, me deito na cama e Levi se senta ao


meu lado, com Lorran em seu colo. A médica entra com um sorriso no rosto.

— Bom dia, mamãe e papai — ela se senta na cadeira perto de mim — e


esse menininho, é o filho de vocês?

— Sim — Levi responde orgulhoso.

— Nos seus registros não consta que você já teve filhos — ela analisa uma
prancheta — acho que devemos atualizar ele.
— Ele não nasceu de mim — digo — a bebê será a primeira que vou dar à
luz.

— Minha outra mamãe tá no céu — Lorran levanta os bracinhos — a


mamãe Olivia tá na terra comigo — ele se estica, e Levi o ajuda a beijar minha
bochecha — e eu amo a mamãe.

— Amo você, meu menino — aliso os cabelos dele.

— Que família feliz! Vamos logo ver como está a irmãzinha dele — passa
o gel em meu ventre e coloca o aparelho.

Meu plano não garantiu um ultrassom 3D, por isso foi a normal, e tenho
um pouco de dificuldades em entender as imagens na tela, mesmo a médica me
explicando sobre o tamanho da bebê.

Levi me encara e ergue a sobrancelha como quem diz “eu te avisei” dou de
ombros.

— Agora vamos ao coração.

Tum... Tum... Tum...

Preenche a sala, e eu choro feliz por escutar o som da vida da minha filha
em meu ventre. Levi me beija, com o Lorran pendurado entre nós, as lágrimas
dele misturadas as minhas, e o Lorran deita a cabeça em meu peito.

Eu tenho uma família comigo e não abrirei mão dela, nunca mais serei
infeliz.

****

3 meses depois
Meu bebê já tem 24,5 centímetros, e após o ultrassom 3D, conseguimos
ver melhor o formato do corpinho dela, ainda não tivemos a confirmação do
sexo, mas ela segue saudável e bem, dentro de mim, e meu coração que estava
obscurecido por tristeza ganhou a luz do amor, e a felicidade fez morada nele.

Eu e o Levi estamos bem, ainda não falei que o aceitei completamente,


embora passemos o tempo juntos, e fazendo amor.

No último mês ele montou um ateliê para ele perto do apartamento, e tem
passado bastante tempo por lá, criando sua próxima coleção. Ele não me deixou
ver nada, e Lorran é seu principal cúmplice nas peças.

— Mamãe — Lorran chama, estou dobrando a roupa dele, quando o vejo


pelado puxando o pinto — tá doendo.

— O que meu amor? — fico de olhos, e procuro machucado em seu


pintinho.

— Aqui — puxa novamente a piroquinha, e faz careta, prestes a chorar.

— O que você estava fazendo para doer aí?

— Blincando na valanda — tiro a mão dele e vejo que a cabecinha está


vermelha — aí o gatinho da vizinha pulou pla cá, e eu o peguei no colo, e o
pintinho ta doendo.

— O gatinho te arranhou?

Já avisei para aquela diaba de menina não deixar o gato dela vir para a
nossa varanda. Vou mandar colocar uma tela de proteção que impeça a vinda do
animal, dificilmente deixo o Lorran ficar na varanda, fecho as portas, e tenho
certeza de que não abri elas.

— Sim, no pintinho — tem lágrimas nos olhos.


— Vamos, vou te levar ao hospital, e depois ter uma conversa séria com
aquela diaba.

— Celto.

Visto uma roupa no Lorran, e o pego no colo, evitando seus pés perto do
meu ventre. Na sala, vejo que a governanta está limpando a varanda com as
portas abertas.

— Você saiu e deixou as portas abertas? — pergunto, ela vira se


assustando.

— Santo Deus, menina, que susto — coloca a mão no peito. — Sai


rapidinho para buscar mais água na cozinha, por quê?

— A gata da vizinha pulou para cá de novo e arranhou o Lorran, vou levar


ele ao médico.

Chamo o motorista, e uma hora depois deixamos o hospital com o Lorran


medicado para infecção urinaria. Chegamos no apartamento com ele dormindo, e
ouço batidas na varanda, vou ver o que acontece, e encontro o Levi, dando
ordens para três homens que colocam janelas com uma tela de proteção,
tampando tudo.

É isso que ele faz, ele cuida da gente sem que precisemos falar nada. Eu
amo esse homem, e estou pronta para abandonar a dor e viver o amor.
Olivia

3 meses depois
— É uma menina! — a médica fala feliz, e Levi grita, comemorando. —
Demorou, mas finalmente conseguimos ver o sexo.

Estou de 32 semanas, e somente agora minha pequena abriu as pernas


durante um ultrassom, e descobrimos o sexo dela.

O enxoval já está completamente pronto, e nossa família vai se reunir


amanhã na Itália, para comemorarmos o aniversário da Cecilia, faz tempo que
não reunimos todo mundo.

A Bianca e o Louis, estão quase morando lá, e o Daniel assumiu como


CEO da empresa no Brasil. A Lira terminou semana passada o filme da
adaptação de um livro famoso, e em breve sairá em tour na divulgação da obra.

Beatrice, que tem mantido contato por vídeos, chamadas com o sobrinho e
comigo, vai estar presente, e eu tenho quase certeza de que o maior motivo, é por
ela querer ver o Dante.
O Cowboy não sai da cabeça da Beatrice, assim como o Daniel não para de
povoar os pensamentos da Lira.

Eu e Levi estamos bem, vivendo juntos, e cada um fazendo seus trabalhos.


Ele diz que logo terminara a coleção, enquanto eu não tenho mais certeza se
preciso dizer que o aceito de volta, ele sente isso, quando o beijo e fazemos amor.

— Você estava certa — Levi beija minha testa — vamos ter uma menina.

— Eu sempre soube — respondo com o coração flutuando de felicidade.

— Uma irmãzinha pla mim — Lorran abre os braços.

Saímos do consultório e vamos a um restaurante comemorar, depois


voltamos para o apartamento. Entramos, e a casa está repleta de música, sigo o
som, e vejo meu pai montando o berço da minha menina, o quarto já está quase
pronto, só falta o, guarda-roupas e a cadeira de amamentação chegarem.

As paredes foram pintadas de lilás com branco, nuvens de algodão-doce,


com ursinhos descendo por ela em todos os lugares, e gatinhos folgados,
dormindo tranquilo, a patinha deles é a mão do Lorran pintada na parede.

— E então? — meu pai pergunta.

— É uma menina!

Ele comemora e bate na mão do Levi, ambos fizeram as pazes, e desde que
passei a morar aqui, o meu pai tem me visitado para brincar com Lorran, e
conversar comigo e com o Levi.

Eu gosto da direção que a minha família tomou, e nada poderá estragar a


felicidade nascente.

Partimos para a Itália, e quando chegamos lá, Bianca corre para me abraçar
e perguntar tudo sobre a gravidez. Não escondo nenhum detalhe, e logo a Lira e a
Beatrice se juntam a nós.

As quatro na beira da piscina, enquanto os homens preparam o almoço.

— Agora vocês, me conte o que tem acontecido — peço para as duas.

— Bom, eu estou grávida — Lira joga isso como uma bomba, e dá de


ombros — já contei ao Louis, e vou falar com o Levi ainda, não vou dizer quem
é o pai — o medo nos olhos dela arde tanto quanto o ódio — eu tentei contar três
vezes a ele sobre o bebê, e o babaca sempre desliga na minha cara, achando que
estou sendo grudenta, então ele que vá se ferrar.

— De quantas semanas? — pergunto ainda absorvendo o impacto da


informação.

— 29 semanas — as bochechas assumem um tom vermelho e ela pede


segredo com a expressão. 29 semanas atrás, Bianca estava se casando, e a Lira
estava flertando com o cafajeste do Daniel.

— Tem certeza de que não quer contar ao pai do bebê? — pergunto com o
coração apertado, pelo que ela deve estar passando.

— Sim — ergue o queixo — quando ele perceber minha barriga


protuberante, e fizer as contas na cabeça dele, vou decidir o que fazer, enquanto
isso, não vou implorar pela atenção do desgraçado.

— Estamos aqui — Bianca segura a mão dela — para o que precisar, como
o Louis disse ontem.

— Obrigada — Lira beija a cabeça da Bianca, e eu aperto a mão dela.

Levi vai surtar quando souber, e considerando que o Daniel veio para cá,
acho difícil o segredo continuar por muito tempo.
— Você sabe que é provável que ele descubra hoje, né? — pergunto
baixinho a abraçando.

— Estou pronta para isso — beija meu ombro.

— E você, dona Beatrice? — Bianca a cutuca.

— Ah, eu estou bem — ela continua procurando pelo Dante com os olhos.

— Manteve contato com o Cowboy? — instigo.

— Talvez, ele me ajuda com os animais.

— E com outras coisas, pelo seu sorriso — acuso e ela morde os lábios
rindo internamente.

Continuamos conversando, e depois almoçamos.

Lira chama o Levi para conversar, e eles somem por quase duas horas,
depois retornam, e ele tem a expressão de quem vai cometer um assassinato a
qualquer instante.

Por sorte se controla.

Pego o Daniel seguindo a Lira com os olhos, e quando ela se recolhe no


quarto ele vai atrás. Estou tentada a ir ver o que acontece, quando o Cowboy da
Beatrice entra dando boa noite a todos, e eu fico para ver a interação tímida e
cheia de química desses dois.

Duas histórias de amor se desenrolam diante dos meus olhos, e não sei por
qual estou mais ansiosa para assistir.

Nos recolhemos no quarto, e o Levi não perde tempo ao me puxar para ele,
me coloca sentada na cama e fica de joelhos na minha frente.
— Você me deu um ano para provar que eu te amava e estava pronto para
viver ao seu lado — segura minhas mãos — mas eu sou apressado demais, e não
consigo mais não te chamar de minha esposa, ainda precisamos de um ano?

— Não, meu amor — seguro seu rosto, certa de minha decisão.

— Chegou a hora Olivia — ele esfrega as mãos, e põem dentro do bolso


— eu juro que iria fazer isso amanhã, em um cenário de tirar o folego, mas eu
não consigo esperar para poder dizer — puxa a caixinha, e vejo um anel de ouro
branco com um diamante no centro — eu te amo, passei os últimos meses
provando que estou mudado, e você é a única mulher no meu coração, sem
passado, somente o presente.

Ele puxa minha mão para si, e eu travo a garganta, pronta para responder.

— Você é a mãe do Lorran e da nossa menininha, vamos construir nossa


família juntos, ter muitos mais filhos, e viver em um lar cheio de amor. Olivia
Baptista, me perdoa por ter te magoado e causado uma ferida em seu coração,
espero que você tenha percebido que eu sou uma pessoa melhor — aceno em
positivo — deixa eu cuidar de você e dos nossos filhos, me permita te amar até
nosso último suspiro — beija minha mão — casa comigo?

— Sim, eu te perdoei, e caso com você.

Levi me puxa em seus braços com amor, beijando todos os lugares que ele
encontra. Os lábios afoitos não me deixam respirar ou rir, enquanto sou devorada
por ele.

— Eu tinha planejado um mega pedido...

— Foi perfeito — o interrompo, e deixo que coloque a aliança no meu


dedo.
— Se quiser, nos casamos amanhã — alisa meu rosto — fiz um vestido de
noiva para você, e trouxe comigo, nossas famílias estão aqui, e tudo que eu
preciso é de você.

— Vamos — gargalho.

Fazemos amor a noite toda, e no dia seguinte, ninguém fica surpreso com a
notícia do casamento, pelo contrário.

— Seu sem-vergonha — Louis bate na cabeça do irmão — passei um mês


te ajudando a montar o cenário perfeito, e você estraga tudo pedindo adiantado, o
que custava aguentar mais um pouco?

— Eu não consigo ficar mais um segundo longe dela!

— Você gostou do pedido? — meu pai pergunta, acho que ele também
tinha ajudado o Levi.

— Sim — gargalho.

— Vamos usar o cenário para o nosso casamento — Levi diz — Dante,


traga um padre, casamos às 17 horas.

A chuva de gritos é grande, Bianca puxa minha mão sorrindo para mim, e
sumimos entre nossos familiares entrando no carro.

— Vamos te deixar linda para a sua cerimônia. — Ela sorri, e a abraço.

Fazer cabelo, maquiagem, depilação, escolher as joias, é exaustivo, mas


quando chegamos a mansão e vejo tudo decorado para o casamento, eu me
pergunto há quanto tempo o Levi planejou tudo isso e guardou segredo.

Subo sem o deixar me ver, e no quarto encontro Beatrice arrumando meu


vestido no cabide. É uma peça deslumbrante, leve, com renda, e de alças finas.
Visto, e a peça serve perfeitamente, ajustada na minha barriga para não
causar pressão. Meu pai entra no quarto com um sorriso no rosto, vestindo um
terno preto e arrumado.

— Desde quando você sabia?

— Ele começou a planejar tudo quando voltamos ao Brasil — me entrega


uma caixinha de veludo, abro, e vejo um broche azul — algo azul, emprestado,
pois quero de volta, ele era da sua avó, e sua mãe o usou no nosso casamento,
então é bem velho — coloca o broche no meu cabelo e prende o véu — estou
orgulhoso de você Olivia.

— Obrigada pai — beijo seu rosto. Não existe a necessidade de mais


apalavras entre nós, fizemos as pazes, e perdoamos um ao outro naquela noite.

— Vamos? — estende o braço.

— Sim.

Descemos as escadas e caminhamos por um tapete vermelho, até que vejo


as cadeiras de frente para uma estrutura de madeira, rodeada de flores, banhado
pelo pôr do sol no horizonte.

Levi me espera usando um terno cinza, e nossos familiares e amigos, que


eu nem sabia que tinham vindo — levantam quando a marcha nupcial inicia.

Em todas às vezes que imaginei como seria o meu casamento, me via


correndo de um lado para o outro, resolvendo tudo e pensando se meu noivo
ajudaria.

Hoje vou me casar com o homem, que sozinho arrumou a nossa festa e me
trouxe segurança, conforto, e amor, que me deu uma família e me fez realizar o
meu desejo, de ter uma família só minha.
Minha história de amor não começou com amor à primeira vista, foi ódio,
depois a paixão, e então a decepção, e hoje, estamos escrevendo o primeiro
capítulo da nossa vida como, casados, sem dores em nosso peito, amando um ao
outro, e estando certos de que é isso o que queremos.

— Eu te amo — ele sussurra.

— Eu amo você — devolvo.

No altar o padre fala, e eu só consigo sentir minha pequena chutando o


meu ventre, levo a mão do Levi a minha barriga, e ele arregala os olhos com
lágrimas descendo por suas bochechas. Lorran entra, segurando as alianças e fica
parado sorrindo, esperando que peguemos elas.

Beijo a cabeça do meu menino, e Levi faz o mesmo.

— Levi Vittileno, você aceita Olivia Baptista como sua esposa para amar,
honrar, respeitar, e ser fiel em todos os dias da sua vida, até que a morte os
separe?

— Aceito — ele coloca a aliança em meu dedo.

— Olivia Baptista, você aceita Levi Vittileno, como seu marido, para amar,
honrar, respeitar, e ser fiel em todos os dias da sua vida, até que a morte os
separe?

— Aceito.

Coloco a aliança no dedo dele.

— Pelos poderes a mim concedidos pela Santa Igreja Católica, eu vos


declaro, marido, e mulher, pode beijar a noiva.

Nossos lábios se tocam, entrelaçando nossas vidas no amor eterno que


viveremos.
Olivia
Eu nunca senti tanta dor quanto nas horas que passei em trabalho de parto.
Ter meu corpo sendo partido em dois é agoniante e muito dolorido. Minha
pequena nasceu gordinha, com 4 quilos, e a coisa mais linda do universo.

Ela tem bochechas gorduchas, e cabelos, castanho escuro como os meus,


os olhos alternam entre azul e verde, e eu não poderia estar mais cansada e feliz
do que nesse segundo, segurando o meu pequeno mundo nos braços.

Ainda não decidimos o nome, deixamos Lorran escolher, e ele tem


demorado para se decidir. Vamos dar mais dois dias, se ele não falar qual nome
quer dar a irmã, eu vou decidir com o Levi.

Estou no quarto da maternidade com minha pequena no colo, faz menos de


dez minutos que ela nasceu e eu só tenho a agradecer, minha menina nasceu com
2 meses de diferença para a data de aniversário do Lorran, e ele acha o máximo,
e quer comemorar o aniversário de ambos juntos.

— Mamãe! — grita, e corre afoito para a cama, segurando a pelúcia do


cachorro e do gatinho.
— Vem ver sua irmãzinha amor — Levi o pega no colo e coloca o Lorran
entre minhas pernas abertas, ele tem os olhos arregalados e cheios de amor
observando a irmã.

— Já sei o nome.

— Qual? — Levi pergunta segurando a cabeça pequena de nossa menina.

— Lorran, igual a mim — abre os braços a bate palmas, encaro o Levi, e


damos risada.

Estou exausta, e consigo rir plenamente com as gracinhas dele.

— Não pode Lorran — Levi responde — ela é menina, e tem de ter nome
de menina.

— E tem de ser diferente do seu — digo.

— Lorra... — Bota o dedo no queixo olhando para cima — ny. Lorrany.

Não tenho como negar, um nome lindo, e escolhido pelo meu filho. Após o
casamento, Levi e eu oficializamos a maternidade do Lorran, adotei ele como
meu, e para todos os fins legais e emocionais, ele é o meu filho e ninguém nunca
poderá mudar isso.

Tenho meus dois fofinhos na cama comigo, e meu marido, que me enche
de amor todos os dias.

— Eu amei — digo e beijo a cabecinha dela — bem-vinda ao mundo


Lorrany.

— Eu te amo irmãzinha — Lorran a beija na bochecha com cuidado —


para você — entrega a pelúcia de gatinho, e eu embargo, ele é apegado ao
gatinho e ao cachorrinho, e dar a irmã, é um gesto enorme.
— Tem certeza, Lorran? — Levi pergunta, com os olhos marejados.

— Sì, ela é minha irmãzinha, e o gatinho e o cachorrinho também, vamos


dividir eles — beija ela de novo — ela é tão lindaaaaaa.

— É, sim, igual a você — encaro meu menino e meu marido.

Eu encontrei a felicidade, e nada nesse mundo poderá apagar a luz que se


acendeu nas nossas vidas.

***

3 meses depois.

Itália.
Retorno de Levi Vittileno, o estilista da marca Vittileno.

— Boa noite a todos, e todas — Levi sobe ao palco segurando o


microfone.

Hoje ele vai mostrar ao mundo a sua nova coleção, e o seu retorno como o
estilista da VITTILENO. Estamos todos reunidos para presenciar o momento,
Louis e Bianca com a Cecília, e esperando o próximo bebê deles, no ventre, de 3
meses da minha irmã.

Lira, com um barrigão de 8 meses, prestes a dar à luz, retornou a Itália para
que o bebê pudesse nascer no país de origem dela. Infelizmente o Daniel não
perguntou sobre a paternidade, e acho que eles não se viram desde o casamento.
Minha cunhada aguentou firme a gravidez, com o cafajeste do pai do bebê, sem
ter noção de que o bebê dele, está prestes a vir ao mundo.

Beatrice, eu não sei dizer o que acontece entre ela e o Dante, uma hora
acho que estão juntos, e na outra parece que ela vai voar no pescoço dele e
arrancar sua cabeça fora.

Hoje eles estão em paz, com pequenos olhares, e se alfinetando. Ele tem
babado de ciúmes desde que um estilista amigo do Levi se sentou ao lado da
Beatrice, e não para de puxar assunto com ela.

Marcelo e Enrico se tornaram bons amigos, e agora que meu pai se


aposentou, tem viajado bastante com meu sogro pelo mundo. Tenho a leve
desconfiança de que ambos arrumaram uma namorada, e um acoberta o outro.

Por enquanto vou respeitar o silêncio deles, ambos perderam as esposas, e


um entende o outro melhor do que ninguém.

— Mamãe — Lorran me chama — vai começar!

— Vai sim — aliso sua cabeça e chego a Lorrany dormindo no carrinho, na


minha frente.

— Como já foi anunciado pela mídia, eu sou o estilista por trás de todas as
peças da VITTILENO, e após meus hiatos de 4 anos, estou retornando aos
palcos, no dia do aniversário da minha linda esposa — aponta para mim — um
salve de palmas para a mulher, que tem meu coração, e a mãe dos meus filhos.

Fico envergonhada quando os flashs viram na minha direção, e um coro de


“parabéns” entoa alto no salão.

Após isso, Levi chama atenção para ele novamente.

— Hoje a minha coleção se chama “raio de sol” em homenagem aos três


raios de sol que eu tenho na minha vida. Meu menino Lorran, minha garotinha
Lorrany, e minha esposa Olivia. Obrigado por não desistirem de mim e me
apoiado em toda a trajetória até esse momento, eu amo vocês, meus raios de sol.
Aproveitem o desfile.
Levi vai para os bastidores, e as luzes focam na passarela, as modelos
entram uma a uma, mostrando as peças deslumbrantes em cores claras e
vibrantes, transbordando alegria e amor como tem sido nossas vidas.

Me desprender do ódio e aceitar o amor foi a escolha mais certa que fiz.
Conquistei a minha família, e todos os meus dias têm sido felizes desde então.

Puxo meu menino para mim, e seguro a mão da minha filha, a aliança
brilhando meu dedo.

FIM
UMA FILHA PARA O BILIONÁRIO ITALIANO
(IRMÃOS VITTILENO)

SINOPSE
Ele acredita que foi enganado por ela.

Ela decide manter sua gravidez inesperada em segredo!

Aos 37 anos, Louis Vittileno chegou no momento mais crucial de sua vida:
assumir a liderança da empresa da família. Um típico italiano arrogante que sabe
seu potencial para os negócios e para as mulheres, mulherengo e conhecido por
nunca ter relacionamentos duradouros, Louis acredita que as mulheres só se
interessam por seu dinheiro e que nunca conseguirá encontrar um grande amor.

Bianca Baptista, é a mais nova secretária do futuro presidente das


indústrias VITTILENO. Tímida desde pequena, nunca conseguiu se relacionar
com outros rapazes ou se permitir viver uma paixão, o bullying que sofreu ainda
adolescente machucou seu coração e a encheu de inseguranças.
Ao se conhecerem na festa da empresa, um não faz ideia de quem o outro
seja, a atração explosiva resulta na primeira vez de Bianca e em um coração
partido ao acordar no dia seguinte e ver um bolo de dinheiro no lugar que Louis
deveria estar.

A convivência entre os dois na empresa é insuportável, Louis não confia


em Bianca, e ela não consegue o perdoar por humilhá-la. Mas a química entre
eles falará mais alto e quando o casal parece estar aceitando os sentimentos que
nutrem um pelo outro, uma reviravolta coloca tudo a perder.

Bianca é acusada de traição.

Louis, com o seu cargo como futuro presidente na empresa ameaçado.

Com a rejeição e o coração partido, ela esconde dele que engravidou e vai
embora sem olhar para trás. Quando Louis se depara com a verdade e percebe os
perigos que os rondam, não tem outra alternativa, a não ser manter a mulher que
ele ama longe para que ela fique segura. Sem fazer ideia de que ela espera sua
filha, quando descobre a verdade ele terá de reconquistá-la enquanto ela nega que
a filha é sua.

Uma gravidez inesperada seria o suficiente para acabar com as mágoas e


unir o jovem casal que nunca vivenciaram o amor?
LIAM : A OBSESSÃO DO BAD BOY
(BULLDOGS YALE)

SINOPSE
Você é exatamente aquilo que eu queria ser quando era criança, mas
meus demônios não permitiram.

Liam Stevens estava acostumado a ser o centro das atenções em Yale,


reconhecido pelo seu sobrenome e pelo seu estilo de vida envolto em
bebidas, drogas e mulheres. Contudo, o que poucos pareciam notar era que,
por trás da fachada de bad boy arrogante, havia um garoto quebrado, com
um passado traumático.

Amber Jones lutou a vida toda para arcar com seus estudos e tentar
melhorar a vida de sua irmã com uma formação em psicologia. Tímida, ela
odeia ser o foco das atenções, mas isso acontece quando se torna a obsessão
do bad boy mais popular da faculdade.
Liam está obcecado pela garota que é tudo aquilo que ele desejava
ser.

Amber o odeia por ser tudo aquilo que ela sempre desprezou.

Como costumam dizer, amor e ódio caminham lado a lado.


[1]
também, não chora, eu te dou chocolate
[2]
Bora
[3]
brigou comigo
[4]
Sim, como se chama?
[5]
Como vai bebê?
[6]
salvo do dinossauro
[7]
você é um pequeno muito inteligente
[8]
quero mais
[9]
Vai brincar um pouco, preciso falar com seu tio
[10]
não sei a que você se refere
[11]
ontem você ficou comigo
[12]
Não sei a que você se refere

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