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Joseph
4 anos atrás
Não diria que minha vida era perfeita, pois isso é uma ilusão, mas
consegui o que esperava: uma noiva maravilhosa, com quem iria me
encontrar em alguns minutos, e um trabalho bem-sucedido na petrolífera.
Até então, tudo estava como deveria ser.
Os tons claros da casa davam uma boa iluminação, além das muitas
janelas imensas nos cômodos.
Não sabia como agir. Assistia à minha noiva, a mulher que eu mais
amava, transando com o meu melhor amigo, Mathews, como se fossem
universitários apaixonados por sexo. Dentro de mim se formava um
sentimento de dor que se transformava em raiva a cada instante.
— Senhor....
Eu diria que Taylor era mais meu amigo do que Mathews; ainda
mais naquele momento. Nós dois viemos de mundos diferentes, porém
sempre o vi como amigo e o ajudava no que precisasse.
— Não sei o que aconteceu, mas acho que o que tem que fazer agora
é relaxar.
— Não vai dar para relaxar. — respondi exaltado. — Você relaxaria
se descobrisse que sua noiva está fodendo com seu melhor amigo?
Não houve resposta, todavia pude ver sua surpresa. Quem não se
sentiria surpreso com algo assim?
***
Chris
4 anos depois
— Estou certa.
— Não vou sair com você, nem agora, nem nunca. Não quero o
seu dinheiro idiota. — Virou o rosto.
— Hum... Achei que você fosse um completo babaca, mas vejo que
tem sentimentos que não sejam apenas por si mesmo. — Levantou uma das
sobrancelhas.
— De mais sete.
Mesmo repetindo o meu mantra de vida, que adquiri depois que fui
contratada pela Arme Technology, Sebastian Smith estava, mais uma vez,
tentando me rebaixar a nada só por ser mulher.
Entre todos com quem já havia tido algum tipo de interação, ele era
o mais educado e simpático. Pelo menos não me olhava como uma estranha
quando falava dos meus projetos e ideias.
Assim que Rodolfo nos deixou a sós, despejei toda a raiva em cima
do idiota intrometido.
Já tinha passado por muito disso antes e durante o meu período ali,
para saber que homens como ele não se importavam com palavras doces ou
pedidos simples, do tipo “me deixe em paz”. Contudo, era sempre bom
reforçar, para que não acabassem fazendo merda.
Ele iria dizer algo, no entanto eu já estava de saco cheio e tinha que
chegar logo em casa. Hoper parecia bem preocupada e nós tínhamos
planejado um jantar, que, no caso, seria pizza e refrigerante.
Era bom morar com minha melhor e única amiga, pois muito do que
eu passava no trabalho, despejava quando chegava em casa. Muitas vezes
seu conselho era: “Você não merece passar por isso. Sabe que pode arranjar
coisa melhor”. Era verdade, todavia eu gostava de morar em Nova York e
estar ao lado dela. Minha vida solitária era triste demais para voltar para ela,
então aguentava tudo e esperava encontrar uma forma de mostrar meu valor
ou talvez outro emprego.
Lembrar-me disso doía... Doía mais do que uma ferida. E ela não foi
a única que abriu um buraco no meu peito. Como eu disse, não nasci com
sorte alguma.
“Não sei como lidar com alguém como ela. Samantha tem uma
inteligência fora do comum, e não sei o que fazer. Sinto muito querida, mas
não.”
***
Como de costume, deixei Hoper falar primeiro, pois ela era a que
mais lamentava entre nós duas. Eu já tinha desistido de fazer isso, já que era
comum coisas ruins me acontecerem.
A morena era assim: bruta, sem modos e bem sem noção. O que me
fazia gostar dela.
— Sabe? Minha ideia está sendo posta em prática e devo dizer que
será um sucesso.
— Sei que você não acredita que possa ser possível, no entanto me
baseio nos pensamentos de quem se apaixona à primeira vista.
— O que foi?
— Você é uma das pessoas mais fechadas que conheço. Seus medos
ultrapassam barreiras nunca vistas por mim, e teme tanto se machucar, que
se recusa a viver. — E lá estava ela, a menina que me julgava. Era a parte
em que discutíamos. — Sabe por que me empolguei ou insisti tanto nessa
experiência?
— Não quero saber. — Joguei de volta na caixa de papelão o pedaço
de pizza e me levantei da cadeira, desejando não brigar por conta daquilo.
O sorriso de deboche que saiu de mim, doía por dentro. Era assim
que eu me sentia quando era alvo das suas pesquisas. Parecia que estava em
uma gaiola, como um rato de laboratório.
— Não!
— Não!
Desejei matá-la por jogar isso na minha cara. Não era fácil me
permitir fazer algo, ainda mais isso.
Era bem verdade que nos últimos anos eu estava sendo uma pessoa
sem nenhuma paciência de sobra. Meu trabalho, por si só, já consumia
muito de mim. O pior de tudo, naquele momento, era estar sentado atrás da
minha mesa de vidro, no escritório da empresa, depois de um dia exaustivo,
ouvindo as idiotices do meu irmão mais novo.
— Sei que é um trauma que se repete desde o ocorrido e que não vai
mais se apaixonar, só que nós dois sabemos o quanto você é infeliz. —
Inclinou-se sobre a mesa. — Joseph, gosto do meu irmão quando está feliz.
Só foca no trabalho, foge de situações que o leva a conhecer alguém e...
***
Ou talvez eu quem fosse um homem frio demais, por achar isso uma
piada.
Bem... Conhecendo Ian, eu sabia que isso era verdade. Ele saía com
modelos, mulheres com vidas de alto padrão. Apesar da beleza de Emma, se
eles tivessem se visto antes, ela não chamaria a sua atenção.
Desejei socá-lo por estar certo. A traição não me doía apenas por ter
perdido quem amava ou meu amigo, como também por ter me perdido no
meio disso. Eu gostava de levar flores à minha noiva, de planejar jantares e
de ouvir sobre o seu dia. Ria de bobagens e esquematizava o futuro como se
isso fosse um complemento da minha felicidade.
Hoje meu futuro é incerto. Nem penso nele, só para não me lembrar
dos planos que fiz no passado e foram destruídos por pura luxúria.
— Ian.
A expressão no seu rosto me dizia que ele não sabia a resposta para
a minha pergunta.
Porra! Por que eu era tão cobrada, e os idiotas que tinham uma
eficiência inferior à minha, não?
Precisava me esforçar duas vezes mais para conseguir algo, para ser
ouvida e ter meu nome em trabalhos que eu criava.
— Você tem que ser mais aberta, Samantha. — tentei imitar a voz
de Hoper, que, nesse instante, era irritante. — Não vai te matar aparecer lá e
conversar com alguém. — continuei.
Meu intuito não era namorar. Deus me livre! O problema era a
minha curiosidade. Meu lado cientista gritava, dizendo que eu estava sendo
dura com a ideia.
Eu iria sussurrar que isso não iria acontecer comigo, mas resolvi
deixar minhas palavras irônicas para Hoper. No fim, assinei e devolvi o
papel à mulher, no balcão. Recebi um número e achei isso estranho, porém
depois me foi explicado que cada encontro aconteceria em uma sala
diferente. Segui até a minha, sem esperança de sair dali sem uma dor de
cabeça. Fui eu quem escolhi ir.
Vamos! Não será tão difícil. Não veio aqui em busca de um amor.
Pense que será uma conversa comum com um estranho no bar. — falou a
menina dentro de mim. — Um estranho no bar! Um estranho no bar!
— Sofre da mesma ideia louca de odiar e não saber por que está
aqui? — perguntei assim que fechei a porta, seguindo para o que pensei ser
uma cadeira. Descobri que era uma poltrona macia. — Acabo me
perguntando se faz parte da experiência causar tal confusão nos
participantes.
— O que posso dizer é que torço para que isso acabe logo. —
respondeu, fazendo-me rir.
— Fui alienado por todos ao meu redor. — disse ainda com rispidez.
— Pelo que dizem, sou triste e solitário. E com base no que as outras duas
mulheres disseram antes de você, sou arrogante e mereço ficar sozinho.
— Não faz sentido você ser a melhor e ser roubada dessa forma.
Uma pergunta que eu me fazia sempre era: “Por que eu tenho que
passar por isso, e eles não?”
— A única coisa que sei é que ser mulher em uma empresa
majoritariamente constituída por homens é difícil. — lamentei.
— Tenho algumas opções, porém teria que sair de Nova York. E não
é o que quero neste momento. Mas, e você? O que faz da vida?
Sua resposta não veio rapidamente. Não achei que estivesse sendo
intrometida, já que tinha falado bastante sobre o meu dilema.
Apesar de eu não o conhecer e não desejar nada com ele, não achava
que diria isso para agradar alguém que não tinha interesse algum em flertar.
— Não mesmo!
— Posso dizer que é a minha forma de burlar a vida, que nunca foi
legal comigo.
— Gosto muito, porém não acho que terei um filho, já que não sei o
que é ser mãe.
Ele não precisou dizer em palavras pelo que passou, para que eu
soubesse que foi traído por quem um dia amou. Eu não passei por algo
assim, entretanto as decepções que tive, também me marcaram.
De forma alguma queria estar naquele lugar, porém sabia que se não
fosse, Christophe não me deixaria em paz. A ideia era passar, no mínimo,
meia hora lá. Depois eu o diria que fui e odiei. No entanto, quando eu
estava prestes a ir embora, a voz daquela mulher chamou a minha atenção.
Não foi nada romântico, entretanto expressou o meu sentimento naquele
instante.
Admito que fui rude e grosseiro com as mulheres com quem tive
uma breve conversa antes, mas que Samantha despertou em mim uma
simpatia fora do comum.
Uma hora mais tarde percebi que tinha me deixado levar pelo
momento, e depois não consegui tirá-la da minha cabeça mais. O pior de
tudo era que eu não sabia quem ela era, e desejava, fortemente, voltar
àquela sala — o que tinha prometido não fazer de novo — só para ter a
oportunidade de encontrá-la mais uma vez.
Não notei quando Taylor saiu com o carro. Como estava pensativo e
em dúvida, mal podia perceber as coisas ao meu redor.
Eu sabia que não deveria tratar as pessoas dessa forma, contudo não
conseguia controlar minha boca, nem meus pensamentos quando me sentia
acuado.
— Acho que deve entrar e tirar as suas dúvidas. Sei como ficará se
não fizer isso: vai se arrepender por não ter tentado ou acabado com sua
curiosidade.
Ele não era a pessoa que exibia um sorriso com facilidade ou era
amoroso. Assim como eu, tinha seus dramas e um passado nada bonito.
— Penso que isso é uma fuga. Só que, desta vez, não vai funcionar
simplesmente se não entrar naquela sala. Se continuarem conversando, sem
interesses mútuos, pode achar uma amiga ou se decepcionar agora e a
esquecer de vez.
Como no dia anterior, não quis saber das outras pessoas ao meu
redor. Mais nove homens participavam desse circo criado e apoiado por
Christophe, e eu não disse uma palavra a nenhum deles. O que demonstrava
a minha arrogância. Não era tão babaca, no entanto não seria simpático com
quem eu não queria papo.
Não seja idiota. Ela não está o esperando nesta sala. Se estiver tão
desconfortável com esta experiência imbecil, como você, não voltará para
uma conversa casual com um estranho.
— É fácil manipulá-lo?
Ela tinha razão, entretanto eu não diria isso com tanta facilidade,
pois acabaria admitindo que gostava da sua presença.
— Você me parece cansado. Seu dia foi tão difícil quanto o meu?
Estava tão distraído, que só fui perceber que ainda estava na sala
escura ao ouvir sua voz doce.
— Eu gosto do meu trabalho, porém lidar com burocracias cansa,
principalmente quando se tem reuniões intermináveis. — Acomodei-me no
lugar. Até parecia que já estava me acostumando à penumbra e à conversa
agradável. — No entanto, lidar com chefes como os seus deve ser bem mais
cansativo.
Eu ri.
— Claro. Tem isso. Entretanto, não é porque você não tem uma
família ou não foi adotada, que deve pensar que não merece ser amada.
— Não é porque você foi traído, que não deva acreditar no amor ou
que não possa encontrar alguém decente. — rebateu ríspida.
Acho que fui tolo ao pensar que poderíamos chegar a uma conversa
agradável assim. Eu não falava muito sobre isso. Sei que a culpa não foi
sua, e sim minha, por ter tocado no assunto.
— Pode ser, mas dava trabalho. — Ainda não podia acreditar no que
ela dizia; não por achar que fosse uma mentira, e sim por ser algo fora do
normal. — Passei por escolhas especiais, tive dificuldade de me manter em
salas de aula, e os professores tinham que trabalhar dobrado comigo. Eu
sabia que não era comum e tentei mudar meu jeito para ser escolhida. No
fim, não dá para esconder o que se é das pessoas.
— Samantha...
— Você disse que foi manipulado. Quer dizer que não queria estar
aqui.
— Então, concorda?
— Acho que sim. Mas saiba que não vai durar para sempre.
— Concordo totalmente.
— Ok, vamos mudar de assunto. Vejo que nossos gostos por filmes
se divergem. — falei com ironia, sabendo que ele odiava isso.
— Você é o meu amigo anônimo. Posso não saber quem você é, mas
não é um estranho para mim.
Ouvi um riso do outro lado, todavia não foi algo que lhe trouxe
humor, parecia mais um deboche.
— É novo e estranho.
O que isso queria dizer? Não, eu não podia imaginar muitas coisas.
Era lógico que ele não queria perder uma amiga. Não significava que...
— Não, só estou surpresa por alguém querer tanto ser meu amigo.
Geralmente, as pessoas fogem de mim.
Não queria analisar cada palavra que saía da sua boca, no entanto
ficava difícil quando elas me deixavam ansiosa e confusa.
***
Passei quase a noite toda pensando nisso e no que faria nesse dia.
Meu peito parecia mais inquieto que o normal, deixando-me furiosa.
1: Você só está assim por conta da situação, não porque gosta dele
em outro sentido.
2: Não é tão difícil fazer amizade. O que está sentindo é algo novo,
pois nunca se permitiu achar um amigo, mesmo que tenha Hoper.
3: Vê-lo não vai mudar nada, só terá uma imagem para associar à
voz.
Foi irritante ver seu sorriso surgir lentamente, assim como o olhar
convencido.
— O que aconteceu?
— Samantha...
***
Achei estranho não estarmos nas salas ainda. Parecia que minha
amiga estava armando algo.
— Me desculpe. Eu não...
Joseph talvez soubesse que fosse eu. Ele não terminou sua frase e
ainda me segurava pela cintura, fazendo com que meu coração ficasse por
um fio. O calor que emanava do seu corpo me possuía, e sua respiração
estava tão próxima, que quase roubava o meu ar, assim como o perfume.
Pigarrei, tentando sair do transe, e me afastei dele, arrumando
minhas roupas, mesmo que ninguém pudesse me ver.
— Isso te incomoda?
— Tem sorte por estar uma penumbra aqui, senão chutaria o meio
de suas pernas. — Cruzei os braços. — Enfim, me perdoe por sair. É que
não estou nada confortável.
— Acho que será bom ver a sua expressão de raiva. Quem sabe nos
conhecermos longe destas pessoas malucas a agrade mais.
Verdade seja dita: eu estava querendo fugir sim. Não era só a sala,
com pessoas conversando no escuro e rindo como se estivessem em um bar,
que me deixava tensa, mas também estar tão próxima a ele e saber que ele
desejava me ver.
Joseph não era um cara com quem sairia para um encontro e depois
teria uma noite de sexo. Sempre que fazia isso, ia embora na manhã
seguinte e nunca mais via a pessoa, no entanto ele era diferente. Se eu fosse
dormir com ele, não iria sumir no outro dia. Na verdade, esse homem
despertou em mim algo novo e assustador que me deixava apreensiva.
Não aguardei por mais palavras suas. O meu desejo era ficar a uma
boa distância dele e esperava que esses segundos me ajudassem a me
acalmar mais. O que seria difícil. A cada passo para longe, meu peito só
reclamava da situação.
Por sorte, em todo o circo montado pela minha amiga, a porta estava
sinalizada. Eu a abri e saí sem olhar para trás, torcendo para não parecer tão
dramática.
Mas você não está aqui por um motivo romântico, sua ridícula!
Agradeci por isso, mas logo notei que havia alguém atrás de mim.
Um imenso arrepio tomou o meu corpo; senti minhas mãos suarem e meu
peito quase explodir de ansiedade.
Quase pisei no meu próprio pé por estar encarando sua boca bonita.
— Sua amiga tem razão. — Ouvir sua voz e a unir à sua imagem me
deixou ainda mais abalada. — Devo confessar que não saber quem era você
me trouxe a este lugar várias vezes.
Não percebi quando Joseph abriu uma brecha. Estava tão nervosa e
ansiosa, que podia ser visível. Algo que odiava. Deixar que as pessoas
vissem o meu interior sempre me levava ao chão.
Capitulo 7
Joseph
Quando a vi, não sabia que era ela, mas foi só ouvir seu nome, que
confirmei sua identidade. Passei tanto tempo tentando imaginá-la, que não
me preparei para a realidade. O pior é que estava nervoso e ansioso para
continuar com nossa conversa, além de curioso sobre como seria as suas
reações tão de perto.
— Não sabe? — questionou com o cenho franzido. Era lindo ver seu
rosto deste jeito, tão de perto. — Não foi com você que conversei todo
aquele tempo?
— Não muda o fato de que não nos conhecíamos e que não nos
encontrávamos há meses, e sim há semanas.
— De forma alguma.
— Tudo bem, se for o seu desejo. Mas não nos conhecemos, com
certeza. As últimas semanas não foram tempo o suficiente para isso. —
falou convencida.
Era lindo ver seu rosto brilhar sob a pouca luz. Eu estava quase
acreditando que essa mulher tinha conseguido mexer comigo com tão
pouco esforço.
— Você me disse que não confia em mais ninguém que não sejam
aqueles em que conta nos dedos. — lembrou-me.
— Não se sinta ofendido por eu dizer que ainda não confio em você,
mas...
— Por que diz isso? — Seu jeito sério de falar demonstrava que ela
estava me questionando, pensando que minhas palavras fossem algo ruim.
***
Desde o dia anterior não parava de pensar nela, de desejar ouvir sua
voz ou ver seu sorriso que tanto me encantou.
Contudo, não tentaria levar esse ódio até o fim e, talvez, perder
minha única oportunidade de encontrar a mulher com quem poderia
realmente ter um amor verdadeiro. No entanto, ela não teria como ser a
Samantha. Ela era boa demais, pura demais, e, com certeza, eu estragaria
isso nela.
— Humm.
Desci antes que ele dissesse mais alguma coisa. Ele não era idiota, e
eu não queria ser confrontado.
— Pelo visto, o dia foi bem cheio para você. — Ele me observou
por cima do copo em que bebia. — Ontem foi seu último encontro com a
mulher misteriosa.
Ian me encarou com um sorriso. No fundo, eu sabia que ele não iria
parar de falar no assunto.
Eu nem pude levá-la para casa. Ela foi difícil, como eu já esperava.
A única coisa que tinha dela era o seu telefone, contudo estava com medo
de parecer desesperado se marcasse algo logo.
Acho que foi uma péssima ideia ter vindo até aqui.
— Eu vim aqui para não ficar irritado, e as coisas ridículas que você
está falando estão me irritando. — falei sério. — Pare de criar ideias
absurdas.
— Está fugindo, é?
— Ok, amigo. Se você diz que não gosta dela, não serei eu quem
vou plantar esse pensamento na sua cabeça. — Levanto as mãos ao ar. —
Me desculpe se estraguei a sua noite, mas, antes que vá, pense no que está
sentindo. Se for uma amizade, continue com ela, e se for outra coisa, não
deixe que a mulher escape e outro a ganhe.
Ele era um cara, um homem legal, meu amigo. Por que eu tinha que
ficar tão mexida e ansiosa só por estar em sua presença?
— Nada demais.
Ele me olhava como se fosse me dar uma bronca, mas eu sabia que
não era isso. Na verdade, eu não sabia o que era.
Devo confessar que pensar assim deixava o meu peito ainda mais
agoniado.
Saí do veículo antes que continuasse a falar bobagens. Era por esse
motivo que eu costumava optar por ser bem-humorada e fazer algumas
piadas quando o clima pesava. Minhas noites nem sempre terminavam de
maneira divertida, mas não por falta de esforço.
Senti meu celular vibrar e o peguei, achando que, enfim, era Hoper.
Minha surpresa foi tanta, que a expressei em meu rosto. Joseph!
“Pelo visto, a sua noite foi tão conturbada quanto a minha. Acho
melhor evitarmos uma repetição, saindo amanhã. O que acha?”
***
— Samantha, que bom que está aqui. — A voz idiota do meu chefe
fez eu me virar com urgência. Ele era responsável pela minha dor de
cabeça. — Hoje começamos a produção de...
— Isso tudo é por causa do bonitão quase trilionário com quem vai
sair hoje?
Não estava com energia para a responder à altura, nem para ficar
irritada.
— Sam, você tem que sair desse lugar. — Veio atrás de mim. —
Está sendo prejudicada de uma forma emocional, e não merece passar por
isso. Sabe que consegue outro emprego em qualquer outra empresa.
— Sim. Mas me garantir com uma patente exclusiva não vai me dar
plenos poderes sobre o que faço. Sair agora vai colocá-los na gaveta, e seria
tempo e dedicação jogados fora.
***
Foi estranho ir até o local no carro dele, com seu motorista gato. O
homem não disse uma palavra depois de explicar que foi me buscar. Eu
nem sabia o que dizer ou perguntar, portanto fiquei calada, mexendo no
celular.
Eu não fazia ideia de onde estava, só via que o lugar era lindo e
gigantesco, com um enorme portão, como daqueles de filmes em que o
mocinho é super rico e mora em uma mansão linda. Ok, não era só o portão
que me dava tal impressão e me deixava de boca aberta, e sim tudo: a
mansão branca, a porta enorme, que achei exagerada, o jardim lindo, o
caminho de pedras e a fonte de água que ficava entre a porta de entrada e o
jardim.
Lembrei-me de Hoper dizendo que eu iria me encontrar com um dos
caras mais lindos e ricos do país e que o vestido era bem melhor. Insisti,
dizendo que era uma mulher simples e que ele sabia disso. Não tinha noção
do quanto era rico.
Olhei-o com mais precisão e quase babei na sua frente. Taylor era
bem alto — quase mais alto que Joseph —, tinha uma pele cor de oliva, os
olhos verdes intensos, o rosto simétrico e irresistível e o corpo todo
definido. Estava um charme nas roupas que usava. Preto combinava com
ele, deixando-o misterioso e um pecado.
Gostei quando seu sorriso se estendeu por uma boa parte do seu
rosto, respirei fundo e andei até os poucos degraus que tinha na entrada.
Logo de cara, eu não sabia o que fazer. Tocar a campainha? Abrir a porta e
ir direto ao ponto? Estava com vergonha de me virar e perguntar ao Taylor,
contudo essa questão foi rapidamente anulada quando um homem, que
devia ter entre cinquenta e sessenta anos, abriu a porta, deixando-me
surpresa.
OK, ele tem uma casa perfeita e empregados para todo tipo de
afazer. Por que me chamou para um jantar? Por que tem interesse em ser
meu amigo?
Já no hall de entrada, deu para perceber o quanto a casa era linda e
chique —, inclusive a escada —, pelo piso de mármore branco, paredes da
mesma tonalidade e detalhes em madeira e em dourado.
Estava tão boba com a arquitetura e beleza dali, que não vi quando o
senhor parou e quase me esbarrei nele. Ele abriu uma segunda porta e me
pediu para entrar no cômodo. Era a cozinha. Quem estava lá? Sim, Joseph.
Além do ambiente ser quase perfeito, o homem que partia alguns legumes
completava esse fato, deixando a impressão de ser um quadro pintado por
um grande artista.
Ainda bem que ele não estava me vendo, pois fiquei desconsertada.
— Ok. Sei que não devo me meter na sua vida, mas quando fico
curiosa, tenho que saciar essa curiosidade. — Bebi um gole do delicioso
vinho e o olhei novamente. Ele estava com um meio-sorriso, observando-
me e me deixando estranha. — Este lugar serve como um brinquedo para a
diversão, tipo aqueles de crianças, só que do tamanho real, ou é algum
fetiche seu ter essa propriedade em mãos?
— Foi um pedido da minha mãe. Ela disse que algum dia vai voltar
para Nova York, porém só quando eu arranjar uma esposa. Eu disse que isso
iria demorar e que nem sabia se realmente aconteceria. — A história se
tornava ainda mais confusa. — Então, ela disse: “Procure uma casa grande,
com muitos quartos. Quem sabe, morando nela, você se sinta tão sozinho,
que saia para achar uma namorada”.
— Ela acha que isso vai funcionar? Ou, melhor dizendo, você acha
que vai?
— Ainda podem existir pessoas que valham a sua exceção e que não
sejam de todo mal.
— Você tinha algum sonho de ser chefe de cozinha, que lhe foi
impedido por conta da responsabilidade de herdar a empresa da família?
Não queria admitir, mas o momento era bom. Estava tendo uma
conversa engraçada e interessante com alguém que não precisava de muito
para me fazer rir. Tudo perfeito: a comida, o vinho e ele.
— Sebastian?
— Ele prejudica não só a mim, como também a eles. Fiz isso para
proteger o meu patrimônio intelectual e trabalho. Tudo que eu criar durante
o tempo em que estiver na empresa, cabe 50% para cada lado, a mim e a
ela. Caso eu saia, tenho o direito de impedir que continuem a produzir o que
eu fiz. Sei exatamente que sou uma formiga se comparada a eles, então,
mesmo se eu conseguir ganhar uma causa judicialmente, meu projeto, que
custou muito tempo e dedicação, será colocado em uma gaveta e esquecido.
E se eles ganharem, mesmo eu tendo assinado o papel, serei excluída, e
aquilo ao que dediquei meu tempo, será usado para beneficiar os idiotas.
Respirei fundo, sabendo que, apesar de isso ser verdade, a única que
sairia perdendo seria eu.
— Por quê?
— Eu sei que pode resolver sozinha. Mas não precisa. Não está mais
sozinha. — Acariciou o meu rosto, fazendo meu coração acelerar como o
motor de uma Ferrari e quase parando a minha respiração. — Prometo que
só vou buscar informações. Nunca te prejudicaria.
Capítulo 10
Samantha
“Não está mais sozinha”. O que ele quis dizer com isso? Foi uma
mensagem escondida ou só um papo de amigos com o qual eu não estava
acostumada?
Uma questão que me tirava o sono era estar naquela empresa, sendo
colocada para trás constantemente. Ficava frustrada e ainda mais magoada.
No entanto, sabendo que poderia sair dela a qualquer momento, sentia-me
amedrontada de perder todas as coisas nas quais tinha passado anos
trabalhando.
Meu dia foi uma merda, apesar de estar empolgada com o ritmo da
produção. Como eu gostava de pôr as mãos na massa, sempre entrava nas
salas de desenvolvimento, fazendo aquilo que tanto me dava prazer: pegar
no material, usar os equipamentos e soldar alguma coisa minúscula. Era o
que me fazia esquecer, mesmo que por pouco tempo, de onde estava.
Muito preocupante. Por que você quer ser alguém para Joseph?
***
— Você não faria isso. Sabe que te mataria durante o seu sono. —
adverti com um pouco de comida na boca. O que me lembrou da outra
noite.
— Não sonhe!
— Não...
— Quer dizer que você pode acabá-la por medo. — Odiava ser
acusada assim. Transformava-me em uma covarde. No fundo, era verdade,
entretanto não quer dizer que eu gostava de ser lembrada disso.
Um mês depois
Confesso que ele não era só um cara normal com quem eu tinha
conversas banais. Joseph se tornou o meu maior e mais confuso problema.
Ele era elegante, sempre me ajudava a sentar à mesa, abria a porta do carro
para mim e beijava a minha mão, olhando-me nos olhos. Também era
engraçado e provocante. Sempre que estávamos juntos, eu não me lembrava
do drama que era a minha vida e ficava balançada o suficiente para desejar
beijá-lo. Com isso, sentia-me culpada e uma fraca.
Eu dizia a mim mesma que nunca olharia para alguém dessa forma e
que não me apaixonaria por ninguém, entretanto não imaginava que um
homem como Joseph pudesse chegar em minha vida e bagunçar tudo dentro
do meu ser. Na noite passada, quando ele me ligou e me convidou para mais
um de seus magníficos jantares feito por si próprio, senti um aperto no
peito. Queria dizê-lo o que se passava dentro de mim, falar que eu queria
ser mais que uma amiga sua, todavia veio à minha mente tudo que
aconteceria se eu fizesse tal burrice.
— Primeiro: Taylor ficaria feliz por saber que tem uma fã. —
Coloquei uma mecha do meu cabelo, que estava deixando na cor natural,
atrás da orelha. — Segundo: eu já estou pronta.
— Eu sou horrorosa.
— Não é como se ele sentisse atração por mim. Só não quero que
me confundam com uma tia-avó dele. — Revirei os olhos.
***
Tive que mandar embora esses pensamentos para não desistir de ver
Joseph. Na verdade, eu queria isso, queria acabar de vez com essa piada.
Ser amiga dele era uma grande piada. Em menos de três meses descobri
que...
— Gentil da sua parte. — afirmei tímida. Dava para sentir meu rosto
pegando fogo. — Acho exagerado. Queria testar algo novo, mas...
Não estava preparado para sentir o que sentia. Ela estava diferente,
usando um vestido que valorizava suas curvas e deixou a franja à mostra.
Sua boca era uma tentação. Notei diferença nas suas expressões, ações, e
fiquei preocupado.
Não pude deixar de rir. Como não havia mais ninguém presente ali,
sua atitude de sussurrar foi engraçada.
— Você o quê?!
— Por que ainda está sussurrando? — fiz o mesmo, bem perto do
seu rosto, sentindo ainda mais o seu perfume. Algo que mexia comigo de
formas inexplicáveis. Eu entendia o que significava, só não queria admitir.
— Não gosto de lugares lotados e desejo privacidade em nosso jantar.
— E o que seria?
Samantha tinha tendência à fuga, só que eu não diria que era uma
medrosa. Muito pelo contrário. Ela era uma mulher forte e determinada de
quem eu me orgulhava, contudo, em relação a sentimentos, sabia fugir e
driblar tais situações.
— Devo confessar que há coisas que são diferentes para nós dois,
mas que não sei por que isso a incomoda.
Novamente, um silêncio entre nós. Ele me perturbava. Eu sabia
exatamente o que desejava dizer, porém esse não era um ponto que me
incomodava. Muitas vezes percebia que Samantha não se sentia bem com o
mundo em que eu vivia, pois o dela era simples e calmo. Algo com que ela
já era acostumada. Era um dos pontos que me botava medo também.
Fuga. Sempre que estávamos em uma conversa séria como essa, ela
fugia. Foi assim que cresceu: fugindo de problemas dos quais achava que
sairia ferida.
— Deus me livre! — Ela estava tão ofendida, que quase dei uma
gargalhada. — Deus faz milagres, mas até ele tem seus limites.
O quê?!
Abri a porta do carro para ela. Os segundos tão perto do seu corpo
fizeram com que meu coração fosse à boca. Eu já tinha me apaixonado
antes. Foi intenso e bom, só que não dessa forma. Era maior, sufocante e me
deixava angustiado e com medo. Embora fosse tão bom, também era ruim,
já que a mulher por quem eu sentia todas essas coisas, protegia-se tanto, que
não se permitiria tentar algo a mais.
Encontro?
Il Mulino!
Pigarrei e arrumei as minhas roupas, sendo que não tinha nada fora
do lugar.
— Devo ir agora. Parece que vocês têm muito o que conversar, e...
— Assim que ela me olhou, não consegui disfarçar o quanto estava
incomodado. — Boa noite, Samantha.
Fiquei com o coração na boca depois que Joseph foi embora não
muito feliz. Nossa noite foi maravilhosa e me fez esquecer de todas as
minhas inseguranças, inclusive do fato de ele ser apenas meu amigo. Suas
palavras e gestos só me confundiram ainda mais.
Que tipo de amigo diz essas coisas, olhando nos olhos e tocando na
mão da amiga, como se fosse uma declaração de amor?
Quis até matá-lo por estar fazendo isso, entretanto confessaria que o
amava. Droga! Eu me apaixonei por ele. O cara mais incrível e amoroso
que conhecia, além de rico e bonito, estava tão alto, no topo, que meu
pescoço doía ao olhá-lo.
— Eu estava lá; ouvi o que disse. Não precisava ser na frente dele,
daquele jeito, e nem deveria ter marcado nada em meu lugar. — Mal
percebi que tinha me aproximado dela, apontando o dedo em sua direção,
bastante furiosa.
Não importava se não era nada demais. Eu tinha a necessidade de
deixar claro que não havia nada entre mim e mais ninguém. Sabia que era
idiota e que aquele “amor” era quase impossível, no entanto, saber que ele
pensava de mim o que minha amiga supôs, deixava-me a quilômetros de
distância de alguma chance de ficarmos juntos.
Era óbvio que isso não iria acontecer entre nós ou com mais alguém.
Minha boca traiçoeira repetia tantas vezes essa afirmação, que se eu o
revelasse tudo o que sentia, seria interpretada de formas erradas. Sem falar
que ele tinha saído ferido de um relacionamento, magoado o bastante para
criar uma barreira enorme entre o amor e o seu coração.
Era idiota da minha parte achar que ele se incomodava com o fato
de eu sair com outro cara, mesmo que esse não fosse um encontro
romântico.
— Claro. Porque ele é o único amigo que posso ter. Não viaje!
***
Príncipes não existem. Pelo menos não iguais aos dos contos de
fadas. E Joseph não era um deles, apesar de ser o cara mais perfeito que eu
já havia conhecido. Ele me deixava tão feliz, que acabava me esquecendo
das barreiras.
Era uma frase simples, sem conter muitos detalhes. As palavras não
escritas doíam mais do que as que enviei.
***
— Fico feliz. — Ele tocou na minha mão que estava sobre a mesa.
— Consegui para você essa oportunidade em Londres.
Não queria deixar que ninguém mais visse o quanto eu estava triste.
Ao abrir a porta, dei de cara com Joseph. Meu coração foi à boca.
Ele não estava feliz e eu imaginava que fosse um sonho louco.
— Você não gosta de... — Literalmente, fui calada por ele, pelos
seus belos lábios macios.
— Joseph, você está aqui! — disse com uma voz aguda, quase me
fazendo bater nela. — Achei que tinha saído com o professor gato, e não...
— dirigiu-se a mim.
Não pude dizer nada. Ele saiu e não disse mais nem uma palavra.
— ELE O QUÊ?!
— Foi por isso que ele veio e marcou o jantar. Richard me convidou
para ser uma colaboradora na sua pesquisa em conjunto com a Oxford e,
além disso, me ofereceu a oportunidade de fazer doutorado lá. Agora vai
achar que quero algo com ele.
— Ótimo. Olha... Eu sei o quanto quer isso, mas... Mas não pode
conseguir o doutorado e perder o amor da sua vida.
— Está exagerando.
— E vai dizer?
— Não sei.
Sentia-me péssima. Duas coisas que eu mais queria, aconteceram ao
mesmo tempo, e tinha que escolher entre meu doutorado e Joseph Morson.
Eu não poderia dizer que não estava pensativa sobre Londres desde
a noite passada, ao sair do restaurante. Era uma ótima oportunidade que me
levaria ao que sempre quis, porém existia uma grande parte em mim que
entendia que se eu fosse, poderia perder a coisa boa que encontrei com
Joseph. No entanto, essa mesma parte achava que eu não teria alguma
chance com ele e que permanecer no país me faria perder uma oportunidade
única.
Ainda sentia em meus lábios o desejo e a sensação boa que foi beijá-
lo. Não foi como nas outras vezes, com os outros caras; foi tão bom, que
não percebi o que fazia até Hoper aparecer e me trazer ao mundo real. Eu
poderia passar horas fazendo isso novamente e acreditava que sentiria o
mesmo que senti na primeira vez.
Não faça isso comigo, Deus! Ele não pode ser mais um babaca.
Não sabia se sua fala era boa ou ruim, contudo decidi respondê-lo
com sinceridade.
Eu diria que estava gostando de ver Phillip suar e ser calado. Era
uma oportunidade única. No entanto, eu não era burra de acreditar que
David gostava de mim ou me respeitava. Não eram muitos os engenheiros
que assinavam cláusulas especiais, como eu tinha feito. Foi um modo de me
proteger. Algo no qual pensei muito antes de entrar ali. Meu conselheiro, na
época, dizia que muitos que trabalhavam nesse ramo eram esquecidos e
jogados no canto da sala, para que só a empresa ganhasse o mérito de um
bom projeto de engenharia. Um detalhe que era duas vezes pior quando
passávamos pela área de tecnologia. Levava meses ou anos, muitas vezes,
para concluir algo como o que fiz. Eu só fui tão rápida porque me dediquei
bastante ao trabalho e não tinha mais nada a fazer.
— Sei que parece estranho o que vou perguntar, mas... Quando a vi,
automaticamente me lembrei do passado. O que me ligou um alerta. —
Encostou-se na cadeira e me olhou sério.
Nunca estive tão ansioso com algo. Na verdade, já fazia quatro anos,
ou mais, que não me sentia feliz assim. Apesar de ter 34 anos, parecia que
era novamente um adolescente apaixonado, empolgado para rever a mulher
que tanto desejava. Dormir à noite depois daquele beijo foi quase um
desafio.
Confesso que fiquei puto ao ler aquela mensagem. Eu sabia que ela
estava fugindo e entendia por quê. Jantar em um restaurante com um ex-
professor poderia ser até comum para pessoas como ela, que trabalhava
com as ciências e tudo mais, no entanto descobri em mim um ciúme fora do
comum que me fez socar tão forte um saco, que quase o estourei.
Não era tão ciumento assim. Pelo menos achava que não.
E foi naquele momento que peguei o que pude e fui até ela,
compreendendo que seria um risco e que eu poderia botar tudo a perder.
Mesmo assim fui.
Taylor entrou desconfiado pela porta. Ele era meu melhor amigo.
Odiava ter que lutar contra seu orgulho e sabia que insistir pelo contrário o
ofenderia.
— Não quero. Mas não o quero mais como meu motorista. — Tomei
um grande gole da bebida.
— Está me demitindo? — Seus quase dois metros de altura e
grandes músculos vieram até mim, fazendo-me achar que seria socado. Eu
sabia que não. Já apanhei dele uma vez, no ringue, e não queria provocá-lo
de novo. — Você é um babaca.
— O quê?
Taylor era difícil de lidar. Sua vida era simples e, quando seu pai
adoeceu, ele precisou tomar a liderança da família e ralar muito. Então, meu
pai e eu os ajudamos em tudo. O problema foi convencê-lo de que tudo o
que fizemos não foi um empréstimo financeiro, e sim uma atitude de
amizade. Eu usaria da persuasão para o convencer a mudar de ideia.
— Que promoção?
— Não aceito!
Ele me olhou por alguns instantes. Não discutiria mais. Eu sabia que
era insistente e que meu pedido não era tão absurdo. Afinal, ele foi o
melhor da sua turma e estagiou em uma das melhores empresas de
advocacia empresarial de Nova York.
***
Sabia que ela estava brincando, usando o humor, como fazia para
sair de situações desconfortáveis. O que me deixou desanimado. Eu não
queria que ela se sentisse dessa forma.
Não estava sendo fácil saber como agir, pois nunca havia estado
nessa situação. Sentia um medo e um receio fora do comum. Eu tinha
certeza total de que o amava, de que esse sentimento estava dentro de mim.
Não tinha como negar. Desejava me jogar de cabeça nisso, porém algo me
deixava com um pé atrás, e não era a falta de interesse nele.
Hoper era a minha amiga, e até ela, no início, teve que lidar com
meu lado medroso. Arriscava-me em coisas comuns, como novas amizades,
um trabalho e tudo mais, no entanto sempre esperando pelo pior. Só minha
melhor amiga conseguiu me dar segurança para amar tanto e pensar que
nossa amizade não acabaria em um piscar de olhos.
Essa era a parte que eu mais odiava, pois não era covarde. Só
quando dizia respeito aos meus sentimentos e a ele.
— Não precisa dizer isso. Sei dos meus defeitos. — Afastei minha
mão da sua, sentindo-me como se ele pudesse ver quão tensa eu estava.
Conversas assim me deixavam desconfortáveis, já que não sabia
lidar muito bem com a tensão em relação ao que sentia dentro do peito.
Senti seus olhos em mim, então deixei de prestar atenção nos carros
de luxo do estacionamento e o olhei de volta.
Na última vez deixei isso de lado, no entanto não podia mais ignorar
esse fato.
— Nasci nesta família. Não pode me culpar por ser quem sou. —
prosseguiu.
— Não culpo. — Eu me senti mal por ele achar isso. Não era a
minha intenção.
Joseph fechou a porta com uma força extra, pegou em minha mão e
me conduziu até o elevador.
— Não é sua culpa eu estar me sentindo assim. Sei que não faz
diferença para você. — continuei.
— Não faz.
Que se dane!
— Claro.
— Não se preocupe. David não aceitou minha demissão, e... essa foi
uma das partes estranhas do dia.
— Era de se esperar, pois você não tem culpa de nada. E ele é muito
correto.
— Está interessada em saber sobre seu novo chefe que não quis
demiti-la?
Eu não queria que aquilo ficasse entre nós. Era um problema meu,
não dele. Entretanto, não controlava meu medo e insegurança muito bem. O
que acabava interferindo nas minhas relações com as pessoas.
— Sei disso, e não quero que essa mulher me impeça, mesmo que
psicologicamente, no que temos e na minha vida. No entanto, é o que
acontece, e não controlo. Quando vejo, já fiz a besteira de me afastar.
— Não faça isso. Esse não pode ser um problema entre nós. — Eu
mal tinha percebido que estávamos tão juntos. Era bom sentir seu corpo. O
que não era possível antes, já que a amizade tanto nos aproximava quanto
nos distanciava. — Ela não está mais aqui. Sei que dizer para a esquecer
pode ser fácil para mim e difícil para você, entretanto, se colocar entre nós
essa insegurança e medo de ser como ela, não sobrará espaço para
tentarmos ser felizes.
— Falei que vim a Nova York por causa dela. E, sim, eu a encontrei.
Toda vez que eu falava sobre o assunto, uma angústia tomava o meu
corpo. Não era para eu me torturar tanto. Tinha sobrevivido — não graças a
ela —, mas era impossível não se sentir rejeitada.
— Eu descobri que ela estava aqui, então vim. Assim que terminei
meu mestrado, deixei Chicago e busquei pela nova identidade dela. Teve
dois filhos e vive em uma casa tão grande quanto a sua. Sempre me torturo
a vendo viver feliz, sem pensar no que deixou para trás. Por isso odeio
pensar que alguém possa imaginar que estou fazendo o mesmo, estando
com você.
— Venha. Você está com fome. — Achei esquisito ele ter ignorado
tudo que o contei.
— Você ficou estranho. Tem certeza de que está tudo bem com o
que eu disse? — Estava realmente aflita.
— Não tem como ficar bem com o que você disse. Sofreu por causa
dela, e ainda sofre, além de se afastar das pessoas por conta disso. Não
estou feliz por saber que você sofre enquanto ela desfruta de uma boa vida.
Não vou deixar que isso aconteça mais.
— Como assim?
— Está me zoando? — Claro que não. Ele era rico e o edifício era
de luxo. Obviamente, isso seria possível. — Eu não fazia ideia de que
prédios de luxo viessem com um restaurante particular.
— Você ainda não viu nada. — disse com um sorriso no rosto. —
Quer saber? Acho que vou tirar férias. E você vai comigo.
— Não. Mas agora, que tenho uma namorada, quero passar tempo o
suficiente curtindo com ela. — Deu um beijo rápido em meus lábios. — Sei
até para onde irmos.
— Quando tira?
— Pela lei do estado, você tem esse direito. E, como nunca tirou
nenhuma, pelo que disse, tem também o direito de pedir essa rescisão
quando achar necessário. Quero passar uma semana longe de Nova York,
com minha namorada.
Dias atrás
Por incrível que pareça, ele entrou na sala assim que o mencionei.
Ele riu como se eu tivesse contado uma piada. Depois que viu que
não era, olhou-me como se eu fosse louco.
— Relaxe! Vou tirar uma folga, viajar. E Taylor estará aqui quando
precisar.
***
Samy estava furiosa quando chegou à sala, segurando algo que não
dava para identificar o que era.
Não pude deixar de rir. Minha namorada estava linda e, cada vez
que a olhava, tinha a impressão de estar ainda mais.
Não queria ter que admitir, mas estava empolgada com a viagem
surpresa. Nunca tinha me arriscado a sair do país. Na verdade, nunca havia
tido um porquê ou uma motivação suficiente para isso. Sempre me diziam
que eu era muito racional e que não aproveitava a vida. Minha maior crítica
era Hoper. Foi só eu mencionar as palavras “férias” e “viagem” em uma
frase, que ela se levantou no mesmo minuto do sofá e se empolgou como se
fosse ela a ir em meu lugar.
O pior não foi aceitar ir à viagem com meu namorado lindo e sexy
ou fazer compras; difícil e vergonhoso foi ver a quantidade de coisas que eu
iria levar para ficar uma semana fora. Por sorte, notei o exagero de Hoper e
a fiz diminuir a quantidade de coisas nas malas. No fim, sobrou apenas
uma, apesar de ser enorme.
Pensei que poderíamos estar indo a algum lugar dentro dos Estados
Unidos e que fosse melhor utilizar esse meio de transporte para chegarmos
lá mais rápido. Contudo, logo que ouvi o piloto falar sobre 5 a 8 horas de
voo, fiquei confusa e impressionada.
— Não sou idiota. Sei que ela comentou sobre o meu aniversário.
Todo ano faz um drama.
— Eu odeio que ela faça todo um drama por conta disso. É um dia
comum, que, por um acaso, foi no qual nasci. Não tem nada demais, nem é
importante. — expliquei com um pouco mais de raiva do que gostaria. —
Me desculpe. Não quis ser dramática também.
— Você vai?
— É uma surpresa.
Ele riu.
***
Revirei os olhos com um sorriso no rosto. Ele era tão clichê, que
acabaria me deixando boba com coisas que eu sempre dizia odiar.
O sol ainda estava radiante e eu fiquei de boca aberta assim que pus
os pés no primeiro degrau da saída. A ilha não era pequena, tinha uma
montanha ao longe e a praia não ficava muito distante da pista de pouso.
Havia um carro à nossa espera, deixando-me ainda mais impressionada.
Havia árvores e muito verde. Ficava lindo em contraste com a cor do céu e
do mar.
— Acho que a conheço o bastante para saber que isso nunca vai
acontecer. — ele respondeu, trazendo-me à realidade, e depois estendeu a
mão para mim, ajudando-me a descer. Eu já nem me lembrava do que
estávamos falando.
Partimos para algum lugar que, com certeza, era lindo. Essa ocasião
parecia um sonho maluco. Se alguém tivesse me dito, há meses, que estaria
passando por isso, não acreditaria. Mas aqui estou eu, ao lado de um
magnata do petróleo, em um resort particular, em uma ilha, completamente
apaixonada por ele.
— Ficaremos aqui. Não quero ter que passar os dias a sós com você
no hotel da ilha. — Ah! Então, tem um hotel. — Além disso, aqui é bem
quente. Não quero que nenhum tarado veja minha namorada sem peças de
roupas importantes. Só eu posso ver.
— Quem disse que vou passar os dias sem roupas? — Tentei não rir
da sua cara de safado.
— Acredite: vamos estar sem roupas em vários momentos da
viagem. — Veio até mim e me beijou.
Capítulo 19
Samantha
A noite estava até ficando mais fria e, do nada, senti meu corpo
sendo preso por braços fortes. O beijo na minha nuca me deixou arrepiada e
eu quase tive um infarto pelo susto que levei.
— Achei que tinha ido embora sem mim. — Virei-me, com ele
ainda me abraçando e me analisando como se quisesse descobrir no que eu
estava pensando.
— Nunca faria isso. Estar com você aqui é tudo que mais preciso.
— Ainda tinha medo de pensar que era um sonho. Como poderia ser real, se
era tão perfeito? — Na verdade, estava preparando os detalhes do nosso
jantar. Hoje vamos ser servidos, e exigi que os responsáveis vão embora
assim que isso acontecer.
Com nossos dedos entrelaçados, ele me guiou para fora da casa, que
era maior que a de dois andares onde eu morava com Hoper. A noite estava
linda e o céu estrelado. Havia luzes pelo caminho de pedras e em um lugar
não muito longe da casa, com uma mesa também. Fiquei encantada.
Depois que se sentou em seu lugar, ele me encarou. Lidar com isso
antes do nosso início do relacionamento era fácil. Minha mente não
matutava a todo instante se ele estava gostando de mim e do que eu vestia,
no que estava pensando e se eu faria algo para estragar as coisas.
— Não é com tanta frequência, mas tem coisas com as quais eu não
concordo e você concorda, e vice-versa. Seu temperamento não me irrita.
Na verdade, gosto quando fica irritada.
— Não diga uma coisa dessa. Posso mandar todos irem embora. —
O sorriso safado na face dele me deixou envergonhada e, inusitadamente,
excitada.
Não era a primeira vez que me sentia tão atraída por ele a ponto de
poder agarrá-lo, só que dessa vez era mais real e forte. Eu tinha a
expectativa de que, no fim da noite, estaríamos pelados na cama.
Estava tudo tão perfeito, que surgiu uma ansiedade no meu peito.
Tentei me livrar do medo criado pelo meu cérebro idiota, que,
constantemente, boicotava a minha felicidade.
Não queria dizê-lo que, mais uma vez, estava com receio de que
acabássemos, então expulsei esse pensamento e sorri.
Ele pegou em minha mão e a beijou sem dizer uma palavra sequer.
Seus olhos me fitavam, levando-me a entender sua mensagem silenciosa,
dizendo que tudo ficaria bem. Eu tinha que mudar. Não extremamente, para
me adaptar a situações assim, mas a respeito dos meus pensamentos e
medos. Sempre me diziam que o medo poderia estragar as coisas e levar
embora aquilo que nos fazia feliz. E era verdade. Perdê-lo quando tanto o
amava seria minha destruição.
Não o respondi, apenas peguei sua mão e caminhei com ele para
longe da mesa. Seguimos pelo caminho de pedras até um sofá que ficava de
frente para a praia.
Ele disse que estávamos em um resort, mas até então não o tinha
visto. Talvez a ilha fosse maior do que eu imaginava e que esse local
estivesse bem longe.
— Funciona assim: eu falo algo que nunca fiz. Se você não fez, não
precisa beber, mas se fez, tem que beber o vinho e contar como aconteceu.
Ele riu.
— Minha língua fica solta quando uns mililitros entram pela boca.
— confessei.
— Foi logo depois que descobri a traição. — Não estava feliz com a
confissão. — Bebi muito, quebrei algumas coisas e pedi para ver minha ex-
noiva. Acabamos transando naquela noite. Mas foi a última vez.
— Ficaram juntos depois que ela te traiu? — perguntei irritada,
sendo que não deveria estar. Era uma coisa que tinha acontecido bem antes
de ele sonhar em me encontrar.
Não seja ridícula! Ele não gosta dela. Aquela vadia o traiu.
Então, por que ele ainda permite que ela trabalhe com ele?
— Você nunca disse exatamente por que ela ainda trabalha para
você. — comentei espontaneamente. Nem queria puxar esse assunto,
entretanto não consegui fechar a boca. — Ainda deseja vê-la todos os dias?
— Não sei. Você acabou de dizer que transou com ela depois do que
viu.
— Eu estava alucinando. Hoper falou que era uma boa ideia e que
eu ficaria sexy, então fui fazer. — Estávamos tão bêbadas, que fomos
andando até um amigo dela que não me parecia confiável. — Bem que
dizem que tem que fazer essas coisas estando sóbrio. Até hoje quero
esquecer, mas é só tirar as roupas, que me lembro desse dia.
— Ficou ruim?
Ele riu.
— Quer ver? — Olhei em seus olhos. — Vou ter que tirar as roupas.
— Achei que não tinha mais como melhorar a noite, mas com você
é sempre uma surpresa boa. — Beijou-me.
Antes mesmo de abrir os olhos, pela manhã, senti que o dia seria
maravilhoso; não só por estar perto da praia, mas por ser acordada por
beijos e carícias do meu namorado romântico. Antes do café, ele me deu
uma motivação a mais para começar o dia. Sexo para dormir e depois de
acordar era novo e estimulante. Nunca pensei que ter um relacionamento
significasse estar tão relaxada e feliz. Por mim, passaríamos mais tempo
sozinhos, trocando beijos e fazendo coisas a mais, porém ele tinha outras
ideias.
Saímos da casa para dar um passeio pela praia. Achei que teria mais
pessoas ali, contudo não encontramos ninguém.
— Tem certeza de que não tem mais pessoas aqui, nessa ilha? —
Olhei para os lados e não encontrei ninguém. — Parece que estamos
naqueles filmes em que o casal se perde no mar, para em uma ilha
paradisíaca e fica lá para sempre.
— Não vai ter a praia, nem a paz do silêncio, mas acho que sim.
Não dá para apagar o amor dentro de nós. E, enquanto ele existir, nada vai
mudar.
Ele riu.
Demorou tanto para, enfim, eu ter algo tão bom e satisfatório, que
tinha medo de que acabasse em um piscar de olhos e a culpa fosse minha.
— Fale sobre sua família. O máximo que disse não foi tão revelador.
— Peguei os talheres e parti a carne macia que foi servida.
Os trinta minutos seguintes foram bem mais animados. Ele falou das
melhores partes da sua infância. Sempre imaginei que os seus pais tivessem
criado os filhos da forma mais fina e protetora possível, todavia Joseph e
seu irmão viveram como crianças comuns, correndo e sujando as roupas
chiques.
***
Depois que voltamos do jantar, tivemos uma noite mais que ótima
juntos. Ele era tão carinhoso e sexy, que não precisava de muito para me
encantar ou despertar o meu desejo. Um olhar, e já me ganhava, já me tinha
sob sua mão. Isso tanto me animava, quanto assustava.
Não seja boba. Ele está aqui. Pela primeira vez, você não está
sozinha.
Eu saí do quarto e a primeira coisa que senti foi o aroma bom que
vinha da cozinha, fazendo meu estômago roncar. A passos curtos, andei até
lá e vi suas costas largas. Ele demonstrava estar animado, e nem isso me
deixou menos triste, contudo disfarcei quando ele se virou e me encontrou.
— Bom dia. — Veio até mim e beijou o meu rosto. — Espero que
tenha dormido bem.
— Muito bem. — menti, não querendo olhar para outro lugar que
não fosse ele. — Está contente!
— Estou em uma ilha paradisíaca com uma mulher linda e
maravilhosa. O que mais devo querer para ser feliz?
Joseph me fez rir, embora, por dentro, eu não estivesse com muita
motivação para isso. Percebendo algo, ele me analisou como se tentasse
adivinhar o que se passava em minha cabeça, pelo seu olhar.
— Falei que não a lembraria e que faria de tudo para mudar o que
sente sobre esse dia. — Pegou carinhosamente a minha mão que estava em
cima da mesa. — Mas está mal e tenta esconder de mim. Não vou insistir,
claro... — Inclinou-se e beijou o meu rosto. — Porém, odeio que esteja mal
e que eu não saiba como mudar esse fato. — sussurrou perto do meu
ouvido.
— Se você não está bem, eu não estou bem. Então, fica nas suas
mãos, querida. — Levantou-se e pegou algo da bancada. Estava tenso e
preocupado, deixando-me ainda mais chateada comigo mesma. — Sei que
não queria tocar no assunto que mais odeia e deseja esquecer, só que a
minha cabeça não consegue, de forma alguma, entender o que de tão ruim
pode ter acontecido para que você odeie tanto o dia do seu aniversário.
— Não.
***
Depois do que falei, Joseph mudou por alguns minutos, aposto que
pensando no que houve comigo e no que eu disse. Eu me preocupei com
que a revelação tivesse estragado tudo, a nossa viagem. Mas depois, quando
ele percebeu que eu o olhava enquanto estávamos perto de uma enorme
piscina, tomando bebidas alcoolizadas de frutas, mudou. Estragar as coisas
entre nós era tudo o que eu não queria.
Nosso dia foi ótimo, com atividades. Fomos para o mar aberto e
nadamos perto dos corais, todavia não me diverti como o planejado. Eu
diria que meu “medo” de me afogar veio de um pequeno “acidente” em um
dos meus lares adotivos que não deram certo, e até então me julgava por
não abandonar tal receio.
— Minha mãe virá para Nova York. Não sei exatamente quando,
porém sei que vai querer conhecê-la no mesmo dia em que pôr os pés na
cidade. — Sua frase me deixou ansiosa e um pouco nervosa.
Eu tinha uma quantidade de taças para cada risco. Uma e duas não
era ariscado; eu sabia o que dizer e como agir. Era a partir daí que as coisas
mudavam. Três revelariam fatos sobre mim que, normalmente, não diria
com tanta facilidade, e me faria subir em cima do meu namorado, como se a
lenha do fogo estivesse dentro de mim. Quatro era uma zona de risco. Não
falava nada que me deixasse em uma saia justa, nem cometia algum
assassinato, no entanto já teve vezes em que disse ou fiz coisas que me
deixaram constrangidas. Da quinta em diante, para alguém que não tinha
costume de beber álcool, a situação complicava. Eu fazia e dizia coisas que
eu não me lembrava depois e que me deixavam, enfim, em saia justa.
O pior era que ele sabia que eu estava ansiosa. Por isso o sorriso
convencido.
A cada vez que ele chegava mais perto de mim, tocando em meu
corpo, mais me deixava ansiosa e excitada.
— Joseph.
— Sim?
— Acho que vou trabalhar tanto, que ficará difícil encontrá-la como
eu gostaria. — Seu desânimo era também o meu. Já pensava nisso até antes
de entrar no avião. — Não queria ter que voltar, mas não posso deixar tudo
para lá e me esquecer dos meus deveres, apesar de querer muito.
Seria difícil não dormir e acordar ao seu lado. Uma semana foi
capaz de mexer comigo de uma forma assustadora.
— Prometo que assim que estiver tudo em ordem, se meu irmão não
estragou tudo, voltaremos a nos divertir só nós dois. — Conhecia sua
expressão facial. Era aquela que ele usava quando queria ser um safado
engraçado.
— Acho que você tem que ir resolver o que tem que resolver.
Assim que ele partiu, subi os degraus e abri a porta, sentindo como
se meu corpo pesasse.
***
Essa lógica não convencia o meu coração, que já sentia a sua falta,
porém deixei passar essa.
Ah, não!
“Sim. Mas prometo que vou dar um jeito de sair correndo daqui e ir até
você. Se isso não acontecer, é porque me enviaram uma pilha de
documentos que, provavelmente, vou levar para casa e terminar o quanto
antes.”
“Já. E tem razão. Porém, quem faria esse trabalho por mim?”
“Não sei, mas espero que isso não roube o meu namorado de mim, ou
terá grandes problemas, Morson.”
— Fiquei sabendo disso. Por isso estou aqui. — ele respondeu com
firmeza, arrumando o terno fino e se aproximando. — Bem... Relatado o
problema, acho que você já pode ir, Sebastian.
— Não. Não vim aqui para isso, menina. — Fechou a porta da sala.
— Disputa? Que tipo de disputa? Eu estava fora por uma semana e...
— Eu comentei com alguns que você era a pessoa mais apta para
ocupar o cargo de chefe do setor de criação e produção da empresa. Cargo
esse que era de outro funcionário, que acabou saindo por conta do que
descobri.
— Vamos parar com a produção dos chips por agora. Ache o defeito
e o conserte. Vou colocar alguém para investigar isso também. —
Levantou-se.
— Também?
Fiquei preocupada com o que ele disse. Isso nunca tinha acontecido
comigo, no entanto não colocaria a minha mão no fogo por Sebastian. Ele
sempre tentava ser melhor que eu e já despertava interesse pelo cargo,
mesmo eu não o querendo.
***
Peguei minhas coisas com tanta raiva, que elas quase caíram da
minha mão. Bufando de raiva, saí do prédio, e nem notei que me
observavam no escuro. Só me dei conta disso quando estava praticamente
dentro do meu carro.
Nós nos encaramos por um tempo, até que eu baixei a guarda. Ele
não era culpado pela minha dor de cabeça.
***
Tudo que eu mais queria fazer desde que voltei, era dormir com meu
namorado e sentir aquele conforto e paz de antes, no entanto não foi
exatamente o que aconteceu. Joseph estava ali, beijando-me, abraçando-me
e tentando me fazer esquecer das coisas, como sempre. Mas não funcionou.
Eu não conseguia parar de pensar no que estava havendo e tentava achar
respostas que eu já sabia.
— Vou resolver isso hoje e, com certeza, dormir bem nesta noite.
Isso se você estiver aqui.
— Sua mãe?!
— Abigail.
— Abigail. — repeti.
Quando o meu celular apitou, meu coração foi à boca, por ver as
horas e de quem era a mensagem. Joseph!
***
— Você dizer isso não fará com que eu pare de pensar no que de
errado pode acontecer.
— Se ela me odiar, você ainda vai ficar comigo, porque teremos que
conversar sobre isso.
— Não tem como ela te odiar. E, mesmo que isso pudesse acontecer,
não anularia o meu amor.
Depois que fechei a porta, meu coração ficou ainda mais apreensivo.
Joseph tocava em outros assuntos, querendo me fazer relaxar ou me
esquecer dos receios. Ele conseguiu por um momento, até que avistei o
portão chique e a casa enorme, elegante. Meu coração foi à boca. Era
ridículo estar assim. Sempre fui confiante, mas era como se tudo que tivesse
relação com meu namorado, trouxesse-me uma insegurança do fundo da
minha alma.
Descemos do carro e, antes de eu dar um passo adiante, respirei
fundo, dizendo a mim mesma que me bateria se estragasse tudo por medo.
Medo de uma mãe. Talvez fosse por nunca ter me dado bem com essa
palavra.
— Relaxe, Samy. Ela é minha mãe, não uma super vilã. — Deixou-
me só.
Ela me encarou séria. Por sorte, seu filho já estava de volta para nos
tirar do clima estranho.
Nem pude dizer nada, pois sua mãe decidiu contar a história toda.
— Eu não sabia quem você era, só... — Fiquei tímida com os dois
me encarando.
— Joseph, não pense muito nisso. Já passou. E aposto que sua mãe
nunca mais vai ficar em cima de uma faixa amarela. — falei em um tom
brincalhão, vendo-o sério. — Está com raiva?
Gostei de ver seu sorriso. Poderia dizer que ficava mais feliz quando
ele estava feliz.
Ele pegou em minha mão e fomos para a sala de jantar, onde eu não
tinha ido antes. Abigail arrumava algo na mesa enorme e repleta de taças,
pratos e talheres. Até parecia que uma dúzia de pessoas jantariam.
Pensar era mais fácil do que fazer. Era a primeira vez que eu estava
me apresentando como namorada de Joseph, porém não era a primeira vez
que eu tinha que impressionar para ser aceita na família de alguém. Passar
por várias famílias adotivas não foram as melhores experiências da minha
vida. Sempre me via como um objeto que deveria agradar e não poderia
errar, senão voltaria para o orfanato.
Eu não era mais uma menina, era uma mulher, no entanto não
ajudava muito saber disso. E o pior era que dessa vez eu não podia falhar,
ou perderia aquele que mais amava.
Isso não é para ser adotada, é pelo Joseph, pelo amor que ele criou
dentro de mim. Não posso sair daqui sem saber que não vou voltar para o
orfanato e ficar sozinha outra vez.
Eu queria bater nele para que calasse a boca, mas não fiz nada.
— Não estou sendo rude, só... Sei que ela sabe de muito, mas que
está buscando alguma informação a mais. Não é, mãe? — Estreitou os
olhos.
— Tudo bem. — falei antes que ele dissesse algo. — Sou mais
reservada, no entanto estamos aqui para nos conhecer. E não tem nada
demais em conversar com sua mãe, Joseph. — Eu botei a mão sobre a sua e
ele me encarou, buscando uma resposta silenciosa.
Sua resistência era por causa de mim e por ser a sua mãe a perguntar
sobre a nossa relação. Ele era reservado e não gostava de falar muito sobre
nós, assim como sobre sua família. Achei que fosse eu a pessoa tensa que
poderia estragar a noite, mas notei que meu namorado estava tão inseguro
quanto eu.
Quando percebi que Abigail nos observava, tirei minha mão da dele,
sentindo-me constrangida; não por fazer algo errado, e sim por fazer na
frente dela.
E daí que é a mãe dele? Você é a namorada; não tem que sentir
vergonha.
— Viu? Não tem que me tratar como uma intrusa. Só quero
conhecer a mulher que será a mãe dos meus netos.
— É, eu sei.
— Ele ama você. Não tem com o que se preocupar. — afirmou com
tanta certeza, que me impressionou. — Ele está na defensiva por achar que
vou te assustar. Conheço o meu filho.
Achei que a noite poderia acabar assim, com tudo perfeito, mas
então Joseph voltou estranho, pensativo e de cara fechada. Ao se sentar em
seu lugar, não olhou para mim.
Meu coração quase parou de bater. Tinha algo errado, eu fiz algo
errado. Joseph não me perguntou nada, não me olhou um segundo sequer
desde que retornou e estava acabando com a nossa conversa, sem
explicação.
— Fiz algo de ruim? Falei alguma coisa que não devia? — perguntei
preocupada. Joseph nunca havia feito isso comigo, nem me ignorado ou
sido tão frio, como estava sendo. — Fale alguma coisa, Joseph! — Estava
me controlando para não gritar.
Pelo menos quando ele me olhava, não era ódio o que eu via.
Porém, saber que ele estava magoado comigo, não me alegrava. Eu nem
sabia o que tinha feito para merecer esse olhar.
— Não quero brigar. Não sou de brigar, nem quero perder você, mas
te trazer aqui não significou apenas um jantar comum. Eu a apresentei à
minha mãe e quero você na minha vida, na família. Não vou suportar se me
esconder coisas.
— Não vou para Londres. Não cogitei te dizer isso porque não valia
a pena. Até tinha me esquecido dessa proposta, porque estava com você,
feliz, em paz. E agora você está me expulsando.
— Quero que vá. Sou um idiota por confessar isso, mas não quero
que fique e se arrependa, que me odeie algum dia por ter desistido de seja lá
o que for, por minha causa.
O meu tempo sem reação o fez questionar sobre seus atos. Vi isso
em seus olhos azuis.
Deixei tudo de lado e tomei uma atitude. Tudo poderia estar uma
bagunça, mas era só beijá-lo, que o resto sumia, os problemas não existiam,
as barreiras eram derrubadas e as dúvidas respondidas. Foi o que busquei
quando o agarrei, e nem me importei se estava quase na porta da sua casa,
com sua mãe lá dentro. O calor do seu corpo, a maciez dos seus cabelos e o
desejo no beijo me tirou o fôlego. Não poderia imaginar que amar fosse tão
bom e que preencheria o vazio do meu peito.
— Tudo bem.
Capítulo 23
Samantha
3 meses depois
Ok, achei uma coisa que não estava tão perfeita. Hoper disse que a
troquei pelo meu namorado. Coisa que era um absurdo, pois continuávamos
as mesmas, com nossas conversas diárias, ouvindo os problemas uma da
outra e tudo mais. No entanto, ela ainda tinha ciúme, embora torcesse por
nós.
— Está com a cara fechada porque não gosta de festas e está
odiando ir comigo? — meu namorado perguntou, trazendo-me de volta à
realidade.
Ele riu.
— Eu sei. Mas foi por causa de Hoper. Ela disse que te odiaria se eu
não aceitasse.
— Ela disse que depois que foi para Londres, você fez uma lavagem
cerebral em mim e que agora somos como unha e carne. Coisa da qual ela
não gosta em nada. — Eu ri tanto quando minha amiga disse exatamente
isso, que ela ficou de cara fechada o dia inteiro.
— Sim.
— E que ser unha e carne é uma coisa normal?
— Sim.
— Sim.
Eu ri mais ainda.
— Foi por isso que pedi ao Taylor para a ajudar em uma questão
jurídica em relação aos seus experimentos e formulários.
Desde sempre, minha amiga tinha uma queda pelo homem lindo e
musculoso, que, por coincidência, era o melhor amigo do meu namorado.
Entre os dois havia uma tensão, uma química, então pensei em dar um
empurrão.
— Não foi o que falei. Mas devo avisar que Taylor não se dá bem
em relacionamentos. Eu diria que, assim como você, ele foge e cria
situações que o leva na direção oposta à que estamos agora.
— E você acha que sua amiga tem cola o suficiente para colar
Taylor?
— Você fez isso, mas não teria conseguido sem a ajuda dela. Na
verdade, não teria uma chance sequer para tentar. — Eu gostava de
provocá-lo, e ele de ser desafiado.
Era claro que ele só estava brincando; não era um pedido. Além
disso, ainda era recente a nossa história de namoro, embora eu o amasse e
desejasse passar o resto da vida com ele.
Como eu queria agarrá-lo e o beijar sem ter que ser observada por
ricaços mimados e idiotas que achavam que tudo tinha que ser perfeito e
que demonstrações de afeto entre duas pessoas que se amavam, em público,
seria considerado inapropriado.
Não podia negar que ver meu chefe em um evento como aquele era
assustador.
Queria me virar para ver o que o abalava tanto, mas ele se foi
rapidamente, sem me dar a oportunidade de saber mais. Achei besteira me
importar com isso.
Entrei em uma das cabines para fazer xixi e ouvi alguém entrar no
banheiro. Tranquei a porta e fiz o mínimo de silêncio possível, como se não
quisesse ser vista por ninguém. Estava começando a achar que era uma
paranoia minha.
Eu tive que me segurar para não cair, porém o mesmo não aconteceu
com minhas lágrimas, que, por vontade própria, foram derramadas sobre o
meu rosto. Achei que tudo aquilo fosse um dos pesadelos que,
constantemente, perturbavam-me, só que a dor em meu peito confirmava a
realidade.
Não sabia se era verdade o que ela dizia e se era de mim que falava,
apenas tomei essa dor sem precisar de muito.
Cora estava tão surpresa quanto eu. Ela era fria, amargurada e
odiava tudo, até ela mesma. Com certeza faria um aborto. Talvez não fosse
eu a criança de quem ele falava. A minha história começou depois disso,
com o pai sobre quem minha avó sempre me contava antes de morrer.
Não?!
— É uma menina.
— Eu não sei onde ela está. Juro que tentei encontrá-la e que voltei
para a procurar depois de um tempo. Não a encontrei.
— ANTES DE ABANDONÁ-LA?!
— VÁ LOGO!
Comecei a ficar desesperada. Não tinha como ele saber que era eu,
mesmo com meu nome e minha semelhança com Cora. Não tinha como.
Entretanto, algo me dizia, pelos seus olhos desesperados, que sabia sobre
mim.
Pensava que aquela seria uma noite como outra qualquer: encarar
uma dúzia de homens falando sobre negócios, família e dinheiro. Nada do
que eu já não tivesse visto. No entanto, enganei-me ao achar que voltaria
para casa com minha namorada linda e que dormiríamos juntos depois de
um bom sexo.
— Ela falou que ele era seu pai? — indaguei, mesmo sabendo que
ela odiava repetir as coisas.
Não era loucura imaginar que Samantha Still era a filha de David
Lancaster. Eu só estava surpreso.
Eu não queria que ela sofresse ainda mais por conta desse assunto
delicado de se tocar.
— Eu nem deveria estar aqui. Ele nem sabe quem sou eu. Posso
estragar tudo. E se ele achar que eu sabia e que planejei tudo isso? E se…?
— Samy, o David não vai pensar nada disso. — Tentei acalmá-la ou,
pelo menos, parar sua imaginação fértil. — Você nunca pensaria em fazer
mal a ninguém ou tirar vantagem. É a pessoa mais doce e sensível que
conheço e nunca abaixou a cabeça. Não importa se ele era o seu chefe ou
não; você mesmo disse que ele te tratava diferente. Ele pode não saber que
você é a Samantha de quem Cora falava, mas sabe que não é como ela.
— Só quero ficar aqui apenas para saber se ele está bem. Depois
vamos embora. Não vou dizer nada sobre mim. — falou nervosa.
Eu queria deixar tudo perfeito para ela, para que não se magoasse ou
voltasse a acreditar que estava sozinha, que não merecia tudo que tínhamos
e fugisse novamente de mim. O problema era que nada era perfeito e eu não
podia mudar as coisas. O que me deixava com medo... Medo de perdê-la.
***
Samantha
Não tinha como ficar calma. Há meia hora tinha descoberto quem
era meu pai e Cora descobriu sobre mim. Eu estava em uma sala de espera,
no hospital, enquanto David, que não sabia que eu era a sua filha, tinha um
ataque do coração.
Sim, eu estava com medo... Medo de perder o pai que eu ainda não
conhecia e mais medo ainda de ele me rejeitar, assim como fez a mãe que
eu deveria ter tido.
Fugi de Cora por todos os anos em que estive em Nova York. Ela
estava feliz com sua família perfeita, era muito rica e nem se lembrava da
pobre e coitada menina que abandonou.
Estar cara a cara com ela me deixou enjoada, com o coração na mão.
Desde o momento em que ela foi embora, nós nunca mais tínhamos nos
visto, apesar de eu já tê-la observado a muitos metros de mim.
Nada podia ser tão normal na minha vida. David Lancaster chegou e
me pôs uma sensação estranha, tratando-me como se já me conhecesse. Só
que não sabia sobre mim. E naquela noite descobri o porquê de tanta
estranheza em seu olhar.
Finalmente, pude relaxar e ficar mais calma. Pelo menos ele não vai
morrer por causa daquela bruxa.
— Que bom que ele está bem. — comentei aliviada. — Acho que
podemos ir agora.
— Ok. Vou ouvir o que ele tem a dizer. — afirmei depois de respirar
fundo.
Fiquei em silêncio, assim como ele. O homem, que não era tão
velho assim, observava-me com atenção. Achei que tivesse novamente,
com meus 10 anos de idade, entrando na casa de uma família adotiva. Não
tinha noção do que fazer. Sorria? Ficava calada? Eu sempre estava à espera
de uma luz para me guiar, para ter uma família.
— Eu não sabia. Juro que não sabia. Vim a Nova York por causa
dela e nem sabia que o senhor era o dono da empresa. Até me demiti, mas o
senhor não aceitou. — Achei que deveria me justificar.
— Não estou a acusando. — disse surpreso. — Eu a procurei muito.
Contratei um detetive e busquei por Cora, porém ela sempre me ignorava.
— Quando nos conhecemos, suspeitei da verdade, mesmo achando muita
coincidência, mesmo podendo ser um engano, e não achei muita coisa. Mas
depois do que Cora falou, sei que a menina que passou de casa em casa, em
lares adotivos, é a minha filha.
— Nunca fui escolhida. Eles não me achavam boa para ser filha
deles. Tenho muitos defeitos. — Limpei o rosto.
— Queria ter sido o seu pai desde muito antes. Assim, não teria
sofrido tanto. — Olhou no fundo dos meus olhos. — Não preciso de
confirmação alguma para saber que é minha filha.
— Sempre achei que o que tive e que tudo pelo que passei fosse por
eu não ser merecedora de nada bom. Não me achava boa o bastante para ter
um amor ou ser feliz. Tudo que aconteceu me fez resistir e agradecer pelo
amor que encontrei e tanto me trouxe felicidade. — As palavras saíram sem
que eu percebesse.
— Tem certeza de que não quer que eu fique? Posso colocar outro
em meu lugar. — Era nítida a sua preocupação.
Eu até gostava da atenção que ela me dava, todavia não poderia
deixar que se prejudicasse por algo tão inútil.
— Relaxe, Hoper. Eu não vou voltar a ser a garota chorosa que você
conheceu. — Revirei os olhos enquanto segurava a xícara de café com as
duas mãos. Eu estava sentada à mesa, e ela em pé, na minha frente, com o
cenho franzido e cara de preocupação. — Sabe que não sou mais criança,
né? O que aconteceu foi algo bom, não uma típica tragédia do meu passado.
— Foi uma tragédia sim, mesmo que não fosse tão preocupante
quanto antes. Você descobriu que o seu chefe é seu pai, e que a bruxa que te
pôs no mundo sabe sobre você estar aqui, em Nova York. E...
Nada do que falei, foi mentira. Apesar de estar mexida com tudo
que houve, realmente estava feliz. Finalmente.
Já fazia uma semana que não ia para o trabalho. Não tinha ideia de
como agir ou do que pensar. Pelo menos David Lancaster não se importou
com minha ausência e, talvez, entendesse-a. Mas eu precisava colocar a
cara à tapa e seguir com minha vida.
Tentei imaginar que isso fosse uma fantasia criada pelo medo, só
que não era. Apesar de eu rezar para que seu fantasma sumisse, ela ainda
estava à minha espera.
Não sei de onde veio o sorriso de deboche que estava em meu rosto.
Só poderia ser uma piada.
— Há vinte e um anos, eu era a sua filha, uma menina que não tinha
pai ou qualquer outra pessoa que me desse conforto. Só tinha você. E não se
importou em me dar esperanças ou em me deixar para trás no dia do meu
aniversário.
Como ela teve coragem de vir até aqui se justificar? Pensa que tudo
vai mudar porque se arrependeu? Que vai consertar anos de ausência?
Cora é mesmo uma idiota, sem escrúpulos.
***
— Sabiam que vocês são o único casal que ainda estão juntos? —
comentou Hoper, que estava em nossa frente, segurando papéis e agindo
como se fosse uma psicóloga de casais. — A convivência realmente é
difícil, e vocês conseguiram passar por ela, ficando ainda mais unidos.
— É, vocês venceram.
— Não exagere. Você nem queria nada comigo. Dizia que éramos
amigos. — lembrei-o.
— Verdade. — concordei.
— Ela estava relutante, então eu tive que insistir por nós dois. E,
como você já sabe, Samantha foi difícil, fez questão de ser um desafio.
— Você é bem diferente de mim. Achou que eu iria levar isso numa
boa, sem ter passado por essa resistência antes?
— Não! — neguei.
— Sim! — contrapôs Joseph.
— Até que está sendo bom fazer isso. Apesar de sabermos muito um
do outro e estarmos em uma fase boa em nosso relacionamento, nunca
paramos para conversar sobre essas questões. — disse Joseph.
Essa era a pergunta que eu mais me fazia desde o dia que o conheci.
Nunca imaginei que estaria aqui, sentada em um sofá, conversando sobre
um relacionamento e feliz por ter um homem que me ama. Sempre vivia um
dia de cada vez, sem esperar muito da vida. Contudo, eu passei a fazer
planos. E esses planos incluíam uma vida ao lado de Joseph Morson.
Dizer em voz alta que meu medo ainda não tinha acabado só faria eu
admitir que ainda era a medrosa que ele havia conhecido meses atrás. E
essa era a questão. Sentia-me como se ele soubesse disso e sentisse o
mesmo. Olhar em seus olhos, questionando essa pergunta e ser entendida,
era reconfortante, pois sabia que Joseph queria o mesmo que eu, que temia
e que se esforçava para ganhar a confiança que nós dois precisávamos.
— Não sei o que será do nosso futuro, mas sei que quero ter a
oportunidade de acordar todos os dias ao seu lado. — ele confessou,
deixando-me boba, como sempre.
— Pode preparar o vestido. Essa é a nossa meta para o ano que vem.
— afirmou meu namorado.
Capítulo 26
Samantha
Um ano depois
Para mim, o meu maior sonho era estar em um lugar onde realizaria
todos os meus desejos. Mas não aqueles patéticos ou que são fáceis de
serem realizados, e sim aqueles que nunca achei que alcançaria, pois
pareciam tão absurdos e distantes, que se tornaram uma fantasia. E fantasias
não se realizam com tanta facilidade.
Revirei os olhos por achar que ela estava muito sensível quanto a
isso.
Não poderia negar que meu coração estava quase saindo pela boca.
A cada passo que eu dava, sabia que estava mais perto dele.
No fim dos degraus, David me esperava. No último ano, ele foi uma
das melhores coisas que poderia ter acontecido comigo. Nunca imaginei
que teria um pai me apoiando, dando-me força e motivação. Ele foi tudo
isso e muito mais para mim. Mesmo sendo sua filha e sabendo da minha
capacidade e merecimento, não aceitei de cara a promoção para substituir
Phillip. Uma das coisas que eu não queria era ouvir alguém dizer que eu
estava sendo favorecida por conta da minha ligação com o chefe. Por isso
mostrei do que era capaz antes de, finalmente, subir de cargo.
— Você está linda. — Eu diria que havia um brilho em seu olhar
que me deixou envergonhada. — Espero que Joseph Morson saiba cuidar da
minha filha, ou vou matá-lo se magoá-la.
— Vamos logo, antes que ele pense que desisti. — Peguei no braço
de David.
— Sei que você é um bom homem e que foi quem a ajudou com esta
coisa de relacionamento, mas ela é minha filha, a filha que eu não sabia que
tinha e que agora tenho. Então, acho melhor cumprir com o que vai
prometer neste altar. Caso contrário, é comigo que terá que conversar no
fim. — David falou baixinho apenas para que Joseph e eu ouvíssemos.
Ele riu, encarou-me e pegou a minha mão, que estava sendo
entregue à sua pelo meu pai.
Por fora, eu estava plena, segura de mim, mas, por dentro, estava
quase explodindo. Portanto, esperava que tudo começasse logo, senão
desmontaria na frente de todos.
— Joseph! — Ninguém era tão perfeito, e ele não era essa exceção,
mesmo que muitas vezes eu pensasse assim. Depois de ele me apoiar tanto,
era a minha vez de lhe dar força. — Não espero que seja nada, pois já é
tudo que mais quero. Eu não estaria aqui se não soubesse disso.
Mais uma vez, sendo encarada pelos seus olhos azuis, senti que ele
me dizia um “eu te amo” silencioso.
Fim.
Outros livros dessa autora
A virgem e o bilionário
Emma sempre foi uma garota tímida, que sabe de tudo, mas que não
tem amigos. Quando se formou na faculdade, só pensava em fazer o que
amava e trabalhar tranquilamente na frente de um computador. Mas, em um
dia fatídico, ela é praticamente atropelada por um anônimo que vai embora
sem ao menos lhe pedir desculpa, deixando para trás um único objeto: o seu
celular.
Porém, o problema nisso tudo é que ela não quer ser descoberta e
Ian não descansará até encontrar a única mulher que o desafia e não tem
medo dele; pelo menos na internet.
***
A mentira do CEO: Seduzida pelo chefe
O pior era que eu tinha três meses para provar que era realmente boa
no trabalho, caso contrário, seria demitida de novo.
Eu teria que fingir ser a namorada dele. Teria que dizer que o amava
e o pior de tudo, beija-lo.
Henrique podia ser o pior dos chefes, mas não sabia se resistiria a
ele.
***
A Obsessão do Mafioso
Eu era uma filha exemplar, nunca faltei a escola ou dava bola para
as provocações da minha irmã mais velha. Amava o meu pai, mesmo que
passasse pouco tempo em casa, mas tudo mudou quando ele morreu.
Fui humilhada e expulsa de casa pela invejosa da minha irmã e
quando pensei que estava livre, descobri que havia algo nas sombras que
me observava e que não me deixaria ir.
Eu nunca imaginei que ele fosse tão terrível. Não sabia como
escapar das suas garras, e agora, estou presa ao seu amor obsessivo.
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