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Copyright © 2022 Nah Christine

ATENÇÃO

Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com personagens, nomes,


acontecimentos e lugares descritos é mera coincidência. Esta é uma obra de imaginação
da autora.

Texto revisado de acordo com as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.

Todos os direitos reservados.

É expressamente proibida a sua cópia, reprodução, armazenamento, modificação ou


qualquer outro uso, na totalidade ou em qualquer parte através de qualquer meio, sem o
consentimento da autora.

A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei nº 9.610/98 e punido pelo
artigo 184 do Código Penal.

REDENÇÃO (Duologia Ouro de Mina – Livro 2)


Nah Christine
1ª Edição | Fevereiro de 2022
Edição Digital | Criado no Brasil
Obra registrada no Avctoris

Capa: Ellen Ferreira


Revisão e Preparação: Lidiane Mastello
Ilustração: Jaque Summer
Diagramação: N.C.
Sumário
Avisos Importantes
Playlist
Dedicatória
Sinopse
Epígrafe
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Epílogo
Em 2022
Agradecimentos
Notas da Autora
Outras Obras da Autora
Contatos da Autora
Notas de Rodapé
Avisos Importantes
Caro(a) Leitor(a),
Seja muito bem-vindo(a).
Este é o segundo livro da duologia Ouro de Mina. É
obrigatória a leitura do primeiro livro já lançado, que se chama
Vingança, pois, trata-se de uma continuação.
Esta é uma obra de ficção que contém linguagem de conteúdo
adulto, cenas de sexo, violência e algumas situações podem
desencadear gatilhos em pessoas sensíveis. Possui uma carga
dramática intensa, com muitas intrigas, mistérios... e, como o próprio
título já diz, redenção.
A história é ambientada nas cidades de Ouro Preto, em Minas
Gerais/Brasil, e Palermo, na região da Sicília/Itália. Por isso, pode
ser que no decorrer do texto você encontre algumas palavras que
são comuns em suas culturas, assim como estrangeirismos,
regionalismos, além de termos coloquiais.
Como citei nos avisos do primeiro livro, escrever essa duologia
foi um desafio, tanto pela temática forte, quanto pela complexidade
dos personagens. A ideia central surgiu no final de 2020, e, colocá-
la no papel depois de tanto tempo é gratificante. Fiquei bastante
satisfeita com o resultado. E eu espero, do fundo do meu coração,
que o desfecho que preparei para a história de vingança, redenção
e amor, muito amor de Isabela Moraes e Romeo Cavalieri
conquiste você, da mesma maneira que me conquistou.
Desejo uma ótima leitura, e, se possível, ao final deixe a sua
avaliação que é de extrema importância para mim e, também
incentiva outros leitores a conhecerem a história.
Com carinho,
Nah Christine.
Playlist
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aplicativo, clicar em ‘Buscar’, selecionar o ícone da câmera e
apontar para a imagem abaixo.

Ou, clique aqui!


Dedicatória
Para todos aqueles que acreditam no amor – e em segundas
chances.
Sinopse
“Não há redenção sem sofrimento.”

Isabela Moraes se apaixonou perdidamente e teve o seu


coração partido da pior forma pelo homem que amava. Tudo que
viveu foi uma mentira. Cada beijo, cada olhar, cada palavra, cada
toque. Ela foi enganada e usada como uma peça em um sórdido
plano de vingança.
Romeo Cavalieri estava cego pelo ódio. Foram anos
planejando cada mínimo detalhe para que nada desse errado. O
que ele não esperava, no entanto, era se apaixonar pela filha do
homem que arruinou a vida da sua família.
Mas era tarde demais.
Ele cometeu um grande erro e agora precisará lutar com todas
as forças para reconquistar o amor e a confiança de Isabela.
Nessa história de vingança, haverá espaço para a redenção?

“Ele aprendeu a amar.


Todo o amor que ela sentia foi destruído.”
Epígrafe
“Tu és o mais belo nascer do sol
Você pinta um sorriso no meu rosto ao vê-la novamente
Como chuva no deserto, você impregnou em mim
Meu mundo mudou a partir do momento em que te conheci
Somos corpo e alma, par de gotas d’água
Você e eu, mais que amor
Somos noite e lua, como mar e espuma
Você e eu, mais que amor.”
Il Volo – Más que Amor
Capítulo 1
BELO HORIZONTE, MINAS GERAIS, BRASIL

ROMEO CAVALIERI

A viagem até o Brasil pareceu uma eternidade. Mal esperei o


avião aterrissar e já me levantei, enlouquecido, como uma fera
enjaulada. Meu coração estava batendo forte dentro do peito, a
sensação era de que ele saltaria para fora a qualquer momento.
Uma angústia avassaladora tomava conta de cada célula do
meu corpo. Um nó na garganta. Eu me neguei a acreditar no que
Gustavo tinha dito, porque só acreditaria vendo com meus próprios
olhos.
Não podia ser!
Isabela e meu filho estavam bem. Nada de ruim tinha
acontecido com eles. Eu rezei, porra! Rezei tanto! Que todo mal
viesse para mim, não para eles. Nunca. Eu não poderia viver sem
os meus amores.
Eu não quis saber de nada, nem das desculpas do meu pai,
nem sobre o maldito erro que havíamos cometido. Depois eu
resolveria o que tivesse que resolver, mas, por ora, tudo que eu
precisava era ver Isabela, viva. Só de imaginar o contrário me
faltava o ar.
Saí do avião com Lucca no meu encalço. Eu sequer fazia ideia
de como ele havia conseguido providenciar a viagem com tanta
rapidez. Não trocamos uma palavra durante as horas de voo, eu
estava perdido em meus próprios pensamentos. Preso na culpa que
carregaria pelo resto da minha vida.
Depois de fazer todos os procedimentos burocráticos no
aeroporto, seguimos direto para o estacionamento onde meu carro
estava desde que embarquei para a Itália com Isabela.
— Gustavo acabou de mandar uma mensagem, ele já está em
Belo Horizonte — Lucca disse, parecendo preocupado.
Pouco antes de sairmos de Palermo, Gustavo nos informou
que Isabela e o motorista do veículo haviam sido levados para um
renomado hospital de Belo Horizonte. Ele ainda não sabia
exatamente qual era a gravidade da situação, o que sabia, no
entanto, era que o acidente havia sido muito feio.
Eu pedi imagens, fotos, vídeos, o que quer que fosse. Queria
provas daquilo que Gustavo falava. Precisava, para ser mais exato,
pois só assim acreditaria. Contudo, ele não havia me enviado nada.
Disse apenas que eu deveria me preparar para o pior.
Nunca! Eu nunca estaria preparado!
A ida para o hospital, por mais assustadora e sufocante que
pudesse parecer, tinha que ser um bom sinal. Se algo pior tivesse
acontecido, não seria para o hospital que ela seria levada. Agarrei-
me ao fio de esperança com todas as minhas forças.
E, mesmo assim, a sensação que eu tinha era de que eles
queriam me poupar de alguma coisa, e isso me deixava ainda pior.
Odiava essa sensação de impotência. Odiava perder o controle,
quando sempre o tive nas mãos. Odiava-me por ter feito o que fiz.
Odiava-me por ter feito tanto mal a Isabela.
Eu não me perdoaria se a perdesse. Se os perdesse.
— Porra! — grunhi assim que avistei meu carro.
— Você precisa manter a calma, Romeo. Ficar nesse estado
não vai adiantar nada — Lucca disse, encarando-me com firmeza.
— Agora me dê a chave do carro. — Estendeu a mão.
— Eu dirijo!
— Você não tem a menor condição de dirigir, me dá essa
chave — falou e num lapso de distração, ele puxou a chave da
minha mão.
Resolvi não discutir, não poderia perder tempo.
— Figlio di puttana[1]! — Segui para o lado do carona e Lucca
se sentou no banco do motorista, sem retrucar meu xingamento.
Ele digitou alguma coisa no celular, provavelmente o endereço
do hospital, pude ver pelo mapa aberto na tela. Minutos depois
seguimos pelo trajeto já conhecido por mim, afinal, o fiz tantas
vezes. Quando deveríamos seguir para Ouro Preto, no entanto,
continuamos na capital mineira.
Aproximadamente uma hora depois chegamos em frente a um
imenso hospital. Saí do carro feito um louco. Eu estava cego,
desesperado. Só me dei conta de que Gustavo estava na minha
frente quando esbarrei nele, na entrada da emergência.
— Gustavo, onde está a minha mulher? — indaguei e ele me
encarou com pesar.
— Não sei de nada ainda, Romeo.
— Como não sabe, porra? Você está me escondendo alguma
coisa? — Parti para cima dele, mas antes que pudesse grudar no
seu colarinho, Lucca me segurou.
Gustavo não se amedrontou, pelo contrário, manteve-se firme.
Tínhamos o mesmo porte físico, mas o único disposto a brigar era
eu. Como se não bastasse tudo que fiz, eu precisava descontar as
minhas frustrações em alguém.
Inferno!
— Você precisa manter a calma, minha equipe já está tentando
rastrear os prontuários.
— Não posso esperar. Eles terão que me dizer alguma coisa,
Isabela é minha esposa. — Desviei dele e entrei no hospital.
No caminho até as recepcionistas, avistei uma silhueta
conhecida, Alícia. Ela estava sentada em uma das cadeiras,
cotovelos apoiados nas pernas e o rosto entre as mãos. Aproximei-
me dela e, quando notou a minha presença, seus olhos vermelhos e
cheios de lágrimas me fitaram com ódio.
— O que é que você está fazendo aqui, seu monstro? —
Levantou-se, gritando, parecia uma leoa.
Suas mãos encontraram meu peito e me empurraram com
uma força maior do que a esperada para alguém do seu tamanho.
Ainda assim, não foi o bastante para que eu me movesse.
— Alícia — Lucca sussurrou e tentou segurá-la pela cintura,
com delicadeza.
— Me solta! — ela gritou ainda mais alto, seu olhar para o meu
sócio não era de ódio, como para mim, e sim, mágoa.
— Eu preciso de notícias, Alícia, por favor! — supliquei.
— Precisa? — Riu com escárnio. — Para quê? Para aliviar a
culpa de ter usado a minha amiga? — Respirou fundo. — Sabe o
que você precisa? Sumir daqui! Desaparecer!
— Não sairei daqui até saber como a Isabela e o meu filho
estão!
— Você só pode ser algum tipo de sádico! — As palavras me
feriram, eu merecia cada uma delas, e todas as outras que estavam
por vir. — O que veio realmente fazer aqui? Pisar ainda mais no
coração da minha amiga? — Apontou o dedo no meu peito. — Não
bastou tê-la escorraçado da Itália sem um tostão? Não bastou tê-la
deixado completamente sozinha em um país desconhecido onde as
pessoas falam outro idioma? — Empurrou-me ainda mais forte com
as duas mãos, as lágrimas desciam pelos seus olhos como
cachoeiras. — Você é um monstro, Romeo! Enganou a pessoa de
coração mais puro que existe nesse mundo!
— Eu não...
— Desejo que você conviva com a culpa de ter machucado
Isabela pelo resto da sua vida. E não ouse se aproximar nunca mais
da minha amiga, ou medidas extremas serão tomadas! —
interrompeu-me.
— Ela é a minha esposa! — grunhi.
— Chega, Romeo! — Lucca disse, encarando-me enquanto
suas mãos se mantinham firmes em Alícia.
— E você, me solta! — Alícia se afastou das mãos dele
abruptamente. — Leve esse monstro para longe daqui e o
mantenha longe da minha amiga, ou eu não responderei por mim —
bradou.
— Nós vamos embora, acalme-se — Lucca falou com
suavidade.
— Não sairei daqui até ter notícias da minha mulher.
— Seu desgraçado! — Alícia partiu para cima de mim e
estapeou meu peito, enfurecida.
Mais uma vez Lucca tentou acalmá-la e eu levantei a mão para
ele, em um pedido silencioso para que ele a deixasse descontar a
raiva em mim. Eu merecia. Mas não durou muito, porque segundos
depois surgiram dois seguranças, uma mulher e um homem. A
mulher tirou Alícia de cima de mim com cuidado, e o homem disse
que se continuássemos fazendo escândalo, seríamos expulsos do
hospital.
Um movimento na entrada chamou a nossa atenção, reconheci
quem havia chegado. Era o irmão da Alícia, Max. Ele encarou a irmã
e veio na direção dela a passos largos, a expressão lívida de
preocupação.
— Max — ela murmurou, correndo para os braços do irmão e
desabando em lágrimas e soluços desesperados.
Ele a amparou, e observei que sussurrou algumas palavras no
seu ouvido. Alícia estava descontrolada, eu não podia julgar, porque
estava contendo o meu próprio descontrole. Eu queria invadir esse
hospital, colocá-lo abaixo, entrar em cada sala, cada quarto, cada
canto, até encontrar a Isabela.
Alícia falou alguma coisa e o olhar de Max desviou para o meu,
incrédulo e, ao mesmo tempo, cheio de fúria. Observei as mãos
cerradas em punho e me preparei para a briga. Contudo, ele
titubeou quando a irmã o abraçou ainda mais forte. O ódio que
estava sentindo, certamente não era maior do que a preocupação
com Alícia.
— Romeo, por que você não vai embora com Lucca? Ficarei
aqui até ter alguma notícia, seja pelos médicos, ou pela minha
equipe — Gustavo sugeriu.
— Boa ideia, vamos, Romeo — Lucca acatou.
— Não sairei daqui até ver a minha piccola[2] — falei, seguindo
na direção das recepcionistas. — Preciso de notícias sobre o estado
de saúde de Isabela Moraes, agora! — vociferei e elas me fitaram
impassíveis.
— Qual é o seu nome, e o que o senhor é da paciente? — uma
delas indagou, com o tom de voz baixo e calmo.
— Me chamo Romeo Cavalieri, sou marido dela — respondi,
firme e ela desviou os olhos para o computador, digitando alguma
coisa.
— Sinto muito. Não posso dar nenhuma informação da
paciente ao senhor.
— Como não? Ela é a minha esposa, está me ouvindo?
— Romeo, chega! Vamos dar uma volta! — Meu amigo
colocou a mão em meu ombro.
— Porra, Lucca! Eu já disse que não vou sair daqui!
Virei-me para ele, disposto a mandá-lo para o inferno, quando
um soco forte atingiu o meu rosto, deixando-me aturdido. Olhei na
direção de onde veio o golpe e Max me encarava furioso.
— Seu desgraçado! Se alguma coisa acontecer com Isabela,
considere-se um homem morto! — bradou.
Ele não precisava me ameaçar, porque eu morreria em vida se
algo acontecesse com ela. E somente a menção de que qualquer
coisa ruim pudesse ocorrer, a fúria me cegou, vi vermelho na minha
frente e parti para cima dele.
— Filho da puta! — Devolvi o soco e nos atracamos no chão.
Lucca e Gustavo não conseguiram nos separar, Max era bom
de briga. Foi preciso, além dos dois, mais três seguranças com
quase o dobro do nosso tamanho para que nos separassem. Pouco
me importei se estávamos fazendo um escândalo, ou se as pessoas
ao redor nos olhavam assustadas. Tentei me desvencilhar dos três
pares de mãos que me seguravam, sem sucesso. Max e eu nos
encarávamos em uma guerra silenciosa.
— Vá embora, Romeo! — A voz de Alícia chegou aos meus
ouvidos. — Não há mais nada para você aqui, você destruiu tudo
que tinha — disse, dando-me o golpe final.
Encarei-a, impossibilitado de responder qualquer coisa. Senti o
gosto amargo de sangue na boca e um ardor em meus lábios, que
nada se comparava a dor massacrante que parecia me engolir por
inteiro.
Max foi levado para um lado e eu para outro. Entrei em um
consultório médico e estava tão inerte que mal pude falar. Notei que
o Lucca trocava algumas palavras com a enfermeira enquanto ela
cuidava dos ferimentos em meu rosto.
Eu só queria Isabela. Só precisava de Isabela.
Não sabia quanto tempo havia se passado, mas saí do
consultório com Lucca segurando meu braço com firmeza de um
lado, e Gustavo do outro. Eles me impediriam de cometer qualquer
loucura. No instante em que avistei Alícia, ela conversava com um
homem de branco, mais velho, parecia ser o médico.
Percebi que ela acenava negativamente, desesperada,
enquanto Max tentava acalmá-la. Ele também já havia cuidado dos
machucados. Se o meu rosto estava feio, o dele havia ficado dez
vezes pior.
— O que aconteceu? — Aproximei-me, sendo contido por
Lucca e Gustavo. — Pelo amor de Deus, o que aconteceu? —
bradei e o médico me encarou, depois encarou Alícia.
— Pode dizer, tio. Pode dizer a esse desgraçado o que ele
causou! — gritou, soluçando em desespero.
Não!
— Isabela Moraes está fora de perigo — falou e somente
então eu pude respirar, aliviado. — Mas infelizmente não
conseguimos salvar o bebê.
As palavras cruas e diretas do médico me atingiram como
socos, como uma punhalada direto no coração. A dor me rasgou
ainda mais por dentro. Eu jamais me perdoaria.
Não! Não podia ser verdade!
Era mentira, todos estavam mentindo para mim.
— Não — murmurei.
— Sinto muito — ele disse, entre outras coisas que não pude
prestar atenção.
Perdi a força das pernas e caí de joelhos no chão. O pranto
veio em ondas crescentes. As lágrimas se misturaram aos soluços.
Eu não poderia viver sabendo que causei tanto mal a Isabela, eu
não poderia viver sem o pedacinho de nós dois. Rezei, supliquei por
um milagre, só para poder trocar de lugar com ele. Eu morreria pelo
meu filho, mas acabei o matando. Não cuidei dele e o perdi para
sempre.
— Não! Meu filho... não pode ser! Meu bebê! — Os murmúrios
e lamúrias viraram gritos de desespero, a cada segundo a angústia
me esmagava ainda mais por dentro.
Eu era o culpado pela morte do meu filho. Eu o matei. Eu
destruí a vida de Isabela, destruí tudo que eu tinha de mais bonito.
Acabei com tudo.
Capítulo 2
ISABELA MORAES

Meus olhos ardiam pelas lágrimas derramadas. Nunca pensei


que pudesse sentir tanta dor. Eu estava despedaçada, destruída.
Não tinha forças para nada, tanto que nem sabia ao certo como
havia conseguido chegar no Brasil. O tempo passou como um
borrão, e tudo que eu me lembrava desde que saí da casa de
Romeo Cavalieri eram apenas flashes.
Alguém me ajudando a chamar um táxi, o avião decolando em
Palermo, o avião aterrissando em Belo Horizonte, eu entrando no
táxi a caminho de Ouro Preto, ligando para a Alícia. E segundos
antes de tudo acontecer, do acidente, vislumbrei uma luz branca
muito forte próxima a mim, rodeando-me. Escutei um barulho de
pneu cantando, senti uma freada brusca e apaguei. Foi tudo muito
rápido e, por algum motivo, não vi nada, não me assustei, não sofri
o impacto.
Eu havia nascido de novo, foi o que os médicos que me
atenderam assim que abri meus olhos, já no hospital, disseram. Um
milagre. E essa era a prova de que algo muito forte e poderoso
havia me protegido. Não era coisa da minha cabeça.
E, segundo o que me falaram, de acordo com informações da
polícia e dos profissionais que prestaram os primeiros socorros,
quem havia visto o estado em que ficou o carro, não diria que
tínhamos saído com vida. Felizmente o senhor que estava dirigindo
o táxi também estava bem. Já o motorista do veículo que entrou na
nossa pista e nos atingiu não teve a mesma sorte, havia falecido no
local do acidente. Ao que tudo indicava, estava bêbado.
Senti um ardor na testa e coloquei minha mão no local
dolorido, sentindo o áspero do curativo. Os pequenos curativos dos
ferimentos espalhados pelos meus braços, causados pelos
estilhaços do vidro não doíam. A dor física estava totalmente
anestesiada, porque a dor na alma era maior do que qualquer coisa.
A dor da traição, a dor de ter sido usada.
Respirei fundo, eu precisava me controlar, manter-me calma.
As lembranças misturadas ao cheiro forte de hospital estavam me
deixando enjoada. Estava com um acesso venoso no dorso da mão,
recebendo soro e vitaminas. Ergui um pouco meu corpo, talvez a
nova posição me livrasse do incômodo.
Escutei o barulho da porta e avistei Alícia novamente entrando
no quarto, seguida pelo seu tio que, além de médico, era o
responsável pelo hospital em que eu estava. Eu já o conhecia,
assim como a sua esposa, das várias vezes em que foram na casa
da minha amiga e eu estava lá.
Alícia soube do acidente através da polícia. Como eu havia
ligado para ela, eles viram seu número nos meus contatos recentes
do celular e conseguiram comunicá-la. Ela havia chegado no
hospital pouco tempo depois de mim. E só saiu do meu lado nos
momentos em que precisei fazer exames.
— Precisarei manter você aqui pelo menos mais uns dois dias
para observação, Isabela — doutor Emílio disse.
— Tudo bem — respondi.
Em seguida, ele perguntou se eu estava sentindo dor de
cabeça ou no corpo e eu neguei. Examinou-me novamente, anotou
algumas coisas no prontuário, e se retirou minutos depois.
Fitei a minha amiga, seus olhos estavam vermelhos e cheios
de lágrimas. A minha dor era a sua dor. Éramos como irmãs. Não
queria que ela carregasse mais esse fardo comigo, ele era só meu e
eu precisava dar conta sozinha.
— Ele já foi embora? — indaguei.
Eu sabia que Romeo estava aqui, inclusive que havia feito um
escândalo e brigado com Max, ela mesma havia me dito.
Sinceramente, eu não conseguia entender o que ele queria de mim.
Talvez a sua intenção fosse me ver despedaçada, ou quisesse
apenas se certificar do mal que me havia feito. Afinal, segundo ele
mesmo disse naquela carta, planejou tudo por tantos anos.
— Não. Ele disse que só sairá daqui depois de ver você —
Alícia disse, sentando-se ao meu lado e segurando a minha mão
livre do acesso. — Mas já garanti que isso não vai acontecer. —
Sorriu docemente, tentando me deixar tranquila.
Eu não queria vê-lo na minha frente. Nunca mais. No entanto,
se eu conhecia Romeo ao menos um pouco, tinha certeza de que
ele não desistiria assim tão fácil. E mesmo não querendo vê-lo, eu
precisava dar um jeito nisso. Precisava que ele visse nos meus
olhos todo o mal que me fez, mesmo que isso fosse amaciar o seu
ego.
Por mais destroçada que eu estivesse, eu não era covarde
como ele, que teve que se esconder através de uma carta, que não
teve coragem de me encarar e dizer que me usou, que eu fazia
parte de um plano de vingança. Baixo, cruel, sórdido.
— Eu quero vê-lo. — falei e Alícia me olhou assustada.
— Não, Isa! Não faça isso, amiga... você só vai se machucar
ainda mais.
— É impossível, Alícia, eu já estou machucada o bastante. E
eu sei que Romeo não vai desistir.
— O problema é dele. Você não precisa disso!
— Eu sei que não, mas eu quero. Mande-o entrar, por favor...
será rápido.
— Tem certeza? — indagou.
Não.
— Tenho.
— Tudo bem, eu estarei do lado de fora... qualquer coisa me
chame — disse a contragosto, enquanto se levantava e respirava
fundo.
Eu não estava certa de que tinha sido a melhor decisão,
estava confusa, abalada demais. No entanto, certamente não seria
pior do que ter sido usada, do que ter entregado o meu coração nas
suas mãos, que ao invés de cuidar, o jogou no chão e pisoteou em
cima dele.
Minutos depois, a porta se abriu num rompante e fui atingida
pela força poderosa da sua presença. Romeo me procurou pelo
quarto, e não consegui decifrar o que vi em seus olhos quando me
encarou. Nem queria, na verdade... porque quando o fiz, das outras
vezes, enganei-me completamente. Foi tudo uma mentira.
Ele me analisou dos pés à cabeça, e notei que seu olhar se
demorou em meu ventre. A mágoa veio com tudo, senti raiva. Muita
raiva. Dele. De mim. Por ter me apaixonado. Tive vontade de chorar,
e não sabia de onde estava vindo tanta força para manter as
lágrimas presas em meus olhos.
— Bella! — disse, aproximando-se e eu levantei minhas mãos.
— Não se aproxime. Não me chame assim nunca mais — falei,
firme.
— Eu cometi um erro, eu... me perdoe, por favor. — Tentou dar
mais um passo.
— Não me faça chamar a segurança! — bradei e ele estacou.
— Você não cometeu erro nenhum, você planejou tudo isso por
anos!
— Só peço que me escute, me dê uma chance para que eu
possa me explicar.
— Você não tem que se explicar, eu li aquela carta, entendi
tudo. Não sou idiota, apesar de ter me apaixonado por você —
expliquei. — Eu permiti que você viesse até aqui, porque essa será
a última vez que você olhará em meus olhos, Romeo.
— Bella, não... não diga isso. Eu sinto tanto. — Desviou os
olhos para a minha barriga e eu não aguentei mais conter o choro.
Ele sabia, Alícia e o médico já o tinham comunicado. E,
obviamente, viu a caixinha com a surpresa que eu havia esquecido
na sua casa e só fui me lembrar dela quando embarquei no avião,
de tão sem rumo e perdida que eu estava.
— Quero que você olhe bem para mim e para o mal que me
fez, que nos fez. — Coloquei minhas mãos no ventre. — Meu filho
se foi por sua culpa.
— Não! — Caiu de joelhos no chão.
Eu não acreditava mais nele, poderia fazer o teatro que fosse.
— Sim! Você o... matou — murmurei, quase não podia
enxergar nada na minha frente, de tantas lágrimas que caíam dos
meus olhos. Eu precisava ser forte, por mais que por dentro
estivesse destruída. — Eu espero que essa culpa o martirize por
todos os dias da sua vida!
— Não! — O grito de dor que Romeo deu foi ensurdecedor. —
Me perdoe... me perdoe... me perdoe — repetiu como um mantra,
em meio ao desespero, enquanto se levantava.
— Eu nunca vou perdoar você, Romeo. Nunca! Agora saia
daqui e não me procure nunca mais. — Respirei fundo e finalizei
com a maior mentira de todas: — Você morreu para mim!
Observei o rosto molhado pelas lágrimas, e a indignação veio
com tudo, não era possível que alguém pudesse ser tão cínico, tão
vil. Mas de Romeo Cavalieri eu não poderia esperar nada diferente.
— Alícia! — gritei quando percebi que ele tentava se aproximar
de mim.
Minha amiga abriu a porta rapidamente e me encarou, depois
desviou os olhos para Romeo.
— Saia! — Alícia disse, firme.
— Bella — ele murmurou, em uma súplica silenciosa e eu virei
o rosto para o lado oposto ao que ele estava.
Seu cheiro que um dia eu tanto amei estava impregnado pelo
quarto. E eu não suportaria nem mais um segundo da sua presença.
Não suportaria olhar em seus olhos uma última vez. Eu não
suportaria, ele precisava ir embora.
Só abri meus olhos quando escutei o barulho da porta se
fechando. Alícia veio na minha direção e então eu desabei, mais
uma vez. Minha amiga me abraçou e eu chorei desesperadamente.
Solucei, abalada demais, machucada demais.
A sensação era tão horrível, parecia que o meu coração
realmente estava se partindo ao meio. Vivi o amor na sua forma
mais bonita, mesmo que tenha sido tudo uma mentira. E vivi a
destruição dele da pior forma.
— Eu estou aqui, minha amiga. Pode chorar que eu cuidarei
de você — Alícia disse, sua voz estava embargada, ela com certeza
estava chorando também.
— Por que... ele fez isso... comigo? Eu o amei... tanto —
murmurei entre os soluços.
— Sinto muito — falou apenas, abraçando-me ainda mais
forte.
Não sei quanto tempo o meu pranto durou, só sei que em um
determinado momento, não tinha mais lágrimas para chorar. Eu
estava exausta, física e mentalmente.
Uma das enfermeiras entrou no quarto e Alícia e ela trocaram
algumas palavras que eu não pude compreender, minha cabeça
estava longe. Notei apenas que mexeu na medicação, anotou
algumas informações no prontuário e saiu.
Segundos depois, o cansaço me venceu e eu adormeci.

OURO PRETO, MINAS GERAIS, BRASIL

Depois de dois dias no hospital, enfim, recebi alta. Com a


ajuda do doutor Emílio, Alícia e eu saímos pelo acesso exclusivo
dos médicos, que era ligado direto na garagem onde estava o carro
da minha amiga. Não queria correr o risco de esbarrar com Romeo,
ou com quem quer que ele pudesse ter colocado para me vigiar.
Assim que chegamos na sua casa, após pouco mais de 2h de
viagem, fui recebida com muito carinho pelos seus pais. Eles me
trataram como se nada tivesse acontecido, tinham preparado um
almoço delicioso. Eu estava sem fome, mas jamais faria uma
desfeita, e eu precisava me alimentar de todo jeito.
Após terminarmos de comer, seguimos para o seu quarto. As
recomendações médicas eram claras, eu precisava repousar por
mais alguns dias, e somente então poderia voltar à rotina normal.
Deitei-me na cama de Alícia, que era espaçosa o suficiente para
caber duas de mim e duas dela.
— Você está confortável? Precisa de alguma coisa? —
inquiriu, enquanto fechava um pouco as cortinas e ligava o ar-
condicionado, deixando o quarto em uma temperatura agradável.
— Não preciso de nada, não se preocupe — falei,
aconchegando-me.
— Eu preciso ir ver aquele imóvel que havíamos comentado
que seria perfeito para a nossa galeria. Será rápido, prometo.
Meu coração se apertou, esse sonho agora parecia tão
distante.
— Tudo bem, amiga. Pode ir, eu ficarei bem.
— Eu adiaria novamente, mas já fiz isso duas vezes.
Alícia devia estar cheia de pendências para resolver, já que
não saiu do meu lado durante o tempo em que permaneci no
hospital. Eu seria eternamente grata por tudo que ela estava
fazendo por mim. Por ser a irmã que eu não tive, a única pessoa
que eu podia confiar verdadeiramente.
— Não tem problema.
— Se precisar de qualquer coisa, me ligue que eu volto
correndo — disse, tentando arrancar uma risada minha.
— Pode deixar, vá tranquila — respondi, dando um breve
sorriso.
Quando fiquei sozinha novamente, a sensação de vazio me
golpeou com força. Meu coração acelerou e eu respirei fundo. Não,
eu não estava sozinha. Não tinha vazio nenhum.
Fechei os meus olhos e toquei em meu ventre, ciente de que
seria dali que eu encontraria a força para continuar, para me
reerguer.
— A mamãe ama muito você, meu amor — sussurrei,
acariciando o pequeno montinho na minha barriga. — Seremos nós
dois contra o mundo.
Doeu ter que fingir, dizer aquelas palavras, que o pior havia
acontecido. Mas foi um mal necessário. Romeo nunca saberia a
verdade. Ele não merecia ser pai de um anjo, de um ser inocente.
Eu jamais permitiria que o meu bebê sofresse, ou que fosse vítima
de uma vingança.
Ninguém mais nos faria mal. Eu o protegeria com a minha vida
se fosse preciso. E poderia até não saber o que o futuro nos
reservava, mas uma coisa era certa, eu faria de tudo para que ele
fosse a criança mais amada e feliz desse mundo. Nada faltaria a
ele.
Eu o amava com tudo de mim, e amaria por todos os dias da
minha vida.
Capítulo 3
ROMEO CAVALIERI

No fundo do poço. Era onde eu estava.


Eu nunca pensei que fosse possível sentir tanta dor. E não era
uma dor física, eu sequer sabia explicar. Era uma coisa estranha,
como se tudo dentro de mim estivesse estraçalhado, quebrado.
De fato, estava. Um pedaço do meu coração se foi para
sempre. E a parte que restou só estava batendo por ela. Única e
exclusivamente por ela. Que me amou, que se entregou de corpo e
alma, que me entregou o seu coração sem reservas.
“Você o... matou. Eu espero que essa culpa o martirize por
todos os dias da sua vida!”
Ainda podia ouvir a voz embargada, cheia de dor. As palavras
estavam cravadas na minha mente. E ficariam para sempre, como
um lembrete de todo mal que fiz, de toda a dor que causei.
Lembrei das vezes em que fui um canalha desgraçado, das
vezes em que prometi tantas coisas, das vezes em que prometi não
a machucar. E fiz exatamente o contrário. Usei até mesmo uma
criança inocente, Noah. Não precisava ter jogado tão baixo. Prometi
uma vida feliz, prometi dar a família que ela não teve, filhos.
Se eu pudesse, voltaria no tempo. Não teria escrito aquela
carta, não teria seguido com a vingança. Nós estaríamos felizes,
aproveitando a nossa lua de mel, nos amando. Amando o nosso
fruto, que estaria bem protegido no seu ventre.
Nada de ruim teria acontecido. Eles ainda seriam meus.
Olhei para a camisetinha que estava comigo desde que a
peguei nas mãos pela primeira vez e a fitei por vários segundos. A
frase ‘eu e a mamãe somos do papai’ escrita em italiano me
destruiu. Eles eram meus.
Aproximei do nariz, as lágrimas arderam nos meus olhos. O
cheiro de bebê ainda estava ali, intacto, como o cheiro de Isabela,
em uma mistura que me enlouquecia. Senti-me ainda mais
quebrado sabendo que ele, ou ela, nunca usaria a roupinha.
O nó na garganta quase impediu a passagem de ar. Perguntei-
me se teríamos um menino, se ele seria parecido comigo, se teria o
meu gênio impetuoso... ou se teríamos uma menininha, linda, doce
e pura como ela. Infelizmente eu não teria a resposta.
— Meu filho... — murmurei, eu estava jogado no sofá da sala
da minha casa. — Bella.
Minha cabeça doía, tudo doía. Já tinha perdido as contas de
quantas doses de uísque havia bebido. Nada fazia parar essa dor,
nada. Nunca iria parar, eu os havia perdido para sempre. Perdi meu
filho e Isabela.
Aquela sensação ruim que me perseguia desde quando estava
próximo do fim continuava, mais forte, mais massacrante, quase me
tirava o ar. E, ao contrário do que eu pensava, não era ódio. Era
amor antes mesmo que eu tivesse me dado conta, mas eu estava
cego demais para perceber.
Porque a verdade era apenas uma. Eu me apaixonei por
Isabela no instante em que a vi pessoalmente pela primeira vez. E a
amei no momento em que a toquei, senti seu cheiro, o gosto dos
seus lábios. Perdi a razão, perdi o controle. Perdi tudo.
— Acho que já chega, Romeo! — Lucca disse quando me
levantei para colocar mais uma dose no copo.
Meu amigo não havia saído do meu lado. Ele estava cuidando
de tudo. Da empresa, da minha vida, dos meus problemas. E foi
graças ao pedido dele, inclusive, que Gustavo enviou um de seus
funcionários para Belo Horizonte para acompanhar a chegada de
Isabela, e este acabou presenciando o acidente. Lucca agiu como
eu teria agido caso tivesse atendido os telefonemas de Gustavo
naquele maldito dia. Ele cuidou dela, mais do que eu havia cuidado.
— Eu preciso anestesiar essa dor — falei, o tom de voz estava
embargado.
— Não consigo imaginar o quanto está sendo difícil para você,
irmão. Mas você precisa encarar, não anestesiar.
— Eu matei o meu filho, Lucca. Como posso encarar isso? Eu
deveria ter escutado você... porra!
Lucca me fitou, não disse nada, não me culpou. Eu queria que
ele jogasse na minha cara que tinha me avisado, que eu não devia
ter seguido com o plano. Mas não, ele não me julgava, e isso me
deixava ainda pior.
— Você ama a Isabela, não ama? — indagou.
Porra, sim! Ela e o nosso bebê... os amava mais do que
qualquer coisa nessa vida!
— Mais do que qualquer coisa — respondi.
— Então trate de se recompor e lutar por ela! — disse, firme.
— Isabela nunca vai me perdoar, ela mesma disse isso,
olhando nos meus olhos. — Lembrei-me da dor que vi em seu rosto,
jamais me esqueceria. — Estava tão quebrada.
— Dê um tempo a ela, e depois faça o que for preciso para ser
merecedor do seu perdão.
Mesmo que um dia, com muita, mas muita sorte ela me
perdoasse, eu não me perdoaria. Nunca.
Enquanto eu vivesse, levaria essa culpa comigo.

Eu tinha acabado de tomar um banho quando o toque do meu


celular me distraiu. Era Gustavo, ele tinha chegado naquele instante
na minha casa. Apesar de não estar com cabeça para resolver tudo
que precisava, não dava mais para adiar essa conversa.
Nós tínhamos cometido um erro, e esse erro custou a vida do
meu filho.
— Romeo. — Cumprimentou-me com um aceno assim que me
avistou, ao entrar na sala. — Sinto muito — repetiu o que já havia
me dito no hospital.
Apenas dei um breve aceno.
— Obrigado por vir, Gustavo — Lucca disse. — Fique à
vontade.
— Eu tenho algumas informações importantes a dizer. Mas
antes, Romeo, gostaria de pedir desculpas... sei que não vai
adiantar, porém, ter colocado Paulo Moraes como o principal
culpado foi um erro tremendo. Ele foi uma vítima, assim como você
e sua família — se justificou.
Gustavo não era o culpado. O único culpado era eu, que
planejei essa maldita vingança por todos esses anos, sem ter a
menor ideia de que, além de destruir as pessoas que mais amei na
vida, eu também estaria arruinado quando tudo terminasse.
— Não se desculpe, Gustavo. Você não tem culpa de nada,
apenas fez aquilo que pedimos. O único culpado sou eu, por ter feito
tudo que fiz. — Respirei fundo. — Quero saber tudo, cada detalhe
do que aconteceu, o que você descobriu, quem são os verdadeiros
responsáveis pela tragédia. Tudo.
Ele me encarou, depois encarou Lucca, e começou a falar:
— O seu envolvimento com Isabela e o que pediu para eu
investigar no desenrolar desses meses me deixaram em alerta,
desconfiado. Na época em que tudo aconteceu, tivemos que lidar
com outras coisas, mas, depois de tanto tempo, cheguei a
conclusões que anos atrás nem cogitei.
— Prossiga, por favor — pedi, agoniado.
— Eu acessei registro por registro da Mineradora Cavalieri,
desde um ano antes da tragédia até o dia em que tudo aconteceu.
Encontrei várias coisas, entre elas, um comunicado e um e-mail,
Romeo... de um colega de trabalho de Paulo Moraes. Os dois
haviam concorrido a vaga de chefia, mas Paulo acabou se
destacando e foi promovido.
Porra! Essa pressão em meu peito ainda me mataria!
— E o que isso tem a ver com a explosão? — Lucca
perguntou.
— A explosão aconteceu devido a uma detonação não
programada de uma bomba. E o mais estranho de tudo isso é que,
de acordo com os documentos periciais do acidente, a explosão
ocorreu minutos após o carregamento de frente, que é o processo
de preparação para a detonação de uma determinada área. E
apenas o Paulo estava próximo ao local, quando deveria ter uma
equipe junto.
Isso tudo nós já sabíamos. Inclusive, o fato de ele estar
sozinho era uma das maiores provas de que a explosão seguida de
incêndio havia sido criminal, e não um acidente, como conseguiram
provar, falsamente, que foi.
— E como você chegou à conclusão de que foi uma
emboscada?
— Parece que na época não investigaram tudo. Encontrei as
gravações das conversas entre os mineradores via rádio. E foi
enviado um comunicado desse tal colega de trabalho minutos antes
da explosão, avisando que, a pedido de Paulo Moraes, a equipe
inteira deveria se dirigir para um outro local, distante apenas o
suficiente para não se ferirem. Coincidentemente o único rádio que
não recebeu a comunicação foi o de Paulo.
Já li e reli tantas vezes o processo, todos que trabalhavam
com a vítima testemunharam a mesma coisa, que ele havia dado a
ordem. Talvez até acreditassem que tinha sido daquela forma, com
exceção desse tal colega, desgraçado mentiroso.
— Mentiroso! O filho da puta mentiu — grunhi.
— E o e-mail? — Lucca indagou.
— Além do comunicado, o tal homem enviou um e-mail para
uma conta e excluiu logo em seguida. Encontrei-o, como disse,
porque analisei basicamente tudo e cada detalhe do último ano que
antecedeu a tragédia. Por sorte, a empresa de vocês tinha
backups[3] não apenas da base de dados e de todo e qualquer
trabalho que era realizado, assim como tudo que era excluído.
— Não estou entendendo, Gustavo. O que tinha nesse e-mail?
Para quem foi enviado? — questionei.
— O e-mail tinha o relatório diário de operações inteiro do
último mês. Alguém de fora da empresa tinha acesso a todas as
atividades dos mineradores. A má notícia é que infelizmente não foi
possível rastrear quem era o destinatário.
— Porra, não me fode, caralho!
— Tentei de tudo, enviei para colegas dos EUA, mas não
tivemos sucesso. — Suspirou pesadamente.
Caminhei até a mesinha de bebidas, eu precisava de álcool.
Não estava sendo fácil digerir que o homem que odiei a minha vida
inteira era inocente. Eu estava a ponto de explodir. Surtar.
— Mas a boa notícia, ou não tão boa assim, é que eu encontrei
o ex-funcionário.
— Onde está esse filho da puta? Quem é ele?
— Por enquanto manterei o nome dele em sigilo, até ter as
confirmações que eu preciso. Mas, o que posso dizer é que... ele
está internado em uma clínica psiquiátrica há mais de dezesseis
anos, ou seja, logo após a tragédia — respondeu e eu cerrei a
mandíbula, enfurecido.
— Quem... é... o... desgraçado? — indaguei novamente,
lançando um olhar cortante na direção de Gustavo.
Eu precisava de respostas rápidas... passaria por cima do
mundo inteiro se fosse necessário.
— Romeo, não vá por esse caminho de novo — Lucca disse.
— Diante de todas as evidências que encontrei, cheguei à
conclusão de que esse homem auxiliou quem quer que tenha
tramado tudo, por inveja, ambição... ele queria a vaga de Paulo.
Resta confirmar quem realmente está por trás de tudo isso.
— Você tem dúvidas? Só pode ser coisa daqueles infelizes do
Cícero e do Marcos.
— Calma, Romeo. Você já viu o que um erro causou, não
vamos cometer o segundo — Lucca me interrompeu, centrado como
sempre.
— O Romeo tem razão, Lucca. Com certeza tem dedo dos
dois nessa história, principalmente pela questão do processo
complexo da tutela da Isabela — ponderou. — Mas, Romeo, peço
que você não faça nada. Nós precisamos nos manter um passo à
frente, logo pegaremos todos os envolvidos e a justiça se
encarregará do resto.
— Justiça? — Ri de escárnio. — A justiça não foi capaz sequer
de descobrir que o acidente foi proposital, como querem que
descubram os causadores?
— Cícero e Marcos estão sujos até o último fio de cabelo,
Romeo. Assim que conseguirmos as devidas provas, todo o resto
virá à tona.
— Eu preciso me vingar... e agora não somente por mim —
falei, determinado.
— Não é possível que você esteja falando sério, Romeo —
Lucca disse, incrédulo.
— Isabela não estará segura enquanto esses filhos da puta
estiverem soltos. E eu não posso permitir que nada de ruim
aconteça com ela.
Não cuidei do meu filho e ele se foi. Estava extremamente
difícil viver, respirar com essa culpa. Por isso não poderia permitir,
sob nenhuma hipótese, que o mesmo acontecesse com a minha
piccola. Enquanto eu vivesse, a protegeria. Faria o que fosse
preciso, mesmo que isso custasse a minha própria vida.
Eu estava indo pelo mesmo caminho de anos atrás, sabia
disso. No entanto, era uma obrigação minha, eu precisava garantir
que todos os envolvidos fossem punidos. Precisava fazer justiça,
não somente por todo mal que nos causaram, como por terem
roubado a infância de Isabela, por terem matado o seu pai e por
tudo que fizeram com a minha família.
Eu devia isso a ela, ao meu filho e ao Paulo Moraes.
Capítulo 4
ISABELA MORAES

Despertei sentindo um enjoo terrível, o mesmo que sentia


todos os dias ao acordar. Corri para o banheiro e só deu tempo de
abrir a tampa da privada e vomitar todo o jantar da noite anterior.
Eu realmente havia comido demais. Tia Clarice, mãe da Alícia,
tinha mãos de fada e cozinhava como ninguém. Por falar em Alícia,
assim que coloquei tudo para fora, ela já tinha botado a pasta de
dente na minha escova, ligado a torneira e pegado a toalhinha para
que eu pudesse me recompor.
Ultimamente estava sendo repetitiva, mas eu não tinha mais
palavras para agradecer todas as coisas que ela e sua família
estavam fazendo por mim. Desde seus pais, seu irmão, e até
mesmo o seu tio, o doutor Emílio, que mentiu por mim ao dizer que
o meu filho não havia sobrevivido. Não foi fácil convencê-lo, ainda
ouvimos um sermão sobre ética profissional, entre outras coisas.
Entretanto, com a ajuda de Alícia, que comentou brevemente
sobre algumas coisas que eu havia passado, ele acabou acatando.
E não havia feito somente isso, o tio da minha amiga simplesmente
excluiu todos os registros da minha gravidez dos prontuários
médicos.
Eu conhecia Romeo o bastante para saber que ele seria capaz
de invadir o sistema do hospital atrás de informações. Não poderia
permitir que descobrisse a verdade, não daria mais nenhuma
chance, eu já estava calejada de todas as suas maldades.
— Obrigada, amiga! — agradeci, após terminar de escovar os
dentes.
— Não dá para acreditar que o meu sobrinho, ou sobrinha, que
tem o tamanho de uma ameixa, cause esse enjoo todo — disse e eu
sorri, enquanto caminhávamos novamente para o quarto.
Eu já estava de doze semanas, e na consulta de ontem a
médica havia dito que ele estava do tamanho de uma ameixa. Era
muito pequenino, frágil.
— Pelo menos são só nos primeiros minutos da manhã,
depois, passa. — Acariciei a pequena elevação. — No entanto, tudo
vale a pena por ele, ou ela.
— Estou ansiosa para saber o sexo, você tem algum palpite?
— indagou.
Havíamos nos deitado na cama de novo. Ainda estava cedo, e
eu andava mais preguiçosa do que o normal.
— Acho que é menina — respondi, desde que descobri, era o
que eu sentia.
No entanto, isso não faria diferença. Tudo que me importava
era que ele, ou ela, estava seguro aqui dentro, protegido. Alícia
estava mais ansiosa do que eu, mas, de acordo com a médica,
através da ultrassonografia, só seria possível saber a partir da
décima sexta semana.
— Será uma mini Isabela e eu não estou preparada para isso,
vou esmagá-la de tanto amor — disse.
— Tenho muita sorte de ter você, minha amiga. O meu bebê
terá uma madrinha incrível.
— Isa, você... — Encarei a minha amiga e seus olhos se
encheram de lágrimas. — Eu serei madrinha?
— Claro que sim — respondi e ela me abraçou, emocionada.
— Eu amo vocês, minha irmã... amo muito! Estaremos juntas
sempre!
— Nós também amamos você, madrinha. — Suspirei. —
Quero que me prometa uma coisa... que se algo acontecer comigo,
você cuidará dele, ou dela.
— Não fale besteiras, Isa, por Deus! — exclamou, brava.
Não era uma besteira. Eu ainda temia que algo ruim pudesse
acontecer comigo. Temia muito. Não confiava em mais ninguém
além da minha amiga para isso, pois, todos aqueles que diziam me
amar me traíram, me destruíram.
— Me prometa, por favor. Eu preciso ter certeza de que, se um
dia eu faltar, meu bebê não estará desamparado.
— Eu só vou prometer para você ficar tranquila, mas não
quero que repita mais esse absurdo. Por favor, Isa! — falou, senti no
seu tom de voz que estava chateada. — A propósito, você pensou
sobre o que conversamos?
Alícia tinha sugerido que eu buscasse as minhas coisas na
casa dos meus tios, mas eu não colocaria meus pés lá nunca mais.
Não queria me encontrar com o meu tio, muito menos com Júlia.
Meu único pesar com tudo isso, era a falta que a tia Gisele fazia na
minha vida. Entretanto, eu daria um jeito de entrar em contato com
ela apenas para avisar que eu estava bem.
— Não quero que o meu tio me veja, ou saiba notícias de mim.
Nem Júlia.
— Eu já disse que vou para você, e o Max se colocou à
disposição para ir comigo. Todas as suas coisas estão lá, suas
roupas, seu carro.
— O carro eu não quero. Não quero nada que tenha vindo
daquele dinheiro maldito, Alícia. — Meus olhos se encheram de
lágrimas. — O meu paizinho... ele...
— Shhhh... fique calma, o tio Paulo não fez aquilo, tenho
certeza.
— Eu... eu também tenho certeza. Meu pai era um homem
honrado, e eu jamais permitirei que manchem a sua honra. —
Respirei fundo, contendo firmemente as lágrimas.
— Essa herança, seja pelo seguro, ou por qualquer outro
motivo, é sua, direito seu.
— Não quero! Esse dinheiro é maldito! — Minha respiração
estava agitada. — Em breve começarei a trabalhar e conquistarei as
minhas próprias coisas. Não quero nem um centavo da família
Cavalieri. Eles que façam bom proveito
— Tudo bem, você quem sabe — disse com a voz serena,
tranquilizando-me.
— Eu só preciso que você faça algo por mim, além de ir buscar
as minhas roupas, apenas as roupas, na casa do meu tio.
— Claro, o quê?
— A caixinha... com as lembranças dos meus pais... ficou na
casa de Romeo.
Só queria que ela trouxesse isso. Não queria mais nada. Nada
do que ele havia comprado para mim e me dado de presente.
Nenhuma roupa, joia, nada. Não queria nada dele, nunca mais.
— Eu busco para você, fique tranquila. — Sorriu docemente.
— Obrigada, minha irmã.
— Não por isso, você sabe que pode contar comigo. —
Segurou meu dedo mindinho com o seu, da mesma forma que
fazíamos quando éramos crianças.
— Como você está se sentindo hoje? — Ela perguntava isso
todos os dias quando acordávamos, sua preocupação comigo
enchia meu coração de carinho.
— Estou melhor do que ontem, e tenho certeza de que
amanhã estarei melhor do que hoje — respondi, sincera.
Era a verdade. Eu estava vivendo um dia de cada vez.
Recuperando-me, reerguendo-me depois de ter sido apunhalada
pelo homem que eu amava. Passei os primeiros dias remoendo tudo
que ele havia feito comigo, cada mentira que disse, a forma sórdida
como foi capaz de envolver até mesmo o Noah em seus planos.
Romeo Cavalieri era cruel. Ele me enganou, me iludiu, fez com
que eu me apaixonasse por um homem que nunca existiu.
Desde ontem, no entanto, quando ouvi pela segunda vez o
coraçãozinho da minha ameixinha batendo forte e acelerado, foi
como se todas as minhas forças tivessem sido recarregadas. O som
ritmado era a melodia mais bonita que eu já havia escutado em toda
a minha vida.
Como um bálsamo.
E era no meu bebê que eu focaria, somente nele. Precisava
ficar bem, para que ele também ficasse bem. Não queria que
absorvesse nada de ruim, nenhuma melancolia, nenhuma mágoa.
Por isso, resolvi enterrar tudo que vivi dentro do meu coração.
Alícia tinha acabado de me deixar em frente à casa de Maitê.
Ela embarcaria para Buenos Aires em alguns dias e eu me
prontifiquei a ajudá-la com os últimos detalhes da mudança.
Ela certamente havia achado estranho o meu retorno
antecipado da lua de mel, mas não me perguntou nada quando nos
falamos pelo telefone. Maitê tinha visto o quanto eu estava radiante
com o casamento, com a vida ao lado de Romeo. Agora, contudo,
as coisas mudaram completamente, e eu nem sabia por onde
começar a contar para ela tudo que tinha acontecido.
— Isa, querida! — Recebeu-me com um abraço. — Como você
está? — indagou, analisando-me com atenção.
Tive que me segurar para não desabar na sua frente. Eu já
tinha esgotado a minha cota de lágrimas, e estava decidida a não
derramar mais nenhuma gota por alguém que não me merecia.
— Estou bem, obrigada, Maitê. E você? Muito atribulada com a
mudança? — perguntei enquanto caminhávamos para dentro da
bela casa.
— Demais, são tantas coisas, mas vai dar tudo certo. Obrigada
por ter vindo, de coração.
— É um prazer... sentirei a sua falta — falei, eu estava
bastante emotiva devido aos hormônios da gravidez.
— Querida, também sentirei muito a sua falta. — Maitê indicou
para que eu me sentasse no sofá, e assim o fiz, sendo seguida por
ela.
Na mesa de centro da sala tinha uma garrafa térmica de café,
suco de laranja e alguns biscoitos tradicionais da nossa cidade.
Salivei de vontade de pegar um, mas me contive. Minha ameixinha
era bem esfomeada.
— Quer um café? Fique à vontade.
— Vou aceitar um copo de suco, e um desses biscoitos. Eles
estão com uma cara ótima — respondi e ela sorriu.
— Vou acompanhar você com um cafezinho. Até tento largar
esse vício, mas está difícil — disse, enquanto eu mordia um pedaço
do delicioso biscoito.
— É gostoso mesmo, eu adoro. Mas, no momento, estou
evitando beber café — falei e ela me fitou, como se soubesse os
meus motivos.
— Você parece um pouquinho abatida, tem certeza de que
está tudo bem? — indagou, verdadeiramente preocupada e eu
respirei fundo, tentando conter a angústia.
— Não tão bem quanto eu gostaria, mas eu vou ficar.
— O que houve, querida? Posso ajudar com alguma coisa?
E foi o suficiente para que eu desabafasse com ela. Dividi
tantas coisas com Maitê, não teria motivos para não contar que o
meu conto de fadas, na verdade, não passava de uma mentira.
Enquanto eu falava, mais firme do que pensei que conseguiria, ela
me ouvia com atenção. Por fim, consegui dizer tudo sem derramar
uma lágrima, e já me considerei vitoriosa por isso.
— Eu sinto muito. Você está precisando de alguma coisa?
— Não, muito obrigada. Tenho certeza de que logo ficarei
bem... é só o tempo de me recuperar desse baque.
— Com certeza... eu passei por algo semelhante no passado.
Mas, não fiquei grávida, e o motivo não foi vingança. Não vou
mentir, levou um tempo até que eu me reerguesse, contudo, quando
o fiz, me tornei muito mais forte do que já tinha sido um dia.
— É difícil, mas não posso desabar. Tenho alguém que
depende única e exclusivamente de mim... eu preciso ficar bem por
ele, principalmente. Depois penso em mim.
— Concordo em partes... você precisa olhar para si mesma
com carinho, e entender que nada do que passou foi culpa sua. Nós
nunca erramos por amar demais — disse, carinhosa, e segurou as
minhas mãos. — E esse bebezinho? Como está?
— Muito bem, crescendo forte e saudável. — Falar desse
serzinho era uma das únicas coisas que me fazia dar um sorriso
sincero.
— Que bom, fico muito feliz... você será uma mãezona para
ele.
— Farei o meu melhor.
— E fique tranquila, manterei sigilo, como você pediu. Mas,
permita-me dar uma opinião?
— Todas... — Era óbvio que eu ouviria os conselhos de Maitê,
eu sabia que ela queria o meu bem.
— Daqui a pouco a sua barriga começará a crescer, você não
vai mais conseguir esconder. Não tem receio de que alguém possa
contar a ele? Ou receio de que ele mesmo veja?
— Muito. É algo que penso a todo tempo, mas não permitirei
que ele descubra. Nunca.
— E se você fosse comigo para Buenos Aires? — O convite
veio de maneira inesperada, e acabei ficando sem reação.
— Nossa, agradeço muito pelo convite, Maitê. É tentador, na
verdade. Mas não posso, minha vida é aqui, tenho minhas crianças
também... há tantas coisas em jogo.
— Entendo. De todo modo, você não precisará ficar
definitivamente se não quiser. Pode esperar a poeira baixar, passar
a gravidez, ter o seu bebê, e depois voltar.
Talvez não fosse uma má ideia, seria uma boa maneira de
esconder a minha gravidez de Romeo e de qualquer pessoa ligada
a ele. No entanto, era uma decisão séria demais para ser tomada
sem pensar, e, além do mais, não queria atrapalhar a nova vida de
Maitê. Não queria ser um peso para ela.
— Muito obrigada, Maitê. Eu prometo que vou pensar com
carinho.
— Claro, pense com calma e decida o que for melhor para
você. Não quero que se preocupe com nada, caso opte por ir. Você
ficará morando comigo, poderá me ajudar na galeria, se quiser. Fará
tudo do seu jeito... será bom para mim ter uma companhia também.
Adoro você, adoro crianças. E adoraria ajudá-la de alguma forma.
Senti que ela estava sendo verdadeira em cada palavra. Talvez
não tivesse recebido o mesmo suporte quando passou pelo que eu
passei, e, por isso, se compadeceu da minha situação. Era bom
saber que existiam pessoas como ela no mundo, e que nem só de
gente ruim eu estava rodeada.
— Eu também adoro você.
P elo restante da tarde a ajudei a embalar algumas obras
de artes espalhadas pela sua casa. Tinha combinado que no final da
semana iria na galeria com ela, auxiliá-la lá também. Já estava
quase tudo empacotado, só faltavam algumas coisas.
Não me esqueci do seu convite por nenhum segundo, as suas
palavras ficaram martelando na minha cabeça o tempo inteiro.
Capítulo 5
ROMEO CAVALIERI

Quase não acreditei quando recebi uma mensagem de Alícia


avisando que estava vindo na minha casa buscar uma caixa que
Isabela havia deixado aqui. Não era exatamente a sua amiga que eu
gostaria de ver, no entanto, tentaria saber notícias da minha piccola,
qualquer uma que fosse.
Deixei o portão aberto para que entrasse, e foi o que
aconteceu, minutos depois. Ela não estava sozinha, seu irmão
dirigia o carro. Quando estacionou, percebi que discutiram sobre
alguma coisa, e foi Alícia quem saiu do veículo e veio na minha
direção como uma leoa pronta para o ataque.
— Onde está a caixa? — perguntou, altiva.
— Como Isabela está? — indaguei, ansioso.
— Como você acha? Péssima, se é o que quer saber... você
tirou tudo da minha amiga, satisfeito? — grunhiu. — Agora, por
favor, me dê a caixa — insistiu.
— Alícia, por favor, me escute... me deixe ao menos explicar.
— Você não me deve explicação nenhuma!
— Eu preciso da Isabela, sou completamente maluco por ela.
Por favor, me ajude, preciso que ela me escute.
— Precisa dela, ou precisa aliviar a culpa pelo que fez?
Não, não era para aliviar nada. Eu amava Isabela, e o que eu
precisava era fazer com que ela entendesse isso. Eu precisava
pedir perdão por tudo que fiz, o faria quantas vezes fosse preciso.
— Não foi dessa forma, eu só preciso...
— Eu não tenho que ficar aqui ouvindo as suas desculpas,
principalmente quando não há justificativa nenhuma para o que você
fez com ela. Me dê a caixa, por favor! — disse, um pouco mais
alterada.
Lucca surgiu naquele instante, com a caixa que pertencia a
Isabela nas mãos. Alícia o encarou cheia de mágoa, como da outra
vez no hospital, e percebi que titubeou, mas logo se recompôs.
Caminhou até ele, puxou a caixa das suas mãos, nos deu as costas
e seguiu para o carro.
— Porra! Estou tão arrependido dessa merda toda! — grunhi,
entrando em casa com Lucca me seguindo. — Só queria voltar no
tempo e fazer tudo diferente — lamentei.
— Sinto muito, Romeo, mas voltar no tempo é impossível. No
entanto, você ainda pode fazer diferente, mudar o seu futuro e,
quem sabe assim, possa recuperar o amor e a confiança de Isabela.
— Como, Lucca? Eu não sei mais o que fazer!
— Isso quem vai descobrir é você, meu amigo. Dê um tempo,
pense um pouco... não faça nada por impulso.
Porra!
Lucca me conhecia ao ponto de saber que a minha
impetuosidade, neste momento, poderia me atrapalhar muito. Eu
precisava recuperar o meu autocontrole, me centralizar novamente.
Por mais difícil que fosse, por mais vontade que eu tivesse de
agarrá-la e não a soltar nunca mais, fazer com que me ouvisse à
força, eu não faria isso. Teria que ir com calma, e não sabia nem se
isso funcionaria. Entretanto, eu precisava tentar. Nunca desisti fácil
daquilo que eu quis durante a minha vida inteira, e agora não seria
diferente. Eu lutaria por ela com todas as minhas forças.
Nunca desejei tanto algo como desejava recuperar o amor e a
confiança de Isabela.

— Nós precisaremos ir a Palermo, está chegando o dia do


evento da AURUM — Lucca disse enquanto eu tentava me
concentrar em um contrato.
— Porra, nem me lembrava mais disso — grunhi,
massageando a têmpora. — Não posso sair de Ouro Preto.
— Nem pensar, Romeo. Vamos apresentar oficialmente o
lançamento do nosso uísque com ouro, como você pode cogitar não
ir?
— Eu sei! Eu sei! — respondi.
Ele tinha razão, mas não queria perder Isabela de vista.
Gustavo colocou alguns homens de sua confiança para fazer a
segurança dela, de longe e sem levantar suspeitas. E, mesmo
assim, quase todos os dias eu ia próximo à casa de Alícia só para
ter a chance de vê-la, caso saísse.
Foi o que aconteceu umas duas vezes... era uma migalha
apenas, mas eu estava sobrevivendo disso. Certo de que estava
cada dia mais apaixonado por ela. Quanto maior era a distância
entre nós, mais eu a amava. E mais arrependido eu ficava por todas
as coisas que fiz.
— Você já não foi para Belo Horizonte para assinar o contrato
com a importadora, e agora está cogitando não ir em um evento tão
importante para a nossa trajetória — disse, com razão. — Não é
dessa forma que você vai mudar as coisas, Romeo.
Lucca tinha ido sozinho à capital mineira para formalizar o
contrato que havíamos firmado com a empresa da Paula.
Felizmente as coisas na nossa destilaria estavam indo bem, muito
diferente de como ia a minha vida pessoal.
— Eu não vou discordar de você, Lucca, porque tem total
razão. — Respirei fundo. — E eu sei o quanto isso é importante
para a AURUM... mas, depois que eu perdi o que tinha de mais
valioso, passei a enxergar tudo de maneira diferente. Coisas que
antes estavam no topo da minha lista de prioridades, hoje já não
estão mais.
— Sinto muito, Romeo, eu realmente sinto muito. E eu entendo
o quanto deve ser difícil ser o mesmo depois de um baque desses.
— Não é difícil apenas, é impossível — falei, categórico.
Era a verdade, uma parte de mim tinha morrido junto com o
meu bebê.
— Volto a dizer, você pode fazer diferente a partir de agora e
mudar o seu futuro. Nem todos têm essa chance.
Meu filho, por exemplo, não teve nem a chance de vir ao
mundo. E isso me atormentaria pelo resto da vida.
O toque do meu celular me distraiu, era meu pai novamente.
Eu já tinha perdido as contas de quantas vezes Salvatore Cavalieri
tentou entrar em contato comigo desde que cheguei ao Brasil.
Eu não atendi nenhuma das ligações, sequer conseguiria ouvi-
lo, ou encará-lo. Não apenas pelo fato de ter alimentado o meu ódio
e a minha sede por vingança durante todos esses anos, mas por eu
não ter dado um basta quando podia. Nem ele eu poderia culpar,
porque eu era adulto e responsável por cada escolha. E somente eu
poderia arcar com as consequências de cada uma delas.
— Meu pai falou que está segurando Salvatore na Itália, mas
não sabe por quanto tempo irá conseguir — Lucca disse, quando
percebeu que eu não atendi a ligação.
— Não o quero aqui.
— Vocês precisarão conversar em algum momento. Segundo
meu pai, ele parece muito arrependido, Romeo.
Saber daquilo doía em mim. Foram anos de uma relação
distante, conturbada. Perdemos o elo que tínhamos quando a minha
mãe faleceu. Se é que tínhamos um. E a única coisa que nos ligava
era a maldita vingança.
— Que ele lide com isso, porque eu tenho muito mais para
lidar do que com os seus arrependimentos — falei.
Meu celular voltou a tocar novamente, e quase o arremessei
contra a parede. No entanto, antes que o fizesse, avistei o nome de
Gustavo na tela e atendi imediatamente.
— Fala, Gustavo.
— Romeo, tenho um contato importante que conseguiu um
horário na clínica psiquiátrica onde o ex-funcionário da Mineradora
Cavalieri está internado. Estou a caminho.
— Passe aqui, vou com você.
— Não sei se é uma boa ideia, Romeo. Deixe que eu veja
como está a situação e...
— Passe aqui! — exclamei, sem dar chance para que ele
contestasse.
— Ok — respondeu apenas, e após nos despedirmos,
encerramos a ligação.
Fechei o meu notebook e me levantei. Peguei a minha carteira
que estava no aparador da sala e coloquei no bolso da calça.
— Gustavo irá passar aqui, vamos à clínica psiquiátrica atrás
daquele infeliz — falei e Lucca desviou o olhar do seu notebook
para mim. — Quer ir conosco?
Convidei tendo a certeza de que ele iria. Meu amigo sabia que
não seria uma boa ideia que eu fosse apenas com Gustavo,
conhecendo-me como me conhecia.
— Estou no meio de um e-mail importante — olhou no relógio,
digitou mais alguma coisa e me encarou —, mas, ok, irei pegar a
minha carteira — disse ao se levantar.
Minutos depois Gustavo chegou e após nos cumprimentarmos,
seguimos para a clínica.
— Romeo, preciso que me garanta que ficará apenas de
espectador, que não irá dizer nada, apenas observar — Gustavo
pediu.
Eu não podia garantir nada, mas faria o possível para me
manter centrado.
— Qualquer coisa que fizermos não planejada poderá
atrapalhar tudo, tenha isso em mente — finalizou após notar o meu
silêncio.
Por mais que eu estivesse sedento por informações, não
poderia permitir que nada desse errado. Não sabia o que
encontraríamos pela frente, mas certamente não seria algo muito
bom, tendo em vista o local em que o infeliz estava.
— Ok, fique tranquilo.
Após pouco mais de 1h30 de viagem, chegamos à tal clínica
que ficava localizada numa cidade próxima a Belo Horizonte.
Gustavo fez uma ligação e não demorou para que um homem alto e
corpulento, usando roupas brancas, surgisse e o cumprimentasse.
Eles trocaram algumas palavras, e ouvi Gustavo o chamando de
doutor Alexandre. Em seguida, apresentou-nos e caminhamos para
dentro da clínica.
O local, apesar de antigo, era limpo e bem cuidado. Entretanto,
era impossível não sentir a energia pesada, o clima estranho.
Alguns pacientes nos observavam curiosos, outros andavam de um
lado para o outro, e me peguei pensando no horror que deveria ser
viver preso na própria mente.
Entramos em um salão enorme, cheio de mesas com jogos de
todos os tipos espalhados. Isolado em um canto, longe de todos,
estava um homem que aparentava ter uns sessenta anos, sentado
em uma cadeira e mexendo o corpo para frente e para trás, e
fazendo uns gestos com a cabeça, como um tique nervoso.
— Ele está lá, não garanto que consigam conversar com ele,
ou interagir. Há anos ele está do mesmo jeito, e, os colegas mais
antigos que já trabalhavam aqui quando ele chegou, dizem que
sempre foi assim — o doutor Alexandre disse.
Gustavo o agradeceu e nos aproximamos. Somente então
conseguimos perceber que ele falava sem parar, murmúrios
incompreensíveis.
— Ademar — Gustavo o chamou pelo nome e ele se assustou,
como se tivesse saído de um transe. — Fique tranquilo, não viemos
fazer mal a você.
— Mal... mal... eles vieram fazer mal... fogo, vai pegar fogo! —
disse baixo e voltou a olhar para a frente e mexer o corpo de forma
mais frenética.
— Ademar, converse comigo, como você está se sentindo? —
Gustavo tentou novamente.
— Fogo, fogo... explodiu tudo — soltou as palavras
desconexas e colocou as mãos uma de cada lado da cabeça. —
Não matei ninguém... o fogo matou... explodiu.
Contive-me para não me intrometer, o homem estava
completamente fora de si.
— Que fogo, Ademar? — Gustavo insistiu.
— Paulo, o Paulo...
Gustavo me encarou e naquelas palavras atropeladas pela
insanidade, tivemos a certeza. A culpa que sentia fez com que
Ademar enlouquecesse. E pelo jeito, já eram mais de dezesseis
anos preso naquilo.
— Ademar, quem você estava ajudando?
— Não matei... não matei... o fogo matou, eles mandaram. Eu
explodi.
— Eles quem?
— Fogo! — gritou, levantando-se. — Fogo! Fogo! — berrou e
saiu correndo.
Dali em diante o caos ficou instaurado. Começou uma gritaria
sem fim na clínica, todos os pacientes ficaram desesperados
achando que havia fogo em algum lugar, enquanto os enfermeiros e
médicos tentavam conter o agito.
— Meu Deus! — Lucca disse, incrédulo.
— Não sei se conseguiremos mais informações relevantes
desse homem, ele está completamente fora de si — Gustavo
considerou.
— Concordo que ele está fora de si, mas sabe muito bem o
que fez, e quem o mandou fazer — ponderei.
Aquela insanidade nada mais era do que culpa.
— Podemos tentar outro dia, por hoje, acho que temos o
suficiente.
— Com certeza tentaremos — concordei.
Depois de falarmos com o médico, que nos garantiu que o tal
Ademar só falava disso o tempo inteiro e não deveríamos considerar
nada do que havia dito, fomos embora.
Não tive como não ficar em alerta, e mais preocupado do que
já estava. Cícero e Marcos estavam envolvidos nessa história até o
último fio de cabelo, e eu temi ainda mais pela segurança de
Isabela. Se os desgraçados foram capazes de matar o próprio irmão
e amigo, fazer mal a ela não seria nada.
Mas, antes mesmo que pensassem em encostar um dedo
nela, eu os colocaria atrás das grades, que era o lugar de gente
como eles, a escória da humanidade. Logo, logo, aqueles calhordas
teriam o que mereciam.
A culpa me espezinhou por dentro, desde o início era neles
que eu deveria ter focado, não na minha bella.
Contudo, estava feito. De agora em diante eu não permitiria
mais que Isabela sofresse. A bagagem de tristeza pela perda do
nosso filho, e que ela levaria para o resto da vida, era mais do que
qualquer um poderia suportar.
Eu sabia melhor do que ninguém, pois, além da tristeza, eu
também carregava a culpa.
Capítulo 6
ISABELA MORAES

Eu nunca havia sentido tanta paz.


Caminhava por um incrível campo de lírios brancos, enquanto
ouvia o canto dos pássaros e a brisa suave do fim de tarde
abraçava o meu corpo. Peguei-me sorrindo, estava me sentindo feliz
como há muito tempo não me sentia.
Escutei uma risadinha infantil e busquei-a com o meu olhar.
Encontrei uma linda garotinha de cabelos castanhos e esvoaçantes
pulando e sorrindo enquanto algumas borboletas azuis a rodeavam.
Meu sorriso se ampliou e eu me aproximei.
Ela deveria ter uns cinco anos e parecia um anjo. Usava um
vestido branco, rodado, a coisa mais linda. Era uma verdadeira
boneca de porcelana. As bochechas estavam rosadas, os olhos
eram verdes... iguais aos meus. Sua boquinha tinha formato de
coração, toda perfeita.
A gargalhada ainda mais alta foi como música para os meus
ouvidos.
Quando cheguei perto o bastante e ela me encarou, pude
sentir todo o amor que tinha naqueles olhinhos. E esse amor era
direcionado a mim. Ela correu na minha direção, eufórica.
— Mamãe... mamãe! — Meu coração falhou uma batida.
Suas mãozinhas grudaram em minhas pernas e ela me
abraçou com força. Ajoelhei-me para ficar da sua altura e seus
bracinhos rodearam o meu pescoço. Lágrimas de emoção invadiram
meus olhos, o seu cheiro era o melhor do mundo.
— Como é o seu nome? — perguntei ao encará-la com todo
amor que tinha em meu coração.
— Giordana — disse e deu uma risadinha, para logo após
tocar em meu ventre. — Em pouco tempo estarei nos seus braços,
mamãe.
♦♦♦

Despertei sentindo o meu coração batendo descompassado.


Coloquei as mãos na minha barriga e não contive as lágrimas de
felicidade ao lembrar do sonho com a minha ameixinha.
Giordana, minha menina.
Ainda podia sentir o seu cheiro, eu jamais me esqueceria. E o
som da sua risada era mais perfeito do que qualquer melodia criada
por Mozart. Ela era tão linda, tão minha. Um pedaço do meu
coração fora do corpo.
Se ainda restava qualquer dúvida sobre o sexo, havia cessado
naquele momento. Eu teria uma menina. Ainda não havia pensado
em nenhum nome, mas Giordana parecia perfeito. Combinava tanto
com ela.
— Não vejo a hora de ter você em meus braços, Gio! —
sussurrei ao acariciar a pequena elevação.
Senti-me invencível. Uma força absurda tomou conta de cada
parte do meu ser. Uma garra, uma vontade de vencer, de me
reerguer.
De voltar a sonhar.
— Isa, está tudo bem? — Alícia perguntou ao entrar no quarto
segurando um copo de água.
Ainda era noite, e como eu andava bastante cansada,
provavelmente cochilei antes da minha amiga. Lembro apenas de
que estávamos vendo um filme e, de repente, eu apaguei.
— Tudo, tudo ótimo. Você não vai acreditar no que acabou de
acontecer — respondi e ela me olhou com preocupação.
Contei cada detalhe do que havia sonhado e ao terminar, nós
duas estávamos com lágrimas nos olhos. Senti, no fundo do meu
coração, que aquilo era um bom sinal, que tudo ficaria bem.
Giordana era a minha maior certeza.
Tentei vestir três calças jeans e não consegui. Elas não
passavam no meu quadril, que havia ganhado novas curvas. Minha
barriga estava cada dia crescendo um pouco mais, e os meus peitos
estavam imensos. Apenas um dos meus sutiãs estava servindo,
mas ficava tão apertado que machucava os meus seios, por isso,
optei por não o usar.
De roupa mais larga não dava para perceber, mas quando eu
ficava nua, era impossível não perceber a mudança no meu corpo.
Minha gravidez estava cada vez mais visível, até mesmo de um dia
para o outro conseguia notar as pequenas mudanças. Eu tentava
escondê-las de qualquer jeito.
Após várias tentativas, desisti de vestir calça jeans e coloquei
um vestidinho florido e soltinho. Por sinal, não havia ficado tão
soltinho como ficava antes, mas daria para o gasto. Além do mais,
era confortável para o que eu pretendia fazer hoje.
— Por que você está suada e vermelha? — Alícia perguntou
ao sair do banheiro. — Espero que não esteja fazendo nenhum
esforço.
Ela sempre se preocupava comigo, não deixava nem eu pegar
uma folha que caía no chão. Embora eu dissesse que estava bem,
que estávamos bem, minha amiga não me deixava contestar.
— Eu estava, mas já desisti. Nenhuma das minhas calças
serve mais — respondi, ofegante.
— Precisamos renovar o seu guarda-roupa — disse.
— Não há necessidade. Tenho vários vestidos que poderei
usar durante a gravidez.
Minha amiga e o seu irmão tinham ido na casa dos meus tios
buscar as minhas coisas. Por sorte, apenas a tia Gisele estava
presente. Alícia conversou brevemente com ela, e disse que eu
entraria em contato para que tomássemos um café. Eu realmente
faria isso, mas precisava garantir que nem o meu tio e nem a minha
prima estariam lá.
— Ficou bom assim? — perguntei. — Dá para notar alguma
coisa?
— Sinceramente? Você mudou, Isa... seu corpo está diferente,
e quem a conhece bem poderá perceber.
Esse era o meu medo. Não sabia se Romeo continuava em
Ouro Preto, ou se havia voltado para a Itália, mas, ele conhecia
cada parte do meu corpo. E somente de pensar na possibilidade de
ele me ver, eu me apavorava.
— Alícia...
— Como eu disse, somente quem a conhece bem conseguirá
perceber. Mas não se preocupe, acho que é porque eu sei da sua
gravidez. Quem não sabe, poderá pensar que engordou uns
quilinhos.
— Ótimo, assim é melhor.
Alícia me deu a chave do seu carro e após me despedir dela,
segui para o meu lugar preferido no mundo.
Cheguei ao Jardim da Criança e mal coloquei meus pés na
sala, quando Noah deu um grito de alegria e veio correndo na minha
direção.
Meu pequeno garotinho.
— Tia Isa!
— Oi, meu príncipe. Que saudade! — Abaixei-me para receber
o seu abraço apertado.
Era muito, muito amor. Enquanto seus braços permaneciam
rodeados no meu pescoço, como ele sempre fazia devido ao medo
que tinha de que eu me afastasse, não tive como não me lembrar do
que Romeo havia feito.
Como poderia ter jogado tão sujo?
Ele havia conhecido o Noah, observou a nossa interação, viu o
quanto nos amávamos. Não havia perdão para o fato de ele ter
usado uma criança inocente em um plano tão sórdido.
Fechei os olhos e respirei fundo, interrompendo meus
pensamentos. Não queria estragar o momento especial pensando
nele, ou no rancor que eu sentia. Jamais me tornaria uma pessoa
amarga, por mais que em algumas ocasiões fosse impossível de
conter as lembranças, a mágoa, a raiva.
— Munta xaudade. — Beijei sua testinha e acariciei os fios
macios do seu cabelo. — Vamo blincá?
— Claro que sim, a tia Isa só vai conversar rapidinho com a
dona Lúcia, está bem? — falei e ele acenou em concordância, e
saiu correndo para perto dos brinquedos.
Segui para a sala onde a dona Lúcia ficava e a porta estava
aberta.
— Isabela, querida. Entre, por favor! — disse, simpática.
— Olá, dona Lúcia, como vai?
— Tudo ótimo, graças a Deus! E você, como está? — indagou,
dando-me um abraço apertado. — Faz tempo que não aparece por
aqui.
Ela não sabia sobre o casamento, muito menos sobre a
gravidez. Evitei comentar até que Romeo e eu voltássemos da lua
de mel e déssemos entrada na adoção. Só havia comentado que
ficaria fora da cidade por umas semanas, e logo estaria de volta.
Queria fazer uma surpresa, mas não seria dessa vez.
— Estou ótima também. Como estão as coisas por aqui?
— Tudo certo, o Noah pergunta de você todos os dias. Essa
ligação que vocês têm é incrível, parece até de mãe e filho — disse
e eu sorri.
— Eu o amo como se fosse meu, de coração.
— Sei que sim, é visível esse amor em seus olhos.
— Vocês estão precisando de alguma coisa?
— Não, neste mês recebemos uma grande doação dos pais da
sua amiga, Alícia. Além deles, o hospital onde o irmão da mãe dela
trabalha mandou alguns profissionais até aqui para verificar as
crianças. Vieram enfermeiros, fonoaudiólogos, nutricionistas.
— A Alícia me contou, que ótimo!
— Muito, eles fizeram um trabalho incrível.
— Fico feliz. — Sorri.
— E não foi apenas isso... recebemos uma quantia bem
exorbitante não identificada. Foi tanto dinheiro que a nossa auditoria
decidiu aplicar em um fundo de reserva próprio do Jardim da
Criança.
— Isso é maravilhoso! — falei, perplexa.
A notícia deixou o meu coração quentinho, por saber que
existiam pessoas maravilhosas nesse mundo, e que se
preocupavam com as crianças. Em dar a elas a possibilidade de
uma vida mais confortável. Eu estava ali há bastante tempo para
saber que toda ajuda era bem-vinda, fosse com amor e presença,
ou com dinheiro.
Por enquanto eu não conseguiria prestar nenhum auxílio
financeiro, até que a nossa galeria ficasse pronta, e até que eu me
restabelecesse. Ainda levaria um tempo, mas, quando as coisas
melhorassem, eu voltaria a ajudar.
Depois de conversar com ela, voltei para onde Noah e as
demais crianças estávamos, e brinquei com eles por toda a tarde.
Foi muito divertido, dei muita risada. Eles tinham uma energia
surreal, tanto que, quando me despedi e fui embora, ainda estava
agitada pelo dia incrível.
Atravessei a rua e esbarrei em alguém enquanto procurava a
chave do carro na bolsa. Antes que eu pudesse erguer os meus
olhos e me desculpar pela distração, reconheci o cheiro único,
assim como o toque das mãos em meus braços.
Na minha frente, estava a última pessoa que eu gostaria de
ver.
— O que você está fazendo aqui? — perguntei entredentes,
enquanto observava o olhar de Romeo Cavalieri escrutinando o meu
corpo inteiro.
Quis me esconder, ele não poderia desconfiar de nada.
— Piccola — disse, aproximando-se ainda mais.
— Me solta! Não me chame assim nunca mais! Não sou sua
piccola, não sou sua bella! — Afastei-me abruptamente de seus
braços e tentei passar por ele, mas fui impedida quando segurou o
meu braço com delicadeza novamente. — Eu mandei você me
soltar! Quer que eu faça um escândalo aqui? — vociferei, furiosa.
— Me perdoe, Isabela, por favor. Eu só quero que você me
escute.
— Não tenho nada para escutar, Romeo! E acho bom você
sumir da minha vida, caso contrário, farei um boletim de ocorrência
contra você e solicitarei uma ordem de restrição! — Minhas palavras
o deixaram perplexo, e aproveitei para me afastar novamente e
seguir para o carro.
— Eu fiz tudo errado, tudo! — Respirou pesadamente. — O
meu único acerto foi você, Isabela, eu sou apaixonado por cada
detalhe seu — disse no tom de voz firme e grosso com o sotaque
que eu tanto amei um dia.
Estaquei os meus passos e respirei fundo. Tentei me conter o
máximo que pude, pois eu não derramaria uma lágrima na sua
frente. Virei-me novamente para ele e encarei os seus olhos, que
me fitavam profundamente.
Como ele ousava continuar mentindo? O que ele queria de
mim?
— Você não passa de um mentiroso! Dissimulado! — Parti
para cima dele, cheia de mágoa, de raiva.
Em um lampejo de descontrole, empurrei o seu peito, mas ele
não se moveu.
— Não é mentira! Você é tudo que eu tenho... me perdoe! —
pediu, parecia angustiado, desesperado.
Não existia a menor possibilidade de eu acreditar novamente
nele.
— Eu não acredito em mais nenhuma palavra que sai da sua
boca. — Encarei-o pela última vez e dei as costas.
— Bella...
Entrei no carro e saí dali sem olhar para trás. Concentrei-me
no trânsito e só parei no acostamento quando estava a uma
distância segura dele. Longe da sua vista, da sua presença.
Meu coração batia acelerado dentro do peito, e, diferente do
que pensei, as lágrimas não caíram. Eu me sentia mais forte de
alguma forma, embora cada palavra sua tivesse mexido com cada
parte de mim.
Sua presença imponente e poderosa, o seu cheiro, o seu tom
de voz.
Por mais destruída que eu estivesse, um amor tão forte como
o que eu senti por ele não seria esquecido de um dia para o outro.
Só poderíamos oferecer aquilo que tínhamos dentro de nós, e foi o
que eu fiz. Amei, amei intensamente. O meu único arrependimento
foi de ter sido ingênua demais.
E eu, que nunca fui capaz de odiar, me vi odiando o fato de
ainda o amar, mesmo depois de tudo que fez comigo.
Foi por isso, apenas por isso, que resolvi tomar uma decisão
que mudaria tudo.
Capítulo 7
PALERMO, SICÍLIA, ITÁLIA

ROMEO CAVALIERI

Eu havia desembarcado em Palermo no início da tarde, mas a


minha cabeça tinha ficado em Ouro Preto. Diferente das outras
vezes, não fui para a empresa, segui direto para a minha casa.
Foi uma péssima decisão, e só percebi quando cheguei e senti
a presença de Isabela em cada cômodo. Essa casa havia marcado
o fim de tudo, e estar aqui era sufocante. Eu precisava dar um jeito
nisso.
Querendo fugir e não encarar a dor, segui para a academia e
me perdi dentro dela pelas próximas horas. Entre socos no saco de
pancadas e musculação tentei ocupar a minha mente. Contudo,
cheguei à conclusão de que não importava aonde eu fosse, ela
sempre estaria comigo.
Em meus pensamentos, em meu coração, em cada parte de
mim.
Segui novamente para dentro de casa e fui tomar um banho.
Nem mesmo a hora que passei debaixo do chuveiro foi capaz de me
relaxar. Era culpa desse lugar, que antes eu considerava um lar, um
refúgio, e hoje mais parecia um tormento.
Saí do banheiro e vesti o meu smoking no modo automático.
Em algumas horas aconteceria o evento de lançamento do uísque
com ouro da AURUM. Pessoas importantes de toda a Europa
estariam presentes, e só de pensar que eu teria que ficar a noite
inteira interagindo, me fazia não ter vontade de sair de casa.
Contudo, ao mesmo tempo, queria fugir daqui.
Porra! Eu estava prestes a enlouquecer!
Assim que terminei de me arrumar, peguei o meu celular, a
minha carteira, a chave do carro e saí de casa. Durante o trajeto até
o local em que aconteceria o evento, no entanto, o universo pareceu
querer me testar, quando a música que me fazia lembrar de Isabela
tocou no som do carro. Grande amore, do trio Il Volo.
— Como se precisasse de música... — resmunguei, referindo-
me ao fato de que ela estava cravada em minha mente.

(...)
Chiudo gli occhi e penso a lei
Fecho os olhos e penso nela
Il profumo dolce della pelle sua
O doce aroma de sua pele
E' una voce dentro che mi sta portando
É uma voz interior que está me levando
Dove nasce il sole
Onde o sol nasce
Sole sono le parole
Solitárias são as palavras
Ma se vanno scritte tutto può cambiare
Mas se as escrever tudo pode mudar
Senza più timore te lo voglio urlare
Sem mais temer eu querer gritar
Questo grande amore
Esse grande amor
Amore, solo amore
Amor, só amor
È quello che sento
É o que eu sinto
(...)

Essa canção dizia tantas coisas, como um breve resumo de


tudo que eu sentia. Eu não temia mais, poderia gritar para o mundo
o meu amor por Isabela. O meu grande amor, amor, só amor.
A música finalizou no exato momento em que estacionei o
carro. Entreguei a chave do veículo ao manobrista e segui para a
entrada, onde a mídia estava presente fotografando cada
convidado.
Eu teria passado direto se Lucca não tivesse me avistado no
meio do caminho e me chamado. Como proprietários da marca
AURUM, era o nosso dever posar para as fotos e responder
algumas perguntas dos repórteres. Fiz tudo como mandava o
figurino, ainda que no modo automático.
Minutos depois, adentramos ao salão e eu mal havia dado dois
passos quando encontrei o meu pai e o Guido. Era óbvio que eu o
encontraria, já estava ciente e preparado para isso.
— Romeo. — Guido me cumprimentou com um breve abraço,
após me sondar.
— Guido. — Retribuí o cumprimento.
— Filho — meu pai interrompeu, parecia agitado, ansioso. —
Sinto muito.
Quando me abraçou, não consegui retribuir. Eu o queria ter
evitado, mas obviamente não seria o melhor a fazer na frente de
toda essa gente. Caso contrário, amanhã mesmo estaria estampado
em todos os jornais que meu pai e eu estávamos em um clima nada
agradável.
— Não toque nesse assunto. Nem aqui nem em lugar nenhum
— murmurei.
— Eu preciso conversar com você, estou me sentindo muito
culpado.
— Não se preocupe, eu não o culpo por nada — falei com o
tom de voz mais grosso do que gostaria.
— Errei a minha vida inteira com você, não fui um pai
presente. Fui um péssimo pai, na verdade. Mas quero consertar
isso, me dê uma chance de consertar isso — sussurrou.
Lucca e Guido estavam por perto, mas a conversa tinha ficado
apenas entre o meu pai e eu. Aquele não era o momento de
falarmos de algo que não se resolveria tão facilmente.
— Não há o que consertar, o que está feito, está feito. Agora
se me der licença — rosnei e me afastei, já estava me sentindo
sufocado o bastante.
Ouvi passos atrás de mim, era Lucca. Seguimos até o bar
enquanto cumprimentávamos alguns conhecidos pelo caminho. Pedi
uma dose de AURUM e o meu sócio me acompanhou.
— Você precisa dar uma chance ao seu pai, Romeo.
— Não me pressione — pedi.
— Lembre-se que tudo que você quer de Isabela é que ela
ouça você. Não negue isso ao Salvatore — ponderou.
Ele tinha razão, mas não era tão simples como parecia.
— Não vamos falar sobre isso hoje, por favor. Não estou com
cabeça, quero focar apenas na AURUM.
— Ok, irmão, você está certo. — Ofereceu o copo em um
brinde. — A AURUM.
— A AURUM.
Após brindarmos, continuamos recepcionando os convidados,
trocando contatos com pessoas influentes, empresas. Passou algum
tempo até que um dos organizadores nos chamou para fazer o
discurso.
Cada um falou um pouco sobre a história da empresa, assim
como do quanto estávamos orgulhosos pela nossa trajetória. Há
alguns anos, não pensávamos que poderíamos chegar tão longe. E
eu tinha a plena certeza de que ainda chegaríamos muito mais.
Quando finalizamos o discurso, fomos aplaudidos e parabenizados
por todos.
Algum tempo depois, próximo ao fim do evento, resolvi dar a
noite por encerrada. Lucca disse que ficaria até o fim, mas que
estava tudo certo e eu poderia ir tranquilo. Despedi-me dele e de
mais algumas pessoas, e segui para a minha casa.
Quando cheguei, aproximadamente meia hora depois, o meu
celular tocou, era uma ligação de Gustavo.
— Cavalieri — atendi.
— Romeo, você está podendo falar agora? — indagou.
— Posso! Aconteceu alguma coisa?
— Eu tenho duas notícias não tão boas para te dar — disse e
imediatamente fiquei em alerta. — A primeira é sobre o Ademar.
— O que tem ele?
— Ele está morto. Sofreu um ataque cardíaco na madrugada
de ontem e veio a óbito.
— Porra! Não acredito! — bradei.
Não tínhamos garantia nenhuma de que conseguiríamos
alguma informação relevante dele, já que estava com sérios
problemas psiquiátricos. No entanto, foi por pouco, muito pouco que
ele não disse mais no dia em que fomos à clínica. Até mesmo o
nome do Paulo ele havia citado. Agora era tarde.
— Irei solicitar que investiguem minuciosamente essa morte.
— Você está desconfiado de alguma coisa?
— Por enquanto são só suspeitas, mas, vamos aguardar. —
Respirou fundo. — Há outra coisa mais importante agora. E eu
preciso que você mantenha a calma, nós iremos resolver tudo —
pediu.
No mesmo instante a imagem de Isabela veio em minha
mente, como um maldito pressentimento de que algo ruim tinha
acontecido.
— O que houve? Isabela está bem?
— Ela desapareceu, Romeo, sem deixar rastros. Não há
vestígios dela em lugar nenhum de Ouro Preto, nem de Minas
Gerais.
Meu coração sacolejou dentro do peito.
— Como assim desapareceu? Que porra você está falando,
Gustavo?
— Havíamos notado que ela não saía de casa há alguns dias,
enquanto Alícia e sua família seguiam a vida normalmente. Quando
Alícia, o irmão e os pais saíram de casa, pedi que um dos
seguranças entrasse na residência com o máximo de discrição
possível, e não encontraram nada. Ninguém estava lá. Isabela não
está na casa dos tios, não foi mais ao orfanato.
— E a polícia? Você já os informou sobre o desaparecimento
dela? Eles já estão a procurando?
— Não para todas as perguntas — ponderou antes de
continuar: — Tudo leva a crer que ela foi embora, Romeo.
Senti um aperto no peito, uma sensação esmagadora,
sufocante. Eu sabia que não deveria ter saído de Ouro Preto, o meu
sexto sentido me alertou desde o início.
— Porra, Gustavo! Como vocês deixaram isso acontecer? —
vociferei. — Eu mandei você colocar os melhores homens da sua
equipe para cuidar da segurança de Isabela.
— E eu selecionei os melhores, Romeo — garantiu.
— Não pode ser! De novo não!
— Nós vamos encontrá-la. Alícia não me parece preocupada,
então, acredito que ela mesma ajudou a amiga a ir embora sem
deixar vestígios.
— Irei para o Brasil o mais breve possível, enquanto não
chego, me mantenha informado sobre qualquer novidade — falei e,
segundos depois, encerramos a ligação.
Onde você se meteu, piccola?

OURO PRETO, MINAS GERAIS, BRASIL

Não fiquei nem três dias em Palermo e voltei para o Brasil


assim que consegui a liberação do jatinho da empresa. Lucca,
dessa vez, não veio junto. Tinha alguns assuntos para resolver por
lá e viria assim que possível.
Depois de várias horas de viagem, cheguei em casa exausto.
Tudo estava do mesmo jeito que deixei quando saí. As roupas de
Isabela continuavam no seu lado do closet, os sapatos, os
perfumes.
Todas as noites eu colocava um pouco no travesseiro, como
um maldito viciado. Nem assim eu conseguia aplacar a saudade
louca que eu sentia dela, do seu corpo junto ao meu, dos nossos
momentos.
Isabela era o meu vício, e eu estava em abstinência.
Peguei o meu celular no bolso e liguei mais uma vez para a
Alícia. Perdi as contas de quantas vezes tentei contato com ela
desde que soube que Isabela havia desaparecido. Contudo, sem
sucesso. Alícia não me atendeu, e, pelo jeito, não me atenderia.
Como eu não era um homem que desistia fácil das coisas,
resolvi ir até a casa dela.
Dirigi feito um louco pelas ruas de Ouro Preto, até chegar em
frente à mansão onde Alícia e sua família moravam. Saí do carro e
toquei o interfone diversas vezes, mas, ao que tudo indicava, não
havia ninguém.
Voltei e esperei por quase uma hora até que eu avistasse o
veículo de Alícia estacionando em frente à casa. Segui até ela a
passos largos, estava distraída abrindo o portão quando percebeu
que alguém se aproximava.
— O que você está fazendo aqui? — indagou ao me encarar
com o mesmo olhar acusatório de sempre.
— Onde está Isabela? — devolvi a sua pergunta com outra.
— Não interessa! — respondeu, ríspida e tentou entrar, mas
me coloquei na sua frente.
— Alícia, por favor — pedi, tentando demonstrar uma
tranquilidade que estava longe de existir. — Estou extremamente
preocupado, preciso saber se ela está bem.
— Desista, Romeo! Será que você não enxerga o mal que fez
a ela?
— Eu prometo que vou consertar tudo! Só preciso que ela me
dê uma chance.
— Todas as suas promessas são vazias! Você prometeu que
não a machucaria, e foi só o que fez! — Suas palavras me atingiram
como farpas.
Alícia entrou em casa e fechou o portão com força, trancando-
o, sem me dar tempo para falar mais uma palavra. Eu teria que
descobrir por conta própria, porque ela, definitivamente, não me
ajudaria. E eu não poderia julgá-la por defender a sua amiga.
Liguei para Gustavo e minutos depois segui para o seu
escritório.
Passamos o restante da tarde, até a noite envolvidos com as
várias suposições de locais onde Isabela poderia estar. Ele me
questionou se existia algum lugar que ela havia comentado que
gostaria de ir, qualquer coisa, mas eu não me lembrava de nada que
pudesse auxiliar.
Gustavo acessou os registros de voos nacionais e
internacionais que saíram do Brasil desde o último dia em que
Isabela foi vista, e não encontrou nada. Nos registros das
rodoviárias muito menos. Com isso, chegamos à conclusão de que
ela havia usado outro nome para viajar. Isso se, ela realmente
tivesse saído de Ouro Preto.
Massageei a têmpora, exausto, não tinha descansado desde
que cheguei de viagem.
Em seguida, montamos algumas estratégias e eu exigi que ele
ficasse atento a cada passo de Alícia. Em algum momento ela daria
uma pista, ninguém sumia assim tão fácil, sem deixar vestígios.
Eu precisava de Isabela perto de mim, mesmo que me
rejeitasse, mesmo que estivéssemos a milhares de quilômetros de
distância emocionalmente. Fisicamente eu a queria por perto.
Não saber onde ela estava me enlouquecia.
Capítulo 8
BUENOS AIRES, ARGENTINA

Seis meses depois...

ISABELA MORAES

Dei um grito ensurdecedor quando mais uma contração forte


veio com tudo.
— Força, querida! Está quase! — a médica disse.
Eu havia entrado em trabalho de parto há mais de vinte horas,
mas seguia firme, apesar de exausta. Alícia estava ao meu lado, ela
veio às pressas para Buenos Aires assim que eu a avisei que a
nossa ameixinha estava vindo ao mundo.
Mal pude recuperar o ar da última contração, quando uma
nova veio me rasgando inteira. O grito que eu dei e a força que fiz
foi seguido por uma sensação diferente das outras, de algo se
remexendo dentro de mim e depois um vazio.
Um chorinho alto de bebê preencheu os meus ouvidos e
segundos depois, minha Giordana foi colocada em meus braços.
Não contive as lágrimas ao olhar para cada pedacinho dela. Era tão
linda.
— Minha princesa, a mamãe ama tanto você, tanto, tanto —
sussurrei enquanto beijava a sua testinha.
— Ela é tão perfeita, Isa — minha amiga disse, emocionada.
— Minha afilhada.
Eu não conseguia parar de sorrir e chorar. Palavras nunca
seriam capazes de descrever tudo que eu estava sentindo naquele
momento. Com toda a certeza do mundo, tinha sido o mais bonito e
especial de toda a minha vida. Eu jamais me esqueceria, foi único.
Uma das enfermeiras se aproximou e me auxiliou com a
primeira amamentação, enquanto a médica cortava o cordão
umbilical. Minha bebê agiu com instinto ao abocanhar o meu seio
esfomeada, parando de resmungar no mesmo instante.
Acariciei os fios macios do cabelinho, não conseguia tirar os
meus olhos dela. No momento em que Giordana Moraes nasceu, eu
renasci. Eu nunca mais seria a mesma, porque ela me fez alguém
melhor.
Me fez mãe.

Depois de dois dias no hospital, minha bebê e eu finalmente


fomos para casa.
Quando chegamos ao apartamento de Maitê, nosso lar nos
últimos meses, fui surpreendida com o que vi à minha frente. Maitê
havia preparado uma linda recepção para a nossa chegada, com
balões cor-de-rosa e várias decorações no tema de algodão doce.
— Maitê, que coisa mais linda! Eu amei!
— Sejam bem-vindas, minhas lindas. Fiz com muito carinho
para comemorarmos o nascimento dessa princesa. Aliás, fizemos —
disse e deu uma piscadinha para Alícia, que segurava a minha mala
de maternidade e sorriu de volta para ela.
— Obrigada, muito obrigada por tudo. Você é especial demais
para nós duas — agradeci e ela nos deu um abraço carinhoso.
— Vocês também são para mim — respondeu, emocionada.
Observei a mesa repleta de coisas gostosas e saudáveis. Elas
haviam pensado em tudo, em cada detalhe.
— Quer segurar Giordana? — ofereci e ela se animou.
— Com certeza!
Entreguei a minha filha para Maitê com cuidado, tentando fazer
o menor movimento possível. Ela estava dormindo desde que
saímos do hospital e eu sabia que em breve ela acordaria para
mamar.
Alícia pegou o seu celular e tirou algumas fotos da decoração.
Em seguida, sugeriu que tirássemos fotos nossas para registrar o
momento e eu adorei a ideia. Havíamos tirado várias e eu pedi
discretamente à minha amiga que mandasse revelar uma das fotos
em que estávamos Maitê, Giordana e eu, e colocasse em um porta-
retrato para que eu desse de presente a ela. A mulher que tanto me
ajudou nesses últimos meses.
Ter vindo para Buenos Aires foi a melhor decisão que eu
poderia ter tomado. Longe de Ouro Preto e de tudo que havia
acontecido, pude viver uma gravidez tranquila e sem nenhuma
intercorrência. Auxiliei Maitê com a sua nova galeria, passeamos por
Buenos Aires, encontramos uma obstetra brasileira que
acompanhou toda a minha gestação desde que cheguei aqui.
Quando comentei com Alícia sobre o convite para vir com ela
para Buenos Aires, minha amiga me apoiou totalmente. Ela sabia,
assim como eu, que Romeo não desistiria fácil e se eu
permanecesse lá, logo ele descobriria sobre a gravidez.
Eu esperava, do fundo do meu coração, que quando eu
voltasse para a minha terra, ele não estivesse mais vivendo em
Ouro Preto. Esperava ainda que tivesse me esquecido de uma vez
por todas.
Minha vinda para a capital da Argentina nunca foi com a
intenção de ser definitiva. Eu já tinha deixado tudo acertado.
Quando finalizasse a reforma do local em que inauguraríamos a
nossa galeria, eu retornaria. Sabia que ocorreria após o nascimento
de Giordana, afinal, os responsáveis pela obra já haviam estipulado
um prazo prévio. E estava próximo de isso acontecer, faltavam
apenas os ajustes finais.
Confesso que não foi difícil a adaptação em Buenos Aires,
principalmente porque me mantive bastante ocupada nos últimos
meses. E, além disso, a companhia de Maitê era ótima. Eu estava
muito feliz por ver a sua felicidade. Era como se ela tivesse
desabrochado, como se no Brasil estivesse presa ao luto de tantos
anos pelo marido que faleceu tão precocemente.
Aqui, no entanto, ela acabou conhecendo um homem mais
velho, viúvo também, e ultimamente vivia suspirando pelos cantos.
Era um empresário importante do ramo imobiliário, já o tinha visto
algumas vezes. Eles formavam um casal belíssimo e eu estava
torcendo para que tudo desse certo.
Eu tinha um carinho enorme por ela, e uma gratidão do
tamanho do mundo. Maitê era muito mais do que uma amiga, era
como família.
Contudo, ainda que tivesse sido maravilhoso, não pude deixar
de sentir um pouco de saudade da minha rotina no Brasil, do
orfanato, das crianças, do Noah. Da Alícia e de sua família. Porém,
mesmo com a distância, minha amiga e eu nos falávamos todos os
dias, e ao menos uma vez por mês ela vinha me visitar.
— Isa, querida, essa menina é a sua cópia fiel — Maitê disse
ao olhar de maneira apaixonada para Giordana.
Não tinha como não se apaixonar por ela, definitivamente.
— Eu também acho, e desconfio que você tem uma copiadora
no lugar do útero — Alícia comentou, brincalhona como sempre, e
sorrimos.
Não demorou para que Giordana acordasse e começasse a
resmungar. Peguei-a do colo de Maitê e nos sentamos à mesa.
Consegui tomar um suco e comer algumas coisinhas antes que o
resmungo virasse um choro alto, sinal de que ela também estava
com fome.
A amamentação estava sendo um desafio diário. Não era tão
fácil como parecia, e eu soube disso através dos relatos de outras
mamães de primeira viagem. Além desses relatos contando várias
experiências, li muitos livros sobre maternidade, fiz pesquisas.
Queria entender esse mundo tão maravilhoso, e ao mesmo tempo
tão complexo, para que quando a minha filha nascesse, eu
estivesse preparada.
No entanto, todas as teorias que eu havia lido e aprendido não
se comparavam ao que era viver a maternidade na prática. Era
desafiador, pude perceber nos últimos três dias, desde quando
entrei em trabalho de parto.
Ainda teria muito o que aprender, mas ter Giordana em meus
braços, sentir o seu cheirinho bom e a energia vibrante que
emanava mesmo sendo tão pequenina, só me dava mais certeza de
que o meu sonho de ser mãe era muito melhor do que eu havia
imaginado.
Depois do breve e gostoso momento de comemoração que
Maitê preparou com muito carinho, ela e Alícia praticamente me
obrigaram a ir para o quarto e descansar. E nem que eu quisesse
rejeitaria a oferta, estava exausta.
Não estava conseguindo dormir direito, só dava uns cochilos
rápidos. Despertava a todo momento para ver como Giordana
estava, ou despertava ao menor movimento dela ou dos barulhinhos
que fazia. Eu estava a conhecendo, assim como ela a mim.
Alícia ficou com a minha filha para que eu pudesse tomar um
banho antes de descansar, mas não consegui ficar nem cinco
minutos debaixo da ducha, porque logo escutei o seu choro, que de
tão alto podia ser ouvido a longa distância.
Enxaguei-me rapidamente, coloquei uma camisola confortável,
escovei os dentes, penteei o cabelo e o prendi em um coque, tudo
isso em pouco mais de um minuto. Saí do banheiro e me
aconcheguei na cama.
Peguei-a em meus braços e minha amiga se retirou, deixando-
nos em um momento somente de mãe e filha, e que eu amava.
Afastei a camisola e coloquei o bico do meu seio próximo à sua
boquinha. Os seus resmungos cessaram completamente, como eu
já sabia que aconteceria.
Seus olhinhos estavam abertos, atentos e observadores em
mim. Eu sabia, no entanto, que ainda não enxergava com clareza,
por isso, resolvi contar uma história para ela enquanto a
amamentava e fazia carinho na sua cabecinha minúscula.
— Era uma vez.... em um lugar muito, muito distante daqui —
sussurrei. — Uma princesa morava com os pais em um castelo
imenso e florido com os mais perfeitos lírios brancos. Ela tinha
vários sonhos, mas o maior deles era encontrar um grande amor e
ter uma família tão maravilhosa quanto a sua era. — Enquanto eu
falava, Giordana mantinha-se vidrada em mim, parecia até que
estava entendendo tudo. — Um belo dia ela conheceu um lindo
príncipe. Ele cuidou dela como um cristal delicado, a protegeu, deu
flores, e a princesa não conseguiu evitar. Ela se apaixonou. — Uma
lágrima escorreu dos meus olhos. — O príncipe, também
apaixonado, a pediu em casamento. Eles viveram momentos muito
especiais e que jamais esqueceriam. — Embarguei. — O amor do
príncipe e da princesa era tão forte, mas tão forte, que logo eles se
tornaram três quando descobriram que uma princesinha estava a
caminho. Eles ficaram radiantes com a notícia e o nascimento da
pequena herdeira foi uma verdadeira festa no castelo. Algum tempo
depois, a princesinha ganhou um irmãozinho que foi gerado no
coração da sua mamãe e do seu papai... e então eles viveram
felizes para sempre — murmurei a parte final enquanto limpava a
última lágrima que havia escorrido.
Minha ameixinha continuava me olhando com atenção e eu
sorri para ela. Era tão gulosa e preguiçosa quanto eu. Percebi,
algum tempo depois, que seus olhinhos começaram a se fechar,
mas ela estava resistindo bravamente ao sono. Cochilava e parava
de mamar, despertava e continuava.
Não demorou até ser vencida pelo cansaço. Coloquei-a em
uma posição confortável para que pudesse arrotar e assim que fez
isso, depositei-a com cuidado no bercinho que havia acoplado à
minha cama. Até isso Maitê providenciou, eu seria eternamente
grata.
Ajeitei a minha camisola e me deitei na cama.
Peguei-me pensando em como teria sido se as coisas
tivessem acontecido de forma diferente. Se Romeo realmente
tivesse me amado. Ele estaria agora aqui comigo e com a Giordana,
aliás, provavelmente nós três estaríamos em Ouro Preto, vivendo a
plenitude.
A verdade era que os meus hormônios continuavam uma
bagunça completa, porque com a mesma intensidade que eu odiava
o fato de não conseguir esquecê-lo, eu desejava que a história que
contei para a minha filha fosse real.
Por mais que eu tentasse, todos os dias e com todas as
minhas forças, eu tinha muito medo de não conseguir deixar de
amar Romeo Cavalieri.
— Minha ameixinha, logo, logo a sua madrinha estará de volta
para encher você de beijos — Alícia disse.
Eu sabia que a minha amiga estava contendo o máximo que
podia o seu modo felícia[4], porque Giordana ainda era muito
pequena. Mas, quando minha filha ficasse um pouco maiorzinha,
certamente seria muito afofada pela madrinha.
— Obrigada por tudo, minha irmã. Eu amo você, aliás, nós
amamos você! — falei ao me despedir.
Alícia precisava voltar para o Brasil, não poderia se ausentar
por muito tempo por conta das obras na galeria e do tanto de coisas
que precisava resolver até a inauguração.
— Eu amo vocês! — Abraçou-me de volta. — Vamos
conversando no decorrer dos próximos dias sobre o seu retorno,
acredito que ainda teremos um mês e meio ou dois até tudo ficar
pronto.
Seria perfeito, eu pretendia voltar quando Giordana tivesse uns
três meses de idade. Inclusive, a tia Clarice, mãe de Alícia,
disponibilizou-se a ficar com a minha filha nos períodos em que eu
precisasse estar presente na galeria. Eu tinha uma rede de apoio
fantástica, só tinha a agradecer.
— Ótimo. Até lá você ainda virá nos visitar algumas vezes,
mais perto da data nós decidimos tudo.
— Se cuidem. Fique bem, Isa! Se precisar de qualquer coisa,
me avisa que eu venho correndo, de verdade — disse e eu sabia
que ela seria realmente capaz de fazer isso.
— Ficaremos bem, vá tranquila. Se cuide também.
Depois de nos despedirmos, Alícia foi embora. Maitê iria levá-
la ao aeroporto e depois seguiria direto para a galeria. Ela disse que
não demoraria, precisava apenas assinar alguns documentos.
Minha ameixinha se remexeu e eu a fitei com todo amor que
tinha no meu coração.
Giordana era o meu mundo.
Capítulo 9
ROMEO CAVALIERI

Havia desembarcado em Buenos Aires há dois dias, e nem


podia acreditar que depois de tantos meses sem saber nenhuma
notícia, eu estava muito perto de encontrar Isabela novamente.
Foram os meses mais difíceis e preocupantes de toda a minha
vida. Por várias vezes tentei contato com Alícia para saber qualquer
informação que fosse. Eu pensei que enlouqueceria.
Mas, finalmente, ela cometeu um deslize ao voar para a
Argentina. Poderia ser uma viagem qualquer, poderia. Contudo,
quando Gustavo me avisou que havia conseguido rastreá-la através
dos dados do aeroporto, eu me dei conta de tudo, completamente.
Como eu não tinha pensado nessa possibilidade?
Isabela havia comentado comigo quando ainda estávamos
juntos, que a sua chefe estava indo embora de Ouro Preto, pois
tinha recebido uma proposta para abrir uma galeria na capital
argentina.
No entanto, eu estava tão fora de mim, enlouquecido de tanta
saudade e preocupação que sequer cogitei a hipótese. E tudo que
eu queria agora, era encontrá-la o mais breve possível, garantir que
estava bem, segura.
Desde ontem, quando Gustavo descobriu o endereço de Maitê
e me informou, eu estava acampado em frente a ele, dentro de um
veículo que aluguei assim que cheguei. Aguardava ansiosamente
por vê-la, saindo ou chegando, somente dessa forma eu conseguiria
falar com ela. Se eu tentasse através da portaria, ela jamais
permitiria a minha entrada.
As horas estavam se passando, e nada de ela sair de casa.
Antes mesmo de Gustavo descobrir onde elas estavam morando,
estive em frente à galeria de Maitê, também esperando por qualquer
sinal de Isabela, mas ela não apareceu por lá.
Observei o prédio suntuoso, o entrar e sair de carros, e
comecei a notar algo que não havia percebido antes. O portão
automático da garagem demorava mais do que poderia ser
considerado normal para fechar quando um veículo entrava ou saía.
Não era possível que um condomínio de luxo como esse, em um
bairro nobre de Buenos Aires, pudesse ter uma falha de segurança
desse nível.
Comecei a cogitar a possibilidade de me aproveitar dessa
falha, e somente depois relatá-la aos responsáveis pela
administração. Eu estava prestes a cometer uma loucura, e não
deveria fazer o que eu iria fazer. Contudo, precisava. Demorou uns
minutos até que um veículo grande e imponente se aproximou do
portão, e eu o segui.
Não havia motivo para desconfiança, uma vez que o carro que
eu havia alugado era um dos mais caros, minhas roupas eram de
marca e eu poderia tranquilamente me passar como morador do
prédio. Ninguém desconfiaria que eu estava invadindo, eu precisava
arriscar.
Estacionei em uma vaga qualquer, próximo ao veículo que eu
havia seguido, e de dentro dele saiu uma senhora de uns sessenta
anos, mais ou menos. A cumprimentei com o meu melhor sotaque
argentino e ela me cumprimentou de volta, de maneira simpática.
A acompanhei até o elevador, e notei quando aproximou o seu
dedo do painel para que o desbloqueasse com a digital. Era o meu
dia de sorte, pois, assim que o fez e apertou o botão do seu andar,
perguntou qual era o meu e eu informei o número do andar de
Maitê.
A senhora se despediu ao chegar no seu andar e eu continuei
dentro do elevador. Ao que tudo indicava, Maitê morava na
cobertura.
Achei que o meu coração fosse sair para fora do peito, de tão
acelerado que estava quando parei em frente à porta do
apartamento.
Toquei a campainha e aguardei. Não sabia quanto tempo havia
se passado, estava nervoso demais para me atentar a isso, mas a
demora foi suficiente para que eu apertasse novamente o botão.
Segundos depois, a porta se abriu e eu não pude acreditar no
que vi à minha frente.
Isabela, minha bella, segurava um pacotinho rosa nos braços.
Fixei o meu olhar naquele ponto, hipnotizado. Senti uma pressão em
meu peito, achei que infartaria. Não consegui comandar o meu
próprio corpo, não consegui mover as pernas. Falar qualquer coisa
parecia impossível.
Eu estava diante da cena mais linda que já havia visto.
Receava ter morrido e ido para o paraíso, parecia um sonho.
Havia uma fraldinha de pano rosa no ombro de Isabela que ia até o
pacotinho. Despertei do transe quando um chorinho invadiu os meus
ouvidos, com a melodia mais bonita.
Isabela também pareceu sair do estado de torpor e me olhou
assustada, e ao mesmo tempo enfurecida.
— O que é que você está fazendo aqui? Como me achou? —
indagou, baixo, contendo o ímpeto raivoso.
Naquele instante, o embrulho rosa se moveu e puxou a fralda
de pano que a cobria, permitindo-me visualizar a cena com um
pouco mais de clareza.
Minha... minha filha! Ela não se foi.
Sem que eu pudesse impedir, as lágrimas caíram
desenfreadas dos meus olhos.
Minha bebê... não se foi, ela estava viva. Viva!
Isabela, ao perceber o meu estado e a minha constatação,
virou-se de costas e andou para dentro do apartamento. Querendo
se esconder... querendo esconder a minha filha de mim.
— Vá embora, Romeo! — bradou.
— Bella. — Fiz o contrário do que ela pediu, e a segui até a
sala, desesperado para ver de novo aquela cena.
— Vá... embora! — disse entredentes, encarando-me. — Eu
vou chamar a polícia!
— Não faz assim, piccola. — Aproximei-me o suficiente para
tocar a cabecinha cheia de cabelos da bebê, quando Isabela se
afastou abruptamente. — Minha filha...
— Ela não é sua filha! Ela é só minha, está entendendo? —
falou, como uma leoa.
Porra! Eu amava essa mulher! Não somente amava, como era
louco por ela!
— Minhas meninas... — murmurei, ainda entorpecido.
Eu estava parecendo um retardado, mas não conseguia agir
diferente. Era muita coisa para assimilar, a saudade acumulada, a
preocupação, o amor louco que eu sentia por ela. Por elas. Saber
que a minha filha não tinha ido embora como eu havia pensado em
cada maldito dia dos últimos meses.
— Nós não somos as suas meninas! Saia daqui, por favor! —
Percebi que a raiva deu lugar à mágoa.
Encarei-a e me apaixonei ainda mais. Ela estava tão linda,
seus cabelos presos em um coque despenteado, e, mesmo com a
aparência cansada, estava mais perfeita do que eu podia me
lembrar.
O corpo que eu tanto venerei havia ganhado novas curvas,
que eu teria percebido quando a vi pela última vez na saída do
orfanato, se não estivesse tão alucinado com a sua presença tão
perto, com o seu cheiro que me embriagava.
— Deixe-me abraçar vocês — supliquei.
Vi no olhar magoado que titubeou, mas foi muito rápido,
porque logo se recompôs e ergueu o queixo, demonstrando que não
estava nem um pouco abalada, quando eu sabia que sim, ela
estava.
Eu a conhecia tão bem, mais do que a mim mesmo.
— Não! Você nunca mais tocará em mim — disse, firme.
— Deixe-me ao menos segurá-la em meus braços. Ela
também é minha — falei, o sentimento de possessividade tão
intrínseco em mim dando às caras de novo. — Não me negue isso.
— Você nos mandou embora da sua vida! Nos escorraçou! —
exclamou, um pouco mais brusca do que deveria, pois a pequena
começou a chorar alto.
Isabela desviou os olhos dos meus e devolveu a sua atenção
completa à nossa filha. Sentou-se no sofá e a trocou de lado, para
que mamasse no outro seio. Tudo escondido dos meus olhos pela
fraldinha de pano rosa que usava.
— A mamãe está aqui, minha ameixinha — sussurrou,
enquanto acariciava os cabelos, e o apelido carinhoso me deixou
enlevado.
Eu também queria tocá-la, Deus! Como eu queria! Colocaria as
duas em meus braços e não permitiria que se afastassem nunca
mais de mim. Eu faria tudo, qualquer coisa por elas.
Queria me aproximar, mas me contive. Minha filha parecia
irritada, e deixar Isabela nervosa não ajudaria em nada. O cheiro de
bebê estava impregnado no apartamento, pude sentir enquanto as
encarava, hipnotizado.
Porra! Eu era pai, minha filha estava viva, saudável! Saber que
eu não a havia perdido me tirou completamente da escuridão. Meu
mundo cinza e tempestuoso se tornou mais colorido e calmo quando
a vi.
E foi inevitável não pensar nas coisas que não vivi com
Isabela. A descoberta da gravidez, juntos e felizes, os enjoos, os
desejos, a barriga crescendo, protegendo a nossa menina. O
nascimento dela, como tinha sido cada minuto desses meses.
Eu precisava saber de tudo, cada detalhe. Talvez assim, a
culpa que sentia amenizasse, pelo menos um pouco. De todo modo,
saber que ela estava bem era o que mais importava, todo o resto
poderia ficar em segundo plano.
Nem mesmo o fato de ter mentido tinha importância, até
porque eu havia merecido. Não fui homem o bastante para honrar,
para cuidar delas. Mas agora, tudo seria diferente. Se antes eu já
tinha um motivo para lutar, agora eu tinha dois.
Cessei meus pensamentos quando Isabela me encarou cheia
de mágoa.
— Vá embora, Romeo! Se você tem o mínimo que seja de
consideração por mim, vá embora, por favor — pediu, dessa vez as
palavras não vieram cheias de ódio, elas vieram em um tom de voz
baixo e calmo.
— Eu vou, piccola. Mas antes, quero pedir apenas uma coisa,
não me negue isso por favor. — Seu olhar pareceu amolecer
quando ouviu o apelido que a chamei tantas vezes. — Deixe-me ao
menos vê-la por uns minutos.
— Ela está mamando agora — disse, enfática.
— Não é como se eu não tivesse visto cada parte do seu
corpo, bella — retruquei e percebi que suspirou, ela ainda sentia
alguma coisa por mim. — Por favor, depois disso eu garanto que
vou embora.
Eu prometo.
Isabela se esticou para pegar o telefone que estava na
cômoda ao lado do sofá.
— Ok, Romeo! — Rendeu-se. — Mas depois você vai embora.
Se não for, eu ligarei para a polícia... estou falando sério — falou,
percebi que tremia ao segurar o telefone com uma das mãos,
enquanto a outra segurava a nossa filha.
Eu me aproximei e ela afastou o tecido que a escondia de
mim, e eu vislumbrei aquilo que ansiava desde que havia chegado
aqui. A pequena bezerrinha mamava esfomeada. Seus olhinhos
estavam abertos, observadores, eram os mesmos de Isabela.
Nossa filha era a sua cópia.
Um sentimento forte me envolveu. Era amor na sua forma mais
pura, mais bonita. O mesmo amor que eu sentia pela sua mãe, que
agora havia se multiplicado. Era possessividade, desespero por
querer protegê-las do mundo inteiro e mantê-las sempre em meus
braços, seguras.
— Bambina di papà — murmurei ao me abaixar, estava tão
perto delas, do cheiro, da paz que me davam.
Ao ouvir a minha voz, a pequena curiosa largou o seio da mãe
e me procurou com o olhar. Inevitavelmente minhas mãos se
moveram ao seu encontro, e eu acariciei os fios macios do cabelo.
Ela era tão pequena.
Os olhinhos observadores passaram a piscar com mais
lentidão, as mãozinhas foram na direção dos olhos e ela virou o
rostinho, abrindo a boca para encontrar novamente o seio da mãe.
Antes que eu pudesse ter mais alguns segundos daquela cena,
Isabela voltou a colocar a fraldinha sobre ela.
— Chega, Romeo! Vá embora!
— Qual é o nome dela? — perguntei, curioso.
Eu queria saber tudo sobre a minha menina, nome, quando
havia nascido, com qual peso e tamanho. Tudo. Eu daria o mundo
por ela. Por elas. Toda fortuna que eu tinha, se fosse preciso.
Porque minha filha e Isabela eram o que eu tinha de mais valioso.
Elas eram a minha vida, a luz dos meus dias.
— Vá... embora! — Não respondeu, e resolvi não insistir, não
queria estressá-las.
— Eu vou, bella. — Aproximei-me o suficiente para sussurrar:
— Mas eu volto, e lutarei com todas as minhas forças pelo amor de
vocês.
Isabela desviou o olhar do meu e não disse nada. Eu as fitei
uma última vez antes de sair dali, minha vontade era nunca mais
sair de perto delas. Entretanto, agora, eu precisava mais do que
tudo recuperar a sua confiança.
Palavras não seriam suficientes. Eu precisava demonstrar que
o que eu sentia era verdadeiro. Precisava mostrar todo o amor que
eu tinha dentro do meu coração, e que era todo delas, somente
delas.
Minhas piccolas.
Capítulo 10
ISABELA MORAES

Malditos hormônios.
Estava andando de um lado para o outro em meu quarto,
quase à beira de um ataque de nervos. Giordana estava dormindo
no bercinho, enquanto eu lidava com os meus pensamentos
tumultuados, agitados.
Romeo saiu daqui há poucos minutos, e sua presença ainda
estava por todos os espaços. Seu cheiro impregnou em mim de uma
maneira que eu mal podia aguentar, isso que ele sequer havia me
tocado.
Deus!
Era raiva misturada com tesão. Saudade misturada com
mágoa. Eu não sabia mais o que fazer. Pensei que tanto tempo sem
o ver daria uma trégua nessa loucura toda que eu sentia, mas não.
Só parecia aumentar.
Quando escutei a campainha, pensei que era Maitê. De vez
em quando ela esquecia a sua chave e voltava para buscar, eu já
estava acostumada.
Mas nada, nada havia me preparado para ver Romeo na
minha frente depois de tanto tempo. Primeiro veio a surpresa, o
choque. Depois a realidade bateu com força, não havia mais como
esconder.
Ele viu Giordana. E eu registrei cada emoção que passou pelo
seu olhar. Parecia tão sincero, mas, das outras vezes ele também
pareceu sincero e só havia mentido, enganado. Eu sempre tive em
mente que a confiança era como um cristal delicado que, uma vez
partido, jamais voltaria ao que era antes.
Não tinha como voltar a confiar em Romeo, não havia garantia
nenhuma de que ele estava sendo sincero nas suas palavras.
E se ele fizesse tudo de novo? Se nos quebrasse ainda mais?
Antes era apenas eu. E eu poderia lidar com uma traição.
Agora, no entanto, eu não estava sozinha, tinha a minha filha. E eu
jamais permitiria que ela sofresse. Eu a defenderia com unhas e
dentes. Ninguém a machucaria. Nunca, nunca.
Senti-me culpada por ter permitido a aproximação dele,
mesmo que breve. Eu o deveria ter mandado embora, ter sido mais
incisiva, mesmo sabendo que ele não desistiria tão fácil.
Eu não queria Romeo perto de nós duas. Era o que eu tentava
fixar na minha mente, porque, na verdade, o que eu queria mesmo
era o contrário daquilo.
Ele prometeu não machucar você, e foi o que fez; a minha
razão ponderou.
Peguei o meu celular e liguei para a Alícia. Eu precisava
desabafar, precisava de respostas para as minhas perguntas.
Precisava de um conselho, de alguma coisa que me fizesse parar
de desejá-lo tanto.
— Oi, Isa! Como você e a minha ameixinha estão? — minha
amiga indagou ao atender no segundo toque.
— Ele veio aqui, amiga. Ele... sabe sobre Giordana — falei,
não respondendo o que ela havia me perguntado.
— Ele... como? Romeo? Não é possível, como ele descobriu
onde vocês estavam?
— Não faço ideia, aparentemente não há nada que Romeo
não descubra.
— Ah, meu Deus! Como eu sou idiota! — disse, parecendo se
lembrar de alguma coisa.
— O quê, Alícia? — perguntei.
— Eu não fui de jatinho para o nascimento da Gio, peguei um
voo normal. O jatinho estava fretado naquele dia e eu estava tão
eufórica para chegar aí logo que nem me dei conta de que Romeo
poderia estar me rastreando. Droga! Me esqueci completamente!
O jatinho ao qual ela se referia, pertencia a empresa de um
grande amigo de Max. Tanto que, quando vim para Buenos Aires,
foram eles que organizaram tudo para que as informações com os
meus dados fossem excluídas das bases. O mesmo acontecia com
Alícia todas as vezes que vinha me ver. Resolvi me precaver, pois
sabia que Romeo era capaz de tudo.
— Me desculpe, Isa, mil desculpas!
— Tudo bem, amiga. Não há motivos para se desculpar, agora
já foi. Está feito.
— Eu vou cumprir com aquilo que disse, vou acabar com
aquele rostinho bonito e ordinário! — bradou, protetora como
sempre. — Como foi? Como você está?
— Ainda em choque, me sentindo culpada.
— Culpada pelo quê? — indagou.
— Por ter permitido que ele visse Giordana.
— Não se culpe, a culpa foi toda minha! — Suspirou, como se
ainda estivesse incrédula. — Como ele reagiu?
— Ele olhou para a filha da mesma maneira que me olhou
tantas vezes, com amor, como se ela fosse tudo de mais importante
na sua vida — falei. — Ela pareceu reconhecer o pai, acredita? O
procurou com os olhinhos curiosos quando ouviu a sua voz.
— Minha amiga, queria tanto estar aí com vocês.
— Ele não a merece, amiga. Não nos merece.
— E se ele quiser assumi-la? Você precisa começar a pensar
nessa possibilidade.
— Por que ele iria querer isso? Para me machucar ainda
mais? — Respirei fundo, não queria cogitar a possibilidade. — E se
ele quiser tirá-la de mim?
— Ele não pode fazer isso, não se preocupe. No entanto, se
quiser assumir a paternidade e realmente lutar por isso, ele poderá,
Isa.
Eu tinha tanto medo de que isso acontecesse. Por mais que
tivesse dito que lutaria por nós duas, eu não acreditava. E mesmo
que fizesse o que disse, ele nunca me teria de volta. Entre nós dois
não havia mais nada.
Tudo que tínhamos terminou no momento em que saí da Itália.
Não tinha mais volta.
— Agora me fale como você está? O que sentiu quando viu
ele?
— Sinceramente? Eu estou uma verdadeira bagunça. Sei que
os hormônios têm uma grande parcela nisso tudo. — Suspirei ao
lembrar do quanto ele estava bonito, cheiroso. Tão perto de mim. —
Se Giordana não estivesse em meus braços eu teria pulado no seu
colo e me entregado mais uma vez. Quão masoquista eu sou por
isso?
— Você não é masoquista, amiga, você é mulher. Tem seus
desejos, suas vontades... vocês tiveram uma filha juntos. Não foi
uma relação de uma noite.
— Ele me destruiu. Como posso continuar o amando depois de
tudo?
Já tinha desabafado tantas vezes com a minha amiga que
perdi as contas.
— Não temos controle sobre o nosso coração. — Suspirou. —
Mas, Isa, você já pensou na possibilidade de ele realmente amar
você?
Não. Na minha cabeça não havia espaço para essa
possibilidade. Eu fui apenas um meio para um fim. Não confiava
mais em Romeo, nem em nada do que ele me dizia.
— Não. E nem pensarei.
Aquela era a deixa para que não falássemos mais sobre o
assunto. Minha amiga nunca interferiu em nenhuma decisão minha.
Tudo que eu fiz e escolhi, foi porque eu quis. E sempre tive o seu
apoio. No início, sempre que falávamos dele, ela também ficava
enfurecida. Com o passar do tempo, no entanto, as coisas foram
mudando.
Eu sabia que Romeo a procurava para saber de mim, e não
duvidava que tivesse falado coisas bonitas para ela para convencê-
la do amor que sentia. Eu também sabia muito bem como o efeito
das suas palavras era poderoso. Senti na pele a dor de ter sido
iludida.
Giordana deu um resmungo baixo e foi o bastante para que os
meus pensamentos focassem inteiramente nela.
Aconcheguei-me, trazendo-a para perto e beijei sua testinha,
sentindo-me cada dia mais apaixonada.

Giordana estava completando trinta dias de vida, e Maitê,


Alícia e eu resolvemos dar um passeio com ela no Puerto Madero[5],
após um almoço delicioso em um dos vários restaurantes que
tinham por ali.
Minha amiga tinha chegado ontem do Brasil para comemorar o
primeiro mês de vida da afilhada. Já tínhamos decidido a data do
meu retorno, que aconteceria em dois meses. Eu estava ansiosa,
morrendo de saudade da minha rotina, do Noah, das crianças.
Sentiria muita falta da minha vida em Buenos Aires, da Maitê.
Contudo, desde o início eu sabia que teria um prazo.
Um dos meus maiores receios de voltar para o meu país não
existia mais, porque Romeo havia descoberto sobre a filha. Mesmo
assim, eu a manteria segura o bastante para que outras pessoas
não soubessem sobre ela.
A princípio, ficaríamos na casa de Alícia, depois, conforme a
nossa galeria fosse crescendo, eu procuraria o meu próprio
cantinho. Se eu não tivesse Giordana, qualquer lugar serviria. Mas,
precisava pensar no seu conforto e na sua segurança acima de
qualquer coisa, até mesmo do meu orgulho.
Romeo havia entrado em contato comigo mais umas cinco
vezes. Diferente da primeira, ele não entrou no prédio, que por sinal
até hoje eu não fazia ideia de como tinha conseguido, e sim,
identificou-se na portaria. Obviamente eu rejeitei a sua entrada. Na
última vez, pedi que ele voltasse para a Itália e nos deixasse em
paz.
— Essa cidade é muito linda, essa brisa no final da tarde é
perfeita — Alícia comentou, interrompendo meus devaneios.
— Muito mesmo, sou completamente apaixonada — Maitê
complementou.
Elas tinham razão, Buenos Aires era realmente linda e
apaixonante. Eu certamente voltaria outras tantas vezes, porque
além de amar, foi aqui que eu ganhei o meu presente mais bonito, o
bem mais precioso.
Minha ameixinha.
O apelido que Giordana ganhou quando eu estava grávida de
doze semanas havia permanecido. Ela estava cada vez mais
parecida comigo, mas por diversas vezes me peguei notando as
semelhanças com Romeo, não fisicamente. Mas na intensidade do
olhar, na maneira como reagia quando queria alguma coisa.
Era uma italianinha de sangue quente.
— E além de linda, é uma cidade especial porque foi onde
nasceu a ameixinha da madrinha — disse e eu sorri.
Ficamos ali por mais alguns minutos, e quando começou a
ventar com mais intensidade, voltamos para casa. No aparador que
ficava na parede lateral da entrada, estava o porta-retrato com a
nossa foto. Minha, de Maitê e de Giordana, do dia que chegamos do
hospital. Eu havia dado de presente para Maitê, ela amou e deixou
exatamente ali, visível para quando chegasse em casa, e saísse.
Alícia e eu seguimos para o meu quarto, e, quando entramos,
notei que ela olhou o celular e suspirou pesadamente.
— Aconteceu alguma coisa? — perguntei.
— Eu estou tentando não incomodar você com isso, Isa, mas
Romeo quer a todo custo falar com você — disse, sondando-me.
Eu havia mudado de número quando tudo aconteceu, e, até
então, ele ainda não tinha descoberto.
— O que ele quer? — indaguei, colocando Giordana no
bercinho.
— Ver vocês, saber se estão precisando de alguma coisa... o
de sempre.
— Pois diga que não precisamos dele.
— O homem sabe ser insistente, Deus! — Alícia mal concluiu a
frase quando o seu celular começou a tocar. — É ele.
— Me dê esse celular! — Alícia não disse nada, apenas o
estendeu para mim.
Respirei fundo e atendi.
— O que você quer, Romeo?
— Bella?
— Você não vai desistir?
— Nunca! Eu nunca vou desistir de vocês. Estão precisando
de alguma coisa? — inquiriu, parecia desesperado.
— Não! Nós não precisamos de você. — Respirei fundo. —
Romeo, é a última vez que eu vou pedir, se você continuar me
procurando, solicitarei uma medida protetiva.
— Você não pode fazer isso. Vamos conversar, piccola, por
favor. É só o que eu peço, uma conversa.
Deus, que saudade de ouvir essa voz grossa, esse sotaque
sussurrado no meu ouvido.
— Não, Romeo.
— Eu preciso de você.
— Espero que tenha me escutado, dessa vez não será só uma
ameaça — falei, desligando na cara dele.
Devolvi o celular para a Alícia e ela me encarou incrédula.
Nem eu mesma podia acreditar nas palavras que saíram da minha
boca, nem na firmeza com que as falei.
— Você sabe que ele não vai desistir, não é?
— Sei.
— E pretende mesmo pedir uma medida protetiva? Ele é pai
da Giordana, Isa... não o estou defendendo, mas você precisa
pensar que no futuro, quando ela crescer, poderá perguntar por ele,
querer ter contato.
— Falta muito tempo ainda.
— Isa, mais do que ninguém, eu sei de tudo que você passou,
o quanto sofreu. E você tem todo direito de não querer ter mais
contato com ele. Mas, não pode negar a paternidade de Romeo.
— Posso e vou! Não permitirei que ele a faça sofrer como fez
comigo.
— Ele não vai desistir. E se por acaso Romeo envolver a
justiça na história e solicitar a guarda compartilhada?
— Nem pensar, minha filha é totalmente dependente de mim.
Eu sou o alimento dela, o colo, o aconchego. Ele não seria capaz.
— Pense no que estou dizendo, por favor. Aproveite esses
dois meses que restam até você voltar para pensar bem — disse,
sábia. — Se eu estivesse no seu lugar, aceitaria conversar com ele,
e, nessa conversa, deixaria tudo alinhado. Ouça o que ele tem para
dizer, fale o que você precisa falar.
— Por que eu deveria fazer isso? Para me machucar ainda
mais?
— Não. Pela sua filha. Ela será o foco dessa conversa, e é
isso que você precisa deixar claro para ele.
Talvez Alícia tivesse razão. Eu precisava garantir que Romeo
não tentaria tirar a minha filha de mim, e nem exigiria a guarda
compartilhada.
Eu não suportaria.
Capítulo 11
OURO PRETO, MINAS GERAIS, BRASIL

ROMEO CAVALIERI

Isabela estava decidida a não ter nenhum tipo de contato


comigo. A firmeza com que disse aquelas palavras me assustou. Eu
queria acreditar que ela não seria capaz de realmente solicitar uma
medida protetiva, mas teria que recuar. Não podia correr o risco.
Eu já estava com uma saudade absurda das duas, aqueles
poucos minutos que fiquei perto delas não foram capazes de
aplacar nem 1%. No entanto, recuar, por ora, seria a melhor opção.
Não queria que Isabela pensasse que eu entraria na justiça
pela nossa filha, porque eu não seria louco de fazer isso. Eu as
reconquistaria, e elas voltariam a ser minhas, como já foram um dia.
Faria tudo do jeito certo dessa vez, sem a impulsividade de sempre,
apesar de querer trazê-las para perto de mim o mais rápido
possível.
Mesmo que Isabela estivesse me rejeitando, com toda razão
que tinha, eu não podia deixar de me sentir um filho da puta sortudo.
Ver mãe e filha tão conectadas, tão lindas, tão minhas, deixou-me
com uma sensação foda. Inexplicável.
Nunca vi nada tão bonito em toda a minha vida. Meu peito
parecia que iria explodir a qualquer momento. Elas estavam bem,
era o que mais importava. Minha bella e nossa ameixinha. Queria
saber a origem do apelido, combinava com ela.
— Que cara é essa? — Lucca perguntou.
Ele havia chegado ao Brasil há alguns dias, e tinha ficado
perplexo com a notícia. Meu amigo foi o primeiro a saber que a
minha filha estava viva. Logo que saí do apartamento em que
Isabela estava morando, em Buenos Aires, liguei para ele.
Precisava dividir um pouco daquilo que eu estava sentindo.
— Que cara? — Não entendi a sua pergunta.
— Esse projeto de sorriso, coisa que nunca vi — disse, um
tanto debochado.
— Vai se foder, Lucca!
— Que tal uma aposta? Se eu acertar o que você está
pensando, recebo quinhentos euros, se eu errar, você recebe os
quinhentos. — Encarei meu sócio, ele estava ficando maluco. —
Você está pensando na Isabela e na filha de vocês — falou e eu
revirei os olhos.
— Não apostei porra nenhuma! Figlio di puttana! — Ele sorriu,
cínico.
— Falando sério agora, você conseguiu algum avanço?
— Nada, cada vez que dou um passo para frente, ela me faz
voltar dez.
— E eu não tiro a razão dela. Mas, também sei que você está
sendo sincero, o conheço há muitos anos para saber que você ama
Isabela. Acho até que descobri isso antes mesmo de você — Lucca
disse.
— Se ela me escutar ao menos uma vez, a convencerei disso.
— Vá com calma, se não pode ser que você a afaste ainda
mais — ponderou.
— Eu vou, não aguento mais de saudade dela e da minha
filha. Se eu tiver o mínimo que for das duas, para mim já será o
máximo.
— Falei com o meu pai há alguns minutos, acho que Salvatore
vai vir para o Brasil. — Mudou de assunto, sondando-me.
Eu sabia que não demoraria muito para acontecer. Meu pai já
estava ciente de que a sua neta estava viva, eu não pedi segredo ao
Lucca. E desde então, Salvatore Cavalieri passou a insistir com
mais veemência para falar comigo. Eu já não o estava mais evitando
porque não queria encará-lo, mas porque as coisas por aqui
estavam muito agitadas, eu estava sem tempo para nada. Dividido
entre as atividades da empresa, as minhas tentativas de me
reaproximar de Isabela, e outras coisas que passei a fazer desde
que foi embora.
No entanto, a sua vinda poderia atrapalhar e interferir na minha
relação com ela. E tudo que eu não precisava nesse momento era
de que alguém atrapalhasse, mesmo que não tivesse intenção.
— Precisamos de Guido e Salvatore na Itália durante a nossa
ausência, Lucca.
— Sim, eu já conversei com o meu pai e até mesmo com
Salvatore. Acho que só por isso ele não veio ainda, mas só estou
comentando porque acho que não vai aguentar muito tempo.
— Eu vou me organizar para ir a Palermo para ter essa
conversa com ele antes disso, quem sabe ele sossegue por lá. —
Olhei as horas no relógio em meu pulso.
Teria um almoço com Gustavo em uma hora, ele havia
descoberto algumas informações bem importantes relacionadas às
investigações que estava fazendo daqueles malditos do Cícero e do
Marcos.
Havia comentado com Lucca, mas ele não poderia
comparecer, pois estava preso em um contrato importante, e havia
combinado de dar um retorno hoje ao nosso advogado.
Algo me dizia que estávamos muito próximos de colocar
aqueles infelizes atrás das grades.

Quando cheguei ao restaurante que havia combinado com


Gustavo, ele já estava me aguardando. Depois de cumprimentá-lo,
fizemos os nossos pedidos e ele já foi direto ao assunto.
— Comentei com você algumas vezes sobre o processo de
tutela de Isabela, certo? Sempre desconfiei de que tinha alguma
coisa estranha, já que não é comum no Brasil que precise aguardar
completar vinte e um anos para ter acesso à herança, já que a
maioridade é dezoito anos.
— E então?
— O teor do processo é todo falso, Romeo. — Suspirou
pesadamente. — Tomei a liberdade de enviar, há alguns meses,
toda a documentação para uns conhecidos nos EUA, que são
especialistas nessa área. Somente agora eu recebi o retorno. Nunca
existiu tal informação de que só poderia ter acesso aos vinte e um
anos. Inclusive, a parte que cita sobre o casamento, após os
dezoito, também não existe.
— Puta que pariu!
— Está claro que Marcos fez isso para poder manipular
Isabela e controlar o dinheiro dela.
— Como esses desgraçados conseguiram fazer? Que justiça é
essa?
— Aí é que está! O processo de tutela corre em segredo de
justiça, e, o juiz que fez parte dele é o mesmo responsável pelo
caso da Mineradora Cavalieri — disse, deixando-me incrédulo. —
Ele e Cícero são bem íntimos, por sinal. Tem gente muito maior
envolvida nessa história do que os dois.
— Você tem noção do que está dizendo, Gustavo? Essa porra
beira ao absurdo!
— Isso é apenas a ponta do iceberg, tem muito mais sujeira
por trás de tudo isso, coisa que sequer desconfiamos.
— Isabela foi enganada a vida inteira. — A constatação do que
eu já sabia me deixou aturdido.
— Ela é a maior vítima dessa história — disse, empurrando-me
ainda mais para baixo.
Se eu tivesse dito a Gustavo desde o início quais eram os
meus planos, talvez conseguisse me impedir de fazer o que fiz.
Talvez estaríamos juntos ainda e eu estaria cuidando dela e da
nossa filha, protegendo-as.
— Por que nós esperamos tanto tempo para investigar isso,
Gustavo? Porra!
— Sinto muito, Romeo. É a primeira vez que vejo algo dessa
magnitude. Tanto que, só comecei a desconfiar quando notei algo
estranho no processo da tutela, e, depois, quando soube que Paulo
Moraes sofreu uma emboscada. O que eles fizeram não foi coisa de
amador, foi muito bem-feito para que nunca fossem descobertos.
Mas, nenhum crime é perfeito.
— O que nós vamos fazer agora?
— Solicitarei o desarquivamento do caso da mineradora, e
preciso da sua ajuda para isso. Depois, veremos a questão do
processo da herança, precisaremos de Isabela — falou, cauteloso.
— Mas devo alertar que entraremos em um terreno perigoso,
Romeo.
— Eu sei, porra! — grunhi, precisava pensar.
— Podemos aguardar mais um pouco, caso ache necessário.
— Eu preciso fazer com que Isabela volte para mim. Não
posso arriscar a vida dela e da minha filha mais uma vez, Gustavo.
Por mais agoniado que eu estivesse para que aqueles infelizes
pagassem por tudo que fizeram, eu tinha que agir com frieza e
cautela. Todas as coisas que fiz pelo impulso não deram muito
certo.
— Vamos esperar, então, Romeo. Eu acho que é o melhor a
fazer... enquanto isso continuarei monitorando os passos dos filhos
da puta. Porque quando começarmos a mexer nisso, eles virão com
tudo para cima de nós... bandidos como eles não têm nada a perder.
— E eu tenho, Gustavo, tenho muito.
O que me levava inclusive a questionar novamente o
falecimento de Ademar. Se havia sido realmente um ataque
cardíaco como o médico dissera. Eu não duvidava de mais nada. No
entanto, a autópsia que Gustavo encaminhou para análise de
especialistas reafirmaram a causa da morte. Ele possuía um quadro
grave de cardiopatia, a doença era uma bomba-relógio.
— De todo modo, uma das notícias boas é que Isabela já
completou vinte e um anos e, desde o casamento, o dinheiro segue
intocado. Fiz como você ordenou naquele dia, o mantive na conta
dela, assim como cancelei tudo que enviaríamos à mídia contra a
família Moraes.
Não tinha certeza de que a notícia era tão boa assim. O
dinheiro estava todo nas mãos dela, Marcos perdeu o controle de
tudo e isso a colocava em mais risco do que já estava. Isabela, no
entanto, não havia gastado um centavo sequer do que estava na
conta.
— E o Bruno e a Júlia? Alguma novidade? — indaguei.
— Nada além do que eu já tinha dito. Eles assumiram o
relacionamento e não estão mais se encontrando às escondidas.
— Esse silêncio deles, de todos eles, é preocupante.
E então eu comecei a considerar que o fato de Isabela estar
em Buenos Aires não era tão ruim assim. Se Gustavo e eu, com
todos os recursos, demoramos a encontrá-la, aqueles filhos da puta
não a encontrariam.
Mas, mesmo assim, manteria a equipe que contratei para a
sua segurança enquanto estivesse lá. Todo cuidado do mundo era
pouco, e eu ultimamente andava obcecado com a segurança delas.
— Fique tranquilo, quando começarmos a jogar todas as
merdas no ventilador, eles não terão para onde correr. Entretanto, é
preciso que todos vocês estejam em segurança quando isso
acontecer — Gustavo disse.
Eu precisava dar um jeito de entrar em contato com Isabela,
agora mais do que nunca. Ela foi enganada a vida inteira por quem
pensou que a amava. A culpa veio com tudo, acertando-me em
cheio... porque como se não bastasse ter sido traída e enganada
pela sua própria família, eu ainda entrei na sua vida e a destruí mais
um pouco.
Depois do almoço com Gustavo, ao invés de ir para a casa,
segui para o lugar que passei a frequentar nos últimos meses desde
que Isabela foi embora, e que me trazia tanta paz.

Após algumas horas de malhação pesada para aliviar um


pouco a tensão, segui para o meu quarto. Lucca e eu tínhamos uma
reunião agendada com Guido e Salvatore sobre as vendas do
uísque com ouro e os próximos projetos que faríamos.
O sucesso tinha sido absoluto, como já esperávamos. E, por
consequência, decidimos manter a fabricação do novo uísque.
Assim que lançamos as primeiras unidades, elas logo se esgotaram.
E hoje, era uma das bebidas mais consumidas de todo o continente
europeu.
A maneira como a AURUM crescia a cada dia era
assustadora. Mas, para nós, que não tínhamos medo do trabalho e
estávamos preparados para tudo, era só motivo de orgulho por cada
conquista diária. A nossa marca se espalhava pelo mundo de
maneira vertiginosa.
E isso era o fruto do trabalho bem-feito, com ética e muita
responsabilidade.
Ultimamente eu não havia conseguido dar a devida atenção
que sempre dei, mas tinha sorte por ter Lucca como sócio. Ele, mais
do que qualquer um, compreendia os meus motivos.
No entanto, depois que descobri que a minha filha estava viva,
retomei os trabalhos com ainda mais energia. Pela intensa vontade
de dar um futuro confortável, uma vida boa, onde ela pudesse ser
tudo aquilo que quisesse.
E não era apenas dinheiro, eu queria dar amor, ser um pai
presente.
Deus! Como eu queria!
Ela, tão pequenina, sem saber, tornou-me um homem infinitas
vezes melhor. Ainda não tive a oportunidade de pegá-la em meus
braços, abraçá-la, fazê-la dormir. Mas, saber que o seu
coraçãozinho continuava batendo, era o motivo das batidas do meu.
Eu errei feio, muito feio. E o meu maior castigo era não poder
estar ao lado delas. Não ter acompanhado cada momento da
gravidez, do nascimento, os primeiros dias de vida.
Entretanto, um dia, a minha filha saberia do tamanho do meu
amor por ela, e que eu seria capaz de qualquer coisa pela sua
felicidade e segurança.
Um dia, a ameixinha e sua mãe voltariam para mim.
Eu as faria as mulheres mais felizes do mundo inteiro. Eu as
honraria da maneira que elas mereciam. Seria um pai, um marido,
uma fortaleza. Seria o braço que protege, o colo que acolhe. Daria
todo amor que eu tinha.
E quando esse dia chegasse, eu seria o homem mais feliz do
mundo.
Capítulo 12
ISABELA MORAES

Ah, minha terra querida, quanta saudade eu senti!


Estar novamente em Ouro Preto depois de tantos meses era
inexplicável. Minha ameixinha dormiu a viagem inteira, felizmente
não se incomodou com nada. Ela era toda perfeitinha.
Quando chegamos à casa de Alícia, a festa foi imensa. Seus
pais ficaram encantados com Giordana, eles haviam preparado uma
recepção deliciosa para a gente. E eu não podia estar mais grata
por serem tão maravilhosos.
— Você está ainda mais linda, Isa. A maternidade fez muito
bem para você — Max disse, enquanto Alícia e seus pais babavam
na minha princesa.
— Obrigada, Max, você também está bonitão como sempre —
brinquei e ele me fitou com intensidade.
Max, no passado, tentou ficar comigo algumas vezes. Porém,
sempre tive medo de que algo pudesse estragar não só a ótima
relação que eu tinha com ele, como a minha amizade com Alícia, e
também com os seus pais. Nunca cedi às suas investidas, por mais
que tivesse ficado tentada algumas vezes.
— Como vocês estão? — perguntou, interessado.
— Muito bem, aquela pequena ali é a luz dos meus dias —
falei, desviando o olhar para o pacotinho rosa, que sorria para a
madrinha.
— Ela é a sua cópia — ele disse e eu sorri, toda orgulhosa.
— Max, nunca consegui agradecer você o suficiente por tudo
que fez. Eu só consegui ter paz graças a você. — Referi-me ao fato
de que foi com a ajuda de Max que eu consegui ir para Buenos
Aires sem levantar suspeitas.
— Não precisa agradecer. Conte comigo para o que precisar,
Isa.
— Obrigada, mesmo, de coração — repeti e ele tocou em meu
braço com suavidade.
— Olha só, Max, se essa não é a ameixinha mais linda desse
mundo inteiro! — Alícia exclamou, interrompendo o breve momento
de interação entre mim e ele.
Quando minha filha me avistou, o sorriso ficou ainda maior, e
eu quase me derreti inteira quando seus bracinhos balançaram na
minha direção. Ela recém tinha completado três meses, e estava
cada dia mais esperta.
— É linda mesmo, a cara da mãe — ele disse novamente,
encarando-me, enquanto eu pegava a Gio nos braços.
Max era um homem bonito, tinha um coração do tamanho do
mundo, assim como Alícia e seus pais. E, até onde eu me lembrava,
ele era um mulherengo. Segundo palavras da minha amiga, ela
perdeu as contas de quantas namoradas ele já teve.
Contudo, não podia deixar de notar os olhares que estava me
dando desde que eu havia chegado. Na verdade, ele sempre me
olhou diferente, mas das outras vezes, não parecia muito disposto a
demonstrar.
Giordana começou a tentar puxar para baixo,
desgovernadamente, a minha camiseta. E aquilo era um sinal
clássico de que ela queria mamar. Às vezes eu tinha a sensação de
que era uma vaca leiteira, porque enquanto estava com outras
pessoas, ela não resmungava ou fazia essas coisas, mas era só
chegar perto de mim para a sua fome chegar com tudo. Ela sentia o
meu cheiro, era como um instinto.
Nossa ligação era única.
— Se vocês me derem licença, eu já volto — falei, sorrindo,
antes que ela me deixasse nua ou abrisse o berreiro.
— Vá, querida... esperaremos você para começar a almoçar —
a tia Clarice disse.
Alícia nos acompanhou até o quarto e eu dei o que tanto a
minha filha queria. Soltei um gemido de dor quando ela abocanhou
o meu seio com tanta avidez, que parecia não mamar há dias.
— Dói? — Alícia perguntou.
— Não, mas às vezes ela pega com tanta ânsia que machuca.
— É fome, mamãe — disse, sorridente, enquanto observava a
afilhada. — Ela cresceu tanto, está tão grandona.
— Está mesmo! Todos os dias noto algo diferente nela, e me
apaixono um pouco mais — respondi. — Amiga, esqueci de avisar a
Maitê que chegamos, você pode, por favor, mandar uma mensagem
para ela? — Estendi meu celular na sua direção.
— Claro. — Alícia fez o que pedi e me devolveu o aparelho. —
Como foi a despedida?
— Ela ficou bem emotiva, eu também. Maitê foi um anjo na
minha vida, nunca conseguirei agradecer o suficiente por tudo que
fez.
— Eu imagino, foram bons meses com ela, não é?
— Ótimos, mas já era hora de voltar, não se pode fugir para
sempre.
— Não mesmo. E quais são os planos para os primeiros dias
antes da inauguração da nossa galeria? — indagou.
— Isso que eu queria comentar com você. Será que posso
deixar a Giordana apenas por umas horinhas aqui com vocês? Eu
preciso ir ao orfanato, estou morrendo de saudades de Noah e das
crianças.
— Claro que sim, Isa. Cuidaremos muito bem dessa princesa.
— Eu vou deixar um pouco de leite, para o caso de ela querer.
Mas acho que não terá necessidade, eu não vou demorar.
— Fique tranquila, vamos nos divertir muito.
— Obrigada, minha amiga. — Sorri. — E a tia Gisele, você tem
alguma notícia dela?
— Não, Isa. Nunca mais a vi... e nem a malévola e o idiota —
disse, referindo-se a Júlia e ao Bruno.
— Será que eles estão juntos ainda?
— Não duvido... e se merecem, viu.
Pelo jeito as coisas continuavam do mesmo jeito que estavam
quando fui embora. E eu esperava que continuassem assim, não
queria encontrar nenhum deles na minha frente, com exceção da tia
Gisele. Eu sentia muita saudade dela, e pretendia encontrá-la assim
que possível.
Nos últimos meses preferi não arriscar nenhum contato, não
queria que o meu tio soubesse onde eu estava, porque eu não
confiava mais nele, nem sabia do que ele poderia ser capaz.

Cheguei ao Jardim da Criança no meio da tarde, cheia de


saudade. Nunca tinha ficado tanto tempo longe desde que passei a
frequentar o orfanato. O dia estava meio nublado, e eu já podia ouvir
de longe as risadinhas infantis que eu tanto amava.
Se tivesse sol, certamente eles estariam brincando aqui fora.
Fiz o percurso de sempre, ansiosa para vê-los, mas quando entrei
na sala, nada me preparou para o baque ao ver a cena que vi à
minha frente.
Achei que minhas pernas não sustentariam o meu corpo.
Romeo Cavalieri estava sentado no chão e, em seu colo, Noah
prestava atenção na historinha infantil que Romeo lia para ele. Tinha
mais duas crianças bem pertinho deles, ouvindo com atenção,
enquanto as outras, menores, se entretinham com outras coisas.
O que ele estava fazendo ali?
Meu coração estava acelerado, as minhas pernas pareciam
gelatinas. Cada parte do meu corpo reagiu à sua presença. Vê-lo
com Noah nos braços me desarmou de uma maneira que nem
mesmo eu esperava. Era exatamente aquela cena que eu desejava
ver, quando me prometeu tantas coisas.
— Tia Isa! — O gritinho estridente de Noah fez com que eu
saísse do estado de torpor.
Ele veio correndo na minha direção e pulou em meu colo com
tanta força que por muito pouco não caímos os dois no chão.
— Meu lindo príncipe, como você cresceu! — falei, fitando os
olhinhos castanhos e intensos, depois o abracei com força e o enchi
de beijos.
— Tia Isa, vuxê demolo... — disse, formando um biquinho e os
olhos encheram de lágrimas.
Meu coração ficou pequenininho. Não queria que ele tivesse
sofrido com a minha ausência, mesmo sabendo que aquilo seria
inevitável... Noah e eu éramos muito ligados um ao outro. E, assim
como ele, eu também sofri. Mas já era adulta, tinha discernimento
de tudo que estava acontecendo, diferente dele.
— Sinto muito, meu amor... a tia Isa precisou fazer uma
viagem. Prometo que não ficarei mais longe, está bem? — perguntei
e ele acenou em concordância.
Seus bracinhos rodearam o meu pescoço e os meus olhos
foram puxados na direção de Romeo, como um ímã. Ele me
encarava, ao mesmo tempo em que estava perplexo, parecia
preocupado. Mas, que ficasse tranquilo, eu não faria nenhum
escândalo.
Só queria entender o porquê ele estava ali.
— Preciso falar com a dona Lúcia, querido — sussurrei quando
percebi que Noah não me largaria.
— Não! — disse, apertando-me com mais força, querendo
chorar.
— Shh... tudo bem, eu estou aqui, meu lindo príncipe. Fique
calmo — falei e me virei de costas para Romeo, não estava
conseguindo lidar com a profundidade do seu olhar no meu. —
Vamos lá com a tia Isa, então.
Segui com Noah para a sala de dona Lúcia. A porta, como
sempre, estava aberta, e assim que entrei, fui recebida com um
enorme sorriso. Lembrei-me de que antes de viajar, eu liguei para
ela e a avisei que ficaria um tempo fora. Não tive coragem de vir
aqui e me despedir das crianças, de Noah. Fui fraca, hoje, no
entanto, não era mais.
— Isabela, querida! Quanto tempo! — exclamou, levantando-
se e me deu um abraço forte. — Esse pequeno não larga mais de
você agora — brincou.
— Não, é um grude. Meu grude. — Beijei a testinha de Noah.
— Como estão as coisas por aqui?
— Tudo ótimo, graças a Deus, muito bem. E você, como está?
Parece tão radiante.
— Que bom, fico feliz. Eu estou bem também. — Sorri, grata
pelo seu carinho. — Romeo está frequentando o Jardim da Criança
desde quando? — sussurrei.
— Ele começou a vir poucos dias após você me ligar para
avisar que passaria um tempo fora... e tem vindo quase toda
semana. Noah e ele estão bem próximos, criaram um vínculo muito
bonito. Romeo é um homem especial.
Ah, se ela soubesse.
Eu não pretendia comentar com ela tudo o que aconteceu.
Poucas pessoas sabiam, apenas as que eu confiava cegamente. E
não significava que eu não confiava em dona Lúcia, mas não tinha
motivo para falar a ela algo tão pessoal, e que dizia respeito
somente a Romeo e a mim.
No entanto, se Romeo apenas cogitasse magoar Noah, eu não
responderia por mim.
Após conversar com ela, voltamos para a sala onde estavam
as crianças. Romeo continuava lá, dessa vez, ajudava um menino
de uns dois anos a montar um carrinho de lego. Quando Noah o viu,
se debateu em meu colo e eu o coloquei no chão.
Ele deu o seu jeitinho e se enfiou entre Romeo e o outro
garotinho, todo enciumado.
— Ele é assim. Não pode ver Romeo dando atenção a outra
criança que fica com ciúmes — Dona Lúcia disse.
Meu menino, estava cada dia mais lindo. Queria tanto levá-lo
comigo.
Passei mais algum tempo interagindo com as crianças e
fugindo do olhar de Romeo, que a todo tempo me encarava, me
procurava. Tentei não dar importância, fingir que não me abalava.
Meu seio começou a doer e pesar, eu sabia que estava na
hora de voltar para casa. Ainda não tinha me afastado de Giordana
por tanto tempo, que no caso, não havia passado de duas horas.
E foi naquele momento que recebi uma ligação de Alícia.
— Oi, Alícia! — atendi rapidamente e ouvi o choro estridente
da minha filha.
— Isa, nossa ameixinha quer você. Ela acordou do soninho,
nós duas brincamos, quando começou a resmungar tentei oferecer
a mamadeira e ela não quis.
— Estou indo agora mesmo — garanti.
— Venha com calma, a madrinha está cuidando dessa
manhosa.
Após encerrarmos a ligação, aproveitei que Noah estava
brincando de correr com os amiguinhos e fui embora. Antes mesmo
que pudesse chegar no portão, senti a presença de Romeo atrás de
mim.
— Bella.
— Eu não posso falar com você agora, Romeo.
— Como está a nossa filha? — foi a primeira coisa que
perguntou, e eu pude perceber que estava ansioso.
— Está bem. — Tentei retomar o meu caminho, e fui
interceptada pelo seu toque em meu braço. — Romeo, eu preciso ir!
— Tudo bem. Mas você aceita jantar comigo qualquer noite
dessas? Eu preciso muito conversar com você, por favor.
— Não vou jantar com você, mas nós realmente precisamos
conversar — falei, firme. — Quando eu puder, entro em contato com
você.
Senti minha camiseta úmida na região dos seios e olhei para
baixo. Meu movimento fez com que Romeo seguisse o meu olhar e
seus olhos fixaram-se ali, onde o leite havia escapado.
— Droga! — Coloquei meus braços na frente, não queria que
ele visse aquilo. — Se me der licença. — Caminhei na direção do
carro.
— Aguardarei a sua ligação, bella — disse e eu o encarei pela
última vez, sem responder mais nada.
Fui para casa cheia de dúvidas e questionamentos.
E com Romeo nos meus pensamentos.
Capítulo 13
ROMEO CAVALIERI

Havia acabado de estacionar em frente à casa de Alícia. Ainda


não estava acreditando que Isabela tinha entrado em contato
comigo para conversarmos, finalmente. Não seria um jantar, como
eu pretendia, mas estava valendo.
Desde que recebi a sua mensagem, eu estava louco para que
o tempo passasse o mais rápido possível. Fazia quase três meses
que eu não via a minha filha, não por falta de tentativa da minha
parte. E isso me destruía todos os dias, massacrava o meu coração.
Saí do carro e toquei o interfone.
Não demorou para que a razão da minha loucura surgisse,
linda como sempre, perfeita, porra!
O portão se abriu e eu entrei, caminhando na sua direção. Ela
usava um de seus vestidos soltinhos, as curvas que havia ganhado
a deixaram ainda mais gostosa do que já era. Senti a brisa do vento
passando entre nós e trazendo o seu cheiro para mim.
Respirei fundo, como um maldito viciado.
E tudo que eu queria fazer era beijar aquela boca, tocá-la,
amá-la da forma que merecia. Mas me contive. Eu precisava me
conter, ou esse pequeno avanço poderia fracassar.
— Bella — falei ao me aproximar, segurando-me para não a
tocar.
— Me acompanhe, por favor — disse, o queixo estava erguido,
demonstrando segurança.
Mas eu conhecia Isabela como a palma da minha mão.
Percebi como me olhou, como corou, mesmo que tivesse tentado
disfarçar. De alguma forma, eu ainda mexia com ela. E isso me dava
alguns pontos.
Eu a segui, absorvendo cada detalhe seu. Sem prestar
atenção em mais nada, só no silêncio ao nosso redor, quebrado
apenas pelo som das nossas respirações e dos nossos passos.
Isabela entrou em um corredor, caminhou até parar em frente a
uma porta, e em seguida, entrou por ela. Era um escritório.
— Eu queria ver a nossa filha, piccola — falei, ansioso.
— Não me chame de piccola, Romeo, nós não temos
intimidade nenhuma para esses apelidos! — exclamou, altiva. — E
sim, você vai ver a sua filha, mas antes nós iremos acertar algumas
coisas. — Ela apontou para o sofá e eu me sentei, esperando que
viesse para o meu lado, mas não, Isabela sentou-se na cadeira ao
lado oposto.
— Como vocês estão? Precisando de alguma coisa? Eu...
— Estamos ótimas! E não, nós não estamos precisando de
nada — interrompeu-me.
O olhar que tantas vezes me olhou cheio de amor, agora me
olhava com mágoa. A fúria parecia ter abrandado, mas,
sinceramente, eu preferia mil vezes ver Isabela brava do que triste.
— Me desculpe — falei, encarando-a.
Minhas desculpas eram as mais sinceras, todas as vezes que
pedi foram do fundo do meu coração. E não era apenas para me
aliviar da culpa que eu sentia todos os dias, mas porque eu
realmente queria o seu perdão. Queria consertar tudo.
— Quero acertar as coisas com relação à nossa filha. Eu não
vou permitir que você a tire de mim, fique ciente disso, Romeo —
disse, firme.
— Eu jamais faria isso — me defendi. — Eu nunca...
— Eu não acredito em você. — Embargou, mas logo se
recompôs. — Mas, como você é o pai, poderá ter contato com ela.
— Senti a acidez de suas palavras. — Contudo, será do meu jeito.
Como e quando eu quiser!
Já era alguma coisa.
— Eu amo você, Isabela — falei, sem que esperasse. Declarei-
me pela primeira vez. — Porra! Eu amo você pra caralho! Faço
qualquer coisa para ter vocês de volta!
E lá estava eu sendo impetuoso mais uma vez. Era mais forte
do que eu. Essa urgência, essa impulsividade. Eu não conseguia
me controlar na frente dela, precisava provar que a amava.
— Se você começar com essa conversa, irei retirar tudo que
eu disse! — O tom de voz, embora firme, estava mais baixo.
— Eu amo você, amo a nossa filha — insisti.
— Não insista! Não há mais nada entre nós! — Respirou
fundo. — Quanto aos encontros, serão a cada quinze dias, por uma
hora. Giordana ainda mama e depende de mim para tudo... — Dali
para frente não escutei mais nada.
Giordana.
Não podia ser. O nome da minha filha era o mesmo nome da
minha mãe?
— Gio... como? — indaguei e ela me olhou confusa.
Achei que meu coração fosse sair pela boca. Eu nunca havia
mencionado o nome da minha mãe para Isabela... algo sacudiu
dentro de mim, se agitou, a coincidência era demais para que eu
conseguisse me centralizar.
— Ah, sim, o nome dela é Giordana. Giordana Moraes —
disse, encarando-me.
— É o nome da minha mãe — murmurei, deixando-a perplexa.
— O quê?
— Giordana Accorsi Cavalieri era o nome da minha mãe.
— Deus! — Isabela levantou-se, parecendo atordoada. — O
sonho... eu sonhei. Minha filha me disse o nome dela.
— Que sonho? — perguntei.
— Não importa — respondeu, perdida em pensamentos.
Eu queria saber, mas ela não estava disposta a dividi-lo
comigo.
— Deixe-me vê-la, por favor! — supliquei, levantando-me e me
aproximando.
Isabela se afastou, colocando uma distância segura entre nós
dois. Ela ainda parecia aturdida, tanto quanto eu. Era uma emoção
louca, descomunal. Minha filha carregava o nome da avó.
— Ok. Não saia daqui! Eu já volto — disse, sem me encarar, e
saiu como se estivesse fugindo de alguma coisa.
Senti que o meu coração acelerou ainda mais. Eu a veria
depois desses meses que pareceram uma eternidade. Minha filha,
meu sangue. Minha herdeira.
Não demorou muito para que Isabela retornasse. Sua postura
firme e rígida de minutos atrás estava completamente diferente.
Agora, ela estava calma, o andar suave, exalava doçura.
E o motivo estava em seus braços, soltando uns pequenos
resmungos.
Sem me conter, aproximei-me das duas e por pouco não
contive as lágrimas em meus olhos. Minha filha estava ainda mais
parecida com Isabela. Ela cresceu desde a última vez que a vi,
havia ganhado peso, estava gordinha e as perninhas tinham dobras.
Linda, toda linda.
Usava um vestido rosa, cheio de babados. E um laço pequeno
do mesmo tom do vestido no cabelo. Porra! Vi-me ainda mais
apaixonado por essa garotinha. Cego de tanto amor.
Toquei com delicadeza no seu rostinho. Minha mão era
gigante, bruta demais para ela, que era toda pequena e delicada.
— Bambina di papà — murmurei e ela me encarou, curiosa. —
Deixe-me segurá-la — pedi.
— Eu não sei se...
— Por favor, Isabela — implorei, ela parecia em dúvida.
— Tenha cuidado, por favor — disse, depois de pensar por
breves segundos. — Ela é muito pequena.
— Eu jamais a machucaria — sussurrei, enquanto Isabela me
entregava a nossa filha.
E pela primeira vez, eu segurei o meu mundo inteiro nas mãos.
Giordana era tão pequenina. Parecia tão frágil. Ela não
desviou os olhinhos dos meus, observadora. Criamos uma conexão
naquele instante. Um elo inquebrável. De pai e filha.
Isabela se manteve por perto, atenta.
Aproximei a testinha dela do meu nariz e a cheirei. Era o
mesmo cheiro da camisetinha que eu ainda guardava, eu o
reconheceria em qualquer lugar, em qualquer ocasião. Beijei com
suavidade a sua bochecha. Ela tinha a pele tão branca quanto a da
mãe, e receei arranhá-la com a minha barba. Giordana ficou calma
em meus braços, como se soubesse que dentro deles estaria
segura para sempre.
— Papà ti ama, principessa — murmurei.
Algo fez com que ela abrisse o maior e mais lindo sorriso do
mundo. E ele era todo para mim. Eu não pensei que seria possível
amá-la mais do que eu já amava. Não tive como não sorrir de volta,
coisa que eu não costumava fazer com frequência.
Encarei Isabela e ela nos olhava de uma forma que eu não
saberia explicar. Seus olhos brilhavam de lágrimas contidas. Ela se
mantinha forte. Minha piccola era uma fortaleza.
— Eu amo vocês. — Encarei-a com intensidade e ela arfou.
— Acho que já chega. — Aproximou-se, mas eu ainda não
queria perder o contato com a minha filha, tinha sido pouco tempo.
— Vem com a mamãe, ameixinha — disse, com suavidade.
Nossa filha deu um gritinho, achando graça. E, do seu jeitinho,
fugiu dos braços da mãe, escondendo-se em mim. Um novo sorriso
curvou em meus lábios ao constatar que eu, provavelmente, teria
uma forte aliada para reconquistar Isabela.
— Eu acho que ela quer ficar mais um pouco com o papà.
Giordana segurou o meu rosto com as duas mãozinhas, um
tanto descoordenadas, e mordeu o meu queixo com a boca sem
dente... poderia me fazer de gato e sapato se quisesse. Ela me tinha
nas mãos, assim como a sua mãe.
Eu estava completamente rendido por elas.

PALERMO, SICÍLIA, ITÁLIA


Eu havia acabado de desembarcar em Palermo. Era uma
viagem não programada, de urgência, após receber uma ligação de
meu pai, informando que algo tinha acontecido com Lucca. Não
sabia ao certo o que era, ele não atendeu as minhas ligações, mas
eu estava preocupado, e muito.
Nem passei em casa, fui direto ao seu apartamento.
Quando cheguei, não esperava ver o meu amigo do jeito que
vi. A última vez que o vi assim foi há anos, quando seu grande amor
se foi. Guido estava por ali, encarava o filho com pesar, assim como
a sua mãe.
— Lucca? — o chamei e ele me encarou. — O que houve? —
Aproximei-me.
Ele estava sentado na poltrona. Na mesa à sua frente tinha
uma garrafa de uísque do mais vagabundo de todos. Aquilo
certamente daria uma ressaca filha da puta, e pelo jeito era o que
ele queria, já que optou por não beber o nosso uísque.
— Ela morreu, Romeo. Minha Laura morreu — murmurou, a
mandíbula estava cerrada, os lábios se fecharam em uma linha fina.
Puta que pariu! Mas ela não tinha ido embora? Como morreu?
— Eu sinto muito, irmão.
Eu sabia exatamente o que ele estava sentindo. Passei pelo
mesmo quando achei que Isabela tinha morrido naquele acidente. É
uma sensação esmagadora, de impotência, revolta. Fúria.
Queria perguntar, saber detalhes sobre o que tinha acontecido.
Mas não queria forçá-lo. Lucca parecia no limite. E isso era muito
raro de acontecer. Geralmente ele era o centro, os pés no chão.
Entretanto, tudo que fiz foi caminhar até a mesinha de bebidas
que ficava ao lado do sofá, servi duas doses de AURUM e me
sentei à sua frente, afastando a garrafa daquele uísque horroroso,
que sequer tinha uma marca.
Lucca esteve ao meu lado quando eu mais precisei. Foram
tantas vezes que eu perdi as contas. E agora eu estava ali pelo meu
irmão. Dividiria com ele todo o peso, toda a carga e toda a dor.
— Ela foi embora para morrer... Laura não me deixou porque
não me amava mais, Romeo! — Pegou o copo da minha mão e
virou de uma só vez, fiz o mesmo com o meu. — Eu teria ficado ao
lado dela, teria feito de tudo para salvá-la, porra!
Quando Laura se foi, era o que ele pensava, que ela não o
amava mais. Tanto que, depois de ter sofrido igual a um condenado,
se desligou das lembranças e passou a viver no automático. Eu
sabia, no entanto, que aquilo era apenas uma fuga.
Lucca se levantou e caminhou até a janela da cobertura em
que morava. Fixou o seu olhar no breu da noite e ficou perdido nas
próprias lembranças.
Observei Guido e a esposa que chorava abraçada a ele.
— O que aconteceu? Como Laura morreu? — perguntei.
— Ela estava com uma doença degenerativa, seus pais nos
ligaram ontem para comunicar sobre o falecimento — Guido
respondeu.
— E o velório? Quando vai ser?
— Já aconteceu, só nos avisaram depois. Lucca está
inconformado.
— Porra! Não poderiam ter feito isso com ele!
— Foi um desejo de Laura, Romeo. Ela não queria que ele a
visse doente.
Eu não podia acreditar, era injusto de tantas maneiras. Nada a
traria de volta, mas, quem deveria escolher ir ou não ao último
adeus era ele. No entanto, eu não julgava a atitude dos pais em
respeitar a última decisão da filha.
Era uma situação fodida.
Eu senti na pele tudo que ele estava sentindo agora. Mas, no
meu caso, Isabela não se foi, seu coração continuava batendo. Ela
estava viva. Laura não. Laura tinha ido embora, dessa vez, para
sempre.
Caminhei até o meu amigo e apertei o seu ombro, confortando-
o, demonstrando que eu estava ao seu lado, e estaria sempre que
ele precisasse. Éramos irmãos.
— Sinto muito — murmurei mais uma vez.
Ele não disse nada, sequer se mexeu. Seus olhos estavam
fixos em um ponto qualquer. Nunca o tinha visto daquele jeito.
Lucca estava destruído.
Capítulo 14
OURO PRETO, MINAS GERAIS, BRASIL

ISABELA MORAES

Tim-tim!
Alícia e eu brindamos à nossa galeria, que enfim, havia sido
inaugurada. Nem nos meus melhores sonhos eu imaginei que
estaria me sentindo tão realizada profissionalmente. Era uma
sensação gostosa, a certeza de que depois da tempestade, sempre
vinha a calmaria.
E eu estava vivendo dias de paz.
A inauguração oficial aconteceu há uma semana, em uma
pequena celebração somente para a sua família. Queríamos algo
bem intimista, apenas para não passar em branco o momento que
tanto havíamos almejado.
Todos os dias, minha amiga e eu brindávamos com uma xícara
de chá, assim que chegávamos no nosso local de trabalho.
Era para dar sorte.
Alícia acabava ficando ali a maior parte do tempo, já que eu
precisava me dividir entre a galeria e a minha filha. E, como
Giordana não pegava a mamadeira de jeito nenhum, eu precisava
me ausentar várias vezes ao dia.
Felizmente, não era muito longe da casa de Alícia, o que
facilitava bastante. Além do mais, a tia Clarice estava ficando com
ela durante a minha ausência, então eu podia ficar mais tranquila.
Minha garotinha era cheia de vontades, e teimosa. O que tinha
de parecida comigo na aparência, era a cópia do pai no gênio. Tão
pequenina e o sangue quente italiano já falava mais alto.
Giordana... o nome da sua mãe. Eu ainda não acreditava em
tamanha coincidência.
Não havia um dia desde que Romeo a segurou pela primeira
vez em seus braços, que eu não relembrava daquela cena. Ele todo
grande, forte, vestido de preto, calça jeans, camiseta e casaco de
couro, segurando um pacotinho cor-de-rosa com a maior delicadeza
do mundo.
Eu não confiava mais em Romeo, contudo, não podia negar
que ele amava a filha de verdade. Ele até sorriu, coisa que eu
mesma nunca vi. E era, de fato, inevitável não se apaixonar por
Giordana. A pequena traidora ainda fez graça, como se soubesse
que era filha dele.
Era só pensar nele que eu me agitava inteira. Tudo em mim,
reagia a tudo dele.
O olhar, o cheiro, a presença imponente e poderosa. Senti um
calor descomunal, queria ser tocada quando não deveria. Queria
que me pegasse com força, daquele jeito bruto e urgente dele.
Ultimamente andava tendo uns pensamentos nada puros, e atribuí
isso a falta de sexo.
A falta de sexo com ele.
Romeo Cavalieri havia me machucado de uma maneira
irreparável, eu não deveria sequer cogitar uma reaproximação. Mas,
ao mesmo tempo, eu ficava excitada só de pensar no que ele
poderia fazer comigo entre quatro paredes.
Eu só podia estar ficando maluca.
Sacudi a cabeça e freei os meus pensamentos. Precisava
focar no meu trabalho, e não em um homem que não significava
mais nada para mim. Tudo que Romeo era, era pai da minha filha.
Apenas isso. Mais nada.

Alícia precisou sair um pouco mais cedo para resolver umas


questões de banco, enquanto eu aguardava o horário de fechar a
galeria para poder ir para casa. Estava organizando a sala que eu
usava para fazer os meus objetos de cerâmica, quando o barulho da
porta me levou ao salão principal.
Era ele.
— O que você está fazendo aqui, Romeo? — indaguei.
O sol já estava se pondo em um belo espetáculo de fim de
tarde, observei através das imensas janelas. Romeo acompanhava
o espetáculo, ele estava tão lindo.
Droga!
Eu não podia amá-lo... ele me machucou. Eu queria apenas
que me tocasse como fez tantas vezes. Eu estava tão, tão, tão
confusa. Minha emoção queria, mas a minha razão não. Ela me
mandava alertas a cada segundo do quão perigoso poderia ser.
— Vim ver você — disse e virou-se para a porta, trancando-a.
Nem fiz questão de questionar como ele sabia o endereço da
galeria, não faria diferença. Romeo era capaz de descobrir qualquer
coisa.
— Eu não quero ver você — menti.
Romeo Cavalieri caminhou na minha direção impetuosamente.
Seus passos elegantes pareciam de um predador prestes a atacar a
presa. Os olhos me encaravam cheios de intensidade.
— Ah, bella, você quer sim.
— Não quero! Vá embora! — bradei e dei as costas para ele,
caminhando apressadamente até a minha sala.
Senti suas mãos segurarem com firmeza a minha cintura e
achei que desmaiaria ali mesmo. Um arrepio subiu pela minha
coluna, e um formigamento se fez em meu ventre. Eu sabia bem o
que aquilo significava.
— Me solta! — pedi, mas nem eu mesma acreditei nas minhas
palavras.
Seus lábios beijaram o meu pescoço e, ao invés de afastá-lo,
me expus ainda mais aos seus beijos. Fazia tanto tempo... mas eu
não tinha me esquecido da sensação. Não tinha me esquecido de
nada.
— Chega, Isabela! Chega desse joguinho de cão e gato! Não
aguento mais de saudades, estou enlouquecendo! — sussurrou no
meu ouvido e eu não contive o gemido.
Não era um joguinho. Eu não queria mais nada com ele.
Mentirosa, meu subconsciente riu de mim, escancaradamente.
— Romeo... — Seu nome saiu dos meus lábios como uma
lamúria.
Virei-me de frente para ele e o encarei. Perdi todo o meu
controle naquele momento. Todas as barreiras que eu levantei no
decorrer do último ano escorreram bem na minha frente. Eu só
precisava beijá-lo novamente, senti-lo dentro de mim, mesmo que
fosse pela última vez.
Dane-se a razão!
Puxei-o pelo pescoço e beijei a sua boca com desespero.
Quase gemi ao sentir a maciez da sua língua me reivindicando,
provando-me. Romeo parecia esfomeado. Eu não estava muito
diferente dele.
Suas mãos agarraram a minha bunda e ele me ergueu,
fazendo com que eu envolvesse o seu quadril com as minhas
pernas. Para variar, eu estava usando um dos meus vestidos, o que
fez com que eu sentisse a sua dureza em meu centro com maior
intensidade.
Remexi-me, enquanto ele engolia os meus gemidos. A fricção
era deliciosa, e eu estava tão necessitada que poderia gozar a
qualquer instante.
— Porra! Você está gostosa pra caralho! — disse, deslizando o
beijo para o meu colo, perto dos meus seios. — Quero lamber cada
pedaço seu, bella. Mas, antes, irei fodê-la do jeito que gosta.
— Pare de falar e me foda logo, Romeo! — ordenei,
desesperada.
Tais palavras nunca tinham saído da minha boca. A forma
como seus olhos brilharam de desejo me deixou maluca. O que eu
sentia por ele não podia ser normal, não podia ser.
Romeo me colocou no chão apenas para pegar o preservativo
do bolso da sua calça, o que me deu a certeza de que ele estava
bastante confiante do que ia acontecer. E, só para provocá-lo, tive
vontade de mandá-lo embora. Mas eu também precisava daquilo.
E os meus desejos seriam priorizados.
Observei-o enquanto abaixava a calça e a cueca apenas o
suficiente para libertar o seu membro, após, desenrolou a camisinha
por toda a sua extensão majestosa. Senti minha intimidade
encharcada, e a minha calcinha havia ficado em um estado
lastimável.
Tirei o meu vestido e Romeo se ajoelhou aos meus pés,
segurando a barra da minha lingerie e puxando-a para baixo. Ele
levou o pedaço de pano ao nariz e cheirou, sem desviar o olhar do
meu. E, com desespero, chupou a minha intimidade como se fosse
uma sobremesa gostosa.
— Ai, Romeo! — lamuriei, estava tão sensível.
— Porra! Eu passaria horas aqui, mas preciso foder essa
boceta — murmurou, levantando-se a contragosto.
Ele estava com pressa, tanto quanto eu. Observei que colocou
a minha calcinha no bolso da sua calça. Em seguida, seus dedos
percorreram o caminho para tirar o meu sutiã e eu o impedi.
Não por vergonha ou qualquer coisa do tipo, mas porque eu
produzia muito leite, e não seria uma situação nada agradável
transar com tudo vazando. Romeo não disse nada, apenas me virou
de costas, com urgência, fazendo com que eu ficasse colada em um
dos pilares.
— Você está linda, tão linda! — sussurrou no meu ouvido
enquanto a mão percorria o caminho do umbigo até a minha
intimidade.
Abri-me mais para que ele tivesse acesso. Seus dedos ágeis e
habilidosos acariciaram minhas dobras macias e eu soltei um
gemido alto. Ele queria se certificar de que eu estava preparada.
Segundos depois, tirou os dedos e os levou à boca. Observei tudo
de canto de olho, excitada demais.
— Esse gosto, porra! Gostoso demais. Que saudade de te ter
assim, toda minha.
— Rápido, Romeo! — Remexi-me e ele pincelou o seu
membro da minha intimidade até o meu ânus, repetindo o processo
por várias e várias vezes.
Senti quando posicionou a cabeça robusta em minha
intimidade e, lentamente preencheu centímetro por centímetro com
a sua extensão dura e quente.
— Ahh! — Não contive o grito que escapou da minha garganta
com o prazer estratosférico.
Agarrei-me no pilar, como se fosse cair a qualquer momento.
Mas não cairia, Romeo estava colado nas minhas costas, mãos
cravadas na minha cintura, enquanto estocava dentro de mim e
murmurava palavras desconexas.
— Sou completamente maluco por você!
— Mais forte! — implorei, não queria que ele ficasse falando
essas coisas para mim.
Era só sexo. Só.
Romeo não estava em uma posição tão confortável, já que eu
era baixinha e ele muito alto. Senti um ardor no ombro, onde ele
havia acabado de morder, depois, passou a língua e depositou um
beijo.
Meu corpo sacolejava com suas arremetidas precisas e
certeiras.
Era tão bom.
Eu estava quase chegando ao ápice quando ele saiu de dentro
de mim.
— Por que parou? — questionei em um fio de voz.
Romeo me colocou no chão, em cima de um tapete, de quatro,
e passou a meter com mais força e urgência. A posição, ainda que
dolorida, atingia os pontos mais sensíveis dentro de mim. Era uma
mistura deliciosa de dor e prazer.
— Não estou nem perto de parar!
Ele saiu todo de dentro, depois, estocou de uma só vez, saiu,
entrou, saiu entrou por incontáveis vezes. Podia sentir as suas bolas
pesadas batendo em minha intimidade. Girou o quadril, manteve-se
parado dentro de mim, enterrado até o fundo.
Entrou, saiu, entrou, saiu, em um ritmo alucinante.
O tapa estalou em minha bunda, enquanto me castigava sem
dó com as suas investidas. Dei mais um grito. Meus olhos se
reviraram com o prazer, com o desejo voraz que sentia por ele,
apenas por ele. Meu corpo traidor reagindo como se soubesse que
o pertencia.
O fato era incontestável: Romeo Cavalieri me estragou para os
outros homens. Eu jamais conseguiria me entregar da mesma forma
a outra pessoa.
— Mais... mais forte! — Eu não queria pensar em nada,
apenas sentir.
E ele me deu o que eu pedi. Forte, rápido. Bruto, selvagem.
Insano. Explosivo.
Com uma destreza perfeita, me mudou de posição, agora,
colocando-me deitada e ficando por cima de mim. Não estava
preparada para lidar com o seu olhar, por isso, puxei a sua nuca e o
beijei.
Meu coração batia tão forte e acelerado, meu corpo estava
suado. Eu quase toda nua, usava apenas o sutiã, enquanto ele
permanecia de roupa, só com o membro de fora.
Novamente fui preenchida por ele, a sensação de plenitude
quase me sufocava. Deslizei minhas mãos pelas suas costas, por
dentro da camiseta e o arranhei. Queria machucá-lo por ter feito o
que fez comigo, e pelo fato de não me deixar esquecê-lo.
— Tigresa gostosa! — murmurou contra os meus lábios, e
senti ainda mais raiva por saber que ele estava gostando daquilo.
Romeo mordeu a minha boca e deslizou a língua pelo meu
pescoço, colo. Enfiou o rosto em meus seios, deixando-me
atordoada.
— Estão maiores, tão gostosos! — disse, puxando apenas um
pouco do sutiã para baixo.
O bico estava úmido, Romeo me encarou com um desejo
ainda maior. Depositou um beijo ali, próximo ao mamilo, sem desviar
o olhar do meu. Em seguida, chupou o bico fazendo-me ver
estrelas, enquanto me penetrava lentamente.
— Romeo — arfei, a respiração estava entrecortada.
Repetiu o processo no outro seio... a sensação era diferente.
Segundos depois, levou os meus braços acima da minha
cabeça e os manteve ali, presos. Voltou a estocar com tanta força,
que só escutávamos os nossos gemidos e o barulho dos nossos
corpos se unindo.
Senti minha intimidade se contrair e meu ventre formigar. Soltei
um gemido alto quando o orgasmo me atingiu com tudo. Fechei os
olhos, não queria ter que olhar para ele. Ofegava em busca de ar,
enquanto Romeo continuava estocando dentro de mim. Estava perto
de atingir o próprio prazer, eu podia sentir.
— Olhe para mim! — ordenou e eu neguei com a cabeça, se o
encarasse seria a minha destruição. — Eu amo você... eu amo
você, porra! — grunhiu.
Segurou meu queixo com firmeza e me beijou tão forte que
deixou meus lábios ardidos. E, segundos depois, soltou um rugido
gutural ao gozar. Romeo caiu com o corpo por cima do meu
enquanto tentava recuperar o próprio fôlego. Podia sentir seu
coração acelerado.
Tinha sido tão bom, mas eu estava me sentindo arrasada.
Não devia ter feito isso. Eu estava dando abertura para que ele
me machucasse novamente. Fui irresponsável, fui fraca. Deveria ter
mantido as coisas do jeito que estavam.
Empurrei-o e me afastei.
— Bella.
Não respondi, apenas me levantei e caminhei até onde estava
o meu vestido.
— Vá embora, Romeo! — falei ao me vestir rapidamente,
enquanto ele se levantava, encarando-me perplexo.
— Não se afaste de novo, por favor — suplicou, aproximando-
se, após arrumar a cueca e a calça e se recompor.
— Eu nunca me aproximei, Romeo. Foi só sexo, nada mais.
Não significou nada! — respondi, as lágrimas estavam na borda.
— Não seja mentirosa!
— E você não seja insistente! Você veio, eu tive aquilo que
queria, e agora cada um segue a sua vida! — exclamei, ríspida.
Queria magoá-lo de alguma forma, porque as minhas palavras
não eram reais. Queria fazer com que ele se sentisse usado,
quando, na verdade, não foi nada daquilo. O que aconteceu só
deixou ainda mais claro o quanto eu o amava.
Romeo me encarou uma última vez e foi embora sem dizer
mais nada.
Eu havia conseguido. Nunca vi aquele olhar antes.
Quando escutei o barulho da porta se fechando, as lágrimas
que mantive presas caíram desenfreadas, e eu desabei. Achei que
me sentiria melhor se o fizesse mal, mas o efeito foi totalmente
oposto.
Eu estava péssima.
Capítulo 15
ROMEO CAVALIERI

Eu estava completamente fodido. Em uma mistura de fúria e


tesão, eu socava o saco de pancadas sem parar. Senti os músculos
dos meus braços queimarem pelos golpes que estava desferindo há
mais de uma hora.
Ainda podia sentir o gosto dela em meus lábios.
Isabela estava tão entregue, tão minha, para logo depois se
afastar. Colocar-se a uma distância ainda maior, como se de fato
houvesse um abismo entre nós dois. Eu estava louco de saudade,
amava-a tanto.
Quando fui até ela, sabia que não me negaria. Até tentei me
controlar, mas as coisas que ela me fazia sentir eram fortes demais
para que eu conseguisse. Desde o nosso último encontro, na casa
de Alícia, eu tinha certeza de que Isabela ainda me amava. Ela
podia tentar me odiar o quanto fosse, mas ela me amava.
Porra!
O suor escorria pelo meu rosto, pescoço, peitoral.
Ela queria me ferir, queria me machucar. E isso fez com que a
culpa e o ódio que eu sentia por ter feito o que fiz aumentasse
desenfreadamente. Ainda que o desejo falasse mais alto, Isabela se
mantinha firme no propósito de me afastar.
No entanto, não dava para negar que a conexão que tínhamos,
continuava intacta.
Era uma química absurda, como se tivéssemos sido moldados
um para o outro. E quanto mais o tempo passava, mais eu tinha
certeza de que era realmente isso. Que eu estava destinado a ser
dela, e ela a ser minha.
Como almas gêmeas.
Lucca estava com a aparência exausta, como se não dormisse
há dias. Abatido.
Ele havia acabado de chegar em Ouro Preto. Sugeri que
viesse passar um tempo no Brasil, para espairecer, esfriar a cabeça.
Eu daria conta de tudo, cuidaria da empresa junto com Guido e
Salvatore. Era o mínimo que eu podia fazer por ele, depois de tudo
que fez por mim.
— Como você está? — indaguei.
— Fodido! O que não é muito diferente de como eu estava
antes de saber que Laura morreu — respondeu, apático.
— Sei como é a sensação de impotência. Posso ter uma ideia
do que você está sentindo, mesmo que no meu caso a história não
tenha terminado da mesma forma que a sua terminou.
— É exatamente isso, Romeo. Impotência! Laura foi egoísta,
pensou apenas nela!
Meu amigo tinha razão, contudo, nada a traria de volta. Não
adiantaria ficar remoendo, e até mesmo a odiando. Eu carreguei
esse sentimento por muitos anos para saber que ele só trazia coisas
ruins.
— Não vá por esse caminho, Lucca. Não sabemos o que se
passou pela cabeça dela — aconselhei.
— E nunca saberemos. Também pouco me importa, ela
preferiu fugir a me manter ao seu lado. Eu teria cuidado de tudo, se
tivesse me falado, talvez ainda estivesse aqui.
— Há coisas inexplicáveis e que fogem à nossa razão. —
Suspirei pesadamente. — Guardar esse sentimento não o levará a
nada. — Ele me encarou, incrédulo. — Passei a minha vida inteira
fazendo isso e olha o que aconteceu.
Se eu seguisse os meus próprios conselhos, não me meteria
em tantos problemas.
— Você ainda tem Isabela, tem a sua filha. De Laura só me
restaram as lembranças.
Anos atrás, quando ela se foi, ele havia ficado da mesma
forma. Tempos depois, foi como se nada tivesse acontecido. E no
fundo eu nunca estive errado... tudo que ele fez após a partida dela
foi para mascarar o que sentia, foi para tentar esquecê-la
— Sinto muito, cara! Muito mesmo — falei, apenas.
Não tinha o que dizer. Palavra nenhuma no mundo o
confortaria. Levantei-me do sofá e fui até a mesinha de bebidas.
Peguei uma dose de AURUM para cada um e o entreguei. Lucca
virou em um só gole.
Como se a bebida pudesse anestesiar a dor.

Alguns dias tinham se passado desde o meu encontro com


Isabela, e eu me mantive distante, como ela havia pedido. No
entanto, diariamente mandava mensagens para saber como estava
a minha filha.
Não era sempre que respondia, e quando o fazia, as respostas
eram curtas e objetivas. As visitas aconteceriam quando ela
pudesse e quisesse, segundo palavras dela mesma. E quando
percebi que não seria tão fácil como eu pensava, principalmente
após a nossa transa na galeria, passei a pedir para vê-la com mais
veemência.
Isabela tinha o direito de não querer me ver, mas não podia me
deixar longe da minha filha. Eu jamais seria capaz de usar de
recursos judiciais para ver Giordana, mas iria exercer o meu papel
de pai, ela querendo ou não.
Havia pedido, inclusive, para Gustavo preparar a
documentação para que eu a registrasse em meu nome. Ela não era
apenas Giordana Moraes.
Era Giordana Moraes Cavalieri.
Além de estar morrendo de saudade da minha filha, eu queria
que Lucca a conhecesse. Havia mandado uma nova mensagem
para o celular dela há algumas horas e estava aguardando a sua
resposta.
Isabela, após muita insistência da minha parte, me deu o seu
novo número com a condição de que eu só usaria para falar sobre
Giordana, caso contrário ela me bloquearia. Óbvio que aceitei a sua
condição, afinal, eu precisava saber de notícias da minha bambina.
Elas sequer faziam ideia, mas o quartinho de Giordana em
minha casa havia ficado pronto há um tempo. Eu não entendia nada
de decoração, ao contrário do arquiteto que contratei e que fez um
projeto que ficou perfeito. Era todo rosa bebê, com o tema de
bailarina... tinha bonecas e ursos para todos os lados, e um guarda-
roupa com diversas roupinhas e sapatos.
Só esperando por ela. Eu estava ansioso para que Giordana
pudesse aproveitar tudo.
O toque de uma nova mensagem me distraiu e eu rapidamente
peguei o meu celular, abrindo a notificação.

Se quiser ver Giordana, venha até


a galeria.

Curta e objetiva. Como sempre. Mas o teor da mensagem era


o mais importante.
Lucca e eu saímos da minha casa minutos depois, e
chegamos à galeria de Isabela e Alícia em uma velocidade recorde.
Havia trazido comigo o presente que comprei para ela, uma
pulseirinha de ouro com o seu nome gravado.
Saí do carro e Lucca me seguiu. Entrei na galeria louco para
vê-la, mas o que vi me deixou enfurecido.
O filho da puta do Max estava segurando a minha filha! A
minha filha, porra!
Quando eu sequer tive a oportunidade de segurá-la mais do
que uma vez. Isabela observava a interação entre eles e sorria. Se a
sua intenção era me enlouquecer, ponto para ela, porque havia
conseguido. Enxerguei vermelho na minha frente, um ciúme louco
me golpeou. Uma possessividade.
Elas eram minhas, minhas!
Eu estava prestes a fazer o que havia feito no hospital. Dessa
vez, no entanto, eu seria o primeiro a agir, com um soco direto no
nariz do infeliz. Dei um passo para a frente e Lucca segurou-me
pelo braço.
— Não faça um escândalo, Romeo. Não estrague tudo —
murmurou.
Antes que eu pudesse respondê-lo, Isabela desviou os olhos
para a minha direção, parecendo um pouco surpresa. Desconfiei
que estivesse, de fato, já que tinha me informado que a minha filha
estava aqui, e era óbvio que eu viria.
Somente então eu percebi a presença de Alícia, que foi até
eles, enquanto Isabela pegava Giordana do colo de Max e a sua
amiga tirava o irmão dali. Quando Max me viu, seu olhar na minha
direção foi cortante.
Filho da puta! Mal sabia ele que eu não tinha medo de cara
feia!
Passou por mim feito um foguete, sendo seguido pela irmã.
Aproximei-me de Isabela, mas sequer a olhei, depois eu falaria com
ela. Por ora, só queria pegar a minha filha em meus braços mais
uma vez.
— Bambina di papà. — Giordana pareceu reconhecer minha
voz, porque assim que a ouviu, se agitou nos braços da mãe,
procurando-me.
Isabela não contestou, não disse nada. Apenas me entregou a
nossa filha.
Quando a minha garotinha sorriu para mim, todos os
problemas do mundo pareceram evaporar, todas as preocupações
sumiram da minha cabeça. Giordana era muito mais do que eu
merecia.
Era um presente, a melhor coisa que já havia acontecido.
Ela usava um vestido verde, e o lacinho do cabelo era da
mesma cor. Uma boneca de porcelana. Beijei sua testinha enquanto
seus dedinhos ágeis pegavam o colar do meu pescoço, com
curiosidade. Seu cheirinho era tão bom, único. De paz.
E se o paraíso tivesse um cheiro, certamente seria aquele.
— Parabéns, cara! Ela é linda — Lucca disse, e somente então
eu me lembrei de que meu amigo estava ali.
— Desculpe, Lucca... eu esqueço do mundo quando estou
com ela.
Com elas.
— Isabela. — Ele a cumprimentou com um aceno, e ela
apenas devolveu o cumprimento. — Parabéns pela filha.
— Obrigada — agradeceu, apenas.
Seu olhar para ele era de mágoa, certamente por pensar que o
meu amigo também fazia parte do plano de vingança, o que não era
verdade. Apesar de saber, Lucca e seu pai sempre foram contra.
Perdi completamente a noção do tempo com ela em meus
braços.
Isabela se mantinha atenta, por perto, observando-nos. Eu
podia sentir o seu olhar sobre Giordana e eu. Não podia admitir que
Max tinha mais contato com a minha filha do que eu, não podia
sequer pensar que ele e Isabela estavam morando na mesma casa.
Isso me enlouquecia.
Foda-se se eu estivesse parecendo um homem das cavernas!
Tirei do bolso a caixinha com a pulseira que havia comprado
para Giordana e entreguei a Isabela. Ela me olhou confusa e deu
um passo à frente, fazendo com que seu cheiro delicioso me
invadisse.
— É para Giordana, coloque nela — pedi.
Isabela abriu a caixinha, deparando-se com a joia e, após
alguns segundos, fez o que eu pedi, colocando no pulso gordinho da
nossa filha. Havia ficado perfeito, como imaginei que ficaria.
— Não fique enchendo Giordana de coisas caras — disse, o
tom de voz estava baixo.
Isabela estava conseguindo me tirar do sério. Estava tentando
descontar sua raiva em mim nas coisas que eu fazia pela nossa
filha, e isso não era justo. Podia me rejeitar, me afastar, mas
Giordana também era minha.
— Você realmente está me falando isso? É a primeira vez que
dou algo à minha filha — retruquei.
— Ela não precisa disso.
— Giordana é tão minha quanto sua, Isabela. Não desconte a
raiva que sente de mim nas coisas que faço por ela — falei e ela me
encarou furiosa, mas se conteve.
Ela não iria discutir comigo na frente de Giordana.
— Não tire a pulseira para nada... é para a proteção dela —
continuei e ela acenou quase imperceptivelmente.
Alícia voltou algum tempo depois, sozinha, enquanto eu
aproveitava cada segundo com a minha bambina. Observei a troca
de olhares entre Lucca e ela, que não durou mais do que alguns
segundos.
— Alícia, pode cuidar da Giordana por alguns minutos
enquanto eu converso com Romeo? — Isabela perguntou, percebi
pelo tom de voz que estava se controlando.
— Com certeza! — respondeu, fitando a amiga com um misto
de curiosidade e dúvida sobre que conversa seria essa. — Vem com
a madrinha, minha ameixinha!
Giordana sequer titubeou, foi para os braços de Alícia toda
sorridente.
— Me acompanhe, Romeo — disse, marchando a passos
largos para a sua sala, a mesma que nós nos amamos dias atrás.
— Já volto, Lucca — falei e ele acenou em concordância.
Entrei naquele local e foi inevitável conter as lembranças. Seu
cheiro estava por toda a parte. Respirei fundo, teria que usar de
todo autocontrole que possuía para não a tocar novamente.
— Romeo, eu falei sério quando disse para não ficar dando
presentes caros para Giordana! — Levantou o queixo e tive vontade
de mordê-lo. — E nunca mais fale daquela forma comigo na frente
dela, está me ouvindo?
— Nós precisamos alinhar as coisas sobre a nossa filha,
Isabela.
— Não há nada para alinhar. Ou será do meu jeito, ou não
será de jeito nenhum.
— E qual seria o seu jeito? Deixar com que a minha filha se
acostume com a presença de outro homem? Que pense que ele é o
seu pai?
— Não seja ridículo! — bradou.
— Quantas vezes Max segurou Giordana nos braços? Aposto
que muito mais do que eu! — Respirei fundo.
— Quer mesmo saber? Ele a segurou tantas vezes que nem
consigo contar — disse, ferindo-me.
— Ela é minha filha! Minha!
— Infelizmente... porque eu preferia que o pai dela fosse o
Max. — Não achei que suas palavras fossem me machucar tanto.
Encarei-a, incrédulo. Eu merecia aquilo, e quanto mais eu
tentava conversar, mais difícil ficava. Algo em minha expressão a
fez titubear... ao invés de se sentir orgulhosa por me ferir, ela havia
se arrependido. Isabela entregava tudo no seu olhar.
— Mas ele não é! Eu sou! E sequer sei o dia que a minha filha
nasceu. — Mexi nos cabelos, andando de um lado para o outro.
— Dia 4 de outubro, satisfeito? — respondeu.
— Não, não estou. Eu preciso de mais, quero saber tudo sobre
a minha filha.
— As coisas continuarão do jeito que estão. Quando eu quiser
e puder, avisarei e você poderá vê-la — disse com firmeza.
Ela podia manter a distância que fosse de mim, mas não podia
fazer o mesmo com a nossa filha. Eu já tinha perdido muito tempo,
não queria perder mais nem um segundo.
— Não faça isso comigo, por favor!
— Você também não podia ter feito o que fez, Romeo! E,
mesmo assim, fez... me seduziu, me usou e depois me descartou
como se eu não valesse nada. — Os lábios tremeram, ela estava se
contendo.
— Se você soubesse o quanto eu me arrependo pelo que fiz
— murmurei, sincero, sem desviar o olhar do seu.
— Quem me garante que você não está me dizendo isso
apenas para me enganar novamente e tomar a Giordana de mim?
Não duvido que esse não seja mais um dos seus planos para levar
a minha filha embora.
— Nunca, bella. Eu não farei isso. Só quero cuidar de vocês,
amá-las. Formar uma família.
— Não diga isso! — vociferou, cheia de mágoa.
Lembrei-me de que havia dito a mesma coisa no passado,
para fazer com que ela aceitasse se casar comigo mais rápido. Ter
repetido que queria formar uma família foi um gatilho para ela.
Um choro alto de bebê nos interrompeu e Isabela se
recompôs, correndo para fora da sala. Era a primeira vez que eu
ouvia o chorinho da minha filha. Fiquei preocupado, desesperado,
na verdade.
— Adivinha? — Alícia falou, fitando Isabela enquanto Giordana
se agitava em seus braços.
— Minha princesa, a mamãe está aqui — Isabela disse,
pegando-a. — Irei dar de mamar na minha sala — murmurou para a
amiga.
Giordana se debatia nos braços da mãe, levando o rostinho na
direção dos seios dela, enquanto quase a desnudava com o agito
das mãozinhas pequenas e gordinhas. Quis ir atrás delas, viver
aquele momento com as duas, mas o olhar que Isabela me lançou
não deixou dúvidas.
Ela me queria fora dali. E foi o que eu fiz, fui embora.
Capítulo 16
ISABELA MORAES

O que estava acontecendo comigo?


De todas as coisas que eu já havia feito para ferir Romeo, ter
dito que preferia que Max fosse pai de Giordana foi a pior de todas.
Nem eu mesma acreditava que tinha realmente falado aquilo.
Minhas palavras tinham sido da boca para fora, mas o havia
machucado.
O que ele fez com você foi muito pior, minha razão insistia em
me alertar do perigo. A diferença era que eu não costumava agir
daquela forma. Eu não era assim, e não me tornaria alguém assim.
Amarga.
Contudo, eu só estava me defendendo, defendendo a minha
filha. Como havia dito a Romeo, eu não tinha garantia nenhuma de
que dessa vez ele estava sendo sincero. E a minha preocupação
não era por mim. Era por Giordana e por Noah. Ele estava se
infiltrando nas nossas vidas outra vez. E não era aos poucos, era do
jeito Romeo de ser, impetuoso, apressado, na sua hora, do seu jeito.
Insistente.
Interrompi meus pensamentos quando me encarei no espelho,
após terminar de me arrumar. Eu e Max sairíamos para jantar.
Desde que voltei para o Brasil, o irmão da minha amiga estava me
convidando para sair com frequência. Não tinha aceitado ainda,
sempre com a desculpa da Giordana.
Entretanto, sabia que a minha filha ficaria muito bem com a
madrinha. Eu não conseguia ficar muito tempo longe da minha
ameixinha. Além do mais, ela ainda mamava exclusivamente no
peito. Não aceitava mamadeira de jeito nenhum. Então, Max já
estava ciente de que não poderíamos demorar muito.
Fazia um bom tempo que eu não tirava umas horinhas para
mim, para aproveitar. Eu ainda era jovem, tinha uma vida inteira pela
frente. De todo modo, seria apenas um jantar entre amigos. Nunca
dei abertura para que ele pensasse que poderia rolar algo a mais
entre nós. Em todas as vezes que tentou ficar comigo, anos atrás,
fui firme.
Max era lindo. Ele lembrava o ator Henry Cavill, só que de
olhos castanhos. Todas as mulheres do universo caíam aos seus
pés, eu não podia julgá-las. Ainda assim, não cedi aos seus
encantos. E talvez por esse motivo eu havia me tornado um desafio
para ele.
Saí do quarto e desci as escadas, encontrando-o na sala junto
com os pais, Alícia e Giordana. Despedi-me da minha ameixinha, e
a minha vontade foi de não sair mais e ficar com ela pelo resto da
noite. Mas eu jamais daria um bolo em Max.
— Vamos? — convidei-o e ele acenou em concordância.
Não deixei de notar o seu olhar em mim, analisando-me dos
pés à cabeça. Despedimo-nos de seus pais e da Alícia e seguimos
para o centro de Ouro Preto em seu veículo.
Durante o trajeto conversamos sobre amenidades, o clima
estava bastante agradável. Max e eu tínhamos certa intimidade, já
que nos conhecíamos há anos, o que era ótimo. Em nenhum
momento ficamos desconfortáveis.
Chegamos em frente ao restaurante que eu já havia
frequentado algumas vezes, inclusive com Romeo, e, após
estacionar, seguimos juntos para dentro. Ele havia feito a reserva,
por isso, assim que entramos, a hostess [6]nos encaminhou até a
mesa.
— Esse restaurante é ótimo! — falei, após fazermos os nossos
pedidos.
— Também gosto daqui, nem me lembro a última vez que saí
para jantar.
— Eu imagino, como estão as coisas na boate? — indaguei.
— Muito bem, melhores do que eu esperava. Estamos
avaliando uma proposta para abrir uma nova casa em Belo
Horizonte.
— Uau! Será ótimo!
— Não tem nada certo ainda, mas meu sócio e eu estamos
animados com a ideia.
— Que legal, fico muito feliz. A boate é ótima mesmo, será um
sucesso.
— E você... me conte quais são os seus projetos futuros —
pediu, encarando-me.
— Giordana e galeria — brinquei e ele sorriu.
Max sorria com muita facilidade, ele tinha covinhas que eram
um charme.
— São ótimos projetos. A sua filha é incrível, Isabela — falou e
eu me derreti.
— Ela é demais mesmo. É tão surreal ter um filho... acredita
que eu não me lembro mais de como era a minha vida sem ela?
Tudo ficou tão mais bonito.
— Imagino.
— E você, Max? Quando vai se casar? — perguntei, em tom
de brincadeira e ele gargalhou.
— Quando você aceitar — respondeu, sorrindo de canto.
— Não seja bobo! Estou falando sério.
Certamente eu estava corada, pude sentir meu rosto pegando
fogo.
— Eu também estou.
— Max! — falei e ele segurou a minha mão por cima da mesa.
O toque foi sutil, delicado. Terno. Não senti nada. Não tinha
aquela eletricidade toda de Romeo. Odiei fazer a comparação, mas
foi inevitável. Eu estava uma completa bagunça.
— Isa, não é de hoje que estou interessado em você. Queria
ter falado antes, mas sei de tudo que você passou, e quis esperar
até que estivesse bem. — Ah, não, não faça isso.
— Max, por favor.
— Confesso que até para mim isso soa diferente. Nunca senti
algo assim, eu adoraria cuidar de você, de Giordana.
— Eu estou uma bagunça, Max, não quero magoar você.
— Estou disposto a ajudá-la com a bagunça, Isa... não quero
pressioná-la, nem a assustar. Mas, se eu não falasse isso hoje,
certamente não falaria nunca mais — confessou e eu apertei seus
dedos com delicadeza.
— Do fundo do meu coração, eu adoraria que as coisas
fossem diferentes. Mas eu não posso fazer isso comigo e
principalmente com você. — Respirei fundo. — Meu coração está
completamente fechado... e você merece encontrar uma mulher
incrível que o ame incondicionalmente — expliquei e ele sorriu,
abaixando a cabeça.
— Você não existe. — Fitou-me com carinho. — Me desculpe
se causei algum desconforto, mas pelo menos agora não posso
dizer que não tentei.
— Não, não há desconforto. Em um mundo perfeito, eu
adoraria me apaixonar por você. Mas sabemos que as coisas não
funcionam assim. — Fui sincera. — Você é um bom amigo, uma
pessoa muito especial para mim.
— Você também é especial para mim. E por favor, não se
afaste... vamos sair outras vezes como bons amigos. Eu gosto de
ter você por perto.
— Eu também adoro a sua companhia! Muito obrigada pelo
convite — agradeci.
— Não por isso. Sempre que quiser, estarei à disposição.
Felizmente o clima que havia ficado um pouco denso mudou.
Estava mais leve, divertido. Max trocou de assunto completamente,
o que fez com que eu me sentisse mais tranquila e à vontade.
Eu havia percebido que a forma como ele me olhava tinha
mudado desde que voltei. E eu realmente gostaria que as coisas
fossem fáceis. Que fosse simples me apaixonar por Max. Mas não
tínhamos como mandar no coração. E eu jamais ficaria com alguém
ou investiria em uma relação sem amar a pessoa.
O amor era o princípio de tudo.
Estava tentando entrar em contato com a tia Gisele há alguns
dias, mas, ainda não tinha conseguido. Ela simplesmente não
estava atendendo os meus telefonemas. Fiquei preocupada, e até
mesmo passei em frente à casa onde morei desde criança para ver
se havia algo diferente.
Mas não, tudo continuava igual.
— A tia Gisele não me atende, estou preocupada, Alícia —
murmurei, minha amiga desviou o olhar do quadro que estava
pintando e me fitou. — Será que ela está bem?
— Que estranho... você quer que eu vá até a casa deles para
falar com ela?
— Não há necessidade. Faz quanto tempo mesmo que você a
viu pela última vez?
— Hum... — Pensou. — Não muito, Isa. Foi uns dias antes de
você voltar — respondeu.
— Só espero que ela não esteja chateada comigo pelo meu
sumiço.
— Não acredito que seja isso, fique tranquila. Se ela não
retornar à ligação até o fim da semana eu vou na casa deles, peço a
Max para ir comigo.
— Está bem.
Não tive como evitar a sensação de culpa. Queria ter mantido
contato com a minha tia, mas o receio de que o tio Marcos pudesse
usar a esposa para me encontrar era maior do que tudo. Tive que
fugir, me afastar completamente.
E ainda que estivesse em Ouro Preto, eu evitava ficar saindo
muito. Não queria esbarrar com nenhum deles, com exceção da
minha tia. Tanto que, ia da galeria para casa, de casa para o
orfanato e só.
A única vez que saí foi para jantar com Max. Por sinal, quando
comentei com Alícia e questionei se sabia que ele ia se declarar, ela
ficou perplexa, disse que não, apesar de ter notado os olhares dele
para mim.
Meu celular vibrou no bolso da calça e o peguei. Havia mais
uma mensagem de Romeo pedindo para ver Giordana.

Bella, tudo bem? Como você e a


Giordana estão? Eu gostaria de
vê-la, me avise quando for
possível, por favor.
Estão precisando de alguma
coisa?
Romeo

Eram sempre as mesmas mensagens, mas de formas


diferentes.

Sim, ela está bem!


Amanhã às 15h00 na galeria.

Minhas respostas também eram sempre as mesmas. Curtas e


objetivas.

No dia seguinte, pontualmente às 15h00, Romeo surgiu na


porta da galeria. Ele trazia nas mãos um embrulho cor-de-rosa
quase do tamanho da minha filha. Seu olhar se dividia entre mim e
Giordana enquanto caminhava na nossa direção.
Parecia ansioso, desesperado. E o meu coração traidor insistia
em acelerar loucamente quando o via. Já dizia o filósofo Blaise
Pascal, o coração tem razões que a própria razão desconhece.
Antes mesmo de ouvir a voz de Romeo, a atenção de
Giordana foi desviada para o pacote nas mãos dele. Ela se agitou
em meu colo, sacudindo as perninhas e os bracinhos que estavam
cada vez mais gordinhos.
— Bambina! — disse, no sotaque forte, e Giordana deu um
gritinho estridente. — Bella. — Encarou-me intensamente.
Deus!
Romeo se aproximou e beijou a testinha dela, enquanto as
mãozinhas pequenas e descoordenadas voaram para o embrulho,
fazendo o maior barulho.
— Calma, filha — pedi, com suavidade.
— O papà ajuda — disse.
Ele desfez o laço gigantesco e tirou de dentro do pacote um
urso cor-de-rosa que era a coisa mais fofa. Giordana ficou ainda
mais agitada, eufórica querendo pegar a pelúcia que era quase do
seu tamanho.
Não teve jeito, minha filha quis ir para os braços de Romeo,
que pareciam muito mais atrativos, já que seguravam o urso de
pelúcia. Entreguei-a com cuidado para ele, que a segurou com
firmeza. Os olhinhos dela brilhavam, e o sorriso estampado era o
mais lindo do mundo inteiro.
Eu morreria por aquele sorriso.
Observei a interação dos dois, Romeo conversava com ela,
todo atencioso. Era sempre assim. Não deixei de notar o brilho nos
olhos dele também. Era um brilho diferente.
Eles ficaram entretidos por vários minutos, enquanto eu estava
apenas de espectadora. De repente, o urso não era mais tão
interessante quanto a barba cerrada de Romeo. Giordana tocava
com as mãozinhas e ele encarava a filha de maneira apaixonada.
— Bella, preciso conversar com você sobre algo.
Eu nem o repreendia mais por me chamar pelos apelidos.
Havia pedido um milhão de vezes para que não me chamasse mais
nem de bella, nem de piccola. Mas não adiantava, então eu
simplesmente desisti.
— Fale — respondi.
— Eu gostaria de registrar Giordana em meu nome.
Sinceramente, achei que estava até demorando para que
Romeo aparecesse com essa ideia. Eu não confiava nele, jamais
voltaria a confiar. Mas, receava que, se o impedisse de algo com
relação à filha, ele pudesse entrar com um processo judicial e aí as
coisas ficariam muito mais difíceis.
— Ok, Romeo — respondi após um suspiro audível.
Ele me olhou confuso, muito provavelmente pensando que eu
rejeitaria o seu pedido e iniciaria mais uma discussão. Mas a
verdade era que eu estava cansada. Cansada dele, cansada de
discutir. Eu só queria paz.
— Eu a amo tanto, bella. Tanto que chega a doer — disse,
fitando Giordana.
Eu o entendia perfeitamente. Minha filha era uma bênção.
— Não ouse machucá-la. Não ouse fazê-la sofrer... ou eu
acabarei com você — falei e, embora minhas palavras soassem
como uma ameaça, não fui rude ou grosseira.
— Eu não farei isso. Nunca.
— E o mesmo vale para Noah. Não sei qual é a sua intenção
indo ao orfanato, mas fique ciente de que não permitirei que você
nos machuque — expliquei e ele me lançou mais um de seus
olhares magoados.
Dessa vez, no entanto, minha intenção não era feri-lo. Queria
apenas deixá-lo ciente de que eu não permitiria que o passado se
repetisse. Eu era adulta, poderia muito bem lidar com tudo, as
minhas crianças não.
Romeo não disse nada, apenas acenou em concordância e
voltou a interagir com Giordana.
Não podia negar, os dois eram lindos juntos.
Pai e filha estavam criando laços fortes.
Capítulo 17
ROMEO CAVALIERI

Estava no meio de uma reunião importante por


videoconferência, quando o toque do meu celular me distraiu
completamente. A princípio, deixei tocar, eu estava fazendo uma
apresentação. Mas, quando notei a insistência, algo me alarmou.
Peguei o meu celular e vi o nome de Isabela na tela, o que fez
com que meu coração sacolejasse dentro do peito. Tudo que minha
mente registrou foi preocupação. Algo tinha acontecido, caso
contrário ela não me ligaria. Nem mesmo falei nada para o pessoal
que estava na reunião, apenas me levantei e atendi desesperado.
— Bella.
— Romeo... — Sua voz estava chorosa, e o pânico me invadiu.
— O que aconteceu? Por que você está chorando?
— Você pode vir me buscar na casa da Alícia? Preciso levar
Giordana ao hospital.
Pânico mais uma vez, angústia, medo.
— Estou indo! O que aconteceu? Fique comigo na linha até
que eu chegue aí —falei, pegando apenas minha carteira e partindo
para a garagem.
— Ela está com febre, já dei o remédio, mas estou tão
preocupada. Eu sei que crianças ficam doentes, só que nunca tinha
acontecido com ela.
— Fique calma, já estou a caminho, ok?
— Uhum — murmurou e eu ouvi um resmungo infantil ao
fundo.
Meu coração, que já não estava muito bem, estraçalhou-se
naquele instante. Eu não queria que minha filha sofresse, por
qualquer que fosse o motivo. A sensação era esmagadora e, se eu
pudesse, pegaria toda a sua dor para mim.
— Quando ela ficou assim?
— Mais cedo eu observei que ela estava quietinha, o que não
é o seu normal. Notei que a temperatura estava um pouquinho
alterada e a mediquei. Tentei fazer com que ela mamasse, e,
quando não aceitou, eu me desesperei — tagarelou sem parar, sinal
de que estava muito preocupada.
E para ter me ligado, não era apenas preocupada que ela
estava.
— Vocês duas estão sozinhas? — perguntei.
Apesar da angústia crescente que eu estava sentindo, dirigia
pelas ruas de Ouro Preto com atenção. Elas estavam precisando de
mim, e eu precisava chegar até elas. Estava correndo mais do que a
velocidade permitida e o trânsito tranquilo possibilitava que eu
fizesse isso.
— Sim, a Alícia está na galeria e os pais dela foram a Belo
Horizonte. — Droga, eu não suportava ver Isabela sofrendo. Nem
ela e nem a nossa filha. — Calma, filha, o papai já está chegando.
— Percebi que afastou o telefone do rosto para falar com Giordana,
a voz ficou mais baixa.
O papai está chegando, sim, eu estava chegando.
Não pude controlar os meus sentimentos quando a ouvi
tranquilizando a nossa filha. Aquela sensação louca me invadiu. Era
um amor indescritível. Um amor pelo qual eu lutaria até o fim dos
meus dias.
— Sim, meus amores, o papà está chegando — murmurei para
que ela ouvisse.
Não demorou muito para que eu enfim chegasse em frente à
casa de Alícia, mas o caminho pareceu uma eternidade. Era final da
tarde, e, apesar de não estar frio, o tempo estava nublado e
chuvoso.
Encerrei a ligação, peguei uma sombrinha que tinha no banco
de trás do carro e saí, caminhando até o portão aberto onde eu já
avistava Isabela com a nossa filha nos braços. Fui até elas a passos
largos.
— Bella — sussurrei e ela me encarou, percebi que as
lágrimas estavam na borda. — Bambina. — Aproximei-me para dar
um beijinho em Giordana e os olhinhos vermelhos dela me fitaram.
Estava agarrada na blusa da mãe, como se a sua vida
dependesse daquilo. Se a angústia que eu senti ao ouvir o seu
choro pelo telefone já era estratosférica, ver o seu olharzinho triste
me destruiu por completo.
Giordana, de fato, não era assim. Apesar de não ter o tanto de
contato que gostaria, em todas as vezes que vi minha filha ela
estava feliz, sorridente. Até mesmo quando a vi reclamar de fome,
em uma das vezes, não era da mesma forma.
— Eu já liguei para a pediatra dela, por sorte está de plantão
— Isabela disse, o tom de voz estava baixo, embargado.
— Ótimo! Então vamos, piccola. — Não me importei se me
rejeitaria ou não, mas, peguei a bolsa que ela carregava, a abracei e
seguimos para o carro.
Ajudei Isabela a se sentar, deixei-a confortável com Giordana
em seus braços. Ela me passou o endereço do hospital e seguimos
para lá. Minhas atenções se dividiam na estrada e no retrovisor que
me dava a ampla visão das duas.
Percebi quando nossa filha começou a chorar e Isabela tentou
amamentá-la. Giordana até mamou, mas por poucos segundos.
Logo se remexeu e o choro foi ficando ainda maior.
— Vai ficar tudo bem! — garanti.
Tinha que ficar.
E por mais que eu soubesse que crianças poderiam adoecer,
não queria que acontecesse com a minha filha.
Chegamos ao hospital aproximadamente vinte minutos depois.
Isabela e eu fomos direto para a emergência, onde uma senhora
simpática nos aguardava.
— Boa tarde! — nos cumprimentou.
— Boa tarde, doutora Cris. Estou tão preocupada — Isabela
falou, aflita.
— Fique calma, mamãe. Vamos ver o que essa garotinha tem
— ela disse, pegando Giordana no colo e caminhando até uma das
salas. — Me acompanhem, por favor. — Nós a seguimos.
Desde que saiu dos braços da mãe, Giordana abriu um
berreiro e aí eu pude ver que os pulmões da minha filha eram fortes
e saudáveis. Isabela limpou uma lágrima solitária que caiu. Foi tão
rápido, mas nada passava despercebido aos meus olhos.
— Fique calma, bella. Vai ficar tudo bem — garanti, as
palavras eram mais para mim do que para ela.
Entramos no consultório médico e tentei prestar atenção nas
coisas que a médica perguntava, mas, estava impossível desviar o
foco da minha menina. No entanto, escutei Isabela dizer tudo que já
tinha me falado.
A partir de então, a médica passou a examinar Giordana com
cuidado e delicadeza, enquanto murmurava palavras carinhosas
para ela. O choro diminuiu um pouco, mas não ao ponto de parar.
Seu rostinho pequeno estava banhado pelas lágrimas.
Se possível fosse, transferiria toda a dor que estava sentindo
para mim. Eu podia lidar.
— Por isso a Giordana não está se alimentando, a gargantinha
dela está bastante inflamada — a doutora Cris constatou.
— Como? Eu cuido tanto para que essas coisas não
aconteçam — Isabela disse, sentindo-se culpada.
Ela não tinha culpa.
— Pode acontecer, querida, mas não há com o que se
preocupar — respondeu, tranquilizando-nos. — Irei receitar um
analgésico e anti-inflamatório e ela já sentirá uma melhora. Peço
apenas que continue atenta aos sintomas e, se a febre persistir,
entre em contato comigo imediatamente.
Assim que terminou de examinar Giordana, a médica tentou
entregá-la à mãe, no entanto, o que a minha garotinha fez foi se
debater com os bracinhos e perninhas na minha direção. Isabela
nos encarou, perplexa, eu não estava muito diferente dela.
Peguei minha filha nos braços, com todo amor que tinha em
meu coração. A protegi dentro do meu abraço e senti quando ela
encostou a cabecinha no meu ombro e enfiou o rostinho em meu
pescoço.
— O papà ama você, bambina. O dodói já vai passar... —
murmurei.
No final da consulta, a médica entregou a receita para Isabela
e saímos do hospital. Enquanto caminhávamos para o
estacionamento, notei que Giordana estava quase dormindo e não
tive como conter a euforia. Minha filha dormiria em meus braços
pela primeira vez.
— Acho melhor esperarmos um pouco dentro do carro até que
ela durma completamente. Se eu a tirar de você agora, é provável
que ela faça um escândalo — Isabela sugeriu.
E foi o que fizemos. Entramos no carro, sentei-me no banco de
trás e ninei a minha filha. Giordana sabia que eu era seu pai, a
ligação que tínhamos era maior do que qualquer coisa, assim como
ela também se sentia segura em meus braços.
— Quer ir para a minha casa? — perguntei.
— Eu não sei se...
— Por favor, eu não ficarei tranquilo longe dela. Saindo daqui
passaremos na farmácia e podemos ir para lá — insisti e ela me
fitou, resignada.
— Ok, Romeo, mas fique ciente de que eu estou indo apenas
pela minha filha. Se você insistir ou tentar qualquer coisa, eu irei
embora.
— Tudo bem — respondi, tentando conter o meu entusiasmo.
Elas iriam para a minha casa, porra!
Minha mulher e minha filha iriam para a minha casa!
Quando percebi que Giordana havia dormido, entreguei-a para
Isabela com cuidado. Ela resmungou, o rostinho estava corado de
tanto chorar. Mas, felizmente não acordou.
Do hospital, segui direto para a farmácia. Enquanto Isabela me
aguardava no carro, comprei o que a médica havia receitado em
uma velocidade recorde. Qualquer segundo longe delas me deixava
maluco.
Voltei para o carro e segui para a minha casa.
Para a nossa casa.
O trajeto todo foi feito em silêncio. E, ao chegarmos, levei-as
para dentro.
— Quero mostrar algo para você — falei e caminhei na direção
das escadas.
— Romeo. — Percebi que ela estava receosa.
— Por favor, será rápido.
Ela me seguiu e eu fiquei atento a elas enquanto subíamos as
escadas. Fui na direção do quartinho em que havia preparado para
Giordana e abri a porta, dando passagem a Isabela.
Vislumbrei cada pequena reação que teve, desde a surpresa,
até o encantamento.
— Meu Deus! Que lindo! — exclamou, entrando no ambiente
infantil e olhando tudo ao redor. — Quando você fez isso? —
perguntou, fitando-me.
— Ficou pronto um mês depois que as encontrei em Buenos
Aires.
— De bailarina... ficou perfeito. Giordana ficará eufórica
quando ver tudo isso — disse, mais para si mesma do que para
mim.
No quartinho, além do berço e de todos os objetos decorativos,
tinha uma poltrona de amamentação, e um sofá-cama bem
confortável. Foi nele que Isabela sentou-se, enquanto admirava
cada canto.
Aproximei-me lentamente, sentando-me ao seu lado, mas a
uma certa distância. Ela não se afastou, não disse nada.
Eu havia esperado tanto por esse momento, que nem poderia
explicar com palavras o que estava sentindo. Depois de muito
tempo, a mãe da minha filha pareceu sair da defensiva. Parou de
lutar contra o inevitável.
Giordana despertou naquele instante, soltando uns resmungos
baixinhos.
— Você pode buscar o remédio dela, por favor? — pediu.
— Claro. — Saí do quarto e desci as escadas correndo.
Peguei a sacola da farmácia e subi novamente. Ela pegou o
medicamento e, com maestria, pingou algumas gotas na boquinha
da nossa filha, que fez uma careta ao engolir. Antes que chorasse,
Isabela ergueu a blusa, tirou o sutiã e ofereceu o seio a ela.
Fiquei hipnotizado com a cena, eu poderia ficar ali para
sempre, vendo-as tão conectadas. Giordana mamou avidamente,
uma das mãozinhas se posicionou em cima do seio de Isabela,
enquanto ela fitava a mãe com amor.
Eu era um filho da puta sortudo!
Nada no mundo era tão perfeito quanto elas. Nem a obra de
arte mais bonita poderia se igualar à beleza das mulheres da minha
vida. As duas eram o meu bem mais precioso.
Encarei Isabela e ela me fitou de volta. Nossa troca de olhares
foi cheia de significados. Eu tentei demonstrar através deles tudo
que eu sentia por elas. Ela podia não acreditar nas minhas palavras,
mas, jamais poderia fugir do meu olhar.
Do meu amor.
Algum tempo depois, Giordana adormeceu novamente. Já era
noite, provavelmente o horário que costumava dormir.
— Posso segurá-la? — perguntei e Isabela acenou em
concordância.
O bercinho estava ali, pronto para ser usado. Mas, eu só
queria recuperar todo o tempo perdido, dos colos que eu não dei,
das coisas que eu não vivi junto com elas. Abri o sofá-cama com
cuidado, para que ficássemos mais confortáveis.
Depois me ajeitei e Isabela me entregou a nossa filha.
Coloquei-a deitada em meu peito e ela se aconchegou, após soltar
uns resmungos preguiçosos. Pelo jeito, Giordana não era apenas
igual a Isabela na aparência, como também na preguiça.
Lembrei-me dos nossos momentos, cheio de saudade. Queria
ter a oportunidade de viver tudo aquilo novamente. Dessa vez, sem
a cegueira que me impedia de ver o óbvio, que eu já estava
apaixonado por Isabela muito antes de saber.
Nós tínhamos algo que nos ligaria para sempre.
Giordana.
Ela era o nosso elo. Um elo que ia muito além do amor que
sentíamos. Sim, sentíamos. Eu sabia que Isabela ainda me amava,
tinha certeza. E faria de tudo para recuperar a sua confiança, para
reconquistá-la e ter o seu amor novamente.
Só assim eu me sentiria completo, como estava me sentindo
agora.
Com as duas ao meu lado.
Capítulo 18
ISABELA MORAES

Despertei em algo macio, forte. Mãos grandes e firmes


seguravam-me pela cintura. Abri meus olhos e enrijeci quando
percebi o que estava acontecendo. Eu estava deitada com a cabeça
no peito de Romeo.
Nossa filha estava com o rostinho bem próximo ao meu,
dormindo pesadamente.
Seu pai a segurava firme com um dos braços, enquanto o
outro me abraçava. Por um breve segundo não me movi. Estava tão
gostoso que eu poderia ficar em seus braços para sempre.
Contudo, a realidade me atingiu com força.
Nós não poderíamos estar fazendo aquilo. Eu havia ligado
para ele apenas devido ao desespero que senti por estar sozinha
com Giordana, e porque ela nunca tinha adoecido. Não deveríamos
ter misturado as coisas. Romeo era o pai dela, mas entre mim e ele
não existia mais nada.
Tentei me lembrar de como fui parar ali, talvez tenha ido
quando já havia cochilado. Afastei-me com cuidado, torcendo para
que ele estivesse dormindo. Mas não estava, Romeo me encarou
com intensidade.
— Não se afaste, fique aqui mais um pouco — murmurou.
— Não, Romeo. Não vamos misturar as coisas — sussurrei.
Peguei o meu celular e conferi as horas, eram 23h30. Tinha
recebido várias mensagens de Alícia e só então me dei conta que
no desespero, acabei não a avisando sobre Giordana. Respondi
com um pedido de desculpas, expliquei mais ou menos a situação e
a informei que estávamos na casa de Romeo.
Depois contaria tudo a ela.
Pensei em pedir que ele nos levasse embora, mas acima de
qualquer necessidade minha, estava a minha filha. Ela estava tão
confortável, quietinha, em seus braços, que eu não a tiraria dali.
— Quando você a sentiu se mexer pela primeira vez? —
perguntou.
Romeo tinha ânsia por saber tudo sobre ela, atento a qualquer
mínima informação. Nem sempre eu respondia às suas perguntas,
mas podia ver que ficava realmente ansioso para saber mais e mais.
— Quando completei dezesseis semanas — respondi,
lembrando-me com saudade. — Um pouco antes disso eu senti uns
pequenos tremores, era uma sensação diferente. — Fitei-o e notei
que seus olhos brilhavam.
Não era apenas diferente, era uma sensação maravilhosa, na
verdade. Única.
— E quando você descobriu que era menina, como foi? —
indagou.
— Antes mesmo de fazer o ultrassom eu já sabia. Eu sonhei
com ela.
Narrei para ele brevemente o sonho que eu havia tido.
Estávamos conversando aos sussurros para não a acordar. Romeo
parecia perplexo e encantado ao mesmo tempo. Foi a minha menina
que me disse qual era o seu nome.
— Parece surreal — falou, pensativo. — Ela ter escolhido o
nome da avó.
Essa era a verdade, como se Giordana realmente tivesse
escolhido o nome. E desde que eu descobri que era o mesmo da
mãe de Romeo, não me esqueci mais. Contando não dava para
acreditar.
— E o nascimento dela? Foi cesárea ou parto normal?
— Parto normal. Foi bem dolorido, mas depois que a peguei
em meus braços, toda a dor foi esquecida.
— Queria ter estado ao seu lado. Eu sinto muito, me perdoe —
murmurou.
Estava feito, não tínhamos como voltar no tempo. Infelizmente.
Desviei o olhar do seu e apoiei a minha cabeça no sofá-cama. Nada
mais foi dito, cada um ficou perdido nos próprios pensamentos.
Acordei ao escutar um gritinho estridente. Culpei-me por ter
dormido novamente, mas fazia tanto tempo que eu não pregava os
meus olhos assim, que não dormia tão tranquila. Estava sempre
atenta a Giordana, às suas necessidades.
— Calma, bambina di papà. Você precisa me ajudar, eu nunca
fiz isso na vida — Romeo disse e um novo gritinho preencheu os
meus ouvidos.
Abri meus olhos e quase não acreditei no que vi. Romeo e
Giordana estavam em meio a uma bagunça de fralda, talco, lenço
umedecido, pomada de assadura. Enquanto ele tentava limpar a
filha, ela mordia um brinquedinho e sacudia as perninhas, agitada.
Fiquei maravilhada com a cena que vislumbrei tantas vezes
em minha mente.
Observei-os por alguns segundos, até que resolvi me levantar
para ajudá-lo, ou ele ficaria mais umas três horas ali. Ele percebeu a
minha aproximação e me encarou com aquele olhar que me
desnudava por completo. Seus cabelos estavam cheios de talco, a
camiseta que usava estava manchada de cocô.
Deus, que bagunça!
— Quer ajuda? — perguntei, tentando conter uma gargalhada.
— Com certeza! Eu estou tentando, mas essa pequena não
para um segundo — disse. — É tão bom vê-la assim, feliz,
saudável.
E como. Minha filha estava visivelmente melhor, o que me
aliviava completamente da preocupação. Toquei sua testinha e
estava sem nenhum vestígio de febre.
— Eu medi a temperatura dela, sem febre — ele falou.
— Que bom! A ameixinha da mamãe está melhor? —
perguntei com o tom de voz que usava exclusivamente para falar
com ela.
Giordana sorriu e deu mais um de seus gritinhos em resposta.
Sim, ela estava bem. E parecia eufórica olhando tudo ao redor.
— De onde surgiu esse apelido? — perguntou, curioso.
— Na consulta de doze semanas a médica disse que ela
estava do tamanho de uma ameixa, desde então se tornou o seu
apelido.
— Eu gosto. Ameixinha — repetiu e o sotaque forte fez com
que a palavra ficasse engraçada saindo de seus lábios.
Terminei de trocar sua fralda e peguei um pijaminha na bolsa
dela. Ainda era madrugada, estava na hora de amamentá-la. Soube
quando Romeo tentou pegá-la, mas ela se jogou no meu colo.
— Vou trocar essa roupa — ele disse, apontando para si
mesmo. — Você está com fome? Posso preparar um sanduíche, ou
o que preferir — ofereceu.
Eu estava faminta.
— Aceito um sanduíche, obrigada — respondi enquanto me
sentava novamente para alimentar a minha filha.
— Ok, eu já volto. Fique à vontade, essa casa é de vocês
também — falou e eu desviei o olhar do seu.
Romeo se retirou e ficamos apenas Giordana e eu. Podia
parecer simples para quem estava de fora, amamentar, trocar a
fralda, dar banho, interagir, e depois recomeçar tudo novamente.
Não era simples, por vezes era exaustivo, mas era tanto, tanto
amor, que o sentimento sobrepujava qualquer coisa.
E receber esse amor de volta, através dos gestos, do
olharzinho apaixonado que ela dirigia a mim, era recompensador.
Fazia tudo valer a pena. Eu passaria por tudo novamente, se no
final soubesse que a teria em meus braços, e que experimentaria
um sentimento tão puro e genuíno.
Em vinte minutos Romeo estava de volta, devidamente
trocado, e carregando uma bandeja enorme com várias coisas.
Sanduíche com queijo branco, alface e tomate. Frutas, suco de
laranja, iogurte. Um verdadeiro banquete.
— Obrigada — agradeci e ele deu um breve aceno.
Olhei para Giordana e ela estava lutando para manter os
olhinhos abertos, mas já tinha cochilado umas duas vezes durante a
mamada. Contudo, era só tentar tirá-la de meus seios que ela
voltava a sugar com avidez.
Eu sabia que não demoraria a se entregar, e foi o que
aconteceu em cinco minutos.
Levantei-me e a segurei um pouco até que arrotasse. Quando
o fez, coloquei-a no bercinho, de lado, com as perninhas por cima
de uma almofada, como ela gostava. Arrumei minha blusa e
observei Romeo me encarando.
No começo não gostava que ele estivesse presente enquanto
eu amamentava Giordana. Não queria que pensasse que eu estava
dando qualquer abertura ou intimidade novamente. Agora, no
entanto, nem me importava mais. Não era nada que ele já não tinha
visto incontáveis vezes.
Caminhei até a bandeja e peguei o sanduíche. Estava
delicioso. Quando terminei, tomei o copo de suco e, em seguida,
comi o iogurte com uma banana. Eu precisava me manter bem
alimentada para produzir leite e ter energia para Giordana.
— Obrigada, Romeo — agradeci assim que me senti satisfeita.
— Quer mais alguma coisa? Se precisar ir ao banheiro, tomar
um banho, fique à vontade. Suas coisas estão todas no nosso... no
meu quarto.
Ele estava respeitando o meu espaço, mantendo a distância
segura que eu havia pedido. Eu tinha saído um pouco da defensiva,
e descobri que poderia tentar viver em paz pelo bem da nossa filha.
Somente por ela eu daria essa trégua a ele.
— Estou bem, obrigada. Preciso apenas ir ao banheiro, você
fica com ela enquanto isso?
— Claro, não precisa nem me pedir. Não sairei daqui —
garantiu.
— Ok, eu já volto.
Eu poderia muito bem ir até o seu quarto, e usar o banheiro
dele. No entanto, não seria correto. Por isso, desci as escadas e fui
ao banheiro social. Fiz minhas necessidades, lavei meu rosto e
voltei para onde eles estavam.
Sentei-me novamente no sofá-cama ao seu lado e ficamos em
um silêncio confortável. Não preguei mais os olhos pelo resto da
madrugada.

Romeo havia acabado de estacionar em frente à casa de


Alícia. O dia tinha amanhecido lindo, diferente de ontem que estava
nublado e chuvoso, hoje o sol estava brilhante e o céu azul, sem
nuvens.
— Obrigada, Romeo — agradeci antes de sair.
Ele queria que ficássemos na sua casa, mas não aceitei.
Romeo não insistiu, apenas me fez garantir que o manteria
informado sobre Giordana e, qualquer coisa que ela voltasse a
sentir, era para ligar imediatamente para ele.
— Fiquem bem, qualquer coisa me liga, bella — disse, o tom
de voz estava baixo e o olhar estava preocupado.
Não falei nada, apenas acenei em concordância enquanto ele
se despedia de Giordana, enchendo-a de beijos. Ela gargalhava,
minha garotinha estava tão feliz, tão bem.
Saí do carro e dei a volta, parando na sua porta. Giordana
resistiu um pouco em vir para os meus braços, e vi que Romeo
havia ficado igualmente chateado. Senti, pela primeira vez, um
pouco de culpa por separá-la do pai.
— Tchau, Romeo.
— Tchau, bella.
Segui para dentro da casa da minha amiga, seus pais não
estavam. Ainda não tinha dado o horário para irmos à galeria, então,
certamente Alícia deveria estar se preparando para tal.
Fui direto ao seu quarto, apesar de Giordana e eu estarmos
ficando no quarto de hóspedes, que por sinal foi todo adaptado para
o nosso conforto. Eu teria uma gratidão infinita ao que ela, seus pais
e Max faziam por mim e pela minha filha.
— Amiga? — Dei duas batidinhas na porta, que estava
entreaberta.
— Isa? Ameixinha? Que saudades, amor da madrinha! —
disse, aproximando-se de nós duas de maneira efusiva, como
sempre. — O que aconteceu? Ela está melhor?
Giordana fez a maior festa com a madrinha. Eu amava ver a
relação das duas. Depois de alguns minutos, minha amiga me
encarou e eu sabia que estava se mordendo de curiosidade para
saber o que tinha acontecido, e preocupação também.
— Lembra que achamos ela um pouquinho quieta ontem pela
manhã? — perguntei e ela acenou em concordância. — No meio da
tarde ela começou a ter febre, dei remédio, mas não baixou, fiquei
tão preocupada.
— Por que não me ligou? Eu teria fechado a galeria e levado
vocês na médica dela.
— Sinto muito, amiga. O primeiro impulso que tive foi ligar para
Romeo. Sei que não deveria.
— Não estou cobrando você por isso, Isa. Mas porque fiquei
preocupada quando cheguei em casa e não encontrei vocês —
disse, tranquilizando-me. — E como foi?
— Ele chegou aqui tão rápido que nem acreditei. Fomos ao
hospital, a pediatra dela estava lá e depois de examiná-la, constatou
que Giordana estava com a garganta inflamada.
— Mas ela está bem agora? Está tomando remédio?
— Está ótima. E sim, tomará por mais uns dias para eliminar a
inflamação.
— Que bom! — Suspirou aliviada. — E como do hospital você
foi parar na casa de Romeo? — indagou, curiosa.
— Ele não queria se afastar da filha, e não achei justo fazer
aquilo com ele. Com eles, na verdade. Minha ameixinha dormiu nos
braços do pai pela primeira vez, amiga, como se sentisse segura,
protegida.
— Pecado da minha lindinha, dodói — Alícia brincou com a
voz infantil, arrancando uma risada de Giordana.
— Eles estão criando um laço muito forte. Tenho tanto medo.
— Entendo, Isa. Mas posso ser sincera?
— Por favor...
— Se fosse para fazer qualquer coisa, ele já teria feito. —
Referiu-se ao meu medo de perder Giordana. — Tenho observado
tudo, e cada dia mais tenho certeza de que Romeo não fará nada
que possa afastar você dela. Tudo que tenho visto é um pai
desesperado pelo mínimo contato possível com a filha.
— Você acha que eu agi errado durante todo esse tempo? —
questionei.
— Claro que não! Eu também não confio nele ainda, por mais
que seja visível em cada gesto, em cada olhar que lança na direção
de vocês, o quanto está arrependido.
— Não sei... às vezes sinto que sim, em outras quero que ele
suma da minha vida — falei, mas não queria que ele sumisse
realmente.
Ele havia sido tão atencioso conosco. Contei tudo para Alícia,
desde que ele havia tentado trocar a filha pela primeira vez, até que
havia preparado uma bandeja cheia de comida para mim. Ela ouviu
tudo com atenção e manteve-se imparcial.
Era bom poder desabafar com a minha amiga, somente ela era
capaz de entender a bagunça em que eu me encontrava.
Nem eu mesma era capaz.
Capítulo 19
ROMEO CAVALIERI

Estava há uma hora na academia, já tinha feito quarenta


minutos de musculação, e faria mais quarenta de luta. Escutei o
toque do meu celular e cessei os socos no saco de pancadas.
Avistei o nome de Gustavo na tela e o atendi.
— Fala, Gustavo!
— Romeo? Pode falar agora? — perguntou.
— Posso... aconteceu alguma coisa?
— Aconteceu. Gisele, a tia de Isabela, deu entrada no hospital
da cidade em estado grave. Ela foi espancada, Romeo.
— O quê? — Gelei dos pés à cabeça.
— Um dos homens que coloquei próximo a casa deles para
vigiar Marcos e Júlia escutou uma discussão séria entre os dois.
Horas depois, Marcos saiu de casa com uma mala, e, quando ele se
aprontou para seguir o infeliz, avistou Gisele se arrastando, até que
caiu na porta de casa.
Fui golpeado por uma sensação horrível. Era uma mistura de
nojo e raiva. E saber que Isabela conviveu com um desgraçado
desses desde criança me deixou ainda mais furioso.
— Porra! Maldito desgraçado!
— A situação dela é muito delicada. Infelizmente perdemos o
filho da puta de vista. Se esse homem que coloquei para vigiá-los
não tivesse socorrido Gisele, nem sei...
— Preciso avisar Isabela.
— Se cuidem, Romeo. Não sabemos onde o calhorda se
escondeu! Se já tinha cometido crimes para ficar preso pelo resto da
vida, depois de ter agredido a esposa, ele se enterrou ainda mais.
Marcos não tem nada a perder.
Eu tinha. E era por isso que me manteria em alerta, mais do
que já estava. Se ele ousasse tocar em um fio de cabelo de Isabela,
seria capaz de matá-lo com as minhas próprias mãos.
— Reforce a segurança de Isabela, da família de Alícia, nada
pode acontecer a nenhum deles.
— Já fiz isso. Porém, todo cuidado é pouco.
— E o Cícero?
— Nenhuma movimentação estranha, eles são espertos. Estou
a caminho do hospital, tentarei descobrir mais alguma coisa.
— Irei avisar Isabela e o encontrarei lá.
— Ok, até mais.
Despedimo-nos e pensei em ligar para ela, no entanto, não era
uma notícia que poderia ser dada por telefone. Além do mais, eu
temia que Isabela se desesperasse e tentasse ir até a tia, e eu não
podia permitir que se colocasse em risco.
Tomei uma ducha rápida, arrumei-me e saí de casa.
Minutos depois, estacionei em frente à galeria.
Ao entrar, notei que Isabela e Alícia estavam atendendo um
casal de senhores. Ela me avistou e me encarou confusa. Percebi
que pediu licença a eles e caminhou na minha direção.
— Romeo? O que você está fazendo aqui? — perguntou, o
tom de voz era amistoso.
— Bella, como está Giordana? — indaguei e ela ficou ainda
mais confusa.
Já tínhamos trocado mensagens mais cedo falando sobre a
nossa filha. No entanto, já era um costume meu. Minha bambina
sempre seria o principal foco da minha atenção. Tudo sobre ela.
— Está ótima, a mãe da Alícia está cuidando dela agora —
respondeu —, mas não é por isso que você está aqui... aconteceu
alguma coisa?
— Aconteceu... é sobre a sua tia, a Gisele — falei e ela
empalideceu.
— O que aconteceu?
— Ela está no hospital, estou indo para lá agora e achei certo
comunicá-la.
— Hospital? Meu Deus, o que ela tem? Está doente? —
questionou, aflita.
— Não está doente, bella. Ela foi agredida... não sei direito o
que aconteceu, mas assim que souber ligo para dar notícias a você,
ok?
— Agredida? Quem faria isso? — Não respondi à sua
pergunta, mas ela entendeu tudo através do meu olhar. — Não! Ele
não seria capaz! — Lágrimas salpicaram nos seus olhos.
— Sinto muito. Achei que você deveria saber sobre isso por
mim, antes que descobrisse de outra forma.
— Como você sou... ah, esquece! — Suspirou, contendo as
lágrimas. — Eu vou com você ao hospital.
— Acho melhor não, bella. Ainda não sei como ela está —
falei, omitindo a verdade.
— Eu vou com você! — retrucou, firme e conferiu o relógio em
seu pulso. — Preciso estar de volta em duas horas para amamentar
Giordana, acredito que é tempo suficiente.
Sem dar chance para que eu falasse qualquer coisa, ela fez
um gesto para Alícia, informando-a que logo voltaria, e seguiu a
passos rápidos para fora da galeria. A acompanhei e abri a porta do
carro para ela. Dei a volta e me sentei no banco do motorista.
— Você falou com a sua tia ultimamente? — perguntei.
— Não, já tinha comentado com Alícia que ela não estava
respondendo minhas mensagens. Estava me sentindo tão culpada
por ter sumido sem dar notícias a ela, mas tinha medo de que o meu
tio... de que Marcos descobrisse onde eu estava. Como esse
homem pode ser meu tio? — tagarelou sem parar, preocupada. —
Onde ele está? Já o prenderam?
— Não, ele sumiu.
— Deus! — Percebi que ficou ainda mais pálida do que estava,
seu peito subia e descia, agitado. — Ele não pode saber sobre
Giordana — disse a si mesma, perdida.
— Nada acontecerá nem com ela e nem com você.
— Eu morro se acontecer alguma coisa com a minha filha. Eu
morro!
Eu também.
— Ei, fique calma. Não permitirei que nada aconteça. Vocês
estão seguras — garanti, apertando com suavidade a sua mão
trêmula.
Isabela não disse mais nada, também não rejeitou o meu
toque.
Pouco tempo depois, chegamos em frente ao hospital.
Seguimos para a recepção da emergência e Isabela foi direto ao
balcão para saber notícias. Ela precisou se identificar, provando que
era familiar da paciente.
— Ela acabou de sair do centro cirúrgico, está em observação.
— Centro cirúrgico? — indagou, perplexa. — Qual é o estado
dela?
— O médico já deve estar vindo dar notícias, peço a gentileza
que aguarde uns minutos — respondeu, apontando para os bancos.
Acompanhei Isabela e procurei por Gustavo, que não estava
ali. Quando peguei meu celular para entrar em contato com ele, o vi
entrando pela porta do hospital. Avistou-me logo em seguida e se
aproximou, cumprimentando Isabela e eu.
— Alguma novidade? — perguntou.
— Ela acabou de sair de uma cirurgia — respondi.
— Cirurgia... o que ele fez com ela? Quanto minha tia deve ter
sofrido nas mãos daquele homem? — indagou Isabela a si mesma,
e, apesar da voz embargada, estava firme.
Naquele instante, um médico se aproximou e perguntou quem
eram os familiares de Gisele Moraes, e Isabela se levantou.
Estranhei o fato de a própria filha não estar ali, de qualquer modo,
quanto mais longe ela estivesse, melhor seria.
— A situação da paciente é bastante delicada, as próximas
24h serão decisivas. Ela teve ossos da costela quebrados, e
tivemos que fazer a cirurgia de emergência para conter uma
hemorragia interna.
Tive que conter a fúria que eu estava sentindo, e que se
intensificava a cada segundo. Marcos Moraes era um covarde
desgraçado!
— Meu Deus! E eu posso vê-la? — Isabela perguntou.
— Infelizmente não. Se o seu estado evoluir para uma
melhora, analisarei novamente o seu pedido e quem sabe a libere.
Mas, por enquanto, ela precisa de cuidados intensivos e não poderá
receber visitas.
— Ok, amanhã estarei aqui novamente — Isabela garantiu. —
Qualquer notícia, por favor, me informe o mais breve possível —
pediu.
O médico orientou que ela informasse o número do celular a
uma das enfermeiras, e se prontificou a avisá-la sobre qualquer
mudança no quadro clínico. Em seguida, retirou-se.
— Certamente o hospital já notificou a polícia. Os médicos
foram avisados de que ela foi agredida e, pela forma como estava,
daria para identificar de qualquer jeito — Gustavo falou.
— Eles precisam encontrá-lo! Esse desgraçado tem que
apodrecer na cadeia! — grunhi, encarando Gustavo.
Não apenas pelo que fez à esposa, como também por todos os
crimes cometidos.
— Eu preciso ir para casa — Isabela disse, estava muito
abalada.
— Gustavo, se souber de qualquer notícia relacionada àquele
infeliz me informe, por favor.
— Fique tranquilo.
Despedimo-nos e segui para o meu carro com Isabela.
Durante o trajeto até a casa de Alícia, ela se manteve em
silêncio, perdida em seus próprios pensamentos, e provavelmente
se dando conta da realidade, de que viveu por tantos anos com um
bandido.
Não queria nem pensar em quando ela descobrisse que foi
aquele desgraçado que matou o seu pai. Minha vontade era nunca
contar a ela, no entanto, algum dia precisaria saber da verdade.
Isabela desabaria, mas eu jamais permitiria que caísse. A seguraria
em meus braços e seria uma fortaleza para ela.
— Piccola, não vá ao hospital sem a minha presença, ok?
Amanhã passo para buscar você no mesmo horário — falei,
enquanto estacionava em frente à casa de Alícia.
— Está bem. Obrigada por me avisar e me levar até lá,
Romeo. Se souber de mais alguma coisa, me avise, por favor!
— Pode deixar, fique tranquila. — Respirei pesadamente,
odiando ver aqueles olhos verdes magoados. — Dê um beijo na
ameixinha por mim.
Isabela me encarou por alguns segundos, pensei que falaria
alguma coisa e até me animei com a possibilidade de que me
convidasse para entrar. Eu já estava morrendo de saudade da
minha italianinha. Porém, apenas acenou em concordância e saiu
do carro. Observei-a até que entrasse pelo portão, e só então segui
para a minha casa.

Alguns dias tinham se passado, e, felizmente, as notícias


sobre Gisele eram boas, o que surpreendeu a todos. Contudo, ela
ainda estava internada e precisaria ficar um bom tempo no hospital.
E isso não era tão ruim assim, afinal, eu sabia bem do que o seu
marido poderia ser capaz.
Não tínhamos conseguido liberação para vê-la enquanto
estava na UTI. Gustavo até tentou conseguir um mandado judicial,
mas, como ela estava em situação de risco, não havia sido
autorizado.
Hoje, no entanto, ela tinha ido para o quarto, e Isabela e eu
estávamos aguardando na recepção para visitá-la. Assim que
recebemos a liberação, entregaram-nos um crachá de identificação,
informaram o andar e o número do quarto em que estava, e
seguimos para lá.
Eu odiava o clima hospitalar, e nem a estrutura de primeiro
mundo o tornava agradável.
Chegamos em frente ao quarto e pudemos ouvir uma conversa
baixa, em duas vozes femininas. Isabela ficou tensa ao meu lado,
certamente reconhecendo a dona da outra voz que não era a da tia.
Ela respirou fundo e abriu a porta lentamente, sem fazer
barulho.
— Você é uma fraca! Sempre foi, não sei como pode ser minha
mãe! — Pude ouvir as palavras cortantes de Júlia Moraes.
Fiquei perplexo. Essa garota era uma psicopata.
— Chega... — Gisele murmurou, o tom de voz estava baixo,
como se sentisse dor.
— Júlia? Você está louca? — Isabela disse, partindo para cima
da prima.
Segurei-a pela cintura antes que desse o próximo passo, ela
estava enfurecida. Júlia, em um primeiro momento, encarou-nos
assustada, depois, sorriu de uma maneira diabólica.
— Ah, chegou a outra fraca! — Riu. — Resolveu lembrar que
tem família, priminha?
— Minha tia é a minha única família, você e o seu pai nunca
foram.
— Graças a Deus! — disse e desviou o olhar novamente para
a mãe. — Não sei como o meu pai aguentou você por tanto tempo!
Assim como não sei o que um homem desses viu em você! — falou
ao voltar o olhar para Isabela, que estremeceu em meus braços.
Estava fora de si.
— Chega! Vá embora ou chamarei a segurança! — falei, rude.
— Estou indo... não suporto hospitais, e essas duas me dão
preguiça! Fique aqui com a sua queridinha — disse, olhando para a
mãe. — Você nunca me amou mesmo, só ama Isabela, por pena.
Pelo menos eu tenho o meu pai, ele me ama.
Isabela tentou sair dos meus braços novamente, mas a segurei
com força.
— Não é verdade — Gisele disse.
Mal tinha conseguido olhar para ela, mas quando o fiz, quase
fiquei em choque. Eu a tinha visto uma única vez, quando resgatei
Isabela da casa deles, e agora ela estava irreconhecível.
Desgraçada! Júlia Moraes tinha o mesmo gene podre do pai!
Ela se empinou toda e, quando tentou passar para sair do
quarto, não consegui impedir que Isabela agarrasse em seu braço
com toda força, pegando-a totalmente de surpresa.
— Não ouse aparecer aqui novamente! — bradou.
— Hum... a órfã coitadinha enfim resolveu mostrar as garras —
debochou.
— Saia! — vociferei, tirando Isabela de perto dela.
A infeliz me deu uma olhada cobiçosa e nojenta, e, por fim,
retirou-se sem dizer mais nada. Isabela se recompôs no mesmo
instante e correu até a tia. Percebi algumas lágrimas no rosto cheio
de hematomas de Gisele, a mulher estava destruída.
— Tia, eu sinto muito, muito — disse, carinhosa, enquanto
segurava a sua mão.
— Querida... que saudade. Como você está? — perguntou em
um tom ainda mais baixo, a voz embargada.
Fiquei surpreso, ela passou por coisas horríveis, quase
morreu, ouviu o que nenhuma mãe deveria ouvir de um filho, e
antes de qualquer coisa perguntou como Isabela estava, parecendo
verdadeiramente preocupada.
Enquanto as duas conversavam, Isabela se desculpava a todo
momento por ter sumido sem dar notícias. Escutei-a perguntar como
aquilo tinha acontecido, e Gisele relatou que estava cansada e que
havia pedido o divórcio. Por isso ele a agrediu.
Covarde! Desgraçado!
Os dias livres de Marcos Moraes estavam contados. Já passou
da hora de ele pagar por cada crime cometido. Tive vontade de
arrebentar a cara dele, fazer justiça com as próprias mãos.
No entanto, eu não poderia agir com impulso. Tinha que
pensar em Isabela e na nossa filha. Elas precisavam de mim, assim
como eu precisava delas.
E nada nesse mundo seria capaz de me tirar de perto das
minhas piccolas.
Capítulo 20
ISABELA MORAES

O sábado havia chegado, finalmente, e eu consegui escapar


da minha pequena bezerrinha para ir ao Jardim da Criança. Quando
cheguei, no final da tarde, não me surpreendi ao encontrar Romeo.
Suas visitas tinham, de fato, se tornado frequentes.
De alguma forma, seus gestos estavam amolecendo um pouco
o meu coração, mas eu me recusava a aceitar. Da última vez que eu
me entreguei, fui machucada, ferida profundamente na alma. Seria
difícil conseguir confiar novamente. E não havia a menor
possibilidade de eu me relacionar com uma pessoa sem confiar.
Ainda assim, decidi conviver de maneira pacífica. Por
Giordana.
Noah, assim que me viu, veio correndo na minha direção,
como em todas as vezes. Ele era um doce de criança, e eu não
conseguia me conformar, de jeito nenhum, que ele ainda estava ali.
Talvez fosse por obra do destino, talvez ele deveria ser meu.
Senti algo muito forte ao abraçá-lo, ainda maior do que das
outras tantas vezes. Era tão, mas tão grandioso, que se igualava ao
que eu sentia por Giordana. Não havia diferença nenhuma no
sentimento. E constatar o óbvio me espantou.
Noah era meu filho, não havia nascido de mim, mas, nasceu
para mim.
Assim que eu encontrasse um apartamento para morar,
entraria na justiça e lutaria pela sua guarda. Sabia bem que seria
um processo moroso, difícil, porém, felizmente as coisas na galeria
estavam indo muito bem. E muito em breve eu poderia comprovar
uma estabilidade familiar e financeira, e seríamos uma família: eu e
meus dois filhos.
— Bella.
— Oi, Romeo — cumprimentei após Noah voltar a brincar.
— Como você está? E a minha bambina?
— Estou bem, e ela está ótima também. Obrigada.
— Gostaria de vê-la, quando podemos marcar? — perguntou.
Romeo Cavalieri estava colaborando muito para uma
convivência harmoniosa. Não estava sendo mais tão insistente
comigo, nem tão impetuoso como era. Respeitava o meu tempo e o
meu espaço, e passou a deixar as suas urgências de lado.
— Se você quiser, pode ir comigo daqui a pouco — respondi e
seus olhos brilharam.
— Eu quero! — disse, entusiasmado. — Podemos ir para a
minha casa, gostaria que Giordana aproveitasse um pouco o
quartinho dela.
Sei...
— Pode ser, Romeo.
— Ótimo! Posso acompanhá-la até a casa de Alícia e, de lá,
seguimos para a minha casa, o que você acha?
— Está bem... — respondi.
Encerramos a breve conversa e passei a próxima hora
entretida com as crianças. Noah dividia a sua atenção comigo e com
Romeo. E poderia até parecer absurdo, ou coisa da minha cabeça,
mas vendo-os juntos, eram até parecidos. Como se fossem pai e
filho.
— Tia Isa, eu queria munto ser seu filho — repetiu a frase que
tinha me dito há algum tempo.
Meu coração falhou uma batida, eu também queria muito ser
sua mãe.
— Meu lindo príncipe. — O abracei e fiz uma série de cócegas
nele, tentando desviar do assunto.
Eu queria poder dizer que não só queria, como amaria ser sua
mãe, e que já me sentia como se fosse. No entanto, dar esperanças
a uma criança seria cruel demais. Se os meus planos não dessem
certo, eu não me perdoaria.
Romeo estava por perto, observando tudo. Não demonstrou
nenhuma reação à frase de Noah, mas eu sabia que ele tinha
escutado. E por mais que eu tentasse, não consegui evitar as
lembranças da sua falsa promessa. E com elas, veio a mágoa
novamente.
Decidi que era hora de ir embora, e me despedi de todos.
Romeo fez o mesmo e me seguiu, mas eu havia mudado de ideia.
Não queria mais ir à sua casa.
— Romeo, acabei de me lembrar que tenho algo combinado
com Alícia. Me desculpe, podemos marcar outro dia? — indaguei e
percebi que o seu olhar murchou totalmente.
— Podemos — disse, o tom de voz estava baixo. — Se der,
me mande uma foto de Giordana quando chegar em casa. Estou
com muita saudade — concluiu e eu quase voltei atrás na minha
decisão.
Quanta confusão... Deus!
Apenas acenei em concordância e fui embora. Romeo seguiu
para um lado, e eu para o outro. Exatamente como deveria ser.

Depois de alguns dias mantendo uma distância segura de


Romeo, pelo bem da minha sanidade, aceitei o seu convite para
irmos à sua casa. Giordana e eu. Nós trocávamos mensagens todos
os dias, e eu o respondia da melhor forma possível, sempre o
mantendo a par das coisas que aconteciam com a nossa filha.
Mas, algo me alertou de que eu precisava recuar. Estava
abrindo espaços novamente, e Romeo estava preenchendo todos
eles. No entanto, minha filha o adorava, e por ela eu resolvi aceitar o
seu convite.
Eu iria com o carro de Alícia, mas Romeo foi irredutível, disse
que viria nos buscar. Até pensei em negar, mas depois do que
aconteceu com a tia Gisele, eu realmente fiquei bem apreensiva e
assustada.
Marcos ainda não havia sido encontrado, a polícia estava atrás
dele após a denúncia da minha tia. Em um primeiro momento ela
negou, disse que não o denunciaria, porque temia que, da próxima
vez, ele realmente a matasse.
Ela ainda estava no hospital, recuperando-se, fazendo uma
série de acompanhamentos com vários profissionais, desde
fisioterapeutas, psicólogos entre outros. A Júlia não havia mais
aparecido por lá, e, após a minha insistência, ela solicitou aos
médicos a proibição da entrada da filha. Fiquei horrorizada com tudo
que vi e ouvi, minha tia estava despedaçada. Contudo, tentava se
manter forte.
Eu a admirava tanto.
Meus pensamentos foram interrompidos com uma mensagem
de Romeo, informando que havia chegado. Peguei as nossas bolsas
e fui até o bercinho onde Giordana dormia agarrada ao urso cor-de-
rosa de pelúcia que havia ganhado do pai.
Peguei-a com cuidado, despedi-me de Alícia e seus pais, e saí
de casa.
Romeo me esperava encostado em seu carro, e quando me
viu, seu olhar reverberou dentro de mim de uma maneira que eu
tentei fugir completamente. Ele deu um sorriso de canto, charmoso.
— Olá, bella — disse baixinho, quando me aproximei.
Beijou a testinha da filha com carinho e ela continuou apagada.
Em seguida, tirou as nossas bolsas do meu braço e abriu a porta do
carro para que eu entrasse. Notei algo que não tinha antes, uma
cadeirinha de bebê.
Coloquei Giordana ali, arrumei o cinto de segurança nela e em
mim, enquanto ele colocava nossas bolsas no banco do carona e
dava a volta para entrar no veículo. Antes de dar partida, trocamos
olhares através do retrovisor.
Desviei após alguns segundos e somente então ele seguiu
para a sua casa. O volume do som estava baixo, tocava uma
música italiana. Seu cheiro estava impregnado no carro, e me
embriagava. A temperatura do ar-condicionado estava bem
agradável, deixando o clima ameno.
Algum tempo depois, chegamos em sua casa.
— Deixe que eu pego a cadeirinha — ele disse, após abrir a
minha porta.
— Tudo bem.
Observei a forma como os músculos fortes do braço se
moveram quando ele pegou a cadeirinha com Giordana dentro,
como se não pesasse nada. E eu sabia bem o quanto a minha
ameixinha estava pesada.
— Vamos? — chamou e eu acenei em concordância.
Peguei nossas bolsas de dentro do carro e o segui para dentro
da sua casa. Senti um cheiro delicioso de comida, e meu estômago
roncou baixinho. Romeo tirou Giordana da cadeirinha, deu um
cheirinho nela e a colocou no sofá, enchendo de almofadas ao seu
redor. Depois, se aproximou de mim.
Ele pegou de cima do aparador um imenso buquê de rosas
brancas que só então eu havia notado. Eram lindas.
Não faça isso, por favor. Não faça com que eu te ame ainda
mais.
— São para você.
— Romeo — meu tom de voz soou como uma advertência.
— Aceite, por favor — pediu e eu peguei o buquê das suas
mãos, levando-o ao nariz.
— Obrigada, são lindas — agradeci.
— Eu tenho uma boa notícia — disse e puxou um papel que
também estava em cima do aparador, entregando-me.
Notei que aquele era o registro de Giordana em seu nome. O
processo de reconhecimento de paternidade havia sido encerrado, e
agora a minha ameixinha se chamava Giordana Moraes Cavalieri.
Encarei-o, e a emoção que vi em seus olhos foi diferente de
qualquer coisa que eu já havia visto. No brilho do seu olhar, estava
refletido todo o amor que tinha por ela. E o orgulho que sentia em
ser o seu pai, agora oficialmente.
— Você tem sido um ótimo pai, Romeo, e eu espero que
continue dessa forma — falei, depositando com cuidado o meu
buquê em cima do aparador.
— Quero ser ainda melhor, sinto que faço pouco por vocês.
— Não há necessidade de fazer nada por mim. Basta que faça
por Giordana, ela deve vir em primeiro lugar, antes de tudo e todos,
até mesmo antes de você. Deve ser prioridade na sua vida —
alertei-o.
— Ela já é, e sempre será — disse com firmeza.
Eu sabia que sim.
Ficamos presos no olhar um do outro por vários segundos. Ele
estava tão lindo. Percebi quando se aproximou ainda mais e eu dei
uns passos para trás. Se ele me tocasse, seria o meu fim.
Eu não teria forças para sair dos seus braços, porque eu podia
afastá-lo com palavras, mas falharia miseravelmente se ele se
aproximasse demais.
— Romeo.
— Eu estou enlouquecendo longe de você, bella. Não se
afaste, por favor. Deixe-me abraçá-la, sentir o seu cheiro.
Fiquei entre ele e a parede, presa. Seu perfume se intensificou
e eu tive que conter um arfar desavergonhado. Pude sentir o seu
calor antes mesmo que me tocasse, assim como aquela eletricidade
toda que ele emanava.
Romeo Cavalieri era um homem imponente, exalava poder.
Suas mãos cravaram em minha cintura, não tive tempo nem de
impedir. E, sinceramente, eu não queria impedir. Ele encarou meus
lábios, e aproximou o rosto do meu com uma lentidão quase
agoniante.
Foi naquele exato instante que Giordana despertou, fazendo
uns sonzinhos com a boquinha para chamar a atenção, avisar que
havia acordado, como sempre fazia. Romeo deu um sorriso de
canto e encostou a testa na minha. Depositou um beijo ali, casto, e
foi até a filha.
— Bambina! — disse ao se aproximar.
Nossa ameixinha deu um gritinho e sacudiu as pernas e os
braços para ele, feliz, reconhecendo-o. Fiquei de longe, observando
o amor que tinham um pelo outro. Ela era um verdadeiro anjo.
Acordou em uma casa diferente e não foi capaz de estranhar
ou chorar. A primeira pessoa que ela viu não foi eu e, mesmo assim,
estava eufórica. Mesmo sendo pequenina, Giordana sabia que
Romeo era seu pai.
— Eu amo você, minha ameixinha — disse, abraçando-a,
beijando-a.
E ali eu me derreti inteira.
Não sabia por quanto tempo mais conseguiria resistir a ele e
as suas investidas. Eu estava sendo ótima em fugir, e estava dando
o meu melhor para manter a distância entre nós dois.
Mas estava cada vez mais difícil.
Tudo de mim amava tudo dele, até as imperfeições, o gênio
impetuoso, o sangue quente. Nem mesmo depois de tudo que ele
me fez, eu consegui esquecê-lo. E talvez eu devesse desistir de
lutar contra o que eu estava sentindo.
Mas eu tinha medo.
Eu queria não o querer tanto. Tive o meu primeiro amor e a
minha primeira decepção amorosa nele. E por mais forte que eu
tentasse me manter, às vezes doía tanto a saudade que eu sentia
do que não tínhamos vivido, das coisas que a sua vingança nos
roubou.
Entre elas, a mais preciosa de todas: a confiança.
Quando eu sentia que estávamos próximos demais, recuava.
Quando eu pensava que estava sendo muito dura ao manter a filha
longe dele, me aproximava. Independentemente de estarmos juntos
ou não, Giordana também era sua, e isso não tinha como mudar.
E eu não queria mudar...
Bastava olhar para a minha ameixinha e ver o sorrisinho lindo
em seus lábios ao encarar o pai para perceber o quanto ela era
apaixonada por ele. Giordana puxava sua barba cerrada, o cabelo,
mordia o seu queixo, babava o rosto inteiro, e Romeo não se
importava. Pelo contrário, a sua expressão era de felicidade
genuína.
Ele me encarou como se soubesse de todas as minhas
dúvidas, todos os meus receios. Não precisou dizer nada, porque a
maneira intensa como os olhos castanhos me fitaram me falou tudo.
Que ele me amava e lutaria por mim.
Por mim e pela nossa filha.
Capítulo 21
PALERMO, SICÍLIA, ITÁLIA

ROMEO CAVALIERI

Depois de algum tempo sem voltar ao meu país, não tive mais
como postergar a vinda. Tinha algumas coisas para resolver na
AURUM, e precisava assinar a documentação de compra da minha
nova casa em Palermo.
Entretanto, só vim até aqui porque Lucca havia ido ao Brasil e
retornaria para a Itália apenas quando eu voltasse para lá. Não
poderia deixar Isabela e Giordana sozinhas sabendo que o infeliz do
Marcos estava desaparecido, por mais que estivessem cercadas de
seguranças por todos os lados.
E isso não significava que eu não confiava em Gustavo,
porque eu confiava muito. Mas, não havia outra pessoa além de
Lucca que eu pudesse confiar os meus bens mais preciosos.
Cheguei à AURUM após um breve cochilo na minha casa que,
em breve não seria mais minha. Eu a tinha colocado à venda. Não
suportava mais ficar lá sabendo que havia sido o fim de tudo que eu
vivi com Isabela.
Havia comprado uma mansão ainda maior, próximo de onde
era a minha casa atual. Fiz a negociação toda à distância, com a
mesma empresa que cuidava dos meus imóveis espalhados pela
Itália. E agora, que tínhamos fechado negócio, tive que vir para
assinar os papéis.
Logo que o elevador me deixou no meu andar, esbarrei com o
meu pai. A expressão de Salvatore Cavalieri era um sinal de que eu
não teria mais para onde correr, nós precisávamos conversar.
— Filho! — disse de maneira entusiasmada ao me
cumprimentar. — Achei que não voltaria mais.
— Minha casa agora é em Ouro Preto — falei e ele me
encarou.
— Eu sei, eu sei. Romeo, nós precisamos conversar. Faltou
pouco para eu não ir ao Brasil — afirmou, enquanto me seguia até a
minha sala.
— Melhor assim. As coisas não estão fáceis por lá, com
Isabela.
— Eu sinto tanto, tanto por isso. Me perdoe, Romeo... se
houver qualquer coisa que eu possa fazer para ajudar, eu farei.
— Não há o que fazer — respondi, categórico. — Eu a destruí,
e não sei se algum dia conseguirei recuperar a confiança de Isabela.
— Você não é o culpado, eu sou. Por ter alimentado durante
todos esses anos esse ódio dentro de você.
— Não, pai! Eu sou adulto e homem o suficiente para assumir
os meus erros. Fiz tudo que fiz com consciência, e agora estou
pagando caro.
— Eu jamais permitirei que você carregue essa culpa sozinho.
Por causa dessa maldita vingança, você perdeu momentos
importantes da vida da sua filha. E quase a perdeu t...
— Não ouse, não ouse terminar essa frase. Minha filha está
viva, bem, saudável.
— Me desculpe, eu... — Senti que embargou. — Como ela é?
A nossa italianinha? — perguntou, curioso.
— Giordana é a melhor parte de mim — confessei, cheio de
saudades.
— O quê? — indagou e eu o encarei, meu pai estava pálido,
em choque.
Só então eu percebi que havia falado o nome da minha filha.
Já tinha me acostumado com a ideia de que ela carregava o mesmo
nome da minha mãe. Era tão incrível, neta e avó. Mas, assim como
Lucca havia ficado perplexo quando soube, meu pai também teve a
mesma reação.
— Ela se chama Giordana.
— Como pode ser? — Não apenas chocado, pude ver a
emoção estampada dele.
Minha mãe havia sido o grande amor da sua vida. Depois que
ela se foi, ele ficou ainda mais perdido, distante. Tanto que, depois
de todos esses anos, ele nunca mais se relacionou com ninguém.
— Foi uma surpresa para mim também. Isabela sequer sabia o
nome da minha mãe, quando sonhou com uma garotinha que se
chamava Giordana — comentei.
— Eu quero conhecê-la. Quero tanto! Como eu pedi durante
todos aqueles meses em que vivemos pensando que ela havia ido
embora, para que fosse eu no seu lugar. Mas ela não se foi, minha
italianinha está viva.
Peguei o meu celular e mostrei uma foto dela. E logo ele,
Salvatore Cavalieri, que há anos me disse que homens não
choravam, estava prestes a soltar as lágrimas presas em seus
olhos.
Existia um abismo de distância entre mim e o meu pai. No
entanto, apesar de tudo, eu não achava justo privá-lo de conhecer a
neta. Se eu estava disposto a mudar por Isabela, não podia
continuar agindo da mesma forma de anos atrás com ele.
Não seria fácil nos aproximarmos, levaria um tempo. E eu não
sabia sequer se conseguiríamos estreitar os nossos laços de pai e
filho. Contudo, eu daria essa chance. Já remoí demais o passado
para continuar preso nele.
— Ela é linda... minha neta — disse, cheio de orgulho.
— Giordana é a cópia de Isabela.
— Mas ela tem uns traços da nossa família, veja bem.
Só se for o branco dos olhos, pensei.
— De jeito nenhum — contestei.
— E como andam as investigações? Quando aqueles infelizes
serão presos por tudo que fizeram? — indagou.
Certamente Gustavo o mantinha a par de tudo relacionado ao
processo da Mineradora Cavalieri, mas, ainda assim, estava me
sondando para saber se tínhamos tido algum progresso.
— Iremos colocá-los na cadeia em breve! Marcos, no entanto,
já está sendo procurado pela polícia por outras razões.
— O desgraçado que matou o irmão?
— Ele mesmo! O filho da puta espancou a mulher, quase a
matou! — exclamei, cada vez que eu me lembrava daquilo, o nojo e
a raiva vinham com tudo.
— Esse homem é um assassino! — meu pai disse, raivoso. —
Se a justiça não se encarregar desse filho da puta, eu mesmo o
mato com as minhas próprias mãos!
Era difícil que alguma coisa conseguisse me assustar, mas a
forma como as palavras cheias de ódio saiu da boca do meu pai me
assustou de verdade. Não era apenas uma ameaça, Salvatore
Cavalieri realmente parecia prestes a sujar suas mãos de sangue.
— Pai, não faça nada, não se iguale àquele bandido — pedi,
sabendo que eu mesmo já tive vontade de acabar com ele.
— Ele destruiu as nossas vidas, matou o irmão, espancou a
mulher... merece morrer!
— Morrer é muito pouco para ele, Marcos Moraes merece
apodrecer na cadeia. Isso que ele merece — falei.
— E como ela está? A mulher? — questionou.
— Se recuperando, é uma sobrevivente. — Meu pai andava de
um lado para o outro, parecia uma fera enjaulada.
Vi-me nele. Éramos parecidos não apenas na aparência, como
no ímpeto, na impulsividade, no gênio forte e no sangue quente.
Eu precisaria mantê-lo na Itália, não poderia arriscar a sua ida
para o Brasil, eu temia que ele realmente fizesse algo contra
Marcos, não apenas por tudo que o desgraçado havia feito de ruim,
mas para aliviar um pouco da culpa que sentia.
Porque eu já havia me sentido assim.

Eu havia contratado uma super equipe para fazer a limpeza e


preparar a minha nova mansão para a minha chegada. Em dois dias
tudo foi feito, desde a mudança até a arrumação. E, antes de voltar
ao Brasil, teria a primeira noite em um lar zerado de lembranças.
Ali só teria espaço para momentos bons, e eu esperava vivê-
los em breve com a Isabela e com a nossa filha. Queria que elas
estivessem comigo. Eu estava dando o meu melhor, tudo de mim,
para que em breve estivessem.
Havia trocado algumas mensagens com ela no decorrer dos
dias, assim como mantinha contato direto com Lucca. Segundo ele,
estava tudo sob controle. Quando decidi vir à Itália, pedi-lhe que
ficasse em Ouro Preto durante o período em que eu estivesse fora.
Era muito longe, outro país, se acontecesse qualquer coisa, ao
menos ele estaria por perto.
Eu estava certo de que não aconteceria nada. Gustavo estava
atento a tudo, Lucca estava por perto, e uma multidão de
seguranças estava cuidando de Isabela e, consecutivamente, de
Giordana. Não havia motivos para temer, elas estavam bem
protegidas.
Peguei uma dose de AURUM, da nossa edição com ouro, o
novo lar merecia. Apreciei a bebida lentamente, sentindo o gosto
único que diferenciava a nossa marca de qualquer outra, e que nos
tornava a melhor do continente europeu.
Observei a paisagem à minha frente, ainda mais bonita do que
na casa antiga. Da janela do meu quarto eu tinha a ampla visão do
mar, que brilhava à luz da lua e das estrelas. O breu da noite não
impedia o espetáculo, tornava tudo mais belo.
A escuridão tinha o seu encantamento.
Lembrei-me da vista que tinha na janela da sala da minha casa
de Ouro Preto, e pude sentir quase a mesma sensação que sentia
quando estava lá. Eram paisagens diferentes, uma era mar,
horizonte, infinito; a outra era verde, paz, aconchego, mas o
sentimento era o mesmo.
De pertencer, se sentir em casa.

Depois de uma boa noite de sono, fui para a empresa e passei


o resto do dia lá, em reuniões, videoconferências, e várias outras
atividades que Lucca havia designado. Enquanto ele, por outro lado,
estava no Brasil fazendo as coisas que geralmente era eu quem
fazia.
No fim da tarde, fui direto para o aeroporto, onde o jatinho que
me levaria de volta ao Brasil já me aguardava. Fiz todos os
procedimentos burocráticos para o embarque, segui para a pista de
pouso e entrei na aeronave.
Não via a hora de chegar em casa e matar as saudades das
minhas meninas. Eu já tinha avisado a Isabela de que amanhã
estaria em Ouro Preto e pretendia vê-las o mais breve possível. Ela
ainda não tinha respondido, mas eu sabia que teria uma resposta
positiva.
Estávamos caminhando a passos de tartaruga, mas já era
alguma coisa. O que importava era que estávamos em paz. Eu nem
parecia o mesmo Romeo de anos atrás, que quando queria uma
coisa, ia com tudo para cima, sem se importar com os destroços que
deixava pelo caminho. E não era algo pelo qual eu me orgulhava.
Precisei perder tudo que eu tinha, sofrer feito um condenado,
para então aprender.
Tive sorte por não ter realmente perdido. Contudo, o
sofrimento por ter pensado que sim durante meses foi suficiente
para uma vida. Pelo menos eu ainda tinha chances de recuperar o
amor de Isabela, mesmo que demorasse uma eternidade.
Distraí-me dos meus pensamentos quando o piloto anunciou a
decolagem. Passaria a noite analisando alguns contratos, estava
agitado demais para dormir. Quando o jatinho já estava na altura
adequada, peguei meu o notebook e dei continuidade ao que estava
fazendo durante o dia.
Em algum momento do voo, escutei um barulho estranho e a
aeronave sofreu uma turbulência. Não me assustei, como eu voava
muito, estava acostumado, aquilo já tinha acontecido tantas vezes.
Senti um novo tremor no instante em que o piloto começou a
falar o que estava acontecendo. E então eu fiquei com medo, muito
medo. Só senti essa sensação duas vezes na minha vida, quando
perdi a minha mãe, e quando achei que tinha perdido a minha filha.
Havia uma falha na turbina do avião e precisaríamos fazer um
pouso de emergência.
Senti que meu coração falhou uma batida. Um desespero me
consumiu. Eu não podia morrer, não podia morrer sem recuperar o
amor de Isabela, sem criar uma família com ela e com a nossa filha,
sem ter Noah e os outros filhos que viriam.
A aeronave começou a descer de uma maneira estranha.
Um nó na garganta quase me sufocou, porque as
probabilidades de sair com vida de uma queda de avião eram quase
nulas. E não era bem uma queda o nosso caso, mas, um pouso de
emergência, e sabe-se lá onde iríamos parar, e como iríamos parar.
A voz do piloto estava tranquila, eles eram treinados para
momentos assim. Ou deveriam ser. Observei o comissário sentado
em uma poltrona à frente e ele também parecia calmo. Estávamos
apenas nós quatro no jatinho. Eu, ele, o piloto e o copiloto. Ambos
eram funcionários da AURUM, assim como o jatinho pertencia à
minha empresa.
Não pude discernir quanto tempo havia se passado, eu parei
de contar no instante em que percebi que poderia morrer.
E quando senti o impacto no chão, a última imagem que tive
antes de tudo escurecer, foi a de Isabela com a nossa filha nos
braços.
Capítulo 22
OURO PRETO, MINAS GERAIS, BRASIL

ISABELA MORAES

Eu estava tão preocupada, com um pressentimento estranho.


Fazia dois dias que Romeo não entrava em contato comigo, o
que nunca havia acontecido antes, pois, diariamente, ele costumava
me enviar muitas mensagens para saber da filha.
Sua última mensagem, no entanto, foi para avisar que estava
retornando ao Brasil e queria marcar para ver Giordana. Acabei
respondendo somente algumas horas depois, e não foi proposital,
eu estava muito ocupada. Contudo, não obtive mais nenhum
retorno.
No auge da preocupação, cheguei até mesmo a ligar para ele,
mas a ligação só caía na caixa postal. Não comentei nada com a
Alícia, porque poderia ser coisa da minha cabeça, talvez ele
estivesse resolvendo algo importante do trabalho.
Tinha acabado de dar um banho em Giordana e estava a
amamentando. Seus olhinhos me fitavam, lutando contra o sono.
Nossa rotina de todos os dias era essa, eu saía da galeria um pouco
antes de Alícia, vinha para casa, brincava com ela, depois,
tomávamos um banho e ficávamos grudadinhas pelo resto da noite.
Escutei duas batidas na porta e segundos depois minha amiga
surgiu por ela.
— Isa?
— Oi, entra. — Recebi-a com um sorriso.
— Como está a ameixinha da madrinha? — perguntou, sua
expressão estava estranha.
— Lutando contra o sono, para variar — respondi, fitando a
bezerrinha em meus braços. — Tudo bem? — questionei ao olhar
novamente para ela.
— Preciso falar com você, mas irei esperar Giordana terminar
de mamar. Não quero atrapalhar esse momento lindo de vocês
duas.
— Não atrapalha, pode falar.
— Está bem, eu já volto. — Percebi que disfarçou ao verificar o
celular, e se retirou.
Não demorou muito tempo para que a minha filha se
entregasse ao sono. Coloquei-a com cuidado no berço, beijei a sua
testinha e quando me preparei para ir atrás de Alícia, ela voltou.
— E então, o que houve? Alguma coisa na galeria? —
indaguei e ela acenou negativamente.
— Isa, não sei nem como dar essa notícia para você —
sussurrou, seu olhar estava triste, pesaroso.
Aquele pressentimento esquisito que eu estava sentindo se
intensificou ao ponto de o nó na minha garganta quase impedir a
passagem do ar. Minhas pernas amoleceram e tive que firmar os
pés no chão para não cair.
— Que notícia? Alícia, pelo amor de Deus, fale logo!
— O jatinho em que o Romeo estava vindo... desapareceu —
disse tão baixo que pensei até ter escutado errado.
— O quê?
— Minutos antes de perder o contato com as torres de
comunicação, o piloto alegou que precisariam fazer um pouso de
emergência devido a um problema nas turbinas da aeronave.
— Não!
Minha visão ficou turva e eu tive que me sentar na cama,
estava prestes a desmaiar.
— O Lucca esteve na galeria hoje, e pediu que eu avisasse
você. As buscas já começaram, mas ainda não encontraram
nenhum sinal de onde o avião possa ter... pousado.
Ela diria caído, porque era o que eu também havia pensado. E
eu tinha total consciência de que uma queda de avião poderia ser
fatal. E essa ciência fez com que o meu desespero aumentasse
ainda mais.
— Ele não pode, Alícia! Romeo não pode fazer isso comigo! —
falei alto e ela desviou o olhar para o bercinho onde Giordana
continuava dormindo.
— Fique calma, não vamos pensar no pior.
— Meu Deus! Não, não pode ser!
As lágrimas brotaram sem que eu tivesse controle. Eu desejei
tanto que ele sumisse, mas não no sentido de desaparecer e sim,
voltar para a Itália e nos deixar em paz. Entretanto, não era o que eu
queria realmente.
Minha amiga me abraçou forte e então as lágrimas se
transformaram em um choro agonizante, de soluçar.
Foi inevitável não me sentir culpada. Tantas vezes eu o
mantive longe da filha, para castigá-lo, puni-lo pelo que ele havia
feito conosco. E Romeo jamais questionou, jamais me cobrou,
jamais me julgou por ter mentido para ele.
Afastei-o de tantas maneiras que perdi as contas, quando tudo
que ele mais queria era poder conviver com a nossa ameixinha, dar
amor, segurança, proteção. Ele não poderia ir assim, simplesmente.
Ele me garantiu que não deixaria Giordana desamparada.
— Fique calma, minha amiga. Ele será encontrado, tenho
certeza disso.
— Eu o amo tanto, tanto. — Coloquei o rosto entre as mãos e
desabei. — Ele me garantiu que cuidaria de Giordana, que cuidaria
de nós duas... Romeo não pode fazer isso comigo de novo!
A dor que eu sentia era exatamente a mesma de quando ele
me deixou a primeira vez, quando descobri que fui usada por causa
de uma maldita vingança. Era angustiante, como se alguém
estivesse esmagando o meu coração, rasgando a minha alma.
Romeo havia me deixado mais uma vez.
Eu havia o perdido para sempre.
A pior parte do sumiço de alguém era a incerteza.
Não ter notícias, não saber se a pessoa estava bem, se estava
com fome, sede, frio. Se estava com tanto medo quanto quem
esperava desesperadamente por qualquer informação.
Mais três dias haviam passado desde o desaparecimento de
Romeo, e a cada segundo as minhas esperanças se esvaíam um
pouco. Até mesmo Giordana parecia sentir a minha angústia,
porque estava mais amuada, manhosa e só queria o meu colo. Ou
talvez não fosse por minha causa e sim, pela falta que sentia do pai.
Eu só queria voltar no tempo para tê-lo deixado aproveitar
mais com a nossa ameixinha. Eu só queria voltar no tempo para não
o afastar mais. Eu só queria voltar no tempo para dizer que o
amava, e que odiava o fato de não conseguir esquecê-lo.
Meu coração estava destroçado e minha cota de lágrimas tinha
acabado.
Não estava conseguindo me concentrar em nada além da
minha filha. Nem mesmo à galeria eu tinha ido mais. Alícia estava
cuidando de tudo, assim como seus pais e Max me apoiavam e não
me deixavam desamparada por um só minuto. Eu orava a todo
momento, pedindo com toda fé que ainda restava para que ele
estivesse bem e voltasse logo para nós.
E foi no meio da tarde, enquanto eu amamentava Giordana,
que Alícia surgiu em sua casa com Lucca. O desespero me atingiu
em ondas crescentes, mas tive que me controlar para que minha
filha não sentisse.
— O que houve? Romeo foi encontrado? — perguntei,
ansiosa.
— Sim, minha amiga... ele foi encontrado com vida e está
sendo levado para a Itália — respondeu, seu olhar demonstrava
alívio.
Ah, meu Deus! Obrigada! Obrigada! Obrigada!
— E como ele está? Eu preciso ir até ele, Giordana e eu
precisamos — falei, levantando-me com ela em meus braços.
— Por enquanto não sabemos de muitos detalhes. Ele está
sendo transferido para Palermo junto com as outras três pessoas
que também estavam no jatinho, ambos estão sendo
acompanhados por uma equipe de médicos — Lucca disse.
— Me leve até ele, Lucca, por favor — supliquei e ele trocou
olhares com Alícia.
— Não acho que seja uma boa ideia, Isa. Pense em Giordana,
uma viagem dessas é muito exaustiva, e... ainda não sabemos ao
certo como estão as coisas — minha amiga disse.
— Estou pensando única e exclusivamente nela. Romeo
precisa da filha, e ela precisa do pai.
E era verdade, por mais que eu estivesse desesperada para
vê-lo, era por Giordana e por ele que eu estava pensando em ir para
a Itália. Eu nunca mais o distanciaria da filha, já tinha sido cruel o
bastante.
— Talvez não seja uma má ideia, Alícia — Lucca falou,
encarando-a. — Eu não posso sair do Brasil sem Isabela, então, se
ela resolver ficar, eu fico. Se decidir ir, eu vou também.
O que aquilo significava?
— O que você está falando? Eu não entendo...
— Eu prometi a ele que enquanto não voltasse de Palermo, eu
não tiraria os meus pés de Ouro Preto.
— Por quê? — indaguei.
— Porque Romeo confiou você e Giordana a mim durante o
período em que estivesse fora — respondeu.
Meus olhos arderam com a informação, o aperto no peito se
intensificou. Como se de alguma forma, Romeo estivesse prevendo
o pior. E mais uma vez ele demonstrou através das suas ações o
quanto nos amava.
Eu havia deixado claro que não acreditaria mais em suas
palavras.
No entanto, ele estava fazendo de tudo para que eu voltasse a
confiar nele. Se não com palavras, no amor que sentia por mim e
por Giordana. Ele sempre cuidou de tudo, desde o início, e
continuava cuidando, mesmo de longe.
Meu coração aqueceu e apertou de saudade ao mesmo
tempo.
Romeo Cavalieri iria ficar bem. Ele tinha que ficar bem, porque
estava me devendo a família que havia me prometido. E eu decidi
que não fugiria mais, estava cansada de lutar contra os meus
sentimentos.
Porque o medo que eu senti de perder de vez o amor da minha
vida, foi maior do que todo sofrimento que eu vivi. Eu aprendi a lidar
com a dor, ela me fortaleceu. Contudo, eu jamais aprenderia a lidar
com a sua ausência, ou com a ideia de que ele não existisse mais.
Eu o amava com tudo de mim.

PALERMO, SICÍLIA, ITÁLIA

Giordana e eu desembarcamos em Palermo acompanhadas


por Lucca.
Não sabia dizer com precisão o que eu estava sentindo ao
pisar na Itália depois de tanto tempo. E, sinceramente, eu nem fazia
questão de saber, porque tudo que mais me importava era ver
Romeo bem.
Ver Romeo e Giordana juntos novamente.
Lucca nos acompanhou até a mansão de Romeo, que por
sinal, não era a mesma que eu havia conhecido e eu me abstive de
perguntar o porquê da mudança. Não tinha importância, de qualquer
modo. Após nos deixar em segurança e mostrar toda a casa, ele
pediu que eu ficasse à vontade e descansasse da viagem, pois,
assim que tivesse notícias, me informaria imediatamente.
Por mim, iríamos junto com ele, mas Giordana estava exausta
e eu precisava fazer com que ela dormisse um pouco. Como
sempre, minha filha se comportou durante a maior parte do voo,
somente nas horas finais ela ficou um pouco mais irritadiça. Eu
também havia ficado.
Não sabia como Romeo conseguia voar com tanta frequência
e se acostumar a isso.
Fui até o quarto dele e o seu perfume se alastrou pelas minhas
entranhas. Respirei profundamente, querendo absorver tudo. Eu era
completamente apaixonada pelo seu cheiro. Notei que Giordana
observava tudo com curiosidade.
Dei um banho gostoso nela, coloquei um pijaminha confortável
e a amamentei. Minha ameixinha não demorou mais do que dez
minutos para pegar no sono, ela estava realmente cansada.
Depositei-a com cuidado em cima da imensa cama e coloquei vários
travesseiros ao seu redor.
Giordana virou-se de ladinho e abraçou um dos travesseiros,
como se sentisse o cheiro e a presença do pai. Fiquei vários
minutos olhando para ela, com a certeza de que de todas as coisas
que Romeo e eu havíamos feito, ela era a mais bonita.
Era uma parte de nós dois. A melhor parte.
Levantei-me e fui tomar um banho, deixei a porta do banheiro
aberta para conseguir escutar caso ela acordasse. Mas, se eu bem
a conhecia, ela dormiria direto até a próxima mamada.
Toquei em cada objeto que tinha no banheiro de Romeo, como
se aquilo me fizesse sentir mais perto dele, sabendo que esteve ali
há poucos dias. Usei seu sabonete, seu xampu, tudo dele.
Eu estava com tanta saudade, queria entrar em seu abraço e
não sair nunca mais.
Não demorei no banho, ao sair, enxuguei-me, enrolei-me em
seu roupão e me deitei ao lado da nossa filha. Coloquei meu rosto
bem próximo ao seu, quase colando os nossos narizes. E, envolvida
pelo seu cheirinho, misturado ao cheiro de Romeo, tudo que eu
senti foi uma paz em meu coração.
Aquele pressentimento ruim se foi totalmente quando, algum
tempo depois, eu recebi uma mensagem de Lucca informando que o
tinha visto e que estava tudo bem. E que eu poderia ficar tranquila,
pois assim que possível, nos buscaria para nos levar até ele.
Jamais conseguiria expressar em palavras a felicidade e a
sensação de plenitude que eu senti ao receber a notícia. O alívio
tomou conta, levando embora toda a tensão dos últimos dias.
Romeo havia voltado para mim.

Em algum momento eu havia cochilado e, agora, estava no


meio de um sonho bom. Mãos firmes seguravam-me pela cintura, e
um corpo forte e grande estava encaixado atrás de mim. Suspirei
com a sensação gostosa, eu sabia que era ele.
Desejei que o sonho fosse real, e que Romeo realmente
estivesse ali. Comecei a despertar quando senti um ar quente em
minha nuca, e logo em seguida lábios macios deixaram um beijo
suave ali. Eu o reconheceria mesmo que todas as minhas memórias
se apagassem.
— Bella.
Capítulo 23
Algumas horas antes...

ROMEO CAVALIERI

Eu havia renascido.
Quando uma das turbinas do jatinho que me levava de volta ao
Brasil falhou, estávamos voando pela região de Cabo Verde, um
arquipélago vulcânico localizado na África Ocidental.
O pouso de emergência teve um impacto brusco contra o
chão, mas não fatal. Vivi momentos de completo horror junto à
equipe de bordo que estava comigo. Havíamos pousado em uma
área florestal, em plena madrugada, e, ainda por cima, havia
dificuldade de comunicação.
Por sorte, ninguém se feriu gravemente, apenas uns arranhões
e cortes superficiais. Conseguimos nos alimentar e nos hidratar com
as comidas e bebidas que tinham no jatinho, enquanto esperávamos
por resgate.
E após quase três dias de desespero, finalmente o piloto
conseguiu se comunicar com as torres de controle e pedir ajuda.
Porém, até que nos resgatassem, levou mais um dia, já que
estávamos em um local de difícil acesso.
Tudo que eu mais temi durante aqueles dias que pareceram
uma eternidade, foi ficar longe de Isabela e Giordana. Tive que lidar
com o pavor de saber que ficariam desamparadas, e de que eu não
estaria ao lado delas para protegê-las do mundo.
A primeira coisa que eu desejei fazer quando o resgate
chegou, foi ligar para ela. Mas, meu celular estava sem bateria e,
num estado completo de desespero, não me lembrei do número de
ninguém.
A segunda coisa que eu desejei fazer quando o resgate
chegou, foi voar direto para o Brasil. No entanto, fomos levados para
um hospital de Cabo Verde e, após realizarmos alguns exames mais
urgentes, eu simplesmente apaguei.
Talvez pela exaustão por não ter dormido direito naqueles dias,
ou pelos medicamentos que estava recebendo direto na veia. Ou
pela mistura dos dois.
Não me lembrava de nada, nem mesmo de como fomos
transferidos para Palermo. Só me recordava de ter acordado meio
grogue e da presença do meu pai. Foi quando eu percebi que
estava na minha terra.
Em meio aos meus pensamentos, ouvi as vozes de Lucca e
Salvatore. Os dois conversavam baixo na antessala que dava
acesso ao quarto em que eu estava internado. Das outras vezes
que eu tentei me manter acordado, não consegui. Mas, agora que já
tinha colocado o meu sono em dia, estava um pouco mais disposto.
— Lucca? Você não deveria estar no Brasil? — indaguei,
chamando a atenção deles.
Tínhamos combinado de que ele só sairia de lá quando eu
voltasse, e não podia acreditar que o meu amigo havia deixado
Isabela e minha filha lá, sozinhas. Pedi que ele não saísse de perto
delas, sob nenhuma hipótese.
— Fique calmo, Romeo! Como você está? — perguntou,
aproximando-se.
— Eu estou bem. E Isabela e a minha filha?
— Elas estão bem, estão aqui, em Palermo.
O quê? Será que eu estava sonhando? Ou tinha morrido e ido
para o céu?
— Elas...
— Sim... estão na sua casa, esperando por notícias.
Achei que morreria de tanta felicidade. Saber que as duas
estavam ali, por mim, fez com que eu me sentisse de um jeito que
eu nunca havia me sentido. Elas estavam na nossa casa. Ergui-me
imediatamente. Nada me seguraria nesse hospital.
— Romeo, nem pense nisso. Você ainda deve ficar em
observação por mais algumas horas — Salvatore disse.
— Eu estou ótimo, e ficarei melhor ainda quando estiver com
elas. Chame o médico, eu quero ir para casa! — ordenei.
Lucca e meu pai me conheciam o suficiente para saber que eu
não desistiria. E foi o mais velho que saiu do quarto para chamar o
médico.
— Porra, cara! Que susto! — Lucca disse, referindo-se ao
acidente. — Como foi? Seu pai me contou mais ou menos o que os
médicos disseram de acordo com o relato de vocês.
— Nem me fale... não sei dizer o que foi pior, a pane na
turbina, o aviso de pouso de emergência, o pouso em si, ou ficar
quase quatro dias naquela floresta sem ter ideia se sairíamos vivos
de lá.
— Foram dias angustiantes para nós também.
— E a minha bambina?
— Cara, ela cresceu desde a última vez que a vi. Está linda,
como sempre. — Pensei no quanto eu era sortudo. — Felizmente
ela puxou a mãe — provocou e, mesmo sendo meu amigo, não
pude evitar o ciúme de Isabela.
Eu era completamente louco por aquela mulher.
— Vá se foder! — grunhi.
— Com todo respeito, irmão — disse debochado.
Fiquei feliz por ver que, aos poucos, Lucca estava se
recuperando do baque pela perda de Laura. Eu sabia que aquela
era uma dor que nunca cessaria, ele a amou muito, e ainda a
amava.
Não demorou muito tempo para que o meu pai voltasse
acompanhado pelo médico.
— Romeo, não acho prudente dar alta a você agora. Por mais
que esteja se sentindo bem, gostaria que ficasse em observação por
mais umas horas.
— Se você não me der alta, eu sairei daqui por conta própria
— falei, categórico.
Observei que meu pai o chamou novamente e os dois
trocaram umas palavras. Ele questionou sobre o resultado dos
exames, e disse que se estava tudo bem, não havia motivos para
me manter ali. O médico respondeu que era apenas por precaução,
mas que eu estava fora de perigo. Até que, por fim, Salvatore
Cavalieri o convenceu.
Até mesmo na insistência e na teimosia éramos parecidos um
com o outro.

Lucca entrou pelo portão da minha casa e avistei a equipe de


segurança que havia transferido da outra residência para esta, todos
estavam a postos. Meu amigo estacionou em frente à porta, e, antes
de sair, o agradeci.
— Obrigado, irmão! Por tudo!
— Estamos juntos... conte comigo sempre — falou, dando um
toque suave em meu ombro.
Tive vontade de correr para dentro, louco de saudades das
minhas meninas, e só não o fiz porque meu corpo dolorido
protestou. Era o resultado da tensão, das horas deitado, tudo
acumulado. Nem mesmo o tempo que eu passava na academia me
deixava assim.
Abri a porta contendo a minha ansiedade, estava tudo
silencioso, mas, assim que dei o primeiro passo, senti o cheiro
delas.
Por instinto, segui direto para o meu quarto, eu sabia que elas
estariam lá. Só podiam estar. Subi as escadas mais devagar do que
gostaria e segui pelos corredores. A porta do meu quarto estava
entreaberta e quando entrei, as vi dormindo juntas.
Porra! Que filho da puta sortudo eu era!
Caminhei, devagar, fazendo o mínimo de barulho possível, não
ousaria acordá-las, as duas pareciam exaustas. Isabela e Giordana
estavam com os rostos quase colados, os narizes arrebitados e
iguais encostados um no outro.
Elas eram minhas.
Primeiro, fui para o lado em que minha filha estava e a
observei por vários segundos, enlevado, orgulhoso por saber que fui
eu quem fiz. Ela era tão perfeita. Depositei um beijo suave na sua
cabeça e segui para o lado da mulher da minha vida.
Isabela estava enrolada no meu roupão, e quase sumia dentro
dele. Repeti o que havia feito com Giordana, depositei um beijo nela
e segui para o closet. Peguei uma calça de moletom e uma
camiseta e fui tomar uma ducha. Já tinha tomado banho antes de
sair do hospital, mas parecia que aquele cheiro de álcool e remédio
continuava em mim.
Fiz tudo muito rápido, e quando terminei, vesti-me e deitei-me
ao lado de Isabela, abraçando-a por trás e enfiando o rosto na sua
nuca.
Cheirosa demais, porra!
Apertei a sua cintura com suavidade e ouvi um arfar. Encostei
meus lábios na parte de trás do pescoço e dei um beijo ali. Senti
que sua respiração mudou, ela havia acordado.
— Bella — murmurei.
Isabela se virou com cuidado e me fitou. Nada no mundo
poderia explicar o significado do olhar que havíamos trocado
naquele momento. Era uma mistura de saudade, amor, medo,
paixão.
— Romeo...
Seus olhos se encheram de lágrimas e ela pulou em cima de
mim, agarrando-me com força. Tive que conter um gemido de dor,
não ousaria reclamar. Sonhei com esse dia por muito tempo.
O dia em que ela voltaria para mim.
— Estou aqui, bella. Eu estou aqui. — Abracei-a de volta,
ignorando a dor que estava sentindo.
Isabela soluçava com o rosto enfiado em meu peito, e eu me
senti um maldito por tê-la preocupado, por saber que, mais uma vez,
estava sendo a razão do seu choro. Não queria que ela sofresse, eu
estava ao seu lado, vivo. Por elas.
— Eu senti tanto medo — disse tão baixo que mal pude ouvir.
— Medo de não ver você nunca mais e...
— Shh... eu não vou a lugar algum — interrompi, segurando-a
com firmeza.
Quando me encarou, eu voltei no tempo. O olhar cheio de
amor que me deu era o mesmo que me dava antes de tudo
acontecer. E dali para a frente, eu faria o que fosse preciso para que
ela só me olhasse daquela maneira.
— Eu amo você, Romeo, nunca o esqueci. E odiei por muito
tempo o fato de não conseguir te esquecer, mas eu estou cansada,
cansada de lutar.
— Não precisa mais lutar, bella. Eu estou aqui para te amar, te
venerar, cuidar de você, da nossa filha. Amo vocês mais do que
qualquer coisa nesse mundo. — Respirei fundo. — Volte para mim.
Sua resposta foi um beijo em meus lábios, doce, quente, lento,
ao modo Isabela. Deixei que guiasse, estava com saudade demais.
E só eu sei o quanto tive que me controlar para não deixar o meu
lado dominador comandar e pegá-la de jeito. Seria capaz de ignorar
todas as recomendações médicas de repouso e as dores pelo
corpo. No entanto, mantive-me centrado, afinal, nossa filha estava
dormindo ao nosso lado.
Isabela cessou o beijo depositando vários selinhos pelo meu
rosto. Depois, agarrou-se novamente em mim feito um bicho-
preguiça, como fez tantas vezes. Ela voltou para mim, e eu não
poderia estar mais feliz
— Não me machuque mais. Nunca mais — sussurrou no meu
ouvido.
— Nunca — murmurei em resposta, apertando-a ainda mais
forte no meu abraço.
Se eu morresse agora, morreria feliz, porque eu finalmente
estava onde deveria.
Ao lado delas.
Eu ainda não acreditava que Isabela e a minha filha estavam
realmente ali. Giordana havia acordado logo depois que eu cheguei,
e fez a maior festa quando me viu. Estava cada vez mais apegada a
mim, e eu a ela. Ficamos brincando por várias horas, e eu nunca me
senti tão completo.
Diferente das outras vezes, a partir de agora elas não iriam
mais embora.
Nossa ameixinha tinha mamado e se rendido novamente ao
sono. E sua mãe e eu aproveitamos que dormiu para nos
alimentarmos também. Eu havia pedido uma massa de um
restaurante tradicional daqui de Palermo e que adorava.
Ele era famoso por preparar várias comidas típicas da região
da Sicília. Pedi o meu prato preferido, uma Pasta alla Norma, que
era feita com molho de tomate, berinjela, ricota e manjericão.
Isabela adorou e aprovou.
Enquanto jantávamos, ela me pediu que eu contasse como
havia sido o pouso de emergência. Não queria ter que falar sobre
aquilo com ela, não queria que se preocupasse, ou ficasse aflita,
porque já tinha passado. No entanto, ela quis saber, e eu não
esconderia mais nada dela. Nada.
— O que você sentiu quando tudo aconteceu? — perguntou.
— Medo. Medo de nunca mais ver vocês — respondi a
verdade. — Mas o que importa é que tudo passou.
— Eu também senti medo, até Giordana andava tristinha. Não
sei se estava sentindo a minha angústia, ou a sua falta. — Sua
confissão me deixou atordoado.
Eu nunca mais as faria sofrer.
— Não precisa mais sentir medo, eu cuidarei de vocês —
garanti, apertando com suavidade a sua mão.
— Nós temos muitas coisas para conversar, alinhar — disse
firme.
— E iremos, bella. Nada mais ficará entre nós.
— Aquela carta, eu...
Referiu-se a carta em que eu contei tudo, sobre a vingança,
sobre quem eu realmente era. Apesar de ser difícil de engolir, as
únicas mentiras daquelas palavras eram sobre o seu pai; ele não
era quem pensávamos, Paulo Moraes havia sido uma vítima, como
nós.
E a outra mentira era que ela havia sido apenas parte de um
plano. No início, antes de conhecê-la, até podia ter sido. Contudo,
depois que a vi pela primeira vez, não era mais. Eu havia me
apaixonado completamente, mas fui muito covarde para admitir. Era
como se de alguma forma, eu tivesse a certeza de que ela era pura
demais para um homem como eu.
— Eu amo você — interrompi.
Estava na hora de Isabela saber a verdade.
Capítulo 24
ISABELA MORAES

Eu estava em choque.
Romeo havia me contado tudo. Tudo que aconteceu anos
atrás na Mineradora Cavalieri, e que culminou na morte do meu pai.
Meu coração esmagou dentro do peito, mas eu precisava passar por
aquilo. Fugi a minha vida inteira do assunto, estava na hora de
encarar.
Meu pai não era o bandido que eles pensavam, eu nunca
estive enganada. Eu era sua filha, apesar de ter convivido apenas
os primeiros anos da minha vida com ele, eu sabia quem era Paulo
Moraes. Um homem honrado, forte, justo, e que me amava muito.
— Eles são uns monstros, todos eles! — falei, referindo-me ao
Cícero e ao Marcos.
Mesmo que ainda estivessem em busca de mais evidências,
tudo levava a crer que eles foram os responsáveis pela tragédia. Eu
não podia acreditar que o homem que eu chamei de tio por anos, o
homem pelo qual tive muito carinho e gratidão foi capaz de matar o
próprio irmão.
Ele matou o sangue do seu sangue, espancou a mulher,
roubou e destruiu a vida da família de Romeo e colocou a culpa em
uma pessoa inocente. E o Cícero foi conivente com tudo.
— Os dias deles estão contados, bella.
— E agora com o Marcos desaparecido, fico ainda mais
apavorada de que possa fazer algo conosco... ele já deve saber
quem você é.
— Não se preocupe, estou cuidando de tudo.
— E essa questão toda da herança, eu não quero esse
dinheiro, ele é sujo. Ele só existe às custas da morte do meu pai!
Era muita informação para processar. Sem saber que o
dinheiro que eu pensava que era meu havia sido roubado, eu
permitia com que Marcos administrasse tudo. Eu fui manipulada
durante anos para fazer as vontades dele, pois fez com que eu me
sentisse acolhida e me deu uma falsa liberdade.
Ele era dissimulado ao ponto de se fazer de coitado, dizer que
havia prometido ao meu pai que cuidaria de mim... sendo que tudo
que queria, na verdade, era o dinheiro. Apenas o dinheiro.
— Depois que completei dezoito anos eu assinei tantas coisas
sem ler, confiei nele.
— Já imaginávamos, bella. O montante da sua herança era
muito maior do que é hoje. Não sabemos o que ele usou para gastar
esse dinheiro todo, mas iremos descobrir.
— Esse dinheiro é podre, ele está manchado com o sangue do
meu pai.
— Eu sinto muito, muito mesmo. Porém, continua sendo seu...
continua na mesma conta.
Naquele instante, uma ideia surgiu em minha mente. Uma
ideia antiga, e que agora eu poderia colocar em prática.
— Vou doar tudo — afirmei. — Farei uma pesquisa em todos
os orfanatos do Brasil, e irei distribuir esse dinheiro entre os mais
carentes de recursos.
— Tem certeza? — Romeo questionou.
— Eu já faria isso de qualquer forma, com parte do dinheiro.
Mas, agora, sabendo de onde veio, não quero nem um centavo.
— Está bem, se você prefere assim, assim será.
— Como eu não suspeitei de que havia algo errado no
processo da tutela? Sequer me atentei ao fato de a maioridade no
Brasil ser aos dezoito anos.
— Ele fez tudo para que você não desconfiasse, inclusive a
manipulou — Romeo falou ao me apertar ainda mais em seus
braços. — Mas, não se culpe, você é inocente nessa história toda...
você e seu pai.
Meu paizinho.
Só de pensar que se não fosse a maldade humana ele ainda
estaria vivo. De todas as coisas que Marcos fez, ter matado o meu
pai era a pior delas. Ter matado o meu pai e espancado a tia Gisele.
Ambas as situações eram estarrecedoras, e graves, muito graves.
Ele representava um risco muito grande estando foragido.
— Deus! Ele queria que eu me casasse com o Bruno. — Só de
lembrar eu sentia asco. — Para continuar controlando o dinheiro...
que homem sujo!
— Filho da puta! — Romeo disse, enfurecido, somente à
menção do nome do Bruno.
— Tudo isso por ambição, poder...
— A justiça será feita, e não vai demorar.
— Romeo! Você precisa me garantir que não irá fazer nada por
impulso, e nada que possa colocá-lo em risco.
— Fique tranquila, bella. Eu jamais me arriscaria... além do
mais, a justiça que eu me refiro é a do Brasil. Iremos desarquivar o
caso da mineradora, e então será o fim deles.
Eu estava arrasada, porém, me mantive firme, segura. Romeo
me garantiu que a justiça seria feita e que, em breve, todos os
envolvidos na morte do meu pai estariam atrás das grades. Marcos,
Cícero, o juiz corrupto.
Todos eles pagariam pelos crimes que cometeram.

Minha bezerrinha havia acordado para a mamada da


madrugada, e Romeo, que não tinha pregado o olho, nos olhava
hipnotizado. Giordana até tentou dar um pouco de moral para ele,
mas estava cheia de preguiça. Naquele horário, ela costumava
acordar apenas para mamar e logo dormia, só despertando
completamente pela manhã.
— Vocês são perfeitas, Deus do céu! Como eu sonhei com
esse momento! — murmurou, o sotaque estava bastante acentuado.
Eu o amava.
Minutos depois, Giordana dormiu e eu a coloquei deitada de
lado, como ela gostava. A cama de Romeo era gigantesca e,
mesmo sendo ocupada por nós três, ainda tinha espaço de sobra.
Nós nos deitamos novamente, e Romeo abraçou-me por trás.
Sua mão estava espalmada na minha barriga, e, mesmo sendo um
toque sutil, inocente, reverberou dentro de mim com intensidade.
Senti um arrepio, um calor.
Virei o rosto na sua direção e sussurrei:
— Preciso de você.
— Porra, bella. Não faça isso comigo — murmurou.
— Estou indo ao banheiro, espero você em cinco minutos —
falei ao me levantar rapidamente.
Romeo me encarou incrédulo, mas não dei chance para que
ele falasse mais nada. Eu precisava dele, e tinha que ser agora.
Assim que entrei no banheiro do seu quarto, encostei a porta e
comecei a preparar a banheira. Deixei a água em uma temperatura
morna, coloquei sais de banho, tirei a minha camisola e entrei.
Romeo surgiu assim que completou os cinco minutos, e o olhar
que me lançou era cheio de promessas. Ele encostou a porta, mas
não a fechou. Se Giordana acordasse nós a escutaríamos. Observei
o espetáculo que era aquele homem quando tirou a camiseta e,
depois, a calça de moletom.
Arrepiei-me quando vi o seu membro semiereto. Ele preenchia
cada espaço dentro de mim, conseguia atingir os meus pontos mais
sensíveis. Eu estava necessitada, desejosa, louca para me perder
em seus braços.
Romeo colocou três pacotes de preservativo na borda da
banheira ao entrar e se sentou de frente para mim. Acendi-me
inteiramente, o homem era insaciável e, muito provavelmente, me
daria uma canseira.
— Vem, senta aqui — disse, naquele tom de voz que eu
amava.
E eu fui, sem titubear. Sentei-me em suas pernas e o abracei
pelo pescoço. Encaramo-nos sem desviar os nossos olhares, por
vários segundos. Em uma conexão única, só nossa.
— Eu amo você, Romeo.
— Eu amo você, bella.
Beijei-o apaixonadamente. Suas mãos cravaram em minha
cintura e eu gemi entre o beijo. Remexi-me, friccionando o clitóris
em sua coxa, estava tão ansiosa. Peguei o seu membro com uma
das mãos e o masturbei. Romeo chupou meu lábio inferior,
arrancando-me um gemido.
Contive-me no mesmo instante, se eu fizesse os escândalos
ao qual estava acostumada, Giordana poderia acordar. E ela
precisava dormir por mais algumas horinhas.
— Não grite — disse, provavelmente pensando o mesmo que
eu. — Sente-se na borda da banheira — ordenou.
Romeo me encarou com um olhar cheio de tesão e eu soube
exatamente o que aquilo significava. Ergui-me e fiz o que ele havia
me pedido. Estava tão alucinada que não me importei com os meus
seios e com o leite que poderia vazar deles.
Ele arreganhou as minhas pernas, e olhou para a minha
intimidade como se estivesse diante de uma obra de arte, tamanho
desejo que estava estampado em seu olhar. Encostou o nariz em
meu clitóris e inspirou profundamente. Fitou-me e por fim,
mergulhou a boca nas minhas dobras macias.
Soltou murmúrios incompreensíveis, seus olhos se fecharam
pelo prazer.
Mordi os lábios para não dar um grito. Meu coração estava
acelerado, só faltava sair pela boca. Senti aquele formigamento
gostoso em meu ventre e tive que me conter. Soltei umas lamúrias e
Romeo tampou a minha boca com uma das mãos.
— Quieta!
— Romeo — choraminguei.
Minha respiração estava ofegante, enquanto sua língua
castigava meu clitóris, minha abertura... estava tão sensível. Ele mal
podia encostar em mim que eu já ficava excitada. Desde a primeira
vez foi assim.
Não havia explicação para o que nós dois tínhamos, era de
outro mundo.
Gemi contra a sua mão sentindo tudo em uma intensidade
estratosférica. Era a sua língua habilidosa que sabia exatamente o
que fazer e como fazer, a forma apaixonada como me olhava. Tudo,
cada detalhe.
Com a mão livre, Romeo colocou um dedo na minha entrada,
depois o segundo, e o terceiro, abrindo-me toda para ele. Seus
dedos ágeis e longos me penetravam enquanto ele chupava o meu
clitóris com avidez.
— Que gostoso — sussurrei.
Estava tão difícil me manter quieta, mas eu tinha que
conseguir.
— Essa boceta vai ser a minha ruína, Isabela! — disse,
encarando-me com os olhos castanhos e intensos. — Quero fodê-la
tanto que, ao final, você estará tão exausta que só lembrará do meu
nome.
— Ai... sim! — Eu queria aquilo, muito.
Ele começou a estocar os dedos com mais velocidade, as
sucções no meu ponto de prazer ficaram mais intensas e eu sabia
que estava perto do orgasmo. Foi quando Romeo pressionou
suavemente o meu clitóris em seus dentes que eu explodi.
A sorte era que sua mão havia tampado melhor a minha boca,
se não, a Itália inteira teria ouvido o meu grito de prazer. Estava toda
trêmula, lânguida, sensível, poderia dormir ali mesmo. Mas, tinha a
perfeita ciência de que não tínhamos nem começado.
— Gostosa pra caralho! Puta que pariu! — Eu adorava essa
boca suja na hora do sexo.
— Agora é a minha vez — falei, entrando novamente na
banheira e beijando-o. — Sente-se na borda da banheira.
Romeo fez o que eu pedi, não sem antes deixar um chupão
forte em meus lábios, como se quisesse me marcar como sua.
Com as duas mãos, peguei o membro que agora estava
totalmente ereto, grosso, e o masturbei lentamente. Aproximei os
lábios da cabeça robusta e depositei um beijo ali, enquanto suas
pernas tencionavam e ele grunhia. Seus dedos fincaram em meu
cabelo com força e eu gemi enquanto passava a língua apenas pela
cabeça.
Queria provocá-lo, testá-lo, levá-lo ao limite.
— Porra, que boquinha deliciosa! Toda macia, como essa
boceta! — murmurou.
E bastou o seu incentivo para que eu o engolisse quase todo.
Só não o fiz, porque Romeo era grande demais. E a parte que a
minha boca não alcançava, eu masturbava com uma das mãos,
enquanto a outra massageava as bolas pesadas e cheias.
— Goza na minha boca, Romeo — sussurrei e ele pressionou
ainda mais as mãos na minha cabeça, forçando-a para baixo.
Apoiou as costas na parede, jogando a cabeça para trás
enquanto soltava uns sons baixos e graves de prazer. Não demorou
muito e senti os jatos quentes e espessos do seu gozo na minha
boca. Engoli tudo, até a última gota.
— Ah, porra! Porra! — grunhiu.
Ele pegou o pacote de preservativo que estava ali, desenrolou-
o pelo membro ainda duro e me puxou como se eu não pesasse
nada. Sua boca esfomeada me beijou desesperadamente enquanto
seus dedos tocaram a minha intimidade. Quando se certificou de
que eu estava pronta, colocou-me montada nele e deslizei por toda
a sua extensão.
— Hum... — murmurei entre o beijo.
Romeo engoliu todos os meus gemidos, e tive que me conter
quando deslizou os lábios pelo meu pescoço, colo. Observei-o
encarar o meu seio com desejo, e, segundos depois, ele chupou o
mamilo avidamente.
— Tudo em você é perfeito, porra! — disse.
— Ai, Romeo — choraminguei quando seus dentes
pressionaram suavemente o meu bico inchado.
Suas mãos deslizaram para a minha bunda, esmagando as
nádegas. O tapa estalou com força, seguido por uma massagem. Eu
me movimentava subindo e descendo, sentindo cada centímetro seu
me penetrando até o fundo.
As mãos continuaram na minha bunda, esmagando-a, depois a
massageando. Romeo repetiu o processo incontáveis vezes, até
que um dos dedos percorreu um caminho perigoso até a minha
entrada traseira.
— Um dia irei fodê-la aqui — avisou ao tocar a minha entrada
com um dos dedos.
Nunca pensei em fazer sexo anal, no entanto, a forma como
falou de maneira tão depravada me deixou tentada. Com Romeo eu
estava disposta. Eu queria tudo dele, tudo com ele.
— Eu vou gozar — sussurrei, sentindo aquele formigamento
conhecido.
— Goze, bella, goze no meu pau!
Ele mal terminou a frase e eu explodi em um orgasmo ainda
mais intenso e forte do que o de antes. Antes que eu pudesse gritar,
sua boca capturou a minha em um beijo cheio de luxúria. Senti
minha intimidade se contrair em seu membro, enquanto ele me
movimentava fazendo com que o barulho das estocadas me
deixasse louca. Ele não demorou a encontrar o seu próprio prazer,
que veio logo depois do meu.
Tinha sido incrível, mas teríamos que fazer muito mais vezes
para acabar com a saudade que estávamos sentindo um do outro.
Desabei em seus braços, nossos corpos se colaram, Romeo
me esmagou contra o seu peito. Pude sentir as batidas aceleradas
do seu coração, e o meu não estava muito diferente.
A sensação de plenitude que me atingiu foi indescritível. Eu
estava exausta, porém feliz.
Muito feliz.
Capítulo 25
OURO PRETO, MINAS GERAIS, BRASIL

ROMEO CAVALIERI

Deixei Isabela e Giordana na casa de Alícia, mesmo contra a


minha vontade.
Eu queria que elas fossem comigo, para a nossa casa. No
entanto, Isabela disse que precisaria conversar com a amiga, e
pediu um tempo até que pudesse organizar a mudança. Acabei
cedendo, estávamos em um clima tão bom que eu não queria
estragar nada entre nós dois.
Segui pelas ruas de Ouro Preto com uma sensação
inigualável. Isabela me deu uma nova chance, e eu faria valer a
pena cada segundo. Recuperaria todo o tempo perdido, e, talvez um
dia, eu conseguisse me perdoar pelo que fiz.
Ter passado esses dias com elas em Palermo, em uma bolha
só nossa, foi perfeito. Minha mulher e minha filha estavam comigo, e
dessa vez seria para sempre.
Meu pai tentou de todas as formas me convencer a deixá-lo ir
até a minha casa, ele queria conhecer a neta. Contudo, por ora,
decidi não misturar as coisas. Ainda estava tudo muito recente,
Isabela havia ficado magoada demais com todas as coisas que
descobriu. Além do mais, aquele momento era nosso, apenas
nosso.
Depois de tanto tempo, tanto sofrimento, tanta angústia.
Não faltaria oportunidade para que ele as conhecesse. Eu
jamais o privaria disso. E tinha que reconhecer que Salvatore
Cavalieri estava se esforçando para criar um elo comigo. Não diria
nem recuperar, porque nós nunca o tivemos de fato.
Cheguei em casa agitado demais. Antes de começar a
trabalhar, eu precisaria de umas horas de treino. Esses dias todos
sem ter feito só não me deixaram maluco porque eu estava me
exercitando de outra forma muito mais gostosa.
Fui ao meu quarto, coloquei uma roupa leve, minhas luvas de
boxe e segui para a academia.
Depois de tanto tempo, minha vida estava entrando no eixo
novamente. E quanto mais os dias se passavam, mais eu percebia
que todos aqueles anos que eu passei querendo me vingar, cheio
de ódio e rancor, não valeram a pena.
Deveria ter escutado Lucca e Guido, mas eu não fazia muito o
tipo de pessoa que dançava conforme a música. Eu ditava o meu
próprio ritmo, sempre foi assim. Algumas coisas não haviam
mudado, e eu sabia que precisava controlar o meu gênio impetuoso.
Mas, agora, não era somente eu. Eu tinha duas pessoas para
cuidar, amar e proteger.
Antes, a minha lista de prioridades se resumia em: AURUM e
vingança, exatamente nessa ordem. A vingança deixou de existir, eu
exterminei essa palavra do meu dicionário.
E minha ordem de prioridades havia mudado completamente:
minhas meninas, e a AURUM. Elas sempre viriam em primeiro
lugar.

Havia acabado de receber por e-mail o laudo pericial da falha


na turbina do jatinho da AURUM. O problema aconteceu devido a
uma fadiga do metal, que ocorre quando um material é usado com
frequência e, com o passar do tempo, acaba sendo danificado.
Solicitei ao Lucca que suspendesse o contrato com a empresa
terceirizada que cuidava da manutenção das nossas aeronaves. Se
o problema tivesse sido visto antes, não teríamos passado por
aquilo. Teríamos que procurar outra empresa.
Felizmente tudo acabou bem, apesar do susto. Tanto eu
quanto a equipe de bordo que estava comigo naquela noite
estávamos bem. Tivemos sorte, poderia ter sido fatal. E, para mim,
não foi apenas um erro, foi uma irresponsabilidade gigantesca, isso
porque não pagávamos pouco a eles.
De todo modo, era praxe abrir um inquérito policial quando um
acidente dessa magnitude acontecia. E eles não apenas teriam o
contrato conosco rescindido, como responderiam pelo ocorrido
judicialmente.
O segundo e-mail que abri, foi um de Gustavo, recebido há
algumas horas. Segundo informações recém-descobertas, Marcos
Moraes havia saído há mais de três anos da empresa onde
trabalhava. E que a data coincidia com a época em que Isabela
completou dezoito anos. Ou seja, o infeliz estava mesmo roubando
o dinheiro dela.
Peguei o celular e liguei para Gustavo, estava na hora de
agirmos.
— Romeo, tudo bem? Como você está? — perguntou ao
atender.
— Tudo bem, Gustavo. Acabei de ler o seu e-mail, quantas
coisas mais nós vamos descobrir até encontrar esse desgraçado?
— Não somos só nós, Romeo, a polícia também está atrás
dele após a denúncia da tia de Isabela. Ele está mais sujo do que
imaginávamos.
— Comece a se preparar para desarquivar o caso da
mineradora. Quero não apenas o Marcos, como o desgraçado do
Cícero e do juiz presos. Além disso, precisamos enquadrar a Júlia e
o Bruno. — Respirei fundo. — Assim que a Isabela e a minha filha
estiverem aqui, seguras, eu o informo. Não irá demorar.
— Fico no aguardo do seu ok e então iniciaremos a caçada —
disse e continuou: — E como você está com relação ao acidente
que sofreu? Fiquei feliz por saber que, apesar do susto, nada grave
aconteceu.
— Eu estou bem! O susto foi grande, mas estou bem.
— Ótimo! Preciso ir, tenho uma audiência em alguns minutos.
Até breve, Romeo.
— Até! Obrigado, Gustavo — agradeci e encerramos a ligação.
Cada dia era uma notícia nova, e a cada dia aumentava a lista
de crimes de Marcos Moraes. Perguntei-me como aquele homem
conseguiu viver tanto tempo omitindo os seus crimes, as suas
sujeiras. Certamente o infeliz do seu advogado o ajudava com tudo.
Não apenas ele, como também o juiz responsável pelo processo da
Mineradora Cavalieri.
Essa corja estava com os dias contados.

Uns dias tinham se passado e finalmente eu estava a caminho


da casa de Alícia para buscar a Isabela e a nossa filha. Durante
esse período, eu as visitei todos os dias. Mas não parecia suficiente,
a saudade só cessaria por completo quando elas estivessem ao
meu lado, em nossa casa.
As coisas dela e de Giordana, poucas coisas, por sinal, foram
mais cedo, com o frete que eu havia contratado. Já deixei tudo
organizado para a chegada delas, não teriam que se preocupar com
nada.
Estacionei o carro e mandei uma mensagem para Isabela,
avisando que havia chegado. Ela me respondeu dizendo que já
estava vindo, quando avistei Alícia caminhando na direção do
portão.
Desci do carro para cumprimentá-la.
— Boa noite, Alícia.
— Oi, Romeo. A Isa já está vindo, está terminando de arrumar
a Giordana. Eu vim antes porque preciso trocar umas palavrinhas
com você — disse e eu fiz um sinal para que continuasse: — Eu
acho que algumas pessoas merecem uma segunda chance na vida,
e você é uma delas.
— Fico grato, Alícia. E devo desculpas a você também, pelo
que fiz — respondi e ela acenou negativamente.
— Não preciso perdoá-lo por nada. No entanto, quero deixar
bem claro que se você apenas pensar em chatear ou machucar a
minha amiga mais uma vez, não ficarei apenas nas ameaças. Eu
acabarei com você, Romeo! — exclamou de maneira ameaçadora.
— Eu não farei isso, Alícia, garanto a você.
— Acho bom! — retrucou, altiva.
Não tirava a razão de Alícia, ela não estava errada em
proteger a amiga. Saber que Isabela tinha alguém como ela, que
pudesse confiar verdadeiramente, que foi e continuava sendo a
família que não teve, me deixava muito aliviado.
Isabela surgiu em meu campo de visão carregando a nossa
filha em seus braços. Giordana usava um macacão cor-de-rosa, e
um laço da mesma cor no cabelo. Ela mordia as mãozinhas,
observando tudo com curiosidade.
Quando me encarou, deu um gritinho estridente de felicidade e
se jogou para os meus braços. As perninhas agitadas se sacudiam
enquanto eu tinha o meu rosto todo babado.
— Bambina di papà. — Beijei a bochecha redonda e corada.
Isabela e Alícia sorriram da cena, não tinha como ser diferente.
Era muito amor.
Quando consegui, cumprimentei Isabela com um beijo na boca
e, em seguida, ela se despediu da amiga com lágrimas nos olhos.
Eu sabia que ela tinha vivido uma fase importante ali naquela casa e
mesmo que as duas continuassem se vendo diariamente, a rotina
seria outra.
— Minha ameixinha, sentirei sua falta! — Alícia disse,
apertando as dobrinhas de Giordana.
Minha filha deu uma gargalhada engraçada, como se estivesse
entendendo tudo. E quando Alícia tentou pegá-la de meus braços, a
danadinha abraçou-me com força pelo pescoço, achando graça.
— Filha, não vai dar um beijo na sua madrinha? — Isabela
disse, mas Giordana continuou agarrada em meu pescoço.
Ela estava fazendo a maior festa, provocando a Alícia.
E depois de muita farra, por fim nos despedimos e seguimos
para a nossa casa. Durante o trajeto, Giordana não parou um
segundo sequer de conversar, do jeito dela obviamente, e que
ninguém entendia. Isabela só fingia que estava entendendo.
— Chegamos! — falei ao estacionar.
Saí do carro, abri a porta para elas e caminhamos juntos para
dentro de casa, da nossa casa.
Era o começo de uma nova vida.
Ao entrarmos, seguimos direto para o quarto da nossa filha.
Giordana, como da última vez que esteve ali, ficou bastante agitada
com os objetos decorativos e a explosão de rosa que era o seu
quartinho.
E quando viu o urso de pelúcia cor-de-rosa que eu havia dado,
em cima do berço, jogou os bracinhos na direção dele.
— Deus, ela não larga mais esse urso, desde quando você
deu.
Uma sensação inexplicável tomou conta, poderia parecer algo
bobo, mas a verdade era que a minha filha sempre extrairia o
melhor de mim.
— Porra, bella, estou feliz pra caralho! — Abracei-a pela
cintura, enquanto babávamos em nossa filha brincando com o urso
dentro do berço.
— Romeo, olha essa boca suja na frente da Giordana! —
repreendeu-me.
Estava realmente feliz demais para me conter.
— Você gosta — murmurei no seu ouvido.
— Gosto, mas não quero que a minha filha fique ouvindo
esses palavrões — respondeu.
— Nossa filha, bella. Nossa! — Dei um selinho suave em seus
lábios. — Quero mostrar algo a você.
Caminhei até o guarda-roupa e tirei de lá o que havia me
mantido um pouco mais centrado por todo esse tempo.
— O que é isso? Você...
— Sim, eu guardei isso aqui. — Entreguei a caixa para ela.
Era a mesma que ela havia deixado na minha antiga casa em
Palermo, contendo um teste de gravidez, um sapatinho de crochê
amarelo, e a camisetinha com a frase ‘eu e a mamãe somos do
papai’, escrita em italiano.
Pude ver seus olhos lacrimejarem.
— Sinto muito. — Abracei-a. — Nós ainda poderemos usar
essa camisetinha e esse sapatinho nos próximos filhos que teremos.
— Isabela apenas acenou em concordância, emotiva. — Eu amo
você, bella, amo tudo em você.
— Romeo...
— Aquela casa não existe mais. — Referi-me à venda da
antiga casa. — Eu farei com que você se esqueça de tudo que
passou... criaremos lembranças aqui, no nosso novo lar em
Palermo, ou em qualquer lugar em que estejamos juntos.
Eu sabia que não era tão simples como parecia, até porque eu
mesmo demoraria a esquecer, ou talvez nem esquecesse por
completo. Mas eu não suportava a ideia de ficarmos em um lugar
onde havíamos sofrido tanto.
Isabela me abraçou pelo pescoço e a segurei com força.
De agora em diante tudo seria diferente. Eu viveria por ela e
por Giordana, para elas e para os futuros filhos que viessem.
Naquela noite eu mal pude fechar os olhos. Estava eufórico
demais para tal. Levamos Giordana para o nosso quarto. As duas
não demoraram a dormir, e eu passei a madrugada inteira velando o
sono delas.
No dia seguinte, quando me levantei, a primeira coisa que fiz
foi mandar uma mensagem a Gustavo, avisando que ele poderia
começar. Desarquivaríamos o processo judicial contra a Mineradora
Cavalieri, e a caçada começaria.
Em breve todos os responsáveis pelo falecimento de Paulo
Moraes estariam atrás das grades. E eu me certificaria para que
eles nunca mais saíssem de lá. Eu devia isso a Isabela, devia isso
ao seu pai, por todos os anos que o odiei sendo que ele foi apenas
uma vítima.
A vingança que tramei não me levou a lugar nenhum, ela
quase destruiu o que eu tive de mais bonito durante a minha vida.
Por isso, desta vez, deixaria com que a justiça fizesse o papel que
deveria ter feito anos atrás.
Pois, agora que Isabela e Giordana estavam ao meu lado,
devidamente seguras, eu seria capaz de enfrentar o mundo inteiro
por elas.
Para mantê-las protegidas.
Capítulo 26
ISABELA MORAES

A vida ao lado de Romeo estava maravilhosa, muito melhor do


que sempre foi. Estávamos mais conectados do que nunca, e esse
laço ficava ainda mais firme por causa de Giordana.
O elo que nos ligaria para sempre.
Ele era completamente apaixonado pela filha, eu via isso a
cada olhar, a cada abraço. A cada vez que ele a amparava quando
ela chorava, e como seu olhar se entristecia quando isso acontecia.
A cada sorriso que dava quando nossa filha dava os seus gritinhos
de felicidade sempre que o via.
Conforme os dias se passavam, mais eu tinha certeza da
minha escolha.
As rotinas de idas para a galeria continuavam a toda, e,
quando eu precisava estar lá, Romeo ficava com Giordana. Eu
achava isso importante para os dois, e, a todo momento ele me
mandava fotos, vídeos.
Não pensava que poderia me apaixonar mais, entretanto, era o
que acontecia.
As coisas estavam indo muito bem entre a gente, o que me
preocupava ainda, no entanto, era o sumiço de Marcos. Enquanto
não fosse encontrado, eu viveria com esse medo. Eu não temia
apenas por mim, mas principalmente pela minha filha e pela tia
Gisele.
Ela receberia alta em alguns dias, depois de tanto tempo no
hospital. De certa forma, não era tão ruim que estivesse lá, pois
assim estava segura daquele monstro. E foi quando eu tive uma
ideia e decidi compartilhar com Romeo.
Estava aguardando que terminasse uma reunião e conversaria
com ele sobre a possibilidade de trazermos a tia Gisele para ficar
conosco, até que toda a situação fosse resolvida. Eu não sabia se
ele aceitaria ou não, mas, de todo modo, seria apenas
temporariamente.
Até porque eu conhecia muito bem a minha tia para saber que
ela também não iria querer ficar por muito tempo. E, para aquela
casa ela não voltaria jamais. Ainda não podia acreditar que, além do
marido, ela também perdeu a filha. Júlia teve uma vida maravilhosa,
tinha uma mãe ao seu lado, e, mesmo assim, não deu valor.
Enquanto eu, daria tudo para ter a minha ao meu lado.
— No que você tanto pensa? — Romeo perguntou ao parar na
porta do quarto em que o meu ateliê se mantinha intacto.
Ele não mexeu em nada, não moveu sequer uma cadeira de
lugar. Estava tudo exatamente como eu havia deixado na última vez
que usei. Assim como as minhas roupas, meus acessórios e meus
itens pessoais se mantinham no seu quarto.
No nosso quarto.
— Na tia Gisele... ela receberá alta em breve e eu não posso
nem a imaginar voltando para aquela casa. — Encarei-o e ele
caminhou para dentro do quarto.
— Você pode convidar ela para passar um tempo aqui, até que
tudo se resolva. O que acha? — inquiriu ao parar atrás de mim e
massagear os meus ombros.
Não precisei nem pedir, ele se ofereceu antes.
— Obrigada, Romeo... farei isso. Eu sei que a princípio ela vai
rejeitar, mas, será o melhor a se fazer.
— Essa casa é enorme, ela pode escolher o quarto de
hóspedes que preferir. E estará segura aqui... também não acho
prudente que fique sozinha — falou, parecendo preocupado.
— Nenhuma novidade? Nenhum sinal daquele monstro? —
indaguei.
— Por enquanto não, mas a polícia está atrás dele. Marcos
não conseguirá se esconder para sempre.
Assim eu esperava.
Giordana e eu aguardávamos a chegada da tia Gisele em
casa, enquanto Romeo foi buscá-la no hospital. Quando escutei o
barulho do seu carro, fui para a porta com a minha filha em meus
braços.
Seria uma surpresa e tanto, ela ainda não sabia sobre
Giordana. E não era por nenhum motivo específico, mas, porque eu
quis contar quando tudo estivesse bem. Queria primeiro que ela se
recuperasse.
Fitei-a saindo do carro. Por fora não havia mais nenhum sinal
da agressão, com exceção de um leve repuxar da perna enquanto
andava, uma sequela que ainda duraria um tempo. Mas o problema
não era como estava por fora, e sim, por dentro.
Seria uma luta até que se recuperasse completamente. Ela
seguiria fazendo o acompanhamento psicológico, e eu faria o
possível para que ficasse bem.
Romeo a auxiliou para subir os pequenos degraus da varanda
da casa, enquanto ela encarava Giordana aturdida.
— Oi, tia! Seja bem-vinda! — Cumprimentei-a com um abraço.
— Querida, obrigada. Eu... essa princesa... ela é sua filha? —
indagou, os olhos marejados.
— Sim... ela é minha. Se chama Giordana — respondi, não
contendo a minha própria emoção.
Minha filha a fitava com curiosidade, afinal, nunca a tinha visto.
— Meu Deus! Ela é tão linda, tão perfeita. Como... oi, minha
linda — disse, fazendo um carinho suave no bracinho de Giordana.
Minha ameixinha deu um sorrisinho banguela e apaixonante.
— Temos muitas coisas para conversar, mas, antes, venha,
vamos entrar — convidei.
— Obrigada, queridos, por me receberem aqui. Prometo que
assim que puder, procurarei um lugar para mim.
Preparei-me para responder, mas foi Romeo quem falou:
— Não se preocupe com isso, Gisele, você pode ficar aqui o
tempo que precisar.
— Obrigada, de coração. Não sei como poderei retribuir tudo
que vocês estão fazendo por mim. Eu nem merecia tanto. —
Desviou o olhar de Romeo para o meu.
Era certo que se diminuiria. Ela foi submissa uma vida inteira
e, por mais que Marcos nunca a tivesse agredido fisicamente como
aconteceu da última vez, ele mexia com o psicológico dela, assim
como mexia com o meu. E isso poderia causar danos sérios e
permanentes.
— Você merece muito mais — respondi. — Vamos, vou levar
você ao seu quarto e depois almoçaremos uma deliciosa pasta
italiana.
Romeo havia pedido ao chef que preparasse um prato especial
para a recepção dela.
Como ela estava com aquele pequeno problema nas pernas,
Romeo e eu preparamos um quarto aqui no andar de baixo para que
ficasse mais à vontade. Era uma sala desocupada, com banheiro,
varanda. E, como não utilizávamos, ele a transformou em um quarto
aconchegante e confortável.
Tivemos um almoço agradável, e na parte da tarde, quando
Romeo foi trabalhar em seu escritório, tia Gisele e eu colocamos
quase toda a conversa em dia. Não dei muitos detalhes sobre o que
tinha acontecido, não queria mais falar daquele assunto.
Ela ficou encantada com Giordana, e Giordana com ela.
Percebi que ainda estava bastante abalada, e fiquei
estarrecida quando ela disse que de tudo que aconteceu, as
palavras de Júlia machucaram mais do que a agressão. Ela se
culpou por ter fechado os olhos para o que a filha fez por tantos
anos.
Júlia tinha sérios problemas psicológicos, e não era de hoje.
Ninguém normal seria capaz de fazer o que ela fez. Nem comigo,
nem com a sua mãe. Não era somente o gene ruim herdado do pai.
Ela era uma pessoa má.
Conversamos muito, eu estava muito feliz com a sua presença
ali.
Giordana já estava dormindo em seu quartinho há algumas
noites. Tínhamos providenciado uma babá eletrônica que ficava na
cômoda ao meu lado da cama. Qualquer barulho que fizesse, por
menor que fosse, eu ia até ela. Eu ou Romeo.
Ele tinha o sono leve, e eu só comecei a ter depois que a
minha filha nasceu.
Não havia sido difícil a adaptação, ela amava ficar lá. E apenas
na primeira noite acordou duas vezes, agora, já dormia direto depois
da última mamada da noite, até de manhã cedo.
— Como você está se sentindo? — Romeo perguntou.
Eu estava nua, de bruços, e ele estava fazendo uma
massagem deliciosa e relaxante nas minhas costas, usando uns
óleos especiais. Estava tão gostoso que eu não tinha forças nem
para falar. Suas mãos grandes e grossas eram quase capazes de
cobrir as minhas costas inteiras.
— Muito bem. Obrigada por fazer tanto por nós.
— Não me agradeça, eu amo você — disse, depositando um
beijo em meu ombro.
Eu estava presa, suas pernas estavam uma de cada lado do
meu corpo. Ele estava sentado em minhas pernas, mas eu sabia
que não estava colocando nem metade do seu peso em cima do
meu.
Percebi que seu o toque mudou naquele instante. Algo dentro
de mim se agitou, esquentou. Mantive-me de bruços enquanto
Romeo deixou uma trilha de beijos pela minha nuca, costas,
nádegas, coxas e pés.
— Romeo... — lamuriei, levantando minha bunda
involuntariamente na sua direção.
Com uma destreza perfeita, ele ergueu o meu corpo e colocou
um travesseiro na região do meu quadril, deixando-me mais exposta
a ele. Senti o ar quente de sua boca em minha intimidade e, logo em
seguida, sua língua a lambeu do clitóris até o ânus.
Senti o meu rosto corar violentamente, e ergui o pescoço à
procura do seu olhar. Romeo mergulhou com intensidade, aquela
língua era o paraíso, ele fazia coisas maravilhosas com ela.
Notei os murmúrios incompreensíveis que soltava a cada
lambida, chupada, mordida.
— Ah, ai... — gemi, estava tão sensível.
Seus beijos foram subindo novamente pelas minhas costas,
até chegar ao meu ouvido:
— Essa boceta é como um pedaço do paraíso, seu gosto não
pode nem ser descrito, Isabela, de tão perfeito. Você é toda perfeita,
e minha! — exclamou, autoritário.
Sim...
Romeo se esticou até a cômoda e pegou um preservativo. Ele
voltou a se sentar em minhas pernas e eu virei o meu rosto na sua
direção, como pude, para ver o espetáculo que era aquele homem.
Todo grande, forte.
Todo meu.
Senti quando ele pincelou o membro na minha intimidade que
escorria de tão excitada. E quando a cabeça robusta entrou, abrindo
espaço, eu revirei os olhos de tanto prazer.
Romeo começou estocando devagar, lento. Como se quisesse
absorver cada segundo daquilo que era uma delícia. Suas mãos
juntaram as minhas acima da minha cabeça, deixando-me toda
esticada sobre o colchão. Aquela posição era tão, tão gostosa.
Eu o podia sentir por completo. Inteiro.
— Gostosa!
— Ah, Romeo... assim! — choraminguei.
De lento ele passou a estocar com tanta força que eu pensei
que aquela cama gigantesca sairia do lugar. O som dos nossos
gemidos se misturou ao barulho do seu púbis batendo na minha
bunda.
Suas mãos, agora estavam apoiadas no colchão enquanto ele
arremetia com força dentro de mim, e eu me movia a cada investida.
Senti o suor escorrer pelas minhas costas, o cabelo grudou no meu
rosto.
Fechei os olhos e mordi meus lábios... aquele formigamento
em meu ventre ganhando vida. Eu explodiria em um orgasmo a
qualquer momento, estava sensível demais.
Não me preparei para os seus planos, quando, com agilidade e
destreza, ele me virou de costas. Romeo me penetrou novamente,
encarando-me com tanta intensidade, tesão e... amor.
— Eu amo você, bella. Amo você, porra! — disse, a voz estava
ofegante.
Alguns fios do seu cabelo estavam colados na testa. Éramos
uma mistura de corpos ofegantes, suor, cheiro de sexo... a nossa
mistura. A melhor de todas.
— Te amo — murmurei em meio ao gemido.
Seus lábios encontraram os meus com tanto desespero, tanta
urgência, que quase me faltou o ar por completo. Ele mordeu,
chupou, lambeu, da mesma forma que havia feito em minha
intimidade.
— Case-se comigo! — pediu, o rosto colado ao meu, olhos nos
meus olhos, sua mão em meu queixo.
Não sabia definir os meus sentimentos naquele momento,
ouvindo o mesmo pedido que fora feito há um tempo. Da outra vez,
no entanto, veio sem os olhos nos olhos, apesar da intensidade. E
ali eu percebi que não era apenas um pedido. Era o seu amor, a
demonstração de que me entregaria o seu coração.
— Ah... mas... nós já somos... casados! — respondi, arfante, a
respiração entrecortada.
— Não desse jeito! — disse, firme. — Eu amo você! Case-se
comigo!
A cada palavra uma estocada forte, profunda. Ele queria
mudar a nossa história, era um fato. Não contive as lágrimas,
Romeo beijou cada uma delas. Vi em seus próprios olhos uma
emoção contida.
— Eu... sim, eu aceito — respondi.
Ele me beijou de maneira apaixonada, e quando o ápice do
prazer nos atingiu, explodimos juntos. Me abraçou fortemente,
nossos corações acelerados batiam no mesmo ritmo.
Naquele instante, eu descobri que nascemos para ser um do
outro. De um jeito meio torto no início, mas não tinha como ser
diferente.
Era coisa do destino.
Algum tempo depois, Romeo se afastou apenas o suficiente
para pegar o celular na cômoda e vi que mexeu em algo. Fiquei
confusa, achei estranho, até que ele virou a tela para mim.
Quando comecei a ler o que estava escrito, as lágrimas
voltaram a descer desenfreadas, junto ao imenso sorriso que abriu
em meus lábios. Uma emoção intensa me atingiu, tudo que eu mais
sonhei estava prestes a acontecer.
Romeo havia dado entrada no processo de adoção de Noah.
Capítulo 27
ROMEO CAVALIERI

Salvatore Cavalieri havia desembarcado no Brasil naquela


manhã, depois de tantos anos. Ele veio junto com o Lucca, e eu fui
buscá-los no aeroporto de Belo Horizonte. Estávamos a caminho da
minha casa, e pude observar a ansiedade em que meu pai estava
porque iria se encontrar com a neta pela primeira vez.
Além de ansioso, pude ver um misto de nervosismo também.
Ele não sabia o que esperar de Isabela e se sentia, assim como eu,
muito culpado por ter planejado a vida inteira destruí-la, sendo que
era a maior vítima de todas.
No entanto, o que ele não sabia, era que Isabela possuía o
maior coração do mundo.
Em nenhum momento eu o havia culpado, desde o início eu
me responsabilizei por tudo que fiz. O seu arrependimento e a
maneira como estava lidando comigo tentando reparar um erro de
muito tempo já era o bastante. Ele também perdeu muita coisa, sua
mulher, a empresa da sua família.
Contudo, nada do que fizemos ou planejamos valeu a pena.
Nunca valeria, a vingança destrói tudo, mata, corrói. Causa danos
irreparáveis não apenas em quem sofre o ato, mas em quem se
vinga.
Estávamos a passos lentos, e mesmo que eu tivesse convivido
durante anos com a sua ausência, se eu era merecedor de uma
segunda chance, ele também poderia ser. Ter passado pelas coisas
que passei, e ainda de quebra ter sofrido um acidente aéreo que
poderia ter sido fatal, me fez mudar alguns conceitos. Ser menos
rígido, intolerante.
Só tinham algumas pessoas que continuaram tendo esse
comportamento da minha parte, mas elas seriam presas em breve.
Muito em breve.
Conversamos sobre vários assuntos durante o trajeto, todos
relacionados à AURUM. Guido havia ficado por lá para tomar conta
de tudo, enquanto o meu pai e o meu amigo estivessem aqui.
O motivo principal da vinda de Salvatore era devido ao
desarquivamento do processo que culminou na tragédia da nossa
mineradora. Ele teria que prestar novos depoimentos, e eu também.
Mesmo que na época tivesse apenas catorze anos, os anos de
investigação fizeram com que eu tivesse subsídios para tal.
Gustavo estava cuidando de tudo, mantinha-me informado
diariamente com relação ao andamento das novas investigações
judiciais. E junto a isso, com o aval de Isabela, ele entrou com um
processo para punir, além do Marcos, o Cícero e o tal juiz que
produziu uma série de documentos judiciais falsos para que a tutela
de Isabela se postergasse até os vinte e um anos.
Ele, como seu advogado, e agora escolhido por ela,
conseguiria ter acesso a tudo que ocorreu durante todos esses
anos. Eu sabia que descobriríamos muito mais sujeira, estava só
aguardando. Nada mais me surpreenderia.
Chegamos à minha casa após uma viagem tranquila.
Isabela e Gisele estavam na sala quando entramos, entretidas
enquanto brincavam com Giordana. Minha mulher foi a primeira a
me ver, e fui recebido pelo sorriso mais lindo. Ainda não podia
acreditar que nos casaríamos, e que dessa vez para sempre.
— Olá, até que enfim chegaram. — Ela se levantou e
caminhou na nossa direção.
Deu-me um beijo suave nos lábios, cumprimentou Lucca de
maneira simpática e receptiva, e, depois, foi a vez do meu pai.
— Seja bem-vindo, senhor Cavalieri. Sinta-se em casa! —
disse, cumprimentando-o com um abraço e pegando o meu pai
completamente desprevenido.
Enquanto a abraçava, pude ver que fechou os olhos, o
arrependimento e a culpa explícitos em sua expressão. Isabela o
desarmou completamente, era impossível que alguém não ficasse
encantado com a sua doçura.
Quando a conheci, foi uma das coisas que mais me chamou
atenção, e que fez com que eu me apaixonasse tão rápido. Sua
doçura e ingenuidade. Hoje, no entanto, Isabela deixou de ser
ingênua. Ela havia se fortalecido e, apesar de firme, seu jeito doce
continuava exatamente o mesmo.
— Nada de senhor, querida. Obrigado, obrigado. — Percebi
que embargou, mais uma novidade para Salvatore Cavalieri. —
Sinto muito, espero que possa me perdoar um dia. — Pude ouvi-lo
murmurar apenas para que ela escutasse.
Isabela não disse nada, porque o gritinho de Giordana
interrompeu a todos.
Peguei-a do chão, onde brincava com as diversas bonecas e a
levei para perto dele. Meu pai ficou incrédulo, perplexo, surpreso.
Todas as emoções passaram pelo seu olhar. E dentro deles, eu vi
algo que nunca tinha visto, ou não me lembrava.
Ele a olhou com amor.
— La bambina del nonno[7]! — disse.
Minha filha o olhou com curiosidade, e depois de alguns
segundos, deu um sorrisinho suave e escondeu o rosto no meu
pescoço. Ela estava envergonhada, costumava fazer isso de vez em
quando.
— Filha, dê oi para o vovô — Isabela falou, mas ela continuou
agarrada em mim. — Bom, deixe-me apresentá-los à minha tia.
Isabela apresentou Gisele a Lucca e ao meu pai, enquanto eu
os observava com Giordana em meus braços. Percebi uma olhada
mais analítica do meu pai para ela, como se quisesse procurar
algum vestígio da agressão que havia sofrido.
Poucas vezes na vida eu o vi tão transtornado quanto aquela
em que ele soube que Gisele havia sido espancada pelo próprio
marido. Ele havia ficado enfurecido. E eu sabia que aquilo ia muito
além.
Era culpa. Por ter se enganado, por ter se afastado, por ter
planejado contra uma pessoa inocente. Como se quisesse reparar o
dano de alguma forma.
— Vocês devem estar cansados da viagem, mas o almoço
está pronto — Isabela avisou.
— Cansados nada, vamos almoçar e depois temos muito
trabalho a fazer — falei, categórico.
Ela me encarou como se não acreditasse nas minhas palavras
e eu a abracei pela cintura, depositando um beijo em sua bochecha.
Em meus braços, estavam as duas coisas mais preciosas que eu
tinha na vida.
Seguimos para a cozinha e eu nunca pensei que um dia
poderia me sentar à mesa junto ao meu pai e a Isabela, e que
pudéssemos trocar amenidades enquanto almoçávamos em um
clima agradável.
Aquilo era muito mais do que eu merecia.

Estávamos no escritório de Gustavo, meu pai, Lucca e eu,


enquanto eu revirava os documentos que ele nos havia mostrado.
Eram todos do processo de herança e tutela da Isabela.
Entre os documentos que já havíamos descoberto serem
falsos, estavam vários atestados médicos, notas de supermercado,
escola... tudo ali, em valores altos demais, para não dizer absurdos.
— Isso aqui não existe, nada do que consta aqui é real —
bradei. — O filho da puta prestou contas falsas para ter acesso ao
dinheiro. Desgraçado!
— É pior do que imaginávamos, Romeo. Em muitos desses
documentos, os mais recentes, consta a assinatura de Isabela.
Ela realmente havia comentado comigo que assinou algumas
coisas sem ter ideia do que era, confiava no tio tão cegamente. E
não tinha como ser diferente, o desgraçado fez tudo de caso
pensado, manipulando-a até que ela não permitiu mais, e ele
passou a usar o nome do pai para conseguir mantê-la sob as suas
asas. Para roubar o seu dinheiro.
Um toque de celular nos distraiu, era o de Gustavo. Ele o
atendeu enquanto meu pai, Lucca e eu revirávamos aqueles
documentos e líamos, relíamos, nos indignávamos. Era muita gente
envolvida nessa sujeira.
— Tenho ótimas notícias! — Gustavo disse com uma
expressão entusiasmada. — O juiz Pereira foi preso tentando
atravessar a fronteira para o Paraguai.
Esse era o filho da puta corrupto que tinha fodido com a vida
da minha família. Que também tinha sentenciado os processos da
herança de Isabela, e auxiliou na falsificação documental.
— Porra, finalmente! — Dei um tapa na mesa, não me
contendo.
— Precisaremos ficar atentos ao Cícero agora, ele pode tentar
fugir também. Tenho certeza de que Pereira não ficará calado.
— E para onde o estão levando? Qual é o próximo passo
agora? — perguntei.
— Sabemos que ele não é um homem burro, certamente
conseguiu descobrir que estávamos reabrindo os processos e deu
logo um jeito de sumir — Gustavo falou.
— Se um homem desses não conseguiu fugir, me pergunto
como Marcos conseguiu? Onde é que esse infeliz se escondeu? —
meu pai perguntou a si mesmo.
— Não sei, mas nós iremos descobrir — Gustavo disse,
confiante.
Eu não sabia qual de nós estava mais sedento por isso. Já
tinha passado da hora de a justiça ser feita. A Mineradora Cavalieri
havia ficado para trás, não a recuperaríamos mais. Porém, teríamos
a nossa alma lavada quando esses calhordas fossem presos.
E foi no fim daquela tarde, quando estávamos quase
encerrando a reunião, que eu recebi a ligação que fez o meu mundo
inteiro desmoronar.
Minha filha havia desaparecido.
Cheguei em frente à galeria e sequer esperei Lucca estacionar
para sair do carro. Eu estava louco, morreria se algo acontecesse à
minha menina, a minha garotinha. Senti um nó na garganta, uma
sensação horrível.
Isabela estava fora de si, transtornada, enquanto Alícia tentava
acalmá-la de todas as formas.
— O que houve? — indaguei e somente então ela percebeu a
minha presença e correu para os meus braços.
Quando ela me ligou, não consegui entender direito o que
estava acontecendo. Só me levantei e foi o tempo de Lucca pegar
as chaves da minha mão e corrermos para cá.
— Romeo... a minha filha, eu preciso da minha filha — gritou.
— Nós vamos encontrá-la, eu prometo. Mas preciso que se
acalme e me fale exatamente o que aconteceu.
Pedi a ela algo que eu estava longe de conseguir, que era ficar
calmo.
— Como você quer que eu fique calma? — vociferou.
— Romeo — Alícia me chamou, estava com os olhos
vermelhos também, mas parecia um pouco menos descontrolada.
— A Isabela trouxe a Giordana e a tia Gisele aqui, para mostrar a
galeria. Nós tivemos que ir ao outro salão atender uns clientes e
quando voltamos elas não estavam mais. Nós não ficamos nem dois
minutos fora — disse, chorando.
Gustavo entrou na galeria naquele instante, acompanhado por
um dos homens responsáveis pela segurança de Isabela e
Giordana.
Não pude evitar, parti para cima do filho da puta, furioso.
Peguei-o pelo colarinho, enquanto Lucca tentava me conter.
— Me dê uma boa razão para não acabar com a sua vida! Seu
infeliz! Onde é que você estava?
— Sinto muito, senhor Cavalieri, é como se elas não tivessem
saído da galeria.
— Está me dizendo que a minha mulher está louca? — O fiz
encarar o estado em que Isabela estava. — Que estamos loucos?
— Se algo acontecer com a minha neta, eu mato você! — meu
pai trovejou.
— Tem certeza de que você não saiu para nada? De que não
viu nada? Qualquer coisa? — Gustavo questionou.
— Não, senhor!
Uma angústia devastadora me golpeou. Eu não suportaria, não
suportaria. Minha bambina. Perdi as forças nos braços e caminhei
até Isabela. Ela me abraçou enquanto soluçava desesperada. E por
mais que eu estivesse a ponto de matar um, concentrei-me o
máximo que pude para passar segurança a ela.
Ordenei a Gustavo que agisse. Não podíamos esperar mais
nem um segundo sequer. Ele ligou para um colega que era
delegado e explicou brevemente toda a situação. Pediu sigilo nas
buscas, já que estávamos lidando com gente perigosa. E, conforme
ele relatava o desaparecimento da minha filha, mais desesperado
eu ficava.
Onde você está, minha menininha?
Não sei quanto tempo se passou, se foram segundos, minutos
ou horas. Eu só queria que aquilo tudo fosse um pesadelo. Mas,
infelizmente, não era. E quando a realidade me atingiu com força,
não contive as lágrimas de desespero.
Beijei o topo da cabeça de Isabela, que estava agarrada a mim
e não me soltava por um segundo sequer.
— Nós vamos encontrá-la, nem que seja a última coisa que eu
faça nessa vida! — murmurei, mas tive certeza de que ela não
ouviu.
Até que algo em minha mente se iluminou. A pulseira... a
pulseira que eu havia dado a Giordana tinha um microchip de
rastreamento.
Porra! Porra! Por que não me lembrei disso antes?
Quando abri a minha boca para falar, o toque do seu celular
nos distraiu. Isabela tentou segurá-lo, mas suas mãos estavam
trêmulas, então eu o fiz. Desbloqueei a tela e tinha uma mensagem
de um número desconhecido.
Se você quiser recuperar a sua
filha com vida, transfira todo o
dinheiro da herança para a conta
bancária abaixo. Assim que o
fizer, darei o endereço de onde
ela está.
Ah, devo alertá-la que se você
apenas cogitar avisar à polícia,
terei o maior prazer em estourar
os miolos dessa chorona, e da sua
tia querida também.
Com amor, titio.

Enxerguei vermelho na minha frente.


E naquele instante tive a certeza de que, mais uma vez, não
cumpriria a promessa que fiz para Isabela, de não me arriscar e
deixar que a justiça cuidasse de Marcos Moraes, porque eu o
mataria com as minhas próprias mãos.
Eu o mataria.
Capítulo 28
ROMEO CAVALIERI

Havíamos acabado de chegar em casa.


Eu precisava acessar o meu computador com urgência, para
rastrear Giordana. Isabela não tinha mais tirado a pulseira do
bracinho da minha filha, como eu havia pedido quando dei.
Enquanto isso, Gustavo nos acompanhou, mas, trabalhava na
mensagem recebida, junto ao delegado. Eles tentariam descobrir
alguma informação relevante. O fiz jurar de pés juntos que a polícia
não fizesse nada sem o nosso aval... a ameaça foi o suficiente para
que o pânico viesse ainda mais forte, gelando-me dos pés à cabeça.
E o mandei demitir o infeliz do segurança que não prestava
para porra nenhuma.
— Conseguiu? — Isabela perguntou, angustiada.
Ela estava atrás de mim, andando de um lado para o outro.
Além dela, Lucca, meu pai e Alícia me olhavam com expectativa e
preocupação. Incredulidade tomava conta de todos nós. Medo
também. Muito medo... estava quase impossível de respirar.
Eu traria a minha ameixinha sã e salva para casa.
— Consegui! — falei assim que o rastreamento foi concluído.
— Irei até lá!
Procurei o local no Google Maps, e quase caí para trás quando
reconheci o endereço. Era próximo ao local onde ficava a sede
administrativa da Mineradora Cavalieri.
— Não! Eu preciso ir, a mensagem de Marcos foi clara! —
Isabela disse.
— Nem pensar! Você ficará aqui... eu irei buscar Giordana e a
sua tia.
— Eu não estou pedindo, Romeo! Eu vou junto, você querendo
ou não — afirmou, encarando-me.
Já era mais do que eu poderia suportar a preocupação com
Giordana, não poderia sequer considerar a hipótese de Isabela estar
nas mãos daquele desgraçado também.
— Bella, não posso colocar a sua vida em risco. — Abracei-a.
— E você acha que eu posso arriscar a vida da minha filha? —
indagou, as lágrimas não cessavam.
— Nada acontecerá a ela — afirmei, tentando acreditar
fielmente nas minhas palavras. — Eu a trarei para você.
— Eu não vou suportar ficar aqui esperando, Romeo. Por
favor! — Não era um pedido, era uma súplica.
Porra!
— Isa, minha nora, fique em casa com a sua amiga, que eu irei
com Romeo. Prometo que traremos a nossa bambina de volta —
meu pai falou.
— Eu também vou! — Lucca disse.
— Isa, amiga, eles têm razão. Você precisa estar bem para
quando Giordana voltar.
Isabela soluçou em meu peito, e tudo que eu queria era tirar
essa dor do seu coração. Não tive como frear a sensação de culpa.
Eu não as havia protegido como deveria.
— Eu a protegi tanto, nunca pensei que ele descobriria sobre
ela — falou, o tom de voz baixo, derrotado.
— Vai ficar tudo bem — murmurei, novamente mais para mim
do que para ela.
— Você promete? — ela indagou, fitando-me com esperança.
— Prometo. Eu prometo, bella.
Não podia mais perder tempo. Saí de casa deixando Isabela
apavorada, enquanto Alícia preparava um chá para que ela se
acalmasse um pouco. Meu pai, Lucca e Gustavo estavam comigo.
— Lucca, encoste no meio fio. Precisamos acertar algumas
coisas — Gustavo pediu.
Novamente eles não me deixaram dirigir, e estavam certos. Eu
não estava enxergando nada à minha frente. Só vermelho.
Vermelho do sangue que eu tiraria daquele infeliz.
— Não temos tempo, Gustavo — retruquei.
— É pela segurança de Giordana — disse, e bastaram aquelas
palavras para que Lucca fizesse o que ele havia pedido. — O
delegado Rossi montou uma operação de resgate, está esperando
apenas a nossa anuência e o endereço que você descobriu — falou.
— Eu tenho medo, Gustavo. — Apoiei a cabeça no encosto, o
desespero e a angústia cada vez mais aterrorizantes. — Marcos é
capaz de tudo.
— Não há o que temer. Nós resgataremos Giordana e, de
quebra, finalmente colocaremos as mãos no desgraçado. A equipe
de Rossi é treinada para isso, eles são experientes no assunto,
jamais arriscariam a vida de alguém.
— Filho. — Meu pai tocou o meu ombro, ele estava no banco
traseiro junto com Gustavo. — Ele tem razão, nós precisamos da
ajuda da polícia. Não podemos agir pelo impulso neste momento —
considerou.
Merda, merda!
— Ok, agora vamos logo, porra! — falei, por fim.
Levou pouco mais de meia hora para que chegássemos ao
local. O galpão era bem distante da rodovia onde estávamos. Ficava
no meio do nada, em um lugar sombrio, esquisito. A única coisa que
cortava o silêncio era o barulho dos carros que passavam por ali.
O desespero esmagou ainda mais o meu peito.
Eu só queria correr desesperadamente até lá e resgatar a
minha filha. Faltou pouco, muito pouco para que eu não fizesse isso.
Minha razão falou mais alto, eu precisava ser racional, pela sua
segurança. Apenas por isso.
Pouco tempo depois, uns veículos que não eram o da polícia
pararam próximos ao meu carro. A princípio, fiquei apavorado, mas,
quando Gustavo acenou para um dos homens, eu entendi tudo.
Era o delegado Rossi e sua equipe.
Eles não vieram com a viatura para não levantar nenhuma
suspeita. Os homens que saíram do carro poderiam assustar
qualquer um. Todos usavam preto e tinham a expressão fechada,
enquanto analisavam tudo ao redor. Notei que por baixo da roupa
eles usavam coletes a prova de bala.
Fomos apresentados rapidamente quando o delegado Rossi
começou a dar as instruções.
— Dez homens ficarão do lado de fora, cada um em um ponto
estratégico, próximo ao galpão e nós aguardaremos até que alguém
entre ou saia de lá. Pelo que Gustavo relatou, há mais pessoas
envolvidas.
Era claro que tinha, mas eu não podia esperar.
— Me desculpe, delegado Rossi, mas não posso esperar nem
mais um minuto — respondi.
— Eu imagino que você esteja apreensivo, Romeo, mas
lembre-se que a sua filha está lá dentro. Se agirmos por impulso,
tudo pode dar errado.
— Fique calmo, filho. Nós vamos levar a nossa italianinha para
casa — meu pai disse, apertando meu ombro.
E assim seguimos, a primeira hora passou, a segunda. E nada,
nenhuma movimentação. Até mesmo os segundos pareciam uma
eternidade. Enquanto a equipe do delegado se dispersou conforme
ele havia ordenado, aguardávamos escondidos atrás de um antigo
posto de gasolina.
De onde estávamos, só era possível ver o galpão, mais nada.
Os homens que Rossi havia trazido estavam espalhados, porém,
não dava para ver nenhum deles. Tive que reconhecer que eram
bons em desaparecer.
Foi quando algo chamou a nossa atenção. Um homem saiu
pela porta do galpão e eu reconheci o filho da puta. Era Bruno. Dei
um passo para frente e Gustavo me puxou de volta.
— Nem pense nisso, aguarde e verá o que vai acontecer.
Um dos homens apareceu, escondendo-se de Bruno, e,
quando se aproximou, não deu nem tempo para que reagisse, pois
desmaiou ao ter um pano colocado em seu nariz. Outro dos homens
de Rossi surgiu e eles o trouxeram até nós.
Nem quis esperar o desgraçado acordar, por mim o mataria
sem que ele tivesse a chance de abrir os olhos novamente. Porém,
mais uma vez fui interceptado por Gustavo. Se não fosse ele, seria
por meu pai ou Lucca.
Não demorou mais do que cinco minutos e ele despertou,
confuso. Foi então que ninguém me segurou, e eu desferi uma série
de socos contra o seu rosto ainda atordoado pelo desmaio.
— Onde está a minha filha, seu desgraçado! — vociferei.
— Viva... mas não sei... por quanto tempo — disse, cuspindo
um dos dentes que eu havia quebrado.
— Romeo, chega! — o delegado Rossi falou. — Precisamos
dele vivo para chegar até o galpão.
Dei um último soco, deixando-o aturdido.
Em seguida, o delegado fez com que Bruno informasse cada
mínimo detalhe do galpão, de quantas pessoas havia dentro, e
quais armas os desgraçados estavam usando. Achei que ele não
diria, mas Rossi deu um jeito. Algo na sua postura, ou na forma
como ameaçou Bruno o assustou.
Giordana, Gisele, Marcos e Júlia eram as pessoas que
estavam lá dentro.
Puta que pariu!
Não podia nem imaginar o desespero que a minha bambina
estava sentindo. Eu daria tudo para trocar de lugar com ela, para
que não tivesse que passar por isso sendo tão pequenina.
Fui distraído dos meus pensamentos, quando Rossi ordenou
que eu colocasse um dos coletes a prova de balas. Meu pai se
desesperou, disse que também iria junto. A princípio, foi negado,
mas, somente eu sabia o quanto Salvatore Cavalieri poderia ser
insistente. Afinal, eu era igual. Por fim, ele também recebeu um
colete.
— Lucca, eu preciso que me prometa uma coisa! — falei, ao
me aproximar do meu amigo.
— O que você quiser, cara — respondeu.
— Se algo acontecer comigo, você cuidará de Isabela e
Giordana. Eu confio a vida delas a você.
— Nada vai acontecer, irmão — disse, preocupado.
— Me prometa! — pedi novamente.
— Eu farei isso, fique tranquilo... e tome cuidado. Tomem
cuidado — falou, olhando para meu pai e para mim.
Seguimos para o galpão ouvindo as últimas orientações do
delegado Rossi. Eu, meu pai, e mais três homens. Um deles
carregava Bruno, que estava com uma fita na boca e os braços
amarrados e se debatia inutilmente.
Ao chegarmos em frente à porta, Rossi deu duas batidas
seguidas e, depois, mais duas, como Bruno havia dito. Era um sinal
combinado entre eles e eu rezei internamente para que o infeliz não
estivesse nos pregando uma peça.
Escutei um choro estridente de criança e meu coração se
partiu. Segundos depois, Júlia abriu a porta e não consegui ver nem
ouvir mais nada, quando vi Giordana em seus braços.
Ela se debatia e chorava. Era um choro rouco, sinal de que
estava assim há horas. Seu rostinho estava vermelho, as lágrimas
escorriam por ele. Passei meus olhos por cada parte da minha filha,
e, com exceção do desespero em seu olhar, não havia nenhum
ferimento.
Foi tudo muito rápido, Júlia deu um grito, tirando Giordana da
minha vista e entrando no galpão. Nós a seguimos para dentro com
Bruno preso nas mãos de um dos homens do delegado Rossi.
Marcos ficou perplexo, e Júlia foi para trás dele. Olhei ao redor
do galpão e encontrei Gisele sentada em uma cadeira, amarrada e
com a boca tampada por uma fita. Também não havia nenhum sinal
de agressão. Ela me olhou estarrecida, como se se sentisse
culpada.
Ela não tinha culpa! Porra!
Voltei o olhar para a minha filha, que berrava sem controle e,
quando me viu, sacudiu os bracinhos e as perninhas na minha
direção. Dei um passo para frente, mas, antes que eu pudesse
correr para Giordana, Marcos apontou a arma para ela.
— Seu desgraçado! Eu vou matar você! — vociferei,
estacando os passos.
— Se você der um passo a mais eu mato essa garota! Ela não
parou de chorar desde a hora que chegou e minha paciência está
por um triz! — disse, descontrolado.
Meu sangue gelou naquele momento e eu pensei que
desmaiaria. Os policiais apontaram a arma para Marcos, que
gargalhou de maneira doentia.
— O que você quer? — Salvatore se colocou entre Marcos e
eu.
O filho da puta o encarou, e pude ver reconhecimento em seu
olhar. Era a primeira vez que eles estavam se encontrando depois
de tantos anos. Depois do processo que culminou na falência da
nossa empresa.
— Olha, olha! Depois de todos esses anos você enfim teve
coragem de pisar nesse país! Depois que vocês causaram a morte
do meu querido irmão — debochou.
A arma continuava apontada para a minha filha, enquanto Júlia
a balançava de modo desengonçado. Tudo que eu queria era
segurá-la em meus braços, protegê-la, arrancar essas lágrimas dos
seus olhos.
— Marcos, entregue a criança ao Romeo. Ela não tem culpa
de nada — Salvatore disse.
— Entregar? Ela é a minha garantia de que receberei o
dinheiro e sumirei do mapa.
— Não, minha filha não vai a lugar algum! — Júlia gritou,
transtornada.
Desgraçada! Ela era minha, minha! Minha e de Isabela.
— Por quê? — Encarei novamente o infeliz. — Por que você
matou o seu irmão? Qual é o sentido de tudo isso?
Eu precisava arrancar uma confissão dele. O delegado Rossi e
os policiais estavam usando roupas normais, não estavam fardados.
Então, certamente Marcos estava pensando que eram apenas meus
seguranças.
— Eu matei? — Olhou-me com deboche.
— Matou! Nunca fomos os culpados, nós não somos os vilões
dessa história! — meu pai se intrometeu. — Só não entendi até hoje
o porquê você fez isso. Foi por dinheiro? Inveja?
Marcos deu uma risada doentia, e dessa vez a arma foi
apontada para o meu pai. Desespero me empurrou ainda mais para
baixo.
— Inveja? Daquele imprestável? Do todo correto e honesto
Paulo Moraes? Não, não mesmo!
O galpão fedia, era sujo, mal tinha iluminação. Realmente
assustador, e eu só queria tirar a minha menininha dali.
— Entregue a minha neta e eu dou o que você quiser —
Salvatore disse.
— O que eu realmente queria vocês tiraram de mim! Eu aturei
aquela infeliz por dezesseis anos, e ela foi uma ingrata!
Eu cometeria um assassinato.
— Aturou? Você roubou um dinheiro que era dela! — exclamei.
— Meu! Meu dinheiro! Demorei anos para colocar as mãos
nele, vocês não o tirarão de mim!
Continue... continue falando, confesse.
— Seu? Nunca foi seu...
— O dinheiro dele era para ser meu, a mulher dele era para
ser minha. Ela morreu para que Isabela nascesse, eu nunca o
perdoarei por isso! Nunca! — grunhiu.
Fiquei perplexo. Não era somente por ambição e dinheiro,
Marcos Moraes era apaixonado pela mãe de Isabela... a coisa não
poderia ficar pior. Encarei Gisele e o seu olhar estava baixo, aquela
confissão deve ter a surpreendido também. Ele estava confessando,
e Rossi acompanhava tudo, sua equipe a postos, preparados para
qualquer coisa que viesse a seguir.
— A culpa é sua! — Apontou a arma para mim. — Se você não
tivesse aparecido na vida de Isabela, ela teria se casado com o
Bruno, e então, todo dinheiro seria meu.
Só deu tempo de ouvir o disparo e eu fechei os meus olhos.
Pensei em Giordana, Isabela, mas o baque não veio. Escutei um
gemido baixo, meu pai estava no chão. Ele havia se jogado na
minha frente. Sua camiseta estava manchada de sangue na região
do ombro. O segundo disparo não foi ouvido, saiu da arma de um
dos policiais. E atingiu a perna de Marcos, que caiu no chão urrando
de dor.
Olhei para o meu pai, em seguida para a minha filha.
— Pegue... pegue a minha neta — meu pai disse. — Eu estou
bem.
Corri na direção de Giordana, e Júlia a afastou de mim. Ela
estava completamente fora de si. Eu tinha que dar um jeito de pegar
a minha filha de seus braços.
— Não! Você não vai tirar a minha filha de mim! — Ela ria e
chorava ao mesmo tempo, parecia estar em um surto psicótico.
— Júlia, querida. Deixe-me segurar a nossa filha — falei,
sentindo asco pelas palavras, mas por Giordana eu faria qualquer
coisa.
Aproximei-me mais um pouco, ela não teria como medir forças
comigo, e, pela análise rápida, estava sem armas. Desliguei-me de
tudo que acontecia atrás de mim, só podia ouvir os gritos e a
correria dos policiais.
— Ela é nossa, não é daquela órfã...
— Sim, é nossa. — Cerrei a mandíbula, nojo me consumindo.
Peguei Giordana de seus braços, e observei que um dos
homens se aproximava por trás de Júlia. Ela logo foi contida e teve
as suas mãos algemadas. Encarou-me com uma mistura de ódio e
loucura, e, em seguida, começou a chorar e a gargalhar ao mesmo
tempo de forma sinistra.
Afastei-me daquela maluca e não pensei em mais nada, só
amparei minha filha, que se acalmou visivelmente quando a abracei.
— Bambina di papà, já passou.
Meu coração estava dilacerado. Queria apagar essa
lembrança infeliz da sua cabecinha. Sussurrei no seu ouvido
palavras de amor e carinho, e quando se acalmou por completo, só
restaram uns solucinhos que soltava de vez em quando, por ter
chorado tanto.
Virei-me novamente e avistei o meu pai sentado no chão,
sendo atendido por um dos homens que vieram com o delegado
Rossi. Não eram apenas policiais, tinha uma equipe médica
também.
— Pai?
— Filho, estou bem.
— Parece que foi só de raspão — o tal homem disse e eu
fiquei aliviado.
Marcos se debatia enquanto dois homens eram necessários
para segurá-lo. Procurei por Gisele e ela havia sido libertada das
cordas, mas continuava sentada, em estado de choque. Aproximei-
me, eu precisava levar ela e Giordana para casa em segurança.
— Gisele? — chamei e ela me encarou, parecendo sair do
estado de torpor naquele momento.
— Romeo, me desculpe, foi tudo tão rápido. Me desculpe, eu
não...
— Não se desculpe, Gisele, você não tem culpa de nada —
falei, acalmando-a. — Vem, vamos embora daqui.
Eu só precisava levar Giordana para casa. Para Isabela, como
eu havia prometido.
Capítulo 29
ISABELA MORAES

Minha vida voltou a ser colorida quando Romeo trouxe a nossa


filha de volta.
Durante as horas em que esteve desaparecida, eu achei que
morreria de tanto desespero e sofrimento. Passei cada segundo
daquele momento de horror no quartinho dela, sentindo seu
cheirinho gostoso, enquanto Alícia tentava me tranquilizar.
— Ameixinha da mamãe — sussurrei, contendo as lágrimas
em meus olhos.
Ela estava mamando desde que havia chegado, desde que
veio para os meus braços não me largou mais. Eu sabia que ia
muito além da fome, que já deveria tê-la saciado. A amamentação
estava a acalmando. E eu ficaria o resto da noite assim, se fosse
necessário.
Estávamos em nosso quarto, eu tentei dar um banho nela,
trocar a sua roupinha, mas não tinha jeito. Cada vez que eu tentava
a afastar, ela me abraçava com mais avidez e desespero.
— Minha bambina — Romeo disse, beijando a cabecinha dela.
Ainda não tínhamos conversado sobre o acontecido. Eu não
queria falar sobre aquilo com Giordana por perto, já bastava o que
ela tinha passado. E tudo que mais me importava agora era que ela
ficasse bem.
Percebi que seus olhinhos se fechavam de cansaço, mas ela
estava lutando firmemente contra o sono.
— Dorme, minha princesa... a mamãe está aqui — falei
baixinho, enquanto acariciava suas costinhas.
Romeo nos abraçava, estávamos grudados, fortalecendo-nos,
acalmando-nos. Foi tão desesperador, nunca senti nada parecido
em toda a minha vida. Eu daria qualquer coisa para trocar de lugar
com ela, para que não tivesse que passar por isso sendo tão
pequena.
Quando por fim se rendeu, algum tempo depois, eu tirei sua
roupinha e a limpei com um lencinho umedecido. Não seria capaz
de acordá-la para dar banho. Troquei sua fralda, coloquei uma
roupinha confortável e a ajeitei no nosso meio.
Podia ouvir o seu ressonar baixinho, os pequenos soluços que
dava, sinal de que tinha chorado muito.
— Eu tive tanto medo — Romeo confessou. — Eu sonhei com
a minha mãe, já faz algum tempo... foi antes de tudo acontecer. Ela
me avisou, me avisou desde o início para cuidar de vocês.
Suas palavras me atingiram em cheio. Imediatamente lembrei-
me do sonho que tive com a garotinha, com a minha filha. E então,
outra lembrança surgiu, deixando-me aturdida. Aquela luz... aquela
luz forte que nos protegeu do acidente de carro.
Era ela, a mãe de Romeo. Eu tinha certeza de que era. De
alguma forma, ela nos protegeu.
— E hoje eu senti a sua presença tão forte ao nosso lado,
como se estivesse ali nos protegendo — continuou.
— Romeo, eu... senti a mesma coisa quando sofri aquele
acidente de carro — falei e ele me fitou. — Eu vi uma luz tão forte
me rodear, antes de tudo acontecer. Sua mãe nos protegeu.
Ele não disse nada, apenas me encarou, em uma mistura de
emoção e incredulidade. Eu estava me sentindo do mesmo jeito.
Giordana Accorsi Cavalieri era o nosso anjo da guarda.

No dia seguinte, fui a primeira a despertar, o que era raro. Na


verdade, eu sequer tinha conseguido dormir um sono tranquilo.
Acordava a cada hora com o coração acelerado, e procurando por
Giordana. Bastava sentir o seu cheirinho, e o seu calor ao meu lado
que eu me acalmava um pouco.
Deixei Romeo e ela dormindo e desci as escadas, eu
precisava conversar com a tia Gisele. Quando chegou ontem após o
sequestro, ela estava arrasada, meio em estado de choque. Bati na
porta do seu quarto, que foi aberta em poucos segundos.
— Oi, tia, como você está?
— Me sinto tão culpada, eu fiquei com tanto medo de que o
Bruno fizesse mal a Giordana, que sequer resisti. Saí caminhando
normalmente.
Então havia sido Bruno o responsável pelo sequestro. E talvez
por isso, por ela não ter resistido, que o segurança que Romeo
havia contratado para nos proteger não percebeu.
— Não quero que se sinta culpada, você e a Giordana foram
vítimas.
— Eles planejaram isso. Marcos, Bruno... Júlia. O que eu fiz de
errado com ela? E como eu me permiti ser enganada por todo esse
tempo por Marcos? — se perguntou.
— Você não fez nada de errado, tia. Os errados são eles, que
não a merecem.
Fiquei ali, conversando com ela, ouvindo-a por mais alguns
minutos, e em seguida me retirei quando percebi que havia ficado
um pouco mais calma. Ela estava cansada, a aparência exausta não
negava que ela tinha ficado acordada a noite inteira.
Estava subindo novamente para o quarto, quando vi Romeo
descendo as escadas.
— Tudo bem? — perguntou, sondando-me.
— Tudo... a tia Gisele está muito abalada. Eu estava
conversando com ela, tentando tranquilizá-la.
— Ela está se sentindo culpada.
— Me diga, Romeo... me diga tudo que aconteceu.
Caminhamos até a cozinha, eu precisava beber alguma coisa,
uma água ou um suco antes de digerir tudo que ele teria para me
contar. Romeo me encarou por alguns segundos antes de começar
a falar.
E, conforme foi relatando de maneira bem resumida o que
havia acontecido naquelas horas de puro terror, deixando-me
aturdida, apavorada. Marcos já havia cometido crimes terríveis, eu
esperava qualquer coisa dele. Isso somente até Romeo dizer que
ele confessou ter sido apaixonado pela minha mãe.
Fiquei horrorizada. Não havia sido somente por ganância. Ele
invejava o meu pai, a vida que tinha, e a queria para ele. Aquele
homem não poderia ser considerado um irmão. Ele era um bandido,
um criminoso.
O sequestro foi apenas mais um crime para a ficha extensa de
Marcos na polícia.
E só de pensar que Giordana esteve nos braços da louca da
Júlia eu me desesperava. Principalmente ao saber que ela disse
aqueles absurdos, chamando a minha filha de sua. Eu nem
conseguia imaginar o que seria capaz de fazer se estivesse
presente.
No fim, Romeo tinha razão ao não permitir que eu fosse junto.
— E o meu pai levou um tiro de raspão, Lucca ficou com ele
essa noite no hospital, só por precaução. A pressão dele estava
alta, os médicos preferiram mantê-lo por lá.
— Deus, Romeo! Me desculpe por não perguntar sobre o seu
pai e sobre o Lucca... eu estava tão aflita quando vocês chegaram,
que me esqueci completamente do mundo.
— Ei, não fique assim, não se desculpe. Lucca me mandou
uma mensagem informando que daqui a pouco eles estarão aqui.
— Que bom! — respondi, extremamente aliviada. — Mas...
como aconteceu? — Percebi que ele titubeou, não queria me contar.
— Marcos... mirou e atirou em mim, e o meu pai se jogou na
frente — disse e pareceu se dar conta do que havia acontecido
somente naquele instante, ao falar em voz alta.
Romeo ainda comentou que não estavam correndo perigo,
pois ambos usavam colete à prova de balas. Tudo que eu fiz foi
correr para os seus braços e abraçá-lo com toda força que eu tinha,
enquanto o medo se esvaía por completo.
Ele estava bem, todos estavam.
— Eu espero que Marcos nunca mais saia da cadeia!
— Garanto que isso não vai acontecer. Ele nunca mais fará
mal a você, a nossa filha ou a qualquer outra pessoa — disse ao
beijar o topo da minha cabeça.
— E o Cícero? — indaguei.
Romeo não havia comentado nada sobre ele, e eu só ficaria
totalmente aliviada quando todos eles fossem julgados, condenados
e presos.
— Não estava lá quando chegamos, mas com certeza tem
participação nisso, como teve em todas as outras coisas —
respondeu —, mas, só falta o pegarem agora... o desgraçado do juiz
Pereira também foi preso tentando fugir do país. Gustavo disse que,
provavelmente, ele vai falar tudo que sabe.
Fomos interrompidos por um barulho de motor de carro. Era
Salvatore e Lucca.
Caminhamos até a porta para recebê-los, e avistei o pai de
Romeo com uma tipoia no braço. Ele e o filho eram incrivelmente
parecidos. E, com o passar dos dias, eu percebia que as
semelhanças não eram apenas físicas.
O pedido de desculpas feito na primeira vez em que nos vimos
ainda soava em minha mente. Assim como Romeo, Salvatore
também culpou e odiou o meu pai pela ruína da sua família.
Meus devaneios foram interrompidos quando Romeo
caminhou a passos largos na direção do pai e eles se abraçaram
fortemente. Os dois não disseram uma palavra, e eu tive a sensação
de que aquilo não acontecia há anos. Era um abraço cheio de
significado.
Depois, foi a minha vez de abraçá-lo.
— Obrigada pelo que fez por minha filha e pelo Romeo,
Salvatore. Estimo melhoras.
— Eu dou a minha vida por eles, minha nora.
Senti um afago no coração com as suas palavras, ele estava
sendo sincero.
Romeo e eu tínhamos acabado de colocar Giordana no berço.
Ela havia ficado grudada o dia inteiro conosco, se não estava
comigo, estava com o pai. Ela havia acordado sorridente, o que nos
deixou bem mais tranquilos.
— Como é a sua relação com o seu pai? — questionei assim
que nos deitamos na cama.
— Nunca foi das melhores... ele sempre foi um pai muito
ausente, estava direto aqui no Brasil, então eu cresci sem tê-lo por
perto.
— Fazia quanto tempo que vocês não se abraçavam? —
referi-me ao abraço de hoje de manhã.
— Não me lembro — disse, pensativo. — Só recordo que tudo
piorou com a morte da minha mãe.
— Eu sinto muito...
— O Salvatore de hoje está irreconhecível. Ele vivia em uma
bolha, completamente amargurado. — Respirou fundo. — Eu senti
que o perdi no mesmo dia em que perdi a minha mãe.
— Deve ter sido muito difícil para você, era somente um
garotinho.
— Ele está tentando recuperar o tempo perdido, tem se
esforçado... não vou dizer que é fácil, foram anos de uma relação
complicada. Mas, se eu sou merecedor de uma segunda chance,
por que ele não seria?
— Você ainda o tem... pense nisso. Podem se perdoar,
restabelecer o vínculo de pai e filho — falei, sendo sincera.
Eu não tinha vivido as coisas que Romeo viveu, não podia
julgá-lo por ter ressentimentos. No entanto, não pude deixar de
refletir sobre as coisas que ele havia falado. Ainda tinha muita
mágoa em seu coração, Romeo era um homem rancoroso.
Contudo, aos poucos, ele estava se desprendendo de algumas
amarras antigas. Eu podia ver o quanto ele estava se esforçando
para se tornar um homem melhor.
Não apenas por mim e por Giordana, mas principalmente por
ele.
E assim como Salvatore estava se esforçando para recuperar
o elo perdido com o filho, Romeo também estava se esforçando
para criar laços com o pai.
Pensei em meu pai, e no quanto eu o queria comigo. Não
apenas ele, como mamãe também. Eu me perguntei se eles
estariam felizes e orgulhosos de mim, pelas coisas que eu havia
conquistado, pelas coisas que eu havia superado, pela mulher que
eu me tornei e pela família que eu estava construindo. E várias
vezes eu me perguntei como seria a nossa relação, como
estaríamos hoje caso eles estivessem vivos.
De vez em quando uma saudade mais forte apertava o meu
coração.
Entretanto, eles não voltariam mais. E, apesar de não estarem
mais nesse plano, meus pais continuavam vivos em meu coração.
Mesmo com as poucas lembranças que me restaram deles, eu tinha
a plena certeza de que me amaram e me desejaram muito. Eu era
uma parte de Elisa e Paulo Moraes.
Hoje mais do que nunca eu podia entender o amor de uma
mãe. Nada no mundo se comparava a isso. Era forte, inigualável.
Por vezes até doía. Era um amor pelo qual seríamos capazes de
qualquer coisa. Até mesmo de matar ou morrer, se fosse preciso.
Eu desejava dar a Giordana tudo que eu não tive. Desejava
dar ao Noah a família que ele também não teve. E eu desejava fazer
tudo isso ao lado de Romeo, o homem que eu escolhi no passado,
escolhi agora novamente, e escolheria para sempre. Nós
escreveríamos a nossa própria história.
Sem mágoas ou ressentimentos do passado, somente coisas
boas.
E passaríamos aos nossos filhos os valores mais importantes,
que dinheiro nenhum no mundo seria capaz de comprar: o amor, a
bondade, a honestidade. Um dia, eles passariam esses mesmos
valores aos seus filhos, e o nosso legado se perpetuaria.
Um legado de amor.
Capítulo 30
BUENOS AIRES, ARGENTINA

ISABELA MORAES

Quanta saudade eu senti de Buenos Aires, país que me


acolheu tão bem, e que me deu o meu bem mais precioso.
Havíamos desembarcado na capital argentina no início da
tarde, Giordana, Romeo e eu, para a cerimônia de casamento de
Maitê. Hernán, um charmoso senhor do ramo imobiliário que ela
conheceu assim que chegamos aqui, a pediu em casamento há
alguns meses e, finalmente, havia chegado o grande dia.
Eu estava muito feliz pela minha amiga, ela estava radiante.
Maitê foi uma pessoa importante demais na minha vida, eu
devia a ela o meu recomeço. A oportunidade que tive de me
reerguer, de me fortalecer. Em Buenos Aires vivi um dos períodos
mais difíceis, e também o mais marcante.
Romeo e eu ficaríamos por mais dois dias para aproveitar um
pouco da cidade. Nós merecíamos esse tempo apenas para nós e
para a nossa filha, depois do grande susto que havíamos passado.
Susto não, horror.
Chegamos ao hotel para prepararmo-nos para a noite, e
Giordana estava eufórica. Eu precisava fazer com que ela dormisse
agora, para que a noite conseguisse se manter um pouquinho
desperta.
Minha ameixinha era um verdadeiro grude com o pai. Romeo
se transformava completamente quando estava ao seu lado. E eu
ficava enlevada ao vê-los assim, tão apegados um ao outro.
Nós havíamos passado por muitas provações, e nada poderia
me fazer mais feliz do que ver a minha família unida e alegre. Ainda
faltava um pequeno pedacinho para que nos sentíssemos
completos, e eu tinha certeza de que em breve ele estaria ao nosso
lado.
Nosso pequeno Noah, ele nem imaginava o que estava por vir.
Romeo havia me dito que em breve o processo seria concluído
e, enfim, poderíamos levá-lo para a nossa casa. Eu não podia nem
imaginar qual seria a sua reação, mas estava contando os dias para
que ele fosse nosso.
Nosso pedacinho.
— Amore — chamei-o e ele me fitou com intensidade. — Há
um tempo, a dona Lúcia comentou comigo que o orfanato recebeu
uma doação de um valor bem alto.
— É mesmo? Que ótimo.
Fingido.
— Sim... você tem algo a ver com isso?
— O que importa? — perguntou-me, e notei um suave curvar
em seus lábios.
— Tudo. Foi você? — questionei mais uma vez, e ele pareceu
pensar antes de responder.
— Foi. E depois, eu passei a frequentar o orfanato quando
você foi embora. — Suspirou pesadamente. — A princípio, foi uma
forma que eu encontrei de manter você mais perto de mim depois
que desapareceu. Mas, depois, não conseguia passar uma semana
sem ir até lá. Aquelas crianças me preenchem de uma forma que
nunca imaginei.
Sua confissão fez meus olhos se encherem de lágrimas. Eu
me sentia da mesma forma. Desde que comecei a frequentar o
Jardim da Criança, os melhores dias da semana para mim eram
aqueles em que eu ia até lá. Tanto que, se fosse possível, eu
adotaria todas as crianças.
— Eu amo você, Romeo. Você me transborda — confessei.
— E você me torna um homem melhor a cada dia, bella. Eu te
quero tanto — se declarou, aproximando-se e me abraçando com o
braço livre.
Romeo era um homem tão forte que, com apenas um abraço,
ele conseguia envolver Giordana e eu.
O restante da tarde passou rapidamente. Conseguimos tirar
um cochilo gostoso juntos, antes de acordarmos para começarmos
os preparativos.
A cerimônia aconteceria em um salão chique daqui de Buenos
Aires. Maitê era uma mulher requintada, fina. Ela era uma artista. E,
apesar de ter convidado apenas familiares e amigos mais próximos,
eu tinha certeza de que seria tudo impecável.
Coloquei um vestido preto longo, e o único detalhe mais
ousado dele era um decote nas costas, que ia até a base da minha
coluna. Fiz um coque despenteado e uma maquiagem suave, mas
que destacou bem os meus olhos. Estava me sentindo bonita.
Romeo entrou na antessala do nosso quarto segurando nossa
filha em seus braços, enquanto eu finalizava os últimos ajustes.
Giordana usava um vestido lilás, e um arco da mesma cor na
cabeça. Estava parecendo uma boneca de porcelana. Já Romeo,
usava um terno caro escuro. O meu homem era um pedaço de mau
caminho.
— Che bella! — murmurou em meu ouvido e a mão livre, e
muito boba por sinal, resvalou em minha bunda de maneira
proposital.
— Lindo.
Dei uma encarada nele, e Giordana se mostrou presente ao se
jogar em meus braços. Não me importei com a maquiagem, nem
com o cabelo que ela fez questão de pegar com seus dedinhos
agitados.
Ela murmurava suas palavrinhas incompreensíveis e eu fingia
que entendia tudo. Romeo também passou a fingir porque era
engraçado demais ouvi-la conversando conosco em sua própria
língua. Estávamos ansiosos para saber qual seria a sua primeira
palavra.
Minutos depois, saímos do hotel e seguimos para o local onde
aconteceria a cerimônia. Ao chegarmos, fomos recebidos por Maitê
e Hernán. Se eu pensava que ela estava feliz quando nos vimos
pela última vez, agora eu não poderia descrever o quanto ela estava
radiante.
O carinho e a devoção com a qual o seu agora marido a
tratava era apaixonante.
— Que saudade dessa ameixinha! — Maitê disse.
Minha filha parecia ter a reconhecido, pois, se jogou em seus
braços e teve as bochechinhas beijadas e apertadas com
delicadeza. Se tinha uma coisa que Giordana adorava era festa.
— Sejam bem-vindos — Hernán disse, cumprimentando-nos
em português, porém, com um forte sotaque.
Certamente Maitê o estava ensinando a falar algumas palavras
no idioma dela. No entanto, isso nunca foi empecilho para eles.
Minha ex-chefe e amiga era uma mulher culta, antes de receber o
convite para abrir a galeria em Buenos Aires, ela já falava um pouco
de espanhol. Ainda assim, resolveu fazer um curso para se
aperfeiçoar antes de vir de vez para a cidade.
Eu não havia aprendido tantas coisas, mas me virava bem. Até
mesmo Romeo dominava um pouco da língua. E eu ainda não havia
descoberto algo em que ele pudesse ter dificuldade. Era
extremamente inteligente em todas as esferas. Não existia sequer
uma pergunta que ele não soubesse a resposta.
— Obrigado, Hernán — Romeo o agradeceu em espanhol.
— Você está lindíssima, Maitê, está tudo incrível aqui — falei,
enquanto Romeo e Hernán trocavam algumas palavras.
— Obrigada, Isa. Estou com uma sensação de plenitude
inexplicável. Buenos Aires mudou a minha vida, e de quebra ainda
me trouxe um amor. Não é maravilhoso?
— Você merece cada segundo dessa plenitude — respondi,
abraçando-a.
Foi uma noite especial. Celebrar o amor sempre era.
E os outros dois dias que passamos em Buenos Aires também
foram. Aproveitamos cada segundo da nossa bolha. Com certeza
voltaríamos mais vezes, e com muito mais frequência.

OURO PRETO, MINAS GERAIS, BRASIL


Estava terminando de trocar a fralda de Giordana quando
Romeo entrou no nosso quarto. Ele estava com uma expressão em
seu rosto que eu só tinha visto uma vez na vida, que foi quando me
pediu em casamento pela segunda vez. Em suas mãos, segurava
um papel com tanta força que estava quase o amassando.
— O que aconteceu? — perguntei, ansiosa.
— Deu certo, bella. — Respirou fundo. — Vamos buscar o
nosso bambino. Está na hora de ele vir para a casa.
Achei que desmaiaria. Meu coração acelerou e eu nunca
poderia descrever o que senti naquele momento. Era a mesma
coisa que eu havia sentido no nascimento de Giordana.
— O quê? Romeo, você...
Ele não disse nada, apenas estendeu o papel na minha
direção. Era a certidão de nascimento de Noah, que agora constava
o meu nome e o de Romeo como pai e mãe. Somente então a ficha
pareceu cair. Lágrimas invadiram os meus olhos ao ver os nossos
sobrenomes junto ao nome dele. O meu menino ficaria tão feliz.
Noah Moraes Cavalieri.
Romeo deu um passo para a frente e abraçou Giordana e eu
com tanta força que pensei que nos esmagaria. Nossa ameixinha
parecia até que estava entendendo tudo, pois a gargalhada que deu
foi contagiante.
— Vamos buscar o seu irmãozinho, bambina — disse ao beijar
a bochecha de Giordana.
— Nós já podemos ir? Agora? — perguntei, ansiosa.
— Nesse minuto. Já avisei a dona Lúcia, pedi que ela o
arrumasse e não o deixasse por perto das outras crianças. Não
quero nenhuma delas tristes com a saída dele.
Romeo pensava em absolutamente tudo. Por ser o mais velho,
Noah certamente faria falta para as outras crianças. E quando eu
digo que ele pensava em tudo, era em tudo mesmo.
O quartinho de Noah ficou pronto dias após darmos entrada no
processo de adoção. Foi Romeo quem pensou em cada detalhe
junto ao arquiteto responsável pelo projeto. O tema escolhido para o
quartinho foi de carro. E ele havia comprado uma coleção em
miniatura para Noah.
Mal tive tempo de me arrumar, na verdade, nem pensei nisso.
Tudo que eu queria era trazer o meu menino para a casa.
Sonhei com isso por tanto tempo. Estava entusiasmada para saber
como ele reagiria, para ver o sorriso lindo em seu rosto. Noah nunca
mais sentiria a dor da rejeição.
Chegamos ao orfanato e Romeo pegou Giordana no colo
quando entramos. Seguimos para a sala da dona Lúcia, onde ela
estava nos aguardando com Noah. Como era início da noite, as
crianças já estavam em seus quartinhos. Não quis nem saber como
Romeo havia conseguido com que pudéssemos buscá-lo naquela
hora.
A porta da sala da dona Lúcia estava entreaberta. E a primeira
coisa que eu avistei foi uma mãozinha pequena brincando com um
desses bonecos super-heróis. Abri mais um pouco a porta e o vi por
inteiro. Noah estava todo lindo para ir para a casa com os papais.
Vestia um moletom preto e usava gel no cabelo. Eu nunca o vi tão
parecido com Romeo. Eles pareciam, de fato, pai e filho.
Só podia ser destino.
— Meu lindo príncipe! — chamei e quando ouviu a minha voz,
olhou-me da mesma maneira apaixonante de sempre.
Noah largou o boneco de qualquer jeito e correu para os meus
braços, enquanto eu me abaixava para recebê-lo.
— Tia Isa! — disse, agarrando-me com tanta força que eu
achei que ficaria sem ar, mas não me importei nem um pouco.
— Lembra quando você me disse que queria muito ser meu
filho?
— Shim... — Acenou efusivamente, olhando de Romeo para
mim.
— Eu nunca falei para você, mas o meu maior sonho também
era que fosse meu filho. — Ele me encarou, ouvindo tudo com
atenção.
Seus olhinhos castanhos brilhavam com esperança. Notei a
presença de Romeo e Giordana bem pertinho de nós dois.
— Meu lindo príncipe, nosso sonho se tornou realidade. Você
agora é nosso filho. Romeo e eu somos os seus papais — falei,
contendo o máximo que podia das lágrimas.
Nada me preparou para o segundo seguinte, quando seus
olhinhos lacrimejaram e ele me abraçou ainda mais forte do que da
primeira vez. Acalentei suas costinhas enquanto escutava os
solucinhos baixos.
— Eu tenho papais! Eu tenho papais! — disse, correndo de
mim para Romeo e agarrando as pernas dele.
Ele se abaixou para ficar da altura de Noah, e ali eu vislumbrei
a cena mais bonita de toda a minha vida. Romeo segurando em
seus braços os nossos dois filhos. Pude ver a emoção estampada
em seus olhos, embora não tivesse derramado uma lágrima.
Giordana observava tudo com atenção, e olhava de maneira
curiosa para Noah.
— Filho, essa é sua irmãzinha — Romeo disse, e achei que
não tinha como ficar mais emocionada ao ouvi-lo chamando Noah
de filho.
— Ela palexe uma buneca — respondeu, também olhando
com curiosidade para a sua irmã, enquanto segurava a sua
mãozinha.
Não contivemos a gargalhada com a sua espontaneidade.
Crianças eram tão sinceras, tão puras. E das lágrimas ele passou a
sorrir de orelha a orelha.
Troquei algumas palavras com a dona Lúcia, que também
estava emocionada. Noah se despediu dela com um abraço
apertado e em seguida, colocou-se entre Romeo e eu, e deu as
mãozinhas para nós dois.
Fomos embora dali com o nosso filho, nosso presente. Feito
para nós, nascido para ser nosso. Não tinha como ser diferente.
Não tinha como ser mais emocionante.
Eu estava no céu, ou em algum lugar muito próximo ao
paraíso.
A nossa família estava completa.
Capítulo 31
ROMEO CAVALIERI

Eu aprendi a duras penas que nenhum tipo de vingança


compensa. No entanto, não poderia deixar de pensar que se não
fosse por isso, eu não teria encontrado a mulher da minha vida, que
era meu grande amor. E, com ela, teríamos recebido os maiores
presentes do mundo.
Giordana e Noah, nossos filhos.
Por eles eu enfrentaria o mundo, enfrentaria todas as batalhas
que precisasse. Pela felicidade deles, eu seria capaz de qualquer
coisa. Daria todas as minhas fortunas, porque aqueles sorrisos eram
tudo para mim.
E agora que a nossa família estava completa, com exceção
dos filhos que ainda viriam, eu me sentia o homem mais feliz e
sortudo de todos. Por ter tido a chance de me redimir, porque ela me
deu uma segunda chance.
Isabela e eu tínhamos acabado de chegar para o julgamento
de Marcos Moraes e toda sua corja de cúmplices. Estávamos
angustiados porque hoje, finalmente, eles teriam as suas sentenças.
Todos os outros trâmites já tinham sido feitos.
Apresentação de provas, audição de testemunhas, depoimento
dos envolvidos, das vítimas. Tudo na devida ordem, de maneira
correta e ética pelo novo juiz que assumiu o caso.
Passaram-se mais de dezoito anos desde que esses bandidos
planejaram e executaram o assassinato de Paulo Moraes,
arruinaram a minha família, e acabaram com a infância de Isabela.
Passaram-se mais de dezoito anos para que a justiça fosse
feita, esse era o resultado que esperávamos da audiência de hoje.
Justiça. Estávamos confiantes e certos de que não teria a menor
possibilidade de serem julgados inocentes. Além das milhares de
provas e do flagrante do sequestro, o juiz Pereira prestou mais de
quarenta horas de depoimento, onde confessou tudo,
absolutamente tudo e todos os podres de Marcos e Cícero.
Cícero foi preso dias após o depoimento do juiz.
Ele planejou tudo junto ao Marcos, tinha acesso à herança de
Isabela tanto quanto ele. Com o dinheiro de Isabela, eles
compraram muitas pessoas influentes e conseguiram coisas que
ninguém conseguiria se não pagasse caro.
Quando tivemos acesso ao teor do depoimento, foi chocante,
por mais que soubéssemos da podridão que os envolvia. E não
apenas isso, foi estarrecedora a frieza com que eles planejaram
tudo, cada maldito detalhe.
O juiz Pereira não poupou detalhes, e Gustavo realmente
havia dito que ele não ficaria quieto. Afinal, por mais dinheiro que
tivesse recebido para calar a boca, um homem sujo como ele jamais
se ferraria sozinho, ainda mais não sendo o principal mandante de
todos os crimes.
Por este motivo, a tragédia da Mineradora Cavalieri não foi
investigada devidamente. Todo o processo, que, para um juiz
honesto seria considerado complexo demais, seria analisado
minuciosamente, ouvido uma, duas, três vezes as testemunhas, foi
julgado de forma rápida e superficial demais.
Na época, meu pai sofreu retaliações no Brasil, foi
escorraçado. E preferiu deixar para fazer justiça com as próprias
mãos, com vingança. O resultado, já sabíamos como tinha sido.
Desastroso.
Fomos culpados por falta de segurança. Sendo que, a
explosão seguida de incêndio não ocorreu devido à detonação não
programada de uma bomba, como pensávamos. Ela foi pensada
minimamente de forma fria e calculista.
Quem mudou os registros do dispositivo e da detonação foi o
Ademar, o ex-funcionário que faleceu de ataque cardíaco algum
tempo atrás, a mando de Marcos. Ela foi programada para explodir
no exato momento em que Paulo Moraes estava no local. Segundo
partes do depoimento do juiz Pereira, as provas da mudança na
programação da detonação foram ocultadas antes mesmo de a
perícia chegar ao local do acidente.
E essa informação corroborava com o fato de que o próprio
Ademar avisou aos colegas via rádio de que o local de trabalho
havia mudado naquele dia. Como se a vítima tivesse solicitado. Ele
se sentiu tão culpado pela morte do colega de trabalho, tão culpado
por ter o invejado pela promoção, que surtou completamente.
Eles foram tão sujos, que até mesmo forjaram um e-mail como
se Paulo tivesse encaminhado aos diretores e equipe técnica
responsável pela saúde e segurança dos funcionários da
mineradora, informando sobre um problema no tal dispositivo. E-
mail esse que nunca existiu — Gustavo nunca o encontrou, nem na
base de dados da empresa, nem nos registros excluídos —,
tampouco o problema no dispositivo.
Salvatore Cavalieri poderia ter todos os defeitos do mundo,
mas, se tinha uma coisa que ele prezava mais do que qualquer
outra, era a segurança dos seus funcionários. Sempre foi assim, e
era até hoje com a AURUM.
Quando a questão da herança de Isabela e do processo de
tutela, o negócio todo foi tão sujo quanto. Ela ficou mais abalada do
que já estava, por saber que, por um triz, nada pior aconteceu a ela.
O juiz Pereira afirmou com veemência que os planos de Marcos e
Cícero eram casá-la com o Bruno, para, em seguida, matá-la e
assumirem de vez todo o dinheiro.
Só de pensar no assunto o ódio vinha com força, fazendo-me
enxergar apenas vermelho na minha frente.
Vermelho sangue.
Sabe-se lá o que teria acontecido se ela tivesse ido comigo no
dia em que Giordana foi sequestrada. Podia sentir o pânico me
corroendo somente ao pensar. Saber que a sua vida corria perigo
era desesperador.
Eu daria a minha própria por ela e pelos nossos filhos.
Durante todos esses anos, o silêncio do juiz Pereira foi
comprado com alguns milhões de reais. Milhões esses, retirados da
herança de Isabela, ao qual Marcos prestava contas falsas de
estudo, alimentação, serviços médicos, vestuário, e todo e qualquer
gasto que não tinha com ela.
Nada daquilo era real. Nem a documentação, nem o teor dos
processos. A própria Isabela depôs informando que o tio nunca
aceitou o dinheiro dela, quando, na verdade, era o dinheiro dela que
ele estava usando. Não só para as coisas dela, como para os luxos
filhinha psicopata.
Tudo que aconteceu serviu para nos mostrar o quanto as
pessoas podiam ser gananciosas, aceitando fazer qualquer coisa
por dinheiro. Qualquer coisa. Manipular, enganar, mentir... matar.
Senti a tensão de Isabela ao meu lado, e deixei os meus
pensamentos cheios de ódio de lado. Não queria que ela tivesse
que passar por tudo isso. Por mim ela nem viria a esse julgamento,
no entanto, além de fazer parte do processo, ela era uma das
principais interessadas, e que desejava tanto quanto eu, a punição
desses infelizes.
Apertei a sua mão, pude sentir que ela suava de nervosismo.
Massageei os dedos pequenos, macios e delicados, tentando
acalmá-la. Tudo daria certo. Faltava pouco para que, enfim,
conseguíssemos viver em plena paz.
— Sabe de uma coisa... — ela começou a sussurrar. — Agora
que eu me dei conta, que se você não tivesse vindo atrás de mim no
começo de tudo, eu poderia estar...
— Não termine essa frase — interrompi.
Isabela não tocava mais na palavra vingança. Depois que me
perdoou, nunca mais jogou na minha cara as coisas que fiz. Nunca
mais remoeu, nunca mais me olhou com mágoa. Aquilo tinha ficado
para trás, esquecido. Mesmo que, para mim, ainda não estivesse
completamente.
— De uma forma ou outra, você me salvou do meu tio e de
todos eles.
Porra! Não, não!
— Eu amo você, Isabela! Não só amo, como sou louco e faço
qualquer coisa por você, pelos nossos filhos e pela segurança de
vocês.
Ela me encarou e deu um breve sorriso. Segundos depois,
fomos convocados a entrar na sala onde ocorreria o julgamento.
Além de Gustavo e Isabela, estavam presentes a Gisele, o Lucca e
o meu pai.
O juiz deu início ao julgamento e falou por mais de duas horas
sobre o processo, até que chegou a hora de dar a sentença. Abracei
Isabela junto a mim, dando toda a segurança e tranquilidade que
precisava para escutar o que o juiz tinha para dizer.
— Devido a quantidade mais do que suficiente de provas
fornecidas, o Tribunal de Ouro Preto considera Marcos Moraes
culpado pelas acusações de homicídio doloso... — Dali em diante
não ouvi mais nada.
Culpados! Todos eles foram julgados culpados e ficariam
presos por muitos anos. Se um dia tivessem sorte de sair da cadeia,
eu cuidaria de tudo. Enquanto isso, que apodrecessem atrás das
grades, que era o que gente como eles, a escória da humanidade,
merecia.
Marcos Moraes, além de toda ficha podre que tinha, ainda
cumpriria pena por sequestro e violência doméstica. Ele apodreceria
na cadeia, e eu me certificaria de que não saísse nunca mais de lá.
Não somente ele, como todos aqueles que foram seus cúmplices
durante todos esses anos.
Bruno, Cícero, o tal juiz Pereira, desgraçado, corrupto, e que
nunca mereceu o título de doutor, muito menos de juiz. Todos eles
atrás das grades, pelos crimes, por serem cúmplices do filho da puta
do Marcos.
Apenas Júlia, a prima de Isabela, ficou de fora do julgamento.
O caso dela foi separado, e, além de ter sido acusada pelo
sequestro de Giordana, também foi considerada culpada. No
entanto, ela não iria para a cadeia, pois estava internada em um
hospital de custódia[8] após ter sido diagnosticada com distúrbio
psíquico. Ao que tudo indicava, também não sairia mais de lá.
Eu me senti de alma lavada, porque desta vez, a justiça
realmente havia sido feita.
Eu e toda a minha família mal conseguíamos conter a
felicidade. E não fazíamos nenhuma questão mesmo de esconder.
Até mesmo Gisele ficou visivelmente feliz com o resultado do
julgamento. Ter que conviver com os traumas de um relacionamento
abusivo já era o bastante. Se tivesse que conviver com isso, e ainda
com o desgraçado foragido seria mil vezes pior.
Ela vendeu a casa em que morava e comprou um apartamento
perto da minha casa, onde podia vir com mais facilidade e
frequência para visitar a Giordana e o Noah, que a adoravam.
Depois de tantos anos, para uns mais, para outro menos,
poderíamos começar a viver com tranquilidade, segurança e paz,
pois o risco que corríamos não existia mais. E era exatamente isso
que Isabela e eu estávamos fazendo desde então.
Vivendo.
Sem qualquer tipo de medo ou receio. Contudo, todos os
sustos que passei bastaram para que eu nunca mais a deixasse
sem segurança. Nem ela e nem os nossos filhos.
Cheguei em casa no final da tarde após uma viagem rápida a
São Paulo.
Encontrei as razões da minha vida inteira na sala fazendo
bagunça. O primeiro a me ver foi Noah, que correu na minha direção
com um sorriso imenso e um brilho no olhar pelo qual eu seria
capaz de qualquer coisa.
— Papà!
Eu amava o jeito como ele me chamava, desde que o havia
ensinado a palavra papai em italiano, ele só me chamava daquela
forma. Eu tinha em minhas lembranças, e jamais me esqueceria, do
dia em que fomos buscar Noah no orfanato. Do dia em que ele se
tornou nosso. Fui o homem mais feliz do mundo naquele dia, assim
como fui o mais feliz quando vi Giordana, recém-nascida, pela
primeira vez.
— Mio bambino! — Abracei-o fortemente.
Não demorou para que Giordana também viesse na minha
direção, correndo com o seu jeitinho um tanto desgovernado de
quem tinha aprendido a andar há pouco tempo.
— Papà... papà!
Como o irmão, ela também só me chamava assim, e eu sorria
feito bobo... por sinal, estava sorrindo nesses últimos tempos mais
do que sorri a minha vida inteira. E os culpados eram esses três que
eu amava tanto.
— Mia bambina!
Coloquei os dois no meu abraço de urso e eles gargalharam.
Isabela se aproximou, sorridente, e só pensei no filho da puta
sortudo que eu era por ter essa mulher. Eu era completamente louco
por ela.
— Tem um espacinho aí para mim também? — perguntou,
encarando-me de maneira intensa.
— Sempre, bella. Sempre terei espaço para todos vocês em
meus braços — respondi e ela veio.
E era verdade. A mais pura verdade. Mesmo que tivéssemos
mais dois, três, cinco filhos, todos eles caberiam no meu abraço.
Eles eram a melhor parte de mim, e eu me tornava um homem
melhor a cada dia por eles.
Por eles e para eles. Para sempre.
Capítulo 32
PALERMO, SICÍLIA, ITÁLIA

Alguns meses depois...

ISABELA MORAES

O grande dia havia chegado e eu estava tão ansiosa que a


ficha parecia nem ter caído ainda.
Era o dia do meu casamento com Romeo Cavalieri.
Depois da cerimônia na igreja, reuniríamos amigos e familiares
em uma grande festa na nossa casa em Palermo. Na mesma cidade
que, algum tempo atrás, sentenciou o nosso fim, agora sentenciaria
o nosso recomeço.
E era somente nisso que eu focava desde que havia decidido
perdoar Romeo com todo o meu coração. No nosso recomeço.
Deixei todas as mágoas e lembranças ruins para trás, guardando
apenas tudo que aconteceu de maravilhoso em nossas vidas.
Não éramos perfeitos, estávamos longe de ser. Mas,
buscávamos todos os dias sermos os melhores naquilo que nos
dispusemos a fazer. Marido e mulher, pai e mãe. E eu poderia
afirmar com convicção que formávamos uma dupla e tanto.
Nossos filhos eram e para sempre seriam a melhor parte de
nós.
Giordana era completamente maluca e apaixonada pelo pai,
como eu. Tanto que, nem fiquei surpresa quando a primeira
palavrinha que disse foi papà. Ao contrário de Romeo, que só faltou
esmagar a nossa ameixinha de tanto que a beijou e a apertou.
Noah era muito apegado a mim, sempre foi. Estávamos juntos
há muitos anos... criamos um vínculo surreal de mãe e filho muito
antes de ele ser meu. No entanto, ele também era apegado ao pai.
Eu podia ver em seus olhinhos castanhos o quanto parecia se sentir
orgulhoso de ser filho de Romeo.
Poderia parecer inacreditável, mas os dois estavam ficando
cada dia mais parecidos.
Não apenas na aparência, como nos trejeitos, na forma de
andar. Em absolutamente tudo. Se a semelhança já se tornava a
cada dia mais surpreendente para nós dois, quem não nos conhecia
poderia jurar de pés juntos que os dois tinham o mesmo sangue.
E eu nem precisava dizer o quanto Romeo ficava bobo com
isso. Ele vivia me dizendo que a sua bambina era a minha cópia, e o
seu bambino era a cópia dele. Chegou até a dizer que o nosso
próximo filho seria uma mistura de nós dois. E eu acreditei, tanto
que, quase pude vê-lo conosco.
Ele, ou ela, já estava no forninho. E o primeiro a perceber
desta vez, foi Romeo. Antes mesmo que eu sentisse os primeiros
sintomas da gravidez, ele já disse que eu estava grávida, que notou
as mudanças em meu corpo, e pela minha libido bastante
aumentada.
Não podia fazer nada se o meu maior desejo da gravidez se
chamava Romeo Cavalieri. Felizmente eu tinha um homem
insaciável e disposto a realizá-lo a qualquer momento.
Ainda não tínhamos definido se firmaríamos residência fixa em
Ouro Preto ou Palermo. No entanto, não deixaria que isso fosse um
entrave para nós, o mais importante era estarmos sempre juntos.
Afinal, não éramos apenas nós dois.
Respirei fundo quando a cerimonialista se aproximou
informando que abririam as portas da igreja. Quando se abriu, a
primeira pessoa que vi foi ele.
O homem da minha vida.
Com um dos braços, ele segurava Giordana com firmeza, e,
com a mão livre, segurava a mãozinha do nosso filho. Noah usava
um smoking cinza-escuro igual ao do pai, e Giordana um vestido
igual ao meu na versão mini.
Deus, como eu os amava!
Eu segurava um buquê de lírios brancos nas mãos e um terço
branco com relicário, onde estavam as fotos do meu pai e da minha
mãe. Eles estavam comigo a todo momento, guiando-me,
protegendo-me, sendo meus anjos. Não apenas eles, como também
Giordana Accorsi Cavalieri, mãe de Romeo.
Olhei de relance para os convidados presentes, e as pessoas
que sempre estiveram ao meu lado também estavam ali: tia Gisele,
Maitê e o marido, os pais de Alícia, e até mesmo Max, que veio
acompanhado pela namorada que era um amor de pessoa. Ele e
Romeo, aos poucos, estavam aprendendo a conviver melhor um
com o outro, felizmente.
Minha amiga, estava no altar, ao lado de Lucca. Eles
testemunhariam a nossa união mais uma vez. Após idas, vindas,
indecisões e resistências, os dois resolveram se dar uma chance e
estavam começando um relacionamento, mas essa é uma outra
história.
Do outro lado, estavam todas as pessoas importantes para
Romeo.
Retomei o caminho na direção dos amores da minha vida,
sorrindo de orelha a orelha enquanto tentava, firmemente, conter o
choro de emoção.
Quando me aproximei o bastante, pude ver o rosto de Romeo
banhado pelas lágrimas ao me encarar de maneira intensa e
profunda, como se estivesse diante de uma obra de arte caríssima.
Era sempre assim, sempre essa devoção.
A partir daquele momento, não me contive mais. Permiti que
as lágrimas que antes brilhavam na borda, despejassem feito
cachoeiras.
Somente Romeo e eu sabíamos o quanto aquele momento era
importante, e o que ele significava para nós dois. Nós já estávamos
juntos há bastante tempo, tínhamos dois filhos, e em breve teríamos
o terceiro — que já estava começando a aparecer em meu ventre
suavemente arredondado —, mas era como se estivéssemos
recomeçando.
Escrevendo um novo ciclo, uma nova história.
Não deixava de ser.
Um mar de pensamentos invadiu a minha mente naqueles
breves segundos em que eu caminhava até eles. Romeo se
aproximou com os nossos filhos, e antes de qualquer coisa, beijei-os
e os abracei fortemente.
Após, a Giordana foi para o colo da tia Gisele, e Noah deu a
mão para o vovô Salvatore.
Fitei a minha tia, que me amava com o carinho de uma mãe, e
vi os seus olhos brilharem. Depois de ter passado por tantos
momentos difíceis, poderia dizer que somente agora ela estava um
pouco melhor e mais recuperada dos baques que teve. Para onde
quer que eu fosse, minha tia iria comigo.
Salvatore e ela tinham construído uma amizade muito bonita.
Romeo jurava que os dois teriam algo a mais, já eu não tinha
tanta certeza. Minha tia ainda carregava muitos traumas do
relacionamento com o Marcos, por mais que permanecesse com os
tratamentos psicológicos. Eu não sabia se, algum dia, ela
conseguiria se abrir para um novo relacionamento.
Senti as mãos grandes de Romeo rodearem a minha cintura, e
seus lábios tocarem a minha testa com delicadeza.
— Bella, mia bella — disse, o tom de voz ainda mais
apaixonado.
Seus dedos resvalaram em meu ventre, como uma forma de
carinho. Romeo estava curtindo cada etapa desta gravidez. Desde a
descoberta, que não foi tão descoberta assim para ele, até os
poucos enjoos que tive, as consultas obstétricas.
Absolutamente tudo.
— Eu amo você, amore — me declarei.
E mais ou menos uma hora depois, o padre encerrou a
cerimônia religiosa com um versículo da bíblia — Coríntios 13:4-7
—, que pareceu ter sido escrito para nós dois. Por tudo que
tínhamos vivido e por tudo que tínhamos nos tornado em nome do
amor.
Do nosso amor.

“O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha.
Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor.
O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade.
Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.”
VENEZA, VÊNETO, ITÁLIA

ROMEO CAVALIERI

Isabela Moraes Cavalieri soltava uns gemidos gostosos


embaixo de mim, enquanto eu estocava naquela boceta quente e
apertada que era a minha perdição. Seus olhos se reviravam de
prazer e ela mordia os lábios.
Estávamos em lua de mel, apenas nós dois, e desde que
havíamos chegado em Veneza, não tínhamos saído do quarto
ainda. E isso já fazia três dias. Passávamos dia e noite nus, minha
mulher estava mais insaciável do que nunca.
A gestação de pouco mais de três meses deixou a sua libido
alta, e o sortudo era eu.
— Você gosta que eu te coma desse jeito? — indaguei,
mexendo-me lentamente enquanto lambia a boca dela para que
parasse de morder os lábios. — Ou prefere com força? — Estoquei
quase até as bolas, em uma metida forte e certeira.
Isabela deu um grito despudorado e arranhou as minhas
costas, como a tigresa que era e que me deixava completamente
maluco e insano a cada dia mais.
— Ah... ai, Romeo! — choramingou.
Fiquei cego pelo prazer, não me contive mais e passei a fodê-
la do jeito que eu sabia que era o seu preferido. Forte, duro,
selvagem. O barulho da minha pélvis batendo com força na dela me
enlouqueceu.
— Gostosa! Você é toda gostosa! Essa boceta, essa boca,
esse rabo!
Mudei-nos de posição, deixando-a por cima. Ela ficou meio
atordoada pela mudança abrupta, mas, quando me encarou, pude
ver em seus olhos o quanto havia adorado ficar no controle.
Isabela passou a subir e descer com rapidez, no seu ritmo.
Suas mãos estavam espalmadas em meu peito enquanto eu tinha a
perfeita visão dos seus seios empinados e firmes, e do rosto corado
e embriagado pelo tesão.
Minhas mãos estavam cravadas na sua cintura com tanta força
que certamente ficariam marcas. Percebi quando o seu orgasmo
estava na borda, Isabela acelerou os movimentos e seus gemidos
ficaram mais altos.
A boceta que ainda seria a minha perdição esmagou o meu
pau e eu a puxei, fazendo-a sentar-se sobre o meu rosto. Eu queria
gozar feito um louco dentro dela, mas, naquele momento, tudo que
eu mais desejava era ter o gosto do seu prazer na minha boca.
Isabela deu um gritinho pela surpresa e pela forma como eu a
peguei com facilidade, e eu aproveitei para surpreendê-la ao
abocanhar a boceta cremosa.
— Ahhhh, Romeo! Que gostoso!
O clitóris inchado foi o meu segundo alvo. Minha esposa
estava tão sensível, que bastou que eu o colocasse entre os dentes
para que explodisse em um orgasmo estratosférico.
Isabela se apoiou na cabeceira da cama enquanto resfolegava
em busca de ar. Coloquei-a deitada sobre o meu corpo, lânguida,
saciada e preguiçosa como sempre ficava pós-orgasmo.
Nós estávamos suados e com as respirações ofegantes.
A boceta dela pingava e estava quente feito forno em brasa.
Pude sentir quando peguei o meu pau e pincelei ali. Ela se remexeu,
ao mesmo tempo em que estava sensível, queria mais.
Posicionei a cabeça na sua entrada e a penetrei lentamente.
— Hum... assim, Romeo. Quero tudo de você, goze dentro de
mim — sussurrou no meu ouvido.
Porra! Eu ainda morreria com essa mulher!
— Safada! Gostosa! — grunhi e meti toda a minha extensão
até o fundo.
Precisei de apenas umas cinco estocadas e encontrei a minha
própria libertação ao gozar dentro dela, como havia me pedido. E
como eu não negava absolutamente nada a minha mulher, a
obedeci.
— Humm... ai — lamuriou aos sussurros.
— Eu amo você, bella! Porra, eu amo você... amo tudo em
você... cada detalhe seu! Sou um filho da puta sortudo por você ser
minha! — me declarei em meio a respiração entrecortada.
— Sim, amore, sua — respondeu.
E dali ela não saiu mais. Isabela dormiu em poucos segundos
agarrada a mim. Eu ainda estava dentro dela, preenchendo-a,
sendo preenchido. Meu coração batia acelerado e forte, enquanto
seus seios esmagavam o meu peito e eu sentia as batidas
tranquilas do seu próprio coração.
O que eu sentia por essa mulher era tão forte, que até mesmo
a palavra amor parecia pequena demais para definir. Era uma coisa
louca, de outro mundo. Como se fosse de outras vidas.
Não tinha explicação.
Massageei suas curvas gostosas enquanto ela ressonava,
preguiçosa. Grávida, Isabela ficava ainda mais linda, o que eu
achava ser impossível, já que era perfeita em todas as suas fases.
Poder acompanhar de perto essa gestação me deixou ainda
mais apaixonado por ela. Por cada mudança em seu corpo, cada
mudança de humor, até mesmo nas vezes em que se irritava
comigo.
Eu estava aproveitando cada segundo, vivendo tudo aquilo
pela primeira vez. E, do jeito que amávamos crianças — e fazer
crianças —, certamente não pararíamos por ali. Não tive a
oportunidade de viver aquilo quando Giordana ainda estava dentro
dela, mas todo aquele remorso, toda aquela culpa havia ido embora.
Tudo que vivemos nos trouxe grandes lições, e que levaríamos
para sempre: o quanto era bom poder amar e ser amado; perdoar e
ser perdoado.
Amor e perdão eram constantes em nossas vidas.
Abracei Isabela e beijei o topo da sua cabeça. Ela era a mulher
responsável pelo homem que eu havia me tornado. Um homem que
não levava mais ódio no coração, nem rancor, nada que não nos
agregasse ou que pudesse contaminar a nossa felicidade.
Com ela, eu aprendi a rir das coisas mais simples, a amar
intensamente, a viver cada dia como se fosse o último. Com ela, eu
realizei todos os meus sonhos, e ainda realizaria muito mais. Porque
os meus sonhos eram seus, e os seus eram meus.
Os dias de lua de mel foram exatamente do jeito que havíamos
planejado, com exceção de que quase não consegui mostrar
Veneza a Isabela, mas, ficamos com a promessa de voltar com os
nossos filhos.
Fiz daqueles dias os melhores e mais felizes das nossas vidas.
Aliás, os segundos melhores e mais felizes, porque os responsáveis
pelos primeiros haviam ficado em Palermo com o meu pai e com a
Gisele.
Nosso bem maior, os frutos do nosso amor. Giordana e Noah.
Isabela Moraes Cavalieri e os nossos filhos eram meus ouros
de mina.
Eram a minha redenção.
Epílogo
PALERMO, SICÍLIA, ITÁLIA

Alguns anos depois...

ISABELA MORAES CAVALIERI

Enquanto eu observava os meus meninos brincando de bola,


percebi que estava ainda mais apaixonada por eles. Em alguns
momentos, eu pensava que chegaria ao ponto de explodir de tanto
amor.
Noah era um garoto adorável e muito inteligente. Estava muito
parecido com Romeo, tanto na aparência, quanto no gênio
impetuoso, protetor e ciumento. Nosso filho mais velho adorava
cuidar dos irmãos. Ele os protegia, dava atenção, carinho e amor.
Meu lindo príncipe.
Paolo era o mais novo deles, até o momento. Seu nome era o
italiano de Paulo, e foi escolhido por Romeo para batizar o nosso
terceiro filho como uma forma de homenagear o meu pai. Nosso
caçula era uma mistura minha e de Romeo. Ele tinha o formato do
rosto do pai, mas os olhos e o tom dos cabelos eram iguais aos
meus. Meu denguinho.
Enquanto os dois se divertiam com Romeo, minha filha estava
ao meu lado, ensaiando uns passinhos de balé.
Giordana era apegadíssima ao pai desde sempre. Era papà
para lá e para cá o tempo inteiro. Foi com ela que eu aprendi a ser
mãe, e a garotinha era a minha cópia fiel, a cada dia ficávamos mais
parecidas e às vezes até eu mesma me surpreendia com tantas
semelhanças. Minha ameixinha.
Senti que estava sendo observada, e meus olhos voaram no
mesmo instante para Romeo, como um ímã. O seu olhar quente e
poderoso atravessou o meu de uma forma que me aqueceu por
dentro. Era sempre assim, e de vez em quando eu me perguntava
se um dia poderia me acostumar a ele.
Eu era a mulher mais feliz do mundo ao seu lado. Estava
extremamente feliz e me sentia realizada por completo.
Quando escolhi o perdão, catei todos os caquinhos da
confiança e os juntei. Hoje não havia mais nem sinal de que um dia
havia se partido. Ela foi totalmente reconstituída pelo amor.
Pelo seu amor por mim.
Nós havíamos nos mudado definitivamente para Palermo há
dois anos, após pensarmos muito, conversarmos muito, e definirmos
que aquela era a melhor escolha. E de fato havia sido. Embora
sentisse falta da minha rotina em Ouro Preto, eu estava amando
viver na Itália.
Assim que chegamos aqui, Romeo fez uma surpresa para mim
ao me presentear com uma filial da galeria que eu e Alícia tínhamos
no Brasil. Enquanto alguns funcionários cuidavam de tudo por lá, eu
e ela cuidávamos de tudo por aqui.
Eu era uma mulher completamente realizada, pessoal e
profissionalmente.
Levantei-me de onde estava sentada com Giordana e caminhei
na direção de Romeo, enquanto ele também caminhava ao meu
encontro.
— Sou louco por você — murmurou, beijando-me com um
selinho.
E eu também era louca por ele.
— E eu te amo, amore mio. Hoje, amanhã e sempre — falei.
— Bella.
A forma como me chamava ainda me arrepiava como se fosse
a primeira vez. E, ali eu tive a resposta para a pergunta que havia
feito anteriormente a mim mesma. A resposta era não. Eu nunca me
acostumaria a ele. Todas as vezes sempre iriam parecer a primeira.
Coisas do amor.

ROMEO CAVALIERI
De acordo com o dicionário, redenção é o ato ou efeito de
redimir ou remir, que significa libertação, reabilitação, reparo,
salvação.
O amor que eu senti por Isabela no instante em que a vi pela
primeira vez foi a minha salvação.
Eu demorei, e por muito pouco não perdi tudo. Entretanto,
aprendi que a vingança não vale a pena, o ódio não vale a pena, o
rancor não vale a pena. Tudo isso só nos corrói, e destrói toda e
qualquer possibilidade de sermos felizes.
Havia acabado de chegar na casa do meu pai para buscar
Giordana. Ele e a Gisele, que resolveram dar uma chance ao que
sentiam um pelo outro há tanto tempo, tinham ido buscar Giordana
no balé enquanto eu voltava de uma rápida viagem da Espanha com
Lucca.
Meu pai e eu, depois de tantos anos, finalmente passamos a
ter uma relação de pai e filho. Ele mudou muito depois que tudo
aconteceu... e até os dias de hoje tentava se redimir de alguma
forma, compensar o tempo que perdeu.
Salvatore Cavalieri era apaixonado pelos netos. Um vovô
babão e que os deixava fazer tudo que tinham vontade. Os meus
filhos eram igualmente apaixonados pelo avô, e também pela avó
Gisele. Quase todos os finais de semana Isabela e eu ficávamos
sozinhos em casa, já que eles vinham para cá com bastante
frequência.
Adentrei pelos portões da casa do meu pai, e ele já aguardava
com Giordana. Notei que ele tentava explicar alguma coisa para ela,
e quando saí do carro ainda pude ouvi-lo pedindo que ela
mantivesse segredo.
Seria muito difícil, a minha ameixinha não segurava a língua.
— Papà! — disse e correu na minha direção.
Seu vestidinho rosa e cheio de brilho estava esvoaçante pela
sua empolgação. Abaixei-me para pegá-la e ela pulou em meus
braços, toda feliz. Era minha grudezinha, cópia da mãe. Giordana
seria a responsável pelos meus cabelos brancos, isso era um fato
incontestável.
— Bambina! — Beijei o seu rostinho e em seguida, levantei-me
novamente para cumprimentar o meu pai.
Trocamos algumas palavras e depois que nos despedimos,
segui para a casa com Giordana, onde Isabela, Noah e Paolo nos
aguardavam.
— Papà, o que é segredo? — perguntou, curiosa como a mãe.
— É uma coisa muito importante que alguém conta para você,
mas você não pode contar para ninguém.
— Hum...
— Por quê? — indaguei.
— Porque a mamãe me contou que tem um bebezinho na
barriga dela e me pediu segredo — disse, e, somente após falar a
última palavra foi que ela se deu conta de que havia me contado. —
Ops... — murmurou e colocou as mãozinhas na boca.
Meu coração bateu forte e acelerado com a novidade, e um
sorriso curvou meus lábios. Eu seria pai novamente... a constatação
me deixou sem palavras, mas extremamente feliz.
Ah, Isabela!
Eu sabia que ela estava me escondendo alguma coisa, a
conhecia como a palma da minha mão. Ela ainda me mataria de
tanto amor... e eu não via a hora de chegar em casa e abraçá-la,
abraçar os nossos filhos e ser preenchido por aquele sentimento
único.
Ouro nenhum, fortuna nenhuma no mundo valia mais do que o
amor que eu sentia por Isabela e pelos nossos filhos.
Eles eram a minha vida e eu os amava com tudo de mim.
Para todo o sempre.

FIM
Em 2022
AURUM
A HISTÓRIA DE LUCCA MASERATI
Agradecimentos
Primeiramente a Deus.
À minha família que tanto amo e que sempre me apoia em
todas as minhas decisões.
Às minhas queridas amigas, Eva Oliveira, Luciana Pezzatto e
Mirian Soares que são meus braços direito e esquerdo e estão
sempre dispostas a me ajudar. Obrigada por existirem, vocês são
maravilhosas.
À minha querida amiga, Lara Chaves, que foi um dos
presentes que ganhei nesse mundo literário incrível.
À minha revisora maravilhosa, Lidiane Mastello, que sempre
trata meus livros com muito carinho e dedicação, e, que fez um
trabalho incrível em tempo recorde. Obrigada por tudo.
Às minhas parceiras, blogueiras e donas de IG’s literários, que
me apoiam, divulgam meus trabalhos e abraçaram essa história
com muito amor. Gratidão.
À todas as leitoras que me acompanham e sempre aguardam
ansiosamente por novas histórias.
Muito obrigada.
Notas da Autora
“Vós, que sofreis, porque amais, amai ainda mais. Morrer de amor é
viver dele.”
Victor Hugo

♦♦♦

NAH CHRISTINE é uma leitora ávida que resolveu se aventurar


pelo mundo prazeroso da escrita.
Se você gosta de romances, te convido a conhecer todas as minhas
histórias e dividir comigo experiências emocionantes. Desejo que
você se apaixone por cada uma delas, tanto quanto eu amei
escrevê-las.

Obrigada por ler o meu livro.

Com carinho,
NAH CHRISTINE
Outras Obras da Autora

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Solidão.
Esse é o maior medo de Catarina de Albuquerque, de viver eternamente na solidão. Uma
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Este livro possui alguns temas sensíveis que podem ativar gatilhos mentais, como
relacionamento abusivo, violência física e psicológica.
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ATENÇÃO: "KALEL - Minha melhor escolha" é um spin-off de "HUNT - Tudo por ela".
Apesar de serem livros distintos, para melhor entendimento da história é importante
ler o primeiro.

Até que ponto as nossas escolhas podem interferir no nosso futuro e mudar as nossas
vidas?
Laurel Mitchell é uma mulher admirável, decidida e forte. Nascida em uma família
tradicional de Chicago, retornará para a sua cidade natal após um período morando em
Sydney, na Austrália, onde concluiu sua formação superior e mestrado em psicologia.
Conhecida por seu imenso coração, ela mudará a vida de muitas crianças e adolescentes
através da profissão que escolheu.
Kalel Barton é um homem que sofreu duras perdas, e após uma grande tragédia que
marcou sua vida, passou a se dedicar completamente ao trabalho, se tornando um
renomado investigador da polícia de Chicago. Conhecido por ser um profissional íntegro e
rigoroso, ele não admite nenhum tipo de injustiça e sempre lutará pelo que acredita.
Eles estão focados em suas carreiras e não pensam em relacionamento sério, mas um
encontro mudará o rumo das suas vidas para sempre, fazendo-os perceber que o presente
é consequência de certas decisões que tomaram no passado.
Laurel e Kalel serão capazes de renunciar àquilo que está enraizado em suas essências?
Para essa pergunta, uma única resposta: o amor sempre será a melhor escolha.

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Este livro possui alguns temas sensíveis que podem ativar gatilhos mentais, como abuso
físico e psicológico.
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Antonella Agostini é uma jovem recém-formada em medicina, que teve a infância e a
adolescência marcada por um pai extremamente hostil. Em contrapartida, recebeu em
dobro o amor da sua mãe e dos seus avós maternos. Um acaso do destino mudará a sua
história para sempre, deixando marcas profundas. No auge da dor, o seu caminho cruzará
com o de Enrico Batistelli, médico e herdeiro do maior hospital da Itália. Ele passou por
uma experiência dolorosa, que o deixou abalado, ferido e vivendo sua vida no automático.
O que acontecerá quando esses dois mundos colidirem? Eles serão capazes de superar
juntos todas as dificuldades, e curar as suas cicatrizes mais lancinantes?
Convido-os a embarcar com Antonella e Enrico nessa aventura cheia de romance. E
preparem-se para viver um amor sublime, inesquecível e de arrancar suspiros. Um amor de
alma.

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2ª Edição - Agosto de 2020


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Agatha é uma jovem grega, feliz e de bem com a vida, que nasceu em uma família cercada
de muito carinho. O seu maior sonho era encontrar um amor tão bonito quanto o de seus
pais, mas ela não imaginava que sofreria uma decepção amorosa que a machucaria ao
ponto de quase a fazer desistir dessa ideia.
Rafael é um jovem brasileiro, que nasceu em uma família muito rica e sem nenhum afeto.
Com o falecimento de seu pai, se tornou sócio e CEO de uma das maiores construtoras do
mundo, com matriz no Brasil. Ele era implacável, não somente nos negócios, mas também
na cama. Na sua visão, o amor era sinônimo de fraqueza.
Dois mundos distantes, mas que estavam mais próximos do que eles mesmo imaginavam.
Bastou apenas um olhar para que as almas de Agatha Zabat e Rafael de Andrade se
reconhecessem.
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Este livro é uma sequência do romance "O olhar da minha alma". Apesar de serem
histórias distintas, para melhor entendimento é importante ler o primeiro.
Recomendado para aqueles que acreditam no encontro e reencontro de almas
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Este e-book contém a história completa (conto "Sedução a bordo" + livro “Depois da
sedução, o amor”).

O paradisíaco litoral espanhol foi palco de estreia da paixão arrebatadora entre Aline Muniz
e Lucas Ferrari. A bordo de um cruzeiro internacional, eles viveram momentos
inesquecíveis que ficariam para sempre gravados em suas memórias.
A viagem chegou ao fim, mas o que sentiram um pelo outro durante todos aqueles dias,
não. No entanto, agora que estão em terra firme, de volta às suas rotinas, eles irão
perceber que as suas diferenças vão muito além da idade.
Aline deseja conquistar o mundo.
Ela é uma jovem tímida e sem muitas experiências amorosas. Nasceu em uma família de
origem humilde e apesar de todas as dificuldades, se formou com méritos em Pedagogia.
Vive uma vida simples no interior de Minas Gerais com os pais e os irmãos, em um lar
cheio de amor.
Lucas possui o mundo aos seus pés.
Ele é um homem experiente, workaholic assumido, tem compulsão não somente por
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herdeiro da maior da maior indústria farmacêutica do Brasil, com sede na capital de São
Paulo.
Alguns obstáculos surgirão pelo caminho e a atração que os uniu será colocada à prova.
Será que o que eles sentem um pelo outro vai ser forte o suficiente para superar as
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No último Natal, Melanie e Ethan estavam com os seus corações despedaçados e sem
esperanças. Mas encontraram no amor que sentiam um pelo outro a força que precisavam
para recomeçar.
Entretanto, o que eles não imaginavam no meio de tudo isso, era que o milagre das suas
vidas estava por vir. E dessa vez, para ficar. Aos poucos, a angústia foi dando espaço para
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Veja o milagre do casal Bryant acontecer e se apaixone por essa história.

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Notas de Rodapé
[1]
FIGLIO DI PUTTANA significa ‘filho da puta’ em italiano.
[2]
PICCOLA significa ‘pequena’ em italiano.
[3]
BACKUPS são cópias de segurança de dados de um dispositivo de armazenamento.
[4]
FELÍCIA é uma personagem de desenho que ama abraçar e apertar coisas fofas.
[5]
PUERTO MADERO é uma zona de docas requalificadas, um ponto turístico de Buenos
Aires.
[6]
HOSTESS é o mesmo que anfitriã/recepcionista.
[7]
LA BAMBINA DEL NONNO significa ‘garotinha do vovô’ em italiano.
[8]
HOSPITAL DE CUSTÓDIA é uma instituição prisional destinada ao cumprimento de
medidas de segurança de internação.

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