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JOSIANE VEIGA
Anjo e Demônio
JOSIANE VEIGA
1ª Edição
2019
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou
transmitida por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou
arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem autorização escrita da autora.
Esta é uma obra de ficção. Os fatos aqui narrados são produto da imaginação. Qualquer
semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real deve ser considerado mera
coincidência.
Título:
Anjo e Demônio
Romance/Drama
ISBN –
9781095544587
Texto Copyright © 2019 por Josiane Biancon da Veiga
Sinopse:
Victor Bianconi era membro de uma máfia que tinha origem na Itália e agora dominava a
Serra Gaúcha. Ele havia sido salvo por aqueles bandidos e devia a eles mais que a vida, toda a
sua lealdade.
Sem princípios morais que pudesse carregá-lo, ele sempre acreditou que cumprir seu papel
de vilão bastaria... Até ela aparecer.
Francine Stein era de uma boa família. E era, igualmente, uma boa pessoa. O tipo de gente
que jamais iria se aproximar de um bandido como Victor.
Mas, o destino provou-se ser mais forte que tudo.
Anjo e Demônio queriam coexistir.
Aquilo seria, definitivamente, o apocalipse.
Sumário
JOSIANE VEIGA
Sumário
Nota da Autora
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Francine
Victor
Lucas
Considerações Finais
LEIA AQUIMAIS LIVROS DA AUTORA
Nota da Autora
Quem me acompanha sabe que eu escolhi 2019 como um ano para escrever comédias românticas
acessíveis e fáceis de ler, sem grande profundidade, mas com alto teor de hot.
Contudo, alguns leitores estão me mandando e-mails pedindo determinados gêneros ou estilos. Então,
esse não é um livro comum a mim, e sim uma resposta aos leitores que o solicitaram.
Primeiramente: o gênero. Dark foi comentado para mim pelo Tom Adamz (acho, se não foi, desculpe), e
eu disse que escreveria. Fui atrás de explicações sobre o tema, mas nada do que vi pode ser pior que os
eventos reais que já narrei em livros anteriores como Kinshi na Karada ou A Insígnia de Claymor. Então,
decidi que será um dark leve, porque, francamente, acho que chega de tanta desgraça nas minhas obras.
O segundo pedido era algo estilo Romeu e Julieta. Pensei em famílias rivais, mas já escrevi isso em
Quem Tem Medo do Lobo Mau?, assim não haveria novidade. Optei então pelas vidas opostas, duas
pessoas completamente diferentes, o que explica o título.
O terceiro pedido era sobre máfia. Eu já escrevi sobre isso, mas decidi criar algo novo, no Brasil. A
família representada na obra não existe e também não sei da existência de nada mafioso no RS, mas decidi
optar por isso. O nome é inspirado no meu sobrenome.
A cidade Esperança é fictícia, usada em várias obras minhas. Vocês vão reconhecê-la se já leram outros
livros meus.
Os protagonistas são jovens respeitando o pedido Romeu e Julieta.
Eu não vou poupar na baixeza porque é dark, então, se você não aguenta o tranco, abandone esse treco
AGORA.
Avisos dados, podem seguir adiante ^.^
Prólogo
O s Vitali eram conhecidos pelo silêncio. Eles entravam em uma casa, faziam o
serviço, e iam embora sem que ninguém houvesse escutado um mísero som de
suas balas.
Mas os sons existiam. Aquele “bam” seco que fazia qualquer vivente se
arrepiar.
Naquela pequena cidade na Serra Gaúcha, onde a lei do silêncio
imperava mais que qualquer outra, o pequeno Victor Conti imaginou que nem
tudo que se dizia era verdade.
Os Vitali faziam barulho.
Com o rosto forçado contra o chão, a pequena criança tentou chamar a
mãe. Mas, a mãe não respondia mais. Não depois de seus gritos de piedade, não
mais depois de vários homens subirem nela e a forçarem com tanta brutalidade
que o sangue escorria de suas pernas e formava uma poça logo abaixo, no
assoalho de madeira encerada.
— A puta morreu? — um dos homens indagou.
— Acho que sim — o outro riu, balançando o corpo já sem vida.
Então, os homens olharam para ele.
Victor tinha oito anos, mas sabia o que o aguardava. Uma vizinha havia
dito, certa vez, que o destino de crianças como ele era cadeia ou cemitério.
A mãe vendia drogas. Às vezes colocava saquinhos de crack por baixo da
sua blusa e o fazia cruzar a cidade para levar a substância a outro lugar.
Era “mula”. Tinha oito anos, não sabia ler, nem escrever, mas era “mula”.
Não que ele culpasse a mãe. Ela mesma só entrou nessa vida porque o
pai, antes de morrer, deixou-lhe uma dívida imensa com drogas. E os Vitali não
perdoavam quem lhes devia.
— A gente mata ou a gente come?
— Eu lá vou comer um moleque? — um dos homens resmungou.
— Eu comeria. Bunda é bunda — deu os ombros. — Mas, dê um tiro na
cabeça dele e vamos embora.
Victor fechou os olhos com força.
Era assim que iria morrer.
Contudo, outro som soou acima dele. Outro tiro, mais seco, denotando
que era de uma 45’, diferente das espingardas doze que os homens dos Vitali
carregavam.
Victor viu, entre as lágrimas, outros homens invadindo o casebre. Um
deles, muito bem vestido, tirou luvas negras das mãos e o observou com atenção.
— É bom que saibam que ninguém invade nosso território — ele avisou
a um dos homens que ainda agonizava no chão.
Mais um tiro. O fim do tormento. Seus olhos então volveram a Victor.
— Tem para onde ir?
Negou. Fechou os olhos. Esperou a morte. Porém, o homem agachou-se
diante dele, e Victor forçou-se a encará-lo.
— Sabe por que eu os matei? — questionou. — Os Vitali não respeitam a
terra dos outros, e ninguém entra no território dos Bianconi.
Victor assentiu, numa concordância forçada. Ele não entendia aquelas
regras e não se importava com elas.
— Você quer ser um Bianconi?
Havia duas saídas. Aceitar ou morrer.
Ele assentiu. Ele aceitaria ser qualquer coisa naquele instante.
— Então se levante — o homem resmungou. — Eu sou Pietro Bianconi.
E você, agora, é um de nós.
Francine
E u não quero parecer uma santinha do pau oco, mas a verdade é que aquele
não era ambiente para mim.
Nunca frequentei festas daquele tipo, em lugares onde o pecado e a
maldade pareciam correr soltos sem qualquer pingo de constrangimento.
Não que eu fosse perfeita. Oh, Deus sabia que eu tinha meus erros, mas
eu ainda não chegara ao ponto de viver como se a libertinagem fosse algo bonito
e acolhedor.
Sabia não ser verdade.
Meu pai era ministro da Igreja Luterana, e metade das pessoas que pedia
aconselhamento eram exatamente aquelas que viviam, quando jovens, como se a
vida fosse uma eterna aurora dos dias.
Não era.
Os anos passavam, os erros pesavam. Meu pai me deu o único conselho
que podia quando eu viajei para Esperança para estudar enfermagem na nova
universidade daquela cidade.
“Siga seus principíos. Não importa o que aconteça, enquanto seguir seus
princípios tudo ficará bem”.
E eu estava ali agora, junto a Vanessa, minha amiga de infância, entrando
naquele bar cheio de pessoas mal encaradas e mulheres bêbadas com roupas
mostrando demais.
— Eu devia ir embora — murmurei.
— Você devia viver! — Vanessa objetou, me puxando até uma mesa.
Não fui criada com restrições e regras absurdas. Eu tinha liberdade de
escolhas. Mas, essas liberdades não me deixavam à vontade para viver como
uma garota que entraria em um bar de má fama.
— Amanhã começa nosso curso. Passaremos os próximos anos
enfurnadas numa sala de aula, estudando muito, para não colocarmos o
investimento de nossos pais no lixo. Então, nessa noite, nessa última noite,
vamos aproveitar — ela disse, alto, por causa da música ensurdecedora,
enquanto se balançava num ritmo de banda.
Eu assenti, apesar da minha cara séria. Realmente não queria passar meu
último dia de liberdade num lugar daqueles.
— Quem sabe você arruma um namorado — ela bateu palmas, como se
aquela ideia fosse excelente.
Honestamente, eu não queria um namorado. Não depois de ter passado
anos da minha vida ao lado de Marcos e acreditado piamente que ele era meu
príncipe encantado.
Bem, essa é a minha história: Marcos Kuhn e eu nos conhecemos na
escola dominical. Ele era filho de um comerciante e eu era filha do pastor.
Ambos tínhamos o mesmo ritmo calmo e sereno de ver as coisas, e o namoro se
tornou apenas o cumprimento de algo que todos percebiam que ia ocorrer.
Ele tentou avançar algumas vezes, mas eu queria casar virgem. Então,
apesar de termos apenas dezoito anos, meu pai marcou a data. Eu estava feliz,
iríamos ter uma casa bonita perto da paróquia e uma vida de sonhos. Era o que
eu queria. Marcos, filhos, serenidade.
Mas, tudo acabou quando eu o flagrei, no último dia de aula, transando
com Ana Viegas, nossa colega, atrás do vestiário feminino.
Naquele instante, eu apenas queria desaparecer. Romper o noivado,
cancelar os preparativos, decidir ir para outra cidade estudar enfermagem, enfim,
tudo fez parte do meu processo de cura pela dor provocada por Marcos.
Vanessa tinha parte importante nisso. Minha melhor amiga. A pessoa que
mais me estendeu a mão. O que era até cômico, porque ela era, sem dúvidas, o
contraponto de mim mesma. Van era ateia, dona de uma personalidade forte,
cresceu sem pai e com a mãe conhecida por vagabunda. Enfim, mesmo assim,
durante as aulas, nós nos aproximamos e firmamos amizade.
Meu pai sempre a tratou com muito carinho, e Vanessa correspondeu à
minha família respeitando a nossa fé. Éramos diferentes, mas o amor que nos
unia era igual.
É claro que nada foi fácil. Marcos não quis acabar com o noivado.
Culpou Ana pelo sexo, disse que ela o seduziu, que mexeu com ele ao ponto de
cegá-lo, pediu que a Igreja o colocasse em disciplina, mas que meu pai me
forçasse a permanecer com ele.
Marcos não conhecia, realmente, meu pai. Pastor João era justo. E
pareceu aliviado por eu ter desistido do noivado.
“Você é muito jovem, Fran” — papai disse, me abraçando. — “Viva um
pouco antes de saber exatamente com quem quer ficar”.
E era ali que eu estava, após isso. Ainda sofrendo, claro. Ainda sentindo
aquela melancólica sensação de que Marcos e eu podíamos dar certo, podíamos
sermos felizes; e, ao mesmo tempo, tendo a certeza que aquilo não aconteceria
porque mulher de caráter jamais perdoaria aquele tipo de traição.
Princípios...
Meus princípios me diziam que eu devia seguir em frente. E era a eles
que eu devia ouvir. Eles falavam algo a mais, também. E era sobre confiança.
Como eu voltaria a confiar em alguém depois do que Marcos fez
comigo?
Nós tínhamos a mesma índole, a mesma fé, o mesmo temperamento... e
mesmo assim ele me traiu. Por que outro homem não faria igual, ou pior?
— Eu não quero um namorado — respondi a Vanessa. —
Definitivamente, não quero compromisso.
Vanessa me olhou com certa pena. Aquilo me incomodou.
— Você realmente precisa se curar, Fran. Viemos aqui para nos divertir,
lembra? Não fique preocupada com mais nada.
— Eu não gosto de bebidas, não gosto desse tipo de música, e esses caras
me olham como se fossem me devorar — objetei. — Como posso me divertir?
— Seu pai não disse para viver um pouco? Olhe — observou ao redor. —
Esses caras são meio feios e parecem um bando de idiotas. Mas, Marcos parecia
o cara perfeito. As aparências enganam, sabia?
Eu assenti. Eu devia estar ali para aliviar o estresse. Mas, ao mesmo
tempo, eu pensei que poderia estar bebendo um cálice de vinho em uma banheira
com água quente.
A Serra era conhecida pelos vinhos maravilhosos e eu ainda não havia
bebido nem sequer um cálice.
Eu cruzei meus braços sobre o peito. Estava cansada.
— Acho melhor eu ir.
— Fran! E se você for e perder a chance de encontrar o cara da sua vida?
— ela indagou como se fosse sério.
— Aqui? — ri.
— Aqui — afirmou. — Em qualquer lugar. Além disso, não precisa ser o
cara da sua vida, apenas alguém que devolva a sua autoconfiança. Ou que faça
sexo gostoso.
— O quê? — Resmunguei, irritada. — Você sabe que eu não sou assim!
— Não há nada de errado em fazer sexo com alguém, sem amarras.
— Para mim sexo tem que vir unido a amor.
— Amor? — ela gargalhou. — Céus, você ainda acredita mesmo que
isso exista.
— Deve existir — apontei. — Em algum lugar. De algum jeito...
— Amor é só fantasia, amiga — ela me consolou.
— Não — fui firme. — Eu sei que um dia vou encontrá-lo. — Peguei
minha bolsa. Aquela conversa estava encerrada e eu queria ir para o apartamento
que dividia com Vanessa. — O amor está em algum lugar, em alguém. Basta que
um dia eu cruze com ele, e eu saberei.
Ao me virar em direção à saída, meus olhos foram capturados pelos dele.
Victor
E u jamais bebia no meu próprio bar. Primeiro porque era lugar de viciados e
prostitutas, depois porque Pietro sempre deixou claro que um Bianconi não devia
se entregar a devassidão de drogas.
E o álcool estava incluso nisso.
Obviamente, eu não bebia muito. Às vezes, depois de um dia cansativo,
eu ia até aquela pequena boate perto da rodovia e pedia uma cerveja. Gostava do
gosto amargo, queimado, gelado, descendo pela minha garganta.
Depois, sempre voltava para casa. Um apartamento em cima do bar que
eu gerenciava.
A vida foi boa para mim. Na infância, eu vi minha mãe, uma drogada
inútil, ser estuprada e morta por uma antiga associação mafiosa que Pietro
destruiu. Depois, o homem se encarregou de ser um pai substituto, me deu
educação, e me colocou para cuidar de um dos muitos pontos de atuação da
família.
Era assim que éramos chamados: família.
Eu não era um Bianconi de sangue. Não me lembrava do meu
sobrenome. Ele não importava. Além disso, eu sempre fui tratado como um
Bianconi, e era isso que me dava orgulho.
Pietro era um pai exigente. Ele nasceu na Itália e veio ao Brasil logo após
a Segunda Guerra. Não foi fácil, de início, o governo perseguia imigrantes.
Mas, ele venceu do nada. E hoje era o maior nome do tráfico do Sul. Eu
o admirava e me orgulhava de ser alguém que ele chamava de filho.
Senti a presença de Marcelo ao meu lado. Ele tinha um sorriso arrogante
no rosto, e parecia estar curtindo a atmosfera do clube. Eu sorri, percebendo
porque ele estava tão alegre. Algumas garotas da cidade já haviam dado sorrisos
em sua direção. Ora, ele era um puta filhinho de papai, cheio da grana, e garotas
normalmente se atraem por isso. Dinheiro e carro. Motos. Boas roupas. Lugares
que ele pode levá-las para viajar.
É claro que elas nem desconfiam que ele é estúpido o bastante para ser
meu cliente. E, nem estou falando do bar.
Isso eu nunca vou entender. Um cara que tem tudo, toda a grana que
precisa, uma família presente, um futuro brilhante, mas prefere frequentar meu
bar todas as noites em busca de um pózinho branco que escondo nos fundos do
estabelecimento.
Ok. Ele é um babaca. Mas, paga suas contas. Nunca ficou me devendo,
nem pediu fiado. Já era alguma coisa. Era o mais próximo que conseguiria
chegar de mim, talvez até chamar de amigo.
— E aí? — ele murmura em minha direção. Eu percebo suas mãos
trêmulas. — Que tal a gente ir lá para o seu bar?
— Estou de folga. — neguei.
— Quebra essa pra mim? — ele pediu, era quase uma súplica.
Eu assenti.
— Depois — resmunguei.
Marcelo vira as costas para a mesa do bar e encara a pista de dança. As
luzes estão fracas, mas o estroboscópio girava numa velocidade alucinada, dando
ainda mais ênfase a quem já estava um pouco mexido pela bebida.
— Carne nova na cidade — ele murmura.
Eu giro na direção que Marcelo observa. Em um dos cantos, percebo
duas garotas. Elas parecem conversar da mesma forma que eu e Marcelo. A
menor não parecia feliz por estar ali. Talvez por isso meu olhar fixou-se nela. De
súbito, se levanta. Ela gira, seu rosto agora nítido pela luz fraca.
Ela é linda...
O cabelo era claro, o corpo bem desenvolvido. Suas coxas eram grossas e
afinavam em direção a barriga. Era meu tipo de mulher, e fazia alguns meses que
eu não tinha uma.
Foi tão intenso e instantâneo. Eu a quis no momento que a vi.
Ela começou a andar. Apesar de perceber que ela me notou, a garota
desviou o olhar, incomodada. Eu não estava flertando, mas algo em mim pareceu
desnorteá-la.
Parecia uma daquelas moças ingênuas do interior e talvez eu a tenha
assustado porque era cheio de tatuagens e tinha o rosto sério e marcado pelos
anos de uma vida difícil.
Foda-se isso. Ela é linda e eu a quero. E vou tê-la. Nessa noite. Na minha
cama. Na minha vida.
Ela se aproximou da porta. Ali, a luz clara me deixa perceber a cor dos
seus olhos. Verdes. Eles se fixam nos meus novamente, por alguns instantes, e
então ela os desviou. Percebo um leve rubor em suas bochechas.
Culpa, talvez?
Ela é fofa. Daquele jeito que desperta qualquer homem.
E tem uma boca carnuda, suculenta, que me faz desejar beijá-la. Eu
adoraria ver aqueles lábios em volta do meu pau.
Eu sufoco um gemido quando meu pau endurece em minhas calças. Ele
parecia implorar para que eu o enterrasse em uma boceta quente.
E a dela parecia isso.
Claro, igualmente ela demonstrava ser uma boa menina, alguém que eu
jamais colocaria como alvo. Mas, subitamente, aquela diferença de parâmetros
pareceu aumentar o meu fogo de caçador.
A maioria das garotas que eu conhecia que fazia aquele jogo de “boa
moça”, na verdade só estava à espera de um bad boy para “libertá-la”. Eu
costumava tê-las chupando meu pau em poucos dias.
De repente, sua mão na maçaneta da porta. Ela iria sair, e eu –
possivelmente – perderia minha chance.
Então, deixei Marcelo falando sozinho e avancei em sua direção.
Estava ansioso por aquele jogo.
Francine
N ada bom.
Eu sabia que aquilo era um perigo assim que meus olhos focaram-se naquele
rapaz.
Ele vinha caminhando em minha direção, e ao invés de eu desaparecer
pela porta, travei e o aguardei. Não sei dizer por quê. Eu devia estar louca...
O rapaz era alto. Tinha descendência italiana, logo reparei, pelos cabelos
escuros e a pele pálida. Ele era bonito, literalmente de tirar o fôlego. Eu
estremeci quando notei as tatuagens nos braços que pareciam escapar pela
camisa e chegar até o pescoço.
Era exatamente o estereótipo de pessoa que eu me afastava. Contudo, seu
olhar escuro me prendeu como um apelo de oportunidade. Eu queria me mexer.
Sumir. Desaparecer. Mas, eu só conseguia ficar parada.
Precisei ser forte. Aquele não era meu lugar, e aquele homem não era
meu tipo. Você não se envolve com gente ímpia, do mundo. O primeiro salmo
surgiu na minha mente. “Não se assente na roda dos escarnecedores”.
Ele era um escarnecedor. Obviamente. Um homem do mundo. Sua
aparência deixava isso claro. A forma como andava, a maneira como seu olhar
desviava para as bundas das mulheres que cruzavam por ele, enfim, tudo
demonstrou que aquele não era alguém para mim.
Respirei fundo. Olhei em volta, procurando Vanessa. A vi batendo papo
com um cara empolgado demais com a música. Volvi meu olhar para o rapaz que
se aproximava.
Lembrei-me nos gatos quando estão caçando. Soube que eu era uma
presa para aquele felino.
Tentei afastar aqueles pensamentos. Eu nunca fui a mais bela das
mulheres e havia outras naquele ambiente que estariam dispostas a flertar com
aquele cara.
Bem... Na verdade eu não sabia se ele estava flertando. Eu só tive um
namorado e nosso namoro foi dentro dos parâmetros cristãos.
“Ele está flertando, Fran!”, uma voz surgiu na minha mente.
Era óbvio. Ele me observava como se me devorasse. Eu devia me sentir
bem com aquilo, porque era admirada, e nem pensava que aquilo seria possível
depois do que Marcos fez. Mas, havia um temor que subjugava qualquer outro
sentimento.
Não era exatamente uma paquera. Era como se ele estivesse marcando
território. Havia uma atmosfera de posse. Ele estava retomando algo que era seu.
Eu.
E nada poderia impedi-lo.
Meu coração bateu com força diante dos pensamentos. Fiquei nervosa.
Preciso fugir...
— Oi — enfim ele se aproximou o suficiente para um cumprimento.
Suas mãos nos bolsos deixavam sua postura ainda mais provocadora.
— Olá — eu respondo, meus olhos buscando os dele, desviando e
retornando, demonstrando o quanto eu estava nervosa.
— Você já está indo? — ele indagou.
SIM! ESTOU INDO! ATÉ NUNCA MAIS!
— Eu... — minha respiração ficou presa na minha garganta.
— Se importa de eu pagar uma cerveja antes de ir? — questionou.
Seu tom era amigável. Ele quase podia me enganar. Todavia, seu tom era
igualmente profundo, sexy, e arrepiava minha pele, deixando claro uma
necessidade latente que eu mal conseguia aguentar.
— Eu... não sei...
Céus, como eu estava desconsertada. Nunca fiz o tipo tímida, afinal eu
ajudava meu pai nos cultos desde a infância. Era filha única e minha mãe havia
falecido quando eu era pequena. Assim, aprendi a me virar desde cedo.
— Eu sou Victor — ele se apresentou, percebendo meu estado.
Era um nome bonito.
— Prazer em conhecê-lo, Victor.
— Oi, eu sou Vanessa — o som da voz da minha amiga surgiu entre nós.
Claramente, meu anjo da guarda. Percebeu a atmosfera e se aproximou,
meu resgate gentil.
— Olá Vanessa — ele sorriu na direção dela e estendeu a mão.
Mas, meu anjo não parecia preparado para me afastar dali. Van me
encarou e depois me apresentou.
— Minha amiga que não consegue articular uma frase se chama
Francine.
Enrubesci. Respirei fundo, e estendi minha mão para ele.
— Desculpe — murmurei. — Não sou acostumada a sair — admiti.
Percebi seu olhar surpreso. Depois, ele aceitou meu cumprimento. Senti
uma descarga elétrica cruzando entre nós.
Eu paralisei.
De alguma maneira, você sabe quando encontrou sua perdição. Naquele
exato momento, sentindo as reações que o toque simples de Victor me provocou,
percebi que sucumbiria àquele pecado.
Eu precisava me afastar, mas não conseguia. Estava paralisada.
— Prazer em conhecê-la, Francine — sua voz profunda e gutural
intensificou-se na mesma medida que o aperto na minha mão, como se ele
quisesse dizer algo com aquele toque.
— Prazer — murmuro.
Preciso dizer que devo ir. Quero fugir. Não consigo. Seus olhos queimam
como brasa sobre mim.
— Bom, já fui cupido o suficiente — Vanessa diz alto, a música parece
atiçar algo desavergonhado nela. — Não nasci para vela — brinca. — Tchau
crianças — e ela vai em direção à pista de dança.
Fiquei lívida de vergonha. Contudo, antes que eu pudesse me opor, ela já
havia sumido e me deixado sozinha com aquele homem.
— E então? Aceita a cerveja?
Eu odiei a maneira como ele me fazia sentir. Sei que perdi meu próprio
controle quando me vi assentindo e o seguindo até uma mesa.
Victor foi buscar duas canecas enquanto eu respiro fundo, tentando
colocar meus pensamentos em ordem.
Ele retorna. Senta-se na minha frente e sorri. Não nego que a maneira
gentil como ele me encarou depois de me perceber tão nervosa me surpreendeu.
Ele tinha cara de mau. Mas, foi extremamente cavalheiro.
— Então, Francine...
— Fran — o corrijo. Nunca me agradou meu nome completo.
— Certo, Fran... — Victor me dá um sorriso juvenil que faz minha voz
interna gritar para eu fugir antes que seja tarde demais. — Você parece bem
deslocada nesse lugar.
— Eu não sou boa em ambientes assim.
— Nunca a vi na cidade — ele prosseguiu. — Veio por causa da nova
universidade?
— Sim.
— Vai cursar o quê?
— Enfermagem.
Ele arqueou as sobrancelhas.
— Combina com você. Parece uma boa garota, disposta a ajudar os
outros.
— Eu... — gaguejei. — Eu sempre fiz trabalho voluntário.
— É mesmo?
— Eu ajudava a cuidar de idosos no asilo da cidade que eu cresci. Meu
pai dirige a Igreja de lá.
Ele pareceu impressionado.
— Você sabe, só existe uma regra para homens como eu: Sempre
respeitar uma jovem cristã.
Fiquei curiosa.
— Como assim?
— Bom, claramente eu não sou um exemplo de bom moço — ele
estendeu as mãos, e eu percebi que se referia as tatuagens. — Mas, meu pai
sempre diz que Deus existe e que devemos respeitá-lo e aos seus servos. E eu
sou bom nisso. Nunca me meti com gente que serve a Deus. E sempre respeitei
as mulheres.
De fato, eu não me sentia intimidada na presença dele depois que passou
a conversar.
— Eu sou bom em outras coisas também — ele sussurrou tão baixo que
quase não ouvi.
Dou um gole no chopp. A cerveja está ótima. Percebo que ele não tocou
na sua caneca.
— Não vai beber?
— Já bebi uma garrafa antes — comentou. — Meu pai não gosta que
abusamos do álcool.
Segunda referência paterna. Percebi que o pai era importante para ele.
— Seu pai mora aqui na cidade? — pergunto.
— Não, ele está sempre viajando, mas tem residência fixa em Porto
Alegre. Eu fico na cidade pra cuidar do bar dele.
— Esse bar?
— Não. Meu bar é mais modesto. Fica no outro lado da cidade. Um lugar
simples para o pessoal tomar uns tragos após o trabalho na fábrica de fumo.
Eu balanço a cabeça, compreendendo.
— Estranho ser uma cidade de plantação de fumo, não? A região seria
ótima para uvas.
— As maiores plantações de tabaco ficam lá pelas bandas de São
Lourenço do Sul. Nem sei porque Esperança entrou nessa também. Enfim, a
fábrica é quem mais emprega as pessoas na região.
— Ouvi comentários que a antiga gerente hoje é casada com um cantor.
— Miguel Lins — ele confirmou. — O que é a vida, não é? Eu a via no
mercado, às vezes.
Aquela conversa estava tão animada e amigável que percebi que entrei
em total relaxamento. Céus, tudo que ele me mostrava através da sua aparência
era o quanto ameaçador era. Mas, conversando, senti que ele tinha uma faceta
cortês.
Então, veio novamente aquele olhar... Aquele olhar que me fazia perder o
chão.
Algo no meu íntimo gritou. Um desejo cruel, nunca experimentado.
Fiquei nervosa e me movimentei na cadeira, tentando impedir as batidas
frenéticas do meu coração.
É isso aí. Eu tenho que fugir.
— Desculpe, tenho que ir! — Me ergui, buscando a bolsa, não dando a
ele uma chance de recusar.
Movimentei-me rápido em direção à porta. Saí. Livre. Enfim, um suspiro
escapou da minha garganta.
Eu não pensei em Vanessa e que estava deixando-a sozinha. Eu só
precisava escapar. De alguma maneira, eu sabia que ele era uma tentação.
— Ei — a voz dele surgiu atrás de mim.
Meus joelhos ficaram fracos.
— Eu fiz algo que te incomodou? — ele questionou.
Eu o encaro por alguns segundos. Ele sabe. Ele percebe o calor que
emana entre nós.
Aquilo não era certo. Porque esse tipo de desejo não era certo. Amor era
algo calmo e conquistado aos poucos, não uma coisa tão arrebatadora que trazia
medo e urgência.
Tentei correr. Aproximei-me do estacionamento onde meu pequeno
básico me aguardava. De súbito, a mão dele no meu braço. Aquele calor
desesperado.
Logo, ele me girou na direção dele e senti seu corpo, duro como pedra,
me prensando contra o gelado do veículo.
— Que tipo de bruxa você é? — Sua voz era suave, não ameaçadora.
Sua respiração quente fez meus mamilos endurecerem. Meu núcleo ficou
encharcado e meu centro feminino se apertou, pulsando, pela primeira vez na
minha vida.
Isso é bom. Mas, igualmente, horrível.
Eu o quero. Eu sei. Cada centímetro do meu corpo anseia por ele.
Mas eu não sou esse tipo de mulher. Eu sou uma pessoa correta. Uma
pessoa correta não se deixa ficar agarrada em um homem que acabou de
conhecer.
Meus princípios contra meu corpo pegando fogo. Meu vestido parecia
estar subindo pelas minhas coxas, num convite que eu jamais me atreveria a
fazer, mesmo em pensamento.
— Eu não entendo você — murmurei, em defesa.
— Eu acho que você entende — contrapôs.
Victor se aproximou mais, como se estivesse prestes a me beijar. Se seus
lábios tocassem os meus, eu sei que aquilo seria meu fim.
Eu pensei no meu pai. Na decepção que ele teria em me ver assim.
— Me solta agora ou eu vou gritar.
Eu não sei de onde tirei coragem e energia para ser tão séria naquela
ameaça.
Victor me soltou, como se fosse doloroso para ele fazer aquilo.
Talvez ele quisesse dizer algo. Mas, simplesmente se calou enquanto eu
entrava no veículo e ia embora.
Que Deus me ajudasse. Que nunca mais eu o visse.
Victor
Q uando retornei ao bar, percebo Marcelo, único cliente daquele final de tarde,
sentado perto da janela, as mãos tremendo denotando ansiedade, a me aguardar.
— Cara, preciso comprar... — ele murmura, e eu aceno, chamando-o
para o interior do bar.
Ele me entrega uma nota de cem reais e eu lhe passo um papelote de uma
das melhores cocaínas produzidas no Brasil. Pietro insistia pela qualidade, e nós
cobrávamos caro pelo produto bem preparado.
Deixo-o numa sala vazia, com um sofá confortável, onde ele pode
consumir com privacidade.
Enquanto o percebia sentar no sofá, imaginei o que aconteceria caso um
dia um dos clientes tivesse uma overdose. Já aconteceu um caso assim, num bar
próximo de Tenente Portela, e um dos meus irmãos – Augusto – que cuidava do
estabelecimento, teve que jogar o corpo no Rio Uruguai. Esperança não tinha
rios, e eu teria que dar outro jeito de me desfazer de um provável cadáver.
Aquilo sempre me deixava preocupado.
— Qualquer coisa, chama — disse a Marcelo, que mal parecia me ouvir,
centrado nas drogas.
Voltei ao bar e comecei a limpar algumas mesas. Dali a poucas horas
chegariam os trabalhadores da fábrica de tabaco. O pessoal gostava de tomar
uma cerveja antes de ir para casa. O tempo quente contribuía para os negócios.
Depois de tudo organizado, voltei para trás do balcão e arrumei um café
forte, para me preparar para a noite. Naquele instante, a imagem de Fran
enrubescida pelo meu beijo me tocou.
Céus, que mulher era aquela? Tão pudida, por que mexia tanto comigo?
Em tempos outrora eu já teria desistido. Você não demora muito atrás de
uma caça, quando outras estão tão à disposição. Mas, de repente, todas as outras
perderam a importância. Eu só conseguia pensar nela, em tê-la, em avassalá-la...
É claro que ela estava lutando contra nosso desejo. Não me importava.
Poderia continuar me rejeitando e me afastando porque eu sabia que era questão
de tempo. Ela me quer e eu a quero. É inevitável, vai acontecer.
Se estivéssemos sozinhos no seu pequeno apartamento, talvez eu
conseguisse convencê-la a entregar-se a mim. Mas a presença de Vanessa coibiu
minhas intenções. Eu queria quebrar seus muros, mas quando tivesse tempo para
fazê-lo. Com Vanessa ali, eu não poderia desfrutar como desejava de cada
pedaço de Fran.
— Está atrasado, Lucas — eu murmuro em direção a um garoto de
dezoito anos que entra no bar e me encara com olhos abatidos.
O rapaz foi tirado de grupo de drogados por Pietro, quando tinha doze
anos. Pietro não costumava ter muita piedade de consumidores, mas o histórico
do rapaz lhe despertou bondade. Lucas foi abandonado pelo pai e perdeu a mãe
num acidente. Não tinha família e a nova madrasta não o queria em casa. Passou
a consumir álcool porque fazia muito frio no inverno, e as drogas eram apenas
para tentar afugentar a fome e a solidão.
Depois de saber porque o rapaz estava nas ruas, Pietro o levou para sua
casa, lhe acolheu e educou. Fazia poucos dias que havia o enviado a Esperança,
para treinar comigo. Pietro queria que Lucas soubesse como cuidar de um bar.
Lucas não era o primeiro garoto que eu recebia para treinamento. Eu era
bom em ensinar. Talvez se tivesse a chance de outra vida, teria sido professor.
— Não chegue mais atrasado — ralhei. — A família não tolera atrasos.
— Faltou água no meu prédio e eu precisava tomar banho — se explicou.
Lucas podia ir morar comigo, mas Pietro queria que ele soubesse ser
independente. Então, estava morando em um pequeno apartamento do outro lado
da pequena cidade.
— Dê seu jeito — indiquei. — Nunca mais se atrase.
O garoto assentiu, buscando o avental.
— Tem algum cliente na sala de recreação? — ele indagou.
— Marcelo — indico, servindo meu café.
— Aquele cara nunca cansa? É todo dia.
— É assim quando você não manda no seu próprio corpo. Nunca deixe
que nada seja maior que sua escolha própria — avisei.
Percebi outro aceno com a fronte.
— Você está bem? — ele perguntou, depois de um silêncio curto.
— Como assim, bem?
— Você parece feliz. E você nunca parece feliz, irmão.
Eu quero rir daquela frase, mas tento manter a concentração. Eu sou o
mentor de Lucas, é importante que eu mantenha uma postura rígida diante dele.
— Conheci uma garota — contei, apesar de tudo.
— Nossa, isso é raro — percebo a ironia.
— Não como as outras — afirmo, tentando deixar claro meus motivos.
Exato, Fran não era em nada como as outras...
A porta abre e um homem velho entra. Eu já o conheço. Peço para Lucas
ir lhe atender. Vou secar alguns copos enquanto visualizo o atendimento por um
enorme espelho posto atrás das garrafas caras de uísque.
Lucas é bom. É simpático. Vai ser um grande comerciante.
Desvio meu olhar, e o pensamento volta a centralizar-se em Francine.
A lembrança do rubor da sua pele me pega de assalto. Eu não esperava
que ela pudesse mexer tanto com meu mundo. Minhas fantasias se constroem
diante dos meus olhos. Meus lábios pressionando os dela, deslizando pelo seu
pescoço, um beijo gentil na sua clavícula.
Mais...
Minha boca indo aos seus seios. Eu quase me vejo deslizando a língua
pelo seu mamilo enquanto ela se contorce embaixo de mim.
Outro barulho na porta. Meus olhos se encontram com os de Afonso. Ele
está aposentado e vem aqui o tempo todo. Sorrio imaginando se a esposa dele
gosta dessas saídas.
— Olá Victor. Lucas, como está? Traga-me uma cerveja.
Lucas cumpre o pedido, enquanto eu permaneço atrás do balção,
ajeitando alguns copos.
— E como vai à senhora Tânia — indago a Afonso. Cordialidade é algo
importante.
— Melhorou um pouco do reumatismo.
— E os netos? Carolina e Henrique, não é?
— Isso. Foram para Caxias do Sul. As férias terminaram. Vou sentir falta
das crianças correndo pela casa.
Outro breve silêncio. Silêncios curtos fazem parte da minha rotina.
— Você parece animado — Afonso aponta.
Percebo Lucas rindo e o outro cliente me encarando, curioso. Fofocas são
sempre bem aproveitadas em Esperança.
— Animado? — indago, dando os ombros. — Só torcendo para o verão
acabar logo. Esse calor está de matar.
— Sei... — Afonso ri, indicando que não acredita.
— Ora essa — finjo braveza. — Não posso estar animado?
— Com esse calor de renguear cusco?
— Renguear cusco no verão? — brinco com o ditado sulista.
Normalmente é usado no inverno para informar frio extremo.
— Ninguém se anima assim se não for por mulher — Afonso permanece
firme no seu pensamento.
— É mulher sim — Lucas me entrega e eu apenas dou uma risada falha.
— É uma das filhas da costureira Marlene? Sei que ambas as garotas tem
uma queda por você.
— Não... Não é nenhuma delas.
Todo mundo se conhecia naquela cidade, então soube que meu segredo
não ficaria a salvo por muito tempo.
— Uma estudante que chegou para o novo curso de enfermagem —
expliquei.
Afonso dá um sorriso, enquanto Lucas parece se interessar por outra
coisa.
— E como ela é na cama? — dispara meu irmão mais novo.
O sorriso desaparece da minha face. Não porque eu ainda não a tive, mas
porque não queria que nenhum dos caras pensasse em Francine assim.
— Ela não é esse tipo de garota — advirto.
Afonso ri e se inclina para trás em seu assento. Lucas me encara como se
não acreditasse. Sexo sempre foi um jogo de poder para os Bianconi. Pietro diz
que homens precisam fazer com regularidade para não ficarem afoitos ou se
apaixonarem. Dessa forma, sempre tem garotas bonitas perambulando pela
grande casa, dispostas a servir seus filhos.
— Ela é tipo uma mocinha de família?
— O pai dela é pastor luterano — conto.
Nem sei porque disse isso. Pareceu cravar nossas diferenças de forma
estrondosa. Estava ali, eu, tatuado, traficante, má influência, contrastando com a
doce e gentil filha do pastor.
Sim, ela é boa demais para mim, mas boas garotas amam garotos maus. É
assim em filmes. Em romances. Seria na vida real?
— Qual é o nome dela? — Afonso pergunta, me trazendo de volta ao
presente.
— Francine.
— Tinha uma BBB com esse nome, não?
— BBB?
— Aquele programa de TV. Big Brother — Lucas explica.
Eu não assisto televisão, e não sei de nada disso.
— Ela prefere que a chamem de Fran — murmuro.
De repente, a porta se abre novamente. Meus olhos se chocam com
Gabriel, e eu me assusto porque não esperava vê-lo, já que Antônio havia
fechado a contabilidade do mês.
Gabriel e eu crescemos juntos, mas eu jamais o chamei de irmão. Ele é
alto e bonito como Marcelo, tem um rosto sereno e agradável, mas esconde um
temperamento cruel e implacável.
Nós nunca nos demos bem, e Pietro sempre nos deixou separados para
evitar brigas. Gabriel era ruim com animais, e eu já havia me atracado em socos
com ele por causa de uma cachorra grávida que cuidava da casa de Pietro,
quando éramos menores.
Enfim, eu não gostava dele. E, com certeza, ele nutria o mesmo
sentimento por mim. Talvez me visse como uma ameaça à afeição de nosso pai,
mas definitivamente eu não sabia exatamente o que havia entre nós que causava
tanto mal estar.
— Gabriel! — Lucas o cumprimenta enquanto ele caminha em nossa
direção. — Tudo bem, irmão?
Gabriel o encara de forma séria. Não responde o cumprimento, e sei que
Lucas fica desajeitado diante disso.
— Escritório — Gabriel diz, indicando que quer privacidade.
Respiro fundo e o sigo. Lucas fica indeciso se vai conosco, mas eu pisco,
tentando deixá-lo menos tenso. "Deixe comigo", é a mensagem que tento lhe
transmitir.
— Algum problema? — eu entro no escritório, atrás de Gabriel.
Fecho a porta.
— Antônio esqueceu alguns papéis e, como está ocupado, Pietro me
pediu para buscá-los.
Ele observa o escritório, como se houvesse algo interessante nas paredes
bege feio. Enquanto isso, eu rumo em direção à mesa. Percebo um maço de
papeis amarelados em uma das gavetas.
Porra, Antônio, assim tu me fode!
— Como você faz para sempre ter lucro? — Gabriel questiona.
Eu tento manter a neutralidade na voz.
— Está com problemas? — questiono. — Pietro mandou você para a
lanchonete de uma universidade. Lá é venda certa.
— Estudantes gostam de atrasar as contas — ele murmurou. — E eu
tenho que ter cuidado porque a maioria tem papai importante. Não é fácil dar
sumiço em inadimplentes.
— Nenhum pai é mais importante que o nosso — aponto.
— Nenhum — ele confirmou —, irmão — completou depois de um
tempo.
Senti um arrepio na espinha, mas despistei.
— Aqui estão os papéis. Pode conferir tudo com privacidade. Vou voltar
ao bar. Quando terminar, venha tomar uma cerveja.
Eu saí do escritório sentindo o peso do olhar de Gabriel nas minhas
costas.
No bar, Afonso parece ansioso pelo meu retorno.
— Então?
— Então? — pergunto, não entendo sua colocação.
— A garota, Fran? Como ela é?
A sensação de aperto no meu peito diminui e um sorriso se encaixa nos
meus lábios.
De repente, ignorar a presença de Gabriel ficou fácil.
— Conheci-a no clube na outra noite. E, bem, encontrei-a novamente
hoje. E, vamos à bomba? A garota é minha vizinha. — Eu não consigo evitar
minha alegria. Meu sorriso se alarga. — E ela é perfeita. Não sei explicar como,
mas é.
Eles riem.
— Nunca o vi animado assim por uma mulher — Afonso aponta.
— Eu sei que somos bem diferentes, mas... Eu sinto uma ligação com
ela.
— Diferentes? — Gabriel retorna, papéis embaixo do braço. Ele foi
rápido.
— Victor está interessado numa garota que é filha de um pastor — Lucas
conta, e eu não gosto disso.
— Filha de pastor? — ele parece desprezar. — Bem o tipo de gente que
nós não nos aproximamos, irmão — Gabriel me encara. — Mas, o que posso
dizer? Acho que vai conseguir a vadia. Sabem como dizem: toda santinha gosta
de um diabão.
Há risos no fundo, mas eu estou com o estômago apertado.
— Ela não é uma vadia — eu devolvo.
— Se você diz — ele dá os ombros e levanta as mãos em sinal de
rendição.
Seus olhos estão indecifráveis. Eu começo a me irritar. Gabriel e eu num
mesmo espaço nunca foi coisa boa.
— Irmão, a garota é nossa vizinha — Lucas conta, animado. Não sei
porque diabos, o moleque quer a simpatia de Gabriel.
As sobrancelhas de Gabriel se levantam e um sorriso torto cresce em seu
rosto. Eu não gosto disso. Meu estômago afunda.
— Papai sempre gostou de ter mulheres por perto. Você puxou à ele,
nisso.
Mas ela não era como as mulheres de papai. Meu primeiro pensamento é
deixar bem claro que quero que ele fique longe dela, mas não posso dizer isso.
Conhecendo-o, ele iria atrás dela apenas para me irritar, para foder comigo. Ele
machucaria Fran, tinha certeza.
— Pois é, eu puxei a papai.
Gabriel solta uma risada sem humor.
— Bem, irmãozinho... Quando se cansar, quem sabe ela terá lugar na
grande casa, hem?
Lucas ficou pálido atrás de Gabriel. Ele percebeu que fora longe demais,
falara demais, e mantinha os olhos no chão, provavelmente preocupado com a
minha reação depois de Gabriel partir.
— Se papai me tirar da universidade, passarei a buscar as papeladas de
Antônio — ele me contou, mudando de assunto e se aproximando da mesa. —
Acho que iremos nos vermos mais, irmão.
Depois disso, partiu. A lacuna de sua presença permaneceu, mesmo que
ele tenha sumido do local.
Francine
Ele é o estereótipo do “bad boy”. Até a maneira como ele mastiga um chiclete
denota isso. E, por algum motivo, aquilo me atrai tão profundamente que sinto
meu coração acelerar e minha mente nublar.
Fugir... Eu preciso fugir...
— Olá — respondo. — Como está?
Minha voz soa fria, apesar do calor que emana do meu corpo. Eu preciso
me mudar. Assim que encerrar o contrato irei para longe. Aquele homem é
perigoso. Ele representa meus demônios internos atiçados contra mim.
— Bem. Está afim de uma cerveja gelada? — ele indaga.
— Não, obrigada.
— Está um calor dos diabos. Vamos lá! Você parece tensa.
— Não! — sou mais dura, categórica.
Inferno! Victor entende o que provoca em mim? Ele me desespera!
— Por que você é sempre tão defensiva comigo? Nunca parece amistosa,
faz questão de colocar uma carranca e me tratar mal.
Eu fiquei surpresa pelas palavras. Definitivamente, eu não esperava por
elas.
— É por causa das tatuagens? — ele insistiu.
— O quê?
— Você julga as pessoas pela aparência?
Eu não faço isso!
Eu faço isso...
É exatamente o que eu estou fazendo com ele.
Mas, existe algo além das tatuagens. O cheiro dele me traz lembranças de
algo que não vivi. Sua voz parece tocar minha alma. Sua presença me
desestabiliza.
— Eu não... — tento articular algo, mas estou tão nervosa que mal
consigo processar os pensamentos.
— E, apesar de tudo isso, tudo que eu consigo pensar é em beijá-la — ele
devolve, me deixando boquiaberta.
Ele é muito direto no que quer. É meu oposto, porque eu tento de todas as
formas fugir dos meus desejos.
— Eu preciso tomar um banho — digo, nem sei porque, tentando volver
em direção ao prédio.
A sobrancelha direita de Victor se ergue.
— Coincidência, também estou indo para casa — ele sorri.
Aparentemente, me provocar é fácil.
Tento afastar meus pensamentos. Ele está apenas sendo legal, gentil, ao
me acompanhar até o apartamento.
Apesar do que diz e do beijo que trocamos, ele não parece disposto a se
impor sobre mim. Eu sinto uma leve folga nos ombros e percebo que ele pegou
minha bolsa. Encaro-o.
— Você parece tensa e seus ombros parecem doloridos — ele murmura.
É verdade. Ele está sendo um cavalheiro em levar minha mochila para
dentro.
— Obrigada. Contudo, não precisa se incomodar. São apenas alguns
passos.
— Eu não preciso, mas eu quero.
Eu não consigo evitar um sorriso. Victor arregala os olhos.
— Meu Deus, ela sorri — ele debocha.
— Ei! — finjo estar brava. — Eu tenho um ótimo humor.
— Não comigo — devolve.
Está certo.
— Porque eu acho que você é perigoso — fui extremamente franca. —
Ainda mais para alguém sem experiência de vida como eu.
Seus olhos se obscurecem. Agora ele sabe meus motivos e talvez isso
faça com que me deixe em paz.
— Eu nunca te machucaria — ele não nega minha informação, mas me
diz algo que sinto ser verdade.
— Não mesmo?
— Eu nunca te machucaria — ele repetiu, dessa vez mais firme, senti sua
força no tom das palavras.
— E por que eu? — insisti. — Eu vi como as outras garotas olhavam
para você naquele bar. Com certeza você já teve um monte de mulheres e
imagino que diga o mesmo para todas. Fazem-nas sentir que são especiais, que
são escolhidas, mas depois as deixa...
— É como você me imagina.
— Sim. Eu penso que é esse tipo de cara. Bonito, pinta de mau... você
atrai as pessoas facilmente.
— Mas, não sou um monstro com as garotas — ele devolveu. – Não com
as que quero, ao menos. Eu sou mais do tipo que deixa claro que estou no jogo
apenas por uma noite. Você tem razão em achar que já tive várias mulheres, é
verdade. Mas, nunca um relacionamento, porque nunca estive disposto a ser de
uma única mulher.
Ele insinua que quer ser meu?
— Isso tudo é por que eu sou a primeira que luto para rejeitá-lo? —
questiono.
Estávamos sendo extremamente francos ali, e eu queria saber tudo.
— É verdade que você é a primeira que me rejeitou, mas não é por isso
que estou insistindo em você. Você não sente isso?
— Sentir?
— Como se a gente tivesse se reencontrado depois de muito tempo.
Eu não sei porque, mas eu queria chorar.
— Isso está errado — insisto.
Dois passos na minha direção. Estou travada. Sinto o calor que emana do
seu corpo. Sua respiração contra minha face.
— Você sente isso, não sente?
Meu clitóris pulsava enquanto meu corpo sentia um calor abrasador.
Sim, eu sinto.
Mas, eu não digo nada. Não respondo. Não quero negar, nem confirmar.
Só quero continuar minha vida em paz.
Victor me dá um olhar intenso.
— Desculpe, eu preciso subir — tento encerrar aquele assunto.
— Eu só estou pedindo uma chance, Fran. Só me conheça.
— Não. — Começo a andar em direção a porta do prédio.
— Uma noite — ele sugere. — Só uma.
Se eu desse uma noite para ele, aquilo jamais teria fim.
— Não — reafirmo. — Isso está fora de cogitação.
Subimos a escada em silêncio. Logo chegamos à porta do meu
apartamento.
— Obrigada por carregar minha mochila — estendo a mão para pegá-la
de volta.
Ele sorri. Sem menção de me devolver.
— Por favor? — peço.
Ele está me estudando, só Deus sabe por quê. E eu tenho a nítida
sensação de que ele está amando a minha descompostura, a julgar pelo sorriso
arrogante em seu rosto.
— Você sabe que não vou desistir, não é? — Seus olhos estão brilhando.
— Não entendo você. Já lhe dei minha resposta.
— Você não me deu a sua resposta. Seu medo me deu uma resposta.
Eu odeio admitir isso, mas é verdade.
— Um encontro — ele pede. — Como um pedido de desculpas.
— Desculpas?
— Por você me julgar tão mal por causa das minhas tatuagens. Vamos lá,
Fran, você me deve isso.
Eu quero recusar. Mas, me vi assentindo.
— Tudo bem.
— Você está falando sério? — ele parece chocado com a minha
aquiescência.
Subitamente, cubro os lábios para rir. De verdade, é muito estranho a
filha do pastor aceitando se encontrar com o dono do bar da pequena cidade.
— Sim, é sério. — reafirmo.
— Ok — sua voz está animada. — Vou te mostrar que sou mais que
essas tatuagens e essa pose de cara mau.
Ele me devolve a mochila.
— Hoje à noite? — ele questiona.
— Estou esperando a ligação do meu pai, hoje.
— Amanhã?
— Amanhã tenho que estudar. Terei uma prova na segunda. Oh, domingo
também vou estudar.
Ele abre a boca, chocado. Claramente, pensou que minha aceitação foi
apenas para que me devolvesse a mochila. Quero me explicar, dizer que pode ser
no próximo final de semana, quando meu corpo é empurrado contra a porta,
esmagado pelos seus músculos.
Posso sentir sua ereção cavando minha intimidade. É a primeira vez que
sou tocada assim. Sinto minha vagina se contraindo, um lado primitivo de mim
que jamais havia reagido assim antes.
Seus lábios estão tão perto dos meus e eu não quero nada mais do que beijá-los.
Devore-me, rogo em silêncio.
Victor olha nos meus olhos e eu estou perdida. Se ele me quiser agora,
não terei forças para recusá-lo.
Meu corpo arde de desejo. Eu sinto que todas as minhas defesas estão
desmoronando, como se eu estivesse prestes a ser totalmente dele.
Victor sabe disso e me dá um sorriso arrogante. Ele se aproxima, trazendo seus
lábios para perto do meu pescoço. Eu posso sentir o hálito quente dele e isso me
deixa louca, fazendo meus membros estremecerem de antecipação.
Victor trilha seus lábios pelo meu pescoço, roçando minha carne, todo o
caminho até minha boca.
É isso, o inevitável.
Este é o momento em que ele me beija e eu me entrego a ele. Depois
disso, não há volta. Eu sei. Ele sabe. Não se luta contra o destino traçado.
Eu fecho meus olhos, aguardando.
Um segundo depois, escuto um riso debochado.
Abro meus olhos e percebo que ele está se afastando.
— Querida, só vou beijá-la no nosso encontro. Então, escolha a data e me
avise. Sabe onde me achar.
Pasma, vejo-o caminhar pelo corredor e desaparecer nas escadas.
Victor
N ão tomei banho frio depois daquele encontro porque o calor infernal que
fazia naquele final de mês parecia derreter os ossos. Postei-me embaixo da água
gelada por um único motivo: Francine.
Aquela mulher me deixou louco. Eu observei minha ereção e resolvi
desfazê-la com as mãos. Fecho os olhos, enquanto deslizo os dedos pela
extensão do meu pênis.
Fran era tão delicada. Doce. Mal conseguia expressar o quanto ela mexia
com todos os meus brios.
De súbito, tudo para quando penso no depois. Sim, porque até então meu
objetivo era tê-la. Porém, uma garota como ela não era do tipo com quem você
dormia e depois sumia.
Nós não tínhamos futuro porque éramos muito diferentes, mas se eu
prosseguisse com aquilo, talvez estaria enroscando nossas vidas de uma forma
que jamais conseguiríamos escapar da armadilha.
Desisto de me tocar, e desligo a água. Saio do chuveiro buscando a
toalha, andando pelo banheiro, secando-me, arrumando o barbeador... Meus
pensamentos no automático enquanto outro tomava conta de tudo.
Eu a queria e estava perto de tê-la. Era um fato, por mais que ela o
negasse e fugisse. Havia reações na carne que você sentia. Contudo, estava
disposto a destruir sua paz?
E a minha? O quanto ela podia me influenciar?
A família era muito importante e, por causa disso, o pai não gostava de
nos ver perto de moças religiosas ou com algum tipo de moral e ética que
pudesse nos fazer questionar o que fazíamos.
Até porque... Não fazíamos nada de errado.
Só matávamos aqueles que não pagavam pelas drogas que consumiam.
Vendíamos anonimamente porque a porra do governo não respeitava as escolhas
individuais de consumo. Eu não era culpado porque caras como Marcelo não
entendiam a vida que tinham e se afundavam na miséria dos entorpecentes.
Ok, Victor, pense racionalmente. Será apenas sexo. Foda a garota e
depois dê o fora! Você não quer pensamentos de certo e errado minando sua
vida.
De repente meus olhos cruzam com a parede. Ali, do outro lado, ficava o
banheiro de Fran. Talvez ela estivesse no banho naquele instante, talvez também
tentando abafar as necessidades latentes da sua boceta. Talvez também pensando
em mim. Talvez também afundando aqueles dedos lindos entre suas pétalas
rosadas.
Eu quase posso vê-la...
Meu pau volta a ficar duro. Eu preciso bombeá-lo antes que um gemido
escape da minha boca. Inclino-me contra a parede, enquanto a imagem de uma
Fran nua se força na minha mente.
Eu penso em como seus seios se sentiram pressionados contra o meu
peito, aqueles gemidos suaves se derramando de seus lábios, e isso é tudo que eu
preciso.
Eu a imagino lambendo meu pau, e me acaricio mais rápido.
Imagino-me em cima dela agora mesmo. Eu deslizaria aquela blusa
horrorosa que ela gostava de usar e chuparia seus mamilos endurecidos na minha
boca. Eu quero sentir o peso daqueles peitos na minha mão. Eu posso ouvi-la
gemer enquanto eu giro minha língua, mordendo levemente.
Eu a libertaria de toda a sua repressão. Sua boca, sua vagina. Eu quero
tudo isso. Eu quero senti-la gozar no meu pau.
De repente, um leve gemido. Não meu. Eu encosto a cabeça na parede e
escuto. Silêncio do outro lado. Mas, eu sei que ela está ali. E pelo gemido
acanhado que eu acabei de ouvir, ela está fazendo o mesmo que eu.
Eu não consigo deixar de sorrir. Eu quero vê-la tocando-se. Eu quero vê-
la... Porra, eu quero vê-la!
Começo a bombear meu pau novamente, meu rosto colado na parede.
Outro leve gemido, como se ela houvesse acabado de se aliviar.
Quando o clímax me toma, eu sei que esse é um caminho sem volta.
Francine
A única pergunta que circulava em minha mente ainda entorpecida pelo sexo
incrível era: eu fiz algo errado?
Porque eu sentia que Fran desejava fugir de mim? Que sua indicação
para que eu fosse embora fosse claramente uma desculpa para me afastar?
Eu não sei o porque, mas eu não a deixarei ir.
Sem palavras, a puxo para meus braços. Ela não parece disposta, mas eu
a forço. Ela precisa de um abraço e eu estou lá para isso. Então, assim que a
relutância inicial termina, percebo um leve soluço contra meus ombros.
— Eu te machuquei?
Era a única coisa que me vinha à mente para aquelas lágrimas. Eu tentei
ser o mais delicado possível, pois havia a questão da virgindade. Na nossa
primeira vez ela sangrou um pouco e dei um tempo para se recuperar. De todas
as formas, sempre tentei deixá-la confortável.
Suspiro de alívio quando Fran nega com a face.
— Então, o que é?
Porra, por que lágrimas? Ficava nervoso diante delas. Nunca quis ver
Francine assim. Eu me esforçava para ser bom com ela, mesmo lutando contra
todos os meus instintos que sempre foram fortes em destacar que eu não
precisava ser bom com ninguém.
— Estou com medo, Victor — ela confessa, e meu coração sangra diante
das palavras.
— Medo?
— Como isso — aponta para nós dois, numa sequência — pode dar
certo?
— Não está dando?
Ela sorri. Percebo que é um sorriso triste.
Era óbvio que havia uma diferença extensa entre nós. Ela era gentil, eu
rude. Ela doce, eu amargo. Ela era uma boa pessoa, eu era um traficante.
Todavia, ela era minha. E disso eu não abriria mão.
— Eu não vou te machucar — afirmo.
E não sinto nenhuma dúvida nessas palavras. Eu realmente vou cuidar
dela. Nunca deixarei que nada ouse feri-la.
Suas bochechas estão avermelhadas e manchadas de lágrimas, mas de
alguma forma ela parece ainda mais bonita. Sua vulnerabilidade e emoção são
coisas que mexem com meus instintos.
— Ouça-me, Fran...
Meu coração bate no meu peito com ansiedade. Estou fazendo uma
promessa para ela neste momento. E estou sendo sério.
— Eu nunca vou te machucar — reafirmo. — Eu nunca vou te
abandonar. Eu sempre estarei ao seu lado, não importa o quê, não importa
como... Eu estarei lá. Se um dia precisar de mim, bastará estender a mão para o
lado. Você sentirá minha presença. Seus dedos tocarão a minha pele. Nem morto,
me afastarei de ti.
Nosso olhar se encontra. Existe uma emoção presente que eu não me
lembrava de já ter experimentado.
— Eu sou seu, Fran... Você será minha?
E então sua boca se abriu. Seus doces lábios, naquele sorriso
maravilhoso. E eu sei que valeria morrer por ela.
— O que você acha? — ela perguntou.
— Eu sei a resposta, mas quero ouvi-la — insisti.
— Sim — seu murmuro é a confirmação da minha felicidade.
Eu a trago para mais um beijo. Nada parecia o suficiente. Eu estava nas
nuvens.
Eu não sei quanto tempo vai durar até ela perceber que somos um
desastre prestes a eclodir. Mas, enquanto eu tiver uma chance de permanecer no
paraíso com aquele anjo, eu me recusaria a voltar para o inferno.
— Não há nada melhor que uma boa cerveja preta no frio — Vanessa
brinca, enquanto bebe um gole da caneca.
Fran sorri para a amiga e também bebe um gole. Eu gosto de tê-la ali, no
meu local de trabalho.
Bem da verdade, eu gosto de ter Francine por perto em qualquer
momento. Especialmente quando ela está claramente à vontade, sentada
confortavelmente num banco acolchoado, sorrindo para a amiga e conversando
com Lucas.
Estava tudo bem...
Eu sentia isso, e isso me animava.
— Você sabia que enfermeiras têm que limpar a bunda de velhos, no
hospital? — Lucas indagou a ela, que sorriu.
Eles estavam num jogo de provocações desde que ela falou sobre o curso
de enfermagem. Eu assistia as brincadeiras do outro lado do balcão.
— Não seria minha primeira bunda — devolveu. — Fui voluntária em
um asilo e dei banhos em idosos.
— Uau — Lucas bateu palmas. — Você tirou a sorte grande — ele
volveu para mim. — Ela poderá dar banho em você também.
— Vou gostar disso — devolvo.
— Viu como ele está apaixonado? — Lucas volve para Fran que ri.
Eu não nego. É verdade.
— Eu não sei se você está com sorte — Lucas prossegue. — Meu irmão
nunca conseguiu ter um relacionamento que durasse mais que uma semana.
Fran fica quieta e eu literalmente quero matar Lucas pela língua solta.
Ele tem alguma ideia de que minha instabilidade em relacionamentos anteriores
é péssima para o que estou tentando agora?
Lucas ainda é muito jovem. Uma das coisas que terei que ensinar a ele é
em manter a boca mais fechada que aberta. No nosso ramo, nunca devemos falar
demais.
— Mas agora ele foi marcado a ferro — Vanessa desdobra e eu concordo,
enquanto rio, agradecendo aos céus pela presença espirituosa dela.
E então, em uma fração de segundo, toda a felicidade se foi quando vejo
Pierre andando até o prédio com uma carranca no rosto.
Pierre nunca vem a Esperança. Ele sempre está em Porto Alegre e sou eu
que viajo para visitá-lo. Agora, sua presença me assusta. Seu olhar pouco
amigável mais ainda.
Meu olhar vai em direção a Fran. Percebo como a testa feminina se
aperta e ela olha para mim como se eu lhe devesse uma explicação do porque da
mudança de ares. Mas, não posso dizer nada.
— Eu já volto — explico, assim que Pierre adentra o bar e caminha até
mim.
Lucas se enrijece imediatamente. Seu corpo parece tão tenso que eu
quase sinto que ele vai desmontar diante de mim.
O que diabos aconteceu?
Meu pai não cumprimenta ninguém. Eu o conheço o suficiente para saber
que ele está possesso. Caminho com ele rumo ao escritório. Fecho a porta atrás
de mim.
— Pai... Algum problema?
— Algum problema, Victor? — ele devolve, sentando-se à mesa. Suas
mãos se retorcem. — Você chefia Esperança. Não devia ser você a me responder
se está ocorrendo algum problema? — Minhas sobrancelhas se erguem. — Está
dando alguma festinha? — indaga, depois disso, mudando o assunto.
— São apenas amigas — respondo.
Algo em mim não quer que Pierre saiba sobre Francine.
— Mande essas putas embora. Precisamos conversar.
Mas, eu não consigo me mexer. Meu pai costuma ser caloroso e gentil. O
que diabos aconteceu?
— Eu disse para tirar essas cadelas daqui, agora!
Meu rosto balança, em concordância. Eu viro de costas para ele e vou
direto para o bar.
— Vocês tem que ir — eu digo assim que me aproximo.
— Por quê? — Fran pergunta.
Eu percebo que está preocupada.
— Apenas vão — indico. — Menos você, Lucas. Papai quer conversar.
Percebo o quanto aquilo era confuso para ela. Se era meu pai, porque não
a apresentava?
— Num outro momento, eu falarei sobre você para ele, Fran — explico.
— Hoje ele não está de bom humor.
— Papai de mau humor nunca é coisa boa — Lucas parecia temeroso.
Dói ver as perguntas não respondidas de Fran em seus olhos. Ela quer
saber o que está acontecendo, de verdade, não aquela minha desculpa
esfarrapada. Mas eu não posso dizer a ela. De jeito nenhum.
— Eu... — gaguejo. Lucas está sentado ao meu lado. — Eu não sei como
isso aconteceu...
Estou sendo sincero. Incrivelmente sincero. Nunca em todos aqueles
anos houve qualquer falha na minha contabilidade. Eu nunca fiquei com
nenhuma porcentagem do valor.
— Você não fez os cálculos? — Pierre questionou. — Não sabe como
aconteceu?
— Eu não fiz os cálculos — admiti. — Entreguei as papeladas para
Gabriel e deixei que Antônio fizesse o serviço. Nunca havia dado qualquer
problema antes, não pensei que pudesse ocorrer algo...
Eu sinto um resmungo ao meu lado. Volvo meu olhar para Lucas.
— É minha culpa, pai — o rapaz assume.
Porra, cala o caralho da boca, seu imbecil! Você não entende que nosso
pai não admite falhas? Que sempre há punições?
— Como assim? — Pierre insistiu.
— Um cliente fixo, Marcelo... A família cortou a mesada dele... Enfim,
ele levou algumas gramas para pagar depois. Algumas pagou, outras ainda estão
pendentes...
Lucas vendeu fiado sem minha autorização?
— Você ficou louco? — Pierre arregalou os olhos. — O que eu sempre
digo? Droga numa mão, dinheiro na outra!
Eu apertei meus olhos, tentando controlar a respiração. Eu sabia o que os
Bianconi faziam com devedores.
— Victor, você levará seu irmão para cobrar essa dívida. Ele tem que
aprender que há consequências.
— Não podemos antes dar um prazo ao cliente? Ele já nos deu muito
lucro. Quem sabe...
— Quem sabe ele dá com a língua nos dentes e conta que o dono do bar
o está cobrando por drogas? — Pierre gracejou. — Esse trabalho não é
filantropia, muito menos um boteco com caderno para vocês venderem fiado. A
polícia nunca desconfiou de nós porque não deixamos rastro. E vocês dois
deixaram um rastro grande e inconsequente. Um drogado. Então, vão ter que
limpar essa bagunça.
Era matar ou morrer.
Francine
A porta se abre, e tudo que consigo pensar é no quanto estou revoltado pela
conversa que ouvi no corredor.
Um homem de cabelos brancos surgiu, encarando-me, julgando-me,
estreitando-me.
Eu sei o que pareço. E ele não faz questão de fingir que não me considera
um lixo podre por causa disso.
Normalmente não dou a mínima para velhos julgadores com suas Bíblias
embaixo do braço, mas minha garota está parada atrás dele parecendo nervosa e
em conflito.
E ninguém mexe com a mulher de um Bianconi.
— Você deve ser o pai de Fran — eu digo enquanto estendo a mão para o
velho. — Prazer em conhecê-lo, senhor.
Ele deixa minha mão pairar no ar por um momento, um momento que me
permite saber o que ele realmente pensa. Finalmente, ele a toma com um aperto
firme.
— Você deve ser Victor. — Sua voz não esconde o desprezo. — Fran me
contou sobre você. Ou, ao menos, me contou o pouco que sabe.
Ignoro a malícia.
“Um Bianconi nunca fala demais”, papai fortalece em minha mente.
Mas, aquele homem disse que eu era um desconhecido para Fran. Nem
tudo era mentira, mas o que eu podia falar, eu falaria:
— Sou Victor Bianconi. Minha família é do norte da Itália — afirmo,
orgulhoso. — Meus avós eram fascistas e amavam Mussolini. Meu pai também
se agrada dessas ideias. — Escancaro o pior. — E, pelo seu sobrenome, o senhor
é alemão, mas deve ter um pé no judaísmo. No sangue, quero dizer. Eu soube de
Steins que foram presos pelos nazistas. Provavelmente há uns cinquenta anos
nós seríamos inimigos... Mas, agora não vejo motivos para sermos.
Fran dá alguns passos em nossa direção e segura minha mão.
— Victor não é fascista — ela afirma. — Ele só está contando as origens
para o senhor saber — observa. Ela molha os lábios, percebo o quanto está
nervosa. — Ele é uma boa pessoa. Victor é meu... — ela hesita em terminar,
porque nunca havíamos dado um nome para nossa relação.
Nunca precisamos. Pertencíamos um ao outros desde a aurora dos
tempos.
— Sou o namorado de Fran — completo.
O homem não esconde sua decepção. Eu me sinto irritado e nervoso. Ele
já não teve o genro perfeito? Vanessa me comentou que o antigo namorado de
Fran era da Igreja, líder do grupo de jovens, e que ambos iriam se casar, mas
Fran o pegou com outra.
— Eu só vim ver como foram suas provas — comentei para ela,
subitamente resoluto em ir embora.
Não queria ficar lá diante daqueles olhos que cravavam minha carne.
— Fui bem — ela respondeu, simples.
Antes que ela possa dizer qualquer outra coisa, seu pai interrompe.
— Então, o seu nome real é Victor Bianconi?
Ok. Eu não gosto de como ele está levando essa situação. Meu nome não
era Bianconi, mas eu tinha documentos falsos. Eu nem me lembrava direito de
como era o sobrenome da puta que me deu a vida...
Conti...
O nome veio de súbito e quase me tirou o ar.
— Sim, é meu nome.
— Bom saber — ele eu os ombros. — Você sabe que membros da minha
Igreja são policiais. Não vejo problema em levantar sua ficha. Você vê?
— Por causa das minhas tatuagens? — devolvo, escancarando seus
preconceitos. — Levantaria a ficha de um homem de pele lisa?
Estou me cansando de tanto convencionalismo.
— Eu sou velho, rapaz — ele destacou. — É difícil enganar um homem
que já viu de tudo nessa vida.
— Papai, por favor... — Os lábios de Fran estão pressionados em uma
linha fina e ela está olhando para o pai como se estivesse pronta para chorar.
Eu nem conseguia culpá-lo, na verdade. Estava a poucos momentos de
cometer mais um assassinato. O esquema com Marcelo já havia sido discutido
com Pierre, e eu vendia drogas de forma discreta no meu bar.
O homem sabia que eu não prestava. O que ele não percebia era o quanto
eu adorava sua filha.
— O que você vê nele, Fran? — ele se volta para ela.
— Papai! — O tom de Fran assume uma firmeza raivosa.
— É sério? O que você viu nele? O que ele tem de especial que a faz
discutir comigo para defendê-lo?
— O que ela viu em mim? — retruco. — Talvez alguém que não queira
controlá-la, que a respeite, que a ame do jeito que é. Alguém que não a traía, que
ela pode confiar!
Ele parece furioso. Eu não posso culpá-lo, mas eu não vou deixá-lo falar
desse jeito. Depois de um minuto ele balança a cabeça para Fran como se
estivesse desapontado com ela e essa é a última gota, mas antes que eu possa
dizer qualquer coisa, Fran fala alto:
— Papai, eu te amo! Mas você precisa parar com isso. Agora. Você
precisa respeitar minhas escolhas!
Eu percebo suas lágrimas. De repente, Fran chora compulsivamente e
aquilo acaba comigo. Eu nunca quis fazê-la chorar. Não sou esse tipo de cara.
— Fran, está tudo bem. Eu vou sair e deixá-los a sós e volto num
momento mais calmo. — Giro em direção ao pastor. — Prazer em conhecê-lo,
Sr. — Forço-me a ser formal.
— Você não precisa ir — Fran tenta amenizar com uma voz suave.
— Está tudo bem. Seu pai veio visitá-la e devem passar esse tempo
juntos.
E então me afasto.
Fran não sabe, mas eu realmente preciso ir. A noite se aproxima e eu
preciso dar os primeiros passos para cumprir a palavra dada a Pietro.
D izem que a casa enlouqueceu a jovem e bela esposa do antigo diretor. Um dia
ela pegou veneno e deu a filha, uma criança bela e miúda, e depois também se
envenenou.
A criança não resistiu, mas a mãe sobreviveu. Foi parar em um sanatório,
onde passou seus dias a declarar que apenas havia libertado a filha da terrível dor
dos dias.
O local já não era bem quisto. Sempre houve rumores que a casa secular
era mal assombrada. Após a morte de Laura, a menina, a coisa piorou e os
imóveis ao redor também se desvalorizaram.
Agora, aquele bairro compartilhava a fama da casa. Não havia muitos
moradores, e a maioria das casas havia sido abandonada.
Eu vi o carro de Marcelo surgir atrás do meu e ele dar um sinal de luz.
— Vai começar — avisei a Lucas, ao meu lado.
Percebi os pelos do seu braço ficarem arrepiados. Eu queria dizer que
estava tudo bem, que isso fazia parte da nossa vida como Bianconi, mas eu sabia
que depois de tomar aquele caminho, não havia volta.
Você pode conseguir a redenção de qualquer delito praticado. Mas,
assassinato é algo sem volta.
Marcelo nos seguiu até próximo de uma estrada de chão que ninguém
usava, pois ia a lugar nenhum. Depois da queda das vendas de fumo, muitas
fazendas daquela região haviam sido abandonadas e agora suas estradas eram
apenas poeira sem pisadas.
Paramos os veículos e logo Marcelo surgiu no banco de trás do prisma
modelo antigo que eu dirigia. Não era meu carro, eu o havia roubado e
adulterado a placa no dia anterior, em uma cidade próxima. Tudo foi bem
planejado para que eu não estivesse vinculado ao desaparecimento dele.
Dirigi em silêncio por uns cinco quilômetros naquela estrada terrível,
entendendo que o balanceamento dos pneus iria ser destruído pelos buracos
enormes da estrada. Então parei.
O ar gelado me tocou enquanto eu descia do veículo.
— O bagulho está escondido — disse a Marcelo, adentrando na mata
fechada.
Lucas, em total silêncio.
O outro me seguia igual um cordeiro indo ao matadouro. Nenhum som
de sua voz, nenhum sinal de qualquer desconfiança.
Então, parei. Girei. O olhar de Marcelo me encontrou e só então ele
soube o que viria. Contudo, antes de dar tempo de reação, eu o acertei com um
soco.
Seu corpo magro chocou-se no chão.
Aproximei-me de Lucas e estendi uma 45 para ele.
— Sua vez — avisei.
Ele parecia reticente, mas não havia escolhas.
— Você tem que fazer — eu avisei. — Se não fizer, papai matará você. E
depois me matará porque não o fiz fazê-lo.
Lucas apontou a arma para Marcelo. Cerrou os olhos, uma dor que
transparecia em seu semblante de pavor.
Originalmente, ele não era um assassino. Mas, depois de tornar-se um
Bianconi, todos nós nos tornávamos um.
Não há fuga. Não há meios de escapar.
Você faz o serviço.
O tiro ecoou.
A morte atingiu a nós três.
Há muito tempo uma mãe matou sua pequena filha naquela pequena
cidade de Esperança.
Agora outro assassinato manchava aquele chão.
O sangue era, definitivamente, maldito.