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19/02/1998.
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Epílogo
Capítulo 1
Clara
Vê-lo, sabendo que seria a última vez, que tudo o que vivemos foi
real apenas para mim, não para ele, doía ao ponto de sentir que a dor saía dos
meus ossos e atravessava a minha pele. Como se essa dor fosse espinhos me
rasgando.
— Clara — ele esticou a mão para o meu rosto, mas recuei.
Ainda estava fraca, e ter o seu toque acabaria com o pouco de
determinação para fazer a coisa certa.
— Posso entrar? — foi apenas um sussurro fraco saindo da minha
boca.
relação a isso. E talvez fosse o que me machucasse tanto. Ele era capaz de
amar. Só não a mim.
— A Lídia é o elo mais forte que me restou de família. Eu faria tudo
por ela. E naquelas horas que a vi inconsciente na cama, lutando pela própria
vida — as lágrimas que tentei segurar finalmente descem, densas, por meu
rosto, e as sequei com o dorso da mão — Eu lembrei da nossa mãe. Quando a
vi sem vida. Sem respirar. E quando soube do motivo de ela estar ali, lutando
para viver, toda fúria e revolta, que tinha guardado por tanto tempo, virou
desejo de vingança. — Ele deu um passo, e mais outro. Sentia-me presa no
lugar, conforme Pedro se aproximava — A Lídia perdeu o bebê. Nós nunca
vamos poder segurá-lo nos braços, entende? Como nunca mais poderei
abraçar os meus pais. Naquele dia, isso me deixou louco. Eu só queria, por
uma única vez, poder dar o troco em quem nos tinha ferido.
— Mas eu não feri vocês! — Minha voz saiu mais exaltada do que
pretendi — Eu nem conhecia a sua irmã. E nunca faria nada para machucar
alguém intencionalmente.
E não tive essa mesma consideração, nem de Diogo, de Pedro e até
mesmo de Lídia, que conhecia toda a verdade.
— Eu não sabia, Clara. Todos os indícios apontavam contra você.
De que os dois riam juntos às costas de Lídia — ele explicou com a voz tensa
— Aquele infeliz jogava mais provas falsas em cima, distorcendo tudo, só
lágrimas transbordando dos meus olhos — Tudo isso enquanto o seu plano de
vingança seguia o curso. Você roubou o meu lar. Toda a minha história. O
último sonho do meu pai. E não contente com isso, pisou no meu coração.
— Eu sinto tanto, pequena.
Quase tapei os ouvidos ao escutá-lo me chamar assim. Um dia foi
especial, mas hoje, soava falso, como toda a nossa relação. Como ele.
— Eu me entreguei a você. Eu me apaixonei por você — e esse
sentimento ainda habitava dentro de mim — Para descobrir que tinha
sonhado com uma mentira.
Fechei os meus olhos. Suas palavras causavam uma dor quase que
insuportável.
— Pouco a pouco, vi que a pessoa que acreditei que fosse e a que
convivia todos os dias comigo eram completamente diferentes... Eu pensei
que a vingança tinha me levado até você, mas não — ele passou a mão em
meu rosto — Foi você, pequena. Só você. Eu te quis mais do que a vingança,
só que fui burro e demorei tempo demais para ver isso.
Ele tocou a minha testa com os lábios. Estremeci e meu corpo
sacodiu com o soluço que emiti. Pedro me abraçou, suas mãos sôfregas
passaram por meus cabelos e ele me prendeu mais forte, e tudo o que eu mais
queria era continuar ali. Sentindo seu calor, desejando que ele afastasse toda a
frieza da minha alma.
— Você fez com que eu me olhasse e quisesse ser um homem
diferente. Eu quero ser alguém melhor, porque você me faz buscar isso todos
os dias, Clara. Ser alguém digno para você amar.
— Pedro... — Segurei firme a sua camisa para me equilibrar, as
minhas lágrimas estavam manchando-a.
angústia e ao ódio que sentia dos seus atos cruéis, e não me deixar fraquejar.
— Você se lembra — ele segurou meu rosto com as duas mãos
trêmulas — Lembra quando eu disse que aquele homem não era eu? Aquele
era um cara amargurado e cego pela raiva. Sinto muito ter causado dor à sua
família, mas me deixa consertar tudo isso.
Foram tantos avisos que não consegui compreender naquela época, e
que agora não tinham peso algum.
— Pode ser que sim. Talvez você tenha se arrependido e até ter
nascido algum sentimento por mim. — Meu peito doía intensamente, porque
Queria gritar com ele. Dizer que não era justo continuar me
maltratando assim.
Mas quando Pedro beijou os meus lábios, isso me desestabilizou,
enfraqueceu. Minha mente dizia uma coisa, o meu corpo e coração falavam
outra.
Queria que tudo desaparecesse. A dor. A decepção. A raiva por ter
sido enganada mais uma vez. E que só restasse nós dois no mundo e este
momento.
te amo.
Meu coração se apertou.
Por um momento, acho que nem mesmo respirei.
— Talvez algum dia eu consiga olhar para o passado e perdoar,
Pedro — murmurei fracamente — Tirar essa mágoa do coração e seguir em
frente.
Mas nesse momento eu não conseguia confiar em ninguém.
— Agora eu não posso. — Segui até a porta, tendo o rosto banhado
Eu parti.
Meu coração ficou com ele.
Saí tendo a certeza de que nunca mais o teria de volta.
Pedro
primeiro ônibus que vi passar e desci em uma estação de metrô. Depois disso,
andei sem rumo, de um lugar a outro, e só acabei chegando em casa ao
anoitecer.
Eu meio que pensei em nada e em tudo ao mesmo tempo. A minha
cabeça explodia quando tomei banho e desabei na cama.
Aquele fim de semana passou como um borrão. As ligações e
mensagens de Pedro não paravam de chegar, e para que eu não caísse na
tentação de atendê-lo, como na última vez, foi preciso que eu retirasse o chip
fofoca. Eu nem era uma pessoa pública, mas parecia que minha reação
impensada tinha me tornado uma celebridade instantânea. E como ninguém
tinha conhecimento da história real, as pessoas inventavam, criavam suas
próprias teses, distorciam algumas coisas e inventavam outras.
— Eu estava pensando... O que você acha de a gente ir ao cinema,
esse fim de semana?
Remexi-me na cama, mas não respondi. Letícia era uma boa amiga.
Tentava sempre me colocar para cima, mas o problema estava em mim.
Aquele velho clichê: não é você, sou eu.
Eu sei que a vida, às vezes, parece cruel com a gente. E que não dá nem
vontade de viver, mas se você olhar em volta verá que tem muitos motivos
para isso.
Ela tinha razão, e eu queria buscar em mim a força e coragem que
sempre tive, mas eu não sabia mais onde encontrar. Eu me sentia perdida.
— Eu tinha um pouco mais de dezenove anos e uma barriga imensa
quando a minha mãe me colocou para fora de casa, após uma discussão com
ela — Letícia fungou e isso me fez virar para ela — Dormi aqui e ali. Ouvi
todos os tipos de humilhação só para ter um teto e um prato de comida.
para expulsá-lo, mas minha amiga era corajosa o suficiente para isso.
Contudo, lembrei que agora ele era o chefe dela, e que apesar de
Letícia já ter sugerido sair da S.A. para me dar apoio moral, não queria que se
prejudicasse por mim.
— Quem é, tia Beatriz?
Foi ela a fazer a pergunta por mim. O meu coração estava disparado
demais para que conseguisse falar.
Pedro
Desta vez eu jurei que faria tudo diferente. Ouviria mais o Nick e
Saber que me odiava e me via como um homem cruel me deixava louco. Mas
doía muito mais descobrir, através de outras pessoas, que ela não reagia bem
a essa distância que nos machucava.
A amargura e a culpa em saber que eu fui o causador de todo o seu
sofrimento tiravam a minha paz, me fazia perder o sono, e nas vezes que
conseguia dormir era assombrado por pesadelos. Neles eu não conseguia
chegar à Clara a tempo de evitar que algum mal lhe acontecesse. Ou que a
tiravam de mim, levando-a para longe.
Lembrei que há alguns meses tive uma espécie de aviso em um
sonho. A minha mãe pedia para que eu tivesse cuidado e que eu poderia estar
seguindo por um caminho sem volta. Ao menos esse aviso eu deveria ter
escutado.
Agora, eu estava aqui, outra vez, em frente à porta de Clara,
Bem, ele era metade brasileiro também, mas isso não importava.
— Eu não me lembro se no meu contrato há alguma cláusula que me
obriga a relatar a minha vida pessoal a você.
Estava pronto para avançar sobre ele, quando a mãe de Clara se
colocou entre nós.
A cena me fez lembrar a de seu apartamento na Itália. Clara que quis
evitar que eu desse uma boa lição no piloto. Assim como naquele dia, ele
sorria, debochado, só para me irritar.
— Sr. Santini, não quero brigas em minha porta — alertou Beatriz,
desviando o olhar zangado de mim para encarar Giuliano, que claro, para ela,
exibia um olhar inocente — Resolvam seus assuntos em outro lugar.
A única questão que eu tinha para tratar com Giuliano era o meu
punho na cara dele, e estava devendo isso há muito tempo. Contudo, a minha
Não fui para o sofá que ela indicou. Em vez disso, andei de um lado
a outro pela sala.
— Ela ainda tá brava com você — olhei para baixo, em direção à
voz, e vi Suzana se pendurando no sofá, enquanto me encarava — Por que
— Então você fez algo muito errado, porque a Clara tá muito triste.
Eu também estava muito triste.
— Mas você está arrependido, né?
— Muito, e eu só queria dizer a ela o quanto.
— Faz cara de triste — ela fez uma careta de cachorrinho
arrependido, e ao piscar os olhos, me fez sorrir — Diz que sente muito e vai
ser bem bonzinho. A Clara nunca fica brava depois disso. E se não der certo,
você chora.
Bons conselhos. O grande problema era conseguir chegar até a irmã
dela.
— E também... — era óbvio que ela não tinha acabado — Tem que
prometer que não vai ser mais um cãodenado.
— Um cão o quê?
aproximar. Mas isso era o mais perto que chegava dela, e de alguma forma,
mantinha o que me restava de sanidade.
— Tudo bem — me desesperava ter que dizer isso — Eu vou dar um
tempo a ela.
— Posso guardar as flores? — ela indicou o buque em minhas mãos
e o entreguei a ela.
A saudade torturava demais, mas eu estava disposto a tudo para ter
Clara de volta, inclusive aguentar firme esse sofrimento. E se fosse preciso,
até mesmo manter distância por um tempo, mesmo que me custasse muito.
***
Fernando.
Chegando lá, fui guiado pela governanta até o escritório. Serafina, a
senhora que cuidava da casa da fazenda, trabalhava para a família Brandão há
muitos anos e Fernando a considerava como uma avó adotiva.
ouviu de Letícia...
— A garota tirando o sossego de Nick?
Eu não sabia em que pé andava a relação deles — se é que podia se
chamar assim — desde que esteve na empresa e me fez ligar para o
departamento que Letícia trabalha, para dispensá-la para tomar um café com
ele. Foi um dia antes de Diogo fazer o meu mundo desmoronar. Eu esperava
que minha situação com Clara não viesse a atrapalhar Nick, ele estava mesmo
interessado na “brasileirinha”.
Meu Deus, eu daria tudo o que tenho só para ter a chance de olhar
minha pequena outra vez. Alguns segundos já trariam a minha paz.
Até o desgraçado do Milanesi tinha conseguido mais do que isso.
— E é uma tortura, todo santo dia. Eu não posso forçar a barra e
fazer com que ela me escute, porque isso pode deixá-la exaltada. E às vezes,
simplesmente, não consigo me segurar — confessou ele.
Sobre isso eu entendia muito bem. Tentávamos ser homens
melhores, mas a nossa essência, o Dom dentro de nós, às vezes gritava muito
forte.
— Eu acho que o acidente... — ele continuou — Ela tem medo,
sabe? Desconfio que tem mais medo de me amar do que determinação em me
fazer ficar longe. Ela acredita que a qualquer momento irá partir...
corre riscos, Pedro. Você mesmo corre, com o Diogo à solta. O problema
com a sua irmã é que por causa do nosso passado e como lidamos com o
sexo, ela não acredita que possa ser o que eu quero. E eu não preciso mais
daquela vida, não sem a Lídia.
causa dos seus pais — confessou ele — A verdade é que nossa relação, do
início ao fim, foi confusa. Diogo me usou para se aproximar de Lídia. Ela o
usou para chamar minha atenção, fazendo ciúmes, e conseguiu. Eu não queria
quebrar a sua confiança em mim, mas também não conseguia resistir à minha
atração por ela.
E foi então que toda a rede de mentiras começou.
— Eu quis assustá-la com a minha vida, mas a Lídia parecia feita
para isso, entende?
Foi assim que vi Clara desde a primeira vez. Perfeita para mim e
para o que buscava em uma companheira. Quis trazê-la para o meu mundo e
mergulhei de cabeça no dela.
— Tínhamos um caso, quando ela nem tinha nada de real com o
Diogo, e quando entreguei as fotos exigi que ela terminasse com ele. Mas
você sabe como é a Lídia — ele esfregou o rosto — Estava empenhada em
descobrir as provas contra ele e te proteger. Nós brigamos, naquele dia.
Afoguei minhas mágoas na bebida e, bom, tive uma visita inesperada.
Suellen.
Clara
aliviada, porque ele parecia descontraído demais para quem poderia trazer
más notícias.
— Ela ficou de enviar as encomendas por aquela sua amiga...—
disse ele — Ah, Letícia. Mas eu passei aqui perto e achei que eu mesmo
poderia pegar.
— Encomendas?
Vendo que tinha me pegado completamente despreparada, ele soltou
uma imprecação, baixinho.
— Caspita! — Ele coçou a cabeça, sem jeito — Acho que falei
demais.
— De que encomendas o senhor está falando?
— Bem, Beatriz tem feito doces e bolos caseiros para o restaurante.
Meu queixo literalmente caiu quando ele disse isso. Minha mãe
Não levou muito tempo para Oberto surgir. Eu chorava sem parar,
tentando acordá-la, sem conseguir pensar em como agir.
Foi ele que a pegou no colo e me disse para buscar o que
precisaríamos para levá-la ao hospital.
Corri, cega pelas lágrimas, até o quarto dela. A bolsa estava em cima
de uma poltrona. Quando tranquei a porta do apartamento, Oberto já me
aguardava no elevador.
— Mamãe, me desculpa — chorava, passando a mão nos cabelos
dela.
Estive tão imersa em minha própria dor e desespero, que não prestei
atenção no que acontecia à minha volta e nem em todas as pessoas que eu
afetava com a minha apatia.
***
A espera por notícias foi angustiante. O parecer do médico chegou
quase duas horas depois, e não foi um espanto para mim. Infelizmente já
passamos por isso diversas vezes. Como o LES é uma doença autoimune,
minha mãe vivia em constante luta com ela.
— Foi um desequilíbrio na produção de anticorpos que reagiram
com proteínas do próprio organismo da Sra. Gusmão — explicou o médico,
mais para Oberto ao meu lado do que para mim — Isso causou a inflamação
na pele e principalmente nos rins. Eu também identifiquei sinais de infecção
nos pulmões.
Mordi os lábios para tentar conter as lágrimas se acumulando em
meus olhos.
— Também encontramos uma diminuição das células do sangue,
que são os glóbulos vermelhos e brancos, devido a anticorpos contra essas
células.
egoísta e insensível.
— Não se culpe, filha. Eu só queria cuidar de você. Tirar um pouco
da responsabilidade para que tivesse energia para se recuperar.
Éramos assim, cuidávamos uma da outra. Mas por muito tempo eu
tinha me tornado a rocha da casa.
— Olá, Oberto — ela o cumprimentou e eu me ergui, secando os
olhos — Desculpe, mas acho que não poderei atender os pedidos da semana.
— Não tem que se preocupar com isso — ele sorriu para ela — A
Porque eu fui fraca, deixei que a minha dor e angústia fossem mais
fortes do que o que deveria ser mais importante em minha vida: Suzana e a
nossa mãe.
Apesar de não gostar de vê-la aqui, debilitada, a culpa que eu estava
concentrado. Sempre que dava por mim, via a minha mente divagando para
Clara. Quando não estava pensando em formas de trazê-la de volta, ficava
lembrando dos nossos momentos juntos.
Tomei duas decisões estúpidas que quase fizeram as ações de um
dos meus negócios despencarem na bolsa de valores, porque eu simplesmente
não conseguia manter o foco. Como agora, que relia pela terceira vez o
contrato de um dos patrocinadores da equipe de corrida. Acabei optando por
finalizar mais tarde, e minimizava a tela, quando a linha que me comunicava
— E a família dele?
Os dois se entreolharam e depois me encararam.
— Ele roubou milhões da empresa e está preocupado com a família
dele? — indagou Montenegro.
— Não quero prejudicar mais nenhum inocente — avisei, firme —
Já feri pessoas demais. Não desejo mais vingança, apenas justiça. Diga a
Bertolini que encontre uma forma de deixar a viúva e os filhos bem
assegurados.
Eles assentiram, e pelas expressões que faziam, provavelmente me
achando maluco.
Quando criança e aprontava muito, minha mãe dizia que para cada
ação ruim que eu fizesse, deveria fazer mais dez boas. Encarando pela
filosofia dela, eu tinha muitas coisas a acertar com o mundo.
fraudulento, pedi que Helena cuidasse para que uma mala e alguns pertences
fossem enviados ao meu avião.
Segundo a investigação de Montenegro, o trâmite acontecia da
seguinte forma: um funcionário da Receita indicava os nomes de pessoas
falecidas, que ainda não constavam no site do órgão. Depois de obter esses
dados, falsificavam toda a documentação, que era levada até o banco. Na
agência bancária, o gerente viabilizava saques e envios para outras contas
fora do país. Existiam até procurações, para o caso de um gerente de outro
banco suspeitar do esquema, o que o fazia também cair no golpe.
— Pelo que você me diz, vai muito além do que Diogo e Nolasco
fizeram com o dinheiro da S.A.
— É só uma ponta do iceberg. Há várias quadrilhas, e casos de
estelionato são comuns. Existem muitas formações de organizações
***
duas vezes. Essas coisas normalmente são negociadas por telefone, em uma
linha segura. E boa parte por troca de mensagens.
Saquei o meu telefone, e após meio minuto mexendo nele, coloquei
o aparelho diante do homem.
Diogo.
— Eu quero que esse homem seja mantido em segurança — avisei
quando saímos da casa — Não quero que aconteça com ele o mesmo que
Nolasco e o detetive de Lídia.
Um morreu envenenado e o outro estava desaparecido desde a noite
da festa.
— Cuidarei disso — avisou Ricardo.
Um carro já estava me esperando para levar-me de volta ao
Clara
precisávamos.
Fugia da minha compreensão que ele pudesse ser duas pessoas tão
diferentes, o homem incrível por quem me apaixonei e o cruel que brincou e
manipulou meus sentimentos o tempo todo.
que vem com elas — a minha voz não saiu com a firmeza que imaginei ou
que eu gostaria.
Estava ao ponto de mandar tudo ao inferno e apenas apoiar meu
rosto em seu peito, esquecer tudo. Voltar a ser a Clara que tinha fé e
esperança num mundo cor de rosa.
Mas eu não conseguia. Essa parte em mim estava quebrada.
— O meu erro foi me apaixonar por você. Mas vou tirá-lo do meu
coração, como já tirei da minha vida — senti aquela dorzinha no peito
começar a crescer, tinha de me acostumar com ela — Só vá embora e me
deixe em paz.
Minha mão mal conseguiu girar a maçaneta, e quando finalmente fiz
isso, abrir a porta, ouvi seu pedido fraco me chamando de volta.
Segui firme, só até o momento que cobri o rosto com as mãos. Os
Pedro
entanto, tinha que admitir, nos últimos meses deitei e rolei sobre as merdas
que fiz.
Contei sobre a minha ida a Minas e depois a visita ao hospital, sobre
a rejeição de Clara, a visita ao advogado e o pedido que fiz a ele.
— Algo me diz que ela não vai gostar muito disso, Pedro.
— Foi o correto a se fazer, Nick.
— Por Clara ou por que sua imagem pública está arranhada?
A expressão em meu rosto demonstrou o descontentamento com a
insinuação.
— Eu tenho pessoas qualificadas que já estão dando um jeito nos
danos. Eu nunca a usaria para esse fim. Além disso, se você leu um pouco do
que estão especulando...
Com Clara.
Na empresa.
E a respeito de Diogo.
— Sabe o que eu acho que é mais desesperador para você, e eu
O tio do Pedro passou a tarde inteira com a gente e até fez o almoço,
macarronada com almôndegas e uma versão que a mamãe pôde comer. Ele
era um cara divertido e fazia minha irmã e a nossa mãe rirem muito. Fiquei
várias vezes observando-os em silêncio, admirando como os três
funcionavam bem juntos. Inclusive eu e Suzana ficávamos cutucando uma a
outra quando pegávamos Oberto dando uns olhares nada discretos à Dona
Beatriz. Ela disfarçava, quase que bem, mas eu percebia que receber
novamente esse tipo de atenção, vinda de um homem interessante e gentil,
mexia com ela mais do que conseguia admitir. Além disso, ele fazia aquele
estilo homem maduro, difícil de resistir. Os Lucchese não deviam nada aos
Santini em relação ao charme, e Pedro era uma mistura explosiva dos dois
lados italianos.
Ao mesmo tempo em que eu ficava feliz que a minha mãe pudesse
ter uma nova chance de reconstruir sua vida amorosa, me preocupava e tinha
medo. Preocupação porque amar podia vir com uma imensa parcela de dor, e
ela já tinha sofrido o suficiente nessa vida, ao perder o marido, tão jovem, e
lutando contra uma doença autoimune. O temor vinha do fato de que lidar
com uma pessoa doente nunca era algo fácil e nem todo mundo conseguia
encarar isso por muito tempo.
Oberto parecia ser um homem decente, mas quantas vezes ele
suportaria as recaídas e crises dela? Eu não queria vê-la sofrer. O segundo
cruéis, que me olhava nos olhos, falava comigo e nunca cogitou me dizer
alguma coisa me deixava decepcionada. Bom, ele era amigo do Pedro, devia
sua lealdade a ele, certo?
Contudo, magoava saber que Nick também havia mentido ou
ocultado coisas de mim. Por causa disso, já não fazia mais gosto de que entre
ele e Letícia rolasse alguma coisa. Diga-me com quem andas, que te direi
quem és. E ela era mais do que uma amiga, eu a tinha como uma irmã. Nesses
dias, que quase mergulhei em uma profunda depressão, Letícia foi um dos
meus alicerces, me mantendo em pé, exigindo que eu fizesse mais do que
somente respirar. Eu não queria que ela sofresse com Nick e enfrentasse a
mesma decepção que eu. Mas não disse nada. A escolha não era minha,
embora também não conseguisse imaginar todos nós passando uma tarde
Suzana e a minha mãe, mas havia um limite que eu poderia ir até mesmo
pelas duas.
Uma coisa era suportar um chefe arrogante e mal-humorado, outra
um homem cujo único propósito tinha sido me ferir.
me colocou nessa confusão com a família Santini, era mais do que justo que
eu usasse a prova de suas mentiras para transformar em algo bom.
Ainda assim, na atual situação que me encontrava, viver em um
lugar como esse seria caro. A melhor opção que tinha e via era arranjar uma
renda extra, e para isso teria de largar a faculdade. Por um tempo, só até
podermos ir para um lugar diferente sem grandes complicações.
Chegar a essa conclusão me deixou com um enorme nó na garganta.
Quantos sonhos eu ainda teria de abandonar?
— Filha?
Enxuguei meu rosto com pressa. Não queria que a mamãe me visse
assim. De alguma forma, eu iria encontrar um jeito de nos tirar dessa
enrascada.
— Fazendo as contas? — Ela puxou uma cadeira para se sentar ao
meu lado.
— Você não deveria estar na cama?
Sem dúvida, era dela que vinha toda a minha coragem e força, mas
como dizia o meu pai quando vivo: “a teimosia também.”
— Precisava me esticar um pouco — respondeu e encarou as contas
que eu tinha feito — Eu pensei que assim que estiver melhor eu posso
voltar...
— Não — sabia bem o que ela queria sugerir.
fazendo uma torta com o que sobrou na geladeira e um bolo para Suzana —
disse ela — Lembrei das vezes que vendia coisas lá no antigo prédio, mas a
gente já não mora lá e, bem, não acho que as pessoas que moram aqui gostem
de ser incomodadas com isso. Eu pensei em levar à igreja. E não sei por que
lembrei do restaurante. Foi o pai do Oberto que primeiro provou um dos
meus doces. Eles têm sobremesa também, mas a especialidade da casa são as
massas. Deixei umas amostras lá e pediram outras, e o resto você já sabe.
É claro que atender o restaurante não sanaria todas as nossas
necessidades. Água, luz, internet, compras do mês, os móveis novos que eu
— Eu já fiz isso.
Ela respirou fundo e já imaginava o que tinha a dizer.
— Eu não consigo entender por que está do lado dele! Nunca gostou
do Diogo, mas o Pedro, você perdoa.
— São duas situações diferentes, Clara. Um é sem caráter e
perigoso. O outro só fez muita merda. Mas teve coisas boas também. Você
tinha um bom trabalho. Viemos para um lugar melhor.
— Ele mentiu. Enganou. Fez você ficar doente antes e agora. Traiu a
morreu, não estava mais brava. Acho que ele sabia disso, mas eu nunca disse.
Porque eu jamais dava o primeiro passo. E nunca vou poder fazer isso,
entende? Dizer a ele que sentia muito e nossa discussão foi boba.
Ouvir isso me causou tristeza e agora eu compreendia o fato de ela
venda e descobri que não era nada ruim. Eu estava montando uma planilha no
caderno, que digitaria no computador para deixar tudo mais organizado,
quando o interfone tocou.
— Quem era?
Eu acho que ainda exibia a mesma cara de choque que fiz ao porteiro
quando anunciou a visita.
— É o Sr. Bertolini — vendo que ela não fazia ideia de quem eu
falava, tratei de esclarecer — O advogado de Pedro.
Não tive tempo de explicar mais nada, tampouco conjecturar o que o
advogado de Pedro estava fazendo aqui, pois a campainha soou logo em
seguida.
— Srta. Gusmão — o simpático senhor me cumprimentou assim que
a aborreceria e não queria que tivesse uma reação emocional por minha
culpa.
— O Pedro sabe disso — disse ele e encarei-o com descrédito —
Escuta. Conheço o Santini desde menino. Tem um temperamento difícil. Sei
cada minuto desaparecer? O dano tinha sido causado em meu coração. Ele
estava despedaçado, e isso nem todo o dinheiro do mundo poderia resolver.
— Eu não quero nada dele — disse ao advogado — Pode levar de
volta.
— Clara! — minha mãe me repreendeu.
— Não quero nada dele! — repeti, desolada — Sobrevivemos sem o
Pedro antes e vamos sobreviver agora.
— A senhorita não pode recusar o imóvel, porque ele não é seu —
informou ele, mais uma vez me deixando em choque — Está no nome de
Suzana Dias Gusmão. Não poderá ser doado ou vendido até que ela complete
21 anos.
— O quê?
Encarei o homem com a fúria saindo pelos meus olhos.
quanto a mim.
Desde que nos unimos como um casal, essa era primeira vez que
ficamos tanto tempo longe. Isto estava me matando.
Eu sentia uma enorme falta dela. De seu sorriso. Do olhar gentil e
amoroso que sempre me dava, quando acreditava que não a estava olhando.
Das suas tiradas inocentes e engraçadas. De sua doçura. Estava difícil pra
cacete olhar a mesa dela e vê-la vazia. O silêncio no escritório fazia com que
eu sentisse que ia enlouquecer.
— Senhor Santini?
Pisquei os olhos algumas vezes e fiz com que esse estado
desnorteado fosse embora.
— Desculpe. Hum... Certo. Peça que ela entre, por favor.
Saltei da cadeira e dei a volta em minha mesa. Mexi nervosamente
em minha gravata, que parecia me sufocar. Fiquei acompanhando, entre
aterrorizado e feliz, desde o movimento da maçaneta girando, por segundos
intermináveis, até a porta se abrir.
De tudo que Diogo despejou até agora, sobre uma coisa ele estava
certo: o jogo tinha virado. Clara tinha o meu coração em suas mãos agora, na
verdade, sob seus pés, ela estava pisando nele.
— Não sei como vou fazer isso, mas vou devolver cada centavo que
gastou para quitar o restante da dívida. Nem que eu leve anos para fazer isso.
Foi como levar um tapa.
— Eu não quero o seu dinheiro — me exasperei, finalmente
perdendo a calma que eu lutava para manter.
Seu olhar atordoado caiu sobre mim. Eu mergulhei neles, vi-me
afogando e perdendo o ar. Porque era isso que Clara fazia comigo. Ela tirava
o meu fôlego.
— Será que não consegue mesmo enxergar o que eu realmente
quero? — segurei seus braços e a puxei para mim — O que eu preciso mais
do que tudo?
Escrutinei seu rosto, vendo em Clara o mesmo tipo de tormenta que
eu sentia. Mas notava também que ela lutava ferozmente para resistir aos seus
sentimentos, ao que os nossos corações me diziam.
— Não vê que eu te amo? — Apertei sua cintura e a outra mão levei
ao seu rosto, segurando-o e impedindo que seu olhar escapasse do meu.
Estávamos tão perto agora. Como antes, podia sentir seu perfume, a
sua pele macia, que fazia a ponta dos meus dedos formigarem. O cheiro que
Alisei-a antes de segurar firme, até prendê-la. Esfregando nela o meu pau rijo
e latejando de desejo.
— Sei que sente isso, amor — pausei o beijo apaixonado e esfreguei
meu rosto de seu queixo ao pescoço — Que o seu corpo queima tanto quanto
o meu quando a toco.
Desesperado, comecei a correr os meus dedos por sua perna, coxa,
erguendo a barra do vestido a cada centímetro que avançava.
Queria tocar sua boceta. Comprovar se estava molhada por mim,
como sempre ficava, assim com o meu pau doía pela necessidade de estar
dentro dela.
— Não — o gemido veio tão fraco que no primeiro momento não
percebi — Não... Não, Pedro.
Com um empurrão firme, fui afastado dela. Uma curta distância, mas
estaria resolvido.
— Trabalhar aqui? — Clara me encarou com descrença.
— Não comigo, se te incomoda tanto. Qualquer outro departamento
ou lugar desse maldito prédio. Só... volte.
fez meu sorriso convencido morrer e a ferida em meu peito abrir um pouco
mais — Que tal essa verdade? Eu vou me erguer de novo. Sem você.
— Clara...
Talvez eu tivesse ido rápido demais. Acontece que com ela eu perdia
Clara
E fraca.
Eu tinha vindo até a empresa determinada a colocar Pedro em seu
devido lugar. Em mostrar a ele que não podia controlar tudo à sua maneira e
que suas manipulações não me afetavam mais.
homem entrou.
— Clara?
Ambos apresentamos surpresa em nos encontrarmos.
— Oi, Giuliano.
Ele entrou e vi que o elevador só tinha parado em um dos andares.
— Voltou para a empresa? — perguntou, apoiando o ombro contra a
parede do elevador, enquanto cruzava os braços.
— Não. Eu precisei vir aqui — abraçando a minha cintura, encarei
dependem de mim.
— E você, Clara? Do que precisa?
Nesse momento?
Esquecer Pedro Santini. Algum dia eu conseguiria isso?
— Colocar minha vida no lugar — suspirei — Procurar outro
emprego. Seguir com os meus sonhos.
Ele me encarou atentamente. O suficiente para começar a me fazer
ficar constrangida. Felizmente os cafés foram servidos.
— Exatamente por não querer mais isso, que tenho que ficar longe
dele.
Pelo menos enquanto o meu coração ainda disparasse sempre que
Pedro estivesse por perto.
Giuliano. Achei que se não desse importância, com o tempo, ninguém mais
iria ligar. Afinal, quem era Clara Gusmão?
Olhei em torno da sala lotada — todo começo de semestre era assim
— procurando um lugar vazio e rostos conhecidos.
Vi Dandara com um novo grupo de alunas em um canto. Juninho
estava no fundo da sala com alguns rapazes.
Como no corredor, senti que todos me olhavam, analisando. O único
lugar vazio ficava na frente da mesa do professor e foi para lá que segui. Pelo
menos não precisaria passar entre as mesas, sendo dissecada como um sapo
em laboratório.
A primeira aula seria de Direito Administrativo, um assunto que me
interessava e conseguiu manter minha atenção no professor.
Durante o intervalo, fiquei em dúvida se saía para comer ou beber
alguma coisa, mas o receio de ser novamente olhada e apontada nos
corredores acabou me fazendo ficar na sala.
Eu tinha pensado em pedir a matéria atrasada a Dandara, mas ela
passou com suas novas amigas sem nem ao menos olhar para mim. Juninho
exceto o primeiro.
Provavelmente fugindo do trote com os iniciantes, eu também não
gostava disso.
Diferente da maioria dos jovens, ela não me encarou de um jeito
esquisito ou com indisfarçável deboche, o sorriso foi bem simpático,
constatei.
— E a senhora poderia emprestar as suas anotações para eu tirar
cópias? Perdi as primeiras matérias.
Achei que pedir o caderno para levar para casa seria abuso demais.
— Claro. Se conseguir entender a minha letra.
Ela me passou o caderno florido, e eu não demorei em ir até a sala
da copiadora, no final do corredor.
A fila não estava muito grande. Havia uns três alunos à minha frente.
Duas amigas e um rapaz. As meninas estavam entretidas, falando sobre
viagens de férias. Foi impossível minha mente não vagar até a Itália.
Recordando com um misto de tristeza e alegria os dias mais felizes que tive
na vida e que agora não passariam disso, doces lembranças.
A dor que isso me causou trouxe lágrimas aos meus olhos, mas eu as
contive, respirando fundo.
— Olha, de santa essa daí só tem a cara mesmo — ouvi de uma das
garotas que chegaram atrás de mim.
garota maldosa e suas amigas estavam falando de mim. Era devido a esses
rumores que me olhavam estranho. Cochichavam e me apontavam com o
olhar.
Mas essas garotas eram piores. Elas simplesmente não se
inclusive para Dandara, que pelo menos, por dois semestres, achei que fosse
minha amiga.
Pelo jeito, algumas semanas de férias e matérias mentirosas da mídia
me provaram que não.
— O que essa instituição deveria rever é ter como alunos pessoas tão
preconceituosas como vocês — eu não iria chorar, não na frente dessas
garotas — Ainda que eu fosse uma garota de programa, não seria direito meu
estudar e tentar mudar isso? E, Dandara, não esperava isso de você.
Eu a vi baixar o olhar, envergonhada, mas também não disse nada
em sua defesa. Encarei a garota que tinha disparado acusações sem sentido.
Era baixinha, usava roupas e bolsa de marca, dava para ver que possuía boas
condições financeiras, mas tinha um olhar tão rancoroso quanto a carranca
em seu rosto exibia.
— É verdade que todo mundo anda dizendo que sou uma prostituta?
— Todos, não — ele tentou me dar um sorriso gentil — Só algumas
garotas invejosas e uns caras babacas a quem você não deu mole no último
semestre.
respirava.
Após ver a porta do elevador fechar, privando-me do rosto dela,
retornei à minha mesa e abri o aplicativo de monitoramento de segurança no
computador. Quando a imagem de Clara surgiu, meu peito se encheu de
alegria e, de certa forma, de paz. Durou poucos segundos, até notar que ela
chorava e se atormentava com toda essa situação que vivemos.
Toquei a tela, alisei a imagem do seu rosto angustiado com as pontas
dos dedos. Queria poder tocá-la de verdade, consolar seu coração machucado.
— Qual café?
Uma parte de mim, a que eu fazia um esforço enorme para escutar a
razão, dizia para eu manter a calma e não fazer mais uma merda. Eram
apenas duas pessoas tomando café enquanto conversavam. A outra parte, a
que via o perigo se aproximar e que morria de ciúmes, dizia para tomar uma
atitude antes que fosse tarde demais.
Se você ama algo, então você cuida.
— Do outro lado do prédio, senhor.
Olhei para onde ele indicou e o vi escorado em um muro, vigiando a
Tio Oberto. Péssimo momento para ele aparecer, mas pela expressão
séria e zangada em seu rosto, percebi que não conseguiria me livrar dele.
— A gente precisa conversar, garoto.
Como imaginei, ao conduzir tio Oberto para dentro da empresa e em
seguida para a minha sala, a visita não era social. Ele já sabia o que fiz à
Clara e sua família e estava puto com isso.
— Só penso em como a sua mãe estaria decepcionada, Pedro —
disse ele, enraivecido — Deve estar se revirando no túmulo agora.
minha vida.
— Aquela garota e a família dela são pessoas decentes, Pedro. Seja
lá o que esteja pensando fazer, tem que parar, ou eu mesmo te dou a coça que
seu pai deveria ter dado há muito tempo.
— A única coisa que estou pensando em fazer, tio, é conseguir o
perdão da Clara — avisei, tão irritado quanto ele — E está sendo muito
difícil.
— Eu acho isso ótimo. É bem o que você merece e me faz admirar
aquela garota ainda mais — disse ele, agora sorrindo. Carcamano irritante!
— Você tem de aprender que na vida nem tudo é do jeito que você quer e seu
dinheiro não compra tudo. Honra e amor não se compram.
Eu aprendia isso da forma mais dura possível.
— Eu a amo. Eu amo de verdade, tio — confessei com desespero —
E a distância está acabando comigo.
Em tão pouco tempo, essa menina tinha chegado, revirado a minha
vida e se transformado em alguém muito importante para mim.
— Foi a Lídia que te contou?
Ela é uma mulher doente, tio. Não merece também ter o coração partido.
— Como você fez com a filha dela? Seria uma maldição dos
Santini?
— Você não é um Santini.
Figlio di puttana![1]
— Tio Oberto...
— Olha, rapaz, o tempo que tive com Beatriz me fez perceber o que
você levou meses para descobrir. O tipo que ela e sua família são: gente
decente — ele se aprumou na cadeira e cruzou os braços — Isso é tudo o
que tenho a dizer. Preocupe-se em arrumar as suas merdas.
Em uma forma mais direta: cuide da própria vida.
***
— acusou o rapaz.
Eu não queria e nem iria bater boca com um moleque. A única coisa
que me importava era Clara.
— Amor — dei dois passos em direção a ela — O que aconteceu?
Vamos conversar.
A tristeza e a angústia que via nela me destruíam por dentro.
— Por favor, fala comigo, Clara.
Eu só queria fazer com que ela ficasse bem. Seu sofrimento
significava o meu.
— Cara, você não acha que já fez o suficiente? — O rapaz voltou a
se colocar entre mim e ela — Já não basta aquelas matérias e imbecis na
faculdade chamando a Clara de prostituta?
Recuei. Não pelo garotinho tentando se impor, mas pelo que ele
disse. Primeiro, fiquei em choque, depois muito enfurecido com isso.
— É verdade?
Não precisei de uma resposta. Seus lábios trêmulos diziam tudo.
Parecia que todas as coisas que me envolviam traziam dor à Clara.
— Eu sinto muito. Eu sinto muito, Clara — olhei em direção à
entrada, onde outras pessoas começavam a sair — Me fala quem é, eu...
— Não, Pedro — seu toque em meu braço foi para me parar, mas
queria tanto isso que, por um breve segundo, o motivo não teve importância
— Por favor...
Ela partiu. Subiu na garupa de outro, abraçou sua cintura, apoiou a
cabeça em suas costas, e não pude fazer nada além de, com as flores em
minha mão, assistir.
Clara
consolada e ouvida por Juninho. E acreditei que estava bem, até me deparar
com Pedro parado em frente à saída da faculdade. Meu coração se encheu de
alegria em vê-lo, quis pular em seu colo e pedir que me levasse para qualquer
lugar onde o resto do mundo deixasse de existir.
Por outro lado, o medo e a mágoa, ainda tão vivos em meu coração,
foram como um balde de água fria em minha breve felicidade.
Acreditei que ficaria bem em simplesmente dar as costas a Pedro.
Dar o desprezo que sentia que ele merecia, mas não foi assim. Fiquei
arrasada. Nunca fui o tipo de pessoa que mágoa as outras pessoas de
propósito, mas a minha decisão em partir com Juninho tinha ferido Pedro. Vi
isso em seu olhar. E não foi nada fácil para mim.
Essa não era eu. E será que algum dia eu conseguiria trazer de volta
a antiga Clara?
— Você também.
Passei o cartão na catraca e entrei. Esse era um horário no qual
muitos estudantes estavam indo para casa, então o vagão estava cheio. Nem
me importei de ficar em pé. Passei o caminho todo refletindo. Torturando-me,
na verdade.
Fui dura demais com Pedro?
Algum dia eu iria conseguir, mesmo que não ficássemos juntos,
perdoá-lo?
Era como se dentro de mim, sei lá, existissem duas Claras.
Era claro que ele não iria desistir. Pelo menos, esse Pedro
determinado e teimoso eu conhecia bem.
— Olha — ele se aproximou, acuado — Eu não estou perseguindo
você.
Ele me fez lembrar de Suzana, quando se defendia de algo que nem
a tinha acusado ainda.
— Não? — Com a pergunta irônica, eu sorri — Não parece.
Acho que era primeiro sorriso que dava a ele em muito tempo.
achava impossível, você ficava mais firme. Dia a dia, você me mostrava
quem era você, Clara. E o que antes era uma atração com a qual eu não sabia
lidar, virou amor.
Ele não podia fazer isso. Eu tinha erguido um muro de gelo ao redor
do meu coração e Pedro não podia começar a derretê-lo.
— Lembra o choque que foi descobrir que fui o primeiro homem da
sua vida?
Ele tinha ficado atormentado e me deixado magoada e confusa.
saudade. Soltei um gemido nos lábios de Pedro, e isso o fez me abraçar mais
forte. Seu membro esfregou contra mim e eu notei que ele me desejava tanto
quanto eu o desejava. Isso, como o amor que eu sentia por ele, nunca iria
mudar.
O amor durava uma vida inteira. Mas isso ele precisava descobrir
sozinho.
Foi então que as palavras de Zia Nina vieram à minha cabeça.
“Você é o equilíbrio.”
Todo mundo sabia que não se largava o emprego, não um tão bom
quanto eu tinha, sem ter outro em vista.
— Olha o que te preocupa é questão do aluguel, não é mesmo? Ter
que sair do apartamento? A sua mãe e Suzana gostam muito de lá né?
Não era apenas por isso. Suzana ficaria chateada de perder o quarto
só para ela. Mas lugar era bonito, mais arejado e confortável para a mamãe.
Tinha uma cozinha maior que ela poderia usar se quisesse mesmo continuar
atendendo ao Lucchese. Era mais perto da escola da minha irmã. O bairro era
mais seguro e com Diogo por aí, isso contava muito.
— Sinceramente, não acho que o amigo do Pedro, ou até ele mesmo,
irão permitir que esse negócio de multa siga adiante.
Se Pedro estiver sendo mesmo honesto e arrependido do que fez,
Letícia tinha razão, a multa caso decidisse voltar para o apartamento antigo
não seria mais problema. Afinal, as intenções dele quando me levou para lá
eram outras.
Só que eu ainda tinha dúvidas e uma coisa chamada orgulho.
— Pra mim é uma questão de honra Letícia. Não sou a interesseira
que o Pedro imaginou quando me conheceu.
— Você disse bem, imaginou. Não é mais assim.
— Também está do lado dele agora?
Minha mãe. Suzana, Juninho e agora até Letícia que tinha ficado pê
sim. Eu disse que iria me erguer, sozinha. E é isso que vou fazer.
— Ninguém vai a lugar nenhum sozinha. Você ajuda todo mundo,
mas parece que não fica confortável em receber suporte.
Talvez ela estivesse certa e eu fosse orgulhosa demais. Por tanto
tempo precisei cuidar de mim mesma e da minha família sozinha, que não
sabia agir diferente.
— Certo, faça como achar melhor — diante de minha teimosia ela
entregou os pontos — Eu queria falar com você, porque fiquei imaginando o
que eu poderia fazer para te ajudar.
memórias, isso ninguém poderia tirar da gente. O meu pai estava dentro do
meu coração e eu iria carregá-lo comigo para onde quer que fosse. Assim
também parecia acontecer com Pedro. Ele estava dentro de mim. Acho que eu
nunca iria conseguir tirá-lo.
— Eu poderia alugar e quando acabar o seu contrato e você não
precisar pagar a multa, poderão voltar para o apartamento antigo.
Ela estava procurando um bom lugar para morar com a filha, mas
não estava sendo fácil.
— Eu teria que ver com o advogado, mas você tem certeza?
significaria para minha amiga, o que o atual significava para mim, um lugar
melhor para recomeçar.
— Eu não vou poder pagar muito, mas seria uma renda extra para
vocês — continuou ela.
Eu não cobraria nada para ela ficar lá e várias vezes tinha oferecido
para que viesse morar com a gente. Mas se existia algo que tínhamos em
comum era o desejo de vencer na vida pelo próprio esforço e com um
trabalho digno.
estávamos sozinhos.
— Já foi dito que é um projeto do banco.
Do banco? Eles não ajudavam ninguém, ainda mais um projeto sem
fins lucrativos que iria gerar muitos custos.
estava aborrecida.
— Isso tem coisa dele, né?
— Todo mundo já sabe? — indaguei, preocupada.
— Relaxa. Eu saquei porque pela sua reação, ficou meio óbvio —
ele coçou a cabeça — O cara tá mesmo querendo ajeitar as coisas. Dá um
desconto pro cara.
O sorriso voltou ao seu rosto — Somos homens. O milagre é não
fazermos merda.
manhã como sua namorada, coisa que Diogo nunca fez, nunca conheci ou
conheceria a família dele.
— Chegamos, senhorita — avisou o motorista.
Só quando tirei a mão da campainha que me dei conta que não tinha
ser tão bonito? A roupa escura que o fazia parecer um felino, pronto a atacar,
e os cabelos molhados fez com que eu desejasse passar os meus dedos entre
eles, não estavam ajudando.
— Eu... nossa — ele abriu um enorme sorriso para mim, dos que
faziam brilhar os olhos — Você está aqui mesmo.
— Ítalo Leite — disparei quando o vi se aproximar.
— Clara.
— Qual o seu problema? — indaguei furiosa, diminuindo a
distância entre nós — E aquele discurso todo de não mentir mais para mim e
manipular as coisas.
— Eu não menti e nem estou manipulando nada — ele passou a
mão nos cabelos, exasperado — Estava indo até a sua casa. Eu sei que não
quer que a procure na faculdade.
Mesmo que você fosse uma prostituta, se destacaria mais do que todos eles.
Ele me puxou para mais perto.
— Desculpe. Não quis manipular nada — confessou com suavidade
na voz — A culpa foi minha. Só pensei em amenizar os danos. Que tudo
frustrado.
— Você sabe que não é assim.
Juninho tinha razão, milagre era os homens não fazerem merda.
— Claro que, não. Ele não mentiu, enganou e nem foi desonesto
comigo.
Pela sua reação magoada, eu estava colocando o dedo na ferida e
girando dentro dela, mas Pedro precisa ouvir a verdade. Suas ações tinham
sido horríveis por mais que se arrependesse delas.
— Não aceita — ele segurou minha cintura e com a outra mão o
Achei que tinha sentido saudade dele, do seu toque, seus beijos, os
dentes arranhando a minha pele, mas só tinha real noção disse, nesse
momento.
— Pedro... — o nome escapou dos meus lábios quando a mão dele
palavras de Pedro.
— Não.
O empurrei o suficiente para deslizar por baixo dele.
— Clara — ele tinha um olhar intenso, selvagem.
— Não. Eu não quero.
A palavra mentirosa piscava em minha testa. Eu queria, e se tivesse
mais alguns minutos teria ido até o fim.
Ele se sentou de joelhos no sofá e me deu um olhar atormentado.
— Faz parte do castigo que quer me dar? — indagou, frustrado —
cada saída. Pelo mar e com uma embarcação não rastreada seria o caminho
mais longo, mas também o mais seguro, se eu não continuasse a perder
tempo. O maldito Santini continuava a cercar a Clara e eu não podia permitir
uma reaproximação deles.
Ela era minha. Sempre seria minha, custe o que custar.
— Diogo?
Afastei meu olhar da imagem caótica e de horripilante pobreza que
via através de uma fresta na janela, coberta por um papelão, e encarei
Clara
Eu não deveria ter feito isso, tê-lo procurado de novo. Agi sem
pensar. Procurava ser uma pessoa sensata, na maior parte do tempo, mas
também sou muito guiada pelas emoções. Não gostava de ficar protelando as
coisas, e na ânsia de resolver tudo com Pedro, caí em seus braços mais uma
vez.
Internamente eu me perguntava se não era isso que,
humorada de minha mãe — Fazia tempo que não via isso, filha. Seu sorriso é
tão bonito.
Ela veio até mim, e da forma carinhosa de sempre, passou a mão em
meu rosto.
de suas mãos não foi algo com que ele soube lidar. Exatamente como o
Santini. O Pedro vê no Giuliano uma ameaça real. Porque se alguém poderia
conquistar seu coração, seria ele. Você é atraída para ajudar os outros. Una
um homem ferido e o seu coração bondoso.
Eu nunca tinha pensado sobre nós três dessa forma.
— Eu acho que Giuliano já estava pronto para se reerguer e você
apareceu no momento certo. Mas ele está agradecido.
— Mas quem irá colocá-lo de volta às pistas é o Pedro.
Mamãe sorriu.
— Você é leal às causas mesmo quando quem defende não está com
você. O piloto admira isso. No fim, os dois são iguais. Atraentes e intensos. E
o Pedro se sente ameaçado.
— De onde vem toda essa sabedoria, Dona Beatriz?
Ela tinha que passar um pouco para mim, quem sabe eu fizesse
menos burradas na vida.
— Observo as pessoas e tenho alguns anos a mais de experiência.
— Não tenho interesse no Giuliano, além de uma possível amizade.
ir até Pedro.
— Eu não acho que você fez certo e nem errado. Agiu como o seu
coração mandou. Às vezes, precisamos ser guiados por ele.
— Ouvir o coração só me fez tomar decisões erradas e sair ferida.
Está na hora de usar um pouco mais a cabeça.
Ela abriu os lábios, ia me dizer alguma coisa, mas pareceu mudar de
ideia no último segundo.
— O que ia dizer?
eu dei uma olhada em volta. Com certeza Nick oferecia um ótimo serviço de
quarto, mas Giuliano parecia ser um desordeiro por natureza.
— Já tomou café?
Ele ergueu uma sobrancelha de forma irônica. Estava óbvio que eu
tinha sido o despertador dele. Notei que não era apenas a sua agenda de
trabalho que precisava de uma organização.
— Eu vou pedir o café e durante ele podemos falar sobre o meu
trabalho, pode ser?
nossos lugares.
Só agora eu me dava conta de como realmente queria o emprego.
— Mas eu preciso deixar algumas coisas esclarecidas.
— Apesar de tudo o que ele fez — ele parou a faca com requeijão no
Pedro
funcionando.
Dos três, o último era o único que ainda conseguia controlar. Apesar
de sentir que Diogo estava mais perto.
A movimentação de uma conta fora do país levou Vilela e
Montenegro a um destino. O desgraçado deixaria rastro, eu conseguiria pegá-
lo e finalmente fazer o acerto de contas com ele.
Já com Clara, as coisas não andavam nada fáceis. Ela era dura na
queda e estava me fazendo comer todos os pães que o diabo havia amassado
Joguei a caneta que havia estourado em minha mão e fui até a pia no
banheiro do escritório, lavar-me. Enquanto esfregava as mãos manchadas,
refleti um pouco. Eu não poderia seguir por esse caminho. Ficar cego de
ciúmes, além de me enlouquecer, só afastaria ainda mais Clara de mim. Não
mas também porque sua profissão puxava dele uma grande carga emocional,
além da exposição pública e todos os tipos de julgamento dentro e fora das
pistas.
Entre essas obrigações, ainda teriam as provas dos uniformes de
corrida, reuniões com a equipe e os testes no carro.
Meu trabalho era mantê-lo atento a cada compromisso agendado,
acompanhá-lo nos que fossem possíveis e manter pessoas indesejáveis, como
repórteres e fãs malucos, afastados. Um pouco diferente do meu trabalho com
Pedro, mas, a meu ver, muito mais fácil também.
chefe.
Enquanto aguardava o retorno dele com o Sr. Carvalho, a secretária
me fez companhia. Ela me mostrou fotos de campanhas e os modelos de
óculos da coleção anterior.
— A Solar também quer competir com o mercado europeu — ela
explicou ao pegar de volta o catálogo que eu tinha folheado — Por causa do
Sr. Milanesi, a empresa acredita que começar pela Itália é o melhor caminho.
— Eu acho que é uma ideia excelente.
A porta foi novamente aberta e um Giuliano estranhamente calmo e
segurar o meu rosto com as duas mãos — Você tem traços muito bonitos. Os
óculos ficariam lindos em você. E lembra bem a atriz que estaria na
campanha. Não vamos ter que mudar exatamente nada. Além disso, foi um
pedido do Sr. Milanesi, impossível de recusar.
multa do contrato de aluguel, mas também tudo o que Pedro havia gastado no
apartamento de Suzana e ainda sobraria uma boa quantia, até para financiar
um novo se eu quisesse.
— Isso é realmente verdade?
— Se você aceitar, sim.
Nos últimos anos, eu tive dias de muita luta, trabalho árduo,
decepções e sofrimento.
Será que a vida estava realmente sorrindo para mim? Ou em algum
momento eu teria que pagar um alto preço por essa chance?
quebrassem esse voto, a culpa não estava em mim, por acreditar e ser correta,
mas sim em quem não podia ser.
— Eu vou confiar — sorri, agora bem mais animada — Mas eu mato
você se for um fracasso.
— Pela minha vida — ele ergueu a mão em tom de brincadeira — é
melhor que não seja.
Giuliano riu, e o Sr. Carvalho foi chamado de volta à sala. Ele me
explicou com mais detalhes os prós e contras da campanha e do contrato que
campanha do Giuliano?
— Qual o problema com isso?
Recuei um pouco quando o vi se agigantar, ficando possesso.
— Qual o problema? Esse idiota só está querendo te cercar. Primeiro
com o emprego, agora com essa campanha. Ele quer te roubar de mim.
O ciúme geralmente deixava as pessoas irracionais. Pedro Santini ia
para um patamar bem além.
— É só um trabalho, Pedro — retruquei, no mesmo tom — E não dá
para roubar de você o que você não tem.
Com isso, eu o atingi. Vi isso pela forma como piscou os olhos e se
encolheu, como se eu tivesse o agredido fisicamente.
Só que quando eu feria Pedro, sentia que também me feria. Não me
O Pedro tinha que aprender que o que ele fizera não foi certo. Se ele
sofria, eu padecia muito mais com a nossa separação, e não tinha feito nada
para merecer isso.
— Os adultos dizem isso — de irritada, ela me encarou triste e com
lágrimas nos olhos — Mas sempre estão errados.
Minha vida seria tão mais fácil se eu conseguisse enxergá-la com a
mesma simplicidade de Suzana.
— Eu gosto dele — ela choramingou, e me deu um aperto no peito
tentando fazer com que isso não transparecesse, pelo menos hoje.
Por isso, quando toquei a campainha do apartamento antigo e Lelê
veio, toda feliz, me atender na porta, eu exibia um enorme sorriso.
— Clara! — Ela pulou sobre mim antes de me puxar para dentro —
Bem-vinda ao meu novo lar, amiga.
Foi esquisito olhar para o meu antigo apartamento, agora quase
vazio. Letícia não conseguira mobiliar tudo ainda. Sabia que ela tinha
comprado o fogão e a geladeira. Que tinha ganhado da tia e dos primos o
quisemos cancelar o pagamento dos aluguéis, eu não precisaria mais, mas ela
foi irredutível.
Acho que tinha a ver com o que a mãe dela tinha falado quando ela
saiu de casa, carregando as malas e a filha nos braços. Que Letícia não era
capaz de se virar sozinha e que quando ficasse arrependida não fosse procurar
ajuda, porque ela não a aceitaria de volta. E o que me deixou mais chocada,
quando me contou chorando, que ela não se atrevesse a ficar grávida de novo,
porque lidaria sozinha com as consequências.
O que a mãe dela não sabia, era que a filha não estava sozinha. Eu e
toda a minha família a amávamos. Como uma mãe podia jogar tanto ódio e
previsões ruins para a própria filha?
Não. A minha amiga seria feliz aqui, tanto quanto nós fomos. E ela
venceria na vida, porque era uma garota guerreira.
Depois de ver todos os cantinhos que ela tinha organizado do seu
jeito, fomos nos arrumar. Enquanto uma pintava as unhas, a outra hidratava
os cabelos. Fiz cachos nos dela e Letícia deixou os meus ainda mais lisos
com a chapinha. Maquiamos uma a outra e cuidamos dos detalhes finais.
Ela quis dividir um Uber para irmos até o salão alugado pela escola,
para a festa, mas eu insisti que seria parte do meu presente de formatura. Ela
precisava economizar o máximo de dinheiro que conseguisse.
A noite iniciou bem divertida, como esperei. A prima de Letícia, a
pouco antes de Letícia retornar à mesa — Vai se arrepender muito de não dar
valor à filha que tem.
Isso era algo que eu também acreditava.
— Trouxe um Ice para você, Clara — Letícia entregou a bebida
quando voltou e ocupou a cadeira do outro lado da mesa, deixando vazio
onde estivera ao meu lado — De frutas, como você gosta.
Agradeci com um sorriso e dei um pequeno gole. Não era muito
resistente ao álcool, então precisava me policiar.
— Minha nossa senhora! — olhei, entre divertida e curiosa, para a
Eu era fraca para bebida, mas acho que ela seria a única coisa capaz
de me ajudar essa noite. Porque achava que nem os anjos no céu
conseguiriam.
Capítulo 10
Pedro
Eu tinha recebido duas importantes recomendações de Nick para
essa noite: não perder a cabeça, não importasse o que acontecesse, e agir com
cautela. E segui para o local reservado para a formatura de Letícia muito
inicial eu já dei.
Sinceramente, não acreditava que Clara ficaria por muito tempo
aborrecida com Nick. Não era do feitio dela.
— Cansei de ter paciência.
— Me amar é errado?
Ela aquiesceu, balançando a cabeça, e isso fez os cabelos cobrirem
seu rosto, que mais uma vez e com carinho afastei com meus dedos.
— Não, querida — balancei, levando-a comigo — Errado é ficarmos
longe.
Eu tinha a grande consciência do mal que tinha feito a Clara. E
mesmo estando em meus braços e querendo permanecer neles, ela se sentia
insegura.
E isso era o que mais doía em mim e me fazia sofrer. Eu a tive
Letícia tinha se divertido muito e estava alta, mas não tanto como
Clara.
— Pelo visto — disse em tom amargo —, ainda tem as piores
impressões sobre mim.
uma mistura explosiva. Eu precisava usar toda a minha força de vontade para
manter o controle.
Como eu esperava, convencer Clara a encerrar a noite não foi uma
tarefa fácil, mas alguns minutos depois eu a tinha em meu carro, ajudando-a a
colocar o cinto de segurança.
O caminho foi feito ao som de seu cantarolar feliz e desconexo.
Claro que com muitos refrões dedicados a mim, que ressaltavam como eu
tinha sido um belo filho da puta.
— Desencana, facilita, deixa eu viver em paz — ela cantou alto —
peito.
— Você acredita mesmo nisso, pequena? — indaguei ao estacionar
o carro na frente do seu prédio.
Não era cem por cento a Clara dizendo essas coisas para mim, mas
uma parte dela que eu tinha quebrado e que já não sabia mais o que fazer para
consertar.
— Se eu fosse sensata, deveria acreditar.
— Pessoas sensatas não amam como nós.
Passei a língua inteira por ela, e isso fez Clara gemer e fincar as
mãos no banco. Intercalava as lambidas e chupadas, às vezes beliscava seu
clitóris com os dentes e ela se oferecia mais a mim.
Eu amava vê-la se entregar desse jeito. Tinha sentido saudade pra
cacete.
— Hum... — os gemidos e pedidos vinham em tons suplicantes —
Pedro...
Comecei a sugar seu nervo inchado, enquanto introduzia dois dedos
dentro dela. Clara me acompanhava, movendo o quadril. Esfreguei os meus
dedos no local que sabia que causaria ainda mais prazer.
— Ah... — ela convulsionava com as minhas carícias — Assim.
O orgasmo estava próximo. Uma chupada mais forte em seu clítoris
aconteceu?
— Não se preocupe — avisei rapidamente — Ela só se divertiu
demais. Posso colocá-la na cama?
Em resposta, ela se afastou e abriu mais a porta para que eu pudesse
passar. Aproveitei de cada minuto que tinha para manter minha pequena em
meus braços. Ela balbuciou algo quando a coloquei na cama e sorriu.
Registrei esse momento em minha memória, guardaria pelo restante dessa
noite e além disso.
— Obrigada por ter cuidado dela — disse sua mãe, quando apagou a
— Vocês se acertaram?
Não tinha como dizer a ela o que aconteceu dentro do carro, há
alguns minutos, e sua pergunta nem se referia a isso.
— Um passo de cada vez — repeti a frase de Nick — Mas eu sei que
a Clara me ama e isso renova as minhas esperanças. Sinceramente? Já não me
faz sofrer tanto ter que lutar por ela. Vale a pena cada batalha.
— Sei que é um rapaz bom e irá fazê-la feliz.
Nem que isso custasse a minha vida. A intensidade desse
Clara
porque apenas lembrar esses momentos juntos me causava calor. Muito calor.
Mas Pedro não estava aqui e eu precisava lidar com essa frustação
sem sentido. Saltei da cama, e após escolher uma roupa, fui para o banheiro.
Um banho relaxante ajudou a colocar minhas ideias no lugar e
acalmar o meu corpo. Dei uma rápida ajeitada no quarto antes de sair. Suzana
já estava acordada, vendo TV na sala. Baguncei ainda mais os cabelos dela,
que não reclamou, isso queria dizer que estava começando a me perdoar por
ter expulsado de casa a sua mais nova pessoa favorita no mundo.
Encontrei minha mãe na cozinha. Ela estava fazendo bolos para o
que nunca.
— Então o perdoe, amiga.
— Acho que já fiz isso, embora não esteja pronta ainda para admitir.
Eu sabia que o único sentimento ruim que ainda carregava em meu
peito era o medo de voltar a me machucar.
— E eu não sei o que pensar. Não tenho notícias dele desde ontem.
Foi a primeira vez que chegamos bem perto de sermos o mesmo
casal de antes, e esse sumiço inesperado de Pedro me colocava insegura.
— Talvez ele esteja dando o fim de semana para você refletir. Ainda
tenho um ranço dele — disse Letícia — Mas tenho que admitir, ele está se
esforçando, Clara.
Ela tinha razão, mas tudo em nossa história era conturbado e
confuso.
No fim da noite, finalmente recebi uma mensagem de Pedro.
“Eu te amo.”
Apenas isso. Três palavras que significavam muito e levaram
embora um pouco da insegurança pesando em meu peito.
Pedro
Meu fim de semana não foi nada bom. Apesar de termos colocado as
mãos em João Rodrigues, ele levou muito tempo para abrir a boca e revelar o
esconderijo de Diogo. Quando a polícia invadiu o barraco no Capão
Redondo, no fim do domingo, o lugar já estava vazio.
O desgraçado mais uma vez tinha fugido por entre meus dedos,
como areia. E só não fiquei completamente enlouquecido pela raiva porque o
cerco em volta dele estava se fechando.
Mas me preocupava muito a ameaça que ele tinha feito por telefone.
Aproveite seus momentos com Clara. Serão os últimos.
A última vez que tive uma intuição tão ruim, foi quando meus pais
foram assassinados. E com esses pensamentos angustiantes, enviei uma
mensagem a Clara assim que saí do esconderijo de Diogo.
Não fui capaz de dizer nada além das três palavras que resumiam
tudo o que eu sentia por ela.
Se eu pudesse, teria feito tudo diferente.
***
Na segunda, cheguei bem cedo ao escritório, mas não consegui
manter a minha mente conectada por muito tempo. Hoje teria a primeira
prova do carro e decidi ir até a pista de treino.
Cheguei à sala, de onde poderia observar o galpão, e percebi que
havia uma discussão acontecendo entre o engenheiro e Giuliano, já em seu
mesmo tempo que eu me preocupava com ele, sentia muita raiva. Ele podia
ser um bom motorista e achar que dirigia melhor que o restante dos mortais.
Estávamos falando de um carro de corrida que poderia chegar a até 360k/h.
O Fórmula 1 é um carro agressivo porque ele acelera mais, faz mais curvas,
freia e tem mais tecnologia. Além disso, mesmo Giuliano tendo ficado algum
tempo fora das pistas, ele era um piloto profissional, conhecia e dominava as
técnicas.
— O senhor tem que fazer alguma coisa — disse ao engenheiro
esclarecia uma ou outra coisa para mim. Eu só via os dois correndo lado a
lado, as vezes muito grudados um no outro e a cada curva eu sentia que iria
desmaiar.
— Ele é bom — disse Duarte em uma empolgação completamente
masculina — O Sr. Santini poderia ter seguido a carreira. Ele tem aquele dom
natural.
A meu ver Pedro estava agindo como a pessoa mais estúpida do
mundo. Nada justificava ele colocar a vida em risco dessa forma.
conseguia desejar que isso terminasse logo. Teve uns momentos quando
Pedro conseguiu ficar na frente do piloto ou tê-lo ultrapassado em alguma
curva que vibrei feliz. Não consegui evitar. Mas nesses últimos momentos eu
me senti tensa.
Principalmente quando Duarte recebeu mensagens em seu
headphone e começou a se afastar de mim, conversando de forma tensa com
a equipe.
Alguma coisa estava errada, eu sentia.
conseguia ter coragem para olhar o acidente, precisava saber como Pedro
estava.
Quando finalmente consegui descobrir meus olhos nublados pelas
lágrimas, observei que a equipe de socorro seguiu rapidamente para o lugar.
dele.
Eu sabia que Giuliano deveria estar precisando de um apoio
emocional e rapidamente outros membros da equipe chegaram até ele. Só que
no momento tanto a minha mente como coração estavam em Pedro.
Vi quando ele saiu segurando o volante do carro e depois tentou tirar
o capacete. Foi colocado em uma maca, mesmo querendo lutar contra isso e
levado ao ponto de socorro.
Tinha muitas pessoas em volta e eu só consegui segui-los,
apreensiva. Não pude entrar na sala onde ele estava sendo atendido, durante
Um soluço escapou dos meus lábios e isso o fez saltar da cama e vir
apressado até mim. Quando Pedro me abraçou eu tremia tanto que não o
repudiei.
— Está tudo bem — ele sussurrou afagando as minhas costas — Foi
só um problema no carro e não comigo.
— Você podia ter morrido — disse entre soluços — Na minha
frente.
Eu conseguia pensar e lembrar disso. Pedro poderia ter morrido na
minha frente e eu não poderia ter feito nada. Isso arrasaria comigo.
— Porque você não foi pescar. Ou... ou lutar box. Correr como
sempre faz — meu nível de fúria estava se elevando — Não. Você tinha que
bancar o todo poderoso Santini que pode tudo. Odeio você.
Tive que me afastar saindo a sala pois eu não sabia o que seria capaz
de fazer com Pedro.
— Você foi completamente inconsequente em não apenas colocar a
vida em risco, mas trabalho de toda a equipe — encarei-o agora mais
desapontada do que nervosa — Não pensou em Giuliano e o que tudo isso
— Você não quis conversar quando eu pedi que não entrasse naquele
carro. Então não me peça isso agora.
Saí pisando duro e soltando fogo pelos olhos. Fui a procura de
Giuliano. Encontrei-o do lado de fora, apoiado contra um poste, fumando um
cigarro. Eu não fazia ideia de como ele tinha conseguido esse veneno, mas
tendo a consciência que os últimos minutos foram tensos, não chamei a
atenção dele. Aproveitei enquanto ele finalizava para chamar um carro para
nos levar de volta para o hotel.
O caminho foi feito em silêncio e eu respeitei esse momento de
Giuliano. Se ainda estava sendo difícil eu ter que lidar com momentos de
medo, não conseguia nem imaginar o que ele poderia estar sentindo com
tantas lembranças a amagar, justo no dia que entraria em um carro de corrida
deixar Giuliano sozinho. Imaginando que ele pudesse ter uma recaída e
fizesse besteira.
Eu tinha diante de mim dois homens ricos, bonitos, talentosos, mas
pareciam as pessoas mais perdidas no mundo.
***
respiração pesada.
— Esse fim de semana foi uma grande merda — disse ele e
rapidamente tentou se explicar — Não a parte que envolve a nós, que foi
maravilhosa. Eu estive com ele nas minhas mãos.
— O Diogo?
— Chegamos tão perto dessa vez. Só mais alguns minutos e... o
desgraçado conseguiu escapar. Outra vez. Eu só queria que esse inferno
acabasse logo.
Fazia sentido Pedro ter perdido a cabeça hoje. Não justificava, mas
fazia sentido. Tudo que mais desejou na vida, foi justiça em relação a morte
de seus país. Foi essa justiça e desejo de vingança que nos separaram.
Além disso, com Diogo a solta todos estavam em risco e isso
também me preocupava. Não por mim, mas com o que ele pudesse fazer
contra a minha família e a Pedro.
— Ele não vai fugir por muito tempo — disse cheia de esperança —
Tenha fé nisso.
O mal não podia sobrepujar o bem. Sempre acreditei nisso e tinha fé
alguns deles para elas, principalmente a minha mãe que por causa do LES
não podia pegar sol.
— Por hoje é só isso — disse o fotografo quase cinco horas depois.
A maioria das pessoas — inclusive eu, tinha pensado assim — que a
vida de modelo era uma moleza. Comparado a alguns trabalhos braçais, não
era tão ruim, mas tinha seu lado cansativo também. Muitos minutos na
mesma posição mantendo um sorriso. São horas tendo que parecer plena e no
final do dia minha mandíbula doía de tanto que fui obrigada a sustentar o
sorriso o carão de mulher fatal.
— Por enquanto acho que material que temos é suficiente — avisou
o fotografo — Podemos dar início ao que a marca quer.
Ele me disse que as imagens seriam tratadas e que paisagens seriam
Pedro
era mesmo muito bom e não facilitou nada para mim. Só que aí, nas últimas
voltas, percebi uma falha no carro e comuniquei a equipe. Não conseguia
frear e a única solução era usar a mureta de proteção para desacelerar e parar
o carro. O estrago foi mais na máquina do que em mim. Fiquei apenas zonzo
mim, estava na Domino. Por ser segunda a casa de Nick estava fechada, mas
ele estava cuidando de alguns detalhes da administração e pelo que imaginei
ao ver o negro alto e com uma camiseta preta da Polícia Federal de algo mais
importante.
mais.
— Nick...
— Está tudo certo, Pedro. Você já tem muito com o que se
preocupar. O que aconteceu agora? A última vez que te vi foi saindo com a
Clara da formatura e sinceramente, pensei que não teria notícias suas por um
bom tempo.
Não adiantava forçar. Nick só falaria o que poderia estar
preocupando-o em relação a boate quando quisesse ou estivesse pronto.
Fiquei em dúvida em despejar sobre ele os meus problemas mais uma vez.
Talvez devesse ter ido procurar meu avô. Ficamos bem mais próximos após
minha visita a ele.
— Acho que eu não deveria ter vindo...
— Pedro. Desembucha.
Concordava com ele, mais do que isso, a certeza que precisava pará-
lo estava me deixando maluco.
— Eu sei que não é fácil Pedro. E nem sei como reagiria se minha
família ou a mulher que eu amasse estivesse em perigo — disse ele depois
que narrei os acontecimentos desse dia — Mas se não mantiver a cabeça fria,
o Diogo vence. O que ele quer é desestabilizar você.
— Falar é mais fácil do que agir Nick. Quando penso em qualquer
coisa que ele possa fazer à Clara, perco a razão.
Eu morreria por ela se fosse preciso.
— Você tem que lembrar que Giuliano não é seu inimigo — avisou
ele — O Diogo é.
Nick tinha razão por que embora Giuliano representasse um perigo
Clara
Era o terceiro dia de teste com o carro e embora o segundo tenha
sido tranquilo, fiquei angustiada de ver Giuliano entrar dentro dele, por isso,
seja, isso era um problema de Aron. Deveria ser por isso que eu,
infelizmente, tinha que contar com a presença de sua, nada agradável, esposa.
— Soube que não trabalha mais com Pedro — disse ela — Foi mais
rápido do que imaginei. Eu, pelo menos fiquei mais do que alguns meses com
ele, sabe.
Eu poderia dizer a ela que não estar mais com Pedro tinha sido
decisão minha, mas isso só provaria que ser venenosa comigo estava me
afetando.
— Cada um sabe o valor que tem — encaro-a com um sorriso tão
Talvez ela tivesse razão em alguns aspectos, mas sabia que Pedro
nunca teria me forçado a fazer o que eu não me sentisse confortável.
— Se eu fosse você não teria tanta certeza, assim — alertei
munindo-me de toda a confiança que eu era capaz — Me subestimar pode ser
precisa ser sempre honesto comigo. Além disso, apesar de toda a diversão
pesada, vai ter algum tipo de arrecadação beneficente ou algo assim —
explicou ela depois abriu um sorriso debochado, levando a mão ao peito —
Veja só, esse povo tem coração.
***
Nunca fui o tipo de mulher que olhos brilhavam diante de uma joia.
A mais cara que “usei” foi o colar que Pedro me deu, ainda na Itália quando
se revelou como um Dom. Contudo, quando passei em frente a uma joalheria
elegante dentro do Éden ao sair do trabalho, uma ideia empolgante me veio à
cabeça.
até retornar da fazenda, onde Lídia tivera uma crise de ansiedade, fazendo-a
desejar voltar para casa.
Sobre a minha irmã ela ficou mais tranquila e eu consegui convencê-
la a continuar por lá. Fiz com que compreendesse que não ter que ficar de
olho nela o tempo todo, facilitava o meu trabalho. Antes do fim da conversa,
e o pouco que me falou, me fez perceber que seu desespero estava mais
ligado à convivência quase que forçada com Fernando, do que com a
preocupação de que Diogo viesse a me atacar.
Já a bomba que Nick jogou sobre meu colo me deixou muito mais
furioso e angustiado.
— Que merda você tem na cabeça para fazer o convite, Nick?
Por sempre ter sido um bom amigo eu me controlava para não socar
a cara dele.
— Quem fez o convite foi o Aron, se você não se lembra. E quem
reforçou a presença de Clara foi a Letícia.
— Porque você convidou a Letícia — disparei, furioso — Você nem
está transando com ela. Por que decidiu levá-la?
Pelo que eu sabia, Letícia era mais dura na queda do que Nick tinha
imaginado, o que só o fazia ficar mais interessado nela. Os homens eram
assim. Gostavam da caça, já Nick adorava um desafio.
— Letícia queria conhecer — ele deu de ombros e dirigiu a atenção
Nick e Letícia, e que eu soubesse que ambos cuidariam dela, nada no mundo
me faria ficar tranquilo e confortável. Eu sabia bem o tipo de pessoas e jogos
aconteceriam no local.
— É claro que eu vou — disse pegando outra dose de uísque.
De jeito nenhum eu permitiria que minha pequena andasse
desprotegida em meio aos lobos.
— Se eu fosse você eu não diria nada a ela — aconselhou Nick.
A sugestão me pegou de surpresa. Ele era o que mais incitava que eu
fosse sempre honesto com Clara.
entrasse no quarto.
Fiquei admirado em como tudo parecia muito limpo e organizado.
— Quer tomar algo? — ofereceu ele.
Na mesa eu só vi garrafas de água, latas de refrigerante e uma
variedade de petiscos.
Pelo que via ele estava levando a sério não consumir bebidas
alcóolicas.
— Eu não pretendo demorar. Gostaria de falar com você sobre a
Clara.
Ele não emitiu espanto com o que eu disse, achava que já esperava
por isso. O que tínhamos a lidar sobre trabalho era feito através dos
advogados, a assistente dele e seu agente.
— Eu amo a Clara.
chateada. Mas jurei pela minha vida que por ela, por esse sentimento que só
cresce em meu peito, cada dia tentarei ser um homem melhor. Para ela e as
pessoas a minha volta.
— Por isso está aqui?
— Não. Estou aqui para dizer que não sei as suas intenções com ela,
mas eu confio na Clara, no seu amor por mim, porque sim, ela me ama. E vou
lutar por ela a cada minuto da minha vida. De forma justa e limpa. Eu
esperaria que você fizesse o mesmo se essa for sua pretensão.
Após meu discurso ele apenas me encarou. Absorvendo as minhas
palavras ou articulando outras contra mim. Que se foda. Eu disse o que
precisava dizer e estava feito.
— Ela não me quer — ouvi a voz dele quando seguia até a porta —
Se há uma coisa que você pode ter certeza, Santini é que essa garota te ama.
Então não estrague tudo quando ela te der uma segunda chance. Nem todos
conseguem isso.
Fora dos esportes eu não seria o maior fã de Milanesi, mas se ele
tivesse sofrido com a mulher que um dia amou e talvez ainda amasse, o
mesmo tormento que passei ao achar que tinha perdido Clara, eu poderia
entender ele ter caído tão fundo.
— Obrigado.
Ele assentiu balançando a cabeça. E isso era o mais próximo de um
que fizesse comigo, durante as minhas longas noites solitárias, e que por
orgulho não me permitia ter, deixava-me maluca.
Eu era dele, sempre soube disso, mesmo quando tentei negar a mim
mesma, mas Pedro era meu também. Isso nunca iria mudar. E ele sempre
estivera certo ao dizer que fomos feitos para ficarmos juntos. E essa noite eu
iria provar que sim.
— Uau! — disse a minha mãe quando me viu sair do quarto —
Quem você quer matar do coração? Não. Não precisa me responder.
Mordi o canto da boca, nervosa.
olhando pela janela enquanto recordava dos momentos mais importantes com
Pedro. Conjecturando o quanto a nossa relação mudaria mais uma vez essa
noite e no que o futuro nos reservava.
Mal prestei a atenção na interação entre Nick e Letícia, voltando a
mim, apenas quando chegamos em frente a um imponente casarão. A
arquitetura era do tempo colonial, mas estava tudo muito bem conservado.
Nós descemos do carro e um valete veio pegá-lo.
— Nossa! — Letícia puxou o meu braço para cochichar — Isso aqui
é inacreditável.
Eu estava tão encantada com tudo que via que meu coração chegou a
dar um pulo no peito, quando reconheci a voz do homem que se identificava
na porta.
— Santini — disse ele, em um tom firme e calmo, bem diferente de
como eu me sentia — Pedro Santini.
De onde ele tinha surgido?
Como que puxado por alguma força magnética, seu olhar encontrou
o meu. Intenso e profundo como um lago escuro que eu desejaria mergulhar.
as instruções.
— Vermelho significa que estão acompanhadas e ninguém pode
tocar em vocês — disse uma mulher, usando uma roupa sexy de couro, ela
segurava uma bandeja dourada, contendo várias pulseiras — Amarela estão
abertas a convites. E azul, tudo é permitido.
— Vermelho — dissemos juntas.
Na verdade, achava que nenhuma de nós realmente tinha consciência
do mundo que estávamos prestes a nos meter. Contudo não consegui prestar
muita atenção nas dúvidas que Leticia tirava. Estava focada em Pedro, que
também não parecia prestar muita atenção no amigo.
Devido ao seu olhar em chamas, toquei o colar em meu pescoço.
Não iria mentir dizendo que não sabia o efeito que isso causaria nele e
principalmente o significado disso.
Eu o vi balançar a cabeça, negando algo para Nick e depois esfregar
o rosto antes de se afastar para o final do corredor.
— Senhoritas — disse Nick, a atenção focada nas pulseiras
colocadas em nossos pulsos — Podemos seguir?
evento comum.
Nick riu antes de pegar com garçom, usando calça social, mas sem
camisa, duas taças de champanhe para nós. Ao que eu via, os homens de
peito nus e as mulheres com lingeries sexys eram as únicas provas de que
realmente estavam em uma festa “adulta”.
— Esse é apenas o primeiro ambiente — avisou ele e apontou a
escada — A melhor parte está no andar de cima. Fizeram bem em escolher o
vermelho.
Um sorriso safado surgiu no rosto dele ao encarar Letícia. E pelo
olhar provocador de minha amiga, ela estava bem propensa a mudar de ideia
e trocar sua pulseira para amarelo. Eu por outro lado, só pensava em
encontrar Pedro. Até que o vi do outro lado da sala. Observei o curioso grupo
com bastante atenção. Aron próximo a lareira, degustando algum drinque de
que eu.
— Quem é a mulher se pendurando no Pedro? — Letícia fez a
pergunta queimando em minha boca.
A mulher que não estava recebendo a atenção que esperava, olhou
para nós e abriu um largo sorriso para Nick. Ouvi Letícia bufar.
— O homem é o senhor Möller e a loira a mulher dele, Natasha —
eu disse a Letícia — A outra eu não sei, mas acho que Nick pode nos dizer,
não é mesmo?
De repente ele tinha duas mulheres o encarando com fúria.
o mesmo comigo. Eu tinha vindo até aqui com o propósito de deixar isso
esclarecido, mas não contei que tudo pudesse sair do controle como estava
acontecendo.
— Senhores e senhoritas! — Uma voz vinda do fundo da sala
chamou nossa atenção — O salão está aberto.
O grupo começou a se desfazer em direção onde o homem
desapareceu. Nick e Letícia seguiram na frente, concentrados em uma
conversa que parecia bem acalorada. Se ela estiver sentido por ele, metade do
ciúme que Pedro me causava com a morena forçando a barra, coitado do
diabo ruivo.
— Clara?
Pedro segurou o meu braço e fez com que eu parasse na metade do
caminho. A mulher já não estava grudada nele.
ser provocado um pouco. Não tinha nada que permitir que aquela mulher ou
qualquer outra chegasse perto dele. Isso me deixava fora de controle, algumas
vezes querendo chorar de raiva e outras de arrancar os cabelos dele.
Era muita tensão acumulada. Nós estávamos levando um ao outro ao
limite e em algum momento daria merda.
— Por que está aqui? — indagou ele, bastante frustrado.
Nos enfrentamos com o olhar cheio de acusações.
— Por que você veio? — devolvi a pergunta.
— Estava... — ele começou a dizer e no último segundo pareceu
fiquei bem ciente das mãos em minha cintura e o seu corpo colando no meu
— É apenas o começo, pequena. Você acha que conseguirá lidar com isso?
A sua pergunta desafiadora me deu forças para me desvencilhar dele
dançavam.
Se eu estava cem por cento segura do que disse a Pedro? Não. Mas
ele não precisava saber disso, pelo menos agora.
Pedro
Clara, a levaria para um canto seguro e a faria ver que esse não era um
ambiente que a agradaria. Ela curtia nossos momentos de sexo mais
apimentando, mas aqui estávamos falando de sexo sem limites e perversão.
Algo normal para mim, mas que chocaria minha menina.
Só que eu não contei que cruzaria com ela na entrada. Eu tinha me
afastado para tentar ligar para Nick e saber se eles tinham chegado e depois
de inúmeras tentativas sem respostas, decidi procurá-los lá dentro.
Mas podia ser capaz de sentir a presença de Clara mesmo a
quilômetros e quando a vi parada atrás de mim, tão linda e perfeita, a única
coisa que desejei foi arrastá-la para o meu carro e levá-la embora. Até que vi
o colar em seu pescoço.
Clara não era muito de usar joias, principalmente colar. Por isso,
rapidamente entendi a mensagem. Ela tinha um dono.
minha vida e pago um alto preço para isso, mas estúpido eu não sou.
Vendo que não me convenceria com suas desculpas falhas, ela me
encarou com rancor.
— Ela não vai aguentar muito tempo nesse mundo — disparou,
venenosa — Aposto que antes do fim da noite sairá fugindo como uma
gatinha assustada.
Tomei o último gole de minha bebida antes de me dirigir a ela.
— Vou dizer algo e espero que seja a última vez que eu faça isso —
indiquei com o copo vazio a pista onde as pessoas se movimentavam felizes,
inclusive o motivo do meu discurso — Está vendo aquela linda mulher? Ela
fez algo que nunca achei que aconteceria. Roubou meu coração e fez eu
apaixonar-me por ela. Eu não apenas amo a Clara, sou completamente
maluco por ela. De uma forma e com uma intensidade que você nunca irá
entender.
Voltei a olhar Natasha, agora de forma dura.
— Então nunca mais tente se aproximar dela ou colocar qualquer
intriga entre nós. Você não vai gostar de saber o que eu posso fazer quando
provocado, Natasha.
O que disse a Giuliano em nossa conversa foi sincero. Eu tentaria de
agora em diante, ser uma pessoa mais paciente e agradável com as pessoas ao
meu redor, porque isso deixaria Clara contente, ao ver que que eu me tornava
alguém melhor, mas tudo na vida tinha um limite. O meu era qualquer um
que cogitasse ferir minha pequena. Encontrariam uma fera implacável.
— Faça como quiser, Pedro — ela se esforçou para manter uma pose
segura — Só não venha dizer que eu não avisei.
Eu diria onde ela deveria enfiar seus conselhos, mas não queria mais
perder o meu tempo com Natasha.
Voltei a minha atenção a pista onde o som havia diminuído. As luzes
na pista pararam de girar. E as pessoas interromperam a dança para observar
um casal se aproximando.
O homem vestia apenas calça preta de couro. Ele puxava uma
corrente onde a outra ponta estava amarrada a uma coleira postural, que
cobria todo pescoço da mulher que ele arrastava. Os pulsos dela estavam
presos com duas pulseiras de couro que se uniam. No rosto ela tinha uma
mordaça ring gag revestida em tiras de couro, os fios de aço prendiam o nariz
e restante cobria a boca, mantendo-a aberta para o uso de seu dom. E essas
eram as únicas peças em seu corpo nu.
As pessoas se espalharam pelo salão outras como Clara, Letícia e
Nick, ficaram próximos, observando a cena.
Lembrei que Clara sempre havia afirmado que apreciava tudo,
menos sado e o que ela estava prestes a presenciar com toda certeza
reforçaria esse pensamento. Isso nunca me preocupou, eu conhecia partes
bem pesadas desse mundo, mas também não curtia violências extremas.
Brincar com velas, facas e chicotes entre outros acessórios me satisfaziam
desde que usados dentro dos meus limites e da parceira.
Agora o que me preocupava mais eram as palavras de Natasha. O
quanto disso faria Clara correr assustada dessa vida que por muito tempo eu
achei que me completava e realizava em relação ao sexo.
Fui me aproximando de Clara, enquanto a cena começava se
desenrolar.
A mulher ficou de joelhos. O homem passou a mão por seu rosto e
cabelos. Havia quase uma dança de sedução antes da parte mais intensa
surgir.
Ele tirou de suas calças uma cane, que era uma espécie de chicote de
Depois ele a fez ficar novamente de joelhos e chupar o seu pau até
que gozasse na garganta dela. Não houve penetração. Nem sempre acontece.
Cenas como essa serviam para mostrar que era possível sentir prazer até
mesmo com a presença da dor.
Com o show encerrado, procurei Clara ao meu lado. Vi quando se
afastou correndo, indo em direção ao banheiro, mas não fui rápido o bastante
para alcançá-la e teria derrubado a merda da porta se Nick não tivesse
segurado meu ombro.
trazer Clara a essa parte da minha vida, assim. Eu a levaria quando estivesse
pronta a encarar tudo de forma que não ficasse assustada ou impressionada
demais ao ponto de desejar fugir.
— Vamos tomar uma bebida — sugeriu Nick e me arrastou para o
bar.
Só me restava esperar Clara deixar seu refúgio e ver o quanto do que
tinha presenciado a havia afetado.
Clara
uma boa parte dela. Por isso, quando o número acabou, precisei escapar em
busca de ar e alguns minutos para pensar. Essa forma de viver me
impressionava, mas devia ser honesta e confessar que atraía também. Se nós
pudermos encontrar um meio termo e Pedro respeitar meus limites, não me
de tentar.
— Achei que eu era maluca por ter pensado isso — disse ela.
Apesar de Letícia ter uma filha e sempre afirmar que gostava de
sexo, ainda que não tenha feito nada, desde o nascimento de Emily, eu podia
dizer que era tão inexperiente quanto eu, nesse excêntrico estilo de vida.
Porque isso não se aplicava a quantidade de sexo que se fazia, mas o tanto
que nos permitíamos conhecer. Eu acreditava que ela só experimentou o que
conhecíamos como sexo baunilha.
— Você quer voltar? — indaguei a ela.
Observei-a respirar fundo e estender a mão para mim.
Voltamos assim para o salão. As músicas que tocavam agora eram
mais sensuais e as luzes só eram utilizadas para dar um clima ainda mais
erótico.
Onde o casal anterior estivera, tinha uma cadeira com um homem
sentado e uma ruiva bonita no colo dele. Um segundo homem na cena
chupava os seios dela, enquanto o que a mantinha com as pernas abertas, no
colo dele, a fodia com os dedos.
Em um dos sofás me deparei com duas garotas começando a ser
amarradas por um Dom, a terceira as lambia e acaricia com empolgação,
levando-as gemer.
Mas não tinha apenas homens no comando. Algumas mulheres
noite toda com seus novos brinquedos. Vale lembrar que a SSC[2] precisa ser
mantida.
Lembrei que Letícia tinha citado algo relacionado a caridade, mas
nunca tinha imaginado uma coisa dessas.
— Alguém?
Duas garotas foram até Aron. Outras conversavam entre si e mais
cinco se candidataram, até que eu vi passar por mim a mesma submissa que
tinha se oferecido a Pedro. Muito bem, que ela encontrasse um Dom e
deixasse o meu em paz.
Quem diria, até poucos dias eu estava fazendo uma lista de todos os
motivos que eu deveria focar para manter Pedro longe de mim. Agora estava
em uma disputa silenciosa e irracional por ele.
— Muito bem — dessa vez foi a voz de Natasha a reverberar pelo
ambiente e ela foi em direção a minha rival, pegando a mão dela — O que
acha de dar o primeiro lance Sr. Santini?
O quê?
A cretina da Natasha e sua amiga oferecida estavam mesmo
cogitando isso? Que Pedro desse um lance por ela. Fiquei tão cega de raiva
que qualquer pensamento racional fugiu de mim.
— Espera! — gritei, fazendo com que todos os olhares caíssem
sobre mim — Eu também vou me candidatar.
e queixo enrijecido.
— Eu... eu... — gaguejei — Ninguém irá fazer nada que eu não
queira, não é?
Em resposta, ouvi um xingamento baixinho dele.
Como iria explicar a Pedro que fiquei tão cega e temerosa que ele
arrematasse a submissa oferecida, que não pensei em mais nada. Talvez ele
até desse um lance pela garota, só para dar início ao leilão, mas isso não
significava que Pedro brigaria pela mulher até o fim. Eu fui muito boba e
ciumenta, devo admitir.
sorri de volta, agradecida. Se queria ter algo comigo ou só fazia isso porque
notava o meu pânico eu veria depois, o importante era não ser leiloada a
nenhum desses homens no salão que não fosse Pedro.
— Oito mil — a oferta de Aron me fez voltar a encará-lo, chocada.
— Dez mil — rebateu Pedro.
Encarei a mulher e ela apenas balançou os ombros avisando que
tinha chegado o limite para ela.
Pedro e Aron seguiram cobrindo o lance um do outro. O salão já se
encontrava agitado com as ofertas absurdas que cada um oferecia.
nada, mesmo que me deixasse puto. Talvez o Aron também. Mas eu não
posso dizer o mesmo sobre o restante daquelas pessoas lá embaixo, droga.
Pessoas são imprevisíveis.
Eu sabia que ele estava certo. De certa forma me coloquei em risco.
Porque diferente da maioria das pessoas na festa, eu pouco conhecia desse
mundo. Pessoas más e que deturpavam as coisas, existiam em qualquer lugar
ou situação.
Ele virou de costas indo até a outra parede onde apoiou a mão. Pedro
tentava controlar a irritação, para não descontar a frustração em mim.
Dei alguns passos vacilantes até ele e coloquei a mão em seu ombro.
— Sobre o dinheiro. Uma parte é minha, certo? Eu vou devolver...
Ele se virou rapidamente. Acho que eu tinha colocado o dedo dentro
da sua ferida. Novamente fui agarrada e comprimida entre ele e a parede.
dentro de si, na época em que desejou vingança contra tudo e todos, que
achou ter causado dor a sua família.
— Sinto muito. Posso também dar a minha parte à caridade?
Provavelmente muitas pessoas diriam que eu estava sendo louca.
Mas o importante não era a pequena fortuna que eu poderia ganhar com o
leilão, mas o homem que me mantinha em seus braços.
Ele balançou levemente a cabeça e um sorriso surgiu.
— Garota, você nunca cansa de me surpreender?
— Bom... — me remexi contra ele — Sou sua submissa, pelo
menos por essa noite. O que mais posso fazer para agradar o meu Mestre?
Foi como ter mudado o canal de uma TV. O olhar zangado e até
mesmo atormentado deu lugar ao intenso e cheio de poder. Suas mãos
seguraram com mais firmeza os meus braços e ele uniu ainda mais os nossos
corpos em chamas.
— Quer um Dom? — sussurrou entre os meus lábios, resvalando a
boca na minha — Você terá um, pequena.
Estremeci da cabeça aos pés ao ouvir sua promessa. E nem tive
tempo de avaliar o quanto ela me fazia feliz quando fui arrebatada pelo beijo
apaixonado.
Diferente da última vez que nos beijamos, dessa vez eu estava
completamente ligada as carícias que começamos a trocar. Caminhamos às
cegas pelo corredor até Pedro parar em frente a uma porta de madeira. Eu não
fazia a mínima ideia do que poderia encontrar ali e as experiências que ele me
faria ter, no entanto, estava ansiosa.
— Tira o colar — ordenou ele e isso me fez levar a mão ao pescoço.
Já tinha me esquecido da joia.
— Mas é um...
— Tira.
A voz saiu firme, porém eu vi resquício de angústia brilhar nele. O
problema não era a joia em si, mas o que a outra significava para nós.
presas a elas correntes. Do teto descia uma longa corda. Havia muitos
espelhos espalhados. Uma mesa preta e muito elegante. Eu vi um tipo de rede
de couro, suspensa por correntes. Grades para restrição. Uma cadeira que me
lembrava a de dentista, mas tinhas amarras embutidas que eu acreditava ser
para prender pernas e braços. Uma cama vermelha e redonda também com
correntes instaladas. Em uma das paredes tinha um suporte onde uma fileira
de chicotes, cordas, laços e gravatas estavam agrupadas. Tinha até um pufe
no formato de um sapato feminino nas cores vermelho e preto. Por último, no
chão, um colchão preto com quatro pares de algemas de couro,
emparelhadas.
Enquanto eu ainda avaliava tudo, Pedro se colocou as minhas costas.
Ele alisou os meus ombros, afastou os cabelos do meu pescoço, jogando-os
para frente e seu nariz correu por toda a minha nuca, depois ele fez o caminho
minha cintura e costas, fazendo um bonito trabalho com ela e por fim,
prendeu minhas mãos, mantendo os braços esticados acima da cabeça.
Ele sumiu do meu campo de visão indo para trás de mim, depois
ressurgiu carregando uma espécie de chicotes com tiras.
— Você foi uma garota muito malvada — passou as cerdas por meu
peito e deslizou até a barriga — Sabe o que meninas travessas recebem?
Balancei a cabeça mergulhando no jogo.
— Castigo — murmurou ele abrindo um sorriso perverso — O jogo
de hoje se chama Provocação e Negação.
Ele passava as cerdas do chicote de uma lateral a outra do meu corpo
enquanto andava em volta de mim, esclarecendo-me como tudo iria
acontecer.
— Significa que vou levá-la ao limite. Você irá implorar para gozar,
mas só fará isso quando eu quiser, entende?
Engoli em seco, apenas a sua explicação já me deixava nesse ponto
em que desejava implorar por mais.
— Você entendeu, Clara? Vai permitir que eu faça tudo o que eu
quiser com você.
— Sado, não — avisei rapidamente.
Ele sorriu e eu quis morder os seus lábios por isso.
— Sado, não — ele repetiu e passou o chicote suavemente pelo meu
saltar no lugar com o ataque. Fez o mesmo com as minhas coxas, barriga, foi
distribuindo por todo meu corpo. E quando chegou aos seios, alternava as
batidas com chupadas que me faziam apertar uma perna na outra.
Ele sabia perfeitamente como dosar a dor e o prazer. E com o avanço
de seu castigo eu sentia mais o segundo do que a primeiro.
Pedro tomou minha boca. Trocamos beijos carregados de
sensualidade e que nos faziam perder o fôlego. Então seus lábios molhados
foram descendo pelo meu queixo, pescoço, ele deu um pouco de atenção a
meus seios, mordendo levemente os bicos, me fazendo estremecer.
Notei que ele ficou de joelhos porque separou meus lábios vaginais e
deu uma longa lambida, da entrada vagina até o meu clítoris.
Eu me contorcia sacudindo as cordas em meus pulsos, mas não
conseguia me mover mais do que isso. Pedro continuou me lambendo,
parava, batia com o chicote em meu clítoris e voltava a me chupar outra vez.
— Ah... Pedro — o processo repetiu tantas vezes que seu aviso logo
se cumpriu.
Gemia pedindo por mais, chegando muito perto do orgasmo que
assim como ele dissera, impedia de eu alcançar. Era uma tortura e delícia ao
mesmo tempo. Meu ventre parecia doer pelo prazer não alcançado e minha
vagina se contraía cada vez mais.
Percebi que ele desapareceu quando seus toques em mim cessaram.
Agucei os ouvidos, ouvi ruídos aqui e ali, desesperada e desejosa por saber
onde ele estava.
Então suas mãos alisaram as minhas costas. Eu senti algo líquido
cair sobre minha pele e Pedro a massageou até chegar a minha bunda.
— Vou colocar o plug em você — avisou ele — Tudo bem?
Eu estava tão excitada e sentia tanto tesão com ele, que aceitaria
qualquer coisa que me oferecesse.
— Tudo bem — respondi, me contorcendo ao seu toque.
Primeiro ele levou o objeto a minha boca. Percebi que tinha formato
de gota, mas era menor do que aquele que ele tinha usado em mim pela
primeira vez. Ele fez movimentos dentro e fora da minha boca, fazendo-me
chupá-lo. Quando ficou satisfeito, deslizou por meu corpo. Jogou mais óleo
lubrificante em mim. Com a pontinha esfregou meu orifício anal e foi
introduzindo o plug pouco a pouco até que estivesse completamente dentro
de mim.
Em seguida ele tirou com mais rapidez e fez o mesmo processo,
algumas vezes.
— Ai...
O prazer era tão intenso que eu poderia gozar. Eu precisava disso
desesperadamente, mas Pedro ainda não tinha me liberado. O desgraçado
sabia o momento exato de recuar. Ele colocou o plug mais uma vez e o
manteve lá.
Voltou a acariciar meus seios com as mãos, boca, puxava os bicos
com os lábios me fazendo gemer alucinadamente. Sentia como se uma febre
varresse todo o meu corpo e me fizesse estremecer.
— Pedro... gemi quando lambeu meu pescoço e deu uma mordida ali
— Por favor.
Eu o queria me fodendo. Fazendo-me dele, levando-me ao topo mais
alto do prazer. Tudo em mim queimava por ele.
— Ainda não pequena — avisou ele e tive mais uma vez o ataque
***
***
relógio na cabeceira, conclui que não. Passava das nove horas, tarde demais
para ele fazer isso.
Com certeza tinha cansado de me esperar acordar e tinha decido para
o café da manhã. Pensava em fazer o mesmo, mas primeiro iria tomar um
que ela conseguisse ver que isso era o mais importante de tudo. Só isso que
deveria contar.
— Sei que fiz coisas horríveis amor — arrastei-me para mais perto
dela e segurei seu rosto atormentado — Que eu errei. Falhei com você. Que
te feri muito. Mas não houve um único dia desde que me livrei da venda que
me cegava que não tenha sofrido e lamentado isso. Não faz isso com a gente.
Eu a puxei para mim no chão e a abracei forte, colando meu rosto no
seu. O soluço dolorido que ela emitiu ao estar novamente em meus braços,
arrancou o meu.
— Não diz que eu sou tóxico. Que o nosso amor é ruim. Eu te amo.
Você me ama. É o que há de mais bonito entre nós.
Não conseguia entender, mas algo estava muito errado. Nada disso
podia ser real. Eu não suportaria ter que vê-la partir mais uma vez.
— Pedro... — meu nome saiu dos lábios dela em um gemido
angustiado.
Seus dedos trêmulos agarraram a minha camisa e a segurei mais
forte. Tentando mostrar através do meu abraço, que eu sempre estaria com ela
para proteger.
— O que foi meu amor? — beijei seu rosto molhado pelas lágrimas
— O que aconteceu?
Por um instante deixei que ela apenas chorasse em meu peito. A dor
de Clara reverberava a minha. Estava bem nítido a mim que nenhum de nós
queria causar tanto sofrimento ao outro.
— Me diz o que aconteceu — eu a afastei um pouco de mim e
escrutinei seu rosto devastado — Fala pequena. Juntos nós somos mais fortes.
Minha declaração a fez soluçar mais uma vez. Seu rosto estava
inchado, os olhos vermelhos, os cabelos desgrenhados de tanto que passei
minhas mãos desesperadas por eles, mas eu a achava linda. A mulher mais
linda do mundo.
fechando o cerco contra Diogo, ele tentava a última arma que tinha, me
desestabilizar.
— Isso não vai acontecer amor. Ele não vai pôr as mãos nelas.
Nem que eu tivesse que colocar um exército ao lado das duas.
Clara cobriu o rosto enquanto soluçava mais forte. Vê-la sim me
deixava arrasado.
— Você não entende — ela tentou engolir o pranto e saiu do meu
colo — Ele é maluco.
Era uma ideia arriscada e para ser sincero eu não gostava dela
nenhum pouco, mas se isso trouxesse a tranquilidade de Clara, faríamos isso.
Eu faria qualquer coisa por essa garota, até mesmo ficar longe dela, se isso
garantisse sua felicidade.
Se isso não era prova suficiente que somos feitos um para outro não
sei mais o que poderia afirmar.
Nós nos amávamos e era isso que nos daria forças para enfrentar
tudo.
Clara
imaginando o que Diogo poderia pensar. Era uma forma horrível de se viver.
Sempre com medo.
— Você está certa — ele passou as mãos pelos cabelos, exasperado
— Mas o Thomaz irá segui-la de uma distância segura. O suficiente para que
o informante de Diogo não perceba.
Isso me deixava um pouquinho mais segura, mas não menos triste.
Nós tínhamos acabado de nos acertar. Era para estarmos felizes e
comemorando isso. Agora, dividíamos segredos para proteger a quem
tivesse sido. Chorei igual, e quando finalmente entrei em meu quarto, estava
despedaçada.
Fiquei aliviada em ver Suzana e a mamãe bem e seguras. Eu tentei
ocultar da minha mãe a tristeza que fazia meu peito ficar, pesado, mas ela
vivemos juntos.
Antes olhar para elas me causaria tristeza. Sentia que agora seria o
que me ajudaria a me manter firme e suportar essa distância que nos faria
sofrer tanto.
Capítulo 16
Clara
O dia seguinte não foi nada fácil. Eu consegui manter a minha apatia
escondida de Giuliano porque ele andava preocupado com a mãe. Apesar de
ela se encontrar em uma clínica melhor, o seu estado de saúde não tinha
abraçá-lo agora. Dizer o quanto o amava e que o passado já não tinha mais
importância.
— Clara?
Dei as costas a voz que me chamava e sequei minhas bochechas
rapidamente.
— Giuliano — esperava que ele não notasse os meus olhos sensíveis
— Desculpe. Acho que me distrai, você me perguntou algo?
Ele me encarou por um longo momento. Eu fazia o possível para não
desabar na frente dele. Se eu fizesse isso teria que contar o que vinha me
deixando arrasada.
— Telefone para você — disse ele e deixando-me confusa, entregou
seu celular.
Ele se afastou, acho que para me dar privacidade e eu levei o
pudesse ver o quanto eu podia ser forte e estar ao lado dele nesse momento,
mas eu me sentia devastada pela distância e o medo pelo que poderia
acontecer.
— Eu amo você, sabia? — disse ele, arrancando um sorriso em meio
as minhas lágrimas silenciosas.
— Eu também te amo. Muito.
Por um instante ficamos assim, apenas ouvindo o respirar um do
outro. Eu pensei em quanto tempo perdi remoendo a raiva e decepção em
relação a Pedro.
um pouco da saudade.
— Isso vai acabar muito mais rápido do que você imagina, Clara.
Você só tem que se manter firme, tudo bem?
— Tudo bem. Eu vou ser forte.
— Você é forte, querida — havia sorriso em sua voz — É a pessoa
mais forte que eu conheço. Agora eu preciso desligar.
A despedida foi dolorida, mas só fato de ter falado com Pedro por
alguns minutos me deixou menos aflita. Com o coração e alma mais leves.
— Tudo bem? — indagou Giuliano quando fui devolver o telefone.
acreditar. Mas eu entendia que para ele era uma longa jornada, primeiro
precisava ter fé em si mesmo, acho que só assim se sentiria digno de lutar
pelo coração da mulher que ele amava.
Pedro
Depois que desliguei fiquei um bom tempo encarando o celular em
minha mão. Minha única preocupação agora, deveria ser caçar Diogo, ao
invés disso eu precisava fingir continuar fazendo o jogo dele. Dançar sua
música.
Eu poderia pegar as três e levá-las para segurança da minha casa,
para tirar esse desgraçado das nossas vidas de uma vez por todas, Clara e eu
tivéssemos que nos sacrificar um pouco, valeria a pena.
Eu sabia esperar. Aguardei por anos para descobrir o assassino dos
meus pais. Só precisava ter um pouco mais de cabeça fria, para finalmente
pôr as minhas mãos em cima de Diogo.
— Sr. Santini? — indagou Helena quando atendi seu chamado — O
Sr. Thomaz está aqui.
— Mande-o entrar.
Pedi que Thomaz viesse me ver enquanto Clara estivesse no hotel
com Giuliano.
— Senhor?
Eu queria um plano de segurança ainda mais reforçado do que o
anterior, tanto para Clara como para sua mãe e irmã.
Mas uma coisa de cada vez. Primeiro atrair Diogo para a armadilha,
depois levar ele e todos os seus cumplices para atrás das grades.
Eu tinha jurado a Clara que nossa separação não duraria muito
tempo e eu não iria quebrar a promessa.
Clara
Suzana por eu não saber se Pedro um dia iria nos visitar. Ela ainda achava
que a culpa era minha.
— Achei que depois da festa, sei lá — ela fechou o armário —
Vocês estariam marcando a data do casamento.
Se Diogo não tivesse cruzado nossos caminhos mais uma vez, eu
achava bem possível isso ter acontecido.
— Nós... — comecei a abrir a caixa com talheres novos, se Letícia
olhasse em meus olhos veria que eu estava mentindo — Decidimos dar um
tempo.
Queria muito contar a ela, mas não podia colocá-la em risco e nem o
pouco que conseguia manter com Pedro, se Diogo descobrisse que estávamos
fingindo para ele.
— Quem decidiu isso? Você ou o Pedro?
Se eu dissesse que foi ele, Letícia não iria acreditar.
— Decisão minha.
— Ah, Clara. Eu acho que você está fazendo besteira e vai se
arrepender. Eu sei que ele foi muito, muito cretino, mas... eu acho... — ergui
meu olhar e encontrei o dela sobre mim — Acho que ele te ama mesmo sabe.
Você deveria pensar sobre isso.
— Eu vou pensar Letícia.
Claro que ela notou que as minhas palavras não foram firmes.
então...
— Então?
— Bom. Você chorava de um lado e Pedro alugava o Nick do outro.
A gente chegou à conclusão que dava para dar um empurrãozinho, sabe?
— Empurrãozinho?
— Na minha festa de formatura. Depois na festa do Sr. Möller. Quer
dizer, eu nunca iria em um lugar como aquele e...
— Usaram isso para me unir ao Pedro?
Eu queria rir, mas precisava fingir pelo menos um pouco, ter ficado
chateada, quando na verdade eu achava muito fofo dos dois. Eles viviam feito
cão e gato, ao menos o pouco que eu via, mas tinham se unido para juntar
novamente seus melhores amigos de corações partidos.
— É que o Pedro não ia naquela festa, sabe.
Ele me contou depois. O ciúme nos levou até lá, agora eu sabia que
Letícia e Nick também tinham mexido os pauzinhos. Como bons amigos,
queriam nos ver juntos e felizes.
— Então você passou a semana toda me envenenando e me
enchendo de ciúmes. E aposto que o Nick fez o mesmo com o Pedro.
Ela assentiu e fez cara de cachorrinho perdido. Eu mantive a minha
cara fechada, apesar disso.
— Agradeço a intenção de vocês, mas já viram que não deu certo.
tinha vindo numa boa hora, se Letícia voltasse a levantar o assunto de Pedro,
não saberia o que fazer.
Assim que cheguei ao elevador, coloquei no aplicativo a localização
do lugar que ele me passou por mensagem. Não demorou para o carro chegar
e em menos de uma hora eu estava diante de um prédio elegante, com
Giuliano me esperando na calçada.
— Não me lembro desse lugar — avisei ao me juntar a ele.
Eu o tinha convencido que apesar de linda e confortável, a suíte no
hotel depois de algum tempo ficava muito impessoal. Então a procura do
Achei que era errado ter sentimentos por alguém que tinha me machucado
tanto. Mas a garota que você queria ferir não era a mesma por quem se
apaixonou, certo?
— Não justifica, Clara. Mesmo que você fosse a pessoa que eu quis
odiar, o que eu fiz foi errado.
Eu via sinceridade nele. E acreditava agora.
— Não mereço você — ele uniu nossas mãos e levou ao peito —
Mas eu prometo todos os dias provar o quanto eu te amo e que posso ser
meu.
— Sim?
— Para de falar e me beija.
A risada sexy fez meu corpo vibrar.
— O seu pedido é...
Não o deixei terminar, grudei a minha boca na dele e rapidamente
nos entregamos a um beijo apaixonado. Pedro me tirou do chão, jogando-me
em seu colo. Emiti um gritinho feliz nos lábios dele e me vi sendo conduzido
pelo apartamento vazio até que ele parasse em frente a uma porta.
braços do meu amor, era isso que ele era para mim: meu, o meu amor.
Ele me beijou com urgência e muito carinho, uma mistura que só
Pedro sabia criar. Tiramos nossas roupas e fizemos amor, tudo muito rápido,
mas com a intensidade de nossa saudade. Quando eu estava me recuperando
de meu segundo orgasmo, ele me beijou e olhou fixamente.
— Você que ficaria aqui? Em meus braços, para sempre?
— Eu não gostaria de ficar em outro lugar — respondi sentindo-me
meio mole, não sei por termos gastado tanta energia ou se era o efeito de
Pedro em mim.
— Eu sei que você vai ter — disse a ele com muita confiança, eu
voltava a acreditar num mundo melhor para todos nós — Com ela ou outra
mulher que irá te fazer feliz. Quando isso acontecer eu quero ser a madrinha
do casamento.
— E eu serei do seu?
Ainda estávamos andando de braços dado quando fomos em direção
ao carro.
Pedro e eu, mesmo antes da separação nunca falamos sobre
casamento, mas eu sentia que isso iria acontecer.
— Bom, você tem que entrar na fila.
— Eu não tenho não, Santini me deve um favor, lembra?
E do jeito que as coisas estavam se encaminhando, até colocarmos as
plano, achei que ele estava louco, mas jamais perderia uma chance para ver
minha Pequena.
Providenciei algumas coisas para nos deixar mais confortáveis no
apartamento vazio e que fosse fácil para transportar, não poderia deixar
rastros. Agora era recolher tudo.
Foi difícil fazer isso. Seu cheiro ainda estava no ar, em minhas
roupas, na minha pele. Essa tortura teria que acabar o quanto antes, esse era
meu mantra atual, e não desistiria até conseguir torná-lo realidade.
Sabia que não era certo enganá-los dessa forma, mentiras assim
foram o que nos colocaram em confusão, mas era necessário fazer isso, o
pouco que tinha com Clara era frágil demais e eu não aceitaria perder isso.
— Mas ela me pediu um tempo para pensar.
Notei que Lídia ficou chateada e para evitar novas mentiras, cortei o
assunto falando sobre Diogo e as últimas atualizações sobre ele. Não poderia
falar nada a mais, então era melhor não prolongar a conversa.
— Vocês irão ficar até o fim de semana?
Depois deles irem para os aposentos fui para o meu quarto e liguei
para Clara.
— Oi, pequena. Chegou bem em casa?
Primeiro ouvi o suspiro de lamento.
Realmente era uma tortura termos que viver assim. Mas saber que
Clara era minha, novamente de alma e coração e que eu também pertencia a
ela, confortava bastante.
— Amor, isso vai acabar — voltei a deitar na cama — Eu prometo.
— Você sempre cumpre as suas promessas — havia muito carinho
em sua voz, isso aqueceu o meu peito — É o que me dá um pouco de
esperança e tranquilidade.
Embora nos falássemos pelo celular reserva, preferia não ficar
arriscando tanto. Conversamos um pouco mais, desejei bons sonhos a ela e
olhando para o teto após desligar, fiquei sonhando com nosso próximo
encontro.
O meu consolo era que na sexta-feira haveria o coquetel de
lançamento da campanha de óculos da Solar, que Clara e Giuliano foram os
Juan da cara dele, sempre que ele lançava sorrisinhos a Clara. Ela não olhava
para Giuliano da mesma forma que fazia comigo, com um sorriso encantado
e olhar sonhador. Ainda o considerava um italiano irritante, mas não ele era
uma pessoa má e Nick como sempre tinha razão, meu inimigo era outro.
Clara
Em muitos dias essa foi a noite mais tranquila que tive. Pedro tinha
esse efeito sobre mim, eu me sentia em casa ao seu lado e a certeza de que em
breve isso seria definitivo que me dava forças para seguir em frente.
Hoje era domingo, dia de ficar em casa com a família. E eu estava
indo em direção a cozinha para tomar café com a mamãe e Suz quando o
interfone tocou.
Ao atender fiquei sem ação, e pedi que o porteiro liberasse as
entradas. E quando abri a porta para Lídia não sabia o que falar ou fazer. Foi
ela quem quebrou o gelo, abrindo um sorriso.
— Obrigada por me receber!
— Imagina. Desculpe, mas não esperava você — dei espaço para
que ela entrasse, mas não vi Fernando no corredor — Soube que estava fora
da cidade.
— Estou na fazenda de Fernando, ele e Pedro se uniram para me
manter exilada — ela revirou os olhos e bufou ao dizer, mas olhando
atentamente, não parecia irritada —Mas nem posso reclamar, fiz tanta
besteira que eu acho que mereço isso.
— Como assim, você não fez nada — indiquei o sofá para que ela se
acomodasse — Eu que nem sei como começar, bem, me desculpe, eu juro
que...
— Para Clara! Eu sei, fique tranquila. Eu sempre soube que nós
éramos peças do jogo do Diogo. Eu entrei no jogo dele e quando percebi não
tinha como sair. Precisava ir até o fundo daquilo. Minha preocupação era que
ele fizesse mais uma vítima, entende.
Balancei a cabeça debagar, afirmando que de certa forma, entendia a
razão dela. Porque Pedro e eu também mentíamos agora para proteger todos
que amamos das loucuras de Diogo.
— Só que teve o acidente. Tudo deu errado. Não consegui falar com
você e não fazia ideia o que Pedro estava desejando. Que ele estivesse com
tanto ódio — disse ela, seu rosto expressando toda a culpa que sentia —
Quando soube que estava trabalhando com ele, pensei que ele só queria
manter a amante do meu “noivo” longe de mim. Eu não desconfiei que meu
irmão estivesse tão confuso. Eu juro que teria esclarecido algumas coisas
medo me aterrorizava e não podia dividir isso com ninguém além de Pedro e
Giuliano.
— Clara, fique calma. Eu sei que você não tem culpa.
Aos poucos fui me controlando e, finalmente, consegui falar: —
— Oi, Suzana, eu sou a Lídia — ela estendeu a mão para minha irmã
— Pode deixar que eu falo sim. O Pedro já me falou muito de você. Que é
uma mocinha muito inteligente. O que você acha se sua mãe e irmã sua irmã
puder vocês irem ir lá em casa tomar banho de piscina?
Suzana logo abriu um sorrisão de contentamento. Eu me sentia a
pior pessoa em estragar a alegria dela, mas nesse momento isso não poderia
acontecer. Já Lídia percebia que era só uma armação para me juntar a Pedro.
Eu nem podia sonhar com isso. Se Diogo soubesse faria um inferno e viria
com novas ameaças.
com você. Vocês são como nós éramos antes... Bem, você sabe. Antes de
nossos pais. Deixa pra lá. Clara. Pense no que te falei. Por favor, dê uma
chance para ele. E me desculpe.
— Eu vou tentar. Obrigada por ter vindo e aqui colocar um ponto
embaixo. Quis subir para também desculpas, mas eu quis tentar falar sozinha
com você. Não imaginei que estivesse aberta a conversar, mas o Pedro tinha
razão, você tem um lindo coração.
Tudo dependia do tempo, ele realmente era o senhor da razão.
Quando descobri tudo, não estava pronta para conversar com Lídia e nem
termos essa conversa pacífica. Não que eu fosse uma santa como Pedro
descrevia, eu só me sentia mais forte e segura para esclarecer as coisas.
— Acho que já vou indo. Até mais.
— Até logo.
E assim que fechei a porta para Lídia me apoiei contra ela, ficando
sem saber o que fazer e como conter uma Suzana muito curiosa e animada
com a nova “amiga”.
Diogo
diferença.
Mas dela não.
De Clara eu não abriria mão por nada!
O dia e local de conseguir pegá-la de volta e para sempre já estava
marcado.
Depois de estarmos muito longe, faria questão de enviar uma foto a
Santini e mostrar para ele que nesse jogo o único ganhador seria eu.
Capítulo 18
Clara
A semana passou rápido demais. Minha cabeça estava a mil. Hoje
era o dia do coquetel para o lançamento da campanha de óculos da Solar.
Ainda não me acostumei a ver minhas fotos em painéis do hotel e até já
namorado do mundo, e até sendo mais paciente com o piloto, ele ainda não
conseguia evitar esse tipo de sentimento. Eu o entendia, porque se o visse em
fotos assim com Natasha, por exemplo, ou aquela submissa que ficou se
jogando para ele na festa, também ficaria incomodada. Mas passado o
choque inicial, Pedro me elogiou até e me disse que a campanha seria um
sucesso. Vai entender os homens.
Hoje ele estaria no evento, não teria como evitar. O difícil seria
fingir que não queria ficar perto dele. Bastava eu olhar para Pedro para ver o
amor brilhando em meus olhos. Ainda mais com a saudade que me matava
um pouco a cada dia. Contudo, eu estava certa de que o Diogo estaria de olho
que nunca. Eles estavam armando algo contra Diogo e existia uma grande
possibilidade de pegarem o infeliz. Eu cheguei a dizer que queria ir à igreja
com minha mãe e fazer uma promessa a Santa Rita, mas Pedro pediu que
ficássemos em casa e nos mantivéssemos em segurança.
Por isso eu só iria a esse compromisso profissional com a Solar,
ficando no coquetel até o momento que pudesse ser liberada, depois seguiria
direto para casa. Até um carro com motorista tinha sido alugado por
Giuliano, para que tivéssemos mais facilidade e segurança para ir embora
quando quiséssemos.
— Prontinho, querida — o maquiador enviado pela revista se afastou
de mim e deu uma bela conferida em meu rosto — Você está perfeita.
Além do homem simpático, também fora enviado o mesmo
cabeleireiro que fez os ensaios fotográficos. A dupla era muito talentosa, e no
final do trabalho deles eu me sentia linda. Estava muito feliz que Pedro
pudesse me ver assim, não havia mais ninguém no evento que eu quisesse
seduzir e agradar mais do que ele.
— Obrigada — abri um sorriso de gratidão aos dois — Vocês são
muito bons.
— Vá e arrasa — disse o cabeleireiro, e os dois saíram juntos do
quarto para que eu pudesse me vestir.
A roupa também foi escolhida e enviada pela Solar. Um lindo
vestido rosa pastel, de alças finas, com um belo decote que fazia meus seios
parecerem maiores, tinha um tecido bem levinho que parecia flutuar ao redor
dos meus pés.
— Como estou? — indaguei à minha mãe quando me uni a ela, na
sala.
— E você consegue ficar menos que deslumbrante?
Eu ri do exagero dela, mas não a contrariei, a gente sabia quando
estava bonita, e eu me sentia assim.
atrevesse a ter uma conversa com ela. Porque, ao contrário de mim, que
geralmente era tímida, Suzana adorava falar e receber atenção.
A primeira coisa que ela fez ao descermos foi elogiar o carro preto e
elegante quando o avistamos. Suzana não foi de muita conversa com
Giuliano. Eu achava que, por Pedro ter sido meu chefe e eu tivesse namorado
com ele, temia que o mesmo fosse acontecer agora com o piloto. Estava bem
nítido que ela era Team Pedro até o fim.
— Nós vamos ter que ir pela passagem principal — avisou Giuliano,
quando chegamos ao local reservado para o evento — Mas a sua mãe e irmã
podem ir pela entrada privativa que fica nos fundos. É por lá que também
vamos embora.
Achei uma boa estratégia, como os modelos principais da campanha,
sendo Giuliano a grande estrela da noite, precisaríamos posar juntos para os
fotógrafos parados no tapete vermelho. Mas não achava que minha irmã,
principalmente a minha mãe, se sentiriam confortáveis com os flashes e
tantas pessoas à nossa volta, fazendo perguntas. Ambas estavam aqui apenas
para apoiar um trabalho que me foi importante.
— Encontro vocês duas lá dentro, tudo bem?
Elas apenas acenaram, estavam com os rostos grudados no vidro,
admiradas com o fluxo de pessoas bem-vestidas, bonitas e todos os
fotógrafos em volta delas. Tinha até um programa de TV fazendo uma
cobertura exclusiva.
— E você, está pronta? — indagou Giuliano.
Na verdade, eu não estava. O dia da coletiva não saía da minha
cabeça e eu temia ser perguntada sobre isso.
— Fique calma — disse ele, pegando a minha mão — E deixe que
eu responda às perguntas mais indiscretas. Apenas sorria, e isso deixará todos
ofuscados.
Ter esse apoio dele me deixava um pouco mais calma.
Assim que o motorista parou, o valet veio abrir a porta do carro.
Giuliano foi o primeiro a descer e estendeu a mão para mim. Assim que
fomos avistados, dezenas de rostos se viraram para nós. As luzes começaram
a incomodar os meus olhos, e perguntas vinham de todas as direções. Grande
parte estava relacionada à campanha, algumas sobre o retorno dele às pistas, e
salão.
— Foi bem mais fácil do que imaginei.
Ainda estava nervosa, mas achava que o pior já tínhamos
enfrentado.
ao outro.
Enquanto Giuliano estava entretendo o grupo onde estávamos,
falando sobre corrida, eu bebericava o meu drinque, pequenas doses, porque
eu sou fraca para bebidas alcoólicas.
entendeu?
Essa era uma promessa que me custaria muito cumprir. Apenas as
carícias dele em minhas pernas já me deixavam em chamas.
— Tá bom — disse, buscando ar, e estremeci um pouco mais
quando ele segurou a barra do vestido e começou a subi-lo até alcançar minha
cintura — Eu vou tentar.
Eu não podia ver seu sorriso, mas sabia que estava presente. O
pedido não era um capricho dele, precisávamos ter todo o cuidado. Por isso,
mantive a barra do vestido presa em apenas uma mão e levei as costas da
outra até a minha boca.
Pedro sabia como, pouco a pouco, me levar à loucura. Começando
pelas carícias de suas mãos em minhas pernas. Depositando beijos sensuais
Pedro dobrou um dos meus joelhos e levou minha perna até o seu
ombro. Depois disso caiu de boca, sem piedade, chupando meu clítoris e
enfiando dois dedos grossos em mim. Por vontade própria, meu quadril
impulsionava para ele em busca de todo o prazer que me dava. Eu queria
gritar, soltar os gemidos presos em minha garganta, e não poder fazer isso só
me excitava ainda mais.
Ele mordiscava e sugava o nervo de onde irradiava meu prazer, e
com os dedos me tocava nos pontos certos.
— Ai... — não consegui conter o gemido baixinho — Pedro...
O que ele fazia comigo era deliciosamente cruel, mas o queria dentro
de mim. Se essa também era a necessidade dele, ou porque não tínhamos
muito tempo a perder, não sabia dizer, ele abaixou minha perna e ficou de pé
Duas.
Três estocadas firmes, sem desgrudar nossas bocas.
Minhas costas subiam e desciam pela porta, enquanto ele me fodia
com força e paixão. Eu não iria demorar muito, e pelo que via dos
estremecimentos dele, Pedro também não.
Não havia nada no mundo que eu desejasse e amasse mais do que
estar nos braços dele.
— Eu te amo, pequena — ele separou os nossos lábios rapidamente
Pedro.
— Desculpe, fiquei esse tempo todo no lugar errado, então — disse
a ela, seguindo-a — O bom que estava tão cansada que aliviei um pouco os
meus pés.
Ela fechou a porta e colocou a maleta sobre uma mesa. Preparou
agulhas e alfinetes e foi para trás de mim. Não sabia dizer se realmente mexia
no vestido, mas parecia que sim.
— Prontinho, senhorita — disse ela, ajeitando tanto meu vestido
quanto os meus cabelos, quando terminou — Pode voltar lindamente para o
coquetel.
Agradeci com um sorriso que expressava minha gratidão, não apenas
por “consertar” o vestido, mas pelos momentos preciosos que me ajudou a
ter com Pedro.
ficar me vigiando e não entregar meus sentimentos por Pedro sempre que
ficávamos muito próximos.
— Podemos ir? — indagou Giuliano, a festa já tinha dado para ele
tanto como para mim.
perto, que notei não ser o mesmo que viemos. Fui me afastando de novo,
estando certa que era de alguém também saindo da festa, e quando eu
chegava próximo ao toldo, a porta do passageiro foi aberta e a pessoa que
mais temia ver no mundo surgiu.
— Oi, meu amor.
— Diogo? — murmurei, recuando alguns passos.
— Entra, Clara.
Neguei com a cabeça, e ele, atrevidamente, desceu, vindo até mim.
carinho que tinha por elas contra mim. O desgraçado sabia bem como mexer
comigo e me deixar em pânico. Eu era do tipo que facilmente dava a vida
pelas pessoas que eu amava. Letícia era como uma irmã e eu tinha loucura
por sua filha. Eu nunca permitiria que nada acontecesse a elas,
apesar de, por pouco, não ter chegado a tempo, ou se me apavorava porque eu
tinha a certeza que ele viria atrás de nós.
Eu não queria um confronto assim, principalmente porque, ao
contrário de Diogo, Pedro estava desarmado. Rezei todos os dias para que a
armadilha que fariam para o infeliz, no dia seguinte, fosse acompanhada pela
polícia e que Pedro não se colocasse em risco. Eu morreria se algo
acontecesse a ele.
Só que as coisas não seriam tão fáceis assim. Diogo planejava fugir,
mas o tempo todo, em sua mente deturpada, acreditou que eu iria com ele.
foram suficientes para aplacar o meu desejo por ela correndo em minhas
veias, mas ajudou a diminuir um pouco a saudade que sentíamos.
A razão da minha ansiedade relacionava-se ao dia seguinte. O plano
precisava dar certo. Tínhamos que conseguir atrair Diogo para a armadilha.
Vilela, com alguns de seus homens, e Bertolini já estavam em Santos, com a
polícia de sobreaviso. Dessa vez esse verme não iria escapar e finalmente
Clara e eu poderíamos ser felizes, sem as amarras do medo que nos prendiam.
Quando um garçom passou, depositei a taça, que eu mal levei aos
rapidamente o reconheci.
O desgraçado do Diogo. Apressei-me até eles, mas foi tudo muito
rápido. Cheguei ao automóvel quando Clara foi jogada para dentro e a porta
batida.
queria perder tempo com explicações inúteis agora — Preciso ir atrás dele.
— Pedro — ouvi o chamado de Giuliano surgir assim que abri a
porta do motorista — Eu dirijo. Sou um pouco melhor do que você e estou
mais calmo também.
Encarei-o sem paciência para suas tiradas ácidas. Mas não era uma
das provocações que ele adorava fazer. Sobre isso Giuliano estava certo. Ele
podia agir como um babaca a maior parte do tempo, mas como piloto era
excelente.
— Já perdemos tempo demais.
Deixei a passagem livre para que ele ocupasse o volante e dei a volta
no carro com pressa. Quando me acomodei, vi a porta do passageiro bater e
que Thomaz, mesmo ferido, também havia entrado no carro.
— Eu anotei a placa, DKN6780, e sei bem para onde Diogo está
de F1.
— Eu te indico o caminho até avistarmos o carro — comuniquei a
ele — Corra como se dependesse da sua vida, porque a minha depende,
Giuliano. Eu cuido das multas ou qualquer coisa depois. Só não pare para
nada.
Foi uma decisão acertada, permitir que ele dirigisse. A minha fúria e
pavor de que algo acontecesse à minha pequena poderiam me levar a cometer
alguma besteira.
— Ali! — indiquei a Giuliano.
Por estar tarde, não havia tantos carros na pista, por isso não foi tão
difícil Giuliano conseguir costurar e avançar, ultrapassando os carros à nossa
frente.
— Na frente daquele carro vermelho. É ele.
Desta vez Diogo não iria fugir, e havia sido estúpido demais em
tentar forçar minha mulher a ir com ele. Quando eu colocasse as mãos nele,
que Deus o ajudasse, pois eu não teria piedade, porque, com certeza, o diabo
não iria ajudá-lo.
Clara
Nem mesmo quando ele me trancou no quarto do hotel, naquela época eu não
tinha ideia ainda de quão insano Diogo poderia ser.
— Embora? — Ele passou a ponta da arma em meus lábios e eu
fechei os olhos, com medo — Sim, querida, mas vamos juntos.
Um movimento brusco do carro me fez cair no colo dele. A vontade
de vomitar, quando Diogo me tocou, foi forte o bastante para eu sentir o
gosto amargo subir pela minha boca.
— Que porra é essa? — gritou Diogo, e eu voltei a me afastar dele
com pressa.
— Estão batendo na gente!
Enquanto os dois discutiam, fui em direção à maçaneta, disposta a
abrir a porta e saltar. Uma decisão não muito inteligente, mas eu seria capaz
de qualquer coisa para escapar, mesmo que arriscasse a minha vida.
— Filha da puta! — Diogo me percebeu tentando abrir a porta
travada, agarrou minha garganta e me fez afastar da porta — Não fode, Clara.
Seja boazinha, ou vou ter que tomar uma atitude que você não vai gostar, e
vai doer muito.
machucar.
— A culpa é dele, Clara. Será que não consegue enxergar isso? —
Ele me encarava como se eu fosse insana, quando o único alucinado nesse
carro era ele — Sempre teve tudo de mão beijada e nunca deu valor a nada.
Eu poderia ser o grande CEO da Santini. Ele me tirou tudo. Até você.
— O Pedro é o herdeiro, Diogo. Tudo é dele por direito.
— Pelo sangue maldito que carrega, sim, mas não por merecimento.
Isso era meu. Você era minha, e até isso o desgraçado do Santini me roubou.
Ele a sujou com as mãos e mente sujas — ele tocou o meu rosto e eu me
encolhi, enojada por seu toque e pela forma que deturpava a história.
Nada fazia sentido, mas Diogo acreditava na teoria deturpada que ele
mesmo criou, jogando em Pedro as frustrações de seus sonhos não
alcançados. Ele que era sujo, golpista, um assassino frio e cruel. Suas mãos
eu pedir, ele o deixa ir. Pode fugir para qualquer lugar e reconstruir a sua
vida.
Ele desviou o olhar da pista onde o carro de Pedro tinha se afastado
um pouco e me encarou com raiva.
— Sem você? Nunca, querida. Vamos juntos, ou morreremos
juntos.
Sentindo o corpo gelar um pouco mais, notei em seus olhos frios que
essa era mais do que uma ameaça: era um juramento.
lutar com ele, chutando suas pernas, mas ele me arrastou pelos cabelos, e
para me convencer de vez a não continuar resistindo, colocou a ponta do
revólver no canto da minha testa.
— Acho melhor não fazer nenhuma besteira, Clara — avisou,
puxando meus cabelos mais forte, fazendo a minha cabeça ir para trás — Eu
não quero machucar você.
Mas ele faria isso se fosse preciso, ou se não tivesse saída para ele.
Não me restava outra coisa a fazer, além de, no momento, colaborar
com ele. Diogo saiu primeiro do carro e, agarrando firme meu braço, me
arrastou para fora.
— Clara! — ouvi o grito preocupado de Pedro.
Eu o vi dar alguns passos em minha direção, mas Giuliano, que
surgiu ao seu lado, o puxou para trás.
As lágrimas de desespero e o medo do que pudesse acontecer a nós,
por um momento, me cegaram.
— Sempre no meu caminho, não é, Santini? — acusou Diogo, nos
fazendo andar para trás — Primeiro com a empresa, agora querendo tirar de
seus crimes foram descobertos. Deixe a Clara, e eu darei uma vantagem para
você ir.
Levou alguns segundos até a risada louca e descontrolada dele
surgir. O aperto em meu braço me fez gemer de dor e o revólver retornou à
minha cabeça.
— Sabe, você deveria ter trazido a sua irmã para negociar comigo,
Pedro. Ela é muito mais inteligente — debochou ele, e vi os olhos de Pedro
estreitarem, ele estava tentando se manter calmo, mas Diogo não era uma
pessoa fácil de se lidar, sabia tocar onde mais doía: nas pessoas que
amávamos — Achei que era tolinha, que seria fácil enganá-la e me livrar
dela, mas veja só, deu um baile em nós. Sabe, se a Lídia não fosse uma puta,
agindo pelas minhas costas, até teria ficado com ela.
E me mantido como a amante que ele enganava? O plano nojento de
Diogo sempre fora esse, manter nós duas até conseguir se livrar de uma de
nós.
— Solta a Clara, Diogo — ordenou Pedro em um tom firme —
Você sabe bem que não haverá escapatória para você, se a machucar.
Eles se duelaram através do olhar. Pedro estava muito perto de
perder o controle, e a única vantagem de Diogo, e ele sabia disso, era ter uma
arma carregada em minha cabeça. O Pedro não faria nada que viesse a me
machucar. Estávamos nas mãos de um louco, e isso me apavorava.
mesmo terror que eu sentia . Ele balançou levemente a cabeça, pedindo que
eu fizesse isso.
— Eu... — tentei me encolher, mas Diogo me manteve firme no
lugar, obrigando-me a encarar o rosto atormentado do homem que eu amava,
enquanto era obrigada a dizer o contrário — Odeio. Você.
Não era para Pedro essas minhas palavras, e ele sabia muito bem. Eu
me referia a Diogo e todo esse terror que ele nos fazia passar.
— Viu, Santini, mesmo que a soltasse ela nunca seria sua. A Clara o
despreza.
Eu queria gritar que não era verdade, que a única pessoa no mundo a
quem eu desprezava era ele.
— Então deixe-a ir, Diogo — Pedro andou lentamente — É comigo
que você quer acertar suas contas. Eu vou com você.
A risada de Diogo me era, no mínimo, diabólica. Tinha um ar de
loucura e me assustou até os ossos.
— Tenho uma proposta melhor — disse ele, em uma tranquilidade
invejável — Você ama a Clara? Então nos prove que sim. Uma vida pela
outra.
Eu estava tão tensa que levou alguns segundos para entender onde
Diogo queria chegar, e quando finalmente consegui, o pânico me deixou
paralisada.
desprezível — Ou eu atiro nela na sua frente. Vou matar a mulher que ama,
assim como fiz com seu pai.
— Diogo! — tentei chamar a atenção dele e desviá-lo dessa loucura
— Você disse que me amava. Que me queria com você. Se o obrigar a isso,
eu nunca vou poder te perdoar.
— Posso não ter você — quase desmoronei diante de seu sorriso frio
— Mas o Santini também não. Ele não estará vivo para isso.
Foi então que entendi que Diogo era como um desses homens
obcecados, que se a mulher não era dele, não seria de mais ninguém. E o ódio
que sentia de Pedro só fazia sua mente deturpar tudo ainda mais.
— Vamos lá, Pedro. É você ou a Clara?
Em pânico, o vi começar a caminhar em direção à mureta. A ponte
era espantosamente muito alta, e se ele não morresse na queda, com certeza
mais.
Capítulo 20
Pedro
Tinha chegado o momento que eu acertaria as minhas contas com
Diogo, mas não era para ser desse jeito, não com Clara nas mãos daquele
maluco, correndo o risco de, em um ato insano, ele fazer algo a ela. Jamais
mureta, onde a lateral bateu. Eu nem esperei que Giuliano desligasse o motor
para sair do carro.
Senti meu coração congelar no peito por alguns segundos, quando
avistei Diogo saindo do veículo com Clara. Ele apontava uma arma na cabeça
dela e a usava como escudo para que eu não me aproximasse. Dei apenas
alguns passos precavidos, tentando ficar o mais próximo possível. Eu só
queria olhar nos olhos dela e garantir que ficaria tudo bem, que a tiraria das
mãos desse psicopata.
Chamei por ela. O terror e o sofrimento que via em seu rosto faziam
uma grande fúria fervilhar dentro de mim. Clara não merecia isso, passar por
uma situação tão assustadora e traumática.
Diogo, em sua irracionalidade previsível, me atacou com palavras,
dizendo que eu tinha roubado a empresa e a garota dele. Elas nunca foram
dele. Sua inveja e ódio por mim não o deixavam enxergar isso.
— Solte-a, Diogo — pedi com calma, mas por dentro eu era um
vulcão querendo explodir. No entanto, sabia que precisava manter a calma,
qualquer gesto impensado meu colocaria a vida de Clara em risco — Vamos
resolver isso entre nós dois. Só eu e você.
Desta vez, eu precisava ser mais frio e inteligente que ele. E
enquanto ele se mostrava eufórico, olhei rapidamente à minha volta. O
motorista de Diogo tentara fugir, mas Thomaz conseguiu rendê-lo e amarrava
pista. Ele ergueu a mão e me pediu calma. Rapidamente entendi o que ele
pretendia fazer. Se chegasse até Diogo e eu continuasse a distraí-lo com uma
conversa, haveria uma grande chance de ele se aproximar e desarmar Diogo
por trás.
com nada do que pudesse acontecer comigo e, sem pensar uma única vez,
trocaria de lugar com ela. Eu só precisava convencer Diogo disso.
— Você a ama, Santini? — Eu rangi os dentes quando o vi puxar os
cabelos dela e a dor que vi expressa em seu rosto quando a fez olhar para
mim — Mas ela não o ama.
Ele queria obrigá-la, assim como fez no dia que mandou as fotos de
Beatriz e Suzana, a me ferir negando seu amor, o nosso amor. Eu estava farto
de assistir a minha pequena sofrer. Então sussurrei para que ela o obedecesse,
mesmo sabendo que isso a machucaria. Giuliano estava muito perto agora.
frente, com um único objetivo: chegar até Clara. Parecia que eu caminhava
em câmera lenta ou que mãos cruéis me puxavam para trás. Assisti,
apavorado, enquanto Clara e Diogo se olhavam; ele com espanto, ela com
dor. Ele a largou, e Clara afastou-se lentamente, a mão cobrindo a barriga
onde o vestido começava a manchar de sangue.
— Não! — gritei, chegando até ela, segundos antes de cair no chão.
Tudo o que eu mais temia se tornava um pesadelo diante de mim. A
minha pequena, a minha menina, a mulher que eu amava, que tinha feito meu
urgentemente.
— É culpa sua, Santini — ouvi Diogo gritar, quando Giuliano, que
conseguiu rendê-lo, o entregou para Thomaz — Assim como eu, as suas
mãos estão sujas de sangue. A Clara vai morrer, e a culpa é só sua.
Essa era sua última tentativa de me atingir, e por mais irracional que
pudesse ser, sentia que Diogo estava certo. Eu tinha nas mãos o sangue de
Clara. Por envolvê-la em toda a escuridão que era a minha vida, poderia
perder a pessoa que eu mais amava no mundo. Diogo fez a arma disparar,
— Não faz isso comigo, Clara! — Meu grito torturado deve ter
ecoado pela cidade inteira — Amor, não faz isso comigo.
Eu a balançava comigo no colo. Para frente e para trás. A cada
segundo implorando que ela ficasse comigo. Que não me deixasse. Sem
Clara, eu simplesmente não teria uma vida. Só uma casca vazia no lugar de
um coração.
Eu não saberia viver assim.
***
da minha alma.
— Não me deixa, pequena — chorei, abraçando os meus joelhos —
Não me deixa, porque eu não vou suportar.
Eu encontrei o amor tarde demais, e tão cedo poderia perdê-lo.
receber o mesmo tipo de sangue. E ela perdeu muito no percurso até aqui e
durante a cirurgia. Usamos tudo o que tínhamos em nosso banco. Vamos
precisar de doações.
O meu sangue era AB+. Eu não poderia ajudar minha pequena nem
— Sei que faria o mesmo por mim, meu amigo — ele bateu
levemente em meu ombro — Quem sabe isso amenize um pouco meu
julgamento precipitado em relação a Clara e ela consiga me ver como um
amigo, no futuro.
***
Mesmo com a doação de Fernando, Clara ainda iria precisar de mais
sangue. O médico já tinha conseguido alguma coisa em outra unidade
hospitalar. A mãe dela também entrou em contato com a igreja, pedindo
ajuda.
Letícia, que estava cuidando de Suzana, até que a menina pudesse
vir ao hospital, disse que avisaria amigos e familiares. Eu entrei em contato
com Helena e pedi que ela enviasse e-mails a todos os funcionários da Santini
Isso era o que mais me mexia por dentro. Saber o tamanho do amor
de Clara por mim. Eu ainda não a merecia. Talvez eu nunca fosse merecer.
Mas eu amava essa menina. Com uma grandiosidade e intensidade que eu
nunca conseguiria descrever.
— Eu não iria pular da ponte, porque o Giuliano iria render o Diogo
— confessei a ela, e relembrar esses momentos me causou uma fisgada
dolorida no peito — Mas se fosse preciso, se não tivesse outro jeito de salvar
a vida dela, eu teria feito isso, Lídia. Eu teria pulado.
A minha confissão fez minha irmã soluçar, e eu a abracei.
— Tudo bem, Lídia. Estou aqui. A Clara vai ficar bem. Tudo vai
ficar bem.
Sei que para ela devia ser terrível ouvir eu dizer que daria a vida pela
mulher que eu amava. Mas eu faria isso também por ela e todos que estavam
dentro do meu coração. Porque faziam com que enxergássemos além de nós
mesmos.
Perto do horário de visita, uma enfermeira veio nos buscar. Beatriz
entrou primeiro e eu entendi isso, mas a cada minuto que aguardava, meu
coração batia mais acelerado no peito. E quando a vi sair do quarto,
chorando, abatida, senti que minhas pernas iriam fraquejar.
— Beatriz...
Ela enxugou os olhos para conseguir me olhar.
parecia tão frágil e indefesa. Grossas lágrimas caíram dos meus olhos,
manchando a máscara em meu rosto.
— Oi, amor — busquei a mão dela, fria e tão delicada como Clara
— Eu estou aqui. O Pedro.
Clara
a minha mãe, foi Suzana. Partiu tanto o meu coração vê-la se aproximar de
mim com medo.
— Vem cá, meu amorzinho — a puxei para os meus braços e quase
voltei a me quebrar ao ouvir seu choro sentido.
necessárias.
Dos amigos do Pedro, ele era o que eu tinha menos proximidade,
mas agora queria mudar isso. Logo seríamos todos uma grande e feliz
família.
emocionado ao dizer. “Ele te ama muito, minha filha, você não tem ideia”.
Se fosse metade do que eu sentia por ele, eu sabia muito bem.
— Você é minha irmã agora. Eu sempre desejei ter uma. Cuidar um
dos outros é o que uma família faz, certo?
— Eu sempre acreditei nisso.
***
Aos pouquinhos, tudo começou a se ajeitar. Recebi mais visitas no
hospital, do tio Oberto, o avô materno de Pedro, Giuliano, que num primeiro
para casa, deixar o passado para trás e construir uma vida feliz ao lado de
todos que eu amava e me queriam bem. Marcas, todo mundo carregava na
vida. Eu poderia ter uma em minha pele, mas jamais permitiria que ficasse
em meu coração. Dentro dele eu só queria amor.
— Aqui estamos — disse Pedro, quando parou a cadeira de rodas em
frente à porta do apartamento — Feliz em voltar para casa?
— Felicidade nem chega perto disso.
Pedro se ajoelhou ao meu lado, segurou o meu rosto com firmeza e
iniciamos um beijo apaixonado e cheio de sentimentos. Cada vez que nos
encarar a gente.
— Parem com essa safadeza logo e entrem — foi uma ordem que a
gente nem se arriscaria a descumprir — Está todo mundo esperando vocês.
Assim que ela saiu da porta, para que Pedro empurrasse a cadeira de
rodas, vi que ela não estava exagerando nada. Achei que todo mundo que eu
conhecia estava no apartamento para me receber. Juninho, Helena, Dona
Isabel. Os avós paternos de Pedro, que vieram da Itália com Zia Nina, e o
outro tio que eu ainda não conhecia. Algumas garotas da loja, Giuliano,
peito.
Capítulo 22
Clara
Esse era o meu primeiro fim de semana sozinha com Pedro, desde
que recebi alta do hospital. Ele ia me ver todos os dias em vários horários, e
quando não fazia isso, por causa do trabalho ou algum compromisso de
negócios, ligava ou enviava mensagens.
Eu fui me recuperando. Por duas noites, fui jantar com sua família,
os avós e a irmã, na casa dele, com minha irmã e a mamãe. Levamos Suzana
para curtir um sábado na piscina, a convite de Lídia, que dessa vez não pude
recusar. E enquanto as duas se conheciam melhor e se divertiam, Pedro e eu
passamos a maior parte do tempo namorando no quarto dele.
A cada dia e semana que passavam, nosso desejo e vontade de
— Haverá sempre uma parte de mim que amará o seu pai, Clara —
confessou ela, e a emoção dela me tocou — Mas eu prometo que vou pensar
no assunto.
Eu ficava muito feliz que ela estivesse aberta a isso. Se havia alguém
alguns dias após eu ter voltado para casa. Eu tinha acabado de sair do banho,
estava só de roupão e toalha enrolada na cabeça, mas cantava a plenos
pulmões.
— Linda do jeito que é. Da cabeça ao pé. Do jeitinho que for —
comecei junto com a música — É, e só de pensar, sei que já vou estar
morrendo de amor. De amor.
Pedro segurou por um momento a minha mão e começou a cantar
comigo. Eu sentia que cada palavra da canção era o que ele queria me dizer.
“Coisa linda. Vou pra onde você está. Não precisa nem chamar.
Coisa linda. Vou pra onde você está”.
Sempre fui uma garota muito sonhadora, mas também tentava
manter os pés dentro da realidade. era consciente que problemas aconteciam e
que o grande desafio da vida era saber como enfrentá-los. Matar um leão por
dia, mas contanto que eu sempre tivesse as pessoas que amava perto de mim,
eu estaria pronta para qualquer coisa. Esse era o meu sonho de felicidade, ver
minha família e amigos bem e ter ao meu lado o homem que eu amava, tendo
o mesmo objetivo: fazermos o outro feliz. Eu tive a chance de renascer e seria
quando comigo bastava apenas sentir seu olhar intenso para me fazer derreter.
Quando entrei na cobertura, fui impactada com um cenário
completamente diferente do que eu me lembrava da última vez que estive
aqui.
que cada detalhe fora pensado em mim, nas cores, nos objetos de decoração,
o porta-retrato na mesinha de cabeceira com uma das fotos nossas tiradas na
Itália.
Para aumentar ainda mais meu encantamento, o quarto foi enfeitado
com pétalas de rosas, cobrindo o chão e a cama nova. Velas perfumavam o
ambiente, deixando tudo mais romântico e bonito.
— Um recomeço — murmurei, emocionada, tocando o rosto dele ao
ser colocada de novo no chão — Lindas e novas lembranças que começarão a
partir desta noite.
Ele me tocou com os lábios bem ali, e o gesto trouxe lágrimas aos
meus olhos.
Afundei os dedos em seus cabelos e Pedro foi depositando beijos
suaves em minha pele, subindo pelo meu corpo até nossas bocas se unirem
mais uma vez.
Meu coração batia a mil. Pedro me beijou, e beijou de forma tão
profunda, como somente ele sabia fazer. E suas mãos correram pela lateral do
meu corpo, elas chegaram aos meus seios, minha cabeça caiu para trás
quando Pedro os segurou firme. Brincou com os mamilos e os fez ficarem
foi deslizando para dentro de mim. Nos unindo como somente duas pessoas
tão apaixonadas conseguiam ficar.
— Clara? — ouvi seu chamado por mim, mas estava nas alturas, ele
me levava até lá — Olha para mim, pequena.
Ele se mexeu dentro de mim, e atender ao seu pedido foi uma tarefa
quase impossível. Quando nos escaramos, senti que nos conectamos ainda
mais com o olhar. A cada longa e firme estocada de Pedro, meu prazer
aumentava um pouco mais.
— Clara — ele se mexeu, indo mais fundo dentro mim — Ah...
Estremecemos juntos.
Estava enlouquecendo e gemendo em seus lábios que exigiam os
meus. Suas mãos me agarraram, me prenderam, me possuíram. Pedro me
possuía. Eu era dele. Sempre fui. Eu sempre seria de Pedro Santini, e ele era
meu.
E eu senti o calor irradiando por todo meu corpo. O prazer explodiu
em minha cabeça, forte, intenso, incontrolável e tirando completamente todos
os meus sentidos.
— Eu te amo, pequena — ouvi seu sussurrar ao desabar ao meu lado
e me encaixar em seus braços.
Acredito ter confessado o mesmo enquanto meus olhos começavam
a fechar. Um sorriso preguiçoso e satisfeito surgiu em meu rosto e só quis me
***
O fim de semana foi exatamente como Pedro tinha prometido.
Romântico, perfeito e com muito sexo. Fosse no quarto, no banheiro, no sofá
ao tentar ver algum filme – o que nunca conseguíamos – no chão, após
algumas garrafas de vinho, morangos e chocolates. Na cozinha, em cima da
mesa, em pé contra a porta da geladeira. Fazendo jogos ou não. Só
ruins querendo nos machucar. Estávamos livres para amar e nos sentirmos
amados. A cada dia, via fortalecer mais a nossa relação.
Sentia como se tudo à minha volta estivesse no perfeito lugar.
Bom... Estava, até Pedro me dar a notícia que me deixou
melancólica.
— Mas para onde você vai? — meus lábios tremeram ao perguntar
isso — Quando volta?
Nós tínhamos acabado de fazer amor na banheira e voltado para o
quarto, quando Pedro me levou até a cama e me contou sobre a viagem que
precisava fazer, dentro de alguns dias.
— Não posso dizer ainda — ele afastou as mechas caindo em meu
rosto — Nem quando volto. Mas eu volto.
Durante toda a minha recuperação, Pedro foi o mais cuidadoso,
atencioso e presente possível. E eu meio que fiquei mimada, recebendo tanto
carinho e atenção. Mas a nossa vida precisava voltar à normalidade. Ele era
um homem de negócios e viagens era algo comum. O que me deixava
inquieta era o mistério dessa viagem inesperada, e não saber quando ele iria
retornar.
— Eu fiz uma promessa, Clara — ele afagou minhas bochechas com
os polegares.
— Uma promessa? — encarei-o, confusa.
que causei a eles enquanto lutava pela minha vida. E nem conseguia me
imaginar passar pelos mesmos momentos angustiantes de Pedro e minha mãe.
— Eu fiz uma promessa para te ter de volta, pequena — confessou
ele — E faria um milhão delas se fosse preciso, se significasse tê-la aqui. Nos
meus braços.
Pedro não era um homem muito religioso, não tanto quanto eu, mas
ele tinha fé, ou por minha causa tinha voltado a tê-la. Saber que havia feito
uma promessa, pedindo pela minha vida, encheu meu coração ainda mais de
amor.
fazer com a cobertura o mesmo que Clara havia feito comigo: transformei
algo sem cor, sem vida, duro e frio em um espaço cheio de luz, alegria e
muito amor. Iniciava um novo capítulo da nossa história, cheio de esperança.
Eu me empenhei ao máximo para que o nosso recomeço fosse inesquecível, e
foi.
O que eu via para o nosso futuro era seguirmos juntos, lado a lado,
apoiando e respeitando o outro. Por isso não esperei nada menos do que a
compreensão e o total apoio de Clara em relação à missão que eu precisava
cumprir em breve, mesmo que isso, inegavelmente, a deixasse triste pelo fato
estava para iniciar, e eu não conseguiria viajar sem olhar nos olhos dele e
dizer tudo que sempre estivera entalado em minha garganta.
— Vitória? Não, mas posso garantir que estou satisfeito que, enfim,
a justiça tenha sido feita — murmurei em um tom impressionantemente frio
— Sabe, passei anos buscando a verdade. Alimentando o desejo de vingança.
Eu fiquei cego. Cometi muitos erros no caminho. Traí a confiança da mulher
que eu amo. Magoei pessoas. E quase me tornei um homem como você.
Com notória dificuldade, Diogo ergueu-se da cama estreita, grudada
como deveria amargar cada dia desse inferno real que vivia. E pelas
estimativas dos meus advogados, duraria longos e merecidos anos.
— Você sempre se achou superior a mim, não é, Santini?
— Eu sou, Diogo. E é por isso que sempre teve inveja. Quis me
tomar tudo, mas agora você que não tem nada. Amigos. Família. A Clara.
Nunca vai saber a dádiva que é ter amor e respeito de uma mulher tão incrível
como ela. Ter uma família. Envelhecer juntos.
Ele agarrou a grade com toda a força que conseguia. Seu rosto
contorcido expressava toda a raiva e impotência que as minhas palavras
causavam a ele.
— Clara e eu nos amamos. Eu vou me casar com a Clara. Teremos
filhos. Netos. Anos maravilhosos pela frente — nem se eu usasse uma espada
afiada e a transpassasse pelo seu corpo o torturaria mais — Você ficará aqui,
preso, definhando, enquanto Clara e eu seguimos felizes, muito longe de
você. Esse é o seu real castigo, Diogo. Eu ter tudo que que você desejou e
não conseguiu ter.
— Maldito! — Os braços passaram pelo vão entre as grades, mas
não o suficiente para me alcançar.
Ele não podia mais chegar a mim ou tocar qualquer pessoa que eu
amava e jurava proteger. E enquanto eu caminhava para bem longe do
inferno que Diogo viveria, durante os anos mais longos de sua vida, ouvindo
Clara
fotos juntos, que nem percebi Suzana entrar no quarto, emburrada, e sentar-se
ao meu lado na cama.
— Quê?
— Achei que você tivesse feito as pazes com o Pedro — o semblante
cada vez mais zangado só me deixou mais confusa.
— Por que acha que briguei com ele? De onde você tirou isso,
Suzana?
— Então por que ele tá indo embora? Vai ver, só descobriu que você
é chata e mandona.
— Suzi, a Clara não fez nada, nem antes e nem agora. Eu tinha
feito. Ela só precisou de um tempo para me perdoar — explicou ele — Está
tudo bem agora. Eu não estou indo embora. Só tenho algo muito importante
que preciso fazer. Em breve estarei de volta e nós, todos nós, ficaremos
Não sabia dizer por quanto tempo ele ficaria fora, mas guardaria
cada momento que passamos juntos, e assim conseguiria suportar um pouco
toda saudade que sentiria dele.
***
achava ser suficiente para ter uma vida confortável para mim e minha família.
E isso me mantinha orgulhosa.
Além disso, ter a minha cabeça sempre ocupada ajudava a manter
minha sanidade, enquanto Pedro estava longe. Tudo o que eu tinha dele eram
últimas décadas.
Houvera feridos e muitas famílias viviam agora em acampamentos e
abrigos, enquanto aguardavam a reconstrução de seus lares.
Pelo que Taú dizia, e eu percebia a cada minuto que avançávamos,
Minha mãe acreditava que o bem era a cura do mal. Que era dando
que se recebia. Os que tinham muito deveriam olhar para quem não possuíam
nada. Eu admirava e tentava viver da forma que ela via o mundo. Até que ela
se foi, arrancada de mim, levando consigo todos os ensinamentos que tentou
me passar. Eu os enterrei em meu coração, no mesmo túmulo onde enterrei os
meus pais.
Passei a olhar o mundo que vivemos com frieza. Só me importava
ser e ganhar. Transformei-me em um ditador em meu reino, vazio e
mim.
Foram dias de entrega física e emocional, principalmente emocional.
Por me deparar com a dura e padecida realidade desse povo, que ao lado de
outros missionários eu tentava levar algum tipo de esperança, e a saudade de
Abracei-a com força. Eu inalei o suave perfume que vinha dos seus
cabelos. Beijei sua testa, os cantos dos olhos, as bochechas úmidas.
Clara correu as mãos sôfregas por meu rosto, meus ombros e o peito,
como se precisasse confirmar que eu realmente estava ali, que estávamos
juntos.
— Eu te amo, Pedro Santini — ela se afastou um pouco e seu olhar,
cheio de amor, atingiu em cheio meu peito.
— Casa comigo, pequena?
Seus olhos piscaram e novas lágrimas surgiram quando fiquei de
ansiosamente pela resposta, não para algo impulsivo, como Clara poderia
estar considerando, mas para o que tinha refletido e vinha desejando desde
que pus os meus pés no avião.
— Pedro... Mas e a mamãe, a Suzi, todos os nosso amigos?
Esse era um passo importante, e eu entendi que ela quisesse ter todo
mundo celebrando com a gente.
— Também vamos nos casar no Brasil. Na igreja, perante o juiz e
diante de todas as pessoas que amamos. O que eu quero aqui, essa noite, é
Clara
uma no final.
Pedro.
O meu amor.
E estava lindo em uma espécie de túnica branca. Com o sorriso que
me deixava atordoada, caminhou até mim. Ele beijou minha mão e em
seguida tocou levemente a minha testa com os seus lábios. Nós paramos
diante do altar improvisado, onde firmaríamos nossa união.
No alto, uma linda e redonda lua iluminava o céu, fazendo com que
nossos olhares.
— Sou sua.
“Eu estarei ao seu lado até que a morte nos separe”, dissemos
juntos.
E foi ali, diante de pessoas tão humildes, a quem na vida só restavam
ter fé e esperança, em uma cerimônia singela, festiva e inegavelmente bonita,
que tive a dádiva de unir a minha alma e meu coração ao meu único e grande
amor.
Só que a vida real quase nunca é tão simples assim. Ela é feita de
altos e baixos. De erros e acertos. Desafios e frustrações. De lutas e
conquistas.
Mas, principalmente, de importantes e preciosos momentos que
compartilhamos com quem amamos. E Pedro e eu colocamos como meta
uma única e importante missão: fazer o outro feliz. Cultivando, fortificando e
fazendo o nosso amor crescer a cada dia. E fomos muito além, ele
transbordou de nós, dando-nos o nosso maior presente, o pequeno Valentin.
mal chegara ao mundo e havia uma lista infinita de pessoas que o amavam e
queriam bem. Acabei, por direito, escolhendo Letícia, e Pedro fez o convite a
Fernando. O furacão ruivo ficou bravo por um tempo, mas uma certa morena
endiabrada, como ele costumava dizer, conseguiu o acalmar.
descanso, depois de, assim como nós, ter gastado quase todas as suas energias
na comemoração deste dia tão importante.
— Estava só um pouquinho presa às lembranças especiais —
esclareci, quando Pedro me envolveu em seus braços amorosos.
Demos uma última olhada no bebê. E eu até cheguei a soltar um
suspiro de amor, antes de ser conduzida para fora do quarto.
— Hum... — o sorriso sedutor surgiu e, como sempre acontecia,
mexeu comigo — Sabe o que eu acho, Sra. Santini?
dominador.
Mas esse não era apenas o nosso felizes para sempre, mas sim, para
sempre: felizes.
Agradecimento
Escrever esse livro, com toda certeza, foi um desafio incrível para
mim. Dizer adeus a esse casal, que trouxe tantas alegrias e fez com que eu me
desafiasse a cada palavra, faz meu coração ficar um pouquinho menor. Mas
me despeço de Pedro e Clara tendo mim a certeza que fiz o meu melhor e que
usei todo meu coração para contar sua história.
Sou grata a todo o carinho que recebi e ainda recebo através deles. E
não poderia deixar de citar aqui, algumas pessoas que me ajudaram a fazer
essa jornada um pouco mais fácil e prazerosa.
Agradeço a Adriana Melo, por ler e apontar todas as dicas para que o
livro ficasse como imaginei. À Ana Rascado, seu papel nesse livro foi
fundamental, e que coisa incrível descobrimos juntas, não é mesmo?
[1]
Figlio di puttana: Filho de uma puta.
[2]
SSC: Sã, Seguro e Consensual.