Você está na página 1de 260

Davi

a redenção de um homem

Parte 2

Aline Pádua
Copyright 2018 © Aline Pádua

1° edição – maio 2018

Todo o enredo é de total domínio da autora, sendo todos os

direitos reservados. Proibida qualquer forma de reprodução total


ou parcial da obra, sem autorização prévia e expressa da autora.

Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Revisão: Gabi Ferraz

Diagramação: Aline Pádua

Ilustração: Queen Designer


Sumário
Sumário
Importante
Sinopse
Playlist
Prólogo
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
Epílogo
Te quero para sempre
Guilherme – a escolha de um homem
Contatos da autora
Dedicado a Manuele Cruz, por ser a amiga, parceira e

inspiração...
Importante

Esse é livro é a PARTE 2 de outro que carrega o mesmo

nome Davi – a redenção de um homem (parte 1). É


indispensável ler a primeira parte para poder entender essa!
Sinopse

Até onde a ambição pode nos levar?

Davi Rivera tinha tudo o que tanto almejou, e ao mesmo tempo, sentia
não ter nada. Algo dentro dele tinha mudado, pois toda a vez que fechava os
olhos, ou até mesmo seus pensamentos se perdiam, sua mente era povoada
por uma certa morena de olhos castanhos, que tinha lhe mostrado uma vida
completamente diferente. Ela era sua esposa, porém não o queria mais. Davi
não sabia o que ponderar, nem o que pensar. Só tinha a certeza de que seria
pai, e que de alguma forma, Manuele nunca seria apenas a mãe do seu filho.
Pois ele tinha tomado seu coração.

Manuele Cardoso ainda processava toda a carga emocional de


descobrir o que de fato fez Davi se tornar o homem de seus sonhos. Ele não o
era... Jamais seria. Então por que não conseguia tirar o atual marido de seus
pensamentos? Ela acreditava que o sentimento passaria. Que longe o
suficiente para pensar, Davi não seria mais o causador de suas lágrimas. O
problema consistia em que de algum jeito o destino sempre a colocava de
frente com o homem que apenas lhe entregou partes, além de tudo, falsas.
Porém, daquela vez, ela não queria partes. Ela queria tudo. Tudo o que Davi
Rivera não representava.

Um embate de sentimentos confusos...


Descobertas que mudarão a vida de ambos para sempre...

Um homem em busca de redenção...

Uma mulher em busca da felicidade...

Entre a linha tênue entre a redenção e felicidade, ambos conseguiriam


se encontrar?

Afinal, qual será a redenção desse homem?


Playlist

3x4 – Engenheiros do Hawaii

All I ask – Adele

Born to Die – Lana Del Rey

Call out my name – The Weeknd

Close – Nick Jonas feat. Tove lo

Feels like home - Chantal Kreviazuk.

Happier – Ed Sheeran

I have questions – Camila Cabello

Impossible – Shontelle

In my blood – Shawn Mendes

Índios – Legião Urbana

Photograph – Ed Sheeran

Pray – Sam Smith

Skinny love – Birdy

Story of my life – One Direction

The heart wants what it wants – Selena Gomez

To good at goodbyes – Sam Smith

Uh Hu – Julia Michaels
Vento no litoral – Legião Urbana

Who you are – Jessie J.

Wildest dreams – Taylor Swift

Worst in me – Julia Michaels


Dedicado aos românticos incuráveis, que acreditam no recomeço de um
mesmo amor...
“Queria o real, um real sem nada por trás dele mesmo. Apenas mais
fundo, mais indisfarçável, sem nenhum sentido outro que não aquele que se
pudesse ver, tocar e cheirar com os cheiros, mesmo nauseantes, mas
verdadeiros (…) Eu estava farto do invisível.”

Caio Fernando Abreu


Prólogo

“Laying on the bathroom floor

Feeling nothing

I'm overwhelmed and insecure

Give me something

I can take to ease my mind slowly.”[1]

Sentia-me um completo desgraçado. E como as palavras


de Manu estavam certas, sentia-me um maldito covarde. Pois eu
era! Na realidade, tinha sido. A questão toda é que no mesmo

segundo que a porta do elevador fechou e sua imagem


desapareceu de meu campo de visão. Ali, finalmente acordei para
a vida.
Ela sempre foi muito mais do que um plano... Ela era
minha.

Joguei o copo de uísque com força na parede e levei as

mãos aos cabelos. Depois daquele momento, eu tentei, perdi a


conta das inúmeras vezes, me aproximar e mostrar a ela que não
era pelo bebê, nem porque a magoei, muito menos pelo meu

sobrenome. Eu a queria pra mim.

Eu a amava... Demorei para entender, para ver que aquilo


era real. Ela foi a única a destruir todas minhas barreiras e me
tinha em suas mãos. Era aterrorizante, mas ao mesmo tempo,

sentia-me um sortudo. Ela era perfeita. Um presente que ganhei


numa noite que tinha tudo para não passar daquilo.

A minha vida tinha sido milimetricamente calculada. Eu não

acreditava em amor, após ver minha própria irmã se afundar


diante de tal sentimento. Não pedi, não esperei, muito menos
escolhi... Mas encontrei amor no segundo em que tive Manuele

em meus braços.

— Coragem, Davi! — falei alto, como se aquilo me


encorajasse.
Saí em direção ao banheiro e mesmo ainda sob o efeito do
álcool, cheguei vivo até o box. Abri a ducha gelada e permiti-me
ficar ali até que tivesse recobrado minha sanidade por completo.

Eu iria até Manuele, confessaria tudo, sem chance de vê-la pedir


mais tempo e espaço. Sem desculpas, sem brigas, sem temer...

Ela seria minha novamente.

Entrei no banco do passageiro, e o segurança me olhou


como sempre impassível. Dei a ordem para até a fazenda, e
assim, ele o fez. Suspirei fundo, encostando-me contra o banco, e

pensando em todas as palavras que ainda precisavam ser ditas,


em tudo que precisava deixar claro, antes de trazê-la de volta

para nossa vida. Porque se resumia naquilo, tínhamos tornado


tudo em “nós”.

Quando finalmente o carro estacionou frente à fazenda,

desci, e fui em busca da mulher que amava. A passos incertos,


cheguei a frente de sua casa, e bati levemente na porta. Esperei
por alguns minutos, mas não obtive resposta. Passei as mãos por

meus cabelos, já me sentindo impaciente.

Estava prestes a explodir tudo o que sentia. Aqueles


meses tinham sido tão torturantes, e completamente agoniantes.
Tudo o que nossa vida se tornou, o que realmente mudou ao
redor. Nada seria o mesmo, não depois de todas as descobertas

que fizemos.

Mas a que mais me importava era: o amor que sentia pela

minha mulher. E que não me permitiria perde-la para sempre.

— Ei. — virei-me ao som da voz de Luíza, que me encarou

um pouco sem jeito. — Ela não está.

Continuei apenas encarando, sem saber o que dizer. Luíza


esteve devastada desde a briga sem fim que teve com Marcelo, e

parecia a ponto de querer deixar de vez seu casamento. Meu


amigo era o único que parecia não notar que uma noite de foda

no passado entre eu e Luíza não tinha significado. Ele estava


perdendo a mulher que amava por aquilo.

— Foi andar em volta do lago, acho que está por lá. —

forçou um sorriso. — Não o fiz antes, mas, quando me defendeu


naquele dia em que Marcelo entrou na casa de Manu... —
suspirou, claramente perdida. — Obrigada por aquele dia, Davi.

— Não precisa agradecer. — lágrimas desceram por seu


rosto. — Ele vai ver que está metendo os pés pelas mãos e...
— Ele tem outra! Ou outras... — falou resignada. — E eu,

estou com os papéis do divórcio prontos.

— Lu...

— Eu o amo, mas acima de tudo, amo a mim e...

— Dona Luíza!

Viramos em direção a voz e lá estava o novo capataz da


fazenda, sorrindo amplamente para ela. Arqueei a sobrancelha e
ali, consegui ver a fundo a merda que meu amigo tinha se metido.

— Preciso ir. — bateu em meu ombro. — Não desista dela,


está na cara de ambos que se amam.

— Acha mesmo? Acha que ela me ama? — perguntei


temeroso.

Luíza balançou a cabeça e sorriu verdadeiramente.

— Vá ver por si mesmo.

Saí dali, e fui em direção ao lago. Meu coração acelerando


aos poucos, deixando-me ainda mais perdido. Precisava chegar
até minha mulher e não deixá-la ir nunca mais. A levaria em meu

colo se preciso, mas ela me ouviria, me daria uma chance de ao


menos ouvir cada pequena parte de toda a história.
Assim que a vi de longe, arqueada em direção ao lago,
meu peito sofreu um solavanco. Então, aquilo era amor... Sentir-
se tão malditamente entregue a alguém, sem ao menos saber

porque e sem se importar.

Sorri, ao mesmo tempo em que ela virou de lado, me


dando a visão da grande barriga de seis meses, que me deixava

absurdamente orgulhoso. Ela era minha... Carregava nosso filho.


Éramos uma família.

Dei um passo, pensei em gritar seu nome para que me


visse. Mas o desenrolar da cena a minha frente, fez com que

paralisasse. O tal Rogério que sequer tinha notado a


presença, sorriu para ela, que retribuiu, e em menos de um
segundo, os lábios dele estavam sobre os dela. Arregalei os

olhos, incrédulo. Sem conseguir pensar, sentindo-me quebrar.


01

“I will leave my heart at the door

I won't say a word

They've all been said before, you know

So why don't we just play pretend

Like we're not scared of what's coming next

Or scared of having nothing left.”[2]

Meses antes...

— Olha, eu não estou entendendo o que estão falando. —

falei nervosa, segurando de leve em minha barriga, tentando me


orientar diante tanto do homem que dizia ser meu irmão, e da
mulher que era simplesmente idêntica à irmã falecida de Davi. —

Eu preciso...

— Desculpe, eu não... — o tal Hugo tentou tocar meu

braço, acho que notando minha fraqueza, mas logo senti meu
corpo sendo puxado, e o cheiro familiar de Davi tomou conta ao
redor.

— Se afaste dela! — ele praticamente gritou, e tentei


recuperar meu fôlego, sequer entendendo o que sentia.

Senti as mãos de Davi em meu rosto, mas não consegui


olhá-lo, sequer afastá-lo. Aquele dia estava sendo demais para

mim. Busquei forças em meu filho, que chutou no mesmo


instante, como se estivesse me dando todo apoio. Num impulso,
soltei-me de Davi, e olhei para os cinco seguranças que sequer

sabia de onde tinham surgido, que cercavam o tal Hugo e a


mulher.

Davi parecia não ver nada ao redor, e forcei-me a encará-

lo, já que o que menos esperava era vê-lo e tê-lo tão próximo
daquela forma.

— Davi...
— O que fizeram com você? — perguntou baixo, e só

assim notei seus olhos semicerrados.

— Olhe pra ela. — pedi baixinho, e ele franziu o cenho. —

Apenas faça isso. — insisti.

Tocou de leve meu braço, o qual afastei no mesmo

instante. Os olhos dele pareciam perdidos, assim como os meus.


Porém, vendo que não mudaria minha posição, acabou acatando
meu pedido, e finalmente, encarando a mulher loira a sua frente.

Dessa vez, vi Davi paralisar, e sua boca abriu num perfeito


“o”.

— Branca. — falou baixo, e deu um passo pra perto dela,


como se conferisse que era real.

— Desculpe, deve estar me confundindo. — ela falou baixo

e gentil, como tinha feito antes. — Sou Daniela.

— Não.— ele passou as mãos nervosamente pelos

cabelos, virando-se para mim. — Está vendo o mesmo que eu?

— Estou tão incrédula quanto você. — respondi, finalmente

encontrando minha voz.

— Por isso está assim? — perguntou, aproximando-se. —


Eu... Nem sei o que pensar.
— Ela parece não saber de nada, Davi. — falei, e o mesmo
assentiu. Quando se virou para ela, acabei tomando coragem e
tocando seu braço, puxando-o. — Não force nada, não sabemos

o que está acontecendo.

Ele pareceu digerir minhas palavras, e engoliu em seco,


como se finalmente percebesse o poder que tinha sobre as

pessoas. Ele tinha esmagado e dilacerado meu coração, e ali,


naquele instante, vendo aquela mulher inocente, que tinha tudo,

ao menos fisicamente, para ser sua irmã, eu não o permitiria


trocar os pés pelas mãos. Ao menos alguém, protegeria. Já que
sequer cuidei de mim mesma.

— Precisamos sair daqui e conversar. — falou num tom


calmo, mas que não deixava vazão para desculpas. — Preciso

entender o que está acontecendo.

— Do que está falando? — Hugo se pronunciou, e Davi fez

um sinal com a cabeça para os seguranças, que se afastaram. —


Eu vim falar com minha irmã, apenas isso. Não somos ameaça
ou...

— Irmã? — Davi olhou entre nós, e acabei dando de


ombros.
— Descobri há poucos segundos. — contei, e senti um nó
em minha garganta. — Isso está sendo demais pra mim! —

confessei, e senti meu corpo ainda mais pesado.

— Cariño... — Davi me segurou em seus braços, e naquele


instante, não fugi, já que sequer conseguia sentir minhas pernas.

— Vamos para meu apartamento e lá, pode descansar e todos


conversamos, o que acha?

Seus olhos me encararam suplicantes, e pela primeira vez,


em todos aqueles meses, notei que Davi realmente pedia

permissão para algo. Desde o princípio ele me engoliu como uma


avalanche sem fim, sem me dar sequer um segundo para respirar.
Eu permiti, diante da paixão em meu peito. Mas ali, naquele

instante, mesmo que tudo o que quisesse fosse acreditar em seus


olhos... Minha mente negou.

Eu neguei.

Olhei de relance para a aliança em seu dedo anelar


esquerdo e segurei as lágrimas. As palavras cortantes da

conversa de minutos atrás voltando a minha mente:

— Eu já tinha um plano arquitetado. Tinha uma mulher em


mente que aceitaria facilmente minha proposta de casamento e
não teria danos algum. Tudo correria bem. Era um plano sem

falhas. Mas daí nos envolvemos e...

— Então por que, Davi? Por que me usou para isso?

— Porque ficou grávida.

Afastei-me de seu corpo, e me forcei a ficar em pé,

tentando não parecer tão abalada.

— Olha, tem sido um dia de merda. — falei com toda


sinceridade, alto para que todos ouvissem. — Claramente, não é

um assunto que podemos deixar pra depois. — olhei para


Daniela, que parecia ainda mais perdida que nós. — Então, eu
proponho irmos até minha casa, fica numa fazenda não muito

longe daqui.

Hugo abriu um sorriso, claramente aliviado por saber que


aceitaria falar com ele. Deus, quem era ele? Seria ele uma parte

da família que nunca conheci? E pior, como meus pais, que


sempre foram tão amorosos, tinham um filho e não o sabiam?

— Pela gente... — ele falou, olhando para Daniela que


assentiu. — Tudo bem. Estamos de carro e podemos te seguir.

— Certo. — apertei minhas têmporas com cuidado. — Eu


vou com um dos seguranças, tudo bem? — Davi assentiu, pela
primeira vez, não usando nenhuma de suas armas sobre mim.

— Posso ir no mesmo carro que você? — perguntou baixo,


num tom que apenas eu podia ouvir.

Seus olhos, sua boca, sua face... Tudo transmitia algo


além, como se ele realmente me amasse, e que tudo aquilo não

passava de um mal entendido. Mas não era, meu conto de fadas


não era real.

Sequer sabia o que ele fazia ali, na calçada justo naquele

momento. Ele não deveria estar ali. Ele tinha a presidência, o que
precisava. Eu tinha um coração quebrado para colar.

— Tudo bem. — concordei, mas olhei-o da forma mais fria


que consegui. — Apenas não me chame mais de cariño, e me dê
espaço Davi. Não somos mais nada um do outro.

Minhas palavras saíram livremente, e pareceram acertar


onde realmente queria, seu ego. Algo em Davi reagia a mim,
afinal. Seus olhos se arregalaram ligeiramente, como se

processasse minha fala. Ele disfarçava bem, e naquele instante,


finalmente concluí o quão bom ele era em esconder suas feições.
O que de fato eu conhecia nele? Já não tinha ideia. Porém, por

um segundo, ele não se sentiria tão imbatível assim.


02

“You got me sippin' on something

I can't compare to nothing

I've ever known, I'm hoping

That after this fever I'll survive” [3]

Encostei a cabeça contra o estofado macio do carro, e


tentei ignorar por completo a presença de Davi ao meu lado. Eu
sabia de alguma forma que estava sendo observada, e acabei
escolhendo a opção mais fácil: fingir. Sorri de lado, sem conseguir

crer que fazia o mesmo que ele. Tudo o que Davi Rivera fez
durante aqueles meses. Desde o segundo em que me pediu em
casamento, até o momento em que colocou uma aliança em meu
dedo – condenando-me a um casamento onde o amor estava fora
de seus planos.

O divórcio existia para casos assim, ao menos, eu

pensava. Onde o amor não existia mais, ou ao menos, não valia


mais o esforço. Davi não merecia mais nada de mim, porém, eu
ainda queria saber sobre tudo. Pois sentia que ele escondia mais
por trás de suas próprias palavras. Algo me instigava a querer
saber, por mais que pudesse doer. Mas como estilhaçar o que já
estava quebrado?

— Por que? — perguntei, ajeitando-me no banco. — Por


que me pediu em casamento?

Mudei meu foco para Davi, que verifiquei se estava a uma


distância segura do mesmo. Ele disse algo ao segurança, subindo

uma janela que sequer sabia ter ali no carro, que logo nos
separou do mesmo, deixando-nos completamente a sós.

— Cariño... Quer dizer, Manuele. — agradeci internamente


por ter corrigido sua fala. — Eu já te disse o que aconteceu.

— Por que eu sinto que tem mais? — encarei-o friamente,

tentando manter meu corpo num estado relaxado, porém, era


impossível. — Você tinha um plano, não é?
— Sim. — respondeu sem vontade.

— Me conte sobre ele. — insisti, e ele negou com a


cabeça, passando as mãos pelos cabelos, deixando-os ainda
mais bagunçados.

Eu só consegui pensar o quanto adorava bagunça-los


sobre a fronha do travesseiro, enquanto o mesmo dormia. Aquele
sentimento em meu peito era insano.

— Não é algo bonito pra se ouvir.

— O que fez comigo, com certeza não é algo belo. —

retruquei, sentindo meu peito pesar. — A mágoa que sinto nesse


instante, me faz querer nunca mais olhar pra sua cara.

— Eu sei. — falou, e seu olhar parecia perdido. — Não tem


perdão para o que fiz, Manuele.

— Então, apenas me dê toda a verdade. — pedi, sem

saber ao certo a quem queria convencer.

De toda forma, ainda sentia que aquela conversa em seu


apartamento não seria a última que teríamos sobre o assunto, e
ali, dentro do carro, queria finalizar de vez qualquer questão
sobre. Não queria, nunca mais, ter de relembrar com ele, os

motivos que o levaram a fingir que se importava.


— Eu precisava estar casado para conseguir de fato a
presidência. — soltou num fôlego. — Por isso, tinha um plano

sobre tudo. Uma ex, a qual esteve comigo antes de minha irmã...
Deus, que sequer sei agora o que houve. — falou resignado. —
Enfim, ela era perfeita pois sempre amou status e dinheiro, assim,
não se importaria em casar e muito menos fingir uma paixão
platônica. Seria fácil convencer meus pais e...

— Como assim? Convencer? — perguntei de relance.

— Não bastava assinar os papéis... Meu pai é um homem


que usou o que pode para que eu deixasse a empresa de lado e
vivesse minha vida. — fechou os olhos por um instante, e senti
sua fragilidade. — Desde que Branca se foi, desisti por completo

do que seria amor... E além de tudo, do que significava família. Já


que a minha própria mentiu da forma mais vil. Só agora, quando
você saiu do apartamento eu... Entendi o que fiz com eles. —
olhei-o atentamente, já sem entender nada. — Não sei mesmo
quem é essa mulher no carro atrás do nosso... Ela é idêntica a

minha irmã e se ela for Branca, há muito mais para entender


sobre o passado. — abriu os olhos e me encarou, vendo que
falou sobre algo que sequer perguntei. — Desculpe, eu... Não sei
lidar muito bem com esse assunto.
— Tudo bem. — assenti, pois de certa forma, aquilo devia
ser algo pesado de seu passado e ainda mais, algo que tinha
acabado de ser desenterrado.

— Enfim, eu não conseguia confiar em mais ninguém... O

sexo era apenas isso, nada mais. — deu de ombros. — Quando


voltei para o Brasil, foi porque soube sobre o que de fato atrasava
meu cargo de presidente, e decidi que não abriria mão da minha
liberdade por conta do que meu pai queria, muito menos, depois
de ter levantado a empresa da família da lama. — ele parecia com

raiva. — Adiei o máximo possível, até que descobri que se não


me casasse esse ano, a chance passaria a meu irmão,
Guilherme, e foi quando tomei a dianteira de seguir os passos do
plano.

— Mas não saiu como planejado, não é? — sorri

sarcasticamente. — Eu não entendo sobre contratos, cláusulas,


muito menos sobre presidência de empresa. Mas pelo jeito tudo
se baseou em poder, já que dinheiro você tem de sobra, não é?

— Queria provar a eles, e a mim mesmo, de que a


empresa podia sim ser tudo o que precisava. — seus olhos

cortaram meu coração. — Mas eu estava errado.


— Eu acho que não. — fugi de seu olhar, sem querer me
enganar novamente. — Devia ter me dito... Quando contei da
gravidez, do que realmente precisava. — suspirei fundo,
segurando de leve em minha barriga. — Não precisava fingir tudo
aquilo, Davi. Não tinha o direito de brincar comigo e ainda mais
me fazer acreditar que queria a mim, como o nosso filho.

— Mas eu quero! — sua voz foi cortante, e fechei os olhos,


mirando em seguida meu olhar em direção a janela. — Eu sei que
tudo começou errado, mas...

— Você tinha a escolha de ficar com a mulher do seu

plano, e ser um pai para o nosso filho. — olhei-o com pesar. —


Mas não era o suficiente? Por que?

— Porque eu... Tinha mais nos papéis. — franzi o cenho, já


preparada para qualquer coisa que saísse de sua boca. — Além
do casamento, exigia um herdeiro.

Sua voz falhou, e senti o bolo se formar em minha

garganta, o qual pareceu indigerível. Não, ele não podia estar


falando sério.

— Não...

— Manuele, eu...
— E ainda não teve a coragem de me contar isso de
primeira! — acusei, sentindo meu coração sangrar novamente. —

Então, até nosso filho é algo que veio a calhar, não é? — ri sem
vontade, segurando as lágrimas. — Quer me dizer que apenas fui
a mulher grávida na hora certa, no momento certo para aceitar um
casamento, e ainda por cima te dar tudo o que queria e um pouco
mais?

— Não nesses termos, mas...

— Não existem termos aqui, Davi! — falei furiosa. — Eu


sou um ser humano, assim como você. Como foi capaz de me
enganar tão friamente e ainda por cima fingir ser algo que não é?
— minha cabeça girava ruidosamente, e encarei de relance a

janela, notando que já estávamos na fazenda.

Graças a Deus!

Eu precisava urgentemente, me trancar num lugar e gritar o


mais alto possível. Tentar tirar aquela dor inquietante de meu
peito.

— Manuele, se me deixar explicar, tenho certeza que...

— O tempo de explicações já passou. — limpei


rapidamente uma lágrima que desceu. — Você tinha a opção de
ser sincero desde o começo. Mas não foi, e eu não sou uma
pessoa que sabe lidar com mentiras, Davi.

— O que quer dizer com isso?

O carro parou, e tirei o cinto, em seguida, abrindo a porta.


Senti meu braço sendo puxado, antes de conseguir me levantar, e
olhei para Davi com desgosto.

— Que não sei lidar com pessoas como você.

Saí de seu aperto e inspirei profundamente, caminhando

em direção a minha antiga casa. Ali, na fazenda, com toda


certeza o caos ainda estava instaurado. Já que meu segurança
continuava a frente da casa dos pais de Luíza, e não tinha sinal
de Marcelo. Realmente, era um dia de merda.

Assim que coloquei a mão na madeira da porta da minha


antiga casa, suspirei, pois sabia bem que ali voltara a ser meu lar.

Lembrei-me do esconderijo da chave extra, já que vivia para


perder cópias da chave, e sorri ao encontra-la dentro do vaso do
cacto que sempre deixava a frente.

Destranquei a porta e abri, olhando de relance para dentro

e sentindo uma nostalgia bater em meu peito. Tendo a certeza de


que nunca, em momento algum, deveria ter saído dali.
Davi estava mais próximo e foi o primeiro a estar ao meu

lado, o que me fez enrijecer. Não o queria por perto, mas


infelizmente, o destino parecia querer de alguma forma, colocá-lo
sempre a minha frente.

Hugo e Daniela estavam de mãos dadas e ela parecia dizer


algo para acalmá-lo, como se a maior incógnita ali não fosse ela.

Foi naquele instante que comecei a desconfiar que ela sequer


suspeitava do que imaginávamos. Logo, os dois estavam a nossa
frente, e lhes dei espaço para entrar. A casa estava bem
iluminada, e assim que coloquei os pés para dentro, notei que o
cheiro era de limpeza.

Alguém a mantinha bem cuidada... E agradeci


imensamente por aquilo.

— Bom, fiquem à vontade. — falei, indicando o sofá, e me


sentando em seguida numa poltrona a frente deles.

Davi permaneceu de pé, ao lado da porta de entrada, e

logo vi dois seguranças adentrarem a casa, que seria incomum,


se eu já não estivesse acostumada com aquilo.

— Isso é necessário? — Hugo perguntou, e encarei Davi,


que me lançou um olhar duro. — Eles já me revistaram, e até
mesmo mexeram na bolsa da Daniela. Não temos nada a
esconder, apenas quero falar com você, Manuele.

Olhei para Davi novamente, e o mesmo parecia entender o

desespero na voz de Hugo. Em poucos segundos os seguranças


se retiraram, mas eu sabia, que continuavam do lado de fora.

— Bom, eu nem sei o que dizer. — fui sincera, e ajeitei-me


contra o sofá.

— Acho melhor começar do começo, não é? — assenti, e


Hugo sorriu, apertando a mão da loira ao seu lado.

Suspirei fundo, preparando-me psicologicamente para


receber qualquer nova história. Minha vida tinha se tornado um
grande e espetaculoso cenário de novela naquele dia. Porém,
mesmo com a vontade de me esconder com todas minhas dores

e inseguranças, logo após receber toda a enxurrada de meias


verdades de Davi, optei por prestar atenção em Hugo, tentando
finalmente sair do capítulo que tinha parado.
03

“Lost, but now I am found

I can see, but once I was blind

I was so confused as a little child

Tried to take what I could get, scared that I couldn’t find

All the answers, honey.”[4]

— Faz algumas semanas que de fato descobri que não sou


filho biológico do homem que me criou como filho. — Hugo
começou, e o encarei atentamente. — Sou do interior do Paraná,
e há cerca de um ano minha mãe ficou doente e infelizmente,

acabou falecendo há um mês. — olhei-o com pesar. — Eu já tinha


perdido meu pai, Jorge, num acidente de trabalho há dois anos, e
a dor da perda já era uma companheira, porém, fiquei devastado.

— ele parecia quebrado. — Minha mãe, Tânia, deixou uma carta


para mim, que seria entregue apenas após sua morte. Assim,
quando a li, descobri de fato que não sou filho biológico de Jorge,
e sim de, Eduardo Cardoso.

Abri a boca assustada diante de suas palavras, ainda


incrédula.

— Não acreditei de primeira, e fiquei completamente


perdido. Mas a história que ela conta na carta pareceu tão real,
assim como a foto de Eduardo que era muito parecido comigo. —
passou as mãos pelo rosto, parecendo como eu, uma bagunça.

— Eu descobri que ele e sua esposa, Fabiana, tinham falecido, e


com a ajuda de Dani, soube sobre você.

— Hugo não é muito ligado em redes sociais, e ficou


devastado ao descobrir que na realidade o pai que ele sequer
sabia que era seu, tinha falecido. — Daniela começou a dizer. —
Mas eu sigo diversos perfis em redes sociais, e assim que parei

por acaso em Davi Rivera e vi uma foto sua com ele, acabei
ligando seu sobrenome ao de Eduardo, e acabamos descobrindo
pelo seu perfil, e com a ajuda do detetive, que é de fato filha de
Fabiana e Eduardo Cardoso.
— Deus do céu! — levei as mãos à cabeça, sentindo uma
dor aguda. — Eu não consigo entender essa história toda e...
Meus pais eram maravilhosos, e tenho certeza que meu pai

jamais te deixaria, Hugo.

— Mamãe deixou claro na carta que Eduardo nunca soube


sobre mim, era o segredo que ela sempre guardou e que nunca
teve a chance de me pedir perdão. Palavras dela. — falou com
pesar. — Minha mãe era apenas uma conhecida dos seus pais, e
nutria sentimentos por Eduardo. Uma noite eles se envolveram,

mas não foi nada demais... Porém, nove meses depois eu nasci.
Eduardo nunca soube porque minha mãe escolheu viver aquilo
sozinha, pois sabia que ele não a amava, mas que ficaria com ela
por conta do bebê. Ela então se mudou para o Paraná e por lá
ficou.

— Eu nem sei o que dizer. — passei as mãos


nervosamente sobre minhas pernas.

— Tenho trinta anos, então acho que pelo pouco que


descobrimos através das redes sociais e um detetive, que tem
vinte e cinco, não é? — assenti. — Sei que é muita informação,

mas eu precisava saber se ainda tinha uma família. Pode ser que
não sejamos irmãos, que tudo seja coincidência...
— No momento, não acredito em nenhuma coincidência. —
soltei nervosa, olhando de relance para Daniela. — Podemos tirar
essa história toda a limpo, apenas fazendo o exame de DNA.

O mesmo sorriu, parecendo aliviado, e o encarei com


carinho. De alguma forma, sentia-me ligada a ele.

— Eu agradeço muito por me ouvir e... Estou muito feliz em


conhece-la, Manuele.

— Digo o mesmo. — sorri verdadeiramente. — Mas eu


preciso falar com vocês a respeito de algo.

— Como assim? — Daniela perguntou, ambos parecendo

confusos.

— É que nos encontraram em meio as redes sociais, não


é? — perguntei, olhando de relance para Davi. — Não tem
realmente noção sobre quem os Rivera são?

Ambos me encararam claramente sem entender, e fiz um


sinal com a cabeça para que Davi se aproximasse. Comecei
então a pensar sobre todas as fotos que ele adorava tirar e

colocar em sua rede social principal, o instagram[5]. Não entendia

ao certo o porquê de Davi gostar daquilo, mas tinha a impressão


de que o mesmo amava fotografia, contudo, até aquilo parecia ter
sido mais uma de suas armações para simplesmente conseguir o
que queria.

— Esse é Davi Rivera. — falei baixo, tentando parecer


calma. — Ele, assim como eu, reconheceu você, Daniela.

Ela franziu o cenho, e Hugo passou o braço ao redor de


suas costas, num ato claramente protetor.

— Do que está falando?

Davi mexeu no celular por alguns segundos e logo me


mostrou a foto que tinha escolhido, assenti para o mesmo,
notando que ele parecia completamente emocionado e ao mesmo
tempo incrédulo diante da mulher loira a sua frente.

— Minha irmã, Branca Rivera, morreu há cinco anos. —


começou a dizer, ainda em pé a nossa frente. — Poucas pessoas
tiveram contato com ela, já que sempre foi a protegida da nossa
família e tentamos poupá-la da mídia e todo restante. Ter o nosso
sobrenome era um peso, ainda mais para a garotinha que foi
adotada depois de mais velha pela família.

— O que isso tem a ver com a gente? — Hugo se


pronunciou, mas notei que parecia desconfiado de algo.
— Tem a ver com ela. — Davi engoliu em seco, e lhes
entregou o celular. — Essa era minha irmã.

Os olhos de Daniela se arregalaram, assim como os de


Hugo, e ambos trocaram um olhar significativo, como se

tentassem juntar todas as peças perdidas. Não consegui dizer o


que sentia naquele instante, mas notei o olhar suplicante de
Daniela para Davi, como se quisesse entender o que acontecia, e
além de tudo, a forma que ele a encarava com esperança.

— Hugo. — foi tudo o que ela disse, ficando estática de


repente.

— Merda! — ele tocou seu rosto, e foi minha vez de


levantar, ficando próxima a eles. — Ela está tendo outra crise.

— Hugo, eu... Meu nome... — ela parecia perdida nas


palavras, e tentava recuperar o fôlego, que sequer entendi como

perdeu.

— Tá tudo bem, loirinha. — fez carinhos em seu rosto. —


Vamos lembrar de tudo, não é?

Ouvi o barulho da porta da casa se abrindo, e no segundo

seguinte, Guilherme Rivera estava ao meu lado. Assim que os


olhos de Branca encontraram os dele, ela pareceu entrar em
estado de pânico, e Davi praticamente esmurrou o irmão para
longe, que sequer se mexia.

Daniela piscou uma vez, antes de fechar os olhos, e


apagar ali mesmo. Aquela situação parecia toda errada, enquanto
Hugo se virava, ajeitando-a no sofá, mas que parecia
completamente acostumado com tal situação. Ouvi os gritos de

Davi com o irmão, mas simplesmente ignorei, prestando atenção


em Hugo que fazia carinhos nos cabelos dela.

— Ela tem essas crises... Na realidade, não as tinha a mais


de dois anos. — suspirou fundo. — Quando a encontrei, há cinco

anos, fiz de tudo para descobrir sobre seu passado, e ainda mais,
ajudá-la a se reencontrar.

— Como assim? — olhei-a com cuidado. — Ela não


precisa de um hospital?

Ele negou com a cabeça.

— Ela precisa, e vai para um agora! — Davi praticamente

exigiu, e Hugo se levantou, claramente contrariado.

— Estou com ela há cinco anos, cara. — colocou as mãos


no bolso. — Já passamos por diversos médicos e todos nos
deram a mesma resposta, e o que podemos fazer é esperar que
ela acorde, e se lembre de algo.

— Se lembrar? — Guilherme indagou.

— Quando a encontrei pela primeira vez há cinco anos, ela


não se lembrava de nada. — confessou, e prendi uma respiração.

— O que? — foi a vez de Davi perguntar.

— Ela tinha perdido a memória.

Levei as mãos a boca completamente chocada, e olhei


para Davi que parecia estático, e Guilherme que estava branco
feito papel. Aquela, a nossa frente, era de fato, Branca Rivera. Só
não entendia ao certo, o que diabos o destino queria, mas de
certa forma, estávamos todas entrelaçados a partir dali.
04

“The story of my life, I take her home

I drive all night to keep her warm and time is frozen

The story of my life I give her hope

I spend her love

Until she's broke inside.”[6]

O pânico que tomou conta de meu corpo desde o instante


em que coloquei os olhos sobre a mulher loira a frente de
Manuele, ainda na calçada de meu prédio, não significava nada,

perto da agonia que meu peito se tornou ao ouvir as palavras do


tal Hugo.

Como assim? Ela tinha perdido a memória?


— Davi... — ouvi a voz de meu irmão e o encarei com

pesar. — É ela, irmão. É Branca.

Ele estava praticamente sem cor, e começou a andar de


um lado para o outro, como se tentasse se controlar. Puxei uma
respiração profunda e pela primeira vez em muitos anos banquei
o que de fato era para ele, seu irmão.

Toquei seus ombros com força, e ele me encarou,


completamente perdido.

— Mantenha a calma. — falei tentando soar firme, e ele


piscou algumas vezes.

— Depois de tantos anos, Davi... Não, isso não é possível!

— se afastou no mesmo instante, olhando o teto. — Agora, até


você está falando comigo novamente.

— Guilherme...

— O que? — ele parecia a ponto de chorar. — Só porque

Branca está viva a nossa frente, isso não diminui minha culpa! —
bateu com força em seu próprio peito. — Foi só me ver que ela
apagou. Não percebe que sempre acabo causando o pior nela?

Eu não o reconhecia, Guilherme raramente demonstrava


seus sentimentos. Sempre imaginei que ele tinha total domínio
sobre o que aconteceu no passado e tinha certeza que na
realidade não foi sua culpa. Porém, depois de tê-lo julgado tanto,
e agora, sem olhar pela mágoa, notava claramente – ele era

quebrado.

— Preciso ir... — falou em desespero, e simplesmente


assenti, vendo-o sair de meu campo de visão em questão de
segundos.

Levei as mãos aos cabelos, completamente atordoado, e


sentindo toda culpa me invadir. A forma que julguei Guilherme foi
cruel para a dor que com certeza o acertou, e o assolou por anos.
Ele nunca foi o culpado... Mesmo assim, o condenei friamente.

Olhei para Manuele, que assistia a cena completamente


inerte, como se dividida entre eu e meu irmão, assim como das

duas outras pessoas presentes naquele cômodo. Notei que nunca


quis tanto seu abraço como naquele instante, pois ela me
reconfortava, tinha se tornado a minha droga favorita, e eu era
viciado na mesma. Ela era a razão pela qual, naquele instante eu
entendi as razões de meu irmão, os porquês de Branca ter

sofrido, e mesmo não entendendo seu destino, ter acreditado


tanto no amor.
Manuele me fazia acreditar num sentimento que antes
pensava ser incapaz de sentir.

— Qual o problema? — perguntou, e acenei com a cabeça,


pedindo implicitamente que se afastasse de Hugo e Branca, que
permanecia desacordada.

Manuele veio a passos calmos até mim, e logo estávamos


frente a frente, numa distância clara que me matava aos poucos.
Aquele espaço entre nós me machucava, mesmo não tendo
direito algum a sentir qualquer tipo de dor naquele momento.

— Há muito por trás da “morte” de Branca. — suspirei


fundo. — Se o que o tal Hugo diz for real, preciso agora começar
a investigar o que aconteceu... E como simplesmente a perdemos
durante anos achando que estava de fato morta.

— Por que Guilherme estava aqui? — dei de ombros, pois


nem eu mesmo sabia. — Ele parecia abalado.

— No passado, ele se culpou pela morte dela. Assim como


eu o culpei. — confessei, sentindo-me completamente
envergonhado. — Hoje, vejo que mesmo que ela tivesse falecido,
nunca foi culpa dele.
— Eu estou perdida em meio a tudo isso. — ela parecia
completamente abalada. — Acho melhor que Branca, Daniela...

Enfim, que ela e Hugo fiquem aqui se precisarem, e que depois


conversem melhor. Deve ser algo difícil pra ela.

Manuele tinha razão, porém eu não queria me afastar de


Branca, não depois de tê-la encontrado e com tantas dúvidas em
mente. Porém, em meio a todo o caos, ela parecia ser a última

pessoa com quem teríamos alguma explicação.

— Ela acordou.

Olhei para Hugo, que ajudou Branca a se sentar


novamente no sofá, e a mesma piscou várias vezes, olhando ao

redor. Quando seus olhos pousaram nos meus, notei aquele


mesmo sentimento fraterno bater em meu peito, e todo meu
coração se aqueceu, pela falta, pela dor, e ainda mais, por saber
que tinha a deixado só por tanto tempo.

Branca sempre foi a princesa da casa, nossa protegida... E


vê-la ali, completamente acuada, claramente perdida, partia meu

coração.

— Davi. — ela falou baixinho, como se testasse meu nome


em seus lábios.
Dei passos para perto dela, e me ajoelhei a sua frente,
tentando conter as lágrimas. Ela parecia tentar me reconhecer,
mas ainda assim, vi claramente em seus olhos, que não me
conhecia.

— Eu sinto muito. — uma lágrima desceu por seu rosto. —


Não consigo lembrar, por mais que tente, eu...

— Está tudo bem. — arrisquei tocar em sua mão, e


felizmente ela não recuou. — Sou seu irmão, e sinto sua falta.

Terá todo o tempo de mundo pra se lembrar, e se não o fizer,


estarei aqui pra te contar cada detalhe de você, nossa família... —
as palavras saíram falhadas de minha boca. — Pensamos que

estava morta. Enterramos você, nena[7]. — engoli em seco,


fechando os olhos com força. — Senti sua falta, irmã. Sei que
tudo parece confuso, mas vamos resolver. Tenha certeza.

— Desculpe, eu...

— Não precisa dizer nada. — apertei levemente sua mão e


me levantei, dando em seguida um beijo em sua testa.

Branca continuava a mesma, com o olhar inocente de


sempre, que entregava por completo o que ela sentia. Não
conseguia acreditar, que naquele dia, o mais bagunçado e
perdido de todos, o qual perdia a minha esposa, acabei de frente
com meu passado, que felizmente, ainda era parte da minha vida.

— Vamos ficar um bom tempo no Rio de Janeiro. — ela


falou, assim que me afastei. — Podemos conversar e... Quero
entender como nunca consegui descobrir de onde vim.

— Nós tentamos de tudo. — Hugo interviu, e eu assenti,


afastando-me deles.

Manuele chegou próxima de nós e sorriu.

— Se precisarem de um lugar pra ficar, aqui é ótimo e...

— Nós agradecemos mas acho que preciso de um tempo

para respirar. Vamos voltar para o hotel. — Branca falou, e tocou


a mão de Hugo, que a ajudou levantar. — Podemos conversar em
breve, o que acham?

— Eu adoraria. — Manu interviu, diante da minha falta de

palavras. — Marquem o meu número, assim podemos conversar


com calma sobre tudo.

— Tudo bem.

Eles logo trocaram telefones, e fiquei acuado, assistindo


aquela cena se desenrolar. Tudo ali parecia completamente fora
de contexto, porém, era a realidade mais inusitada e feliz de
minha vida. Minha irmã estava viva!

— Obrigado por ter me ouvido. — ouvi Hugo falar, e o


mesmo sorriu para Manuele.

— Temos muito ainda pra falar. — ela sorriu pra ele, e no


mesmo momento que vi ele e minha irmã se afastarem, notei que

Branca me olhou de sobressaio, ainda claramente curiosa com


toda aquela situação.

Sorri sozinho, sabendo que alguma coisa em minha vida


parecia estar entrando nos eixos. Peguei o celular no mesmo
instante e mandei uma mensagem para um dos meus homens de
confiança que com toda certeza conseguiria descobrir o que tinha
acontecido, e o que realmente se passava com Branca.

Porém, no momento em que me encontrei sozinho com


Manuele, meu sorriso morreu, e seus olhos tornaram-se frios
novamente. Ali, tive a certeza, de que nunca mais teria seu olhar
amoroso sobre mim. E que tinha causado meu próprio inferno,
sacrificado tudo por absolutamente nada.
05

“And I am feeling so small

It was over my head

I know nothing at all.”[8]

— Já pode ir, Davi. — falei rapidamente, fingindo que não

me importava nem um pouco com sua presença.

Ele me encarou com os olhos semicerrados, como se ainda


tivesse muito a ser dito. Porém, após todas aquelas revelações,
eu só pensava em me esconder do mundo e digerir uma a uma.
Tudo era um imenso nó em minha mente.
— Manuele, precisamos conversar. — deu um passo em
minha direção, e neguei com a cabeça, afastando-me.

— Já falamos sobre tudo. — abracei meu próprio corpo. —


Apenas me deixe em paz, Davi.

— Eu... — sua respiração tornou-se profunda. — Sei que


foi um dia exaustivo, mas eu preciso que saiba que não vou
desistir.

— Do que? — eu estava cansada. — De fingir ser quem

não é? De me enganar? Isso não vai mais funcionar!

— Não, eu só quero te mostrar que não fingi o que não era


e...

— Como não, Davi? — sorri sem vontade. — Tudo agora


ficou claro pra mim. Cada passo dado por você foi
milimetricamente calculado para fazer com que me apaixonasse e
por fim, ajudasse sem saber nessa sua ambição sem tamanho!

— Não foi bem assim, eu posso explicar.

— Não, não pode! — acusei, apontando o dedo, sentindo-

me completamente perdida. — Eu fui sincera a cada segundo...


Te entreguei tudo o que tinha, e ainda assim, não parou um
segundo para me contar e tentar reaver o que fez.
— Você ia me deixar! — respondeu de relance, sua voz se
alterando. — Se em qualquer momento te contasse o que queria
de fato, você me deixaria!

— Claro! — aproximei-me dele e bati em seu peito, irada


com aquela situação. — Eu jamais ficaria com um homem que me

usou e ainda por cima não me ama!

— Mas eu...

Engoliu em seco, claramente segurando-se para não dizer


algo, porém, eu sabia que as palavras que sairiam de sua boca,
serviriam para apenas uma coisa: me fazer de boba. Novamente,
Davi estava jogando comigo.

— Não! — afastei-me, ficando de costas para o mesmo. —


Não ouse depois de tudo o que foi dito, dizer que me ama!

Senti sua presença em minhas costas, mas me mantive


firme, mesmo desmoronando por completo.

— Eu...

Suas palavras morreram, mas consegui sentir sua


respiração próxima a meu pescoço.

— Tem muito o que descobrir sobre sua irmã. — resolvi me

manter num assunto o qual não nos envolvia. — Apenas me


deixe.

— Continua sendo minha esposa, Manuele. — suas

palavras me cortaram por dentro. — O filho que carrega ainda é


meu.

— Ele com toda certeza terá um pai. — virei-me para ele, e


só assim notei o quão próximo estávamos.

Seus olhos que antes pareciam as janelas de sua alma,


estavam apagados, mas naquele momento sequer tentei lê-los.
Qualquer coisa que ele transmitia me parecia mentira, portanto,
não era real. Assim, suspirei fundo, e o encarei sem vontade.

— Mas quero o divórcio, Davi. — seu maxilar enrijeceu e


pisquei algumas vezes, atordoada por já sequer conseguir parar
em pé. — É o mínimo que pode fazer.

— Tem certeza disso?

Não, eu não tinha... Mas era o certo, o que minha mente


gritava. Ao menos, naquele instante, seguiria a razão. O coração

tinha apenas se entregado para sair completamente perdido após


Davi Rivera.

— Tenho.
Ele não disse mais nada, apenas me encarou por alguns
segundos como se analisasse minha postura.

— Me deixe.

Essas palavras foram o suficiente para que ele virasse de


costas e saísse pela porta da frente, deixando-me a sós. Andei a
passos largos até a mesma, fechando-a rapidamente e trancando
em seguida. No segundo seguinte, encostei-me contra a madeira,
e permiti meu corpo encontrar o chão, sentada ali, sentindo o
peso do mundo em minhas costas.

Meu pesadelo era real... A conversa com Hugo e Branca


tinha me afastado dos reais motivos para estar tão desolada
naquele dia. Mas bastou aqueles segundos sozinha com Davi, e
agora, estar finalmente presa em meus próprios pensamentos,
para encarar a realidade.

O amor que vivi...

O que sentia...

Tudo não passou de uma ilusão... A qual tinha me


destruído por completo.

Ali, sozinha, em meio a todo aquele mar de emoções,


entreguei-me a dor. As lágrimas desciam volumosamente, e não
me contive. Soluçando alto, deixei com que parte do que sentia
fosse embora com aquele desespero. Passei as mãos por minha
barriga, e meu filho chutava com vontade, marcando sua
presença ali.

Foi então que ao menos tive a certeza, de que nunca mais,


mesmo que minha vida estivesse sob uma completa tormenta, eu

estaria sozinha.

Meu filho era a única coisa boa e real que Davi Rivera tinha
me dado.

Acordei em minha antiga cama com a cabeça um pouco


tonta, e uma sede descomunal. Passei as mãos pelos lençóis e
os senti ainda um pouco molhados, pelo jeito eu não tinha
apagado há muito, já que minhas lágrimas ainda estavam
espalhadas pelo tecido.

Pisquei algumas vezes, acostumando-me com a escuridão


do quarto, e levantei-me com cuidado. Passei as mãos por meu
rosto, enquanto caminhava até a cozinha, refazendo em minha
mente cada acontecimento daquele dia que parecia interminável.
Em cima da geladeira, da forma como deixei, ainda permanecia o
relógio, que marcava cerca de onze horas da noite. Infelizmente,
aquele dia realmente não tinha acabado.

Peguei a água dentro da geladeira, e agradeci


imensamente por Luíza ter pedido para que minha antiga casa
permanecesse habitável. Ao menos, assim, eu tinha chances de
recomeçar de onde parei, ou melhor, de onde nunca deveria ter
saído. Bebi a água avidamente, e por um segundo, notei o quanto
as coisas simples conseguiam melhorar a vida.

Naquele instante, coisas simples também tinham sido


capazes de quebrar meu coração. Coisas simples como dizer “eu
te amo” sem amar... Dizer “sim” a um casamento sem amor...
Conviver por meses ao lado de alguém que nunca de fato chegou
a conhecer... Aquilo parecia um carma, o qual não tinha sequer
noção do porque tinha aparecido em minha vida.

Fechei os olhos, escorada contra a geladeira e passei a


relembrar cada momento que Davi me fez acreditar que de fato
estava apaixonado. Não consegui organizar meus pensamentos,
já que em todos eles, os olhos amorosos de Davi pareciam tão
reais. Era muito ingênua, em acreditar fielmente e cegamente
numa pessoa que nunca se entregou de fato. Aquilo me corroía
por dentro.

Meu celular tocou em algum lugar da casa, e segui o som,


parando em seguida perto da sala, onde ele estava jogado. Assim
que olhei o nome no visor, abri um leve sorriso. Ao menos Luíza,
era alguém que podia contar.

— Ei, eu vi sua mensagem agora. — falou no mesmo


instante, sem me dar sequer a oportunidade de dizer “olá”. —
Onde está? Por Deus, o que aconteceu? Se foi pelo que
descobriu sobre eu e Davi...

— Lu! — praticamente gritei. — Não, não tem nada a ver


sobre o que aconteceu entre vocês. — aquilo sequer me intrigava.
— Apenas descobri a verdade sobre Davi, sobre o porquê do
nosso casamento e ainda mais, como ele me usou. — soltei de
uma vez, já sem conseguir segurar a barra.

Eu não queria levar problemas a mais ninguém, entretanto,


aquilo estava me sufocando. Deixando-me no limite em que o
choro não conseguia mais levar embora a dor. Meu peito gritava
por um amor que não existia, e de certa forma, precisava
extravasar.
— O que? — sua voz saiu num sussurro. — Do que está

falando?

— É uma longa história... — suspirei. — Mas acho que


prefiro contar pessoalmente.

— Está mesmo na fazenda?

— Sim, na minha antiga casa, e aliás, obrigada de novo por


mantê-la por mim. — sentei-me no sofá, cruzando as pernas. —
Onde você está?

— Eu pensei... Nossa, sequer imaginei que sua mensagem


fosse real. Pensei que Davi e você tinham brigado, que logo se
entenderiam, mas não isso. — fechei os olhos, sabendo bem o

que ela imaginava.

A mensagem que mandei há algumas horas não era


explícita sobre o que de fato aconteceu, apenas resolvi avisar que
estava bem e longe de Davi naquele dia, devido a certas
descobertas. Contei apenas o básico, de que vim para fazenda e

estava na minha antiga casa, ao menos, para que Luíza não se


assustasse por ter alguém ali sem avisar. Ela tinha tido um dia de
merda também, e não queria de forma alguma piorar sua carga
emocional... Mas ela era tudo o que eu tinha. Ninguém mais
conseguiria me entender.

— Não vamos nos entender, Lu. — fui sincera, a dor em

meu peito já tinha se tornando constante. — Davi não é o homem


que pensei.

— Como assim? — indagou, e ouvi o barulho alto de


sapatos contra a madeira. — Estou descendo as escadas e indo

pra aí, ok?

— Lu, sei que não está bem, que seu dia foi cheio, ainda
mais que Marcelo...

— Marcelo foi escorraçado pelo segurança que deixou aqui


na frente. — notei sua voz um pouco falhada. — Ele bebeu
demais e fez de tudo para entrar, só saiu depois de levar um
soco, e ainda tive que chamar um táxi para leva-lo da fazenda. O
mandei para Davi, foi a única opção que me restou.

— Eu sinto muito.

— Não sinta. — sua voz era decidida, mas eu sabia o

quanto ela estava mexida. — Marcelo está magoado, eu entendo


de verdade, Manu. Mas a forma como ele me acusou doeu
demais, e não sei se estou preparada para outra discussão. Não
agora.

Ouvi batidas na porta, e antes mesmo de responder no


celular, acabei desligando. Abri a mesma em seguida, e Luíza
sorriu, como sempre, sendo a mais forte dentre nós,
demonstrando que mesmo que o mundo te derrube um milhão de
vezes, você é capaz de levantar o dobro.

— Lu... — engoli em seco, e ela balançou a cabeça.

— Desligando na cara da melhor amiga! — fez-se de

magoada, e tive que sorrir, segurando as lágrimas que teimavam


em querer descer.

O sorriso de Luíza aos poucos foi se desmanchando, e seu


olhar estava atento ao meu. Foi quando recapitulei o único
momento feliz daquele dia, onde eu tinha descoberto o que de
fato a minha sementinha era. Luíza parecia preocupada ao notar

meu semblante, mas eu não conseguia disfarçar, muito menos


fingir com ela.

Diante da única pessoa que de fato confiava, todas as


minhas paredes desabaram.
— É um menino. — contei, sorrindo em meio as lágrimas
de tristeza por tudo o que tinha acontecido, e pela felicidade, de

poder finalmente compartilhar aquilo com alguém que estava ali


por mim.

Ela piscou algumas vezes, e em seguida levou as mãos a


boca.

— Eu sabia! — gritou, dando um passo à frente, e me


dando um forte abraço. — Eu sabia!

Ela repetiu várias vezes a mesma fala, enquanto ainda me


abraçava, como se tentasse ser o meu pilar naquele instante. Ela
sabia, me conhecia bem... Naquele abraço, encontrei o que
necessitava para poder continuar com minha vida – carinho.

Aos poucos nos afastamos, e ela limpou meu rosto com as


mãos, ainda me encarando preocupada. Ela era como uma irmã
que a vida tinha me dado, e agradeci imensamente a força do
universo por nunca me deixar só. Eu podia desmoronar, mas
ainda assim, tinha alguém ao meu lado.

— Eu nunca te vi assim. — falou, enquanto sentava no


sofá, e eu me deitava em seu colo, deixando minha cabeça sobre
uma almofada. — Não com esse olhar, Manu.
— Que olhar? — indaguei, olhando-a, enquanto a mesma
fazia carinhos em meus cabelos.

— De pura decepção.

A sinceridade era algo que Luíza não conseguia disfarçar.

— Davi é a pior decepção da minha vida. — passei as


mãos levemente pela barriga. — Se não estivesse grávida,
poderia dizer que tudo o que ele trouxe para mim foram mentiras.

— Eu não consigo acreditar. — soltou um suspiro fundo. —

Me conta o que aconteceu.... Eu jurava que vocês dois seria para


sempre.

— Eu também, Lu... Eu também. — foquei meu olhar no


teto, mas ainda sentia os olhos de Luíza sobre mim. — Mas a
realidade é outra, infelizmente, bem longe do meu conto de fadas.

— No momento, com toda certeza voltei a acreditar no meu


antigo lema: “sem amor, sem problema.”. — forçou um sorriso,
assim como eu, pois ambas sabíamos que nenhuma das duas
acreditava naquilo.

Eu de fato nunca o tinha feito... Já Luíza passou grande


parte da vida de solteira completamente livre e com isso em
mente. Agora, ambas tínhamos o coração entregue, e
infelizmente, quebrados.

Talvez, o meu problema tenha sido acreditar demais... E


sem medo do que o desconhecido me traria. Eu nunca tinha
amado alguém, como seria possível entender as consequências
de um coração partido?

Naquele instante, eu começava a entender.


06

“I know you're thinkin' I'm heartless

I know you're thinkin' I'm cold

I'm just protectin' my innocence

I'm just protectin' my soul!”[9]

Olhei para o espelho a minha frente e me senti o maior dos


miseráveis. Haviam folhas com fotos, documentos, assinaturas
falsas... Tudo ao meu redor, comprovando o quão enganado tanto
eu quanto minha família fomos. Branca sequer esteve dentro de
seu carro naquela fatídica noite, muito menos esteve nele durante

a explosão.

Passei as mãos por meu rosto, virando mais um gole direto


da garrafa de uísque ao meu lado, que já começava a esvaziar.
Eu não conseguia raciocinar direito, muito menos pensar diante
de tudo o que tinha lido, e ainda mais, os sentimentos que me
atingiram.

Amassei com força um dos papéis, onde afirmavam que

uma mesma garota, da idade de Branca foi declarada


desaparecida no mesmo dia há cinco anos, onde o corpo de
minha irmã foi encontrado em meio a destroços, carbonizado. Não
teria como reconhecermos o corpo, mas era uma mulher, loira,
dentro do carro da minha irmã... Como poderíamos duvidar da
verdade estampada a nossa frente?

Lembrei-me de como foi receber a notícia, e quebrei ali.


Pois não fui o mesmo nunca mais.

Estava saindo de mais uma reunião, porém a empolgação


de comandar a empresa era algo que me animava. Por mais

cansativo que fosse, eu amava minha rotina, e ainda mais saber


que de certa forma estava alavancando a empresa da família
depois de anos no prejuízo.

Assim que cheguei a grande casa onde todos morávamos,


o silêncio me recebeu e achei completamente estranho. Olhei

meu relógio de pulso e pelo horário, era pra Branca como sempre
me receber animada, e ainda mais, meus pais e irmão mais novo,
estarem jogados pelo sofá. Era o programa de família as quartas.

Peguei meu celular e disquei o número de meu irmão, que


tocou até cair. Franzi o cenho, sem entender nada, e apenas
joguei a pasta de couro sobre o braço do sofá, e disquei o número
de meu pai.

— Papa, onde estão?

— Onde você está? — estranhei seu tom de voz, mas


respondi rapidamente. —Estamos indo pra aí.

Encarei o celular diante da ligação desfeita. Aguardei por


cerca de dez minutos, jogado no sofá da sala, e completamente
impaciente, sem saber porque dentro de mim sentia que algo
estava errado.

A porta da frente se abriu, abri um sorriso ao ver meus


pais, o qual se desfez em breve.

— O que está acontecendo? — minha postura era rígida,


diante dos rostos vermelhos de ambos, e a forma como me

encaravam perdidos. — Mamá[10]! Papá[11]!

— Filho... — mamãe começou, e de repente estava em


meus braços, chorando copiosamente.
— O que houve, papá? — perguntei, e meu pai engoliu em
seco, com um semblante tão perdido, que nunca sequer o tinha
visto daquela forma.

— Sua irmã... — paralisei, e foi difícil respirar. — Ela sofreu


um acidente de carro.

— Não! — praticamente gritei, e se não fosse os braços de


minha mãe, com certeza estaria no chão. — Onde ela está? Em
que hospital? — perguntei desesperado.

Minha mãe tocou meu rosto, e fez carinhos, negando com


a cabeça. Era claro o que acontecia ali, mas eu não podia
acreditar. Não era real!

— Ela está bem, mamá. Não está? — insisti, e meu pai

tocou meu ombro.

— Branca não resistiu, hijo[12].

Naquele momento, meu mundo parou.

Passei as mãos pelas lágrimas que corriam livremente por


meu rosto e tomei mais um gole, tentando não embarcar em
lembranças que apenas doíam. Sendo que por mais que tenha
ficado de luto, ele não era mais real. Minha irmã estava viva, e
não deveria mais chorar pelo passado.
Mas não era aquilo que me fez beber... Beber pra
esquecer. Fechei os olhos, lembrando-me do olhar frio de
Manuele, algo pareceu atingir minha espinha de forma
arrebatadora, e um soluço escapou de minha boca.

A culpa que sentia por tê-la usada era insana, pois em

momento algum tinha cogitado a possibilidade que ela descobriria


tudo, e ainda mais, que me deixaria. Encarei meu reflexo horrível,
e levantei a garrafa, como se brindando comigo mesmo a própria
desgraça. A culpa era minha, por completo. Não tinha desculpas,
muito menos escapatória.

Entretanto, ainda me sentia miserável, por não conseguir


pensar em algo diferente de ir até Manuele e implorar seu perdão.
Era aquilo que percebi, desde o segundo em que ela deixou o
apartamento, pedindo o divórcio. Não a deixaria ir, pois eu a
amava.

Amar era uma merda! Pois em menos de segundos que


tinha reconhecido tal sentimento, já estava sofrendo feito um
condenado.

Sua culpa!
Meu subconsciente tinha razão, pois eu tinha visto o lado
bonito do amor, e encarava sua pior face, por livre escolha. O pior
era saber que Manuele o fazia da mesma forma, só que sendo
obrigada. Ela estava sofrendo, notei isso em cada segundo que
seu olhar parou no meu. Aquilo apenas me lembrava de que
deveria ficar longe dela... Mas como? Ela tinha conseguido tirar
tudo de mim.

Ela me fez cair de tão alto, que sequer senti a queda... Pois
tudo nela, fazia-me querer ser meu melhor. Ser o homem certo
para ela, e, no entanto, transformei-me no oposto. Aquela era a
merda de não ter admitido desde o começo o que sentia, por mais
que quisesse e tentasse negar.

Manuele teve minha alma no dia em que seus olhos


capturaram os meus... E acabou por levar todo resto do meu ser,
no dia em que nos amamos pela primeira vez. Lembrei-me de
nosso filho, que agora descobrimos ser um menino, e apenas
pensei o quanto o destino pareceu trabalhar para ficarmos juntos.

E no quanto queria estar ao seu lado a cada segundo da


gravidez.

Não era para ser ela, nunca foi. Nunca planejei que ela
sofresse e muito menos fosse a mulher a fazer parte, mesmo
inconsciente, de meu plano. Mas ela foi... E ainda é a mulher
certa para mim. Eu a desejei feito um louco desde o momento em
que nos vimos pela primeira vez, mas agora, o sentimento era

muito maior. Ela era minha esposa, a mãe do meu filho. Mal sabia
ela, que quando disse que aquele era meu maior sonho, uma
família, foi real. Que cada momento em que demonstrei mesmo
sem querer e saber o que sentia, eu estava realmente entregue.

Eu a amava.

Olhei ao redor do apartamento e a falta que senti dela foi


esmagadora. Tínhamos construído em pouquíssimo tempo uma
rotina, e ainda mais, uma vida. Ela tinha se tornado a primeira
imagem ao ver quando acordava e a última antes de dormir. Além
de poder tocar sua barriga, a parte fantástica de um ser feito por

nós dois. Eu era pai... e nunca pensei que amaria tanto aquilo.

Bebi mais um gole, e de repente, notei que a garrafa


estava vazia. Joguei-a com força a frente, esquecendo-me do
espelho, e assim que os vidros se encontraram, ambos
explodiram pela força que utilizei, fazendo com que se
estraçalhassem por todos os lados. A dor de vidros sobre minha

pele fez-me abrir um sorriso sem vontade, incrédulo diante de


minha situação.
Tinha me tornado um homem perdido sem ela. E aquele
era apenas o começo do meu fim.
07

“We keep this love in a photograph

We made these memories for ourselves

Where our eyes are never closing

Our hearts were never broken

And time's forever frozen still.”[13]

Poderia mentir e dizer que dormi tranquilamente naquela


noite, mas ao meu redor, já tinham existido mentiras demais.
Suspirei fundo, encarando meu reflexo que mostrava claramente
uma noite mal dormida, regada a ver fotos minhas no instagram
de Davi.

Sentia-me estúpida a cada foto que vi, a cada legenda


simples, mas que parecia tocar meu coração. Os comentários
eram as piores partes, pois além de enganar a mim, ele realmente
tinha conseguido enganar as outras centenas de pessoas que o
seguiam. Mulheres e homens suspiravam nos comentários.

Joguei a água em meu rosto e toquei de leve minhas


olheiras. Ao menos não estava enjoada naquela manhã, na
realidade, tudo o que queria era um café da manhã reforçado,
com direito a um pão francês fresquinho e bem quente. Prendi
meus cabelos no alto da cabeça e logo saí, encontrando Luíza
ainda caída na cama, completamente apagada.

Depois de contar tudo a ela, chorar o que podia, além do


que deveria, ela acabou desabafando também, e nos afundamos
em um filme romântico qualquer, enquanto aceitávamos que
ambas éramos azaradas ao extremo em relacionamentos. Senti-
me como um adolescente de filme, mas felizmente, aquele

momento me fez sorrir e aceitar que nem todos os dias seriam


alegres como imaginava.

A vida nos surpreendia, e eu sabia bem daquilo. Porém,


estar com Davi, deu-me tamanha segurança que sequer esperava
alguma reviravolta ou dias cinzas. Com ele, parecia ser intocável,

e ainda mais, impossível que minha felicidade se esvaísse. O


maior problema de todos foi ter depositado em alguém a minha
própria compreensão da vida, sendo que na realidade, bastava a
mim. E agora, meu filho.

Sentei-me na poltrona a frente da cama, e abri novamente


o aplicativo em meu celular, vendo as fotos que ele tanto tirou.
Algo dentro de mim quebrava a cada vez que as olhava, por
finalmente entender que os sorrisos em redes sociais nem sempre

eram verdadeiros. Parei na foto do dia do nosso casamento, onde


ele tirou uma minha dormindo enrolada no lençol branco. A
legenda partia meu coração: de branco ela fica ainda mais linda.

Por que ele fez aquilo? Para quem tanto ele precisava

provar que me amava?

Eu ainda tentava digerir o fato de que me usou para


conseguir a presidência, e ainda mais, nosso filho. Contudo,
aquilo tinha acabado, assim que assinei os papéis do casamento.
Para que então insistir naquele teatro? Ele não era aquela
pessoa, e me negava a admitir que me apaixonei por um homem

inexistente, porém, era verdade.

Meu celular vibrou e notei mais uma mensagem vinda do


mesmo número. Era Davi, mais uma vez, com duas palavras
apenas. O que ele esperava?
Remetente: Davi

Me perdoe.

Como? Sendo que não conseguia perdoar a mim mesma

por sequer ter desconfiado dele. Como poderia simplesmente


perdoá-lo?

Ignorei mais uma vez sua mensagem, e deixei o celular de


lado. Parecia uma bela masoquista, por ficar me indagando e
procurando de alguma forma entender o que realmente tivemos.

Eu estava apaixonada, e aquilo me cegava. Pela primeira vez na


vida a frase “o amor é cego” fez todo o sentido. De algum jeito, eu
ainda não aceitava que tudo não passou de uma armação.
Mesmo sendo a verdade.

Às vezes, a verdade é nossa pior inimiga. Eu era feliz e


reluzente em meio às mentiras, e o pior de tudo, era ter total

noção daquilo.

Meu celular tocou e olhei para o visor sem muita vontade,


se fosse Davi, teria que desligar e fingir que sequer tinha visto.
Porém, era Giulia, e só então me lembrei de que tinha combinado
com ela de ver os desenhos já prontos, mas tinha certeza, mesmo
um pouco perdida, que não seria naquele dia.

— Bom dia, Manuele.

— Oi, Giulia. Bom dia! Como vai?

— Estou ótima. Desculpe ligar tão cedo, mas é que tenho


uma nova proposta pra você!

— Qual? — franzi o cenho, já ansiosa com sua resposta.

— A sua exposição está marcada para daqui duas

semanas, certo? — respondi rapidamente um “sim”. — Então,


tivemos um pequeno problema com um dos artistas que iria expor
na semana que vem, e estamos com a vaga aberta.

— Como assim?

— Queríamos que fizesse uma pequena exposição, já que


está em cima da hora pra essa data antecipada. Sei que seus
desenhos devem estar prontos, mas ainda assim, seria bom pra
termos uma introdução para todos os clientes, e na outra semana,
voilà, teríamos todos os que sobrarem para expor e fazê-los
babar.

Ela parecia tão animada, que me senti uma idiota por não
estar em meu melhor momento.
— Eu nem sei o que dizer. — realmente, eu não sabia.

— Basta aceitar. — ouvi sua risada ao fundo. — Que tal


um almoço amanhã pra conversarmos os detalhes e aí você me
dá uma resposta conclusiva?

— Tudo bem. — suspirei fundo, sabendo que o melhor era


me concentrar nas coisas boas, para que as ruins não me
fizessem afundar.

— Perfeito! Mais tarde te mando os detalhes por


mensagem. — ouvi alguém chamando seu nome. — Tenho que ir,
até amanhã!

— Até!

Sem me dar tempo de agradecer ela desligou, e fiquei


alguns segundos apenas encarando o celular. Por mais que
minha vida pessoal estivesse completamente sem foco, a
profissional, pela primeira vez, estava indo de bem a melhor.
Felizmente tinha ouvido Luíza, e investido no meu sonho, e agora,

tinha a oportunidade, de quem sabe, viver do mesmo. Era o


começo... Mas apenas me enxergava fazendo aquilo dali em
diante. Desenhar era meu maior prazer.
— Parece que levei uma pancada na cabeça. — levantei o
olhar, e encontrei Luíza com o cenho franzido e as mãos na
cabeça. — Deus do céu! Acho que dormi demais!

— Ainda são nove da manhã. — falei, virando o visor do


celular pra ela, que piscou algumas vezes tentando ler.

— Sorte que não tenho nenhum cliente hoje. — bufou


baixo. — Sou míope, não vai dar! — jogou-se novamente contra o

colchão, e escutei seu sorriso. — Nunca dormi tão pouco e ainda


assim, apaguei por completo.

Não disse nada e apenas foquei em apagar as mensagens


de Davi, que chegavam a cada dois minutos. Por que ele insistia
naquilo?

— Ao contrário de mim, alguém parece que sequer pregou


o olho. — a voz acusadora de Luíza, fez-me olhá-la.

— Minhas olheiras enormes e olhos inchados não ajudam


a mentir. — dei de ombros. — Passei a noite repassando tudo o
que vivi com Davi, como se tivesse um flashback dos últimos
meses.

— E chegou a que conclusão? — perguntou, claramente


preocupada.
— Nenhuma. — sorri sem vontade. — Só de pensar que
ele usou a mim, ao nosso filho... Me faz querer nunca tê-lo
conhecido.

— Mas sabe que não tem como fugir dele pra sempre, não
é? — deixei o celular de lado.

— Sei. — passei as mãos pelos cabelos e os soltei. — Mas


enquanto puder mantê-lo afastado, será bom. O que temos pra
conversar é sobre nosso filho... Nada mais.

— Entendo. — ela estava claramente triste. — Mas, e

sobre seu irmão? Já falou com ele ou a tal Branca?

— Estou esperando a mensagem deles. Acho que Branca


ainda precisa de um tempo para se posicionar sobre tudo o que
descobriu. Imagine só como é descobrir que tem uma família que
chorou pela sua morte, sendo que todo esse tempo esteve viva

sem uma lembrança sequer?

— Isso com toda certeza é barra pesada.

— E coloca pesada nisso. — levantei e fui até a cama,


puxando um lençol para envolver meu corpo, sentia um pouco de
frio, e sentei-me a beira. — E você? O que pretende fazer?

— Bom...
Um estrondo vindo da parte debaixo da casa fez com que

ela parasse de falar, e ambas trocamos um olhar, sem entender o


que estava acontecendo. Luíza se levantou, praticamente
ordenando para que eu ficasse na cama.

— Fica aí! — exigiu. — Grávidas não podem passar por


estresse, você já teve muito!

— Lu, não sabemos...

— Fica aí! — sua fala não me dava outra escolha.

Assim que ela passou pela porta do quarto, entretanto, fui


atrás, ouvindo vozes alteradas, e de repente, um vidro se
quebrando. Assim que cheguei ao topo da escada, vi Luíza

parada na ponta da mesma, encarando a cena da nossa frente,


tão embasbacada quanto eu.

Davi estava sobre Marcelo, segurando-o com força contra


a parede, como se impedindo-o de algo. O segurança que
reconheci rapidamente, Júlio, estava a alguns passos dos dois,

como se preparado para algo, caso saísse do controle. Desci os


poucos degraus rapidamente, e parei ao lado de minha amiga.

Assim que seu olhar encontrou o meu, notei as lágrimas


descendo por sua face, ela parecia completamente desolada.
— Ei! — puxei-a para meu abraço, e ela facilmente se
aconchegou.

— Chega dessa merda, Marcelo! — Davi bradou, e soltou o

amigo, que abriu uma risada claramente falsa. — Olhe ao seu


redor, vejo a merda que está causando!

— Eu olho, e sabe o que vejo? — a voz de Marcelo estava


arrastada, e suas palavras um pouco embaralhadas. Ele estava
bêbado. — Uma vadia! — acusou Luíza, e não me contive.

Deixei-a sentada na escada, que infelizmente, estava


acuada. Ela não era uma pessoa de aceitar ser acusada daquela
forma, porém, Marcelo conseguia despertar a parte mais frágil
dela, mesmo que odiasse admitir. Por isso, ela tinha medo do que
sentia por ele. Ele a fazia sentir completamente diferente, e tinha

certeza, suas palavras a machucavam ao limite.

— Chega! — gritei, e me aproximei de Marcelo, que


arregalou os olhos diante de minha voz. — Não vai acusa-la
dessa forma! Não vou permitir! — apontei o dedo em seu peito. —
Se vai julgar por algo do passado deveria ser homem suficiente
para ouvir a história toda e enxergar a verdade, não beber feito

um cretino e derrubar portas! — ele piscou algumas vezes,


assumindo uma nova posição. — Ela é sua esposa e merece
respeito!

— Respeito... — ele sorriu sarcástico. — Ela não o teve


comigo! — sua voz era ameaçadora mas não me intimidei.

Infelizmente Davi passou a minha frente, ficando entre nós,


como se me protegesse.

— Se não respeita Luíza, ao menos respeite Manuele. —


sua voz era tão fria e firme, que me assustei ao vê-lo de tal forma.
— Ela está grávida e não pode passar por toda essa merda! Ao
menos tenha um pouco de respeito com ela!

Marcelo pareceu medir as palavras dele, e encarou de


relance minha barriga, suspirando fundo em seguida.

— Não sabe a sorte que teve em se casar com a mulher


certa.

Ao dizer isso, Marcelo saiu, a passos trocados, deixando


um silêncio ensurdecedor para trás. Olhei rapidamente para
minha amiga, que fez um sinal de negativo com a cabeça e subiu
as escadas. Ela precisava ficar sozinha, e infelizmente, eu era
obrigada a respeitar seu momento.
Suspirei fundo e segurei as lágrimas. Aquilo era um
verdadeiro pesadelo. Ambos se amavam loucamente, por que

não facilitar de uma vez, e ficar juntos?

— Oi.

A voz de Davi me trouxe para realidade, e pisquei algumas


vezes antes de encará-lo. Ele era bonito... Na realidade, a
verdadeira definição de beleza. Só de olhá-lo, senti todo meu
corpo implorar por seu toque, e ainda mais, por sua proteção.
Amar Davi Rivera era como permitir a si mesmo a própria
destruição. Não podia admitir, mesmo que meu coração
destroçado por ele, ainda insistisse em acelerar na sua presença.

— Marcelo não estava no seu apartamento? — perguntei,


tentando focar em qualquer outra coisa, que não fosse sua
presença em minha sala, que fazia-me sentir ainda mais
intimidada.

— Quando os seguranças o trouxeram completamente


desacordado para meu apartamento, o mandei para o antigo
apartamento que ele mantém no centro. — deu de ombros. — Se
ele me visse, com toda certeza as coisas seriam piores.
— Entendi. — estudei minhas próprias palavras. — Mas o
que vocês dois fazem aqui?

— Marcelo eu não sei... Apenas o encontrei derrubando a


porta da frente e meu segurança quase o deixou no chão em

segundos, e acabei me intrometendo quando ele pegou um copo


para tentar parar Júlio. — arregalei os olhos. — Eu... Eu vim te
ver, Manuele.
08

“I remember years ago

Someone told me I should take

Caution when it comes to love, I did

And you were strong and I was not

My illusion, my mistake

I was careless, I forgot, I did.”[14]

Franzi o cenho, sem querer entrar naquele assunto.

— O que quer, Davi? — fui direta.

— Eu não sou bom com palavras, mas eu quero apenas


que me dê a chance de explicar tudo, e...

— Já falamos tudo. — cortei-o rapidamente.


— Não, eu ainda preciso...

— Já conseguiu o queria, não foi? — minha voz saiu


cortante, e segurei um soluço.

Davi ficou claramente rígido e senti todo meu corpo tenso.


Eu amava aquele homem, na mesma proporção em que odiava
saber que nunca o conheci de verdade. Quem era o Davi a minha
frente? Eu não tinha sequer a resposta para aquela pergunta.

— Sabe o pior de tudo isso. — comecei a dizer, mesmo


sabendo que minhas palavras não surtiriam efeito algum. — A sua
insistência! Por que não pode simplesmente me deixar em paz e
seguir sua vida? O plano deu certo, Davi! Vá comemorar! Eu te
pedi o divórcio!

— Não posso. — levou as mãos aos cabelos. — Não


posso te dar o divórcio.

Ele pareceu quebrado, e abaixou a cabeça. Não segurei a


risada, pois de alguma forma minha experiência ao seu lado
acusava: mais um teatro para me iludir.

— Chega! — exigi alto, e ele não me olhou. — Chega de


fingir! Já sei de toda a verdade e não vou cair em mais um plano
estúpido seu! Fui burra uma vez, mas não vai me fazer de tola
novamente!

— Não é um plano, eu só...

— Não tem uma empresa para comandar, senhor


presidente? — sequer me reconheci diante da pergunta, mas a
armadura que ostentava diante dele era necessária. Davi tinha
me usado para seu bel prazer, e eu... não sabia mais lidar com
aquele redemoinho de sentimentos.

— Tenho uma família para reconquistar, Manuele. — seus


olhos encontraram os meus, e só então notei que estavam
marejados. — Pode não acreditar em mim, me acusar, fazer de
gato e sapato... Mas não vou desistir!

Sua voz soou firme, e por um milésimo de segundo meu


coração bobo falhou uma batida, quase querendo se entregar
novamente por completo. Porém, minha razão estava no
comando, e tive que gargalhar diante do homem que fingia
novamente a minha frente.

— Realmente, você deveria ser ator. — falei com escárnio.


— Apenas me deixe em paz, Davi. Não quero e não preciso da
sua pena.
— Eu não estou aqui por pena. — deu um passo à frente, e
não me movi, mesmo com sua proximidade. Precisava mostrar
tanto para ele, quanto para mim mesma, que conseguia enfrentá-
lo de igual para igual. — Estou aqui por vocês... por mim.

— Eu e Samuel não vamos fazer parte de mais um plano


seu. — ergui meu queixo o máximo que podia, e mesmo ele
sendo mais alto, não me permiti intimidar. — Pode ter feito o que
quis comigo, Davi. Mas com meu filho não! Não mais!

— Nosso filho. — corrigiu numa lufada de ar, e bufei,


sabendo que não foi daquela forma que quis pontuar. — Então já
escolheu o nome?

Pisquei sem entender sua repentina mudança de assunto,


e de repente senti Samuel chutar com força. Me curvei para
frente, já que não estava acostumada com aquilo, e logo senti as
mãos de Davi em minhas costas.

— Está tudo bem? — perguntou atencioso, e levantei meu

olhar, afastando-me de seu toque.

— Samuel aprendeu a chutar costelas, só pode.

O brilho no olhar de Davi foi tão intenso que estranhei, e


ele me encarou por alguns segundos, com a mão parada no ar,
como se pedisse permissão.

— Posso? — acabou perguntando, e senti meu filho chutar


com ainda mais força.

Deus do céu! Ele gostava de ouvir o pai falar!

Dei alguns passos para trás, e logo sentei-me com cuidado


no sofá, numa posição que fosse confortável. Minha barriga era o
ponto de parada de Davi de todos os dias em que estivemos

juntos... Ele a acariciava todo momento. Eu me recordava bem de


todas as noites em que acordava com suas mãos sobre a mesma,
fazendo carinhos circulares, como se aquele fosse seu momento
com nosso filho. Ledo engano.

Seria aquilo apenas mais uma parte de seu plano?

Davi se ajoelhou a minha frente, e assenti, mesmo que


aquilo admitisse uma proximidade entre nós. Eu poderia crucifica-
lo por tudo, entretanto, não negaria ao meu filho um contato com
o pai, e ainda mais, que ele não merecia sofrer pelos erros
alheios.

Assim que a mão de Davi tocou minha barriga, senti outro


chute forte e me contorci um pouco, tentando me acostumar com
a sensação. Sempre imaginei que fosse maravilhoso sentir o
bebê mexer, mas daquela forma, apenas conseguia pensar que
meu filho já queria vir logo para o mundo.

Alguns minutos se passaram e Davi soltou algumas


palavras em espanhol, fazendo Samuel praticamente virar
cambalhotas dentro de mim. De algum jeito, eles já tinham uma

conexão muito forte.

— Mi hijo, mi vida... papá te amo tanto. — não precisava


ser boa em espanhol para entender, e segurei a emoção ao ouvi-
lo completar a fala. — Mi amado Samuel.

O olhar de Davi encontrou o meu e desviei rapidamente,


sem querer confrontá-lo. Era tudo muito recente, e eu sabia, que
seria ainda mais difícil com o passar os dias. Nunca teria distância
o suficiente de Davi, e era o que mais necessitava.

— Preciso de espaço. — soltei por fim, e Davi se afastou


no mesmo instante, colocando-se de pé. — Não dá pra ser assim,
Davi.

— O que quer dizer?

— Não podemos agir como se nada tivesse acontecido.


Preciso de um tempo longe de você, para poder repensar o que

fazer e viver a minha vida.


— Eu te quero, Manuele. — encarei-o incrédula. — Eu te
amo, e não quero perde-la.

Suas palavras me pegaram de surpresa, e não existia


armadura suficiente para ostentar. Nunca esperei, desde o
segundo em que ele admitiu que fui parte de um plano para
conseguir algo mais, que ele estaria ali, falando aquilo.

— Davi, não...

— Eu estou tentando achar o momento certo pra confessar


isso, desde o segundo que deixou meu apartamento ontem. —
levou as mãos aos cabelos. — Eu pensei em mandar na
mensagem, mas eu precisava olhar nos seus olhos e dizer,

mesmo que nunca acredite. Eu te amo e não vou desistir.

— Eu preciso...

— Sei que precisa de espaço e tempo... E vou respeitar


isso. É uma promessa de que vou esperar o tempo que for. —
engoli em seco, sem esperar por aquela reação. — Apenas peço
que pense em mim e tenha a certeza, que todos os momentos
juntos foram reais. Eu não te contei as vias de fato, mas estou
aqui pra explicar o que quiser.
— Hoje não... — balancei a cabeça, totalmente perdida. —
Não é o momento. Não consigo olhar pra você e não lembrar que
fui parte do seu plano, e ainda mais, que nosso filho fez parte
disso.

— Posso ser um completo desgraçado ao admitir, mas se


essa fosse a única maneira de ficarmos juntos, eu faria tudo de
novo. — fechei os olhos com força. — Só por favor, não me peça
o divórcio ainda. Posso te provar que sou o homem certo, basta
me ouvir.

— Vá embora, Davi!

Não quis olhá-lo, nem mesmo acreditar no que ele dizia.


Em poucos segundos ouvi seus passos sobre o piso de madeira,
e em seguida, o silêncio completo. Abri os olhos, sem querer
pensar em tudo o que ele dizia, e muito menos imaginar que
fosse real.

— É mentira, Manuele! — recriminei-me. — Com certeza


ele está planejando mais uma coisa.

Encarei o local onde deveria estar minha porta, que agora


estava caída no chão. Suspirei frustrada, sabendo que aquilo era

culpa de Marcelo. Foi então que me toquei de que Luíza ainda


permanecia no primeiro andar e não tinha sequer feito um barulho
desde que subiu.

Olhei rapidamente para o lado de fora da casa, e ali estava


Júlio, parado, e lhe dei um breve aceno com as mãos, o qual o
mesmo retribuiu com um aceno de cabeça. Aquilo eu podia

aceitar de Davi, pois além de me proteger, fazia o mesmo por


Luíza. Voltei para dentro de casa e subi rapidamente as escadas.
Assim que abri a porta do meu quarto encontrei Luíza sentada ao
lado da cama, abraçada nas próprias pernas, olhando para o
nada.

Por um segundo escolhi cuidar de minha amiga, e


esquecer que Davi Rivera tinha declarado seu amor.

Mas o que ele entedia sobre tal sentimento?

Era apenas mais uma mentira!


09

“I put you on top, I put you on top

I claimed you so proud and openly

And when times were rough, when times were rough

I made sure I held you close to me.”[15]

Assim que parei em frente ao meu prédio, não consegui


sequer pensar na possibilidade de subir para meu apartamento.
Tudo lá me lembrava Manuele, e o que não queria era estar lá,
sem sua presença. Nem aquilo fazia mais sentido.

Meu celular não parava de tocar, e eu tinha certeza que


minha secretária estava enlouquecendo, assim como a relações
pública da empresa. Entretanto, nada me deixava focar no
trabalho, muito menos saber que o que ambicionava lá, era a
causa de não ter mais minha esposa ao meu lado. Aquele era
meu inferno.

Peguei meu celular e disquei o número de meu irmão,


saindo do carro, e avisando em seguida aos seguranças que
daria uma volta no quarteirão. Precisava esfriar minha cabeça e
não pensar muito. Daria a Manuele o tempo que ela necessitava e
torceria para que ela não pedisse o divórcio. Enquanto começava
a acertar meus erros no passado. Admitir que minha dor nunca
justificou a culpa que joguei sobre minha família.

O amor que sentia por Manuele, deixava claro que não


temos controle sobre tudo ao nosso redor. Apenas tentamos fazer
nosso melhor, por mais errado que seja, e por mais que
machuque quem menos esperamos.

Sua chamada está sendo encaminhada para caixa-postal...


Deixe um recado após o sinal.

— Merda! — reclamei, mas continuei na linha até ouvir o

bipe. — Irmão... hermano[16], sei o que está pensando, e sei que é


uma merda. Mas por favor, apenas vamos conversar. Sei que fui
eu quem não quis essa conversa durante todos esses anos, mas
eu aprendi... Antes mesmo de saber sobre nossa irmã. O que

sinto por Manuele me fez ver o quanto errei com você... Com
nossos pais. — admiti, e suspirei fundo, torcendo para que ele
ouvisse aquela mensagem. — Por favor, me ligue!

Assim que desliguei a chamada, fiquei alguns segundos


encarando o visor do celular. Era frustrante fazer aquilo, e pela

primeira vez, em todos aqueles anos, entendi perfeitamente como


era estar na situação de Guilherme. Ele tinha deixado centenas
de mensagens em minha caixa postal, além de ligações e
milhares de mensagens escritas... Foram cinco anos renegando
meu próprio sangue, e ainda mais, a palavra amor.

Mas bastou deixar Manuele entrar e entender toda a


complexidade do que sentia para saber que nenhum deles agiu
de má fé. Nem mesmo minha irmã quando se apaixonou por
Guilherme, não tinha controle sobre. Amor não é algo que possa
ser controlado. Ela não tinha culpa por amá-lo, não existiam laços
sanguíneos entre eles, e ele muito menos tinha culpa por renegar
tal amor. Ele sempre a viu como eu, nossa irmãzinha, a qual
protegíamos de tudo e todos. Eu não fazia ideia de como tudo
ocorreu, ainda mais como ele reagiu quando ela confessou seu
amor... Aquilo deve tê-lo matado por dentro. Assim como ela, por
ter sido rejeitada.

Por que não parei para pensar naquilo antes? Teria evitado
anos de raiva e mágoa por culpar tanto ele quanto nossa família
pela morte de Branca. Agora, o destino além de me fazer
enxergar que não existia culpa, colocava minha irmã a frente, a
prova de que meu erro foi ainda maior.

— Davi.

Aquela voz me fez paralisar, e me virei rapidamente,


encarando-a surpreso. De todas as pessoas que esperava ver,
Branca com toda certeza não era uma delas.

— Branca. — sorri de lado, dando passos cuidadosos para


perto dela. — O que faz aqui? — limpei minha garganta. — Digo,
está tudo bem?

— Eu... Eu ia tentar descobrir seu apartamento. — ela tinha


os braços ao redor do corpo, deixando claro que não estava nem
um pouco segura do que fazia. — Eu lembrei de algo mas não
consegui contar a Hugo, e não sei a quem mais recorrer.

— Você lembrou? — arqueei a sobrancelha, a esperança


tomando conta de meu ser. — Lembrou do que exatamente?
— De você... De Guilherme. — engoliu em seco,
parecendo incomodada. — Lembrei de nós três, a frente de uma
praia, com músicas. Guilherme tocava, eu estava na areia e você
cantava baixo.

A lembrança das últimas férias juntos em Búzios me fez


mergulhar nas memórias. Branca parecia apavorada a cada
palavra que saía de sua boca, como se nem ela mesma
acreditasse no que lembrava. Mas era real, aquele momento
realmente aconteceu. Eu me lembrava claramente.

— Sim, foi nas nossas últimas férias juntos... Antes do


acidente. — sorri, tentando amenizar o clima. — Quer ir a algum
lugar? Tem um café aqui na esquina, talvez se sinta mais à
vontade lá.

— Eu prefiro, obrigada. — ela abriu um sorriso rápido, e


meu coração se aqueceu.

Mesmo com a distância clara que existia entre nós, ela


estava ali, era minha irmã. Eu faria de tudo para poder ajudá-la.

Assim que adentramos o café, escolhi uma mesa ao fundo,


um pouco mais afastada dos olhares alheios. Branca se sentou à
minha frente, e bateu os dedos sobre a mesa, claramente

nervosa.

Pedi um café preto sem açúcar e ela como me lembrava,


optou por um chocolate quente. Os pedidos chegaram
rapidamente, mas o silêncio se estendeu entre nós. Branca
parecia procurar pelas palavras certas.

— Então é verdade? — perguntou de repente, olhando


pela janela. — A cena que te contei, realmente aconteceu?

— Sim, eu estava lá, assim como nosso irmão. — ela


assentiu.

— É tão estranho... Foram cinco anos tentando me

lembrar, fazendo todo tipo de tratamento e nenhuma resposta.


Nada sobre mim foi encontrado por mais que Hugo tenha feito de
tudo pra me ajudar. — suspirou profundamente. — Eu me lembrei
claramente de seus nomes, rostos... A proximidade entre nós.
Bastou encontrar você e Guilherme, e de repente eu estava lá
mergulhada numa lembrança.

— Deve ter algo que explique isso. — admiti minha


ignorância sobre o assunto. — Mas fico feliz que tenha se
lembrado de nós.
— Eu tentei lembrar dos seus pais... — ela me encarou
sem jeito. — Quer dizer, nossos pais. Eles devem saber muito
mais sobre meu passado e devem sofrer pela perda da filha mais

nova. Eu pesquisei na internet sobre.... Mim. — sorriu


completamente sem graça. — Isso é estranho!

— Ainda não falei com eles. — confessei. — Tudo tem sido


uma bagunça, não por sua causa, mas em minha própria vida
pessoal. Não é certo esconder deles que a filha que eles tanto
amam está viva, mas não posso escolher o momento para contar.
Acho que isso pertence a você.

— Quero conhecê-los. — falou de repente, surpreendendo-


me. — Sinto que posso lembrar ainda mais sobre tudo... E quero
entender, como me declararam morta. — sua voz falhou. — É

estranho saber que existe um túmulo com meu nome por aí.

Eu sabia bem o que tinha acontecido. Mas não soube


como começar a contar a ela. Não era minha história, e tinha
certeza que poderia assustá-la ainda mais. Optei pela meia
verdade, por mais que fosse completamente contra omissões. Ela
precisava de um “norte” e eu estava ali para dá-lo.

— Meus homens pesquisaram sobre o acidente... —


coloquei os cotovelos sobre a mesa. — Foi tudo uma grande
confusão, causada por pessoas muito perigosas. Eles queriam a
garota que na realidade estava dentro do seu carro, no momento
em que o mesmo explodiu. — expliquei rapidamente, diante do
seu olhar atento. — Ela era prometida de um cara, digamos, barra
pesada, mas não o queria, por isso tentou fugir... roubando seu
carro no desespero. Ela foi a garota que enterramos.

— Deus! — levou as mãos a boca, claramente incrédula.

Bom, até eu tinha ficado daquela forma quando li o


relatório. Algo que nunca desconfiamos.

— Vocês tinham o mesmo biotipo, e como o carro explodiu


na batida, acabamos ligando um mais um. — levei as mãos aos
cabelos, completamente frustrado. — Ela era uma desconhecida,
que pegou suas chaves enquanto você bebia... Assim como nós
fomos enganados diante do corpo no carro, os caras que vieram
atrás dela, acabaram levando você no lugar.

— Mas a minha memória... Eu não consigo entender.

— Ao que tudo indica, você foi levada até o Paraná para


ser entregue ao cara. — aquela história me fazia mal, por
imaginar que minha irmã, tão jovem, tinha estado na mão de
bandidos. — Meus homens têm contatos em todos os lugares, e
um deles sabe um pouco do que houve na época. Pelo que
contaram, assim que o cara te viu, soube que não era a garota.
De algum jeito você conseguiu escapar e quando os caras
souberam sobre sua perda total de memória, te deixaram em paz.
Resumidamente é isso, mas sei que há muitas lacunas.

— Meus laudos médicos dizem que sofri uma grande


batida na cabeça, que foi a responsável pelo apagão de minha
mente. — ela parecia frustrada. — Mas com o tempo, tive
esperança que voltaria, deveria ter voltado... Mas meu psicológico
parecia mais abalado que meu próprio físico.

— Inconscientemente você fez o precisava para sobreviver.


— acabei dando minha opinião. — Nossa mente pode usar de
todas as formas para nos proteger, até de nós mesmos.

— Obrigada. — abriu um leve sorriso. — Obrigada mesmo.

— Eu sou seu irmão, Branca. — deixei meus braços


pousarem sobre a mesa. — Não há nada do mundo que não faça
para te ver feliz.

— Eu só consigo me lembrar de você assim. — confessou,


claramente emocionada. — Cuidando de mim.
— Sou o irmão mais velho chato, acredite. — pisquei
divertido, e ela sorriu ainda mais, trazendo de volta momentos que
pensei nunca mais ter.

— Eu vou me esforçar para lembrar. — senti seu toque em


minha mão, bem fraco, mas que me fez sentir inteiro por meio
segundo. — E quero muito poder fazer parte da sua vida, e todos
que são minha família.

— Nunca esperaria menos de você, nena.

Ela sorriu, e apertei sua mão, num gesto que ela não se
lembrava, mas que era nosso “toque”. Todos os dias nos
cumprimentávamos daquela forma, e eu sabia que estava alheia
a qualquer coisa daquela. Entretanto, Branca me dava algo que
parecia perdido – esperança.
10

“Don't lose who you are in the blur of the stars

Seeing is deceiving, dreaming is believing

It's okay not to be okay.”[17]

Sorri sem jeito para Hugo que parecia ainda mais ansioso
do que eu para fazer aquele teste. Tínhamos trocado algumas
mensagens, e ali estávamos, três dias depois de nossa primeira
conversa, dentro de uma clínica, para fazer a coleta de material
do exame de DNA.

Era estranho pois só de olhá-lo eu tinha certeza em meu


coração de que ele não mentia, e que era mesmo meu irmão. Mas
quem poderia dizer que ambos não estávamos nos iludindo diante
da história de sua mãe? Mesmo que sua fisionomia entregasse
por completo que era filho de Eduardo Cardoso, além de tudo, por
ser muito parecido comigo.

Assim que a coleta foi feita, voltei para a recepção e


aguardei que ele saísse. Felizmente o procedimento era rápido e
em cerca de duas semanas teríamos o resultado. Tinha certeza
que aqueles dias seriam torturantes, pois já bastava ser uma
pessoa ansiosa, e ainda mais agora, estando grávida, eu estava
praticamente o triplo de ansiedade.

— Está tudo bem? — Branca perguntou, e eu assenti,


sorrindo.

Ainda não sabia nem ao menos como chamá-la. Mas de


todo jeito, meu inconsciente a associava diretamente como

Branca Rivera.

— Foi bem rápido. — dei de ombros. — Não sei porque o


de Hugo está demorando. — franzi o cenho.

— Ele tem medo de agulhas. — sorriu amplamente, quase


gargalhando. — Pode ter certeza que está enrolando lá dentro
com o objetivo de adiar a dor.

— Não consigo acreditar que um homem do tamanho dele


tenha medo de uma agulha. — confessei, completamente
chocada. A gargalhada que ela deu, fez-me perceber que tinha
falado demais, e senti meu rosto queimar. — Desculpe.

— Pelo que? — ela parecia mais relaxada. — É a primeira


risada que dou em dias. — suspirou profundamente. — Tem sido
confusão essa “autodescoberta.” — fez aspas com os dedos.

— Vai ficar tudo bem, tenho certeza. — sentei-me ao seu


lado, ajeitando-me melhor por conta da barriga.

— Eu me lembrei de algumas coisas... principalmente de

meus irmãos. — arregalei os olhos, focando em suas palavras. —


Por mais que não me lembre muito, apenas consigo ter certeza de
que eles são incríveis. Encontrei com Davi alguns dias atrás... —
só de ouvir aquele nome, senti um pequeno frio na espinha. — Eu
tive minha primeira lembrança, e acabei saindo correndo de hotel
e parado a frente do prédio dele. Precisava saber se não era
minha cabeça confundido tudo e armando uma falsa realidade. —
deu de ombros, parecendo perdida. — Mas ele se lembra do
mesmo que eu. Foi incrível saber disso, e aos poucos, estou
conseguindo lembrar mais.

— Eu fico imensamente feliz por isso. — fui sincera. — O


pouco que convivi com Davi deixou claro o quanto ele te ama, e
quanto sentia sua falta. — confessei, e momentos ao lado dele
povoaram minha mente, o que me fez espantá-los rapidamente.

— Sei que seus pais vão ficar muito felizes.

— Desculpe. — pediu de repente. — Sei que não está tudo


bem entre você e Davi, e acabei... — sua voz saiu um pouco
fraca. — Logo vou encontrar meus pais e estou uma pilha de
nervos, por isso acabo falando muito. Sei que não nos
conhecemos, mas eu sinto perto de você, o mesmo que Hugo
demonstrou pra mim quando o conheci – confiança. — ela parecia
envergonhada. — Me apaixonei por ele tão rápido que sequer tive
chance de pensar em fugir.

— Vocês parecem ter uma história e tanto. — brinquei, de

certa forma curiosa, e por outro lado fugindo por completo do


assunto ‘Davi’.

— Você não faz ideia. — sorriu enigmática. — Prometo te


contar um dia.

— Vou cobrar.

Logo uma voz grossa chamou nossa atenção e foquei


atenção em Hugo, que estava claramente incomodado com o
pequeno curativo em seu braço. Branca e eu trocamos um olhar
cúmplice, pois agora eu também sabia, que aquele homem de
quase um metro e noventa, tinha dado trabalho para apenas tirar
um pouco de sangue.

Segurei a risada, torcendo com toda força de meu coração


para que ele fosse mesmo meu irmão.

— Odeio cozinhar! — ouvi o grito de Luíza e gargalhei,


descendo as escadas rapidamente. — Não vem me julgar! Só

porque tem as benditas mãos de fada. Isso é tão injusto!

Cheguei próxima a ela, vendo que a mesma jogava a


frigideira que era prata, já com o fundo completamente preto, e o
cheiro de queimado impregnava o lugar. Assim que ela abriu a
torneira, e a água entrou em contato, uma fumaça subiu e não
consegui não gargalhar ainda mais.

— Isso! Ri mesmo da desgraça alheia. — reclamou


emburrada, fechando a torneira. — Hahá! Estou gargalhando
também! — debochou, e levantei as mãos em claro sinal de
rendição.
— Você está tentando, isso que importa. — abri a geladeira
e peguei um iogurte. — Aliás, o que faz aqui tão cedo?

— Estou oficialmente me mudando pra cá. — arregalei os


olhos sem entender nada.

Luíza tinha me dito que conversou com Marcelo, que ele


pediu perdão e eles acabaram se entendendo. Por que ela ficaria
morando comigo?

— Não me olha assim. — revirou os olhos. — Como sabe,


meus pais decidiram estender a viagem por um tempo, e eles
merecem mesmo umas férias. — deu de ombros, enquanto me
sentava a frente da mesa. — Enfim, eu e Marcelo decidimos que
seria bom um tempo de recomeço, agir como namorados.

— Mas ele mora na casa a poucos metros daqui. —


provoquei, e ela bufou.

— Na realidade ele vai ficar no antigo apartamento,


enquanto nos ajeitamos. — sua voz não era muito decidida. —
Ele está inseguro, e realmente, eu compreendo. Mas essa história
de recomeçar ainda me parece maluca.

— Pensei que apenas eu estava pensando assim. —


acabei soltando, e ela se sentou à minha frente, pegando uma
maçã na fruteira ao lado, a qual ela tinha abastecido, assim como
todas as comidas e produtos da casa, e roupas emprestadas. Já
que eu estava praticamente perdida diante de tudo. — Marcelo é
um tanto intenso, vamos combinar? — ela assentiu um pouco
sem graça. — Acho que não faz o estilo dele essa coisa toda de
“recomeço”. Por isso estou estranhando.

— Então, imagine eu! — falou comendo de boca aberta,

fazendo-me sorrir. — Ele está estranho.

— Vai ficar tudo bem. — pisquei pra mesma. — Acho que


ele só precisa de um tempo.

— Obrigada por entender, Manu. — deixou a maçã de lado


e me encarou com carinho. — Pensei em te contar sobre aquela
noite no momento que falou de Davi mas... Não sabia como.

— Honestamente? — abri o iogurte e tomei um gole. —


Não importa pra mim, de verdade.

— Eu acredito que não me julgue por isso, nem ele... Mas


não acredito que não se importa. Você está sofrendo longe dele!
Assim como o ama, é fácil de ver. — aquele era o problema de ter
uma melhor amiga ariana, ela era terrivelmente sincera. — Mas
sei que tem seus motivos pra chutar a bunda dele.
— Obrigada. — brinquei, sorrindo amplamente. — Tento
fugir de Davi mas a cada dia fica pior.

— Como assim? — indagou curiosa.

— Os desenhos... — falei apreensiva, e ela fez uma careta.


— Continuam no apartamento dele, como meus outros trabalhos.
Assim como quase todas as minhas roupas e objetos pessoais. —
suspirei frustrada.

Os dias se passaram e não tive sequer a coragem de ir até


o apartamento buscar o que era meu.

— A exposição adiantada é daqui alguns dias... — pareceu


refletir. — Eu te falei que buscava todos os desenhos. Além de
que podia pedir para o seu segurança, quase meu também que
vive ali fora. — falou emburrada.

— Primeiro de tudo que esse não é o trabalho de Júlio. —


ela revirou os olhos, pois sabia que ele o faria se o pedisse,
mesmo assim, não achava certo. — E te colocar dentro do
apartamento de Davi não é uma boa ideia, Marcelo pode saber
e...

— Ele ia saber. — cortou minha fala. — Não é como se


pudesse evitar Davi para sempre, além de tudo, sou grata pelo
que fez no dia em que Marcelo apareceu aqui completamente
desnorteado. Davi é o pai do meu sobrinho, não tem como
Marcelo pensar que não vamos nos encontrar. Teremos muitos
aniversários de Samuel pela frente.

— Merda! — toquei minhas testa, massageando-a. — Não


tinha parado pra pensar nisso.

— Infelizmente, vai ter que encarar Davi muitas vezes. —


sorriu amplamente.

Eu sabia, ela era a primeira da torcida para que eu e Davi

nos resolvêssemos. Mas o que poderíamos resolver? Não existia


nada entre nós. Infelizmente, suas palavras, seu amor... Eram
completamente perdidos no momento em que recordava o porquê
ele tinha sido daquela forma. Apenas conseguia pensar que se
tratava de um novo plano.

Confiança quebrada era algo difícil de reconquistar... Não


tinha prazo para tê-la de volta, muito menos, noção se um dia a
teria.

— Mas o maior motivo é que não quero parecer fraca


diante dele. — confessei. — Não posso simplesmente entrar no
apartamento e pegar os meus desenhos? Eu tenho que conseguir
fazer isso! — fiquei agitada, tentando acreditar em minhas
próprias palavras.

— É claro que você consegue. — Luíza sorriu. — Se puder


me esperar voltar do trabalho, posso te ajudar, porque precisa de
alguém para levar os desenhos. Além das malas com as suas
coisas.

— Isso te traria problemas, e vamos evitar por enquanto. —


insisti, e ela acabou cedendo, sabendo que era o melhor. — Vou
falar com Rogério, ele está por aqui hoje, mas acho que vai voltar
para o centro.

— Eu jurava que vocês acabariam juntos.

Quase cuspi o gole de iogurte, e comecei a tossir, tentando


me recompor. Luíza gargalhou alto, e assim que me acalmei,
acabei rindo também.

— Eu te contei sobre nosso encontro... Ele é um cara


incrível mas faltou algo.

— Ele é um cara tão gato. — Lu suspirou, fazendo-me rir.


— Qual é? Vai me dizer que ele não é um deus grego? O cara
deve deixar mulheres desmaiadas pelas cama que passa. — ela
não tinha mesmo jeito.
— Eu sei que ele é bonito. — revirei os olhos diante de seu
olhar perspicaz. — Ok, um gato! — ela sorriu. — Mesmo assim o
beijo foi horrível.

— Ainda assim, aposto que ele quis outro encontro.

— Na verdade não. — pensei um pouco. — Ele pareceu


sentir o mesmo no momento que nos olhamos depois do beijo.
Não teve aquela coisa...

— Que Davi te faz sentir só de olhar. — provocou, e peguei


o pano de prato do lado, jogando em sua cara.

— Não seja uma vaca!

— Eu sou sua melhor amiga. — sorriu amplamente. — Mas


entendo, ser bonito não basta.

— Ao menos nisso concordamos.

— Enfim, acha que ele vai com você? — perguntou


interessada. — Rogério não é um grande fã de Davi, ao menos,
nunca sequer se falaram.

— Mas ele não precisa falar com Davi. Vou me certificar de

que Davi não esteja no apartamento. Por que eles não se falam?

— Além de Davi ser frio como uma pedra de gelo com


todos que não sejam você? — revirei os olhos. — Não faço ideia.
Acho que foi apenas uma impressão.

— Sei. — eu sabia que ela estava desconfiada de algo. —


Fala logo!

— Juro que é só minha intuição acusando que Rogério


gosta de você. — deu de ombros e fiz uma careta. — Não me

olha assim. Vai dizer que não desconfia?

— Não. — falei rapidamente. — Ele é meu amigo.

— Mas quer mais do que isso. Não imagina a cara dele


quando Marcelo contou que você estava grávida e ia se casar.

— Sua intuição está completamente enganada. — falei

despreocupada. — Rogério tem alguém na vida dele com quem


se importa, tenho certeza.

— Se você diz. — deu de ombros. — Tenho que me


arrumar pro trabalho. Beijo e boa sorte!

— Ok, bom dia!

Ela logo subiu as escadas, e fiquei ali, olhando ao redor da


cozinha. Subi as escadas em seguida, e fui até meu quarto,
pegando o celular jogado sobre a cama. Assim que abri a caixa
de mensagens, notei que estava vazia. Davi tinha parado de
mandar as mensagens repetitivas. Ao menos, ele estava
respeitando meu pedido. Mesmo que não soubesse o porquê de
realmente ter pedido tempo.

Destinatário: Davi

Oi, bom dia!

Preciso dos desenhos que estão no seu apartamento. Tudo


bem passar lá para pegar?

RASCUNHO

Acabei apagando a mensagem, e encarei novamente o


teclado do celular, sem saber o que digitar. Era estranho estar
daquela forma, já que aquele mesmo apartamento tinha se
tornado minha casa por um curto período. Voltar lá era como
aceitar minha grande derrota no amor. Ao mesmo tempo que
fazia-me lembrar de como realmente acreditei que era real.

Abri o seu contato e por alguns segundos apenas encarei


sua foto, onde ele sorria misteriosamente. Uma das poucas fotos
que via dele, já que ele era o cara que tirava de outras pessoas,
mas nunca aparecia. Suspirei frustrada, pois aquela sensação
partia meu coração. Olhar para seu sorriso e seu olhar... Senti-me
perdida e completamente fraca.

Precisava enfrentar minha realidade, e esquecê-lo. Pedi


um tempo não para que pudesse pensar sobre nós... Eu tinha

pensado, no momento em que chorei toda minha dor logo após


saber da verdade. Minha decisão tinha sido tomada, e Luíza já
tinha começado a preparar os papéis do divórcio. O problema era
que não conseguia dizer a ele. O tempo que pedi era para me
preparar apenas para anunciar tal decisão. Não tinha como ficar
com ele depois de tudo. Não sabia como confiar, ou por onde
recomeçar ao seu lado.

Decidi o que fazer, clicando em LIGAR. Precisava começar


por algum lugar, já que ele sempre estaria presente em minha
vida, e teria que arrancar aquele amor de meu coração, de uma
forma ou de outra.

— Manuele.

Ele atendeu tão rápido que sequer tive tempo de raciocinar.


Merda!

— Oi, Davi! — falei um pouco sem graça, mas tentei


manter o tom. — Bom dia. Desculpe se estiver atrapalhando.
— Você nunca atrapalha. — ele jogava baixo. —
Aconteceu alguma coisa? Samuel está bem?

— Ah, não! — respondi rapidamente. — Quer dizer, não


aconteceu nada. Samuel está bem. Minha próxima consulta é na
próxima semana, mas não tive nenhum problema.

— Fico feliz em saber. — seu tom era de alívio. — É... Em


que posso ajudar?

— Eu preciso dos desenhos que deixei em seu


apartamento. — soltei de uma vez, omitindo sobre meus
pertences. Talvez não fosse uma boa ideia contar aquilo, já que
ele ainda não sabia sobre o divórcio, e os papéis sequer estavam

prontos. — Tudo bem passar lá para pegar?

— Eu estou na empresa, mas consigo chegar lá em alguns


minutos...

— Não precisa se incomodar. — cortei-o rapidamente. —


Eu ainda tenho a senha decorada, e já estou perto do
apartamento mesmo. — menti descaradamente, e torci para que o
mesmo caísse.

— Ah, certo. — felizmente cedeu, e segurei um suspiro de


alívio. — Fique a vontade para ir lá.
— Obrigada, Davi!

— Disponha. — sua voz era baixa. — Quando é a próxima


consulta?

— Preciso confirmar na agenda, mas acho que na sexta-


feira que vem.

— Acabei perdendo a revelação sobre o sexo dele, não


quero perder mais nada. — sua voz era quase falhada. — Por

favor, me avise por mensagem.

— Claro. — respondi sem graça, sabendo que sequer


tínhamos assunto.

— Obrigado por não me afastar dele. — sua voz deixou


meu coração pequeno.

— Ele é seu filho, Davi. — passei as mãos pelo cabelo,


tentando medir minhas palavras. — Jamais te afastaria dele.

— Isso só me faz te amar ainda mais.

Fechei os olhos, sem saber o que responder. Suas


palavras girando em minha mente e meu coração bateu
desesperado, como se reconhecendo-o como seu. Aquele
sentimento era forte demais, eu sabia. Mas de algum jeito
precisava ignorá-lo, para meu próprio bem.
— Sinto muito. — sua voz soou do outro lado da linha. —
Prometo que não vou te pressionar.

— Tudo bem.

Não! Nada ia bem!

Diga e ele que vai pedir o divórcio!

Diga a ele que não existe tempo para pensar!

Diga que acabou!

Forcei minha boca a se abrir, e nada saiu. A culpa

invadindo meu ser, e me sentindo uma completa bagunça. Não


conseguia... Ainda não. Tentei convencer a mim mesma, e
acreditar, que era apenas uma fase. Que em breve, em algum
momento, diria a ele todas aquelas palavras.

— Até mais, Davi!

— Até, Manuele!

Desfiz a ligação rapidamente, ainda completamente


perdida, e encarei o teto. Uma corrente de lembranças pareceu se
abrir ali, a minha frente, enquanto tentava não pensar em Davi.
Falhas tentativas de um coração ainda entregue e completamente
devastado.
11

“My, my name was safest in your mouth

And why'd you have to go and spit it out?

Oh, your voice, it was the most familiar sound

But it sounds so dangerous to me now.” [18]

— Quer que eu suba com você? — Rogério perguntou


assim que estacionou o carro a frente do prédio de Davi.

— Não... Se me lembro bem são poucas coisas. —


confessei sem muito jeito. — Eu volto em alguns minutos.

Ele assentiu, parecendo ainda me analisar, e senti-me pior.

Nunca pensei que seria tão difícil descer de um carro e entrar


num prédio que tinha se tornado meu lar, mesmo que por pouco
tempo.
Tirei o cinto de segurança e abri a porta, tomando uma
coragem que parecia inexistente. Senti então um leve puxão em
meu braço e encarei Rogério.

— Me manda uma mensagem qualquer coisa. — sorriu


levemente.

— Obrigada.

Desci do carro e caminhei a passos incertos pela calçada,


até chegar no interior do prédio e encarar o elevador privativo.
Digitei a senha, sentindo a sensação de flashback me acertar.
Nossa primeira noite passando por minha mente a cada andar
que o elevador mostrava na pequena tela, e ao encarar o reflexo
no espelho. Tudo dentro de mim era uma grande bagunça.

Assim que o elevador parou, e as portas se abriram,

respirei fundo, dando passos para fora. Ali continuava a mesma


coisa. Do jeitinho que me lembrava, de como minha saudade
gritava. Tinha me acostumado a chamar ali de casa, a ser ali para
onde voltava.

— Você consegue fazer isso, Manuele!

Repeti a mesma frase uma dúzia de vezes ante de


finalmente abrir a porta do apartamento, e entrar. Assim que
coloquei meus pés na sala, minha vontade era voltar correndo
para a fazenda, e esquecer-me por completo do que fazia ali. A
dor era ainda maior ao lembrar que tudo foi tão real... Ao menos
pareceu.

Caminhei incerta até a parte dos quartos e assim que abri

meu antigo estúdio e escritório, olhei para os desenhos prontos


separados no canto esquerdo, e uma tela que ficou parada desde
o dia em que deixei Davi. Aquele lugar tinha se tornado um dos
meus favoritos no mundo, eu adorava sentar ali e ficar por horas
apenas desenhando.

Sentei-me a frente do desenho inacabado e sorri sem


graça, pois eu sabia bem o que aqueles traços significavam. Não
deveria tê-lo começado, mesmo assim, era uma parte minha tão
feliz, que era impossível não ter me inspirado. Ajeitei tudo da
forma mais rápida que pude, tentando mandar minhas
lembranças para longe, e ajeitando praticamente vinte desenhos
prontos, dentro de cada canudo extensível que tinha
estrategicamente colocados perto da estante de livros.

Consegui acomodar todos os desenhos de forma que não


ficasse difícil descer no elevador, e ao olhar ao redor, vendo que o
lugar perdera a vida, acabei não resistindo, e optei por ser
novamente masoquista. As lembranças pareciam tão vivas, como
se pudesse tocá-las... e assim, abri a porta ao lado, e encarei o
quarto que seria de nosso Samuel.

Continuava da forma como Davi e eu tínhamos começado


a montar. Um berço no canto direito na cor branca, e a primeira
roupinha da mesma cor, sobre o pequeno colchão. Não tinha
nada além, e pensei em como seria lindo deixar aquele quarto
alegre e cheio de vida, por conta de nosso filho. Mas não era mais
ali o seu lar, muito menos o meu.

Como se Samuel entendesse o que se passava em minha


mente, remexeu-se com gosto dentro de minha barriga, fazendo-
me tocá-la para sentir cada movimento.

— É filho... Aqui é a casa do seu papai.

Adentrei o cômodo que mais temia, e não me permiti olhar


ao redor, indo até o closet e pegando as cinco malas vazias que
chegaram ali com toda minha vida. Olhando para a quantidade de
roupas e objetos meus espalhados, acabei optando apenas pela
maior, e dando um jeito de colocar ao menos o básico. Aos
poucos, passando por cada prateleira, gaveta e nicho, minhas
coisas foram desaparecendo dali.
Deixei as outras quatro malas com as coisas e pensei em
pedir para que fossem levadas depois, mas o certo era partir dali
de uma vez. Peguei meu celular e liguei para Júlio que tinha nos
seguido desde a fazenda. Eu ainda carregava o sobrenome

Rivera, e sabia bem que Davi se negaria a tirar minha segurança,


depois do próprio amigo ter invadido minha casa daquele modo.
Eu carregava um filho que seria herdeiro de um império caso
optasse por tal carreira, e não sabia ao certo o limite da maldade
humana. Segurança não era nada demais.

— Senhora. — ao menos Júlio não me chamava pelo


sobrenome de Davi, e agradecia imensamente por aquilo.

— Oi! Sei que me está na frente do prédio de Davi. —


expliquei rapidamente. — Sei também que não é seu trabalho,
mas... Poderia me ajudar com algumas malas?

— Estarei aí em alguns minutos, senhora.

— Obrigada, Júlio!

Desfiz a ligação e terminei de fechar as malas, puxando-as


até a sala de estar. Lembrei-me de um relógio que sempre
deixava sobre o criado mudo e voltei para o quarto. Assim que o

peguei, colocando no bolso da calça, olhei de relance para o lado


e encontrei ali, minha aliança. Por um instante, a dor me assolou,
fazendo-me recordar o que realmente acontecia.

Eu estava indo embora da vida do homem que amava


loucamente... Que tinha entregado cada parte de meu coração.
Toquei de leve na aliança e o significado da mesma fez-me sentir
uma completa boba. Como pude ser tão ingênua e sequer
desconfiar?

Decidi não me torturar mais e voltei para o escritório ao


lado, pegando os canudos com os desenhos, e jogando sobre um
ombro, de uma forma que me deixava uma verdadeira confusão,

mas que ainda assim, permitia-me fazer parte daquilo só.

Passei novamente pela sala de estar, e franzi o cenho ao


notar os travesseiros e edredom de Davi jogados no chão da
mesma, como se ele tivesse passado a noite ali. Não queria
pensar naquilo, muito menos pensar no porquê. Davi era um
jogador, e podia muito bem estar usando pequenos detalhes para
me convencer de algo.

Eu te quero, Manuele. Eu te amo, e não quero perde-la.

Aquelas palavras me atormentavam, como se de alguma


forma pudessem ser reais. Entretanto, não conseguia deixar meu
coração falar, não conseguia acreditar.

A porta do apartamento se abriu e Júlio veio em minha


direção, sem dizer nada, puxou as cinco malas, de forma que
sequer conseguiria explicar, e me encarou de relance.

— Apenas isso, senhora?

— O que preciso fazer para que me chame de Manuele? —


indaguei, e pela primeira vez, vi um leve sorriso no canto de sua
boca. — É só isso mesmo.

— Precisa de ajuda com os canudos? — perguntou, com


certeza notando minha falta de jeito.

— Vou chegar viva até lá em baixo. — brinquei, e ele


assentiu. — Obrigada pela ajuda!

Saímos do apartamento, e fui em direção ao elevador, em


busca de um ar que sequer sabia que faltava. Quando finalmente
cheguei a calçada, Rogério estava do lado de fora do carro e
praticamente correu até mim, ajudando-me.

De relance vi Júlio, acomodar as malas no porta-malas de


seu carro, e me dar um leve aceno com a cabeça. Claro, ele ainda
cuidava da minha segurança e com toda certeza iria nos seguir
até a fazenda, e por lá permanecer, até o fim de seu turno. Não
entendia muito bem como funcionava, mas seu rosto era o que
mais via por lá.

— Isso com certeza não é pouco! — Rogério falou pasmo,


encarando os canudos e de soslaio as malas que Júlio terminava
de guardar no carro ao lado.

Forcei um sorriso, dando alguns canudos para ele carregar,


e olhei rapidamente para o prédio. O que se faz quando se quer
entender o passado e ainda assim, ama o que não deveria?

Eu tinha medo, pois Davi tinha muito poder sobre mim...


principalmente sobre meu coração. Entrei no carro, ajeitando os
desenhos no banco de trás, e assim que terminei, soltei uma
respiração profunda.

Um segundo a mais ali e eu não sairia. Permaneceria


dentro do apartamento apenas para ouvir o que Davi tinha a dizer.

Mas eu não estava preparada. Sentia que nunca estaria.

— Esses desenhos são incríveis! — Luíza falou animada,


enquanto me ajudava a colocá-los no quarto vazio ao lado do
meu, onde voltaria a desenhar e me preparia para a exposição. —
Não sei como consegue.

— Eu simplesmente deixo fluir.

— Você tem um dom incrível, isso sim! — virou-se para me


olhar. — Como foi lá?

— Sinceramente? — assentiu. — Um pesadelo. Quis ficar


lá e ouvir o que Davi tem pra dizer. Mas acabei pegando tudo e
vindo pra casa.

— Por que não o fez?

— É tudo recente... Não dá pra simplesmente ouvir meu


coração depois de ter feito isso, me casado, me enganado, ser
usada... É muito mais complicado do que ouvir Davi dizer o que
quero.

— Por que acha que ele fará isso? — perguntou inquisitiva,


como se me avaliasse.

— Não sei. — menti descaradamente.

— Fala! — insistiu, pois me conhecia bem o bastante para


desconfiar.

— Acho que ele está tramando mais alguma coisa. —


confessei derrotada, deixando os desenhos de lado, e saindo do
quarto.

Senti os passos de Luíza atrás de mim, e fui para meu


quarto, sentando novamente na poltrona que tinha se tornado

minha companheira em noites insones. Mesmo que Samuel


muitas vezes me fizesse capotar durante o dia, a noite era um
completo vazio, e sequer conseguia pregar o olho.

— Eu sei que parece difícil agora. — Luíza começou a


dizer, e sentou-se no chão a minha frente. — Mas dê tempo pra
você, pro seu coração se curar. Não tem como se entregar
novamente enquanto não estiver bem consigo mesma.

— O problema é que não quero me entregar, Lu. Parte de


mim é tão insegura a respeito de Davi, que me sinto em meio de
julgamento diário. — confessei derrotada. — Por isso pedi para já

fazer os papéis de divórcio... Sei que não consigo mais. Eu deixei


toda minha vida por ele, de uma forma tão entregue. E aqui estou
de volta, tentando recomeçar do mesmo lugar. O dinheiro que
tenho guardado no banco não é pouco, é o suficiente para que
consiga alugar algo e saia daqui, para ter novos ares, e consiga...

— Ei ei ei ei! — Luíza praticamente gritou. — Não precisa


sair do lugar que ama para se reencontrar ou recomeçar. De onde
tirou uma ideia dessas?
— Já se sentiu um estorvo na vida das pessoas? — fechei
os olhos, sabendo que minhas palavras eram cruéis, mas ao
mesmo tempo, estavam engasgadas em minha garganta. — Me
sinto assim todos os dias.

— Nada disso! — seu tom foi gélido, e a encarei. — Aqui é


sua casa! Meus pais e eu somos sua família! A vida nos colocou
frente a frente por algum motivo, e agradeço a Deus pela irmã
que tenho. Meus pais te amam como uma filha, não sabe o
quanto papai e mamãe xingaram Davi por telefone, e só não
vieram aqui porque implorei para não fazerem. — arregalei os
olhos, incrédula. — É verdade, não me olhe assim! Além de tudo,
por mais que se sinta perdida... Você tem Hugo agora, que meu
Deus, se não for seu irmão de sangue, pode muito bem ser nosso
amigo.

— Ele é a cópia de meu pai. — soltei em meio a um

suspiro perdido.

— Sua cópia também. — assenti. — Ele é sua versão


masculina, é claro de se ver. Acha mesmo que é estorvo na vida
de alguém sendo que um cara deixou a vida dele de lado, te
procurou, e agora está aqui, esperando um resultado por nada?
— Eu sou uma idiota, sei disso. — deixei com que uma
lágrima descesse. — Mas é tão difícil confiar, tão.... Difícil lembrar

que Davi sempre estará em minha vida e que ainda o amo.

— As coisas na vida acontecem de jeitos confusos. —


tocou minha perna, chamando minha atenção. — Eu sei que no
final de tudo, você vai estar feliz e ser a melhor mãe do mundo.

— Queria ter a sua confiança sobre isso.

— Não é confiança. — sorriu de lado. — É fé. O mundo


pode desabar, mas eu sei que de algum jeito, a gente volta a
sorrir.

— Quanto tempo isso deve levar? — passei as mãos pelo


rosto.

— O seu tempo. — piscou com o olho esquerdo. — Só


você vai saber o que fazer.

— Acho que estou focando apenas nas coisas ruins e as


transformando em foco da minha vida. — passei as mãos pela
barriga, sentindo a culpa me invadir.

— Vamos focar em cuidar desse bebezinho e logo menos


da sua exposição. — levantou-se e me encarou em expectativa.
— Você é uma guerreira, Manu. Quantas vezes a vida te derrubou
e seguiu firme?

Não resisti, e fui até ela, abraçando-a da forma que


conseguia. A cada dia minha barriga estava maior. Luíza me
abraçou de volta, consolando-me em seus braços. Era tudo o que
precisava naquele instante. Pois eu tinha muito mais do que
imaginava, e não permitiria mais que a dor me deixasse cega.
12

“I'm not a saint, I'm more of a sinner

I don't wanna lose, but I fear for the winners

When I try to explain, the words run away

That's why I am stood here today.”[19]

Quando os seguranças me avisaram que meu irmão estava


subindo no elevador, comecei a andar de um lado para o outro no
apartamento. Eu esperava por aquela conversa há muito tempo,
mesmo não tendo noção sobre. Além de tudo, meus pais estavam
no Brasil, tudo a meu pedido, que precisava conversar com eles.
Com certeza eles estranharam tal pedido, mas felizmente, sabia
bem que eles já tinham entendido que queria apenas tê-los de
volta em minha vida.
Eu trocava mensagens com Branca, assim como tinha tido
um jantar com ela e seu noivo, o tal Hugo. Ele parecia um cara
legal, e era impossível não notar a semelhança dele com
Manuele. Contudo, ele tinha medo dobrado por Branca, e ainda
tentava a todo custo ter paciência.

Imaginava, estando do lado de fora, o quanto estava sendo


confuso para ambos. Branca ainda tentava entender seu
passado, o qual aos poucos parecia voltar a sua mente. Hugo

tentava assimilar que não só ele estava em busca da família, no


caso, Manuele, mas também Branca. Era complicado, mas
conseguia ver nos olhares que trocavam, o quanto se amavam...
Aquilo era apenas uma turbulência no caminho.

Foi ela quem pediu para chamar nossos pais, pois queria
conhecê-los, ou melhor, tentar reconhecê-los. Ao mesmo tempo
que parecia entender o quanto poderia ser alarmante e frustrante
para eles, que a filha que tanto amavam, estava na realidade viva
e não se lembrava. Mas acabamos chegando a um acordo, no
qual eu contaria a eles o que tinha acontecido, e em seguida, ela
apareceria. Mesmo que não se lembrasse a fundo e nós, ela
parecia ansiosa para o reencontro. Bom, quem não ficaria?
A porta do apartamento se abriu, e levantei meu olhar,
encontrando Guilherme com a feição claramente tensa. Forçou
um sorriso, típico dele, mas que agora não me enganava. Por
anos permiti-me culpá-lo por algo que não tinha sequer controle,
que ninguém tinha. E meu irmão, o qual tanto protegi durante
todos os anos lado a lado, como melhores amigos, sofreu e se
culpou ainda mais, só que em silêncio.

— Eu ouvi sua mensagem na caixa postal. — começou a


dizer, e permaneceu parado a poucos passos da porta. — Eu não
te julgo por ter me culpado pela morte dela. — suspirou,
claramente frustrado. — Eu me culpei, hermano. Por todos esses
anos, não teve um dia sequer que não me lembrei das palavras
dela e quis que fosse eu naquele carro.

— Mas não era ela lá. — dei um passo à frente, um pouco


hesitante. — E mesmo que fosse, um dia estaríamos tendo essa
conversa. Peço perdão por tudo, irmão! Por tudo que te acusei,
que...

— Não precisa.

— Preciso sim! — falei no tom autoritário que ele tanto


conhecia, mas sorri ao fim. — Eu acusei você e nossos pais, pela
morte dela. Mas nunca, nunca me coloquei no lugar de cada um.
— Até Branca aparecer viva. — sua voz soou magoada, e
eu o entendi perfeitamente.

— Até Manuele chegar ao meu coração. — suspirei fundo.


— Não foi Branca que me fez enxergar o quanto errei. Acredite ou
não, quando conversamos naquele dia, eu percebi o que tinha
feito com Manuele, a proporção que tudo aquilo tomou. Nosso
próprio pai me investigou... Tem noção do que é isso? Éramos
uma família, e pelo luto, escolhi perder todos em uma única noite.

— Você teve suas razões, Davi.

Ele ainda se culpava, e era fácil perceber. Agora, não mais

pela morte de nossa irmã. Mas pelo que com certeza ele também
tinha descoberto sobre o que acontecera com ela. Já que os
papéis eram rasos, perto do que poderia realmente ter ocorrido. O
se passou com Branca no meio tempo até chegar a encontrar
Hugo, era um verdadeiro mistério. Que apenas ela poderia
descobrir, ou melhor, recordar.

— Escuta bem! — segurei em seus ombros, e o mesmo me


encarou. — Você não tem culpa!

— Fui eu, hermano. Fui eu que a reneguei e por isso ela


começou a frequentar aquele bar... Por isso ela passou a beber...
Branca era inteira e eu a quebrei.

— Você foi sincero com ela. — seus olhos estavam


marejados, e pude sentir sua dor. — Eu julguei você e nossos
pais, por ser o único a não saber dos sentimentos de Branca para
você. Mas eu não tinha esse direito! Ela se apaixonou... Pessoas
se apaixonam todos os dias, Guilherme. Só que muitas vezes,
não é pra ser. Você não a amava da forma que ela queria, não
podia compactuar com aquilo apenas para que ela não sofresse.

— A última ligação dela foi pra mim. — confessou


derrotado, sem saber que eu tinha noção daquilo. Naquela época
eu fiquei a par de todos os detalhes. — Se eu tivesse atendido...
Se eu...

De repente, ele desmoronou. O amparei em meus braços,


sem conseguir crer que depois de tanto tempo recriminando-o, ele
ainda permanecia meu irmão. Aquilo era ser família.
Independente de tudo.

— O destino tem suas façanhas, hermano. — chamá-lo


daquele jeito, apenas me lembrava de nossa infância, onde tudo
era mais fácil. — E Branca está viva, tem que focar nisso.
— E se ela lembrar, Davi? — afastou-se e me encarou
perdido. — E se ela lembrar que fui a causa de seu maior
sofrimento?

— O tempo passou... Ela cresceu e se tornou uma mulher


ainda mais incrível, e está noiva de um cara que consigo ver de
longe que ama. — ele pareceu mais aliviado diante de minhas
palavras. — Ela é feliz, e você tem que estar firme pra ela.

— Tenho medo de magoá-la novamente. — foi sincero. —


Eu fui até você na fazenda aquele dia, porque imaginei poder

ajudar com Manuele, mas então, Branca me viu e... Desmaiou!

— É isso que fazemos, somos humanos e magoamos uns


aos outros. — brinquei, e ele levou uma das mãos a frente do
rosto, limpando as lágrimas. — hermano, eu quero que me
perdoe... Por ter sido tão cego. — frisei cada palavra.

— Está tudo bem, mesmo. — pareceu ponderar o que


dizia. — Apenas preciso entender o que fazer diante de nossa
irmã.

— Seja o irmão dela.

— Isso é tão bizarro. — ele passou por mim, e foi até o


sofá, jogando-se no mesmo. — Conversar com você depois de
tantos anos, vê-lo tão diferente do habitual, nossa irmã viva... Eu
passei dias enfiado no álcool tentando entender como não
desconfiamos de nada.

— Não tinha como ter desconfiado. — passei as mãos nos


cabelos, completamente frustrado. — Você deve ter lido o que li,
certo? — ele assentiu. — Conversei com ela sobre isso, sobre o
que aconteceu. Ela não sabe sobre o que sentia por você, mas
acho que as lembranças, ou até mesmo uma conversa entre
vocês resolverá isso.

— Espero nunca ter que falar sobre aquilo. — fechou os


olhos, claramente sem jeito. — Não soube lidar com isso naquela
época, não sei lidar agora.

— As coisas mudaram, Guilherme. — sentei-me no sofá a


sua frente. — Não tem porque sofrer ou se culpar por algo que
passou.

— Vou tentar. — forçou um sorriso. — Mamá e papá estão

ansiosos para te ver. Me ligaram animados, porque sentem falta


do filho mais velho, da nora e do neto a caminho.

E ali estava o assunto que queria evitar – Manuele.


— Eu a amo. — falei sem pensar muito, e Guilherme
encarou-me divertido. — O que foi?

— Demorou pra perceber, hermano. — provocou. —


Estava na sua cara, a forma como a protegeu, as fotos em rede
sociais... Podia ser no começo para convencer nosso pai, mas até
ele notou que você estava se “esforçando” demais. — fez aspas
com os dedos.

— Tudo entre nós aconteceu naturalmente... E pensei em


contar a ela a verdade por muitas vezes, mas temi que ela me
deixasse. — confessei. — Eu não pensava na empresa quando
queria contar, pois era nela que me preocupava... do fato que ela
não ia me perdoar. Como perdoaria? E ela realmente, não o fez.
— suspirei frustrado. — Hoje ela me ligou e pediu para pegar os
desenhos que estavam aqui... Ela levou muito mais, na realidade,
levou tudo o que era dela.

— Quando discutimos naquele dia, eu soube o quanto ela


mexia com você. — falou com calma. — Ela te ama, isso é óbvio.
Precisa de um tempo para absorver tudo isso, e com certeza, de
espaço. Mas não será fácil tê-la de volta.

— Não espero isso.... Mas, ainda assim, tenho esperança.


— balancei a cabeça em sinal de negação. — Estou parecendo
nosso papá! Jesus!

Guilherme explodiu numa gargalhada, e acabei o


acompanhando. Eu tinha me tornado uma versão mais jovem do
meu pai, que beijava o chão onde minha mãe passava. Eu era
aquilo, o cara que moveria céus e terras por Manuele. Já que tudo

parecia girar em torno de perdê-la, precisava entender por onde


começar e ter minha mulher de volta.
13

“Agora está tão longe

Ver a linha do horizonte me distrai

Dos nossos planos é que tenho mais saudade

Quando olhávamos juntos na mesma direção

Aonde está você agora além de aqui dentro de mim?”[20]

— Ei, nena! — Branca me abraçou rapidamente, e em


seguida beijou meu rosto. — Como vão as coisas?

— No momento? Nervosas! — confessou, e vi seu olhar


vagar para o outro lado da sala, onde Guilherme estava,
parecendo uma estátua.

Ela caminhou até nosso irmão, e virei meu olhar em


direção a Hugo. Lhe estendi a mão, o qual apertou firmemente.
— Como ela está? — perguntei baixo, e ele entendeu bem
que estava preocupado.

— Ansiosa, nervosa, quase não dormiu na noite passada.


— sorriu levemente. — Ela está feliz para ser completamente
franco. E acho que ver os pais hoje, será uma realização.

— Espero que sim.

Olhei para o lado e a encontrei nos braços de Guilherme,


que estava claramente emocionado. Eu não sabia ao certo o que

realmente tinha acontecido tudo entre eles, como de fato ele a


rejeitou, mas ali, eu tive a noção de que meu irmão temia muito
magoá-la novamente. Mesmo que os sentimentos de Branca
fossem fraternos naquele momento. Contudo, não sabíamos o
que aconteceria caso ela se lembrasse, ou quando Guilherme
contasse a ela sobre o passado.

Meu celular vibrou e meus seguranças avisaram sobre a


subida de meus pais.

— Eles estão subindo. — falei alto, e Branca me encarou,


indo até Hugo. — Vou conversar com eles, para que estejam
preparados com isso. Podem ficar no meu escritório. Eu os chamo

assim que terminar.


— Obrigada, irmão. — Branca falou, e sorriu
verdadeiramente, fazendo meu peito quase explodir por poder
ouvir aquela palavra dela novamente.

Hugo assistia a cena claramente feliz em vê-la tão leve, e


em seguida, guiei ambos até o meu escritório, onde tinha um sofá
que poderiam ficar mais confortáveis.

— Eu já volto. — sorri e fechei a porta, deixando-os na


expectativa.

Assim que voltei para a sala, as duas pessoas que me


esperavam, com os olhos arregalados pela ansiedade, e como
sempre, o carinho estampado no rosto, fizeram com que toda
aquela armadura estúpida que criei fosse desarmada
instantaneamente.

— Mamá! — falei emocionado, e cheguei perto dela, que


nem me deu tempo de falar nada, abraçou-me com força, estando
colada em minha cintura, pelo seu pequeno tamanho.

— Mi hijo! Mi Davi! — exclamou, já explodindo num choro,


e abracei-a fortemente, devolvendo todo meu amor. — Senti tanto
sua falta, mi angél.
— Estou aqui, depois de ser um idiota. — admiti, e virei
meu olhar para o homem que sempre foi meu exemplo, e meu
herói. — Papá!

— Acho que é de família, ser um completo imbecil. —


sorriu, claramente segurando a emoção. — Nena, deixa eu
abraçar nosso filho, por favor.

Mamãe se afastou um pouco, e tocou meu rosto, como se


marcasse minha face, reconhecendo-me como seu filho
novamente.

— Nos perdoe, querido.

Assim que ela se afastou, meu pai me surpreendeu com


um abraço forte, que demonstrava o quanto o tempo tinha
passado, e como tinha me proibido de entender o que era ser
família. Eles não me contaram sobre os sentimentos de minha
irmã por Guilherme, nem mesmo que Guilherme a rejeitou, pelo
simples fato que não queriam que eu sofresse junto aquilo.

Me protegeram de saber o porquê Branca tinha mudado


repentinamente, porque ambos me conheciam, sabiam que
culparia Guilherme, e seria um caos. Eu faria mesmo aquilo, sabia
bem, além de que depois do acidente dela, eu achava que se
soubesse, poderia ter feito com que ela não o amasse mais, e
entendesse que era apenas algo passageiro. Talvez realmente
fosse passageiro, e Branca estivesse confundindo tudo. Mesmo
assim, eu não tinha poder algum sobre ela, muito menos sobre
sua vida... A dor me cegou por completo. Achava que poderia ter
impedido sua perda.

A realidade era que não conseguia aceitar que minha irmã


se foi, e descontei por todos os lados, naqueles que mais amava,
razões infundadas para usar de pretexto e explicar o porquê tinha
perdido Branca. Eu fui um covarde!

— Eu peço perdão por tudo, mamá, papá! — falei de uma


vez, assim que meu pai se afastou. — Chamei-os aqui hoje por
um motivo especial, e também para contar a verdade.

— Como assim?

— Fiquem à vontade. — ambos me encararam


desconfiados, mas em seguida se sentaram. — Eu me apaixonei
por Manuele nesse caminho, que sabem o que planejava. Não
era com ela, muito menos uma gravidez real... Mas aconteceu e
eu a usei da mesma forma, só que eu a amo. — confessei, e os
olhos de ambos se arregalaram. — Hoje eu sei que ela me
mostrou o amor, e me fez ver o quanto estava errado sobre vocês,
sobre Guilherme, e sobre Branca... — engoli em seco, vendo seus
olhares atentos.

— Onde Manuele está? — mamá perguntou, pois ela era


perspicaz demais.

— Ela não está aqui hoje porque me deixou... Me deixou


ao descobrir a verdade do que me levou a pedi-la em casamento
e enfim, no dia em que ela saiu daqui, eu fui atrás, porque a
amava, porque não queria perde-la.... A encontrei na calçada do
prédio, de frente com um casal. O homem que estava ali, estava
atrás da irmã que acredita ser Manuele. — os dois me encararam
surpresos. — A mulher que estava ao lado dele foi quem me
intrigou.

— Como assim, Davi?

— Papá, você quem reconheceu o corpo de Branca, não


foi? — perguntei de repente, sem conseguir me segurar.

Meu pai franziu o cenho, e pareceu ainda mais perdido,


mas assentiu.

— Não tinha muito o que reconhecer, hijo. — confessou. —


Só os cabelos loiros, a altura... Não quero me lembrar disso.
— Eu sinto muito, mas vou ter que ser direto. — respirei
fundo. — Não era ela naquele carro, papá.

— O que? — ambos praticamente gritaram, encarando-me

perdidos. — Do que está falando, hijo?

— O carro de Branca foi roubado naquela noite... Não era


ela no carro. — não consegui encará-los, e sentei-me no sofá a
sua frente. — A mulher que roubou o carro era prometida de um
cara... Branca foi levada no lugar dela por engano, e de algum
jeito, conseguiu fugir.

— Hijo, não...

— Branca não morreu. — confessei. — Eu a reencontrei a


poucos dias, na frente do prédio.

— Mas ela... — meu pai se levantou andando de um lado


para outro, claramente transtornado, em quanto minha mãe
encarava o teto.

— Ela de algum jeito perdeu a memória, e nunca se


lembrou de nós. — contei completamente sem jeito, chocando-os

por completo. — Sei que é muita informação, mas...

— Onde ela está? — meu pai pareceu desesperado,


quando parou a minha frente. — Onde...
— Aqui. — contei baixo, e ele arregalou os olhos. — Ela
não teve uma lembrança durante esses cinco anos que se
passaram, mas depois que viu eu e Guilherme, acabou se
lembrando de uma noite em Búzios. Ela pediu para ver vocês,
pois quer se lembrar dos pais.

— Por favor, hijo... Onde ela está? — mamãe perguntou, e


me levantei, indo em direção ao escritório.

Assim que abri a porta, Branca me olhou em expectativa, e


se levantou rapidamente.

— Eles querem vê-la.

— Ok. — falou sem jeito. — Eles estão bem?

— Na medida do possível.

Dei espaço para ela e Hugo, que tinha a mão sobre sua

cintura, claramente preocupado. Ela podia desmaiar e nós


sabíamos daquilo, portanto, estávamos apreensivos e ao mesmo
tempo, atentos. Assim que Branca chegou a sala, vi minha mãe
perder a cor, e Guilherme se levantou rapidamente para segurar
nosso pai que quase caiu.

— Hija... mi princesa.
Minha mãe foi a primeira a se levantar, com cuidado, indo

até Branca, analisando-a por completa. Hugo permaneceu ao seu


lado, assim como eu, caso ela passasse mal. Meu pai demorou
um pouco, mas conseguiu chegar perto, ambos sem tocá-la, mas
completamente emocionados.

— Nuestra princesa[21]. — papai falou, e encarou-a como


sempre, com todo seu amor. — Não consigo acreditar!

Deixei-os em seu momento, e encarei meu irmão, que a


todo custo parecia se segurar para não desabar também. Nunca
imaginamos que aquilo aconteceria, não tínhamos como. Mas por
um segundo, quando vi minha irmã abraçar nossos pais, eu
soube – éramos novamente uma família completa.

Meu coração batia freneticamente diante da cena, porém,


meus pensamentos estavam longe, nas duas pessoas que
faltavam ali, para completar minha noite, minha família, minha
vida... Manuele e Samuel, as duas melhores partes de mim. E que
naquele instante, queria com toda a força, ao meu lado. Na
realidade, para sempre.
14

“You'll see me in hindsight

Tangled up with you all night

Burning it down

Someday, when you leave me

I bet these memories

Follow you around.”[22]

— Hugo acabou de mandar mais uma mensagem pedindo


desculpas, pois realmente não vão conseguir chegar a tempo da
exposição. — contei a Luíza, saindo do banheiro.

— Ele com certeza é o típico irmão mais velho babão.


— Espero que seja. — fui sincera.

— Calma, falta apenas mais uns dias para o resultado. —


piscou em minha direção. — Meus pais já estão no centro,
acredita? Loucos de orgulho pra ver seus desenhos.

— Eles são incríveis.

— E loucos. — acrescentou sorrindo. — Depois da


exposição já vão para o aeroporto, aproveitar uma nova viagem,
dessa vez para Rússia.

— Queria eu estar indo pra Rússia. — soltei sem querer,


sentindo a pressão daquela noite.

Olhei de relance para Luíza, completamente nervosa e a


beira do apavoramento. Ela me encarava animada e inquisitiva,
enquanto colocava as peças de roupa sobre a cama, eu
permanecia ainda enrolada numa toalha de banho.

— E se ninguém gostar? — perguntei por fim, sentindo


toda a insegurança me abater.

— Eu compro todos. — piscou em minha direção,


deixando-me inerte. — Tô falando sério!

— Não é sobre vender, é mais sobre...


— Gostarem do que vão ver? — assenti um pouco sem
jeito. — Eles vão amar, assim como eu e todos que já viram seus
desenhos.

— Apenas você, as galerias e... Davi viram.

— E todos amamos! — bateu palmas, como se para


espantar algo. — Xô, negatividade! É sua noite de brilhar!

— Tenho medo de que a aposta que Giulia está fazendo


seja em vão.

— Manuele Cardoso! — chamou minha atenção. — Você


tem que parar com isso! Agora! Vai ser um sucesso, e se você
não acredita, eu acredito por você!

— Ai, Lu... — reclamei, sem saber mais como me


posicionar. — Não vou mais!

— Ah, mas vai sim! — insistiu. — Eu não me matei para


achar esse macacão divo preto para grávida, e a senhora me
negar isso!

Revirei os olhos e ela bufou.

— Anda, se veste logo!

— Eu tô com medo! — confessei.

— Jura? — ironizou. — Nem pecebi!


— Você está com um humor ácido hoje.

Soltei a toalha e coloquei a lingerie, enquanto Luíza


parecia decidir algo sobre minha maquiagem, já que jogou todos
os produtos que eu tinha, junto com uma maleta dela sobre a

cama.

— Ah, perfeito! — exclamou animada, ao pegar um batom


de cor vermelha. — Vai ficar lindo em você.

— Se você diz. — sorri de sua animação.

— Vamos logo, preciso te deixar ainda mais linda e nos


divertimos na primeira noite de sucesso do seu trabalho!

A animação de Luíza era contagiante, e tive que sorrir,


terminando de colocar o macacão e em seguida, sentando-me a
sua frente, preparada para ser tratada por minha maquiadora de
plantão que adorava testar suas combinações. Nunca tinha
parado para pensar sobre nossa diferença de idade, já que Luíza
já tinha seus trinta e dois anos, mesmo assim, era incrível o
quanto pensávamos parecido.

Ela era a irmã mais velha que a vida me deu, e eu sabia,

que sem ela, nada seria o mesmo.


— Meu Deus! — exclamei incrédula, ao adentrar a


imponente galeria e ver cada desenho meu exposto.

— Isso está incrível. — Luíza falou ao meu lado.

— E só tende a melhorar. — virei-me ao ouvir a voz de


Giulia que sorria abertamente. — Assim que todos os clientes
entrarem e pirarem com cada obra.

— Obrigada! — falei, sentindo a emoção me atingir. — Não


tenho palavras para agradecer.

— Minha querida e doce Manu... — tocou minhas mãos

com carinho, e sorriu. — Você fez tudo isso, a razão disso existir,
é você! Sua arte! Somos apenas o intermédio disso, e claro,
admiradores.

— Mesmo assim, eu.... Estou sem palavras.

— Dê uma circulada por aí... — piscou em minha direção.


— Logo os clientes dessa noite chegarão e aí sim, vai ter que
segurar a emoção.
Luíza estava ao meu lado, tão embasbacada quanto eu.

Aos poucos as pessoas foram chegando e fiquei um pouco


alheia a tudo, sentindo os olhares curiosos sobre mim, e até
mesmo quando algumas pessoas que exalavam classe se
aproximavam. Eu os respondia cordialmente, tentando não chorar
a cada elogio, cada palavra de motivação.

A noite estava perfeita.

— Eu sabia que seu talento estava escondido.

Sorrio ao ouvir a voz de Marcelo e me virei, abraçando-o


em seguida.

— Parabéns, Manu! — falou, deixando um beijo em meu


rosto.

— Obrigada.

Ele sorria, mas notei claramente o semblante perdido em


seus olhos. Não era nem de longe o amigo que eu tanto adorava.
Procurei por Luíza e a encontrei no canto oposto da galeria,
conversando com um casal mais velho, que pareciam
interessados em um quadro.

— Por que só chegou agora? — perguntei como quem não


queria nada, e Marcelo piscou um pouco sem jeito. — Luíza não
me disse que viria.

— Ela me avisou sobre a exposição em cima da hora. —


deu de ombros. — Terminei as coisas no escritório e corri pra cá.

— Entendo. — perdurei minhas palavras.

Analisei-o atentamente e notei uma pequena marca de


batom no colarinho de sua camisa azul bebê, que não deixava
muito a dúvida. A questão era que minha melhor amiga, sua
esposa, passou o dia todo em uma reunião com clientes que
segundo ela eram insuportáveis. Luíza teria me contado caso
tivesse estado com Marcelo, e sua tensão quando chegou em
casa, deixava claro que não o tinha feito.

— Jéssica? — perguntei, pegando-o de surpresa.

— O que tem ela?

— A marca no colarinho da sua camisa. — ele arregalou os


olhos e levou as mãos para o mesmo local que falei. — Isso é
ridículo, Marcelo!

— Manu, não é o que está pensando.

— Esteve com Luíza hoje? — perguntei, e ele desviou o

olhar, dando-me a resposta. — Ótimo! Eu não vou fingir que não


vi isso.
— Manu, nós não temos mais nada.

— O que? — perguntei incrédula, e no mesmo instante


notei o olhar de minha amiga sobre nós. — Como assim?

Eles não estavam recomeçando?

— Eu aceitei Luíza de volta, mas sob minhas condições. —


falou sério, e fiquei incrédula. — Nada é como antes, e ela sabe
bem disso.

— Está me dizendo, que é casado com minha amiga, que


ama você, e exigiu um relacionamento aberto? — ele piscou
algumas vezes, mas assentiu. — Não consigo acreditar que...

— Ei! — Luíza apareceu ao meu lado, e sequer olhou na


direção dele.

Olhei-a acusadoramente e a ela entendeu bem que tinha


descoberto algo.

— Nos dê licença, Marcelo. — pediu, e em meio segundo,


ele já estava longe o suficiente. — Não pense muito sobre isso.

— Lu...

— Não quero você no meio dessa bagunça que eu e


Marcelo nos tornamos. Isso não é algo que me orgulho, e
prometo te contar tudo, mas não por agora... Muito menos hoje.
— Lu...

— Por favor. — pediu e acabei assentindo. — Obrigada,


você é a melhor!

— No momento me sinto a pior amiga do mundo.

— Você não seria nem se tentasse. — brincou, e sorriu


amplamente. — Aliás, se depois de hoje me odiar, saiba que te
amo muito.

— Como assim?

— Nada. — deu de ombros. — Preciso ir no banheiro


rapidinho, mas logo volto, ok?

— Ok!

Ela saiu, e fiquei sozinha novamente, encarando as


pessoas que olhavam para os desenhos, admirando-os. Minha
arte e sonhos expostos, aquilo era realmente incrível.

— Manuele, meu doce. — Giulia apareceu de repente,


junto a uma mulher alta, esguia, e de olhos curiosos, que exalava
segurança. A reconheci de imediato pelos cabelos ruivos
marcantes. — Essa é Laís Novaes, não sei se conhece, mas por
cima, é uma das influenciadoras digitais mais famosas do
momento. Ela disse que adoraria falar sobre você.
— Oh! — exclamei assustada.

Quem não conhecia Laís Novaes? Ela era um marco


daquele ano. Estilo, moda, beleza, bem-estar... Ela falava de tudo,
além de bafos sobre casais famosos, enaltecendo o amor entre
eles.

— Aliás, eu não sabia que era casada com Davi Rivera. —


olhei-a um pouco sem jeito. — Fui um pouco relapsa, já que não
sou muito antenada em redes sociais, mas Laís te viu aqui e me
disse que são um dos casais mais amados ultimamente pelo
público jovem adulto.

— Eu....

— Desculpe pela falta de jeito. — Laís falou, salvando-me.


— Sou Laís, como Giulia disse, e é um prazer.

Cumprimentei-a com toda educação, e comecei a repensar


o que dizer para a mulher que parecia completamente curiosa
sobre minha vida pessoal.

— Eu amo demais o instagram do seu marido. As fotos,


legendas... — ela suspirou e sorri completamente sem jeito. —
Mas o que vi aqui hoje, assim que reconheci você, fiquei

encantada. A sua arte é incrível! Disse no mesmo instante pra


Giulia que precisava falar sobre você. — ela era mesmo animada.
— Podemos apenas conversar um pouco, e se topar, fazer algo
para a internet. Sem pressão alguma.

Se tinha uma coisa que senti naquele momento foi a


bendita pressão. Como dizer não para uma das mulheres que eu
simplesmente adorava todas as dicas? Ela queria falar sobre mim,
minha arte... O problema, é que ela também sabia sobre Davi.
Sobre as benditas fotos que ele ainda tinha na rede social, e
parecia não querer apagar. Além de tudo a voz da galeria que
confiou em mim, parecia animada ao extremo ao ouvir tal
proposta. Como eu recusaria?

— Claro. — respondi por fim, completamente perdida.

Alguns minutos se passaram, e com eles, comecei a me


sentir leve. De repente o foco era mesmo sobre minha arte, e Laís
se mostrou uma pessoa encantadora. Nunca imaginei conhecer
uma pessoa famosa, e fiquei abismada, com o fato de ela ser tão
simples pessoalmente, uma pessoa fácil de se conversar.

— Me desculpe se estiver sendo indiscreta, mas... São


quantos meses?

Sorri, passando a mão por minha barriga.


— Completei quatro. — sorri, ao sentir meu pequeno
chutar. — É um menino.

— Acredite ou não, desse fato eu já sabia. — sorriu


amplamente. — Seu marido postou uma foto linda de um body
branco, falando a respeito de ser pai de menino. Ele é meio
enigmático na legenda, mas deu pra perceber.

— Davi é assim. — soltei sem querer, e ela me encarou


ainda mais curiosa.

— Eu o vi a pouco e me desculpe, mas é impossível não se


encantar com a forma que ele admira cada desenho.

— O que? — minha voz quase não saiu, e ela franziu o


cenho.

— Não sabia que ele viria? — foi a vez dela me encarar em


dúvida.

— Cariño... — senti uma mão enlaçar minha cintura, e


retesei o corpo no mesmo instante. — Surpresa!

Ele sorriu amplamente, depositando um leve beijo em


minha testa. Naquele milésimo de segundo olhei ao redor,
notando os olhares de Laís e Giulia, completamente encantadas,
e no outro, encontrei o de Luíza, que vinha para a perto de nós,
parecendo temerosa.

Bingo!

Foi ela que o colocou ali.

— Oi. — falei sem graça, mas continuei a encenação. —


Acho que já o conhecem, mas... Esse é Davi Rivera.

Eles se cumprimentaram gentilmente, mas em momento


algum a mão de Davi saiu de minha cintura.

— Vocês são ainda mais lindos pessoalmente. — Laís


falou, parecendo encantada. — Desculpe! Fã número 1
detectada.

— Tudo bem. — forcei um sorriso e finalmente voltei meu


olhar para Davi.

Ele parecia bem à vontade com tudo aquilo, enquanto


conversava com as mulheres a nossa frente do jeito macio e
calmo, habitual do mesmo. O que ele estava fazendo?

— Podemos tirar a foto, então? — Laís perguntou, e


encarei Davi, completamente duvidosa.

— Algum problema, cariño? — aquele apelido me matava


por dentro e ele pareceu perceber, deixando um leve beijo em
meu cabelo. — Não precisa fazer isso... — sussurrou em meu
ouvido.

— Tudo bem. — tomei coragem, pois não iria morrer por


conta daquilo. Eu enfrentaria meus sentimentos.

A foto foi tirada, e assim me afastei deles, dando a


desculpa de ir ao banheiro. Assim que me encontrei sozinha,

passei água na nuca, tentando acordar daquele pesadelo, e


querendo saber como pude compactuar com aquilo.

A porta do banheiro se abriu, e não fiz questão de olhar, já


que estava perdida em meus próprios pensamentos. Porém, a
presença de alguém atrás de meu corpo, fez-me encarar o
reflexo, e assim os olhos de Davi encontraram os meus.

— O que está fazendo? — perguntei, completamente


transtornada, e me virei pra ele. — Não devia estar aqui, muito
menos...

— Luíza me chamou. — falou calmamente. — Ela


descobriu que no evento teriam pessoas muito interessadas em
destruir a imagem dos Rivera, e eles usariam você pra isso.

— O que?
— Casais amados vendem notícia. — começou um pouco
relutante. — Casais que estão separados mas fingem algo, são
os que vendem como água.

— Do que está falando?

— Há várias pessoas aqui dentro que estão atrás de um


furo. — franzi o cenho, completamente incrédula. — Se eu não
viesse, eles dariam um jeito de distorcer a imagem e acabar com
a carreira que acabou de começar. Pode não parecer, mas a
imagem do artista é muito importante, principalmente para essa
galeria.

— Isso não faz sentido algum.

— Meu sobrenome tem um peso, Manuele. — passou as


mãos pelo queixo, claramente irritado. —Sinto muito por isso.

— Não podemos fingir para sempre.

— Tem repórteres ali na frente... A galeria ama isso, e


sempre tiram várias fotos de todos os nomes importantes que
estão aqui. — arregalei os olhos. — Você é importante pra eles, e
os repórteres lá fora sabem muito bem que somos casados.

— Como?
— Eles querem fotos nossas, apenas isso. — falou,
parecendo derrotado. — Só vim porque não queria te ver perdida
diante de todos esses abutres.

— Deus do céu! — levei as mãos a cabeça. — Como isso


é possível? Eu não sou ninguém.

— Você acaba de se tornar uma artista, e mesmo que não


queira... — sua fala saiu um pouco fraca. — É minha esposa.

— Eu sei, eu entendi isso. — falei frustrada. — Mas não


consigo aceitar que está realmente acontecendo.

— Podemos fingir apenas hoje e na próxima exposição, sei

que tem outra na semana que vem. — deu de ombros. — Não


precisa me olhar desse jeito.

— Que jeito?

— Como se eu tivesse armado isso. — sua voz foi


cortante. — Sou um imbecil, mas nunca... Nunca mais vou te
forçar a algo sem te contar toda a verdade.

— Apenas vamos sair daqui.

Suas palavras me confundiam, assim como minha cabeça


girava em círculos. Seu sobrenome realmente tinha um peso, pois
as pessoas até descobriram sobre mim... Aquilo era insano. Fingir
que era casada e feliz com o homem que quebrou meu coração, e
que ainda permanecia meu marido no papel. Aquilo não passava
de um grande erro.

Sorrie e acene!

Foi tudo o que fiz até o fim daquela noite.


15

“Now it's like we're scared of getting good

Cause we know the truth is that we could

Yeah we know that we might actually work

And the truth is that we could.”[23]

Dias depois...

— Dá pra falar comigo normalmente? — Luíza insistiu, e


apenas dei de ombros, focando nos traços do desenho. — Qual é,
Manu? Não é como se eu tivesse ao lado de Davi. Eu apenas
queria ajudar vocês.
— Mas e se esse for um joguinho dele? — perguntei com

raiva.

— Não tem como armar tudo aquilo. — sabia que se referia


aos repórteres. — Além disso, ele não fez nada demais.

— Ele estava lá! — resmunguei. — E agora vai estar na


próxima exposição.

— Eu pensei... Droga, me desculpe! — parou a minha


frente. — Não queria piorar as coisas. Juro!

— Ok, eu sei... — passei as mãos pelo rosto. — Desculpe


estar sendo uma vaca, você apenas tentou me ajudar.

— Está ansiosa, não é? — assenti, virando minha atenção


para Lu, e abandonado o lápis.

— Tenho medo de que ele não seja meu irmão... —


suspirei. — Sinto uma ligação tão forte com ele e...

— Relaxa! — tocou meus ombros, claramente tentando me


acalmar. — Daqui poucos minutos ele vem aqui, e vão poder
saber.

— Ele vai trazer o resultado. — fechei os olhos, ainda mais


nervosa. — Não sei se aguentaria não olhar.
Luíza gargalhou e fiz o mesmo, sabendo que éramos
curiosas demais.

— Com toda certeza ele vai abrir com você.

— Tenho medo da decepção. — confessei.

— Ele é seu irmão, assim como eu. — sorri diante de suas


palavras. — Sangue não importa.

Ela tinha razão, mesmo assim, conseguiria imaginar a


decepção de Hugo caso não fosse sua irmã. Ele acreditava nas
palavras da mãe, e ainda mais, em nossas características em
comuns. Eu o queria em minha vida, pois família sempre foi tudo
pra mim.

Ouvimos uma buzina e olhei para Luíza, que encarou-me


curiosa. Fomos até a janela, e paralisei ao ver Branca dando um

tchau de dentro do carro, com os olhos cheios de lágrimas. Virei-


me para o barulho de dentro de casa, e em poucos segundos vi
Hugo ali parado, encarando-me completamente emocionado.

— Acho que ele não se aguentou.

A voz de Luíza rodava minha mente, a cada passo que


Hugo dava até mim, com o papel amassado em suas mãos.

— Irmã. — falou emocionado, e me entregou o papel.


Fui direito para a parte que importava, e meus olhos se
encheram de lágrimas. Olhei para cima, de relance pra Luíza, que
nos olhava com carinho. Voltei meu olhar para Hugo, que
permanecia parado, esperando uma reação minha.

— Irmão.

Ele não esperou nem mais um segundo e me abraçou, me


levantando em seus braços com cuidado. Ri em seu pescoço, e
ele beijou meus cabelos, tão feliz quanto eu por sermos parte da
mesma família. Logo que nos afastamos, toquei seu rosto, e ali,
tive a certeza, que mesmo sem saber, papai me deixou uma
pessoa incrível para apoiar. Eu sabia, que agora, meu filho tinha
um novo tio, e eu... um irmão mais velho para me chamar
atenção. Mas principalmente, para conhecer.


— Eu sei que queria estar aqui. — ri do palavrão que Luíza
soltou. — Você está no meio de uma reunião, então volte pra lá
agora! Prometo que te conto tudo quando sair da consulta.

— Ah, que raiva desses... — podia imaginar sua cara


transtornada, e segurei a gargalhada. — Clientes maravilhosos.

— Vai trabalhar, Luíza!

— Te odeio! — resmungou. — Apenas falo com você pelo


meu sobrinho.

— Estou entrando na clínica. — parei a frente da recepção


de meu médico. — Te ligo depois, ok?

— Ok. — soltou um suspiro. — Voltarei para o tortura.

— Tchau, dramática!

Adentrei a clínica, e assim que cheguei a recepção, apenas


confirmei a consulta com a recepcionista. Sentei-me a frente de
algumas pessoas que também aguardavam. Algumas

compenetradas em seus celulares, outras na televisão, e apenas


resolvi observá-las. A inspiração de meus desenhos vinha
daquilo, prestar atenção ao redor.

Muitas de minhas inspirações eram momentos simples.


Uma mãe beijando a testa do filho em um supermercado, que me
fazia passar ao papel de forma enigmática, o olhar de carinho,
perdido a uma névoa de proteção. Arte não era explicada, sempre
acreditei fielmente naquilo. Ali, encarando alguns casais que
sorriam um para o outro, senti como a inspiração romântica de
meus desenhos tinha mudado.

No quarto que transformei em um meu cantinho, um


desenho permanecia intocado, e todos os dias, o encarava,
tentando finalizar, mas era em vão. Os olhos de Davi traduzidos
naqueles traços escuros tal como a realidade, mas que já não me
transmitiam emoção. Apenas lembrava de nossa distância, da
mentira que nos tornamos, de nosso casamento fracassado.

Coloquei os fones de ouvido, sentindo-me perder em


pensamentos, enquanto aguardava meu nome ser chamado. A
playlist já aberta era tão confusa quanto minha alma e coração
naquele instante, e em meio aquela avalanche de sentimentos,
lembrei-me do sorriso de meus pais, e acabei fechando os olhos.
Cliquei na música que minha mãe tanto adorava cantar para meu
pai, e consequentemente, para mim.

Aperte o play e deixei minha cabeça viajar. Com as mãos


em minha barriga, senti o chute de Samuel que parecia tão
conectado quanto eu naquele momento. Decidi ali que começaria
a cantar pra ele a partir daquele dia.

“Something in your eyes makes me want to lose myself

Makes me want to lose myself in your arms

There's something in your voice

Makes my heart beat fast

Hope this feeling lasts the rest of my life

If you knew how lonely my life has been

And how long I've been so alone

If you knew how I wanted someone to come along

And change my life the way you've done

Feels like home to me

Feels like home to me

Feels like I'm all the way back where I come from

Feels like home to me


Feels like home to me

Feels like I'm all the way back where I belong

A window breaks down a long dark street

And a siren wails in the night

But I'm alright cause I have you here with me

And I can almost see through the dark there's light.”[24]

Senti meus braços serem balançados e pisquei algumas


vezes, limpando rapidamente as lágrimas que desciam por meu
rosto. Deus, eu estava uma bagunça! Levantei-me diante do olhar
preocupado de Davi, e segui em direção ao corredor que dava
para os banheiros.

Sem falar nada para ele, que senti em meu encalço, entrei
no banheiro, e tentei dar um jeito de me recompor. Encarando
meu reflexo, sorri de minha cabeça de vento, por ter me
esquecido por completo que estava em uma sala de espera com
outras pessoas, e deixei-me levar pela emoção.

Passei um pouco de água no rosto, e prendi o cabelo num


coque alto. Em poucos segundos já saí, e encontrei Davi parado
no mesmo lugar. Seus olhos pareciam perdidos, e notei que a
barba em seu rosto estava maior, além de olheiras aparentes.
Nem mesmo sua imponência parecia presente. Estávamos todos
acabados?

Dei-lhe um sorriso sem dentes, e vesti novamente a


armadura que preparei para cada ocasião como aquela. Eu o
queria longe, mas não tinha o direito de afastá-lo do filho, e vice-
versa. Portanto, ali estávamos, frente a frente, e prontos para
mais uma consulta.

— Está tudo bem?

Olhei-o intensamente e tentei procurar a pergunta para tal


resposta, mas ela não existia. Se ele soubesse o que se passava
por minha mente... O como ainda me sentia quebrada por toda
aquela situação. Éramos o que restou de seu plano, partes
perdidas de nós mesmos.

Nos olhos dele encontrava o mesmo abismo no qual caí


desde que nos separamos. Não acreditava que sofria por mim,
mas ainda assim, algo nele parecia mudado. Éramos partes de
um quebra-cabeça perdido, e não existia lugar para nos encaixar.
Davi pareceu ouvir algo, e se virou. Encarei-o sem
entender, e feliz por ter sido disperso de sua pergunta.

— Estão te chamando. — assenti, e comecei a andar em


direção a recepção. — Manuele...

Balancei a cabeça sem querer falar naquele instante,

principalmente ali. Cumprimentei o médico que me aguardava, e


logo estávamos em sua sala. Minutos depois, já com a camisola
horrível que sempre vestia, e com a imagem de meu filho no
monitor, ao fundo o som de seu coraçãozinho... Senti-me
abençoada de maneiras extremas.

O médico explicava sobre o peso, tamanho e todo o resto


sobre minha pequena sementinha, que a cada dia estava maior e
mais forte. Sorri, em meio a uma lágrima que desceu. Os
hormônios realmente mexiam com meu estado emocional, e ali
estava, quase fazendo o mesmo que na recepção.

Mas por Samuel, valia cada lágrima. Além de tudo, porque

ele era a melhor parte de mim. A parte que amava, e me fazia


seguir em frente.

— Lágrimas de felicidade, mamãe?


Sorri para o médico, que parecia encantando com minha
situação. Não tinha palavras para explicar, apenas a frase da
música que há poucos minutos tinha me feito desabar, fez todo
sentido.

Eu me sentia em casa.
16

“Ain't nobody hurt you like I hurt you

But ain't nobody love you like I do

Promise that I will not take it personal, baby

If you're moving on with someone new.”[25]

Meses depois...

Ouvia mais uma vez o mesmo som, com um sorriso


escancarado em meu rosto, diante da vista magnífica a minha
frente, onde senti-me no topo. Entretanto, o que me fazia daquela
forma, não era mais o amplo horizonte que as paredes de vidro
do escritório me permitiam enxergar, nem mesmo o novo título à
frente de minha porta.

Era a foto de Manuele, deitada em nossa antiga cama, com


o rosto sereno, as mãos involuntariamente na barriga, com os
olhos fechados em seu sono. No pano de fundo, os batimentos do
coração do nosso filho soavam altos e potentes. Fechei os olhos,
recordando-me da última consulta, de como tinha sido incrível
ouvir seu coração mais uma vez.

Era aquela proximidade que tinha de minha mulher, que


ainda era muito mais do que merecia. Ela me permitia estar por
perto nas consultas de nosso Samuel, e nunca me privou de
poder tocar sua barriga. Senti-lo mexer era algo que fazia meu
coração explodir no peito, um orgulho absurdo. Naquele instante,
em que estava com as mãos na barriga dela, conversando com
meu filho, tudo parecia em seu devido lugar.

Infelizmente, aqueles momentos tinham fim... E lá estava


eu de volta a realidade. Manuele seguia seu caminho para
fazenda, enquanto eu fugia para minha sala de estar, dormindo
esparramado no sofá, sem conseguir ficar muito tempo em nosso
antigo quarto, por todas as lembranças que ele me trazia. Faltava
uma parte de mim... E eu sabia muito bem onde ela estava.
Suspirei frustrado, olhando de relance para o teto, e
girando em seguida com a cadeira. Nada daquilo me era tão
importante, nem mesmo meu sobrenome. Se eu pudesse dizer

tudo a Manuele... Contar a ela que entendia finalmente o que


tinha me feito sedento pela empresa, que foi ela, a única e
exclusiva razão de ter superado todo meu passado. Ela merecia
saber e de alguma forma, torcia para que me desse outra chance.

Completavam dois meses...

Dois meses que passei de homem insano para chegar em


casa e tê-la em meus braços, para aquele que foge do próprio
quarto como o diabo foge da cruz. As coisas em minha vida
tinham se acertado naquele meio tempo, fui atrás de quem era
minha família e aparei cada aresta que faltava, perdoei e fui

perdoado. Mas ainda assim, a melhor parte de mim era dela.


Mesmo que ela não soubesse, ou melhor, não acreditasse.

Ouvi batidas na porta e levantei meu olhar. Logo minha


secretária entrou a passos largos, e olhou-me um pouco sem
jeito. Tinha motivos claros para Valéria estar ali, era muito mais
que uma secretária, tornou-se praticamente meu braço direito
desde que voltei para o Brasil. Entretanto, nunca a vi com aquele
olhar apreensivo em seu rosto.
Ela era competente e focada, além de nunca, em momento
algum ter confundido nossa relação profissional. Num passado,
bem distante, as coisas em minha vida eram passionais, mas
nunca tinha me envolvido com alguém do trabalho, por motivos
óbvios de foco. Algumas pessoas entendiam aquilo, outras não.
Dentre todas, a única que realmente não forçava nada era ela.

— Senhor Rivera. — ela engoliu em seco, olhando-me sem


jeito. — Esses papéis chegaram a alguns minutos e como
sempre, os abri... Eram suas ordens especificas mas... Sinto
muito por tê-lo feito.

— Como assim?

Ela colocou o envelope aberto sobre minha mesa,


completamente sem graça.

— Assim que ler vai entender. — abriu um sorriso,


claramente forçado. — Espero que fique tudo bem.

Sem dizer mais nada, ela saiu, deixando-me


completamente atônito. Olhei para o envelope a minha frente e
perdurei sobre abrir ou não. Minhas ordens para Valéria sempre
foram claras. Abrir qualquer envelope, pasta ou caixa que não
fosse entregue por minha segurança pessoal. Ela apenas cumpriu
ordens ao abrir aquele envelope. Por que toda aquela apreensão?

Assim que peguei a primeira folha em mãos, semicerrei os


olhos, franzi o cenho e senti minha boca secar. A razão de minha
própria secretária estar apreensiva era clara. Ela tinha sido a
pessoa a abrir o pedido de divórcio de minha mulher.

Levei as mãos aos cabelos, sentindo-me completamente


derrotado. Eu tinha dado o espaço que Manuele pedira, e não
conseguia entender os papéis a minha frente. Passei as mãos
pelo rosto, sem querer mais ler. Um documento nunca tinha sido
tão pesado em toda minha vida.

— Porra! — praticamente gritei, agoniado com tudo ao meu


redor.

Não conseguia raciocinar direito, sem saber mais o que


fazer. Olhei para o porta-retratos em minha mesa, e assim que
encontrei novamente a imagem dela, soube que era hora de agir.

Eu dei o espaço que pediu, o tempo... Daria muito mais.


Mas o divórcio não era uma resposta que eu esperava, não
naquele momento. Não antes de ela ouvir cada mísera palavra
que eu precisava dizer. Eu tinha errado, como um verdadeiro
condenado, mas ainda assim, não desistiria.

Deixei os papéis jogados sobre a mesa, e já comecei a


desfazer minha gravata. Saí de dentro da sala sem dizer nada
para Valéria, que apenas me acompanhou com os olhos,
claramente triste com minha situação. Eu era de dar pena... Um
completo perdido. A cada andar que o elevador passava, sentia-
me ainda mais sufocado. Nada ali tinha importância, não mais.

Entrei em meu carro e fui direto para o apartamento,


chegando lá, entrei em nosso quarto e não tive outra opção –
desabei. Olhei ao redor, sentindo-me quebrar a cada segundo,
deixando o choro levar toda a raiva que sentia no peito. A raiva de
não ter lhe contado a verdade em meio a névoa de paixão que
vivíamos... De não ter entendido meu amor antes, quando ainda
havia tempo de consertar.

Sentei-me na cama e tentei controlar meu próprio choro,


tentando me forçar a ser mais do que aquilo. Manuele merecia
mais! Um mais que claramente não era eu.

Ali, naquele quarto, eu tive tudo... Tudo o que reneguei por


anos, e que não acreditava ser real. Minha cabeça estava a mil,
precisava pensar, tentar raciocinar e encontrar um jeito de não
permitir que aquela mulher me deixasse.

Ela me amava!

Ao menos, antes de descobrir a verdade, ela o fez.

Será que não era mais real para ela?

Levantei-me, ainda com toda aquela pressão sobre os


ombros, sentindo a cada passo que dava até o meu escritório, o
coração afundar no peito. Não deveria me afogar no álcool, mas
era a única coisa que consegui pensar naquele momento. Eu era
fraco demais, e tive a certeza no instante em que me joguei contra

o tapete do escritório, com a garrafa de uísque ao meu lado, e um


copo com o líquido em mãos, e logo em seguida, dei um gole
generoso.

Manuele tinha mudado, não teria como não o fazer. Sua


arte aos poucos se tornava reconhecida, e a cada dia, vi-me mais
encantado com seu sucesso. Eu tinha um orgulho imenso por
saber que ela era feliz fazendo o que amava. Para os olhares
alheios, em suas exposições, eu era o marido prestativo e amado,
que sorria para as fotos. A imprensa nos adorava, assim como os
comentários em meu instagram e no dela.
A realidade era dolorosa, e ninguém de fato sabia. Eu
estava há quilômetros dela todos os dias, e a mentira deslavada
era que havia me mudado para a fazenda, e estava por lá depois
de cada expediente. Minha sorte era meus seguranças serem os
melhores em afastar qualquer paparazzo ou engraçadinho. Além
de tudo, sempre ter sido um cara reservado, que nunca gostou de
fotos minhas expostas ou sair em público.

Eu amava era tirar as fotos... Principalmente de Manuele. E


corroborando com nossa farsa exacerbada, acabava postando
fotos antigas de meu celular. Ela podia odiar aquilo, mas em
momento algum tocou no assunto, a não ser quando concordou
em fingir diante das câmeras. Nosso assunto era nosso filho e
ponto final. Palavras dela, que agora faziam todo sentido.

Não era por estar magoada ou por não confiar. Ela não me
queria mais, e apenas esperou o tempo passar e simplesmente
me deixar de vez. Além do que já tinha acontecido, era de fato o
fim.

Praticamente enchi o copo e voltei a beber, sentindo-me


impotente. A dor da rejeição pairando sobre meu ser, sobre meus
sentimentos... Tinha acabado.

Sentia-me um completo desgraçado. E como as palavras


de Manu estavam certas, sentia-me um maldito covarde. Pois eu
era! Na realidade, tinha sido. A questão toda é que no mesmo
segundo que a porta do elevador fechou e sua imagem
desapareceu de meu campo de visão. Ali, finalmente acordei para
a vida.

Ela sempre foi muito mais do que um plano... Ela era


minha.

Joguei o copo de uísque com força na parede e levei as


mãos aos cabelos. Depois daquele momento, eu tentei, perdi a
conta das inúmeras vezes, me aproximar e mostrar a ela que não

era pelo bebê, nem porque a magoei, muito menos pelo meu
sobrenome. Eu a queria pra mim.

Eu a amava... Demorei para entender, para ver que aquilo


era real. Ela foi a única a destruir todas minhas barreiras e me
tinha em suas mãos. Era aterrorizante, mas ao mesmo tempo,
sentia-me um sortudo. Ela era perfeita. Um presente que ganhei
numa noite que tinha tudo para não passar daquilo.
A minha vida tinha sido milimetricamente calculada. Eu não

acreditava em amor, após ver minha própria irmã se afundar


diante de tal sentimento. Não pedi, não esperei, muito menos
escolhi... Mas encontrei amor no segundo em que tive Manuele
em meus braços.

— Coragem, Davi! — falei alto, como se aquilo me


encorajasse.

Saí em direção ao banheiro e mesmo ainda sob o efeito do


álcool, cheguei vivo até o box. Abri a ducha gelada e permiti-me
ficar ali até que tivesse recobrado minha sanidade por completo.
Eu iria até Manuele, confessaria tudo, sem chance de vê-la pedir

mais tempo e espaço. Sem desculpas, sem brigas, sem temer...


Ela seria minha novamente.

Entrei no banco do passageiro, e o segurança me olhou


como sempre impassível. Dei a ordem para até a fazenda, e
assim, ele o fez. Suspirei fundo, encostando-me contra o banco, e
pensando em todas as palavras que ainda precisavam ser ditas,
em tudo que precisava deixar claro, antes de trazê-la de volta
para nossa vida. Porque se resumia naquilo, tínhamos tornado
tudo em “nós”.
Quando finalmente o carro estacionou frente à fazenda,
desci, e fui em busca da mulher que amava. A passos incertos,
cheguei a frente de sua casa, e bati levemente na porta. Esperei
por alguns minutos, mas não obtive resposta. Passei as mãos por
meus cabelos, já me sentindo impaciente.

Estava prestes a explodir tudo o que sentia. Aqueles


meses tinham sido tão torturantes, e completamente agoniantes.
Tudo o que nossa vida se tornou, o que realmente mudou ao
redor. Nada seria o mesmo, não depois de todas as descobertas
que fizemos.

Mas a que mais me importava era: o amor que sentia pela


minha mulher. E que não me permitiria perde-la para sempre.

— Ei. — virei-me ao som da voz de Luíza, que me encarou


um pouco sem jeito. — Ela não está.

Continuei apenas encarando, sem saber o que dizer. Luíza


esteve devastada desde a briga sem fim que teve com Marcelo, e
parecia a ponto de querer deixar de vez seu casamento. Meu
amigo era o único que parecia não notar que uma noite de foda

no passado entre eu e Luíza não tinha significado. Ele estava


perdendo a mulher que amava por aquilo.
— Foi andar em volta do lago, acho que está por lá. —
forçou um sorriso. — Não o fiz antes, mas, quando me defendeu
naquele dia em que Marcelo entrou na casa de Manu... —
suspirou, claramente perdida. — Obrigada por aquele dia, Davi.

— Não precisa agradecer. — lágrimas desceram por seu


rosto. — Ele vai ver que está metendo os pés pelas mãos e...

— Ele tem outra! Ou outras... — falou resignada. — E eu,


estou com os papéis do divórcio prontos.

— Lu...

— Eu o amo, mas acima de tudo, amo a mim e...

— Dona Luíza!

Viramos em direção a voz e lá estava o novo capataz da


fazenda, sorrindo amplamente para ela. Arqueei a sobrancelha e
ali, consegui ver a fundo a merda que meu amigo tinha se metido.

— Preciso ir. — bateu em meu ombro. — Não desista dela,


está na cara de ambos que se amam.

— Acha mesmo? Acha que ela me ama? — perguntei


temeroso.

Luíza balançou a cabeça e sorriu verdadeiramente.

— Vá ver por si mesmo.


Saí dali, e fui em direção ao lago. Meu coração acelerando
aos poucos, deixando-me ainda mais perdido. Precisava chegar
até minha mulher e não deixá-la ir nunca mais. A levaria em meu
colo se preciso, mas ela me ouviria, me daria uma chance de ao
menos ouvir cada pequena parte de toda a história.

Assim que a vi de longe, arqueada em direção ao lago,


meu peito sofreu um solavanco. Então, aquilo era amor... Sentir-

se tão malditamente entregue a alguém, sem ao menos saber


porque e sem se importar.

Sorri, ao mesmo tempo em que ela virou de lado, me


dando a visão da grande barriga de seis meses, que me deixava
absurdamente orgulhoso. Ela era minha... Carregava nosso filho.
Éramos uma família.

Dei um passo, pensei em gritar seu nome para que me


visse. Mas o desenrolar da cena a minha frente, fez com que
paralisasse. O tal Rogério que sequer tinha notado a
presença, sorriu para ela, que retribuiu, e em menos de um

segundo, os lábios dele estavam sobre os dela. Arregalei os


olhos, incrédulo. Sem conseguir pensar, sentindo-me quebrar.

Acelerei os passos, sem sequer pensar em me conter. Não


me importava mais nada, iria de algum jeito quebrar a cara
daquele merdinha, e tirar minha mulher dos seus braços, mesmo
que ela não me pertencesse.

Porém, nada me preparou para vê-la o empurrar com força

e acertar seu rosto em seguida com um soco. Deus! Ela tinha


socado a cara dele.

Parei a poucos passos deles, mesmo assim não consegui


ouvir o que diziam. Entretanto, assim que Manuele balançou a
cabeça em claro sinal de negação, seus olhos encontram os
meus. Ela ficou estática, como se tivesse sido pega de surpresa.
Meu coração bateu freneticamente, pois eu sabia bem o que faria.

— Davi! — meu nome saiu fraco de sua boca, e ela deu


passos para perto de mim, claramente abalada.

Eu estava ali por ela. Permaneci calado, apenas


observando a forma como a mesma andava. Ignorei por completo
o metido a Don Juan, e foquei na mulher linda, que carregava
meu filho no ventre, e além de tudo, ainda era minha esposa.

Suspirei no segundo em que ela parou a minha frente. Era


agora ou... agora. E eu sabia bem o que faria... A faria minha
novamente.
17

“Diga a verdade, ponha o dedo na ferida

Você se apaixonou pelos meus erros

E eu perdi as chaves, mas que cabeça a minha

Agora vai ter que ser para toda a vida.”[26]

— Tem certeza que é a melhor coisa a fazer? — Rogério


perguntou, enquanto caminhávamos perto do lago.

— O meu tempo com Davi passou. — confessei, ainda


abalada com aquela situação.

Finalmente decidi, depois de dois meses, mandar o pedido


de divórcio a Davi. Aquela decisão já tinha sido tomada, mas ao
decorrer do tempo, a coragem que faltava finalmente se fez
presente. Pois a cada dia que se passava, mesmo vendo-o
esporadicamente, a distância entre nós se tornou um abismo.

Queria fingir que não, mas a realidade era que esperei tudo
de Davi desde que saí do apartamento... Mas nunca, no momento
em que olhou em meus olhos e disse que me amava, que no fim,
ele sequer lutaria por nós. Sua atitude deixava claro: o que sentia
não era real. Em minha mente boba de romântica incurável, ele
lutaria de forma tão absurda, que de algum jeito, eu conseguiria
enxergar que dizia a verdade. Ledo engano.

Nada mudou, muito menos o que ele dizia sentir. Tínhamos


nos tornado apenas os pais de Samuel, e mesmo que ao redor
acreditassem em nossa relação, ela não existia. Nem mesmo as

fotos e legendas de Davi me convenciam. Acreditava que ele não


tinha a coragem de encerrar de uma vez o casamento, talvez por
algum motivo desconhecido, ou até mesmo por pena. Nos dois
casos, eu não aceitaria. E ainda, não conseguia mais... Tê-lo ao
meu lado em cada exposição e forçar sorrisos.

Meu amor permanecia, porém, minha mente já não


tolerava aquela situação. Eu o amava, mas precisava me libertar
do que já não existia, e quem sabe, finalmente, esquecê-lo.
Parei a frente do lago, encarando aquele lugar onde tudo
começou, e foi como voltar no tempo, e imaginar estar nos braços
dele, mas que não seria mais meu, muito menos foi. Senti, a cada
dia mais, a certeza de que tinha sido um desvio benéfico na vida
dele, sem qualquer importância.

— Manu. — virei-me de lado, encarando Rogério.

Ele parecia tenso e encarei-o sem entender. Abri a boca


para perguntar o porquê daquela expressão, porém minha voz

não saiu, já que num rompante, ele simplesmente me beijou. O


toque dos seus lábios me fez perceber que estava destruída para
qualquer outro homem naquele momento, e empurrei-o meio
segundo depois.

Seus olhos pareceram perdidos, mas reagi no automático,


fechando o punho e acertando seu rosto. Quando senti a dor se
alastrar por meus dedos e seu rosto vermelho, arregalei os olhos,
completamente arrependida.

— Merda, Rogério! Eu não queria te machucar!

— Está tudo bem. — falou de relance, sem me olhar.

Nunca, em todo o tempo que conhecia, encontrei-me numa


situação tão constrangedora ao seu lado.
— Por que fez isso? — indaguei sem entender. — Você
sabe a bagunça que sou e...

— Você nunca percebeu, não é? — perguntou, claramente


perdido. — Eu sou apaixonado por você.

— Rô, eu... — suspirei fundo. — Não sei o que dizer.

— Não posso dizer que não esperava essa reação.

— Sinto muito.

Seus olhos estavam claramente magoados, e senti-me


uma idiota por não conseguir mandar em meu coração e me
apaixonar por aquele homem. Balancei a cabeça, completamente

perdida, e no segundo seguinte encontrei o olhar que menos


esperava. Davi estava ali, parado, assistindo a todo o desenrolar.

Notei sua feição, e não pensei duas vezes em me


aproximar. Ali, no seu olhar, encontrei o que tanto imaginava –
frieza. Davi nunca tinha me amado, tive a certeza naquele
instante, pois sequer parecia se importar com o que tinha visto.

Uma retrospectiva dos últimos meses passou por minha


mente. Foquei em recomeçar minha vida, construir minha carreira,
e aos poucos, vi as portas se abrirem e meus desenhos serem
admirados. Na correria, diante da felicidade daqueles momentos,
além de ter meu filho como suporte, não encarei a simples
realidade de primeira. Já tinha sido derrotada pelo amor, porém,
ali, a esperança daquele sentimento, pareceu se esvair por
completo.

Davi e eu não fomos feitos para durar. Era para ter sido
uma noite e nada mais, e mesmo assim, meu coração que lutava
para a esquecê-lo, esperava alguma atitude daquele homem. Eu
inconscientemente esperei por um homem que não existia.

— O que faz aqui? — perguntei, já completamente fora de


foco.

Davi permaneceu calado, e apenas acenou com a cabeça,


em direção ao lago. Olhei na direção, e notei que Rogério já não
estava mais lá, e senti-me aliviada. O que menos conseguiria
fazer naquele momento, era encará-lo. Senti-me uma completa
imbecil.

— Por que? — sua voz saiu baixa, parando de costas para


mim, diante do pôr do sol que cobria o lago. — Por que pediu o
divórcio?

— O que?

Eu esperava qualquer pergunta menos aquela.


— Os papéis chegaram hoje. — parecia completamente
perdido. — Eu estava... Estou te esperando desde o momento
que pediu tempo. Pensei que me daria um momento para ao
menos lhe explicar o que aconteceu comigo. — se virou, seu olhar
preso no meu. — Explicar o que sinto, e poder... — sua voz era
baixa e falha. — Quem sabe te reconquistar.

— O que? — eu não sabia nem o que perguntar. — Você


estava me esperando?

— Pelo tempo que precisasse.

Ele parecia tão determinado que fiquei pasma, encarando-


o sem entender.

— Eu não consigo entender. — fui sincera. — Eu...

— Eu não sou um homem bom com palavras, Manuele. —


começou de repente. — Muito menos bom em relacionamentos, já
que nunca cheguei a isso antes, só com você. Sou um imbecil, sei
disso. Mas não posso te perder... — fechou os olhos brevemente.
— Não posso!

— Davi...

Seus olhos se abriram, e a distância entre nós se tornou


curta. Ele tinha muito a dizer, consegui lê-lo perfeitamente. Mas
naquele instante, nem um de nós sabia o que falar. Ele arriscou
um toque em meu rosto, e acabei fechando meus olhos,
assustada com aquela intensidade, e ainda mais, por meu corpo
não recusar o seu.

— Me desculpe por isso.

— O que? — perguntei, e abri meus olhos.

Suas mãos encontraram meu rosto, no gesto que era tão


acostumada, no qual ele me forçava a olhá-lo, a querê-lo. E ali,
ele não precisou sequer pedir. Em todo aquele tempo, sequer
imaginei que estaria de volta em seus braços, mas por um
segundo, permiti-me errar novamente.

Sua boca encontrou a minha, e o toque de nossos lábios,


fez meu corpo ferver. As mãos de Davi desceram para minha
cintura, e um arrepio percorreu toda minha espinha, fazendo-me
arfar. Minha barriga de seis meses não pareceu empecilho algum
para nós, já que consegui sentir cada parte do seu corpo
incendiando por completo o meu.

Naquele beijo me permiti acreditar que ao menos era uma


despedida. Naquele momento deixaria marcado que meu amor
por Davi Rivera foi real, e que mesmo em meio a um mar de
ilusões e decepções, tinha terminado de uma forma bonita.

Seus lábios deixaram os meus, após um momento que


pareceu durar para sempre. Respirei profundamente, e nossos
olhos se encontraram. Ele tinha um sorriso de menino, com
tamanha afeição que me deixou desnorteada.

— Eu pensei que respeitando seu espaço, mostraria o


quanto te amo e que não sou um homem que vai te enganar
novamente. — começou a dizer, e suas mãos pararam em minha
barriga, numa leve carícia.

— Não podemos fingir que nada aconteceu. — falei,


recuperando minha sanidade. — Acabamos por nos tornar uma
mentira.

— Pela primeira vez na vida eu gostei de ter repórteres em


cima de mim, pois isso me permitiu ficar próximo a você... Te
tocar, mesmo que vagamente.

— Isso continua sendo uma mentira.

Já não sabia se acusava a ele, a mim, ou a nós dois.

— Não. — falou firme, e acabei me afastando, confusa


demais com tudo o que acontecia. — Não aceito que diga isso.
— Quer que diga o que, Davi? — perguntei derrotada. —
Você me pediu em casamento porque precisava da presidência.
Me apaixonei por uma versão de você que não existe. Quer ouvir
a verdade? Esperei todo o dia que o homem que amo aparecesse
mais uma vez, e que fosse real. Mas olhe só pra mim! — bati de
leve em meu peito, sentindo-me a beira do precipício. — Bastou
se aproximar e já caí em seus braços! Mesmo sabendo que...

— Você é real, porra! — praticamente gritou, parecendo


transtornado. — Nós fomos e ainda somos reais! Olhe pra mim,
Manuele! — neguei com a cabeça, desviando minha atenção para
o lago. Meu corpo se negando a acreditar em suas palavras. —
Olhe pra mim e diga que não acredita que te amei loucamente e
ainda amo! Que acredita mesmo que fingi ser algo! Que não me
quer de volta!

— Eu não sei o que pensar. — revidei, explodindo. —


Parece que foi ontem que descobri que o homem que amo me
usou da forma mais cruel.

— Parece que foi ontem que encontrei seus olhos pela


primeira vez. Que foi ontem que decidi mandar toda minha razão
a merda e ter uma noite com você! Que foi ontem que em vez de
simplesmente exigir um casamento por conta da gravidez, não agi
em meu modus operandi[27], e te levei para um dos meus lugares
favoritos, em seguida para a casa de praia que há cinco anos não
entrava! Que foi ontem que tentei convencer a mim mesmo de

que não estava mudando, que cada passo que dava, ficando
cada vez mais louco por você, era pela presidência. Mas a quem
eu queria enganar? — riu sem vontade. — Meu medo a cada
segundo em que pensava em te contar a verdade, não era por
aquela merda de ambição, mas sim porque já te amava feito um
louco. Você me fez ver o que tanto perdi em anos sem
fundamento longe de minha família. Você me fez acordar pra vida!
Eu menti? Sim! E não me isento da culpa, mas não posso mais
agir como se fosse esperar para sempre.... — sua voz saiu baixa.
— Eu te quero de volta, Manuele.

— Tudo isso por que pedi o divórcio?

— Tudo isso porque não posso mais ficar um segundo sem


você. — falou rapidamente, olhando-me profundamente. —
Acreditei que estivesse pensando em nós... Mas hoje tive a
confirmação de que apenas levou seu tempo para mandar os
papéis de divórcio. — ele parecia perdido, sua voz em um tom
doloroso.

— Davi...
— Você pode acreditar que não me conhece, mas o faz.
Assim como, olhando pra você, sei que estou certo. — falou com
pesar. — Todos os dias, forcei a mim mesmo a não vir até aqui e
implorar seu perdão. Além de não te ligar com qualquer desculpa

só para ouvir sua voz.

— Não sei o que dizer.

— Diga que ainda me ama. — arregalei os olhos, incrédula


com seu pedido. Ele sorriu, aquecendo meu coração. — Você me
desespera a ponto de não medir minhas palavras. Mas o que vim
fazer aqui é pegar a minha mulher de volta e fazê-la enxergar que
a amo.

— Está agindo de cabeça quente. — dei passos para trás,


assustada com suas palavras.

Depois de dois meses de quietude e chegando a acreditar


que ele estava apenas esperando o divórcio, vê-lo agir de tal
maneira, fez cada parte do meu corpo desconfiar de suas reais
intenções.

— Estou agindo como um homem apaixonado.

— Não faz isso, Davi. — soltei por fim. — Não me engane


de novo.
Abracei a mim mesma, e tentei buscar algum tipo de apoio.
Davi pareceu absorver minhas palavras e entender como aquilo
me afetava. Por mais que tudo que quisesse era me jogar em
seus braços e ser dele novamente, a confiança permanecia
destroçada.

— Eu nunca mais vou mentir pra você. — falou decidido. —


Sei que não vai ser fácil confiar, mas... Me dê uma chance.
Apenas uma chance para provar que em momento algum fingi ser
algo com você. Sou eu, Davi Rivera, seu homem.

Respirei descompassadamente e o encarei sem saber o

que responder. Analisei tudo o que aconteceu até ali, e tentei não
julgar a mim mesma por ainda querê-lo de forma tão
arrebatadora.

— Acho que chegou a hora de ouvir tudo o que quer me


dizer. — resolvi arriscar.

Um vislumbre de sorriso apareceu em sua boca, e andei


devagar em direção a minha casa, sentindo que era seguida.
Assim que abri a porta, Davi entrou e sua presença ali, fez meu
coração bater freneticamente. Quantas vezes o imaginei ali
dentro, confessando o que tanto queria?
A hora tinha chegado e ficar com ele ou não, seria minha
escolha.
18

“And I told you to be patient, and I told you to be fine

And I told you to be balanced, and I told you to be kind

Now all your love is wasted? Then who the hell was I?

Now I'm breaking at the bridges and at the end of all your lines”[28]

Sentei-me no sofá, e tentei de alguma forma ficar


confortável. O ar de repente parecia pesado e não consegui saber
o que seria de mim depois daquela noite. Davi se sentou na
poltrona a minha frente, e colocou os cotovelos nos joelhos,
abaixando a cabeça, sem me encarar.

— Eu nunca precisei fingir ser alguém com você. —


começou a dizer, e permaneci atenta. — Apenas voltei a ser quem
era antes do acidente de Branca. — olhei-o sem entender. — Eu
já te disse por cima, que culpei meus pais e Guilherme por conta
da morte de minha irmã, e parei de acreditar no amor e em família
depois disso. O que realmente aconteceu na época, foi que
Branca se declarou, de forma apaixonada, para Guilherme. Ele
não sentia o mesmo, então a rejeitou. — minha cabeça deu um
giro de 360 graus. O que? — Eu não tinha ideia do que
acontecia... Ninguém me contou, e pelo que sei agora meus pais
descobriram por acaso. — suspirou profundamente. — Mesmo
assim, no dia que... Que achamos que ela morreu, descobri toda
a verdade. Os culpei pela morte dela por terem me escondido que
minha irmã mudou completamente depois de se declarar para
Guilherme... Me senti traído, porque pensei que podia ter mudado
o destino dela, caso soubesse.

— Meu Deus! — exclamei, surpresa e chocada com todas


aquelas informações.

Nunca tinha passado pela minha cabeça tal situação.

— Eu fiquei cego pela dor, e acabei perdendo por completo


minha família. Foi uma escolha, de encontrar um culpado para a
morte dela. — senti meu coração afundar no peito. — Onde quero
chegar dizendo isso é que me joguei de cabeça no trabalho, não
pensava em nada além de contratos e reuniões. Para esquecer o
que aconteceu, praticamente me tornei um robô. Meus pais viram
minha situação de longe, e queriam me impedir de trabalhar
daquela forma... Me demitindo. — arregalei os olhos, e Davi
permaneceu de cabeça baixa. — Fiquei completamente
transtornado, pois foi sob minha supervisão que a empresa saiu
de um prejuízo de anos. Então, os enfrentei de todas as formas,
até cederem. Só que meu pai impôs a condição de que não me
tornaria presidente.

— Isso só o fez querer ainda mais isso, não é? — assentiu,


passando as mãos pelos cabelos.

— Quis provar a eles que era capaz. — ele parecia


completamente distante. —Por mais que a maior parte das ações
fossem deles, recuperei a empresa fechando contratos, assim
como vendendo ações. Assim, eles sabiam que mais cedo ou
mais tarde, conseguiria a presidência, e provaria que nem eles,
muito menos o tal “amor” que eles viviam para pregar como a
melhor coisa, iam me fazer parar. Quis provar que era completo
apenas com meu trabalho.

— Mas seu pai tinha uma carta na manga. — soltei sem


querer, e seus olhos finalmente encontraram os meus.
— Ele nunca pensou que faria uso daquele documento...
Mas quando viu minha situação, acabou impondo. Tentei de todas
as formas recorrer da decisão. — suspirou, claramente frustrado.
— Mas não tinha como, era um documento existente desde a
criação da empresa por meu bisavô, que poderia ser usado por
qualquer Rivera. Os detalhes eram claros e bom... Fiquem sem
qualquer poder de escolha.

— Por que está me contando tudo isso? — perguntei, já


perdida em todo aquele contexto.

— Eu era outra pessoa, Manuele. — falou de forma dura,


como se não gostasse de recordar aquilo. — Não ia para festas
de família, não deveria estar na casa dos Monteiro. As últimas
viradas do ano, passei dentro de algum bar, bebendo até
esquecer meu nome, ou simplesmente, trabalhando.

— Por que veio?

— Porque eu te queria. — confessou de forma tão leve,


que fiquei assustada. — Eu te observava há um tempo, e sempre
dava um jeito de vir a fazenda, porque não sei explicar...

— Era como um imã. — acabei complementando, e o


mesmo assentiu.
— Eu sabia pelo pouco que te vi conversando com Luíza,
que jamais aceitaria ir pra minha cama, caso fosse casado. Por
isso estava tão reticente naquela noite, porque não tinha
planejado estar com você, mas te queria de um jeito que não me
controlei.

— Por isso foi um imbecil no começo. — ele assentiu,


parecendo envergonhado. — Tudo em sua vida tinha sido
planejado desde que se afastou de sua família? — perguntei
incrédula.

— Tudo. E quando te levei para o meu apartamento, e


tivemos aquela noite... Eu não queria que fosse embora tão cedo.
Queria ter ao máximo a liberdade que senti com você, algo que
nunca imaginei.

— Por isso ficou tão desesperado quando pensou que


tinha ido embora. — assentiu sem graça.

— Por isso iria adiar ao máximo o plano do casamento,


pois queria você de novo.

— Mas eu engravidei. — intervi, relembrando cada passo


que nos levou até aquela conversa. — E mais uma vez nada saiu
como planejado.
— Poderia mentir e dizer que não gostei da novidade, mas
ao vê-la ali, me contando que teríamos um filho... Agradeci aos
céus por ter te colocado no meu caminho. — fiquei ainda mais
perdida. — Hoje sei que já te amava naquela época, sem sequer
perceber. Foi ali, que voltei a ser o Davi de antes. Eu te ofereci
aquela semana, jurando a mim mesmo que era pra convencê-la...
Só que eu sabia que existiam outras formas de obrigá-la ao
casamento. Mas quis te conquistar, algo em mim gritava para te
fazer realmente minha. E o fiz... Todos os dias em que estivemos
juntos, e a cada segundo em que fiquei ao seu lado.

— Por que não me contou a verdade? — perguntei, mesmo


já tendo tido tal resposta.

— Você me deixaria, e... Não queria te perder. Eu sabia,


inconscientemente, que não teria volta.

— E ia mentir até quanto? Se eu não ouvisse a conversa...


Até quando, Davi?

— Eu não tenho resposta pra essa pergunta. — foi


completamente sincero, surpreendendo-me. — Eu ainda não

reconhecia meu amor... Na primeira vez que disse que te amava,


em nossa casa, foi um susto, pois as palavras saíram sem que
precisasse pensar. Quando me deixou pra trás no apartamento,
um flashback de cada dia em minha vida se passou e vi o quanto
errei com as pessoas que mais amava, e estava repetindo o
mesmo com você.

— Por isso foi atrás de mim?

— Porque eu te amo. — saiu da poltrona, e se ajoelhou a


minha frente.

Seu rosto estava próximo ao meu, devido a nossa


diferença de altura, e notei seus olhos marejados.

— Eu te amo muito, enlouquecidamente. — confessou. —


Não teve um dia em que não quis vir até aqui e te forçar a voltar
pra casa.

— Lá não é minha casa. — uma lágrima desceu.

— Dizem que nosso lar é onde estão aqueles que


amamos. — olhou-me profundamente. — Tem razão, pois o
apartamento nunca mais foi o mesmo sem você. Sequer consegui
dormir na nossa cama.

Fechei os olhos, absorvendo suas palavras. Não sabia


como, nem como diria a ele que não lhe daria uma chance. Já
que tudo de mim, queria apenas se jogar em seus braços e
permanecer.
— Sei que não vai voltar para mim de repente. — sua voz
soou baixa, e senti seus dedos tocarem de leve meu rosto. —
Apenas peço para que não me deixe... que eu possa te provar
meu amor.

Abri os olhos diante de suas palavras, e ali notei o


vislumbre da verdade de tudo o que dizia. Eu queria confiar,
queria acreditar... Mas não consegui. Porém, mesmo que
custasse os pedaços que colei de meu coração, não existia outra
alternativa, a não ser arriscar. O que eu poderia perder lhe dando
uma chance?

Porém, a pergunta correta passou por minha mente, e


tomei coragem de fazê-la.

— O que ganha se lhe der uma chance?

Davi me encarou surpreso, mas não demorou cinco


segundos para me dar a resposta.

— Espero que você. — sorriu de lado, claramente sem


jeito. Ele realmente se perdia em suas próprias palavras. —
Nossa família de volta.

Fiquei em silêncio, e ele se afastou, fazendo-me sentir falta


de seu toque. Porém, notei novamente que ele ainda usava sua
aliança, que parecia nunca ter tirado. No meu caso, ao contrário,
uma das coisas que mais questionavam entre nós,
principalmente, em comentários, era sobre a falta da aliança em
meu dedo anelar esquerdo. Nunca fiz questão de explicar, pois
aquilo implicaria na verdade.

Os pequenos detalhes faziam com que meu coração


batesse freneticamente, como se ao mesmo tempo que alertava
para ter cuidado, para fugir dos “se” que a vida poderia me cobrar.
Eu queria conhecer Davi Rivera, mais uma vez... Daquela vez, de
sem mentira alguma por trás.

— Não sei por onde começar. — confessei, e seus olhos


me analisaram.

— Antes de me dizer o que decidiu eu...

— Não precisa dizer nada. — tomei coragem e coloquei um


dedo sobre seus lábios, calando-o. — Quero dizer que não sei por
onde começar, para conhecer o pai do meu filho que ainda é meu
marido.

Seus olhos se arregalaram, e ele pareceu não acreditar.

— Manuele... — naquele instante, senti falta da forma


carinhosa com que me chamava. — Não vai se arrepender, eu...
— É Davi Rivera, eu sei. — cortei-o rapidamente, tentando
encarnar aquela personagem. — Sempre o vi pela casa de minha
melhor amiga.

Davi pareceu ponderar minhas palavras, e um sorriso


presunçoso cresceu em seus lábios. Senti-me novamente dentro
de um filme, e nunca imaginei que Davi o protagonizaria comigo.

— Me lembro de você... — fez uma careta, fingindo


confusão.

— Manuele... Manuele Cardoso.

— É um prazer. — sorri, no instante em que seus lábios


tocaram meu rosto.

— Digo o mesmo, senhor Rivera. — brinquei, e ele franziu


o cenho. — Prefere Davi?

Pareceu pensar um pouco, e sorriu levemente de lado.

— Prefiro ser chamado de outra forma. — deu de ombros.

— Como?

— De seu.

Ele era perigoso para meu coração, e sabia daquilo.


Suspirei fundo, e olhei no fundo dos seus olhos. Sem mentiras,
sem passado, sem mistérios... Era a nossa chance de recomeçar.
19

“I know, I know you know you're scared

Your heart, your mind, your soul, your body, yeah

They won't, they won't, they won't be careful

But I guess that you don't know me.”[29]

Semanas depois...

— Se eu soubesse que Davi mandaria um buquê diferente


todo dia quando lhe desse uma chance, eu nunca teria torcido por
vocês! — Luíza falou, fingindo estar furiosa, e espirrou em
seguida. — E ainda são rosas brancas! Que cor mais sem graça.
— fez uma careta, fazendo-me rir.
— São lindas! — defendi, e cheirei o buquê mais uma vez.
— E estão com o perfume dele. — menti, apenas para provocá-la.

— Diabetes! — fez uma careta ainda pior. — Não sei ainda


porque não estão numa cama e... Aliás, por que não foram pra
cama ainda? — direta como sempre, e balancei a cabeça,
acompanhando seu raciocínio.

Estávamos em pé perto da cozinha, depois de mais uma


manhã recebendo um entregador que trazia um buquê, dessa
vez, de rosas brancas. Perdi a conta das variedades de flores que

passaram por aquela casa, já que Davi descobriu por acaso que
adoro flores, e resolveu me entupir delas. Não reclamaria, nunca.
Era a coisa mais clichê e até mesmo cafona, mas em nosso caso,
era tudo o que eu precisava.

— Você não presta! — falei em meio a um sorriso. — Não


estamos porque...

Por que mesmo?

Tudo bem, iria completar um mês que lhe dei uma chance.
Saíamos para jantar, a praia, cinema... e todos os programas
possíveis de casais, uns três dias por semana. Era engraçado e
ao mesmo tempo surpreendente a forma como estava
conhecendo Davi mais a fundo.

Confirmei coisas sobre ele que apenas desconfiava, e


descobri outras, que nunca passaram por minha cabeça, Seu
gosto pela fotografia ficou claro, depois que confessou que
quando mais novo, tinha sido um sonho, mas que acabou se
transformando em um hobby. Porém, descobri seu fanatismo
absoluto por histórias em quadrinhos, algo que sequer imaginei.
Ele mesmo tinha uma coleção, que ficava guardada na antiga
casa dos Rivera, e que prometeu um dia me mostrar. Não que
estivesse ansiosa para aquilo, porém, por ele, até mesmo daria
uma chance.

Porém, o máximo que chegamos foram em beijos. Davi


parecia ter medo de errar comigo, e a todo instante, notei como
me olhava com cuidado e atenção. Ele estava me fazendo sentir
as velhas “borboletas no estômago”, e nunca imaginei que o
homem pelo qual me apaixonei, realmente existia. Nunca foi um
personagem de Davi, apenas sua real forma, mesmo que sobre
suas intenções.

— E agora começou a suspirar. — a voz de Luíza me


despertou dos pensamentos. — Quando vai atacar seu homem,
mulher?

— Eu... — senti meu rosto queimar. — Como uma mulher


com a barriga do meu tamanho pode ficar sexy? — perguntei,
tentando disfarçar minha vergonha.

— Como que pode não estar sexy? — revirou os olhos. —


Olha o tamanho dos seus peitos, Manu! Olha para essa bunda! —
gargalhei alto. — Davi só pode ser um frouxo se ficar focando na
barriga, que além de tudo, carrega um filho dele!

— Não sei se consigo fazer isso.

— Como assim? Seduzi-lo? — assenti. — É porque não vê


a cara de safado que ele faz toda vez que vira de costas.

— O que? — perguntei chocada.

— Ele está se controlando. — olhei-a sem acreditar. — E


não sei como você, grávida desse jeito, com os hormônios a flor
da pele não o atacou.

— Eu me seguro. — confessei, colocando as rosas dentro


de um vaso com água. — E fico com medo de estar dando um

passo maior que a perna.

— Manu... Você e Davi ficaram distantes por dois meses,


as exposições e consultas não contam! — olhei-a interessada. —
Teve que pedir o divórcio, achando que ele não te amava, para
que aquela anta acordasse pra vida e visse que respeitar o seu
pedido, não te traria de volta. Agora que estão dando essa
chance... Você grávida de um filho dele, apaixonada, e ainda por
cima, casada... Está com medo de transar?

Tive que rir de sua expressão, pois ela tinha toda razão.
Enterramos o passado no lugar dele quando decidi lhe dar aquela
chance. Claro, era difícil confiar, mas em vários momentos, me vi
completamente entregue a ele novamente. A cada dia, Davi
reconquistava uma parte minha.

— Eu ainda tenho aquela viagem para Salvador amanhã.


— passei as mãos pelos cabelos, mordendo o lábio. — Vão ser só
cinco dias, mas...

— Deveria ao menos se despedir com classe do seu


marido. — provocou, e senti meu rosto queimar novamente.

— Vou sentir falta dele nesses dias. — confessei, sentindo-


me uma adolescente.

— Eu estou é louca pra te ver se casando com ele de novo.


— arregalei os olhos, assustada com suas palavras. — Não me
olha assim não! Acha mesmo que ele não vai fazer o pedido?
— Ele vai?

Luíza deu de ombros.

— Eu acho que não vai demorar. — olhei-a desconfiada. —


Nem me olha assim! Eu tive a ver com ele ir a galeria, e até
mesmo fiz torcida... Mas juro que não sei de nada sobre
casamento.

— Se soubesse me contaria, não é?

— Nem sob tortura. — falou, em meio a um sorriso. — Mas


hoje, juro que não sei.

— Ok. — falei por fim, lembrando-me do que queria fazer.


— Hoje não vamos nos ver... — comecei a pensar. — Acha que
aparecer no apartamento dele seria uma má ideia?

— Manuele... — tocou em meus ombros, sorrindo


amplamente. — Foi a melhor ideia que teve em meses.

Davi
— Pode mesmo fazer isso, hermano? — Guilherme
assentiu, mas notei que estava um pouco incerto. — Se não
puder, eu...

— Nem pensar! — cortou-me rapidamente. — Ficar nessa


cadeira por alguns dias não vai me matar, fique tranquilo.

— Obrigado mesmo.

— Apenas faça minha cunhada feliz e não me deve nada.

— deu de ombros, mexendo em algo na estante de livros do


escritório. — Aliás, quando fará o pedido?

— Quando sentir que ela não vai fugir. — fui sincero. —


Por mais que seja tudo tão intenso entre a gente, ainda tenho
medo estar pressionando.

— Ela te ama.

— Mas amor nem sempre é o bastante. — fechei os olhos,


cansado de mais um dia de trabalho. — Acho que preciso tomar
um banho e dormir um pouco.

— Essas reuniões são mesmo um porre. — ri de sua


careta. — Mas vou sobreviver.

— Espero que sim.

Ele olhou algo em seu celular e franziu o cenho.


— O que foi?

— Uma mensagem de número desconhecido... Algo sobre


estar a disposição. — me entregou o aparelho, e reconheci o
número, e até a forma profissional de escrever.

— É Valéria! — falei despreocupado. — Passei seu


telefone pessoal para ela, é minha secretária.

— Ah. — passou as mãos na nuca, parecendo intrigado.

— Vamos? — levantei-me, pegando o celular sobre a


mesa, e olhando rapidamente para ver se não esqueci nada. —
Quer carona?

— Aceito. — murmurou, seguindo-me para fora da sala na


empresa.

Entramos no elevador, e Guilherme estava focado em


alguma conversa no celular. Olhei rapidamente minha caixa de
mensagens e abri um sorriso, ao ver um simples “Boa noite” de
Manuele. Nos vimos ontem, e eu já estava feito um pateta, louco
de saudade. Tudo o que queria, era tê-la de volta em nossa casa,
porém, ainda era cedo demais para pensar naquilo.
Cheguei em meu apartamento e fui direto para o banheiro,
abrindo a ducha quente, e deixando meu corpo relaxar após
aquele dia cansativo. Os minutos se passaram, e acabei sorrindo
por lembrar de como minha vida finalmente tinha entrado nos
eixos. Poder recomeçar com Manuele era como ter uma nova
chance na vida, e felizmente, poder reconquistar minha família.

Após um longo banho, sequei-me rapidamente, e senti


meus ombros pesarem. Precisava urgentemente descansar, pois
aqueles dias tinham sido difíceis e muito corridos. Saí do
banheiro, passando uma toalha no cabelo, e em seguida,
coloquei-a e minha cintura. Alonguei meus braços, andando em
direção a cozinha, pensando em que comer. Um som chamou
minha atenção e franzi o cenho.

Deixei a fome de lado e caminhei até o quarto, ouvindo


uma música de fundo. Será o aplicativo de música começou a
tocar sozinho em meu celular de novo? Porém, assim que ouvi
claramente a letra, e meus olhos recaíram na mulher ajoelhada
sobre minha cama, esqueci qualquer indagação.

Manuele estava no centro da cama, vestida em uma


camisola de cor branca, mas que em certos pedaços era
completamente transparente. Seus seios estavam praticamente
pulando para fora do tecido, e senti-me completamente
possessivo a forma como sua barriga se sobressaía... Fiz minha
inspeção até seu rosto, e seus olhos castanhos me hipnotizaram,
tanto porque ela não usava maquiagem. Ela sabia bem que a
achava linda produzida, mas daquela forma, totalmente natural,
deixava-me de joelhos.

O sorriso em seu rosto era fatal, assim como o olhar


determinado. Aproximei-me a passos lentos, tentando acreditar
que não era um sonho.

— Já pode dizer alguma coisa. — pediu com um meio


sorriso, e só então notei a fragilidade em seu olhar.

Subi na cama, ficando de joelhos a sua frente, e não resisti,


passei as mãos pelos cabelos um pouco mais curtos, mas que
eram uma bagunça selvagem a minha frente. Puxei-a com
delicadeza pela nuca, e deixei nossos lábios próximos um do
outro.

— Prefiro fazer, cariño.

Assisti seu olhar inflamar, e por dentro, senti-me um puto


sortudo. Pois ela não rejeitou o apelido, muito menos a mim... Eu
estava tomando minha mulher de volta.
20

“It's electric how symmetric

We both get when you lay beside me

It's phonetic how our mouths grip

Almost too tight to the words we're sayin'

We're in deep now, should we slow down?

Should we slow down now?.”[30]

Quando pensei que sentiria seus lábios nos meus, Davi


simplesmente mudou de direção e mordiscou de leve meu
pescoço, fazendo-me arfar. Senti então um de seus braços em
minhas costas, e em seguida, meu corpo sendo levantado, e
depositado por completo sobre a cama.
Ele parou um momento e simplesmente me encarou,
fazendo todo meu corpo ambicionar ainda mais o seu. Quando
entrei em seu apartamento e armei tudo aquilo, não imaginei que
daria tão certo. Mas ali estava ele, com apenas uma toalha ao
redor da cintura, olhando-me de forma feroz, com o corpo mais
tentador do universo, deixando-me a beira da insanidade.

— Ansiosa? — sua voz era rouca e tentei me controlar.

Ao menos da sua mulher grávida ele teria pena, não é?

Seu corpo pairou sobre o meu, e seus lábios retomaram o


caminho de meu pescoço. Aos poucos o senti descendo por meu
corpo, e em poucos segundos estava sobre meu colo.

— Davi... — reclamei, puxando seus cabelos.

— O que, carinõ? — perguntou baixo, num tom desafiador.

— Está me matando aqui.

— De prazer? — antes que pudesse responder, apenas


senti seus lábios sobre os meus, devorando-me.

Suas mãos subiram para meus seios, fazendo-me arfar e


perder total controle. Eu estava mais do que pronta para tê-lo,
quase implorando para que as preliminares fossem mandadas a
merda. Precisava apenas de seu corpo no meu, nada mais.
— Por favor. — pedi, assim que ele se afastou, e notei
seus braços tensos, assim como seu maxilar. — Me faz sua.

— Eu quero seu corpo inteiro, cariño. — desceu as mãos


para minha bunda, fazendo-me tremer ao seu toque. — Quero te
provar de todas as formas.

— Depois. — pedi, passando a mão por sua cintura e


tirando a toalha. Suspirei ao vê-lo completamente nu, e esqueci
qualquer razão para não tê-lo dentro de mim naquele instante. —
Te quero agora.

Antes que ele pudesse pensar em negar, ou acabasse por


me distrair com sua boca. Desci as mãos para a camisola e a
puxei rapidamente, ficando nua debaixo de seu corpo. Senti a
respiração de Davi se alterar, e uma de suas mãos se infiltrou
sobre meus cabelos, puxando-os com força.

— Não vou parar. — engoli em seco, sabendo que ele


cumpriria aquilo. — Nunca mais vou te deixar ir.

— Essa é a intenção. — mordi com vontade seu pescoço.

Em meio segundo, Davi nos virou na cama, e estávamos


de lado. Seu peitoral bateu contra minhas costas, e senti o quanto
ele estava pronto, mas a sua paciência não tinha acabado. Ele

queria me enlouquecer.

— Olhe pra mim. — seu tom era autoritário, e senti uma


mão em meu cabelo, e a outra sobre minha perna.

Encarei-o perdida no prazer do seu simples toque e


queimando por mais.

— Quero que olhe nos meus olhos enquanto te faço minha.


— arfei, sem encontrar as palavras certas para expressar a
ansiedade que tomou posse de meu corpo.

No momento exato em que nossos olhos pareciam ler a


alma um do outro, senti-o me invadir lentamente, possuindo cada
parte.

— Eu te amo, cariño. — lágrimas se formaram em meus


olhos, de puro prazer, pura emoção. — Vou te amar pra sempre.

— Eu... — segurei contra seu pescoço, sentindo-me em


meio ao nirvana.

— Não diz nada. — mordeu de leve minhas costas. —


Apenas sinta... Sinta que é minha.

Não consegui, nada além de gemidos saíram de minha


boca. Davi parecia tão descontrolado quanto eu, pois a cada
movimento, estava mais próxima da borda... Mais próxima de me
sentir completamente sua. Sem volta daquela vez.

Ele repetiu por diversas vezes que me amava, forçando-me


a manter os olhos abertos, a senti-lo por completo. Nunca o sexo
foi daquela maneira, tão cru e real, ao mesmo tempo, tão
apaixonado. A beira do precipício, senti meu coração se entregar
novamente, assim como meu corpo.

— Eu te amo. — confessei, em meio as lágrimas do prazer.

Davi afundou a cabeça em meu pescoço, respirando


descompassadamente, encontrando seu próprio prazer. Ele tocou
meu rosto, puxando-me para um beijo, onde nossas almas se
entregaram. Assim que se afastou, senti seu sorriso contra minha
pele. Soube ali, que nunca mais, conseguiria viver sem aquele
homem.

Tinha feito a escolha certa.


Estava deitada sobre seu peito, enquanto uma de suas
mãos acariciava minha barriga e Samuel parecia fazer festa.

— Alguém está feliz aqui. — brinquei, e Davi sorriu

abertamente, dando-me um leve beijo.

— Não mais do que eu. — parou a mão sobre minha


barriga, e a subiu para meu rosto, tocando-o de leve. — Não
consigo acreditar que é real. Que te tenho aqui!

— Eu escolhi ficar com você. — suspirei apaixonada.

— Eu te amo, cariño. — beijei seu peito, e abracei-o com


vontade, sentindo cada parte do corpo que me fazia delirar.

— Eu também te amo. — confessei, levantando meu olhar,


analisando-o da forma que tanto gostava, completamente
relaxado.

Fechei meus olhos por alguns segundos, e me concentrei


em ouvir sua respiração, baixa e leve. Sentir seu peito subindo e
descendo com calma. Ali, estava perdida num mar de emoções.
Coloquei a mão em minha barriga, e sorri abertamente, por
entender que finalmente estava completa.

— Casa comigo?
Pisquei algumas vezes, pensando estar sonhando. Mas a
voz de Davi soou mais uma vez, alta e clara.

— Casa comigo, cariño?

Abri os olhos e encarei os seus. Davi ostentava um olhar


sério, mas ao mesmo tempo, tinha um sorriso no rosto.

— Já somos casados. — constatei o óbvio.

— Quero que case comigo porque me ama, assim como eu


te amo.

De repente ele se afastou do meu corpo, e me sentei na


cama, enrolada no lençol. Olhei de relance para Davi que ficou de
pé ao lado da cama, e de repente se pôs de joelhos. Arregalei os
olhos, levando as mãos a boca, sem conseguir acreditar.

— Eu nunca imaginei que amaria alguém dessa forma. —


suspirou fundo, passando as mãos pelos cabelos revoltos. — Mas
eu te quero, para sempre. Eu, você, nosso Samuel, e quantas
sementinhas vierem.

Segurei a emoção, olhando-o com todo meu amor. Nunca


esperei que conseguiria estar de volta em seus braços e acreditar.
Mas naquele momento, vendo-o entregue, de joelhos, vestindo
apenas uma cueca branca, enquanto seus olhos me encaravam
esperançosos, eu tive a certeza – o amaria para sempre.

Sem dizer nada, apenas me sentei a sua frente, e desci

meu rosto para o seu, dando-lhe um beijo, e tocando seu rosto


em seguida.

— Sim, meu amor. — sorri, em meio as lágrimas que


nublaram minha visão. — Eu aceito me casar com você.

— Ai! — gemi da dor em meu dedo mindinho, por ter batido


direto na quina de algum móvel.

Em meio a escuridão da madrugada, tentava chegar a


cozinha sem ter que acender as luzes. Era muito mais que
desastrada e com certeza, deveria tê-las acendido.

Voltei meu olhar para onde bati e franzi o cenho,


estranhando uma mala tão grande no meio do corredor. Estive tão
nervosa quando cheguei no apartamento de Davi para surpresa,
que sequer tinha notado.

Fui até a cozinha, e sorria feito uma boba enquanto tomava


um pouco de água. Samuel estava se mexendo há um tempo,
como se quisesse chamar minha atenção.

— Filho. — falei com calma, tocando minha barriga. — A


mamãe mal vê a hora de te ter nos braços.

— Eu sinto o mesmo.

Dei um pulo de susto, e logo senti a gargalhada de Davi em


meu pescoço. Um beijo foi depositado ali, e sequer consegui ficar
brava com ele.

— Fui abandonado na cama. — sussurrou e me virou pra


si. — Está com fome? — perguntou, parecendo preocupado.

— Não. — sorri levemente, dando-lhe um selinho. —


Apenas vim tomar água.

Deixei o copo vazio sobre a pia, e me virei novamente para


ele.

— Agora me diz. — enlacei seu pescoço. — Por que tem


uma mala grande no meio do corredor?

Davi pareceu pensar um pouco e logo sorriu enigmático.


— Ei, estou ficando curiosa. — acusei, e ele passou as
mãos de leve pelas laterais de meu corpo. — Não pode fazer isso
com uma grávida.

— Golpe baixo. — brincou, e sorri levemente. — Bom,


talvez eu tenha planejado uma viagem para o Nordeste junto da
minha atual e futura esposa linda, que está esperando nosso
primeiro filho.

— O que? — minha voz saiu quase num grito.

Davi gargalhou e beijou minha testa.

— Era pra ser uma surpresa, cariño. Ia te encontrar no


aeroporto, mas precisamente, dentro do avião. Já que sou o cara
que sentará ao seu lado. — arregalei os olhos, completamente
surpresa.

— Mas e seu trabalho? — indaguei curiosa.

— Guilherme cuidará bem dele. — deu de ombros. — Além


disso, não ficarei muito tempo na empresa.

— O que? Como assim?

— O tempo que me dediquei aquilo já passou. — parecia


completamente despreocupado. — Quero poder passar mais
tempo com você... Com nuestro hijo. — sorriu amoroso e aquelas
palavras em espanhol aqueceram meu coração. — Em alguns
meses, deixo de ser o presidente da empresa.

— Mas era seu sonho, Davi! Não pode simplesmente...

— Era minha ambição. — cortou-me rapidamente. — Não


me sinto mais a vontade lá, muito menos feliz... E bom, talvez,
alguém tenha uma boa proposta de emprego pra mim.

— Quem? No que? — perguntei curiosa.

— Bom, a minha atual e futura esposa tem uma carreira


para administrar, que tenho certeza, se tornará internacional... —
deixou as palavras morrerem e me encarou animado.

— Por um acaso está se oferecendo para ser meu


empresário ou seja lá como se chama?

— Bom... sim. — falou um pouco sem graça.

— São planos para o futuro, senhor Rivera. — toquei seu


rosto, sentindo que aquele momento me marcaria para sempre. —
Muito pode acontecer até lá.

— Então vamos focar no hoje. — colocou uma mecha de


cabelo atrás da minha orelha. — E viver cada dia como se fosse

eterno.

— Não seria como se fosse o último? — indaguei.


— Não, cariño. — sorriu, puxando-me pra mais perto. —
Com você, eu quero tudo, sem prazo para acabar.

— De onde surgiu esse homem romântico? — brinquei. —


Estou procurando minha pedra de gelo favorita, mas não estou
encontrando.

— Talvez porque na sua frente, está o homem certo dessa


vez. O homem que te ama perdidamente, e precisa nesse instante
te beijar.

Sorri, e seus lábios logo encontraram os meus. Naquele


momento, eu só tinha uma certeza, de que estava nos braços do
homem que amava perdidamente.

De todos os momentos que imaginei ter, e


consequentemente viver, nada se comparava aquele sentimento.
Nem mesmo a primeira vez em que estivemos juntos me marcara
tanto. Porque ali, estávamos livres de qualquer dúvida ou
questionamento... Duas almas e corações completamente

entregues, sem medo do amanhã e com toda certeza, na


esperança de um futuro. Um futuro, juntos.
Epílogo

“Mas acabei entendendo que amar é mais do que resmungar três palavrinhas
antes de dormir. O amor é sustentado por ações, pela constante dedicação às

coisas que um faz pelo outro diariamente.”[31]

As ondas encontravam a areia da praia, enquanto a brisa


tocava de leve o rosto de Manuele, tendo-a completamente inerte
a todas aquelas sensações. Suspirou fundo, segurando
firmemente no braço de seu irmão, que sorriu de forma carinhosa
para ela. Hugo lhe dava o suporte que ela sequer teria, caso não
estivesse firmemente presa a ele.

— Pronta?

Tal pergunta nunca foi tão difícil de responder. Ela estava


ali, há poucos metros de se entregar mais uma vez ao homem
que amava, mas nunca teria tal resposta. Nunca poderia dizer
que estava 100% pronta para o momento em que a união deles
fosse selada... Como poderia? Era o seu casamento, o dia em
que nada além do amor estava em jogo. O amor permanecia
como o sentimento que a deixava mais confusa, e ao mesmo
tempo, mais completa.

Em seu coração a única certeza era de que poderia viver


mil vidas, entretanto, nenhuma delas seria o suficiente para
explicar o amor que explodia em seu peito. Então, a pergunta de
seu irmão permaneceria sem resposta, já que só conseguia
pensar em cada passo que a levou, até o momento de colocar os
pés em uma simples rasteirinha, e sentir o calor de Búzios lhe
embalar, no segundo dia mais importante de sua vida.

— Mamá!

Sorriu para o pequeno que estava no colo da tia, e ainda


tinha sua língua um pouco enrolada. Samuel Cardoso Rivera
tinha completado um ano de idade, e nunca se sentiu tão
ciumenta sobre o filho, como naquele instante. Ele estava
crescendo muito rápido, e ela só pensava em formas de fazer
com que o tempo parasse, apenas para poder velar seu sono ou
brincarem a tarde toda. Samuel era o responsável pelo melhor dia
de sua vida, no qual, ele viera ao mundo.

Mais uma vez Manuele teve que segurar as lágrimas e


tentar não estragar toda a maquiagem já pronta. Pegou o filho no
colo, dando-lhe um leve beijo na testa, explodindo pela felicidade
de tê-lo ali, naquele momento. O dia não podia estar mais
perfeito.

Era fim de tarde em Búzios, mas especificamente, na casa


de praia dos Rivera, onde ela e Davi cultivaram memórias
inesquecíveis. Ali, se tornaria um lugar ainda mais importante,
pois seu amor seria reafirmado, a frente de todos aqueles que
amavam. Era a primeira vez de ambos num altar, mesmo que
numa simples decoração a beira da praia.

O mar os abençoaria, assim como a lei dos homens como


renovação de seus votos. As escolhas de ambos os levaram a se
casar muito tempo depois do pedido, ainda assim, sentiam que
era o momento certo.

Enquanto Manuele se posicionava para caminhar até o


homem de sua vida, Davi Rivera tentava ao máximo segurar a
emoção. Ele aprendeu ao decorrer de cada momento vivido ao
lado de sua família, que na realidade, era um homem apaixonado
que se derretia facilmente, e a cada dia, tentava aprender com
seus erros.

Ele estava exposto, por completo. Diante de sua família,


dos amigos íntimos, e da imensidão azul do mar. Suspirou
profundamente tentando se controlar, pois as lágrimas já
ameaçavam cair. No minuto seguinte, a música começou a tocar,
e nada o preparou para o momento que viu a mulher que tanto
amava, vestida de branco, no lugar onde se amaram loucamente,

caminhando em sua direção... Entregando-se a ele mais uma vez.

Aquele momento superou até mesmo quando ela o


surpreendeu, em uma de suas exposições de sucesso, ter como
desenho principal, o qual ela não vendia, que na realidade, eram
traços dos olhos dele. Nunca imaginou que ela o desenhasse,
muito menos uma declaração de amor mais explícita do que
aquela. Manuele o desenhava, guardava, surpreendia... Naquele
instante, se aproximava para lhe pertencer.

Ele não se achava merecedor dela, muito menos de seu


amor. Mal sabia ele que amor não se têm por mérito, mas sim

pela própria escolha e inconsciência do coração. Manuele o


amava, confiava e finalmente, acreditava. O passado ficou em seu
lugar, e a cada dia mais, trilhavam novas memórias.

A cada passo dado para perto dele, estava mais próxima


de completar aquele ciclo de sua vida. Ele era seu marido, amigo,
companheiro, empresário, pai do seu filho, e além de tudo, porto
seguro. Davi Rivera era seu sonho, vestido todo de branco,
despojadamente, em lágrimas, esperando apenas mais alguns
segundos para tê-la de novo.

Era o que ele fazia... A tinha, de todas as formas.

Assim que Hugo a entregou a Davi, ambos permaneciam


numa conexão, que nada ao redor parecia chamar atenção. Os
olhares presos um no outro, o leve toque das mãos que incendiou
seus corpos... O amor entre eles era tão claro, que não tinha uma
pessoa que assistia a cena sem se emocionar.

A história de um amor pode ser complicada, errônea, e até


mesmo, complexa. Entretanto, as melhores histórias de amor são
aquelas que não tem fim, ou ao menos, não o enxergamos
claramente. Deixamos a mente divagar sobre o que aconteceu
depois do “sim”, do “felizes para sempre”... Mas também,
podemos escolher entender o que levou um homem a redenção.

Manuele Cardoso no segundo em que permitiu que Davi


Rivera lhe amasse como se aquela fosse a última noite de suas
vidas, mal sabia que era apenas o começo da redenção daquele
homem. Que nada mais foi do que a libertação de um passado
que o consumiu por completo devido a suas falhas, que apenas o
amor lhe fez enxergar.
Liberdade era a palavra daquele casal. Manuele era livre
para amar profundamente, sem medos ou receios... Davi
finalmente era livre para ser a melhor versão de si mesmo... Duas
pessoas, e uma só vontade: ser feliz. Buscando aquilo não em
meio a afirmações de seu amor, mas em cada pequeno detalhe
do dia a dia.

Ali, frente a frente, entregues mais uma vez...

Mas naquela tarde, Davi Rivera quis mostrar um lado seu


quase perdido, que na realidade, ele aprendeu a ter. Por Manuele,
ele aprendera a traduzir o que sentia em palavras, de forma que
não restassem dúvidas de seu sentimento. Em seus votos,
acabara por tocar a alma de sua mulher.

— A todos os homens é permitido sonhar. Quando te vi


pela primeira vez, eu não sabia que estaria aqui, hoje, dando-lhe
tudo de mim mais uma vez. Quando te toquei, te fiz minha... nada
me preparou para os sentimentos que foram despertos. Quando
te perdi, pelo meu erro... nenhuma palavra de consolo foi
suficiente para aplacar a dor de meu coração. Quando tive minha
segunda chance, nunca imaginei que poderia realmente me
perdoar... mas o fez. Pois é isso que sempre faz comigo, me
surpreende. Você se entrega de maneira tão profunda, que me
enlouquece. Você me tem irrevogável e irreversivelmente. Sem
chance de voltar atrás, sem vontade de correr. Pois eu também
tenho a permissão de sonhar... E de alguma forma, tive cada um
de meus sonhos, que sequer sabia, realizados por você. Pois
você me completa, de forma tão avassaladora que mal consigo
respirar. Não sou um homem bom com palavras, você sabe disso.
Mas, o que quis, forçando-me ao máximo a aprender a colocar
meus sentimentos em viva-voz, é lhe mostrar que sempre.... Em
cada momento, pelo resto de nossas vidas, e pelas tantas outras
que vierem, tentarei ser a melhor versão de mim mesmo. Pois eu
te amo, cariño. Eu sou seu.

Nada mais precisou ser dito, e nenhuma dúvida existia. Os


olhares intensos, corações entregues... Eles se pertenciam. Para
sempre.

FIM
Te quero para sempre

Sinopse:

O quão caro uma omissão pode custar?

Luíza Monteiro após uma desilusão amorosa se tornou um


espírito livre, não pensando em nada além de uma vida ao
extremo, sem arrependimentos, e a última coisa que esperava era
se envolver. Entretanto, seu melhor amigo, Marcelo, surge em
uma de suas noites sem fim, onde tudo o que ela desejava era o
prazer. Porém, naquela noite ela encontrou muito mais nos olhos
azuis profundos do homem que era declarado um romântico – ela
encontrou o amor.

Marcelo Carvalho não esperava depois de três anos


casado com a mulher que amava, que de alguma forma, voltaria a
ser machucado por ela. Luíza tinha enlaçado seu coração desde
o primeiro olhar trocado, mas por um longo período pisoteou e
rechaçou seus sentimentos. Porém, ele não era conhecido por
desistir do que queria, assim, casou-se com a mulher que amava.
Mas o tempo passou, e de repente, ele viu tudo ao seu redor ruir,
e mais, sua confiança quebrada.

A omissão sobre uma noite no passado acaba por destruir


o conto de fadas que estavam construindo. Marcelo se vê dividido
entre a raiva e vingança... Luíza se vê a cada dia mais longe
daquele que jurou amar. Marcelo faz sua escolha, e Luíza as
acata.

Quais serão as consequências?

Disponível aqui: link


Guilherme – a escolha de um homem

Sinopse:

Escolhas podem mudar tudo...

Jéssica Medeiros apenas tinha um objetivo: ser feliz


novamente. Porém, o homem o qual desejara era casado, e pior,
nunca a olharia como sua. Não daquela vez. Assim, ela
enfrentava seus próprios demônios, decorrentes de um
relacionamento abusivo, que lhe deixou marcas para toda a vida.
Era difícil confiar em homens, ainda mais os quais ostentavam
sorrisos fáceis e um carisma gratuito. Guilherme Rivera era tal
personificação. Entretanto, um homem como ele não precisa se
tornar algo mais, apenas seria uma noite... que lhe resultou muito
mais.

Uma mulher que não confia

Um homem confrontado por escolhas

O destino parece interferir em cada momento

Um amor pode surgir em meio as maiores indecisões?

Disponível aqui: link


Contatos da autora

E-mail - Site - Spotify

Wattpad: @AlinePadua

Instagram: @alineapadua

Facebook: Aline Pádua

Grupo do facebook: link


Meus outros livros: aqui.
[1] “Deitado no chão do banheiro

Sem sentir nada

Eu estou sobrecarregado e inseguro

Me dê algo

Que eu poderia tomar para relaxar minha mente lentamente”

In my blood – Shawn Mendes

[2] “Eu deixarei meu coração na porta

Eu não direi uma palavra

Elas já foram todas ditas antes, você sabe

Então porque nós não fingimos

Como se não tivéssemos medo do que virá

Ou medo que nada reste.”

All I ask – Adele

[3] “Você me fez experimentar algo

Que não posso comparar a nada

Que eu já conheci, e tenho esperança

Que depois dessa febre eu sobreviverei.”

The heart wants what it wants – Selena Gomez


[4] “Perdida, mas agora me encontrei

Posso ver, mas uma vez já fui cega

Estava tão confusa, feito uma criancinha

Tentei pegar o que podia, com medo de não conseguir encontrar

Todas as respostas, querido.”

Born to Die – Lana Del Rey

[5] É uma rede social online de compartilhamento de fotos e vídeos entre


seus usuários, que permite aplicar filtros digitais e compartilhá-los em uma
variedade de serviços de redes sociais, como Facebook, Twitter, Tumblr e
Flickr. (Fonte: Instagram Blog)

[6] “A história da minha vida, eu a levo para casa

Dirijo a noite toda para mantê-la quente e o tempo está congelado

A história da minha vida, eu dou esperança a ela

Eu uso o amor dela

Até ela ficar quebrada por dentro.”

Story of my life – One direction

[7] Querida em espanhol.

[8] “E estou me sentindo tão pequeno

Isso estava tomando conta da minha cabeça

Eu não sei nada.”


Say something – A Great Big World feat. Christina Aguilera.

[9] “Eu sei que você está pensando que eu não tenho coração

Eu sei que você está pensando que eu sou frio

Eu estou apenas protegendo minha inocência

Estou apenas protegendo minha alma.”

To good at goodbyes – Sam Smith

[10] Mamãe em espanhol.

[11] Papai em espanhol.

[12] Filho em espanhol.

[13] “Nós mantemos este amor numa fotografia

Nós fizemos estas memórias para nós mesmos

Onde nossos olhos nunca se fecham

Nossos corações nunca estiveram partidos

E o tempo está congelado para sempre.”

Photograph – Ed Sheeran

[14] “Eu me lembro de anos atrás

Alguém me disse que eu deveria ter

Cuidado quando se trata de amor, eu tive

E você foi forte e eu não

Minha ilusão, meu erro


Eu fui descuidado, eu esqueci, eu esqueci.”

Impossible – Shontelle

[15] “Eu te coloquei no topo, eu te coloquei no topo

Eu te assumi tão orgulhosamente e abertamente

E quando os tempos eram difíceis, quando os tempos eram difíceis

Eu me certifiquei de te segurar perto de mim.”

Call out my name – The Weeknd

[16] Irmão em espanhol.

[17] “Não perca quem você é no borrão das estrelas

Ver é enganar, sonhar é acreditar

Tudo bem não estar bem

Às vezes, é difícil seguir seu coração

Lágrimas não significam sua derrota

Todo mundo se machuca. ”

Who you are – Jessie J.

[18] “Meu, meu nome era mais seguro na sua boca

E por que você teve que ir e cuspi-lo?

Oh, sua voz, era o som mais familiar

Mas parece tão perigoso para mim agora.”

I have questions – Camila Cabello

[19] “Não sou um santo, sou mais um pecador


Não quero perder, mas temo pelos vencedores

Quando tento explicar, as palavras fogem

É por isso que estou aqui hoje.”

Pray – Sam Smith

[20] Trecho da canção Vento no litoral do álbum V – Legião Urbana


(1991).

[21] Nossa princesa em espanhol.

[22] “Você me verá em retrospectiva

Enroscada com você a noite toda

Ardendo em chamas

Um dia quando você me deixar

Aposto que essas memórias

Seguirão você em toda parte. ”

Wildest dreams – Taylor Swift

[23] “Agora é como se tivéssemos medo de ficar bem

Porque sabemos a verdade é que poderíamos

Sim, sabemos que podemos realmente dar certo

E a verdade é que nós poderíamos.”

Worst in me – Julia Michaels

[24] Alguma coisa nos seus olhos faz com que eu queira me perder/Faz
com que eu queira me perder em seus braços/Tem alguma coisa na sua
voz/que faz meu coração disparar/Espero que este sentimento dure pelo resto
da minha vida/Se você soubesse como minha vida tem sido solitária/E há
quanto tempo estou tão sozinha/Se você soubesse o quanto eu queria que
alguém viesse/e mudasse minha vida do jeito que você fez/E eu me sinto em
casa, eu me sinto em casa/Parece que eu voltei todo o caminho de onde eu
vim/E eu me sinto em casa, eu me sinto em casa/Parece que estou de volta
para onde pertenço/Uma janela quebra, abaixo de uma rua longa, escura/e
uma sirene toca na noite/Mas estou bem, porque tenho você aqui comigo/E
quase posso ver que há uma luz em meio à escuridão. Feels like home -
Chantal Kreviazuk.

[25] “Ninguém nunca te machucou como eu te machuquei

Mas ninguém te ama como eu amo

Prometo que não vou levar para o lado pessoal, amor

Se você está seguindo em frente com alguém novo.”

Happier – Ed Sheeran

[26] Trecho da canção 3x4 do álbum ¡Tchau Radar!- Engenheiros do


Hawaii (1999).

[27] Tradução do latim: modo de operação.

[28] “Eu te disse para ser paciente, e eu te disse para ficar bem

Eu te disse para ser equilibrado, e eu te disse para ser gentil

Agora todo o seu amor é desperdiçado? Então quem diabos eu fui?

Agora estou quebrando nossa ponte e no final de toda a sua história.”

Skinny love – Birdy


[29] “Eu sei, eu sei que você sabe que está com medo

Seu coração, sua mente, sua alma, seu corpo

Eles não serão, não serão, não serão cuidadosos

Mas acho que você não me conhece.”

Close – Nick Jonas feat. Tove lo

[30] “É elétrico quão simétrico

Nós dois ficamos quando você se deitou ao meu lado

É fenomenal como nossas bocas aderem

Quase muito apertado para as palavras, estamos dizendo

Estamos profundamente agora, devemos ir devagar?

Devemos ir devagar agora?”

Uh Hu – Julia Michaels

[31] Passagem do livro O casamento do escrito norte americano Nicholas


Sparks.

Você também pode gostar