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Copyright © 2022 Marcelle Oliveira

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Capa: Designer Liberty (@libertydesigner_goldoficial)


Recomendado para maiores de 18 anos.
Contém palavras de baixo calão.
Título anteriormente lançado como “UMA NAMORADA PARA O CEO”.
Uma garota responsável, estudiosa... (e atrapalhada).
Um homem sexy, maduro e extremamente indecente.
Chantel não queria romper com seus valores, ela tinha uma carreira a ser
preservada, era responsável demais para se dobrar a qualquer gostoso,
principalmente àquele que a fazia pensar em "coisas" que não eram trabalho e estudos.
Já Thor Baker não tinha nada a perder, milionário e com problemas até o pescoço, ele
só precisava se livrar de uma terrível enrascada. E a menina linda de olhos azuis e
respostas afiadas, poderia ser a sua salvação... ou perdição...

Como eu fui capaz de aceitar namorar aquela encrenca de um metro e


noventa, e corpo perfeitamente escultural?!
Uma das minhas condições seria a de nem ao menos nos beijarmos. A dele, de
eu não me apaixonar. Sem falar que descobrimos que uma baita coincidência poderia nos
unir ainda mais nessa proposta insana!

Será que conseguiram cumprir com o acordo ou sentimentos se misturaram à


encenação à qual se propuseram?
Termino o meu segundo copo de uísque e deposito-o vazio,
sobre a mesa ao lado da poltrona confortável onde estou jogado,
após uma noite daquelas. O meu corpo inteiro está dolorido, sem
falar que a cabeça estala a cada buzinada escandalosa que ressoa
do outro lado da janela. Tomo um pouco de coragem para jogar uma
ducha morna no corpo, e assim que faço menção de me levantar,
sinto mãos femininas me impedirem, segurando com propriedade
nos meus ombros, como se elas detivessem algum poder sobre
mim.
— Não te aflige saber que esta é a sua última noite
solteiro? — a voz doce e ao mesmo tempo áspera sussurra no meu
ouvido.
Definitivamente esta era uma situação a qual eu não
gostava de relembrar.
— É claro que eu estou me sentindo um verdadeiro merda.
A loira então prefere intrometer a língua nas curvas da
minha orelha, no lugar de pegar as suas roupas e dar um fora
daquele quarto de hotel.
Estava em Chicago para uma audiência importantíssima
que envolvia a minha empresa e outros dois grandes empresários
do ramo automobilístico, para dirimir algumas situações acerca de
um contrato que havíamos feito há anos atrás, na época em que o
meu pai ainda estava vivo. Contudo, o que me angustiava no
momento, não eram essas questões, tampouco os milhares de
dólares envolvidos nessa terrível quebra de contrato, mas os
malditos escândalos dos quais eu, sem querer, fui vítima.
Então aproveitei para espairecer das horas exaustivas de
trabalho, de tudo o que me sufocava impiedosamente e arruinava a
minha paz, para me permitir na companhia de uma bela loira, que
havia conhecido, por um acaso, em um pub, no centro da cidade.
Precisava, principalmente, me esquecer da minha condição
insuportável de futuro marido de uma mulher, pela qual eu não
sustentava qualquer tipo de interesse, muito pelo contrário, Stella
era a criatura mais traiçoeira que eu já havia conhecido.
— Você quer mesmo que eu vá embora?! Não terminamos
o que...
Interrompo a loira, virando o seu corpo sobre o sofá,
segurando firmemente nos seus braços. Giro Samantha de uma
maneira que ela se estatela nua sobre a poltrona.
Sorrio torto ao perceber os seus olhos arregalados.
— Ainda não está satisfeita? — sussurro, nos seus lábios,
deslizando tranquilamente o dedo sobre a barriguinha sexy. —
Pensei que todos aqueles orgasmos múltiplos te saciariam pelo
resto dos seus dias.
— Por isso mesmo que eu preciso de mais. — as pernas
da loira envolvem a minha estrutura. E por eu estar pelado e
naquela posição sugestiva, os meus instintos resolvem inflamar
outra vez. — Não sei quando vou cruzar novamente com um
moreno intenso, milionário, detentor de mãos experientes e
avassaladoras capazes de me fazer esquecer inclusive do meu
nome.
— E, pelo jeito, você também já deve ter se esquecido que
amanhã eu fico noivo, sem falar na porra do meu voo que sai daqui
a duas horas!
Definitivamente, eu não queria me livrar da companhia da
loira gostosa, para sair na noite fria até o aeroporto, ou melhor, até a
minha sentença definitiva, em Nova York.
— Casa comigo, bebê, prometo deixar a sua rotina bem
mais interessante. — ela mia, de repente, e eu solto uma forte
gargalhada, a ponto de arranhar a minha garganta.
Seguro o rosto delicado nas mãos, o qual exibia algumas
intervenções cirúrgicas no nariz e queixo.
— Tudo o que eu mais queria era poder tomar decisões,
mas o meu irmão mais velho cismou em cumprir com o pedido que
o meu pai o fez, no leito de sua morte, — suspiro profundamente. —
que eu me casasse com Stella Bronks.
Reviro os olhos, sentindo-me patético por estar vivendo tal
situação, afinal de contas, eu não era mais o garoto que o meu
irmão ajudou a criar, assim que a nossa mãe resolveu ir embora
com o seu amante grego para Mykonus. A mulher nunca mais
procurou saber sobre a nossa existência, deixando nós dois
sozinhos sob os cuidados do velho Baker.
— Stella Bronks, a modelo internacional?
Desfiro beijos pelo pescoço perfumado da loira, enquanto
estava prestes a penetrá-la.
— E filha da última namorada do meu pai...
A moça, então, resolve segurar no meu rosto, fazendo com
que eu cesse contrariado as carícias. Estranhamente, percebo que
ela está envolvida com as minhas tragédias emocionais.
— Sinto muito, bebê.
— Por eu ter que me casar obrigado?
— Não, pela morte do seu pai. — sorrio com perplexidade.
— Eu entendo que você vai sair dessa facilmente. Viver relações
extraconjugais ainda não é crime.
E um sorrisinho safado desponta de sua boca vermelha.
Samantha não é nada boba.
— Se eu pelo menos tivesse uma namorada, tiraria essa
ideia tosca da cabeça do meu irmão. — suspiro, tentando ainda
buscar soluções, quando me dou conta do semblante cheio de
insinuações da loira. — Por que caralhos está me olhando assim?
— Adoro ir ao cinema e também sei cozinhar.
Imediatamente, eu me levanto, deixando Samantha jogada
sobre a poltrona. Sinto o meu corpo arder de desejo, mas, pelo jeito,
já havia passado da hora de ela ir embora.
— Samantha, por favor, não me faça rir.
Ela seria a última pessoa na face da Terra à qual eu
poderia fazer uma proposta desse tipo. A loira pelo jeito não
desgrudaria nunca mais, e ainda por cima iria me usurpar alguns
milhares de dólares. Samantha e os seus seios fartos não me
enganavam.
— Tudo bem, — ela levanta da poltrona, para finalmente
catar as suas roupas. — a gente ainda se encontra por Chicago.
Espero sinceramente que você consiga se livrar desse casamento
de fachada, eu estarei aqui te esperando.
Bufo, entediado.
Verdade mesmo que Samantha estava sustentando algum
tipo de esperança?
— Ah sim, com certeza. — respondo, sarcástico,
observando a loira vestir as suas peças íntimas.
Eu não costumava repetir mulheres. Toda a
responsabilidade de assumir algum compromisso sério soava para
mim apenas como mais uma “dor de cabeça”, no meio das milhares
que eu já tinha na minha rotina. A minha empresa e a cilada na qual
fui vítima nos últimos meses só serviram para anular o meu sono e,
a essas alturas, eu só queria tornar as coisas mais leves para mim.
Depois de ajudar Samantha a subir o zíper do seu vestido
preto, ela encaixa os pés nos scarpins da mesma cor e sai
rebolando em direção à porta.
Passo as mãos pelos cabelos, aflito, por entender que
muitas coisas mudariam daqui para frente, no quesito mulheres. Eu
estava prestes a me tornar o homem de uma só, mas até quando
conseguiria me sustentar numa posição a qual eu não queria
assumir?!
— Até mais, bebê. — ela sussurra e eu aceno em resposta.
Bato a porta da suíte nas costas da loira, experimentando
ainda uma dor de cabeça descomunal, sem falar no cheiro cru de
sexo e de suor que ainda estava entranhado na minha pele.
Observo a noite escura pela janela, colando o pau duro na
textura gelada de vidro, para que assim ele se acalmasse aos
poucos, imaginando ao mesmo tempo que, além da merda de
compromisso que estava cada vez mais próximo, o que me afligia
demasiadamente era que eu não poderia contrariar a minha família.
As minhas tias me cobravam esse matrimônio, como se eu pudesse
trazer o meu pai de volta, no momento em que fosse subir no altar
ao lado de Stella. E me casar com essa modelo já havia se tornado
algo praticamente sagrado para todo o clã Baker. O meu irmão, por
sua vez, só faltou fazer com que eu assinasse um contrato, com
todas as condições que ele impusesse!
Admito que estava vivendo um verdadeiro inferno!
Mordo os nós dos dedos, afastando-me da janela, quando
viro o rosto para o lado oposto e, surpreendentemente, encontro
uma menina, na suíte vizinha, me encarando com os olhos
extremamente arregalados.
Sorrio de volta e ela fecha a janela num rompante,
chegando a prender as cortinas do lado de fora.
— Detesto mulheres pudicas. — resmungo, já a caminho
do banho.
Estava em Chicago para realizar um curso importantíssimo,
na área de Direito trabalhista, que o meu pai havia pagado para
mim, com as suas economias. Eu era advogada recém-formada, e
estava na iminência de assumir um emprego em uma das empresas
mais renomadas de advocacia de Nova York, a Lions Advocacia e
Consultoria Jurídica.
O curso havia chegado ao fim, há dois dias, mas aproveitei
o ensejo para curtir um pouco mais da cidade charmosa de Chicago,
conhecendo alguns pontos turísticos, desfrutando também do hotel
confortável onde estava hospedada. O que eu não poderia imaginar,
definitivamente, era que este lugar se assemelhava a um motel de
quinta categoria. Tudo isso devido aos escândalos intermináveis e
gritos de “bebê” que ecoaram por toda a noite, no quarto ao lado.
Eu já estava saturada de tentar ler qualquer artigo, pois os
gemidos e barulhos inconvenientes quebravam a todo instante a
minha concentração, sem falar que avançavam noite adentro.
Cheguei inclusive a reclamar com a recepção, mas, pelo que
parece, pouco se importaram com a minha aflição por estar
participando indiretamente de uma noite de orgia.
O meu voo para Nova York está marcado para daqui a
pouco, inclusive as malas já estão estrategicamente colocadas ao
lado da porta. O meu coração acelera apenas por imaginar que vou
viver longe dos meus pais, do clima aconchegante da Flórida, para
realizar um grande sonho: o de consolidar a minha carreira. Mesmo
sentindo milhares de borboletas no estômago, admito que estou
muito feliz, já que como um plus, conquistarei também a minha
própria independência, vivendo sozinha naquela grande metrópole.
Corro até a janela, com o celular na mão, para fotografar
mais uma vez a paisagem elegante de Chicago noturna. Mamãe
gostava quando eu mandava para ela os registros da viagem. Dou
um clique, quando uma vozinha ressoa nos meus ouvidos. A
consciência me instigando a intrometer os olhos curiosos para
dentro da suíte barra motel de quinta.
E assim faço, quando simplesmente o celular escorrega da
minha mão, colidindo imediatamente com a unha do meu dedo
mínimo. A dor é terrível. Xingo alguns palavrões, ainda desnorteada,
sem acreditar na cena que havia acabado de flagrar.
Uau.
Um moreno escultural está ao lado, apetitosamente pelado,
à vontade, assim como veio ao mundo.
E, não posso acreditar, ele está... excitado?! Os pelos
pubianos todinhos à mostra, e os dois observando distraídos a
paisagem através da janela.
Pisco os olhos diversas vezes, ainda digerindo aquela
imagem. Na Flórida não costuma ter homens tão gostosos e
devassos desse tipo.
Que merda de surpresa era aquela?!
Contudo, apenas por eu me lembrar das madrugadas
insones, do roça-roça na parede vizinha, eu cerro os meus pulsos e
os odeio com todas as minhas forças.
— Malditos. — sussurro, ainda contornando os meus olhos
por aquele macho alfa e seu membro imponente.
Certamente o moreno era um daqueles homens que lidava
com mulheres como se estivesse em um rodízio ou algo do tipo. A
famosa espécie de cafajeste, da qual eu queria distância.
Volto a encará-lo, curiosa.
Quanto mais proibida a situação, mais tentador é vivê-la.
Sr. Indecente ainda não havia me notado, e eu juro que ele
deveria carregar algum aviso, para que não fosse observado por
mais de dois segundos, porque, merda, eu já estava completamente
encantada.
O calor enrubesce as minhas bochechas, a minha boca
resseca de vergonha, simplesmente porque o pau ainda desponta
duro contra a janela, colado, amassado, me encarando de volta.
Subo os olhos delicadamente, observando os gomos
profundos de sua barriga trincada, morena, convidativa... os braços
desenhados de músculos, as luzes do quarto que deixam aquela
sombra ainda mais apetitosa. Mordo os lábios, quando tenho a leve
sensação de que alguém está me observando.
O coração para na boca, eu não quero me certificar de que
o moreno sexy havia notado a minha presença.
Movo as pupilas lentamente para a esquerda.
E ele sorri.
Sr. Indecente sorri.
Terrivelmente lindo.
Ainda me sentindo confusa, envergonhada, sei lá, mas
sobretudo com muita antipatia daquele que me fez ler artigos,
misturando as leis a cenas eróticas de filmes pornô, eu fecho a
janela, de maneira abrupta, prendendo as cortinas, resfolegando
intimidada, para, logo em seguida, correr em busca de meio litro de
água gelada.
Abro, sem demoras, o frigobar, sentindo a mão trêmula, e
encaixo a garrafa na boca, no entanto a curva dos meus seios bebe
mais da água do que eu mesma.
Onde eu poderia estar com a cabeça quando fui me atrever
onde não deveria?
Imediatamente enxugo o colo com a toalha, respirando
fundo e aliviada, imaginando que nem tão cedo eu colocaria os
meus pés em Chicago, para cruzar com morenos deliciosamente
pelados, na janela...
Envolvo o cachecol no pescoço e depois puxo as minhas
malas na direção do corredor, afinal, já estava na iminência de partir
rumo a Nova York.
Em alguns segundos, realizo o check out, felizmente com
os ânimos mais tranquilos.
— Foi tudo bem na sua estadia, Senhorita Smith? — a
recepcionista pergunta, com os olhos mais cínicos que poderia
esboçar.
— Se o vizinho da suíte 305, resolvesse transar com
mulheres e não com uma hiena, acredito que tudo estaria bem, sim.
A mulher me avalia consternada, devolvendo-me o troco
das despesas que tive nos últimos dias. E não adiantava se fazer de
sonsa, pois certeza de que ela se lembrava muito bem de todo o
meu desespero, para que alguém intervisse naquela orgia, que ela
fez questão de ignorar.
— Boa noite. — despeço-me da recepcionista, guardando
as moedas no bolso do casaco, feliz por saber que dormirei horas
maravilhosas na poltrona do avião, chegando ao ponto de acreditar
que terei uma noite impecável de sono, em uma porra de classe
econômica, melhor do que em um hotel cinco estrelas de Chicago!
Sigo para a calçada, fazendo sinal para o primeiro táxi que
surge na avenida, afinal, já estava mais do que na hora de estar no
aeroporto.
Assim que o carro estaciona, vislumbro um homem
passando na minha frente, apressado, impetuoso, já intrometendo
as malas no bagageiro.
Imediatamente, eu movo as minhas botas, pronta para tirar
satisfação.
— Ei, esse táxi é meu.
O homem se vira, de repente, em um sobretudo preto
elegante, o cachecol farto da mesma cor, que realçava o seu belo
rosto, sem falar no perfume amadeirado que atinge em cheio as
minhas narinas.
Merda! Era ele!
Sr. Indecente, em carne, músculos e ossos.
— Já não bastou você não me deixar estudar pelas últimas
horas, agora quer que eu perca o meu voo?
A moça loira e delicada como uma boneca, me crava
aqueles dois imensos olhos azuis revoltados. Por mais que ela
quisesse se impor, caralho, me dava era vontade de pegá-la no colo
e dar-lhe umas boas palmadas, por estar me intimidando dessa
maneira, no meio da rua.
— A gente se conhece? — cruzo os braços, tentando
entender se já havia cruzado com aquela figura.
Ela aparentava uns vinte anos, a sua voz, doze, mas o seu
corpo beirava o de uma mulher no auge da sua virilidade.
— Infelizmente, eu fui a sua vizinha de quarto, nestes
últimos dias. — ela expira, se enrolando no cachecol vermelho. Está
prestes a se enforcar. — E tenho certeza que você não faz questão,
que eu refresque a sua memória!
Sorrio torto.
Coitada, não deveria estar exagerando quando citava as
minhas noites na suíte 305.
— Ah. A menina que bateu a janela porque estava olhando
para onde não deveria.
As bochechas da loira ficam praticamente roxas, ela abre a
boca e não consegue esboçar nenhuma palavra sequer. Será que
ela realmente cogitou que eu não a reconheceria? Os seus cabelos
eram loiros e lindos demais para passarem despercebidos.
— Se eu estivesse nua na janela, você também não me
notaria?
Coço o queixo, ao ouvir à pergunta atrevida.
— É lógico que eu te notaria.
A loira arregala os olhos azuis, praticamente deixando-os
escapulir de suas órbitas.
— Então você fez de propósito?
Bufo, exasperado.
— Do que você está falando?
A menina de porcelana se aproxima, o indicador impetuoso
praticamente mirando no meu rosto.
— Você queria que eu saísse da minha suíte,
completamente enfeitiçada por esse corpo sexy, e fosse como uma
coelhinha participar das suas noites de orgia!
Gargalho.
Coelhinha! É, combina com ela.
— As suas palavras estão te entregando, menina. —
seguro nos seus punhos, quando sinto que a loira está prestes a
avançar em mim. — Tome cuidado para não falar mais do que
deveria, os seus argumentos estão prestes a te trair.
Ela sai do meu alcance, ainda mais exaltada.
— Eu estava em Chicago para estudar, mas por culpa sua,
eu aprendi muito mais sobre as merdas das preliminares do que
sobre leis trabalhistas!
Engulo o sorriso, eu não poderia cair nas sandices daquela
garota.
— Tenho certeza que você não chegou a escutar tudo.
— Não precisa se vangloriar das suas sacanagens. — ela
me interrompe, ajeitando os cabelos loiros e eu percebo a sua mão
trêmula. Nunca imaginei ser tão odiado por uma desconhecida. — E
eu juro que vou avaliar a merda da acústica desse hotel com a porra
de uma única estrela!
O seu grito reverbera pelos quatro cantos. Apenas pigarro,
observando os olhares das pessoas ao redor, o constrangimento do
segurança do hotel que não para de nos avaliar. A garota já havia
me exposto demais. Prontamente resolvo ignorar o seu escândalo e
giro para trás, prestes a entrar no táxi, quando me dou conta das
minhas malas ainda depositadas na calçada.
Inferno!
— O táxi foi embora! — exclamo e confiro, preocupado, o
horário no relógio de pulso.
— A culpa é minha? — a menina profere irritada.
Então coço a barba de maneira impaciente, tentando
acalmar os ânimos.
— Eu admito que infernizei o seu precioso silêncio, peço
desculpas sinceras por isso, mas agora eu preciso seguir para o
aeroporto.
Viro de costas, na direção de um outro táxi, quando sou
impedido por uma mão pequena e impetuosa no meu braço. Maneio
o rosto para trás, vislumbrando os olhos interrogativos cor de mar.
— Você também vai para o aeroporto? — ela me pergunta.
— Não está me dizendo que...
— Nova York?
— Nova York.
Os nossos olhos se interrogam por um tempo, as
coincidências nos intrigavam, e nesse meio tempo, um táxi
estaciona ao nosso lado. Olhamos um paro o outro em disputa, mas
decido colocar o meu cavalheirismo em prática, com a intenção de
convidar a tal garota a seguir comigo, mas não dá tempo, ela
praticamente me empurra, abre a porta do veículo com urgência e
se apossa da poltrona com as suas bolsas e, claro, a sua bunda
gigantesca.
— Tem espaço aqui. — é o que ela diz, ao me encarar com
mais tranquilidade.
— Ótimo.
Sento-me ao lado da loira e então seguimos juntos rumo ao
aeroporto, enquanto eu não entendia que caralhos de brincadeira de
mau gosto era aquela. Retornar para a minha cidade, nas vésperas
de um noivado fajuto, na companhia de uma adorável irritante.
Sr. Indecente se manteve ocupado durante todo o percurso
até o aeroporto. O celular dele tocava o tempo inteiro, com
compromissos e mais compromissos, sem falar que os meus olhos
arregalaram quando me dei conta de que ele estava em Chicago
para uma audiência. Será que ele também era advogado? Não
seria possível existir mais coincidências entre nós dois.
Coloquei os pés na aeronave, quando algo me encucou.
— Eu vou ficar na classe econômica. — constatei, no
momento em que ele me encaminhava para a primeira classe, no
seu belo sobretudo, que cobria tudo o que ainda estava claramente
exposto na minha memória.
— Eu fiz o seu check in e acabei te transferindo para a
mesma classe que a minha.
Abro a boca, consternada, cessando os passos, fazendo
com que uma fila imensa se formasse atrás de mim.
— Você aproveitou que eu fui ao banheiro, com a bexiga
estourando, para me trocar de classe, se nem ao menos me
consultar? — tento diminuir o volume da voz. — Quanta liberdade,
se ainda nem fomos apresentados!
— Chantel Smith, aqui estão os seus documentos. — Sr.
Indecente proferiu, me esticando o RG e afins.
Apenas sorri amarelo, imaginando o quanto eu poderia ser
ingênua. Deixar os meus documentos nas mãos de um estranho,
apenas porque a minha bexiga já estava explodindo, foi a minha
perdição. No entanto, se eu não fizesse isso, com toda a certeza
perderia o voo. Então, resolvo baixar a guarda e demonstrar
gratidão àquele belíssimo moreno.
— Obrigada, Sr...
— Thor. Pode me chamar de Thor.
— Thor?! — pisco os olhos diversas vezes me dando conta
de que, pelas próximas horas, eu estaria na companhia de um deus.
O deus nórdico dos trovões e das batalhas... bem, e eu entendia a
que tipo de batalha aquele Thor se referia.
— Chantel também não é um nome nada comum. — ele
comenta, deixando a nossa bagagem de mão no compartimento.
Reviro os olhos me jogando na poltrona, ao lado do
corredor.
— O que não é comum é um homem ficar pelado na frente
de uma janela. Já ouviu falar em atentado violento ao pudor?
Thor gargalha até mais alto do que deveria.
Ele é irritante.
— Porra, você ainda não se esqueceu?!
O moreno passa por mim e se senta ao meu lado. E eu me
odeio quando o seu perfume me invade, despertando
indomitamente os meus instintos.
— É claro que eu já me esqueci daquela cena
desagradável. — minto, afivelando o cinto. — O que ainda preciso
apagar da memória são as falas aleatórias da hiena com a qual
você transou por algumas noites.
Sr. Indecente entorta os lábios num maldito sorriso.
— Você está chamando a Samantha de hiena?
Começo a folhear uma revista e quando foco os olhos com
mais atenção, me dou conta de que é um cardápio, sinto-me ainda
mais satisfeita por Thor ter me salvado da classe econômica.
— Ah pelo menos ela é domesticada. — resmungo.
— Vai me dizer que ainda é virgem, que nunca perdeu as
estribeiras em uma noite de prazer?
Jogo o cardápio no colo do moreno atrevido.
— Ainda? Onde está escrito a idade ideal com que
devemos perder a virgindade?
Um tipo de comentários desses só poderia sair da boca de
um macho alfa.
— Você está certa, Chantel. Você, pelo jeito, está sempre
certa.
Percebo que o homem não deseja entrar nesse mérito,
discutir feminismo comigo às dez da noite, em um voo cansativo
para Nova York. O que me resta é voltar a desejar as refeições do
cardápio.
Prontamente, pego o objeto de volta no colo do homem e,
sem querer (eu juro), os meus dedos tocam no seu volume
proeminente.
Sinto um arrepio morno na espinha e a boca
estranhamente ressecada.
— Parece que estou ouvindo aos meus pais. Eles também
falam que eu estou sempre certa. — tento fingir naturalidade, porém
a minha voz totalmente trêmula denunciava o bem-estar, ops!, o
mal-estar por tê-lo tocado tão intimamente.
Retiro a mão do colo de Thor, com o cardápio entre os
dedos. É claro que as minhas bochechas já são dois enormes faróis
vermelhos.
— Eles ficaram em Chicago? — o belo me pergunta,
percebendo todo o meu constrangimento.
Pelo menos ele estava a fim de sustentar uma conversa
séria comigo.
— Eu sou de Tampa, na Flórida, estou indo para Nova York
a trabalho.
— Flórida? — ele repousa a cabeça na poltrona e me
encara de lado. Consigo perceber com maior precisão todos os
detalhes lindos do seu rosto. — Eu já estive lá algumas vezes. Não
acha que vai estranhar? Nova York e Tampa são tão opostos!
— Eu me adapto, não tenho problema com isso. — sorrio,
sem ser modesta. — Eu já passei um mês em Porto Rico, sabe
naquelas casas de árvore que ficam no meio da floresta tropical? É
claro que eu tive mordidas de mosquito até onde você se permita
imaginar, sem falar que acordei com uma maldita aranha do
tamanho da minha mãe, em cima do meu travesseiro.
— Não seria da sua mão?
— É mãe mesmo. E ela tinha tenebrosos olhos azuis.
Thor me encara com amabilidade, mas mesmo assim não
duvido que ele esteja me achando esquisita, da mesma maneira que
todos os caras sempre me adjetivaram. Nenhum deles nunca soube
lidar com a minha espontaneidade.
— Você também tem olhos azuis e não é um horror, pelo
contrário, é linda.
Perco o ar por segundos.
— Thor. — pisco os olhos diversas vezes. — Cantadas
baratas no meio de uma conversa que estava aparentemente
rendendo?
— Não foi uma cantada barata, foi um elogio sincero.
Percebemos, então, que o avião está prestes a alçar voo.
Instintivamente, seguro na mão grande e bruta de Thor. Ele sorri
torto, me acolhendo, obviamente.
Eu odiava a parte da decolagem e aterrissagem. O meu
estômago se contorcia de medo, toda vez que eu imaginava o motor
escapulindo por uma tampa do fundo do avião, assim que ele
embicasse para o alto.
— Costuma ser assim com todas as mulheres? — tento
manter o assunto, para me distrair, quando o avião começa a andar
pela pista, se preparando para alçar voo.
— Assim como?
— Sedutor a ponto de todas elas quererem ser levadas
para a sua cama.
Que merda estou dizendo?!
Aperto os olhos, quando o avião começa a pegar embalo.
— Então eu te fiz sentir vontade de ser levada para a minha
cama? Juro que eu não fiz com intenções.
Amasso os dedos de Thor na minha pequena mão, assim
que começamos a decolar.
— Homens são todos iguais.
— Por que está falando isso? Nunca namorou?
Relaxo o corpo, já mais tranquila com a estabilidade
adquirida pela aeronave.
— Eu nunca encontrei alguém especial. — os meus olhos
imediatamente rolam para os dele. Solto dos seus dedos e percebo
ainda o calor da sua mão na minha.
— O que é especial para você?
— Alguém que me aceite como eu sou. Não estou a fim de
mudar os meus defeitos por ninguém. — as luzes do avião se
apagam. Apenas as indiretas me permitem vislumbrar olhos tão
pretos. — E você também não sente vontade de assumir um
compromisso sério? Posso estar enganada, mas acredito que a tal
Samantha não seja a sua namorada.
Ele faz a uma negativa com a cabeça.
— Na verdade, eu vou ser obrigado a assumir um.
Enrugo as sobrancelhas.
— Obrigado?!
Não se encaixava. Um cara tão livre, maduro, obrigado a
um compromisso, em pleno século XXI?!
— Acredita que o meu pai, no seu leito de morte, pediu
para eu me casar com a filha da sua namorada. — os seus olhos
sempre tão animados, agora ganham um ar mais triste. — Esse
assunto é tão absurdo que estou fazendo questão de comentar com
todo mundo, para ver se contrai uma carga menor.
— Mas... vocês estão namorando?! — então me dou conta
de que ele estava na suíte com a tal Samantha. — E você ainda fez
o favor de trair a pobre moça!
Não importa, eu precisava manter a sororidade.
— Não estamos namorando. — a sua voz de trovão me
deixa ainda mais confusa. — Já saímos algumas vezes, mas nunca
rolou nada. Também não sou o tipo de cara que passa o rodo em
todas, como você pensa.
— Então você vai ser obrigado a casar com essa moça, só
por que foi o último pedido do seu pai?
— E não é só por isso. — ele expira e dá uma breve olhada
para a janela. — A família inteira está me cobrando essa sandice.
Inclusive o meu irmão mais velho, o Karl, pelo qual eu sustento uma
puta consideração.
Afago a mão de Thor com empatia e ele me encara com
profundidade nos olhos. Eu queria sinceramente poder ajudá-lo,
mas as minhas soluções não eram nada convenientes, como, por
exemplo, ele inventar que tinha DST.
De repente, somos interrompidos pela aeromoça que nos
serve champanhe. O que teríamos de magnífico para brindar afinal,
depois das confissões absurdas de Sr. Indecente?
— Não tem saída?!
— Nenhuma. Eu fico noivo amanhã à noite.
Inspiro, preocupada, já imaginando o quanto deveria ser
estranho entrar num relacionamento apenas por conveniência. Na
realidade, entrar num relacionamento já é problemático, imagina
nessas condições!
— Pobre, Thor.
— A não ser que eu apresentasse uma namorada a todos
eles e dissesse que estava fazendo a vontade do meu pai de
alguma maneira, abandonando a vida desregrada, para me dedicar
exclusivamente a alguém.
Olho além do rosto de Thor e fito a janela. As luzes
mínimas de Chicago, ficando ainda mais distantes, me fazem refletir
que Sr. Indecente poderia ter a namorada que quisesse num estalar
de dedos. Não seria tão difícil assim de ele se livrar de um
compromisso tosco como esse!
Assim que percebo as nossas taças cheias de espumante,
aponto a minha na direção da do moreno.
— Um brinde ao seu noivado, então!
— Chantel, quanta crueldade.
— Não que eu esteja sendo cruel ou fazendo pouco caso
da sua aflição, mas tenho certeza que, de alguma maneira, você vai
se livrar desse compromisso.
Pisco um olho, tentando consolá-lo, enquanto beberico o
champanhe e percebo que Thor me devora com as suas duas
órbitas escuras, indecifráveis.
— Suas palavras são reconfortantes, mas definitivamente
eu não quero brindar ao meu noivado.
— A que então?
Ele dá um meio sorriso e umedece os lábios bonitos, antes
de falar.
— À sua beleza.
Desvio imediatamente os meus olhos dos dele e faço
questão de engolir uns três goles seguidos da bebida. Deus do céu,
aonde isso tudo ia parar. Ainda faltavam duas longas horas de voo!
Aconchego o meu corpo mais um pouco na poltrona macia
da primeira classe, porque, juro, eu não estava menos enganada
quando imaginei que teria a noite perfeita de sono neste avião, sem
gritinhos, gemidos e ordens de todos os tipos, ressoando ao fundo.
Abro os olhos, experimentando o perfume amadeirado
ainda nas minhas narinas, quando me dou conta de que estou
deitada sobre o ombro de Sr. Indecente. Prontamente me afasto,
temendo acordá-lo do seu sono dos anjos, quando ouço a uma
informação importante vindo da cabine de comando, dizendo que há
uma tempestade de neve muito forte sobre a cidade de Nova York, e
o piloto ainda enfatiza que a nossa sorte é grande, já que há poucas
horas atrás, o aeroporto não estava disponível para receber nenhum
tipo de voo.
Merda, eu sempre imaginei que o meu primeiro encontro
com a neve seria para fazer bonecos ou jogar bolas na cara de
alguém, inclusive estava ansiosa para a neve, em Chicago, mas
infelizmente não ocorreu, e agora tem neve até dizer chega, só para
atrapalhar os meus planos e me causar preocupação. Eu precisava
chegar ao hotel indicado pela empresa, era só isso o que me
atormentava.
Apreensiva, faço menção de acordar o belo moreno ao meu
lado, quando a minha mão pende imóvel no ar. Era tão perfeita
aquela imagem, de Thor dormindo inocentemente, e tão perto, com
os lábios semiabertos, os cílios pretos e longos que se encerravam
na sua pele, as sobrancelhas grossas e perigosamente atraentes
que eram moldura perfeita para os seus belos olhos.
Até agora, Sr. Indecente havia sido extremamente gentil
comigo, sobretudo quando pagou a mais para que eu o fizesse
companhia na primeira classe. Acredito que eu não tenha dado
nenhum vexame, até agora, já que a última vez em que segurei uma
taça de espumante, foi num estande de provas grátis, em um
supermercado. Eu definitivamente não tinha esses hábitos de gente
chique.
— Thor... — cochicho bem próximo ao ouvido do homem.
— Já estamos chegando.
O perfume gostoso fazendo confusão nos meus instintos,
mas eu deveria me manter firme e disposta a não o ver mais, assim
que saíssemos juntos pelos portões do aeroporto, afinal de contas,
jamais me imaginaria com uma encrenca de um metro e noventa, na
minha vida.
— Thor... — balbucio mais uma vez, quando apenas sinto
uma mão pesar a minha nuca e me puxar na direção daquele rosto
másculo e belo.
Arregalo os olhos atordoada, quando me dou conta de que
estamos a centímetros de distância.
— Ser acordado por você, sem termos transado, é um tanto
quanto estranho. — ele confessa com os olhos negros
exclusivamente na minha boca.
Tento não me sentir atraída, mas o meu sexo entra em
alerta.
Por que Thor me deixa tão molhada, tão frágil, apenas por
segurar a minha nuca de maneira tão rude, fazendo inclusive com
que eu sinta o calor do seu hálito mentalado me atingir sem
preocupação alguma?
Eu desejo a sua boca, eu não sou louca de mentir, mas ele
era a última criatura na face da Terra pela qual eu deveria sentir
interesse.
— Você só pensa em sexo? — sussurro e ele sorri
sensualmente torto.
— Impossível não pensar. Você é atraente demais, Chantel.
O meu coração para.
— Você só quer me levar para cama, é só isso.
— Tenho certeza que depois de uma noite comigo, não vai
achar que seja só isso.
Fecho os olhos, esfregando delicadamente as pernas,
porém ainda me resguardando nas palavras.
— Você não é nada modesto, pelo contrário, faz questão de
mostrar o tempo inteiro o quanto é bom de cama. — é claro que eu
invento argumentos. — É preciso de muito mais para me conquistar,
se você quer saber.
O seu dedo contorna o meu rosto. Por um breve segundo
eu me esqueço de que a tempestade de neve atrapalha todos os
meus planos, do outro lado da janela.
— Você quer ser conquistada?
— Não por você.
As nossas bocas estão agora a milímetros. Sinto uma
vontade louca de grudar os meus lábios nos dele, roçar as nossas
línguas e experimentar o seu sabor champanhe, mas eu precisava
entender que ele estava prestes a ficar noivo, sem falar que,
definitivamente, não combinávamos em nada.
Afasto-me contrariada, quando as luzes se acendem. O
avião já está preparando para a aterrissagem.
— Não seja tão difícil. Você não imagina o quanto isso me
excita. — a voz rouca de Thor me arrepia, os olhos perigosamente
carentes dançam pela minha boca e, inferno, a imagem da janela do
hotel, cai como um meteoro nas minhas lembranças. — Está com as
pupilas dilatadas? — ele completa, de repente. — Nos seus olhos
azuis é mais fácil de identificar.
Abro a boca, surpresa, afinal, nunca vi homem mais
perspicaz do que ele, para identificar as fragilidades de uma mulher.
Que loucura.
— Por favor, me deixa em paz. — profiro, esboçando
segurança, refazendo ao mesmo tempo o nó do cachecol.
— Dormimos no mesmo hotel, estamos viajando para a
mesma cidade. Acredito que não seja tão fácil se livrar de mim. —
ele sussurra com a voz de sono, a cabeça levemente inclinada na
minha direção.
Estava fazendo de tudo para me tirar do sério.
— Deus do céu, um psicopata.
Thor sorri.
— Tudo bem, então. — ele se ajeita na poltrona,
esboçando um ar conformado. — Cada um vai para o seu canto,
assim que sairmos do aeroporto. Nada de trocar telefones ou buscar
pelo nome do outro nas redes sociais.
— É claro. — sopro me sentindo estranhamente insegura.
— Nada mais provável, já que somos apenas dois estranhos que
decidiram fazer companhia um ao outro, num voo até Nova York.
Sr. Indecente amassa os lábios em um sorriso envolvente e
toma a minha mão na sua. Eu sinto gratidão naquele gesto tão
genuíno, já que as poucas horas que passamos juntos, apesar de
tudo, foram extremamente agradáveis.
Sorrio, em resposta, não querendo ser tão intransigente. E
quando me dou conta, o avião já havia aterrissado. O medo nem
teve tempo de se manifestar, enquanto os olhos de Thor e toda a
sua beleza máscula me distraíam.
Finalmente, pegamos as nossas bagagens na esteira e
saímos na direção dos táxis. Sr. Indecente cessa os passos ao meu
lado, para deixar um afago caloroso nos meus cabelos e um beijo
fraternal na minha testa, e depois caminhar, na direção contrária,
sem falar simplesmente nada.
Juro que não queria me sentir assim, mas a sensação de
que eu não o veria nunca mais, me deixa um tanto quanto estranha,
um vazio, talvez, definitivamente eu estava me sentindo ridícula por
me apegar àquele homem por causa das poucas horas que
dividimos juntos.
Praguejo o meu lado emocional barato e saio na direção
dos carros, sem olhar para trás, solicitando a um taxista para que
me levasse até o hotel recomendado pela empresa.
— Impossível, senhorita. Não temos como atravessar a
cidade, nessa situação.
Abro a boca, apavorada.
— Eu vou ter que dormir no aeroporto?!
O homem mastiga chicletes como se Nova York não
estivesse virando sorvete a essas alturas.
— Tem um hotel aqui perto, eu posso te levar até lá.
— Claro, — jogo o corpo para dentro do carro. — é melhor
do que dormir com as costas esticadas no chão.
O motorista segue pelo asfalto, enquanto os meus olhos
desobedientes cismam em procurar pelo Thor. Idiota que sou, grudo
o nariz no vidro, tentando identificar alguma figura máscula no meio
da tempestade de neve, mas infelizmente não vejo nem sequer
rastros de Sr. Indecente.
Eu deveria aceitar a despedida.
Jogo as costas de volta na poltrona e, quando me dou
conta, foram apenas poucos metros até chegar ao hotel.
Agradeço a gentileza do taxista, no momento em que desço
em frente ao prédio antigo. Até que era aconchegante, arrumadinho,
mas nada se comparava ao cinco estrelas de Chicago.
Coloquei os pés no saguão e me dei conta de que havia
muitas pessoas espalhadas pela recepção, mulheres com crianças
chorando no colo, velhinhas cochilando pelos sofás, um verdadeiro
caos.
— Boa noite, eu gostaria de uma suíte. — proferi para
atendente, debruçando os cotovelos sobre a bancada.
— Esgotado, meu bem. — ela simplesmente respondeu
sem nem ao menos me olhar.
Desesperada, avancei sobre a moça e segurei no seu
queixo, obrigando-a a me olhar nos olhos.
Eu não queria morrer congelada, jogada em qualquer
esquina! Eu não conhecia simplesmente nada, em Nova York! O
que seria de mim!
— Não vai haver desistência, não...
— A não ser que você aceite dividir uma comigo, Chantel.
Soltei o rosto da menina, para virar imediatamente para o
lado.
Quando senti os meus ombros relaxando, além de duas
breves piscadinhas no meio das pernas.
— Thor?!
Oh, não.
Quando fitei os cabelos loiros esvoaçantes, atravessando a
pequena recepção do hotel, não pude evitar de entortar os lábios
em um sorriso. Era ela, Chantel Smith, desesperada por uma cama
que a acolhesse nesta noite de tempestade, e imediatamente me
perguntei por que não fazer essa caridade, já que a viagem se
tornou interessantíssima, depois de ter a companhia da garota
durante o voo. E não era só por isso, eu jamais poderia me omitir,
sabendo que ela estava sozinha em uma cidade desconhecida.
Os dólares que gastei a mais com a sua passagem de
primeira classe nunca foram tão bem empregados. Chantel, sem
sombra de dúvidas, era mais interessante do que qualquer mulher
que ousasse, simplesmente por que ela era osso duro de roer.
Prontamente me afastei da pequena lareira e segui na
direção do balcão.
— Thor, o que você está fazendo aqui? — ela me
perguntou o óbvio, sem conseguir desgrudar os olhos da chave
pendendo na minha mão, à sua frente.
Inevitavelmente, senti-me vitorioso, naquele momento.
— É sério que você nem faz ideia? — entortei as
sobrancelhas.
— Me dá essa chave, eu posso...
A moça de um metro e meio precisou dar pequenos pulos,
para tentar alcançar o molho na minha mão.
Apenas sorri da sua inocência.
— Eu deixei bem claro que poderemos dividir a suíte. —
enfatizei.
— Aceita logo, menina, senão eu vou no seu lugar. — uma
mulher muito atraente, em um belo vestido azul, clamou do outro
lado da recepção.
Sorri para ela ao mesmo tempo em que avaliava a reação
de Chantel.
— Estou recebendo propostas, e quase desistindo de você.
— informei.
— Você não seria louco.
Eu gostava do nosso jogo. Chantel tentando se fazer de
difícil, enquanto ela mesma percebia que não poderia se livrar tão
facilmente dos seus desejos — e de mim.
Existia química entre a gente, isso era perceptível.
— Nós dois vamos dividir a suíte. — Chantel finalmente
informou à recepcionista, para depois me desferir aqueles grandes
olhos azuis, como se me odiasse por eu tê-la nas mãos. — Ou isso
ou morrer de frio. — completou, rendida.
A garota aparentava ser muito independente e livre.
Deveria fazer cócegas no seu ego entender que ela precisava
depender de mim, neste momento.
— Eu só preciso dos seus documentos. — a moça lhe
respondeu.
— Ah, claro.
As mãos de Chantel tremiam tanto, que ela mal conseguia
abrir a bolsa. Tudo bem que estávamos enfrentando um frio de vinte
graus abaixo de zero, mas o aquecimento do hotel, sem falar na
lareira tímida no canto da recepção, estavam dando conta. Acredito
que ela esteja nervosa por ter que passar a noite inteira na minha
companhia e essa situação me deixava um tanto curioso, afinal de
contas, jamais mulher alguma sentiu algum tipo de receio por ter
que dormir ao meu lado.
— Bem, então vamos? — proferi, fazendo menção de
puxar as nossas bagagens.
— Eu levo as minhas malas. — ela rosnou, pegando a alça
da minha mão.
Subimos as escadas apertadas, até o primeiro andar,
enquanto eu admirava a teimosia de Chantel. Umas duas vezes o
corpo dela pendeu para trás, por ela não estar simplesmente
conseguindo sustentar todo o peso das bagagens nos braços.
Gentilmente, eu apenas apoiava a mão livre nas suas costas,
evitando que ela se estatelasse nos degraus de carpete verde.
— Esse hotel fede. — ela exclamou, me olhando por cima
do ombro, enquanto caminhava pelo corredor. — E não me restam
dúvidas de que esse prédio deve ter a mesma idade da rainha
Elizabeth.
Concordei, observando os quadros semelhantes aos de
museu, espalhados pelas paredes.
— Bem, entendendo que se sobrevivermos um ao outro,
será uma noite bastante agradável. — ironizei, ao girar a chave na
porta.
— O que pretende fazer? Me amordaçar para que não ouça
mais a minha voz? — Chantel proferiu irritada, adentrando com
urgência o quarto.
Não entendia todo o seu ódio abrupto por mim. Talvez era a
maneira que encontrou para se esquivar da nossa química.
Imediatamente a moça se jogou na cama, exausta por ter
carregado aqueles quilos todos, nos braços delicados.
Olhei para ela, através do reflexo do espelho, enquanto me
livrava do cachecol.
— Humm, amordaçar você, não seria uma má ideia. —
porra, pensei alto até demais.
Chantel revirou os olhos, me exibindo uma grande carranca
em seguida.
— Má ideia foi eu ter aceitado estar com você neste
cubículo.
Os seus olhos estavam dentro dos meus. Ela estava
bastante aborrecida. Nunca imaginei que poderia fazer inimizades
apenas por cantar uma garota.
Prontamente, a loira se levantou da cama e retirou as suas
botas. Os seus pés delicados surgiram em meias de coração
vermelho. Segurei o riso para não fazer uma piada.
Em seguida, joguei o corpo na cama, no momento em que
ela se levantou para conferir umas duas vezes ou mais, a paisagem,
através da janela. Chantel estava aparentemente cismada, com a
tempestade de neve que nem tão cedo estiaria.
Então, ainda deitado sobre aquele maldito colchão duro,
respondendo a alguns e-mails pelo celular, eu observei de canto de
olho, a menina abrindo um armário bastante surrado que estava
estrategicamente ao lado da cama.
— Ai, meu Deus. — de repente ela exclamou, assim que a
porta velha de madeira caiu praticamente por cima do seu corpo.
Num segundo, eu me levantei, preocupado, para ajudá-la a
conter o peso da porta. Chantel segurava de um lado, eu do outro. A
porta pendia aos poucos sobre as nossas mãos, enquanto nos
encarávamos apreensivos.
— Pode deixar que eu tento colocar esse bagulho no lugar.
— Por que você? — ela me encarou. — Naquela viagem
para Porto Rico, eu tive que dar conta de toras bem mais grossas e
pesadas do que essa porta.
Gargalhei, sem poder evitar as analogias.
— Do que você está rindo, seu maldoso?!
— Toda a sua experiência de vida se resume a Porto Rico...
— E toda a sua experiência de vida se resume a sexo.
Bufei.
Ela tinha resposta para tudo.
Estava difícil de acreditar que passaríamos horas tranquilas
juntos, durante essa noite. A garota estava completamente indócil.
E, porra, pelo menos eu queria receber gratidão, por eu ter feito a
ela o convite de dividir a suíte comigo.
— Chantel... por favor... os seus pulsos já estão tremendo.
A loira me encarou tentando ser forte, mas os seus joelhos
flexionaram.
— Certo. Você venceu. — respondeu num fio de voz,
desistindo de se fazer a heroína. — Realmente, não estou
suportando todo esse peso.
E, para o meu alívio, num único movimento, consegui
encaixar a porta no lugar. Depois, ainda convenci Chantel para que
não se aproximasse mais daquele guarda-roupa, enquanto
estivéssemos por aqui.
— Se você quebrar o braço, vai ser um problema. Não
conseguiremos chegar ao hospital.
— Você tem razão, Thor.
Arqueei as sobrancelhas, quando eu percebi que Chantel
estava concordando comigo, o que parecia raridade. Em resposta,
ela desferiu um pequeno sorriso para mim.
Caralho, aquilo me quebrou.
— Eu preciso de um banho. — confessei, precisando sair
imediatamente daquele quarto, porque a imagem da loira deitada
casualmente sobre a cama, denotava muitas coisas.
Nunca passei por situação parecida. Ter uma mulher
gostosa em um quarto, a qual era simplesmente proibida para mim.
Bem, até segunda ordem.
— Fique à vontade. Eu vou procurar por um canal que
preste. — ela resmungou, mexendo aleatoriamente no controle da
televisão.
— Então é a sua primeira vez em Nova York? — puxei
assunto, retirando o sobretudo.
Chantel olhou para mim e depois desviou, completamente
constrangida.
— É, sim. E eu nem pude aproveitar a neve, porque,
merda, a tempestade acabou se tornando um grande empecilho
para os meus planos. — ela suspirou. — Você não vai acreditar,
mas eu sempre sonhei com esse dia.
— Eu posso te levar para jantar comigo, amanhã, após a
porra do noivado. E podemos ver a neve juntos, se você quiser. —
convidei de coração aberto, jogando os meus dois casacos sobre
uma cadeira velha, que por sorte não quebrou.
— Vai tomar seu banho, Thor. — Chantel retrucou,
entredentes, jogando o travesseiro sobre mim. — Eu não quero
jantar com você. Sinceramente, não sei aonde você pretende
chegar com essa conversa mole.
Cocei a barba, me sentindo deliciosamente desafiado. Se
eu quisesse passar uma noite de amor com Chantel, eu deveria
lutar ardentemente por isso.
O que me restou foi adentrar o banheiro, ainda de calça e
camisa social e, não desistindo da menina tão facilmente, decidi
fazer a ela um convite “nada comprometedor”.
— Não vem comigo? — recostei o ombro esquerdo no
batente.
A loira sorriu, perplexa.
— Não me interessa te ver pelado outra vez.
Cruzei os braços, entusiasmado com aquela figura de um
metro e meio.
— Você fica levemente vesga quando mente, já percebeu
isso?
Chantel me encarou perturbada. Putz, então era realmente
verdade.
— Para de inventar. — ela exclamou, azeda, desviando o
olhar do meu.
Resolvi tomar finalmente o banho e deixar de pentelhar a
garota. Ela já estava estressada demais com toda a situação pela
qual estávamos passando. E ao mesmo tempo eu entendia o quanto
ela era resiliente, por ter que dividir a suíte com um cara, que tinha
como as suas últimas referências, transas escandalosas na suíte
vizinha e um flagra nada convencional, à janela. Eu compreendia
por que Chantel estava o tempo inteiro na retaguarda, afinal, o
ataque é a melhor defesa.
— Porra, não tem sabonete, xampu, nada. — exclamei,
assim que puxei a cortina por cima da banheira.
O que eu queria, os mesmos serviços do cinco estrelas de
Chicago?
— Além de tudo, é metrossexual. — Chantel vociferou do
quarto.
— Querida, eu estou falando de higiene. — comentei,
retornando para aquele cômodo, envolvido apenas na toalha
branca.
Chantel ficou paralisada, por segundos, me dissecando
com os olhos arregalados. A maneira como ela observava cada
esquina do meu peitoral, eu confesso, me deixou extremamente
excitado, sem falar que ela umedecia os lábios a cada rolar de suas
pupilas.
A espontaneidade, como sempre, guiando as suas atitudes.
Entendendo que poderia rolar finalmente alguma coisa
entre nós dois, que o seu rosto abismado era um prenúncio para
nos afogarmos naqueles lençóis mofados, eu desfilei até a cama,
coçando a barba, com os meus olhos exclusivamente nos dela.
Chantel expirou assim que eu estava a milímetros.
Supreendentemente, a loira esticou a mão para me tocar, o
volume crescendo na velocidade da luz, mas, para a minha
surpresa, ela recuou.
— Você se acha!
Entortei as sobrancelhas.
— E você é mal-humorada.
Virei de costas de maneira abrupta, tanto que a porra do nó
da toalha soltou.
Foda-se.
Chantel não iria ver novidades.
— Está bem. — ela proferiu, engasgada, enquanto eu
estava de costas, caminhando pelado, na direção do banheiro. —
Eu vou te emprestar os meus produtos. Todos eles. Divirta-se.
Eu girei, mostrando a ela todos os meus desejos.
Chantel levou as mãos à boca.
— Eu te agradeço por isso. — proferi.
— É... é o mínimo que eu posso fazer por você, Sr.
Indecente, digo, — ela pigarra, com os olhos no meu membro. —
Thor. Afinal, você já fez tanto por mim.
Chantel simplesmente vira para o lado, abre a sua mala e
pega uma espécie de estojo. Em seguida, ela enche as mãos com
tudo o que tem direito e joga uma tonelada de mini vidrinhos por
cima da cômoda, ansiosa para se livrar de mim.
Agora, ela já não me olha mais, virada na direção da janela.
Prontamente recolho tudo. Eu nem fazia ideia para que
serviam todas aquelas merdas. Seleciono dois deles, um que
poderia servir de sabonete e outro de xampu.
Retorno ao banheiro e, em segundos, tomo um banho
relaxante, imaginando que, apesar do gênio forte, Chantel Smith
mexia demasiadamente comigo. Virgem, sexy e chata.
Se não fosse agora que ela me entregaria a sua virgindade,
quem sabe em breve. Ou melhor, a loira de olhos azuis intensos
poderia muito bem se passar pela minha namorada, ninguém mais
louca do que ela para aceitar à proposta tão tosca, mas que
definitivamente salvaria a minha vida.
Passo a toalha pelos cabelos, disposto a sugerir tal acordo.
Poderia pedir um vinho, uns acompanhamentos e fazer a ela esse
pedido nada convencional.
Porra, não custava nada ela me ajudar! Nem de Nova York
ela era! Seria perfeito, ninguém notaria a nossa farsa. E eu me
livraria de Stella.
Saio do boxe minúsculo, ainda enxugando os cabelos,
quando o meu coração dá uma guinada. Imediatamente me assusto
com a imagem no reflexo. Que porra é essa. Eu não quero acreditar
no que estou vendo. Sem demoras, passo a toalha no vapor do
espelho, o que faz com que eu oscile dois passos para trás.
— Caralho, Chantel! O meu cabelo tá loiro!
Saio da cama, completamente desesperada, em apenas
um pulo. Não poderia acreditar que havia dado o descolorante de
pelos, para Thor, no meio de todos aqueles frascos! Mas, pensando
bem, é claro que seria totalmente possível, já que agi fora da minha
sanidade, justamente porque o belo moreno estava pelado na minha
frente, OUTRA VEZ. Aquele atrevido!
Mas, ao mesmo tempo, me dou conta de que ele era tão
lindo, tão másculo, tão atraente... só não aceitava o seu lado macho
alfa irritante!
— Não acredito... — sussurrei à porta, levando as mãos à
boca.
O cabelo de Thor não estava uniformemente loiro, alguns
pontos estavam falhados e na verdade ele se parecia mais com um
tigre.
— O que eu faço agora, garota! Me explica!
Cheguei bem perto de Sr. Indecente e comecei a intrometer
os dedos nos seus fios loiros, e agora que solução poderia dar a ele,
a não ser passar uma outra tintura?!
Ele se mantinha de costas, em frente ao espelho. Sem
querer os meus olhos acompanhavam algumas gotas que
escorregavam casualmente, pelas suas costas morenas.
— Bem, o que podemos fazer é...
De repente, Sr. Indecente gira o seu corpo, sem eu nem ao
menos perceber. Os centímetros que estavam nos separando
permitem que o homem deposite instantaneamente as suas mãos
na minha cintura. Thor me segura, como se eu fosse um pacote de
biscoito, e eu gemo quando ele me coloca sentada por cima da
bancada de mármore. Os belos olhos escuros estão completamente
desesperados dentro dos meus. A minha boca ofega, eu realmente
não sabia o que ele queria de mim.
— Chantel.
— Hmmm...
— Eu tenho uma merda de imagem a zelar. Eu sou um
CEO de renome nesta cidade, o que os meus funcionários vão
pensar de mim, os meus clientes? Sem falar que a porra do noivado
acontecerá amanhã à noite!
CEO?
Pisco os olhos diversas vezes, analisando todo o
desespero do homem. O que ele queria que eu fizesse, no final das
contas? Que eu me transformasse numa tintura! Afinal, a
tempestade de neve ainda nos impedia de fazer qualquer coisa!
— Eu compro amanhã uma tinta escura e tinjo o seu cabelo
outra vez... — profiro, cheia de boa vontade, esquecendo-me
inclusive se era certo que o clima de Nova York voltaria à
normalidade no dia seguinte. — Bem, se os seus fios reagirem à
tintura e se a tempestade de neve passar... — levanto os ombros. —
desculpa... eu não fiz por mal...
— Sabia que há outra maneira de me pedir desculpas?
Os seus dedos intrometidos contornam os meus lábios,
sinto o seu sabor másculo, as unhas curtas que incomodam a pele
da minha boca.
— Transando com você? Esquece! — empurro a sua mão
atrevida, fazendo menção de descer da pia, mas o belo prontamente
me impede.
— Não pense o pior de mim, Chantel.
Os seus dedos se afundam nos meus braços, a respiração
intensa atinge em cheio o meu rosto. A sua boca é um belo convite,
sem falar no corpo de academia a milímetros do meu. Sinto tesão, a
calcinha encharcada outra vez... e eu me odeio por minhas
fragilidades.
— O que é, então? — tento manter a voz firme, enquanto
que por dentro sou uma lava vulcânica de tão quente e inconstante.
— Quer fingir ser a minha namorada?
— O quê?!
Pisco os olhos diversas vezes, sem acreditar que Sr.
Indecente teve coragem o suficiente para me fazer tal proposta
descabida.
— Eu te apresento no dia do jantar, a gente finge um
romance, eu dispenso a Stella e depois da meia-noite, você já
estará livre, Cinderela.
Reviro os olhos, notando a boca sexy a centímetros.
Confesso que estava quase cedendo a um beijo ou à proposta tão
ridícula, mas como conviver com uma porra de encrenca de um
metro e noventa pelos próximos dias!
— Entendi. Você quer que eu engane a sua família, as
pessoas que sempre te amaram e fizeram de tudo por você. — toco
na sua ferida.
— Pelo amor de Deus, não me deixe com a consciência
pesada. Aonde você quer chegar?
Belisco o queixo bonito, aproximando os nossos lábios.
Thor sorri tentadoramente, acreditando que seja um prenúncio de
um beijo, o que me faz imaginar, mais uma vez, o quanto aquele
homem se acha.
— Por que você não chama a Samantha ou outra qualquer
da sua lista de contatos?!
Empurro o seu queixo para o lado contrário, porém Thor se
apossa ainda mais do meio das minhas pernas, colando
completamente o seu corpo ao meu. O nó da toalha pressiona o
meu sexo, o peitoral forte e perfumado se une ao meu casaco
pesado. Sinto as suas mãos se perdendo nos cabelos da minha
nuca.
— Porque elas jamais se permitiriam nesta farsa comigo.
As mulheres às quais poderia fazer tal proposta, me levam a sério
demais para isso.
Amasso os lábios, imaginando que o azar era o dele,
contudo, eu não poderia ser tão indiferente. Sr. Indecente havia me
acolhido na sua suíte, nesta noite em que poderia estar virando gelo
em qualquer esquina.
— Thor, eu...
— Por favor. — ele sussurra com a voz rouca, o semblante
levemente carente e em expectativa.
Os meus olhos descem pelo seu rosto bonito e fitam a boca
carnuda, umedecida. O perfume inebriante da pele recém-
ensaboada me causa várias sensações. Quero aceitar o convite,
porém eu confesso que não sei se vou conseguir fingir uma coisa
tão séria! Estava prestes a me jogar num precipício, ao aceitar ser a
falsa namorada de um cara extremamente lindo. E cafajeste.
— Tá, eu te ajudo. — falo, sem querer.
Porra, que merda estou dizendo!
— Chantel. — ele exclama e sorri.
Tarde demais.
Todas as esperanças de Thor, para se livrar da tal mulher,
estão nas minhas mãos agora.
— Porém, eu tenho várias condições. — não seria tão fácil.
O homem coça o queixo, desconfiado, para depois deslizar
as mãos para as minhas costas, enquanto eu me sinto
estranhamente confortável por tê-lo no meio das minhas pernas.
— Não me importo. Eu acato a todas elas. — ele
responde, me fitando com precisão.
Então, enumero, erguendo uma das sobrancelhas.
— Sem sexo.
— Claro.
— Sem beijos.
Ele sorri. Os dentes brancos despistando as minhas
intenções iniciais.
— Mas que porra de casal de namorado não se beija?
— Você já falou que acata a todas elas. — ele bufa,
rendido. — E sem... — acrescento, fazendo um pequeno drama.
— Sem? — ele questiona, curioso.
— Sem se relacionar com outras mulheres enquanto
estivermos nessa farsa.
Thor ajeita as mãos nas minhas coxas e sibila na minha
boca.
— Ciúmes?
Aperto os olhos, sentindo cada extremidade do meu corpo,
arrepiada.
Eu não estava enganada quando o julgava o rei da cocada
preta.
— Eu não quero ser corna, nem que seja de brincadeira.
O homem desliza as mãos pelos seus cabelos, talvez
arrependido por cogitar que eu era a garota certa para isso.
— Ótimo. Então quer dizer que você vai me colocar
praticamente um cinto de castidade?
Sorri, coçando a sua barba rala.
— Vai te fazer bem.
De repente, sinto um tranque no meu corpo, quando ele
pesa os seus braços ao redor da minha estrutura. Assusto-me com
a sua força, a pegada insana que ele me desfere.
— Eu tenho apenas uma condição.
— E qual é? — sussurro derretida nos seus lábios.
— Você não se apaixonar.
Gargalho.
— Você realmente se acha o deus nórdico.
Pulei do mármore, empurrando o corpo de Thor para o
lado, sem me dar conta de que havia esbarrado no nó da toalha,
com o joelho. E quando eu virei na sua direção, lá estava ele
novamente pelado. O membro apetitoso me roubando todo o
oxigênio, o V perfeito emoldurando os pelos pubianos, o umbigo
bem desenhado se perdendo nos gomos de sua barriga trincada.
Abri a boca e fechei a porta do banheiro, num gesto abrupto.
Definitivamente, eu estava perdida ao aceitar tal proposta, se eu não
tinha sequer maturidade para isso!

***

Estávamos sobre a cama, a dez centímetros de distância,


os quais eu havia imposto. Thor já estava devidamente vestido no
seu pijama de cinco mil dólares, enquanto eu me encolhia embaixo
do edredom, vestida num conjunto de moletom amarelo-ovo.
— Então, me fale sobre você. — ele proferiu, assim que fiz
menção de desligar a televisão para dormir. Eu já estava exausta da
viagem, principalmente das últimas emoções do dia. — Eu acho que
a gente precisa se conhecer melhor, Chantel, para poder levar à
frente o nosso namoro.
— De mentira. — fiz questão de reiterar, virando o corpo
para o lado contrário, encolhendo a minha bunda para que ele não
encostasse nenhuma unha sequer da sua mão soberba, sobre ela.
— Sou Chantel Smith, vinte e dois anos, sou recém-formada em
Direito e vou assumir uma vaga na Lions Advocacia e Assistência
Jurídica. Gosto de...
— Porra, na Lions?
— O que foi?
Viro para trás, completamente encucada com o tom de voz
de Sr. Indecente. Observo os seus olhos abismados e apenas quero
acreditar que ele esteja encenando.
— Erick Lion, o homem mais podre que eu já conheci em
toda a minha vida.
Thor está visivelmente incomodado, ele morde o lábio
inferior, entrelaçando a mão direita nas madeixas cor de tigre.
Confesso que me sinto extremamente encucada com tais
revelações. Definitivamente, eu não queria ter um chefe merda que
pudesse transformar o meu ambiente de trabalho, num pesadelo.
— Obrigada por me deixar preocupada. — confesso,
ajeitando o corpo sob o edredom.
— Desculpa, Chantel, mas esse cara trabalhou na empresa
do meu pai e o traiu de uma maneira muito cruel. Negócios...
— Bem, pelo menos vou ficar em alerta, depois dessa.
Eu já havia pesquisado muito sobre a empresa do tal Erick
Lion, antes de me arriscar na entrevista de emprego on line, e não
havia encontrado nada de suspeito, muito pelo contrário, a empresa
de assistência jurídica sempre estava envolvida em causas
grandiosas, as quais sempre ganhava.
— Desculpa, eu não queria te preocupar. — Thor profere e
depois deposita a sua mão sobre a minha. Experimento a
temperatura agradável da sua pele. — Mas eu te aconselho para
que realmente fique atenta a tudo, desconfie, seja prudente nas
palavras, enfim, tenha sempre um pé atrás com esse cara.
Imediatamente retiro a minha mão da dele e puxo ainda
mais o edredom sobre o meu corpo. Pelo menos, estávamos com
roupas de cama separadas. Eu não teria qualquer discernimento se
sentisse o corpo daquele espetáculo nórdico grudado ao meu,
durante toda a madrugada, ao mesmo tempo em que não queria
fazer escândalos para a suíte vizinha.
Ainda que estivesse com uma pulga atrás da orelha sobre o
tal Erick Lion, eu não queria que Thor me colocasse mais
preocupada quanto a isso. Caberia a mim avaliar com o meu próprio
discernimento, se valeria a pena trabalhar com o Lion ou não.
Ao mesmo tempo, acredito que tenha sido positivo saber
sobre tais revelações, já que eu havia dado uma guinada de cento e
oitenta graus na minha vida, apenas para trabalhar nessa empresa,
e tudo o que eu mais queria era me realizar na carreira, logo estava
disposta a seguir sim os conselhos de Thor.
— Eu pretendo agir da maneira mais discreta possível na
empresa. Agora, me fala de você. — tento mudar o assunto.
O moreno sorri torto, mirando os olhos escuros
exclusivamente na televisão, onde está passando um documentário
qualquer. Sem querer, eu me perco na beleza do seu rosto
quadrado.
— Sou Thor Baker, trinta e cinco anos e gosto de esquiar.
Curto de tudo um pouco, rock, blues...
E ele não me detalha nada sobre a sua profissão. Apenas
entendo que ele é um CEO muito ocupado e podre de rico. Os seus
pertences e a sua postura não me deixam enganar.
— E mais o quê?
Por que infernos ele não queria se abrir comigo?!
— Adoro viajar, culinária oriental e, também, de filmes de
terror.
— Sério? Eu amo filme de terror. — sento sobre as pernas,
completamente empolgada, esquecendo-me inclusive dos detalhes
da carreira de Thor. — A maioria das minhas amigas detesta...
— Podemos marcar uma sessão só eu e você.
— Por que não agora?
Busco loucamente pelo controle remoto no meio do
edredom, quando seguro em algo parecido. Largo imediatamente
aquela espessura, para depositar os olhos aflitos nos de Thor. Ele
sorri do meu gesto nada calculado, para depois me mostrar o
controle depositado sobre a cômoda.
Sorrio amarelo, com as pálpebras trêmulas.
Eu era um desastre.
Estico o braço, alcançando o objeto, sentindo as bochechas
arderem envergonhadas. Quantas vezes eu ainda iria segurar o seu
pau por engano ou flagrá-lo pelado?!
Deveria estar muito focada, para não me entregar ao
cafajeste de olhos pretos, deitado lindamente ao meu lado.
Thor apenas atrapalhava os meus planos, justamente por
ser um metro e noventa de pura perdição.
Finalmente, acesso o cardápio de filmes na Netflix e juntos
escolhemos um que ainda não havíamos assistido.
— Chantel, se você sentir medo, não faça média. A gente
muda de filme.
— Mais fácil você se jogar nos meus braços, implorando
para desligar.
E no meio de mais algumas trocas de farpa, assistimos
juntos ao filme Cadaver, sem desgrudar os olhos da tela. Admito
que, vez ou outra, eu ainda me permitia jogar as pupilas no rosto
daquele lindo homem. Ele estava sério, compenetrado, exibindo a
mesma postura de um CEO renomado. Não demorou muito para eu
pegar no sono, antes mesmo do filme terminar. Confesso que a
única sensação que tive foi a de um beijo carinhoso sendo
depositado sobre a minha testa.
Dessa vez, Chantel Smith permitiu que eu a ajudasse com
as suas bagagens, até o táxi. A tempestade de neve já havia estiado
e era bem cedo quando ela chegou ao quarto com uma tintura na
mão, empolgada para colorir o meu cabelo.
Assim que deixei aquela louca jogar o produto fedorento na
minha cabeça, senti medo, mas admito que as suas mãos delicadas
massageando os meus fios, me fizeram relaxar. Chantel era doce
sim, embora a sua língua estivesse sempre afiada.
— Você não me falou sobre a sua mãe. Será que ela vai
gostar de me conhecer, no lugar da tal modelo famosa?! — a loira
perguntou, assim que adentramos o táxi, na direção do hotel onde
Chantel iria morar pelos próximos dias, até alugar um apartamento
na cidade.
— Não se preocupe com a mamãe, ela não mora neste
continente.
— Não?
— Ela conheceu um grego milionário, num desses almoços
de negócio do meu pai, e infelizmente o traiu, fugindo com o amante
para Mykonos, deixando a mim, apenas com cinco anos de idade.
Karl, com doze anos, foi quem ajudou a me criar.
Chantel me encarou com amabilidade, enquanto
depositava as suas mãos em luvas de couro, sobre as minhas.
— O seu irmão então é praticamente o seu segundo pai.
Talvez o noivado por obrigação começava agora a fazer
todo o sentido para ela.
— Exatamente, e as minhas tias ficaram no lugar de
mamãe.
— Então é sobre elas que preciso saber. — proferiu, me
desferindo um olhar bonito, ao mesmo tempo em que ajeitava a
touca preta sobre os cabelos fartos e loiros.
Pisquei os olhos lentamente, antes de dizer qualquer coisa.
A sua beleza me deixava mudo.
O sorriso atraente não negava o quanto Chantel estava
empolgada com a nossa história, sentia que ela estava
verdadeiramente disposta a me ajudar. Sem falar no quanto ela me
fazia repensar sobre um namoro de verdade. Tudo nessa menina
me atiçava, a beleza, a ironia, o jeito que sorria exibindo covinhas, o
tom da sua risada, a maneira angelical como ela dormia. E me dava
raiva só de imaginar que já dormimos juntos duas malditas vezes,
sem nem ao menos termos transado! Mas o mais lógico seria eu
seguir nessa farsa, ou correria sérios riscos de me perder de vez,
nas confusões que Chantel me causa.
— Se você gosta de mim, é óbvio que as minhas tias vão te
adorar.
— Sim, eu gosto de você, — ela me encara com os olhos
azuis expressivos e estranhamente o meu coração erra uma batida.
— mas não sei se é da maneira que convém a elas.
Aperto os lábios em um sorriso. Adorava a ingenuidade de
Chantel em certos momentos, porém o seu único defeito era que ela
seria assistente do Lion, e exatamente por isso que preferi omitir
detalhes da minha empresa, dos meus negócios. Não que ela
pudesse fazer por mal, mas, sem querer, poderia entregar ao
pilantra alguma situação que diz respeitasse apenas a mim.
— A minha regra é você não se apaixonar. — enfatizo e a
menina revira os olhos. — Gostar já é completamente diferente.
Pode ser sem medo.
— Você é assim o tempo inteiro?
— Como?
Ela joga os cabelos para trás e acrescenta:
— Atrevido.
— E você é diferente disso? — ergo uma sobrancelha e
Chantel umedece os lábios cor-de-rosa, antes de me responder.
— Devo ser, porque você me escolheu como a aliada de
um plano.
Sorrio.
Eu não deveria esperar menos dela.
— Você é afiada.
— Não coloquei como regra, mas é melhor você também
não se apaixonar. — olhei compenetradamente para os seus olhos.
— Afinal, você não é o homem ideal para mim e, além de tudo,
ainda é muito bonito.
Ela concluiu, parecendo que havia acabado de dar um
xeque-mate. O seu olhar era altivo e me cobria de maneira segura.
— Muito bonito? — cruzei os braços, as maçãs do seu
rosto ainda vermelhas.
— Imagina? Eu não teria paz! Não confio em homens muito
bonitos. Eu sei que posso estar sendo preconceituosa, mas não me
sinto tranquila para me envolver com quem chama muito a atenção.
Gargalho, sem evitar de incomodar o taxista.
— E do que você gosta, então?
— Na verdade, eu não me importo com aparência, traços
perfeitos. Não adianta um cara belo e extremamente idiota.
— E eu sou só aparência para você?
Chantel começa a tossir, como se engasgasse com as
salivas. Eu adorava deixá-la sem palavras, o que não era muito fácil.
— Por que não me contou sobre o seu emprego?
Namorados sabem de tudo! Precisa parecer verídico o nosso plano.
Ela desvia o assunto e também o olhar do meu. Agora
Chantel observa a paisagem, assim que atravessamos a ponte do
Brooklyn.
Eu não poderia detalhar. O merda do Lion estava sempre
atento a tudo, poderia muito bem ferrar com os meus negócios, da
mesma maneira que fez com o meu falecido pai.
— Você já sabe, Chantel, eu sou CEO de uma empresa de
automóveis.
Ela virou o rosto bonito e impetuoso para mim.
— Certo, então. Se me colocarem numa saia justa sobre
isso, que você esteja ao meu lado para poder me socorrer.
— Vai dar tudo certo. — apertei firmemente as suas mãos
pequenas. A loira, então, deixou escapar um breve gemido pelo
intervalo dos seus lábios. — Não sei como te agradecer. Só espere
pelo seu vestido, hoje, mais tarde.
— Vestido?
O seu rosto era uma perfeita interrogação, mas era o
mínimo que eu poderia fazer por ela.
— Vai chegar no hotel. Eu mesmo vou escolhê-lo para
você.
— Eu não gosto de vestidos que me deixem velha ou
exposta demais.
Sempre direta, é claro que ela iria fazer questão de expor a
sua preferência.
— As suas meias de cachorrinho me dizem muita coisa,
Doutora Smith. Fique tranquila.
Ela olhou para as suas canelas e fez questão de exibir os
poodles nas suas meias brancas. Chantel sorriu para mim e, mais
uma vez, isso foi a minha ruína. A loira sabia muito bem que o seu
sorriso seguro seria capaz de quebrar qualquer um, até um cara
averso a romances.
A sua beleza e impetuosidade só tornavam as coisas mais
difíceis.
O nosso tempo juntos passou tão rápido que nem me dei
conta quando o táxi estacionou em frente ao hotel. Após trocarmos
os nossos números, Chantel deixou um aceno, mas eu segurei
firmemente na sua mão e prontamente depositei um beijo sobre o
dorso perfumado, que já se encontrava sem a luva de couro.
Prontamente ela me desferiu um maldito sorriso tentador, sem
conseguir evitar os seus olhos caídos dentro dos meus.
— Hoje, às 19h. — informei.
Ela não respondeu nada, apenas me deu as costas,
fazendo com que a bagunça dos seus loiros me atingisse em cheio
o rosto. O perfume de mel invadiu a minha alma, a bunda
avantajada dançando por baixo do sobretudo, chamou
tentadoramente a minha atenção. A loira subiu as escadas,
carregando as suas malas até o funcionário do hotel. Dessa vez, ela
o deixou ajudá-la.
Os meus olhos ainda se perdiam naquela bela imagem. O
taxista acelerou, antes mesmo que eu pudesse ver Chantel
entrando na porta giratória.
No final das contas, eu deveria me comportar, já que a
menina estava apenas me fazendo um grande favor, demonstrando,
inclusive, por diversas vezes, não querer sustentar nenhum lance
comigo, apesar da chama acesa nos nossos corpos, quando
estávamos juntos.
Sem falar que as minhas intenções do momento eram
apenas as de focar na minha carreira, nos negócios, nas parcerias.
Logo, controlar os meus instintos se tornou a grande prioridade — e
o desafio — nesses próximos dias.
Precisava de um bom banho e horas de sono. Dormir a
última noite ao lado de Thor Baker não foi nada fácil. O belo
moreno, que exalava sexo por seus poros, esteve deliciosamente
vulnerável ao meu lado, por toda a madrugada. Tive que evitar,
inclusive, de jogar o meu corpo contra o dele e deixar as faíscas,
que nos envolviam, falarem mais alto do que os muros que impus
nesse relacionamento de fachada. Sem falar que foi incrível
compartilharmos juntos aquelas horas, principalmente quando
assistimos ao filme de terror. Se não fosse todo o meu cansaço,
ainda toparia assistir a mais um, para desfrutar um pouco mais
daquela companhia agradável — e sexy — que fatalmente me
retirava de todos os eixos.
Jogo o corpo sobre a cama, imaginando a merda que havia
feito ao aceitar tal acordo. Eu só poderia estar fora de mim,
enfeitiçada, mas na verdade estava sem graça por ter deixado o
homem “loiro pivete”, nas vésperas do seu noivado.
Retiro as botas com os pés, quando me dou conta de que
há alguém batendo à porta. Deveria ser o vestido? Mas será que
Thor já teve tempo o suficiente para escolhê-lo?
Prontamente me levanto da cama e dou uma pequena
corrida, esticando a mão na maçaneta, quando vislumbro uma moça
com o uniforme do hotel, estática à minha frente.
— Senhorita Smith? — ela pergunta e eu assinto,
preocupada. — Pediram para entregar esta correspondência.
Imediatamente, sem fazer nenhuma média, pego o
envelope das mãos da mulher e faço logo questão de abri-lo. Eu só
pensava nos meus pais. Os meus olhos correm insaciáveis pelas
pequenas letras, quando o meu coração para por um instante.
Olho atordoada para a moça, então percebo que ela está
esperando por uma gorjeta. Sem demoras, pego alguns dólares
sobre a mesa do quarto e deixo nas suas mãos. Ela agradece e sai,
sorridente.
Fecho a porta e me jogo na cama, sentindo o sangue
esquentar as minhas veias. Era a porra de uma reunião do trabalho
que aconteceria no restaurante do hotel, uma hora mais tarde que o
meu compromisso com o Thor! Que merda de coincidência!
E agora? O que eu poderia fazer? Definitivamente, eu não
voltaria atrás com a minha promessa a Thor. Eu dei a ele a minha
palavra e jamais o deixaria na mão em situação tão delicada. Por
um outro lado, eu tinha o meu trabalho, o meu grande sonho de
consolidar a minha carreira em Nova York, que foi exatamente o que
me trouxe até aqui. Nunca que eu poderia deixar de me apresentar
no primeiro compromisso da Lions. Isso seria muito irresponsável da
minha parte e eu corria todos os riscos de ter a minha imagem
arruinada.
Jogo o envelope sobre a cabeceira e mordo o canto das
unhas, transtornada.
Estava entre a cruz e a espada.
O silêncio da suíte, sem querer, me traz as lembranças de
Thor, o meu companheiro, nas últimas horas. Tão educado, gentil
e... um atrevido. Não posso me esquecer das vezes em que ele
ficou pelado “sem querer” e a maneira como ele tentou me
reivindicar um beijo.
Sorrio de mim mesma e depois cato algumas coisas, na
minha mala, antes de entrar no banheiro, um roupão de pugs e
também um sabonete esfoliante, para me ajudar a relaxar num bom
banho e colocar todos os pensamentos no lugar. Eu precisava
resolver logo esse empasse, afinal, o relógio não sentia piedade
alguma de mim.
Meia hora depois, saio do banheiro. Ainda de roupão, e
completamente preocupada, desfaço a mala em segundos,
deixando tudo organizado nos armários. Casacos de um lado,
camisas e calças do outro. Os meus olhos brilham com tanta
organização.
Exausta, apenas decido me afogar no edredom e dormir
pelas últimas horas, precisava estar bastante disposta e sem
olheiras, já que um desafio enorme e cheio de músculos me
aguardava às 19h. Só que antes, precisava decidir se conseguiria
chegar a tempo para a reunião de trabalho. Ainda em cólicas,
resolvo solicitar à recepção um hambúrguer com várias carnes e
molhos, e um balde de batata frita, só assim eu poderia controlar a
minha ansiedade e decidir pelo melhor a ser feito.

***

Abro os olhos delicadamente, quando ouço alguém me


chamar à porta. Corro na direção da maçaneta e me dou conta de
que o meu vestido havia chegado. Os meus batimentos aceleram, a
ansiedade para enfrentar esse grande desafio junto a Thor, me
deixa sem voz. Era tentador demais fingir ser a namorada de um
belo CEO, apenas para livrá-lo de um noivado imposto.
— Obrigada! — agradeço ao rapaz, segurando no cabide
que sustenta a vestimenta.
Ansiosa, jogo o embrulho sobre a cama, abrindo-o
imediatamente. Os meus olhos marejam com tamanho luxo, a ponto
de eu decidir chegar atrasada na reunião de trabalho, sim.
Eu só poderia estar louca.
Retiro imediatamente o roupão, visto as minhas peças
íntimas e entro no vestido, como se naquele momento, eu
assumisse a postura de namorada de Thor Baker.
Nada mais importa.
— Uau, como estou linda!
Eu não estava acostumada com tanto luxo.
Prontamente me observo no espelho e me dou conta de
que o vestido é perfeito, preto e muito elegante. Não muito
decotado, mas tinha o seu charme e sensualidade, inclusive uma
bela fenda lateral, que rasgava desde o alto da coxa.
Thor havia me dissecado com precisão, pois as medidas
pareciam perfeitas. Um arrepio morno me envolveu, de repente,
apenas por me dar conta disso, o coração acelerou ansioso pelo
encontro. Imediatamente catei o meu celular, que estava depositado
sobre a mesa redonda de canto, e me dei conta de que tinha
apenas uma hora e meia para me arrumar.
Um sorriso bobo desenhou a minha boca, enquanto as
borboletas voavam loucas no meu estômago. Eu estava mais que
disposta a viver um compromisso de mentira com Thor Baker.
Ajeitei a gravata no espelho do elevador, sem evitar um
sorriso genuíno nos lábios. Estava extremamente ansioso para
reencontrar Chantel e admito, inclusive, que senti falta da sua
presença petulante nas últimas horas. Queria fitar o belo corpo no
vestido que escolhi a dedo para ela. Eu sempre fui muito detalhista,
sobretudo nesse quesito, e tinha certeza que a peça havia ficado
perfeita na garota.
Dou três toques na porta e não demora muito para ela se
abrir.
— Merda. — xingo, baixo. — Quarto errado. Perdão.
— Não, não, não.
Uma moça baixinha de franja segura impetuosamente no
meu braço. Recuo alguns passos com o seu gesto atrevido, sem
saber que porra ela queria comigo.
— Você é o Thor Baker? Empresário do ramo
automobilístico!
Olho para ela, desconfiado.
— Sim, sou eu. A recepção me informou que Chantel Smith
está hospedada neste quarto.
A moça franziu o cenho, desconfiada, mas em seguida fez
um gesto para que eu adentrasse o cômodo.
— Eu sou Cristal e estamos dividindo essa suíte.
Inferno. Mais uma pessoa ligada a Erick Lion que saberia
do meu envolvimento com uma de suas assistentes. Contudo, não
sei se Chantel manteve a discrição ou fez questão de explanar o
nosso plano para a nova colega.
— E onde está a Chantel? — pergunto intrometendo os
olhos indiscretamente para dentro do banheiro.
A minha curiosidade não me deixava relaxar nenhum
minuto sequer.
— A Chantel? Ela foi até o restaurante. Já deve estar
chegando. — a menina informa, caminhando lentamente na minha
direção, com botas estranhas. Os seus olhos caídos me causam
receio. — Quer uma água, um refrigerante... — e, de repente, ela
começa a enrolar o dedo na minha gravata. — um vinho?
— Eu não quero nada, obrigado. Chantel e eu temos um
compromisso! O que infernos ela foi fazer em um restaurante a
essas horas?
— É o restaurante do hotel, relaxa. Ela só foi pegar umas
bebidas para gente.
Prontamente desvio o meu corpo daquela presença
incisiva, para me sentar em uma das cadeiras de uma mesa
redonda, que ficava no canto do quarto, torcendo para que Chantel
chegasse logo, antes que eu fosse estuprado por sua coleguinha.
— Thor... — ela sibila dando pequenos passos até mim. As
suas mãos bagunçam os seus cabelos ralos, enquanto eu pigarro,
constrangido. — Sabia que eu nunca estive sozinha em um quarto,
com um cara tão atraente, elegante, gostoso...
Bufo, exasperado.
— Azar o seu. — despejo, tentando intimidá-la, mas a
menina praticamente geme com a minha resposta atravessada.
— Para de charme. — inspiro num susto quando ela se
senta de frente no meu colo. — Um beijo só não é pecado.
A moça rebola no meu colo, enquanto estica as mãos nos
meus cabelos, praticamente forçando a minha boca à dela. Desvio
de todas as maneiras possíveis, quando sinto o meu rosto sufocado
no meio dos seus seios.
Dois gigantes seios.
Ela grunhe, amassando o decote do moletom contra a
minha boca, enquanto tento empurrá-la com toda a minha força,
mas é em vão.
Agora eu entendo todo o desespero dos personagens dos
filmes, quando são asfixiadas por travesseiros.
— Ai, Thor...
A louca está prestes a ter um orgasmo, e tudo o que faço é
tentar desviar, sentindo o ar me faltar aos poucos.
Tento virar o rosto para o lado, mas o volume de seios me
sufoca. Jogo o corpo para trás, contudo Cristal se sente ainda mais
à vontade em me esfregar aquelas malditas tetas.
O que caralhos está acontecendo aqui?
Seguro nos braços da garota, mas ela ainda força a minha
nuca. O roça-roça é constante no meu pau, porém a adrenalina é
tanta que não consigo me entregar a qualquer desejo.
— Morde, Thor... morde...
A minha vontade é de mordê-la como se fosse um bife,
apenas para que a garota sentisse dor e recuasse, mas eu não
poderia colocar a minha imagem em risco, agindo como um maldito
agressor de mulheres.
O meu oxigênio é roubado aos poucos, ao mesmo tempo
em que as minhas mãos apertam com gana os braços da maluca,
imaginando os noticiários de amanhã, “CEO renomado, Thor Baker,
é asfixiado por tetas, em suíte de hotel em Nova York”. Merda, seria
patético.
Finalmente, consigo conter a menina com os braços,
afastando-a de mim e, apressado, saio da suíte, em poucos passos,
quando encontro Chantel, abrindo a porta ao lado!
— O que está acontecendo aqui? — ela pergunta,
desconfiada.
Sinto o ar retornando aos poucos para os meus pulmões,
exatamente no momento em que vislumbro Chantel extremamente
linda, à porta.
— Essa louca me atacou. — justifico, caminhando atônito,
e ainda resfolegante, na direção da loira. — Pelo jeito, eu bati na
porta errada e ela mentiu para mim que estava dividindo a porra do
quarto com você, só para me atacar!
Devolvo um olhar revoltado a Cristal, que apenas cruza os
braços e se delicia com a nossa cena.
Ainda estou sem ar, não apenas por ter sido praticamente
assassinado há pouco, porém a beleza de Chantel, estática à minha
frente, me rouba ainda mais todo o oxigênio.
Ela está deslumbrante. Uma trança loira atravessa os seus
seios delicados, a maquiagem é elegante, sem falar no vestido que
destaca as curvas do seu corpo, sem demonstrar qualquer
vulgaridade. Perpasso a mão pelos cabelos, completamente em
êxtase. Sem sombra de dúvidas a minha namorada de mentira é
muito mais linda que a modelo famosa Stella Bronks.
Os azuis dos olhos de Chantel são duas poças cristalinas,
os seus lábios recebem um tom aveludado, além da coxa
extremamente sensual despontando do tecido preto e brilhante,
como se fosse uma peça de porcelana. Sem querer, os meus
pensamentos voam. Beijo a coxa de Chantel fazendo-a arrepiar,
enquanto os meus dedos se entrelaçam nas laterais da sua
calcinha...
— É sério, eu nunca vi um cara tão lindo... e de terno...
uau...
Expiro, ao me dar conta de que Cristal ainda falava
asneiras nos meus ouvidos.
Eu nunca havia sido atacado dessa maneira, por mulher
alguma! Muito menos resistido à uma boa rebolada no meu colo.
Sem perceber, vislumbro Chantel caminhando nos seus
saltos, para o interior do quarto e depois batendo a porta num
estrondo. Ela estava bastante irritada para quem estava apenas
fingindo um romance.
— Você não tem discernimento? — questiono à Cristal. —
Como vai se atracando dessa maneira, com um cara que você nem
conhece, só por que se sentiu atraída?
A menina revira os olhos, em resposta, extremamente
debochada, quando eu percebo que ela faz menção de limpar a
minha boca, mas eu desvio.
— Eu te sujei com o meu batom. — ela informa, para
depois dar de ombros e adentrar o seu quarto.
O meu jeito frio sempre afastava as mulheres. No entanto,
com Chantel, era completamente diferente, eu agia da maneira mais
espontânea possível, era como se ela pudesse extrair o melhor de
mim, apenas por estarmos perto.
Prontamente limpo a boca com um lenço e me sinto idiota
por ter caído na lábia de Cristal, ao mesmo tempo em que a reação
tão autêntica de Chantel ainda me encuca.
Bato à porta, já recuperado daquele susto tosco e não
demora muito para a loira surgir ainda mais bela, à minha frente.
As bochechas de Chantel são dois tomates. Está
visivelmente constrangida, sem falar que a cena que flagrou há
pouco, havia mexido com ela de certa maneira.
— Vamos, Thor. — profere, apressada, entrelaçando o seu
braço delicado ao meu. — Ou quer se despedir da sua amiga?
— Eu não conheço aquela mulher.
— Claro. Você é tão lindo a ponto das mulheres não
conseguirem lidar com isso. — ironizou. — Agora você entende
quando digo que não quero compromissos com homens muito
bonitos.
— Seus argumentos são perfeitos, Chantel. Sem sombra
de dúvidas, você é uma excelente advogada. — devolvi a ironia,
assim que adentramos juntos o elevador.
Em seguida, ajeitei o terno no corpo e também os cabelos
no reflexo do espelho, me dando conta de que a maluca havia
praticamente me amarrotado inteiro.
— Você ficou realmente com ciúmes? — perguntei.
Por mais que Chantel negasse, eu percebi o tom da sua
voz, a maneira como arregalou os olhos por ter me flagrado junto à
sua vizinha.
— Ciúmes? Eu só achei que ela te desrespeitou. Sem falar
que uma das minhas condições era que você não se envolvesse
com ninguém! — e deu uma risada de incredulidade. — Estava no
salão me aprontando para o nosso compromisso, e quando retorno,
eu te flagro todo descabelado e sujo de batom, saindo da suíte ao
lado. Que merda quer que eu pense!
Saímos juntos do elevador, enquanto Chantel mantinha
espontaneamente o braço unido ao meu.
E eu gostava dessa sensação.
— E se de fato tivesse rolado um beijo entre mim e ela?
— Eu não teria culpa do seu mau gosto. — sorrio afetado
pelo atrevimento da garota. Tudo nela soava muito espontâneo,
sincero, atraente. — E outra coisa, Thor. Eu não quero passar a
imagem de uma mulher que aceita passivamente as aventuras do
seu namorado cafajeste. Eu não admito ser “traída”, quando o meu
intuito é apenas o de te ajudar! Quantas vezes é preciso repetir?
— Porra, não rolou nada. — passo as mãos pelos bolsos,
buscando pelo controle do carro. Merda, só faltava eu ter deixado
cair na suíte daquela louca. — A não ser os peitões daquela garota
que estavam praticamente implorando para entrarem na minha
boca. — sorrio torto, assim que encontro finalmente o controle.
— Que nojo. — Chantel revira os belos olhos maquiados.
— Não sabia que você sofria da síndrome do bezerro desmamado.
Enrugo as sobrancelhas.
— De onde você tira essas merdas?
— A culpa é sua.
Ela cruza os braços, exibindo uma linda carranca, ao
repousar o corpo contra o carro.
— Essa é a nossa primeira briga. Percebeu? — informo,
ajeitando uma mecha de cabelo loiro que cai sobre o rosto de
Chantel, ao lado de sua bela trança.
Ela era absurdamente linda.
— Então, começamos bem? — ela pergunta e resolve me
olhar, exibindo um semblante mais tranquilo.
Instintivamente, eu me aproximo, colando os nossos
corpos, tentado a beijar a boca carnuda e vermelha, extremamente
apetitosa, mas segundo Chantel eu não poderia.
Ser proibido de beijá-la era uma das coisas mais injustas
que já havia acontecido comigo, até agora.
— Tudo que começa bem, termina ainda melhor.
Concorda? — profiro, amassando o meu quadril ao dela.
Chantel expira e se move lentamente, ao sentir o meu pau
na sua virilha.
— Poderia ter falado isso à Cristal, para ver se ela se
renderia na sua cama.
Seguro no queixo da menina.
— Na minha cama, agora, só cabe você.
— Thor. — ela retira a minha mão do seu alcance. — Já
feriu uma condição que impus, e agora quer atropelar a outra?
— Não me importo de cometer esse crime.
A garota sorri, perplexa.
— Então, você é um homem sem palavra?
Beijo delicadamente a sua bochecha, e observo os braços
da loira arrepiando, aos poucos.
— Sem dramas, Chantel, eu sei o quanto você está
entregue...
Inspiro o cheiro cru da sua pele, em meio a beijos na curva
do seu pescoço, enquanto o volume cresce absurdamente no meio
das minhas pernas, apenas por tocar Chantel com mais intimidade,
deixando que somente os desejos sejam o guia dos meus gestos.
— Só temos um acordo a cumprir, nada além disso. — ela
sibila, áspera, mas ainda envolvida com as minhas carícias.
Com cuidado, deslizo as mãos pelos seus ombros nus,
Chantel umedece os lábios, ao fitar bem no fundo dos meus olhos.
— Um acordo que dura apenas esta noite. — profiro, no
seu ouvido. — Amanhã, é um outro dia.
Quando penso que podemos nos acertar e chegar à casa
da minha família, sustentando um caso, que seja, a menina reage,
de repente, se afastando.
— Você está com o perfume daquela Cristal! — e espalma
as mãos contra o meu corpo. — Eu não confio que você não tenha
beijado aquela garota! — vocifera, irritada.
Chantel poderia negar, mas as suas atitudes eram reais
demais para admitir que estava apenas encenando os seus
sentimentos.
Eu sentia que ela estava na mesma sintonia que a minha.
Eu tinha certeza disso, já que me envolver com milhares de
mulheres, apenas me deixou mais experiente para entender alguns
de seus sinais.
— Vamos esquecer da Cristal agora, querida. — informei,
acionando o controle do Rolls-Royce. — Eu só preciso te agradecer
por isso, e dizer o quanto você está linda. — proferi, assim que abri
a porta do carro para Chantel. Prontamente ela se sentou ao
carona.
Os seus olhos estavam brilhantes, consternados, muitas
emoções a envolviam neste momento.
Imediatamente, dei a volta no carro e me sentei ao lado da
minha adorável irritante.
— Thor, eu amei o vestido. — ela transparecia sinceridade.
— Você é realmente minucioso. Ele é perfeito para mim.
Sem intenções, os meus olhos dançaram por aquela
belíssima imagem, outra vez. Começando pelo decote, onde fios
loiros se intrometiam, seguindo pelo belo par de coxas, onde uma
estava deliciosamente exposta.
Simplesmente segurei no queixo da minha garota, sentindo
a sua respiração tocar delicadamente a minha mão.
— Vai dar tudo certo. — sussurrei, observando um sorriso
brotar na sua boca desenhada. — Jamais desconfiarão que não
somos o casal perfeito.
— Não me restam dúvidas. Você vai conseguir se livrar
desse compromisso, para continuar seguindo na sua vida de
boemias.
Abaixei os olhos, incomodado, para depois dar a partida no
carro.
Por que caralhos a minha liberdade não me preenchia mais
os olhos, como sempre foi?
O que eu mais desejava, no momento, era possuir Chantel,
para ter ainda mais certeza, que mulher nenhuma poderia ser capaz
de me satisfazer, a não ser ela.
Thor estacionou o carro em frente a uma belíssima mansão
e os meus olhos marejaram. Árvores centenárias contornavam
aquela elegantérrima construção de três andares em tom pastel,
que se destacava no gramado que avançava pelo quarteirão.
O meu coração disparou, quando me dei conta de que
faltava muito pouco para eu ser apresentada à família Baker, como
a namorada de Sr. Indecente.
Esperava sinceramente dar conta de toda a farsa, não
cometer nenhum deslize para as tias e o irmão de Thor, pois ele,
mais do que ninguém, merecia se livrar de um compromisso
imposto. Na verdade, nenhum ser humano na Terra merecia uma
aberração desse tipo.
E admito que o meu coração disparou, quando me deparei
com toda a beleza de Sr. Indecente, no corredor do hotel, e
confesso que não poderia condenar toda a loucura de Cristal, ao se
ver sozinha com aquele homem de beleza estonteante. Ainda que a
sensação de ter sido traída me encucava e me deixava
estranhamente irritada, eu não poderia ferir qualquer condição que
impus, ou essa seria a minha sentença definitiva.
Thor estava tão asseado no terno preto, com a camisa
branca que marcava discretamente a curva dos seus músculos e a
gravata também preta com textura, que combinava com o tom de
seus olhos. Embora o casaco insistisse em ocultar aquelas curvas,
as minhas pupilas eram perspicazes demais para não perceberem
toda aquela tentação. Sem dúvidas, ele era o próprio deus nórdico.
— Vamos, Chantel? — a sua voz ressoou grave e os pelos
dos meus braços se ergueram.
O que me restou foi assentir, entrelaçando os meus dedos
aos dele, assim que ele esticou a sua mão bruta na minha direção.
Levantei do carona, desfilando em meus saltos, até as escadarias
do casarão. Apertei os olhos, para enxergar melhor, uma figura que
nos esperava à porta. Era uma mulher muito elegante, trajada em
um uniforme de governanta, a típica senhorinha desses filmes de
grã-finos.
Estava atordoada com tanto luxo e confesso, inclusive, que
eu não sei se saberia me comportar com todas as regras de
etiqueta, sem deixar nenhuma gafe, afinal, não estava acostumada
com todos esses frufrus.
— Boa noite, Sra. Foster. — Thor proferiu educadamente,
mas a mulher não nos cumprimentou de volta, apenas levou as
mãos à boca, quando se deu conta de que o noivo estava chegando
acompanhado, para o próprio noivado.
O cheiro da encrenca havia ficado ainda mais cru.
— Boa noite, Sr. Thor Baker e senhorita...
— Smith. — ele respondeu.
A mulher apenas me avaliou dos pés à cabeça, enquanto
sorri amarelo para ela e passei pela porta de braço dado com o
Thor, sentindo um calor infernal, dentro do meu sobretudo de pelo.
Todas as pessoas presentes naquela sala se levantaram
dos sofás, no momento em que chegamos. Duas mulheres muito
elegantes em trajes de gala me chamaram imediatamente a
atenção. A mais alta usava uma pele de guaxinim ao redor do
pescoço, a outra, um colar exagerado com uma pedra vermelha,
brilhante, que, para mim, mais se parecia com uma bala de cereja,
além de um senhor muito parecido com Thor, que deveria ser o seu
irmão mais velho, acompanhado de uma mulher e duas meninas
adolescentes.
Olhei para Thor e ele sustentava um sorriso tímido na boca,
sem falar no seu olhar seguro que era extremamente invejável, ao
passo que a minha vontade, no momento, era a de sair dali
diretamente para o colo da minha mãe.
— A Stella ainda não chegou? — Sr. Indecente perguntou,
enquanto eu entrelaçava o meu braço ainda mais ao dele.
Só faltava a tal modelo surgir de alguma porta e nos flagrar,
sem eu ao menos ter tomado uma taça qualquer de bebida
alcoólica.
— O que significa isso, querido? — pele de guaxinim
perguntou.
Apenas nos entreolhamos, simulando olhares apaixonados.
Thor não a respondeu, simplesmente se colocou atrás de mim e
retirou delicadamente o meu sobretudo de pelo, para entregá-lo à
governanta, em seguida. Quando pensei que ele fosse me convidar,
para sentar, senti um beijo atrevido colar na curva do meu ombro e
pescoço. Esbocei uma carranca, mas quando me dei conta de todos
aqueles olhares nos avaliando, arqueei os lábios em um sorriso
doce.
— Por que você veio acompanhado dessa menina! Isso é
uma afronta! O que você quer? Desonrar o nosso pai?
Sr. Indecente não se intimidou com as farpas do irmão,
apenas colou os nossos corpos e apertou firmemente a minha
cintura. Confesso que senti o meio das minhas pernas piscar três
vezes.
— Ela é Chantel Smith, a minha namorada.
Todos abriram a boca e esboçaram expressões de
assombro, enquanto eu sentia o meu rosto esquentar
gradativamente.
— Boa noite. — sorri, transparecendo simpatia, ainda que a
minha voz denunciasse muito desespero.
— Filho, você quer nos matar do coração? — bala de
cereja lamentou.
— A Stella já está a caminho e você conhece muito bem a
personalidade da sua futura sogra. — a cunhada de Thor fez
questão de apontar, enquanto eu apenas avaliava o semblante
impaciente do deus nórdico.
Definitivamente, não esperávamos que fôssemos adentrar
aquela espécie de tribunal, seria muito mais fácil se a família Baker
aceitasse o nosso romance. Quer saber? Ao meu ver isso tudo
soava como ridículo.
— Eu estou apaixonado. — Sr. Indecente vociferou e eu o
encarei completamente atordoada. Ainda que fosse de mentira,
mexia com as minhas emoções. Mas que porra eu estava
pensando? — Sou um homem completamente livre, independente,
dono da minha própria vida! Pelo amor de Deus, chega de tanta
cobrança! Qualquer que seja a condição, eu não vou noivar com a
Stella!
— Cara, não delira. A sua noiva está a caminho. — Karl
implorou pelo discernimento do irmão, ao mesmo tempo em que as
mulheres da família voltaram a se sentar no sofá.
Os dois estavam agora frente a frente, ao passo que eu
ainda sustentava o meu corpo, e todas as emoções que me
consumiam, apoiados a Thor.
— Exatamente por isso que eu estou aqui, Karl. Não quero
fugir dos meus compromissos, Stella vai entender tudo quando ver a
Chantel.
— A sua namorada sabe que está correndo risco de vida?
Olhamos atordoados para trás, quando nos damos conta
de que uma das sobrinhas de Thor fez questão de ressaltar que eu
estava com as horas contadas. Puta que pariu, morrer virgem era
sem sombra de dúvidas a pior das possibilidades.
— Amber, por favor. — guaxinim advertiu.
— O que ela quis dizer com isso? — imediatamente
perguntei a Thor.
Se fosse o caso, eu juro que me lançaria com ele no
primeiro banheiro que visse disponível ou quem sabe nas próprias
escadarias da mansão, e entregaria a minha virgindade a Sr.
Indecente, neste exato momento. Seria cruel demais morrer
intocada.
— Ela é só uma menina. Não sabe o que está falando. —
Sr. Indecente retrucou.
— Sente-se aqui, querida. — bala de cereja veio ao meu
encontro. — Vamos tomar um bom vinho para relaxar.
As coisas estavam começando a fluir.
— Obrigada, senhora...
— Olga Baker.
Assim que aconcheguei o meu corpo, em um daqueles
sofás macios e brancos feitos louça, um garçom elegante se
aproximou com uma bandeja repleta de taças. Imediatamente
peguei uma, sedenta, desejando que o meu juízo me abandonasse
um pouco. Eu precisava de umas boas horas de delírio.
— Senhora Olga, Thor e eu precisamos ficar juntos. Os
nossos sentimentos...
— Não podem falar mais alto do que um pedido do nosso
pai.
Olhei para cima, completamente aturdida, quando fui
interrompida por Karl. Os seus olhos negros, como os do irmão, me
devoravam, ao mesmo tempo que Thor, ao seu lado, fazia
expressões de desespero para mim, que denunciavam o quanto ele
estava fodido.
— O nosso pai certamente ficaria muito satisfeito com o
meu relacionamento. Chantel é uma menina de ouro. — Sr.
Indecente ainda conseguiu acrescentar.
— Vocês já estão juntos há muito tempo? — guaxinim
perguntou do outro lado do sofá.
— Há um mês. A vida foi cruel e generosa comigo na
mesma época. — Thor transparecia segurança. O medo do
compromisso era o seu diploma de ator. — Papai se foi e eu conheci
a Chantel, alguns dias depois, em um pub da cidade. Eu estava me
sentindo sozinho, sem qualquer norte, depois que perdi uma das
grandes referências da minha vida, mas essa garota chegou de
repente e me apresentou um outro lado da minha realidade. Ela me
aconselhou a não desistir de ser feliz. — Thor estava visivelmente
emocionado.
Os seus olhos marejados mergulharam nos meus. Não
duvidava nada que ele estivesse desejando, que tudo o que havia
acabado de inventar, fosse de fato realidade.
As minhas pernas amoleceram, com essa possibilidade.
— Porra, já havíamos conversado sobre a Stella! — Karl
vociferou, enquanto eu bebia mais um pouco do vinho.
Os ânimos nem tão cedo se acalmariam, considerando que
a modelo já estava prestes a chegar.
— Karl, você é apaixonado pela sua esposa! Caralho, não
entende o que eu estou sentindo? — Thor argumentou, enquanto
bala de cereja nos avaliava com os olhos brilhantes, talvez já
estivesse empática com o nosso suposto romance.
Deus do céu, aonde isso tudo ia parar?
— Eu nunca precisei descumprir com um pedido do papai.
— Karl proferiu, se sentindo o máximo, enquanto eu experimentava
uma tremenda empatia por Thor.
Parecia que havia uma disputa entre os irmãos, vindo da
parte do mais velho, é claro. Karl era casado, tinha filhas, vivia a
vida que aparentemente o pai sempre sonhou e, pelo jeito, ele era o
filho adorado e preferido do velho Baker. As minhas suspeitas nunca
falhavam.
— Às vezes o seu pai se preocupava apenas com a vida de
liberdade que Thor levava, — argumentei, ao mesmo tempo em que
Sr. Indecente me desferia um olhar enfeitiçante. — ele não quis
impor um relacionamento, eu entendo dessa maneira, deve ter sido
uma sugestão para que...
— Não destorça as palavras do meu falecido pai, menina.
— Karl me interrompeu mais uma vez, completamente áspero.
Estava prestes a manchar o seu terno cinza de vinho.
— Que afronta! — guaxinim gritou para mim do outro lado,
torcendo o nariz arrebitado. — Você não pode colocar palavras na
boca do meu irmão!
Agora, eu entendia muito bem todo o desespero de Thor
por estar obrigado a um compromisso. A família dele não era menos
que a própria Inquisição.
— Vocês querem colocar um fim no nosso romance, é
isso? — proferi, levemente irritada. — Eu sei de toda a história de
vida de Thor. Sei que ele foi criado por você, Karl. Que as senhoras
foram mães para ele, mas isso não pode ultrapassar as vontades
desse homem. Pelo amor de Deus, ele é um CEO, um homem bem-
sucedido, que tenho certeza que também fez a melhor escolha para
a sua vida amorosa. O defeito de toda família, na maioria das vezes,
é amar demais, a ponto de sufocar. E é exatamente isso o que está
acontecendo agora! — pisquei o olho para Thor.
— Chantel e eu nos amamos. Formaremos futuramente a
família que o meu pai sempre sonhou para mim. — ele acrescentou.
Merecíamos o Oscar, depois dessa. — Eu nunca ambicionei Stella
nos meus planos. Ela mal me acolheu quando eu passava por um
dos momentos mais cruéis da minha vida.
— Vocês estão sendo precipitados. — tia Olga
acrescentou.
— Thor, depois não vai me dizer que eu não quis te ajudar.
Você está sempre metendo os pés pelas mãos! — Karl vociferou,
consternado e as suas palavras me deixaram em alerta. Deveria
haver muito mais por trás disso tudo.
— Eu gostava mais da versão Don Juan do meu tio. —
sobressaltamos com a voz fininha vindo do fundo da sala.
Era uma das filhas de Karl.
— Dançarino de boate, como o papai falava. — Amber
acrescentou e todos nós arregalamos os olhos, enquanto Thor e seu
irmão se entreolhavam, constrangidos, na frente das mulheres da
família.
O que ninguém sabia era que dançarinos de boate
costumavam andar mais vestidos que o tal Sr. Indecente.
— A senhorita Stella acabou de chegar, na companhia de
Sra. Carmell. — a voz da governanta ressoou como as trombetas do
Apocalipse.
Emendei mais uma golada de vinho, ao mesmo tempo em
que fazia um gesto para que o garçom me servisse mais, tudo sob o
olhar preocupado de Thor.
— Misericórdia. — bala de cereja suplicou.
De repente, uma moça alta, muito alta, adentrou a sala em
suas botas de cano alto, o casaco pesado de couro, certamente o
meu rim estava incluído no valor daquela peça. Os seus cabelos
eram longos, negros, fartos, como os de uma japonesa. Ela era
linda, traços perfeitos, olhos verdes levemente puxados, boca
carnuda e um nariz de fazer inveja à Gisele Bündchen.
Por que caralhos Thor não queria se casar com ela?
Até eu estava na iminência de mudar de time, de tão
perfeita que era Stella Bronks!
— Boa noite, meu amor. Estou tão feliz.
Os meus olhos saíram praticamente de órbita quando Stella
avançou nos braços de Thor, desferindo em seguida um beijo
meloso na boca do moreno. O meu coração saiu do peito, estava
prestes a surtar com tamanha afronta.
— Larga do meu namorado, agora. — vociferei, segurando
firmemente no braço da mulher.
Puta que pariu, eu já havia entrado no personagem! Difícil
seria sair.
— Quem é essa louca? — Stella perguntou enquanto Thor
se manteve na retaguarda, limpando os lábios, se aproximando de
mim, para tentar conter a minha fúria, que na verdade eu não sabia
mais afirmar se era de verdade ou mera encenação.
— É a namorada do tio Thor. — a irmã de Amber, mais uma
vez, jogando lenha na fogueira.
— Nem precisou noivar para levar um chifre.
— Amber!!! — gritaram em uníssono, ao mesmo tempo em
que sorri para a garota.
Não sei bem o motivo, mas eu havia me identificado com a
sobrinha de Thor.
Senhora Carmell me encarava em estranhamento,
enquanto eu tentava apaziguar Stella e Chantel. As duas se
enfrentavam apenas com o olhar e eu me perguntava por que
caralhos a garota estava tão envolvida na nossa farsa. Será que em
breve eu a teria nos braços? Então, não foi de todo o mal inventar
esse namoro fajuto, já que as coisas começavam a caminhar ao
meu favor.
— O jantar está servido. — Sra. Foster informou, no meio
da sala, como se estivéssemos numa reunião tranquila de família.
As minhas tias se entreolharam, o meu irmão fez um sinal
para que eu levasse Chantel comigo para a sala de jantar, enquanto
Stella apenas segurou firmemente no meu braço.
— Você me deve explicações, carinho.
Porra, eu detestava quando Stella me chamava assim, e
ela fazia isso em qualquer ocasião. O tom da sua voz também era
muito estranho, anasalado, além do seu jeito soberbo que não era
nada atraente, embora toda a sua beleza insistisse em ocultar esses
detalhes que me incomodavam.
— No jantar, eu te explico. — comuniquei, desviando de
suas mãos, para abraçar Chantel e guiá-la na direção do outro
cômodo.
— Thor, eu preciso saber agora de tudo o que está
acontecendo, aqui. — Dona Carmell cuspia palavras atravessadas
nos meus ouvidos, enquanto guiava a filha para a sala de jantar. —
Não pense que vai sair ileso por estar prejudicando a imagem da
minha menina.
— Ela te ameaçou?! — Chantel cochichou no meu ouvido.
— Você pode processá-la por isso.
— Querida, pelo pouco tempo que elas estão nessa casa,
você já pode perceber o quanto as duas podem ser perigosas. —
sussurrei de volta. — Se temos uma reputação a zelar, eu peço
encarecidamente que não demonstre tanto assim os seus
sentimentos por mim.
— Opa, eu não estou demonstrando sentimentos! —
respondeu, me cravando os seus grandes olhos azuis, como se
estivesse na iminência de arrancar os meus com as unhas. — O
meu coração praticamente morre de tédio quando está na sua
presença, se você quer saber.
— Sinto muito, mas você está vesga.
A loira piscou os olhos diversas vezes. Estava possessa
que eu havia descoberto o seu ponto fraco.
Deixei Chantel em dúvida de suas palavras, e já na sala de
jantar, fiz a gentileza de puxar a cadeira para que ela se sentasse ao
meu lado. A garota agradeceu, com um olhar meloso, e depois
deixou uma beliscada discreta na minha bunda.
O que ela queria com isso?
Me enlouquecer?
Imediatamente, senti um arrepio frio na espinha,
imaginando como ela poderia ser na cama.
Uma merda que Chantel estava apenas encenando!
Toda a família já estava devidamente acomodada na
imensa mesa de madeira. Tia Olga e tia Karen estavam uma ao lado
da outra, e nas cadeiras seguidas, as duas sobrinhas-netas. Do
outro lado estava Loren, a minha cunhada, ao lado de Karl que
ocupava o lugar de papai, na cabeceira. Stella e Dona Carmell
estavam ao lado de Loren. E eu me preocupei quando me dei conta
de que Chantel estava ao lado da mãe de Stella. Não confiava na
megera, no que ela poderia aprontar durante o nosso jantar. Decidi
ficar de prontidão para proteger a menina de qualquer malícia.
— Boa noite a todos. — cumprimentei, de pé, ajeitando o
tom da voz. — Primeiramente eu gostaria de pedir desculpas pelo
mal-entendido desta noite. Sobretudo a você, Stella. — a mulher me
encarou com os olhos verdes, decepcionados, porém não era o
suficiente para me trazer qualquer tipo de ressentimento, afinal, eu
conhecia muito bem as suas artimanhas, sem falar que eu precisava
me livrar dessa porra de compromisso o quanto antes. — Não vai
mais haver noivado, embora eu entenda que esse foi o último
pedido do meu pai, eu não posso seguir com um relacionamento
apenas por conveniência. Sou um CEO de renome e não mais o
garotinho que cede a todas as vontades do meu irmão!
Assim que pausei, para escolher as melhores palavras,
sobre o meu relacionamento com Chantel, Dona Carmell se
levantou furiosa da cadeira, arremessando o guardanapo de linho
sobre as baixelas.
— Thor, você não presta! Você iludiu a minha filha!
Expirei, com preguiça.
— Eu nunca falei abertamente que eu iria me casar com a
Stella. Quem organizou isso tudo foi o Karl. — saí pela tangente, me
sentando ao lado de Chantel, enquanto, apenas por abraçá-la,
percebi todo o seu corpo trêmulo.
Senti dó da garota e ao mesmo tempo admiração, por ela
estar enfrentando situação tão delicada, apenas para me ajudar.
— É muito fácil colocar a culpa em mim, agora. Fugir das
suas responsabilidades, Thor. — o meu irmão esbravejou da
cabeceira. — Você é um ingrato! Egocêntrico!
Cocei a barba, sentindo-me completamente injustiçado. Por
mais que eu quisesse responder o meu irmão à altura, eu não
poderia desrespeitar a presença das minhas tias e também das
minhas sobrinhas.
— Eu não sou responsável por atitudes vindas de você e
de papai. — cuspi, acidamente.
As minhas tias se entreolharam agoniadas, enquanto
Chantel afagava o meu joelho e, caralho, eu sentia a minha
segurança se esvair com esse gesto acolhedor, e ao mesmo tempo
atrevido. Sem querer, ela havia esquentado, mais uma vez, as
minhas bolas.
— Filho, não diga isso. — tia Karen estava com os olhos
marejados. — O seu pai e o seu irmão sempre quiseram o melhor
para você.
Antes de respondê-la, observei ao redor, e ninguém
conseguia se servir, o jantar esfriando nas travessas, ao mesmo
tempo em que nossos ânimos nem tão cedo resfriariam.
— Me perdoem, tia Karen e tia Olga. Vocês sabem o
quanto eu as amo, porém eu não posso me casar com uma mulher,
sendo que o meu coração pertence à outra. — Chantel expirou
lentamente ao meu lado. — Isso não é justo e, inclusive, serei
incapaz de fazer a Stella feliz.
— Que sina triste a minha! — a modelo lamentou,
repousando a mão sobre a testa. — O problema é que carinho
nunca me enxergou como uma mulher de verdade.
— Ele prefere as anônimas, de um metro e meio.
Semicerrei os olhos, agoniado, ao ouvir a afronta de Dona
Carmell. Eu não estava completamente errado quando imaginei que
ela não se comportaria com educação, na presença de Chantel.
Estava prestes a defender a garota, mas ela conseguiu ser bem
mais rápida do que eu.
— Não falte o respeito comigo, Sra. Carmell. — a sua voz
era doce e firme. — Custa muito para vocês todos entenderem que
a gente se ama e não importam as possibilidades, nós vamos seguir
juntos nesse relacionamento, sim.
Fiquei admirado com tamanha precisão na atitude e no
olhar de Chantel, enquanto os membros da família Baker apenas se
entreolhavam pensativos. Já a Stella, ainda era amparada pela mãe.
Aquela meia dúzia de palavras proferidas por Chantel me
causava um alvoroço tremendo, mas eu não poderia ser tão ridículo
ao ponto de acreditar que o nosso faz-de-conta se tornaria
realidade, começando pela possibilidade de eu me atrever em um
romance.
Aproveitando o silêncio um tanto quanto incômodo que
acabara de se instaurar na sala de jantar, Chantel imediatamente se
levantou da cadeira, para em seguida pegar o meu prato. Eu não
entendi muito bem a sua atitude. Ela começou a me servir a
refeição, o que me trouxe um grande alívio, pois cheguei a suspeitar
que a loira poderia arremessar aquela louça nos córneos de
Carmell.
— O Thor é alérgico a camarões. — Tia Karen exclamou
para Chantel, que sorriu amarelo e fez menção de me servir um
outro prato.
— Ele não gosta de frutos do mar. — Tia Olga também a
interrompeu, enquanto passei a mão pelos cabelos, incomodado.
As duas eram superprotetoras até dizer chega!
Então, constrangida, a loira se virou para a baixela ao meu
lado.
— Garota, o que você está fazendo? Ele também detesta
macarrão ao molho de quatro queijos! — Tia Karen interveio mais
uma vez.
Prontamente eu segurei no pulso da menina e a encarei,
consternado, notando a suas bochechas coradas.
— Só a salada e os palitos de frango, querida.
Chantel assentiu, imaginando o quanto estávamos fora de
sintonia, para um casal que dizia que se amava.
— Namora o menino há um mês, mas não o conhece o
suficiente. Poderia matá-lo com esses camarões! — tia Karen
exagerou, enquanto eu peguei o prato de Chantel para servi-la. Eu
queria retribuir aquele gesto de carinho.
— Preferimos fast-food. — entrei em defesa, analisando o
olhar preocupado da loira, enquanto pegava a colher de prata.
— Eu também não gosto de molho quatro queijos. — a
menina cochichou de repente ao meu lado, o talher pairando no ar,
e tia Olga apenas franziu o cenho, inquieta.
— A sintonia desse casal é zero!
— Chega. — Chantel se irritou, espalmando as mãos sobre
a mesa, enquanto eu desisti de servi-la. — Quem garante que o Sr.
Baker, no seu leito de morte, fez realmente esse pedido ao Karl?
Que provas vocês têm sobre isso? — a loira despejou
impiedosamente.
Em resposta, a família exclamou, em uníssono, um longo
“oh”.
Chantel havia acabado de colocar a situação em xeque.
Eu juro que não sabia como agir diante disso tudo.
O meu pai, depois que morreu, se tornou praticamente
sagrado para todos eles e, sem dúvidas, aquele era um terreno
muito perigoso no qual Chantel estava pisando, contudo ela me
causava muita admiração, fazendo jus à advogada incrível que
certamente deveria ser.
— Não duvide da palavra do meu pai, garota. Isso é muito
sério. — o meu irmão esbravejou, levando o dedo em riste.
— A Chantel tem razão. — entrei em defesa, porque
caralhos essa possibilidade me instigava. — Isso só pode ser coisa
da cabeça do Karl. Ele sempre foi muito ligado a papai e à Dona
Carmell. Não duvido que vocês três tenham arquitetado isso tudo.
As minhas tias cochichavam, as minhas sobrinhas já
haviam saído da mesa faz tempo, quando eu percebi Stella se
virando contra a mãe.
— Você foi capaz de inventar toda essa história?
— Claro que não, minha filha.
A morena fungava, antes de prosseguir. Se fosse real
mesmo toda essa armação, Stella era tão vítima quanto eu.
— Já não basta eu me sentir humilhada, por ter que casar
com um noivo que está sendo praticamente obrigado! O pior ainda é
saber que tudo começou com uma falcatrua sua!
— Stella, — a mãe segurou desesperadamente na mão da
filha, ao mesmo tempo em que o burburinho se instaurou na mesa.
— você está desrespeitando a memória do Baker.
— Jura, mamãe?
Chantel me encarou com tédio.
— Ele queria tanto que você fosse a sua norinha. Foi o que
aquele grande homem sempre me disse. — revirei os olhos, sem
paciência, para tanta embromação. — Como o Baker te amava,
minha filha, te admirava, sonhando inclusive com filhos seus e de
Thor.
Notei as bochechas da loira se tornarem brasas.
— Eu amava tanto o Sr. Baker. — Stella proferiu, mas nem
sequer deu qualquer carinho ao meu pai, quando ele estava
entrevado naquela cama. — Apesar de tudo, o que eu mais quero
na vida é subir no altar ao lado do seu filho caçula.
Então, Chantel, num atrevimento clássico de sua
personalidade, segurou nos ombros de Stella, encarando a moça
nos olhos. Prontamente, eu me levantei, temendo que acontecesse
o pior. E, nesse meio tempo, o meu irmão ainda conseguiu expulsar
as filhas para a sala.
— Não vai haver mais noivado, Stella! Aceite as
consequências! — ela afirmou, convicta. A voz completamente
afetada por sentimentos. — Ninguém pode ser obrigado a
simplesmente nada! Você ainda não entendeu que Thor Baker me
ama?
Sem esperar, Stella se levantou da sua cadeira,
praticamente derrubando-a e avançou com as mãos no pescoço de
Chantel.
Imediatamente ficaram todos de pé.
— Sua...
Carmell tentou conter a fúria da filha, enquanto ela
esganava o pescoço delicado da menina. As minhas tias gritavam, o
meu irmão revirava os olhos, enquanto a esposa estava petrificada
com as mãos sobre a boca. Fiz menção de separar as duas,
contudo Chantel era bem mais esperta do que poderia calcular.
Quando estava na iminência de retirar os punhos de Stella do
alcance de Chantel, a loira desferiu um chute nas canelas da
modelo, dando-lhe uma linda rasteira. A morena gritou, assustada,
trombando com a mãe e as duas caíram ridiculamente no chão.
As minhas tias e o meu irmão correram para ajudá-las,
enquanto eu amparava Chantel, contra o meu corpo. Ela respirava
sem ritmo, relaxada sobre o meu ombro. O meu coração estava em
pedaços. E ao perceber o seu pescoço delicado completamente
vermelho, enfiei as mãos no balde de gelo, para depois depositar as
pequenas pedras em um guardanapo. Ajeitei o embrulho no
pescoço da menina, quando apenas vi todo o molho quatro queijos
se misturando aos cabelos loiros da garota.
Chantel abriu a boca, apavorada, os pingos de molho
adentrando os seus lábios.
— Porra, Stella! — gritei, enquanto as minhas tias saíram
da sala de jantar, apavoradas. O meu irmão também guiou a esposa
em direção ao outro cômodo.
Coube a mim tentar colocar um fim em todo aquele
alvoroço.
Stella permaneceu atrás de Chantel, ofegante, possessa,
ainda estática, com a baixela vazia nas mãos. Quando tentei afastá-
la dali, a loira pulou por cima do corpo da modelo e as duas se
estatelaram sobre a mesa, engalfinhadas.
— Parem vocês duas! — clamei, em vão.
Comecei a duvidar se Chantel havia sido realmente uma
boa escolha. Caralho, ela estava muito envolvida com a situação,
não precisava de tanto! A minha preocupação principalmente era
que ela estava se colocando em risco. Stella e Carmell poderiam vir
a prejudicá-la, futuramente. Ao mesmo tempo, eu gostava de todo o
seu atrevimento, isso alimentava uma puta esperança de tê-la nos
meus braços, ao final desta noite.
Bufei, puxando nos ombros de Stella, enquanto Chantel
esfregava a salada no rosto da modelo. Ela conseguiu entranhar as
folhas verdes no nariz da mulher, puxando os seus cabelos, ao
mesmo tempo em que Stella derramava todo o molho de frutos do
mar no rosto de Chantel. A loira praticamente se afogou, buscando
ar, e eu agradeci mentalmente por aquele prato já estar frio.
— Chega! — esbravejei, ainda puxando Stella por cima do
corpo de Chantel, mas o seu casaco de couro escorregava das
minhas mãos.
Prontamente abracei a cintura da modelo e consegui erguê-
la, livrando-a do corpo de Chantel, quando percebi que Stella
sustentava palitos de frango dentro dos ouvidos.
— Me solta, carinho. Já chega. — ela choramingou, se
debatendo. — Eu não quero mais te ver. — uma sensação de alívio
me arrebatou. Anjos cantaram “Aleluia”. — Danem-se os seus
negócios, a minha carreira. O que eu não posso fazer é ficar me
sujeitando a uma situação tão ridícula como essa. Implorando por
um amor que, na realidade, nunca vai existir.
— Desculpa por tudo, Stella. — proferi, não querendo ser
um babaca completo. — Você já sabe de toda a verdade, só
precisamos dar tempo ao tempo. Vamos desistir agora dessa
loucura.
A moça soltou dos meus braços, deixando que alfaces e
croutons ainda escapulissem de seus cabelos pretos, para sair
pisando firme em direção à sala. Ao mesmo tempo, eu entendia que
Stella também era vítima nessa história toda, assim como eu.
Estava me sentindo extremamente aliviado, por Chantel ter
feito Stella desistir. Não me restavam dúvidas de que ela havia sido
a mulher perfeita para isso.
Assim que maneei o rosto para trás, encontrei a loira ainda
deitada no meio daquela bagunça de comidas. Os olhos,
arregalados. Sem demoras, levei as minhas mãos às suas costas e,
em apoio, a ergui na minha direção. Ela cheirava a camarão e tudo
mais nesse sentido, mas o aroma do mar combinava perfeitamente
com os seus lindos olhos oceânicos.
— Você está se saindo muito bem. — comentei, deslizando
o guardanapo pelos seus seios, livrando a curva deles de qualquer
traço de molho.
— Essa mulher é asquerosa. — reclamou, fazendo com
que as covinhas das suas bochechas realçassem.
— Está com raivas sinceras da Stella? — perpassei o
guardanapo pelo rosto de Chantel e percebi ainda mais o quanto ele
era delicado.
— Sinto pena, dó. Ela deveria se amar mais.
— Quem sabe eu não deveria ter cedido ao pedido do meu
pai? Subir no altar ao lado de Stella, para juntos tentarmos construir
o amor, como geralmente acontece na cultura mulçumana. Não sei
se já ouviu sobre isso. — impliquei, só para avaliar a reação de
Chantel e aonde todo o seu comprometimento em me ajudar,
poderia chegar.
— Ingrato! Depois de tudo o que eu fiz! — a garota
espalmou as mãos no meu corpo e se levantou da mesa, inquieta.
Ainda que ela estivesse toda manchada de molho, a sua beleza
naquele vestido e as suas atitudes me faziam ofegar. — Eu só
queria dar um fim nisso tudo! — ela proferiu se virando para mim. —
Eu realmente me envolvi com os seus dramas, me entregando
inteira para te ajudar! Eu senti empatia por você e por Stella.
Ninguém é feliz quando é obrigado a estar junto, afinal, o mais
bonito de um relacionamento é a maneira genuína como se
entregam um ao outro. E se não há entrega, tampouco existe
felicidade. E em agradecimento, você profere essas merdas? Olha
para o meu estado! Parece que tomei banho numa panela de
comida!
Imediatamente, eu me aproximei da moça, comovido com
toda a sua boa-vontade. Ela expirou baixinho quando eu grudei o
meu corpo ao dela, segurando firmemente nos seus cabelos.
— Você foi incrível. — olhei para ela com gratidão. — Eu
juro que eu não sei como te agradecer.
— Depois dessa noite, quando o nosso plano der certo, não
precisamos mais nos ver, não é mesmo?
O meu coração ardeu com essa possibilidade. Não ver
mais Chantel era doloroso demais. Nem parecia que eu havia
conhecido a menina há poucos dias, porém foram momentos muito
intensos que apenas serviram para que eu a desejasse ainda mais.
— Chantel, eu não te detalhei o meu plano, mas eu preciso
que você siga por uma semana, pelo menos, como a minha
namorada. — a loira sorriu, incrédula. — Ainda vou precisar me
encontrar com a minha família e você tem que estar por perto.
Ela segurou delicadamente no meu queixo, grudando os
nossos rostos. Os seus cabelos levemente úmidos de molho a
deixavam bonita.
— Você é uma encrenca de um metro e noventa que só me
faz mal.
Percebi os seus olhos vesgos.
— Para de mentir.
Chantel estava claramente envolvida. As suas atitudes a
denunciavam.
— Thor, eu não quero mais seguir nessa farsa. Você
precisa respeitar a minha decisão. — ela proferiu nos meus lábios e
eu senti uma vontade absurda de beijá-la. — Depois dessa noite,
acabou, entendeu?
— Farsa?!
Olhamos sobressaltados para trás, ao nos darmos conta da
voz fininha que adentrava a sala de jantar.
— Amber??? — exclamamos em uníssono, realizando a
merda que havíamos feito.
— Garota, o que você está fazendo aqui? — pergunto,
completamente preocupado com a presença abrupta da minha
sobrinha.
Infelizmente, a Amber tinha uma personalidade um tanto
quanto difícil de lidar. Não era muito simples de dobrá-la, e saber
que ela havia escutado mais do que deveria, me causa
imediatamente um mal-estar por dentro.
— Só imaginei que veria vocês dois comemorando, afinal
de contas, a Stella e Dona Carmell já foram embora. — ela dá de
ombros se aproximando de nós dois.
Percebo o seu olhar desconfiado e repleto de intenções. A
garota sardenta de cabelos cor de mel não era a doçura que
anunciava.
— Você não ouviu nada, não é mesmo? — Chantel faz
questão de perguntar.
Em resposta, Amber dá um sorrisinho maléfico.
— O quê?! Que vocês dois inventaram essa história de
namoro?
— Não inventamos nada. — entro em defesa. — Nós
somos namorados e estamos apaixonados.
— Não parece. — Amber ergue uma sobrancelha. — Eu
não vi vocês dois se beijando, até agora!
Chantel e eu nos entreolhamos. O olhar de desespero da
loira me traz à lembrança, uma de suas condições. E agora? Que
argumento teríamos, se realmente não estavam incluídos beijos no
nosso compromisso?
— Não gosto de me expor na frente da família. — pigarro,
caminhando para o outro lado da sala.
— Um selinho não é exposição. — Amber sabia como ser
irritante, mas ao mesmo tempo eu não odiava essa possibilidade de
juntar a minha boca à de Chantel.
Estava completamente ansioso para esse momento.
— Amber, volte para a sala. — imponho, segurando no
braço da menina de quinze anos.
— Eu quero ver um beijo. — ela implora.
Enrugo a testa, sem querer acreditar no que ouço.
Essas meninas de hoje em dia!
— Para de ser ridícula, Amber. — Chantel rosna, com um
ar completamente apavorado.
Certamente estava com receio de saber o quanto as
nossas bocas se encaixavam perfeitamente.
— Se vocês dois não se beijarem, eu vou contar para o
meu pai que você, tio Thor, tentou enganá-lo.
Cruzo os braços, levando os olhos aos céus.
Era só o que me faltava!
Thor Baker sendo chantageado por uma pirralha!
— Um beijo? — Chantel sussurra, sem querer acreditar.
Em resposta, Amber faz uma afirmativa insistente com a
cabeça.
Então, Chantel vira de costas, roendo o canto das unhas,
respirando sem ritmo algum. Consigo perceber inclusive o quanto
ela está ansiosa, incomodada, com tal situação. Não duvido muito
também que a moça possa sair correndo pelo corredor, para fugir do
nosso beijo e me deixar sozinho nesse apuro que eu mesmo havia
inventado, para fugir de um compromisso imposto. Contudo, no
momento em que ela gira em seus calcanhares e me encara com
segurança nos seus azuis, tenho certeza de que Chantel jamais
abandonaria o nosso plano.
Ela dá alguns passos na minha direção, não sei o que
posso esperar dela, quando de repente Chantel fica na ponta dos
pés e deposita um beijo rápido na minha boca.
Não dá nem tempo de eu sentir a temperatura dos seus
lábios.
Porra, que merda de beijo.
— Pronto. — a moça comemora.
— Não. De língua.
— Amber! — a loira grita em desespero.
Passo as mãos pelos cabelos, agoniado. Definitivamente,
eu não queria fazer isso na frente da minha sobrinha. Era altamente
constrangedor.
— Garotinha atentada. — Chantel completa, fazendo
menção de sair da sala.
— Eu quero ver um beijo de língua. — Amber insiste.
Prontamente a moça de olhos azuis pausa os seus passos
e me desfere aquele olhar bonito, seguro, decidido.
— Muito bem. — ela profere, se aproximando.
Tenho a sensação de que ela gostava de ser desafiada.
Sem esperar, apenas sinto as suas mãos puxando
impetuosamente a minha nuca. A sua língua atravessa o intervalo
dos meus lábios, roçando insistentemente em círculos, na minha.
Tento me entregar ao momento, mas obviamente eu não consigo
devido à presença de Amber, e apenas sinto o constrangimento
desenhar a minha face, contudo não posso negar o quanto Chantel
é deliciosa no que faz.
— Mais o que você quer? — a loira se afasta, limpando os
lábios com um guardanapo, e imediatamente eu me pergunto se
havia sido tão ruim assim.
Do que caralhos ela queria se livrar?!
— Cem dólares. — Amber é certeira.
Sem demoras, eu puxo uma nota da carteira e entrego à
minha sobrinha. Eu precisava me livrar dessa garotinha, o quanto
antes.
— Aqui está.
— E um ingresso para o show do...
— Dá licença, menina.
Conduzo Amber para fora da sala de jantar, imaginando
que havia sido a pior situação pela qual eu já havia passado. E,
depois dessa noite, eu estava disposto a conversar com o Karl
sobre as atitudes da sua filha, sem expor realmente o que havia
acontecido, mas deixando as entrelinhas. Eu não poderia me omitir
diante de comportamento tão lastimável para uma menina de
apenas quinze anos.
— Você acredita mesmo que ela não vai comentar nada?
— Chantel me pergunta, repousando as costas contra a parede,
enquanto as copeiras, ainda percebendo a nossa presença, se
retiram da sala de jantar com as bandejas de louças sujas.
— Tenho certeza. Eu conheço muito bem a minha sobrinha.
Os cem dólares vão pesar na sua consciência. Ela não vai ter
coragem de fazer nada, sabendo que eu fui generoso com ela. —
confesso, passando as mãos pelos cabelos, decidido a seguir em
frente nessa farsa.
Ainda mais agora que eu havia experimentado o sabor da
boca de Chantel, praticamente doía a possibilidade de nos
afastarmos.
Inferno, eu já estava completamente envolvido!
— Bem, então vamos para a sala? — ela gira de maneira
charmosa, nos seus saltos. — Ainda temos muito o que esclarecer,
mas antes eu preciso ir ao banheiro.
Sem querer me afastar da possibilidade de beijar Chantel
outra vez, eu seguro no seu braço, fazendo imediatamente com que
a sua estrutura se colida contra a minha.
Os olhos azuis se tornam ainda mais bonitos, bem
próximos aos meus. Os lábios apetitosos de Chantel são um
convite, sem falar no corpo curvilíneo se encaixando perfeitamente à
minha curvatura. Que merda, eu odiava assumir o quanto a nossa
química era perfeita.
— Eu gostei de te beijar. — sussurro nos seus lábios, os
meus dedos depositados na altura do quadril avantajado.
— Problema seu. — ela retruca, mole, no meio dos meus
braços.
Os nossos olhos se enfrentam, a respiração de Chantel fica
alterada, ainda que ela queira simular o seu envolvimento. Os
nossos corpos completamente colados entram em curto circuito. Em
segundos, eu grudo a minha boca à dela e a menina se entrega em
um beijo sôfrego, intenso, as suas mãos se apossam das minhas
costas com gana, a ponta dos seus dedos se afundam na minha
roupa. Delicio-me naquele beijo cálido, experimentado o seu quadril
sedento se apossando ainda mais do meu.
Contorno cada canto da boca delicada, saborosa, roçando
os nossos narizes, inspirando o cheiro bom da sua pele. Ela morde
o meu lábio inferior e eu sinto o volume crescer entre as minhas
pernas, imaginando ao mesmo tempo no quanto ela deveria estar
molhada.
— Chantel... — sussurro, colando o seu corpo contra a
parede, subindo uma das mãos pela fenda do vestido.
Ela abre os olhos, depositando as mãos nos meus ombros
e se esquiva, cabisbaixa, contornando os lábios com os dedos.
— Vamos, ainda não terminamos o que a gente se propôs
a fazer.
Ela sai do meu alcance, na direção do corredor, como se
tudo o que acabou de acontecer fosse uma mera encenação, algo
ensaiado. No entanto, eu não era otário. Chantel havia se
entregado, ainda que fizesse questão de negar.
Tranco a porta do banheiro, ainda sem conseguir respirar.
O beijo de Thor havia me deixado completamente sem ar e, na
verdade, eu não sei mais como vou conseguir agir daqui para frente.
Deus do céu, a nossa química é tão intensa! Eu nunca
imaginei o quanto ele poderia ser gostoso e irresistível, o seu beijo,
extremamente viciante, e que pegada... Nunca cogitei ser tão fácil
de me derreter nos seus braços torneados.
Mas eu não poderia me entregar! Estávamos em uma
farsa! Isso deveria estar bem nítido dentro de mim. Aquela encrenca
de olhos pretos ainda poderia quebrar o meu coração. Um cafajeste
daquele tipo jamais se atreveria em um romance, sem falar que,
apesar de beijar bem, definitivamente, ele não era o meu tipo.
Retiro com a toalha qualquer vestígio de molho dos
cabelos. A trança e a maquiagem ainda estão intactas, apesar do
cheiro de maresia grudado na minha pele. Realmente, eu não sei o
que deu em mim. Agi fora da minha razão, mas tudo isso devido à
Stella, aquela afrontosa! E mergulhar a salada na sua cara foi o
mínimo, perto de tudo o que ela merecia. Não que eu a odiasse,
longe de mim. A bela morena de olhos verdes deveria se amar, não
se casar obrigada com ninguém, nem que este alguém fosse Thor
Baker.
Estou torcendo sinceramente para que Stella Bronks
consiga resgatar o seu amor próprio daqui para frente.
Ainda desconfiada que o pedido de Sr. Baker não tenha
passado de um acordo imundo entre Karl e Sra. Carmell, eu saio do
banheiro, experimentando as pernas bambas, simplesmente por
degustar o sabor da boca de Thor, ainda tão recente na minha. O
seu beijo era tão perfeito, tão sexy! Que ódio poder cogitar em não
me afastar mais dele! Eu precisava colocar as emoções em ordem,
ou senão entraria para o mesmo time de Stella. Definitivamente, eu
precisava amar primeiramente a mim.
Chego à sala elegante de estar e respiro fundo ao vê-lo tão
lindo, me avaliando com os olhos semicerrados, jogado
casualmente em uma das poltronas. Thor sustenta uma perna
dobrada sobre a outra e instintivamente os meus olhos rolam para a
protuberância marcada no meio das suas calças.
Sr. Indecente era realmente uma delícia, isso era
inquestionável, porém o aviso de “ALERTA! PERIGO! Homem
gostoso demais para ser de uma só!” estava tatuado na sua testa, o
que me faz imediatamente desviar os olhos e a atenção de toda a
sua beleza de deus nórdico.
— Um vexame. Foi exatamente isso o que você e Stella
fizeram neste jantar de noivado! — tia Olga esbraveja no momento
em que Chantel coloca os pés na sala de estar.
Ela me encara com as bochechas coradas e eu faço um
sinal para que se aproxime. Não queria que a moça ficasse exposta
no meio da sala, como num próprio tribunal. Tia Olga sabia muito
bem como ultrapassar todos os limites.
Então, ao perceber o meu aceno, a loira caminha na minha
direção, elegantemente nas suas sandálias prateadas, a coxa ora
esconde, ora se mostra, através da fenda, e tudo o que eu faço é
morder o lábio inferior, segurando os instintos para não fazer a ela
um convite para dormir na minha suíte, esta noite.
Agora, Chantel está bem perto, já posso inclusive inspirar o
seu perfume de mar, e por eu estar sentado em uma poltrona
individual, automaticamente seguro na cintura delicada, fazendo
com que a moça caia estatelada no meu colo.
Chantel não recebe muito bem a minha afronta, ela
arregala os olhos e fecha a mão, para desferir um soco no meu
peito, mas assim que percebe os olhares desconfiados na nossa
direção, o seu gesto de indignação se transforma em deliciosas
carícias.
— Você me paga. — ela sussurra para mim, entredentes.
Apenas apoio as mãos nos seus quadris, me sentindo o
cara mais sortudo do mundo, simplesmente por ter uma mulher tão
incrível e gostosa, no meu colo.
— Não... eu te pego.... — cochicho na orelhinha delicada e
Chantel me encara com assombro, porém os seus olhos a
denunciam, no momento em que as suas pupilas voam para a
minha boca.
Ela se fazia de difícil, mas os seus desejos a traíam.
— Vexame maior foi o Thor não cumprir com o pedido do
nosso pai. — Karl continua desferindo desaforos nos meus ouvidos.
— Eu nunca imaginei que você me decepcionaria tanto. Não
enxerga que eu quero apenas conservar a sua imagem?
Apenas envolvo a garota ainda mais nos meus braços,
enquanto ela relaxa o corpo e deita a cabeça sobre o meu ombro.
Até que ponto ela poderia estar encenando?
— O melhor é vocês aceitarem de uma vez por todas que
Chantel e eu estamos juntos. — o meu irmão bufa, deixando clara a
sua indignação. — Stella já foi embora, não haverá mais casamento.
Temos que lidar com os fatos.
— Senhora Carmell deixou bem claro que não desistirá tão
fácil. — o meu irmão acrescenta e eu começo a desconfiar da sua
insistência.
Deveria ter muito mais intenções por trás desse plano
sórdido, que com toda a certeza a mãe de Stella e ele armaram para
cima de mim. Mas, a troco de quê?!
— A Stella também deixou claro que vai passar na sua
cobertura, para vocês conversarem. — tia Karen acrescenta.
Apenas sinto uma náusea momentânea contornando o meu
estômago.
No mesmo momento, Chantel joga o seu olhar azulado
para dentro do meu. Vejo preocupação desenhada nele.
— O que infernos a Stella quer comigo! Ela já desistiu
desse compromisso tosco! — vocifero, inquieto.
— E você acreditou? A mãe faz da filha uma marionete! —
tia Olga acrescenta sabiamente.
Ela não estava errada. Ao mesmo tempo em que Karl
tentava me controlar, Dona Carmell não agia diferentemente disso.
Stella e eu estávamos fadados a termos as nossas vidas
controladas, como se fossem um maldito tabuleiro de xadrez, tudo
por que sempre fomos criados sob muitos cuidados e paparicos
desmedidos.
— A não ser que você e Chantel fiquem noivos. — tia Olga
sugere e os meus braços arrepiam.
Essa possibilidade surpreendentemente me instiga.
Imediatamente a loira pula do meu colo, num susto, para
caminhar aleatoriamente pela sala, e quando percebo, ela dá duas
passadas na direção das bebidas. Ainda consigo avaliar o seu
semblante preocupado.
No final das contas, Chantel deveria estar cogitando a
possibilidade de também ser obrigada a subir no altar comigo. Ela
não poderia esperar menos da minha família.
O silêncio se instaura no momento em que todos esperam
por alguma reação da garota. Um “sim”, um “não”, qualquer merda.
As minhas tias lhe desferem um olhar inquisidor, o meu irmão, por
sua vez, esboça um semblante afrontoso, insatisfeito.
Chantel, então, olha para mim, aflita, para depois abrir uma
garrafa de uísque. Fico esperando pelo momento em que ela vai
preencher o copo de gelo e servi-lo com o líquido, mas a garota é
bem mais louca do que eu posso calcular. Ela simplesmente vira a
garrafa no gargalo.
Caralho, o que porra ela estava querendo?
— O que ela está fazendo? — tia Karen levanta para
ampará-la.
As demais pessoas presentes na sala começam a
cochichar, recriminando a sua atitude.
— É com uma menina sem escrúpulos como Chantel que
você deseja se casar? — Karl é impiedoso.
Eu nem ao menos consigo me levantar do sofá, a vontade
de soltar uma forte gargalhada me tolhe os movimentos.
Definitivamente, os preceitos daquela família precisavam ser
chacoalhados com a presença de uma mulher feito Chantel.
— Não! Eu sou muito nova para assumir um compromisso
desse tipo! — a loira finalmente exclama e desvia das mãos da
minha tia para voltar a se sentar no meu colo. — Casamento é
sinônimo de rotina. E eu odeio rotinas.
Ainda bem que ela havia largado a garrafa sobre o bar.
Caso contrário, eu ia fazer questão que ela dividisse o uísque
comigo.
Vou aos céus quando Chantel quica na minha virilha, eu
realmente não esperava por toda aquela fartura em cima de mim,
outra vez. O meu pau vibra na cueca, ao sentir o quadril gostoso
pressionando-o, sem intenção alguma.
— Por isso que a Stella seria a mulher ideal. Você não
enxerga que a Chantel não te valoriza? Qualquer mulher daria a
vida para se casar com você! — Loren despeja, demonstrando que
está dando total apoio ao meu irmão, o que não me surpreende. A
minha cunhada sempre foi assim, sem opinião formada.
— O Thor deve... — Karl prossegue, mas eu o interrompo.
— Chega de controlarem a minha vida, porra! Desculpa a
falta de respeito, mas todos vocês estão me tirando do sério com
essa história!
Chantel sussurra para que eu me acalme, enquanto eu a
abraço e inspiro o perfume da sua nuca, tentando colocar as
emoções no lugar.
— Como eu já perdi todas as esperanças de cumprir com o
pedido do meu velho irmão, eu cedo ao que for melhor para você,
Thor. — tia Karen profere, de repente, e eu vejo uma espécie de luz
no final do túnel.
Chantel, ao mesmo tempo, me desfere uma pequena
cotovelada em comemoração, enquanto não consigo retirar os olhos
de tia Olga. Eu também precisava do seu consentimento.
— Eu também estou de acordo com a Karen. — a minha tia
informa e Chantel envolve o meu rosto nas suas mãos, desferindo
um beijo rápido na minha boca, entre sorrisos. Caralho, e ela me
quebra dessa maneira. — Vocês têm o meu apoio. Que eu não seja
julgada no dia do juízo, por conta disso.
— Vocês não imaginam o bem que estão me fazendo. —
confesso, ainda mais abraçado à minha “namorada” — Karl? — faço
questão de perguntá-lo, afinal, preciso saber também da sua
opinião, quando me dou conta de que Amber e Caroline não estão
na sala.
Com toda a certeza Karl deveria ter dispensado as meninas
para a varanda. Ele não gostava que elas participassem de reuniões
tensas como essa. Agora eu não entendo do que ele queria poupá-
las, principalmente a Amber, que era bem mais algoz do que
poderíamos imaginar.
— Eu ainda acredito que a Stella seja a melhor saída.
Vamos embora, Loren. — Karl profere e isso me causa agonia,
raiva, tudo mais nesse sentido.
Chantel me encara preocupada e também com empatia nos
olhos, ao mesmo tempo em que coço a barba, observando-o sair
acompanhado da esposa, na direção do jardim.
Não que eu precisasse do seu consentimento ou apoio, já
estava praticamente ligando o foda-se para a nossa relação, se até
agora tudo o que Karl fez, foi me desrespeitar, porém o que me
afligia verdadeiramente era o que estava por trás disso tudo.
Sabendo também que tia Olga e tia Karen estavam “do
meu lado”, já me causava um tremendo alívio. No final das contas,
tudo indicava que elas não estavam coniventes com Karl e Carmell.
— Não fique com raiva do seu irmão. — tia Karen se
aproxima. — Ele sempre foi muito ligado ao pai de vocês, por isso
está disposto a conseguir te convencer. — ele me aconselha,
afagando com carinho os meus ombros.
Nisso, Chantel querendo nos deixar a sós, levanta do meu
colo e imediatamente se senta no outro sofá, ao lado da tia Olga.
Ela estava folheando um álbum de fotografias, certamente
recuperando as lembranças do meu pai. Confesso que foi agradável
ver as duas interagindo com amabilidade, de certa forma a cena
esquentou o meu coração.
— É impossível eu me relacionar com a Stella, qualquer
que seja a condição. Eu sou louco pela Chantel. — confessei à tia
Karen e ela suspirou, ainda massageando os meus ombros.
Estranhei quando senti uma sinceridade além do normal,
no momento em que admiti o quanto eu era louco por Chantel.
A beleza e a personalidade forte daquela garota só
tornavam as coisas mais difíceis.
— Eu juro que não entendo o que o meu irmão pretende
com isso tudo, — confesso, angustiado. — Karl sabe que eu sou
inocente! Ainda estou duvidando que esse alarde todo seja por
causa de um pedido do meu pai.
— Querido, eu acredito que o seu pai tenha realmente
pedido para que você se casasse com a Stella, mas, se quiser me
provar o contrário, fique à vontade. Estou aberta à qualquer
possibilidade.
Respirei mais tranquilo com o apoio de tia Karen. Eu estava
disposto a descobrir o que infernos estava acontecendo.
E ainda entusiasmado com a interação de tia Olga e “minha
namorada”, levantei da poltrona e caminhei na direção delas,
aproveitando para pegar uma boa dose de uísque, sobre o bar.
Chantel abriu espaço para que me sentasse ao seu lado, e
assim que me aconcheguei, ela maneou o rosto na minha direção e
abriu um sorriso, mais iluminado que o próprio mar nos dias de
Verão.
— Você costuma fazer caridade às crianças com câncer?
Dei um meio sorriso.
— Tia Olga, por que foi mostrar isso à Chantel?!
— Olha que lindinho o Thor vestido de palhaço. — tia
Karen apontou o dedo sobre a foto em que estou com três crianças
no colo, naquela fantasia que todas elas adoravam.
Este era um dos momentos mais singelos da minha vida,
em que eu amenizava sofrimentos de seres tão puros. O meu
coração, ao mesmo tempo, se preenchia de gratidão e esperança,
se livrando um pouco das experiências pesadas que vivia na minha
rotina.
— Estou muito emocionada com a sua atitude. — Chantel
confessou, segurando firmemente na minha mão.
Os seus olhos estavam marejados, o seu sorriso era
completamente lindo e sincero. Não queria ver tanto envolvimento
assim no seu semblante, porque, caralho, eu estava na iminência de
me apaixonar.
— Essas coisas a gente deve esconder, não é para
divulgar. — recriminei tia Olga e sua mania de alardear os meus
bons feitos.
— Eu só sinto um orgulho danado do meu menino. Ele é
muito especial. — ela confessou, ainda com os olhos molhados
sobre as fotografias.
— Realmente, muito especial... — Chantel enfatizou e eu
comecei a entender que ela havia conhecido um outro Thor,
diferentemente do cafajeste que transava escandalosamente com
mulheres ou que não tinha pudor algum ao ficar pelado em frente a
uma janela de hotel.
Ali, Chantel via muito mais de mim, penetrando aos poucos
na minha história, no meu coração.
Saímos juntos da mansão das tias de Thor, lugar também
onde Sr. Baker morou até os seus últimos dias, e tudo o que concluo
é que essa noite repleta de emoções me ajudou a conhecer uma
versão diferente de Sr. Indecente.
O beijo intenso que rolou na sala de jantar e toda a química
intensa que soltava pelos nossos poros atrapalharam
demasiadamente os nossos planos. Era para ser um faz-de-conta,
porém a conexão entre nós dois era real demais para ser ignorada.
Contudo, cogitar namorar um cara como Thor, apenas me causava
uma avalanche de inseguranças. Eu não sabia se ele estava
realmente a fim de um compromisso ou se estava pronto para viver
um. Definitivamente eu não queria fazer parte do seu harém e me
sentir apenas mais uma na sua lista gigantesca. Thor cheirava a
problema e, droga, isso me instigava.
Outra coisa que me afetou, mas positivamente, foi saber
que Thor Baker se dedicava à caridade, às crianças com câncer.
Vê-lo fantasiado de palhaço, assumindo uma postura tão delicada,
tão sensível, me fez enxergar que o corpo sexy e escultural sustenta
um coração cheio de qualidades e não apenas as intenções de um
macho alfa arrebatador.
Thor, pelo jeito, era uma caixinha de surpresas e o que
mais me incomodava nessa história toda era saber que as nossas
trocas de farpas estavam apenas nos aproximando mais,
costurando vínculos, fortalecendo a nossa parceria e, merda, isso
me assustava, já que ter um coração quebrado era uma enorme
possibilidade diante de todas essas circunstâncias.
O medo de enfrentar uma decepção amorosa me repelia
dos braços de Sr. Indecente. Contudo eu já estava mais que
envolvida por um macho alfa irritante, mas extremamente doce e
sensual...
— Vai ficar no hotel? — o belo me perguntou, fazendo com
que eu levasse um breve susto, visto que já estava praticamente
cochilando na poltrona do seu carro de luxo.
A boa dose de uísque que bebi, para enfrentar a sabatina
da família de Thor, apenas me proporcionou uma moleza terrível no
corpo.
— É claro. Depois dessa noite louca, eu só preciso relaxar.
— suspirei, observando a paisagem pela janela. Já era tarde da
noite e a neve caía tranquilamente naquela grande metrópole. — Eu
nunca imaginei passar por isso, sempre fui péssima em simular,
você já deve imaginar o porquê. Mas acredito que, apesar de
algumas gafes, conseguimos convencer a sua família do nosso
romance.
— É a nossa química, Chantel, que tornou as coisas mais
críveis.
Thor me encarou com safadeza nos olhos, e tudo o que eu
fiz foi piscar as pálpebras lentamente e observar o seu rosto
quadrado, a barba rala, o nariz reto e imponente, o olhar febril,
instigante, sem falar nos lábios mais gostosos que já beijei.
Inferno! Já estava completamente encantada por um cara
que, pelo jeito, estava apenas comigo para fingir um compromisso.
Eu fui idiota quando gargalhei da condição de Thor que era
a de não me apaixonar. Não era para eu ter levado na brincadeira,
mas sim tomado todos os cuidados possíveis e impossíveis para
que isso não acontecesse. Agora estou imergida num enorme apuro
de um metro e noventa, detentor de um delicioso membro
imponente.
— Quer dormir na minha cobertura hoje, Chantel? — ele
me perguntou, me degustando com aquele olhar que me irradiava.
O meu corpo instintivamente incendiou.
Sempre senti receio em ser apenas mais uma, mas quando
Thor pronunciava delicadamente o meu nome, “Chantel”, tão
sensualmente e com cuidado, eu me sentia a mulher mais
importante do mundo.
Além dos meus braços arrepiarem com convite tão
atrevido, a sua voz rouca desviava a minha atenção inteira para
aqueles lábios lindos, que me atraíam, me cegavam, faziam com
que as minhas pernas bambeassem, apenas com o tom da sua voz.
Thor era o próprio deus nórdico.
— Sem chances. — eu não iria dar o braço a torcer tão
facilmente. Se ele me quisesse, que lutasse. — Só não quero que
você se esqueça que estamos vivendo um compromisso de faz-de-
conta. — fiz questão de relembrá-lo.
— Então faz de conta que a gente vai chegar na minha
suíte, para tomar um banho juntos, eu vou massagear as suas
costas, depois você vai deitar ao meu lado e eu vou tirar a sua
camisola, explorando cada canto do seu corpo com a minha boca...
Uau...
Esfreguei as pernas, derretida, imaginando no quanto ele
estava jogando baixo.
— Isso é só na sua imaginação. — cruzei os braços,
indignada. Ele não poderia me fazer propostas desse tipo, afinal, eu
estava disposta a dizer um “sim” bem sonoro. — Eu não vou perder
a minha virgindade com um cara que me vê como mais uma na
multidão. Eu preciso me sentir especial, Thor.
— E quem disse que você não é especial para mim,
Chantel?
Abri a boca e não consegui mais fechá-la. A sensação que
experimentei no momento, em que ouvi àquelas poucas palavras, foi
que eu havia acabado de me jogar de um precipício.
O meu coração havia batido mais forte e agora não tinha
mais volta. A paixão já havia me tomado.
— Só está me dizendo isso para poder lamber o meu
corpo. — sussurrei, preocupada, querendo colocar em xeque as
palavras de Thor, até que ele provasse para mim, que estava sendo
realmente sincero.
O meu coração ainda se agitava no peito, na medida em
que ele dirigia com um olhar malditamente seguro, de quem estava
adorando o nosso jogo.
— Eu estou sendo sincero. Eu nunca me senti tão atraído
por uma garota. — merda, ele me encarou e eu percebi os seus
olhos brilharem. — Você é autêntica, inteligente, bonita, um pouco
chata, eu confesso, mas eu sou completamente louco pelo seu jeito.
— ele completou e eu senti o meu corpo derreter como se fosse
lava vulcânica.
Os meus braços atingiram o nível máximo de arrepio, as
minhas extremidades ficaram dormentes, eu senti toda a vontade do
mundo em aceitar o convite para ser a hiena da vez, mas muitas
coisas ainda me impediam de prosseguir. E depois que o nosso
compromisso terminasse? Como seria?
Não queria ficar iludida.
— E funcionária do Lion, esqueceu? Isso o perturba, eu sei.
— fiz questão de colocar o dedo na ferida.
Até que ponto ele poderia estar realmente a fim de uma
menina como eu.
— Você acha que eu vou dar ibope para aquele merda do
Lion? — Thor sorriu. — Estamos namorando, não se esqueça disso.
Erick Lion vai saber mais cedo ou mais tarde. E o que ele vai
pensar, realmente, não me importa.
— Eu sei que ele foi escroto com o seu pai, mas fique
tranquilo que eu não vou ser link entre vocês dois. Eu sou discreta e
sei separar muito bem as coisas. — preferi deixar claro, antes que
Thor cogitasse a possibilidade de eu ser a “leva e traz” dos seus
assuntos, porque até agora eu não engoli por ele não ter se aberto
comigo sobre a sua carreira.
— Eu não estou te subestimando, Chantel. Eu sei que
posso contar com você. — Thor voltou novamente a me encarar. —
Essa noite só me provou que, além de tudo, eu também posso
confiar em você.
Engoli em seco, imaginando que merda de conquista era
aquela. O que Thor queria, além de retirar a minha camisola com os
dentes?
Estou perdida, não consigo entender mais nada.
O moreno aumentou um pouco o volume do som e calados,
na verdade, pensativos, continuamos o trajeto até o hotel, ouvindo
ao tema de “Armagedom”.
Em minutos, o moreno estacionou o carro em frente ao
prédio. Admito que a minha vontade do momento era a de seguir
com ele para a sua cobertura, mas eu ainda era cedo demais para
ceder. Se Thor realmente estivesse a fim de um lance comigo, ele
teria que ser bastante convincente, caso contrário, nada tiraria da
minha cabeça que a sua intenção era apenas a de tirar a minha
virgindade.
Sr. Indecente desligou o carro e se virou para mim. Por um
segundo já havia me esquecido do quanto ele era atraente. Os seus
olhos negros levemente puxados me invadiam apenas por me
tocarem. Era como se o seu olhar deixasse um rastro ardente pela
minha pele. Sentia um misto de prazer e vulnerabilidade, ao mesmo
tempo.
Então, apenas sentindo o coração na boca, além de
Aerosmith tocando baixinho, o moreno segurou nos meus joelhos.
Gemi, sem entender as suas intenções.
— Thor... por favor...
— Por que você está tentando esconder os seus desejos,
se eles estão tão claros...
O seu dedo deslizou pelo meu rosto e tudo o que eu
imaginei foi que eu ainda estava fedendo a camarão, mas pelo jeito
Sr. Indecente pouco se importava com isso. O dedo intrometido
permaneceu me instigando, principalmente no momento em que
desceu do meu queixo para o meu colo.
— Hmmm... — gemi, fechando os olhos, prestes a ceder à
qualquer merda que Thor me propusesse.
— A sua pele é tão delicada, essa boca, uma perdição. —
ele amassou os meus lábios com o polegar e eu fui capaz de deixar
a minha língua tocar na ponta do seu dedo. O olhar de Thor
inflamou. — Chantel... — o homem pronunciou, rouco, afetado.
Então, apenas senti as suas mãos pesarem nas minhas coxas. A
minha calcinha derreteu. — As suas pernas são um maldito convite,
que vontade de abri-las e chupar a parte mais quente do seu corpo.
Eu sei o quanto você deseja isso. O quanto está molhada...
— Thor...
— A sua razão está impedindo você de viver momentos
inesquecíveis, de conhecer sensações deliciosas... deixa eu te
apresentar isso tudo, querida...
As suas mãos subiram para os cabelos da minha nuca. A
respiração intensa do homem me atingiu, quando ele lambeu a
minha orelha e eu mordi o lábio inferior, tentada a apertar o meio
das suas pernas...
— É um faz-de-conta. Você está confundindo as coisas. —
balbuciei, experimentando beijos delicados por toda a extensão do
meu pescoço.
O clima só esquentava, e o meu juízo derretia com tudo
isso.
— Eu sei que a sua condição era a de não nos beijarmos.
Já furamos, esquece. — ele pronuncia, me encarando
profundamente nos olhos, enquanto eu odiava os seus argumentos.
— A minha era a de você não se apaixonar. E a outra era a de não
transarmos. Quem vai ceder primeiro?
— Essas regras pelo jeito não servem para merda
nenhuma.
— Somos péssimos em cumprir protocolos.
As suas mãos desceram da minha nuca, para as minhas
coxas. Os seus dedos começaram a subir lentamente em direção à
minha calcinha. O meu sexo implorando para ser tocado, explorado,
enquanto eu apenas via um alerta de perigo piscando
insistentemente à minha frente.
Os lábios quentes de Thor fizeram questão de me beijar
mais uma vez. A sua língua atrevida roçou contra a minha de
maneira que senti o ar me faltando aos poucos, enquanto as mãos
experientes atravessavam o limite que impus no início do nosso
pacto. Os seus dedos tocavam devagar a minha boceta, ao mesmo
tempo em que eu abria instintivamente as pernas, para favorecer a
ele o toque que me excitava demasiadamente.
Sedenta, suguei o lábio inferior de Thor, gemendo assim
que sentia o seu dedo melar na minha parte íntima. As minhas mãos
estavam trêmulas, deslizando pela textura do seu terno alinhado,
quando eu senti que ele havia encontrado o ponto mais sensível do
meu sexo.
Estava prestes a ceder.
— A Cristal está me chamando. — falei, retirando as suas
mãos de mim.
— O quê?
Sem demoras, abri a porta do carro, e no momento em que
já estava de pé na calçada, observando ao seu olhar tão repleto de
desejos, eu sussurrei:
— Boa noite.
Virei de costas, deixando a porta do carona aberta, subindo
correndo as escadas do hotel.
— Chantel! — Thor ainda chamou por mim, mas saí
tropeçando nos meus saltos, sem olhar para trás.
Cheguei ao saguão do hotel, completamente ofegante,
ainda digerindo todo o desejo que irradiava a minha corrente
sanguínea. Experimentava a boca seca, o coração agitado, sem
falar que o meio das minhas pernas estava completamente atiçado.
Precisava de uma boa taça de espumante para conter isso tudo.
A Lions deixou bem claro que poderíamos consumir à
vontade no hotel, que todas as despesas ficariam sob
responsabilidade da empresa, então, sem me preocupar em gastar
o limite do cartão de crédito, jogo a minha bunda sobre a banqueta
do bar, fazendo imediatamente o pedido ao barman.
O homem se aproxima, mas assim que chega bem perto,
recua alguns passos, e então as minhas bochechas ardem
envergonhadas, por me dar conta do quanto eu ainda poderia estar
suja e fedida.
Um vexame.
— Deixa para a próxima... — falei para ele, em meio a um
sorrisinho amarelo e assim que saltei da banqueta, odiando-a por
ser tal alta, eu fiz menção de ir na direção do elevador, quando
finalmente eu me dei conta! — O meu jantar de trabalho!
Corri os olhos pelo salão e facilmente encontrei a mesa
onde estavam os funcionários da Lions. Devido à esfera muito séria
e formal que absorvia os que ali estavam, foi simples de localizá-los.
Estavam reunidos três homens de terno e uma mulher
também formalmente vestida. Fiquei preocupada com o estado no
qual eu me encontrava, porém eu já estava completamente
atrasada, não daria tempo de tomar um banho para sequer trocar a
roupa. Corria riscos de eu retornar e não os encontrar mais.
Muitas pessoas transitavam por aquele espaço neste
horário, então eu não estava conseguindo me dar conta de quem
mais estava os acompanhando.
Sem me preocupar com mais nada, pensando apenas na
minha carreira e no meu atraso de mais de uma hora, dei alguns
passos na direção da mesa, quando os meus olhos praticamente
saíram de suas órbitas.
A mulher que fez o meu recrutamento estava presente, a
Sra. Parker, além de mais dois caras e, Deus do céu, o próprio Erick
Lion, mais ruivo e mais lion do que nunca.
Prontamente joguei a minha mão sobre o ombro de Sra.
Parker, piscando os olhos diversas vezes.
— Boa noite.
— Doutora Smith?! — ela virou o rosto na minha direção, e
ao me ver estática ao seu lado, arregalou os olhos, como se
estivesse realmente surpresa.
Enquanto isso, eu sentia as suas pupilas me fuzilando,
cheias de desentendimento, ao passo que eu mordia os lábios,
tamanho constrangimento pelo atraso e sobretudo pela condição
deprimente na qual eu me encontrava.
— Senhorita Chantel Smith? Não está um pouco atrasada?
— Sra. Parker, com seus lindos cabelos estilo poodle, clamou da
mesa, enquanto eu sentia uma vergonha danada me contornando.
— Devo estar.
— Nossa, que cheiro estranho de repente. — a mulher fez
questão de reclamar, apertando o nariz, e então fui me dar conta de
que a maldita Stella havia me deixado semelhante a um bueiro. Não
havia ninguém que não pudesse perceber aquele forte odor de
peixe podre.
Contudo, eu estava tão trabalhada no desespero, que fiz
questão de puxar uma cadeira ao lado de Sra. Parker e ligar o foda-
se para o meu perfume camarão number five. Eu precisava estar na
reunião, ou todos os meus sonhos desceriam por ralo abaixo.
— Eu não estou atrasada para um compromisso o qual eu
nem ao menos sabia da existência. — fiz questão de mentir,
enquanto ajeitava o guardanapo de linho sobre o colo. — Me
perdoe, Sra. Parker, Sr. Lion e demais presentes, mas eu não fui
informada sobre este jantar.
Que outra saída eu poderia ter?!
— Como não? Chegou uma convocação na sua suíte. A
recepcionista me confirmou! — a mulher esganiçou, enquanto eu
observava os semblantes confusos das pessoas à mesa.
Contudo Erick Lion permanecia indecifrável, digitando ao
celular, ao mesmo tempo em que eu imaginava que estava frente-a-
frente com o maior desafeto de Thor Baker.
— Eu não devo ter visto a minha convocação, sou muito
distraída, mas o que realmente importa foi que eu cheguei a tempo.
— respondi, com tranquilidade, enquanto o garçom preenchia a
minha taça com espumante.
Os rapazes sentados à mesa me encaravam com
desconfiança, enquanto eu já suspeitava o que Sra. Parker poderia
ter falado sobre mim, antes de eu chegar. Deveria ter me adjetivado
de irresponsável e outros nomes que nem sequer imagino, e quem
sabe até cogitado me dispensar da vaga que tanto lutei para
conseguir?
Engulo o champanhe, que desce rasgando a garganta,
enquanto observo melhor os dois rapazes. Eles parecem que são
assim como eu, advogados recém-formados e, além de tudo, são
um tanto quanto excêntricos. Um estava com uma gravata
borboleta, o outro tinha um bigode à la Salvador Dali. No mínimo,
curiosos.
— Alguém pediu peixe? — olhei atordoada para o lado,
cheirando a minha trança, no momento em que ouvi Sra. Parker
perguntar.
Ela já estava chata, insistindo nesse assunto.
Prontamente, fiz questão de improvisar a desentendida.
— A mesa ao lado.
— Dra. Smith, — voltei o meu olhar para Sra. Parker. — o
Dr. Lion estava explanando para a sua nova equipe de advogados,
Dr. Logan e Dr. Scott, o quanto a contratação de vocês é de suma
importância para que nos assessore no escândalo que envolve o
renomado CEO do campo automobilístico, Thor Baker. — senti
instantaneamente um tranque no coração. O garfo caiu da minha
mão, mas eu apenas pedi desculpas e sustentei o meu olhar mais
frio. Estava perplexa. — Como vocês sabem, a Lions sempre foi
referência na cidade de Nova York, atendendo sempre a casos
sigilosos e outros que são figurinhas constantes na mídia,
defendendo clientes muito importantes, principalmente alguns
membros do Governo, — ela pigarra. — e no caso “Thor Baker”, não
poderia ser diferente. Estamos auxiliando a modelo famosa Stella
Bronks, buscando todos os mecanismos para defendê-la, já que ela
e sua mãe fizeram questão de contratar os nossos serviços, diante
de toda a crueldade que sofreram. Sem falar que o escândalo “Thor
e Stella” está arruinando com os negócios da família, a Baker
Automobilística está prestes a fechar as portas. Então, o nosso
momento de contra-atacar é agora.
Suspirei profundamente, sentindo os meus joelhos
vibrarem. Que porra estava acontecendo? O que Stella poderia ter
feito para chegar ao ponto de ameaçar a empresa de Thor? Ao
mesmo tempo os pelos dos meus braços eriçaram, ao me dar conta
de que eu não estava numa reunião de trabalho, mas na porra de
um complô sórdido.
Apenas me mantive com a feição mais tranquila e imparcial
possível, espetando alguns pedaços de carne, no garfo.
— Desculpa, eu sou da Flórida, e não cheguei a me inteirar
desse escândalo. O que aconteceu à Stella? — informei, deixando
os meus ouvidos bem atentos.
— Ela foi acusada de ser violentada pelo principal
representante da Baker, o Thor Baker. — Erick Lion informou e eu
bebi toda a taça de espumante em uma golada só. Eu não estava
acreditando no que ouvia! Era cruel demais! — Esse escândalo
ganhou a mídia por meses, a figura da modelo foi exposta, do CEO,
enfim, foi estrondoso o efeito que causou à empresa Baker.
— Inclusive acreditam que a morte de Charles Baker se
deu em decorrência desse escândalo. — gravata borboleta
comentou.
— Sim, e o patriarca nem teve tempo de certificar se o filho
era inocente ou não. Bateu as botas antes mesmo da sentença
definitiva. — o outro advogado lamentou, em meio a um suspiro.
Que tragédia.
— Agora, esse caso corre em segredo de justiça. — Lion
informou, enquanto eu sentia a minha garganta entalada. —
Contudo não existirão contratempos o suficientes que me freiem a
fechar as portas da Baker.
Não descia mais nada.
As minhas mãos tremiam, o meu corpo suava, parecia que
havia sido picada por um daqueles mosquitos venenosos de Porto
Rico, estava prestes a ter um piripaque, mas no auge da reunião, eu
não poderia ser tão louca.
E tudo o que havia acabado de acontecer naquele jantar
retornou como uma avalanche nos meus pensamentos. Mas, porra,
nada se encaixava, muito menos fazia sentido.
Eu precisava de mais informações.
— Eu fiquei sabendo que o irmão de Thor, Karl Baker, está
disposto a unir os dois em matrimônio, para abafar de vez o
escândalo. — bigode à la Dali comentou e eu me assustei. As
fofocas corriam soltas.
— Um casamento de fachada! — Erick Lion completou,
jogando os olhos para cima de mim.
Senti-me incomodada, porém eu tinha certeza de que ele
não sabia do meu envolvimento com o Thor. Não poderia ser tão
paranoica.
— Mas a Stella não vai acatar proposta tão descabida, se
ela foi violentada! — Erick Lion despejou impiedosamente. — Thor
parece ser muito esperto, mas não passa de um garoto mimado e
egocêntrico.
Amassei o guardanapo entre os dedos, sustentando um
semblante de paz, enquanto que por dentro a minha metralhadora
imaginária já tinha dado conta de todos eles.
No caso, eu entendo que a Stella não tenha sido
violentada! Não mesmo! A Dona Carmell jamais aceitaria unir a sua
filha com um cara que a violentou. Não fazia sentido. Por aí, eu já
inferia que Thor era inocente sim, eu não esperava menos dele.
Pelo que parece, Stella e Carmell estavam se aproveitando
da situação. Elas mesmas devem ter inventado essa história toda
contra o Thor, certamente para a modelo receber todo o foco da
mídia ou quem sabe para tirar dinheiro da família Baker!
— Eu soube que Dona Carmell estava prestes a receber
uma grande parte da herança de Charles Baker, mas não deu tempo
deles se casarem. — Sra. Parker informou e eu comemorei
internamente.
Bingo.
Tudo indicava que Dona Carmell estava fazendo o
impossível para que a Stella se casasse com o Thor, por causa da
herança e, Karl, pelo jeito, estava apenas querendo proteger o irmão
dos escândalos, visando também o bem da empresa da família, é
claro.
Então, Thor, Karl, Stella, Dona Carmell, as tias, todos
naquele jantar preferiram omitir esse assunto, assim que se deram
conta da minha presença?! Pelo jeito, atuar foi a solução que
encontraram!
Thor deve ter feito de propósito, quando sugeriu a mim, o
namoro de fachada, para eu atrapalhar o plano sórdido de todos
eles. Contudo, o que mais me desanimava foi que o CEO não havia
sido completamente sincero comigo.
— Thor Baker, o seu pai e o seu irmão, sempre me
odiaram. — Erick Lion informou, em meio a uma boa golada na sua
taça de espumante. — Trabalhei muitos anos na empresa de carros
dessa família, mas tudo o que eu recebi de volta foi ingratidão. — os
meus olhos marejavam a cada palavra proferida pela boca daquele
homem. — Preciso que vocês trabalhem para que o tal CEO seja
condenado. Ele não vai sair ileso dessa baixaria.
— Crueldade, Dr. Lion. — Sra. Parker acrescentou.
Olhei ao redor e me senti num covil de cobras. Tudo o que
eu mais queria era sair dali e chorar por horas, desesperada, por
saber que todos os meus sonhos estavam prestes a se
estilhaçarem. Eu não conseguiria me sustentar nesse complô por
muito tempo.
— Por isso resolvi contratar advogados de outros estados.
— Lion acrescentou e o meu coração apertou ainda mais. —
Precisava de profissionais competentes, neutros, que não tivessem
qualquer tipo de conhecimento sobre essa família. Eles são muito
conhecidos nesta cidade, e definitivamente, não quero correr o risco
de ser traído.
Voltei os meus olhos para a mesa, completamente
boquiaberta.
Eu não queria perder o meu emprego, muito menos
prejudicar Thor.
Mastiguei o bife, observando os olhos verdes do meu
chefe, Erick Lion, esboçando ao mesmo tempo um ar de boa
menina.
Agora eu entendia por que morar distante de Nova York era
um dos pré-requisitos para a vaga.
Depois de um dia de trabalho exaustivo na Lions, aceno
para o primeiro táxi que dobra a esquina e sigo imediatamente para
a cobertura de Thor Baker.
Mais cedo, havíamos conversado por mensagens e,
obviamente, eu não havia sido idiota de adiantar o assunto. Eu
queria estar frente-a-frente com Sr. Indecente, olhar
compenetradamente nos seus olhos, para me certificar de todas as
suas verdades.
Até agora, a única coisa que fiz, foi ligar o meu alerta na
empresa. Cada passo de Erick Lion e de seus assessores, por
aqueles corredores, eu fui capaz de observar, imaginando ao
mesmo tempo que eu deveria manter a discrição quanto ao meu
envolvimento com Thor Baker. Estava disposta a descobrir as
armações de Lion, para arruinar os negócios de Thor, enquanto o
advogado e sua equipe trabalhavam arduamente para defender
Stella Bronks.
No momento em que o táxi estaciona em frente ao prédio
de Thor, sinto o coração acelerar estranhamente, pois tudo indicava
que a sedução, tão presente em cada célula do corpo esbelto
daquele homem, não daria sequer uma trégua, depois de tudo o que
eu vivenciei no carro, após o encontro na mansão de sua família.
Subo tranquilamente o elevador, imaginando que seria
muito fácil de evitar as conquistas baratas de Sr. Indecente. Eu
estava cada vez mais segura que não combinávamos, que beijá-lo
mais uma vez seria a minha sentença de morte e que
definitivamente eu não iria cair na sua lábia. Eu estava ainda mais
preparada — e blindada — para o que viesse pela frente.
Assim que estico a mão na direção da campainha, não
demora muito para que o belo abra a porta.
E todas as minhas seguranças se espatifam no chão.
Thor Baker está simplesmente lindo, envolvido em um belo
roupão preto e felpudo. O seu olhar, ao se deparar com a minha
imagem, tão vulnerável à porta, se torna intimidante, constrangedor.
As suas pupilas me contornam, enquanto prendo a respiração,
apenas por imaginar que Sr. Indecente poderia estar atrevidamente
pelado por baixo daquela peça.
Não gosto nem de imaginar.
Antes de me cumprimentar, Sr. Indecente cruza os braços e
dá um meio sorriso.
As minhas pernas embambecem e imediatamente me julgo
idiota por estar tão envolvida.
— Nunca imaginei que pudesse vir espontaneamente até a
minha casa. — ela fala e eu reviro os olhos.
— Não é tão espontaneamente assim. Muitas situações me
obrigaram.
Estico a minha mão em direção a Thor, ele entrelaça os
nossos dedos e beija o meu dorso.
Deliciosamente devagar.
Sorrio, tímida, quando posteriormente o belo faz menção de
puxar o meu corpo contra o dele, mas eu apenas desvio para
adentrar a sala elegante.
— Não precisamos encenar agora. — profiro, contrariada,
já me imaginando afogada contra aquela estrutura pecadoramente
perfeita.
Observo ao redor e imediatamente me dou conta de que
não havia sido Thor que decorou aquele ambiente, pois tudo
aparentava demais o jeito de suas tias. Tudo extremamente
conservador para a essência moderna daquele belo homem.
Quando me dou conta, Thor envolve o meu corpo por trás,
inspirando o perfume dos meus cabelos, juntando as nossas
estruturas, fazendo com que cada pelo do meu corpo se erguesse
como em um feitiço.
Como negar que eu já estava apaixonada?
— Eu não quero mais encenar, Chantel. Eu só quero viver
o que estamos sentindo...
— Por que você me omitiu, que o seu casamento com
Stella, era para te livrar de um caso que corre agora em segredo de
justiça? — interrompo-o, virando-me na sua direção.
Thor Baker fica completamente estatelado. Os seus olhos
me contornam e me questionam muitas coisas. Ele está
visivelmente aflito por eu estar sabendo de toda a verdade.
— Como sabe disso?
— Erick Lion. — profiro e jogo a minha bolsa sobre o sofá.
Em seguida, eu me sento, cruzando as pernas, esperando
por respostas.
— Caralho, ele ainda não desistiu dessa perseguição tosca!
— Thor esbraveja e depois deixa um chute na primeira cadeira que
encontra. — Claro que não! — ele sorri, ironicamente. — Dona
Carmell fez questão de contratá-lo para me ferrar. — e deixa um
soco sobre a mesa de centro.
Eu me assusto, porém adoro a maneira como ele coloca
para fora todas as suas mazelas.
— Fique tranquilo, porque eu fui o mais discreta possível.
Erick Lion não desconfiou de nada.
Thor imediatamente se senta ao meu lado. O seu perfume
me entorpece e tudo o que eu mais quero no momento é beijá-lo.
Por que eu nunca cumpro com as minhas promessas,
quando estou perto desse homem?
— O que ele falou sobre mim? O que infernos Lion ainda
quer comigo!
— Ontem, cheguei ao hotel e estavam todos reunidos num
jantar de “negócios”. As emoções da noite foram tantas que acabei
me esquecendo de comentar com você que eu tinha essa reunião,
após o nosso compromisso.
— Quem estava nesse jantar, além de você e Erick?
— Sra. Parker e mais dois advogados.
— E ele abriu para vocês o caso da Stella?
— Sim, mas eu tenho certeza de que você não a violentou.
Thor sorriu amavelmente e com tranquilidade, enquanto eu
já percebia as nossas mãos unidas.
— Obrigado por confiar em mim.
— Entendo também que Sra. Carmell jamais aceitaria que
a filha se casasse com um abusador.
Thor atravessa as mãos nos cabelos e eu observo a sua
respiração irregular. Deveria ser muito difícil para ele lidar com toda
essa situação, sendo um homem tão poderoso e conhecido em toda
a cidade.
— Carmell quer a herança. Antes do meu pai falecer, Stella
e sua mãe aprontaram essa farsa. Eu saí para jantar com a modelo,
ela me dopou, e quando eu acordei, já estava estampado em todos
os jornais que eu havia abusado de Stella. O meu mundo veio
abaixo. — Thor suspira. — Rompi vários contratos milionários,
inclusive foi o que fui fazer em Chicago. Por isso fiz questão de
frisar para você, no jantar de noivado, o quanto aquelas duas podem
ser traiçoeiras.
— E por que elas fizeram isso? — os meus olhos ardem,
aflitos.
— Fama e dinheiro. Já ouviu falar nessa mistura maligna?
Não há ego que não dê conta.
Thor se levanta do meu lado e caminha na direção da
janela da sala de sua cobertura. A sua imagem bruta e irresistível,
de costas, me faz suspirar, ainda que a situação me obrigue a
manter a seriedade.
— E por que o seu irmão quer unir vocês dois, inventando
essa história do seu pai ter feito o tal pedido no leito de morte? Era
para Karl estar do seu lado.
Thor se vira para mim e eu percebo o seu semblante
transtornado. Tudo o que eu mais queria era ajudá-lo, ainda que o
emprego dos meus sonhos estivesse em jogo.
— O meu irmão acredita que, ao me casar com Stella,
colocarei um ponto final em todo o escândalo. Ele está cego, não
enxerga que este é um acordo sórdido entre Stella e Dona Carmell.
Se eu me casar com essa mulher, certamente corro sérios riscos de
colocar tudo a perder! Sem falar que é extremamente deplorável
casar com quem não se ama.
Levanto do sofá e caminho na sua direção. Os meus olhos
aflitos mergulham nos dele.
— Por que não me contou tudo isso antes?
— Esse assunto é muito delicado, Chantel. — o homem
envolve o meu rosto nas suas mãos brutas. — Eu queria inclusive
que você agisse da maneira mais genuína possível, naquele jantar,
e se soubesse de tudo, talvez poderia acabar entregando o nosso
acordo, num momento de raiva. Sem falar que você trabalha na
Lions e isso, infelizmente, se tornou um grande obstáculo, o que não
me fez sentir à vontade, para compartilhar as minhas verdades com
você.
— Você já me confessou uma vez que confiava em mim.
— Por isso estou me abrindo com você agora.
— Só pelo motivo de eu ter descoberto tudo.
Saio decepcionada do seu alcance.
— Não. Eu vejo muita sinceridade dentro de você, querida.
— Thor me puxa contra o seu corpo. — Por mais que você pretenda
omitir, eu...
— A campainha.
— Quem pode ser? — Thor sai incomodado na direção da
porta. — Stella?!
Bufo, completamente impaciente. Era só o que me faltava,
a essas alturas!
Chantel corre imediatamente na minha direção, se
colocando atrás de mim, no momento em que recebo Stella, à porta.
E quando me dou conta, a loira abre um pouco a altura do
meu roupão, e começa a desferir beijos perturbadores pela
extensão do meu ombro e pescoço, com toda a certeza para irritar a
modelo.
Definitivamente, eu adorava o nosso jogo.
— Atrapalho alguma coisa? — Stella pergunta,
completamente incomodada com a cena que flagrava.
— Sempre. — Chantel retruca, sem desgrudar a boca da
minha pele.
— O que você quer, Stella? — questiono, sentindo-me
extasiado com aqueles beijos nada inocentes.
A loira estava prestes a me enlouquecer.
— Podemos conversar?
Olho para os azuis de Chantel, à espera de um
consentimento. Ela faz que sim, num aceno, então prontamente eu
permito que a modelo entre na minha cobertura.
Que merda! Tudo o que eu precisava saber agora, era
aonde aqueles beijos provocantes poderiam parar. Estava farto
deste assunto que envolvia tanta injustiça, e queria o quanto antes
me afogar nos desejos que sentia por Chantel. Eu precisava dessa
catarse.
Surpreendentemente Stella não está acompanhada da
mãe, o que, para mim, é uma grande surpresa, já que as duas
normalmente não se desgrudavam.
— A Chantel pode nos dar licença, por favor. — Stella
sugere, sentando-se no sofá.
— Ela já sabe de tudo. — fiz questão de frisar.
— Tudo?
— Namorados não guardam segredo um do outro. —
Chantel intervém, retirando ao mesmo tempo uma expressão de
assombro da modelo.
— Thor! — ela me repreende.
— Não recrimine o Thor pelas suas atitudes. — Chantel
intervém. — Ele é um cara de bom coração. Qualquer outro, depois
da armação sórdida entre você e sua mãe, não estaria nem sequer
respirando o mesmo ar que o seu.
— O Thor já me perdoou. — ela observa, enquanto Chantel
e eu nos sentamos no sofá à sua frente. — Eu sei que ele é
inocente. Infelizmente, eu fui obrigada a adicionar sonífero no seu
uísque, ou a minha mãe estava prestes a fazer alguma coisa, para
me colocar na mídia outra vez. Definitivamente eu não queria testar
a sua criatividade. Ela também precisava de grana para pagar
aquelas dívidas e...
— Dívidas absurdas de joias, roupas de grife e viagens! —
esbravejo.
— Você é tão vítima quanto eu, carinho.
— Por que caralhos não retira a queixa, então? — Chantel
vocifera. — Coloca logo um fim nessa injustiça toda?
— Eu tenho uma imagem a zelar. Para você que é
anônima, as coisas podem parecer bem mais fáceis.
— Mais do que anônima, eu sou justa.
Chantel deixa Stella sem palavras. Os meus olhos
encontram os azuis da loira e toda a consideração que ela está
revelando por mim, me enche de orgulho.
— Todas as provas que fazem jus à minha inocência, já
foram incluídas no processo, e eu não vejo a hora desse pesadelo
acabar. — acrescento, sentindo angústia por estar vivendo tal
situação.
— Se nós dois subirmos no altar, a grande mídia vai
entender que tudo não passou de um engano. — Stella aponta,
enquanto Chantel gargalha com sarcasmo. — As portas da empresa
não se fecharão mais, eu vou finalmente ter paz, e não serei mais
perseguida por paparazzi...
— Pobre, Stella. — Chantel ironiza. — Não era isso o que
você e sua mãe queriam? Estar na mídia? Conseguiram!
A modelo engole em seco. Os seus argumentos aos
poucos perdiam força.
— Vocês dois podem estar apaixonados, mas eu tenho
certeza de que eu posso trazer muito mais benefícios à vida do
Thor.
— Não me subestime dessa maneira, Stella. — intervenho.
— Eu jamais me casaria com você, qualquer que fosse a
circunstância. Tudo o que eu mais desejo é me afastar de você e de
todas as merdas que causou na minha vida. — ela começa a chorar
em silêncio, mas isso não é o suficiente para me frear. — Por causa
de você, estamos prestes a perder o patrimônio que o meu pai
conquistou com tanta luta! Não sinto menos que asco de suas
lágrimas dissimuladas!
A morena abaixa os olhos, constrangida. Pelo menos
esboçava vergonha por estar agindo de maneira tão inescrupulosa.
— E você ainda não entendeu o quanto estamos
apaixonados. — Chantel exclama impaciente, ao mesmo tempo em
que me incomoda ouvir essa arrumação de palavras. Por um
segundo, eu desejava que fosse verdade. — Se soubesse
realmente dos nossos sentimentos, não estava aqui, neste
momento, fazendo chantagens, subestimando a si mesma, sendo
imoral com um homem tão íntegro como o Thor. — ela é categórica
e isso me esquenta o coração. — Mas tenho certeza que ele vai ser
inocentado em breve, porque ao contrário de você e da sua mãe,
ele tem valores.
A modelo expira, impaciente.
— O seu pai nos fez o pedido, carinho, por que não ceder?
— Stella insiste e isso me irrita.
Ela não sentia vergonha realmente!
Imediatamente, fico de pé.
— Para de me dar atestado de otário, menina! Não teve
pedido algum! Isso é apenas mais uma armação entre você e sua
mãe, e infelizmente Karl está conivente com toda essa merda.
— Melhor você ir embora. — a loira impõe.
— Me obrigue, Chantel.
De repente, a minha bela “namorada” segura
impetuosamente, nos meus ombros, e me empurra contra o sofá.
Não acredito quando ela se senta de frente no meu colo e começa,
outra vez, a desferir beijos pela extensão do meu pescoço. Caralho,
estou excitado, e Chantel nem se dá conta de que estou
completamente pelado por baixo do roupão.
Ela está correndo perigo.
— O que vocês estão fazendo? — Stella grita apavorada.
Sem que eu ao menos perceba, a loira invade os meus
lábios com os seus. O beijo delicioso se demora, em meio a
investidas lascivas de sua língua. Fecho os olhos me entregando ao
momento, perpassando as mãos nas suas costas, descendo para a
sua calça de alfaiataria, até sentir toda a extensão de seu quadril
gostoso entre os dedos.
Apenas ouvimos a porta bater.
— Conseguimos. — Chantel comenta, fazendo menção de
se levantar do meu colo, mas obviamente eu a impeço.
— Aonde você pensa que vai?
Ela segura o seu celular, certamente conferindo o horário.
— Embora. Pretendo deixar currículos por aí.
Transtornado, seguro o seu rosto nas minhas mãos.
— Não quero que prejudique a sua carreira por causa dos
meus problemas.
— Eu só preciso me afastar de um ambiente tão sórdido
como aquele.
Vejo tristeza e muita decepção nos azuis de Chantel. Ela
está completamente frustrada, talvez desejando que não tivesse me
conhecido antes, apenas para estar neutra diante de toda essa
situação e assim poder realizar imparcialmente o seu trabalho, para,
aos poucos, consolidar a sua carreira dos sonhos, em Nova York.
— Calma, Chantel. Não se precipite. — enxugo uma
lágrima que rola de repente no seu lindo rosto. O meu coração está
em pedaços. — É lógico que Lion não tem apenas o meu caso para
resolver. Você vai ser direcionada a outros processos, a sua
competência vai fazer com que você se destaque.
Ela suspira.
— Tem razão, melhor dar tempo ao tempo. — não vejo
sinceridade nas suas palavras.
Está destruída demais para continuar acreditando que o
seu novo emprego é o que sempre idealizou para a sua carreira.
Chantel, então, faz menção de se levantar mais uma vez do
meu colo, mas prontamente consigo impedi-la.
— Espera. Você não pode ir embora assim.
Os nossos rostos estão a centímetros.
Mesmo que negue, sinto a loira derreter nos meus braços.
— O que você quer? — ela me pergunta, com os lábios
praticamente colados nos meus.
— O mesmo que você, garota.
— Não, eu não quero...
— Tem certeza?
— Claro que não tenho...
Sorrio, contido, ajeitando os fios dourados sobre o seu
rosto.
— Você já percebeu que, sem querer, está fazendo por
mim muito mais que uma namorada se proporia a fazer?
Pego Chantel no colo, ela entrelaça as pernas ao meu
redor e, assim, eu a conduzo na direção do corredor. O meu
coração acelera, como nunca antes, apenas por saber que nesse
gesto, eu havia obtido o seu consentimento.
— O que você quer de mim? — ela pergunta, assim que
chegamos à suíte.
— Tudo o que você deseja...
Deito lentamente o corpo de Chantel sobre a cama, ela
resfolega, em expectativa, sem saber as emoções inéditas que a
esperam.
A neve cai com preguiça do outro lado da janela, que exibe
a ponta dos arranha-céus de Nova York. A tarde está prestes a se
encerrar, e eu só quero ter, pelo resto da noite, a companhia da loira
que teve a proeza de me retirar dos trilhos.
Retiro o casaco pesado de Chantel, jogando-o para o lado.
As minhas mãos correm ansiosas para os botões da camisa branca.
Abro cada um, observando os olhos da menina brilharem, os seus
lábios entreabertos que imploram por um beijo, a respiração
alterada que afeta o seu ritmo. Consigo me livrar da sua camisa e os
seios despontam empinados em um charmoso sutiã de renda, sem
demoras intrometo a língua na curva sensual de seu colo e percebo
a sua pele arrepiar, tentadoramente.
Em resposta, Chantel crava os seus dedos nos cabelos da
minha nuca e geme, ao sentir que tenho um dos seus mamilos na
minha língua. Lambo deliciosamente e sugo entre mordidas aquele
ponto rosado, ao mesmo tempo em que puxo o zíper e abaixo a sua
calça de alfaiataria.
Estou sedento para possuí-la, como nunca antes estive.
A explosão dos seus cabelos loiros em contraste com o
travesseiro preto, deixa Chantel ainda mais linda, como uma
princesa prestes a ser coroada.
— Por favor, Thor... — ela implora, no momento em que
beijo o seu umbigo e retiro a sua calcinha, pelas laterais.
O meu pau lateja. Caralho, nunca estive tão excitado.
Entre beijos cálidos, desenho caminhos pela extensão da
sua pele alva, até alcançar a sua virilha intocada. Chantel está
deliciosamente depilada, os lábios da sua boceta completamente
inchados, excitados. Apenas babo, tentado a lambê-los.
Sem demoras, afogo a minha boca nos lábios quentes,
chegando ao ponto de lamber a excitação de Chantel. Ela envolve
as pernas nas minhas costas, quicando na minha boca, sem saber
qual reação esboçar, tamanho prazer que a proporciono naquele
delicioso sexo oral.
— Que delícia... — a loira geme com intensidade, assim
que lambo o seu pontinho vermelho, durinho. Subo e desço,
melando-o com a língua e faço voltas, roçando e explorando onde
lhe dá mais prazer.
Cravo as mãos nas coxas grossas e deposito-as sobre os
meus ombros. Caralho, a visão privilegiada da sua boceta aberta me
deixa louco. Estou duro, completamente insaciável para penetrá-la.
Lambo desde o seu cuzinho até o líquido que brota no meio das
suas pernas.
Chantel está apetitosamente excitada.
Ela grita.
— Não...
Sem demoras, retiro o meu roupão. Os olhos azuis
arregalam ao me vislumbrarem. Não havia novidades ali para
Chantel, mas ela sabe que, neste momento, o meu pau pertence a
ela.
— Vou tomar cuidado. — tranquilizo a moça, ao mesmo
tempo em que coloco a camisinha, sem saber exatamente se toda a
minha sede por aquele belíssimo corpo, me permitiria cumprir com a
minha promessa.
Ela se ajeita pelada sob a minha estrutura, como se sempre
tivesse pertencido a mim, esboçando um sorrisinho safado, o que
me acalenta completamente, já que sei que Chantel está envolvida
com o nosso momento.
Pronto para penetrá-la, deslizo as mãos até os seus joelhos
e abro novamente as suas pernas. Encaixo o pau no furinho estreito
e Chantel morde o meu ombro. Deslizo vagarosamente a cabeça
para o interior da menina e ela choraminga.
— Mais. — sorrio, quando ela implora para ser fodida.
— Que boceta apertadinha... você é uma perdição.
Invisto no meio das suas pernas, estocando o pau até o
limite do seu canal. Quando me dou conta, as minhas bolas já estão
batendo no meio das suas pernas. Soco gostoso o caralho em
Chantel e ela rebola, gemendo, sentindo certamente o prazer e a
dor da perda de sua virgindade.
— É melhor do que eu imaginava. — ela comenta, sugando
os meus lábios, suada, aflita, controlando toda a carga de prazer
que a arrebata naquele momento.
Estou derretido, envolvido com tanta beleza, tanta doçura.
Os meus olhos se perdem no rosto de Chantel, observo cada traço
delicado das suas expressões, ora ela sorri, ora ela geme. O meu
pau insaciável fodendo a boceta que esquenta o meu membro e se
contrai ao seu redor, denunciando todo o fogo presente no corpo da
minha garota.
Amasso os seios de Chantel, lambo um deles, enquanto
rebolo no meio das suas pernas. Prestes a gozar, retiro
completamente o pau e seguro na cintura da moça e ela grita assim
que giro o seu corpo.
— Eu não esperava por isso.
As suas nádegas apetitosas me preenchem os olhos.
Seguro as bandas da sua bunda e abro, apenas para ver o seu
cuzinho gostoso. Imediatamente penetro a língua no meio da fenda
de Chantel, arranhando a sua silhueta com as minhas unhas curtas.
— Thor, por favor... — ela sussurra, anestesiada.
Subo com a boca pelo seu quadril até as suas costas,
lambendo toda a extensão da sua pele e quando chego na nuca da
menina, solto um sorrisinho safado e desfiro um tapa naquela bunda
tentadoramente deliciosa, enquanto o meu pau brinca no seu
cuzinho, tentado a fazer um anal.
— Aah... Estou sem ar...
Muito mais a esperava.
Ajeito as mãos na cintura curvilínea e empino a bunda de
Chantel, deixando-a de quatro. Sem demoras, penetro a sua boceta,
enquanto desfiro beijos de língua pelas suas costas nuas e puxo
delicadamente os seus cabelos.
Soco o pau na boceta de Chantel e ela grita.
— Thor, isso é muito bom.
Caralho, estou prestes a enlouquecer, sobretudo quando a
loira começa a rebolar no meu pau, quicando, em círculos, e eu
continuo na empreitada de atingir o seu ponto G, masturbando ao
mesmo tempo a boceta melada. Subo e desço com o dedo e roço
freneticamente o clitóris saboroso.
De repente, percebo o corpo de Chantel entrar numa
espécie de curto-circuito. O orgasmo tomando conta das suas
emoções, o ápice do prazer fazendo a menina se contorcer sob o
meu corpo. As suas mãos se entranham no travesseiro, ela se
movimenta, entre gemidos altos, até que o orgasmo vem forte nas
minhas bolas, permitindo que eu transborde deliciosamente no
interior da minha garota.
— Você é louco. — ela fala, num fio de voz, assim que me
jogo ao seu lado.
Giro o rosto na sua direção e me apoio em uma das mãos,
contornando os seus lábios com o indicador.
— Não sei o que está acontecendo aqui. Por que preciso
lidar com sentimentos, se eu tinha certeza que eles não existiam?
Resolvo confessar tudo o que está acumulado no meu
coração, agora. Não é apenas tesão, Chantel, definitivamente, não é
mais uma nesta cama, ela é a mulher com a qual desejo estar o
tempo inteiro.
— O que você quer dizer com isso? — os seus olhos azuis
semiabertos e a sua voz rouca devido à toda entrega me inquerem.
Posso notar o quanto ela está confusa.
— Eu estou apaixonado por você, Chantel. — falo e me
aproximo ainda mais do seu corpo perfumado.
Ela segura na minha mão, completamente em choque. Os
seus cabelos despenteados ainda cobrindo o meu travesseiro se
juntam no meu rosto. Repouso a cabeça ao seu lado,
experimentando o coração bater num ritmo nada normal.
— Deus do céu... por que fomos inventar isso?
— Eu não quero mais voltar para a realidade.
Chantel acaricia a minha barba, ao mesmo tempo em que o
meu braço direito descansa sobre o seu ventre. Apenas por sentir o
calor da sua pele delicada, os meus instintos resolvem aflorar.
— Falhamos rudemente no que propomos.
— Não... — retifico. — Falhamos adoravelmente. Não vou
te propor nada agora. Está tudo ainda muito recente. — expiro. —
Eu não vou saber lidar com o seu não.
Nunca me imaginei tão frágil diante de sentimentos. Eu
sentia inclusive medo de perder a Chantel. Tudo indicava que ela
estava prestes a retornar para a Flórida e isso seria uma tragédia.
Onde encontraria uma mulher semelhante a ela? Toda a sua
consideração por mim era excepcional, impossível de ver nas
mulheres que apenas se interessavam pela minha grana ou pelo
meu corpo.
— O que quer me propor então? — os seus olhos
brilhavam com intensidade, a sua boca vermelha dos meus beijos
era sem dúvidas um convite.
— Quer me fazer companhia no hospital do câncer
amanhã?
Chantel sorriu, animada.
— Palhacinhos do bem?
— Sim... Você vai amar. É uma experiência inesquecível,
acalentadora. Você vai sair renovada de lá.
— Preciso controlar as minhas emoções para poder viver
intensamente esse momento.
Então a moça puxou o lençol preto e cobriu todo o seu
corpo. O meu braço ainda permaneceu naquela posição agradável.
Estávamos tão íntimos, tão unidos, parecia que já nos conhecíamos
há décadas.
— Obrigada por tudo. — balbuciei com toda a sinceridade.
— Eu nunca experimentei tanta consideração de alguém. Sem falar
que tudo o que acabou de acontecer nesta cama, foi muito
verdadeiro.
Sustentávamos uma sintonia enorme, uma química que
ficou evidente desde o primeiro momento em que nos tocamos. E
Chantel sabia muito bem disso.
— Confesse. — ela deslizou o indicador pelo meu nariz. —
Você nunca imaginou que pagar a passagem de primeira classe
para mim e dividir aquela suíte comigo, te renderia tantos frutos.
Ela brincou e eu sorri.
— Chantel, — encaixamos ainda mais os nossos corpos —
não costumo fazer nada buscando reconhecimento ou esperando
algo em troca. Eu fiz isso por você, porque eu tinha certeza de que
mudaria a minha maneira de enxergar os meus problemas.
— Thor...
— Foi a primeira vez que eu não chorei com saudades do
meu pai, quando dormimos juntos naquele hotel de quinta. A
primeira vez que não precisei tomar calmantes no voo, porque eu
tive a sua companhia o tempo inteiro. Eu não queria magoar a
minha família, ignorar um suposto pedido do meu pai, mas você, por
estar de fora, me ajudou a enxergar que tudo não passava de
mentiras e armações.
Chantel sorriu, emocionada.
Por mais que ela negasse, existiam sentimentos muitos
sinceros em seu coração.
— Prometo fazer muito mais por você, Thor. Não porque
também desejo algo em troca, mas simplesmente por eu ter me
tornado especial na sua vida. Isso é muito importante para mim.
E não pude evitar, ansioso para tocá-la novamente, deixei
um beijo sôfrego na boca de Chantel. O seu sabor era tão intenso, o
seu perfume me inebriava, os seus carinhos na minha nuca eram
bem melhores do que qualquer masturbação que ousasse. Ela me
dava prazer apenas por estar tão perto.
— Filme de terror? — ela sorriu nos meus lábios.
— Filme de terror. — assenti.
Após tomarmos um bom banho juntos, assistimos
novamente ao “It”, entre beijos, pizzas, e apesar de não ser uma
comédia, muitos sorrisos.
Eu estava me sentindo repleto.
O final de semana não poderia ser menos prazeroso.
Nunca imaginei que perderia a minha virgindade de maneira tão
intensa, tão louca, apaixonada. A chama dos nossos desejos
contribuiu muito para que eu tivesse a noite dos meus sonhos, sem
falar no quanto Thor foi carinhoso e extremamente envolvente. Uau,
eu perdi o ar várias vezes e, sem sombra de dúvidas, o ápice do
prazer foi a sensação mais arrebatadora que o meu corpo já ousou
experimentar. Estava me sentindo regozijada com o que vivi ao lado
de Sr. Indecente.
Já no sábado, Thor e eu, juntos como “namorados”,
pintados de palhaço e com perucas coloridas, retiramos muitos
sorrisos e carinhos daqueles seres tão inocentes e tão fortes. Além
de termos realizado essa visita tão especial, no hospital infantil do
câncer, descobrindo emoções as quais eu desconhecia, aprendi,
finalmente, a enxergar a vida com outros olhos.
Primeiramente, sendo grata pela minha saúde, coisa que
nunca me atentei muito ou dei valor. Depois, vivenciando de perto a
situação de injustiça e de armações pela qual Thor vem lutando.
Percebi muita tristeza nos seus gestos na noite que passei na sua
cobertura, ainda que eu me esforçasse para amenizar as suas
cicatrizes. Um homem bonito, milionário, poderoso, mas tão frágil,
tão infeliz. No final das contas, eu descobri que a minha força
interior não depende de cargos, muito menos de dinheiro ou fama,
eu posso sim ser bem maior do que os meus problemas e enfrentá-
los destemidamente.
E é exatamente isso o que vou fazer agora.
Ajeito a minha saia lápis no corpo, prestes a adentrar a sala
de Erick Lion. Não faço ideia do que o meu chefe quer comigo.
Geralmente Sra. Parker faz questão de estar à frente de todos os
imbróglios do dia-a-dia, já que o homem mal olha nos nossos olhos
ou profere qualquer “bom dia”, ao atravessar a nossa sala.
— Com licença, Dr. Lion. — abro a porta e já o encontro
sentado no seu posto de honra.
A sala era toda em tons marrons e fedia a mofo. Nesses
poucos dias de trabalho, eu não me lembro se já havia pisado aqui
antes.
— Sente-se, Senhorita Smith.
Puxo a cadeira de rodinhas e me ajeito, cruzando as
pernas.
O homem continua sério, esboçando um olhar enigmático.
Só faltava ele me solicitar alguma coisa relacionada ao processo de
Thor.
Já estava saturada de tanta crueldade.
— No que posso ajudá-lo?
O homem não responde nada. Apenas observo os seus
olhos verdes, intensos, torturantes. O seu semblante não nega o
quanto ele está inquieto.
— Veja este jornal.
Então ele praticamente joga por cima de mim o noticiário do
dia. Enrugo as sobrancelhas em estranhamento, buscando as
respostas no meio daquelas letras.
Quando os meus olhos arregalam e o coração pulsa na
minha garganta.
Uma foto enorme estampando as colunas sociais. Thor e
eu, juntos às crianças com câncer, em uma bela pose de “casal
solidário”.
— Malditos jornalistas. — resmungo.
— O que disse? — a sua voz me ensurdece.
— Não os conheço.
— Está com a mesma roupa que veio trabalhar na sexta-
feira. — arregalo os olhos. — Essa observação foi feita pela Sra.
Parker, se você quer saber. Sem falar nos olhos azuis e no sorriso
inconfundível. — ele estica o indicador na minha direção,
encarando-me com fúria. — A senhorita está despedida!
— Eu...
— O que você entregou a este canalha? — grita,
espalmando as mãos sobre a mesa. — Se você atrapalhou os meus
planos, não sairá ilesa. Você não sabe do que eu sou capaz,
menina.
Fico completamente em estado de choque. As ameaças
gratuitas, o meu emprego dos sonhos se esvaindo por água baixo, a
saudade gritante dos meus pais que deixei em Tampa, para ganhar
a vida nesta metrópole, tudo isso explode nos meus pensamentos,
trazendo a sensação de que eu apenas falhei rudemente.
Peraí, mas eu apenas queria fazer o justo, o correto.
O errado dessa história não era eu!
— O senhor não sente vergonha de me ameaçar? —
recupero o fôlego e minha autoestima.
Esse cara não poderia me tratar de maneira tão opressora.
— Confessa logo que foi o Thor que pediu para que você
assumisse esse cargo!
Sorrio, balançando o corpo lentamente na cadeira,
enquanto percebo o meu chefe bufar irritado à minha frente.
— Não te interessa o que aconteceu. Não vou te detalhar
nada, Dr. Lion. Eu só quero que o senhor saiba que as suas
armações estão com os dias contados. Se é capaz de me ameaçar,
também não me intimido a fazer o mesmo.
Dou de ombros, prestes a levantar da cadeira, quando o
leão dá a volta ao entorno da mesa e puxa a cadeira comigo junto,
na sua direção.
O meu scarpin já estava em alerta para chutar as suas
partes baixas, caso ele ousasse ultrapassar todos os limites.
— Garota, quem você pensa que é? Mais uma prostituta
que se rendeu nos braços de um milionário, que está à beira da
falência!
— Se já sabe quem sou eu, então por que caralhos me
pergunta.
Lion sorri sem graça, ainda com as mãos depositadas
sobre os braços da cadeira. O seu corpo pendia aos poucos sobre o
meu, inevitavelmente eu sentia o seu mau hálito nojento de cigarro.
— Uma moça jovem, bonita, mas tão incoerente nas suas
atitudes. — viro o rosto para o lado contrário. Olhar para ele me
causava náusea. — Jogou fora todas as oportunidades de se tornar
uma advogada renomada, de se destacar em uma das empresas de
assistência jurídica mais importantes da cidade, para se aliar ao
merda do Thor.
Revirei os olhos.
— Ganhar destaque fazendo falcatruas? Incriminando um
homem inocente? É realmente muito tentador. — debochei,
enquanto sentia o corpo do homem ainda mais pendente por cima
do meu.
— Não seja tola. — ele segurou no meu queixo para nivelar
os nossos olhares. Instintivamente, o meu coração disparou,
apreensivo. — Você é ainda muito jovem e não sabe do que é
necessário para se destacar. Já ouviu falar em concorrência? — ele
ainda grita. — Se você não fizer o que todo mundo está disposto a
fazer, você será apenas mais uma.
— Prefiro ser mais uma com a consciência tranquila, do
que “a” advogada sabendo que jogo sujo com a vida das pessoas.
— Muito bonito o seu discurso, — ele segura na minha mão
de maneira asquerosa. — uma pena que ele não me interessa.
Empurro o corpo do homem, com força, e me afasto.
Estava extremamente incomodada com tantos gritos, humilhações,
ameaças, assédios. Eu não era obrigada a passar por isso.
Empregos como este deveriam existir milhares pelo país! Nem que
fosse a última oportunidade da minha carreira, eu não me renderia a
um chefe inescrupuloso como esse homem. Eu precisava zelar pelo
meu psicológico.
— Chantel Smith! — ele me grita, assim que seguro a
maçaneta.
A sua vontade era a de me torturar, para me tirar todas as
verdades sobre Thor. Mas da minha boca ele não iria conseguir
simplesmente nada.
— Vou passar no RH.
— Retorne para a Flórida agora. — ele ainda grita, ao
mesmo tempo em que continuo estática à porta. — A sua carreira
em Nova York não tem chance alguma de decolar. Eu nunca vou
permitir que uma menina traiçoeira como você chegue a lugar
algum!
— Tudo bem. — virei-me para ele. — Os seus planos
contra Thor jamais darão certo, também. Então, estamos quites.
Bato a porta, sentindo um nó horroroso na garganta. Tudo
o que eu mais quero no momento é sair desse prédio, dessa cidade,
e me esquecer do que aconteceu!
No entanto a tal encrenca de um metro e noventa ainda me
deixa terrivelmente tentada a ficar aqui. O que eu vou fazer? Tornar
a morar com os meus pais e procurar por um emprego na Flórida?
Ou me render à paixão tão forte que arrebatou o meu coração,
mesmo sabendo que o tal Lion pode fazer estragos na minha vida
profissional, se decido continuar em Nova York?
Maldito dilema.
— Que vergonha, Senhorita Smith. — olho assustada para
o lado, enquanto separo os meus pertences em uma caixa de
papelão. — Infiltrada na nossa empresa, para defender um
abusador de mulheres!
Sra. Parker está ao meu lado, cuspindo desaforos nos
meus ouvidos.
Expiro, lentamente, buscando serenidade.
— O Thor é inocente.
A mulher me contorna com os olhos.
— Você está muito convicta disso. — desconfia.
— Se isso te incomoda, eu não posso fazer nada.
Continuo separando os meus pertences, códigos e afins.
— Quando ganharmos a causa, você sentirá falta da sua
comissão milionária.
Jogo um grampeador dentro da caixa, antes de encarar a
mulher.
— Dinheiro sujo? Não, obrigada. Ainda não atingi esse
nível de desonestidade.
— Quanto que o Thor está te pagando para fazer esse
papel? — ela puxa o meu ombro. — É com sexo?
Pelo jeito o lema da Lions era assédio moral para cima.
— Do que a senhora está falando?
— Namorada de fachada! Espiã da nossa empresa! Não
seja tola.
Abro a boca sem conseguir fechá-la. Como Sra. Parker
sabia desses detalhes? Pelo jeito Lion não brincava em serviço para
arruinar a vida de Thor Baker.
Respiro fundo e a encaro nos olhos.
— Tola é a senhora que não passa de capacho de um
homem podre e sem limites como Erick Lion. Você não me conhece,
mas eu já vi o suficiente sobre você, para sentir pena de toda a sua
bajulação, e nem sexo pode reivindicar em troca, a este homem.
Seguro a caixa nas mãos e saio quicando nos meus saltos
em direção à porta. Um burburinho se instaura na sala. Pouco me
importo com as palavras que acabei de desferir, achei pouco perto
do que ela realmente merecia ouvir.
— Chantel, eu sou casada, muito bem casada! — a mulher
ainda esganiça.
Finalmente, entro no elevador, e seleciono o andar do RH.
Sem querer, vejo no espelho uma lágrima rolando pelo meu rosto.
Apago-a com o dedo. Não era momento para isso, ainda precisava
tomar decisões muito importantes na minha vida.
— O que você está fazendo?
Thor adentra o quarto do hotel, onde decidi ficar hospedada
por mais uns três dias. Eu ainda tinha algumas situações pendentes
em Nova York, sem falar que a esperança de algum emprego ainda
fazia cócegas no meu coração, porém, até agora, não havia
conseguido simplesmente nada.
Sem dinheiro, sem perspectivas, arrumo as minhas malas,
para retornar à Flórida.
— Estou indo embora, catando as minhas tralhas.
Sinto as mãos brutas de Thor pesarem os meus ombros.
Ele gira o meu corpo na sua direção e o seu rosto bonito preenche
os meus olhos.
— Você não pode fazer isso, Chantel. E os nossos
sentimentos? Decidiu ignorá-los?
— Não... — balbucio, sentindo um aperto doloroso no
coração. — eu sou completamente apaixonada por você, Thor, mas
eu estou muito insegura com o que Erick Lion ainda possa vir a
fazer comigo.
Seguro o choro na garganta. Eu já havia adiantado para
Thor, por telefone, tudo o que havia acontecido comigo na sala de
Lion, naquela manhã. Era cruel demais lidar com as possibilidades.
O meu coração pertencia a Sr. Indecente, isso era mais do que
verdadeiro, mas ao mesmo tempo a minha carreira profissional
estava em jogo, eu não poderia desistir num estalar de dedos de ser
a advogada que eu sempre idealizei, da qual os meus pais sempre
sentiram muito orgulho. A faculdade custou horas exaustivas de
trabalho do meu pai, no Parque Busch Gardens Tampa, logo, eu
não poderia ignorar tudo isso, ainda que viver um romance ao lado
de Thor fosse a coisa mais maravilhosa que poderia acontecer na
minha vida.
— O Erick Lion é um psicopata. Não encontro outro
adjetivo. — Thor profere e sai de perto de mim, para se sentar sobre
a cama, ao lado da minha mala. — O que ele fez na minha
empresa, no passado, foi irresponsável e cruel. Como advogado da
Baker Automobilística, ele jamais poderia se envolver em casos
para defender as nossas concorrentes. O meu pai praticamente
pirou quando soube de tamanha traição. E agradeço a Deus por
papai não ter tido tempo de saber que Sra. Carmell contratou
justamente o Lion, para defender a sua filha de um crime, que eu
não cometi.
As feridas de Thor ainda estavam expostas, mas eu tinha
certeza de que ele seria inocentado, em breve.
— Como eu te falei por telefone, ele foi categórico quando
me ameaçou. Sem falar que Lion já sabia do nosso namoro de
fachada, mas, como? Isso apenas comprova o quanto ele tem o
controle dos nossos passos. Isso é assustador.
Jogo o meu corpo ao lado de Thor e uno as nossas mãos.
Inspiro o seu perfume amadeirado e o meu coração dispara. A
paixão dando voltas nas veias do coração, obrigando-me a agir com
a emoção, porém o juízo ainda não havia me deixado.
— Esse pesadelo só vai acabar quando eu for inocentado,
diferentemente disso, Lion vai fazer o impossível para ganhar essa
causa. — concordei com Thor e deixei um beijo carinhoso no seu
dorso.
A sua mão envolveu o meu rosto e eu me derreti. Neste
momento, eu desejava não ter tantas expectativas quanto à minha
carreira. A minha vontade era de jogar tudo para o alto e viver em
função de Thor, mas, definitivamente, isso não combinava com a
minha personalidade independente.
— Acredita que a Stella chegou a me chantagear? —
arregalei os olhos, surpresa. — Ela retornou ao apartamento com a
ideia tosca de que retiraria a queixa, mesmo se isso prejudicasse a
sua carreira, apenas para que eu aceitasse me casar com ela.
— Deus do céu, ainda esse assunto. — passo as mãos
irritada, pelos cabelos. — Certamente essa ideia ridícula partiu de
Dona Carmell. Será que ela nunca vai desistir?
— Isso não importa. Só sei que eu também não vou desistir
de você, Chantel. — sinto as mãos de Thor ao redor do meu rosto.
Expiro, brevemente. — Fica comigo. Eu te dou emprego, você pode
morar no meu apartamento. Que durmamos em quartos separados,
se for o caso, mas me dá essa chance.
Engulo em seco ao mesmo tempo em que vislumbro os
olhos caídos daquele homem dentro dos meus. A paixão me
obrigando a dizer “sim”, a sua beleza máscula, o seu coração
quebrado e cheio de máculas me obrigando a dar a ele este
acalento...
— Eu não posso depender de você, Thor Baker. Eu vim
para Nova York para ser independente, conquistar os meus sonhos,
isso seria frustrante demais para mim, ainda que estivesse vivendo
um conto-de-fadas ao seu lado.
Sou sincera, ainda que isso me arruíne inteira.
— O antídoto para todas as minhas mazelas é você,
Chantel... para os problemas mais fodas da minha vida. — sinto os
seus dedos deslizarem delicadamente por meu rosto. Fecho os
olhos, sentindo-me especial para Thor, o que, na realidade, foi o que
eu sempre quis. — Chantel, eu tenho trinta e cinco anos e essa é a
primeira vez em que cheguei a pensar num compromisso sério, no
futuro junto a alguém. Tenho a sensação de que você sabe das
minhas dores e medos, muito melhor do que eu mesmo... eu só
preciso de uma chance.
Abro os olhos, sentindo-os dolorosamente marejados. Um
homem tão precioso, implorando por mim... Eu juro que queria
ceder, mas muitas incertezas ainda me impediam.
— Desculpa, Thor. — saí de perto dele e me apoiei na
janela da suíte. A neve caía com pressão dessa vez. — Vai ser
muito difícil para mim continuar em Nova York. Estou me sentindo
tão pressionada com a história do Lion, que eu não sei se vou
conseguir te fazer feliz. Não quero mais te expor, te prejudicar,
trazer mais pesos para a sua vida. Você me entende?
Thor levanta seriamente da cama, em seu belo terno cinza.
O moreno fica ainda mais atraente naquela cor elegante. Os seus
passos são lentos até mim.
— Tudo bem. Eu te entendo.
Ele continua com as mãos nos bolsos e, dessa maneira, faz
menção de sair do quarto.
— Não vai me dar um beijo de despedida? — pergunto,
angustiada.
— Pra quê, se não vai haver despedida? — ele fala,
próximo à porta. — Você vai continuar presa no meu coração, nas
minhas lembranças, todos os dias. E esse beijo só vai ser mais uma
delas.
Saio correndo na sua direção, segurando firmemente no
seu braço.
— Thor, eu só preciso pensar...
— Tudo indica que pra você ainda existe um acordo entre
nós dois.
— Claro que não.
Estava desesperada para ser compreendida.
— Um acordo com prazo de validade e, pelo jeito, ele
expira agora. — faço uma negativa insistente com a cabeça. — Não
vou te obrigar a ficar comigo, Chantel. Estou farto dessa história das
pessoas se aproximarem de mim apenas por interesse ou por
obrigação. Eu quero a sua parte mais sincera, quero você
completamente entregue.
— Thor... — acaricio a sua barba rala.
— Eu só não vou pedir para você me esquecer, porque eu
sei que você vai lembrar de mim, todas as vezes em que me
comparar com o cara, que você vai escolher para viver momentos
que, na verdade, seriam nossos. — ele profere e sai do meu
alcance, batendo a porta do quarto, em seguida.
Imediatamente, puxo a maçaneta e saio correndo na
direção do elevador.
— Thor, por favor!!!
Mas não dá tempo.
Sinto a alma deixar o meu corpo, naquele instante. Os
meus olhos se lavam de lágrimas, uma sensação de impotência me
consome, ao mesmo tempo em que jogo as minhas costas na
parede do corredor, chorando, destruída.
Eu só não queria estar sentindo esse medo terrível de
arriscar.
Eu nunca me senti tão insegura e falha nas minhas
decisões.
Deus do céu, o que eu faço?
Se Thor estivesse realmente nas linhas da minha
existência, os nossos corações encontrariam um caminho para
voltar a bater na mesma sintonia.
Depois de um dos dias mais tristes da minha vida, quando
me despedi daquela maneira horrenda de Thor Baker, eu decidi ficar
mais uma semana em Nova York, apenas para tentar situar os meus
pensamentos, respirar com mais tranquilidade e ter certeza das
minhas escolhas.
Consegui trocar a passagem de volta à Flórida, para hoje,
às 17h. Obviamente, ainda não havia encontrado sequer uma
esperança de emprego, e muito menos falado com Sr. Indecente
durante esses últimos dias. Este intervalo de tempo seria um
momento ideal para que ele também organizasse os seus
pensamentos, escutasse o seu coração e dessa forma
compreendesse se os seus sentimentos por mim eram de fato reais,
fortes o suficiente para que Thor pudesse se arriscar em um
romance, depois de tudo o que vivemos juntos.
Ao mesmo tempo, eu via sinceridade nas suas palavras,
nos seus olhos, nas suas atitudes. Certamente a sua paixão era tão
intensa e arrebatadora quanto à minha. Diante disso, decidi hoje me
despedir dele e tentar acordar que, assim que conseguisse um
emprego em Tampa, eu retornaria a Nova York, para decidirmos
juntos o que poderia ser feito quanto ao que sentíamos um pelo
outro.
Definitivamente, eu não poderia desperdiçar toda a nossa
paixão.
Eu nunca havia experimentado tantas emoções ao lado de
quem quer seja, muito menos conhecido um homem tão repleto de
manchas, mas ao mesmo tempo tão genuinamente adorável. Thor
Baker havia me completado deliciosamente, sobretudo quando me
tocou com tanto carinho e reconheceu com gratidão tudo o que
pude fazer para ajudá-lo.
Saí do táxi, na esquina da rua onde ficava o prédio de Sr.
Indecente. Foi aonde o motorista conseguiu estacionar, naquela
tarde de rush. Enrolei o corpo ainda mais no sobretudo de lã
vermelha e caminhei ansiosa na direção do prédio. Neste horário,
Thor costumava estar em casa para almoçar e seria uma boa
oportunidade de nos despedirmos descentemente, antes de eu
partir para Tampa.
O meu coração anunciava coisas boas, estava esperando
que a gente pudesse selar um outro pacto, que em breve
pudéssemos nos rever e decidir sobre as nossas vidas juntos, assim
que eu me estabilizasse na minha cidade natal.
Thor era especial demais para mim, sem sombra de
dúvidas, eu não queria perdê-lo de vista.
Já bem perto do prédio de Sr. Indecente, faço menção de
subir as enormes escadas de mármore escura, quando as minhas
botas cessam na calçada. Coincidentemente encontro a imagem do
belo homem à porta. Abro um sorriso e encho o meu coração de
expectativas, quando os meus olhos arregalam apavorados.
Continuo parada onde estou.
Thor está acompanhado por Stella. Os dois sorriem, com
intimidade. Ela, ainda mais linda, exuberante, num vestido de lã
verde, as botas elegantes que subiam pelas suas pernas finas e
delicadas.
Mas que merda os dois estavam fazendo juntos, já que o
que Thor mais queria era cortar relações com aquela pilantra,
depois de tudo pelo que passou!
Afunilo um pouco mais os olhos e então me dou conta de
que Karl os acompanha. O irmão de Thor também está sorridente,
ao lado dos dois, ao descerem juntos as escadas do prédio.
Imediatamente, eu recuo para perto de um grupo de adolescentes
que está na calçada, pois eu prefiro que não me vejam.
E os meus olhos ardem ainda mais, quando eu vejo Thor
abraçando Stella com amabilidade, entranhando os seus dedos nos
cabelos pretos e fartos, inspirando o perfume do seu ombro. Ela
fecha os olhos e sorri, com o toque íntimo de Sr. Indecente.
Prontamente, viro o rosto para o lado contrário, evitando flagrar um
beijo.
— Oi, tia.
Levo um susto com aquela abordagem repentina, quando
me dou conta de quem está bem perto de mim é a Amber, a
sobrinha psicopata de Thor.
— Amber! — sorrio, sem graça. — Oi. Eu nem te vi.
— Eu percebi. — ela mastiga chicletes e sustenta uma
touca enorme azul sobre os cabelos lisos. — Praticamente sentou
no nosso colo, quando caminhou de costas até o banco.
Olho para trás perturbada, quando percebo que estou
praticamente empoleirada nos amigos de Amber. Dou alguns
passos para frente, constrangida.
— Desculpa, eu nem me dei conta de que vocês estavam
sentados aí.
Os garotos e as meninas me ignoram com os seus fones
enormes de ouvido e os celulares em punho.
Dou de ombros, olhando mais uma vez na direção do
prédio. Karl, Stella e Thor continuam conversando na calçada,
quando um detalhe me incomoda, a modelo tem o seu braço
irritantemente enlaçado ao do CEO. Isso me causa dolorosos
ciúmes.
Cruzo os braços, irritada, decidindo se vou até eles ou não.
Valeria mesmo à pena me indispor com todos eles, se as respostas
que vim procurar, já estavam mais que óbvias?
— Está nervosa? O que houve? Não vai falar com o tio
Thor?
A garota esganiça nos meus ouvidos, enquanto eu só
queria que ela falasse um pouco mais baixo.
— Quantas perguntas, Amber.
— Sinto muito por vocês terem terminado. — olho
atordoada para ela. — Agora, tio Thor finalmente decidiu se casar
com a Stella.
Abro a boca, completamente em choque.
Todos os meus sonhos acabam de se esvair. Todas as
esperanças de voltar a ter Sr. Indecente nos meus braços, caem por
terra. O meu coração arde ferido, as minhas pernas oscilam.
Estou sem chão.
— Ele vai se casar com a Stella? — pergunto, num fio de
voz.
O que será que teriam acordado dessa vez? O que estava
por trás disso tudo? Será que sentimentos sinceros os envolviam ou
era apenas o trato sórdido entre Karl e Dona Carmell?
— Não está acreditando em mim? Quer que eu chame ele
aqui?
Seguro nos ombros da menina, quando ela faz menção de
girar na direção de Thor e Stella.
— Não, Amber. Sossega.
— Eu não gosto da Stella. — ela comenta. — Ela já fez
muitas crueldades com o meu tio. Papai e ele pensam que eu não
sei de nada, mas eu acompanhei todos os noticiários sobre o
estupro. E eu sei que tio Thor é inocente.
Concordo, com os olhos marejados.
— Claro que o seu tio é inocente. E outra coisa, você não
deve ficar se inteirando desses assuntos. — Amber revira os olhos,
mastigando o chiclete com a boca ainda mais aberta. — Isso não
pode te fazer bem, você ainda não tem maturidade o suficiente para
digerir de forma saudável essas situações.
A garota dá de ombros, lançando o olhar na direção dos
três.
— Eles devem se casar na próxima semana.
Dou um breve sorriso de dor.
Uma lágrima escapole dos meus olhos e tudo o que faço é
abaixar o rosto, para enxugá-la com o meu cachecol.
— Que sejam felizes. — sussurro, rendida.
Ao mesmo tempo sinto tanto arrependimento, por sempre
ser tão racional, por querer fazer as coisas dentro de uma
linearidade, colocando a minha profissão à frente dos meus
prazeres. Qual seria o problema de eu aceitar o emprego na
empresa de Thor, morar na sua cobertura e assim vivermos a nossa
paixão? Se bem que, pelo jeito, os sentimentos dele não passavam
de “fogo de palha”! E se eu tivesse assentido às suas propostas?!
Correria sérios riscos de me ver sozinha e com o coração partido,
nessa cidade desconhecida.
Ah, e também sem emprego, porque nunca que eu iria me
permitir advogar na empresa do meu ex. Vê-lo desfilando com
Stella, diariamente, seria o meu atestado de idiota.
Giro nas minhas botas, em direção à avenida. Estava
pronta para buscar as minhas malas no hotel e, depois, seguir para
Tampa.
Era o que me restava.
— Aonde você vai? Não vai cumprimentá-los?
Amber segura no meu braço.
— O meu voo para Tampa sai às 17h. — informo, sentindo
o meu corpo fraco.
As emoções me consumiam as forças, pouco a pouco.
— Que pena, eu gostei de você.
Sorrio, afagando o rosto delicado de Amber.
— Eu também, querida. Até algum dia.
Ela acena e eu saio dali, completamente desnorteada. As
minhas pernas não me obedecem, as minhas mãos suam, enquanto
eu apenas me julgava imbecil por desperdiçar a oportunidade de ter
o homem mais incrível que já conheci, na minha vida.
Queria saber de mais detalhes, se Stella iria retirar a
queixa, se Thor estava realmente se casando obrigado, por não
aguentar mais conviver com essa situação tão cruel, mesmo que
isso colocasse a sua herança e as suas convicções em risco. Mais
cedo ou mais tarde os canais de comunicação me esclareceriam
essas possibilidades, eu não iria desgrudar mais dos informativos de
Nova York, na internet.
Foi exatamente o que Thor falou, não há despedida quando
as lembranças vivem intensamente no nosso coração. Só que ele
esqueceu de acrescentar que dessa forma todo o sofrimento se
torna ainda maior.
Nova York estava tomada de neve naquela tarde de
Inverno. O clima gelado não era menos incômodo do que a dor
aguda que sangrava impiedosamente o meu coração.
No trajeto até o aeroporto, eu apenas me perguntava, entre
lágrimas e fungadas, por que eu não tive coragem o suficiente para
aceitar a proposta de Thor? Apenas optei pelo que seria mais
conveniente, simplesmente temendo os riscos que a minha
permanência em Nova York poderia me trazer.
Nunca imaginei que pudesse fraquejar diante de qualquer
situação, considerando a maneira como sempre agi. Sempre fui
destemida, impetuosa, decidida, tanto que vim morar sozinha em
uma cidade desconhecida, apenas carregando as esperanças na
bagagem. Agora, eu havia falhada rudemente e estava me odiando
por isso. Sem sombra de dúvidas, eu havia acabado de perder
quem poderia ser o grande amor da minha vida.
Finalmente, chego ao aeroporto e as lembranças apenas
retornam como avalanches nos meus pensamentos. O dia em que
cheguei em Nova York, a tempestade de neve e, principalmente, a
companhia de Thor. O medo que eu sentia de me entregar a ele, de
sofrer, de ter o coração quebrado... e que irônico, eu mesma fui
capaz de quebrar o meu próprio coração...
Realizo o check in e, apenas com a bagagem de mão,
caminho na direção do embarque. Dessa vez, eu iria retornar na
classe econômica, mas isso não me chateava mais do que saber
que Thor não me faria novamente companhia.
A essas alturas, Stella e ele estão fazendo planos para o
dia do casamento. Por mais que Sr. Indecente tenha tentado fugir do
seu compromisso matrimonial, agora o destino provava para ele,
quem realmente mandava nas suas decisões.
Inspiro profundamente, já na fila, jurando para mim mesma
esquecer de tudo que vivi nessa viagem frustrada.
Devido à alta temporada e das férias de Inverno, o
aeroporto está lotado. Mal consigo enxergar o portão de embarque,
mas dou graças a Deus quando a fila começa a se movimentar mais
rapidamente.
— Acho tão romântico homens com rosas vermelhas...
Sobressalto com a voz que me retira, de repente, dos meus
devaneios. Olho para trás e uma senhora muito elegante comenta,
olhando admirada para frente.
— Desculpa, eu não entendi. — respondo, confusa.
— Perto do portão de embarque está um rapaz com um
buquê enorme de rosas. — então ela me avalia dos pés à cabeça.
— Ah, você não dá altura, por isso não está vendo.
Reviro os olhos.
Uma afronta desse tipo era a única coisa que eu não queria
ouvir nesse momento.
— Não me importo com esses caras românticos, no final
das contas só querem fazer média.
A mulher me avalia, desconfiada.
— Está com o coração partido?
Enrugo as sobrancelhas, afinal, estava tão óbvio assim?
— Por que está me perguntando isso?
— Desdenhando de um gesto tão bonito. — ela sorri,
exibindo o seu batom vermelho. — Quando você receber rosas de
um namorado, vai se sentir a mulher mais especial do mundo e nem
vai questionar se ele está fazendo média ou não, já que o carinho
impresso naquelas flores será a resposta para tudo.
Amasso os lábios, incomodada.
Este era o último assunto pelo qual eu sentia interesse, no
momento, depois que fui capaz de arruinar a única possibilidade de
ser feliz no amor.
— Nem tão cedo eu pretendo namorar.
Respiro mais aliviada quando chega a minha vez de passar
pelo portão de embarque. Já estava farta desses assuntos que só
me machucavam ainda mais. Ajeito a pequena mala no braço e viro
o rosto para o lado contrário, quando a bagagem cai imediatamente
da minha mão.
— Thor?!
Perco o ar por segundos ao me dar conta de que o tal
romântico que segurava o buquê de rosas é Thor Baker.
Ele me avalia com um olhar bruto e indecente, e se
aproxima, num belo terno chumbo.
Os seus olhos ainda mais pretos, o sorriso mais branco que
as teclas de um piano, o perfume sempre marcante me entorpece e
todas as minhas certezas de que nunca mais voltaria a vê-lo se
desmontam e, obviamente, eu me sinto feliz por isso.
— Se você não aceitar ficar comigo em Nova York, tudo
bem, só quero que leve as flores e entenda que cada uma delas
significa as vezes em que eu pensei que pudesse viver longe de
você, mas infelizmente falhei.
Imediatamente saio da fila, sob o olhar de surpresa das
pessoas, principalmente da tal mulher que com toda a certeza não
estava entendendo bulhufas a respeito daquela abordagem.
Seguro na mão de Thor e direciono o homem até um dos
bancos do aeroporto, avaliando a beleza daquele gesto, desistindo
de todas as teorias que eu ainda sustentava a respeito de “homens
românticos”, contudo eu já sabia do casamento e apenas precisava
entender o que Sr. Indecente pretendia com aquelas rosas.
— Por que você está fazendo isso comigo? — questiono,
assim que nos acomodamos. — Eu já sei de tudo! Inclusive, a essas
horas, a Stella já deve estar na loja mais chique da cidade,
escolhendo o seu vestido de noiva.
Thor me encara em estranhamento.
— Como assim? Do que está falando?
— Eu fui até o seu prédio para nos despedirmos. — ele me
avalia em expectativa. — Eu não queria partir sem me despedir
decentemente de você, ignorando os nossos sentimentos,
entendendo que a nossa história era página virada. Eu fui até lá com
a intenção de selarmos um outro pacto, assim que eu conseguisse
estabilizar a minha vida em Tampa, eu estava disposta a retornar
para Nova York, para decidirmos a nossa vida juntos.
Thor expira impaciente.
— E você encontrou a Amber.
— Sim, como sabe?
— Foi ela quem me disse que você partiria no voo das
cinco, para a Flórida.
Pisco os olhos diversas vezes, ainda sem entender aonde
Thor pretendia chegar.
— E foi a sua sobrinha querida que me contou que vocês
dois iriam se casar, inclusive eu vi a maneira como você abraçou
Stella, inspirando com ternura o seu perfume barato. — profiro,
enciumada.
— Definitivamente, a Amber precisa ser estudada. — Thor
crava as mãos nos cabelos, o buquê de rosas ainda no meio de nós
dois. — Por que caralhos ela inventou essa mentira?!
Levo as mãos à boca.
— Mentira?
— É claro! — olho atordoada para ele, me julgado a pessoa
mais idiota do mundo, ao ser manipulada por uma pirralha. — Eu
fico triste por você ter acreditado mais na Amber, do que em mim!
Tenho certeza que a primeira coisa que você fez, foi julgar que os
meus sentimentos por você não passavam de pretextos para eu te
levar para cama.
Umedeço os lábios, arrependida.
Era o destino tentando unir nós dois, novamente. Eu
simplesmente não poderia mais jogar fora essa chance. Thor Baker,
sem sombra de dúvidas, foi quem me fez descobrir a verdadeira
magnitude de um sentimento verdadeiro.
— Eu estou muito confusa, Thor. — envolvo o seu lindo
rosto nas minhas mãos. — Por favor, me perdoa.
O homem se afasta, recusando o meu toque, ao mesmo
tempo em que observa desnorteado o buquê.
— Você já sabe o que eu te propus, Chantel! Não vou
insistir! Seria ridículo da minha parte fazer chantagem emocional e
te obrigar a ficar aqui só por que está se sentindo mal com isso
tudo.
Prontamente, eu me levanto de onde estou e me jogo nos
braços de Thor, sentando no seu colo, deixando as rosas tocarem
os nossos rostos que agora estão bem próximos.
— Eu vou ficar com você, sim, Thor. Sabe por quê? —
seguro firmemente na sua face. — Eu estou louca, apaixonada,
cega, devastada de tanto amor.
— Chantel...
— Eu não consigo mais me imaginar longe do seu corpo,
do seu sorriso, da sua voz, das suas implicâncias. — os meus olhos
marejam, a boca de Thor tão próxima à minha, me deixa
hipnotizada. — Eu não vou mais abrir mão de você por nada. O que
eu sinto aqui dentro, vale todo o risco do mundo.
Sr. Indecente prontamente dá um meio sorriso e me
desfere aquele olhar penetrante, repleto de sentimentos.
Estava ansiosa aguardando por uma resposta.
— Eu nunca me humilhei para mulher nenhuma. — os
olhos negros de Thor transparecem tanta sinceridade. — Se um dia
você desejou ser especial para alguém, pode se sentir felizarda,
porque caralhos Chantel, você é única. Nunca vi uma garota tão
difícil para ser conquistada.
O meu coração acelera, a ponto de eu desfalecer. Era tudo
que eu mais precisava ouvir, depois de todas as incertezas que me
freavam a viver o amor ao lado de Thor.
— Eu errei, fui racional demais, a ponto de ferir os nossos
corações, eu sei disso tudo, mas eu também sei como reconhecer
as minhas falhas.
Thor apenas me observa com paixão, ainda que o seu
semblante sério oculte as respostas de que tanto preciso.
— Eu fui inocentado.
Abro a boca sem ter certeza do que eu havia escutado.
— O que disse?
Thor suspira.
— Karl e Stella foram até a minha cobertura para me
comunicarem dessa grande notícia e aproveitei o ensejo para selar
a paz com a modelo. Agora, ela vai passar uma temporada em
Milão, até “baixar toda a poeira”. Não vai ser fácil para ela, depois
de ter sido desmascarada, manter o sucesso e a imagem. Então, só
estávamos nos despedindo. E eu sei que a culpa de todas as
armações sórdidas é de Dona Carmell. Stella sempre foi tão vítima
quanto eu.
Assinto, experimentando o coração leve. A notícia da
inocência de Thor me deixa completamente em êxtase, ao mesmo
tempo em que me sinto tão injusta por ter julgado cruelmente os
sentimentos deste homem.
— A gravação te inocentou. — afirmo, ainda sentada em
seu colo.
— Como sabe? — ele estranha.
— No dia em que Stella esteve no seu apartamento,
naquele fatídico dia em que eu me entreguei a você, eu gravei no
celular a modelo confessando as armações, dizendo inclusive que
ela sabia que você era inocente.
Thor sorri incrédulo.
— Foi você?
Afirmo, observando a sua expressão de surpresa.
— Eu fiquei esses últimos dias em Nova York, pesquisando
tudo sobre o seu processo e então consegui descobrir o seu
advogado de defesa. Dr. Rony Scott. Fui até o escritório do homem
e entreguei a ele o áudio. Era o mínimo que eu poderia ter feito.
Sinto a mão de Thor afagar carinhosamente o meu rosto.
— Chantel... Estou perplexo...
— Não quero mais ser tão orgulhosa, cabeça dura, desistir
de tudo, como se fosse fácil encontrar um amor por aí. — sorrio,
rendida. — É muito mais fácil encontrar um outro emprego, não é
mesmo?
Thor imediatamente me abraça, afogando as rosas contra
os nossos corações, para ajeitar os lábios no meu ouvido.
— Você merece o mundo, querida. Confia em mim. —
fecho os olhos, sentindo-me extremamente acalentada. — Tem uma
vaga te esperando na empresa, eu libero o quarto de hóspedes para
você, retiro as minhas tralhas de lá, eu só não quero deixar a minha
garota excêntrica ir embora. — sorrio. — E você vai trabalhar na
Baker Automobilística por mérito, porque você é excelente no que
faz. Sem falar que agora estamos livres de Erick Lion.
Voltamos a nos encarar.
— Você se livrou...
— Eu te protejo. — os olhos de Thor exalam tanta verdade.
— Ele não vai ser capaz de fazer mais nada, afinal, eu fui
inocentado.
— Eu confio em você, Thor Baker. — confesso e me jogo,
apaixonada, contra o seu corpo, deixando um beijo sôfrego na boca
de Sr. Indecente.
A paixão queimando os nossos lábios, inflamando os
desejos que sempre existiram.
— Chantel, — ele profere na minha boca. — você não foi
apenas a cúmplice de um plano, mas a mulher que me ajudou a dar
um fim nos meus maiores pesadelos.
— E na sua sina de cafajeste, é claro.
Brinco e ele sorri, para depois me beijar tão intensamente,
como se décadas tivessem separado a gente.
Por que demorei tanto tempo para perceber o quanto eu
estava entregue?
Vislumbro por cima das copas das árvores, o oceano azul
turquesa que parece estar ali como a própria continuação do céu.
As mãos de Thor envolvem o meu ventre, enquanto sorrio, lavando
um apetitoso cacho de uvas, na pequena cozinha daquela casa de
árvore charmosa, em Porto Rico.
Estávamos vivendo a nossa tão sonhada lua-de-mel.
Depois de ele me propor Paris ou Roma, eu consegui convencer o
meu lindo marido que as casas na floresta tropical podem ser bem
mais românticas que o luxo dessas capitais europeias. Sem falar
que o nosso trabalho, na Baker Automobilística, ficaria
exclusivamente em Nova York, já que aqui não tínhamos sequer
área de internet.
— Se for uma menina, vai se chamar Charlotte. Em
homenagem ao meu pai, Charles Baker.
Termino de enxugar as mãos e me viro sorrindo, na direção
de Thor. O bronzeado da sua pele, devido aos dias quentes de
Verão nesta ilha, deixa-o ainda mais sexy.
Eu havia engravidado, poucos meses antes do casamento.
Em outra época, eu me desesperaria, sentiria vergonha dos meus
pais, cogitaria estar trocando os “pés pelas mãos”, contudo, agora,
toda a minha tranquilidade e satisfação só sacramentavam ainda
mais a minha escolha pela felicidade, e não mais pelo o que sempre
acreditei como o convencional e o correto.
— Eu gosto de Charlotte, mas se for menino, eu prefiro
Erick. — informo e Thor gargalha.
— Não brinque assim.
— Deus me livre, prefiro até Osama, mas Erick, jamais.
— Ele foi preso, finalmente.
Thor leva os olhos aos céus, enquanto eu acaricio a sua
barba bonita. Enquanto isso, ouvimos às ondas do mar quebrando
há apenas alguns metros dali.
— Graças a Deus, a justiça foi feita. — expiro, tranquila. —
Quantas pessoas podem ter sido prejudicadas por causa da
maneira sórdida como Erick Lion trabalhava, fazendo falcatruas,
passando por cima de valores e do juramento que foi capaz de fazer
no dia da formatura, apenas para ganhar as causas e, óbvio, as
comissões milionárias.
Thor concorda comigo, envolvendo o meu rosto
delicadamente nas suas mãos.
— Vamos esquecer desse merda. — então, ele abraça o
meu corpo e a barriga de seis meses nos relembra ainda mais o
quanto nos amávamos. — Eu só penso no rostinho do nosso bebê.
Sorrio emocionada e feliz por Thor ter topado descobrir
comigo o sexo do bebê, apenas quando ele nascesse, enquanto
isso apenas sonhávamos com essa surpresa. Eu sempre entendi
que descobrir antes do nascimento, não alterava em nada, apenas
para fins de organização de quarto e enxoval e esses detalhes não
sobrepunham a minha vontade de saber o sexo do meu filho,
somente quando ele ou ela estivesse nos meus braços. Toda a
emoção desse momento seria ainda mais intensa e genuína.
— Você fica linda neste biquíni verde.
Giro, exibindo a minha barriguinha de grávida e algumas
manchas vermelhas de picadas de mosquito, para então me jogar
nos braços musculosos daquele lindo moreno.
— Thor, como eu te amo...
Beijo lentamente a sua boca, experimentando ainda o
sabor da geleia de framboesa do nosso café-da-manhã.
— Minha vida... eu também te amo tanto...
Em seguida, saímos de mãos dadas da casa, na direção da
praia. O clima estava altamente convidativo, sem falar no quanto eu
amava mergulhar nas águas claras do Caribe e encontrar os
peixinhos coloridos no fundo do mar. E nem era preciso ir tão longe
da arrebentação, para vê-los.
— Karl, a essas alturas, deve estar pirando sem mim, à
frente dos negócios.
Atravessamos a pequena trilha no meio das árvores,
enquanto as folhas e os galhos secos estalavam sob os nossos pés.
— O seu irmão é muito competente. — aponto. — Quem
deve estar pirando mesmo é a Loren, para justificar para o marido o
vestido de madrinha de trinta mil dólares.
Thor concorda, ainda incomodado com essa história.
— Nem me lebre disso, o meu irmão deve estar fazendo
greve de sexo.
— Eu nunca imaginei que trabalhar com o seu irmão seria
tão prazeroso, que ele me aceitaria tão bem.
— Karl sente um orgulho enorme de você, Chantel. —
quando me dou conta, já estamos na areia. — Você já conseguiu
livrar a empresa de muitos imbróglios, que outros advogados jamais
dariam conta.
Sorrio, experimentando muito gratidão por dentro. Ter o
reconhecimento de Karl e principalmente o de Thor, era a maneira
de me sentir realizada na minha carreira, tudo o que sempre desejei
para mim.
— Mesmo assim, ainda me sinto diminuída em certas
audiências, a maneira como me recebem, focalizando apenas na
minha fisionomia, idade e sobretudo no meu gênero.
As ondas tocam os nossos pés, enquanto subo os meus
olhos pelo porte físico do meu marido, de fazer inveja a qualquer
modelo de capa de revista.
— O importante é que você prova para eles, a cada
audiência, que nada disso é mérito, mas sim a sua competência e
perspicácia que fazem toda a diferença, deixando todos eles
boquiabertos. E fodidos.
Gargalho, sentindo-me feliz e realizada com todo o
prestígio de Thor.
Então, ele me avalia, com os olhos semicerrados, e eu
apenas ajeito os meus fios loiros com a brisa morna do mar, para
depois enlaçar a minha mão à dele e, dessa maneira, entrarmos um
pouco mais no meio das ondas calmas.
— Infelizmente, isso não anula a sociedade machista na
qual a gente vive. — lamento, enquanto as ondas fazem cócegas na
minha barriga.
— Sim, temos um trabalho árduo pela frente.
— Eu queria te dizer algo muito importante, agora que você
vai ser o pai dos meus filhos, meu amor.
Seguro nas mãos de Thor, para repousá-las sobre o meu
ventre. O homem sorri, com ternura, enquanto o mar balança os
nossos corpos unidos, no mesmo ritmo, naquela manhã quente de
Verão.
— Pode falar, querida.
— Você não entendeu? — pergunto.
— Como assim? — Thor está lindamente confuso.
— Você vai ser pai dos meus filhos, — enfatizo. — eu estou
grávida de gêmeos.
Imediatamente, Thor oscila os olhos marejados no meu
ventre e no meu rosto. Está sem fala, ele gagueja e não sai
nenhuma palavra sequer.
Apenas sorrio.
— Chantel... não brinca dessa maneira.
— Eu pedi para o Dr. Hans não comentar nada na sua
frente, no dia em que fomos fazer aquela ultrassonografia, afinal de
contas, eu mesma queria te dar essa linda notícia, aqui em Porto
Rico.
— Então você já desconfiava?
— Nós, mães, sabemos de tudo, meu amor. — ergo uma
sobrancelha e envolvo os meus braços no seu pescoço.
Thor retribui, enlaçando as mãos na minha cintura.
— Meu Deus, esse é o dia mais feliz da minha vida. — ele
sussurra, em êxtase.
Sem dúvidas, todos os momentos que eu estava vivendo
ao lado de Thor, haviam se tornado únicos e muito especiais.
De repente, ele me pega no colo e eu grito, num susto,
para depois correr comigo para o interior da água cristalina e morna.
— Nós três te amamos muito. — confesso, olhando no
fundo dos seus olhos pretos.
Eu nunca imaginei que poderia ser tão realizada nas duas
esferas mais importantes da minha vida, tudo isso devido ao amor
de Thor Baker, o Sr. Indecente mais incrível e amoroso, com o qual
eu nunca sonhei, mas que foi capaz de me mostrar o quanto ele
poderia ser perfeito para mim.
— Chantel, vocês são a minha vida. E todo dia eu
compreendo melhor, porque eu me apaixonei por você. — ele fala e
eu me misturo ao mar, nos seus braços, para depois abaixarmos
juntos, no meio de uma onda, e nos deliciando em um beijo salgado,
com sabor de oceano, eu me dou conta do tamanho da minha
felicidade.
Incentive os escritores nacionais e independentes, avaliando os seus livros. :)
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@umcafeeumebookporfavor
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