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Copyright © 2021 Olívia Molinari

Capa e Diagramação: L.A Capas e Design / Olívia Molinari


Revisão: Barbara Pinheiro
Adobe Stock, PNGTree

Molinari, Olívia – 1ª Edição – Publicação Independente, 2021.


Romance Contemporâneo

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens e acontecimentos


descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer
semelhança é mera coincidência

Todos os direitos reservados.


Proibida a cópia e reprodução, por quaisquer meios, sem a prévia
autorização por escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido pela lei nº
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Aviso:
Dedicatória
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Epílogo
Notas da Autora
Agradecimentos
Sobre a autora
Outras obras:
Este livro pode ser lido separadamente, mas contém alguns spoilers
do livro 1 da série “Amores em São Paulo”.
Caso queira ler “O bebê, a secretária & o CEO”

Clique Aqui
In Memorian
Marry, a gatinha do rabo torto.
Que deu seu último suspiro enquanto eu terminava de escrever esta
história.
Tente não enlouquecer os anjos, minha querida neném.
Um dia nos encontraremos nas nuvens.
Alguns anos antes de nossa história realmente começar...

— Rafa, mano do céu… — Eduardo entrou afobado em minha


sala. Parecia que um asteroide havia caído no centro de São Paulo
pela sua cara. — Cara, tu nem imagina o que aconteceu. Aliás, o
que está acontecendo.
Desencostei da cadeira lentamente e olhei para ele. Eduardo
era o tipo de pessoa que nunca ia direto ao ponto, mas acho que se
fosse um asteroide, ele já teria gritado aos quatro ventos.
— E o que está acontecendo? — Arqueei uma sobrancelha.
Eduardo olhou para a porta e depois se voltou para mim,
prestes a contar um segredo.
— Você tá ferrado.
— Eu? Por quê?
Eduardo olhou para a porta novamente.
— Estão falando que você está saindo com a nova chefe. Seu
garanhão! — Ele deu uma risada nada discreta e empurrou meu
ombro. Particularmente, odiava quando ele fazia isso. — Não
esperava isso de você, confesso. Mas… se ela deu bola, você é que
está certo.
Meu cérebro assimilou a informação depois de conter a
repulsa de seu toque e meu coração vacilou alguns instantes.
Estavam falando o quê???
— Eduardo — o chamei, trazendo-o a si novamente. — Como
assim, estão falando que eu estou saindo com a chefe?
Eduardo semicerrou os olhos e cruzou os braços.
— Não precisa mentir para mim. Mas as pessoas falam, né?!
Alguém viu vocês dentro do carro dela. Só estão especulando há
quanto tempo isso está acontecendo.
Levantei-me imediatamente.
Não podia ficar ali ouvindo as piadinhas de Eduardo enquanto
falavam de nós.
Não que fosse mentira, mas...
Atravessei os corredores da empresa, indo em direção à sala
da presidência. Precisávamos conversar. Encontrar meios de
manter as coisas em segredo por mais tempo.
Eu entendia Fernanda por um lado, apesar de me sentir um
pouco chateado por outro.
Eu era um funcionário. Ela era a chefe. Ela tinha acabado de
conquistar aquele cargo depois de muito esforço. Ninguém a
respeitaria se soubesse do nosso relacionamento. Sem falar que ela
estava tentando conquistar a confiança dos outros acionistas e
algumas outras coisas envolvendo sua própria família.
Às vezes eu me sentia um idiota por esperar um
relacionamento com alguém muito superior a mim. No entanto, com
Fernanda sempre foi diferente.
Ela era a melhor pessoa que eu havia conhecido, até então.
Claro que ela sabia manter seu lugar como chefe, mas ao mesmo
tempo era doce, inteligente e me amava. Ela havia dito isso várias
vezes.
E era incrível o quanto eu também estava apaixonado por ela.
Por isso, mesmo que fosse extremamente humilhante manter
um relacionamento em segredo, por ela, eu fazia sem o menor
esforço. Esperando apenas o dia em que poderíamos assumir isso
publicamente.
Quando cheguei à recepção, Giovana, a secretária de
Fernanda, não estava em seu lugar. Então atrevi-me a ir
diretamente, sem anunciar a minha entrada.
Porém, quando abri um pouco da porta, ela não estava
sozinha. Havia outra pessoa ali e a discussão entre eles era
calorosa.
— Mas que merda é essa que estão falando na empresa,
Fernanda? — Era a voz de Marcelo. Um engravatado de merda que
se achava o futuro marido de Fernanda.
Eu sabia que deveria fechar a porta e sair dali. Mas algo me
prendeu em meu lugar e eu continuei, afinal, meu nome também
estava envolvido naquilo.
— Não sei do que você está falando — ela respondeu,
mantendo a voz calma.
Para muitos, sua voz soava tranquila, mas eu a conhecia
perfeitamente para saber que havia um leve tremor em seu tom.
— Ah, não sabe? — Marcelo retrucou. — Estão comentando
por aí que aquele imbecil do TI está trepando com a própria chefe.
Tem noção do que isso significa?
Minha vontade era de entrar na sala e socar aquele idiota até a
morte. Mas eu sabia que não deveria fazer nada, pois só atrairia
mais público.
Achei que Fernanda fingiria um susto, porém, ela riu.
— E quem é o “o imbecil do TI”? Ele deve ter um nome, não é?
Marcelo socou a mesa.
— Rafael Souza. Aquele mesmo que lambe o chão que você
passa.
Fernanda ficou em silêncio por vários segundos. Nesse
momento, quis que ela dissesse que tínhamos um caso, sim. Que
ela me pertencia.
Marcelo e ela eram próximos demais. Suas famílias eram
amigas e o relacionamento dos dois era como se já estivesse selado
desde antes de nascerem.
— Ai, Marcelo… — Ela bufou e riu novamente. — Quem
inventou essa história absurda?
— Todo mundo está comentando — ele repetiu. — E não
importa quem inventou. Importa saber se isso é verdade ou não.
— É claro que não é verdade! — Fernanda explodiu, desta
vez. — Você acha mesmo que uma pessoa como eu, vai se
envolver com um pobretão como ele? Até parece que você não me
conhece!
A explosão de Fernanda foi tão repentina que suas palavras
tomaram uma proporção maior do que eu esperava. Aquela não era
Fernanda… ela não diria uma coisa assim.
Mesmo que fosse para tentar ludibriar Marcelo... ela não usaria
palavras tão ferinas.
Pensei em entrar na sala, mas resolvi ouvir o restante. Depois
precisaria conversar com ela.
— Você sabe que tem muita coisa em jogo, não sabe,
Fernanda? — Marcelo disse.
— Eu sei disso, Marcelo — ela respondeu imediatamente. —
Achei que você me conhecesse e confiasse em mim.
Abri só um pouco mais a porta e então vi Marcelo se
aproximando dela e a encurralando contra a mesa. Ele passou a
mão pelo rosto dela e depois desceu pelo seu braço e pelo seu
corpo.
Fernanda fechou os olhos e jogou os braços ao redor do
pescoço dele. Eles trocaram um beijo entusiasmado demais.
E nesse momento a minha dignidade foi para o ralo.
— Então eu quero que você o demita. Se é verdade que vocês
não têm nada, isso é mínimo que você pode fazer — disse ele,
quando pararam o beijo.
Nunca fui um homem nervoso, mas ver aquilo fez meu sangue
ferver. Fernanda parecia estar gostando das carícias daquele idiota.
Então em um movimento só, entrei na sala, pegando-os
desprevenidos.
— Ora, que bom vê-lo por aqui — Marcelo comentou, com voz
desdenhosa. — Estávamos mesmo falando de você.
Marcelo se afastou dela, dando alguns passos para trás. Ele
disse mais algumas coisas, mas não me importava o que ele dizia,
porque eu apenas mantinha meu olhar sobre Fernanda.
Queria que ela me encarasse para eu poder decifrar em seus
olhos se aquilo era uma encenação para tirar o foco do nosso
relacionamento clandestino ou se Fernanda realmente tinha gostado
daquilo.
Então quando ela me encarou, a frieza que eu vi em seus
olhos foi irreconhecível.
Eu vi que não era encenação. Era real.
Marcelo deu uma risada depois de alguns instantes.
— Uau… — ele disse, ainda rindo. — Fer, me conta como é
experiência de trepar com um funcionário. Você sabe que eu nunca
fiz isso com nossas meninas, porque não gosto de me misturar com
essa laia…
— Cale a boca, Marcelo… — Fernanda retrucou, abaixando o
rosto.
— Não. É sério. Deve ser divertido. — Ele riu novamente e me
encarou. — Iludir um sujeito que pensa que vai ser alguém, mas
que, na verdade, é apenas uma distração… Já contou a ele onde
você passou a noite passada, Fer?
Ela o encarou de forma assassina.
Mas não precisava dizer nada, porque eu já sabia o que estava
acontecendo ali.
— Bem, confesso que fiquei um pouco irritado agora. —
Marcelo ajeitou a gravata. — Não gosto de compartilhar o que me
pertence, ainda mais com um sujeito bem abaixo de nós.
Meu coração se partiu ao meio e eu senti que se não saísse
dali, eu teria um ataque de fúria.
— Mas eu vou perdoá-la por essa distração. — Marcelo enfiou
as mãos nos bolsos das calças e se aproximou de mim. — Não
achou mesmo que ela gostava de você, não é? Eu conheço
Fernanda desde que éramos crianças. Tudo o que ela ama é
dinheiro e diversão. Não é a primeira vez que ela se envolve com
outras pessoas. Mas fico surpreso por ser a primeira vez com um
sujeito do seu porte.
Fechei as mãos em punhos, pronto para dar um soco na cara
do imbecil.
— Já sabe o que precisa fazer, Fer. Se quiser controlar as
fofocas e manter o seu lugar dentro desta companhia.
Eu quase podia ouvir o tamborilar de um relógio antigo que ela
mantinha no escritório porque era de seu pai e ele o adorava.
O clima se tornou tenso, eu já não sabia mais quem eu era. Já
não sabia quem ela era.
Mas eu ainda tinha esperanças de que ela dissesse que era
mentira de Marcelo. Que ela me amava, que nosso relacionamento
era importante, mesmo eu sendo tão abaixo dela.
Nem percebi que Marcelo tinha saído da sala. Então respirei
fundo, sentindo uma frieza estranha tomando posse do meu ser.
— Onde você passou a noite de ontem? — perguntei, baixo.
Fernanda levantou o rosto, impassível.
— Com Marcelo. Você sabe que precisa ser assim — ela
emendou.
Então, naquele momento, todos os sentimentos que eu nutria
por aquela mulher vieram abaixo. Como uma explosão.
As pessoas tinham motivos para rir de mim, é claro. Eu
banquei o idiota, acreditando que uma mulher como ela poderia me
amar na mesma intensidade, sem colocar o dinheiro no meio.
Marcelo tinha razão ao me chamar de imbecil. Fernanda não
precisava se relacionar com ele para manter sua posição.
Mas ela queria. Ela gostava.
Provavelmente ela viu todos os sentimentos que eu lutava
contra fluindo para fora mim e abriu a boca. Porém, estendi a mão,
detendo-a.
Não queria ouvir explicações. Não queria ouvir nada.
— Não precisa se dar o trabalho de me demitir, Fernanda. Pois
eu me demito.
Reuni o restante de dignidade que eu tinha, virei as costas e
saí da sala.
Fernanda não me seguiu, mas eu também não esperava que
fosse me seguir.
Seis anos depois.
São Paulo – Capital.

Sofia

— Julia, eu posso sair mais cedo para resolver umas coisas?


— perguntei baixinho, enquanto Julia arrumava sua mala de viagem.
— Sair mais cedo? — Ela parou de mexer nas roupas e me
encarou. — Mas você não vai com a gente pro sítio?
— Então... — Olhei para baixo. — Eu posso ir amanhã cedo. É
que eu preciso acompanhar a minha avó ao banco. Deu algum
problema na aposentadoria dela e eles estão enrolando, sabe?!
Preciso ir junto para tentar resolver isso.
Julia entrou no closet e voltou com dois vestidos floridos.
— Tudo bem. Pode ir. Mas... como você vai para o sítio
amanhã? É um pouco longe, não acha?
— Eu dou um jeito.
Julia sorriu e levantou os dois vestidos.
— Qual deles eu levo?
Olhei atentamente para os dois vestidos que eram
praticamente iguais. Só que um tinha um tom de azul mais escuro
que o outro.
— Leva os dois.
Julia olhou para eles e deu de ombros.
— É, talvez eu deva levar os dois, mesmo.
— Então, eu já vou — comuniquei, me desencostando da
parede. — Vou me despedir da Aninha.
Julia assentiu e continuou ali perdida no seu montante de
roupas.
— Até amanhã, querida.
— Até.
Saí do quarto e atravessei o corredor em direção ao quarto da
pequena Ana. Ela tinha completado quatro anos e era uma criança
linda e muito saudável. Era a alegria da casa e fazia todos rirem.
A vida era muito engraçada em algumas coisas.
Quando conheci Julia, ela era a secretária de Andrew e tinha
se metido em uma confusão com ele, que foi momentaneamente
enganado quando um bebê chegou ao seu escritório dentro de um
cesto, com um bilhete dizendo que ele era o pai.
Na época, a única pessoa capaz de ajudá-lo era Julia, porém,
seu irmão Rafael sofreu um acidente de moto e não restou a
Andrew outro jeito a não ser me procurar para ajudá-lo.
Ajudei-os de bom grado, pois eu sempre adorei crianças.
Então os anos se passaram, Julia e Andrew se casaram e, quase
dois anos depois, tiveram Aninha.
Eles se lembraram de mim e eu voltei a ajudá-los, ganhando
assim o emprego fixo de babá.
Só que agora esse emprego estava correndo sérios riscos.
Abri a porta do quarto de Aninha e ela estava sentada em uma
mesinha no centro de seu quarto. Ela adorava pintar com lápis de
cor, mesmo que seus traços às vezes saíssem fora dos riscos do
desenho.
— Oi, amor. Tudo bem por aí?
Ela ergueu a cabeça e levantou o desenho para mim.
— Olha... você que desenhou? — perguntei, analisando o
desenho de uma pessoa em forma de palitos.
Ela assentiu com seu sorrisinho lindo e gracioso.
— E quem é?
— O tio Rafa.
Mordi o lábio, sem saber o que responder.
Ela continuou:
— Estou com saudade dele. — Ela ergueu os olhinhos verdes,
herança de seu pai. — Ele vai vir no meu aniversário?
— Vai sim, Aninha — respondi, me abaixando até ficar na sua
altura. — Acho que ele chega ainda hoje.
Ela abriu um sorriso radiante.
— E será que ele vai me trazer um presente?
— Vai, sim — garanti, mesmo sem ter certeza, porque Rafael a
adorava mais que tudo.
Aninha começou a falar sobre seus planos para o aniversário,
porque, apesar de ser bem pequena, ela era falante e muito esperta.
Sorri, alisei seus cabelos claros e deixei que falasse tudo o que
tinha em mente. Então, enquanto ela falava, meus pensamentos se
encaminharam até Rafael.
Fazia alguns meses que ele havia ido para os Estados Unidos
cuidar dos negócios que ele e Andrew tinham conquistado. Sim, ele
se tornara um grande empresário, digno de todos os seus esforços.
Nós havíamos nos tornado bons amigos desde que o conheci,
na época da confusão da Julia. Também havíamos ficado algumas
vezes, mas Rafael era um homem muito complicado e sempre dizia
que não havia espaço para sentimentos em seu coração.
O único sentimento que ele alimentava era o desejo de
enriquecer cada vez mais.
A verdade era que eu não culpava Rafael por se tornar um
homem frio e distante. Avesso a relacionamento. Em uma de nossas
noites, ele me contou o que aconteceu na empresa em que
trabalhava, anos antes. Rafael me contou cada detalhe, que me
deixou muito chocada por ver aonde uma pessoa podia ir para ferir
a outra.
Fernanda havia se casado, mas pelo que fiquei sabendo, ela
sempre dava um jeito de procurar Rafael. Ele sempre parecera
irredutível, mas eu sabia que nem todas as feridas abertas
cicatrizavam rápido. Algumas, levavam mais anos do que
gostaríamos.
Então preferi não me meter nesse rolo e continuarmos
somente com a amizade. E estava tudo indo muito bem desse jeito.
— A tia veio te falar que vai precisar sair, para resolver umas
coisas com a vovó Florência — falei, interrompendo o raciocínio da
garotinha. — Mas eu prometo que amanhã cedo encontro vocês no
sítio.
— Ahhhh, você não vai com a gente no carro? — Aninha
cruzou os braços, emburrada. — Pensei que a gente ia cantando
musiquinha.
— Você vai com seus pais — falei. — A tia precisa mesmo sair
para resolver essas coisas, tá bom?
Aninha assentiu e voltou ao seu desenho.
— Prometo que levo os chocolates que você adora —
sussurrei em seu ouvido, enquanto me levantava.
Pronto, toda a tristeza tinha sido dissipada com apenas uma
pequena promessa.
— Ótimo — ela respondeu, tão seriamente, que às vezes eu
achava que ela era uma pequena réplica do próprio pai.
— Promessa é dívida.
Saí do quarto com um pequeno sorriso no rosto.
Bem, agora não importava, mas eu precisaria comprar esses
chocolates de um jeito ou de outro.

Não era verdade quando eu disse que precisava ir ao banco.


Tudo era uma grande desculpa para o que eu realmente precisava
fazer.
— A senhorita deseja fazer o seu pedido? — O garçom
interrompeu meus pensamentos.
— Ahn, uma água, por favor — falei, mas o que mais eu ia
pedir, enquanto meus nervos teimavam em ficar aflorados?
O garçom anotou na comanda e saiu para pegar o que eu
havia pedido.
Olhei no relógio do celular.
Ele estava vinte minutos atrasado.
Fechei os olhos com o pavor tentando tomar conta do meu ser.
Será que ele já sabia o que eu queria falar? Será que pela minha
voz eu já tinha evidenciado o que estava acontecendo?
— Ah, Sofia! — Sua voz interrompeu meus pensamentos e eu
levantei a cabeça. Ele estava eufórico, como se tivesse percorrido
uma maratona para chegar até ali.
Porém, mesmo assim, ele continuava lindo. Seus cabelos
castanho-claros penteados para o lado. Seu terno cinza-claro
combinando com seu porte de empresário.
— Perdão pela demora — ele disse, sentando-se. — Estava
resolvendo algumas coisas importantes. — Ergueu o dedo e
chamou o garçom. — Já fez seu pedido?
— Pedi só uma água.
— Ah! — Ele se virou para o garçom. — Nos traga o de
sempre, por favor.
O de sempre era um prato de massa com molho à bolonhesa e
vinho tinto.
Não era como se eu não gostasse, mas eu não estava com a
mínima vontade de comer.
— Então, como você está? — ele perguntou, mas antes que
eu pudesse responder, ele emendou: — Estranhei você me chamar
aqui, a essa hora. Achei que havíamos combinado que eu
procuraria você e...
— Eu estou bem e você? — o cortei.
— Bem também — ele respondeu, um pouco irritado pela
interrupção. Então pegou o celular e começou a mexer. — Já vou
avisando que não vou poder ficar muito tempo com você. Minha
irmã está me esperando para uma reunião daqui a pouco.
— Ahn, o que eu preciso falar é rápido.
— Ótimo. — Ele continuou encarando o celular.
Paulo Casablanca era assim.
Ele era lindo, charmoso, um sonho para qualquer mulher.
Ainda mais uma mulher como eu. No entanto, ele também era
totalmente desdenhoso em relação às pessoas ao seu redor e eu
sempre me perguntava por que diabos eu havia me envolvido com
ele.
— Então...? — ele me instigou.
Respirei fundo.
Não sabia se um restaurante era um local apropriado para uma
conversa como aquela. Porém não tinha outras opções. Se eu fosse
até a empresa onde ele trabalhava e era um dos donos, certamente
levantariam suspeitas. E nosso relacionamento sempre foi assim.
Eu nunca ia atrás de Paulo.
Era ele quem me procurava. Quando queria.
— Paulo, eu... — comecei a falar, porém, o garçom chegou
com um carrinho contendo nossos pratos.
Paulo estava com tanta fome, que nem me instigou a falar
mais. Apenas pegou seu prato e o devorou, enquanto falava sem
parar sobre o sabor delicioso da comida daquele lugar.
Eu sorria pela metade.
Também comi pela metade.
Comer não era o meu foco ali. Mas ele estava tão agitado que
eu sequer conseguia iniciar o assunto.
Olhei para os lados e vi que o restaurante estava mais cheio
do que quando eu havia chegado. Então resolvi me forçar a comer o
restante e coloquei um sorriso animado no rosto.
Paulo pediu sobremesa e eu também comi.
— Você vai voltar para a casa dos Sanches? — Paulo
perguntou, quando o garçom trouxe a conta.
Assenti, mas, na verdade, eu não ia. Isso era apenas uma
desculpa para ele me dar uma carona. Se eu dissesse que estava
indo para a minha casa, ele daria um jeito de inventar qualquer
desculpa. Paulo sempre dizia que não colocava seu precioso carro
em um bairro como o meu.
— Ótimo, posso te dar uma carona, mas é claro que não posso
parar lá em frente. No mesmo esquema de sempre, te deixo na
esquina. Pode ser?
Assenti novamente, engolindo em seco.
Paulo pagou a conta e nós saímos do restaurante. Ele
continuou falando sobre o que havia acontecido na empresa durante
a semana. Ele estava animado porque sua irmã estava lhe
confiando novos trabalhos e ele também queria arriscar novos
investimentos.
Mas eu sabia que a empresa deles não estava indo bem das
pernas. No entanto, eu sorria e assentia para tudo o que ele dizia.
A verdade era que eu estava a ponto de chorar. Queria mandá-
lo calar a boca e gritar tudo o que estava preso em minha garganta.
Por que Paulo era assim? Ele nunca ouvia os outros. Ele sempre
era o centro de tudo.
— Bom, chegamos. — Ele estacionou o carro e, pela primeira
vez, notei onde estávamos.
Era na esquina do prédio onde Julia e Andrew moravam.
— Paulo, eu preciso falar uma coisa — falei, mesmo vendo em
seus olhos o quanto ele queria que eu saísse logo de seu carro.
— Eu estou atrasado, Sofia. — Ele olhou no relógio,
impaciente.
— Mas que droga, Paulo! — gritei, exasperada. — Você
sempre está ocupado quando quero falar com você. Que inferno!
Será que não pode tirar um minuto para me ouvir?
Paulo arregalou os olhos, mas ficou em silêncio.
Respirei fundo, controlando a vontade de chorar.
— Eu estou grávida — soltei de uma só vez, antes que
perdesse a coragem.
Foram apenas segundos para o semblante de Paulo mudar
drasticamente.
O homem de sorriso fácil e feições alegres se transformou em
um homem sério e irritado.
— O que você disse?
— Eu disse que estou grávida! — repeti, impaciente. — E não
adianta querer afirmar que não é seu, porque você é o único homem
com quem estou saindo nos últimos meses.
Paulo ficou em silêncio por vários segundos, talvez, digerindo
o que eu havia dito. Seu rosto era de puro choque.
— Você não vai ter esse filho — ele falou, com uma voz
assustadora. — Está me ouvindo, Sofia?
Arregalei os olhos.
— O quê?
— É isso que você ouviu — ele disse, segurando meu rosto
para encará-lo. — Eu devia imaginar que uma garota como você ia
armar uma dessa pra mim. — Ele riu e me soltou, me deixando
ainda mais humilhada e nervosa. — Não perdeu a chance, não é?
Eu não vou cair no seu golpe, Sofia.
Dessa vez as lágrimas começaram a rolar.
— Paulo! Não é assim!
Ele apontou o dedo no meu rosto.
— Essa criança, se é verdade que você está grávida, não é
minha. Não adianta pensar que vai aplicar o golpe do baú em mim,
porque isso não vai dar certo, Sofia.
Balancei a cabeça negativamente várias vezes.
— Saia do meu carro. — Ele se esticou por cima de mim e
abriu a porta. — Se abrir a boca e disser para alguém sobre essa
conversa, você vai se arrepender.
Abri a boca para retrucar, mas meu coração estava tão aos
frangalhos que eu não conseguia fazer outra coisa a não ser chorar.
— Paulo, eu...
— SAIA! — ele gritou. — Eu nunca conheci você, muito menos
fiz essa criança que está carregando. Nunca mais me procure com
seus joguinhos.
Peguei a minha bolsa e saí do carro.
Paulo fechou a porta e saiu cantando pneus.
As lágrimas vieram com força e eu me sentei na calçada, sem
forças até para andar.
O que eu faria?
Eu estava sozinha.
Coloquei as mãos na minha barriga.
Eu devia ter imaginado que um homem como Paulo, que
gostava de cercar empregadas e que lidava com a vida como se
fosse um grande parque de diversões, jamais assumiria as próprias
responsabilidades.
Ah, eu como eu era burra! Grávida de um idiota egocêntrico.
Sequei meu rosto com raiva e me levantei do chão. No final
das contas, sozinha eu não estava. Tinha uma criança no meu
ventre e eu precisava ter forças para cuidar dela.

Não voltei para o apartamento de Julia, pois ela já tinha me


liberado pelo restante do dia. Sem falar que eles já deveriam ter ido
para o sítio. Então, voltei para casa e me tranquei em meu quarto
até o anoitecer.
Aproveitei para arrumar a minha mala com algumas peças de
roupas para o final de semana. Depois, desci as escadas para
deixá-la perto da porta, assim, eu não perderia tempo no outro dia.
— Já arrumou sua mala para o fim de semana? — vovó
perguntou, assim que cruzei o espaço entre a escada e a porta.
— Já, sim. — Deixei a mala e voltei para a sala. Aproximei-me
e me sentei na outra poltrona, em frente à da minha avó. — Só não
sei ainda como vou.
Vovó fixou os olhos na TV novamente.
— Tentou falar com o Carlos? Ele faz preços bons para
viagens assim.
Carlos era um conhecido da família e trabalhava com Uber. O
sítio da família de Andrew ficava a duas horas da capital e ir até lá
era um pouco complicado.
— Ele já pegou outra viagem para amanhã. — Cocei minha
cabeça, sem saber o que fazer.
— Não tem ninguém que você possa pedir uma carona?
Algum conhecido que vá para lá amanhã? — vovó perguntou e
nesse instante se acendeu uma luz em minha cabeça.
Olhei no relógio em cima do rack da TV e se eu não estava
enganada, Julia havia dito que Rafael chegaria antes das 20h em
São Paulo. E ele havia prometido à Julia que iria ao aniversário.
Pronto! Era isso!
— Já sei! — Pulei do assento e fui até a cozinha, onde meu
celular estava carregando.
Peguei o aparelho e procurei pelo número de Rafael.
Então liguei.
Nova York – Estados Unidos.
Várias horas antes.

Rafael

— Caramba, Julia. Eu já disse que vou chegar a tempo para a


festa da Aninha. — Enfiei o último casaco que estava em minha
cama dentro da mala, enquanto tentava equilibrar o celular em meu
ouvido e ouvia os surtos da minha querida irmã.
— Você sabe que ela te adora, Rafael. Se você não estiver
aqui, igual no ano passado, eu vou te matar. Eu estou falando sério.
Respirei fundo pela vigésima vez.
— Eu já pedi perdão por não ter ido ano passado. E a
recompensei depois, levando-a até o Beto Carrero.
Julia bufou.
— Tudo bem, Rafa. É só que... você sempre está viajando e
raramente consegue parar para visitar a sua família. Nós, que
amamos tanto você.
A tristeza estampada na voz de Julia me fez parar
imediatamente o que eu fazia. Aproximei-me da janela do quarto de
hotel onde eu estava hospedado em uma avenida famosa de Nova
York e suspirei.
— Você sabe que eu te amo. Que eu amo todos vocês.
— Eu sei — ela retrucou. — Mas às vezes sinto falta das
nossas conversas loucas e de tudo o que vivíamos antes.
— Mas você não é feliz agora? — perguntei, encostando a
testa no vidro da janela. — Se Andrew estiver aprontando, eu juro
que...
— Não! — ela quase gritou. — Não é isso, pelo amor de Deus!
Andrew é o melhor marido que eu podia ter pedido a Deus. Eu sou
feliz demais. Tenho Aninha e torço para o próximo vir logo... temos
tudo o que o dinheiro pode comprar, mas é que eu sinto a sua falta,
Rafa. — Julia suspirou. — Eu sei, fico feliz em ver tudo o que você
conquistou nesses últimos anos, ver quem você se tornou, mas ao
mesmo tempo fico triste, porque você parece cada vez mais frio,
mais distante.
Ficamos em silêncio por alguns instantes na linha.
— Julia, eu estarei aí para o aniversário da Aninha. Eu juro. Já
estou de saída para o aeroporto.
— Tudo bem, então. Vamos te aguardar no sítio. Te amo. Boa
viagem.
— Obrigado. Também te amo.
Encerrei a ligação e desencostei minha cabeça do vidro
gelado. Olhei para os prédios imponentes da cidade e repassei em
minha mente tudo o que Julia havia falado.
Ela tinha razão. Tanta coisa havia mudado nos últimos seis
anos. E a principal delas: eu.
Depois que Julia decidiu se casar com Andrew, eu pedi
demissão do emprego em que estava, porque jurei que jamais
voltaria a atravessar a cidade de moto, depois de ter sofrido um
acidente que poderia ter sido bem pior.
Então resolvi montar minha própria empresa.
Apresentei uma proposta para Andrew, que achou o negócio
interessante e abraçou a minha ideia. Fundamos então a RKS
Tecnologies e nos especializamos em TI e Informática.
O negócio decolou em pouquíssimo tempo, surpreendendo a
todos nós.
Abrimos um escritório na Avenida Paulista e, contrato atrás de
contrato, crescemos. Hoje, a RKS era uma das maiores empresas
do ramo no Brasil, conquistando a primeira filial em Nova York.
E era por isso que de dois anos para cá, eu mais vivia em
Nova York do que no Brasil.
Estava sempre em reuniões, gerenciando e cuidando com
muito esmero de tudo aquilo que havia sido colocado em minhas
mãos nos últimos anos. Se era por Deus? Eu não sabia..., mas eu
gostava de acreditar que Ele também gostava de mim.
No entanto, o trabalho consumiu boa parte do meu tempo.
Principalmente o tempo que eu reservava para Julia e meus pais,
que agora viviam em uma fazenda espetacular que havíamos
comprado para eles, no interior do estado.
Tudo ia bem, era claro. Nunca imaginei que eu poderia chegar
aonde cheguei. Mas, às vezes eu me pegava no silêncio da noite,
olhando para as estrelas e me perguntando o que mais faltava em
minha vida.
Dinheiro? Agora eu tinha para comprar o que eu quisesse...
E então me vinha à cabeça uma fatídica cena, como uma
lembrança amarga daquela mulher que eu amei um dia.

— Uau… — ele disse, ainda rindo. — Fer, me conta como é


experiência de trepar com um funcionário. Você sabe que eu nunca
fiz isso com nossas meninas, porque não gosto de me misturar com
essa laia…
— Cale a boca, Marcelo… — Fernanda retrucou, abaixando o
rosto.
— Não. É sério. Deve ser divertido. — Ele riu novamente e me
encarou. — Iludir um sujeito que pensa que vai ser alguém, mas
que, na verdade, é apenas uma distração… Já contou a ele onde
você passou a noite passada, Fer?

Desgraçada.
Fernanda havia estragado meu coração. Nunca consegui me
apaixonar por outra mulher, porque ela sempre vinha em meus
pensamentos. Agora, eu sempre achava que elas se aproximavam
de mim pelo dinheiro que eu tinha.
Então eu tinha apenas encontros casuais. Mulheres que
passavam em minha cama e nada mais. Jurei nunca mais entregar
meu coração a ninguém e era assim que eu levava a vida.
Durante os anos, tive o desprazer de encontrar Fernanda em
algumas festas, afinal, ela era amiga de Andrew. Ao ver que ela
nunca mais me teria de volta, chegou a fazer propostas para sermos
amantes.
Só que eu nunca caí em sua lábia. Se eu quisesse, poderia tê-
la usado, porque ela era bem deliciosa na cama.
Mas não.
Eu não era esse tipo de homem.
Fernanda e Marcelo haviam se casado e, pelo que eu sabia, a
empresa de ambos não estava bem das pernas. Só que isso não
me importava.
O telefone do meu quarto tocou, atraindo-me de volta dos
meus pensamentos.
— Sim? — respondi, em inglês.
— Seu carro já chegou, senhor — o rapaz da recepção
respondeu, também na mesma língua.
— Ok. Obrigado.
Desliguei o telefone, olhei para minha única mala e depois
olhei ao redor do quarto.
Viver em hotéis era o que eu mais fazia nos últimos anos.
Talvez eu devesse comprar um apartamento em Nova York.
Facilitaria muito a minha vida.

O voo até São Paulo foi bem tranquilo.


Cheguei ao aeroporto de Guarulhos por volta das 20h de uma
sexta-feira. O aniversário da minha sobrinha seria no domingo,
então eu ainda tinha a possibilidade de ir para o meu apartamento e
descansar antes de pegar a estrada novamente.
Quando cheguei em casa, havia um bilhete em cima do
aparador.

“Olá, senhor Rafael.


Deixei comida pronta na geladeira. Sabe que não gosto que se
alimente de porcarias.
Suas roupas estão todas limpas e passadas no closet.
O presente que o senhor pediu que eu comprasse para Aninha
está no quarto de hóspedes. Mas espero que o senhor tenha trazido
algo útil dos Estados Unidos. Seria bem decepcionante para ela se
não, afinal, o senhor sabia que ela queria aquela boneca que não foi
lançada no Brasil ainda...
Depois me ligue dizendo qual dia devo voltar para o trabalho.

Márcia.”

Dona Márcia era a minha funcionária e cozinheira, mas a


verdade era que eu a considerava como uma mãe. Ela cuidava de
tudo para mim e eu a recompensava com um salário bem acima da
média no Brasil.
No entanto, como eu mais viajava do que ficava em casa, eu
estipulava os dias em que ela deveria ir. Era mais fácil, pois assim
quando eu chegasse em casa, já tinha tudo certo e no lugar.
Inclusive, uma boa comida brasileira preparada na geladeira.
Deixei a mala em um canto, tirei a gravata e o terno, jogando-
os em cima do sofá, arregacei as mangas da camisa e fui direto
para a cozinha.
Dona Márcia havia deixado uma marmita pronta, somente para
esquentar no micro-ondas e foi o que eu fiz, sem pensar duas
vezes. Estava morto de fome.
Enquanto esquentava, chequei meu celular e me surpreendi
com duas chamadas perdidas. Eram de Sofia, a babá da minha
sobrinha, mas que também era minha amiga de longa data.
Nossa amizade começou havia mais de seis anos, quando ela
ajudou Julia e Andrew em uma confusão envolvendo um bebê.
Sempre que dava, saíamos juntos e aproveitávamos um pouco.
Bem, podia confessar que já fomos amigos bem íntimos, mas Sofia
disse que era melhor que ficássemos apenas na amizade.
Na época, eu tinha deixado claro para ela algumas coisas,
envolvendo a minha história com Fernanda. Deve ter soado patético
para ela, mas Sofia me entendeu e disse que sempre me apoiaria.
Inclusive, se eu quisesse permanecer solteiro a vida inteira.
Eu lembro que nós rimos, mas aquela foi a última noite em que
fizemos sexo.
Disquei o número de Sofia e ela atendeu no segundo toque.
— Olha quem se lembrou dos amigos… — ela acusou. — Oi,
Rafa, tudo bem? Já chegou ao Brasil?
Encostei-me na pia.
— Olá, Sofia. Tudo ótimo. Na verdade, cheguei agora há
pouco. Estou esquentando um prato de comida.
Eu quase podia vê-la sorrindo.
— Ah, e como foi lá? Muitos negócios fechados?
— De certa forma, sim. Está tudo dentro dos conformes. — O
micro-ondas apitou e eu fui até ele, retirando a minha marmita. —
Como você está?
— Estou bem. Um pouco cansada, porque a minha avó me
deixa louca.
Dei risada.
A avó de Sofia era uma senhorinha muito engraçada.
Daquelas que não mediam suas palavras, mas que também sabia
ser amorosa e nos fazia sentir como se fôssemos da família.
— Bem, eu acredito em você. Onde você está? Já foi para o
sítio?
— Na verdade, não. Falei pra Julia que eu precisava resolver
umas coisas hoje e ela me liberou. Rafa, eu liguei para você, porque
imaginei que você só iria pra lá amanhã e...
— Você achou que poderia conseguir uma carona — completei
e ela soltou uma risada gostosa.
— Tem como?
— Ah, deixa eu pensar… — brinquei, fazendo suspense. —
Claro que sim, Sofia. Amanhã eu passo aí pra te pegar.
— Nossa, valeu, Rafa. Você me salvou de gastar uma fortuna
com Uber.
— Bem, fico feliz em ser seu salvador.
Ela riu novamente e então disse que precisava desligar.
— Até amanhã, então.
— Até, querido. Beijos.
Ela desligou e eu coloquei o telefone de lado, me
concentrando no prato à minha frente.
O fim de semana seria divertido.
E eu poderia provar para Julia que, apesar de trabalhar como
um jumento, eu ainda os amava mais do que tudo.
Sofia

Passei a manhã toda olhando para o teste de gravidez que eu


havia colocado no meio das minhas roupas. Isso sem falar no
exame de sangue que eu já tinha guardado também.
Bem, eu não era nenhuma criança, já tinha vinte e cinco anos
e podia lidar com a situação.
Mas eu estava com medo.
De tudo.
E o medo nem era da reação da minha avó, porque eu tinha
certeza de que ela me ajudaria em tudo o que eu precisasse. Meu
medo se resumia em que tipo de futuro eu poderia dar àquela
criança.
Fechei os olhos e coloquei uma mão sobre a barriga.
Eu seria uma boa mãe e lutaria pelo meu filho ou filha em
todas as circunstâncias, era óbvio. Faria como Victoria Portes, a
mãe da bebê que Julia e Andrew cuidaram, anos atrás.
Só que, por sorte, Victoria depois de fazer uma loucura
conseguiu chamar a atenção do pai da criança e no final eles
resolveram sua situação. Já com Paulo, eu sabia que não seria
assim. Ele tivera a coragem de me dizer para não ter a criança.
Eu não sabia o que fazer, mas eu sabia que teria, sim, aquela
criança e eu cuidaria dela com todo o meu coração.
Quando o relógio se aproximou do horário que Rafael tinha
combinado comigo, me levantei e guardei o teste no mesmo lugar
de antes. Depois que eu voltasse do sítio, contaria a verdade para
minha avó.
— Bom, eu já vou indo, vovó. — Desci as escadas e a
encontrei sentada na sala.
Ela olhou para fora.
— Mas ele não chegou ainda.
Olhei no relógio de pulso.
— Mas ele vai chegar em alguns minutos. Rafael é sempre
muito pontual.
— Ele é um ótimo rapaz, Sofia. Você deveria investir nele.
Conquistá-lo, sabe?!
Revirei os olhos. Essa era a milésima vez que ela tocava
nesse assunto.
— Rafael não está atrás de uma namorada, vovó.
— Uma namorada pode ser que não, mas uma mulher... todo
homem está sempre atrás de uma mulher. O compromisso pode vir
depois.
Arregalei os olhos e comecei a rir. Pelo menos, disso eu podia
rir. Minha avó era muito louca.
Antes que eu pudesse arrumar qualquer argumento que
explicasse Rafael, um carro estacionou em frente de casa e
ouvimos a buzina.
— Não falei que ele era pontual? — Puxei a alça da minha
mala. — Até segunda, vovó.
Ela se levantou.
— Vou acompanhá-la até a porta. Faz meses que não vejo
esse rapaz.
Minha avó seguiu atrás de mim.
Quando saí no quintal, Rafael já tinha descido do carro e
estava do lado do porta-malas aberto.
Ah, céus. Ele estava tão lindo.
Rafael sempre foi um homem bonito, isso era um fato. No
entanto, agora ele parecia diferente. Mais encorpado. Devia ter
malhado bastante nos últimos meses.
— Que foi, Sofia? — Minha avó me deu um empurrão e só
então percebi que eu estava parada olhando para os músculos dele.
— Minha nossa, olha como esse sujeito está gostosão.
— Vó!
Ela deu uma risadinha e se apressou na minha frente, abrindo
o portão.
— Dona Florência! — Rafael se aproximou, cumprimentando-a
com um abraço caloroso. — Há quanto tempo, hein?!
— Você nos abandonou, menino ingrato! — ela ralhou com ele.
— Mas veja só, como você está lindo!
Rafael ficou um pouco vermelho e retirou os óculos escuros.
— A senhora que está o charme de sempre!
Ela riu e apertou as bochechas dele.
— Não fale bobagens, garoto.
Rafael também riu e depois me encarou.
— Não vai abraçar um velho amigo?
Aproximei-me dele e o abracei com força. Rafael estava
cheirando a banho recém-tomado e perfume da melhor qualidade.
— Que bom que você voltou.
E era verdade.
Ele era o meu amigo mais próximo e os últimos meses, os
quais eu havia me envolvido com Paulo, haviam sido péssimos sem
alguém para desabafar.
Rafael retribuiu o meu abraço com a mesma convicção.
— É bom estar de volta.
Não sei quanto tempo passou em que ficamos abraçados, mas
sei que o encanto foi interrompido quando minha avó tossiu.
— Ah, que droga — ela resmungou, quando nos separamos.
— Ficar velho dá nisso. Todo dia é uma coisa diferente.
Nós rimos, então Rafael jogou a minha mala dentro do carro.
— Até segunda, vovó. — Dei um beijo no rosto dela. — Cuide-
se, hein?!
— Vá se divertir, garota. — Ela deu outro beijo em meu rosto.
— E você, menino, apareça mais vezes.
Rafael assentiu.
— Prometo que venho jantar na semana que vem, claro, se a
senhora me convidar.
— Nem precisa de convite, meu filho. A casa é sua.
Rafael deu outro abraço nela e então abriu a porta do carona
para mim.
Nós nos despedimos mais uma vez da minha avó e então
deixamos a rua para trás.
— Seis anos, e sua avó não muda — ele comentou, com um
meio sorriso.
— Muda, sim... está cada vez mais teimosa e bocuda.
Ele riu.
Rafael tinha colocado os óculos escuros de aviador
novamente.
— Então, como foi sua viagem aos Estados Unidos? —
perguntei, tentando me distrair para não ficar de olho em seu corpo
recém-malhado.
— Cansativa — ele respondeu, desanimado. — Mas tudo está
dando certo, graças a Deus.
— Fico feliz em saber. — Coloquei minha mão sobre a dele no
câmbio e ele sorriu. — Você se tornou um novo homem. Como pôde
mudar tanto em alguns meses?
Ele me encarou de relance.
— Eu? Mudar? Eu apenas tenho dinheiro agora, Sof.
— Não é isso, Rafa — me remexi no banco —, já faz um bom
tempo que você enriqueceu. Digo que você está com um porte
diferente. Falando de uma forma diferente também. Se bem que,
falar bem, acho que você aprendeu com Andrew.
Ele deu um meio sorriso.
— E, meu Deus, Rafa. Eu me casaria com você. Minha avó
está certa quando disse que está tão gostoso! — brinquei e dessa
vez nós rimos bem alto. — Você não estava assim esses tempos
atrás. Bem, também faz um bom tempo que não nos vemos, não é?
— Confesso que andei malhando bastante. Tem me ajudado a
tirar o estresse do trabalho.
— Hummm.
Rafael concentrou sua atenção no trânsito e eu me acomodei
no banco de couro de uma forma bem relaxada.
Olhar para Rafael, tão bonito e desejável, era difícil. Podia ser
péssimo da minha parte pensar assim, mas por que o destino não
conspirou para Rafael ser o pai da criança que eu estava
esperando?
Ele certamente não me abandonaria nessa situação.
— E o coração? Não me diga que não encontrou nenhuma
mulher que te agrade por aí?
Aff, por que perguntei isso?
Se ele tivesse encontrado, eu ficaria chateada, porque lá no
fundo eu ainda gostava dele. Mas se não tivesse encontrado, que
diferença faria também?
Nunca seríamos um casal.
Rafael se remexeu no assento, desconfortável com a pergunta.
— Saí com algumas... — respondeu lentamente.
— Mulheres ricas, aposto.
Minha língua ferina que nunca se controlava.
— Depende do ponto de vista — ele disse.
— Como assim?
Rafael me olhou de esguelha.
— Riqueza é algo muito relativo, Sofia. Saí com mulheres
endinheiradas. Ricas de dinheiro, porém, a maioria era bem pobres
de espírito.
Levei alguns segundos processando suas palavras e então
respirei, aliviada.
— Uau. Você ainda é o mesmo Rafael.
Ele abriu seu sorriso lindo.
— Eu nunca mudei a minha essência. Tenha certeza disso.
Rafael me via apenas como uma amiga, eu já sabia disso.
Mas, às vezes eu me perguntava por que nunca tentei ir além da
amizade com ele. Quando paramos de transar, foi porque eu pedi.
Não porque ele queria.
Talvez tenha sido melhor assim. Era ruim saber que ele nunca
olharia para mim com outros olhos, não precisava também me iludir
achando que isso poderia acontecer algum dia.
Já bastava eu ter me iludido com Paulo.
Eu não amava Paulo, mas achei que com o tempo poderíamos
nos entender e, quem sabe, poderíamos assumir algo publicamente.
Ledo engano, tudo o que ele queria era apenas me usar como as
outras garotas que viviam correndo atrás dele.
Antes de pegarmos a rodovia, Rafael parou em um posto de
gasolina para encher o tanque. Aproveitei para entrar na loja de
conveniência e comprar algumas guloseimas para comermos até
chegar ao sítio.
Estava grávida de dois meses, segundo o médico, e apesar de
conseguir disfarçar a minha barriga usando roupas mais largas, eu
já estava comendo mais que o normal. Sentia fome o tempo todo.
Quando voltei, Rafael já estava dentro do carro procurando
uma música no aparelho de som.
— Acho que você não tomou café da manhã, não é? — ele
brincou, ao ver tudo o que eu tinha pegado.
— Mais ou menos. — Sorri, tentando não demonstrar que eu
estava comendo por dois. — Na verdade, não posso comer essas
coisas perto da Aninha, porque a Julia quer que ela tenha uma
alimentação saudável. Então, aproveito quando estou longe. O que
é bem raro, porque você sabe como sua irmã é exigente.
— Julia exigente? — Ele riu, descrente. — Essa é novidade.
— Bem, deve ser o convívio com Andrew que é, sim, bastante
exigente.
Abri meu saco de salgadinho e ofereci a ele, mas ele recusou.
Então ligou o carro e seguimos viagem.

Duas horas depois chegamos ao nosso destino.


O sítio da família de Andrew ficava no alto de uma colina, em
um lugar bem escondido. Rafael quase errou a entrada, mas, por
sorte, eu o alertei antes.
Percebi que não éramos os primeiros a chegar, assim que
estacionamos.
— Espero que a Julia não brigue comigo por chegar agora…
— resmunguei, enquanto soltava o cinto. — Vou jogar a culpa em
você, se ela reclamar do atraso.
— E eu vou dizer que você exigiu que eu parasse em um posto
de gasolina para comprar toda a loja de conveniência.
Encarei Rafael com um meio sorriso.
— Você não faria isso.
— Você sabe que eu faria.
— Ra-fa-el... — falei seu nome pausadamente. — Você não
era assim.
Nós nos encaramos por alguns segundos e depois nos
desmanchamos em risadas.
Eu havia me esquecido de como era fácil rir com ele.
— ORA! ATÉ QUE ENFIM! — Andrew atrapalhou nosso
momento com um grito bem em frente ao carro. — Tem ideia de que
a Julia ia matá-lo, se você não viesse? — Ele se dirigiu ao lado de
Rafael no carro.
— Lá vem o meio-americano — brinquei.
Rafael sorriu.
— Abre o porta-malas? — pedi.
— Deixa que eu te ajudo.
Desci do carro, cumprimentei Andrew e Rafael trocou algumas
palavras com ele enquanto me ajudava.
Porém, enquanto ele descia a mala, olhei para a entrada da
casa e gelei ao ver Paulo e Fernanda entrando na casa
despreocupadamente. Eles deveriam estar vindo do outro lado do
sítio, pois carregavam algumas frutas nas mãos.
Era só essa que me faltava.
Mas eu devia ter imaginado que eles estariam aqui. Fernanda
era amiga de Andrew e ela sempre estava nos eventos, nas festas.
Agora, por que diabos ela resolveu trazer o irmão?
Ah, céus.
Olhei para Rafa segurando a minha mala, então tentei pegar
dele, porém, ele a puxou de volta e disse:
— Pode deixar que eu a levo.
Rafael sempre foi um cavalheiro. Em todas as situações. E
isso era péssimo, porque só me fazia querer cada vez mais que ele
fosse o homem dos meus sonhos.
Só que na falta do homem dos sonhos, eu tinha que ter me
envolvido com o homem dos meus pesadelos?
Ah, que vida cruel.
Nós nos encaminhamos até a entrada da casa e Andrew nos
seguia falando, falando e falando. Olhei para Rafael e ele já parecia
estar zonzo.
Então, antes de subirmos os degraus, Julia apareceu na porta
e deu um grito de surpresa. Ela agarrou Rafael, beijou-o e o abraçou
com força.
— Você veio! — ela disse, emocionada.
— Eu disse que viria — ele falou devagar, certamente achando
o surto da irmã totalmente desnecessário.
— Eu achei que estava mentindo!
Rafael a afastou, visivelmente irritado.
— Pelo amor de Deus, Julia. Achei que me conhecesse.
Somos irmãos.
Ela abaixou o rosto, envergonhada. Depois olhou para Andrew,
para mim e de volta para Rafael.
Senti o impulso de entrar e deixá-los à vontade e correr para o
meu quarto, porém, Rafael estava segurando a minha mala e eu
precisava dela.
— Agora que já está aqui, acho que posso te contar uma coisa
— Julia disse, um pouco tímida.
— Contar o quê?
— Eu vou pegar uma cerveja, já volto. — Andrew saiu
apressadamente, como se não quisesse presenciar uma possível
cena de crime.
— Bem, eu vou ver como a Aninha está… — Dei um passo
adiante, porém, Rafael me barrou, colocando um braço na minha
frente.
— Espera um pouco, Sofia. Que pressa é essa?
Fiquei em silêncio e pressionei as minhas pernas. Um dos
sintomas que eu estava tendo era a vontade incontrolável de fazer
xixi.
Podia usar essa desculpa.
Rafael encarou Julia novamente.
— Então?
Ela olhou para cima e depois para ele.
— Fernanda, a sua ex, está aqui.
Bem, para mim não era surpresa, porque eu já a tinha visto.
No entanto, Rafael pareceu levar um choque bem grande.
Pela sua expressão, ele realmente a odiava.
Rafael levou vários segundos para dizer algo e quando isso
aconteceu, foi um palavrão que ninguém gostaria de ter ouvido.
— Me perdoa, Rafa — Julia se apressou a dizer, juntando as
mãos. — Eu sei que você não quer vê-la nem pintada a ouro, mas
ela é amiga de Andrew e gosta muito da Aninha e a Aninha dela,
então…
— Mas que droga, Julia — Rafael quase berrou. — Por que
trouxe essa mulher? Eles nem têm nada a ver com nossa família!
Então nesse momento uma ideia simplesmente louca passou
pela minha cabeça, enquanto Rafael e Julia discutiam.
Eu também estava com um grande problema ali.
— Rafa! — Toquei seu braço e tanto ele quanto Julia me
olharam imediatamente.
— Meu Deus, Sofia, eu já disse que vou levar sua mala até o
seu quarto, não se preocupe — ele disse, porém, eu balancei a
cabeça negativamente.
— Não é isso, eu... ahn... poderíamos trocar uma palavrinha
rápido?
Ele demorou alguns instantes, porque ainda estava nervoso
com Julia, mas assentiu e nos afastamos alguns metros da entrada
da casa.
Rafael era bem alto e quando ele parou na minha frente, cobriu
quase toda a minha visão de Julia desesperada.
— Eu, ahn... que sacanagem da Julia chamar a Fernanda,
né?!
Ele bufou.
— Nem me fale. Não sei que diabos essa mulher tem sempre
que estar envolvida com a minha família.
— Pois é. — Cruzei os braços, fingindo indignação. — Ela
ainda fica atrás de você?
Ele olhou para trás e disse distraidamente:
— Sempre que tem a oportunidade. Já nos encontramos em
alguns eventos empresariais e, mesmo casada, ela não perde
tempo. Acha que eu vou cair na conversinha dela novamente.
— É uma ordinária — falei.
Rafael concordou e me encarou.
— Se eu soubesse, não teria vindo.
— Ah, mas isso seria injusto com a Ana.
Ele meneou a cabeça.
— Isso é. Bem, fazer o quê? Não me resta outra coisa a não
ser fugir dela o fim de semana todo.
Cruzei as pernas novamente.
— Então, Rafa... eu acho que tenho uma solução para o seu
problema. Claro que isso também vai solucionar o meu, para ser
sincera.
Rafael me encarou com seus olhos castanhos por um bom
tempo, talvez tentando entender aonde eu queria chegar.
Ele esperou. Eu bufei.
— Tá. Tem uma pessoa que está aí e eu estava tendo um rolo
com ela... e as coisas não acabaram bem.
— Sério? — Rafa ergueu as sobrancelhas. — Quem é?
— Ah, você não vai querer saber.
— Ah, quero sim. — Ele sorriu de forma travessa.
Cruzei os braços. Minha vontade era de sair correndo e chorar.
— É o Paulo.
Rafael ficou pasmo.
— O irmão da Fernanda?
Assenti lentamente.
Rafael soltou outro palavrão.
— Não acredito, Sof. Por que se envolveu com ele? Aquele
cara não vale um centavo! Pelo amor de Cristo, se eu pudesse, eu o
pegava e quebrava a cara dele de uma só vez e...
Ah, como eu sabia disso! Sabia da pior maneira possível.
— Eu sei, Rafa — o cortei. — Eu realmente não sei onde
estava com a cabeça — choraminguei. — Mas agora já era.
Ele me olhou com pena.
Isso porque ele nem sabia que eu estava grávida daquele
imbecil.
— Enfim — dei de ombros —, o que eu quero dizer é o
seguinte: lá dentro tem duas pessoas que estamos querendo evitar.
Nós podemos nos ajudar e assim vamos nos ver livres deles, pelo
menos, no fim de semana.
Rafael soltou a minha mala e cruzou os braços.
— E como seria isso?
Mordi o lábio.
Ele iria rir de mim, certamente.
— Vamos fingir que estamos juntos.
— Mas nós estamos juntos — Rafael disse e eu quis quebrar a
mala em sua cabeça.
Tão lindo e tão lerdo.
— Não é isso! — quase gritei. — Pensa comigo. Vamos fingir
que estamos namorando! Assim eles vão ficar bem longe de nós.
Rafael acompanhou meu raciocínio e então seus olhos se
iluminaram.
— Ah, meu Deus. — Ele riu. — Você é genial, Sofia. Como não
pensei nisso antes?
Se eu fosse genial, eu não teria engravidado de um imbecil,
mas aquilo eu podia deixar de fora.
— Obrigada.
— Mas vamos lá, eu sei que você vai querer algo em troca. —
Rafael semicerrou os olhos. — Pode escolher e eu te dou.
Arqueei uma sobrancelha.
— Acha que estou fazendo isso por dinheiro?
— Claro que não. — Ele pareceu ofendido. — Só acho que
você merece algo por me livrar dessa enrascada, que Julia, maldita
seja, me enfiou.
Cruzei os braços e direcionei meu olhar até o estacionamento.
— Gostei do seu carro.
Rafael ergueu as sobrancelhas, um pouco surpreso.
— Gostou da EcoSport?
Balancei a cabeça afirmativamente.
— Posso te dar um novo — ele disse, com seu ego do
tamanho do Maracanã.
— Não precisa ser novo — retruquei, séria. Se ele me desse
um carro 0km eu me sentiria ainda mais uma mercenária. — Pode
ser esse. Só preciso de um carro para ter que parar de usar
transporte público todo santo dia.
Quem diria que um dia eu estaria negociando um carro em
troca de um namoro de mentira.
— Tudo bem, então — ele concordou. — Agora é a minha vez
de exigir alguma coisa. Já que você pode, eu também posso.
Rafael deu um passo adiante, diminuindo a distância entre
nós.
— Eu não sou bom em fingir as coisas, Sofia — ele falou
pausadamente, sem deixar de me encarar. — E eu acho que um
namoro precisa ser convincente.
Assenti lentamente, mas ainda não estava entendendo aonde
ele queria chegar.
Ele sorriu maliciosamente.
— Eles precisam acreditar em nós e, para isso, vamos ter que
fazer algumas coisas que namorados fazem.
Engoli em seco.
— Tá falando sobre o quê? Beijos, carícias? Isso posso fazer,
é claro. Posso ser a namorada mais doce do mundo, se você quiser.
Só não podemos ir para a cama.
— Por que não? — ele ronronou perto do meu ouvido. — Você
gostava de ir para a cama comigo.
— RAFAEL! — Dei um tapa em seu braço e ele riu.
— Desculpa, mas eu não resisto.
Nós nos encaramos por alguns instantes e depois rimos.
— Estou brincando. Acho que não vamos precisar chegar a
esse ponto.
Respirei fundo. Estava suando.
— Então, acordo fechado? — Estendi a mão. — Vou ser a
namorada perfeita pra você e em troca você vai ser meu namorado
perfeito. Claro, depois quero seu carro também.
Ele estendeu a mão e apertou a minha.
— Acordo fechado, Sof.
Ah, meu Deus.
Eu estava selando um acordo com o diabo e sabia disso.
Rafael era muito safado e não perderia tempo se tivesse a chance
de ir para a cama comigo.
Mas eu não podia.
Isso era apenas para nos livrar dos nossos infortúnios. Não
queria dar o gosto a Paulo de que eu estava para baixo depois de
ele ter me enxotado. Queria que ele visse que eu era
suficientemente capaz de arrumar outra pessoa. Mesmo estando
grávida.
Ah, meu Deus. A quem eu queria enganar?
Dificilmente eu conseguiria arrumar outra pessoa estando
grávida. O próprio Rafael sairia correndo, assim que soubesse a
verdade.
Eu era muito otária.
Sofia

Depois de combinarmos a história do nosso “namoro”, Rafael e


eu entramos na casa. Julia estava na sala com as visitas e assim
que eles nos viram, tivemos que ir cumprimentá-los.
Ainda eram poucas pessoas, mas entre eles estava George e
Victoria; Fernanda e seu marido, Marcelo, que continuava o mesmo
paspalhão de sempre; e Paulo, que me não desgrudou o olhar de
mim um só momento.
Notei também que Fernanda fazia o mesmo com Rafael. Então
quando terminamos de cumprimentar a todos, me coloquei ao lado
de Rafael, que não perdeu tempo e passou um braço pela minha
cintura.
— Nossa, mas o que é isso? — Julia arregalou os olhos.
Rafael deu uma risadinha marota.
— O que poderia ser? — ele perguntou calmamente. — Sofia
e eu estamos namorando. Não te contei isso?
— Ah, meu Deus! — Victoria deu um gritinho e veio me
abraçar. — Parabéns, amiga! Vocês são lindos juntos, sabia?
Sempre achei isso.
Quase chorei ao ouvir isso.
Nesse momento Andrew e George também vieram nos
abraçar, porém, Paulo e Fernanda trocaram olhares como se
estivessem se perguntando “que diabos é isso?”
— Ah, mas um namoro assim precisa de um beijo daqueles! —
Andrew disse, com seu sotaque americano.
Eu quis assassiná-lo. Era tudo o que Rafael queria, uma
oportunidade para bancar o safado.
Olhei para ele e não tive dúvidas dos meus pensamentos.
Rafael sorria igual um idiota.
— Tem razão, Andy. Um namoro não é um namoro sem uns
beijinhos, não é, Sof?
Assenti lentamente, com um sorrisinho que não enganava
ninguém.
Eles ficaram atentos nos encarando, esperando o tal beijo.
Virei para Rafael e ele segurou meu rosto entre as mãos.
Ele abaixou a cabeça lentamente e quando nossos lábios
estavam quase encostando...
— TIO RAFA!!!!
O encanto foi quebrado por Aninha, que entrou na sala
correndo e se jogando contra Rafael.
Afastei-me e respirei fundo.
Ufa, salva pelo gongo.
— Ahhh, que pena — Andrew resmungou. — Mas fica para
depois.
Rafael se dedicou à Aninha que não parava de falar o quanto
havia sentido saudade e eu arrisquei um olhar a Paulo.
Ele estava atrás de Fernanda, com os braços cruzados, me
olhando como se sua visão fosse de raio-laser e pudesse me
ultrapassar.
Demônio dos infernos.
Rafael cumpriu o que havia prometido e levou a mala até o
meu quarto, depois que Aninha e Helena, as duas crianças que ele
mais amava, o liberaram.
— Está entregue, moça... — Ele colocou a mala no quarto e
então colocou a cabeça para dentro. — Nossa, seu quarto é melhor
que o meu.
Ele não esperou que eu o convidasse e entrou para bisbilhotar.
— Tem até uma sacada. — Ele se aproximou da porta e a
abriu. — Vista legal. Bem em frente à piscina.
Dei de ombros.
— A Julia acha melhor que eu fique com este quarto, por
precaução. As meninas podem tentar fazer estripulias.
— Entendo.
Rafael fechou a porta e se virou para mim.
— Ahn... gostaria de dar uma volta comigo mais tarde?
— Ah, claro — dei um meio sorriso —, mas eu agora estou um
pouco cansada e enjoada pela viagem.
Rafa sorriu.
— Tudo bem, vou deixar você descansar. — Ele deu um passo
e depositou um beijo na minha testa. — Quer que eu peça para
trazerem algo para você comer?
— Não é necessário. Obrigada.
Ele assentiu e então sorrimos um para o outro.
— Você acha que eles acreditaram? — ele perguntou.
Suspirei.
— Espero que sim.
— É, também espero. — Rafael se aproximou da porta. —
Daqui umas duas horas te espero lá na sala, para gente ver o pôr do
sol perto do lago, pode ser?
— Hummm, programa bem romântico para casais.
Ele riu.
— Eu sei ser romântico. — Ele ergueu uma sobrancelha. — Eu
acho, pelo menos. Faz muito tempo que não preciso lidar com essas
coisas.
Seu semblante caiu de repente, talvez pensando naquela
desgraçada que partiu seu coração.
Fiquei com vontade de puxá-lo para dentro novamente e fazê-
lo se esquecer dessas coisas, mas eu não podia. Já estava trilhando
um caminho bem perigoso com aquele namoro de mentira.
— Mas você pode ser romântico comigo, então — eu disse,
tentando aliviar a situação. — Pelo menos, neste fim de semana.
Rafael me encarou e depois sorriu.
— Eu serei, Sofia.
Então ele fechou a porta e eu me joguei na cama.
Ah, meu Deus, que confusão eu estava me metendo?

Cochilei por uma hora e depois fiquei quase uma hora debaixo
do chuveiro, pensando na droga que a minha vida era.
Coloquei uma roupa leve, um short jeans larguinho e uma
camiseta branca. Deixei os cabelos soltos para secarem
naturalmente. Então saí do quarto e desci as escadas. Ao chegar ao
último degrau ouvi as vozes furiosas de Aninha e Helena.
— Você não quer me deixar brincar com o Rabbit! — Aninha
gritou e cruzou os braços. — Eu vou contar tudo para o meu pai!
— Você não sabe brincar com ele! — Helena devolveu. — Tio
Rafa! Diz pra ela que não pode apertar o coelho, senão ele morde!
Rafael estava sentado no sofá, de costas para a escada. As
duas estavam na sua frente, talvez tentando fazer com que ele
chegasse a uma posição entre elas.
— Aninha, você apertou o coelho? — Rafa perguntou,
tentando manter a seriedade na voz.
Ela abriu a boca e começou a chorar.
— Não, não chora! — Ele a puxou para os braços e a colocou
em seu colo. — A Helena vai deixar você brincar com ele.
Ela continuou chorando.
— Tia Sof! — Helena levantou o rosto e me viu. Aproximei-me
deles.
— Nossa, mas que briga é essa? — Rafael me olhou como se
pedisse socorro. — Aninha?
— A He-Helena nã-não me-me deixa... — Ela tentou falar.
— Eu ouvi vocês falando, quer dizer, brigando. — Suspirei e
me sentei ao lado de Rafael, puxando-a para o meu colo. — Você
sabe que não pode apertar o Rabbit. Ele é muito sensível e pode te
machucar.
Aninha adorava animais e no sítio tinham muitos coelhos,
gatos e cachorros. Andrew dizia que na capital ficava complicado
cuidar deles, mas no sítio a festa era liberada. Então Aninha
escolheu alguns coelhos e um deles era o seu favorito. Rabbit. No
entanto, ele era o mais arisco também.
— Eu só estava tentando proteger ela, tia — Helena se
explicou.
— Eu sei, querida.
Balancei Aninha por um bom tempo, até que ela se acalmou.
— Quer que a tia vá com você brincar com o Rabbit? —
perguntei.
— Não precisa, Sof. — A voz de Cristina, babá de Helena,
surgiu vindo da cozinha. — Julia pediu que eu olhasse as duas.
Mas pela sua cara não tinha sido só um “pedido”. Só não
queria imaginar quanto Julia havia pagado à babá para cuidar de
duas.
Aninha pulou do meu colo, pegando na mão de Helena.
— Vão lá brincar. E parem de brigar, hein?! — adverti.
Elas saíram correndo com a outra babá.
Rafael riu e depois de alguns instantes em silêncio, disse:
— Como você consegue ser assim?
— Assim como?
— Sei lá, tão paciente com crianças... elas te adoram.
Dei de ombros.
— Acho que eu sempre fui assim. Eu gosto delas.
— Você será uma ótima mãe — Rafael disse. Meu coração
deu uma pontada.
— E você também será um bom pai.
Ele riu e depois negou com a cabeça.
— Essa é a última coisa que quero na vida.
Fiquei em silêncio.
O que eu poderia dizer?
Rafael estava no auge de sua vida, conquistando mundos e
fundos. Claro que uma família não estava nos seus planos.
— Ahn, você não queria dar uma volta lá fora? — perguntei,
mudando de assunto. — Acho que logo vai escurecer.
Rafael assentiu e ficou em pé, me puxando pela mão.
— Vamos rápido então, porque a vista é linda. — Ele
entrelaçou nossos dedos e saímos pela porta da frente. — Você já
foi até o lago, né?
— Já, sim.
Continuamos caminhando, até que demos de cara com outro
casal, que parecia estar vindo do lago.
— Eita, nóis — resmunguei.
— Ora, ora. — Fernanda e Marcelo pararam na nossa frente,
quase um metro de distância. — Então é verdade que vocês são o
casal do ano.
Marcelo e sua voz de garoto mimado. Segurei para não revirar
os olhos.
— É... — Rafael soltou minha mão e me abraçou. — Acredito
que somos, mesmo.
Fernanda me encarou de cima a baixo.
— Você não é a babá da filha do Andrew? Como isso
aconteceu?
Ouvi o desdém em sua voz, porém, não me deixei abalar.
— Quando duas pessoas se gostam... elas ficam juntas. Claro,
quando se gostam de verdade — falei, dando uma risadinha. — É
assim que acontece.
Ela fechou o semblante.
— Bem, não dei meus parabéns lá dentro. — Marcelo
estendeu a mão e nós a apertamos, mesmo que fosse a última
coisa que queríamos fazer naquele momento. — Desejo felicidades.
— Obrigado, Marcelo — Rafael assentiu.
— É, desejo o mesmo — Fernanda disse, mas seu rosto
demonstrava outra coisa.
— Vocês estão indo ao lago? — Marcelo perguntou, passando
um braço pelos ombros da esposa.
Nós assentimos.
— Ah, sim. A vista lá é ótima.
— É, sim — Rafael concordou. — Bom, nós vamos logo,
porque senão iremos perder o pôr do sol.
— Hummm, programa romântico. — Marcelo deu uma piscada
e depois riu. — Vão lá, estamos tomando o tempo de vocês.
Nós nos despedimos e eles se foram na direção da casa.
Rafael pegou minha mão novamente e continuamos descendo
uma pequena colina que levava ao lago.
— Ela está me odiando — cantarolei.
— Mais do que ele me odeia? — Rafael bufou. — Impossível.
Olhei para Rafa de esguelha.
— Será que ele ainda te odeia?
— E não? — Ele ergueu uma sobrancelha. — Nos últimos
anos, eu ultrapassei a empresa deles e peguei vários clientes
poderosos. É claro que ele me odeia. E se ele souber que Fernanda
ainda tenta algo comigo, depois de tantos anos, vai me odiar ainda
mais.
— Será que há um jeito nos livrarmos dessa cruz? — perguntei
baixinho.
— Talvez. — Rafael me fitou. — Quem sabe um dia.
Abri um pequeno sorriso e continuei concentrada em nossa
caminhada.
Se Fernanda estava daquele jeito, eu não queria nem imaginar
como Paulo estava. Seria preciso fugir dele o tempo todo.
Rafael tinha razão quando disse que a vista do pôr do sol na
beira do lago era linda. Era impressionante, na verdade.
Sentamo-nos em um banco de madeira posicionado ali para
quem gostava de apreciar uma imagem como aquela.
— E então, Sof — Rafael se acomodou ao meu lado —, como
estão as coisas? Nós conversávamos pelo telefone, mas sempre
foram conversas rápidas nesses últimos meses.
Suspirei lentamente. Ah, se ele soubesse.
— Está tudo bem — menti. — Minha avó teve um problema de
infecção urinária, esses tempos atrás, mas já está melhor.
Conseguimos um médico bonitão e ela disse que só iria tomar os
remédios por causa dele. — Parei. — Dá para acreditar?
— Dá, sim. — Rafael deu uma risada gostosa. — Mas se
precisar de qualquer coisa, sabe que pode contar comigo. — Ele
colocou a mão sobre a minha.
Desci o olhar até onde sua mão estava e meu coração se
apertou.
Ah, Rafa... bem que podia ser você o pai do meu bebê.
— Obrigada.
Ele sorriu e a levantou, depositando um beijo entre os meus
dedos.
— Imagina. Você é a única pessoa que me aguentou por todos
esses anos e, aliás, a única que guarda os meus segredos mais
sombrios.
Ele deu uma piscadela e eu sorri.
Realmente eu era a única pessoa que sabia a fundo sobre o
desastre do relacionamento dele com Fernanda Casablanca.
— Nunca contou à Julia a verdade?
— Não. — Ele colocou minha mão na sua coxa e olhou para o
lago. — Não quero que ela pense que seu irmão é um patético.
— Você não é patético — retruquei. — Você é um bom
homem, que cometeu o erro de entregar seu coração a alguém que
não valia nada.
Ah, céus. Às vezes eu falava demais.
Rafael me olhou de volta e levantou a mão, colocando uma
mecha do meu cabelo atrás da orelha.
— Você é muito gentil, Sofia — ele disse baixinho. — Aliás, eu
não sei se disse isso, mas... — Ele sorriu. — Você está ainda mais
bonita do que a última vez que a vi.
Seu elogio me pegou desprevenida.
— O... obrigada.
— É sério. — Ele me olhou com mais intensidade. — Não sei o
que aconteceu nesses últimos meses, mas você está diferente
também.
Seria o instinto da maternidade?
Como eu poderia explicar a ele esse detalhe?
Bem, não havia explicações, então resolvi mudar de assunto.
— Você vai voltar para os Estados Unidos?
Ele retirou a mão do meu rosto e voltou a olhar para o lago.
— Acredito que daqui a dois meses. Por enquanto, meu
trabalho está aqui.
Abri um meio sorriso.
Pelo menos, por dois meses eu teria um amigo ao meu lado.
Rafael

Depois de apreciarmos o pôr do sol na beira do lago, Sofia e


eu voltamos para a casa.
Ela foi ajudar Julia com os preparativos da festa e ficar de olho
nas meninas. Eu disse a ela que me recolheria em meu quarto, mas
que depois nos veríamos no jantar.
Enquanto subia as escadas, não conseguia parar de pensar
naquele falso namoro, mas também na forma como Sofia era tão
doce e amiga. Não dava para acreditar que ela tinha caído na lábia
de um otário mimado como Paulo Casablanca.
Sofia era muito mais do que ele podia ter e eu sabia disso,
porque já havia ficado com ela no passado. Claro que, na época, eu
era um idiota que ainda estava apaixonado por Fernanda.
Mas, pensando bem, se eu tivesse tentado algo com Sofia...
Bem, duvido que ela fosse me querer. Ela mesma agradeceu a
minha sinceridade e disse que era melhor que continuássemos
apenas amigos.
E assim foi.
Até essa manhã, achei que Sofia e eu só podíamos nutrir uma
amizade, mesmo. Porém como eu podia explicar a vontade de beijá-
la, que me assolou de repente?
Homens são assim.
Claro que sim, mas... o problema é que eu não sabia se
conseguiria manter minhas mãos longe dela. E aí entrava o segundo
problema: se nos relacionássemos novamente, nossa amizade iria
para o saco?
Provavelmente, sim.
Quantas idas e vindas uma amizade conseguiria suportar?
Inferno.
Bem, eu deveria estar ficando louco ou era apenas cansaço,
afinal, havia atravessado o continente e mal dormi, já tive que pegar
a estrada novamente.
Abri a porta do quarto, que era o último do corredor. Estava
tudo escuro. Entrei, acendi a luz e fechei a porta. No momento em
que me virei de frente para a cama, soltei um palavrão.
— Desculpa te assustar.
Fernanda.
Quem mais teria a audácia de entrar no meu quarto e ficar
sentada no escuro com um sorrisinho diabólico nos lábios?
— Não sabia que Julia tinha trocado os quartos — disparei.
Abri a porta novamente para sair, mas ela deu um salto da
cama e veio na minha direção, empurrando a porta.
— Por favor. Ela não trocou. Eu só vim te perguntar uma coisa.
Olhei bem dentro de seus olhos esverdeados.
Ela continuava linda, sem dúvidas, mas a sua beleza não me
enganava mais.
— O que você quer, Fernanda? — perguntei, rispidamente. —
Acho que o seu marido não vai gostar de saber que você está aqui,
no meu quarto.
Ela bufou e se afastou alguns passos.
— É verdade que você está namorando com a... — Ela olhou
para baixo e depois me encarou. — Babá da sua sobrinha?
Cruzei os braços e a encarei fixamente por alguns segundos.
Babá.
Ela disse aquela palavra com um tom tão esnobe, que eu não
poderia deixar isso quieto.
— Não entendi por que usou esse tom desdenhoso. — Cruzei
os braços. — Sofia é, sim, minha namorada.
Fernanda ergueu o queixo, ultrajada.
— Ela não serve para você. Sabia que ela estava de rolo com
meu irmão, até umas semanas atrás? É muito estranho que vocês
estejam juntos agora.
— Bem, não sei como isso pode afetar o meu relacionamento
com ela, já que ela não está mais com seu irmão, porém, estou
certo de que você não detém o poder de ditar quem serve para mim
ou não. — Dei uma risada incrédula e esfreguei os olhos. — Você
fez bem em se casar com Marcelo. São iguais.
— Quer dizer o que com isso? — ela retrucou. — Estou
dizendo que Sofia é apenas uma garota que nunca conseguiu um
trabalho melhor na vida e agora quer tentar fisgar um cara rico. Não
acha que...
— Não acha que o quê, Fernanda? — Dei um passo em sua
direção. Já perdendo a paciência. — Meça as suas palavras quando
falar algo sobre Sofia! Nem todo mundo quer ser como você. Nem
todo mundo quer ter um emprego em uma empresa. Nem todo
mundo quer ter status social para esfregar na cara das outras
pessoas. Sofia é maravilhosa e tem, sim, uma vida humilde, mas
uma vida digna. Ela é sincera, doce e verdadeira. Coisa que você
está bem longe de ser. Não vou admitir que fale essas coisas
esnobes sobre Sofia.
Fernanda ficou em silêncio por alguns instantes.
— Eu já disse que eu errei, Rafa...
— Pare de me chamar assim — quase gritei. — “Rafa” é um
apelido para pessoas íntimas, o que não a inclui. O que existia entre
nós acabou, Fernanda. Você fez a sua escolha ao se casar com
Marcelo, agora aguente-a até o final.
— Eu não podia abrir mão do que eu tinha...
Fechei os olhos e respirei fundo.
— Que seja, Fernanda. Já não me importa mais.
Ela deu um passo em minha direção e deslizou uma mão em
meu peito.
— Pode passar o tempo que for, sei que você nunca vai me
esquecer.
— Você não sabe o que diz — retruquei, segurando seu braço
com força e a guiei até a porta. — Agora, se já falou o que queria,
por favor, se retire do meu quarto. Não quero que minha namorada
pense que eu ainda perco meu tempo com você.
Escancarei a porta.
Fernanda abriu a boca, mas depois fechou-a novamente e me
deu um último olhar antes de sair.
Quando ela se foi, fechei a porta e soltei um palavrão.
Fernanda era a mesma pessoa de sempre. Orgulhosa, metida,
arrogante. Mas se ela achava que seus ataques histéricos teriam
alguma influência sobre mim, ela estava muito enganada.
Ouvi algumas batidas na porta enquanto eu tentava escolher
uma camisa para usar no jantar.
Pela força da batida, deduzi que podia ser Julia, então abri a
porta rapidamente, mas me surpreendi ao ver Sofia, com um sorriso
lindo e um vestidinho florido que ia até os joelhos. Seus cabelos
loiros estavam soltos, ondulados e descendo pelos ombros.
Senti vontade de puxá-la para um beijo sedento e assim poder
enfiar meus dedos em seus cabelos macios, para depois levá-la até
a minha cama e...
— Rafa? — Sofia estalou os dedos em frente ao meu rosto.
Ah, que legal. Eu estava fantasiando coisas safadas com ela
me olhando. Provavelmente, eu estava com cara de idiota.
— Desculpa, Sof. Eu estava pensando em algumas coisas.
Virei-me em direção ao closet, para que ela não visse a ereção
surgindo entre as minhas pernas.
— Hummm... percebi — ela murmurou. — Posso entrar?
— Ah, sim. Claro.
Na verdade, não era uma boa ideia. Eu estava ali, duro por
fantasiar uma transa bem louca com ela. Mas se eu dissesse isso
em voz alta, Sofia sairia correndo.
Resignei-me ao silêncio.
Pelo menos, por ora.
— Está indeciso? — ela perguntou.
Indeciso? Eu estava era louco de vontade de pegá-la e reviver
o que tínhamos, anos atrás.
Virei-me para Sofia e a vi olhando para as três camisas que eu
tinha deixado em cima da cama.
Ah, ela estava se referindo às camisas.
Rafael, você é um idiota.
— Um pouco.
— Bem, acho que a azul-escuro fica legal pra você.
Olhei para a camisa e depois cocei a cabeça.
— É, pode ser.
Sofia pegou a camisa e me entregou.
Enquanto eu me vestia, observei-a através do espelho. Sofia
olhava para o quarto de forma curiosa.
— Seu quarto realmente é menor que o meu.
Fechei o último botão e me virei para ela.
— Pode ser que me deram o último quarto do corredor por ser
aquele que nunca aparece nas festas.
Ela riu e se aproximou, ficando apenas alguns centímetros de
distância.
— Deixa eu te ajudar aqui. — Ela levou as mãos até a gola da
camisa e a ajeitou.
Não consegui tirar os olhos dela.
Seus lábios carnudos...
Seu rosto lindo e doce.
Mas então eu abri a minha maldita boca e disse a última coisa
que eu deveria ter falado em um momento como aquele:
— Ela esteve aqui no meu quarto.
Sofia parou de mexer na minha camisa e deu dois passos para
trás.
— Fernanda?
Assenti.
— Que vagabunda! — ela praguejou, indignada. — Desculpa,
eu... — Sofia suspirou. — O que ela queria?
— Dizer que você não é apropriada para mim.
Sofia arregalou os olhos.
— O quê? — ela quase gritou. — EU VOU DAR UMA
LIÇÃOZINHA NESSA... — Sofia se virou para sair do quarto, mas
eu a segurei pela cintura a tempo.
— Hey, calma! O que pensa que está fazendo?
Sofia se soltou do meu aperto e bufou.
— Ela se acha a rainha do pedaço, só porque tem dinheiro. Ou
tinha, né, porque pelo que sei, eles estão passando por maus
momentos na empresa. Eu vou mostrar que posso ser bem melhor
que ela!
Dei um passo na direção de Sofia e segurei seu rosto entre as
minhas mãos.
— Você é melhor que ela.
Ela me encarou.
— Você só está dizendo isso para me agradar.
— Não estou, não. — Suspirei, então soltei seu rosto e segurei
sua mão. — Vamos jantar. Você é minha namorada e eu quero
enchê-la de atenção neste fim de semana. Pelos menos,
hipoteticamente1 falando.
Sofia deu uma risada gostosa e eu a puxei em direção à porta.
Pelo menos, eu havia dito a verdade.
Para mim, Sofia era mil vezes melhor que Fernanda.

— Ué. Onde estão as crianças? — Sofia perguntou, assim que


entramos na sala de jantar.
Para a nossa sorte — ou não — os convidados que já tinham
chegado, estavam sentados em seus respectivos lugares,
esperando-nos.
— Elas vão jantar no quarto de cima — Julia respondeu, com
um sorrisinho.
Sofia me olhou, sem entender.
Eu não queria entrar em uma discussão com Julia sobre os
motivos daquela decisão, então apenas puxei uma cadeira vazia e
fiz sinal para que Sofia se sentasse.
Ela se sentou.
Eu me sentei ao seu lado. E foi quando ergui o olhar e dei de
cara com Fernanda, Marcelo e Paulo nos encarando.
O trio do inferno.
Eu me esmurraria ali mesmo, se fosse possível. Mas é claro,
não havia outros lugares vazios. Agora eu começava a entender o
sorrisinho cínico da minha irmã.
— Acho que elas vão se comportar melhor lá. E queremos
conversar sobre coisas de adultos. Crianças não gostam de ouvir
essas coisas — Julia disse, calmamente.
— Mas quem está com elas? — Sofia perguntou, claramente
preocupada.
— Cristina.
Sofia olhou para Julia, depois seu olhar foi direto para o rosto
de Fernanda, que não disfarçava o interesse em mantê-la sob sua
mira. Ela evitava olhar para Paulo.
— Você é a babá da Aninha, não é? — Paulo perguntou, com
desdém.
Mas eu sabia exatamente o que ele queria dizer.
— E é minha namorada também — o cortei. — Julia não
comentou nada sobre as crianças jantarem em cômodos diferentes.
Se esse for o caso, Sofia e eu podemos muito bem jantar com as
crianças.
— Não! — Julia arregalou os olhos. — Isso não é necessário.
Pelo amor de Deus. — Ela riu, desconcertada. — E eu fiz isso pela
Sofia, mesmo. Quero que ela se sinta parte da família. Não como a
babá de Aninha, mas como minha cunhada.
Fernanda fechou o semblante. Assim como seu irmãozinho.
Sofia sorriu para Julia em agradecimento e eu depositei um
beijo em seu rosto.
Não foi intencional, mas aconteceu.
O jantar prosseguiu tranquilamente.
Sofia não teve dificuldades em desempenhar seu papel,
porque ela já estava acostumada com a minha família. Sem falar
que a cada toque de carinho que ela me dava, eu via seu sorriso
maquiavélico, como se fôssemos dois grandes cúmplices de um
crime.
Podíamos mudar nossos nomes para Bonnie e Clyde2.
No entanto, uma coisa estava me deixando incomodado. Será
que ela estava apaixonada por Paulo e só estava fazendo isso para
deixá-lo enciumado, ou ela realmente queria fugir das investidas
dele?
Depois eu a confrontaria sobre isso.
Fernanda e Marcelo tentavam entrar no assunto, sempre
falando de negócios.
Dinheiro, dinheiro, dinheiro…
Claro que eu também me interessava pelo assunto. Mas, pelo
amor de Deus, estávamos em um jantar de família. Uma família que
fazia um bom tempo que eu não encontrava.
Custava eles falarem sobre outra coisa?
Graças a Deus, depois da sobremesa, Victoria, George e
Paulo quiseram sair para tomar um ar fresco perto do lago.
— Quer ir também, Sof? — perguntei a ela, segurando a sua
mão que descansava sobre a mesa.
Ela me olhou e abriu um sorriso tímido.
— Acho que eu prefiro ir para o quarto…
— Woooow! — Andrew deu uma gargalhada no outro lado da
mesa. — Julia, que saudade de quando éramos apenas namorados,
hein?!
— Andrew! — Julia arremessou nele o guardanapo e nós
rimos.
Sofia ficou vermelha. Eu passei um braço pelos ombros dela.
— Não foi isso que eu quis dizer, gente — ela murmurou, sem
jeito.
— A gente sabe, querida — Julia a tranquilizou. — Andrew é
idiota às vezes.
— Um idiota que você ama, não é? — Ele fez um beicinho e
ela riu, depositando um beijo nele.
Marcelo deu uma tossida.
— Bem, eu sei que vocês estão cansados e eu também estou,
na verdade — ele disse, olhando alternadamente de mim para
Andrew. — Mas já que estamos aqui, eu gostaria de entrar em um
assunto delicado. Vim justamente um dia antes, porque Andrew
havia me garantido que você estaria aqui, Rafael.
Fernanda apertou o braço dele suavemente e ele murmurou
algo como: “me deixa”.
Troquei um olhar assassino com meu cunhado.
— Sobre o que seria, Marcelo? — Andrew perguntou.
Com a ponta do dedo, comecei a acariciar o braço de Sofia
lentamente. Ela estremeceu sob o meu toque e eu tive que me
segurar para não sorrir.
Podia soar canalha, mas era reconfortante saber que ela ainda
se lembrava como era ser tocada por mim.
— Bem, acho que não é novidade para vocês que estamos
enfrentando alguns problemas financeiros e...
— Marcelo! — Fernanda o interrompeu. — Acho que esse é
um assunto que devemos tratar com eles em outro lugar. — Ela
virou o rosto e encarou Sofia. — Um lugar apropriado e a sós.
Sofia se retesou no mesmo instante.
— Não me leve a mal, querida — Fernanda continuou. — Você
é apenas uma babá e não entende de negócios. Nem você, Julia.
Me desculpe, mas você era apenas a secretária de Andrew.
— O que não me impedia de conhecer cada instância daquela
empresa — Julia retrucou, indignada. — Fernanda, aqui estamos
entre família. Não há segredos entre nós. O que vocês querem de
Andrew, podem falar na nossa frente. Eu sou a esposa de Andrew, e
Sofia é a namorada do meu irmão e, acredito, pelo andar da
carruagem, que logo também será a esposa dele.
Ai, ai.
Estava tão divertido ver as feições de Fernanda.
Ultraje, horror, indignação...
Sofia olhou para Julia e elas trocaram aqueles olhares
cúmplices, de amigas.
Eu nunca quis tanto dar um beijo na testa da minha irmã.
— Continue, Marcelo — falei, mais como uma ordem do que
um pedido.
Marcelo olhou para Fernanda e bufou.
— Como eu dizia… vocês devem saber que estamos
passando por problemas financeiros.
Puxei Sofia para mais perto do meu corpo, enquanto o
paspalhão falava.
— Não é vergonha dizer isso, afinal, vocês sabem que os
negócios andam ruins para todo mundo…
Para ele.
Que era um imbecil.
— Então, aproveitando que estamos aqui, eu gostaria de pedir
ajuda a vocês — Marcelo disse, finalmente. — Já não sei mais a
quem recorrer. O pai da Fernanda morreu ano passado e nos deixou
mais dívidas, além das que já tínhamos. Paulo não sabe disso, mas
estamos à beira da falência.
Fernanda abaixou o olhar para o próprio prato. Eu quase podia
ver fumaça saindo de sua cabeça.
Andrew resolveu abraçar sua esposa também.
— Bem… e como quer a nossa ajuda?
Marcelo olhou para ele e depois para mim.
— Vocês são homens de sucesso. — Ah, agora ele reconhecia
isso, né? — Não tenho intenção de vender a companhia, mas acho
que podemos fazer uma sociedade que vai ajudar a todos nós.
Ficamos em silêncio por um tempo.
Eu cocei minha sobrancelha. Andrew coçou a cabeça.
— E por que iríamos querer nos atrelar a vocês? — perguntei,
por fim.
Marcelo me encarou.
— Você já foi nosso funcionário. Sabe que a empresa é ótima
e…
— Se fosse ótima, você não estaria aqui fazendo essa
proposta — retruquei. — Onde estão os outros sócios?
— Eles caíram fora. Isso nos arruinou mais ainda — Fernanda
murmurou, ainda encarando o próprio prato.
Claro. Quem em sã consciência aguentaria aqueles dois?
Aliás, aqueles três.
— Bem, essa é uma conversa que leva tempo e… — Andrew
suspirou. — Temos que pensar com calma. Não dá para resolver
uma questão dessa em um jantar de família.
— Eu sei disso — Marcelo disse. — Me perdoem se o
momento é inoportuno. Eu só queria deixar o assunto levantado
para vocês pensarem com calma. Podemos marcar uma reunião na
terça ou quarta-feira. Claro, se Rafael não voltar aos Estados
Unidos.
— Por enquanto, não — afirmei. — Mas acho que a conversa
já se estendeu demais. Sofia está cansada e eu também.
Fernanda ergueu o olhar depois de todo esse tempo e nos
encarou.
— Vamos, Sof? — Segurei sua mão e ela assentiu.
Nós nos despedimos de todos e subimos as escadas.
Acompanhei Sofia até seu quarto, que era do outro lado do corredor.
— Vai entrar? — ela perguntou, enquanto girava a chave e
destrancava a porta.
— Se não for incomodá-la.
Ela não respondeu, mas eu tive a impressão de que ela se
arrepiou, devido à nossa proximidade.
Então ela abriu a porta e deu espaço para que eu entrasse.
Depois, trancou a porta e se jogou na poltrona, perto da cama.
— Você vai aceitar? — ela perguntou.
— O quê?
— Uma sociedade com aqueles patetas?
Dei risada.
Sentei-me na cama, de frente para ela.
— Andrew tem razão em dizer que esse é um assunto que não
dá para resolver assim, de repente — expliquei. — É claro que a
companhia deles já foi muito vantajosa e já valeu milhões. E é claro
que podemos recuperar isso, Andrew e eu. Porém…
Sofia bufou e esticou as pernas no sofá.
Meu olhar acompanhou suas pernas torneadas enquanto o
vestido subia um pouco, deixando suas coxas à mostra.
— Você sabe que isso significa passar mais tempo com ela no
seu pé, não sabe?
Assenti, mas meus pensamentos haviam sido diluídos ao ver
suas lindas pernas de fora.
— Ela está tentando enlaçar você, Rafa.
— Está? — perguntei, ainda hipnotizado com a imagem à
minha frente.
— Sim, está. Sujeitinha ordinária… — Ela bufou. Então se
sentou direito e me encarou com raiva. — Viu o que ela disse? Me
acha inferior por ser uma babá.
— Calma, Sof. — Estendi a mão e ela segurou. Puxei-a de
encontro a mim, colocando-a de pé entre as minhas pernas. —
Relaxa. Quer que eu te ajude a relaxar?
Sofia apoiou as mãos nos meus ombros e me encarou com um
sorrisinho.
— Que tipo de relaxamento seria esse?
— Do tipo que você quiser. — Abri o meu melhor sorriso
safado.
— Ai, Rafa… — Ela suspirou e olhou para cima. — Eu adoraria
ir para a cama com você. Mas acho que é melhor mantermos isso
somente na mentira.
Uma pontada de decepção me atingiu, mas não demonstrei.
— É claro. Eu estava brincando.
Ela passou as mãos pelos meus cabelos.
— Mas se quiser dormir aqui comigo, para ela pensar que
tivemos uma noite de muito sexo suado e grudento, eu deixo.
Sorri novamente.
— Posso mesmo, é?
Ela assentiu.
— Então tá bom.
Nós sorrimos um para o outro.
Não seria a noite que eu esperava, ainda mais depois de tanta
provocação entre nós, mas eu não dormiria sozinho, como fazia há
tanto tempo.
Dormiria ali, com Sofia.
E quem sabe eu até dormiria em paz.
Preparamos a cama, apagamos a luz e nos deitamos. Puxei
Sofia de encontro ao meu corpo e a abracei. Foi, sem dúvidas, a
pior posição que ela podia ficar, com a bunda colada no meu pau,
mas era o que tínhamos para a noite.
— Sof — chamei-a, depois de um tempo em silêncio.
— Hum?
— Posso perguntar uma coisa?
— Pode.
— Vai me responder com sinceridade?
— Depende.
Eu ri. Ela estava com a voz sonolenta.
— Você está apaixonada pelo Paulo?
Ela se virou de frente e me encarou.
— Por que está perguntando isso?
Encarei seu rosto, iluminado apenas pela luz que vinha da
porta de vidro.
— Porque eu... — Como eu explicaria a vontade repentina de
fazer aquele namoro de mentira se tornar verdadeiro? — Por nada.
É besteira minha.
Ela fechou os olhos e se acomodou em meu peito.
— E você? Ainda é apaixonado pela dementadora3?
— Dementadora?
Ela deu uma risadinha.
— Vamos lá, você já leu Harry Potter, e sabe o que são
“dementadores”.
— Eu sei. — Acariciei seus cabelos. — São seres que sugam
toda a felicidade de uma pessoa.
— Aham.
Nunca tinha pensado em Fernanda daquela maneira, mas
agora com Sophia colocando daquele jeito, até que dava certo.
— Não. Não sou mais apaixonado por ela.
Ela suspirou e me encarou.
— Que bom pra você.
E era verdade.
Fernanda fazia parte do meu passado e por muito tempo me
mantive fechado por causa dela. Mas e se eu estivesse perdendo
tempo? E se eu pudesse encontrar uma pessoa boa, legal,
companheira para estar comigo em todos os momentos?
Não que eu fosse entregar meu coração, porque isso era algo
que eu nunca mais faria.
Mas... uma namorada, de verdade. Um relacionamento sério, o
qual eu pudesse sossegar e ter uma mulher só minha.
Então enxerguei Sofia.
Ela abaixou a cabeça e se aninhou em meu peito.
Sofia era minha amiga e nos entendíamos bem. Ela era
solteira e eu também.
A pergunta era: Por que não?
Sofia

Fui a primeira a acordar.


Ainda era cedo e Rafael estava dormindo profundamente.
Levantei-me bem devagar para não o acordar, fui até o banheiro e
fiz minha higiene pessoal.
Coloquei uma calça legging preta e uma camiseta larguinha
bem simples. Era domingo, o dia da festa de Aninha e eu sabia que
Julia precisaria de toda a ajuda possível.
Olhei para Rafael uma última vez antes de deixar o quarto.
Nossa conversa antes de dormir havia sido bem estranha, mas
eu não podia me preocupar com isso naquele momento. Apesar da
loucura da minha vida, eu tinha que me preocupar com meu
trabalho e com o que eu podia resolver naquele momento.
Fechei a porta lentamente, tentando não fazer nenhum
barulho. Então me virei e meu coração quase parou.
— Ora, ora. — Paulo deu um passo adiante, prensando-me
contra a parede. — Até que enfim consegui encontrá-la sozinha.
Seu olhar era de quem não estava nem um pouco feliz.
— O que você quer? — disparei, tentando falar baixo. — Não
acha que já disse tudo o que queria?
Paulo deu uma risadinha e olhou furtivamente para a porta.
— Ah... seu namoradinho está aí dentro? — Ele voltou a olhar
para mim. — Hum, ele sabe que você está grávida de outro
homem?
— Não é da sua conta! — Tentei me afastar, mas Paulo
segurou meu braço com força.
— Acho que é sim. Ainda mais quando você afirmou com tanta
veemência que essa criança é minha.
— Ah, então agora está interessado no seu filho? — Ergui as
duas sobrancelhas. — Mas que pena... porque agora sou eu que
não estou interessada que você tenha qualquer ligação com a
minha criança.
Paulo suspirou de modo desdenhoso.
— Eu acho que eu devia alertar o Rafael sobre a namoradinha
dele. — Ele cutucou meu queixo. — Uma mocinha que só quer um
homem rico para bancar seus luxos.
Fechei os olhos, controlando a vontade de chorar.
— O que você quer, Paulo?
— Quero saber quando você vai resolver essa situação.
— Que situação? — O encarei, aturdida. — Não vou tirar a
criança, se é isso o que você quer.
Ele aproximou a cabeça da minha e seu olhar era feroz.
— Se você abrir a boca e contar para o Rafael que eu
supostamente sou o pai dessa criança, eu vou contar para ele a
vadia que você é, que tentou dar um golpe do baú em mim e viu que
não conseguiu, agora está tentando com ele.
— Você é desprezível.
Ele sorriu maliciosamente.
— Mas bem que você gostava de ir para a cama do
desprezível, não é?
Fechei os olhos, implorando a Deus que algo acontecesse
para que ele me deixasse em paz.
Já não bastava o que ele havia me dito? Já não bastava deixar
bem claro que jamais assumiria aquela criança?
— Eu não vou incomodá-lo com essa criança — falei, tentando
manter a dignidade. — Prometo que você nunca será cobrado por
nada em relação a ela.
— Sua palavra não me basta, Sofia. Eu quero garantias — ele
disse, lentamente. — Não quero que daqui a alguns anos você me
venha com a história de que precisa de pensão ou algo do tipo.
Abri a boca para retrucar, porém, nesse momento a porta se
abriu e Paulo se afastou bruscamente.
Rafael.
Obrigada, Deus.
Ele olhou para Paulo e depois para mim.
— O que está acontecendo aqui?
Paulo fez um movimento distraído de cabeça.
— Estava apenas cumprimentando a Sofia. Vejo que ela está
feliz agora, com você.
Rafael sustentou seu olhar.
— Sim..., mas não quero ver você perto da Sofia. — Ele
cruzou os braços. — Não tem mais o que fazer por aí?
Paulo perdeu até o rumo.
— Ah, não. É claro... nós só nos esbarramos. Eu estava indo
tomar café.
Rafael assentiu.
— É, só que a cozinha fica pra lá — Rafael apontou para o
outro lado.
Paulo me olhou pela última vez e, sem dizer mais nada, se foi.
Quando ele sumiu de nossas vistas, Rafael me puxou de volta
para o quarto e eu não aguentei. Joguei-me em seus braços e deixei
que as lágrimas rolassem.
Rafael me abraçou com força.
— O que ele fez?
Balancei a cabeça negativamente.
— Ele te machucou?
Podia não ter me batido, mas suas palavras eram como
verdadeiras flechas ultrapassando meu corpo.
— Sofia, fale comigo.
Chorei.
Chorei até não aguentar mais.
Rafael me puxou de volta para a cama e nós nos deitamos. Eu
me deitei em seu peito, mas fiquei em silêncio, enquanto suas mãos
acariciavam minhas costas.
Eu sabia que se lhe contasse toda a verdade, Rafael não me
julgaria. Mas eu não precisava colocar esse fardo sobre suas
costas. Pelo menos, por agora.
Era bem capaz de Rafael obrigar Paulo a se casar comigo.
— Durma mais um pouco — ele disse baixinho. — Ainda é
muito cedo.
Fechei os olhos e adormeci.
Levantei-me um pouco depois das nove horas e, nesse
momento, Rafael já tinha saído do quarto. No entanto, ele tinha
deixado um bilhete avisando que estaria no andar de baixo se eu
precisasse de algo.
Suspirei lentamente e deixei o papel de volta na mesa de
cabeceira.
Rafael estava sendo tão atencioso que parecia realmente ter
entrado no papel de namorado. O que não era ruim, se, claro, ele
quisesse uma namorada de verdade.
No entanto, isso era algo que já estava fora de cogitação. Era
só um namoro de mentira, até o final do dia, em que os convidados
iriam embora e nós poderíamos voltar para as nossas vidas.
Bem, talvez eu tivesse que fingir um pouco mais para Julia e
Andrew. Seria bem estranho se eu chegasse no dia seguinte e
simplesmente dissesse que não estávamos mais namorando.
Penteei meu cabelo novamente e o prendi em um rabo de
cavalo.
Saí do quarto, mas antes chequei se Paulo ou a cobra da irmã
dele não estavam por ali. Fui em direção às escadas e desci degrau
por degrau como se estivesse pisando em ovos.
Ah, Deus, que vida ridícula a minha.
— Sofia! — Levei a mão ao peito. — Desculpe te assustar.
Julia abriu um sorrisinho.
— Tudo bem — falei, respirando fundo. Ela segurava uma
caixa junto ao peito. — Precisa de ajuda?
— Já tomou café da manhã? — ela perguntou. — Rafael está
lá na cozinha, preparando aquelas coisas que musculosos gostam
de tomar quando fazem academia. — Ela revirou os olhos. —
Depois você vai lá no jardim, estou montando a mesa do bolo.
— Ah, tudo bem. — Abri um leve sorriso. — Vou comer
rapidinho e já vou te ajudar.
— Sem pressa. — Julia deu um último sorriso e se foi.
Ouvi as crianças gritando na parte de trás da casa e a babá de
Helena correndo atrás delas.
Instintivamente levei a mão à barriga. Logo eu não poderia
mais correr atrás de Aninha e teria que correr atrás do meu próprio
bebê.
Fui até a cozinha e Rafael estava na beirada da pia mexendo
no liquidificador.
— Olá — cumprimentei e ele se virou para mim.
— Olá, Sof. Que bom que você está aqui, porque eu não sei
como diabos se mexe nesse liquidificador.
Aproximei-me e ri ao vê-lo brigando com o aparelho.
— Você está fazendo errado — falei, tomando a frente da
situação. — Precisa girar o copo pra ele ficar preso. Senão não
funciona mesmo.
Rafael ergueu as sobrancelhas como se compreensão tivesse
o atingido.
— Nunca usei um desses, então não sabia.
Liguei o liquidificador e bati a vitamina ou sei lá que raios era
aquilo para ele. Quando terminei, abri a tampa e perguntei:
— Tá bom assim ou quer que bata mais?
Ele deu um passo e olhou dentro do copo.
— Está bom.
Assenti e virei o líquido no copo de vidro que ele já tinha
deixado ali posicionado.
Então quando me virei para entregar-lhe a bebida, Rafael
estava ainda mais perto, me olhando de uma forma que eu não
conseguia decifrar.
— Ahn... — Ergui o copo em sua direção. — Aqui está.
Ele pegou da minha mão, olhou a bebida e depois me encarou
novamente.
— Como você está?
É claro que ele estava preocupado com o que tinha acontecido
mais cedo.
— Estou bem — menti.
Ele bebeu um pouco e eu virei de costas, procurando alguma
coisa para fazer na pia limpa. Só não queria continuar encarando
seus olhos, porque ele facilmente podia me decifrar.
— Sofia, você sabe que pode me contar tudo — ele disse, bem
próximo ao meu ouvido.
Fechei os olhos.
Eu podia contar tudo? Inclusive, que eu gostava dele desde a
época em que ficamos, mas como ele não me quis, me envolvi com
outros e agora tinha engravidado de um idiota?
Acho que isso eu não podia contar.
Respirei fundo.
— Quer dar uma volta? — ele perguntou.
— Não posso, preciso tomar café e ir ajudar a Julia com os
preparativos da festa.
Rafael pegou meu braço e me fez virar para ele.
— Tudo bem, mas depois vamos conversar sobre o que
aconteceu lá em cima.
— Aff, você não muda, não é? — Me afastei.
— Como assim?
— Continua o mesmo chato e mandão — retruquei. — Sorte
que Julia não precisa mais te obedecer.
Ele ergueu as sobrancelhas, surpreso.
— E digo mais — falei, sentindo a irritação nas minhas veias.
— Coitada da mulher que se casar com você.
— Oras, mas por quê?
— Porque sim. Porque você é insuportável na maioria das
vezes, Rafael.
Ele abriu um sorrisinho e deu um passo na minha direção, me
prensando contra a geladeira.
— Primeiro, que a mulher que se casar comigo — ele falou
lentamente, sem deixar de me encarar —, vai ter que ter um
coração bem grande. E, segundo, ela vai me aguentar, sim, sabe
por quê?
— Por quê? — rosnei.
Ele se aproximou do meu ouvido e disse:
— Porque vou mostrar a ela que um casamento pode ser
prazeroso.
Abri a boca, em choque.
Ele riu.
— Acho que nem preciso falar muito, não é? Você já teve
amostras do que sei fazer com uma mulher, alguns anos atrás.
Meu Deus, como ele se achava!
— Quem garante que você não perdeu o jeito?
Epa, eu devia ter ficado quieta.
Rafael deu uma risada gostosa.
— Se quiser, posso te dar algumas amostras da minha
evolução com o tempo, querida.
Aquilo era claramente um convite de: “vamos transar”.
Bem que eu queria, na verdade. Mas eu não podia. Não
mesmo.
— Aff. — Me afastei dele e fui em direção à porta.
— Não vai comer? — ele perguntou.
— Perdi a fome.
Rafael ficou rindo para trás e eu saí, furiosa. Bem, com fome
eu estava, sim...
E o pior.
Fome de comida e de sexo.

Enquanto eu carregava algumas caixas de um lado do jardim


para o outro, eu sentia dois pares de olhos me observando.
Um deles estava com Victoria, talvez fingindo que conversava
com ela, quando, na verdade, me espionava. O segundo par de
olhos estava sentado, bem relaxado, na mureta que dividia o jardim
e a entrada da casa.
De qualquer maneira, eu fingia que não sabia que eles
estavam, de fato, me secando.
Claro que cada um por seus motivos diferentes.
— Acho que você poderia ser sincera comigo, sabe. — Julia se
aproximou com outra caixa, cheia de acessórios que seriam usados
na festa.
— Sincera? Sobre o quê?
Julia colocou a caixa em cima da mesa, olhou para onde os
pares de olhos estavam e depois me fitou.
— Rafael nunca soube mentir. Eu sei que esse namoro entre
vocês é uma loucura da cabeça dele e olha, eu tenho receio de...
— Não, Julia... — a cortei. — Bem, na verdade, você tem
razão. — Olhei para os lados, para ver o quão longe estávamos dos
outros para não sermos ouvidas. — Na verdade, fui eu que propus
isso a ele. — Resolvi deixar a parte do Paulo de fora. — Essa
safada tá tentando dar em cima dele novamente. Rafa não quer e
eu estou ajudando-o a lidar com isso.
— Eu odiei a maneira como ela se referiu a nós na noite
passada. Quem ela pensa que é? — Julia cruzou os braços. —
Ignorante. Ainda bem que o Rafa nunca deu ouvidos às lamúrias
dela.
— Pois, é. — Cruzei os braços também. — Me perdoe por
estar fingindo esse namoro, mas é pelo bem do próprio Rafa.
Julia me encarou e depois sorriu.
— Não se preocupe. Eu só tenho receio por vocês... — Ela
olhou para o Rafa e depois de volta para mim. — Que eu saiba, meu
irmão não quer um relacionamento. E ele mais viaja do que tudo.
Seria ótimo se vocês aprofundassem uma relação, mas meu irmão é
idiota e duvido que ele queira fazer isso.
E nem dava para pensar nisso. Pelo menos, não comigo,
grávida de outro homem.
— Eu vou ficar bem. — Sorri, tentando parecer confiante. — E
outra, é só até hoje à noite. Amanhã cada um vai voltar para sua
própria vida e esquecer que isso aconteceu.
Julia assentiu e nós voltamos a arrumar as coisas para a festa.
— Você pode arrumar os docinhos em cima da mesa, por
favor? — ela pediu.
— Claro, vou lá pegar.
Saí na direção da casa e dei uma piscada para Rafa, que
observava atentamente todos os meus passos. Não tínhamos
conversado mais, desde a sua proposta indecente, mas eu via a
cada sorrisinho que ele só estava esperando uma oportunidade.
Fui até a cozinha e peguei as bandejas de docinhos. A casa
estava uma verdadeira bagunça, as crianças corriam para lá e para
cá, mas, por sorte, os homens haviam saído.
Voltei para o jardim e fui até a mesa.
Victoria e a safada ainda continuavam conversando, mas,
como sempre, decidi ignorar o olhar fulminante em cima de mim e
me concentrei em fazer o que Julia havia pedido.
Coloquei um docinho, depois outro e, então, senti dois braços
circundando a minha cintura e um corpo quente e forte se grudando
ao meu.
Ah, céus...
— Por que raios a Julia não pede para outra pessoa fazer
isso? — Estremeci ao ouvir a voz de Rafael bem junto ao meu
ouvido.
— Por que eu sou a babá da filha dela? — perguntei baixinho.
— Ou porque ela confia em mim.
Rafael bufou e então depositou um beijo no meu pescoço.
— Rafa... — resmunguei.
— Ela está olhando — ele falou. — Dá para fingir que está
gostando?
Ah, claro.
Ergui a cabeça e fechei os olhos.
Ele depositou outro beijo perto da minha orelha.
— Sabe, eu falei sério sobre te mostrar o que eu aprendi com
o passar dos anos.
— Meu Deus, Rafael. Você é insistente, não é?
— Ah, eu sou. Você sabe disso.
Respirei fundo, ciente de que aquele toque era tão verdadeiro
quanto falso. Rafael estava fazendo isso apenas para mostrar à
Fernanda que ele havia seguido em frente. Bem, eu havia
concordado com isso, mas também não podia negar que ele me
afetava e muito.
— Acho que você podia me dar um beijinho — ele brincou,
ainda agarrado a mim. — Só um. Estou solitário... você sabe. É ruim
ter uma namorada que não dá beijinhos.
— Só um.
Virei o rosto e dei um selinho em seus lábios.
— Tá, por enquanto vou aceitar esse — ele murmurou,
descontente. — Só vou deixá-la em paz quando me contar o que
Julia e você estavam conversando.
Ah... então era isso.
O safado só queria saber se ele era o motivo da nossa
conversa.
— Assuntos de mulheres, Rafael — falei, voltando a colocar os
docinhos no lugar.
Os docinhos acabaram, eu me afastei dele e estendi a
bandeja.
— Pode pegar o restante lá dentro, por favor?
Ele fez uma careta, mas pegou a bandeja e se foi.
Foram apenas alguns segundos depois que Rafael entrou na
casa, eu ouvi o barulho de algo caindo dentro da piscina.
E então os gritos começaram.
Rafael

Eu sabia de apenas duas coisas:


A primeira, era que Sofia estava escondendo alguma coisa de
mim. Algo grave, porque ela nunca foi de me esconder nada, mas
havia escondido essa relação com Paulo.
E, depois, o ataque de choro nessa manhã.
E a segunda coisa que eu sabia, era que queria levar Sofia
para a cama. Para a minha cama.
Mas, ah... inferno. Nós éramos amigos. Essas coisas
estragavam amizades, eu sabia disso. Podia não ter estragado da
primeira, mas a segunda seria fatal.
Entrei na casa ainda mais intrigado do que antes.
Fui até a mesa para pegar o restante dos doces, mas uma
gritaria começou do lado de fora e eu saí correndo para ver o que
era.
— Rafa! — Victoria me encontrou na saída da porta. — Ajuda
a Fernanda! Ela caiu na piscina!
Inferno.
Larguei a bandeja e saí correndo na direção da piscina.
Mergulhei sem nem me importar com as roupas. Fernanda se
debatia, pedindo por socorro.
— Calma, já a peguei. — Me aproximei dela e a peguei pela
cintura, levantando-a na água.
Ela tentava respirar fundo.
— Se apoie em mim. Vou tirar você daqui.
Ela fez o que eu disse e eu nadei até a borda com ela apoiada
em mim.
— Meu Deus. O que aconteceu? — Julia se aproximou, com
os olhos arregalados.
Ajudei Fernanda a sair da piscina e a sentei na borda. Ela
ainda tossia e respirava com dificuldade.
— Não sei! — Victoria respondeu, com as mãos na cintura. —
Estávamos conversando na borda da piscina e de repente ela caiu.
Ela disse que não sabia nadar.
— Ela realmente não sabe nadar — eu disse, mas depois me
arrependi, porque todos os olhares vieram para cima de mim.
— Eu. Me. Desequilibrei — Fernanda disse, com dificuldade.
Depois tossiu. — Obri-gada, Rafa.
Julia me encarou, depois encarou Sofia e, por último,
Fernanda.
— Tudo bem, já passou. Onde diabos está o seu marido?
— Foi caminhar pelas terras com Andrew e George —
respondi à Julia.
Ela assentiu.
— Venha comigo, Fernanda. Vou acompanhá-la até seu
quarto. — Afastei-me de Fernanda, e Julia tomou posição para
ajudá-la.
Fernanda tomou sua mão e as duas saíram na direção da
casa, com Victoria falando sem parar atrás.
Quando elas já tinham sumido de nossas vistas, Sofia deu
uma risada, incrédula.
— Ela é persistente.
— O que quer dizer?
Sofia me encarou com tédio e mais alguma coisa que eu não
sabia identificar.
— Você é ingênuo, Rafael? Não percebeu que ela se jogou na
piscina, porque sabia que só havia você de homem na casa para
poder resgatá-la?
Cocei a cabeça.
Ela cruzou os braços e bufou.
— Essa mulher nunca vai te deixar em paz.
— Ela vai, sim — retruquei. — Não importa o que ela fizer.
Sofia me encarou por vários segundos, abriu a boca, mas
depois a fechou. Por fim, ela disse:
— Vá trocar de roupa ou você vai ficar doente.
— Doente? Com um calor desses? — resmunguei. — Mas eu
vou... eu já volto e vamos continuar aquela conversa de antes.
Ela deu de ombros e eu saí em disparada para trocar de
roupa.
Fernanda era ardilosa e, talvez, Sofia tivesse razão. Mas isso
ainda não mudava o que eu sentia por ela.

A festa de Aninha estava sendo um verdadeiro sucesso.


Ela corria animada de um lado para o outro, brincava com
Helena e puxava outras crianças para brincar com elas.
Havia chegado mais pessoas um pouco antes da festa,
incluindo meus pais e os de Andrew. Cumprimentamo-nos, porém,
eu não estava com ânimo para ficar conversando por muito tempo,
então eu me recolhi em um canto afastado, com uma cerveja nas
mãos e fiquei observando a movimentação.
Sofia estava organizando as brincadeiras, o que era péssimo,
porque ela não podia ficar ao meu lado. George, Andrew, o idiota do
Marcelo, o imbecil do Paulo e nossos pais ainda estavam
conversando sobre negócios.
— Não te agradeci direito por ter me salvado na piscina. — A
voz soou atrás de mim e eu nem precisava me virar para saber
quem era.
— Não foi nada — respondi, ainda olhando para a frente. —
Eu teria feito o mesmo por qualquer um.
Ela ficou em silêncio, mas depois puxou uma cadeira e se
sentou ao meu lado.
— Posso me sentar aqui?
— Já se sentou, né?!
Ela bufou.
— Por que me trata com tanta frieza, Rafael?
Ah, então agora ela queria falar sobre frieza... que
interessante.
— Eu a trato como trataria qualquer outra pessoa, Fernanda.
— A encarei, para que ela soubesse que eu estava dizendo a
verdade.
— Isso é mentira. Eu vejo como você trata aquela Sofia.
— Bem, ela é minha namorada. Acho que devo tratá-la de
forma diferente, mesmo. — Cocei o queixo. — Ou estou errado?
— Não é possível que você se esqueceu do quanto me amava
— ela choramingou. — Você era feliz comigo.
— Você disse corretamente: era. Isso passou, Fernanda. Por
que não consegue seguir em frente? — Bebi um pouco da cerveja.
— Pelo amor de Deus. Veja só, eu estou tocando a minha vida e
estou satisfeito.
Ela olhou para onde Sofia estava.
— Não é possível que você goste dela. Não consigo entender.
— Se você veio aqui para ofender a minha namorada...
— Não, não vou fazer isso. — Ela se levantou. — Esse tal
“namoro”, algo repentino, né?! — Ela riu. — Eu sei tudo sobre a sua
vida, Rafael. Nunca deixei de saber os mínimos detalhes do que
você fazia. Então acho muito estranho você vir com uma namorada
assim, do nada. Sem contar que essa garota estava de rolo com
meu irmão, uns tempos atrás.
Eu a encarei com firmeza.
— Mas vamos lá, mesmo que seja verdade — ela continuou.
— Isso não vai durar. Logo você vai estar sozinho de novo. Sabe,
não ia te contar agora, mas já que estamos aqui, quero que saiba
que eu já dei entrada nos papéis de divórcio. Logo vou me livrar do
Marcelo e aí poderemos ficar juntos novamente.
— Só nos seus sonhos, Fernanda. — Bebi mais cerveja.
Fernanda demorou ainda alguns segundos, porém, não disse
mais nada e virou as costas, indo embora.
Mas que mulherzinha arrogante e insuportável.
Fernanda achava que eu seria um fantoche em suas mãos,
mas isso ela estava enganada.
Olhei para a direção de Sofia e a vi rindo, feliz, girando com as
crianças em uma brincadeira.
Elas eram tão diferentes.
Por que eu não havia conhecido Sofia antes? Talvez hoje
fôssemos uma família feliz.

— Você passou o dia todo sentado nessa cadeira. — Sofia se


aproximou. — Tem cola aí na sua bunda?
Eu ri.
A noite já havia caído e a maioria dos convidados já tinha ido
embora. Os que restaram estavam na outra parte da casa,
aproveitando a piscina.
— É preciso aproveitar a tranquilidade quando nos é oferecida
— respondi, erguendo a cabeça para fitá-la.
— Ahh, estou exausta. — Ela se sentou na cadeira onde
Fernanda tinha sentado, horas antes. — Essas crianças roubaram
meu fôlego.
— Quer beber uma cerveja? — Ergui uma latinha. — Ainda
tenho uma aqui.
— Não, obrigada. — Ela sorriu. — Não sou chegada à cerveja.
— É uma pena. — Suspirei. — Na Alemanha, eu provei uma
que, olha, vou te falar, é muito boa.
— Eu prefiro vinho.
— Também gosto — admiti. — Tem um restaurante, que eu
vou às vezes, eles têm uma variedade impressionante de vinhos
importados. Preciso levá-la para conhecer.
Sofia ficou em silêncio e de repente olhou para o chão.
— Eu vi a dementadora conversando com você hoje à tarde. O
que ela queria?
Relaxei no assento e respirei fundo.
— Encher o meu saco.
Sofia riu.
— Estou falando sério. Ela ainda está atrás de você?
— Ela veio dizer que vai se separar do imbecil do marido.
Como se eu fosse correr atrás dela, quando isso acontecer. Por
mim, estou pouco me lixando para o que ela faz.
Ficamos em silêncio novamente. Sofia se remexeu no assento,
parecendo desconfortável.
— Sof, vem cá. — Estendi a mão.
Sofia olhou para a minha mão e depois para mim. Se levantou
e encaixou sua pequena mão na minha, então a puxei para se
sentar no meu colo.
Ela se sentou de frente para mim, as pernas cada uma de um
lado da minha cintura.
— O que você pretende fazer quando voltarmos para a
capital? — perguntei.
Ela cravou seus olhos nos meus.
— Do que você está falando?
— Planos, projetos. O que pretende fazer?
Ela abriu a boca, mas depois a fechou. Então disse:
— Vou voltar ao meu trabalho e à minha vida, oras.
— E se eu lhe fizesse outra proposta? — perguntei, descendo
o olhar até seus lábios.
Eu não era apaixonado por Sofia, mas ela era uma mulher
muito bonita e gostosa, com curvas de dar inveja a qualquer uma.
Ela me excitava e nem tinha consciência do quanto. Sem falar que
eu estava cansado de mulheres que só enxergavam o meu dinheiro
e a minha posição social.
— Que tipo de proposta? — ela perguntou, arqueando
levemente a sobrancelha.
Segurei-a mais forte contra o meu corpo. Sofia sentiu a minha
ereção e arregalou os olhos.
— Não faça essa cara — a censurei. — Você sabe que eu sou
homem e você é uma mulher muito bonita, que inconscientemente
mexe com meu instinto.
— Mas eu não sabia que... — Ela tocou meu peito. — Rafa,
eu...
— Psiu. — Coloquei um dedo em seus lábios. — Não quer
ouvir a minha proposta?
Ela me analisou por alguns instantes em silêncio. Depois deu
uma risadinha.
— Vamos, diga que proposta é essa.
— Bom — comecei, com um pouco de hesitação. — Nós
somos solteiros, essa é a verdade. Quando formos embora, nosso
acordo terá terminado.
Ela assentiu.
— Mas e se eu quisesse estender isso? — perguntei. — E se
eu quisesse que você continuasse fingindo ser minha namorada por
mais um tempo?
Sofia me encarou por longos instantes.
Instantes que quase fizeram eu me arrepender de ter dito
aquilo. Ela iria rir e debochar da minha cara, sem dúvidas.
— Por que está propondo isso, Rafa? — ela perguntou
baixinho, mas não havia sombras de deboche em seu tom, era outra
coisa. Talvez, preocupação.
— Porque eu estou cansado de mulheres que só me cercam
pelo dinheiro. — Tentei explicar. — Sei que é loucura, mas...
— Você pode ter quais mulheres desejar — ela disse, me
cortando. — Por que quer fazer isso comigo?
Eu podia ter ido pelo caminho mais correto e a pedido em
namoro, mesmo. Porém com Sofia eu sabia que isso não ia
funcionar assim. Era mais fácil tratar de “acordos” do que falar de
um relacionamento de verdade.
— Porque eu gosto de você, Sofia. Sempre nos entendemos
bem e acho que pode dar certo. Não estou lhe prometendo amor
nem casamento, é apenas uma proposta para beneficiar a nós dois.
Sofia ficou em silêncio, me encarando. Pelos céus, o que ela
estaria pensando?
— Rafael Henrique Souza, não sei o que dizer sobre isso.
Fiquei em silêncio.
— Ela te afeta ainda?
— Quem?
— A imbecil da Fernanda.
— Ah, não. Não me sinto afetado por ela.
E isso era verdade.
Eu só... me sentia solitário.
Sofia ergueu a sobrancelha novamente.
— Eu... meu Deus, como iremos fazer isso? — ela perguntou.
— Você me acompanha em jantares, lugares que eu for, como
minha namorada. Já que você sente que não podemos ir além,
porque pode envolver sentimento, eu a libero dessa parte.
Mas era óbvio que eu faria de tudo para persuadi-la depois. Eu
só precisava de tempo.
Ela me encarou por longos instantes.
— Vamos estabelecer um prazo, então. Assim não vamos
esperar nada além um do outro.
— Acho justo.
Ela deu um meio sorriso.
— Então, tudo bem. Será divertido te acompanhar nesses
eventos de ricos que você vai.
Eu ri abertamente e a puxei para mais perto.
— Vai ser uma aventura louca.
— Eu não sei nem o que pensar dessa aventura, senhor
Souza.
Ergui minha mão direita e acariciei seu rosto, bem lentamente.
— Uma aventura boa é sempre bem-vinda, não acha?
Ela fechou os olhos sentindo meu toque sobre sua pele.
— Eu ainda acho que você bebeu cerveja demais e amanhã
nem vai se lembrar do meu nome, muito menos, dessa proposta
maluca.
Eu ri e desci meus dedos pelo seu pescoço.
— Eu acho que você dá pouco crédito ao que eu digo. E isso
não é de hoje. É desde que nos conhecemos.
Sofia abriu os olhos e me encarou.
— É, já faz bastante tempo.
Aproximei meus lábios dos dela.
— Então acho que preciso correr atrás do prejuízo e mudar
essa sua percepção sobre a minha pessoa.
— Será que você consegue?
— Vou tentar.
Antes que Sofia dissesse algo, colei meus lábios nos dela com
um beijo calmo e tranquilo. Saboreei cada pedacinho da carne e
então afundei a minha língua na boca dela, movimentando-a com
precisão.
Sofia enroscou as mãos em meu pescoço e eu passei a
acariciar suas costas, bem lentamente.
Eu queria me levantar dali e levá-la comigo para o quarto, mas
era impossível, porque todo mundo ainda estava acordado.
Entretanto, uma das minhas virtudes era a paciência e, mesmo que
eu a tivesse liberado das demais atividades, Sofia mal podia esperar
para quando eu fosse encontrá-la mais tarde.
Sofia

Eu realmente não sabia onde estava com a cabeça quando


concordei com a proposta absurda de Rafael. E eu estava
começando a sentir que, em dois dias, as coisas já tinham saído do
controle.
Rafael basicamente queria que eu continuasse sendo sua
namorada, mas nós dois sabíamos que tudo aquilo era um acordo e
logo acabaria. Tinha que acabar, logo minha barriga começaria a
crescer e eu não queria que falassem que eu havia dado o golpe em
Rafael.
Fiquei até às 22h conversando com os pais do Rafa perto da
piscina. Eles ficaram extasiados quando souberam da novidade e
não paravam de fazer planos para quando nos casássemos.
Casamento...
Santo Deus.
Então, recolhi Aninha e Helena e as acompanhei até o quarto,
antes que eu falasse algo que me comprometesse. Até porque o
único ali que podia fazer isso era Paulo e ele tinha recebido uma
ligação e havia ido embora com urgência.
Julia tentou me impedir de subir com as crianças, mas eu disse
que a babá da Helena precisava de um descanso, então dei banho
em Aninha, troquei-a e a coloquei para dormir. Helena já sabia se
virar, mesmo assim, dei um pulo em seu quarto para ver se ela já
estava na cama.
— Tia Sof? — Helena me chamou, assim que me aproximei da
porta.
— Sim?
— Você vai se casar com o tio Rafa?
Respirei fundo e me virei para ela.
— Não sei, Helena. Por quê?
Ela se sentou na cama.
— As pessoas não namoram para se casarem?
— Bem, geralmente sim. — Aproximei-me, sentando-me na
beirada da cama. — Mas mudanças podem acontecer.
Ela me encarou com os olhos verdes característicos da família.
— Quais mudanças?
— Pessoas podem se separar, Helena. Às vezes o sentimento
que existe entre elas acaba e aí não faz sentido ficarem juntas, se
estão ofuscando a felicidade uma da outra.
Ela coçou a cabeça.
— Mas isso é assunto para quando você for bem grandinha. —
A empurrei para que se deitasse. — Vá dormir. Amanhã seus pais
vão sair cedo.
Helena sorriu e eu depositei um beijo em sua testa. Apaguei a
luz do quarto e fui em direção ao meu, totalmente exausta.
Porém, quando me aproximei, quase choraminguei ao ver
Fernanda encostada na porta, com os braços cruzados.
— Eu já ia bater na porta.
— O que você quer? — Fui direta. Estava cansada e um
embate era a coisa que eu menos queria naquele momento.
— Queria conversar com você um pouquinho. — Ela fez sinal
com a cabeça para dentro do quarto. — Claro, se não for
incomodar...
— Acho que você pode falar aqui no corredor mesmo.
Fernanda bufou.
— Como queira, então. — Ela me olhou de cima a baixo. —
Acho que nem preciso dizer sobre o que quero falar, não é?
— Se é sobre o Rafael...
— Claro que é sobre ele — ela me cortou. — Sobre o que mais
eu falaria com você?
Encarei-a com firmeza.
Ela deu um passo, ficando bem próxima.
— Eu sei que você está grávida do meu irmão — ela rosnou.
— E ele disse que você teria o bom senso de tirar essa criança.
Engoli em seco.
— É, querida — ela cruzou os braços —, eu sei de tudo o que
acontece. Então, não sei se o Rafa sabe que a namoradinha dele
está grávida de outro, mas... não consigo imaginar um homem como
ele assumindo uma interesseira como você.
Meu coração afundou. Abri a boca para retrucar, porém, ela
ergueu a mão, me parando.
— Pelo visto, ele não sabe. — Ela deu uma risadinha cínica. —
Eu vou ser gentil com você e vou lhe dar algumas opções. A
primeira delas é: você se afasta de Rafael e tira a criança, eu não
vou contar nada para ele, mas também vou ter certeza de que meu
irmão não será envolvido nessa história, ou você fica com a criança,
mas se afasta de todos nós.
— Então basicamente a única opção que eu tenho é me
afastar de vocês? — perguntei baixinho. Estava quase sem forças
para falar.
Ela sorriu. A maldita.
— Você é inteligente. Pena que não foi tão inteligente assim
para se manter longe do meu irmão.
O resto de paciência que eu tinha foi para o inferno.
Avancei em Fernanda, mas ela foi rápida e me segurou pelos
braços.
— Sua vaca! — gritei. — Rafael nunca vai voltar pra você!
— Ah, vamos ver se não!
Uma luta corporal começou entre nós, mas eu estava tão
mortificada e assustada, que Fernanda parecia ter vantagem sobre
mim.
Então aconteceu.
Ela me empurrou contra a parede, mas eu só senti minha nuca
batendo contra algo duro e frio.
Foram apenas segundos para que eu caísse, com a minha
consciência se esvaindo do meu corpo.
Meus olhos se fecharam.
Rafael

Eu sabia que Sofia tinha ido colocar as crianças na cama,


mesmo assim, eu precisava falar com ela. Precisava saber se para
ela não era demais aquela situação. Se ela realmente podia ser a
minha falsa/verdadeira namorada durante aquele tempo.
Porém, quando cheguei à ponta da escada, ouvi gritos.
E não eram gritos de crianças.
Julia, que estava na sala, acompanhada de Andrew, George,
Victoria e Marcelo também ouviram e me olharam, assustados.
— Mas que diabos? — Subi os degraus de dois em dois e
quando cheguei ao andar de cima, meu coração quase parou.
— Eu não queria, Rafa! — Fernanda estava encostada em
uma parede, com as mãos na boca e os olhos arregalados de terror
enquanto as lágrimas desciam pelo rosto. — Eu não queria, eu juro!
Olhei para a direção que ela olhava horrorizada e meu coração
quase parou.
— Sofia! — gritei e fui em sua direção no mesmo instante.
Ela estava caída no chão, totalmente desacordada.
— Ah, meu Deus! — Julia se exasperou logo atrás de mim.
Nesse momento eu já não sabia o que eles diziam, porque me
concentrei em pegar Sofia nos meus braços e tirá-la daquele
corredor.
— Ela precisa de um médico — falei, pedindo licença ao grupo
que se aglomerou no corredor. — Agora!
Andrew tirou uma chave do bolso e me entregou.
— Vá com meu carro. Vá rápido. Pode ser apenas uma
concussão, mas é melhor um médico averiguar.
Assenti e saí às pressas com Sofia em meus braços.
Eu não queria nem pensar no que havia acontecido ali entre as
duas, porque eu certamente não saberia lidar com as explicações
de Fernanda naquele momento.
Então me concentrei no que era essencial: levar Sofia até um
médico.

Meu medo era de que algo muito terrível tivesse acontecido a


ela, que ainda estava desacordada em meus braços.
Quando entramos no pequeno hospital, um enfermeiro já veio
correndo ao meu encontro e logo trouxeram uma maca onde a
colocaram. Expliquei a eles que eu não sabia exatamente o que
havia acontecido, mas que ela poderia ter batido a cabeça em uma
queda.
Eles a levaram e disseram para que eu aguardasse na sala de
espera.
O médico apareceu depois de um tempo e eu me levantei.
— Doutor? Como Sofia está?
Ele olhou na prancheta e riscou algumas coisas.
— Aparentemente está bem, mas vamos fazer alguns exames,
ok? — ele disse.
— Faça o que tiver que fazer.
O médico me encarou de forma especulativa. Será que ele
pensava que eu tinha batido em Sofia?
Pelo amor Deus.
— Por enquanto, ela vai ficar em repouso absoluto, ok? Mais
tarde posso permitir visitas, se ela estiver bem. Mas quero que me
conte em detalhes o que aconteceu.
— Ok.
Então contei tudo o que eu sabia e tinha visto.

Depois de algumas horas, uma enfermeira me informou que o


médico queria falar comigo urgentemente.
Fui até a sua sala e o encontrei com vários papéis em cima da
mesa. Acreditei que deveriam ser os exames de Sofia.
Alguma coisa no ambiente me dizia que ele tinha uma notícia
ruim. E, se fosse, eu não estava preparado.
Comecei a me culpar por aquilo.
Julia havia me ligado, enquanto eu estava no hospital,
confirmando as minhas suspeitas de que Sofia e Fernanda haviam
discutido e que na briga, ela empurrou Sofia, que bateu a cabeça na
parede e desmaiou.
Senti ódio.
Ódio de Fernanda, que era uma sombra maldita em minha
vida. Mas principalmente ódio de mim.
Se eu tivesse agido como um homem de verdade e colocado
Fernanda em seu lugar...
— Ela está bem, rapaz — o médico falou, de modo animador,
tirando uma carga enorme dos meus ombros. — Aliás, eles estão
bem.
Eles?
Olhei para o médico sem entender.
Ele abriu um sorrisinho.
— Bem, acredito que ainda é recente e que ela não teve tempo
para lhe contar, mas...
— Espera — interrompi o médico. — Você disse “eles”. Eles
quem?
— Sua namorada e o bebê, oras.
Paralisei no mesmo instante.
Bebê?
Que bebê???
— Como eu dizia — o médico retomou — é recente e acredito
que ela não teve tempo de lhe contar, mas ela está esperando um
bebê e ambos estão bem.
Levantei-me da cadeira, com tudo ao meu redor girando,
praticamente sem ar nos pulmões.
Sofia estava grávida?
Meu Deus do céu.
Sofia

Após abrir os olhos, não precisei de muito tempo para saber


que me encontrava em um hospital, porque havia uma agulha em
meu braço e eu claramente estava deitada em uma maca.
Mas o que me surpreendeu não foi estar em um hospital,
porque eu me lembrava vagamente do que havia acontecido. O que
me surpreendeu foi olhar para o lado e ver Rafael sentado em uma
poltrona, com os olhos vidrados em alguma coisa na janela do
quarto e um rosto completamente indecifrável.
— Água — pedi, com dificuldade.
Ele me encarou. Não disse nada, então se levantou e foi até
uma jarra onde despejou o líquido e o trouxe até mim.
Sentei-me um pouco e ele me ajudou a beber.
— Como está se sentindo? — perguntou, quando terminei e
voltei a me deitar.
— A cabeça dói um pouco, mas acho que estou bem.
— Se lembra do que aconteceu?
— Sim.
Ele respirou fundo e colocou o copo no lugar de volta.
— Quer me contar?
— Não foi culpa dela — eu disse, tentando amenizar a
situação. — Eu avancei nela.
Rafael assentiu.
— E qual foi o motivo da discussão?
— Isso importa?
— Quando colocou a sua vida e a da criança que você está
esperando em risco, passou a importar, sim.
Pensei ter ouvido demais.
Mas então eu vi nos olhos de Rafael que ele já sabia.
Ah, meu Deus!
Desviei o rosto. Não queria encará-lo mais.
— Por que não me contou? — Rafael pegou na minha mão. —
É do Paulo?
Assenti.
Ele soltou um palavrão.
— Mas eu não entendo — ele disse. — Olha pra mim, Sof. Por
favor.
Eu não tinha estrutura quando ele falava daquele jeito dócil.
Então virei o rosto, mas ainda assim não encarei seus olhos.
— O que você não entende?
— Se ele é o pai... por que você está fugindo dele?
Eu ri, sem humor.
— Porque ele, claramente, rejeitou a minha gravidez? —
perguntei, com escárnio. — Porque ele é um babaca, que disse que
era para eu abortar essa criança?
Rafael ficou mudo.
As lágrimas começaram a rolar pelo meu rosto.
— Eu não queria que isso tivesse acontecido. Eu fui burra, eu
sei... — Passei a mão livre pelo rosto. — Nos envolvemos e eu
achei que ele era, no fundo, uma boa pessoa. Mas eu devia
imaginar que um homem como ele nunca ficaria com uma simples
babá. Claro, eu não engravidei de propósito, mas achei que ele pelo
menos assumiria a paternidade.
Rafael não disse nada por um bom tempo. Então quando achei
que ele iria me julgar, ele apertou a minha mão e disse:
— Sinto muito.
Assenti lentamente e desviei o olhar para os pés da cama.
— E a discussão com Fernanda, teve algo a ver com isso?
— Sim. Ela sabe da gravidez e disse que se eu não me
afastasse de você, ela iria contar a verdade. — Bufei. — Disse que
eu estava usando você para tentar dar o golpe, já que com o irmão
não havia funcionado.
Rafael balançou a cabeça, incrédulo.
— Essa família só nos trouxe problemas, não acha? — ele
perguntou, com um toque de humor na voz.
— Realmente.
Ficamos um tempo em silêncio, até que Rafael perguntou:
— A Julia já sabe?
— Não. Eu... ia contar para ela.
Rafael segurou meu rosto e o puxou gentilmente, me fazendo
olhar para ele.
— Você sabe que pode contar comigo para o que precisar, não
sabe?
Assenti lentamente.
— Você não pensa em tirar a criança, não é? — Ele ergueu as
sobrancelhas.
Neguei.
— Ótimo.
Perscrutei o rosto de Rafael, tentando entender seu olhar
enigmático.
— Rafa, sobre o namoro...
— Vai ser ótimo, Sofia — ele me interrompeu. — Uma
namorada grávida. — Ele riu. — Vai me ajudar ainda mais.
— Como assim?
— Não vou deixar você sozinha, neste momento — ele
explicou. — Vamos continuar com nosso plano. Mesmo que... as
coisas entre nós fiquem somente na amizade mesmo, pelo menos,
eu vou ter ajudado você durante todo o processo da gravidez.
Levei vários segundos para entender.
— Você está falando sério?
— Nunca falei tão sério em minha vida. — Ele me encarou
com determinação. — Agora que não posso mesmo deixar você
sozinha. Nesses próximos meses, seremos namorados falsos
grávidos. — Ele sorriu, de forma tranquilizadora. — É loucura, mas...
Eu ri, balançando a cabeça.
— Meu Deus, Rafael, você é mais louco do que eu pensava.
— As melhores coisas acontecem quando nos permitimos
viver um pouco da nossa loucura interior, Sofia.
Encarei-o por longos instantes, mas vi sinceridade em seu
olhar.
Novamente senti aquele aperto no peito.
Por que a vida não tinha conspirado para Rafael ser o pai do
meu bebê?
No outro dia, logo cedo, Rafael me ajudou até o carro, porque
eu estava um pouco enjoada e com um pouco de fraqueza nas
pernas.
— Vamos passar no sítio para pegar as nossas coisas, mas já
vamos voltar para a capital, ok? — ele falou, enquanto me ajudava a
colocar o cinto.
— Tudo bem.
Era bom que não ficássemos mais no sítio, afinal, a última
coisa que eu queria ver era a cara da safada da Fernanda na minha
frente.
Rafael dirigiu com cuidado, mas mantivemos o silêncio durante
todo o percurso. Na verdade, não era um silêncio incômodo. Era
algo confortável. E era bom porque me dava mais tempo para
pensar.
A última coisa que eu queria era envolver Rafael em minha
confusão. Então, quando ele estacionou o carro, eu segurei a sua
mão e disse:
— Rafa, não quero puxar você para essa confusão. Eu tenho
plena consciência no que me meti e vou arcar com as
consequências, mas você não precisa se envolver.
Ele apertou minha mão de volta.
— Está tudo bem, Sofia. Amigos são para essas coisas, sabia?
Assenti lentamente.
— Quando você vai contar para a Julia? — ele perguntou. —
Sinceramente, espero que conte logo, não quero você fazendo
esforço, colocando a criança em risco. Aliás, colocando vocês dois.
— Eu estou bem, Rafa.
Ele assentiu, mas parecia preocupado.
— Eu vou contar logo — falei, levando o antebraço à testa. —
Só preciso conversar com a dona Florência primeiro.
Rafael fez uma cara de quem tentava segurar o riso.
— Pode rir... eu sei que ela vai me matar.
— Talvez — ele ponderou —, mas duvido que ela irá rejeitar
essa criança.
— Rejeitar, não vai. Minha avó não é dessas coisas.
— Bem, então vamos lá pegar nossas coisas e partiu.

Rafael pegou minha mala e, por sorte, não precisamos dar de


cara com Fernanda e Marcelo, porque ambos haviam saído ao
amanhecer.
Julia fez inúmeras perguntas, que eu tentei responder sendo
sincera, claro, sem mencionar nada sobre a gravidez. Esse era um
assunto para ser discutido com calma e não ali, em pé, com uma
mala de viagem esperando para ser colocada dentro do carro.
— Vou levar a Sofia, mas que fique claro que ela irá tirar uma
semana de folga, pelo menos — Rafael disse, com o tom
extremamente autoritário para Julia, que me encarava com
preocupação.
— Eu sei disso, seu idiota — ela retrucou. — Acha que eu iria
obrigá-la a ir trabalhar, depois dessa confusão toda?
Ele deu de ombros.
Eu não soube nem o que dizer sobre aquele excesso de
proteção de ambos os lados.
— Meu irmão está bem protetor, hein?! — Ela ergueu uma
sobrancelha e deu uma risadinha. Julia se aproximou e me abraçou.
— Fique quietinha durante a semana. Eu já passei por isso e não foi
nada legal. Descanso é primordial.
— Pode deixar — falei, abraçada à Julia por mais tempo que o
necessário. — Obrigada por ser tão amiga.
Nós nos separamos e Julia sorriu.
— Você será a minha irmã. — Ela deu uma piscadinha. — Não
precisa me agradecer.
Eu sabia que ela estava falando isso de brincadeira, mas seu
tom parecia conter uma verdade que eu nem sabia que poderia
existir.
— Vamos, Sof? — Rafael nos interrompeu. — Vamos pegar
um trânsito dos infernos, nessa cidade dos infernos.
— Vamos.
Dei um último abraço em toda a família e pedi mais uma vez
para Julia explicar para Aninha que eu estava bem. As crianças
ainda estavam dormindo e eu não quis acordá-las.
O trajeto realmente demorou porque, mais uma vez, Rafael
estava certo: pegamos um trânsito dos infernos.
— Eu não sei qual cidade é pior, São Paulo ou Nova York —
ele disse, irritado.
— Todas as grandes capitais são terríveis.
— Pois é. — Ele me encarou. — Por que diabos gostamos
mesmo de morar em capitais?
Nós rimos e foi um alívio quando ele estacionou em frente à
minha casa, horas depois do planejado.
— Vou pegar a sua mala — ele disse, saindo do carro.
Saí do carro também e o observei enquanto abria o porta-
malas e pegava minha bagagem.
Rafael estava despojado, usando uma bermuda e uma regata
que deixava à mostra seus músculos bem definidos. E, claro que eu
tinha que notar isso bem agora, que estava em frente à casa da
minha avó.
— Prontinho. — Ele colocou a mala no chão, puxando a alça.
— Sua avó está em casa, será?
Olhei para a porta da casa.
Estranho.
Ela era do tipo que sempre que ouvia um carro estacionar em
frente de casa, já saía para ver quem era.
— Será que ela saiu? — perguntei baixinho.
Rafael puxou minha mala em direção à entrada da casa.
— Será que ela se importaria se eu entrasse?
— Claro que não. — Peguei minha chave na bolsa e abri o
portão. — Ela ama você.
Rafael riu e nós entramos em casa.
— Vó? — gritei, nos cômodos de baixo. — Vó???
— É, acho que ela saiu — Rafael disse, olhando ao redor. —
Posso usar o banheiro?
— Claro. — Fiz sinal com a mão. — Sabe onde fica, né?
— Sei.
Rafael foi ao banheiro e eu me joguei no sofá. Minha avó
certamente não esperava me ver tão cedo.
Fechei os olhos e respirei fundo.
Estava exausta.
Precisava de um banho, um analgésico e uma boa noite de
sono, porque, francamente, cama de hospital não era nada
confortável.
Ouvi a porta do banheiro se abrindo e abri os olhos
rapidamente.
— Será que a sua avó vai demorar? — Rafa perguntou,
olhando ao redor.
— Não sei..., mas acho que não.
Ele suspirou e se sentou na outra poltrona, em frente à minha.
— Então vou esperar aqui.
— Esperar? Aqui? — repeti.
— Não vou deixar você sozinha.
Abri a boca para enumerar os motivos pelos quais ele não
precisava se preocupar, mas os engoli quando seu olhar encarnou o
empresário de sucesso que ele era, dizendo claramente “não
discuta comigo”.
— Vá tomar um banho — ele disse. — Vou assistir a um pouco
de TV.
Balancei a cabeça, rindo.
— O que foi? — Ele arqueou uma sobrancelha.
— Já parou para pensar o que minha avó vai pensar, quando
chegar e te ver aqui, sentado na poltrona favorita dela, assistindo à
TV?
Ele olhou para a poltrona.
— Esta é a poltrona dela?
Balancei a cabeça afirmativamente.
Ele deu um salto, como se algo tivesse picado sua bunda.
Eu ri novamente.
Até mesmo Rafael sabia que minha avó odiava que se
sentassem em sua poltrona favorita.
— Acho melhor você ir tomar banho, Sof — Rafael disse, com
menos paciência dessa vez. — Se a sua avó chegar, eu me entendo
com ela.
Levantei-me e fui em direção às escadas.
— Só veja lá o que você vai dizer, hein?!
— Vou dizer que eu a trouxe e não quis deixá-la sozinha.
— Acho bom. — Dei uma última olhada para ele antes de subir
as escadas. — Você é meio linguarudo, às vezes.
— Eu? — Ele me olhou, pasmo. — Acho que você deve estar
me confundindo com outra pessoa.
— Ah, é? — Dei uma risada. — E quem foi que contou para a
Julia que eu tinha me esquecido de ir buscar a Aninha na natação,
ano passado?
Ele deu de ombros e abriu um sorrisinho.
— Bem, eu sou um tio preocupado.
— É, mas eu estava indo para lá. Não tive culpa que o pneu do
motorista do Uber furou e perdemos mais de uma hora nisso.
— Está magoada, Sofia? — ele perguntou, com uma voz
mansa, enquanto cruzava os braços. — Eu apenas cumpri o meu
dever. Me ligaram da escolinha, dizendo que ela estava triste por ter
sido esquecida pela babá.
Virei as costas e subi o primeiro degrau.
— Só veja lá o que você vai falar para a minha avó quando ela
chegar.
— Fique tranquila, Sofia.
Rafael

— Eu trouxe a Sofia e decidi ficar aqui esperando a senhora


chegar, porque não podia deixar a minha namorada sozinha, depois
de ela ter discutido com a minha ex e caído, batendo a cabeça em
seguida.
E foi só depois que eu disse essas palavras, que eu percebi
que não deveria ter dito.
Dona Florência me fitou por alguns instantes. Vários instantes,
até. Achei que ela tinha se esquecido de como falava.
— Você disse “namorada”? — ela perguntou baixinho.
Céus, eu disse que Sofia tinha batido a cabeça e ela só ouviu
a palavra “namorada”?
Assenti, frustrado com a minha própria falta de senso.
Não era para ter falado sobre isso, assim.
Sofia subiu para tomar banho e uma hora havia se passado e
ela não tinha voltado. Resolvi subir para ver o que tinha acontecido
e ela havia adormecido na cama, enrolada em uma toalha.
Foi um verdadeiro caos colocá-la de uma forma confortável na
cama, porque enquanto eu a pegava, sua toalha se abriu, revelando
seu corpo e tudo o que eu definitivamente não podia ver naquele
momento.
Mesmo assim, a coloquei e a cobri com uma manta e saí
correndo do quarto.
Soaria patético para outros homens, mas eu jamais me
aproveitaria de uma jovem adormecida.
Então, logo quando eu descia as escadas, dona Florência
entrava na casa.
Ela levou um baita susto, mas se acalmou quando eu implorei
que não me machucasse com sua sombrinha pontuda, que ela
mantinha erguida em minha direção.
Depois, resolveu fazer um chá para nós. E ali estávamos,
como velhos conhecidos, tomando chá em pleno horário do almoço.
— Mas então, o que a senhora me conta bom? — Decidi
mudar de assunto.
— Não mude de assunto, menino insolente! — Ela ergueu o
indicador para mim. — Quero que me conte essa história direito.
— Que história, vó?
Sofia.
Ah, meu Deus. Eu não sabia se ficava aliviado ou se saía
correndo novamente. Sofia ia me matar, tudo porque a minha boca
era grande demais.
Ela tinha razão ao dizer que um dos meus defeitos era não
saber manter a língua dentro da boca.
— Ah! Oi, querida. — Dona Florência olhou para as escadas,
onde Sofia estava nos observando sem entender nada. — Pela sua
cara, o fim de semana não foi tão bom assim.
Sofia se aproximou e se sentou ao meu lado no sofá.
— É sério que vocês estão tomando chá a essa hora?
— Qual é o problema de tomar chá a essa hora? — perguntei.
— Chá é bom a todo momento.
— Garoto esperto. — Dona Florência riu, mas depois fechou o
semblante novamente. — Esse menino estava me falando uma
coisa muito interessante, Sofia.
Senti seu olhar penetrante em cima de mim.
— Ah, é? E o que ele disse?
Dona Florência se acomodou na poltrona.
— Deixa eu pensar... — Ela estava adorando aquela pequena
tortura. — Ele disse algo como “onde a senhora estava? Eu não
podia deixar a minha namorada sozinha, já que ela teve uma
discussão com minha ex e caiu, batendo a cabeça.”
Sofia ficou em silêncio.
Eu nem quis olhar para ela.
— E então? Não querem me contar nada?
Bufei.
— Bem, é isso o que a senhora entendeu mesmo. Mas Sofia
está bem, olhe para ela. Forte como um touro.
Sofia revirou os olhos.
— Ai, vó... depois eu te conto tudo. É uma longa história.
Ela bebericou o chá e depois disse:
— Mas e sobre essa história de namoro? É verdade mesmo?
— Seus olhos se arregalaram. — Porque, se for, fico muito feliz. É
ótimo, sabe?!
— É claro que é ótimo, né — Sofia retrucou, azeda. — Rafael
foi sempre o partido que a senhora queria para mim.
Encarei dona Florência.
— A senhora já fazia gosto?
Sofia deu um tapa no meu braço.
— Mas o que me deixa intrigada é... como aconteceu isso? —
Dona Florência era muito esperta. — Faz meses que vocês não se
veem.
— Aplicativos de chamadas on-line — disse rapidamente. — A
gente já vinha conversando há algum tempo.
— Hum.
Olhei para Sofia, quase dizendo “sinto muito”.
Ela bufou e balançou a cabeça negativamente.
Fiz cara de cachorro pidão.
Ela virou o rosto.
— Bom, eu preciso ir. — Levantei-me. Lidar com duas
mulheres turronas era bem difícil. — Preciso passar no escritório
ainda hoje.
— Ô, meu filho, que pena. O almoço vai sair já, já. Claro,
apesar de ser o que sobrou de ontem.
Eu sorri e entreguei para ela a xícara.
— Eu volto outro dia — garanti. — Muito obrigado pelo chá.
— Não há de quê.
Olhei para Sofia, mas ela continuava com o olhar perdido.
— Bom, então vou nessa.
Ela não se mexeu.
— Sofia! — dona Florência quase gritou. Sofia a encarou. —
Não vai acompanhar seu boy até a saída?
— Nossa vó, onde que você anda aprendendo essas gírias?
— Com as meninas da Zumba. Agora anda, vá acompanhar o
menino até a saída.
Sofia bufou, mas se levantou e me acompanhou até a saída.
Quando chegamos ao lado de fora do portão, ela cruzou os braços.
— Eu disse que você era um linguarudo desgraçado.
Levei uma mão ao coração, me fingindo de ofendido.
— Assim você me magoa.
— Poxa, Rafa! — Sofia resmungou. — Eu tô grávida! Agora
minha avó vai pensar que o filho é seu. Não pensou nisso? Pois é...
você complicou a minha vida ainda mais.
— Bem, é melhor ela pensar que eu sou o pai, e estou aqui ao
seu lado, do que aquele imbecil que a rejeitou.
Sofia me encarou.
— Adianta muito você ser presente por um tempo, até
perceber que a sua vida de solteiro é melhor e que você não pode
se comprometer com uma mulher que tem um filho de outro cara e,
então, ir embora, me deixando sozinha novamente.
Fiquei em silêncio por alguns instantes.
Era claro que eu ainda não sabia o que eu realmente queria
com Sofia, mas estava óbvio que eu não podia deixá-la sozinha
naquele momento.
— Desculpa, Sof. — Foi só o que consegui dizer.
Ela balançou a cabeça e depois olhou para cima. Seus olhos
estavam marejados.
— Eu... me desculpa, Rafa. Você é maravilhoso e eu estou
sendo uma imbecil.
— Não fala assim. — A puxei para os meus braços em um
abraço forte. Sofia começou a chorar novamente. — Você é
maravilhosa. Eu a conheço faz anos e sei que você será uma mãe
extraordinária.
Sofia apertou os braços ao redor da minha cintura e eu
depositei um beijo no topo da sua cabeça.
— Não chore — pedi gentilmente. — Se você continuar
chorando, eu vou sair daqui e dar um soco na cara do Paulo.
Ela se afastou e me encarou.
— Você não faria isso.
— Claro que faria. — Segurei seu rosto entre as mãos. —
Você sabe que eu sempre fui meio louco.
Ela riu e nesse momento meu dia se iluminou.
— Será que isso pode dar certo, Rafa? — ela perguntou
baixinho.
— Só saberemos se nós tentarmos.
Ela deu uma risadinha e secou os olhos com as pontas dos
dedos.
— Ah, meu Deus, eu só me meto em confusão.
— Eu também. — Sorri de volta, então desci meus olhos até
seus lábios. Eles eram vermelhinhos, convidativos. — Posso te
beijar?
— Por que está pedindo permissão? — ela perguntou,
desconfiada.
— Porque a sua avó está escondida atrás da cortina, nos
observando.
Sofia arregalou os olhos.
— AH, MEU DEUS.
Nós rimos.
— Temos que fazer nosso papel, Sof — argumentei. — E bem
direitinho.
Ela sorriu timidamente.
E eu mandei ao inferno todo o restante do bom senso que eu
tinha, puxando-a para um beijo caloroso, que certamente deixou a
dona Florência com as bochechas vermelhas.
Sofia se derreteu em meus braços, exatamente como ela fazia
anos atrás. Então saboreei cada pedacinho de sua boca,
explorando-a com a minha língua.
Seus braços envolveram meu pescoço, me puxando para mais
perto. Ela queria mais. Mas eu sabia que aquilo já estava indecente
demais para uma rua familiar, em pleno horário do almoço.
Então encerrei o beijo, encostando minha testa na dela.
— Bem, esta semana eu tenho que viajar para Florianópolis,
para resolver alguns assuntos de trabalho — falei. — Mas na terça,
estarei de volta. Topa um jantar? — perguntei.
— Claro. — Ela sorriu. — Na sua casa?
— Não sei ainda. — Acariciei seu rosto. — Te mando uma
mensagem, confirmando o horário e tudo certinho.
— Tá bom.
Relutantemente soltei Sofia e ela se afastou com um sorrisinho
nos lábios.
— Até logo, então.
— Até logo.
Entrei no carro, dei um tchauzinho e fui embora logo, porque a
minha vontade era enfiá-la no carro, levá-la para o meu apartamento
e me perder em seu corpo, que certamente ficaria ainda mais
delicioso quando se transformasse pela gravidez.
Atravessei o corredor frio e com cheiro de álcool de limpeza.
A sala dele era a última e, claro, não era a primeira vez que eu
ia até ali. Mas era a primeira vez que eu ia por causa de um assunto
que era totalmente fora do que costumávamos tratar.
Dei duas batidas na porta e entrei. Ele estava ao telefone,
despejando ordens em alguém.
— Não interessa! Você é incompetente, por acaso? — ele
disparou, irritado. — Faça o que ordenei, seu maricas!
E desligou.
— Problemas, Otávio?
Ele esfregou as têmporas e depois me encarou.
— Eu trabalho em uma delegacia. “Problemas” fazem parte de
todo o meu santo dia.
Dei uma risada. Ele se levantou e estendeu a mão em um
cumprimento.
— Como vai, Rafael?
— Bem e você?
Ele deu de ombros e indicou a cadeira vazia na frente da
mesa.
— Bem, na medida do possível. — Ele se sentou também e
acendeu um cigarro. — Fuma?
Neguei com a cabeça.
— Faz bem.
— Não vai perguntar o que estou fazendo aqui?
Ele deu de ombros.
— Você vai dizer, mesmo que eu não pergunte.
Otávio Albuquerque era um grande amigo. Ele era filho de um
ricaço dono de inúmeros negócios espalhados pelo Brasil, mas sua
vocação nunca foram os negócios. Então ele ingressou na polícia e,
alguns anos depois, se tornou delegado da 1ª Delegacia Seccional,
no Jardins.
Ele não era velho, tinha praticamente a mesma idade que eu,
mas a vida na polícia não era fácil. Otávio já havia me ajudado ao
longo dos anos com problemas dentro da empresa, desde
funcionários mau caráter e outros problemas de roubo.
A vida de empresário nunca era mil maravilhas.
— Preciso da sua ajuda — falei.
Ele deu algumas tragadas no cigarro.
— Bem, eu já esperava que sim. — Ele riu. — Duvido que
estaria aqui apenas para tomar um chá.
— Chá, não. Acabei de tomar chá e... — Ele me encarou,
como se eu estivesse doido. Balancei a cabeça e recomecei. —
Estou namorando.
— Sério? — Seus olhos se iluminaram. — Meus parabéns!
Apertei sua mão estendida.
— Só que há um problema sério — pontuei, devagar. — Sofia
está grávida, mas é de outro sujeito.
O cigarro ficou pendurado na boca de Otávio, enquanto ele me
olhava assustado.
— Espera, não estou entendendo.
Bufei.
Contei toda a história para Otávio, que respirou, aliviado,
quando eu disse que o namoro, não era tão namoro assim. Mas que
eu gostava dela e que queria tentar algo mais.
— Você é corajoso — ele disse, enfiando a ponta do cigarro no
cinzeiro.
— Por quê?
Ele deu uma risadinha.
— Essa coisa de assumir filho dos outros, é complicado. Já
tive uma experiência que não deu certo.
— Porque você é um babaca machista? — arrisquei.
Ele riu.
— Estamos falando de você e não de mim. Mas vamos lá, no
que posso te ajudar, então?
— O ex da Sofia é um babaca. Ele é irmão da minha ex e eu o
conheço muito bem. Sei que ele vai infernizar a vida da Sofia,
enquanto ela não concordar em tirar a criança.
Otávio fez uma careta de compreensão.
— Quero que você coloque alguns homens para ficarem de
olho nela. Não importa o quanto isso vai custar.
Otávio encostou no assento.
— Não é melhor você pagar uma segurança por fora, então?
— Não confio nos outros. E outra, você é meu amigo, não é?
— Claro que sou.
— Então sei que você vai quebrar essa pra mim.
Otávio suspirou e depois assentiu.
— Tudo bem, mas... você vai precisar me passar tudo sobre
ela. Vou ver o que consigo fazer.
Assenti e me levantei.
— Eu sabia que podia contar com você.
Otávio também se levantou e apertou a minha mão.
— Amigos são para essas coisas. — Ele deu um meio sorriso.
— Tá a fim de beber algo hoje à noite?
— Pode ser. Eu vou ter que me ausentar esta semana, então
quanto antes você começar esse trabalho, melhor. À noite já te levo
algumas informações sobre ela e o sujeito.
— Ótimo.
Prevenção era essencial e eu não queria contar muito com a
sorte. Mesmo assumindo publicamente que estava com Sofia,
duvidava que Paulo ficaria quieto.
Então, todo cuidado era pouco.
Só que quando ele viesse, se viesse, eu estaria preparado.
Sofia

— Vó, eu preciso conversar com a senhora.


Já estava escuro e minha avó estava sentada na sua poltrona
favorita, assistindo a um programa da Record, enquanto tricotava
alguma coisa.
Era terça-feira da semana seguinte e Rafael tinha combinado
de vir me buscar às 19h30. Eram 19h agora, então eu ainda tinha
um tempo para conversar com ela e esclarecer aquela situação de
uma vez por todas.
Sentei-me na outra poltrona.
— Então... o que está tricotando aí, vó? — perguntei, como
quem não queria nada.
Seria muito absurdo já chegar falando: “Vó, tô grávida e o pai
nem é o Rafael”.
Ela ergueu a linha e o pouco que já tinha feito.
— Acho que pode ser um lindo sapatinho de bebê.
Gelei no mesmo instante.
Minha vó nunca foi dessas pessoas que jogava conversa sem
saber do que exatamente estava falando. Ela sabia. E quando ela
me encarou, eu tive a certeza de que ela sabia.
— Vó, eu...
— Desculpe mexer nas suas coisas, mas eu tinha acabado de
dobrar umas roupas limpas e fui arrumar sua gaveta.
A maldita gaveta.
Engoli em seco.
— Eu que peço desculpas, vó — falei, tentando soar o mais
sincera possível. — Eu ia te contar tudo, mas estava esperando
uma oportunidade.
Ela deu uma risadinha e voltou a tricotar.
— Vocês jovens acham que conseguem enganar nós velhos.
Nós sabemos muito mais sobre a vida do que vocês.
— Mas eu também preciso confessar que...
— Rafael não é o pai — ela completou.
Meu Deus do céu.
Minha avó era vidente agora?
— Como a senhora sabe?
Ela deu uma risadinha.
— Você não ouviu o que eu disse agora há pouco? — Ela me
encarou. — Claro, também há o fato de que o menino estava há
meses nos Estados Unidos e, pelo telefone, não haveria meios de
fazer um filho em você.
Bem, nisso ela tinha razão.
Nós caímos em um silêncio angustiante por um bom tempo.
Até que ela suspirou e disse:
— Quer me contar quem é o pai da criança? E por que você e
o Rafael estão fingindo ser uma coisa que não são? Quer dizer,
você está fingindo... ele não está fingindo tanto assim, não.
— Como assim?
— Ele parece estar levando isso muito mais a sério.
Esparramei-me no sofá e levei uma almofada até meu rosto.
Como eu ia explicar aquela confusão toda para minha avó vidente?
Mesmo assim, tomei fôlego e comecei a contar tudo, desde o
começo.
Ela ouviu.
Ouviu.
Ouviu.
E quando eu parei de falar, ela ainda ficou um tempo em
silêncio.
— É uma pena que o pai da criança não seja o Rafael. Ele
seria um pai maravilhoso.
Quase choraminguei, porque eu sabia que isso era a pura
verdade.
— Mas não há o que fazer — declarei, derrotada. — Ainda não
entendi bem o que o Rafa quer comigo e nem aonde ele quer
chegar, mas... sei lá. — Bufei, olhando para minha barriga. — Ele é
um bom amigo. Sempre foi. Vai ser bom ter alguém ao meu lado
neste momento.
— Eu estarei ao seu lado, querida — minha avó disse, de
forma tranquilizadora. — Em todas as situações.
Levantei-me e ajoelhei aos seus pés, entrelaçando suas mãos
nas minhas.
— Eu te amo, vó. Obrigada por me apoiar.
Ela sorriu.
— Sempre, querida. Sempre.
Nós sorrimos uma para a outra e ela depositou um beijo na
minha testa. Foi nesse momento que uma buzina quebrou o nosso
momento ternura.
— O menino chegou — vovó disse, quando eu me levantei e
ajeitei minha roupa.
Eu tinha colocado um vestido azul-marinho, com decote V e
mangas curtas, que ia até os joelhos. Não sabia a que tipo de lugar
ele me levaria, mas eu queria estar, ao menos, apresentável.
— Estou bonita? — perguntei, olhando para minha própria
roupa.
— Está linda. — Vovó sorriu. — O menino vai se apaixonar.
Eu ri.
Bem alto.
Primeiro, porque não era a primeira vez que Rafael me via
bem-arrumada. Segundo, que se fosse para ele se apaixonar por
mim, isso já teria acontecido, anos atrás.
— Tudo o que o Rafa sente por mim é uma bela amizade, vó
— falei, depositando um beijo na sua cabeça. — Agora, eu vou
nessa, porque ele odeia atrasos.
Peguei minha bolsa em cima do sofá e fui na direção da porta.
— Devo esperá-la? — vovó perguntou, antes que eu saísse.
Mordi o lábio, sem saber o que responder.
Rafael era um exímio safado e eu não sabia se teria muito
controle para me segurar, ainda mais depois do beijo que ele me
deu, na segunda anterior, que me deixou sem fôlego até agora,
praticamente.
— Nem precisa responder. — Vovó riu.
— Talvez, vovó!
Abri a porta e saí de casa. Estava bem escuro do lado de fora,
mas algumas lamparinas do jardim iluminavam o quintal, então
consegui vislumbrar Rafael encostado do lado de fora do carro.
Agradeci aos céus por ter escolhido um vestido bonito, porque
ele, francamente, estava maravilhoso em um terno escuro de corte
impecável, somente sua camisa branca se destacava.
— Olá, Rafa. — Fechei o portãozinho e me virei para ele. —
Você está bonito.
Rafael me encarava de um jeito que eu sabia o que significava.
Aquele olhar intenso, que fazia minhas pernas tremerem.
Pelos céus.
— Olá, Sofia. — Ele estendeu a mão e pegou a minha. —
Você está belíssima — completou, depositando um beijo.
Minhas bochechas coraram.
Apesar de já ter indo para a cama com Rafael, anos atrás, era
incrível como ele ainda tinha o poder de me fazer corar. Mas é claro
que isso se devia ao fato de ele ser, além de tudo, um grande
cavalheiro.
Pensando nos meus ex, nenhum chegava aos pés do
cavalheirismo de Rafael.
E isso era assustador.
Um homem como ele, solteiro e cheio de posses...
Como diria Jane Austen, em Orgulho e Preconceito:

“É uma verdade universalmente reconhecida que um homem rico e


solteiro precisa de uma esposa.”

Céus.
O problema era que quando esse dia chegasse, mulheres do
mundo inteiro certamente chorariam.
— Vamos? — Rafael interrompeu meus pensamentos.
— Claro, desculpe. Obrigada pelo elogio.
Ele sorriu e abriu a porta do carona para mim.
Rafael estava com outro carro, um SUV preto, muito bonito.
— Trocou de carro? — perguntei, enquanto colocava o cinto.
— Não... apenas tirei este da garagem. — Ele sorriu. — O
outro já está sendo preparado para você.
Ah, o acordo envolvendo a EcoSport, claro.
Rafael ligou o carro e nos levou pelas ruas de São Paulo até
um restaurante na área mais rica da cidade. Quis xingá-lo por fazer
isso, mas ele apenas deu um sorriso e disse que a comida
compensava o valor.
O restaurante era lindo.
Ele era decorado de forma rústica, mas também havia
bastante vegetação ao seu redor. Na parte de trás, segundo Rafael,
havia um jardim e alguns bancos para sentar e aproveitar o clima.
Havia também uma música ambiente, música clássica. Era um lugar
aconchegante.
Rafael me guiou até o mezanino, onde uma mesa muito bem-
arrumada já nos esperava.
— Tenho que confessar uma coisa — ele disse, assim que nos
sentamos e o garçom nos entregou os cardápios.
— O quê?
— Eu comprei este restaurante.
Arregalei os olhos levemente.
— Sério?
Ele balançou a cabeça afirmativamente.
— Que bom, Rafa. — Sorri de volta e pousei minha mão sobre
a dele em cima da mesa. — Fico feliz por você estar realizando
todos os seus sonhos.
Ele me encarou e sorriu singelamente.
— Você é a primeira pessoa que eu trago aqui, desde então.
Meu coração se apertou. Um pouco por alegria, nessa frase
que toda mulher gostaria de ouvir, mas também de tristeza por
saber que aquilo era apenas amizade.
Ah, como seria bom se esse homem realmente me amasse.
— Obrigada, Rafa. — Recolhi minha mão e voltei a me atentar
ao cardápio.
Nós escolhemos os pratos. Uma entrada de saladas e o prato
principal: massa, porque era o que mais gostávamos de comer.
Rafael pediu vinho para ele e uma jarra de suco de laranja para
mim, já que eu não podia beber álcool.
Quando o garçom voltou com nossos pedidos, Rafael pegou
da mão dele e disse que podia deixar por sua conta.
Habilmente ele me serviu, o que me deixou um pouco
desconfortável enquanto olhava para seus braços fortes e suas
mãos viris segurando a jarra, despejando o líquido em minha taça.
O olhar de Rafael encontrou o meu e eu tive que desviar. O
que eu estava pensando, pelo amor de Deus? Àquela altura, até no
meio das minhas pernas já começava a sentir uma leve pressão.
Os médicos diziam que mulheres grávidas tinham um apetite
sexual maior do que o normal.
Se isso fosse verdade, que Deus me ajudasse.
Rafael encheu sua própria taça e sorriu novamente para mim.
— Você está calada hoje, Sof. Aconteceu alguma coisa?
— Não... eu só estou pensando em algumas coisas.
Tipo, em como seria bom suas mãos no meio das minhas
pernas.
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Que me envolva diretamente?
Ah, danadinho. Ele sabia.
Dei de ombros.
— Quem sabe.
Rafael pegou a taça e a ergueu, como em um brinde.
— Ao bebê que você está esperando? — ele perguntou.
Ergui minha taça também e abri um sorriso tímido.
— Ao bebê.
Nós sorrimos um para o outro e brindamos.
Rafael e eu comemos, bebemos e conversamos sobre coisas
aleatórias. Com ele era fácil conversar, rir e debochar de situações
engraçadas. Com ele eu me sentia leve, animada, conseguia
enxergar as coisas de outras perspectivas.
Com ele eu conseguia esquecer que o pai do meu bebê era
um cretino, que queria que eu abortasse.
— Espero que Paulo não tenha dado às caras — Rafael falou,
erguendo uma das sobrancelhas.
— Ele não apareceu.
Rafael relaxou no assento.
— Ótimo. Espero que ele não apareça mesmo — ele disse
baixinho, mas eu ouvi.
— Como disse?
Ele me encarou.
— Ahn, como está a sua avó?
— Está bem — disse, pousando o talher no meu prato. —
Semana que vem tem consulta com o médico bonitão. Ela está toda
animada.
Rafael riu abertamente.
— Sua avó é demais. Eu gosto muito dela.
— Ela também gosta muito de você. Inclusive, ela acha que eu
deveria lhe fazer uma proposta.
— Ah, é? Qual? — ele perguntou, interessado. — Se for um
namoro de mentira, incluindo ser pai de mentira, já estamos nessa.
Eu ri.
— Não é isso. — Balancei a cabeça. — Ela acha que eu devo
abrir um café, tipo uma doceria, para poder vender as guloseimas
que eu gosto de fazer. Ela acha que eu devo fazer uma sociedade
com você.
Os olhos de Rafael brilharam de interesse.
— Eu me lembro que você comentou algo sobre abrir um café,
alguns anos atrás, mas depois não disse mais nada. Desistiu do
sonho?
— Não, é que... — Olhei para a minha taça vazia e suspirei. —
É um dinheiro que eu não tenho. Bom, agora talvez eu possa vender
o carro que você vai me dar e com o dinheiro dele conseguir realizar
esse sonho.
Rafael assentiu e bebeu o restante do vinho.
— Podemos conversar sobre isso em outro momento. Eu
adoro investir meu dinheiro.
— Talvez, quem sabe. Se bem que... acho melhor não — falei,
encarando-o novamente.
Nós já tínhamos negócios demais “em comum”, se assim
pudéssemos dizer.
Eu só esperava que nosso acordo e nossa amizade não
chegassem ao fim quando tudo isso acabasse.
Rafael me encarou por um longo instante. Depois pediu a
sobremesa.
Rafael

Sofia comeu uma sobremesa gigantesca.


— Agora estou comendo por dois — disse ela, com a boca
cheia.
Eu ri.
Então quando acabamos, convidei-a para ir ao meu
apartamento. Sabia que irmos até lá poderia culminar em outras
coisas bem prazerosas e eu tinha quase certeza de que ela também
sabia, pois seu olhar se demorou por um longo instante em meu
rosto, antes de dizer sim.
— Quero mostrar a decoração do meu apartamento — disse,
mas depois me arrependi.
Que desculpa dos infernos era aquela?
Era óbvio que eu queria ficar a sós com Sofia, para
conversarmos mais e... se rolasse algo, pelos céus, eu estaria
completamente preparado. Na realidade, eu estava ansioso. Como
um menino na puberdade.
E, sinceramente, eu ainda entendia por que estava daquele
jeito.
— Você ainda mora no mesmo prédio? — ela perguntou. —
Digo, acho que a última vez que você se mudou faz um ano, não é?
— Acho que sim..., mas eu mudei de novo. — Sorri, enquanto
a guiava até o carro. — E acho que você vai adorar a vista do novo
apartamento.
O caminho até meu apartamento foi tranquilo. Não
conversamos muito, o que foi um grande erro, porque cada vez que
eu olhava para Sofia e a via tão linda naquele vestido, já ficava
extasiado, pensando em quantas formas existiam para que eu
tirasse aquele vestido.

1 – Com os dentes.
2 – Usando uma tesoura. Mas aí corria o risco de machucá-la.
3 – Agindo como uma pessoa normal e abrindo o zíper.

O problema era que agir como uma pessoa normal estava


praticamente fora de questão. Nada que Sofia e eu fazíamos
entrava nessa categoria.
Após estacionar o carro, ajudei Sofia a sair e segurei a mão
dela, entrelaçando nossos dedos enquanto íamos até o elevador.
— É realmente necessário andarmos assim? — ela perguntou,
erguendo nossas mãos.
— Se é pra fingirmos, vamos fingir corretamente.
Ela riu e eu tive que me controlar para não a beijar ali mesmo e
testar todas as teorias que minha mente estava projetando dentro
do carro.
O elevador abriu e nós entramos. Então eu mandei ao inferno
todo o autocontrole e a prensei contra a parede, colando minha
boca na dela.
Ansiava por aquele beijo desde que o último se encerrou na
frente da casa dela.
Sofia ficou surpresa por alguns instantes, mas logo se rendeu,
deixando que eu invadisse sua boca com a minha língua,
saboreando-a com vontade e loucura.
Uma maldita semana inteira que eu precisei esperar para
aquele momento.
Ela espalmou as mãos em meu peito e eu a puxei para mais
perto, segurando sua cintura com força.
Céus, ela era deliciosa.
Então o elevador parou e fomos obrigados a nos separar.
Ela estava vermelha, linda com os cabelos loiros um pouco
despenteados. O peito subindo e descendo com a respiração
agitada.
— Meu Deus, Rafa — ela murmurou, levando uma mão ao
peito e deu uma risadinha, constrangida.
Puxei-a pelo corredor que ligava à minha sala de estar.
Ela olhou ao redor e lentamente seus olhos se arregalaram.
— Meu Deus, você comprou a cobertura?
— Comprei. — Soltei a sua mão e me sentei no sofá. — Senta
aqui no meu colo, porque tem uma coisa que não terminamos no
elevador.
Ela nem me deu bola. Saiu olhando o apartamento todo, quer
dizer, pelo menos as áreas da sala de estar, cozinha que era
integrada e se apaixonou pela vista.
Sofia foi até as vidraças da sala, que davam para uma enorme
sacada e um jardim que eu ainda estava construindo. Ela deslizou a
porta de vidro e olhou para fora.
— Meu Deus, até piscina tem! — Ela se virou para mim,
encantada. — Que lindo, Rafa! Você é um homem de sorte.
Bem, eu seria mais, se ela simplesmente tivesse aceitado se
sentar em meu colo para terminarmos a conversa do elevador. Mas
isso eu não diria em voz alta. Ainda tínhamos a noite inteira.
— Não faça essa cara. — Ela apontou o dedo para mim.
— Que cara?
— Essa de tédio. Você disse que queria que eu viesse aqui
para me mostrar o apartamento. E aqui estou. Quero ver tudo.
Ela voltou a olhar para o lado de fora e eu respirei fundo. Sofia
tinha razão, eu estava me comportando como um animal no cio.
Levantei-me e me aproximei dela.
— Quer nadar um pouco? — perguntei, bem próximo ao seu
ouvido.
— Eu não trouxe roupa pra isso.
— Não precisa de roupas. Aqui é tão alto, que ninguém
consegue ver.
Ela ficou em silêncio por alguns instantes e depois se virou
para mim.
— Bom, quem sabe depois. — Ela deu um sorrisinho safado e
voltou para a sala.
— Seu apartamento ficou lindo. — Ela parou no meio do
cômodo, admirada, olhando ao redor. — Parece coisa de filme.
Tirei o terno e o joguei em cima de uma poltrona.
Aproximei-me por trás novamente e desta vez passei os
braços pela sua cintura, trazendo-a para mim.
— Você gostou? — sussurrei em seu ouvido.
— Aham.
Sofia amoleceu em meus braços.
— Tem outras partes da casa que posso te mostrar também.
— Ah, é?
Ela fechou os olhos e eu depositei um beijo demorado em seu
pescoço.
— Quer beber alguma coisa? — perguntei. — Eu te ofereceria
algo alcoólico, mas você não pode. Faz mal ao bebê.
Sofia assentiu e se afastou de mim, mais uma vez.
— Suco, eu posso beber.
— Que seja suco, então.
Fui até a cozinha e peguei na geladeira uma garrafa de suco
de laranja. Despejei o líquido em um copo e o entreguei a ela, que
ainda estava parada no meio da sala, admirada com tudo.
— Obrigada. — Ela sorriu e pegou o copo da minha mão. —
Estou muito feliz por você. O outro apartamento já era lindo, este
então...
Afastei-me de Sofia e me sentei no sofá.
— Venha aqui — a chamei, com o dedo indicador, apontando
para o meu colo.
Dessa vez ela não fugiu. Sofia se aproximou, abriu as pernas e
se encaixou no meu colo, tomando cuidado para não derramar o
suco.
— Está bom assim, namorado? — perguntou, passando uma
mecha de cabelo atrás da orelha.
— Vai ficar melhor — murmurei, praticamente hipnotizado.
Sofia sorriu, bebericou o restante de suco e deixou o copo na
mesinha ao lado.
Então percebi seu desconforto.
— Por que está agindo assim? — Segurei seu rosto levemente
e a fiz me encarar. — Algo de errado?
Ela suspirou.
— Nada de errado.
— Então, por que está fugindo?
— Não estou fugindo. — Ela colocou as mãos em meus
ombros. — Mas... eu sei o que você quer e não sei se isso é uma
boa ideia.
— Por que não seria?
Ela olhou para cima.
— Eu estou grávida, Rafael.
— Não vejo qual o problema nisso.
— De outro!
— Você quer ficar com ele? É isso? — Arqueei uma
sobrancelha. — Se quiser, eu...
— Não é isso! — Ela deu um tapa em meu ombro. — Deus me
livre voltar a ficar com aquele cara. O problema é que...
— É que...?
Ela me encarou.
— E se envolver sentimento? Eu estou grávida, minhas
emoções estão ficando à flor da pele.
Respirei fundo.
Segurei o rosto de Sofia entre as mãos. Eu nunca tinha
reparado realmente na sua beleza.
Seus cabelos loiros emolduravam seu rosto pequeno e
delicado. Seus lábios carnudos gritavam, pedindo que eu os
beijasse novamente. Seus olhos carregavam um brilho que, pela
primeira vez, eu queria me perder neles.
Eu conhecia Sofia..., mas agora parecia que eu a conhecia de
verdade.
— Se você não quiser fazer isso, eu vou entender. Podemos
encerrar aqui. Não quero te pressionar a nada.
Ela me fitou, surpresa.
— Você quer encerrar?
— De jeito algum — respondi, sendo bem sincero. — Mas não
quero que faça nada obrigada. Isso, sim, estragaria a nossa
amizade.
Ela olhou para cima novamente, um claro sinal de que sua
cabecinha estava pensando em toda aquela situação.
A verdade era que nem eu mesmo entendia por qual caminho
estava levando aquela história. Eu só sabia que queria Sofia, queria
seu corpo, mas também queria ajudá-la com a criança. Queria estar
ao seu lado agora que estava praticamente sozinha.
— Acho que estamos falando e pensando demais, Rafael.
Ela sorriu. Eu sorri de volta.
Sofia tinha razão.
Coloquei minhas mãos em seu quadril e os trouxe mais perto
de mim. Sofia entrelaçou os braços em meu pescoço e nossos
lábios se uniram em um beijo extasiante.
Enquanto nossos lábios se moviam, subi minhas mãos pela
sua cintura, sentindo o tecido do vestido deslizar. Então segurei sua
cabeça com firmeza e exigi mais de seus lábios, colocando mais
pressão. Minha língua reivindicando a sua.
Sofia não me decepcionou. Ela se entregou ao momento.
Quando o ar foi necessário, ela virou o rosto e eu comecei a
explorar seu pescoço e depois o seu colo.
— Sentiu falta disso? — perguntei, deslizando meus lábios
bem devagar.
Ela ergueu mais a cabeça, como um gatinho quando quer
carinho.
— Senti.
Ela pressionou meus ombros e se aconchegou mais perto.
Minhas mãos deixaram suas costas e eu passei a acariciar
seus seios por cima do tecido.
— E disso?
Ela gemeu.
— Ai, Rafa!
Dei uma risadinha. Pressionei-os novamente.
— Sentiu falta disso?
— Senti.
Voltei a beijá-la nos lábios, desta vez bem devagar.
Saboreando o momento. Sofia enfiou os dedos entre os meus
cabelos e depois acariciou meu rosto.
— Preciso te mostrar o restante da casa — falei, entre um
beijo e outro.
— Agora? — Sofia murmurou, surpresa.
— Aham.
Então me levantei e a levei junto em meu colo.
Sofia deu um gritinho e nós rimos enquanto eu seguia pelas
escadas até o andar de cima.
— Sorte sua que eu ainda estou leve — ela disse, quando eu
já estava nos últimos degraus.
— Sorte a sua que eu sou um homem fitness.
Sofia riu.
Meu quarto tinha uma vista impressionante, mas nada daquilo
importava agora.
Liguei uma meia luz, apenas para nos guiarmos e porque eu
queria vê-la a todo momento. Então coloquei-a sentada na cama.
— Uau, a sua cama é demais — ela comentou, impressionada,
enquanto eu tirava a gravata e o colete, deixando-os em cima de
uma poltrona. — Acho que dá duas da minha.
Aproximei-me dela novamente e subi na cama, fazendo-a se
deitar.
— Você é exagerada. — Dei um beijo rápido em sua boca.
— Exagerada nada. Olha esse colchão, que macio...
Depositei um beijo no seu pescoço. Já estava cada vez mais
louco de desejo.
— Vamos ficar falando de colchões? — perguntei.
— Não. Mas você deve concordar comigo que o seu colchão é
maravilhoso.
Explorei sua clavícula com a língua. Logo Sofia começou a
arquear.
— Bem, podemos testar a eficácia dele com atividades boas
para o corpo humano — falei, encarando-a novamente.
Sofia suspirou.
Ela me olhou por um longo instante.
Então eu me perguntei por que deixamos tanto tempo passar.
Nós gostávamos da companhia um do outro, gostávamos do sexo.
Por que simplesmente paramos?
Claro que na época eu não queria relacionamentos. Talvez eu
ainda nem quisesse, mas...
— Seu cheiro é maravilhoso — ela disse, interrompendo meus
pensamentos.
Seus dedos começaram a abrir os botões da minha camisa.
Um por um.
— É o mesmo perfume de sempre — falei, fechando os olhos
quando ela se esticou e começou a beijar o meu pescoço.
— Hummm. Depois que ficou rico, então não começou a
comprar perfumes caros?
— Tenho um ou outro — confessei. — Mas esse ainda é meu
favorito.
Ela passou a língua perto da minha orelha.
— Eu gosto desse.
Céus.
Daquele dia em diante eu compraria dez caixas daquele
perfume.
Sofia se deitou novamente e riu.
— Pronto, agora é só você tirar a sua camisa.
Levantei-me e tirei a camisa, jogando-a no chão. Então estendi
a mão e a puxei para que ficasse em pé.
— Sabia que no carro eu estava pensando em quantas formas
eu podia arrancar esse vestido de você? — deslizei a mão pelo seu
rosto.
— Já imaginava. Você me olhava de uma forma intensa.
— Bem, então como você prefere? — perguntei, um dedo
descendo pelo decote. — Que eu arranque com os dentes ou que
eu faça como alguém normal?
Ela arregalou os olhos e riu.
— Como alguém normal, por favor.
— Então vire-se, por favor.
Sofia obedeceu no mesmo instante. Encontrei o zíper do
vestido e o abri lentamente.
A pele de Sofia era alva e macia. Me perdi enquanto o vestido
deslizava até seus pés e eu depositava beijos em seus ombros.
— Rafa... — ela gemeu.
Ela não estava usando sutiã, apenas uma calcinha de renda
preta.
— Sofia — murmurei em seu ouvido.
Levei minhas mãos aos seus seios, macios e grandes.
Deliciosos. Acariciei os bicos rosados com as pontas dos dedos.
Sofia se encostou em mim e gemeu.
— Ahh, Rafa...
— Isso é só o começo, querida.
Virei-a de frente para mim e a fiz se deitar na cama
novamente. Subi por cima dela e tomei um dos seus seios na boca,
sugando-o com força. Sofia se retorceu, pedindo por mais.
Segurei-os na mão, levantando-os para mim. Eles eram o meu
presente e eu queria provocar em Sofia todas as sensações
possíveis, por isso continuei chupando-os, provocando-os. Um de
cada vez.
Ela era tão deliciosa.
Eu só conseguia me perguntar como eu consegui ficar tanto
tempo longe dela.
Ah, é claro. Nossa amizade.
Amizades verdadeiras não permitiam esse tipo de situação.
Mas talvez, aquela amizade tivesse chegado ao fim.
— Rafa! — Ela arfou. — Por favor.
— Por favor, o quê? — perguntei em seu ouvido. — O que
você quer, Sofia?
— Quero mais!
— Então você vai ter.
Abandonei seus seios e desci beijando sua barriga enquanto
puxava sua calcinha e a jogava longe. Abri as pernas de Sofia e
depositei vários beijos em suas coxas, até encontrar sua intimidade.
Então deslizei minha língua no seu local quente e úmido.
Ela me encarou, surpresa, e depois deitou a cabeça
novamente. Provavelmente não esperava que eu fizesse isso de
primeira.
Suguei-a com vontade.
Sofia adorava sexo oral e eu também gostava de oferecer isso
às mulheres com quem eu saía. Se uma mulher conseguisse
alcançar o orgasmo através da minha boca, eu já me sentia
satisfeito.
Deslizei minha língua em seu centro, sentindo seu gosto.
Chupei-a de forma que ela se arqueava, pedindo por mais. Cada
vez estava mais ansioso por penetrar seu corpo e fazê-la minha.
Mais uma vez.
No entanto, eu queria que ela alcançasse o prazer em primeiro
lugar.
Sofia se debatia, gemia e arqueava querendo mais. E eu
obedeci. Levei-a à loucura, até que percebi seu corpo tremendo com
aquelas sensações maravilhosas.
— Ah, meu Deus, Rafa. — Ela me fitou. — Você me matou.
Eu sorri e aproximei meu rosto do dela.
— Ainda não acabou, gatinha.
Ela sabia disso.
Levantei-me da cama e tirei a cueca. Ela olhou para o meu
pênis com desejo.
Estávamos no caminho certo.
Subi na cama e me posicionei na entrada dela.
— Ahn, você quer que eu coloque camisinha? — perguntei,
lembrando-me desse detalhe.
Ela deu uma risadinha, suas pernas abraçando minha cintura.
— Acho que não dá para eu engravidar, já estando grávida.
Dei risada. Só ela mesmo para me fazer rir em um momento
como esse.
— Eu digo, porque faz anos que...
Ela acariciou meu rosto.
— Eu confio em você, Rafael.
Isso foi como um bálsamo em minha alma.
Penetrei-a lentamente, olhando bem fundo dentro de seus
olhos.
E a sensação, meu Deus, foi como um déjà vu4.
Na verdade, era um déjà vu. Eu já tinha estado ali naquele
corpo, anos antes. Mas talvez agora as coisas fossem diferentes.
Decidi ir com calma.
Comecei a estocá-la lentamente, acostumando nossos corpos
que haviam ficado separados por tanto tempo. A sorte era que eles
se lembravam exatamente de como era essa sensação e nos
encaixamos com perfeição.
— Ah, Sofia! — gemi, sentindo-a apertada e quente ao meu
redor.
— Quero tudo de você, Rafael — ela disse baixinho.
Intensifiquei os movimentos, estocando-a com mais força.
Ela era tão deliciosa.
Ela me levava à loucura.
Fazia tempos que eu não me sentia dessa forma. Completo.
Mesmo saindo com mulheres de várias partes do mundo.
Mudei nossas posições, colocando Sofia por cima de mim.
— Eu quero que você me monte — falei. — Você se lembra
como eu gosto disso?
— Lembro, sim.
Segurei seus quadris e a guiei da forma que eu queria. Era
glorioso ver seus seios subindo e descendo, enquanto nossos
corpos se moviam em compasso.
Uma verdadeira dança erótica.
Deixamos os receios de lado e nos entregamos ao momento.
Cada vez que ela descia sobre o meu corpo, eu me sentia completo.
Então o orgasmo veio. O dela novamente, depois o meu.
E foi tudo o que eu havia imaginado.
Aliás, tinha sido até melhor.
Sofia abriu os olhos e se deixou cair ao meu lado na cama.
Virei-me para ela e acariciei seus cabelos.
Respirávamos com dificuldade. Estávamos ambos suados.
Olhamo-nos com intensidade.
Palavras que não saíam de nossos lábios, mas podiam ser
vistas em nossos olhares.
Sorrimos um para o outro.
E eu soube que eu estava perdido.
Não havia outro corpo que eu queria que não fosse o de Sofia.
Rafael

Abri os olhos com a claridade do dia invadindo meu quarto.


Havia me esquecido de puxar as cortinas escuras para amenizar a
situação.
Senti um corpo quente agarrado ao meu, então sorri ao me
lembrar dos acontecimentos da noite anterior. Aliás, de quase
metade da madrugada toda.
Puxei meu celular da mesinha de cabeceira e resmunguei ao
ver o horário: 8h45, o que não teria problema algum se eu não
tivesse que estar na empresa às 9h.
— Sof? — chamei-a baixinho.
Ela resmungou e se virou para o outro lado.
O lençol a descobriu, deixando-a parcialmente nua.
— Hey... — Depositei um beijo em seu ombro. — Acorda,
preguicinha.
— Por quê? — Sofia se virou para mim e jogou os braços ao
redor dos meus ombros. — Sua cama é tão deliciosa.
— Só a cama? — Depositei um beijo rápido em sua boca.
— Outras coisas também.
Sofia ficou com as bochechas vermelhas e eu sorri.
— Gostou da noite passada?
— Mais do que deveria.
— É, acredito que eu também... — confessei. — E eu queria
aproveitar o dia todo com você, mas... o dever me chama.
— Você é um homem sério, de negócios... — Ela colocou um
dedo em meus lábios. — Precisa dar exemplo aos funcionários.
Eu sorri.
— Que horas você entra hoje no trabalho? — perguntei.
— Hoje é quarta, né... — Ela bocejou. — Hoje a Aninha tem
natação, então posso entrar um pouco mais tarde.
Eu não deveria, mas já estava excitado e meu dia seria um
completo fracasso se eu fosse trabalhar sem aproveitar a
oportunidade que estava à minha frente.
— Eu acho que posso me atrasar um pouquinho. — Enfiei a
cabeça no pescoço de Sofia e comecei a espalhar beijos.
— Sorte a sua que é o chefe, então.
Ela riu e eu me coloquei por cima dela.
— Você me deixa louco, Sofia.
— Rafael...
Meu nome em seus lábios era como música aos meus
ouvidos.
Então me perdi em seu corpo novamente.

Quando saí do banheiro, Sofia estava de lado, se olhando no


espelho.
— Minha barriga já começou a crescer.
— Já, sim. — Aproximei-me e apoiei as mãos em seus
ombros. — E vai ficar linda quando estiver maior.
Ela bufou e se afastou.
— Você só está dizendo isso para me animar. Sei que vou ficar
gorda, com estrias e provavelmente nada desejável.
Sofia foi até a cama e calçou seu sapato.
— Não fale assim. É o processo natural de uma gravidez. O
corpo muda, várias coisas mudam. — Me agachei onde ela estava
sentada e a ajudei. — Você precisa lidar com isso, mas se quiser,
conheço alguém que pode te ajudar psicologicamente nesse
processo.
— Uma psicóloga?
— Sim, é uma amiga que conheci através do Cardoso. Eles
trabalham no mesmo hospital — expliquei. — Veja bem, quero que
você saiba que vou estar ao seu lado em todo esse processo, mas
se você perceber que não é o suficiente, não hesite em me falar.
Rebeca é uma ótima psicóloga.
Sofia assentiu e eu peguei suas mãos, depositando um beijo
demorado em cada uma delas.
— Vamos? — Levantei, puxando-a junto. — Podemos tomar
café no caminho.
— Vamos, então.
Eu estava atrasado, mas não podia deixar Sofia com fome.
Primeiro levei-a até sua casa para trocar de roupa e, depois, a levei
em uma cafeteria que eu gostava muito e ali tomamos um café da
manhã bem caprichado.
Depois levei-a para o apartamento de Julia e Andrew.
— Então é isso — falei, ao estacionar o carro em frente ao
edifício. — Vai conversar com a Julia hoje?
Ela assentiu.
— É melhor. Ainda mais agora que minha avó sabe.
— Você vai contar quem é o pai? — perguntei, devagar.
Ela olhou para a janela.
— Não sei. Se Julia perguntar, sim. Bem, a quem eu quero
enganar? É claro que ela vai perguntar. — Sofia riu. — Mas vou ser
sincera com ela. Sua irmã é de confiança e acredito que não irá me
julgar.
— Não mesmo. — Segurei o rosto de Sofia e depositei um
beijo em sua testa. — Depois quero que me passe os dados do
médico que você está se consultando.
— Pra quê? — Ela arqueou uma sobrancelha.
— Porque quero ver se ele é bom mesmo — respondi. — Você
merece se consultar com os melhores médicos.
Sofia corou novamente e me deu um selinho rápido antes de
sair do carro. Observei-a entrando no prédio e me afundei no banco.
Eu estava assumindo aquela paternidade, essa era a verdade.
Mas o que eu podia fazer?
Sofia era uma das melhores pessoas que eu já havia
conhecido na minha vida. Não merecia passar por tudo isso sozinha
ou, pior, ao lado daquele moleque que se achava homem.
Liguei o carro e acelerei.

— Bom dia, chefe — Graziela, minha assistente, me


cumprimentou, assim que ultrapassei o elevador.
— Bom dia, Grazi — cumprimentei-a de volta. — Tive um
imprevisto e atrasei um pouco.
Ela me estendeu um papel com tudo o que eu precisaria fazer
no dia, enquanto caminhávamos até minha sala.
— Reunião com o Cardoso? O que diabos ele quer?
— Acredito que ele quer ver alguma coisa para o hospital.
Algum sistema novo.
Cardoso havia se dado bem ao conseguir trabalhar em um
hospital particular famoso em São Paulo. Ele agora era um dos
sócios e estava muito bem de vida.
Abri a porta da minha sala e entrei.
— Às 16h, reunião com Juliano Sassarich... — continuei,
olhando para o papel.
— É, mas você se esqueceu que às 10h teria uma reunião
comigo. — A última voz que eu gostaria de ouvir no mundo ecoou
de dentro da sala.
Parei de andar e ergui a cabeça.
Marcelo, Fernanda, Paulo e Andrew estavam sentados no
sofá, tomando uma xícara de café.
Olhei para minha assistente, com o famoso olhar “que diabos
está acontecendo aqui?”, porque eu realmente não me lembrava de
ter marcado uma reunião com a trupe dos infernos.
Exceto meu cunhado, é claro.
Aliás, depois eu precisaria perguntar a ele o que diabos estava
fazendo ali com aquelas pessoas.
Ela deu um meio sorriso.
— Você mandou remarcar a reunião de semana passada e o
único dia que eles podiam era hoje.
— Às 10h da manhã? — perguntei, cerrando os dentes.
Ela deu outro meio sorriso.
— Desculpa, achei que...
— Não importa. — Devolvi o papel a ela com raiva e coloquei
minha pasta em cima da mesa.
De Graziela, eu cuidaria depois... assim como de Andrew,
aquele traidorzinho que certamente só estava ali pensando em
dinheiro.
— Bom dia. — Eles se levantaram assim que me aproximei e
cumprimentei a todos. — Peço perdão, mas minha assistente se
esqueceu de me avisar que a reunião com vocês havia sido
remarcada para hoje.
Até porque eu esperava outro cliente. Não esses. Que nem
clientes eram.
— Falei, sim, você que...
Olhei para ela com as palavras “fique calada” nos olhos.
— Não falou. Se tivesse falado, eu estaria aqui no horário.
Graziela engoliu em seco e abriu um sorriso tímido.
— É verdade, acredito que esqueci.
Fernanda olhou Graziela dos pés à cabeça e fez a sua mesma
cara de tédio de sempre.
— Tudo bem, Rafa. — Andrew mexeu os braços
despreocupadamente. — Sabemos como sua cabeça anda em uma
certa loirinha.
Olhei para Andrew. Sério que ele ia dar uma de tiozão das
piadas?
— Bem, então vamos nos sentar. — Apontei para eles se
acomodarem novamente. — Grazi, uma xícara de café sem açúcar,
por favor. E... café para os demais.
Ela assentiu e saiu correndo.
Então olhei para o trio do ano: Marcelo, Fernanda e Paulo, e
esperei que eles começassem a falar.

Marcelo falou pelo que pareceram horas.


E quando ele terminou, foi a vez de Fernanda. Que também
falou por horas. E quando ela terminou, Paulo entrou na conversa,
dando um verdadeiro chilique.
— Eu falei que seria perda de tempo vir aqui. — Paulo se
levantou. — Não estão vendo a cara dele?
— Bem, e qual é a minha cara? — perguntei, irônico.
Paulo me fulminou com o olhar.
— Senta aí, Paulo — Fernanda o censurou.
Ele se sentou, totalmente emburrado.
Respirei fundo. No final das contas, eles queriam uma
sociedade para poder reerguer a empresa.
Só que os termos deles eram absurdos.
Como Andrew não se pronunciava, eu abri a boca e disse:
— A proposta de vocês é ridícula. Eu até aceito essa
sociedade, se caso Andrew quiser mesmo. Mas eu quero 51%.
Marcelo arregalou os olhos.
— Quer 51% para você? Só pode estar louco.
Cruzei os dedos em forma de pirâmide.
— Acho que é justo para o que vamos ter que investir para
reerguer a sua empresa, meu caro. Já que vocês não foram
competentes o suficiente para comandá-la ao longo dos anos.
— Não fale coisas que você não sabe — Paulo latiu.
— Vai mandar o seu irmão calar a boca ou prefere que eu o
tire da minha sala? — Encarei Fernanda.
Todos ficaram em silêncio.
Então ela olhou para ele e, mesmo sem dizer uma palavra em
voz alta, disse tudo com o olhar.
Ele era patético. Um verdadeiro moleque mimado.
Ainda não imaginava como Sofia podia ter se enredado com
um babaca daqueles.
A verdade era que eu não queria entrar nessa jogada. Por
vários motivos. Mas eu também não podia discordar que uma vez
reerguida, aquela empresa valeria milhões.
Era, sim, um bom empreendimento.
Marcelo e Fernanda se entreolharam. Andrew me encarou com
um sorriso discreto. Ele sabia o quanto eu era implacável nos
negócios.
— E quanto tempo essa sociedade irá durar? — Marcelo
perguntou.
— Não sei... até eu conseguir triplicar o que vou investir?
Marcelo me encarou e então eu vi o mesmo olhar de ódio que
ele me dirigiu no dia em que me humilhou na sala de Fernanda, seis
anos antes.
Ele continuava o mesmo.
E a vida era tão engraçada, que agora não só ele me olhava
assim, mas Paulo também e, para ser um pouco sincero, até
Fernanda.
— Precisamos de um tempo para conversar sobre isso —
Marcelo falou, finalmente. — Podem nos dar algum tempo?
— O quanto precisarem. — Dei de ombros e me servi de mais
um pouco de café.
Marcelo assentiu e se levantou. Logo depois, Fernanda, Paulo
e Andrew também se levantaram.
— Logo lhe daremos a resposta.
— Tudo bem.
Não me dignei a levantar para guiá-los até a porta, porque
Graziela fez o serviço por mim.
Quando a porta se fechou, respirei fundo.
Que família dos infernos era aquela.
Como eu podia ter me deixado levar pela beleza de Fernanda?
Uma beleza que contrastava com o que verdadeiramente havia
dentro de si. Que diga-se de passagem, não era nada bom.
Será que Fernanda sempre estaria no meu caminho? Será que
o destino não podia nos afastar de uma vez por todas?
A porta se abriu novamente e achei que fosse Andrew, para
conversarmos sobre o que eu havia dito.
Mas eu me enganei quando o chilique começou:
— Por que está fazendo isso, Rafael? — Ouvi a voz de
Fernanda atrás de mim. — É vingança?
Ela parecia nervosa, mas ao mesmo tempo sua voz continha
traços de choro.
— Não sei do que está falando, Fernanda.
— Olha pra mim, seu idiota arrogante! — ela falou mais alto. —
Te afeto tanto, que nem me olhar você consegue?
Bem, isso foi a gota d’água.
Levantei-me com a xícara de café na mão e a encarei.
Fernanda deu alguns passos até ficar próxima de mim. Ela era
mais baixa que eu, mas a sua arrogância certamente era maior que
a minha.
— Acredito que a reunião já acabou e não temos mais nada
para conversar — falei, estendendo a mão para a porta.
— Você sabe o quanto essa empresa é importante para mim.
Não posso entregá-la de bandeja a você.
— Mas entregou a Marcelo, não foi? — Ergui uma
sobrancelha. — Não adianta, Fernanda. Seu choro, suas palavras,
não me convencem. Não mais. Desde aquele dia que eu vi quem
você era verdadeiramente.
Ela fechou os olhos.
— Eu sei que eu fui uma cretina com você, mas eu tinha os
meus motivos. Eu nunca amei o Marcelo, se é isso que você acha.
Eu precisava dele na época, afinal, ele já estava destinado a ser
meu marido desde que éramos crianças.
Beberiquei meu café e depois a fitei novamente.
— Eu não quero ouvir, Fernanda — falei, cansado. — Pouco
me importa quais eram os seus motivos. O que existiu entre nós
acabou. Não é vingança o que quero, é apenas dinheiro e, pelo
menos, isso a sua empresa pode me dar.
Talvez minhas palavras tenham soado duras demais, mas foi o
suficiente para fazer Fernanda deixar minha sala com as lágrimas
rolando pelo rosto.
Era para ser um dia feliz.
Eu tinha feito um sexo matinal maravilhoso com uma mulher
que realmente valia a pena.
Eu poderia até ter perdoado Graziela e Andrew pela falha de
ambos.
Eu poderia até ter perdoado o 7x1 que o Brasil levou da
Alemanha.
No entanto, parecia que o destino conspirava contra a minha
pessoa, trazendo tudo o que eu não queria de volta.
Afundei-me no sofá e peguei meu celular. Só havia uma
pessoa com quem eu queria falar naquele momento. E pouco me
importava se ela estava no horário de trabalho.
Que inferno!
Sofia

— Aninha, eu trouxe esses desenhos pra você. — Entrei no


quarto de estudos da menina, segurando algumas folhas que tinha
acabado de imprimir no escritório. — Acho que você vai gostar.
Aninha levantou os olhos e sorriu, animada.
— Obrigada, tia Sof.
Coloquei os desenhos na mesinha e me sentei na cadeira ao
seu lado.
— Como estão as aulas de natação?
Não senti muita animação quando ela respondeu:
— Eu gosto.
— Isso é bom... não é?
Ela levantou um ombro, exatamente como sua mãe e seu tio
faziam.
Abri a boca para falar, porém, meu celular começou a vibrar.
Olhei no visor e me surpreendi ao ver que era Rafael.
Levantei-me e me aproximei da janela, atendendo a ligação.
— Olá?
— Oi, Sofia. — Sua voz soou tensa.
— Tá tudo bem? — perguntei, já sentindo um aperto no peito.
— Poderia estar melhor.
— Problemas no trabalho?
Ele deu uma risada de escárnio.
— Antes fosse.
Fiquei em silêncio, esperando que ele continuasse.
— Eu sei que você está no horário de trabalho, mas se
importaria se eu fosse aí?
— Vir aqui? — Olhei para Aninha sentada na mesinha. Agora
era o momento de dar atenção a ela. — Não sei se é uma boa ideia,
Rafael.
Ele suspirou, parecia cansado.
— Por favor, Sofia.
— Tudo bem. — Bufei. — Só não quero levar bronca da Julia
por sua causa.
— Eu prometo me comportar.
— Acho bom.
— Além de tudo, eu sou tio da menina. Uma visita não faria
mal a ela.
— É, mas sabemos que você não está vindo visitá-la.
Ele riu e se despediu, alegando que logo chegaria.
Depois que ele desligou, fiquei um tempo olhando para o
celular.
Ah, Rafael...
Eu não queria, mas não havia meios de controlar os meus
sentimentos em relação a ele. Não quando ele era tão atencioso,
tão amigo, tão amante.
A noite foi maravilhosa.
Era extraordinário saber que ele me desejava. Porém, o
problema estava em saber onde o meu coração se encaixava
naquela história.
— Aninha, o tio Rafa está vindo aí.
— Sério? — Os olhinhos dela brilharam. — A gente podia ir ao
parque.
— Veremos, querida.

— Tio Rafaaaaaaa! — Aninha correu para os braços de Rafael,


assim que ele ultrapassou a porta.
— Minha princesa! — Rafael se abaixou e a pegou no colo. —
Como você está?
— Estou bem. — Ela sorriu e então eu me aproximei dos dois.
— Você não deu um beijo na tia Sof.
Rafael me encarou e sorriu.
— Realmente, que falha a minha! — Ele se aproximou e
depositou um beijo rápido em meus lábios.
Corei, provavelmente ficando da cor da blusa que Aninha
usava, que era um vermelho gritante.
— Você não deveria estar na natação, mocinha? — ele
perguntou, colocando-a no chão.
— Cheguei mais cedo — ela respondeu.
— A professora faltou — expliquei. — Colocaram outra no
lugar, que decidiu mandar a criançada embora mais cedo.
— E Julia, está em casa?
— Ela saiu assim que eu cheguei. Disse que precisava
resolver algumas questões com Andrew no escritório.
— Hummm. Por isso que Andrew não voltou para conversar
comigo — ele murmurou seus pensamentos em voz alta e eu o
encarei, sem entender. — Não é nada. Apenas negócios.
Assenti lentamente.
— Aninha, você não quer ir lá em cima brincar um pouco com
o Rabbit? A tia vai conversar um pouquinho com o tio, mas já vamos
lá pra brincar com você.
— Tá bom, tia.
Aninha saiu correndo escadaria acima e nós a observamos,
até ela sumir de vista.
— É sério que eles trouxeram o coelho? — Rafael me encarou,
incrédulo.
Dei de ombros, como se dissesse “e o que Andrew não faz por
essa garota”?
Rafael riu.
— Sua voz estava estranha ao telefone — comentei. — O que
houve?
Rafael deu um passo em minha direção, sem desviar os olhos
dos meus.
— Estava com saudade de você.
— Aff, que mentira.
Nós rimos.
Ele deu outro passo e me puxou para si.
— Queria repetir o que aconteceu ontem. O que acha?
Arregalei os olhos.
— Agora?
— Não! — Ele jogou a cabeça para trás e riu. — Você poderia
ir para a minha casa esta noite. De novo.
Encarei-o por alguns segundos e suspirei lentamente.
Agindo dessa maneira, as coisas ficariam cada vez mais
difíceis de serem levadas apenas como um “acordo”.
— Minha avó precisa de mim, Rafa.
Afastei-me dele e virei as costas. Caminhei até a janela da
sala. Então logo o senti atrás de mim, passando os braços pela
minha cintura.
— Mas eu também preciso. E sei que você também quer.
O maldito sabia mesmo.
— Mas existe uma linha tênue entre o que queremos e o que
podemos, Rafael. — Bufei. — Você não acha que quanto mais nos
relacionarmos, as chances de estragar a nossa amizade serão
maiores?
Rafael me soltou e esfregou o rosto.
— Não acho. É só nós aproveitarmos o agora, sem pensar no
amanhã.
— Ah, isso é tão fácil para você falar, né?! — Me sentei em
uma poltrona. — Eu estou grávida. Minhas emoções estão mais
intensas. Não quero me apaixonar por você.
Ele assentiu, como se aquilo tudo fosse normal.
— Quando nosso acordo chegar ao fim... — falei, encarando-o.
— Daqui a um mês... tudo bem pra você, se eu transar com o cara
da pizza?
— Que cara da pizza??? — Ele me olhou de forma assassina.
Eu ri.
— Estou apenas impondo os limites na nossa relação.
Rafael segurou meu queixo, não forte, mas também não muito
fraco.
— Nossa relação passou dos limites desde que entramos
nesse acordo, querida.
Fiquei em silêncio e ele me soltou. Ele se afastou e se sentou
em uma poltrona.
— Tem uma coisa que eu quero te falar.
— Sobre? — Ergui uma sobrancelha.
— Estou inclinado a me associar com Fernanda e Marcelo —
ele disse, devagar, talvez testando a minha reação. Quando viu que
eu não ia dizer nada, continuou: — No entanto, não tivemos uma
reunião muito boa. Paulo estava lá.
Soltei um palavrão.
— Sofia — ele me chamou. — Se esse sujeito te incomodar,
eu preciso que você me diga.
Bem, desde que havíamos voltado do sítio, Paulo não me
mandou nem uma mensagem. Agora que eu estava supostamente
“namorando” com Rafael, eu duvidava que ele aparecesse.
— Ele não me incomodou, até agora.
Rafael manteve seu olhar preso ao meu.
— Só prometa que vai me informar.
— Nossa, você está agindo como se ele fosse um homem
perigoso.
Rafael mexeu em sua gravata, como se estivesse sufocado.
— Um homem que se sente humilhado pode se tornar
perigoso da noite para o dia. Todo cuidado é pouco.
Assenti lentamente, pensando naquelas palavras.
Apesar do chilique que Paulo havia dado dentro do carro, eu
duvidava que ele fosse capaz de fazer algo ruim. Entretanto, Rafael
tinha razão.
— Já que você está aqui, vamos ao parque? — perguntei,
lembrando-me que Aninha havia sugerido antes de ele chegar.
— Vamos, claro.

— Ah, esqueci de te falar duas coisas — falei para Rafael,


enquanto caminhávamos no parque do Ibirapuera. Aninha andava
um pouco à nossa frente, com sua pequena bicicleta.
Apesar de ter quatro anos, ela já era bem avançada.
— Sim?
— Tenho consulta médica na semana que vem, é a primeira
coisa. — Dei um meio sorriso. — A segunda é que vou conversar
com Julia hoje à noite.
— Isso é bom. — Rafael sorriu. — Tenho certeza de que Julia
irá apoiá-la, e sobre a consulta, que dia será?
— Na quinta-feira.
— Hummm.
— O que foi? — Arqueei uma sobrancelha. — Vai ver se tem
um espacinho na sua agenda?
Rafael me encarou, assustado, mas era apenas uma
brincadeira.
— Estou brincando — avisei, aliviando sua tensão. — Só falei
porque você pediu para que eu te falasse...
Rafael parou de andar e segurou meu pulso. Parei também e
fiquei de frente para ele.
— Aninha! Espera! — gritei, antes que ela fosse longe demais.
— Eu falei que vou estar ao seu lado a todo momento e é isso
que vou fazer — Rafael disse, convicto. — Não duvide.
Quase suspirei.
Não era obrigação dele estar comigo nesse momento, mas
saber que o faria e de coração, me deixava praticamente
emocionada.
— Obrigada, Rafa.
Ele tocou meu rosto com um sorriso.
— Tiaaaaa, vem logo! Eu quero tomar sorvete!
Rafael deu uma risadinha.
— Eu vou pegar essa garotaaaa! — Ele saiu correndo na
direção de Aninha e ela deu um gritinho quando ele a tirou da
bicicleta e a girou no ar. Ambos rindo e felizes.
Será que Rafael seria assim com o meu bebê também? Será
que ele teria tanto amor quanto ele tinha pela sobrinha e até por
Helena, que nem era sua parente de sangue?
Ah, Rafa...
Ele nem sonhava que a cada segundo que se passava, eu
imaginava-o segurando meu filho em seus braços, amando-o como
se fosse seu próprio bebê.
Mas eu sabia que tudo isso não passava de um sonho.
Rafael e eu curtíamos o sexo um com o outro e era apenas
isso. Da minha parte envolvia um pouco mais de sentimentos, mas
da parte dele eu duvidava que um dia ele pudesse me amar como
amou Fernanda Casablanca.
Ele mesmo dissera que ela fora seu único e grande amor.
Mesmo casada, Fernanda continuava linda, rica — bem, agora
talvez nem tanto —, mas eu sabia que assim que saíssem os papéis
do divórcio, ela se tornaria incessante na vida de Rafael e duvidava
que eu pudesse ganhar nessa disputa.
Então, eu preferia me manter onde eu estava: na estaca zero
no coração de Rafael.
Rafael

— Eu só quero te perguntar uma coisa. — Julia ergueu o dedo


indicador na minha direção. — Você vai assumir o bebê da Sofia?
Hoje era o dia em que Sofia ia ao médico, então me adiantei e
antes de ir buscá-la, dei uma passada no escritório de Andrew para
resolver algumas questões.
Não fiquei surpreso quando encontrei Julia lá. Porém fiquei
surpreso com a violência de suas palavras.
— Perdão?
— Não se faça de desentendido. Sofia me contou tudo e, meu
Deus, que confusão. — Ela olhou para Andrew. — Acho que é uma
confusão maior que a nossa, quando Helena foi deixada no seu
escritório.
— Qualquer confusão que envolva uma criança é uma
confusão bem grande, querida — Andrew falou, calmamente. —
Mas não estou entendendo por que você está fazendo essa cara,
Rafael.
— Por que diabos vocês estão se metendo na minha vida? —
perguntei, ironicamente.
Julia se aproximou de mim, com os braços cruzados.
— Ah, engraçado... há seis anos você também se meteu na
minha vida, quando resolvi ajudar Andrew com a questão do bebê.
— Mas era diferente, Julia.
— A situação, sim, mas a complicação é a mesma. E envolve
uma criança. — Ela bufou e se afastou. — Veja bem, não estou
julgando a Sofia e já disse a ela que ela dispõe de todo o nosso
apoio. A questão é que eu não estou entendendo por que vocês
estão juntos, sendo que você já sabe que ela está grávida.
Esfreguei minhas têmporas.
Havia coisas que Julia nunca entenderia, assim como nem eu
mesmo. Eu queria Sofia por perto e depois de descobrir que ela
estava sozinha e sem proteção, algo dentro de mim pediu que eu
continuasse ali, amparando-a.
— Eu sou seu irmão mais velho, Julia.
— Mas isso não me impede de colocar juízo na sua cabeça —
ela retrucou. — Estou preocupada com vocês. Principalmente com a
criança.
— Eu não vou abandonar Sofia, se é isso o que você pensa.
— Fitei-a seriamente. — Eu... não sei bem definir o que eu sinto por
ela. Sei que ela é minha amiga, eu gosto dela, nos damos bem em
vários aspectos, aspectos que eu nem gostaria de compartilhar com
você. E agora tem a questão da gravidez. Não posso abandoná-la.
— Você vai se casar com ela, então?
Olhei-a, atônito.
— Estamos no século 21, Julia. Desde quando precisamos nos
casar para eu ajudar Sofia com a criança?
Ela negou com a cabeça.
— Sofia precisa de um nome. Precisa de proteção. Por que
não se casa com ela, então? Ela gosta de você. Acho que sempre
gostou.
Fiquei em silêncio.
Sofia gostava de mim como um amigo. Não era possível que
ela mantivesse outro tipo de sentimento oculto por tanto tempo.
Ou seria possível?
— Sem falar que você precisa de uma esposa — Julia
continuou, com um sorrisinho travesso. — Já está ficando velho e...
aliás, quero acreditar que você não está esperando o divórcio da
Fernanda pra poder voltar com ela.
Fiz o sinal da cruz, três vezes para garantir.
— Ótimo, então — Julia disse, satisfeita. — Sofia vai ser uma
ótima mãe. Como tenho certeza de que também será uma ótima
esposa.
Fitei a minha irmã por longos instantes e depois me virei para
Andrew.
— Como você a aguenta?
— Eu a amo. — Ele ergueu um ombro.
Ergui meu corpo, que antes estava inclinado sobre o encosto
de uma poltrona, e passei uma das mãos pelos cabelos.
— Se você já me passou todo o sermão, eu vou embora.
— Vai ver a Sof? — Julia passou por mim, dando pulinhos. Sua
voz quase soava como a de satanás atentando uma pessoa. —
Aposto que ela quer te ver e quem sabe mais o que ela quer fazer
com você...
Revirei os olhos e joguei meu terno por cima do ombro.
— Vou levá-la ao médico.
Julia se colocou atrás de Andrew e o abraçou.
— Amor, não acha que o Rafa vai ser um ótimo pai?
— Vai sim, querida. Ele adora crianças — Andrew respondeu,
sem tirar os olhos dos papéis.
— É claro que vai. Ele cuidou tão bem da Helena naqueles
tempos. E ele era um moleque, seis anos atrás.
— Bem, se você já cansou de cuidar da minha vida, Julia, vou
me retirar. Não quero que Sofia se atrase.
Julia soltou o marido e veio em minha direção. Eu era mais alto
que ela, então sua cabeça batia na altura do meu peito.
— Eu te amo. — Ela me abraçou. — Sei que sou chata, mas
quero vê-lo feliz e completo, assim como eu sou.
Depositei um beijo na cabeça de Julia.
— Eu também te amo, Julinha.
Despedi-me de Andrew e saí do escritório com aquela
conversa na cabeça.
Julia era uma intrometida da pior espécie, mas ela tinha razão
em alguns aspectos: Sofia precisava de proteção, de carinho.
Precisava de um nome para protegê-la junto com a criança que viria
ao mundo.
Paulo não estava disposto a oferecer isso e eu sabia por
fontes confiáveis que ele já estava saindo com outra mulher. Uma
atriz de uma grande emissora carioca.
Liguei meu carro e olhei para o volante por alguns segundos.
Eu realmente estava ficando velho. Já não tinha vontade de
vadiar por aí. Então...
Por que, não?
Eu já estaria ao lado de Sofia. Por que não um casamento?
Eu podia não estar apaixonado, mas eu sentia carinho por ela.
E, pensando bem, era até melhor.
Paixão deixa a gente desregrado. Paixão nos leva a coisas das
quais nos arrependemos depois.
Um casamento.
Sofia teria meu nome. Seu bebê teria um nome.
E eu poderia ser pai.
Uma família completa.
O que mais eu poderia querer?
Sofia

Rafael chegou com antecedência e isso deu a ele alguns


minutos para sentar e tomar um chá com minha avó, enquanto eu
terminava de me arrumar.
Eles conversaram bastante e quando me aproximei, já tinham
terminado o chá.
Durante a consulta, Rafael fez milhares de perguntas ao
médico, o que levou o homem a acreditar que ele era o pai da
criança.
No final da consulta, Rafael precisou sair da sala para atender
a uma ligação, então o médico me estendeu a mão e disse com um
sorrisinho:
— Parabéns, moça. Você escolheu muito bem o pai para seu
filho.
Isso foi como uma faca sendo cravada em meu peito.
Dei um sorrisinho sem graça de volta, mas não tive coragem
de desmentir.

— Bem, são vários exames que ele pediu — Rafael disse,


quando entramos no carro. — Posso levá-la em uma clínica de
confiança.
— Seria ótimo. — Sorri. — Aliás, Rafa, estou com uma fome
do cão.
Rafael ligou o carro e riu.
— Então, vamos alimentá-los.
Rafa nos levou ao mesmo restaurante do nosso jantar. Claro, o
empreendimento pertencia a ele, nada mais justo que ele fosse lá
de vez em quando para dar uma olhada em tudo.
Já fiquei animada pensando em quais pratos eu iria comer. O
cardápio oferecia uma enorme variedade de comidas deliciosas. Eu
já adorava comer, agora que era por dois, então...
Porém minha animação durou apenas até chegarmos à
entrada do restaurante e darmos de cara com Paulo e uma mulher
ruiva em seu encalço.
Eles pararam abruptamente, assim como nós.
— Ora, ora. — Paulo abriu um sorriso ao alternar o olhar entre
Rafa e eu. — Que bom vê-los.
Eu tinha ouvido falar em um programa de fofoca dos que
minha avó assistia, que a mulher que estava com ele era uma atriz
de uma famosa emissora e estava namorando um grande
empresário paulista.
Grande empresário...
Dava vontade de rir.
— Não sei se posso dizer o mesmo — Rafael retrucou.
— Ah, deixe-me apresentar minha namorada — ele disse,
como se eu não estivesse esperando um filho dele.
Isso doeu.
Não porque eu amasse aquele idiota. Mas porque aquela
criança carregava o sangue dele, poxa.
— Já a conheço. — Apertei a mão da moça ruiva. Ela era
bonita, afinal. — Adoro suas novelas.
— Ah, que bom! — Ela sorriu. — Fico feliz em saber.
Rafael também a cumprimentou educadamente. Já no caso de
Paulo, eu tinha quase certeza de que ele queria esmurrá-lo ali
mesmo. — É bom ver que você pode finalmente frequentar um lugar
como este, Sofia — Paulo disse, acidamente, enquanto me
encarava. — Um jantar aqui certamente custaria seu salário inteiro
de babá.
Rafael ficou vermelho de repente e quis soltar minha mão, mas
eu não deixei.
— É, eu posso, sim — respondi, sem me deixar abalar. —
Rafael é um namorado maravilhoso e tenho certeza de que vai ser
um pai maravilhoso também. — Coloquei a mão livre sobre a minha
barriga e eu vi o rosto debochado de Paulo se fechar rapidamente.
— Ahhh, meu Deus, você está grávida? — a ruiva perguntou,
animada. — Meus parabéns! Está de quanto tempo?
— É recente ainda. Completando dez semanas.
— Ah, sua barriga ainda está pequenininha. — Ela sorriu. —
Sente muito enjoo?
— Por incrível que pareça, não. — Respirei fundo e alisei
minha barriga. — Acho que sou sortuda.
— Ah, é mesmo! Minha irmã sofria muito com enjoos.
— Bem, eu ando me sentindo mais cansada que o normal e
muita fome. Sem falar outras coisinhas..., mas acho que faz parte,
né?!
— Vamos, Giovana? — Paulo deu um puxão em seu braço,
que até me assustou. — Estou atrasado para aquela reunião.
— Nossa! Calma, amor. — Ela olhou para a mão dele
segurando seu braço. — Eu gosto desse assunto. Quero muito ter
um bebê, em breve.
Paulo ficou mais branco que a camisa que usava.
— Então converse outra hora. Estou atrasado.
Ela assentiu e me devolveu um sorriso triste.
Quando eles se foram, respirei, aliviada. Rafael estava se
contorcendo de raiva.
— Por que não deixou que eu desse um soco na cara dele?
— Porque ele não vale uma mão machucada. — Alisei o rosto
de Rafael. — Posso ser sincera? Tenho pena dessa garota.
Rafael mexeu na gravata, irritado.
— Eu também.
Nós entramos no restaurante e ele me guiou até o mezanino.
— Falando nisso, você fechou negócio com eles?
— Ainda não — ele respondeu, ao puxar uma cadeira para
mim. — Marcelo está quase cedendo, mas Fernanda não quer dar o
braço a torcer. Quer impor as condições dela.
— Se ela fosse boa no que faz, a empresa não estaria na
situação em que está — comentei baixinho.
Rafael segurou a minha mão e me encarou.
— Você está bem? Não te afetou ver aquele homem?
— Não vou mentir e dizer que não fiquei chateada por ele dizer
aquelas coisas, ainda mais sabendo que estou grávida dele. Mas...
eu não sinto nada por Paulo. O que aconteceu foi um acidente e
nada mais.
Rafael assentiu e puxando minha mão para si, depositou um
beijo.
— Ele não sabe o que está perdendo deixando você ir. Aliás,
vocês irem.
Minhas bochechas coraram.
— Rafa... — disse baixinho, em tom de censura.
— O quê? — Ele ergueu uma sobrancelha. — Estou dizendo
alguma mentira?
Abaixei o rosto e ele beijou novamente a minha mão.
— Tem algum plano para amanhã à noite?
— Assistir aos Simpsons na Fox — respondi e ele riu. — Eu
gosto, viu?!
— Meu Deus, Sof. — Ele riu novamente. — Estou falando
sério.
— Não, não tenho nada. — Encarei-o. — O que o senhor
planeja?
— Bem, espere e verá.

— Já vai, Sof? — Julia desviou a atenção do seu notebook em


minha direção.
— Já... o Rafa acabou de chegar.
— E como aquele cretino não veio me ver?
— Quem disse que eu não vim te ver? — Dei espaço para
Rafael entrar no escritório.
Julia ficou em pé e abriu um sorrisão.
Eu adorava ver a interação entre os irmãos. Eles brigavam,
claro, mas se amavam acima de tudo.
— Achei que tinha se esquecido de mim. — Ela fez um
beicinho e então Rafael a puxou para um abraço.
— Esquecer a minha irmã chata? Jamais.
Ela deu um soco no peito dele e depois riu.
— Vocês vão passear? — Ela olhou dele para mim com
interesse.
— Não sei. Estou sob as ordens do jovem aí — respondi,
indicando-o com a cabeça.
Rafael riu.
— Tenho um jantar de negócios e Sofia irá me acompanhar.
— Hummmmm. — Julia abriu um sorriso malicioso. — Então
vão logo. Não percam tempo. Aliás, vocês poderiam vir almoçar
amanhã conosco, o que acham? George, Victoria e Helena virão
também.
Rafael me encarou com a dúvida no olhar.
— Se o Rafa quiser vir, eu também quero.
— É claro que ele quer vir — Julia respondeu, olhando feio
para ele. — É apenas um almoço de família.
— Viremos, então. — Rafael depositou um beijo na cabeça
dela e depois veio na minha direção, pegando a minha mão e
entrelaçando nossos dedos.
— Tchau, Ju. — Acenei para ela.
— Divirtam-se, crianças!
Fechei a porta, rindo, e saí pelo corredor com Rafael ao meu
lado. Ele estava tão elegante e bonito em um smoking preto. Claro,
para tentar me manter à altura dele, coloquei um vestido bordô
longo que eu só tinha usado uma vez, em um casamento de uma
amiga.
— Sua irmã anda tão feliz ultimamente.
— Ela sempre é feliz — Rafael respondeu, abrindo a porta da
saída. — Mas acho que isso tem a ver com as tentativas de
engravidar novamente.
Ele apertou o botão do elevador e esperamos.
— Será?
Rafael deu de ombros e quando o elevador se abriu nós
entramos.
— Dizem que o sexo estimula o hormônio do prazer — disse
ele.
— Bem, isso é verdade, mas...
Rafael soltou minha mão e me prensou contra a parede do
elevador.
— Eu queria estar tão feliz quanto a Julia também, mas você
não colabora... — Ele desceu o dedo indicador pelo meu colo.
— Rafa... — Arregalei os olhos levemente.
— O que foi? — Ele aproximou a boca do meu ouvido. — Já
faz duas semanas, Sofia. Eu quero repetir a dose.
— Duas semanas? — indaguei, gaguejando. — Não seja
exagerado.
Ele me encarou com aquela cara de safado.
— Você está lindíssima, aliás.
Minhas bochechas coraram.
O elevador se abriu e nós saímos como se nada tivesse
acontecido.
De uma coisa eu já sabia: aquela noite Rafael não me deixaria
sair de sua cama nem que uma vaca começasse a tossir. Não que
fosse algo ruim, mas eu estava tentando a todo custo não me
envolver completamente com ele.
Se bem que àquela altura eu já tinha perdido a mão de tudo.
Rafael dirigiu até o espaço onde seria o jantar. Era um local
chique, com pessoas ricas e famosas que eu conhecia da internet e
da televisão.
— Por que não me disse que até a imprensa estaria aqui? —
perguntei, enganchando meu braço no dele. — Eu teria usado um
vestido mais elegante.
— Eu já disse que você está linda. — Ele me guiou pelo tapete
até a entrada do salão. — Na realidade, eu preferia você sem esse
vestido, deitada na minha cama.
— Rafa!
Ele riu descaradamente.
— Mas eu posso aguardar até o final da festa para isso.
Um casal bem elegante veio nos cumprimentar. Eles deviam
ter mais de cinquenta anos. Rafael me apresentou como sua
namorada e eles me cumprimentaram como um sorriso acalentador.
Rafael cumprimentou mais algumas pessoas e então fomos
até a mesa reservada para nós. No entanto, para minha surpresa,
nessa mesa também havia outras pessoas importantes, que me
foram apresentadas, exceto um casal de amigos, Natalie e
Fernando Costermani, que eu já conhecia.
— Espero que não esteja desconfortável nesse vestido —
Natalie comentou, próxima ao meu ouvido, quando me sentei.
— Desconfortável?
Ela sorriu.
— Por causa da gravidez.
Olhei para ela, surpresa. Estava tão óbvio assim?
Antes que eu perguntasse algo, ela explicou:
— Sua barriga ainda é pequena, mas já dá pra perceber.
Podia ser apenas gordura na barriga, oras.
— Ahhh... — Levei a mão à minha barriga e dei uma risadinha.
— É, realmente. Este vestido não ajuda muito a disfarçar.
Ela bebericou um pouco de vinho.
— Olha, eu amo a maternidade..., mas as coisas que
passamos até chegar na hora de a criança nascer, eu detesto. —
Ela deu uma risadinha nervosa.
— Você tem quantos filhos mesmo?
— Dois. Uma menina e um menino. Só que... Fernando está
querendo mais um. — Ela me encarou, desesperada. — Tem ideia
de como posso tirar isso da cabeça dele?
— Olha... não sei. — Dei uma risadinha. — Homens são
teimosos quando querem algo.
O garçom se aproximou, mas antes que pudesse colocar
bebida em minha taça, Rafael pediu que trouxesse algo sem teor
alcoólico. Sorri em agradecimento e ele puxou a minha mão direita,
depositando um beijo demorado nela.
Então depois voltou a conversar com os homens.
— Hummm, ele está apaixonado por você mesmo, hein?! —
Natalie disse, atraindo minha atenção novamente. — Estão juntos
há muito tempo?
— Não... — Olhei para minha taça sendo preenchida com suco
de abacaxi com hortelã. — Ele não está apaixonado por mim.
— Como não? — Natalie arregalou os olhos. — Está sim,
acredite em mim.
Bebi um pouco de suco para tentar acalmar meu coração.
Palavras como aquela não ajudavam em nada. Só me deixavam
ainda mais confusa.
— Por que disse que ele não está apaixonado por você? — ela
perguntou, em tom de suspeita.
— Porque... É complicado.
Natalie jogou a cabeça para trás e riu.
— Os melhores relacionamentos são complicados. — Ela
piscou. — Você sabe da história de como Fernando e eu acabamos
juntos, não sabe?
Balancei a cabeça afirmativamente. Julia já havia me contado
uma vez.
— Então — ela bebericou mais um pouco de vinho —, Rafael
vai ser pai. Mesmo que isso tenha acontecido por acidente, é a sua
chance de conquistar esse homem. E olha, quem diria que ele iria
crescer na vida tão rápido. Meu Deus. Lembro-me dele quando Julia
trabalhou um tempo para Fernando. Não achei que ele ia ter tanta
sorte nos negócios assim.
Olhei para Rafael, ele estava entretido com os outros em uma
conversa sobre negócios e criptomoedas. Seria tão bom se ele
realmente estivesse apaixonado por mim.
Seria tão bom se aquele filho que eu esperava fosse dele.
Seria bom se...
Ah, que inferno.
Nós nos entretemos em outras conversas e eu tentei deixar de
lado aquelas frustrações e me concentrar no que eu estava fazendo
ali. Era a namorada de Rafael Souza, precisava agir como tal.
De vez em quando eu sorria para ele. Entrelaçava nossos
dedos. Perguntava o que ele estava achando da comida.
Então em certo momento, o DJ chamou os casais para
dançarem. Já havia alguns lá na pista, mas antes eles estavam
dançando músicas agitadas.
— Quer dançar uma música comigo, Sof? — Rafael perguntou,
bem próximo ao meu ouvido.
— Eu não sei dançar.
— Nem eu.
Nós rimos e nos encaramos por um longo instante.
— Não se esqueça que eu tenho um pino na perna, por causa
daquele maldito acidente — ele lembrou.
— Ah, tudo bem. Mas não dê risada se eu pisar no seu pé.
Ele se levantou e estendeu a mão.
— Se isso acontecer, iremos os dois ao chão.
Nós rimos e caminhamos até a pista de dança. A música já
estava nos seus acordes iniciais.
Ficamos de frente um para o outro e naquele momento parecia
que não havia mais ninguém ali. Apenas Rafael e eu.
Ele passou um braço pela minha cintura, me puxando para si e
a outra mão pegou a minha livre.

Quer parar o tempo?


Pra eu ver daqui
Teu mundo vir assanhar meu rio
Eu posso até te olhar sem ir
Eu conhecia aquela música. Era da Sandy e eu adorava, mas
nunca tinha prestado a atenção em sua letra.
Até aquele momento.

Tudo no seu tempo


Tão veloz por dentro
Em mim passa devagar
A me acertar

Feito areia êa-ah


Feito areia êa-ah
Em mim...

Balançamos nossos corpos lentamente, ao som daquela linda


canção. Rafael nunca tinha me olhado daquele jeito antes. Ele não
tirava os olhos dos meus e, eu também não conseguia desviar,
embora achasse que eu estava ficando louca e imaginando coisas.

Tenho fragmentos
De uma vida com você
E tantos intervalos só
De longe, mas querendo crer

Tudo no seu tempo (tudo no seu tempo)


Tão veloz por dentro (tão veloz por dentro)
Em mim passa devagar
A me acertar

A letra daquela canção parecia ter sido feita para nós.


— Sofia, eu queria te perguntar uma coisa — Rafael
interrompeu meus pensamentos com sua voz calma.
— Sim?
Ainda estávamos balançando ao som da música. Ele olhou
para cima, respirou fundo e depois me encarou novamente.
— Eu queria saber se... — Ele pausou, talvez procurando as
palavras certas. — Sofia, eu...
— Rafa, você sabe que eu sou a pessoa mais curiosa do
mundo — avisei, abrindo um sorriso. — Fale logo.
Ele riu e apertou mais a minha cintura. Me encarou
profundamente e disse:
— Sofia, você quer se casar comigo?
Meu sorriso morreu no mesmo instante.
O quê?
Ele havia me pedido em casamento?
O choque de suas palavras percorreu meu corpo da cabeça
aos pés e eu afastei-me abruptamente.
Estava zonza. De repente me senti sufocada.
Precisava respirar.
Dei passos para trás e esbarrei em alguém.
Rafael estava me pedindo em casamento?
Olhei para ele, o brilho em seu olhar que ele ostentava antes,
tinha se tornado preocupação.
Ai, meu Deus.
Então eu virei as costas e saí correndo.
Rafael

— Sofia! — gritei, segundos antes de outro trovão irromper nos


céus.
A chuva caía sem dó, mas eu precisava encontrá-la. Sofia
fugiu e eu não tinha nem ideia de onde ela havia se metido. Só
sabia que ela tinha corrido para fora do salão.
Quando cheguei à calçada, vi um vulto correndo pela esquina
do prédio.
Maldição.
Todo mundo tentava se proteger da chuva, mas eu sabia que
era Sofia. Corri na direção do vulto e ao virar a esquina, encontrei-a,
toda ensopada tentando se esconder na marquise do prédio.
— Mas que diabos, Sofia! — Alcancei-a.
Ela recuou, parecendo um gatinho molhado e assustado.
— Não, Rafa! Você está se molhando!
Juntei-me a ela no pequeno esconderijo.
— Como se você mesma não estivesse toda ensopada.
Ela negou com a cabeça e se abraçou. Estava tremendo.
— Vamos para casa. Você precisa se esquentar, senão vai
pegar uma pneumonia.
Ela quis protestar, porém, usei a arma infalível.
— O bebê — lembrei-a. — Não queremos que tenha uma
complicação com o bebê, não é?
Sofia assentiu.
Meu carro não estava longe dali, então corremos até ele. Meu
motorista já estava a postos, então quando entramos, ele olhou para
Sofia e depois para mim.
— Minha Nossa Senhora! Não podiam esperar a chuva
passar? — perguntou, exasperado. — Jovens. — Ele balançou a
cabeça negativamente e ligou o carro, nos tirando dali.
Nem perdi meu tempo para ralhar com Tom, porque ele era um
dos meus empregados mais especiais. Isso, talvez, enchesse seu
ego a ponto de deixar seus comentários escaparem de vez em
quando.
Puxei Sofia para o meu peito e tentei aquecê-la, enquanto não
chegávamos. Tom ligou o ar quente do carro e isso ajudou um
pouco.
Não queria pensar no que levou Sofia à beira da histeria
quando lhe fiz o pedido de casamento. Depois conversaríamos com
calma. Agora eu precisava cuidar dela e do bebê.
Quando chegamos ao apartamento, guiei Sofia diretamente
para o meu quarto.
— Vou ligar o chuveiro. Tire essas roupas molhadas —
ordenei. — O que está esperando, Sofia? — perguntei, ao ver sua
hesitação.
— Eu, eu... — Ela bateu os dentes. — É melhor você sair.
— Pelo amor de Deus, Sofia! — exclamei, irritado. — Agora
não é momento para pudor. Não há nada que eu não tenha visto
antes.
Ela assentiu, ainda tremendo.
Fui até o banheiro e liguei o chuveiro no quente. Deixei a água
sair um pouco para formar um pequeno vapor e depois voltei ao
quarto. Sofia já estava somente com as roupas íntimas.
— Venha. — Estendi a mão, que ela aceitou sem reclamar.
Ajudei-a a entrar no box e quando a água quente começou a
cair em seu corpo, ela suspirou, aliviada.
— Vou tomar banho no outro banheiro — avisei. — Pode pegar
alguma camiseta minha. O que preferir.
Ela assentiu.
Eu assenti também.
Mas não conseguia sair dali.
Diabos, eu tinha feito um pedido de casamento. Por que ela
não aceitou? Por que estava agindo daquela forma, como se eu
fosse um estranho qualquer?
— Bem, depois eu volto. — Dessa vez eu virei as costas e saí
do banheiro.
Meu coração estava em frangalhos.
Pela maldita segunda vez eu estava sendo rejeitado? Era
isso?
Balancei a cabeça e decidi providenciar meu próprio banho,
antes que eu também acabasse doente.

Duas horas depois, coloquei as sopas que eu havia acabado


de preparar na bandeja, pão, salsinha e queijo, e segui para o meu
quarto.
Sofia não tinha saído de lá, mas eu acreditava que ela já
tivesse saído do banho.
Abri a porta e, para a minha surpresa, ela estava meio deitada,
meio sentada, na minha cama, com o cobertor até o queixo. Ela
estava assistindo a um programa da madrugada, o famoso “Fala
que eu te escuto”.
— Vendo programação de igreja? — perguntei, levando a
bandeja até a cama.
Ela me deu um sorriso triste.
— Eu gosto da oração que eles fazem no final. Tenho uma tia
que vai nessa igreja e sempre leva as minhas roupas para eles
orarem.
Eu nunca fui religioso, mas acreditava em Deus e não tinha
preconceito com religião alguma.
— Confesso que também já assisti algumas vezes.
Madrugadas em que eu não conseguia dormir.
Ela sorriu novamente.
— Posso me sentar aqui? — perguntei, apontando o seu lado
da cama.
— Claro.
Sofia abaixou o som da televisão e seus olhos se direcionaram
à sopa.
— Hummm, parece deliciosa.
— E quente. Para nos aquecer.
Puxei a bandeja para o meu colo e Sofia se aproximou,
pegando sua própria cumbuca. Encheu de cebolinha e queijo e
depois pegou o pão, picando-o e comendo-o aos poucos.
Comemos em silêncio e assistimos ao programa de TV, que
por ironia ou não, falava sobre relacionamentos amorosos.
Ah, céus.
Havia tanto para conversarmos, mas eu não a pressionaria.
Ainda não.
— Meu Deus, estava ótimo, Rafa — ela disse, ao terminar. —
Não sabia que você cozinhava tão bem.
— Precisei aprender quando vim morar sozinho em São Paulo.
Depois a Julia veio e assumiu a cozinha, mas eu ainda gosto de
fazer isso de vez em quando.
Ela sorriu.
— Muito obrigada.
Terminei de comer e levei as louças de volta para a cozinha.
Quando voltei ao quarto, Sofia já estava com os olhos fechados.
Bem, já se passavam das duas da manhã. Eu não podia culpá-
la.
Entrei debaixo do edredom e passei um braço ao redor de sua
cintura, puxando-a para perto de mim. Ela tinha secado os cabelos e
eles estavam cheirando o meu xampu.
Eu gostei.
Depositei um beijo leve perto de sua orelha, desliguei a TV e
apaguei o abajur.
Precisávamos dormir.

Abri os olhos lentamente, meus sentidos aguçados pelo cheiro


que invadia minhas narinas.
A claridade das janelas me atingiu e precisei de alguns
segundos para me localizar. Claro, eu estava em casa, mas não
fazia ideia de que dia era aquele.
Ah, bem, era sábado e... Sofia não estava ao meu lado.
Seu espaço na cama estava vazio, mas se eu estivesse certo,
o cheiro bom vinha da cozinha. Eu só esperava que não fosse
Márcia que resolveu aparecer do nada para fazer faxina no
apartamento.
Esfreguei meu rosto e me levantei. Fiz minha higiene pessoal e
saí do quarto, sem me preocupar em trocar de roupa. Estava de
calça de moletom e uma camiseta velha e surrada.
Para o meu alívio, era Sofia cozinhando. Ela parecia bem
entretida com as panelas no fogão.
Ela se virou na minha direção e deu um pulo.
— Ah, meu Deus. — Ela levou a mão ao coração. — Faz
tempo que você está aí? Eu já ia te chamar pra tomar café da
manhã.
— Acabei de chegar. — Sentei-me na banqueta da ilha. — O
cheiro delicioso me acordou.
Ela sorriu.
— Acordei com vontade de comer ovos com bacon e, por
sorte, você tinha na geladeira. Então eu fiz. — Sofia abriu o armário
de pratos e pegou dois, colocando-os na minha frente. — Também
fiz suco de laranja. Mas se você quiser café, posso preparar
também.
— Pode ser suco mesmo — respondi.
Sofia encheu os dois copos com suco e depois colocou os
ovos com bacon nos pratos.
Dei uma olhadinha em seu corpo. Ela estava usando apenas
uma camiseta minha.
Uma verdadeira tentação.
— Também usei a sua torradeira de gringo. — Ela colocou
torradas em nossos pratos. — Você quer geleia ou manteiga?
— Manteiga.
Sofia colocou-a na minha frente junto com uma faca. Então se
sentou ao meu lado e começou a comer.
— Que horas são? — perguntei, ainda um pouco atordoado.
— Onze horas. — Ela deu uma risadinha. — Temos que comer
agora, porque ainda tem o almoço da Julia.
— Ah, é. — Esfreguei o rosto. — O almoço da Julia.
Sofia encheu a boca com torrada.
— Você sabe que ela sempre prepara um banquete.
— E como sei.
Passei manteiga nas minhas torradas e as comi lentamente.
Sofia parecia que ia devorar um elefante. Estava tão entusiasmada,
que nem se parecia com a gatinha assustada e molhada do dia
anterior.
— Sofia... — comecei a falar, sem saber se aquele era um bom
momento para aquela conversa. — Sobre ontem...
— Rafa — ela me cortou. — Eu agi como louca ontem, me
perdoe.
Bem, ao que parecia, ela tinha voltado ao normal.
— Não é necessário pedir perdão.
— Eu não devia ter corrido daquele jeito. Ainda mais que
estava chovendo e eu realmente não posso ficar doente. Pelo bebê.
Ela acariciou a barriga que já estava um pouco mais aparente.
Ficamos em silêncio por alguns instantes.
— Por que você fez aquela proposta? — ela perguntou, de
repente.
Passei manteiga em minhas torradas.
— Existem vários motivos que eu posso listar, se você quiser...
— respondi e ela deu uma risadinha.
— Mas você não me ama, Rafa.
Deixei a faca de lado e a encarei.
— Eu gosto de você, Sofia — falei calmamente. — Acho que
nos damos bem e podemos fazer um casamento dar certo.
Ela bebeu um pouco do suco.
— Se casamentos por amor já não dão certo... — ela
começou, mas eu a interrompi.
— Casamento é feito de escolhas, Sofia. Tanto de um quanto
de outro. A paixão se esfria com a convivência e o que fica é o
carinho e o respeito que um tem pelo outro.
Ela suspirou.
— Você quer dizer que o carinho que há entre nós pode ser
suficiente para sustentar um casamento?
— Talvez. — Ergui um ombro. — Só saberemos se tentarmos.
Ela ficou em silêncio e comeu o restante de seu ovo com
bacon.
— E o que vai acontecer quando ela se separar?
— Ela quem?
— A Fernanda, oras. Você mesmo disse que ela foi a única
pessoa que você já amou.
Bufei, irritado.
— Dane-se a Fernanda, Sofia. Quantas vezes vou ter que
dizer que não me importo com ela? Ela é página virada na minha
história.
Sofia ficou em silêncio e olhou para seu próprio prato vazio.
Virei-me na banqueta para ficar de frente para ela. Levantei
seu queixo.
— Sofia. Você é linda, você me atrai, nós somos amigos. E
você vai ter um bebê. Não quero que essa criança cresça sem saber
o que é ter um pai. — Vi um brilho em seu olhar. — Eu tive a sorte
de crescer em um lar onde meus pais sempre foram unidos. Quero
que seja assim com seu bebê também.
Aquele brilho era uma lágrima, que escorreu pelo rosto de
Sofia.
— Rafa... não quero que se sacrifique por mim.
— Não é sacrifício, Sofia. Eu acho que podemos fazer
escolhas que nos levarão ao contentamento em nosso casamento.
— Mas e se você encontrar alguém que arrebate seu coração?
— ela perguntou baixinho.
— Meu coração não pertence a ninguém. Mas estou tentando
oferecer a você um pouco de quem eu posso ser e de tudo o que eu
tenho. Duvida que posso ser um bom marido?
Ela deu uma risadinha.
— Não sei.
Segurei o rosto de Sofia entre as mãos.
— Eu prometo que vou ser fiel, se você for fiel a mim também.
— Claro que serei fiel. — Ela arregalou levemente os olhos.
— Então está dizendo que vai se casar comigo?
Ela respirou fundo, olhou para baixo e depois abriu um
sorrisinho.
— Tá bom, Rafael. Eu me caso com você.
Levei minha boca de encontro à de Sofia e a beijei com
vontade, movimentando nossos lábios com precisão.
Seus braços envolveram meus ombros e eu a puxei para mim
em um abraço poderoso. Mordisquei seus lábios e subi uma das
minhas mãos até a sua bunda, confirmando as minhas suspeitas de
que ela estava sem calcinha.
— Ops... — ela murmurou, parando o beijo. — Acho que as
roupas ainda não secaram completamente.
Arqueei uma sobrancelha.
— É bom que não sequem tão logo, mesmo.
Sofia riu e eu a peguei no colo, levando-a de volta ao quarto.
— O que está fazendo, Rafa? — Ela arregalou os olhos.
— Quero comemorar, ué. Agora sou um homem
comprometido. E futuro pai.
Sofia jogou a cabeça para trás e riu.
Ela era linda.
Ela me roubava o fôlego.
E seria minha.
Completamente minha.
Sofia

Enquanto Rafael dirigia o carro e nos levava até a casa de


Julia, eu ainda me perguntava se nós estávamos mesmo noivos ou
se aquilo tudo era fruto da minha imaginação fértil, e eu logo
acordaria na minha cama e a vida seguiria como se nada tivesse
acontecido.
Mas não...
Eu havia me beliscado em algum momento dentro do carro e
percebido que sim, eu estava acordada e havia aceitado o pedido
de casamento de Rafael.
— Antes de irmos até a casa da Julia, vamos passar em uma
joalheria. Quero que escolha um anel — Rafael disse, como uma
confirmação para os meus pensamentos.
— Não precisa de anel... — disse baixinho. — Sério, mesmo.
Ele me deu uma olhada e depois voltou a atenção ao volante.
— Precisa, sim. Eu nunca fiquei noivo antes, Sofia. Quero
fazer tudo como deve ser.
Respirei fundo e assenti.
Ele tinha razão.
Rafael estava entrando naquilo de cabeça e eu precisava fazer
o mesmo. Ele era cavalheiro demais para que eu agisse como uma
ogra naquela situação tão especial.
Na cama, enquanto fazíamos amor, Rafael tinha me dado
algumas ordens.
A primeira delas era que nunca, em hipótese alguma,
deveríamos dizer que aquele casamento não envolvia sentimentos.
Porque mesmo que não sentíssemos aquela paixão louca, nos
gostávamos. Queríamos bem um ao outro.
E a segunda delas era que deveríamos viver o momento,
deixando de lado nossas preocupações e nos concentrando no que
realmente deveríamos fazer. E para fazer um casamento dar certo,
demandaria esforços das nossas partes.
Bem, eu havia concordado com tudo, mesmo que naquele
momento o prazer de seus toques estivesse me deixando à beira da
loucura.
Mas, já que eu havia concordado, dissuadida ou não pelas
suas carícias, agora eu precisaria cumprir a minha parte.
Não estava iludida achando que Rafael se apaixonaria por
mim. Mas ele havia prometido ser fiel e eu o conhecia
suficientemente bem para saber que ele cumpriria suas promessas.
Ah, meu Deus.
Eu seria esposa de Rafael.
— Bem, aqui estamos... — Rafael parou o carro no
estacionamento de uma grande joalheria da cidade, que eu sabia
que cada joia podia custar nossos rins juntos. Mas eu não iria
bancar a chata. Se ele queria algo de qualidade, eu usaria de bom
grado.
— Eu teria comprado antes — ele disse, parecendo temer
minha reação. — Mas eu não sabia o seu tamanho, também queria
que escolhêssemos juntos.
— Tudo bem, Rafa. — Coloquei uma mão em seu antebraço e
sorri. — Acho perfeito escolhermos juntos.
Ele sorriu e se inclinou, depositando um beijo em meu rosto.
— Então, vamos.
Rafael e eu entramos na loja chique de mãos dadas. Uma
vendedora morena e sorridente veio nos atender e Rafael disse que
queria ver os anéis de noivado.
Ela nos guiou até uma das vitrines da loja, onde havia
inúmeras opções. No entanto, nenhuma parecia do agrado de
Rafael.
— Tem outras opções? — ele perguntou, erguendo uma
sobrancelha.
— Eu tenho algumas coleções especiais. Vou mostrar aos
senhores.
Em instantes, a vendedora nos trouxe uma caixa com edições
lindíssimas, mas que certamente eram mais caras.
Dei uma olhada em todas elas, mas vi quando os dedos de
Rafael foram em direção a uma peça em especial.
— Hummm, essa peça é lindíssima, senhor — a vendedora
disse. — Esse solitário é feito em ouro rosé. Digno de uma
verdadeira princesa.
Rafael pegou a peça e a examinou com cuidado.
— Posso colocar em seu dedo, Sofia? — ele perguntou, com
aquela voz sedutora que deixava as mulheres aos seus pés.
— Sim. — Estendi a mão, um pouco trêmula.
A vendedora quase soltou um suspiro quando ele colocou o
anel em meu dedo com todo o cuidado e carinho.
Levantei a mão e olhei para a peça, que ostentava um
diamante branco, nem tão grande nem tão pequeno, contrastando
com a cor do anel. Era a coisa mais linda que eu já havia visto em
minha vida. E cabia perfeitamente no meu dedo.
— Gostou? — Rafael perguntou, em expectativa.
— Eu amei, Rafa.
Nesse momento não consegui impedir que lágrimas se
formassem nos meus olhos.
Tudo era lindo demais.
Perfeito demais.
E eu não merecia.
— Vamos ficar com esse — Rafael determinou e a vendedora
abriu um sorriso.
— Ótima escolha, senhores. Esse anel irá fazer qualquer
mulher desejar estar no lugar da senhorita. — Ela deu uma piscada
e eu tirei o anel, entregando-o para que ela fizesse todos os trâmites
da venda.
— Só de estar noiva dele, elas já vão desejar estar no meu
lugar — confidenciei à vendedora, que olhou para ele e assentiu.
— É, a senhorita tem razão.
Nós rimos e ela se foi.
A coisa era séria. Eu realmente iria me casar com Rafael.

Rafael e eu fomos recebidos por duas crianças


entusiasmadas.
— Aninha! Não pula no colo da tia Sofia. Ela não pode pegar
peso! — Julia ralhou com a menina, que insistia em subir em meu
colo.
— A tia Sof não pode, mas eu posso. — Rafael a pegou no
colo e a girou no ar, fazendo-a rir.
— Eu também quero. — Helena cruzou os braços e fez um
beicinho.
— Mas é claro, minha querida. — Rafael soltou Aninha e
pegou Helena, tentando fazer o mesmo. Mas como se aguentava
uma criança de seis anos por muito tempo?
Julia me abraçou.
Ela estava linda em um vestido longo azul com flores brancas
e rosas.
— Venham, os demais estão na área da piscina. Andrew
resolveu bancar o churrasqueiro.
— Churrasqueiro? — Rafael perguntou, incrédulo. — Meu
Deus, acho que prefiro ir almoçar no meu restaurante.
Nós seguimos Julia até a varanda, onde George e Andrew
estavam na churrasqueira e Victoria ria assistindo às trapalhadas
dos dois.
— Eles são a vergon da profission — Rafael falou, imitando o
sotaque francês do chef Erick Jacquin5. — Deixa eu mostrar pra
esses idiotas como se assa uma carne.
Rafael soltou Helena e Aninha e foi na direção dos dois.
Cumprimentei Victoria com um abraço caloroso. Então nos
sentamos em uma mesa, Julia, Victoria e eu.
— Então é verdade, Sof? — Victoria arregalou levemente seus
olhos. — Você está mesmo grávida.
Assenti, abrindo um pequeno sorriso.
Desde a festa no sítio, não tínhamos mais nos encontrado.
— Ah, meu Deus, que notícia boa! — Ela apertou minha mão
que estava disposta em cima da mesa. — Meus parabéns. Rafael
deve estar radiante, não é?
Olhei para Julia, desesperada.
— Claro que está — Julia respondeu por mim. — Não vê a
hora de a criança nascer.
Abri um sorriso em forma de agradecimento. Ela sorriu de
volta. E esse era mais um dos motivos pelos quais eu amava Julia.
— Sua barriga ainda está pequena. Se bem que acho que não
vai crescer muito. Você é bem magrinha. — Victoria sorriu. — Eu
fiquei enorme quando engravidei da Helena.
— Não pensa em ter outro? — perguntei.
Ela suspirou.
— Não sei. No momento, não. — Ela olhou na direção de
George. — Ele quer mais filhos, mas acredito que daqui um ano ou
dois.
— Bem, eu estou tentando novamente. — Julia sorriu. —
Quero ter logo outro, antes que a Aninha fique mais velha e a
diferença entre eles seja absurda.
— É bom ter um irmão — falei. — Eu sempre quis ter um,
infelizmente meus pais faleceram antes que isso fosse possível.
O silêncio reinou por alguns instantes. Então percebi que eu
havia trazido um clima ruim para a conversa. Pensei em falar sobre
o noivado, mas Rafael havia dito que faria um anúncio formal
durante o almoço.
— Conseguiram acender a churrasqueira, pelo amor de Deus?
— Julia gritou.
— Mais ou menos. — George fez um movimento com as
mãos. — Eu acho que somos melhores em negócios do que
acendendo churrasqueiras.
— Eu disse que deveria ter pedido ao zelador para fazer isso.
Ele sempre faz. — Julia cruzou os braços, frustrada.
Andrew se virou na direção dela.
— Confie em mim, meu amor. Eu vou acender essa droga,
nem que seja a última coisa que eu faça em minha vida.
— Vamos ver.

Duas horas depois, a churrasqueira não tinha sido acesa.


Andrew olhou em vários tutoriais na internet, mas tudo o que
eles faziam dava errado.
— EU ESTOU COM FOME! — Julia gritou, pela décima vez. —
E NÃO TEMOS COMIDA PRONTA POR CAUSA DA
INCOMPETÊNCIA DE VOCÊS!
A essa altura, os homens já estavam derrotados.
— Eu acho que todos vocês são a vergonha da profissão, isso
sim — falei, sentindo minha barriga roncar.
Rafael esfregou o rosto.
— Já tentou falar com o zelador?
— Já! — Julia o olhou de forma assassina. — Mas ele não
está. Eu tinha que ter visto isso com ele ontem, mas Andrew disse
que se garantia.
— Me perdoe, meu amor...
— Chega! — Rafael bufou, jogando o pano de prato longe. —
Vamos almoçar no Ruston.
Nós, mulheres, ficamos em silêncio.
Não adiantava mais discutir com eles. A única solução era
irmos para o restaurante de Rafael e acabar com o assunto.
— Então vamos logo. Também estou morta de fome — Victoria
resmungou.
Rafael me puxou para um abraço, enquanto seguíamos para a
saída do apartamento e sussurrou em meu ouvido:
— Eu juro que tentei.
— Eu vi — dei uma risadinha —, mas me lembre de não
colocarmos uma churrasqueira em nossa casa.
Ele ergueu uma sobrancelha.
— Tarde demais. Já temos uma.
— Então você vai ter que fazer um curso para aprender a
acender uma churrasqueira.
— Eu vou aprender. — Ele sorriu para mim, antes de
entrarmos no elevador. — Não quero ter que vir aqui chamar o
zelador da Julia para fazer isso para nós.

Ser dono de um restaurante tinha muitas vantagens, entre elas


não precisar enfrentar fila para entrar, porque sempre há um lugar
para você e os seus vinte acompanhantes, e a comida é preparada
mais rápida.
— Já falei que esse foi o melhor investimento que você fez,
Rafael? — Andrew elogiou, em tom de brincadeira, enquanto se
deliciava com seu prato de frutos do mar.
— Ah claro, né. Sorte a sua, ou teria que enfrentar uma
pequena fila para entrar.
— Você deveria investir em um restaurante, Andrew. — Julia o
encarou. — Como nunca pensou nisso antes?
Ele deu de ombros.
— Vou pensar no assunto.
— E você, Sof? — Julia me encarou. — Pelo que me lembro,
você tinha o sonho de abrir uma doceria. Ainda tem vontade?
— Bem, tenho... — respondi lentamente. — Mas agora não é o
momento para isso.
— Claro, claro. — Ela sorriu. — O bebê primeiro.
— O bebê, mas também há outra coisa que merece toda a
nossa atenção no momento — Rafael disse, com um sorriso
triunfante.
Todos pararam de comer e nos encararam.
— Ah, é? Conta, então — Victoria instigou.
Rafael me lançou um olhar animado e se levantou.
— Tenho um anúncio para vocês.
Foi como se todo o restaurante tivesse ouvido. De repente, o
barulho de pessoas conversando cessou e os olhares se dirigiram
ao mezanino, que era onde estávamos.
— Na realidade, eu preciso fazer isso direito — Rafael falou
timidamente, tirando do bolso da calça a caixinha com o anel.
Ele se ajoelhou, abrindo-a em minha direção.
Meu coração se acelerou novamente, porque agora não tinha
nem como pensar que aquilo era um sonho. Havia inúmeras
pessoas ali como prova do que estava acontecendo.
Julia, Victoria, até mesmo Andrew e George arregalaram os
olhos e ficaram mudos, sem saber o que dizer.
— Sofia Helen de Moretto, me concede a honra de ser minha
esposa?
Naquele momento, eu já não sabia se Rafael estava apenas
encenando para sua família ou se estava tentando ser um cara legal
comigo. Eu só sabia que eu estava vivendo um sonho e não queria
acordar.
A realidade das coisas era cruel demais.
— É claro que eu aceito — respondi, abrindo o meu melhor
sorriso. — Eu aceito ser sua esposa, Rafael.
Ele se levantou, com um sorriso satisfeito no rosto.
Levantei-me também e ele deslizou o anel pelo meu dedo.
Algo aconteceu.
A barreira de sentimentos, que eu tentava a todo custo manter
erguida, caiu e eu soube que estava perdida.
Eu estava apaixonada por Rafael e feliz pelo rumo que as
coisas estavam tomando. Mas eu temia o dia em que ele caísse na
realidade e percebesse que eu não era a mulher da sua vida.
Nesse dia, meu conto de fadas chegaria ao fim e eu ficaria
completamente destruída.
Rafael me beijou com carinho, enquanto as palmas tomavam
todo o salão. Pessoas torcendo por nós, incluindo os funcionários,
que haviam parado suas atividades para ver o que estava
acontecendo com seu chefe.
— Bem, já não era sem tempo — Julia comentou, arrancando
risos dos outros. — Você fez a coisa certa, Rafael.
Ele sorriu para a irmã.
Trocamos abraços de felicitações, mas a única coisa que eu
ouvia era Julia perguntando sobre a data.
— Não sabemos ainda — respondi. — Ainda não tenho nem
ideia do que eu quero.
Julia e Victoria trocaram olhares.
— Ah, nós temos um casamento para preparar! — Victoria
bateu palmas. — Estou tão animada!
— Três meses — Julia determinou.
— Três meses para o quê? — Rafael a encarou.
— Para o casamento, tolinho.
— Três meses? — Ele arregalou os olhos. — Achei que um
mês seria o suficiente.
Ela ergueu o indicador e fez sinal negativo.
— Daqui a três meses a barriga da Sofia vai estar maior e vai
ser lindo vê-la em um vestido especial de grávida. Confie em mim,
irmão. Confie em mim, Sofia. Vamos fazer um casamento à altura
de ambos.
Olhei para Rafael e nós rimos. Porém, não era riso de alegria,
mas sim de desespero.
Eu já sabia que quando se caía nas mãos de Julia Sanchez,
você tinha que dançar conforme a música que ela tocava. E os
outros também já sabiam disso, pois ninguém se atreveu a dar outra
sugestão.
— Que seja. — Rafael bufou. — Três meses.
Ela bateu palmas.
— Mal posso esperar para começarmos os preparativos!
Sorri fracamente.
Que Deus me ajudasse!
Três meses depois...

Sofia

— Não foi esse véu que pedimos! — Julia andava de um lado


para o outro com o celular no ouvido e o véu em outra mão. — Não
quero saber. Vocês erraram e eu quero a troca hoje. O casamento é
amanhã, pelo amor de Deus!
Eu estava sentada na beira da cama, tentando me manter
tranquila pelo bebê. Meus Deus, como eu poderia imaginar que um
casamento desse tanto problema?
Já havíamos devolvido o bolo que viera errado, a decoração
viera faltando alguns detalhes e agora o véu do meu vestido estava
errado.
Eu só podia pensar que aquilo era um mau presságio.
Por sorte, Julia e Victoria estavam me ajudando em tudo. Em
tudo mesmo. E até nas brigas com os fornecedores, elas tomavam a
frente.
— Vai dar tudo certo. — Julia se aproximou e apertou as
minhas mãos. — Eles vão trocar esse maldito véu nem que eu vá lá
derrubar aquela loja inteira.
Abri um sorrisinho e então alisei a minha barriga.
Ela estava bem maior.
Mas eu também estava me sentindo gorda. Era engraçado,
porque ao mesmo tempo que eu olhava no espelho e me achava
linda, também me achava horrorosa.
E aí nessas horas eu começava a chorar sem parar.
— Já consegui arrumar os detalhes da decoração que estavam
faltando. — Victoria entrou no quarto, mas parou ao ver a nossa
cara de frustração. — O que houve agora?
Julia ergueu o véu.
— Mandaram errado.
— Mandaram o vestido errado?
— Não, só o véu.
Victoria suspirou.
— Menos mal. Pior se fosse o vestido todo. — Ela se
aproximou e se sentou ao meu lado. — Como está se sentindo,
querida?
— Gorda, frustrada, ansiosa...
Ela riu.
— Precisa se acalmar, pelo bebê. — Ela acariciou minha
barriga. — Amanhã é o seu grande dia e você será o centro das
atenções. Precisa estar radiante.
Tentei sorrir, mas era em vão.
Eu sabia que aquele casamento nada mais era do que um
favor que Rafael estava fazendo por mim.
Ele nunca havia dito nada disso, mas as pessoas já eram tão
desacreditadas de casamento, que não havia motivos para ele se
casar comigo, a não ser proteger a mim e ao meu filho, por
amizade.
Nesses três meses que se passaram, Rafael e eu engatamos
um namoro de verdade. Aliás, um noivado. Saímos para passear
várias vezes, visitamos outros restaurantes, assistimos a filmes de
terror e comemos pipoca. Brigamos também quando eu tive um
surto, dizendo que não queria que ele se sacrificasse por mim. Ele
também foi comigo ao médico em todas as consultas. Sempre se
mostrando preocupado comigo e com o bebê.
Éramos um casal de verdade.
O problema era que, lá no fundo, uma vozinha maquiavélica
dizia que ele não me amava. Nunca chegaria a me amar.
Mas então, àquela altura do campeonato, eu já estava
completamente apaixonada por ele. Sempre ansiando por seus
toques, seus beijos, suas carícias e até os momentos em que
apenas ficávamos na cama olhando um para o outro e conversando
sobre o futuro.
Rafael tinha muitos planos. Queria expandir ainda mais os
negócios.
E eu... eu só tinha planos de ser uma boa mãe e uma boa
esposa.
— Estou com fome — reclamei.
— Eu também. — Julia bufou. — Vamos comer alguma coisa?
Precisamos recarregar nossas energias.

Já se passavam das 19h30 quando saí do apartamento de


Julia.
Rafael estava na correria com os preparativos no salão, então
disse a ele que não precisava me buscar, que eu iria para casa
diretamente. Ele ofereceu seu motorista particular, Tom, mas eu
neguei.
Nos meses que se passaram, eu notei que estava sendo
seguida. Confrontei Rafael e ele confessou que havia pedido a
alguns colegas que ficassem por perto, caso Paulo aparecesse.
O que ele, graças a Deus, não fez.
Ainda precisava terminar de arrumar a minha mala, pois
iríamos passar a lua de mel em Cancún, no México, e eu não tinha
nem ideia do que levar, mesmo depois de Julia ter enchido meu
guarda-roupa com peças novas e caras.
Então peguei o ônibus e fui para casa.
Apesar de estar um clima ameno, típico de verão, minha rua
estava deserta. Um arrepio transpassou minha pele enquanto eu
caminhava pela calçada, já procurando a chave do portão na minha
bolsa.
Um carro se aproximou e parou ao meu lado. Virei-me para ver
quem era e o que queria, e levei um susto.
— Sofia — disse Paulo, com um sorriso que não enganava
ninguém. — Entre no carro, precisamos conversar um pouquinho.
— O quê? Não vou entrar.
Ele deu um soco no volante, me fazendo dar outro pulo.
— Entra no maldito carro, Sofia. Não quero enfiá-la à força.
Ah, meu Deus.
Olhei para os lados e não havia ninguém que eu pudesse pedir
ajuda. Onde estavam os malditos policiais quando eu precisava?
Paulo respirou fundo, parecendo se acalmar.
— Não vou lhe fazer mal, Sofia. Só quero dar uma palavrinha
com você.
Respirei fundo e assenti.
Dei a volta no veículo e, tremendo, abri a porta e entrei no lado
do passageiro.
Paulo sorriu satisfeito e fechou os vidros do carro.
— Eu disse que só iríamos conversar. Só coloquei um pouco
de pressão porque você é muito teimosa, às vezes.
— Diga logo o que você quer, Paulo.
Ele deu algumas batidinhas no volante e me encarou. Depois
seu olhar desceu para minha barriga.
— Hum... meu bebê está bem grande.
— Ele não é o seu bebê! — vociferei, erguendo o dedo
indicador na sua cara. — Você o rejeitou, esqueceu?
Ele riu e meneou a cabeça.
— Tem razão. Eu realmente não quero um filho. — Ele bufou.
— Seu noivinho sabe que essa criança fui eu que fiz em você?
Neguei com a cabeça. Paulo não precisava saber de todos os
detalhes da minha relação com Rafael.
— Ótimo. — Paulo levou uma mão ao meu queixo e o segurou.
— É bom que mantenha sua boca calada. Não quero que me
associem a você e muito menos a essa criança.
Balancei a cabeça, desvencilhando-me de seu toque que só
me causava náuseas.
— Eu soube que vocês vão se casar amanhã — ele disse. —
Uma pena eu não ter recebido o convite, mas... quero lhe dar os
meus parabéns, Sofia. Finalmente você conseguiu o que queria: um
marido rico para bancar os seus luxos.
— Não diga isso — rosnei. — Estou me casando com Rafael
porque o amo.
Ele riu.
— Bem, então é uma pena pra você. — Ele abaixou o olhar até
o câmbio do carro. — Sabe, o processo de divórcio da minha irmã
está quase saindo. Tenho certeza de que quando ela esfregar os
papéis de liberdade no rosto do seu querido amor, ele vai te deixar
em dois segundos.
Meu coração se apertou novamente. Queria sair correndo
daquele carro, para longe daquele cretino.
— Enfim... eu só vim para lhe dar os parabéns pelo
casamento, Sofia. — Ele segurou meu pulso. — Sabe, quando você
disse que estava grávida, eu já a imaginei gorda, descabelada...,
porém, eu me enganei. — Ele desceu o olhar pelo meu corpo de
uma forma que demonstrava seus pensamentos ordinários. — Você
está mais gostosa que antes. Que tal uma despedida de solteira? —
Ele riu ao ver minha cara de espanto. — Oras, Sofia. Não se faça de
desentendida... você gritava tanto quando eu a fazia atingir o
orgasmo.
— Você é desprezível.
— Hoje não, né? — Ele suspirou. — Mas pelo que sei, ainda
tem alguns meses aí de gravidez pela frente. Quem sabe podemos
fazer um joguinho. Minha irmã, Rafael, eu... você.
Tapei meus ouvidos enquanto as lágrimas desciam pelo meu
rosto.
— Cale a boca, Paulo! Eu te odeio!
Ele riu e se esticou, abrindo a minha porta.
— Pense com carinho na proposta, Sofia. Seria bem divertido.
Pulei para fora do carro, atordoada. Ele acelerou e foi embora,
me deixando ali à beira do precipício emocional.
Sentei-me na calçada e chorei.
Por que esse maldito tinha que aparecer para estragar a minha
felicidade? Para colocar mais dúvidas em meus pensamentos?
Por quê?

Rafael

— Rafael, vai pra casa descansar — Júnior, o DJ, falou ao se


aproximar. — Você já está aqui há horas. Deixa que o pessoal
termina de arrumar.
Desci a escadinha e olhei para o arranjo que tínhamos
colocado na parte de cima de uma coluna.
— Eu sei — bati as mãos, tirando a poeira de terra —, mas eu
gosto de ajudar. E isso ajuda a controlar minha ansiedade.
Júnior riu.
— Está tudo perfeito. Sua noiva vai adorar.
Olhei para o salão todo decorado e abri um sorriso.
Realmente, Sofia ia adorar. Era tudo calmo, claro e perfeito. A
combinação de cores que me lembravam seu sorriso sereno.
Meu celular começou a vibrar e vi que era o número de Sofia.
— Aí, acho que ela já está sentindo falta de mim — brinquei e
me afastei assim que atendi a ligação. — Olá, futura esposa.
— Rafa? — Era a voz de dona Florência. — Vem para cá,
Rafa! Minha menina está passando mal!
Meu coração gelou.
— Dona Florência? O que houve?
Ela estava com a voz abafada.
— Não sei, menino. O vizinho encontrou Sofia chorando na
calçada. Vem pra cá, ela não para de chorar e não quer falar o que
aconteceu.
— Estou indo agora mesmo.
Encerrei a ligação e saí como um louco pelas ruas de São
Paulo.
Quando cheguei à casa de Sofia, o portão estava aberto e eu
entrei. Encontrei dona Florência sentada no sofá.
— Ela está no quarto, menino. Não quer falar comigo, nem
dizer o que houve.
— Vou tentar falar com ela.
Subi as escadas de dois em dois degraus. Cheguei ao quarto
de Sofia e tentei abrir a porta, mas estava trancada.
— Sofia? — chamei. — Sou eu, Rafael.
— Vá embora! — ela gritou.
— Sofia, abra essa porta! Vamos conversar! — Ela não
respondeu. — Eu vou arrombar essa porta, se você não a abrir.
Levou três segundos, mas ouvi a porta sendo destrancada.
— O que você quer? — ela se afastou, deixando a passagem
livre para mim.
Entrei no quarto e fechei a porta. Ela estava com os cabelos
bagunçados, e seu rosto estava vermelho, de tanto chorar.
— O que houve, Sofia? — perguntei, lentamente. — Sua avó
me disse que a encontraram chorando na calçada.
Tentei não soar desesperado, mas parecia impossível.
Sofia se virou para mim e se jogou em meu peito. Abracei-a
com força.
— Paulo esteve aqui. Disse coisas horríveis. — As lágrimas
voltaram a descer. — Eu tenho medo dele. — Sofia me encarou. —
Do que ele possa fazer com o bebê.
Meu sangue ferveu no instante em que Sofia mencionou
aquele patife desgraçado.
— O que ele disse? — perguntei, entredentes.
Ela balançou a cabeça negativamente.
— Ele te ameaçou? — Segurei seu rosto entre as mãos. — Ele
te fez algum mal? Eu vou matar aquele filho da...
— Não! — Sofia gritou. — Você não vai fazer nada. Ele é
louco. Ele gritou para eu entrar no carro, senão ele iria me colocar à
força. Não quero que você corra riscos por causa dele.
Puxei Sofia para meus braços outra vez.
Depois de um tempo em silêncio, ela disse:
— Ele veio me dar os parabéns pelo casamento. Disse que eu
finalmente consegui dar o golpe do baú em alguém. Também me
disse que é uma pena, porque os papéis de divórcio da Fernanda
estão quase prontos e ele sabe que você vai voltar pra ela quando
isso acontecer. — Sofia se afastou para encarar meu rosto. — Você
vai me abandonar pra ficar com ela?
Encarei os olhos de Sofia profundamente.
— Eu dei a minha palavra a você que serei fiel aos nossos
votos. Não dei?
Ela demorou, mas assentiu.
— Então como pode acreditar nas coisas que aquele maluco
diz? — perguntei. — Se eu quisesse alguma coisa com Fernanda,
não acha que eu já a teria há muito tempo? Oportunidades não
faltaram.
Sofia olhou para baixo.
— Eu quero construir uma nova vida com você, Sofia. — Alisei
seu rosto. — Com nosso filho... uma casa feliz e cheia de momentos
bons.
Ela olhou para mim.
— Será que isso vai dar certo?
— Por que você não tem fé em nós? — perguntei, um pouco
indignado.
Ela deu de ombros.
— Casamentos com amor já são difíceis de dar certo.
Casamentos sem amor, então...
— Psiu — coloquei um dedo em seu lábio —, eu já disse que
só depende de nós.
Puxei Sofia para mais perto e levei meus lábios até os dela,
beijando-a com lentidão.
Aos poucos ela relaxou em meus braços e suas mãos
começaram a caminhar pela minha camisa, indo em direção aos
botões. Mas eu segurei seus pulsos.
— O que foi? — ela perguntou, a voz estremecida.
— Vamos nos casar amanhã — disse, mesmo que aquilo fosse
bem difícil. — Já estamos nesse celibato há quase um mês. Falta só
um dia.
Ela choramingou.
— Eu preciso de você, Rafael.
— Eu também preciso de você, gatinha. — Toquei seu lábio
com a ponta do dedo. — Mas hoje não. A partir de amanhã você
precisará me enxotar da cama, porque não vou deixá-la sair um só
instante.
Ela bufou e se afastou.
— Tudo bem, né... Eu espero, então.
Eu sorri, aliviado.
— Você vai ficar bem? — perguntei. — Quer que eu durma
aqui?
— Se você dormir aqui, eu o farei quebrar esse voto ridículo de
celibato. Então, vá embora. Amanhã nós nos veremos.
— Eu vou embora, mas antes quero que você vá tomar um
banho. Enquanto isso vou preparar um chá e um calmante pra você.
Ela pegou a toalha pendurada no guarda-roupa e foi ao
banheiro.
Respirei fundo, passando as mãos pelos cabelos.
O que eu podia fazer com Paulo?
Hoje eu não faria nada. Nem amanhã..., mas o dia dele
chegaria e eu teria o prazer de acabar com a sua raça.

— Mas que merda é essa? — Otávio vociferou, quando entrei


na sala dele, pegando-o pelo colarinho.
— A merda é que você não está cumprindo a sua maldita
parte. — O soltei e me afastei. — Sofia entrou em uma crise
nervosa, depois que aquele tranqueira a coagiu a entrar no carro
dele — falei, encarando-o com raiva. — E onde estavam os seus
malditos policiais?
Otávio ajustou a camisa e se sentou na cadeira.
— Bem, hoje tivemos um dia difícil na cidade. Precisei mandá-
los em uma missão.
— Mas eu também te dei uma missão. — Apertei o encosto da
cadeira.
— Eu não sou seu empregado, Rafael — Otávio respondeu. —
E eu não vivo para suas missões. Eu vivo sob ordem do maldito
Estado. A cidade vem em primeiro lugar.
— Os cidadãos vêm em primeiro lugar.
— Tanto faz! — ele retrucou e pegou um cigarro, acendendo-o.
— Por que não a trouxe para abrir uma queixa? Eu invadiria a casa
dele e poderia lhe dar umas porradas, se é isso o que você quer.
— Ah, porque adianta muito vir aqui abrir uma queixa —
respondi, irônico. — Eu quero que fiquem de olho naquele
desgraçado. Sei que ele vai tentar alguma gracinha e eu quero
pegá-lo no flagra!
Otávio tragou o cigarro alguns instantes.
— Tudo bem, Rafael. Vou ver o que consigo fazer.
Esfreguei minha testa.
— Amanhã eu me caso. Quero você lá.
— Não recebi nenhum convite.
Tirei um convite do bolso da calça e o joguei em cima da mesa.
— Às 9h da manhã. Sem desculpas.
Saí da sala de Otávio antes que ele dissesse mais alguma
coisa. Maldito fosse ele, que não estava cumprindo o que eu havia
pedido. Aliás, eu estava lhe pagando muito bem para que ficasse de
olho em Sofia.
Não havia desculpas.
Eu queria Paulo atrás das grades. Eu queria vê-lo rastejando,
na miséria, se possível.
Fernanda e Marcelo nunca chegavam a um acordo e eu não
conseguia colocar a mão na empresa deles. Tudo era uma questão
de negócios, mas agora era pessoal.
Sofia

Levantei os olhos diante do espelho e levei vários segundos


para reconhecer a minha imagem refletida.
Meus cabelos estavam presos em um coque, com algumas
mechas caindo ao redor do meu rosto, que já estava um pouco
arredondado pelo peso que eu ganhei devido à gravidez. Em cima,
havia uma tiara em pedrarias finas.
Era linda.
Ao meu redor, caía o véu, desta vez, o certo.
Meu vestido era em tom de champanhe, porque eu não quis
um exatamente branco. No entanto, era lindo e delicado. Deixavam
meus ombros à mostra e o corpete se ajustava ao meu corpo,
descendo com uma cauda de sereia.
— Ah, não chore, por favor — Victoria disse, ao ver que meus
olhos estavam marejados. — Vai estragar a maquiagem.
Olhei para cima e respirei fundo.
— Tudo bem, não vou chorar.
A porta se abriu de repente e era Julia, que estacou ao ver
minha aparência.
— Ah, meu Deus — ela sussurrou. — Você está lindíssima!
Sorri.
— Obrigada.
Ela se aproximou com o buquê em mãos.
— Rafael está mais nervoso do que quando abriu a primeira
empresa. — Julia riu, me entregando o buquê. — Vic, posso ficar a
sós com a Sof?
Victoria assentiu.
— Vou levar as meninas para o carro e despachá-las. Vejo
vocês na igreja.
Depois que Victoria saiu, Julia sorriu.
— Estou tão feliz por vocês. Saiba que eu faço muito gosto por
você ser parte da minha família. Uma irmã.
— Obrigada, Julia. — Suspirei. — Acredite quando eu digo que
isso tudo é uma grande loucura, mas...
Ela segurou minhas mãos.
— A vida é uma loucura. Sei que o casamento de vocês é algo
muito inesperado e que você preferia que as coisas tivessem
acontecido de uma forma diferente. Mas, eu também sei que a vida
é cheia de surpresas e às vezes coisas inusitadas precisam
acontecer para nos colocar no caminho certo. — Andrew e eu... —
ela riu —... ficamos juntos por causa de um bebê que, no final, nem
dele era.
Ri também, lembrando-me da situação em que os dois haviam
se metido.
— Sof, eu sei que o Rafael pode ser uma pessoa difícil, mas
ele tem bom coração e se prometeu cuidar de você, é isso o que ele
vai fazer.
Abaixei o rosto.
— Ele prometeu, sim. — Suspirei. — Mas acho que ele nunca
vai chegar a me amar, Julia.
— Será? — Julia ergueu meu rosto. — Talvez ele ainda não
tenha se expressado com palavras, mas quem disse que o amor
verdadeiro é medido por palavras? — Ela suspirou. — O amor
verdadeiro é medido através de atitudes e acho que só de o Rafael
estar ao seu lado em todos esses momentos, já significa muito mais
coisas do que podemos imaginar.
As palavras de Julia acenderam uma centelha de esperança
dentro de mim. Eu estava ali, prestes a me unir a Rafael. Será que
eu poderia fazê-lo me amar de verdade?
— Obrigada, Julia. Eu amo você.
— Eu também a amo.
Nós nos abraçamos, mas nos separamos logo. Julia não
queria que eu chorasse e, muito menos, amarrotasse meu vestido.
Saímos do hotel onde eu estava me arrumando e tirando as
fotos para o álbum, e encontrei minha avó em uma limusine alugada
especialmente para nós.
Quando chegamos ao salão, meu coração estava quase
saindo pela boca.
— Calma, minha filha. — Vovó pegou em minhas mãos. —
Você está linda.
Sorri.
— Obrigada por tudo, vó.
Ela sorriu e depositou um beijo em meu rosto antes de sair do
carro.
Fiquei presa no carro enquanto via a cerimonialista arrumar
tudo. Tinha bastante gente. Alguns amigos que eu havia convidado,
vizinhos, amigos de Rafael e de sua família.
Quando tudo já estava organizado, Andrew veio abrir a porta.
Ele ia me levar ao altar, já que eu não tinha pai, nem irmãos. E ele
achava que tinha a obrigação de fazer isso, já que, por sua causa,
meu caminho e o de Rafael se cruzou.
“— Se eu não fosse mulherengo e não achasse que o bebê
que apareceu no meu escritório fosse meu, vocês jamais teriam se
conhecido.”
Ele havia justificado, dias antes, arrancando risos de todos.
Saí do carro com sua ajuda, pensando que aquele momento
era especial e eu precisava vivê-lo com toda a intensidade.
Quando coloquei os pés dentro do salão, no tapete vermelho,
e todos os olhares se voltaram para mim, eu percebi que não havia
volta. Ainda não conseguia entender como eu tinha chegado até ali,
mas a questão era que sim, eu tinha chegado.
Rafael Henrique Souza seria meu.
Ele estava em pé, ao lado do juiz, me esperando. Estava lindo
em um terno escuro de corte ajustado em seu corpo maravilhoso.
Ele me olhava com intensidade enquanto eu caminhava.
Eu sorri.
Ele sorriu de volta.
E foram naqueles poucos segundos que eu soube que jamais
esqueceria aquele dia.
O juiz falou algumas palavras rápidas, que eu, nervosa como
estava, nem prestei atenção.
Aninha entrou com as alianças e depois se juntou à Helena,
que era a florista, do outro lado.
Só havíamos escolhido dois pares de padrinhos. Victoria e
George, Andrew e Julia.
Rafael colocou a aliança no meu dedo e repetiu as palavras
que o juiz mandou, sem deixar de olhar em meus olhos. Fiz o
mesmo e quando coloquei a aliança em seu dedo, ele abriu um
sorriso safado.
Rafael sempre seria Rafael, mesmo nos momentos mais
importantes da vida.
Ele me beijou sem esperar a permissão do juiz e, enquanto
todos aplaudiam, ele se abaixou e beijou a minha barriga.
Nesse momento eu chorei.
Rafael era um homem maravilhoso e eu não o merecia, mas
eu certamente faria de tudo para fazê-lo feliz.

— Tia Sof! — Senti a barra do meu vestido sendo puxado. —


Tia Sof!
Olhei para baixo e vi a pequena Aninha me chamando.
— O que foi, querida? — Abaixei-me até sua altura.
— Que horas você vai jogar o buquê?
Abri um sorriso caloroso.
— Logo, querida. Cadê a Helena? Vá brincar com ela.
— Ela está com o Rabbit.
Arregalei os olhos.
— Vocês trouxeram o Rabbit???
Ela abriu um sorriso travesso.
— Mas ninguém sabe — ela falou baixinho. — A Helena achou
a gaiola do gato dela e nós colocamos o Rabbit dentro.
Ah, meu Deus.
— Bem, só tentem não o deixar escapar. Ele deve estar
assustado.
— Ele não vai fugir. — Ela abriu um sorrisinho. — A cozinheira
deu comida a ele agora mesmo.
— Sofia? — Rafael me chamou e eu me levantei. Aninha saiu
correndo pelo salão. — Aconteceu alguma coisa?
— O Rabbit — respondi, ainda pasma.
Ele me encarou, sem entender.
— Elas trouxeram o coelho — expliquei.
Rafael arregalou os olhos.
— Julia sabe?
— Acredito que não.
— Meu Deus. — Ele passou a mão pelo cabelo. — Essas
meninas vão nos matar qualquer dia desses.
Eu ri, mas logo comecei a imaginar quando meu bebê
nascesse. Nossa vida estaria cercada de crianças.
Um homem de traços fortes, bonito e elegante se aproximou
de nós. Naquela noite, eu já havia cumprimentado tantas pessoas
que eu sequer conhecia. E aquele era mais um que eu não fazia
ideia de onde tinha surgido.
— Sofia, quero te apresentar Otávio Albuquerque. Ele é
delegado da 1ª Seccional, no Jardins.
O homem estendeu a mão, que eu apertei sem hesitar. Ele
tinha os cabelos negros, assim como seus olhos. Mas, além disso,
ele tinha um porte predatório. Bem, não era à toa que era um
delegado.
Engraçado que ele parecia ser bem jovem, provavelmente a
mesma idade de Rafael. Com aquele porte e ar perigoso, eu não
duvidava que as mulheres rastejavam aos seus pés.
— Muito prazer, senhora. Desejo-lhe felicidades, tanto pelo
casamento quanto pelo bebê.
— Obrigada. — Sorri.
— Otávio é um amigo — Rafael esclareceu. — Tem me
ajudado em muitas coisas ao longo dos anos e eu não podia deixá-
lo de fora desse momento especial.
— Ah, é claro. — Sorri e encarei o homem novamente. —
Espero que esteja gostando da festa.
Amigo... provavelmente era ele quem colocava aqueles
policiais atrás de mim.
Ele olhou para os lados, relaxado.
— Estou, sim. Vocês estão de parabéns.
Rafael abriu a boca para dizer algo mais, mas depois a fechou.
— Bem, vou deixar os noivos aproveitarem a festa. Vou beber
mais um pouco.
Otávio se despediu e saiu para o outro lado do salão.
— Por que diabos trouxe um policial para o nosso casamento?
— perguntei, aturdida.
Rafael não me encarou.
— Eu já disse. Ele é meu amigo.
Dei uma risada estrangulada.
— Sei. Amigos delegados... — Bufei. — Bem, ele não me é
estranho. Acho que já o vi em algum lugar.
Rafael deu de ombros.
— Ele vive dando entrevistas para os programas
sensacionalistas que a sua avó gosta de assistir.
— Deve ser isso.
— Está gostando da festa? — Rafael perguntou, mudando de
assunto.
— Está tudo lindo — falei, sendo sincera. — É mais do que eu
sempre sonhei.
Rafael pegou a minha mão e depositou um beijo.
— Fico feliz em saber. Vamos abrir a pista de dança?
Nós havíamos ensaiado uma coreografia para abrir a pista,
mas eu estava nervosa e com medo de errar os passos. Pelos céus,
minha barriga estava enorme, e se eu me atrapalhasse?
— Confie em mim, Sofia. Vamos arrasar.
Sorri e Rafael me puxou para a pista de dança. O DJ anunciou
que os noivos fariam a dança de abertura e que, depois, quem
quisesse podia se juntar a nós.
Fiquei de frente para Rafael e respirei fundo.
Os primeiros passos eram simples, de uma valsa calma ao
som de “Can't Help Falling In Love” do Elvis Presley. Depois houve
um “bum” e a música “Treasure” do Bruno Mars começou a tocar e
nossos passos ficaram agitados.
As pessoas formaram um círculo ao nosso redor, todos
animados enquanto nossos passos iam para lá e para cá. Palmas,
pulinhos. Eu ria, Rafael estava feliz demais. Outro “bum” na música
e um funk começou. Nesse momento, Rafael tirou o terno,
lançando-o longe enquanto requebrava até o chão.
Assobios rolavam e de repente Julia, George, Victoria e
Andrew se juntaram a nós, a baderna tomando conta geral. Eu ria
demais, enquanto tentava fazer os passos ensaiados.
Quando achei que já não aguentaria mais, uma música lenta
recomeçou e Rafael me puxou para si. Estávamos ambos
ofegantes, mas a alegria do momento nos contagiava.
— Está feliz? — Rafael perguntou em meu ouvido, enquanto
girávamos devagar.
— Estou. Muito. E você?
— Estou radiante. — Ele sorriu.
Nós nos encaramos por um momento e Rafael me beijou. Seu
beijo era diferente. Não era como das outras vezes, que ele me
beijava com a intenção de me excitar para me levar para a cama.
Esse beijo foi terno. Parecia conter sentimentos.
— Pronta para ir embora, senhora Souza? — ele perguntou,
ao separar nossos lábios.
— Estou pronta, se o senhor estiver.
Ele riu.
— Vá jogar o buquê para as solteironas. Depois, nós vamos
embora. Estou louco para aproveitar nossa lua de mel.
Passei os dedos pelo rosto dele e sorri.
— Eu também.
Sofia

Rafael não quis passar a noite em um hotel, preferindo que


fôssemos direto ao aeroporto para pegarmos o avião particular que
ele havia emprestado de Andrew.
O avião era lindo, confortável e dava para levar um grupo de
pessoas ali, se quiséssemos.
— Boa noite, senhores. Sou o piloto Júlio, ao dispor — o
homem nos cumprimentou, assim que subimos as escadinhas.
Havia outro homem ao seu lado, que também nos cumprimentou. —
Eu e o copiloto, Fred, iremos pilotar a aeronave para os senhores.
Uma aeromoça nos guiou, acomodando-nos em nossos
lugares.
— Vou trazer champanhe para os senhores. Desejam algo
mais?
— Champanhe só para mim — Rafael disse. — Para minha
esposa algo sem álcool. Suco de laranja, melhor.
Rafael sabia que eu amava suco de laranja.
A aeromoça assentiu.
— Ah, perdão. É o costume de oferecer champanhe a todos a
bordo. Nem tinha me tocado que a senhora está grávida e não pode
consumir bebida alcoólica.
— Tudo bem, fique tranquila.
Ela sorriu e foi para a parte traseira da aeronave.
Algum tempo depois de o avião ter decolado, virei-me para
Rafael e indaguei:
— Quem é aquele ali? — Apontei para um homem sentado
nos fundos da aeronave.
Rafael deu uma olhada para trás.
— É um médico. Solicitei que tivesse um, no caso de você
precisar.
— Ah, obrigada. — Dei um meio sorriso. — Ele vai ficar o
tempo todo com a gente?
— Bem, sim. Mas ele vai ter seu próprio lugar de descanso. Só
vai nos atender se eu chamar.
— Certo.
Rafael sorriu.
— O voo vai ser longo, querida. Quer descansar?
— Bem, eu realmente estou quebrada. Acho que preciso
descansar.
Dormi por algumas horas, até fazermos uma parada com o
avião. Depois voltamos a voar até o nosso destino final.
— Querida? — Ouvi a voz bem baixinha perto do meu ouvido.
— Chegamos.
Abri os olhos lentamente e o avião já havia pousado.
— Vamos? — Rafael estendeu a mão. — O carro já está nos
esperando.
Agarrei a mão de Rafael e deixei que me guiasse até um SUV
preto que estava do lado de fora nos esperando.
Ainda estava muito sonolenta. Os últimos meses foram
corridos, sem falar a gravidez, que a cada dia que passava me
deixava maior e mais cansada.
Eu já estava perdida pelo fuso horário, mas sabia que muitas
horas havia se passado desde que saímos da festa. O interessante
era que em Cancún estava claro o dia.
Fomos levados a um hotel luxuoso, que ficava na beira da
praia e era lindo. Sua decoração era de primeira categoria, assim
como os atendentes que abriam sorrisos a tudo o que dizíamos.
Quer dizer, a tudo o que Rafael dizia, porque eu não entendia nem
uma palavra que saía de sua boca.
— Espero que você goste do quarto que reservei — Rafael
disse, guiando-me pelo corredor. — Ele fica bem de frente para o
mar.
— Eu sei que vou gostar de tudo o que você escolheu, Rafa —
falei baixinho. — Tudo isso ainda parece um sonho.
Ele sorriu e passou o cartão no sistema eletrônico da porta.
Quando entrei, foi inevitável não arregalar os olhos. Lindo era
pouco para explicar a magnitude do quarto. Ele tinha dois
ambientes, uma antessala com alguns móveis e uma mesinha
central. O quarto anexo também era gigantesco e sua vista dava
para o mar azul.
Rafael pegou nossas malas com o homem, deu-lhe uma
gorjeta e fechou a porta.
— E aí, aprovou? — ele perguntou, virando-se para mim.
— É perfeito — murmurei, impressionada. — Rafa —
aproximei-me dele —, muito obrigada.
Ele abriu a boca para responder, mas eu o agarrei pelo
pescoço e o beijei com todo meu coração.
Rafael devolveu o beijo na mesma proporção. Meu corpo se
acendeu no mesmo instante, afinal, já havia um mês que não rolava
nada entre a gente. Eu o queria e naquele momento.
Mas Rafael parou o beijo e me afastou.
— Você está cansada. Precisa descansar da viagem. Depois
iremos dar uma volta na praia e à noite eu já reservei um
restaurante magnífico para jantarmos.
Fiz um beicinho.
— Tem certeza de que não quer consumar o casamento aqui e
agora?
Ele respirou fundo.
— Não me tente, Sofia.
Abri um sorriso malicioso.
— Achei que você estivesse ansioso para chegarmos aqui e
podermos...
— Vá descansar. — Ele me virou e sussurrou em meu ouvido:
— Nós vamos consumar esse casamento, logo, logo. — Então,
depois me deu um tapa na bunda.
Eu ri, mas sabia que ele tinha razão. Na verdade, até ele
estava exausto. Precisávamos repor nossas energias para depois
perdê-las novamente.
Olhei para a aliança em meu dedo junto com o anel de
noivado.
Aquilo não era um sonho.
Era real.
Dormi por várias horas, mas quando acordei vi pela janela que
já estava escuro. Ao meu lado na cama havia um bilhete, que abri
imediatamente.

“Espero por você no bar que há neste hotel. Coloque o vestido que
separei para você no closet.
Seu marido, Rafa.”

Bem, eu não conseguia nem imaginar qual tipo de vestido que


ele havia escolhido, mas resolvi checar e sorri ao ver um longo
vestido verde, de cetim. Seu decote era em V e as costas ficavam à
mostra.
Era um vestido muito elegante e eu não me lembrava de tê-lo
colocado na mala. Provavelmente essa era mais uma das surpresas
de Rafael.
Banhei-me com calma, agora já totalmente recuperada da
correria do casamento e da viagem. Queria apenas curtir o
momento, relaxar e aproveitar o que, de alguma forma, eu havia
conquistado.
Gostaria muito de ver a cara da Fernanda quando soube que
Rafael e eu nos casaríamos. Pelo que eu sabia, ela estava
irredutível no acordo que eles tentavam fechar. Mas Rafael também
estava pouco se importando, quanto mais tempo passasse, pior era
para eles.
Balancei a cabeça, espantando aqueles pensamentos.
Eu era a esposa de Rafael e mesmo que ele não tivesse
declarado amor eterno a mim, só o fato de ele me escolher como
sua companheira já dizia muito sobre o seu caráter. Ele queria uma
família e eu daria isso a ele.
Não podia deixar os meus medos e angústias prevalecerem
agora que eu já tinha assinado os papéis e colocado uma aliança
em meu dedo.
Saí da banheira, sequei-me e coloquei uma lingerie com cinta-
liga. Escolhi uma de cor branca, na esperança de que ele ficasse
louco ao ver. Coloquei o vestido e soltei meus cabelos, que, por
sorte, estavam sedosos e bonitos.
Passei uma maquiagem leve, porém, destaquei os lábios com
um batom vermelho. Mesmo com o peso da minha barriga, coloquei
um sapato com um saltinho um pouco mais alto.
O esforço valeria a pena.
Estava louca para que Rafael me tomasse em seus braços.
Desci pelo elevador e entrei no lounge do hotel. Fui até o bar e
mesmo de costas eu o reconheci. Rafael estava sentado no balcão,
com uma bebida à sua frente, porém, havia uma mulher
conversando animadamente com ele.
Meu semblante fechou no mesmo instante e então me
aproximei.
— Olá, querido — ronronei, passando as mãos em seus
ombros. — Senti a sua falta.
Rafael se virou para mim com um sorriso radiante e me puxou
pela cintura.
— Olá, querida. — Ele depositou um beijo em meu rosto e
depois me olhou da cabeça aos pés. — Você está lindíssima.
A mulher, que antes estava com um sorriso de orelha a orelha,
murchou no mesmo instante.
— Gostaria de beber algo, senhorita? — ela perguntou, em
sua língua natal, o espanhol. Não foi difícil entender.
— Não, obrigado — Rafael respondeu por mim. — Nós temos
um jantar.
A mulher assentiu e saiu de perto.
Então me soltei de Rafael.
— A conversa estava bem animada entre vocês... —
resmunguei. — Não sabia que você gostava de conversar com
mulheres em bares.
Rafael ergueu uma sobrancelha.
— Está com ciúme?
— Ciúme? — repeti, incrédula. — Ah, por favor.
Cruzei os braços e ele riu, levantando-se e agigantando-se na
minha frente.
— Estava apenas contando a ela que estou em lua de mel e
que estava esperando por você. Apenas isso. Ela me disse que
também se casou recentemente.
Idiota, idiota, idiota.
Eu quis me bater naquele momento.
— Ok, me desculpe. — Abri um meio sorriso. — Meus nervos
andam à flor da pele por causa da gravidez.
Rafael depositou um beijo na minha testa.
— Vamos? Nosso lugar já está reservado.

O restaurante era no mesmo complexo que o hotel, mas


Rafael me explicou que conseguir uma vaga não era fácil, afinal,
todo mundo queria jantar ali, por ter uma comida bem melhor do que
a que era servida no próprio hotel.
Apesar de estarmos em um restaurante na beira da praia, o
local tinha uma decoração que me lembrava os palácios europeus.
Não que eu já tivesse visitado algum, mas era o que eu via na TV e
nas revistas.
Quando nos acomodamos, o garçom nos entregou o cardápio
e Rafael me explicou o que era cada prato.
Pedimos salada de polvo grelhado como entrada e depois
ravioli de cogumelos da floresta com trufa italiana. Rafael pediu
vinho tinto e uma opção de bebida sem álcool para mim.
— Meu Deus, este lugar é magnífico — falei, enquanto nos
deliciávamos naquela comida maravilhosa. — Você já veio aqui
antes?
Rafael negou com a cabeça.
— Andrew já veio. Ele que me indicou.
— Ah, é verdade. Eles vieram ano passado para cá.
Rafael assentiu.
— Acha que fomos mal-educados por termos saído antes da
festa acabar? — Rafael perguntou.
— Acho que não. — Sorri. — Todo mundo sabe o quanto é
cansativo um casamento. Não podem nos julgar.
— Tem razão.
Rafael e eu comemos e conversamos sobre outras coisas.
Pedimos sobremesa, que eu quase pedi para repetir. Meu Deus, eu
realmente estava comendo por dois.
As horas se passaram e o assunto nunca acabava. Estávamos
felizes.
— Vamos? — Rafael estendeu a mão depois de acertar a
conta com o garçom.
— Vamos. — Coloquei minha mão sobre a dele e deixei que
me guiasse.
Achei que iríamos dar uma volta pela praia, mas eu já
imaginava que Rafael estava pegando fogo tanto quanto eu, então
não reclamei quando ele me guiou para o elevador, direto para
nossa suíte.
— Feche os olhos — ele instruiu, antes de abrir a porta.
— Por quê?
— Porque eu estou mandando.
— Rafa! — Dei um tapa em seu braço e ele riu.
— É sério, feche os olhos.
— Tudo bem. — Bufei, mas fiz o que ele pediu. — Só me guie
para eu não cair.
— Não vou deixá-la cair — ele prometeu.
Ouvi a porta destrancando e abrindo, depois senti a mão de
Rafael se encaixando na minha e me guiando.
— Ainda não abra os olhos.
— Tá bom...
Senti que ele me guiava diretamente para o quarto. Meus
nervos já estavam à flor da pele, mas eu não queria demonstrar.
Pelos céus, não era a primeira vez que eu fazia aquilo com
Rafael.
Tinha que ser fácil.
Bem, a diferença era que agora eu carregava seu sobrenome.
A primeira coisa que eu senti foi o cheiro de incenso.
— Posso abrir os olhos? — perguntei.
— Hum, espera só um pouquinho. — Rafael se afastou e, pela
minha percepção, ele tinha ido até a porta que dava para a sacada
do quarto. Depois ele voltou. — Prontinho, pode abrir os olhos.
Abri lentamente os olhos e olhei ao redor.
Meu Deus.
O quarto estava com as luzes apagadas, mas com várias velas
acesas ao redor, dando uma iluminação rústica. A cama estava
decorada com várias pétalas de rosas.
A porta da sacada estava aberta, o que fazia entrar um ar
noturno gostoso, junto com a brisa e o cheiro do mar.
Então Rafael bateu palmas duas vezes e uma música lenta e
sensual começou a tocar.
— Uau, Rafa. — Abri um sorriso e me virei para ele.
Rafael estava tão lindo, com seus cabelos negros contrastando
com sua pele morena. Seu terno estava aberto e os primeiros
botões de sua camisa também já estavam abertos.
Eu não sabia qual visão era mais deliciosa: Rafael dono de
empresa ou Rafael dono de empresa despojado.
— Gostou? — Ele ergueu uma sobrancelha.
Olhei ao redor novamente.
— Eu amei. É perfeito.
Ele suspirou, parecendo aliviado.
— Vem cá, eu pedi que preparassem algo para nós. — Ele me
puxou, levando-me para a sacada.
Em uma mesinha havia uma bandeja com champanhe,
morangos, manga, uva e chocolate.
— Uau, que delícia! — falei, animada. — Pena que não posso
tomar o champanhe.
— Esse você pode. — Rafael pegou a garrafa e a abriu. —
Não tem teor alcoólico.
— Hummm, você pensa em tudo, não é? — Peguei um
morango e molhei no chocolate, mordendo-o em seguida.
Rafael encheu duas taças e entregou uma para mim.
— Gosto dos detalhes.
Peguei a bebida de sua mão e sorri.
— Então fico feliz de ter me casado com você.
Rafael sorriu de volta e nós brindamos.
Peguei uma uva e a mergulhei no chocolate. Rafael observava
todos os meus movimentos.
— Não vai comer? — perguntei.
— Prefiro observá-la.
Minhas pernas tremeram.
E foi nesse momento que eu percebi que não havia me casado
com o Rafael que conheci seis anos antes. Eu me casei com um
novo homem. A essência de seu caráter era o mesmo, claro, mas
agora ele era... implacável. Intenso.
Não que antes não fosse, mas agora as coisas eram
diferentes.
Em pensar que eu quase havia recusado sua proposta.
Rafael, aquele homem, era meu.
E mesmo que ele não dissesse que me amava, eu lutaria por
ele. Lutaria por nós.
Deixei a taça de lado e dei alguns passos até ficar diante de
Rafael.
— Eu acho que você está me olhando muito — falei baixinho,
encarando seus olhos. — E eu acho que você está se segurando
para não me atirar naquela cama e fazer amor comigo até o
amanhecer.
Rafael grunhiu baixinho e então uma de suas mãos me
segurou pela nuca.
— Você não faz ideia — ele disse, aproximando-se do meu
ouvido — do que eu vou fazer com você a noite inteira.
Minha respiração falhou.
Ele se afastou com um sorrisinho safado e com a outra mão
livre, pegou um morango e o mergulhou no chocolate. Depois o
arrastou pela minha clavícula.
— Acho que vou começar por aqui. — Rafael se abaixou
novamente e deslizou a língua por onde o chocolate havia passado.
Fechei os olhos e respirei fundo.
— Ou então — ele arrastou o chocolate para baixo, em direção
ao vale entre os meus seios —, vou começar por aqui.
— Rafael... — Suspirei.
— O que foi, querida? — ele perguntou, com ar inocente.
Não consegui responder.
Rafael engoliu o morango e deu uma risadinha.
— Acho que vou experimentar uvas... — ele disse, pegando
uma e fazendo o mesmo ritual de antes. Depois ele passou a uva
pelos meus lábios. — Delícia.
Então seus lábios vieram de encontro aos meus e nosso beijo
se misturou ao gosto de chocolate.
Rafael soltou minha nuca e segurou minha cintura, puxando-
me para o seu corpo. Não resisti, enlacei meus braços ao redor de
seu pescoço e deixei que ele saboreasse meus lábios.
Quando percebi, já estávamos no quarto.
— Vem cá. — Rafael me puxou pela mão e se sentou na beira
da cama, me colocando entre as suas pernas. — Você está linda
com esse vestido.
— Obrigada. — Apoiei as mãos em seus ombros. — Não me
lembrava de tê-lo colocado na mala.
— Essa foi uma surpresa que não te contei. — Ele piscou. —
Agora vamos ver uma forma de não precisarmos rasgar esse belo
vestido.
Joguei a cabeça para trás, rindo, mas Rafael era esperto. Em
segundos, o zíper foi aberto e eu senti o vestido caindo aos meus
pés.
Ouvi a respiração entrecortada de Rafael quando viu minha
lingerie toda trabalhada.
— Não é só você que faz surpresas. — Coloquei um dedo em
seus lábios.
Ele capturou o meu dedo e o lambeu de uma forma erótica.
Fechei os olhos, levando-me naquelas sensações.
As mãos dele subiram e desceram pelo meu corpo, apreciando
cada parte.
— Eu estou gorda — reclamei baixinho.
— Você está deliciosa — ele retrucou. — Meu Deus, Sofia.
Rafael abriu o fecho do meu sutiã e liberou meus seios que já
estavam maiores àquela altura. Ele os capturou com a boca,
beijando-os e traçando a língua ao redor deles.
Joguei a cabeça para trás, gemendo. Queria que ele tivesse
tudo de mim.
Apoiei minhas mãos em seus ombros enquanto ele me
torturava com sua boca e com suas mãos, que desceram até a
minha calcinha, já úmida.
— Cintas-ligas — ele murmurou. — Elas vão sumir rapidinho.
Rafael as soltou e deslizou as meias pelas minhas pernas,
jogando-as em um canto qualquer do quarto.
Ergui seu rosto e o beijei novamente. Misturando nossas
línguas, buscando o melhor de um no outro.
Rafael massageou minha intimidade já inchada e nesse
momento eu perdi a compostura. Gemi, pedi por mais.
— Você está toda molhada para mim — ele sussurrou em meu
ouvido, enquanto eu gemia e me apoiava em seu corpo. — Assim
que eu gosto.
— Por favor, Rafa.
— Por favor, o quê?
— Eu quero você.
Ele continuou massageando minha intimidade. Depois enfiou
um dedo fazendo movimentos de vai e vem, levando-me à loucura.
Eu precisava dele.
O desgraçado sorria porque sabia que eu estava prestes a
explodir, ali, em pé, quase caindo por cima de seu corpo.
E foi isso que aconteceu algum tempo depois de tanto me
retorcer e pedir por mais. Eu explodi e Rafael me segurou antes que
eu desabasse.
— Ainda não acabou, meu amor — ele sussurrou em meu
ouvido, me colocando de costas na cama. — Quero sentir o seu
gosto.
Rafael se colocou de pé, tirou o terno, a camisa e a calça,
ficando apenas de cueca.
Ele retirou a minha calcinha ou pelo menos o que restava dela
e a atirou longe. Depois subiu na cama e se colocou entre as
minhas pernas.
— Apoie as pernas nos meus ombros.
Obedeci sem pestanejar.
Rafael passou a língua pela minha intimidade e eu apertei o
lençol entre os meus dedos. Estávamos cercados por pétalas, mas
não importava. Mesmo que estivéssemos no chão, o prazer que ele
estava me proporcionando fazia tudo valer a pena.
Ergui o quadril quando a língua dele começou a explorar com
mais força. Enquanto ele me chupava, voltou a me explorar com o
dedo. Fui à loucura mais uma vez.
— Rafa! — gritei, enquanto meu corpo era tomado por vários
espasmos.
Ele ergueu a cabeça.
— O que foi, querida?
— Eu preciso...
— Precisa?
— De você. — Bufei e deitei a cabeça novamente.
Ele deu uma risada gostosa e se levantou. Tirou a cueca e eu
salivei ao ver seu pênis ereto e ansioso por mim.
Aquele homem era meu.
Coloquei-me de joelhos na cama, ficando de frente para ele.
— Quer que eu chupe você? — perguntei.
— Quem sabe mais tarde — ele disse, segurando meu rosto
entre as mãos. — Agora eu quero me perder dentro de você.
Rafael me beijou apaixonadamente, mas eu não queria perder
o controle. Então o deitei de costas e me coloquei por cima dele.
— Essa posição é melhor pra você? — ele perguntou.
— Sim. — Fechei os olhos, enquanto descia minha intimidade
até o final e sentia sua grossura me preenchendo. — Ah, Rafa...
Ele gemeu também.
Suas mãos seguraram meu quadril e ele me ajudou, guiando
meus movimentos. Subi e desci, ora rápido, ora devagar. Eu queria
que ele sentisse todo o prazer possível.
Eu queria que ele me amasse.
— Sofia! — ele gemeu, enquanto ouvíamos os sons da fricção
de nossos corpos unidos.
— Rafa.
Ele me segurou, parando meus movimentos.
— Fique de quatro — ele ordenou, levantando-se da cama.
Céus, essa posição nos destruía, porque ela era intensa e
profunda. Mas era imensamente deliciosa.
Posicionei-me do jeito que ele queria. Minha barriga estava
grande, mas ainda dava para fazer umas estripulias como aquela.
— Se eu a machucar, por favor, diga que eu paro — ele
sussurrou em meu ouvido.
— Tudo bem.
Rafael alisou minha bunda e então penetrou minha vagina por
trás.
Arfei.
Ele juntou meus cabelos e os segurou, dando um leve puxão.
Então iniciou seus movimentos, entrando e saindo.
Perdemo-nos um no outro.
Nossas respirações.
Nossos corpos unidos.
Era tudo tão perfeito.
Quando chegamos ao ápice, Rafael gozou e saiu de mim, se
jogando na cama e me puxando para si.
Estávamos ofegantes, fora de órbita.
— Olá, esposa. — Ele deu uma risadinha enquanto tirava
umas mechas de cabelo do meu rosto.
— Olá, esposo — respondi, abrindo um sorriso maravilhado.
Eu amava aquele homem.
E eu só tinha uma oportunidade de fazê-lo me amar também.
Que Deus me ajudasse.
Sofia

Rafael e eu tomamos café da manhã nas dependências do


hotel. Um café da manhã maravilhoso, diga-se de passagem,
recheado de coisas gostosas para comer.
Depois, voltamos ao quarto e nos preparamos para ir à praia.
Eu estava louca para entrar no mar e aproveitar a tranquilidade que
ele nos oferecia.
A praia não estava tão cheia, então não foi difícil arrumar um
lugar para ficarmos. Rafael passou protetor solar em meu corpo e
eu no dele. Trocamos beijos animados e rimos quando ele passou
protetor em minha barriga, dizendo que era uma camada extra de
proteção ao bebê.
Eu estava feliz demais.
Nós nos banhamos no mar agitado, mas eu quis me manter
mais perto da orla, onde a água não me arrastasse tanto. Depois
voltei para a areia e me deitei na cadeira.
Rafael ficou ainda na água e eu observava-o de longe.
Aquele homem bonito, forte e másculo era meu.
Peguei meu Kindle na bolsa para ler enquanto Rafael se
divertia na água, mas a minha paz durou poucos segundos. Logo,
quatro mulheres falantes se aproximaram com caixas, chapéus
gigantes e guarda-sol.
— Eu disse que era muito coisa pra trazermos — uma delas
falou. — Estamos pagando mico.
Ah, elas eram brasileiras.
— Quem está pagando mico? — a mais velha, de cabelos
encaracolados, retrucou. — Estamos apenas sendo prevenidas.
Elas continuaram vindo em minha direção, até que estacaram
ao me ver.
— Ah! Olá, moça! — a de cabelo encaracolado disse. — Quer
dizer, ehn, — ela se virou para a outra —, como que se
cumprimenta alguém em espanhol, mesmo?
— Acho que é...
— Eu sou brasileira — as interrompi. — Não se preocupem.
Elas sorriram, aliviadas.
O grupo era de mulheres de meia-idade, exceto por uma que
deveria ter uns 18 anos. Todas elas pareciam bem animadas.
— Viemos para cá por estar mais tranquilo. Incomoda-se se
montarmos nossa barraca por aqui?
Toda a praia estava tranquila, mesmo assim, eu dei de ombros
e disse:
— Claro que não, fiquem à vontade.
Elas se animaram e começaram a montar suas coisas, perto
até demais. Dei de ombros e voltei a ler o meu livro no Kindle.
— Está de férias? — a de cabelo encaracolado perguntou. —
Ah, me desculpe. Nem nos apresentamos. Eu sou Valéria, esta é
minha filha Vanusa. — Ela apontou para a mais nova do grupo. — E
estas são minhas amigas, Lurdes e Regina.
— Ah, muito prazer. — Sorri para todas. — Sou Sofia e estou
em lua de mel.
Elas sorriram.
— Ah, parabéns pelo casamento e pelo bebê. Está de quanto
tempo? — Lurdes perguntou.
— Estou de 23 semanas.
— E já sabe o sexo? — Regina quis saber.
— Bem, nós pedimos ao médico para guardar segredo. — Dei
um meio sorriso.
— Mas e quanto aos preparativos? — Valéria arregalou os
olhos. — Acredito que você vai querer deixar tudo de acordo.
Alisei minha barriga.
— Não me importo muito com essa coisa de cor. Meu bebê irá
usar cores neutras. Claro que se for menino, depois darei prioridade
para cores escuras ou se for menina, adicionarei alguns tons de
rosa.
Elas assentiram.
Percebi que Rafa tinha saído da água e se aproximava.
— Olá, querida. — Ele depositou um beijo em meus lábios e
depois pegou uma toalha para se secar — Está lendo o quê?
As mulheres que estavam perto arregalaram os olhos.
— Ah, querido. Deixa eu te apresentar minhas novas... — O
que eu ia dizer? “Amigas”? Eu nem as conhecia direito, pelo amor
de Deus.
— Amigas — Valéria falou, com um sorriso vitorioso.
Rafael arqueou uma sobrancelha e depois que eu falei o nome
de cada uma, ele as cumprimentou. Então se deitou na cadeira ao
meu lado.
— Que diabos essas velhas querem aqui? — ele resmungou.
— Rafa! — Dei um tapinha em seu ombro. — Elas só queriam
um canto mais tranquilo, igual a gente.
— Sei.
Ele fechou os olhos e relaxou no assento.
Peguei meu Kindle novamente, mas foi difícil me concentrar
com aquele bando de mulheres doidas, falando sem parar. Elas
resolveram ir para a água e era uma situação mais hilária que a
outra.
Depois de algum tempo, o celular de Rafael tocou.
— Aff — ele resmungou, olhando a tela do celular. — É o
Andrew.
— Será que aconteceu alguma coisa?
— Não sei. Vou precisar atender... tudo bem? — Ele me fitou,
receoso.
— Claro, vá atender.
Rafael se levantou e se afastou com o celular em mãos.
Respirei fundo. O que poderia ser? Andrew sabia que estávamos
em lua de mel e só nos ligaria se fosse algo extremamente urgente.
Enquanto Rafael estava afastado, falando ao telefone, as
mulheres doidas saíram da água e se sentaram novamente.
— Menina, que marido é esse, hein? — Valéria comentou, com
um tom malicioso. — Ele tem algum irmão solteiro?
Eu ri.
— Ele tem uma irmã, apenas.
— É uma pena. — Regina suspirou. — Então vocês se
casaram apenas porque você está grávida?
— Não, é que... — Minhas palavras morreram ao pensar em
como explicar aquela confusão toda.
— Se for por isso, é complicado, menina — Lurdes comentou.
— Homem como o seu só quer a gente enquanto temos o corpo
bonito e tudo no lugar. Quando a maternidade vem, as coisas
mudam. Os homens mudam também. O meu me deixou quando
minha filha tinha apenas um ano.
— Ah, isso eu concordo — Valéria disse, levando uma mão ao
peito. — O pai da Vanusa me deixou quando ela tinha cinco anos.
— Ela me encarou. — Não queremos te assustar, mas um bebê
muda tudo entre o casal. Se você não perde o tesão, ele perde. E
aí... as coisas vão ladeira abaixo.
Não soube o que responder, apenas virei a cabeça e olhei em
direção ao Rafael. Ele era um homem muito bonito, alto, forte, bem-
sucedido, desses que as mulheres fazem de tudo para ter na cama.
Minha situação era complicada em vários fatores: Rafael não
era o pai da criança que eu esperava. Ele não me amava.
Mas eu o amava.
— Algumas pessoas não dão sorte — comentei baixinho.
— Algumas? — Valéria bufou e riu. — Então 90% das
mulheres não dão sorte nesta vida, querida. Aproveita enquanto é
tempo. Mas se quer um conselho, não se apegue a esse homem ou
você irá sofrer.
Fiquei em silêncio, mas as lágrimas vieram aos meus olhos,
ameaçando cair a qualquer momento. Enfiei o Kindle na bolsa. Já
era o bastante para hoje.
Quando Rafael veio na minha direção, sua feição não era boa.
— O que houve? — perguntei, levantando-me para recolher
minhas coisas.
— Fernanda Casablanca aceitou o acordo — ele disse, sem
rodeios. — Ela finalmente quer a nossa ajuda.
Então meu mundo ruiu de uma só vez.
Fernanda.
Maldita Fernanda.
Meu casamento mal havia começado, mas já estava prestes a
ruir.
Senti uma tontura e tombei para trás, mas Rafael teve tempo
de me segurar.
— Sofia? Sofia?
E depois eu não vi mais nada.

Abri os olhos lentamente, mas logo os fechei ao sentir uma


pontada em minha cabeça.
— Sofia?
Voltei a abrir os olhos e vi Rafael sentado ao meu lado,
segurando a minha mão.
— Sof? — ele chamou novamente.
— Água — resmunguei, ao sentir minha boca seca.
Rafael se levantou e ultrapassou a porta. Nesse momento
percebi que estávamos em nosso quarto no hotel. Ele voltou com
um copo de água nas mãos e me ajudou a beber.
— O que houve? — perguntei, assim que minha sede foi
saciada.
— Você desmaiou na praia. O doutor te examinou, você
acordou e depois ele te deu um remédio para dormir.
Deitei-me na cama e respirei fundo.
— Nossa, não lembro de nada disso.
Ele apertou minha mão.
— Algo a deixou nervosa — ele disse. — Consegue se
lembrar?
Respirei fundo.
— Lembro que estávamos ao lado de umas velhas mal-
amadas — falei. — Depois o telefone tocou e você saiu para
atender.
E claro, Fernanda tinha voltado para a nossa vida.
Mas isso eu não ia falar em voz alta.
Rafael suspirou.
— Tem alguma coisa te preocupando? Sabe que pode se abrir
comigo, ainda mais agora que estamos... casados.
Desviei o olhar para a porta da sacada um pouco aberta.
— Que horas são?
— Três da manhã.
— O quê? — Arregalei os olhos.
Ele riu.
— Está com fome? Pedi que trouxessem o jantar no quarto,
para quando você acordasse.
Balancei a cabeça negativamente.
Rafael se levantou e caminhou até a porta da sacada.
— Quer dar uma volta comigo na praia?
— Agora?
— Por que, não?
— Levando em consideração que eu já dormi por horas, tudo
bem. — Me levantei, devagar. — Espero que não seja proibido
caminhar pela praia em plena madrugada.
Rafael riu.
— Não, não é.
Rafa me ajudou a calçar meus chinelos e depois de lavar o
meu rosto e prender meus cabelos em um rabo de cavalo, saímos
do quarto e caminhamos em direção à praia.
Estava tudo silencioso, exceto pelo barulho da quebra das
ondas.
Rafael e eu tiramos nossos chinelos e começamos a caminhar
pela orla de mãos dadas, sentindo a areia fofinha entre nossos
dedos dos pés.
— Eu acho que o seu desmaio foi culpa minha — Rafael falou.
Seu tom era como se carregasse um caminhão de culpa. — Falei de
quem não devia em nossa lua de mel.
— Não, Rafa. — Tentei tranquilizá-lo. — Bem, eu estou grávida
e sou um turbilhão de sentimentos ambulantes.
— Por isso mesmo — ele emendou. — Qualquer coisa ruim
pode te atingir de maneiras catastróficas e eu não quero de jeito
nenhum que você ou o bebê corram risco.
Rafael parou de andar e me puxou para ficar de frente para
ele.
— Me perdoa?
— Perdoar o quê?
— Por ter falado sobre “aquela que não deve ser nomeada6”?
Eu ri.
— Ai, Rafa. Você é bobo.
Ele sorriu e fitou meus lábios.
— Só quero o seu bem-estar. E o do bebê.
Ficamos em silêncio enquanto o barulho das ondas dizia muito
mais coisas do que conseguíamos dizer em voz alta. Eu queria falar
que o amava, que não queria perdê-lo agora que já o havia
conquistado. O problema era que eu não havia conquistado Rafael.
Pelo menos, não o seu coração.
— Rafa... — respirei fundo —... como você está se sentindo,
em relação a esse casamento?
Ele passou uma mão pelo meu rosto.
— Estou satisfeito e você?
— Também.
Ele deu mais um passo e abaixou o rosto em minha direção.
— Então é isso o que importa. Quero que se sinta bem, que
tenha tudo o que tiver direito e se algo a incomodar, não hesite em
me falar.
Joguei os braços ao redor de seu pescoço.
— Tá bom. Vou tentar não ser uma esposa chata.
Ele riu.
— Bem, certamente uma esposa chata não vai me ajudar em
muitas coisas. Mas eu a conheço, Sofia, e sei a pessoa maravilhosa
que você é. Eu fiz a escolha ideal.
Meus olhos marejaram.
Rafael abaixou o rosto e capturou meus lábios em um beijo
doce e sincero. Suas mãos se enfiaram em meus cabelos,
desmanchando o rabo de cavalo que eu havia feito.
Então pouco a pouco nos deitamos na areia. Rafael distribuía
beijos por toda a extensão do meu colo e acariciava meu corpo com
as mãos livres.
— Rafa, acho que não podemos...
— Psiu... — Ele me silenciou com outro beijo quente. — Tudo
podemos, desde que ninguém nos veja.
— E se alguém vir? — perguntei, quando ele abaixou a alça do
meu vestido.
— A gente sai correndo.
— Eu não posso correr, estou grávida!
Ele capturou meu seio e o sugou, arrancando um suspiro alto
da minha boca.
— A gente dá um jeito.
— Ai, meu Deus, Rafa — arfei, quando nos tornamos uma
confusão de mãos e bocas.
— Quero que você tenha o melhor sexo na praia — ele disse,
antes de me penetrar.
E eu acreditava nas palavras de Rafael.
Porque aquele sexo na praia, eu jamais me esqueceria.
Rafael

Os vinte dias da nossa lua de mel passaram mais rápido do


que eu gostaria. Porém foram os melhores vinte dias da minha vida.
Sofia e eu nos entendíamos melhor do que eu poderia
imaginar. Estávamos criando uma conexão muito boa e estava
sendo uma experiência bem interessante acompanhá-la durante a
gravidez. Exceto, talvez, quando ela cismava de comer alguma
coisa que eu não fazia ideia de onde encontrar.
Então voltamos para casa, que eu já havia pedido que
preparassem para a nossa chegada.
— Temos que preparar o quarto do bebê — Sofia falou,
virando o rosto para me encarar. Estávamos no banco detrás do
carro, indo em direção ao nosso apartamento.
— Temos, mesmo. O tempo está voando. — Coloquei a mão
sobre a barriga dela.
Dias antes, eu tinha sentido o bebê se mexer. Havia sido uma
experiência diferente de tudo o que eu já tinha experimentado na
vida.
— Quais cores você acha legal usarmos? — ela perguntou.
— Acho que podemos usar uma variação de todos os tons. —
Sorri. — Se bem que eu não entendo nada de colorimetria. Você vai
precisar pedir ajuda a uma designer de interiores.
Sofia riu.
— Eu também não entendo nada.
— Então realmente precisamos encontrar uma designer.
Entrelaçamos nossos dedos e seguimos o restante do trajeto
em silêncio.
Eu sabia que casamentos não eram assim o tempo todo e que
uma hora ou outra teríamos alguma discussão. Mas a questão era
que eu estava satisfeito com tudo.
Depois eu precisaria dar um presente para Julia, por ter me
incentivado a pedir Sofia em casamento.
Ao chegarmos em casa, fomos recebidos por dona Márcia,
empolgada com toda aquela situação.
— Querem que eu prepare algo para vocês comerem? — ela
perguntou. — Claro, não sei se agora vão precisar do meu trabalho,
mas...
Céus.
Com toda aquela correria eu havia me esquecido de conversar
com dona Márcia sobre nossa nova vida.
— Perdão, dona Márcia, eu acho que esses foram os meses
mais incertos para a senhora — falei, sentindo-me um asno.
Ela deu uma risadinha envergonhada.
— Não se preocupe, menino. Se você não for precisar mais do
meu trabalho, eu consegui guardar uma graninha com o bônus que
você me dava todos os meses.
Sofia olhou para mim como se dissesse “meu Deus, Rafael,
onde estava a sua cabeça?”
— É claro que vamos precisar da senhora. — Sofia a puxou
pela mão. — Ainda mais agora com o bebê chegando. Aliás, acho
que Rafael vai até que aumentar o seu salário, porque vou precisar
de muita ajuda.
Dona Márcia riu, parecendo aliviada.
— Ah, se é assim... eu ficarei muito feliz em continuar
trabalhando aqui.
Aproximei-me de dona Márcia e a puxei para o meu peito,
depositando um beijo em sua cabeça.
— Perdoe esse pobre cabeça-dura. Depois vamos falar sobre
seu novo salário, ok? Mas me lembre, porque minha cabeça anda
bem agitada ultimamente.
Ela riu.
— Pode deixar que vou cobrá-lo, menino.
Respirei, aliviado, ao ver que, pelo menos, algumas coisas
continuaram iguais.
Dona Márcia foi correndo para a cozinha e Sofia olhou ao
redor da casa. Parecia animada, feliz e todos os adjetivos bons que
pudessem existir.
— Ah, Rafa... eu amo essa decoração. Não sei se quero
mudar nada aqui.
— A casa também é sua. Fique à vontade para fazer o que
desejar.
Ela me encarou.
— E se eu quiser colocar uma árvore de Natal bem no meio da
sala?
— Desde que não atrapalhe a visão que eu terei de você
sentada naquela poltrona. — Apontei. — Por mim, tudo bem.
Ela riu e se jogou nos meus braços, me dando um beijo
entusiasmado.
— Vamos até o futuro quarto do bebê? — Ela puxou a minha
mão. — Estou tentando imaginar como podemos decorá-lo.
Segui Sofia escadaria acima, segurando sua mão. Viramos à
direita, onde ao fundo ficava o nosso quarto e o do bebê seria ao
lado.
Ela abriu a porta e nós entramos no cômodo vazio, exceto por
algumas caixas que Sofia havia trazido de sua antiga casa.
— Acho que vai ser legal o bebê ficar aqui, pertinho da gente.
— Ela olhou ao redor. — Quero um berço aqui — apontou para um
canto — e mais uma cômoda ao lado. Do lado de cá, penso em
colocar uma estante. Nosso bebê precisa apreciar livros desde
pequeno.
— Ou pequena — completei, aproximando-me por trás e
puxando Sofia para mim. — E eu concordo com você. Livros são a
essência da alma.
Sofia fechou os olhos e relaxou em meus braços.
— Rafa, eu ainda acho que estou sonhando.
Depositei um beijo em sua bochecha.
— Por que acha isso?
Ela ficou em silêncio, mas depois abriu os olhos e neles havia
conflitos, tristezas, incertezas...
Sofia se afastou de mim e foi até a janela.
— Não sei. Até agora está tudo indo bem, mas eu ainda acho
que um dia você vai acordar, olhar para mim e ver que essa foi a
maior besteira que você fez. E o bebê...
Ela parou de falar.
— O nosso bebê — completei, dando um passo à frente. —
Sofia, quando eu te pedi em casamento, eu também pedi a
responsabilidade e a paternidade dessa criança.
Ela encostou a testa na janela.
— Mas e se você se arrepender?
— Eu não vou me arrepender. — Dei mais um passo e virei-a
para mim. Segurei seu rosto entre as mãos. — Eu... eu...
Inferno.
Eu sabia que já estava apaixonado por Sofia, isso era óbvio.
Mas por que eu não conseguia dizer?
Ela me encarou com expectativa.
— Eu sei que vai dar tudo certo — falei, finalmente. —
Seremos bons pais.
As expectativas de Sofia sumiram e ela se afastou de mim.
— Vou descer lá, comer alguma coisa e depois vou dormir —
ela disse. — Você vem também?
— Já vou.
Sofia saiu do quarto e eu tive vontade de me esmurrar. Eu
sabia que aqueles conflitos que ela tinha se deviam ao fato de eu
não ter entregado meu coração totalmente a ela.
Embora eu já tivesse feito isso quando enfiei um anel em seu
dedo.
Sofia queria palavras, mas eu ainda não conseguia dizê-las.
Eu sabia que ela nunca seria como Fernanda. Sofia retribuía com
vontade tudo aquilo que eu lhe oferecia.
O problema era que...
Eu não conseguia dizer que a amava. Era como se essa
palavra tivesse sido abortada do meu dicionário. Era como se algo
se rasgasse dentro de mim toda vez que eu pensava nisso.
Então eu preferia viver o momento.
Mas eu sabia que isso logo não seria o suficiente.
Sofia

— Você acha que vai ficar legal colocar o berço deste lado? —
Julia perguntou. — Talvez, desse outro...
— Mas eu gostei do desenho que a designer fez — falei,
mexendo o açúcar na minha xícara de chá. — Vai ficar legal.
Julia assentiu.
— Não vejo a hora de começar a fazer isso também — ela
disse, animada. — Mas, no meu caso, ainda vai demorar um tempo.
Minha gravidez é muito recente.
E a barriga dela nem tinha começado a aparecer.
— Andrew deve estar extasiado — falei.
— Ah, ele está. — Ela sorriu. — Queremos que seja um
menino, para fazer companhia à Ana. Mas se não for, tudo bem
também.
— Eu já não vejo a hora de nascer — falei. — Cada dia me
sinto mais pesada, mais cansada. Tem dias que quero comer até o
reboco das paredes.
Julia riu.
— Bem, cada mulher reage de um jeito, né?! — Ela deu de
ombros. — Bom, vou deixar isso aqui. — Julia deixou uma sacola
com algumas decorações para o quarto perto das caixas. — E o
Rafa, como está? — ela perguntou, enquanto saíamos do quarto. —
Faz semanas que não o vejo.
— Trabalhando muito. Depois que voltamos de viagem, ele
entrou de cabeça no trabalho.
— Mas espero que ele esteja te dando à devida atenção. —
Julia me olhou de esguelha.
— Ah, sim. Ele está. — Dei um meio sorriso. — Esses dias
apenas que ele voltou mais tarde que o normal.
Julia e eu descemos as escadas e fomos direto para o sofá da
sala.
— Desculpa me intrometer nisso, mas — ela passou as mãos
pelos cabelos castanhos — a vida sexual, está ativa?
Respirei fundo e bebi o restante de chá.
— Confesso que esses dias ando muito cansada e sem
vontade alguma.
— Bem, são os hormônios. Eu também tinha picos de desejo
sexual como também picos de desejo de matar Andrew. — Ela riu.
— Pobrezinho do meu marido.
— Mas isso passa, né? — perguntei.
— Passa. Claro. — Ela sorriu. — Vocês só precisam ter
diálogo aberto. Para que não haja interpretações erradas.
Assenti lentamente.
Rafael e eu conversávamos bastante, mas nunca sobre
nossos sentimentos e às vezes eu achava que isso era péssimo.
— Tem visto a Fernanda? — perguntei, como quem não queria
nada.
— A vi esses dias — Julia respondeu. — Ela estava saindo do
escritório de Andrew.
— Hum.
— Pelo que sei, Andrew está à frente da negociação em nome
do Rafael — ela disse, tentando me tranquilizar. — Mas não sei
exatamente como anda essa negociação, porque eles enrolaram
demais. Agora quem quer enrolar os dois é Rafael.
Dei uma risadinha.
— Se eu fosse ele, nem me enfiava nesse negócio.
— Eu também acho. — Julia cruzou as pernas. — Mas
homens não podem ver a palavra “dinheiro” que ficam loucos. E
talvez ele queira esfregar essa pequena vitória na cara da
Fernanda. Sabe que até hoje eu não sei exatamente por que os dois
se odeiam tanto, mas eu acho que o Rafa deve ter um bom motivo.
Rafael e Fernanda na mesma frase era algo que não me
agradava. Nem um pouco. Mas eu não queria falar isso em voz alta.
— E Paulo... apareceu novamente? — Julia perguntou
baixinho.
Neguei com a cabeça.
— Ele rejeitou a criança. Não há motivos para ele aparecer.
— Se ele fizer alguma gracinha, não hesite em contar ao Rafa,
hein?! — Ela apontou o dedo. — Não quero vocês correndo riscos
desnecessários.
— Pode deixar.
Julia e eu ficamos mais um bom tempo conversando. Ela me
contou que estava gostando da nova babá da Ana, mas que ela
ainda precisava aprender a controlar a menina.
Eu gostava de conversar com Julia, porque a hora passava
mais rápido. Agora como eu não trabalhava mais e não podia fazer
muitas coisas devido à gravidez, os dias pareciam passar
lentamente.
— Você precisa sair um pouco. — Julia me deu um abraço
quando já estava na porta, indo embora. — Por que não vai visitar o
Rafa? Garanto que ele irá adorar receber sua visita. — Ela olhou
para os lados e deu uma risadinha sugestiva. — Bebês podem ser
gerados em cima da mesa de um escritório, sabia?
— Meu Deus, Julia.
Ela riu.
— Bem — ela ergueu um ombro —, nossos maridos são ricos
e lindos, se não nos colocarmos na posição de esposa, as
vagabundas acham que podem dar em cima deles. Ouça meu
conselho. Vá assegurar o que é seu.
Dei um último sorriso e me despedi de Julia.
Quando fechei a porta, me encostei nela e repassei toda
aquela tarde em minha cabeça.
Julia tinha razão, afinal de contas.
Já fazia quase um mês que havíamos voltado às nossas vidas
e eu não tinha ido visitar Rafael nem um dia. Talvez estivesse na
hora de fazer isso e mostrar que eu também me interessava pelo
que ele fazia.
Amanhã eu faria isso.
— Dona Márcia? — gritei, enquanto ia para a sala.
— Sim, querida? — Ela apareceu minutos depois.
— Pode me preparar um banho bem relaxante e depois uma
panqueca de chocolate com morangos?
— Pode deixar. Quer doce de leite na panqueca?
— Quero!
— A senhora quer que tire o prato do senhor Rafael? — dona
Márcia perguntou, ao ver que eu já havia terminado meu jantar.
Suspirei.
— Pode tirar.
Ela tirou rapidamente nossos pratos, então me levantei,
olhando em meu celular se havia alguma mensagem. No WhatsApp
a última mensagem que Rafael havia me mandado, foi às 13h,
dizendo que estava saindo para almoçar com um cliente importante.
Sentei-me no sofá e assisti a um pouco de televisão, até que a
dona Márcia se despediu e foi embora.
O relógio marcava 20h.
Olhei no celular e não havia nenhuma mensagem.
Resolvi subir para o quarto e tomar um banho. Enchi a
banheira, e mergulhei, tentando esquecer que na última semana o
meu marido estava chegando muito tarde em casa.
Eu estava grávida, inferno. Será que ele não se importava
mais?
Calma, Sofia. Ele está trabalhando.
Saí da banheira quando a água já estava esfriando e vesti um
pijama comum. Liguei a TV do quarto e me enfiei debaixo dos
lençóis.
O cansaço me venceu e eu fechei os olhos gradualmente.
Não sei quanto tempo se passou, mas fui acordada com beijos
demorados em meu pescoço. Mãos sedentas percorriam meu
corpo, dedos acariciavam meus seios.
— Rafa? — resmunguei, ainda sonolenta.
— Perdão por não ter vindo jantar — ele sussurrou em meu
ouvido. — Trabalhei como um condenado hoje.
Sua boca veio até a minha em um beijo sedento, possesso.
Não sabia dizer, mas ele já deveria ter tomado banho, pois seu
cabelo estava molhado, sua barba recém-feita e ele cheirava ao seu
sabonete favorito.
— Você me perdoa, Sofia? — ele perguntou, deslizando uma
mão para dentro da minha calcinha.
— Perdoo.
Ele massageou minha carne e foi impossível resistir.
Entreguei-me à paixão dele.
Rafael não demorou nas preliminares, mas garantiu que eu
atingisse o orgasmo. Depois me penetrou e estocou com vontade,
como se estivesse sedento disso havia dias.
Bem, eu não podia culpá-lo. Nossa vida sexual não estava tão
ativa quanto no começo de tudo.
Quando acabou, ele se deitou ao meu lado e puxou a coberta
para nos cobrir. Depois acariciou meu rosto e meus cabelos.
— Como vocês estão?
— Estamos bem.
Ele deu um meio sorriso.
— Durma. Já se passa da meia-noite.
Arregalei os olhos.
Meia-noite?
— Você trabalhou até agora? — perguntei baixinho, mas o
pânico podia ser sentido em meu tom.
— Não, querida. — Ele alisou meu rosto. — Trabalhei até às
21h. Depois dei uma passada na casa da Julia, porque precisava
falar com Andy. Cheguei às 23h, mas você já estava dormindo.
— Ah, sim...
Abracei Rafael e tentei acalmar meus pensamentos.
Acredite nele, Sofia.
Mas como eu podia acreditar em um homem que sequer
conseguia me amar?

No outro dia, resolvi espantar a frustração e fazer o que Julia


havia dito. Pensei até em ligar para ela ir comigo, mas eu sabia que
me posicionar como a esposa do chefe, era algo que eu precisava
fazer sozinha.
Coloquei um vestido longo, com listras azuis e brancas. Dei
uma enrolada em meus cabelos com o babyliss e depois os soltei,
deixando-os com cachos grandes, apenas ondulados. Passei uma
maquiagem leve e me certifiquei de que eu estava bela o suficiente
para o meu marido me admirar.
— Bom dia, dona Sofia — dona Márcia me cumprimentou,
assim que me aproximei da cozinha. — Uau, a senhora está linda.
— Obrigada, dona Márcia. — Me sentei na bancada com um
pouco de dificuldade. A barriga estava cada dia mais pesada.
— O que a senhora quer de café da manhã?
— Ah, o de sempre — respondi. — Ovos mexidos com
presunto e queijo. Leite e achocolatado.
Ela sorriu.
— Vou preparar já.
Enquanto ela preparava meu café, chequei meu celular. Não
havia nada de interessante nas redes sociais, nem no WhatsApp.
Mandei uma mensagem para minha avó, dizendo que a visitaria
antes de ir à empresa.
— A senhora vai ver o patrão? — dona Márcia perguntou,
animada, enquanto me servia.
— Vou, sim. — Olhei para o meu prato. — Acho que já passou
da hora de saberem que ele tem uma esposa linda e grávida.
Dona Márcia riu.
— Está certa, querida. O patrão, bonito do jeito que é, com
todo o respeito, deve ter um monte de mulher querendo uma
chance.
— Pois é. — Enfiei o garfo no presunto misturado com o ovo
— Ele saiu muito cedo? Nem vi que horas eram.
— Ele saiu assim que eu cheguei — ela respondeu. — Era
umas 07h30.
— Ah, sim.
Não me lembrava de muita coisa, nem mesmo de Rafael ter
me dado um beijo de despedida, coisa que ele fazia todos os dias.
Tomei meu café da manhã e saí de casa. Rafael tinha
contratado um novo funcionário para mim, que era como meu
motorista. No começo, eu disse que era besteira, que não precisava
disso porque eu sabia dirigir. Mas, agora com a gravidez avançada,
eu estava quase satisfeita por ter Jonatas como meu motorista
particular.
Outro ponto positivo de ter Jonatas, era o fato de que se Paulo
tentasse se aproximar, ele estaria por perto e com seu tamanho de
lutador de boxe, duvidava de que Paulo teria alguma chance.
Conversei com minha avó durante uma hora inteira. Ela estava
animada com a chegada do bebê e com meu casamento.
— Eu sempre disse que ele era o marido ideal para você.
Talvez minha avó tivesse razão, mas eu sentia que ainda
estávamos bem longe de ser o casal ideal.
Quando saí de lá, pedi que me levasse diretamente à
empresa. Um grandioso prédio localizado na Avenida Paulista.
Eu já tinha ido ali algumas vezes durante nosso namoro e o
noivado. Bem, podia se dizer que eu tinha ido ali três vezes. Mas
era sempre um ambiente no qual eu não me encaixava.
Executivos de um lado, mulheres elegantes de outro.
Dinheiro, dinheiro, dinheiro.
Eu quase podia ver o Tio Patinhas7 jogando as notas para
cima. E eu, uma ex-babá, não conseguia me enxergar naquele
mundo corporativo que Rafael tanto amava.
— Bom dia, senhora Sofia! — Graziela, a assistente de Rafael,
me recebeu com o maior sorriso do mundo. — Que surpresa
agradável vê-la por aqui.
Olhei para os lados, examinando a antessala. Havia algumas
pessoas sentadas, talvez esperando para falar com Rafael.
— É, resolvi dar uma passadinha aqui.
— E como está a gravidez? — Ela olhou para minha barriga.
— Meu Deus, parece que foi ontem que a barriga estava
pequenininha, agora já está enorme.
— Pois é. — Alisei minha barriga. — Crescendo e chutando
muito.
— Será que é menino, então?
— Talvez. E se for, acho que será jogador de futebol.
Graziela riu e então ela se aproximou de sua mesa.
— Eu gostaria de falar com meu marido. Posso entrar? —
perguntei, indo em direção à porta da sala.
Graziela hesitou.
— Bem, ele está em reunião com uma cliente.
— Uma cliente? — repeti, dando ênfase no sexo da pessoa.
Graziela ficou vermelha como um pimentão.
— Bem, sim. Era, na verdade, para ter vindo um casal, mas ao
que parece o homem não veio, apenas a esposa.
O clima se tornou tenso de repente.
Respirei fundo.
— Bem, não vou atrapalhar meu marido — falei, já girando a
maçaneta da porta. — Mas eu...
— Então, mas é melhor a senhora esperar. — Graziela pulou
na minha frente.
A porta se abriu e meu olhar foi direto para dentro da sala.
A conversa que havia antes, cessou. Rafael olhou diretamente
para mim, depois para Graziela.
— O que está acontecendo? — ele perguntou.
Busquei o rosto da mulher que estava com ele. Então respirei,
aliviada, ao ver que não era Fernanda, mas sim uma senhora de
cabelos grisalhos.
— Ah, querido — falei, tomando as rédeas da situação. —
Perdoe-me por interromper. Graziela estava me dizendo que você
estava ocupado, mas eu já estava entrando.
A essa altura, Rafael já tinha se levantado e se aproximava de
nós.
— Não tem problema, querida. — Ele sorriu, dando um beijo
em minha bochecha. Então olhou feio para Graziela. — Eu,
francamente, espero que você não tenha tentado impedir a entrada
da minha esposa.
— Não, não, senhor — ela gaguejou.
— Ótimo.
Rafael me puxou para dentro da sala e me apresentou para a
mulher. Ela foi simpática e como todo mundo fez várias perguntas
sobre a gravidez.
Por sorte, a conversa deles já estava no fim e eu me senti
aliviada por não ter interrompido um negócio sério.
Quando ela se foi, Rafael trancou a porta da sala e se
aproximou de mim.
— Estava com saudade do seu marido? — perguntou, me
puxando para si.
— E se eu estivesse?
Ele abaixou a cabeça e me beijou.
— Eu ficaria imensamente honrado.
Dei uma risadinha e espalmei minhas mãos em seu peito.
Rafael me beijou com vigor, até que minha bunda encontrou a
beirada de sua mesa.
— Quando saí, você estava em um sono profundo — ele disse,
acariciando meu rosto. — Não quis acordá-la.
— Eu gosto quando você me acorda. Se eu acordo tarde, me
sinto inútil o resto do dia.
Rafael riu.
Depois me beijou mais uma vez.
— Queria te comer aqui em cima da minha mesa — ele falou
descaradamente em meu ouvido. — Mas não sei se isso é
apropriado no momento.
— Por quê? — perguntei, sem esconder a decepção na minha
voz.
— Porque não seria uma posição confortável para você. E
temos que zelar pelo bebê. — Ele me encarou. — Não faltarão
oportunidades para isso.
Beijei Rafael novamente.
Eu adorava seus beijos. Eles ora eram quentes, ora lentos.
Mas eles sempre me excitavam.
Depois que o beijo cessou, ele olhou no relógio.
— Você chegou na hora certa. Vamos almoçar juntos? Faz
tempo que não fazemos isso.
— Vamos, claro.
Rafael sorriu e, naquele momento, eu senti que ainda estava
em vantagem na conquista do coração do meu marido.
Algumas semanas depois...

Sofia

— Bem, seu bebê já está bem formado... olhe as mãozinhas


aqui. — O médico apontou para a pequena tela do ultrassom. — Ele
já consegue ter percepção de luz e sons, viu?
Rafael olhou para mim com um sorriso de orelha a orelha.
— Então ele já pode distinguir nossas vozes? — perguntou.
— Sim — respondeu o médico e então desligou o monitor. —
O bebê de vocês está em ótima formação. Acredito que se Sofia
continuar se cuidando, tudo será bem tranquilo.
Apertei a mão de Rafael.
— Eu estou me cuidando.
— Mas deve se cuidar mais ainda. — O médico me encarou.
— Você está no sétimo mês, indo para o oitavo e todo cuidado é
necessário. É uma fase de risco, tanto para você quanto para o
bebê. Não deve se descuidar.
Assenti lentamente.
— Vou pedir um teste de glicemia, mas quero que tome esse
suplemento também. — Ele anotou algumas coisas em uma
prancheta, tirou os papéis e entregou a Rafael. — Quando tiver o
resultado do exame, volte.
Saímos da clínica e Rafael me levou diretamente para casa.
Àquela altura eu já sentia dores nas costas, então preferia me
manter deitada na maior parte do tempo.
Estava tão perto de o bebê nascer. Felicidade e pânico se
misturavam e eu não sabia como agir. Falava pouco sobre isso com
Rafael, afinal, ele já tinha seus próprios problemas para lidar.
— Bem, o quarto já está quase pronto. — Rafael abriu a porta
do quarto do bebê antes de chegarmos ao nosso. — Mas eu acho
que esse projeto já está enrolado demais. Você ouviu o doutor dizer,
você está em uma fase delicada.
— Eu sei, a arquiteta disse que vai terminar tudo até o final do
mês. Caso aconteça alguma coisa e o bebê nasça antes do tempo,
tudo estará pronto.
— Acho bom. — Rafael fechou a porta e então seguimos para
o nosso quarto.
— Você vai ficar para almoçar? — perguntei, deitando-me na
cama.
— Não posso, tenho um almoço com Andrew. — Ele deu um
beijo em minha testa.
Tentei esconder a decepção.
— E vai vir para o jantar?
Depois daqueles dias de trabalho intenso, Rafael tinha voltado
a vir mais cedo para casa, porém, nas últimas duas semanas, ele
estava atolado e chegando tarde novamente.
— Jantar de negócios. Andrew também vai — ele disse. —
Talvez seja melhor não me esperar acordada.
Rafael nunca tinha me falado isso.
Encarei seus olhos por um longo instante, as inseguranças
voltando de uma só vez.
— Tudo bem.
Ele deu um beijo rápido em meus lábios.
— Cuide bem do nosso bebê.
Dei um meio sorriso e observei-o saindo do quarto.
Fechei os olhos e respirei fundo.
Não posso ficar nervosa.
Repeti isso por dez vezes.
Mas eu já estava nervosa. Rafael nunca tinha me dito para não
o esperar. Por que ele queria que eu dormisse antes de ele chegar?
Pense em outra coisa, Sofia.
Decidi ligar para Julia para saber sobre o chá de revelação,
que aconteceria no próximo domingo. Julia havia sido escolhida
para saber o sexo do bebê e era ela quem estava organizando tudo.
— Oi, Sof — ela atendeu no terceiro toque. Parecia estar
comendo.
— Tudo bem? Estou atrapalhando?
— Tudo ótimo. Não, imagina. Estou assistindo a Irmãos à
Obra, não acordei muito bem hoje.
— Nossa, mas... o que você tem?
— Mal-estar da gravidez, eu acho — ela resmungou. — Mas
não se preocupe, vou ficar bem.
Assenti.
— Então, eu liguei porque queria saber sobre o andamento do
chá. Me sinto inútil deixando tudo na sua mão.
— Sof! Não se preocupe com isso — ela ralhou. — Eu estou
organizando tudo com muito carinho. Tenho certeza de que vocês
vão amar.
— Então vai ser no domingo, mesmo?
— Sim. Eu já enviei os convites. — Ela parou. — Eu não te
falei o horário?
— Não.
Ela riu.
— Ah, meu Deus. Minha cabeça de vento. — Ela suspirou. —
Bem, o Rafa sabe. Eu falei pra ele.
— Hum... ele não me disse nada. — Deslizei o dedo pela
colcha. — Talvez pudéssemos marcar um jantar hoje à noite, que
tal? Rafa, eu, você, Andrew e Aninha.
— Ahhh, eu adoraria! Espera aí, deixa eu perguntar para o
Andy se ele tem algum compromisso.
Ouvi-a gritando para Andrew.
— Ele disse que não tem nada marcado hoje — Julia voltou a
falar. — Que horas vocês vêm?
Demorei vários segundos processando aquela informação.
— Tem certeza de que ele não tem nada marcado? —
perguntei, com aquele nó entalado na garganta.
— Ué, tenho. Andrew nem foi trabalhar hoje, porque eu vomitei
muito de manhã e pedi que ele ficasse em casa comigo.
Minhas mãos começaram a suar.
— Sofia?
— Ahn, sim... tá bom, Julia — me forcei a falar. — Chegamos
aí às 20h, ok?
— Tá bom, vou esperar vocês. Beijooo.
Desliguei o telefone e novamente o desespero começou a me
tomar. Por que Rafael havia mentido? Andrew não ia estar com ele
coisa nenhuma.
Havia alguma coisa nessa conversa e eu precisava descobrir.
Levantei e liguei direto para o escritório.
Graziela atendeu.
— Oi, Grazi. É a Sofia.
— Ahhh, oi, dona Sofia — ela respondeu, alegremente. —
Deseja falar com o senhor Rafael? Ele está ocupado, mas posso...
— Não — a cortei. — Na verdade, eu só preciso saber da
agenda dele de hoje.
Graziela hesitou alguns instantes.
— Bem, deixa eu ver aqui. — Ela suspirou. — Ele tem uma
reunião na clínica com o doutor Cardoso, às 16h. Depois... bem, ele
tem um jantar de negócios com... — Ela hesitou.
— Com quem?
— Ahn, Fernanda Casablanca.
Encostei na parede e respirei fundo por três vezes.
— Tem certeza? — perguntei. — É com Fernanda e mais
alguém?
— Aqui só está o nome dela — Graziela falou. — Mas posso
perguntar a ele se...
— Não — a cortei novamente. — Ele não pode saber que eu te
perguntei sobre a agenda dele, entendeu?
— Sim, senhora.
— Essa conversa morre aqui — repeti, em tom ameaçador. —
Entendeu, Graziela?
— Entendi, sim, senhora.
— Agora me passe o endereço do restaurante.
Ela passou e eu desliguei o telefone, deixando que as lágrimas
rolassem pelo meu rosto.
Eu sabia que seria assim. Dias antes, eu tinha ouvido Julia
falar com Victoria que o divórcio de alguém tinha saído, mas eu não
tinha me ligado que era Fernanda.
Rafael jamais me amaria.
Ele havia se casado comigo por pena, apenas para eu não ser
uma mãe solteira.
Olhei para aquele quarto gigantesco e me senti sozinha. Me
senti a pior das pessoas.

Rafael

Saí da clínica onde Cardoso era sócio e voltei para o meu


escritório. Trabalhei por mais algumas horas até ver que já estava
no horário do jantar que Andrew e eu havíamos combinado com
Fernanda e Marcelo.
Peguei minha pasta, vesti meu terno e saí do escritório.
Graziela e a maioria dos outros funcionários já haviam ido embora.
Dirigi até o restaurante combinado e fui guiado até a mesa,
onde já estavam me esperando. Porém, quando cheguei lá, apenas
Fernanda estava sentada, olhando o cardápio.
— Onde está o seu marido? — perguntei, pensando mil vezes
se me sentaria ali ou ia embora.
Ela abaixou o cardápio e abriu um sorriso.
— Não sabe que eu me separei dele? Agora é oficial.
Respirei fundo.
— Eu sei disso — falei, impaciente. — Mas que eu saiba, ele
ainda tem negócios com você.
Ela deu de ombros.
— Ele não precisa saber desta reunião.
Balancei a cabeça negativamente e olhei no relógio. Onde
estava Andrew? Ele nunca se atrasava, essa era uma das virtudes
daquele maldito meio-americano.
— Vou ligar para Andrew — avisei.
Ela deu de ombros novamente.
Disquei para o celular de Andrew, mas só caía na caixa postal.
Maldição.
— Por que não se senta? — Fernanda apontou para a cadeira
à sua frente. — Andrew deve estar chegando. O trânsito de São
Paulo é horrível.
Hesitei um pouco, mas depois assenti. Se eu tratasse
Fernanda de maneira distante, ela logo perceberia que tinha sido
um erro não trazer o ex babaca.
O garçom se aproximou e fizemos nossos pedidos.
— Não bebe mais vinho? — ela perguntou, ao ver que eu pedi
apenas água.
— Só bebo vinho com amigos — respondi secamente.
Ela deu uma risadinha.
— Costumávamos ser mais que amigos, embora você lute
para deixar isso enterrado.
Olhei-a fixamente.
— Fernanda, estamos aqui para uma conversa profissional. Se
você quiser levar para o pessoal, eu vou embora agora mesmo.
— Acalme-se, Rafael — ela ronronou. — Você está muito
estressado ultimamente. É a gravidez da Sofia? Imagino como ela
deve estar enorme e... — Ela fez uma careta. — Deve ser difícil,
sabe...
Soquei a mesa.
— Eu não estou brincando, Fernanda — avisei, pela última
vez. — Não mencione a minha esposa nessa conversa. Diabos, eu
nem deveria estar sozinho aqui com você.
— Por quê? Ela tem ciúme de você? — Ela ergueu uma
sobrancelha. — Ela acha que eu ainda posso reconquistar você?
— Fernanda, eu... — Minha cabeça começou a doer.
— Bem, é uma luta desigual, claro. — Ela deu de ombros. —
Uma ex-babá, grávida de outro homem... — Ela suspirou. — Será
que se eu pedir, ela deixa eu ver o meu sobrinho ou sobrinha
quando nascer?
Abri a boca para mandar Fernanda se calar, mas então eu ouvi
uma voz baixa, porém, ressentida, chamando o meu nome.
— Rafael?
Virei a cabeça e ali, próximo da nossa mesa, estava Sofia, me
olhando como se eu tivesse acabado de trai-la.
— Ops... — Fernanda deu uma risadinha.
— Sofia. — Levantei-me imediatamente.
Sofia se aproximou, com os olhos cheios de água.
— Então é por isso que você chega tarde em casa? — ela
gritou. — Está me traindo com ela? Não, não responda. — Ela deu
um passo para trás. — Eu sabia que isso ia acontecer, só achei
que...
— Sofia, não é nada disso! — Dei um passo em sua direção.
As lágrimas corriam por seu rosto e eu estava completamente
sem reação. Sem saber o que fazer.
Maldito fosse Andrew que não tinha chegado.
Sofia saiu correndo pelo restaurante e eu olhei para Fernanda,
que se mantinha impassível diante da cena.
Corri atrás de Sofia e a encontrei na calçada, com o celular em
mãos, provavelmente pedindo um motorista por aplicativo.
— Sofia, não é nada disso. — A puxei pelo ombro, mas ela
deu um passo para trás.
— Não me toque, Rafael — ela rugiu. — Vá para o seu jantar
com aquela mulher. Você sempre a amou. Aproveita agora que ela
está solteira novamente.
— Sofia, pelo amor de Deus! — Me coloquei na frente dela. —
Maldição, me ouça!
— Ouvir o quê? — ela gritou, dando alguns passos para trás.
— Vocês homens sempre mentem em relação a isso. Mas eu sei
que você está com ela. Você sempre chega tarde, quase nunca nos
falamos durante o dia. Eu sei, Rafael, não precisa mentir para mim.
Antes de ser sua esposa, eu era a sua melhor amiga!
Prensei Sofia contra a parede e a encarei.
— Exatamente por isso que eu digo com todas as letras que
eu não a traí com Fernanda! — disse, exasperado. — Não sei o que
houve, mas meu maldito cunhado não apareceu e você nos pegou
no momento que estávamos sozinhos. Mas eu jamais teria vindo a
esse jantar se Andrew tivesse dito que não viria!
Sofia ficou em silêncio.
Respirei fundo e encostei minha testa na dela.
— Você precisa acreditar em mim, Sofia. Eu prometi ser fiel e
eu estou sendo.
— Você prometeu segurança, Rafael, e não é isso que você
está me dando — ela retrucou.
E isso foi como um soco em meu estômago.
Eu sabia que esse dia chegaria.
— Eu, eu... — me engasguei —... Sofia, eu estou te dando
tudo o que posso.
— Mas não me deu seu coração! — ela disparou. — Para mim,
pouco importa se você tem dinheiro ou não. Eu sempre te amei,
desde a primeira vez que ficamos, mas o que eu recebi de você?
Apenas um afeto de irmão.
O carro que Sofia havia pedido chegou e ela se desvencilhou
de mim.
— Sofia! — Tentei impedi-la de entrar no carro.
— É melhor você me soltar, Rafael — ela avisou. — Ou eu vou
gritar e as coisas serão piores.
Eu a soltei.
Mas senti como se eu estivesse perdendo ali uma parte de
mim.

— Maldição, Andrew! — berrei, segurando-o pelo colarinho. —


Como assim, você se esqueceu desse maldito jantar?
— Nossa, perdão, Rafa. — Ele se ajeitou assim que eu o
soltei. — Julia passou mal o dia todo. Como acha que fiquei? Minha
cabeça nem estava associando àquele jantar com a Fernanda.
Perdão, ok?
Passei as mãos pelos cabelos.
— Agora você vai ter que se explicar com Sofia.
— Por quê? O que houve?
— Ela acha que eu tinha marcado um encontro com Fernanda.
Você vai ter que explicar que não foi porque é um imbecil esquecido.
Andrew bufou.
— Tudo bem, mas pode ser amanhã? — Ele me fitou,
cansado. — Quero dormir. Estou cansado.
— Vá dormir, seu idiota.
Saí do escritório da casa de Andrew e fui para minha casa. Já
eram quase 23h e eu esperava que Sofia tivesse se acalmado,
assim poderíamos conversar como pessoas civilizadas.
Abri a porta do apartamento, mas encontrei Sofia sentada no
sofá, com uma mala ao seu lado.
— Que diabos é isso? — perguntei, frustrado.
Ela se levantou.
— Eu estava esperando você chegar. Eu vou embora.
— O quê?
Sofia respirou fundo.
— Andrew me ligou e me explicou o que aconteceu — ela
disse.
— Então por que você quer ir embora?
Ela me fitou com os olhos cheios de lágrimas.
— Porque eu não posso viver assim, Rafael. — Ela balançou a
cabeça negativamente. — Eu não posso viver sempre com
desconfianças de que um dia você vai se apaixonar por alguém e
vai me deixar.
— Eu não vou te deixar, Sofia. — Dei um passo em sua
direção. — Pelo amor de Deus.
— Não, não se aproxime. — Ela secou o rosto. — Eu não
posso passar nervoso. Eu te amo, Rafael, mas sinto que você não
sente o mesmo. Não posso viver assim.
Fitei-a por longos instantes.
Minha mente gritava dizendo o que eu deveria dizer a ela. Que
ela era importante para mim, que eu havia me apaixonado por ela
durante aqueles meses, que eu não queria outra pessoa que não
fosse ela ao meu lado.
Mas eu não conseguia.
As palavras não fluíam.
— Sofia, por favor, seja razoável.
Ela deu uma risada descrente.
— Estou sendo razoável. Eu nunca deveria ter aceitado me
casar com você. Eu sabia que eu me decepcionaria ao ver que
jamais conseguiria me amar.
Sofia puxou a alça da mala e então me coloquei à sua frente.
— Sofia, não faça isso. Por favor.
— Por que, Rafael?
Sua pergunta me pegou desprevenido.
— Me dê um motivo para ficar, Rafael.
Diga a ela!
— Por favor, eu... eu sei que fui negligente nesses últimos
dias. Andei trabalhando muito, mas...
— Um motivo, Rafael!
— Eu a quero. — Dei um passo adiante. — A quero ao meu
lado.
Ela negou com a cabeça.
— Você quer sexo. Isso qualquer mulher pode te dar.
— Diabos, Sofia! — explodi. — O que você quer que eu diga?
— Quero saber se você me ama! — ela gritou. — Quero saber
se o que você sente por mim vai além de uma amizade.
Diga a ela!
Amor.
Aquele sentimento que um dia me destruiu completamente.
Que me fez enxergar que eu nunca seria nada se eu não tivesse um
império em minhas mãos.
Eu amava Sofia, sabia disso. Mas não conseguia colocar
aquelas palavras para fora. Era como se eu soubesse que ao dizê-
las, me tornaria um homem patético mais uma vez.
— Sofia... seja razoável.
Ela bufou.
— Até mais, Rafael.
Ela puxou sua mala e eu a vi saindo do apartamento. O
problema era que ela não estava apenas saindo do meu
apartamento, estava saindo da minha vida.
E não só ela.
O bebê também.
Naquele momento, eu odiei Fernanda Casablanca por ter me
estragado daquela maneira, mas odiei mais a mim mesmo, por não
conseguir expressar corretamente o que eu sentia.
Inferno!
Sofia

— Sofia, faz quatro dias que esses homens não saem da


frente de casa. — Minha avó fechou a cortina e me encarou. —
Devo me preocupar?
— Não. — Folheei a revista que eu segurava. — São policiais.
Rafael os paga para ficarem de olho em mim.
— Mas por que isso?
— Porque ele acha que Paulo pode tentar alguma gracinha.
Mas faz meses que nem ouço falar dele, então acho que tudo isso é
bem desnecessário.
— Seu marido se preocupa com você. Por que não volta para
casa?
— Vó, já tivemos essa conversa. Rafael não me ama. Não
quero viver com ele, sabendo que pode me deixar a qualquer
momento, quando encontrar outra pessoa ou, quem sabe, até voltar
com aquela ex.
Minha avó bufou e se sentou em sua poltrona favorita.
— Você é uma idiota, Sofia. Sabia que homens não
conseguem expressar o que sentem com facilidade? Seu avô era
desse jeito, mas eu sabia que ele me amava por cada atitude que
ele tinha comigo.
Fechei a revista e fiquei em silêncio.
Talvez minha avó tivesse razão, talvez eu estivesse com os
nervos à flor da pele apenas por causa da gravidez. O fato era que
quatro dias já havia se passado desde que eu saíra de casa e
Rafael não tinha vindo me ver.
— De qualquer maneira, ele nem está sentindo a minha falta.
Se estivesse, já teria vindo aqui ou me ligado.
Minha avó se levantou.
— Eu vou fazer um chá, porque vocês jovens são tolos demais
para saberem o que é o amor verdadeiro.
Ela foi para a cozinha e eu deitei a cabeça na almofada do
sofá.
Um dia antes, Andrew tinha aparecido em casa e se explicou
mais uma vez. Jurou que Rafael nunca mentiu, que na maioria das
vezes eles sempre estavam juntos nos jantares.
Eu acreditei.
Ainda assim, não conseguia acreditar que Rafael sentisse algo
por mim além de amizade. E eu queria mais. Queria seu coração.
Talvez eu pudesse mandar uma mensagem para ele...
Não.
Se ele sentisse minha falta, ele viria atrás.

Rafael

— Bem, então finalmente chegamos a um acordo que


beneficie ambos os lados, não é? — Andrew falou, animado. —
Vamos marcar o dia para assinarmos os contratos?
— Que seja rápido — Marcelo falou, rispidamente. — Acho
que já passou tempo demais.
— E a culpa não foi nossa — retruquei. — Quem pediu mais
tempo na negociação foi você e Fernanda.
— Tínhamos esperanças de conseguir resolver esse problema
de outra forma — ela disse, passando as mãos nos cabelos. — Mas
aqui estamos e agora não importa mais.
Andrew olhou para todos nós e deu uma leve tossida.
— Eu acho que se deixássemos o pessoal de lado, seria muito
mais fácil de trabalharmos juntos.
Ficamos todos em silêncio.
— Terça que vem, pode ser? — ele perguntou. — Graziela,
anote aí, às 10h da manhã. Vocês preferem aqui ou no meu
escritório?
— Tanto faz. — Marcelo deu de ombros. — Desde que seja
resolvido logo.
Olhei para aquele almofadinha e me controlei para não rir de
sua desgraça. Enrolou por tantos meses, achando que poderia
erguer uma empresa que ele mesmo deixou na miséria e agora
achava que podia exigir prazos rápidos.
Patético.
— Só lembrando que tudo será nos meus termos —
determinei. — Eu ainda posso desistir desse negócio e vocês
estarão na miséria.
Eles ficaram em silêncio.
— Então, por hoje é isso. — Encerrei a reunião, nem me
dando ao trabalho de me levantar. — Graziela vai acompanhá-los
até a saída. Tenham um ótimo dia.
Marcelo e Fernanda se levantaram e, depois de
cumprimentarem Andrew, se foram.
Respirei fundo, anotando os principais pontos que eu iria
trabalhar em cima daquele negócio, quando Andrew se aproximou.
— Seu humor está pior do que quando eu levei Julia pela
primeira vez na sua casa.
— Ah, é? — falei, sem encará-lo. — Nem tinha notado.
— Quando você vai atrás da sua esposa?
— Eu tenho que ir atrás dela? — Ergui os olhos para Andrew.
— Sendo que foi ela que surtou e me deixou?
Andrew colocou uma mão na cintura e se aproximou das
janelas da sala.
— Ela está grávida, com os hormônios à flor da pele. Ela
achou que você tinha mentido para ela e nem venha querer se
justificar, porque você realmente vacilou.
— Vacilei? — Ergui o tom de voz. — Vacilei em quê? Em me
casar com ela? Em assumir o bebê? Vacilei em dar o melhor para
ela?
Andrew me olhou impaciente.
— Vacilou em não dizer que a ama, seu tolo ridículo.
— Palavras? — perguntei, incrédulo. — O que são palavras
perto de atitudes? Eu dei o mundo a ela, isso não é demonstrar o
que sinto?
Andrew se aproximou da mesa.
— Se você não consegue dizer uma “palavra”, como você
mesmo diz, com esse tom esnobe, como pode demonstrar com
atitudes? — Ele ergueu uma sobrancelha. — Eu sei que dizer “eu te
amo” não significa muita coisa, na prática. Mas já é um passo, um
passo muito grande. Talvez seja a segurança que ela quer. Saber
que é dona do seu coração.
Fiquei em silêncio e voltei a rabiscar algumas malditas linhas
de algo que eu já nem sabia mais o que estava escrevendo.
— Eu vou falar com ela — falei, quando Andrew chegou à
porta. — Posso parecer insensível, mas Sofia já é parte de mim e
isso não posso negar.
— Então diga isso a ela.
Andrew fechou a porta e eu joguei a agenda longe.
Diabos.
Eu estava sentindo uma saudade excruciante de Sofia. Minha
casa estava um vazio tremendo e minha cama fria e sem sentido.
Eu precisava dizer isso a ela.

O dia, assim como os outros desde a partida de Sofia, foi um


verdadeiro teste de paciência. Então eu percebi que as coisas não
iam melhorar enquanto eu não tomasse uma atitude.
Peguei o telefone e disquei para o celular de Sofia.
Demorou cinco toques.
Talvez ela estivesse pensando se me atenderia ou não.
— Oi, Rafa. — Sua voz soou um pouco cansada.
— Oi, Sof. Tudo bem?
— Sim e você?
— Ah... não — resolvi ser sincero. — Como está o bebê?
— Está bem. — Ela pausou. — Por que você não está bem?
Aconteceu algo?
Encostei na cadeira e brinquei com uma caneta em cima da
mesa.
— Minha esposa me deixou há quatro dias. Não vejo motivos
para ficar bem com isso.
O silêncio imperou por vários segundos.
— O que você quer, Rafa?
— Precisamos conversar, Sofia. Pessoalmente.
Ela demorou alguns instantes, mas depois suspirou.
— Tudo bem. Quando?
— Hoje?
— Hoje não posso. Já prometi de levar minha avó para comer
pizza do Don Gianello.
— Ah, sim. — Mordi o punho. — Amanhã, então? Podemos
almoçar juntos.
— Pode ser.
— Eu te busco, então.
— Não, não precisa — ela falou. — Eu posso ir até lá. Antes
quero passar em uma loja pra comprar mais algumas coisas do
enxoval do bebê.
— Certo. — Suspirei, concordando. — Julia quer saber se os
planos do chá ainda estão em pé. Já é domingo agora.
— Nossa, é verdade. — Ela bufou. — Eu tinha até me
esquecido. Mas diga a ela que sim, está em pé.
— Ótimo. — Dei um meio sorriso. — Então nos vemos
amanhã? No lugar de sempre.
Quase pude vê-la sorrir.
— No lugar de sempre.
— Beijo.
— Tchau, Rafa.
E então encerramos a ligação.
Apesar de toda a frustração e de saber que eu só conseguiria
resolver esse problema no outro dia, eu já me sentia em paz, pelo
menos um pouco. Uma boa conversa, um bom vinho e uma boa
comida nos colocaria nos trilhos novamente.
Levantei-me, já um pouco mais animado, para ir até a casa de
Julia. Iria rever com ela os planos do chá de bebê e jantar com eles,
já que era horrível ficar sozinho em casa.
Engraçado que quando você passa a viver com uma pessoa,
qualquer dia longe dela já se torna um tormento.
Vesti meu terno e então ouvi três batidinhas na porta. Graziela
entrou.
— Senhor?
— O que foi, Grazi? — perguntei, ajeitando meu terno.
— Tem uma pessoa que gostaria de falar com o senhor.
— Agora? — Diabos, já era mais de 18h. Àquela hora eu não
recebia ninguém, pelo menos não sem agendamento.
— Sim, ela disse que é importante.
— E quem é ela?
— Sou eu. — A voz veio da porta e eu olhei em sua direção.
Fernanda estava parada no umbral da porta, com os braços
cruzados.
Graziela me fitou, como se perguntasse o que deveria fazer.
Enxotá-la? Não podíamos.
— Pode ir, Grazi. Eu atendo a senhorita Casablanca.
Graziela assentiu e se foi, fechando a porta para que Fernanda
e eu tivéssemos privacidade.
Ela usava uma saia um pouco mais curta, com meias escuras.
Uma camisa de seda na cor bege e seus cabelos estavam soltos,
um pouco ondulados.
A mesma mulher bonita e arrogante de sempre.
— Então? — Ergui as duas sobrancelhas. — O que você quer?
Fernanda não parou para me encarar. Começou a andar em
volta da sala, analisando cada detalhe.
— Sabe, eu fico feliz por ver aonde você chegou — ela
murmurou, mexendo em uma orquídea que estava em um armário.
— Nunca duvidei de que você seria alguém na vida, mas confesso
que você me impressionou.
Apoiei os punhos na mesa e esperei.
— Acho que já tivemos essa conversa um milhão de vezes,
mas enquanto eu sentir que tenho uma chance, vou tentar repeti-la.
— Ela se virou para mim. — Você é o único homem que eu amei,
Rafael. Eu sei que fui idiota e coloquei a empresa e os negócios à
frente do que sentíamos. Acredite, naquele dia que Marcelo
descobriu tudo, eu fiquei sem saber o que fazer. Meu pai queria que
eu me casasse com ele ou então eu não poderia assumir a
presidência da empresa. Os pais dele também me pressionavam.
Eu trabalhei tanto por isso, Rafael. Eu não podia simplesmente jogar
tudo para o alto.
Continuei encarando Fernanda em silêncio.
— Você sabe que meu casamento com Marcelo sempre foi de
fachada. Nunca nos amamos e tivemos que manter esse laço até a
morte do meu pai. — Ela suspirou e se virou novamente para a
orquídea. — Mesmo assim, depois de todos esses anos, eu ainda
amo você, Rafael.
Endireitei minha postura e alisei a minha gravata. Minha
vontade era de bocejar, porque aquela ladainha eu já tinha ouvido
outras milhares de vezes.
— Eu me separei dele. Acho que agora podemos recomeçar.
— Ela se virou para mim e se aproximou. — Eu nunca deixei de te
amar. E sei que apesar de tudo, você ainda sente desejo por mim.
Lembra que você disse que eu era a única pessoa que você
entregaria seu coração?
Fernanda deu mais um passo.
— Não consigo acreditar que a nossa história tenha morrido lá
atrás. Eu sei que você se casou com Sofia apenas para ser o pai
para o filho dela. Meu irmão é um irresponsável, eu sei, mas Sofia
sabia que ele era assim. Nunca se pode esperar muita coisa dele.
Respirei fundo. Aquilo já estava me dando dor de cabeça.
Ao ver que eu não dizia nada, ela continuou:
— Por favor, Rafa. Nos dê outra chance! Eu sei que Sofia te
deixou. Sei que você não conseguiu nem vai conseguir amá-la. —
Ela deu mais um passo, ficando apenas alguns centímetros de
distância e então, descaradamente apoiou as duas mãos em meu
peito. — Eu sei que o nosso amor não morreu. Eu sei que podemos
apagar o passado e recomeçarmos juntos.
Fernanda aproximou o rosto do meu e fechou os olhos.
De repente, seu perfume adocicado adentrou as minhas
narinas e eu me lembrei de como era beijar aqueles lábios
carnudos. Lembrei-me de como era tê-la em meus braços.
Anos atrás, eu teria me abalado com aquela situação. Levei
anos tentando ignorar meus sentimentos por ela, enquanto a via nos
braços de Marcelo.
Quando Fernanda sugeriu que fôssemos amantes, até
ponderei. Eu a teria de volta, mesmo que clandestinamente. Mas
meu subconsciente falou comigo naquele dia e disse: a troco de que
manter um caso com uma mulher que não conseguiu te escolher?
Então veio o choque de consciência. Aquela história de não
querer para os outros o que não quer para você. Passei seis anos
rejeitando Fernanda Casablanca, porque ela não merecia o meu
amor.
Olhar para aqueles lábios um dia foi uma tortura, mas agora
não era mais. Agora eu não sentia mais nada por Fernanda. Ela
significava apenas uma parte estragada do meu passado.
Quando seus lábios estavam a centímetros dos meus, eu
segurei seus pulsos e me afastei, dando um passo para trás.
Fernanda abriu os olhos, atordoada.
— Eu vou dizer pela última vez, Fernanda: o que vivemos no
passado, ficou lá. No passado. Eu a amei, sim, amei mais do que
deveria e agora estou pagando o preço por ter entregado meu
coração a você. — Ela ergueu as sobrancelhas, seu rosto
finalmente entendendo o que eu estava dizendo. — Eu amo a minha
esposa, Sofia. É ela quem eu quero para o resto da minha vida. Por
favor, me deixe em paz.
Soltei seus pulsos e me afastei, pegando a minha pasta.
— Você não pode estar falando sério! — Fernanda protestou,
tentando entrar na minha frente. — Aquela garota está grávida de
outro homem!
— Você chama o seu irmão de homem? — perguntei, bufando.
— Ele pode ser tudo, menos homem. Um homem de verdade
assumiria o que fez.
As lágrimas vieram aos seus olhos, mas ela as segurou.
Afastei-me dela e fui em direção à porta.
— Então essa é a sua última palavra? Você não me quer
mais?
Parei antes de atingir a maçaneta e me virei para ela.
— É, Fernanda. E espero que seja a última vez que nós temos
que conversar sobre isso. Eu estou extremamente apaixonado pela
minha esposa e pelo meu filho que está para nascer. Se você não
consegue lidar com isso, acho que é melhor repensar o contrato e
se afastar de mim e da minha família.
Abri a porta e saí da sala, deixando todo aquele inferno de
sentimento que Fernanda um dia evocou em mim para trás. E feliz
por ter conseguido dizer o quanto eu estava apaixonado por Sofia.
Agora só faltava dizer isso a ela com todas as palavras do
dicionário.
Sofia

— Nossa, menina, não é que a pizza deste lugar é deliciosa


mesmo? — vovó comentou, enquanto seguíamos pela calçada até
um lugar onde eu iria chamar um Uber.
— Eu falei, vó. — Abri o aplicativo. — A massa deles é
diferente, não é pesada.
— Sim, mas também pelo preço. — Ela bufou. — Você deveria
ter chamado o menino Rafael para vir com você, se queria tanto vir
aqui.
— Eu falei com ele hoje, vó. Amanhã vamos almoçar juntos
para conversar.
— Acho bom mesmo.
Decidi ignorar minha avó e me concentrar no celular, enquanto
eu pedia o carro. A calçada estava cheia de gente, porque aquele
lugar era famoso e todo mundo queria comer uma pizza de lá em
uma sexta à noite.
Então alguém esbarrou em mim e eu ergui a cabeça para me
desculpar, mas quando vi quem era, gelei.
Bem, não só eu gelei. Ele também, pela forma como arregalou
os olhos.
— Ora, Sofia — ele disse, mas sua voz mais soava decepção
do que tudo. — Que surpresa agradável vê-la aqui.
Então olhei para o lado e vi a namorada famosa de cabelo
ruivo e, por incrível que pareça, não me surpreendi quando abaixei o
olhar e vi sua barriga saliente.
— Olá, Paulo. — Tentei abrir um sorriso falso. — Olá, Giovana.
Ela me reconheceu de imediato e me abraçou, como se
fôssemos grandes amigas.
Trocamos algumas palavras fúteis, mas Paulo estava
extremamente incomodado com algo.
— Querida, pode me esperar lá dentro? — ele perguntou. —
Quero dar uma palavrinha com a Sofia.
Ela olhou interrogativamente para ele.
— É sobre trabalho.
— Ah, sim. — Ela sorriu, se virou para mim e se despediu. Deu
um abraço em minha avó também.
Quando ela entrou na pizzaria, Paulo olhou com desdém para
minha avó e me puxou para um canto, pedindo desculpas a ela por
precisar da minha atenção por alguns segundos.
— Ai, me solta, seu cretino — reclamei, sentindo meu pulso
arder. — O que você quer?
Ele olhou para os lados, certificando-se de que ninguém nos
ouviria.
— Achei que já tinha nascido. — Ele olhou para minha barriga.
— Claro que achou, você nunca soube fazer conta de cabeça
— retruquei, mas ele apertou meu braço novamente.
— Fiquei sabendo que seu conto de fadas durou bem menos
do que eu imaginava — ele disse, entredentes. — Espero que não
pense que eu vou assumir essa criança, agora que Rafael caiu fora.
— Não, não espero. — Puxei meu braço de volta. — Por mim,
você pode morrer, sumir do mapa, o que achar melhor.
Ele respirou fundo e ergueu o indicador, apontando para o meu
rosto.
— Eu gosto da Giovana e ela está grávida. Não quero que
você estrague isso. Ela, sim, vale a pena.
— Vá para o inferno, Paulo — retruquei. — Eu nunca pedi a
sua ajuda, não vai ser agora que vou querer que se responsabilize
por alguma coisa.
Ele sorriu e passou o mesmo dedo por uma mecha do meu
cabelo.
— Boa menina. Agora vá, não gosto de me lembrar que um dia
tive algo com você.
— Estamos quites então, cretino desgraçado — murmurei. —
Boa sorte com sua namoradinha. Ao contrário de você, eu desejo
que vocês sejam felizes.
Ele me olhou pela última vez, bufou e se foi.
Ergui os olhos para os céus, as lágrimas brotando dos meus
olhos. Por sorte, eu não tinha me apaixonado por aquele imbecil. Eu
faria de tudo para que meu filho seguisse os passos de Rafael, que
eu tinha certeza de que seria um ótimo pai.
— Tudo bem, filha? — Minha avó se aproximou.
— Tudo sim, vó. O carro chegou?
— Chegou. Vamos.

Finalmente o sábado chegou.


Acordei animada logo cedo e já abri as cortinas do meu antigo
quarto, que era onde eu estava dormindo naqueles dias longe de
casa.
Os pássaros estavam cantando nas árvores e eu peguei um
punhado de farelo de pão e deixei na beirada da janela. Eles logo
vieram abocanhar.
Algo me dizia que essa noite havia sido a última que eu tinha
passado em meu quarto. Mas a última mesmo. Eu tinha quase
certeza de que Rafael e eu nos acertaríamos e ambos voltaríamos
para o nosso lar.
A verdade era que eu já estava sentindo falta de lá, da minha
cama enorme, até da dona Márcia e suas comidas deliciosas. Mas,
principalmente, eu sentia falta de Rafael. Do seu cheiro, dos seus
abraços, dos seus toques.
Eu estava na reta final da gestação, precisava dele ao meu
lado.
Tomei café da manhã com minha avó e nós rimos das coisas
que ela ficava sabendo das vizinhas. Uma havia espancado o
marido com um cabo de vassoura, a outra tinha fugido com o
amante.
Se existia vizinhança mais agitada que aquela no estado de
São Paulo, eu desconhecia.
Então, quando se aproximou do horário de sair de casa,
encostei minha mala pronta do lado da porta e só deixei de fora o
vestido que eu usaria no almoço. Ele tinha flores rosas e azuis. Eu
gostava dele, pois era elegante e confortável.
Havia sido presente de Julia.
Tomei banho, me arrumei, passei o perfume que Rafael
gostava e deixei meus cabelos soltos.
— Mala pronta? — vovó perguntou, quando desci as escadas
e deixei a mala encostada perto da saída.
— Pois é. Se tudo der certo, vou voltar para casa.
Dona Florência sorriu.
— Não tem por que não dar certo. Vocês se amam, só
precisam descobrir isso juntos.
Eu sorri.
— Quer que eu te acompanhe até o restaurante? — ela
perguntou. — Não sei, não estou gostando da ideia de você ir
sozinha até lá.
— Vó, tem policiais disfarçados aí do lado de fora, que
certamente vão seguir os meus passos. — Revirei os olhos. — Não
há perigo. Eu estou bem, estou me sentindo até mais feliz.
Vovó se levantou e veio em minha direção.
— Eu só desejo o melhor para você, minha filha. — Ela beijou
meu rosto. — Que você e seu marido consigam se acertar.
Sorri e depositei outro beijo na testa da minha avó.
— Eu te amo tanto. Não sei o que seria de mim sem a
senhora.
Nós nos abraçamos por um tempo, até que eu a soltei.
— Bem, mas isso não é uma despedida. Rafael e eu nem
conversamos ainda. Eu só volto para casa dependendo do que ele
me falar hoje.
— Ele vai dizer que é louco por você.
Dei uma risadinha e fui em direção à porta.
— Deus te ouça, vovó.
Saí de casa e observei um carro azul parado um pouco mais à
frente de casa. Achei um pouco estranho estarem com outro
veículo, mas eles sempre disfarçavam, às vezes iam até um trailer
que havia na esquina.
Peguei meu celular para pedir um carro pelo aplicativo, quando
um SUV preto parou bem ao meu lado.
— Oi, dona Sofia! — Era Jonatas, com seu jeito alegre. —
Estava passando por aqui e resolvi ver se a senhora não gostaria de
uma carona.
Revirei os olhos.
— Pode falar que o seu chefe mandou vir me buscar — falei,
impaciente e ele riu, dando de ombros.
— De qualquer maneira — falei, entrando no carro. — Isso vai
me economizar um pouco. Só que já vou avisando, você vai comigo
comprar umas coisas para o bebê.
Ele arregalou os olhos pelo retrovisor.
— Ih, dona. Eu não sei nada dessas coisas, não.
— Ah, mas vai aprender, então.
Jonatas acelerou o carro em direção ao endereço que eu tinha
lhe passado. O outro carro também nos seguiu.
Era extremamente exagerado da parte de Rafael, mas por um
lado eu até me sentia mais tranquila. Só Deus sabia os perigos que
nos rodeavam uma cidade como São Paulo.
Jonatas estacionou onde eu pedi, em uma ruazinha
movimentada perto do Brás.
— Vamos?
Jonatas saiu do carro, um pouco desconfortável por deixar um
SUV daqueles parado na rua onde havia muita gente tentando
ganhar o pão de cada dia.
— Se roubarem o carro, o Sr. Rafael vai me demitir, dona.
— Não vão roubar o carro — o tranquilizei. — E ele tem
seguro, não tem?
— Deve ter, né?!
Dei risada e apressei o passo, me concentrando no que eu
precisava fazer.
Meias, sapatinhos, touquinhas...
Peguei na minha bolsa uma listinha do que eu queria comprar
e caminhei em direção à faixa de pedestres. Não era muita coisa,
mas eu queria ver se encontrava tudo ali por perto.
— Sabe, o Rafa vai surtar quando souber que eu vim aqui em
pleno sábado lotado para comprar coisas do enxoval — confidenciei
a Jonatas, que estava ao meu lado. — O que você acha?
Jonatas abriu a boca para falar, então eu vi o semáforo de
pedestres prestes a fechar.
— Vem, vamos logo! — O puxei.
Eram os últimos segundos, mas dava tempo.
Só que quando coloquei os pés no meio da avenida, vi um
carro acelerando para cima de mim.
Tudo aconteceu rápido demais.
Gritei.
Fui puxada com força.
Mesmo assim, eu senti o impacto quando alguém caiu por
cima de mim e saímos rolando pelo chão.
Minhas costas queimaram imediatamente.
Meu bebê. Protejam meu bebê.
E a última coisa que eu vi foi o céu azul de um dia que eu tinha
jurado que seria perfeito.
Rafael

— Eu acho que esse vaso ficaria bonito em cima da mesa —


falei ao garçom, enquanto ele preparava a mesa onde Sofia e eu
almoçaríamos. — Não, ela não gosta de margaridas. Orquídeas eu
sei que ela gosta.
— Sim, senhor. — Ele tirou o vaso — Vou trocar por orquídeas.
— Ok. Fizeram a sobremesa que ela gosta?
— Fizemos, senhor — ele assentiu. — Pudim de leite
condensado com bastante calda de açúcar.
— Ótimo.
O homem se foi e eu apoiei as mãos na sacada do mezanino,
observando o movimento do restaurante. Foi ali que eu havia pedido
Sofia em casamento e seria ali que nós resolveríamos nossos
problemas e tudo voltaria aos eixos.
Meu celular começou a tocar e eu vi que era Jonatas, o
motorista que designei para Sofia, mas que, na verdade, era seu
segurança particular. Não confiava apenas nos homens de Otávio.
— O que foi, Jonatas?
— Senhor! — ele exclamou, eufórico — Houve um acidente,
senhor!
Apertei a madeira da sacada.
— Que acidente, homem? Do que está falando?
— A senhora Sofia, quase foi atropelada. Eu a puxei a tempo,
mas ela caiu e rolamos no chão. — Sua voz beirava o desespero.
O mesmo desespero que imediatamente tomou conta do meu
coração.
— Pelo amor de Cristo, homem! — quase berrei. — Onde você
está?
— Estamos levando-a para o hospital, senhor. Ela... começou
a sangrar.
Fiquei estático.
Sem reação.
Meu mundo parou ao pensar, ao tentar imaginar o que tinha
acontecido.
— Senhor? Senhor?
— Qual hospital estão levando Sofia?
Ele me passou o endereço e eu saí do restaurante igual a um
louco.

Cheguei ao hospital, louco de ansiedade em saber como Sofia


estava.
O bebê.
Pelo amor de Deus.
Eu não podia perdê-los.
Fui informado por uma mulher, a enfermeira-chefe, de que
Sofia tinha entrado em trabalho de parto e que eles estavam
cuidando dela.
— O parto foi apressado, então precisamos dar um jeito logo
ou os dois correm sérios riscos de vida — ela foi sincera.
— Eu quero vê-la! — Quase a segurei pelos ombros.
— O senhor precisa se acalmar — ela falou, erguendo as duas
sobrancelhas. — Vocês tiveram sorte por ela não ter sido atropelada
pelo carro.
A enfermeira se foi e eu fiquei parado no meio do corredor,
tentando digerir tudo o que estava acontecendo.
Esfreguei meu rosto, meus cabelos.
— O que aconteceu, Jonatas? — encontrei o homem sentado
na recepção.
Ele estava com alguns poucos arranhões, que já haviam sido
tratados.
— A dona Sofia me fez levá-la ao Brás, porque queria comprar
algumas coisas para o bebê — ele disse, olhando para a frente.
Parecia em estado de choque. — Ela estava tão animada... disse
que o senhor a mataria se soubesse que ela tinha preferido ir lá ao
comprar tudo em um Shopping.
Jonatas ficou em silêncio e depois abaixou a cabeça.
— Ela vai morrer? — ele perguntou, levantando o rosto em
minha direção.
— Não, homem. Pelos céus, não diga uma coisa dessas — o
censurei. — Não, ela não...
Minha voz ficou entalada.
E se o parto desse errado?
Não seria a primeira nem a última vez que um parto se
complicava e a mãe não resistia.
— Um carro acelerou para cima dela, antes de o semáforo
abrir — ele disse, parecendo reviver a cena. — Então eu a puxei e,
como instinto, pulei em cima dela.
Jonatas era um homem forte, mas pela primeira vez eu o vi
chorar.
— Depois lembrei-me do bebê. Meu Deus e se eu o matei com
meu peso?
Esfreguei meu rosto.
Meu Deus. Aquilo era demais.
— Você viu que carro era? — perguntei, minha mente
começando a trabalhar.
— Um carro azul, uma Mercedes.
Meu coração quase parou.
Aquele era um dos carros que Paulo ostentava.
— Os policiais foram atrás dele? — perguntei, sentindo a fúria
tomando as minhas veias.
— Só tinha um hoje. Ele até foi atrás, mas ficou perdido entre
me ajudar, chamar a ambulância ou correr atrás do maldito carro.
Soltei um palavrão.
Levei vários segundos para conseguir respirar com calma. Eu
devia ter imaginado. Paulo sabia que Sofia estava longe de mim e
aproveitou a situação para, de um jeito ou de outro, se livrar dela e
da criança.
— Fique aqui — falei a Jonatas. Minhas mãos tremiam com
ódio. — E se alguém aparecer, não diga nada sobre o nome de
Paulo.
Ele assentiu e eu saí pelos corredores do hospital, disposto a
tudo para me vingar daquele desgraçado.
— Hey. — Otávio quase esbarrou em mim quando virei a
esquina. — Acabei de ficar sabendo o que houve. Pelo amor de
Deus, Rafael, que cara é essa?
Olhei para ele.
— Vá fazer o seu trabalho, Otávio, que eu vou fazer o meu.
Desvencilhei-me de Otávio e saí do hospital.
Eu ia matar aquele desgraçado.

Cheguei ao prédio onde Paulo morava e, por sorte, consegui


passar pela segurança como se eu fosse um amigo íntimo.
O elevador subiu lentamente.
A demora era deprimente. Queria logo colocar as minhas mãos
na garganta dele.
Paulo morava na cobertura, afinal, ele nunca quis deixar os
luxos da vida de mauricinho que tinha sido acostumado desde
criança.
Não foi difícil entrar em seu apartamento.
Só que, pelo visto, ele já tinha sido avisado que alguém estava
subindo.
— Mas quem diabos ousa me acordar a essa hora? — Ele
desceu as escadas, irritado.
Mas parou assim que me viu.
Não sabia dizer o que Paulo enxergou, mas seus olhos se
arregalaram levemente.
Ali estava eu. Um marido, um pai desconsolado. Buscando
vingança.
— Eu vim aqui para te matar — falei, dando passos bem lentos
para cima dele. — Por ter usado Sofia, por tê-la jogado fora e agora
por ter tentado matar ela e o bebê.
Paulo também deu passos para trás, erguendo a mão.
— Que isso, Rafael? — ele falou, um leve tremor em sua voz.
— Eu acabei de acordar! Do que diabos você tá falando?
Pulei em cima de Paulo e o segurei pelo pescoço.
Derrubei-o no sofá e desferi vários socos em seu rosto. Eu
queria o sangue dele, queria que ele pagasse por Sofia estar
naquela situação.
Então bati uma, duas, três vezes.
Segurei sua garganta, roubando seu fôlego por algumas
vezes. Mas eu não ia matá-lo enquanto ele não sofresse tudo o que
merecia. Então eu o deixava voltar a respirar.
Bati mais algumas vezes. Destruir seu rosto de modelo
também seria interessante.
Ódio era tudo o que eu via na minha frente.
Ouvi gritos, mas não parei.
— Pare com isso, pelo amor de Deus! — Alguém me puxou
com força, afastando-me de Paulo, que já estava todo
ensanguentado no sofá que um dia foi branco.
Era Otávio.
— Você tá maluco??? — ele gritou, olhando em meu rosto. Eu
não conseguia vê-lo realmente. — Quer ser preso por matar uma
pessoa?
— Foi ele quem tentou matar Sofia! — gritei.
Otávio me deu um tapa no rosto.
— Cala essa boca! — ele ralhou. — Zenon, segura ele.
Um policial me segurou e eu tentei me desvencilhar, mas
naquele momento eu já tinha perdido todas as minhas forças.
— Não fui eu — Paulo conseguiu dizer, mesmo com seu rosto
todo deformado e ensanguentado. — Eu juro. Não sei do que ele
está falando.
Otávio bufou e tirou o distintivo do terno, apontando-o para
Paulo.
— Paulo Casablanca, o senhor está preso por tentativa de
assassinato. O senhor tem o direito de permanecer calado ou tudo o
que disser poderá ser usado contra você em um tribunal.
Outros dois policiais entraram na casa e prenderam Paulo, que
gritava alegando que ele não sabia o que estava acontecendo. A
essa altura, a namorada dele já tinha desmaiado de horror no meio
das escadas.
Ela também foi levada para amparo médico. O policial me
prendeu em um dos sofás e eu fiquei ali por um bom tempo.
Aos poucos, a minha consciência foi voltando.
Por um instante, eu achei que estava sozinho, mas quando
ergui a cabeça, encontrei Otávio fumando um cigarro na sacada.
— Vai me prender também? — perguntei, em tom de ironia.
Otávio se virou para mim e caminhou até onde eu estava, me
fuzilando com os olhos.
— Que desgraça você achou que estava fazendo, Rafael? —
ele gritou. — Sabia que ele pode te processar?
— Não me importo! — cuspi.
— Claro que não se importa. — Ele balançou a cabeça
negativamente. — Olha aqui pra mim. — Ele me puxou, fazendo-me
encará-lo. — O carro usado para tentar atropelar Sofia está na
garagem dele, mas não temos garantia de que foi ele quem usou.
Só saberemos depois de vermos as imagens das câmeras dos
arredores. Então acho bom você ir para o hospital, cuidar dessa
mão e rezar pela sua esposa e pelo seu filho. — Ele me soltou e
deu um tapinha no meu rosto. — Do resto, eu cuido.
Otávio fez sinal para outro policial que eu nem tinha percebido
que ainda estava ali e eles foram embora.
Fiquei sentado por mais alguns minutos.
Eu precisava de Sofia. Precisava do nosso filho.
Mesmo que não tivesse sido eu a gerar aquela vida no ventre
de Sofia, eu já tinha me apegado à ideia de ser pai. Eu já queria
aquela criança.
Lágrimas brotaram dos meus olhos e eu chorei amargamente,
pensando que eu era um idiota completo. Poderia ter sido tudo
diferente, se naquela noite eu não tivesse deixado Sofia ir embora.
Se eu tivesse dito que a amava.
Meu peito doía como se uma lâmina estivesse rasgando-o de
cima a baixo.
Sequei meus olhos e me levantei. Caminhei até a porta, mas
então eu olhei para trás.
Se eu iria levar um processo, queria que fosse por muito mais.
Então derrubei mesas, cadeiras, quadros. Quebrei vasos que
deveriam custar milhares de reais. Acabei com tudo o que ousou
entrar em meu caminho.
Foi apenas um lembrete a Paulo para que nunca mais
cruzasse o meu caminho nem o da minha família.
Rafael

— Por que ela ainda não acordou? — perguntei, segurando a


mão de Sofia.
— Ela está apenas descansando — a enfermeira falou. —
Acalme-se. Ela vai ficar bem. O parto foi difícil, mas ambos ficarão
bem.
— Posso ficar com ela?
— Pode, claro. Se precisar de algo, pode nos chamar.
A enfermeira se foi e eu fiquei um bom tempo olhando para
Sofia. Seu peito subia e descia lentamente, seus olhos estavam
fundos, e seus cabelos bagunçados.
O parto havia sido difícil, mas o bebê nasceu e tinha sido
encaminhado à UTI Neonatal por ter nascido um pouco antes do
tempo. O médico me garantiu que ele estava bem, precisava
apenas de cuidados extras e em algumas semanas poderia ser
liberado.
Ele.
Eu jurava que seria uma menina, para fazer companhia à
Aninha e a Helena. Mas não, um menino veio e Sofia e eu
precisaríamos discutir sobre o nome dele.
Queria um nome forte, bonito. Nome de um futuro homem de
negócios, se assim ele quisesse, claro.
Alisei o rosto de Sofia.
— Eu espero que você possa me perdoar, Sof — falei, mesmo
sabendo que ela não me ouviria. — Fui um idiota ao não dizer o
quanto eu te amo. E não, não é um amor de amigos, embora eu
fique feliz por ter me casado com minha melhor amiga. — Dei uma
risada, mas de repente uma lágrima escorreu pelo meu rosto. —
Espero que tudo isso se resolva logo, para podermos ir para casa
com nosso filho. Eu juro que vou tentar ser um marido melhor e eu
juro que vou te mostrar o quanto te amo todos os dias. — Puxei sua
mão e depositei um beijo. — Obrigado por não desistir do meu
coração, ele é todo seu.
Coloquei a mão de Sofia de volta no leito e respirei fundo. Não
era um homem de sentir emoções assim, mas agora parecia que
elas estavam vindo todas de uma só vez.
Virei as costas para sair do quarto, mas ouvi uma voz bem
baixinho:
— Rafa?
Virei-me imediatamente. Sofia tinha aberto os olhos, mas
parecia um pouco atordoada.
— Hey, não se mexa. — Segurei-a pelos ombros. — Vou
chamar uma enfermeira.
Ela negou com a cabeça.
— Estou bem. Estou com sede.
Enchi um copo de água e entreguei a ela.
— Beba, devagar.
Ela bebericou apenas um pouco e me devolveu. Depois me
fitou por longos instantes.
— Nosso filho nasceu, mas está na UTI Neonatal — expliquei.
— Ele vai precisar de muitos cuidados, porque foi um pouco
apressadinho para nascer.
— Mas ele vai ficar bem? — Seus olhos se arregalaram.
Apertei sua mão.
— Vai, sim. Logo, logo iremos para casa, meu amor.
Sofia olhou para minha mão na dela e depois olhou para meu
rosto.
— Por que suas mãos estão enfaixadas?
— Um... acerto de contas que eu fiz por aí.
Ficamos em silêncio por um tempo, até que ela disse:
— Eu ouvi o que você falou. Só que não tenho certeza se era
verdade ou se era os efeitos dos remédios.
— O que você ouviu? — Encarei-a com expectativa.
Ela deu uma risadinha.
— Algo sobre não desistir do seu coração.
Aproximei nossos rostos.
— Eu só disse que eu a amo. Amo de verdade, não apenas
como minha amiga, embora seja satisfatório ter me casado com
minha amiga — falei, devagar. Ela sorriu. — Eu te amo, Sofia. E
quero ser o melhor marido para você e o melhor pai para o nosso
bebê.
Beijei Sofia com o máximo de cuidado e ela retribuiu com todo
o carinho e amor que tinha guardado por mim por todos esses anos.
Quando o beijo cessou, encostamos nossas testas.
— Bem, precisamos achar um nome bem bonito e forte para o
bebê — falei, tomando fôlego.
— Que tal, Arthur?
— Hummm. — Ergui uma sobrancelha. — Arthur, um líder
nato. Gostei.
Sofia sorriu.
— Arthur Rafael de Souza — ela disse. — Eu gosto dessa
combinação.
— Eu também.

Alguns dias depois...

— Como está sua esposa? — Otávio perguntou, assim que me


sentei na cadeira em frente à sua mesa.
— Está bem.
— E seu filho?
— Também. Logo poderemos ir para casa.
Ele respirou fundo e deixou o cigarro no cinzeiro.
— Ótimo. Fico feliz em saber que no final deu tudo certo.
Assenti lentamente.
Otávio havia me mandado uma mensagem, informando que eu
fosse até a delegacia o mais rápido possível, pois tinha novidades
sobre o caso de Sofia e a tentativa de assassinato.
— E, então? — Ergui uma sobrancelha. — Espero que me
diga que aquele maldito ainda está preso.
Otávio bufou.
— Não te chamei aqui para dizer o que eu tenho que fazer. —
Ele me encarou profundamente com seus olhos azuis. — Eu quero
te mostrar uma coisa.
— Ok.
Otávio abriu o laptop que estava ao seu lado, digitou alguma
coisa e acessou uma pasta. Depois virou o aparelho em minha
direção. Era um vídeo, e pelo que mostrava na tela congelada, era
do dia do acidente de Sofia.
— Antes de soltar esse vídeo, já quero adiantar que você deve
prestar muita atenção em quem estava no volante. As imagens são
ruins, mas dá pra ver um pouco.
— Foi Paulo — retruquei. — O maldito carro estava na
garagem dele. Você mesmo viu.
— Assista a droga do vídeo. Depois você me diz tudo o que
quiser.
Bufei, mas assenti.
Otávio deu o play e começou a reproduzir a gravação.
Vi Sofia descendo do carro com Jonatas. Vi ambos
caminhando pela calçada cheia de pessoas.
Vi quando eles se aproximaram da faixa de pedestres.
E vi quando o acidente aconteceu.
Otávio pausou.
— Essa é a gravação de uma das câmeras de cima — ele
falou. — Agora eu tenho outra, que dá pra ver do outro ângulo.
Ele abriu outro arquivo e deu play.
Foquei minha visão no motorista do carro e nesse momento
meu coração quase parou.
As mãos no volante tinham unhas pintadas de vermelho. Era
uma mulher, sem dúvidas. Ela usava óculos escuros, e véu sobre os
cabelos, mas eu a reconheceria até no inferno.
Levantei-me com todo o ódio consumindo meu corpo. Encostei
minha cabeça na porta e fechei as mãos em punho, controlando-me
para não acabar com a sala de Otávio.
Era ela.
Só podia ser.
Fernanda.
— Já emiti uma ordem de prisão para ela. Tem outro vídeo que
até mostra melhor o perfil dela. Não há como contestar — Otávio
disse. — Eu só quis que você visse, para depois não sair por aí
dizendo que eu estou maluco e prendendo a pessoa errada.
Respirei fundo, várias vezes.
— Você vai acusá-la, não vai? — Otávio perguntou.
Virei-me para ele.
— É lógico.
— Ótimo. — Ele fechou o notebook e acendeu outro cigarro. —
Então era isso, agora vá para sua esposa e deixe o resto comigo.
— Assim que a tiver sob custódia, me avise — falei, ajeitando
meu terno. — Quero dar uma palavrinha com ela.
Otávio me olhou com suspeita.
— Olha, depois do que você fez com o irmão dela e com o
apartamento...
— Não importa — retruquei. — Ele que ouse me processar. Eu
arrebento a cara dele novamente.
Otávio balançou a cabeça e riu.
— Rafael, Rafael... é por isso que eu não me apaixono. O que
o amor não faz com as pessoas, hein?
— O amor transforma as pessoas, Otávio. — Abri a porta da
sala para ir embora. — Você deveria experimentar.
Contei tudo para Andrew e Julia, que estavam ao nosso lado a
todo o momento. Eles ficaram encantados ao conhecer o pequeno
Arthur Rafael, e já faziam planos para o seu primeiro mesversário.
— Não vejo motivos para fazer uma festa de 1 mês.
— Hoje em dia é moda, Rafael — Julia retrucou. — Não seja
estraga-prazeres.
Aquiesci, porque na minha vida era assim. As mulheres
sempre faziam o que queriam.

Então, depois de uma longa conversa com Andrew, alguns


dias depois, Otávio me informou que Fernanda já estava sob
custódia e que aguardaria julgamento.

— Tem certeza de que quer fazer isso? — Andrew perguntou,


enquanto caminhávamos pelo corredor frio e agourento da
penitenciária provisória. — Podia simplesmente resolver isso com
Marcelo, que praticamente já perdeu a cabeça depois de tudo o que
aconteceu.
— Eu preciso fazer isso.
Encaminharam-nos para uma sala onde os detentos recebiam
as visitas. Não demorou para que Fernanda fosse trazida até nós,
com os braços algemados.
Ela se sentou, mas não ousou nos olhar.
— Eu soube que você confessou a tentativa de assassinato
contra a minha esposa — falei.
Ela ergueu o rosto e me encarou.
— Confessei.
— E o que queria com isso?
Ela desviou o olhar para além de mim.
— Eu nunca gostei de Sofia, desde que eu soube que vocês
mantinham uma amizade — ela confessou. — Mas eu passei a
gostar menos ainda quando vocês começaram a... — ela engoliu
—... namorar.
— Mas eu sempre disse que não tinha mais chance para nós.
Ela me encarou novamente.
— Quando você disse que tinha se apaixonado por ela, então
eu a odiei. Como podia uma pobretona, babá, conquistar o seu
coração? — Ela deu uma risadinha. — Eu tenho pena de você,
Rafael. Uma mulher muito abaixo do seu nível.
Respirei fundo, então peguei os contratos que eu nem tinha
assinado ainda e os coloquei em cima da mesa.
— Pena eu tenho de você, Fernanda — falei, tentando soar
calmo. — Que vai ficar presa por um bom tempo. Pena, porque o
negócio que você tanto trabalhou, tanto almejou em sua vida, irá
para o fundo do poço. — Peguei os contratos e comecei a rasgar
um por um. — Pena eu tenho de você que sempre achou que a sua
posição social era alguma coisa.
Fernanda olhou desesperada para os contratos sendo
rasgados e então eu tive a confirmação de que tudo o que sempre
importou para ela foram os negócios.
Dinheiro.
— Sofia veio do mesmo lugar que eu e esteve comigo quando
eu ainda não era nada. — Rasguei o último contrato. — Por sorte,
nós nos entendemos muito bem e a tendência é de que alcancemos
o topo do mundo juntos.
Levantei-me e Andrew se levantou junto.
— Eu vou sair daqui logo — ela disse, desdenhosa.
— Eu sei que a lei no Brasil é falha, mas pode acreditar que eu
vou gastar até o meu último centavo para te ver atrás das grades. —
Virei as costas e dei alguns passos, mas depois parei e me voltei
para ela. — Sabe por que eu nunca quis ser seu amante?
Ela não respondeu.
— Porque, enquanto solteira, pra mim, você também era um
bom negócio.
Virei as costas e a deixei com o olhar de fúria em cima de mim.
Quando saímos da prisão e entramos no carro, Andrew
perguntou:
— Era verdade o que você disse a ela?
— Sobre o quê?
— Sobre ela ser um bom negócio e tal.
— Claro que não — respondi, ajeitando o terno.
— Então por que disse isso?
Dei uma risadinha.
— Porque é bom ela saber qual é a sensação de ser usado.

Os dias passaram e Sofia se recuperou muito bem, assim


como Arthur se tornou cada vez mais forte.
O médico nos liberou e finalmente pudemos ir para casa.
Enquanto estávamos no hospital, pedi que a designer
finalizasse logo o quarto do bebê, agora acrescentando detalhes em
azul.
Fomos recebidos com uma pequena festa em família. Julia,
Andrew, Aninha, Victoria, George e Helena. Todos felizes por
estarmos de volta e saudáveis.
— Eu quero pegar o bebê! — Helena se aproximou, saltitando.
— Não! Eu quero o bebê! — Aninha a empurrou e as duas
começaram uma pequena briga.
— Hey, ninguém vai pegar o bebê assim — falei, separando as
duas. — Julia, Victoria, cuidem de suas filhas, pelo amor de Deus.
Após exibirmos um pouco o bebê para todos, Sofia entregou a
criança para dona Márcia, que a levou para o seu novo quarto.
Aproveitamos um pouco a presença de nossos familiares, mas
a verdade era que queríamos ficar a sós. Então, graças a Deus,
depois do jantar, eles foram para casa.
— O bebê está dormindo como um anjinho. — Dona Márcia
desceu a escada que estávamos prestes a subir. — Mas, assim
como os outros, vou deixá-los descansarem e curtirem o novo
habitante da casa.
Sofia riu e abraçou dona Márcia.
Eu agradeci por tudo.
Quando ela se foi, Sofia andou pela sala, tocando em cada
coisa com um olhar sonhador.
— Achei que não voltaria aqui — ela confessou. — Quando eu
caí no chão, achei que estava tudo acabado. Só pedi que salvassem
o bebê, porque eu sabia que você cuidaria dele, assim como
havíamos planejado.
Meu coração se apertou ao pensar em um mundo onde Sofia
não existia.
Ela se virou para mim.
— Eu lhe devo um pedido de desculpas.
— Você? — Franzi o cenho. — Por quê?
— Porque se eu não tivesse surtado, ido embora, nada disso
teria acontecido.
Aproximei-me dela e segurei seu rosto entre as mãos.
— Tem coisas que precisam acontecer, Sofia — falei, olhando
dentro de seus olhos. — Coisas boas, mas também ruins. E elas
sempre nos levam a algum lugar.
Ela assentiu lentamente.
— E geralmente são as coisas ruins que nos levam às coisas
boas. Aquele famoso ditado que diz “depois da tempestade, vem a
bonança” — falei, encostando nossas testas. — Tudo o que
aconteceu me trouxe até você e a partir de hoje, nunca mais haverá
entre nós a palavra “separação”.
— Tem certeza, Rafa? — Ela ergueu as sobrancelhas.
— Tenho certeza de que a amo e que a quero pelo resto da
minha vida — falei, como se cada vez que eu dissesse aquilo, meu
coração se aliviava mais e mais. Peguei sua mão e a coloquei em
cima do meu peito. — O meu coração é seu.
Sofia se ergueu na ponta dos pés e me beijou.
Um beijo doce.
Suave.
Repleto de sentimentos.
Um beijo de pertencimento.
Porque sim, agora eu sabia que meu coração pertencia
inteiramente a ela.
Alguns meses depois.

Sofia

— Rafa, para onde você está me levando? — perguntei,


desconfiada.
Ele havia chegado em casa todo eufórico, fazendo com que eu
me arrumasse rápido para sairmos.
— Já, já você vai saber — ele falou, girando o volante para
pegar outra avenida.
— Você sabe que sou curiosa. — Cruzei os braços. — Não
custa nada me dar uma dica.
Ele deu uma risadinha.
— Qualquer dica que eu der, você já vai saber do que se trata,
então, controle-se, mulher.
Bufei e tentei me aquietar no assento.
— Até a dona Márcia ficou assustada com a sua euforia.
Espero que o bebê não tenha se assustado também.
— Arthur não é assustado, ao contrário de você. — Ele deu
uma piscadela.
Arthur já estava bem grandinho e gordinho. Era engraçado que
ele não tinha sequer um traço de Paulo, o que me deixava bastante
aliviada.
Depois do julgamento de Fernanda, nunca mais nos vimos e
eu preferia assim, mesmo que morássemos na mesma cidade e,
ocasionalmente, pudéssemos nos esbarrar.
Paulo e Fernanda eram páginas viradas em nossas vidas.
Rafael entrou em uma rua no Jardins. Eu conhecia aquele
lugar, porque abrigava algumas lojas finas.
Então ele diminuiu a velocidade e estacionou em uma vaga.
— Vamos, é ali na esquina.
Soltei meu cinto e saí do carro.
Rafael entrelaçou nossos dedos e me levou até a esquina,
onde havia um prédio muito bonito, porém, fechado.
— Bem, o que é isso? — perguntei, olhando para o local.
Rafael tirou do casaco um pequeno molho de chaves e me
entregou.
— Eu acho que aqui vai dar uma ótima doceria, não acha? —
Ele piscou.
Meu coração vacilou.
Olhei para a chave, depois para o prédio e de volta para
Rafael.
— Claro que vamos precisar fazer uma reforma e contratar
algumas pessoas para te ajudar. Mas eu acredito que será um bom
negócio. O que acha de uma doceria no estilo das que existem em
Nova York?
Eu ainda não conseguia falar.
Rafael e eu tínhamos ido a Nova York a trabalho, dois meses
antes, e eu comentei, revivendo meu desejo de abrir uma
doceria/café nesse estilo em São Paulo.
Mas eram apenas planos, desejos...
Não tinha nem pensado na ideia a fundo.
— Você alugou aqui? — perguntei, finalmente.
— Eu comprei. Era o seu sonho, Sofia, e eu queria que você o
tivesse por completo.
Balancei a cabeça.
— Não acredito, Rafa!
Ele sorriu.
— Bem, você pode trazer o Arthur e a dona Márcia. Vamos
fazer um negócio de sucesso, bem aqui.
Joguei-me nos braços de Rafael e o beijei ternamente.
— Eu te amo tanto!
— Eu te amo mais — ele retrucou.
— Vou fazer muitos doces para você engordar.
Ele bufou.
— Alguns meses de casamento e eu já ganhei algum peso,
não duvido de nada.
Nós rimos.
Rafael e eu abrimos a porta do local desocupado e eu já pude
visualizar ali o meu futuro negócio, cheio de clientes.
— Rafa, eu tenho uma coisa pra você também — falei,
enquanto ele averiguava o lugar.
— O que é?
Tirei da bolsa um teste de gravidez feito naquele dia mesmo e
esperei que ele se virasse para mim.
Não estava nos meus planos mostrar daquele jeito, mas já que
estávamos em um momento de grandes surpresas...
Quando Rafael se virou e viu o que tinha em minha mão,
choque percorreu seus olhos. Imediatamente um sorriso terno
brotou em seus lábios e, por fim, seus olhos se encheram de
lágrimas.
— É sério?
Balancei a cabeça afirmativamente.
Outro filho também não estava nos nossos planos tão cedo.
Mas eu queria um filho com Rafael. Queria a semente dele
germinando dentro de mim.
Ele cortou a nossa distância e me puxou para seus braços.
— Você é a melhor coisa que aconteceu na minha vida — ele
murmurou, após me dar um beijo longo. — Claro, com nossos
bebês.
Eu ri.
— Você também, Rafael. Você é o presente que Deus me deu.
E eu sabia que na vida teríamos muitos momentos bons como
aquele, mas também teríamos momentos ruins. Porém o que
importava era que eu havia conseguido.
O coração do meu amado, era meu.
Quando idealizei a história do Rafael, lá no livro da irmã dele,
eu havia imaginado um rumo. E foi esse rumo que eu segui por
cinco capítulos, até perceber que Rafael não precisava da Fernanda
na vida dele, mas sim da doce, meiga e amiga Sofia.
Então eu precisei recomeçar sua história e lidar com seus
dramas sob outra perspectiva. E é engraçado pensar nisso, porque
alguns anos atrás, era eu na posição de Rafael.
Um coração endurecido pelos relacionamentos que não deram
certo e que enquanto eu não colocasse uma pedra em cima,
continuariam me perseguindo pelo resto da vida, me atrapalhando
de ser feliz com quem merecia meu amor.
Escrevo livros para entretenimento, mas não consigo deixar de
pensar que talvez, querida leitora, você esteja passando por uma
situação semelhante.
Então, fica aqui o meu conselho: faça como Rafael. Coloque
um peso no passado e se abra para o novo. Pode parecer que não,
mas ainda existem os “Rafas” por aí. Basta procurar.
E se você chegou até aqui, muito obrigada por ler esta história
e aguarde, que nos veremos no próximo livro, desvendando como
George e Victoria se acertaram. ;)

Amo vocês.
Olívia Molinari.
São muitas pessoas que preciso agradecer aqui, mas em
primeiro lugar: a Deus, que é o meu amor maior. Quem me dá
forças nos momentos de tristeza e desânimo. Depois, às minhas
leitoras que gostam e apoiam o meu trabalho. Eu amo todas vocês.
Bah Pinheiro, minha revisora e amiga para todos os momentos. Às
meninas da Sala da Justiça, às meninas do Clube do Chá das
Cinco, onde nos reunimos para falar sobre os nossos amores
platônicos por cavalheiros de época. Aos pastores e bispos da igreja
Universal, lugar onde encontrei paz e abrigo nos momentos mais
difíceis da vida. Aos meus pais e, principalmente ao meu marido,
que não mede esforços para me ver feliz.
Muito obrigada!
Nascida e criada em Jacareí, interior do Estado de São Paulo,
Olívia é casada e mamãe de um gato laranja. Desde criança sempre
foi apaixonada por livros, gastando horas dentro da biblioteca da
escola. Aos quinze anos começou a escrever fanfics que
conquistaram leitoras em sites como Nyah! Fanfiction. Sempre
gostou de criar personagens femininas fortes, que apesar de seus
conflitos interiores, lutam pelos seus sonhos. Acredita que os livros
transformam as pessoas.

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Sinopse:

Julia Souza almeja a mesma coisa que todo mundo após sair da
faculdade: encontrar o emprego dos sonhos e ser bem-sucedida.
Então em um lance com a sorte, Julia é chamada para fazer
entrevista em uma grande empresa no ramo de Tecnologia. Ela
consegue a vaga e vai trabalhar para o meio americano, meio
brasileiro, Andrew Sanches.
Apesar de exigente, Andrew se mostra um bom chefe, até o dia em
que uma encomenda deixada na recepção o pega desprevenido.
Um bebê e um bilhete anunciando que Andrew é o pai.
Então, desesperado, com uma ex-noiva que não aceita o fim do
relacionamento, sem saber quem foi a louca que deixou um bebê
em seu escritório, Andrew recorre à única pessoa que lhe transmitiu
confiança nos últimos dias: sua nova secretária.
E é nessa jornada que a vida de ambos vai mudar completamente.
Uma proposta conveniente
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Sinopse:

Fernando Costermani passou a vida inteira odiando Natalie


Romanno.
O motivo?
Para ele, a garota nunca passou de uma mimada, prepotente e
egoísta. Que abandonou seu irmão para viver na Europa, como se a
vida fosse uma festa.
Entretanto, depois de sete anos vivendo em outro país, Natalie está
de volta e se chocará ao saber que toda a sua família escondeu de
si que o atual presidente da empresa de sua família não é nada
mais, nada menos, que o sujeito que a perseguiu a vida toda.
Acreditando que a vida está lhe dando uma segunda chance,
Natalie irá tentar recuperar o amor que deixou para trás, porém,
Fernando não irá permitir, bolando um plano esquisito para mantê-la
sob o seu domínio.
Com gênios extremamente parecidos, Fernando e Natalie vão
cruzar a linha tênue do amor e ódio, que vai lhes mostrar que as
coisas nem sempre são como parecem e que o amor pode nascer
nas situações mais improváveis.
Apaixonado por ela
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Sinopse:

Mariana Fernandes é uma jovem batalhadora, que não mede


esforços para construir um futuro melhor para si e sua família. Isso
inclui atravessar a cidade todos os dias para estudar em uma das
melhores universidades do país, onde conseguiu uma bolsa de
estudos.
Ela acredita no amor, porém, seu coração está partido, após a
traição daquele que parecia ser o “amor da sua vida”.
Ricardo Alencar é apaixonado por Mariana desde a primeira vez que
a viu. Entretanto, apesar de ser próximo dela, afinal, é irmão da
melhor amiga de Mariana, sabe que isso é impossível. Primeiro, por
causa da sua fama de “pegador da universidade” e, segundo,
porque ela sempre teve olhos somente para Marlon, seu amigo.
Mas como a vida adora pregar peças, depois que a traição é
descoberta, Ricardo vê que o caminho para conquistar o coração de
sua amada está livre e uma viagem a Paris pode dar aquela
ajudinha que ele tanto precisa.
Será que Mariana irá dar uma chance ao sujeito que já dormiu com
mais da metade das garotas da universidade?
Um natal para recomeçar
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Sinopse:

Hannah Berbroock, uma famosa escritora de romances,


decidiu passar o Natal em um chalé nas montanhas do Colorado,
após ver que sua vida precisava de uma mudança. Porém ela não
contava que um estranho bateria em sua porta, horas antes da
meia-noite, em meio a uma terrível nevasca.

Um estranho à porta, uma noite especial.


Novos recomeços para aqueles que buscavam a magia do
Natal.

Conto de Natal - Contém cenas +18


Minha chefe me odeia
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Sinopse:

Edward Smith saiu de Londres para tentar a sorte em Nova York,


longe da pressão de sua família. Com uma nova identidade, ele
estava pronto para ser mais um cidadão comum, em uma grande
cidade. Mesmo com a dificuldade para encontrar emprego, é
surpreendido por um anúncio inusitado: uma vaga de assistente
pessoal da herdeira de um grande império.
Elizabeth Adams não é o tipo de mulher que ele está acostumado.
Ela é fria, arrogante e exigente. Noiva de um sujeito mau caráter,
que não está disposto a abrir mão de seu relacionamento.
Todos lhe dizem que não passará do primeiro mês. Entretanto,
Edward é persistente e não se deixa intimidar pelo olhar frio de sua
chefe. Aos poucos, eles se aproximam e a relação entre Chefe e
Funcionário pode se transformar na melhor experiência de suas
vidas.
Meu sócio me odeia
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Sinopse:

Edward Smith cometeu o grave erro de se apaixonar por sua chefe,


além de esconder sua verdadeira identidade. Edward James
Phillips, seu verdadeiro nome, é um membro da extensa família
Real Britânica. Alguns meses se passam até que uma reunião em
Londres pode mudar o destino de ambos. Juntos, terão que lutar
para deixar de lado o orgulho, as diferenças e mágoas. Aprendendo
que para um relacionamento dar certo, a verdade tem que estar
acima de tudo e todos.
Será que 30 dias serão suficientes para resgatar a confiança antes
que Elizabeth se transforme na senhora Sanders?
Que comece a contagem regressiva...
Traga-me para a vida
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Sinopse:

Alice Kaufmann teve a sorte de encontrar um pretendente na sua


primeira temporada em Londres. Lucius Oldenberg era tudo o que
ela sonhava: bonito, inteligente, herdeiro de um Condado e parecia
realmente amá-la.
Tudo era perfeito até que uma desilusão a pega desprevenida.
Alice, em seu momento de desespero sofre um acidente que resulta
na perda dos movimentos das pernas.
Machucada e desacreditada do amor, Alice é enviada para ser dama
de companhia de Evelyn Thompson, irmã mais nova do Duque de
Hatfield, um homem conhecido por ser misterioso e arrogante.
Phillip e Alice tentam encontrar um no outro forças para sobreviver e
conquistar aquilo que é necessário: Curar as feridas do passado.
Entretanto, o Duque esconde um terrível segredo que pode colocar
a vida da jovem em perigo.
Agora, Alice terá que decidir: entregar-se a um novo amor ou manter
sua vida a salvo e longe de problemas.
Traga-me para a redenção
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Sinopse:

Após uma série de acontecimentos que quase destruíram sua


família, Charles Thompson resolve sair de Londres e viajar pelo
mundo, em busca de novas experiências para fazê-lo esquecer o
passado.
Obrigado a carregar o segredo de sua família, sabe que sua vida
sempre será um mar de confusões. Mortes, sangue e desejo são
apenas alguns detalhes que ficam marcados por onde ele passa.
Cansado da vida que leva, ele parte em sua última aventura: uma
temporada em um reino conhecido por suas festas e belas
mulheres. Um prato cheio de diversão, antes de retornar para casa.
No entanto, ao chegar no lugar, se depara com uma situação
incomum. A jovem e linda princesa, Susanna Von Waldstein, deseja
a sua ajuda para escapar de um casamento arranjado com o chefe
do exército de seu pai e seu irmão por consideração.
Charles sabe que pode ajudá-la, afinal, suas habilidades como
vampiro o fazem se destacar, tornando-o melhor do que vários
homens do Exército do Rei. Entretanto, as coisas podem não sair
como o planejado.
Ele tem apenas duas escolhas: ajudar a princesa e levantar um
exército contra si ou deixar que a moça sofra nas mãos de seu
algoz.
O problema começa quando ele percebe que já não é capaz de
escolher a segunda opção...
Uma rockstar em minha vida
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Sinopse:

Lauren Stewart sonha com o dia em que será uma estrela do Rock.
A convite de sua melhor amiga, Jessica, ela parte para a Califórnia
em busca de novas oportunidades que poderão colocá-la no
caminho do sucesso. Porém, Lauren não contava que um acidente
de trânsito mudaria sua vida, ao colocar Bruce Hastings em seu
caminho.
Bruce é um empresário, apaixonado por sua única filha, mas que
carrega consigo um passado terrível e cheio de mágoas. Entretanto,
suas convicções serão colocadas em jogo quando conhecer a
rebelde Lauren, que não abaixará a cabeça mediante as suas
“regras”.
Lauren e Bruce são completamente diferentes, mas, aos poucos,
vão perceber que aquela famosa lei de que “os opostos se atraem”
faz mais sentido do que um dia já imaginaram.
Notas

[←1]
Uma hipótese suposição ou especulação é uma formulação provisória, com
intenções de ser posteriormente demonstrada ou verificada, constituindo
uma suposição admissível.
[←2]
Bonnie Elizabeth Parker e Clyde Chestnut Barrow foram um casal de criminosos
norte-americanos que viajavam pela região central dos Estados Unidos da América
com sua gangue durante a Grande Depressão, roubando e matando pessoas quando
encurralados ou confrontados.
[←3]
Dementadores são não-seres das trevas, considerados uns dos mais sujos
a habitar o mundo. Dementadores se alimentam de felicidade humana e,
assim, causam depressão e desespero para qualquer um perto deles.
[←4]
Déjà vu é o termo francês que significa literalmente "já visto". Este termo é
usado para designar a sensação que a pessoa tem de já ter vivido no
passado um exato momento pelo qual está passando no presente, ou de
sentir que um local estranho é familiar.
[←5]
Érick Jacquin é um chef de cozinha francês, naturalizado brasileiro, que atua
na América Latina. Tornou-se mais conhecido após entrar como jurado no
talent show MasterChef, transmitido no Brasil pela Band e pelo Discovery
Home & Health
[←6]
Em Harry Po er, os bruxos não falam o nome do Lorde Voldemort, adotando assim
a frase “aquele que não deve ser nomeado”
[←7]
Personagem da Walt Disney, o Tio Pa nhas, considerado o pato mais rico do Mundo,
tem acumulada uma fortuna que faz dele o dono de um vasto império empresarial
espalhado pelos quatro cantos do planeta.

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