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DIÁRIO DE UM PECADO

A “IRMÃZINHA” DO CEO
Copyright © 2021 Izabella Mancini
IZABELLA MANCINI
Edição — 2021

Copyright © 2021 Izabella Mancini

Instagram: @autoraizabellamancini

Esta é uma Obra de ficção. Nomes, personagens e acontecimentos aqui


contidos são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com a
realidade é mera coincidência. Os termos destacados no texto são palavras
utilizadas em outras línguas – Russo e Espanhol. Deixo claro de antemão:
Valentim e Analuz NÃO são irmãos consanguíneos.
Capa: Ester Capas
Todos os direitos autorais são de propriedade da autora. É proibido o
armazenamento ou reprodução desta Obra sem autorização prévia da autora.
Ressalva para textos curtos e trechos utilizados para divulgação do mesmo. A
violação de direitos autorais é crime previsto em Lei.
Prólogo
Capítulo Um
Capítulo Dois
Capítulo Três
Capítulo Quatro
Capítulo Cinco
Capítulo Seis
Capítulo Sete
Capítulo Oito
Capítulo Nove
Capítulo Dez
Capítulo Onze
Capítulo Doze
Capítulo Treze
Epílogo
Notas da Autora
PRÓLOGO

Querido diário,

Hoje é o pior dia de toda minha vida!

Valentim vai embora e levará consigo uma parte de meu coração. Olho pela
janela alta do quarto e fico pensando no que farei amanhã quando acordar.
O que vai ser de mim sem ele por perto? Como vou seguir sem tê-lo
segurando minha mão?

A vida não parece ter graça sem ele e tão pouco viver sem sua presença... Eu
o amo, como escrevo aqui todos os dias, mas esse segredo vai ter que morrer
em minha garganta, tragado por meu estômago e amassado no passado.
Para ele sou apenas uma menininha.

Não significo nada!

Valentim não hesitou em ir embora sem olhar para trás. Sem ter em mente
que me deixaria... Eu implorei para que ficasse, mas simplesmente vai me
deixar.
E o odeio por isso!

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

— Ana... — Ergui os olhos do diário vagarosamente, dando de cara com os


olhos cor de café de Valentim. Instantaneamente minhas mãos fecharam o
diário em meu colo, empurrando-o para o chão abaixo da balança no qual eu
estava sentada — Não vai mesmo se despedir?

Talvez fosse a última vez na vida em que eu o visse. Baixei o olhar


novamente, apertando as mãos na corda do balanço sob a árvore. O nosso
lugar favorito do mundo... Nosso esconderijo secreto.

— Eu já disse tudo que tinha para dizer, Valentim — Sussurrei ignorando seu
olhar, tentando disfarçar a maneira como estava admirando-o naquela calça
jeans escura e camisa preta colada ao peito forte. Sua pele morena reluzia sob
o sol fraco do fim de tarde e os cabelos negros caiam ao lado do rosto. Ele era
lindo... Meu príncipe, mesmo que não soubesse!

Valentim se ajoelhou à minha frente, segurando delicadamente em minhas


pernas. Suas mãos grandes sempre me tocavam com carinho e uma ternura
quase palpável exalava de seu olhar. Meu corpo se incendiava com um
simples toque...

— Prometo que vou voltar, Loirinha — Revirei os olhos diante do apelido


que sempre usava para se referir a mim. "Loirinha". Era o que eu era, afinal!
Apenas uma criança para ele. Ainda ignorava seu olhar, por isso suas mãos
carinhosas me fizeram encará-lo com um toque em meu queixo — Prometo
que não vou esquecê-la.
— Claro que vai! — Esbravejei diante de seu rosto, já nervosa pela maneira
como falava — Quando uma garota roubar sua atenção você vai esquecer
completamente de mim!

— Nenhuma garota no mundo terá mais minha atenção do que você, Analuz
— Segurou meu rosto com as duas mãos, olhando-me firmemente. Havia
verdade em seus olhos castanhos, por isso me calei. Segurava minhas
lágrimas o máximo que podia, mas era como se a figura linda de meu "meio
irmão" se esvaísse cada vez que nos encaramos. Como se virasse uma sombra
— Você é minha menina, minha irmãzinha...

Seu dedo secou a lágrima que rolou em minha bochecha com carinho e se
aproximou para beijar minha testa demoradamente, segurando-me contra seu
peito.

Permiti-me chorar. Não somente chorar, mas abraçá-lo com todas minhas
forças e deitar, talvez pela última vez, meu rosto em seus ombros firmes e
largos... Aqueles braços que eu tanto gostava... Aquele calor que me
preenchia por completo.

— Você não é meu irmão! — Relembrei entre as lágrimas, mas me afastei


quase brutalmente, ainda com a face molhada e marcada pela dor — E talvez
seja mesmo melhor que vá embora de uma vez!

Tentei me soltar, mas Valentim me trouxe de volta com uma pegada forte em
meu pulso.

Era melhor que fosse e sumisse! Era melhor não tê-lo, do que vê-lo e ser
chamada de "irmãzinha". De menina. De "Loirinha". Era isso que eu era e
sempre seria diante dos olhos dele... Sua irmã mais nova, mesmo que de fato
não fosse! Nada mais sou do que a filha biológica de seu padrasto, o homem
que o adotou como um verdadeiro filho após a morte de sua mãe. Nada mais
sou do que uma menininha de catorze anos que o perturbava desde o
nascimento.

"Valentim já tem vinte e quatro anos" Dizia minha mãe toda vez que me via
chorar pela partida dele "Precisa ir para a faculdade e terminar os estudos na
melhor escola, querida".

Vinte e quatro anos. Eu, catorze.

Valentim jamais me veria com outros olhos além daqueles cheios de carinho
que me acalentavam. Nunca sequer cogitou que o amor que eu sentia por ele
era diferente, não tinha nada a ver com o de irmã... Ele sempre foi meu
príncipe, na verdade, desde criança. Sempre o vi como meu final feliz, mas
em mim Valentim apenas via sua irmã.

Para sempre irmãzinha!

Era melhor que ele se fosse de uma vez!

— Não quero ir, Analuz — Sua convicção, pela primeira vez, me pareceu
sincera. A firmeza de seu olhar se tornou ainda mais poderosa quando me
segurou pelos braços com as duas mãos, trazendo-me para perto de seu corpo
forte — A última coisa que desejo em toda a vida é deixá-la, mas... —
Fechou os olhos e suspirou. Eu podia sentir seu hálito em meu rosto e não
afastava o olhar de sua boca — Não tenho outra saída. Não posso continuar
aqui! As coisas podem fugir do meu controle, será que não entende?

— Não! — Esbravejei diante de sua face — Não entendo! Seja mais claro,
diga com todas as letras seus motivos para ir!

Valentim me encarou de uma maneira que jamais o fez em toda a vida.


Seus olhos cor de café — um castanho claro brilhante — deslizaram por mim
dos pés à cabeça, detendo-se por fim em meu olhar. Estremeci em seus
braços e senti suas mãos grandes me soltando aos poucos. Afastou-se um
passo para trás, pousando uma das mãos sobre os lábios e a outra na cintura.

— A única coisa que posso dizer é que faço isso pelo seu bem... Pelo nosso
bem — Assegurou tentando não me olhar. Parecia constrangido e voltei a me
sentar no balanço — Não posso ficar nem mais um minuto aqui, Analuz.
Cada segundo que passa me sinto pior por tudo que vem acontecendo e... —
Deteve-se, erguendo os olhos para mim como se pedisse desculpas — E vai
ser melhor assim.

Balancei-me brevemente no balanço, sentindo os fios claros de meu cabelo


ricocheteando em minha face. As lágrimas rolavam, mas eu já nem mais
sentia. Já não mais soluçava... Agora o silêncio dominava minha alma como
sempre faria após a partida do homem que eu amava.

Valentim abaixou a minha frente novamente, segurando em minhas pernas


para que eu parasse de balançar.

— Você vai voltar um dia? — Questionei quase sem voz e encarei seu rosto.
Uma lágrima deslizou em sua face e notei que era a primeira vez na vida em
que o via chorar. Assustada, toquei sua face com a mão trêmula e ele fechou
os olhos diante de meu toque.

— Vou... Eu juro que um dia volto para te ver novamente, Loirinha. Mesmo
que brevemente... Mesmo que por apenas um minuto — Sorriu de maneira
triste, virando o rosto para beijar minha mão que pousava em sua face.

Eu sentia seu calor em minha palma. Sua face áspera pela barba recém-feita.
Aproximei-me e colei a testa na dele, fechando os olhos.
— Nunca te vi chorando, Valentim.

— Está doendo... — Pousou uma das mãos no peito e torceu os lábios,


afastando-se um pouco para me olhar nos olhos — Está ardendo muito em
meu peito saber que é a última vez em muito tempo que vejo a cor azul de
seus olhos. O loiro de seu cabelo. A maneira como sorri... Seu rostinho
inocente.

Sorri para ele entre as lágrimas, contendo-me para não falar demais.

— Eu te amo — Sussurrei tocando novamente seu rosto e Valentim fechou os


olhos diante de minhas palavras. Parecia querer guardar aquele momento
tanto quanto eu — Não entendo e nunca vou ser capaz de compreender o
motivo que te levou a ir embora, mas eu te amo...

Aproximei-me e o beijei na bochecha, quase nos lábios, colando minha


bochecha na dele em seguida. Valentim me apertou em seus braços até me
tirar o ar, beijando meu rosto com carinho. Retirou minha mão de sua face
quando nos separamos, levando-a aos lábios e beijando-a com devoção.

— Também te amo, Loirinha. Um dia... — Tocou a ponta do meu nariz como


sempre fazia quando éramos crianças — Você vai entender meus motivos.
Um dia vai ver que fiz o melhor para nós.

Baixei a mão aos poucos, sabendo que aquele tinha sido o último toque que
compartilhamos. O sorriso de Valentim se apagou e dei alguns passos para
trás, voltando ao balanço.

Ele me amava, eu sabia. Mas como irmãzinha. Era melhor que fosse embora.

— Adeus Valentim Ruiz Vilanova — Sussurrei encarando-o firmemente,


segurando as lágrimas — Adeus para nunca mais!
— Adeus Analuz Anastácia Vilanova Petrova — Sorriu ao dizer meu nome
completo — Guarde em sua mente que tudo o que estou fazendo é por você.
Tudo!

Querido diário,

Aquelas foram às últimas palavras que Valentim me disse e não


compreendo... Nunca vou compreender! Ele estava enganado! Ir embora não
era o melhor para nós, como poderia ser?

Talvez fosse para mim, uma vez que teria a oportunidade de esquecê-lo e
fazer aquele amor secreto morrer no silêncio, mas não era o melhor para ele.

Porque deixar o padrasto e a mãe de criação? Porque deixar a família que o


criou após a morte de sua mãe, a única família que ele conhecia? Porque ir
estudar fora se a faculdade daqui também era ótima? Por quê?

Ele queria viver...

E eu não saberia como continuar minha vida sem acordar todos os dias e tê-
lo comigo.

Não sei como vou continuar sem ele. Não sei como tirar essa dor que sempre
vai viver em meu peito. Ainda fecho os olhos toda noite e o vejo indo em meu
quarto e beijando minha testa antes de fazer alguma brincadeira boba sobre
minhas bonecas. Ainda o vejo me fazendo cócegas, comprando meus doces
favoritos e me protegendo sempre que precisei.

Ainda o vejo como meu príncipe encantado. Ele não é meu irmão... Mas
mesmo assim o amo. Será que é esse o pecado? Será que é isso que Valentim
queria dizer quando falou que fez o melhor para mim?

Nunca saberei, apenas me afogarei na dor.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.


Capítulo Um

Quatro anos depois...

Diante de tudo o que fiz em nome de minha sanidade mental e do bem-estar


de minha família, no melhor dos casos, fui simplesmente um idiota.

Cuidadoso, alguns poderiam arriscar, mas me afundei em uma vida de


mentiras para tentar tapar o buraco que a ausência dela deixou em meu
coração depois que fui obrigado por minha própria consciência a ir embora.

No fundo do meu coração sei que por isso Analuz jamais irá me perdoar. Tê-
la deixado foi a maior das traições e sim... Era isso que eu queria! Que ela me
odiasse! Talvez fosse a única maneira de jamais voltar a pensar nela.

— No que está pensando amor? — Desvio a atenção da pintura de uma


galáxia pendurada no quarto para o rosto belo de Michele, deitada nua ao
meu lado. Sua mão desliza em meu peito, mas realmente não sinto nada —
Você parece tão fora da realidade...

— Realmente estou bem longe — Comento sem encará-la, sentindo agora


sua mão se movendo entre os pelos do meu peito.

— Você sempre fica assim depois que fazemos amor, querido... Algo te
incomoda? — Desvio a atenção rapidamente para o olhar curioso de minha
namorada, uma morena escultural de longos cabelos escuros e olhos
amendoados.

Michele é o ideal para todo homem que busca alguém para afogar as mágoas.
Uma aposentada modelo das mais caras marcas da moda e com o corpo
moldado por academias e procedimentos estéticos variados. Pouco cérebro,
muita sensualidade. Poucas perguntas e muito a oferecer na cama. Aos vinte
e oito anos era comentarista de moda em programas de auditório e famosa
por posar nas mais variadas revistas em circulação.

No fundo sei que está interessada em minha fortuna, mas prefiro fingir que
acredito em sua história de amor. Meu padrasto e o advogado de minha
falecida mãe eram as pessoas mais próximas em minha vida e ambos me
orientaram a me casar... Ao menos foi isso que mamãe estipulou em seu
testamento antes de morrer e me deixar toda sua fortuna e os bens que um dia
foram de seus pais, meus avós.

Antes dos trinta deveria me casar, se queria realmente ficar à frente das
empresas que assumi e herdei aos vinte e cinco.

Os vinte e oito anos também batiam em minha porta e era hora de começar a
pensar em tudo. Michele foi o mais sensato, visando que era a mais
comportada entre todas as outras que apareceram. Ainda era cedo para pensar
em casamento, mas não havia escapatória.

Petrônio — meu padrasto — tratava de seguir à risca tudo o que sua falecida
esposa estipulou para mim no testamento. Até minha maior idade foi ele
quem administrou minha herança e sempre foi muito correto em relação a
tudo. Sei, como homem, que jamais amou Yekaterina — sua atual esposa e
mãe de sua filha — como um dia amou minha mãe, a quem perdeu
precocemente para o câncer.

— Falou com seu padrasto, querido? — Michele comentou um tempo depois,


mexendo em seu celular, ainda nua na cama. Segui lá, encarando a pintura de
galáxia — Como anda a saúde de sua madrasta?

— Nada bem... Yekaterina está fazendo hemodiálise frequentemente, um de


seus rins foi completamente tomado pelo câncer e o outro está
enfraquecendo... E ela é minha mãe, Michele. Ao menos é a única mãe que
realmente conheci e Yekaterina não tolera que eu a trate de outra maneira -
Michele baixou o celular do rosto e me encarou com os olhos castanhos
curiosos — Terei de passar uma temporada com eles. Petrônio teme que ela
não consiga resistir por muito tempo e, claro, ela quer me ver. Quer que
estejamos todos juntos neste momento doloroso.

Senti Michele segurar minha mão com delicadeza.

— Querido, eu entendo... Mas não poderei deixar Madrid agora. Preciso


terminar a temporada do programa, você sabe! — Concordei com um sorriso
fraco diante de seu desespero. O programa de televisão era a vida dela.

— Não se preocupe! Entendo perfeitamente. Direi a eles que está trabalhando


— Não me irritou em nada o fato dela não poder me acompanhar a casa de
meus pais adotivos.

Jamais esteve em meus planos voltar, muito menos com Michele ou qualquer
outra mulher a tiracolo. Se não fosse pela saúde debilitada da mulher que me
criou como filho, eu jamais voltaria a colocar meus pés em minha cidade
natal, no Brasil.

— Mas estou ansiosa para conhecer seus pais e sua família no Brasil,
querido! — Sentou-se empolgada — Me fale um pouco sobre eles!
Suspirei e passei os dedos entre os fios de meu cabelo escuro e bagunçado
pelo sexo de minutos antes. Desviei o olhar novamente para a pintura.

— Não tem muito que dizer. Petrônio é um homem de negócios. As empresas


aqui de Madrid tem uma filial no Brasil, a qual Antônio administra. Ele
também é o homem que cuida de todas as decisões importantes junto a mim.
Não faço nada sem consultá-lo. As empresas deixadas por minha mãe foram
administradas por ele completamente até que eu cumprisse os estudos que ela
estipulou e estivesse apto a exercer meu papel de CEO — Michele não
escondia o interesse, mordendo os lábios conforme me ouvia — É sempre
muito ocupado... Yekaterina é um doce, muito maternal e preocupada com a
família. Não tem um dia que deixe de me ligar. Eva é a empregada mais
antiga da casa, quase da família! Foi ela quem me criou desde que nasci, era
empregada de minha mãe e seguiu com Petrônio após sua morte. Tem
também a irmã de Yekaterina, Alessa. É viúva e tem dois filhos, Philip e
Violeta. Eles costumam passar algumas temporadas com meus pais, sabe
como é.... Alessa se aproveita do dinheiro da irmã e da boa vontade dela com
os sobrinhos.

— E sua irmãzinha, filha do seu padrasto? — Michele perguntou em tom


infantil — Você quase nunca fala dela, querido.

Comprimi os lábios sem conseguir esconder o desconforto.

— O que quer saber? — Questionei seco.

— Como ela é? Como se chama mesmo? Anita?

— Analuz — Repeti o nome dela em voz alta depois de muito tempo. O


simples fato fez meu coração disparar — Se chama Analuz.

— Que nome fofo! — Michele suspirou — Deve ser uma menininha


encantadora!

— Ela não é mais uma menina... Mês que vem, no dia quatro, completa
dezoito anos — Michele se calou e me encarou surpresa.

— Uau! Você nunca decora data nenhuma, sequer o aniversário de seus pais,
no entanto sabe o aniversário de sua irmãzinha! — Corei um pouco,
suspirando pelo nervoso que me causava falar sobre o tema — Ela é muito
importante em sua vida, pelo que vejo.

— É minha irmã, não é? Claro que é importante! — Vociferei me


controlando para não sair do sério — É uma menina, Michele! Uma garotinha
que me odeia porque sempre brigávamos.

— É bonita? — Michele perguntou interessada — Você nunca mostrou fotos


dela ou algo assim. Nunca te vi sequer conversando com ela...

— Ela não tem redes sociais. Petrônio impôs como segurança, sabe como é...
Muito dinheiro, muito cuidado. É uma patricinha super protegida, quase
como... Um diamante. E sim, é bonita. Muito bonita. Satisfeita?

— Quero muito conhecê-la! Seguramente seremos boas amigas e cunhadas!

— Seguramente... — Ironizei, tendo em vista que não pretendia apresentá-las


tão logo.

Michele se abraçou a mim enquanto segui pensando em tudo que disse.


Analuz não era minha irmã, afinal. A filha de meu padrasto com sua segunda
esposa era, na verdade, o maior impasse de toda minha vida! Jamais poderei
compreender como um dia fui capaz de me encantar por ela a ponto de ter
que largar tudo em nome de um desejo desenfreado que jamais poderia se
concretizar.
Jamais.

Queria diário,

Não sei exatamente o motivo, mas tenho certeza de que meus pais me
escondem alguma coisa!

Desde que mamãe adoeceu as coisas mudaram muito por aqui e não sei se
me contam exatamente o que está acontecendo. Como diz Eva, minha babá,
meus pais não querem me machucar. Mamãe diz que está bem, mas vejo em
seus olhos e nas idas frequentes aos centros médicos que não é verdade!

Será que eles não entendem que já não sou uma menininha e posso entender
as dores do mundo?

Falta um mês para meu aniversário de dezoito anos. Cerca de três meses
para terminar o ensino médio.

As decisões em minha vida devem ser tomadas, mas papai e mamãe sequer
me deram a chance de conversar com eles sobre o assunto! Os dois sentem
pavor da ideia de me deixar voar...
Além da doença de mamãe, sinto que algo a mais está movimentando a casa,
até mesmo Eva e Violeta parecem estranhas. Disseram que é apenas uma
visita, mas quem poderá ser tão importante?

Sinto que algo distinto está para acontecer...

Algo que mudará completamente minha vida.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

— Ainda perdendo tempo nesse diário bobo, Ana? Qual é! — Roberta, minha
melhor amiga de cabelos coloridos, bateu em minha carteira ao voltar do
intervalo. Fechei o diário em um reflexo, afastando meu cabelo claro da face
corada — Porque passou o intervalo todo aqui na sala e não desceu com a
gente?

— Ah, não estou com muito humor. Sabe como é... Minha mãe anda doente
— O sorriso de Roberta murchou. Sua maquiagem forte não escondia sua
vergonha.

— Desculpa... Esqueci. Tem algo que possa fazer para ajudar, amiga? —
Segurou minha mão com carinho — Não gosto de te ver assim...

— Não, não há nada... É só que... Tem algo muito estranho acontecendo em


minha casa. Algo que ninguém quer me contar, sabe? — Roberta apoiou os
braços em minha carteira, virada para trás e me encarando interessada —
Meu pai e todos os empregados estão escondendo alguma coisa!

— O que será? Será que seu pai, o Todo Poderoso Petrônio Vilanova —
Dizia o nome dele como se anunciasse um prêmio — Vai te dar uma Ferrari
em seu aniversário de dezoito anos?

— Ah, claro! — Roberta ria enquanto eu revirar meus olhos azuis, apoiando
o rosto na parede ao lado da carteira e cruzando os braços — Meu pai me
trata como um bebê, Roberta. Até parece que logo você não sabe disso!

— Queria eu ter um pai multimilionário que me tratasse como um bebê! —


Torci os lábios.

— Meu pai ficou multimilionário depois que a primeira esposa dele morreu,
querida. Quem de fato é dono de tudo que temos é ela! Meu pai também tinha
uma boa posição social, mas nada comparado a ela — Relembrei a Roberta.

— Então não é o seu pai o grande dono de tudo, mas seu irmão, é isso? — A
raiva dominou meu semblante e fechei a expressão no mesmo momento.
Aproximei-me um pouco do rosto dela para dizer.

— Sim, ele é o herdeiro de tudo, mas aquele playboyzinho não seria nada se
não fosse meu pai tê-lo acolhido e assumido a responsabilidade de criá-lo e
administrar sua herança! Ele sequer sabia fazer xixi no penico quando a mãe
dele morreu e o deixou completamente sozinho no mundo, sem ter ninguém
que pudesse criá-lo! Se não fosse por meu pai, ele teria sido criado em um
orfanato comum até cumprir dezoito e poder, definitivamente, assumir o
dinheiro todo. Graças ao meu pai ele cresceu com uma família, com pais
adotivos e... — Engoli em seco — Ele não é meu irmão!

— Nossa amiga, calma! — Roberta sorriu um pouco assustada, erguendo


uma das mãos — Não precisa ficar nervosa, eu só comentei! Desculpa! —
Voltei a me encostar na parede, ainda aflita — E o pai dele? Os avós?

— O pai morreu antes de sequer registrá-lo. A mãe dele era filha única, já
órfã, sozinha e a frente de um império após a morte dos pais. Meu pai se
casou com ela e assumiu o menino como filho... — Expliquei brevemente,
querendo sair daquele assunto o mais rápido possível — Mais alguma
dúvida?

— Porque você sempre fica assim quando fala do seu irmão? — Questionou
curiosa, aproximando-se um pouco mais de mim.

— Assim como? — Desconversei, sorrindo sem humor. Minhas bochechas


pegavam fogo!

— Assim... Nervosa, tremendo, com seu rosto pálido todo vermelho! — Dei
um tapinha em sua mão quando apertou minha bochecha — Anda, me fala!
Porque sempre fica assim quando fala de seu irmão?

— Não sei do que está falando e, repito, ele não é meu irmão! — A
professora entrou na sala e espiamos a mesma.

— Você ainda não perdoou ele tê-la deixado, não é? Sei que Valentim
sempre foi muito importante para você, Analuz, não se faça de difícil! —
Neguei com um suspiro entediado, retirando meu caderno da bolsa e
colocando sobre a carteira.

— Por mim aquele garoto pode explodir no mundo, querida! Se não fossem
meus pais lembrando ele a todo o momento, eu sequer me recordaria de que
existe, se quer saber! — Roberta sorriu.

— Ele é um gato, né? Nossa! Sua mãe me mostrou uma foto uma vez e...

— Pode virar? A professora está olhando! — Apontei para frente, buscando


cortar o assunto.

Roberta se virou ao notar o olhar da professora e finalmente me vi livre das


perguntas. Todos meus amigos conheciam Valentim. Aliás, muitas pessoas,
diga-se de passagem. Estampava capas de revista, anúncios sobre
empreendedorismo e era um ícone de apelo sexual para as mulheres com sua
pele morena e olhos cativantes.

O CEO do ramo têxtil mais jovem e atraente do país. Durante muito tempo, o
herdeiro mais cobiçado entre as mulheres.

Não para mim.

Não para a irmã mais nova dele.

Era assim que me via, não era? Sempre a menininha...

Quatro anos se passaram desde que nos vimos pela última vez. A vida seguiu
e tudo mudou... Bom, ao menos no mundo dele.

Segui a mesma vida pacata de sempre, estudando em colégios de doutrinas


conservadoras e religiosas, recebendo aula de canto, violino e piano,
dançando balé das horas vagas, estudando três idiomas simultaneamente e
cumprindo perfeitamente meu papel de filha perfeita. A filha irretocável que
meus pais sempre cobiçaram e ao menos tenho orgulho de ser.

Não estava em meus planos ser uma rebelde sem causa, tão pouco uma
patricinha fútil e mimada... Apenas almejo orgulhar meus pais, as pessoas
que mais amo no mundo. Ambos são muito orgulhosos do filho favorito, o
mais velho, aquele que sequer tem o sangue deles! Porque não podiam me
admirar da mesma maneira?

Um dia serei tão inspiradora e inteligente quanto Valentim, aquele que nunca
erra. Aquele que está acima do bem e do mal.
Aquele que um dia foi embora levando consigo meu coração sem se importar
em me deixar para trás.

— Vamos, senhorita Analuz? — Fred, o motorista, abriu a porta para mim


assim que saí do colégio.

— Chegou cedo, hein Fred! — Comentei enquanto ele abria a porta traseira
do carro — Está tudo bem em casa?

— Sim senhorita, mais do que bem! — Sorria e parecia mais animado —


Seus pais te aguardam com uma boa surpresa!

— Surpresa? Agora sim estou curiosa!

Entrei no carro empolgada, jogando a bolsa para o lado e alisando minha saia
azul escura com o logo dourado do colégio. Também ajeitei a meia longa e
branca que subia por toda minha panturrilha, parando abaixo do joelho.
Pendurei, com a ajuda de Violeta, um lacinho vermelho nas laterais da
mesma para dar um charme a mais. A camiseta do colégio era branca com o
logo dourado, mas por cima havia um casaquinho azul escuro combinando
com a saia.

Não era a melhor roupa do mundo, de fato, mas servia para receber, quem
sabe, meu carro novo!

Será que Roberta tinha razão e o mistério em minha casa se devia a compra
de um carro para meu aniversário que estava próximo? Meu pai já
providenciava tudo para que eu tirasse a carteira de motorista após meu
aniversário.

Tirei um pequeno espelho da bolsa e me olhei de perto . Cabelos loiros - a


ponto de alguns fios serem quase brancos - e ondulados. Não tão lisos, mas
nem tão cacheados. Pele pálida e olhos levemente marcados... Lábios
vermelhos e chamativos. Olhos azuis e muito claros, um tom quase
indecifrável. Mamãe dizia que minha aparência era idêntica a de minha
falecida avó, a mãe dela, que era Russa de berço. Mamãe também nasceu na
antiga União Soviética, mas mudou-se para o Brasil ainda menina.

Apesar de tudo, mantínhamos algumas tradições do país de origem de


mamãe, sempre presentes em minha criação. Russo era meu segundo idioma.

Jamais gostei de ser tão pálida.

De ter pouco tamanho nos seios — algo valorizado entre os adolescentes — e


um quadril mais largo.

Não gostava de meu cabelo loiro, quase branco.

De ter traços tão diferentes.

Passei um pouco de batom nos lábios e retoquei o rímel para parecer mais
bonita quando recebesse minha surpresa. Esfreguei as mãos enquanto o carro
estacionava, sequer esperando que Fred abrisse a porta para mim para descer.

Corri as escadas centrais animada, saltitando em meus sapatos baixos e


brancos. Abri a porta e não encontrei ninguém, apenas um vazio...

— Mamãe? Papai? — Sussurrei olhando em volta, ainda com a mochila nos


ombros — Eva? Violeta?

Foi Eva a primeira a aparecer, vindo da sala de jantar com impaciência.

— Analuz, querida! — Agarrou minha mão e comecei a sorrir — Venha!


Estamos te esperando para o almoço! Seus pais tem uma surpresa!
— Ai, sim! — Comemorei saltitando junto dela, seguindo-a de perto —
Sabia que existia um segredo, sabia que papai não me deixaria sem um
presente e...

— Analuz, querida... — Paralisei na porta da sala de jantar ao ver todos os


membros da mesa se colocando de pé para me receber — Esperávamos por
você!

A voz de papai ecoava, mas eu sequer ouvia. Alguns fios de meu cabelo loiro
se colavam a minha face assustada e a bolsa deslizou aos poucos de meu
ombro conforme meu corpo se tornava estático.

Além de meus pais, minha tia Alessa e meus primos, Philip e Violeta, estava
na mesa uma terceira pessoa de costas para mim...

Alto. Moreno. Cabelos até a nuca, jogados para trás e revoltosos. Ombros
fortes e maiores do que eu me lembrava. Levei a mão até o peito ao notar que
sim, eu não estava louca!

Era ele!

Perdi o ar quando o homem se virou em minha direção, também parecendo


surpreso ao me analisar dos pés à cabeça.

— Agora sim minha família está completa! — Mamãe dizia feliz como há
muito não parecia — Eu, meu esposo e nossos dois filhos amados!

— Analuz... — Ele sussurrou quase sem voz, uma das mãos no bolso e a
outra pousada sobre os lábios. Também estático. Também surpreso. Também
desacreditado.

Ele mudou demais! Ainda era lindo como eu me lembrava, mas um outro
homem. Muito mais homem do que quando se foi.

— Valentim...

Foi tudo que consegui dizer em meio ao caos de sentimentos que se


instalavam em meu coração.

Aquela era, por fim, minha tão esperada surpresa.


Capítulo Dois

Era como de fato ver a luz.

A palpitação em meu peito era ainda maior do que eu me lembrava quando


pousei novamente os olhos sobre ela.

Não era mais a criança doce que eu amava ternamente quando garoto, muito
menos a adolescente que desabrochava diante de meus olhos quando me
peguei apaixonado por ela e tive de ir embora... Analuz agora era uma
mulher! Ao menos fisicamente.

Seu cabelo ondulado e loiro descia até os ombros. O rosto ainda trazia traços
delicados, mas muito mais marcantes e definidos. Seus olhos azuis eram
exatamente os mesmos pelos quais me apaixonei... Lindos, profundos e
indecifráveis. Mesmo que em sonhos, eu ainda era capaz de me perder
completamente neles.

Usava um uniforme de colégio e parecia ainda mais nova do que realmente


era. Recordo-me de Petrônio ter citado que ela perdeu um ano na escola
quando fui embora... Adoeceu e não pode frequentar as aulas por um bom
tempo, por isso ainda cursava o último ano prestes a completar dezoito anos.
Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

Encará-la novamente era como despertar de um grande vazio. Um vale sem


cores.

O azul de seus olhos tinha o poder renovador de me trazer de volta à vida.

— Analuz! Seu irmão voltou! — Yekaterina foi até a filha, que ainda seguia
estática no mesmo lugar em que parou ao chegar, e apoiou as mãos no ombro
dela — Não vai sequer abraçá-lo?

Analuz encarou a mãe, desviando, finalmente, o olhar do meu. Seu olhar era
de pânico. Desespero. Descrença, talvez. Arrisquei dar um passo em direção
a ela, mas rapidamente recuou dois.

— Com licença! — Foi tudo o que disse antes de correr para as grandes
escadas e subi-las de maneira desesperada. Todos na mesa me encararam
quando baixei o olhar e comprimi os lábios.

— Me desculpe, querido! — Yekaterina veio ao meu lado, beijando-me no


rosto — Sua irmã está muito sensível ultimamente, certamente ficou em
choque ao revê-lo...

— Essa menina sempre dando seus chiliques — Alessa comentou


despertando minha atenção, sentada à mesa ao lado dos filhos — Quando
você foi viajar aconteceu a mesma coisa, Valentim! Passou meses fazendo
birra!

— Ela ficou doente, mãe, até o ano da escola ela perdeu! — Violeta, a jovem
prima que tinha pouco mais idade que Analuz, comentou baixinho ao lado.
Ao contrário de Ana, era morena de cabelos escuros e longos — Não foi um
chilique.
— Yekaterina, minha irmã... Você precisa parar de mimar essa menina!
Todos sempre fazem suas vontades!

— Um minuto! — Chamei a atenção de Alessa, que me encarou surpresa —


Analuz é prioridade para nossa família. É nossa caçula e seguiremos
oferecendo a ela todos os mimos que, como boa menina que é, merece! —
Yekaterina separou os lábios ao meu lado, mas não disse nada. Alessa parecia
envergonhada — Agora, se me derem licença, vou subir para falar com ela.

— É claro, meu filho! — Yekaterina beijou meu rosto novamente — É claro!

— Mais um para dar tudo o que a bonequinha quer... — Ouvi Philip


comentando com a mãe antes de sair da mesa. Apenas lancei um olhar
contrariado, deixando claro que qualquer um que se indispusesse com Analuz
teria problemas comigo.

Parei diante da porta do quarto dela, que ainda era o mesmo de quando parti.

Bati duas vezes, mas não houve resposta. Tentei abrir a porta e a mesma
estava apenas encostada. Entrei sem perguntar.

O quarto ainda era como o de uma menina. Prateleiras com algumas bonecas,
livros e perfumes. Penteadeira de espelho com luzes nas extremidades, muita
maquiagem e fotos dela com as amigas. Uma grande foto de Analuz aos
cinco anos era exibida em um quadro grande e decorado, abaixo dela, mais
fotografias. Entre todas, uma de nós dois.

A cama de casal com almofadas de várias pelúcias.

Nos encaramos fixamente quando a vi saindo do banheiro e coçando os


olhos. Certamente lavava o rosto úmido pelas lágrimas.
— Precisamos conversar, não acha? — Ignorando-me completamente, seguiu
até a cama e sentou com uma almofada de unicórnio no colo, virando o rosto
na direção oposta — Pretendo ficar me ignorando durante toda minha estadia
na casa? — Aproximei-me dela com as mãos nos bolsos de minha calça preta
— Sabe que isso não fará bem para a saúde de mamãe...

— Então foi por isso que você voltou? — Ainda não me olhava — Pela
mamãe...

— Também por isso — Segui parado ao lado dela, que seguia sentada — O
que preciso fazer para que me dê um beijo ou ao menos um abraço de boas-
vindas? Me diga... Qualquer coisa!

Soou engraçada a maneira como implorei, ainda assim me mantendo astuto.


Poderia dar toda minha fortuna apenas para receber um breve beijo dela...
Para sentir o roçar de seus lábios em minha pele.

— O que quer que eu faça? Que te encha de abraços depois de ter me deixado
sem olhar para trás? — Finalmente me encarou, colocando-se de pé aos
poucos frente a mim — Que pule em seus braços como uma boa irmã caçula
faria depois de ter me abandonado? — Segui estático diante de seu rosto,
admirando seus olhos... O simples soar de sua voz. Fechei os olhos por um
minuto para sentir o cheiro que exalava dela, sentindo todo o corpo tencionar
pela proximidade. O desejo que sentia por Analuz era avassalador,
completamente incontrolável — Não, Valentim. Isso não vai acontecer! —
Vendo que eu sequer me movia, protestou — Vai ficar parado apenas me
olhando? Não vai dizer nada?

— Você é ainda mais linda do que eu me lembrava — Sua agressividade


recuou um pouco e pude ver em seus olhos o quanto minhas palavras a
surpreenderam — Eu já disse... O que posso fazer para que me perdoe? Peça-
me o que quiser, Analuz, o que desejar!

— O dinheiro não me impressiona, já esqueceu? — Cruzou os braços diante


do peito. Mesmo escondida pelo uniforme, ainda pude reparar em como tinha
um corpo mais desenvolvido agora, repleto de curvas e beleza — O papai
pode me dar tudo também. Não sou como suas modelos... — Suspirei e
fechei os olhos, já cansado de discutir — Vou descer pela mamãe. Pela saúde
dela! Não por você!

— Analuz...

— E ah! — Aproximou-se um pouco mais de meu rosto, tirando-me o ar


completamente — O meu perdão não está à venda, grande CEO!

— Já percebi que não, loirinha... — Corou nas bochechas quando citei seu
antigo apelido.

Abri a porta do quarto e Analuz passou rapidamente, caminhando depressa à


minha frente.

Valentim não era mais o mesmo.

Agora era mandão e prepotente, o mesmo todo-poderoso que eu lia nas


revistas e que a internet mencionava.
Meu irmão, aquele garoto amável, se tornou um homem duro e frio,
completamente voltado para os negócios e seu mundo de cor cinza. Sua
primeira atitude foi tentar comprar meu perdão, não explicar uma palavra
sobre o motivo pelo qual teve que partir.

— Ora, veja só! Voltaram! — Tia Alessa, aquela que gostava de me


repreender, comentou quando me sentei à mesa ao lado de minha mãe.
Valentim estava ao meu lado também, ajeitando a cadeira para que eu me
arrumasse — Que bom que conseguiu convencê-la, Valentim.

Lancei um olhar desafiador para ela, que ergueu o copo como se brindasse.

— Está melhor filha? — Papai questionou preocupado — Sente-se bem?

— Sim pai, tudo bem — Sorri sem humor enquanto avaliava o prato posto a
minha frente e começava a comer sem a menor vontade.

— E você pretende ficar muito tempo, priminho? — Philip questionou em


seu corriqueiro tom enfadonho. Era um típico mauricinho falido que vivia à
custa das migalhas que minha mãe oferecia a eles. A única ali que
representava qualquer bondade era Violeta.

— Tempo suficiente para que Petrônio possa me instruir sobre os próximos


passos — Valentim encarou meu pai, que sorriu orgulhoso.

— E qual é o próximo passo? Você já não se formou em todos os cursos que


sua falecida mãe estipulou? O que mais ela quer? — Philip comentou
curioso.

— Casamento, obviamente — Comprimi os lábios quando tia Alessa


mencionou tal parte, erguendo os olhos do prato para o rosto dela —
Certamente sua mãe estipulou que deveria se casar, não é, grande herdeiro?
— Trata-se de um assunto entre meu filho e eu, Alessa — Papai finalmente a
cortou — Valentim ficará o tempo que for necessário. Este é seu lar, meu
filho. Sua mãe, sua irmã e eu ficamos imensamente felizes com sua presença!

— A irmã parece que não muito... — Philip enquanto bebericava sua bebida.

— E esse... — Valentim engrossou o tom de voz, fazendo com que até


mesmo eu o encarasse — É um problema entre Analuz e eu.

— Desculpe, foi apenas um comentário — Sem graça, Philip baixou o olhar


para o prato e voltou a comer.

Ele está aqui! Valentim está aqui, bem ao meu lado como uma visão! Mais
lindo do que nunca... Mais forte do que nunca... Com o melhor perfume
masculino que já senti na vida!

A maneira como me olhava não saia de minha cabeça.

"O que preciso fazer para que me dê apenas um abraço?"

A vontade de me atirar em seus braços definidos e fortes era gigante, mas tive
de me conter. Aquele sentimento que eu trazia no peito quando menina ainda
seguia vivo, pude constatar desde que voltei a colocar os olhos nele. Aquele
sentimento absurdamente errado!

— Deve ter se assustado ao ver Analuz, meu filho... — Mamãe falava com
Valentim carinhosamente — Veja só como cresceu! Já é uma mulher!

— Por favor, Yekaterina! Analuz tem dezessete anos! — Papai repreendeu e


ela sorriu — É só uma menina!

Valentim me olhou sem esconder a atenção, roubando meu olhar com a


intensidade do seu.
— Sinto dizer, pai... — Ainda me olhava — Mas sua menina já não é mais
criança — Continuamos nos encarando diante de todos. Os olhos castanhos
se fixaram nos meus de maneira impossível de ignorar. Desviei o olhar para o
prato quase sem fôlego — E está linda, é claro. Sempre foi, desde pequena.

— Obrigado... — Sussurrei sem encará-lo — Mas diz isso porque é meu


irmão.

— Não por isso. Você realmente é linda e... Nós não somos irmãos — Todos
na mesa o encararam quando disse tal frase. A tensão que pairou no ar se
dissipou quando mamãe o repreendeu de maneira brincalhona.

— Sabe que não gosto de ouvir essa frase por aqui, meu amor! — Tocou o
ombro dele — Vocês dois são meus filhos, criados sob o mesmo teto e com o
mesmo amor e carinho! Somos uma família e os dois são sim irmãos!

— Violeta também se tornou uma moça muito bonita, não acha Valentim? —
Tia Alessa tocou o cabelo da filha, que parecia constrangida.

Violeta era completamente o oposto da mãe. Não suportava a ideia de viver


de favor na casa de meus pais e muito menos de depender financeiramente de
minha mãe após a morte do pai dela, que era quem sustentava a casa em que
viviam. Com muitas dívidas após a morte do marido, tia Alessa e os filhos
ficaram na rua e foram acolhidos por mamãe, que cuidava dos estudos dos
sobrinhos, na época, adolescentes.

Vivem em uma casa de classe média — bancada por minha mãe — na


periferia, mas titia passa algumas temporadas na casa de meus pais.

— Claro que sim! — Valentim sorriu — Também está linda, prima! —


Alegre, comentou, arrancando um sorriso tímido de Violeta.
A diferença como falava de mim para como falava dela era nítida.

— E a sua namorada, priminho... — Philip comentou — Aquela sim é uma


tremenda de uma gata!

— Namorada? — Deixei meu garfo escapar com a informação, causando um


barulho alto na sala — Você tem namorada?

Valentim ficou um pouco decepcionado, quase sem conseguir exibir reação.


Não sabia o que dizer.

— Michele Bonilha — Philip respondeu por ele — Aquela morena


espetacular!

— Realmente é uma moça bonita, filho — Mamãe tocou o ombro dele, que
ainda me encarava.

— Por favor, podemos mudar de tema? — Valentim pediu.

Sequei os lábios com o guardanapo quando toda a comida embolou em minha


garganta. Senti nojo e enjoo. Senti raiva. Senti... Ciúme!

— Com licença! Já terminei minha refeição, preciso estudar. Amanhã tenho


uma prova importante — Coloquei-me de pé e Valentim fez o mesmo.

— Posso te ajudar, se quiser...

— Não. Obrigado. Prefiro ficar sozinha!

Subi para o quarto rapidamente, fechando a porta e abrindo meu diário sobre
a cama.
Querido diário,

Ele voltou!

Valentim voltou e está aqui em casa!

Valentim voltou e está lindo como nunca, ainda mais lindo do que eu me
lembrava!

Valentim voltou e não explicou o motivo de ter ido embora!

Valentim voltou e partiu meu coração... Ele tem uma namorada!

Porque dói tanto saber disso? Realmente acreditei que depois de tanto tempo
um homem lindo e poderoso ficaria realmente solteiro?

Valentim jamais vai olhar para mim, porque me dói saber que agora é de
outra? Porque me dói saber que já não é aquele garoto que me amava?

O que realmente dói, querido diário, é saber que ainda sinto coisas por ele.
Coisas que uma irmã não deveria sentir e ninguém pode explicar. Coisas que
desconheço!

Será que o amo? Será pecado? Será que me acha realmente bonita?

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.


— Meu filho... — Petrônio apoiou uma mão em meu ombro enquanto
bebíamos o melhor uísque da adega dele juntos no escritório — Quero que
saiba o quanto eu e sua mãe nos orgulhamos do homem que se tornou — Me
encarava com os olhos azuis como os de Analuz completamente sinceros —
Yolanda, que Deus a tenha, teria ainda mais orgulho, filho. Sua mãe
biológica está igualmente contente com a maneira como vem conduzindo os
negócios que ela deixou em nossas mãos.

— Graças a você, pai — Bati meu copo no dele, que sorriu — Se não fosse o
senhor, o que teria sido de mim? Se não fosse o senhor me guiar até hoje nos
negócios, o que seria do grupo Ruiz-Vilanova? O senhor me fez o homem
que sou, pai. O senhor!

Nos abraçamos carinhosamente, um batendo nas costas do outro com


animação.

— Você é um orgulho nos estudos e nos negócios, filho, mas precisamos


falar de sua vida amorosa — Revirei os olhos quando nos sentamos no sofá
de couro preto frente a frente — Yolanda estipulou que você deveria se casar
aos trinta, mas pelo que sei, não leva as mulheres muito a sério — Cruzei as
pernas uma sobre a outra e apoiei o copo no calcanhar — É um tema
importante, filho. Você já teve tempo suficiente para curtir o dinheiro e
festejar. É hora de colocar a cabeça no lugar, criar juízo e uma bela família.

Baixei o olhar diante dele, que me observava atentamente.

— Trata-se de um tema delicado, pai — Confessei coçando a barba que


crescia com a mão livre — Nunca foi fácil falar disso.

— Porque não? Você não tem uma namorada agora?

— Sim, mas não a amo — Respondi na lata, sem pensar — Estou com ela
porque é a melhor opção em meio ao mundo que vivo, mas... Não a amo.

— Se está com ela deve amá-la ao menos um pouco, não é?

— Não. Gosto dela e temos uma boa química na cama, mas... — Neguei com
um aceno — Não a amo.

Bebi um gole grande de uísque sentindo a bebida rasgar em minha garganta


conforme descia.

— Para ser tão convicto em relação a isso certamente já conheceu o amor,


verdade?

Encarei meu pai — o homem que me criou como filho, eu amo como um pai,
mas não têm meu sangue — seriamente. As palavras entalavam em minha
garganta.

Como reagiria se soubesse que meu grande amor, o amor de toda minha vida
e devoção, era a filha dele de dezessete anos? Como reagiria se soubesse que
tive de ir embora para não me entregar ao desejo e possuí-la quando tinha
apenas quatorze anos? Como dizer que ficar perto dela era quase um
martírio? Ter que vê-la sem poder tocá-la era como morrer aos poucos?
Petrônio jamais admitiria.

Sou dez anos mais velho! Sou como um irmão para ela, é assim que nos
chamamos, não é? Além de tudo, Analuz é seu diamante, a menina de seus
olhos! O homem que se casasse com ela seria escolhido a dedo por Petrônio.
Analuz lhe era cara, protegida, venerada. Analuz era proibida para mim.

— Sim, já amei uma mulher como um louco, realmente perdi a cabeça, mas...
— Suspirei — Já coloquei no lugar novamente e espero mantê-la assim por
um bom tempo.

— E quem é essa mulher?

— Pai, eu... — Aproximei-me dele, descruzando as pernas e abaixando os


ombros — Podemos pular essa condição no testamento? Podemos excluir
isso de casamento e tudo? Não posso ser solteiro por mais uns dez anos?

Quem sabe quando eu tivesse quarenta e Analuz trinta as coisas fossem mais
fáceis do que eram hoje?

— Filho, não fui eu quem determinou o testamento, foi Yolanda antes que o
câncer a levasse... O advogado e a justiça exigem que você obedeça aos
critérios estabelecidos, do contrário, corre o risco de perder parte da fortuna.
Nós seguimos à risca tudo que está estipulado durante anos, não podemos
lançar tudo a perder agora!

— Isso é um absurdo! — Esfreguei o cabelo com a mão livre — Minha mãe


não podia estar mais enganada quando estipulou essa cláusula.

— Ela queria estar segura de que você não acabaria com a herança com as
coisas erradas, mas que investiria no futuro de uma família, nos netos dela —
Comprimi os lábios — Você ainda tem dois anos, filho. Dois anos é um bom
tempo para conhecer uma mulher e se apaixonar.

Não quando seu coração já está ocupado desde sempre.

— E Analuz, pai? — A surpresa no olhar dele disse muito — Também vai


estipular que ela se case aos trinta para garantir que tenha netos?

— Analuz... — Petrônio rodou o uísque no copo — Analuz é muito bela e


tem muitos pretendentes se candidatando ao posto, mas trato de afastá-los.
Minha menina ainda tem muito a estudar antes de se enrabichar com qualquer
um por aí... Estarei atento para que nenhum engraçadinho a desvie do bom
caminho.

— Ela é uma jóia preciosa, pai — Encostei-me ao sofá — Não deve mesmo
deixar que ninguém a machuque.

— Sua irmã te ama muito, filho, você é importante para ela. Analuz sofreu
quando você foi estudar fora... Aproveite esse tempo para dar atenção a sua
irmã — Cobri os lábios com uma das mãos ao ouvir suas palavras.

— Analuz também é muito importante para mim, pai. Muito.

Petrônio sorriu orgulhoso.

— Se um dia acontecer algo comigo e com Yekaterina, você será a única


pessoa com a qual sua irmã verdadeiramente pode contar. Promete que irá
sempre protegê-la?

— Claro pai. Sempre protegerei Analuz. Eu prometo!

Inclusive de mim mesmo.


Capítulo Três

Coloquei meus livros sobre a carteira de maneira impaciente, sentando-me


em seguida com cara de poucos amigos.

— Ui! Que humor logo pela manhã! — Roberta comentou chupando seu
pirulito vermelho e com o cabelo colorido ajeitado em uma tiara — O que foi
agora princesinha?

— Ele voltou — Respondi secamente, arrumando meu material sobre a


carteira — Você sabe quem!

— Ele quem? Voldemort? — Sobressaltou-se, agarrada a cadeira.

— Quem me dera! Estou falando de Valentim! — Roberta separou os lábios


em surpresa. Finalmente a encarei — Cheguei da escola ontem e estava lá,
almoçando com meus pais, minha tia e meus primos! Está lá em casa,
Roberta! De volta para minha vida!

— E está brava assim porque seu irmão voltou? Ora, é a casa dele! — Fechei
a expressão, encarando-a nervosa — Porque ele ter voltado te deixa tão aflita,
amiga? Deveria estar feliz porque seu único irmão voltou para casa!

— Pouco me importo com ele... Você gostaria que um irmão chato e que é o
queridinho de seus pais voltasse para casa? — Roberta pensou — Além de
tudo e você sabe, ele não é meu irmão!

— Ai Analuz! Chega de estresse! — Bateu na mesa — Porque não focamos


na festa que vamos hoje à noite? Vai ser a festa do ano! — Pouco empolgada,
apoiei o rosto na mão — Porque essa cara? Até ontem você estava feliz!

— Ele tem uma namorada... — Comentei sem encará-la, fazendo um bico


involuntário e mordendo meu lábio — Uma modelo linda e Espanhola.

— Ele quem?

— Valentim! — Relembrei nervosa — Roberta!

— Amiga, deixa seu irmão para lá! Vamos focar na festa! Vai me emprestar
um vestido, não é? — Revirei os olhos sabendo perfeitamente que não
poderia escapar da tal festa. O aniversário de uma de nossas melhores amigas
em sua casa.

— Empresto o que quiser. Agora vai começar a aula, pode prestar atenção?
— Apontei para frente e ela me mostrou a língua.

Não foquei em nada. Não lembrei nada. Por pouco não tiro nota mínima na
atividade.

Porque era tão complicado seguir a vida normal sabendo que agora meu
irmão estava de volta?

Eu já não sentia mais nada por ele... Sentia? Aquela ilusão tola de menina
ficou para trás, esquecida em meu diário. Valentim tinha uma namorada
linda, uma morena espetacular como eu jamais seria, pálida como sou! O
amor para mim seria nos braços de outro homem, afinal, mesmo que um dia
Valentim me olhasse, papai e mamãe não tolerariam tal relação.
Nós somos irmãos, mesmo que de criação! Perante os olhos de nossos pais e
a sociedade, sim, somos irmãos!

— Já está mais animada, Ana! — Roberta, de braço dado comigo, caminhava


até as escadarias do colégio — Está até sorrindo!

— Resolvi tirar ideias bobas da cabeça... Ideias absurdas! Você vai comigo
para a festa ou nos encontramos lá? — Começamos a descer as escadarias.

— Nos vemos lá e... Ana! — Roberta se deteve e me puxou, nós duas paradas
no topo da escadaria — Aquele não é... Seu irmão?

Olhei na direção em que Roberta olhava, seguindo seu olhar até um carro
prateado e conhecido. Um dos carros da coleção de meu pai. O favorito de
Valentim!

Aliás, parado a frente do mesmo e usando um terno cinza estava ele... Meu
irmão de criação. Engoli em seco ao notar que as meninas não escondiam o
interesse por sua presença. Quem esconderia? Usava óculos escuro no rosto,
a barba por fazer e tinha uma rosa nas mãos. Alguns seguranças da família o
observavam de longe - apenas eu sabia reconhecer - e apertei os olhos diante
da vergonha que me consumia.

Todo mundo, absolutamente todo mundo, olhava em sua direção.

— É... É ele sim — Sussurrei para Roberta, voltando a descer as escadas


quando Valentim acenou para mim. Segui em sua direção com as pernas
trêmulas e o rosto corado — Nos vemos a noite, Roberta?

— Sim amiga. Até de noite — Roberta me acompanhava, mas ficou para trás
quando cheguei perto do carro.
Parei na frente dele, que sorria para mim.

— O que está fazendo na porta do meu colégio no meio do dia? —


Questionei cruzando os braços e encarando-o — Será que o grande CEO não
tem mais obrigações?

Valentim passou os dedos sobre os lábios enquanto sorria.

— O grande CEO... — Repetiu com certa ironia — Também tem horário de


almoço — Esticou a rosa em minha direção — Vim te trazer isso... E te
oferecer uma carona até em casa — Peguei a rosa diante de meu rosto e
encarei o rosto dele, que tirou os óculos de sol. O desgraçado era lindo, ainda
mais de perto — Não vou descansar até que você diga que é mentira...

— O que é mentira? — Questionei sem compreender, cheirando a rosa.

— Que você não vai me amar nunca mais.

Desviei o olhar e suspirei. Valentim tirou do bolso uma caixinha de uma


famosa joalheria, a favorita de mamãe. Estendeu-me antes de abrir a porta do
carro para que eu entrasse.

— O que é isso?

— Um presente — Piscou para mim e entrei no carro, acomodando-me


enquanto ele se colocava no banco do motorista — Não vai abrir?

Abri a caixinha após encará-lo por um momento, irredutível em minha


decisão. Valentim me deixou quando mais precisei dele e não seriam
presentes que mudariam minha maneira de pensar. Nunca mais confiaria
nele... Nunca mais me apegaria a ele... Jamais voltaria a sonhar!

— Gostou? — Encarei a pulseira dentro da caixinha com os lábios separados.


Certamente era uma joia sob medida, uma vez que tinha o meu nome
cravejado nela com pedras preciosas, intercalando em branco e azul claro, a
cor de meus olhos — Uma joia rara para minha joia rara — Pousou uma das
mãos no peito e sorriu.

— Realmente você me surpreendeu! — Peguei a pulseira em mãos e admirei


de perto.

— É difícil presentear a menininha do papai... — Sussurrou chegando um


pouco mais perto para olhar também a pulseira em minhas mãos, nós dois
dentro do carro parecia muito apertado. Ele preenchia tudo com seu tamanho
e beleza — Mas eu gastaria toda minha fortuna, cada centavo, para que você
me amasse como antes.

— Devia ter pensado nisso antes de ir embora — Coloquei a pulseira em meu


pulso enquanto ele ainda seguia perto, com o nariz quase em meu cabelo —
Vamos? Tenho hora para chegar em casa.

— Claro. Vamos — Afastando-se de mim, Valentim se recompôs e ligou o


carro.

Fizemos o percurso calados e, ao chegar em casa, a atenção dele foi roubada


por um telefonema da empresa. Não demorou a ter que partir e segui logo
para meu quarto, sentando-me sobre a cama enquanto admirava a pulseira em
meu pulso e a rosa em minha estante.

Peguei um de meus diários antigos, abrindo em um trecho que escrevi logo


após Valentim partir, quatro anos atrás.
Queria diário,

Jamais voltarei a amar Valentim!

Jamais voltarei a confiar nele!

Nunca no mundo o perdoarei por ter ido embora!

Porque teve que me deixar? Porque não me ama de verdade?

Ele parece ter medo de mim e jamais vou me esquecer da maneira como me
abandonou. Aquele que disse que me amaria para sempre, me protegeria de
todo o mal e seria meu eterno irmão jamais gostou de mim de verdade.
Jamais!

Fechei a página me lembrando da dor que senti no estômago nos dias que
passei sem comer. O vazio da depressão que senti pela ausência dele. Foi um
ano conturbado, uma vida toda parada pela dor da perda... Não era justo ele
voltar e querer que tudo fosse como antes.

Não agora, quando ele tinha uma namorada!

Não agora, quando minha vida começava a caminhar definitivamente para


longe dele.

Eu já não o amava... Nunca mais o amaria! Ao menos era disso que eu


tentava me convencer.
— Analuz não quer me perdoar, pai. Não quer nem me ver.

Passei a mão na nuca enquanto bebia um pouco de café no escritório com


papai.

— Parece que não conhece sua irmã, filho — Analisando alguns papéis na
mesa, parecia sério e centrado — Analuz é caprichosa e sofreu muito com sua
ausência. Mas ela te ama e uma hora dará o braço a torcer e voltará a se
aproximar. Continue insistindo...

— Não sei como agir com ela — Confessei pensativo, desatando o nó da


gravata - Com as outras é tudo tão fácil... Um presente e uma flor e tudo está
arrumado! Agora Analuz — Sorri ao pensar nela — Tudo isso não a
impressiona. Nada disso é diferente do que ela já tem.

— Está comparando sua irmã com uma mulher, filho? — Virei-me para meu
pai, que me encarava confuso, retirando os óculos de grau de frente do rosto.

— Claro que não, pai — Engoli em seco, gaguejando — Eu só... As mulheres


gostam de presentes, não é? A mamãe também é assim! Todas as mulheres
gostam de mimos.
— Por um minuto você me assustou — Sorriu aliviado, voltando-se para os
papéis — Analuz ainda é uma menina, não sabe nada da vida. Não leve tão a
sério o que ela diz.

— Não é só uma menina — Parei a frente da mesa e ele novamente me


encarou — É minha irmã! — Emendei finalizando com um sorriso.

— E por ser sua irmã... Te digo que ela também te ama. Dê tempo ao tempo,
filho.

Tempo ao tempo.

Sai do escritório sob uma forte chuva e entrando em casa recebi uma ligação.

— Meu amor! — Em seu sotaque espanhol, Michele dizia do outro lado


— Estou com tanta saudade!

— Oi Michele, eu... — Fechei a porta e parei na entrada — Estou em uma


reunião importante, será que podemos nos falar depois?

— Oh amor, esqueci do tal horário... Tudo bem, não tem problema! Como
está tudo por aí? E sua mãe?

— Está bem, na medida do possível. Bem, tenho que desligar. Nos falamos
depois? — Subi as escadas para os quartos.

— Ok, baby. Até mais. Te amo!

— Um beijo!

Parei diante da porta do quarto de Analuz, entreaberta no corredor. Espiei


pela fresta e a vi parada diante do espelho da penteadeira ajeitando o cabelo
loiro em cachos nas pontas.
Estava linda... Mais linda do que nunca! Era a primeira vez que a via sem o
uniforme do colégio desde que voltei.

Usava um vestido azul claro colado ao corpo e que parava em meio às coxas
torneadas. Nos ombros um casaquinho jeans da moda entre os adolescentes.
Cada ano, cada dia, cada minuto que passava ela se tornava ainda mais
tentadora diante de meus olhos, agora incrivelmente maravilhosa e moldada
em um corpo de mulher.

Um corpo atraente.

Poucos seios, cintura fina e quadril largo. Coxas grossas. O cabelo macio e
brilhante chamava tanto a atenção quanto seus olhos claros. Sequer sabia
apontar o que me parecia mais lindo nela...

Vendo-me pelo espelho, virou-se.

— Me espiando? — Questionou com uma das mãos na cintura — Vou contar


para o papai...

Voltou-se novamente para o espelho quando entrei no quarto, finalmente


revelando minha presença.

— Só estava passando — Segurei a maçaneta e permaneci parado enquanto


ela passava batom nos lábios despreocupadamente, inclinando um pouco o
corpo em direção ao espelho. Não pude evitar reparar em seu corpo, em seu
movimento. Com pouco Analuz me deixava maluco. Pigarreei — Aonde vai
assim?

— Assim como? — Mexia na bolsinha de maquiagem.

— Assim, ainda mais bonita — Insisti vendo seu olhar curioso para mim —
Vai sair com alguém?

— Vou sair sim — Disse agora passando algo sobre os olhos — Não que te
importe, porque você não é meu pai... Mas sim. Vou a uma festa com meus
amigos.

— E tem permissão? — Meu tom era cauteloso. Enciumado — Pelo que me


lembro, o papai não te deixa sair sozinha.

— Não sei se reparou, maninho — Virou-se para mim e mostrou o corpo com
um movimento de mãos da cabeça ao quadril — Mas eu cresci! As coisas
mudaram por aqui! — Piscou para mim e caminhou até sua bolsa, que estava
sobre a cama. Passei os dedos entre o cabelo, incapaz de me controlar. O
ciúme me dominava e nada podia fazer para detê-la — E você, poderoso
CEO? Vai passar a sexta à noite em casa ou a sua super top model te permite
sair um pouco?

Ajeitando a bolsa no ombro, Analuz me encarou.

— Você espera eu tomar um banho? — Apontei atrás de mim — Levo dez


minutos.

— Como assim?

— Como assim o que? Não se faz de tonta! — Me aproximei dela


vagarosamente. Parei diante de seu rosto — Vou te levar.

— Ah, mas não mesmo! Não preciso de um guarda costas! — Tentou se


desviar, mas coloquei o braço de modo a impedir que passasse. Ergueu os
olhos azuis para meu rosto — Valentim, fala sério!

— Me espere. Dez minutos! — Apontei para seu rosto, seguindo em direção


ao meu quarto. Passei por meu pai no corredor — Pai, acompanharei Analuz
na festa! Faça ela me esperar!

— Vocês sempre o defendem, não é? Sempre! — Resmunguei ao lado de


meus pais na sala de estar, ambos me encarando abraçados na outra ponta.

— Filha, o que custa levar seu irmão na festa? Ele precisa mesmo sair um
pouco do escritório... O pobre não faz outra coisa da vida além de trabalhar!
— Mamãe, com seu jeitinho meigo, comentou.

— A senhora é mesmo inocente, não é, mãe? — Cruzei os braços diante do


peito — E eu já disse que ele pode ser seu filho, mas não é e nunca será meu
irmão!

— Analuz e sua maneira doce de demonstrar o quanto me ama! — Olhei para


a escada e o vi descendo. Usava uma camisa social preta, calça jeans e
ajeitava as mangas da camisa para que ficassem nos ombros. O relógio de
ouro reluzia sob a luz da sala. Deu-me um estalado beijo no cabelo e me
abraçou de lado — Vamos?
Ignorei a sensação ardente em meu estômago, mas não pude evitar o rubor
nas bochechas. Diante de meus pais o tom dele comigo mudava
completamente.

— Querido, Analuz me mostrou a pulseira que você deu de presente! Foi um


gesto tão carinhoso! — Mamãe comentou enquanto eu revirava os olhos, o
braço dele ainda me abraçando pelo ombro.

— Quero recuperar o amor de minha irmã, mamãe. Quero que voltemos a ser
como éramos antes de...

— Antes de você ir embora! — Enfatizei.

— Claro que vão, querido! Irmãos sempre se amarão! Não importa o quanto
briguem, sempre se amarão!

— Juízo os dois, hein? — Papai comentou quando começamos a caminhar


até a porta que Valentim abriu para mim.

— Pode deixar, pai. Vou cuidar muito bem de sua joia preciosa!

Descemos em direção ao carro favorito de Valentim, o prateado, que já nos


esperava na entrada. Uma vez dentro, não escondi meu descontentamento.

— Você finge muito bem na frente de nossos pais — Comentei sem encará-
lo, olhando a janela. Valentim já dirigia após eu explicar o caminho da festa.

— Em relação a quê?

— A me tratar como uma irmã caçula querida...

— E como te trato, se não assim? — Me encarou quando o sinal fechou e as


palavras morreram em minha garganta. Olhei para ele de volta, intrigada com
sua maneira cínica de falar — Não vai dizer nada?

Queria falar sobre os elogios ou as olhadas que me lançava, mas me neguei.


Desviei o olhar para a rua novamente, ignorando-o.

— É aqui! — Indiquei o local e ele parou o carro no acostamento — Não vai


descer?

— Não... — Comentou para minha surpresa, agora mais sério — Já que sou
tão indesejado, prefiro ficar.

Murchei os ombros, encostando-me ao banco.

— Você já veio até aqui e se arrumou todo! Anda, vamos! — Ele não se
moveu — Ou foi sua top model que não deu permissão? — Valentim me
encarou e desligou o carro, nitidamente contrariado com o desafio. Sorri ao
descer, vendo que me seguia de perto. Ao avistarem-no, meus amigos já
cochichavam entre si sobre a ilustre presença — É, pelo jeito a noite vai ser
inesquecível...

Cruzei os braços ao sentir a mão forte me tocando nas costas de maneira


possessiva.

— Será, maninha. Essa é a intenção!

— Analuz! — Roberta veio em minha direção completamente transformada


em um vestido negro e botas — Que bom que chegou! — Olhava para
Valentim.

Parei diante de todos com ele sorrindo a meu encalço.

— Gente, eu trouxe meu... — Pensei por um segundo.


— Valentim Vilanova! — Estendeu a mão para Roberta, que aceitou
imediatamente.

— Então esse é seu irmão mais velho, Ana? — Roberta sorria enquanto
Valentim apertava a mão de nossos amigos — Que bom conhecê-lo, a Ana
fala muito de você!

— Ah sim? — Fazendo o cínico, Valentim me encarou. Segui de braços


cruzados em frente a ele — Posso imaginar tudo o que ela diz...

— Vem! Sentem-se conosco! — Seguimos até a mesa com muitas pessoas


conhecidas do colégio.

— Vê se não fica grudado em mim feito um bobalhão! — Sussurrei para ele


quando nos sentamos. Valentim seguia colado a mim.

— Ana? Valentim? — Violeta passava com Philip e ambos pararam ao nos


ver — O que fazem aqui?

— Olha que surpresa... O grande CEO também tem vida social. Pensei que
fosse apenas um homem de negócios, priminho! — Philip bateu no ombro de
Valentim, que olhou para a mão dele com certa antipatia.

— Já eu penso ao contrário sobre você. Seria interessante te ver trabalhando e


longe da farra... Faria bem para sua cabeça, priminho — Sorriu cinicamente e
não pude evitar rir, encarando-o — Vai, vaza Philip! — Sem fazer qualquer
esforço para ser agradável, Valentim seguia desdenhando - Ninguém merece
ter você até aqui para encher o saco!

— Quer sentar conosco, Vi? — Segurei a mão de Violeta.

— Quero! — A morena sentou ao meu lado, animada — Até maninho!


— Arrogante... — Philip saiu xingando Valentim, que sequer deu atenção.
Enquanto ele pedia bebida ao garçom, Violeta se aproximou para falar sem
que ele nos ouvisse.

— Resolveu dar uma chance para o seu irmão, Ana? Isso é muito bom!

— Não dei chance nenhuma, esse garoto sem noção que colou em mim feito
chiclete! Até parece que você não conhece... — Nós duas rimos e em minutos
a mesa estava repleta de bebida e comida.

Valentim recebeu uma mensagem enquanto conversávamos e desde então


parou completamente de responder. Espirei enquanto digitava e o nome
"Michele" estava escrito com um emoji de coração. Revirei os olhos e peguei
uma caipirinha na mesa, ficando de pé com Violeta.

— Aonde vai? — Questionou ao me ver tirar a jaqueta e ficar de vestido.


Desceu o olhar para meu corpo brevemente.

— Dançar! Já que você vai ficar no celular o tempo todo, eu ainda sou jovem
e quero me divertir!

— Analuz!

Ouvi a voz de Valentim atrás de mim, mas segui com Violeta e Roberta até a
pista de dança e passamos a dançar juntas enquanto comentamos as fofocas
do colégio. Na mesa, os olhos de Valentim não me abandonaram por nem um
momento.

Eu, que não costumava beber, muito menos em festas de amigos, me senti
absurdamente desequilibrada quando o vi trocando mensagens com a tal
modelo perfeita.
Era incontrolável não sentir raiva, ciúme e decepção. Ele, que antes de ir
jurou que nenhuma outra roubaria sua atenção, tinha me traído da pior forma.

Bebi mais um gole da caipirinha pensando que aquela noite era o cenário
perfeito para me vingar!
Capítulo Quatro

Analuz podia parecer muito inteligente e dona de si, mas não tinha ideia do
quanto era ingênua e inocente. Não tinha ideia de como sua beleza era capaz
de arrebatar os homens ao redor.

Muitos se aproximavam dela sem que sequer desse conta, ignorando-os


naturalmente. Dançava de maneira simples e descontraída, mas mesmo assim
sua beleza diferente se destacava entre as demais.

Era naturalmente loira. Tinha os cabelos ondulados, não lisos ou alisados.


Seu rosto era tão uniforme quanto o corpo, que a cada movimento na pista de
dança me deixava ainda mais nervoso. Cada segundo ao lado dela era uma
prova de fogo a mais em meu autocontrole.

— Aqui está ele, não te falei? — Me virei e encontrei Philip ao lado de uma
figura conhecida. Estreitei o olhar quando o homem me esticou a mão com
um grande sorriso — Chegou faz alguns dias...

— Não se lembra de mim, mano? Sou Sebastian! Sebastian Ferrer! —


Coloquei-me de pé no mesmo momento, abraçando-o com animação.

— Sebastian! Quantos anos, meu amigo? — Bati no ombro forte do homem


loiro que me abraçava — Você parece muito bem!

Sebastian é meu amigo de infância. Crescemos juntos porque a família dele


era muito amiga dos Vilanova, família de meu padrasto, e a mãe dele, em
especial, amiga íntima de Yekaterina, minha mãe adotiva.

— Não melhor do que você, cara! O grande CEO do ramo têxtil! Fui
perguntar sobre você para seu primo e olha... Você estava bem aqui! — Sorri
pegando meu copo de cima da mesa. Philip nos ouvia, mas logo saiu diante
de meu olhar.

— Cheguei faz pouco... Vim acompanhar Analuz, se lembra dela? —


Sebastian pensou, também segurando uma bebida.

— Sua irmãzinha? — Suspirei cansado — Claro que lembro! Ela já tem


autorização para entrar neste lugar? Caramba! Estou velho mesmo!

— Aqui pode entrar com dezesseis, então sim, ela tem — Concordei batendo
em seu ombro — E ai, me diga... Como vão as coisas? Soube que seus
negócios vão de vento em poupa...

Enquanto conversávamos, meu olhar seguia em Analuz, que dançava com as


prima e a amiga. Seus olhos me buscavam vez ou outra, interessada em
minha conversa.

Sebastian seguia os passos do pai à frente da empresa da família e seguia


solteiro e festeiro, mas buscava um relacionamento, segundo o que disse.
Elogiou meu namoro com Michele, algo público, e me parabenizou por ter
uma noiva tão bonita. Meus olhos, mesmo que ouvissem tais palavras, apenas
podiam ver Analuz.

Um garoto se aproximou dela. Ambos começaram a conversar um pouco


alheios a Violeta e Roberta, chamando minha atenção. Suspirei enciumado,
sem conseguir me controlar quando o garoto em questão lhe tocou o braço e
se aproximou para beijar seu rosto.

Pedi um minuto para Sebastian e fui até ela, parando as suas costas e
encarando o rapaz com a ira no olhar, analisando-o. O mesmo engoliu em
seco ao me ver, fazendo Analuz se virar.

— Ah, com licença! É o meu irmão... — O garoto concordou, saindo em


seguida com receio — O que você quer, hein?

— Quem é esse? — Analuz sorriu ironicamente, desafiando-me com o olhar.

— Um amigo do colégio... E eu já disse que você não é meu pai!

— Sou seu irmão mais velho! Não vou deixar um pirralho qualquer ficar se
aproveitando de você na frente de todos! — Ela riu sem humor.

— Apenas estávamos conversando, Valentim! — Analuz se colocou na ponta


dos pés para falar, quase alcançando meus lábios. Senti o cheiro de bebida em
seus lábios, dando-me conta de que já se excedia no álcool — E você não é
meu irmão!

— Veja só... Então essa é Analuz Vilanova? — Nos separamos quando


Sebastian parou ao nosso lado, encarando Ana dos pés a cabeça.

— Sim, sou eu — Ana não escondeu o interesse ao vê-lo. Olhou-me — É seu


amigo?

— Sou amigo do seu irmão há muito tempo, desde a infância. Lembro-me de


você quando era menina... Sebastian Ferrer, muito prazer! — Esticou a mão
para ela, que apertou com um sorriso — Sua irmãzinha cresceu e se tornou
uma moça linda, amigo.

— Obrigado, que amável! — Analuz me olhou ao responder, provocando-me


— Não é sempre que alguém se dá conta de que cresci. A maioria me trata
como uma menininha boba...

— Bom, não é assim que te vejo — Sebastian sorria para ela e no mesmo
momento compreendi o que pretendia. Meu melhor amigo de infância
também caiu no feitiço que irradiava dos olhos azuis claros de Analuz. O
mesmo feitiço que me roubou a alma anos atrás, quando ela ainda era uma
menina — Acho que não há problema em te chamar para dançar, não é?

Sebastian esticou a mão e Analuz sorriu, aceitando.

— Não costumo aceitar, mas... Já que é amigo de meu irmão... — Deu de


ombros e me encarou — Com licença, maninho.

Não pude fazer nada.

Não pude impedir Analuz de caminhar para a pista de dança com meu amigo
de infância, um homem de minha mesma idade e interesses. Também era
milionário. Também agradava a meus pais. Nossa única diferença?

Sebastian não era irmão dela!

Passei os dedos entre os fios de meu cabelo e apanhei um novo copo de


bebida, praticamente virando nos lábios enquanto me escorava no bar. Meu
celular vibrava e era Michele.

— Não estou em uma festa qualquer, vim acompanhar minha irmã, Michele,
eu já disse! — Expliquei ao atender e ela se irritar pelo barulho — Não posso
deixá-la sozinha!
— Então foi para isso que voltou ao Brasil, não pela saúde de sua mãe?
Voltou para ser a babá de sua irmãzinha caçula?

Desliguei o celular ao ver Sebastian abraçando Analuz enquanto dançavam,


movendo a mão na cintura dela. Atravessei o salão sem me importar com
nada, parando ao lado deles e puxando-a em direção a mim.

— Vamos! Hora de ir! — Analuz soluçou surpresa. Sebastian levou a mão


aos lábios pela interrupção abrupta — Acho que você já passou da conta
hoje, garota.

— Para de agir como se fosse meu pai! — Sussurrou perto de meu rosto,
puxando o braço de minha mão — Volte para seu celular com sua noivinha...
Prefiro ficar aqui com Sebastian!

Meu olhar para Sebastian foi tão gélido que sequer precisei dizer nada para
que compreendesse o recado.

— Analuz, tudo bem. Seu irmão tem razão. É melhor você ir para casa, talvez
tenha exagerado na bebida... — Corando, Analuz recuou alguns passos —
Amigo, eu... — Não desfiz minha expressão, travando o maxilar — Passo
para visitá-los em breve.

— Não se preocupe, cara — Acenei em sua direção. Violeta chegou ao


mesmo instante com as coisas de Analuz, seu casaco e sua bolsa — Até mais.

— Foi muito bom revê-los! Nos vemos em breve! — Sebastian falava, mas o
deixei para trás levando as meninas comigo.

— Acho melhor levar a Ana, primo — Violeta colocou as coisas de Ana em


minhas mãos — Ela não está bem e não quero que meu irmão a veja assim.
Ele pode abrir a boca e isso vai ser péssimo se ficarem sabendo em casa!
— Claro que estou bem! — Analuz, guiada por minhas mãos em seus braços,
caminhava errando os passos — Você já me viu bêbada na vida, Violeta?

— Não! Você nunca bebe, por isso estou preocupada!

Paramos na entrada da boate e coloquei o casaco nos ombros de Analuz, que


se agasalhou nervosa. Segurei a bolsa dela, notando como sequer conseguia
dizer algo plausível.

— Quer ir conosco, prima? — Violeta negou meu pedido.

— Vou com meu irmão. Cuide dela, primo. Tem alguma coisa estranha em
Ana, ela não parece estar agindo com a razão!

— Violeta! De que lado você está? — Analuz vociferou nervosa — Ai! —


Levou a mão à cabeça.

— Não deixe tio Petrônio vê-la assim, muito menos tia Yekaterina! A saúde
dela não anda das melhores — Concordei e Violeta se foi.

Levei Analuz para o carro e a coloquei no banco do passageiro.

— Você é impossível! — Acomodei-me no banco do motorista enquanto ela


protestava — Ninguém pode fazer nada distante da vontade do todo-
poderoso! Qual era o problema de me deixar lá com Sebastian? Você não
cuida da sua namoradinha? Ele também poderia cuidar de mim!

— Chega de birra, Analuz! Você quer ser tão adulta, mas não passa de uma
menina mimada e caprichosa! — Segui dirigindo nervoso — Homens como
Sebastian não se contentam com beijinhos e mãos dadas, menina.

— Ele gostou de mim, será que não percebeu?


— Claro que percebi, não está escrito idiota na minha testa, está?

— Claro que está! Agora que percebeu?

— E você? Quando vai perceber que não é bebendo e se insinuando para um


imbecil que se chama a atenção de um homem?

Analuz me encarou nervosa, os olhos azuis marejados e a expressão


envergonhada. Cruzou os braços em frente ao corpo frágil e virou o rosto em
direção à rua, calada. Vi lágrimas rolando em sua bochecha, mas ela
rapidamente secou.

— Agora sim posso dizer que nunca mais volto a te amar, Valentim Ruiz
Vilanova! Nunca mais!

Apertei os olhos e segui dirigindo mais rápido, chegando em casa antes do


previsto. Estacionei e notei todas as luzes apagadas. Desci com Analuz
tomando cuidado para não sermos vistos e bolando na mente desculpas
diferentes para que ela nada precisasse dizer.

Não precisei usá-las.

Não havia ninguém acordado. Meus pais, ao saberem que ela estava comigo,
relaxaram e não se preocuparam com a caçula, protegida pelo irmão mais
velho.

Uma vez no quarto dela, passei a chave na porta com receio de sermos
ouvidos.

— Porque você trancou? — Sentei Analuz na cama e me abaixei para tirar


seus sapatos, uma vez que ela sequer conseguia dar um passo sozinha — Sai
daqui, Valentim! Some da minha frente! Some da minha vida!
— Dá para falar mais baixo? Quer que o papai e a mamãe te escutem e
saibam quem a filhinha intocável chegou em tal estado em casa, caindo de
bêbada? — Coloquei-me de pé encarando-a.

Analuz tinha as mãos tapando o rosto para não me olhar. O cabelo ondulado e
loiro caía revolto ao redor do rosto, marcado pela maquiagem que escorreu
com as lágrimas. Ela era um caos pós-festa, mas era linda... Tudo o que
minha cabeça perversa podia pensar naquele momento era em como seria
fácil despi-la e amá-la, tomando-a em sua cama cor de rosa como sempre
imaginei.

— Não estou caindo de bêbada! — Afastou as mãos do rosto e fixou os olhos


azuis em mim — O que quer ouvir? Obrigado maninho por ter estragado
minha noite? Bom, você é mestre nisso, não é? Sempre estragando minha
vida, sempre!

Suspirei derrotado ao vê-la jogando o cabelo loiro claríssimo para longe do


rosto, secando a face com as mãos trêmulas.

— O que preciso fazer para que me perdoe por ter ido, Analuz? — Ela não
me olhava — Já disse que te dou o que quiser, te faço o que quiser... Basta
me dizer! Tudo o que quero é que voltemos a nos dar bem. Quero ser seu
amigo novamente e ter de volta a irmã que me amava!

Analuz ergueu os olhos para mim lentamente, uma frieza incomum tomando
conta de seu olhar.

— Eu já disse que dinheiro não me compra! — Relembrou nervosa — É tão


fácil para você, não é? Certamente quebra o coração das mulheres e concerta
com presentes! — Analuz ficou de pé frente a mim em uma postura
enraivecida — Você escolheu me deixar... Sabe o quanto sofri ao ver a única
pessoa que cuidava de mim verdadeiramente e se importava em me fazer feliz
todos os dias indo embora? Papai e mamãe nunca tiveram tempo de me ouvir,
nunca me levaram a sério... Mas você... Você era tudo, Valentim! —
Lágrimas percorreram o rosto dela e apertei as mãos em punho para não tocá-
la — Dizia que eu era a coisa mais importante na sua vida e sempre iria me
amar e proteger, mas quando mais precisei, quando comecei a... — Deteve-
se, pensando no que diria — Quando percebi que também sempre te amaria,
você me deixou! Simplesmente se foi! Como quer que eu volte a te amar se
você me destruiu?

— Jamais quis te machucar! — Garanti enfaticamente — Se lembra do que


eu disse antes de partir?

— Que estava fazendo aquilo por mim... Pelo meu bem — Sorriu sem humor.
A expressão já cansada de discutir — Mas não vejo como foi para o meu
bem. Perdi a fome, a vontade de tudo e adoeci. Fiquei um ano me olhando no
espelho e pensando onde tinha errado, no que tinha falhado para que você me
deixasse...

— Falhar, Analuz? — Caminhei até ela, segurando-a pelos braços contra meu
peito — Como pode ter falhado, se para mim você é perfeita?

Analuz travou contra meu peito, encarando-me desconcertada após minhas


palavras. Toquei seu rosto, subindo delicadamente a mão até sua linda face.
Empurrando-me, saiu de meu toque.

— As coisas vão voltar a ser como antes quando você me disser o motivo de
ter ido embora. O motivo real, sem mentiras ou desculpas...

— Quer saber mesmo? — Ela assentiu positivamente, nervosa e apreensiva


— Quer ouvir com todas as letras, Analuz? — Encarei-a de maneira
desafiadora.

— Se você tiver coragem de me dizer... — Deu de ombros em uma clara


afronta. Mordi os lábios diante de sua ousadia.

— Pois bem... Mas depois... — Apontei para ela — Depois não diga que não
te avisei!

Não pensei em nada além do desejo que me percorria as veias há muitos


anos.

Não pensei em nada além da vontade que me consumia durante os últimos


anos em segredo, a vontade mais secreta que me fazia revirar na cama noites
e noites, tocar mulheres pensando nela...

A vontade de tê-la. De senti-la. De tocá-la!

Peguei-a nos braços com voracidade, beijando-a com o ímpeto e desejo de


um homem sedento, faminto, alucinado por uma mulher há anos!

Analuz me empurrou no começo, completamente surpresa e assustada, mas


aos poucos, conforme meus lábios se moviam nos dela e minha língua lhe
penetrava a boca, foi se acalmando e me retribuindo a sua maneira.

Abraçou-me pelo pescoço enquanto minha língua saboreava o gosto que


tanto imaginei como seria... Enquanto minhas mãos passeavam em seu corpo
frágil da maneira que eu sempre desejei... Sem reservas, tocando-a onde
queria.

Pressionei seu quadril no meu com desespero, como um homem que vê a luz
pela primeira vez em muito tempo, sentindo nas mãos o corpo dela
estremecendo pelo contato.
Senti seus seios rijos contra meu peito. Seu coração batendo rapidamente. Os
dedos pequenos em meu cabelo. A maneira desesperada como também queria
me sentir... Ela me queria, eu estava certo! Nunca me odiou... Analuz
também me amava!

Afastei-me sem acreditar, os olhos ainda fechados pelo êxtase que me


consumia. Queria guardar aquele beijo para sempre na memória, queria me
lembrar de cada segundo que tive nos braços da mulher de meus sonhos, a
dona dos meus pecados.

Analuz não exibia reação, completamente imóvel em meus braços. Soltei-a


aos poucos, controlando-me antes de encará-la. Pousou a mão nos lábios e
me olhou assustada, recuando.

— Você ficou louco? — Questionou trêmula, finalmente caindo em si —


Perdeu o juízo?

— Você me desafiou, Analuz. Ninguém me desafia em vão! — Respondi


ainda em êxtase, a respiração descompassada — Espero que agora
compreenda...

— Compreendo que você é um... — Tomou fôlego e sentou-se na cama um


pouco desequilibrada — Um descarado! Como se atreve a... Tem ideia do
que...

Analuz me encarava assustada. Cocei a barba e, dominado pela incerteza, sai


do quarto dela sem dizer nada.

A partir de agora as coisas entre nós mudariam para sempre.


Capítulo Cinco

Não consegui dormir durante muito tempo naquela noite, por isso ouvi o
momento exato em que Valentim entrou em meu quarto durante a madrugada
e se abaixou ao lado de minha cama.

Sua mão grande e forte me tocou o cabelo com carinho e segui estática virada
na direção oposta, fingindo descansar em sono profundo. Não me movi ao
sentir um beijo demorado em meu cabelo. Não me movi ao sentir sua mão me
acariciando o cabelo delicadamente...

A confusão, mais do que nunca, se instalou em minha alma.

Perguntei o motivo de ter ido embora e ele simplesmente me beijou, assim,


sem mais nem menos!

Querido Diário,

Hoje Valentim me beijou.

Bom, nós nos beijamos!


Não fiz força para que me soltasse e muito menos relutei em aceitar sua
língua em minha boca, pelo contrário! Senti borboletas no estômago! Me
senti como nos filmes e queria sentir muito mais se pudesse!

Não consigo deixar de pensar que beijar meu irmão foi o maior erro de
minha vida. Não consigo deixar de pensar nele, tão pouco... Em suas mãos.
Em seu toque firme e agradável.

Em como ele parecia encantado por me tocar.

Será que estava brincando comigo e apenas queria me pregar uma peça?

Papai ficaria uma fera se soubesse! Não haveria ninguém no mundo capaz
de explicar a ele que isso era aceitável, mesmo nós dois não sendo parentes
de sangue. Para ele e mamãe, Valentim e eu somos irmãos!

Os desonraria se não fosse assim.

Me desonraria!

Que espécie de mulher Valentim pensa que sou, se ele tem uma namorada e
me beija como se pudesse fazê-lo a sua vontade? Que espécie de homem
Valentim é, se me beijou na boca sem se importar com as consequências?

Se ele não pensou bem em tudo, posso fazer isso por ele. Esse beijo deve ser
esquecido como o amor que um dia senti por ele foi.

Esse beijo deve ficar oculto no passado, para sempre.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

— Loirinha... — Ao sair de meu quarto ainda de pijama na manhã de sábado,


ouvi a voz dele me chamando no corredor. Me virei e o vi caminhando em
direção a mim. Usava nada além de uma calça de moletom cinza. O peito
desnudo. Engoli em seco diante da visão de seu peitoral forte, tentando
ignorá-lo — Precisamos conversar...

— Precisamos? — Cruzei os braços à frente do corpo depois de bocejar —


Vai me encher o saco logo cedo, maninho?

Valentim apoiou as mãos na cintura sem esconder a confusão no olhar cor de


café.

— Precisamos falar sobre ontem, Analuz, não se faz de tonta! — Insistiu


baixinho e chegando mais perto.

— Ah claro! Preciso te agradecer! — Sorri despreocupada, executando bem


meu papel de atriz — Obrigado por ter me trazido! Foi você que me trouxe,
não foi? Nem me lembro como cheguei ontem! O papai viu a gente? —
Sussurrei também.

Valentim travou enquanto me encarava.

— Não se lembra de nada?

— Me lembro, claro! Estávamos na festa, seu amigo começou a se empolgar


comigo e você me levou embora porque eu estava bêbada! — Enumerei os
fatos fingindo pensar — Só lembro de você e Violeta conversando, algo
assim... Depois... — Fiz um sinal negativo. Bati no ombro de Valentim, que
me encarava desacreditado — Por quê? Tem mais alguma coisa para lembrar,
além disso? Eu paguei mico? Sabe, não costumo beber. Quando coloca uma
gotinha de álcool na boca já fico louca e se o papai descobre... Estou em
problemas! Não vai contar, vai?
Valentim me encarava decepcionado.

— Tem certeza que não se lembra de nada?

— Absoluta! — Garanti cruzando os braços novamente e encarando-o


seriamente — E você? Tem algo a me dizer?

— Não — Respondeu sem me encarar — Está... Tudo bem. Não vou contar
nada ao papai e... Esquece. É melhor.

Voltou por aonde veio sem olhar para trás e me escorei na parede do meu
quarto nervosa, palpitando por dentro pela sensação de abandono. Parte de
mim desejava que ele insistisse e dissesse que nos beijamos. Parte de mim
queria que me abraçasse contra o peito forte, queria mais um beijo!

A outra parte sabia que o melhor foi feito. Aquilo era uma loucura e eu
jamais poderia perdoá-lo!

— A que devemos este passeio, pai? — Questionei enquanto eu e Petrônio


passeávamos na hípica em que costumávamos frequentar aos sábados quando
eu era garoto — Sei que apenas me traz a este lugar quando precisa falar
sobre algo sério...

Petrônio sempre foi muito forte, mas naquela tarde parecia mais destroçado
que eu, que passei a noite em claro morrendo por dentro por ter cometido
uma loucura.

Cheguei a pensar que talvez fosse meu passaporte para a liberdade. Analuz
me correspondeu quando a beijei... Não demonstrou em momento algum
qualquer tipo de repulsa por mim. Cheguei a pensar que tudo poderia mudar
definitivamente entre nós, mas recebi um banho de água fria!

Ela não se lembrava! Ao menos era o que dizia.

— Filho... — Tocou meu ombro carinhosamente. O cabelo loiro, com alguns


fios brancos, reluzia sob o sol fraco da tarde — O que tenho a dizer não é
fácil, principalmente para nós dois que já passamos por algo parecido um
dia...

— Pai... Do que está falando?

Detive-me e parei frente a ele. Os olhos azuis de Petrônio se tornaram úmidos


e ele retirou os óculos.

— Yekaterina, meu filho. O câncer de sua mãe não compromete apenas o


rim, mas também o intestino. Os médicos me disseram que não há muito mais
a ser feito e... Talvez ela não chegue a ter mais um ano de vida — Derramava
lágrimas no rosto cansado — Vão começar novamente o tratamento, mas se
espalhar mais as coisas se complicarão.

— Pai! — Nos abraçamos fortemente — Parece que vem um filme em minha


cabeça.
Senti também lágrimas em meus olhos.

— Primeiro Yolanda. Agora Yekaterina! — Nos encaramos — Acho que sou


realmente amaldiçoado, filho.

— Pai, não diga isso...

— Ao menos tenho você e Analuz para me fortalecerem — Tocou meu


ombro novamente — Vocês são tudo para mim e neste momento apenas
posso contar com vocês... Mais com você, uma vez que Analuz é uma
menina.

— Você contou a ela?

— Não. Yekaterina não quer que Analuz sofra antecipadamente, muito


menos agora que está terminando o ensino médio e nas provas finais. Vai ser
muito doloroso.

— Mas pai... Yekaterina é mãe de Analuz! Ela tem o direito de saber!

— Filho, sua irmã só tem dezessete anos! — Relembrou emocionado — É


imatura demais para lidar com isso. Se você ir embora a afetou tanto, que dirá
a morte da mãe!

— Não sei guardar segredo, pai. Muito menos de Analuz!

— Mas terá que fazê-lo. Yekaterina não quer que ninguém saiba, até mesmo
você, mas como é meu filho mais velho e melhor amigo de toda a vida, não
pude esconder. Espero que entenda. Assim como respeitamos todas as
vontades de Yolanda até hoje, seguindo à risca tudo o que estipulou no
testamento, também vamos seguir as vontades de Yekaterina.

Não pude protestar.


— Sinto muito, pai. É a segunda vez que perderei uma mãe — Sequei meu
rosto úmido — E a segunda vez que você perderá sua mulher... Perder a
mulher que ama é algo que não desejo para ninguém. Para ninguém!

— Como pode dizer isso, filho? Você tem sua namorada bem viva ao seu
lado, rapaz! — Sorriu entre as lágrimas.

— Já disse que não a amo, pai.

— Então lute pela mulher que ama... Não abra mão dela!

Encarei o rosto de Petrônio sem conseguir expressar palavras. Aquele


momento em que me confessava a dor de possivelmente perder a segunda
esposa em breve realmente não era o momento de contar algo como minha
paixão pela filha dele, a menina que foi criada como minha irmã.

— Vai ficar tudo bem, pai — O abracei novamente — Mamãe é forte, ela vai
vencer mais essa! Estou seguro que sim!

Voltei para casa já à noite após eu e papai passarmos um longo período na


empresa, mesmo se tratando de um sábado.

Estar à frente de uma fortuna exigia bem mais do que assinar papéis,
portanto, tomar as decisões relacionadas ao futuro da empresa estavam em
nossas mãos, exclusivamente.

Violeta e Analuz correram até a porta quando entrei, mas eu não era o grande
alvo, e sim Petrônio.
— Pai, já pensei em tudo para minha festa de dezoito anos! Violeta está me
ajudando com os preparativos! — Analuz sequer falou comigo ao lançar-se
nos braços carinhosos de Petrônio. Violeta seguia atrás dela — Posso
começar a preparar tudo?

— Claro meu amor! Contratarei a mesma pessoa que organizou nosso último
evento no grupo Ruiz-Vilanova — Segui até o bar da sala para pegar uma
bebida enquanto conversavam no sofá — É uma ótima ideia, não acha, filho?

— Sim pai, uma formidável ideia! — Respondi enchendo o copo de uísque e


sorrindo — Nada mais do que o melhor para Analuz em seus dezoito anos!
Finalmente dezoito!

Ergui o copo em direção a eles, como se fizesse um brinde.

— Você ama ironizar minha idade, não é? — Analuz me encarou um pouco


contrariada.

— Não estou ironizando, estou comemorando, loirinha! — Sentei-me ao sofá


animado, sem esconder o alívio que os dezoito anos de Analuz representava
para mim.

Era como tirar o título de louco das costas. Parte do peso se esvai com a idade
dela aumentando, tornando-a adulta diante de meu desejo e da sociedade. Já
não bastava ser pecado, tinha também de ser um crime?

Não mais!

— Seu irmão e eu podemos dançar uma valsa com você, filha — Petrônio
também pegou uma bebida — Já que não quis aos quinze anos, podemos
fazer agora.
— Prefiro morrer do que dançar com esse chato na minha festa, pai! — Sorri
para Analuz diante de sua expressão contrariada — Acho que podemos
dispensar a valsa e ficar com o clássico mesmo. Pista de dança.

— Você e Valentim ficariam muito bem juntos, Ana. Porque não aceita a
dança? — Violeta disse baixinho.

— Finalmente uma voz sensata! — Ergui o copo para Violeta.

— Porque somos incapazes de respirar o mesmo ar sem brigar, Vi — Sorriu


sem humor para mim.

— Faça como quiser em sua festa, querida — Petrônio garantiu a filha —


Apenas não extrapole no orçamento.

— Pode gastar o quanto quiser, Analuz — Afirmei encarando-a. Ela me


olhou de volta um pouco confusa — Faça sua festa como sonha e não se
preocupe com os gastos. Faço questão de pagar tudo na comemoração dos
dezoito anos de Analuz!

— Queria eu ter um irmão assim! — Violeta comentou com um suspiro.

— Valentim... — Papai chamou minha atenção enquanto Analuz ainda me


encarava surpresa — Pare de fazer todas as vontades de sua irmã! Depois o
culpado dela ficar acostumada a ter tudo o que quer sou eu!

— Com o que vou gastar tanto dinheiro, pai, se não satisfazendo os desejos
de minha... Irmãzinha? — Analuz encarou o chão um pouco desconcertada.

— Com licença, senhor. Chegou uma visita... Senhor Sebastian Ferrer.

A funcionária anunciou a visita e encarei em direção ao homem que sorria ao


lado dela. Quase derrubei o copo das mãos quando vi a maneira como
encarava Analuz, que se virou para encará-lo.

— Sebastian! — Petrônio o recepcionou contente — Quanto tempo, meu


filho!

— Petrônio! Como é bom revê-lo! — Abraçaram-se e me coloquei de pé


encarando Analuz — Analuz! Como é bom reencontrá-la!

— Oi Sebastian, como está? — Cumprimentaram-se com um beijo no rosto e


meu estômago apertou. Diante do olhar do pai, Analuz explicou — Nos
conhecemos na festa ontem, pai. Ele é amigo de Valentim.

— O que está fazendo aqui, cara? — Questionei sem esconder o incômodo.

— Vim visitar Analuz. Ela não parecia muito bem ontem quando vocês
saíram e fiquei preocupado.

— Ah, foi só um mal-estar, já estou ótima!

— Sente-se rapaz! — Petrônio apontou o sofá — Deseja tomar algo conosco?

— Um café seria ótimo — Analuz se sentou próxima dele e me sentei à


frente de ambos, encarando-a fixamente.

Petrônio não parecia incomodado que Sebastian estivesse ali, ao contrário.


Mostrava-se animado com a visita e parecia gostar da proximidade entre
Sebastian e Analuz. Diga-se de passagem, era um herdeiro e filho de uma
grande amiga de Yekaterina. O pretendente perfeito para a filha dele!

Me mantive calado durante toda a conversa, respondendo apenas quando me


perguntavam e impaciente para que Sebastian fosse embora.

Era claro que estava ali por Analuz!


Era mais do que evidente que havia se interessado por ela, que também se
dava conta do fato. Olhava para ele sem esconder a afronta, deixando claro
que sim, compreendia suas intenções. Não compreendia, no entanto, meu
ciúme.

— Você parece nervoso, amigo — Inquieto, caminhei com Sebastian até a


porta. Analuz e Violeta vinham ao nosso encalço e Petrônio foi até o quarto
ver Yekaterina — Algo te preocupa?

— Não, está tudo bem — Respondi encarando-o sem esconder o


descontentamento.

— Gostaria de visitar o grupo Ruiz-Vilanova, amigo e...

— Petrônio convidou, não convidou? — Respondi nervoso — Então marque


um dia com a secretária e passe lá.

— Valentim! — Analuz repreendeu — Você é bem-vindo na empresa sempre


que quiser, Sebastian.

— Em nossa casa também! — Violeta inteirou.

— Bom, já vou. Obrigado pela recepção e espero voltar em breve — Tentou


segurar a mão de Analuz, mas entrei na frente e apertei a mão dele, levando-o
para a saída com um aperto no ombro.

Violeta e Analuz não disfarçaram o descontentamento ao subirem juntas em


direção ao quarto.
— Não sei mais o que fazer com esse homem chato e tóxico no meu pé! —
Sentei em minha cama agarrando minha almofada favorita, a de unicórnio.
Violeta se sentou à minha frente lixando a unha — Estou contando os dias
para que ele volte para Madrid e me deixe em paz!

— Está mesmo?

— Claro! Você não viu o show que ele deu com Sebastian? Quase expulsou o
pobre daqui a pontapés e ficou cortando ele com grosserias! — Suspirei —
Aposto que Sebastian nunca mais vai querer me ver depois dessa ceninha de
Valentim.

Apoiei o rosto na mão e meus lábios desenharam um bico triste.

— Tem razão...

— Tenho? — Encarei-a surpresa.

— Sim. Valentim passa do ponto com você em muita coisa. Ele estava morto
de ciúme lá na sala!

— Não é ciúme, é implicância comigo! Quer tornar minha vida impossível!


— Analuz, não seja boba! — Violeta baixou a lixa e me encarou fixamente
— Valentim estava com ciúme de você! Ciúme! Estava escrito na cara dele!
— Revirei os olhos por, no fundo, concordar — E não era bem um ciúme de
irmão, não, viu? — Apontou para mim com a lixa — Estava muito
nervosinho para ser.

— O que quer dizer com isso?

Violeta pensou um pouco antes de prosseguir, encarando-me para falar.

— Não acha um pouco estranho as atitudes de Valentim com você? — Franzi


o cenho — Ele te enche de mimos, muito mais do que um irmão
normalmente faria com a irmã, ainda mais depois de quatro anos separados.
Te deu uma joia caríssima feita sob medida, se ofereceu para pagar toda sua
festa de dezoito anos sem impor limite de gastos e agora surta com o
Sebastian demonstrando interesse sério em você? Vocês tiraram uma selfie na
sala agora e Valentim só faltou arrancar o celular da sua mão e jogar longe!
— Me encolhi um pouco, mordendo os lábios — Ontem na boate eu só fiquei
olhando o jeito como Valentim te encarava... Ele não tirava o olho de você e
foi só ver o Sebastian descendo um pouco a mão que correu lá para te levar
embora.

— Fala logo o que você quer dizer com esse discurso todo, garota — Insisti
aflita — Quer dizer que Valentim é um irmão mais velho protetor e ciumento,
além de chato?

— Quero dizer que Valentim gosta de você de outra maneira, não como irmã.

Calei-me diante de suas palavras.

— Você está louca? Está se ouvindo, menina? — Apontei o ouvido — Ele é


meu irmão!
— Não é! Você sabe! Como também sabe que o que digo é verdade, basta
prestar atenção. Valentim gosta de você como mulher, Analuz. Abre teu
olho!

Me coloquei de pé ainda com a almofada nos braços. Caminhei até minha


penteadeira e Violeta ficou sentada na cama ainda lixando as unhas.

— Esse é o maior absurdo que já ouvi na vida, Violeta. É melhor não falar
essas asneiras para ninguém, garota, principalmente perto de meus pais! É
tudo fruto da sua imaginação!

— Nisso concordo! Se esse tipo de assunto chegar no seus pais,


principalmente no seu pai, as coisas vão ser bem pesadas aqui. Vai ser um
caos, pensa? Vocês não têm o mesmo sangue, mas foram criados como
irmãos! — Me olhava no espelho enquanto ouvia a voz de Violeta ecoando
em meu ouvido — Da mesma maneira que uma mãe e um pai são as pessoas
que nos criam e dão amor, sem importar realmente o sangue, um irmão é um
irmão a partir do momento que sempre foi um irmão. Você entende?

Baixei o olhar e fingi arrumar algo na penteadeira.

— Sim, entendo. E concordo... — Sussurrei — Ele não têm meu sangue, mas
sempre foi meu irmão. Desde sempre.

— Mas nada me tira da cabeça que Valentim é completamente louco por


você. A maneira como ele te olha... Ele te venera com o olhar, Analuz! —
Fiquei de pé abruptamente.

— Ele é louco, disso tenho certeza! Agora vamos parar de criar alucinações,
prima querida? — Sentei-me na cama ao lado dela e coloquei a caixa de
esmaltes — Qual cor vai querer?
Fiz com que Violeta se calasse e esquecesse o assunto, mas tudo o que disse
me soou demasiadamente preocupante! Se ela, que nem era tão próxima de
Valentim, podia entender que algo diferente de uma relação de irmãos
acontecia entre nós, que dirá meus pais?

Queria diário,

Estou cada vez mais convencida de que Valentim ficou maluco e Violeta não
está tão errada assim...

Apesar de nunca antes ter feito sentido, agora consigo compreender o que
está acontecendo. Valentim realmente não me trata como antes. Não me trata
como irmã, mas sim de outra maneira... Em frente a nossos pais é um
perfeito irmão mais velho, mas quando estamos sozinhos as coisas mudam e
ele se comporta diferente.

Violeta tem razão. Valentim me venera com o olhar e não posso evitar não
retribuí-lo!

Apesar de odiá-lo por ter me deixado um dia, não há um minuto sequer em


que eu não sonhe com seu beijo. Com suas mãos. Com seu corpo grande e
forte.

Decidi colocar tudo à prova de uma vez.

Vou descobrir, definitivamente, se Valentim realmente gosta de mim como


mulher ou não! Espero não me arrepender depois!

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.


Deitada na cama e sozinha após Violeta sair, editei a foto que tirei com
Sebastian para mandar a mãe dele, amiga de minha mãe, e subi no aplicativo
de mensagens particulares, o único que meu pai me permitia ter porque eram
apenas números adicionados que poderiam me comunicar. Adicionei
Valentim no mesmo a pouco, após chegar de Madrid.

Na legenda do status, provoquei.

"Sebastian, obrigado por ser tão especial! Já te adoro!"

— Postar! Pronto! — Me deitei de costas e desliguei o celular — Agora é só


esperar para ver se o ciúme dele é realmente de irmão ou...

Fechei os olhos e tomei fôlego. Em breve tudo iria começar!


Capítulo Seis

— Pensei que você ficaria mais calmo quando finalmente visitasse seus pais,
querido, mas parece ainda mais nervoso! O que está acontecendo realmente,
Valentim?

O espaço do escritório na casa de Petrônio parecia pequeno para conter toda


minha ansiedade. Caminhar de um lado para o outro com o copo de bebida na
mão parecia ser a única maneira de me livrar da inquietude que se instalava
em meu peito.

— Estou perdendo minha mãe pela segunda vez para a mesma maldita
doença, Michele. Acha isso pouco? — Tentei parecer calmo na resposta —
Além disso, tenho problemas na empresa e... Estou prestes a completar vinte
e nove anos. Isso significa que tenho pouco mais de treze meses para me
casar.

— Quanto a isso, não se preocupe! Sabe que estou disponível para me casar
com você na hora em que desejar, baby!

Comprimi os lábios e bebi mais um grande gole de bebida.

Ela estava disposta a se casar, mas e eu? Realmente abriria mão do amor para
me atar a um casamento de mentiras para salvar a fortuna de minha família?
Seria capaz de abrir mão do amor de minha vida, mesmo que ela de fato
nunca tenha sido minha?

Após desligar, sentei-me na poltrona principal do escritório e contemplei uma


foto de família que Petrônio mantinha pendurada ali.

Petrônio sentado em uma poltrona vermelha, Yekaterina ao seu lado, Analuz


atrás da mãe e eu atrás de Petrônio. Ela deveria ter uns oito ou nove anos e eu
dezoito. Naquela época tudo era tão simples... Era tão fácil amá-la como uma
irmãzinha caçula adorável. Era tão bom ser livre de qualquer impedimento!

Mas conforme foi crescendo e se tornando mulher, Analuz trouxe consigo


algo diferente, fazendo com que eu me descobrisse apaixonado por ela.
Loucamente apaixonado!

Não podia simplesmente dizer a Michele que todo meu nervosismo era
porque Analuz não se lembrava de meu beijo. Não podia dizer que sentia
vontade de quebrar toda a mobília da casa por me dar conta de que Petrônio
estava aprovando a ideia de Sebastian, meu melhor amigo de infância,
demonstrar interesse em Analuz!

Abri o aplicativo de mensagem para enviar uma mensagem de desculpas a


Michele quando vi uma foto diferente do status de Analuz. Não hesitei em
abri-la.

Lá estava ela... Com Sebastian!

Apertei o celular na mão e senti o sangue fervendo nas veias! Coloquei-me de


pé sem pensar, subindo em direção ao quarto dela em passadas firmes pela
escada. O corredor escuro evidenciava que muitos já dormiam, inclusive
meus pais.
Não bati na porta, sequer pensei em fazê-lo. Abri e entrei, fechando a porta
atrás de mim com um empurrão.

Analuz estava deitada de bruços na cama escrevendo em um diário... Um dos


mesmos que escrevia desde menina e mantinha coleção. Ao me notar, sentou-
se repentinamente. Foi aí que me dei conta de que estava de sutiã e short. Um
sutiã azul claro com rendas e um short curto e branco. O cabelo preso para
trás e os olhos azuis surpresos.

Minha garganta secou ao vê-la de tal forma. Os seios eram pequenos, mas
saltavam no sutiã apertado. A pele era clara e limpa. Algumas pintas se
espalhavam em seus ombros, perdendo-se nos seios, e minhas palmas suaram
pela visão.

— O que você está fazendo no meu quarto? — Questionou irritada e


apontando a porta — Me deixa em paz, por favor! Já não basta o show que
deu com Sebastian hoje, ainda tem mais para me atormentar?

Por um momento fiquei sem palavras diante dela e sua falta de roupas, mas
logo me lembrei do motivo pelo qual estava ali.

— Pode me explicar que palhaçada é essa? — Mostrei a foto e ela analisou


— Agora é tão fácil, Analuz? Qualquer um que chega pode se tornar seu
grande e querido amigo?

— Pode deixar as vulgaridades de lado, por favor? Fácil aqui é você, que
ficou quatro anos fora e já voltou praticamente casado com uma gringa
qualquer! — Vociferou em minha direção — Sou livre, irmãozinho! Sou
solteira e posso ser amiga de quem quiser, inclusive de um homem bonito
que me vê como mulher, não como uma menininha tola!

Minhas mãos foram para os braços dela e a segurei contra o peito. Analuz
suspirou quando a trouxe para perto, encarando-me com os lábios separados e
os olhos brilhando.

O azul de seus olhos era a única coisa no mundo capaz de me tirar do eixo.
Capaz de arrancar a sanidade e a racionalidade de minha mente sempre tão
centrada.

— Não estou com vulgaridades, muito menos insinuando nada! Estou


deixando claro que não será tão fácil existir um homem que me convença ser
apto para você!

— Quer falar baixo? Ou acha lindo que todos saibam do show que você faz
em meu quarto cada vez que me vê com outro homem? — Estreitei o olhar,
descendo-o pelo corpo de Analuz.

— Sou seu irmão mais velho e posso opinar em determinados assuntos —


Sussurrei um pouco mais calmo, soltando-a e dando-lhe as costas. Nervoso,
tratei de me controlar.

— Não... Você não é meu irmão! — Sussurrou de volta e a voz dela ecoou
para mim — E é exatamente por isso que está aqui!

Virei-me novamente e encontrei Analuz parada há apenas alguns passos.


Encarava-me deixando claro que sabia perfeitamente o que dizia... Lembrava-
se de nosso beijo. Seus olhos azuis me pediam algo em silêncio... Algo que
não podia ser dito com palavras, muito menos em voz alta.

Atravessei o espaço sem pensar, tomando-lhe o rosto com as duas mãos e


beijando-a na boca com voracidade, com fome... Com vontade!

As mãos pequenas de Analuz subiram por minhas costas, alisando meus


ombros com carinho e puxando-me ainda mais para ela. Beijá-la despertava
meu lado mais obscuro, principalmente sentindo sua pele delicada em minhas
mãos fortes.

— Nenhum homem vai te ter, Analuz — Falei entre o beijo, levando-a até a
cama cor de rosa e deitando-a sob meu corpo — Porque você é minha!
Sempre foi e sempre vai ser minha!

— Você está louco, Valentim! — Respondia ofegante enquanto meus lábios


desciam por seu rosto e alcançavam o pescoço. Suas mãos se enroscavam em
meu cabelo.

— Sempre estive, Analuz, sempre estive! — Respondi puxando as alças do


sutiã azul para beijar-lhe os ombros — Por isso fui embora, por isso... —
Ofeguei descendo os lábios por seus seios cobertos no sutiã. Arrastei-o com
os lábios, alcançando os mamilos rosados com a boca sedenta — Por isso
larguei tudo! Porque você me enlouquece, me deixa louco! Louco!

Analuz sorriu e mordeu os lábios, segurando meu rosto ainda mais contra
seus seios empinados. Não havia nada capaz de me convencer de que ali,
naquele instante, eu poderia morrer apenas por tocá-la.
Valentim e seus lábios firmes...

Valentim e seus beijos avassaladores!

Valentim e sua boca quente em meu pescoço, em meus seios... A sensação


era tão incrível que poderia senti-la para sempre! Todo meu corpo se
arrepiava sob o toque experiente de sua língua quente, macia e muito
agradável.

Suas mãos desceram em meu corpo e abri os olhos, encarando o teto ao me


lembrar de que era virgem. De que isso não era o mais sensato!

— Para! Não! — O empurrei e prontamente Valentim parou. Movi-me sob


ele e sentei-me na cama, puxando uma das almofadas de unicórnio para tapar
meus seios desnudos — Não posso fazer isso, não... Você é meu irmão e eu
nunca... Nenhum homem me tocou! Você só pode estar louco!

— E você uma mentirosa! — Valentim evitava me encarar. Tinha o maxilar


travado e os olhos fechados — É claro que se lembra do nosso beijo! Se não
lembrasse, jamais teria aceitado...

— Tem coisas que ficam melhores no esquecimento, não acha? — Os olhos


castanhos subiram para meu rosto corado — Como vou explicar para alguém
isso que acontece entre nós? Como vou explicar que meu irmão e eu...

— Não somos irmãos! — Relembrou secamente — Você sabe que não.

— Sabe do que sei? — Aproximei-me um pouco mais e nos encaramos


fixamente. O olhar dele era de um homem totalmente perdido — Sei que
você tem uma noiva e é a segunda vez que me beija! Que você vai se casar
em alguns meses e ousou me tocar!
— Dá um tapa na minha cara, vamos! — Ofereceu a face erguendo o rosto —
Vai, Analuz! Me acerta por ter te ofendido! Vai, me bate! Desconta o quanto
te desonrei, o quanto você repudiou o meu toque, o quanto não gostou dos
meus beijos! Vai! — Paralisada, desviei o olhar do dele declarando-me
culpada — Não vai, sabe por quê? — Segurou meu queixo e me fez olhá-lo
— Porque você gosta!

Calada, observei Valentim se colocar de pé.

— Se você voltar a me tocar... Ou me beijar... Juro por Deus que direi tudo
ao papai! — Ameacei com lágrimas nos olhos — Não estou aqui para ser o
brinquedo do CEO, ou sua amante... O que seja! — Valentim passou as mãos
entre os fios escuros de seu cabelo totalmente descontrolado pelas emoções
— Não vou servir de diversão enquanto sua mulherzinha oficial está do outro
lado do mundo!

— Não é assim... — Encarou-me e me coloquei de pé, parando de costas para


ele ainda segurando a almofada contra os seios desnudos.

— Você é meu irmão e não posso... Nem devo... Te ver de outra maneira.
Agora sai! Sai daqui!

Ouvi a porta sendo aberta e fechada em seguida. Lancei-me contra a cama e


desabei em lágrimas, totalmente decepcionada comigo mesma. Meu corpo
todo clamava por Valentim e seus beijos... A maldita tentação me perseguiu
até mesmo em sonhos.

A armadilha com a foto de Sebastian deu certo e Valentim caiu


certeiramente.

Agora sim eu tinha certeza de que seus olhos jamais me enxergaram como
uma irmã. Jamais!
A água fria do chuveiro caía em meus ombros e meus braços se apoiavam na
parede.

Minha mente era incapaz de abandonar as lembranças, desenhando


detalhadamente cada pedaço do sensual corpo de Analuz.

Se já era louco por ela, agora sequer conseguia mensurar o tamanho do


desejo que pulsava em mim. O sabor de seus seios em meus lábios repercutia
e tudo o que podia pensar naquele momento era que seria capaz de tudo para
tê-la. Tudo!

Sai do banheiro nu e com o cabelo pingando, sentando-me na poltrona do


quarto e fechando os olhos. Era incapaz de esquecê-la, de desejar tocá-la.
Suspirei com a imagem de seu corpo presa na memória.

Nos dias que se seguiram, Analuz sequer me olhou nos olhos fixamente,
evitando minha presença em cada momento que podia. Apenas nos
encontrávamos no jantar, uma ocasião onde toda a família estava presente e
ela não tinha como me evitar.

Me afundei no trabalho, dedicando-me ao grupo Ruiz-Vilanova enquanto


meus pais adotivos seguiam com o tratamento do câncer de Yekaterina em
tempo quase integral. Analuz seguia com os preparativos de sua festa, que
aconteceria em alguns dias.

Eu não podia deixar de pensar que meu aniversário de vinte e nove anos viria
logo depois e o prazo se estreitava. Eu não amava Michele, mas se não me
casasse toda minha família adotiva poderia ser prejudicada e perder boa parte
da fortuna. Minha falecida mãe deixou tudo muito bem especificado em seu
testamento e caso eu não fizesse como ela ditou, todo meu dinheiro correria
riscos.

Concordei com o termo aos dezoito anos e teria de segui-lo.

Caso não me casasse, a própria Analuz poderia ser prejudicada!

— Você não deveria estar tão animada com sua festa vendo sua mãe em tal
estado, garota.

Atentei as vozes que ouvi assim que cheguei em casa. Tratava-se de Alessa.

— Em que estado minha mãe está, tia? Ela apenas está doente e já está em
tratamento, não vejo porque tanto alarde!

Analuz respondeu.

— Você é mesmo muito ingênua, não é? É uma patricinha mimada pelo seu
pai e seu irmão, que te protegem demais e te tornaram inútil!

— Não entendo porque está dizendo isso!

— Não entende? Sua mãe está à beira da morte e você aí, preocupada com
uma festa patética!
— Minha mãe não está à beira da morte, isso é mentira!

— Abra seus olhos, Analuz! Saia da bolha que construíram ao seu redor!

Apareci na sala ao ouvir a voz de Philip ecoar ao final. Alessa e o filho


encaravam Analuz, que segurava os convites de sua festa em mãos e tinha o
rosto convertido em tristeza e desespero.

Seus olhos azuis subiram para meu rosto em um claro pedido de ajuda.

— Acho que quem deveria abrir os olhos são outros — Alessa e Philip me
encararam assustados — Não é nenhum pouco educado falar de tal maneira
com a filha dos donos da casa, não acham? Eu, particularmente, não gostei
nada do tom que usaram para falar com a minha irmã...

Cruzei os braços à frente do peito.

— Valentim, nós...

— Não quero nunca mais saber que perturbaram Analuz, ficou claro? Não
quero nunca mais presenciar situações como essa, do contrário terei de
comunicar a Yekaterina que seus parentes não podem mais ficar na casa que
Petrônio e eu herdamos de minha mãe — Alessa corou de raiva — Se eu e
Petrônio mantemos Analuz distante de tais assuntos, isso não é problema de
vocês, em definitiva! Agora mesmo os dois vão pedir desculpas a ela.

Analuz parecia atônita diante de minha postura. Alessa e Philip sussurraram


um pedido de desculpas e saíram em seguida, sem conseguirem me encarar
diretamente.

— É verdade? — Analuz questionou ao ficar sozinha comigo, finalmente me


dirigindo a palavra e o olhar depois de dias — É verdade que a mamãe vai
morrer?

— Claro que não, Analuz — Por Petrônio, não falei sobre a gravidade do
câncer e da iminente possibilidade de morte. Pela consideração a Yekaterina,
que pediu diretamente, não dei detalhes a Analuz — Mamãe vai ficar bem —
Ela baixou o olhar e vi lágrimas em seus olhos azuis. Aproximei-me um
passo — Não dê ouvidos ao que sua tia fala. Se ela voltar a incomodá-la, me
diga que imediatamente tomo uma atitude.

— Porque você faz isso? — Questionou ainda baqueada — Porque me


defende?

— Porque você é a pessoa mais importante de toda minha vida

Nos encaramos mais próximos. Finalmente voltava a me olhar. Finalmente


voltava a me considerar.

— Valentim, eu...

— Meus filhos! — Yekaterina apareceu na sala e caminhou em nossa


direção. Analuz correu para abraçá-la — Como é bom chegar em casa e revê-
los!

— Mamãe! — Abracei as duas também, feliz por vê-la depois de alguns dias
no hospital — Estava com tanta saudade!

— Como se sente, mãe? — Yekaterina se apoiou em mim e vi em seus olhos


como parecia cansada. Era loira como Analuz, de ascendência e
nacionalidade Russa. Os olhos igualmente profundamente azuis. As rugas em
seu rosto evidenciaram sua luta.

— Bem, filho. Bem! E você, Ana. E o aniversário? Valentim está te


ajudando?

— Ele está pagando, o que já é ótimo, e me deixou fazer tudo como desejar,
sem colocar orçamento!

— Valentim... Sempre fazendo as vontades dessa menina, não é? Cuidado


para não gastar toda sua fortuna com ela! — Yekaterina repreendeu enquanto
íamos juntos até o sofá.

— Eu gastaria até meu último centavo para vê-la feliz, mãe.

— Está vendo, querida? Você foi agraciada com o melhor irmão do mundo!
— Analuz me encarou e vi a culpa em sua face. Sentia-se enganando a mãe
depois de nosso momento exatamente como eu me sentia desde que comecei
a me apaixonar por ela — E sua noiva, meu filho? Quando vamos conhecê-
la? Ela vem para o aniversário de sua irmã?

— Mãe, fala sério! — Analuz resmungou.

— O que foi, querida? A moça é sua cunhada!

— Não sei quando virá, mãe. Também não sei se...

— Ora, por favor, filho! Você não pode jogar pelos ares tudo o que construiu
com Petrônio todos estes anos!

— Você não a ama? — A pergunta de Analuz foi quase impensada, pude ver
em seus olhos o constrangimento — Quero dizer...

— Infelizmente não é todo mundo que tem sorte nos negócios e no amor,
irmãzinha. No amor, nasci fadado ao fracasso!

Analuz desviou o olhar do meu.


— Não diga besteiras, menino! Você é muito jovem para dizer isso, filho!

Yekaterina não demorou a sentir-se cansada e Petrônio a acomodou em seu


quarto. Ao ficarmos a sós, Analuz se aproximou em passos curtos e parou à
minha frente. A visão tão próxima de seus olhos azuis me fez estremecer por
dentro.

— Obrigado por me defender.

— Eu sempre te defendi e sempre defenderei — Respondi parado com as


mãos nos bolsos da calça — Ninguém vai te machucar na minha frente.

Tímida, fez um aceno positivo e passou por mim em passos curtos até a
escada.

— Apesar de você já não me amar... Eu ainda te amo — Sussurrei quando ela


já não podia me ouvir. Apesar de ser algo impossível, eu sempre a amaria.

Queria diário,

Não tive coragem de falar com Valentim depois das coisas que dissemos um
ao outro naquela noite em que nos beijamos.

Não tive sequer valor de olhá-lo nos olhos depois que me viu seminua e
pior... Depois de ter me beijado por todo o corpo.

Acabei com o pouco de amor de irmão que ainda restava entre nós quando
planejei aquela armadilha e coloquei tudo a perder! Além de não poder mais
contar com ele, agora sequer podia buscar um motivo idiota para atormentá-
lo!

Mesmo com ele aqui, novamente existia um oceano de distância entre nós
com a água tão gélida que podia nos consumir por inteiro!

Deveria ter dado um tapa na cara dela quando me ofereceu a face naquela
noite! Deveria ter deixado claro que o odiava, mas simplesmente fui incapaz!
A verdade é que não posso parar de pensar nele e muito menos sou capaz de
não o desejar!

Porque tem que ser tão lindo?

Porque tem que ter namorada?

Porque tem que ser meu irmão de criação?

De todos os modos, devo odiá-lo! Ou pelo menos fingir que odeio!

O problema é não conseguir fingir quando ele me defende. Quando me mima


e satisfaz todas minhas vontades. Pior ainda é não conseguir fingir quando
me toca, me olha, me beija...

Pior é descobrir que, talvez, eu ainda o ame. Talvez nunca o tenha


esquecido.
Mas terei de esquecer. Valentim para mim é e sempre será meu irmão. Um
homem proibido!

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.


Capítulo Sete

— Posso entrar?

Toquei a porta delicadamente e Valentim ergueu o olhar por trás do


computador do escritório. Quando não estava na empresa, certamente estava
no escritório trabalhando e fui buscá-lo assim que voltei do colégio naquela
tarde.

— Claro — Respondeu voltando a atentar-se ao computador — Algum


problema com a festa? Eu te dei a senha do cartão, pode usar o que for
preciso.

— Não, é só que... — Parei ao lado dele, sentando-me na mesa à sua frente,


bem ao lado do computador. Valentim parou de digitar e ergueu os olhos para
mim, subindo-o por minha saia do uniforme — Não quero ficar brigada com
você. Querer eu queria, mas não consigo ficar evitando uma pessoa que me
defende e faz tudo por mim — Valentim me ouvia atentamente, mas eu não
conseguia encará-lo.

— Porque não consegue me olhar nos olhos? — Segui tímida, olhando para
meu colo — Está com vergonha pelo que aconteceu entre nós? — Sua
pergunta foi humilde. Concordei com um aceno, corando — Foi a primeira
vez que um homem te tocou, não foi?

— Sim, eu já disse! — Respondi nervosa, ajeitando meu cabelo loiro atrás da


orelha — Fico pensando que toda vez que você me olha me vê nua.

Valentim sorriu abertamente, passando os dedos nos lábios, que mordeu em


seguida. Eu era absolutamente incapaz de parar de olhar para ele, tão lindo e
atraente. Todo meu corpo reagia ao contato de sua língua com os lábios.

— Bom... Prometo tentar não pensar nisso se decidir voltar a ser minha irmã
— Neguei com um aceno, desviando o olhar timidamente.

— Acha mesmo possível? — Valentim nada respondeu, apenas me encarou


mais de perto — Pelo bem de papai e mamãe, principalmente a mamãe,
devemos parar de brigar e... Outras coisas.

— É você quem briga comigo, eu nunca brigo com você — Valentim sorriu
ainda mais e o acompanhei.

— Quem mandou você ser insuportável? — Nos encaramos tranquilamente,


apesar de meu coração disparar cada vez que ele sorria — Bom, tenho muita
lição de casa!

Desci da mesa e ele me acompanhou com o olhar a todo o momento.


— Lição de casa... — Valentim comentou pensativo.

— Pois é. Garanto que cursar o ensino médio é muito mais trabalhoso que ser
um CEO de prestígio como você e o papai — Valentim seguiu sentado e me
encarando com um sorriso aliviado. Pensei por um minuto e fui até ele,
sentando em seu colo e o abraçando pelo pescoço como costumava fazer em
minha infância — Obrigado pelo que disse a tia Alessa.

Beijei seu rosto e Valentim me abraçou também, nitidamente emocionado por


finalmente selarmos as pazes. Sua mão forte descansou em minha coxa e
estremeci com sua proximidade. A pele quente contra a minha me fez
lembrar tudo o que Valentim me fez sentir naquela noite.

Senti seu hálito em minha frente e sua mão grande e quente em minha coxa.
Eu queria que a subisse mais. Não conseguia parar de pensar no que faria se
me tocasse mais em cima, onde eu clamava por ele.

— Eu faria qualquer coisa que você me pedisse, Analuz — Afastou uma


mecha de meu cabelo loiro do rosto e ajeitou atrás de minha orelha.

— Interrompo? — Afastei-me de Valentim para encarar Philip na porta do


escritório — Que cena tão terna entre os irmãozinhos...

Me coloquei de pé corada e Valentim fez o mesmo, disfarçando um pouco a


maneira como parecia incomodado.

— O que quer? — Vociferou sem paciência.

— Preciso falar com o todo Poderoso, mas pelo visto está ocupado — Philip
sorriu com segundas intenções.

— Já estou de saída. Com licença.


Passei por Philip sem nada dizer, subindo para meu quarto com as bochechas
coradas e o coração disparado. Aquele garoto com sua língua ferina era a pior
pessoa que poderia presenciar qualquer momento fora da curva entre mim e
Valentim.

— Você anda tão estranha, menina — Eva comentou após deixar uma salada
de frutas em meu quarto enquanto eu estudava na cama.

— Estranha como? Credo Eva, até você resolveu pegar no meu pé? — Segui
escrevendo em meu caderno.

— Desde que seu irmão voltou, você anda calada e inquieta. Pensei que
ficaria feliz com a volta dele, mas parece ainda mais... — A encarei
esperando a palavra — Nervosa.

— Não tem nada a ver com meu irmão. São as provas finais do Ensino
médio. Vou prestar vestibular e ainda não decidi o curso que pretendo fazer
na faculdade — Eva cruzou os braços frente ao peito claramente duvidando.

— Porque não fala com seu irmão? Já percebi que vocês não se olham há
dias! Chorou tanto quando ele foi embora e agora que o tem fica fazendo
doce...

— Eva, pode me deixar estudar? Além de tudo, para seu governo, já fiz as
pazes com Valentim. Estamos bem agora.

— E estavam brigados por quê? — A encarei contrariada — Está bem, já


vou!

Eva saiu do quarto e suspirei com as mãos cobrindo o rosto. Puxei meu diário
do meio de meus livros na mesa e o abri frente aos olhos.
Queria diário,

Pedi a Valentim que voltássemos a nos falar, mesmo que a vergonha por
tudo que aconteceu entre nós ainda me consuma.

Cada vez que ele me toca quero morrer de vergonha... Ou de prazer... Ou de


vontade.

Não posso ficar brigada com além que me trata com tanto carinho e me
defende quando sequer meus pais são capazes de fazê-lo.

Mamãe nunca foi contra tia Alessa quando a mesma me repreende e


Valentim parece ser o único capaz de ver como ela é capaz de me ferir com
as palavras. Apesar de ser minha tia, parece me odiar!

Valentim, por outro lado, apesar de NÃO ser meu irmão, realmente parece
me amar com suas atitudes.

Não sei o que pensar. Não sei o que sinto quando estou com ele, mas estou
segura que todos esses sentimentos que me desperta me causam medo ao
mesmo tempo em que adoro.

Valentim diz que faria tudo por mim, mas a única coisa no mundo que
realmente desejo nem toda sua fortuna pode comprar.

Meu grande desejo seria não ser irmã dele, mesmo que de criação.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.


— É tão complicado falar com você, amor. Mas você parece bem mais feliz
hoje.

— Digamos que as coisas estão melhores por aqui, Michele — Abri a porta
do meu quarto após chegar em casa na sexta à noite — Ando atarefado na
empresa e amanhã é aniversário de Analuz.

— Sua irmãzinha? Oh, que fofa! Quantos anos ela fará?

— Dezoito! — Respondi com o alívio preenchendo a alma e desatando o nó


da gravata.

— Manda os parabéns a ela! Em breve iremos nos conhecer e ser grandes


amigas!

— Preciso desligar. Vou jantar com a família. Yekaterina anda muito


sentimental e exigindo todos juntos.

— Ok baby. Te amo!

— Tchau Michele.

Desliguei e joguei o celular sobre a cama, dirigindo-me ao banheiro para


tomar um banho rápido. Explicar sobre minha variação constante de humor
era inviável ultimamente, principalmente com Michele.

Não tão difícil como foi explicar aos meus pais o grande presente que dei a
Analuz em seus dezoito anos.

— Analuz? — Bati na porta e esperei sua voz autorizar para entrar.

Ela estava na cama, deitada de bruços e usando um vestido rosa claro. Parado
atrás dela pude analisar suas pernas torneadas e o movimentar de seu quadril
a cada momento em que as pernas balançavam no ar. Ajeitei o cabelo e passei
a língua nos lábios analisando o corpo dela.

Belo e bem feito. Não podia ignorar a maneira como ficava sensual com as
roupas que usava em casa.

— Valentim... Pelo menos bateu desta vez — Seguia escrevendo, como se


me provocasse enquanto a admirava na cama.

— Vim te desejar os parabéns — Comentei coçando a barba que crescia


levemente e ela sorriu na cama, ajeitando o cabelo loiro e cacheado para
longe da face corada — Finalmente dezoito, não é?

— Finalmente não pode mais me chamar de pirralha ou menininha — Ao me


olhar notou como eu a encarava apaixonado e sentou-se na beira da cama
cruzando as pernas — Obrigado pelos parabéns.

Seus olhos azuis me provocavam com ainda mais intensidade.

— Tenho um presente também, mas só vou dar se ganhar um abraço —


Mostrei o rosto e apontei a bochecha — E um beijo!

Analuz sorriu contrariada, mas caminhou até mim e parou à minha frente.
Nos encaramos e me deleitei no azul cristalino de seus olhos. Ela usava a
pulseira que lhe dei. Toquei seu pulso com interesse.

— Mais presentes? Você já me deu mais coisas em alguns dias do que o


papai a vida toda! — Brincou sorrindo e me olhando analisar seu pulso.
Beijei sua mão com carinho e devoção.

— Se quiser saber o que é... Já sabe quanto tem que pagar — Apontei o rosto
novamente e ela se colocou na ponta dos pés para me dar um beijo na
bochecha.

A envolvi pela cintura trazendo-a para perto e fechei os olhos ao sentir o


macio de seus lábios em minha pele. Nada no mundo valia mais para mim do
que qualquer toque vindo dela. Seu calor me preencheu e ela seguia colada ao
meu corpo quando terminou.

— Pronto! — Separou-se, mas segui envolvendo-a pela cintura. Sua mão


pequena se apoiava em meu ombro e seguíamos perto — Onde está o
presente?

— Aqui.

Retirei do bolso uma chave sem deixar de encará-la. Havia um chaveiro em


formato de estrela azul clara e delicada com o nome dela escrito no centro.
Coloquei a chave em suas mãos.

— O que é isso?

— O que você mais queria — Seu rosto não escondeu o espanto — Espero
que goste do modelo. Confesso que pedi ajuda a Violeta e ela me indicou o
que você realmente esperava. É zero e branco, como você queria — Tomei
fôlego — Feliz aniversário, Analuz.
— Você só pode estar zoando, não é? — Questionou atônita — Você não fez
isso! O papai disse que não ia me dar, que ainda sequer tenho carta!

— Tudo que você quiser, eu já disse — Relembrei fazendo-a sorrir — A


carta nós vemos depois, isso é o de menos!

Analuz se lançou contra mim, abraçando-me fortemente enquanto eu a erguia


no ar.

— Obrigado Valentim! — Fechei os olhos enquanto a abraçava, dando-me


conta do tamanho de todo amor que sempre nutri por ela.

Nada no mundo era maior que meu amor por Analuz, mesmo que fosse
proibida para mim.

Nos separamos após um momento, mas seu rosto e o meu se mantiveram


próximos e senti sua respiração em meus lábios. O azul de seus olhos me
fascinava.

— Desce — Sussurrei quando notei seu temor — O carro está lá fora — Sorri
e ela também, pegando minha mão e me puxando para a porta — Para quem
não se surpreendia com bens materiais você parece bem interessada.

Comentei e ela revirou os olhos.

— O papai jamais me daria um carro tão facilmente. Ele continua achando


que sou um bebê!

No entanto, Petrônio não pareceu nada contente quando chegou a empresa


naquela manhã.

— Você deu um carro para Analuz, Valentim? — Questionou parando na


frente da minha mesa sem esconder o nervosismo. Ergui os olhos.
— Qual o problema? Ela acaba de completar dezoito anos.

— Qual o problema? — Petrônio parecia contrariado — O problema é que


parei de mimar Analuz por não querer transformá-la em uma dondoca sem
objetivos e você está fazendo exatamente o contrário! Analuz está sem
limites e você com a atitude de dar tudo o que ela pede a transformará em
uma mulher acomodada!

— Pai, que exagero! — Recostei-me a cadeira de maneira despreocupada —


Analuz está fazendo aniversário. Você nunca me recusou nada, porque temos
que recusar para Analuz?

— A fortuna que construímos é graças ao dinheiro deixado por Yolanda. Não


posso negar nada ao dono de tudo isso, mas a minha filha sim!

— Tudo que é meu é de Analuz — O encarei seriamente — E sim, vou seguir


fazendo o que ela quer. Não adianta me dizer o contrário!

— Entendo que ame sua irmã, filho, mas impor limites também é um ato de
amor.

— Não, pai. Você não entende — Petrônio me encarou curioso e cobri os


lábios com uma das mãos — Me sinto em dívida com Analuz por tê-la
deixado.

— Você está se excedendo, filho. Analuz precisa sair um pouco da bolha que
construímos ao redor dela. Ainda é uma menina, mas precisa crescer.

— Analuz nunca vai precisar de ninguém se eu der tudo a ela, pai.

Petrônio, pela primeira vez, me encarou sob suspeita. Não consegui retificar
nada diante da verdade iminente. Tão pouco queria. Aquela era a verdade! Eu
queria Analuz para mim e sob meu olhar por toda a vida. Ela era minha,
mesmo que não fosse.

— Não acha que está exagerando?

— Não, não acho. Mas posso levar em consideração sua posição de pai e não
dar um presente tão caro como um carro sem consultá-lo.

— Ótimo — Petrônio se colocou de pé e ajeitou o paletó, saindo da sala —


Pare de mimar sua irmã, filho, ou ela ficará sem limites.

Recostei-me a cadeira novamente ao ficar sozinho, fechando os olhos e me


lembrando do perfume dela quando me abraçou pela manhã. Seu rosto
encantador. Seu beijo inocente.

Meu celular tocou e era Michele, a mulher com a qual eu deveria me casar.

Ignorei a ligação, afinal, tratava-se do aniversário de Analuz e aquele dia


seria totalmente dedicado a ela, sem qualquer distração.

Assim que abri a porta central de casa a vi descendo as escadas correndo em


minha direção. Saltou em meu colo sem que eu pudesse me preparar e a
abracei fortemente.

— Valentim, minha festa está linda, você precisa ver! — Afastou-se falando
rapidamente e animada — Você... Você é a única pessoa que realmente tem
olhado para mim e te agradeço muito por isso.

Segurei sua mão pequena na minha e beijei carinhosamente.

— Mamãe está doente e papai está com muito trabalho — Relembrei — Mas
você continua sendo importante, Analuz. Sempre será.
— Ninguém me trata como você — Sussurrou aproximando-se mais, olhando
aos arredores com interesse. Parou bem próxima, se erguendo para me beijar
no rosto. A encarei de perto com o desejo ardendo na alma — Promete que
nunca mais vai me deixar?

— Isso eu não posso prometer — Sua expressão se tornou triste e ela deu um
passo para trás — Sabe que não prometo o que não posso cumprir.

— Ora, se não é o seu anjo da guarda, Analuz! — Philip comentou passando


por nós em direção a escada — O irmão mais velho mais generoso de todos!
Isso é... Se realmente essa relação for algo realmente de irmãos, não é?

— Cala boca garoto! — Analuz vociferou e suspirei.

— Já estou ficando cansado de ouvir você zunindo em meus ouvidos, Philip.


Cansado!

— O que será que tia Yekaterina e tio Petrônio vão pensar sobre certas
liberdades que os irmãozinhos têm quando estão juntos? — Cruzou os braços
e fingiu pensar.

Analuz empalideceu e me encarou com desespero.

— Não sei do que está falando e sugiro... — Passei por ele o empurrando
pelo peito — Que pense bem antes de sair por aí contando histórias.

Philip se desequilibrou e bateu contra o corrimão da escada. Analuz subiu a


meu encalço e, uma vez no corredor, me puxou pelo pulso.

— Valentim, será que ele... — Sussurrava apenas para que eu ouvisse — Será
que viu algo entre nós? Será que viu quando ficamos juntos e... — Corou.

— Estávamos no quarto, não tinha como ninguém ver — Sussurrei de volta,


olhando ao redor — Não se preocupe. Philip é um idiota. Ninguém
acreditaria em suas histórias sem fundamento. O que aconteceu entre nós
ficou apenas entre nós, você não tem porque temer — Toquei sua bochecha
carinhosamente.

— Você disse que se esqueceria de tudo — Seu olhar azul era curioso.

— Você sabe que não — Toquei seu queixo com carinho e ela baixou o olhar
— Nunca serei capaz de esquecer.

— Analuz! — Violeta dizia de dentro do quarto — Você já subiu? Vem ver o


vestido logo!

Afastando-se, Analuz me encarou até entrar no quarto, deixando claro em


seus olhos que ela também não se esqueceu. E jamais esqueceria.

A festa de Analuz definitivamente foi um acontecimento memorável.

Cada centavo que gastei valeu a pena para vê-la tão feliz e, principalmente,
comemorando dezoito anos. Perdi o fôlego quando a vi chegando com
Violeta ao encalço usando um vestido de sua cor favorita... Azul claro, como
seus olhos. O vestido parava em uma saia longa sobre o estômago e um
cropped finalizava o mesmo.

Usava a pulseira que lhe dei e concluí que não retirava a mesma do pulso
desde que colocou pela primeira vez. O cabelo loiro claro encontrava-se
alisado, algo que raramente ela fazia e destacava ainda mais seu rosto
delicado. Sorri orgulhoso quando nos encaramos de longe, erguendo o copo
para ela como se fizesse um brinde.

Aquele dia definitivamente era muito especial para mim.

Sebastian apareceu por lá, apertando minha mão quando nos encontramos no
salão.

— Você parecia bolado comigo aquele dia, Valentim — Comentou também


bebendo e com a mão em um dos bolsos de seu traje formal — Não quero
que haja desentendimentos entre nós. Pretendo fazer parte da família e
preciso ficar bem com meu futuro cunhado.

— Pretende fazer parte da família? — Repeti sem esconder a ironia — Está


interessado em Analuz, claramente falando?

— De certo que sim! Sei que é mais nova do que eu, mas não acredito que
seja um empecilho tão grave. Somos amigos de infância! Não pode aliviar
um pouco seu ciúme de irmão?

Baixei a taça e o encarei com um dedo em riste apontado para seu rosto
pálido.

— É bom que saiba... Analuz é preciosa para mim e não será tão fácil
convencer Petrônio de que está em idade para ter um compromisso —
Sebastian se incomodou com meu tom, pigarreando — Se eu souber que você
passou do ponto ou fez qualquer coisa que ela não queira... Nós vamos
conversar, cara.

— Fica calmo, cara — Abriu os braços em sinal de paz — Não precisa ficar
tão nervoso.
— Tem outra coisa que precisa ficar muito clara entre nós — Sebastian me
encarava receoso — Analuz e eu não somos irmãos.

— Não? — Realmente pareceu surpreso. Bebi um longo gole de bebida —


Como não?

— Não temos o mesmo sangue, apenas fomos criados juntos. Sou enteado do
pai dela, não irmão de verdade.

Sebastian me encarou como se finalmente compreendesse tudo.

— Sebastian! — Analuz apareceu ao nosso lado, finalmente se aproximando


de mim durante a festa — Que bom que veio!

— Eu não perderia por nada, Analuz — Respondeu com um sorriso patético.


Tomei um grande gole de minha bebida e revirei os olhos — Você está linda!

— Obrigado, que gentil!

— Que dançar comigo? — Esticou a mão para ela, que me encarou um pouco
confusa.

— Ah, sinto muito! — Coloquei minha taça de lado — Analuz me deve uma
dança e acho que é um maravilhoso momento. Não é?

— Claro, vamos... — Disse com um sorriso constrangido — Logo danço com


você também, Sebastian. Sabe como são os irmãos! — Toquei em sua mão e
a levei para a pista de dança, girando-a para que me deixasse pousar as mãos
em sua estreita cintura — Valentim, por favor, para de me constranger com o
Sebastian!

— O que te importa esse mauricinho? Não me diga que está interessada nele
também?
— Como assim também? — Ergueu os olhos para mim e sorri — Você está
interessado nele, por acaso?

— Não se faz de boba, Analuz. Sebastian está interessado em você, é algo


claro como água — Nos encaramos enquanto dançávamos uma música lenta
junto a outros casais. Encarando-me com os olhos azuis brilhando, Analuz
sequer parecia se lembrar de Sebastian — Você disse que preferia morrer a
dançar comigo em sua festa, se lembra?

— Eu digo algumas besteiras as vezes — Corou e movi as mãos em sua


cintura, segurando seu corpo pequeno ainda mais perto do meu — Estava
brava com você.

— Por quê? — Sussurrei e ela desviou o olhar.

— Porque você foi abusado comigo — Sorriu de canto — Agora você não se
faça de bobo! — Sorri também e ela hesitou um pouco, subindo as mãos
pequenas em meus ombros enquanto me analisava mais de perto — Acha que
fiquei bonita com esse vestido?

Sua pergunta foi inocente. Percorri seu corpo com o olhar.

— Você é perfeita, Ana. Está belíssima, mas confesso que prefiro sem nada
— Analuz separou os lábios, corando com a indignação.

— Você prometeu esquecer!

— Nunca vou me esquecer. Nunca vou deixar de desejar tê-la em meus


braços e agora posso dizer isso a você... Agora você não é mais criança e tão
pouco menor de idade. Agora você sabe.

Analuz parecia estar diante de algo chocante, dada sua expressão surpresa e
os olhos claros curiosos.

— Valentim, se alguém escuta isso... — Olhou ao redor e se aproximou mais


— Nós não podemos! Eu nunca... Eu não posso!

— O que sente por mim, Analuz? — Questionei sem pensar — Não me diga
que é indiferente, porque não acredito. O que sente por mim, além de carinho
de irmão?

Analuz apertou os músculos de meus braços em suas mãos que ali pousavam.
Era como se experimentasse a sensação. Encarou-me e mordeu os lábios. Os
olhos azuis pareciam mais claros e límpidos que nunca. Pude notar ali que
não havia maneira de negar... Algo existia entre nós.

Algo além de amor fraterno.

— Às vezes sinto muita raiva de você por ter me deixado, mas também
sinto... Uma coisa que nunca senti antes em toda minha vida.
Capítulo Oito

Valentim me fez perder o eixo em meio a minha festa de dezoito anos e não
conseguir enxergar mais nada que não fosse ele.

— Você está bem, garota? — Roberta perguntou em dado momento em que


conversávamos e eu não conseguia tirar os olhos de Valentim falando ao
celular — Parece fora da realidade...

— O que você faria se o homem que você amou em segredo durante muito
tempo dissesse que te deseja? — Roberta não escondeu a curiosidade.

— Daria pulos de alegria!

— E se ele tivesse uma namorada e mesmo assim te dissesse isso?

— Daria um tapa na cara dele!

— Mas no caso você está louca por ele e a namorada está longe...

— Isso é furada! Homem comprometido que trai uma vez, trai sempre! —
Comprimi os lábios de maneira pensativa — Você perguntou se ele pretende
terminar com ela?

— Na verdade não...
— Se ele está louco por você, não deveria estar com ela! A não ser que não
goste verdadeiramente dela e descobriu que gosta de você agora, eu sei lá!

— Aí Roberta, você está me confundindo!

— De quem você está falando, hein? Me conta!

— Analuz! — Valentim se aproximava segurando a chave do carro em mãos


— Vamos? Eu prometi ao papai que te levaria quando a festa acabasse.

— Claro, vamos — Olhei para Roberta, que encarava Valentim sem esconder
que o admirava — Quer carona, amiga?

Roberta aceitou a carona e se atentou a maneira como Valentim colocou seu


casaco em meus ombros pela leve chuva que começava. Paramos frente à
casa dela.

— Obrigado pela carona, Valentim. Obrigado amiga, depois falamos sobre


sua questão amorosa. Espero que tudo se resolva logo!

— Obrigado amiga.

Assim que Roberta saiu do carro a tempestade apertou na madrugada e


Valentim me encarou de maneira curiosa. Seus olhos castanhos brilhavam
junto ao sorriso fácil e apaixonante.

Valentim rodou com o carro mais um pouco e parou quando ficou impedido
de enxergar com a forte chuva. Nos sentamos no banco de trás para esperar e
seu corpo grande se aproximou demais do meu. O encarei de baixo, surpresa
pela maneira como ainda estava cheiroso mesmo depois da festa.

— Questão amorosa? — Mordi os lábios sem encará-lo — Falou de nós para


ela?
— Você se acha mesmo, não é? Claro que não falei nada sobre nós, como
poderia? O que diria? Que meu irmão vem tomando certas liberdades
comigo?

— E que você não tem recusado... — Apoiou uma das mãos no queixo e seu
olhar se tornou tentador — Não somos irmãos, Analuz. Você bem sabe!

— Não tão bem quanto você.

— Analuz... — Me virei em sua direção e sua mão grande se apoiou em


minha perna. Estremeci com o contato, encarando seus olhos castanhos e
tentadores tão próximos.

— Valentim, não vou negar que você é atraente e me faz sentir coisas... —
Tomei fôlego e ele se aproximou ainda mais — Mas você tem namorada e eu
não estou disposta a ser brinquedo de ninguém!

Valentim revirou os olhos e ergueu meu queixo em direção a seu olhar firme.

— Você, mais do que ninguém, sabe que preciso me casar em breve. É


somente por isso que tenho esse relacionamento.

— Não a ama?

— Não! — Convicto, respondeu — Não a amo.

Sempre fui capaz de ver nos olhos dele quando mentia e agora não conseguia
enxergar nada! Valentim segurava meu rosto com uma das mãos, mas fui eu
quem não resistiu a sua proximidade e me lancei nos braços fortes como
queria fazer a muito tempo.

A única coisa que desejava no dia de meu aniversário era beijá-lo!


Mais do que qualquer presente, nada me faria mais feliz do que ter sua língua
na minha e suas mãos fortes passeando por meu corpo e levando com elas o
calor que me preenchia.

— Se não a ama, então você é um covarde! — Falei entre o beijo, segurando


o rosto dele enquanto sua boca descia em meu pescoço. Fechei os olhos
diante da sensação, à barba por fazer arranhando minha pele levemente.

— Se você me disser agora... — Valentim deslizou a alça de meu vestido e


beijou meu ombro com sofreguidão, deslizando os lábios por minha pele com
urgência — Que se casa comigo... Falo com Petrônio e movo céus e terras
para que isso aconteça.

— Você só pode estar louco! — Gemi ao sentir sua boca no vão entre meus
seios, arqueando o corpo para sentir mais — Isso nunca poderá ser.

— Até agora não te ouvi dizer que não me quer... — Voltou a beijar meus
lábios, subindo a mão pelo vão da saia de meu vestido. Estremeci com o
contato de sua mão firme e grande em minha pele — Você não está
entendendo o quanto significa para mim, Analuz.

Ofegantes, nos encaramos próximos e com os hálitos roçando nossos lábios


inchados. Coloquei os dedos em seus lábios quando veio me beijar
novamente, tremendo pelas sensações que me causava. Já podia sentir uma
umidade estranha entre as pernas e calafrios me percorrendo de cima a baixo.

Aquilo me apavorava, principalmente por ser com Valentim tantos


sentimentos.

— A chuva já parou. Precisamos ir para casa, Valentim. Precisamos ir...

Ao chegar em casa, todos os olhares se direcionavam para nós.


— Finalmente chegaram — Tia Alessa comentou sentada ao sofá — Como
demoraram!

— Estávamos falando sobre a festa, filha. Foi tudo tão lindo! — Mamãe
sorria ainda arrumada com seu vestido e junto de papai — O que foi?
Aconteceu alguma coisa? Porque essas caras?

Valentim parecia ter levado um soco no estômago e eu me sentia


completamente desnorteada. Molhados pela chuva, éramos o retrato perfeito
de duas pessoas que cometeram um crime. Um crime contra nossos pais, os
únicos que realmente se importariam.

Um crime maravilhoso, diga-se de passagem, porque eu ainda sentia o sabor


do beijo dele em meus lábios.

— Nada mãe, estamos cansados — Valentim interveio — Vai descansar,


Analuz. Você não disse que tem prova segunda-feira e amanhã precisa
estudar?

— Sim, tenho prova e estou cansada — Dei um beijo em meus pais e passei
por Valentim. Ele me segurou pela cintura e me ergui para beijá-lo bem
rápido — Boa noite.

— Descansa...

Apertei os olhos enquanto subia, trancando-me em meu quarto e correndo até


o diário sobre a cama.

Querido diário,
Valentim não só me beijou novamente, como também disse que me deseja!

Não posso acreditar que um homem feito como ele esteja interessado em uma
menina como eu, mas parece real. Ao menos os beijos dele são muito reais e
incríveis, não se parecem em nada com os beijos dos meninos que já fiquei.

Tenho medo do que sinto por ele.

Tenho medo que alguém descubra o que está acontecendo!

Ao mesmo tempo, não tenho coragem de ficar longe de suas mãos


carinhosas, seu olhar que me venera e seu toque quente...

Eu seria capaz de perder a cabeça, como já estou perdendo, mas não tenho
coragem de dizer nada aos meus pais. Nunca! Para eles somos irmãos e
qualquer coisa que haja entre Valentim e eu deve ser um segredo.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova

Prendi a franja de meu cabelo ondulado e coloquei um belo vestido rosa claro
para o café da manhã. Passei um pouco de maquiagem, nada muito forte, e
analisei de perto a pulseira que ele me deu quando voltou.

Valentim havia dito que eu era perfeita e assim passei a me sentir desde que
descobri que um homem pode me achar atraente. O homem que sempre fui
apaixonada em segredo e pensei que jamais me olharia com outros olhos.

— Bom dia! — A manhã de domingo era sempre animada, mas naquela em


específico parecia turbulenta — Nossa, o que houve?

Valentim se levantou para puxar a cadeira para mim ao seu lado. Sua
expressão não era das melhores, apesar de estar lindo de preto e com a manga
da camisa dobrada até o cotovelo. O cabelo úmido. O perfume me
embriagou.

— Seu irmão... — Alessa apontou Valentim ao meu lado — Acaba de dar


uma notícia bombástica.

Minha alma gelou e o encarei. Valentim me olhou de volta com apreensão.

— O que você disse? — Questionei sem esconder o medo.

— Que terminou o relacionamento com a namorada — Mamãe completou e


respirei aliviada — É uma pena, meu filho.

— É mesmo uma pena... — Papai suspirou e limpou os lábios — Espero que


tenha algo em mente, Valentim. Apoio suas decisões, mas você precisa
pensar com a razão.

— Pai, não tem mais como continuar. Não posso seguir mentindo — Baixei a
cabeça e mordi os lábios — Eu não a amo e o melhor a ser feito foi terminar.

— Já deve ter outra engatilhada, né priminho? — Philip me encarou quando


disse e me movi desconfortavelmente na cadeira. Comecei a comer fingindo
não me importar, mas meu coração corria descompassado no peito — Uma
que estivesse mais perto.

— É melhor não tirar conclusões precipitadas, Philip — Valentim respondeu


em tom seco — É melhor nem pensar muito.

— O que você acha, Ana? — Tia Alessa questionou — Acha prudente seu
irmão terminar com um prazo tão curto para se casar?

— Valentim sabe o melhor para ele, tia.


Tomei café em silêncio e notei as olhadas curtas que Valentim me lançava.
Saiu para o escritório com papai e ambos se trancaram lá. Subi para o quarto
e ao passar pelo quarto de minha mãe ouvi uma conversa entre ela e tia
Alessa.

— Me desculpe, minha irmã, mas existe algo raro nessa relação de Analuz e
Valentim... Valentim sente muito ciúme dela, você não vê como trata
Sebastian Ferrer?

— Alessa, por favor! Irmãos são assim mesmo! Valentim sempre foi
cuidadoso com a irmã mais nova.

— Não notou como pareciam corados ontem ao chegarem? Analuz anda


muito estranha e calada desde que ele chegou... Não é o normal dela. Além, é
claro, de todos os presentes que Valentim dá a ela! Não roupas ou caprichos,
mas festas caras, carros e joias, presentes que apenas se dá para uma
mulher, não para uma irmã querida.

— O que quer insinuar, Alessa?

— Não está claro? Valentim tem interesse em Analuz, interesse como


mulher! Ele a olha com veneração, como mulher! Deve ser por isso que ele
terminou com a noiva... Porque agora a menina já tem dezoito anos e não é
mais uma criança. Agora poderá tê-la.

Tapei a boca com as mãos.

— Alessa, por Deus que nos olha do céu e pune nossos pecados! Como se
atreve a dizer tamanho absurdo em minha cara?

— Qual seria o problema, além dos dez anos que os separam? Analuz e
Valentim não tem qualquer laço de sangue, minha irmã! É normal que
morando sob o mesmo teto coisas tenham acontecido entre eles. Sua
adorável filha não deve ser o maior exemplo de pureza, como pensamos!

— Já basta, Alessa! Entre todos os disparates que já ouvi saindo de sua


boca, este é o maior e pior de todos! Como pode pensar que Valentim, sendo
um homem de quase trinta anos, olharia para Analuz, uma menina de dezoito
anos, como mulher? Como pode sugerir que meus filhos, a menina que saiu
de mim e o menino que crio como meu desde os cinco anos, possam estar
tendo um caso dentro de minha casa? Você definitivamente perdeu a noção
do certo e do errado, do bem e do mal! Como pode insinuar algo assim, tão
pecaminoso? Analuz é uma menina pura e assim vai se casar!

— Não seja tão ingênua, irmã... Por favor! Eles se adoram e isso é mais do
que notável!

Mamãe parou de falar e começou a passar mal. Entrei no quarto um pouco


depois, aflita ao vê-la tão pálida.

— Mãe, o que você tem? — Ajoelhei-me ao seu lado e beijei sua mão fria.

— É minha doença, filha. Fique calma.

— Pois é, sua mãe não pode ter emoções fortes, você bem sabe — Tia
sussurrou atrás de mim.

— E o que a fez ficar nervosa? — A encarei com certa raiva — O que disse a
ela?

— Olha garotinha petulante... Somente não vou lhe dar as palmadas que
merece porque seu irmãozinho a protege e não quero problemas com ele!
Tenha mais respeito ao falar com os mais velhos!
— Alessa, saia — Mamãe pediu cansada — Saia!

— Sai! Já ouviu? — Insisti nervosa — Mãe, não sei porque atura essa mulher
aqui! Ela é insuportável e apenas te faz mal!

Peguei algumas pílulas para ela na gaveta e lhe dei com um grande copo de
água. Bebeu em seguida.

— Quero ter toda minha família ao meu redor, querida. Diante da doença e da
morte, o que somos, meu amor? — Tocando meu rosto dizia.

— Mãe, mas você não vai morrer! Valentim disse que...

— Valentim disse o que disse para te proteger e porque eu pedi, querida. Mas
a verdade é que posso morrer a qualquer momento. Não tenho certeza se
realmente irei me salvar.

Uma lágrima caiu em minha bochecha e a sequei com as costas da mão.

— Não, mãe. A senhora é forte, vai conseguir vencer!

— Está tudo bem, querida. O que mais me dói diante da morte é deixar você
e Valentim tão perdidos em suas vidas, não felizes como eu queria que
fossem. Meu grande sonho é vê-los completamente felizes.

Tocou a lágrima que rolava em meu rosto. Beijei sua mão.

Deitei na cama com o diário, as lágrimas escorrendo pelo rosto e pingando


nas páginas em branco que se borravam com a tinta azul da caneta.

Queria diário,
Valentim mentiu para mim!

Meu pai mentiu também!

Mamãe não vai ficar bem, ela vai morrer! Tem os dias contados, se o que
disse sobre o câncer for real.

O que vou fazer sem ela? O que vai ser de mim sem minha mãe? Não é justo
uma mulher boa como ela partir e deixar sua família! Seria esse um castigo
por mim sentir tudo o que sinto por Valentim?

Concluo que jamais seremos irmãos novamente, se é que um dia realmente


fomos! O que sentimos é forte demais para ser colocado no patamar
fraternal e devo admitir o fato para mim mesma.

Eu o amo.

Mesmo que não diga diretamente, sempre o amei.

Não quero ser infeliz como minha mãe me vê sendo. Diante da iminente
possibilidade de perder minha mãe para sempre, me vejo diante de um
grande dilema... Quão passageira a vida é para se perder tempo com tantas
questões.

Não quero abrir mão do amor, mesmo que seja secreto. Não posso e nem
devo abrir mão de viver o amor com o homem que amei durante toda a vida.

Mesmo que seja errado.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

Ouvi Valentim ao telefone.


Ouvi claramente quando disse a tal Michele que o relacionamento deles não
podia continuar e que seria melhor que ela aceitasse de maneira pacífica.
Ouvi quando disse que não a amava. Ao menos nisso Valentim não estava
mentindo!

Reuni coragem quando desligou e bati na porta do quarto dele delicadamente,


secando a lágrima que caia em meu rosto.

Todos dormiam e por sorte ninguém me veria entrando no quarto de meu


"irmão mais velho" no começo da madrugada. Não houve resposta, por isso
abri e entrei sem pedir permissão.

Ele estava lá.

Sentando na poltrona de couro no escuro, apenas com uma fraca luz vinda do
abajur reluzindo no quarto e mostrando-o à meia luz. Estava nu, apenas com
uma toalha branca envolta na cintura e o cabelo escuro que caia na nuca
pingando no peito forte. Os olhos cor de café subiram para meu rosto no
mesmo instante, a expressão indecifrável.

— Precisamos conversar — Sussurrei fechando a porta e me escorando nela.

Meu corpo todo estremeceu com a visão que tive dele ali, sem roupas, apenas
de toalha. Seu corpo me chamava atenção. Seu semblante. Os músculos em
seu abdômen. Eu queria tocá-lo! Não podia deixar de pensar no que poderia
fazer comigo.

— Posso me trocar? — Sua voz grave ecoou e dei de ombros.

— Não precisa... — Caminhei hesitante até a cama dele, bem em frente à


poltrona onde estava sentado, e me sentei na beira. Senti-me uma boba
usando aquela camisola cor de rosa com rendinhas enquanto ele estava nu,
somente de toalha — Você realmente terminou com a sua namorada?

— Sim — Respondeu firme, me encarando a meia luz.

— Por mim? — Sugeri tímida, com o olhar semicerrado.

— Não posso ser um covarde, como você mesma disse. Se minha mãe quer
me manipular mesmo depois de morta, terá de falhar neste quesito. Não
posso me casar com a mulher que amo... Ao menos não agora. Não me
casarei por um negócio. Não serei um covarde — Os olhos de Valentim
brilhavam com sua verdade.

Senti fogo me percorrendo de cima a baixo apenas com seu tom de voz, sua
segurança que contagiava.

— Eu já sei que a mamãe vai morrer. Já sei que você e papai mentiram para
mim. Ela mesma me disse isso hoje — Sussurrei encarando-o com pesar.

Valentim cerrou os punhos ao lado do corpo e fechou os olhos para pensar.

— Eu não queria te machucar. Não queria vê-la sofrendo antecipadamente,


logo agora que está prestes a se formar no ensino médio e com tantas coisas
na cabeça.

— Porque não se importou em me machucar quando foi embora e me


deixou? — A maneira como me encarou tocou fundo em meu coração.
Parecia sentir uma dor realmente palpável.

— Pensei somente em você quando fui, Analuz. Lembra-se do que eu disse


naquele dia? Que tomava aquela atitude por você, por nós? — Concordei
com um aceno breve, afastando o cabelo loiro de minha face corada — Fui
embora porque não podia vê-la sem desejá-la. Fui embora porque não
conseguia compreender em que momento deixei de te ver como uma irmã
querida e comecei a vê-la como mulher. Fui embora porque me deixava louco
te ver, me deixava louco saber que estava tão perto... Me enlouquecia o fato
de você existir, Analuz! Eu te amava como um louco, estava ardendo por
você, que era somente uma menina de quatorze anos! Isso era repulsivo para
mim, mas eu não podia evitar admirá-la e desejá-la. Acabei encontrando seu
diário... Acabei lendo algumas páginas, eu confesso! — Não escondi a
surpresa — Me perdoe... Li o que escreveu sobre mim. Sobre o que sentia por
mim também e naquele momento percebi que se não fosse embora e me
afastasse de você, perderia o controle. Não conseguiria me conter sabendo
que você também me desejava e também sentia algo por mim... Mais cedo ou
mais tarde, se ficasse, colocaria tudo a perder entre nós. Tudo!

Baixei o olhar e olhei minhas mãos em meu colo. Mordi os lábios e o encarei
novamente, encontrando seu rosto aliviado por ter despejado sobre mim sua
verdade.

— Você me amava tanto que teve que ir embora, é isso?

— Te amava. Te desejava. Sempre fui louco por você! Essa é a verdade,


Analuz Anastácia... Sempre fui maluco por você!

— Não é mais? Não me ama mais? — Sorri de canto ao encará-lo. Valentim


sorriu também, passando a mão pelo cabelo que pingava em seu peito.

Minha boca secava acompanhando cada uma delas.

— Você me encanta e me tira a razão — Confessou fazendo-me encará-lo


sem disfarçar as intenções — É a mulher que amo e sempre amei. A mulher
mais importante de toda minha vida.

Não pensei em nada quando me ergui e delicadamente caminhei até ele. A


partir daquela noite meu amor e o de Valentim não seriam apenas meras
palavras.
Capítulo Nove

Analuz caminhou em minha direção à meia luz como fazia em todos os meus
sonhos.

Em silêncio admirei seu cabelo loiro claro caindo na face corada, os lábios
vermelhos e os olhos mais azuis do que nunca. Usava uma camisola curta e
cor de rosa e caminhava com graça e certeza.

Parou a minha frente por alguns segundos antes de se sentar em meu colo
delicadamente, encarando-me de frente com as pernas ao lado de meu
quadril. Sua mão pequena tocou meu maxilar carinhosamente e fechei os
olhos conforme corria os dedos em minha face, passando por meus lábios e
descendo por meu peito.

Perdi o raciocínio ao vê-la tão linda e próxima.

Ao notar seu olhar curioso em meu corpo, uma novidade enorme para uma
menina virgem.

As mãos alcançaram meus ombros, correndo facilmente por minha pele


úmida. Desceram com delicadeza por meus braços, voltando o caminho e
tocando-me no abdômen, descendo por minha barriga molhada. Eu me
arrepiava sob seu toque e ela gostava, encarando-me de maneira tentadora
quando reparava. Afastei seu cabelo da face gentilmente, finalmente me
movendo.

A voz, embargada pelo desejo, não saia de minha garganta.

— Te amo, Valentim. Te amei por toda a vida — Sussurrou aproximando os


lábios dos meus, ainda explorando meu corpo com as mãos curiosas — Eu
quis morrer quando você me deixou...

— Analuz... — Sussurrei, mas não consegui concluir a frase.

Analuz levou as mãos trêmulas à barra da camisola e a retirou por cima da


cabeça em uma passada rápida, olhando-me nos olhos. Não usava nada por
baixo, estava completamente nua diante de minha visão. Senti a resposta
imediata de meu corpo, excitado pela mulher que amo.

Analuz me encarava em questionamento. Insegura.

Imóvel pela surpresa, desci o olhar para seus lindos seios rosados e pequenos,
passando pelo ventre plano e sua nudez absoluta. Era definitivamente a
imagem mais linda que já tive o prazer de ver em toda a vida.

— Você gosta de mim? — Sussurrou se aproximando de meus lábios, os


olhos azuis presos aos meus — Me acha bonita?

Tomei seu rosto em minhas mãos trazendo-a para mim enquanto tomava os
lábios rosados nos meus com ânsia e desespero. Analuz me beijava com
ímpeto e eu sentia os mamilos rijos roçando nos pelos de meu peito conforme
nos beijávamos.
Aquele era o momento pelo qual esperei durante muito tempo.

As mãos pequenas desceram para a toalha, desfazendo o nó dela sem que eu


me desse conta. Em pouco tempo estava nu também, com as mãos dela
tocando sobre meu membro excitado com insegurança e curiosidade. Ofeguei
em meio ao beijo, descendo a boca por seu pescoço e lhe tomando os seios
com os lábios.

Ela queria me enlouquecer, mas provaria do próprio veneno. Eu também


poderia enlouquecê-la!

Não havia pudores na maneira como me tocava, muito menos dúvidas.


Analuz movia meu membro em sua mão com delicadeza, experimentando o
toque no que descobria. Toquei sua intimidade carinhosamente, sentindo
como estava úmida e pronta para mim, gemendo com meus beijos e se
inebriando com o toque em sua parte mais sensível.

Meu único pensamento naquele momento, como um homem louco e sedento


pela paixão da mulher que ama, era me enterrar em sua intimidade o mais
fundo que pudesse e me perder em seu corpo até esquecer quem sou.

Analuz agarrava meu cabelo enquanto nos beijávamos, deleitando-se com


meu toque. Quando senti sua intimidade pulsando em meus dedos e ouvi seu
gemido apaixonado, nossas respirações se fundiram enquanto ela, audaciosa,
movia o quadril até que sua intimidade encontrasse meu membro pronto para
penetrá-la.

Segurei em sua cintura com a surpresa de sentir-me afundando delicadamente


em sua umidade quente, sem acreditar que realmente estivesse acontecendo.
Todo aquele prazer não parecia ser real. Fechei os olhos quando Analuz se
moveu mais para baixo, unindo-nos até que senti sua barreira me impedindo
de prosseguir.

Ofegou, segurando em meus ombros e mordendo os lábios. Me olhava com


seus olhos azuis assustados.

Eu não podia mais recuar.

Em um momento de loucura a levei até a cama em uma passada, prostrando-


me sobre seu corpo pequeno e entrando vagarosamente até ficar
completamente dentro dela, ouvindo-a gemer pela invasão em sua delicada
intimidade antes intocada.

Fechei os olhos ao sentir seu calor. Seu corpo sob o meu. Sua umidade, sua
doçura, sua intimidade apertada ao meu redor, adaptando-se ao amor físico
que jamais experimentou. Era o cabelo loiro de Analuz espalhado em meu
travesseiro. Seu corpo lindo e seu sangue em meus lençóis. Os olhos azuis
que eu venerava me encaravam apaixonados e assim fui o primeiro homem
dela.

Na loucura. Na incerteza. Em um momento inesperado.

A possui com toda a vontade que guardei durante anos. Como um homem
sedento, faminto e desesperado.

Gemia em meus lábios, usando meu beijo para calar a dor que a tomava cada
vez que eu me movimentava. Marcava em mim cada segundo daquele
arrebatador prazer com as unhas em minhas costas e os dentes em minha
pele. Guardava na memória cada investida nela, cada vez que meu corpo se
perdia dentro da mulher que amo.

Analuz, como se soubesse exatamente o que fazer, instintivamente separava


ainda mais as pernas para me receber e movia o quadril junto ao meu,
apaixonada por tudo que sentia e encantada pela forma como nossos corpos
se encaixavam.

Aquela loucura seria o selo de nosso amor. Entregar-se a mim era de fato a
prova de que Analuz me amava da mesma maneira com a qual sempre a
amei.

Estremecendo, cai junto dela, beijando-a incansavelmente e logo pronto para


amá-la de novo. Não queria acordar nunca daquele sonho maravilhoso e com
um inconfundível sabor de pecado.

Valentim ficou em profundo silêncio quando tudo acabou.

Deitei-me em seu peito ouvindo as batidas de seu coração para preencher o


vazio de palavras. A respiração ainda ofegante ecoava em meus ouvidos
junto a minha própria.

Deslizei a mão em seu peito, brincando com os pelos que delicadamente


roçavam minha palma.

— Você me chamou de descarado quando te beijei pela primeira vez... De


louco — Ergui os olhos para seu rosto e ele me encarou também, tocando-me
no queixo e deslizando o dedo por minha bochecha vagarosamente — E veja
só o que fez, Analuz — Tomou minha mão de seu peito e beijou com carinho
— Foi sua primeira vez, somente em meu quarto. Não pude preparar uma
noite romântica ou algo do tipo...

— Você pode achar que sou uma menina tola que espera por flores e
chocolates, mas o que sempre esperei foi você — Confessei tímida —
Quando imaginava minha primeira vez, imaginava com você, aqui, no seu
quarto... — Olhei ao redor — Foi exatamente como eu queria.

Valentim ainda parecia encantado cada vez que me encarava. Seu olhar era o
mais apaixonante em todo o mundo.

— Te machuquei? — Sussurrou quando me sentei à sua frente — Foi uma


loucura, Analuz, mas tão pouco pude parar. Sonhei com você por tanto
tempo...

Inclinei-me sobre seu corpo e as mãos fortes desceram por minha cintura,
puxando-me para ele.

— Não me machucou e... — Passei novamente as mãos em seus braços —


Você é tão lindo. Tão grande. Tão firme e macio...

Sorrindo, Valentim me beijou novamente.

— Você é um anjo, minha menina. Um anjo que caiu do céu direto para os
meus braços — Apreciei seu beijo quente em meu pescoço e novamente
experimentei a sensação deliciosa de ter seu corpo imponente sobre o meu,
causando sensações arrebatadoras.

Valentim parou de beijar meu ventre quando notou uma mancha no lençol.
Uma mancha de sangue. Ao reparar, me sentei e analisei junto dele.
— Eva... Eva vai ver isso amanhã — Sussurrei ajeitando o cabelo para longe
do rosto. Valentim pensou por um minuto e o vi se colocar de pé ainda nu e
caminhar até uma das gavetas. De lá tirou um canivete — Valentim...

Minha voz morreu na garganta quando o vi cortando a própria mão em um


risco suave. Sua expressão se alterou um pouco com a dor do corte e meu
queixo caiu diante da cena. O sangue escorreu por sua mão até o pulso e ele
deixou que algumas gotas mais pingassem no lençol.

— Quando falo que você é louco... — Comentei rindo ao ver a cena, o


sangue pingando em várias partes do lençol e até no chão do quarto.

— E você, audaciosa e sedutora... — Fechou a mão e olhou ao redor — Sabe


fazer curativo?

— Posso tentar, se quiser.

Valentim, ainda nu, voltou do banheiro com gaze, algodão e antisséptico.


Apreciei a visão deitada na cama, sentando-me com o lençol frente aos seios
para tapar a ferida que intencionalmente causou para ter uma desculpa para
justificar o sangue na cama.

Enquanto eu envolvia sua mão na faixa, seus olhos não abandonaram meu
rosto.

— Vou falar com papai — Segui com o curativo — Vou dizer a ele que te
amo e que pretendo me casar contigo.

Parei o que fazia e ergui os olhos para seu rosto. Valentim falava sério.

— Não pode fazer isso, Valentim. Não agora que mamãe está debilitada e...
— Tomei fôlego — Tia Alessa falou com ela sobre nós. Ela suspeita que
exista algo entre nós além de amor fraterno e mamãe ficou furiosa quando
ouviu o que tinha a dizer. Passou mal e não quero que algo terrível aconteça
com ela por minha culpa!

— Não posso deixar passar o que houve hoje entre nós, Ana — Apertei os
olhos ao ouvi-lo — Não posso simplesmente ignorar! Te amo, te quero e abro
mão do que for para tê-la!

— Valentim, tenho dezoito anos! Além de todos os problemas que nos


cercam, principalmente o fato de sermos “irmão” — Fiz aspas no ar — Não
posso me casar agora! Tenho que entrar na faculdade antes, você não acha?

Valentim pensou por um momento, olhando mais de perto o curativo que fiz
em sua mão.

— Concordo que não esteja pronta, mas papai tem que saber o que acontece
entre nós. Que homem eu seria se continuasse escondendo, me encontrando
com você sem revelar aos demais? Não, Analuz. Você sabe que não posso
seguir escondendo.

— Por favor — Segurei sua face entre as mãos — Não quero que conte nada
ao papai, por favor...

— Não se sente segura quanto ao que sente por mim? — Sua pergunta me fez
recuar. O beijei delicadamente, sentindo novamente o intenso sabor de seus
lábios quentes.

— Não estou preparada para enfrentá-los ainda, mas eu não podia mais me
privar de viver o que sinto aqui dentro — Toquei meu peito — Não podia
mais seguir fingindo para mim mesma que não preciso de você mais do que
tudo em minha vida.
Valentim me beijou com ardor, as mãos fortes me guiando para deitar
novamente.

— Vou te dar o tempo que precisa, mas não vai ser muito. Sou homem,
Analuz. Preciso assumir as coisas que faço.

— No caso, eu te seduzi... — Toquei seu nariz rapidamente e ele sorriu.

— Engraçadinha...

— Valentim, menino! — Eva apareceu na sala de jantar enquanto tomávamos


café da manhã e bateu no ombro dele com preocupação — O que houve com
você? Tinha sangue no seu quarto, rapaz. Na cama, no chão... — Valentim
ergueu a mão enfaixada para ela, que soltou um sussurro.

— Me cortei, Eva — Bebericou o café enquanto ainda mantinha a mão


erguida e enfaixada — Foi um pequeno acidente.

Segui com os olhos baixos, comendo em silêncio como se nada houvesse


acontecido. Como se nada daquilo me importasse.

— Como foi isso meu filho? — Mamãe perguntou preocupada também.

— Um canivete antigo em minha gaveta, mãe. Acabei me cortando sem


querer — Engoli a respiração e tentei não corar. Valentim era mesmo um
bom ator, mas eu podia perceber na voz dele o incômodo por mentir.

— Tome mais cuidado, querido. Está muito feio?


— Não mãe. Foi superficial — Secou a boca com o guardanapo.

— Valentim... Sempre desastrado — Comentei sorrindo para ele, que sorriu


de volta.

— Bom, pai, vou um pouco mais cedo hoje. Tenho muito trabalho, parece
que tivemos problemas na empresa de Madrid — Colocou-se de pé.

— Estou ciente, filho — Papai parecia preocupado — Vou acompanhar


Yekaterina na hemodiálise e te encontro após o almoço.

— Que carona, Analuz? — Ergui o olhar para Valentim, parado atrás de


minha cadeira — Te deixo no colégio.

— Quero, obrigado — Me levantei rapidamente, apanhando minha mochila.


Valentim a pegou de mim, carregando-a. Beijei meus pais e sai com ele sem
nada dizer, mas sob o olhar de todos.

— Que bom que pararam de brigar — Violeta comentou e pude ouvi-la.

Uma vez no carro, Valentim parecia incomodado.

— Me sinto errado mentindo assim para nossos pais — Baixei o olhar para
meu colo, alisando minha saia azul do uniforme enquanto ele dirigia.

— Não podemos dizer nada, você sabe. Mamãe não suportaria.

— Você está bem? — Questionou tocando minha mão com delicadeza.

— Estou ótima — Sorri para ele com delicadeza — Aposto que sua mão se
encontra em uma situação pior do que a minha.

— Certamente, mas não sinto nada. Ainda estou entorpecido pelo amor que
você me fez sentir ontem — Me estiquei para beijá-lo quando o sinal fechou.
O celular de Valentim vibrou entre nós e ele atendeu rapidamente — Sim? —
Silêncio — Quem? — Mais silêncio — Diga que em vinte minutos estou aí.
Obrigado.

— Problemas? — Questionei tentando parecer despretensiosa.

— Sim, problemas. Preciso ir para a empresa rapidamente — Valentim


estacionou frente ao colégio e olhei ao redor. Ali não era seguro beijá-lo —
Nos vemos à noite?

— Sim — O beijei no rosto — Até a noite.

— Te amo — Sua voz soou hesitante. Parada do lado de fora, olhei-o pela
janela.

— Eu também.

Eu o conhecia. Algo ali estava muito errado!

Cheguei na empresa nervoso e apreensivo, caminhando entre os


departamentos com o temor estampado no olhar.

— Que horas ela chegou? — Questionei inclinando-me na mesa de minha


secretária, que parecia confusa.
— Faz quase uma hora, senhor. Está na sua sala.

— Sozinha?

— Sozinha, senhor.

Segui em direção a minha sala e abri a porta. Lá estava ela... Cabelos negros
e longos. Pele morena e sedutora. Roupas da moda. Virou-se para mim e
pude ver seu rosto bonito e um sorriso fatal nos lábios. Michele.

— Baby! — Caminhou até mim com seu sotaque aflorado — Surpresa, mi


amor!

— Michele... — Não esbocei reação quando me abraçou e ela pareceu não se


importar — O que faz aqui? Quando chegou ao país?

— Hoje pela madrugada, baby. Não podia deixar um amor como lo nuestro
se acabar assim, à distância! Não posso aceitar que me dejes se ainda te amo!
— Segurava em minha gravata enquanto falava — Passei em sua casa, mas
me disseram que você estaria aqui, por isso vim até a empresa.

— Michele, por favor. Não torne tudo mais complicado! — Retirei sua mão
de minha gravata — Não posso continuar com você porque não te amo,
Michele. Gosto de você como pessoa, mas não te amo para formarmos uma
família. Tão pouco nos casar.

— Quem é a outra que te dominou, Tim? — Suspirei — Sempre desconfiei


que existia outra mujer em tu vida, mas nunca consegui descobrir quem
poderia ser! Sua obsessão em voltar ao Brasil tinha algo a mais além de
saudade de casa, estou certa?

— Sim, está — Não menti e ela levou as mãos ao rosto — Tem outra mulher
em minha vida. Uma mulher que sempre esteve em minha vida e nada será
capaz de mudar o fato.

— Ao menos possa saber quem é? — Apoiei as mãos na cintura.

— Que diferença faz saber quem ela é?

Michele nada disse. Caminhou pelo escritório em silêncio, olhando


atentamente para todos os detalhes contidos na sala. As fotografias em minha
mesa resumiam-se a uma de minha família — eu, Yekaterina, Petrônio e
Analuz — e outra de minha mãe. A frente delas, uma foto atual de Analuz em
um porta-retratos com uma fita azul pendurada no mesmo e anexa a uma
estrela que brilhava no escuro. Um presente que ela me deu quando ainda era
menina e guardei para sempre me lembrar dela quando estivesse longe.

A tela de meu computador era uma foto minha e de Analuz, algo que para
Petrônio soava como amor fraterno, mas para Michele realmente foi a prova
que buscava.

— Sempre desconfiei que você e sua irmãzinha fossem muito mais do que
apenas irmãos de criação — Dizia olhando a foto em que sorriamos juntos no
último aniversário dela — Era muito estranha a maneira que você tinha de se
referir a ela, principalmente de evitar falar sobre ela. Nunca suportou sequer
ligar ou procurá-la, porque você sabia que se ouvisse a voz dela ia voltar
correndo para encontrá-la.

— Michele...

— Não tente negar, Valentim. Eu dormi ao seu lado muitas noites ouvindo
você dizendo o nome dela. Me fiz de idiota porque não achei que teria o
atrevimento de dizer algo a ela sobre seus sentimentos, mas pelo visto sua
coragem sucumbiu ao desejo.
— As coisas não são como parecem ser, Michele. Você gostaria de ser infeliz
ao meu lado, sabendo que amo outra mulher?

— Mulher? — Michele pegou meu porta retratos e analisou a foto de Analuz


— Ela é uma menina, Valentim! Você não tem vergonha? É por isso que já
não me queria como antes.

— Não vamos chegar em lugar nenhum com isso, Michele.

— Já percebi que não.

— Te respeito e por isso terminei o relacionamento. Não quero magoá-la e


muito menos fazer com que case com um homem que não te amará o
suficiente.

Michele assentiu positivamente, ajeitando a bolsa no braço e me encarando


com tristeza.

— Podemos almoçar juntos, ao menos? Deixei minhas coisas na sua casa e


nem fiz uma reserva em hotel decente.

— Se você esperar, sim. Tenho muito trabalho pela manhã — Apontei um


sofá na sala onde ela se sentou — Mas que fique claro que entre nós, agora,
existe apenas uma amizade, tudo bem?

— Como quiser, Valentim. Como quiser! — Suspirou derrotada.


Capítulo Dez

Querido Diário,

Nunca pensei que fosse sofrer tanto novamente em toda minha vida.

Quando pensei que a felicidade fosse absurda e nada poderia me abalar –


apesar de todos os problemas que envolviam meu relacionamento com
Valentim – cheguei do colégio e o vi na sala de estar de nossa casa com
aquela tal modelo Espanhola.

Travei diante da visão, sentindo como se todo o mundo desabasse aos meus
pés! Surpreso ao me ver, Valentim parecia perdido diante de nossos pais,
que conversavam com a tal modelo. A mesma me mediu de cima a baixo,
sorrindo para mim de maneira cínica.

Meu coração partiu aos poucos.

Novamente Valentim mentiu. Tudo o que queria era brincar com meus
sentimentos e fui uma idiota por ter correspondido a ele!

Me sinto uma estúpida por ter me entregado a Valentim! Me sinto uma boba
por ter me apaixonado por ele! Queria jamais tê-lo conhecido em minha
vida!

Jamais senti uma dor tão grande quanto ao vê-lo com a outra. Jamais me
senti tão tola.

Agora, no entanto, tudo vai mudar.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

— Analuz! — Valentim batia na porta do meu quarto com toda a força


enquanto eu me trocava. Por sorte meus pais não estavam em casa para ouvir
todo aquele circo — Me deixa explicar, por favor! Analuz!

Terminei de passar o batom vermelho nos lábios e me encarei no espelho de


meu quarto de princesa.

O vestido preto se moldava perfeitamente a meu corpo e os olhos azuis,


maquiados, se destacavam em um visual pesado pouco característico de mim,
a princesinha sempre perfeita.

Peguei a bolsa e abri a porta, encontrando-o com o rosto cansado e o suor


escorrendo na face. Há muito tempo me chamava sem uma resposta. Há
muito tempo queria me explicar o inexplicável.

— O que faz aqui? — Valentim me encarava consternado, sem esconder o


espanto ao contemplar meu visual — Porque não está na sala com sua
noivinha?

Passei por ele caminhando apressada e Valentim me seguiu de perto.


— Espera! — Agarrou meu pulso, que puxei com voracidade — Será que
pode parar de agir como uma criança imatura e me escutar como adulta?

— Acontece, querido, que tenho dezoito anos! Sou realmente imatura, não
sabia? — Ironizei com lágrimas nos olhos — Se bem que agora, graças a
você, não sou mais menina, não é? Era isso que queria, Valentim? Me usar
para satisfazer suas vontades?

— Foi você quem me procurou, Analuz, não se faça de inocente! — Puxou-


me para ele, mas recuei, encarando os olhos castanhos com intensidade —
Jamais te usei! Jamais seria capaz de me deitar com você se não te amasse,
será que não entende? Ela chegou de surpresa!

— De surpresa? Nossa, que feliz coincidência! — Ironizei — Sabe de uma


coisa? Talvez seja o melhor! Uma vez mais confiei em você e acabei
arruinada!

Desci as escadas e Valentim veio atrás. Uma vez na sala, dei de cara com a
tal Michele junto a algumas malas. Travei com a visão, encarando-a
curiosamente.

— Analuz Vilanova — Disse aproximando-se, ainda me analisando —


Realmente você é muito bonita — Segui parada com Valentim atrás de mim
— Você é Russa, verdade?

— Minha mãe é — Esclareci sem compreender suas intenções.

— Sabe que Espanha e Rússia não têm uma relação muito amistosa. Os
interesses condizem, mas a competitividade é demasiada — Apoiou uma das
mãos embaixo do queixo.

— Estou estudando um pouco sobre a guerra fria no colégio. A Rússia


sempre foi poderosa, apesar da União Soviética ter se desfeito. Sempre achei
mais interessante nossa maneira de dominar do que a antiga e antiquada
monarquia Europeia — Michele não escondeu a surpresa e Valentim soltou
uma risadinha — De todos os modos, não é da minha natureza competir de
igual para igual com ninguém. Nós, Russos, não perdemos tempo gastando
palavras. O vocabulário já é bem complicado!

— Tão pouco é da minha índole entrar em guerras para perder — Michele se


aproximou de mim — Por isso, mi querida, tu hermano es todo tuyo! No voy
a pelear por algo que ya esta perdido! Apenas espero que esteja tan
enamorada de el quanto el por ti!

— Analuz, menina! — Eva apareceu na sala com Sebastian a seu encalço.


Todos nos voltamos para eles — Sua visita chegou, menina!

— Vamos, Analuz? Nossa, como está linda! — Aproximou-se de mim para


me beijar no rosto.

Valentim me encarou sem esconder a raiva. Tinha o rosto moreno corado e


passou os dedos entre os fios de seu cabelo escuro.

— Hola, que tal? — Michele ironizou, acenando para Sebastian.

— Essa é a noiva de Valentim, Sebastian — Apresentei-os encarando


fixamente Valentim.

— Ex-noiva! — Valentim respondeu nervoso, também me encarando


desacreditado.

— É um prazer — Sebastian voltou a mim — Vamos, Ana? Comprei


ingressos para um filme ótimo!
— Vamos... — Sussurrei confusa, sem saber ao certo no que acreditar.
Realmente a modelo Espanhola dizia a verdade? Sem jeito de recusar
Sebastian, sai com ele — Boa noite.

Os olhos de Valentim quando sai com Sebastian não saiam de minha cabeça.

— Está tudo bem, Ana? — Sebastian questionou na fila do cinema.

— Você me acha infantil e mimada? — Questionei sem pensar, ainda


pensando em Valentim — Acha que sou uma patricinha desinteressante?

Sebastian riu baixinho.

— Não, Analuz. Você ainda é muito jovem e não sabe muito sobre a vida,
por isso age com infantilidade às vezes. Mas não acredito que seja proposital,
tão pouco que seja desinteressante. Você tem muitas características.

— Sebastian, você é um cara legal e não sabe como tudo seria mais fácil para
mim com você — Torci os lábios e ajeitei o cabelo atrás da orelha — Mas
não crie esperanças comigo. Não sou apaixonada por você, sinto muito.

Definitivamente deveria ser sincera. Envolver outra pessoa para machucá-lo


era realmente mais uma atitude infantil que eu não queria tomar naquele
momento.

— É pelo Valentim, não é? — Ergui o olhar para seu rosto, surpresa — Ele já
me disse que vocês não são irmãos de sangue e já reparei que existe algo
estranho entre vocês.

Será tão óbvio assim? Respirei profundamente.

— Claro que não, Sebastian, ele é meu irmão de criação, quero dizer...
— Não vou contar nada, Analuz, fique tranquila — Tocou meu ombro
carinhosamente — Acho que vocês formam um bom par. Se se amarem,
devem ficar juntos.

— Não é tão fácil — Cruzei os braços frente ao peito — De todos os modos,


meus pais nos veem como filhos. Como irmãos. Todo mundo nos vê assim!

— Isso é um detalhe... Analuz, eu... Posso te confessar algo agora que me


disse que não quer nada comigo? — Concordei com um aceno — Sua prima
Violeta. Ela me interessa muito!

— Sério? — Empolgada, lhe dei um tapinha no braço forte — Não me diga!


Isso sim é ótimo! A Vi é uma garota incrível!

— Também acho! Desde que percebi que você e Valentim estavam


envolvidos comecei a reparar nela. Será que me daria uma chance para
conhecê-la?

— Claro que daria! Vou agitar isso para você!

— Podemos continuar sendo amigos?

— Com certeza! Em breve, primos! — Sebastian me abraçou e retribui seu


abraço com carinho e tranquilidade.

Finalmente me sentia livre!


Analuz ainda era uma menina incapaz de compreender o mundo fora da
bolha que criamos para ela.

Por mais que parecesse adulta e muito segura de si, ainda era uma garota
imatura e que começava agora a descobrir o amor.

Levei Michele no hotel que se hospedou na cidade e dali por diante nosso
laço seria rompido. Voltei para o trabalho com a cabeça presa em Analuz,
que deveria estar nos braços daquele babaca.

— Está tudo bem, primo? — Violeta apareceu na cozinha de pijama e me viu


com a garrafa de uísque aberta sobre a mesa, a gravata com o nó desfeito e
alguns botões na camisa abertos. Envergonhado, ajeitei a postura — Você
parece na fossa... É pela Espanhola?

— Não Vi... É fossa de amor, mas não por ela. Fossa por ser um idiota e
gostar de pessoa errada!

— Isso é grave! — Sentou-se à minha frente — Quem é a mulher que te tira a


paz, primo?

— A única mulher no mundo que não posso ter — Confessei notando como
parecia surpresa. Os olhos castanhos curiosos — Mas a única que amo. A
única aos meus olhos... A única aqui — Levei a mão até o peito — Dói saber
que posso causar algum mal a ela, se tanto a amo!

— Até você, um homem cheio de poder, sofre por amor — Suspirou com a
mão apoiando o rosto — Pensei que os CEO’S famosos como você pudessem
comprar o amor de qualquer mulher no mundo com tanto dinheiro, poder e
influência!

Contornei o copo com um dedo e sorri de canto.

— Para mim isso não funciona! Tão pouco gostaria de comprar amor, isso
soa como um ultraje — Dei de ombros — De todos os modos, talvez o
melhor para ela seja ficar longe de mim.

Violeta olhou para a sala.

— Acho que é Analuz. Vou até lá falar com ela, com licença, primo! Curte
bem sua fossa!

Analuz.

Virei o rosto para encará-la entrando na sala, mas ela não me viu. Começou a
conversar com Violeta muito empolgada, explicando algo com interesse.
Violeta ouvia desacreditada e as duas subiram juntas para o quarto.

— Como pôde, Analuz? — Sussurrei olhando o visor do meu celular com


uma foto dela — Como pôde ficar com outro depois de ter sido minha
mulher?

Encostei o celular no rosto como se assim pudesse ficar mais perto dela.

O banho gelado me acalmou os ânimos, mas não tirava o espinho cravado em


meu coração. Lidar com Analuz não era fácil, muito menos protegê-la de
mim mesmo.

Sai do banheiro de toalha na cintura e secando o cabelo com outra. Me detive


no quarto ao vê-la sentada em minha poltrona com o olhar azul confuso e
envergonhado.

— O que faz aqui? — Usava uma camisola azul clara e tinha o cabelo loiro
solto ao redor da face corada — O encontro com seu príncipe encantado não
rendeu bons frutos, por isso veio me procurar? — Analuz ergueu os olhos
para mim, parado a frente dela — Desta vez que não quer ser o brinquedo sou
eu, Analuz. Já estou farto da sua imaturidade, da maneira como tenta me
atingir... Sempre busquei te fazer o bem e tudo o que fiz na vida foi por você,
até mesmo renunciar às condições do testamento de minha mãe. O que recebo
em troca? Sequer é capaz de me ouvir por um minuto antes de se jogar nos
braços do primeiro idiota que aparece!

Nervoso, respirei profundamente quando notei meu tom de voz subindo


substancialmente. Dei as costas a ela, que se colocou de pé vagarosamente,
caminhando até mim.

— Tem razão — Sussurrou timidamente — Fui uma menina boba e imatura.


Não sei como agir, Valentim. Somente tenho pavor da ideia de te perder de
novo — A olhei por cima do ombro quase desacreditado — Eu não fiquei
com Sebastian, ele está interessado na Vi e já sabe que eu e você... — Baixou
o olhar.

— Sabe? — Me virei em sua direção.

— Disse que qualquer um que preste a atenção pode notar — Deu de ombros
delicadamente — Pensei que você ia embora novamente com a sua
espanhola. Pensei que tinha me enganado!
Sorri de canto e caminhei até ela, tomando-a em meus braços e envolvendo o
corpo pequeno pela cintura fina. Analuz me abraçou com força, quase como
se desejasse se fundir a meu corpo.

— Eu já disse que perco tudo em minha vida, menos você — Analuz me


apertou ainda mais, separando-se para me beijar carinhosamente, como se
fosse à primeira vez.

Senti o sabor de seus lábios nos meus com delicadeza, deleitando-me na


sensação perfeita. Eu a amava... Amava como um louco! Seus dedos
pequenos se apertavam em meu ombro forte, nu e molhado.

— Se você se casar com ela ou com qualquer outra — Apontou o dedo em


riste para meu rosto — Juro que fico sem comer para sempre e me jogo da
janela do quarto! Não vou deixar!

A abracei novamente, tocando a ponta de seu nariz com carinho. Analuz


pulou em meu colo, abraçando-me pelo pescoço e me beijando o rosto com
intensidade.

— Minha menina... Sou eu quem morre sem você. Morri durante quatro anos
e não pretendo morrer nenhum dia mais! Nenhum dia!

Em mais um dia normal de trabalho, cheguei na casa de meus pais esgotado


pelo cansaço e com muita vontade de esquecer qualquer coisa que tivesse a
ver com o mundo dos negócios.
— Mãe... — Comentei de toalha, olhando brevemente o retrato de minha mãe
sobre minha estante no quarto. Yolanda Ruiz Vilanova foi uma morena
espetacular e arrasava corações. Talvez fosse por isso que Petrônio jamais foi
capaz de esquecê-la, mesmo depois da morte, e assumiu a criação de seu
filho. Ele a amou demais! — Porque não me deixou apenas um pouquinho de
grana, mas todo um império?

Brinquei pegando o retrato e beijando carinhosamente, devolvendo-o.

A noite estava quente, por isso tomei um banho e vesti somente uma
bermuda. Sempre fui de andar nu dentro de casa, na Espanha quando morava
sozinho, mas na casa de meus pais era um pouco complicado.

— Menino, vai descer para o jantar? — Eva bateu na porta delicadamente.

— Não Eva, estou sem fome agora! Obrigado! E meus pais? — Gritei de
dentro do quarto, deitado com o celular na mão.

— Saíram para jantar juntos! Se quiser comer eu preparo algo, filho!

— Não precisa, Eva. Obrigado!

Segui respondendo mensagens do trabalho, mesmo em horário de folga,


acostumado a ser sempre o chefe. Meu único momento de distração era
quando estava com Analuz, mas ela parecia preocupada demais com as
provas finais... Ultimamente parecia mais atarefada do que eu!

Bateram em minha porta novamente, desta vez, mais discreto. Revirei os


olhos e me coloquei de pé, passando as mãos pelo cabelo escuro e úmido.

— Já falei que não quero comer, Eva! — Abri a porta e me deparei com os
olhos azuis mais intensos do mundo.
Os olhos de Analuz, que me encarava usando um biquíni azul e o cabelo loiro
e ondulado caindo na face corada.

— Posso? — Apontou para dentro do quarto. Dei passagem no mesmo


momento, sem conseguir dizer nada. Ela parecia ainda mais tentadora com
aquele biquíni, azul no mesmo tom de seus olhos e pequeno, exibindo
demasiadamente seu corpo. Eu podia ver as laterais de seus pequenos seios,
que saltavam no biquíni. Jamais a vi usando um traje daquele em toda a vida
e não era dos que costumava usar quando tomava banho de piscina em casa
— Vim te convidar para dar um mergulho. Está afim?

Sorri, fechando a porta atrás de mim. Sequer sai de perto da mesma.

— Adoraria, mas é melhor não! — Garanti olhando-a dos pés a cabeça e


apoiando as mãos na cintura — Vai ser bem desagradável ficar excitado com
todo mundo podendo ver, é bem complicado com você vestida assim... —
Gesticulei e ela riu, sem graça.

— Valentim, por favor! — Juntou as mãos nas costas e notei que ela queria
que eu a visse. Queria se mostrar para mim e conseguia! Eu ficava louco com
a simples visão de seus seios pequenos marcando no biquíni. Neguei,
comprimindo os lábios.

— Impossível Analuz.

— Então, já que é assim... — Caminhou em minha direção, parando frente à


porta e ao meu lado. Passou a chave na maçaneta, olhando-me de baixo de
maneira sugestiva — Que tal mergulhar... — Levou um dos dedos aos meus
lábios, descendo-o por meu peito nu — Aqui mesmo?

Como rendido que sou as suas vontades, não demorei a tomá-la nos braços e
envolvê-la contra meu peito nu, já sentindo sua pele macia em contato com a
minha. Beijá-la era diferente de tudo. Tê-la comigo era o êxtase, pois ter nos
braços a mulher que amo e sou totalmente louco é a mais incrível das
dádivas.

Desci as mãos por suas costas, acariciando-a no quadril e pressionando-a em


minha ereção. Queria que ela soubesse o quão louco era capaz de me deixar.

A levei até a mesa de madeira no canto, jogando no chão as poucas coisas


que tinham sobre ela para deitar Analuz na beira. Não retirei seu biquíni,
apenas afastei o pouco que cobria, tomando os seios rosados em meus lábios
enquanto ela gemia baixo e me apertava ainda mais forte contra si.

Provei seu corpo, deslizando a língua em sua pele completamente


enlouquecido pelo prazer que sentia. Nenhuma mulher, por mais experiente
que fosse, me causava tudo que a doce Analuz, ainda uma menina
inexperiente, podia me despertar.

Sua mão pequena deslizava em meu peito forte quando a trouxe para mim, na
mesa e encaixando-me entre suas coxas macias, mergulhando em seu calor.
Seus braços me abraçaram pelo pescoço e ela gemeu contra meus lábios,
usando meus beijos para calar as súplicas de prazer que proferia cada vez que
eu me movia em seu interior úmido e apertado.

— Valentim? — Parei de me mover ao ouvir a voz de Eva vindo do corredor,


batendo levemente na porta.

Fechei os olhos, ainda sentindo o prazer de estar dentro de Analuz e com seus
lábios a centímetros dos meus. Os olhos azuis da minha menina me
encaravam assustados, mas de maneira engraçada.

— Eva... — Respondi contendo o gemido.


— Você viu sua irmã por aí? Não encontro essa menina em lado nenhum!

— N-não — Respondi alto — Não, Eva. Estou entrando no banho.

Os sons sumiram e voltei a respirar, apertando Analuz novamente contra mim


e me movendo para penetrá-la com ainda mais força para terminar o que de
bom grado havíamos começado.

Nosso segredo, cedo ou tarde, seria descoberto!

Finalmente, depois de toda uma vida a amando em segredo, Analuz veio para
meus braços.

Não era simples resistir a vontade de gritar para todos que era minha, porém,
como totalmente rendido à sua vontade que sempre fui, não consegui passar
por cima de seu receio de que algo ruim acontecesse, principalmente com
nossa mãe, enferma com uma doença tão grave e terrível.

Um escândalo na família e na sociedade poderia gerar ainda mais problemas


para sua delicada saúde.

— Você enlouqueceu, menino! — Petrônio me dizia enquanto estávamos


frente ao advogado que norteava o testamento de minha mãe — Não
podemos simplesmente virar as costas para o testamento! Corremos o risco
de perder tudo o que construímos se você não se casar!

— Não vou me vender, pai. Sei que é importante para você, mas meu amor
não está à venda. É o que de mais valioso existe em mim.

— Mais valioso que nossa fortuna? Duvido muito, meu filho!

— Você se casaria com uma mulher que não ama por dinheiro?

Petrônio coçou o cabelo branco de maneira pensativa. Os olhos azuis me


encaravam em dúvida.

— Você não disse que ama uma mulher? — Tocou meu ombro — Vá atrás
dela!

— Não é tão simples assim... — Suspirei.

O advogado voltou-se para mim, retirando uma carta antiga do meio do


testamento. O papel era amarelado pelo tempo em que esteve guardado e a
caligrafia contida na mesma me era muito familiar. A letra de minha falecida
mãe!

PARA VALENTIM, MEU FILHO AMADO

— Como já ocorreu em outras ocasiões, Yolanda deixou uma carta para


você. Mas, neste caso em específico, deixou duas cartas, Valentim — O
advogado dizia me encarando — Uma para entregar caso você se casasse e
uma para o caso de não se casar.

— Yolanda era muito inteligente e perspicaz — Petrônio comentou


analisando a carta que o advogado me entregava em mãos — Certamente
tinha em mente que um casamento poderia não vir a acontecer.

— Esta é a carta referente à sua negativa para o casamento. Pode abri-la, se


desejar.
Analisei o envelope com atenção. Meu coração disparava conforme desfazia
o mesmo. Passei a ler o conteúdo em voz alta e clara.

Querido filho,

Hoje você é um homem de quase trinta anos e pode — deve — tomar as


próprias decisões.

No lugar que estou, saiba que me sinto orgulhosa por não ter sucumbido ao
poder e ao dinheiro em nome do amor... Ou de sua liberdade. Queria poder
abraçá-lo para comemorarmos juntos o homem incrível e seguro que se
tornou por abrir mão do material pelos verdadeiros sentimentos.

Esta é a resposta correta, meu amor. Esta é a carta que realmente escrevi
com alegria!

Adianto que sim, espero ter netos, e desejo de antemão que uma mulher
valiosa apareça em seu caminho para garantir nossa descendência, mas no
tempo correto e de acordo com sua vontade.

Nenhum real será tirado de sua herança, querido. Tratava-se apenas de um


dilema que impus para você mesmo testar seu caráter.

Estou orgulhosa.

Amando por você por toda eternidade,

Yolanda Ruiz Vilanova.

Caí sentado e suspirei pelo alívio.


Estendi a carta para Petrônio enquanto ria sozinho. A fortuna dos Vilanova
estava a salvo e Analuz não ficaria sem a vida que sempre teve. Nossa família
seguiria sendo poderosa com nossos esforços.

— Obrigado mãe! — Sussurrei de olhos fechados e com a mão no coração —


Obrigado!

— E então? — Analuz desceu as escadas correndo, ainda usando seu


uniforme da escola quando Petrônio e eu retornamos. Parou a minha frente
em expectativa enquanto Petrônio nos encarava — Ficamos na ruína?

Retirei a carta do bolso e estendi a ela, que parecia confusa enquanto lia.

— Minha mãe não me tirou a fortuna, Analuz! Tudo se resolveu, eu não


disse?

Emocionada, Analuz me abraçou com carinho e felicidade, suspirando de


alívio pelo final favorável que conseguimos diante de sua teimosia em não
querer abrir nosso relacionamento para nossos pais.

— Um golpe de sorte! — Petrônio advertiu me encarando de maneira


contrariada — Yolanda era muito perspicaz e te conhecia, mesmo que fosse
tão pequeno quando se foi. Mais uma vez salvou a todos nós!

Analuz me soltou ainda segurando a carta.

— Quer sair para comemorar? — Questionei tocando a ponta de seu nariz


com carinho.

— Sim, para onde? Você espera eu tirar o uniforme?

— Vai continuar sendo mimada, não é, Analuz? — Petrônio comentou ao


notar a felicidade no sorriso da filha.

— Papai! Somente estou feliz porque tudo terminou bem!

Petrônio, em sua inocência, não enxergava qualquer resquício do amor real


que existia entre mim e Analuz bem diante de seus olhos.
Capítulo Onze

Querido Diário,

Hoje é o dia mais feliz de toda minha vida!

Finalmente Valentim está livre! Livre do testamento da mãe, livre da


Espanhola e todo para mim!

Se não fosse por nossos pais, que ainda ignoram nossa relação, poderia
dizer que vivo um sonho ao lado do homem que amo.

Não posso deixar de pensar no que minha mãe pensaria se soubesse que já
não sou mais sua menina e sim mulher de Valentim.

Me sinto culpada por enganá-la.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova

— Aonde vai tão linda, priminha?

Philip, sentado ao sofá da sala de estar junto a mamãe e tia Alessa,


questionou ao me ver descendo as escadas centrais.

— Vou sair... Obrigado pelo elogio — Joguei o cabelo levemente,


demonstrando a felicidade de estar bonita.

Aquele vestido azul escuro realmente me caía bem e combinava com meus
olhos e tom de pele. Alisei o cabelo, algo que nunca fui muito adepta, e me
maquiei com a ajuda de Violeta, que já havia saído com Sebastian. No pulso,
a pulseira que Valentim me presenteou e era meu talismã.

— Tudo isso para sair com Valentim? — Mamãe indagou curiosa, olhando-
me de cima a baixo — Seu pai disse que vão sair juntos para comemorar a
boa notícia.

— Mãe! Não posso sair feia ao lado de Valentim! Sabe que os fotógrafos
adoram abordá-lo por ser influente e coisas do tipo!

— Nem se quisesse você ficaria feia, Analuz. Acho que nem nascendo de
novo — Valentim descia as escadas e me virei para encará-lo. Usava uma
camisa vinho colada ao peito forte e com as mangas dobradas até o cotovelo.
Calça preta e o cabelo escuro perfeitamente alinhado. Tomei fôlego para não
pular em seus braços — Vamos?

— Vamos — Respondi quase sem voz, apaixonada por seus olhos castanhos
e profundos.

— Spokoynoy Nochi! Divirtam-se! — Mamãe disse com um largo sorriso no


sofá, desejando-nos boa noite em seu idioma nativo.

Valentim, com sua simples presença, fazia meu corpo todo reagir a seu
encanto. Não havia nada no mundo mais fascinante que os sentimentos que
despertava em meu coração cada vez que me tocava ou simplesmente me
abraçava e depositava um beijo em minha testa, a única coisa que se permitia
fazer frente a nossa família.

Dirigiu para longe de casa até parar e finalmente me tomar nos braços,
beijando-me com a intensidade que guardou para si desde a última vez em
que estivemos juntos.

Segurei seu rosto enquanto me fartava com seu beijo, tocando o maxilar
áspero em meus dedos pequenos. As mãos fortes desceram por meu corpo de
maneira possessiva e tudo o que pude pensar foi em ser dele. Novamente,
como naquela noite em seu quarto onde ele cortou a própria mão para
justificar meu sangue.

— Aonde quer ir, minha menina? — Perguntou entre o beijo, acariciando


minha perna por cima do vestido.

— Para qualquer lugar onde possamos ficar a sós. Qualquer lugar onde eu
possa esquecer que o mundo existe e possamos fazer barulho! — Valentim
riu contra meus lábios.

Aquele sorriso de quem sabe muito bem o que fazer e para onde me levar.

Era incrível e parecia errado. Errado por sermos irmãos de criação. Por fazer
tudo sob o nariz de nossos pais. Pelos dez anos que nos separavam.

Esqueci-me de tudo quando chegamos a um motel de luxo, um lugar discreto


e maravilhoso que abrigou nosso amor naquela noite. Um amor avassalador
que me fazia recordar o motivo pelo qual mentia e me comportava como uma
pecadora.

Mamãe me via como pura e recatada. Sequer imaginava a maneira como eu


retribuía as carícias de Valentim e gemia alto cada vez que sua língua
brincava com meu corpo como fazia agora, correndo em meus mamilos rijos
e deslizando em meio a minhas coxas. Eu podia jurar que jamais me senti tão
viva e nunca experimentei tanto prazer quanto aquela boca me proporciona.

Eu mentiria para sempre para sentir seus músculos em minhas mãos. Para
poder beijá-lo também, tomando nas mãos cada parte de seu corpo e senti-lo
se deitando sobre mim com seu corpo quente e acolhedor.

Mentiria outra vez e quantas fossem necessárias para sentir seu membro rijo
me penetrando a carne com cuidado enquanto sua boca mordia meu pescoço
e seus gemidos ecoavam em meus ouvidos.

Faria o que fosse necessário para morrer de prazer nos braços fortes de
Valentim enquanto ele me dominava em seus braços e me enchia com suas
investidas firmes. Eu o amava e ele me enlouquecia! Me fazia esquecer meu
nome cada vez que se enterrava em mim.

— Acho que mamãe e tia Alessa desconfiam de algo — Na banheira do


quarto e sentada no colo dele sob a água, fechei os olhos enquanto as mãos
grandes percorriam meus seios tomadas por espuma. A sensação era doce e
quente, refletindo imediatamente entre minhas pernas — Viu a maneira como
olharam para nós antes de sairmos?

— Acha que desconfiam que estamos em um motel? — Questionou ao meu


ouvido, brincando com meus mamilos em seus dedos.

— Soa tão errado quando você fala assim... — Ele sorriu ao meu ouvido,
beijando meu pescoço e descendo a mão por meu ventre, tocando-me
intimamente — Nós somos irmãos.

— Não repita isso nunca mais! — Vociferou ao meu ouvido antes que meus
gemidos tomassem o quarto novamente e ficasse impossível raciocinar pelos
próximos minutos.

Virei-me para ela ofegante pelo prazer que me proporcionou e colei a testa na
sua. Sua mão afastou a mecha de cabelo que desprendia do coque e caia em
minha face, analisando-me apaixonado.

— Quando foi que você começou a me amar, Valentim? Você nunca deixou
isso claro — Valentim beijou minha mão com carinho.

— Quando li seu diário e percebi que as coisas que eu sentia eram recíprocas.
Quando me dei conta de que você já não era somente uma irmã, mas uma
menina que se meteu em meu coração. Quanto mais você amadurece, mais te
amo, Analuz.

O beijei nos lábios enquanto minhas mãos percorriam os ombros largos e


molhados. Valentim novamente estava pronto para me tomar.

— Sempre sonhei com isso, desde que era menina — Sussurrei sorrindo para
ele — Sempre sonhei em ser sua.

— E eu em tê-la, minha menina.

Foi o que ele fez, ali mesmo na banheira. Novamente o senti em meu interior,
penetrando-me com seu mesmo e devorando-me com seus beijos
apaixonados.
Madrid, Espanha.

Esse seria meu destino nos próximos dias e foi complicado contar o fato a
Analuz, traumatizada com minha última viagem quase sem fim. A empresa
estava com problemas na Espanha e cabia a mim ir resolvê-los, uma vez que
Petrônio estava com Yekaterina doente e não podia se afastar dela.

Minha língua experimentava o doce sabor de Analuz conforme se


movimentava em sua delicada intimidade. Minha mão esquerda deslizava
sobre seu ventre plano em direção a seus seios com ansiedade, levando a
camisola azul clara comigo e revelando seu corpo quente para mim. Apertei o
monte pequeno em minha palma áspera, colocando ainda mais pressão na
língua. Lançava olhares para ela conforme a provava, apaixonando-me mais
cada vez que via a capacidade que tinha de proporcionar-lhe prazer.

Jurei não a tocar na casa de nossos pais adotivos, os pais dela, mas naquela
noite, quando tive de contar sobre a viagem, sua decepção foi tamanha que
tive de recorrer a métodos avançados para acalmá-la. Tomá-la em meus
braços e beijá-la foi à única maneira de demonstrar que voltaria.

Fazê-la recordar o amor que nos unia, demonstrando o quanto a amava,


talvez fosse a única forma de convencê-la.
Terminamos na cama dela, no lençol cor de rosa e macio. Analuz se continha
para não gemer alto, apertando meu cabelo em suas mãos enquanto mordia os
lábios para expressar seu prazer e pressionava as coxas ao redor de meu
rosto. Amá-la era meu vício eterno.

— Não quero que vá... — Sussurrou quando me coloquei sobre ela, beijando-
lhe os lábios — Não me deixe de novo! — Implorou cansada, os olhos azuis
brilhando na luz do quarto — O que vou fazer sem você?

— Vou voltar, minha menina. Não sou capaz de ficar longe de você por
muito tempo, nunca serei! — Prometi lhe beijando também. As mãos
pequenas se agarravam à minha camisa branca.

Tive que ir.

Analuz não disfarçou o descontentamento ao se despedir, tensa e de braços


cruzados ao lado de mamãe, dando-me um abraço e um beijo no rosto antes.

— Se cuida — Sussurrei tocando seu cabelo loiro com carinho. Ela usava
uma faixa azul no cabelo e um vestido no mesmo tom. Sempre linda. Sempre
menininha — Vou sentir saudade.

— Eu também — Sussurrou com os olhos marejados, aproximando-se para


me beijar o rosto com delicadeza — Lyublyu vas, Valentim.

As palavras significavam “te amo” em Russo, eu sabia desde pequeno, uma


vez que Yekaterina as sussurrava para nós todas as noites. Apertei sua mão
na minha, respondendo-a com o olhar. Ela não tinha ideia do quão amada era!
Do quanto me encantava e fascinava!

Aquilo era o permitido frente a nossos pais, mas passamos uma noite
maravilhosa no quarto dela. Petrônio e Yekaterina sequer desconfiavam de
tudo que fazíamos.

Um mês longe de Analuz colocaria à prova nossos sentimentos e reais


intenções. Ficou bem claro para ela que, quando eu retornasse, nossa relação
não seria mais um segredo. Analuz seguia relutante em contar a nossos pais,
mas não havia escolha. A verdade, mesmo que chocante, deveria ser dita.

Queria diário,

Ficar longe de Valentim é terrível, mas está sendo proveitoso para colocar
as coisas importantes da minha vida em dia.

Consegui me formar com louvor no ensino médio e estou apta a cursar a


faculdade. Meus pais estão orgulhosos, principalmente o papai, que gostou
muito de saber que desejo seguir na área de artes e escrita. Ele, que sempre
amou literatura, me apoia incondicionalmente para me tornar escritora ou,
quem sabe, professora. Já me inscrevi em três faculdades e aguardo os
vestibulares e também o exame nacional.

Mamãe está progredindo e talvez tenha uma chance. O câncer desapareceu,


para surpresa dos médicos, mas seu estado ainda é delicado. Quando
Valentim viajar ela não para de falar nele, fato que me deixa ainda mais
triste.

Pensar nele é doloroso quando está longe.

Me dei conta de que sou duas versões de mim distintas com e sem ele.

Com ele sou incrível. Sequer posso acreditar que realmente fiz tudo o que fiz
com ele, principalmente na cama. Parece incrível que meu sonho de estar
com Valentim tenha se concretizado. Não o esqueço por um só minuto e nos
falamos sempre que possível pela internet, mas não é suficiente.

Tenho o cheiro dele na memória, mas preciso de suas carícias para me sentir
completa. Sei que quando voltar tudo será diferente e falta pouco, mas ainda
não me sinto preparada para enfrentar meus pais.

Sei que sou covarde, mas não posso evitar me preocupar com mamãe. Amo
Valentim mais do que tudo e algo diferente vem acontecendo comigo.

Algo que vem me causando muito medo e se for real pode destruir tudo o que
construímos. Tudo!

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

Meu estômago embrulhou assim que Eva colocou o prato na minha frente e
tive o impulso de levar a mão aos lábios.

Apertei os olhos com o sabor de vômito que me tomou a boca e engoli um


pouco de suco para conter o refluxo intenso que vinha me acometendo há
dias.
— Você está bem, menina? — Eva me tocou o ombro e concordei — Fiz
essa sopinha de legumes para ver se algo para na sua barriga. Ultimamente
anda tão sensível à comida...

Tia Alessa e mamãe me dirigiram o olhar de maneira acusatória, ambas se


entreolhando como se falassem entre si.

— Só estou consumida pelo vestibular, Eva. Somente isso! — Mexi na sopa


tentando me manter ereta e bem, mas meu estômago chorava pelo enjoo. Dei
uma colherada e mastiguei por um tempo.

— Não acha melhor visitar um médico, querida? — Papai questionou mais


tranquilo — Quem sabe não está com gastrite ou algo assim.

— Gastrite? — Tia Alessa comentou me encarando — Isso acontecia comigo


quando grávida. Era um enjoo terrível!

A encarei desconcertada e no mesmo momento a comida voltou. Sai da mesa


desesperada em direção ao banheiro mais próximo, vomitando todo o jantar
como vinha acontecendo há alguns dias.

— Prima... — Violeta entrou no banheiro e parou atrás de mim, ajoelhada no


vaso — Você está bem? Precisa de ajuda? — Dei a descarga e limpei a boca
com o papel higiênico, fechando a tampa do vaso e me sentando encostada à
parede. Neguei com um aceno — O que está acontecendo com você, Ana?

— Não sei... Realmente não sei! — Levei as mãos ao cabelo e me afastei da


mesa, nervosa e apreensiva — Estou com muito medo, Violeta.

Segurei a mão dela na minha com força, buscando ali um pouco de energia.
Não contei nada a Valentim, uma vez que o faria voltar imediatamente.
— Por acaso... Não tem a ver com o Sebastian, tem? — Neguei rapidamente.

— Claro que não! Nunca tive nada com Sebastian, seria impossível! — Dei
de ombros e a encarei em seguida com os olhos saltados no rosto — Por quê?
Você acha que eu possa...

— Não sei — Deu de ombros — Você já...? — Corei e cobri os lábios com
as mãos, chocada com a informação — Oh droga! Sim, Analuz. Se você já
transou, você pode estar grávida.

— Não! — Neguei com acenos descompassados — Eu me protegi! Não é


possível que aconteça!

— Sim, é muito possível — Sussurrou amedrontada — Nenhum método


garante total eficácia, prima. Você não sabia? — Neguei aflita — Com quem
foi, se não com Sebastian?

Baixei as mãos e apertei os olhos.

— Não posso dizer, Vi. Mas não estou grávida! Não posso estar, isso
acabaria com tudo! — Juntei os joelhos ao peito e escondi o rosto ali.

— Foi com Valentim? — Sussurrou quase dentro do meu ouvido. Ergui os


olhos para ela totalmente assustada e surpresa — Me desculpe, prima, mas
não sou boba!

— Não repete isso em voz alta!

Eva entrou no banheiro e disse que mamãe me chamava no escritório. Fui até
o escritório com as pernas bambas encontrar mamãe, ao lado de papai. Eva,
que era como minha segunda mãe, entrou junto e fechou a porta atrás de nós.
Meus pais tinham um semblante sério e nervoso.
— Analuz... Sente-se — Mamãe disse severamente. Sentei-me na cadeira
frente a ambos, do outro lado da mesa — Me diga de uma vez, Analuz. Vai
ser melhor do que esconder isso por mais tempo...

— Mãe...

— Você anda vomitando todo o jantar e se sentindo muito fraca — Eva disse
atrás de mim e a encarei — Isso não é normal, querida.

— Você tem algo a nos contar, filha? — Papai inclinou-se um pouco para
mim.

Encarei os dois rostos na minha frente e senti o corpo todo tenso. Se com
Valentim era complicado, sem ele era ainda pior! Se estivesse ali tudo seria
mais fácil, mas eu estava miseravelmente sozinha!

— Não, eu...

— Você está grávida? — Mamãe apoiou os braços na mesa e me perguntou


severamente — É melhor dizer de uma vez, Analuz, se não tudo pode piorar!

Corei de vergonha e senti as lágrimas no rosto quando apertei os olhos


fortemente.

— Não. Não sei — Respondi sem encará-los.

Papai e mamãe se olharam em choque. Eva parecia tão surpresa quanto eles.
Meu pai ficou de pé em um impulso, quase quebrando a cadeira que caiu no
chão atrás dele.

— Vou agora mesmo ligar para Sebastian e fazê-lo vir arcar com as
consequências!
Ergui-me também.

— Não pai! Sebastian não tem nada a ver com isso e posso garantir! Além do
mais, é namorado da Violeta agora! Eu nunca... — Tomei fôlego — Nunca
fui para a cama com ele!

— Não acredito que foi capaz de me esconder semelhante situação, Analuz


— Eu via a decepção na face de mamãe e isso me destroçou a alma — Pensei
que fosse uma menina ajuizada... Aos meus olhos era somente uma
menininha! Estou transtornada e decepcionada!

Comprimi os lábios.

— Prosti menya mama! — Desculpei-me — Me desculpe mamãe. Perdoe-me


por... — Não consegui terminar, envergonhada.

— Realmente pode estar grávida, filha? — Meu pai tirou os óculos de grau,
demonstrando seu intenso nervosismo — Realmente foi capaz de se entregar
a um homem que sequer tinha um compromisso sério com você? Não
acredito que minha Analuz seja capaz de algo assim!

Concordo apenas com um aceno, envergonhada. Aos olhos deles, agora,


deixei de ser uma filhinha inocente e me tornei uma promíscua qualquer.

— Você nunca sai de casa, Analuz! — Mamãe dizia ainda descrente — Vai
da escola para casa e de casa para a escola! Nunca teve um namorado sério,
somente Sebastian se interessou por você por aqui e nos diz que ele não tem
nada a ver, que nunca se deitou com ele! Como pode estar grávida em tais
condições? Onde foi que engravidou, se não coloca o rosto para fora desta
casa?

O fôlego me faltou diante de ambos.


— Não sei se estou grávida, apenas disse que posso, talvez, estar —
Expliquei quase sem voz.

— Analuz... — Papai voltou a se sentar levando uma das mãos ao peito em


sinal de decepção — Como... Minha filha!

— Sinto muito por decepcioná-los — Sussurrei — Sinto muito por não ser a
filha perfeita, mas eu já me tornei mulher, pai! Já posso tomar minhas
próprias decisões e arcar com as consequências delas! Tenho dezoito anos,
não sou mais uma criança!

— E como vai arcar com um filho prestes a ir para a faculdade? — Mamãe


vociferou — Como vai criar uma criança, se sequer pode nos dizer quem é o
pai? Razocharovaniye...

Aquela palavra significava “desapontamento”. Talvez resumisse tudo o que


ela sentia por mim em toda a vida... Profunda decepção! Mamãe praguejava
em Russo para não enraivecer ainda mais meu pai, porém eu era capaz de
compreender tudo.

Era capaz de compreender sua dor.

— Onde está o canalha que fez isso? — Papai soou enraivecido — Onde está
o homem que foi capaz de te tocar sem ter um compromisso com você diante
de mim, Analuz? Exijo que me diga agora mesmo!

Encarei os olhos de papai — exatamente iguais aos meus — em total


desespero. A verdade estava presa em minha garganta, mas não fui capaz de
proferi-la. Eles tinham razão! Eu não era capaz de arcar com as
consequências de nada, ainda era uma menina imatura sem qualquer
coragem!
— Sinto muito, pai — Afastei-me deles com passos hesitantes para trás —
Mas isso... Isso eu não posso dizer!

— Como não?

— Não posso! — Afirmei convicta — Não posso e não há nada no mundo


que me faça contar! Nada!

Dei as costas a ambos e corri escada acima, ignorando todos os olhares que
ficaram nas minhas costas.

A verdade, em partes, estava dita. Agora restava saber se eu realmente estava,


de fato, grávida.

Grávida de meu irmão... Que era meu irmão, mesmo que não tivéssemos o
mesmo sangue!
Capítulo Doze

— Já pretende voltar, senhor?

Meu secretário na empresa de Madrid questionou diante de meu pedido para


que comprasse uma nova passagem para o Brasil.

— Sim, Santiago.

— Ainda tem muitos assuntos por aqui, senhor.

— Nada que eu não possa resolver do Brasil. Por lá tenho coisas mais
importantes que requerem minha atenção.

Analuz não parecia bem em nossa última ligação, mas não dizia o que
exatamente a afligia. Orgulhosa como era, nunca gostou de me confessar suas
fragilidades, mas ficar longe dela não me parecia saudável. Nada me deixava
pior do que ficar distante de meu grande amor.

Os milhões e as empresas nada significavam se eu não a tivesse.

Todo o luxo e poder não faziam qualquer sentido sem minha menina por
perto para desfrutar comigo. Mimá-la, mesmo que a distância, não era o
mesmo de ver seus olhos azuis brilhando cada vez que satisfazia uma de suas
vontades.

Ela sumiu por dois dias e foi o suficiente para me preocupar. Uma mensagem
de Violeta, no entanto, me fez tomar a atitude de retornar ao Brasil antes da
data prevista.

Analuz precisa de você, primo. Por aqui está tudo bem, mas ela precisa
mesmo que você venha.

Franzi o cenho diante da mensagem.

Me diga por favor o que está acontecendo, Vi. Analuz está ferida?

A resposta veio imediatamente.

Sinto muito, mas não posso dizer mais nada. Analuz está bem e segura, mas
precisa da sua ajuda. É só o que posso dizer por hora.

Não hesitei em tomar o primeiro voo para o Brasil, deixando meus homens
de confiança encaminhados para resolverem os problemas finais que deixai
para trás.

Abri a porta da casa de meus pais adotivos aflito. Eva não apareceu, apenas o
motorista levou minhas malas para o quarto. Não havia ninguém em casa, por
isso segui até o escritório e encontrei Petrônio sentado no escuro com um
copo de bebida na mão.

— Pai? — Questionei um pouco intimidado pelo estado em que se


encontrava. Parecia ter sido atropelado por um caminhão — Pai... O que
houve? Onde estão todos?

Petrônio ergueu o olhar para mim e se colocou de pé cambaleando, cheirando


a álcool e com a camisa branca desabotoada nos primeiros botões. A gravata
pendurada ao redor do pescoço e desfeita. Não se parecia em nada com o
sempre impecável chefe de nossa família.

— Eva está na cozinha e sua mãe saiu com Analuz — Explicou monótono,
segurando meu ombro após nos abraçarmos longamente — Foi levá-la ao
médico! — Sorriu sem humor, com lágrimas nos olhos — Pode acreditar,
meu filho? Pode acreditar que Analuz fez isso com nós?

— O que houve com Analuz, pai? Porque está no hospital, o que aconteceu
por aqui em minha ausência? Porque o senhor não me ligou? — Questionei
apreensivo, atropelando as palavras enquanto as disparava.

Petrônio virou o copo de bebida nos lábios, que limpou com a manga da
camisa amassada. Seus olhos azuis eram um espelho que nada viam.

— Analuz destruiu tudo que planejei para ela, filho — Sussurrou com
lágrimas nos olhos azuis — Destruiu meus sonhos de pai e... — Suspirou —
Está grávida. Minha filhinha, uma menina que sequer tinha um namorado que
pudesse assumir a responsabilidade, ficou grávida bem debaixo do meu nariz!

Travei diante das palavras dele, encarando-o totalmente confuso.

— G... Grávida? — Sussurrei as palavras afastando-me dele alguns passos


para trás com o impacto da notícia — Não, não pode ser! — Sorri sem humor
— Não pode ser, pai...

Passei a mão pelo cabelo pensando nas palavras de Petrônio. Jamais me senti
tão confuso.

— Estou dizendo, meu filho — Petrônio voltou a se sentar com dificuldade,


cambaleando e caindo na cadeira em seguida — Começou a vomitar e sentir
fraqueza. Sua mãe desconfiou e questionamos. Ela não negou em momento
nenhum!

Apertei os olhos e passei os dedos entre os fios de meu cabelo mais


intensamente.

— Analuz não está grávida, pai — Assegurei firmemente, apoiando os braços


na mesa frente a ele — Te garanto que não!

— Sei que você confia muito nela e está decepcionado, mas infelizmente é
real. Infelizmente — Petrônio estava bêbado. Pude notar por seu semblante e
palavras. Aquele não era o momento de falarmos seriamente sobre Analuz e
eu. Ajudei Petrônio a ficar de pé, carregando-o para o quarto — Falhei como
pai, Valentim! Falhei com Analuz! Ela só tem dezoito anos, é uma menina!
Quem foi capaz de fazer isso com a minha menina? Quem?

— Fique calmo, pai. Isso tudo não passa de um grande mal entendido! —
Subi as escadas com ele, que cambaleava e sequer conseguia parar em pé pela
bebedeira — Você precisa ficar calmo! Nós dois temos muito que conversar,
mas quando a bebida tiver baixado.

Sai do quarto de Petrônio e procurei alguém em casa. Sequer Alessa e os


filhos estavam no local. Nervoso, sentei-me no quarto de Analuz aguardando
sua chegada.

Ela teria muito que me explicar!


Toquei meu ventre, totalmente transtornada enquanto aguardava ser chamada
pela médica. Eu era a única menina adolescente naquela sala repleta de
mulheres grávidas e casais felizes.

Mamãe, calada, se mantinha fria como uma estátua Russa ao meu lado. Seu
rosto pálido refletia sua apreensão. Os cabelos loiros, quase brancos como os
meus, caiam revoltos ao redor da face. Seu olhar azul, quando se direcionava
a mim, exacerbava decepção.

— Tem ideia do que transformou sua vida, Analuz? — Perguntou ao meu


lado, baixinho — Agora, ao invés de ir para a faculdade, se transformará em
mãe adolescente!

Comprimi os lábios e baixei o rosto.

— Mas eu me protegi... Ele... — Contive as palavras — Ele me garantiu que


não ia acontecer!

Segui com a mão sobre o ventre. Eu não sentia nada! Não me sentia grávida,
tão pouco desesperada, como deveria. Se realmente houvesse um bebê ali, era
meu e de Valentim. Dentro de mim, no fundo de meu coração, a ideia me
parecia bonita.
Eu o amava... Amaria também o fruto de nosso amor.

— Todos os homens quando querem levar uma mulher para a cama


prometem coisas, minha filha! — Mamãe segurou em meu ombro
delicadamente — Você é muito inocente, menina!

— Mas mãe...

— Se realmente estiver grávida teremos de pensar sobre o futuro da criança.


Você não tem idade, muito menos maturidade, para ser mãe!

Afastei-me dela com um impulso, encarando-a severamente.

— Escute bem, mamãe... Nem a senhora e nem ninguém vai me tirar meu
filho! — Vociferei sem me importar com que nos ouvia — Posso ser uma
menina imatura e mimada como dizem, mas isso não tira minha
responsabilidade e muito menos o meu amor!

— Lyubov? Amor? É isso que menciona?

— Amor! Amo o pai desta criança, assim como o amarei igualmente! E


repito... Nada vai nos separar! Nada!

A médica chamou meu nome e me coloquei de pé, caminhando até ela com
os olhos ainda em minha mãe. Eu sabia que nem ela e nem papai seriam
capazes de tamanha atrocidade. Ninguém me separaria de meu bebê!

Abri a porta do meu quarto cansada, retirando a jaqueta jeans dos ombros e
acendendo a luz, pois já era noite. Ao me virar, fui pega de surpresa com a
figura de Valentim sentando em minha cama.

— Valentim! — Exclamei com uma das mãos no peito, separando os lábios


pelo baque — Valentim!

Corri até ele, que ficou de pé para me abraçar e me erguer no ar com sua
força. Apertei os dedos nos ombros fortes, cheirando o cabelo escuro e
beijando seu rosto onde podia alcançar. Desci o beijo por seu maxilar com a
barba por fazer, alcançando a boca quente e tomando-a para mim.

Parecia uma visão perfeita de minha saudade materializada.

— Minha menina... — Sussurrou apaixonado, beijando-me com o mesmo


ímpeto. Segurava meu rosto e ainda me mantinha em seus braços — Minha
amada menina...

— Quando você chegou? — Questionei ainda beijando-o, acariciando seu


rosto com devoção. Ele tinha os olhos fechados diante de meu toque — Meu
amor... Você está aqui!

Nos beijamos novamente e ele me apertou ainda mais em seus braços,


deslizando uma das mãos por minhas nádegas, pegando-me pelas coxas.
Abracei seu pescoço, sorrindo diante de seu rosto lindo e olhos apaixonados.
Valentim sempre me encarava com extrema devoção.

— Violeta me chamou. Que história é essa, Analuz? Que história é essa de


que você está grávida? — Engoli a respiração e travei diante dele, baixando o
olhar nervosamente. Valentim usou uma das mãos para erguer meu queixo,
obrigando-me a encará-lo. Soltou-me no chão à sua frente — Que história é
essa que deveria ter chegado até mim por seus lábios, não pelos demais?
— Valentim... — Comecei nervosa — Andei passando mal. Vomitando e
tendo fraquezas. Mamãe me perguntou e tive que confessar a verdade, não
podia seguir mentindo para eles assim!

— Mas não contou sobre nós — Afirmou com decepção — Porque não
contou de uma vez?

— Tive medo de fazer isso sozinha.

— Sempre o medo, não é? — Comprimiu os lábios e baixei o olhar — Você


me ama ou sente mais medo do que amor? Não é capaz de confessar a nossos
pais que me ama, mesmo diante de uma situação em que será punida e
humilhada! Quando será capaz, Analuz? Quando?

— Valentim...

— Você não está grávida! — Garantiu firmemente. Os olhos escuros


convictos e sérios — Te amo o suficiente para protegê-la acima de tudo, até
mesmo acima de qualquer desejo que exista em mim. Sempre usei
preservativo e na única vez que não, tirei antes de terminar. Você não está
grávida!

— Sei que não — Retirei do bolso da calça um papel e mostrei a ele — O


exame deu negativo — Valentim leu e concordou, suspirando de alívio — Eu
não podia contar tudo sozinha, Valentim. Não podia fazer isso sem você
aqui!

— Tudo bem — Amassou o papel de jogou na cama, voltando-se para mim


— Agora estou aqui e vamos agora mesmo descer e conversar com a mamãe
sobre tudo. Vamos contar a ela de uma vez e ao papai quando o porre dele
passar!
Valentim me tomou pela mão e me arrastou até a porta, mas o impedi,
segurando o corpo.

— Não Valentim! Não! — Implorei nervosa, puxando-o na direção contrária.


Ele parou e me encarou, ainda segurando minha mão — Para! Não faz isso!

Os olhos castanhos de Valentim me encaravam com tristeza, certo receio.


Jamais o vi tão decepcionado, o mesmo sentimento que meus pais
expressavam ao me encarar.

— Você realmente me ama, Analuz? — Questionou segurando-me pelos


braços contra seu peito. Vi lágrimas em seus olhos e senti o coração arder —
Realmente me ama como diz amar quanto está em meus braços, na cama?

— Claro que amo... Amo como louca — Sussurrei próxima, sentindo seu
hálito em meus lábios — Amo como nunca vou amar outro.

— Então porque não é capaz de admitir para nossos pais e para o mundo o
que sente? Porque não é capaz de enfrentar a todos por nós, por nosso amor?
— Baixei o olhar.

— Valentim...

— Você é o que eu sempre quis, além de tudo ou qualquer coisa. Sempre te


amei e estou disposto a tudo por nós, Analuz.

— Tenho medo que nossos pais nos separem. Tenho medo que me proíbam
de te ver e não quero, não consigo, viver longe de você de novo! Não,
Valentim!

— Ninguém vai nos separar! — Garantiu convicto, chacoalhando-me um


pouco — Não permito! Você já é maior de idade, já é minha mulher!
Ninguém vai nos separar, Analuz. Ninguém!

Apertei os olhos e deixei as lágrimas deslizarem em meu rosto. Jamais senti


tanto medo de algo como sentia de perdê-lo.

— Não tem ideia de como sofri quando você foi embora, por isso não se
importa com meus sentimentos.

— Tenho ideia de que Petrônio e Yekaterina estão profundamente


decepcionados com a filha querida que poderia estar grávida sem ter um
relacionamento para justificar! Tenho ideia do que estão pensando sobre
você, sobre sua honra e seu caráter, quando na verdade eu sou o culpado!

— Eles não estão enganados — Suspirei diante das palavras dele — Pior será
quando descobrirem que estivemos juntos.

— Que estamos juntos! — Retificou — Analuz... — Levou uma das mãos a


testa, apertando os olhos — Se não pode assumir nosso relacionamento, se
não pode assumir que me ama... Eu sim devo tomar responsabilidade sobre
tudo o que fiz. Eu sim irei dizer a nossos pais tudo o que houve — Apenas o
encarei — E não me resta dúvida de que não importo para você. Não me resta
dúvida de que nosso amor... — Gesticulou entre nós — Somente existe para
mim.

— Isso não é verdade! — Sussurrei.

— Já pensou que podem gostar da ideia? — Sugeriu pensativo. Neguei — Já


pensou que podem aprovar e até ficarem satisfeitos com nosso
relacionamento?

— E também podem nos separar! Podem sentir como se houvéssemos os


traído, principalmente você! — Valentim baixou os braços em uma postura
derrotada.

Me encarava com descrença. Com pena. Cansado.

— Direi a verdade aos nossos pais porque devo ser homem para assumir o
que fiz e entre nós... — Dizia com lágrimas nos olhos — Vai ser como você
quiser. Já não existe nada. Mais nada!

Valentim saiu de meu quarto e não tive sequer valor de ir atrás dele. Cai
deitada na cama e agarrei minha almofada de unicórnio, chorando sobre ela
com o coração aos pedaços.

Para mim era mais claro do que água que Analuz jamais iria me assumir
diante de todos e meu amor era unilateral.

Não podia continuar cedendo aos caprichos dela, não quando agora seu nome
estava envolvido em um problema com nossos pais... Problema esse que
também causei! Que tipo de homem seria se não tomasse partido?

Analuz era imatura e mimada, deixava o medo dominá-la e não se dava conta
de que sua imaturidade era a grande vilã em nossa história. Eu não podia
mais continuar às escondidas com ela, ocultando tudo como um criminoso.
Estava apaixonado, não cometendo um crime, afinal!

Desci as escadas disposto a contar tudo à minha mãe adotiva, mas fui pego de
surpresa ao vê-la com dor no sofá e chorando em silêncio.

— Mãe — Corri até ela, amparando-a quando tentou se erguer — O que você
tem?

— É o rim, querido. Sinto muitas dores pelas cirurgias — Disse ofegante e


apoiando em mim — Analuz... Você já a viu?

— Sim mãe — Respondi ajudando-a a caminhar — Está no quarto.

— Querido, pode me ajudar a deitar no meu quarto? Sinto-me muito


cansada... Com muitas dores!

Petrônio bêbado e Yekaterina enferma. Aquele era um momento


completamente fora de questão para se dizer algo, por isso ajudei minha mãe
a chegar no quarto e desci para o escritório, bebendo em silêncio enquanto
analisava alguns e-mails do trabalho.

Encostei a cabeça na cadeira e suspirei diante de meu celular, que vibrava em


uma ligação dela. Não mais... Não mais cederia aos caprichos dela. Não mais
seria refém de suas vontades! Sempre fiz o que Analuz queria e me tornei um
escravo de seu próprio medo, agora, se realmente me quisesse, teria de partir
dela a iniciativa de assumir nosso amor. Dela!

Eva desfez as malas enquanto eu bebia sozinho na biblioteca onde antes


Petrônio enchia a cara.

Olhando para os arredores da grande mansão escura e vazia, me dei conta de


quantas lembranças profundas e incríveis criei ao lado dos Vilanova, a única
família que conheci. Enquanto o copo de bebida descansava em uma de
minhas mãos, na outra eu segurava meu documento de identidade onde
constava que Petrônio Vilanova era meu pai e Yolanda Ruiz minha mãe.

Petrônio não era meu pai verdadeiro. Meu pai biológico, na verdade, era um
milionário falido que usou minha inocente, rica e órfã mãe para tentar subir
novamente sua conta bancária. Não valia nada, como mamãe me disse em
uma carta. Seduziu-a, usou-a e engravidou-a com o intuito de enriquecer
novamente.

Por sorte mamãe foi esperta e sequer chegou a se casar com ele. Conheceu
melhor Petrônio ainda grávida, pois ele era funcionário de confiança de seu
pai, meu avô, antes de sua morte. Petrônio era seu braço direito nas empresas
da família e parecia a pessoa certa para orientá-la. Ambos acabaram se
apaixonando e quando nasci, Petrônio não pensou duas vezes antes de me
registrar como seu filho a pedido dela, que aquela altura já era sua namorada.

Ele acompanhou toda a gestação e me viu nascer. Cuidou de minha mãe, que
descobriu um câncer no ovário cinco após o parto, até seu último suspiro de
vida. Petrônio era a pessoa que eu mais admirava no mundo e não podia
pensar na ideia de decepcioná-lo. Ele teria de compreender minhas intenções
e algo me dizia que iria.

Petrônio me conhecia! Sabe que jamais seria capaz de machucar Analuz,


mesmo com a situação da quase gravidez.

Petrônio amou minha mãe mais do que qualquer coisa em sua vida e disso
sempre estive convicto e ele sempre me disse em palavras claras. Yolanda foi
seu grande amor e Analuz era o meu! Apenas um homem que amou
verdadeiramente poderia compreender o tamanho de meu amor, de minha
loucura...

Eu daria minha vida por Analuz sem pensar duas vezes!

Sai do banho já de madrugada e a vi em meu quarto, deitada em minha cama


de bruços e com a camisola rosa que usava quando transamos pela primeira
vez. Engoli em seco, nu, enrolando a toalha em minha cintura enquanto ela
me encarava sem esconder o interesse.

— O que houve? — Questionei fingindo desinteresse, caminhando até meu


celular na mesinha e checando-o.

— Você ficou tanto tempo fora e é assim que me trata? Com essa frieza? —
Seguia deitada na cama me olhando.

Eu sabia o que Analuz queria com aquela provocação. Seus olhos azuis
jamais me enganaram, muito menos quando queria prazer. Prazer este, que
conheceu em meus braços e se viciou.

— Já disse que tudo acabou entre nós — Reafirmei tentando não encará-la.
Era tentador e perigoso — Já que não pode assumir seus sentimentos, não
podemos mais ficar juntos.

Analuz saiu da cama e parou frente a mim, encarando-me de baixo. Era


pequena e delicada. Seu cheiro de menina me embriagava e lutava, mais do
que tudo, para não tirar sua camisola e possuí-la em minha cama como vinha
desejando desde que o fiz pela última vez.

— Você mentiu, então — Sussurrou triste.


— Menti? Quando?

— Quando disse que me esperaria a vida toda. Lembra-se?

— Aquilo não foi uma promessa... Foi uma brincadeira! Você só tinha nove
anos, como pode se lembrar disso? — Sorri desacreditado.

— Eu disse que se me esperasse crescer eu poderia ser sua namorada. Você


disse que esperaria. Porque não me espera, Valentim? — Analuz tinha
lágrimas nos olhos.

— Porque ninguém pode esperar tanto tempo, Analuz — A segurei pelo


cabelo, trazendo-a para mim. Eu precisava beijá-la, nem que fosse ao menos
um simples beijo — Ninguém!

Analuz me abraçou pelos ombros com ímpeto e força, escorando o corpo no


meu com voracidade. Ela me queria como louca e eu a ela da mesma
maneira, incendiado por dentro e maluco para possuí-la.

Desci os beijos de seus lábios doces para seu pescoço, inebriando-me com o
aroma delicioso que exalava de sua pele clara e macia. As mãos pequenas me
apertavam em sua pele conforme meus beijos arrastavam as alças de sua
camisola para o chão. Senti seu corpo estremecendo ao ficar nua e unir
nossas peles.

Seus delicados seios rosados roçavam meu peito nu. As mãos habilidosas
puxaram minha toalha e cobriram meu membro rígido com delicadeza,
sabendo perfeitamente como me ganhar. Ela não precisava de muito. Contra
ela eu não podia ganhar!

Levei-a para cama em uma passada rápida, postando-me sobre ela para beijar
cada centímetro de seu corpo que tanto me fez falta. Lembrei-me da
camisinha enquanto tomava seus mamilos nos lábios, saboreando-os com
minha língua enquanto ela gemia meu nome baixinho, preocupada em não ser
ouvida. Eu jamais me esqueceria...

Não demorei a penetrá-la, sussurrado ao ouvido dela o quanto a amava e o


quanto me dava prazer com seu corpo. Analuz demonstrava me amar da
mesma forma, mas eu não compreendia seu medo.

— Em meus braços, na cama, é uma amante apaixonada e desesperada para


ser minha, gemendo meu nome como se fosse à última vez — Falei quando
terminamos, saindo da cama nu e ofegante, odiando a mim mesmo por ser
sucumbido — Fora dela, se comporta como se eu fosse apenas um irmão.
Não é capaz de realmente assumir o que sente.

— Valentim, por favor... — Fechou os olhos também nua, segurando a


camisola contra os seios.

— Essa foi à última vez, Analuz — Ela vestiu a camisola com os olhos
baixos — A última vez.

— Você não consegue ficar sem mim. É tão viciado em mim quanto eu e
você!

— Realmente sou viciado em você e jamais neguei, mas tenho sentimentos!


Em nome deles terei de aprender a resistir.

— Eu também tenho sentimentos, Valentim! — Sussurrou triste — Eu


também!

Analuz me deu as costas nervosa, saindo do quarto sem dizer nada mais.
Apertei os olhos e contive a vontade de ir atrás dela. Eu precisava ser forte!
Precisava resistir, do contrário, Analuz jamais aprenderia!
Queria diário,

Fui uma completa idiota!

Valentim tem razão quando diz que o medo é meu maior empecilho e o
verdadeiro vilão de nossa história. Sempre tive medo de decepcionar meus
pais e acabei decepcionando-os de outra maneira, uma ainda mais cruel.

Se não contar sobre meu grande amor, perderei Valentim de qualquer


maneira.

Preciso de coragem, preciso de maturidade e de uma força que não existe em


mim, mas que farei brotar.

Estou disposta a tudo para ter o amor do homem que sempre amei e sempre
irei amar. Mesmo que seja errado.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

Cheguei da aula de idioma, no dia seguinte, disposta a assumir perante meus


pais tudo o que Valentim haveria dito sobre nós. Certamente meus pais já
sabiam de tudo após conversarem com Valentim e nosso relacionamento já
não era um segredo.

Não podia resistir a ele me afastando, muito menos depois de ontem, quando
fizemos amor e Valentim saiu da cama em seguida, desesperado para fugir de
mim e de meu feitiço. Ele queria se ver livre e isso eu jamais permitiria!

Valentim era meu e eu dele. Nada mais importava agora!

No entanto, tudo mudou quando o motorista foi se aproximando de casa e


notamos que várias viaturas da polícia circulavam pelo local, junto a alguns
carros de imprensa e até mesmo policiais federais especializados.

Algo realmente muito grave estava acontecendo!

Desci do carro nervosa, correndo escada acima com a mochila nas costas e o
cabelo loiro desgrenhado batendo em meu rosto aflito e corado. Fui liberada
para entrar junto do motorista e encontrei meus pais, minha tia e meus primos
na sala, todos nervosos e apreensivos.

— Analuz! — Mamãe gritou ao me ver, abrindo os braços para que eu a


abraçasse. Foi o que fiz, indo até ela enquanto procurava Valentim pelo
ambiente — Minha filha! Que bom que está aqui, querida!

— Mãe... O que está acontecendo? — A abracei, segurando-a enquanto


chorava — Pai...

Os olhos azuis do meu pai pareciam mais aflitos do que nunca. Jamais o vi
tão desequilibrado.

— Querida...

— Diga de uma vez, Petrônio! — Tia Alessa vociferou sentada no sofá


despreocupadamente, chacoalhando a perna cruzada — Sequestraram seu
irmão, Analuz. Valentim está na mira de bandidos!

Foi como um tiro certeiro em meu coração.

— O que? — Sussurrei separando-me de mamãe, encarando-a chorar ainda


mais intensamente — Não, não pode ser! — Sorri sem humor — Que
brincadeira mais idiota, Valentim sempre está protegido com seguranças e...

— É real, filha — Papai se aproximou e tocou meus ombros — Um dos


seguranças estava infiltrado no crime de sequestro. Foi comprado pelos
marginais, seduzido por dinheiro, por isso aconteceu. Falhamos, querida.
Valentim e eu falhamos com os seguranças da família e agora seu irmão está
pagando!

— Todos vocês, não é? O valor do resgate é milionário! — Philip comentou


sentado ao lado da mãe.

— Vocês dois — Apontei para tia Alessa e Philip com sangue nos olhos,
nervosa por me dar conta da gravidade da situação — Saiam daqui! Este
assunto somente diz respeito a minha mãe, meu pai e eu! Já estou farta de
tanto veneno e indiretas! Vocês não querem o bem de minha família! Se
quisesse, teria empatia com o momento que estamos vivendo, com minha
mãe doente e meu pai se culpando! Os dois, FORA!

Gritei nervosa, apontando para a porta da casa. Meu peito subia e descia com
a respiração ofegante.

— Como se atreve a falar assim com sua tia, menina? — Alessa se colocou
de pé.

— Ela tem toda razão! — Meu pai vociferou colocando-se frente a mim —
Você e Philip já passaram da conta e não são mais bem vindos nesta casa!

— Violeta pode ficar se quiser, mas vocês... — Apontei novamente para a


porta central — Peguem tudo e sumam! Já cansei de tantos disparates e
minha mãe que me perdoe!

— Você tem razão, querida... — Mamãe comentou cansada — Alessa nunca


quis o bem de minha família e isso ficou claro agora. Sinto muito, irmã, mas
você terá que ir. Meus filhos são minha prioridade!

— Então deveria se atentar mais ao que se passa entre seus filhos, querida
irmã! — Alessa comentou nervosa, passando por mim e me encarando de
perto — Principalmente no que diz respeito a certas... Liberdades!

Philip e Alessa subiram e me sentei ao lado de Violeta, que me abraçou de


lado.

— Vai ficar tudo bem, prima. Desculpe-me por minha mãe e...

— Eu não posso perdê-lo, não posso! O que farei sem ele, Vi? O que vai ser
de mim?

O choro me dominou enquanto papai conversava com a polícia e mamãe me


observava abraçava a Violeta, totalmente descontrolada. Valentim era toda
minha vida e naquele momento me dei conta de que nada mais importava,
nada mais tinha valor ou sentido se não fosse com ele.

Apenas esperava que ainda tivéssemos tempo... Tempo para que eu me


redimisse. Tempo para viver nosso intenso amor da maneira como o mesmo
merecia ser vivido!
Capítulo Treze

Papai falava ao telefone com os sequestradores junto a oficiais da polícia


Federal no escritório. Na sala, a mamãe segurava um rosário de madeira entre
os dedos e orava baixinho em Russo envolta a um xale azul.

Violeta a acompanhava, orando também em Russo, uma vez que eu era


incapaz de me mover sentada um pouco distante delas.

Meu rosto era um retrato vivo do meu desespero. Do mesmo jeito que
cheguei, permaneci. Há horas Valentim estava nas mãos daqueles homens e a
notícia rodava o país, mostrando em todos os noticiários.

— Menina — Eva me tocou no ombro, também abalada e de olhos inchados.


A velha senhora parecia ter chorado por horas, assim como todos ali
presentes — Você precisa comer algo, faz quase doze horas que não sei dessa
poltrona.

— Não tenho fome, Eva — Sussurrei sem alterar a expressão, apenas


derramando lágrimas silenciosas cada vez que me movia demais —
Obrigado.

— Seu irmão não ia gostar de vê-la assim, menina — Sentou-se ao meu lado
e abraçou-me pelos ombros. Eu suspirei, secando as lágrimas com as costas
da mão trêmula — A coisa mais importante para Valentim é você, querida.
Imagina quando chegar por aquela porta e encontrá-la em estado tão
deplorável? Você parece uma morta-viva!

— Você acha que ele volta, Eva? — Sussurrei com o nó na garganta


atrapalhando a fala — Acha que Valentim vai voltar para nós?

— Claro que volta, querida! — Voltei a chorar e ela me abraçou ainda mais
forte. Mamãe e Violeta rezavam, mas prestavam atenção também — Seu
irmão é um touro saudável e inteligente. Não vai acontecer nada com ele,
você vai ver!

— Ele... Ele não é meu irmão, Eva — Garanti separando-me dela, que ainda
me abraçava levemente pelo ombro — Valentim é muito mais do que isso.
Sempre foi — Derramei ainda mais lágrimas — Valentim é meu tudo... É
meu protetor, meu melhor amigo, incentivador... Amante... — Suspirei —
Meu grande amor.

— O que disse? — Eva questionou curiosa.

Violeta e mamãe também me encararam, parando de rezar. Para Vi não era


uma novidade, mas mamãe parecia ter levado um susto. Papai entrou na sala,
mas sequer notei sua presença junto à de alguns agentes, que passaram reto
pela sala.

— O que ouviu — Voltei a falar mirando os olhos escuros de Eva, minha fiel
babá — Valentim e eu não somos irmãos, somos amantes. Namorados. Nos
gostamos. Sempre estivemos juntos, Eva. Por toda a vida, mesmo que apenas
há pouco tempo tenhamos de fato assumido isso para nós mesmos.

— O que está dizendo, Analuz? — Mamãe questionou atônita. Violeta


segurou a mão dela em apoio — Você e Valentim...
— Sim! — Admiti sentindo o peito finalmente se esvaindo com aquele
segredo — Eu e Valentim não somos irmãos e nunca fomos. Sempre nos
amamos... Ele sempre me amou! — Segui chorando — Eu, como a mimada e
imatura que sou, nunca soube valorizar esse amor que construí com base no
medo! Medo de vocês, medo de todos e do que iam pensar... — Tomei fôlego
— Agora não o tenho... Agora posso perdê-lo para sempre e nada mais me
importa! Agora vejo que o medo jamais me levaria a qualquer lugar e que a
única coisa que deveria ter me importado era Valentim e nosso amor. Nada
mais... Nada mais!

Eva me abraçou pelos ombros novamente. Obviamente estava chocada, mas


parecia ainda mais preocupada com meu estado de saúde.

— Então a sua possível gravidez está explicada — Eva comentou olhando


para meus pais, que se encaravam desconcertados e chocados.

— Sim — Ergui o rosto e sequei as lágrimas com as mãos trêmulas — Se eu


estivesse grávida seria de Valentim, não tinha como ser de nenhum outro.

Admiti também, sentindo o alívio me preenchendo enquanto colocava tudo


para fora.

— Analuz — Mamãe sussurrou quase sem voz. Violeta a segurava em apoio


— Tem ideia do que está nos dizendo?

— Sinto muito por decepcioná-los — Sussurrei de volta, encarando os olhos


claros de minha mãe com pesar. Seu cabelo loiro e desgrenhado se agarrava à
face úmida, exatamente como o meu — Sinto muito mais por ter tido medo
de dizer antes. Sinto muito, muito mais, por ter sido covarde quando
Valentim me pediu para assumirmos. Quando me pediu para confiar nele e
segurar sua mão, que me protegeria. Nada mais importa agora... Fui uma tola
e deixei a imaturidade me cegar. Deixei a birra ser maior do que a verdade. O
medo... Me fez perder meu grande amor!

— Nada está perdido, menina! — Eva me abraçou pelo ombro novamente,


chacoalhando-me — Seu ir... Quero dizer, Valentim vai voltar para nós! Vai
ficar tudo bem!

Papai tinha o semblante de quem acabou de receber um tiro no escuro.


Mamãe parecia chocada, totalmente alarmada diante de um fato terrível.
Violeta sentia pena de mim.

— Vocês não vão dizer nada?

Papai engoliu em seco, apoiando as mãos na cintura.

— Por hora tudo o que quero é ter meu filho de volta — Respondeu convicto,
mas ainda baqueado — Depois que essa tempestade passar conversaremos
sobre isso — Mamãe largou o rosário no sofá e deixou as mãos caírem ao
lado do corpo como se não tivesse reação. Encarava-me atônita — Sobe para
seu quarto, Analuz. É o melhor — Papai me encarava — Tome um banho e
se acalme. Em breve tudo isso terminará.

Concordei com um aceno breve, ficando de pé com a ajuda de Eva.

Senti o repúdio nos olhos de mamãe e o pesar nos de papai. Senti como se o
mundo abrisse debaixo de mim, mas nada importava. Eu apenas queria ter
meu Valentim de volta!

— Sabe que sempre reparei que Valentim te olhava diferente e te dava


demasiada atenção e presentes, mas achava que era coisa da minha cachola
velha — Eva comentou penteando meu cabelo depois que tomei banho,
sentada em minha cama totalmente transtornada.
— Será que meus pais reagiriam da mesma maneira se não fosse nessa
circunstância, com Valentim em perigo? — Questionei monótona.

— É uma surpresa muito grande, menina, não pode culpá-los! Mas tão pouco
é pecado. Vocês não têm o mesmo sangue, não são irmãos biológicos, então
pecado não é! — Me virei para olhá-la.

— Você tem razão... — Sussurrei como se algo muito importante acabasse de


ser dito — Sempre ouvi que Valentim era meu irmão, pois foi assim que
fomos criados, e confesso que às vezes esquecia de que de fato não somos.
Meus pais enraizaram isso de tal forma em nossos corações que se tornou um
pecado inconsciente, mesmo que não fosse.

— Talvez por isso você tenha demorado tanto para assumir seus sentimentos,
menina. Por esse parentesco que habitava em seu coração, mas não era real
— Eva tinha razão, mais do que qualquer coisa — Seus pais podem e vão
ficar chocados de início, uma vez que vocês são mesmo filhos deles, você
biológica e Valentim de criação, mas isso vai passar, querida. Uma hora vai
passar, pois pecado não é!

Sorri, pela primeira vez em dias!

Abracei Eva carinhosamente, compreendendo o que sempre foi um grande


mistério. Valentim não era qualquer homem, era meu irmão de criação. Meus
confusos sentimentos se deviam ao fato, mas agora era tudo muito claro.

A única coisa que me importava era tê-lo de volta!


Já era noite quando a polícia Federal retornou a nossa casa com papai.

Parei no topo da escada enquanto ouvia meus pais conversando em sussurros


e se abraçando longamente. Mamãe secava as lágrimas com as costas das
mãos, mas parecia preocupada e apreensiva. Ambos seguiram para o
escritório e fiz o mesmo, seguindo-os sem ser vista.

Os dois se alarmaram quando me viram na porta segurando quatro cadernos


cor-de-rosa, encarando-me juntamente quando entrei em passos lentos.

— Analuz... — Papai disse baixinho, surpreso ao me ver — Como se sente?


Pensei que estivesse dormindo.

— Não consigo pregar os olhos, você sabe — Respondi caminhando até a


beira da mesa. Ambos estavam parados atrás dela.

— O que é isso? — Mamãe apontou para os cadernos. Despejei todos sobre a


mesa e ambos analisaram.

— Meus diários — Mamãe pegou um deles em mãos e observou mais de


perto — Tudo que escrevi de mais íntimo desde os doze anos.

— Porque trouxe isso, filha? — Papai questionou sem sequer olhar,


preocupado, mas com outra situação.

— Para que leiam quando tiverem tempo. Somente assim serão capazes de
compreender tudo o que ouviram de meus lábios mais cedo sobre Valentim e
eu.

Mamãe parecia realmente interessada, mas papai sequer deu bola. Concordou
com um aceno enquanto ela segurava um dos diários contra o peito. Não me
importei que lessem meus mais profundos segredos, nada mais me
importava!

— Analuz, isso que nos contou é muito profundo e grave — Mamãe disse
preocupada — Realmente não sei o que dizer... — Encolheu os ombros.

— Proshcheniye, mama — Seus olhos azuis se banharam em lágrimas


quando me ouviu falar. Eu dificilmente falava em Russo, algo que mamãe
adorava e fazia questão, mas naquele momento não consegui expressar de
outra maneira. Pedi “perdão” falando diretamente com seu coração, com o
que nos unia — Me perdoe, mamãe. Eu jamais quis decepcioná-la, mas meu
amor é real.

— Você não viu no noticiário? — Papai questionou se aproximando um


pouco, quando nenhuma de nós foi capaz de proferir qualquer palavra.
Neguei com certo receio — Valentim foi liberado!

Demorei um pouco para compreender e realmente me dar conta do fato.


Levei as mãos aos lábios.

— Onde ele está? Porque não está aqui?

Papai se aproximou de mim em passos lentos, segurando meu ombro com


carinho.

— Está internado no hospital, filha. Infelizmente levou um tiro após ser


liberado, na troca de tiros entre os criminosos e os policiais — Papai me
segurou quando fraquejei — Mas ficará bem, querida. Temos que ter fé!
Abracei meu pai com força, aliviada por Valentim estar bem, mas
desesperada por saber que estava ferido. Senti o carinho de meu pai, que de
fato não parecia em nada zangado comigo ou receoso como mamãe.

— Quero vê-lo agora mesmo, pai! Preciso vê-lo! — Implorei ainda abraçada
a ele.

— Nós iremos, querida. Nós iremos.

Abri os olhos diante de uma grande confusão e senti o braço arder, mas não
tanto quanto o coração.

— Sobrevivi? — Foi à única coisa que me ocorreu sussurrar aos médicos que
me avaliavam.

— Felizmente, senhor Vilanova. A bala atingiu apenas o ombro e de raspão


na cabeça. Removemos o projétil do ombro em cirurgia bem sucedida e na
cabeça apenas fizemos um curativo. O senhor está bem agora.

Pisquei absorvendo a informação, recostando-me na cama e apertando os


olhos ainda mais forte.

— Seus pais e sua irmã estão lá fora aguardando o senhor acordar — A


enfermeira seguiu falando — Posso deixá-los entrar?

— Analuz não é minha irmã — Retifiquei calmamente — Muito obrigado


moça, pode deixá-los entrar sim, por favor.

— Com licença.

Suspirei pela dor no braço, analisando o soro com medicamento que pingava
em minha veia. Aquela linha tênue também significava o quão próximo
estive da morte. Nas mãos daqueles homens pensei que morreria, mas estive
grato todo o tempo porque ouvi claramente dos lábios de um deles que o
sequestro estava programado para Analuz — a irmãzinha caçula do grande
CEO — não para mim, propriamente dito.

Por azar — eu via como sorte — Analuz saiu atrasada e acabei sendo pego na
emboscada no lugar dela.

Mesmo que morresse ali, tudo valeria a pena. Eu seria capaz de dar minha
vida e muito mais por meu grande e único amor.

A porta se abriu e a vi novamente depois de todo aquele pesadelo! Analuz


entrou correndo na frente, voando para meus braços com lágrimas nos olhos e
na bonita face. Seus olhos azuis brilhavam em alegria. Os olhos azuis que me
encantavam e tomavam meus pensamentos a cada minuto, a cada instante...

Abraçou-me sem delongas, segurando meu rosto e beijando-me nos lábios


sem hesitar, desesperada para me sentir. Não consegui abraçá-la com um dos
braços na medicação e o outro imóvel, mas afundei o rosto em seu cabelo
loiro inalando o doce aroma de minha amada. Estava certo de que ali era o
paraíso!

— Tive tanto medo de não voltar a te ver! — Sussurrou segurando minha


face muito perto, eu sentia seu hálito nos lábios — Tive tanto medo de perdê-
lo para sempre... De não viver nosso amor!

Colou a testa na minha com carinho.

— Eu só pensava em você o tempo todo... O tempo todo — Confessei


aliviado.

— Te amo, Valentim. Te amo, sempre te amei e sempre vou amar! Me


perdoe por ter sido covarde e imatura, me perdoe por não ter assumido nossa
história quando me pediu!

— Não tenho que perdoá-la, meu amor. Sempre te compreendi.

Finalmente me dei conta de que nossos pais também estavam ali, assistindo
toda a cena. Travei quando constatei o fato, encarando-os com surpresa.
Olhei Analuz, que seguia da mesma maneira, sem fazer qualquer esforço para
esconder-se.

— Meu filho! — Yekaterina se aproximou e me beijou na testa, abraçando-


me contra o peito — Como é bom tê-lo de volta!

Petrônio bateu em meu ombro. Ele sabia o que tinha acontecido, sabia
perfeitamente que o sequestro era para Analuz, não para mim. Aquele
agradecimento era por ter me arriscado pela filha dele, eu estava seguro.

— É muito bom revê-los, é muito bom estar de volta! — Comentei sorrindo e


beijando a mão de Yekaterina.

— Já contei tudo — Analuz sussurrou ainda sentada na maca junto a mim.

— Contou? — Questionei preocupado, encarando meus pais adotivos.


Petrônio parecia sereno e Yekaterina um pouco desconfortável — Imagino
que precisem de uma explicação...

— Acha que é o momento correto, filho? — Yekaterina questionou —


Podemos conversar sobre isso depois e...

— Não, mãe — Analuz segurava minha mão com força, mostrando que
estávamos juntos nisso — Durante todo o tempo que passei sob a mira
daqueles criminosos pensei que se pudesse ter outra chance, a primeira coisa
que faria seria explicar sobre Analuz e eu para vocês.

— Se Valentim não disse nada, a culpa foi minha! — Analuz se pronunciou


— Fui eu quem impediu que ele falasse porque temia a reação de vocês...

— No dia anterior ao sequestro, quando cheguei à cidade e descobri da


suposta gravidez, tentei falar, mas Petrônio estava bêbado e Yekaterina com
muitas dores — Ambos se entreolharam, recordando — Esperei até o dia
seguinte, mas infelizmente acabei sequestrado.

— Tinha medo de nós, Analuz? — Mamãe sussurrou confusa.

— Sim... Tinha medo de decepcioná-los, mas acabei falhando, de todas as


maneiras.

— Sei que somos irmãos de criação e sou imensamente grato por tudo que
fizeram por mim na vida, mas não posso seguir mentindo. Sou apaixonado
por Analuz e a amo como um homem ama uma mulher. Pretendo assumir
todas as responsabilidades e, futuramente, construir uma família. Não existe
outra mulher para mim e, em tudo isso, apenas lamento o rumo que as coisas
tomaram. Não queria estar dizendo isso a vocês em uma maca de hospital,
mas em uma situação mais agradável e respeitosa. Vocês são as pessoas mais
importantes da minha vida e me sinto na obrigação de dizer o que sinto e me
desculpar.
— O homem que arriscou a vida para salvar a de minha filha não precisa se
desculpar, Valentim — Petrônio disse convicto. Tinha as mãos na cintura e
uma expressão séria. Yekaterina e Analuz pareciam confusas — Os federais
me disseram que o sequestro era para Analuz, não para você. Disseram que
você se colocou na mira quando pensaram em te usar para atraí-la e se
recusou a compactuar, correndo o risco de morrer para não comprometê-la.
Apenas isso, somado a sua conduta da vida toda como um bom filho e bom
homem, já me prova que realmente é um homem mais do que aceitável para
estar na vida dela.

Analuz tinha os olhos azuis maiores do que o rosto ao me encarar.

— Isso é verdade? — Questionou em um sussurro — Você... Se arriscou por


mim?

— Eu sempre disse que faria tudo por você — Toquei sua mão com ainda
mais veneração — Daria minha vida, se fosse necessário.

Analuz, emocionada, me abraçou com carinho e gratidão, beijando-me com


ainda mais amor que o normal.

— Confesso que para mim tudo é muito complicado, pois realmente vejo
Valentim como um filho, mas Eva tem razão quando diz que vocês não tem
nenhum laço de sangue e não se trata de um verdadeiro pecado — Valentim e
eu trocamos um olhar engraçado — Será confuso explicar a sociedade,
apenas. Sempre apresentei ambos como meus filhos, Valentim tem Petrônio
como pai de registro e agora...

— Acredito que possamos superar isso em nome de nossa família. Em nome


da felicidade de nossos filhos, Yekaterina — Petrônio a envolveu pelos
ombros — Você esteve muito próxima da morte e pôde compreender o quão
rápida e frágil a vida é. O que realmente importa em tudo isso, meu amor?

Yekaterina nos encarou com um sorriso emocionado.

— O amor, querido — Disse ao marido, que a beijou na testa — O que


importa é o amor! E se Analuz deseja de fato misturar nosso sangue Russo
com as origens Brasileiras de Valentim, em nada me oponho! Sempre fui
apaixonada por esse menino, que agora será ainda mais meu filho!

Jamais vi Analuz tão feliz e aliviada quanto estava ao abraçar a mãe, que a
acolheu em um abraço terno e igualmente aliviado.

— Spasibo, mama! — Analuz agradeceu com lágrimas nos olhos azuis. As


duas se encaravam com alegria — Ya Lyublyu vas!

Eu sabia, durante anos vivendo com uma mãe adotiva Russa, o que aquelas
palavras significavam. Te amo.

— Lyublyu vas! Também te amo, querida! Sinto-me aliviada por saber que
minha filha não é uma descabeçada... Que seu filho sim teria um bom pai! —
Yekaterina reafirmou.

— Mãe! — Analuz disse de maneira engraçada, fazendo-nos rir — Não


pretendo ter filhos tão cedo, não é, Valentim?

— Claro que não... Você precisa se formar e eu... — Suspirei, abraçando-a


pelos ombros — Ainda tenho muito trabalho!

— Ninguém mandou ser um CEO tão requisitado — Brincou. A beijei na


testa.

— E você, filha, passou de irmã do CEO para futura esposa, eu acho? —


Yekaterina arriscou.
— Primeira e única! — Beijei Analuz, que sorria mais do que seus lábios
podiam comportar.

Não existia outra mulher em minha vida... Não havia no mundo nenhuma
outra mulher para mim que não fosse à única que um dia cheguei a pensar
que jamais poderia tocar.

Minha Analuz já não era minha irmã. Já não era proibida para mim!
EPÍLOGO

Exausto após um longo dia de trabalho, fechei o notebook no escritório e


alonguei o pescoço para a esquerda.

Era um daqueles dias em que o celular não parava de tocar e as reuniões


pareciam intermináveis. Era meu primeiro dia de trabalho após os dias no
hospital e alguns de molho em casa e, devido a minha ausência momentânea,
tudo parecia um caos no grupo Ruiz-Vilanova.

Quando menos esperei, um envelope foi lançado a minha frente na mesa.


Ergui os olhos e encontrei Petrônio ali, parado frente a mim.

— O que é isso Petrônio? — Peguei o envelope branco e ele sentou na


cadeira de maneira despreocupada.

— Petrônio? — Questionou um pouco receoso — Não sou mais seu pai,


Valentim?

Nos encaramos através do espaço e me dei conta de que ali estava a pessoa
que mais me conhecia em toda a vida. O homem que me viu nascer e me
criou como um filho durante quase trinta anos. Assenti perante seus olhos
azuis, envergonhado.
— Não sei como se sente em relação a mim agora, Petrônio. Me sinto em
divida com você — Petrônio apenas apontou o envelope.

— Abra! — Pediu com um pequeno sorriso — É um presente, meu filho.


Depois falamos sobre o resto — Curioso, abri o envelope encarando Petrônio.
Era a primeira vez que ficávamos totalmente sozinhos após as revelações,
sem ninguém entre nossa conversa. Tomei nas mãos o conteúdo do envelope
e li atentamente — Trata-se de um documento que garante que você deixará
de ser meu filho perante a lei — Ergui meus olhos para ele — A partir de
hoje, você não tem mais o nome do pai na certidão e oficialmente.

Separei os lábios diante da afirmação. Jamais esperei uma atitude daquela


vinda de Petrônio e tudo me deixou demasiadamente confuso. Sequer sabia o
que dizer.

— Petrônio...

— A partir de hoje você e Analuz não são mais irmãos, Valentim — Li


novamente o documento, sorrindo de canto. Apenas o nome de minha mãe
constaria agora em meus documentos — Pode parecer uma crueldade
destituir em filho, mas fiz porque sei que é o correto. Assim você e Analuz
poderão se casar, formar uma família e terem os filhos que desejarem sem
qualquer impedimento legal.

Aos poucos me dei conta do que aquilo significava. Petrônio não me odiava,
ao contrário! Aquele documento era a prova de que realmente acreditava em
meu amor por Analuz, a filha que tinha seu sangue. Aquele documento
significava que confiava em mim como um filho, o que eu sempre seria para
ele.

— Obrigado Petrônio! — Me coloquei de pé para abraçá-lo, sentindo sua


retribuição muito calorosa — Obrigado pai! Jamais quis magoá-lo ou
decepcioná-lo! Você é a pessoa mais inspiradora de toda minha vida e se não
fosse por você... — Fiz um sinal negativo — Me perdoe se te decepcionei!

Petrônio segurou minha face com carinho e bateu em minha bochecha


levemente.

— Conheço seu caráter, filho. Fui eu quem forjou — Sorriu orgulhoso — Sei
que fará Analuz feliz e será o melhor homem para ela. Não tenho dúvidas
disso...

— Farei o possível para honrar sua confiança e o amor que sinto por Analuz.
Eu prometo!

— É o mesmo amor que senti por Yolanda um dia e que jamais morreu em
mim, filho. Vejo em seus olhos que seu amor por minha filha é o mesmo que
sempre tive por sua mãe.

— Eu sei, Petrônio — Sorri emocionado.

— Yolanda estaria orgulhosa do homem que você se tornou. E nunca mais


me chame de Petrônio. Sou seu pai e sempre serei, filho, mesmo que esse
documento diga o contrário! Em meu coração você é meu filho e sempre
será! Agora mais do que nunca!

— E você sempre será meu pai, Petrônio Vilanova! — Nos abraçamos


novamente, emocionados com o feito — Agora mais do que nunca!
Naquele lugar, sob a árvore, me sentei em uma manhã qualquer após
conseguir colocar as ideias no lugar.

Valentim estava saudável!

Meus pais aceitaram nosso relacionamento!

Consegui entrar na faculdade de literatura!

Tudo, absolutamente tudo, estava no lugar agora. Parecia mentira algo ser tão
incrível.

Não me dei conta quando Valentim sentou ao meu lado ali, abraçando-me
contra o peito forte por trás e beijando-me o pescoço. Fechei os olhos e me
aconcheguei em seus braços, aproveitando a doce sensação de ser amada pelo
homem que sempre desejei. Por toda a vida.

— Se lembra de uma vez... Acho que você tinha uns oito anos e era somente
uma menininha magricela e cabelos loiros, quase brancos, e olhos azuis
curiosos — Valentim dizia com carinho — Lembro que eu estava aqui,
exatamente neste lugar, sentado ali no balanço, e você me perguntou o
porquê de eu estar tão triste.

Sorri apaixonada, recordando-me.


— Você disse que sua namorada tinha te deixado... — Sussurrei.

— Minha primeira namorada — Afirmou — Foi um baque para mim e eu me


sentia o pior dos garotos — Rimos juntos — Você usava um vestido azul,
aquele que era seu favorito, e uma tiara no cabelo. Você se lembra do que me
disse?

Nos olhamos e concordei, deitando-me novamente contra o peito dele.

— Disse que você não precisava chorar, porque se me esperasse crescer eu


seria sua namorada. Você sorriu e disse que eu não deveria pensar naquilo,
mas insisti e você disse que éramos irmãos.

— Você disse que não éramos irmãos de verdade — Valentim parecia


surpreso — Foi a primeira vez que me disse aquilo, pois era sempre você
quem me chamava de irmão. Desde então, nunca mais chamou.

— Você jurou de dedinho que me esperaria o tempo que fosse necessário...


— Sussurrei apaixonada.

— Naquela época levei tudo como uma brincadeira, é claro — Tocou minha
bochecha com carinho — Naquela época jamais pensei que fosse virar uma
realidade!

Nos separamos e Valentim olhou para o diário ao meu lado. A capa rosa-
claro. Meu nome escrito com letras coladas de glitter azul e rosa. Uma
pequena bandeira da Rússia em cima e uma pequena do Brasil em baixo.
Peguei o diário no colo, mostrando a ele mais de perto.

— Escrevo sobre você aqui desde os doze anos — Confessei como um


segredo. Valentim sorriu abertamente, pedindo o diário. Coloquei em sua
mão. Seu olhar era curioso.
— Li uma vez. Desde então, jamais me atrevi a fazê-lo novamente.

— Abra. Leia — Incentivei com um aceno — É sobre você... É sobre nós.

Valentim pensou um pouco, mas a curiosidade o venceu. Abriu em uma


página aleatória, lendo em voz alta.

Querido diário,

Você é o único que sabe meus segredos. É o único que sabe que sou
apaixonada pelo meu irmão de criação e tem em suas páginas gravados
segredos proibidos!

É o único para quem posso confessar que se Valentim morrer naquele


cativeiro, minha vida toda acabará com a dele. Não sou capaz de viver sem
ele, muito menos sem seu amor que covardemente deixei de desfrutar.

Espero que ele me perdoe. Espero que ele volte e possa saber o quanto o
amo. O quanto meu amor também é imensurável!

Por favor.

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova.

— Eu sempre soube o tamanho de seu amor, Analuz.

— Mas fui uma tola e... — Valentim pousou um dedo em meus lábios e me
encarou com seus intensos olhos cor de café. Gelei com sua proximidade,
estremecendo contra seu corpo forte e másculo.
— Eu não prometi que esperaria o tempo que fosse necessário? —
Concordei, acenando — Pois então. Eu esperei, Analuz. Esperei!

Sorrindo, Valentim me beijou e o abracei com ainda mais paixão e força. Sua
promessa era uma dívida cumprida, assim como acontece com todo grande
CEO.

Queria diário,

Há anos não escrevo nada por aqui e com isso me dou conta de que há anos
sou imensamente realizada, sem ter algo para reclamar em suas páginas tão
maltratadas por minha história de amor impossível no passado.

Hoje completo trinta anos e resolvi tirar um tempo para finalizar essa
história, sentada sob a árvore onde tudo começou... Onde Valentim me
deixou um dia.

Depois que Valentim foi salvo, finalmente vivemos intensamente nosso amor
sem nos esconder e livres de qualquer amarra. Papai e mamãe
compreenderam e com o tempo tudo se normalizou.

Violeta e Sebastian seguiram em frente e hoje são pais de duas lindas


crianças. Tia Alessa foi viver com Philip, que se casou por interesse com a
filha de um milionário.

Mamãe, a doce e amável Yekaterina Petrova Vilanova, faleceu cinco anos


depois do maldito câncer, mas se foi feliz e completa, sabendo que deixou os
dois filhos contemplados pela felicidade. Não há um dia em que não sinta
falta dela.
Papai se aposentou das empresas após o ocorrido, mas seguia intermediando
em assuntos necessários quando Valentim — agora meu marido —
precisava. O grupo têxtil Ruiz-Vilanova seguia crescendo e a fortuna da
família se expandia, orgulhando a falecida mãe de meu marido, a saudosa
Yolanda. Já me peguei pensando várias vezes o que teria sido de toda essa
história, se não fosse essa inteligente e perspicaz mulher que sequer esteve
viva para participar, mas deixou imenso legado. Mulheres geniais e
inspiradoras, esse era meu norte. Era o que eu queria ser, muito além da
esposa do CEO.

Formei-me em literatura, mudando completamente os planos. Fiz cursos


complementares, aprofundei-me nos métodos de escrita e passei a fazer o
que mais amo... Escrever! Conquistei minha coluna pessoal no jornal mais
famoso da cidade e também dou opiniões sobre negócios — uma vez que vivo
desde pequena no meio empreendedor.

Somente aos vinte e seis, depois de formada e realizada, Valentim me pediu


em casamento, cumprindo assim a promessa de me deixar voar. Sempre
esteve presente como um namorado exemplar e me apoiou em tudo.

Nos casamos na casa de campo de papai e tudo foi incrível, como sonhamos.

Aos vinte e oito descobri a gravidez da nossa primeira filha. Nossa amada e
esperada durante toda uma vida, Yolanda Yekaterina Ruiz Vilanova. Uma
linda e perspicaz garotinha com sangue Russo e Brasileiro, forte como as
avós e inteligente como sempre desejei.

Talvez não exista nada que o tempo e o amor não possam consertar, por isso,
querido diário, depois de muito descobri que não era um pecado... Jamais
foi! Você, querido diário, não traz relatos de um pecado, mas sim de um
amor. Um grande e verdadeiro amor.
Meu grande segredo agora é uma verdade e espero que todos possam
encontrar um grande amor um dia.

Com carinho e gratidão,

Ass. Analuz Anastácia Vilanova Petrova

FIM

Obrigado por ler o livro até o final!


Espero que tenham gostado da história de amor proibido entre Valentim &
Analuz e convido a ler todos meus ebooks publicados na Amazon Kindle!
Para mais informações sobre o trabalho da autora, siga no instagram
@autoraizabellamancini

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Notas da Autora

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