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Capa: LA Capas
Foto: Adobe Stock
Revisão: Walter Bezerra
Diagramação Digital: Carla Arine
ISBN: 978-65-00-52888-6 .
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos
descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com
nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
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1ª Edição
2022
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— Mademoiselle Bárbara?
Estou muito distraída, focada na tela à minha frente para que um grupo de
50 pessoas venha para uma renovação de votos na Fontaine des Mers, no fim do
próximo mês.
— Fale, Simon — respondo para meu gerente e braço direito, tirando os
olhos da tela.
— Podemos ir? — pergunta e só então olho para o relógio e percebo a
hora.
— Deus do céu! Está muito tarde.
Então, dispenso-os também, saio e fecho a agência.
Vou para o meu apartamento, tomo um banho relaxante e caio na cama.
Bem que seria uma boa encontrar um velho da lancha para me dar umas férias
dessa rotina de trabalho com mais trabalho que é a minha vida. Não é reclamação,
eu amo trabalhar com turismo, mas bem que eu queria um cara gato na minha vida
para pagar minhas contas, me fazer gozar entre quatro paredes e, ainda por cima,
dizer que me ama. Será que seria pedir demais?
— Eu tenho que parar de ler romances — falo comigo mesma, rolando nos
cobertores.
Pensando nos meus relacionamentos, nenhum deles tinham renda para
realizar o meu desejo. Desde o primeiro até o mais recente, fica provado que tenho
dedo para pobre. Se for elencar, Agenor, que era dono de um mercado de
vizinhança, foi o mais endinheirado com quem fiquei, mas era tão... apressado na
cama que foi decepcionante. Um dos que pagava a conta nos restaurantes e até de
surpresa era Francisco, entretanto esse dava dor de cabeça breve. O homem
tomava uma cerveja e se tornava o maior ciumento de todos os tempos. Carol foi a
primeira a me dizer que tinha algo errado com ele. Como ainda estávamos
começando, foi fácil dizer que não estava rolando e o dispensei.
Aquele que quase bateu todas as minhas especificações foi uma das minhas
maiores decepções. O último com quem me relacionei quando estava no Brasil:
Brian Wilson. Um americano que é melhor amigo do marido da minha amiga. Ele
tinha quase tudo, pegada com gosto, beijos quentes, bom de cama, se dizia
apaixonado por mim... Só faltava dinheiro e uma grande empresa para ser o CEO
de um livro.
Como me entreguei a esse homem! Foi tudo tão rápido e intenso que não
vi as mentiras na minha cara. Por isso, sempre falo quando penso nesse assunto
“Fica de aprendizado”.
Trim Trim
Estico a mão pelo colchão e alcanço o telefone. Vejo o nome de Carolina e
atendo à videochamada.
— Que cara é essa, Babis? Não dormiu? — pergunta ela.
— Estava quase.
— Eu sempre me enrolo com fuso horário.
— Mais cinco horas aqui — lembro-a pela quinta vez, eu acho.
— Desculpe, mas eu precisava te falar uma coisa.
— Fala — peço.
A vejo sorrir antes de começar.
— Lembra daquela inscrição de sócios com o Arnon Miller?
Imediatamente me sento, alerta.
— Claro que sim. O “Sócios pelo mundo”. Amiga, o cara é o mestre em
turismo, qualquer empresário gostaria de fundar uma empresa com ele. Em
qualquer lugar do mundo. Se Arnon fala que o lugar é bom, o povo compra
passeios para conhecer.
— Está sabendo que começaram as convocações?
No mesmo instante, me sento na cama e pego meu notebook.
— Como assim, Carol?
Ela vai explicando que Samuel foi a uma conferência em São Paulo e que
comentaram sobre a expansão da fundação de Arnon Miller no mundo, bem como
falaram que iriam selecionar um grupo de 30 pessoas. A convocação já tinha
começado selecionando um nome por dia.
— Amiga, no Instagram da fundação estão falando os nomes dos
selecionados.
Vejo que já estão no número 28 e que só faltam dois nomes para aparecer.
— Pode ser que não saia o meu nome...
— Eu acho que sai, sim. Você é uma ótima empresária e tem um negócio
próspero. Tenho quase certeza de que seu nome sai antes de fechar.
Eu rio.
— Bem que eu queria ganhar esse sócio e o capital que vem junto. Eu
poderia fazer uma expansão maravilhosa, mas... — Minha voz vai morrendo.
— Babis, não faz isso contigo. — ela me repreende — Sonhar faz parte da
vida. Sei algumas coisas não deram certo, mas não significa que você deve se
fechar para o mundo. Já viu seus rendimentos deste ano? Estão cada vez melhores.
— Estão assim porque tive a sua ajuda — lembro.
— Eu sei, amiga. Mas o crédito na França é seu. Nunca se esqueça disso.
— Ela suspira. — Quer saber? Se esse tal de Arnon te chamar ou não, eu tenho
certeza de que vai conseguir expandir a agência no próximo ano.
Sorrio para o telefone. Só Carolina para ser assim, decidida e
supercompetente em tudo. Até nas amizades. Depois, trocamos de assunto e
passamos a falar dos filhos dela, David e Rose, que estão cada vez mais lindos. A
caçula está com um ano e é uma fofura. David está com quase três anos e se acha
o homenzinho da casa. Eles já vieram aqui e, sempre que posso, fico mimando os
dois com presentes, carinhos e beijinhos.
Ao fim, falamos das novidades e ela sempre me pergunta dos meus
relacionamentos. Novamente digo que não estou tendo nada sério com ninguém, o
que é um fato, mas falar que não peguei alguns franceses nesse período é mentira.
Assim, encerramos a chamada e volto para a cama tentando dormir.
Falando a verdade, bem que eu queria ter um relacionamento sério, mas
quem disse que consigo? Não é que os homens sumiram do meu radar, mas todas
as vezes que estou na cama com um desses me lembro de Brian. Aquele gringo
que é tão lindo quanto mentiroso. Até queria me entregar, namorar de verdade, me
apaixonar, casar e ter filhos tão fofos como os da minha amiga. Só que,
infelizmente, acredito que essa vida não seja para mim.
— Bonjour!
Entro na agência cumprimentando os funcionários e percebo na hora que
tem algo estranho rolando. Pergunto o que é e depois de tanto insistir, meu gerente
mostra o telefone na página do instituto de Arnon Miller. Então, vejo a minha foto,
e mesmo tendo conhecimento na língua francesa, não consigo entender o que está
escrito. Traduzo a página para português-Brasil e então consigo ler.
— Deus do céu! — exclamo, saltando de susto e alegria.
Não creio, mas está realmente ali “Bárbara S. S. Alves. Vigésima nona
selecionada para o projeto Sócios pelo Mundo”.
— Em quanto tempo chegaremos? — pergunto ao motorista, me
inclinando para frente.
— Aconteceu um acidente na via, mas já devem estar liberando o
trânsito.
Suspiro, irritado, me encostando no banco. O trânsito de Nova York
é uma merda. O problema é que estou em cima da hora para uma reunião
importante.
— Senhor, estão começando a liberar...
— Assim espero.
Ainda bem que dez minutos depois ele para na frente do prédio
empresarial e abre a porta para mim. Pego minha pasta de negócios e
caminho para dentro a passos largos.
— Bom dia, senhor Smith. — A recepcionista me cumprimenta
enquanto sigo para o elevador privativo da diretoria.
Assim, paro no último andar do edifício, a porta se abre e duas
secretárias se aproximam. A primeira pega a minha pasta e a outra me passa
relatórios e documentos para a reunião.
— Eles estão te esperando na sala de conferências um, senhor
Smith.
Concordo com a cabeça e sigo na devida direção, lendo o
documento que me foi apresentado.
Hoje vamos ter um encontro tenso, principalmente pela quantidade
de pessoas envolvidas, mas nada diferente do que já fiz antes. Abro a porta
e encontro meu primo, Robert H. Price, conversando com eles.
— Graças aos céus você chegou — declara ao me ver e me
apresenta. — Agora é contigo.
Balanço a cabeça confirmando, deixando os documentos sobre a
mesa e me colocando no extremo da mesa.
— Bom dia a todos — cumprimento os outros presentes. — Sou
Brian Hamilton Smith. Herdeiro e CEO da Hamilton Empreendimentos
Imobiliários. Vamos fechar a nossa negociação sobre os terrenos dos
senhores?
Duas horas; esse é tempo em que estou tentando fechar a negociação
das áreas de terra pertencentes aos herdeiros dos Kings. O pai havia
falecido há pouco e já sabia de pronto que eles queriam vender, o problema
era o preço. Cada um queria um montante maior. Aí começou o problema.
Principalmente porque eu já tinha um valor fechado de quanto pagaria, mas
o mais velho deles, por conta do meu atraso, insistiu que deveria pagar mais
pelo descaso de fazê-los esperar, e eu já estava perdendo a paciência.
— Senhora e senhores — digo olhando para meu relógio. — Devido
ao impasse, nós da Hamilton estamos retirando a oferta...
— Não, senhor Smith — a mulher me interrompe. — Posso
conversar com meus irmãos a sós?
Olho para Robert e ele concorda com a cabeça. Saímos os dois,
deixando-os a sós.
— Vai deixá-los lá por quanto tempo? — ele me pergunta ao fechar
a porta.
— Vai por mim, em menos de cinco minutos...
Toc Toc.
— Senhor Smith. — A porta se abre e a mulher que pediu o tempo
aparece. — Vamos fechar a venda.
Então, abrimos um champanhe e a moça, que agora descobri se
chamar Aurora King, começa a flertar comigo. Claro que não estou
interessado. Não sou de misturar negócios com prazer, e a verdade é que
estou fechado por tempo indeterminado para relacionamentos.
Por isso, dou de desentendido e deixo meu primo festeiro com o
trio. Como ele é casado, sei que não vai se engraçar demais com a moça, o
que me deixa livre para ver os projetos das novas construções da empresa.
Vou para o almoço e quando retorno, encontro na mesa uma caixa
vermelha com um cartão em cima. De início, fico preocupado, mas minha
secretária fala que foi a moça de hoje de manhã que deixou.
Então abro a caixa e vejo uma calcinha de renda vermelha carregada
de um perfume doce. No bilhete, um recado que, se fosse de outra pessoa,
teria mexido comigo “Adoraria usar somente essa peça contigo”.
— Mais direta que isso aqui é impossível — comento comigo
mesmo.
O azar dela é que não sou assim. Se fosse o meu melhor amigo,
Samuel, antes de ser casado, estaria transando com ela num canto sem
pensar nas consequências. Porém, a senhorita King errou na sua cartada.
Um fato é que sempre fui muito seletivo. Não é qualquer uma que
vou levar para a minha cama. Na verdade, em toda minha vida, só tive sete
mulheres, e cada uma deixou sua marca na minha estrada. Mas a única que
conseguiu me arrebatar à primeira vista foi uma bela brasileira de sorriso de
sol. A minha eterna número sete.
Quando fui para o Brasil, me mostrei a todo tempo como uma
pessoa comum, sem recursos, vantagens, e é por isso sei que jamais passou
por sua cabeça que eu era um herdeiro com muitas riquezas, e muito menos
que o “H” do meu nome significa Hamilton. Entretanto, foi o
relacionamento mais natural e genuíno que já tive na minha história.
Depois de Bárbara, as seis anteriores se tornaram somente
recordações rasas. Algumas boas e outras nem tanto, mas nenhuma se
assemelha ao quanto aquela mulher foi na minha vida.
O único problema é que a perdi para sempre. Eu tentei de tudo para
provar que foi um grande mal-entendido, mas ela jamais me perdoou por
conta de um comentário infeliz do senhor Oscar Wilson, tio de Samuel.
Dei um tempo para que ela conseguisse pensar no assunto, mas
todas às vezes que perguntava sobre aquilo para a amiga e esposa do meu
melhor amigo, nada tinha mudado. Quando ela se mudou para Paris, pensei
que lá poderia acontecer a nossa tão aguardada reconciliação, mas não deu
certo.
Não tive a chance de falar com Bárbara. Na verdade, minha irmã
mais nova, Madson, que tive que deixar para trás quando fui ao Brasil,
estava precisando de mim. Desta forma, tive que voltar aos EUA para
reencontrar-me com ela e meus problemas, e é assim que tenho passado os
dias desde então.
Resolvi boa parte da situação, mas infelizmente não consegui voltar
para Paris. Sendo sincero, perdi as contas de quantas vezes troquei a data da
viagem para vê-la, mas sempre surge alguma coisa por aqui que me impede
de ir.
No casamento de Carol e Sam, uma das poucas vezes que viajei, eu
a vi depois de quase um ano do nosso término, mas não tive oportunidade
de conversar com ela. Um pouco depois da cerimônia, recebi uma ligação
do meu primo falando que não tinha conseguido fechar o prazo de um
contrato importante. Até tentei pedir para meu pai resolver, mas ele tinha
ido para a Espanha e não poderia me ajudar. Por isso, rapidamente me
despedi dos noivos e voltei de jato particular para a América, com raiva de
mim mesmo por perder outra chance com a minha amada.
— Você tem que aceitar, Bárbara! — exclama Carol do outro lado da linha.
— Carol, como assim? E o que eu faço com a minha agência em Paris?
Esqueceu que é tudo em Nova York?
— Claro que não, e é por isso que você vai — ela me incentiva. — Você
não consegue gerenciar boa parte das coisas com o computador com internet?
Concordo.
— Então, mulher? — ela me questiona. — Você vai mexer essa bunda
brasileira, sair de Paris e partir para Nova York. Entendeu?
Reviro os olhos.
— Para você parece tão fácil — comento.
— Falou a empresária divando na França, que não está fedendo a leite
azedo, com olheiras enormes e com o cabelo tão cheio como um leão raivoso —
declara minha amiga, e não consigo deixar de rir.
— Mas, amiga — digo depois que me controlo —, quem vai ficar tomando
conta da loja quando eu não estiver? É no mínimo um mês de curso e mais seis
para inaugurar a agência. Eu tinha a ideia de montar negócio aqui na França.
Sendo mais específica, em Marselha, mas isso é totalmente fora do que eu estava
planejando.
Ela fica em silêncio por alguns instantes e depois escuto ao fundo da
chamada a porta bater.
— Babis, nem sempre a vida é planejada. Veja o meu caso, mulher. Me
casei com um gringo que era o único empecilho para realizar o meu sonho. —
Você sabe que sempre foquei em carreira, mas Sam...
— Nem todas têm sorte no amor...
— Mas quem sabe os EUA é o lugar onde você vai conseguir esquecer de
verdade do Brian? Tirando também que 550.000 dólares para fundar uma agência
nova não caem de uma árvore.
É verdade. Não caem. Ontem mesmo eu estava pensando em conseguir um
capital para me ajudar. Contudo, vamos combinar: essas coisas não acontecem
duas vezes com a mesma pessoa. É uma oportunidade incrível. Por isso, fecho os
olhos e digo: — Carol, partiu Nova York.
Não acredito que estou aqui. Os táxis amarelos, o povo que anda correndo,
a cidade que nunca dorme, a Big Apple. Sim! Estou em Nova York, e como isso é
lindo e emocionante.
Em dois dias consegui arrumar minhas coisas em duas malas grandes e
deixei meu gerente à frente da loja. Ainda bem que Carolina e Sam prometeram
que farão viagens quinzenais para ver o movimento das coisas, enquanto vou
estudar com o meu ídolo. Arnon Miller.
Essa é outra coisa que está me deixando com o coração na boca. Conhecer
esse homem, para mim, vai ser como ver uma celebridade. Estou o acompanhando
desde o primeiro período da minha faculdade. Carol fez certo em insistir, se não
estivesse aqui, iria me martirizar para sempre.
— Chegamos no hotel, senhora — o motorista do táxi me avisa.
Agradeço ao sair e logo abro o porta-malas. O concierge as pega para mim
e coloca num carrinho, ao passo que me acompanha até a entrada do hotel.
— Uau! — exclamo na hora, vendo o quanto o lugar é fino e requintado.
Graças aos céus não pago as diárias, mas se fosse no meu bolso, faltaria rim para
pagar a terceira diária.
— Nome completo, por favor — pergunta-me o recepcionista.
— Bárbara Sophia Souza Alves — respondo.
Mais brasileiro que meu nome, acho difícil encontrar.
Ele confirma e me entrega a chave. Quando entro no meu quarto, seguro
meu queixo para que não despenque. Se lá embaixo é lindo, meu quarto dá até
pena de entrar e usar de tão bonito. O rapaz deixa as malas no armário e espera a
gorjeta. Eu o pago e tranco a porta após sua saída. Depois, abro a janela e me
deparo com a Time Square.
— Puta que pariu! — exclamo, rindo como uma criança.
Nem nos meus melhores sonhos imaginei ficar num lugar como este. O
ridículo é que assim que vejo os corações nos letreiros, a primeira imagem que
surge na minha cabeça é a dele. Brian. Entretanto, sei que ele jamais voltaria para
os EUA devido aos seus problemas de família.
E isso é bom, pelo menos vou curtir minha vida. Quem sabe encontro
outro gringo? NÃO! Nada de americanos até daqui a uns 20 anos. Mesmo que
sejam gatos, gostosos, cabelos escuros, olhos azuis, sorriso charmoso e jeito fofo
que dá vontade de colocar num potinho.
— Para de pensar no Brian, Bárbara! — reclamo comigo mesma.
Então, tiro a imagem dele da minha cabeça e pego na mesinha o
cronograma das atividades do programa “Sócios pelo mundo”. Percebo que estou
em cima da hora e, então, tomo uma chuveirada rápida, babando na banheira de
hidromassagem maravilhosa que tem no meu quarto.
Demoramos uma hora para sairmos do hotel. Ela tem somente duas malas
enormes e eu tenho uma grande. Não planejei fazer negócios por lá, mas é bom ter
uma roupa formal em caso de necessidade. Como vamos para uma região praiana,
estou preparado para curtir o momento com ela; quem sabe quando voltar de lá
não estejamos mais em uma fachada.
A quem eu quero enganar? Vai ser um sacrifício ver a minha esposa num
daqueles biquínis brasileiros. Pior ainda é ter que me segurar para não surtar se
algum babaca olhar demais para ela.
— Chegamos, senhor.
Olho para a “Raio de Sol” e percebo terror em seus olhos.
— O que foi, Bárbara? — pergunto, preocupado.
— Você não mentiu quando falou sobre o jatinho — confessa, juntando as
sobrancelhas de nervoso.
— Te falei que não mentiria, já se esqueceu?
— Brian, esse avião é tão pequeno... — declara, segurando a minha mão.
— Isso é seguro?
Agora entendi o problema.
— Minha linda, não precisa se preocupar. — Toco em seu rosto e a trago
para junto de mim. — Os pilotos possuem muitas horas de voo, vão nos levar e
trazer em segurança. Confia em mim?
Ela balança a cabeça e vem me abraçar. Porém, no mesmo instante, um dos
seguranças abre a sua porta.
— Senhora Hamilton Smith.
Bárbara sai do carro e faço o mesmo, apressando-me em segurar sua mão.
Como está um pouco frio, estamos com casacos fechados. Passo o braço por seus
ombros, trazendo-a mais para perto, até que chegamos nas escadas da aeronave.
A comissária de bordo nos cumprimenta, bem como aos pilotos. Peço que
Bárbara vá na frente e a acompanho. Nos acomodamos lado a lado e esperamos a
decolagem.
— Vai ficar tudo bem — falo ao pé de seu ouvido.
Ela pega meus dedos e segura minha mão. As turbinas são ligadas e seu
rosto cai nos meus ombros. Passo a mãos por seus cabelos, tentando fazê-la
relaxar, enquanto isso, sou impactado pelo seu cheiro delicioso.
Minha esposa nem percebe quando saímos do chão. Pouco depois ela
adormece, e só acorda quando estamos quase chegando.
Aterrissamos com uma Bárbara sonolenta ao meu lado. Quando estamos
caminhando, faço a pergunta que ficou na minha mente: — Você quer um quarto
separado para nós?
Vejo surpresa quando me encara. Em seguida, ela nega com a cabeça.
— Somos recém-casados, Brian. O melhor é ficarmos no mesmo quarto.
Vai que alguém surge no Havaí e desconfia de alguma coisa.
— Tudo certo, minha esposa — declaro e abro a porta do carro para ela.
Meu marido. É tanta coisa para me acostumar... Essas palavras são
complicadas para serem pronunciadas. Vamos combinar? Eu me casei com
um herdeiro bilionário, nunca mais vou precisar pensar em boletos...
Hospedagens em hotéis cinco estrelas é pouco. E meu marido, além de
lindo e gostoso, só tem olhos para mim e...
— Já levaram as nossas malas para o quarto — ele me avisa,
despertando-me dos pensamentos pervertidos —, vamos entrar?
Brian me mostra a chave em cartão e o acompanho. Aqui é tudo tão
lindo, o som do mar está presente e traz a memória de férias. Passamos pela
parte inicial e seguimos até os chalés.
O mais perto da praia, que é do tamanho de uma casa com dois
andares, é o nosso.
Ele abre a porta para nós e vejo se tratar de um duplex chique. Tem
sofá, televisão, cozinha e banheiro no andar de baixo. O ambiente é bem
claro, com vidros por todos os lados. Também possui cortinas, caso
queiramos privacidade. No canto há uma escada com pétalas vermelhas nos
degraus, e acredito que está com tal decoração até a cama de casal.
— Isso é lindo — comento.
Ele fecha a porta e mais uma vez estamos sozinhos.
— Eu vou lá em cima pegar meu calção de banho — ele me avisa,
subindo as escadas. — Melhor aproveitar o sol.
Concordo e subo com ele. Brian me ajuda com a mala e pego meu
biquíni e uma saída de praia. Eu juro que tentei usar um desses das
americanas, mas ele é tão grande atrás que parece que estou usando as
roupas de banho da minha avó.
Desço e vou para o banheiro, deixando-o no andar de cima.
Enquanto estou trocando de roupa, me lembro do último momento em que
passamos sozinhos, ainda em Nova York. Aquela barraca armada estava tão
sugestiva que se ele não tivesse falado algo, eu teria caído de boca
literalmente. Deus do céu! Bem que poderíamos aproveitar a fachada do
casamento e virarmos amigos com benefícios como estávamos pensando.
Aí estaria tudo perfeito e... Droga! Não dá para fazer isso.
— Vamos, querida? — Escuto sua voz do lado de fora.
Eu até queria cair em seus braços, mas perdão não é algo da minha
natureza. Estou tentando relevar, no entanto, não é tão simples. Sei que se
passarmos dos limites dos beijos, como o que quase aconteceu quando ele
aceitou o casamento na sua sala, tudo vai ficar ainda mais confuso entre
nós. Por isso, acho que não vale o risco.
Abro a porta e vou para a sala. Porém, sou impactada com a imagem
do Brian com somente um calção de banho branco e peitoral nu. Deus do
céu! Eu não acredito que esse gringo lindo é meu, mas não posso transar
com ele. É tentação demais para esta pecadora aqui.
Fica ainda mais difícil quando ele sorri para mim e segura minha
mão. Imediatamente sinto como se tivesse uma eletricidade gostosa entre
nós.
— Recém-casados ficam juntos a maior parte do tempo, senhora
Hamilton Smith.
Sinto-me presa no mundo azul que vem dos seus olhos e juro que
não quero acordar. Seus dedos seguram os meus com força, e aquele jeito
tímido de que quer a mesma coisa que me chama para ele. Engulo em seco,
doida para continuar.
Aproximo-me mais dele passando os braços ao redor de seu
pescoço. Sinto sua respiração arrepiar os pelos da minha nuca. Ele aperta
minha cintura e me levanta contra a bancada da cozinha.
Passo minhas unhas em suas costas enquanto sinto seu pau roçar
entre as minhas pernas. Seus lábios tocam meu pescoço e me sinto derreter
com o calor de sua boca. Sua mão pega um dos meus seios numa carícia
que só ele sabe fazer.
Desço minhas mãos até seu calção, mas paro tudo quando o escuto
me perguntar: — Você quer seguir por esse caminho mesmo?
Então, percebo a grande merda que estávamos quase fazendo.
Ter Brian por perto e ser obrigada a ficar no zero a zero é muito
penoso. Não fizemos acordo para sexo, mas não sei se consigo resistir sem
isso. Vamos combinar: Estou tão na seca que estou atacando meu marido
gostoso, que só se casou comigo para me ajudar a conseguir um visto e
manter um emprego.
— Acho melhor... a gente parar por aqui — declaro, e na mesma
hora vejo a decepção brilhar em seus olhos.
Mas Brian não reclama ou fala algo. Somente balança a cabeça e se
afasta, indo para o banheiro.
Que merda que eu fiz! Ele é um homem maravilhoso e eu aqui como
uma bruxa o fazendo sofrer por minha causa. É melhor a gente acordar os
termos do nosso casamento. Sei bem que não vai querer ficar sem sexo por
tempo indeterminado, e eu também. Talvez possamos ter amantes
reservados com o tempo, como vi em algumas histórias, mas... saber que
alguma infeliz vai estar transando com ele me deixa tão furiosa e...
— Brian, a gente pode conversar?
— Depois, Bárbara. Pode ir para a praia. Te encontro lá — ele
responde sem abrir a porta.
Respiro fundo esperando que ele mude de ideia, quando não o faz,
saio sozinha enquanto penso no que posso fazer para reverter essa situação.
Vai faltar água gelada para me deixar apresentável para sentar numa
cadeira na praia ao lado dela. Essa pequena brincadeira que tivemos foi o
que faltava para destruir o fim do meu juízo. Queria ir com ela, mas agora
vai ser difícil. Nenhuma das minhas ex conseguiram mexer comigo desse
jeito, mas Bárbara brinca com a minha razão e acaba com a minha força de
vontade. Se ela dissesse um simples “Sim”, eu teria perdido a praia com
gosto e não daria descanso até vê-la gozar algumas vezes gritando meu
nome.
Agora nem imagino como ela está. Bater mais uma não vai resolver
o meu problema. O que quero é essa mulher, mas já que não posso tê-la, é
melhor ficar um tempo na água fria e me sentar no sofá da sala.
Demoro mais uns quinze minutos e acredito que estou sozinho.
Prendo uma toalha na cintura e vou para o sofá. Relaxo assistindo algum
filme de ação. Quando estou mais tranquilo, coloco uma roupa e já me
preparo para a noite.
Quando ela retorna, somente me cumprimenta e vai para o banheiro.
Como sua roupa está um pouco úmida, consigo ver por baixo o desenho de
sua bunda arrebitada. Caralho! Por que fiz isso? Ela só é minha no papel, e
infelizmente ainda não encontrei uma estratégia para tê-la de outras
maneiras...
— Vamos ficar aqui à noite? — ela me pergunta, tirando-me dos
meus pensamentos.
— Não, vou te levar para jantar...
— Brian, a gente precisa falar sobre...
— Podemos fazer isso depois. Você vai gostar da comida daqui.
Ela concorda, pega umas roupas e volta para o banheiro. Será que
Bárbara pensa que não sei o que está planejando? Ainda não estou pronto
para conversar sobre nós e quem sabe jogar uma das piores opções, que
seria abrir o nosso casamento. Sei que vai ser difícil para mim, mas não
quero nenhum infeliz fodendo com a minha mulher. Jamais vou dar aval
para isso. Ela ainda não sabe, mas já é minha.
Fico mais algum tempo vendo televisão e só percebo sua presença
quando seu perfume invade o ambiente. Puta merda! É maldade dessa
mulher! Ela está num vestido florido vermelho com decote, deixando seus
seios marcados. O tecido leve bate em seus joelhos, e com o vento lá de
fora será impossível que não levante. Nos pés, somente um chinelo de
couro. Os cabelos estão soltos. Ou seja, a visão da minha loucura.
— Demorei muito?
— Não mesmo — respondo. — Podemos ir?
Ela balança a cabeça e abro a porta para que saia. Eu sabia que o
vento iria bagunçá-la, mas preferi não comentar. Bárbara fica mais solta
quando perde o controle das coisas. Quando entramos no restaurante, ela já
estava sorrindo e brincando.
— A mesa de vocês já está pronta — o maitre do restaurante nos
indica o lugar.
Ao chegarmos na mesa perto do aquário, ajudo minha esposa a se
sentar.
— Isso aqui é tão bonito — ela comenta.
Não posso negar que é. Este restaurante é belíssimo, mas o
arquipélago em si é maravilhoso também.
Recordo-me que na última vez que vim aqui, foi com o Sam, e é
claro que não fomos para um restaurante assim. Na verdade, eu curti os
eventos e meu melhor amigo, as mulheres que estavam neles.
— Posso pedir para nós? — ela pergunta.
— Você que manda, esposa — respondo.
— Obrigada, marido.
Ela chama o garçom, mas me perco pensando no que ela falou. Não
me lembro de quando ela me chamou assim. Então, fico admirando minha
bela esposa, desejando que isso seja verdade um dia. Como seria perfeito se
Bárbara fosse realmente a minha esposa e a mãe dos meus filhos. Pensando
bem, esse é um assunto que não falamos até agora.
— Você pensa em ter filhos? — indago e ela se assusta, quase
derrubando o vinho. — Desculpe, não foi minha intenção...
Ela limpa os lábios com o guardanapo.
— A gente deveria ter falado sobre isso antes do “sim”, não acha?
— ela me questiona.
Rio, balançando a cabeça.
— Verdade, mas tivemos — abaixo, aproximando-me dela — pressa
para nos casar.
— Minha culpa — confessa, rindo. — Mas eu penso sim. Penso em
dois. Quem sabe um adotivo também? Mas um casal seria ótimo.
— Se vier uma menina como você, vou ser o pai mais feliz de todos
— comento.
— E o mais babão também — brinca e balanço a cabeça, vendo o
quanto está certa. — Que trabalho essa criança vai me dar.
Seguro sua mão sobre a mesa.
— Você vai ser uma mãe incrível. O meu sete da sorte — declaro
sorrindo para ela.
Na mesma hora, chega o nosso jantar. Nem imagino o que pediu,
mas parece ótimo.
Passamos o restante da noite conversando. Não sei o que foi, só que
não me bateu bem e comecei a me sentir estranho quando voltamos para o
chalé. Bárbara me perguntou o que eu tinha, mas desconversei, achando ser
somente cansaço.
— Eu durmo no sofá...
— Não mesmo. A cama é grande e há espaço suficiente para nós
dois.
Concordo e vou para cima. Tiro somente os sapatos, me deito e
fecho os olhos...
Ele está com alguma coisa. Homens. Por que não falam de uma vez
que estão doentes e deixam a gente ajudar? Está na cara que não está bem.
— Brian...
— Vou dormir — ele me interrompe, subindo.
Reviro os olhos e troco de roupa. Vou para a cama e o vejo jogado,
desengonçado no colchão. Jogo um lençol sobre ele e me deito ao lado,
apagando as luzes enquanto tento dormir.
Tem cinco dias que estou aqui esperando meu marido acordar. Brian
resistiu às primeiras noites e já está respirando mais tranquilamente, mas
nada de despertar. Durante esse tempo, aprendi na marra o que é ser esposa
de bilionário.
Tive que adiar a nossa estadia, porque a tempestade não deixou que
fôssemos para a América, e também não confio naquele jatinho. Falei com
alguns investidores, disse que ele estava impossibilitado e que teria que
negociar com o primo Robert ou com o meu sogro. Falei com a minha
família, com a dele, com nossos amigos em comum e todos que foram
relevantes. Mesmo assim, não consigo ficar tranquila.
Por que ele não acorda? Estou todos os dias questionando os
médicos sobre isso, principalmente depois de descobrir que eles o
colocaram em coma para conseguir tratar a reação. Só que agora eles não
conseguem fazê-lo sair desta condição. Que ódio! Já os ameacei de todas as
formas possíveis. Se meu Brian ficar com alguma sequela por conta disso,
eu nem sei o que faço com a administração deste lugar.
— Senhora Hamilton Smith — o médico me cumprimenta. —
Temos boas notícias. Hoje de manhã, seu marido mostrou reação. Parece
estar despertando.
Sinto-me mais aliviada, mas não vou suavizar com eles.
— Eu quero vê-lo agora.
Caminho com pressa, na expectativa de encontrá-lo desperto, mas
novamente fico frustrada ao encontrá-lo dormindo em seu quarto hospitalar
de puro luxo.
— Ele ainda está dormindo... — declaro.
— Mas está quase...
Bufo, irritada.
— Vão embora. Eu quero ficar sozinha com o meu marido — aviso,
expulsando-os e fechando a porta.
Quem diria que essa seria a minha vida de recém-casada? Meu
marido sofreu um baita ataque alérgico que quase o matou. Passei dias
desesperada, mas como a médica tinha me dito, conversar com ele ajuda a
nós dois, é isso que tenho feito.
Sento-me na cadeira ao lado de sua cama e observo seu rosto. Exigi
que mantivessem sua barba e seus cabelos cortados como sempre. É o
mesmo cara com o qual me casei, a diferença é que está dormindo direto há
mais de cinco dias.
— Oi, marido. Sou eu, a sua “Raio de Sol”. Que saudade estou de
conversar contigo. Acredita que desde o dia em que você dormiu ainda não
teve sol por aqui? — pergunto, segurando sua mão. — Acho que ele ficou
triste porque estou sozinha neste lugar lindo e... o homem que eu quero do
meu lado está dormindo no ponto. — Rio, lembrando-me da expressão. —
Ontem à noite eu estava lembrando de quando nos conhecemos no Brasil.
Lembra disso? Eu derrubei os papéis da apresentação da Carolina e você
me ajudou. Sabia que me encantei com o seu jeito fofo ali? — Uma lágrima
desce dos meus olhos. — Eu até falei para a Carol que você era do tipo que
se guarda num potinho.
Passo a mão em seu rosto, que está com uma temperatura mais
natural.
— Estava pensando em quando me beijou pela primeira vez na sala
de xerox. — Lembro. — Que loucura foi aquilo, não é? A gente namorando
escondido com documentos de dois adversários tensos. Acredita que Carol
nunca desconfiou que isso aconteceu?
Trim. Trim.
— Tem uma ligação aqui no seu telefone. Uma tal de “Número
três”. Quando você acordar, vamos conversar sobre isso. Está bem?
Penso em beijar seu rosto, mas, dessa vez, deixo um beijo casto em
seus lábios.
— Até daqui a pouco, meu marido — me despeço, saindo e
fechando a porta.
Quando estou longe o bastante, atendo à chamada e a mesma cai na
hora. Reviro os olhos, mas seja quem for, liga novamente.
— Oi, você é a esposa do Brian? — uma voz feminina me questiona
do outro lado da linha.
— Quem é você? — questiono. — Se for uma amante que...
— Não! — ela me interrompe. — Sou uma amiga de infância dele.
Me chamo Emma Ambani.
Esse nome é familiar, mas não consigo identificar quem é.
— Por que seu nome está como “Número três”?
— Merda! — ela xinga em francês.
— Eu entendo esse idioma — retruco —, vai responder ou não?
— Acho que temos coisas mais urgentes agora, que é a saúde do
Brian. Eu consegui um jato, vou até aí buscar vocês dois e mandá-lo para o
melhor hospital do planeta...
— Não precisamos de sua ajuda — declaro.
— Madson falou que você tem pavor de voar de jato. Eu posso
ajudar e...
— Senhora Hamilton Smith — a enfermeira me chama —, seu
marido acordou e está chamando a senhora.
“Sabia que me encantei com o seu jeito fofo? Eu até falei para a Carol que
você era do tipo que se guarda num potinho.”
Isso parece música nos meus ouvidos, mas na verdade eu sei que é um
sonho. Até a sensação deliciosa dos lábios da minha Raio de Sol sobre os meus
parecia ser...
Tento abrir meus olhos, mas não consigo. Eles estão pesados, como se eu
estivesse dormindo há muito tempo. Mas eu sei que não foi isso. Mexo meus
braços, que também demoram para responder. Depois de alguns instantes, com
muita dificuldade, consigo abrir os olhos.
Cacete! Tá tão claro. Será que dormi até tarde?
Coloco a mão contra o rosto e percebo algo a prendendo, limitando o
movimento. Reconheço o fio branco e o sigo, encontrando ao lado da cama um
soro.
— Onde é que estou? — questiono, me sentando.
— O senhor acordou! — exclama uma mulher de branco. — Deus seja
louvado!
— Quem é você? Cadê a minha esposa...?
Meus olhos batem na minha mão esquerda e percebo que a aliança sumiu.
Será que sonhei que me casei também? Não. Bárbara...
— Brian!
Aí está ela. A minha eterna número sete. A dona do meu coração.
— Bárb...
Antes que eu diga uma palavra, ela me beija com um desespero que até me
assusta.
— Graças a Deus você acordou.
Bárbara me abraça com força, como se não me visse há tempos. Confesso
que não estou entendendo nada do que está acontecendo, mas não vou negar que
estou gostando. Despertar com um beijo dela e... Então, começo a sentir algo
molhando minha camisa e vejo que ela está soluçando.
— Raio de sol, o que está acontecendo? — pergunto. — Você está bem? É
algum problema em casa? Com sua família ou a minha?
Ela se levanta e seus olhos castanhos estão vermelhos de tanto chorar.
— Você não se lembra?
— Do quê? — questiono, confuso.
— Quase perdi você nessa ilha e fiquei fora de mim... — Ela vai falando, e
mesmo acreditando no que diz, parece uma grande utopia. — Nunca mais faz isso
comigo. Eu não sei o que faria da minha vida sem você, Brian.
Eu queria acreditar que o que me diz é sobre sentimentos, mas sei que não
é isso, infelizmente. Entretanto o futuro dela já estava acertado quando nos
casamos.
— Você seria uma viúva rica que...
Ela bufa, irritada, e dessa vez sou eu quem não entende nada.
— Quem disse que quero o seu dinheiro?
Antes que eu possa retrucar, um homem de jaleco entra no quarto.
— Senhor Hamilton Smith. Ainda bem que despertou. Sua esposa não te
deixou sozinho um só instante por todos esses dias.
Dias?
Olho para ela e percebo a irritação em seu olhar.
— Seu caso foi bem preocupante — prossegue o médico. — A senhora
Hamilton Smith chamou a emergência e quando percebemos o choque
anafilático...
— Espera um pouco — interrompo o homem, que claramente é um
médico. — Eu estou hospitalizado por causa de uma alergia? Há quanto tempo?
— Olho para Bárbara, esperando resposta.
— Você está aqui quase seis dias — ela me responde.
— Como é que é? — questiono, abismado. — Vocês estão enganados. Eu
me casei há dois...
— Brian, temos uma semana de casados — comenta Bárbara, quase
chorando de novo.
Que porra está acontecendo? Eu quase morri mesmo?
— Fizemos um teste alérgico para saber como tratá-lo e descobrimos que
tem alergia a camarão... — continua o médico.
— Lagosta — respondo.
— Senhor Smith, se continuar do jeito que está, amanhã terá alta — ele me
informa, virando-se para a porta. — Vou deixá-los a sós. Mais à noite retorno.
Ele fecha a porta e passo a mão na cabeça, bastante nervoso com isso tudo.
Tá estampado na cara da Bárbara que não é mentira, mas não consigo crer que
perdi uma semana da minha vida.
Até que a escuto soluçar outra vez.
— Bárbara... — eu a chamo e ela chora ainda mais alto.
— Eu não sabia...
— Não sabia do quê? — questiono.
— Nunca faria isso...
— Do que está falando? — Sento novamente e tento me levantar, mas
minhas pernas fraquejam.
— Brian! — Ela se levanta rápido, me apoiando, mas quase cai junto. —
Ainda bem que seguro a maca e me jogo de costas no colchão. Porém, ela vem
batendo forte na minha barriga.
— Ai!
— Eu te machuquei!? — fala, se afastando. — Eu sou a pior esposa de
todos os tempos. Por minha culpa você está aqui e...
— Bárbara. Do que está falando? — pergunto, encostando-me na cama.
Ela coloca as duas mãos contra o rosto e balança a cabeça.
— Fui eu quem pediu o nosso jantar e era tipo um bobó de frutos do mar.
Parecia tanto com os que comia no Brasil que eu quis que você provasse e... —
Ela volta a chorar. — Eu quase matei você...
Não me lembro da última vez que a vi tão sensível.
— Vem aqui, Raio de Sol — eu a chamo e ela reluta em se aproximar, mas
vem.
— Você me perdoa?
— Por que eu teria que te perdoar? Você não sabia...
— Mas eu devia saber — ela retruca.
Eu rio e passo os dedos no seu rosto, ao passo que a vejo fechar os olhos.
— Vai ter tempo para saber mais de mim assim como eu devo saber sobre
você, senhora Hamilton Smith.
— Eu quero uma lista completa. Isso não vai se repetir jamais...
— Aham.
— Brian, não brinca comigo! — ela reclama, se aproximando do meu
rosto. — Estou falando sério. Não posso perder você. Está entendendo?
Eu acho que ainda estou dormindo. Bárbara está parecendo demais com a
minha namorada brasileira esquentadinha, mas deve ser só impressão ou somente
preocupação pelo que passei. Por isso, digo: — Sim, minha senhora.
— Vocês demoraram demais para voltar — fala o meu sogro, seu Joseph,
conosco na mesa de café da manhã. — Mas fico feliz que esteja bem, meu filho.
Estamos em quatro aqui na mesa. Abigail, meu sogro, Brian e eu. Na
verdade, nem acredito que saímos da cama na hora. Ficamos tanto tempo
trancados no quarto que achei que me atrasaria para o meu primeiro dia.
— Sim, eu não sabia da alergia de Brian, mas isso não vai mais acontecer.
— Assim espero, minha nora.
Ele me olha tão estranho que fico até ressabiada. Tomo meu suco e aviso
ao Brian que vou pegar minha bolsa para irmos. Ele concorda e me afasto, indo
para o andar de cima. No corredor, encontro com Madson, que me manda um
sorriso amistoso.
— Ele te contou, não é, número sete?
Balanço a cabeça em concordância.
— Ainda precisamos falar mais sobre isso. O que acha de fazer isso no fim
do dia, quando eu voltar?
Ela aceita o meu convite.
— Até mais e bom primeiro dia.
— Bárbara, se acontecer qualquer coisa que te deixe constrangida, preciso
que você me fale. Está bem?
Do nada, Brian entra nesse assunto. Estamos a caminho da loja e ele viajou
quieto, provavelmente pensando em como falar disso.
— O que quer dizer com isso?
— Nada demais. Mas você é minha esposa e ninguém pode te rebaixar por
estar casada comigo. Ok?
Concordo. Quando paramos na entrada do trabalho, ele sai, indo para a
porta do carona. Então ele me beija. Arnon aparece na hora e cumprimenta meu
marido.
— Ela está em boas mãos, meu afilhado. Não precisa se preocupar.
— Está bem, padrinho. — Brian se vira para mim e diz: — Não se esquece
do que te falei.
Concordo dando um outro beijo em seus lábios.
— Bom trabalho, marido.
Ele sai com o carro e percebo na hora os olhares estranhos das outras duas
funcionárias contratadas. Arnon me apresenta como uma das sócias da nova
agência. Depois, nos reunimos montando as estratégias competitivas para nós.
Falo do que fiz na França e como conseguir manter a empresa funcionando. Meu
novo sócio gosta bastante do que digo e me explica que vai ficar trabalhando
diretamente comigo pela primeira semana. Em seguida, vai verificar comigo
online como vamos funcionar com a sua agenda apertada.
Quando o dia termina, ninguém menos que a maior ciumenta da história
surge toda retocada. Annie.
— Querida, começamos hoje com a agência da nova senhora Hamilton
Smith.
— Sinto muito que sua lua de mel tenha sido interrompida por um marido
doente acamado. Ele já está melhor? — ela me pergunta, mas sinto a agulhada na
hora.
— Está maravilhoso. Passou aqui mais cedo — respondo.
— Acredito que já está na nossa hora — começa ela. — Vamos Arnon?
— Sim, mas como a agência ainda não está funcionando, vou fechar tudo e
deixar Bárbara em casa, meu docinho.
Vê se isso não dá enjoo?
Mesmo assim, chego em casa um pouco antes pegando carona. Eles abrem
o portão para mim e quando passo pela entrada, escuto a voz da dona Abigail
dizendo: — Infelizmente ele se casou com aquela brasileira.
— Eu estava aqui — comenta uma voz feminina. — Não gostei do que vi e
o pior foi ser escorraçada...
— Mas tente entender, ele nem imaginava que tinha essa bênção.
Bênção?
Dou uns passos para dentro da mansão e me deparo com um menino de
cabelos escuros sentado no chão, de mais ou menos quatro anos, brincando com
um carrinho.
— Bárbara? — comenta Abigail.
Nesse momento, a criança olha para mim e são os mesmos olhos azuis que
o meu marido possui.
Isso deve ser loucura da minha cabeça.
Por Deus.
Tem que ser isso.
Depois que deixei Bárbara na agência com meu padrinho, fui
trabalhar mais tranquilo. Quem disse que quase morrer diminui os
trabalhos, está redondamente enganado. Tinha tanta coisa para resolver que
praticamente perdi meu almoço acertando os orçamentos que ficaram
devendo autorização.
Precisamente, foi necessário pedir revisão de alguns que meu primo
fez no qual não concordei com os valores e algumas quantidades. Ele ficou
furioso, mas como a palavra de ordem é minha, teve que acatar.
A todo instante eu queria ligar para Bárbara, digo, para minha
esposa. Mas eu sei que também está trabalhando e não ficaria bem ser
interrompida por mim no seu primeiro dia.
— Que merda!
Olho para mais uma pasta de documento do período em que estava
no Havaí e não tem como não surtar com o que leio. Tiro o telefone do
gancho e passo para a secretária um recado simples e direto: quero falar
agora mesmo com Robert. Recebo a informação de que ele está em reunião,
mas que virá assim que possível; me seguro para não ficar mais furioso do
que antes.
Isso é demais. Eu e Robert somos incrivelmente parecidos. Temos
altura semelhante, porte, cor de cabelo, os olhos claros, mas em
personalidade, nada mais é semelhante. Seu pai abandonou minha tia
Abigail quando era criança, e numa tentativa de compensação, deu tudo que
o filho queria; nesta, causou o estrago.
Disso posso agradecer ao meu pai. Mesmo sem minha mãe, aprendi
o valor do dinheiro e sou cauteloso, mas ele... Se permitir, vende a própria
casa para fazer uma festa de ostentação e ainda fica devendo parte do valor.
— Brian?
— Entra e senta — digo, voltando para minha mesa.
Ele me olha de rabo de olho e se senta.
— Primo...
— Que merda foi essa, Robert? — questiono ao jogar uma pasta na
mesa.
Ele pega o documento e olha com uma paciência fora do comum.
Analisa página por página das 20 folhas e só depois para e me olha.
— Prestação de contas. É só você assinar...
— Eu não vou assinar essa merda! — exclamo.
— Por que não?
— O que é esse gasto no SPA? Eu estava quase morrendo no Havaí
e você torrando dinheiro da empresa para relaxar? Que porra foi essa?
Ele se levanta e passa a mão no terno.
— Eu deveria ter te contado. — Torce o lábio.
— O quê?
— A Julie pediu o divórcio! — confessa com pesar.
Fico paralisado com sua fala. Ele e Julie sempre foram perfeitos
juntos e claramente ela o amava.
— Mas...
— Prefiro não falar disso. — Ele suspira. — Estava sem chão. Por
isso precisei do SPA, mas eu posso pagar. Deixa que eu abato nas minhas
contas.
Fico pensando em como fiquei quando me separei de Bárbara, e
realmente foi penoso. Fiz algumas merdas, mas nada tão ostentoso assim.
Somente me isolei um pouco mais e criei amizade com as garrafas e meu
telefone. Samuel aguentou muito a minha fossa. Porém, meu primo não tem
o mesmo histórico e um amigo como o meu.
— Rob. Eu vou pagar essas contas...
— Não, primo...
— Sim. Eu vou fazer o pagamento na minha conta pessoal — digo,
finalizando o assunto. — Mas espero que isso não aconteça novamente.
Contas da empresa são diferentes das pessoais.
Ele balança a cabeça.
— Sim...
— Por isso, vamos precisar realocar sua função — continuo.
— Como é que é?
— Rob...
— Nem vem com isso! Minha vida virou um inferno enquanto você
estava trepando com aquela brasileira no Havaí e ainda quer mexer no meu
dinheiro...?
— Olha como você fala da minha esposa... — ameaço, tentando me
controlar.
— Será que não percebe que ela é uma golpista, Brian?
Levanto-me na hora com as mãos em punho.
— Lave sua boca antes de falar da Bárbara, ou vamos entrar em
terras desconhecidas aqui.
— Senhor Smith? — chama a minha secretária.
— Então não se meta na minha parte da herança ou teremos grandes
problemas, priminho — acusa, saindo da sala.
A secretária me olha e fico pensando em como resolver essa merda.
— Devo chamar alguém?
— Não. Só anota que na reunião geral vamos ter que falar sobre
meu primo.
Ela balança a cabeça e sai da sala.
As horas se passam e enfim chega o fim do dia. Um pouco mais
cedo, recebi o recado de que Bárbara pegou carona com meu padrinho. Por
isso, vou para casa sozinho.
Assim que fecho a porta do carro, o cheiro do seu perfume toma o
ambiente e chego a sorrir mais relaxado.
— Quando te encontrar, vou mostrar o tamanho da saudade que
estou sentindo, minha linda — murmuro conduzindo o veículo.
Chego em casa deixando o carro com os seguranças e encontro na
entrada de casa a minha esposa.
— Raio de Sol?
Eu a chamo, mas meus olhos encontram com ninguém menos que
Scarlet sentada no sofá, acompanhada da minha tia Abigail e... um
garotinho bastante familiar.
— O que está acontecendo aqui? — pergunto, chamando a atenção
de ambos enquanto caminho para o centro da sala.
— Brian — declara minha ex abrindo um dos sorrisos ensaiados que
já conheço há tempos.
— O que você está fazendo aqui?
— Graças a Deus você está bem! — Ela me abraça, mas
imediatamente a tiro de perto de mim.
— Vai embora da minha casa. Não é bem-vinda aqui há bastante
tempo.
— Sobrinho. É melhor esperar um pouco — começa minha tia, mas
parece que o dia de hoje foi planejado para me tirar do sério.
— Do que vocês estão falando? — questiono e capturo o olhar
desesperado da minha esposa.
Sigo o olhar e vejo a criança brincando no tapete, alheia a tudo.
— Eu sei que não vai acreditar, mas ele é nosso filho e está
precisando muito do pai — declara Scarlet.
Viro meu rosto em sua direção e declaro firmemente: — Não é!
Ela arregala os olhos, chocada.
— Você quer que eu te lembre quando me engravidou?
— A gente nunca transou sem camisinha. Disso eu tenho certeza,
Scarlet — lembro.
— Mas teve uma vez que ela furou e...
Porra! Pior que ela está certa. Caralho! Foi uma única vez, mas... é
possível. Puta merda! Será que abandonei um filho gerado por acidente com
a Número Seis? Eu nem imaginava, mas isso também pode ser mentira.
Dou uma olhada no menino e realmente se parece comigo. Tem
cabelos escuros, olhos tão azuis como os da minha família e...
— Brian, você abandonou um filho para ir ao Brasil? — Bárbara me
pergunta, e pela primeira vez não sei o que responder.
Parece que tudo está girando em alta velocidade e não sei o que
dizer. Sento-me no sofá tentando me encontrar nessa volta de 360º que
minha vida está dando.
— Brian — Scarlet chama meu nome —, eu sei que te devo quatro
anos da vida do nosso filho, mas...
— Scarlet, fique calada. Eu preciso pensar...
— Ele é um menino bom...
— Se ele é mesmo meu filho, por que não apareceu antes? Sempre
teve acesso à minha família...
— Mas eu fiquei com medo de contar tudo e tirarem o Ryan de
mim.
Ryan. Esse é o nome dele.
— O parto foi difícil e fiquei muito envergonhada de falar disso.
Você estava no Brasil e eles poderiam exigir a guarda do nosso menino. —
Ela suspira. — Ninguém conseguia falar contigo enquanto estava lá.
E a culpa disso era de quem? Da própria que fez um inferno na
minha vida.
— Você não está sendo sincera, Scarlet.
— Claro que estou! — questiona, revoltada. — Brian, eu te procurei
por um tempo enorme. Tive que parar de modelar quando a barriga
começou a aparecer e até depois do nascimento, já que modificou todo o
meu corpo. — Ela tenta segurar minhas mãos, mas não deixo. — Quando
soube que tinha voltado para a Hamilton, descobri que já estava de
casamento marcado com a brasileira. Não deu tempo para te contar isso
antes.
Respiro fundo e passo as mãos nos cabelos, quase os arrancando de
nervoso.
— Você pode falar o que for, mas saiba que vou precisar de todas as
provas de que essa criança é realmente minha.
Esforço-me para encontrar uma luz diante desse pesadelo de ter um
filho com uma mulher que não amo, mas sou tragado pelo terror quando
escuto: — E você vai ter, meu querido.
Perdoem-me, mas não pude suportar escutar a tal da Scarlet
lembrando de quando engravidou do meu marido. Fato que aconteceu bem
antes de nos conhecermos. Vamos combinar, foi antes, mas quem quer
escutar esse tipo de coisa da ex?
Eu sei, o certo seria ficar ouvindo tudo ao lado dele, mas meu
estômago ou o meu ciúme não iria aguentar tanta tortura. Por isso, olhando
quem também claramente não estava participando da conversa, trouxe o
menino para a cozinha da mansão.
Deixei-os conversando, tendo a tia dele como observadora, e
convidei o menino para vir comigo. O rapazinho nem olhou para trás e
veio; acredito que fiz o melhor nesse momento. Quem já passou por um
trauma familiar sabe bem o que pode ser feito para evitar que isso se repita.
Então, eu o coloco sentado na mesa da cozinha e peço que deem
algum doce caseiro para ele, torcendo para que não tenha alergia alimentar.
Nada de repetir o episódio do camarão. Pelo amor de Deus!
— Oi. Qual o seu nome, rapazinho?
Os olhos azul-claros batem nos meus, mas ele não me responde de
primeira, apenas dobra os braços e baixa a cabeça. Tento novamente ao
entrar numa conserva como da época quando aprendi inglês.
— Meu nome é Bárbara e o seu...?
— Ryan — ele responde, abrindo um olhinho.
Ryan. Tinha que ter um nome semelhante ao do suposto pai? Calma,
Bárbara. Melhor não comentar sobre isso agora. Por isso, seguro nos dedos
que estão mais próximo e cumprimento.
— É um prazer te conhecer, Ryan.
Ele assume uma postura mais reta e aperta a minha mão como um
pequeno cavalheiro.
— O prazer é meu. — Então, volta-se para frente e percebo mais um
ponto do Brian.
Sei que ele ainda desconfia, mas está mais do que certo que essa
criança tem, sim, algum parentesco com meu marido. Impossível não ter. A
timidez e o jeito são totalmente do Brian.
Preciso parar um pouco de pensar nesse baita “Elefante na Sala”.
— Você quer comer alguma coisa? — pergunto, fugindo do óbvio.
Ele somente balança a cabeça afirmando. Somando ao doce, solicito
um lanche simples de biscoitos com suco e peço para que sirvam. A criança
come os primeiros biscoitos tranquilamente, mas do nada começa a tossir
forte. Eu acho que se engasgou, principalmente quando os espasmos
pioram. Começo a me desesperar. Será que estou matando o filho do meu
marido? Está vendo? Nem para madrasta eu tenho facilidade.
— Deus do céu! O que eu faço? — pergunto para as cozinheiras e
uma delas pega água, mas Ryan recusa, pegando na sua mochilinha uma
bombinha.
— Ryan...
Ele não me responde e se medica sozinho, apertando o inalador duas
vezes e recuperando a respiração como se nada tivesse acontecido.
Depois, volta a tomar suco e comer os biscoitos. Simples assim.
Ryan até me oferece o biscoito, mas depois do coração ir até a boca de tanto
nervoso, prefiro somente tomar água. A tal da Scarlet não mentiu, esse
menino precisa urgentemente de ajuda.
— Está ouvindo isso, Brian? — Scarlet questiona, mas não estava
prestando atenção em nada.
Apurando os ouvidos, percebo o barulho de criança tossindo lá
dentro de casa. Também procuro Bárbara, não a encontrando. Estamos
somente a Número Seis e minha tia.
— É o nosso filho lutando para respirar contra a asma — ela
esclarece.
— Como é que é? Você o deixou sem medicação? — indago,
preocupado.
— Claro que tem, Brian — responde. — Que tipo de mãe eu seria?
A verdade é que Ryan desenvolveu esse mal com seis meses de vida, e
desde então sofre com as medicações, que são caras.
Suspiro um pouco aliviado. Mesmo sem saber se o garoto é meu
filho, jamais desejaria mal a uma criança.
— Scarlet...
— Se aquela brasileira não tivesse te cercado o tempo todo, teria te
contado. Eu juro. Ryan é seu filho e já estava necessitando de apoio desde
quando engravidei. Você sabe que remédios não são baratos, não é? E agora
que não consegui mais convites de trabalho, vou precisar que me ajude com
a saúde...
— Para com isso! — exijo, cortando o seu velho drama crônico.
— Você sabia que asma pode matar? Ryan poderia não ter
resistido...
A merda é que, em meio às pesquisas que fiz quando jovem sobre
uma bronquite que Madson e Robert desenvolveram na infância, sei que
não está mentindo.
Não dá para ter certeza que é meu filho, mas jamais deixaria de
ajudar uma criança necessitada. Posso afirmar que Scarlet não foi a minha
melhor namorada, mas o menino não tem culpa da mãe que tem. Quem sabe
realmente seja meu filho?
Depois vamos descobrir sobre isso. O mais importante é resolver o
que está diante de mim. Por isso, me levanto do sofá e pego no bolso do
meu terno o telefone.
— Eu vou te ajudar, mas não espere mais do que isso antes de
confirmar a real paternidade do menino.
Um sorriso triste brota em seus lábios e uma lágrima desce pela
face.
— Agradeço, mas você não imagina quantas vezes tentei te achar,
Brian! — argumenta. — Quando tive o teste positivo, eu vim te procurar,
mas me contaram que estava no Brasil com o Samuel. Liguei pelo seu
telefone, mas nem o seu melhor amigo, que seria o nosso padrinho de
casamento, atendia minhas ligações.
— Para de história. Sabe que me afastei da América por sua causa e
todo aquele circo que armou — recordo. — Lembra do escândalo que
causou quando eu não aceitei casar contigo?
Ela limpa as lágrimas e aperta os lábios olhando para os lados.
— Eu sei que errei quando terminamos...
— Você tentou me dar um golpe, Scarlet! — esclareço, nem um
pouco convencido da sua cena. — Ainda usou a mídia mundial para fazer
tudo...
— Me perdoe! — grita em desespero. — Eu não sabia que estava
grávida de um filho seu.
— Mas se soubesse, teria feito pior — confesso.
Ela olha para cima deixando mais uma lágrima rolar em seu rosto.
— Lembra daquela noite? — pergunta.
— Scarlet... — começo, tentando impedi-la de falar daquele dia que
prefiro esquecer. Porém, sei que não vai adiantar.
Seus olhos castanhos passam por meu corpo e desvio olhando para o
telefone.
— Era nosso aniversário de namoro.
Lembro dessa noite, mas preferia esquecer.
— Você me deu uma pulseira linda de diamantes, feita em ouro
branco. Tivemos um jantar fabuloso e fechamos a noite nos amando
enquanto eu vestia somente aquela joia...
— E o preservativo estourou e te comprei a pílula do dia seguinte —
declaro com frieza. — Dessa parte eu lembro.
— Você sabe que aquilo não é totalmente certo...
Suspiro, cansado dessa besteira toda, e abro o aplicativo do meu
banco. Acredito que cinco mil dólares será o suficiente para ela se
estabelecer com o menino.
— Brian — ela me chama.
— Scarlet, relembrar o passado não vai resolver nada — declaro
com firmeza. — Já te falei. Só vou fazer algo a mais quando tiver um teste
de DNA.
— Não acredito que desconfia de mim — diz, tentando me tocar. —
Eu ainda te amo e se aquela brasileira não tivesse entrado no seu caminho,
seríamos uma família.
— O que está rolando aqui? — Escuto a voz de Madson, que
claramente caiu no meio dessa loucura.
Simplesmente tiro os braços da mulher de perto de mim, ficando
furioso com minha tia, que nada faz. De positivo, Bárbara aparece
segurando o menino pela mão.
— Filho! — A mulher pega o menino nos braços, lançando um
olhar enviesado para minha esposa.
— Scarlet, deixe com minha tia o número do seu telefone...
— O meu número permanece o mesmo — declara, mirando meus
olhos.
Puta merda! Era só o que me faltava.
— Não me recordo. Somente faça o que estou falando — exijo e
puxo Bárbara para perto de mim, sentindo-a fria ao meu toque.
— Diga tchau para o papai, Ryan. — Ela me olha e avisa: — Daqui
a uns dias o trago de volta.
Olho para o menino, que somente cai nos ombros de Scarlet sem
entender nada. Então, vão embora deixando para trás um problema épico
que nem imagino como irei resolver. Puta merda! O que eu faço agora?
Sabe aquelas situações em que você quer fazer muita coisa, mas está sem
ação diante das circunstâncias insanas que se apresentam? É desse jeito que estou.
— Bárbara? — Brian chama a minha atenção, mas parece que estou em
outro planeta.
Vamos combinar. Quem imaginaria uma bomba dessas?
Então, percebo que Madson estava na entrada da casa e passa por nós.
— Mad... — ele a chama.
— Irmão, depois a gente conversa. Acho que seria melhor falar com a
Bárbara primeiro. Ok? — Antes que possamos dizer algo, ela sobe para seu
quarto.
Viro-me para Brian e toco seu rosto, percebendo que mesmo sendo a
esposa de conveniência, ele precisa de mim.
— Vamos subir? — pergunto.
Ele somente segura minha mão e nos leva para o quarto. Tranco a porta e
fecho as cortinas, dando-nos privacidade. Brian se afasta e entra no closet. Tira
suas roupas e segue para o banheiro, ao passo que entra na banheira ainda vazia.
Abre todas as torneiras, enchendo-a enquanto está lá.
Fico o observando, perdido em seus pensamentos, claramente perturbado
com essa situação. Pego um pouco de sais de banho e jogo na água. Ele segura
minha mão, me impedindo. Seus olhos travam nos meus e consigo ver o medo
aterrorizante em seus olhos.
Sem me importar de ainda estar vestida, entro na água quente com ele.
Seus braços prendem o meu corpo junto ao dele. Sinto seu toque em meu rosto e
fecho os olhos, sentindo meus cabelos sendo soltos do prendedor.
Suas mãos passam por debaixo da minha blusa e levanto meus braços,
facilitando para que as retire de meu corpo. Levanto-me um pouco, ainda presa em
seu Mar Azul enquanto tiro a calça e a calcinha.
Brian me puxa para ele, fazendo com que uma parte da água caia, mas
pouco importa. Nesse momento, sinto-me como se fosse a sua fórmula sob
medida. Não posso negar que estou mais do que envolvida com Brian, e dói
demais ver o homem que amo assim.
— Brian...
— Shiii! — Ele coloca as mãos em meus lábios. — Seja somente minha
mulher. Só preciso disso neste momento.
Sorrio e me prendo em seus braços, beijando sua boca e permitindo que
nossas línguas se toquem enquanto sinto suas mãos acariciando todo meu corpo.
Jamais poderia negar que sou dele.
Quando achei que continuaríamos aqui, Brian me ergue da água e me
carrega para a cama.
Adorada. Não tem outra palavra que possa descrever como me sinto
quando os olhos de Brian observam meu corpo. Ainda estamos molhados, mas não
sinto frio. Na verdade, há um calor fervente que começa no dedo do pé e vai até o
fio de cabelo.
Brian segura uma das minhas pernas e tira os olhos dos meus para beijar
meus pés, subindo pelo calcanhar, joelho, coxa, até chegar ao meu centro. Faz o
mesmo na outra perna, deixando-me fervendo por ele.
Seus toques vão para meus braços repetindo o mesmo processo. Quando
seus lábios tocam meu seio, um gemido escapa dos meus lábios. Seus dedos tocam
o outro, massageando-o enquanto amasso seus cabelos, sendo arrebatada com
tamanha atenção.
Brian não está com pressa. Por isso, desce lentamente beijando minha
barriga, meu umbigo, e por fim abre minhas pernas, deixando toda a minha
intimidade a seu bel-prazer. Sinto sua língua passar e solto um gritinho de
antecipação. Seus dedos mergulham dentro de mim e sua boca me devora.
Estou tão excitada que sei que não vou demorar para gozar. Mesmo sendo
somente o dedo, Brian consegue o que quiser de mim. Seu toque fica mais rápido
e não consigo segurar meus gemidos de puro prazer. Quando chego ao ápice, ele
ainda está me chupando como se eu fosse sua fruta favorita.
Capturo seus olhos e sei que ainda não terminou. Na verdade, nem sei se
quero que termine.
Ele escala meu corpo, deixando uns beijos quentes no caminho. Depois,
levanta uma das minhas pernas e a coloca em sua cintura, entrando em mim de
uma única vez, sem dar aviso.
Arfo com a surpresa e seus lábios tomam os meus. Brian mete fundo e me
beija com profundidade. Suas mãos me apertam enquanto me arremete com força.
Ele me arranca mais um orgasmo, chegando ao ápice junto comigo.
Espero que se recupere massageando seus cabelos. Brian me coloca de
lado e consigo perceber que o desespero de mais cedo está diminuindo.
Ele segura minha mão esquerda e beija minha aliança com uma ternura
fora do comum.
— Você não imagina o quanto é importante na minha vida, Bárbara —
declara.
Sorrio em resposta a seu gesto e deixo meu coração falar: — Seja como
for, vou estar do seu lado, meu marido.
Crash!
— Ai! — grito, despertando.
Olho para os lados, mas não encontro nada quebrado. Ainda está de noite,
mas tenho certeza de que ouvi barulho de vidro.
Tiro os braços do meu marido de cima de mim e vou ao banheiro à procura
de algo que tenha caído. Entretanto, está tudo no seu devido lugar. Volto para o
quarto tentando ver se tem algo aqui no chão; mesmo com a luz da lareira acesa,
não encontro nada.
Abro a porta que dá para o corredor e escuto vozes ao longe. Como isso
aqui é enorme e está de madrugada, deve ter sido alguém da equipe de cozinha
que deixou algo cair.
— Amor, cadê você? — Escuto a voz rouca de Brian.
Ele nunca mais me chamou assim e só esse pouco já é o suficiente para
aquecer meu coração molenga. Então, retorno para os cobertores e me prendo aos
seus braços.
— Estou aqui, meu amor — respondo ao me aconchegar em seu calor,
adormecendo em minutos.
Um silêncio a nível ensurdecedor. Olho de relance para Bárbara e
consigo ver os nós de seus dedos brancos contra sua bolsa de mão. Está
claro o quão furiosa se encontra, e ela tenta se conter para não explodir. Sei
o motivo disso, e ele corresponde a uma única pessoa.
Ligo o som do carro e coloco uma música clássica bem tranquila
para que ela relaxe, entretanto, está nítido seu nervosismo. Principalmente
por reduzir o volume até nos encontrarmos, outra vez, em extremo silêncio.
Preparo-me, aguardando o seu momento de fala, mas os minutos se
passam e nada disso acontece tão cedo.
Agora, estamos em um dos meus carros voltando de um evento
beneficente, no qual fomos convidados para representar a Hamilton.
Passamos duas horas por lá e estamos voltando para casa.
Entretanto, o aborrecimento dela aconteceu antes da nossa ida ao local.
— Abigail está cada vez mais intragável, Brian. Principalmente para
agradar aquela infeliz — reclama.
— Bárbara...
— A sua tia me detesta e sei que se tivesse a oportunidade, me
mandaria de volta para o Brasil sem pestanejar...
— Ela não pode fazer isso com a minha esposa.
— Mas se ela descobrir a verdade sobre nós...
— Isso não vai acontecer, Bárbara — finalizo, encerrando o assunto.
Ela bufa, batendo a mão no painel.
Eu deveria ter imaginado que o problema era maior que Scarlet na
nossa casa. Por incrível que pareça, Bárbara está certa. Antes da chegada da
minha ex, no início da semana, minha tia ligou para meu escritório na
empresa para questionar os costumes peculiares da minha mulher. Falou do
vício de banho, da mania de guardar as coisas em lugares estranhos para
nós. Tentei explicar, mas quando argumentou de que fiz uma péssima
escolha para esposa, encerrei o assunto deixando claro que ela não
influencia minhas escolhas. Podemos estar num casamento de fachada, no
entanto, nunca desejei outra mulher como quero a minha Raio de Sol.
— Vou tentar conversar com ela — afirmo para Bárbara.
Ela somente balança a cabeça e se mantém quieta enquanto
trafegamos pela estrada quase congelada pela neve. Quando entramos, a
sala está vazia e seguimos para o nosso quarto. Assim que a porta se fecha,
seu telefone toca. Bárbara corre até o computador, que fica numa mesa que
deixamos no quarto, e começa a mexer nele.
Troco de roupa e vou atrás de dona Abigail. Posso afirmar que
estamos estremecidos, mas como é com a minha esposa o problema, isso é
algo para que eu resolva.
Bato na porta de seu quarto, mas quem a abre é Scarlet. Ela me dá
um daqueles sorrisos que nunca tiveram efeito comigo e me pergunta: — Se
perdeu no caminho para o quarto da brasileira? Bem que a gente poderia
relembrar o passado...
Suspiro, resignado.
— Não mesmo, Scarlet. Estou em busca da minha tia. Ela deveria
estar aqui.
Seus lábios se curvam num sorriso e ela passa os dedos nos cabelos
lisos.
— Ela foi um amorzinho e trocou de quarto comigo. — Scarlet sai
do recinto. — O nosso menino está aqui do lado...
Estranho esse comportamento dela por saber que ama demais a vista
matutina que o cômodo possui. Pensando bem, Scarlet poderia ficar no
mesmo que o filho, não é? Agora, tenho que concordar com Bárbara: minha
tia tem uma clara preferência para a Scarlet. Isso é péssimo.
Nem me despeço da minha ex e caminho para o quarto de hóspedes
que fica vazio normalmente, e minha tia, que me atende de pronto, me
coloca para dentro de seu quarto. Por conseguinte, temos uma conversa
sobre o que ela pode ou não fazer aqui, não sendo a dona da casa.
— Aquela estrangeira não pode fazer isso comigo, Brian —
reclama. — Eu estou aqui há mais tempo.
— A senhora sabe que ela é minha mulher. Depois que meu pai
deixou a responsabilidade da empresa e da casa nas minhas costas, quem
coordena a mansão é ela e não pode desacatar às suas ordens...
— Estava ajudando ao seu filho, que é como se fosse o meu neto —
retruca.
Respiro fundo.
— Tia, do jeito que está agindo, está criando atrito no meu
casamento. — Foco seus olhos e digo: — Exijo que não se intrometa nos
assuntos da minha mulher e de Scarlet. Espero que estejamos entendidos
depois disso.
Seu rosto começa a avermelhar de pura raiva, no entanto, não posso
fazer nada sobre isso. Então, viro-me e retorno para meu quarto quando
escuto: — A Scarlet seria uma esposa melhor para você...
— Já falei que não vamos entrar nesse assunto.
Estou cansado dessa insistência, por isso volto-me para ela.
— Somente para a senhora saber, eu amo demais a minha esposa e
espero um dia encher essa casa de brasileirinhos meus e dela. Independente
disso, mesmo se Bárbara não existisse e não tivesse surgido em meu
caminho, tenho certeza de que não estaria com Scarlet. Ela pode ser bonita,
mas nunca me atraiu nem um por cento do que a minha mulher faz. Então,
se realmente se considera como minha mãe, pense na minha felicidade e
jamais repita essas palavras.
Depois, saio de seu quarto batendo a porta.
Sinto como se o peso de um mundo tivesse saído das minhas costas.
Declarar meus sentimentos sobre Bárbara trouxe um alívio enorme para
minha alma. Eu e ela ainda não trocamos palavras apaixonadas, mas
qualquer um que me vê perto dela percebe o quanto a amo.
O Ryan, que pode ser meu filho realmente, falou a mesma coisa na
nossa última conversa.
Trim Trim.
Escuto o barulho ao longe, mas estou morto de cansado.
— Brian, é o seu telefone. — A voz da Raio de Sol me desperta um
pouco.
Espreguiço-me e tento pegar o aparelho, que nem imagino onde
deixei. Vou seguindo o som até que o encontro dentro do casaco que deixei
no chão. Vejo ser uma chamada do diretor financeiro da Hamilton.
Suspiro e atendo a contragosto.
— Alô — falo com a voz rouca.
— Chefe, você precisa vir urgentemente para a empresa. — Ele
suspira. — Tem um problema daqueles para o senhor ver...
— Me conte — exijo.
Ele fica em silêncio por alguns minutos.
— Seu primo, Robert Hamilton, fez uma grande retirada nas contas
da empresa.
— Como é que é!? — questiono, levantando o meu tom de voz e
saindo da cama.
— Brian — minha esposa reclama —, preciso dormir.
— Desculpe, amor. Descanse. — Beijo sua cabeça e entro no
banheiro.
O meu diretor vai me explicando e a cada instante, fico mais
furioso. Rob não fez uma grande retirada nas contas da Hamilton, ele pegou
uma fortuna em títulos. Mais de um milhão de dólares retirados do caixa da
empresa.
— Como vocês deixaram que ele fizesse isso? Eu não permiti!
— Senhor, é melhor que venha...
— Está bem. Chame o jurídico, faça a demissão dele, prenda-o se
for possível. Robert vai ter que devolver cada centavo da Hamilton.
Quando estava quase dormindo de novo, senti um beijo em minha
barriga e as palavras do meu Brian.
— Cuida da mamãe, filhote. Mais tarde, papai tá em casa.
Eu até ia impedi-lo de ir sem me dar um beijo de verdade, mas sabia
que tinha que sair. Aquela ligação, agora há pouco, o deixou preocupado
demais, mas não a ponto de nos esquecer. Provavelmente mais uma bomba
tinha explodido e Brian estava indo socorrer os feridos.
Pouco depois que foi embora, me arrumei, mais tranquila, e passei o
aviso aos empregados sobre quem não mais morava aqui. Depois, comprei
um telefone para mim, já que Brian está usando o antigo do Brasil, e voltei
para a agência.
Todos se mostraram bastante preocupados comigo e alguns, até
desconfiados. Entretanto, esclareci a todos o que tinha acontecido, deixando
claro que meu casamento estava indo muito bem. Contei também que estou
grávida.
Graças aos céus, eles me apoiaram. Na hora do almoço, fui ver o
meu menino de ouro. Quando entrei no hospital, percebi um clima estranho
entre os funcionários e logo me preocupei com Ryan.
Ainda bem que liberaram logo o meu acesso e subi rápido para ver o
que tinha acontecido com ele. Agora, estou abrindo a porta do quarto e
graças aos céus, fico aliviada ao vê-lo brincando sozinho com um carrinho
de brinquedo.
— Ryan — eu o chamo e ele abre os bracinhos para mim.
Trago-o para meu peito, beijando sua cabeça. Procuro por sua mãe,
mas não a acho. Pergunto à enfermeira, mas a expressão em seu rosto me
traz novamente preocupação. Tento ligar para a doida da Scarlet, mas a
chamada é encaminhada para a caixa de mensagens.
— Ryan, você sabe da sua mãe? Ela não veio te ver? — pergunto
para o meu pequeno.
— A minha outra mamãe não veio hoje. Só você, mãe.
Suas palavras me surpreendem e involuntariamente, um sorriso
cresce em meus lábios.
— Como assim sua outra mãe, meu amor? — pergunto, limpando
uma lágrima que cai. Deus do céu! Como ando emotiva.
Eu amo esse menino de ouro como filho desde o dia em que o
encontrei, mas ele sabe que não nasceu de mim, e isso é demais para o meu
coração.
— Você também é a minha mamãe. Não é, Babi? — Seus olhos
interrogativos vão sobre mim.
Confirmo com a cabeça e o trago junto a mim, deixando as lágrimas
de alegria virem.
— Eu sou sua mãe, meu amor. — Beijo sua cabeça. — Do fundo do
meu coração, você é o filho que a vida trouxe.
— E vocês são a razão da minha felicidade. — Escuto a voz de
Brian, que entra no quarto.
Ele se aproxima sorrindo e cobre seus lábios com os meus, beijando
em seguida a cabeça do nosso filho mais velho.
— Amor, precisamos conversar — ele me avisa, mas estou sem
vontade alguma de me separar do meu menino de ouro. — Você me deixa
roubar sua mãe um pouquinho? — pergunta para Ryan.
— Não demora — reclama, se soltando de mim e nos fazendo rir.
— Prometo que vai ter sua mãe Babi por muito tempo — responde,
segurando minha mão.
Ele fecha a porta e começa a me contar o motivo pelo qual saiu cedo
hoje. Eu ainda não acredito que um outro herdeiro bilionário tenha roubado
o dinheiro da empresa da família. Porém, o que vem depois disso me deixa
preocupada.
— Foi como um assalto. Eles não tiveram como impedir. Rob ficou
louco e seu fascínio por dinheiro chegou a níveis fora do comum.
— Deus do céu, Brian. Eu sabia que ele era um crápula, mas não
que se tornaria um bandido desse jeito.
Ele balança a cabeça.
— Tem outra coisa, amor. A Mad e a tia Vic me contaram que tem
algo importante para nos dizer. No entanto, tem que ser em casa.
— Mas o Ryan? — questiono.
— Vocês são os responsáveis pelo menino aqui?
Um médico se aproxima de nós, interrompendo a conversa.
— Somos os pais — afirmo e sinto Brian segurar a minha mão.
— Era para ter alta ontem, mas nenhum responsável apareceu...
— A gente veio tarde da noite — informa meu marido —, ele já
estava dormindo.
— Entendido, mas ele está de alta. Somente mantenham as
medicações, evitem friagem que o menino vai se recuperar completamente.
Sorrio animada, e sem esperar as receitas médicas, entro no quarto.
— Está tudo bem, mamãe? — pergunta.
— Sim, filho. Nós vamos para casa, meu amor — informo.
No entanto, ele fica triste e cruza os braços.
— Não quero ir — responde. — Quero ficar aqui.
— Filhão. — Brian se senta ao meu lado. — Vai ser bom voltar para
a mansão. Vai ser somente eu, você, sua mãe Babi e o seu irmãozinho que
ainda vai nascer.
Os olhos dele brilham. Por isso, prefiro não corrigir Brian,
lembrando-o que temos uma Scarlet no nosso caminho que pode atrapalhar
os nossos planos de família. Outra hora explicaremos isso para o nosso
menino de ouro.
— Vou ter um irmão?
Então, foi nisso que o nosso menino de ouro pensou? Um irmão?
— Sim, meu amor — respondo, rindo. — E você vai ajudar muito a
cuidar dele, mas não se esqueça de que também pode ser uma menina.
— Sim. Imagina uma garotinha linda como a sua mãe. Vai dar
trabalho para a gente, não acha, Ryan? — comenta Brian, segurando a perna
dele.
— Mas eu vou ajudar, papai — promete ele, sorrindo.
— Para ajudar, você precisa sair daqui — aviso. — Vamos para
casa?
Só então ele concorda e chamamos a enfermeira para nos ajudar.
Pouco depois, estamos os três indo para casa. Ryan está animado e contente
em estar em família conosco. Preferi ficar no banco de trás e manter o nosso
menino quieto nos meus braços.
Quando passamos na estrada que leva para a saída da cidade, vemos
que está um trânsito dos infernos por conta de um acidente. Eu achei que
seria uma viagem rápida para casa e depois iria voltar para a agência, mas
não foi o que aconteceu. Logo após mais de meia hora de viagem, ligo para
eles avisando que não retornaria.
Entretanto, quando entramos na mansão, estranho a presença de
tantas pessoas na casa. Uma delas, Abigail, que chora desesperadamente
sentada no sofá da sala.
Deus do céu! O que será que aconteceu?
— Que merda está rolando aqui? — murmuro para mim mesmo,
entrando em casa.
A princípio, encontro minha tia sentada no sofá chorando. Também,
a ex-mulher de Robert, que por sinal é a melhor amiga da Scarlet.
— Eu sei que não é o melhor momento para ouvir essas coisas. No
entanto, a senhora precisa saber que tipo de homem seu filho era — declara
Julie.
Era?
— O que está acontecendo aqui? — questiono, chamando a atenção
de todos para mim.
Minha tia está com o rosto vermelho, lavado em lágrimas. Seus
olhos se voltam para Ryan, que ainda está segurando a minha mão, e ela
chora, mais desesperada ainda.
— Babi... — Viro-me para a minha esposa, que pega o nosso filho e
leva para dentro.
— Vem com a mamãe, amor. — Ela o leva, me deixando para
resolver mais uma situação.
Ainda bem que Mad aparece e me abraça.
— Irmão, aconteceu uma tragédia.
Sinto um frio nas costas e só então ela se afasta e me fala: — O Rob
e a Scarlet morreram num acidente hoje de manhã. O pior é que não acaba
por aí.
— Como assim? — questiono, chocado com a notícia. — Não sou
fã de Scarlet e estou furioso com Rob, mas... jamais desejaria a morte dos
dois. Ela é a mãe do Ryan e...
As palavras morrem em meus lábios enquanto estou processando a
situação.
Meu primo morreu. A mãe do meu filho também... Como isso está
relacionado? Como que...
— Maninho, é melhor irmos para dentro. A Julie está conversando
com a tia Abigail e a tia Vic quer conversar com você e a Babi.
Concordo, sendo conduzido para o escritório do meu pai. Lá,
encontro minha esposa sozinha com minha tia. Quando passo pela porta,
percebo seus soluços de choro e me preocupo imediatamente.
— Como que ela morreu? Como vou explicar isso para o Ryan?
Ele... — Sua voz some e me sento ao seu lado, trazendo-a para meus
braços.
— Vou explicar melhor para vocês o que sabemos até agora —
começa minha irmã, fechando a porta.
— Nem imagino como vão reagir quando souber de tudo — declara
minha tia, pegando uma caixa de lenço para Bárbara.
— O que querem dizer? Parem de rodeio e contem logo de uma vez
— exijo, já sabendo que o que virá não é coisa boa.
— Brian. O Rob e a Scarlet tinham um caso de muitos anos —
confessa minha irmã, se encostando na mesa do escritório e aguardando a
nossa reação.
— Anos? — questiona Bárbara, tão surpresa quanto eu.
— Como é que é?
— Eu sinto muito dizer isso, mas... — minha irmã suspira — a
gente fez uma pesquisa com um investigador e... Merda!!! — Seus olhos
batem nos meus enquanto deixa os papéis sobre a mesa, provando o caso
deles. — Maninho, o Ryan não é o seu filho, é do Robert.
— Fala que é mentira agora, Madson! — ordena minha esposa,
revoltada.
— Babi, eu sei que... — minha irmã vai explicando e não consigo
compreender suas palavras.
Não consigo acreditar nisso. Como que isso tudo é mentira? Ryan
foi apresentado como meu desde o início e nada me dizia que não poderia
ser verdade. Principalmente por ele ser parecido demais comigo, mas...
Pensando melhor agora, com essa informação, mesmo o menino sendo a
minha cara, eu e Rob somos, digo, éramos muito parecidos.
— Espera um pouco... — falo depois de uns instantes, refletindo. —
Vocês têm certeza disso? Até hoje não consegui fazer o exame de DNA por
causa da Scarlet que...
— Eu encomendei no hospital, Brian — minha tia avisa, pegando da
bolsa um exame. — Recorda-se de quando fez os seus exames da empresa?
Confirmo com a cabeça, me lembrando de que, há poucos dias, foi
solicitado que eu fizesse exames simples. É um padrão na Hamilton.
— Pedi para pegar uma amostra sua em sigilo. Desde quando foi sua
noiva, Scarlet não se mostrava confiável. Entretanto, quando vi a marca de
nascença da família paterna de Rob na nádega direita do menino, precisei
confirmar — confessa. — Eu sinto, digo, sentia muita mentira naquela
mulher, mas a verdade é que Ryan é seu primo de segundo grau. Não é seu
filho.
Estou sem chão diante de uma notícia como essa. Não me sinto
traído pela Scarlet, mas iludido por toda essa farsa. Está claro que a única
coisa que ela queria era dinheiro, e nada mais... Eu me apaixonei por aquele
menino como se ele fosse realmente meu filho e... Sinto um apertão mais
forte em meus dedos e a minha Raio de Sol sorri para mim. Demoro uns
instantes para perceber e só então entendo o que quer. Por isso, sorrio de
volta para ela.
— Eu estou arrasada em saber que aquele menino doce perdeu o pai
e a mãe num acidente... — comenta minha irmã.
— Mad — eu a interrompo. — O Ryan tem a nós. Mesmo que ele
não seja meu filho biológico, já se tornou nosso faz tempo. Não é, meu
amor?
— Sim. Nós vamos adotá-lo — declara a minha esposa, sorrindo
para mim. — Será o nosso filho mais velho como o consideramos, e vamos
dar muito amor para eles.
Dou um beijo suave em seus lábios.
— Mas como mais... Espera aí. Você tá grávida? — minha irmã
pergunta e confirmamos. — Vou ser titia!
— Sim, Mad — respondo. — Tia de dois de uma vez só.
— Eu também adoro aquele garoto quietinho — confessa, nos
abraçando. — Eu adorei saber que tem mais um sobrinho chegando.
— Felicidades para vocês — deseja minha tia. — Sei que estão
vivenciando uma alegria do recomeço, no entanto, devo dar conforto para
minha irmã — avisa, caminhando para porta. — Tenho ciência de que ela e
os dois falecidos erraram muito, mais de uma vez, entretanto, nenhuma mãe
merece perder o filho. Mesmo ele sendo um mau-caráter como foi o Robert,
que renegou um menino lindo como o pequeno Ryan — declara ao sair. —
Até mais tarde.
Permanecemos com minha irmã e ela nos conta como aconteceu o
acidente. Pelo que soube, os dois entraram na mansão pouco depois de eu
mesmo ter expulsado Scarlet. Rob pegou a chave de um dos carros mais
caros da garagem e ambos foram para a empresa. Como precisavam de
dinheiro, fizeram um desfalque daqueles— que ainda estou pensando em
como vou resolver — e depois foram embora, abandonando o filho.
Conforme Mad me diz, eles não tinham mais o que perder depois
que o golpe, quando tentaram nos separar, não surtiu o efeito desejado. A
confirmação provavelmente aconteceu quando a mandei embora da mansão,
deixando claro, com todas as letras, que jamais teríamos algo.
— Os bombeiros avisaram que o Rob perdeu a direção do carro
numa curva e caiu numa ribanceira. A queda foi grande e nenhum dos dois
sobreviveu.
— Deus do céu! — Bárbara exclama.
Eu a trago para meus braços e beijo seus cabelos. Mad sai para
pegar água.
— Amor, vamos ter que explicar isso para o Ryan — comenta.
— O que acha de esperarmos ele crescer mais um pouco? —
questiono. — Talvez quando chegar seu irmãozinho...
— Ou irmãzinha — declara e eu rio, colocando a mão em sua
barriga.
— Quem sabe mais alguns? — pergunta, sorrindo.
— Assim você me mata, Raio de Sol — confesso, roubando um
beijo dos seus lábios doces.
— Mas não é você que diz que o sete é o seu número da sorte?
Meses depois.