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TÍTULO — OS BEBÊS DO COWBOY VIÚVO

Maria Amanda Dantas

Revisão: Luana Souza


Capa: LA Creative
Diagramação: Grazi Fontes – Artes Gráficas

Todos os direitos reservados.


Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares
e acontecimentos descritos são produtos da imaginação
da autora.
Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos
reais é mera coincidência.
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida
por qualquer meio ou forma sem a prévia autorização dos
autores.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na
Lei nº 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
SUMÁRIO
Sinopse
Nota da autora
Dedicatória
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Epílogo
Agradecimentos
Um cowboy destruído pela perda de um grande amor.

Uma menina inocente quebrada emocionalmente pela


perda da irmã amada.Ele busca paz.

Ela busca vingança.

Maria Luíza sabe quem foi o responsável pela morte


da sua irmã. Na última vez em que a viu, ouviu ela chamar
o nome dele várias vezes ao celular. Otto Cavalcante. Ela
pesquisou sobre a sua vida e descobriu que os dois se
casaram e tiveram bebês gêmeos.
Um cowboy bilionário, que vive em uma fazenda, no
interior de Nova Lima, em Minas Gerais, não esperava que
uma moça da cidade fosse aceitar ser a nova cozinheira
em sua casa. Desde que a viu, ele sentiu algo diferente.
Seu coração acelerou. E ele decidiu brincar com ela,
passando a reclamar da sua comida, ganhando cada vez
mais seu ódio e desprezo.

Malu foi em busca de provas que pudessem incriminar


Otto e, assim, poder fazer justiça pela sua irmã.

Otto não imagina que a nova cozinheira da fazenda é,


na verdade, sua cunhada.

Provocações quentes se iniciam entre os dois.

Ela não deseja se envolver com ninguém, muito


menos com o pai dos seus sobrinhos, e fará de tudo para
não o amar.

Dizem que ódio e amor caminham lado a lado. Pode


ser verdade?
Este livro é um romance. Tudo descrito nele é fruto da
minha mera imaginação. Cidades e nomes de estados
incluem algumas alterações e dados que eu acrescentei
com a minha liberdade de escrita.
A todos os leitores de romance que amam um cowboy
de coração partido e uma mocinha determinada.
Respiro fundo ao reconhecer no IML o corpo imóvel
da minha irmã. Nenhuma irmã amada deveria partir assim,
tão repentinamente. Eva era uma menina doce, a mais
gentil e, acima de tudo, cheia de sonhos. Ela era a pessoa
mais bondosa que já conheci em toda a minha vida.
Quando ficamos sem o nosso pai, passamos a morar com
a nossa tia Teresa e o seu marido, Paulo. Ele é o homem
mais abominável que conheço em todo o mundo. Minha
irmã e eu escapamos de muitas tentativas de abuso da
sua parte. Ele é, sem dúvidas, o ser mais desprezível de
toda a Terra. Já a minha tia é uma mulher amorosa,
incapaz de enxergar a maldade dele.

Mas tentamos seguir em frente. E quando Eva


completou dezoito anos, conseguiu um emprego. Eu era
jovem demais para perceber que o marido da minha tia
não queria somente brincar, e toda a sua atenção, eu
atribuía a um carinho paterno, já que ficamos bastante
carentes depois da morte do papai. Eva era seis anos
mais velha que eu, responsável, e conseguimos ir morar
em outra casa graças ao bom salário que recebíamos. A
saúde da minha tia não era uma das melhores, mas, ainda
assim, fomos obrigadas a deixar seu lar, para a nossa
proteção.

“Eu sempre vou cuidar de você, irmãzinha. Confie


sempre em mim” — era o que minha irmã me dizia dia e
noite, sem parar.

Ela sempre estava lá quando eu acordava assustada,


com medo, por conta de algum pesadelo que eu não sabia
explicar a razão pela qual o havia tido. Não sei até hoje. E
tudo isso era relacionado ao Paulo. Nós nos mudamos
para outra cidade a fim de poder viver em paz. A nossa
vida era simples e pacata, porém éramos bastante unidas.
Sempre fomos apenas eu e ela cuidando uma da outra.
Terminei os meus estudos graças à Eva e à sua
disponibilidade em trabalhar para garantir que nada nunca
me faltasse. Serei grata a ela eternamente por todos os
seus esforços.

Estou vendo-a completamente sem vida, com partes


do seu corpo entrando em decomposição, tão pálida e sem
cor. Não posso imaginar uma dor pior que essa, a dor de
perder uma irmã querida e amada. A minha vida nunca
mais será a mesma sem ela.

— Filha, não se preocupe com nada. Paulo está


organizando tudo para o enterro. Como você mesma vê,
não haverá velório, devido às condições do corpo.

Disseram que minha irmã foi encontrada sem vida


próxima a uma área rural. O carro que ela estava dirigindo
até resultar no acidente sofrido estava completamente
destruído, mas o fogo causado pelo vazamento de óleo
não a queimou viva, pois segundo a perícia, ela conseguiu
sair do veículo com vida e morreu a poucos metros de
distância do local.

— Eu entendo, tia. No entanto, estou muito abalada.


Eu jamais acreditei que minha irmã pudesse morrer tão
jovem.

Meu choro rasga a alma, juntamente com o choque da


notícia.
— Você sabe que pode morar conosco, Malu. Eu e
seu tio sempre iremos receber você com muito amor em
nossa casa.

Neste momento o Paulo surge, sorrateiro, como uma


cobra prestes a dar o seu bote. No entanto, ele se controla
sempre que está na frente da minha tia, fazendo-se de
bom marido e tio preocupado com a sobrinha
desamparada.

— Tudo resolvido. As duas não precisam se


preocupar com nada — ele disse, fitando-me com aquele
olhar nojento que me causa repulsa. — Sobre o que
conversavam?

— Sobre a proposta de levarmos a Malu para morar


conosco.

— É uma ótima ideia. Se ela aceitar, será bem-vinda.


Sabe muito bem disso, querida.

— Como eu estava falando, tia — eu o deixei de fora


da conversa —, agradeço por todo o apoio que está me
dando. Sou grata por todo o seu carinho e amor por mim,
mas não vou morar com vocês.

— A delegada quer falar com você — uma médica do


IML me avisou.

Assinto e converso com a delegada Patrícia. Ela me


faz mil e uma perguntas. Algumas delas já foram feitas, só
que a polícia sempre repete as mesmas para ter certeza
de que não estamos mentindo.

Eva estava desaparecida há mais de um ano e todos


diziam que ela havia fugido e me abandonado. Porém, eu
sabia que não tinha sido bem assim. Sabia que minha irmã
jamais me deixaria. E seja lá qual foi o motivo da sua
partida misteriosa, eu irei descobrir, nem que seja a última
coisa que eu faça nesta vida.

QUATRO MESES DEPOIS

— Tia, consegui um novo emprego, que paga mais


que o anterior.

— E a sua faculdade, querida? Você adora cozinhar e


será uma ótima chef de cozinha. Não me diga que vai
abandonar o curso.

— No momento estou pensando em trancá-la, mas


não é nada definitivo. Eu só preciso esfriar a minha
cabeça, tentar esquecer todos os problemas e,
principalmente, a dor de ter perdido a minha irmã amada.

— Emprego? Onde é esse emprego?


Respiro fundo. Preciso criar uma longa história sobre
o que está prestes a acontecer de agora em diante. De
fato, eu irei trabalhar, sim, como cozinheira na casa de um
homem muito rico do interior. Nessa parte, eu não minto.
Porém, o que minha tia não sabe é que vou atrás do
homem que, de certa forma, matou a minha irmã.

Antes de precisar sair de casa, aflita e desesperada,


Eva falou o seu nome várias vezes naquela noite, ao
celular. Otto Cavalcante. Sei tudo sobre ele; fiz pesquisas
reveladoras a seu respeito ao longo do tempo em que
minha irmã ficou desaparecida. Também recebi cartas dela
— sim, eu sei que é meio retrô —, então eu sabia, de certa
forma, que ela estava envolvida com um homem.

— Irmãzinha, eu preciso fazer uma viagem rápida —


minha irmã me disse, nervosa.

— Viagem? Para onde?

Ela nunca sai em cima da hora para lugar nenhum,


muito menos para viajar.

— Eu prometo que volto rápido. Promete que, custe o


que custar, você não vai à polícia?

— Polícia? Por quê?


— Promete?

— Prometo.

Eu não pude cumprir essa promessa. Após cerca de


seis meses desaparecida, ela parou de me escrever e eu
fiquei preocupada, sem saber o que fazer, então liguei
para a nossa tia. Ela não sabe das cartas, nem a polícia.
Nas oito cartas que recebi da minha irmã, ela mencionou
que estava bem e vivendo com o homem que amava. Eva
não escreveu o nome dele, entretanto eu sabia que se
tratava do tal Otto Cavalcante, principalmente agora,
depois que recebi provas sobre a relação dela com esse
homem. Um tal de Samuel, um amigo muito próximo que
ela tinha, enviou-me uma caixa com algumas fotos que
minha irmã havia tirado com esse Otto. E um fato
interessante é a sua barriga de grávida com cinco meses
de gestação. Os dois pareciam muito felizes e
apaixonados.

Otto Cavalcante é um bilionário fazendeiro, dono de


mais de dez fazendas produtivas no ramo da agropecuária
e na criação de gados. Ele é considerado o rei do gado no
Brasil, com mais de 45 mil cabeças de bois, em um
sistema de recria e engorda, fornecendo cerca de trinta
mil delas por ano. Ou seja, além de muito rico e poderoso,
esse é um homem respeitado pela sociedade. O que me
deixou em choque foi saber que ele esteve envolvido com
a minha irmã, que era uma moça simples. O que pode ter
acontecido entre eles? Como eles se conheceram?

O diário de Eva tem muitas informações sobre o tal


Otto. Nele, ela se referia a ele como “meu amor”.

Há cerca de um mês recebi todos os pertences dela.


Ela confiou o seu amigo para enviar tudo para mim. Na
última página escrita do seu diário rosa, Eva disse que
voltaria para a cidade e me contaria tudo que havia
acontecido. Contudo, não tivemos essa oportunidade, pois
ela faleceu no acidente. Nele também conta que ela teve
bebês gêmeos com esse homem. Alícia e Lohan foram
entregues ao pai poucas semanas após nascerem, e se as
minhas contas estiverem certas, eles têm cerca de nove
meses. São meus sobrinhos, filhos da minha irmã amada.

Eu estou indo trabalhar em Nova Lima, um município


com quase cem mil habitantes, localizado na região
metropolitana de Minas Gerais. Exatamente nessa região
estão os meus sobrinhos vivendo com o pai. A vida nessa
cidade é bastante segura, e isso se une à calmaria de
morar no campo. Porém, nada me fará ficar calma. Preciso
saber o que realmente aconteceu, por que minha irmã não
quis ficar com os filhos, se houve alguma discussão que
resultou na separação do casal e se há algum
envolvimento por parte de Otto na morte dela.
Por esses motivos, eu me candidatei para a vaga de
cozinheira na fazenda Cavalcante. Não sei o que me
espera lá, apenas sei que estou indo com um propósito:
descobrir toda a verdade. E se, por acaso, Otto tiver
alguma coisa a ver com a morte da minha irmã, eu juro
que ele pagará caro por tudo que fez, ou não me chamo
Maria Luíza.

— Esse emprego é muito longe, querida.

— Eu sei, tia, mas preciso de uma chance como essa


para mostrar minhas especialidades. Cozinhar para a
senhora e para a família não é a mesma coisa que
cozinhar para pessoas ricas. São elas que vão contratar
meus serviços. A senhora me entende?

— Entendo sim e apoio sua decisão.

Ninguém sabe ainda que minha irmã teve filhos, e,


por enquanto, guardarei esse segredo somente para mim.
Como mencionei, necessito saber da verdade antes de
expô-la. E se, realmente, aquele homem teve alguma
coisa a ver com a morte da minha irmã, preciso obter a
guarda dos meus sobrinhos. E para isso acontecer,
necessito de provas para pressionar as autoridades.

Eu me moldei ao longo dos meses para parecer fria e


realista. Se tem algo que aprendi nesta vida foi a ser forte.
Mais cedo ou mais tarde a polícia chegará ao Otto e
descobrirá dos bebês, mas até lá já terei provas para o
incriminar. Sei que um homem rico pode, muito bem, livrar-
se da cadeia facilmente, seja comprando os policiais e
juízes ou encobrindo provas, todavia, nesse caso, eu serei
mais esperta. Nada me impedirá de cumprir minha
vingança.

Otto Cavalcante irá se arrepender por tudo que fez


com a minha irmã. Páginas e páginas do seu diário
relatam o ciúme excessivo dele. Ele queria que ela
largasse o emprego. Isso mostra o quão machista esse
homem é e quão honesta e trabalhadora minha irmã era.
Mesmo sabendo de toda a riqueza que seu amado
possuía, não queria viver às custas dele; algo que o
irritava.

“Otto e eu brigamos mais uma vez por causa do meu


trabalho. O seu ciúme excessivo chega a me assustar às
vezes. Não o reconheço quando está agindo como um
idiota. O que ele não sabe é que ninguém pode mandar em
mim jamais. Eu sou livre e solta como o vento. Posso amá-
lo, mas nunca serei dobrada aos seus caprichos.”

Personalidade não faltava na minha irmã. Ela irá fazer


muita falta. Jamais me esquecerei dos bons momentos que
passamos juntas.
Já organizei todas minhas coisas, roupas e
acessórios para a viagem. Nova Lima será o meu novo
destino. Agora estou na rodoviária.

— Vou comprar doces para você levar. — Titia sai


para os comprar. Ela sempre mimou a mim e a minha irmã.

Paulo se coloca na minha frente. Sua cara de poucos


amigos não me assusta. Ele é astuto, aproxima-se de mim
somente quando a minha tia se afasta.

— Não pense que poderá fugir de mim a vida toda,


docinho. Ainda vou ser o seu primeiro, lembre-se disso. —
Abre um sorriso asqueroso.

— Eu nunca serei sua. Aproveite seus últimos dias de


liberdade, pois em um futuro muito breve terei coragem de
denunciá-lo por assédio.

— Você não faria isso. Não seria capaz de magoar a


sua doce e bondosa tia.

— Quer pagar para ver? — desafiei-o.

O verme ri, em desdém.

Ele é trinta anos mais velho que eu, tem idade para
ser meu pai. Vergonha é algo que não ficou para todos.
Esse homem deveria me respeitar e cuidar de mim, não
agir como um idiota.
— Meu amor, aqui estão os doces. Vou sentir muito a
sua falta, querida Malu.

— Eu também, titia. — Dou-lhe um último abraço e


ouço o funcionário gritar que é sua última chamada para
eu entrar no ônibus.

— Boa viagem, sobrinha querida. — Quando Paulo


vem me abraçar, dou-lhe as costas e saio sem me
importar.

A minha tia nunca percebe nada mesmo, e não será


diferente agora.

Adentro o ônibus. A próxima parada será em Nova


Lima.

Aguarde-me, Otto Cavalcante. Você irá pagar caro por


todas as coisas que fez com a minha irmã. Isso é uma
promessa.
— Mocinha, chegamos — avisou-me a mulher sentada
ao meu lado.

Espreguiço-me. Dormi por algumas horas e estou com


as costas quebradas. Oh, céus! Chegamos à Nova Lima e
são um pouco mais de oito horas da noite. Foram mais de
cinco horas de viagem, então me sinto destruída, cansada
e louca para tomar um banho e descansar. Contudo, ainda
levarei mais de vinte minutos para chegar à fazenda.

Um tal de Marcos, peão da fazenda, ficou de me


buscar na rodoviária, porém não vejo sinal algum dele. O
que é estranho, já que foi o combinado ele vir. Lucrécia, a
governanta da casa, disse para mim ao telefone que ele
me levaria para lá. Entretanto, sem esse Marcos, terei que
dar um jeito de chegar ao lugar. Tento ligar para a mulher,
no entanto a bateria do meu celular acaba rapidamente.
Preciso comprar um novo quando receber meu primeiro
salário.

Respiro fundo e saio em busca de algum táxi, mas


não encontro nenhum que trabalhe a este horário da noite.
Ainda é cedo, só que em cidade pequena não tem muitas
opções.

Sem saber o que fazer, sento-me na calçada. Minhas


malas e mochila estão ao meu lado. Procuro pelo meu
carregador para tentar carregar meu celular. As coisas
aqui começaram a ficar vazias a partir das nove horas e
quase não há mais pessoas na rodoviária. Encontro uma
tomada, deixo o meu aparelho dar uma carga rápida e
consigo ligar para a senhora Lucrécia. Já são quase nove
e meia.

— Alô? Lucrécia?
— Boa noite. Fazenda do senhor Cavalcante. Em que
posso ajudar?

— Sou eu, Lucrécia, a Maria Luíza, nova cozinheira


contratada da fazenda. Eu estou aqui, na rodoviária. Creio
que o peão que ficou de me buscar, o Marcos, não veio.

— Senhorita, você não iria chegar amanhã? No dia


nove?

— Não, senhora. Eu disse “dia oito”. Eu estou em


Nova Lima, pronta para ir à fazenda.

— Todos os funcionários dormem cedo, senhorita.


Vou ver o que posso fazer para a buscarem. Dentro de
alguns minutos irei ligar para lhe dar notícias.

— Fico no aguardo.

Como ela confundiu a data da minha chegada? Eu fui


clara ao dizer “dia oito”, e não “dia nove”. Considerando
que ela tem mais de sessenta anos, associo essa
confusão à sua velhice. Li na internet que a governanta
que trabalha para os Cavalcante já passou da idade de se
aposentar, mas que ama a família e cuida bem de todos da
casa. Ao todo, a família Cavalcante se resume à mãe de
Otto, uma socialite finíssima, viúva — há algo nela que me
desagrada, talvez sejam seus luxos excessivos. Ela é
relatada como uma mulher rica, que abusa nas compras
—, à sua filha, Érika, que está noiva e com o casamento
marcado para ocorrer dentro de alguns meses — eu não
sei o que dizer dela, mas, por foto, parece ser uma menina
comum, com uma herança estimada em cem milhões de
reais —, e ao Otto, que é um homem muito viril, que exala
beleza. Não se encontram muitas fotos dele na internet,
somente algumas, principalmente de quando ele era mais
jovem, ao lado do seu pai. Ele parecia feliz. Contudo,
nada relacionado à sua vida pessoal e passada me
importa. Meu único desejo é descobrir por que ele e a
minha irmã discutiram a ponto de ela entregar os bebês
para ele.

“Eu tinha medo... Medo pela fortuna daquele homem,


pelo prestígio, e do que poderia acontecer comigo caso eu
me recusasse a entregá-lo meus filhos. Otto, quando
estava rodeado pela família, era um homem diferente,
mais cruel. Não era o meu Otto.”

Essas foram as palavras de Eva. Eu tratei de


memorizar cada página daquele diário e, também, tenho
uma cópia dele guardada em um lugar seguro.

Estou quase dormindo, quando ouço buzinas na


minha frente. Uma caminhonete 4×4, Ford Ranger, está
parada diante de mim. O carro é luxuoso, adaptado para o
campo, da cor preta, e está com os vidros fechados. O da
porta que se abre para mim está baixo, na metade, e uma
voz fria e arrogante sai de dentro do automóvel.

— Senhorita Rezende?
— Sim, sou eu. Quem é você?

Dentro do veículo está escuro, portanto não consigo


ver o rosto da pessoa com clareza, apenas sei que é um
homem por causa da voz rouca, masculina.

— Entre no carro — ele falou como se estivesse me


dando uma ordem. — Vim da fazenda Cavalcante para a
buscar. Entre de uma vez. Não tenho todo o tempo do
mundo para esperar pela sua boa vontade — disse de um
modo grosseiro.

Ele me fez sentir repulsa de imediato.

Lucrécia liga para mim neste instante.

— Lucrécia? Você mandou um cara vir me buscar em


uma picape preta?

— Sim, eu mandei. Pode entrar tranquila.

— Ok. Obrigada. — Encerro a ligação.

A respiração do homem é tão pesada, que posso ouvi-


la daqui de fora.

— As minhas malas, onde eu coloco?

— No porta-malas — falou com desdém o óbvio.

— Pode abri-lo para mim? — pedi, esperando sua boa


educação aparecer em algum momento, com a gentileza,
para ele descer do carro e guardar minhas malas.
Entretanto, isso não acontece.

— Seja rápida, ou o dia irá amanhecer e você não


sairá do lugar. — Irritado, ele bufa.

Que cara grosso. Nunca tinha conhecido alguém tão


arrogante em toda a minha vida. Apresso o serviço. Como
ele já está sem paciência, pretendo não perder a minha.
Que cara mais sem noção. Já ouvi dizer que peões são
grosseiros, mas não nesse nível. Com dificuldade, coloco
as minhas malas na parte de trás do carro. Respiro fundo
ao abrir a porta da frente e me sentar ao lado do motorista
irritado. Pensei que o Marcos fosse mais gentil.

— Tudo certinho. Podemos ir? — Ele me ignora,


passando a marcha do carro e dando partida em seguida.
Fico indignada com a sua reação. — Eu me chamo Maria
Luíza, mas odeio que me chamem pelo meu nome
completo, então pode me chamar de Malu. Eu gosto mais
assim. Sou a nova cozinheira da fazenda Cavalcante.

— Eu não perguntei quem você é. — Levo isso como


uma bofetada na face. Ele precisava ser grosseiro?

— Eu só quis ser gentil. Não tenho culpa se você não


teve um dia bom. — Cruzo os braços e desvio o olhar do
seu rosto.
Pude ver sua barba por fazer. Ele veste uma camisa
de mangas longas, dobradas até o cotovelo, e usa botas
escuras com um jeans apertado. Como está escuro dentro
do carro, não consigo ver o seu rosto com clareza. E
apesar de esse homem sem noção ter sido arrogante,
mantenho a calma para não explodir e perder a minha
paciência com ele. Seus braços fortes são musculosos e
suas mãos grandes sobre o volante o fazem ficar sensual.
Sempre me senti atraída por homens dirigindo, é algo que
desperta a minha atração. Não sou nenhuma moça
recatada, da igreja. Já tive algumas paqueras e namorei,
só que nunca cheguei a fazer sexo, por opção minha. Logo
decidi que não queria me prender a um namorado antes de
concluir minha faculdade. Por isso decidi que curtiria a
vida somente depois que me formasse.

— Ainda falta muito? — perguntei, curiosa. Já contei


mais de vinte minutos na estrada de terra e ainda não
chegamos.

— Quando chegarmos, você verá.

— Qual é a sua? Eu fiz algo que o deixou irritado?


Creio que não.

— Se você diz... — ele não me deu a resposta que eu


desejava ouvir e ainda desdenhou de mim.

— Posso, ao menos, saber por que está sendo


grosseiro comigo? O que eu lhe fiz? Me desculpe se fiz
você ir me buscar a este horário. Eu não tive culpa se a
governanta te mandou lá. Sou tão sortuda, que ela
mandou o peão mais entojado da fazenda ir me pegar. Eu
mereço.

Se ele não faz questão de me tratar bem, eu também


não vou ser gentil. Cara chato! Ele é remelento e gosta de
caçar briga. Já cansei de ser maltratada.

Eu respiro fundo e ele não diz nada. O que mais me


irrita é esse seu silêncio. Parece que não sabe falar.
Matuto, arrogante!

— Faltam uns dez minutos — agora ele resolveu falar


comigo.

— Obrigada. — Não deveria, mas agradeci. Meu pai e


minha irmã sempre me ensinaram a ser educada.

Algumas pessoas não merecem ser tratadas bem,


como ele, porém isso é mais forte do que eu.

As estradas são boas e quase não têm buracos. Só


quando chove, que deve ficar bastante ruim a passagem.
Eu pensei que o lugar ficasse mais perto da cidade, mas
me enganei ao fazer as contas. Vendo tudo à noite, não
sei descrever quase nada. Passamos por uma placa que
indica que a fazenda começa a partir dela. São dez
minutos até chegarmos à casa grande. Estou extasiada
com tanta beleza. A mansão é uma relíquia nacional,
moderna, no entanto há muitos traços de sua época. Sim,
eu pesquisei. Ela existe há mais de cento e cinquenta
anos. É um local histórico, herdado de pai para filho, até
os dias de hoje.

O peão, que se recusou a me dizer seu nome e


desdenhou do meu, para o carro em frente à casa. Há
cerca de uns dez a doze degraus para subir até a entrada.
A iluminação é boa, só que durante o dia deve ser ainda
mais bonito aqui.

— Pode entrar. Eu levo suas malas. Lucrécia a


espera.

Ele está pegando as minhas malas. Ao menos uma


gentileza na noite.

Subo os degraus com cuidado e observo tudo à minha


volta. Estou encantada. Agora entendo o que minha irmã
descrevia sobre esse lugar.

“O lugar mais bonito onde eu já estive.”

Concordo com ela. É, sim, muito lindo. Compreendo


por que ela amou essa fazenda de cara.

Avisto uma senhora de meia-idade próxima à porta,


que abre espaço para eu entrar.

— Boa noite. Pode entrar, senhorita Rezende. Como


foi a viagem?
— Cansativa. Como a senhora sabe, eu não morava
perto daqui.

— Entendo perfeitamente.

— O peão que a senhora mandou me buscar vai


trazer as minhas malas?

— Peão? — ela não compreendeu.

— Sim, o Marcos, como a senhora me disse na


ligação.

— O Marcos iria te buscar, mas ele não está na


fazenda. E assim, em cima da hora, só restou o senhor
Cavalcante para ir buscá-la.

Congelo com sua resposta. Quem foi me buscar e


esteve comigo até agora foi o Otto Cavalcante? Engulo em
seco.

— O senhor Otto Cavalcante?

— Sim.

— O meu chefe?

— Sim, menina.

Minha garganta seca mais uma vez, arranhando. Eu


estava com ele, o dono desta fazenda, o homem que fez a
minha irmã sair de casa e passar mais de um ano sem
quase me dar notícias. Meu coração se enche de ódio.
Agora entendo tanta arrogância. Ele não é o homem
carinhoso que ela descreveu nas primeiras páginas do
diário, e sim o arrogante que descreveu nas últimas. Como
alguém pode ser tão grosseiro? Ele falou comigo como se
eu não fosse nada. Eu não esperava uma recepção
agradável, mas também não esperava que fosse tão ruim e
grosseira.

Ouço um barulho atrás de mim e, imediatamente, viro-


me para ver do que se trata. É ele. Agora, com a luz sobre
nossas cabeças, reconheço seu rosto das fotos. Ele está
diferente, com a barba grande por fazer e os cabelos
maiores. Quando nossos olhares se encontram, posso
sentir apenas repulsa da minha parte. E da sua, parece
que ele me analisa com uma necessidade urgente. Ainda
não acredito que fui grossa com o meu chefe. Será que
coloquei tudo a perder e que ele vai me demitir?

— Lucrécia, ajude a levar as malas da moça para o


quarto. A senhorita Maria Luíza deve estar muito cansada
e querendo dormir logo, assim como todos desta casa. —
Ele sempre fala como se estivesse com raiva. É algo
natural ou é apenas comigo?

— Agora mesmo irei levar, Otto.

Lucrécia o chama de Otto. Deve ter intimidade com


ele por trabalhar há anos nesta casa. Ela também deve
saber do envolvimento dele com a minha irmã. Tenho que
me aproximar dela. Quem sabe eu consiga arrancá-la
informações?

Otto olha para mim mais uma vez com desprezo e eu


respiro fundo, pois seu olhar gélido me derruba a ponto de
me deixar fraca e sem ação. Ou talvez o sono esteja
chegando.

— Deseja mais alguma coisa, Otto?

— Nada. Apenas execute a minha ordem e garanta


que a nova funcionária fique a par de todas as regras da
casa.

Otto nos dá as costas e sobe a escada sem olhar


para trás. Observo o seu caminhar até ele desaparecer. O
homem é ainda mais bonito pessoalmente, mesmo que sua
aparência esteja mais descuidada do que demonstrava nas
fotos.

Meu coração acelera por algum motivo. Eu desejo


muito poder conhecer os meus sobrinhos e os abraçar.
Terei que fazer tudo isso com discrição para não levantar
suspeitas.

Amanhã será um novo dia e minha investigação


começará nas primeiras horas da manhã.
O som de pássaros e o barulho de tratores, carros e
pessoas se movimentando para lá e para cá, de alguma
forma, mudam a minha ideia sobre o campo ser um lugar
calmo e tranquilo. Ontem à noite, depois que Lucrécia
mostrou o meu quarto na ala reservada aos empregados,
capotei na cama sem organizar nada.
O uniforme pendurado, feito sob medida para mim, da
cor preta, passa-me a impressão de que irei morrer
agoniada de calor dentro dele. Porém, essa será a
primeira vez que irei trabalhar fazendo aquilo que amo e
me dediquei a vida toda para conseguir. Seria quase que
uma realização para mim se o meu objetivo aqui não fosse
outro e, obviamente, eu estaria mais feliz por estar
trabalhando em uma área com a qual me identifico.

O dólmã, o avental, o chapéu, os sapatos gourmet e a


calça chef caíram super bem no meu corpo. Até ganhei
algumas curvas mais charmosas, vestida desse modo. Na
verdade, o meu maior sonho é ter o meu próprio
restaurante e conseguir bons clientes. Pretendo, algum
dia, realizá-lo, quando eu tiver a certeza de que meus
sobrinhos estarão seguros, vivendo comigo. Assim que eu
descobrir toda a sujeira que envolve Otto Cavalcante,
entrarei com o pedido de guarda deles. Farei todo o
possível para isso acontecer o quanto antes. Eu já sabia
que ele não era um bom homem e tenho sérias dúvidas
sobre ser um bom pai. Preciso fazer alguma coisa para ver
os bebês da minha irmã ainda hoje. Como tia, sinto a
necessidade e a ansiedade de conhecê-los.

— Bom dia, Lucrécia — falei ao abrir a porta. Ela


estava prestes a bater nela. — Acordei dentro do horário
estabelecido — informei, para o caso de ela ter dúvida.
— Bom dia, senhorita Rezende. Não se preocupe,
está dentro do seu horário. Eu vim aqui para ver se está
tudo bem e, também, para lhe esclarecer todas as regras
da casa.

— Estou à disposição para aprender tudo. —


Mantenho uma expressão tranquila, sendo que, por dentro,
estou irritada.

Lembro-me das palavras dele ontem à noite.

“Garanta que a nova funcionária fique a par de todas


as regras”.

Ele acredita que é um ser superior, para impor todos


os seus desejos e vontades aos funcionários, que as
executam por temer toda a crueldade que ele é capaz de
cometer contra pessoas inocentes e indefesas.

“Há histórias terríveis sobre Otto nesta fazenda. Os


funcionários temem a sua presença. Me assusta o fato de
estar aqui. É como se eu soubesse que algo ruim vai
acontecer.”

Até a minha irmã tinha medo de Otto, e ela o amava


profundamente a ponto de ignorar toda a obscuridade em
volta da vida dele. Pergunto-me o que deu nela para se
envolver com esse homem e para querer se casar com ele.
No seu diário há citações que não consigo compreender,
outras vezes nem parece ser ela falando, e ainda há
páginas que foram arrancadas. Tento entrar em contato
sempre com o amigo que me enviou as coisas dela, porém
ele demora a responder. É como se não quisesse se
envolver. Mas agora é tarde, ele terá que falar comigo,
pois sou bastante insistente e determinada quando desejo
conseguir algo.

Há tantas regras nesta casa, que eu a associaria a


uma prisão. O meu único dever aqui será trabalhar
preparando e seguindo os cardápios. O café da manhã não
é responsabilidade minha, e sim das minhas ajudantes,
então, devido a isso, consigo conhecer bem a fazenda ao
menos por dentro.

— Naquele corredor ficam os quartos do senhor


Cavalcante e dos filhos dele.

Os gêmeos dormem no mesmo quarto. Foi bom saber


disso. Pelo menos eles ficam juntos. Assim, poderão criar
cada vez mais laços. Eu e minha irmã sempre dividimos
um também.

— Eu posso vê-los? — acabei falando mais alto do


que imaginei.

Lucrécia se mostra surpresa com a minha pergunta.


Ela está incomodada.

— Não — respondeu em um sopapo, como se tivesse


me dado um tapa. Foi rude de sua parte. — Não pode vê-
los.

— Por quê?

— Porque eles não são responsabilidades suas.


Lembre-se de que a sua única obrigação nesta casa é
trabalhar para garantir que haja uma boa alimentação forte
e saudável para todos.

— Eu sei disso. Bem... Eu adoro crianças, então


pensei que poderia conhecer os filhos do chefe.

— Se o chefe decidir apresentar os gêmeos a você


algum dia, poderá conhecê-los. O que eu duvido muito —
ela desdenhou; não com maldade, e sim por saber que
isso é improvável.

— Poxa, Lucrécia! Eu queria tanto vê-los, nem que


fosse de longe.

Por mais que eu usasse meu charme, ela não cederia.


Uma mulher leal ao seu chefe não seria capaz de
desobedecê-lo.

— É melhor não, está proibido.

— Por quê?

— Não pense que isso é somente com você. O senhor


Otto não gosta que ninguém entre aqui, e os bebês
raramente são vistos pelos demais empregados. Apenas
as babás têm acesso às crianças.

Um pai ausente? Foi isso que ela quis me dizer?


Respiro fundo para não perder o controle, ir até aquele
cômodo atrás dos meus sobrinhos e os levar daqui. O que
seria impossível. Com toda a segurança que há nesta
fazenda, eu não sairia sequer do quarto.

— Eu entendo perfeitamente. É necessário ter babás


quando se tem gêmeos. Deve ser difícil para a mãe das
crianças passar todo o tempo com os filhos.

A mulher à minha frente paralisa, não conseguindo


pronunciar nada. Ela parece tentar usar as palavras
corretas.

— A mãe dos bebês não está aqui. — Leva-me para


longe do corredor. — Vamos, menina. Precisamos sair
daqui antes que o senhor Otto possa nos ver.

— Claro, senhora.

A mulher continua a me colocar a par de todas as


minhas obrigações. Acredito que não seria bom para
nenhuma de nós se o nosso chefe nos pegasse nessa
área. Agora, sim, estamos no local com o qual me
identifico. Nessa cozinha moderna e com muitos
utensílios, poderei cozinhar comidas deliciosas para
todos, a começar por um saboroso bife de porco com
batatas, rabada com agrião, arroz e feijão tropeiro. É fácil
cozinhar quando tem pessoas dispostas a seguir todas as
suas ordens. Ser chef de cozinha é minha maior paixão.

O horário do almoço vai se aproximando e eu já estou


com tudo pronto. Mariana e Amélia são minhas ajudantes.
Elas me auxiliam também no preparo do suco de laranja
com limão. Este calorão pede algo refrescante.

A comida dos peões é servida na área de serviço,


onde há uma enorme mesa de madeira com vinte cadeiras.
Ao todo são mais de dez homens cuidando do gado e da
plantação, fora os funcionários temporários contratados
para a colheita. Cozinhar para homens famintos e os ver
satisfeitos com sua comida é satisfatório.

— Todos adoraram a sua comida, Malu. — Mariana é


jovem e muito talentosa também.

— Sério mesmo? Será que não é porque eles estão


famintos? — Encaro os homens famintos e exaustos pelo
trabalho. — Veja como eles comem rápido. — Eles comem
como se toda a comida do mundo fosse acabar neste
instante.

— Não se assuste, Malu. Você ainda não viu nada.


Até que eles estão comportados hoje.

Rimos juntas. De todas as pessoas, ela foi a que me


acolheu melhor.
— Comida deliciosa — um deles disse, entusiasmado
e de boca cheia.

— Tão gostosa quanto quem a fez — outro falou


baixinho, mas pude ouvir.

Peões são todos iguais? Não, há uns piores.

— Não ligue, senhorita, para o que eles dizem. Na


verdade, são assim mesmo.

— Não é normal, Mariana. — Aproximo-me deles.

Todos mantêm seus olhares fixos em mim. Uns me


olham como se eu fosse um pedaço de carne, e outros
com mais respeito, só que, ainda assim, como se eu fosse
um objeto comestível. Hipócritas!

— Boa tarde, rapazes. Como vocês já devem saber,


eu sou a nova chef de cozinha, Maria Luíza, mas podem
me chamar de Malu. Claro... Se vocês forem bons garotos.
Porque o comentário que eu acabei de escutar pode me
levar a colocar bastante sal na comida de vocês amanhã.
O que me dizem? — Deixo as mãos apoiadas na cintura e
abro um sorriso sarcástico. — Vejamos... Vocês ficaram
imóveis? Foi o que pensei. O sexo masculino costuma ser
bastante tolo. Mas nem sempre, alguns são exceções.

Eles se mantêm em silêncio.


— Perdoe-os, senhorita Malu. — Uma voz rouca me
faz encarar o homem loiro, com o rosto vermelho,
bronzeado. Ele também é peão, suponho.

— E você, quem é?

— Sou o Marcos. É um prazer conhecê-la. Vim até


aqui com bastante fome. O cheiro dessa comida
maravilhosa pode ser sentida de muito longe.

— Espero que goste da comida.

Marcos é lindo, forte, musculoso e carrega um sorriso


largo nos seus lábios carnudos. Ele assente e se senta na
última cadeira que estava vaga.

— Desculpe, senhorita — um dos peões disse.

— Foi mal, senhorita. Perdão.

— A senhorita cozinha muito bem, divinamente.

— Trem bão demais!

Assinto e me junto à Mariana, que está rindo.

— Você enfrentou eles e ainda os fez pedir perdão. É


mágica?

— Não, mas não tolero injustiça. Nenhuma mulher


deve ser julgada por homens escrotos.
Mostro-me bastante chateada, porém sei que não
seria bom para mim causar confusão logo na minha
chegada, no meu primeiro dia de emprego. A última coisa
que pode acontecer sou eu causar problemas entre mim e
meu chefe.

— Parece que o senhor Cavalcante estava


observando você conversar com os peões — Mariana me
contou.

Quando olho para trás, não vejo ninguém. Será que


ela falou isso para me assustar?

— O chefe?

— Sim, mas ele já foi.

Engulo em seco. Ele estava me observando? Talvez


estivesse procurando por algum peão.

Retorno para a cozinha, atordoada. Otto é um homem


que me causa somente ódio. Depois do nosso encontro
ontem, ele só se mostrou ser um homem arrogante e
desprezível.

— Senhorita Malu. — Lucrécia se aproxima de mim.


— A comida do senhor Cavalcante... — Ela não sabe como
dizer isso. — Ele pediu para que coloque um pouco mais
de sal.
— Você está me dizendo que o patrão está
reclamando do meu tempero?

— Foi apenas uma observação, senhorita. O senhor


Cavalcante é um homem bastante exigente.

— Tudo bem, senhora Lucrécia. Para o jantar,


colocarei mais sal na sopa. Eu estava pensando em fazer
uma sopa de legumes.

— É a favorita do patrão.

Eu sei disso graças ao que minha irmã escrevia em


seu diário.

Meu coração se enche de ódio. A minha comida está


ideal e deliciosa. Todo mundo elogiou. O que há de
diferente no paladar desse homem, para dizer que ela não
estava boa?

— Não fique triste, Malu. O senhor Otto não gosta


nem tolera quase nada mesmo. Acredito que possa estar
testando você — Mariana disse.

— Não estou triste. E farei uma sopa tão gostosa, que


todo mundo irá lamber até os fundos dos pratos.

— O senhor Otto costuma ser desagradável em 99%


das vezes, e nos outros 1% procura ser ainda mais
terrível.
Rimos baixinho.

— Há quanto tempo trabalha aqui, Mariana?

— Há três anos, Malu.

Três anos. Então ela sabe de muitas coisas,


principalmente do período em que minha irmã esteve aqui.

— Acredito que os filhos do senhor Otto façam os


dias dele mais felizes.

— Acredito que sim. Na verdade, eu nem sei lhe


dizer. Não tenho muito acesso aos filhos do patrão,
somente às vezes, quando levo as mamadeiras.

— A mãe dos bebês deve ficar bastante cansada.

— A mãe dos bebês, lamentavelmente, faleceu, mas


ela já não estava mais aqui, na fazenda, há alguns meses.

— Não estava? Como assim?

— Não sei, Malu. Eu não costumo me meter na vida


do patrão, e a Lucrécia não conta nada para nós. Ela é a
única que sabe de toda a história. Parece que há uma
história trágica por trás de tudo. E eu juro que não posso
falar mais nada.

— Por quê?
— Ninguém comenta sobre a vida do patrão, todos
são proibidos, e eu temo perder meu emprego.

— Eu entendo.

Todos temem falar sobre o que ocorreu aqui, nessa


fazenda, e eu também não posso insistir para que Mariana
fale o que sabe sem antes gravar a sua confissão. Todas
as provas me ajudarão a vingar a morte da minha irmã.

À noite preparo a sopa e recebo bastantes elogios,


inclusive de Lucrécia, que repete o prato. A janta do
patrão já foi servida e estou aguardando o aval dele na
cozinha.

— E, então? — perguntei à Mariana.

— O senhor Cavalcante deseja que coloque mais sal


na sopa. Ele disse que ela está insossa.

Ele está de sacanagem comigo, querendo me


enlouquecer. Essa sopa não precisa de sal.

— A única coisa que precisa de sal aqui é o bom


humor dele, diacho — resmunguei.

— Como eu lhe disse, o senhor está testando você. —


Ela dá de ombros.

Quer saber? Eu não preciso da opinião dele para


mudar nada. Sou boa no que faço, e não vai ser um
fazendeiro bruto e arrogante que irá me dizer se cozinho
bem ou não. Todos adoraram a minha comida.

Ao me deitar na minha cama, depois de tomar banho


e vestir meu pijama, fecho os olhos. Então, a imagem de
Rafael me vem à cabeça, o meu ex-namorado. Ele era
uma pessoa que me entendia e que cuidou de mim no
tempo em que minha irmã sumiu, só que suas crises de
ciúme me deixavam sufocada. Às vezes sinto sua falta, às
vezes não, mas em noites como essa me recordo dele. É
melhor eu dormir de uma vez, antes que eu perca o sono.

O campo já está modernizado, tem internet via Wi-Fi


de boa qualidade. E como esta fazenda fica próxima à
cidade de Nova Lima e ao grande centro de Belo
Horizonte, tudo fica mais fácil.

Amanhã terei mais uma oportunidade de ver os meus


sobrinhos pela primeira vez. Meu coração se enche de
amor quando imagino essa possibilidade como algo real.
Adormeço sonhando com os meus anjinhos.
O cheiro da comida quentinha e temperada pode
chegar aos lugares mais remotos. Cozinhar é uma arte
feita com muito amor. Se não há amor, não há tempero; e
se não há tempero, não há comida boa. Sempre cozinho
com bastante amor, não esperando por elogios, apesar de
ser maravilhoso ouvir da boca de outra pessoa que minha
comida está gostosa. Cozinho com paixão. É o que sei
fazer de melhor nesta vida. Desde criança, vendo a minha
avó cozinhar para todos em nossa humilde casa, eu soube
que queria ser como ela.

— A comida está com um cheiro ótimo.

— Espero que o gosto também, Mariana. Confesso


que cozinhar para um monte de marmanjos não é fácil.

— Todos adoram a sua comida. Até o senhor


Cavalcante parou de reclamar da falta de sal.

Isso é verdade. Ao menos nos últimos dois dias, ele


não enviou nenhuma observação para a cozinha sobre o
meu tempero. Felizmente, porque eu já estava para perder
o controle diante de todas as reclamações que chegavam
até mim. Se ele não estava gostando da minha comida,
por que não me demitia de uma vez por todas, em vez de
ficar me causando desapontamento e um pouco de
constrangimento sempre que alguma empregada trazia a
sua opinião? Ele é tão sem noção, que não teve coragem
de me falar pessoalmente. Se bem que eu não sei se
desejava encontrar aquele homem novamente. Manter a
distância entre nós pode ser bom.

Até o momento não causei nenhuma confusão em


nome da minha sensatez, que está ficando por um fio, e
até então não sei por quanto tempo me manterei calma,
pois todas as vezes que ouço o nome daquele homem,
meu desejo é de matá-lo. Às vezes me assusta saber que
sinto vontade de matar alguém, pois esses sentimentos
nunca estiveram tão fortes dentro de mim como agora.

Descobri também que é praticamente impossível subir


ao andar proibido. Não tenho permissão para circular pela
área de cima, já que não é minha função levar a comida
dos bebês, e a babá raramente vem até a cozinha buscá-
la; sempre são duas empregadas que preparam e levam.
Tentei ser gentil e me ofereci para levar uma vez, porém
elas disseram que era proibido, que ninguém além delas
poderia fazer isso. Esta mansão é muito sinistra. Todos
parecem saber de tudo, entretanto ninguém é capaz de
abrir o bico nem por um milhão de reais. E eu não teria
como pagar isso, nunca.

Após fazer o almoço, decido ir tomar um pouco de ar


fresco na varanda da cozinha. Daqui a vista é privilegiada.
Há muito verde ao nosso redor, mas também bastante
barulho de tratores. A vida no campo nem sempre é tão
tranquila, porém só é assim durante algumas horas. Eu
poderei descansar por toda a tarde, pois já deixei
adiantados todos os temperos para o jantar, e as minhas
ajudantes também descansarão por esse tempo.

Costumo ficar bastante pensativa quando estou


sozinha e me distraio facilmente com meus pensamentos.
Tanto que não notei a chegada de Marcos, o loiro dos
olhos verdes.
— Senhorita Malu? — Ele tira o seu chapéu ao ganhar
minha atenção.

— É Marcos o seu nome, não é mesmo? — Sei que


esse é o seu nome.

— Isso mesmo. Parecia distraída, senhorita.

— Por favor, sem o “senhorita”, apenas Malu. Afinal


de contas, eu não o chamo de “senhor Marcos” —
brinquei.

— E não teria por que chamar, sou um simples peão


da fazenda.

— Um peão muito educado, diga-se de passagem —


elogiei-o. — Se metade dos homens tivesse sua
educação... — referi-me ao dia em que ele advertiu os
peões que me chamaram de gostosa com segundas
intenções.

Seria ele quem me buscaria na rodoviária, mas quis o


destino que fosse o patrão, o homem mais arrogante que
já tive o infeliz desprazer de conhecer.

— É muita generosidade a sua, senhorita, mas não


mereço todos os seus elogios.

— Precisa de alguma coisa, Marcos? Está com fome?


— perguntei, estranhando o fato de ele estar aqui neste
horário.
Ele vive o tempo todo na fazenda, que tem um
dormitório para os homens que aqui moram, assim como
uma pequena vila próxima, onde alguns ficam com suas
esposas e famílias. O que não é o caso dele: jovem,
bonito e solteiro é cobiçado por algumas empregadas.

— Na verdade, vim pegar alguns equipamentos que


faltam, e também aproveitar para saber se tem um pouco
mais da costela bovina que preparou hoje, senhorita.

Seus olhos verdes pidões e envergonhados são um


charme à parte, além de todos os músculos definidos que
exalam testosterona. Agora entendo por que todas as
meninas solteiras da fazenda são apaixonadas por ele.

— Se parar de me chamar de senhorita, eu posso lhe


servir.

— Tudo bem, senhor... Me desculpe, é um hábito. E o


patrão ordenou que a chamássemos assim.

— De senhorita? Por quê?

— É melhor eu voltar pro meu serviço.

— Espere, Marcos. Eu quero entender. Por que


chamar a mim de senhorita?

— Porque a senhorita é nova aqui e veio da cidade.


Até que se habitue conosco, devemos chamá-la assim.
Tenha uma boa tarde. — Ele sai o mais depressa que
pode.

Diacho! Por que tantos mistérios? Tantas frases mal


explicadas? Eu só queria entender o mais simples das
frases ditas pela metade.

Este Otto é um homem cheio de mistérios, mas eu irei


descobrir todos.

A costela bovina rendeu. As meninas prepararam


algumas marmitas para mandar os demais homens, que
vivem no vilarejo, levarem, e o que sobrou — que ainda foi
muita coisa —, reaproveitei para o jantar dos que aqui
ficam.

— Por que quase ninguém comeu no jantar? —


perguntei, estranhando.

— Porque hoje é a primeira noite da festa da colheita.


Haverá carne de carneiro assada e os homens vão dançar
músicas caipiras ao redor da fogueira. Você vai? —
informou-me Mariana.

— Mas eu nem fui convidada.


— Não precisa de convite para ir, a festa é para todos
os trabalhadores rurais e para nós, da casa grande,
também.

— São quantos dias de festa?

— Normalmente cinco.

— Você vai estar lá nesta noite?

— Estou com um pouco de dor de cabeça, mas quem


sabe amanhã? E você vai?

— Podemos ir amanhã, se você assim quiser.

— Ótimo.

Vou para o meu quarto descansar. Não se pode ouvir


a música daqui, já que a festa ocorre em um lugar mais
distante, aos arredores da fazenda. Deve ser legal uma
festa da colheita: música boa e uma fogueira para assar
milho e comer uma boa carne, fora as bebidas, além de
poder estar sob a luz da lua. Como estou inquieta e sem
sono, decido ir até a varanda novamente para respirar um
ar fresco, vestida somente com meu pijama de mangas,
composto por calça e moletom. A noite aqui costuma ser
gélida quando não estamos bem aquecidos. Observo as
estrelas e me perco em meus pensamentos.

Os meus sobrinhos estão pertinho de mim, porém


distantes. O acesso a eles é muito difícil. Pergunto-me se
essas crianças passam o dia inteiro trancados naquele
quarto. Eles são como prisioneiros? Não veem a luz do
dia? Otto é tão cruel assim, a ponto de não amar os
filhos? Dói saber que não posso abraçá-los e os proteger
de todas as pessoas ruins que os cercam.

Respiro fundo, com a intenção de retornar para o meu


quarto, e ouço um barulho estranho vindo de baixo, como
se fossem gemidos. Ou eu estou enlouquecendo? Talvez
possa ser alguém em perigo, eu não tenho certeza. Por
esse motivo, com cautela, decido me aproximar do lugar.
Fico atrás da árvore e posso ver, com dificuldade, uma
mulher com as costas nuas e cabelos curtos. Há um
homem no chão, sobre quem ela está cavalgando
enlouquecidamente. Não consigo ver o rosto dele com
clareza. Os dois estão em um momento íntimo e eu não
deveria estar aqui.

Viro-me depressa para sair correndo e acabo pisando


em um pedaço de pau seco no chão. O barulho foi notável,
tanto que alguém pergunta:

— Quem está aí? O que está fazendo aqui?

Foi a voz da Mariana?

Ela está com um homem aqui fora. Eu apareci no


local errado, na hora errada. Que vergonha. Mariana não
está com dor de cabeça, como me disse. Espero que eles
não tenham me visto, pois eu não saberei como negar se
uma pergunta direta for feita para mim.

Fecho a porta do meu quarto e, por fim, entrego-me


ao sono.

Tenho evitado Mariana o tempo todo. Todas as vezes


que ela se aproxima, eu lhe dou instruções para evitar
conversar sobre ontem. Creio que ela sabe que eu estava
lá e que a vi com um homem.

Contudo, é inevitável permanecer longe dela quando


o almoço é servido e estamos apenas nós duas na
varanda.

— Eu sei que você me viu ontem à noite — ela não


poderia ter sido mais direta.

— Você sabe? — Constrangida, mantenho-me imóvel.

— Sim. E eu também sei que você não teve culpa. Só


peço que não comente com ninguém.

— Eu jamais faria isso, e peço desculpa. Juro que


não tive a intenção de ver nada.

— Você viu quem estava comigo?


— Não. Eu juro por Deus que não.

— Mesmo assim vou te contar, porque somos amigas


e eu confio plenamente em você.

Ela vai me revelar quem estava no jardim com ela.


Não sei se estou pronta para saber de algo tão íntimo,
mas se quero ganhar sua confiança, essa é uma ótima
chance de eu lhe mostrar que sou leal e, acima de tudo,
uma pessoa confiável.

— Seu segredo estará seguro comigo.

— Eu sei que sim. O homem com quem me viu ontem


à noite foi o senhor Cavalcante — hesitou ao falar o nome
do patrão. — Nós temos um lance há alguns meses.

Sua resposta me deixa estarrecida. Ela estava


transando com ele de uma maneira tão apaixonante e
envolvente, que me deixou muito surpresa. Um homem
como Otto se envolvendo com uma empregada? Não me
parece o perfil dele.

— Disse “meses”?

Mariana está incomodada, porém prossegue.

— Sim. Mas, por favor, não conte a ninguém. Não


quero que todos tenham uma má impressão de mim —
mostrou-se preocupada.
— Mas esse romance começou quando o patrão ainda
estava casado?

— Ele nunca foi casado. Não oficialmente.

Em seguida, Lucrécia a pede para fazer uma tarefa.

Ainda estarrecida, não sei o que pensar. Otto é um


homem da pior qualidade que existe. Ele traía a minha
irmã quando ela estava grávida? É horrível pensar que ela
sofreu por alguém que nunca a amou da maneira como
realmente merecia. Por isso as crises de ciúme dela. Não
eram sem motivos. Sempre há um motivo por trás de tudo.
Isso não justifica Eva ter estapeado a face dele, mas na
citação em seu diário, na parte em que ela diz,
claramente, que eles brigaram a ponto de ela o golpear,
associo essa situação ao fato de ela ter descoberto
alguma traição dele. A página seguinte a esse
acontecimento foi rasgada por alguma razão. Talvez ele
tenha feito isso. Ou ela se arrependeu do que fez? São
tantas dúvidas, que chego a ter dores de cabeça,
pensando em como vou solucionar tudo isso. Ninguém
aqui nunca abre o bico para nada.

Limito-me sempre a ficar dentro da cozinha, sem ter


muito acesso à sala e aos demais cômodos. Se ao menos
eu pudesse circular mais livremente pela casa, poderia
encontrar algumas pistas comprometedoras. Busco uma
solução ágil e precisa. Quanto mais tempo passa, mas
difícil fica encontrar tudo que necessito.
Hoje, pela manhã, havia uma chamada perdida de
Rafael. Pensei em retornar, mas este não é o momento.
Não posso manter contato com meu ex. Não agora,
quando meu objetivo é outro. Há algo maior em jogo e
mais importante a ser resolvido. Mas sinto a falta dele sim,
e isso é relevante, principalmente à noite, na solidão do
meu quarto. Penso que seria bom tê-lo por perto, se não
fosse pelo seu ciúme excessivo. Se algum dia formos ficar
juntos, ele terá que mudar, ou nunca mais me terá. Um
relacionamento abusivo é a última coisa que desejo.

— Animada para hoje à noite? — Mariana me


perguntou.

— Hoje à noite?

— A festa da colheita, bobinha. Vamos juntas. Não


combinamos isso?

— É verdade. O que devo vestir para uma festa da


colheita?

— Você tem vestido soltinho? E botas?

— Tenho sim.

— Ou, talvez, calça jeans com camiseta quadriculada


e botas. Com esse corpo que tem, ficará mais bonita
vestida assim.
Mariana é doidinha mesmo. Ainda estou estarrecida
com o caso dela com o patrão, no entanto não posso me
meter, nem a alertar sobre quem é aquele homem cruel
que enganou e manipulou a minha irmã. Isso, ela terá que
descobrir sozinha.
O único motivo pelo qual estou aqui, em uma festa
totalmente diferente de tudo que imaginei, em vez de estar
dormindo, é a tentativa de conseguir informações
relevantes sobre o tempo em que minha irmã passou aqui,
nessa fazenda. A fogueira ao centro é enorme, e eu nunca
tinha visto algo tão extraordinário como esta festa. Apesar
de esse não ser o meu habitat, tentarei aproveitar tudo e
relaxar ao máximo. Estou precisando aliviar toda a tensão
que venho enfrentando sozinha no último ano.

Respiro fundo ao encarar casais dançando, animados.


Há muitas bebidas, carne assada e uma mesa cheia de
comidas, como mugunzá, abóbora, milho assado e cozido,
bolo de milho, petiscos e lombo. Comidas pesadas para se
comer à noite, mas quem liga para isso, estando em uma
festa?

Vesti minha calça mais nova e, também, a única que


eu trouxe para a fazenda, calcei botas lindas, vesti uma
camiseta quadriculada rosa e preta e prendi meus cabelos
grandes em um rabo de cavalo. Estou pensando em cortá-
lo.

— Fico feliz que tenha aceitado vir comigo. —


Mariana está usando vestido e botas, com o cabelos soltos
ao vento.

— Você me prometeu que não me deixaria sozinha


por nenhum instante — lembrei-a mais uma vez.

— Verdade. E eu não vou.

Mariana encara Marcos, que está colocando mais


lenha na fogueira. A maneira como ela o olha é bastante
peculiar. Ela tem um envolvimento com o patrão e fica
dando mole para um peão? Tem algo nessa história que
não encaixa. É como se Mariana gostasse de Marcos, mas
se visse envolvida por Otto. Entre os dois, eu escolheria o
peão, sem sombra de dúvidas. Pergunto-me se tem algo a
ver com status.

— Será que o patrão vem nesta noite? — ela


questionou.

— Ele costuma vir?

— E quem você acha que banca toda essa festa?

— O senhor Cavalcante?

— Claro, né, menina. — Dá um tapinha no meu


ombro.

— E vocês estão pensando em se encontrar hoje à


noite?

— Acho que não. O patrão gosta de pegar as


empregadas, mas nunca gosta de assumir que está
mantendo relações sexuais com elas, para ninguém saber.
A mãe dele enlouqueceria se soubesse disso. Essa
senhora é a uma velha medíocre, que sempre está
menosprezando toda a “criadagem”, como ela mesma fala.

Só consegui entender a parte que Otto gosta de pegar


empregadas. Então, quer dizer que ele já teve relações
com outra empregada?
— Então, o patrão já teve envolvimento com alguma
outra empregada?

Receosa, ela abre um sorriso divertido.

— Você é muito curiosa, Malu.

— Confesso que sou, mas você começa a falar as


coisas e não explica tudo. Poderia ser mais direta sempre
que me diz algo.

— Você gostaria que o patrão laçasse você?

Até me engasgo com sua pergunta. De onde ela tirou


isso? Óbvio que não. Eu nem me sinto atraída por aquele
homem. A única coisa que sinto é ódio, rancor e muita
raiva por tudo que ele fez com a minha irmã. Eu jamais
poderia me atrair por alguém como ele. Jamais! Está
proibido. Mesmo que eu o quisesse e o desejasse, não
poderia permitir que tal sentimento tomasse conta de mim.
Seria como se eu estivesse traindo a minha pobre irmã.
Eva e eu sempre fomos próximas e unidas. Jamais faria
algo assim com a memória dela. A dor do luto ainda me
rodeia e me castiga severamente. Ela era a única pessoa
que se importava comigo, junto com a nossa tia. Porém, o
marido pedófilo dela é um problema para a nossa relação.

— Pare de rir, não tem graça — discuti com Mariana,


que ria da minha reação.
— Não se preocupe, eu não tenho ciúme. Posso
dividir o patrão com você.

— Eu vou te matar — ameacei.

Ela ri e paramos próximas a uma barraca de algodão


doce.

— Veja só. Desde que chegamos, o Marcos não tira


os olhos de você. O que pensa sobre isso?

— Eu não penso nada.

Não tinha percebido que Marcos estava me olhando,


mas agora, que Mariana falou, noto que é verdade. Ele,
sempre que pode, encara-me. Seu olhar é intimidador e
me faz corar.

— Ouvi dizer que ele achou você muito bonita.

— Ele também é muito bonito — falei sem pensar e


pude ver ciúme nos olhos dela. — Mas não se preocupe, o
meu coração já foi fisgado.

— Fisgado? Conte mais, fiquei curiosa.

— Tá bem, eu falo. Mas é segredo.

— Fale de uma vez.

— Eu ainda gosto muito do meu ex, o Rafael. Ele foi o


meu primeiro namorado, e mesmo depois de ter terminado
com ele, vivo pensando seriamente em lhe dar uma
segunda chance.

— Se o seu coração ainda ama esse tal Rafael, você


deveria lhe dar mais uma chance. Algo me diz que ele é
um homem de muita sorte por ser o dono do seu coração.

Sorrio e volto a admirar a quadrilha. Tudo está indo


bem, até um peão, cujo não sei o nome, tirar Mariana para
dançar. Fico sozinha e de mãos abanando. Ninguém chega
em mim para dançar, nem mesmo Marcos, que sempre me
olha discretamente. Eu também o olho, mas não com
interesses amorosos. Decido me aproximar dele. Muito
cavalheiro, ele tira o chapéu para me cumprimentar. Posso
ver os seus cabelos loiros bagunçados.

— Marcos.

— Senhorita. Gostando da festa?

— Sim, é divertida.

— Fico contente que esteja apreciando. — De repente


o sorriso na sua face desaparece e ele coloca o chapéu
novamente sobre a cabeça. Está muito amedrontado, eu
diria. — Peço perdão. Preciso ir colocar mais lenha na
fogueira. Tenha uma boa noite, senhorita.

— Marcos, espere.

Ele não me olha nos olhos.


— Senhorita, eu preciso ir.

— Eu não conheço ninguém aqui além de você e da


Mari, que está dançando por aí. Por favor, me faça
companhia. Quem sabe eu possa te ajudar? É o mínimo
que você me deve depois daquele cafezinho que eu te dei
naquele outro dia — fiz chantagem emocional.

Ele sorri, sem graça, mas parece estar querendo


correr para longe de mim.

— Senhorita, me perdoe, mas a fogueira precisa de


lenha. Nós nos vemos depois. — Sai sem dizer mais
nenhuma palavra.

Por que ele correu de mim? Eu disse algo que o


desagradou?

Eu me viro e meus olhos vão de encontro aos seus.


Otto está distante, porém me encarando como se
estivesse com raiva. Suas írises negras paradas em mim,
assustam-me. A calça preta afivelada, o camisete preto,
os sapatos pretos e o chapéu da mesma cor o deixaram
muito bonito, mas bastante assustador. Sinto calafrios só
de olhá-lo. De alguma forma, esse homem me faz ter
pesadelos. Meu coração erra as batidas, já que estou
tomada pelo medo. É melhor eu sair daqui de uma vez. O
olhar dele queima sobre mim, e isso me incomoda. Por
que ele está me encarando dessa maneira? Suas mãos
estão dentro dos bolsos da calça e ele se mostra
chateado, insatisfeito. Ou, talvez, essa seja a sua
expressão natural. Não me importa, só não quero cruzar o
seu caminho nesta noite.

Estou começando a me arrepender de ter vindo


trabalhar na fazenda. Se o simples fato de o ver me faz
tremer e ficar com as pernas bambas, o que estou fazendo
aqui? Estou apavorada por tudo: por não saber da
verdade, por não ver os meus sobrinhos... Minha vontade
é de sair gritando que Otto é um idiota, mas não bebi o
suficiente para fazer isso. Seria vergonhoso demais para
mim no dia seguinte.

A circulação de pessoas aumentou nos últimos


minutos, e o show ao vivo de um cantor da moda sertaneja
raiz irá se apresentar. Vou para a primeira fila para assistir
a tudo de perto. Uma boa música me ajudará a relaxar.

Balanço a cabeça e o corpo para um lado e para o


outro até fechar os olhos. Gostaria de arrancar este aperto
do meu coração. As primeiras músicas estavam mais
animadas, mas a terceira em diante vieram carregadas de
sentimentos, fazendo-me chorar brevemente. Cuido para
que ninguém perceba essa tristeza enraizada dentro de
mim. Tenho certeza de que conseguirei vencer o meu
objetivo e colocar todos os responsáveis pelo que houve
atrás das grades. Eva não merecia ter sofrido daquela
maneira. Não merecia.
— Música mais melosa. Venha, junte-se a nós na
quadrilha — Mariana me chamou.

— Ninguém me convidou para dançar.

— Claro que não, mas eu convido você. Vamos


dançar.

— Não vamos parecer duas bêbadas?

— Você bebeu?

— Quase nada. E você?

— Vamos dançar.

Eu não sei dançar quadrilha, apenas rebolo e tento


fazer o que as demais pessoas fazem, mesmo estando
mais perdida que uma agulha no meio do deserto e
desengonçada. Entretanto, estou me divertindo como há
muito tempo não me divertia. Eu precisava sentir toda
essa adrenalina boa irradiar do meu coração e se
introduzir na minha alma.

— Estou ridícula.

— Nós estamos. E quem se importa?

Rio alto e continuo dançando. Isso é mais divertido e


emocionante do que andar de montanha-russa, e olha que
é algo que adoro. Eu concordo que deveria ter vindo
ontem para a festa, só que ainda restam mais três dias.
Com certeza virei em todos. Não vejo a hora de poder me
divertir mais, como hoje.

— Essa noite foi maravilhosa — falei.

Já estamos voltando para a fazenda a pé. Segundo


Mariana, é uma caminhada segura, pois sempre há muita
segurança aqui.

— A moça da cidade também gosta de se divertir com


caipiras como nós.

— Vocês são os caipiras mais legais do mundo.

— E você é a garota da cidade mais gente boa que já


conheci.

Uma amizade de trilhões está sendo fortalecida a


cada dia.

Lucrécia vem da sala. Ela acabou de levar o almoço


do patrão para a mesa. Fiz um frango grelhado ao molho,
com macarrão ao molho branco e os tradicionais arroz e
feijão tropeiro. Os peões já terminaram de comer e, aos
poucos, estão saindo.

Minha roupa de chef me causa muito calor.


— E, então? Algo a me dizer, Lucrécia?

— O patrão não reclamou desta vez.

Por incrível que pareça, isso me anima bastante.

Fui convidada para ir ao riacho aqui perto, mas minha


única amiga me deu um perdido. Pelo que vejo, só nos
encontraremos na festa, hoje à noite. Espero que seja tão
animada como ontem. Me diverti como há muito tempo não
me divertia.

— Lucrécia, precisa de ajuda para mais alguma


coisa?

— Você poderia preparar as mamadeiras dos bebês?

Meus olhos se enchem de emoção. Pela primeira vez


serei eu a preparar a refeição dos bebês.

— Claro que sim. Me diga o que eu preciso fazer, que


leite usar, a massa, e eu faço tudo com muito prazer.

Em menos de dez minutos está tudo pronto. Queria eu


poder levá-las para os gêmeos e os acalentar no meu
colo.

— Lucrécia, posso levar lá para cima, se quiser.


Assim, a senhora evita ficar cansada por subir a escada.

— Não é necessário. A babá me espera prontamente.


Obrigada, senhorita Malu.
— Por nada. — Meu sorriso desaparece.

Pergunto-me quando poderei ver os meus sobrinhos.


Como tia, tenho direitos legais de vê-los. Puxo o ar e
engulo o choro. Gostaria de estar com os meus pequenos
agora, enchê-los de beijos e dizer: “Titia está aqui por
vocês”. Eles não entenderiam, mas ao menos eu me
sentiria bem. Não sei sequer como são os rostinhos deles
e não entendo por que minha irmã não me contou que teve
filhos. Ela pensou que eu a julgaria? Jamais faria isso. Eu
sempre a apoiava em tudo. Se não fosse pelo seu melhor
amigo, que me enviou seu diário e seus pertences, eu não
saberia de nada sobre a existência dos meus sobrinhos.
Foi enviada a mim também uma foto dela com eles nos
braços, ainda no hospital, só que mal dá para ver a
fisionomia deles. Em seu diário diz que eles parecem
muito com o pai.

Seria eu capaz de amar uns minis Otto?

A primeira coisa que venho ver quando chego à festa


é uma apresentação de modo raiz, enquanto minha amiga
dança quadrilha. Eu comprei um algodão doce, pois estava
com fome. Tive que comer pouco para entrar no vestido. A
vida no campo engorda. Ao menos me sinto mais cheia.
Depois vou assistir à quadrilha, na esperança de
algum homem me chamar para dançar. Eu sou tão feia
assim? Certifico-me de que não estou com mau hálito
também. É incrível como os homens desviam os olhares
do meu como se eu fosse abominável, e até mesmo
Marcos foge de mim como o diabo foge da cruz. Tentei
falar com ele duas vezes, e ele deu um jeito de escapar e
desviar o caminho. O que pode estar acontecendo?

— Eu vou embora — falei, irritada.

— Por quê?

— Ninguém me convida para dançar. Estou


começando a acreditar que as pessoas aqui não gostam
de mim. — Não há outra lógica e explicação além dessa.

— Não é isso. Todos gostam muito de você, porém


ninguém pode chamá-la para dançar.

— Por que não? — perguntei, chateada.

— Deixe isso para lá, Malu. — Mariana não quer se


comprometer.

— Agora diga de uma vez. Por que ninguém pode me


convidar para dançar?

— Ouvi dizer que o patrão proibiu qualquer um de


convidá-la. Eu não sei se isso é verdade, mas é melhor
deixar para lá.
Meu coração se enche de ódio. Como assim ele
proibiu? Quem esse homem pensa que é para impor algo
que não está em seu direito? Por que ninguém pode
dançar comigo? Ele fez isso somente para me irritar?

— Ele não pode fazer isso. Eu sou uma mulher livre,


danço com quem quiser, e ninguém pode me proibir.
Ninguém mesmo. — Irritada, não penso duas vezes antes
de ir até o palco e gritar para o cantor me deixar subir.

Por incrível que pareça, ele pede para o segurança


me ajudar a subir. Depois de um pouco de esforço, estou
em cima do palco, recebendo todos os olhares das
pessoas à minha volta.

— Quem é você, linda moça?

— Malu — respondi quando o cantor colocou o


microfone perto dos meus lábios.

— E o que você deseja, Malu?

— Dance comigo — convidei-o, sorrindo.

— Eu não posso negar o pedido de uma moça tão


linda. Produção, solte o som.

Mesmo sem saber dançar quase nada, meu corpo cai


no molejo. Sou conduzida para lá e para cá, animada e me
sentindo vitoriosa. Homem nenhum me chamou para
dançar por causa de uma ordem imbecil e completamente
fora de lógica, porém estou dançando com o cantor da
festa. Uma vitória para mim. Espero que Otto esteja
vendo, e, melhor, que esteja com bastante raiva, porque
só assim ganharei a minha noite. Creio que consigo sentir
seu olhar queimando sobre mim em meio à multidão e abro
um sorriso vitorioso.
O último dia da festa da colheita está recheado de
atrações. Nos primeiros dias tiveram festejos mais
populares, só que hoje aqui está cheio de pessoas de
cidades vizinhas e terá a apresentação de Jorge e
Matheus. Brotou gente até de Marte. Confesso que uma
grande multidão me sufoca e que prefiro ficar mais
afastada, para poder curtir mais.
A festa da colheita do senhor Cavalcante virou
manchete, principalmente pela boa safra que ele obtém.
Nada mais justo do que comemorar isso em grande estilo.
Falando no diabo, ele está esplendoroso. Parece que a cor
preta lhe cai muito bem. De longe, posso vê-lo
conversando com alguns homens, que, pelas roupas que
vestem, são pessoas importantes e com dinheiro. É
claro... Ninguém vê o patrão conversando com peões.

Ainda estou indignada com o fato de ele ter proibido


os peões de me convidarem para dançar. Baseado em
que, ele pensa que me dá ordens? Ele não é nada meu, e
mesmo que fosse, ninguém pode controlar outra pessoa. A
vontade que sinto é de dançar a noite toda, até cansar.
Passei a gostar desse ritmo animado e acho que já
aprendi alguns passos.

Mari está linda. Seus lábios carnudos, vermelho-


sangue pelo batom que usa, deixam ela deslumbrante, e o
jeans curto marca suas belas curvas.

— Você deveria ter vindo de short. Não acredito que


vestiu uma calça. Você está linda, porém suas coxas
grossas realçariam no jeans apertadinho e curto.

— Vestir um jeans curto e passar frio o resto da


noite? Nem pensar. Está louca?

— Anteontem você tava mais soltinha de vestido, mas


deixa para lá. Vamos cumprimentar o Marcos. Ele está
lindo hoje, muito mais que ontem.

Marcos é um homem bonito, isso é um fato, porém ele


parece ter medo de mim. Talvez seja pela proibição que o
patrão o impôs. Meus olhos queimam de raiva todas as
vezes que me lembro desse fato. Só que isso não vai ficar
assim. Eu darei a volta por cima, ou não me chamo Maria
Luíza.

— Boa. — O sorriso estonteante de Mariana é quase


um “Marcos, me beije”.

Como alguém que mantém um caso com o patrão fica


dando mole para outro?

— Boa — ele a cumprimentou. — Senhorita, boa.

— Boa noite, Marcos. Animada a festa, não é mesmo?

— Sim, senhorita. — O jeito tímido dele ao conversar


comigo é charmoso.

— Eu gostaria de dançar. Dance comigo, Marcos —


pedi.

Receoso, ele não sabe o que dizer. Na verdade, está


buscando um jeito gentil de dizer que não quer dançar
comigo. Porém, não dou a opção de ele negar.

— Ou você aceita dançar comigo ou pode esquecer


os cafezinhos toda tarde, e também a minha amizade. —
Agora o deixei assustado. — Poxa, é só uma dança. Não
vou comer você.

— E, então, Marcos? Vai contra a ordem do patrão?


— Mari está preocupada.

— Você contou para ela? — ele perguntou, chateado


e preocupado. — Ficou maluca, mulher? O patrão pode
demitir você. Sabe que ele gosta de manter as coisas em
sigilo.

— Marcos, eu estou aqui. E sim, eu descobri. Não


importa a ordem que o patrão deu. Eu sou uma mulher
livre, e você um homem livre. Vamos dançar e pronto. —
Pego-o pela mão e o arrasto para o centro do salão.

— Senhorita... por favor... é melhor nós pararmos por


aqui. — Nervoso, ele procura ver se Otto está nos
encarando.

— Calma, homem. Eu lhe garanto que não vai perder


o seu trabalho por uma dança. Você é o chefe dos peões,
o homem que deixa tudo em ordem aqui, nessa fazenda. O
senhor Otto não é maluco de perder o melhor empregado,
não é mesmo?

Ele parece pensar e logo depois fica mais relaxado.


Abro um sorriso vitorioso.

— O Senhor Otto não gosta que os empregados se


relacionem entre si, gosta de manter tudo somente no
profissional.

— Qual o problema de dois empregados se


relacionarem entre si?

— Uma vez um peão e uma empregada doméstica


tiveram um caso, mas o peão não aceitou bem a
separação e parece que tentou matar a mulher aqui, na
fazenda. — Fico chocada com a sua revelação. — Acho
que tudo isso foi no tempo em que o pai do senhor Otto
ainda era o dono da fazenda.

— Então faz bastante tempo.

— Sim. E desde então, o patrão não gosta que nós,


empregados, mantenhamos relações amorosas com as
empregadas.

Vendo por um lado, é compreensível, devido ao que


aconteceu no passado, só que ele não pode generalizar
todos os relacionamentos. Nem todo mundo é igual.

— E se duas pessoas que trabalham para ele se


apaixonarem?

— O patrão as demite, como já fez antes.

— Isso é bárbaro.

— São as regras do patrão, ninguém vai contra elas.


— Entendo. Todo mundo precisa do salário no fim do
mês.

Agora entendi por que ele proibiu os peões de


dançarem comigo. Como eu sou nova aqui, ainda não
sabia dessa regra absurda. Ele deve pensar que eu sou
uma mulher atirada, ou pior. No entanto, a sua opinião
para mim vale bem menos que um cocô de cavalo.

— Marcos, eu vou entender se quiser parar de dançar


comigo.

— A senhorita não imagina como eu quis convidá-la


para dançar.

— É mesmo?

— Sim. Eu vi que ninguém teve coragem de chamá-la


para uma dança. E eu, assim como todos, também não
tive. — Fica vermelho. — Mas saiba que está sendo um
prazer para mim ter a sua companhia nesta noite.

— Para mim também, Marcos. Mas de agora em


diante, não vou pressioná-lo mais a dançar.

— Por favor, pressione sempre. — Ao suplicar, ele me


faz rir.

— Você dança bem.


— A minha mãe me ensinou. E a senhorita? Aprendeu
a dançar tão bem com quem?

— Aqui mesmo. Eu não sabia dançar até então.


Porém, não precisa ser gentil o tempo inteiro comigo.
Aceito uma crítica construtiva da minha dança ruim se
você parar de me chamar de senhorita.

— Não posso.

— Quando estivermos somente nós dois, você me


chama de Malu, ok? Ou vou lhe dar umas bofetadas.

Ele ri e concorda.

— Você sabia que eu sou o homem mais sortudo da


noite?

— Sortudo? Por quê?

— Todos os homens livres querem dançar com você,


e eu sou o único que consegui.

Balanço a cabeça divertidamente e paramos de


dançar quando a música termina. Ele me chamaria para
continuar na próxima se não tivesse aparecido alguém
assustador atrás de mim. Parece que ele viu um fantasma.

— Marcos, está tudo bem?

— Devo ir, senhorita. Boa. — Tira o chapéu para mim.


O que diabos houve? Foi o meu hálito? Não, eu
chupei umas pastilhas e escovei bem os dentes. Viro-me
para tentar entender o que aconteceu e quase tenho um
ataque cardíaco ao ver aquele homem muito próximo de
mim. Seus olhos negros cobertos por uma sombra negra
me deixam apavorada. O que ele faz aqui? Puxo o ar, que
não vem. É como se ele o sugasse de mim. Meu coração
fica apertado como nunca esteve antes e a sensação de
que estou em perigo faz com que todos os meus pelos dos
braços e pernas fiquem arrepiados. A tensão domina parte
dos meus ombros e pescoço. A vontade que tenho é de
sair correndo para muito longe daqui, porém não consigo
dar um passo à frente. Suas írises escuras paradas em
mim fazem eu permanecer imóvel. Foi algum tipo de magia
negra que me fez perder o movimento das pernas?

Assustada, quero gritar e sair correndo, só que nada


me faria sair daqui, nem mesmo se um raio caísse aqui,
neste instante. Eu nunca quis que um caísse tanto, como
agora. Loucura! Eu estou imóvel e diante desse senhor
das trevas, que me causa calafrios. Dez segundos são
como se fossem horas. É tenebrosa a maneira como ele
me olha. É como se desejasse apertar o meu pescoço até
me ver desfalecida, sem vida. Ao menos essa é a
impressão que ele me transmite.

— Senhorita Rezende, posso saber o que faz aqui? —


perguntou como se eu fosse uma intrusa em sua festa.
Não consigo pronunciar nenhuma palavra, e isso o
deixa ainda mais furioso.

— Está surda? Perdeu a língua? Não sabe mais como


se fala?

Irritada, falo pela força do ódio. Quem ele pensa que


é para gritar comigo? Ninguém nunca grita comigo.

— Não, senhor. Não perdi a língua e não sou surda.


Porém, não compreendi a sua pergunta.

— Então, vejo que é mais burra do que eu poderia


imaginar — disse sem a menor delicadeza.

Ele é um bruto, um homem das cavernas.

A única pessoa que me chamava de burra era Paulo,


simplesmente porque eu nunca aceitei ser a sua amante,
como ele me propôs várias vezes. Aquele ser asqueroso!
Como eu desejei a sua morte. Não era suficiente para ele
enganar a minha tia com outras mulheres, porque ainda
desejava eu e minha irmã. Eva sempre me protegeu dele e
de todos. Culpo-me por não ter conseguido protegê-la de
Otto.

— O senhor me chamou de burra?

— Maria Luíza, você não tem permissão para estar


nesta festa — falou com rancor.
— Permissão? Eu preciso de uma?

Que absurdo! Eu já tinha ouvido as tiranias praticadas


por esse homem, mas o que ele está querendo fazer
comigo é sem lógica alguma.

— Não é minha funcionária, Maria Luíza? —


pronunciou o meu nome como se sentisse satisfação. Na
verdade, faz isso para me irritar.

No dia em que ele foi me buscar na rodoviária, eu não


percebi que era o senhor Cavalcante, por conta da
escuridão, então lhe disse que não gosto que me chamem
de Maria Luíza. Apenas pessoas próximas me chamam
assim, como os meus pais e minha irmã chamavam.

— Eu sou sim, senhor Cavalcante, porém o fato de o


senhor ser o meu patrão não lhe dá o direito de me
chamar de burra. Eu não acredito que me chamou assim
— expressei toda a minha indignação, que parece não ser
nada para ele. Um homem de gelo está parado diante de
mim.

— E como quer que eu a chame? Eu lhe fiz uma


pergunta clara, e você fica se fazendo de desentendida. O
que quer que eu pense? Que não é uma garota desprovida
de inteligência?

— Eu não admito que me chame de burra ou seja lá o


que for. Pode pagar o meu salário, mas não pode me
ofender dessa maneira. — Por que estou querendo
chorar?

— Se não quiser se meter em problemas, sugiro que


volte para a casa agora. Não tem minha permissão para
estar nesta festa, muito menos para se esfregar nos meus
funcionários. — Agora ele foi duro, agindo da pior maneira
que uma pessoa pode com a outra.

Otto me chamou de oferecida ou até mesmo de puta


em sua cabeça oca, que eu jurava que não pensava. Eu
não vou admitir que ele me trate assim. Quem ele pensa
que é? Posso perder o meu emprego, mas a minha
dignidade nunca.

— Eu não admito que o senhor me trate dessa


maneira.

— E quem é você para admitir alguma coisa, Maria


Luíza?

— Quem sou eu? Alguém que não sai correndo toda


vez que o senhor decide humilhar ou agir como um idiota.
O senhor diz que eu não tenho permissão para estar aqui,
mas quem é você para dizer onde eu devo estar ou não?

— O dono destas terras. — Se ele não fosse tão


grosseiro, teria lacrado.

— Pode ser o dono dessas terras e pode mandar em


tudo e em todos, mas em mim, o senhor não manda. E se
quiser me ver longe dessas terras, me demita ou chame a
polícia para me tirar daqui — desafiei-o.

— Não teste a minha paciência.

— Senão o quê? Não me diga que vai me bater —


provoquei-o. — Porque se for fazer isso, faça na frente de
todo mundo, e não escondido, como um covarde.

Já não há mais controle dentro de mim, e nele


também não. Não importa, porque nós dois não sabemos
controlar nossa impulsividade. Eu o odeio e, claramente,
ele parece não gostar de mim também.

— Não vou falar pela terceira vez. Vá embora daqui


agora! — rosnou.

— Eu não vou. — Meus olhos estão marejados, mas,


mesmo assim, mantenho-me firme.

— Não me faça levá-la à força. Você não vai gostar.

— Eu não saio daqui. Se o senhor é tão machão


assim, por que não faz o que diz?

O senhor Cavalcante voaria em cima de mim


brutalmente se Mariana não tivesse chegado. Ela segura
firme o meu braço, percebendo o meu estado emocional e
o clima tenso entre nós.

— Senhor Otto, algum problema?


— Tire essa garota daqui agora mesmo e se certifique
de que amanhã bem cedo ela embarcará para bem longe
da minha fazenda. Está demitida, senhorita Rezende, pela
sua audácia.

Demitida? Ele me deixou arrasada. Acabei de arruinar


todas as minhas chances de descobrir algo que possa
incriminá-lo e a única chance que eu tinha de ficar perto
dos meus sobrinhos.

— Senhor...

— Leve-a daqui! — ele ordenou brutalmente. Mari não


o contraria mais. — Lucrécia acertará tudo que lhe devo
antes que vá.

— Jogue seu maldito dinheiro no inferno! Ou melhor,


fique com ele, seu idiota!

— Saiba que eu só não te jogo no meio da rua porque


não quero ter que responder um processo por causa de
alguém tão insignificante.

— Insignificante é o seu ego — revidei sem temer. Já


fui demitida mesmo.

Mari tenta me levar para longe, no entanto não sairei


daqui antes de dizer tudo que está engasgado dentro de
mim.
— Desde quando eu cheguei a esta fazenda tenho
aguentado seu lado grosseiro e escroto. Não tenho culpa
se você não foi ensinado a tratar bem uma mulher. Nem
pena, eu consigo sentir de um homem tão desprezível
como você. — Minhas palavras parecem não o abalar em
nada. — Se o senhor gosta de tanto sal na comida,
deveria jogá-lo sobre si mesmo. A sua vida está
precisando de bastante sal.

— Leve essa mulher daqui, antes que eu perca o meu


controle.

— Sim, senhor. Vamos, Malu, por favor — Mari


suplicou.

— Eu vou, Mari, mas o senhor “dono da razão”


precisa entender que nem todo mundo nasceu para ser
pisado por ele. Eu pensei que um homem bem-sucedido
tivesse ao menos uma boa educação, porém vejo que o
dinheiro não pode comprar caráter. Saiba que todas as
ofensas que me fez, não sairão baratas. — Dou-lhe as
costas.

Como pode alguém ser tão perverso e grosseiro?

Eu não contenho minhas lágrimas ao sair da festa e


Mari está sem entender nada.

— O que deu em você para desafiar o patrão,


menina?
— Aquele homem é o pior que já conheci em toda a
minha vida. O pior.

— Tranquila. Ele vai reconsiderar.

— Estou nervosa, Mari. Preciso beber café.

— Vou preparar para você.

Suas palavras duras não me machucam mais do que a


dor de ter que partir amanhã cedo sem sequer ter
conhecido os meus sobrinhos.
Chorar por causa de alguém que você mais odeia no
mundo é a maior raiva e indignação que uma pessoa pode
passar na vida. Aquele homem me humilhou com palavras
duras, e isso é imperdoável, apesar de eu saber que meu
perdão não significa nada para ele. Eu não poderia
permitir que aquele cowboy desprezível pisasse em mim
como se eu fosse uma barata. Nunca tinha sido tão
humilhada em toda a minha vida. Otto não precisava ter
me tratado daquela maneira somente porque fui a uma
festa sem lhe pedir permissão. Eu não sabia dessa maldita
autorização que todos os empregados têm que ter para
sair da fazenda.

Arrumei as minhas malas durante a madrugada e não


consegui pregar os olhos. Eu sabia que assim que o sol
nascesse, teria que ir embora e ficar longe dos meus
sobrinhos queridos. Como pude perder o controle daquela
maneira? Arrependo-me desse erro somente pelo fato de
que terei que partir daqui por conta dele. Eu tinha tudo
planejado na minha cabeça, e tudo sairia de acordo com o
plano, mas o ódio me dominou ontem à noite quando
escutei Otto me chamando de burra e desprovida de
inteligência. O sangue ferveu em minha cabeça e eu
necessitava jogar na sua cara que ele é o pior homem de
todos. Em compensação, perdi o meu emprego e todas as
chances de conseguir a guarda dos meus sobrinhos. Eu
nem os conheci. Queria gritar bem alto que eles são meus,
que eu vou levá-los daqui e que ninguém poderá me
impedir, porém sei que isso não é possível.

A minha maior frustração é saber que perdi, que fui


vencida por aquele fazendeiro destruidor de corações. Eu
não pude vingar a minha irmã, nem descobrir nada sobre
Otto Cavalcante que pudesse colocá-lo atrás das grades,
nenhum esquema corrupto e sujo, por menor que seja.

Eu falhei!
Mariana passou a noite comigo, em meu quarto, para
garantir que eu não seria capaz de fazer nenhuma
besteira. Ela é a minha maior apoiadora nesta casa e
acabou dormindo na minha cama, enquanto eu passei a
noite inteira entre a cadeira de madeira, sentada no piso,
no chão, e de pé. Teria cavado um buraco por ter andado
tanto em círculos.

O mais triste foi quando amanheceu. Todos nesta


fazenda acordam com as galinhas.

Mari já está de pé nas primeiras horas da manhã.

— Como passou a noite? — ela me perguntou.

— Acordada. — Tento esconder toda a minha dor.

— Desculpa, eu acabei dormindo.

— Tudo bem. Eu já até fiz as minhas malas. —


Mostro-as sem nenhum entusiasmo.

Ela parece triste com a minha partida, sua expressão


demonstra isso.

— Malu, eu não queria que você tivesse que ir


embora. Eu sei que faz somente alguns dias que nos
conhecemos, mas sinto que temos uma afinidade tão
verdadeira.
— Eu também sinto isso, mas não posso mais
trabalhar aqui. O senhor Otto me disse coisas horríveis e
me demitiu.

— Talvez eu deva conversar com ele e tentar alguma


coisa.

— Não precisa. Você e eu sabemos que ele não é o


tipo de homem que pode ser manipulado. Ele não vai
voltar atrás na sua decisão. Eu estou demitida, e é isso. O
Marcos vai me levar para a rodoviária.

— Eu sei que não posso fazer nada para evitar que vá


embora, mas ao menos posso preparar seu último café da
manhã nesta casa. Não se preocupe, comida aqui nunca é
negada.

Em compensação, grosserias e maus tratos são


permitidos como se fossem comuns. Respiro fundo para
que as lágrimas não desçam novamente. Nunca fui de
chorar na frente de ninguém. Toda a minha dor, carrego
sozinha, sempre choro sozinha. É melhor chorar na
escuridão do seu quarto do que diante das pessoas,
principalmente daquelas que querem saber somente meus
pontos fracos. E isso, eu jamais revelo.

— Vou preparar um café quentinho. Tem bolo também;


você quem fez a receita. Eu acho que vai gostar bastante.
Se bem que...
Paro de ouvir o que Mariana tagarela sozinha e ouço
gritos vindo da sala. Gritos de desespero. Alguém está
gritando por ajuda.

— Ouviu isso?

— Isso o quê? — Ela me serve o café.

— Esses gritos.

— Não ouço nada.

Será que estou ficando louca e imaginando coisas?


Não é possível que tenha sido somente na minha cabeça.

— Você não dormiu ontem à noite. Tome uma xícara


quente de café e se sentirá melhor.

Bebo um gole do meu café e, em seguida, tomo um


susto, quase derrubando toda a bebida em cima da minha
coxa, com o grito desesperador que uma das babás dos
gêmeos dá. Quase nunca as vejo, principalmente na
cozinha. A mulher de meia-idade está pálida e parece
muito assustada. Sinto um aperto em meu peito.
Aconteceu algo com os bebês?

— Por favor, me ajudem! O bebê Lohan... Ele... — A


mulher está chorando.

— Respire fundo, Mônica. O que aconteceu? — Ela


está desesperada e só consegue chorar. Meu mundo está
girando. Ela precisa falar alguma coisa, precisa acalmar o
meu coração inquieto. — O que aconteceu? Fale de uma
vez, Mônica! — praticamente gritei, fazendo-a reagir.

— O bebê Lohan... Ele se engasgou. Eu não sei o que


fazer, já tentei de tudo.

Imediatamente saio correndo o mais depressa que


consigo até a sala. A outra babá vem terminando de
descer a escada com o menino, que já está ficando roxo
em seus braços. Será possível que elas não fizeram nada
para o ajudar além de ficarem desesperadas? É a primeira
vez que eu vejo o meu sobrinho face a face, mas a tensão
do momento não me permite chorar de emoção, porque o
nervosismo fala mais alto.

Lucrécia acabou de acordar com todo o barulho e


agitação. As duas babás estão aflitas, sem saber o que
fazer.

— Vocês tentaram desengasgar o menino?

— Sim, senhora. Tentamos de tudo. O bebê estava


tomando leite, quando se engasgou. Não sabemos o que
fazer.

Não é comum bebês de nove meses se engasgarem


com leite. Estranhei o que a moça cujo o nome é Amanda
disse, só que não tenho tempo para pensar muito e corro
em sua direção para ajudar.
— Me dê o bebê. — Pego o meu sobrinho nos braços
pela primeira vez. Ele é lindo e pesadinho.

Seus olhos são iguais aos da sua mãe. Eva era


conhecida pelos lindos olhos azuis, cabelos lisos e cintura
de pilão. Esse menino é o bebê mais lindo que já vi na
vida, é parte do meu sangue.

Agora o amor da minha vida precisa ser salvo. Com


bastante calma, procuro colocar em prática tudo aquilo
que aprendi no curso de primeiros socorros. Sempre é
bom entender o básico para casos como esse. Desde
antes de eu saber que tinha sobrinhos, fiz um curso para
aprender mais sobre como lidar com situações como essa.
O primeiro passo é apoiar o bebê de barriga para baixo,
no meu antebraço, e a cabeça dele deve ficar apoiada na
minha mão, inclinada para baixo em relação ao resto do
corpo. É preciso ter cuidado para a sua boca não ficar
tapada durante o processo. Respiro fundo e sigo o
próximo passo. Faço cinco compressões nele utilizando o
dedo indicador e, também, o médio, sempre mantendo a
sua cabeça inclinada para baixo. Repito o movimento duas
vezes.

Lohan continua engasgado, porém não entro em


pânico. Isso pode acontecer. Nem sempre a primeira
tentativa vai funcionar. Mantenho a calma e continuo com
bastante tranquilidade.

— Vamos, Lohan! Você consegue, garotão!


Posso ouvir Lucrécia rezar um pai-nosso em alto tom
e os choros das babás. Todo mundo está em desespero.

— Vá chamar o senhor Cavalcante, Mariana —


ordenou Lucrécia.

— Sim, senhora. — Ela sai imediatamente.

Como a obstrução continuou, giro o bebê e o coloco


com a barriga para a frente, ainda mantendo sua cabeça
inclinada para baixo. Na região central do tórax dele, entre
os mamilos, faço cinco compressões utilizando os dedos.
Repito o processo até a saída do líquido.

O menino chora, assustado, podendo, enfim, respirar


novamente. Um choro de alívio me domina. Eu consegui!
As babás e Lucrécia estavam rezando, pedindo por um
milagre. O milagre veio, o meu sobrinho está respirando.

Consigo acalmá-lo somente com um abraço. Sento-me


na escada e o envolvo com meus braços e uma melodia
calma que a minha mãe cantava para mim quando era
criança.

Ouço passos atrás de mim. Passos pesados. O cheiro


forte e dominante invade minhas narinas. Aquele homem
tem um cheiro único. Ignoro ele. Meus olhos estão
fechados. Canto a melodia ao mesmo tempo em que estou
chorando.
Essa foi uma situação assustadora, mas, felizmente,
eu sabia como reagir. Minha vontade é de gritar. Tudo está
bem, o susto já passou. Ainda bem que eu soube me
controlar e não permiti que o pânico se apoderasse das
minhas ações. A cada dia me torno uma mulher mais forte
e destemida, e essa situação só me fortaleceu ainda mais.

Meu coração bate acelerado. Além de eu ter


conhecido o meu sobrinho amado e salvado a sua vida,
agora o tenho em meus braços, seguro em meu abraço. A
emoção de tê-lo assim, juntinho de mim, é indescritível.
Muitas vezes cheguei a sonhar com esse momento. A
grandiosidade dessa emoção não se pode medir. O amor
não se mede, apenas se sente, e eu o senti desde o
momento em que soube da existência deles. Quando vi
aquela fotografia dos gêmeos, soube que minha vida tinha
uma razão. Eles são a razão de tudo para mim.

A sensação é de que posso abraçar a minha irmã


novamente através desse bebê. É o filho dela. Meu choro
agora é de emoção. Sempre faço de tudo para nunca
chorar na frente de ninguém, mas agora se tornou
impossível não mergulhar em lágrimas de alegria.
Acreditei que iria embora sem nunca poder abraçar esse
bebê lindo. Eu o amo. Meu coração grita isso. É como se
mais nada existisse à nossa volta. Tudo o que sei é que
Lohan sabe quem eu sou. Ele nunca me viu antes, nunca
havíamos tido contato algum, porém ele sabe que eu sou
quase uma mãe para eles, tanto que se acalmou com um
abraço que poderia ser desconhecido, mas que se tornou
o que ele mais precisava. Esse bebê sabe, de alguma
forma, que é amado por mim.

Para tudo ficar ainda mais perfeito, eu gostaria que


Alícia estivesse aqui, conosco. Ela, certamente, parece
muito com a minha irmã. Uma verdadeira bonequinha,
acredito.

— O que aconteceu? — preocupado, Otto rosnou


atrás de mim.

Ele não desceu a escada e eu não me dou o trabalho


de vê-lo.

— Senhor, tudo aconteceu muito depressa. O menino


Lohan se engasgou enquanto tomava leite e a senhorita
Malu salvou a vida dele. Ela é um anjo enviado por Deus
para esta fazenda. — Lucrécia está emocionada.

Coitadinha. Ela passou por um susto daqueles. Para


uma pessoa da sua idade, poderia ter sido perigoso.

— Quem foi a incompetente que permitiu que algo


assim acontecesse? — Otto esbravejou.

Diacho de homem que sempre busca colocar a culpa


nas pessoas. Cowboy bruto.

— Senhor, eu não tive culpa — a mulher disse,


assustada.
Mantenho, o tempo todo, os olhos fechados. Não
quero que o momento especial acabe nunca. Tenho medo
de abri-los, ter o bebê arrancado dos meus braços e nunca
mais vê-lo. A sensação é mágica, é como se eu estivesse
abraçando a minha irmã novamente. E eu não quero sair
mais desse abraço que me lembra ela.

— Você está demitida — ele rosnou.

A mulher chora, contida. Para ele é fácil demitir


pessoas sem se importar com o que vai acontecer com
elas futuramente. É um homem arrogante, cheio de
maldade em seu coração. No entanto, as babás me
pareceram despreparadas para cuidar de bebês. Elas não
sabiam nem como socorrer Lohan. Um acidente como esse
pode acontecer com qualquer pessoa, porém devemos ser
capacitados para assuntos desse porte, pois um bebê
engasgado pode ir a óbito. Agora entendo a reação do pai
dos gêmeos. Ele já perdeu uma pessoa e não quer passar
por essa dor novamente, assim como eu. Acredito que
somos dois corações partidos, despedaçados por essa
profunda dor.

— A senhorita Malu é um anjo! Um anjo! — Lucrécia


está eufórica. — Se não fosse por ela, eu não saberia o
que fazer, assim como as babás, senhor. Me parece que
essas duas moças não sabem como agir em uma situação
como essa.
— Por isso as duas estão demitidas. Quero vê-las
bem longe das minhas terras o mais rápido possível — ele
esbravejou.

As mulheres não dizem uma palavra sequer. Elas


sabem que estão erradas. Trabalhar como babá exige uma
grande responsabilidade que deve ser cumprida.
Certamente, ambas colocaram em seus currículos que
tinham curso de primeiros socorros, mas no momento em
que foi necessário usar esse conhecimento, só sabiam
chorar e nada fizeram. A demissão, nesse caso, foi justa.
Não tem como eu ficar contra Otto desta vez. Por mais
que eu queira, não posso defendê-las. Essa situação é
bastante delicada, e talvez seja bom eu me manter quieta
ao menos agora, para evitar mais discussões
desnecessárias. Somente desta vez irei me calar.

— Não me canso de dizer: Malu é um anjo. Ela salvou


a vida do seu filho, senhor Cavalcante. Se não fosse por
essa menina, a notícia poderia ser preocupante agora.

Isso é verdade. Se não fosse por mim, não quero


imaginar o que poderia ter acontecido. Dói meu coração só
de pensar no pior. Felizmente, eu ainda estava aqui e
pude salvar a vida desse bebê.

Otto não pronuncia uma palavra, mas sei que ele está
ao lado da senhora Lucrécia, pois ouvi seus passos indo
até ela. Minha audição é muito boa. Os dois, certamente,
estão me encarando fixamente. Porém, nada me importa.
Estar abraçada ao meu sobrinho é tudo de mais
importante para mim neste momento. Como eu sonhei com
esse abraço. Desde que cheguei aqui, ainda não tinha
conseguido ver os bebês, não havia tido oportunidades, e
tive que me calar quando queria gritar bem alto que eles
são meu sangue, meus sobrinhos. E agora Lohan está
acalentado em meus braços. Não há sensação melhor no
mundo do que estar ligada a uma pequena parte da minha
irmã.

— Malu tem muitos conhecimentos sobre primeiros


socorros. Ela me enviou o seu currículo, e agora pude
comprovar que realmente é verdade. Essa menina é um
anjo — Lucrécia disse mais uma vez. — Como o senhor
pode ter sido capaz de demiti-la? Uma pessoa assim,
como ela, é muito especial. Necessitamos de gente mais
capacitada nesta fazenda

O que ele deve estar pensando? Seria Otto capaz de


me recontratar? Não consigo olhar para ele. Ao abrir os
olhos, apenas fixo-os na face do bebê, que até abre um
sorriso encantador para mim.

— Olá, pequeno príncipe. Você está bem agora?


Tranquilo, meu amor.

Não me toquei que pessoas me observavam. Lucrécia


se aproxima para pegar o bebê de mim e, receosa, eu não
quero soltá-lo, nunca mais; quero sempre estar ao seu
lado. Eles não podem me tirar o meu sobrinho. A mulher
abre um sorriso e eu sou obrigada a entregá-lo. Estou
chorando ao ver que ela o leva para os braços do pai, que
está preocupado e abraça o filho com muito carinho.

— Tudo bem, garotão. Você é muito forte, já passou.


O papai está aqui — ele falou com tanto amor, que chegou
a me impressionar.

Ele realmente ama esse bebê, como está


demonstrando? Sim, o neném em seus braços até sorri,
sabendo que está no colo do pai. A ligação entre os dois é
bastante forte e há muito amor envolvido nessa cena,
posso sentir. Ao menos Otto não aparenta ser um pai
ausente; sempre está na fazenda, e constantemente ouço
que ele está com os bebês. Minha irmã ficaria feliz em
saber que seus filhos são amados pelo pai.

— Bão dia para vocês. O carro para levar a senhorita


Malu já está pronto — a voz de Marcos me transmitiu
aquilo que menos desejo: ir embora. — Já peguei suas
malas do quarto, senhorita. Podemos ir.

— Obrigada, Marcos. Espere só um minuto e eu já


vou.

O peão assente e eu respiro fundo, segurando o


choro. Preciso da ajuda de Lucrécia para me pôr de pé.
Estou abalada com a minha partida, não desejo ir embora.
A mulher me olha ainda chorando. Ela quer que eu fique.
Até Marcos não acredita que eu já estou indo. Dói saber
que não conhecerei Alícia agora. Terei que obter alguma
permissão para voltar a esta fazenda por meio de um juiz,
e pode levar meses.

— Lucrécia, eu posso ensiná-la como fazer aquilo, se


quiser. É muito simples e não levará mais que duas horas
para eu te ensinar tudo. Pode ser na rodoviária, se me
acompanhar — falei, preocupada.

— Será muito bom aprender. Posso ir com você,


menina, até a rodoviária. Assim, você não vai sozinha com
um peão e terá companhia até o ônibus chegar.

— Ótimo. Só precisarei desse tempo para te ensinar.


E a senhora poderá ensinar a todos que trabalham aqui.
Seria algo útil.

Ela assente e sorri.

Ao darmos alguns passos à frente, a voz tenebrosa


ordena:

— Ninguém vai a lugar nenhum. Marcos, pode voltar


para o seu serviço. Senhora Lucrécia, leve o meu filho
para o quarto.

— Sim, senhor. — Ela está sorrindo, parecendo


comemorar o que Otto acabou de dizer.

Será que esse grosseiro irá me levar até a rodoviária?


Se for assim, eu me recuso. Prefiro ir a pé a ter que entrar
em um carro sozinha com esse bruto. Estamos somente eu
e ele agora. Seu olhar rude queima sobre o meu e estou
parecendo uma gelatina mole fora da geladeira. Eu não
queria sentir essas coisas quando fico a sós com ele, mas
é inevitável.

Lucrécia levou meu sobrinho para longe de mim e


parece que uma faca atravessou a minha alma, deixando-
me sem chão. Já Marcos saiu, como foi ordenado. Todo
mundo sempre faz as vontades desse homem, o que me
irrita.

Não desvio os meus olhos dos seus. É escuro o que


há ao redor das suas pupilas. O fazendeiro está vestido
com um moletom folgado, que realça ainda mais o quão
bonito ele fica nesse estilo despojado.

Em que diabos estou pensando? Enlouqueci de vez,


por estar achando esse homem bonito.

— E quanto a você, Maria Luíza, venha comigo agora


até o meu escritório.

— Não vou — neguei, firme.

Vejo-o demonstrar o quanto minha resposta o deixou


intrigado. Seu olhar de reprovação recai sobre mim como
uma pedra descendo um penhasco em alta velocidade e
me acertando.

— Estou lhe dando uma ordem direta, Maria Luíza.


Otto insiste em me chamar de Maria Luíza somente
para me irritar. Eu lhe disse que prefiro Malu, mas, ainda
assim, ele ignora. Contrariar-me parece divertido para
esse cowboy, que não sabe que eu sou maravilhosa em
tirar alguém do sério.

— O senhor não pode me dar ordens, não sou mais


sua funcionária — rebati.

— Diacho de mulher teimosa! — resmungou. —


Vambora! Não me irrite mais! Acompanhe-me, trem!

Infeliz daquele que cruzar o meu caminho quando eu


estiver furiosa. Sou boazinha, mas também sou cruel com
aqueles que merecem. A samaritana era a Eva, não eu.

— Eu não vou! — repeti, decidida.

— Ora! Não me faça levá-la à força — ameaçou.

— Pode ser bruto com todo mundo, mas comigo, eu


não permito que seja. Eu não vou e pronto. — Piso firme
no chão.

Ele caminha na minha direção, furioso. Nossas


respirações estão ofegantes. Ele não me causa medo,
apesar de parecer uma besta que acabou de sair da jaula.

— Na minha sala agora! — ordenou mais uma vez.


Otto se intitula um rei para pensar que pode me dar
ordens. Mantenho-me firme. Não vou obedecê-lo.

— Sabe, Maria Luíza... Tem vezes que desejo… —


Respira fundo. — É melhor nem saber o que tenho
vontade de fazer com você.

Em seus olhos consigo ver irritação. Quando ele


franze o cenho, penso que vai me arrastar à força para o
escritório, todavia demonstra tranquilidade.

— Por que eu devo obedecer?

— Porque se você não vier, não saberá o que tenho


para lhe dizer.

Se Otto deseja me ofender mais uma vez, irá me ver


virar uma fera selvagem. E isso, ele deveria temer. Uma
mulher furiosa e coberta de razão é bastante perigosa.

Acompanho-o até seu escritório. Nunca tinha entrado


aqui. Nem mesmo Lucrécia me mostrou esse cômodo da
casa na minha chegada. Esse lugar possui móveis de
madeira e muitos livros nas prateleiras. Meus olhos
brilhariam se fossem romances que estou acostumada a
ler.

Otto se senta em sua cadeira de chefe. Ele combina


com esse ambiente. É a sua cara. Todos os detalhes aqui
possuem a sua marca.
Engulo em seco quando o vejo apontar para a cadeira
vazia à minha frente. Estou receosa. Eu não queria ter
vindo a essa sala, muito menos fechado a porta atrás de
mim. Como irei correr se precisar?

Seu semblante sempre está fechado. Acho que ele


nem sabe como rir, pois sempre se mostra arrogante e
desprezível. Não há bondade em seu coração de pedra.
No entanto, a maneira como ele segurou o filho em seus
braços me fez acreditar que ele ama aquele garotinho que
é a cópia da mãe. Estou diante do homem que mais odeio
na minha vida, aguardando que ele me diga o que quer.
Controlo a respiração para não perder o controle, mesmo
que já tenha perdido o meu emprego e não devesse mais
agir com cautela.

Estou prestes a explodir diante do seu silêncio, só


que ao ver a foto dela sobre sua mesa, paraliso.
Encaro Otto com os olhos cheios de ódio e o coração
gélido. É inevitável olhá-lo e não sentir que ele roubou
tudo de mim, toda a esperança de poder ficar ao lado dos
meus sobrinhos. Apesar da circunstância tensa e bastante
desesperadora em que conheci Lohan, meu coração se
enche cada vez mais de amor por ele. E para completar
ainda mais a minha alegria, necessito conhecer Alícia, que
deve ser a bonequinha mais linda deste mundo. Mas estou
com as malas feitas para ir embora desta fazenda, sem
saber o que fazer para abrir um processo judicial contra
Otto Cavalcante. O que eu iria alegar? Que ele matou a
minha irmã, sem ter provas? Com as provas, sei que seria
uma luta árdua; e sem elas é uma guerra perdida. Pessoas
ricas e poderosas costumam ter todo um esquema de leis
a favor deles, e Otto tem os melhores advogados do país,
a começar pela sua irmã mais nova. A empresa de
advocacia mais renomada de Minas Gerais pertence à
família dele. Quem entraria em um processo contra
pessoas tão poderosas? Ninguém aceitaria me defender
no tribunal, e saber disso me parte o coração, assim como
ter que ir para longe sem esperança de dias bons.

A incerteza me domina, assim como o desespero para


voar em cima dele como uma onça selvagem e rasgar toda
a sua carne de uma maneira assassina. Mas, como? Se eu
não mato nem uma mosca, o que dirá uma pessoa, por
mais má que ela possa ser.

Eu falhei, eu perdi. Devo aceitar a minha derrota, ir


embora de uma vez por todas e não chorar mais na frente
desse homem asqueroso.

Obviamente, ele me trouxe aqui para acertarmos tudo


sobre a demissão. Ele que enfie seu maldito dinheiro
naquele lugar, porque eu não quero um real vindo dele.
Não vim aqui pelo dinheiro, e sim pelos meus sobrinhos.

— Sente-se, Maria Luíza — ordenou.


Por que ele sempre tem que falar como se fosse um
soberano? E dois: por que me chama assim, sendo que
deixei bem claro que prefiro que me chamem de Malu?

— Estou bem aqui. — Mantenho uma postura forte.


Não quero parecer ainda mais fraca diante dele.

— É tão difícil assim para você obedecer a uma


ordem minha? — ele indagou de maneira arrogante.

— O senhor deseja o quê? Posso saber? — retruquei,


já sem paciência.

O que se passa na mente desse homem é uma


verdadeira incógnita. Suas expressões não transmitem o
que ele realmente está pensando ou sentindo.

— Devo reconhecer que a senhorita não é tão


desprovida de inteligência, como eu supus na noite
passada.

Insolente! Desta vez não vou tolerar mais nenhuma


ofensa de sua parte.

— Me chamou aqui para continuar a me humilhar?


Saiba que não vou tolerar. Não é mais o meu patrão. Não
lhe devo mais nada, muito menos educação, algo que o
senhor não sabe o que é. — Eu fungo, irritada, e ele
parece notar essa minha característica. Eva também
ficava assim quando estava aborrecida. Provavelmente,
aprendi isso com ela. A irmã mais nova sempre copia
quase tudo da irmã mais velha na infância.

— Não quero ofender você, pelo contrário, devo


reconhecer que é uma mulher muito capacitada,
principalmente para agir em situações tensas como as de
agora a pouco. — Isso foi um elogio? Minha mente está
bugada.

— O que quer dizer com isso?

— Quero dizer que estou em dívida com você. Salvou


a vida do meu filho — reconheceu. — Caso a senhorita
não estivesse aqui, provavelmente meu filho estaria em
uma situação mais complicada neste momento. Você
salvou a vida dele e eu me sinto em débito com você.
Obrigado, senhorita.

Otto Cavalcante disse que se sente em dívida comigo,


e ele realmente está sendo sincero. Consigo enxergar
gratidão em sua face. Pela primeira vez na vida, vejo algo
bom nele. O que só mostra o quanto ele ama o Lohan. É
nítido também todo o seu alívio. Para um homem rude e
arrogante, até que não foi nada difícil para ele reconhecer
que me devia ao menos um “obrigado”. Contudo, não
quero que Otto fique o tempo todo se sentindo grato a
mim. Eu fiz somente o que meu coração mandou fazer. Eu
sabia como lidar com aquela situação, e teria feito aquilo
com qualquer pessoa que estivesse ao meu alcance.
— Por nada.

— O que fez naquela sala instantes atrás jamais será


esquecido por mim. Salvou a vida do meu filho, e eu lhe
devo muito.

— O senhor não me deve nada, acredite nisso.

— Foi um ato heroico, como Lucrécia bem disse.

— Eu só fiz o que achei necessário. Não poderia


negar ajuda a alguém que estava necessitando dela.

O senhor Cavalcante me olha fixamente, como se


procurasse algum vestígio familiar em mim. Já fui mais
parecida com a minha irmã na infância, porém algo em
que ainda me pareço muito com ela são nos olhos azuis,
que são mais claros que os dela, mas, ainda assim,
remetem semelhança.

— Maria Luíza, repito: eu estou em dívida com você


— ressaltou.

O cowboy bruto está em débito comigo. Se ele


soubesse como eu gostaria que ele pagasse por esse
débito...

— Não, o senhor não está em dívida comigo. Não me


deve nada — retruquei.
— Por que é tão teimosa? — indagou de uma maneira
sexy.

Diacho! E este calor que sinto quando ele me olha


assim?

— Por que é tão insistente? — Ergo uma sobrancelha,


desafiando-o.

— Eu realmente só a estou enaltecendo. Sei que fui


injusto com você na noite passada. Eu me excedi em meu
tom. Peço que reconsidere sua admissão nesta fazenda.

Admissão? Ele está me recontratando? Quase


engasgo com sua proposta.

— Quer que eu continue trabalhando aqui?

— Sim, quero que continue trabalhando nesta casa.


Preciso de funcionários competentes, e a senhorita é mais
que eficaz para a vaga que ocupa.

Competente e eficaz? Estou sendo elogiada pela


mesma pessoa que se referiu a mim como burra? O mundo
não gira, ele capota, como dizem. Não sei o que me deixa
mais incrédula: Otto reconsiderar minha demissão ou me
elogiar. Realmente, não sei como lidar com essa situação.
Gostaria de gritar que aceito permanecer neste emprego,
pois meu maior desejo é ficar perto dos meus sobrinhos,
mas também não posso me esquecer do quanto fui
humilhada na noite passada.
— Eu não sei o que dizer.

— Apenas aceite continuar trabalhando como


cozinheira, se assim desejar.

— Se eu ficar, me dá a sua palavra de que irá parar


de ser grosseiro? Eu não aceitarei ser humilhada
novamente — deixei bem claro.

— Peço desculpa pelas duras palavras de ontem à


noite.

O bruto reconheceu que errou? Para mim, é como um


triunfo saber que ele reconheceu que estava errado.

— Tudo bem. Se me prometer que isso jamais voltará


a se repetir, eu posso repensar se aceito trabalhar nesta
fazenda. — Respiro fundo ao completar a frase.

Fiz jogo duro, pois preciso mostrar para ele que não
pode me faltar com respeito.

— Não voltará a se repetir, dou-lhe a minha palavra.

Otto é um homem culto e seu português é muito


formal. Raramente, ele fala gírias. Teve uma ótima
formação acadêmica, isso é nítido.

— Se aceitar trabalhar na fazenda novamente,


preciso que me ajude com mais uma coisa.
Ergo uma sobrancelha, em desafio. O que ele poderia
querer de mim? Eu mal reconsiderei o seu pedido de
desculpa e ele já se sente íntimo a ponto de me pedir
algo?

— O que seria?

— Como demiti as duas babás dos meus filhos,


gostaria de contar com a sua ajuda para auxiliar a
Lucrécia no cuidado com eles.

Respiro fundo. Estou bastante emocionada com esse


pedido. Cuidar dos meus sobrinhos é tudo que eu mais
desejo neste momento.

— Eu aceito — não pensei duas vezes antes de


responder. Não contenho minha emoção.

— Será um trabalho redobrado, pois não posso abrir


mão dos seus serviços na cozinha, mas também necessito
que esteja dando atenção aos meus filhos. Lucrécia já é
uma mulher de idade e se cansa com mais facilidade,
diferentemente de você, que é jovem e cheia de energia.
— Senti um certo desconforto de sua parte ao falar da
minha juventude.

Otto é mais velho dezoito anos que eu, mas, mesmo


assim, mantém uma boa aparência. Ele é um homem
bonito e com aspecto jovem, mesmo que sua idade diga o
contrário.
— Eu posso conduzir as duas coisas com facilidade.

— Qual a sua experiência com crianças?

— Eu tenho bastante, já cuidei de bebês dos meus


vizinhos.

— Como bem sabe, poucas pessoas se disponibilizam


a trabalhar em uma fazenda, por ser um lugar mais remoto
e afastado dos grandes centros industriais. É muito difícil
conseguir empregados que estejam dispostos a passar
todo o seu tempo vivendo no campo. Por isso alerto a
senhorita de que pode ser que leve algum tempo para eu
encontrar uma nova babá que esteja disponível a vir
trabalhar aqui.

— Eu passo o tempo que for necessário cuidando dos


bebês.

— O seu salário será redobrado, não se preocupe


com isso.

Assinto, escondendo a grande satisfação que está


transbordando dentro de mim. Sinto tanta felicidade, que
engulo todo o meu orgulho. Se fosse outra situação, eu
mandaria a proposta dele para o inferno, mas como é por
um bem maior e pelo amor incondicional que tenho pelos
meus sobrinhos, nada mais importa para mim, somente o
desejo de ficar aqui, nessa fazenda.

— E quando eu devo começar? Agora mesmo?


— Lucrécia será encarregada de lhe ensinar tudo que
necessita. E, mais uma vez, senhorita, lhe digo que estou
em dívida com você.

— Se insiste, eu vou começar a acreditar que,


realmente, está dizendo a verdade — falei sem pensar.
Quando me dei conta, já havia dito.

— Por que não acredita? Me julga como uma pessoa


de caráter duvidoso?

Minha vontade é de gritar que sim, porém sou contida


para não estragar mais essa chance que a vida me deu.
Pude salvar a vida de Lohan e irei permanecer na fazenda,
em busca do meu propósito.

— Não é isso. É que o comportamento hostil que o


senhor vem demonstrando comigo me faz acreditar que
não se importa com nada relacionado a mim.

— Engana-se. Eu me importo com todos que


trabalham na fazenda. E se deseja saber por que a
repreendi na festa, pergunte à Lucrécia. Ela lhe falará
tudo.

— Por que o senhor mesmo não me fala?

— É perigoso andar por estas terras à noite. Homens


bêbados podem fazer coisas horríveis com mulheres
indefesas. E como eu não sabia que você estaria na festa,
não pude avisar aos meus funcionários para garantir a sua
segurança. Por isso todas as minhas funcionárias me
pedem permissão para ir à festa da colheita. Assim, posso
protegê-las.

É impressionante tudo que acabei de ouvir. Ele faz


por onde para garantir a segurança de suas empregadas.
É um gesto muito nobre da sua parte. Eu não pensava que
um homem tão arrogante pudesse ter um coração
generoso e gentil. Ele não teria por que mentir, e se
Lucrécia pode confirmar, perguntarei a ela. Mas agora só
desejo conhecer a minha pequena e linda Alícia.

— Posso me retirar?

— Sim.

Saio da sala com o coração mais tranquilo. Quem


diria que uma conversa com Otto acalmaria meu estado
emocional e me transmitiria paz?

— O que vocês conversavam? — Mari me perguntou,


curiosa.

— Eu vou continuar trabalhando aqui.

Ela comemora e me abraça, sorrindo. Eu a deixo para


trás, sem pestanejar, depois de agradecer por toda a sua
atenção e carinho. Alícia me espera para um encontro
emocionante e cheio de amor. Finalmente posso colocar
os meus pés no corredor proibido. Lucrécia está no quarto
das crianças, segurando o menino nos braços, e a bebê
está deitada no berço. Ao me ver, ela chora de emoção.

— Eu sabia que o patrão não permitiria que um anjo


como você fosse embora.

— Ele me deixou ficar. Sou a cozinheira e ajudarei


você com as crianças.

Acaricio o rostinho de Lohan, que está mordendo seu


mordedor azul, e caminho até o berço da menina. Acho
lindo os dois dividirem o mesmo quarto. As tonalidades
rosa e azul são muito bonitas, só que os detalhes neste
instante não importam. A minha sobrinha é uma
bonequinha. Como ela é parecida com a mãe. Ao notar
minha presença, parece tentar se lembrar de mim. A coisa
mais fofa e gordinha que a titia já viu. Está uma
princesinha, usando um vestido rosa. As meias da mesma
cor e a tiara na sua cabeça a deixam ainda mais fofa.

Pego-a nos braços pela primeira vez. Ela é perfeita.

— Oi, meu amor. Sou eu, a Malu — falei baixinho. —


A sua titia, minha vida. Eu vou cuidar de você muito bem,
e do seu irmão também. Meus amores.

Lucrécia me entrega o menino e eu me sento na


cama, podendo segurar os dois nos braços. Eu juro que
farei de tudo para ter a guarda deles e que sempre lhes
darei todo o meu amor. Por essas crianças, eu sou capaz
de tudo. Enfrentarei todo o mundo para os ver alegres e
seguros. Com eles em meus braços, transmito-lhes muito
amor e carinho. Juro pela minha irmã que cuidarei deles
por toda a minha vida.

Agora eles são a razão da minha existência, e nada


mudará isso.
Agora, sim, já posso respirar um pouco mais aliviada.
Pensei que tudo havia desmoronado e que o meu plano
não teria mais nenhuma chance de ter sucesso. Estou
mais tranquila, apesar de um pouco receosa com a atitude
do patrão. Como um homem arrogante pode ter mudado de
opinião a meu respeito tão rápido? Tudo isso se deve ao
amor incondicional que ele sente pelos filhos? Minha
mente está uma verdadeira confusão. Precisei de um copo
com água e açúcar para me acalmar depois de todas
aquelas emoções vividas.

— A senhorita é uma menina muito especial. Posso


sentir isso ao fitar sua face angelical — Lucrécia foi gentil
com as suas palavras. — O senhor Cavalcante está em
dívida com a senhorita. Ele mesmo me disse isso.

— Por um instante, eu pensei que havia perdido tudo


— desabafei, vendo que ela não compreendia nada. — Eu
preciso bastante desse emprego, o salário é muito bom.

— Entendo você. Não se preocupe, nada mais a fará


ir embora desta fazenda. O senhor Otto percebeu quão
qualificada você é para trabalhar aqui, e seu ato heroico
contribuiu bastante.

— O que eu fiz, teria feito por qualquer pessoa que


estivesse precisando de ajuda.

— Sei que sim. Seu coração é bondoso. E agora, que


ficará de vez conosco, te passarei todas as instruções do
serviço. Ele tomará bastante parte do seu tempo livre.

— Eu não me importo, aceito trabalhar com prazer.

— O senhor Otto não costuma ter sempre bom humor.


Essa não é uma característica boa, porém ele é um ótimo
patrão. Não o julgue pelas vezes em que foi duro contigo.
Mariana me contou sobre o incidente que vocês tiveram.
Ela não deveria ter contado nada, mas como eu tinha
sido demitida, todos acabariam sabendo, uma hora ou
outra, o motivo.

— O senhor Otto não sabe como se expressar. Ele


sempre é arrogante com todo mundo, mas isso não
significa que seja uma má pessoa — ela complementou.

— Se a senhora está dizendo... — Dou de ombros

— Ele ainda está de luto pela perda da esposa.

Esposa? Otto e minha irmã realmente se casaram,


como ela descreveu no diário?

— Esposa? — perguntei como se não quisesse saber


muito a respeito.

— Sim, a senhora Eva, mãe dos filhos do senhor


Cavalcante. Foi uma história triste de amor entre os dois.
Não tenho permissão para falar mais nada sobre o
assunto, apenas lhe peço que não o julgue pelas suas
atitudes grosseiras. O senhor ainda sofre pela perda da
esposa... Pelas duas perdas que teve.

Duas perdas? O que ela quis dizer?

— Me conte um pouco mais. Assim, eu poderei


compreendê-lo melhor — pedi, buscando alguma resposta.
Lucrécia é muito receosa. Ela não sabe se deve me
falar ou não.

— Os empregados conversam muitas coisas sobre o


ocorrido. É melhor que eu saiba pela voz de alguém que
diga a verdade em vez de saber por pessoas que sempre
aumentam a história verdadeira e contam mentiras muitas
vezes.

— Serei breve. A senhora Eva foi embora dois meses


depois de dar à luz, desapareceu sem dizer nada.
Ninguém sabe como ela saiu da fazenda sem ser vista ou
quem a ajudou, apenas recebemos a notícia de sua morte
meses depois.

Minha irmã foi embora da fazenda sem falar nada


para ninguém? Essa é a história que eles contam aqui?
Em seu diário, ela disse que precisou fugir, pois tinha
medo do que poderia lhe acontecer.

— Será que ela não fugiu?

— Pode ser que sim.

— Eu quero dizer... Será que ela não temia alguém?


Talvez o marido.

— Otto era um marido maravilhoso e apaixonado;


fazia tudo que a senhora Eva queria. Para ser sincera, ele
comia na palma da mão dela. Por que uma mulher que
sempre tinha tudo o que desejava, fugiria?
— Ótima pergunta, Lucrécia.

— Agora te ensinarei tudo que precisa aprender sobre


o cuidado com as crianças.

— Sabe, Lucrécia... Depois dessas emoções vividas,


preciso de café.

Ela ri.

Eva fugiu? Não é possível que ela tenha ido embora


sem algum motivo. Acredito eu que tenha sido por algo
que Otto fez. Ela o descreveu como perigoso e assustador,
um homem cruel. E eu pude sentir toda a sua crueldade.
Nada justifica suas atitudes. E como ele ainda vive a dor
do luto, se está transando com Mariana? Que amor é
esse, que precisa ser preenchido com o corpo de outra
mulher? Contenho a emoção do choro por estar cuidando
dos meus sobrinhos. Tudo o que eu mais desejava era
poder estar ao lado deles, e agora esse sonho se tornou
realidade.

As peças desse quebra-cabeça estão cada vez mais


difíceis de serem encaixadas. Cada um tem a sua própria
versão e os fatos não batem, não condizem com o que
está escrito no diário da minha irmã. As versões são
totalmente opostas. E é claro que eu acredito na palavra
de Eva, não nas dessas pessoas que não conheço. Apesar
de elas me parecerem bastantes sinceras, não posso,
simplesmente, acreditar nelas e ignorar tudo que li no
diário. Meu coração se encontra apertado por eu saber
que conseguir as provas está cada vez mais difícil. Mas eu
sei que agora, que estou circulando livremente pela casa,
no momento certo terei as respostas que tanto preciso
para esclarecer todas as minhas dúvidas.

Como alguém que dizia amar tanto a minha irmã,


pode ter feito ela sofrer a ponto de ir embora e entregar os
filhos para ele cuidar? As peças não se encaixam. Para a
idade de Lucrécia, seria muito feio ela sustentar uma
mentira, mas talvez, por medo, faça isso, a fim de garantir
seu emprego. Acredito que, pelo seu caráter, sua intenção
não é contar mentiras; não é de sua índole.

Preparo o almoço e deixo todos os passos escritos


para que as meninas não se confundam em nada. Elas são
ágeis e muito competentes. Nesse meio tempo, preparo
também o mingau dos bebês, que estão dormindo.
Segundo o cronograma deles, passado pela nutricionista,
às três horas eles sentem fome. As opções são
mamadeiras, suco saudável de frutas ou melancia. Eu
optei por fazer o mingau hoje, mas sempre dá para mudar.

— Você leva jeito com bebês — Lucrécia elogiou meu


cuidado com os meninos.

— Obrigada. Eu já cuidei de bebês antes.

— Você tem jeito com eles, é notável. Tenho certeza


de que será uma boa mãe algum dia.
— É o meu sonho um dia — respondi com um sorriso.

— Pela sua expressão de empolgação, suponho que


tenha um amor na sua vida.

— Digamos que sim. — Dou de ombros.

— Eu também já tive um amor na minha vida, mas


nunca tive filhos biológicos.

— Compreendo.

— E esse amor é seu namorado? — Ela costuma ser


curiosa

— Ele é meu... — Levo alguns segundos para


responder.

Neste meio tempo, Lucrécia está com os olhos fixos


na porta aberta. Direciono minha visão para lá e vejo ele
parado como uma estátua, com seu olhar parado em mim,
como se estivesse me observando. Ele estava ouvindo a
nossa conversa o tempo todo?

— Senhor Otto, os gêmeos acabaram de acordar — a


governanta avisou.

Vê-lo pela segunda vez no mesmo dia é demais para


o meu coração suportar. Não sei explicar, mas há algo
além de ódio.
— Passei aqui somente para ver como estão os meus
filhos. — Ele entra rapidinho para ver a filha, que está
deitada no berço, e o menino, que está nos braços de
Lucrécia. Depois de dar um beijo sereno nos dois, sai sem
dizer mais nenhuma palavra.

— Ele ainda parecia preocupado — comentei.

— Também. Porém, o patrão sempre passa por aqui


neste horário para ver os filhos.

Que fofo da parte dele. Até abri um sorriso sem


perceber. É um gesto muito bonito da sua parte. Então,
quer dizer que ele realmente se importa com os bebês. Há
amor entre ele e os filhos.

— Vou precisar sair por umas duas horas para ir à


cidade. Estarei de volta mais tarde. Você ficará bem,
cuidando dos gêmeos sozinha?

— Não se preocupe. Tudo ficará bem, senhora


Lucrécia.

Um momento a sós com esses dois anjinhos é tudo


que eu mais preciso. Poder abraçar e os beijar sem
recriminações, sem medo de que alguém veja, é uma
sensação indescritível. Meus olhos se enchem de lágrimas
todas as vezes que escuto as risadinhas gostosas deles.
Alícia sente cócegas na barriga e sempre ri por tudo; já
Lohan é mais sério e quase nunca está rindo. As
bochechas gordinhas de ambos são um charme.

— Quem são os bebês mais lindos da titia?

Alícia rasga um gritinho gostoso enquanto Lohan me


olha como se quisesse rir, mas nem sorri. Ele se
acostumará comigo com o passar dos dias.

— Vamos lá, garotinho lindo. A titia está falando com


você. A sua titia preferida — falei sorrindo.

Ele também abre um meio-sorriso.

Meu sonho se tornou realidade. Eu cogitei que levaria


mais tempo para poder ficar mais próxima deles. Um
instante ao lado desses anjinhos é como se não tivesse
havido nenhum dia escuro.

Às vezes sinto vontade de chorar. Se a minha irmã


pudesse estar aqui, vendo os bebês crescerem fortes e
saudáveis, tudo seria diferente. Lohan nasceu primeiro. A
minha irmã foi uma guerreira em toda a sua vida, e seus
filhos sempre serão uma memória viva dela.

Os primeiros dias me desdobrando entre a cozinha e


os gêmeos foram tranquilos. Aqueles bebês são calmos,
choram apenas quando sentem fome e passam a maior
parte do dia brincando. Estou me saindo bem com essa
missão dupla, tanto que está me faltando tempo para
encontrar pistas. A primeira semana foi marcada por
vários acontecimentos fofos e engraçados. Meu celular já
está acabando a memória, de tantas fotos que eu tiro dos
bebês. A cada dez minutos uma sessão de fotos é
iniciada.

Como é possível eu amar tanto dois bebezinhos


pequenos de uma maneira incondicional? O amor não se
explica, apenas se sente.

— Você é a garota mais sortuda que já pisou nesta


fazenda. Foi demitida e contratada no mesmo dia —
Mariana disse, animada.

— Não sou sortuda, apenas uma injustiça foi reparada


a tempo. Eu não merecia ser demitida daquela maneira.

— Como não? Você afrontou o patrão. É maluca. A


última pessoa que fez isso, está morta... — Mari para de
falar ao perceber o que disse.

Será que ela estava falando da minha irmã? Pela sua


expressão de amedrontada, claro que estava.

— O que quis dizer com isso?

— Eu não deveria falar, mas como somos amigas, eu


vou falar sim. A patroa, a senhora Eva... Que Deus a
tenha. — Faz o sinal da cruz. — Todos aqui estão
cansados de saber que ela desafiava o patrão dia e noite
por tudo. Ela nunca fazia o que ele queria, e talvez isso
fizesse com que ele a amasse tanto.

— Você chegou a ver eles discutindo alguma vez?

— Algumas vezes. A patroa sempre era a responsável


pela maioria das discussões.

Eva seria incapaz de discutir se não tivesse motivos


para isso. Ela era do tipo paz e amor.

— Você diz isso porque está com o patrão.


Certamente o ama e, obviamente, o defende.

— Não é assim. Eu não o amo. Eu pensei que


amasse, mas não amo — confessou como se carregasse
uma certa culpa no que disse. — Eu jamais defenderia
uma pessoa que estivesse errada. A senhora Eva era uma
mulher difícil, sempre estava com a cara fechada e tinha
ciúme de todas as mulheres do planeta.

— Ela deveria ter seus motivos — sondei.

— Ela era uma mulher insegura, apesar de ser muito


bonita. Sentia ciúme até de Lucrécia, que tem idade para
ser a mãe do senhor Cavalcante. Uma vez ela bateu na
prima do patrão, na última festa da colheita, por causa
disso, mas todo mundo sabe que ele não tinha olhos para
outras mulheres.
Eva não era uma mulher possessiva e ciumenta. Não
importa o que digam dela, eu me recuso a acreditar e a
aceitar essa “verdade” que me passam. Minha irmã era
uma menina doce e gentil, não era uma malvada, violenta.
Essa prima, de quem ela falou no diário, é uma mulher
esnobe que vivia a humilhá-la por não ter dinheiro. Se Eva
bateu nela, foi bem merecido, e se eu a visse, iria lhe dar
um tapa.

— São muitas histórias sobre a esposa do patrão.

— Sim. Principalmente agora, que a viuvez dele está


sendo noticiada. Me parece que nesta manhã esteve um
delegado aqui.

Delegado? Estão investigando a morte da minha


irmã?

— O que mais sabe sobre isso?

— Sei que fizeram muitas perguntas ao patrão e que


ele estava furioso por isso.

Se a polícia chegou ao Otto, será questão de dias até


ele descobrir sobre mim. E se isso acontecer antes que eu
possa reunir todas as provas para o incriminar, estarei
demitida e, desta vez, sem esperanças de vencê-lo.
Preciso correr contra o tempo, e farei isso. Na última
semana tentei, diversas vezes, ir até o escritório do
patrão, porém todas as minhas tentativas foram falhas e
em vão. Todos estão comentando que ele vai estar
presente na famosa festa do boi, na qual os peões que
correm vaquejada, reúnem-se para competir. Será hoje à
noite e acontecerá em um vilarejo que fica a mais ou
menos duas horas daqui. Ou seja, quando Otto sair, terei
tempo o suficiente para procurar por pistas.

Espero o momento certo até que os bebês durmam e


o patrão saia junto com Marcos e mais dois peões. O
cavalo bom de vaquejada foi levado nessa tarde para o
local. Essa é uma tradição, grandes fazendeiros sempre
participam da derrubada de boi.

Lucrécia ficou com os bebês após eu lhe dizer que


precisava ir ao banheiro, pois estava com dor de barriga.
Ela logo acreditou no que eu disse e me mandou sair o
mais depressa possível do quarto. Respiro fundo ao
encarar a porta de madeira grande e fechada à minha
frente. O escritório fica no andar de baixo. Eu já estive
aqui uma vez antes, e foi bastante intimidador saber que
estava sozinha dentro de uma sala com aquele homem
abominável.

Minhas mãos estão suadas. É comum o nervosismo


que sinto, já que nunca precisei invadir nada de ninguém
antes. Sinto uma pequena parcela de culpa por estar
entrando em um local sem ser convidada, no entanto não
posso permitir que isso me domine e coloque a perder
todos os meus planos. Um delegado esteve na fazenda na
semana passada e fez muitas perguntas que deixaram
Otto irritado. Era nítido em seu rosto. Além do mais, todos
comentavam o quão abalado e furioso o patrão estava. As
investigações sobre a morte da minha irmã estão
ganhando uma nova proporção e eu temo tudo que pode
ser descoberto, apesar de eu estar em busca de
respostas.

Eu abro a porta sem fazer barulho e todas as luzes se


acendem automaticamente. Acabo tomando um susto, não
sabia que era assim o sistema. Encaro todo o espaço
amplo, sem saber por onde começar. Nos filmes de ação e
mistérios sempre procuram primeiro alguma coisa na
gaveta da escrivaninha, e eu não posso fazer diferente.
Ajoelho-me no chão e a abro. Nela contém papéis e
algumas pastas; tudo relacionado à fazenda, pela rápida
leitura que posso fazer. Na segunda gaveta encontro mais
pastas e pastas. Resta-me somente a terceira, porém ela
está trancada. Tento puxá-la e não consigo abrir. Onde
poderia estar a chave? Procuro-a por cima da mesa e
entre um espaço e outro da estante, mas nada de
encontrá-la.

O porta-retratos sobre a mesa, no qual está a foto da


minha irmã e os gêmeos, continua no mesmo lugar. É
impossível não chorar diante de uma imagem tão linda.
Meus sobrinhos nunca vão poder saber o quão gentil e
amável a mãe deles poderia ser. Eu tenho certeza de que
ela amou esses bebês mais que a sua própria vida; e se
ela os entregou para Otto, deve ter tido alguma razão
forte. Se ao menos o seu amigo misterioso, que me enviou
o seu diário e mais alguns pertences dela, decidisse
conversar comigo, meu pobre coração poderia encontrar
todas as respostas que deseja. Mas ele não me dá
notícias há semanas.

Como vou abrir essa gaveta? Não tenho força o


suficiente para a arrombar, muito menos uma solução
prática para a abrir. Penso em buscar uma faca pontuda
na cozinha, só que eu poderia arranhar a madeira e ser
descoberta. A única solução é encontrar a chave e voltar
aqui.

A porta é aberta e eu quase grito, assustada,


pensando que Otto pode ter retornado, mas, para a minha
sorte, é Mariana.

— Eu passei aqui, vi a luz acesa e pensei que o


patrão pudesse ter esquecido alguma coisa ou estivesse
precisando de algo.

— Ele já foi para a festa.

Ela cruza os braços e me olha com suspeita,


principalmente porque estou segurando o porta-retratos
com a foto da minha irmã.

— Você tem noção de todo o perigo que está correndo


por ter entrado sem permissão no escritório do patrão, e,
ainda por cima, estar segurando o porta-retratos com a
foto da falecida esposa dele? Quer ser demitida
novamente, Malu?

— Não, eu não tenho essa intenção.


— Então o coloque de volta no lugar e saia daqui
imediatamente, garota — disse, preocupada.

— Eu só queria ler um livro dessa estante. Sou


apaixonada por leitura — falei, nervosa, tentando soar
verdadeira.

Eu amo ler sim, mas nada sobre direitos penais e


livros de história e contabilidade.

— Nunca mais entre aqui sem ser chamada. Você


poderia ter sido flagrada por outra pessoa e amanhã
estaria fazendo suas malas para ir embora.

Fecho a porta atrás de mim e concordo, acenando


com a cabeça. Ela tem razão, mas, ainda assim, era um
risco que eu precisava correr.

— Promete não contar a ninguém?

— Claro que sim. Mas, também, prometa que não vai


mais entrar aí, muito menos voltar a pegar aquele porta-
retratos. O patrão é capaz de enxergar as marcas dos
seus dedos e lhe rastrear. Aquele homem sempre
consegue descobrir tudo que deseja — ela me avisou,
convicta.

— Eu sei. Ele fareja medo — falei, séria.

Nós acabamos rindo do meu comentário e ela balança


a cabeça em negativa. Depois volta a dizer:
— Todo assunto referente à dona Eva o deixa furioso.
Você precisava ver como ele estava depois que o
delegado saiu.

— Você sabe o que esse tal delegado queria?

— Não sei. — Dá de ombros.

Voltamos cada uma às nossas funções.

Depois desse pequeno susto, eu só preciso


descansar.

Minha primeira folga na fazenda caiu junto com a de


Mariana. Assim, pudemos tirar uma manhã livre para
passear pela fazenda. Esse lugar é incrível, muito grande.
Fazemos uma longa caminhada até nos aproximarmos do
riacho. É onde faremos um piquenique. Eu não trouxe uma
cesta pesada até aqui para nada.

— Tem uma cachoeira linda perto daqui. Ela despeja


toda a água nesse riacho. É um lugar lindo.

— Estou apaixonada pelo verde desta fazenda. É uma


pena que eu tenha esquecido meu celular, senão
registraria esse momento.
Eu ouço o som de um cavalo relinchando e nossa
atenção é voltada para Marcos, que está passando perto
do lugar. Mariana se empolga e acena para ele.

— Já sei, vou pedir para o Marcos me deixar


rapidinho na casa grande, para eu poder pegar seu
celular. — Ela sai correndo atrás dele.

— Espera! Não precisa... — gritei.

— Não é perigoso aqui, pode confiar em mim. Eu


volto o mais depressa possível — ela continuou correndo e
falando ao mesmo tempo, até conseguir parar Marcos e
montar no cavalo dele.

A doida acena para mim e eu abro um sorriso triste.


Caminhamos cerca de quinze minutos até chegarmos aqui,
e agora ela me deixa sozinha? Eu não deveria ter falado
desse celular.

O som da água descendo é como um calmante para


os meus ouvidos. Nesta época do ano, o riacho costuma
estar cheio e ótimo para tomar banho. Não penso duas
vezes antes de tirar a minha blusa e ficar apenas com a
parte de cima do biquíni que coloquei. Tomarei banho de
short jeans mesmo. Como não há ninguém à minha volta e
estou sozinha, posso ter um pouco de tranquilidade em
vez de ouvir a maluca da Mari tagarelar sobre o capítulo
da novela. Entro na água, que está com a temperatura
deliciosa, solto meus cabelos e dou um mergulho gostoso
nela. Sei nadar desde criança. Ela está vindo acima dos
meus seios e eu nem entrei na parte mais funda. Sei
nadar, mas faço isso com segurança.

Fecho os olhos e fico de barriga para cima, boiando


sobre as águas relaxantes. Nadar é uma terapia para mim.
Nesse momento tenso que venho atravessando, poucas
coisas fazem eu me sentir bem.

Creio que já passei mais de vinte minutos dentro do


riacho, e nada da Mari aparecer. Começo a me preocupar.
Será que ela se esqueceu de mim? Ou não a deixaram vir
mais? Não sei se me recordo do caminho de volta para a
fazenda. E se eu me perder no meio dessa mata? Mil e
uma coisas se passam pela minha cabeça.

Eu trouxe uma toalha e roupas secas, então me seco


primeiro e olho para todos os lados, acreditando que
aquela louca vai aparecer em algum momento. Respiro
fundo e penso em dar mais um mergulho antes de comer.
Coloco a toalha ao lado da cesta e volto a olhar para as
águas calmas do riacho. Inicialmente, levo um susto ao
ver alguém emergir dele. Não havia ninguém ali antes, e
agora sai um homem de lá. Eu teria gritado se não o
tivesse reconhecido instantaneamente. É Otto. Ele não
notou a minha presença e passa as mãos sobre o rosto e
cabelos. Quando dou por mim, estou admirando cada
movimento seu. Ele caminha para sair da água e, só
então, noto que ele está despido, completamente nu.
Arregalo os olhos ao ver o tamanho do seu membro e
engulo em seco. É possível algo ser tão grande assim?
Assusta-me. É bastante assustador e enorme. Minha
respiração se tornou pesada.

Otto ainda não percebeu a minha presença e eu não


consigo esconder a careta que faço. Estou em choque. E
quando ele olha para a minha direção, vendo-me e
percebendo que eu estava olhando-o, minhas bochechas
coram violentamente. Viro-me de costas, tomada pela
minha vergonha e timidez.

— Jesus Cristo! — exclamei, envergonhada.

O que eu acabei de ver foi algo surreal. Ele é um


homem muito forte, com braços, pernas e abdômen
definidos. Pude até ver os pelos do seu peitoral e daquele
lugar. Esse foi o momento mais constrangedor de toda a
minha vida. Como eu posso encará-lo depois de ter
testemunhado toda a espessura grande e grossa do seu
membro? A vontade que sinto é de sair correndo, só que
minhas pernas travaram e eu não posso me mover nem um
centímetro à frente. As batidas do meu coração são tão
altas, que conseguiria contá-las.

Pelos céus! Onde vim me meter? Por que não fiquei


no meu quarto, lendo um livro online? Respiro fundo mais
uma vez. Eu sei que ele está parado atrás de mim, e
talvez perto até demais. Será que não se importa de estar
despido na frente de uma mulher desconhecida? Ou, pior
ainda, na frente de sua ex-cunhada? Apesar de ele não
saber disso. Sinto-me mal por ter olhado para o homem
que foi da minha irmã, para o pai dos meus sobrinhos, e
ter sentido atração por míseros segundos. Jamais me
perdoarei por isso, é inadmissível. Otto é o último homem
por quem eu poderia sentir atração, e também é o primeiro
que vi nu.

Conto mentalmente até 10, porém me atrapalho e


confundo a ordem, trocando o 6 pelo 8, e o 8 pelo 10.

Quando a sua voz ressoa atrás de mim, causa-me


arrepios intensos.

— Maria Luíza! O que faz aqui, senhorita? — não


houve arrogância em seu tom, nem mesmo raiva ou algo
parecido.

Mas, ainda assim, posso sentir calafrios. Estou muito


envergonhada.

— D-desculpe, senhor Cavalcante. E-eu não sabia


que o senhor estava aqui — respondi, nervosa,
gaguejando.

Minhas costas estão praticamente nuas, à mostra,


pois a fita que amarra meu biquíni é pequena e muito
reveladora. Sinto que seus olhos estão queimando-as de
alguma forma. É intimidador.
— Não deveria estar sozinha. Aqui é muito longe da
casa grande — agora, em sua voz, houve preocupação.

— Eu sei, mas não estava sozinha. Mariana foi buscar


algo que esquecemos lá.

Eu não posso dizer que ela saiu com Marcos, já que


ele poderia pensar coisas erradas sobre ela.

— Creio que a minha presença já foi o suficiente para


lhe causar tremores. Imagina se algo mais perigoso
tivesse acontecido.

— Algo mais perigoso?

Ele está dizendo que é perigoso e que há algo ainda


mais perigoso que ele?

— Não é recomendável que uma mulher esteja


sozinha e tão longe de casa. Há outras terras que fazem
limites com as minhas e há peões que eu não sou capaz
de controlar, se é que me entende.

— Sim, eu entendo.

— Creio que perdi minhas roupas. Poderia me ajudar,


Maria Luíza? — Sinto que ele se divertiu ao pedir isso.

Arregalo os olhos com o seu pedido. O que eu


poderia fazer?

— Como eu ajudaria? Trem!


— Talvez possa me emprestar essa toalha e me
ajudar a procurá-las.

Sinto tremores e arrepios a cada fala sua. Abaixo-me


para pegar a toalha e, ainda de costas, movo meu braço
para trás, para que Otto possa pegá-la, e assim ele faz.

— Tem o seu cheiro nela.

Ele gosta do meu perfume? Ele fez uma pequena


confusão na minha mente.

— É porque é minha.

Tendo passado alguns segundos, ainda estou de


costas, quando a voz rouca pronuncia:

— Agora pode se virar para mim, Maria Luíza. Eu não


vou comer você. — Teve um duplo significado em sua
frase. Consegui associá-la a sexo.

— O senhor tem certeza de que cobriu bem esse


trem? — Droga! Eu falo coisas sem sentido quando fico
nervosa. É que depois de ver um homem nu, no caso o
meu patrão, não tem como não tremer.

— Tenho sim — houve diversão em seu tom.

Mesmo receosa, encaro-o, olhando fixamente em


seus olhos. Brevemente, certifico-me de que a toalha está
em volta da sua cintura. Ele a segura com uma mão, pois
não deu nenhum nó nela. Otto é um homem bonito e
atraente. Se não fosse por todo o meu ódio, que me cega,
eu até entenderia por que minha irmã se casou com ele.
Mas na minha cabeça, ele sempre será o homem dela. Por
isso não posso sentir nenhuma atração ou nada parecido
por Otto. Está proibido e fora de cogitação.

Reparo que seus olhos tempestuosos estão me


observando como se me analisassem. Posso ver interesse
neles. Apesar de estar usando o biquíni, sinto-me como se
tivesse acabado de ser despida por essas írises negras.

— Diga-me, Maria Luíza: quantos anos tem?

Por que ele insiste em me chamar pelo meu primeiro


e segundo nome todas as vezes que dirige a palavra a
mim? É como se sentisse prazer em pronunciá-los.

— Vinte e um — respondi, sem entender.

— Não tem idade o suficiente para ter terminado a


faculdade, a menos que tenha concluído o ensino médio
bastante jovem.

— Eu não terminei a faculdade. Essa informação está


no meu currículo.

— Sei disso. — Então, por que me perguntou? — Por


que não terminou?
— Motivos pessoais. — Ele parece não aprovar a
minha resposta. — Nem todos têm a sorte de nascer
herdeiro.

— Acha que isso é questão de sorte?

— Sim. O senhor não acha? — devolvi a pergunta.

— Ter nascido herdeiro não é considerado algo de


sorte se você não souber administrar tudo que lhe foi
herdado. Acha que eu não trabalho duro?

— Eu não acho nada. Eu nem sei como essas coisas


funcionam.

— Para se ter uma grande fortuna é preciso trabalhar


e se dedicar ao que faz. Caso contrário, possua alguns
milhões, não saiba administrá-los, e dentro de algum
tempo não terá mais nada.

Ele tem razão, mas eu não preciso concordar.

— Você é uma garota muito ingênua. Sabia disso?

— Isso porque me considera alguém incapaz?

Pensei que ele não seria mais arrogante. Só que não


é arrogância, e sim sinceridade que sai de sua boca em
forma de palavras que me deixam desconfortáveis.

— Não é assim. Eu sei que é capaz de muitas coisas


— afirmou, deixando-me com uma pulga atrás da orelha.
— Mas é ingênua e imatura para alguns assuntos.

— Acredito que, como meu chefe, não precisa me


falar essas coisas, até porque elas não fazem a menor
diferença para mim. O que o senhor diz ou não, não faz
diferença alguma em minha vida.

Ele parece estar me estudando. Preciso manter a


calma para não perder o controle.

Pego a cesta pesada.

— Creio que não posso ajudá-lo mais. Depois me


mande uma toalha nova. Essa, que está usando, pode
jogar fora se quiser. — Abro um sorriso irônico e lhe dou
as costas.

— Eu posso farejar o seu medo, Maria Luíza — ele


disse, fazendo-me olhá-lo novamente.

— E, segundo o senhor, que medo é esse que pode


farejar?

Ele dá um passo à frente e eu dou dois para trás. Otto


conseguiu fazer com que eu demonstrasse meu medo.
Diacho!

— O medo de ficar sozinha comigo.

Bingo! Ele sabe que sua presença me causa


tremores. Apesar de ele não ser um bicho de sete
cabeças, assusta-me.

— Não tenho medo de ficar sozinha com ninguém.

— Comigo, você tem.

— Óbvio que não — tentei parecer destemida.

— Se não tem medo de mim, não saia correndo todas


as vezes que me vir.

Ele notou isso? Sempre que o vejo, desvio minha


rota. Pensei que ele nunca estivesse atento a isso.

— Eu não corro.

— E o que está fazendo agora?

— E o que quer que eu faça? O senhor está sem


roupas, enrolado na minha toalha, estamos em um lugar
afastado e ambos estamos molhados. O que dirão de mim
se me virem aqui? Que sou o brinquedinho do patrão? —
enfureci-me. — Eu me importo com o que as pessoas
podem pensar de mim, e a última coisa que quero é que
pensem que estou dando mole para o patrão. — Consegui
me articular bem dessa vez. Espero que ele acredite em
mim.

— Não se preocupe, você não faz o meu tipo.

Por que isso doeu tanto? Foi como um tapa na cara.


— Você também não faz o meu — falei o mesmo,
tentando me convencer disso.

— Mais uma ingenuidade sua: se importa com o que


dizem de você.

— Ninguém chega para o senhor e diz tudo que


pensa, por medo de perder o emprego, mas comigo é
diferente. Sou apenas a cozinheira desta fazenda, e se as
pessoas já falam sobre mim, imagina se me virem aqui,
com o patrão. Eu já estou de saída.

Ele segura o meu braço firmemente e um choque


percorre cada parte do meu ser, eletrocutando-me, com
esse contato físico. Meus olhos vão para a sua mão
grande e forte a me segurar. Por que ele está me
segurando assim?

— Me solte, ou eu vou gritar.

— Tranquila. Acabei de dizer que você não faz o meu


tipo. E mesmo que fizesse, eu não ataco mulheres
indefesas.

— Então, me solte.

— A sua língua é muito grande e afiada. Cuidado,


senhorita. Pode ser bonita, mas não tente se colocar
acima das minhas ordens. Não vai ser bom para ti,
menina.
— Está me ameaçando? O que fará se eu não fizer o
que deseja?

— Irei te domar.

Rio do seu comentário. O que ele pensa que sou? Um


animal?

— Não sou um de seus animais, para ser domada.

— Tem razão, é ainda pior. Mas eu já domei muitos


bois bravos. Uma mulher, para mim, nunca é difícil de
domar.

— Vá sonhando com o dia em que farei suas


vontades.

Ele abre um sorriso cafajeste, e isso me assusta.


Quem ele pensa que é para dizer que pode me domar?

Visto a minha blusa e caminho até chegar à fazenda.


Aquela conversa foi tensa e, ao mesmo tempo,
perturbadora. Otto consegue mexer com minhas emoções,
é inacreditável.
Que diacho de menina mais irritante e ingênua a
Maria Luíza. Todo o meu ser vibra por aquela boquinha
pequena e atrevida, pela sua cintura de pilão e,
principalmente, por aquela bocetinha, que eu tenho
certeza de que é rosadinha, assim como os mamilos dos
seus seios. Desde que ela pisou os pés na minha fazenda,
naquela noite em que fui buscá-la na rodoviária, pensei
que estivesse diante de um anjo. Não é possível uma
pessoa poder me lembrar tanto outra.

Eva foi a minha esposa por um ano, mas o nosso


relacionamento começou bem antes disso. Ela era a
mulher mais intrigante e feliz que eu já havia conhecido ao
longo da minha vida. Quando eu a perdi, acreditei que
jamais pudesse sentir meu coração bater forte por outra
mulher, até conhecer Maria Luíza, uma menina jovem, de
vinte e um anos. Todo esse alvoroço que sinto por ela
chega a ser um absurdo. Sou dezoito anos mais velho que
ela, e não falta muito para eu chegar à casa dos quarenta
anos. Já vivi muitas paixões, mas nenhuma tão
avassaladora como essa. Todas as vezes que a ouço falar
e que a vejo caminhar, minha vontade é de puxá-la pelo
braço e a levar para a minha cama, onde eu tenho certeza
que tiraria toda a sua braveza. Lá, ela seria submissa em
vez de mandona, como é fora dela.

Todas as vezes que a olho, sou dominado por uma


raiva brutal. Seja lá o que a trouxe à minha fazenda, estou
certo de que não é páreo para mim. Eu poderia seduzi-la
facilmente, como fiz com diversas mulheres, e depois que
a tivesse na minha cama, mandá-la embora. Mas me sinto
incapaz de fazer isso. Ela é um anjo em fisionomia
humana. Seu rosto angelical e olhos azuis inocentes
carregam uma dor profunda, mas, ainda assim, ela
consegue trazer alegria para esta casa, sem contar que
salvou a vida do meu filho, Lohan. Eu não poderia seduzir
a mulher que consegue acalmar as minhas crianças.

Os gêmeos, Alícia e Lohan, são os meus maiores


tesouros. Confesso que a esta altura do campeonato, ser
pai perto dos quarenta anos, deixou-me em choque em um
primeiro momento. Pensei que morreria sem deixar
herdeiros e que tudo ficaria para os filhos da minha irmã
em um futuro distante, pois sempre pretendi viver
bastante. Na minha cabeça, era como se eu pudesse
controlar tudo à minha volta, porém Eva chegou para
abalar todas as minhas estruturas e me mostrar que eu
não estava no controle de tudo.

Quando a vi, linda e majestosa, dançando naquela


boate de strippers, exigi um show particular seu somente
para mim. Ela não parecia nervosa, e a cada peça que
tirava, mais o meu pau endurecia. Eu precisava devorar
aquela mulher deliciosa. Paguei por uma noite de sexo
envolvente com ela, e a safada soube exatamente como
me enlouquecer, a ponto de me fazer perder a cabeça. Por
Eva, eu fui contra toda a minha família. Casei-me com
uma mulher sem posses e, ainda por cima, dançarina de
stripper. Quando a minha mãe soube, passou a fazer da
nossa vida um inferno, muitas vezes armando situações
para humilhar a minha esposa e até mesmo fazê-la perder
o controle, surtando de ciúme.
Talvez fosse isso que eu mais amasse em Eva. Ela
nunca tinha medo de nada e não agia como uma marionete
perante a sociedade; não permitia que ninguém jamais a
dominasse, nem mesmo eu. Acredito que o único que foi
dominado nessa história fui eu.

Lembro-me bem da última noite em que a vi em nossa


fazenda, dormindo com um peão após eles terem feito
amor em nossa cama. Eu estava enfurecido. Já havíamos
discutido antes, depois de ela ter jogado na minha cara
que nunca me amou. Eu a tinha deixado sozinha e ido
para a festa do boi, afinal de contas, com Eva ou sem, eu
precisava ir lá por ser um dos anfitriões e investidores do
evento. Ela sabia disso e se recusou a me acompanhar. Já
estava de caso com aquele homem. Eu deveria ter matado
os dois infelizes quando cheguei em casa, mas em vez
disso, eu a coloquei para fora daqui após discutirmos por
horas naquela noite. Eva pegou o carro que lhe dei de
presente de casamento e desapareceu, deixando-me com
os nossos filhos. Eu me questionei se realmente eles eram
meus, mas o exame de DNA mostrou que sim. São meus.
E eu decidi cuidar deles, mesmo atravessando a dor da
traição.

Três meses depois sem saber de notícia alguma sobre


Eva, um delegado veio até a minha casa e me comunicou
sobre a morte dela. Acidente de carro. Não fui ao funeral.
Nem tinha como eu ir. Quando vim saber dessa notícia já
havia se passado uma semana do acontecido. Mas visitei
o seu túmulo na cidade onde ela morava. Eu sabia pouco
sobre o passado da minha mulher, apenas que ela era
sozinha e que vivia da dança. Ela nunca me disse mais
nada sobre a sua história. Sem família e sozinha, ganhava
a vida de uma maneira peculiar. Não era errado Eva
dançar e se prostituir para conseguir sobreviver. Algumas
pessoas não têm outra opção, nem oportunidades. No
entanto, por mais que eu tenha tentado deixar o seu
passado para trás, sempre morria de ciúme ao vê-la sorrir
para outros homens. Isso era motivo de discussão sempre
entre nós dois.

Tenho a suspeita de que a minha mãe estava


envolvida no que aconteceu entre Eva e o peão naquela
noite. Ela jurou pela vida dos nossos filhos que não sabia
o que tinha acontecido e que não houve nada entre ela e
aquele homem, porém eu estava cego de ciúme e preferi
mandá-la embora a ter que a machucar. Vivo carregado de
remorso. A sua morte foi minha culpa? Isso eu não poderia
controlar, mas se eu não a tivesse expulsado da fazenda,
hoje ela poderia estar aqui, e em nome do nosso amor eu
a teria perdoado.

A dúvida me consome. Minha mãe jura que não teve


nada a ver com essa história, no entanto sei o quão cruel
ela pode ser. Por isso, sempre que posso, evito visitas
suas à minha casa. Eu seria incapaz de perdoá-la se
descobrisse que aquela noite triste foi mais uma de suas
armações. Sendo assim, ela seria a culpada de tudo.
Desde a morte de Eva venho tentando ser forte. A
minha armadura sempre foi minha ignorância, porém ela
está sendo quebrada com a chegada de Maria Luíza.
Mandei investigar sobre a vida dela. É estranho que uma
moça da cidade grande tenha vindo trabalhar em uma
fazenda isolada de tudo com o que ela estava
acostumada. Preciso saber o que ela quer aqui e o que
veio fazer; quero poder saber se minhas suspeitas têm
fundamentos.

Todas as vezes que a olho, é como se eu enxergasse


a minha Eva no seu jeito de agir. A maneira como ela fala,
a risada alta que ela sempre dá quando está conversando
com Lucrécia e Mariana... Há algo nela muito familiar. Não
nego que sempre que meus olhos mergulham no azul dos
seus, consigo sentir paz e um desejo incontrolável de
fazê-la minha. Se Maria Luíza fosse minha, eu passaria
todos os meus dias trancado no meu quarto, admirando
aqueles olhos azuis inocentes. Sinto-me um pervertido a
cada vez que a desejo, mesmo ela sendo maior de idade.
É como se eu estivesse pecando quando meu corpo a
quer. Fica difícil esconder minha ereção quando estou
perto dela. No riacho, quando ela me viu despido e quase
teve um ataque de vergonha, precisei segurar a toalha
para, assim, deixá-la mais folgada e ela não ver meu pau
ereto, duro por ela.

O sinal em suas costas me chamou bastante atenção.


Próxima à sua cintura tem uma mancha escura que parece
mais uma figura de um coração, com um lado maior que o
outro. A minha filha tem esse mesmo sinal na coxa. Seria
muita coincidência?

Às vezes tenho a impressão de que Eva escondia


mais coisas de mim, que não me contava, como a sua irmã
mais nova. O delegado que veio à minha fazenda me
contou que estão tentando localizar a irmã da minha
mulher. E se tudo se confirmar como estou suspeitando,
ela pode estar mais perto de mim do que eu poderia
imaginar.

Sempre falamos de tantos assuntos e havia muita


afinidade entre nós. Era como se eu a conhecesse de uma
longa data. E com o casamento, nós nos tornamos mais
íntimos a cada dia. Entretanto, ela nunca mencionou a
irmã, nem o seu nome. O delegado buscava pela garota. A
investigação da morte da minha esposa se tornou séria,
pois a polícia descobriu que os freios do carro não
funcionavam. Eles estão investigando isso com mais
atenção. O delegado não me revelou o nome da irmã de
Eva por questão de um protocolo de segurança. É como se
todos fossem suspeitos, inclusive eu, que era seu marido.
Mas eu jamais teria sido capaz de mandar cortar os freios
do veículo dela. Nem a sua traição me faria cometer um
crime tão horrendo. Eva era a mãe dos meus filhos e,
apesar de tudo, eu sentia respeito por ela.
O detetive particular que contratei reunirá todas as
informações que preciso saber, e dentro de alguns dias
poderei esclarecer algumas dúvidas. Espero que minhas
suspeitas estejam erradas.

Viro-me de um lado para o outro na cama, sem sono,


pensando naquela diaba inocente. Eu preciso vê-la, mas,
pelo horário, a garota já se encontra dormindo. Eu sei
disso porque já entrei em seu quarto outras vezes para a
admirar durante o seu sono, o qual sei que é pesado.

Sem pensar duas vezes, direciono-me, sem fazer


barulho, até o quarto de Maria Luíza. O som do seu nome
me causa tesão. Ela é deliciosa demais, uma tentação de
mulher. Abro a porta sem fazer barulho e não a vejo. Onde
poderia estar? Isso me deixa furioso, porque ela pode
estar em qualquer lugar, até mesmo nos braços de outro.
Eu não admitirei isso. Não sei em que lugar a procurar.

Irritado e prestes a acordar todos nesta casa para que


a encontrem, ouço a sua voz doce. Ela está próxima à
passarela que dá acesso ao seu quarto, com os cotovelos
apoiados sobre o corrimão e falando ao celular com
alguém. Quem será? Aproximo-me com cuidado para ouvir
a conversa.
— Também estou com saudade — sua voz delicada
pronunciou.

Saudade de quem, uai? Coisa boa não deve ser.

— Eu também te amo e não vejo a hora de estarmos


juntos novamente.

Seria o tal namorado que todos comentam que ela


tem? Em certa tarde, quando ouvi sua conversa com
Lucrécia, elas falavam sobre esse homem. Eu gostaria de
saber onde ele vive, para eu poder matá-lo.

— Daqui a alguns dias, na minha próxima folga, quem


sabe você não venha para Nova Lima? Há pousadas aqui,
e podemos nos ver.

Se ela pensa que vou permitir isso, está muito


enganada.

— Te amo. Eu atendo sim a sua ligação. Beijos. — Ela


respira fundo e, ao se virar para trás, grita, assustada,
vendo-me.

Pressiono-a contra o corrimão. Meu corpo está colado


ao seu e minha mão vai de encontro à sua boca linda que
tanto quero beijar no intuito de silenciá-la e, assim, não
despertar ninguém mais nesta casa.

— Tranquila. Sou eu.


Maria Luíza arregala seus lindos olhos azuis e sua
expressão, aos poucos, volta a ficar tranquila. Ela é um
poço de doçura no qual desejo mergulhar com intensidade.

— Não grite mais, por favor. — Ela balança a cabeça,


em afirmativa. — Não queria assustar você. — Retiro a
mão da sua boca gostosa.

— O senhor quase me matou de susto. Aconteceu


alguma coisa com os bebês?

Ela supõe que estou aqui por algo relacionado aos


meus filhos. Nem imagina que me enlouquece com sua
beleza rara e seu atrevimento. Se soubesse que quero
domar sua braveza mais do que qualquer outra coisa
neste mundo... Um desafio para mim é enfrentar a
pequena fera que há dentro dela.

— Está tudo bem com os bebês.

Se o assunto fosse meus filhos, eu teria ido até


Lucrécia em vez de sair procurando pela menina de olhos
inocentes que esconde uma profunda dor. Vê-la assim, tão
carente, faz eu querer abraçar o seu pequeno corpo e,
desse modo, protegê-la.

— Então, o que faz aqui?

Droga! O que lhe direi? Que vim vê-la? Não posso


parecer um idiota mais uma vez. Acredito que uma menina
da sua idade prefira rapazes mais jovens em vez de
homens mais velhos e barbudos. Preciso fazer a minha
barba para diminuir a minha idade uns dez anos.

— Estou na minha fazenda, Maria Luíza. O que eu


faço em determinados lugares não lhe diz respeito —
acabei sendo grosseiro com ela. O que não era a minha
intenção.

Às vezes sou pior que um cavalo bruto e arrogante


como um touro. Posso ver em sua expressão que ela não
gostou em nada da minha resposta.

Malu — como ela gosta de ser chamada — abotoa o


robe que estava mostrando seu pequeno corpo coberto por
um pijama minúsculo. Minha ereção começa a dar sinal.

— Então, boa noite, senhor Cavalcante. — Passa ao


meu lado.

Não me contenho e seguro firme o seu braço, fazendo


com que ela me olhe assustada.

Adoro vê-la com medo de mim, fico com tesão. Sinto-


me um insano por ficar duro diante desse pensamento.

— Com quem estava falando ao celular? — A minha


paciência já está por um fio. É bom que ela seja sincera e
me diga a verdade.

— Não é da sua conta — rebateu.


— É da minha conta sim, principalmente se estiver
pensando em trazer esse idiota para a minha fazenda.

— Primeiro: o senhor não tem nada a ver com minha


vida pessoal. Segundo: não sou louca de trazer ninguém
aqui. Agora, me solte! — rosnou. — Esta é a segunda vez
que me segura contra a minha vontade. Não estou
gostando disso.

Queria ter argumentos para a fazer ficar aqui, porém


não tenho nenhum.

— Ele é o seu namorado?

— Isso não é da sua conta.

— Responda! — exigi, furioso. Ela dá um pulo, em


sobressalto. — Ele é o seu namorado?

— Por que deseja saber?

— Responda!

— Ele é sim. Qual o problema?

— Todos — respondi, ainda mais furioso.

Malu estranha a minha reação, e eu também. Não


deveria estar agindo com ela dessa maneira. Agora ela
sentirá cada vez mais medo da minha presença, bem mais
do que já sentia antes.
— Vá para o seu quarto — ordenei, vendo-a me olhar
sem compreender nada. — Agora! — rosnei.

Malu sai correndo, assustada. Acredito que cometi


uma grande besteira nessa noite. Ela ainda não é minha e
já ajo como se fosse seu dono.
Ainda há uma revolta da minha parte por Otto ter me
confrontado daquela maneira quando eu estava falando
com Rafael ao celular. Qual o problema? Até onde sei, é
proibido se relacionar com os seus funcionários. Era só o
que me faltava esse fazendeiro bruto querer se intrometer
na minha vida pessoal. Custei a dormir, pensando nisso.
Eu posso ter me deixado levar ontem à noite, falando
que amava o Rafael. Na verdade, eu gosto bastante dele.
Ele foi o único cara com quem eu namorei, o meu primeiro
namorado, o que me levou para jantar, ao cinema, à
praia... Tivemos momentos bons, até seu ciúme querer me
proibir de usar saias, vestidos, e por aí vai. Se ele deseja
uma segunda chance comigo precisarei ter certeza de que
sua mudança é verdadeira. Não vou viver um
relacionamento tóxico.

Acabei de trocar as fraldas dos bebês. Eles são uns


sapequinhas cheirosos e gordinhos. A titia sente vontade
de morder as bochechas redondinhas deles, mas ela não
seria tão cruel assim com os dois anjinhos que mais ama
nesta vida. Consigo arrancar boas risadas deles, até
mesmo do Lohan, que é sério como o seu pai. Ele é lindo
também. Não que eu ache o pai dele um homem
exageradamente bonito; ele é bonito dentro do normal,
nada além disso. Convenço-me desse fato, porém sei que,
ao fechar os olhos, a imagem dele nu sempre me vem à
cabeça. Ainda não sei como consegui encará-lo ontem à
noite. É inevitável não me lembrar de tudo que vi.

Será que eu deveria contar à Mariana? Talvez não.


Ela poderia ficar irritada comigo. E não aconteceu nada
demais entre nós dois, foi apenas uma casualidade tê-lo
encontrado naquele riacho.
— Eu trouxe o seu almoço. Você não sai deste quarto
para nada mesmo. Gosta tanto assim de cuidar de bebês?
— ela perguntou.

— Sim, eu amo cuidar de bebês — confessei. — Eu


amo esses bebezinhos. — Pisco para eles e sorrio.

Como se os dois me entendessem, também sorriem.


Os pequenos estão deitados no berço. Eles acabaram de
acordar e daqui a pouco será hora do lanchinho da tarde
deles. Uma boa alimentação para ambos nesta fase é
essencial para o bom desenvolvimento.

— Peço perdão por não ter voltado para o riacho


ontem. Eu acabei me encontrando com o patrão, e você
sabe o que rola entre nós dois.

Estranho. Ela disse que se encontrou com Otto e que,


por isso, não retornou? Mas ele estava comigo e ainda
ficou no riacho quando eu saí. Por que Mariana está
mentindo?

— Disse que estava com o patrão?

— Sim, eu estava.

Eu poderia jogar na sua cara que ela está mentindo,


mas se eu fizesse isso, teria que contar que vi Otto sem
roupas, e essa não é a minha intenção. No entanto, o fato
de ela estar mentindo me intriga. Por que dizer que estava
com o patrão, sendo que não estava? Não entendo o
motivo da mentira. O que ela esconde?

— E como foi?

— Maravilhoso, como sempre. Aquele homem é


incrível. — Morde os lábios.

Associando isso a tudo que aconteceu no riacho,


levanto a leve suspeita de que ela pode estar mentindo:
em vez de estar dormindo com o patrão, está dormindo
com outra pessoa, um funcionário. Claro que sim. Por isso
ela mente para mim. Descobrirei a verdade sobre isso,
mas agora preciso aproveitar para comer enquanto a
comida ainda está quente.

— Deve ter sido maravilhoso mesmo. A sua


expressão de apaixonada diz tudo.

— Não há nada melhor do que estar apaixonada. O


seu coração bater aceleradamente por alguém é algo
inexplicável. Você deve sentir isso com o Rafael.

Na verdade, eu não sinto mais isso com o Rafael, e


sim com outro homem por quem eu deveria nutrir apenas
ódio, não sensações poderosas e estranhas. Talvez esse
seja o efeito colateral do rancor. Ao menos tento me
convencer sempre disso.

— Às vezes sinto — menti para não acabar gerando


um boato.
— Então sabe que não há explicação lógica para
descrever o que você sente quando vocês estão se
amando como homem e mulher.

— Você quis dizer “sexo”?

— Sexo também pode ser amor — rebateu. — Nunca


fez sexo apaixonado com o seu namorado?

Engulo em seco. Eu nunca fiz sexo com ninguém.


Para mim, não é nenhum tabu conversar sobre isso com
uma amiga, mas como acabei de descobrir que ela mentiu
para mim, não posso me abrir sobre algo tão íntimo.
Apenas balanço a cabeça, concordando. Ela vai embora
após eu comer tudo.

Gosto de ver as estrelas no céu. Os bebês dormiram


e a babá eletrônica está em meu bolso. Assim, posso ouvir
tudo que está acontecendo lá dentro. Embora eu esteja na
varanda do quarto deles, fechei as portas para que a
claridade não entre lá. Eles gostam de dormir com pouca
luz.

Estou distraída, olhando para o céu estrelado, quando


uma pequena movimentação lá embaixo chama a minha
atenção. Marcos está olhando para trás a todo momento,
buscando a certeza de que ninguém o está vendo. É
suspeito, pois ele me parece assustado. Continua a
observar ao redor discretamente, até sumir na escuridão,
onde a luz não é mais capaz de chegar. De fato, é muito
estranho o que acabei de ver, e mais estranho ainda é
presenciar Mariana ir na mesma direção que ele cerca de
dez minutos depois. Ela também desaparece na escuridão.
Há algo entre eles, e agora tenho cem por cento de
certeza. Um romance proibido e escondido por causa das
regras que Otto impõe sobre seus funcionários não se
relacionarem. Marcos e Mariana realmente se amam e
estão se arriscando, escondendo esse amor do chefe. Os
dois estariam despedidos, jogados na rua, caso aquele
ogro fazendeiro descobrisse tudo. Como ele não sabe
nada sobre o amor, impediria duas pessoas que se amam
de poder viver esse sentimento. Agora tudo faz sentido
para mim. A mentira sobre Mariana se envolver com Otto,
ninguém nunca comentaria, pois estariam falando do
patrão. Ela apenas protegeu o seu amado. Isso, sim, é
uma linda história de amor.

— Me pergunto o que a faz olhar tanto para baixo. —


A voz rouca me desperta imediatamente dos meus
pensamentos.

Certifico-me de que está tudo limpo e que ninguém


vai sair daquela escuridão e ser visto pelo patrão. Seus
olhos negros estão fixos nos meus. É intimidador. Agora
me vejo na obrigação de proteger aquele casal e de me
proteger dele e de suas palavras duras.
— Eu estava me perguntando se você seria capaz de
pular.

— Por que eu pularia?

— É isso que eu me pergunto. O que há de tão


interessante para estar olhando insistentemente para lá?
— Apoia as mãos no corrimão e começa a olhar para
baixo.

O que farei para o tirar daqui? Estou nervosa e


buscando uma solução rápida para que ele não acabe
vendo nada.

— O senhor já viu os gêmeos? Eles estão dormindo.


É melhor irmos para o corredor, porque podemos acordá-
los.

— Não se preocupe, meus filhos não acordam durante


a noite. — É verdade, e ele parece saber disso, para ter
falado com bastante tranquilidade. — Estamos
conversando baixinho, e a porta também está fechada.

Ele não precisava me lembrar de que a porta está


fechada.

— A fazenda costuma ser bastante escura à noite,


diferentemente da cidade grande, que é cheia de luzes,
onde está acostumada a viver.
— Realmente é diferente, mas eu gosto dessa
calmaria. — Ele me olha intrigado, como se quisesse ouvir
mais. — Na cidade, eu não consigo ver um céu tão
estrelado como esse. Veja como é bonito.

Ele observa o céu. E, diacho! O que Marcos e


Mariana estão fazendo? Estão se beijando ao alcance de
olhares. Eles são loucos e, certamente, acreditam que
ninguém pode vê-los. Minhas pernas tremem pelo nervoso.
Otto não pode olhar para baixo, não pode.

— Concordo. A cidade não pode proporcionar a


mesma paz e calmaria que a vida no campo.

— Por isso gosta de viver na fazenda? — Olho para


baixo, nervosa. Eles ainda estão lá.

Otto volta a me olhar e estranha a minha reação. O


que farei agora? Ele vai olhar para baixo. É instantâneo,
eu faria o mesmo. Penso rápido e já sei como impedi-lo.

— Ai, ai, ai, ai, ai! — Faço uma careta horrível de


“dor” e me apoio nele, fingindo que perdi o equilíbrio.

Ele me segura firme pelos meus braços e eu posso


sentir seu perfume amadeirado invadir minhas narinas. É
forte e só dele. Por uma questão de segundos, consigo
sorrir e ser tomada por uma sensação boa, porém
desperto do meu delírio e encaro a realidade. Duas
pessoas podem se complicar caso ele olhe para baixo.
— O que foi? Está bem? — seu tom de voz foi
arrogante e, ao mesmo tempo, preocupado.

Não consigo ver sua face, pois encostei minha cabeça


no seu peitoral. Estou quase chorando, temendo o que
pode acontecer, mas continuo firme no meu teatro.

— O meu pé está doendo muito e eu não consigo ficar


em pé. Acho que é câimbra. — Finjo sentir dor. — Ai, ai,
ai! É horrível. Nunca senti algo doer tanto. — Posso ter
exagerado, mas está funcionando.

Otto me segura com força nos braços e eu me


encolho, envergonhada. O calor do seu corpo aquece o
meu. Eu nunca havia sentido esse calor tão forte. Arrepios
me invadem da cabeça aos pés. Ele faz o meu coração
bater acelerado como nunca antes. Tudo está associado
ao cheiro bom do seu perfume, ao aroma bom da sua boca
e à sua masculinidade gritante e arrebatadora. Tudo
contribui para essa série de fatores que me deixam sem
reação.

Otto me leva até duas cadeiras que estão no terraço e


faz eu me sentar em uma delas com cuidado. Ele fica de
joelhos, ajudando-me a alongar a perna.

— Está se sentindo melhor?

Seus olhos negros me fazem querer tantas coisas


neste momento, que prefiro nem dizer.
— Acho que estou sim, um pouco.

— Talvez seja porque use esses tênis a todo


momento. Poderia calçar outros sapatos, talvez calçados
abertos, não fechados.

— Eu gosto de estar de tênis.

— Percebe-se. — Ele revira os olhos e eu sinto


vontade de rir. — Você está em uma fazenda, não em um
centro comercial de uma grande cidade. Há outros tipos de
calçados que pode usar aqui. Assim se sentirá mais à
vontade.

Ele tem razão, mas essa é uma mania minha: sempre


combino tudo com um par de tênis.

— Se quiser, posso levá-la para o seu quarto. Já está


quase no horário de Lucrécia vir ficar com os bebês, e eu
posso ajudá-la também.

— O senhor passa a noite inteira com os bebês?

— Qual o problema?

— Pensei que não soubesse como cuidar muito bem


de crianças.

— A senhorita não sabe quase nada sobre as coisas


que sou capaz de fazer.
— Acredito que não, mas não precisa me ajudar. Eu
acho que já consigo caminhar. Vamos ver. — Levanto-me
em um salto e caminho o mais depressa possível pela
varanda.

Para o meu alívio, não há mais ninguém lá embaixo,


e, para a minha surpresa, Otto já está aqui, ao meu lado.
Ele é muito rápido.

— Não vai mesmo me falar o que tanto a faz olhar


para baixo?

— Creio que o senhor esteja imaginando demais. Não


há nada para eu lhe dizer.

— Você está mentindo — afirmou. — Se tem algo que


você faz muito mal, Maria Luíza, é mentir.

Ele sabe da mentira e que tentei enganá-lo.

— Não estou...

— Seu pé não ficou dormente, você estava


escondendo algo de mim, algo que eu não poderia ver. E é
melhor que me fale tudo agora mesmo, ou irei puxar as
câmeras de segurança e você poderá se arrepender por
ter me enganado. — A sua expressão muda rapidamente
para a de alguém assustador.

Meu Deus! O que farei se ele puxar as câmeras de


segurança? O casal estará perdido. Engulo em seco.
— E, então? Vai me contar o que está escondendo?

Não posso abrir a boca e dedurar Mariana e Marcos,


mas se Otto descobrir, nós três estaremos perdidos. Eu
estou perdida. O que farei para me livrar desse homem?
Posso empurrá-lo? Mas não seria capaz de matar uma
pessoa, mesmo que essa pessoa seja meu ex-cunhado
que tanto odeio.

— Vamos lá, me conte de uma vez — rosnou, furioso.


— Por acaso havia alguém lá em baixo que eu não poderia
ver?

Parece que ele já sabe de tudo. É intimidadora a


maneira como ele demonstra estar jogando comigo. Eu
não sei como vencê-lo.

— Senhor, eu...

— Era o seu namorado? Ousou trazê-lo para a minha


fazenda?

— O quê?

— Amanhã bem cedo vou puxar todas as imagens de


segurança dessa fazenda, e se eu vir alguém diferente
rodeando minhas terras, será um problema para a
senhorita.

Ele pensa que Rafael estava aqui? De onde tira essas


coisas absurdas?
— Juro por Deus que eu não trouxe ninguém para cá,
muito menos meu namorado.

— Não minta para mim. — Há faíscas saindo de seus


olhos. Otto se transformou em um dragão possesso de
raiva.

— Não estou mentindo. Eu juro, patrão.

Ele me analisa, ainda furioso, tentando raciocinar.

— Eu juro que não traria alguém à sua fazenda sem


comunicar antes, muito menos sem permissão.

— Pode até ser que não tenha trazido seu namorado


aqui, até porque há uma ordem minha para atirar em
qualquer pessoa suspeita que entrar nas minhas terras por
conta do roubo de gado que está acontecendo.

Estão roubando seu gado? Lucrécia me disse que


muitas fazendas são vítimas de roubos todos os anos.
Otto é louco. Dar uma ordem de atirar é perverso demais.

— Eu juro que não trouxe meu namorado aqui, e


nunca trarei, porque não tenho namorado.

Ele me olha sem compreender, tentando entender.


Também posso ver uma certa satisfação nele com o que
me ouviu dizer.
— Mais uma mentira? Eu a ouvi falar que ama
alguém.

— Sim, ouviu. Era o Rafael, meu ex-namorado. Nós


terminamos antes de eu vir trabalhar na sua fazenda,
porém nosso término não me faz deixar de amá-lo. Ele foi
importante para mim e me deu apoio quando ninguém mais
estava ao meu lado.

— Então, o seu coração pertence a esse homem?

— Eu não sei, estou confusa — acabei falando o que


não deveria.

Otto me faz bater as costas na parede, machucando-


me um pouco. Ele está me intimidando, e eu não gosto da
sensação de me sentir sua prisioneira. É como se o ar
tivesse diminuído de repente.

— Diga-me uma coisa, Maria Luíza: você se entregou


para ele?

— Como é?

Sua pergunta foi desconcertante e inconveniente.


Como alguém é capaz de ir tão fundo assim?

— Você se entregou para ele? Fizeram sexo?

Arregalo os olhos. Ele fez minhas bochechas corarem.

— Não vou lhe dizer isso.


— Então, isso é um “não”?

— Isso é um “não é da sua conta”. Não pode ser tão


invasivo assim, é a minha vida pessoal. Seria a mesma
coisa se eu o perguntasse sobre a última vez que fez sexo
ou com quantas já transou. Não é da minha conta e eu não
quero saber nada disso, porque é algo pessoal, que não
me diz respeito.

— A minha esposa foi a última mulher com quem eu


transei, e não sei lhe dizer com quantas já fiz sexo,
apenas que foram muitas.

Sua revelação me deixa em choque. Ele não teve


outra mulher depois da minha irmã. Isso, sim, é algo
impactante para mim, até mesmo mais que o fato de ele
ter perdido as contas de com quantas mulheres já transou.

— Não é possível. Já faz alguns meses que sua


esposa faleceu.

— Sim, faz.

— Então, não precisa mentir para mim.

— Não necessito mentir para você. O que eu disse é


a verdade nua e crua. Você não entenderia, pois nunca
passou por algo semelhante. Amar é muito profundo e
verdadeiro.
— Ainda a ama? — A pergunta que não quer se calar.
Se ele se sente íntimo para me perguntar se já transei,
também posso invadir sua privacidade e buscar
informações que gostaria de saber.

— Amo — confessou sem o menor pesar.

Ele ainda ama alguém que morreu. Otto está sendo


verdadeiro.

— Eu sinto muito pela sua perda — consegui ser


sincera e verdadeira com as minhas palavras.

— Eu amo a minha ex-esposa, e desde que ela


morreu, para mim, foi como se o mundo tivesse acabado
— foi profunda a sua revelação. — Todas as mulheres
morreram para mim e não consegui me sentir atraído por
mais ninguém, porém eu voltei a desejar uma mulher ao
vê-la.

Abro a boca e não consigo pronunciar nenhuma


palavra. Ele me deseja e acabou de dizer isso na minha
cara, sem nenhum pudor e sem imaginar que sou irmã da
sua falecida esposa. Nunca me senti tão culpada em toda
a minha vida. Otto é o homem que eu odeio
profundamente. Ele roubou Eva de mim, trouxe ela para
essa fazenda, fez ela sofrer, e agora está dizendo que se
sente atraído por mim. Sinto-me suja por ter despertado
desejo nele.
Ele era o homem da minha irmã! Eu jamais poderia
me envolver com ele; nem em meus pesadelos, muito
menos na vida real.

Volto a sentir aquela dor horrível no coração, aquela


dor que senti no dia em que reconheci o corpo sem vida
da minha irmã. Eu seria uma traidora se correspondesse a
esse desejo que também ousei sentir.

— Diga alguma coisa, Maria Luíza.

— Não tenho nada para dizer.

— Prefere fugir em vez de conversar comigo


honestamente como os dois adultos que somos?

Encaro-o com receio e com uma profunda dor que já


não posso mais esconder, além de um sentimento de asco.
Isso está bem explícito no meu olhar.

— Tudo bem, o senhor pediu para ouvir. Eu vou falar


tudo que sinto. — Ele aguarda por isso. — Como eu
poderia sentir desejo por alguém que desde que eu
cheguei aqui só soube me maltratar com duras palavras?
— Ele vai dizer alguma coisa, porém não deixo. — Eu
ainda não terminei. — Ele assente e eu continuo. — Eu o
acho desprezível. Na verdade, tudo em você me causa
asco, inclusive a maneira rude como age. Eu não tolero
sua arrogância comigo e com todos. É um bruto, um ogro.
Um fazendeiro ogro. Não tem como uma mulher, em sua
consciência perfeita, se encantar por você. Se tem algo
que eu sinto quando se aproxima de mim é medo dos seus
ataques rudes. Eu não o desejo, e nunca irei desejar
alguém que me faz sentir pavor e tremores quando está
por perto.

Ele ouviu a tudo atentamente, sem demonstrar


nenhuma irritação.

— É isso que pensa de mim? Que sou um ogro?

— É isso que tem me mostrado desde o primeiro dia


que eu cheguei a esta fazenda. Você, Otto Cavalcante,
seria o último homem na face da terra por quem eu me
apaixonaria. Está proibido, proibido, proibido — repeti
baixinho, não sabendo se ele poderia me ouvir. — Então,
eu peço que, por favor, não volte a me abordar com
perguntas delicadas e íntimas. Eu não sou seu
brinquedinho. Não pode se divertir comigo.

— Quem disse que quero me divertir com você?

— Como não? Primeiro me disse que eu não faço o


seu tipo, e agora me disse que me deseja. Por favor, vá
procurar outra para enganar, porque eu sou imune ao seu
charme e à sua beleza.

Quero acreditar muito nisso, entretanto, quando o


vejo sorrir — o que acontece raramente —, fico
desconcertada como um brinquedo que acabou de
quebrar.

— Me acha charmoso e bonito?

Quem não acha? Deus pintou tanta beleza nele, que


chega a ser extraordinário.

— Eu não acho nada. Por favor, não volte a me


importunar, ou terá que encontrar outra empregada. —
Dou-lhe as costas e saio do quarto aos prantos. Tudo isso
foi demais para mim. — Eva, me perdoe — pedi baixinho,
chorando.

Sinto que estou traindo todos os meus propósitos e a


minha irmã. Algo que me dói profundamente.
Fecho a porta do meu quarto e passo a chave para
garantir que ninguém entrará aqui. Melhor dizendo, ele.
Escoro as costas na madeira e desço escorregando até me
sentar sobre o chão. O choro me domina. Pretendo ser
forte e não chorar porque aquele ogro fazendeiro disse
que se sente atraído por mim. A última coisa que eu
desejava nesta vida era atrair sexualmente o homem que
ainda diz amar a minha irmã.
Ficar nesta fazenda está se tornando algo perturbador
para mim e cada vez mais difícil. Os meus sobrinhos me
fazem querer ficar aqui para sempre, cuidando deles, e o
meu lado racional me pede para encontrar provas para
incriminar Otto, mas nada aqui parece comprometê-lo. Eu
não quero acreditar que ele não possa ter culpa de nada.
Ele não pode ser inocente.

Sinto que meu corpo está sendo balançado em um


giro de trezentos e sessenta graus, e minha cabeça está
tonta. Preciso dormir. Preciso encontrar a paz que tanto
procuro. E, acima de tudo, tenho que fugir das garras
daquele homem; não por medo de ele me atacar, e sim por
medo de mim. Não sei se seria capaz de resistir.

Diacho de vida! Diacho de fazendeiro! Otto poderia


ser mais ogro na aparência também, em vez de ser um
belo deus grego que consegue arrancar suspiros de todas
as mulheres.

Nunca quis me apaixonar, pois sei o quanto o amor


pode machucar. Até hoje todas as pessoas que amei foram
as que mais me machucaram. Por isso não queria amar. A
minha irmã amou e saiu profundamente machucada. A sua
dor é a minha dor até hoje.

Mergulho na minha dor.


Quando despertei, estava sobre o chão, com a cabeça
derreada. Dormi de mau jeito. Meu pescoço dói e, talvez,
eu não consiga nem trabalhar nesta manhã. Mandei
avisarem à Lucrécia que não me sinto bem.

— Você precisa ir a ao médico. Irei com você.

A minha dor, médico nenhum pode curar, somente a


solução do caso da minha irmã. Mais cedo vi ligações
perdidas da delegada que investiga o caso de Eva. Será
que estão me procurando? Eu fui embora sem avisar,
porém nada me mantinha mais presa àquela cidade.
Também, nenhuma ordem judicial foi expedida, proibindo a
minha saída.

— É apenas um mal-estar. Creio que se eu descansar


nesta manhã, poderei trabalhar à tarde.

Lucrécia e Mariana se olham e discordam, mas nada


podem fazer. Quando estou sozinha com Mari, ela me
encara com um certo desconforto. Noto que ela quer
conversar.

— Você me salvou ontem à noite. — Ergo uma


sobrancelha. — Marcos disse que o patrão estava prestes
a nos flagrar, quando você desviou a atenção dele —
disse, envergonhada. — Eu menti, e agora você sabe.
Porém, eu...

— Você fez isso para proteger o seu amor.

— Não está chateada?

Ela mentiu para mim, e eu odeio mentiras, mas


também não estou sendo sincera com ninguém. Portanto,
não posso exigir nada em troca além daquilo que posso
oferecer no momento. Seria muito arriscado se alguém
descobrisse quem eu realmente sou. Prefiro viver com
esse medo e receio a correr o risco de ir embora sem
provas.

— Eu poderia ter ficado chateada se você não


amasse profundamente o Marcos, e ele a você. Vocês dois
combinam, e eu espero que tome mais cuidado na próxima
vez que forem se amar. — Eu acabo rindo e ela ri comigo.

— Eu só menti por medo de que alguém pudesse, de


alguma forma, descobrir. Eu nunca tive nada com o senhor
Otto. Imagina. Ele é orgulhoso demais para olhar para
nós, da “criadagem”.

— Então, você não o ama?

— Claro que não. Eu amo o Marcos, e ele a mim, mas


não podemos assumir esse amor, muito menos desistir dos
nossos trabalhos. Nossas famílias dependem de nós.
— Eu juro que nunca entregaria vocês dois, mas temo
que o segredo de vocês não esteja seguro.

— Por que diz isso?

— Há câmeras de segurança. O patrão disse que


olharia todas hoje cedo.

— Não se preocupe, Marcos desligou as câmeras


daquele local. O patrão não saberá de nada, nunca.

Respiro aliviada. Uma notícia boa. Se aquele ogro


visse as imagens, como eu disse, os dois estariam no olho
da rua.

— Mais uma vez, muito obrigada.

— Por nada. Fiz de coração. Salvei uma amiga e o


amor dela.

— Você salvou bem mais que o nosso amor, salvou


nossas famílias também. A mãe do Marcos está muito
doente, e é ele quem compra todos os remédios dela. E eu
ajudo meus pais, que vivem na cidade.

— Tudo ficará bem. Só tenham mais cuidado. Beijos


apenas em lugares onde a luz estiver fora de cogitação.
Agora, eu preciso beber café.

— É incrível como você resolve tudo bebendo café. —


Ela ri e volta ao serviço.
Como eu disse, à tarde me sinto melhor para
trabalhar.

— Já que se sente melhor, poderia ir na cidade com o


Marcos comprar todas essas coisas que estão na lista? —
Lucrécia me pediu.

— Claro. Mas e os bebês?

— Cuido deles. Aproveite e vá ao médico, caso não


se sinta bem. O patrão queria trazer um médico para a
fazenda. Eu tive que dizer que você estava naqueles dias
e que, por isso, não necessitava de um.

— Obrigada, Lucrécia. Eu tenho pavor de médicos e


hospitais, mas prometo que passarei no posto de saúde.

Ir até a cidade me ajudará a esfriar a cabeça. O peão


me aguarda na frente da casa e Lucrécia me leva até a
porta. Desço a escadaria até chegar ao carro. Meus olhos
observam o outro carro, que estacionou próximo à fonte. É
Otto e outro peão que acabaram de chegar de algum lugar.
Ele está lindo, usando um chapéu montana marrom e
óculos escuros. O rei do gado fica lindo de jeans apertado
e camisete preto. Raramente, ele veste quadriculado de
duas cores.

Desvio meu olhar e entro na caminhonete com


Marcos.

— Boa tarde, senhorita. Se sente melhor?


Vejo que a notícia da minha indisposição se espalhou
por toda a fazenda.

— Estou bem. Podemos ir.

Marcos dá partida e, ao passarmos próximos ao


patrão, ele buzina. Meu coração acelera só de vê-lo. Ainda
bem que os vidros estão fechados e eles não podem nos
ver.

A lista contém mercadorias de supermercado. Tudo


aqui é comprado em grandes fardos para o armazém.

— Já está tudo encomendado, senhorita. Eu só irei


pegar. Lucrécia me disse para a deixar no posto de saúde
e depois passar lá para a buscar.

— Diacho, eu não tô doente!

— Cumpro apenas ordens, senhorita.

— Eu sei que sim, Marcos.

Marcos parece querer me dizer alguma coisa, como


se buscasse coragem. É divertido. Mariana é apaixonada
por ele e eu sei exatamente por quê: ele é cavalheiro
demais.

— Quero agradecer por ontem à noite. Mariana me


contou tudo.

— Não há o que agradecer.


— Há sim. Muito obrigado.

— Por nada, então.

— Sobre aquele dia, na festa, eu lhe disse que todos


queriam dançar com a senhorita, inclusive eu, porém não
era verdade. Eu disse que queria dançar com a senhorita
somente para não levantar suspeitas do meu
relacionamento com a Mariana. Não que eu não a ache
bonita.

— Eu entendo. Pode ficar tranquilo, afinal de contas,


você não me disse nada demais. — Sorrio.

Ele me deixa no posto médico. O que eu irei fazer


aqui, sem estar doente? Apenas esperar Marcos retornar
para me buscar. O que levará algum tempo, visto que ele
foi carregar o carro com o estoque de comida. Eu não
posso nem dar uma volta, pois não conheço bem a cidade
e poderia me perder. O posto médico fica em frente a uma
pracinha, onde procuro um assento até que minha carona
volte.

Aproveito para ligar para a minha tia. Faz alguns dias


que não falo com ela.

— Pensei que havia se esquecido da sua tia amada.

— Jamais, tia. Eu não liguei antes por causa da


correria do dia a dia.
— Mas tem falado com o Rafael — afirmou. — Ele
esteve aqui e está muito ansioso para encontrar você
novamente.

— Como a senhora está?

— Bem. O seu tio está aqui. Deseja falar com ele?

— Não. Na verdade, eu liguei somente para dar um


“oi” e dizer que estou bem.

— Sinto sua falta, meu anjinho. Sabe que Deus não


me abençoou com filhos, mas que você é a filha que ele
me deu.

— Em breve lhe farei uma visita. Te amo, tia.

— Eu te amo, Maria Luíza.

— Também te amo, tia.

— Filha, antes que eu me esqueça: a delegada Milena


esteve procurando por você. — Gelo com sua informação.
— É a respeito da investigação do acidente da sua irmã.
Eu não compreendi muito bem, mas parece que surgiram
novas provas. Estou muito preocupada, minha querida. A
polícia acredita que o acidente pode ter sido planejado.
Quem teria sido capaz de fazer algo assim contra a sua
irmã?

— Há muitas pessoas ruins, tia.


Otto pagará por tudo, eu juro.

— Eu não queria conversar isso por telefone, minha


querida, mas a sua irmã se casou e teve filhos durante o
tempo em que ficou desaparecida.

A polícia já chegou a essas pistas. Certamente, logo


estarão na cola de Otto. Preciso ser mais ágil e conseguir
provas que possam culpá-lo.

Somente pessoas íntimas me chamam de Maria Luíza.


Por isso me incomoda quando Otto me chama dessa
maneira. Não somos íntimos e não quero, nunca, ficar
íntima dele.

— Tia, não fale para a delegada da minha viagem a


trabalho.

— A senhora Milena me disse que o homem que se


casou com a sua irmã vive no campo. E você está em uma
fazenda. Me diga o que está acontecendo agora mesmo,
Malu.

Respiro fundo. Odeio ter que mentir para as pessoas


que amo, e diante de tantas informações, minha tia vai
saber se eu não falar a verdade.

— Tia, a senhora confia em mim e sabe que nunca


menti, nem me envolvi com nada errado. Eu peço que, por
favor, acredite em mim quando digo que preciso estar
onde estou. E não conte nada à delegada.
— Eu confio, filha. E não falei sobre o seu paradeiro,
apenas disse que não sabia onde você poderia estar.
Prometa-me que vai se cuidar, minha linda.

— Prometo.

Agora, que minha tia sabe de muitas coisas, preciso


ser rápida e precisa.

Observo a bela fonte que jorra água e a grande


árvore que dá frutos de amora. É muito lindo aqui. A minha
irmã descreveu essa praça em seu diário. Ao fechar os
olhos, posso imaginá-la com um sorriso lindo, estonteante,
enquanto escrevia o que sentia. Ela narrou esse lugar
como “a cidade mais linda em que já estive”. A vida no
campo a deixava feliz, principalmente porque construiu
uma família aqui, nessas terras.

Desperto dos meus pensamentos com a buzina do


carro. Já se passaram quase duas horas desde que
chegamos e logo anoiteceu. Adentro o veículo, fecho a
porta e depois prendo o cinto.

— Nossa! Você demorou uma eternidade. Pensei que


tivesse se esquecido de mim, Marcos. — Ao olhar para o
lado, tomo um leve susto inicialmente.

O que Otto faz aqui, no lugar de Marcos? Os carros


são iguais, por isso não pensei que pudesse ter tido uma
mudança de motorista. Ninguém me avisou nada.
— O que faz aqui?

— Vou levá-la de volta para a fazenda.

— Mas eu não vim com você, e sim com o Marcos.

— Marcos precisou ir na frente, e como eu estava na


cidade, levarei você de volta. Algum problema com isso?

— Nenhum. — Desvio meu olhar do seu. Estou


nervosa por ontem à noite.

— Está se sentindo bem?

— Sim, estou. Podemos ir em silêncio?

Ele não diz mais nada.

Como há fofoqueiros na fazenda, todos devem saber


que vim ao “médico”. Agora estamos nós dois sozinhos
dentro de um carro fechado, onde todo o ar tem o seu
perfume. Não havia reparado que iria chover até começar.
A rodovia que percorremos não é muito extensa, mas a
estrada de terra já pode estar muito escorregadia com o
tanto de água que cai do céu.

— Acho melhor pararmos e não seguirmos. A chuva


forte costuma fazer estragos e buracos na estrada. Pode
ser perigoso — Otto avisou.

— Mas não estamos longe da fazenda.


— Qual a parte de “pode ser perigoso”, você não
entendeu?

— Por que tem que ser rude a todo momento? —


retruquei.

— Porque você é teimosa demais — rebateu.

— Engraçado ouvir isso de alguém que é tão teimoso


ou até mais que eu.

Ele prefere não continuar essa pequena discussão.

— Vou dirigir até a cabana. É melhor nos refugiarmos


nela.

— Qual cabana?

— Cabana de caça. Estamos a menos de cinco


minutos dela.

Pelos trovões assustadores, parece que o mundo está


prestes a acabar. Posso ver a cabana por causa dos faróis
do carro, que iluminam até lá.

A acelerada alta me assusta. Acho que atolamos. Otto


bate no volante do carro, irritado.

— Entramos em um buraco. Teremos que ir a pé.

— Nem pensar. Eu não vou.


— Então ficará sozinha aqui. — Ele abre a porta e
desce após desligar o carro, deixando-me sozinha.

Quanta grosseria! Não penso duas vezes antes de


descer e ir correndo atrás dele, que está me esperando
próximo ao capô do carro.

— Rápido!

Quando o trovão estronda, grito, em desespero.


Trovões me assustam desde quando eu era criança.

— Jesus Cristo! É hoje que vou morrer.

— Medo de trovões?

Eu balanço a cabeça em um “sim” e Otto agarra a


minha cintura, ajudando-me a caminhar em meio à lama.
Andamos o mais depressa possível até a cabana. Agarro-
me nele ao ouvir mais um trovão. Isso realmente me
assusta.

Enfim chegamos à cabana. Otto acende os lampiões,


já que está sem energia aqui. Ele constou isso ao ligar a
luz e ela não acender.

— Aqui costuma faltar luz quando tem temporais


fortes.

— Jesus! — Estou tremendo de frio.


Ele sabe onde tem velas e fósforos, e depois de
deixar o ambiente bem iluminado, eu posso ver a cama de
solteiro no canto, uma lareira com bastante lenha, uma
geladeira, um armário e uma porta que parece ser a de um
banheiro. É uma cabana charmosa e pequena, além de
confortável e segura. Fecho as cortinas para não ver o
clarão dos relâmpagos. Ainda estou tremendo de frio.

— Tem roupas minhas aqui. — Otto abre um baú e


pega uma camiseta para mim. — Vista isso. — Entrega-
me. — Tem toalhas em cima da cama, pode pegar.

— Não quer se trocar primeiro?

Ele simplesmente tira a camisa e abaixa a calça.


Antes que faça o mesmo com a cueca, eu me viro de
costas e o espero finalizar todo o processo.

— O banheiro é apertado para se trocar.

— Então, quando terminar de se vestir, pode se virar


de costas para eu poder fazer o mesmo?

Ouço sua risada majestosa, que me irrita.

— Posso.

Ele me avisa quando posso me virar. Já está de


costas.

— Não olhe até eu dizer que pode se virar.


— Não vou fazer isso sem a sua permissão.

Livro-me de todas as minhas roupas e visto sua


camisa, que fica folgada em mim e uns quatro dedos
acima dos meus joelhos. Ela é branca, tem seu perfume e
está limpa. Agora enxugo meus cabelos.

— Quanta demora — ele resmungou.

— Já terminei.

Otto me encara com deslumbre. Ele vestiu uma calça


moletom. Está bonito e aquecido, enquanto eu ainda sinto
frio.

— Posso te dar minha camisa.

— De maneira nenhuma. Acende a fogueira para a


gente?

— Claro.

— Vou ver o que tem para comer aqui.

— Você encontrará somente água, sucos e bolachas.

— É melhor do que dormir com fome. Se bem que eu


não vou dormir com toda essa chuva.

Ele se abaixa para acender a lareira. Será que vai dar


certo, com esse temporal?
— Tem medo de trovões realmente?

— Um pouco. — Abro o armário e, de fato, só tem


bolachas. — Não é nada exagerado.

Corro na sua direção quando escuto um trovão


assustador. Agora, sim, parece que o céu desabou sobre
nossas cabeças. Também grito, assustada, e me agarro à
sua cintura. Não vou soltá-lo por nada. Ele me abraça e
massageia meus cabelos molhados.

— Tranquila. Você está segura.

Minha cabeça está colada em seu peitoral forte e


quente. Ele é proibido, e meu coração grita isso. Portanto,
afasto-me desse homem bonito e cheiroso.

— Desculpe — falei, tremendo de frio.

Otto pega um cobertor e me envolve nele.

— Assim, você ficará mais aquecida, caso não queira


ficar nos meus braços.

— Aqui tá bom mesmo — respondi sem pensar.

Eu me sento na cama e Otto busca bolachas para a


gente comer. É melhor do que passar fome, e minha
barriga já ronca. Ele se senta no chão, próximo a mim, já
que dividimos o mesmo pacote.

— Sempre teve medo de trovões?


— Sim, desde criança. A minha mãe também tinha,
então eu acabei herdando isso dela. — Ele compreende —
Parece que vai passar a noite inteira assim.

— Acredito que sim.

— Como será que os bebês estão? Será que estão


assustados?

— Acredito que não dê para eles ouvir muito do


quarto forrado, e Lucrécia está com eles. — Assinto e
como mais uma bolacha. — Você gosta de bebês, está
escrito em seu olhar.

— Gosto sim — respondi, comendo. — E você gosta


de ser pai?

— Para ser sincero, eu nunca quis ter filhos. Com


quase quarenta anos, eu não me imaginava mais cuidando
de crianças e também não havia encontrado um amor.

— Entendo.

— Confesso que fiquei bastante assustado com a


ideia de ser pai. A gravidez da minha esposa não foi
planejada por nenhum de nós dois, apenas aconteceu.

Como ela descreveu em seu diário. Apenas


aconteceu.

— Mas você lidou bem com isso. Até se casaram.


— Porque eu a amava, e não pelo fato de ela ter
engravidado.

— Um casamento por amor é muito bonito hoje em


dia. Acho que eu jamais me casaria sem amor.

— Pensa em se casar?

— Algum dia, talvez.

— Com o seu ex?

— Com o amor da minha vida. Só assim irei me casar.

Otto começa a dar indícios de que está ficando


insatisfeito com o rumo da nossa conversa.

— E você pretende se casar novamente?

— Não. No que depender de mim, nunca mais. — Ao


menos meus sobrinhos não terão uma madrasta ruim. Mas
ele também pode mudar de ideia. — Você ainda está
tremendo. Assim ficará doente.

— Eu estou bem. — Na verdade, não estou. Está


muito frio.

— Eu sei como resolver isso.

— Sabe?
Otto arruma no chão um lençol, coloca dois
travesseiros por cima e depois mais um lençol, sem cobrir
os travesseiros. Vejo-o tirar a camisa. É muito sarado. Ele
segura a minha mão e pede para eu me sentar no chão.
Eu faço isso. Observo-o se sentar também e se deitar de
frente para mim. Logo me faz deitar com a cabeça em seu
peito. Todo o seu corpo envolve o meu em um abraço
apertado, caloroso, e ele puxa o lençol para nos cobrir.

Por que Otto está fazendo isso? Por que é tão bom
estar em seus braços?

— Otto, eu...

— Estou lhe aquecendo, Maria Luíza. Não seja


teimosa e fique quieta. Eu não estou violentando você.

Não está, porém seus toques fazem meu coração


disparar. Absorvo o calor do seu corpo quente. Como ele
tirou a camisa, posso perceber melhor o nosso contato
físico e íntimo. É bom demais e me faz sentir o que menos
desejo: atração. Seus dedos fazem cafuné nos meus
cabelos molhados e eu fecho os olhos, sentindo seus
lábios tocarem em minha testa. Ele beija essa região.

Sua boca entrou em contato com a minha pele como


uma corrente elétrica, fazendo-me abrir os olhos. Seu
olhar está fixo no meu. Tento sair do seu abraço, porém
sua força não deixa.
— Por favor, fique comigo. — Otto pedindo “por
favor”? Isso, sim, é novidade. — Quero acordar ao seu
lado. — Suas palavras me deixam sem resposta.

Ele é proibido, proibido, proibido...

— Otto...

— Você é tão gostosa, que me deixa louco, menina.

— Eu...

— Quase sempre imagino você e eu sem roupas, nós


dois perdendo o controle... Diga-me que não pensa em
nada disso e eu me calo para sempre.

Engulo em seco. Por que diabos quero que ele me


toque e me faça sua?

— Eu não posso...

— Você é uma mulher solteira, eu sou um viúvo


desimpedido. Seja minha. É só isso que te peço.

Meu coração grita para eu aceitar, mas minha razão


fala que não.

Isso seria traição, Maria Luíza.

Não consigo evitar sentir essa forte atração.


Otto fica por cima de mim sem deixar que seu peso
me machuque. Meus olhos são atraídos fortemente pelos
seus e minha boca saliva pela sua. É tão errado, mas eu
não posso evitar sentir esse desejo ardente que me
queima por dentro.

— Seja minha.

Eu balanço a cabeça em um “sim” e um sorriso safado


brota dos seus lábios carnudos. Eu serei dele nesta noite
chuvosa.
Estou cometendo a maior loucura da minha vida,
prestes a me entregar de corpo e alma para o único
homem que é proibido para mim. Onde está todo o ódio
que sinto por ele? Pergunto-me e não encontro nenhuma
resposta coerente. Minha respiração se torna pesada, sua
mão grande toca em minha face e seus lábios carnudos
encostam nos meus.
Proibido, proibido...

É como se eu tivesse acabado de desligar o alarme e


estivesse completamente fora de mim. Sou dominada por
um desejo ardente que me faz perder o controle sobre
todas as minhas ações. Torno-me refém dos seus toques.
Na verdade, suplico por eles. Otto é o homem mais bonito
que já vi. Vendo sua face assim, cara a cara, não tenho
mais dúvida.

— Sinto uma vontade louca de te ter por perto, Maria


Luíza — sua voz rouca sussurrou ao meu ouvido. — Eu
fico louco quando você me contraria. — Isso me faz sorrir.
Eu já sabia. — Não quero pressionar você a ser minha.

Este é o momento para a minha lucidez gritar que não


o quero, porém a força da atração que ele lança sobre
mim é inquebrável. Estou à mercê dele, completamente
rendida. Isso não estava em meus planos. Tudo está
dando errado. Nada parece estar saindo de acordo com o
planejado.

— Eu quero que fique comigo. Desejo acordar ao seu


lado.

Neste momento nós dois sabemos o que queremos e


creio que ele pode sentir quão excitada estou apenas com
seus toques suaves em forma de carinho em volta das
minhas bochechas. Nunca pensei que ele pudesse ser um
homem carinhoso, só imaginei que fosse um monstro, e
nada além disso. Não pensei que pudesse haver bondade
em seu coração, muito menos que ele tivesse um. Temo
que depois que a tempestade passar, ele possa voltar a
ser aquele homem bruto e terrível.

Sei que me arrependerei por permitir que seus lábios


se colem aos meus. O toque suave da sua boca quente
sobre a minha me leva a um delírio enlouquecedor. Otto
Cavalcante é um homem proibido para mim e agora estou
prestes a me tornar sua. Por mais que eu deseje parar,
não consigo. Eu preciso do seu calor para me aquecer,
tanto que chega a ser mais que uma necessidade física. É
como se eu necessitasse desse momento para me sentir
bem.

Tudo isso não passa de uma grande loucura. Ele é um


homem que anseia por desejos carnais, não busca mais
um amor. E eu nunca iria querer ser esse amor.

Ignoro toda a minha culpa ao menos por agora, um


momento em que a razão não fala mais que os desejos
ardentes que percorrem todo o meu corpo, levando-me à
loucura. É insano, mas eu também o desejo. O homem da
minha irmã! Neste instante quero que tudo isso se dane. É
como se até todo o barulho da chuva já não fosse mais um
problema, porque estou em seus braços. Nunca pensei
que fosse sentir segurança estando ao lado de um homem
que considero um “monstro”.
Sua língua invade a minha boca, pedindo passagem.
Sem pressão, sem pressa, apenas com bastante desejo.
Tempo é o que mais temos hoje. E neste lugar, sozinhos,
ninguém chegará aqui agora.

Minha respiração se torna pesada e alta, assim como


as batidas do meu coração, que estão aceleradas. Ele me
provoca coisas que nunca senti antes. Suas mãos grandes
e quentes entram em contato com minha pele, fazendo-me
tremer com a sensação esplendorosa. O tesão está
presente em ambos, porém isso não é nenhuma novidade
para ele, um homem que não sabe com quantas mulheres
já transou, por terem sido muitas, e com os instintos
presos, se realmente não fez sexo com nenhuma mulher
desde a morte da minha irmã. Acredito que Otto esteja
insaciável e disposto a uma longa rodada de sexo quente.

Suas mãos exploram minha cintura por baixo da


camiseta folgada e vão subindo até chegar à altura dos
meus seios, apertando-os com volúpia. Há bastante
luxúria em seus olhos negros, que agora estão soltando
faíscas por toda a parte. Eu nunca os tinha visto tão
entusiasmados como agora. Otto está possuído pelo
desejo.

Ele sabe que estou sem calcinha, porém é como se


buscasse autorização minha para poder investir.

— Porra! Você é gostosa demais, Maria Luíza —


sussurrou ao meu ouvido com a voz embargada pelo
tesão.

Ele dá algumas mordidas em meu pescoço e distribui


chupões nele. Reviro os olhos, alucinada. Em um
movimento rápido e prático, Otto tira a camisa que me
vestia, a única peça de roupa que me cobria. Chego a
arregalar os olhos, de tão veloz e fácil que foi para ele a
retirar.

— Assustei você, pequena? — indagou, preocupado,


encarando a minha face.

— Não — neguei com a voz por um fio.

O cowboy abre um sorriso safado e beija a minha


mandíbula suavemente. Ele pode sentir o quanto o desejo.
É mais do que eu posso controlar e maior do que tudo que
eu já senti. Sou virgem, mas já experimentei algumas
coisas prazerosas, só que nada nunca foi tão bom quanto
isso. Não há nem como comparar. Otto me faz ver estrelas
durante um dia ensolarado.

Há fascinação em seus olhos quando ele se livra do


cobertor e admira meu corpo nu sobre o chão, gostando
do que vê. Não que minha autoestima seja ruim, no
entanto acredito que sou uma mulher comum, sem muitos
atrativos. Eu sou só a irmã alegre.

— Gostosa! — Seus olhos negros podem transmitir


muitas coisas pecaminosas, e isso me deixa
envergonhada. Sei que ele está pensando em muitas
formas de fazê-las.

Ele é um bruto, mas, ao mesmo tempo, é carinhoso.


Isso deveria ser estranho, mas está sendo o contrário de
tudo que eu poderia imaginar. Foi delirante sentir o calor
de sua boca na minha, mesmo que em um beijo rápido,
pois agora ele ocupa os lábios em outros lugares. Beijos
suaves e intensos são distribuídos pelo meu pescoço, no
entanto seu objetivo maior é chegar à região dos meus
seios. Esse lugar parece ser o seu preferido, pois é ao
qual ele mais dá atenção. Sua língua quente saboreia
cada extensão da minha pele, e os beijos molhados em
meus mamilos me fazem tremer ardentemente.

Minha intimidade lateja, completamente molhada, e


seus dedos hábeis me invadem com delicadeza. É como
se ele soubesse da minha pouca experiência. Mas, apesar
de tudo, eu não temo nada. Sei que Otto não vai me
machucar.

Meu corpo se contorce como se dilacerasse, mas sem


dor alguma, apenas tomado pelo prazer. Acho que isso
chega a ser divertido para ele. No momento em que seus
dedos massageiam meu clitóris, somente me deleito com
essa deliciosa sensação. Gemidos baixos escapam do
meu controle. Agora desconheço o significado dessa
palavra.
Quando penso que estou prestes a explodir naquela
sensação dominadora, instigante, ele para. Inicialmente,
não consigo compreender por que parou.

— Me diga se você gosta de ser fodida com a língua,


bebê.

Ele não me dá tempo para responder, apenas sinto


algo ainda mais delicioso quando a sua língua molhada
contorna o meu clitóris em círculos. Otto sabe como fazer
isso, sabe como enlouquecer uma mulher, tratando-me
como uma sobremesa deliciosa que ele adora comer. Eu
fecho os olhos e o cowboy intensifica as lambidas quando
percebe que estou quase gozando, fazendo tudo ficar
ainda mais gostoso. Em questão de segundos explodo em
um delicioso gozo quente e intenso. Não sei descrever, só
sei que nunca tinha sentido nada tão prazeroso assim.

Pensei que acabaria aqui, mas isso só fez com que


minha libido aumentasse.

Meu gosto está em seus lábios, e ele parece adorar.


Otto precisa sentir ainda mais. Quando ele se levanta e se
livra da calça moletom, descubro que estava sem cueca.
Engulo em seco, sem medo. Duro é ainda bem maior do
que vi naquele dia, no riacho, porém isso não me fará
parar. Nada me fará.

Quando ele volta a ficar por cima de mim, pergunta:


— Como você prefere? Que eu a foda inicialmente
como estamos ou outra posição te agrada mais?

— Eu não sei — expressei toda a minha dúvida. —


Otto, eu nunca fiz sexo — revelei.

Ele não parece se abalar com isso. Pelo contrário.


Seu fogo aumenta ainda mais, queimando minha pele.

— Você é virgem?

— Sou.

— Tem certeza de que deseja fazer isso comigo?

— Já chegamos até aqui, não vamos parar.

Ele abre um sorriso safado e beija meus lábios


fervorosamente. Estamos embriagados pela enorme
vontade de nos unirmos nessa relação sexual.

— Você tem camisinha? — perguntei entre o beijo.

— Não precisamos — ele afirmou, posicionando a


cabeça do seu pau na minha entrada. O contato é quente.

Ele não deu muita importância para essa questão e


eu também acabo me esquecendo disso quando me
concentro nos seus estímulos. Sua boca suga um seio
meu e tudo volta a queimar novamente dentro de mim. Ele
descobriu meu ponto mais sensível e agora usa isso a seu
favor, ao nosso bel-prazer.
Minha boceta está molhada, tanto que a cabeça do
seu membro entra nela sem dificuldade e sem dor. Meus
olhos estão fixos nos seus. Eu viro a cabeça para o lado
da lareira, porém sua mão forte me faz encará-lo de novo.
Desta vez ele massageia meu rosto enquanto seu pau
grande e grosso entra com cuidado em mim, pedindo
passagem. É um pouco desconfortável, e eu demonstro
isso algumas vezes, só que Otto me faz querer mais. Eu o
culpo, mas também é culpa minha. Eu o desejo tanto, que
chega a queimar minha alma.

— Porra! Como você é apertada, bebê. Sabia que isso


me deixa louco? É insano demais para mim.

— Continue, por favor... — supliquei.

Arfo quando ele entra por completo dentro de mim.


Seu membro é grande e as paredes do meu canal são
estreitas. A barreira do hímen acabou de ser rompida e eu
sinto uma leve ardência que logo é esquecida com o beijo
gostoso que ele me dá. Volto a me conectar com o desejo
que me consome mais uma vez, que agora é muito mais
intenso.

Otto teme me machucar, vejo isso em seus olhos. Por


isso abre mão de todos os seus desejos para se
concentrar somente nos meus. Percebo, em seu olhar, que
ele quer me devorar como um leão que rasga a sua presa,
mas não faz isso. Pelo contrário. Ele cuida para que nada
possa me causar dor. Seus movimentos são lentos e muito
intensos; seus lábios tomam os meus a todo momento.
Não há fúria, há somente desejo que reluz algo
semelhante a paixão. Consigo me apaixonar pelo seu
toque macio, pelos seus beijos suaves, pelo perfume na
sua pele e pela intensidade do seu olhar sobre o meu.

Otto acendeu uma fogueira abrasadora dentro de


mim, e somente ele é capaz de apagar esse fogo que
queima ardentemente. Meus gemidos são abafados pelos
seus beijos molhados e o tesão vai se intensificando cada
vez mais. Movo os quadris para facilitar mais as estocadas
fortes e precisas. É delirante, excepcional. Nós dois
estamos lânguidos pelo desejo avassalador. Nossos
corpos suados espantam todo o frio que instantes atrás
nos assolava.

— Você é minha, Maria Luíza. — Suas mãos agora


apertam meu pescoço com posse. É sufocante e prazeroso
ao mesmo tempo.

Seu lado mais pervertido está vindo à tona agora. É


muito mais atraente do que o do bom mocinho. Eu sou
sua. Ao menos por esta noite estou sendo.

Quando penso que não pode ficar mais gostoso, meu


orgasmo intenso me prova o contrário. Posso sentir que
estou rendida por esse homem bom de cama. Otto também
goza intensamente, sua expressão sensual me mostra
isso. Ele me deseja ardentemente, e isso é um fato muito
perigoso.
Quando penso que acabamos por aqui, ele volta a
chupar minha boceta. Minhas pernas tremem, moles como
gelatinas. Sua intenção é me fazer gozar mais uma vez
com a língua. Ele manuseia a situação com bastante vigor
e eu posso sentir todo o deleite da excitação mais uma
vez. Sua língua me invade, também massageando a região
do meu clitóris com precisão. É revigorante ser tocada
desta maneira intensa. Não leva muito tempo e gozo mais
uma vez na sua boca. Ele adora a sensação de me fazer
gozar.

Sei que não vamos parar por aqui. Seus lábios beijam
os meus, fazendo-me esquecer de tudo mais uma vez. Eu
só preciso ser tocada por esse homem mais e mais, sentir-
me acolhida em seus braços e gozar mais vezes com ele.
O fogo queima tanto na lareira quanto em nossos corpos
suados e colados. Não há conversas, apenas beijos
molhados e orgasmos.

Assim eu irei me cansar e dormir tranquilamente em


seus braços até o dia amanhecer.

Quando desperto, ainda está escuro. Nós nos


deitamos agarradinhos na cama de solteiro. O fogo da
lareira está quase acabando e eu estou me sentindo
dolorida. Assim que me recordo de que fiz sexo várias
vezes antes de dormir, tomada pela exaustão, minhas
bochechas queimam. Acredito que ainda seja madrugada.
A chuva forte deu uma trégua, e agora está apenas
librinando.

Respiro fundo. Estou com a cabeça sobre o peito nu


de Otto, coberta até a cintura. Em seus braços não sinto
frio. Ao me remexer na cama, acabo o despertando. Ele
me toma em um beijo intenso. Sua boca devora a minha e
me parece que seu membro está duro mais uma vez. Em
um movimento rápido, o cowboy me faz ficar de quatro
sobre a cama e entra, duro e grosso, na minha intimidade.
Eu solto um gemido alto e ele dá um tapa na minha bunda.

— Que safadinha! Sua bocetinha está encharcada,


bebê!

Agora ele não tem piedade de mim. Ao enrolar meus


cabelos em suas mãos, puxa-os fervorosamente para trás
enquanto estoca em mim com força. Reviro os olhos com a
sensação intensa e maravilhosa pela qual sou envolvida.
Estou cansada, mas também cheia de desejos. Otto é
tentador demais para que eu não me renda a mais uma
rodada de sexo quente e intenso.

— Bocetinha gostosa, bebê! Caralho! Desse jeito irei


ficar viciado nela.

Não podemos nos viciar um no outro, isso é errado. E


bom demais. Nunca pensei que me envolveria dessa
maneira louca com o homem que mais odeio nesta vida.
Todo o meu ódio neste momento dá lugar somente ao
prazer. Neste instante eu sou só dele, e nada mais poderá
mudar isso, nem mesmo o arrependimento que sentirei na
manhã seguinte, que eu sei que será muito grande.
Contudo, agora a única coisa que posso fazer é me
deleitar com tanto prazer.
A pequena dorme com a cabeça sobre meu ombro. O
calor dos nossos corpos suados espanta o frio e aquece
nossas almas. Eu tentei fugir dessa diaba de cabelos
claros, porém foi inevitável, visto que a desejo mais que a
minha própria vida. Eu nunca me senti deslumbrado por
uma mulher dessa maneira.

O cheiro do nosso sexo está presente no ambiente


junto com as lembranças na minha cabeça. Controlo-me
para não a despertar para mais uma rodada de sexo
quente. Meu pau está duro como uma rocha e eu estou
pronto para a fazer gozar mais uma vez, entretanto me
contento com tudo que ela já me deu nessa noite. Maria
Luíza me entregou a sua virgindade, mesmo sabendo que
faríamos sexo sem compromisso.

Todos os nossos embates frente a frente eram duros e


fortes, e nunca pensei que tudo isso poderia ser domado
com muito tesão. Ela me deseja, por isso batia de frente
comigo, querendo negar tudo que sente por mim. Se
soubesse que me enfeitiça com sua rebeldia... Adoro
domar animais brutos, porém, no seu caso, ela é uma rosa
com espinhos. Para chegar à beleza do seu coração,
primeiro tive que quebrar todos os espinhos que o
atravessavam.

Agora sei que ela também me deseja, e isso me


enche de posse. Ela é minha, está dormindo em meus
braços. Eu a possuí em minha cama. Agora a quero todas
as noites, e ninguém poderá tirá-la de mim.

Acreditei que seria impossível sentir algo tão insano


por uma mulher novamente. Maria Luíza é linda e jovem.
Sou dezoito anos mais velho que ela e carrego uma
bagagem pesada e experiente. Não sou nenhum príncipe
encantado, pelo contrário, sou um fazendeiro bruto
envolvido pela inocência de uma menina. Estou perdido
nas suas curvas definidas e no seu corpo pequeno, o qual
fiz questão de beijar em cada parte doce e saborosa.

Maria Luíza me intriga. O que uma moça da cidade


quer na minha fazenda? Carrego muitas dúvidas e
suspeitas dentro de mim. Preciso esclarecer todas. Ela me
despertou um desejo quente que eu nunca mais tinha
sentido por uma mulher.

Agora ela é minha. Somente minha.


Respiro fundo, levanto-me da cama e junto algumas
peças de roupas que estão molhadas. Dará para as vestir.
Eu fito a cama vazia e lembranças da noite passada
invadem meus pensamentos. Todos os beijos intensos
castigam a minha mente, assim como os orgasmos que me
dominaram e o prazer enlouquecedor. Eu quero chorar por
tudo que fizemos.
Visto as roupas o mais depressa possível e me
pergunto onde está Otto, se ele foi embora e me deixou
aqui, sozinha. Como estou sem celular, não sei ao certo
que horas são, mas acredito que seja bem cedo.

Ouço o barulho do carro ligado. Será que ele vai


embora e me deixará só neste lugar? Respiro fundo. Há
algumas lágrimas de arrependimento na minha face. Eu fui
para a cama com o homem da minha irmã, e isso me mata
por dentro. Nunca serei capaz de me perdoar por ter traído
a sua memória dessa maneira. Ele era dela, não meu! E,
mesmo assim, eu me entreguei, eu me rendi ao seu
charme e fui sua por uma noite.

Não é como se ele fosse me pedir em casamento na


manhã seguinte. Certamente, ele nem irá querer mais falar
comigo, pois esses homens milionários querem apenas
diversão. E eu fui a sua na noite passada.

Enxugo as lágrimas e pego tudo que é meu. A cabana


está com pouca iluminação. Abro a porta e dou de cara
com Otto, que estava prestes a entrar no local.

— Eu acordei você sem querer ao ligar o carro.


Estava tentando sair do buraco, e consegui.

Fato. O carro está estacionado em frente à cabana.

Ele está vestido com a calça moletom, sem camisa,


com todos os seus músculos definidos à mostra. Posso
constar quão malhados eles são. Minhas bochechas
queimam com o seu olhar sereno sobre mim. Otto não está
agindo de maneira grosseira, e não sei dizer se isso é bom
ou ruim. Seria melhor se ele voltasse a ser o cowboy
arrogante que odeio.

— Eu não pretendia acordar você agora. Bom dia —


essa foi a primeira vez que ele me cumprimentou
educadamente.

— Tudo bem. Não costumo dormir até tarde. Bom dia


— minha voz saiu baixinha e bastante envergonhada.

A mulher sem controle da outra noite não era eu. Não


medi o tamanho das consequências. Ir para a cama com o
patrão na minha primeira vez não estava em meus planos.
Agora não sei como lidar com essa situação, nem o que
falar. Na verdade, desejo sumir. Desejo cavar um buraco,
enterrar minha cabeça dentro dele e nunca mais ouvir falar
desse homem. Contudo, ele está me encarando de uma
maneira diferente. Não sei dizer o que se passa na sua
cabeça, se está pensando em me demitir ou algo do tipo.
Sinceramente, eu estou pensando em me demitir.

Sou uma covarde por estar querendo fugir em vez de


agir com naturalidade. Sexo hoje em dia não é tabu para
ninguém, exceto para mim, que não sei fingir que nada
aconteceu.

— Está tudo bem com você?


— Uhum. — Balanço a cabeça em um “sim”, cruzando
os braços e fitando seus sapatos.

— Tem certeza disso? — Por que ele tem que ser tão
insistente?

— Aham. — Continuo olhando para o chão, até sua


mão tocar em meu queixo, erguendo meu olhar para si.

Seus olhos negros cobertos por um sentimento


dominador e carregados de posse estão parados em mim.
Otto me puxa pela cintura, colando nossos corpos, e o
choque me faz sentir tantas coisas. O contato íntimo que
tanto tivemos não poderá ser esquecido.

— Foi incrível a noite passada. Espero que tenha sido


prazerosa para você também. Se bem que acredito que
tenha sido bastante, pela quantidade de vezes que a fiz
gozar, seja na minha boca ou com o meu pau.

Ele não tem pudor, muito menos vergonha, com suas


palavras e sorrisos safados. Sabe que me deixou bastante
envergonhada, porém adora me deixar assim. Realmente
achou tudo muito incrível. A cada beijo, mais fascinação
eu podia sentir da sua parte. Otto não somente me fez sua
mulher, como também venerou cada parte minha. É um
amante sedutor, cheio de luxúria. Eu não poderia ter tido
uma primeira vez mais prazerosa que aquela, no entanto
ele jamais saberá disso.
— Confesso que estou louco para repetir agora
mesmo tudo que fizemos. — Ele tenta me beijar, porém
saio do seu abraço apertado e caminho para fora,
buscando ar.

Preciso respirar, pois toda vez que estou junto dele é


como se ele me roubasse o ar. Necessito sentir o ar
fresco. Seguro firme no corrimão de madeira e noto que
tudo à nossa frente está coberto por névoa, além de todo
o frio que nos assola.

Até ontem Otto era o patrão chato que implicava com


o sal na minha comida, e agora foi o meu primeiro. Uma
mudança radical e muito drástica. Eu não poderia ter
permitido que ele me tomasse daquela maneira intensa e
gostosa. Estou arrependida e sem saber o que fazer, como
agir.

As montanhas estão brancas por conta da névoa e


não há muita luz no ambiente natural, mas, ainda assim,
tudo é muito bonito. A beleza da natureza e suas
maravilhas me encantam.

Posso sentir sua presença ao meu lado e não ouso


me perder no seu olhar. Seria um caminho sem volta.

— Fiz algo que a desagradou? — Sua voz rouca


causa arrepios por toda a minha pele como uma corrente
elétrica.
O que eu poderia dizer? Tudo que ele fez não me
desagradou, pelo contrário, foi delirante, alucinante. Há
borboletas em meu estômago. Foi tudo muito incrível,
único, e ele fez eu me sentir especial, desejada; ele me
fez sua mulher na cama. Só me proporcionou prazer. Otto
sabe que tudo foi maravilhoso: a nossa entrega, a união
dos nossos corpos... Tudo foi sensacional. Não há
argumentos para eu o contrariar diante de tantos fatos
verídicos, como eu ter gozado até desmaiar de exaustão
em seus braços quentes, calorosos.

— Otto, eu... — Respiro fundo duas vezes antes de


encarar seus olhos negros. — O que aconteceu entre nós
dois não poderá mais acontecer. Foi um erro — falei com o
coração pesado.

A sua reação é de espanto. Ele não consegue me


compreender, e nunca poderá. Há muito mais coisas
envolvidas e mais importantes do que os sentimentos que
eu possa ter por ele. Tento me convencer de que tudo foi
apenas sexo, que não houve nada além disso. Essa será a
mentira que contarei para mim mesma todos os dias de
agora em diante, até estar convencida algum dia.

— Um erro? — ele indagou, indignado com a minha


resposta.

— Sim — confirmei.
Obviamente, ele não está acostumado com a rejeição
por parte das mulheres. Para quem já teve muitas em sua
cama, na sua vida, está sempre ciente de toda a sua
masculinidade exuberante entre quatro paredes, e também
fora dela. O que vivemos na noite passada não poderá,
jamais, ser apagado da história, nem do meu coração. Foi
intenso demais para ser esquecido.

— Por que eu sou o seu chefe? — ele perguntou


como se esse fato fosse um absurdo.

Ele pode ser bruto e arrogante, mas nunca esfregou


seu dinheiro e poder na cara das pessoas, apesar de
ninguém jamais ser bom o suficiente para ele. Otto não é
esnobe porque tem dinheiro, só não é gentil por natureza
mesmo.

— Eu não posso me envolver com o meu patrão. Isso


é errado — usei a justificativa mais óbvia.

— Não pode se envolver comigo porque sou seu


patrão? Isso não é uma desculpa convincente, Maria
Luíza. Ao menos não para mim. — Ele está espantado e
relutante. — Talvez você esteja agindo assim por medo de
alguma coisa que eu não saiba. Talvez pela minha
diferença de idade? Sou dezoito anos mais velho que
você. — Para ele, isso parece ser algo preocupante.

Esses dezoito anos não são nada para mim. Ele me


atrai, e eu tenho certeza de que essa atração é forte o
bastante para durar muitos anos. O problema jamais será
esse, devido ao fato de homens mais velhos sempre terem
chamado a minha atenção. Se ele soubesse que não é
nada disso... Sua idade não me espanta, pelo contrário. E
ele é o homem mais bonito que eu já vi na vida.

— Sua idade não me espanta. Gosto de homens mais


velhos.

Um sorriso de satisfação brota dos seus lábios,


deixando-o ainda mais tentador.

Sempre me senti atraída por homens com mais idade.


Dezoito anos de diferença não é tão absurdo assim. Pelo
menos não para mim.

— Chega a ser estúpido, para mim, estar encantado


por uma menina dezoito anos mais jovem, porém não
consigo evitar o desejo enlouquecedor que domina todo o
meu ser, principalmente agora, que você é minha.

Minhas bochechas coram violentamente. Não gosto


do desejo de ser domada por um homem, ainda mais pelo
meu cowboy bruto, no entanto eu sei que meu corpo
pertence a ele. Ao menos na noite passada foi assim. Eu
fui sua de corpo e alma.

— Sua? — inquiri com ironia. — Eu não sou de


ninguém.
— Está enganada, Maria Luíza. Você é minha, e eu
não estou disposto a permitir que vá embora e que seja de
outro.

Ele é possessivo e controlador, entretanto sou


rebelde o suficiente para o contrariar.

— Não pense que tem poder sobre mim só porque


tivemos uma noite de sexo. Sou uma mulher livre, e
homem nenhum me domina.

Minhas pernas estão bambeando só por ele me olhar


com tesão. Esforço-me ao máximo para me manter firme.

— Diga isso para o meu pau, querida. Não foi essa


resposta que você deu para ele quando estava gozando.

Pervertido! Imoral! Duas palavras que o definem bem.


Ele me faz lembrar muito bem do quanto delirei em seus
braços abrasadores. Sua boca devorava a minha e cada
gemido meu o fazia sentir mais desejo. Tinha momentos
em que me espantava. Não sabia que poderia ser tão
desejada, como ele me mostrou.

A culpa me consome e me faz quase chorar na sua


frente. Engulo o choro para não parecer uma tola. Dói
saber que fui capaz de ir para cama com ele, o homem
que foi da minha irmã.

— Foi tão ruim assim para você?


Ele está buscando entender o que está acontecendo
comigo, contudo não serei capaz de me abrir, de ser
sincera neste momento. E em nenhum outro. Ele é o
responsável por ter destruído a minha relação com a
minha irmã, levou ela para longe de mim e é o pai dos
meus sobrinhos, um homem proibido.

— Eu... — Minha atenção é voltada para o carro que


acabou de parar ao lado do veículo dele.

Eu trato de enxugar algumas lágrimas solitárias e


Otto me vê fazendo isso. Ele está muito confuso e
preocupado.

Vejo Marcos e mais dois peões saírem do carro.

— Todos na fazenda estão preocupados com vocês


dois. Pensamos que algo ruim pudesse ter acontecido —
Marcos falou praticamente gritando. — Saímos para
procurar por vocês na primeira hora do dia, assim que a
chuva deu mais uma trégua.

— Está tudo bem, Marcos. Tudo sob controle. — O


olhar de Otto queima sobre o meu corpo e eu desvio
minha atenção dele, olhando somente para os homens.

— Chegou visita à fazenda, patrão, ontem à tarde,


antes dessa chuva toda — Marcos avisou, receoso.

— Visita? — Parece que Otto não estava esperando


por ninguém.
Será que o delegado foi novamente à fazenda?

— A sua mãe, patrão, e a sua prima também.

Pela expressão fechada de Otto, a visita da sua mãe


não lhe parece ser nada agradável. Minha irmã a
descrevia como preconceituosa e mesquinha. Se até o
filho, que é sangue dela, parece não a suportar, Eva foi
uma santa por nunca ter esmurrado essa vadia que tanto a
humilhou. E por causa dessa tal prima, ela passou a
discutir frequentemente com o marido. Segundo a minha
irmã, as duas viviam tornando a vida dela um inferno. Esta
será a minha chance de arrancar alguma confissão delas
ou, quem sabe, até provas comprometedoras.

— Nós vamos na frente. A senhorita vai voltar com o


senhor? — Marcos me perguntou.

— Sim, eu a levarei — Otto não me deixou responder.

Os homens adentram o carro no mesmo instante e


Otto me olha fixamente mais uma vez. Seu olhar me
desconcerta e me faz ter arrepios.

— Essa roupa molhada pode lhe causar um resfriado.


É melhor vestir algo meu.

— Obrigada, mas já basta os seus peões terem


encontrado nós dois sozinhos nessa cabana. Já lhes dei
bastante assunto para denigrirem a minha imagem como
mulher.
— Ninguém ousará falar nada de você. Eu lhe
garanto.

— Verdade?

— É uma promessa. — Sua sinceridade me acalma


mais. — Se importa tanto assim com a opinião alheia?

— Ser o motivo de fofoca das pessoas é horrível.


Para esses homens agora, eu, certamente, estou sendo
referida como uma mulher vulgar e oferecida.

— Eu sei que você não é nada disso. Você é especial


demais.

Ele me acha especial. É encantador.

— Para o senhor, é bonito ser visto com uma mulher;


já para nós, mulheres, é diferente. O machismo é muito
injusto.

— Eu lhe asseguro que ninguém ousará falar nada


sobre terem me visto com você na cabana, ou juro que
corto a língua deles. — Essa foi uma ameaça, e eu não
duvido da sua capacidade de cumpri-la.

Entramos no veículo. As estradas estão molhadas e


muito escorregadias, então o automóvel dança na maior
parte do caminho. A área rural está alagada. Durante todo
o trajeto vamos em silêncio, como prefiro. Ao encostar a
cabeça no banco que Otto reclinou para o meu conforto,
finjo estar adormecendo. Assim, evitarei diálogos.

Quando estamos passando pelos portões, peço para


que ele pare longe da casa. Não quero ser vista chegando
com o patrão.

Abro a porta do carro, e após descer, sua voz rouca


chama a minha atenção.

— Nossa conversa não acabou na cabana. Vamos


continuar em outro momento, e não adianta fugir de mim,
muito menos me evitar. Você agora é minha, Maria Luíza
— avisou.

Depois disso, bato a porta. Sinto arrepios. Ele


acredita que sou sua, e fala isso com tanta convicção, que
até eu mesma chego a acreditar nessa meia-verdade.

Logo me jogo na cama e fecho os olhos numa


tentativa de esquecer tudo que aconteceu. Sei que terei
que encarar uma conversa séria com o patrão, e isso me
assusta. Todavia, o que me assusta mais é tudo que vivi
em seus braços. Isso será difícil de apagar da memória e
arrancar do coração.

Otto virá atrás de mim, e eu não sei se poderei negá-


lo.
Tenho a sensação de que um caminhão passou por
cima de mim. Não posso dormir, como desejo neste
instante. O dever me chama. Tenho que preparar o
cardápio do almoço e cuidar de dois anjinhos lindos.
Sinto-me a mais pior das traidoras. Como poderei olhar
para aqueles dois bebezinhos fofos e não sentir que traí a
mãe deles? Preciso de um banho quente para recuperar
minhas energias, pois consumi todas na noite passada.
A cada vez que fecho os olhos, recordações me vêm
à mente, torturando-me e me fazendo chorar. Eu não
poderia ter me envolvido com Otto. Ele era um homem
proibido.

Mesmo tomada pela angústia, necessito trabalhar. Em


frente ao espelho, marcas de chupões em meu pescoço
expressam tudo que vivemos ontem. Essa foi a sensação
que tive: de que ele deixava a sua marca em mim. Respiro
fundo e faço uma maquiagem suave somente para as
cobrir.

Passo na cozinha para dar “bom dia” às meninas, e é


claro que Mariana tem mil e uma perguntas para me fazer.
Eu não a quero dar nenhuma resposta verdadeira. Após
passar todas as instruções, peço que ela me acompanhe
até o quarto dos bebês. Não quero correr o risco de
esbarrar com o patrão. Não teria para onde correr caso o
visse justo agora.

— Vocês passaram a noite em uma cabana? — Mari


achou divertido. — Posso saber o que rolou?

— Não rolou nada — menti. — Apenas dormimos. Eu


na cama, e ele no chão. Mal trocamos duas palavras. Foi a
pior noite da minha vida.

— Imagino que deve ter sido horrível para você


passar a noite com um homem tão fechado e sério. Pelo
menos ele não te sufocou enquanto dormia — deduziu,
rindo.

— Oriente as auxiliares de cozinha no preparo da


refeição. A mãe do patrão está na fazenda e devemos
fazer um almoço mais refinado — mudei de assunto
porque me sinto melhor desse modo.

— Aquela mulher consegue ser ainda pior que o


patrão, e a sobrinha dela muito mais. Se prepare,
Maluzinha. Você estará cozinhando para duas víboras.

— Elas são tão cruéis assim, como diz?

— São duas enviadas do demônio. O clima na


fazenda com elas se torna muito pesado. Não viu a chuva
de ontem? Foi só as duas chegarem.

Acabamos rindo. Eu não tenho superstição, mas Mari


falou de um jeito tão engraçado, que foi inevitável não rir
com seu comentário. Ela parece temer as duas, e até eu
temo, pelo que minha irmã escreveu sobre elas.

Abro a porta do quarto dos gêmeos. Lucrécia está


próxima à entrada, sorri para mim e me cumprimenta
baixinho.

— Bom dia.

— Bom dia. — Abro um meio-sorriso.


Perto dos berços dos bebês está uma senhora muito
elegante, de cabelos loiros presos em um coque muito
sofisticado, usando um vestido verde-esmeralda na altura
dos joelhos, sapatos de saltos altos, um bracelete de prata
e brincos do mesmo material. Ela é a mulher mais fina que
já vi em toda a minha vida. É ela. Reconheço-a pela foto
que vi na internet. A senhora Cavalcante é conhecida por
ser uma dama da alta sociedade, uma viúva muito
refinada. Não há escândalos envolvendo o seu nome. O
que a mídia não sabe é que ela é mesquinha e humilha
pessoas humildes.

— Senhora Cavalcante, essa é a babá de quem te


falei, a senhorita Maria Luíza.

Sua atenção é voltada para mim. A mulher me olha


com certo desdém por não mais que dez segundos e sua
expressão fechada parece estar crucificando Lucrécia.

— Por acaso eu pedi para ser apresentada a uma


serviçal? — ela indagou, irritada. Agora sei de quem Otto
herdou a ignorância.

— Senhora, eu pensei que...

— Você não é paga para pensar, e sim para trabalhar


e deixar esta fazenda em ordem. Mas vejo que não está
mais dando conta do serviço. — Ela é maldosa e muito
mal-educada. Isso os tabloides não mostram. — Veja só...
Uma cozinheira que não terminou o último ano da
faculdade, exercendo a profissão como se realmente
entendesse o que está fazendo, e, ainda por cima,
cuidando dos meus netos sem nenhuma qualificação. Esta
fazenda necessita de mim com bastante urgência.
Algumas mudanças serão feitas, Lucrécia. Te ensinarei a
como executar o serviço.

Sua maneira rude de falar me deixa irritada. Ela não


pode falar dessa maneira com Lucrécia, que merece
respeito por todos os seus anos de serviços prestados a
essa família.

— Senhora Cavalcante. — Seu olhar recai sobre o


meu. Ele é gélido e rude. — A senhora Lucrécia é uma
mulher com bastante experiência, a melhor governanta
que esta fazenda já teve — afirmei com convicção. — A
senhora não entende nada do bom trabalho que ela
executou em todos esses anos. Talvez devesse não falar
nada quando não entende sobre determinado assunto.

Sinto seu ar de superioridade, mas ele não me abala.

— Quem é você para me dirigir a palavra sem que eu


pergunte algo? — Quando penso em responder, ela fala
antes de mim. — Não é ninguém para falar comigo, muito
menos para me ensinar o que devo dizer ou não.
Considere-se demitida, senhorita.

Demitida? Ela pode fazer isso? Lucrécia me encara,


apavorada com essa possibilidade.
— Senhora, por favor, reconsidere. A menina é nova
por aqui, mas lhe garanto que não quis ser desrespeitosa.
Não é mesmo, Malu?

Não estou pensando em concordar com uma senhora


mal-humorada e mal-educada.

— Não fui grossa, muito menos desrespeitosa,


apenas disse a verdade para a senhora Cavalcante. Ela
não pode humilhar seu trabalho.

— Lucrécia, os gêmeos estão dormindo. Peça para


alguém olhá-los. Essa garota está demitida, e você poderá
levá-la para fazer as malas.

— Senhora, não podemos ficar sem cozinheira, muito


menos sem uma babá para as crianças...

— Calada! Eu sou a senhora desta casa, e vocês não


passam de duas empregadas. Portanto, obedeça ao que
eu digo em vez de ficar discutindo com a sua senhora.
Não me façam perder a paciência e colocar as duas no
olho da rua, onde é o lugar devido da criadagem.

Toda a minha educação, acabei de mandar para o


espaço. Como pode alguém ser tão amargurada e
desdenhar de pessoas com uma situação financeira
modesta? Não admito que ela aja como superior.

— Um instante, senhora. Não pode nos chamar de


criadagem. Somos empregadas, funcionárias desta casa, e
recebemos o nosso salário, que é pago pelo senhor
Cavalcante. Não somos criadas, muito menos obrigadas a
ouvir a senhora desdenhar de nós como se fosse superior.

— Você é muito atrevida, garota — a senhora disse,


sem paciência. Eu já perdi a minha também.

— Não sou atrevida, senhora, apenas não sou


obrigada a ficar lhe ouvindo me chamar de criada. Pode
ser uma mulher rica e poderosa, só que não pode humilhar
ninguém. Isso é crime, caso não saiba.

Ela seria capaz de me estrangular, tamanho é o seu


ódio. É impossível manter os bons modos com essa
mulher. Agora entendo tudo que minha irmã descreveu
sobre ela.

“A mulher mais horrível que já conheci na minha


vida.”

Esse “elogio” é pouco para a descrever. Mulher


insuportável! Seu ar de superioridade chega a ser
absurdo.

— Otto, querido, você viu como essa menina é


insolente? Ela não respeita a mãe do patrão, isso é
inadmissível.

Otto estava esse tempo todo atrás de mim? Ele passa


ao meu lado, indo na direção da mãe, que o abraça e lhe
dá um beijo na bochecha. Seu filho retribui. Ele já está
trocado, com roupas apropriadas para o campo e secas.
Seu olhar está voltado para a senhora Cavalcante. Será
que ele vai me demitir? Eu não disse nenhum absurdo,
apenas não me submeti ao terror que ela tenta causar nos
empregados para conseguir temor. Ninguém me humilha e
sai ileso. Não ouço humilhação em silêncio. Minha língua
é como um chicote, para falar a verdade.

Meu coração acelera quando sinto o aroma


amadeirado do seu perfume masculino. Otto está aqui.
Pensei que não o veria tão cedo. Minhas bochechas estão
queimando e não sei se sou capaz de encarar seus olhos
negros sedutores. Estou me sentindo sufocada com a sua
presença no mesmo ambiente que eu. Meu coração
palpita.

— Seja bem-vinda, mãe. Lucrécia providenciará tudo


que a senhora necessitar, como sempre — ele falou, sem
muita paciência.

— Filho, eu lhe perguntei se você escutou o que essa


menina insolente me disse.

— Sim, mãe, eu escutei. Pude ouvir a alteração de


vozes do corredor.

— Não se preocupe, eu resolvo tudo, querido. Acabei


de demitir a sua funcionária. Ela não é qualificada para
trabalhar na sua fazenda. — Comemora a vitória, tendo
certeza de que o filho irá me demitir.
Quando os olhos dele cruzam com os meus, desvio-os
rapidamente, encarando qualquer outra coisa que não seja
suas órbitas negras. Elas me deixam nervosa.

— Maria Luíza fica — ele disse, para a nossa


surpresa, principalmente a da sua mãe, que parece não
acreditar no que acabou de ouvir. — Ela é mais que
qualificada para trabalhar na minha fazenda.

Respiro fundo. Estou certa de que ele falou com


segundas intenções sobre a minha qualificação.

— Otto, querido, como assim?

— Ela fica, mãe. Não há o que discutir. — Com Otto


não há o que contrariar. A última palavra é sua. —
Lucrécia, passarei o dia fora de casa. Se houver alguma
emergência, ligue para o meu celular.

Ele foi contra a mãe só porque fizemos sexo. Minhas


bochechas coram e eu posso vê-lo rir discretamente da
minha timidez. Não há como disfarçar a forte atração
quente e sexual que há entre nós. Otto é como uma
avalanche, destruindo toda a minha estabilidade. Com ele,
eu fiz uma coisa inconsequente: entreguei-me a uma noite
tórrida de sexo. Foi bom, maravilhoso, no entanto nunca
deveria ter acontecido.

— Sim, senhor Cavalcante — Lucrécia respondeu,


bastante entusiasmada.
A mãe de Otto está muito irritada e indignada com a
resposta do filho. Enquanto ela se afoga na sua raiva, eu
comemoro minha permanência aqui. Por alguns minutos
acreditei que poderia ser demitida por essa mulher
hipócrita. Posso respirar aliviada, procurando não olhar
para Otto. Ele me faz sentir palpitações.

A porta se abre, desta vez fazendo um certo barulho.


Olho para trás. A mulher de olhos verdes e cabelos negros
é linda como uma princesa. Ela tem um sorriso largo, um
corpo sarado e o short jeans que usa é curto e provocante,
assim como o camisete dobrado para ficar na altura do
umbigo. Ela tem um piercing na região e os lábios
vermelhos coloridos por um batom.

— Veja só! O cowboy mais lindo e sexy do Brasil! —


Ela praticamente se joga nos braços de Otto em um
abraço apertado. É uma atirada, está se insinuando para
ele.

Diacho! Pietra continua oferecida. Se ela era capaz


de fazer isso quando o primo ainda era casado, agora, que
ele está solteiro, é capaz de aparecer sem roupas na sua
frente e suplicar para que ele a devore. Ele não pode ficar
com ela. Isso me causa dor de cabeça. Não posso exigir
que Otto seja meu, porém não posso evitar que ele venha
a ficar com essa vadia oferecida. Estou morrendo de
ciúme e não consigo evitar ficar assim. Eu não deveria ter
tais sentimentos que consomem a minha alma e faz meu
coração se apertar.

— Pietra, como está?

— Como você pode ver, muito bem.

Ele sorri; não sei se por educação ou porque está


realmente feliz em vê-la. Espero que não seja a segunda
opção. Minha respiração se tornou pesada só por eu os
ver juntos.

— Eu sinto muito, mas já estou de saída.

— Você vai à tal feira na cidade?

— Sim.

— Adoraria ir com você.

Inicialmente, ele demonstra não querer levá-la.

Por favor, que ele diga “não”. Suplico.

— Leve Pietra para distrair a mente. Ela anda muito


estressada com a vida na cidade, por isso a trouxe para
aproveitar a tranquilidade da fazenda — a senhora
Cavalcante praticamente jogou a sobrinha para cima do
filho.

— Minha tia tem razão. Por favor, primo, me leve


junto. Eu prometo não incomodar.
— Tá bão. Estou saindo em dez minutos. Consegue
ficar pronta?

— Eu já nasci pronta — ela falou, animada. — Aliás,


seus filhos estão cada vez mais bonitos. — Pietra tenta
demonstrar carinho pelas crianças, no entanto enxergo
toda a sua mesquinhez ao olhar para os meus anjinhos.

— Sua prima adora bebês. Não é mesmo, Pietra?

— Claro que sim, tia.

O teatro das duas chega a ser tão óbvio, que somente


um cego não seria capaz de perceber que elas vieram à
fazenda com o plano de tentar empurrar Pietra para Otto.

Que ele não sinta nada por ela.

Os dois passarão o dia juntos, e isso me mata. Odiei


saber que ele ficará o dia todo com essa oferecida. A
mulher que fez minha irmã perder a paciência e sentir
bastante ciúme, agora está causando tudo isso em mim.
Gostaria de ser uma mosca para saber o que os dois farão
hoje.

A senhora Cavalcante não consegue esconder toda a


felicidade que sente ao ver o filho sair com a prima.

— Vocês duas, trabalhem — ela falou, esnobe, ao sair


do quarto.
Toda essa cena me fez sentir náuseas. Otto não
deveria ter levado a prima para essa feira. Isso é
imperdoável. Contudo, ele não me deve nenhuma
explicação. Não temos nada um com o outro.

— Maria Luíza, você é maluca por ter enfrentado a


mãe do patrão daquela maneira. Poderia ter sido demitida.

— Aquela mulher não tinha o direito de falar daquele


modo com a senhora. Ela precisa entender que você
praticamente criou os filhos dela sozinha e que agora está
cuidando dos netos. Você merece respeito. Se até o
senhor Cavalcante tem respeito pela senhora, ela deveria
ter também.

— Obrigada por me defender. Você é uma menina de


bom coração. Mas não faça mais isso, ou poderá sofrer as
consequências. A senhora Cavalcante é uma mulher
bastante vingativa.

Vingativa? O que ela quis dizer com isso?

— Vingativa?

— Ela é uma mulher ardilosa. Precisa saber que ela é


poderosa e pode prejudicar a senhorita se desejar. Suma
das vistas dela e faça seu trabalho sem aborrecê-la.

— Pode deixar comigo. Eu não direi mais nada.


Quando os bebês despertam, levo-os para dar uma
volta pelo jardim. Há um canteiro de flores que foi
plantado pela mãe deles. Enquanto o sol está numa
temperatura agradável e recomendada para os bebês,
ficamos aqui brincando. Eu lhes conto histórias e os faço
rir com cócegas. O carrinho deles é adaptado para
gêmeos; uma ótima invenção. Assim, posso empurrá-lo
sozinha e me divertir um pouco com eles. Desse modo,
consigo esquecer tudo que aconteceu entre mim e o pai
deles. Ao menos por algumas horas tiro-o da minha
cabeça. Pergunto-me como farei para agir normalmente
com Otto, sendo que me entreguei a ele de uma maneira
tão profunda, que será impossível não me recordar
daquela noite daqui a cinquenta anos.

— Meus amores, será que a mamãe de vocês é capaz


de compreender meus motivos? Como se vocês
soubessem do que a titia está falando, não é mesmo?

A única coisa que me deixa mais triste é todo o


remorso que carrego dentro de mim e a culpa por tudo que
aconteceu. Sei que teremos uma conversa franca
provavelmente nessa noite.

A polícia pode chegar a qualquer momento para


interrogar Otto, e eu temo que eles venham antes que eu
possa reunir provas concretas. Meu medo é que essa
gente rica possa comprar a polícia com propina e
subornos. Nunca se sabe o que pode acontecer.
Estou vestindo uma camisola folgada e lendo um
livro. A luz do abajur na cabeceira da cama ilumina todo o
quarto. Já é tarde e estou sem sono. Eram mais de nove
horas da noite quando os bebês dormiram, e nada de Otto
chegar da cidade com Pietra. Ambos estão se divertindo
bastante, pelo jeito. Segundo o que Mariana me disse, os
dois possuem uma história, já foram namorados na
adolescência, e Pietra nunca deixou de amar o primo. O
que ela deixou bastante evidente nessa manhã quando se
ofereceu para sair com Otto. Confesso que estou irritada,
morrendo de ciúme. Só de imaginar os dois dançando um
modão agarradinhos me faz sentir uma ira sem tamanho.

Hoje seria o dia perfeito para eu ir ao escritório do


patrão e tentar descobrir o que há na gaveta trancada, se
ele não tivesse levado a chave consigo e deixado o local
trancado. É praticamente impossível invadir a sua
privacidade. Algo me diz que preciso saber o conteúdo
que ele guarda a sete chaves. Certamente, é algo muito
importante. Eu necessito saber. As pistas estão cada vez
mais difíceis e não há nada que o incrimine, pelo
contrário, a chama do seu amor ainda está acesa por ela,
não foi apagada. Quando ele me confessou que ainda a
amava, foi uma grande surpresa. Ele ama a esposa morta.

As coisas desviaram do percurso correto. Otto possui


muitos mistérios em volta dele. Não sei nada sobre seus
gostos, nada pessoal dele, e, mesmo assim, eu me
entreguei para ele. Agi como uma mulher vulgar. Deve ser
por isso que ele preferiu sair com a prima e passar o dia
com ela, evitando um diálogo de adultos entre nós dois.
Acredito que, pelo tom de sua voz mais cedo, ele
necessita falar comigo e esclarecer nossa conversa não
terminada na cabana.

Tento ler para distrair a mente, e ao chegar na cena


hot entre o casal principal, minha mente consegue criá-la
como se fosse eu e Otto nos amando em um castelo na
Irlanda. Eu não deveria insistir na leitura, porém necessito
saber se o rei Henry será capaz de se revelar para a
mocinha, Lavínia, e assumir seu amor por ela. O livro
Comprada pelo CEO misterioso, de Maria Amanda Dantas,
é uma leitura apaixonante entre um rei e uma mocinha
humilde. São muitas reviravoltas. A malvada da Catarina
faz de tudo para arruinar a relação do casal principal e há
toda uma emoção e expectativa sobre ela descobrir quem
é o homem misterioso com quem ela se relaciona.

Minha leitura é interrompida pelo cowboy rude, que


adentra o quarto sem nem ao menos bater na porta. Dou
um pulo e solto o meu kindle sobre a cama. Parece que
Otto veio correndo até aqui, pois demonstra falta de
fôlego.

— Otto, o que faz aqui? — perguntei, quase


gaguejando.

Eu sei que a casa é sua, mas o meu quarto é a minha


privacidade.

— Eu precisava te ver. Não poderia esperar até


amanhã para conversarmos. — Seu olhar queima sobre
minha pele.

— Já está tarde — comentei, mordendo o lábio


inferior sem perceber.
Ele me olha com fascinação e desejo. É um fogo
ardente que sai em faíscas dos seus olhos negros.

— Eu quero você, Maria Luíza — sua voz saiu


embargada de tesão e luxúria.

O cowboy vem na minha direção com urgência,


desejando-me, venerando-me, louco para me possuir e
saciar nossas vontades, porém o alerta de perigo é ligado
no meu coração e eu desvio dele, afastando-me e indo até
a porta. Assim, fico mais perto da saída caso ele deseje
insistir nessa loucura.

— Eu não quero você — falei, decidida, sendo que


por dentro o meu coração está gritando o seu nome. Mas
neste momento minha razão fala mais alto.

Otto está carregado de dúvidas e sem entender a


minha atitude, o meu medo e desespero para correr e fugir
para longe dos seus toques apaixonados.

— Qual o problema, bebê? Por que está fugindo de


mim e me falando que não me deseja, quando seus olhos
dizem outra coisa totalmente diferente?

Otto consegue ler meus sinais. O fazendeiro tem


bastante visão, possui olhos de águia. Ele sabe quando
uma mulher está louca para ser amada.

— Você não está acostumado com rejeição, por isso


está agindo como um louco.
— Eu estou louco sim, mas é por você, menina, pela
sua inocência, pela sua pureza e, principalmente, pela sua
bocetinha rosada. Minha boca saliva para sentir o sabor
dela mais uma vez e o gosto do seu gozo.

Ele é imoral, e isso me excita.

— Otto, eu te disse mais cedo, na cabana, que isso


foi um erro e que não vai voltar a se repetir.

Vejo a sombra da decepção e a frustração orbitando


na escuridão dos seus olhos.

— Um erro?

— Sim. Eu não sou uma dessas mulheres fáceis com


quem você está acostumado a sair. Não sou mulher de
uma noite apenas, muito menos lhe dou passagem para
entrar no meu quarto como bem entender. A fazenda pode
ser sua, mas esse quarto é minha privacidade. Não pode
invadir.

Agora me recordo de que ele abriu a porta que estava


trancada. Ou seja, tem uma chave extra do meu quarto?
Isso é assustador. Será que ele já entrou aqui outras
vezes? Às vezes eu tinha a leve sensação de estar sendo
observada e, mais além, já pensei ter visto alguém saindo
do meu quarto dias atrás. Imaginei que estivesse
sonhando, só que tudo me leva a crer que tenha sido ele.
— Repito: você não é uma mulher qualquer, é uma
menina especial. Não quero que seja minha diversão.
Acredito que o sexo é bom para ambas as partes, e você
sabe que posso te deixar muito relaxada.

Além de bom de cama, ele é convencido. Isso me


irrita e, ao mesmo tempo, faz minha boceta latejar,
querendo ser lambida pela sua língua quente. Aqueles
movimentos circulares... Estou molhada neste momento,
querendo que Otto me possua.

— Por favor, saia — insisti.

— Eu passei o dia inteiro louco para retornar à


fazenda somente para a ver, e agora me pede para sair?

— Acredito que tenha se divertido bastante com


Pietra, afinal de contas, vocês já foram namorados —
despejei todo o meu ciúme nele.

— Pietra? Por favor, não leve a sério todas as coisas


que você ouve nesta fazenda. Minha prima foi minha
namorada quando tínhamos quinze anos. Foi um namoro
adolescente, sem malícia, sem sentimento.

— Então, nunca foi para a cama com ela?

— Por Deus! Óbvio que não. Nosso namoro não


chegou a durar três meses e nunca nos beijamos de
língua, foram apenas selinhos e abraços. Eu a considero
uma irmã, por isso terminamos.
Então foi um namoro infantil, não foi nada sério. Da
parte dele, parece não haver nenhum interesse,
diferentemente de como é com ela, que praticamente se
jogou quase sem roupas nos braços dele. Ainda assim
estou com uma pulga atrás da orelha. Por que devo
acreditar em tudo que ele me conta?

— Não precisa sentir ciúme de Pietra. Eu a vejo da


mesma forma que vejo minha irmã. É diferente da maneira
como enxergo você.

— Acho bom o senhor parar de me enxergar de


maneiras impróprias.

— Senhor? Pensei que tivéssemos deixado as


formalidades para trás, apesar de ser muito sexy ouvir
você me chamar assim. Me dá um tesão da porra.

— Chega! É melhor você ir. — Ele me deixa confusa.


— O que aconteceu na cabana, ficou lá. E como eu disse,
não vai voltar a se repetir. Foi um erro.

— Defina “erro”, porque eu juro que não consigo


entender o que pode ter acontecido que a faça acreditar
que foi um erro.

— Você é meu patrão, eu trabalho nesta fazenda. Não


podemos ter relações amorosas na cama. Eu não sei agir
normalmente. Para mim não dá.
Otto caminha na minha direção e suas mãos tocam
em minha face, fazendo-me carinho. Ele é um homem
bonito, atraente, sedutor e carinhoso. A parte do carinho
me assusta e me encanta. Pensei que ele não fosse um
homem afetivo.

— Diacho de menina bonita! Você bagunça o meu


coração, princesa. — Segura meu braço pelo pulso e
coloca minha mão sobre o seu peito. Posso sentir as
batidas do seu coração. Está acelerado por minha causa?

Princesa? Foi fofo.

— Eu te deixo assim?

Agora estou confusa. Por que meu coração está


batendo no mesmo ritmo que o seu?

— Você me deixa assim: louco. Nada faz sentido para


mim se não estou com você. Eu lutei contra isso e até
tratei você mal para convencer a mim mesmo de que não
estava louco pela sua beleza. — Por isso ele implicou com
a minha comida? — Mas você é diferente, me traz uma
paz enorme. Somente você, Maria, consegue acalmar o
meu coração. Não seja malvada e me faça ficar quieto.

— E como eu posso ajudar?

— Assim. — Seus lábios macios colam nos meus.


É arrepiante beijá-lo e, ao mesmo tempo, sentir as
batidas aceleradas do seu coração. É delirante, instigante,
todos esses sentimentos que só ele me proporciona. Eu
gemo baixinho e sua boca engole meu gemido. Seus
lábios gostosos e macios são uma tentação que eu não
posso evitar. Ele afasta nossas bocas, só que eu quero
mais.

— Eu preciso saber, Maria Luíza: você sente falta


dele? — perguntou entre o beijo.

— O quê?

— Sente falta do seu namorado? — Seus olhos me


encaram, ansiosos pela minha resposta. Eles só me fazem
querer falar a verdade.

— Não sinto — respondi sem nem pensar, só


querendo que sua boca voltasse a me beijar.

— Você o ama?

— Não mais.

Um sorriso vitorioso brota em sua face. Cretino


irresistível!

— Seja minha. Não me diga que é proibido, porque


não é, e muito menos um erro, ou serei obrigado a
castigar você quando meu pau estiver entrando e saindo
dessa bocetinha apertada.
— Você é muito pervertido...

— Sou louco por você. — Ele me beija


fervorosamente.

Estou excitada, louca para ser devorada também pelo


seu pau. Ele se senta sobre a cama e bate com as duas
mãos nas suas coxas.

— Venha sentar no seu cowboy, menina.

Não resisto a tanto charme. Sou refém desses beijos


molhados, que me viciam. Isso não é bom.

— Hoje vou te ensinar a cavalgar no seu cowboy.

Primeiro ele tira a minha camisola, deixando-me sem


roupa alguma, suas mãos exploram minha cintura e a sua
língua sagaz lambe meus mamilos. É tentador demais para
dizer “não”. Ele é irresistível e muito sedutor. Gemo
baixinho para não fazer barulho e acabar despertando
alguém. Beijos e chupões descarregam uma corrente
elétrica na minha intimidade em chamas, e ele constata
isso ao enfiar dois dedos no meu canal.

— Safadinha! Tudo isso é para o seu homem?


Gostosa! — Dá um tapa forte no meu bumbum, que chega
a arder.

Ele é ágil ao tirar suas roupas e me deitar sobre a


cama, abrindo ao máximo minhas pernas. Depois cai de
boca na minha intimidade. Otto é sensacional com a
língua. Agora está difícil gemer baixinho, já que estou
sendo chupada pelo rei dos orgasmos. Eu gozo em sua
boca e noto satisfação em seu olhar. Agora ele abre uma
camisinha e, rapidamente, coloca-a em seu pênis duro.
Em seguida, ele faz eu me sentar sobre seu colo e desliza
minha intimidade pelo seu membro grosso até eu estar
totalmente de frente para o seu corpo. Otto me auxilia no
que devo fazer, deslizando a minha boceta lentamente em
seu pau, enquanto sua boca devora meus seios. Ele brinca
com os dois, quase que ao mesmo tempo, de uni, duni, tê.

Começo a quicar com mais rapidez conforme vai


aumentando o tesão da gente. Ele enrola meus cabelos
em suas mãos e me dá um tapa no rosto. Putz! Isso me
faz gozar deliciosamente em cima do seu membro. Em
seguida, Otto intensifica os movimentos, também
chegando ao clímax. Não perdemos tempo. Como seu pau
ainda está duro, ele apenas troca a camisinha e mete em
mim, agora de quatro. Seu membro entra e sai da minha
boceta e eu recebo tapas nas nádegas, que vão deixar a
marca dos seus dedos na região. Ele me faz gemer como
uma cadela no cio. Nunca pensei que fazer sexo com o
meu inimigo pudesse ser tão delicioso, muito menos que
ele seria o meu primeiro.

Abro-me o máximo que consigo. Gosto da sensação


de estar sendo estocada com um pouco de força. É
tentador.
De todas as posições em que já fizemos sexo, de
quatro e em pé são as melhores que já experimentei.
Deliro de prazer, envolvida em seus braços. Otto me beija
com paixão e sua língua trava uma batalha com a minha.
O homem é insaciável. Por ele, passaríamos a noite inteira
transando. O que não é uma opção para mim devido ao
fato de eu estar aprendendo como se faz. Minha rotina
sexual não suporta que sejam tantas vezes e a exaustão
me domina.

Em seus braços consigo sentir segurança, e todos os


meus receios e medos se tornam minúsculos. O tempo não
deveria passar, e sim parar onde estamos para sempre. E
a realidade deveria ser outra. Queria poder mudar
algumas coisas do passado e, primeiramente, agir
diferente: não ter medo de amar e me permitir ser amada.

Otto é um erro, e eu sei disso muito bem, no entanto


ele é viciante, como heroína no meu sangue. Ele será a
minha perdição. Esse homem colocará todos os meus
propósitos na ruína, pois ele é a minha ruína. Foi a de
minha irmã e agora será a minha.
Despertar em braços largos com beijos e carícias é
uma sensação incrível. Nunca pensei que poderia viver
algo tão intenso e maravilhoso assim, nem me sentir
desejada por alguém a ponto de perdermos o controle.
Quanto mais me entrego a esse homem, mais necessito
sentir seu calor. O fogo que me queima por dentro,
enlouquece-me. Estou ficando viciada na sua pegada
quente de cowboy.
Beijos suculentos me acordam completamente. Todo o
meu corpo entra em combustão e lavas quentes se
espalham pela minha corrente sanguínea. Nossos corpos
nus estão abraçados e todos os sentimentos são
avassaladores.

— Bom dia, minha menina linda.

— Bom dia. — Espreguiço-me, ainda em seus braços.

Depois de uma semana longa, recheada de sexo


todas as noites, já é inevitável resistir. Eu desconheço
essa palavra quando estamos juntos. Nem mesmo Pietra é
capaz de roubar minhas noites prazerosas. Acredito que
Otto não a deseje como mulher, porque se desejasse não
estaria comigo agora.

Suas mãos deslizam pela minha cintura e a seguram


firme, enquanto seu pênis roça sobre minha intimidade
lubrificada. Otto lambe meu seio, instigando-me. Seus
cabelos lisos caindo sobre os olhos é algo charmoso. O
cowboy sorri de uma maneira sexy ao mesmo tempo em
que me beija com volúpia. Seu pau duro entra na minha
boceta molhada e eu arfo, tomada pelo tesão. Ele se move
lentamente e com precisão. Gemo baixinho. Quando
estamos juntos é como se mais nada existisse ao nosso
redor. Arrepios percorrem todo o meu corpo e Otto me
devora como um animal bruto, mas em vez de sentir medo,
sou arrebatada pelo prazer imenso que toma o meu ser.
Suas arremetidas me levam à loucura.
Sei que não posso manter minha sanidade quando
estamos juntos, porém algo deve ser feito com bastante
urgência. Preciso realizar meu propósito e não o aceitar
em minha cama, abrindo as pernas para ele todas as
vezes que deseja. Agora entendo o quão convincente ele
pode ser.

Quando Otto veste suas roupas já são quase sete


horas da manhã. Ele precisa sair sem ser visto. Todos os
dias é esse mesmo esquema. Eu faço uma ronda pelo
corredor, para ver se o caminho está livre, e ao retornar
para o quarto vejo-o segurando o diário de Eva em suas
mãos. Ele está fechado com cadeado para proteger o
conteúdo que há dentro dele.

Arregalo os olhos, tomada pelo nervosismo, e arranco


o caderno de suas mãos. Otto me encara, desconfiado e
intrigado.

— Desculpe, eu não queria mexer nas suas coisas.


Gosta de escrever em diários?

— Faço mais anotações sobre minha rotina e


lembretes para não me esquecer de absolutamente nada.
Não é nada pessoal o que eu escrevo.

Neste momento ele parece estar tendo um déjà vu.


Posso ver um certo brilho em seus olhos. Certamente, ele
se lembrou do quanto a minha irmã adorava escrever. Ela
sempre estava com um diário nas mãos, escrevendo sobre
o seu dia a dia. Acredito que também tenho um déjà vu ao
me recordar disso.

— Conheci alguém que vivia escrevendo


acontecimentos do cotidiano.

— Essa pessoa era a sua esposa?

— Sim, era a minha esposa.

É notório em seu olhar que falar dela o deixa triste.


Ainda há amor de sua parte. Não entendo por que ela o
descreveu como uma má pessoa.

— Deve sentir muito a falta dela.

— Sinto — confessou. — Eu acreditei que sempre


tivesse tudo sob meu controle, porém não há controle
sobre a vida, muito menos sobre a morte. Não podemos
fazer nada quando perdemos uma pessoa querida.

— Eu entendo a sua dor — falei, emocionada,


segurando o choro.

— Entende? Já perdeu alguém que amava?

— Os meus pais faleceram quando eu ainda era


criança. Se não fosse pela minha irmã e a minha tia, eu
não teria superado essa perda.

— Pensei que fosse filha única.


Vejo um ar curioso brotar na sua face. Ele é muito
curioso quando quer saber algo sobre mim e não se
contenta até descobrir tudo que quer.

— E sou — confirmei rapidamente, tentando consertar


a besteira que disse. — A irmã que digo é filha da minha
tia. Somos como irmãs.

Otto se aproxima de mim e me abraça. Seu calor me


completa e faz o vazio do meu coração desaparecer. Esse
é o seu poder sobre mim.

— Eu gostaria de passar o dia inteiro com você — ele


disse.

— Eu também — confessei.

Ele sorri, contente.

— É muito bom ouvir isso dos seus lábios sensuais.

— Não sou sensual.

— Engana-se.

Deliro com mais um beijo envolvente e abrasador.


Otto sabe como usar a língua, em todos os sentidos, e me
faz ver estrelas durante o dia. Ele é bom de cama e
experiente. Quase choramingo entre o beijo quente. O
cowboy é forte e grande. Minha cabeça bate no seu
ombro. Sou pequena, de baixa estatura.
— Acreditei em suas palavras duras na semana
passada — ele falou.

— Não entendo.

— Quando me disse que eu era um erro, magoou meu


ego — respondeu, rindo.

Eu também rio.

— Isso que estamos vivendo é muito bom, mas


sabemos que não vai terminar bem.

— Engana-se, Maria. — Beija meu queixo. — Nos


vemos à noite.

Ele é o único que me chama de Maria, e eu gosto de


ouvi-lo me chamar assim. Só os meus pais me chamavam
pelo meu primeiro nome.

— Até.

Droga! Sorrio igual a uma boba apaixonada.

Respiro fundo e tento ignorar todos os meus


pensamentos e convicções. Otto me faz bem. Quando
estamos juntos é como se mais nada existisse à nossa
volta, porém sei que tudo isso mudará quando ele souber
quem sou e por que vim até a sua fazenda. Por esse
motivo, não posso amá-lo e jamais entregar o meu
coração nas suas mãos. Seria perigoso me ver apaixonada
pelo meu maior inimigo, de quem estou nos braços todas
as noites.

Alícia está em meus braços e eu caminho com ela


pelo quarto. A garotinha, que está aprendendo a fazer
besourinho com a boca, cospe-me toda. É divertido.

Vejo que o pequeno Lohan está com ciúme.

— Meu amor, titia ia pegar você também. Meu


pequeno — falei ao segurá-lo firme em meu colo, depois
de colocar Alícia no andador. — Tenho amor o suficiente
para vocês dois.

O garotinho está se rendendo às minhas brincadeiras.


Também o ensinei a fazer besourinho. Esses dois anjinhos
são os amores da minha vida. Sou capaz de abrir mão de
tudo somente por eles, para os ver felizes e seguros.

A porta do quarto é aberta. Pietra está aqui. Ela me


olha com um desdém disfarçado de falsidade. Seu sorriso
falso me enoja.

— Maria Luíza... Esse é o seu nome, não é mesmo?

Acredito que ela já saiba. Deve ter algum motivo para


ter vindo até mim.
— É sim.

— Esse bebê fofinho herdou a beleza do meu primo.


— Abre um sorriso esnobe. — Ele teve a sorte de parecer
com o pai, diferentemente da pequena Alícia. — Olha para
a menina como se não gostasse dela.

Sinto vontade de colocá-la para fora deste quarto,


mas não tenho autoridade para fazer isso. Ela faz parte da
família Cavalcante, é filha de uma irmã da mãe de Otto. A
maneira como Pietra tenta ser gentil chega a me sufocar.

— Alícia é uma menina linda. Todos comentam que


ela herdou a beleza da mãe.

— Nunca mais comente isso. Minha tia mataria você


se te ouvisse falar da mãe dos bebês. Ela nunca quis o
casamento do filho com aquela mulher vulgar e
interesseira.

— A senhora Eva merece respeito. Ela não está aqui


para se defender das acusações que fazem contra ela.

— Você não a conheceu, não sabe a qualidade de


mulher que ela era.

— E, segundo você, qual qualidade era essa?

Coloco o Lohan no seu andajá para ouvir atentamente


cada palavra que Pietra disser. Ela está disposta a fofocar,
e eu estou disposta a ouvir. Meu sangue ferve. Falem mal
de mim, mas não da minha irmã. Poderia jogar um abajur
na sua cabeça.

— Eu não deveria te contar nada disso, afinal de


contas, é somente uma empregada, mas como vejo que
você é a única em toda a casa que não sabe do passado
vergonhoso da esposa do seu patrão, eu vou te falar.

Passado vergonhoso? Pietra está brincando com fogo


sem saber. Não admito que ninguém falte com respeito à
minha irmã. Ela sempre me defendeu de tudo e de todos.
Não permito que denigram a imagem dela.

— Eva era uma prostituta.

— Como? — Minha mão está quente, pronta para


acertar sua face, porém me contenho e continuo a ouvi-la.

— Uma mulher da vida. Meu primo a conheceu em


uma boate de prostituição. Pobrezinho! Caiu na armadilha
lançada por aquela mulherzinha.

— Tem certeza do que está dizendo?

— Por que você acha que minha tia a odiava tanto?

— Porque ela era pobre.

— Também. Mas, principalmente, porque ela era uma


vadia.
Custo a acreditar no que ela acabou de me falar. Não
é possível que minha irmã tenha se prostituído. Essa é
uma calúnia das piores que existem. Eu saberia se Eva
tivesse se envolvido com algo desse tipo. Não julgo
mulheres que entram nesse ramo, no entanto não acredito
que ela tenha levado essa vida vulgar, como Pietra
afirmou. Não há nenhuma passagem sobre isso em seu
diário. Ela falava sobre esforços e sacrifícios, sobre
enfrentar situações deploráveis para me ver feliz,
entretanto não creio que estivesse mencionando a
prostituição. Seria impossível.

— Se isso é realmente verdade, Otto a quis, mesmo


sabendo do seu passado?

— Eva o enfeitiçou. Toda Eva é persuasiva, é assim


desde o princípio.

Sinto uma faca atravessar o meu coração. Minha irmã


teria mesmo se submetido a uma situação delicada como
essa somente pelo meu bem-estar? Se algo assim
realmente aconteceu, a culpa foi exclusivamente minha.
Nunca irei me perdoar se a fiz se atirar de um precipício
para garantir minha estabilidade.

Engulo o choro. Será doloroso demais para mim se,


de fato, Pietra estiver dizendo a verdade.

— Nossa! Nunca pensei que pudesse ficar abalada


dessa maneira. Infelizmente, existem mulheres
interesseiras. Otto foi contra a família, casando-se com
aquela mulher.

— Ele a amava muito.

— Ele ainda a ama. Chega a ser um absurdo amar a


esposa morta. Homens são fáceis de manipular, e Eva fez
o serviço direitinho, mas aqui estou eu, pronta para
arrancar esse amor do seu coração, e desta vez ninguém
irá me impedir de me tornar sua esposa. — Seu olhar
tentando me ameaçar não me assusta. Não tem como ela
saber do meu envolvimento amoroso com Otto. — Sabe,
queridinha... Você é bonita e me faz lembrar ela, porém
nunca será ela. Portanto, aconselho você a ficar bem
longe do meu Otto, ou serei obrigada a tomar providências
que não vai gostar.

— Está me ameaçando?

— Prefiro dizer que estou alertando você. Eu vi


quando Otto foi até o seu quarto ontem à noite e quando
saiu de lá nessa manhã. Admiro que ele esteja trepando
com a empregada. Logo ele, que sempre teve muito bom
gosto.

— Não pense que está me intimidando com seu tom


de ameaça.

— Queridinha, não é uma ameaça, é apenas um


aviso. Você não vai querer ter a mim e a minha tia contra
você. É melhor que se ocupe apenas em cuidar desses
pirralhas em vez de dar para o patrão, vadia. — Sua boca
se abre e fecha. Ela está cheia de ódio.

Não penso duas vezes antes de estapear a sua face.


Minha respiração está pesada. Pietra conseguiu me tirar
do sério com toda essa história da minha irmã ser uma
garota de programa. Não é aceitável que ela denigra a
imagem de uma mulher falecida. Os mortos não podem se
defender, mas aqui estou eu para garantir que a honra de
Eva não seja manchada.

— Como ousa? — Ela levanta a mão para me bater e


eu sou mais ágil, segurando-a com firmeza, evitando o
tapa.

— Não me toque, senhorita. Pode ser sobrinha da


mãe do patrão, mas isso não lhe dá o direito de me
difamar, muito menos de me ameaçar.

— Eu juro que isso não vai ficar assim. Irá se


arrepender por ter me esbofeteado. Eu já acabei com uma
ameaça muito mais perigosa que você, sua vadia.

Eu deveria ter batido novamente na sua face antes


que ela saísse por aquela porta.

Sinto um aperto no peito. Preciso saber se minha irmã


viveu essa vida vulgar que Pietra tanto afirmou. Se ela
tiver se sacrificado por mim dessa maneira, jamais me
perdoarei. Ela não merecia passar por tudo isso. A dor e a
incerteza de não saber se no dia seguinte teria comida
sobre a nossa mesa a perturbava, e muitas vezes a vi
chorando sozinha. Eva nunca deixava transparecer sua
insegurança na minha frente, contudo eu sabia que não
era fácil para ela a responsabilidade de me criar, de cuidar
de mim e prover tudo para me sustentar. Ela foi como uma
mãe para mim, que me amou e me ensinou a ser bondosa.
Custo a aceitar a ideia de que minha irmã tenha se
prostituído por minha causa. Dói em mim, machuca-me e
dilacera a minha alma. É injusto que ela tenha sofrido
tanto por culpa minha. Eva não merecia ter morrido
naquele acidente e aberto mão dos seus filhos por conta
de pessoas cruéis.

Minha irmã era um poço de bondade, e mesmo que


tenha feito certos sacrifícios, não merece ser condenada.
Quando não se nasce em berço de ouro é fácil julgar a
atitude das outras pessoas. Só quem passa por dificuldade
financeira sabe o quão doloroso é. Eu não admito que
ninguém a menospreze.

Trarei essa verdade à tona. Somente uma pessoa


poderá me revelar tudo sobre todos os mistérios que
envolviam a vida da minha irmã, e essa pessoa se chama
Samuel. Eu irei atrás dele nos confins da terra, mas o
encontrarei.
Agora foi a vez da irmã de Otto chegar à fazenda.
Érika é uma menina doce e encantadora. Ela está grávida
do seu primeiro filho e o seu barrigão de sete meses
anuncia a chegada do seu bebê dentro de algumas
semanas. Posso ver toda a sua ansiedade estampada na
face. Ela adora passar um tempo com os sobrinhos, então
tenho certeza de que será uma boa mãe, com base na
maneira amorosa como ela brinca com os bebês.
— Esses bebezinhos foram as melhores coisas que já
aconteceram na vida do meu irmão. Se não fossem eles,
talvez Otto estivesse no fundo do poço hoje em vez de
estar se erguendo a cada dia.

Ela foi muito gentil comigo e só está aqui há uma


tarde. Hoje haverá um jantar para toda a família, e me
parece que será algo bastante especial.

— Você tem filhos, Maria Luíza?

— Não, senhorita. Não sou mãe. Mas pretendo me


tornar algum dia.

— Estou muito ansiosa para a chegada do meu


menino. A maternidade é linda.

— Muito bonita.

— Eu gostaria de montar a cavalo junto com meu


noivo e meu irmão, só que esta barriga não me deixa fazer
quase nada.

— A senhorita já escolheu o nome do bebê?

— Se chamará Lucas Emanuel.

— Lindo nome.

Érika é gentil. Nem parece ser filha de uma mulher


esnobe, egocêntrica, e prima de uma piranha, muito
menos irmã de Otto. Ela sempre carrega um sorriso largo
consigo e é impossível não gostar dela.

— Eu gostaria muito que o meu irmão encontrasse


uma companheira leal novamente. Eva faz uma falta muito
grande nesta casa.

— Vocês duas se davam bem?

— Muitíssimo. Ela era como uma irmã para mim.


Sabe, Malu... Sinto que posso me abrir com você e que,
talvez, possa me ajudar a mandar a minha prima de volta
para a cidade. Ela que não pense em se jogar para cima
do meu irmão, ou eu mesmo serei obrigada a arrastá-la
pelos cabelos até lá. — Acabo rindo do seu comentário. —
Vim salvar o Otto dos joguinhos da nossa mãe.

— Como posso ajudá-la? Creio que não posso fazer


nada.

— Você é bonita. Poderia distrair o meu irmão? —


Arregalo os olhos. — Brincadeira. Eu estava apenas
desabafando. Estou estudando o que posso fazer para o
salvar.

No diário de Eva, ela mencionava Érika como sua


única amiga, a mais leal e confiável. Ela veio no momento
certo para colocar a prima no seu devido lugar. É bom
saber que há pessoas que gostavam da minha irmã nesta
casa.
O que foi dito por Pietra está me matando por dentro.
Enviei cerca de cem e-mails para Samuel, e nada de
respostas até o momento. Eu o implorei para me ajudar,
mas parece que todo o meu desespero não é nada para
ele. Eu o supliquei por uma ligação, e nada além disso.

Os bebês adoram ficar com a tia. Eles riem bastante.


Estou enciumada, pois pensei que fosse eu a tia favorita
deles. Não posso perder meu status.

No final da tarde, quando Lucrécia pode ficar com os


dois, preciso ir tomar um ar fresco. Caminho perto da
casa, indo em direção ao celeiro, no qual são
armazenados alimentos e materiais de trabalho. Há muitos
cavalos nesta fazenda, e eles costumam ficar lá. O mais
famoso pertence ao patrão e acabou de chegar junto com
um peão.

Tenho que relaxar a minha mente, aliviar a tensão que


me assola. Estou ficando com olheiras, de tanto estar
preocupada e cheia de remorsos que me corroem por
dentro. Na noite passada dormi no quarto de Mariana para
evitar um encontro romântico com Otto. Depois de todas
aquelas revelações e incertezas, não quero passar a noite
nos braços do homem que comprou uma noite de sexo
com a minha irmã. Se ele realmente pagou para sair com
Eva e depois ignorou o seu passado, por estar
perdidamente apaixonado, renegou tudo que a envolvia em
nome desse amor. Otto a amou até o fim. Agora entendo
por que ela descrevia que ele sentia ciúme excessivo. Ela
disse que, certa vez, ele esmurrou um homem durante um
jantar só porque os dois estavam conversando. Otto era
possessivo e tinha certas inseguranças. O que é difícil de
acreditar, considerando toda a sua arrogância e
masculinidade. Mas ele vivia carregando suas incertezas e
medo de perder a minha irmã.

Escoro as costas em um trator, que está próximo ao


celeiro, e observo o entardecer, o sol. Os raios solares
batem na minha face. É um belo espetáculo as maravilhas
da natureza. Contemplando-a, posso distrair a minha
mente. Fecho os olhos e tento não chorar, só que diante
de tantas revelações é impossível não me desmanchar em
lágrimas dolorosas. A cada lágrima derramada é como se
uma faca atravessasse o meu coração.

A paz que tanto busco, estou muito longe de


encontrar. Chega a ser impossível achá-la. Não nesta
fazenda, muito menos me envolvendo com um homem
proibido.

— O que a minha mulher está fazendo aqui? — A voz


rouca de Otto me faz dar um passo à frente.

Ele está atrás de mim, posso sentir sua presença.


Enxugo as lágrimas e não o encaro.

— Não sabia que eu era sua mulher — minha voz saiu


embargada. Espero que ele não note.
— Agora sabe, diacho. Passei a noite inteira
pensando em você. Fui até o seu quarto, mas você não
estava lá. Posso saber por que se escondeu de mim?

Há uma adaga atravessada no meu peito.

Viro-me para o encarar. Otto está sem camisa,


vestindo apenas uma calça jeans azul-escuro e botas
pretas de couro. Seu corpo suado demonstra que ele
estava trabalhando. Ele não é um dono de fazenda que
apenas dá ordens, também gosta de trabalhar, de fazer
serviços de peão. É uma maneira que ele encontrou de
distrair a sua mente. Em seu lugar, eu também faria o
mesmo. Mariana me disse que o patrão sempre gostou de
fazer isso na sua fazenda, porém, depois da morte da
esposa, passou a estar mais no campo do que dentro da
sua própria casa. Ele busca um refúgio.

— Estava chorando? — Suas mãos tocam em minha


face, dando-me carinho.

Sinto vontade de fechar os olhos e o abraçar, mas ele


não é meu e nunca poderá ser. Não posso viver com essa
culpa por muito mais tempo. É preferível que eu me
afaste.

— Diga-me por que está assim. Alguém a fez chorar?


Fale o nome, e eu juro que arranco a cabeça do indivíduo.
Acabo sorrindo da maneira bruta como ele falou. Sei
que estava falando sério, porém me fez rir. E isso
raramente aconteceu nos últimos meses, pois vivo
mergulhada na minha dor.

— Está tudo bem, ninguém me fez chorar — falei


baixinho.

Ele está buscando entender o que está acontecendo.

— Estou assim porque acabei de falar com a minha


tia. Estou com saudade dela.

— Se quiser, posso te levar um dia para a ver. Onde


sua tia mora?

— Em Belo Horizonte.

— Podemos visitá-la quando quiser.

Seu interesse chega a ser sufocante. Por que ele se


importa comigo? Prefiro que seja bruto e arrogante em vez
de carinhoso e protetor. Quando seus braços me envolvem
num abraço apertado, consigo escutar as batidas do seu
coração, que está acelerado, assim como o meu. Nossos
corações seguem o mesmo ritmo, isso é incrível.

Otto mudou drasticamente de bruto e arrogante para


um amante apaixonado e carinhoso. Quero me afastar
dele, só que minhas pernas travam todas as vezes que
ficamos juntos.
— Por que fugiu de mim ontem à noite?

— Não fugi.

Seus olhos negros não acreditam em minhas


palavras.

— Você é uma péssima mentirosa. Já deveria saber


disso.

— Mariana estava resfriada e eu passei a noite com


ela para a ajudar. — Isso é verdade em partes. Ela disse
que eu não precisava dormir lá, mas insisti para a ajudar e
para fugir dele.

— Depois do jantar, quero que venha dormir comigo


no meu quarto. — Essa foi a primeira vez que ele me
convidou para dormir em seu quarto... No quarto que foi
da minha irmã. Não posso aceitar. — Se você não for, eu
vou buscá-la — prometeu.

— Sua família inteira está na fazenda. Se alguém me


vir entrando no seu quarto tarde da noite poderão supor
que estamos juntos. — Preocupo-me por Pietra, ela sabe.

— Não me importo se elas descobrirem. Sou um


homem livre, e você é uma mulher sem compromisso. Qual
o problema de passarmos a noite juntos?

— Para você não haverá problemas, mas para mim


sim. Vão me chamar de interesseira e oportunista.
— Então serei obrigado a expulsar todas da minha
fazenda. — Sorri de lado. — Quero te beijar agora.

— E se alguém nos vir?

— Venha comigo. — Ele segura a minha mão, leva-me


para dentro do celeiro e fecha a porta, trancando-a por
dentro.

Há muitos cavalos aqui. Contei dez só na primeira


parte. Há um lugar onde só há capim para os animais.

Otto me puxa pela cintura e beija a minha boca


fervorosamente. Ele me deseja de uma forma tão intensa,
que chega a ser absurda. Agarro suas costas suadas, sem
me importar com o suor. Meu coração está palpitando, e
há momentos em que tenho a impressão de que ele vai
sair pela boca a qualquer momento.

— Você me deixa louco, menina. — Consigo sentir


sua ereção roçar em minha barriga, perfurando a região.
— Eu preciso te possuir agora e aqui.

Ele tira a minha jaqueta e depois a blusa. Suas mãos


apertam meus seios, cheias de volúpia, e o fecho do sutiã
é quebrado pela sua falta de delicadeza. Beijos molhados
são dados no meu pescoço e eu o alerto:

— Sem deixar marcas, por favor.


— Adoro deixá-la marcada. Assim, todos podem saber
que você é minha.

— Eu mato você se me deixar com marcas de


chupões.

— Me mate de beijos e depois com muito chá de


boceta.

— Imoral!

Sua língua ágil lambe meus mamilos. Otto sabe que


está lidando com o ponto mais sensível do meu corpo. Ele
os chupa como se fossem suculentos, fazendo-me ficar
fraca com tanto prazer sem nem ter me tocado lá embaixo.
Agora me faz deitar sobre o capim macio. Apesar de
minhas costas estarem sendo pinicadas, porque talvez eu
seja alérgica a ele, concentro-me somente quando sua
boca quente beija a minha intimidade. O cowboy é
habilidoso na arte de tirar minhas roupas em questão de
segundos, deixando-me nua e com as pernas bem abertas
para que sua língua possa trabalhar agora na minha
boceta. Ele gosta de me foder com ela, e eu adoro ser
fodida assim. Sua língua molhada lambe meu clitóris em
movimentos circulares e as paredes da minha vagina
tremem, enquanto minhas costas são tomadas por
arrepios. A vontade que tenho é de gemer bem alto, só
que isso poderia assustar os cavalos. Mordo um dedo para
não gritar e, em questão de minutos, gozo na sua boca.
Otto não perde tempo e desliza seu pau na minha
boceta. Ele está possuído e louco para me rasgar ainda
mais. Gosto quando ele me beija e mete forte ao mesmo
tempo. Todo o meu corpo o responde incessantemente e
labaredas de fogo incendeiam tudo à nossa volta. O cheiro
do sexo quente invade as minhas narinas. O fazendeiro
está muito excitado.

Somos completamente viciados um no outro, e esse é


um problema que será resolvido depois que eu gozar.

Enquanto todos estão jantando, considero este o


momento apropriado para retornar ao escritório de Otto e
tentar abrir aquela gaveta. Ninguém virá até aqui. Ao
menos não agora. Abaixo-me para tentar abri-la. Depois
que estávamos vestindo nossas roupas, ainda no celeiro,
notei que Otto havia deixado suas chaves caírem no chão.
Ele não percebeu, e quando foi ver se tinha alguém lá
fora, peguei-as e as escondi. Esperei até o jantar ser
servido para vim ver se alguma delas dará certo. No total,
tem cinco chaves aqui e, felizmente, uma é da gaveta que
ele tranca. Encontro uma maleta preta que contém alguns
envelopes de cartas. Intrigante e, ao mesmo tempo,
romântico.
Otto e Eva trocavam cartas de amor. Posso ler
algumas. Eles se amavam muito, pois nelas há muitas
declarações melosas e, principalmente, provocações de
ambas as partes. Era como um jogo para eles.

Em uma delas diz:

“Eu a vi dançar lindamente ontem à noite. Você vestia


uma lingerie vermelha. Eu só conseguia imaginar meus
lábios puxando cada fio de linha e a deixando nua para
estar em meus braços.”

É de Otto. Ele falou sobre dança. Minha irmã dançava


em um clube.

Eva respondeu:

“Gosto do mistério. Gosto de saber que alguém me


admira, porque não para de me enviar cartas e exige um
show particular. Posso deixá-lo completamente excitado.”

Inicialmente, Otto enviou cartas sem assinar o seu


nome, e isso virou um jogo entre os dois.

Outro trecho diz:

“Quero que seja minha nesta noite. Exijo uma


apresentação particular.”

Como Pietra havia dito, minha irmã dançava para


homens em uma boate.
“Aceito dançar para o senhor misterioso.”

Lágrimas escorrem pela minha face. Ela estava em


um lugar daquele por minha causa.

“Você não se importa com o meu passado? A cada


noite, eu sou de um homem diferente. Sou daquele que
pagar mais, e ontem você fez isso. Porém, quando me
disse que queria se casar comigo, pensei que estivesse
brincando.”

Otto pagou pela minha irmã, é mesmo verdade. Essa


revelação agora não é mais uma suposição, e sim a
verdade escrita. Eu conheço a letra de Eva. Foi ela quem
escreveu essas cartas.

“Seja minha. Nada mais importa se estivermos juntos,


pois se me disser “sim”, você será somente minha, e o seu
passado e o meu já não importarão mais.”

Lágrimas inundam a minha face. Eva se prostituía


para garantir o meu bem-estar. Minha alma está gritando.
Minha irmã não merecia sofrer por minha causa. Eu acabei
me tornando um peso para ela. Desde sempre, ela foi
responsável por mim. Quando o nosso pai saía para
trabalhar, Eva cuidava de mim, assim como quando largou
os estudos para assumir o lugar de mamãe em casa ou
quando fomos morar com a nossa tia, e o marido dela
tentava abusar de nós duas. Em tudo, tomava a frente e
sempre escolhia minha segurança, minha felicidade, em
vez da sua.

Quando minha irmã conheceu Otto e se apaixonou


perdidamente por ele, deve ter se sentido uma traidora por
escolher seguir o seu coração e formar uma família. Ela
não se sentia bem longe de mim, e todo o tempo em que
ficou distante foi para garantir que tudo estaria bem para
nós duas no final.

A porta do escritório é aberta e eu me escondo


embaixo da mesa. Quem será que entrou aqui? As cartas
estão bagunçadas no chão e a gaveta aberta. Sinto
calafrios. Otto me mataria se me visse aqui.

Respiro mais aliviada quando escuto a voz de Pietra.

— Tia, a senhora precisa fazer alguma coisa. Érika


está fazendo de tudo para Otto não passar nenhum tempo
comigo, e o noivo dela está ajudando, sempre o distraindo
durante o dia.

— Pietra, calma. Muita paciência. Não coloque tudo a


perder com sua ansiedade, querida.

— Enquanto eu estou ficando sem espaço na vida


dele, meu amado primo está comendo a cozinheira, a
babá, todas as noites. A senhora precisa fazer algo.

Minha respiração está pesada, pois eu chorei. Faço


de tudo para não chamar a atenção.
Que elas não me vejam, ou estarei perdida.

— Otto não pode se apaixonar por Maria Luíza, tia.


Não posso perdê-lo outra vez.

— Calma, minha querida. Eu me desfiz de uma


ameaça maior no passado. Será fácil me desfazer de
outra. Lembre-se: estamos juntas nisso. Você não pode
esquecer jamais o que fizemos com Eva.

— Agora ela está morta, tia, mas a Maria Luíza está


viva e transando com Otto todas as noites.

— Ela também pode morrer. Um “acidente” pode


acontecer quando menos esperamos.

— Isso pode ser perigoso.

— Não quando se faz do jeito certo.

— A polícia já sabe que cortaram os freios do carro


dela. E se eles...?

— Eles nunca vão saber que tivemos envolvimento


nessa história.

Desbloqueio o celular e começo a gravar a conversa


delas.

— Tia, não há como a polícia descobrir que os freios


foram cortados a mando da senhora?
— Fale baixo, menina. Ninguém nunca irá saber que
fui eu. Agora você precisa manter esse bico fechado.
Lembre-se: foi você quem cortou, querida.

— A mando da senhora, tia. Otto acredita que Eva o


traiu com aquele peão. Imagina só se ele descobrir que
além da senhora ter planejado a morte da amada dele,
ainda o fez pensar que a esposa o traiu naquela noite.

— Nós duas sabíamos o quão ciumento meu filho era.


E veja só: ele acredita que a vadia o traiu. É uma pena
que ele tenha descoberto a morte dela.

— Pelo menos ele não pôde ir ao velório. Somente


uma semana depois a notícia chegou para ele. A senhora
conseguiu evitar que chegasse à fazenda.

As duas riem.

Estou em choque com tudo que acabei de ouvir. Elas


foram as responsáveis pela morte da minha irmã. Otto
nunca teve culpa ou envolvimento em nada, apenas elas.
O preconceito e a soberba delas mataram a minha irmã e
roubaram tudo que ela tinha de bonito com Otto.

Posso ouvir a batida da porta.

As duas não tinham o direito de destruir todos os


sonhos da minha irmã. Eu juro por Deus que elas pagarão
caro por todas as coisas que disseram, por todas as
calúnias e maldades que praticaram. Fizeram de tudo para
separar Eva e Otto, e conseguiram. Minha irmã está morta
e não há mais nenhuma chance de ela ser feliz com o
homem que amou. Também não pode ver seus filhos
crescerem, muito menos ouvi-los a chamarem de mamãe.

Eu juro, Eva, que farei as vadias pagarem caro por


tudo que fizeram com você.
A mãe de Otto e sua prima, Pietra, foram as
responsáveis pela morte da minha irmã. Tenho a confissão
delas gravada no meu celular. Eu poderia ir agora mesmo
à polícia denunciá-las e as incriminar, mas não farei isso.
Não por agora. Meu coração tem cem por cento de certeza
de que Otto não foi o culpado. Ele não teve culpa pelo que
aconteceu. Seu único erro foi ter acreditado que minha
irmã realmente o traiu.
Temo pela minha segurança nesta casa,
principalmente agora, quando ambas sabem que eu estou
me envolvendo com o patrão. Se elas foram capazes de
matar a minha irmã, também seriam capazes de me matar.
Agora consigo compreender tudo. O ódio da senhora
Cavalcante por Eva era tanto, que ela armou para o casal.
Vê-los casados foi como uma afronta para Lisandra, que
jamais aceitou que o filho pudesse amar uma moça
humilde, pobre. Em pleno século vinte e um há mães que
acreditam que podem decidir quem será a esposa perfeita
para os seus filhos.

Minha irmã foi apenas uma vítima indefesa nas mãos


dessa víbora. Primeiro Lisandra envenenou a mente dela,
fazendo-a sentir ciúme do marido. Ela lhe falava que Otto
era um conquistador e lhe contou, principalmente, sobre o
namoro dele com Pietra. Soube manipular a inocência de
Eva, que não conseguia acreditar no esposo quando ele a
dizia que ela era a única mulher que ele amava. Depois
aquelas duas criaram muitas situações que a fizeram
perder o controle, como na noite de exposição de uma
feira de agropecuária, na qual Otto seria homenageado.
Consigo pesquisar e encontrar a manchete que diz:

“Esposa ciumenta agride garçonete.”

Eva jamais seria capaz de agredir alguém que


realmente não a tivesse provocado. E ela conta o que
realmente aconteceu.
“Nessa noite eu percebi a mudança repentina do meu
humor quando Lisandra me trouxe uma bebida. Tenho
quase certeza de que ela colocou alguma substância
perigosa nela. Logo depois pude ver uma mulher sentada
no colo do meu marido. Ele jurava que eu estava
imaginando coisas. Na verdade, tenho a impressão de que
alguém sussurrava para mim que eu deveria bater na
mulher oferecida.”

Sua sogra sabia como deixar o filho irritado. Eva o fez


passar vergonha naquele evento e em mais alguns dos
quais eles participaram, até ele decidir que não a levaria
mais a nenhum, deixando-a em casa, por medo de ela
estragar tudo.

“Eu sempre perdia a cabeça depois que Lisandra me


trazia alguma bebida.”

Eva era muito inocente para perceber o que estava


acontecendo. Na verdade, era bondosa demais para ver
maldade nas pessoas. E isso a fez ser a marionete
perfeita para a mãe de Otto e a prima possessiva.

“Otto se mostrava furioso, e eu sabia que ele tinha


razão. Aceitei não ir mais aos eventos, porém as fotos em
que ele saía ao lado de Pietra eram sempre motivos para
as nossas discussões. Em certo dia vi os dois saírem para
andar a cavalo e quis matá-lo.”
O plano de Lisandra estava saindo totalmente como
ela desejava. Primeiro ela fingia apoiar Eva e se fazia de
sua amiga para ganhar confiança, sendo que, na verdade,
só estava sugando seus pontos fracos. E nesse momento
ela encontrou um trunfo: descobriu que Eva foi garota de
programa. O que faria Otto ficar enciumado se a visse em
situações comprometedoras.

“Suas crises de ciúme chegam a me sufocar. Eu


repito que ele é o único que eu quero, o único que desejo,
mas sempre que ele me vê conversando com algum peão,
explode de ciúme. Parece que surge um homem bonito e
sem camisa todas as vezes que eu saio para dar uma
volta.”

Meu Deus! Tudo era armação da sua sogra, e os dois


foram enganados a ponto de chegarem a duvidar do amor
que sentiam um pelo outro. Minha irmã descreveu
mudanças no humor de Otto, que pode ter sido efeito de
alguma droga usada em pequenas quantidades, que não
chega a causar vício, porém altera o psicológico da
pessoa que a ingere. Armadilhas foram arquitetadas por
Lisandra, no entanto ela só conseguia gerar discórdia e
discussões, nunca o divórcio do casal. Então, ela pôs em
prática seu plano mais cruel: matar a minha irmã. Os
freios foram cortados tempos após a noite em que Otto a
pegou na cama com um peão. Os dois discutiram, ela
pegou as chaves do carro e foi embora.
Estou aos prantos com tantas informações precisas.
Tenho provas suficientes para incriminar aquelas duas e já
poderia ir à polícia na manhã seguinte, mas primeiro me
encontrarei com Samuel. Ele finalmente respondeu a um
dos meus e-mails e disse que está vindo à Nova Lima para
conversarmos.

As minhas provas são guardadas a sete chaves: o


notebook que contém todas as informações, o diário e a
gravação. Tudo está guardado em um lugar seguro e
ninguém desconfia de mim, não sabem que sou irmã de
Eva.

Está decidido: depois que eu conversar com Samuel,


irei até a delegacia entregar tudo.

As horas se passam, e agora estou com dor de


cabeça, quando alguém bate na porta do meu quarto.
Levanto-me em um pulo, sentindo tremores. Saber que
estou debaixo do mesmo teto que as assassinas da minha
irmã me causa calafrios. Apenas a luz baixa do abajur
ilumina o quarto.

Meus olhos encontram o envelope que é passado por


baixo da pequena brecha da porta e eu me abaixo para o
pegar. Ela está trancada.

Sento-me sobre a cama, abro o envelope e leio o


recado em voz baixa.
“Hoje eu percebi que sua teimosia me encanta. Ela
não me enfurece mais, como no princípio. Desde o
primeiro momento em que te vi, soube que seria a ruína
dos meus pensamentos. Você sabe que preciso sentir o
sabor dos seus beijos todas as noites. Não há como negar
que estamos dependentes um do outro.

Eu lhe disse que viria buscá-la se não fosse dormir


comigo. Abra a porta. Estou aqui fora, te esperando.

Otto.”

Dou um sorriso. Somente ele para conseguir me fazer


sorrir depois de ter chorado por horas. Em seus braços
consigo encontrar a paz que tanto procuro.

Ao abrir a porta, dou de cara com suas órbitas


negras.

— Acha que sou a ruína dos seus pensamentos? —


Ainda seguro o papel em minhas mãos.

Cartas me fazem lembrar das que li mais cedo, das


declarações de amor que ele escrevia para a minha irmã.
Ele dizia que não tinha o hábito de escrever para uma
mulher, que só fazia isso quando estava apaixonado.
Pergunto-me se ele está apaixonado por mim.
— Acredito que sim. — Ele me agarra pela cintura e
me beija suavemente. — Veja a minha situação. Pareço
um adolescente apaixonado que invade o quarto de uma
mocinha inocente. Isso é insano demais para mim.

Ele disse a palavra “apaixonado”. Meu coração palpita


freneticamente e se enche de alegria.

— Apaixonado?

Ele está confessando o que sente por mim? Ou estou


delirando?

— Eu não tenho mais idade para isso. Você desperta


em mim sentimentos intensos. Não sou capaz de passar
mais nenhuma noite longe de ti.

Isso seria paixão? Ou somente sexo? Ele pode estar


confuso. Acredito que não sinta o mesmo que eu.

— Eu também não — respondi, fitando meus dedos.

Não queria confessar, mas acabei falando sem


pensar, e agora ele sabe o quanto desejo estar aqui, em
seus braços, sendo a sua mulher. Minha vontade é de
gritar que estou apaixonada, mas jamais farei isso.

— Maria Luíza, eu sou louco por ti, minha menina.


Não me diga que eu sou um erro e não me evite mais.
Estou suplicando.
Ele é um erro sim e eu preciso evitá-lo, mas não
nesta noite. Precisamos de um do outro. E eu não posso
negar o quanto desejo estar em seus braços hoje.

— Suplico que me faça sua a noite inteira.

Nunca pensei que pudesse desejá-lo tanto. Até


sufoca a minha alma. É uma paixão que espalma,
diferente de tudo que já senti com o Rafael. Ele nunca me
beijou com a mesma intensidade que meu cowboy. Hoje
sei que nunca o amei, que era apenas uma paixão infantil.
Já com o fazendeiro é avassalador, arrebatador.

— Não peça isso, menina. Você sabe que não a


deixarei em paz nem por um segundo.

Otto me toma em seus braços. Inicialmente levo um


susto, só que logo gargalho baixinho. Ele me carrega pelo
corredor escuro, iluminado apenas pelo clarão da lua que
adentra as janelas de vidro. Subimos a escada em direção
ao seu quarto.

— Assim parece que estamos indo para a nossa lua


de mel — comentei.

— Eu quero viver uma lua de mel com você todos os


dias, se aceitar ser minha para sempre.

Sua proposta me causa arrepios. Ele deseja ficar


comigo para sempre ou está me dizendo essas coisas
somente pelo sexo? Em seus olhos, posso ver muito
desejo, mas também há outro sentimento, que acredito ser
o mesmo que nutro.

Contudo, mesmo que eu queira, não podemos ficar


juntos. Eu já errei demais até agora.

— Te prometo que nesta noite serei toda sua.

Ele abre a porta do quarto e me coloca sobre o chão,


onde piso firme. Meus olhos percorrem todo o ambiente.
As paredes nos tons preto e cinza deixam o ar mais
pesado. A cama enorme fica no centro do quarto, coberta
por lençóis brancos de seda. Essa é a cor mais viva que
há neste local.

Era aqui que Eva dormia? Preciso saber antes de me


deitar nessa cama.

— Era aqui que você e sua esposa dormiam?

Ele me olha sem entender. Fiz uma pergunta


delicada, posso ver em seu olhar.

— Não. Me mudei para esse quarto depois que ela...


faleceu — completou com dificuldade. — Todos os móveis
foram mudados depois que ela se foi.

Eles não dormiam aqui. Ao menos essa não era a


cama dela. Mudar as coisas de lugar e substituir por novas
foi uma maneira que ele encontrou de amenizar a sua dor.
Eu também fiz isso em nossa casa. Todas as coisas dela
foram doadas, pois não suportei ficar com nada que me
lembrasse ela, nem mesmo a casa. Morei por alguns
meses em um apartamento pequeno, que cabia apenas
uma cama, uma geladeira, um fogão e uma cômoda.
Muitas das minhas roupas ficavam em malas, no chão.

— Tudo bem. Pode falar comigo sobre ela se desejar.


Eu não o julgo por ainda amá-la.

— Eu ainda a amo sim, mas não como minha mulher.


O que sinto por Eva é respeito e carinho. Nunca irei me
esquecer dela. Eu a amo como mãe dos meus filhos.

— Compreendo, mas vejo que você carrega um peso


consigo, uma culpa que não é sua — agora fui fundo na
sua dor mais profunda.

Certamente, ele não se perdoou por ter deixado Eva ir


embora naquela noite.

— A culpa foi minha.

Agora eu sei que a culpa nunca foi dele. Ele nunca


teve culpa pelo que aconteceu.

— Não foi. Você não teve culpa de nada. — Quero


gritar que a culpa é exclusivamente da sua mãe e da sua
prima, e não dele.

Eu passei meses odiando a pessoa errada, odiando


um homem que também foi vítima. Otto perdeu o amor da
sua vida, a única mulher que amou. Ele não se importava
com o passado dela, até usarem isso contra eles. Ele
também foi marionete nas mãos de pessoas em quem
confiava.

— Por que estamos falando sobre o passado?

— Porque eu consigo ver nos seus olhos que ainda


ama a sua esposa e que se culpa por muitas coisas.

Há momentos em que desejo ser sua amiga, poder


ouvir suas lamentações e lhe dizer que está tudo bem, que
juntos vamos superar essa dor e seguir em frente, porém
não posso ser essa pessoa. Otto é o último homem que
posso amar neste mundo. Nosso amor é impossível. Eu sei
que ele me odiaria se soubesse meus reais motivos para
ter vindo à sua fazenda. Ele não me perdoaria se
soubesse que o odiei e que não lhe disse a verdade sobre
quem realmente sou.

— Se eu não a tivesse deixado ir embora naquela


noite, nada teria acontecido. Eu fui o culpado.

Essa culpa não é dele, esse fardo não lhe pertence.


Otto também foi vítima das armações daquelas mulheres
escrotas. Há um vazio em seu coração, e não posso medir
o tamanho da sua dor. Ele perdeu um amor e eu perdi uma
irmã amada.
— Sua única culpa foi amá-la. O amor nunca é um
erro, e sim a melhor escolha que podemos fazer na vida.
Vocês tiveram filhos lindos. Sei que pode ser doloroso
saber que ela nunca mais vai voltar para os seus braços,
mas você deve seguir em frente, como está fazendo, e
jurar que sempre vai proteger e amar seus filhos, pois eles
são o fruto do amor mais belo que os pais deles já
sentiram.

— Você é um doce de menina, Maria Luíza, só que


não pode compreender a minha dor.

— Eu sei que não, porém entendo o quão doloroso é


perder alguém que amamos. Você não sabe, mas perdi
alguém que amava muito recentemente. — Lágrimas
molham a minha face. — Por isso aceitei vir trabalhar
nesta fazenda, longe de todos que eu conhecia. Acreditei
que precisava estar aqui para solucionar algumas coisas,
e estava certa.

— O que quer dizer com isso?

— Eu quero dizer que preciso muito que você me ame


fervorosamente nesta noite. E se eu cair na exaustão, não
pare de me amar, nunca. — Jogo-me em seus braços e o
beijo com urgência.

Necessito sentir o calor da sua pele sobre a minha e


nossos corpos nus e suados se amando pela última vez.
Essa será a nossa despedida. Amanhã estarei muito longe
daqui e com provas suficientes para mostrar a todos quem
foram os culpados pelo que houve. A polícia já sabe que
os freios foram cortados e estão me procurando, no
entanto recusei todas as ligações da delegada. Agora há
um novo delegado conduzindo a investigação, e amanhã
entrarei em contato com ele.

Quando a boca de Otto beija meu corpo, lambendo e


chupando cada parte da minha pele, contorço-me sobre a
maciez da cama. Ele sabe que sou vulnerável quando
estou em seus braços. Arrepios percorrem todo o meu ser
como se eu estivesse recebendo uma descarga elétrica.

Há fogo.

Há desejo.

Há paixão.

Há sentimentos maiores e poderosos.

Desde a nossa primeira vez, eu soube que poderia me


apaixonar perdidamente pelo cowboy. E me apaixonei.
Essa paixão arde em meu peito, chegando a me queimar.
Sei que estou indo longe demais e, acima de tudo, sendo
egoísta por amá-lo. Minha irmã sempre se sacrificou para
me ver bem e feliz, então seria egoísmo meu estar
querendo o seu lugar. Não posso mais agir como se essas
coisas fossem normais. Otto seria a minha perdição, a
ruína da minha felicidade, pois eu não posso amá-lo. Não
da maneira como amo.

— Seja minha para sempre — ele suplicou enquanto


me beijava fervorosamente.

Sua língua quente lambe cada extensão da minha


pele, deixando-me mergulhada no tesão ardente, e seus
dedos massageiam meu clitóris em movimentos circulares
que me fazem ver estrelas. Otto exala testosterona e me
leva ao delírio enlouquecedor da paixão. O desejo
abrasador me invade e o fogo da paixão consome meu
coração.

Eu tenho certeza de que estou apaixonada. Dizem


que esse sentimento dura três meses, mas ao longo dos
dois meses em que estou na fazenda Cavalcante, tenho
convicção de que estou rendida ao Otto.

Não estava em meus planos amar o cowboy.

Posso ver faíscas de amor em seus olhos. Não há


apenas desejo carnal, há algo maior e mais poderoso. Eu
sei disso, pois consigo sentir esse amor. É o mesmo que
eu sinto.

Mas já está decidido: amanhã irei embora de uma vez


por todas. Irei abrir mão desse amor para fazer justiça.
O cheiro do sexo está impregnado em nossos corpos
suados, preso ao ambiente. A cada respiração, posso
sentir o aroma forte exalado por eles. Meu coração dá
vários apertos e eu sinto que estou prestes a despedaçá-
lo com a minha decisão de ir embora. É necessário, o
correto a ser feito. Quando me levanto da cama é
madrugada, um pouco mais de quatro e meia da manhã.
Ele despertará em breve.
Depois de me vestir, eu lhe dou um selinho na boca,
fecho os olhos e sinto a dor de partir rasgar a minha alma.
Vim para esta fazenda com o intuito de conseguir provas
contra Otto, no entanto ele foi tão vítima quanto a minha
irmã. Meus sobrinhos estão seguros sob sua proteção, e o
que devo fazer agora é seguir em frente com a minha vida.

Escrevo uma carta, entretanto não tenho coragem de


deixá-la sobre a cama, por isso a escondo na gaveta do
criado-mudo, abaixo de alguns papéis. Não permitirei que
as lágrimas me dominem, não vou chorar. Preciso ser
forte. Já errei demais até aqui, e não posso seguir com
esse erro, com essa culpa que me dói profundamente.

Também passo no quarto das crianças, onde os dois


anjinhos dormem serenamente. Lucrécia está deitada na
cama, próxima aos berços. Como seu sono é pesado, ela
não acordará antes que eu saia. Alícia abre os olhinhos,
ainda sonolenta. Ela parece saber que estamos nos
despedindo e acordou para me pedir, com seus lindos
olhinhos azuis, que eu fique. É como se ela dissesse
através do seu olhar puro: “Fique, titia. Não vá. Amamos
você.”

— Eu amo muito vocês, meus amores. — Agora, sim,


estou aos prantos, porque terei que ir embora e não sei
quando vou vê-los novamente. — Vocês são a razão da
minha vida. Vou sentir muita saudade. Eu tenho certeza de
que a mamãe de vocês os ama muito, onde quer que ela
esteja lá no céu. É uma estrelinha olhando por vocês. Eu
prometo que vamos nos ver novamente algum dia. —
Enxugo minhas lágrimas.

Meu coração está apertado pela despedida. Eu


gostaria de levá-los comigo, todavia não tenho esse
direito. Não posso afastá-los do pai. Espero, algum dia,
poder visitá-los de novo e sempre que Otto me permitir
estar junto deles, para, assim, criarmos um laço familiar.
Quero muito buscá-los da escola, mimá-los com doces e
os ensinar a nunca esquecer a mãe deles. Mas isso Otto
pode fazer. O amor e respeito que ele tem pela memória
da minha irmã é admirável, e o tempo não será capaz de
apagar isso nunca.

Alícia segura meu dedo com sua pequena mãozinha e


o aperta firme, como se me pedisse para não ir. Acalento a
bebezinha para que ela volte a dormir, beijo sua face com
amor e, depois, a do pequeno Lohan. Mesmo sendo um
bebê mais sério, ele estava aprendendo a rir mais comigo.
Observo os dois por minutos.

O sol logo sairá pronto, e eu também irei em seguida.

Dentro da minha pequena mochila há duas mudas de


roupas, calcinhas, toalhas e todos os meus documentos.
Meu notebook vai dentro da bolsa. Avisei ao Marcos antes
que gostaria de ir à cidade para consertar o notebook e
lhe contei uma história, dizendo que ele havia tido uma
queda e não ligava mais. O diário de Eva, decidi deixar
uma cópia, que eu já trouxe imprimida, para Otto. Está em
meu quarto. Talvez ele vá até lá e o encontre. Também, na
carta que lhe fiz, fala sobre o diário e onde achá-lo.

Sentirei falta deste lugar, das amizades que fiz e da


chama do amor despertada em meu coração. O fogo que
arde em mim não será apagado facilmente.

— Senhorita, tem certeza de que não quer que eu a


espere?

— Não quero atrapalhar o seu serviço. Eu conversei


com o menino que conserta, e ele me disse que vai levar
algumas horas. Quando eu terminar tudo aqui, ligo para a
fazenda e você vem me buscar. Tudo bem assim?

— Como a senhorita desejar.

Marcos é gentil. Também vou sentir falta dele, de ser


cúmplice do seu amor proibido com Mariana. Espero que
esses dois não sejam descobertos, ou perderão seus
empregos. Otto tem uma política severa contra
funcionários se envolverem.

Deixei tudo por escrito na carta sobre o que descobri.


Espero que ele a leia somente depois que eu já estiver em
BH.
— Marcos, tenha cuidado com o seu relacionamento
com Mariana, para que vocês nunca sejam descobertos —
alertei.

— Sim, senhorita. Obrigado.

Ele não entendeu muito bem por que falei desse


assunto de repente.

Ao fechar a porta do carro, vou ao único restaurante


em que posso conversar com Samuel. Eu nunca o vi
pessoalmente e não sei como é a sua face. Estou nervosa.
A mesa que foi reservada para nós é a 23. A este horário
da manhã quase não há movimento no local, e assim
poderemos conversar tranquilamente sobre o assunto, sem
perturbações e barulhos. Caminho até a mesa reservada e
encontro uma mulher lá, não um homem, como eu
esperava. Estranho. Talvez eu tenha me enganado de
reserva.

Ao me ver, a mulher de cabelos ruivos e olhos


castanhos acena para mim. Tenho certeza de que nunca a
tinha visto. Ela pode estar se confundindo.

— Maria Luíza Rezende. Claro que é você. A sua irmã


falou tanto sobre seus cabelos castanho-claros, da cor de
mel, e dos olhos azuis, que seria impossível não a
reconhecer. E mesmo que estivesse com outra coloração
de cabelo, eu saberia que é você pela forma como
caminha. — Ela me assusta por saber tantas coisas sobre
mim. — Desculpe o falatório. Meu nome é Amanda, mas
pode me chamar de Mandy. Você não me conhece. Eu
sou... Era a melhor amiga da sua irmã, Eva.

Puxo uma cadeira para me sentar. Então, ela era


amiga de Eva.

— Perdão. Nos e-mails que eu lhe enviei, me


identifiquei como Samuel. Esse é o nome do meu filho. —
Agora entendo. — Eu tive medo de, ao enviar todas
aquelas coisas, acabar me comprometendo. Não queria
colocar minha segurança e a do meu filho em risco.

— Entendo. Então, você me enviou todas aquelas


coisas?

— O diário e os e-mails? Sim.

— Então você sabe muitas coisas sobre a minha irmã.


Pode me contar tudo que sabe?

— Posso sim, mas antes quero te entregar algo. —


Abre a pasta e me entrega folhas que estão grampeadas.
— São as páginas do diário que eu rasguei. No dia do
acidente, quando Eva estava indo para Belo Horizonte,
disposta a lhe contar tudo sobre o casamento, os gêmeos
e a sogra malvada, ela me pediu para eu te entregar o
diário dela caso alguma coisa de ruim a acontecesse. — A
minha irmã temia a morte. Ela estava assustada, com
bastante medo. — Infelizmente, ela morreu naquele
acidente. Mas acredito que ele foi planejado pela sua
sogra e a sobrinha dela. As duas nunca gostaram de Eva.
Minha amiga me ligou algumas noites antes, me falando
que estava com medo e que não vinha se sentindo bem.
Segundo ela, era como se estivesse ficando
completamente fora de si. Acredito que alguém tenha
colocado substâncias perigosas nas bebidas dela.

— Também acredito nisso. Por favor, Mandy, me conte


tudo.

— Eu conheci a Eva quando ela começou a dançar na


boate Kiss-me. Ela era a dançarina mais bonita e sensual
de lá. Os homens faziam filas para a ver dançar.

— Você sabe por que minha irmã começou a trabalhar


em um lugar como esse? Perdão, não estou julgando
ninguém. Eu sei que foi por mim, para que não me faltasse
nada, mas preciso ouvir isso da boca de alguém que era
próxima a ela.

— Você está certa, foi para que não lhe faltasse nada.
Porém, a sua irmã nunca lamentou nada do que fazia. Ela
gostava de estar lá e se sentia bem, porque não faltava
dinheiro para sustentar vocês duas. Tudo estava indo bem,
até ela conhecer Otto Cavalcante e se apaixonar
perdidamente por ele. Os dois viviam trocando cartas de
amor; chegava a ser meloso.

Eles se amavam. Ele sempre a amou.


— Fui intimada a depor. Um delegado me ligou. Nesta
semana vou prestar depoimento e falar tudo que sei sobre
esse caso. E se for para acusar os verdadeiros culpados,
farei isso. Peço desculpa, mas antes de lhe enviar o
diário, eu fiz cópias dele, as quais mandei à polícia há
alguns meses. Acredito que o processo tenha sido
reaberto com a ajuda dele. As páginas que você não leu
são bastante reveladoras.

— Reveladoras?

— Eva falou sobre a noite em que discutiu com o


marido, em detalhes. Você verá que tudo não parece uma
simples coincidência.

Não espero por mais tempo e começo a ler sobre


aquela noite.

“Minha cabeça doía, parecendo que estava sendo


furada com uma faca, e meu coração se encontrava
apertado.

Estou com saudade da minha irmã. Quero vê-la e lhe


dar um abraço. Faz algum tempo que não a vejo, e sei que
ela está preocupada. Porém, eu estou assustada.

Da janela do meu quarto, pude ver Lisandra


conversando baixinho com um peão, próximos ao meu
carro. Eu sabia que não estava delirando, apesar de minha
cabeça estar girando.

Deitei-me na cama depois de pedir para Lucrécia


cuidar dos meus bebês naquela noite.

Minha irmã vai adorar saber que tem sobrinhos lindos.


Alícia me faz lembrar dela quando era bebê, pois ambas
têm o mesmo sinal de coração.

Havia momentos em que eu não sabia dizer se estava


acordada ou dormindo, no entanto vi Lisandra entrar no
meu quarto e, logo em seguida, minhas roupas foram
arrancadas do meu corpo. Eu adormecia e despertava,
ainda sonolenta, sem forças para me levantar. Estava
agarrada a um homem viril e forte. Pelo perfume, eu sabia
que não era o meu marido. Voltei a dormir com a cabeça
pesada.

Não sei dizer o que aconteceu naquela noite,


contudo, quando Otto arrombou a porta, pude despertar,
assustada, em pânico. Havia um homem na minha cama,
roupas espalhadas pelo chão, meu marido estava furioso e
a minha cabeça parecia que iria explodir.

Nossos gritos poderiam ser ouvidos da cidade. Otto


sempre foi ciumento, e meu passado na boate o deixava
constantemente com ciúme. Ele deveria saber que eu
jamais seria capaz de traí-lo. Logo Lisandra chegou e me
acusou de ter me visto outras vezes com aquele homem.
Eu jurei que era mentira, que ela estava mentindo, mas
Otto não acreditou. Nós dois chorávamos rios.

Eu não seria capaz de ficar ao lado de um homem que


não acredita em mim. Apenas peguei as chaves do carro e
dirigi. Desliguei o meu celular, mas antes de ir, avisei que
voltaria para buscar meus filhos. Ele se opôs, mas sabia
que não poderia me impedir. E jamais faria isso comigo.

Parei para ir ao banheiro e beber água, então me


lembrei de que antes de me deitar naquela noite, Lisandra
me trouxe um suco. Toda a sua bondade chegava a me
assustar e a me deixar desconfiada. Acredito que minha
sogra colocou alguma coisa para eu dormir e que isso
tenha feito com que ela pudesse armar aquele plano
contra mim. Sempre soube que ela nunca aceitou meu
casamento com o seu filho, por eu ser garota de
programa.”

Minha irmã sabia que corria perigo, entretanto não


imaginava que o ódio de Lisandra pudesse lhe fazer tanto
mal, como fez. Agora ela não poderá, nunca mais, ver os
seus bebês crescerem, por culpa daquelas serpentes.

Estou aos prantos. Mandy me dá um lenço para


enxugar as lágrimas.

— Vocês duas eram muito amigas.


— Sim, éramos muito próximas.

— Você acredita que minha irmã poderia ter sido feliz


com o marido, se não fosse pela sogra?

— Eles se amavam, apesar das discussões.

Agora, mais do que nunca, sinto-me culpada por ter


me envolvido com Otto e ter permitido que o desejo
falasse mais que a razão. Eu sempre soube que ele era
proibido e, mesmo assim, provei dessa paixão impossível.
Mergulhei nesse romance impossível. Agora meu coração
sangra por eu estar longe dele e saber que nunca mais
poderei vê-lo.

— Você esteve naquela casa? — ela perguntou.

— Sim, por dois meses.

— Então conhece bem todas as pessoas que


trabalham lá?

— Acredito que sim. Por quê?

— Eva escondeu um pen-drive que contém algumas


gravações importantes que pode nos ajudar.

— E onde ela escondeu?

— Preciso que me leve lá. Eu acho que ainda sei


onde pode estar.
— Quer que eu a leve à fazenda agora?

— Sim, eu quero. Pode fazer isso?

— Como sabe do pen-drive?

— Eva me ligou algumas horas antes do acidente e


me disse tudo que eu precisava saber.

Saí da fazenda nessa manhã acreditando que não


voltaria tão cedo lá, e agora Mandy me pede para irmos
àquela casa juntas para pegar um pen-drive.

— A sua irmã passou a suspeitar da sogra depois que


começou a se sentir mal algumas vezes. Ela tem
gravações de discussões entre as duas, nas quais
Lisandra ameaçava matá-la. Essas provas podem ajudar a
incriminá-la.

— Eu tenho a confissão dela.

Mandy abre um sorriso vitorioso, batendo na mesa.

— Garota, deveríamos virar detetives, pois seremos


nós a solucionar esse crime para a polícia. Concorda em
voltar comigo para a fazenda?

— Concordo.

Mandy está de carro. Depois de eu colocar todas as


coisas dentro do veículo, ela dirige em direção à fazenda.
Eu lhe mostro o caminho, mas ela me diz que já foi lá
algumas vezes.

Minha cabeça está cheia com muitas informações


importantes. Estranho quando o carro para no meio do
nada.

— O pneu abaixou. Me ajuda a trocar?

— Eu nunca fiz isso antes.

— Não importa. Duas é melhor que uma.

Desço do veículo e olho em volta. Acredito que


tenhamos entrado em uma estrada errada e eu não tenha
notado, por estar distraída.

— Qual pneu?

— Aquele traseiro.

Abaixo-me para ver se ele está furado, e acredito que


não esteja, pois está cheio de ar, não está seco. Mandy
pode ter se confundido.

— Não está seco. — Ainda de joelhos sobre o chão,


olho para trás e arregalo os olhos, assustada com o que
vejo.

Mandy está segurando uma arma apontada para mim.


O que diabos está acontecendo? Tremo só de vê-la
armada.
— Jesus! — Eu tento me levantar, só que ela não
deixa, chutando-me e me fazendo deitar sobre o chão.

Seu pé fica sobre a minha barriga.

— Eu sinto muito, Maria Luíza, mas não posso


permitir que coloque tudo a perder.

— Mandy, por favor, não atire. Por que está fazendo


isso?

Ela é cúmplice de Lisandra? Por que a melhor amiga


da minha irmã está com uma arma apontada para a minha
cabeça? Calafrios percorrem as minhas costas, dando-me
choques.

— Eu juro que não queria fazer nada com você. Eu


amava a sua irmã e ela nunca me quis, nunca entendeu o
meu carinho por ela e me via somente como uma amiga,
quando, na verdade, eu sempre fui e seria melhor para ela
do que o marido. — Consigo colocar o celular para gravar
tudo. — Lisandra disse que me ajudaria a ficar com Eva,
que separaria os dois para que eu pudesse amá-la. Depois
que sua irmã a visse, Lisandra a sequestraria e nós duas
iríamos viver felizes em uma ilha deserta, onde ninguém
poderia roubá-la de mim. Eu fiquei com ódio quando ela
morreu, por isso lhe enviei todos os pertences dela.
Acreditei que Lisandra a matou, e você me deu a certeza.
Eu estava disposta a entregá-la para a polícia, mas há
cerca de dois meses descobri que meu filho está com um
câncer raro, e ela vai pagar todo o tratamento dele se eu
me desfizer de você. Agora preciso te matar para que meu
filho viva.

Mandy tinha uma paixão doentia pela minha irmã e


acreditou que viveria com ela, aprisionando-a aos seus
caprichos. Lisandra a enganou, usando-a para matar
minha irmã. Ela sabe que sou a irmã de Eva e deduziu que
eu estava na fazenda para reunir provas, então entrou em
contato com Mandy e a convenceu a me matar para a
ajudar a pagar o tratamento do seu filho.

É assustador saber que posso morrer dentro de


alguns minutos. Ninguém vai me ajudar.

— Por favor, eu imploro! Eu juro que poderei


conseguir ajuda para o seu filho. Mandy, não se torne uma
assassina. Lisandra nunca vai ajudar você de verdade,
pelo contrário, ela está te usando, te manipulando.

— Maria Luíza, você não entende. — Ela está


chorando, nervosa. Nunca fez nada do tipo. É uma pessoa
boa que se vê manipulada pela verdadeira vilã.

— Não seja uma assassina, não destrua o futuro do


seu filho.

— Meu filho pode nem ter futuro se esse tratamento


não for pago. — A dor de uma mãe aflita pode ser
desesperadora a ponto de levá-la a cometer uma loucura.
— Por favor... Eu confiei em você, Mandy. Não faça
isso. Eu imploro.

— Você não tem o direito de me implorar nada. Você


é sozinha e nunca precisou se sacrificar por ninguém,
diferentemente de mim e da sua irmã, que sempre fomos
linchadas para proteger as pessoas que amamos.

— Você é muito mais do que demonstra ser. Eu sei


que minha irmã amava você.

— Você não sabe de nada! — gritou. — Ela nunca me


amou como eu gostaria.

— Eu sou a irmã dela. Não mate a irmã da mulher que


você ama. Seja boa e generosa comigo, e eu juro que
serei boa para você e seu filho.

Sua mente está perturbada. Como eu não notei a


inquietação dela no restaurante? Lisandra é perversa e
cruel, uma cobra venenosa, manipuladora. Não posso
morrer sem antes fazer justiça.

— Prometa-me que vai entregar as provas à delegacia


— pedi.

— Eu não posso. — Lágrimas escorrem pela sua face.

— Pode sim. Lisandra te enganou uma vez, dizendo


que você ficaria com Eva, porém matou o seu amor. E se
você me matar, ela poderá te entregar à polícia.
— Você acha que ela está planejando isso?

— Ela não é uma mulher bondosa, quer incriminar


você e, assim, poder se livrar de qualquer culpa. Por
favor, não cometa esse crime.

Mandy está pensativa e desvia seu olhar para trás por


breves segundos. Tempo o suficiente para eu me levantar
e acertar um soco no seu rosto. A arma cai no chão e nós
duas travamos uma batalha corporal. Ela é forte e tem
quase o dobro do meu peso e da minha altura, mas, ainda
assim, não desisto. Rolamos pela grama. A luta é dura
para ver quem consegue pegar a arma.

— Desista disso e fuja enquanto há tempo — pedi.

Ela acerta um tapa na minha face e eu puxo seus


cabelos. Não vou desistir. Eu sou a única que pode fazer
justiça pela minha irmã. Busco forças onde nem sabia que
tinha, consigo me colocar por cima dela e, com as mãos,
aperto seu pescoço; não com a intenção de matá-la, e sim
para a fazer perder as suas forças e ficar fraca.

— Poderia ter sido tudo diferente, Mandy.

A mulher desfalece e eu saio de cima dela. Abro o


porta-malas e encontro cordas e algemas. Prendo suas
mãos com as algemas. Ela pretendia me matar e usar
essas coisas em mim? Amarro seus pés com as cordas e
confiro a gravação, que está em ótima qualidade.
Como Mandy é pesada, com muita dificuldade a
coloco no banco de trás do carro e fecho a porta. Faz
tanto tempo que dirigi, mas acredito que nada seria pior
do que ir a pé. Sou uma péssima motorista, porém é isso
ou correr o risco de alguém vir atrás de mim e tentar
terminar o serviço. Deixo o ar ligado e travo as portas do
carro ao chegar à fazenda.

Há viaturas da polícia aqui, provavelmente por conta


do diário que Mandy enviou à polícia. Ela não imaginava
que poderia ser manipulada a ponto de quase me matar e
acabar com as demais provas por causa daquela víbora
assassina. Ela terá o final merecido.

Ao passar pelas portas de madeira e adentrar a sala,


posso ver Otto, sua mãe, Lucrécia e Pietra. Ambos estão
na sala. O delegado novo, que está conduzindo a
investigação do crime, e a delegada estão presentes. A
senhora Milena me conhece e, ao me ver, diz:

— Aqui está a irmã da senhora Eva Cavalcante, a


senhorita Maria Luíza Rezende.

Posso ver surpresa nos olhares de todos. Não sei se


é somente por terem descoberto que sou irmã de Eva ou
se é pelo sangue que está escorrendo pelo meu nariz e
cabelos bagunçados. Falta-me força, só que, ainda assim,
não vou desistir de entregar todas as provas às
autoridades.
Estar diante das assassinas da minha irmã depois de
ter me salvado das garras de Mandy, que, aliás, está
trancada no carro, é aterrorizante. A surpresa estampada
na face das duas chega a ser deliciosa de se ver. Elas
acreditaram que tinham se livrado de mim, e agora estou
aqui, pronta para as entregar.
No momento, o que mais me preocupa é a expressão
de Otto. Não sei o que ele está pensando. Ele não deixa
em evidência suas emoções. Pergunto-me se está irritado.
Surpreso? Ou está querendo explicações? Acredito que as
três opções e muitas outras nas quais não penso agora.

Minhas veias pulsam freneticamente, levando todo o


meu corpo à combustão.

Encaro o homem que amei a noite inteira. Otto não


desvia os olhos de mim e eu não desvio meus olhos dele.
Há uma forte conexão entre nós dois e meu coração bate
acelerado, chamando pelo seu. Nosso amor é impossível,
e agora, que ele sabe que sou a irmã da sua esposa,
acredito que me odeia por não ter lhe dito nada.

— A senhorita desapareceu por meses. Tentamos


entrar em contato — a delegada que me conhece, a
senhora Milena, tomou a palavra. — Eu não imaginaria
que pudesse estar aqui. A senhorita é peça fundamental
dessa investigação.

— Peço perdão por não ter avisado nada a vossas


senhorias, mas como a senhora deu o caso por encerrado,
eu decidi vim conhecer os meus sobrinhos — essa foi a
primeira vez que pude chamá-los assim. Sinto-me livre e
aliviada.

Desvio meu olhar do cowboy para falar com a senhora


delegada. O novo delegado me vê como se eu fosse uma
suspeita.

— Então, a cozinheira, que também é babá, na


verdade, é a irmã da Eva? O que ela veio fazer aqui?
Acredito que não tenha sido coisa boa — Pietra destilou
seu veneno.

Minha mão está coçando para não a esmurrar.

— Como podemos ver, senhor delegado, a irmã que


fingiu ser outra pessoa, infiltrando-se em minha casa sem
revelar sua verdadeira identidade, não pode ter vindo
atrás de coisas boas. Acredito que ela seja uma ameaça
para a minha família. — Lisandra é uma serpente
venenosa.

— Acredito que a única ameaça para a sua família


seja você, Lisandra — meu tom de voz foi arrogante e
embargado de ódio e rancor.

A mulher não se mostra nervosa. Acredito que sua


atuação seja excelente e que ela vai apelar até o último
instante.

— Senhora e senhor delegados, será que vocês dois


podem me acompanhar até o escritório? Há algumas
coisas que desejo mostrar, mas antes peço que seus
homens reforcem a segurança e não permitam que
Lisandra e Pietra deixem a fazenda. — Encaro Otto, que
está confuso. — Otto pode vir também. O assunto lhe
interessa bastante.

Ele assente e os dois policiais reforçam a segurança


na porta. Por lá, elas não escapam. Há mais dois deles
pela sala, todos armados e prontos para agir em qualquer
eventualidade. Prefiro que essa conversa seja realizada
no escritório, pois lá está o computador no qual poderei
mostrar os vídeos e as gravações com mais qualidade, já
que deixei o meu no carro.

Todos me seguem. Desejo imensamente que aquelas


vadias paguem por tudo.

Otto e eu conversamos brevemente por meio dos


nossos olhares, e ele não se mostra irritado comigo. Não
da forma como acreditei que estaria.

— Primeiro responda algumas perguntas, senhorita


Rezende. Qual o motivo de ter vindo a esta fazenda em
sigilo, sem revelar sua identidade? — O senhor Molina
pensa que eu sou suspeita. Acredito nisso pela maneira
como ele me olha.

Eu respiro fundo ao me inclinar para ligar o


computador e Otto libera a senha para mim. Seu perfume
amadeirado invade as minhas narinas e ele sussurra
baixinho:
— Eu procurei feito um louco por você nessa manhã.
— Sua voz sensual me causa arrepios.

— Senhor delegado, a minha irmã nunca contou a


ninguém sobre a minha existência. Para ser sincera, eu
vim até essa fazenda para me vingar de uma pessoa que
eu acreditava ser o responsável pela morte da minha irmã.
— Respiro fundo. — Otto Cavalcante. Eu pensei que ele
fosse o responsável pela morte de Eva. Cheguei a odiá-lo
tanto, que esse ódio me consumia.

Otto é bom em esconder as emoções. Sua expressão


facial nunca mostra o que ele realmente sente. Vejo-o
cruzar os braços e sorrir de lado, como se fosse incapaz
de aceitar que eu pudesse o ter odiado por esse motivo.
Hoje sei que ele jamais seria capaz de machucar a minha
irmã.

— Vim a essa fazenda decidida a encontrar provas


para o incriminar, e, com isso, conseguir a guarda dos
meus sobrinhos. — A surpresa em seu olhar agora é
transparente. Creio que acabei de ferir o seu coração com
minhas palavras. — Porém, ao longo dos meses que
passei aqui, convivendo com todos e, principalmente, com
o senhor Cavalcante, pude entender o quão imenso é e
sempre será o seu amor pela minha irmã. Ele a ama. —
Doeu falar isso, pois sei que nunca poderemos ficar
juntos. Isso dilacera o meu coração e a minha alma. —
Hoje eu sei que Otto jamais teria machucado a Eva. Ele
não é o verdadeiro vilão dessa história, e aqui, nesta
mochila, há o diário da minha irmã por completo, que
acredito que já foi enviado para vocês por uma pessoa
anônima. — A delegada assente. — Agora quero que os
senhores ouçam essas duas gravações com atenção.

Solto primeiro a gravação da mãe de Otto e da


sobrinha, aquela que gravei aqui, nesse mesmo escritório,
onde elas confessaram ter matado a minha irmã e ainda
me ameaçaram. O choque não é tão grande, como
imaginei que seria, em Otto. Ele está encarando essa
realidade sem tensão, como se acabasse de receber uma
confirmação. Pergunto-me se ele desconfiava.

Em seguida, mostro a outra gravação, na qual Mandy


confessa tudo. Os dois delegados estão ouvindo
atentamente, assim como o fazendeiro. As provas são
verídicas e incrementam o processo.

— Mandy é a Amanda. Ela me enviou o diário da


minha irmã, se passando por um tal de Samuel. Foi por
meio dela que descobri sobre o casamento de Eva e os
filhos que ela teve. Isso foi muito antes da senhora me
procurar, delegada. Inclusive, Mandy está presa no carro
lá fora. Eu a algemei e amarrei seus pés, porque ela
tentou me matar, como vocês puderam escutar na
gravação.

Consigo respirar com mais facilidade sem todo o peso


que estava sobre mim ao longo desses meses. Acabei de
tirá-lo das minhas costas, e a sensação é de que a paz
que busco está cada vez mais perto.

— Aqui é a delegada Milena. Verifique o carro que


está estacionado em frente à mansão.

— Senhorita Rezende, levaremos as suas provas ao


tribunal. Eu lhe garanto que haverá justiça pela sua irmã.

— Isso era tudo o que eu mais desejava ouvir, senhor.


— O choro agora é de alívio e tranquilidade, por eu saber
que aquelas duas mulheres pagarão pelos seus crimes.

Minha vontade é de abraçar Otto e me sentir segura


em seus braços, mas ele não pode ser meu.

— Precisa de um médico, Maria Luíza.

— Estou bem, senhora. Por favor, não se preocupe


comigo e prenda as culpadas. Eu imploro.

— Preciso de uma ordem de prisão para a senhora


Lisandra Cavalcante e a senhorita Pietra Cavalcante — o
senhor Molina falou ao celular.

Ele deixa o recinto, certamente indo em direção à


sala. Respiro aliviada. Elas serão presas.

— Realizou um ótimo trabalho, Maria Luíza. Graças a


você, a polícia pôde chegar às verdadeiras culpadas e,
enfim, pudemos esclarecer esse caso. Você merece uma
medalha pelos seus serviços. Irei providenciar isso para o
mais breve possível.

— Minha maior medalha será ver as culpadas


pagarem pelos seus crimes.

— E elas irão — assegurou-me.

A delegada se retira em seguida. Agora restamos


apenas eu e ele. Nossos olhares se encontram e eu quero
correr para os seus braços. Otto se aproxima de mim e
coloca as mãos na cintura. Suas órbitas negras me dizem
tantas coisas. Eu o vejo muito magoado, e acredito que
não seja somente comigo.

— Eu nunca quis acreditar que minha mãe pudesse


ser a responsável pela morte da minha Eva.

— Você desconfiava?

— Sim. Eu já havia perguntado diretamente para ela


várias vezes, porém ela sempre negava.

— Agora você sabe que não é culpa sua. Nunca foi e


nunca será. — Vendo toda a sua dor deixá-lo abalado,
apoio minha mão no seu ombro. O calor do seu corpo
acelera meu coração. — A justiça será feita. Espero que
você não me odeie e possa me perdoar algum dia —
expressei todos os meus medos e inseguranças.
Otto seria capaz de esquecer que um dia desconfiei
dele?

— Odiá-la? Nem se eu quisesse, poderia. Quando


chegou à minha fazenda, notei algo especial em você. Eu
precisava saber quem era. Investiguei a fundo sobre sua
origem, e pude receber, há alguns dias, provas valiosas
sobre Maria Luíza Rezende Mendes. Eva não tinha
“Rezende” na certidão de nascimento.

— Não, ela não tinha. — Chego a rir do nosso pai,


que se esqueceu de colocar “Rezende”, e ficou apenas
Eva Mendes. Curtinho e fofo. — Você me odeia?

— Não, eu não odeio. Apesar de já saber quem era


você, esperava que, em algum momento, me revelasse.

— Eu não tinha coragem — confessei.

Meu plano não era ficar, muito menos me apaixonar


por ele. Sua revelação me causou espanto. Otto sabia
quem eu era e, mesmo assim, quis que eu ficasse ao seu
lado, não me condenou e não fez perguntas. Ele me
desejava, e era somente isso que importava.

— O que a fez pensar que eu havia matado a sua


irmã? — curioso, indagou.

— Eu a ouvi falar seu nome ao celular várias vezes


na última noite em que a vi. Ela parecia irritada e nervosa.
— Certamente, deveríamos ter discutido por algo
bobo, como sempre fazíamos.

— A sua mãe é a culpada por isso. Ela colocava


drogas nas bebidas da minha irmã e às vezes na sua. Em
pequenas quantidades não causa vício, nem dependência,
apenas altera o psicológico e pode alterar, também, o
humor. Isso acontecia muito com vocês dois.

— A minha mãe merece apodrecer na cadeia, e no


que depender de mim, ela passará o resto da sua vida lá.

— Agora a justiça será feita, e cada um de nós


poderá dormir em paz.

Suas mãos acariciam a minha face e brevemente


fecho os olhos. Posso relaxar com o seu carinho. Ele me
acalma.

Quero que fique aqui, na fazenda, comigo.

Eu me afasto dele como se tivesse levado um choque


e ele me pede para ficar ao seu lado. Meus olhos enchem
de lágrimas, meu peito se aperta e a dor me consome. Eu
não posso ficar aqui, não posso ser sua.

— Ficar?

— Passaremos por esse momento delicado juntos,


apoiando um ao outro — referiu-se ao processo que trará
muitas audiências ao júri.
— Não podemos... É melhor irmos para a sala...

— Não fuja. Não é errado o que sentimos.

— É sim — rebati.

— Quando vai deixar de ser teimosa?

— Quando vai deixar de ser insistente? Não podemos


ficar juntos. Como eu disse, tudo que aconteceu foi um
grande erro.

— Erro?

— Você não sabe o quão doloroso é saber que uma


irmã amada se prostituía para colocar comida à mesa e
para garantir que sua faculdade fosse paga. Otto, você
nasceu em berço de ouro, nunca soube o que é faltar
comida. Eva se sacrificou por mim, e eu não posso traí-la,
ficando com o homem que ela amava, por mais que meu
coração bata acelerado por você e me diga que o amo
fervorosamente. Sou incapaz de viver esse amor. Prefiro
me afogar na desilusão a qualquer outra coisa que possa
me levar a você.

— Eu amei a sua irmã com todo o meu ser e cheguei


a acreditar que nunca mais seria capaz de amar, porém
você veio para me mostrar que eu estava errado mais uma
vez. Você trouxe luz para a minha vida e paz para o meu
coração. Não posso permitir que vá embora. — Ele segura
a minha mão, levando-me para perto dele. Falta-me o ar.
— Otto, não posso. Eu já decidi. Eu vou embora.
Nunca pensei que pudesse me apaixonar por você. Eu o
odiava tanto, que esse ódio chegava a me consumir por
completo. Não estava em meus planos te amar, e mesmo o
amando incondicionalmente, não me peça para ficar.
Esses últimos meses foram muito difíceis para mim. Eu
perdi uma irmã amada e descobri muitas coisas sobre ela.
Percebi que não a conhecia de verdade, e isso me magoa
muito. Por isso, não posso ser egoísta e ficar aqui com
você. Não posso. Por favor, não torne isso mais difícil.

Em seus olhos há agonia, desespero e medo. Ele não


quer que eu vá embora, muito menos eu, no entanto não
posso ficar nesta fazenda. Preciso me reconhecer como
pessoa, como mulher e tentar esquecer tudo que
aconteceu nesses últimos meses.

— Maria, você não está roubando da sua irmã.


Infelizmente, nós dois perdemos uma pessoa que
amávamos muito, e foi doloroso. Precisamos de um tempo
para pensar e decidir o que irá acontecer entre nós dois
no futuro. Eu não posso te obrigar a ficar, mas saiba que
eu quero muito que você fique comigo. Quero que seja a
minha esposa, a minha mulher.

Seu pedido de casamento me enche de emoção e


meu coração está gritando para eu aceitar e ficar, todavia
este não é o nosso momento.

— Não posso responder agora.


— Quando puder, eu estarei aqui, te esperando.
Passe o tempo que for, eu estarei aqui. Sei que não é
errado o que sentimos um pelo outro. Amar não é errado,
não é pecado. O amor é um sentimento puro e belo, e
espero que, algum dia, você possa enxergar isso e aceitar
ser minha esposa.

Respiro fundo e o abraço carinhosamente. Sabemos


que é nossa despedida e que depois que eu passar por
aquela porta será definitivo. Não sei se conseguirei seguir
em frente, sozinha e sem o meu cowboy, entretanto
preciso desse tempo, e ele está disposto a esperar por
mim.

— Eu amo você, Maria Luíza, com todas as minhas


forças. Eu amo. — Seu coração grita dentro do seu peito.
Posso ouvi-lo. — Esse amor é tão imenso, que chega a
queimar a minha alma. Eu ardo por você desde a primeira
vez que te vi.

— Eu também o amo fervorosamente.

Uma despedida nunca foi tão dolorosa como essa. Ele


é o amor da minha vida, porém não me sinto pronta para
viver esse amor.
A sensação de ver Lisandra e Pietra algemadas,
prontas para serem levadas à delegacia, alivia toda a
minha tensão. Agora não haverá mais dias escuros e
sombrios, somente luz. As trevas não reinarão mais. A
minha irmã poderá descansar em paz, sabendo que as
megeras pagarão pelos seus crimes.

— Eu sempre achei você parecida com ela — Mariana


comentou comigo. — Vou sentir a sua falta.

— Se cuide e proteja o seu amor dele. — Sorrio ao


ver Otto nos encarar com aquele olhar lindo e único que
somente ele tem.

— Pode deixar comigo. Mas se eu fosse você, não iria


embora. O patrão vai se sentir muito sozinho. Está escrito
no semblante dele que ele a ama. Eu já desconfiava, mas
nunca disse nada. — Pisca para mim. — Boa sorte na sua
nova jornada.

— Obrigada. Se cuide. Gosto muito de você, uai.

— Uai, eu também gosto muito de você. Sabe... Você


seria a melhor patroa que esta casa já teve.

— Quem sabe algum dia eu volte para fazer uma


visita?

Despeço-me de Lucrécia, que se mostra chorosa com


essa despedida.
— Não é um “adeus”, é um “até logo” — falei.

— Esta casa necessita da sua luz.

— Todos aqui têm muita sorte de tê-la. Sem você,


esta fazenda seria uma zona e acredito que tudo estaria
fora do lugar. — Seguro em sua mão. — Cuide deles para
mim. Vou sentir saudade dos meus pequenos.

— Otto me incumbiu pessoalmente a levá-los à cidade


para a visitar durante o período em que a senhorita
precisar passar lá.

Olho mais uma vez para ele, que está lindo com um
chapéu de cowboy. Otto sempre será o meu fazendeiro
querido. Há tanto amor dentro de mim, que não me
contento em ir sem lhe dar mais um abraço. Pela primeira
vez o abraço na frente de todos. O calor do seu corpo
sobre o meu faz eu me sentir única e especial. Não serei
capaz de viver muito tempo sem o seu amor.

Aquele velho ditado que diz que ódio e amor


caminham lado a lado é verídico. O ódio pode se tornar
amor, um sentimento perigoso e intenso, além de
assustador para quem o está descobrindo. Minha chegada
à fazenda causou um grande alvoroço até em mim. Só de
pensar que eu o odiava e que naquela festa da colheita
quis matá-lo, agora rio por dentro.
— Não pense que eu vou me esquecer de você — ele
confessou.

— Muito menos eu de você.

— Por favor, se cuide e me ligue se precisar de


alguma coisa. Eu lhe darei espaço e privacidade, mas
saiba que estarei esperando ansiosamente por uma
ligação sua, minha menina linda.

Sorrio pela maneira carinhosa como ele falou comigo.

— Você também, se cuide.

— E não se esqueça de proteger o meu coração. Ele


está em suas mãos. Te entreguei e quero que o proteja
com o seu amor.

— Você também, proteja o meu. Está em suas mãos.


Até logo, meu cowboy sexy. — Pisco para ele e posso ver
o quanto ele precisa se controlar para não vir atrás de
mim.

A delegada Milena me levará até a cidade. Logo


estarei em Belo Horizonte, onde tenho muitas coisas para
resolver e colocar em ordem, a começar pelas denúncias
que cairão sobre o marido da minha tia. Possuo detalhes
dos seus abusos cometidos contra a minha irmã, de todas
as suas tentativas. Precisarei estar ao lado da minha tia
neste momento.
Vou para a cidade, só que deixo meu coração na
fazenda.
Agora não há mais dúvidas, nem desconfianças.
Minha mãe teve envolvimento na morte da minha esposa.
Lamentável. Lisandra é a mulher que me deu a vida, mas
nunca foi uma mãe amorosa. O carinho materno, eu
conheci através de Lucrécia, quando ela era a minha
babá. A minha mãe nunca trocou uma fralda minha, nem
da minha irmã; nunca foi presente e sempre se preocupou
apenas em zelar pelo nome da nossa prestigiada família,
evitando que escândalos colocassem os Cavalcante na
lama. Esse sempre foi o seu maior objetivo, tanto que
nunca esteve presente quando eu e Érika mais
precisávamos. Era o nosso pai quem fazia esse papel. Ele
sempre foi presente, enquanto Lisandra preferia viajar e
gastar com compras e joias em vez de estar na fazenda
com os filhos.

Jamais serei capaz de perdoar essa mulher. Ela não


merece nada além de desprezo. O que eu puder fazer para
a deixar atrás das grades, farei.

Para uma criança, crescer sem o carinho materno


pode se tornar um trauma, porém minha irmã, Érika,
ajudou-me a suprir toda essa carência. Quando perdemos
nosso pai, senti-me sem chão. Meu porto seguro havia
partido para sempre, o meu melhor amigo. Meu pai e eu
sempre fomos parceiros. Aprendi tudo que sei com ele. A
vida no campo sempre foi tranquila e nunca fui fã da
cidade grande. Prefiro estar em contato com a natureza,
continuar com o seu legado, montar no meu cavalo ao
entardecer do sol e apostar uma corrida com o vento.
Minha vida se resume a trabalho e, raramente, à diversão.

Conheci Eva em viagens à cidade que eu fazia para


resolver assuntos da fazenda. Sempre fui um homem
conquistador, namorador. A farra me acompanhava desde
a época da faculdade, quando cursei administração.
Encontrei na farra, na bebida e na pegação uma maneira
de aliviar a minha dor. Com o passar dos anos, fui
envelhecendo dentro dessa fazenda, e Eva foi a
esperança na minha vida. A sua partida me trouxe
desespero e aflição, que foram preenchidos com a
chegada da minha Malu.

Duas irmãs, cada uma com a sua essência e com uma


maneira única de ser. Personalidades distintas. Enquanto
Eva era explosiva e alegre, Malu é mais calada e
carinhosa. Quando eu soube que ambas eram irmãs, tentei
imaginar o que tinha feito Malu vir aqui, afinal de contas,
ela é a minha ex-cunhada e tia dos meus filhos. Sempre
consegui enxergar uma dor profunda na minha Maria, mas
nunca pensei que pudesse ser a irmã que minha esposa
nunca me revelou ter. Eva sempre disse que era sozinha,
que não tinha ninguém da família. Nós nos envolvemos
rápido. Tudo entre nós dois aconteceu muito depressa: a
paixão ardente, o casamento, a gravidez... Em algum
momento, ela me contaria sobre Maria Luíza? Vejo que
tinham tantas coisas sobre minha falecida esposa que eu
não fazia ideia de que existiam.

A investigação serviu para me deixar em alerta.


Nunca quis desconfiar de Malu, muito menos depois que
ela salvou a vida do meu filho. Eu lhe devia bastante
agradecimento e necessitava de uma pessoa competente
trabalhando na minha fazenda. Mas eu pensava: “Por que
ela nunca me disse quem era?”, “Qual é a sua real
intenção?”, “Se ela tivesse boas intenções, teria se
apresentado e dito quem realmente era”. Agora sei que
estou indo para a cama com a irmã da minha falecida
esposa. Eu deveria sentir remorso ou algo parecido,
porém, quando nós dois estamos juntos, sinto-me refém
dos seus beijos e carícias modestas. Meu coração chega a
errar as batidas. E isso nunca aconteceu antes, nem
mesmo com Eva.

Malu faz eu me sentir diferente. Ela consegue


arrancar o meu mau humor com um sorriso maroto, é
manhosa, inocente e somente minha. Confesso que
quando eu soube que ela tinha um suposto namorado, quis
matar o cara sem nem o conhecer. E agora, que ela é
minha, não posso permitir que vá embora. Ter sido o seu
primeiro me faz querer ser o único por toda a vida. E
mesmo se ela já tivesse pertencido a outros homens, não
me importaria. A nossa história começou quando ela
colocou os pés na minha fazenda.

Eu lutei contra esses sentimentos. Não queria voltar a


amar e me decepcionar mais uma vez. A vida foi cruel
comigo, tirando-me a mulher que eu tanto amava. Todavia,
quando acreditei que não amaria novamente, pude ter
certeza de que me enganei, caí do cavalo e bati a cabeça.
Maria Luíza veio para me mostrar que não posso ficar
preso ao passado, que não posso me apegar ao que nunca
mais será meu.
Agora ela acredita que o nosso amor é errado e
proibido. Nunca é errado amar uma pessoa,
principalmente quando as duas são descomprometidas,
livres. Não há nada que nos impeça de ficar juntos, mas
somente ela poderá dizer se deseja permanecer comigo.
Não posso perdê-la, só que também não posso forçá-la a
ficar. Minha vontade é de prendê-la em uma torre e nunca
mais deixá-la sair, no entanto não posso fazer isso. Vê-la
indo embora me causa um enorme desespero.

Meu olhar de desaprovação não a intimida. Ela sabe


que me tem nas mãos, sabe que é a dona do meu coração
e que pode fazer o que quiser com ele.

Quando Malu me dizia que era errado ficarmos juntos,


eu acreditava que ela era apaixonada pelo babaca do seu
ex-namorado e queria matar o infeliz. Minha doce menina
me embriagou com o seu perfume de baunilha, seu cheiro
suave, sua pele macia, cabelos lisos e olhos azul-claros
como duas lagoas de águas cristalinas, que me levam
para outra dimensão. Eu não seria capaz de viver sem
essa mulher.

Otto Cavalcante nunca se dá por vencido. Sou capaz


de viver o resto da minha vida lutando pelo seu amor.
Acredito que ela necessita de um tempo sozinha para
pensar e decidir que eu sou o melhor para a sua vida, que
nosso amor não é errado.
Vê-la entrar naquele carro e partir para a cidade me
despedaça.

Maria precisa entender que o nosso amor nunca será


errado. Eu respeitei a sua irmã durante o nosso
casamento, fui fiel, nunca a traí. Eu a perdi para uma
armação da minha mãe e da minha prima, sofri com a sua
partida, derramei algumas lágrimas e me fechei para o
mundo, porém superei e me reergui. Eu tenho certeza de
que Eva torce por mim. Ela sempre me apoiava. De
alguma forma, sinto que ela está torcendo por nós dois.

Na primeira semana depois da sua partida, o vazio


tomou conta da fazenda. Todas as noites passo no quarto
dos meus filhos, que estão mais inquietos depois que ela
partiu. Eles sentem a falta dela.

— Até os gêmeos estão sentindo a falta dela —


Lucrécia também percebeu.

— Todos estamos. — Acaricio a face da minha


pequena Alícia.

— O que está esperando para ir buscá-la?

— Faz uma semana que Malu foi embora. Não posso


ir atrás dela. Não agora.
— Pode sim. Eu sei que ela sente sua falta, assim
como você sente a dela.

— Sim, eu sinto, mas ela me pediu um tempo. Não


posso ir atrás dela e a sufocar.

— Você tem razão. Neste momento, ela deve estar


pensando se deve ou não amar você. Para uma mocinha
da sua idade, muitas coisas parecem ser confusas
quando, na verdade, são tão simples.

Maria Luíza é uma mulher madura, mesmo com a


pouca idade, que talvez possa assustá-la. De fato, sou
mais velho dezoito anos que ela, que é apenas uma
menina com sonhos pela frente. Não quero prendê-la
nesta fazenda, desejo apoiar os seus sonhos e a
incentivar a viajar e a crescer cada vez mais
profissionalmente.

Primeiro ela me conquistou com a comida. Rio ao


pensar que eu fazia questão de irritar a minha master
chef, dizendo que as refeições precisavam de mais sal.
Ela fazia tudo divinamente, o único problema era a minha
implicância sem fundamentos. Eu me divertia ao ouvi-la
surtar na cozinha. Eu sempre a observava e me
perguntava o que uma moça da cidade poderia estar
querendo na minha fazenda. Havia muitas chances
profissionais para ela na cidade, então eu não entendia o
que a teria feito vir para o campo. Descobrir isso era a
minha maior meta, e quando a verdade veio, já era tarde
demais, porque eu me via completamente viciado no seu
cheiro, no calor do seu corpo pequeno e nos seus beijos
molhados e quentes. Ela é minha, e nada poderá mudar
isso, nem mesmo o tempo, que acredito que seja o nosso
maior inimigo.

Firmei um acordo com Lucrécia. Ela levará as


crianças para visitar a tia uma vez por mês.

Vários sentimentos me dominam: insegurança, medo


de perdê-la e medo de que ela possa reconsiderar voltar
para o ex-namorado, por não aceitar que nosso amor é
correto. Gostaria de poder vê-la através de uma bola de
cristal e, assim, admirá-la durante todo o dia. A saudade
seria menor e meu coração se alegraria ao ouvir sua voz.
Durante as noites sozinho, preciso desligar meu celular
para não ligar para ela e implorar pelo seu amor.

A vida na fazenda exige muito do meu tempo.


Somente assim para eu conseguir sobreviver longe da
minha bonequinha. A presença dos meus filhos também
me ajuda bastante ao longo dessa caminhada.

Aguardo por Lucrécia e pelos meus pequenos, que


acabaram de chegar da cidade. Eles passaram dois dias
com a tia e estão sonolentos por causa da viagem. Ao vê-
los saindo do carro, tenho a leve esperança de ela descer,
mas logo percebo que vieram somente os três.

— Você precisa ver como ela está bonita. As luzes


que ela fez a deixaram com um aspecto de mais madura.
Ela está mudada.

Todas as vezes que Lucrécia volta da cidade, traz


fotos e novidades da minha Malu. Ela retornou para a
faculdade e continuará no último semestre que havia
trancado antes de vir para a fazenda.

— Ela tem planos de abrir um restaurante. Será um


sucesso. A comida dela é divina.

— Acabei de ter uma ideia.

Com o fim da colheita e o final do ano se


aproximando, um novo início chegará. Precisei contratar
mais peões. Nesse ano que virá, aumentaremos a
plantação de milho e café, e eu investirei o dobro do que
foi investido ano passado. Consigo acompanhar o serviço
de perto e focar nos meus outros investimentos na cidade.

Cinco meses depois da prisão da minha mãe e da


minha prima, elas estão em julgamento. Minha presença
foi solicitada para uma intimação. A de Maria Luíza
também. Ela está tão próxima a mim e trocamos alguns
olhares durante a audiência. Ela foi chamada a depor por
ter conseguido as provas que ajudaram a solucionar esse
mistério.

A sentença é dada: as duas são condenadas a trinta e


oito anos de prisão em regime fechado. Elas serão
enviadas para uma penitenciária de mulheres. Enquanto o
peão que foi cúmplice e Mandy, por saber de tudo e não
ter falado com a polícia, são condenados a quinze anos de
prisão. A justiça, enfim, foi feita.

— Irmão, pode respirar aliviado agora. A querida Eva


poderá descansar em paz.

Minha mãe me roubou a minha felicidade e dias


memoráveis que eu teria ao lado da minha esposa. Por
causa do seu preconceito e mesquinhez, ela me quitou um
amor, a felicidade ao lado da mulher que eu amava. Meus
filhos nunca terão boas lembranças da mãe por causa de
Lisandra, por causa da avó. Nunca farei questão de falar
dela para eles. Algum dia eles vão crescer e descobrir o
que aconteceu.

— Maria Luíza passou todo o julgamento chorando.


Venha comigo. Vamos conversar com ela — Érika pediu.

— É melhor você ir. Ela pode não querer conversar


comigo.
— Claro que ela quer. Deixe de ser mulher.

— Tá bão, eu vou. Mas não me cause


constrangimento na frente dela.

— Uai, irmãozinho, você me ofende assim. — Sorri.

Maria está acompanhada por uma senhora muito


bonita e por um homem que creio que seja o marido dela.
A maneira como ele olha para a minha menina me causa
asco e me faz duvidar de algumas coisas.

Vê-la novamente depois de cinco meses faz eu me


sentir revigorado. Meu coração acelera diante da linda
mulher com cabelos curtos e um sorriso tímido ao me
olhar de relance. Ela e a minha irmã se abraçam. Érika me
contou que visitou Malu duas vezes no mês passado. Ela
me disse o quanto Maria Luíza estava encantada com o
meu sobrinho, que nasceu há três meses.

— Oi, cunha... Digo, futura madrinha do meu filho.

— Oi, Érika.

Minha irmã cumprimenta as pessoas que acredito


serem os tios de Malu.

Nossos olhares se cruzam e eu sinto vontade de


abraçá-la.
— Otto, como vai? — Ela enfia as mãos nos bolsos da
calça jeans escura.

— Bem. E você, Maria?

— Bem também.

Nossos olhares gritam e imploram por um abraço.


Nossos corpos querem sentir o calor ardente um do outro.
Mas não é possível no momento. Ela está receosa, e eu
também.

— Maria Luíza, pode vir comigo um instante? — O


advogado que a acompanha, para a sua segurança, leva-a
para longe de mim.

Vê-la só me deixou com mais saudade.

— Otto, essa é a tia da Maria e o marido dela.

— É um prazer conhecê-lo. Minha Malu fala muito de


você — a mulher comentou, acendendo a alegria no meu
coração.

— É um prazer, senhora.

A tia é muito educada e gentil, diferentemente do


homem que é o seu marido. Algo nele me diz que seu
caráter é questionável.
Lendo o diário de Eva, pude entender mais sobre
Paulo, um homem manipulador, que vivia dando em cima
dela e tentou, diversas vezes, abusar das meninas.
Naquela mesma tarde, no dia da audiência, eu conversei
com o juiz do caso, um amigo de longa data. Uma
denúncia será aberta contra Paulo, que pagará por tudo
que tentou contra as duas. Primeiro o caso do assassinato
deverá ser encerrado, e com a audiência final, ele pagará
pelas vezes que assediou Eva e Malu. Será preso.

Tudo está caminhando para o nosso final feliz. Dentro


de alguns meses, Maria se formará e dará início à
realização de um sonho, e eu estarei lá para a aplaudir na
primeira fila.
Caminho a passos largos pelo corredor. Hoje é o
último dia de aula, e dentro de algumas semanas será a
minha tão sonhada festa de formatura. A ansiedade me
domina. Uai! Estou muito feliz e animada.

Eu não esperava encontrar Rafael, que me espera


próximo à minha sala. Aqui está ele mais uma vez,
insistindo para conversarmos. Eu lhe disse várias vezes,
seja pessoalmente ou por mensagem, que não desejo
retornar o nosso namoro.

— Malu, tem um minuto?

— Agora não. A minha última aula começa em dez


minutos.

— Sempre fugindo de mim. Por que me evita? Pensei


que me amasse, mas só foi ir para aquela fazenda no fim
do mundo, para se esquecer de mim. Me diga: você o ama
por ele ter muito dinheiro?

Ofende-me ouvir isso dos seus lábios, dos quais


antes só saía carinho. De alguma forma, ele ficou sabendo
do meu envolvimento com Otto. Eu desabafei com a minha
tia algumas vezes e tive a impressão de que Paulo ouviu.
Ele, certamente, contou ao Rafael, e agora ele acredita
que não o amo por causa da fortuna do cowboy.

— Chega, Rafael! Eu não vou mais tolerar


insinuações. Você não sabe exatamente nada do que
aconteceu comigo nesses meses em que ficamos sem nos
ver.

— Eu nunca pensei que fosse perder você para


sempre. Malu, aquele cara foi marido da sua irmã. Vocês
dois não podem ficar juntos.

A todo momento alguém me lembra isso. Chega a ser


sufocante.
— Eu vou para a minha aula, e quando eu sair, não
quero que venha atrás de mim. O que havia entre nós
acabou para sempre. — Entro na sala.

A aula será sobre despedida, nada que prenda o meu


foco. Rafael ainda permanece por alguns minutos me
observando da porta e depois vai embora, para o meu
alívio. Fui obrigada a trocar de número por causa da sua
insistência doentia. Como pude ter me apaixonado por um
cara tão idiota como ele? É ciumento e nunca fala nada
coerente. Foi absurda a maneira como ele me acusou.
Está crente de que sou uma oportunista que busca uma
fortuna. Se isso fosse verdade, eu não estaria me matando
para me formar e, futuramente, abrir um restaurante.
Estou recebendo bastantes incentivos, principalmente da
parte da minha tia e de Lucrécia, que é uma grande amiga.
Sempre que a vejo, uma vez por mês, ela me traz os
gêmeos e eu posso passar dois dias com eles. Otto é
muito generoso por permitir isso. Todas as vezes que eles
vêm me ver, imagino que o pai deles pode ter vindo, mas
sempre me decepciono. E a culpa é minha. Eu pedi esse
tempo, e ele está respeitando.

Érika tem se tornado uma grande amiga. Ela vive a


me chamar de cunhada e sempre me liga para
conversarmos. Eu conheci o seu bebê, um príncipe
encantado e charmoso que roubou o meu coração.
Ando com a cabeça cheia, só que também estou com
um visual novo. Eu precisava me libertar daquele meu
estilo conservador. Sempre quis ter um corte de cabelo
curto, porém toda vez que ia até o salão, sentia-me
insegura.

Morei no meu antigo apartamento por cinco meses,


até Paulo ser preso e, novamente, eu ser intimada para
depor contra ele. A polícia recebeu o diário de Eva, no
qual ela escreveu sobre as tentativas de abusos sofridas,
e eu era a única que poderia testemunhar. Mesmo que
isso destruísse o coração da minha tia, fez-se necessário.
Todos, sem exceção, devem pagar pelos seus crimes.

Recordo-me da conversa que tive com ela no dia em


que o marido foi preso.

— Querida, por que nunca me contou? — como ela


havia chorado, sua voz saiu embargada.

Vejo o quanto ela sofre, pela sua expressão


melancólica.

— Eu nunca tive coragem de falar nada. — Sento-me


ao seu lado, na cama.

Ela segura o álbum de casamento em mãos.


— Eu juro por Deus que nunca percebi nada. Na
minha frente, ele sempre se mostrava um bom marido.

Na maioria das vezes é assim: o abusador se


encontra dentro de casa e sempre transparece ser alguém
do bem, que não deseja fazer mal a um inseto, o que dirá
a crianças indefesas.

— Acredito na senhora.

— Deus não me abençoou com filhos por alguma


razão, e agora posso entender por quê — lamentou. — Eu
o teria deixado há mais tempo se soubesse o tipo de
homem que ele era.

— Tia... — Abraço-a. — Eu sempre vou estar aqui


para cuidar da senhora. Sabe que és como uma mãe para
mim.

— E você é a filha que sempre pedi a Deus. As


minhas queridas sobrinhas, eu sempre amei como minhas.

— Nós também sempre amamos a senhora.

Minha tia precisa de consolo.

Posso respirar aliviada, pois ela jurou nunca mais


procurar Paulo. E no que depender dela, ela irá depor
contra ele no julgamento. A minha tia é compreensível e
gentil, ficou do lado certo. Nem sempre as coisas
acontecem assim, porque muitas mulheres apoiam o
marido, não o denunciando.

Por esse motivo, sempre aconselho: denuncie seus


agressores e ajude a não traumatizar uma criança.

A ideia de abrir um restaurante me anima, ser a chefe


do meu próprio estabelecimento é sensacional. Porém, sei
que é um investimento alto, e eu não tenho crédito o
suficiente para isso, nem mesmo depois de ter recebido
algumas joias que minha irmã deixou em um cofre para
mim. Acredito que Alícia as mereça mais do que eu, por
ser sua filha. Eu as darei no momento certo.

Meu coração se enche de saudade dos meus dois


anjinhos. Aqueles sapecas já estão falando frases
curtinhas e Alícia caminha sem muita dificuldade. Lohan
ainda não consegue acompanhar o ritmo dela. Os gêmeos
são os amores da minha vida. Os dois dias que sempre
passo com eles, aproveito para os mimar bastante. A
mesma coisa que minha tia faz. Eu passei a morar com ela
depois que Paulo foi preso.

Estamos pensando em vender a casa. A ideia foi dela.


Eu só não imaginava que ela quisesse me dar todo o
dinheiro para abrir o meu negócio.
— Eu não posso aceitar.

— Claro que pode. É seu, meu amor. Com esse


dinheiro, poderá começar alguma coisa.

Olho o cheque em suas mãos. Trezentos mil reais por


uma casa modesta como esta? Chego a suspeitar de que
seja falso.

— Tia, como a senhora conseguiu tudo isso, sendo


que a casa não vale nem a metade?

— Tive sorte, meu amor. Um empresário deseja


construir apartamentos neste terreno. Ele praticamente
implorou para que eu o vendesse.

— Muita sorte mesmo. Mas eu não posso aceitar.

— Claro que pode. — Lucrécia se tornou amiga da


minha tia, vindo sempre trazer os gêmeos para nos visitar.
— A melhor notícia vem agora. Conte para ela.

Minha tia abre um sorriso singelo.

— Meu amor, eu consegui um empréstimo com o


banco. Na verdade, eu e Lucrécia conseguimos. Você
poderá abrir o seu restaurante.

— Sério? Meu Deus! Como vocês...? — As minhas


emoções fazem eu me desmanchar em lágrimas e as duas
vêm me abraçar. — Vocês fizeram isso por mim?
— Você merece, criança — Lucrécia disse.

— Com os lucros do restaurante, você poderá pagar o


banco. Eu tenho certeza de que fará muito sucesso.

Ainda me encontro bastante emocionada. Elas são


maravilhosas. Posso estudar e constato que a proposta de
negócio oferecida pelo banco me enche de esperanças.
Dentro de alguns meses poderei abrir o meu restaurante,
como sempre sonhei. Comemoro essa vitória. Devo tudo a
elas, minhas mais novas sócias.

Chegou o dia da minha formatura. Subo ao palco para


receber meu diploma quando o meu nome é anunciado.
Concluir a faculdade de gastronomia era o meu grande
sonho, e da minha irmã também. Como representante de
turma, cabe a mim fazer um discurso para todas as mais
de trezentas pessoas presentes. Respiro fundo antes de
falar.

— Boa noite a todos. Eu me chamo Maria Luíza


Rezende, tenho vinte e dois anos e posso dizer que acabei
de realizar o meu grande sonho, mas creio que todos já
devem saber disso — falei com um pouco de humor,
fazendo todos rirem. — Eu costumo dizer que não sou boa
com palavras, mas como ninguém mais se propôs a fazer
esse discurso, eu não pude recusar quando a professora
Letícia me pediu para falar hoje. — Olho para a professora
e sorrio. — A senhora sabe que sou tímida e, mesmo
assim, me propôs a discursar, porque confia em mim e na
minha capacidade. Então, quem sou eu para duvidar? —
Ela me aplaude. — Falar sobre o curso exige muitas
horas, porém nós estamos loucos para jogar nossos
chapéus, tirar fotos com nossas famílias e, claro, comer e
beber nesta noite como se não houvesse amanhã. —
Alguns alunos gritam. É divertido. — Como representante
de turma, só tenho a dizer uma coisa: se você tem um
sonho, nunca desista. Se mil te disserem que você não é
capaz, ignore todos, pois eles são tolos que não acreditam
nem em si mesmos, o que dirá nas outras pessoas. A luta
não é fácil, costuma ser árdua, e haverá muitas
tempestades em nossos caminhos. No entanto, saibam
que sempre haverá um arco-íris no fim do túnel. E não há
maior gratificação do que estar segurando seu diploma em
mãos e poder dizer: eu sou capaz. Não é somente sobre
vencer, mas também sobre aprender a nunca duvidar da
nossa capacidade. Obrigada e boa noite.

Todos aplaudem fervorosamente. Assobios e gritos


agora estão fora de controle.

Olhar para baixo daqui de cima e saber que venci é


maravilhoso. Nada poderia roubar a minha paz, a minha
alegria. Eu sei que serei capaz de realizar todos os meus
sonhos.
— Parabéns, meu amor. — Minha tia me abraça
carinhosamente, enchendo-me de beijos. Ela me trouxe
flores. — Você foi incrível.

Tenho uma grande surpresa ao ver que Mariana e


Marcos estão aqui para me felicitar. Lucrécia também veio,
e isso me anima bastante. Recebi tantas flores, que não
consigo segurá-las.

— Muito obrigada a todos vocês que vieram. Estou


muito feliz.

— Jamais perderia a formatura da minha madrinha de


casamento — Mari disse, animada.

— Madrinha? Vocês vão se casar? — Estou animada.


Demonstro, com um sorriso largo, o quanto essa notícia
me deixou feliz.

— Sim, vamos nos casar.

Lembro-me do medo que eles tinham de assumir o


relacionamento e perder seus empregos. Será que eles
foram demitidos?

— Vocês saíram da fazenda? Pediram demissão? Ou


Otto descobriu vocês? — Eles se olham, rindo de mim. —
Eu falei algo errado?

— Vocês não querem me ajudar a guardar as flores?


— minha tia perguntou.
— Claro que sim, tia. Agora. — Mari disse, animada.

Marcos a ajuda a pegar as flores e todos me dão as


costas, deixando-me sozinha, sem entender nada.

— Ué. Para onde todo mundo foi? Diacho!

Meu vestido lilás, longo e soltinho na cintura me deixa


com bastante calor, principalmente por estar neste salão
sem nenhum ar-condicionado. Preciso tomar um ar fresco.
Como recebi cinco ingressos para chamar a minha família,
todos têm entrada garantida na festa.

Posso sentir seu perfume amadeirado ao fechar os


olhos. A sua presença vibrante está atrás de mim.

Ele veio!

Meu coração palpita e, ao me virar para o ver, um


sorriso largo brota em meus lábios. Ele também sorri. O
cowboy cortou os cabelos de um jeito mais moderno, e a
barba rala o deixou com o ar mais jovial.

— Espero que aceite minhas flores.

O buquê de orquídeas é lindo. Seguro-o e sinto o


aroma delas. Estou encantada com o seu novo visual.

— São lindas, eu amei. Obrigada.

— Você é a flor mais bonita e perfumada de todas. —


Seu elogio me desconcerta por inteiro e minhas pernas
chegam a bambear.

Posso ver o quanto ele está mais leve. Não há mais


frieza em seu olhar, nem tensão em seus ombros. Isso
aconteceu com nós dois depois do julgamento. Foi a
última vez que o vi. Em todas as noites penso na gente se
amando, vivendo uma paixão ardente e avassaladora.

— Veio para a festa?

— Esta noite é sua. Aproveite com a sua família e


amigos. Vim somente para a parabenizar por hoje. Seu
discurso foi incrível. Também soube que irá abrir um
restaurante. Estou ansioso para saber se serei convidado
para a inauguração.

— Ficarei muito feliz se puder ir. Eu sei que é um


homem ocupado.

— Sempre tenho tempo para você. Pode contar com a


minha presença.

— Trouxe os gêmeos com você?

— Sim. Pode passar o dia com eles amanhã, se


quiser.

— Quero sim — respondi, entusiasmada.

— Eu soube que será madrinha de casamento.

— Você não os demitiu?


— Serei o padrinho, se você aceitar ser a madrinha.

— Eu já aceitei. Você fez o certo em não os despedir.


Eles são um casal apaixonado.

— Apesar de eles terem escondido o romance,


passando por cima das minhas regras, não os julguei. Eu
sei que quando se está apaixonado, somos capazes de
tudo pela nossa amada.

— Tem certeza de que não quer participar da festa?


Ainda tenho mais um convite.

— Acha mesmo que eu tenho idade para festas?

— Acho sim. — Dou de ombros.

Pego um ingresso na minha bolsa e o entrego.

— Caso deseje entrar mais tarde...

Antes de eu entrar no salão onde será a festa, Otto


beija a minha bochecha e me dá um abraço apertado.
Sentimentos foram despertados. O cowboy causou um
alvoroço em mim.
Nem a música eletrônica é capaz de me fazer
esquecer que ele estava lá fora. Ele pode já ter ido
embora, porém meu coração diz que ainda está lá. A todo
momento meus olhos vão de encontro à porta. Fico
esperando que Otto entre e me chame para a dançar. A
cada nova pessoa que entra, uma frustração diferente me
invade. É isso que dá ser tão orgulhosa, a ponto de não
aceitar que nascemos para ficar juntos. Todos sempre me
dizem para não perder essa chance que a vida está me
dando para o amor.

Otto me ama, e eu sei disso. A maior prova de amor


que ele me dá é respeitar o meu tempo e não me
pressionar para ficarmos juntos. Ele não me força em
absolutamente nada, e eu amo isso nele.

— Esperando alguém, minha querida?

— Sim... Não. Quem eu poderia estar esperando, tia?

— O homem da sua vida. Não acredito que vai


permitir que ele volte para a fazenda sem que vocês dois
se acertem de uma vez.

— Tia, eu...

— Vejo que você não conhecia mesmo a sua irmã.

— Por que diz isso?

— Porque eu sei que ela está torcendo por você onde


quer que esteja, e ninguém mais poderia ficar mais feliz
do que ela, vendo você se formar, prestes a abrir seu
negócio e tendo a chance de ser feliz ao lado do homem
que ama. — Ela segura a minha mão, lançando-me mais
um choque de realidade. — É o seguinte, mocinha: ou
você fica com esse homem de uma vez por todas ou pode
se preparar para o perder, pois um homem bonito daquele
não costuma esperar a vida toda por uma resposta. Eu te
conheço desde sempre, querida. Sei que o ama.

— Tia, não é tão fácil assim. A senhora não gosta de


morar comigo? — fingi estar magoada.

— Eu não gosto de vê-la triste e aérea, pensando


nele. Por mim, você moraria para sempre comigo, mas a
sua tia um dia também irá encontrar uma pessoa para
amar. E você precisa deixar de ser uma solteirona e se
jogar para os braços malhados do cowboy sexy. Eu bebi,
querida. — Eu já sabia. Nós duas rimos. — Não há
ninguém melhor do que eu para saber que você está louca
para correr para os seus braços. Então, vá de uma vez,
antes que eu lhe dê umas palmadas. Como é que vocês,
jovens, dizem mesmo? Lembrei. Veste um cropped,
menina, e reage.

Não tem como não rir com ela.

— A senhora não teria coragem — brinquei. —


Acredito que o diretor está de olho na senhora, e a
senhora nele. — Percebi isso desde a hora do meu
discurso.

— Você me respeite, menina. Eu limpei a sua bunda


muitas vezes.

O diretor se aproxima e a chama para dançar. Em um


primeiro momento, ela fica surpresa, mas se permite ser
feliz. Ela merece essa felicidade e um pouco de paz.
Desde que Paulo foi preso, eu nunca a vi sorrir tanto como
agora, ao vê-la dançar com esse homem. Eles combinam.
Eu gostaria de a ver feliz com alguém que realmente a
ama intensamente, da maneira como ela sempre deveria
ter sido amada.

Fico mais alguns minutos pensativa. Ela tem razão:


eu preciso reagir e ir atrás do homem que amo. Todos
esses meses longe dele só fizeram meu amor crescer cada
vez mais. Jurei que o esqueceria, só que não pude,
porque não é errado. Nunca foi errado. Errado é não
ficarmos mais juntos.

Estou pronta para sair do salão e ligar para ele caso


não esteja mais aqui fora, quando uma moça me entrega
um bilhete. Isso é a cara dele. Uma vez Otto me disse que
costuma enviar bilhetes para a mulher amada. Acho muito
romântico.

“Me encontre no estacionamento. Te espero lá.

Otto.”

Abro um sorriso largo e vejo Marcos e Mariana


dançarem sem saber como se faz. Vendo-os assim, sem
se importar com mais nada além dos seus sorrisos, tenho
certeza de que quero amar e ser amada. Isso é tudo o que
mais desejo. Demorei tempo demais para aceitar.

O estacionamento está cheio de carros e a luz não é


tão boa quanto em outros locais. O segurança também não
está por aqui. O que é estranho, pois ele sempre fica
fazendo uma ronda. Está um pouco frio e estou sem
casaco. Caminho com cuidado para não tropeçar e cair
devido aos saltos altos que estou usando. Procuro por
Otto. Meu coração acelera a cada passo dado. Quero
gritar que o amo, entretanto ele está bem escondido.
Certamente, está brincando comigo. Eu me lembrarei de
lhe dar uns tapas depois que o beijar.

Assusto-me facilmente e teria gritado se não tivesse


ouvido seus passos atrás de mim.

— Vim o mais rápido que pude... — Meu sorriso


desaparece quando vejo Rafael atrás de mim.

Mais uma vez, ele veio me importunar. Já não


aguento mais toda a sua insistência.

— Parabéns, Maria Luíza. Você conseguiu se formar.


— Ele me trouxe flores.

— Obrigada. — Seguro o buquê em minhas mãos.


São rosas vermelhas, que devem ter custado caro para
ele. — São lindas, mas não precisava ter comprado.
— Acha que eu não tenho dinheiro para flores? Até
nisso você me subestima.

— Não estou subestimando, apenas disse que não


precisava me trazer flores, pois você nunca me deu, nem
quando namorávamos.

— Foi um erro meu — assumiu. — Toda mulher


merece ganhar flores. — Essa foi a coisa mais racional
que ele já disse.

O smoking preto mostra o quanto ele está elegante.


Seus olhos azuis me dizem tantas coisas: há remorso,
descontentamento e ódio.

— Hoje eu vi vocês dois juntos, e a minha ficha caiu


quando percebi a maneira carinhosa e apaixonada como
você o olhava.

Ele me viu com Otto. Eu devia estar tão deslumbrada,


que não notei.

— Eu escrevi esse bilhete. Sabia que você viria


correndo se pensasse que foi dele.

Demonstro frustração por ele ter me revelado isso. Eu


estava tão emocionada, que não reparei que não era a
letra de Otto.

— O que você deseja, Rafael? Por que me chamou


para conversarmos?
Não quero perder a paciência com ele, contudo não
vou tolerar mais ofensas de sua parte. Estou pronta para
rebater, se necessário.

— Queria dizer pessoalmente que não vou mais te


incomodar. Nunca mais. — Ele está suando frio e parece
pálido.

— Verdade? — Duvido.

— Verdade. Eu vim me desculpar por ter insistido


todo esse tempo em vão. Eu nunca quis assustar você, e
jamais seria capaz de machucá-la. Não sou desses caras
que fazem ameaças. Se você não me quer como o seu
homem, não posso obrigá-la a ser minha.

— Não pode mesmo. Ninguém pode mandar no


coração do outro.

— Eu enlouqueci quando você foi embora para aquela


fazenda. Se eu soubesse onde estava, teria ido te buscar.
Mas hoje sei que você não teria vindo.

— É, eu não teria.

— Eu perdi o juízo quando soube que você estava


com outro, com o fazendeiro estúpido.

— Ele não é estúpido — defendi Otto.

Rafael ri.
— Você o ama mesmo — constatou. — A maneira
como você o olhava era de uma mulher apaixonada.

— Tem razão, eu o amo. — Minha confirmação não o


abala mais do que ele já demonstrava estar abalado.

Minha intenção nunca foi partir o seu coração, porém


sabemos que não nascemos para ficar juntos. Nosso
namoro foi inocente e não durou muito tempo. Nunca
passamos de beijos e abraços. Eu sentia que ele não era
o cara. E se em algum momento pensei que o amava,
enganei-me.

— Se você ama outro, desejo que vocês dois possam


ser felizes.

Ele parece ter sido sincero em suas palavras. Dá para


ver o quanto ainda gosta de mim, mas sabe que não pode
ser correspondido.

— Eu também desejo que você seja muito feliz.

— Lamento por ter perdido você. Otto é um homem de


sorte. Peço perdão se a ofendi com minha insistência.

— Eu perdoo você. E tenho certeza de que algum dia


será feliz ao lado de uma mulher que te ame com a mesma
intensidade que você a ame.

— Realmente me perdoou?
— Sim. Eu quero que você seja feliz e encontre a
pessoa certa, assim como eu encontrei. — Abro um sorriso
encantador.

— Ele é um homem de sorte.

— Eu também sou uma mulher de sorte.

— Ao menos posso te dar um abraço e te parabenizar


por essa conquista?

— Pode sim.

Ele me abraça, sabendo que essa é a nossa


despedida.

Ao me olhar novamente, sua expressão está fechada,


e eu não entendo por quê.

— Cuide bem dela, cara. — Com quem ele está


falando?

Ao olhar para trás, vejo Otto, que nos observa com a


expressão fechada também. Ele não foi embora. Meu
coração se enche de alegria. Ele estava aqui desde
quando, ouvindo minha conversa com Rafael?

— Pode deixar comigo, cara.

Há tensão entre seus olhares, mas nada que possa


resultar em uma guerra ou algo parecido. Eles poderiam
até apertar as mãos se não fossem homens orgulhosos.
— Mais uma vez: parabéns, Malu.

— Obrigada.

— Adeus.

— Adeus.

Ver Rafael ir embora com o coração partido me deixa


triste, no entanto sei que ele irá encontrar alguém que
goste dele. Só que precisa mudar e deixar de ser
controlador. Desse jeito, nunca encontrará ninguém.

Otto se coloca à minha frente e suas órbitas azuis


cercam o território. Ele está com as mãos enfiadas nos
bolsos da calça.

— Pensei que tivesse ido embora.

— Decidi ficar um pouco mais — sua voz saiu rouca,


porém ele tentou soar suave. — Eu a ouvi dizer que me
ama.

Ele ouviu. Não tem como negar, e eu não desejo


negar. Nunca mais quero fugir dos meus sentimentos, nem
do meu amor. Otto Cavalcante é o homem da minha vida.
Eu desejo me casar com ele, ter filhos com ele. Hoje sei
que encontrei a pessoa certa.

— Acredito que tenha ouvido muito bem.


— Não brinque comigo, princesa. O meu coração não
aguenta tantas emoções. Lembre-se de que sou mais
velho. E não é porque sou um fazendeiro com um passado
traumático, que posso sofrer fortes emoções.

— E não é porque sou uma mocinha doce e gentil,


que posso permitir que meu cowboy tenha fortes emoções.

Vejo-o se ajoelhar diante de mim. Ele me mostra uma


caixinha de veludo e, quando a abre, deparo-me com um
anel prata com uma pedra azul. Deve ser muito valioso.
Meu coração chega a errar as batidas.

— Otto...

— Seja minha esposa, case-se comigo. Aceite ser


minha por toda a nossa vida.

Deslumbrada com o seu pedido e cheia de emoção,


quase choro. É claro que aceito ser sua esposa.

— Sim, eu aceito.

Ele não perde tempo e coloca o anel em meu dedo.


Logo depois seus lábios macios beijam os meus
fervorosamente e meu corpo vibra com os seus toques. Eu
sou sua. Sempre fui. Não tem como fugir desse amor. Ele
foi o meu melhor acerto.

— Você me trouxe flores e eu ganhei um anel —


comentei. — Agora me sinto em dívida com você — falei,
cheia de segundas intenções.

O sorriso maroto em sua face é o meu ponto fraco.


Meu cowboy safado.

— Concordo, você me deve. Mas eu não quero


presentes, me contento com um chá de boceta. — O
safado morde os meus lábios.

Ele me leva até o seu apartamento, no vigésimo


sétimo andar. É deslumbrante a vista daqui de cima.
Posso ver as luzes iluminarem todo o centro, os carros
passando na avenida e as estrelas no céu.

Otto traz champanhe para nós dois.

— Desse, você vai gostar. Contém pouco álcool.

— Vamos brindar ao que exatamente?

— A nós dois, ao nosso namoro, noivado e


casamento. E também à sua formatura e ao negócio que
está para abrir. Lucrécia me contou.

Eu deveria imaginar que ela contaria. E não tem


nenhum problema em ter falado.

— Tim, tim! — Brindamos.

Ele tem razão, eu gostei desse champanhe.


Beijos molhados arrepiam meu pescoço e eu me
encontro em chamas pelo meu cowboy saliente. Sua
língua lambe minha orelha enquanto a sua mão vai
abrindo o zíper do meu vestido. Ele não perde tempo em
me deixar somente de lingerie. Gosto de me sentir amada
e desejada, e sei que ninguém mais poderia me querer da
maneira como ele quer.

Afrouxo o nó da sua gravata e vejo o seu peitoral


definido. Suas mãos passeiam pelo meu corpo e ele me
faz ficar de costas. Posso sentir sua língua lamber minhas
nádegas. Fecho os olhos e levanto a perna quando ele tira
a minha calcinha. Ajoelhado, Otto beija aquela região.
Agora sua boca está em minha intimidade. Gemo baixinho
com esse contato íntimo e prazeroso.

Ele me leva para dentro do quarto e se livra das suas


roupas. Nós dois estamos despidos, desejando um ao
outro. Um misto de sensações arrebatadoras invade
nossos seres. Ele me quer, e eu o quero mais ainda.

Sou surpreendida quando Otto me segura nos braços


e coloca o meu corpo na parede. Depois me ergue um
pouco mais, até que minha boceta fique de encontro à sua
boca. Sinto-me alta agora. E realmente estou. Suas mãos
me seguram pela cintura e minhas pernas estão sobre
seus ombros. Eu encosto os pés um no outro para melhor
me segurar e sua língua hábil esmaga a minha intimidade,
levando-me à loucura. Sou consumida pelo tesão e pelo
desejo ardente, explodindo em um gozo quente e intenso.
Sabendo disso, Otto me deita sobre a cama e diz:

— Quero te amar, minha pequena.

Realmente, eu sou pequena, e quando estamos sem


roupas, pareço ainda menor ao seu lado.

Seu corpo cai sobre o meu e, primeiro, ele brinca com


a cabeça do seu pau roçando na minha entrada. Minha
boca saliva por um beijo seu. Meu gosto está em seus
lábios.

— Eu amo você, minha menina.

— Eu amo você, meu cowboy.

— Venha sentar no seu cowboy. — Com ele pedindo


desse jeito, não tem como negar.

Apoio meus pés firmemente no chão. Otto está


sentado sobre uma cadeira de madeira e minha boceta
engole o seu pau. Cavalgo sobre o seu membro como ele
me ensinou. Sou uma boa aluna e deixo o meu professor
louco de tesão. Ele adora mamar nos meus peitos.

Nós nos completamos de todas as formas.

Ele é um cowboy bruto rendido pela sua menina. Otto


foi a minha melhor escolha.
Aplaudo incansavelmente ao ver minha menina sorrir
lindamente. É um sorriso estonteante, por ela ter acabado
de cortar a faixa de inauguração do seu restaurante.
Alguns meses se passaram desde a sua formatura e
muitas coisas aconteceram, como ela ter descoberto que
fui o responsável pelo banco emprestar dinheiro à sua tia
e à Lucrécia. Todavia, não discutimos, pois apenas facilitei
todo o processo. Eu sabia que ela jamais aceitaria meu
dinheiro, e por isso consegui meios para que o seu sonho
pudesse se tornar realidade.

— Parabéns, minha pequena.

— Obrigada, meu amor. — Malu me beija e volta ao


trabalho, que exige muito da sua atenção.

— Você fica muito sexy vestida dessa maneira.

Seu estilo de empresária sexy me excita. Ela sabe


que estou duro e louco para a amar.

— É melhor você se contentar. Tem um banheiro na


minha sala. Pode tomar banho de água fria lá — ela
brincou.

— Não diga isso nem de brincadeira, minha princesa.


Estou imaginando nós dois nus sobre a sua mesa de
escritório.

— Você nunca abusa de mim?

— Tem dúvidas sobre isso? Óbvio que não, meu mel.


Você é a única capaz de me deixar assim: completamente
duro e louco de amor por ti, uai. É bão demais sentir seu
calor, minha loira.

— Meu cowboy sexy, me deixe trabalhar. — Ela sai do


meu abraço.
Eu estava saboreando seu perfume de flores e
beijando o seu pescoço fino, porém sou obrigado a sair e
a deixar trabalhar, contra a minha vontade. Mas não
insisto, porque mais tarde ela será toda minha e não terá
como fugir dos meus beijos e carícias.

A parte do marketing e toda a divulgação atraiu


bastantes pessoas para a inauguração. Todos fazem filas
para entrar no restaurante. E a equipe é composta por
profissionais capacitados.

Nada me deixa mais feliz do que ser testemunho da


felicidade dela. Seus olhos brilham como nunca antes. Eu
a aplaudo mais uma vez e não me canso de vê-la tão
sorridente.

Decidimos namorar por algum tempo antes de nos


casarmos. A minha menina é também uma mulher de
negócios, e com o restaurante fazendo cada vez mais
sucesso, ela necessita passar mais tempo na cidade. Por
esse motivo, comprei uma mansão perto do trabalho da
minha noiva, para evitar que ela percorra longas
distancias até lá e, assim, não se canse.

Os dias que necessito passar na fazenda, longe dela,


são os piores da minha vida. Estou viciado no seu perfume
de menina e acostumado a ter o seu carinho todas as
noites. Tenho buscado um meio de passar mais tempo na
cidade com ela, e, para isso, estou capacitando o Marcos
para administrar a fazenda quando eu estiver ausente. E
algo me diz que ficarei bastante afastado dos meus
negócios por causa de uma certa loirinha boa de cama.
Meu pau pulsa só por eu pensar que amanhã irei para a
cidade e a terei em meus braços.

Encerro a chamada de vídeo e vou dormir. Viajar para


lá sempre me cansa, só que não deixo o meu cansaço me
abater. Uma menina linda e carente me espera na minha
cama para ser amada. A vida no campo pode ser tranquila
e menos agitada que a vida na cidade, porém quando
estou longe dela, nada consegue me acalmar.

Lucrécia está em uma idade na qual pode apenas


descansar, relaxar, mas não aceitou a minha proposta de
se aposentar e insistiu que quer cuidar dos meus filhos.
Não pude negar esse pedido à mulher que é como uma
mãe para mim e que sempre esteve ao meu lado, com
palavras doces e conselhos sábios. Uma nova babá foi
contratada para a ajudar, e desta vez é uma mulher
qualificada, que detém muito conhecimento. Ela é uma
prima distante de Lucrécia.

A cada dia que se passa, mais sapecas eles ficam.


Ouvi-los me chamarem de papai é o meu presente. Eles
são os amores da minha vida, os meus bebês fofos e
lindos. Eu os amo mais que tudo nesta vida e sempre
estarei ao lado deles, cuidando dos dois e sendo protetor,
mesmo que um dia eles estejam adultos. Sempre farei o
meu melhor para ambos. A paternidade me fez uma
pessoa melhor.

Recordo-me do dia em que ela me disse “sim” no


altar. O casamento foi realizado às 19h, na catedral. Eu
estava suando ao entrar na igreja, ansioso para ver a
minha esposa vestida de branco. Ela foi a noiva mais linda
que já existiu na face da terra.

Nossos padrinhos estão rindo de mim. Parece que


sou um jovem inexperiente. Ela faz eu me sentir assim e
vulnerável a esse amor. Meu cunhado e minha irmã riem
baixinho. Eu gostaria que o padre os repreendesse, seria
divertido.

Quando a marcha nupcial começa a tocar, meus olhos


podem admirar a mulher mais bonita do mundo, a minha
futura esposa.
A coroa prata sobre sua cabeça a torna uma princesa
linda e esbelta. Certamente, as princesas de sangue real
estariam morrendo de ciúme da minha Malu se a vissem
neste momento. Sou um homem de sorte por tê-la
encontrado. Sou grato por ela ter ido à fazenda com o
intuito de se vingar de mim. Fomos unidos pelo seu ódio,
que, na época, já viria a ser amor. Ela apenas não sabia
disso.

Quando a vejo caminhar, algumas lágrimas escorrem


pela minha face. Chorar no dia do casamento não é
fraqueza, e sim uma demonstração de amor. Minha noiva
também está muito emocionada, e ao entrar de braço dado
com Marcos, que também é nosso padrinho, meu coração
acelera, deixando-me louco para a amar da maneira certa:
sob a benção de Deus.

Quando minha mão toca a sua, sinto que ela é a


mulher perfeita para mim. Nunca tive dúvidas sobre isso.
Momentos como esse apenas ressaltam o quanto ela é
única e especial para mim.

— Você está linda — sussurrei.

— Você também está lindo.

Seu sorriso é a minha perdição. Eu me apaixonei por


ele desde a primeira vez que o vi e soube que ela seria
minha.
O padre conduz a cerimônia e tudo está saindo
conforme o planejado e ensaiado. A minha pequena está
nervosa e feliz, assim como eu. Somos parecidos em
tantas coisas e, ao mesmo tempo, tão diferentes. O nosso
amor nos completa.

— Otto Cavalcante, você aceita a Maria Luíza como


sua legítima esposa...?

— Sim, eu aceito — interrompi a fala do padre,


tamanha é a minha emoção e ansiedade para estarmos
casados. — Perdão, padre.

Os convidados acabam rindo e minha noiva também.


Ela está vermelha, rindo por dentro.

— Calma, ela será sua esposa — ele brincou. —


Continuando... Prometendo amá-la e respeitá-la, na
riqueza e na pobreza, nos momentos bons e felizes, por
todos os dias de sua vida?

— Sim, eu aceito.

— Maria Luíza, você aceita Otto como seu legítimo


esposo, prometendo amá-lo e respeitá-lo, na riqueza e na
pobreza, nos momentos bons e felizes, por todos os dias
de sua vida?

— Sim, eu aceito. — Ela abre um sorriso lindo.


— Eu vos declaro casados. Agora são uma só carne
para toda a vida. Pode beijar a noiva.

Beijo a testa dela suavemente como sinal de respeito


e depois os seus lábios com carinho. Todos aplaudem.

Pulamos a etapa da festa e a levo direto para a nossa


viagem. Nós nos despedimos de todos na igreja mesmo.

— Não acredito que me roubou minha festa de


casamento.

— Quando voltarmos da lua de mel haverá uma festa


esperando por nós.

Ela apenas ria e olhava pela janela as luzes dos


prédios a iluminar a cidade. Viemos para Fernando de
Noronha, um paraíso na terra, onde eu reservei uma parte
especial somente para nós dois. Eu posso vê-la rebolar
aquela bunda grande somente de biquíni, sem me
incomodar com outros homens olhando para o que é meu.
Sou ciumento, admito, mas sempre faço de tudo para a ver
feliz e realizada.

Nossos corpos estão suados, amando-se sob a luz da


lua de uma maneira intensa e gostosa. A minha menina
rebola sobre o meu pau duro, esfregando seus seios em
minha cara. Eu os chupo, lambo e mordisco, porque eles
são meus, e ninguém pode tocar neles além de mim.

— Quero fazer muitos filhos em você, minha gostosa.

— Faça quantos quiser, meu cowboy.

Minha gostosa cavalga apaixonadamente, inebriada


de paixão e desejo, assim como eu.

Nossa lua de mel é apenas o início da nossa


felicidade, da nossa escolha correta. Minha menina linda
veio me mostrar que amar nunca é um erro. Pode passar
mil anos, e eu sempre amarei a minha menina gostosa.
Nós estamos casados há quatro anos e todas as
manhãs eu desperto sob seu olhar de predador. A cada dia
que passa, mais descubro que meu marido é insaciável.

Admiro seu tórax desnudo. A única peça de roupa que


ele usa é uma cueca boxer, que marca todo o seu volume.

— Bom dia, minha pequena. — Ele pressiona seus


lábios carnudos sobre os meus e meu corpo já responde a
esse toque com tesão.

— Bom dia, meu amor. — Eu acaricio sua face com as


mãos e ele abre um sorriso safado.

Seus olhos negros me observam minuciosamente. Ele


nunca se cansa de olhar para mim, mesmo quando estou
desarrumada e com olheiras. Para Otto, é como se
estivesse vendo algo extraordinário.

Com seus gestos ousados, ele puxa a mini camisola


sensual que vesti ontem à noite e a pequena calcinha é
arrancada com muita facilidade. Seus dedos hábeis vão de
encontro à minha intimidade encharcada. Ele me deixa
assim todas as vezes que me devora com seu olhar
faminto e sexy.

— Que delícia, amor! Vou comer essa bocetinha


molhadinha.

Estou inebriada pelas suas palavras quentes,


sedutoras, e gemo gostoso quando ele massageia minha
boceta com habilidade. Eu poderia passar toda a manhã
assim, na cama com ele, e mandar todos os meus
assuntos do dia se foderem. Otto não conhece a palavra
“pudor”, já que nunca demonstra ter isso.

O cowboy começa a me chupar lentamente, levando-


me à loucura, e sua língua habilidosa esmaga meu clitóris
com precisão. É questão de minutos para ele me fazer
gozar na sua boca quente. Sou preenchida pelo prazer
delirante.

Todas as nossas manhãs costumam ser quentes e


calorosas. Por ele, passaríamos o dia inteiro na cama,
amando-nos.

— Gostosa!

Ele me vira de costas, fazendo-me ficar de quatro


sobre a cama. Minha posição preferida no sexo, e a dele
também. Seu pau grande está duro como uma rocha e
posso senti-lo esmagar minha boceta, invadindo o meu
canal quente e molhado. Gosto da sensação de ser tocada
pelo meu marido. Suas investidas são rígidas, precisas e
me fazem querer gritar muito alto. Mordo um dedo meu
para não perder o controle e agir como uma
descontrolada. Se bem que essa é a palavra correta para
me descrever quando estou em seus braços. Suas
arremetidas me instigam, levando o meu corpo a ficar
febril, e minhas nádegas carregam a marca de suas mãos.
Otto adora bater nessa região com força.

Eu estou tão excitada, que vou gozar.

— Goze, minha bonequinha. Seu marido também está


louco para gozar. — Dito isso, chego ao meu limite.

A sensação é de que estou flutuando sobre as


nuvens. Somente Otto é capaz de me proporcionar tanto
prazer e me fazer ver estrelas ao amanhecer. Ele também
goza intensamente.

— Porra, gostosa! Assim você me mata, minha


safada.

— Eu te amo. — Eu beijo a sua boca gostosa e ele


retribui com muito desejo.

É melhor levantarmos da cama antes que algum dos


nossos filhos entre por aquela porta e nos flagre pelados,
como quase aconteceu algumas vezes. Ter a casa cheia
de crianças só pode resultar nisso. Os gêmeos, Alícia e
Lohan, são espertos e muito inteligentes. Por serem os
mais velhos, cuidam dos irmãos mais novos. Em quatro
anos de casados, tivemos dois filhos, dois meninos lindos:
Gabriel e Lucas. Eles são minhas paixões e eu vivo para
os amar. Meus quatro bebês são a razão da minha
existência. Os filhos de Otto também são como meus, e
por verem os irmãos me chamando de mamã, eles também
me chamam de mamãe. Para mim é uma grande honra
ouvi-los me chamarem assim.

Depois de um banho quente e longo na banheira com


espuma e sais relaxantes, entro no closet e vejo meu
marido abotoar a camisa. Essa simples cena já me excita
de uma maneira intensa e todo o meu corpo queima por
ele. Através do espelho, ele me vê morder os lábios,
repleta de desejo, e um sorriso satisfeito brota dos seus
lábios.
— Não me faça ir até você, querida, e chupar sua
bocetinha mais uma vez.

— Você não pode, está atrasado — provoquei, vendo


faíscas saltarem dos seus olhos.

— Não posso? — indagou, caminhando na minha


direção.

Ao me beijar, ele abafa meus gemidos com a sua


boca.

— Preciso ir para o restaurante. Tenho alguns papéis


para assinar.

— Tudo bem, mas não faça planos para a noite. Já


sabe que sou o único dono delas.

Eu abri uma outra filial na cidade vizinha há cerca de


um ano e tudo indica que em breve abriremos mais duas.
O meu negócio é cada vez mais um sucesso. O
empréstimo no banco foi renegociado e pago por inteiro
com os lucros que obtive. Apesar de Otto o ter solicitado,
por saber que eu não aceitaria o seu dinheiro, o mérito foi
meu, a ideia e todo o trabalho. Orgulho-me da minha
profissão.

Com Marcos administrando a fazenda e Mariana


sendo a nova governanta, posso ter mais do tempo do meu
marido. Mas é claro que sempre vamos para lá. Uma vez
por mês passamos alguns dias naquela casa, aproveitando
o lazer, andando a cavalo, fazendo amor no riacho,
colhendo café, fazendo amor no cafezal... Resumindo, eu
nunca poderia imaginar que seria tão feliz ao lado do
homem que mais odiei nesta vida. Chego a rir hoje em dia
quando me recordo de todo o ódio que já senti por ele.
Otto nunca foi uma má pessoa, pelo contrário, ele é um
pai excepcional, dedicado, alguém gentil e, acima de tudo,
um bom marido. É protetor, amoroso, sabe me satisfazer
como ninguém, admira o meu trabalho como meu fã
número um e me traz flores quase todos os dias. Tive que
reclamar sobre isso, por ele estar me mimando demais,
porque depois poderia se arrepender.

Estar em família, brindando e comemorando, é


incrível. Quando os meus filhos se juntam com os de Érika
e de Mariana a farra é garantida e podemos esperar
muitas risadas, choros, machucados e crianças felizes.
Elas são sapecas.

A cada ano novo que se inicia, mais certeza tenho de


que fiz a escolha certa. Assistimos à queima de fogos do
quintal. Eu seguro Lucas nos braços e Otto segura
Gabriel. E enquanto abraço Alícia, Lohan está com o pai.
Os dois são muito próximos. As crianças estão
deslumbradas com o grande espetáculo no céu que estão
vendo.
— Deveríamos soltar mais fogos de artifício. Assim,
nossos filhos virariam anjinhos — comentei.

Otto ri e concorda.

— Tem razão, meu amor. Feliz ano novo. Te amo, meu


amor. — Ele me beija suavemente nos lábios e as crianças
mais velhas reclamam, fazendo-nos rir.

— Também te amo, meu amor. Feliz ano novo.

Se alguém tivesse me dito há quatro anos que eu


poderia ser tão feliz, teria duvidado. Eu era uma menina
cheia de sonhos e com ódio no coração, no entanto fui
moldada pelo amor e pela verdade, e hoje não vivo mais
sem a minha família.

O meu “felizes para sempre” não é nenhum conto de


fadas, mas é o melhor que a vida poderia ter me dado.
Brindamos com o restante da nossa família. A minha
irmã está presente com o marido e o filho, assim como
Lucrécia, que é como a nossa mãe, Mariana e Marcos, que
já são da família, e a tia da minha esposa, que é quem
controla a bebida, junto com o seu marido. O romance
dela com o diretor da faculdade resultou em muita
felicidade para ela.

A queima de fogos está quase no fim e as crianças já


estão dormindo. Apenas nós, adultos, estamos curtindo.
Alguns de nós estão tão bêbados, que precisam ser
carregados pela esposa até o quarto, como o meu
cunhado.

Do que um homem precisa para ser feliz? A resposta


está bem ao meu lado e tem menos de um metro e
sessenta e cinco de altura, cabelos claros, olhos azuis e
uma personalidade única e especial. Minha esposa e os
meus filhos são a base de toda a minha felicidade. Cada
dia ao lado da minha princesa faz eu me sentir uma
pessoa feliz e realizada. Vivo intensamente para eles.

Meus olhos veneram a minha pequena dançando de


uma forma desajeitada com a sua amiga Mariana. Ambas
estão um pouco chapadas e chega a ser divertido vê-las
cantar uma música enquanto erram quase toda a letra. Ela
está de pés descalços e com um sorriso no rosto.

— Está na hora de eu levar a minha princesa para


dormir.

— Mas já? Dance uma comigo, meu cowboy gostoso.

Como dizer “não” à minha menina? Agora estamos


somente eu e ela. Não há um lugar sequer nesta casa em
que nós dois já não tenhamos nos amado. Mas o nosso
casamento não se resume apenas a sexo, pelo contrário, o
sexo é a consequência de muito amor acumulado em
nossos corações. Maria Luíza é a minha melhor amiga, a
minha companheira de decisões e de vida. Não existe
mais Otto sem Maria. Ela é a dona do meu coração. Como
eu agradeço todos os dias por tê-la comigo. Quando me
julguei um condenado, um amaldiçoado, nunca pensei que
poderia ser agraciado por um amor tão intenso como esse.

— Faça amor comigo — ela me pediu, quase caindo


de sono.

— Mas você está cansada, meu amor.

— Me beije. — Ela está sonolenta, tombando em


meus braços.

Acabo rindo baixinho e a levo no colo para a nossa


cama, na qual passo a noite inteira admirando-a dormir.
Minha pequena Malu, minha esposa, minha menina.
Eu a amo tanto, que esse amor chega a queimar dentro de
mim. Minha melhor decisão foi amá-la.
Obrigada a toda a equipe por ter colaborado com
mais este romance: revisora, diagramadora, capista e
banista.

Obrigada a todos os meus leitores, por sempre me


darem apoio em todos os meus livros e cada vez mais me
incentivarem a escrever.
UM BEBÊ INESPERADO PARA O BILIONÁRIO

https://www.amazon.com.br/B0B1DVRM44/
Kauã Avillar sempre teve tudo aos seus pés: dinheiro,
mulheres e uma vida regada a luxo e diversão. No passado, ele se
apaixonou pela esposa do seu irmão Viktor, quando ambos ainda
eram namorados. Kauã nunca o perdoou por ter se casado com a
única mulher que ele amou.
Os anos se passaram e ele, agora, está envolvido com outros
prazeres. O homem é bonito, sedutor, o cafajeste perfeito. E, em
uma certa noite, acaba tendo um encontro casual, sob a luz da lua,
com uma mulher misteriosa, que desperta seu lado predador.
A jovem Micaella nem sempre teve a vida fácil. Ela e a mãe
nunca deixaram de batalhar para se sustentarem. A moça é querida,
amada pela sua mãe, encantadora e não tem medo de se arriscar.
Ao se esbarrar com o belo e sedutor Kauã, sente-se atraída, e um
sentimento arrebatador surge em seu coração. Quando se entrega
ao bilionário, vive uma paixão intensa e arrebatadora.
O que Micaella não poderia imaginar era que o seu amor iria
embora e que ela não receberia mais notícias do homem que a
enganou. Dias depois, ela descobre que está grávida. Aflita, não
sabe o que fazer, e se vê perdida para enfrentar a vida sozinha. Ela
jurou nunca mais entregar o seu coração a homem algum.
Mas, e se meses depois, ela encontrasse o pai do seu bebê, mesmo
que sem querer, teria coragem de contá-lo que eles tiveram um
filho?
MEU CHEFE CEO VIÚVO

Livro 2 da série “Viúvos atraídos”


https://amz.onl/5l4D31I

Viktor Avillar amou intensamente uma mulher que também o


amou de corpo e alma. Eles se casaram, tiveram uma linda filha, a
pequena Bia, e a vida deles estava perfeita. Até que, em um dia,
enquanto voltava da casa dos pais, sua mulher, Sofia, sofreu um
grave acidente de carro que a deixou entre a vida e a morte. Os
médicos fizeram tudo que estava ao alcance deles, contudo o
estado dela era muito delicado e ela não teria chance de sobreviver;
definhava em um estado vegetativo e era impossível voltar à vida.
Mas Viktor não desistiu dela e não autorizou que desligassem seus
aparelhos. Porém, o destino não quis que ambos vivessem um final
feliz. Sofia morreu, deixando-o sem esperanças de que, algum dia,
pudesse amar novamente. Ele se fechou para o mundo.
Considerado o viúvo mais bonito de toda a cidade de São
Paulo, sua única luz está na sua filha, quem ele ama e para quem
se dedica ao máximo. Só não imagina que o amor possa ressurgir
para si novamente; e, dessa vez, em forma de uma menina-mulher:
Giulia.
SÉRIE “MÁFIA SMIRNOV”

A PREDILETA DO MAFIOSO (1)


https://amz.onl/gOc7ESi

Bonito, atraente, forte e musculoso. Dominic Smirnov é como o


anjo da noite. Ele é imprevisível quando o assunto é mulheres,
porém decisivo e imponente com seus inimigos. Como chefe da
máfia mais poderosa de toda a Europa, Dom tem tudo sob seu
poder. É o filho mais velho, o sucessor de seu pai. Seu legado é
implacável, genial e impiedoso, e sua fama ganhou os quatro
continentes do mundo. Conhecido pelo seu harém de mulheres, o
“sultão da máfia” jamais entregou seu coração a uma mulher. Seu
conceito sobre casamento e construir uma família não significa nada
além de uma obrigação. Por esse motivo, ele nomeou Malia como
sua futura esposa. Esse será apenas o começo de uma linda
história de amor? Ou grandes conflitos estão prestes a iniciar?
Malia é linda, inteligente, esperta, batalhadora, tem um
coração gigante, é bondosa e encanta todos ao seu redor com sua
beleza e carisma. Ela é uma moça simples que vive com sua mãe
desde a morte do seu pai e que teve que se desdobrar para ajudar
nas despesas da casa. Contra a vontade da mãe, Malia ocupou a
antiga vaga dela, que precisou deixar o emprego por conta de
problemas de saúde. Ser faxineira e garçonete em uma luxuosa
boate não estavam em seus planos, mas tudo estava indo
perfeitamente bem, até que seu caminho se encontrou com o
poderoso chefe da máfia.
A MENINA DO MAFIOSO (2)
https://amz.onl/idTot97

Genevieve é linda, divertida e virgem! Ela precisou fugir do seu


país e vir para a Rússia, com o intuito de ajudar a sua família: sua
mãe e sua irmã mais nova. Ela deseja tirá-las das garras do seu pai
viciado. Chegando em Moscou, ela conheceu Malia e sua mãe, que
são como sua família. Ela leva uma vida tranquila mesmo
trabalhando como faxineira em uma boate de mafiosos.
Após o casamento de seu irmão mais velho, Nikolai, o
subchefe da máfia mais poderosa da Europa precisava encontrar
uma esposa virgem. O que ele não imaginava era que os boatos
sobre a mulher que lhe despertava atenção eram falsos. Ao
descobrir a verdade ele ficará furioso, e a tomara para si.
A ESPOSA VIRGEM DO MAFIOSO (3)
https://amz.onl/3yg9vEC

Iuri Smirnov é um playboy bilionário que sempre teve tudo aos


seus pés, um Don Juan bonito e cheio de carisma. Apesar de vir de
uma família tradicional da máfia russa, o jovem construiu um
patrimônio sólido, tornando-se um dos homens mais ricos da família.
O filho número três sempre foi obcecado pela vida regada a
mulheres e bebidas, mas conforme foi amadurecendo, precisou se
inteirar dos assuntos relacionados à máfia. O mais importante deles
seria honrar o acordo feito pelos seus pais anos atrás: Iuri precisaria
se casar com Marina, a filha da empregada da mansão.
O galinha da família seria capaz de abrir mão das suas farras
por um casamento?
Marina Solokova cresceu sem o pai, foi criada pela mãe e
passou a maior parte da sua vida em uma escola católica, onde
aprendeu os valores da vida. A menina sempre foi esforçada e
dedicada.
A vida de Marina começa a mudar quando ela decide ir morar
com a mãe na mansão Smirnov e virará de cabeça para baixo assim
que ela descobrir que terá que manter um casamento com o filho
dos patrões.
SÉRIE “FAMÍLIA GREGO”

UM MAFIOSO: OCCHI NON AZZURRI (1)


https://amz.onl/0O83g6J

Enrico Grego é um chefe de máfia, que desde cedo aprendeu


a ser um homem frio e calculista. Foi criado para despejar ódio pela
terra, ser implacável com os inimigos, frio com as pessoas que o
cerca e temido por todos a sua volta. Convicto de suas
responsabilidades desde o dia em que veio ao mundo, sabe que
está na hora de tomar sua prometida para si, tornando a garota sua
esposa, mesmo contra a vontade dela. Um homem sombrio e
cercado de mistérios trevosos aprenderá que nem tudo na vida
acontece da sua maneira.
Giovanna Prattes é uma menina indefesa e inocente que se vê
numa situação indelicada ao descobrir que está prometida ao
temido chefe de uma máfia. Contra a sua vontade, ela e sua família
se mudam para a Itália, onde aprenderá que nem tudo sempre foi
magia e que seu mundo de “faz de conta”, não passa de uma
grande ilusão.
Um romance movido por segredos do passado!
PRÍNCIPE DA MÁFIA (2)
https://amz.onl/9LMnYI0

Enzo sempre viveu na sombra do seu irmão mais velho, o


poderoso Enrico Grego. Desde pequeno fora acostumado a ser
sempre o seu braço direito, mas agora, depois de anos sendo
sempre o segundo em tudo, Enzo finalmente assumirá seu cargo de
chefe da máfia francesa, casando-se com a não tão bela jovem
Luana.
Luana sempre criou expectativas em relação ao seu
casamento. Ela o viu apenas algumas vezes, mas isso foi motivo o
suficiente para se apaixonar perdidamente pelo belo Grego.
Sempre sozinha, Luana busca nesse casamento poder ter
novamente uma família de verdade, já que seus pais morreram em
um acidente de carro há alguns anos. Seu único parente vivo é o
seu primo, do qual o respeita e o tem como irmão.
Um casamento de interesses poderá um dia passar disso e se
tornar algo a mais? Você seria capaz de viver um amor em vez de
querer ser o chefe?
PROMETIDA AO CHEFE DA MÁFIA (3)
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Anastácia sempre foi a revoltada da família e nunca teve


direito a nada por ter nascido mulher. Inconformada com a realidade
em que vive, sempre foi a mais direta dos Grego e a única capaz de
dizer tudo o que pensa das pessoas. Uma menina mulher de língua
afiada.
Cansada de ver os irmãos sempre terem tudo e tratarem suas
esposas como capachos, principalmente seu irmão Enzo, que faz da
vida da sua mulher um verdadeiro inferno, tomou uma grande
decisão. Enfim decidiu que iria enfrentar todos os seus medos e ser
feliz acima de tudo.
Sempre viveu um amor escondido ao lado do seu amado
Thiago, até que um dia seu irmão Enrico autorizou esse namoro e
desfez o compromisso que ele mesmo tinha selado para ela com
Andrei Barkov, chefe da máfia russa. Até aí tudo bem.
Compromissos são desfeitos todos os dias. Mas não no mundo da
máfia. O terrível Andrei Barkov, inconformado com o rompimento,
tinha apenas um objetivo: se vingar da família Grego através da
jovem e bela irmã caçula.
DUOLOGIA “CRETINO IRRESISTÍVEL”

PRESA A UM CRETINO IRRESISTÍVEL (1)


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Martina Martins é uma bela jovem brasileira de 19 anos que


vive sua vida pacata morando no morro do alemão, no Rio de
Janeiro. É uma típica menina bonita que sonha em ingressar na
Faculdade e ter uma vida normal, como toda garota da sua idade.
De personalidade forte e temperamento explosivo, não tem “papas
na língua” e não abaixa a cabeça para ninguém. Também é tímida e
inocente. Vive com o seu pai Juan e sua amiga Gaby. Eles são a
única família que ela tem.
Quando tinha 9 anos, foi adotada por Juan. Tininha — como é
conhecida —, não se recorda de nada do seu passado. É como se
tivesse nascido com cinco anos. Todas as suas memórias passadas
foram apagadas e nunca mais voltaram.
Sua vida muda repentinamente quando um grupo de homens
desconhecidos batem na porta da sua casa e a levam à força para
um país desconhecido que ela só ouviu falar pelos livros de
Geografia. Então vai parar nas mãos de Theodore Velarde, um
homem frio e calculista com o ego maior que o planeta terra.
Theodore Velarde, conhecido pelo seu coração de gelo, é um
homem abominável e insaciável que não conhece o significado da
palavra “não”. Quando ele a viu pela primeira vez, ficou obcecado,
imaginando o dia em que a teria em sua cama.
Após Juan, cogitar deixar a equipe, Theodore decidiu que a
filha dele seria sua mais nova diversão. É um homem perigoso,
egoísta e cheio de ambição. Por trás de uma máscara de
empresário bem-sucedido e de prestigio, esconde um passado
perturbado e cheio de marcas. É destinado a ser o mau em forma
de pessoa na terra. Rei dos casinos e de inúmeras casas de luxo, é
envolvido com o mundo da prostituição e fará de Martina a sua mais
nova obsessão.
Aprisionada e trancafiada, ela só deseja fugir e não se
apaixonar pelo seu algoz.
QUASE LIVRE DE UM CRETINO IRRESISTÍVEL
(2)
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Após sua suposta morte, Martina se vê em um novo país com


uma cultura totalmente diferente da qual estava acostumada, porém
cercada daqueles que ama: o seu pai, a Gaby e, agora, seu mais
novo amor, o seu filho Ethan. Ele é o seu refúgio. Ao seu lado, ela
consegue esquecer os dias trevosos que viveu ao lado de Theodore
Velarde.
Todos estão felizes e satisfeitos com a nova vida que levam.
Ambos são livres e podem viver com dignidade e tranquilidade. Mas
não por muito tempo.
Ele passou mais de um ano se culpando pela morte da única
mulher que amou e, também, a que mais o fez sofrer. Agora que
sabe toda a verdade, seu coração se encheu ainda mais de ódio e
rancor. Está decidido a buscá-la e a torná-la sua amante
novamente. Desta vez, para sempre.
Essa história terá, finalmente, um final feliz? Ou Theodore será
capaz de cometer os mesmos erros do passado?
VENDIDA PARA HAKAN

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Adara Alcântara é uma brasileira batalhadora, linda e gentil,


que dedica a sua vida ao seu irmão mais novo, e por ele é capaz de
tudo, inclusive de ir em busca de um emprego melhor para ajudar
com as despesas de casa. Ela só não imaginava que tudo era um
golpe.
Sua vida muda completamente ao cair em uma cilada do
destino.
Adara se vê traficada e nas mãos de uma máfia perigosa,
envolvida com tráfico de mulheres e prostituição. Ela é levada a uma
boate, na Espanha, onde é vendida para um bilionário arrogante
com o qual já havia tido um caso meses atrás: uma noite envolvente
e recheada de sexo. Após ter se entregado ao estranho gostoso,
agora se vê sendo obrigada a conviver com ele.
Hakan Al-Hashid é o emir do Catar. Bonito, bilionário e
inteligente, ele precisa encontrar uma mulher que esteja disposta a
aceitar ser sua noiva por contrato, já que está sendo pressionado ao
casamento pelo seu pai, que está velho, doente e deseja ver o filho
casado. Ele vai até uma boate para comprar uma mulher e encontra
Adara, que já tinha despertado sua atenção meses atrás, quando
eles viveram aquela noite tórrida de sexo. E agora se
reencontraram.
Ela aceitará o que lhe for imposto e será a sua noiva por
contrato. Poderá, de um romance enganoso, nascer amor entre
ambos?
Ele nunca amou antes e ela deseja conhecer o amor que
acontece uma vez na vida, um amor que é para a vida inteira. Seria
Hakan esse amor?
LOUIS - UM CONTRATO DE AMOR

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Louis Harrison é um empresário britânico de 31 anos, solteiro e


galã. Todo dia uma mulher diferente está em sua cama, muitas
delas. Ele está sempre acompanhado das mais belas socialites
britânicas. Se apaixonar não está em seus planos. Louis tem a vida
mudada quando sua mãe exige um casamento para ele, alegando
que já que está mais do que na hora.
A família Harrison precisa garantir um herdeiro para comandar
seus negócios, e tem que ser um homem. O único problema é: que
mulher aceitaria um contrato onde impede que ela crie o seu próprio
filho?
Isabella Silva é uma jovem brasileira de 22 anos e estudante
de medicina pediátrica em uma das mais renomadas Universidades
da Inglaterra, a Universidade de Cambridge. Ela tem sua vida
transformada quando recebe uma grande e dolorosa notícia sobre o
seu pequeno irmão.
O destino a obriga a entrar numa confusão e a garota se vê
indecisa entre aceitar ou não o tal acordo. A vida de seu irmão está
praticamente em suas mãos. Ela aceitará o contrato, mesmo tendo
que abrir mão da futura criança, pelo bem-estar de seu irmão?
O que o futuro os reserva?
SOB O DOMÍNIO DO SHEIK

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Zyan Mohammed Youssef Al-Mim é o atual sheik do país: um


homem poderoso que não conhece limites. Ele é o limite de tudo e
de todos. Hoje, aos 31 anos, Zyan se tornou um homem bastante
respeitado e temido por todos à sua volta. Ele tem um reinado
perfeito e uma esposa que o ama e lhe proporcionou uma
descendência futura com a chegada do seu filho. Contudo, algo o
atormenta: um passado escuro o perturba até os dias de hoje. Ele
gostaria de voltar no tempo e poder corrigir aquele erro.
Layla Nabih Bashar é uma jovem sonhadora e destemida,
porém a vida nem sempre foi perfeita para ela. Após a morte de seu
amado pai, sua mãe Safira se viu totalmente perdida ao descobrir
que a família de seu marido iria tomar a criança para eles, deixando-
a totalmente de lado, com a intenção de mandá-la de volta para seu
país. Ela, então, decidiu fugir com Layla, para os Estados Unidos,
um país onde haveria muitas oportunidades para trabalhar e educar
a sua filha.
Após uma noite terrível, Layla e sua mãe, mais uma vez,
precisaram sair às pressas do lugar onde viviam e foram morar no
Brasil. Estando lá há alguns anos, com uma vida estabilizada, algo
mudará a vida da moça para sempre.
Um encontro capaz de deixar Zyan completamente perturbado.
Uma bela jovem de sorriso encantador acaba roubando o
coração do sheik sem nem ao menos perceber acaba roubando o
coração do Sheik, sem nem ao menos perceber.
A OBSSESSÃO DO CEO

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Stehven Foster é o chefe executivo da Hollings International


Foster, uma empresa de alta tecnologia com sede no Reino Unido e
com filiais em todo o mundo.
Aos 40 anos, Stheven pode se considerar um homem de poder
e influência. Sua vida é regada de mulheres e farras quando as
câmeras não estão registrando sua imagem de “bom moço”. É um
homem frio e arrogante que tornou-se ainda mais prepotente e
amargo após a morte de sua esposa e filha há alguns anos. Tal
fatalidade foi capaz de mudar sua vida para sempre.
O homem não acreditava mais no amor, até vê-la. Como irá
conviver com esse sentimento arrebatador e dominador?
Camilla Roberts não passa de uma menina sonhadora em
busca de estabilidade financeira. Após completar a maior idade,
precisou deixar o orfanato onde morava e seguir sua vida com
algum pouco dinheiro que as freiras lhe deram. Ela encontra morada
com duas amigas que também habitavam no lar para crianças
abandonadas, mas que agora vivem em um apartamento modesto e
afastado do centro, porém confortável.
A moça acreditava no amor mais que tudo nessa vida e só
queria ser amada.
A vida de Camilla está prestes a mudar para sempre ao cruzar
seu destino com o do Stheven, um homem frio e arrogante. Como
ela irá lidar com isso?
A BABÁ VIRGEM DA FILHA DO CEO

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Se você está procurando por mais uma história clichê que


migrou da Wattpad para a Amazon, onde o CEO é lindo e só um
pouquinho arrogante, e a mocinha, além de linda, inocente e virgem,
vira a cabeça dele... Aquele velho clichê entre babá e patrão em que
uma menina de 6 anos vai fazer de tudo para a sua nova babá
namorar com o seu pai... Você está no lugar certo. Bem-vindo ao
meu mundo, onde transformo minha imaginação em páginas de
livros!
Stacy é uma jovem sonhadora que sempre desejou fazer
grandes turnês internacionais quando era criança. Com uma voz de
anjo, encanta todos à sua volta. Com o passar dos anos, ela foi se
esquecendo do seu sonho e começou a focar nos seus estudos.
Após terminar o ensino médio, mudou-se com sua mãe para a
cidade de São Paulo, o grande centro de oportunidades para quem
busca novas chances de emprego.
Um anúncio no jornal se torna sua mais nova esperança. Ser
contratada para ser a babá da filha do CEO irá tirar ela e sua mãe
da crise financeira que ambas vivem.
Stacy só não esperava que o CEO fosse um homem de tirar o
fôlego, lindo e um pouquinho arrogante, que a notaria ao ponto de
querê-la.
Henrique Prado é um CEO bastante carinhoso e amoroso com
sua única filha, Heloyse. Para ele, a pequena é o seu maior tesouro.
Faz de tudo pelo bem-estar dela.
Casado com uma mulher fria e que não faz questão e
esconder o quanto não sente carinho pela filha, Henrique tenta
preencher, de todas as formas, o vazio que existe na menina.
Poderia essa família ter esperanças de um futuro melhor?
COMPRADA PELO CEO MISTERIOSO

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Lavínia viu a mãe morrer de câncer há três anos e, desde


então, trancou-se para o mundo, abandonou a faculdade e passou a
se dedicar ao trabalho em uma lanchonete. Ela vive com sua tia
Joane e seu irmão mais velho, Tomás, conhecido pela sua fama de
vagabundo e pegador, por toda a vizinhança.
A família sempre foi a coisa mais importante para a Laví (como
a garota é chamada carinhosamente), então, no momento em que
recebeu o diagnóstico de que sua tia estava com o mesmo tipo de
câncer da sua mãe, seu mundo desabou mais uma vez, e quando o
médico lhe deu a notícia de que Joane poderia vir a falecer se não
realizasse uma cirurgia com urgência, ela se viu desesperada, sem
saber o que fazer. Para complicar ainda mais, seu irmão está
devendo para o maior e mais perigoso bandido da favela.
Vender sua virgindade para um estranho, é algo que nunca
havia passado pela sua cabeça, até que sua melhor e mais íntima
amiga, Dafne, cogitou e lhe sugeriu essa ideia, por já ter saído com
um homem através de uma agência. Lavínia terá que fazer isso ou
acabará vendo toda sua família morrer, seja pelo câncer ou pelos
bandidos.
Felipe Henry Eduardo O’Donnell é um irlandês sexy, bonito e
multibilionário cheio de ambições. Ele leva uma vida regada a sexo
e a compromissos importantes, e sempre que vai ao Brasil à
negócios, sabe onde encontrar as mulheres mais sensuais e
bonitas, já que é cliente fixo da agência mais requisitada e sigilosa
do país.
Ao se deparar com a foto da virgem mais bonita que ele já viu,
não pensou duas vezes: pagaria o que fosse necessário para ser o
primeiro na vida daquela menina de olhos claros e cabelos cores de
mel. Só não esperava que ficaria obcecado pela jovem carioca ao
ponto de passar noites inteiras em claro pensando nela.
Contudo, ele sabe que sua família jamais aceitará qualquer
relacionamento seu com uma mulher que não tenha o sangue real.
Seis meses se passam e, agora, o príncipe Henry é o rei da
Irlanda.
OLIVER: O MONSTRO

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Laiza Nayara é uma jovem menina doce e inocente que foi


abandonada em um orfanato. Então, descobriu coisas horríveis
sobre o local onde foi abrigada: o simples “orfanato” para meninas,
na verdade, é um prostíbulo.
Ao descobrir que foi comprada por um misterioso bilionário, ela
se vê completamente perdida.
Oliver Campbell quer apenas vingança. Ele é um homem frio e
calculista que não mede esforços para conseguir tudo aquilo que
deseja. Laiza será dele. Na verdade, sempre foi. Um grande mistério
do passado liga a vida dos dois para sempre.
SOBRE A AUTORA

Uma paraibana de 22 anos de idade que se arriscou


recentemente a publicar seus livros na Amazon.
Aos 14 anos decidiu escrever numa plataforma gratuita
chamada Wattpad. O interesse pela escrita surgiu quando ela tinha
apenas 8 anos e escreveu um conto baseado em uma canção
sertaneja. Desse dia em diante, não parou mais.
Em decorrência de ter perdido seu primeiro perfil na
plataforma, pois nunca sabe onde guarda suas anotações, como
senhas, ela voltou somente em 2018 com a série "Cretino
irresistível", a qual logo contou com mais de 1 milhão de leituras
online.
Em 2019 surgiu uma ideia muito doida: três irmãos
completamente comuns. Só que não. Irmãos que se amam e fazem
de tudo para proteger uns aos outros. A família Grego é composta
por Enrico Grego, chefe da máfia; Enzo Grego, príncipe da máfia; e
Anastácia Grego, uma princesinha que se tornou a rainha da máfia.
Convido você a embarcar nessas lindas estórias onde o amor
prevalece no final.
Obrigada por adquirir este livro. Agradeço muito se puder
avaliá-lo com 5 estrelas, pois é muito importante para o autor.
Em breve, volto para a Amazon.
Autora MAD: onde a imaginação ganha vida e vira páginas de
livros.
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